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Henrique Gil

Educação gerontológica na contemporaneidade: a gerontagogia,


as universidades de terceira idade e os nativos digitais
Henrique Gil*

Resumo
O artigo pretende apresentar uma contex- de os capacitar para estes novos desafios
tualização relativa à dinâmica do proces- proporcionando-lhes condições para que
so de envelhecimento com uma reflexão possam usufruir de um melhor e mais ade-
acerca das suas diferentes valências. Tendo quado envelhecimento.
em consideração o aumento da esperan-
ça de vida, torna-se importante promo- Palavras-chave: Envelhecimento humano.
ver uma aprendizagem ao longo da vida Educação gerontológica. Gerontagogia.
‘para’ e ‘com’ os cidadãos mais idosos. Inclusão digital. Universidades da terceira
Neste âmbito, é realizada uma abordagem idade.
multidisciplinar onde se destaca a impor-
tância da gerontologia e da gerontagogia,
num contexto de formação que se preten- Preâmbulo introdutório
de ser mais ajustada às necessidades dos
cidadãos mais idosos. Neste particular, de Através da Resolução do Conselho
formação ao longo da vida, é dado um de Ministros do Conselho Europeu, que
particular realce às Universidades da Ter- se concretizou em 1995, com o lança-
ceira Idade a funcionar em Portugal, rela- mento do Livro Branco sobre Educação
tivamente ao seu contributo educativo e,
ao mesmo tempo, o seu contributo social.
e Formação: ensinar e aprender, rumo
Atendendo ao facto de cada vez mais a à sociedade cognitiva (COMISSÃO
presente sociedade do século XXI assentar EUROPEIA, 1995), foram postuladas
em serviços e plataformas digitais, o artigo bases para uma formação que pudesse
visa ainda promover uma reflexão crítica congregar toda a população.
relativamente aos designados ‘nativos digi-
Um ano mais tarde, em 1996, o «Re-
tais’ e aos ‘imigrantes digitais’, no que res-
peita às respetivas competências digitais latório Delors» (DELORS et al., 1996)
que lhes permitem exercer os seus direitos reforça o conceito de uma educação e
e os seus deveres como cidadãos. Neste aprendizagem ao longo da vida, ao con-
novo contexto digital, torna-se importante siderar que a missão da educação deve
incluir os cidadãos mais idosos no sentido promover quatro diferentes tipos de


*
PhD em Educação. Professor Adjunto na Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Castelo
Branco. Membro do Centro de Administração e Políticas Públicas do Instituto Superior de Ciências Sociais
e Políticas da Universidade Técnica de Lisboa e no Centro de Investigação do Instituto de Educação da
Universidade de Lisboa, Portugal. E-mail: hteixeiragil@ipcb.pt

http://dx.doi.org/10.5335/rbceh.v12i3.6005
Recebido em: 03/11/2015. Aceito em: 30/11/2015.

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aprendizagem a serem incluídas durante deverá ocorrer de forma contínua e inin-


toda a vida de cada indivíduo: terrupta, deve compreender uma dimen-
• Aprender a conhecer: aquisição de são temporal (lifelong) e, por outro lado,
instrumentos da compreensão; conter uma multiplicidade de espaços e
• Aprender a fazer: permitir a sua de contextos (lifewide) de aprendizagem
ação e interação com o meio envol- que devem incluir para além da apren-
vente; dizagem formal, as aprendizagens não
• Aprender a viver em comum: criar formais e informais. Como é referido por
condições para poder participar e Rodrigues (2012), concorda-se e aceita-se
cooperar com os demais em todos o pressuposto que a educação ao longo da
os domínios da atividade humana; vida deve constituir um direito de todas
• Aprender a ser: integração dos três as pessoas, seja qual for a sua idade,
domínios anteriores. habilitações académicas, experiência e
No seio da designada Estratégia de percurso profissional, com a salvaguarda
Lisboa (CONSELHO EUROPEU DE de todas as condições necessárias e su-
LISBOA, 2000), que ocorreu em 2000, ficientes que lhes permitam a aquisição
o Conselho Europeu determinou que a de saberes e competências para a cons-
aprendizagem ao longo da vida consti- trução contínua do seu desenvolvimento
tuiu o elemento chave para a constru- pessoal, social e profissional. No sentido
ção de uma sociedade do conhecimento de lhes serem proporcionados todos os
mais dinâmica que permitiu uma maior meios e todos os instrumentos para que
competitividade económica ao conse- consigam compreender as mudanças
guir combinar a inovação com a coesão que ocorrem numa sociedade em rápi-
social, através da criação de melhores da evolução e mutação e, desta forma,
empregos. poderem identificar os seus interesses e
No âmbito da Assembleia Mundial direitos para uma mais adequada ação
sobre o Envelhecimento que teve lu- e intervenção. Pois, de acordo com Ka-
gar em Madrid, em 2002, foi assumido char (2001 apud SERRA, 2009, p. 15), a
consensualmente, que as pessoas mais aprendizagem ao longo da vida deve ser
idosas constituíam uma base sólida para concretizada numa escola que leve as
o desenvolvimento futuro da sociedade pessoas idosas a ensinar a repensar o
pelo facto da sociedade poder contar com seu pensamento de forma a que estes se
as suas competências, a sua experiência sintam unidos por sentimentos comuns
de vida e a sua sabedoria acumulada que lhes permitam a geração de vínculos
para que possam aperfeiçoarem-se por e de união para poderem
iniciativa própria e, desta forma, con- […] reagir aos estigmas da velhice (perdas,
tribuírem para o aperfeiçoamento da isolamento, incapacidade), para viverem um
sociedade em geral. novo paradigma de velhice (ganhos, lutas,
Neste contexto, tal como refere Pires participação e autonomia), e desta forma es-
(2005), esta aprendizagem ao longo da tarem fortalecidos para sua inserção na fa-
vida, considerada como um processo que mília e em outros grupos sociais (KACHAR,
2001 apud SERRA, 2009, p. 15).

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No caso particular dos cidadãos • Envelhecimento patológico ou se-


