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M.

TUCCI
CARLOS E... ^iZADOR
ORGANI-

A EDIÇÃO
SEGUNDA/
r Universidade
Federal
do Rio Grande
do Sul

Reitora
Wrana Panizzi
Vice-Reitor
Nilton Rodrigues Paim
Pró-Reitor de Extensão
Luiz Fernando Coelho de Souza
Vice-Pró-Reitor de Extensão
José Augusto Avancini

EDITORA DA UNIVERSIDADE
Diretor
Geraldo F. Huff

CONSELHO EDITORIAL
Anna Carolina K. P. Regner
Christa Berger
Eloir Paulo Schenkel
Georgina Bond-Buckup
Jose Antonio Costa
Livio Amaral
Maria da Graça Krieger
Maria Heloísa Lenz
Odone Sanguiné
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Geraldo F. Huff, presidente

Editora da Universidade/UFRGS • Av. Joào Pessoa, 415 - 90040-000 Porto Alegre, RS - Fone (051) 224-
8821 - Fax (051) 316-3977 • Direção: Geraldo Francisco HutF • Editoração: Paulo Antonio da Silveira (coor­
denador), Carla M. Luzzatto, Cláudia Bittencourt, Maria da Glória Almeida dos Santos, Rubens Renato Abreu •
Administração: Julio Cesar de Souza Dias (coordenador), Laerte Balbinot Dias • Apoio: Iara Lombardo, Idalina
Louzada, Laércio Fontoura.
© dos autores
Ia edição: 1993

Direitos reservados desta edição:


Universidade Federal do Rio Grande do Sul

Capa; Carla M. Luzzatto


Ilustração da capa: Rio Araguaia. Imagem SPOT. de 15/7/1986
Revisão: Maria da Graça Storti Féres
Anajara Caibonell CIoss
Maria da Glória Almeida dos Santos
Cláudia Bittencourt

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développem ent
en coopération

Hidrologia: ciência e aplicação / organizado por Carlos E. M. Tucci. - 2.ed.:


2.reimpr. - Porto Alegre : Ed. Umversidade/UFRGS : ABRH. 2001.

(Coleção ABRH de Recursos Hídricos: v.4)

1, Hidrologia. 2. recursos hídricos. I. Tucci, Carlos E. M.

CDU 556.01/.56

Catalogação na publicação: Mônica Ballejo Canto - CRB 10/1023


AGRADECIMENTOS

Este livro contou com a contribuição de um grupo numeroso de pessoas,


além dos autores. Estas contribuições foram na revisão do texto,
identificação de erros, digitação, desenho, edição, ou seja nas diferentes
tarefas que envolvem a produção de um texto desta magnitude. Sem estas
pessoas certamente o livro não seria concluído e muito menos em três anos.
Portanto, os autores desejam agradecer nominalmente a todas as pessoas abaixo
relacionadas que permitiram a conclusão deste livro.
Agradecemos pela revisão e sugestões aos seguintes profissionais:
ÀntonioRighetto, Marcos Leão, Mario Wregue,FranzSemmelman,NelsonCaicedo,
David Marques, Robin T. Clarke, Mario Simões Lopes, Juan C. Bertoni, Olavo
Pedrollo, Adolfo Villanueva, Fernando Genz, Eduardo Sávio, Luis. Brasa e Elisa
Chaves.
A contribuição de Andréa Germano, Fernando Genz e Fernando Steffon e das
bibliotecárias Jusaxa Silva e Jussara Barbieri foram inestimáveis na produção
dos originais enviados à editora. Os desenhos foram elaborados pelo setor de
Desenho do IPH/UFRGS com a dedicação dos desenhistas Mareia Feijó, Olasio
Mendes, Dagobeito Weimar e dos funcionários Geraldo Godoy e Mareia Nelci
Feijó.
PREFÁCIO

A água é um bem essencial à vida e ao desenvolvimento econômico-social


das nações. Trata-se de um recurso natural renovável que pode tomar-se
escasso com o crescimento das populações, das indústrias e da agricultura.
Os pesados investimentos exigidos no setor dos recursos hídricos para
ter esse recurso natural com os requisitos apropriados, em termos de
quantidade e qualidade, representam uma parcela significativa dos orçamentos
nacionais e regionais.
Pela sua importância estratégica, este setor ressente-se ainda da
necessidade de desenvolvimento e aprimoramento de métodos e técnicas próprias
que possibilitem a sua utilização racional na promoção do crescimento
econômico e do bem estar social do país.
A ABRH, atenta para essa demanda, vem dedicando um considerável esforço
na publicação de periódicos e livros técnicos que possam contribuir para o
aprimoramento e qualificação profissional do pessoal envolvido com a ciência
dos Recursos Hídricos.
O iivro que agora apresentamos,"Volume IV da Coleção ABRH", é o mais
novo esforço da Associação nesse contexto da construção de maior capacidade
técnica de nossos profissionais, recomendada de forma prioritária na
Conferência Internacional das Nações Unidas realizada no Rio de Janeiro em
1992. Trata-se de um livro que todo profissional da área deve conhecer para
melhor desempenhar sua contribuição na solução dos problemas dos Recursos
Hídricos. É um livro extenso, de 24 capítulos, que organiza de uma forma
teórica e aplicativa os conhecimentos hidrológicos, oferecendo aos leitores
uma útil fonte de consulta e aprimoramento.
Uma vez que a ABRH dedica o biênio 92/93 ao ensino da ciência dos
wRecursos Hídricos, esse esforço editorial não podería deixar de contemplar
nossa preocupação com os cursos de graduação e pós-graduação de nossas
Universidades. Dessa forma, os autores convidados a escrever os diversos
capítulos procuraram também deixar em seus textos uma seqüência lógica que
deverá permitir que o livro venha a atingir esse público.
A cada um dos autores e a todos que contribuiram para a publicação desse
livro, a diretoria nacional da ABRH deixa, em nome de seus associados, os
mais fortes agradecimentos.

Paulo Canedo de Magalhães

Presidente da ABRH
APRESENTAÇÃO

Inicialmente pretendíamos organizar um texto de apoio ao ensino de pós-


graduação de Hidrologia, mas a grande diversidade de formação dos alunos que
concorrem a esse programa exige que o curso de Hidrologia Básica contenha os
elementos do graduação e a introdução para um programa mais avançado. Dessa
forma o texto pode ser utilizado tanto no graduação como num curso inicial do
pós-graduação, diferenciando-se pela profundidade utilizada em cada capítulo
ou pela escolha de capítulos que atendam ao programa desejado.
Os resultados foram promissores, em apenas quatro meses foram preparados
doze capítulos utilizados num curso introdutório de Hidrologia do pós-
graduação de Recursos Hídricos e Saneamento do IPH/UFRGS. Esta primeira
versão serviu de base para um projeto maior, o de preparar um livro que
contivesse tópicos básicos e aplicados de Hidrologia e fosse utilizado também
nos cursos de graduação. Com essa ampliação e no aprimoramento dos capítulos
anteriormente elaborados, este livro foi concluído através da participação de
dezesseis qualificados professores. O desenvolvimento do texto, revisões e
edição da minuta entregue à editora da UFRGS levou cerca de dois anos e meio.
Quando um curso ou texto sobre um assunto é organizado, existem duas
formas básicas de desenvolvê-lo, segundo a teoria ou com base nas aplicações.
Os conceitos que formam a teoria, em geral, são mais áridos dificultando o
ensino e o aprendizado, enquanto a aplicação é sempre mais fácil de
interessar o leitor. No ensino de graduação de Hidrologia c interesse do
aluno tem sido reduzido, principalmente devido à seqüência de conceitos que
envolve o ciclo hidrológico. Quando este assunto é visto dentro,,de uma ótica
de aplicação passa a ter maiores atrativos. O dilema, no entanto, decorre que
sem os conceitos fundamentais não é possível que os profissionais tenham uma
formação aplicada coerente. Este livro foi dividido em duas partes, a
primeira, que envolve os treze primeiros capítulos, procura ensinar os
principais elementos do ciclo hidrológico, utilizando-sé de exemplos'
práticos. Na segunda parte são apresentados capítulos organizados segundo
aplicações, que utilizam técnicas descritas nos primeiros capítulos. O
primeiro conjunto de capítulos pode ser utilizado em uma disciplina básica do
graduação ou pós-graduação, de acordo com a profundidade utilizada do texto.
O segundo grupo de capítulos pode ser utilizado para disciplinas aplicadas
opcionais destes níveis de formação ou como a segunda parte do curso básico.
Evidentemente que os temas, dentro de cada capítulo, não foram esgotados. A
orientação do texto não foi a de explorar totalmente cada tema, mas a de
introduzir o leitor no conhecimento de uma literatura específica.
A Hidrologia não se resume na descrição e quantificação dos processos
envolvidos em parte do ciclo hidrológico, mas qualquer profissional que atue
nesta área deve conhecer qualitativamente e quantitativamente os processos
físicos envolvidos, para que possa melhor utilizar ferramentas sofisticadas
Apresentação

na avaliação e Planejamento dos Recursos Hídricos. Em Hidrologia atuam


profissionais de diferentes formações, combinando técnicas matemáticas,
estatísticas, processos químicos, físicos e biológicos. Para que todas essas
informações sejam utilizadas corretamente toma-se necessário um bom
conhecimento dos fundamentos envolvidos,
No primeiro capítulo é apresentada uma visão de conjunto da Hidrologia
como ciência e aplicação, procurando identificar as diferentes áreas de
desenvolvimento e os desafios. O segundo capítulo reune a visão macro do
ciclo hidrológíco, quantificando o balanço do globo terrestre, com os
elementos físicos da bacia hidrográfica. O relevo e a sua influência no
comportamento sobre o escoamento resultante da bacia são elementos que a
ciência procura melhor explicar e alguns destes aspectos são introduzidos
nesse capítulo. O capítulo seguinte trata dos elementos de hidrometeorologia
e busca introduzir o leitor nas principais variáveis e processos necessários
à compreensão de algumas condições climáticas e à descrição de metodologias
utilizadas em outros capítulos.
O quarto capítulo trata de Hidrologia Estatística e devido a sua grande
importância dentro de qualquer curso de hidrologia foi mais detalhado e
ocupou um espaço maior neste livro. As estatísticas básicas, os elementos de
probabilidades, regressão e correlação foram introduzidos para o leitor
leigo. Esses xnceitos foram exemplificados com problemas de hidrologia, mas
são utilizados em outros capítulos. No capítulo 17 alguns dos elementos
desses capítulos são aprofundados visando o leitor interessado em aprimorar
seus conhecimentos.
O quinto capítulo inicia a seqüência dos processos do ciclo hidrológíco
com a Precipitação. O mecanismo da precipitação, suas medidas e análise dos
dados básicos são tratados inícialmente. Os aspectos de coleta de dados são
tratados no capítulo 13 que engloba toda a aquisição de dados de bacias
hidrográficas. A seguir neste capítulo são apresentados os principais
elementos sobre a precipitação média e máxima, A interceptação é tratada no
capítulo 6 onde tanto os aspectos da interceptação vegetal como das
depressões do solo são descritos. A evaporação e a evapotranspiração,
descritas no capítulo 7, são apresentadas através dos principais métodos,
dando-se ênfase ao método de Penman, baseado no balanço de energia.
A parte do ciclo hidrológíco em que a água escoa dentro do solo foi
separada em duas partes fundamentais. No capítulo 8 são apresentadas as
principais características do escoamento subterrâneo em meio saturado,
enquanto que no capítulo 9 é apresentada a infiltração, que permite avaliar a
quantidade de água que penetra no solo, e o armazenamento na camada superior
do solo onde, em geral, ocorre o escoamento em meio não-saturado. O
armazenamento no solo é fator importante para a irrigação e drenagem.
O escoamento superficial na bacia hidrográfica pode ser separado em duas
partes principais, o escoamento de pequena profundidade, que escoa na
Hidrologia

superfície, e o escoamento em rios e canais com grande profundidade e largura


definida. No capítulo 10 são apresentados os fundamentos do escoamento não-
permanente, no qual são baseados os métodos utilizados para representar este
escoamento tanto na superfície como nos rios. No capítulo 11 são descritas as
metodologias de análise do escoamento superficial, desde a separação desse
escoamento a partir do hidrograma, cálculo da precipitação efetiva, que gerou
o escoamento superficial até a utilização do hidrograma unitário. No capítulo
12 é descrita inicialmente a metodologia de cálculo de linha de água em
regime permanente em rios, que em geral não é abordada nos cursos ou livros
de mecânica de fluidos. A seguir são descritas as metodologias de simulação
do escoamento em reservatórios e rios.
O capítulo 13, que trata da Aquisição de Dados Hidrológicos, podería
aparecer no início ou no final do grupo de capítulos que retratam o ciclo
hidrológico. A inclusão do capítulo nesta seqüêncía permite que o leitor,
após conhecer os processos, tenha melhores condições de entender como
realizar a aquisição de informações. O capítulo busca dar a visão de uma
bacia e analisar principalmente a coleta das duas variáveis principais, a
precipitação e a vazão. Evidentemente que outras variáveis poderíam ser
incluídas, mas os objetivos deste livro e o espaço disponível não permitiram.
Como mencionado anteriormente, os treze primeiros capítula compõem a
base conceituai de Hidrologia para o nível introdutório. Os capítulos que
seguem não possuem necessariamente seqüêncía e podem ser utilizados como
compartimentos estanques, apesar de existirem algurnas referências entre si
(por exemplo, capítulo 14 e 16, 14 e 21). Esses capítulos representam a
utilização da hidrologia em problemas de engenharia.
No capítulo 14 é tratado um problema tradicional de recursos hídricos, a
vazão ou seqüêncía de vazões (hidrograma) para dimensionamento de uma obra
hidráulica. O capítulo separa a determinação da vazão máxima, quando somente
esta é desejada, e o hidrograma de projeto, quando tanto a máxima como a
evolução das vazões são necessárias. O capítulo 15 trata da regionalização de
vazões que é um conjunto de técnicas utilizadas para estimar as vazões em
locais com deficiências de dados. Essas técnicas são importantes na realidade
brasileira em função do custo da obtenção dos dados e do tamanho do país.
Como se observa, estes dois capítulos são básicos para conhecimentos de
variáveis de projetos de engenharia.
A enchente é um dos problemas freqüentes da cidades que se expandem. No
capítulo 16 são apresentados os principais aspectos necessários ao controle
de enchentes, através de metodologias descritas nos capítulos anteriores e
complementadas nesse capítulo.
O capítulo 17 está integrado com o capítulo 4 e representa um passo mais
aprofundado dentro da Hidrologia Estatística e é recomendado ao leitor que
necessita de aprimorar seus conhecimentos no assunto e explorar mais as
técnicas estatísticas.
Apresentação

O capítulo 18 trata de outro problema tradicional de engenharia de


recursos hídricos, que é o dimensionamento do volume de um reservatório. O
capítulo é conceituai e mostra passo a passo a determinação da relação entre
demanda e armazenamento. Esse capítulo evita o uso dos tradicionais métodos
gráficos, já que com as disponibilidades computacionais hoje disponíveis não
mais se justificam.
A gestão dos recursos hídricos é hoje uma necessidade para uma sociedade
que explora esse recurso limitado. O capítulo 19 inicia tratando de
identificar os principais usos dos recursos hídricos, caracteriza seus
múltiplos usos e apresenta os principais elementos da gestão dos recursos
hídricos.
A Drenagem de águas subterrâneas, tratada no capítulo 20, complementa os
elementos apresentados no capítulo 8, descrevendo os principais aspectos de
drenagem superficial e da exploração de poços.
No capítulo 21 a drenagem urbana é apresentada iniciando com os
princípios do plano diretor de drenagem, que enfatiza a necessidade de evitar
a ampliação das vazões para jusante. O capítulo separa o assunto em macro e
microdrenagens e descreve as principais metodologias utilizadas na prática,
concluindo com o uso integrado dos métodos representado pelo modelo
hidrológico.
O capítulo 22 'tem um título ambicioso para ser tratado em tão poucas
páginas, no entanto, o objetivo foi o de introduzir o leitor nos principais
tópicos onde os usos dos Recursos Hídricos interferem no meio ambiente
aquático. O capítulo menciona novamente os principais usos da água e a sua
intereferência com o meio ambiente, concluindo com um roteiro do RIMA,
Relatório de impacto ambiental de um projeto de irrigação.
O capítulo 23 trata do Uso de Radar, técnica que tem cada vez mais
utilização em hidrologia, com aplicação em diferentes áreas. No Brasil o seu
uso ainda é limitado devido ao alto custo de implementação e operação desse
sistema, no entanto, certamente haverá a tendência de sua ampliação de
instalação. O conteúdo do capítulo busca informar os princípios básicos,
vantagens e limitações, concluindo com a ilustração de diferentes aplicações.
O capítulo 24 encerra este livro tratando da Engenharia de Sedimentos,
que tem um efeito importante sobre algumas variáveis do ciclo hidrológico e
relação direta com a ocupação do espaço pelo homem. Os principais conceitos e
metodologias de estimativa dos sedimentos em bacias hidrográficas são
introduzidos no capítulo

Sugestões para uso do texto no curso de graduação

As sugestões a seguir apresentadas referem-se principalmente à


disciplina de Hidrologia dentro do curso de Engenharia Civil, mas poderão ser
utilizadas em outras formações. Na Resolução n. 48/76 do Ministério da
Hidrologia

Educação de 27/4/76, que define o currículo mínimo de várias carreiras,


inclusive da Engenharia Civil, a Hidrologia é citada explicitamente. O
conteúdo previsto nessa resolução 6 o seguinte:

"Ciclo hidrológico, precipitação, recursos hídricos superficiais e


subterrâneos e evaporação.”

Esta descrição é resumida e limitada. O programa, aplicado em parte


significativa dos importantes cursos das universidades brasileiras, contém,
em síntese, o seguinte:

Ciclo hidrológico, bacia hidrográfica,precipitação, evaporação e


evapotranspiração, água subterrânea, infiltração, escoamentos,
hidrometria, regularização de vazão e vazão de projeto.

Este programa é, em geral, apresentado num semestre com 60 horas de


aula, correspondendo a 4 créditos. Algumas Universidades possuem disciplinas
complementares optativas que se inserem dentro da concentração de Recursos
Hídricos e apresentam conteúdo complementar mais aplicado sobre Hidrologia.
O conteúdo deste livro pode ser utilizado numa seqüência de disciplinas
dentro desta opção, atendendo primeiramente à disciplina obrigatória e depois
àquelas optativas que utilizem combinações dos capítulos apresentados. Na
tabela 1 abaixo, sugerimos um programa para a disciplina com os itens do
livro que poderiam ser utilizados
Este programa é ambicioso devido à quantidade de conteúdos e o tempo
previsto. Adaptações a cada realidade devem ser realizadas. O quadro
apresentado é somente uma das muitas alternativas existentes.

Carlos E.M. Tucci


Apresentação

Tabela 1. Sugestão de programa para um curso de Hidrologia na Engenharia


Civil

Capítulos do programa recomendado Sugestão quanto ao conteúdo Horas


do livro aula
[-Introdução capítulo 1 2
2-Ciclo hidrológico
e Bacia hidrográfica capítulo 2 2
3'Elementos de hidrometeorologia capítulo 3 até 3.2 2
4’EIementos de Estatística capítulo 4; 4.1 a 4.3,4.4.2
(selecione algumas distribuições),
4.5.1. 6
5-Precipitaçao capítulo 5 sem os itens:
vetor regional, PMP e
Método de Chicago 6
ó-Interceptação capítulo 6 2
7-Evaporação e Evapotranspiração capítulo 7 4
8-Agua Subterrânea capítulo 8 (8.1 e 8.2) e
capítulo 20 (20.1 a 20.3) 4
9-Infiltração capítulo 9 (9.1) 4
10-Fundamentos do Escoamento capítulo 10 (sem deduções) 2
1J-Escoamento superficial capítulo 11 (sem HUI) 6
12-Escoamcnto em rios e canais capítulo 12 (sem deduções
Muskingun-Cunge) 6
13-Aquisíção de Dados hidrológicos capítulo 13 até 13.4.2 6
14-Vazão máxima capítulo 14, 14.1 a 14.2.2 4
15-Regularização de vazão capítulo 18 4
AUTORES

CARLOS E. M. TUCCI, PhD


Professor Titular do Departamento de Hidromecânica e Hidrologia do Instituto de
Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

ANDRE L. L. DA SILVEIRA, Dr.


Professor Assistente do Departamento de Hidromecânica e Hidrologia do Ins­
tituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul.

ANTONIO BENETTI, MSc


Professor Assistente do Departamento de Obras Hidráulicas do Instituto de Pes­
quisas H idrátíftâs (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

ANTONIO E. L. LANNA, PhD


Professor Adjunto do Departamento de Obras Hidráulicas do Instituto de Pes­
quisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

FRANCISCO BIDONE, Dr.


Professor Assistente do Departamento de Obras Hidráulicas do Instituto de Pes­
quisas Hidráulicas' (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul,

FRANZ SEMMELMAN, Dr.


Professor Adjunto do Departamento de Obras Hidráulicas do Instituto de Pes­
quisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

JO SÉ A. LOUZADA, MSc
Professor Assistente do Departamento de Obras Hidráulicas do Instituto de Pes­
quisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federai do Rio Grande do Sul.

JUAN C. BERTONI, MSc


Professor Assistente do Departamento de Hidromecânica e Hidrologia do Ins­
tituto de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul.

KAM EL ZAHED FILHO, Dr.


Professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo - USP e enge
nheiro da Companhia Estadual de Saneamento Básico do Estado de São Paulo.

LAWSON F. S. BELTRAME, MSc


Professor Adjunto do Departamento de Obras Hidráulicas e Diretor do Institu o
de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Su .
MARC P. BORDAS, Dr.
Professor Titular do Departamento de Obras Hidráulicas do Instituto de Pesqui­
sas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

MARCOS L. PESSOA, PhD


Engenheiro da Companhia Paranaense de Energia Elétrica - COPEL; professor
visitante do programa de pós-graduação de Engenharia Hidráulica e Sanitária
da USP

NELSON L. CAICEDO, PhD


Professor Titular do Departamento de Hidromecânica e Hidrologia do Instituto de
Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

PIERRE CHEVALLIER, Dr.


Diretor de pesquisa da ORSTOM Instituto Francês de Pesquisa Científica para o
Desenvolvimento em Cooperação e pesquisador visitante no Instituto de Pes­
quisas Hidráulicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul

RUBEM L. PORTO, D r
Professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo - USP e enge­
nheiro do Centro Tecnológico de Hidráulica do Departamento de Águas e Ener­
gia Elétrica do Estado de São Paulo, CTH

ROBIN T. CLARKE, DSc


Professor Visitante do Departamento de Hidromecânica e Hidrologia do Instituto
de Pesquisas Hidráulicas (IPH) da Universidade Federai do Rio Grande do Sul.
SUMARIO

1 - HID RO LOGIA : CIÊNCIA E APLICAÇÃO


Carlos E.M. Tucci

1.1 Introdução 25
1.2 Histórico 27
1.3 Ciência hidrológica 29
1.4 Hidrologia aplicada 31

2 r C IC LO HIDROLÓGICO E BACIA HIDROGRÁFICA


André L. L. da Silveira

2.1 Introdução 35
2.2 Descrição geral do ciclo hidrológico 36
2.3 Quantificação geral dos fluxos e reservas de água 38
2.4 Bacia hidrográfica 40

3 - ELEM ENTOS DE HIDROM ETEOROLOGIA


Juan Carios Bertoni

3.1 A atmosfera terrestre 53


3.2 Umidade atmosférica 54
3.2.1 Relação entre o vapor de água e a temperatura do ar 56
3.2.2 índices da umidade do ar 58
3.2.3 Relações entre os diferentes índices de umidade 60
3.2.4 Determinação da pressão de vapor de água 61
3.3 Processos de transporte 62
3.4 Transformações adiabáticas 65
3.5 Estabilidade atmosférica 67
3.6 Temperaturas associadas a processos convectivos 71
3.7 Altura de águaprecipitável ou condensável 71

4 - ELEM ENTOS DE ESTATÍSTICA E PROBABILIDADES


Antonio Eduardo Lanna

4.1 Introdução 79
4.2 Tratamento estatístico de variáveis hidrológicas 80
4.2.1 Representação gráfica 82
4.2.2 Representação numérica 91
4.3 Modelos probabilísticos em hidrologia 106
4.3.1 Conceitos básicos de probabilidades 109
4.3.2 Funções densidade e cumulativa de probabilidade 113
4.3.3 Estimativa dos parâmetros das distribuições teóricas 115
4.4 Principais modelos probabilísticos 120
4.4.1 Modelos probabilísticos discretos 120
4.4.2 Distribuições contínuas 128
4.5 Avaliação do ajuste de modelos probabilísticos 161
4.5.1 Posições de locação de amostras 162
4.5.2 Papéis probabilísticos de algumas distribuições
teóricas 164

5 - PRECIPITAÇÃO
Juan C. Bertoni e Carlos E.M.Tuccí

5.1 Introdução 1^7


5.2 Mecanismos de formação das precipitações 177
5.3 Classificação das precipitações 180
5.4 Pluviometria 181
5.5 Análise dos dados de precipitação 182
5.5.1 Preenchimento de falhas 183
5.5.2 Análise de consistência de séries pluviométricas 186
5.6 Precipitação média numa área 193
5.7 Análise de freqüência de séries mensaisc anuais 198
5.8 Precipitações máximas 200
5.8.1 Determinação de curvas de intensidade-duração-
freqüência 201
5.8.2 Precipitação máximaprovável 209
5.8.3 Distribuição temporal 220
5.8.4 Distribuição espacial 231

6 - INTERCEPTAÇÃO
Carlos E.M. Tucci

6.1 Introdução 243


6.2 Interceptação vegetal 243
6.3 Armazenamento nas depressões 249

7 - EVAPORAÇÃO E EVAPOTRANSPIRAÇÃO
Carlos E. M. Tucci e Lawson F. S. Beltrame

7.1 Introdução 253


7.2 Evaporação 253
7.2.1 Métodos de transferência demassa 254
7.2.2 Balanço de energia 255
7.2.3 Equações empíricas 264
7.2.4 Evaporímetros 265
7.2.5 Balanço hídrico 267
7.3 Evapotranspiração 269
7.3.1 Medidas diretas 271
7.3.2 Métodos baseados natemperatura 273
7.3.3 Métodos baseados naradiação 275
7.3.4 Método Combinado 276
7.3.5 Balanço hídrico 277

» - ÁGUA SUBTERRÂNEA
Nelson Luna Caicedo

8.1 Conceitos básicos de hidrogeologia 289


8.2 Lei empírica de Darcy 300
8.3 Equações fundamentais do fluxo subterrâneo 306
8.4 Interação de águas superficiais e subterrâneas 316

9 - INFILTRAÇÃO E ARMAZENAMENTO NO SOLO


André L. da Silveira, José A. Louzada e Lawson Beltrame

9.1 Infiltração 335


9.1.1 Capacidade de Infiltração e taxa de infiltração 336
9.1.2 Equacionamento geral da infiltração 337
9.1.3 Equações para cálculo da infiltração pontual 341
9Ol Armazenamento de água no solo 356
9.2.1 Redistribuição interna ^ 356
9.2.2 Umidade do solo: conceitos e métodos 358
9.2.3 Curva de retenção da água no solo 360
9.2.4 Perfis de umidade 365

10 - FUNDAMENTOS DO ESCOAMENTO NÃO-PERMANENTE


Carlos E. M. Tucci

10.1 Introdução 373


10.2 Equações do escoamento 374
10.3 Simplificações das equações do escoamento 379
10.4 Classificação dos modelosdeescoamento 380
11 - ESCOAMENTO SUPERFICIAL
Carlos E. M. Tucci

11.1 Componentes do hidrograma 391


11.2 Separação do escoamento superficial 395
11.3 Determinação da precipitação efetiva 399
11.4 Modelos do escoamento superficial 409
11.5 Modelo Linear 411
11.5.1 Hidrograma unitário instantâneo 412
11.5.2 Hidrograma unitário 414
11.5.3 Hidrograma unitário sintético 428
11.5.4 Transposição de hidrograma unitário 437

12 - ESCOAMENTO EM RIOS E RESERVATÓRIOS


Carlos E.M. Tucci

12.1 Escoamento em regime permanente: remanso 443


12.2 Escoamento não-permanente:contribuição lateral 449
12.3 Escoamento não-permanente em reservatórios 451
12.4 Escoamento em rios 459
12.4.1 Modelo Muskingun 459
12.4.2 Modelo Muskingun-Cunge 465

13 - AQUISIÇÃO E PROCESSAMENTO DE DADOS


Pierre Chevallier

13.1 Introdução 485


13.1.1 Os parâmetros da hidrologia 485
13.1.2 As dimensões temporal e espacial 486
13.1.3 Representação espacial: informação geográfica 488
13.2 Aquisição de dados de precipitações 490
13.2.1 Generalidades 490
13.2.2 Instalação do aparelho 491
13.2.3 Pluviômetro 491
13.2.4 Pluviógrafo 492
13.3 Aquisição de dados de escoamento 496
13.3.1 Medição de cotas \ 496
13.3.2 Medição de v azão / 500
13.4 Curva-chave 508
13.4.1 O conhecimento do campo, algumas definições 508
13.4.2 Traçado da curva-chave 513
13.4.3 Calibragem de estações não-unívocas 518
13.5 Redes hidrológicas 519
13.5.1 Objetivos 519
13.5.2 Exemplo de uma rede nacional: o DNAEE/CGRH 520
13.5.3 Exemplo de uma rede de proteção da saúde humana 520
13.5.4 Exemplo de uma rede de prevenção contra cheias
catastróficas 521
13.6 Bancos de Dados 522
13.6.1 Princípios 522
13.6.2 Exemplos: Hydrom e Pluviom 523

14 - VAZÃO MÁXIMA E HIDROGRAMA DE PRO JETO


Carlos E. M. Tucci

14.1 Conceitos 527


14.2 Vazões máximas 529
14.2.1 Vazões máximas com base em série histórica 529
14.2.2 Vazão máxima com base na precipitação: Método
Racional 539
14.3 Hidrograma de projeto 545
14.3.1 Hidrograma de projeto com base na vazão 545
14.3.2 Hidrograma de projeto com base na precipitação 548

15 - REGIONALIZAÇÃO DE VAZÕES
Carlos E. M. Tucci

15.1 Introdução à regionalização 573


15.2 Análise dos Dados básicos 576
15.3 Regionalização da vazão máxima, média e mínima 577
15.3.1 Definição das variáveis 577
15.3.2 Fases do desenvolvimento da regionalização 579
15.3.3 Seleção dos Dados 580
15.3.4 Curva de Probabilidade adimensional das vazões 581
15.3.5 Equação de regressão 586
15.3.6 Regiões homogêneas 589
15.3.7 Estimativa da vazão e sua variância 593
15.3.8 Vazão máxima instàntanea 598
15.3.9 Mapeamento da vazão específica 600
15.4 Regionalização da curva permanência 603
15.4.1 Curva de Permanência 603
15.4.2 Regionalização 607
15.5 Regionalização de curvas de regularização 609
15.5.1 Regularização de vazões 609
15.5.2 Regionalização 611
16 - CONTROLE DE ENCHENTES
Carlos E.M. Tucci

16.1 Enchentes 621


16.2 Avaliação das enchentes 623
16.3 Medidas para controle da inundação 624
16.3.1 Medidas estruturais 627
16.3.2 Medidas não-estruturais 629
16.4 Controle de inundação com obras hidráulicas 630
16.5 Zoneamento de áreas de inundação 637
16.5.1 Mapa de inundação de cidade 637
16.5.2 Zoneamento 642
16.6 Avaliação dos prejuízos das enchentes 650
16.6.1 Curva nível-prejuízo 650
16.6.2 Método da curva de prejuízo histórico 651
16.6.3 Equação do prejuízo agregado 652

17 - HIDROLOGIA ESTATÍSTICA
Robin T. Clarke

17.1 Conceitos de Hidrologia Estatística 659


j.7.1.1 Variabilidade hidrológica 659
17.1.2 Modelos Estatísticos 664
17.1.3 Modelos Estatísticos usando variáveis explicativas 665
17.1.4 O componente aleatório et 666
17.1.5 Parcimônia na construção de um modelo estatístico 667
17.1.6 Alguns usos hidrológicos de modelos estatísticos 668
17.1.7 Programas computacionais para ajustes rápidos de
modelos estatísticos 671
17.2 Ajuste de distribuições estatísticas 671
17.2.1 Modelo nulo 671
17.2.2 A função de verossimilhança 672
17.2.3 Método dos Momentos 678
17.2.4 As distribuições Gamma de dois e três parâmetros 679
17.2.5 Escolha entre distribuições log-normal e gamma 680
17.2.6 Distribuição Gumbel 681
17.2.7 Distribuição Weibull 683
17.2.8 Precisão das estimativas de máxima verossimilhança 686
17.2.9 Intervalos de confiança para cada cheia de T anos 688
17.3 Relações lineares com variáveis explicativas 690
17.3.1 Princípios de análise de regressão 690
17.3.2 Aplicações hidrológicas de regressão linear 692
17.3.3 Os fundamentos da regressão linear 694
173.4 Caso especial: regressão linear simples 698
18 - REGULARIZAÇÃO DE VAZÕES EM RESERVATÓRIOS
Antonio Eduardo Lanna

18.1 Introdução 703


18.2 Problema simplificado de dimensionamento de
reservatório 704
18.3 Problema real de dimensionamento de reservatório:
método da simulação 707
18.4 Relação demanda suprida versus capacidade útil 713
18.5 Garantia de atendimento à demanda 715
18.6 Método baseado nas diferenças em relação à seqüência
de deflúvios mínimos 718
18.7 Extensão à consideração de risco de desatendimento 720

19 - GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS


Antonio Eduardo Lanna

19.1 Introdução 727


19.2 O processo de formação de capital 728
19.3 Elementos de análise de projetos dos pontos de vista
social e privado 729
19.4 Engenharia dos Recursos Hídricos 733
19.4.1 Tipos de uso 734
19.4.2 Usos múltiplos 739
19.5 Definições 744
19.5.1 Interdisciplinaridade da gestão dos recursos
hídricos 746
19.5.2 Princípios orientadores da gestão dos recursos
hídricos 747
19.5.3 Organização da atividade de planejamento 751
19.5.4 Jurisdições de planejamento 753
19.5.5 Planejamento quanto aos setores 754
19.5.6 Estágios de planejamento 755
19.5.7 Composição das categorias de planejamento 759
19.5.8 Vantagens do planejamento 759
19.6 Gerenciamento dos recursos hídricos 761
19.6.1 Funções do gerenciamento dos recursos hídricos 762
19.6.2 Dificuldades de implementação de um sistema de
gerenciamento dos recursos hídricos 764

20 - DRENAGEM DE ÁGUAS SUBTERRÂNEAS


Nelson Luna Caicedo

20.1 Conceitos básicos 769


20.2 Soluções analíticas no regime permanente 772
20.3 Escoamento radial transitório 778
20.4 Determinação de características hidrogeológicas 781
20.5 Escoamento superficial 792

21 - DRENAGEM URBANA
Rubem L. Porto, Kamel Zahed Filho, Carlos E. M. Tucci
e Francisco Bidone

21.1 Conceitos 805


21.1.1 Impactos da urbanização 806
21.1.2 Planos diretores de drenagem urbana 810
21.2 Hidrologia Urbana 811
21.2.1 Bacias pequenas e médias 812
21.2.2 Escolha do período de retomo 813
21.2.3 Cálculo do tempo de concentração 815
21.2.4 Efeitos da urbanização 820
21.3 Características da drenagem urbana 822
21.4 Microdrenagem urbana 823
21.4.1 Terminologia dos elementos básicos 823
21.4.2 Elementos físicos do projeto 824
21.4.3 Definição do esquema geral do projetQ 824
21.4.4 Vazões de projeto 828
21.4.5 Dimensionamento hidráulico 829
21.4.6 Galerias 836
21.5 Macrodrenagem 836
21.6 Reservatórios de detenção 838
21.7 Modelos matemáticos de drenagem urbana 842

22 - O M EIO AMBIENTE E OS RECURSOS HÍDRICOS


Antonio Benetti e Francisco Bidone

22.1 Introdução 849


22.2 Caracterização do ambiente aquático 849
22.3 Os usos múltiplos dos recursos hídricos 850
22.3.1 Abastecimento público (doméstico) 851
22.3.2 Consumo industrial/matéria prima paraindústrias 852
22.3.3 Irrigação/dessedentação de animais 852
22.3.4 Recreação 852
22.3.5 Geração de energia elétrica 853
22.3.6 Transporte g53
22.3.7 Preservação da flora e fauna (fonte protéica) 853
22.4 Aspectos da qualidade da água associados aos usos 854
22.5 Poluição das águas 855
22.5.1 Fontes de poluição 855
22.5.2 Aspectos físicos, químicos e biológicos da poluição 859
22.6 Monitoramento da qualidade da água 862
22.7 Planejamento ambiental 866
22.7.1 Tratamento de águas residuárias 866
22.7.2 Medidas preventivas de preservação dos recursos hídricos 868
22.7.3 Aspectos político-administrativos do controle
da poluição das águas 869
22.8 Sístematização para avaliação de impactos ambientais 870

23 - HIDROM ETEOROLOGIA COM RADAR


Marcos de Lacerda Pessoa

23.1 Introdução 877


23.2 Princípios do radares 878
23.3 Mapas indicadores de posição no plano à altitude constante 884
23.4 Fatores que afetam a precisão das medidas realizadas através
de radares meteorológicos 889
23.5 Algumas aplicações hidrometeoroiógicas dos radares 896

24 - ELEM ENTOS DE ENGENHARIA DE SEDIMENTOS


Marc P. Bordas e Franz R, Semmelman

24.1 Ciclo hidrossedimentológico 915


24.2 Processos e componentes do ciclo hidrossedimentológico 916
24.3 Às alterações do ciclo hidrossedimentológico 918
24.4 Erosão ou depósito 922
24.4.1 Capacidade de transporte 923
24.4.2 Descarga sólida de abastecimento 925
24.5 Medição da descarga sólida 931
24.5.1 Medição do transporte de sedimentos em arraste 933
24.5.2 Medição do transporte de sedimentos em suspensão 936
24.5.3 Simplificação de programas de amostragem
da descarga sólida em suspensão 938
24.5.4 Outras medições 939
24.6 Morfologia fluvial e engenharia costeira 939
Capítulo 1

HIDROLOGIA: CIÊNCIA E APLICAÇÃO

Carlos E. M. Thcci

1.1 Introdução

Hidrologia é a ciência que trata da água na Terra, sua ocorrência, circula­


ção e distribuição, suas propriedades físicas e químicas, e sua reação com o
meio ambiente, incluindo sua relação com as formas vivas (U.S. Federal Coun-
cií for Science and Technology, citado por Chow,1959).
E uma disciplina consideravelmente ampla, abrangendo uma grande parte
do conhecimento humano. Algumas das áreas em que a Hidrologia, foi subdivi­
dida são as seguintes:

Kidrometeorologia - é a parte da ciência que trata da água na atmosfera;

Limnologia - refcrc-se ao estudo dos lagos e reservatórios.

Potamologia - trata do estudo dos arroios e rios.

Glacioiogia - é a área da ciência relacionada com a neve e o gelo na natureza

Hidrogeologia - é o campo científico que trata das águas subterrâneas.

A Hidrologia é uma ciência interdisciplinar que tem tido evolução signifi­


cativa em face aos problemas crescentes, resultados da ocupação das bacias, do
incremento significativo da utilização da água e do resultante impacto sobre o
meio ambiente do globo. Profissionais de diferentes áreas como engenheiros,
agrônomos, geólogos, matemáticos, estatísticos, geógrafos, biólogos, entre ou­
tros atuam nas diferentes subáreas dessa ciência.
A Hidrologia evoluiu de uma ciência preponderantemente descritiva e qua­
litativa, para uma área de conhecimento onde os métodos quantitativos têm sido
explorados através de metodologias matemáticas e estatísticas, melhorando de
um lado os resultados e de outro explorando melhor as informações existentes.
No âmbito da utilização de Hidrologia em Recursos Hídricos ou como
é às vezes chamada de Engenharia Hidrológica (figura 1.1), a mesma é en­
tendida como a área que estuda o comportamento físico da ocorrência e o
26 Hidrologia

aproveitamento da água na bacia hidrográfica, quantificando os recursos


hídricos no tempo e no espaço e avaliando o impacto da modificação da bacia
hidrográfica sobre o comportamento dos processos hidrológicos. / A
quantificação da disponibilidade hídrica serve de base para o projeto e
planejamento dos recursos hídricos. Alguns exemplos são: produção de energia
hidrelétrica, abastecimento de água, navegação, controle de enchentes e
impacto ambiental. /

A g r i c u 1 tura
Economia
F 1ore s ta
L e g i s 1 ação
P 1 a nej amento C i ênc i a Pol ítica
dos
R ec u rs os
Hí d r ico s M e c â n i c a dos
(Tomada de Fl uido s
D e c i s ão) Engenhar ia
H i drául i ca
Engenh ar i a
Me teoro ! ogi a
Hi dro lógica
E s tat ís t ica
(p r ev is ão )
C iência
Atmos f érica
C i ência Geo 1 og i a
Hidrológica Geoquímíca
( e n tendimento) C i ê n c i a do Solo

Figura 1.1 - Planejamento, previsão e entendimento (NRC, 1991)

No passado, a ocupação do homem na bacia foi realizada com pouco


planejamento, tendo como objetivos o mínimo custo e o máximo benefício de
seus usuários, sem maior preocupação com a preservação do meio ambiente. Com
o crescimento demográfico e da exploração da água, os recursos naturais têm-
se deteriorado. Na população, criou-se uma preocupação maior com a
quantificação do impacto que a exploração humana provoca na bacia, para que
sejam estabelecidas medidas preventivas que minimizem os danos à natureza. Os
resultados da ação da população, sobre o meio ambiente, tinham uma visão na
Hidrologia: Aplicação e Ciência 27

escala da bacia hidrográfica nos anos 70, enquanto que atualmente o problema
está na escala do globo terrestre, em decorrência dos potenciais efeitos
globais da modificação do clima. A complexidade dos sistemas hídricos cresceu
devido à diminuição da disponibilidade dos recursos hídricos e deterioração
da qualidade das águas. Como conseqüência, projetos com múltiplas finalidades
tenderam a ser desenvolvidos, além do aumento do interesse público pelo
impacto dos aproveitamentos hídricos sobre o meio ambiente. O planejamento da
ocupação da bacia hidrográfica é uma necessidade numa sociedade com usos
crescentes da água, e que tende a ocupar espaços com riscos de inundação,
além de danificar o seu meio. A tendência atual envolve desenvolvimento
sustentado da bacia hidrográfica, que implica o aproveitamento racional dos
recursos com o mínimo dano ao ambiente.
A Ciência Hidrológica trata processos que ocorrem em sistemas moldados
pela natureza. Os processos físicos ocorrem num meio que o homem não
projetou, mas ao qual deve-se adaptar, procurando conviver com o
comportamento deste meio ambiente. Para o entendimento desses processos é
necessário interagir com diferentes áreas do conhecimento que influenciam o
ciclo hidrológico (figura 1.1)
NRC(1991) concluiu que o desenvolvimento da ciência hidrológica tem sido
influenciado por aspectos específicos do uso da água, como atendimento da
demanda de água e controle de desastres. A comissão menciona a necessidade
de instruir-se profissionais com formação mais ampla, que englobe
conhecimentos de matemática, física, química, biologia e geociência, para
desenvolver uma ciência dentro de um contexto mais amplo.

1.2 Histórico

A Hidrologia é uma ciência que se baseia na observação dos processos


envolvidos no meio físico natural. Para analisar a sazonalidade da ocorrência
de precipitações, num determinado local, utilizam-se observações realizadas
no passado, uma vez que os fenômenos provocadores dos processos hidrológicos
na bacia hidrográfica são os eventos meteorológicos, cuja previsão a médio e
longo prazos, o conhecimento atual ainda não dispõe de explicações
determinísticas suficientes.
O homem, desde a sua origem, convive com as condições naturais do
planeta, tanto no seu uso como na sua sobrevivência. Filósofos gregos
tentaram erroneamente explicar o ciclo hidrológico, apenas Marcus Vitruvius
Pollio 100 a.C. apresentou conceitos próximos do entendimento atual do ciclo
hidrológico. Admitia-se que o mar alimentava os rios através do subsolo. Até
no início deste século ainda existiam pessoas que questionavam o conceito
moderno do ciclo hidrológico.
Mesmo não conhecendo a origem da água e o funcionamento dos fenômenos
naturais, as civilizações antigas puderam explorar os recursos hídricos
28 Hidrologia

através de projetos de irrigação como os do Egito e Mesopotâmia, aquedutos


para abastecimento de água romanos e irrigação e controle de inundação pelos
chineses.
Somente a partir do século 15, com Leonardo da Vinci e Bemard Palissy o
ciclo hidrológico passou a ser melhor compreendido. A dificuldade era aceitar
que a precipitação tinha um volume maior que a vazão e que os rios são
mantidos perenes pelo retardamento do escoamento do subsolo. Pierre Perrault,
no século 17 (1608-1680), analisou os componentes da relação precipitação-
vazão, ou seja a precipitação, evaporação e capilaridade da bacia do rio Sena
e comparou estas grandezas com medições de vazão realizadas por Edmé
Mariotte, constatando que a vazão era apenas cerca de 16% da precipitação.
No século 19 inicia-se de um lado as medições sistemáticas de
precipitação e vazão e de outro o desenvolvimento teórico e experimental da
hidráulica. Nos Estados Unidos a coleta sistemática de precipitação iniciou
em 1819, enquanto que a de vazões iniciou em 1888. No Brasil os postos mais
antigos de precipitação são do final do século passado, enquanto que a coleta
de dados de níveis e vazão iniciou no começo deste século.
Até a década de 30 a Hidrologia tinha como base elementos descritivos do
funcionamento dos fenômenos naturais e fórmulas empíricas de processos
específicos, tais como as equações de Chezy, para movimento uniforme em
canais, e o método racional para cálculo de vazão máxima em pequenas bacias.
Essa década marcou o início da nidrologia quantitativa com os trabalhos de
Sherman em 1932, que apresentou os conceitos do hidrograma unitário utilizado
para o escoamento superficial; Horton em 1933 apresentou uma equação empírica
para o cálculo da infiltração, permitindo a determinação da precipitação
efetiva; e Theiss em 1935 desenvolveu uma teoria para a hidráulica de poços.
Outros métodos quantitativos foram apresentados a partir desta época,
permitindo a ampliação considerável dos conhecimentos nessa ciência.
Apesar da grande quantidade de dados coletados diariamente, os métodos
utilizados na Hidrologia até a década de 50, praticamente limitavam-se à
indicadores estatísticos dos processos envolvidos. Com o advento do
computadcr, aprimoramento e experimentação das técnicas numéricas e
estatísticas, houve desenvolvimento acelerado de algumas subáreas da
Hidrologia. Os modelos semiconceituais de transformação precipitação-vazão
agregaram o conhecimento de diferentes processos na bacia hidrográfica para,
numa macroanálise, simular matematicamente essa parte do ciclo hidrológico.
Os primeiros modelos foram apresentados por Mero (citado por Clarke, 1973) e
SSARR (Rockwood, 1958) aplicados no rio Columbia. A Hidrologia Estatística,
que teve impulso no começo do século com o estudo da freqüência de cheias,
desenvolveu-se depois com a quantificação de séries temporais (Hidrologia
Estocástica) para dimensionamento de reservatórios.
Outros aspectos da Hidrologia tais como: o escoamento subterrâneo, fluxo
em rios, lagos e estuários desenvolveram-se com a observação e quantificação
Hidrologia: Aplicação e Ciência 29

das variáveis envolvidas, aprimoramento de técnicas matemáticas e o aumento


da capacidade do computador.
Quanto à Hidrologia Experimental, foram criados em diferentes países,
bacias representativas e experimentais visando ao entendimento e
quantificação de processos físicos que ocorrem na bacia, tais como
reflorestamento e desmatamento, erosão do solo e escoamento superficial. Os
estudos visam a um melhor entendimento desses processos e a embasar o
planejamento do uso da bacia hidrográfica.
O desenvolvimento na hidrologia moderna está ligado ao uso da água, ao
controle da ação da mesma sobre a população e ao impacto sobre a bacia e o
globo terrestre.

13 Ciência hidrológica

Dooge (1988) caracteriza que a Hidrologia Científica está dentro do


contexto do desenvolvimento clássico do conhecimento científico, enquanto que
a Hidrologia Aplicada estuda os diferentes fatores relevantes ao provimento
de água para a saude e para a produção de comida no mundo.
A Hidrologia 6 uma ciência que se consolidou apenas na segunda parte do
século 20, através do desenvolvimento de programas de observação e
quantificação sistemática dos diferentes processas que ocorrem no ciclo
hidrológico. A subdivisão apresentada na introdução se expandiu, surgindo
subáreas mais especializadas, como resultado da necessidade crescente da
utilização e preservação da bacia hidrográfica.
Algumas das subáreas que tratam da análise dos processos físicos que
ocorrem na bacia são:

Hidrometeorologia: já definido anteriormente na introdução;

Geomorfologia: trata da análise quantitativa das características do relevo de


bacias hidrográficas e sua associação com o escoamento;

Escoamento superficial: trata do escoamento sobre a superfície da bacia;

Interceptação vegetai: é a subárea do conhecimento que avalia a interceptação


de precipitação pela cobertura vegetal na bacia hidrográfica;

Infiltração e escoamento em meio não-saturado; trata da observação e previsão


da infiltração no solo e do escoamento no solo não-saturado;

Escoamento em meio saturado: envolve o estudo do comportamento do fluxo em


aqüíferos, camada do subsolo saturada;
Hidrologia
30

Escoamento em rios e canais: trata da análise do escoamento em rios, canais e


reservatórios;

Evaporação e evapotranspiração: trata da avaliação da perda de água por


evaporação de superfícies livres como reservatórios e lagos,
evapotranspiração de culturas e da vegetação natural;

Fluxo dinâmico em reservatórios, lagos e estuários; trata do escoamento


turbulento em meios multidimensionais;

Produção e transporte de sedimentos; trata da quantificação da erosão de solo


e do transporte de sedimento, na superfície da bacia e nos rios, devido às
condições naturais e do uso do solo .

Qualidade da água e meio ambiente: trata da quantificação de parâmetros


físicos, químicos e biológicos da água e sua interação com os seus usos na
avaliação do meio ambiente aquático.

A Hidrologia como ciência está voltada para a representação dos


processos físicos que ocorrem na bacia hidrográfica. Em diferentes partes do
mundo foram equipadas bacias representativas e experimentais que permitem
observar em detalhe o comportamento dos diferentes processos. Com base no
registro das variáveis hidrológicas envolvidas é possível entender melhor os
fenômenos e procurar representá-los matematicamente.
Dooge (1988) ressalta que a caracterização dos processos hidrológicos
tem sido desenvolvida para a microescala ( 10'8 a 10"2m), enquanto que para a
mesoescala (102 a lC^m) e macroescala (105 a 107m ) existem muitas
dificuldades, principalmente na transferência da teoria usada de uma escala
para outra.
A representação matemática dos processos evoluiu dentro de dois aspectos
principais: o determinístico para os fenômenos físicos que podem ser
descritos por equações diferenciais que retratam o comportamento do processo;
e o estocástico onde estão envolvidos os aspectos probabilísticos das
variáveis.
O National Research Council (Estados Unidos) apresentou um relatório
sobre a ciência hidrológica (Eagleson, 1990), onde ressalta o seguinte:

"Para estabelecer a identidade para a Hidrologia como uma ciência


separada da Geociência o comitê definiu que a ciência hidrológica
inclui: 1) Processos físicos e químicos do ciclo continental da água em
todas as escalas, assim como os processos biológicos que interagem
signifi-cativamente com o ciclo hidrológico; 2) As características
Hidrologia: Aplicação e Ciência 31

temporais e espaciais do balanço global da água e suas partes no sistema


terrestre."

NRC(1991) ressaltou as seguintes prioridades científicas em Hidrologia,


sem ordem hierárquica: a) componentes químicos e biológicos do ciclo
hidrológico: envolve o melhor conhecimento dos processos geoquímicos; b) a
escala dos processos dinâmicos: a dificuldade de transferência entre
processos que ocorrem em diferentes escalas; c) interação entre superfície e
atmosfera: a interação entre as variáveis climáticas e as superfícies; d)
conhecimento ao nível global do armazenamento e fluxos de água e energia; e)
efeitos hidrológicos devido a atividades humanas.

1.4 Hidrologia Aplicada

A Hidrologia Aplicada está voltada para os diferentes problemas que


envolvem a utilização dos recursos hídricos, preservação do meio ambiente e
ocupação da bacia.
No primeiro caso estão envolvidos os aspectos de disponibilidade
hídrica, regularização de vazão, planejamento, operação e gerenciamento dos
recursos hídricos.
Dentro dessa visão os principais projetos que normalmente são
desenvolvidos com a participação significativa do hidrólogo são: apro­
veitamentos hidrelétricos, abastecimento d’água, irrigação e regularização
para navegação.
Quanto à preservação do meio ambiente, modificações do uso do solo,
regularização para controle de qualidade da água, impacto das obras
hidráulicas sobre o meio ambiente aquático e terreste, são exemplos de
problemas que envolvem aspectos multidisciplinares em que a hidrologia tem
uma parcela importante.
A ocupação da bacia pela população gera duas preocupações distintas: a)
o impacto do meio sobre a população através das enchentes; e b) o impacto do
homem sobre a bacia, mencionado na preservação do meio ambiente.
A ação do homem no planejamento e desenvolvimento da ocupação do espaço
na Terra, requer cada vez mais uma visão ampla sobre as necessidades da
população, os recursos terrestres e aquáticos disponíveis e o conhecimento
sobre o comportamento dos processos naturais na bacia, para racionalmente
compatibilizar necessidades crescentes com recursos limitados.
No Brasil algumas das principais áreas do desenvolvimento da Hidrologia
Aplicada encontram-se nos seguintes aspectos:

Planejamento e gerenciamento da bacia hidrográfica: o desenvolvimento das


principais bacias quanto ao planejamento e controle do uso dos recursos
naturais requer uma ação pública e privada coordenada;
32 Hidrologia

Drenagem urbana: atualmente 75% dapopulação do Brasil ocupa o espaço urbano.


Enchentes, produção de sedimentos e qualidade da água são problemas sérios
encontrados em grande parte das cidades brasileiras;

Energia: a produção de energia hidrelétrica representa 92% de toda a energia


produzida no país. O potencial hidrelétrico ainda existente é significativo.
Esta energia depende da disponibilidade de água, da sua regularização por
obras hidráulicas e o impacto das mesmas sobre o meio ambiente;

O uso do solo rural: a expansão das fronteiras agrícolas e o intenso uso


agrícola têm gerado impacto significativos na produção de sedimentos e
nutrientes nas bacias rurais, resultando em perda de solo fértil e
assoreamento dos rios;

Qualidade da água: o meio ambiente aquático (oceanos, rios, lagos,


reservatórios e aqüíferos) sofre com a falta de tratamento dos despejos
domésticos e industriais e de cargas de pesticidas de uso agrícola;

Abastecimento de água: a disponibilidade de água, que apesar de farta em


grande parte do país, apresenta limitações nas regiões áridas e semi-áridas
do nordeste brasileiro. A redução da qualidade da água dos rios e as grandes
concentrações urbanas têm apresentado limitações quanto à disponibilidade de
água para o abastecimento;

Irrigação: a produção agrícola nas regiões áridas e semi-áridas depende


essencialmente da disponibilidade de água. No sul, culturas como o arroz
utilizam quantidade significativa de água. O aumento da produtividade passa
pelo aumento da irrigação em grande parte do país;

Navegação: a navegação interior é ainda pequena, mas com grande potencial de


transporte, principalmente nos rios Jacuí, Tietê/Paraná, São Francisco e na
Amazônia. A navegação pode ter um peso significativo no desenvolvimento
nacional. Os principais aspectos hidrológicos são: disponibilidade hídrica
para calado, previsão de níveis e planejamento e operação de obras
hidráulicas para navegação.

REFERÊNCIAS

1- CLARKE, R.T., 1973. Mathematical models inhydrology. Rome: FAO. 282p.


(Irrigation and Drainage Paper, 19).

2- CHOW, V.T., 1959. Handbookof applied hydrology. New York: McGraw-Hill.


Paginação irregular.
Hidrologia: Aplicação e Ciência 33

3- DOOGE, J.C., 1988. Hydrology in perspective. Hydrological Sciences Journal,


Oxford, v.33, n.l, p.61-85, Feb.

4- EAGLESON, P., 1990. Opportunities in hydrological Sciences. Newsletters.


IAHS, n.40, Set.

5- NRC, 1991. Opportunities in the hydrologic Sciences. Washington: National


Academy Press. 348p.

6- ROCKWOOD, D.M., 1958. Columbia Basin streamflow routing by Computer.


Journal of the Waterways and Harbors Division. American Society of
Civil Engineers, New York, v.84, n.5, Dec.
Capítulo 2

CICLO HIDROLÓGICO E BACIA HIDRO GRÁFICA

André L.L. da Silveira

2.1 Introdução

O ciclo hidrológico é o fenômeno global de circulação fechada da água


entre a superfície terrestre e a atmosfera, impulsionado fundamentalmente
pela energia solar associada à gravidade e à rotação terrestre.
A superfície terrestre abrange os continentes e os oceanos, participando
do ciclo hidrológico a camada porosa que recobre os continentes (solos,
rochas) e o reservatório formado pelos oceanos. Parte do ciclo hidrológico é
constituída pela circulação da água na própria superfície terrestre, isto é:
a circulação de água no interior e na superfície dos solos e rochas, nos
oceanos e nos seres vivos.
A atmosfera também possui uma diversidade de condições físicas
importante. Entretanto, a maioria dos fenômenos meteorológicos acontece na
fina camada inferior da atmosfera com 8 a lókm de espessura, chamada de
troposfera, onde está contida a quase totalidade da umidade atmosférica,
cerca de 90%, Logo acima da troposfera está situada a estratosfera, com
espessura entre 40 e 70km, cuja importância reside no fato de conter a carnada
de ozônio que é reguladora da radiação solar que atinge a superfície
terrestre, principal fonte de energia do ciclo hidrológico. A água que
circula no interior da atmosfera constitui-se numa fase do ciclo hidrológico.
Este processo é devido às correntes aéreas, deslocando-se tanto no estado de
vapor como também nos estados líquido e sólido. A umidade no estado de vapor
é invisível, sendo as nuvens um conjunto de aerossóis visíveis de
microgotícolas de água, mais umidade, e, dependendo da região e estação do
ano, partículas de gelo.
O intercâmbio entre as circulações da superfície terrestre e da
atmosfera, fechando o ciclo hidrológico, ocorre em dois sentidos: a) no
sentido superfície-atmosfera, onde o fluxo de água ocoiTe fundamentalmente na
forma de vapor, como decorrência dos fenômenos de evaporação e de
transpiração, este último um fenômeno biológico; b) no sentido atmosfera-
superfície, onde a transferência de água ocorre em qualquer estado físico,
sendo mais significativas, em termos mundiais, as precipitações de chuva e
neve.
O ciclo hidrológico só é fechado em nível global. Os volumes evaporados
36 Hidrologia

em um determinado local do planeta não precipitam necessariamente no mesmo


local, porque há movimentos contínuos, com dinâmicas diferentes, na
atmosfera, e também na superfície terrestre. Da precipitação que ocorre nos
continentes, por exemplo, somente parte é aí evaporada, com o restante
escoando para os oceanos. A medida que se considere áreas menores de
drenagem, fica mais caracterizado o ciclo hidrológico como um ciclo aberto ao
nível local.
Entre os fatores que contribuem para que haja uma grande variabilidade
nas manifestações do ciclo hidrológico, nos diferentes pontos do globo
terrestre, pode-se enumerar: a desuniformidade com que a energia solar atinge
os diversos locais, o diferente comportamento térmico dos continentes em
relação aos oceanos, a quantidade de vapor de água, C 0 2 e ozônio na
atmosfera, a variabilidade espacial de solos e coberturas vegetais, e a
influência da rotação e inclinação do eixo terrestre na circulação
atmosférica, sendo esta última a razão da existência das estações do ano.

2.2 Descrição geral do ciclo hidrológico

Pode-se começar a descrever o ciclo hidrológico a partir do vapor de


água presente na atmosfera que, sob determinadas condições meteorológicas,
condensa-se, formando microgotícolas de água que se mantêm suspensas no ar
devido à turbulência natural. O agrupamento das microgotícolas, que são
visíveis com o vapor de água, que é invisível, mais eventuais partículas de
poeira e gelo, formam um aerossol que é chamado de nuvem ou de nevoeiro,
quando o aerossol forma-se junto ao solo. Através da dinâmica das massas de
ar, acontece a principal transferência de água da atmosfera para a superfície
terrestre que é a precipitação.
A precipitação, na sua forma mais comum que é a chuva, ocorre quando
complexos fenômenos de aglutinação e crescimento das microgotícolas, em
nuvens com presença significativa de umidade (vapor de água) e núcleos de
condensação (poeira ou gelo), formam uma grande quantidade de gotas com
tamanho e peso suficientes para que a força da gravidade supere a turbulência
normal ou movimentos ascendentes do meio atmosférico. Quando o vapor de água
transforma-se diretamente em cristais de gelo e estes atingem tamanho e peso
suficientes, a precipitação pode ocorrer na forma de neve ou granizo,
No trajeto em direção à superfície terrestre a precipitação já sofre
evaporação. Em algumas regiões esta evaporação pode ser significativa,
existindo casos em que a precipitação é totalmente vaporizada.
Caindo sobre um solo com cobertura vegetal, parte do volume precipitado
sofre interceptação em folhas e caules, de onde evapora. Excedendo a
capacidade de armazenar água na superfície dos vegetais, ou por ação dos
ventos, a água interceptada pode-se reprecipitar para o solo. A interceptação
Ciclo Hidrológico e Bacia Hidrográfica 37

é um fenômeno que ocorre tanto com a chuva como com a neve.


A água que atinge o solo segue diversos caminhos. Como o solo é um meio
poroso, há infiltração de toda precipitação que chega ao solo, enquanto a
superfície do solo não se satura. A partir do momento da saturação
superficial, à medida que o solo vai sendo saturado a maiores profundidades,
a infiltração decresce até uma taxa residual, com o excesso não infiltrado da
precipitação gerando escoamento superficial. A infiltração e a percolação no
interior do solo são comandadas pelas tensões capilares nos poros e pela
gravidade. A umidade do solo realimentada pela infiltração é aproveitada em
parte pelos vegetais, que a absorvem pelas raízes e a devolvem, quase toda, à
atmosfera por transpiração, na forma de vapor de água. O que os vegetais não
aproveitam, percola para o lençol freático que normalmente contribui para o
escoamento de base dos rios.
O escoamento superficial 6 impulsionado pela gravidade para as cotas
mais baixas, vencendo principalmente o atrito com a superfície do solo. O
escoamento superficial manifesta-se inicialmente na forma de pequenos íiletes
de água que se moldam ao microrrelevo do solo. A erosão de partículas de solo
pelos filetes em seus trajetos, aliada à topografia preexistente, molda, por
sua vez, uma microrrede de drenagem efêrnera que converge para a rede de
cursos de água mais estável, formada por arroios e rios. A presença de
vegetação na superfície do solo contribui para obstaculizar o escoamento
superficial, favorecendo a infiltração em percurso. A vegetação também reduz
a energia cinética de impacto das gotas de chuva no solo, minimizando a
erosão,
Com raras exceções, a água escoada pela rede de drenagem mais estável
destina-se ao oceano. Nos oceanos a circulação das águas é regida por uma
complexa combinação de fenômenos físicos e meteorológicos, destacando-se a
rotação terrestre, os ventos de superfície, variação espacial e temporal da
energia solar absorvida e as marés.
Em qualquer tempo e local por onde circula a água na superfície
terrestre, seja nos continentes ou nos oceanos, há evaporação para a
atmosfera, fenômeno que fecha o ciclo hidrológico ora descrito. Naturalmente,
por cobrir a maior parte da superfície terrestre, cerca de 70%, a
contribuição maior é a dos oceanos. Entretanto o interesse maior, por estar
intimamente ligada a maioria das atividades humanas, reside na água doce dos
continentes, onde é importante o conhecimento da evaporação dos mananciais
superficiais líquidos e dos solos, assim como da transpiração vegetal. A
evapotranspiração, que é a soma da evaporação e da transpiração, depende da
radiação solar, das tensões de vapor do ar e dos ventos. Na figura 2.1 pode-
se visualizar um corte esquemático do continente com as diversas fases do
ciclo hidrológico.
Em certas regiões da Terra o ciclo hidrológico manifesta-se de forma
bastante peculiar. Por exemplo, nas calotas polares ocorre pouca p r e c ip ita ç ã o
38 Hidrologia

e a evaporação é direta das geleiras. Nos grandes desertos também são raras
as precipitações, havendo água permanentemente disponível somente a grande
profundidade, sem trocas significativas com a atmosfera, tendo sido estocada
provavelmente em tempos remotos.
A energia calorífica do Sol, fundamental ao ciclo hidrológico, somente é
aproveitada devido ao efeito estufa natural causado pelo vapor de água e CO ,
2
que impede a perda total do calor emitido pela Terra originado pela radiação
solar (ondas curtas) recebida. Assim a atmosfera mantém-se aquecida,
possibilitando a evaporação e transpiração naturais. Como cerca da metade do
CO natural é absorvido no processo de fotossíntese das algas nos oceanos,
2
verifica-se que é bastante importante a interação entre oceanos e atmosfera
para a estabilidade do clima e do ciclo hidrológico.

\ ' /

O C IA N O

Figura 2.1. Componentes do ciclo hidrológico

2.3 Quantificação geral dos fluxos e reservas de água

A quantificação dos fluxos e reservas de água do ciclo hidrológico


global foi realizada por diversos pesquisadores e os trabalhos recentes não
Ciclo Hidrológico e Bacia Hidrográfica 39

apresentam entre si discrepâncias marcantes. Um exemplo destes trabalhos é o


apresentado por Peixoto e Oort (1990) cujos valores são comentados a seguir.
Para as reservas de água os valores apresentados são os seguintes:

3
Oceanos 1.350 x 1015 m
3
Geleiras 25 x 1015 m
3
Aguas subterrâneas 8,4 x 1015 m
3
Rios e Lagos 0,2 x 1015 m
3
Biosfera 0,0006 x 1015 m
3
Atmosfera 0,0130 x 1015 m

Essa quantificação estática não deixa transparecer a importância


relativa de cada reserva na dinâmica do ciclo da água. Por exemplo, a
atmosfera armazena uma quantidade ínfima da água disponível no planeta, mas
dá origem à precipitação que é uma fase fundamental na dinâmica do ciclo
hidrológico. Outro exemplo de desproporção entre a importância dinâmica e a
quantidade armazenada é a que se observa nas camadas superiores dos solos,
15 3
normalmente não-saturadas: apenas 0,066 x 10 'm (0,08% das águas
subterrâneas)estão presentes nestes locais, em contraposição à sua
importância no ciclo hidrológico, no fenômeno da infiltração. No que diz
respeito aos oceanos a quantidade de água armazenada (97%) é tão
significativa quanto o seu papel no ciclo hidrológico.
O equilíbrio médio anual, em volume, entre a precipitação e a
evapotranspiração, que são os dois fluxos principais entre a superfície
terrestre e a atmosfera, em nível global apresenta o seguinte valor:

P = E = 423 x 1012*m3/ano (2.1)

A evaporação direta dos oceanos para a atmosfera corresponde a 361 x


12 3
10 m , cerca de 85% do total evaporado, sendo os 15% complementares, 62 x
12 3
10 m , devidos à evapotranspiração dos continentes. No balanço da
precipitação os percentuais diferem um pouco, com a atmosfera devolvendo
12 3
aos oceanos 324 x 10 m por ano, cerca de 77% do total precipitado, cabendo
12 3
aos continentes receberem os restantes 23% ou 99 x 10 m . A diferença entre
' 12 3
o que é precipitado anualmente nos continentes (99 x 10 m ) e o que é
12 3
evapotranspirado pelos continentes (62 x 10 m ) corresponde ao escoamento
40 Hidrologia

12 3
para os oceanos (37 x 10 m ). Na figura 2.2 é apresentado um gráfico com os
valores das reservas e fluxos de água:

2.4 Bacia hidrográfica

O ciclo hidrológico é normalmente estudado com maior interesse na fase


terrestre, onde o elemento fundamental de análise é a bacia hidrográfica. A
bacia hidrográfica é uma área de captação natural da água da precipitação que
faz convergir os escoamentos para um único ponto de saída, seu exutório. A
bacia hidrográfica compÕe*se basicamente de um conjunto de superfícies
vertentes e de uma rede de drenagem formada por cursos de água que confluem
até resultar um leito único no exutório (figura 2.3).

A
T
0 ,0 1 3 . 1015 m3
M

62 9 9 . 1 0 12 m3/a n o 324 3 61

c GEL. 25
0
N SUB. 8 ,4

1 SUP. 0 ,2
N

810. 0 ,0 0 0 6

Figura 2 2 . Fluxos e reservas de água globais (Peixoto e Cort, 1990)

A precipitação que cai sobre as vertentes infiltra-se totalmente nos


solos até haver saturação superficial destes, momento em que começam a
decrescer as taxas de infiltração e a surgir crescentes escoamentos
superficiais, se a precipitação persistir. O escoamento superficial gerado
nas vertentes, no contexto da bacia hidrográfica, pode ser interpretado como
uma "produção" de água para escoamento rápido e, portanto, as vertentes
seriam vistas como as fontes produtoras. Seguindo com este enfoque, a água
produzida pelas vertentes tem como destino imediato a rede de drenagem, que
se encarrega de transportá-la à seção de saída da bacia. Na zona de inundação
dos cursos de água (leito maior) há um comportamento ambíguo, ora de
produção, quando os rios estão inicialmente com níveis de água baixos,
funcionando esta zona como vertente, ora de transporte, quando os rios estão
em cheia, com a zona de inundação usada para escoamento.
Ciclo Hidrológico e Bacia Hidrográfica 41

A mesma caracterização da vertente como fonte produtora e a rede de


drenagem como transportadora pode ser usada com respeito aos sedimentos. As
vertentes "produzem" os sedimentos por fenômenos de erosão e estes são
tranportados com a água pela rede de drenagem, junto com a carga
significativa de sedimentos produzida nos próprios leitos dos rios. Na
realidade, não é possível considerar as vertentes e os rios como _entidades
totalmente separadas, uma vez que estão continuamente em interação para
adaptação da bacia hidrográfica' às solicitações da natureza.

Figura 2.3. Bacia hidrográfica do arroio Taboão/RS

Bacia como sistema

A bacia hidrográfica pode ser considerada um sistema físico onde a


entrada é o volume de água precipitado e a saída é o volume de água escoado
pelo exutório, considerando-se como perdas intermediárias os volumes
evaporados e transpirados e também os infiltrados profundamente. Em um evento
isolado pode-se desconsiderar estas perdas e analisar a transformação de
chuva em vazão feita pela bacia com a ajuda da figura 2.4, onde sao
representados o hidrograma (saída) e o hietograma (entrada).
A figura 2.4 espelha bem o papel hidrológico da bacia hidrográfica que é
o de transformar uma entrada de volume concentrada no tempo (precipitação) em
uma saída de água (escoamento) de forma mais distribuída no tempo. Na mesma
figura é feita uma diferenciação entre um escoamento mais lento e outro mais
42 Hidrologia

rápido, este facilmente identificável pela forte elevação das vazões em curto
espaço de tempo, que, apòs atingir um pico, decresce também rapidamente, mas
geralmente em tempo maior que o da elevação. A este escoamento rápido
normalmente é atribuído o nome de escoamento superficial, embora esta
designação seja cientificamente inexata, dada as inúmeras oportunidades de
infiltração e afloramentos de água sucessivas nos diferentes caminhos que a
água pode percorrer até fazer parte do escoamento que passa no exutório. Em
termos práticos a separação entre escoamento rápido, ou superficial e
escoamento lento, ou subterrâneo, é conveniente, porque permite quantificar e
analisar separadamente o escoamento geralmente de maior magnitude numa cheia,
o escoamento superficial, que é explicado mais facilmente numa relação de
causa e efeito com a precipitação. Isto é válido em bacias de regime pluvial.
As técnicas de separação de escoamentos em um hidrograma são apresentadas no
capítulo 11. A parcela da chuva total com mesmo volume de escoamento
superficial é denominada de chuva efetiva. A chuva efetiva e o correspondente
escoamento superficial estão representados na figura 2.4 como áreas
hachuradas.

Gênese do hidrograma de saída

Como o hidrograma de saída de uma bacia hidrográfica atinge determinado


formato, tal como o da figura 2.4, é uma questão científica ainda não
resolvida, mas que tem sido tratada por métodos práticos baseados na análise
do histórico de eventos (volumes precipitados e escoados) e características
físicas das bacias.

Figura 2.4. Resposta hidrológica da bacia hidrográfica


Ciclo Hidrológico e Bacia Hidrográfica 43

Uma maneira consistente de explicar a dispersão do hidrograma no tempo é


considerar o efeito de translação. Analisando-se uma lâmina L precipitada
sobre uma bacia de área A em um pequeno intervalo de tempo, é razoável supor
que a precipitação ocorrida perto do exutório gerará um escoamento que
chegará mais cedo a este ponto, enquanto que o escoamento gerado em locais
mais distantes passará mais tarde pelo mesmo exutório. Desta maneira, há um
escalonamento de chegada dos volumes à seção de saída, que reproduz, em
parte, o efeito de "espalhamento” das vazões no tempo. Para ilustrar,
considere a situação da figura 2.5 onde a, representa uma faixa de área de
onde o volume de água leva um tempo entre t. e t para chegar ao exutório.
Os tempos t identificam linhas de mesmo período de deslocamento até a saída,
i
ou, simplesmente, linhas isócronas. Se o intervalo de tempo entre as
isócronas é constante, quando as gotas de água que estavam na posição t
atingem o exutório, as gotas que estavam na posição t atingem a posição t ,
as que estavam em t chegam a t^, e assim por diante.
Em termos de volume, o que passa inicialmente pelo exutório na figura
2.5 é La^ , o que corresponde a uma vazão média de La /dt, sendo dt o
intervalo de tempo entre duas isócronas sucessivas. No dt seguinte o volume
que passa pelo exutório é La^ , pois no dt anterior este volume avançou uma
faixa. Sucessivamente a situação se repete com os volumes La^ , La^ e La^
chegando à faixa a e escoando pelo exutório.O hidrograma assim resultante
pode ser visto na figura 2.6, onde claramente se verifica o efeito de
distribuição das vazões no tempo causado pela translação O volume escoado na
figura 2,6 tem o mesmo valor do volume precipitado LA. Portanto é uma
análise que se aplica ao escoamento superficial e à precipitação efetiva que
o causou.
Outro fenômeno que contribui para a confoimação do hidrograma de saída
da bacia é o fenômeno hidráulico do armazenamento. Nas condições naturais,
com atrito, quanto maior o volume a escoar na bacia tanto maior é a carga
hidráulica necessária para haver este escoamento, e portanto, tanto maior é o
volume armazenado temporariamente na bacia. Uma analogia pode ser feita com
um vertedor que, para verter maiores vazões, necessita de maiores lâminas de
água sobre a soleira, isto é, necessita de maiores volumes armazenados sobre
a soleira. Numa bacia hidrográfica o efeito de armazenamento é mais
significativo na rede de drenagem, que promove um abatimento na onda de cheia
por armazenamento nos seus canais, fazendo chegar ao exutório um hidrograma
mais distribuído no tempo. O abatimento do hidrograma é mais intenso se o
escoamento atinge as zonas de inundação (leitos maiores) dos cursos de água.
À4 Hidrologia

0 efeito de armazenamento é um fator que impede a existência de isócronas


estáveis na bacia.

Figura 2.5. Linhas isócronas

Figura 2.6. Hidrograma causado por translação

Tanto a translação como o armazenamento dependem profundamente da


topologia da bacia hidrográfica, isto é, de como estão dispostos no espaço as
vertentes e a rede de drenagem. Entretanto, os métodos clássicos da
hidrologia para cálculo do hidrograma de saída não explicitam os papéis das
vertentes e da rede de drenagem, preferindo tratar a bacia como um sistema
Ciclo Hidrològico e Bacia Hidrográfica 45

vertentes e a rede de drenagem. Entretanto, os métodos clássicos da


hidrologia para cálculo do hidrograma de saída não explicitam os papéis das
vertentes e da rede de drenagem, preferindo tratar a bacia como um sistema
que funciona à base da translação e/ou armazenamento. Baseado na translação
existe o método do "histograma tempo-área” de Ross (1921); no armazenamento
tem-se o método de Clark (1945), e, com ambos fenômenos implícitos, o método
do hidrograma unitário de Sherman (1932).
Mais recentemente Rodriguéz-Iturbe e Valdés (1979) desenvolveram uma
metodologia que introduz quantitativamente o efeito da geomorfologia da rede
de drenagem na teoria do hidrograma unitário instantâneo. O hidrograma
unitário instantâneo geomorfológico, HUIG, como passou a ser chamado, foi
interpretado como uma função densidade de probabilidade do tempo gasto por
uma gota de chuva até atingir o exutório da bacia, função esta que, por sua
vez, depende da geomorfologia. A geomorfologia é introduzida no HUIG
geralmente através de índices da rede de drenagem como os de Horton (1945) e
Strahler (1957). índices deste tipo são obtidos da rede de drenagem desenhada
em planta nos mapas topo-hidrográficos. Como o HUIG é fundamentalmente um
operador de translação, normalmente é simulado o efeito de armazenamento nos
canais da rede de drenagem através de reservatórios lineares. Para levar em
conta também o funcionamento das vertentes, já eix o HUIG contempla só a rede
de drenagem, é possível agregar à estrutura do HüíG uma função representativa
baseada nos mecanismos físicos de geração de escoamentos nas vertentes (Mesa
e Mifflin,1986).
Outra abordagem sobre a contribuição das vertentes na geração do
hidrograma de saída da bacia é dada por Beven e Kirkby (1979). A partir da
constatação de que diferentes partes da bacia têm normalmente diferentes
capacidades de infiltração e teores de umidade, fazendo com que as vertentes
gerem escoamentos de diferentes magnitudes, os referidos pesquisadores
relacionaram este fato com um índice topográfico de declividade. Este índice
topográfico é correlacionado com a umidade subsuperficial do solo e, quando
é obtido para diversas partes da bacia, conduz a um diagrama que identifica a
porcentagem da área da bacia que está efetivamente gerando escoamento
superficial.
A simulação matemática com modelos que discretizam a bacia de forma
distribuída, isto é, que calculam o escoamento na rede de canais, trecho a
trecho, e o aporte a estes trechos, considerando diversas sub-bacias, é outra
maneira de obter o hidrograma, levando em conta os efeitos de translação e
armazenamento e os papéis das vertentes e dos canais.

Fisiografia da bacia hidrográfica

Consideram-se dados fisiográficos de uma bacia hidrográfica todos


aqueles dados que podem ser extraídos de mapas, fotografias aéreas e imagens
46 Hidrologia

de satélite. Basicamente são áreas, comprimentos, declividades e coberturas


do solo medidos diretamente ou expressos por índices. A seguir são comentadas
algumas destas medidas e índices mais utilizados.
Área da bacia - representada normalmente por A, a área é um dado fundamental
para definir a potencialidade hídrica da bacia hidrográfica, porque seu valor
multiplicado pela lâmina da chuva precipitada define o volume de água
recebido pela bacia. Por isso considera-se como a área da bacia hidrográfica
a sua área projetada verticalmente. Uma vez definidos os contornos da bacia,
a sua área pode ser obtida por planimetragem direta de mapas que já
incorporam a projeção vertical. Também é possível determinar a área de uma
bacia por cálculos matemáticos de mapas arquivados eletronicamente através do
SIG (Sistemas de Informação Geográfica).

índices de drenagem - à rede de drenagem podem ser atribuídos diversos


índices. O mais simples trata apenas da medição em planta do comprimento L do
curso de água principal. Outros procuram representar a totalidade da rede de
drenagem como os resultantes do trabalho de Horton (1945) que demonstrou a
validade das seguintes relações empíricas, que tendem a ser constantes em uma
bacia:
N
R = 'jq---- relação de bifurcação (2.2)
u+l

L
Rl - £— relação dos comprimentos (2.3)
u -l

sendo o numero total de cursos de água da rede de drenagem com ordem u, e


, a média dos seus comprimentos em planta. Os subíndices u+l e u-l
representam, respectivamente, uma ordem imediatamente superior e uma ordem
imediatamente inferior a u. O ordenamento é feito com números inteiros,
começando com 1. Schumm (1956) propôs uma lei análoga às de Horton para
relacionar áreas de contribuição correspondentes às ordens sucessivas dos
canais:
A
= × relação de áreas (2.4)
u -l

onde A^ é a média das áreas contribuintes dos canais de ordem u e A , dos


u-l
canais de ordem u-l.
Como critérios de ordenamento dos canais da rede de drenagem de uma
Giclo Hidrológico e Bacia Hidrográfica 47

bacia hidrográfica, destacam-se os de Horton (1945) e Strahler (1957). No


sistema de Horton os canais de primeira ordem são aqueles que não possuem
tributários; os canais de segunda ordem têm apenas afluentes de primeira
ordem; os canais de terceira ordem recebem afluência de canais de segunda
ordem, podendo também receber diretamente canais de primeira ordem;
sucessivamente, um canal de ordem u pode ter tributários de ordem u-1 até 1.
Isto implica atribuir a maior ordem ao rio principal, valendo esta designação
em todo o seu comprimento, desde o exutório da bacia até sua nascente. No
sistema de Strahler é evitada a subjetividade de classificação das nascentes.
Para Strahler, todos os canais sem tributários1 são dê primeira ordem, mesmo
que sejam nascentes dos rios principais e afluentes; os canais de segunda
ordem são os que se originam da confluência de dois canais de primeira ordem,
podendo ter afluentes também de primeira ordem; ds canais de terceira ordem
originam-se da confluência de dois canais de segunda ordem, podendo receber
afluentes de segunda e primeira ordens; sucessivamente, um canal de ordem u é
formado pela união de dois canais de ordem u-1, podendo receber afluência de
canais com qualquer ordem inferior. Portanto, no sistema de Strahler, o rio
principal e afluentes não mantêm o número de ordem na totalidade de suas
extensões, como acontece no sistema de Horton que tem problemas práticos de
numeração. Na figura 2.7 estão presentes exemplos de ordenação dos canais de
uma rede de drenagem pelos dois sistemas apresentados.
Outros índices referentes à rede de drenagem, usados em regionalização
de vazões, são os que medem a densidade de drenagem de uma bacia. À densidade
de drenagem é definida como DD = L/A, onde L é o somatório dos comprimentos
de todos os canais da rede e À é a área da bacia. Uma forma mais simples de
representar a densidade de drenagem é calcular a densidade de confluências DC
= NC/A, onde NC é o número de confluências ou bifurcações apresentadas pela
rede de drenagem.
E importante salientar que qualquer índice ou medida de fisiografia
referente à rede de drenagem é profundamente dependente da escala do mapa
utilizado. Portanto, uma precisa identificação do mapa fonte e da sua escala
é um dado que deve acompanhar os índices de drenagem.

índices de declividade - podem ser determinadas declividades referentes aos


cursos de água da rede de drenagem e às vertentes. Para os cursos de água
desenha-se o perfil longitudinal para detectar trechos com declividades
diferentes. No caso de ter-se que atribuir uma única declividade para todo o
curso de água deve-se desprezar os trechos extremos se estes apresentarem
declividades discrepantemente altas (cabeceiras) ou muito baixas (perto da
seção de saída). Para levar em conta todo o perfil pode-se usar o conceito de
declividade equivalente constante, isto é, aquela declividade constante cujo
tempo de translação, para o mesmo comprimento do curso de água em planta,
seria igual ao do perfil acidentado natural. Partindo da fórmula de Chèzy que
Hidrologia
48

aponta o tempo como uma função do inverso da raiz quadrada da declividade,


pode-8ô checar a seguinte expressão para o cálculo da declividade equivalente
constante:

Ie (2.5)

onde L é o comprimento total, em planta, do curso de água, e lj e Ij são o


comprimento e declividade de cada subtrecho, com j= 1, 2,.., n, sendo n
número de subtrechos considerado no cálculo. Uma forma indireta utilizada
para quantificar a declividade do curso de água principal da bacia é
apresentar separadamente as medidas do comprimento L e do desnível máximo H.

A declividade média das vertentes pode ser calculada para uma bacia
hidrográfica pela seguinte relação:

AI:
E — *4
i=l Wj
26
( . )
n A
Hidrologia

onde Al é a diferença de altitude padrão entre duas curvas de nível*


wi= largura entre duas curvas de nível; ai= a área entre as curvas de nível;
A= área total da bacia; n= número de intervalos de curva de nível.
A declividade das vertentes foi utilizada por Beven e Kirkby (1979) para
estabelecer um índice em diversos pontos da bacia, cujo mapeamento, segundo
comprovaram estes pesquisadores, se assemelha muito ao mapeamento da
tendência de maior ou menor saturação superficial nas diversas partes da
bacia. O diagrama resultante do mapeamento espacial na bacia desse índice de
referência foi utilizado por Beven e Kirkby para estimar a porcentagem da
área total da bacia que está saturada superficialmente num determinado
momento e, portanto, gera escoamento superficial. O índice de Beven e Kirkby
calculado para cada verténte ou microbacia interna à bacia de interesse é
dado por ln (ct/tan P), onde a é a área por unidade de largura da vertente e
P o ângulo de inclinação da vertente. Classificando-se as vertentes segundo
diferentes faixas de valor, pode-se obter um mapa temático da bacia com
diversas regiões cada qual identificada por uma faixa de variação para
ln(a/tan P). Planímetrando-se as áreas abrangidas para cada uma destas faixas
pode-se construir um diagrama que relaciona a porcentagem da área da bacia
que tem um valor maior que determinado valor de ln (a/tan P). Uma vez
identificado o estado físico de saturação superficial da bacia, busca-se o
correspondente valor de ln (a/tan P), segundo modelo de escoamento de Beven e
Kirkby (1979), não descrito aqui, para determinar a á re a , efetiva de
contribuição superficial. Na figura 2.8 é apresentado o diagrama do índice em
questão feita pelos autores para uma bacia da Inglaterra.

Figura 2.8. índice de Beven e Kirkby (1979)

Modelo numérico de terreno - atualmente é possível arquivar eletronicamente a


Apresentação 50

superfície de uma bacia hidrográfica e, a partir das informações gravadas,


estudar sua fisiografia. Um arquivo digital representativo da variação real
contínua do relevo de um terreno costuma ser chamado de Modelo Numérico de
Terreno ou, simplesmente, MNT. O MNT mais simples constitui-se de uma grade
digital de células quadradas onde em cada nó é conhecida a altitude. A
obtenção de MNT pode ser feita diretamente por medições sobre pares
estereoscópicos de fotografias áereas ou por interpolações de levantamentos
topográficos. Pode-se obter o MNT a partir de imagens de satélite com limite
de resolução. Para qualquer a fonte, a representatividade de um MNT de uma
bacia está diretamente ligada à resolução espacial. Normalmente, quanto menor
a resolução mais representativo é o MNT, mas melhores equipamentos, softwares
informáticos e informações são exigidos. Como exemplo apresenta-se, na figura
2.9, um MNT da bacia do arraio Taboão/RS (105 Km2) feito por Risso e
Chevallier (1991), com resolução de 100 x lOOm.

Figura 2.9. MNT da bacia do Arraio Taboão (Risso e Chevallier, 1991)

REFERÊNCIAS

1 - BEVEN, KJ., KIRKBY, MJ. 1979. A physically based variable contributing


area model of basin hydrology. Hydrological Sciences Bulletin, Oxford,
v.24, , n.l, p. 43-69, Mar.

2 - CHRISTOFOLETTÍ, A. 1974. Geomorfologia. São Paulo: EdgardBlucher. 150p.


51 Hidrologia

3 - CLARK, C.O. 1945. Storage and the unit hydrograph. Transactions of the
American Society of Civil Enginneers, New York, v.110, p. 1419-46.

4 - HORTON, R. 1945. Erosional development of streams and their drainage


basins: hydrophysical approach to quantitative morphology. Geological
Society of American Bulletin, New York, v.56, n.3, p. 275-370.

5 - MESA, OJ., MIFFLIN, E.R. 1986. On the relative role of hillslope and
network geometry in hydrologic response. In; GUPTA, V.K.; RODRIGUES-
ITURBE, I., WOOD, E J\ (Ed.) 1986. Scale problems in hydrology.
Dordrecht: D. Reidel. 246p. p.1-17.

6 - PEIXOTO, J.P., OORT, A.H. 1990. Le cycle de Peau et le climat. La


Recherche. Spécial: L'eau, v.21, p. 570-79, mai.

7 - RISSO, A., CHEVALLIER, P. 1991. Uso de um modelo numérico do terreno


para a obtenção dos parâmetros topográficos da equação universal de
perda de solo modificada. In; SIMPÓSIO BRASILEIRO DE RECURSOS
HÍDRICOS, 9., 1991, Rio de Janeiro. Anais. Rio de Janeiro: ABRH/APRH.
4v. v.l, p.487-96.

8 - RODRIGUEZ-ITURBE, I., VALDES, J.B. 1979. The geomorphic structure of


hydrologic response. Water Resources Research, Washington, v.15, n.6,
p. 1409-20.

9 - ROSS, C.N. 1921. Calibration of flood discharge by the use of a time-


contour plan. Transaction Inst. Engineers, v.2, p.85.

10- SCHUMM, S. 1956. Evolution of drainage systems and slopes in badlands of


Perth Amboy. Geological Society of America Bulletin, New York, v.67,
p.597-646.

11- SHERMAN, L.K. 1932. Streamflow from rainfall from the unit hydrograph
method. Engineering News Record, v.103, p. 501-05.

12- STRAHLER, A.N. 1957. Quantitative analysis of watershed geomorphology.


Transactions. American Geophysical Union ,v.^8, p. 913-920.
Capítulo 3

ELEM ENTO S DE HIDROM ETEOROLOGIA

Juan Carlos Bertoni

3.1 A atmosfera terrestre

A atmosfera terrestre é a camada gasosa que envolve a Terra e a


acompanha em seus movimentos. A atmosfera é considerada subdividida em
camadas superpostas. Existem duas camadas principais, denominadas alta e
baixa atmosfera. A divisão entre ambas ocorre aproximadamente aos 20km de
altitude, na interface conhecida como estratopausa.
A alta atmosfera possui particular importância devido à presença no seu
interior de elementos especiais, camadas ionizadas, reações fotoquímicas,
etc., e pelos efeitos que a mesma produz sobre atividades tais como:
exploração do espaço e as comunicações. Para o hidrólogo, entretanto, dado
que esta camada possui apenas influência indireta sobre a distribuição das
águas superficiais, apresenta maior interesse o estudo da baixa atmosfera.
A baixa atmosfera subdivide-se em duas camadas separadas pela
tropopausa:

estratosfera: localiza-se entre a tropopausa e a estratopausa, possui


espessura variável e caracteriza-se por apresentar menor variação vertical da
temperatura do que as camadas mais próximas da terra. Nas regiões elevadas da
estratosfera encontra-se a subcamada de ozônio (03), responsável pelo
controle da quantidade de radiação ultravioleta de origem solar que atinge a
Tenra;

troposfera: compreendida entre a superfície terrestre e a tropopausa, a mesma


apresenta maior espessura no equador (aproximadamente 16000m) e menor nos
pólos (em média 8000m). Esta camada é o principal meio de transporte de massa
(água, partículas sólidas, poluentes, etc.), energia (energia térmica
recebida do sol), e quantidade de movimento (ventos) sobre a superfície da
terra, dando origem assim aos principais fenômenos meteorológicos de
interesse nà hidrometeorologia.
Por estar em contato direto com fontes de partículas sólidas, a
troposfera possui, com relação às outras cãsnãàast maior conteúdo de material
sólido. Segundo observações, a concentração de partículas sólidas decai com a
54 Hidrologia

altura, conforme um gradiente exponencial. Este gradiente diminui com a


altura até tomar-se quase nulo. Para a água distribuída na atmosfera pode-se
admitir, como primeira aproximação, um comportamento similar ao das
partículas sólidas.
Com relação à temperatura, observa-se, em média, valores mais altos nas
camadas próximas à superfície terrestre. Isto indica que a fonte primária de
aquecimento do ar atmosférico é a própria terra. Obviamente, a fonte original
é o Sol, mas, devido aos processos associados com o espectro de absorção da
atmosfera e os diferentes comprimentos de onda entre a energia incidente e a
emitida, só uma pequena parte do calor atmosférico provém diretamente do Sol.
As camadas inferiores do ar, por conterem maior quantidade de vapor de
água, gotas e partículas sólidas, tomam-se mais eficientes para absorver a
radiação terrestre do que as camadas altas. Isto acentua o aquecimento
relativo das camadas mais baixas. Origina-se assim um gradiente vertical de
temperatura que permanece relativamente constante na troposfera. Na
estratosfera, entretanto, as variações de temperatura são menores e dependem,
em muito, da quantidade de ozônio. Esta quantidade varia com a latitude e a
estação do ano.
Quanto à pressão, admite~se que na troposfera a mesma varie com a altura
segundo um comportamento hidrostático (observe-se que no caso do ar a massa
específica varia com a altura). A figura 3.1 ilustra os comportamentos
citados.

Ar atmosférico: o ar atmosférico é uma mistura de gases que se constitui do


ar seco acrescido de vapor de água. A distinção entre gases e vapor de água
tem a ver com o comportamento desses dois tipos de substâncias.
É considerado um gás, qualquer substância gaseiforme que se encontre a
uma temperatura maior que a sua temperatura crítica; caso contrário é
considerado um vapor. Temperatura crítica é a temperatura acima da qual o gás
não pode ser liquefeito por compressão. Logo, os vapores podem ser
liquefeitos por compressão, os gases não.
Na composição volumétrica do ar destacam-se o nitrogênio (78,08%) e o
oxigênio (20,95%). A proporção destes gases se mantém aproximadamente
constante com a altitude. O vapor de água, entretanto, apresenta porcentagens
altamente variáveis, no espaço e no tempo, (0% a 4%).

3,2 Umidade Atmosférica

A umidade atmosférica é um elemento essencial do ciclo hidrológico. Ela


é a fonte de todas as precipitações e controla enormemente a taxa de
evaporação do solo e reservatórios, como também a transpiração dos vegetais.
A umidade do ar refere-se unicamente ao vapor de água contido na atmosfera,
não levando em consideração a água nos estados líquido e sólido.
Elementos de Hidrometereologia 55

Tanto o ar seco como o vapor de água nas condições de pressão e de


temperatura observadas na troposfera comportam-se como gases perfeitos. São
ditos gases perfeitos aqueles que cumprem com a relação

p V = (3.1)
r mol

onde p = a pressão absoluta do gas; Vmoj = ao seu volume molar; T = a sua


temperatura absoluta; e S l - a constante universal dos gases que, conforme a
lei de Avogrado, pode-se expressar por

Q t- M R. (3.2)

onde M - a massa de um mol de gás (massa molar) e R = a constante


característica de cada gás (já não mais universalT
Uma expressão alternativa para a equação 3.1 é

p v = RT (3.3)

onde v = o volume específico da substância, definido como a relação

Preasõo, psia
0 2 4 6 8 10 12 14 18 18 20

Figura 3.1. Perfil físico típico da atmosfera (Eagleson,1970)


56 Hidrologia

v = V / M (3.4)
mol

Pode-se observar que a relação 3.4 é a inversa da massa específica da


substância, p.
Para uma mistura de gases perfeitos, a lei de Dalton estabelece que, num
dado volume, cada um deles exerce uma pressão parcial, independente da dos
outros gases, igual à pressão que exercería se fosse o único gás a ocupar o
volume. Sendo p a pressão atmosférica e pa a pressão do ar seco, o vapor de
água exerce na atmosfera uma pressão "e" :

e = P - Pa (3.5)

A pressão "e" é dita pressão parcial do vapor de água, ou simplesmente


pressão de vapor. A pressão do vapor de água é considerada uma medida da
quantidade de vapor de água presente no ar. As unidades usuais de "e" são:
milibar (mb), milímetro de mercúrio (mm Hg) ou Pascal (Pa).

i.2.1 Relação entre o vapor de água e a tem peratura do ar

Dado que nos movimentos habituais das massas atmosféricas as variações


de temperatura são mais significativas que as de pressão, pode-se considerar
que a quantidade de vapor de água que um certo volume de ar pode conter
depende, basicamente, da temperatura relativa do ar e aumenta com o aumento
desta última. Esta relação segue um comportamento aproximadamente exponenciaí
(figura 3.2).
Para uma dada temperatura existe uma quantidade máxima de vapor de água,
es, que o ar pode conter. Quando um certo volume de ar, a uma dada
temperatura, encerrar essa quantidade máxima, diz-se que o vapor é saturante
ou que a porcentagem de saturação é de 100%. Conforme observa-se na figura
3.2, à medida que a porcentagem de saturação aumenta, há um incremento no
gradiente de es.
Quando o ar possui uma pressão de vapor es é impossível comprimir o
vapor de" água sob a forma gaseiforme, isto é, aproximar mais suas moléculas.
Portanto, quando o seu volume é reduzido (experiência de laboratorio) o vapor
saturante se liquefaz, condensa-se. Este efeito de condensação também ocorre
ao resfriar-se a massa de ar, pois tanto um como o outro processo tendem a
aumentar as forças de atração molecular e enfraquecer as forças de repulsão.
Na figura 3.3 são indicados três processos isobáricos naturais através dos
quais uma massa de ar com temperatura "T" e pressão de vapor "e" pode atingir
o estado de saturação, es.
Elementos de Hidrometereologia 57

Figura 3.2.Relação típica entre a temperatura relativa do ar e a pressão de


vapor

Quando por resfriamento, em temperaturas positivas, o ponto de saturação


for atingido, o excesso de vapor passa a condensar-se sob a forma de
minúsculas gotas líquidas que vão constituir, na atmosfera, as nuvens e o
nevoeiro. Esse fenômeno libera calor latente de condensação, sendo
aproximadamente de 600 calorias (2511,3 Joules) por grama de água condensada.
A temperatura à qual uma massa de ar de temperatura T e pressão p
deveria ser isobaricamente resfriada para atingir a condição de saturação o
seu vapor de água é denominada temperatura do ponto de orvalho, Td. Não se
deve confundir ponto de orvalho com orvalho, pois a primeira é um
temperatura, associada à condição de saturação do ar, enquanto que a segun a
é um tipo de precipitação. _ ~0
Para temperaturas abaixo do ponto de congelamento a tensão de saturaç
58 Hidrologia

sobre o gelo apresenta valores inferiores àqueles sobre a água em estado de


sobrefusão* (figura 3.4). Esta característica permite a formação de nuvens e
precipitações em regiões frias e é a base da teoria de Tor Bergeron de
formação de precipitações.
Valores da tensão saturante de vapor es podem ser obtidos em função dos
valores da temperatura do ar T a partir de gráficos, tabelas ou fórmulas,
como a de Tetens (Occhipinti, 1989):

(a-T)/(b + T)
es = 6,11 * 10 (3.6)

onde es = a tensão saturante do vapor em mb, T representa a temperatura do ar


em °C e a e b são valores constantes para a água (a=7,5 ; b=237,3) e para o
gelo (a=9,5 ; b=265,5).

3.2.2 índices da umidade do ar

Além da pressão de vapor de água existem outros índices para avaliar a


umidade do ar. Os mesmos são apresentados a seguir.

_Q
£
4>
4)
C
O
O
CO

O
IO
CO
c
£
Td
Te m p eratu ra do ar ( ° C )

Figura 3.3. Representação esquemática dos processos isobáricos


de saturação (Occhipinti,1989)

(1) - Sobrefusáo 6 o fenômeno pelo qual o líquido que se resina, sob certas
condições, pode pennanecer no estado líquido abaixo do seu ponto de
solidificação. É um caso de equilíbrio instáveL
Elementos de Hidrometereologia 59

Temperatura do ar (°K )

Figura 3.4, Representação entre os diferentes estados de água e


a tensão saturante de vapor (Raudikivi,1979).

Umidade absoluta (pv): é definida como a relação entre a massa de vapor de


água, rr^, e o volume de ar que a contém.

pv - r^/V (3.7)

Este índice recebe também outras denominações tais como: massa


específica de vapor, densidade do vapor ou concentração de vapor de água.

Umidade relativa (U): é a relação percentual que expressa a quantidade real


de vapor no ar em termos relativos ao valor da saturação, para a mesma
temperatura.

U (%) = 100 • (e/es) (3.8)

Umidade específica (q): é o quociente entre a massa de vapor de água e a


massa de ar úmido de densidade p que a contém
60 Hidrologia

q = nyCniü+nv) = Pv/(Pa+Pv) = PV/P (3-9)

sendo ma a massa de ar seco e pa a sua massa específica.

Razão ou teor de mistura (w): é a razão entre a massa de vapor de água e a


massa de ar seco com a qual o vapor se mistura.

w = mv/ma = pv/pa (3.10)

3.23 Relações entre os diferentes índices de umidade

Aplicando a expressão 3.3 ao ar seco e ao vapor de água obtém-se as


seguintes equações:

Pa = Pa* Ra T (3.11)

e = pv\ V T (3.12)

onde Ra e são, respectivamente, as constantes específicas do ar seco e do


vapor de água, e as demais variáveis mantêm o significado dado anteriormente.
Adotando-se o valor 8,314 J/moí °K para Çt (este valor não é realmente
constante, varia ligeiramente para cada gás), e considerando a massa
molecular do ar seco, Ma = 28,9S g/mol, e a massa molecular do vapor de água,
Mv = 18,01 g/mol, resulta a relação

e = R^/Ry = 0,622 (3.13)

Substituindo as equações 3.5, 3.11, 3.12 e 3.13 na expressão da razão de


mistura, w, esta resulta

w = e • e/(p-e) (3.14)

Dado que a pressão de vapor é muito menor que a pressão atmosférica,


pode-se considerar

w = e • e/p (3.15)

Por sua vez, realizando o mesmo processo de substituição sobre a


Elementos de Hidrometereologia 61

expressão 3.9, a umidade específica* q, resulta

q = (e • e)/(p - (l-e)-e] (3.16)

Admitindo-se novamente e « p, obtém-se

q = e * e/p (3.17)

Portanto, na prática adota-se

q= w (3.18)

De acordo com as equações 3.15 e 3.17 a umidade relativa, U, resulta

U (%) = 100 • w/ws = 100 q/q*. (3.19)

onde w$ e qs se referem à condição de saturação.

3.2.4 Determinação da pressão de vapor de água

Na prática corrente, a umidade do ar é medida por meio de psicrômetros.


Os psicrômetros possuem dois termômetros convenientemente ventilados por um
fluxo de ar, a uma velocidade da ordem de 10 m/s. Um destes termômetros é
simples e utiliza-se para determinar a temperatura do ar, T. O outro é
envolto em uma gaze permanentemente umedecida por capilaridade e a sua
leitura determina a temperatura do bulbo úmido, Tw.
Se o ar não está saturado, ao fluir pelo psicrômetro produz evaporação
de água do bulbo úmido. O calor latente necessário para essa evaporação é
retirado do fluxo de ar que ventila o bulbo úmido. Como consequência, o ar se
resfria, e o bulbo úmido passa a indicar uma temperatura Tw< T . Se o ar
estiver saturado ter-se-á Tw = T. A diferença (T-Tw) denomina-se depressão
psicrométrica e é proporcional ao déficit de umidade do ar, representado pela
diferença (ws-w).
Para determinar a pressão de vapor de água, et utilizam-se fórmulas
psicrométricas do tipo:

es - e = A • p • (T - Tw) (3-20)

onde A = uma constante psicrométrica (empírica) obtida de tabelas em função


dos diferentes valores médios de pressão, p, T e Tw são fornecidas pe o
psicrômetros e a tensão de saturação, es, é obtida pela equação 3.2V ou
62 Hidrologia

similares. Conhecido o par de valores (T, e) é possível determinar os demais


índices da umidade do ar.
A temperatura do bulbo úmido, Tw, é sempre maior do que a temperatura do
ponto de orvalho, Td. Dado que as duas são definidas nas condições de
saturação e pressão constante, a razão desta diferença está no processo pelo
qual é resfriado o ar úmido. No ponto de orvalho o resfriamento do ar é
realizado mantendo-se constante o teor de umidade, enquanto que no bulbo
úmido o resfriamento é produzido pela evaporação, que eleva o teor de
umidade. Assim resulta es(Tw) > es(Td) e, portanto, Tw > Td.

3 3 Processos de transporte

Os principais mecanismos de transporte de energia, quantidade de


movimento e massa na atmosfera são os de radiação, condução e convecção.
A importância da radiação é evidente, dado que é o mecanismo mediante o
qual a energia solar ingressa na atmosfera. Seguindo um comportamento
diferente dos outros dois processos, a radiação é proporcional à temperatura
absoluta do corpo radiante. Assim, a baixas temperaturas os mecanismos de
condução e convecção são preponderantes, enquanto que a altas temperaturas a
radiação possui maior importância. Na temperatura do Sol, 6000 °K, a radiação
predomina; entretanto, na superfície da Terra, 278°K, os três processos são
significativos.
O fenômeno de condução origina-se nos movimentos aleatórios das
moléculas das substâncias presentes no ar (líquidas ou gasosas). Estes
movimentos dependem da temperatura. O transporte por condução molecular
origina-se com a contínua troca de posição das moléculas de regiões vizinhas.
Este processo pode permitir o transporte de calor, quando regiões vizinhas se
encontram a diferentes temperaturas. Também pode provocar um transporte de
quantidade de movimento, quando as camadas contíguas apresentarem diferentes
velocidades médias. No caso de sistemas fluidos constituídos por diversos
componentes (como é o caso da atmosfera), variações nas concentrações de cada
um deles provocarão, por condução, um transporte de massa, denominado
difusão.
Do ponto de vista hidrológico o processo de difusão molecular mais
importante na atmosfera é devido ao vapor de água.
Os três tipos de transporte molecular citados (condução, convecção e
difusão) apresentam características análogas aos fenômenos de condução de
calor, quantidade de movimento e difusão, e permitem sua representação
mediante leis semelhantes (lei de Fourier relativa à condução de calor, lei
de Newton da viscosidade e primeira lei de Fick da difusão, respectivamente).
Elementos de Hidrometereologia 63

Na atmosfera, entretanto, existe um outro processo responsável por taxas


de transporte muito maiores que a provocada pelas trocas moleculares: a
convecção turbulenta. Dado que o movimento das massas de ar atmosférico só
apresenta características laminares em condições de grande calmaria, as taxas
mais importantes de transporte na atmosfera produzem-se por turbulência.
O movimento por turbulência pode ser interpretado de forma simplificada
como um sistema de vórtices variando em escala e em intensidade, superposto
ao fluxo médio.

Formulação dos processos convectivos

A primeira lei da termodinâmica estabelece que o calor dQo; recebido por


um sistema, é igual ao incremento na energia intema do sistema dl, mais o
trabalho dW, realizado pelo mesmo. Analiticamente pode-se expressar como

dQ0 = dl + dW (3.21)
onde o sinal de dW é positivo, quando o trabalho é realizado pelo sistema
sobre o meio.
Na ausência de trabalho mecânico (bombeamento, compressão, etc) o
trabalho dW é aquele realizado pela superfície do sistema em expansão ou
contração, contra a pressão externa p, portanto resulta

dW = d(p * V) (3.22)

sendo V o volume do sistema. Admitindo que a pressão é praticamente


constante, a expressão 3.22 resulta

dW = p • dV (3.23)

Se o estudo é restringido a sistemas homogêneos é conveniente expressar


3.21 em termos de massa unitária. Portanto, dividindo pela massa do sistema
(e mantendo uma simbologia semelhante) resulta

dqG = di + dw (3.24)

Na ausência de movimento, gravidade e eletricidade, a energia intema


por unidade de massa de uma substância homogênea é função apenas da
temperatura e do volume. Substituindo i por u para referenciar esta
característica, a expressão 3.24 resulta

dqQ = du + dw (3.25)
64 Hidrologia

ou
dq0 = du + p dv (3.26)
onde v = o volume específico equação 3.4.
Para gases ideais pode-se demonstrar (Eagleson, 1970) que

(3 u/3 v)t = T • (3p/3T)v (3.27)

sendo T = a temperatura e p = a pressão, ambas medidas em termos absolutos.


Combinando 3.27 e 3.3 resulta

(3 u/3 v)t = 0 (3.28)

expressão que indica que para gases ideais a energia interna, u, é na


realidade função unicamente da temperatura.
A equação 3.26 pode ser expressa por

dq0 = c^ • dT + p * dv (3.29)

onde c^ = o calor específico a volume constante, definido segundo

(3u/3T) = c (3.30)
v v

Diferenciando e rearranjando os termos da equação 3.3 resulta

p • dv = R • dT - v • dp (3.31)

Substituindo 3.31 em 3.29

dq0 = (c + R) * dT - v • dp (3.32)

Com base na equação 3.3

dq0 = (cy + R) * dT - R • T * (dp/p) (3.33)

Definindo o calor específico a pressão constante, c , por

cp = (3u/3T)p + [3(p *v)/3T]p (3.34)


Elementos de Hidrometereologia
65
resulta

c = c + R (3.35)
P v

Assim a expressão 3.33 pode ser escrita na forma seguinte

dq0 = cp * dT - R * T • (dp/p) (3.36)

3.4 Transformações adiabáticas

A maioria das transformações que se verificam na atmosfera são tão


rápidas que os ganhos e perdas de calor podem ser desprezados. As
transformações de um sistema que ocorrem sem troca de calor com o meio
externo são ditas transformações adiabáticas.
Um gás ou vapor realiza uma transformação adiabática quando a passagem
do estado inicial ao estado final é realizada com base apenas na variação de
sua energia interna, sem receber ou ceder calor. As consequências imediatas
das transformações adiabáticas podem ser rapidamente visualizadas
considerando um gás contido num cilindro com paredes impermeáveis ao calor.
Se a expansão se fizer adiabaticamente, a energia necessária para executar
esse trabalho é extraída do próprio gás e ele se resfria. Se, pelo contrário,
ele for comprimido adiabaticamente, sua temperatura aumenta, pois o trabalho
de compressão converter-se-á em calor.
Num processo adiabático tem-se dqQ = 0, e, a partir da equação 3=36

dT/T = (R/Cp) (dp/p) (3.37)

Integrando

T/T0 = (p/p,)1-" (3.38)

onde T0 6 a temperatura absoluta à pressão absoluta po, e

1-n = R/c = (c - c )/c ou


P P v p

n = c /c =1/ 1 , 4 1 para o ar seco (3.39)


v p
Quando p0 = 1000 mb a equação 3.38 resulta
66 Hidrologia

T/e = (p/1000)1-0 (3.40)

onde 0 é dita temperatura potencial, a qual permanece constante durante


processos adiabáticos. Observa-se que a cada par de valores (T, p)
corresponde um valor de 0. Portanto, esta última é utilizada para classificar
uma massa de ar úmida não-saturada, determinar sua estrutura vertical e
definir suas condições de estabilidade (abordadas mais adiante), desde que se
verifiquem transformações adiabáticas e que, ao longo destas, o ar não fique
saturado. O valor p0= 1000 mb geralmente é adotado como referência para
definir o nível da base do perfil atmosférico.
Combinando 3.3 e 3.38 resulta a seguinte relação da termodinâmica

p • v 1^ = constante (3.41)

ou

T . y0/n 0 _ c o la n te (3.42)

Para uma parcela de ar seco em movimento vertical do tipo adiabático, a


equação 3.37 fica

1/T * (dT/dz) - (l-n)/p * (dp/dz) (3.43)

onde z indica a direção vertical.


A pressão atmosférica a qualquer nível de altitude representa o peso
total por unidade de área de toda a coluna vertical de ar úmido (ar seco +
vapor de água) acima do ponto considerado. Sua variação com a altura segue a
lei hidrostática

dp/dz = -p * g (3.44)

Combinando as equações 3.3 e 3.44 resulta

dp/p - -g/(R • T ) * dz (3.45)

onde T é a temperatura absoluta da atmosfera à elevação z. Substituindo 3.45


em 3.43 obtém-se

dT/dz = - g • (l-n)/R * T /T (3.46)


Este quociente é denominado gradiente vertical térmico correspondente à
adiabática seca, ya, e tem aproximadamente o valor 9,8°C/Km. Este valor
9

Elementos de Hidrometereologia 67

independe da altitude e da umidade contida no ar, desde que a saturação não


seja atingida.
Se um volume elementar de ar não-saturado se eleva conservando sua
umidade, com o resfriamento atingirá a temperatura de saturação. A umidade
relativa será então de 100%. Qualquer diminuição subseqüente de temperatura
ocasionará condensação e desprendimento de cerca de 600 calorias para cada
grama de vapor de água condensada. Este calor latente de condensação é
absorvido pelo ar e, portanto, o gradiente adiabático se reduz. A variação de
temperatura de um volume de ar saturado com a altura denomina-se gradiente
vertical de temperatura da adiabática saturada, ys.
O valor de ys não é constante, tendendo até o valor ya com o aumento de
altura. A explicação física deste fato está na diminuição de es à medida que
o ar vai-se resfriando, com o qual diminui também o calor latente de
condensação liberado pelo processo. Para condições médias (p=1000 mb e T=10
°C), o gradiente ys tem o valor de 5,3 °C/Km. Verifica-se assim que o
gradiente vertical da adiabática saturada é menor do que aquele da adiabática
seca.

Transformações pseudo-adiabácicas: no processo de expansão do ar saturado a


transformação só seria adiabática se não ocorresse a perda de alguma
quantidade de calor levada pelas gotas de chuva que poderíam cair assim que
houvesse a condensação. Na realidade* quando ocorre uma precipitação existe
uma pequena perda de calor. Para referenciar esta perda o processo é dito
pseudo-adiabático. A perda de calor é tão pequena que pode-se considerar que
a ascensão de uma parcela de ar saturado segue um gradiente praticamente
igual a ys. No entanto, dado que a perda representa um processo irreversível,
quando a mesma parcela tende a descer segue um gradiente mais próximo ao da
adiabática seca, ya (Eagleson, 1970). Este mecanismo é responsável pela
elevação da temperatura que se observa em regiões localizadas a sotavento,
após a ocorrência de precipitações orográficas (figura 3.5).

3.5 Estabilidade atmosférica

Considere uma parcela de ar de massa unitária sujeita a seu peso próprio


e ao empuxo de Arquimedes. Orientando a vertical positivamente para cima e
admitindo que a densidade específica da parcela seja p \ e a do ar
circundante seja p, tem-se (Occhipinti, 1989):

peso: W = - g (3.47)

empuxo: E = p * 1/p* * g (3.48)


68 Hidrologia

A aceleração resultante será:

a = E + W = g • [p/p* - 1] = g ■ Kp-p’)/p] (3.49)

Dado que as densidades específicas são inversamente proporcionais às


temperaturas absolutas, tem-se:

a = g ■ [(T’-T)/T| (3.50)

onde T e T ’ são, respectivamente, as temperaturas absolutas do ar circundante


e da parcela.

Figura 3.5. Processo de aumento da temperatura associado a


chuvas orográficas (Eagleson, 1970)

Condições de estabilidade da parcela

Considere a parcela estável no nível de pressão p0. Para que a partícula


esteja em equilíbrio estático, deve-se ter:

a = 0 com o qual T = T* (3.51)

Elevando a parcela mediante um processo adiabático até um nível de


pressão p < pQ e temperatura T^, pode-se obter três condições distintas:
Elementos de Hidrometereologia
69

(1) T > T’; a < 0


(2) T < T’; a > 0
(3) T = T’; a = 0

Na condição (1) a parcela estará mais fria do que o ar circundante e assim


tenderá retomar ao nível p0 de equilíbrio. Esta situação é de equilíbrio estável A
situação (2) representa o caso contrário, portanto uma condição de equilíbrio
instável. No caso (3), a parcela tenderá a permanecer no nível de pressão p1 e
portanto, é uma condição de equilíbrio indiferente.

Condição de estabilidade de uma curva de sondagem: as sondagens aerológi-


cas realizadas por meio de radiossondas fornecem a distribuição das variáveis p,
T e U ao longo do perfil vertical da atmosfera.
Considere-se uma curva de sondagem de uma camada de ar cujo gradiente
térmico vertical é y e cujas coordenadas de temperatura e pressão de um ponto
qualquer da mesma são T e p, respectivamente. Admita-se que na base da cama­
da a temperatura do ar seja T0 e a pressão p0, e no topo da mesma estas variáveis
adotem os valores T \ e pi . Deslocando-se adiabaticamente uma parcela situada
na base da camada para um nível de pressão p tal que pi < p <■ p0, pode-se
comparar a temperatura T \ alcançada pela parcela no novo nível com a do meio
ambiente T e, assim, determinar a sua condição de equilíbrio na posição inicial
de pressão p0.
Ao comparar-se a curva de sondagem com as curvas adiabáticas seca e
saturada que passam pela posição inicial de coordenadas T0 e p0, pode-se consi­
derar três casos (figura 3.6).
Caso I: y < ys < Ya: equilíbrio absoiutamente estável.
Esta condição implica que sempre T < T e a parcela tenderá a retornar ao
nível pQ.
Caso II: Y> Ya > Ys: equilíbrio absoiutamente instável.
Neste caso ter-se-á sempre T’ > T e a parcela tenderá a continuar subindo.
Caso III: Ys < Y < Ya : equilíbrio condicionalmente estável.
70 Hidrologia

caso i : r < r, < r 9 caso i i : ** > r0 > r #

Absolutamente estável Absolutamente instável


T > Tl T < T*

CASO I I I : r , < r < Ta

Condicionalmente instável
Figura 3.6. Estabilidade atmosférica (Occhipinti, 1989)

Neste caso existem duas situações possíveis, conforme a parcela esteja


saturada ou não no nível inicial de pressão p0. Se a parcela estiver
saturada, ela seguirá a adiabática saturada e neste caso, ter-se-á T’ > T e a
condição será a de equilíbrio instável. Se a parcela for não-saturada, ela se
eleverá através da adiabática seca até o nível de condensação pc. Deste nível
para cima, a parcela seguirá a adiabática saturada. Nesta situação a condição
de equilíbrio depende do nível atingido pela parcela na sua nova posição.
Se Tj e pi são as coordenadas do ponto I, em que a adiabática saturada
que passa por Tc e pc intercepta a curva de sondagem (valores medidos de
Elementos de Hidrometereologia 71

pressão, temperatura e umidade ao longo de uma trajetória percorrida pelo


balão sonda), e a parcela desloca-se apenas até um nível de pressão p > p$
ter-se-á T’ < T e a condição de equilíbrio é estável. Se a parcela tiver
energia suficiente para alcançar um nível de pressão p < Pj ter-se-á T’ > T e
a condição de equilíbrio é dita condicionalmente instável.

3.6 Tem peraturas associadas a processos convectivos

Além das temperatura do ponto de orvalho, Td, e do bulbo úmido, Tw,


previamente definidas, existem outras temperaturas utilizadas nos processos
convectivos como referência das condições reinantes.
Denomina-se temperatura do nível de condensação, Tc, a temperatura
correspondente ao nível pc até o qual é necessário elevar adiabaticamente uma
massa de ar não-saturado, que se encontra nas condições p0, T0 e w , para que
atinja a saturação (figura 3.5). Verifica-se que a temperatura do nível de
condensação, Tc, é sempre menor do que a temperatura do ponto de orvalho, Td.
Temperatura pseudo-adiabática potencial do bulbo úmido, 0SW, é a
temperatura alcançada por uma parcela de ar úmido quando a mesma é elevada,
pelo processo adiabático não-saturado, até o nível de condensação e é
retomada ao nível de lOOOmb pelo processo adiabático saturado (figura 3.7).
Quando, pelo mesmo processo, a parcela de ar úmido retoma ao seu nível
original de pressão, a temperatura é dita temperatura pseudo-adiabática do
bulbo úmido e é designada por Tsw. Na prática Tsw é aproximadamente igual à
temperatura do bulbo úmido, Tw.
Da definição de 0SW se deduz que a mesma representa a adiabática
saturada que intercepta o ponto de condensação (fígurâ 3.7). Uma parcela de
ar úmido ou saturado em toda sua evolução na atmosfera tende a guardar sempre
a mesma temperatura, 0SW. Portanto, esta temperatura é uma propriedade
intrínseca de uma massa de ar. A temperatura 0SW é utilizada para se
determinar a máxima água precipitável que pode ser contida em uma massa de ar
saturado.

3.7 Altura de água precipitável ou condensável

Define-se como a altura de lâmina de água equivalente à condensação de


todo o vapor de água contido em uma coluna de ar úmido. A massa de vapor de
água, dniy, contida em uma coluna vertical elementar com altura dz e seção
transversal de área A, é :
76 Hidrologia

A hipótese admitida implica considerar que 9SW= Td (para p = lOOOmb).


Esta hipótese define a adiabática saturada, que é um invariante que
caracteriza a massa de ar e fomece a distribuição vertical da temperatura
T(p) e da umidade específica qs(p). Esta distribuição é obtida em diagramas
termodinâmicos.
Os valores de W, entretanto, encontram-se normalmente tabelados em
função de Td e pt (a pressão nò topo da camada considerada), sendo que se
adota em geral, p0 = 1000 mb. Altemativamente, os valores de W podem ser
obtidos de gráficos como os indicados pela figura 3.9.
Pode-se determinar a máxima água precipitável entre dois níveis
quaisquer de pressão, p^ e p^, pela diferença:
W - W (3.64)
2 1

A ^ = - 0,01 qs(p)-dp = - 0,01 [ q (p) ‘ dp -


o

qs(p) • dp ] (3.Ó5)

Pi

Estas integrais são calculadas por aproximações numéricas, para cada


temperatura pseudo-adiabática potencial do bulbo úmido, 0 , segundo:
sw

AW. = - 0,01 q . * Ap. (3.66)


1 54 1

onde Ap. = p. - p. ; sendo p. < p.; q . = umidade específica saturante


*i *1+1 ’ *1+1 *T Msá y
média da camada i; AW. = máxima água precipitável contida na camada i
A máxima água precipitável contida em N camadas é obtida pelo somatório:

= - 0,01 (3.67)
máx
i=l
Elementos de Hidrometereologia 77

Temperatura a nível do solo (°C)

O 2a 40 60 80 100 120
Água precipitável (mm)

Temperatura a nível do solo (°C)


28
700 7r~— i
3,0
■ - ^ / / / 1 y / / / / ■ 7 7
E / / /
o 800
»o w j j n 7^ / / /

1 e ^
CL 900

1
1000 60
0 10 20 30 40 50
Água precipita'vel (mm)

Figura 3.9. Gráfico para obter a máxima quantidade de água precipitável, W


(Réméniéras,1971)

Este valor também pode ser determinado a partir óe gráficos^ como


indicado na figura 3.9. Os valores de W assim obtidos correspondem a máxima
água precipitável , em função de Td (p = 1000 mb), para colunas atmosténcas
totalmente saturadas compreendidas entre diferentes pressões no topo
pressão de lOOOmb na base.
78 Hidrologia

REFERÊNCIAS

1 - EAGLESON, P.S. 1970. Dynamic hydrology, New York: McGraw-Hill.


462p.

2 - OCCHEPINTI, A.G. 1989. Hidrometeorologia. In: Engenharia hidrológica.


Rio de Janeiro: ABRH, Ed. da UFRJ. 404p., p.17-141.

3 - RAUDKIVI, ÀJ. 1979. Hydrology. Oxford: Pergamon. 479p.

4 - RÉMENIÉRAS, G. 1971. Tratado de hidrologia aplicada. Barcelona:


ETA, 515 p.

5 - SILVEIRA, R. L. da. 1974. Hidrometeorologia I: notas de aula. Porto


Alegre: Instituto de Pesquisas Hidráulicas da UFRGS. 2v.