mais idosos, face ao exposto no seio do cundário: o individuo apresenta
presente preâmbulo introdutório, pode- doenças degenerativas crónicas
-se propor uma aprendizagem mais lata, com uma deterioração evidente do
mais flexível, mais abrangente e mais seu estado de saúde;
holística a que se poderá designar de • Envelhecimento terciário: carate-
learningagewide. riza-se por uma degenerescência
acelerada das capacidades funcio-
A dinâmica do processo de nais que precedem a morte.
No seio desta perspetiva, pode re-
envelhecimento ferir-se a opinião de Neugarten (1994
O processo de envelhecimento deve apud PAOLA, 2012), ao propor a deno-
ser considerado como sendo um processo minação de “idosos-jovens”, com idades
dinâmico e multidimensional que vai compreendidas entre os 60-74 anos e os
ocorrendo ao longo da vida de cada um. “idosos-idosos” com 75 e mais anos. De
Este processo está sob a influência de acordo com este autor, estas duas catego-
fatores endógenos e exógenos que vai rias referem o maior grau de autonomia
evoluindo numa base onde pontua a para o primeiro grupo, já relativamente
heterogeneidade e a singularidade de ao segundo grupo, onde esse grau de
cada indivíduo. Neste sentido, como é autonomia decresce, salientando-se os
defendido por Paola (2012), o envelhe- níveis mais elevados de dependência e
cimento não deve ser considerado como de doenças associadas. São, pois, catego-
o resultado de uma doença nem de um rias que realçam a díade saúde-doença e
“erro evolutivo”, mas como o resultado esta costuma ser a forma mais simplista
de um processo normal de cada ser vivo. que carateriza o processo de envelheci-
Neste sentido Paola (2012), sugere qua- mento. Contudo, este processo é muito
tro tipos diferentes de envelhecimento: mais complexo e vai muito mais além
• Envelhecimento normal: relativo a das questões bio-fisiológicas. Neste con-
uma conduta ativa na comunidade texto, Freire (1995 apud SERRA, 2009,
com ausência de doenças ou de p. 14), afirma mesmo que os critérios
quaisquer outros aspetos patológi- para a avaliação da idade, da juventude
cos; ou da velhice não podem nem devem
• Envelhecimento bem sucedido: re- estar diretamente relacionados com o
fere-se a um tipo de envelhecimento calendário, dado que esta noção tem que
onde apenas se podem vislumbrar estar vinculada à forma como pensamos
algumas incapacidades funcionais o mundo em que vivemos, da vitalidade
e sensoriais, com a manutenção de de cada um e
níveis elevados de capacidade física […] da esperança com que estamos sempre
e cognitiva com uma participação prontos a começar tudo de novo e se o que fize-
social ativa e produtiva; mos continuar a encarnar sonho nosso, sonho
eticamente válido e politicamente necessário
(FREIRE, 1995 apud SERRA, 2009, p. 14).

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Neste sentido, Salvarezza (1998), dizer, que o envelhecimento deve ser


alerta e chama à atenção para o facto compreendido como um resultado de um
do processo de envelhecimento ser o processo de aprendizagem, que seja um
resultado ou a consequência de cada so- comportamento aprendido e que não es-
ciedade, onde as diferenças entre classes teja linearmente vinculado à idade, mas
sociais, as habilitações literárias, as pro- a outros elementos, como seja a valori-
fissões, os rendimentos, as experiências zação da vida (ALENCAR, 2002). Neste
de vida, os contextos sociais, culturais e sentido, Nazareth (1999), é de opinião
económicos… e as suas múltiplas inter- que os decisores políticos tenham que
-relações fazem com que se promovam salvaguardar vários princípios:
formas próprias de envelhecimento. Pois, • o principio da dignidade ao asse-
tal como também é afirmado por Ludi gurar que todas as pessoas idosas
(2012), não é o mesmo envelhecer quando devem gozar de todos os direitos;
existem condições materiais e simbólicas • o princípio da autonomia, sejam
adequadas ou envelhecer em condições quais forem as circunstâncias, em
onde a pobreza é generalizada. Quer isto especial, durante o seu período de
dizer que o processo de envelhecimento aposentação; o princípio do desen-
se vai construindo num meio cultural e volvimento pessoal ao se assegu-
social que ocorre num dado espaço físico rarem as condições necessárias
e temporal que corresponderá sempre a e suficientes para o seu próprio
uma experiência individual e singular desenvolvimento;
como consequência das vivências, traje- • o princípio de acessibilidade, prin-
tos de vida, das práticas sociais e de toda cipalmente, no que diz respeito aos
uma experiência acumulada. Na opinião cuidados de saúde;
de Alencar (2002), deve-se valorizar esta • o princípio da participação em
grande variabilidade porque desta forma todas as áreas sociais, políticas,
criam-se condições para se poder pensar, económicas, religiosas.
aprender, interagir de múltiplas formas Uma outra questão relacionada com
o que vem conferir novos e diferentes o processo de envelhecimento, prende-se
sentidos à vida de cada um. Pois, como com a designação dos indivíduos com
refere Chopra (1995 apud CACHIONI; mais idade, sendo que o termo de ‘velho’
NERI, 2004), não é possível estabelecer- parece ser aquele que menos adesão tem
-se uma curva de envelhecimento que por lhe ter associada uma conotação
possa ser aplicada a qualquer um dos mais negativa ou depreciativa ao lhe
cidadãos mais idosos porque, como já ser ‘colada’ uma imagem onde sobressa-
foi mencionado, pela razão do processo em as rugas, os cabelos brancos e uma
de envelhecimento ser plural para cada saúde frágil a que corresponderá uma
individuo, em cada sociedade e em cada morte mais próxima. Por essa razão,
cultura, o envelhecimento não pode ser têm sido utilizadas outras denominações
estabelecido como um processo automá- que visam atenuar esta ‘carga’ mais
tico, fixo, linear ou mecânico. Quer isto negativa como, por exemplo: cidadãos
idosos, cidadãos mais idosos, terceira

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idade, séniores, adultos idosos... Mas, disciplinas que se pretendem agir de


o que mais importará, é que seja qual forma coordenada e complementar de
for a denominação que se escolha, é que forma a que se possam criar condições
estes cidadãos mais idosos se sintam para uma melhor qualidade de vida
desejados, escutados, respeitados e, para os idosos no decorrer do seu pro-
principalmente, incluídos pelo simples cesso de envelhecimento, através de
razão da presente sociedade se centrar uma intervenção o mais ativa possível.
em valores diferentes daqueles em que Esta intervenção pode e deve incluir
estes cidadãos foram habituados a ter a educação, considerando-se como um
(FERNÁNDEZ-PORTERO, 1999). Pois, direito social para todas as idades, no
tal como refere Alaiz e Oliveira (2012), sentido desta educação lhes permitir um
nas civilizações mais antigas, os mais desenvolvimento das suas capacidades e
velhos eram merecedores de honrarias potencialidades, de aprenderem e de en-
e de reconhecimento pela sabedoria que sinarem, de promover desafios cognitivos
possuíam onde o respeito pelas suas opi- e de propiciar espaços intergeracionais
niões era ouvido e posto em prática. Pelo de intercâmbio de saberes e de valores,
contrário, presentemente, a sociedade de mas sempre numa perspetiva integra-
consumo que se vive, os cidadãos mais dora e participativa. Ou também como é
velhos são vistos como um ‘peso’ porque já referido por Kachar (2001 apud SERRA,
terminaram o seu ciclo produtivo e, como 2009), a Escola deve ser um espaço para
tal, representam um esforço financeiro se repensar o pensamento, gerar vín-
para os governos de cada país. O pro- culos, criar situações de aprendizagem
blema não foi criado por estes cidadãos para reagirem aos estigmas da velhice
mas sim pela falta de políticas sociais e (ex: perdas, isolamento, incapacidades)
educativas que deveriam ter preparado a para conseguirem viver um novo para-
sociedade para esta realidade, para uma digma da sua velhice onde predominem
sociedade que acompanhou a inversão os ganhos, as lutas, a participação e a
da pirâmide etária sem ter acautelado a
autonomia para uma melhor inserção
posta em prática de medidas ajustadas
familiar e social. Porque, como referem
ao envelhecimento global que vinha a
os adágios populares: “Aprender até
aumentar de forma sustentada.
morrer!” e “O saber não ocupa espaço!”.
Uma possível resposta, no sentido
de acautelar um mais adequado en-
velhecimento, pode estar associada à A aprendizagem e a educação ‘para’
Gerontologia e à Geriatria. Enquanto a e ‘com’ os cidadãos mais idosos: a
Gerontologia tem como principal objetivo multiplicidade de paradigmas
promover uma abordagem que enquadre
as variáveis sociais, psicológicas, demo- Na opinião de Paola (2012), tem que
gráficas e económicas, a Geriatria, por se eliminar o mito de que há limites
sua vez, tem a sua ação privilegiada na que condicionam a aprendizagem dos
prevenção, na cura e na reabilitação da mais idosos. É evidente que, por força
saúde dos mais idosos. São, pois, duas do processo de envelhecimento, podem

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surgir incapacidades relacionadas com a sua própria designação, não constitui


alguma maior lentidão na resolução de uma tarefa fácil nem consensual. Para o
problemas mas o que importa referir é efeito, optou-se por uma referência mais
que os idosos não estão impedidos de sintética mas que convém referir. Tal
raciocinar e de aprender… apenas o como é afirmado por Lemieux e Martinez
ritmo é mais lento quando comparado (2000), a designação de Gerontologia
quando eram mais jovens. É claro que como uma única disciplina teve que ten-
estas situações se podem tonar mais evi- tar ultrapassar alguns obstáculos dado
dentes e mais visíveis em determinados o caráter específico do seu público-alvo
contextos (ex: literacia digital; TIC) onde e que se pode referir em três dimensões:
a capacidade de adaptação pode colocar 1. O envelhecimento é um processo
os idosos numa situação de inferioridade dinâmico e, como tal, invalida ou não
que pode por em causa o exercício de uma consegue proporcionar uma exatidão as
cidadania plena. necessidades e qual o ponto da situação
Ao longo dos anos foram surgindo dado se estar a lidar com um processo
diversas conceções relacionadas com onde a mudança é permanente; 2. Os
aprendizagens mais informais e mais cidadãos mais idosos são, por excelência,
prolongadas: educação permanente e o grupo social mais heterogéneo pelo que
educação ao longo da vida. Neste con- dificulta (e impede) que se possam iden-
texto, importa referir-se o facto da edu- tificar as suas múltiplas idiossincrasias;
cação não se confinar apenas a um dado 3. Um outro aspeto, é que os gerontólogos
percurso escolar formalizado. Ou seja, pretendem tratar este assunto como se
a educação engloba todos os processos se tratasse de uma única disciplina mas
formais, informais e não formais que pretendem, e simultâneo, promover uma
podem e devem transcender a Escola Ins- análise multidisciplinar, o que vem criar
titucional que, para além, da aquisição vários tipos de contradições.
de determinados saberes escolarizados, Neste sentido, Katz (1996) já tinha
as restantes dimensões de aprendizagem avançado com diferentes áreas dentro da
devem incluir objetivos que promovam Gerontologia que também denominou de
uma cidadania ativa e participada, com especializações a fim de se dar resposta
a possibilidade de integrar projetos de a esta multidisciplinaridade: biogeronto-
vida e de realização pessoal e, ao mesmo logia; psicogerontologia; gerontologia so-
tempo, permitir uma adequada integra- cial. No mesmo sentido, Barros-Oliveira
ção social. É este o grande objetivo da (2006) refere a importância de se tratar
aprendizagem ao longo da vida (‘lifelong de uma educação gerontológica que
learning’), no sentido de ser mais global venha a incluir as seguintes vertentes:
e holística. a) Educação cognitiva (para prevenir e
Tendo em consideração a «população amenizar as potencialidades mnésicas
especial» dos cidadãos mais idosos, a dado o seu declínio generalizado ocorrer,
questão relativa à sua educação, no que na grande maioria dos casos a partir dos
concerne a sua tipologia, objetivos e, até 75 anos, deve fazer-se com que estas

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pessoas idosas se mantenham sempre dos cidadão mais idosos que pode incluir
intelectualmente ativas através de lei- três diferentes vertentes: atividades
turas, através da argumentação e da educativas para os cidadãos mais idosos;
resolução de problemas); b) Educação pode ainda incluir propostas de educação
personológico-axiológica (uma educação para todo o tipo de público; formação
com valores e para os valores dando-se dos profissionais de educação acerca do
enfase às questões relacionadas com a processo de envelhecimento. Lemieux e
felicidade, com a sabedoria e com o senti- Martinez referem ainda que:
do d vida); c) Educação social (encontrar […] the interest is placed on the study and
novas formas de viver e de conviver e of the educational practice not as a part of
de ocupar o seu tempo e de promover the aging processes, but firstly, as part of
uma reflexão relativa à adaptação para teaching and learning of people, distinct be-
a nova de fase de vida: aposentação); d) tween each other, in relation with a context
Educação para a saúde (promoverem-se and with a personal and social life that they
try to develop with the most quality and the
condições para uma saúde mais lata e
most happiness (2000, p. 482).
abrangente que não se restrinja apenas
à ausência de doenças e de enfermidades Talvez o expoente máximo ou a mais
mas que seja capaz de criar condições clara evidência da posta em prática da
para um bem-estar físico, mental e Gerontagogia se possa relacionar com as
social); e) Educação tanatalógica (nes- designadas Universidades para a Tercei-
te domínio é pretendido que o idosos ra Idade (UTI) que tiveram a sua origem
se deva ir confrontando com a própria na Universidade de Toulouse em 1973.
morte e também com a possibilidade de Os principais objetivos tiveram por base
se poder confrontar com alguma perda um conjunto de metas mais ou menos
mais significativa). ecléticas e que se passam a enunciar:
Quando se discute uma formação ou promover uma abertura da universidade
educação que inclua, de forma preferen- para cidadãos que na sua grande maioria
cial, os cidadãos mais idosos é comum se encontravam já aposentados e, como
falar-se de Gerontagogia, dado que tem tal, muito afastados das instituições de
por objeto a operacionalização de um ensino; promover, desta forma, condições
conjunto de métodos e de técnicas orien- para uma melhor inserção e participação
tadas para estes cidadãos. Na opinião cívica; contribuir para a diminuição do
de Lemieux e Martinez, a Gerontagogia isolamento e, consequentemente, para
deve ser considerada como um melhor equilíbrio psicossociológico;
criar contextos para novos desafios e
[…] a new hibrid science resulting from the
prolofic combination of educational geron- objetivos de vida; e, ao mesmo tempo,
tology – multidisciplinar specialization in constituir um meio propício para se in-
itself – and education of aging (2000, p. 482). vestigar acerca do processo de envelhe-
cimento. Pode-se referir-se que as UTI
A Gerontagogia, tal como refere
evoluíram de acordo com três gerações
Zolotow (2012), deverá criar condições
(PINTO, 2008 apud RODRIGUES, 2012,
para o incremento da melhoria de vida