6 - WIESNER, CJ. 1970. Hydrometeorology. London: Chapman and Hall


232p.
Capítulo 4

ELEM ENTO S DE ESTATÍSTICA E PROBABILIDADES

Antonio Eduardo Lanna

4.1 Introdução

Os processos hidrológicos são aleatórios. Isto significa que suas


realizações não podem ser conhecidas. Por exemplo, não é possível saber qual
a evolução dos valores de temperatura, vento, insolação, precipitação,
evaporação, vazão em determinada seção fluvial, ao longo do tempo ou do
espaço. Isso estabelece uma dificuldade básica no planejamento das atividades
humanas, pois elas são vinculadas a esses processos. Diante disso, desde o
instante em que o ser humano buscou planejar seus empreendimentos ele se
preocupou em estabelecer instrumentos para o tratamento da aleatoriedade.
Desta preocupação surgiram duas disciplinas relacionada com a teoria das
probabilidades e com a estatística.
Os fenômenos hidrológicos naturais não podem ser reproduzidos, pelo
menos na escala em que ocorrem. No tratamento dos mesmos a estatística
precedeu à teoria das probabilidades. Ou seja, os dados observados de
determinado processo hidrológico foram reunidos por alguém formando uma
amostra. Esta amostra foi submetida à análise estatística (possivelmente por
outra pessoa) visando à definição de probabilidades de certos evenios. Até
aqui se esteve no campo da estatística.
No campo da teoria das probabilidades, em paralelo, foram desenvolvidos
modelos teóricos de probabilidades para processos hipotéticos que tivessem
determinadas características. Isso permitiu a realização da convergência de
ambos os campos. Comparando as características do processo teórico com o do
processo natural foi possível selecionar alguns modelos probabilísticos para
ajustar esse processo. Esse ajuste pertence à parte da estatística denominada
inferência estatística. Comparando os modelos teóricos ajustados com o
empírico, obtido a partir da amostra, poderá ser selecionado um deles. Isto
pertence à parte denominada teste de hipótese. No caso, a hipótese é se algum
dos modelos teóricos selecionados é adequado para representar o processo em
análise ou se o modelo empírico se ajusta ao teórico.
Algum estudante mais curioso vai perguntar: se já existe um modelo
empírico, baseado na amostra do processo, para que se preocupar em obter um
modelo teórico? A resposta ficará evidente mais tarde, mas é possível
adiantar algumas causas. Primeiro, existe a possibilidade de extrapolação do
80 Hidrologia

modelo teórico, o que não é muito fácil de fazer com um modelo empírico.
Segundo, o empírico é baseado tão-somente na amostra. O que interessa a um
analista é o modelo do processo hidrológico estudado. E se houver problemas
de consistência na amostra? Neste caso, ao escolher-se um modelo teórico
desenvolvido para processos com características análogas às do processo
estudado, haverá um certo respaldo contra erros amostrais. Essas
considerações serão retomadas adiante.
No caso de processos hidrológicos, não é possível deduzir um modelo
teórico a priori. Também não é possível criar uma amostra a partir de
experimentos controlados. O analista deve contar com amostras observadas
historicamente. A dificuldade evidente é que não será possível esperar até
que exista uma amostra de tamanho suficiente para então estudar o processo. O
que fazer então quando existe pouca ou nenhuma observação ?
No caso de existir pouca informação poderá ser possível recorrer-se ao
preenchimento de falhas a partir de análise de regressão. Nesse caso busca-se
processos que sejam correlacionados com aquele de interesse. São testados
modelos de regressão que estabeleçam matematicamente a relação existente
entre os processos. O modelo escolhido é analisado ' para verificar sua
adequação. Finalmente, haverá sua operação para obter-se uma amostra maior do
processo estudado Houve, neste caso, a transferência de informação entre as
amostras de dois processos correlacionados.
Em muitos casos não existe qualquer amostra do processo em análise. Para
abordar esta situação foram desenvolvidas técnicas denominadas regionalização
estatística que permitem outro tipo de transferência de informação, a partir
de amostras de processos ocorridos na mesma região.
Este capítulo abordará de forma condensada e aplicada alguns temas
tratados anteriormente. Na primeira parte serão estudadas abordagens
estatísticas de tratamento de dados, incluindo a análise de regressão. Em
seguida serão apresentados os modelos probabilísticos mais comuns da prática
hidrológica, com as técnicas de ajuste mais utilizadas. Nos capítulos 17 e 15
serão tratados aspectos mais avançados da inferência estatística e da análise
de regressão, e regionalização estatística aplicada à hidrologia, respectiva-
mente.

4 2 Tratamento estatístico de variáveis hidrológicas

O tratamento de um processo aleatório pressupõe inicialmente sua


quantificação. Essa quantificação é realizada por uma variável, dita
aleatória. Sendo estocástico o processo hidrológico, ele trata com variáveis
aleatórias hidrológicas.
Para quantificar uma variável hidrológica deve ser percebido que os
processos hidrológicos desenvolvem-se no tempo e no espaço. Por exemplo, a
chuva tem uma variação temporal e, por isso, uma variável que a quantifique
Elementos de Estatística e Probabilidades 81

deve assumir valores distintos ao longo do tempo. Ela também varia ao longo
do espaço, ou seja, a variável representativa devería assumir valores
distintos em função das coordenadas do ponto geográfico de interesse. Para
ser absolutamente preciso, haverá necessidade de 3 coordenadas: latitude (x),
longitude (y) e altitude/profundidade (z). Introduzindo o tempo (t), a
variável representativa do processo chuva deveria ser notada como P(x,y,z,t).
O mesmo ocorre para grande parte dos processos hidrológicos. Para
facilitar a análise é usualmente realizada a simplificação de fixar-se o
local em que o processo será estudado. O processo das precipitações em dado
pluviômetro da cidade de Porto Alegre, por exemplo, pode ser representado por
uma variável P(t), já que apenas ao longo do tempo existe variabilidade
significativa. O mesmo ocorre para grande número de processos hidrológicos
medidos em dado local. Daí decorre o interesse de estudo estatístico das
variáveis aleatórias temporais.
Os exemplos de variáveis aleatórias temporais em hidrologia são
abundantes: chuva, vazão, evaporação, temperatura, insolação, velocidade e
sentido do vento. Todas estas variáveis podem ser representadas pontualmente,
com suas variações sendo realizadas ao longo do tempo.
Algumas vezes pode ser importante o estudo da variabilidade espacial de
um processo hidrológico. Um exemplo claro é o das vazões ao longo de um rio.
Outros exemplos são a distribuição espacial da pressão barométrica e as
chuvas em uma região. Nesse caso, a variabilidade espacial . costuma ser
representada fixando-se o tempo em determinado instante ou período. Por
exemplo, pode ser considerada a variabilidade espacial da pressão barométrica
às 7 horas da manhã, de determinado dia, e dos totais precipitados durante o
:ncs de junho de 1993, no estado do Rio Grande do Sul.
Os processos hidrológicos são geralmente contínuos no tempo e no espaço.
Esse é o caso dos exemplos até agora apresentados. Por processo contínuo
entende-se aquele cuja variável que o quantifica assume valores ao longo de
qualquer ponto, temporal ou espacialmente, no qual for medido. Existe uma
clara dificuldade de tratamento computacional de variáveis contínuas em uma
civilização que optou por computadores digitais. Diante disso, é praxe
representar os processos hidrológicos por variáveis aleatórias temporais
discretizadas. O termo discretização significa que são tratados os valores
das variáveis obtidos em instantes ou períodos sucessivos do tempo, ou em
pontos geográficos definidos do espaço.
Por exemplo, os níveis de água em uma seção fluvial sem linígrafo são
registrados às 7 e às 17 horas de cada dia. Esses registros formarão uma
série de valores discretos instantâneos, de uma variável temporal aleatória
contínua, que quantifica o processo hidrológico níveis de água em dada seçao
fluvial. Ao serem tratados em escritório, é praxe computar-se as vazões,
quando existe curva de calibragem para a seção fluvial considerada, e fazer-
se a média entre os valores obtidos em um mesmo dia. Essas operações formarão
82 Hidrologia

uma série de valores discretos médios diários da variável temporal contínua,


que quantifica o processo hidrológico vazões em dada seção fluvial.
Diferente é a praxe no caso da precipitação. Os totais precipitados em
um pluviômetro no período que vai das 7 horas de um dia às 7 horas do dia
seguinte são anotados e formarão uma série de valores discretos, totalizados
diariamente, da variável temporal contínua que quantifica o processo
hidrolégico chuva no pluviômetro.
Mas esses exemplos não esgotam as possibilidades, mesmo fixando-se
apenas nos casos de vazão e chuva. Os registros de vazão podem ser obtidos na
forma de valores médios diários, mensais e anuais. Os registros de chuva
podem ser obtidos como totais diários, mensais ou anuais. Também podem ser
obtidas séries de valores máximos anuais de chuva em determinado intervalo
como, por exemplo, 5 minutos, 1 hora e 1 dia. Ou séries de valores
instantâneos máximos anuais de vazão em dada seção fluvial. Nesses casos, as
séries de totais, em dado intervalo de tempo de chuva, ou de observações
instantâneas de vazão, são processadas de forma a serem obtidas as séries de
máximos. É comum também manipular-se séries de valores máximos ou mínimos
anuais de vazões em determinado intervalo de tempo, tal como 30 dias. Neste
caso, as séries originais são valores médios diários acumulados
sucessivamente (do dia 1 ao 30, do dia 2 ao 31, etc.) e, dentro de cada ano
(civil ou hidrolégico), obtido o maior ou menor valor.
O que pode ser verificado, enfim, é que um processo hidrológico pode ser
representado de diversas formas por uma série de valores numéricos. A escolha
da forma de representação é determinada pelos objetivos de análise e pelas
características do processo.
Suponha que esteja sendo executado um estudo sobre o abastecimento de
água de uma cidade, a partir de captação em uma seção fluvial. Normalmente é
adequado utilizar-se uma série de valores médios mensais (ou semanais se
houver necessidade de maior precisão) de vazões. No entanto, se o estudo
relaciona-se à proteção da mesma cidade contra grandes inundações fluviais,
haverá necessidade de se contar com valores máximos instantâneos. Caso seja
estabelecido um reservatório de controle de inundações a montante da seção
fluvial aludida, uma série de valores médios diários de vazões poderá ser
suficiente para o seu dimensionamento e estabelecimento de política
operacional. Já no caso da operação do reservatório visar à regularização
para aumentar a disponibilidade de água, uma série de vazões médias mensais
poderá ser usada.

4.2.1 Representação gráfica

Uma das primeiras manipulações que pode ser realizada sobre dados
hidrológicos é a graficação com relação ao tempo. Essa representação gráfica
Poderá dar uma idéia da variabilidade temporal, das periodicidades anuais,
Elementos de Estatística e Probabilidades 83

das estações secas e úmidas, entre outras informações, mas é pouco concisa
para um tratamento mais operacional.
Na figura 4.1a é apresentado um hidrograma hipotético de uma seção
fluvial com grande área de drenagem em região úmida. A curva contínua podería
ser obtida pela interpolação dos pontos referentes às vazões médias diárias.
São apresentados também histogramas compostos pelas vazões médias semanais,
mensais e anuais. O objetivo da figura é mostrar a perda de informação devido
ao aumento do intervalo de discretização.
A figura 4.1b apresenta um hidrograma típico de uma seção fluvial com
pequena área de drenagem. Ele apresenta uma variabilidade maior do que na
situação anterior, devido à reduzida capacidade de regularização natural em
uma pequena bacia. Esta regularização natural é obtida pelo armazenamento no
leito fluvial e no aqüífero subterrâneo que, no caso de pequenas bacias, tem
menor capacidade que em uma bacia de grande porte. Na figura 4.1b apresenta-
se, também, um histograma semanal das vazões. Verifica-se que a perda de
informação é maior que no caso anterior.
Os exemplos mostram que a escolha da variável que representará um
processo hidrolégico dependerá tanto do uso que se pretende fazer, quanto da
natureza deste processo.

(a) grande área de drenagem

(b) pequena área de drenagem

Figura 4.1. Hidrogramas


84 Hidrologia

Curva de permanência

Um tipo de manipulação bastante utilizado é a curva de permanência. Ela


apresenta a freqüência com que ocorrem valores iguais ou superiores aos
valores de uma série temporal Por isso ela é muito utilizada para avaliar o
potencial de abastecimento de uma seção fluvial, por exemplo. O engenheiro
quer ter garantia de qüe poderá contar com vazões iguais ou maiores do que a
demanda que se deseja suprir. Seja 95% uma garantia julgada adequada. Um
valor com garantia de 95% significa que a seção fluvial permanece com vazões
acima dele em 95% do tempo. Para o traçado da curva de permanência que
fornecerá este valor pode-se aplicar o seguinte procedimento:

a) ordenar a variável temporal em ordem decrescente, atribuindo ordem 1 ao


maior valor e ordem n ao menor, em uma amostra com tamanho n;
b) computar a freqüência com que cada valor ordenado é excedido ou igualado
(permanência), como 100.(m/n), sendo m sua ordem e n o tamanho da amostra;
c) graficar a série ordenada em papel decimal com a escala de permanência
representada no eixo horizontal

Exemplo 4.1. A tabela 4.1 apresenta a aplicação desse procedimento aos


valores de vazões médias anuais na seção de Itajuípe do rio Almada, estado da
Bahia, com área de drenagem de 640 km2. As observações foram realizadas entre
1937 e 1979, havendo lacuna no ano de 1968. Existem, portanto, 42 valores na
série.
As colunas 2 e 5 da tabela 4.1 listam os valores de permanência
relacionados com a respectiva ordem, colocada nas colunas 1 e 4. Os valores
ordenados de vazões médias anuais acham-se nas colunas 3 e 6. Consultando-se
a tabela verifica-se que a vazão 3,842 m3/s tem a permanência requerida. No
entanto, deve ser observado que se está buscando valores de vazão que são
superados ao longo do tempo em 95% dos instantes. A tabela apresenta médias
de séries anuais que deverão apresentar flutuações ao longo dos anos. Por
isso é mais correto trabalhar-se com valores diários e não anuais ou mensais.
Do ponto de vista computacional, isso apresenta um problema de ordenação
de cerca de 15.340 valores de vazões que existem em uma série amostrai diária
com 42 anos, o que despenderá longo tempo de processamento. Apresenta-se a
seguir uma alternativa para a resolução dessa inconveniência computacional:

a) selecionar diversos valores de vazões que representem a gama completa de


variação da série observada que poderão ser igualmente espaçados ou não;
b) calcular a permanência de cada valor como 100 (k/n), sendo k o número de
vazões da série observada superiores ao valor;
c) graficar a série ordenada de valores em papel decimal com a escala de
Elementos de Estatística e Probabilidades 85

permanência representada no eixo horizontal.


Nesta situação os valores de vazões que estabelecem os pontos da curva
não são observados» mas os resultados serão próximos ao do procedimento
anterior, se o número de pontos for suficientemente grande.

Tabela 4.1. Curva de permanência das vazões médias anuais do rio Almada
em Itajuípe, BA.
Ordem Permanência Valor Ordem Permanência Valor
(%) (m3/s) (%) (m3/s)
1 2,38 17,622 22 52,38 8,647
2 4,76 15,711 23 54,76 8,389
3 7,14 14,491 24 57,14 8,336
4 9,52 13,471 25 59,52 8,315
5 11,90 13,251 26 61,90 7,529
6 1439 13,047 27 64,29 7,410
7 16,67 12,945 28 66,66 7,102
8 19,05 12,719 29 69,05 6,625
9 21,43 12,496 30 71,43 6,513
10 23,81 12326 31 73,81 6,439
11 26,19 11,993 32 76,19 5,950
OO
-O
-O

12 2837 11,932 33 5,805


13 30,95 11,697 34 80,85 5,598
14 33,33 11,376 35 8 3 ,3 3 5,553
15 35,71 11,328 36 85,71 4,889
16 38,09 11,307 37 8 8 ,0 9 4,866
17 40,48 10,661 38 90,48 4,527
18 42,86 10,470 39 92,85 4,186
19 45,24 10,231 40 95,24 3,842
20 47,62 9,841 41 97,62 3,037
21 50,00 9381 42 100,00 2,912

Na figura 4.2 são apresentadas as curvas de permanência, das vazões


médias anuais, mensais e diánas para o rio Almada em Itajuípe. Para melhor
visualização as vazões são apresentadas para valores menores que 10 m3/s. A
curva anual foi estabelecida com o primeiro procedimento e as demais com o
simplificado. Nota-se que para a permanência 95% obtém-se vazão média mensal
de 1,1 m3/s e média diária de 0,8 m3/s. Estes valores discrepam bastante
entre si e, mais ainda, com aquele estabelecido com base em vazões médias
anuais. Por exemplo, o valor 1,1 m3/s tem permanência em tomo de 85% e o
3,842 m3/s em torno de 50% se for consultada a curva diária, em vez daqueles
86 Hidrologia

obtidos na mensal ou anual, respectivamente.


Uma crítica que se pode fazer à utilização da curva de permanência para
avaliação de disponibilidade hídrica é que a análise dependerá do período
disponível de dados. Se existirem 10 anos ou 50 anos os resultados poderão
ser totalmente diversos. Idealmente, o período de dados utilizado deveria ser
igual à vida útil do projeto, que geralmente é da ordem de 30 a 50 anos.

P e rm a n ê n c ia

Figura 4.2. Curvas de permanência do rio Almada em Itajuípe, BA.

Não obstante isso, ela é bastante utilizada na prática hidrológica, no


caso de projetos de pequeno porte. Por exemplo, no Manual de Pequenas
Centrais Hidrelétricas da ELETROBRÁS é sugerida a utilização da vazão de 90
ou 95% de permanência para dimensionamento destas unidades. A questão que às
vezes é esquecida ou pior, indevidamente simplificada, é sobre a extensão do
intervalo de tempo para representação da variável temporal hidrológica. Seja
o caso das pequenas centrais hidrelétricas. O bom-senso indica que o
intervalo diário é o mais adequado para a análise. Afinal, deseja-se
assegurar que a central tenha vazão para gerar energia na maior parte dos
dias. Contudo, é comum a adoção de curvas de permanência de valores médios
mensais de vazão, em razão de ser mais simples obtê-las do que as diárias.
Obviamente, e a figura 4.2 indica isso, os resultados não serão os mesmos,
ficando a hidrelétrica um número substancialmente maior de dias parados ao
ser adotada a curva de permanência mensal.
Elementos de Estatística e Probabilidades 87

Histogramas de freqüência

Um histograma de freqüências simples 6 a representação gráfica da


freqüência com que urria variável aleatória ocorre com dado valor, caso de
variável discreta, ou em dado intervalo, caso de variável contínua.

Exemplo 4.2. Seja, o número de dias chuvosos em novembro em determinado


local. O estudo desse processo pode interessar a um agricultor que precisa de
dias sem chuva para plantar. As observações das chuvas em 30 anos permitem
estabelecer um histograma de freqüências simples onde no eixo das abscissas é
colocado o número total de dias de chuva em cada mês da amostra. Como
novembro tem 30 dias existirão 31 possibilidades discretas de ocorrência do
evento número de dias chuvosos em novembro. Para definir o histograma os
seguintes passos devem ser realizados:

a) verificar em quantos meses de novembro ocorreram 0, 1,.., 30 dias de


chuva;
b) transformar este número de dias em freqüência simples de ocorrência,
através da relação: F[x] = m/n, sendo m o número de valores na classe
determinada, n o número total de ocorrências e x o número de dias chuvosos em
novembro;
c) graficar o histograma, conforme Figura 4.3a.

Caso se deseje a freqüência com que ocorrem meses de novembro com um


número de dias chuvosos abaixo de determinado valor, deve-se preparar um
histograma de freqüências de não-excedências, fazendo-se a acumulação no
sentido da classe de maior número de dias. A figura 4.3b ilustra o histograma
resultante. Se, ao contrário, deseja-se saber a freqüência com que ocorrem
novembros com número de dias chuvosos maior ou igual a um valor prefixado,
deve*se traçar o histograma de freqüências de excedência, fazendo a
acumulação a partir da classe de maior número de dias. Note-se que havendo
necessidade de ambos os tipos de informação, basta a obtenção de uma delas,
por exemplo, freqüência de não-excedência, para obter-se a outra, já que se
trata com eventos complementares, ou seja: freqüência de excedência =
F[X£x]=l - F[X<x], sendo a freqüência de excedência representada por F[X<xj.
No caso de variáveis contínuas há necessidade de discriminá-las em
classes ou intervalos de ocorrência. Os passos anteriores podem ser seguidos,
com as adaptações necessárias. A relação entre freqüências simples e
acumuladas podem ser apresentadas pela definição dos intervalos de classe.
Sendo e x• os valores dos limites de um intervalo, e X a variável
hidrológica:
88 Hidrologia
OCORRÊNCIA
DE
FREQÜENCIA

a) freqüências de número de dias chuvosos em novembro


NAO - EXCEDENOA
DE
FREQUÊNCIAS

NÚMERO DE DIAS CHUVOSOS EM NOVEMBRO

b) freqüências acumuladas do número de dias chuvosos em novembro

Figura 4.3. Histogramas


Elementos de Estatística e Probabilidades
89

a) freqüência simples: Xj < X< Xj


b) freqüências acumuladas de excedência: x* < X
c) freqüências acumuladas de não-excedência; X < X:

Na estimativa do número de classes pode ser usada a fórmula de Sturges:

m = 1 + 3,3 log (n) (4 ^

sendo m o número de classes e n o tamanho da amostra. Um outro critério


consiste em adotar a largura de uma classe igual ou menor que a quarta parte
do desvio padrão da variável, parâmetro estatísdco a ser definido no próximo
item.

Exemplo 43 . A tabela 4.2 apresenta os cálculos necessários para a graficação


dos histogramas de freqüência da variável contínua, vazões médias anuais no
rio Almada em Itajuípe, apresentados na tabela 4.1. Os histogramas acham-se
desenhados na figura 4.4

Tabela 4.2. Histograma de frequências de vazões médias1-anuais


do rio Almada em Itajuípe
Intervalo Número de Freqüências Freqüências acumuladas
ou classe ocorrências simples de não-excedência
< 4 3 3/42 3/42
4 - 6 8 8/42 11/42
6 - 8 6 6/42 17/42
8 -10 6 6/42 23/42
10-12 9 9/42 32/42
12-14 7 7/42 39/42
>14 3 3/42 42/42 -
TOTAL 42

Deve ser notado que a curva de permanência é uma espécie de histograma


de freqüências de excedências, em que os limites de classe são definidos
pelos valores ordenados das variáveis. Cada classe conta, portanto, com uma
única ocorrência no limite inferior. Outra diferença é que a freqüência é
desenhada no eixo horizontal.
Os histogramas de freqüência tem, portanto, as mesmas vantagens e
desvantagens da curva de permanência. Eles servem para esboçar a distribuição
de freqüências da amostra. Por isso a relevância das análises é limitada ao
tamanho da amostra.
90 Hidrologia

Relação entre duas variáveis

O interesse de consideração da relação entre duas variáveis em


hidrologia vem da possibilidade de relacionar os dois processos que
representam. Por exemplo, os processos chuva e vazões em dada bacia. Como a
chuva é uma das variáveis motoras do processo hidrológico que gera vazões,
existe, sem dúvida, relação entre esses processos. Em função disso, pode-se
cogitar se tal relação pode ser representada por uma relação direta simples,
que graficamente assuma a forma de uma curva. Se este for o caso, a
graficação das variáveis de interesse seria uma primeira avaliação.

Figura 4.4. Histogramas de ffeqüências de vazões médias anuais no rio Almada


em Itajuípe.

Exemplo 4.4. A tabela 4.3 apresenta dados hidrológicos sobre o rio Jacuípe,
Bahia. Trata-se de valores totais anuais de chuva na localidade de França e
de vazões médias anuais em França e Gavião. As áreas das bacias em França e
Gavião são iguais a 1,910 e 6.100 km2, respectivamente. As figuras 4 J e 4.6
apresentam a relação entre as vazões e chuvas em França e entre as vazões em
Gavião e França. Verifica-se que a relação é visualmente mais bem definida
para as vazões do que para as vazões e chuvas. As retas traçadas no gráfico
mostram um ajuste linear para as relações adiante comentadas. Como se pode
verificar, a adoção da relação linear, para interpretar a relação entre as
variáveis, conduziria a menor erro de estimativa no modelo vazão-vazão do que
no modelo vazão-chuva.
Elementos de Estatística e Probabilidades 91

4.2.2 Representação numérica

Outra forma de representação de uma variável aleatória é feita através


de valores numéricos que quantificam as características marcantes da forma de
sua distribuição de freqüências. Esta representação seria uma opção mais
radical de sumarização do que a representação gráfica. Devido à facilidade de
tratamento computacional, ela tem prevalecido em estatística. As principais
características da distribuição de freqüências e os parâmetros numéricos que
as quantificam são apresentados a seguir.

Tendência central

Esta característica é relacionada com a parte central do histograma de


freqüências. Existe, às vezes, uma tendência de que o número de ocorrências
seja maior nesta parte central, significando que a variável aleatória costuma
ocorrer cora maior freqüência nos intervalos centrais. Os parâmetros
estatísticos que a representam são:

Média Aritmética : é computada por :

n
(4.2)

onde: xv i = l,2..,n são realizações da variável aleatória, e n o número


total de realizações, ou seja, o tamanho da amostra.
A média aritmética tem um significado hidrológico importante. Suponha
que um reservatório deverá estabelecer uma regularização total das vazões em
dada seção fluvial. Regularização total significa que as vazões defluentes do
reservatório serão constantes. Caso não haja evaporação ou outro tipo de
perda hídrica e a entrada de água no reservatório seja unicamente dada pela
variável aleatória x^ t = l,...,n, vem:

n
(4.3)
t=l

A expressão indica que o volume inicialmente armazenado, Sj, somado às


afluências xt em um período n, devem ser iguais às defluências no mesmo
92 Hidrologia

período, x \ mais o que restou armazenado no reservatório ao final do período


n, Sn+1. Caso n seja suficientemente grande para que a diferença entre o
armazenamento inicial e o armazenamento final seja pequena diante da soma das
afluências (ou das defluências), os armazenamentos poderão ser cancelados.
1 n
Daí, x’ = — £ xt = x, do que se conclui que x’ é a média aritmética de xt,
t =i
t = l,2..,n. Portanto, a média aritmética é a regularização plena que se pode
obter no reservatório hipotético definido previamente.

Tabela 4.3. Dados hidrológicos da bacia do


rio Jacuípe, BA (1960 a 1978)
França Gavião

Anos Chuvas totais Vazões médias Vazões médias


anuais (mm) anuais (m3/s) anuais (m3/s)
1959 375,0 0,16 0,36
1960 963,3 3,21 10,26
1961 326,3 0,02 0,07
1962 698,2 0,65 0,62
1963 999,6 0,55 1,77
1964 1722,1 3,36 10,75
1965 529,8 0,22 0,73
oq

1966 1053,5 5,86


1967 878,6 0,82 2,62
1968 428,1 UI 4,82
1969 594,2 2,20 7,03
1970 675,2 u i 3,37
1971 675,8 0,08 0,25
1972 509,4 0,42 1.14
1973 755,9 0*53 1,69
1974 1225,7 0,92 2,94
1975 1019,6 1,05 3,37
1976 579,7 0,42 U4
1977 741,5 0,80 2,52
1978 1118,9 2,80 7,36
Média 793,52 1,13 3,44
D.Pad 328,32 1,00 3,16
Elementos de Estatística e Probabilidades 93

o
o
c
o
w
li.
£

5
3
C
O

O
■O
•V
£
VI
V
*o
H
O
>

Figura 4.5. Relação entre as vazões médias e chuvas totais em França, rio
Jacuípe, BA

Figura 4.6. Relação entre vazões médias anuais em Gavião e França no no


Jacuípe, BA
94 Hidrologia

Moda: é o valor representativo do intervalo de classe onde a freqüência de


ocorrência é máxima. Nas figuras 4.3a e 4.4, este valor é representado no
centro do intervalo de classe com maior freqüência, pela notação xHq. O
dimensionamento dos intervalos de classe afeta o valor da moda em uma
distribuição empírica de freqüências.

Mediana: é o valor que é superado (e não superado) por 50% das ocorrências.
Em um histograma de freqüências seria o valor que determinaria áreas iguais à
direita e à esquerda, conforme mostra nas figuras 4.3a e 4.3b notação md.

Variabilidade em torno da média

A figura 4.7 apresenta duas séries hipotéticas de vazões fluviais médias


mensais, com média idêntica e variabilidade em tomo da média distinta. Caso
fosse pretendida a construção de um reservatório de regularização, o local
com o hidrograma b exigiría maior capacidade para armazenar as discrepâncias
positivas, que seriam utilizadas para atender às discrepâncias negativas. Ou
seja, armazenar as cheias para atenuar as estiagens. O efeito do reservatório
será observado no hidrograma regularizado pela diminuição desta
variabilidade. No caso extremo de total regularização, o hidrograma seria uma
linha horizontal sem qualquer variabilidade. Este exemplo mostra a relevância
de se contar com um parâmetro numérico para medir a variabilidade. Ele é o
desvio padrão ou a variança.

Variança:

(Xj * X) ^ — J
--------- = x- - x (4.4)
n
i=l

ou seja, pelo desenvolvimento do termo quadrático obtém-se a estimativa da


variança como a diferença entre a média dos quadrados da variável e o
quadrado da média.
Para evitar o problema de estimativas em amostras pequenas, chamado
tendenciosidade, costuma-se usar uma correção para o desvio padrão em que o
denominador n é substituído por n-1 resultando em :

2 = r) ----------
S2 (Xi' "x)2 (4.5)
n - 1
i=l
Elementos de Estatística e Probabilidades 95

Figura 4.7. Variabilidade em tomo da média

2
Desvio Padrão: é a raiz quadrada da variança s . Verifica-se que quanto maior
for o desvio padrão ou a variança, maior é a uutuação da variável em tomo
da média.

Assimetria

Uma distribuição simétrica é aquela que apresenta simetria em relação a


um eixo vertical que passa pelo valor modal, ou seja, o valor com maior
freqüência (isto seria o mesmo que dizer que um lado da distribuição é uma
imagem de espelho do outro). Nesta situação a média, a mediana e a moda são
iguais. Existem dois tipos de assimetria. Elas são exemplificadas na figura
4.8. No primeiro caso a assimetria é positiva. Existe maior concentração de
freqüências à esquerda do histograma de freqüências simples (figura 4.8a); no
de freqüências acumuladas de não-excedências é observada uma forma côncava
(figura 4.8b). No segundo caso a assimetria é negativa, ocorrendo maior
concentração de freqüências à direita do histograma de freqüências simples
(figura 4.8c). O de freqüências acumuladas de não-excedências apresenta uma
forma convexa (figura 4.8d). A assimetria positiva é típica das distribuições
de variáveis hidroiógicas que costumam ser limitadas inferiormente no valor
zero, e não tem limite superior conhecido.
Existem alguns parâmetros para quantificação da assimetria que são
apresentados a seguir. Quanto maior for a assimetria (ou maior a diferença
entre os dois lados da distribuição), maior o valor destes parâmetros. As
sumarizações numéricas são:
96 Hidrologia

Assimetria:

" [ Xi - x ] 3
aa - ) ---------- (4.6)
u n
í—i

Para evitar tendenciosidades na estimativa da assimetria de pequenas


2
amostras \ pode ser corrigido pelo coeficiente: n /[(n - l)(n - 2)].

Coeficiente de assimetria:

as = a» / s3 (4.7)

O coeficiente de assimetria 6 igual à assimetria adimensionalizada pelo


cubo do desvio padrão. A assimetria, aa, pode ser comum ou corrigida.
Adotando-se as alterações anteriores do coeficiente de assimetria, ele é
computado como:

- 3
n n
(xi " x)
as (4.8)
(n-l)(n-2) i 3
i=l S

Coeficiente de assimetria de Pearson : trata-se de uma medida pouco usada de


assimetria, dada por:

a =5 (x - moda) / mediana (4.9)


P

Exemplo 4.5. Os valores máximos de vazões observados no rio Mãe Luzia em


Forquilhinha, estado de Santa Catarina no período de 1943 a 1985 são
apresentados nas colunas 1 e 2 da tabela 4.4. A tabela indica a inexistência
de observações entre 1968 e 1975. Trabalhando apenas com os 35 anos onde
ocorreram registros, calcula-se:

média (equação 4.2) : 311,27


desvio padrão (raiz quadrada equação 4.5): 169,7
coeficiente de assimetria (equação 4.8) : 1,6

Para cálculo da moda e da mediana há necessidade de ordenar a amostra e


atribuir freqüências de ocorrência a cada valor. Nas colunas 3 e 4 da tabela
Elementos de Estatística e Probabilidades 97
coeficiente de assimetria (equação 4.8) 1,6

Para cálculo da moda e da mediana há necessidade de ordenar a amostra e


atribuir freqüências de ocorrência a cada valor. Nas colunas 3 e 4 da tabela
são apresentadas a ordem e o valor de vazão máxima anual de forma
decrescente. A coluna freqüência de excedência é calculada pela ordem
dividida por 35, tamanho da amostra. Como os valores são dispostos de forma
decrescente, a sua ordem indica quantas ocorrências de máximos iguais ou
maiores do que aquele em pauta foram observadas. Desta forma, as frequências
acumuladas calculadas são de excedência. Por interpolação encontra-se
aproximadamente 285m3/s como a mediana, pois identifica a excedência 50%.

<A
<

IN TER VA LO S Dí CLASSE INTERVALOS DE CLASSE

a) Freqüência de ocorrência com b) Freqüências acumuladas com


assimetria positiva assimetria positiva

M
= 24- 4
o 1W -
S 4
— 20 -
D 80-

I
g * a
o - »•- o
o » so-
o *
• 12-1
4 4 U i
4 w 40-
M « e " i>7» 0
r
«i 20-
ã * «- 3
M O
*
í U . u P71Y A 1/ i
ae 0 -J
5 13 29 39 49 99 99 79 89 »9
i*. 9 19 29 39 49 99 89 79 89 95

IN TERVALO S OE CLASSE IN TERVALO S OE CLASSE

c) Freqüência de ocorrência com d) Freqüência acumuladas com


assimetria negativa assimetria negativa

Figura 4.8. Assimetrias


98 Hidrologia

em tomo de 100 m3/s. Já o critério de estabelecer como a quarta parte do


desvio padrão resulta em um intervalo de 40 m3/s. Adotou-se em função disso
intervalos constantes com 50 m3/s até o valor 550 m3/s e um único intervalo
para valores superiores, resultando em um total de 11 intervalos, como é
colocado na coluna 6 da tabela. A coluna 7 registra as ocorrência de valores
em cada intervalo e a 8 as freqUências de ocorrência. A moda será encontrada
no intervalo 350 - 400 m3/s. Atribuindo-lhe o valor médio deste intervalo ela
será 375 m3/s. Na figura 4.9 são apresentados os histogramas de freqUências
de não-excedências e simples.
Nota-se nesta amostra que a mediana < média < moda. O coeficiente de
assimetria de Pearson é (311,27 - 375) / 285 = - 0,23. Portanto, por este
coeficiente (pouco usado) o sinal da assimetria é diferente daquele computado
pelo coeficiente de assimetria da equação 4.8. Observando o histograma de
freqUências de ocorrência, nota-se que a determinação da moda depende
demasiadamente da definição de intervalos de classe. Caso houvesse sido
estabelecida uma amplitude menor, a tendência seria a moda ficar entre os
valores 200 e 300m3/s, resultando em assimetria positiva para o coeficiente
de Pearson, já que a média e a mediana não dependem da definição de classes.
Os resultados da tabela 4.4 permitem estabelecer por interpelação
valores de vazão com diversas freqUências de excedência. O valor 500 m3/s foi
igualado ou excedido cm cerca de 10% dos anos. O de 773 m3/s, em cerca de 5%
dos anos. Caso houvesse interesse de se estimar a vazão que é excedida em 1%
dos anos haveria necessidade de extrapolação da relação vazão versus
freqüência de excedência. O número de anos necessários na amostra para
atingir-se este percentual é de 100 anos, o que raramente é obtido em
variáveis hidrológicas.

Relação entre duas variáveis

A expressão numérica da relação entre duas variáveis requer um


coeficiente cujo valor atribua uma nota à qualidade do ajuste a uma
tendência. Algumas possibilidades são apresentadas a seguir.

Co-variança amostrai: Este coeficiente é calculado por :

1 n . - 1 n __
sXy = — -E (Xi - x).(ys - y) = — .£ Xj.yj - x.y (4.10)
Í=1 1=1

Quanto maior for este coeficiente maior será a tendência de que valores
altos da variável X estejam relacionados com valores altos da variável Y.
Elementos de Estatística e Probabilidades 99

Tabela 4.4. Valores máximos anuais de vazões no rio Mãe Luzia em


Forquilhinha, em m3/s.

Vazões Ordem Valor Freqüência Intervalo Ocorrências Freqüência


Ano Ordenado Excedência de classe intervalo intervalo
(m3/s) (m3/s) (%) (m3/s) (%)
1943 92,5 1 880 0,0286 50 - 100 2 0,0571
1944 228,6 2 773 0,0571 100 - 150 3 0,0857
1945 72,5 3 545 0,0857 150 - 200 2 0,0571
1946 180 4 480 0,1143 200 - 250 6 0,1714
1947 180 5 470 0,1429 250 - 300 6 0,1714
1948 350 6 390 0,1714 300 - 350 4 0,1143
1949 116,8 7 380 ■0,2000 350 - 400 7 03000
1950 216 8 380 0,2286 400 - 450 0 0,0000
1951 330 9 376 0,2571 450 - 500 2 0,0571
1952 241,2 10 370 0,2857 500 - 550 1 0,0286
1953 300 11 360 03143 > 550 2 0,0571
1954 380 12 350 03429
1955 261 13 340 0,3715
1956 248 14 330 0,4000 35 1,0
1957 256,5 15 315 0,4286
1958 380 16 300 0,4571
1959 221,4 17 290 0,4857
1960 370 18 280 03143
1961 360 19 265 03429
1962 340 20 261 03714
1963 480 21 256,5 0,6000
1964 290 22 252 0,6286
1965 216 23 248 0,6571
1966 390 24 2413 0,6857
1967 376 25 228,6 0,7143
1976 252 26 221,4 0,7429
1977 280 27 216 0,7714
1978 470 28 216 0,8000
1979 773 29 180 0,8286
1980 880 30 180 0,8571
1981 545 31 121 0,8857
1982 117 32 117 0,9143
1983 265 33 116,8 0,9429
1984 121 34 92,5 0,9714
1985 315 35 72,5 1,0000
100 Hidrologia

a) frcqüência simples
md = mediano
mo ^ moda.
me - media

mo
NA
OCORRÊNCIA
DE
FREQUÊNCIAS

b) freqüência acumulada

Figura 4.9, Histogramas de frequências simples e acumuladas das vazões


máximas do rio Mãe Luzia em Forquilhinha
Elementos de Estatística e Probabilidades 101

Quanto menor (negativo), mais vezes valores altos de X (ou Y)


relacionam-se com valores baixos de Y (ou X). O problema desse coeficiente é
que ele não se presta a comparações, pois é característica das variáveis
consideradas.

Exemplo 4.6. A co-variança amostrai entre as séries de chuva e vazão em


França, bacia do rio Jacuípe, é 213,72. O mesmo coeficiente, calculado para
as séries de vazões em Gavião e França na mesma bacia é 3,14. Não obstante
estas diferenças, é nítida a melhor qualidade da relação no segundo caso em
relação ao primeiro, apesar de sua menor co-variança.
Para estabelecer um coeficiente que permita uma apreciação relativa do
ajuste da relação entre duas variáveis a uma tendência, divide-se a co-
variança pelo produto entre os desvios padrões de cada variável, resultando
em:

Coeficiente de correlação - Este coeficiente é calculado por :

rxy = Sxy/(sx.Sy) (4-H)

Pode ser demonstrado que este coeficiente tem seu valor máximo igual a
1, significando um perfeito ajuste da relação a uma tendência retilinear
crescente. Ele terá seu mínimo em -1 significando um perfeito ajuste ao mesmo
tipo de tendência, só que agora decrescente. Quanto mais próximo de zero for
o valor absoluto deste coeficiente, pior o ajuste das variáveis a uma
tendência retilinear.

Exemplo 4.7. Na bacia do rio Jacuípe, o coeficiente de correlação entre as


vazões médias anuais e as chuvas totais anuais em França é 0,6485. Seu valor
aumenta para a relação entre as vazões médias anuais de Gavião e França,
confirmando ^os resultados graficados nas figuras 4-5 e 4.6, atingindo 0,9901.

Regressão linear simples: A relação entre duas variáveis pode ser descrita
por uma função do tipo geral Y = f[X]. Quando esta função for retilinear, ela
assume a forma Y = A.X + B. Os coeficientes „da reta podem s§£_ obtidos
diretamente no gráfico. O valor de B será o de y quando x = 0, encontrando-se
sobre o eixo das coordenadas. O valor de A é a tangente do ângulo que a reta
ajustada faz com a horizontal. Outra alternativa para estimativa de A e B é
pelo método dos mínimos quadrados. Neste caso, supõem-se que a relação entre
Y e X é dada por:

yi = A.X; + B + e; (4.12)
102 Hidrologia

onde o subscrito i indica a posição na amostra com n valores e sendo o


erro de ajuste entre a observação e a estimativa linear. O método dos mínimos
quadrados é resolvido por um problema de minimização do tipo :

Minz = M i n { £ e j ) = £ [yi-(A.Xj+B)]2
A ,B A ,B i = 1 i=l

= E [y] + A2 X; + B2 + 2.A.B.X; - 2.A.Xj.yi - 2.B.yi) =


i=l
n ^ 7 n ? n 0 n n n
: E y i + A - E xi + Z B + 2.A.B.£ Xj - 2.A .£ Xj.y* - 2JB.£ yd}
i=l i=l i=l i=l i=l i=l

em que se busca determinar A e B de forma' que a soma dos quadrados dos erros
é minimizada. Aplicando-se a teoria de máximos e mínimos do cálculo
diferencial, iguala-se a 0 as derivadas parciais em relação aos parâmetros A
e B :

ôz n ? n n
— = 2-A.È *i + 2.B .£ X; - 2 .£ Xj.yj = 0
óA i=l i= l i=i

dz n n
— = 2-n.B + 2.A. E xj - 2. £ yi = 0
3B i=l i=l

O valor de B pode ser obtido da segunda derivada parcial

B = E Yj/n - A. E Xj/n ou
i=i i=l

B = y - A.x (4.13)

Substituindo na primeira derivada parcial o valor de B acima :

2.A. £ Xj + 2.(y - A.x). E xi * E xi*Yi = 0


i=l i=l i=l

o que resulta

A = (E xí-Yí - y-E Xi)/(E xi - X-E xi)


i=l i=l i=l i= 1
Elementos de Estatística e Probabilidades 103

Dividindo numerador e denominador por n e verificando-se as equações


4.10 e 4.4 :
1 n __
— -.1 Xi.yi - x.y
A = ------ L i _ -------= sxy/VAR(X) (4.14)

Substituindo-se as estimativas de A e B na equação vem :

y = sxy/VAR(X).x + y - A.x ou y - y = sxy/VAR(X).(x : x)

Dividindo ambos os termos da equação por sy, o desvio padrão de y,


desdobrando a variança de x em sx.sx, e observando a equação 4.11 vem :

(y - y) (x - x) (X - X)
[sxy/(sx.sy)j = rxy (4.15)

que mostra que a regressão linear entre duas variáveis pode ter seus
coeficientes reduzidos a estatísticas destas variáveis. Note-se, porém, que
os desvios padrões neste caso devem ser computados com a equação 4.4, ou
seja, sem a correção amostrai.

Exemplo 4.8. A tabela abaixo resume as estatísticas já apresentadas para as


chuvas e vazões anuais em França e vazões anuais em Gavião :

Chuvas anuais Vazões anuais Vazões anuais


França (mm) França(m3/s) Gavião (m3/s)
Média 743,52 1,13 3,44
D. Pad. 328,32 1,00 3,16

O coeficiente de correlação entre chuvas e vazões em França é 0,6485 e


entre as vazões em França e Gavião é 0,9901. Substituindo-se estes valores na
equação 4.15 :

Para a relação entre vazões e chuvas em França :

(y - M 3 ) (x - 743,52)
= 0,6485.- ou y —0,001982.x - 0,44068
1,00 328,32
104 Hidrologia

Para a relação entre vazões de Gavião e França :

(y - 3,44) (x - 1,13)
---------------- = 0,9901.------ ou y = 3,115242.x - 0,08568

As retas apresentadas nas figuras 4.5 e 4.6 foram desenhadas a partir


dessas equações.

Transformações da regressão linear

A praticidade da regressão linear tem sido utilizada para ajustar


funções não-lineares a relações entre variáveis. A base para isso é a
obtenção de transformações da função que a façam linear.

g
Exemplo 4.9. A função de potência : Y = A.X pode ser linearizada tomando-se
logaritmos de ambos os termos :

Log(Y) = Log(A) + B.Log(X)

Se for feito Z = Log(Y), A’ = Log(A) e W = Log(X), pode-se escrever a


seguinte equação transformada: Z = B.W + A \ que é a equação de uma reta.
Portanto, transformando-se Y e X em seus logaritmos, a regressão linear
estimará os coeficientes da função de potência acima.
A tabela 4.5 apresenta algumas transformações linearizantes de uso comum
em hidrologia.

Ir Regressão linear múltipla

i !!■
Íi Eventualmente poderá ser necessário estabelecer numericamente uma função
que relacione uma variável com várias outras, ou a chamada regressão linear
múltipla. Isto acontece ffeqüentemente em hidrologia, particularmente nos
métodos de regionalização que serão vistos no capítulo 15. A derivação das
equações equivalentes a 4.13 a 4.15, para múltiplas variáveis, é mais simples
adotando a notação matricial. Seja Z uma variável derivada de Y, através, de
zi = (Yí ■ y)/sy que será dada pelo produto da transposta de um vetor A por
um vetor de m variáveis relacionadas com Y, W. Ou seja :
A = [a,, aj,..., a,,,.,, a j e W s [w1,w2,...,wm. 1,wm], sendo A e W as

transpostas de A e W, com w; = (x: - X:)/s_ .


J J J *i

I
Elementos de Estatística e Probabilidades 105

A equação que relaciona Z com W é dada por :

T
Z = A .W

Tabela 4.5. Linearização de algumas funções não-lineares


Função Transf. y Transf. x Forma linearizada
A B Log(x) Log(y) = Log(A) + BJLog(x)
y = A.x Log(y)

A BX Ln(y) Ln(y) = Ln(A) + B.x


y = A.e X

y = A + B/x y 1/x y = A + B.(l/x)

y = x/(A + B.x) x/y X x/y = A + B.x

y = A/(B + C.x) 1/y X l/y = B/A + C x/A

Manipulando-se esta equação pode-se demonstrar que o vetor A pode ser


estimado por :

A = E[WJZ].(E[W.WT] r ‘ (4.16)

sendo E[.] o operador valor esperado que será visto adiante,

S ,z
rW2(Z
E[WZ] =

rw
m

ou a matriz formada pelos coeficientes de correlação entre as variáveis Wj e


Z e

1 rU ... r l,m

ru 1 ... r 2,m
E [ W .W T ] =
•••

... 1
r l,m r2 jn
m
106 Hidrologia

a matriz formada pelos coeficientes de correlação n : entre as variáveis w-i


e Wj. A inversa desta matriz deverá ser encontrada para ser empregada na
equação 4.16.
O coeficiente de correlação múltipla pode ser estimado neste caso como a
razão entre os desvios padrões dos valores estimados e observados de y :

(4.17)

Exemplo 4.10. Embora as evidências sejam de que não haverá melhoria


substancial, será desenvolvido um modelo de estimativa das vazões médias
anuais em Gavião que utilize as vazões médias anuais e as chuvas totais
anuais em França. Além das estatísticas que foram apresentadas no exemplo
4,8, tem-se que o coeficiente de correlação entre as vazões em Gavião e as
chuvas em França é 0,6475. As matrizes especificadas previamente são:

E[W.Z] 0,6475 0,990lJeE[W .W T] 1 0.6845 T,


.A inversa de E[W.W ]é
0,6845 t

j -l 1,725845 -1,11923
dada por E[W.W ] = Portanto, a matriz A, dada pelo
-1,11923 1,725845

0,009281
produto E[W.Z].E[W.WT]"i é A = Manipulando as equações e
0,984047

substituindo Z e W por seus valores encontra-se :

(y - 3,44) (xr 743,52) (x2- 1,13)


3 ^ - 0,009281. 328732 + ° ’984047-....1,00 sendo xi e

x2 as vazões em Gavião, as chuvas em França e as vazões em França,


respectivamente. Operando os termos poderá ser obtida a equação de regressão
múltipla.

43 Modelos probabilísticos em hidrologia

Um histograma de freqüências simples ou acumuladas da amostra de uma


variável aleatória permite o conhecimento da freqüência com que esta variável
assumiu valores dentro de dado intervalo, durante as observações realizadas
Elementos de Estatística e Probabilidades 107

para a formação da amostra. O interesse deste estudo estatístico é a projeção


do que ocorrerá no futuro em termos de realizações desta variável. Por
exemplo, a tabela 4.4 permite a conclusão que em 5% dos anos a vazão máxima
em Forquilhinha foi superior a cerca de 773 m3/s. Isso pode ser interpretado
que o risco de ocorrência no futuro de cheias maiores é de 5% ? Esta pergunta
remete ao conceito importante que é o de estacionariedade. Caso possa ser
aceito que não existirão modificações substanciais no processo natural de
formação de vazões nesta bacia, pode-se aceitar que, em termos probabi-
lísticos, o que ocorreu no passado deverá ocorrer no futuro. Esta frase deve
ser entendida como: embora não seja possível prever-se que vazões máximas
anuais ocorrerão no futuro distante, pode-se afirmar que as frequências de
ocorrência do passado serão válidas para descrever as probabilidades de
ocorrência no futuro.
Nessa frase caracterizou-se a diferença entre probabilidade e freqüên-
cia: probabilidade refere-se a eventos não conhecidos; freqüência a eventos
observados. De certa forma, a análise estatística trabalha com freqüências,
enquanto a teoria das probabilidades com probabilidades. O conceito de proba­
bilidade pode ser interpretado através do conceito de freqüências : proba­
bilidade de um evento é a proporção de vezes que o evento ocorrerá em uma
série longa de observações ou experimentos repetidos.
Freqüência e probabilidades têm, portanto, uma diferenciação muito
tênue. Em essência, ambas referem-se à porcentagem com que as realizações de
uma variável aleatória ocorreram (freqüência), ou se supõem que ocorrerão
(probabilidade), dentro de dado intervalo. Para passar-se das freqüências
conhecidas em observações no passado, para as probabilidades de ocorrência no
futuro, existe outro conceito importante: é o da representatividade da
amostra. Continuando com o mesmo exemplo, não é difícil entender que uma
amostra de vazões máximas anuais com 5 anos de observações é pouco
representativa do processo analisado, enquanto outra amostra de 35 anos
reprcsenta-o melhor. Nesse caso acha-se em pauta unicamente o tamanho da
amostra. A representatividade depende também da qualidade da amostra. Caso o
leito do rio onde se localiza a seção fluvial for móvel, a curva-chave poderá
sofrer mudanças a cada estação de cheias. Não ocorrendo um acompanhamento
dessas mudanças, através de medições hidrométriças intensivas e atualizações
freqüentes da curva-chave, os valores máximos anuais não serão consistentes,
como se diz no jargão hidrológico. Isto é o mesmo que se dizer que a amostra
de vazões máximas anuais não é representativa do processo, no jargão
estatístico. No caso do rio Mãe Luzia em Forquilhinha verifica-se que após o
período de 1968 a 1975, quando não foram registradas as vazões, houve uma
concentração de valores extremos. Os 3 maiores valores de cheias ocorreram
neste período. Isto pode indicar uma modificação das condições hidrológicas
que levaria a nãò-aceitação da estacionariedade da amostra.
108 Hidrologia

Na medida em que uma amostra seja representativa, pode ser feita a


ligação entre as freqüências amostrais e as probabilidades. Ou seja, o
histograma amostrai de freqüências pode ser suposto como a distribuição
empírica de probabilidades da variável aleatória. O termo distribuição
empírica é introduzido para diferenciar esta distribuição obtida de
observações do fenômeno (ou de uma amostra do fenômeno) da distribuição
populacional de probabilidades, que representa exatamente as probabilidades
de ocorrência de suas realizações. Esta última distribuição raramente é
conhecida em hidrologia e, mais genericamente, no trato de fenômenos
aleatórios naturais. Ao julgar-se a amostra representativa de um fenômeno, e
estabelecer-se sua distribuição empírica de probabilidades, tenta-se inferir
qual é sua distribuição populacional. O jargão estatístico inferir tem seu
correspondente coloquial em descobrir ou, quem sabe, adivinhar.
O leitor poderá agora comentar: já se falou em distribuição empírica e
populacional. E as tão faladas distribuições normal, log-normal, etc.?. Estas
são distribuições teóricas de probabilidades ou modelos probabilísticos
teóricos. Para entender seu papel na análise estatística, deve-se prosseguir
mais um pouco.
Suponha que haja interesse prático no estudo das cheias na localidade de
Forquilhinha. O objetivo é a construção de uma ponte e, portanto, o valor
instantâneo da vazão máxima deve ser objeto de análise. A amostra apresentada
na tabela 4.4 é julgada representar o processo com seus 35 anos de
observação. Dsante disso, os histogramas de frequência da figura 4.9 serão
promovidos à distribuição empírica de probabilidades.
Existe um problema operacional básico para a utilização das
distribuições empíricas de probabilidades: a estimativa da probabilidade de
ocorrência de eventos raros. Suponha que se esteja interessado na
probabilidade de ocorrência de cheias superiores a 1500 m3/s. A amostra não
contém eventos nesta faixa de valores. Haverá necessidade de extrapolação da
distribuição empírica de freqüências acumuladas, tarefa difícil de ser
realizada com precisão razoável, quando a faixa de interesse estiver muito
distante dos valores amostrais. Este problema de extrapolação de pontos é
conhecido em matemática. Pode-se ajustar uma função aos pontos e extrapolá-
la.
Diante disto, o hidrológo deverá buscar funções matemáticas que se
ajustem aos pontos da distribuição empírica e que tenham algumas outras
propriedades como, por exemplo, serem assintóticas ao eixo horizontal que
passa pela freqüência 100%. Na tentativa de resolver este problema, alguns
matemáticos começaram a estudar os fenômenos aleatórios, tentando verificar
se seria possível inferir-se a natureza matemática de suas distribuições
populacionais de probabilidades. Embora não tenham tido até hoje um sucesso
completo nesta tarefa, eles descobriram algumas propriedades que, se fossem
Elementos de Estatística e Probabilidades 109

seguidas pelas variáveis aleatórias, conduziríam suas populações a


distribuirem-se de acordo com determinadas funções matemáticas, que foram
batizadas de distribuições teóricas de probabilidades.
Existem diversas funções matemáticas que foram derivadas dentro desta
ótica, e passaram a ser distribuições teóricas de probabilidades. A vantagem
de usá-las para ajuste das distribuições empíricas de probabilidades são
duas. Primeiro, elas têm as características desejáveis de uma função de
probabilidades. Segundo, muitas vezes se poderá selecionar a distribuição
adequada pelas características da população de onde ela "foi derivada, quando
comparadas com as características do fenômeno estudado. Deve ser alertado
que, geralmente, não existe total convergência entre as características reais
e as teóricas. No entanto, algumas delas poderão existir e levar ao analista
concluir que é aceitável a escolha de uma distribuição teórica como uma
aproximação da distribuição populacional.
Em resumo, a relação entre as distribuições de probabilidades empíricas,
teóricas e populacionais foi estabelecida. A distribuição empírica é aquela
que se conhece. A distribuição populacional é a meta que, em geral, não se
pode alcançar com certeza. A distribuição teórica faz a ponte entre uma e
outra, sendo necessária por questões operacionais (extrapolação) e desejável
por questões teóricas (adequação ao fenômeno estudado). Antes de se
apresentar modelos das distribuições teóricas é importante desenvolver alguns
conceitos sobre probabilidades que deverão ser usados adiante.

43.1 Conceitos básicos de probabilidades

Para tratar com alguns modelos probabilísticos de eventos discretos há


necessidade de introduzir-se alguns conceitos básicos de probabilidade,
através de seus axiomas e teoremas elementares. O uso de espaços amostrais
facilita esta exposição. Espaço amostrai é, em estatística, o conjunto de
todos os possíveis resultados de um experimento ou de uma série de
observações. A representação gráfica de um espaço amostrai permite uma
visualização didática de suas propriedades. A figura 4.10 apresenta algumas
situações baseadas na composição de dois descritores de um fenômeno: ventos
em uma localidade. Suponha-se que as velocidades sejam colocadas em Km/h nas
abscissas e o sentido em graus, nas ordenadas, onde 0o representa o Norte,
90°, o Leste, 180°, o Sul e 270°, o Oeste. Qualquer ponto sobre o diagrama
apresentado representa a ocorrência de uma velocidade e sentido do vento. Por
exemplo, o ponto X representa um evento deste espaço amostrai, em que a
velocidade foi de 100 km/h e o sentido 90° (Leste).
As relações entre eventos e espaços amostrais podem ser estabelecidas
através destes diagramas. Suponha a área A. Ela representa um evento formado
pelo conjunto de ocorrências velocidades entre 100 e 200 Kmih e senti o
110 Hidrologia

Leste-Oeste. Existem diversas ocorrências em A que podem ser representadas


por pontos dentro da sua área. Chama-se evento complementar a A o conjunto de
ocorrências que não estão em A. Logo ele seria representado no diagrama da
figura 4.10a pela área não contida em A e que será notada por A \
A figura 4.10b apresenta além de A, o evento B que é o conjunto das
ocorrências de ventos entre 60 e 140 km/h no sentido Norte-Sul. O evento C,
dado pela interseção de A e B é representado pela área com dupla hachura na
figura 4.10b. Ele é o conjunto de ocorrências de ventos entre 100 e 140 km/h
no quadrante Leste-Sul e é representado como C = A n B = B n A . O evento D,
dado pela união de A e B é representado na figura 4.10b como a soma das
ocorrências de ventos com velocidades entre 100 e 200 Km/h e sentido Leste-
Oeste ou 60 e 140 km/h no sentido Norte-Sul. Sua notação é D = A u B = B u A .
Dois eventos que não tenham partes em comum, como os E e F da figura
4.10c, são denominados mutuamente excludentes. Note-se que E n F = 0 ou um
evento vazio.
Estes diagramas são ffeqüentemente usados para a verificação das
relações entre eventos, dispensando a apresentação de provas formais baseada
em álgebra de conjuntos. Suponha que os diagramas da figura 4.10 foram
construídos de forma que suas áreas sejam proporcionais às probabilidades dos
eventos considerados. Para que isto ocorra, deve-se ter suposto que não
ocorrem ventos superiores a 200 km/h. A área total de cada diagrama é
equivalente à probabilidade 1, ou seja, o espaço amostrai completo engloba
todos as ocorrências possíveis. Isto permite as seguintes constatações:

a) a probabilidade de ocorrência do evento complementar de A, conforme a


figura 4.10a é :

P[A’] = 1 - P[A] (4.18)

b) a probabilidade de união de dois eventos é dada pela soma das


probabilidades dos eventos, subtraída pela probabilidade da sua interseção,
de acordo com a figura 4.10b:

P[D] = P[A u B ] s P [ B u A ] = P[A] + P[B] - P[A n B] (4.19)

c) a probabilidade de união de eventos mutuamente excludentes é dada pela


soma de suas probabilidades, ou seja, conforme a figura 4.10d:

P[G] = P[E u F ] = P[E] + P[F] (4.20)

d) a probabilidade da interseção de dois eventos mutuamente excludente é


zero, conforme a figura 4.10c
1
I

Elementos de Estatística e Probabilidades 111

P[E n F] s P[F n E] = 0 •\ (4.21)

O diagrama da figura 4.10d apresenta a noção de espaço amostrai


condicional. O evento I representa à ocorrência de ventos no sentido Sudeste-
Sudoeste, ou o evento H, condicionado a (ou tal) que suas velocidades sejam
superiores a 100 km/h, ou à ocorrência do evento G. Ele é notado como I =
H| G. O espaço amostrai condicional restringe o espaço amostrai a uma sub-
região G. De acordo com isso, a probabilidade do evento H, condicionado a G,
ou P[H|G] deve ser obtida como a proporção da área de H contida em G em
relação à área de G e não do espaço amostrai completo. Sendo assim, pode-se
apresentar uma nova constatação :

P[I] = P[H | G] = P[H n G] . P[G] (4.22)

ou seja: a probabilidade do evento I, dado pela probabilidade de H


condicionada a G, é obtida pela probabilidade da interseção de H com G,
multiplicada pela probabilidade de G. Este produto tem a propriedade de
reduzir o espaço amostrai ao espaço das realizações do evento G. A
probabilidade dc I é, portanto, proporcional ao quociente entre a área do
evento I n G e do evento G, que é o espaço amostrai condicionai. Esta equação
permite obter-se a probabilidade da interseção de dois eventos:

P[H n G] = P[H | G] . P[G] = P[C I H] . P[H] (4.23)

No caso, mostra-se que tanto faz condicionar-se o espaço amostrai à


ocorrência de um ou de outro evento.
Até aqui foram apresentados eventos que devem ser representados no mesmo
espaço amostrai, como é o caso da velocidade e sentido de um vento. Em certas
situações os eventos pertencem a espaços amostrais distintos. Por exemplo, os
ventos de uma localidade em datas distintas e separadas pelo intervalo de um
ano. Ao representar os eventos em espaços amostrais distintos se está
considerando que a realização de um evento não afeta nem é afetada pela
realização do outro. Em outras palavras, trata-se com eventos independentes.
Ao serem independentes e, por isto, não compartilharem o mesmo espaço
amostrai, o condicionamento de um evento à ocorrência do outro não afeta o
espaço amostrai do segundo. Portanto, para os eventos independentes J e K,
P[j | K] = P[J] e P[K | J] = P[K]. Diante disso, obtém-se com a equação 4.23 a
probabilidade da interseção de eventos independentes como :

P[H n G ] = P[H | G] . P[G] = P[H] . P[G] (4.24)

Ou seja, a probabilidade da interseção de eventos independentes é dada


pelo produto das probabilidades de cada evento. As propriedades previamente
112 Hidrologia

ilustradas para 2 eventos podem ser estendidas para diversos eventos. Isso
será realizado adiante quando for necessário aplicá-las no desenvolvimento de
modelos probabilísticos.

a)

360*

0 50 100 150 200


V e lo cid a d e ( km / h )

C)

Figura 4.10, Espaços amostrais


Elementos de Estatística e Probabilidades
113

43.2 Funções densidade e cumulativa á t probabilidade

As variáveis contínuas têm suas distribuições de probabilidade simples


apresentadas na forma de uma função densidade de probabilidade (FDP). Em vez
de ser estabelecida a probabilidade para ocorrência da variável em dado
intervalo» é estabelecida uma função que integrada em dado intervalo
determina a probabilidade de ocorrência do evento naquele intervalo. Abaixo
são apresentados exemplos de FDP para variável contínua, para o caso das
distribuições teóricas Normal e Assintótica dos Extremos do tipo I, também
conhecida como distribuição de Gumbel.