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29): a) a primeira geração, situada na a própria universidade, para os pro-


década de 60 do século passado, tinha fessores e até para os próprios alunos
como principais objetivos enquadrar a (cidadãos mais idosos). Para a universi-
sua oferta educativa num contexto que dade há uma novo paradigma que não
privilegiava o convívio cultural de forma assenta num público mais jovem mas
a promover e facilitar relações de índole que agora absorve no seu seio indivíduos
social; b) a segunda geração, situada de todas as idades, onde a aquisição de
nos anos 70, possuía já objetivos que, uma certificação ou de um diploma não
para além de melhorar o seu bem-estar vai constituir um objetivo universal. A
mental num contexto onde se implemen- universidade não vai ensinar alunos
tavam atividades culturais, era preten- para o desempenho de uma dada pro-
dido que as pessoas idosas pudessem fissão mas para uma formação mais
intervir e contribuir na resolução de cívica, cultural, onde a cidadania ganha
problemas sociais; c) a terceira geração, especial referência. Para os professores
que se entende ter surgido nos anos 80, há outros desafios. Os programas, as
possuía agora objetivos que nalguns ca- metodologias e as estratégias devem
sos se aproximavam de um ensino mais enquadrar outro tipo de alunos, alunos
tradicional onde para além de uma oferta que já trazem consigo conhecimentos
educativa agora se associa a pesquisa e ‘académicos’ e que, ao mesmo tempo,
o serviço à comunidade; nesta última trazem consigo conhecimentos fruto de
fase foi tornado possível para quem o experiências de vida (laboral, familiar,
desejava a possibilidade de existir uma social). Os professores terão que focalizar
avaliação formal conducente à obtenção o processo de ensino e de aprendizagem
de um certificado ou diploma, ao mesmo não para a preparação de uma via profis-
tempo que outros apenas desejam poder sionalizante mas para um outro tipo de
frequentar a ‘título livre’. objetivos, que terão que ser muito mais
No seio das Universidades para a flexíveis, mais abertos que promovam
Terceira Idade podem referir-se dois um enriquecimento pessoal em termos
diferentes modelos: 1. Modelo Francês: culturais e sociais. Como refere Cachio-
centralizado e coordenado pela univer- ni (2003 apud SERRA, 2009), a relação
sidade com aulas e cursos formalizados; professor-aluno deve ser percebida como
2. Modelo Inglês: é um modelo mais uma intensa troca de conhecimentos
autónomo com diferentes formas de or- onde, na grande maioria dos casos, ocor-
ganização onde o trabalho colaborativo e re um encontro intergeracional entre
cooperativo constituem a base de traba- dois grupos de aprendizes onde, por um
lho onde professores e alunos partilham lado, um possui um saber científico e o
conhecimentos e experiências. outro toda a experiência de uma vida.
Seja qual for o modelo base, ou as Ou seja, deve haver uma preocupação
suas múltiplas adaptações, as Universi- para que os cidadãos mais idosos possam
dades para a Terceira Idade constituem encontrar novos projetos de vida e que o
um desafio aliciante e inovador para processo de envelhecimento seja o mais

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feliz possível e não entendido como uma pragmático, com a criação de condições
etapa que antecede a morte. Este último para melhores níveis de bem-estar. Neste
considerando tem a ver com os próprios perspetiva, Carreras (2005) é de opinião
alunos onde, para além de poderem ad- que sejam identificadas as necessidades
quirir novos conhecimentos, devem apro- das pessoas mais idosas e, para o efeito,
veitar a possibilidade de estabelecerem propõe alguns dos princípios que devem
novos vínculos, em particular, uma outra ser considerados: em primeiro lugar,
dimensão relacionada com as relações tem que existir uma relação íntima
intergeracionais. Neste aspeto concorda- entre o processo educativo/formativo a
-se com Serra (2009), ao referir que este implementar e uma consequente me-
é um grande desafio e um compromisso lhoria nas condições de vida das pessoas
onde devem ser fortalecidos valores, tais idosas; em segundo lugar, é a promoção
como, o respeito, a amizade e a solida- de um envolvimento total das pessoas
riedade entre gerações. Desta forma, o idosas em todas as fases processuais;
processo de ensino e de aprendizagem em terceiro lugar, deve prevalecer um
deve ser um ‘espaço mediador’ que venha clima de respeito mútuo e de prudência
a permitir a troca de conhecimentos e de forma a não poder expor as pessoas
de experiências entre os mais jovens, os idosas a situações constrangedoras; por
adultos e os cidadãos mais idosos. último, em quarto lugar, deve-se passar
De acordo com Zolotow (2012), o à prática, não basta elencar uma série
gerontagogo deve, pois, ter a preocu- de prioridades e de fases se não existir
pação de ser um transformador que a sua posta em prática.
tem como principal objetivo fomentar A dimensão horizontal presente
e promover a autodeterminação dos numa formação de cidadãos mais idosos
alunos. Para o efeito, os cidadãos mais significa também educar para a parti-
idosos terão que possuir uma maior e cipação e com a participação de todos
real consciência da sua situação pessoal para que, em simultâneo, se inclua um
e individual para que se possa adaptar paradigma em que todos são produto-
e requerer os recursos de que necessita res e reprodutores de conhecimentos,
para que possa ampliar os seus níveis tendo por base índices elevados para a
culturais, sociais, cognitivos e as suas promoção de uma maior socialização. É
relações interpessoais. Desta forma, os neste sentido que Alencar (2002) refere a
cidadãos mais idosos poderão ter uma pedagogia de uma educação emancipató-
participação mais crítica e reflexiva e, ria onde o professor/formador privilegie
como consequência, mais interventiva o princípio da autonomia. Na opinião
e mais focalizada em relação às suas de Ferreira, Honório e Batista (2013),
necessidades e interesses. Por esta para além de a Gerontagogia ser um
razão, os programas de ensino devem campo que estuda as pessoas idosas em
privilegiar estas dimensões porque a situação educativa deve ser também uma
motivação é incrementada sempre que se prática, uma prática social que deve ser
aprende algo que tenha um significado orientada para a formação dos cidadãos

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mais idosos. Como ainda é referido por e com descontinuidades constantes o que
Zolotow (2012), terão que ser criados faz com que a educação seja processual
contextos onde se aprende por simples e inacabada. Ou como é afirmado por
prazer de uma forma que os integre e os Patto, “baseado num pensamento que
inclua nas suas redes de contactos com problematiza o existente” (2000, p. 179).
um aprofundamento de relações de cará- Particularizando o contexto de Por-
ter humanístico. Quer isto dizer que uma tugal, Jacob (2012), ao questionar se as
formação que assente na Gerontagogia UTI constituem uma resposta social ou
permita uma melhor adaptação dos cida- formativa, não têm dúvidas em afirmar
dãos mais idosos na presente sociedade que a resposta é unanimemente de
para que possam exercer a sua cidadania caráter social, encarando as valências
e, consequentemente, a sua inclusão so- (disciplinas) de cariz educativo, cultural
cial de uma forma crítica e participativa. ou formativas como sendo o meio que
A aprendizagem terá como preocupação permitem alcançar um fim social. O
a complementaridade, a emancipação, o mesmo autor adianta ainda que as UTI
esclarecimento e uma instrumentaliza- possuem como grande objetivo retirar
ção crítica. Do mesmo modo, Lemieux as pessoas idosas das suas casas e do
e Martinez (2000), referem o modelo seu isolamento para poderem usufruir
piagetiano ao mencionarem a ‘re-equili- de atividades saudáveis, de convívio e,
bration’ como forma destes estudantes fundamentalmente, fomentar e estimu-
mais idosos se poderem adaptar às novas lar a sua participação social, ao acres-
realidades, o que significa que a focaliza- centarem também serem as UTI redes
ção não se deve centrar na aquisição de sociais alternativas. Esta opinião vai ao
novas aprendizagens mas antes numa encontro do afirmado por Clavijo (1999
atualização e contextualização dos seus apud CACHIONI; NERI, 2004), ao fazer
conhecimentos. A este propósito, Le- referência a três principais objetivos que
mieux e Martinez (2000) priorizam a ‘sa- devem fazer parte de qualquer programa
piência’ e a ‘competência’ em detrimento formativo:
da ‘ciência’ porque o que se pretende é a) relação professor/aluno: o professor
que os cidadãos mais idosos façam uma tem a função de orientador e de fa-
melhor gestão dos seus conhecimentos cilitador, sendo o processo centrado
em termos pessoais e sociais, onde deve em torno do educando;
ter lugar uma ‘aprendizagem reflexiva’ b) paradigma didático: o espaço da
e não uma ‘aprendizagem cumulativa’. sala de aula deverá ser encarado
Atendendo à opinião de Moraes (2000) mais como um espaço de encontro,
o novo paradigma educacional tem que onde prevaleçam as relações inter-
ser holístico pela razão de que o mundo pessoais com as respetivas trocas
em que vivemos não ser linear nem de experiências que levem à cons-
sequencial. Pelo contrário, o mundo em trução de novos conhecimentos;
que vivemos é volátil, transforma-se c) aprendizagem significativa: a ne-
quase a cada minuto, com continuidades cessidade dos novos conhecimen-