Função Densidade de Probabilidades da Distribuição Normal:

1 - 0,5 [(x - y.)/a]2


f[x] = —_ e (4.25)
<jv2n

Função Densidade de Probabilidades da Distribuição Assintótica dos Extremos


do Tipo I :

-cc.(x - P)
-a.(x - p) e
f[x] = a e (426)

onde: f[x] é a função densidade de probabilidades ti, é o número 3,14159.., fi,


a, a e (3 são parâmetros de ajuste.
As funções cumulativas de probabilidades ÍFCP), de excedência ou nao-
excedência, são computadas pela integração da FDP entre os limites x e
infinito, no primeiro, e menos infinito e x, no segundo caso:

FCP não-excedência = P[X ^ x] = FDP dx (4.27)

-00

oo
FCP excedência = P[X > x] FDP dx = 1 - P[X í x] (4.28)

A FCP da distribuição Normal é apresentada por uma integral que não tem
solução analítica. O contrário ocorre com a FCP da distribuição Assintótica
dos Extremos do tipo 1 que tem como solução:
114 Hidrologia

- a (x - (3)
P[X < X] = e' e (4.29)

As seguintes condições de coerência devem ser aplicáveis :

b
a) P[a^ X ^ b] s J f(x) dx£ 0 para qualquer b > a ou, o que é a mesma
a

A A

coisa: P[X ^ x] s Jf(x) dx £ Jf(x+e) dx s P[X í x + e] para qualquer e > 0,


-05 -00

ou seja, a FCP é uma função crescente, como serão as probabilidades


acumuladas de não-excedência.

00

b) P[x] dx - 1 ou a área sobre a FDP é unitária.


-CO

Exemplo 4.11 Verificar se a função y = (3 . e_a*x, com x £ 0, a e (3 > 0 passa


nos testes de coerência para ser candidata a uma função densidade de
probabilidades de um modelo probabilístico.

Solução: a função cumulativa de probabilidades de não-excedência no intervalo


b
(a,b) será dada por P [b s x s a] = J p.e~a t dx. Resolvendo-a obtém-se :
T=a

p [b < x í a) = - p/a . e - ^ = ^= - p/a . e’0* -(- p/a . e*0») ou

P [b 5 x í a) = - p/a ( e '0^ - e"f3b).

A função e m tem a primeira derivada iguala-a e ^ que é negativa


para qualquer a > 0. Portanto, e ^ é decrescente, ( e ^ - e < 0, e
então P [a í x ^ b] > 0 se b i a, o que obedece à primeira condição de
coerência.
Elementos de Estatística e Probabilidades 115

Quando a = 0 e b = » , limites desintegração que estabelecem toda


amplitude possível de variação de x, P [0^ x s « ] = - p /a ( 1 * 0). Se a = P
o valor da integral será 1, o que cumprirá a segunda condição de coerência.
Assim, a função estudada pode ser um modelo probabilístico se b = a > 0.
Este modelo teórico, conhecido como distribuição Exponencial, será tratado
mais adiante.

4 3 3 Estimativa dos parâmetros das distribuições teóricas

Nas distribuições teóricas apresentadas nas equações 4.25 e 4.26, as


letras p e o, a e p, são parâmetros. Existem distribuições mais complexas,
com 3, 4 e até 5 parâmetros, usadas em hidrologia, embora a prática determine
a utilização de não mais que 3.
Conforme o valor do parâmetro, a distribuição assumirá uma escala e, às
vezes, uma forma distinta. A figura 4.11 apresenta as diferentes formas da
FDP da distribuição Normal, para distintos valores de p e cf. Nota-se que o
parâmetro p não afeta a forma, mas o posicionamento da distribuição com
relação ao bixo da variável aleatória. Visualmente pode-se constatar que a
moda, mediana e a média posicionam-se em p. O parâmetro a altera a forma,
sendo que ela apresenta-se mais concentrada em tome do eixo x = p quanto
menor for a.

Variável aleatória x

Figura 4.11. FDPs da distribuição Normal


116 Hidrologia

O ajuste de uma distribuição teórica a uma distribuição empírica dev


probabilidades é, na sua essência, a determinação dos valores adequados dos
parâmetros de forma que a primeira se tome a mais idêntica possível à
segunda. Este ajuste podería ser feito por tentativas, como ocorre no caso de
ajustes de modelos hidrológicos do tipo chuva-vazão. A teoria das
probabilidades oferece, no entanto, alguns caminhos mais diretos, como os
métodos: método dos momentos, método dos mínimos quadrados, método da máxima
verossimilhança e método dos momentos ponderados pela probabilidade. Cada um
deles tem vantagens e desvantagens sobre os demais. Os dois primeiros, que
têm a vantagem da simplicidade, serão abordados neste capítulo. Inicialmente
será apresentado o método dos momentos, que ilustrará o ajuste das
distribuições teóricas a serem comentadas. O método dos mínimos quadrados
será introduzido adiante, quando forem tratados os papéis probabilísticos.

Método dos momentos

Antes de tratar do método, há necessidade de se saber o que é momento. O


momento de ordem k de uma' variável aleatória discreta com distribuição de
probabilidades conhecida é uma função matemática com a seguinte estrutura:

(4.30)

sendo xs, i= i,...,n os valores populacionais ou amostrais da variável, re­


sultando nos momentos populacionais ou amostrais, respectivamente. Ou seja,
trata-se da soma do produto dos valores discretos da variável elevados à
potência k, que estabelece a ordem do momento, com as probabilidades de
ocorrência destes valores.

Exemplo 4.12 A FDP da variável aleatória discreta resultante de lançamentos


de um dado não viciado é obtida pela função P[xJ = 1/6, para = t, 2, 3,
4, 5, 6. Esses são os valores populacionais, pois esgotam todas as possi­
bilidades de resultado em um lançamento. O primeiro e o segundo momento da
distribuição podem ser calculados por:

mL = 1/6 . (1 + 2 + 3 + 4 + 5 + 6) = 3,5

m2 = 1/6 . (1 + 4 + 9 + 16 + 25 + 36) = 15,2


Elementos de Estatística e Probabilidades 117

No caso de uma variável aleatória contínua, o somatório vira integral e


á função discreta de probabilidades em função densidade de probabilidades:

CO
*k
mk = x f(x) dx (4.31)
*

-00

O momento de primeira ordem, nq, é também denominado Esperança ou Valor


Esperado da variável, sendo notado por E[X], Ou seja:

CO
m x = E[X] = x f(x) dx (4.32)
-00

Pode ser verificado que: mk = E[X ]

Existe outro tipo de momento mais usado que é o momento central. Seu
cálculo é realizado por:

uk = E[(X - mj)k ] = E^(X - E[X])V> (4.33)

sendo mt o momento de primeira ordem.

O momento central de segunda ordem é também chamado Variança, e é notado


por VAR[X]. Note-se que apesar do nome, e como será verificado depois, da
relação que tem com a variança amostrai, este momento é computado de forma
distinta. O cômputo dos momentos de uma distribuição teórica é uma operação
matemática específica da teoria das probabilidades. O cômputo da variança
amostrai tem a ver com o cálculo estatístico, como é o caso da media,
assimetria e outras estatísticas amostrais.
Os momentos de uma variável aleatória poderão ser computados caso seja
conhecida sua distribuição populacional, aplicando-se as equações 4.30 a
4.33. Como isso geralmente não ocorre em hidrologia, haverá necessidade de
serem realizadas estimativas amostrais dos momentos.
Seja uma variável discreta X que pode ocorrer com m valores discretos
Xj, j = 1, ...,m. Por exemplo, o lançamento de um dado, em que m = 6. Seu
momento de primeira ordem ou esperança será computado como:
118 Hidrologia

E[X] - [ x, p.
j=i

sendo pj a probabilidade de ocorrer Xj.


A.média de uma amostra com n valores desta variável será computada por:

n m

onde Xj são os valores que formam a amostra, m é o número de valores


discretos Xj que a variável X assume e nij é o número de ocorrências de um
valor específico Xj. A soma dos rxij deve ser igual a n. Acima são, portanto,
colocadas duas expressões para cálculo da média amostrai, sendo a segunda
utilizável caso os valores de X tenham sido agrupados nas suas classes de
ocorrência.
Fazendo-se na expressão acima

e notando-se que mj/n é a freqüência com que X ocorre na classe Xj, sendo a
amostra significativa, a freqüência de ocorrência será uma boa estimativa da
probabilidade de ocorrência. Logo:

m
X [ p, x, = E[XJ

Ou seja, a média de uma amostra significativa é uma estimativa da


esperança (populacional) da variável X. O mesmo pode ser repetido para os
demais momentos, havendo a conclusão que a variança amostrai é uma estimativa
da variança (populacional) e que o coeficiente de assimetria amostrai é uma
estimativa do momento central de terceira ordem populacional da variável X.
Elementos de Estatística e Probabilidades 119

Exemplo 4.13. Os momentos de ordem 1 e 2 da amostra das vazões máximas anuais


do rio Mãe Luzia em Forquilhinha, apresentada na tabela 4.4, podem ser
computados utilizando-se as colunas que apresentam o histograma de
freqüências simples. Como a aplicação é feita sobre uma amostra, eles serão
chamados de momentos amostrais. Associando cada freqiiência ao valor de vazão
no meio do intervalo de classe:

m x= 75 . 0,0571 + 125.0,0857 + 175 . 0,0571 + 225 . 0,1714 + 275.0,1714 +


325 . 0,1143 + 375 . 0,2 + 425 . 0 + 475 . 0,0571 + 525 . 0,0286 + 715 .
0,0571 = 304,66

m2 = 752. 0,0571 + 1252. 0,0857 + 1752. 0,0571 + 2252. 0,1714 + 2752. 0,1714
+ 3252. 0,1143 + 3752. 0,2 + 4252. 0 + 4752. 0,0571 + 5252. 0,0286 + 7152.
0,0571 = 115.054,7
t

U2 = (75-304,66)2. 0,0571 + (125-304,66)2. 0,0857 + (175-304,66)2. 0,0571 +


(225-304,66)2. 0,1714 + (275-304,6ó)2. 0,1714 + (325-304,66)2. 0,1143 + (375-
304,66)2 0,2 + (425-304,66)2 0 + (475-304,66)2. 0,0571 + (525-304,66)2.
0,0286 + (715-304,66)2. 0,0571 = 28528,7

A raiz quadrada do momento central de segunda ordem, 28528,7 é igual a


168,9. Pode ser verificado que os valores do momento amostrai de primeira
ordem e da raiz quadrada do momento central amostrai de segunda ordem são
muito próximos aos da média e desvio padrão obtidos no exemplo 4.5 como
311,27 e 169,7, respectivamente. As diferenças são motivadas pelo esquema
adotado de apresentação por classes.

O método dos momentos utiliza as estimativas amostrais dos momentos


centrais de uma distribuição teórica para ajustá-la a uma amostra, O roteiro
utilizado é o seguinte:

a) compute, para a distribuição teórica a ser ajustada, os momentos centrais


até uma ordem igual ao número de parâmetros da distribuição;
b) compute, para a amostra, as estatísticas que estimam cada um dos momentos
computados anteriormente;
c) iguale cada momento teórico à sua estimativa amostrai. Isso formará um
sistema de equações cujas incógnitas são os parâmetros da distribuição
teórica. A solução desse sistema fornecerá a estimativa dos parâmetros.
120 Hidrologia

Exemplo 4.14. No exemplo 4.11 verificou-se que a função y = a . e-00^ pode ser
a função densidade de probabilidades de um modelo probabilístico. O momento
de primeira ordem desse modelo será calculado por :
00

mi E[X] = x . a . e’®* dx, Integrando por partes obtém-se 1 / a.


o

No exemplo 4.4 obteve-se para a série de vazões máximas no rio Mãe Luzia
em Forquilhinha, o valor 311,27 como média amostrai. Igualando-se o momento
de primeira ordem com sua estimativa amostrai, obtém-se : 1/a = 311,27 e â =
0,0032, sendo que o signo circunflexo significa que a é uma estimativa de a.
Portanto, o ajuste do modelo probabilístico exponencial às vazões
máximas de Forquilhinha resulta na FDP :

f(x) = 0,0032 . e' 0,0032*x

4.4 Principais modelos probabilísticos

Os modelos probabilísticos ou distribuições teóricas de probabilidades


que serão considerados são aqueles mais comumente usados em hidrologia. Este
item apresentará inicialmente as distribuições para variáveis discretas e
então para variáveis contínuas. Sempre que for o caso, serão comentadas a
origem da distribuição, ou seja, para que tipo de processo ela foi derivada,
e justificada sua utilização em hidrologia.

4.4.1 Modelos probabilísticos discretos

Os modelos aplicáveis a variáveis discretas têm uma característica


interessante: suas derivações são simples e podem ser apresentadas mesmo em
um capítulo introdutório. Isto será feito no texto que segue.

Distribuição de Bernoulli

Suponha inicialmente que se esteja tratando com uma variável que possa
assumir dois valores apenas. Isso geralmente sucede em hidrologia quando se
trata da ocorrência ou não de uma situação natural. Por exemplo, ocorrência
de cheia em dado ano, ou em dado mês. Caso a probabilidade de ocorrer o
evento seja p, a probabilidade que ele não ocorra será a probabilidade do
evento complementar. Pela propriedade dada na equação 4.18, q = 1 - p.
Eventos que se distribuam dessa forma seguem a distribuição de Bernoulli. A
Elementos de Estatística e Probabilidades 121

importância dessa distribuição vem das distribuições que são delas derivadas.
Elas serão apresentadas a seguir.

Distribuição Binomial

A distribuição Binomial se aplica às ocorrências repetidas de um evento


independente cuja ocorrência isolada siga a distribuição de Bemoulli, Por
exemplo, o evento ocorrência de cheia em um ano segue essa distribuição. A
ocorrência de m cheias em n anos segue a distribuição Binomial, se puder ser
aceita que a ocorrência de cheia em um ano não é afetada pela que ocorreu no
ano anterior.
Seja p a probabilidade de que ocorra uma cheia em um dado ano. A
probabilidade de que ela não ocorra é q = 1 • p. A probabilidade de que
ocorram n anos consecutivos com cheias é a probabilidade da interseção destes
eventos independentes e pode ser computada, de acordo com a equação 4.24
por P[n cheias em n anos] = pn. Da mesma forma, a probabilidade de que não
ocorram cheias em n anos será; P[zero cheias em n anos] = (1 - p)n = q
Seja agora a probabilidade de que ocorra 1 cheia em 3 anos. Note que
este evento pode ser obtido por várias ocorrências:

Ocorrências ano 1 ano 2 ano 3 P (caso)

1 cheia normal normal pq2


2 normal cheia normal pq2
3 normal normal cheia pq2

Cada ocorrência é dada pela interseção de um evento cheia com duas não-
cheia. Sendo as ocorrências em anos distintos independentes, a probabilidade
de cada uma é dada por p.(l-p).(l-p) = pq2. Deseja-se saber a probabilidade
de 1 cheia em 3 anos, o que é satisfeito por qualquer uma das ocorrências 1,
2 ou 3. Logo, busca-se a probabilidade da união desses eventos. Como eles são
mutuamente excludentes a probabilidade da união, conforme equação 4.20, é
dada pela soma das probabilidades individuais e P[1 cheia em 3 anos] = 3 pq2.
O caso mais geral seria a ocorrência de m cheias em n anos. A
probabilidade de ocorrência de um dos casos possíveis, por exemplo, cheia nos
m primeiros anos e normal nos demais, é dada por Pfcheia m anos iniciais de n
, m n-m
anos] = p q
O número de casos possíveis será dado pela combinação de n anos em
122 Hidrologia

grupos de m, ou seja P[m cheias em n anos] = C™ pm qn'm, sendo C™ o número


n n
possível de combinações de n anos em grupos de m, ou a combinação de n, m a
m. A análise combinatorial mostra que :

n!
c 1" (4.34)
m! (n-m)!

As equações anteriores estabelecem a função discreta de probabilidades


da distribuição Binomial. Em termos mais gerais estabelece a probabilidade de
ocorrência de eventos compostos mutuamente excludentes formados por eventos
independentes que sigam a distribuição de Bemoulli, com mesma probabilidade
p. O parâmetro desta distribuição é a probabilidade p, que pode ser estimada
amostralmente observando-se a frequência de ocorrência do evento simples na
amostra.
Mais formalmente, a distribuição de probabilidades simples binomial pode
ser apresentada como:

P[m] = C™ pm q" m (4.35)


a

A função cumulativa de probabilidades será dada pele somatório :

|X \i n -p
P[M 3 m] = £ C7 p q (4.36)
H-o

A figura 4.12 apresenta a função de probabilidades da distribuição


Binomial quando n = 5 e p = 0,1.

Exemplo 4.15. Suponha que ocorra inundação em Forquilhinha, quando a vazão do


rio Mãe Luzia for igual ou superior a 400 m3/s. A tabela 4.4 indica que
ocorreram 5 inundações em 35 anos de observações. Logo, a estimativa da
probabilidade p de ocorrer inundação é 5/35 = 1/7. Como se pode supor que a
ocorrência de inundações em um ano é independente das ocorrências em anos
anteriores, aplica-se a distribuição Binomial para estimar as probabilidades
de eventos compostos de inundação. Por exemplo, a probabilidade de não
ocorrer inundações em um período de 10 anos é dada por :
10 10
P[não ocorrência em 10 anos] = (1 - 1/7) = (6/7) = 0,214 ou 21,4 %

Também pode ser encontrado o risco de ocorrência de uma ou mais cheias


em 10 anos ou seja, a probabilidade de que ocorram cheias em 10 anos. Risco é
•3/“
' : . ....
• ... -V-- .

1---------------1-------------- r- ..............■ ■ r.------------,------------------- r


0 1 2 3 4 5
N ú m tro dt ocorrlncias

Figura 4.12. Distribuição Binomíal para n = 5 e p = 0,1

a probabilidade de um evento adverso. O evento ocorrência de (uma ou mais)


cheias cm 10 anos pode ser concretizado com a ocorrência de 1 cheia, 2
cheias,..., 10 cheias. O cálculo do risco seria obtido por:

r>r u • m 1
P[ocorrer cheia em 10 anos]t =o p q9 + C p2 q8 + ... + ~9
p9 q + C
-10
p 10

No entanto, fica mais fácil o cálculo a partir do evento complementar. A


probabilidade de que ocorram (1 ou mais) cheias em 10 anos é o complemento da
probabilidade de que não ocorram cheias. Ou seja:

Pfocorrcr cheia em 10 anos] = 1 - P[não ocorrer cheia em 10 anos], ou


Pfocorrer cheia em 10 anos] = 1 - qH1 = 1 - (6/7)lü = 0,796 = 79,6%. No entanto
observa-se que dc 1943 a 1962, os primeiros 20 anos, não ocorreram cheias
maiores que 400 m3/s. Isso reforça as suspeitas de inconsistência da amostra.
O valor esperado de m, o número de ocorrências em n anos, e a sua varian-
ça são dados por:

E[M] = np (4.37)

Var[M] = npq (4.38)


124 Hidrologia

Distribuição Geométrica

A distribuição geométrica é a distribuição de probabilidade do tempo até


a primeira ocorrência de um evento que siga a distribuição de Bemoulli. Esse
evento ocorre independentemente de suas realizações passadas com
probabilidade p. Ou seja, se m é o número de anos até a primeira cheia e a
probabilidade de ocorrer uma cheia em qualquer ano é p, o evento descrito
será composto por (m - 1) anos normais e o último ano com cheia. A sua
probabilidade será, portanto, dada por:

m-l m-1
P[m] = (1 - p) p = q p (4.39)

que é a função de probabilidades simples dá distribuição geométrica.


Assim como a distribuição Binomial, a distribuição Geométrica tem um
único parâmetro, p, que é a probabilidade de ocorrência do evento em qualquer
intervalo. A figura 4.13 ilustra sua função de probabilidades, quando p = 0,1
e m = 20.
A função de probabilidades acumuladas pode ser obtida pelo somatório de
P[j] com j variando de 1 a m. Ou seja:

m
j-1 m m
E
[d - P) p] = 1 - (1 - p) = 1 - q (4.40)

j=l

Note-se que o resultado é óbvio. A probabilidade de que a primeira cheia


ocorra antes ou durante o ano m é a probabilidade complementar ao evento
composto pela não oconrência de cheias durante esses m anos. Não tão óbvia é
a interpretação de que a probabilidade de que a primeira cheia ocorra em m
anos é igual à probabilidade de que ocorram cheias nestes m anos. Ela decorre
da comparação entre as equações 4.39 e os resultados do exemplo anterior.

Exemplo 4.16. Encontrar a probabilidade de que a próxima inundação em


Forquiíhinha, ocorra antes do décimo ano, inclusive.

Solução: trata-se de mera aplicação da função de probabilidades acumuladas de


não-excedência da distribuição geométrica:
P [ M s l O ] = 1 - (6/7)10 = 79, 6%.

Na distribuição Geométrica o valor esperado e a variança de M serão


dados por:
Elementos de Estatística e Probabilidades
125

E[M] = 1/p

2
VAR[M] = (1-p) / p (4.42)

Há uma interpretação interessante para o valor esperado de M. Ele é


estimado amostralmente pela média de m, ou seja, o número médio de anos até a
primeira cheia. Esta variável é chamada por Tempo de Retomo da Cheia (Tr). A
equação 4.41 indica que Tr = 1/p. Assim, o tempo de retomo da cheia 400 m3/s
em Forquilhinha é de 7 anos.
Pode-se também obter uma relação que deve ser guardada:

Tr[x] = 1/P [X * x] (4.43)

ou seja, o Tempo de Retomo de uma cheia x, Tr[x], é o recíproco de siia


probabilidade de excedência. Este resultado é derivado da seguinte análise :
ocorrerá cheia se a vazão for igual ou superior ao valor x estipulado,
resultando no evento [X £ x], A probabilidade de excedência P[X £ x] é igual
a p, cuja recíproca é o valor esperado de M, de acordo com a distribuição
geométrica e a equação 4.41. Note-se que quando se trata com séries de
valores mínimos, o evento de interesse será a ocorrência de valores iguais ou
menores que dado valo:. Desta forma, o Tr será a recíproca da probabilidade
de nao-excedência (equação 4.43).

Intervalo da primeira ocorrência

Figura 4.13. Distribuição Geométrica com p = 0,1 e m - 20.


126 Hidrologia

Exemplo 4.17. Qual a probabilidade de que uma cheia com tempo de retorno de
10 anos ocorra antes ou durante o décimo ano ?

Solução: esta é uma pergunta capciosa. Um hidrólogo iniciante menos atento


será tentado a responder: a probabilidade é 1, ou seja, certeza! A resposta
correta pode ser obtida com o uso da distribuição Geométrica. Se o tempo de
retomo è 10 anos a probabilidade p de ocorrer em qualquer ano é 1/Tr —0,10.
Logo:
P[M s 10] = 1 - (1 - 0,1)10 = 0,65 ou 65 % (valor muito diferente de 1)

Distribuição de Poisson

Suponha que haja interesse no número de ocorrências de um evento


independente e raro em um período de tempo longo, comparado com os intervalos
em que este período é dividido. Isto podería ser o caso da ocorrência de
chuvas intensas com duração de 5 minutos em um período de 50 anos, por
exemplo. Suponha que o interesse sejam chuvas intensas raras, por exemplo,
com tempo de retomo de 100 anos (ou probabilidade p = 0,01). Caso possa ser
aceito (o que é duvidoso) que o evento ocorrência de chuvas intensas, com
duração de 5 minutos, seja independente do que ocorreu nos intervalos
anteriores, este é um caso para aplicação da distribuição BinomiaL Como em
50 anos existem 5.259.600 intervalos de 5 minutos (considerando que o ano
médio tem 365,25 dias), o número dessas chuvas intensas de 5 minutos com Tr =
100 anos, em 50 anos, terá probabilidade de ocorrência dada por:

m m 5.259.600-m
PM = C 5.259.600 ° ’01 (1 - ° ’01>

Obviamente, esse cálculo pode ser feito mas será um tanto trabalhoso.
Para evitar isso, podem ser usados os conhecimentos sobre limites de uma
função. Como se trata com a ocorrência de um evento raro em um longo período
de tempo, pode-se supor que n tende a infinito ao mesmo tempo que p tende a
zero. Nesse caso, pode-se demonstrar que a distribuição Binomial tenderá a:
m -np
(np)
P[m] -
m!

O fator np é o valor esperado de m em um período com n intervalos de


tempo (veja momentos da distribuição Binomial) e será notado por X. Ou seja,
X pode ser estimado amostralmente como o número médio de ocorrências por
período. Logo:
Elementos de Estatística e Probabilidades 127

iXm e-X
P[m] = (4.44)
m!

que é a função de probabilidades simples da distribuição de Poisson.


Em essência, a distribuição de Poisson é a distribuição Binomial
adequada para eventos independentes e raros, ocorrendo em um período com
número praticamente infinito de intervalos.
Pode ser demonstrado que o valor esperado e a variança da distribuição
de Poisson são iguais a:

E[M] = X (4.45)

VAR[M] = X (4.46)

Verifica-se também aí a similaridade com a distribuição Binomial. Como


np a equação 4.45 é idêntica à 4.37. Como p é pequeno, q s l e 4.46 será
similar a 4.38.

Exemplo 4.18. Encontrar a probabilidade de que uma chuva intensa com duração
5 minutos e tempo de retomo 100 anos, não ocorra nos próximos 50 anos.

-X
Solução: isso pode ser obtido fazendo-se m = 0 na equação 4.44 : P[0] = e .
O parâmetro X é o número médio de ocorrências de chuvas com duração de 5
minutos e Tr= 100 anos no período de 50 anos. O número médio de ocorrências
em 1 ano é 1/Tr = 1/100. Em 50 anos será 50/100 e daí, X = 0,5. Substituindo
este valor na equação anterior:

P[0] = e’0r5 = 0,607 = 60,7 %

Também pode-se saber a probabilidade que uma cheia rara com tempo de
retomo Tr, não ocorra em Tr anos. Usando-se o mesmo raciocínio anterior:

P(0) = e'T[/ Tr = 1/e = 0,37 = 37 %

onde e = número de Neper (2,71...). Daí pode ser deduzido que o risco de
ocorrência de um evento raro com tempo de retomo Tr, em um período Tr, é a
probabilidade complementar do valor acima, ou seja 63%. Verifica-se que este
resultado é um pouco diferente do obtido na exemplo 4.17. A razão é que ele
se aplica a eventos raros. Caso o problema proposto em 4.17 seja refeito para
valores cada vez maiores de Tr será verificada a convergência para 63%.
128 Hidrologia

Exemplo 4.19. A literatura mostra que um procedimento industrial que dura 1


segundo e é seqüencialmente executado, resultou em 100 casos de poluição
hídrica acidental nos últimos 2 anos. Qual a probabilidade de que não ocorra
poluição deste tipo no próximo semestre?

Solução: inicialmente deve ser estimado o parâmetro X, Como ele é o valor


esperado de m, esta estimativa é a média das ocorrências (poluição hídrica).
Ou seja, 100 ocorrências em 2 anos equivalem a 50 por ano, em média. Como a
unidade que se está trabalhando é o semestre, e não o ano, o valor de X será
25, ou a média de ocorrências em um semestre.
Usando a distribuição de Poisson com m = 0 e X = 25, vem:

P[mj = e'25 = 1,3887944 x 10"“

Para efeito de comparação será computado o valor (exato) que seria dado
pela distribuição Binomial. A freqüência com que a poluição ocorreu por
segundo nos últimos 2 anos foi:

p = 100 / 63.115.200 ='1,5844 x !0'6

sendo o denominador o número de segundos em dois anos. Se a amostra for


representativa, este será também o valor da probabilidade de ocorrência cm
qualquer segundo. Como em um semestre existem 15.778.800 segundos, pela
distribuição binomial:

-6 15.778.800 -11
P[0] = (1 - 1,5844 x 10 ) = 1,3888687 x 10

A diferença dos resultados é, portanto, desprezível.

4.4.2 Distribuições contínuas

As variáveis aleatórias discretas em hidrologia são geralmente


relacionadas com o número de ocorrências ou de intervalos de tempo até a
ocorrência de um evento de interesse. Os exemplos anteriores mostraram a
natureza e importância do seu estudo. Mais comumente, porém, as variáveis são
contínuas. Este é o caso de vazões, chuva, temperatura, etc. O ajuste de
funções teóricas às distribuições amostrais de freqüência dessas variáveis
requer o conhecimento de modelos probabilísticos ou distribuições de
probabilidades teóricas que não são deduzidas tão naturalmente como nos casos
prévios.
A seguir serão inicialmente apresentadas distribuições que são derivadas
^Elementos de Estatística e Probabilidades 129

; de processos representados por variáveis discretas. A forma dessas


distribuições levou a utilizações em hidrologia. As distribuições são a
Exponencial, já comentada previamente nos exemplos 4.11 e 4.14, e a Gama.
Outras distribuições teóricas foram derivadas especificamente para ajuste de
variáveis aleatórias contínuas. Além dos aspectos morfológicos, existem
razões genéticas para seu uso em hidrologia. Elas são as distribuições
Normal, Log-Normal e as Assintóticas de Extremos.

Distribuição Exponencial

Na distribuição de Poisson o parâmetro X representa o valor esperado ou


número médio de ocorrências do evento raro no período considerado com n
intervalos de tempo. Seja a o número médio de ocorrências no intervalo de
tempo em que n é dado. Portanto, a - X / n c X = a.n. Suponha que o período n é
variável e sendo notado por t. Substituindo-se o valor de X na distribuição
de Poisson:

m
(a.t)
P[m] = (4.47)
m!

Suponha que se queira avaliar a probabilidade do número de unidades de


tempo até a primeira ocorrência do evento, como já foi feito com a
distribuição geométrica. Neste caso será usada a probabilidade cumulativa de
excedência:

P[T > t] = 1 - P[T * t] = P[Nãc-ocorrência em t] - P[0]


/ *cct
(a.t) e
Logo : P[0] = ------------
m!

sendo m = 0. Daí vem


FCP : P[T s t] = 1 - e 'a-t (4.48)

Essa é a função cumulativa de probabilidades da distribuição


exponencial. Derivando com respeito a t obtém-se a função densidade de
probabilidade como:

FDP : f[t] = a e_ca (4.49)

Note-se que não faz sentido valor negativo de t.


130 Hidrologia

A distribuição Exponencial é, portanto, a contrapartida para eventos


raros da distribuição Geométrica, assim como a distribuição de Poisson o é em
relação à distribuição Binomial. A importância da distribuição Exponencial
vem de que ela, assim como a de Poisson, é definida para valores contínuos de
t. Mais ainda, é verificado que a forma da distribuição exponencial aproxima-
se da forma da distribuição de frequências de certos eventos hidrológicos
como, por exemplo, as cheias máximas anuais.
Pode-se demonstrar que a média e variança da distribuição Exponencial
são dadas por:

E[T] = 1/a (4.50)

VAR[Tj = 1/a2 (4.51)

O leitor pode ver a analogia desses momentos com os da distribuição


Geométrica considerando que a = p e p = 0. Como a é o fluxo médio de
ocorrências por unidade de tempo t, 1/a é o tempo médio até a próxima
ocorrência, ou o tempo de retomo.

Exerr.plo 4.20. Se ocorrem 3 chuvas catastróficas com duração 1 hora em cada 10


anos qual é a probabilidade de que leve menos de 1 ano até a próxima?

Solução: se ocorrem 3 chuvas em 10 anos, o número médio anual é de 0,3. Esse


valor é uma estimativa de a caso a amostra seja representativa. Pela
distribuição exponencial vem P[T ^ 1] = 1 - e * = 0,26 ou 26%, que é a
probabilidade buscada.
Para uso com variáveis contínuas a distribuição Exponencial é
apresentada matematicamente como:

FDP : f[x] = a.e a x (4.52)

FCP : P[X s x] = <x.e'aT dx = 1 - e CLX (4.53)


,
T=0

A forma da distribuição exponencial pode ser vista na figura 4.14 para


diferentes valores de ot.

Exemplo 4.21,0 exemplo 4.14 apresentou o ajuste pelo métodos dos momentos da
distribuição Exponencial às vazões máximas anuais do rio Mãe Luzia em
Forquilhinha. A função cumulativa de probabilidades de excedência é P[X £ x]
Elementos de Estatística e Probabilidades 131

- e • Usando esta fórmula obtém-se que a maior vazão observada, 880


m3/s tem uma probabilidade de não-excedência de 0,0598 ou 5,98 %. A tabela
4.4 apresentou a estimativa como 2,86%. Como acontece com qualquer ajuste de
curva a pontos, não deve ser esperada uma aderência total! A probabilidade de
ocorrerem vazões iguais ou superiores a 1500 m3/s é estimada como 0,0082 ou
0,82 %, menos de 1 %. Ou seja, agora é possível realizar-se as extrapolações
que não eram confiáveis, quando não havia sido ajustada uma curva aos dados.

Figura 4.14. Distribuição Exponencial

r, i a „ 1 , Tr , - 0,0032.X Tr , 0,0032.x
Pela equação 4.43, 1 / Tr[x] = e e Tr[x] = e , onde
Tr[x] é o tempo de retomo de x. Explicitando x nesta equação vem: x =
Ln{Tr[x])/0,0032. Essa fórmula permite a estimativa de x para diversos tempos
de retomo. Por exemplo, Tr[720] = lOanos, Tr[1222] = 50anos, Tr[1439] =100
anos. O tempo de retomo para a vazão máxima observada, 880 m3/s, é estimado
como 1/0,0598 a 17 anos. A figura 4.15 apresenta o ajuste da distribuição aos
pontos que representam o histograma de freqüências acumuladas de não-
excedências, da tabela 4.4. Nota-se que o ajuste é de má qualidade.
132 Hidrologia

Distribuição Gama

Caso haja interesse em avaliar-se a probabilidade do tempo até o v-ésimo


evento que se distribua de acordo com Poisson, pode ser demonstrado que a
seguinte função densidade de probabilidades, denominada Gama, será obtida :

u 1 e'a,t
FDP : f[t] = a . (a.t) * ---------- (4.54)
(v - 1)1

onde t £ 0 e u £ 1. Pode ser notado que a distribuição Exponencial é um caso


singular da Gama no qual u = 1.
O valor esperado e variança para a distribuição Gama podem ser
calèulados como:

E[T] = v/ a (4.55)
VAR[T] = v/ a (4.56)

A distribuição Gama tem grande aplicação em hidrologia, devido a


aspectos de natureza morfológica unicamente. Nesse caso, o valor de v poderá
ser não inteiro e o fatorial do denominador da equação 4.54 deve ser
computado pela função Gama, que dá seu nome à distribuição :

Figura 4.15. Ajuste das vazões máximas anuais em Forquilhinha à distribuição


exponencial.
Elementos de Estatística e Probabilidades 133

00
w . í t)-l -X ,
r(*ü) = x ,e .dx (4.57)
0

Ela tem a propriedade de que T (v) = (u - 1) ! se v for um inteiro


positivo. Para v não inteiro, ela é tabelada nos manuais de matemática
avançada. Uma aproximação numérica é dada por :

1 1 139
r(u+l) = V l.n .v . x>°. e"y ( 1 + ---- + ) (4.58)
12u 288u2 51840u3

Uma melhor aproximação pode ser obtida pela equação :


rcu) = l+c1.(-u-l)+c2.(u-l)2fc3.(-u-l)3+c4.(u-l)4+c5.(v)-l)5 (4.59)

para l s \ ) í 2 n a qual Cj = -0,5748646, c2 = 0,9512363, c3 = -0,6998588, c4 =


0,4245549, c5 - -0,1010678, Para valores de u fora da faixa de validade da
equação pode-se aplicar a seguinte propriedade da função Gama, válida para u
> j

T(x>) = (u-l).(u-2)...(u-r)r(u-r-l) (4.60)

Em geral, a primeira equação pode ser usada quando se deseja unicamente


uma estimativa isolada de F(v). Quando o objetivo é estimar uma função de
várias estimativas de r(v), como será visto na distribuição de Weibuli, é
aconselhável adotar-se a segunda equação, por ter maior precisão.
A função densidade de probabilidades da distribuição Gama fica :

u-i -CLt
a.(a.t) e
FDP : f[t] = (4.61)
nü)

Mais comumente a distribuição Gama é apresentada sob a seguinte


estrutura matemática, onde x substitui t e 1/p substitui a :

1 u-l -x/p
FDP : f[x] = .x .e (4.62)
f . nv)

Neste caso, os dois primeiros momentos centrais passam a ser:


134 Hidrologia

E[X] = x> . (3 (4.63)

VAR[X] = -o . p2 (4.64)

O momento central de ordem 3, ou coeficiente de assimetria populacional,


da distribuição Gama, A[X], é :

A[X] = 2 / t)1''2 (4.65)

Substituindo E[X] e VAR[X] pelas estimativas amostrais x e s2, encontra-


se pelo método dos momentos para estimativa dos parâmetros (3 e u :

P = s2/ x (4.66)

t» = x2/ s2 (4.67)

A Figura 4.16 apresenta formas da distribuição Gama avaliadas com


parâmetros u iguais a 2 e 3 e diferentes valores de p. Verifica-se que ela
tem uma maior flexibilidade do que a Exponencial devido ao segundo parâmetro,
permitindo que assuma diferentes formas, além da forma Exponencial, quando v
= 1.

VARIÁVEL ALEATÓRIA X

Figura 4.16* Distribuição Gama


Elementos de Estatística e Probabilidades 135

Exemplo 4.22, A média e o desvio padrão das séries de vazões máximas anuais
do rio Mãe Luzia em Forquilhinha são, respectivamente, 311,27 e 169,7. Pelo
método dos momentos são obtidas as seguintes estimativas dos parâmetros : (3 =
92,5 e v = 3,36. Esses valores paramétricos definem a distribuição Gama a ser
ajustada com base no método dos momentos como :

f[x] = [!32^ H3.36)]-1. x2-36. e~x/92’3

A função cumulativa de probabilidades da distribuição Gama é dada por


uma integral que não tem solução analítica. Para obter-se as probabilidades
das vazões excederem ou não determinado valor, ou estimar as vazões para dado
tempo de retomo, deve-se realizar uma integração numérica. Uma planilha de
cálculo pode realizar facilmente esta integração. A tabela 4.6 mostra os
resultados em que as vazões em Forquilhinha foram representadas em intervalos
de 10 m3/s na coluna 1. A coluna 2 apresenta as respectivas densidades de
probabilidades, calculadas pela equação acima. A coluna 3 calcula a área
sobre a função densidade de probabilidades entre cada par de valores da
xi+i
r
coluna 1, como f(x).dx (xi+1 * xj).[f(xj) + f(xi+1)]/2. A coluna 4

acumula os valores da coluna 3, encontrando numericamente P[X ^ x] =


X
f
f(x).dx. A coluna 5, Fmalmente, calcula os tempos de retomo como Tr = 1 /
0
(1 - P[X * x]J. Considerando os valores desta última coluna obteve-se :
Tr[540] = 10 anos, Tr[750] = 50 anos, Tr[835] = 100 anos. O tempo de re*omo
para a vazão máxima observada, 880 nP/s é estimado como 144 anos. A figura
4.17 coresenta o ajuste, verificando-se uma melhoria substancial em relação
ao obtido com a Exponencial.
A versão da distribuição Gama com 3 parâmetros é obtida por :

FDP : f[x] = 1 r - n)
-------.(x .e (x ‘
u ^ -V (4.68)
P . T(v)

onde : (3, v e |i são parâmetros, e r(u ) é a função Gama.


Apenas o momento de primeira ordem, ou seja, o valor esperado, é
alterado neste caso passando a:

E[X] = \i + u.p (4.69)


136 Hidrologia

A estimativa de seus parâmetros pelo método dos momento é dada pelas


equações:

V = 4/a, (4.70)

P = as.s/2 (4.71)

jj, = x - 2.s/a5 (4.72)

sendo x, s e a média, desvio padrão e coeficiente de assimetria da


amostra.

Tabela 4.6 Planilha de cálculo para integração numérica da função


cumulativa de probabilidades Gama.

Vazões
f(x) J f(x) Tr
1! w ^
^

(m3/s) xi (anos)
!

0 0 0 0 1,0
50 0.000515 0,012897 0,012897 1,0
100 0,001542 0,051461 0,012897 u
150 0,002339 0,097043 0,161402 u
200 0,002686 0,125638 0,287040 1.4
250 0,002649 0,133389 0,420430 1.7
300 0,002372 0,125546 0,545977 2,2
350 0,001988 0,109022 0,654999 2,9
400 0,001587 0,089381 0,744381 3,9
450 0,001220 0,070188 0,814569 5,4
500 0,000911 0,053301 0,867871 7,6
550 0,000664 0,039409 0,907281 10,8
600 0,000475 0,028508 0,935789 15,6
650 0,000334 0,020250 0,956039 22,7
700 0,000232 0,014164 0,970204 33,6
750 0,000159 0,009778 0,979983 49,9
800 0,000107 0,006673 0,986657 74,9
850 0,000072 0,004509 0,991167 113,2
900 0,000048 0,003020 0,994187 172,0
950 0,000031 0,002007 0,996195 262,8
1000 0,000021 0,001325 0,997520 403,3
Elementos de Estatística e Probabilidades 137

Exemplo 4.23. A estimativa dos parâmetros da distribuição Gama com 3


parâmetros pelo método dos momentos para as vazões máximas anuais em
Forquilhinha resulta na seguinte função densidade de probabilidades :

f[x] = [135,81-56 rd.56)]-1. (x - 119,l)0-56. e‘(X ' 119'1)/l35’8

A integração numérica permite obter : Tr[570] = 10 anos, T [894] = 50


anos, Tr[1250] = 100 anos. O tempo de retomo para a vazão máxima observada,
880 m3/s é estimado como 48 anos. A figura 4.18 apresenta o ajuste. Nota-se
que, em relação à versão com 2 parâmetros, ocorre uma melhor aderência aos
valores entre 200 e 300 m3/s, prejudicando o ajuste aos 5 menores valores da
amostra. Para os valores máximos há uma pequena melhoria visual, embora
numericamente note-se grandes diferenças nas estimativas.

Distribuição Normal

Seja uma variável aleatória x formada pela soma de n variáveis


aleatórias Wj, i = Os valores esperados e varianças das variáveis W
são conhecidos e, portanto, é possível calcular-se o valor esperado e a
variança da variável x. Caso o número n de variáveis seja grande e elas
cumpram certas condições adiante especificadas, obtém-se com relação à
distribuição de x:

-0,5
1
FDP : f[x] = ------ e (4.73)
oV(2k)

onde: e a são os parâmetros.


As variáveis Wj poderão altemativamente cumprir uma das seguintes
condições: a) Wj são variáveis independentes e identicamente distribuídas; b)
Wj são variáveis independentes, mas não identicamente distribuídas, desde que
nenhuma delas seja dominante; c-Wj não são independentes mas se correlacionam
com poucas variáveis deste conjunto, e a segunda condição ocorre.
As vazões médias anuais podem ser vistas como a soma de 365 (ou 366)
valores de vazões médias diárias. Embora 365 possa ser considerado um grande
número, existe um problema relacionado com a grande autocorrelação que é
notada entre os valores das vazões médias diárias. Diante disto, observa-se
que há uma tendência das vazões médias anuais de pequenas bacias, com
138 Hidrologia

pequenos aqüíferos subterrâneos, se ajustarem melhor à distribuição Normal do


que as vazões médias anuais de grandes bacias com grande capacidade de
armazenamento no aqüífero. A razão é que no primeiro caso a autocorrelação
das vazões médias diárias são menores do que no segundo, devido à menor
capacidade de regularização do aqüífero e da própria bacia. As precipitações
totais anuais, por sua vez, costumam-se ajustar adequadamente à distribuição
Normal devido à baixa autocorrelação das precipitações totais diárias.
Pode ser demonstrado que os parâmetros da distribuição Normal são :

E[X] = ji (4.74)
VAR[X] = a (4.75)

ou seja, o valor esperado e a variança. O coeficiente de assimetria


populacional tem valor zero. As formas assumidas pela distribuição Normal
foram apresentadas na figura 4.11.
Definindo uma variável y = (x - |i)/a pode ser verificado que ela terá
média 0 e desvio padrão 1. Logo, se ela distribuir-se segundo a Normal :

1 -0^-y2
FDP : f[y] = e (4.76)
V2k

que é a chamada distribuição Normal ladrão e y a variável padronizada. A


vantagem do estudo desta distribuição é que qualquer distribuição Normal pode
ser reduzida a ela, se for efetuada a transformação indicada. A função
cumulativa de probabilidades de não-excedência relacionada com f(y) é dada
por:

FCP : F[Y s y ] a ------ e d? (4.77)


T=o v/(2rc

Esta integral não tem solução analítica. Para seu cálculo pode ser usada
uma aproximação numérica dada por :

F[Y —y] — 1 " f(y). (a].q + a^q2 + a3.q3) (4.78)

onde q = (1 + a^y)'!, y são os valores da variável padronizada e os


coeficientes assumem os seguintes valores : aQ = 0,33267; a! = 0,43618; aj =
-0,12017; 33 = 0,93730
Elementos de Estatística e Probabilidades 139

Varões máximos anuais (m3/s)

Figura 4.17. Ajuste da distribuição Gama com 2 parâmetros ás vazões máximas


anuais do rio Mãe Luzia em Forquilhinha

Vazões maximas anuais ( m3/s)

Figura 4.18. Ajuste da distribuição Gama com 3 parâmetros às vazões máximas


anuais do rio Mie Luzia em Forquilhinha
140 Hidrologia

A tabela 4.7 apresenta alguns valores de y, f(y), P[Y s y] e Tr = 1 /


P[Y £ y] com interesse prático. Nos textos mais avançados são apresentadas
tabelas mais completas.

Tabela 4.7/ Valores da distribuição Normal Padrão

y f(y) F[Y s y] Tr
(anos)
1,2816 0,17585 0,90 10
1,6449 0,10226 0,95 20
2,0537 0,04879 0,98 50
2,3263 0,02705 0,99 100
2,5758 0,1431 0,995 200
2,8782 0,00631 0,998 500
3,0902 0,00337 0,999 1000

Exemplo 4.24. A média e o desvio padrão da amostra de vazões máximas anuais


em Forquilhirtha estabelecem as estimativas dos dois parâmetros da
distribuição Normal. A figura 4.19 apresenta este ajuste de má qualidade.
Nota-se que o ajuste é pior do que aquele obtido pelas distribuições Gama.
Explica-se isto por ser a distribuição Normal simétrica, enquanto a amostra
apresenta assimetria positiva de 1,9. A variável y, correspondente às vazões
máximas, é encontrada por y - (x -311,27)/169,7. Portanto, x = 311^27+169,7.y.
Buscando na tabela 4.7 os valores de y, correspondentes aos tempos de retomo
de interesse, obtém-se Tr[529] = 10 anos, Tr[660] = 50 anos e Tr[706] = 100.
A vazão máxima observada, 880 m3/s, tem um valor y = (880 - 311,27)/169,7 =
3,351. Nas tabelas da distribuição Normal encontra-se para este valor um
tempo de retomo igual a 2460 anos.
Uma das propriedades interessantes da distribuição Normal é a
reprodutibilidade. A soma de variáveis aleatórias com distribuição Normal é
Normalmente distribuída.
O uso da distribuição Normal em hidrologia é bastante generalizado. De
forma direta ela é aplicada para ajustar valores anuais, particularmente de
precipitações. Mais comumente ela é adotada no ajuste de valores
transformados de variáveis. Por exemplo, variáveis que não se distribuam
Normal podem ter seus logaritmos assim distribuídos. Existem outras
transformações Normalizantes que serão estudadas em detalhes adiante. Um
teste simplificado para verificar se a distribuição amostrai de uma variável
aleatória pode ser aceita como Normal é baseado no valor de seu coeficiente
de assimetria. Caso ele seja próximo a zero, verifica-se que freqüentemente a
distribuição Normal pode ser usada para ajuste.
Elementos de Estatística e Probabilidades 141

Figura 4.19. Ajuste da distribuição Normal às vazões máximas anuais do rio


Mãe Luzia em Forquilhinha

Distribuição Log-Normal

Suponha que um processo hidrológico possa ser representado de forma


aproximada pela seguinte função:

Yl+1 = o, . Y, + jJj . Z, . Yt = [a, + P, . Z,] . Yt

ou seja, os valores sucessivos da variável são dados pelo valor que assumiu
previamente, somado ao produto deste valor por outra variável aleatória
sendo ambas parcelas modificadas por parâmetros e pt específicos para o
fenômeno e para o instante considerado. Este pode ser visto como o caso das
vazões médias diárias em uma bacia. A vazão de determinado dia seria composta
por uma fração do valor anterior, como conseqüência da persistência promovida
pelo armazenamento no aqüífero e na bacia. Uma outra parte seria originada de
um efeito externo, chuva por exemplo, que multiplicaria o mesmo valor
anterior, de forma que a resultante fosse tanto maior quanto maior fosse a
vazão anterior, e por isso, o estado de umidade da bacia. Esse modelo, embora
simplicado, poderá apresentar resultados aproximados.
Verifícando-se que a variável Yt, à direita da igualdade anterior, pode
também ser desenvolvida da mesma forma, e assim por diante, a seguinte
142 Hidrologia

expressão resultaria:

Y t+i = [ct, + P, . Z , ] . ^ + P u . Z ,.,] . Y t_,

Notando-se o termo entre colchetes por Wt e desenvolvendo-se


sucessivamente a equação resultará:

Yt = Wt . Wu ... W j . W0 . Y0

ou seja, a variável Yt é dada como o produto de diversas outras variáveis


aleatórias, onde o instante zero pode ser tão longe no passado quanto se
queira.
Tomando-se logaritmos de ambos os lados da expressão:

log[Yt] = log[Wt] + ... + log[Wo] + log[Yo]

Ou seja, o logaritmo de Yt é a soma dos logaritmos de um grande número


de variáveis aleatórias Wt com o logaritmo de Y0. Caso o logaritmo destas
variáveis atendam às condições citadas para as variáveis Wt no item da
distribuição Normal, o logaritmo de Yt se distribuirá Normalmente.
Estas considerações explicam porque a transformação logarítmica tem sido
tão bem-sucedida em hidrologia. Sua função densidade de probabilidade é dada
por:

r Ln(x) - ^ 2
1 -04.
FDP : P[x] = ---------- e n j com x i 0 (4.79)
x.an.V^i

sendo jin e Gn os seus parâmetros, calculados como :2

M-n = E p y = E[Ln(X)] (4.80)

a l = VARfXj,] = VAR[Ln(X)] (4.81)

2
ou seja, é o valor esperado dos logaritmos de X e Gn a variança destes
logaritmos, sendo X a variável observada. As relações entre o valor esperado
|i e a variança o da variável X e os parâmetros da distribuição acima
referenciados são :
Elementos de Estatística e Probabilidades 143

E[X] = ji = e (4.82)

2 r a
VAR[X] = a2 = n'.[ewn - 1] (4.83)

Seu coeficiente de variação, dado por fVAR[X]/E[X], será:


2
a r ün 1/2
r| = — = [e 1] (4.84)

O momento central de ordem 3, ou assimetria populacional, da


distribuição de X é dado como função do coeficiente de variação por :

A[X] = y = ri3 + 3 . ti (4.85)

Freqüentemente é desejável expressar os parâmetros e a n da


distribuição Log-Normal como função do valor esperado e da variança de X.
Combinando as equações acima :

1 n
- Ln (— ) - Ln (— ) = Ln(a / q) - 0^JLn(q2 + 1) (4.86)
2 2 t 2 2 2
q +1 \x +a
2 2
u + a
a l = Ln (Tf + 1) = Ln (----------- ) (4.87)

A figura 4.20 apresenta diversas formas da distribuição Log-Normal, para


diferentes valores de seus parâmetros, mostrando sua grande flexibilidade.
Essas distribuições se ajustarão exatamente à Normal, com parâmetros e a n,
ao terem o valor da variável X transformado por logaritmos.

Exemplo 4.25. Para determinar |in e an podem ser usadas duas alternativas de
método dos momentos : a) estimar os parâmetros n e o a partir dos dados
originais e usar as equações 4.86 e 4.87 para determinar e a n; b)
determinar jin e an diretamente dos logaritmos de X. Pela primeira
alternativa, que é a mais direta, na medida em que já se tenha calculado as
estatísticas da amostra original, obtém-se para as vazões máximas anuais em
Forquilhinha, fazendo-se ji e a iguais a suas estimativas amostrais:
144 Hidrologia

* 1 \l l 311 274
P*» = - La (----- ) = - Ln(---------------------) = 5,61
2 p a2 2 311,272+169,72

2 2
A
on 2 -= Ln
T .(-----------
^ + a )^ = tLn(------!---------
/ 311,27 +169,7 -— ), = 0,26
rt ^ e
311,272

= 041

T] = 041/5,61 = 0,091
Coef. assimetria = r|3 - 3.r| = -0,27

Para adotar a segunda opção, apresenta-se na tabela 4.8 os valores das


vazões máximas anuais em Forquilhinha, com suas transformações logarítmicas.
As estatísticas e estimativas dos parâmetros da distribuição Normal, que
ajustará os dados transformados, são :

Média : 5,605 = (L
Desvio Padrão : 0,541 = â
Assimetria : -0,354
Elementos de Estatística e Probabilidades

A diferença entre os dois resultados pode ser explicada pelo fato da


distribuição da amostra não ser exatamente Log-Normal. Adotando os resultados
da primeira opção de estimativa, a distribuição Log-Normal com 2 parâmetros
ajustada fica :

2
f Ln(x) - 5,61 -
-0,5.
FDP : f[x] = e V 0,51
x.o^í V2n

A figura 4.21 apresenta o ajuste obtido. O valor da variável padronizada


y será calculado como y = (Ln(x) - 5,61) / 0,51 ou Ln(x) = 5,61 + 0,51 . y.
Utilizando-se os valores teóricos da Tabela 4.7 calcula-se : Tr[525] - 10
anos, Tr[778] = 50 anos, Tr[894] = 100 anos. O tempo de retomo para a vazão
máxima observada, 880 m3/s é estimado como 92 anos.
Assim como no caso da distribuição Gama, a distribuição Log-Normal pode
ter uma versão com 3 parâmetros. Neste caso ela tem como função densidade de
probabilidades a equação :

2
f Ln(x-P) - m,
-0,5.
FDP : ítx] = ------- — — ■ e V* an com x s p (4.88)
(x-(3).on.i/2rê

sendo ^ a n e {3 seus parâmetros.


Analogamente à versão com 2 parâmetros, ^ e a 3 são o valor esperado e a
variança da variável X^ = Ln[X - j3]. A relação entre E[X] e os parâmetros é :

Vn+oxal
E[X] - M- = P + e (4.89)

Os momentos centrais não são afetados pela translação acima. Portanto,


continua válida a equação 4.83 e 4.85 para os momentos centrais de 2Ã e 3-
ordem. A estimativa de ^ e a n apresenta problemas quando não se conhece
antecipadamente (3. Para estimativa pelo método dos momentos desse parâmetro (3
deve-se considerar as seguintes relações;
a) ri = a/ja, que é o coeficiente de variação da variável original X, sem
transformação;
b) r)y = a y/Py, que é o coeficiente de variação da variável Y = X - P; note-se
que Oy - ct já que a subtração de um valor de X não altera sua variança;
146 Probabilidades de excedências (%) Hidrologia

Vazões ma'ximas anuais (m3/s)

Figura 4.21, Ajuste da distribuição Log-Normal com 2 parâmetros às vazões


máximas anuais do rio Mae Luzia em Forquilhinha

Tabela 4.8 Valores máximos anuais de vazões no rio Mãe Luzia


em Forquilhinha, em m3/s.
Ano Vazões Logaritmos Ano Vazões Logaritmos
(m3/s) naturais (m3/s) naturais
1943 92,5 4427 1961 360 5,886
1944 228.6 5,432 1962 340 5,829
1945 72,5 4,284 1963 480 6,174
1946 180 5,193 1964 290 5,670
1947 180 5,193 1965 216 5,375
1948 350 5,858 1966 390 5,966
1949 116,8 4,764 1967 376 5,929
1950 216 5475 1976 252 5429
1951 330 5,799 1977 280 5,635
1952 24 U 5,486 1978 470 6,153
1953 300 5,704 1979 773 6,650
1954 380 5,940 1980 880 6,780
1955 261 5464 1981 545 6,300
1956 248 5413 1982 117 4,762
1957 2564 5447 1983 265 5480
1958 380 5,940 1984 121 4,796
1959 221,4 5,400 1985 315 5,752
1960 370 5,913
Elementos de Estatística e Probabilidades 147

c) [iy - n - (3, que é a média de Y = X - p. Explicitando o valor de <T na


primeira relação e substituindo-o na segunda, obtém-se : T)y = r\ . \i / \Xy.
Explicitando-se \Xy nesta expressão e substituindo seu valor na terceira
relação, pode-se obter o valor de j3 como :

(3 = p .(1 - x]/ n ) = M- - <*/ny (4.90)

sendo que o termo após a segunda igualdade vem da observação da relação a. O


valor de r\ pode ser estimado diretamente da amostra. Como o segundo e o
terceiro momento central de Y = X -(3 não contêm termos em j3, o valor de t]
pode ser calculado da relação :
d) y = r|y -f 3.r|y, que é a expressão da assimetria de X ou de Y ~ X - (3 em
função do coeficiente de variação de Y, de acordo com a equação 4.85. A
quarta relação pode ser resolvida para obtenção de r\ , através da solução da
y
equação cúbica cuja raiz é :

(4.91)

2 0 5.
na qual <f> = [-y + (y + 4) ' J / 2

O procedimento de estimativa dos parâmetros se desenvolve nas seguintes


etapas:

Etapa 1: compute a média, desvio padrão e coeficiente de assimetria amostrai


da variável observada X, igualando-os a |i, o e y,

Etapa 2: compute q das estimativas anteriores e r)y da equação 4.91;

Etapa 3: compute f3 da equação 4.90;

Etapa 4: compute e cjn pelas equações 4.86 e 4.87, que no caso presente são
mais facilmente processadas na seguinte forma :

(i = Ln(a / rj ) - 0,5.Ln(rf + 1) (4.92)


TI y y

2 , , 2 (4.93)
crn = Ln (T|y + I)
148 Hidrologia

Exemplo 4.26. Para as vazões máximas em Forquilhinha as estimativas são :


tj> = 0,4806, r\y = 0,493 o que resulta em |3 = -32.73, a n = 0,467 e = 5,73.
A figura 4.22 apresenta o ajuste que não tem, visual ou numericamente,
diferença significativa para a versão biparamétrica. A variável padronizada y
é dada por y = [Ln(x-p) - p.]/a ou Ln(x-|3) = \x + a.y e, finalmente,

5,73 + 0,467 . y
x = e 32,73.

Usando os valores de y da tabela 4,7 obtém-se : Tr[528] = 10 anos,


. Tr[771] = 50 anos e Tr[880] = 100 anos.

Figura 4.22. Ajuste da distribuição Log-Normal com 3 parâmetros às vazões


máximas anuais do rio Mãe Luzia em Forquilhinha

Distribuições Assintóticas dos Extremos

Seja a série de variáveis aleatórias Yt formada pelos valores máximos


retirados um de cada série de variáveis aleatórias X = {XlvX2v*»Xn). Isso
seria ilustrado pela série de valores máximos anuais de vazões médias diárias
Elementos de Estatística e Probabilidades 149

em n anos. Existirão n séries, uma para cada ano, cada qual com 365 (ou 366)
valores X (vazões médias ou instantâneas diárias), das quais obtêm-se o maior
para formar a série Yt.
A função cumulativa de probabilidades de Yt será dada por:

P[Y ^ y] = P[todos n valores de X sejam ^ y]

Se for possível supor-se que os valores de X são independentes, vem :

P[Y*y] = P[X1sy]nP[X2sy]a.y^P[Xnáy] = P [X ^y].P [X ^y]...... ? [X ^y]

Caso possa ser também aceito que os valores da série X são identicamente
distribuídos:

P[Y =£ y] = P0 [Xi * y]

Busca-se derivar a distribuição para a qual P[Y s y] tende, quando n


tende a infinito. Daí vem o nome de distribuição assintòtica de extremos.

Entre as 3 soluções existentes 2 são de interesse para a hidrologia,


resultando nas distribuições Assintóticas de Extremos do tipo I e III. Em
cada caso, algumas suposições adicionais são realizadas para a série X e sua
distribuição.

Distribuição Assintóiica dos Extremos do tipo I para série de máximos ou


distribuição de Gumbel

As suposições adicionais são:

a) X é ilimitada apenas na direção positiva;


b) a parte superior da distribuição de X, ou seja, a parte que trata dos
valores máximos menos freqüentes, é do tipo exponencial. Distribuições do
tipo exponencial são: Exponencial, Gama, Normal e Log-Normal, ou seja, todas
distribuições teõricas contínuas estudadas até aqui.

Como resultado é obtida a seguinte função cumulativa de probabilidades:

-CL(y - li)
FCP : P[Y í y] = e'5 (4-94)

que tem como função densidade de probabilidade:


150 Hidrologia

FDP : f[y] = o e (4.95)

onde: a e |i são os parâmetros da distribuição. O parâmetro a é de escala e o


parâmetro p, de locação.
Esta distribuição é usualmente denominada distribuição de Gumbel. Outras
denominações desta distribuição são: Dupla Exponencial e Fisher-Tippet do
tipo L Fazendo a = 1 e \i = 0 obtém-se a chamada forma reduzida, na qual
-z
FCP: P[Z 5 z] = e 6 . Esta distribuição reduzida é ilustrada na Figura 4.23.
Ela tem grande aplicação em hidrologia no ajuste de chuvas e vazões máximas.