RBCEH, Passo Fundo, v. 12, n. 3, p. 212-233, set./dez. 2015 221


Henrique Gil

tos gerados e adquiridos possam existe uma idade limite que impossibilite
ter uma concretização imediata e a participação em espaços educativos/for-
prática com reflexos na melhoria mativos mas, pelo facto desta formação
da qualidade de vida das pessoas não ter como prioridade a obtenção de
idosas. um diploma ou certificado para efeitos
Neste contexto, acrescenta-se ainda laborais há, no entanto, a preferência
a proposta apresentada por Barros-Oli- para se abordarem ‘temas humanos y
veira (2006) ao se referir a uma educação existenciales’ em vez de temáticas orien-
interativa ou participativa onde se inclua tadas para um conhecimento técnico ou
uma colaboração intergeracional que para o exercício de uma dada profissão.
não se restrinja apenas aos educadores/ Quer isto dizer que se rompe uma certa
formadores (geralmente mais jovens) lógica ‘educativa ou universitária’ num
mas que possa envolver os mais novos. sentido unívoco da teoria para a prática,
Por um lado, que se consiga levar as mas antes num processo dialético onde
pessoas idosas a aprender a envelhecer a prática poderá ‘pressionar’ a teoria.
e os mais novos a aprenderem a conhe- Neste contexto, a sequencialidade dos
cer e a apreciar as pessoas idosas para conteúdos e das atividades deixam de ter
que se possa levar a uma maior e mais sentido, optando-se por uma abordagem
extensa solidariedade intergeracional. educativa, defendida por Paulo Freire,
Uma outra proposta, apresentada por onde a aposta se deve focalizar na par-
Carreras (2005, p. 30) sugere três tipos ticipação e no diálogo. Esta opção leva a
de modelos, paradigmas ou orientações encarar o processo educativo/formativo
educativas: “a conductista, tecnológica como sendo um processo colaborativo:
o tecnoacadémica y reproductiva; la […] en donde la acción educativa se lleva a
hermenêutica, interpretativa o comuni- cabo com (y no sobre) la implicación y com-
cativa; y la crítica, sociocrítica o política”. promisso de todos los que se involucran en
No primeiro caso, há toda uma prescri- él, especialmente de las personas mayores
ção de conhecimentos e de atividades cuyas voces personales, testimonios, expe-
conduzidas pelos educadores/formadores riencias, relatos adquieren una dimensión
inigualable en estos processos (CARRERAS,
que será seguida pelas pessoas idosas.
2005, p. 47).
No segundo caso, já se pretende uma
colaboração entre o educador/formador Desta forma, podem e devem criar-se
e as pessoas idosas. No terceiro caso, espaços que possam e venham a promo-
as pessoas idosas ganham um maior ver processos de autoaprendizagem onde
protagonismo e preponderância, uma se deverão concretizar competências de
vez que o processo de educação/formação análise crítica, de mobilização pessoal
está centrado nas pessoas idosas, onde do conhecimento, da posta em prática de
se pretendem satisfazer as suas neces- estratégicas que permitam a valorização
sidades num contexto onde as mesmas e a decisão. Esta dinâmica irá permitir
desenvolvem as suas atividades. Como a autoapropriação e o controlo das suas
é defendido por Carreras (2005), não realidades e consequentes intervenções.

222 RBCEH, Passo Fundo, v. 12, n. 3, p. 212-233, set./dez. 2015


Educação gerontológica na contemporaneidade: a gerontagogia, as universidades de terceira...

Numa perspetiva mais pragmática, a facilitar o acesso e a mobilidade;


ou seja, num contexto de sala de aula, o posto de trabalho deve ter em
Fernández-Portero (1999) apresenta um conta aspetos básicos de ergono-
conjunto de orientações metodológicas mia no que diz respeito à altura
que deverão ser implementadas junto das mesas e das cadeiras e à sua
de uma população mais idosa e que se robustez e sustentabilidade; provi-
passam a referir: denciar muletas ou outros apoios
a) Aspetos de ordem visual: o pro- que facilitem a mobilidade;
fessor/formador deve providenciar d) Aspetos relativos à memorização:
uma sala com uma boa iluminação tendo em consideração o facto de
(se possível com luz natural) evi- a memorização ser um handicap
tando qualquer tipo de encandea- generalizado para estes cidadãos,
mento ou de reflexos; os materiais o professor/formador deve restrin-
impressos ou projetados a serem gir a sua comunicação apenas aos
utilizados deverão ter tamanhos aspetos que sejam realmente rele-
(letras, números, imagens) com vantes; a utilização de listagens e
tamanhos um pouco superiores ao de diagramas pode ser uma ajuda
habitual e com uma boa nitidez; para melhor se reter a informação
providenciar lupas ou outro tipo veiculada;
de material que permita melhorar e) Aspetos relativos à motivação: a
a visualização; dispor as mesas de nova informação a ser veiculada
trabalho de forma a que não seja deve contemplar experiências já
necessário usar a visão periférica vivenciadas pelos formandos; as
para se poderem visualizar todos atividades a propor devem con-
os pontos da sala; ter uma certa dose de novidade,
b) Aspetos de ordem auditiva: os devem ser breves, concretas e
professores/formadores deverão variadas; sempre que possível, as
falar, sempre que possível, num atividades devem ir ao encontro
tom mais grave; disponibilizar das necessidades e/ou propostas
dispositivos de ajuda auditiva (ex: apresentadas pelos formandos e o
auriculares); através de uma lin- professor/formador deve ser capaz
guagem corporal que pode e deve de fazer uma ponte entre as reali-
complementar a linguagem oral; dades pessoais e a sua interligação
realizar a moderação de trabalhos social;
de grupo para que se respeite a f) Aspetos relativos à autoestima:
ordem de intervenção; destaca-se neste particular o refor-
c) Aspetos de ordem psicomotora: ço positivo, a autoavaliação e criar
sempre que possível devem po- contextos para que os formandos
tenciar-se atividades físicas para se possam expressar e serem eles
uma melhor tonificação muscular; mesmos num ambiente onde impe-
organizar a sala de aula de modo re o respeito e a mútua confiança.