0 2 3 4 5 6 7 8 9
-4 -3 -2 -1 O

VARI ÁV E L A LE A T Ó R I A Y

Figura 4.23. Distribuição de Gumbel

Os dois primeiros momentos da distribuição de Gumbel, que deverão ser


usados para estimativas dos parâmetros a e [i, são:

E[Y] = n + 0,577 / a (4.96)

(4.97)

O momento central de ordem 3, ou assimetria populacional, é constante e


Elementos de Estatística e Probabilidades 151

igual a:

A[Y] = 1,1396_

O ajuste dos parâmetros pelo método dos momentos é realizado pelas


solução do sistema de equações obtido pela substituição de E[Y] e VAR[Y] p o r
- 2
suas estimativas amostrais x e s . Como resultado obtém-se :
a = 1,2826 / s (4.98)

(L= x - 0.451.S (4.99)

Exemplo 4.27. Aplicando-se as fórmulas acima para as vazões máximas anuais de


Forquilhinha obtém-se : a = 1,2826 / 169,7 = 0,00756 e £ = 311,27 - 0,451 .
169,7 = 234,7 e a seguinte função cumulativa dc probabilidades de não-
excedências :

0,00756.(y - 234,7)
FCP : P [ Y í y ] = e

Recuperando que Tr = 1/(1 - P[Y ^ y] j e manipulando-se a equação acima


obtém-se: y = 234,7 - (1/0,00756). Ln[-Ln(l - 1/Tr)] que permite a obtenção
dos valo- ' íj de v a m á x i m a em função dos tempos de retomo : Tr[533] = 10
anos, Tr[752] = 50 anos e Tr[84S] = 100 anos. A figura 4.24 ilustra este
ajuste.

Distribuição Assiniótíca dos Extremos do tipo I para série de mínimos

E n relação à distribuição para máximos, ela apresenta a diferença de que


a parte inferior da distribuição de X, ou seja, a parte que trata dos valores
mínimos menos frequentes, é do tipo exponencial.
Como resultado é obtida a seguinte função cumulativa de probabilidades:

a.(y - p)
FCP : P [ Y i y ] = e (4.100)
A forma dessa distribuição dos mínimos é a imagem de espelho da forma
dos máximos. Ela tem como função densidade de probabilidades :

FDP : f[y] = a e (4.101)


152 Hidrologia

onde a e |i são os parâmetros da distribuição.


Os três primeiros momentos desta distribuição são :

E[Y] = \i - 0,577 / a (4.102)

VAR[Y] = n / (6 a 2) = 1,645 / a (4.103)


A[Y] = - 1,1396...

Figura 4.24. Ajuste da distribuição de Gumbel às vazões máximas anuais do


rio Mãe Luzia em Forquilhinha

O ajuste dos parâmetros pelo método dos momentos é realizado pela


solução do sistema de equações obtido pela substituição de E[Y] e VAR[Y] por
— 2
suas estimativas amostrais x e s . Como resultado obtém-se :
a = 1,2826 / s (4.104)

(L = x + 0,45 l.s (4.105)

Exemplo 4.2S. A tabela 4.9 lista os valores mínimos de vazões médias nos 7
dias consecutivos de estiagem mais severa em cada ano do período de 1932 a
Elementos de Estatística e Probabilidades 153

1979, no rio Almada em Itajuípe, Bahia. Os valores amostrais da média e


desvio padrão são 0,995 e 0,649 m3/s, resultando na estimativa de momentos de
U 9 e 1,98 para os parâmetros \i e a, respectivamente. As probabilidades de
não-excedência dos valores amostrais foram estimadas por m/n, sendo m a ordem
na série organizada do menor (m = 1) para o maior valor (m = 45), e n o
tamanho da amostra, 45. A figura 4.25 apresenta o gráfico da função
cumulativa de freqüência - de não-excedência amostrai e da distribuição
ajustada. Verifica-se que os três valores mais altos da amostra forçaram uma
aderência de má qualidade, o que é paradoxal por serem valores situados na
faixa de menor interesse. Eliminando-os da amostra, obteve-se novos valores
amostrais para a média e desvio padrão como 0,878 e 0,477 m3/s e uma
estimativa de \i e a como 1,09 e 2,69. O novo ajuste, mostrado na mesma
figura, é mais satisfatório. Esse exemplo demonstrou uma das inconsistências
dos métodos de ajuste na forma da vulnerabilidade à influência de valorcs
isolados, prejudicando a aderência na parte de maior interesse, como neste
caso, que é o de valores extremos mínimos. Pode-se concluir que a
visualização das condições de ajuste é essencial para a aceitação da
distribuição teórica.
A função cumulativa de probabilidades fica :

P[Y - y] = 1 - e2’69^ - 1’095

Aplicando manipulação análoga ao do exemplo anterior obtém-se : y = 1,09


+ (1/2,69) . Ln[-Ln(l - 1/Tr)], e Tr[0,25] = 10 anos, Tr[0] - 20 anos.

Tabela 4.9. Vazões mínimas de 7 dias no rio Almada em Itajuípe, BA.


Ordem Vazões Ordem Vazões Ordem Vazões Ordem Vazões
(m3/s) (m3/s) (m3/s) (m3/s)
1 0,0 12 0,57 23 0,95 34 1,34
2 0,0 13 0,57 24 0,96 35 1,36
3 0,027 14 0,57 25 1,02 36 1,4
4 0,12 15 0,64 26 1,1 37 1,43
5 0,12 16 0,77 27 1,11 38 1,46
6 0,14 17 0,77 28 1,19 39 1,47
1 0,37 18 0,81 29 UI 40 U l
8 0,44 19 0,89 30 U6 41 U6
9 0,46 20 0,91 31 U6 42 U9
10 0,5 21 0,92 32 U9 43 2,18
11 0,53 22 0,95 33 1,33 44 2,56
45 3,18
154 Hidrologia

Distribuição de Weibull

Para esta distribuição ser derivada parte-se da distribuição Assintótica


dos Extremos do tipo III para valores máximos. Em relação à distribuição
assintótica dos extremos do tipo I para máximos, as suposições adicionais
são:

a) X é limitado superiormente ao valor <f>;


X
b) a distribuição de X é do tipo P[X =s x] = 1 - c(<J> - x) com X > 0.
Como resultado obtém-se para as funções cumulativa e de densidade de
probabilidades:

- [0t> - y)/0t> - n)]


FCP : P[Y < y] = e (4.106)

FDP : P[y] = [V(4> - H)].[(<|> - y) / (4> - ^ j ^ P C Y s y)] (4.107)

Essa distribuição, na versão apresentada, não é usualmente aplicada em


hidrologia, possivelmente por sua limitação superior Uma transformação pode
ser introduzida resultando na distribuição denominada Weibull, que encontrou
aplicação no ajuste de séries de mínimos. A transformação mencionada consiste
em trabalhar com o negativo da variável Y. Ou seja, trabalhar com uma
variável Z tal que: Z = - Y. Ao maximizar-se valores negativos de uma série
se estará obtendo como extremo o valor mínimo, já que o maior valor de uma
série negativa é o menor em valor absoluto. A razão para fazer-se isso é que
sendo Y definida para valores menores que <(>, Z será defmida para valores
maiores que -(j). Fazendo y = ~<j>, e verificando que neste caso as
probabilidades de não-excedências tomam-se de excedências, a função
cumulativa de probabilidades ficará:

X
FCP : P[Z > z] = e ~ [(z ' Y)/(H ' Y)] ou :
X
FCP : P[Z í z] = 1 ■ e " [(z ' Y)/(,X ' Y)] (4.108)

Daí pode ser derivada a função densidade de probabilidades :

FDP : f[z] = \ / Qx - y) . [(Z - y) / (n - y )]^ 1. P[Z s z] (4.109)

Os parâmetros da distribuição de Weibull são jo, X e y, sendo este último


o limite inferior dos valores mínimos. Os momentos são dados por :
Elementos de Estatística e Probabilidades 155

Vazões mínimas ( m 3/s)

a- Primeiro ajuste

b - Segundo ajuste

Figura 4.25. Ajuste da distribuição Assintótica dos Extremos I às vazões


mínimas anuais com 7 dias de duração do rio Almada em Itajuípe.
1

156 Hidrologia

E[Z] = Y + (n - Y) T( l + l IX) (4.110)

VAR[Z] = dl - Y)2 [ H l + 2/X) - V ( l + IA)] (4.111)

A[Z] = m + 3A ) - 3 r(i+ 2 /X )r(i+ iA ) + 2r*(i+iA)] (4.112)


\T(l+2IX) - r 2(l+ lA )]1,5

Verifica-se que a assimetria populacional depende apenas do parâmetro X.


Isso permite a obtenção de uma estimativa de X, conhecida a estimativa
amostrai de A[Z], dada pelo coeficiente de assimetria, Para facilitá-la Kite
(1977) apresenta uma relação inversa entre À, e a assimetria, dada pela função
numérica :

IA = [c0 + Cj.a + c2.a2 + c3.a3 -f c4.a4] (4.113)

sendo c0= 0,2777757913, 0,3132617714, c2= 0,057567091, c3= - 0,0013038566


e c4= - 0,0081523408 e a a estimativa amostrai da assimetria, que deverá
estar entre -1,02 e 2 para validade da equação. A figura 4.26 apresenta a
função X = f(a) graficamente. Conhecido X pode-se obter T( 1 + 1/X) e [ F( 1
2
+ 2/X) - r ( 1 + 1A)L e daí, pelas suas substituições em 4.110 e 4.111 um
sistema de equações que estima ji e y.

Exemplo 4,29. O coeficiente de assimetria amostrai para as vazões mínimas de


7 dias de duração no rio Almada em Itajuípe é 0,406. Isso estabelece uma
estimativa de X de 2,41, de acordo com a fórmula 4.113. As equações 4.110 e
4.111 permitem obter as estimativas de (i e y como 1,007 e -0,333,
respectivamente. A figura 4.27 apresenta graficamente o ajuste. A manipulação
que tem sido aplicada nos exemplos anteriores fornece:

1/2,41
z “ 1,34 . [- Ln(l - 1/Tr)] - 0,333

o que resulta em Tr[0,19] = 10 anos e Tr[0] = 29 anos.

Quando for possível adotar-se y igual a zero, o que não é desproposital


para valores mínimos, a função e seus dois primeiros momentos ficam:

X
FCP : P[Z 5 z] = 1 * e - (z/p.) (4.114)
Elementos de Estatística e Probabilidades 157

e [z ] = n n i + i/x) í 4-115)

VAR[Z] = T( 1 + 2fk) - T2 ( 1 + IA)] (4.116)

Figura 4.26. Relação entre a assimetria e o parâmetro X da distribuição de


Weibull com 3 parâmetros
158 Hidrologia

O coeficiente de variação populacional r}2, dado por /VÃR[Z]/E[Z], é dado


por;

(4.117)

que depende unicamente de X. Essa função é graficada na figura 4.28. A


estimativa dos parâmetros pode ser realizada obtendo-se as estimativas
amostrais de E[Z] e VAR[Z], dadas pela média e variança da série amostrai,
calculando o coeficiente de variação amostrai e, a partir da figura 4.28
estimar-se X. Conhecido X pode ser estimado p da equação 4.115, após cálculo
de r ( l + 1/X).

Exemplo 4.30. O coeficiente de variação das vazões mínimas com 7 dias de


duração em Itajuípe, excluídas as 3 vazões maiores da amostra, é 0,543. A
estimativa de X é 1,9. O valor de F( 1 + 1/X) com X = 1,9 é 0,897, resultando
em p = 0,979. A função cumulativa de probabilidades fica
-(z/0,979)
P[Z * z] = 1 - e

o z 3 4
Vazões mínimos de 7 dias (m3/$)

Figura 4.2*J Ajuste da distribuição de Weibull com 3 parâmetros às vazões


mínimas anuais com 7 dias de duração do rio Almada em Itajuípe.
Elementos de Estatística e Probabilidades 159

Figura 4.28. Relação entre o coeficiente de variação e o parâmetro X da


distribuição de Weibull com 2 parâmetros.
160 Hidrologia

Na figura 4.29 apresenta-se o ajuste. Manipulando a função acima obtém-


se z = 0,979 . [-Ln(l - 1/Tr)] o que resulta nas estimativas Tr[0,3] = 10
anos, Tr[0,205] = 20 anos, Tr[0,12] = 50 anos e Tr[0,086] = 100 anos. Esses
resultados mostram a inconsistência dessa distribuição, quando aplicada a
séries de mínimos que podem ter valores nulos, Valores nulos têm, de acordo
com ela, tempo de retomo infinito !

_ , 3
Vazões m ín im a s a n u a is de 7 dias ( m / s )

Figura 4.29. Ajuste da distribuição de Weibull com 2 parâmetros às vazões


mínimas anuais com 7 dias de duração do rio Almada em Itajuípe.

Transformações "Normalizantes"

Na apresentação da distribuição Normal foi comentado que sua aplicação


como modelo probabilístico em hidrologia ocorre geralmente para ajustar dados
transformados de forma a se ajustarem à mesma. O exemplo da distribuição Log-
Normal ilustrou essa abordagem. Séries que se distribuam Log-Normal ao serem
transformadas pela função logarítmica se ajustarão à distribuição Normal.
Outras transformações podem ter a mesma propriedade. Aqui 6 apresentada uma
delas. Ela parte da verificação que muitas vezes uma transformação de
potência é conveniente para normalizar uma série hidrológica. Potências como
1/2 (raiz quadrada) ou 1/3 (raiz cúbica) têm sido utilizadas para ajustar
séries de chuvas intensas. Uma transformação generalizada de potência foi
proposta por Hinkley (1977) com a forma:
Elementos de Estatística e Probabilidades 161

Y; = (X f - l)/a (4.118)

em que a é a potência normalizaníe. Verifica-se que quando a -» 0, Y-


Ln(Xj). Ou seja, essa transformação é um caso geral da transformação
logarítmica. Por outro lado, quando a = 1, Y. = - 1 o que afetará apenas o
primeiro momento, equivalendo à situação sem transformação.
Para estabelecer o valor de a pode-se adotar o critério simplificado de
minimizar o valor absoluto do coeficiente de assimetria. Quando ele for nulo,
a potência a deverá fazer com que a série transformada se ajuste
aproximadamente à distribuição Normal.

Exemplo 4.31. A potência que 2era a assimetria da série transformada das


vazões máximas em Forquilhinha é calculada por tentativas como 0,1835. O
valor médio e o desvio padrão da série transformada são. respectivamente,
9,867 e 1,5. As equações para estimativa das vazões em função da variável
padronizada y serão :

x - 9,867 + 1,5 . y

1/0,1835
Q = (0,1835 . x + 1)

Com os valores da tabela 4.7 obtém-se ; Tr[531] - 10 anos, Tr[758] = 50 anos,


Tr[854] = 100 bastante próximos daqueles com a distribuição de Gumbel. À
vazão 880 m3/s tem um tempo de retomo estimado em 120 anos.

4.5 Avaliação do ajuste de modelos probabilísticos

Nos exemplos apresentados, verifeou-se como regra a obtenção de


estimativas diferentes para cada distribuição teórica de probabilidades.
Fica, portanto, a pergunta sobre qual delas selecionar. As figuras que
mostraram os ajustes obtidos deram uma alternativa. Uma outra possibilidade
mais interessante vale-se de papéis chamados probabilísticos.
Um papel probabilístico guarda total analogia com os papéis Iogaritmicos
P _ ,
ou bilogarítmicos. Por exemplo, se uma função do tipo Y = a X for graficaaa
em um papel bilogarítmico, ela será representada por uma linha reta. Isso
pode ser verificado analiticamente. Tomando-se logaritmos de ambos os lados
da expressão anterior, obtém-se : Log Y = Log a + pUog X. Se Y' - log Y, X
= log X e a ’ = log a, a expressão resultante será Y’ = a ’ + (3 X \ que é a
162 Hidrologia

equação da linha reta. Ao graficar-se, portanto, Y e X em escalas


logarítmicas será obtida uma linha reta.
Para construir um papel bilogarítmico, inicialmente define-se a origem
no ponto 1, cujo logaritmo é zero. O ponto 2 deverá ficar a uma distância
igual a [Log 2 - Log 1] da origem, na escala escolhida. Um valor genérico i
ficará à distância [Log® - Log(l)] da origem.
QX
Seja agora a expressão Y = cr . Tomando-se logaritmos vem :

log Y = |J.X.Log a.

Explicitando-se X ;

X = [l/(b.Log a)].log Y.

Fazendo-se C = [l/(b.Log a)] e W = Log Y , tem-se que :

X = C Y

que é a equação de uma reta que passa na origem. Graficando-se Y em escala


logarítmica e X em escala decimal comum, obtém-se o papel monologarítmico que
apresenta como reta a função dada.
O interesse é nos papéis probabilísticos. Para construí-los, os exemplos
anteriores mostram o caminho. Através de manipulações, deve ser obtida uma
equação do tipo: h[P(X 5 x)] = a + g(x), onde h[P(X ^ x)] depende da função
cumulativa de probabilidades de não-excedências e g(x) é uma função de x, os
valores que a variável aleatória pode assumir. Distorcendo-se a escala de P(X
3 x) de acordo com h[.] e a de x de acordo com g(x) será obtido o papel, onde
a relação original será graficada com uma linha reta. Portanto, o teste para
verificação da hipótese de que a distribuição teórica que deu origem ao papel
probabilístico ajusta a série amostrai é realizado pela graficação dos pontos
amostrais neste papel. Se formarem uma tendência retilinear, são obtidos os
indícios de que a hipótese pode ser aceita.
A possibilidade de linearização de um modelo probabilístico permite a
adoção de um método alternativo de ajuste de parâmetros : o método de mínimos
quadrados. Este método tem a ele inerente um critério numérico de adequação
de ajuste, através do coeficiente de correlação. Isso será melhor entendido
com um exemplo, adiante apresentado.

4.5.1 Posições de locação de amostras ordenadas

Antes de serem desenvolvidos os papéis probabilísticos de algumas


distribuições teóricas, há necessidade de se tratar da estimativa das
Elementos de Estatística e Probabilidades 163

probabilidades de excedência, ou sua recíproca* igual aos tempos de retomo,


de amostras. Em exemplos anteriores, quando havia necessidade de se estimar
tais probabilidades, elas foram igualadas às freqüências cumulativas de
excedência, calculadas como :

F[X * x] = - 2 - (4.119)

onde m é a ordem do valor na amostra ordenada do valor mais raro para o menos
raro e n é o tamanho da amostra. Este método é chamado por Califórnia por ter
sido primeiro usado no dimensionamento de bueiros nas rodovias desse estado
americano. Existe alguns outros estudos teóricos que mostram que esta
abordagem não é a melhor escolha. Kite (1977), em capítulo introdutório, faz
uma revisão de literatura que situa claramente esses estudos.
Cunnane (1978), analisando as principais fórmulas apresentadas para
estas estimativas, notou que elas podem ser enquadradas em uma estrutura
geral dada por:

1 n - 2.a -f l
Tr = --------- — = ------------------ Í4.120)
P[X ^ x] m - a

onde n é o número de valores da amostra, m é a colocação do valor na amostra


ordenada do evento mais raro para o menos raro e a um parâmetro específico da
distribuição testada. A tabela 4.9 apresenta os valores de a adequados às
diversas distribuições.

Tabela 4.9. Fórmulas para estimativa de tempos de retomo de amostras


ordenadas. Valores de a da equação 4.120
a Fórmula Autor Utilização
0 (n + l)/i Weibuil mais comum
3/8 (n + 0,25)/(i - 0,375) Blom Normal e Log-Normal
0,44 (n + 0,12)/(i - 0,44) Grigorten Assintótica Extremos I
0,5 n/(i - 0,5) Hazen Gama 3 parâmetros
0,4 (n + 0,2)/(i - 0,4) Cunnane compromisso

A fórmula de Weibuil é a mais utilizada na prática hidroldgica. Existem


indícios, porém, de que se trata da pior escolha. A fórmula de Cunane é uma
fórmula de compromisso, que dará bons resultados com a maioria das
distribuições utilizadas na prática hidrológica. As demais devem ser
utilizadas quando a distribuição apontada estiver sendo testada.
Um aspecto importante refere-se à ordenação da amostra. E dito que ela
164 Hidrologia

deve ser realizada do valor mais raro para o menos raro. Isso implica ordenar
do maior para o menor, no caso de série de máximos, e do menor para o maior,
no caso de série de mínimos. Quando a série for de valores médios a ordenação
adotada deverá refletir se o interesse dirige-se a valores acima da média
(ordem decrescente) ou abaixo da média (ordem crescente).

Exemplo 432. A tabela 4.10 apresenta os valores estimados para o tempo de


retomo do valor mais raro, o segundo mais raro e o menos raro de uma amostra
de 30 valores.

Tabela 4.10. Valores estimados de tempos de retomo de amostra com 30 anos

Fórmula m=l m=2 m=30


Weibull 31 15 1,03
Bíom 48 19 1,02
Cunnane 50 19 1,02
Gringorten 54 19 1,02
Hazen 60 20 1,01
i_________

Observa-se, portanto, que existem diferenças substanciais apenas na


estimativa do tempo de retomo do valor mais raro.

4,5.2 Papéis probabilísticos de algumas distribuições teóricas

Papéis probabilísticos .foram desenvolvidos, para as distribuições


Exponencial, Normal e Assintóüca dos Extremos do tipo I. Com transformações
da série amostrai eles podem ser usados para testar algumas distribuições
cujos valores transformados ajustam-se às listadas. Esse é o caso da Log-
Normal.

Papel probabilístico da distribuição Exponencial

O modelo probabilístico Exponencial, P[X £ x] = e '0^ pode ser


linearizado adotando-se os logaritmos naturais (base e) :

Ln{ P[X s: x] } = - a . x. (4.120)

Isto indica que ao utilizar-se o papel monologaritmo e graficar-se as


estimativas de probabilidades de excedências na escala logarítmica, e os
valores correspondentes de x na escala decimal, será obtida uma tendência
retilinear, se a amostra de x for significativa de uma variável aleatória com
Elementos de Estatística e Probabilidades 165

distribuição Exponencial. Em outras palavras, o papel monologarítmico 6 o


papel probabilístico da distribuição Exponencial.

Exemplo 4.33. A figura 4.30 mostra o ajuste da série amostrai das vazões
máximas do rio Mãe Luzia em Forquilhinha a esse papel. A fórmula de Cunnane
foi adotada para estimativa dos tempos de retomo. Os resultados devem ser
interpretados com cuidado. O ajuste dos pontos a uma tendência retilinear não
é ruim. O problema é que a distribuição Exponencial exige que quando x for
nulo, P[X £ x] seja igual à unidade (ver equação acima), ou seja, ela é
limitada a valores não negativos de x. Diante disso, nem toda linha reta, a
ser traçada sobre os pontos, pode ser adotada como representativa dessa
distribuição. A figura mostra a reta representativa do ajusu pelo método dos
momentos, obtida no exemplo 4.14, em que a = 0,0032. Confirma-se o ajuste de
má qualidade mostrado na figura 4.15.
O ajuste de mínimos quadrados do parâmetro a pode ser realizado
adotando-se o seguinte procedimento. A curva a ser ajustada é - - a . Xit
sendo i os anos das observações amostrais. Introduzindo os erros de ajuste,
ela fica Yi = - a . Xj + e*. O objetivo do método é estimar o parâmetro a de
forma que a soma do quadrado dos erros seja mínimo. Isto pode ser
representado comc ;

35 35
M i n [ £ £i2 ) = M i n f £ [Yj + tx X ^ )

Derivando a expressão à esquerda com relação ao parâmetro a e igualando


o resultado a zero obtém-se as condições para minimizar a soma do quadrado
dos erros. Ela é :

35 35 35 35

d a ,=1

Evidenciando-se a, obtém-se a equação para sua estimativa :

35 35
a- n w / z {x^i (4.121)
i=l i=l

Aplicando-se essa expressão aos dados da tabela 4,4 o parâmetro o. é


estimado como 0,0034, muito próximo ao obtido pela estimativa do método dos
momentos, igual a 0,0032.
166 Hidrologia

Figura 4.30, Ajuste das vazões máximas do rio Mãe Luzia em Forquilhinha ao
papel probabilístico Exponencial

Papel probabilístico da distribuição de Gumbel

A função cumulativa de probabilidades de não-excedência reduzida desta


-e ' y
distribuição, quando aplicada a máximos, é dada por: P[X í x] = e , com y
= a.(x-p).
Inicialmente x deve ser explicitado nesta relação. Para isso, toma-se o
logaritmo natural de ambos os lados da equação, inverte-se o sinal e toma-se
outra vez o logaritmo natural de ambos os lados, resultando:

y = a ( x - | i ) = - l n {-ln (P[X ^ x])) ou

x —jj, + (- 1/oc) ln {- ln (P[X s X])J

Fazendo-se q = ln {- ln (P[X s x])] a equação ficará:

x = pi + (-1/oc) q (4.122)

que é equação de uma reta. Caso se deseje estabelecer W como função dos
tempos de retomo Tr[x] a equação fica :

1
q = In {- ln (■------------------------ ) ) (4.123)
1 - P [ X 2S X]
Elementos de Estatística e Probabilidades 167

Portanto, o papel probabilístico da distribuição Assintótica dos


Extremos do tipo I será obtido dístorcendo-se o eixo onde serão graficadas as
probabilidades de não-excedências, de acordo com a fórmula ln[-ln(Z)], sendo
Z a probabilidade acumulada de não-excedência. Esse papel é apresentado na
figura 4.31 com a escala dos tempos de retomo limitada a 100 anos. A
diferença entre a distribuição aplicada a máximos e mínimos se reduz à
relação entre freqüências e tempos de retomo. No caso de máximos, Tr[x] =
1/P[X £ x]; no caso de mínimos, Tr[x] - 1/P[X ^ x]. A variável reduzida será
a mesma e, portanto, o problema se resume em estimar adequadamente os tempos
de retomo e aplicar-se o mesmo papel de probabilidades.

Figura 4.31. Papel probabilístico da distribuição de Gumbel

Exemplo 434. A figura 4.32 apresenta a graficação da série amostrai das


vazões máximas do rio Mãe Luzia em Forquilhinha no papel probabilístico da
distribuição de Assintótica de Extremos do tipo I com a da equação 4.120
igual a 0,44. Usando as séries de vazões máximas e seus respectivos valores W
como pares de valores procedeu-se à estimativa dos parâmetros da equação X =
(l/-a).W + (i pelo método dos mínimos quadrados. Os valores obtidos foram jl =
235,955, 1/a = 113,371 ou a = 0,09; o coeficiente de correlação é 0,974. Pelo
método dos momentos as estimativas foram, respectivamente /I = 234,7 e a =
0,00754. O ajuste de mínimos quadrados é apresentado como a linha reta da
figura 4.32.
168 Hidrologia

Papel probabilístico da distribuição de Weibull

A função cumulativa de probabilidades de excedência da distribuição de


Weibull pode ser obtida da equação 4.108 como :

FCP : P[Z £ z] = e ' C(z ' ' 7)1

Figura 4.32. Ajuste das vazões máximas do rio Mãe Luzia em Forquilhinha ao
papel probabilístico da distribuição Assintótica dos Extremos do tipo í

Tomando-se logaritmos naturais de ambos os termos, após breve


manipulação :

Ln (z - y) = Ln (p, - y) + (l/X) Ln -{-Ln (P[Z £ z])}> (4.123)

que é a expressão requerida. Fazendo-se q = Ln(Z - y), a = Ln(p - y), b = 1fk


e x = Ln | -Ln (P[Z £ z]) J-, obtém-se a equação de uma reta.
Inicialmente verifica-se que se o parâmetro y for zero, ou a
distribuição for de Weibull com dois parâmetros, z deverá ser graficado em
uma escala logarítmica e as probabilidades em uma escala idêntica à obtida
para a distribuição de Gumbel. Este papel será denominado Log-Gumbel. Caso y
não seja zero, ou distribuição de Weibull com 3 parâmetros, o valor de (z -
y) deverá ser graficado na escala distorcida dos logaritmos. Isto apresenta
um problema já que y não é conhecido a priori. Duas alternativas podem ser
adotadas. Uma delas, heterodoxa, consiste em estimar-se y pelo método dos
momentos e graficar-se (z - y) no papel probabilístico. A alternativa
ortodoxa exige tentativas. Grafica-se (z - y) no papel para diferentes
Elementos de Estatística e Probabilidades 169

valores de y até que seja obtida a sua melhor estimativa, identificada por
aquela que estabelece a melhor tendência retilinear,
A estimativa dos parâmetros pelo método dos mínimos quadrados consiste
em realizar-se a regressão linear simples entre q = (z - Ç) e x = Ln -j -Ln
(P[Z £ z])J-, obtendo-se os parâmetros a = Ln($ - y) e b = l / X . Surge aqui o
mesmo problema de se atribuir um valor para X. Uma alternativa para sua
identificação é fazê-lo por tentativas de forma a maximizar o coeficiente de
correlação. O exemplo a seguir ilustra o processo.

Exemplo 435. As vazões mínimas em períodos de 7 dias do rio Almada em


Itajuípe, apresentadas na tabela 4.9 foram graficadas no papel probabilístico
Log-Gumbel, conforme é apresentado na figura 4,33 com y = 0 (distribuição
Weibull com 2 parâmetros) e a da equação 4.120 igual a 0,4. O ajuste é
visualmente ruim. Os parâmetros obtidos por mínimos quadrados são /I = 1,115 e
X = 1,867, próximos às estimativas de momentos do exemplo 4.30 com p.= 0,979
e 1 = 1,9. O coficiente de correlação é 0,76. Na figura 4.33 a linha reta
representa o ajuste de mínimos quadrados.
Usando-se a estimativa de momentos de y, igual a -0,333 (exemplo 4.29),
obteve-se por mínimos quadrados u = 1,034 e X = 2,52, com coeficiente de
correlação igual a 0,975. As estimativas de momentos no exemplo 4.29 foram (1
= 1,007 e X = 2,41. A figura 4.34 apresenta o ajuste no papel probabilístico
Log-Gumbel que se apresenta superior àquele obtido no exemplo anterior. Â
linha reta, como antes, é o ajuste de mínimos quadrados.

Papel probabilístico da distribuição Normal

Para a distribuição normal não existe manipulação que permita a obtenção


de uma equação transformada que indique diretamente as distorções a serem
realizadas nos valores amostrais da variável aleatória e em seus tempos de
retomo para a obtenção de uma reta. No entanto, existe uma aproximação
numérica que fornece o pretendido. A função que relaciona um valor amostrai x
com a probabilidade de não ser excedido P[X ^ x] pode ser obtida pela
aproximação numérica:
2
[c(0) -f c(l) w + c(2) w ] (4.124)
x = }i + a.
[1 + d(l)-w + d(2)-wh d(3)-w3]

sendo p, e a o valor esperado e o desvio padrão da variável aleatória. O termo


entre colchetes é uma função de P[X ^ x], na qual :
170 Hidrologia

. 2 , 1/2
W = Ln \ 1 / [P(X s X )] \ para P[X í x ] í 04
t 2 1/2
w = Ln 1 / [1 - P(X * x)] } para P[X * x] > 04

Figura 4.33. Ajuste das vazões mínimas de 7 dias do rio Almada em Itajuípe ao
papel probabilístico Log-Gumbel - Distribuição Weibull com 2 parâmetros
Elementos de Estatística e Probabilidades 171

Os coeficientes têm os seguintes valores c(0) = 2,515517; c(l) =


0,802853; c(2) = 0,010328; d(l) = 1,432788; d(2) = 0,189269; d(3) = 0,001308
Caso as probabilidades de não-excedência sejam graficadas com a escala
distorcida usando a aproximação numérica acima e x for graficado sem
distorções, o resultado será uma linha reta, se X se distribuir Normal. A
figura 4.35 apresenta um exemplo desse papel. A estimativa de mínimos
quadrados calcula aos parâmetros da função x = a + b.q, sendo q o termo entre
colchetes da equação 1.124. Logo, (1 = a e ô = b.

Exemplo 436. A figura 4.36 apresenta a graficação dos valores amostrais de


vazões máximas do rio Mãe Luzia em Forquilhinha no papel probabilístico
Normal. Os tempos de retomo foram estimados pela equação 4.120 com a =
0,375. As estimativas de mínimos quadrados dos parâmetros são jl = 311,27 e a
= 161,26, com coeficiente de correlação igual a 0,927. As estimativas obtidas
pelo método dos momentos (ou a média e desvio padrão amostrai) são 311,27 e
169,7. Ou seja, ocorre uma pequena modificação na estimativa de a.

Tsmpos rttorno ( anos)

Figura 4.35, Papel probabilístico Normal


172 Hidrologia

Papel probabilístico da distribuição Log-Normal

Como uma variável com distribuição Log-Normal ao ser transformada pela


função logarítmica se distribuirá Normal, o papel probabilístico Log-Normai
será idêntico ao Normal, no que diz respeito ao eixo das probabilidades ou
tempos de retomo. A escala da variável aleatória deverá ser distorcida de
acordo com a função logarítmica.

Exemplo 4.37. Os valores das vazões máximas do rio Mãe Luzia em Forquilhinha
são graficados no papel probabilístico Log-Normal na figura 4.37. Os tempos
de retomo foram estimados com a equação 4.120 e a = 0,375. A estimativa de
mínimos quadrados resultou em ji - 5,606 e o = 0,54-3, com coeficiente de
correlação 0,98, o maior obtido entre todas as distribuições. Os parâmetros
estimados por momentos são, de acordo com o exemplo 4.24, 5,606 e 0,541, na
opção em que X é inicialmente transformado em logaritmos.
O mesmo papel probabilístico pode ser adotado para ajuste da
distribuição Log-Normal com 3 parâmetros. O terceiro parâmetro p poderá ser
estimado por tentativas de forma a maximizar o coeficiente de correlação ou
ser obtido previamente pelo método dos momentos.
Em resumo, os papéis probabilísticos permitem uma visualização essencial
ao julgamento da adequação da distribuição teórica selecionada à série
amostrai estudada e para a seleção da mais indicada.

Figura 4.36. Ajuste das vazões máximas do rio Mãe Luzia em Forquilhinha ac
papel probabilístico Normal
Elementos de Estatística e Probabilidades 173

Figura 4.37, Ajuste das vazões máximas do rio Mãe Luzia em Forquilhinha ao
papel probabílístico Log-Normal

PROBLEMAS

1 - Os valores da tabela 4.11 representam as observações ordenadas na forma


decrescente de chuvas totais anuais em Porto Alegre no período de 1940 a
1971. Construir os histogramas de ffeqüências simples e acumuladas de
excedências. Calcule os valores de chuva p tal que F[P £ p] - 5, 10, 90 e
95%.

Tabela 4.11. Série de precipitações anuais em


Porto Alegre, RS (1940-1971)
i P(mm) i P(mm) í P(mm) i P(mm)
1 20994 9 13724 17 1217,0 25 1086,8
2 1775,7 10 1324,8 18 1211,1 26 1077,9
3 16094 11 1318,4 19 1167,9 27 10704
4 1552,0 12 1317,1 20 11594 28 1039,9
5 1522,9 13 1272,9 21 1159,1 29 983,9
6 1518,1 14 1265,7 22 1128,9 30 943,7
7 1492,2 15 1262,0 23 1122,7 31 807,8
8 1404,1 16 1256,8 24 1100,1 711,9
32
174 Hidrologia

2 - Calcular e graficar a curva de permanência das chuvas totais anuais em


Porto Alegre, encontrando os valores correspondentes às permanências de 90 e
95%.

3 - Calcular a média, moda e mediana, variança e desvio padrão, e o


coeficiente de assimetria comum e o de Pearson para as chuvas anuais em Porto
Alegre. Localize nos histogramas desenhados no exercício 1 as medidas de
tendência central.

4 - Considere as vazões médias anuais no rio Jacuípe, em França e Gavião


apresentados na tabela 4.3. Compute as vazões da bacia incrementai entre
Gravião e França, dadas pela diferença entre as observações destas seções.
Considerando a relação linear y = A + B.x e suas transformações apresentadas
na tabela 4.5, selecione aquela que melhor ajusta a relação entre a vazão
incrementai e as chuvas totais anuais em França. Como critério adote o valor
do coeficiente de correlação. Grafique o melhor resultado.

5 - Considerando as vazões incrementais (DQ) computadas previamente, as


vazões médias anuais (QF) e as chuvas totais anuais (PF) em França, calcule
os parâmetros dos modelos :

DQ = A + B.Qf + C.PF e
B c
DQ = A . Qf . PF

Previamente demonstre que o segundo modelo pode ter seus parâmetros estimados
por regressão linear múltipla adotando-se a transformação logaritma.

6 - Para as chuvas totais anuais em Porto Alegre apresentadas no exercício 1


estimar: a) a probabilidade de que ocorram três anos seguidos com valores
superiores a 1500 mm; b) a probabilidade de que não ocorram em 10 anos com
valores anuais inferiores a 1000 mm; c) a probabilidade de que ocorram
valores superiores a 1500 mm nos próximos 10 anos; d) a probabilidade de que
a primeira chuva superior a 1500 mm ocorra daqui a 5 anos.

7 - Ajustar, pelo método dos momentos os modelos probabilísticos Gama com 2 e


3 parâmetros, Normal e Log-Normal, com 2 e 3 parâmetros, às vazões mínimas
com 7 dias de duração do rio Almada em Itajuípe, apresentadas na tabela 4.9.
Estime os valores com 50 e 100 anos de tempo de retomo.

8 - Estime as potências da equação 4.118 que zeram as assimetrias das chuvas


totais anuais em Porto Alegre, das vazões máximas do rio Mãe Luzia em
Elementos de Estatística e Probabilidades 175

Forquilhinha e das vazões mínimas de 7 dias rvo rio Almada em Itajuípe.


Verifique no papel probabilístico Normal o ajuste de cada série transformada
a esta distribuição. Estime e compare os valores com 10, 50 e 100 anos de
retomo.

9 - A tabela 4.12 apresenta os valores de vazões mínimas de 1 dia do rio


Ingaí no Passo do Ingaí, RS. Ajuste a distribuição Assintótica dos Extremos
do tipo I para valores mínimos, e as Weibull com 2 e 3 parâmetros. Estime e
compare os valores com retomo 10, 50 e 100 anos.

Tabela 4.12. Vazões mínimas de 1 dia do rio Ingaí em Passo do Ingaí, RS.
Ano Vazões Ano Vazões Ano Vazões
(m3/s) (m3/s) (m3/s)
1940 17.4 1950 3,55 1960 7,55
1941 3,85 1951 3,85 1961 3,1
1942 4,07 1952 5,61 1962 2,65
1943 3,55 1953 6,05 1963 6,05
1944 3.7 1954 13,1 1964 5,17
1945 4,29 1955 6,95 1965 11,48
1946 4,29 1956 6,05 1966 6,65
1947 4.51 1957 6,05 1967 5,61
1948 3,25 1958 13,1 1968 7,25
1949 4,07 1959 5,17 1969 5,17

10 - Aplique o método dos mínimos quadrados para estimativa dos parâmetros


das distribuições teóricas Assintótica dos Extremos do tipo I para valores
mínimos, Weibull com 2 parâmetros e Exponencial no ajuste às vazões mínimas
de Passo do Ingaí. Desenhe no papel probabilístico apropriado a distribuição
ajustada junto com os valores amostrais.

REFERENCIAS

1 - CUNNANE, C. 1978. Unbiased Píotting Positions - A Review. Journal of


Hydrology, Amsterdam, v.37. p.205-222.

2 - HINKLEY, D. 1977. On Quick Choice of Power Transformation. Applied


Statistics v.26, n.l. p 67-69.

3 - KITE, G.W. 1977. Frequency and Risk Analysis in Hydrology. Fort


Collins: Water Resources Publications.
176 Hidrologia

Literatura consultada

4 - BENJAMIN, J.R., CORNELL, C. A. 1970. Probability, Statistics, and


Decision Theory for Civil Engineers. New York: McGraw-Hill.

5 - HAAN, C.T. 1977. Statistical Methods in Hydrology. Ames: lowa State


Uníversity.

6 - YEVJEVICH, V. 1972. Probability and Statistics in Hydrology, Fort


Collins: Water Resources Publications.
Capítulo 5

PRECIPITAÇÃO

Juan C. Bertoni e Carlos E. M. Tucci

5.1 Introdução

A precipitação é entendida em hidrologia como toda água proveniente do


meio atmosférico que atinge a superfície terrestre. Neblina, chuva, granizo,
saraiva, orvalho, geada e neve são formas diferentes de precipitações. O que
diferencia essas formas de precipitações é o estado em que a água se
encontra.
A disponibilidade de precipitação numa bacia durante o ano é o fator
determinante para quantificar, entre outros, a necessidade de irrigação de
culturas e o abastecimento de água doméstico e industrial. A determinação da
intensidade da precipitação é importante para o controle de inurdação e a
erosão do solo. Por sua capacidade para produzir escoamento, a chuva é o tipo
de precipitação mais importante para a hidrologia.
As características principais da precipitação são o seu total, duração e
distribuições temporal e espacial. O total precipitado não tem significado se
não estiver ligado a uma duração. Por exemplo, 100 mm pode ser pouco em um
mês, mas é muito em um dia ou, ainda mais, numa hora. A ocorrência da
precipitação é um processo aleatório que não permite uma previsão
determinística com grande antecedência. O tratamento dos dados do
precipitação para a grande maioria dos problemas hidrológicos é estatístico.
Este capítulo, além de apresentar um resumo sobre o mecanismo de
formação das precipitações, aborda as principais técnicas consagradas na
literatura relativas ao estudo das características fundamentais das
precipitações, entre elas a avaliação estatística dos totais precipitados e o
tratamento de precipitações intensas.

5.2 Mecanismos de formação das precipitações

O vapor de água contido na atmosfera constitui um reservatório potencial


de água que, ao condensar-se, possibilita a ocorrência de precipitações. A
origem das precipitações está ligada ao crescimento das gotículas das nuvens,
o que ocorre quando forem reunidas certas condições. Efetivamente, muitas
vezes existem nuvens que não produzem chuvas, o que evidencia a necessidade
de processos que desencadeiem a precipitação.
178 Hidrologia

Para as gotas de água precipitarem é necessário que tenham um volume tal


que seu peso seja superior às forças que as mantêm em suspensão, adquirindo,
então, uma velocidade de queda superior às componentes verticais ascendentes
dos movimentos atmosféricos.
A nuvem é um aerosol constituído por uma mistura de ar, vapor de água e
de gotículas em estado líquido ou sólido cujos diâmetros variam de 0,01 a
0,03 mm, espaçadas, em média, um milímetro entre si. O ar que envolve as
gotículas das nuvens se acha num estado próximo ao da saturação e, por vezes,
supersaturado. Esse aerosol fica estável, em suspensão, pelo efeito da
turbulência no meio atmosférico e/ou devido à existência de correntes de ar
ascendentes que contrabalançam a força da gravidade.
As gotículas possuem massa de 0,5 a 1 grama de água por m3 de ar,
enquanto o ar saturado que envolve as gotículas tem umidade de 1 a 6 gramas
por m3 (-20°C a 5°C). A concentração das gotículas é de cerca de 1000/cm3.
Dessa forma, a quantidade total de água presente numa nuvem, nos três
estados, pode variar de 1,5 a 7 g/m3 (Silveira, 1973).
As gotas de chuva têm diâmetros de 0,5 a 2,0 mm (densidade espacial de
0,1 a 1 gota por dm3), com um valor máximo de 5,0 a 5,5 mm. Quando uma gota
cresce até atingir um diâmetro de 7,0 mm, sua velocidade de queda será de 9
m/s. A uma velocidade tão alta a gota se deforma e se subdivide em gotas
menores devido à resistência do ar. As gotas de chuva tem dimensões muito
maiores do que as gotículas das nuvens ou seja, volumes 106 maiores. A origem
das precipitações está intimamente ligada ao crescimento das gotículas das
nuvens.
O ar atmosférico, além dos gases que o compõem, contém partículas
minúsculas (diâmetros variando de 0,01 a 1 micron) de várias origens:
argilosas, orgânicas (pólen), químicas e sais marinhos. Sobre essas
partículas se realiza com facilidade a condensação do vapor atmosférico.
Essas partículas funcionam como núcleos de condensação. Observa-se que quando
o ar úmido sobe e atinge o nível de saturação, as gotículas de água que se
formam não têm tendência a se unirem entre si sem a presença dos núcleos de
condensação.
Os núcleos mais ativos são partículas de sal procedentes do mar,
cristais de gelo, e os produtos de combustão contendo os ácidos nítrico e
sulfúrico. A concentração desses últimos núcleos nas regiões industriais pode
chegar a alguns milhões por cm3. A seguir são apresentados algumas situações
em que ocorre o crescimento das gotículas por condensação de vapor de água.

Nuvens frias (temperatura abaixo de 0°C) (teoria de Tor Bergeron -


Findensen): abaixo de 0°C a tensão máxima de vapor (vapor saturante) é, para
uma mesma temperatura, menor para o gelo do que para a água sobrefundida.
Precipitação 179

Quando uma nuvem fria, devido à turbulência, contiver ao mesmo tempo cristais
de gelo e gotículas de água sobrefundida, estas se vaporizam em proveito dos
cristais de gelo, tomando-se centros de condensação, aumentando de volume.
Por essa teoria explicam-se as chuvas nas regiões frias e temperadas.

Nuvens com tem peratura superior a 0°C (regiões com latitude média e baixa): é
comum se registrarem diferenças de temperaturas entre as gotículas das
nuvens. Como as gotículas mais quentes têm tensão de vapor maior do que a
tensão das demais partículas, ocorre a vaporização das gotículas quentes em
proveito das gotículas frias, que crescem. Isso explica a origem de algumas
chuvas tropicais e de chuvas das regiões de latitude média.

Nuvens constituídas por gotículas salinas: quando numa nuvem quente


(temperatura maior que zero) existirem gotículas formadas por solução salina,
que se originam pela condensação do vapor atmosférico sobre partículas
higroscópicas de cloreto de sódio, estas desempenham o papel de gotículas
frias pelo fato da tensão do vapor de água salgada ser mais fraca do que a da
água pura. Este fenônemo explica as chuvas nas regiões subtropicais.

A tensão do vapor de água além de variar com a temperatura e com a


salinidade da solução, depende da curvatura das gotículas, sendo inversamente
proporcional ao raio de curvatura. Quando as gotículas são muito pequenas a
tensão de vapor na superfície curva é grande. Isto implica que a gotícula se
oporá a que a ela se aglutinem molécuias de vapor, enquanto a pressão do
vapor não for maior que a tensão da gotícula. Se essa gotícula é introduzida
num ambiente de ar supersaturado, com tensão de vapor superior à tensão de
vapor da gotícula, haverá condensação de vapor de água sobre a gotícula que
começa a crescer. Com o crescimento, diminui a curvatura da gotícula e a
tensão de vapor, propiciando que gotículas menores sejam por elas atraídas.
Observa-se que, para que o processo do crescimento das gotículas por
condensação de vapor possa intervir, é necessária a existência de núcleos, ou
seja, a existência de gradientes de tensão de vapor no interior da nuvem.
Experiências laboratoriais mostraram que a ação isolada dos fatores
citados, ou mesmo ações concomitantes, não conseguem produzir gotículas de
diâmetro superior a 0,2 mm. Portanto, é necessário a existência de outra
causa responsável pelo engordamento das gotículas, até chegar ao tamanho das
gotas de chuvas. É o processo de coalescência direta, onde as gotículas
tomam-se maiores devido aos mencionados processos físicos e pelos choques
diretos com gotículas menores, resultando num crescimento acelerado
(Silveira, 1973).
Além dos processos que permitem a formação das gotas de chuva é
importante considerar também o processo de alimentação contínua das nuvens.
Por exemplo, uma nuvem de 4000 m de altura com uma massa média de água sob a
180 Hidrologia

forma de gotículas de 1 g/m3 e uma massa de vapor de água média de 6 g/m3,


proporcionaria uma precipitação máxima de 24.000 g/m2 ou seja, apenas 24 mm
de precipitação. É normal observar alturas pluviométricas muitas vezes
maiores, o que toma evidente, então, que no decurso de uma chuva duradoura
(por exemplo 2 mm/h durante 60 horas), a nuvem se reconstitui continuamente à
medida que a água condensada a abandona. Essa umidade é trazida à nuvem por
correntes ascendentes de ar quente carregado de umidade.

5 3 Classificação das precipitações

Conforme o mecanismo fundamental pelo qual se produz a ascensão do ar


úmido, as precipitações podem ser classificadas em:

Convectivas: quando em tempo calmo, o ar úmido for aquecido na vizinhança do


solo, podem-se criar camadas de ar que se mantêm em equilíbrio instável.
Pertubado o equilíbrio, forma-se uma brusca ascensão local de ar menos denso
que atingirá seu nível de condensação com formação de nuvens e, muitas vezes,
precipitações. São as chuvas convectivas, características das regiões
equatoriais, onde os ventos são fracos e os movimentos de ar são
essencialmente verticais, podendo ocorrer nas regiões temperadas por ocasião
do verão (tempestades violentas). São, geralmente, chuvas de grande
intensidade e de pequena duração, restritas a áreas pequenas. São
precipitações que podem provocar importantes inundações em pequenas bacias;

Orográfícas: quando ventos quentes e úmidos, soprando geralmente do oceano


para j continente, encontram uma barreira montanhosa, elevam-se e se resfriam
adiabaticamente havendo condensação do vapor, formação de nuvens e ocorrência
de chuvas. São chuvas de pequena intensidade e de grande duração, que cobrem
pequenas áreas. Quando os ventos conseguem ultrapassar a barreira montanhosa,
do lado oposto projeta-se a sombra pluviométrica, dando lugar a áreas secas
ou semi-áridas causadas pelo ar seco, já que a umidade foi descarregada na
encosta oposta;

Frontais ou ciciônicas: provêm da interação de massas de ar quentes e frias.


Nas regiões de convergência na atmosfera, o ar mais quente e úmido é
violentamente impulsionado para cima, resultando no seu resfriamento e na
condensação do vapor de água, de forma a produzir chuvas. São chuvas de
grande duração, atingindo grandes áreas com intensidade média. Essas
precipitações podem vir acompanhadas por ventos fortes com circulação
ciclônica. Podem produzir cheias em grandes bacias.
Precipitação Í81

Observam-se diferentes formas de precipitações na natureza:


Chuvisco (neblina ou garoa); precipitação muito fin&e de baixa intensidade;

Chuva: é a ocorrência da precipitação na forma líquida. A chuva congelada é a


precipitação constituída por gotas de água sobrefundida que congelam
instantaneamente quando se chocam contra o solo, formando uma capa de gelo;

Neve; é a precipitação em forma de cristais de gelo que durante a queda


coalescem formando blocos de dimensões variáveis;

Saraiva; é a precipitação sob a forma de pequenas pedras de gelo arrendodadas


com diâmetro de cerca de 5 mm;

Granizo; Quando as pedras, redondas ou de forma irregular, atingem grande


tamanho (diâmetro £ 5 mm );

Orvalho: nas noites claras e calmas, os objetos expostos ao ar amanhecem


cobertos por gotículas de água. Houve a condensação do vapor de água do ar
dos objetos que se resfriam durante a noite. O resfriamento noturno
geralmente baixa a temperatura até o ponte de orvalho;

Geada; é a deposição de cristais de gelo, fenònemo semelhante ao da formação


de orvalho, mas que ocorre quando a temperatura é inferior a 0°C.

5.4 Piuvíometria

As grandezas que caracterizam uma chuva são:

Altura pluviométrica (P ou r): é a espessura média da lâmina de água


precipitada que recobriria a região atingida pela precipitação admitindo-se
que essa água não se infiltrasse, não se evaporasse, nem se escoasse para
fora dos limites da região. A unidade de medição habitual é o milímetro de
chuva, definido como a quantidade de precipitação correspondente ao volume de
1 litro por metro quadrado de superfície;

Duração (t): é o período de tempo durante o qual a chuva cai. As unidades


normalmente utilizadas são o minuto ou a hora;

Intensidade (i): é a precipitação por unidade de tempo, obtida como a relação


i = P/t. Expressa-se normalmente em mm/h ou mm/min. A intensidade de uma
precipitação apresenta variabilidade temporal, mas, para análise dos
processos hidrològicos, geralmente são definidos intervalos de tempo nos
quais é considerada constante;
í 82 Hidrologia

Freqüência de probabilidade e tempo de recorrência (Tr): a precipitação é um


fenômeno de tipo aleatório. Na análise de alturas pluviométricas (ou
intensidades) máximas, o Tr é interpretado como o número médio de anos
durante o qual espera-se que a precipitação analisada seja igualada ou
superada. O seu inverso é a probabilidade de um fenômeno igual ou superior ao
analisado, se apresentar em um ano qualquer (probabilidade anual). Por
exemplo, uma precipitação com 1 % de probabilidade de ser igualada ou
superada num ano tem um Tr = 100 anos. No caso da análise de precipitações
extremas mínimas deve-se mudar a interpretação no sentido da superação
ocorrer por defeito (valores menores que o analisado). Neste caso Tr é o
inverso da probabilidade de não-excedência.

No capítulo 13 são apresentados os equipamentos utilizados na coleta da


precipitação. Resumidamente, existem pluviômetros para medidas diárias,
pluviógrafos para medidas no tempo e radar que mede no tempo e no espaço. O
pluviômetro é um aparelho totalizador que marca a altura de chuva total
acumulada num dado período de tempo. Este aparelho é mais utilizado para
totalizar a precipitação diária, sendo operado por um operador que mora nas
proximidades do aparelho. O pluviógrafo é um aparelho que registra
automaticamente as variações da precipitação ao longo do tempo. Este aparelho
pode ser gráfico ou digital e é visitado periodicamente por um obstr;ador ou
equipe que controla a rede de aparelhos.

5.5 Análise dos dados de precipitação

O objetivo de um posto de medição de chuvas é o de obter uma série


ininterrupta de precipitações ao longo dos anos (ou o estudo da ''ariação das
intensidades de chuva ao longo das tormentas). Em qualquer caso pode ocorrer
a existência de períodos sem informações ou com falhas nas observações,
devido a problemas com os aparelhos de registro e/ou com o operador do posto.
Os dados coletados devem ser submetidos a uma análise antes de serem
utilizados. As causas mais comuns de erros grosseiros nas observações são: a)
preenchimento errado do valor na caderneta de campo; b) soma errada do número
de provetas, quando a precipitação é alta; c) valor estimado pelo observador,
por não se encontrar no local no dia da amostragem; d) crescimento de
vegetação ou outra obstrução próxima ao posto de observação; e) danificaçao
do aparelho; f) problemas mecânicos no registrador gráfico.
O primeiro passo para se preparar os dados para o tratamento estatístico
consiste na identificação e correção desses erros. Após esta análise as
séries poderão apresentar lacunas que devem ser preenchidas por alguns dos
métodos indicados a seguir.
Precipitação 183

5.5.1 Preenchimento de falhas

Método de ponderação regional


y
E um método simplificado normalmente utilizado para o preenchimento
de séries mensais ou anuais de precipitações, visando a homogeneização do
período de informações e à análise estatística das precipitações. Para um grupo
de postos, são selecionados pelo menos três que possuam no mínimo dez anos
de dados. Para um posto Y que apresenta falhas, as mesmas são preenchidas
com base na seguinte equação

1 r xl x2 , x3 ,,
y = — [ ---- — + — — -+ — ] -ym
3 Xml Xm2 Xm3 (5.1)

onde yc é a precipitação do posto Y a ser estimada; xl. x2 e x3 = as precipitações


correspondentes ao mês (ou ano) que se deseja preencher, observadas em três
estações vizinhas; ym = a precipitação média do posto Y; xml, xm2, xm3 = as
precipitações médias nas três estações circunvizinhas.
Os postos vizinhos escolhidos devem estar numa região ciiinatológica
semelhante ao posto a ser preenchido. Por exemplo, quando um posto se
encontra próximo a um divisor importante como a Serra do Mar. mesmo
havendo outro posto geograficamente próximo do outro lado do divisor, este
rum deve ser escolhido, pois provavelmente os mesmos terão comportamen­
tos distintos devido à precipitação orográfica. () preenchimento efetuado
por esta metodologia c simples c apresenta algumas limitações, quando cada
valor é visto isoladamente. O resultado estatístico da precipitação não sofre
significativamente com as limitações deste preenchimento, o valor preen­
chido é utiiizado para homogeneizar séries de precipitações para a análise
estatística regional. Para o preenchimento dc valores diários de precipitação
não se deve utilizar esta metodologia, pois os resultados podem ser muito
ruins. Normalmente valores diários são de difícil preenchimento devido a
grande variação espacial e temporal da precipitação para os eventos de tre-
qüências médias e pequenas.

Método de regressão linear

Um método mais aprimorado de preenchimento de falhas consiste em


utilizar as regressões linear simples ou múltipla apresentadas nos capítulos 4 c
17. Na regressão linear simples, as precipitações do posto com falhas e de um
posto vizinho são correlacionadas. As estimativas dos dois parâmetros da equa­
ção podem ser obtidas graficamente ou através do critério de mínimos quadra­
dos. No primeiro caso, num gráfico cartesiano ortogonal são plotados os
184 Hidrologia

valores correspondentes aos dois postos envolvidos e traçada, a sentimento, a


reta que passa pelo ponto definido pelos valores médios das duas variáveis
envolvidas e de melhor ajuste a nuvem de pontos. No ajuste por mínimos
quadrados utiliza-se a metodologia descrita nos referidos capítulos. Deve-se
ter o cuidado de escolher um período comum de observação representativo.
Na regressão múltipla as informações pluviométricas do posto Y é
correlacionada com as correspondentes observações de vários postos vizinhos,
através da equação seguinte:

yc = Xli + ai X2i + • • • + an-i Xni + an (5.2)

onde n = o número de postos considerados, ao, ai, • • • *, an = os coeficientes


a serem estimados e xli, X2i, ♦**, xni = as observações correspondentes
registradas nos postos vizinhos. Uma outra alternativa pode ser a relação
potencial do tipo

ai a2 a3 an _
yci = ao* x • x * x *» * • x (5.3)
1i 2i 3i ni

Esta expressão é linearizada através do uso dos logaritmos dos valores


das variáveis envolvidas. Ainda, existe a possibilidade de se introduzir-se
no lado direito das equações 5.2 e 5.3 outras variáveis explicativas
adicionais, tais como características topográficas e climáticas da região.

Método de ponderação regional com base em regressões lineares

Este método é uma combinação dos dois anteriores e consiste em


estabelecer regressões lineares entre o posto com dados a serem preenchidos,
Y, e cada um dos postos vizinhos, Xlt X2, * • •, X^. De cada uma das regressões
lineares efetuadas obtém-se o coeficiente de correlação r, e estabelecem-se
fatores de peso, um para cada posto. A expressão fica

W - v J(r + r + * • * + r ) (5.4)
xj yxj yxl yx2 yxn

sendo W . = o fator de peso entre os postos Y e X., r - o coeficiente de


J y*j
correlação entre os postos citados e n = o número total de postos vizinhos
considerados. A soma de todos os fatores de peso deve ser a unidade.
Finalmente, o valor a preencher no posto Y é obtido por

y = x W + x W + ** •• •• + x W (5.5)
C 1 xl 2 x2 n. xn
Precipitação 185

onde, para simplificar a notação, foi suprimido o subíndice i nas observações


dos postos vizinhos e no correspondente valor calculado.

Exemplo 5.1. Na tabela 5.1 são apresentadas as precipitações totais


correspondentes ao mês de julho (período 1957-75) observadas nos seguintes
postos localizados no estado do Paraná (DNAEE, 1984); Salto Osório, Balsa do
Santana, Ponte da Vitória e Águas do Verê. Admitindo-se desconhecido o
registro correspondente ao ano 1968 no posto Águas do Verê, preencha o mesmo
com base nos três métodos apresentados anteriormente.

Tabela 5.1. Precipitações de julho, mm (DNAEE,1984).


Ano Sal to Balsa do Ponte do Águas do
Osório Santana Vi torino Verê
(D (2) (3) (4)
1957 (*)329,4 304,5 326,5 355,7
58 152,6 190,9 196,9 243 a
59 (*)57,3 45,3 43,3 39,7
60 31,6 80,0 84,1 78,0
61 23,9 59,7 26,7 31,4
62 75,8 81,0 104,3 70,6
63 51,8 37,9 32,4 29,5
64 114,6 116,5 106,4 135,1
65 84,6 232,0 289,6 216,6
66 • 92,0 139,0 122,7 107,5
67 85,8 96,6 100,2 87,8
68 89,8 80,0 92,7 111,1
69 129,2 124,5 108,7 68,8
70 88,6 149,8 174,6 150,0
71 153,2 13733 163,4 120,4
72 184,2 : 157,5 137,5 174,4
73 98/2 86,4 95,8 79,7
74 81,8 87,6 77,9 80,9
75 59,0 50,1 83,7 (*)54,9
*ok>
O

Média 120,92 126/37 118,01


Desvio 70,18 69,14 80,14 84,71
(*) valores estimados pelo DNAEE.

Solução; Método de ponderação regional - As ponderações entre os postos


ficam: S.Osório-Águas do Verê - pi4 = 118,01/105,20 - 1,1218; B.Santana-Aguas
do Verê - p24 = 118,01/120,92 = 0,9759; P.Vitorino-Águas do Verê - p34 =
118,01/126,27 = 0,9346
186 Hidrologia

yc= 1/3 *[89,8 *1,1218 + 80,0*0,9759 + 92,7*0,9346] = 88,46 mm

- Método de regressão simples: S.Osório-Águas do Verê - yc= 11,4223 +


1,0132 x = 102,40 mm (r = 0,839); B.Santana-Águas do Verê yc= -24,5204 +
1,1787 x = 69,77 mm (r = 0,962); P.Vitorino-Águas do Verê yc= -6,0834 +
0,9820 x = 84,95 m m ( r = 0,932);
- Método de ponderação regional de regressões: S.Osório: Wxi=0,3071;
B.Santana Wx2 = 0,3519; P.Vitorino : Wx3 = 0,3410 e yc= 89,8*0,3071 +
80,0*0,3519 + 92,7*0,3410 = 87,34 mm
Conforme os cálculos indicados observa-se que todos os métodos
produziram valores inferiores àquele registrado. A razão básica deste
comportamento é que o valor realmente observado no ano de 1968 foi
sensivelmente maior que os registrados nos postos vizinhos.