RBCEH, Passo Fundo, v. 12, n. 3, p. 212-233, set./dez. 2015 223


Henrique Gil

Face ao exposto, partilha-se a opi- parte dos educadores/formadores são


nião de Alencar (2002) ao afirmar que extremamente valorizadas e que ajudam
seja qual for a metodologia nunca se no fortalecimento da autoestima das
pretenderá ensinar ao cidadão mais pessoas idosas, em especial, se sentirem
idoso qual a fórmula ou o caminho para que são parceiros no processo formativo.
rejuvenescer nem para competir. O que Neste contexto, Both (1998) refere expli-
está subjacente neste processo de educa- citamente que este processo formativo
ção/formação é consciencializar o cidadão deve ser realizado com eles e não por
mais idoso que a sua velhice corresponde eles e para eles.
a mais uma etapa da sua vida que deve
ser vivida de forma positiva, com novas O caso das universidades da terceira
experiências que permitam a interação
com maiores níveis de autonomia pessoal
idade em Portugal
e social e preservar, ao mesmo tempo, as Em Portugal foi criada a 1ª Uni-
suas capacidades físicas, a sua capacida- versidade da Terceira Idade no ano de
de de decisão, no seio de um ambiente 1978 com a designação de Universidade
onde a dignidade e o respeito estejam Internacional para a Terceira Idade –
presentes no seio familiar e social e, se IUTI, publicada no Diário da República
possível de forma criativa. Ou seja, como através da Portaria n.º 923/84. Tal como
propõe Withnall (2003), o debate acerca afirma Veloso (2011), a criação desta
da educação/formação das pessoas idosas UTI tinha como principais objetivos
deve ser equacionado no seio de uma aumentar e diversificar as respostas
perspetiva vital. existentes nos domínios sociais e edu-
Para o efeito, tal como propõe Nicola cativos, no sentido de se poder ter uma
(1999), torna-se fundamental conhecer outra imagem dos idosos, tornando mais
as características dos idosos com os quais visível todo o seu potencial e contributo
se vai trabalhar porque vai ajudar e que ainda poderiam providenciar. Neste
contribuir para uma melhor compreen- sentido, a UTI tinha a preocupação em
são das suas atitudes e, desta forma, o valorizar as pessoas idosas no âmbito
seu envolvimento será o maior possível das suas capacidades educativas ao
tornando-os no centro, como protagonis- poderem assumir, simultaneamente, os
tas. Contudo, Nicola (1999) refere que a papéis de aluno/formando e de educador/
importância do educador/formador deve- formador, dado que tal(ais) estatuto(s)
rá estar ao mesmo nível. Ou seja, devem não lhes eram reconhecidos.
possuir conhecimentos relacionados com No ano de 2005 é criada a RUTIS
o processo de envelhecimento, mas serão – Associação Rede de Universidades da
as suas condutas pessoais e o seu perfil Terceira Idade, considerada como uma
que estão sob o escrutínio dos idosos, o Instituição Particular de Solidariedade
que pode levar ou não à sua aceitação. Social – IPSS. A criação da RUTIS deve-
Cachioni e Neri (2004), referem que o -se a Luís Jacob que foi o impulsionador
afeto e manifestações de carinho por desta iniciativa, tendo a sua sede social

224 RBCEH, Passo Fundo, v. 12, n. 3, p. 212-233, set./dez. 2015


Educação gerontológica na contemporaneidade: a gerontagogia, as universidades de terceira...

em Almeirim, no distrito de Santarém. Tabela 1 – Número de UTI por NUTS II, com
Os seus principais objetivos, de acordo indicação por distrito
com o disposto no Diário da República NUTS II Distritos (Nº de UTI)
– III Série, N.º 11, p. 1120-1127, são os Norte Braga 13
seguintes: Bragança 2
a) Promoção do envelhecimento ativo Porto 21
Viana do Castelo 5
em todas as suas vertentes; Vila Real 4
b) Fomentar a educação e o ensino, Total: 45
a formação e a aprendizagem ao Centro Aveiro 17
longo da vida; Castelo Branco 5
Coimbra 9
c) Incentivar a investigação acadé- Guarda 6
mica e científica na área do enve- Leria 12
lhecimento e da cidadania; Viseu 9
d) Fomentar a cooperação para o Total: 58
Lisboa Lisboa 32
desenvolvimento para a defesa Setúbal 14
dos direitos humanos, para a ci- Total: 46
dadania e para a igualdade e na Alentejo Beja 6
solidariedade; Évora 6
Portalegre 6
e) Atuar na prevenção e na promoção Santarém 20
da saúde; Total: 38
f) Promover atividades solidárias e Algarve Faro 8
de desenvolvimento comunitário. Total: 8
De acordo com dados recolhidos no Região Pico 1
Autónoma São Miguel 1
site da RUTIS, pode-se verificar que pos- dos Açores (Ponta Delgada) 1
suem 202 instituições associadas, repar- Terceira
tidas por todo o país. A sua distribuição (Angra do Heroísmo)
por NUTS II, com a indicação de UTI Total: 3
Região Câmara de Lobos 1
por cada distrito, é a seguinte (Tabela 1): Autónoma Funchal 2
da Madeira Machico 1
Total: 4
Fonte: RUTIS (Disponível em: <www.rutis.org>).

Como se pode verificar, existe uma


cobertura nacional sem que se possa
dizer que possa haver uma dada orienta-
ção nesta disseminação mas que poderá
estar mais dependente de aspetos rela-
cionados diretamente com uma maior
densidade populacional e com uma
agregação a cidades e a localidades de
maior dimensão.

RBCEH, Passo Fundo, v. 12, n. 3, p. 212-233, set./dez. 2015 225


Henrique Gil

A génese das UTI é diversa, enquan- formática; história, línguas; cidadania;


to que algumas partiram da iniciativa ginástica; música; trabalhos manuais e
dos próprios cidadãos mais idosos, outras artes. Aliás, esta oferta formativa vai ao
possuem uma ligação mais direta à San- encontro da opinião de Requejo (2005),
ta Casa da Misericórdia local, a centros que sugere cinco áreas que se enqua-
socias e a associações de caráter cultural dram na realidade portuguesa e que se
e social. O seu maior crescimento regis- passam a apresentar: área de atividades
tou-se a partir da década de 90 do século formativo-culturais; área de dinâmica
XX por razões que se podem associar ao ocupacional; área de desenvolvimento
facto de se começar a sentir de forma físico-psíquico; área de atividades sociais
mais evidente a problemática associa- e participação de cidadania; e, área de
da ao crescimento do envelhecimento estudo e investigação.
populacional e, esta maior visibilidade, Contudo, tal como afirmam Monteiro
trouxe a necessidade de se começarem a e Neto (2008) e Veloso (2011), as UTI
implementar medidas necessárias para podem ser encaradas no seio de uma
responder às necessidades destes cida- estratégia preventiva da solidão, do
dãos. A sua designação também se apre- isolamento e até de marginalização ao
senta com alguma diversificação, desde providenciarem espaços de convívio e
Clube Sénior, a Associação e a Academia de interação social e, ao mesmo tempo,
Sénior. No entanto, é a designação de visam também criar espaços para uma
Universidade Sénior aquela que surge maior consciencialização de cada um
de forma maioritária. para o seu processo de envelhecimento
Em Portugal, as UTI seguiram o de forma a potencializarem e a desen-
modelo inglês, concretizando-se por uma volverem competências para a cidadania
oferta educativa/formativa onde a infor- através da sua promoção, valorização e
malidade está sempre presente, onde os integração. E, tal como afirma Rodrigues
professores/formadores exercem as suas (2012), o sucesso das UTI em Portugal
funções num regime de voluntariado reside no facto das mesmas assentarem
que não é remunerado. De acordo com numa componente humana, social, edu-
Jacob (2012), o número total de idosos a cativa e para a saúde que se destina aos
frequentar as UTI, que devem ter mais idosos mas, mais importante ainda, por-
de 50 anos, serão perto de 30 000 e as que todas estas valências são concretiza-
disciplinas que são oferecidas devem das também através dos idosos, através
rondar as 3 500 e que passam por disci- do seu envolvimento ativo e colaborativo.
plinas com um maior pendor teórico até
ateliês de caráter eminentemente prá- O século XXI, século da Cidadania
tico, a viagens de estudo e à realização
de palestras, conferências e seminários.
Digital: nativos e imigrantes digitais
Em termos globais, as disciplinas que É consensual e unânime afirmar-se
estão mais representadas, de acordo que a presente sociedade está em muta-
com Jacob (2012), são as seguintes: in- ção permanente e de forma mais rápida