5.5.2 Análise de consistência de séries pluviométricas

Após o preenchimento da série é necessário analisar a sua consistência


dentro de uma visão regional, isto é, comprovar o grau de homogeneidade dos
dados disponíveis num posto com relação às observações registradas em postos
vizinhos. O método da Dupla Massa, desenvolvido pelo Geological Survey (USA),
é uma prática comum adotada no Brasil, sendo válido apenas para séries
mensais ou anuais.
O método consiste em selecionar os postos de uma região, acumular para
cada um deles os valores mensais (se for o caso), e plotar num gráfico
cartesiano os valores acumulados correspondentes ao posto a consistir (nas
ordenadas) e de um outro posto confiável adotado como base de comparação (nas
abscissas). Um aprimoramento do método consiste em obter-se os valores médios
das precipitações mensais acumuladas em vários postos da região e utilizar-se
a série, assim formada, como base de comparação (plotando estes valores nas
abscissas). Se o$ valores do posto a consistir são proporcionais aos
observados na base de comparação, os pontos devem-se alinhar segundo uma
única reta (figura 5.1.a). A declividade da reta determina o fator de
proporcionalidade entre ambas as séries. Também é possível que os postos não
se alinhem segundo uma única reta podendo apresentar as seguintes situações:

a) mudança na declividade, determinando duas ou mais retas. Constitui o


exemplo típico derivado da presença de erros sistemáticos, mudança nas
condições de observação ou a existência de uma causa física real, como
alterações climáticas no local provocadas pela presença de reservatórios
artificiais. Para se considerar a existência de mudança na declividade, é
prática comum exigir a ocorrência de pelo menos cinco pontos sucessivos
P recip ita çã o 187
p osto
do
A cu m u la d o

a) sem inconsistências b) com mudança de tendência

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c) erros de transcrição d) diferentes regimes

Figura 5.1. Casos típicos relativos ao método de Dupla Massa.


188 H id ro lo g ia

alinhados segundo a nova tendência. Para corrigir os valores correspondentes


ao posto sob análise, existem duas possibilidades: corrigir os valores mais
antigos para a situação atual ou corrigir os valores mais recentes para a
condição antiga.
A escolha da alternativa de correção depende das causas que provocaram a
mudança da declividade. Por exemplo, se foram detectados erros no período
mais recente, a correção deverá ser realizada no sentido de preservar a
tendência antiga. Os valores deverão ser acumulados a partir do período para
o qual se deseja manter a tendência da reta. Os valores inconsistentes podem
ser corrigidos de acordo com a seguinte expressão (figura 5.1.b):

Pc = Pa* + Ma/Mo * APo (5.6)

onde Pc = a precipitação acumulada ajustada à tendência desejada, Pa* - valor


da ordenada correspondente à interseção das duas tendências, Ma = coeficiente
angular da tendência desejada, Mo = coeficiente angular da tendência a
corrigir e APo = Po-Pa*, sendo Po = valor acumulado a ser corrigido;

b) alinhamento dos pontos em retas paralelas: ocorre quando existem erros de


transcrição de um ou mais dados ou pela presença de anos extremos em uma das
séries plotadas (figura 5.1c). A ocorrência de alinhamentos, segundo duas ou
mais retas aproximadamente horizontais (ou verticais), pode ser a evidência
da comparação de postos com diferentes regimes pluviométricos;

c) distribuição errática dos pontos : geralmente é resultado da comparação de


postos com diferentes regimes pluviométricos, sendo incorreta toda associação
que se deseje fazer entre os dados dos postos plotados (figura 5.1d).

Uma vez finalizada a análise de consistência, pode ser necessária uma


revisão dos valores previamente preenchidos. O preenchimento das séries é uma
tarefa efetuada antes da consistência para evitar distorções no gráfico de
dupla massa, mas se neste gráfico forem observadas modificações de
tendências, o preenchimento deverá ser revisado.

Exemplo 5.2, Com base nos registros apresentados por DNAEE (1985), analise a
consistência da série de precipitações totais anuais do posto Indaial (SC)
para o período 1945-63. Utilize como base de comparação os registros dos
postos de Blumenau, Apiúna e Ibirama, localizados na mesma região geográfica
(tabela 5.2).

Solução: Os valores foram acumulados no sentido do tempo atual para o mais


antigo, A figura 5.2 permite observar a existência de uma leve mudança na
declividade da reta, entre os anos de 1945 e 1952. Aplicando a equação 5.6,
P recip ita çã o 189

com os valores de Pa*, Ma e Mo obtidos do gráfico, obtém-se as precipitações


corrigidas indicadas na tabela 5.2. Para obter-se as estimativas corrigidas
das precipitações até 1950, aplica-se a equação 5.6, com Ma = 1,0448 e
Mo = 1,1667. Os valores corrigidos são indicados na tabela 5.2.

Método do Vetor Regional

O método do vetor regional, desenvolvido por Hiez (1977, 1978) constitui


outra alternativa para realizar as análises de consistência e preenchimento
de dados pluviométricos em níveis mensal e anual. O vetor regional é definido
como uma série cronológica, sintética, de índices pluviométricos anuais (ou
mensais), oriundos da extração por um método de máxima verossimilhança da
informação mais provável contida nos dados de um conjunto de estações de
observação, agrupadas regionalmente.
Seja P a matriz de n observações (precipitações) ao longo do tempo em m
estações localizadas numa região considerada homogênea:

Tabela 5.2. Precipitações anuais, mm (DNAEE, 1985).


Ano Apiuna Blumenau Indaial Xbirama Indaial
corrigida
1945 1208,1 13524 13193 1111,4 1148,1
46 1770,8 1829,0 2002,3 1645,0 1742,8
47 15023 1516,7 1976,1 1461,4 1315,0
48 1409,9 1493,8 15103 1471,8 12473
49 1258,8 13013 1432,9 1145,4 13273
50 1358,0 1403,9 1548,0 1443,9 11273
51 1044,7 12303 1295,4 1197,7
52 1159,1 1322,1 1330,9 1243,8
53 1255,6 1289,4 1356,8 1249,0
54 18513 16523 16923 1673,3
55 1240,0 1289,8 1274,4 1474,3
56 1237,0 12663 1246,6 1402,8
57 1854,7 1941,1 2036,6 1928,6
58 1758,0 1844,6 18933 14043
59 1204,0 1564,6 12873 1025,1
60 1318,9 18823 1583,7 1224,9
61 1751,9 18083 1712,1 1410,6
62 12193 12743 1144,1 11783
63 1530,9 1630,0 1649,0 1392,4
190 H id r o lo g ia

P a c u m u lo d o X 1 0 0 0 ( mm) , P o s t o m edio

Figura 5.2. Aplicação do método Dupla Massa

P ll Pl2 - Plm
P21 P22 - P2m
P = (5.7)

Pnl Pn2 - Pnm

0 método consiste em determinar dois vetores ótimos, L e C cujo produto


é uma aproximação da matriz P. 0 vetor L é um vetor coluna de dimensão n que
recebe 0 nome de vetor regional, enquanto que 0 vetor C é um vetor linha de
dimensão m que representa os coeficientes característicos de cada estação. O
P r e cip ita çã o 191

vetor L contém índices que são únicos para toda a região e estão relacionados
com as alturas precipitadas em cada posto por meio dos coeficientes contidos
no vetor C. A estimativa da altura precipitada no ano i, no posto j, resulta,
A
portanto, p = 1 • c .
ú i j
Para cada mês (ou ano), correspondente a uma estação, existirá uma
diferença entre os valores observado e estimado, de modo que é possível
estabelecer uma matriz D de diferenças (ou erros), cujos elementos são
calculados segundo

d.. = p.. - 1.* c. (5.8)


y ij i j

Os elementos da matriz L e C são determinados pela minimização


quadrática da matriz D. A soma dos quadrados das diferenças é
n m
FO (5.9)
i i U
i= l J=1

Diferenciando a equação 5.9 com relação as incógnitas 1 e c e


1 J
igualando cada expressão a zero, resulta um sistema nao-linear de n+m
equações e n+m incógnitas cuja solução é:

c. = y i.« p .. / y i2 ; j = i, • • *, m (5.10)
j Li í íj Li í
1 í
m m

1. = Y c.* p.. / 7 c2 ; i = 1, * • •, n (5.11)


i L } y u )

A solução do sistema pode ser alcançada mediante processo iterativo,


partindo de uma estimativa inicial do vetor regional. É prática comum adotar
para a estimativa inicial do i-ésimo valor do vetor L a média aritmética das
precipitações registradas nas m estações no ano (ou mês), ou seja:

m
1 = 1/m Y P (5.12)
i L ij
j
Com essa estimativa inicial, resolve-se a equação 5.10. Obtidos os
elementos do vetor C, aplica-se o mesmo processo para recalcular os elementos
192 Hidrologia

do vetor L. Segundo os autores, o processo converge rapidamente. Obtido o


vetor L é preciso calcular os erros relativos segundo a expressão:

e.. = d./O.* c.) = [p. _/(!,♦ c.)] - 1 (5.13)


ij ij i j >J i j

e os seus valores acumulados:

(5.14)

Os erros acumulados obtidos pela expressão 5.14 são plotados em função


do tempo, originando um gráfico denominado duplo-acumulativo, relativo às
séries observada e gerada com base no vetor regional. Cabe destacar que o
segundo termo do lado direito da equação 5.14 (representa a média da soma
acumulada dos erros relativos), 6 incorporado à equação para permitir a
centralização do gráfico.
O método procura identificar, neste tipo de gráfico, desvios anormais
apresentados pelas séries. Basicamente, existem dois tipos de desvios
anormais: isolados - resultam de erros grosseiros de medição ou de
transcrição. São identificados por uma variação abrupta e pontual do gráfico
duplo-acumulativo; e sistemáticos - correspondem aos defeitos nos aparelhos
e/ou às mudanças do local de instalação dos mesmos.
Os critérios utilizados na correção dos desvios dependem da análise de
cada caso particular, mas, em geral, um desvio isolado só pode ser-corrigido
diante da certeza de que o mesmo não 6 correto. Nesse caso, se faz a
substituição desse valor pelo estimado, através do vetor regional. Se o
gráfico apresentar desvios sistemáticos, a correção se realiza segundo as
equações seguintes:

(5.15)

sendo

K = l/(e, + 1) (5.16)

e
Precipitação 193

(5.17)

C —
p = a precipitação corrigida; e = ao desvio médio, entre valores observados
e calculados, correspondente ao período com tendência a ser corrigida; r = ao
número de observações de dito período.
Se o regime pluviométrico da região é caracterizado por uma marcada
variabilidade sazonal, é possível que seja necessário determinar mais de um
vetor para cada ano (vetores em nível sazonal ou, ainda, mensal). O método
apresenta várias vantagens sobre o tradicional enfoque de Dupla Massa, pois,
além de trabalhar com a informação mais provável, é de fácil implementação
computacional e possibilita o seu uso em trabalhos de regionalização
hidrológica.

Exemplo 53. Determine o vetor regional correspondente às precipitações


anuais de 12 estações píuviométricas do estado do Ceará, para o período 1962-
67. Utilize os registros obtidos no banco de dados do DNAEE, reproduzidos na
tabela 5.3.

Solução: Utilizando o programa apresentado por Cochonneau et al(l991), após


13 iterações, obteve-se o vetor regional indicado na tabela 5.4
O vetor coloca em evidência o período 1979-83 e também o excepcional ano
de 1974. Este vetor foi utilizado para calcular os valores correspondentes ao
posto 1. Os valores calculados e os desvios são apresentados na tabela 5.4.
Na tabela não se observam mudanças destacadas ao longo do período analisado.
Os desvios relativos se referem à diferença entre valores observados e
calculados com relação à média de ambos os valores. Os desvios acumulados
foram obtidos conforme a equação 5.14.
A média dos valores observados para o período (25 valores) foi de 757,5
mm, enquanto que a média dos calculados foi de 704,9 mm. No ano de 1974 a
média dos valores calculados com base no vetor regional foi de 737,4 mm.

5.6 Precipitação média numa área

Nos itens anteriores foram abordados métodos de tratamento de dados


pluviométricos e piuviográficos que, com diferentes objetivos, visaram
produzir estimativas pontuais de precipitação. Para calcular a precipitação
média numa superfície qualquer, é necessário utilizar as observações dentro
dessa superfície e nas suas vizinhanças. Aceita-se a precipitação média como
sendo uma lâmina de água de altura uniforme sobre toda a área considerada
(figura 5.3.a), associada a um período de tempo dado (como uma hora, dia,
194 Hidrologia

mês* ano). Isso não deixa de ser uma abstração (Sanchez, 1986), a chuva real
obedece a distribuições espaciais e temporais variáveis (figura 5.3.b).
Existem diversos métodos para determinar a precipitação média numa área,
conforme a ponderação que se faz das observações pontuais disponíveis (figura
5.3c). A seguir são descritos os métodos mais usuais.

Método da média aritmética - Admite-se que todos pluviômetros têm o mesmo


peso. A precipitação média é então calculada como a média aritmética dos
valores medidos:

Pm = 1/n • Z Pi (5.18)

Tabela 5.3. Precipitações totais anuais '


Posto 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
Ano
1962 461 1003 745 961 475 565 566 568 722 619 616 918
1963 982 1142 1250 1444 649 726 746 714 1082 675 808 —

1964 1203 í 118 1535 1220 883 1422 1048



1411 1130 1422 —

1965 812 1070 993 1515 632 832 703 630 547 692 903 1009
1966 425 661 745 408 334 411 601 505 526 494 623 788
1967 1022 1564 1393 732 — - - - —
683 809 1000 1066 1287
1968 831 —
921 836 718 710 822 581 553 721 855 926
1969 533 852 893 718 — 611 —
568 956 854 1349 1361
1970 388 629 635 477 332 529 380 344 409 609 563 589
1971 872 —
1060 774 477 796 667 651 868 695 781 1280
1972 596 940 626 620 —
690 405 523 603 547 526 810
1973 906 2029 1154 1206 738 1012 988 639 966 770 988 1230
1974 —
3457 1856 1725 1197 2241 1722 —
1592 1422 1074 2913
1975 1016 1701 1044 1201 684 607 840 632 — 791 922 1310
1976 773 918 838 —
435 706 562 304 618 338 666 1048
1977 793 1342 1295 1154 906 811 930 774 940 768 918 1592
1978 908 1068 649 710 606 608 550
- - - 639 —
630 —

1979 453 731 627 374 —


555 424 414 458 359 427 470
1980 515 778 799 554 402 530 555 599 565 603 608 486
1981 529 786 921 715 420 412 620 422 501 530 718 —

1982 499 734 589 560 461 705 —


456 687 613 — —

1983 171 332 403 316 143 — —


258 —
275 — —

1984 931 1269 1213 1218 922 924 —


708 —
830 871 795
1985 1988 2681 2086 2179 170 2084 1146 1129 1438 1210 1669 1668
1986 946 1196 1503 1587 — —
1305 824 1033 804 —
1322
1987 386 740 768 517 — —
333 —
517 388 430 600
Precipitação 195

Tabela 5.4. Resultados do exemplo 5.3


Ano Nr.obs. Vetor Obs. Cale. Desvios Desvios
relativos acumulados
1962 12 0,9284 460,5 652,7 -0,349 -0,733
1963 11 1,0223 982,2 728,7 0,299 -0,434
1964 10 1,6931 1203,2 1202,5 0,001 -0,433
1965 12 1,0180 812,1 722,3 0,117 -0,316
1966 12 0,7874 424,7 536,2 -0,233 -0,549
1967 9 1,4209 1021,7 1014,2 0,007 -0,542
1968 11 1,0923 831,4 668,8 0,218 -0,324
1969 10 0,9216 532,8 535,1 -0,004 -0,328
1970 12 0,5423 388,3 456,6 -0,162 -0,486
1971 11 1,0251 871,7 750,9 0,149 -0,337
1972 11 0,8316 595,9 592,2 0,006 -0,331
1973 12 1,2612 906,2 843,8 0,071 -0,260
1974 10 2,1793 1386,0
1975 11 1,0834 10163 755,9 0,296 0,032
1976 11 0,8362 772,7 588,8 0,272 0,304
1977 12 1,2079 793,0 846,7 -0,066 0,238
197o 9 0,9541 907,6 680,7 0,288 0,526
1979 11 0,6556 453,3 468,5 -0,033 0,493
1980 12 0,7224 514,7 507,7 0,014 0,507
1981 11 0,6680 529,3 482,1 0,093 0,600
1982 9 0,7242 498,7 520,5 -0,043 0,557
1983 7 0,4142 171,1 295,1 -0,545 0,012
1984 10 0,1260 931J 807,8 0,142 0,154
1985 12 1,8261 1987,7 12993 0,425 0,579
1986 9 1,3381 946,2 936,7 0,010 0,589
1987 9 1,6746 386,0 473,9 -0,205 0,384

onde Pm = a precipitação média na área em mm, Pi = precipitação média no i-


ésimo pluviômetro e n o número total de pluviômetros. O método ignora as
variações geográficas da precipitação, portanto é aplicável apenas em regiões
onde isso possa ser feito sem incorrer em grandes erros, como áreas planas
com variação gradual e suave do gradiente pluviométrico e com cobertura de
postos de medição bastante densa.

Método de Thiessen - Este método considera a não-uniformidade da distribuição


espacial dos postos, mas não leva em conta o relevo da bacia. A metodologia
consiste no seguinte (figura 5.4): a) ligue os postos por trechos retílineos;
b) trace linhas perpendiculares aos trechos retílineos passando pelo meio da
196 Hidrologia

linha que liga os dois postos; c) prolongue as linhas perpendiculares até


encontrar outra. O polígono é formado pela intersecção das linhas,
correspondendo à área de influência de cada posto; d) a precipitação média é
calculada por

Pm = 1/A • £ AiJPi (5.19)

onde Ai = a área de influência do posto i; Pi = a precipitação registrada no


posto i e A = a área total da bacia.

Superfície

Precipitação me’dia

Figura 5.3. Conceito de Precipitação média (Sanchez,1986)

O método dá bons resultados em terrenos levemente acidentados, quando a


localização e exposição dos pluviômetros são semelhantes e as distâncias
entre eles não são muito grandes. Facilita o cálculo automatizado, já que uma
vez estabelecida a rede, os valores de Ai permanecem constantes, mudando
apenas as precipitações Pi.

Método das isoietas - As isoietas são linhas de igual precipitação que podem
ser traçadas para um evento ou para uma duração específica. O traçado das
isoietas pode seguir a seguinte seqüência (figura 5.5): a) localize os postos
no mapa da região de interesse e escreva o total precipitado para o período
escolhido ao lado de cada posto; b) esboce linhas de igual precipitação,
escolhendo números inteiros ou característicos; c) ajuste estas linhas por
interpelação entre os pontos; d) utilize um mapa de relevo e superponha com o
mapa de isoietas. Faça um ajuste destas linhas com o relevo; e) para se obter
^V-:;0Ã-'

Precipitação 197

a precipitação planimetra-se a área entre isoietas, Ay+i, multiplique pela


média das precipitações das respectivas isoietas, (Pi+Pi+i)/2, e divide-se
pela áreas total (figura 5.5):

Pm = 1/A . £Aü+l . (Pi+Pi+i)/2 (5.20)

Exemplo 5.4. Determine a precipitação média na bacia da figura 5.6 com base
nos dados pluviométricos indicados na mesma.

Solução: - método da média aritmética:

Pm = (41,15 + 64,52 + 107,44 + 92,96 + 53^4)/5 = 71,88 mm

- Método dos polígonos de Thiessen: Na figura 5.6 são apresentados as


áreas Ai e os fatores de peso Wi = Ai/A, correspondentes a cada um dos
polígonos indicados na figura 5.6. O produto de Ai*Wi fornece, para cada
polígono, a precipitação média ponderada. A precipitação média na bacia é a
soma das precipitações correspondentes a cada polígono, resultando Pm = 70,67
mm
- Método das isoietas: Com base nas informações topográficas foram
determinadas as isoietas da figura 5.7. O procedimento utilizado para
calcular Pm é indicado na tabela 5.5, resultando Pm = 64,92 mm.
198 Hidrologia

Tabela 5.5. Método das isoietas


isoieta ^acum Ai ^méd Volume

100 u i 1.11 103,72 115,13


75 13,48 12,47 87,50 1091,12
50 26,58 13,10 62,50 818,75
25 37,50 10,92 37,50 409,50
Total 37,50 37,50 29122 2434,50

5.7 Análise de frequência de séries mensais e anuais

A precipitação é um processo aleatório. A previsão determinística deste


processo somente pode ser realizada com antecedência de poucos dias, mesmo
assim com margem de erro significativa. As previsões de médio prazo são
limitadas quanto à quantidade e tempo de ocorrência. A sua previsão, na
maioria dos problemas, é realizada com base na estatística de eventos
passados. Na prática, o conhecimento estatístico das precipitações apresenta
interesse de ordem técnica por sua freqüente aplicação nos projetos
associados a aproveitamentos de recursos hídricos. Os estudos estatísticos
permitem verificar com que freqüência as precipitações ocorreram com uma dada
maenitude, estimando as probabilidades teóricas de ocorrência das mesmas.
Precipitação 199

( 23,11

precip. (Pi.) Á r e o ( A i ) F a to r de Ponderação


peso ou peso
(mm} (km 2 )
(WL) P ÍL )-W (L )
41,15 6,10 0,163 6,707
2 107.44 8,36 0,223 23,959
3 21,08 1,65 0,044 3,807
4 53,34 7,53 0,201 1 0 ,7 2 1

' 71,8 8 » 5 46,74 0, 8 4 0,022 1,028


6 92,96 4,70 0, 125 11,620
7 71,86 0,73 0,019 1,366
8 64,52 6,16 0,164 10,501
9 23,11 1,41 0,038 0,870
To to I 37,48 0,999 70,679

P= 7 0 , 6 7 mm

M E T 0 0 0 M E O IA A R IT I M E T IC A
41,15 + 6 4 , 5 2 + 1 0 7 , 4 4 + 9 2 , 9 6 + 5 5 , 3 4
= 7 1 , 8 8 mm
P - 7? , 8 8 mm

Figura 5.6. Informações pluviométricas coletadas na região de uma bacia


hidrográfica (exemplo 5.4).

Uma série anual de precipitações totais é obtida pela soma das


precipitações diárias de cada ano. Por exemplo, para um posto com 20 anos de
registros existirão 20 totais anuais. Conforme o Teorema do Limite Central,
como o total anual (ou o total mensal) de precipitações é formado pela
soma dos valores diários (que são valores admitidos aleatórios), é natural
que a primeira distribuição a ser testada seja a distribuição normal (ou de
Gauss).
Caso a curva teórica não se ajuste bem aos valores empíricos é
recomendável testar o ajuste de outra distribuição, ou o ajuste gráfico pelo
traçado de uma curva que melhor se ajuste aos pontos. O ajuste de séries de
valores totais mensais segue o mesmo procedimento indicado para as séries de
valores totais anuais, No capítulo 4 são apresentadas as metodologias de
ajuste de uma distribuição estatística com os dados hidrológicos.
200 Hidrologia

9
o
f 23,11 )

Figura 5.7. Isoietas do exemplo 5.4

5.8 Precipitações máximas

A precipitação máxima é entendida como a ocorrência extrema, com


duração, distribuição temporal e espacial crítica para uma área ou bacia
hidrográfica. A precipitação pode atuar sobre a erosão do solo, inundações em
áreas rurais e urbanas, obras hidráulicas, entre outros. A disponibilidade de
longas séries de precipitações é, em geral, muito mais freqüente que a de
vazão. O estudo das precipitações máximas é um dos caminhos para conhecer-se
a vazão de enchente de uma bacia.
As precipitações máximas são retratadas pontualmente pelas curvas de
intensidade, duração e freqüência (i-d-f) e através da Precipitação Máxima
Precipitação 201

Provável (PMP). A primeira relaciona a duração, a intensidade e o risco da


precipitação ser igualada ou superada, A PMP é definida segundo WMO (1973)
por "a PMP é a maior coluna pluviométrica, correspondente a uma dada duração,
fisicamente possível de ocorrer sobre uma dada área de drenagem em uma dada
época do ano". Este último método é mais utilizado para grandes obras onde o
risco de rompimento deve ser mínimo. Os métodos mencionados caracterizam a
precipitação máxima pontual, no entanto as características de sua
distribuição temporal (hietograma) e espacial são importantes para a
caracterização da vazão na bacia.

5.8.1 Determinação de curvas intensidade-duração-freqüência

Correlacionando intensidades e durações das chuvas verifica-se que


quanto mais intensa for uma precipitação, menor será sua duração. A relação
cronológica das maiores intensidades para cada duração pode ser obtida de uma
série de registros pluviográficos de tormentas intensas. Da mesma forma,
quanto menor for o risco maior será a intensidade. A função i = f( t, p),
onde i = intensidade, t = duração, p = probabilidade ou Tr =l/p, é
determinada com base nos dados dos pluviógrafos do local de interesse ou
estimada com base nos dados dos postos vizinhos.

Determinação das curvas curvas i-d-f em locais com dados

Para projetos de obras hidráulicas, tais como vertedores de barragens,


sistemas de drenagem, galerias pluviais, dimensionamento de bueiros, entre
outros, é necessário conhecer as três grandezas que caracterizam as
precipitações máximas: intensidade, duração e freqüência (ou tempo de
retomo). A intensidade pode ser substituída pela precipitação total na
duração, denominando-se as curvas, neste caso, de p-d-f.
A determinação da relação entre estas três variáveis (curvas i-d-f) deve
ser deduzida das observações das chuvas intensas durante um período de tempo
suficientemente longo e representativo dos eventos extremos do local.
Na análise estatística da estrutura hidrológica das séries de chuva
podem ser seguidos dois enfoques alternativos: séries anuais ou séries
parciais. À escolha de um ou outro tipo de série depende do tamanho da série
disponível e do objetivo do estudo. A metodologida de séries parciais e
utilizada quando o número de anos de dados 6 pequeno ( < 12 anos) e os
tempos de retomo que serão utilizados são inferiores a 5 anos. Wilken (1978)
apresenta maiores detalhes sobre essa metodologia.
À metodologia de série anuais baseia-se na seleção das maiores
precipitações anuais de uma duração escolhida. Com base nesta série de
valores é ajustada uma distribuição de extremos que melhor se ajuste aos
valores.
202 Hidrologia

Na construção da curva i-d-f é necessário ajustar uma distribuição


estatística aos maiores valores anuais de precipitação para cada duração. A
escolha das durações depende da discretização dos dados e da
representatividade desejada para a curva. Quando o aparelho permite
discretização de até 5 minutos, em geral são escolhidas as seguintes
durações: 5, 10, 15, 30 e 60 min, 1, 2, 4, 6, 12, 18 e 24 horas. A
metodologia segue a seguinte seqüência: a) para cada duração são obtidas as
precipitações máximas anuais com base nos dados do pluviògrafo; b) para cada
duração mencionada é ajustada uma distribuição estatística; c) dividindo a
precipitação pela sua duração obtém-se a intensidade; d) as curvas
resultantes são a relação i-d-f. Na figura 5.8 é apresentada a família de
curvas i-d-f definida por DMAE (1972) para um posto em Porto Alegre.

Figura 5.8. Curvas intensidade-duração-freqüência para a cidade de


Porto Alegre, RS (DMAE, 1972).
Precipitação 203

As curvas também podem ser expressas por equações genéricas que têm a
seguinte forma:

b
a . Tr
(5.21)
(t + c)d

onde i = intensidade, geralmente expressa em mm/h; Tr = o tempo de retomo,


em anos; t = a duração da chuva, em minutos, e a, b, c e d são parâmetros que
devem ser determinados para cada local.
A equação permite sintetizar o feixe de curvas, mas poderá apresentar
erros, já que o ajuste nem sempre é perfeito. O ajuste pode ser realizado
linearizando a equação 5.21, através do uso de logaritmos e utilizando
regressão múltipla para determinação dos parâmetros. Na literatura existem
várias equações determinadas para diferentes cidades do país (tabela 5.8).
U m trab alh o p io n e iro na análise de registros p lu v io g ráfico s c pluvio-
m c tricôs, para a determ inação dc curvas i-d-f, foi apresentado por
Pfastcttcr (1957). O autor estabeleceu essas curvas para 9<S p o s t o s lo­
c a liz a d o s e m d ife re n te s reg iões do Brasil. A partir da p lo ta g c m d as cu rv as
n -d -f em escala b iiogarítm ica, o autor ajustou para cada posto a seguinte
equação em pírica:

P = R * [a*t + b • log (l+c*t)] (5.22)

onde P = a precipitação máxima em mm, t = duração d a precipitação em h o r a s ,


a, b e c constantes para cada posto c R = um fator de probabilidade, d e f i n i d o
como:

R = Tr(“ + (5.23)

sendo Tr = tempo de retomo em anos, a e (3 valores que dependem da duração da


precipitação e y uma constante (adotada para todos os postos igual a 0,25). O
fator [a*t + b-log (l+c*t)] fornece a precipitação em mm para um tempo de
recorrência de I ano; o fator R permite calcular a estimativa para outros
tempos de retomo. Na tabela 5.6 são apresentados os valores de cc válidos
para todos os postos estudados, para durações entre 5 min e 6 dias. Na
tabela 5.7, por sua vez, apresentam-se os valores de j3 (função da duração) e
de a, b e c correspondentes a cada um dos 98 postos.
Os coeficientes as equações de i-d-f, para diferentes cidades
brasileiras desenvolvidos após o estudo de Pfastetter, são apresentados de
forma resumida na tabela 5.8.
204 Hidrologia

Exemplo 5*5. Utilize o método empírico apresentado por Pfafstetter (1957)


para determinar: a) precipitação com 1 hora de duração e 10 anos de tempo de
retomo em Uruguaiana (RS); b) tempo de retomo de uma precipitação de 14 mm
e 5 minutos de duração acontecida em Florianópolis (SC).

Solução: a) para 1 hora de duração obtém-se: da tabela 5.6 a = 0,156; da


tabela 5.7 P = 0,120;a = 0,2;b = 38; c = 10, o que resulta

10[0,156+0,120/(100,25)] >
P = [0,2* l+38*log(l+10* 1)] = 66,53 mm

b) para 5 min de duração (0,083 horas) obtém-se: da tabela 5.6 a = 0,108; da


tabela 5.7 p = -0,04; a = 0,3 ; b - 33 ; c = 10

Tabela 5.6. Valores de a (Pfafstetter, 1957).


Duração a duração a duração a
5 min 0,108 15min 0,122 30min 0,138
lh 0,156 2h 0,166 4h 0,174
8h 0,176 14h 0,174 24h 0,170
48h 0,166 3d 0,160 4d 0,156
6d 0,152

Para Tr = 1 ano P/R = [0,3*0,083+33 • log(l+10• 0,083)] * 8,68 mm

Dividindo a precipitação observada pela precipitação correspondente a 1


ano de tempo de retomo obtém-se o fator R:

R = 14 mm/8,68 mm = 1,61

Dado que a equação 5.23 é não-linear com relação a Tr, este último valor
pode ser obtido com base na relação gráfica entre R e Tr (alternativa
utilizada pelo autor), ou pelo uso de método iterativo indicado a seguir. Da
equação (5.2) obtém-se:
i/(a+pmT)
Tr = R (5.24)

Considere Tro = R l/a como primeira iteração na equação 5.24. Calcule Tr


e repita o procedimento até que entre uma iteração e outra a diferença seja
pequena. Para o exemplo obtém-se:
Precipitação 205

m 1 S « 1/0,108 c

Tro =1,61 = 83,6 anos

Substituindo na equação 5.24, resulta Tr =152,2 anos. Após algumas


iterações ocorre a convergência para Tr =140 anos. Utilizando os gráficos
apresentados pelo autor obteve-se Tr = 115 anos. O valor obtido pela iteração
resolve a equação não-linear de forma precisa. A diferença encontrada pode
estar no ajuste gráfico dos coeficientes.

Tabela 5.7. Valores de (3, a, b e c para algumas cidades brasileiras


(Pfafstetter, 1957).
Postos valores de j} a b c
duração
5mi 15mi 30mi lh-6d
oOO

Aracaju-SE 0,00 0,04 0,20 0,6 24 20


o

Belem-PÀ -0,04 0,00 0,00 0,04 0,4 31 20


B.Horizonte-MG 0,12 0,12 0,12 0,04 0,6 26 20
C. do Sul-RS 0,0*0 0,08 0,08 0,08 0.5 23 20
Cuiabá-MT 0,08 0,08 0,08 0,04 0,1 30 20
Curitiba-PR 0,16 0,16 0,16 0,08 0,2 25 20
Florianópolis-SC -0,04 0,12 0,20 0,20 0,3 33 10
Fortaleza-CE 0,04 0,04 0,08 0,08 0,2 36 20
0,2
O
o
oo

Goiania-GO 0,08 0,08 0,12 30 20


RJaneiro -RJ -0,04 0,12 0,12 0,20 0,0 35 10
João Pessoa-Pa 0,00 0,00 0,04 0,08 0,6 33 10
Maceió-AL 0,00 0,04 0,08 0,20 0,5 29 10
Manaus-AM 0,04 0,00 0,00 0,04 0,1 33 20
Natal-RN -0,08 0,00 0,08 0,12 0,7 23 20
Niterói-RJ 0,08 0,12 0,12 0,12 0,2 27 20
Porto Alegre-RS 0,00 0,08 0,08 0,08 0,4 22 20
Porto Velho-RO 0,00 0,00 0,00 0,04 0,3 35 20
ooo

0,3 31 20
1

Rio Branco-AC 0,00 0,04 0,08


o

Salvador-BA -0,04 0,08 0,08 0,12 0,6 33 10


São Luiz-MA -0,08 0,00 0,00 0,08 0,4 42 10
São Carlos-SP -0,04 0,08 0,08 0,12 0,4 29 20
Uruguai ana-RS -0,04 0,08 0,08 0,12 02 38 10
206 Hidrologia

Estimativas das curvas i-d-f em locais sem dados pluviográficos

Freqüentemente é necessário determinar as relações entre a intensidade,


duração e ffeqüência para locais onde não se dispõe de postos pluviográficos.
Para tanto, podem ser aplicadas metodologias como as descritas a seguir que,
com base em dados disponíveis na região, permitem estimar estas relações no
local de interesse.

Método de Bell -Bell (1969) utilizou dados de vários continentes e ajustou a


seguinte equação

P lr = (0,35 In Tr + 0,76) • (0,54 t°’25 - 0,50) P®° (5.25)

onde t em minutos e Tr em anos. Á equação é válida para 5 ^ t ^ 120 minutos e


2 ^ Tr ^ 100 anos.

Tabela 5.8. Coeficientes da equação das curvas i-d-f para algumas


cidades brasileiras
Cidade í
, a b c d Observ. Autor

P. Alegre (Redenção) 1265 0,88/Tr°>05 12 0,052 (7)


P. Alegre (EPH) 509,859 0,72 10 0,196 (10)
P. Alegre (Aeroporto) 748,342 0,803 10 0,191 (10)
P, Alegre (8°D.Met.) 2491,78 1,021 16 0,192 (10)
Lages SC 170 0,465 0 Tr=5 anos; (30)
t ^20 min
Curitiba PR 5950 1,15 26 0,217 (33)
São Paulo SP 29,13 0,89 15 0,181 em mm/min (33)
São Paulo SP 27,96 0,86.Tr'0’0144 15 0,112 t s 60 min (33)
42,23 0,82 0,15 t > 60 min
Rio de Janeiro RJ 1239 0,74 20 0,15 (33)
* os coeficientes a, b, c e d se referem a equação 5.21

A equação acima permite a estimativa da precipitação de duração t e


tempo de retomo Tr (obedecidos os limites), conhecida a precipitação de 2
anos e 1 hora. Quando existe um posto com série curta, a análise por
séries parciais permite a estimativa desta precipitação. Bell (1969), com
base em estudos de Hersfield, estabeleceu uma relação para a precipitação
n 60
P , que é a seguinte:
2*
Precipitação 207

D60
P^ £ CC\ 10
= 6,69* 1 a”3 \4 * n0,33
*M (5.26)

para 0 í M í 50,8 mm e 1 ^ n * 80, onde M é a média das precipitações


máximas anuais com duração diária, em mm e n o número médio de dias de
tormentas.
Para o intervalo 50,8 ^ M ^ 114,3 e 1 ^ n ^ 80, a expressão é

(5.27)

Com base nas três últimas equações é possivel estimar a relação entre
intensidade, duração e freqüência para um local onde existam somente d a d o s
d e pluviômetro.

Método das relações de durações - E s t e m étodo bascia-se cm duas caracterís­


ticas o b s e r v a d a s nas curvas i-d-f c o rre sp o n d e n te s a postos lo calizados c m d iv er­
sas p a r t e s d o m u n d o : a ) e x i s t e a t e n d ê n c i a d a s c u r v a s de probabilidade u c dife­
rentes d u r a ç õ e s mantcrem-sc p a r a l e l a s e n t r e si ( q u e é s i m p l e s d c s e o b s e r v a r
q u a n d o a s m e s m a s s ã o g r a f i c a d a s n o p a p e l iog-iog); e b) p a r a d i f e r e n t e s l o c a i s ,
existe u m a g rande sim ilaridade nas relações entre precipitações m é d ias m á x i­
mas dc d iferentes d u ra ç õ e s (na realidade existe u m a tendência d e ita s relações a
m u d a r ie v e m e n te c o m o te m p o dc retorno)
As relações entre durações são obtidas segundo a exoressão

p r e c i p i t a ç ã o d c d u r a ç ã o tl

p r e c i p i t a ç ã o d c d u r a ç ã o t2

Os valores médios destas relações obtidos para o Brasil e para os


Estados Unidos são apresentados na tabela 5.9. Pode-se observar que estes
valores variam muito pouco. A precipitação de duração diária corresponde ao
valor compreendido entre os horários de observação pluviométrica, enquanto
que a precipitação de 24 horas é o maior valor de chuva correspondente a um
período consecutivo de 24 horas (não necessariamente coincidente com o
período de observação). CETESB (1979) verificou, ainda, que a média das
chuvas de 1 e 2 dias de duração pode ser considerada como uma estimativa
bastante representativa da chuva de 24 horas, para a mesma freqüência.
O método das relações entre durações é de grande aplicabilidade, em face
da existência de grande número de pluviômetros com série longa espalhados por
quase todo o território nacional.
No caso de existir nas proximidades do local de interesse, um posto
pluviográfico, é conveniente utilizar os fatores deduzidos a partir das
curvas i-d-f desse posto. Para tanto, basta consultar o mapa publicado por
208 Hidrologia

CETESB (1979). Alguns cuidados especiais devem ser observados: a) o fator que
relaciona as durações de 24h e 1 dia pode ser menor para regiões onde a
precipitação convectiva é predominante. A precipitação de 24 horas é o total
máximo relativo a um período contínuo de 24 horas e a de 1 dia é o valor
compreendido entre os horários de observação. Precipitações máximas que
iniciem antes do horário de observação pluviométrica e terminem depois tendem
a aumentar este fator, o que nem sempre ocorre em regiões onde a tendência é
de precipitações convectivas devido ao aquecimento diumo, que ocorre no
final da tarde; b) os fatores apresentam um leve tendência de variar com o
tempo de retomo.
Tabela 5.9. Relações entre durações (CETESB* 1979)
relação BRASIL ESTADOS UNIDOS ESTADOS UNIDOS
U .S .W .B u r e a u D enve r
5min/30min 0,34 0,37 0,42
10min/30min 0,54 0,57 0,63
15min/30min 0,70 0,72 0,75
20min/30min 0,81 0,84
25min/30min 0,91 0,92
jOmin/lh 0,74 0,79
lh/24h 0,42 ■ '
6h/24h 0,72
8h/24h 0,78
10h/24h 0,82
12h/24h 0,85
24h/ldia 1,14* 1,13
24h/ldia 1,10**
* valor da cidade de São Paulo.
** Taborga (1974).

Exemplo 5.6. Na tabela 5.11 são apresentadas as precipitações diárias máximas


correspondentes ao posto Sander (RS) para alguns tempos de retomo. Utilize o
método de relação entre durações e determine as curvas í-d-f do posto para as
seguintes durações: 1, 2, 4 e óh. Utilize as informações apresentadas por
CETESB (1979) relativas a postos pluviográfícos próximos do local de
interesse.

Solução: O posto Sander localiza-se na região serrana do Rio Grande do Sul


(lat:29°30’; long:50°45’). Dos postos relacionados por CETESB (1979), adota-
se o posto Caxias do Sul (lat: 29°10’; long: 51°12*) para se estimar as
relações entre durações. Dos valores da curva de p-d-f de Caxias do Sul
obteve-se os coeficientes relativos às relações entre durações para
Precipitação 209

diferentes tempos de retomo (tabela 5.10). Estes coeficientes apresentam


variabilidade em função do tempo de retomo. Os valores médios dos
coeficientes são apresentados para as relações indicadas.
Com base nas estimativas da precipitação de duração diária para
diferentes tempos de retomo, e utilizando-se os valores médios dos
coeficientes^ entre durações, obtiveram-se os valores de lâmina precipitada
indicados na "tabela 5.11. Podería ter sido utilizado o coeficiente de cada
tempo de retomo, mas as variações não são significativas.

Tabela 5.10. Coeficientes entre durações, Caxias do Sul (RS)


r 2 5 10 15 20 25 50 100 média
lh/24h 0,415 0,410 0,406 0,403 0,402 0,401 0,397 0,393 0,40
2h/24h 0,515 0,513 0,512 0,511 0,510 0,510 0,509 0,507 0,51
4h/24h 0,624 0,627 0,629 0,630 0,631 0,631 0,633 0,634 0,63
6h/24Hh 0,693 0,696 0,699 0,700 0,701 0,702 0,705 0,707 0,70
24h/ld 1,13 1,13 1,13 1,13 1,13 1,13 1,13 1,13 1,13

Tabela 5.11. Relações p-d-f estimadas para o posto Sander.


duraç. r coef. 2 5 10 25 50 75 100
ld ld/ld 1,00 81,4 103,2 117,6 135,8 149,4 157,2 162,8
24h 24h/ld 1,13 92,0 116,6 133,9 153,5 168,8 177,6 184,0
6h 6h/24h 0,70 64,4 81,6 93,7 107,4 118,2 124,3 128,8
4h 4h/24h 0,63 57,9 73,5 84,4 96,7 106,3 111,9 115,9
2h 2h/24h 0,51 46,9 59,5 683 78,3 86,1 90,6 93,8
lh lh/24h 0,40 36,8 46,6 53,6 61,4 673 71,0 73,6

5.8.2 Precipitação máxima provável (PMP)

Existem controvérsias quanto à existência de um limite superior de


precipitação num dado locai como resultante da interação de vários fatores
meteorológicos e com base na existência de uma quantidade de massa-
atmosférica constante ao nível da Terra. A PMP pode ser vista não como um
limite físico, que pode vir a ocorrer para as condições analisadas, mas sim
como um evento cuja superação está associada a uraa probabilidade muito baixa.
Muitas organizações vinculadas à segurança de barragens recomendam
explicitamente a PMP para o caso de grandes obras onde o galgamento envolve
grandes riscos (Sugai e Fill, 1990).
Os métodos de avaliação da PMP podem ser classificados em duas
categorias: a) métodos hidrometeorológicos; e b) métodos estatísticos. Dentro
dos métodos hidrometeorológicos distinguem-se aqueles baseados na maximizaçao
210 Hidrologia

de tormentas severas observadas e os que simulam condições extremas através


de modelos de tormentas mais ou menos sofisticados. Quanto aos métodos
estatísticos, o enfoque tradicional baseia-se na utilização da equação geral
de frequência apresentada por Chow (1964).
O procedimento mais adequado resulta da consideração de uma série de
itens tais como condições meteorológicas da região, tamanho da bacia,
disponibilidade de dados, número e característica das tormentas observadas.
Mesmo selecionado um método é sempre aconselhável aplicar outro para comparar
os resultados obtidos.

Métodos hidrometeorológicos

Esses métodos buscam as condições hidrometeorológicas mais severas das


ocorrências observadas. Considerando que o total precipitado tende a crescer
à medida que aumenta o teor de umidade do fluxo de ar que alimenta as
tempestades, admite-se que a coincidência entre máxima precipitação e máxima
umidade não ocorreu no passado devido às flutuações dos demais fatores que
influenciam o fenômeno, mas nada impede que tal coincidência venha a ocorrer
no futuro.
Os fundamentos dessa metodologia encontram-se no manual da WMO (1973).
Nas regiões caracterizadas por tormentas convectivas estes procedimentos
podem ser aplicados em bacias de até algumas poucas centenas de km2. Nas
regiões sob a ação de tormentas frontais pode-se- aplicar a bacias de até
10,000 KmN Alguns estudos têm sido feitos para obter-se estimativas
satisfatórias para bacias de até 50.000 km2. Em condições mais favoráveis,
quando se dispõe de dados, fazem-se estimativas para bacias de até 100.000
km2. A estimativa da PMP para bacias ainda maiores deve merecer uma análise
meteorológica bem fundamentada, e baseia-se no conhecimento do mecanismo de
formação das tormentas severas e nos estudos das distribuições espacial e
temporal das mesmas. A intermitência das precipitações de longa duração deve
ser levada em consideração, a fim de evitar valores exagerados da PMP.
A seguir são apresentados os métodos hidrometeorológicos de aplicação
mais simples. Estes métodos baseiam-se em conceitos hidrometeorológicos
abordados no capítulo 3.

Maximização de tormentas severas - Sob esta denominação agrupam-se as


técnicas de maximização da umidade, maximização espacial (transposição) e
maximização de seqüências de tormentas severas. A maximização da umidade
baseia-se no seguinte: a) a precipitação observada é diretamente proporcional
à massa de vapor de água na atmosfera (altura de água precipitável); b) a
condição extrema de chuva é obtida somente pela maximização da referida massa
de vapor.
Precipitação 211

O conteúdo de umidade numa coluna vertical de ar de área unitária é


obtido por (capítulo 3)

Pi
1/g • f qs(0sw,p) dp (5.29)
Po

onde a massa de água por unidade de área (g/cm~); qs = a umidade


específica; 9sw = a temperatura pseudo-adiabática do bulbo úmido; po e pi =
pressões referentes aos níveis inferior e superior da coluna de ar. Conhecida
a distribuição de qs entre os- níveis po e pi, a equação 5.29 fornece a
quantidade máxima de água precipitável na coluna de ar.
O método é aplicável quando existem dados pluviométricos de um número
significativo de tormentas severas observadas na bacia de projeto. Os passos
básicos de cálculo consistem em: a) seleção das maiores chuvas intensas
observadas na região; b) obtenção da umidade representativa e máxima provável
de cada evento selecionado e; c) cálculo dos fatores de maximizaçáo da
umidade e estimativa das chuvas maximizadas. ' .
Com relação à obtenção das umidades representativa e máxima provável de
uma tormenta, testes realvados pelo U.S. Weather Bureau. demonstraram que a
água precipitável de uma tormenta severa se aproxima da máxima água
precipitável, quando esta 6 estimada a partir da suposição de que a
temperatura pseudo-adiabática potencial áo bulbo úmido , Gsw, á igual á
temperatura do ponto de orvalho a 1000 mb, Td.
Considera-se que o suprimento ds umidade das tormentas severas é
proporcionai à água precipitável obtida pela integração da adiabática
saturada correspondente à temperam: a do ponto de orvalho representativo áe
tais tormentas. Segundo recomendação da WMO (1973), adota-se o maior ponto
de orvalho persistente em 12 horas como o ponto de orvalho representativo do
suprimento de umidade de uma dada tormenta. Este é o maior valor igualado ou
excedido por todas as observações disponíveis em um período de 12 horas e
registrado em uma ou mais estações meteorológicas localizadas no interior da
massa de ar supridora de umidade da tormenta.
Assim, se a série de pontos de orvalho com intervalos de 6 horas a
partir da hora 00 é: 20, 21, 23, 24, 22, 21, 24 e 21 o ponto de orvalho
persistente por 12 horas é de 22 °C, correspondente ao intervalo de tempo
entre as 12 e 00 horas (Raudkivi, 1979).
Quanto aos máximos valores de Td que poderiam ser observados, o critério
é adotar o máximo ponto de orvalho persistente por 12 horas registrado no
passado, naquele local e naquela época do ano. No entanto, se as séries de Td
forem menores que 50 anos, a WMO (1973) aconselha o estudo de freqüências dos
valores máximos observados, e a adoção do valor correspondente a um tempo de
m
Hidrologia

retorno dfl 50 a 100 a1308 como Td máximo provável (valor que é citado por
alguns aüfôres como Td máximo ajustado).
Pafá precipitações de longa duração aplicáveis a bacias de maior porte
adotam-se pontos de orvalho representativos com persistência de 24 horas ou
mais. Em todos os casos os val°res de Td observados em superfície devem ser
reduzidos pseudo-adiabaticamente ao nível de 1000 mb. Na figura 5.9 é
apresentado o gráfico de redução do valor de Td à pressão de 1000 mb. Para
levar enl conta as variações sazonais, geralmente os máximos valores de Td são
plotados cm função do tempo, determinando-se uma envoltória que cobre todo o
período analisado.
A massa total de vapor de água contida numa coluna de área unitária
entre a superfície e uma dada altura pode ser calculada pela equação 5.29.
Via de re#ta» adotam-se como extremos da integral as pressões correspondentes
a 1000 mb (nível do mar) ou 900 mb (1 km) e 200 mb (11-13 Km).

Temperatura do ponto de orvalho (®C)

Figura 5.9. Redução da T^ à pressão de 1000 mb (WMO,1973).

Como no cálculo da altura de água precipitável admite-se a troposfera


totalmente saturada, o valor da umidade específica utilizado na equação 5.29,
qs(0sw,p)» d o correspondente à saturação, que é função somente da
temperatura, Para a maximização, portanto, identifícam-se duas adiabáticas
saturadas, cada uma das quais é associada com os valores do ponto de orvalho
Precipitação
213

previamente calculados (valores representativo e máximo). Os valores de W


podem ser obtidos altemativamente por gráficos (como a figura 3.9), por
tabelas (apresentadas na maioria dos textos de hidrometeorologia), ou pela
discretização da equação 5.29 em camadas supeipostas (Raudkivi, 1979).
O fator de maximização da umidade, fm, é definido pela relação

fm — <
¥fèiÍeUé fm i 1.0 (5 30)

onde = a altura de água precipitável nas condições mais críticas para


aquela época do ano, e W = a altura de água precipitável nas condições em
que foi observada a precipitação que se deseja maximizar.
As precipitações maximizadas (PM) são obtidas como o produto das lâminas
observadas e do fator fm.

PM = fm • P (5.31)

A precipitação máxima provável PMP, para uma dada duração é obtida


finalmente como a maior entre as chuvas maximizadas para esta duração. O
fator fm é independente da duração da tormenta, portanto, dentro de certos
limites, o mesmo fator pode ser aplicado para diferentes durações.
Também deve ser contemplada na maximização da umidade a presença de
barreiras orográficas que, interpostas no caminho das massas de ar que
provocam as tormentas na região de estudo, reduzem a afluência de umidade à
bacia em estudo. Nesse caso a água precipitável é a que existiría sem a
barreira menos a parcela bloqueada pela mesma.
Como regra geral, admite-se a transponibilidade de barreiras de até 1200
m de altura. Alturas maiores alteram diretamente a dinâmica dos frentes de
tormenta (Occhipinti, 1939). O fator de maximização é calculado segundo a
expressão

fm = [miltot) - m (bar))/(^ (toí) - ^ (bar)] (5.32)

onde = a água precipitável total (obtida pela integração compreendida


entre o nível de 1000 mb e o nível superior da troposfera) e ^ífi(bar) = a
parcela da água precipitável bloqueada pela barreira (obtida pela integração
compreendida entre o nível de 1000 mb e o nível superior da baireíra). Por
sua vez, ^ to t) e ‘fâfo&r) são valores equivalentes aos anteriores, relativos
aos representativos de ponto de orvalho.

£xemplo 5,7. Maximize a tormenta frontal indicada na tabela 5.12, a qual foi
observada em uma bacia onde dispõe-se dos seguintes dados: altitude média da
bacia: H = 800 m; altitude média da barreira de afluência: H bar = 1000 m ;Td
214 Hidrologia

representativo da tormenta observada; Tdr = 18 °C; Td máximo no período:


Tdmáx.= 21 °C

Solução: O primeiro passo é a redução das temperaturas Td ao nível de 1000 mb


(figura 5.9); para Tdr = 18 °C Tdr 1000 = 214 °C; para Tdmáx = 21°C -» Td
máx 1000 = 244 °C
É preciso também determinar a água precipitável total contida na coluna
atmosférica. Admitindo a superfície nodal da tormenta a 200 mb, da figura 3.9
obtém-se: ##ot) (214 °C) = 58 mm; (244 °C) = 78 mm .

Tabela 5.12.Distribuição temporal de uma tormenta observada


e PMP obtida pela maximização da umidade.
intervalo altura pluviom étrica (mm) altura p lu v io m é tric a (mm)
(2 horas) observ ada maximi z ada
1 15 204
2 45 61,4
3 30 41,0
4 12 16,4
5 8 11,0

Por sua vez, é necessário determinar a água precipitável bloqueada pela


barreira de afluência: para H(bar) = 1000 m resulta: 7%ar) (Tdr, 1000) = 17
mm e #ftara) (Tdmáx, 1000) = 22 mm.
O fator de ajuste da umidade é: fm = (78 - 22)/(58 - 17) = 1,365, com o
qual a estimativa da PMP resulta segundo indicado na última coluna da tabela
5.12.

Nas regiões montanhosas a maximização da umidade pode contemplar ainda a


maximização do vento. Tem-se verificado que nestas regiões as precipitações
aumentam com a velocidade do vento normal à escarpa das montanhas. O fator de
ajuste do vento é a razão entre a velocidade média máxima do ar, Vmx e a
velocidade média observada durante a tormenta, Vm. As médias são
correspondentes à duração da tormenta (duração d) e a direção é a mais
crítica.
A velocidade média máxima é obtida da distribuição de frequências das
máximas velocidades médias anuais, associada a períodos de retomo de 50 ou
100 anos.
O fator de ajuste do vento resulta

fv = Vmx/ Vm fvd* 1 (5.33)


Precipitação 215

A maximização conjunta da tormenta resulta do produto

PMP = Pobs * fm . fv (5.34)

Transposição de tormentas severas - Quando o número de observações severas


não é suficiente na bacia de interesse, é possível recorrer à transposição de
eventos. A transposição é válida se existem reais condições de que a tormenta
possa ocorrer na bacia, para regiões meteorologicamente homogêneas. Duas
regiões são ditas meteorologicamente homogêneas, quando estão expostas à
incursão das mesmas massas de ar e aos mesmos tipos de tormentas (Occhipinti,
1989).
O ajuste de transposição é efetuado multiplicando-se a altura
piuviométrica da tormenta observada por um ou mais fatores, usados para
compensar as diferenças de condições das duas áreas.
• A freqüência de ocorrência das tormentas nas duas áreas não precisa ser
necessariamente a mesma. As diferenças topográficas entre as duas áreas,
entretanto,, podem dificultar ou até invalidar a transposição. Para tanto é
preciso uma análise prévia dos fatores topográficos, morfoldgicos,
geométricos e de orientação das bacias.

Maximização das seqüências de tormentas severas - Aplica-se em grande bacias,


nas quais a área de drenagem supera significativameme a extensão das
tormentas. Para tanto é preciso definir o sincronismo mais adverso entre as
máximas precipitações acumuladas e o desenvolvimento e propagação das
enchentes.
Na definição desse sincronismo analísam-se os registros históricos
relativos às grandes enchentes, diagnosticam-se as tormentas geradoras das
máximas precipitações acumuladas e determinam-se as maximizações a realizar,
abrangendo relocação e transposição de tormentas.
Um método para determinar o chamado Probable Maxim um Storm Sequence-
PMSS (Myers, 1981; citado por Kelman et ai, 1985) é o embaralhamento de
eventos, que consiste em assumir a distribuição espacial e temporal das
piores chuvas de cada período, para representar as condições mais severas de
dito período. Assim, por exemplo, pode-se construir uma PMSS sobre uma grande
bacia assumindo uma distribuição espacial e temporal das chuvas para o mês 1
igual ao que de mais severo existe no histórico para este mês; já para o mês
2 escolhe-se o que de pior aconteceu no registro para este mês, e assim
sucessivamente.

Exemplo 5.8. Determine a PMP resultante de transpor a tormenta do exemplo 5.7


para uma bacia de área de drenagem similar, situada em uma região vizinha
considerada meteorologicamente homogênea, da qual se dispõem os seguintes
216 Hidrologia

' dados: Td representativo = 23 °C; Td máximo no período = 26°C; altura da


barreira de afluência = 700 m.

Solução: admitíndo-se que o topo da massa de ar alcance o nível de 200 mb,


o fator de ajuste de transposição é determinado a seguir. Conforme solução
do problema anterior, a quantidade de.água alimentadora da tormenta é

#8bs = 58 mm - 17 mm = 41 mm

Por sua vez, na bacia de interesse resulta

#8bs = 68 mm - 15 mm = 53 mm

O fator de transposição é ft - 53/41 = 1,29. Aplicando-se o fator ft às


alturas pluvíométricas observadas obtém-se os valores de chuva
correspondentes ao Td representativo na bacia de interesse (tabela 5.13).
Para esta bacia é necessário determinar o fator de ajuste de umidade: para
Tdr = 23 °C Tdr 1000 = 25,5 °C; para Td(máx) = 26 °C Td(máx) 1000 = 284
°C.
Admitindo a superfície nodal da tormenta a 200 mb, da figura 3.9 obtém-
se a altura de água precipitável total contida na coluna correspondente às
duas temperaturas: M>i (25,5 °C) = 84 mm e (284 °Q = 105 mm
A água precipitável bloqueada pela barreira de afluência é: (Tdr,
1000) = 16 mm, $8ar (Tdmáx, 1000) = 20 mm
O fator de ajuste da umidade é: fm = (105 - 20)/(84 - 16) = 1,25.
Os valores da PMP transposta, obtidos pelo produto dos valores
transpostos pelo fator fm, são apresentados na última coluna da tabela 5.13.

Tabela 5.13, Alturas pluvíométricas na bacia de interesse.


intervalo P o bs. altura p lu v ío m é tric a (mm) altura p lu v ío m é tric a (mm)
(2 horas) mm na bacia de in teresse na bacia de in te re sse
Td » 23ÍC Td = 26ÕC

1 15 19,4 24,3
2 45 58,2 72,8
3 30 38,8 483
4 12 15,5 19,4
5 8 103 12,9
Precipitação 217

Métodos estatísticos

Os métodos estatísticos permitem uma rápida estimativa da PMP e


constítuem-se em ferramentas de grande utilidade nos casos em que, embora se
disponha de suficientes dados de precipitação, os dados ciimatológicos sejam
escassos. Entre os métodos estatísticos propostos o que tem sido melhor
aceito (WMO, 1973) é o desenvolvido por Hershfíeld (1961, 1965). O mesmo é
abordado a seguir.
Este método é recomendado para obter-se estimativas da PMP em bacias de
até 1000 km2 e baseia-se na maximização do fator de recorrência da equação
geral de freqüência proposta por Chow (1964),

XTr = Xn + KTr* Sn (5,35)

onde xTr = a precipitação com período de retorno Tr; Xn e Sn = a média e o


desvio padrão da série de N máximos anuais respectivamente e KTr = ao fator
de recorrência ou freqüência, que varia segundo a distribuição de frèqüência de
valores extremos utilizada.
Em geral, iodos os métodos estatísticos de estimativa da PMP utilizam
distribuições de freqüência assintéricas. Isso equivale a admitir que a
probabilidade de excedência da PMP deve tender a zero. De acordo com as
distribuições assintóticas exponencial ou de Gumbel, o fator de freqüência,
KTr, tem as seguintes expressões (Sugai e Fill, 1990)

KTr = ln Tr - 1 (5.36)

KTr = 0,7797 * ln Tr - 0.45 (5.37)

Hershfíeld (1961) analisou as variações do fator KTr com base em


observações pluviométricas de 2600 estações, 90 % das quais localizadas nos
Estados Unidos. Na análise o autor aplicou a equação 5.35 na forma

Xm = Xn-1 + Km • Sn-1 (5.38)

onde xm = o máximo valor observado de chuva na série r\ máximos anuais, Xn-


1 e Sn-1 são, respectivamente, a média e o desvio padrão da série de n-1 máxi­
mos anuais na qual o valor de xm foi excluído; e Km = ao fator que satisfaz a
equação 5.38.
Inicialmente o autor estabeleceu Km = 15 como valor máximo para todas as
situações. Posteriormente (Hershfíeld, 1965), verificou que os valores de Km
218 Hidrologia

variam ínversamente com a magnitude das médias das precipitações máximas


anuais. A figura 5.10 apresenta os valores de Km em função da média da
precipitação máxima anual e da duração de chuva considerada. Para
complementar seu trabalho, o autor fez ainda diversas análises de
sensibilidade da média e do desvio padrão, estabelecendo uma série de
gráficos (WMO, 1973) que permitem a correção destas estatísticas em função
de: a) presença de um valor atípico na amostra {outlier)\ b) o tamanho da
série; c) a freqüência de observações dentro da duração considerada,
destacando a diferença entre os máximos anuais recorrentes de observações
horárias durante 24 horas e de observações diárias; d) a influência do
aumento da área de abrangência da tormenta sobre a quantidade média de chuva
máxima e, e) a relação entre a duração das tormentas consideradas e as
alturas registradas, em função dos valores observados para 24 horas;

Figura 5.10. Valores de Km em função da duração da chuva e da média de


precipitação máxima anual (WMO, 1973).

Generalização da estimativas - Se na região de interesse existe uma rede de


postos pluviométricos e pluviográfícos pode-se estabelecer estimativas
regionais da PMP. Para cada posto e cada duração desejada, calcula-se os
valores ajustados de Xn e Sn, e com eles determine os correspondentes valores
<1° coeficiente de variação, Cv = Xn/Sn . Os valores de Xn e Cv são plotados
Precipitação 219

num mapa, estabelecendo-se dois conjuntos de isolinhas. Valores de PMP para


qualquer ponto do mapa são obtidos por

PMP = Xn • (1 + Km* Cv) (5.39)

onde Xn e Cv são obtidos do mapa. Realizando este procedimento para diversos


pontos, pode-se estabelecer uma grade de pontos com as correspondentes
estimativas da PMP, e assim, um mapa com isolinhas da PMP.
No cálculo da PMP pelo método estatístico existe controvérsia sobre qual
é o valor mais realista para o coeficiente de recorrência Km. Existem
registros de estações não oficiais dos Estados Unidos e estudos do Canadá
(WMO, 1973) que apontam valores superiores aos apresentados por Hershfield.
Para a bacia do Cauca (Colômbia) estudos citados por Sugai e Fill (1990)
adotaram Km = 10 para chuvas de 1 e 2 dias de duração e Km = 11 para chuvas
de 3, 4 e 5 dias. Para a região Sul do Brasil os autores analisaram os
valores de Km para um total de 130 postos e durações de 1 e 2 dias (figura
5.11). Os autores verificaram que em todos os casos os valores obtidos
estiveram abaixo dos valores recomendados por Hershfield, adotando um valor
fixo igual a 9 para as durações.