226 RBCEH, Passo Fundo, v. 12, n. 3, p. 212-233, set./dez. 2015


Educação gerontológica na contemporaneidade: a gerontagogia, as universidades de terceira...

que as sociedades precedentes. Sempre mais urbana e de uma sociedade sem


que nos deparamos com algo que é novo televisão e sem computador para uma
ou diferente, há sempre a tendência e sociedade predominantemente digital. É
quase uma ‘necessidade’ para se lhe neste contexto que Carreras (2005) afir-
atribuir uma designação. Quando há ma que não se torna necessário invocar o
referência à designada «Sociedade In- conceito de ‘educação permanente’ para
dustrial», qualquer cidadão consegue se justificar o envolvimento das pessoas
interpretar e possuir um conjunto de idosas, dadas as características da socie-
referências relativas a essa sociedade. dade da informação e do conhecimento, a
No presente, e faz-se referência a deno- educação converte-se numa necessidade
minações que já vêm do meados do século básica e essencial para todos os cidadãos,
XX, a sociedade que se sucedeu tomou em especial, para aqueles que se possam
a designação mais óbvia de «Sociedade encontrar mais info-excluídos, onde se
Pós Industrial». Mas o que carateriza encontram a grande maioria das pessoas
a sociedade em que nos encontramos é idosas.
mais que a sucedânea, é uma sociedade As tecnologias digitais criaram um
que promoveu uma nova «vaga», uma novo paradigma que veio trazer e pro-
sociedade que se inclui um contexto tec- vocar alterações estruturais ao influen-
nológico à qual Alvin Tofler apelidou de ciarem o contexto social, económico e
«Terceira Vaga». Pela razão de se assistir cultural (RODRIGUES, 2012). Contudo,
a um avanço de inúmeros dispositivos é importante realçar que a importância
informáticos surgiu a designação de não deve residir e restringir-se apenas
«Idade da Inteligência Informática» ou à tecnologia mas antes às reais possi-
de «Sociedade Informatizada». Outras bilidades que elas encerram através
designações, tais como, «Sociedade da In- do estabelecimento de redes e nas suas
formação» e «Sociedade do Conhecimen- múltiplas interações entre os cidadãos.
to», associadas a autores como Drucker É a esta nova realidade que Ávila (2008)
e Tapscott ao enfatizarem, por um lado, refere de conhecimento para a ação
a disseminação de enormes caudais de com a criação de novos conhecimentos.
informação a que se designaram por «au- Consequentemente, toda esta nova dinâ-
toestradas da informação» e, por outro mica social assente na informação e no
lado, a possibilidade que esta informação conhecimento vem requerer que tenha
tem ao proporcionar a geração de novos lugar uma educação continuada e siste-
conhecimentos. Mais recentemente, Ma- mática ao longo da vida, no sentido dos
nuel Castells veio introduzir uma outra cidadãos poderem não só acompanhar
designação, a da “Sociedade em Rede”. todas as mudanças tecnológicas que se
Ou seja, encontramo-nos sob o «efeito vão operando mas que lhes permitam
de coorte», como afirma Barros-Oliveira ser capazes de serem criativos e inova-
(2006), dado que em pouco menos de uma dores. Dada a influência do incremento,
geração se passou de uma sociedade ba- quer do acesso, quer da distribuição da
seada na agricultura para uma sociedade informação, fazem que esta se transfor-

RBCEH, Passo Fundo, v. 12, n. 3, p. 212-233, set./dez. 2015 227


Henrique Gil

me num recurso fundamental em todos ‘multi-tarefa’, onde a informação gráfica


os setores da sociedade. Por essa razão, prevalece e o acesso é aleatório (numa
Dias (2012) refere que as presentes redes perspetiva hipertexto) mas que preferem
de informação, no seio da internet, criam jogar em vez de um trabalho ‘mais sério’,
novos contextos o que vem implicar que onde a recompensa ou gratificação deve
cada cidadão se aperceba da necessidade estar sempre presente. Ainda de acordo
de eles próprios promoverem uma atu- com Prensky (2001a), estas novas capa-
alização das suas aprendizagens como cidades devem-se a novas adaptações
condição fundamental para a inclusão. e evoluções cerebrais designadas por
Neste particular, a educação ao longo da ‘neuroplasticity’, a qual vem sido opera-
vida ao incluir os cidadãos mais idosos da ao longo dos últimos 20 a 30 anos, ao
irá permitir um adequado acesso a esta afirmar que os dados obtidos a partir da
rede de informação e do conhecimento. investigação vêm demonstrar que o cé-
Porque, tal como afirma Castells, “(…) rebro vai realizando uma ‘reorganização’
since technology is society and society das suas funções de uma forma coerente
cannot be understood or represented e com um certo determinismo que vem
without technological tools (2006, p. 42)”. tornando possível que os nativos digitais
No seio deste novo contexto “socio- adotem novas estruturas cognitivas que
-digital”, tem que se fazer uma referên- fazem uso de processos paralelos e não
cia a Mark Prensky no âmbito das suas tanto sequenciais. Ainda a propósito da
reflexões e intervenções acerca de um designação de “nativos digitais”, como se
novo tipo de cidadãos que já nasceram tratando dos indivíduos que nasceram
num mundo digital e que com ele con- a partir de 1980, muitas têm sido as
vivem desde sempre: «nativos digitais». variantes pra a sua designação. A título
Bennett, Maton e Kervin (2008), referem de exemplo pode referir-se a proposta de
mesmo que para estes jovens os compu- Tapscott (1999) ao denominar por “net
tadores nem sequer são considerados generation” atendendo à utilização sis-
tecnologias porque fazem parte do seu temática e exaustiva da internet. Tendo
‘mobiliário’ indistintamente de outros em consideração o facto da maioritária
recursos que os rodeiam. Esta questão utilização dos suportes digitais serem
é muito mais profunda e vai muito para jogar, Carstens e Beck (2005) deno-
mais além… Tal como afirma Prensky minou esta geração por “gamer genera-
(2001b), os estudantes atuais pensam e tion”. Atendendo à viragem para o século
agem de forma diferente, todo o seu estilo XXI, Pedró (2006) veio designá-los por
de vida é completamente diferente das “newmillenium learners”. Outros auto-
gerações que os precederam, o que os tor- res como, por exemplo, Veen e Vrakking
nam ‘singulares’. São indivíduos que pro- (2006 apud SELDWYN, 2009, p. 365), as-
cessam a informação de uma nova forma, sociam várias dimensões: “generation C”,
para eles a velocidade de processamento pelo facto de possuírem três valências,
aumentou, conseguem realizar processa- tais como, a conectividade, a criatividade
mentos paralelos no seio de esquemas e o click; a “generation M”, ao se associa-