Figura 5.11. Fator Km, para 1 e 2 dias de duração, para a região Sul do
Brasil (Sugai e Fill, 1990).
220 Hidrologia

Quanto aos tempos de retomo associados às PMP, os autores encontraram


grandes variações na região estudada. Comparando os tempos de retomo obtidos
a partir das estimativas estatísticas e hidrometeorológicas, estabeleceram um
tempo de 10.000 anos como referência no caso de utilizar-se o método
hidrometeorològico e de 100.000 anos para o método estatístico. 'Mufioz-
Espinosa (1981), entretanto, comparando as PMP derivadas pelos dois os
métodos para a bacia do rio Uruguai (até a localidade de Itá), considerou as
estimativas do método hidrometeorológico equivalentes às precipitações
decamilenares obtidas pelo método de Gumbel.

5.83 Distribuição temporal

Estudos realizados por diversos autores mostraram que existe grande


variabilidade na distribuição temporal das chuvas durante as tempestades.
Hershfield (1962) examinou um total de 400 tempestades de 50 estações com
diferentes regimes de precipitação. O autor obteve estatisticamente uma curva
expressa em percentagem do total precipitado versus percentagem da duração da
tempestade. Apesar da grande variabilidade, o autor apresentou uma curva
média para todas as durações. O Soil Conservation Service (SCS) desenvolveu
uma curva semelhante, válida para a duração de 6 horas. As duas curvas são
apresentadas na figura 5.12.

Figura 5.12. Distribuição temporal, Hershfield (1962) e SCS (1976).


Precipitação 221

Wiesner (1970) reproduziu curvas similares às anteriores, aplicáveis a


diferentes tipos de tormentas (figura 5.13). Huff (1970) utilizou 49 postos
com 11 anos de registros no estado de Illinois (USA) para determinar as
características da distribuição temporal. O autor classificou as tempestades
inicialmente em quatro grupos. Cada precipitação intensa teve sua duração
total dividida em quatro partes (quartis) e as mesmas foram classificadas de
acordo com a parte da duração em que a precipitação máxima caiu, Para cada
quartil foi realizada uma análise estatística obtendo-se curvas de
distribuição temporal com um determinado nível de probabilidade de ocorrência
para cada um dos quatro tipos. Na figura 5.14 são apresentadas as curvas para
a probabilidade de 50% dos quatro quartis.
Na falta de dados pluviométricos de tormentas diretamente observadas na
área de estudos, pode-se recorrer a distribuições temporais padronizadas
fundamentadas em um grande número de tormentas observadas. A validade deste
trabalho é função direta da homogeneidade climática das regiões envolvidas
(Occhipinti, 1989).

P ORC EN TAG EM DE DURAÇÃO

CURVAS l a 4 : Cl\uv«* d * 1 h o r a d» d u ra ç ã o
com d i f o r o n t o * in f« n s id o d *«
CURVA 5 . Cftuvot d * longo duração
{frento* o ít a c io n d rio s )

CURVA 6 : Chuva* d o 6 o 2 4 h o r a * d»
duração

Figura 5.13. Distribuições temporais de tormentas intensas (Wilken, 1978).

Hietogramas de projeto baseados nas curvas i-d-f

O hietograma de projeto é uma seqüência de precipitações capaz de


provocar a cheia de projeto, ou seja, a maior enchente para a qual a obra
222 Hidrologia

deve estar projetada. Os métodos podem basear-se nas distribuições


mencionadas como na de Huff, na maximização das condições desfavoráveis como
apresentado pelo Bureau of Reclamation (1977) e o método de Chicago (Keifer e
Chu, 1957) que se baseia nos parâmetros da equação i-d-f e tem sido aplicado
em bacias urbanas.

Método do Bureau of Reclamation - Este método foi utilizado para cálculo da


precipitação de projeto do modelo SCS e consiste na seguinte sequência: a)
determine as precipitações correspondentes a diferentes durações (cerca de
seis durações), até o tempo de concentração; b) determine os incrementos de
chuva correspondentes a cada incremento de duração; c) arranje os incrementos
de chuva da seguinte forma: 6, 4, 3, 1, 2, 5; a numeração indica a ordem de
magnitude. Colocando o maior valor no quarto intervalo, procura-se maximizar
o pico do hidrograma, já que as chuvas iniciais atendem as perdas por
infiltração e depressões da bacia e o incremento maior tende a gerar
escoamento superficial.

Figura 5.14, Curvas de 50 % de probabilidade de ocorrência para


os quatro quartis Huff (1970).
Precipitação 223

Exemplo 5.9. Determine através da metodologia do Bureau of Reclamation o


hietograma de chuva total de projeto, para uma bacia com tempo de
concentração igual a 1 hora na cidade de Porto Alegre, RS. Adote Tr = 10
anos.

Solução: Adota-se como critério uma discretização temporal de 5 minutos e


para o período de retomo fixado determinam-se, a partir da equação de curvas
i-d-f para a cidade de Porto Alegre (Cetesb, 1979), as intensidades médias
máximas correspondentes a diferentes durações (tabela 5.14). A seguir
determinam-se os correspondentes volumes precipitados e, por diferenças,
obtém-se as lâminas precipitadas durante intervalos sucessivos de 5 minutos.
Essas lâminas apresentam um comportamento monotonicamente decrescente.
Paia se gerar o hietograma de projeto rearranjam-se essas lâminas,
seguindo uma seqüência similar à indicada precedentemente, O hietograma
obtido é indicado na última coluna da tabela 5.14.

Método de Chicago - Keifer e Chu (1957) apresentaram uma metodologia para


distribuir no tempo uma precipitação de projeto. À mesma baseia-se na
utilização das curvas i-d-f do local de interesse e foi desenvolvida com o
objetivo de dimensionar sistemas de drenagens pluviais em áreas urbanas, não
estando limitado a estas condições.

Tabela 5.14. Determinação do hietograma de projeto (método SCS),para uma


bacia da cidade de Porto Alegre (RS).

du r ação i Pa c . AP rearra njo AP


min mm/h mm mm mm
05 154,54 12,88 12,88 3/02
10 126,25 21,04 8,16 4,49
15 107,52 26,88 5,84 5,84
20 94,10 31,37 4,49 12,88
25 83,97 34,99 3,62 8,16
30 76,03 38,01 3,02 3,62
35 69,61 40,61 2,60 2,60
40 64,30 42,87 2,26 2.26
45 59,84 44,88 2,01 2,01
50 56,02 46,68 1,80 1,80
55 52,71 49,82 1,64 1,64
60 49,82 49,82 uo 1,50

A chuva de projeto determinada através deste método é útil para pequenas


áreas de drenagem. No caso de regiões urbanas a área de estudo é considerada
224 Hidrologia

contida numa área maior. Assim, o hietograma padrão representa uma chuva
intensa de curta duração, como parte de uma chuva de longa duração. Para os
autores, os fatores mais importantes que caracterizam a distribuição temporal
da precipitação são: a) volume de precipitação que cai durante o período de
chuva intensa; b) precipitação antecedente; e, c) localização do pico de
intensidade máxima.
Estes três fatores são identificados na figura 5.15. A combinação dos
mesmos, obtidos com base na série histórica de precipitações intensas,
permite estimar o hietograma de projeto, conforme é descrito a seguir;

Volume no período de duração máxima: o tempo de retomo permite obter o valor


da intensidade média máxima, i, correspondente à duração desejada. Esta
duração é adotada igual ao tempo de concentração da bacia, tc, por ser esta
duração a que provoca a máxima vazão de pico correspondente ao tempo de
retomo escolhido. Na literatura relativa ao método de Chicago, esta duração
é referenciada como duração do período de máxima, duração do período de chuva
intensa, ou, simplesmente, duração máxima.

Figura 5.15. Características do hietograma definido pelo método de Chicago.


Precipitação 225

A metodologia baseia-se em que a chuva de projeto deve ter, para a


duração máxima, a mesma intensidade média, i, da curva intensidade-duração
(figura 5.16). A área sob o hietograma fica

P = 1/60 • | ih(t) dt (5.40)


o
sendo ih = intensidade do hietograma em função do tempo, t, expressa em mm/
h; tc = duração da chuva, cm min.; P = lâmina precipitada, em mm. A relação
entre intensidade e duração pode ser expressa por

i = a/(b + t)n (5.41)

onde i = intensidade média máxima, em mm/h; t = duração, em minutos, e a, b e


n são constantes para o local de medição. O volume precipitado durante um
tempo t é dado por

P = i • t/60 (5.42)
Intensidade

Figura 5.16. Relação entre a curva i-d-f e o hietograma sintético.


226 Hidrologia

Substituindo a equação 5.41 na 5.42, resulta

P = [a/(t+b)n] • (t/60) (5.43)

Derivando a equação as equações 5.42 e 5.43 com relação a t e igualando,


resulta
i = a • ([(l-n)t + b]/(í+b)(1+n)} (5.44)

Adotando uma duração da chuva igual a tc, a equação 5.44 fica


i = a • {[(l-n)tc + b]/(tc+b)(1+n)) (5.45)

Esta última expressão permite calcular a intensidade, i, em função do tem­


po de duração da chuva, tc, e estabelece a mesma intensidade média da curva
intensidade-duração da qual provêm os valores de a, b e n. Esta característica
pode ser visualizada na figura 5.15, na qual a área hachurada, correspondente ao
volume precipitado com intensidade i e duração tc, é igual à área sob o hietogra-
ma sintético de igual duração. Por sua vez, na figura 5.15 esta característica
resulta na igualdade das áreas hachuradas.

Posição do pico: o método considera que qualquer que seja a duração da chuva,
existe um pico que divide o hietograma em dois setores: intensidades
crescentes e decrescentes. Para posicionar o pico os autores consideraram um
fator, y, sendo definido como

Y = tb/te (5.46)

1-Y = Wtc (5.47)

onde tb representa o tempo anterior ao pico, medido do pico para a esquerda e


ta corresponde ao tempo depois dc pico, medido para a direita do pico. Ambos
os tempos são medidos em minutos e indicados na figura 5.16.
O fator y é uma medida do adiantamento do padrão de chuva, isto é,
permite o posicionamento do pico da distribuição de intensidades. Se y = 0 a
chuva é do tipo completamente adiantado e o hietograma tem o seu pico no
inicio da chuva (como é o caso do hietograma da figura 5.17). Se y = 1 a
chuva é do tipo completamente atrasado (tem o seu pico no fim da chuva). Para
padrões de chuva intermediários o valor de y varia entre 0 e 1.
Obtendo-se a expressão de tc a partir das equações 5.46 e 5.47 e
substituindo-as na equação 5.45, resultam respectivamente
Precipitação 227

a*[(l-n)*(tb/y)+b]
i = ------------------------(antes do pico) (5.48)
[tb/yfb](1+n)

ta
a . [(1-n) . +b]
(1-Y)
(depois do pico) (5.49)
[— +b]<l+n)
(i-Y)
A e q u a ç ã o 5 .48 tem a sua o rigem no pico c varia no sentido d o pic o p ara o
início d a p r e c i p ita ç ã o (figura 5.15). A e q u a ç ã o 5.4 9 te m t a m b é m a s u a o r ig e m
no te m p o d o pic o e varia no sentido do fim da precipitação.
Para determinar o hietograma de projeto com base nestas equações as
variáveis tb e ta são sucessivamente substituídas por valores de x, sendo x
uma variável que adota, respectivamente, valores nos intervalos (0, tb) e (0,
ta). Para x = 0 tem-se i =imáx (figura 5.15).
O hietograma sintético traçado a partir das equações 5.48 e 5.49 terá,
para qualquer duração dentro do período mais intenso, a mesma intensidade
média que a curva da qual procedem os valores das constantes a, b e n.
Para a determinação do valor dc y existem dois métodos: com base na
precipitação antecedente e; pela localização do período mais intenso.

Precipitação antecedente: para uma chuva intensa de duração t, a parcela de


precipitação de duração t que ocorre antes do pico, Pb, é estimada por

Pb(t) = y . P = 7 ' 3 ' (5.50)


60 . (t+b)n

sendo P = o total precipitado na duração t.


Dado que o método foi originalmente desenvolvido para tratar o conjunto
de sub-bacias urbanas que formam a rede de escoamento de uma cidade, os
autores consideraram o tempo í* como representativo do maior tempo de
concentração envolvido no cálculo, e admitiram que a precipitação antecedente
correspondente a t*, A(t*), pode ser considerada nula. Desta forma considera-
se que t* corresponde a um grande tempo de duração de precipitação (os
autores utilizaram t*= 180 minutos para a cidade de Chicago).
Para o cálculo da precipitação antecendente correspondente a uma duração
qualquer de chuva t, A(t), sempre que t ^ t*, pode-se utilizar a equação 5.50
para se obter os valores de Pb(t*) e Pb(t) e, posteriormente, aplicar a
expressão
228 Hidrologia

A(t) = Pb(t*) - Pb(t) (5.51)

Substituindo a equação 5.50 em 5.51 e isolando y, resulta

y = 60*A(t)/{a«[t*/(t*+b)n - t/(t+b)n] (5.52)

Utilizando-se dados de uma série de precipitações intensas, para cada


duração desejada é possível estimar a precipitação antecedente A(t), e o
valor de y. A média dos valores de y assim obtidos é a estimativa a ser
utilizada nas equações 5.46 e 5.47. Para uma bacia com tempo de concentração
tc, adota-se na equação 5.52 t = tc.
A determinação de y com base na localização do pico consiste em estimar
um valor médio de y, com base nos registros das chuvas intensas do posto em
estudo. Para cada duração desejada verifica-se o tempo de ocorrência do pico
e sua relação com a duração total da chuva intensa, ou seja

y = tb/t (5.53)

onde t - duração da precipitação intensa.

Exemplo 5.10. A equação abaixo descreve as relações i-d-f dc chuvas num cer­
to local. Determine o hictograma dc projeto e a altura dc chuva antecedente
correspondentes à chuva total, para uma pequena bacia rural. (Tr = 10 anos).
Utilize o método de Chicago, com y = 0,35. Considere como maior tempo dc
concentração t* = 2 horas. Arca da bacia - 6 km2; comprimento do rio 800 m;
declividade média do rio 0,20 m/km; i = (1100 • Tr^»^)/(t+3())0’^ , sendo Tr
em anos, t a duração em minutos c i a intensidade em mm/h.

Solução: Os parâmetros a = 1100 • 10o’15 = 1553,79 ; b = 30 e; n = 0,75


Para determinar o tempo dc concentração da bacia, aplica-sc a equação de
Kirpich, obtendo-se tc = 90 min. Com base nas equações 5.46 c 5.47 são obtidos
os tempos

tb = y • tc = 0,35 • 90 = 31,5 min

ta = (1-y) * tc = 0,65 * 90 = 58,5 min

As intensidades de chuva antes e depois do pico são obtidas pelas


equações 5.48 e 5.49, respectivamente, resultando
Precipitação 229

ib = 1553,79 • [0,25 • (~ /0 ,3 5 )+ 3 0 ]/( t/0 , 35+30)1’75


ib = 1553,79 • [0,25 • (t /0 ,6 5 )+ 3 0 ]/( t /0 , 65+30)1,75

Na figura 5.17 é apresentado o hietograma de projeto. Para se obter a


chuva antecedente, A(tc), aplica-se a equação 5.53, resultando

A(tc) = Pb(t*) - Pb(tc)


=(1553,79 • 0,35)/60 • ([120/(120+30)0’75] - [90/(90+30)0,751 =2,88 mm

130-
(mu» / h )
INTENSIDADE

Figura 5.17. Hietograma de projeto expresso em intensidades médias


máximas.

A chuva antecedente é representada peia área hachurada da Figura 5.17.


Esta figura permite observar que, qualquer que seja a duração da chuva de
projeto, o pico do hietograma não muda, desde que seja mantida a mesma curva
230 Hidrologia

de intensidade-duração, ou seja, desde que seja mantido o tempo de retomo.


Esta característica resulta da propriedade do método de manter, para qualquer
duração, a intensidade média fornecida pela citada curva.
A determinação do hietograma de projeto, em mm, para intervalos
regulares de tempo, baseia-se na obtenção das lâminas precipitadas para
diferentes durações de chuva. A lâmina precipitada para uma dada duração é
determinada multiplicando o valor de intensidade média máxima, i, obtido da
equação 5.42, pela duração considerada. Assim, para uma duração de 90 minutos
obtém-se antes do pico Pac = 42,85*90/60*0,35 = 22,49 mm e depois do pico
Pac = 42,85*90/60*0,65 = 41,78 mm.
Os valores obtidos correspondem à lâmina total acumulada em cada setor
do hietograma. Para tempos intermediários determina-se a correspondente
duração da chuva (para manter constante o valor de y), e aplica-se o mesmo
processo indicado anteriormente. Na tabela 5.15 é apresentado o hietograma

Tabela 5.15. Hietograma de projeto, expresso em mm


A0 t( 10 min) 1 0 3 4 5 6 7 8 9
P (mm) 3,66 5,49 10,60 15,83 9,54 6,67 5,04 4,06 3,38

Na tabela 5.16 são apresentados os valores médios de y diferentes


cidades. Pode-se observar que o mesmo varia na faixa de 0,36 a 0,56.

Tabela 5.16. Valores de y.


Local ou autor y
Chicago (83 postos) 0,37
Winnipeg (60 postos) 0331
Montreal (22 enchentes) 040
Hershfíeld (50 postos) 043
scs 0,37
Los Angeles 046
Cleveland 040
Sidney 040
São Paulo (1 posto) 046
Porto Alegre (1 posto) 0,44
Precipitação 231

5.8.4 Distribuição espacial

Assim como a distribuição temporal, a distribuição espacial das


precipitações máximas é um importante elemento para o projeto de obras de
drenagem e controle dos volumes escoados superficialmente.

A distribuição espacial de chuvas máximas não apresenta necessariamente


um padrão uniforme. Esta variabilidade aleatória, constatada com base em
registros em diferentes partes do mundo, levou a dois procedimentos básicos:

a) padronização de isoietas que produzem as condições mais desfavoráveis


possíveis. Este método aplica-se em áreas com apenas pequenas diferenças de
relevo. A área da bacia de interesse deve ser menor que a área coberta pelo
padrão de isoietas. Para definir este padrão pode ser utilizado um evento
específico, ou adotar um padrão sintético;
b) determinação da curva altura pluviométrica-área-duração, que permite
transferir o resultado pontual para o espacial.
Dependendo das características climáticas e topográficas da região,
valores pontuais de intensidades (ou lâminas) médias máximas consideram-se
representativos de áreas entre 2,5 e 25 km2. Mesmo que o comportamento
pluviométrico na região seja homogêneo, para áreas maiores deve ser levado
em conta o fato da precipitação média máxima ser menor que a pontual. O valor
pontual obtido por um ou mais postos é reduzido de acordo com a duração e a
área de abrangência.
Em facc da escassez de estudos regionais sobre a distribuição espacial da
precipitação, esta redução tem sido realizada correntemente utilizando rela­
ções obtidas pelo Wcather Burcau (1946), com base cm dados americanos
(figura 5.18). Essas curvas foram originalmente desenvolvidas com base numa
rede cobrindo áreas dc 100 a 400 milhas quadradas, localizadas na sua maio­
ria a leste do rio Mississipi (EUA). O número médio de postos em cada rede
foi de 6 e as séries variaram de 7 a 15 anos. O fator obtido nessas curvas é a
proporção entre a precipitação máxima média sobre a área e a precipitação
máxima pontual. Observa-se que as curvas apresentam características análo­
gas para as diferentes durações. Os gradientes decrescem e as razões assíntó-
ticas crescem com o'aumento da duração.
Expressões matemáticas do tipo: Pm = Po * ou Pm = Po - a • Ab
onde Pm = a precipitação média sobre a área A; Po = precipitação no epicentro
da tormenta e k, m, a e b = parâmetros a serem ajustados; são freqüentemente
propostas para retratar estas curvas. Segundo Occhípinti (1989), pesquisas rea­
lizadas sobre chuvas extremas em diferentes pontos da Terra mostram que as
alturas pluviométricas máximas variam com o inverso do quadrado da área so­
bre a qual a precipitação se distribui.
232 Hidrologia

ê
«
o
>
3

O
o
TT

3
O

Figura 5.18. Fator de redução das precipitações máximas pontuais, conforme


estudos do U.S.Weather Bureau (Raudkivi, 1979).

Quando existe uma rede de postos pluviométricos e pluviográficos


suficienterr.cr.tc densa, a variabilidade espacial e temporal das tormentas
extremas pode ser estudada com base no traçado de sucessivos mapas de
isoietas. Para cada tormenta escolhida é possível determinar as alturas
pluviométricas acumuladas correspondentes a diversas durações. Plotando em
planta estes dados e traçando mapas de isoietas é possível observar a
evolução temporal da distribuição espacial da chuva.
Para a determinação de curvas que relacionem altura de chuva, área e
duração pode-se observar o roteiro indicado a seguir: a) selecione algumas
chuvas intensas; b) prepare mapas de isoietas para precipitações com durações
de 6h, 12h, 18h...; c) com base nestes mapas determine as precipitações
médias para as áreas de 25, 50, 100 km2,... até o limite da área da bacia; d)
plote a relação altura-duração de cada tormenta, para cada área e estabeleça
a envoltória com precipitações máximas (figura 5.19a); e) para cada duração
Precipitação 233

a) precipitação-duração para uma área de 2000 km2

O 200 400 300 300

Prscipitaçôo d« 2 4 h o r a s

b) área-precitação para uma duração de 24horas.

Figura 5.19. Curvas precipitação-duração e área-duração (WMO,1973)


234 Hidrologia

plote os valores de área e precipitação, obtendo a envoltória como a da


figura 5.19b; f) com base nos pontos das envoltórias dos itens anteriores são
construídas as curvas de precipitação-duração-área, exemplificadas na figura
5.20.
Nos locais onde relações como as indicadas na figura 5.20 encontram-se
definidas, a utilização da curva envoltória é um método rápido e simples para
se estimar a PMP correspondente a uma dada área e uma dada duração. Os dados
obtidos podem ser rearranjados, a fim de se obter um hietograma mais
concentrado em tomo do pico.
A transposição das relações altura-área-duração obtidas de padrões de
isoietas é também um método alternativo para se obter a PMP em locais sem
dados pluviométricos (Raudkivi, 1979). A maximização consiste na aplicação de
fatores de ajuste apropriados (de umidade, e eventualmente, de vento) às
tormentas máximas observadas utilizadas como pontos de controle para o
traçado da envoltória da região.

6 12 24 48 72

Figura 5.20. Curvas precipitação-duiação-área (V^MO.1973)


Precipitação 235

PROBLEMAS

1- Na tabela 5.17 são apresentados os registros dos totais anuais de


precipitação em duas estações próximas, X e Y, no período 1943-76. Deseja-se
utilizar esses dados para efetuar o balanço hídrico em nível anual na região
em que estão localizadas as estações. Solicita-se efetuar o preenchimento de
todos os valores não disponíveis no período mediante regressão linear.

2 - Na tabela 5.18 são apresentadas as precipitações totais mensais e anuais


do posto Formosa no Distrito Federal. Escolha uma distribuição probabilística
teórica para cada mês e para os totais anuais. Determine a precipitação
mínima com 75% de garantia para cada mês e para o total anual.

Tabela 5.17. Registros totais anuais.


ano X (mm) Y (mm) ano X (mm) Y (mm)
1943 1497 1960 1656
44 1243 61 2167 1678
45 1359 62 2048
46 1505 1493 63 1981 1771
47 1634 1559 64 1551 1191
48 1775 1671 65 1781 1572
49 1421 1533 66 1965 1666
50 1619 67 1342 1012
51 1304 1214 68 841 1064
52 1640 1384 69 1205 1349
53 1569 70 1287 1541
54 2209 2158 71 1509 1539
55 1393 1371 72 1664
56 2035 73 2021
57 2090 2229 74 1906
58 2311 2189 75 1776
59 1638 1553 76 1925

3 - Na tabela 5.19 são apresentadas as precipitações máximas do posto Ilhota.


Ajuste uma distribuição estatística aos valores e estime a precipitação para
durações de 10, 15, 20, 25 e 30 min, 1, 2, 3, 4, 5, 6, 12, 16 e 20 h.
(Arbitre alguns tempos de retomo).

4 - Com base nas relações obtidas por Bell, verifique o ajuste deste método
para um ou mais postos brasileiros (Dados do livro CETESB, 1979).
236 Hidrologia

Tabela 5.18. Precipitação mensal de Formosa (mm).


Ano JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
49 212,7 285,4 66,5 179,7 0,0 0,0 0,0 0,0 0,0 145,1 230,5 210,0
50 241,7 200,8 232,1 81,3 0,0 0,0 0,0 0,0 49,1 166,2 144,8 244,3
51 182,1 92,6 312,4 73,0 34,8 0,0 0,0 0,2 11,8 63,2 90,6 284,0
52 200,7 161,0 315,5 69,2 0,0 0,0 0,0 0,0 50,0 58,2 361,4 327,1
53 149,1 196,2 253,7 150,9 3,6 2,6 2,6 0,0 61,9 94,7 287,6 549,5
54 78,4 270,4 111,1 19,6 13,8 0,0 0,0 0,0 0,0 3,4 351,1 359,6
55 421,2 143,0 90,0 179,3 0,6 0,7 0,0 0,0 0,0 240,3 237,1 337,7
56 117,9 208,3 204,1 34,7 784 23,3 8,1 1,7 11,8 142,5 382,5 441,1
57 392,5 354,1 334,8 102,7 22,8 1,1 0,0 1,3 7,3 62,3 307,3 327,6
58 298,0 195,7 167,7 150,4 25,3 2,4 89,4 0,0 42,9 149,8 74,7 350,4
59 376,2 147,1 266,0 8,3 0,0 3,3 0,1 0,0 14,0 153,0 181,3 273,8
60 315,7 199,9 337,6 75,1 234 2,0 0,0 0,0 0,5 72,2 199,2 249,8
61 269,8 239,6 65,6 73,6 44,8 0,0 0,0 0,0 0,0 61,8 26,5 296,3
62 146,3 324,4 249,3 29,0 11,0 0,0 0,0 9,2 81,6 261,4 163,0 516,4
63 170,3 200,0 52,4 119,0 7,0 0,0 0,0 0,0 0,0 8,0 322,9 56,3
64 463,3 331,9 212,6 91,8 55,7 0,0 21,2 0,0 0,0 128,2 279,3 291,1
65 275,2 163,3 319,3 298,8 0,0 0,0 0,0 1,6 19,0 236,6 208,1 121,5
66 230,7 352,1 169,3 106,9 87,2 0,0 0,0 0,0 84,7 103,9 100,3 347,8
67 90,3 63,2 192,5 204,1 0,0 0,0 0,0 0,0 38,8 86,6 230,7 179,7
68 91,9 450,7 225,1 148,8 274 0,0 0,0 7,1 49,0 88,3 314,7 265,5
69 164,2 122,3 164,7 51,2 49,4 0,0 0,0 0,0 0,0 99,1 194,0 337,4
70 363,8 217,2 150,0 118,2 0,0 0,0 0,0 0,0 74,0 184,7 349,8 130,4
71 99,8 81,6 92,2 131,8 7,4 8,4 0,7 0,0 77,0 220,2 355,8 349,2
72 121,4 225,6 122,8 131,0 16,0 0,0 23,4 0,0 11,0 249,8 259,4 566,4
73 70,4 91,2 222,6 118,8 2,6 13,6 0,0 0,0 28,8 338,0 392,0 202,6
74 120,0 104,4 381,0 19,0 18,0 0,0 0,0 46,5 0,0 70,0 172,7 184,6
75 198,6 189,3 91,8 149,2 4,2 0,0 7,2 0,0 25,0 94,2 173,2 131,8
76 144,8 281,0 117,8 28,0 125,4 0,0 1,0 0,0 130,2 198,6 248,4 218,4
77 247,1 102,6 59,5 266,8 50,4 35,1 0,0 0,0 46,6 177,5 250,5 251,2
78 188,9 269,0 147,8 135,6 87,4 0,0 17,4 0,0 0,5 197,0 242,0 258,9
79 609,3 316,9 311,6 117,2 22,9 0,0 6,1 3,9 33,9 118,2 95,4 207,6
80 412,6 303,8 37,0 219,0 15,6 8,6 0,0 0,0 39,6 13,2 175,6 228,4
81 210,6 61,8 296,2 60,0 44,9 36,0 14,4 U 0,4 256,1 222,8 120,4
82 329,4 48,5 367,8 75,8 89,2 0,0 0,0 31,6 29,6 64,1 149,3 127,4
83 372,8 164,8 249,8 78,0 45,4 0,0 16,2 0,0 21,4 130,0 215,5 240,2

5 - A equação indicada a seguir descreve as relações i-d-f de chuvas num


certo local. Determine os hietogramas de projeto para um sistema de esgotos
pluviais da região próxim a do local, para duas bacias com tempos de
Precipitação 237

concentração iguais a 40 e 90 minutos, respectivamente. Arbitrar um tempo de


retomo. A equação é i = (1200 * Tr°-^)/(t + 20)0-70 onde t em minutos, Tr
em anos e i em mm/h).

6 - Utilizando as curvas de intensidade-duração-freqüência da cidade de São


Paulo, determine o histograma de projeto mediante o método de Chicago, com y
= 0,35 c 0,50. Adote Tc = 120 e 180 minutos. Compare esses resultados c co­
mente. Compare esses resultados com a distribuição SCS e Hershfield.

Tabela 5.19. Precipitação máxima anual (mm) no posto Ilhota.


238 Hidrologia

7 - No livro Drenagem Urbana (CETESB, 1979) são apresentados os valores de


intensidade-duração e freqüência para várias cidades brasileiras. Determine
valores médios para estas relações para os postos do Rio Grande do Sul.

8 - Os fatores mencionados no exercício anterior apresentam uma leve


tendência de diminuir com o tempo de retomo. Procure avaliar o nível de erro
ao adotar-se este valor constante.

Tabela 5.20. Eventos máximos mundiais (Paulhus, 1965).


duração precip i tação local data
horas mm
0,017 31,20 Unionvillejvíaryland 4/julho/1956
0,133 125,98 Fussen,Bavaria 25/maio/1920
0,25 198,12 Plumb Pointjamaica 12/maio/1916
0,333 205,74 Curtea-de-aRGES,Romenia 7/julho/18S9
0,700 304,80 Holt,Missouri - USA 22/junho/1947
2,167 882,60 Rockport.W.Virginea 18/juiho/l 889
2,75 558,80 D‘Han is,Texas,USA 3 l/maio/1935
4,30 782,32 SmethportJ^cnsilv. - 18/julho/1942
9,00 1086,87 BelouveUa Reunion 28/fcv/1964
12,00 1340,10 BclouveJLa Reunion 28-29/02/1964
18,50 1688,85 BclouveJLa Reunion 28-29/02/1964
24,00 1869,95 CílaosJLa Reunion 15-16/03/1952
48,00 2499,89 CilaosUa Reunion 15-17/03/1952
72,00 3240,02 CilaosUa Reunion 15-18/03/1952
4 dias 3503,93 CilaosJLa Reunion 14-18/03/1952
5 dias 3853,94 CilaosJ-a Reunion 13-18/03/1952
6 dias 4055,11 Cilaos,La Reunion 13-19/03/1952
7 dias 4109,97 CilaosJ.& Reunion 12-19/03/1952
8 dias 4129,79 CilaosJ-a Reunion 11-19/03/1952
15 dias 4797,55 Cherrapuunjijndia 24/6-8/07/1931
31 dias 9299,96 Cherrapuunjijndia julho/1861
2 meses 12766,80 Cherrapuunjijndia 06-07/1861
3 meses 16368,78 CherrapuunjiJndia 05-06-07/1861
4 meses 18737,58 Cherrapuunjijndia 04 a 07/1861
5 meses 20411,95 Cherrapuunjijndia 04 a 08/1861
6 meses 22454,35 Cherrapuunjijndia 04 a 09/1861
11 meses 22990,05 Cherrapuunjijndia 1 a 11/1861
1 ano 24461,21 Cherrapuunji,índia 8/1860-7/1861
2 anos 40768,27 Cherrapuunjijndia 1860-1861
Precipitação 239

9 - Determine a curva envolvente de registros máximos mundiais. Os dados são


apresentados na tabela 5.20.

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30- ULLMANN, M.N. 1979. Hidrologia. Lages: UDESC. Não paginado.

31- WEATKERBUREAU. 1 9 4 6 . Manual fo r depth-area-durationanalysisofstorm


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32- WIESNER, CJ. 1970. Hydrometeorology. London: Chapman and Hall. 232p.

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477p.

34- WMO, 1973. Manual for estimation of probable maximum precipitation.


Word Meteorological Organization, Geneva. 190p.
C a p ítu lo 6

ÍNTERCEPTAÇÃO

Carlos E. M. Tucci

6.1 introdução

A interceptação é a retenção de parte da precipitação acima da superfí­


cie do solo (Blake, 1975). A interceptação pode ocorrer devido a vegetação
ou outra forma de obstrução ao escoamento. O volume retido é perdido por
evaporação, retornando à atmosfera. Este processo interfere no balanço hí­
drico da bacia hidrográfica, funcionando como um reservatório que armaze­
na uma parcela da precipitação para consumo. A tendência é de que a inter­
ceptação reduza a variaçao da vazão ao longo do ano, retarde e reduza o
pico das cheias.
Einslcy eí al () 949) menciona que sob condições similares, as perdas por
interceptação vegetal podem chegar ate a 25% da precipitação anual. ílelvey e
Patric, atado por Wigham (1970) indicam que em regiões úmidas c com flores­
tas, a interceptação anual pode chegar a 250 mm.
A retenção de parte do escoamento por depressões do solo não pode ser
considerada uma interceptação propriamente dita. já que parte do volume reti­
do retorna ao fluxo da bacia através da infiltração,
As depressões do solo ou a baixa capacidade de drenagem podem provo­
car o armazenamento de grandes volumes de água reduzindo a vazão média da
bacia. No rio Paraguai observa-se em alguns trechos que a vazão média diminui
para jusante devido ao aumento das áreas de inundação que represam parte do
volume de montante.

6.2 Interceptação vegetai

A interceptação vegetal depende de vários fatores: características da


precipitação e condições climáticas, tipo e densidade da vegetação e perío­
do do ano. As características principais da precipitação são a intensidade, o
volume precipitado e a chuva antecedente. Em florestas, para pequenos vo­
lumes de precipitação ( < 0,3 mm), todo o volume é retido e para precipita­
ções superiores a 1 mm, de 10 a 40% pode ficar retido (Kittredge, apud
Viessman et al., 1977).
244 H id r o lo g ia

Na figura 6.1 são apresentadas curvas para uma determinada vegetação,


relacionando total precipitado e interceptado, para diferentes intensidades
de precipitação. Pode-se observar que para o mesmo total precipitado a
interceptação diminui com o aumento da intensidade.
Precipitações precedidas por 24 horas de período seco produzem curva de
precipitação-interceptação diferente de ocorrências precedidas por condições
úmidas (Blake,1975).
A intensidade do vento é o fator climático mais significativo na
interceptação, aumentando a mesma para uma cheia longa e diminuindo para
cheias menores (Wigham, 1970).

Figura 6.1. Relação entre interceptação-intensidade-precipitação (Blake,1975)

O tipo de vegetação caracteriza a quantidade de gotas que cada folha


pode reter e a densidade da mesma indica o volume retido numa superfície dc
bacia. As folhas geralmente interceptam a maior parte da precipitação, mas a
disposição dos troncos contribui significativamente.
Em regiões em que ocorre uma maior variação climática, ou seja em
latitudes mais elevadas, a vegetação apresenta uma significativa variação da
folhagem ao longo do ano, que interfere diretamente com a interceptação. A
In tercep tação 245

época do ano também pode caracterizar alguns tipos de cultivos que apresentam
as diferentes fases de crescimento e colheita.
A equação da continuidade do sistema de interceptação pode ser descrita
por

Si = P -T - C (6.1)

onde Si = precipitação interceptada; P = precipitação; T = precipitação que


atravessa a vegetação; C = parcela que escoa pelo tronco das árvores.

Medições das variáveis

Precipitação - A quantificação da precipitação é realizada com postos


localizados em clareiras próxima às áreas de interesse. A distribuição dos
postos depende do tipo de precipitação no local e do grau de precisão
desejado. Os problemas maiores ocorrem em locais onde a vegetação tem altura
considerável. Blake(1972) utilizou cinco postos numa floresta da Nova
Zelândia, sendo um dos pluviômetros colocado no topo de uma árvore de 36 m.
Os resultados apresentaram alta correlação entre a precipitação das clareiras
e a do topo das árvores.
A magnitude do erro da avaliação da precipitação pxie ser superior a
faixa de magnitude das outras variáveis envolvidas na equação 6.1, portanto,
a sua quantificação deve ser suficientemente precisa para evitar resultados
falsos.

Precipitação que atravessa a vegetação - (throughfall) Esta precipitação é


medida por drenagem especial colocada abaixo das árvores e distribuída de tal
forma a obter uma representatividade espacial desta variável. Em florestas
altas é possível utilizar pluviômetros que possuem o mesmo padrão da medição
de precipitação. Helvey e Patric citados por Wigham (1970) indicam que é
necessário utilizar cerca de dez vezes mais equipamentos para a medição da
precipitação que atravessa a vegetação do que para a precipitação total.
Isso se deve a grande variabilidade encontrada nos espaços e nas
características da vegetação que produzem esta variável.
Dependendo do tipo de cobertura a quantificação desta variável é ainda
muito difícil, como em gramados e vegetação rasteira.

Escoamento pelos troncos - Esta variável apresenta uma parcela pequena do


total precipitado (de 1 a 15% do total precipitado), e em muitos casos está
dentro da faixa de erros de amostragem das outras variáveis. A medição
desta variável somente é viável para vegetação com tronco de magnitude
razoável.
246 H id r o lo g ia

Quantificação da Interceptação

Fórmulas conceituais - Horton (1919) foi um dos primeiros a descrever e


apresentar resultados e equações para descrever o comportamento da
interceptação vegetal. O referido autor relacionou o volume interceptado
durante uma enchente com a capacidade de interceptação da vegetação e a taxa
de evaporação.

Si = Sv + (Av/A). E. tr (6.2)

onde o primeiro termo da direita representa a parcela retida e o segundo a


evaporação; Sv = é a capacidade de armazenamento da vegetação para a área
(mm); Av = área de vegetação; A = área total; E = evaporação da superfície de
evaporação (mm/h); tr = duração da precipitação em horas.
Essa equação apresenta algumas limitações:

- nela, a interceptação é independente da precipitação;


- a capacidade de armazenamento deve ser preenchida, o que necessaria­
mente não ocorre.

Meriam (1960) introduziu a precipitação na equação original de Horton,


usando a seguinte expressão exponencial

Si = Sv ( 1 - e“p/Sv) + R E tr (6.3)

onde P = precipitação; R = Av/A.


Nesta equação, quando a intensidade aumenta, o termo exponencial reduz,
convergindo para uma constante igual a Sv. O termo da direita da equação é
transformado para

Si = Sv ( 1 - e 'p^ v) + K P (6.4)

onde K = (R E tr )/P é adotado constante. Isto significa que a relação entre


E e P é constante, o que não ocorre necessariamente durante uma tempestade.

Equações empíricas - O uso de equações de regressões relacionando as


principais variáveis e ajustadas a diferentes tipos de dados tem sido uma
prática freqüente. Uma das equações é a seguinte

Si= a + b Pn (6.5)

onde a, b e n = parâmetros ajustados ao local e Si e P = precipitação, em


In tercep tação 247

polegadas. Essa equação é usada para eventos. Valores dos parâmetros


apresentados por Horton (Segundo Wigham, 1970) são apresentados na tabela
6.1. Para a estimativa do volume total interceptado utiliza-se o fator de
projeção f que é multiplicado ao valor de Si, para se obter a interceptação
média da área. Portanto, f representa a parcela de vegetação sobre a área de
interesse. Os coeficientes da tabela 6.1, para alguns cultivos, são
multiplicados pela altura da planta h em pés.

Tabela 6.1. Valores das constantes da equação 65 (Horton 1919)

Cobertura vegetal a b n fator de


projeção
Pomar 0,04 0,018 1,00
"Ash" 0,02 0,018 1,00
"beech" 0,04 0,18 1,00
Carvalho 0,05 0,18 1,00
"maple" 0,04 0,18 1,00
arbustos 0.02 0,40 1,00
pinus 0,05 0,20 0,50
feijão, batata e outras
pequenas culturas 0,02h 0,15h l,00h 0,25h
pasto 0,005h Q,08h 1,00 1,00
forrageíras 0,0 Ih 0,1 Oh 1,00 1,00
pequenos grãos 0,005h 0,05h 1,00 1,00
milho 0,05h 0,005h 1,00 0,10h

Normalmente são utilizadas versões lineares da equação 65, o que


simplifica ainda mais o problema, já que a expressão não leva em conta a
intensidade, umidade antecedente, velocidade do vento, entre outros fatores.
Bultot ct al( 1972) adotaram uma parábola para relacionar o armazenamento
com a precipitação diária, ou seja

Sv= a P2 + b P (6.6)

Esta equação é válida até um valor de P, a partir do qual Sv toma-se


constante.
Clark (1940) após a estimativa da interceptação para diferentes
coberturas, principalmente para cultivos agrícolas, apresentou os resultados
na forma de tabela (tabela 6.2). Estes valores devem ser interpretados como
um experimento, são úteis para se ter uma idéia de grandeza, pois os mesmos
variam de acordo com as condições antecedentes de umidade.
248 H id ro lo g ia

Tabela 6.2. Interceptação em 1 m2 de área (Clark,1940)

Vegetação Precipitação Característica Interceptação


polegadas %
Trigo 0,02 - 0,07 Uma chuva de pequena intensidade 76 - 90
0,24 Duas chuvas fracas 74
0,32 - 0,35 Uma chuva rápida 52 -64
0,46 Uma chuva intensa 46
0,80 Três chuvas 51
1,48 Chuva intensa seguida por outra fraca 33
Cevada 0,11 Uma chuva fraca 72
0,15 várias chuvas leves 57
0,74 Chuva forte seguida de chuva fraca 45
Vegetação 0,02 chuva muito fraca 80
de várzea 0,06 - 0,07 Chuva fraca 66 - 80
0,38 - 0,45 Chuva forte 67 - 78

Interceptação em modelos conceituais - Nos modelos conceituais que retratam a


transformação da precipitação em vazão a interceptação tem sido tratada como
um reservatório com uma capacidade máxima, de acordo com o tipo de cobertura.
Durante a simulação este reservatório retira água da precipitação até atingir
a sua capacidade máxima. Nos períodos secos o reservatório é deplecionado com
base na evaporação e evapotranspiração. Crawford e Linsley (1966) utilizaram
este critério no modelo Stanford IV e sugeriram os valores da tabela 6.3 para
a capacidade máxima do reservatório de interceptação função da cobertura
vegetal. Este tipo de algoritmo faz parte de um conjunto que analisa o
processo de transformação de precipitação em vazão dentro de uma visão
macroespacial da bacias. Neste contexto a interceptação, em grande parte das
bacias, durante as enchentes tem um peso relativo pequeno, perto dos demais
processos. Em bacias onde a vegetação tem peso significativo e deseja-se
estudar o comportamento da retirada ou acréscimo da cobertura de vegetação, é
necessário retratar este processo com maior detalhe.

Interceptação no uso da terra - A quantificação do impacto da modificação da


interceptação, ou seja cobertura vegetal, sobre o escoamento é uma questão
importante para regiões em desenvolvimento com grande ocupação do espaço
rural e urbano como o Brasil. Existe dificuldade de quantificar efetivamente
este processo devido a magnitude deste componente no ciclo hidrológico, se
comparado com os demais. A determinação experimental deste processo é difícil
devido a interação com os outros processos como a infiltração e evaporação.
In tercep ta çã o 249

Tabela 6.3. Capacidade máxima do reservatório


de Interceptação utilizado pelo modelo
STANFORD IV (Crawford e Linsley,1966)
Cobertura Capacidade máxima
mm
Campo, prado 2,50
Floresta ou mato 3,75
Floresta ou mato denso 5,00

Alguns modelos têm utilizado diferentes tipos de cobertura e área


projetada para simular a interceptação de pequenas bacias (Li,1974). Com
dados de uma bacia no país de Gales foi desenvolvido e ajustado um modelo
(Institute o Hydrology, 1973). O modelo foi utilizado para análise de
sensibilidade da interceptação e obteve redução na vazão média de 6 a 20%, de
acordo com a cobertura vegetal implantada (2-8mm de capacidade de
interceptação). Quanto maior for a capacidade de interceptação maior é a
redução da vazão média.

6.3 Armazenamento nas depressões

Na bacia hidrográfica existem obstruções naturais e artificiais ao


escoamento, acumulando parte do volume precipitado. Em áreas rurais isso pode
ser observado após uma enchente, quando áreas sem drenagem formam pequenas
lagoas. O volume de água retido nessas áreas somente diminui por evaporação e
por infiltração. Como o lençol freático fica alto, logo após a enchente, a
saída de água dá-se principalmcnte pela evaporação, reduzindo a vazão média
da bacia. Isso é mais grave em solos que se impermeabilizam com a umidade,
como o argiloso.
Bacias com baixa drenagem tendem a ter menor vazão média e maior
capacidade de regularização natural do escoamento. Os banhados são exemplos
de bacias com este comportamento. O Pantanal, por onde o rio Paraguai
atravessa, é exemplo de uma bacia de grande porte onde a vazão se reduz de
montante para jusante devido a retenção do escoamento por depressões das
várzeas inundadas.
Em bacias urbanas, podem ser criadas artificialmente áreas com retenção
do escoamento em função de aterros, pontes e construções. O somatório destas
perdas se reflete na redução da vazão média e no abatimento dos picos de
enchentes.
Linsley et al. (1949) utilizou a seguinte expressão empírica para
retratar o volume retido pelas depressões do solo após o início da
precipitação
250 H id ro lo g ia

Vd = Sd ( 1 - e-k Pe) (6.7)

onde Vd = volume retido; Sd = capacidade máxima; Pe = precipitação efetiva;


k= coeficiente equivalente a 1/Sd. No uso desta equação, admite-se que no
início da precipitação as depressões estão vazias e para gerar escoamento
superficial é necessário que as depressões estejam preenchidas. São
aproximações do comportamento real já que o escoamento superficial ocorre sem
que as depressões sejam todas preenchidas, devido a variabilidade espacial da
capacidade de retenção das mesmas.
Hickis(1944) indicou valores de 0,10 polegadas para solos argilosos e
0,20 polegadas para solos arenosos. Viessman (1967) apresentou uma relação
entre capacidade das depressões e declividade do solo obtida com base em
quatro pequenas bacias impermeáveis, indicando uma grande correlação entre as
variáveis (figura 6.2).

0 ,2 0 f
i

Figura 6.2. Relação entre depressão do solo e declividade para superfícies


impermeáveis (Viessman, 1967)
In te r c e p ta ç ã o 251

Em grandes bacias as retenções podem funcionar como reservatórios dis­


tribuídos. O volume destes reservatórios pode ser estimado cartograficamente.
Em pequenas bacias, com pequenas depressões, a quantificação c dificultada
pela variabilidade espacial, sendo parametrizada de forma simplificada, ou seja
considerando um volume perdido no início da precipitação.

REFEREN CIAS

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2 - BLAKE, G.J. 1975. The interception process. ín: Prediction in catchment


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13- VIESSMAN, W., KANPP, J.W., LEWIS, G. L., HARBAUGH, T.E.


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14- WIGHAM, J.M. 1970. Interception. In: GRAY, D. (ed.) Handbook of princi­
pies of hydrology. Huntington: Water Information Center. Paginação irre­
gular. Section 4.
Capítulo 7

EVAPORAÇÃO E EVAPOTRANSPIRAÇÃO

Carlos E, M. Tucci e Lawson F. S. Beltrame

7.1 Introdução

A evaporação e a evapotranspíração ocorrem quando a água líquida 6


convertida para vapor de água e transferida, neste estado, para a atmosfera.
O processo somente poderá ocorrer naturalmente se houver ingresso de energia
no sistema, proveniente do sol, da atmosfera, ou de ambos e, será controlado
pela taxa de energia, na forma de vapor de água que se propaga da superfície
da Terra. Esta transferência ocorre fisicamente, nas formas de difusão
molecular e turbulenta. Logo, o processo de evaporação/evapotranspiração de
superfícies naturais, pode ser simulado com embasamento físico, por modelos
que descrevem o efeito de resistência à difusão molecular e turbulenta sobre
a distribuição de energia do sol ou da atmosfera.
Informações . quantitativas desses processos, que se constituem em
importante fase do ciclo hidrológico, são utilizadas na resolução de
numerosos problemas que envolvem o manejo d’água. Tanto o planejamento de
áreas agrícolas de sequeiro ou irrigada, a previsão de cheias ou a construção
e operação de reservatórios, requerem dados confiáveis de evaporação e/ou
evapotranspíração. Entretanto, essas informações obtidas por medidas diretas
de diferentes locais e condições meteorológicas distintas, não existem em
quantidade suficiente. Assim, estimativas baseadas em princípios físicos e
principalmente equações empíricas são utilizadas como alternativas para
suprir esta carência.
Neste capítulo são discutidos os processos de evaporação e
evapotranspíração e apresentados alguns procedimentos de cálculo, com
comentários sobre a conveniência de seu emprego.

7J2 Evaporação

Evaporação 6 o processo físico no qual um líquido ou sólido passa ao


estado gasoso. Em meteorologia, o termo evaporação restringe-se à mudança da
água no estado líquido para vapor devido à radiação solar e aos processos de
difusão molecular e turbulenta. Além da radiação solar, as variáveis
meteorológicas que interferem na evaporação, particularmente de superfícies
livres de água, são a temperatura do ar, vento e pressão de vapor. Esta
254 Hidrologia

-l
mudança de estado físico consome 585 cal.g à 25 oC. Por isto, diz-se que a
evaporação depende fundamentalmente da energia disponível proveniente da
radiação solar. A temperatura do ar está associada à radiação solar e, desta
forma, correlaciona-se positivamente com a evaporação. Um aumento da
temperatura do ar influi favoravelmente na intensidade de evaporação, porque
permite que uma maior quantidade de vapor de água esteja presente no mesmo
volume de ar, quando é atingido o grau de saturação deste. Os ventos são
responsáveis pela renovação do ar acima da superfície evaporante. Entretanto,
existe um limite superior, em velocidade, da ação dos mesmos. Este fenômeno
também é proporcional à diferença entre a pressão do vapor saturado, à
temperatura da água e à pressão do vapor do ar (es - ea), mantidas em
igualdade as demais condições.
Na evaporação de uma superfície de solo descoberto, quando este está
saturado, ou mesmo quando o nível freático for elevado, atuam somente os
fatores meteorológicos. Por outro lado, na condição de solo não-saturado ou
nível freático à grande profundidade, o processo de evaporação passa a
depender também das propriedades do perfil do solo, principalmente da
condutividade hidráulica, que é função da estrutura e textura do mesmo.
Os métodos normalmente utilizados para determinar a evaporação são:

- transferência de massa;
- balanço de energia;
- equações empíricas;
balanço hídrico; e,
- evaporímetros

7.2.1 Métodos de transferência de massa

Os métodos de transferência de massa baseiam-se na primeira Lei de


Dalton, que estabelece a relação entre evaporação e pressão de vapor,
expressa por

Eo = b ( es - ea) (7.1)

onde Eo = evaporação; b = coeficiente empírico; es = pressão de vapor de


saturação na temperatura da superfície; ea — pressão de vapor numa altura
acima da superfície.
O efeito do vento foi introduzido através da alteração do parâmetro b. A
expressão resultante é função da velocidade do vento, expressa por

N f(w)(es-ea)
(7.2)
Evaporação e Evapotranspiração 255

onde N = parâmetro que considera os efeitos da densidade do ar e da pressão;


f(w) = função da velocidade do vento; f(r) = parâmetro de rugosidade.
As funções introduzidas, que retratam o efeito do vento, são obtidas com
base nos conceitos de camada limite que ocorre na ação do vento próximo da
superfície de interesse. Na literatura, existem várias expressões utilizadas
para" estimativa da evaporação em intervalos de tempo superiores a um dia.
Duas expressões deste tipo são apresentadas a seguir:

0,623 p K2 w8 (e2 - e8))


Eo = ---------------------------- Sverdrup (1946) (7.3)
p [ln (800/r)]2

0,623 p K2 (w8-w2)(e2-e8)
Eo = -------------------------------- Thomthwaite e Holzman (1939) (7.4)
p [ln (800/200)]2

onde Eo = evaporação cm g/(cm: .s); p - massa especifica do ar em g/cm3, K


=0,41 constante de Von Karman, w8 c w2 - as velocidades do vento em cm/s a
8 e 2 m acima da superfície, rcspccdvamente; p = pressão atmosférica em mb;
r= altura da rugosidade em cm; c2 e e8 = pressão de vapor a 2 e 8 m, respectiva­
mente, cm mb. Estas equações apresentam limitações devido à dificuldade de
obtenção das variáveis envolvidas.

7.2.2 Balanço de energia

Para melhor entendimento desta metodologia, é necessário revisar alguns


aspectos do comportamento climático sobre a superfície terrestre e a
atmosfera.
A radiação solar que atinge a Terra tem comprimento de onda curto (1 |i)
(figura 7.1). Parte da energia é absorvida pela atmosfera (11%) devido às
moléculas de gases e partículas de poeiras, parte é dispersa em direção ao
espaço ( 9%) e outra parcela em direção à Terra (5%). Uma parcela desta
energia (33%) é refletida e o restante chega na superfície da Terra (42%),
atravessando nuvens ou diretamente. Da parcela que atinge a superfície da
Terra, parte é refletida e parte é absorvida. A parcela absorvida produz
aquecimento na superfície, tendo como resultado a evaporação e a radiação
térmica em direção à atmosfera. Esta radiação tem comprimento de onda longo,
apresentando uma grande absorção (95%) pelos gases existentes na atmosfera
(H20, CO2, N03, ). Ao aquecer a atmosfera, ocorre radiação de volta para
Terra (88%). Este processo de aquecimento da atmosfera, pela radiação térmica
de ondas longas, é 0 denominado "efeito estufa". O aumento do efeito estufa
pode ocorrer com o acréscimo de gases na atmosfera. Os valores percentuais
256 Hidrologia

indicados se referem ao hemisfério Norte (Cray, 1970).


Na figura 7.2 é representado um volume de controle sobre o qual agem os
diferentes processos que afetam a temperatura da água e a evaporação. A
temperatura da mesma depende do balanço de energia e do volume de controle
que influencia a superfície. A equação resultante deste balanço é

AHs = qr + qal - qbl - qc - qe + Hi - Ho (7.5)


onde qr = radiação efetiva de ondas curtas (W/m2); qal =radiação atmosférica
de ondas longas em direção à superfície (W/m2); qbl = radiação de ondas
longas em direção à atmosfera (W/m2); qc = fluxo de calor por condução,
(W/m2); qe = fluxo de calor pela perda por evaporação (W/m2); Hi e Ho=
respectivamente, a energia de entrada e saída do volume de controle (W/m2);
AHs = variação de calor no volume de controle (W/m2).

Radiação solar: a radiação de onda curta na superfície terrestre depende da


efetiva radiação do Sol, a sua posição com relação ao ponto de interesse na
Terra e das condições climáticas que atuam sobre os raios solares. A Terra
recebe no topo da atmosfera um fluxo de energia proveniente do Sol. Este
processo apresenta grande regularidade, dependendo exclusivamente da latitude
do local em estudo, da distância Sol-Terra e do período do ano que se estuda.
Na prática, existem tabelas denominadas de Angot, onde se podem obter os
valores de radiação incidente no topo da atmosfera, para cada dia do ano numa
dada latitude.
Uma parcela variável da radiação que atinge o topo da atmosfera, chega à
superfície terrestre. O fenômeno de penetração da radiação solar na
atmosfera, depende do ângulo de incidência dos raios solares, do conteúdo de
vapor de água existente na atmosfera, altitude e espessura da camada de
nuvens. Este processo complexo é abordado com base em formulações empíricas,
que devem ser verificadas com observações em cada local.
TVA(1972) cita que Angstrom propôs a seguinte equação para relacionar a
radiação no topo da atmosfera (Rt) com radiação incidente de onda curta (G)

G - Rt (a + (3 p ) (7.6)

onde a e |3 = parâmetros que dependem do local e p = é a proporção entre o


efetivo número de horas de brilho solar e o máximo possível.
Uma parcela da radiação de onda curta que recebe uma superfície qualquer
é refletida pela mesma e não intervém no seu balanço térmico. A magnitude
desta parcela depende da superfície. Esta radiação refletiva chama-se albedo
e oscila entre 3 e 10 % para a superfície de água. A radiação efetiva de onda
curta fica
Evaporação e Evapotranspiração 257

Figura 7.1. Componentes do balanço de energia (Schneider, 1987)

Figura 7.2. Balanço de Energia


258 Hidrologia

qr = (1 - a) G (7.7)

onde a = parcela do albedo. Alguns valores de a e p são apresentados na


tabela 7.1. Para a estimativa da radiação solar em locais sem dados é
necessário utilizar dados de postos climatológicos que tenham características
de cobertura de nuvem e latitude semelhante.

Tabela 7.1. Valores de a e (3


Local a p
Estocolmo e Helsinki 0,235 0,765
Washington 0,220 0,780
Rizzleem(Suiça) 0,300 0,700
Região Polar 0,540 0,460
USA 0,350 0,610
Suriname 0,270 0,436
Rio Grande do Sul 0,230 0,480
Inglaterra 0,180 0,436
Clima temperado 0,200 0,530
Clima tropical 0,280 0,480

A superfície absorve a radiação de onda curta c emite radiação térmica


pelas moléculas que compõem a atmosfera em outra faixa do espectro eletro­
magnético (onda longa). Os componentes atmosféricos com maior capacidade
de absorção/emissão são, em ordem de importância, o vapor de água, o dióxido
de carbono e o ozônio.
A radiação efetiva de onda longa para a superfície, com um céu sem nu­
vens, c igual a diferença qai - qbl. A atmosfera absorve grande parte da radiação
de onda longa emitida pela superfície e o coeficiente de emissibilídade retrata
esta relação

radiação de onda longa da atmosfera qai


radiação de onda longa para a atmosfera qbl

qai - qbl = qbl (e - 1) (7.8)

A emissão total de um corpo negro, obtida pela lei de Stefan-Boltzman,


é expressa por
Evaporação e Evapoíranspiração 259

q = a T4 (7.9)

onde q = é a intensidade do fluxo de energia (W/m ) ; a =constante de


8 2 /O 4
Stefan-Boltzman (5,72. 10 W/m /°K ); T = temperatura absoluta da superfície
de radiação ( °K).
Como os corpos naturais não são corpos negros perfeitos, a radiação
emitida é reduzida de um fator que depende da superfície. O fator de redução
6 da ordem de 0,97 para superfície de água (Anderson, 1954). Sendo qbi a
radiação emitida pela superfície e substituindo a equação 7.9 em 7.8, resulta

qai - qbi = (e - 1) 0,97 a T4 (7.10)

O coeficiente de emissibilidade foi expresso por Brunt segundo a


seguinte equação

e = A + B (ea)1'" (7.11)

onde ea = pressão de vapo* a 2m de altura. Na tabela 7.2 são apresentados


alguns valores desses coeficientes.
Essas equações consideram o céu claro. Penman introduziu o coeficiente
c + bp para considerar as nuvens, onde p é o número real de horas de
incidência solar dividido pelo número de horas possíveis. O número máximo de
horas de iuz, encontra-se tabulado no anexo A2 em função do mês e latitude.

Tabela 7.2. Coeficientes da equação de Brunt (Anderson,1954)


Autor e local A B
Kimball (Washington) 0,44 0,061
Angstrom (Califórnia) 0,50 0,032
Anderson (Oklahoma) 0,68 0,036
Eckel(Austria) 0,47 0,063
Goss e Brooks (Davis) 0,66 0,039

A radiação efetiva obtida pelos três primeiros termos da equação 7.5


fica

qef = Rí (a+j3p) (1-a) - 0,97 ct T4 (1-e) (c+bp) (7.12)

Energia de evaporação: uma superfície de água troca constantemente moléculas


260 Hidrologia

de vapor com a atmosfera circundante. Quandc o número de moléculas que saem


do corpo de água é maior do que as que entram, ocorre a evaporação. Este
processo é controlado pela tensão de vapor na atmosfera circundante e quando
esta atinge a saturação se estabelece o equilíbrio. A tensão de vapor de
saturação depende exclusivamente da temperatura do ar circundante. Em
presença de vento o vapor de água é removido das proximidades da superfície,
facilitando a evaporação de outros volumes.
A energia empregada nesse processo é necessária para mudar a parcela de
água evaporada do estado líquido para o gasoso, denominada calor latente de
vaporização e, expressa pela seguinte fdrmula:

qc = L Eo (7.13)

onde L = calor latente de vaporização por unidade de massa, negativo para


evaporação e positivo para condensação; Eo = evaporação. A evaporação pode
ser obtida com base no efeito do vento e na tensão de vapor do ar através da
equação

Eo —(al +bl w?.) ( es - ea) (7.14)

onde al e bl são coeficientes; w2 = velocidade ao ar a 2 metros de altitude;


es e ea = tensões de vapor de saturação a temperatura da superfície de água e
a tensão de vapor a uma altura da superfície.
Quando a temperatura da água é conhecida, a evaporação pode ser
calculada diretamente pela equação 7.14, no entanto a temperatura da água não
é conhecida e a evaporação é calculada pelo balanço de energia da equação
7.5. Desprezando as mudanças de Hs, os efeitos da entrada e saída no volume
de controle, teremos

qef - qe - qc = 0 (7.15)

O calor sensível por condução é devido ao transporte que ocorre por


difusão molecular e turbulenta entre a superfície e a atmosfera. Este fluxo
de calor pode ser produto de convecção livre ou forçada. No primeiro caso, o
próprio gradiente de temperatura nas proximidades da superfície de água
determina a transferência de calor. No segundo, a existência de forças
externas ao processo, como a velocidade do vento, contribuem na troca de
calor por advecção entre o corpo de água e a atmosfera. Este termo pode ser
estabelecido com base na relação de Bowen, que estabelece que o quociente
entre a energia empregada por evaporação e a energia perdida na forma de
calor sensível é proporcional a diferença entre temperatura e tensões de
vapor. Esta relação é
Evaporação e Evapotranspiração 261

qc Ts - Ta
- y
(7.16)
qe es - ea

onde y = parâmetro de Bowen, constante psicrométrica, y = 0,66 mbares °C ou


0,485 mm Hg /°C.
Considerando a variável auxiliar A (Ta)

e s (T s)-e s (T a ) des(T)
A (Ta) T=Ta (7.17)
Ts - Ta dT

onde es(Ta) = tensão de vapor de saturação para T = Ta, onde Ta é a


temperatura do ar; es(Ts)= tensão de vapor saturada para T = Ts.