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Educação gerontológica na contemporaneidade: a gerontagogia, as universidades de terceira...

rem os diferentes media numa dimensão das tecnologias digitais não só promove a
que é multimédia; e a “generation V” por sua inclusão como também vêm oferecer
interagirem num meio virtual. e a promover relações intergeracionais.
Coexistindo com os nativos digitais Neste contexto, Dias (2012) refere ainda
encontram-se os restantes cidadãos que o conceito de envelhecimento produtivo
nasceram numa época onde as tecnolo- dado que as práticas decorrentes no
gias eram praticamente inexistentes, seio das redes digitais promovem para
mas que hoje as utilizam tendo-se adap- os cidadãos mais idosos a realização de
tado a um novo ambiente e contexto atividades significativas que vêm a ter
muito diferente daquele que esteve na um impacto positivo não apenas nas
base da sua educação e desenvolvimento, suas próprias vidas mas também junto
que são apelidados por «imigrantes digi- dos demais criando condições para uma
tais». Como adverte Silveira (2014), ao inclusão simultaneamente social e digi-
referir estudos e reflexões mais recentes tal. Presentemente, tal como é afirmado
de Prensky, não se podem antagonizar por Castells e Cardoso (2005), vem-se
os «nativos digitais» com os «imigrantes instalando uma sociedade ‘hipersocial’,
digitais», dado que houve uma primeira onde se privilegiam as trocas e as rela-
tendência em se assumir que os primei- ções de forma quase ininterrupta ao se
ros incorporavam naturalmente todos os integrarem as tecnologias em todos os
aspetos positivos inerentes ás tecnolo- atos diários, onde a realidade virtual
gias. Pelo contrário, Silveira (2014) vem e a virtualidade real cada vez mais se
reforçar a tese de que tem que haver uma confundem e onde também cada um é
aprendizagem e uma ‘sabedoria’ capaz de consumidor e produtor de conhecimento.
promover e possibilitar uma adequada Para o efeito, as pessoas idosas terão que
integração e não uma mera exposição a ter uma maior e mais sistemática expo-
um ambiente tecnológico: sição às tecnologias para que possam
Digital wisdom can be, and must be, learned rentabilizar ao máximo estes recursos
and taught. As we offer more courses in di- digitais, como é defendido por Alex,
gital literacy, we should also offer students Autry e Zane:
guidance in developping digital wisdom.
Individuals in a culture that is exposed to
Parents and educators are digital wise
and uses technology routinely will most
when they recognize this imperative and
likely program theis brains to process tech-
prepare the children in their care for the
nology inputs differently than a person who
future (PRENSKY, 2009 apud SILVEIRA,
was not raised in a technology environment
2014, p. 14).
and has had limited experiences using digi-
Como se pode verificar tem-se, por tal instruments (2011, p. 464).
um lado, os mais jovens (nativos digitais) E, para finalizar, após tudo o que
e, por outro, num outro extremo etário, já foi referido, é preciso reforçar o que
as pessoas mais idosas, onde apenas uma Alencar (2002) afirma ao reforçar o facto
pequena minoria poderá ser apelidada de que as instituições de ensino devem
de ‘imigrante digital’. O envolvimento reconhecer que dadas as aceleradas
dos cidadãos mais idosos na utilização

RBCEH, Passo Fundo, v. 12, n. 3, p. 212-233, set./dez. 2015 229


Henrique Gil

mudanças que se têm vindo a suceder, se possuírem as competências digitais


as pessoas mais idosas e, principalmente que lhes permitam aceder e utilizar
estes cidadãos, têm que enfrentar muitos esses mesmos recursos digitais. Assim
desafios e a adaptação a estas mudanças sendo, fica claro que quem não possui
constitui a prioridade. Mas não será competências digitais não poderá vir
apenas a sua adaptação, é muito mais a exercer uma cidadania plena. Neste
que isso… é fundamental que as pes- sentido, torna-se altamente prioritário e
soas idosas conheçam e assumam eles pertinente que os cidadãos mais idosos,
próprias as suas transformações e este é na sua grande maioria infoexcluídos,
um grande desafio para o século XXI ao possam ver criadas condições promoto-
ter que proporcionar uma verdadeira e ras para a sua infoinclusão. Pois, uma
integral inclusão para o exercício de uma verdadeira inclusão social só poderá
cidadania plena!!! efetivar-se se existir uma verdadeira
inclusão digital. Este poderá ser um dos
Conclusão maiores desafios que urge ultrapassar
para termos uma sociedade mais justa
Em termos globais, sente-se que e mais igualitária onde todos tenham,
ainda há muito por fazer. A união Eu- realmente e efetivamente, as mesmas
ropeia e Portugal têm vindo a publicar oportunidades… oportunidades digitais!
um conjunto de legislação e de diretivas
relacionadas com os cidadãos mais ido-
sos, com o grande objetivo de virem a
adquirir competências digitais. Até ao
Gerontological education in
presente momento, esta intenção não se contemporary: the gerontagogy, the
tem vindo a concretizar dado que as úl- third age universities and the digital
timas estatísticas têm demonstrado que natives
há medida que se avança na faixa etária
há um gradual decréscimo de cidadãos Abstract
que se possam considerar como infoinclu-
ídos. Para o efeito, diferentes abordagens The paper aims to present the context on
the dynamics of the aging process with
pedagógicas que possam basear-se nos
a reflection about their different levels.
pressupostos da gerontagogia, no seio Taking into account the increase in life ex-
de instituições vocacionadas para a for- pectancy, it is important to promote a life-
mação de cidadãos mais idosos, poderão long learning ‘to’ and ‘with’ older citizens.
constituir uma potencial solução para In this context, a multidisciplinary approa-
esta problemática. ch is carried out which highlights the im-
portance of gerontology and gerontagogy
É importante perceber-se que no atu- in the context of training that aims to be
al contexto digital, onde cada vez mais more tailored to the needs of older citizens.
os cidadãos têm que utilizar serviços e In particular, lifelong learning, is given a
plataformas digitais para exercer os seus specific emphasis on the Universities of the
deveres e direitos, só o poderão realizar Third Age operating in Portugal in respect
of its educational contribution and at the

230 RBCEH, Passo Fundo, v. 12, n. 3, p. 212-233, set./dez. 2015


Educação gerontológica na contemporaneidade: a gerontagogia, as universidades de terceira...

same time, their social contribution. Given the evidence. British Journal of Educational
that this society of XXI century which is Technology, v. 39, n. 5, p. 775-786, 2008.
more and more based on digital services
BOTH, A. Identidade existencial na terceira
and digital platforms, the article aims to
idade: mediações do Estado e da universida-
promote a critical reflection regarding the
de. Tese (Doutorado em Educação) – Facul-
designated ‘digital natives’ and ‘digital im-
dade de Educação, Universidade Federal do
migrants’, as regards the respective digital
Rio Grande do Sul, Porto Alegre, 1998.
competences that allow them to exercise
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