Introduzindo a equação 7.17 na 7.16 resulta

qc y es(Ta)-ea
1 1 ------------- ] (7.18)
qc A(Ta) es(Ts)-ea

A evaporação para condições isotérmicas (Ts = Ta) representada por Ei,


pode ser obtida pela equação 7.14, com es (Ta). Utilizando esta definição em
7.18, resulta:
% y ^i
- = - (1 - — ) (7.19)
Qc A ^

Introduzindo as equações 7.13 e 7.19 na equação 7.15 resulta

A
— qef +qei
Y 7 20)
( .
Eo- / L
A
- + 1
Y

A OMM apresenta na forma abaixo os termos da equação 7.20 que são


utilizados em vários países, ou seja

qef/L = [ G(l-a) - aT4 (0^6-0,09ea'^) (0,l+0,9p) ] / L (7.21)


262 Hidrologia

onde qef (mm/dia); G (cal/cm2.dia); T (°K); o = l,19.10~7cal/cm2.dia;L = 59


cal/(cm2.mm); G pode ser obtido por registros locais ou estimado com base na
equação;

G - Rt (0,24 + 0,58 p) (7.22)

onde Rt é obtido da tabela A l nos anexos, função da latitude e do mês. Os


coeficiente usados foram obtidos para o Planalto Paulista (Cerveílini et
al,1966).
A tensão parcial de vapor de água ea é obtida por

U es
ea = (7.23)
100

onde, U = umidade relativa do ar em %; es (Ta) = tensão de vapor saturado,


obtida com base na temperatura do ar

ijT /a iiM T )
es = 4,58 . 10 (7.24)

onde T é a temperatura em °C e es em mm de Hg.


O termo A/y é obtido pela derivada da expressão 7.24 (veja definição na
equação 7.17), transformada para mb e sendo y = 0,66, resulta

7^T/(237A+T)
A 38640.10
(7.25)
Y (237,3+TT

O termo de evaporação das condições isotérmicas embutida na equação 7.19


fica

Ei = 0,35 (0,5 + w2/160)(es - ea) (7.26)

para W2 em km/dia. Rearranjando os termos a equação 7.20 fica

Ho (mm/dia) = (A/y .qef/L + Ei )/ (A/y +1) (7.27)

Este é o denominado método de Penman, que se baseia no balanço de


energia e nas características aerodinâmicas do processo. Algumas
simplificações foram introduzidas, tais como desprezar a variação da energia
a massa de água e a entrada e saída de energia do volume de controle. Em
Evaporação e Evapotranspiração 263

coberturas como solo e vegetação esta aproximação 6 mais aceitável, mas em


reservatórios isto pode introduzir erros. Linsley et al. (1975) mencionam que
o método, ao considerar Ts=Ta para o termo de radiação, superestima a
evaporação para condições calmas e úmidas e subestima para condições secas e
ventosas.
Para a aplicação do método de Penman são necessários:
- temperatura média, °C;
- umidade relativa do ar, %;
- radiação solar, cal/cm2,dia. No caso de não existir esta informação
pode-se utilizar a equação ajustada, com coeficientes mais
representativos. No caso de não existirem deve-se ajustar os parâmetros
a e p aos dados do local;
- número de horas de incidência solar real, obtidos de heliógrafos. O
valor do número máxima de horas em função da latitude consta da tabela
apresentada no anexo A2;- velocidade do vento a 2 metros de altura, w2,
km/dia. A velocidade do vento é uma das váriáveis que apresentam maiores
incertezas d e v i d o a sua variabilidade temporal e espacial. Para estimar
em cota d i f e r e n t e d e 2m pode-se utilizar uma extrapolação logarítmica,
o u seja
log(200/2)
W2 = w h ------------------
Iog(100 h)

onde h = a altura onde foi medida a velocidade do vento.

Exemplo 7.1. Estime a evaporação média, usando a equação de Penman, de um


reservatório na latitude de 23°S no mês de fevereiro. Os dados disponíveis
são a temperatura média de 23°C, umidade relativa de 66%, incidência solar é
de 6,82 horas e a velocidade do vento é desconhecida.

Solução: Neste caso, como não se conhece a velocidade do vento, o resultado


pode ser obtido para uma faixa possível de valores de velocidade do vento.
Utilizando w2=l m/s e wz=4 m js pode-se ter uma faixa possível de ocorrência.
Para a latitude 23°S na tabela do Anexo Al obtém-se Rt =932 cal/cm2.dia.
Da tabela A2 obtém-se o número de horas de insolação 12,8 e p = 6,82/12,8 =
0,533. O valor do albedo adotado é de 0,05, pois a superfície é a água.
Calculando es com base na equação 124, resulta es= 21,07 mm de Hg e ea fica

ea = 66/100 . 21,07 = 13,90 mm Hg.

O termo de radiação pela equação 7.21 fica


264 Hidrologia

qef/L = 932/59. (1 - 0,05). (0,24 + 0,58 . 0,533) - 1,19 . 10'7. (23 + 273)4.
[ 0,56 - 0,09 (13,9) m ] (0,1 + 0,9. 0,533)/59 = 6,23 mm/dia.
O termo Á/y é obtido pela equação 7.25, A/y = 2,62. Substituindo os
valores conhecidos na equação 7.27 resulta

Eo = (2,62 . 6,23 + Ei)/(2,62 + 1 ) = 4,51 + Ei/ 3,62

Substituindo a expressão para Ei, resulta

Eo = 4,51 + 0,693 (0,5 + 0,54 w2) = 4,86 + 0,374 w2

onde w2 é dado em m/s. Para w2 = lm/s, resulta Eo =5,23 mm/dia (157 mm/mês) e
para 4 m/s resulta Eo = 6,36 mm/dia (190,7 mm/mês). Esses valores permitem
avaliar a variabilidade da evaporação em função do vento e adotar um valor
mais próximo das condições conhecidas no local.

7.2.3 Equações empíricas

As equações empíricas foram estabelecidas com base no ajuste por


regressão das variáveis envolvidas, para algumas regiões e condições
específicas. Por isso devem ser usadas com cuidado. Essas equações se baseiam
usualmente na equação aerodinâmica. Esta equação é do tipo

Eo = K f(w) [es(Ts) - ea] (7.28)

onde K = constante; f(w) = função da velocidade do vento. Um resumo das


equações deste tipo são apresentadas na tabela 7.3

Tabela 7.3. Equações empíricas baseadas na expressão aerodinâmica


equação condições de Referência
aplicação
Eo(pol/mes)=l 1(1+0,Iw8)(es-e8) lagos rasos Meyer(1915)
Eo(pol/dia)=0,771(l,4ó5 - 0,0186p) Rohwer(1931)
(0,44+0,118wo)(es-ea)
p = pressão barométrica pol/Hg
Eo(pol/dia)=0,35(l+0,24w2)(es-ea) pequenos tanques Penman(1948)
Eo(pol/dia)=0,057w8(es-e8) Lago Hefher Marciano e
Eo(pol/dia)=0,072w4(es-e2) Harbeck(1952)
w em mph; o subíndice indica a altura da medição;
Evaporação e Evapotranspiração 265

Unesco (1972) cita uma fórmula utilizada na América do Sul obtida por
regressão com variáveis como precipitação e altitude. A equação conhecida
como de Avellán estima a evaporação por

10(1,426 iogP + 2,4)

Eo = (7.29)
d - e)
P H

onde Eo - evaporação média anual em mm, equivalente a evaporação medida em


tanque classe A; P = precipitação média anual em mm; H altitude em m; e =
obtido por interpolaçao com base em postos vizinhos

0 4^6
1 - log (251,2 P ' Eo)
(7.30)
G” lõg~H

7.2.4 Evaporímetros

Os evaporímetros são instrumentos que possibilitam uma medida direta do


poder evaporativo da atmosfera, estando sujeitos aos efeitos de radiação,
temperatura, vento e umidade. Os mais conhecidos são os atmômetros e os
tanques de evaporação.

Atmômetros: são equipamentos que dispõem de um recipiente com água conectado


a uma placa porosa, de onde ocorre a evaporação. Cabe destacar o de Piché,
bola preta e branca, e Bellani. O mais comum entre estes é o de Piché,
constituído de um tubo de vidro com 11 cm e discos planos horizontais de
papel de filtro, com 3,2 cm de diâmetro. Ambos os lados são expostos ao ar,
figura 7.3a.
O balanço energético de um atmômetro difere consideravelmente do balanço
de uma superfície livre de água, solo descoberto ou vegetado. A energia para
evaporação provém da radiação, transporte de calor sensível e condução de
calor através do recipiente de abastecimento. A instalação, geralmente bem
acima da superfície do solo e o meio circundante, afetam as reações deste
aparelho, tomando-o pouco confiável. Tem como pontos positivos a fácil
instalação, operação e portabilidade.

Tanques de evaporação: em trabalho realizado por Gangopadhyaya et al. (1966),


foram listados 27 tipos de tanques de evaporação, com diferentes
características e grande diversidade de aplicação. Resumidamente, podem ser
reunidos em quatro classes: enterrados, superficiais, fixos e flutuantes,
mais usado em nível mundial é o tanque classe A, figura 7.3b, que tem forma
266 Hidrologia

circular com um diâmetro de 121 cm e profundidade de 25,5 cm. Construído em


aço ou ferro galvanizado, deve ser pintado na cor alumínio e instalado numa
plataforma de madeira a 15 cm da superfície do solo. Deve permanecer com água
variando entre 5,0 e 7,5 cm da borda superior. A taxa de evaporação, medida

a) Atmômetro

b) Tanque de evaporação

Figura 7.3. Evaporímetros


Evaporação e Evapotranspiração 267

com auxílio de uma ponta linimétrica apoiada em um íranqüiiizador, é resultado


das mudanças de nível de agua no tanque, levando em consideração a precipita­
ção ocorrida. A manutenção da água entre profundidades recomendadas, evita
erros que podem chegar a 15% do valor determinado, quando por exemplo, o
nível de água estiver 10 cm abaixo dos níveis estabelecidos. Também a água
dentro do tanque deve ser renovada regularmente para evitar a turbidez, respon­
sável por erros que podem superar 5% dos valores determinados.
Ao instalar um tanque de evaporação, deve-se dar especial atenção à
finalidade a que se destina a informação, evitando, desta maneira, ampliar os
erros cometidos correntemente. O fato do tanque ser instalado sobre o solo
faz com que as paredes do mesmo sofram influência da radiação e da
transferência de calor sensível, traduzindo-se num aumento da evaporação
medida. Os tanques são mais suscetíveis à advecção do que, por exemplo, uma
comunidade vegetal. Doorembos e Pruitt (1990) atribuem incrementos na
temperatura de 2 a 5°C e redução na umidade relativa de 20 a 30%, ao nível do
tanque, quando instalados sobre pisos inadequados. Quando circundados por
cultivos de elevada estatura, subestimam a evaporação. Os valores da
evaporação medida em tanques superam os obtidos em lagos e/ou reservatórios,
devido às diferenças de volume, superfície e localização e também pelo fato
do lago/reservatório depender da variação do transporto de massa e balanço de
energia, que influenciam os dias subseqüentes, enquanto que no tanque isto
não ocorre. O fator que relaciona a evaporação de um reservatório e do tanque
classe A oscila entre 0,6 c 0,8, sendo 0,7 o valor mais utilizado.

7.2.5 Balanço Hídrico

O Balanço hídrico possibilita a determinação da evaporação com base na


equação da continuidade do lago ou reservatório. A referida equação pode ser
escrita da seguinte forma

dV/dt = I - Q - Eo.A + P.A (7.31)

onde V = volume de água contido no reservatório; t = tempo; I = vazão total


de entrada no reservatório; Q = vazão de saída do reservatório; Eo =
evaporação; P = precipitação sobre o reservatório; A = área do reservatório.
A evaporação é obtida da equação 7.31 por

Eo = (I - Q)/A + P - (dV/dt)/A (7.32)

Utilizando as unidades usuais de cada variável, e considerando que o


volume e a área podem-se relacionar por uma função do tipo V = a Ab, ( V em
268 Hidrologia

hectômetros e A em km2) ou utilizando tabelas, a equação 7.32 resulta em


Eo (mm/mês) = 2.592.( I - Q )/A + P - 1000 . a b A1' 1 .

[A(t+i)-A(t)]/At (7.33)
onde A a área da superfície do reservatório no mês (km2); P (mm/mês); I e Q
as vazões médias do mês em m3/s.
O uso de uma equação de balanço hídrico para estimar a evaporação é
teoricamente precisa, pois está alicerçada no princípio de conservação de
massa. Na prática as dificuldades para medir as demais variáveis limitam este
procedimento. As imprecisões ficam por conta principalmente das .contribuições
diretas que aportam ao reservatório. Quando a contribuição direta não-
controlada é grande, o erro na sua avaliação pode produzir erros
significativos na determinação da evaporação.

Exemplo 7.2. A precipitação total no mês de janeiro foi de 154 mm, a vazão de
entrada drenada pelo rio principal foi de 24 m3/s. Este rio drena 75 % da
bacia total que escoa para o reservatório. Com base nas operações do
reservatório ocorreu uma vazão média de saída de 49 m3/s. A relação entre o
volume e a área do reservatório encontra-se -na tabela abaixo. O volume no
6 3 6 3
início do mês era de 288 10 m e no final 244.10 m . Estime a evaporação no
reservatório.

Tabela 7.4. Relação entre volume e área

A
A rea volume
Km2 106 m3
10 10
30 : 60
90 270
110 440

Duas soluções podem ser usadas. A primeira utiliza diretamente a equação


7.32 e a outra a equação 7.33. No primeiro caso evita-se o erro de ajuste de
uma função para a relação entre a área e o volume, mas no segundo é mais
fácil de operar com todas as variáveis envolvidas.

- A(t+1) = 81,43 km2 e A(t) = 92,12 km2, a área média fica A = 86,78 km2
- a variação de volume é = (244 - 288) . 106 = -44 . 10ft
Evaporação e Evapotranspiração 269

- a variação de vazão é = (24/0,75 - 49) = -17 m3/s.

A evaporação em mm/ mês é

Eo = 2592 (-17)/86,78 + 154 + (44/86,78). 1000 = 153 mm.

Como pode-se observar, o uso deste método depende da avaliação de cada


um dos seus termos. As principais dificuldades são na avaliação da vazão
afluente e na precipitação direta sobre o lago. No primeiro caso,
dificilmente existem dados de todos os afluentes e a simples proporção de
áreas, como utilizado no exemplo, pode apresentar erros devido à
variabilidade de contribuição. Este procedimento é mais confiável em períodos
de estiagem. A distribuição espacial da precipitação é outro fator que pode
ser fonte de incertezas. O erro diminui à medida que aumenta o período
avaliado. As outras fontes de incertezas são: as relações entre cota, área e
volume, curva-chave dos extravazores e do rio afluente e perdas para o
aquífero. Para reservatório ou lago, deve ser realizada uma avaliação de cada
um dos termos para se ter uma idéia da magnitude dos erros envolvidos. Quando
a evaporação representa uma parcela pequena do volume, o erro de cálculo pode
ser muito grande, pois pequenas diferenças das variáveis envolvidas produzem
grandes diferenças no cálculo da evaporação. Nesta situação a evaporação
passa a ser pouco importante para o sistema.

73 Evapotranspiração

A evapotranspiração é aqui considerada como a perda de água por


evaporação do solo e transpiração da planta. A evapotranspração é importante
para o balanço hídrico de uma bacia como um todo e, principalmente, paia o
balanço hídrico agrícola, que poderá envolver o cálculo da necessidade de
irrigação.
O solo, as plantas e a atmosfera podem ser considerados como componentes
de um sistema fisicamente inter-relacionado e dinâmico, no qual os vános
processos de fluxo estão interligados como os elos de uma corrente. Neste
sistema, é valioso e aplicável o conceito de potencial hídrico, ou seja, o
fluxo de água ocorre dos pontos de maior potencial para os de menor potencial
(o fluxo ocorre em direção do gradiente de potencial negativo).
A quantidade de água transpirada diariamente é grande em relação às
trocas de água na planta, de modo que se pode considerar o fluxo através da
planta, em curtos períodos de tempo, como um processo em regime permanente.
As diferenças de potencial, em distintos pontos do sistema são proporcionais
à resistência do fluxo. A menor resistência ao fluxo é encontrada na planta.
E a maior resistência é encontrada no fluxo das folhas para a atmos era,
270 Hidrologia

devido à mudança do estado líquido para vapor. A passagem para a atmosfera


ocorre através dos estômatos localizados nas folhas e a diferença total do
potencial entre o solo e a atmosfera pode chegar a centenas de bares. O
transporte de água desde as folhas até a massa de ar ocorre também através do
processo de difusão de vapor, sendo proporcional ao gradiente de tensão do
vapor de água. A umidade relativa ou seja, a relação entre a tensão real e a
de saturação de vapor, relaciona-se exponencialmente com o potencial hídrico.
A transferência de água de uma área cultivada, onde a umidade do solo
não é um fator limitante, ocorre segundo sua intensidade potencial e,
qualquer variação será devida somente a diferenças de condições
meteorológicas, incluindo os efeitos de advecção. De acordo com Beriato e
Molion (1981), o controle exercido pela vegetação seria através da sua
estrutura, afetando o albedo, a rugosidade e o sistema radicular. Na medida
em que diminui a umidade do solo, ocorrem restrições à transferência de água
para a atmosfera, que passa a depender não somente das condições
meteorológicas, mas também do sistema radicular das plantas, bem como de
outras características, como o estado fitossanitário das mesmas. Esta
condição permite distinguir entre evapotranspiração potencial e real.

Evapotranspiração potencial (ETF): quantidade de água transferida para a


atmosfera por evaporação e transpiração, na unidade de tempo, de uma
superfície extensa completamente coberta de vegetação de porte baixo c bem
suprida de água (?enman,195ó),

Evapotranspiração real (ETR): quantidade de água transferida para a atmosfera


por evaporação e transpiração, nas condições reais (existentes) de fatores
atmosféricos e umidade do solo. A evapotranspiração real é igual ou menor que
a evapotranspiração potencial (ETR < ETP) (Gangopadhyaya et al, 1968).

Informações confiáveis sobre evapotranspiração real são escassas e de


difícil obtenção, pois demandam um longo tempo de observação e custam muito
caro. Já a evapotranspiração potencial, pode ser obtida a partir de modelos
baseados em leis físicas e relações empíricas de forma rápida e
suficientemente precisas. Várias teorias, relacionam a ETR e ETP em função da
disponibilidade de água no solo, resumidas na figura 7.4. Apesar destas
tentativas não existe, ainda hoje, nenhuma teoria que seja aceita
universalmente.
Sendo um processo complexo e extremamente dinâmico, que envolve
organismos vivos como o solo e a planta é muito difícil estabelecer um valor
exato de evapotranspiração real. Entretanto, à conjugação de inúmeras
informações associadas ao conceito de ETP, nos permitem estimativas
suficientemente confiáveis para a grande maioria dos nossos objetivos.
As diferenças entre a evapotranspiração real e potencial diminuem sempre
Evaporação e Evapotranspiração 271

que os intervalos de tempo utilizados para o cálculo da segunda são ampliados


(um mês ou mais).
A seguir são apresentados alguns procedimentos usualmente empregados
para medir ou estimar a evapotranspiração:

- medidas diretas;
- métodos baseados na temperatura;
- métodos baseados na radiação;
- método combinado; e
- balanço hídrico.

73.1 Medidas Diretas

Lisímetro: o procedimento mais correto para determinar a evapotranspiração é


através de lisímetros. São estruturas constituídas de um reservatório de solo
com volume mínimo de 1 m3, providos de um sistema de drenagem e instrumental
de operação, figura 7.5. Às medidas podem ser volumétricas ou de massa,
dependendo do tipo de lisímetro. Quando são construídos junto ao local de
interesse, deve-sc tomar cuidado para não provocar nenhuma descontinuidade
entre a cultura implantada no lisímetro e a comunidade vegetal em tome do
mesmo. Quando há necessidade de remoção do solo, deve-se evitar a inversão ou
mistura de horizontes, que modificaria a estrutura do sole e,
consequentemente, as medidas das variáveis. As bordas do reservatório devem
ser tão pequenas que não prejudiquem os fluxos de ar e calor do solo
adjacentes. As variáveis controladas junto ao lisímetro; precipitação,
escoamento, infiltração, armazenamento e percolação profunda, permitem
estabelecer a evapotranspiração real e/ou potencial. Para determinação da
ETR, mantém-se as condições naturais de umidade do solo. Para determinar a
ETP, promove-se a irrigação da cultura implantada no lisímetro, mantendo-se o
solo em capacidade de campo.
A maior restrição imposta aos lisímetros reside no pequeno volume e/ou
área que o mesmo representa. Em algumas situações, como é o caso de vários
lisímetros instalados em casas de vegetação, cria-se um microclima,
desfavorável à precisão da medida de evapotranspiração. Este procedimento é
muito utilizado para calibrar metodologias de estimativa da
evapotranspiração. Aboukhaled et al. (1982) apresentou detalhes sobre uso e
operação de lisímetros.

Medidas de umidade do solo: sucessivas medidas da umidade do solo permitem,


por diferença, estabelecer ura valor de evapotranspiração na ausência de
precipitação e/ou irrigação.
V IE N M E Y E R E H E N O R IC K S O N

permonef*
d« campo

Figura 7.4. Relação entre intensidade relativa de evapotranspiração e o


conteúdo de umidade do solo.

tensiometro

Figura 7.5. Lisímetro de drenagem


Evaporação e Evapotranspiração 273

AW
= ET + Pp (7.34)
t
onde; AW = variação do armazenamento d’água para um determinado perfil de
solo (mm); ET = evapotranspiração (mm/dia); Pp = percolação d’água abaixo do
sistema radicular (mm/dia)', t = tempo.
A umidade do solo poderá ser determinada através dos métodos
gravimétrico, resistência elétrica, tensiométrico ou dispersão de nêutrons,
entre outros. Estes procedimentos estão sujeitos à grande variabilidade
espacial dos solos e, via de regra, são usados somente em áreas irrigadas. A
redistribuição interna e/ou a percolação profunda constituem-se em outra
fonte de erro.
Valores aceitáveis só poderão ser obtidos se forem adotadas algumas
práticas preventivas. Entre elas Jensen (1973) aponta:

- local de amostragem representativo da área;


- nível freático bem abaixo da profundidade alcançada pelo sistema
radicular;
- fazer a determinação em períodos secos;
- em áreas irrigadas, manter a umidade abaixo da capacidade de campo;
- promover as medições de umidade, somente junto da zona radicular.

7.3.2 Métodos baseados na temperatura

Entre as mais antigas expressões para estimativa da evapotranspiração


potencial, com base na temperatura do ar, destacam-se as de Thomthwaite e
Blaney-Criddle.

Thomthwaite: a equação original de Thomthwaite, segundo Chang (1968), é


baseada em dados de precipitação e escoamento, de inúmeras bacias
hidrográficas localizadas nas regiões central e leste dos Estados Unidos,
onde predomina um clima temperado com invernos úmidos e verões secos. O
método correlaciona estas informações com a variável temperatura c
possibilitra a estimativa da evapotranspiração fazendo

T
ETP * Fc 16 (10 - )a (7.35)
I

onde ETP = evapotranspiração potencial para meses de 30 dias e comprimento de


12 horas (mm/mês); T = temperatura média do ar (°C) e ; Fc = fator de
correção em função da latitude e mês do ano, tabulados em A3;
274 H id r o lo g ia

12
ti 1,514
-* )
5
F=1

a = 67,5 . 10"8 I3 - 7,71. 10'6 I2 + 0,01791 I + 0,492

onde T e ti = temperaturas do mês analisado em °C.


Berlato e Molion (1981) citam que em regiões onde o clima difere da­
quele onde a equação foi desenvolvida, os resultados obtidos não são satisfa­
tórios. Pressupõe-se que isso ocorra porque o método não contempla explici-
tamente a umidade do ar. Assim, deve-se ter muita cautela ao utilizar este
método, particularmente em climas de verões úmidos e invernos secos. Ape­
sar de tudo, a equação de Thornthwaite ganhou popularidade mundial, mais
pelo fato de necessitar somente de dados de temperatura do ar, informação
disponível em grande número de estações meteorológicas, do que pela sua
precisão.

Exemplo 7.3. Calcule a evapotranspíração potencial pelo método de


Thornthwaite para os dados da cidade de Passo Fundo.

Solução: os resultados encontram-se na tabela 7.5 e foram obtidos utilizando


as equações acima. Como se observa, a ETP, através deste método tende a ser
menor que os valores do exemplo seguinte.

Tabela 7.5, Resultados de evapotranspíração potencial (mm/mês), calculadas


pelo método de Thornthwaite.

ANO JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ TOT
1971 128 100 94 51 37 25 40 42 66 72 93 121 869
1972 117 90 93 56 62 45 36 37 55 63 89 116 859
1973 122 112 94 85 44 37 35 30 45 68 77 106 854
1974 118 97 92 63 46 24 37 41 56 68 80 99 821
1975 113 99 95 66 44 37 29 47 55 70 89 118 860
MED 120 100 94 64 47 34 35 39 55 68 86 112 853

Blaney-Criddle: este método descrito por Kijne (1978) foi desenvolvido


originalmente para estimativas de uso consuntivo em regiões semiáridas,
baseado na suposição de que a disponibilidade de água para a planta em
crescimento não é um fator limitante.
Evaporação e Evapotranspiração 275

ETP = (0,457 T + 8,13) p (7.36)

onde, ETP = evapotranspiração potencial (mm/mês); T = temperatura média


mensal do ar em °C; p = porcentagem diária de horas de luz, obtida do anexo
A4.
A inclusão de um coeficiente de cultura kc, que deve ser determinado em
lisímetros, para cada cultura e local de interesse, pressupõe um avanço em
termos de confiabilidade dos resultados obtidos. Neste caso:

ET = ETP. kc (7.37)

onde, ET = evapotranspiração estimada para determinada cultura e local de


interesse (mm/dia); kc = coeficiente da cultura, Valores ilustrativos
encontram-se no Anexo A5. Dependendo da precisão desejada, o uso de tais
coeficientes requer uma verificação prévia, o que, via de regra, é
impraticável. Assim sendo, é mais correto empregar este método para cálculo
da evapotranspiração potencial.
Independente do uso do coeficiente de cultura, Doorenbos e Pruitt (1990)
não recomendam a equação de Blaney-Criddle para regiões equatoriais em que a
temperatura se mantém estável, oscilando somente as demais variáveis
meteorológicas. Descartam seu uso em ilhas pequenas, onde a temperatura do ar
é função da temperatura do mar circundante. Também em locais altos e climas
de latitude média, os resultados são duvidosos.
O empirismo contido nos métodos baseados na temperatura do ar,
recomendam seu uso, exclusivamente, quando esta variável for a única
informação meteorológica disponível.

7 3 3 Métodos baseados na radiação

Métodos desenvolvidos com base na variável meteorológica radiação so­


lar, são mais confiáveis, principalmente nas situações em que a advecção possa
scr desconsiderada.
A equação de Jensen e Haisc, descrita por Kijne (1978), é um exemplo de
método baseado na radiação e tem dado resultados razoáveis em diferentes, con­
dições climáticas. A equação é a seguinte:

G
ETP = (0,025 T +0,08 ) — (7.38)
59

onde, ETP = evapotranspiração potencial (mm/dia); T = temperatura do ar (°C);


-2 -l
G = radiação incidente de onda curta (cal. cm . dia ).
216 Hidrologia

Apesar de ter sido proposto originalmente para estimativas diárias, o


emprego deste método, de acordo com a recomendação de Jensen (1973), deve
limitar-se a intervalos de cinco dias, exceto quando o saldo de radiação for
medido diretamente. Neste caso o intervalo poderá ser diário. A principal
dificuldade para uso corrente, está na disponibilidade das informações.
Poucas estações meteorológicas medem rotineiramente a radiação solar, sendo
necessário estimá-la com base na equação 7.6 e coeficientes adequados para o
local de interesse.

7.3.4 Método Combinado

O método combinado ou equação de Penman, apresentado no item 7.2.2 como


alternativa para cálculo da evaporação de superfícies livres de água, também
é utilizado correntemente para estimativas de evapotranspiração potencial.
Na equação 7.27 o termo qef refere-se à radiação efetiva sobre um corpo
de água sendo, neste caso, necessário substituí-lo por valores
representativos da superfície de interesse. Quando a energia efetiva não é
medida, mas estabelecida através de fórmulas empíricas, deve-se adotar o
albedo próprio da cultura. Na tabela 7.6 são apresentados valores de albedo
para diferentes superfícies.
Por tratar-se de superfícies vegetadas, o termo aerodinâmico também se
altera, e a equação representativa deste termo passa a ser

w2
Ei = 0,35 (1 + ---- )(es - ea) (7.39)
160

O termo aerodinâmico, de acordo com observação de Penman (1956) não é


crítico em sua equação, pois um erro na estimativa deste resulta em pequena
variação na evapotranspiração calculada. Entretanto, em regiões semi-áridas e
com ventos constantes, a transferência de calor horizontal poderá ser
apreciável e, com isto provocar erros representativos.
Indiscutivelmente, o método combinado é a melhor opção para estimativa
da evapotranspiração potencial, mas a precisão do método depende
fundamentalmente da radiação efetiva. Quando esta variável for medida, as
estimativas poderão ser diárias. Quando for estimada, o intervalo de tempo
para cálculo da evapotranspiração potencial não deve ser inferior a cinco
dias.
Beltrame et ai. (1993), desenvolveram um estudo sobre regionalização da
evapotranspiração potencial, calculada em base decendial pelo método
combinado, para todo o estado do Rio Grande do Sul.
Evaporação e Evapotranspiração 277

Tabela 7.6. Valores de albedo (Raudkivi, 1979)

Superfícies Intervalo de a
Florestas coníferas 0,10-0,15
Florestas temporárias 0,15-0,20
Cereais 0,10-0(25
Batatas 0,15-0,25
Algodão 0,20-0,25
Campo 0,15-0(20
Superfície de água 0,03-0,10
Solos escuros 0,05-0,20
Argila Seca 0,20-0,35
Solo arenosos (secos) 0,15-0,45

Exemplo 7.4. Considere o enunciado do exemplo 7.1 e calcule a


evapotranspiração potencial da bacia hidrográfica onde está localizado o
reservatório. Adote o albedo de 0,25.

Solução: os termos da equação de Penman ficam

qcf/L = 932/59 ( l - 0,25).(0,24 + 0,58. 0,533) -


-1,19.10 7 (23 +273)4 [0,56-0,09.(13,9)1/2]
(0,1 +0,9.0,533)/59 = 4,491

ETP = 3,25 + Eí/3,62


ETP = 3,95 +■ 0,374 w2 e E = 4,33 mm para w2 = 1 m/s
ETP = 5,45 mm para w2 = 4 m/s.

Os valores anteriores eram, respectivamente, 5^23 e 6,36 mm. Observa-se


uma redução de 17 e 14 %, respectivamente, devido à superfície.

7J.5 Balanço hídrico

O balanço hídrico objetivando o cálculo da evapotranspiração,


normalmente é elaborado para intervalos de tempo superiores a 1 semana,
devido à falta de medição de todas as variáveis envolvidas. Normalmente, os
dados disponíveis são a precipitação e a vazão. A equação 7.31 pode ser
adaptada para uma bacia, resultando em
278 Hidrologia

Vt * Vc + (P - Q - ETP )Àt (7.40)

onde Vt e Vo = são o armazenamento total de umidade na bacia no final e


início do intervalo de tempo At; P, Q e ETP são respectivamente a
precipitação, vazão e evapotranspiração no período. Este balanço é simplista
se considerarmos todos os processos que envolvem o escoamento na bacia. Para
um intervalo de tempo suficientemente grande, o erro cometido no termo
armazenamento, na propagação do escoamento é pequeno se comparado com a
precipitação, vazão e evapotranspiração. Utilizando a equação 7.40 para
intervalos superiores a 1 semana, mês ou ano, pode-se quantificar a
evapotranspiração de uma bacia.

Exemplo 7.5. Estime a evapotranspiração da bacia do rio Passo Fundo em


Ponte do rio Passo Fundo, afluente do rio Uruguai. A bacia possui 3650 km2.
Na tabela 7.7 são apresentadas a precipitação média e a vazão.

Solução - Os valores do evaporímetro apresentam discrepâncias anuais se


comparados com a diferença entre precipitação e vazão, mas na média os
valores são semelhantes. Deve-se considerar que o evaporímetro mede a
evaporação potencial e não a real. Apesar do balanço hídrico basear-se
somente na precipitação e na vazão existe a tendência de apresentar bons
resultados a longo prazo. Erros sistemáticos nos dados podem distorcer os
resultados finais, como por exemplo, a extrapolação inferior ou superior de
uma curva de descarga. A realidade é que muitos processos hidrológicos
possuem variação na faixa de erro de processos como a precipitação e a
evaporação, ficando mascarados numa avaliação global.

Tabela 7.7. Bacia do rio Passo Fundo


Ano P Q E P-Q
mm mm mm mm
1971 1988 627 1158 1361
1972 2671 1454 1162 1217
1973 2582 1288 1123 1294
1974 1695 693 - 1002
1975 1749 647 1250 1102
1976 1802 660 1230 1142
1977 1747 778 1229 969
1978 1266 359 •- 897
1079 2048 832 - 1216
1980 1862 696 - 1166
Média 1941 803 1192 1137
Evaporação e Evapotranspiração 279

O Balanço Hídrico da bacia hidrográfica também envolve a quantificação


dos componentes deste sistema visando ao seguinte:

- melhor entendimento do comportamento do sistema;


- utilização racional dos recursos hídricos.

A bacia hidrográfica pode ser avaliada como um todo ou quanto a um


sistema em particular, como um reservatório. No primeiro caso, é necessário
conhecer a disponibilidade dos recursos hídricos para atender às demandas
existentes e conservar o meio ambiente. O segundo caso, pode estar contido no
primeiro, tem uma visão de detalhe e envolve a melhor utilização de um
aproveitamento, quanto à sua operação.
O balanço hídrico, envolve a continuidade de massa e a troca de energia
dos sistemas envolvidos, no tempo e no espaço. Os componentes principais
deste balanço são:

- precipitação;
- evaporação;
- evapotranspiração;
- escoamento superficial e subterrâneo.

O balanço hídrico corresponde à avaliação de cada um desses processos


(ou outros mais importantes) num sistema. Portanto, existem diferentes
procedimentos utilizados atualmente na prática, que utilizam os componentes
mencionados.
UNESCO (1982) cita o balanço hídrico superficial, aerológico, isotópico,
balanços energéticos, balanços hídricos de superfícies líquidas e modelos
matemáticos. O primeiro utiliza a equação da continuidade composta dos
termos de precipitação, evapotranspiração e escoamento, cada qual calculado
pelas equações conhecidas. O balanço hídrico aerológico envolve o uso de
informações climatoíógicas para estabelecer a conservação de massa na
atmosfera, calculando a diferença efetiva entre a precipitação e a
evaporação. Este tipo de método esbarra ainda na limitação das redes. O
Balanço hídrico isotópico utiliza as propriedades químicas da água que possui
um tipo específico de isótopo para identificar a fonte da água e quantificar
seus componentes.
O balanço energético estabelece o balanço de calor na superfície de
interesse, para cálculo da evaporação ou evapotranspiração. O Balanço hídrico
se refere principalmente a lagos, reservatórios ou trechos de rios. Os
modelos matemáticos representam os principais fenômenos envolvidos e procuram
estimar no tempo e no espaço esses componentes através de diferentes equações
de continuidade integradas.
Os processos que normalmente apresentam maior dificuldade de
280 H id r o lo g ia

estimativa são a evaporação e a evapotranspiração, já que existem diferentes


equações para sua estimativa. Normalmente o balanço hídrico é apresentado
como uma seqüência dos métodos de evaporação e evapotranspiração. O balanço
hídrico agrícola envolve um balanço de detalhe, para cálculo da necessidade
hídrica real de diferentes cultivos.
O balanço hídrico na bacia, envolve a quantificação dos componentes do
processo de transferência de água através da bacia. Como a bacia envolve
diferentes subsistemas pode-se estabelecer o balanço de sistemas
particulares, como um perímetro de irrigação, para cálculo da necessidade
hídrica de irrigação ou de um reservatório ou lago. Em cada caso existe um
objetivo específico, no caso da irrigação o objetivo é o de quantificar o
volume a ser irrigado e no reservatório é o de atender as diferentes
demandas, variações de níveis para recreação, navegação e meio ambiente,
entre outros.
O balanço hídrico como um todo na bacia, envolve quantificar as
macrovariáveis e seu comportamento ao longo do tempo. Para a bacia, dentro de
uma macroanálise pode-se estudar os seguintes fatores:

- precipitação;
- umidade do solo;
- evaporação;
- vazão.

A análise dessas variáveis pode ser realizada de forma simplística


através de valores médios num período longo como o ano ou seqüência de anos.
Para uma análise mais detalhada, em intervalos de tempo menores, deve-se
utilizar modelos matemáticos hidrológicos.

Exemplo 7.6. Considere a bacia do rio Passo Fundo mencionado no exemplo


anterior. Deseja-se construir um reservatório num dos seus afluentes, que
possui área de bacia com 50 km2. A área de inundação do reservatório é de 10
km2. Estime qual deve ser a redução de vazão média disponível na bacia.
Considere que evaporação potencial da surperfície de água é de 1.400 mm.

Solução: pode-se utilizar a equação de Penmam com dados climáticos ou


simplificadamente o seguinte procedimento.
Para a parcela da bacia não-inundada a evapotranspiração continua a
mesma e para a parcela inundada é aumentada para 1.400 mm, o que resulta

ETP = (1400. 10 + 1137 . 40 )/ 50 = 1190 mm.


Q = 1941 - 1190 = 751 mm.
Evaporação e Evapotranspiração 281

A vazão média estimada é 803 mm (tabela 7.7), portanto houve redução


finai de 6,5%. A vazão resultante fica

Q = 751 mm . 50 km2 10 3/86400/ 365 = 1,19 m3/s.

PROBLEMAS

1 - Por que o método de Penman que utiliza o balanço de energia é considerado


simplificado? Quais são suas principais limitações?

2 - No método de Penman como você podería levar em conta os termos que foram
desprezados? Discuta o assunto

3 - Estabeleça a análise de sensibilidade da equação de Penman com relação as


variáveis de entrada.

4 - Estabeleça uma função que relacione evaporação de uma superfície livre de


água e de áreas vegetadas. Quais são as suas conclusões quanto à
variabilidade dessa' função?

5 - Utilize a equação de Penman para resolver o exemplo 7.6. Compare os


resultados. Quais são as suas conclusões?

6 - Num reservatório existem incertezas quanto à contribuição lateral direta


ao lago no mês de março de 1987. A vazão média de entrada a montante é de 2,5
m3/s. A vazão de saída foi de 3,3 m3/s. Houve rebaixamento no reservatório de
0,5m, coiTespondendo a um volume de 1,6. 106 m3. A precipitação no mês foi de
95 mm. A área do lago no início do mês é de 2,5 km2 e 2,1 km2 no final. A
radiação solar medida foi de 395 cal/cm2. dia e umidade de 75%; p=6,5 horas,
T=20°C, Wz = 2,5 m/s na latitude 30 °S. Estime a vazão média da contribuição
lateral neste mês.

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284 Hidrologia

Tabela Al. Radiação solar recebida no tpo da atmosfera no 15° dia de cada mês
o o 2
entre latitudes 10 N e 40 S, em cal/cm dia*.

latitude JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
10 N 761 814 873 885 873 867 873 879 867 826 767 732
8 N 779 832 879 879 861 856 861 873 873 838 785 749
6 N 797 844 879 873 850 838 850 861 873 850 802 873
2 N 832 867 885 861 826 802 814 844 873 867 838 814

Equador 850 879 885 856 808 785 797 832 867 873 856 832

2 S 861 885 885 850 791 767 779 820 867 879 873 850
4 S 879 897 885 838 779 749 755 808 861 885 885 873
6 S 897 903 885 826 755 732 743 797 861 897 897 890
8 S 909 909 879 814 738 708 720 779 856 897 909 903
10 S 920 920 873 802 720 684 702 767 850 897 915 920

12 S 938 920 867 791 696 661 684 755 838 897 826 832
14 S 950 926 861 773 679 637 661 738 838 903 838 944
16 S 956 932 856 755 661 614 637 720 826 903 944 956
18 S 968 932 850 743 637 590 620 702 814 903 956 974
20 S 979 932 838 720 614 566 596 684 802 897 962 985

22 S 991 932 826 702 590 543 572 661 791 897 968 991
24 S 991 832 814 684 566 519 549 643 779 897 968 1003
26 S 997 926 802 661 543 496 519 625 761 891 974 1015
28 S 1003 920 791 643 519 460 496 602 743 885 979 1021
30 S 1003 920 779 620 496 437 472 578 732 873 979 1027

32 S 1009 909 767 596 472 407 448 555 714 867 979 1033
34 S 1009 903 743 578 448 378 313 531 696 861 979 1038
36 S 1009 897 732 555 419 354 389 507 673 850 979 1038
38 S 1009 885 714 531 389 330 366 484 649 838 974 1044
40 S 1003 879 590 507 360 295 336 460 531 826 968 1044
* Shaw e Napier, Manual of Meteorology, Cambridge University Press.
Evaporação e Evapotranspíraçao 285

Tabela A2. Duração máxima da insolação diária em horas. Os valores


correspondem ao 15°dia de cada mês.*

latitude JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
10 N 11,6 11,8 12,1 12,4 12,6 12,7 12,6 12,4 123 11.9 11,7 113
8 N 11.7 11,9 12,1 123 12,5 12,6 123 12,4 12,2 12,0 11,8 11,6
6 N 11,8 11,9 12,1 12,3 12,4 123 12,4 12,3 12,2 12,0 11,9 11,7
4 N 11.9 12,0 12,1 12,2 12,3 12,4 12,3 123 12,0 12,0 11.9 11,9
2 N 12,0 12,0 12,1 12,2 12,2 123 123 12,2 12,1 12,1 12,0 12,0

Equador 12,1 12,1 12,1 12,1 12,1 12,1 12,1 12,1 12,1 12,1 12,1 12,1

2 S 12,2 12,2 12,1 12,1 12,0 12,0 12,0 12,0 12,1 12,1 12,2 12,2
4 S 12,3 12,2 12,1 12,0 11.9 11,8 11,9 12,0 12,1 12,2 .12,3 12,4
6 S 12,4 12,3 12,1 12,0 11,9 11,7 11,8 11,9 12,1 12,2 12,4 123
8 S 12,5 12,4 12,1 11,9 11,7 11,6 11,7 11,9 12,1 12,3 12,5 12,6
10 S 12,6 12,4 12,1 11,9 i 1.7 113 11,6 11,8 12,0 12,3 12,6 12,7

12 S 12,7 12,5 12,2 11,8 11,6 11.4 113 11,7 12,0 12,4 12,7 12,8
14 S 12,8 12,6 12,2 11,8 113 11,3 11,4 11,6 12,0 12,4 12,8 12,9
16 S 13,0 12,7 12,2 11.7 11,4 113 113 11,6 12,0 12,4 12,9 13,1
18 S 13,1 12,7 12,2 11.7 113 11,1 iu 113 12,0 123 13,0 133
20 S 13,1 12,8 12,2 11.6 113 10,9 11,0 11.4 12,0 123 133 133

22 S 13.4 12,8 12,2 11,6 11,1 10,8 10,9 113 12,0 12,6 133 133
24 S 13,5 12,9 12,3 113 103 10,7 10,8 113 11,9 12,6 13,3 13,6
26 S 13,6 12,9 12,3 113 10,8 103 10,7 113 11,9 12,7 13,4 13,8
28 S 13,7 13,0 123 11.4 10,7 10,4 10,6 11.1 11,9 12,8 133 13,9
30 S 13,9 13,1 12,3 11.4 10,6 103 10,4 11,0 11,9 12,8 13,6 14,1

13,7 14,2
32 S 14,0 133 123 113 103 10,0 103 10,9 11,9 12,9
13,9 14,4
34 S 14,2 133 12,3 113 103 9,8 10,1 10,9 11,9 12,9
14,0 14,6
36 S 143 13,4 12,4 113 103 9,7 10,0 10,7 11,9 13,0
143 14,8
38 S 143 133 12,4 11.1 10,1 93 9,8 10,6 11,8 13,1
12,4 9,9 93 9,6 103 11,8 13,1 14,3 15,0
40 S 14,7 13,6 11.1

* Smithsonian Meteorological Tables, 6- Edição, 1951.


286 Hidrologia

Tabela A3. Fator de correção Fc do método de Thomthwaite (UNESCO,1982)

latitude JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
10 N 0,98 0,91 1,03 1,03 1,08 1,06 1,08 1,07 1,02 1,02 0,98 0,99
5 N 1,00 0,93 1,03 1,02 1,06 1,03 1,06 1,05 1,01 1,03 0,99 1,02
0 1,02 0,94 1,04 1,01 1,01 1,01 1,04 1,04 1,01 1,04 1,01 1,04
5 S 1,04 0,95 1,04 1,00 1,02 0,99 1,02 1,03 1,00 1,05 1,03 1,06
10 S 1,08 0,97 1,05 0,99 1,01 0,96 1,00 1,01 1,00 1,06 1,05 1,10
15 S 1,12 0,98 1,05 0,98 0,98 0,94 0,97 1,00 1,00 1,07 1,07 1,12
20 S 1,14 1,00 1,05 0,97 0,96 0,91 0,95 0,99 1,00 1,08 1,09 1,15
25 S 1,17 1,01 1,05 0,96 0,94 0,88 0,93 0,98 1,00 1,10 u i 1,18
30 S 1,20 1,03 1,06 0,95 0,92 0,85 0,90 0,96 1,00 1,12 1,14 1,21
35 S 1,23 1,04 1,06 0,94 0,89 0,82 0,87 0,94 1,00 1,13 1,17 1,25
oo

40 S 1,27 1,06 1,07 0,93 0,86 0,78 0,92 1,00 1,15 1,20 1,29
o

Tabela A4. Proporção média diária (p) de horas de luz para diferentes
latitudes (Doorembos e Pruití, 1990)

iatitude JAN FEV MAR ABR MAI JUN JUL AGO SET OUT NOV DEZ
0 s 0,27 0,27 0,27 0,27 0,27 0,27 0,277 0,27 0,27 027 0,27 0,27
5 S 0,28 0,28 0,28 0,27 0,27 027 0,27 0,27 027 0,28 0,28 0,28
10 s 0,29 0,28 0,28 0,27 0,26 026 0,26 027 027 028 0,28 0,29
15 S 0,29 0,28 0,28 0,27 0,26 0,25 026 026 027 028 0,29 0,29
20 S 0,30 0,29 0,28 0,26 0,25 025 0,25 026 027 028 0,29 020
25 S 0,31 0,29 0,28 0,26 0,25 0,24 024 0,26 027 029 0,30 0,31
30 S 0,31 0,30 0,28 0,26 0,24 0,23 024 0,25 027 0,29 0,31 0,32
35 S 0,32 0,30 0,28 0,25 0,23 022 023 025 027 029 0,31 0,32
40 S 0,33 0,31 0,28 0,25 0,22 021 022 0,24 0,27 0,30 0,32 0534
46 S 0,34 0,32 0,28 0,24 021 0,20 0,20 0,23 0,27 0,30 0,34 0,35
50 S 0,35 0,32 0,28 0,24 0,20 0,18 0,19 0,23 0,27 0,31 0,34 0,36
Evaporação e Evapotranspiração 287

Tabela A5, Coeficiente de cultura kc (Doorenbos e Kassam, 1979)

Cultura I II III IV V período t ot al


de crescimento
Banana:
tropical 0,4-0,50 0,70-0,85 1,00-U 0 0,90-1,00 0,75-0,85 0,70-0,80
subtrop. 04-0,65 0,80-0,90 1,00-140 1,00-1,15 1,00-1,15 0,85-0,95
Feijão:
verde 0,3-0,40 0,65-0,75 0,95-1,05 0,90-0,95 0,85-0,95 0,85-0,90
seco 0,3-0,40 0,70-0,80 1,05-1330 0,65-0,75 0,25-0,30 0,70-0,80
repolho 0,4-040 0,70-0,80 0,95-1,10 0,90-1,00 0,80-0,95 0,70-0,80
Algodão 0,4-040 0,70-0,80 1,05-145 0,80-0,90 0,65-0,70 0,80-0,90
Amendoim 0,4-040 0,70-0,80 0,95-1,10 0,75-0,85 045-0,66 0,75-0,80
Milho:
verde 0,3-040 0,70-0,90 1,05-1,20 1,00-1,15 0,95-1,10 0,75-0,80
grãos 0,3-040 0,80-0,85 1,05-140 0,80-0,95 045-0,60 0,75-0,90
Cebola:
seca 0,4-0,60 0,70-0,80 0,95-1,10 0,85-0,90 0,75-0,85 0,80-0,90
verde 0,4-0,60 0,60-0,70 0,95-1,05 0,95-1,05 0,95-1,05 0,65-0,80
Ervilha 0,4-040 0,70-0,85 1,05-140 1,00-1,15 0,95-1,10 0,80-0,95
Pimenta 0,3-0,40 0,60-0,75 0,95-1,10 0,85-1,00 0,80-0,90 0,70-0,80
Batata 0,4-040 0,70-0,80 1,05-U 0 0,85-0,95 0,70-0,75 0,75-0,90
Arroz 1,1-1,15 1,10-1,50 1,10-140 0,95-1,05 0,95-1,05 1,05-1,20
Açafrão 0,3-0,40 0,70-0,80 1,05-U 0 0,65-0,70 040-0,25 0,65-0,70
Sorgo 0,3-0,40 0,70-0,75 1,00-1,15 0,75-0,80 040-0,55 0,75-0,85
Soja 0,3-0,40 0,70-0,80 1,00-1,15 0,70-0,80 0,40-0,50 0,75-0,90
Beterraba 0,4-0,50 0,75-0,85 1,05-U 0 0,90-1,00 0,60-0,70 0,80-0,90
Cana de
açúcar 0,4-0,50 0,70-1,00 1,00-140 0,75-0,80 0,50-0,60 0,85-1,05
Fumo 0,3-0,40 0,70-0,80 1,00- u o 0,90-1,00 0,75-0,85 0,85-0,95
Tomate 0,4-0,50 0,70-0,80 1,05-1,25 0,80-0,95 0,60-0,65 0,75-0,90
Melancia 0,4-040 0,70-0,80 0,95-1,05 0,80-0,90 0,65-0,75 0,75-0,85
Trigo 0,3-0,40 0,70-0,80 1,05-1,20 0,65-0,75 0,20-0,25 0,80-0,90
Alfafa 0,3-0,40 1,05-1,20 0,85-1,05

1- Intervalo inferior: sob alta umidade (Umid min >70%) e vento fraco (V <5
m/s); intervalo superior: sob baixa umidade ( Umid min < 20%) e vento forte (
V > 5 m/s).
2- Estágios: I- emergência até 10% do desenvolvimento vegetal (dv); II - 10%
do dv até 80% do dv; III - 80% do dv até 100% do dv; IV - maturação; V -
colheita.
Capítulo 8

ÁGUA SUBTERRÂNEA

Nelson Luna Caicedo

8.1 Conceitos básicos de hidrogeoíogia

Os sistemas hidrogeológicos podem ser classificados em:

Àqüífero: é uma formação geológica (ou um grupo de formações) que contém água
e permite que a mesma se movimente em condições naturais e em quantidades
significativas;

Aqüiclude: é uma formação geológica que pode conter água, mas sem condição de
movimentá-la de um lugar para outro, em condições naturais e em quantidades
significativas;

Aqüitardo: é uma formação geológica de natureza semipermeável. Transmite água


a uma taxa muito baixa, comparada com a do àqüífero.

Distribuição vertical da umidade

A umidade pode ser dividida em zonas de acordo com a proporção relativa


do espaço poroso ocupado pela água (figura 8.1). Assim:

Zona de saturação: todos os espaços vazios encontram-se completamente


ocupados pela água;

Zona de aeração:os poros contêm água e ar (ou vapor de água).

A zona de saturação está limitada superiormente pela linha de saturação


(superfície piezométrica) e inferiormente por uma barreira impermeável. As
fontes, os poços e as correntes efluentes têm origem na zona de saturação. Na
linha de saturação, a pressão da água é igual à pressão atmosférica.
A zona de aeração está limitada pela superfície do terreno e pela linha
de saturação. Pode-se diferenciar três zonas: a zona de água do solo
(cinturão de umidade onde as plantas se desenvolvem), a zona intermediária
(serve como freio das chuvas intensas) e a zona capilar (formada pelo ascenso
capilar).
290 Hidrologia

S u p e r f íc ie do terren o &

tp
Zona da
água do solo Aguo do solo W
o
«O3 o
O
i_
</»
c
©
O Zona
Água ©
inte rm e diá­ p e lic u la r e g rav itaciona l >* «
TÜ3 ria
2 5
O
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o Zona O»
N
capilar
Agua ca p ila r '<
___J_ N ível d'dgua__________ /

O
IO
oa
Agua subterrânea

©
■o
o
c
o
rsj
\ _________
L e ito rochoso

Figura 8.1. Divisão da água abaixo da superfície (Todd 1967)

Classificação dos aqüíferos

Os aqüíferos podem ser classificados em confinados e não-confinados


(livres), dependendo da ausência ou da presença da linha da água. O aqüífero
confinado encontra-se a uma pressão maior que a pressão atmosférica. Está
limitado superior e inferiormente por formações impermeáveis. O aqüífero
artesiano é um aqüífero confinado onde a elevação da superfície piezométrica
está sobre a superfície do terreno.
No aqüífero freático (livre) a superfície piezométrica (freática) serve
como fronteira superior. Os aqüíferos confinados são geralmente aqüíferos de
grande produção, enquanto que os aqüíferos livres são os mais explorados
devido ao fácil acesso. A figura 8.2 mostra os principais tipos de aqüíferos.

Porosidade

Porosidade é a medida relativa do volume de vazios de um meio poroso. Os


materiais porosos aqui discutidos, contêm vazios interconectados uns aos
outros, conseqüentemente, participam do processo de armazenamento e
transporte de água. Porosidade é a fração de vazios contidos em um volume
representativo de meio poroso.
Água Subterrânea 291

volume de vazios
<t> = (8 . 1)
volume total

A porosidade primária é, originada por processos geológicos quando a


rocha foi formada. A porosidade secundária (fissuras, juntas, passagem de
soluções, etc.) é desenvolvida depois que a rocha foi formada.

Areo de
re a b a s te c im e n t o

Nível
d ’ agu<

Figura 8.2. Aqüíferos confinados e livres (Todd, 1967)

A porosidade de um material granular depende da forma, do grau de


compactação e da distribuição do tamanho das partículas.
A forma das partículas (angular, arredondada), afeta na maneira como as
mesmas se arranjam entre si. Formas irregulares resultam em porosidades
maiores do que formas arredondadas.
O grau de compactação ou cimentação influi diretamente no valor da
porosidade; quanto mais compactada estiver uma formação, menor será o valor
da porosidade. A porosidade do arenito (0,34) é menor que a da areia (0,40).
Materiais granulares com distribuição uniforme de grãos, têm porosidade
maior que os materiais com distribuição irregular de grãos. As partículas
menores ocupam a porção do volume deixado pelas partículas maiores. Cascalho
fino e areia fma têm porosidades maiores do que seus respectivos pares. No
caso da esfera, com mesmo raio, a porosidade é independente do tamanho.
A tabela 8.1 mostra a porosidade de alguns materiais mais comumente
encontrados na natureza.
292 Hidrologia

Tabela 8.LPorosidade de alguns materiais


(Moiris e Johson, 1967)
Material Intervalo Média
Argila 0,34 - 0,57 0,42
■Silte 0,34 - 0,61 0,46
Areia fina 0,26 - 0,53 0,43
Areia grossa 0,31 - 0,46 0,39
Cascalho fino 0,25 - 0,38 0,34
Cascalho grosso 0,24 - 0,36 0,28

Para estimar o valor da porosídade de um material, devem ser determi­


nados dois dos três volumes característicos, assim definidos: Vt = Volume
total da amostra; Vs = Volume das partículas sólidas; Vv = Volume de vazios.
Por definição:

4> = v v / v t = (Vrvs) / vt = i-vs / vt

segue-se que:

Pi
<t> = 1 - ------ (8.2)
P.

onde pt representa a massa específica de toda a amostra e ps a massa


específica das partículas sólidas.

Dessaturação e retenção específica

O processo de dessaturação consiste na remoção da água do meio poroso,


seguido pela substituição de ar geralmente à pressão atmosférica. O
deslocamento da água pelo ar ocorre porque a pressão da água no poro toma-se
menor que a pressão do ar no poro. Assim, ar e água convivem simultaneamente
nos poros, onde a pressão do ar excede a pressão da água em quantidade
suficiente para deslocar parte dela. Entretanto, a água se adere às
partículas sólidas mais fortemente que o ar, o que faz com que a interface
água-ar seja curva, resultando em forças superficiais que se opõem ao
movimento da água.
A tensão superficial (o) é uma força superficial por unidade de
comprimento, que atua ao longo do perímetro em direção tangente à superfície
curva. No equilíbrio, a força devida a tensão superficial, iguala-se com a
Água Subterrânea 293

força devida a pressão capilar, 27tra = 7tr2pc. Assim:


2a
r = — (8.3)
Pc

0 raio de curvatura da interface água-ar diminui quando há um aumento de


pressão capilar. Por isso, no processo de dessaturação, a água desocupa
primeiro os grandes poros. Os valores das grandezas normalmente encontrados
na natureza são: a = 0,073 N/m (tensão superficial da água a 15°C); p = 1000
Kg/m3 (massa específica da água); g = 9,8 m/s2 (aceleração da gravidade).
O fato da água e o ar conviverem no espaço poroso, requer o conhecimento
de um parâmetro diferente da porosidade para caracterizar o volume relativo
de água no aqüífero. A fração de água de um volume representativo é, por
definição, o conteúdo volumétrico da água (0). Assim:

e=— (8.4)
V,
onde Va= volume de água.
O conteúdo volumétrico da água varia de zero, em um meio poroso
complctamente seco, a um valor máximo, igual à porosidade, quando todos os
espaços porosos estão preenchidos por água. Como a água desocupa gradati­
vamente os grandes poros, à medida que a pressão capilar (pc) ;aumenta, o
conteúdo volumétrico da água diminui com o aumento da pressão capilar. Este
fato pode ser expresso através das curvas de retenção. Essas curvas caracte­
rizam a habilidade que o meio poroso tem em reter água, quando a mesma está
sendo drenada.
A figura 8.3 mostra curvas de retenção para duas texturas diferentes. A
variação de 9 é muito pequena em tomo de pc=0. Nessa faixa de valores de pc,
mesmo os grandes poros são insuficientes para resistir ao processo de
dessaturação. O conteúdo volumétrico da água tende para um valor constante,
quando a pressão capilar aumenta indefinidamente. O valor de 0 para o qual
d9/dpc tende a zero é chamada retenção específica 0r. A retenção específica é
uma característica razoávelmente constante (parâmetro), especialmente em are­
ias e cascalhos. Em laboratório, o conteúdo volumétrico da água a uma pressão
capilar de 1/3 de bar (3,33 m de água) é considerado retenção específica.

Distribuição da pressão capilar acima da linha da água

A pressão da água é distribuída no aqüífero da mesma maneira como


qualquer outro sistema hidráulico em equilíbrio e segue a equação básica da
hidrostática, onde z representa a ordenada orientada de baixo para cima.
294 Hidrologia

P = “P g z (8.5)

A pressão da água nos poros acima da linha de saturação é negativa em


relação à atmosférica. Por essa razão, a água dessa zona não entra em poços,
drenos, galerias, etc. A pressão da água menor que a atmosférica é medida por
sensores especiais chamados tensiômeíros. A distribuição de pressão da água
em equilíbrio independe do tipo de formação. O conteúdo volumétrico não.

Conteúdo volumétrico de água

Figura 8.3. Curvas de retenção

A pressão da água acima da linha de saturação é igual a -p, como


Pc=Par'P> segue-se que pc = -p. Conseqüentemente, a pressão acima da linha de
saturação é a própria pressão capilar.
A figura 8.4 mostra um aparelho utilizado para determinar as curvas de
retenção. O experimento começa com uma amostra completamente saturada (0=<f>).
A sucção (pressão capilar) é aplicada à amostra cada vez que o recipiente de
água inferior sujeito à pressão atmosférica, é rebaixado de nível. A
diferença em elevação entre os dois recipientes é igual à pressão capilar
média aplicada à amostra.

Porosidade efetiva e aparente

, A porosidade efetiva ou produção específica é um parâmetro adimensionai.


E uma relação entre o volume drenável e o volume total. A porosidade
aparente, por outro lado, é uma relação entre o volume de água removido
Água Subterrânea 295

diretamente do aqüífero e o volume de aqtiífero drenado. A porosídade


aparente, quando determinada a partir da sua definição, é um parâmetro que
incorpora a influência do ar próximo da linha de saturação, a estratificação
dos materiais e a posição da linha da água. A porosidade aparente é
considerada constante no tempo, implicando uma entrega instantânea de água
quando a carga cai bruscamente.

O valor da porosidade aparente (<j)a) é sempre menor que a porosidade


efetiva (4>c). A tabela 8.2 mostra a porosidade efetiva de materiais
componentes de aqüíferos naturais.
A figura 8.5 mostra a distribuição de 0 entre a superfície do terreno e
duas sucessivas profundidades da linha de água em um material homogêneo. O
volume de água drenado por unidade de área é igual a (<|> - 0r)(z2 ' z\.)• O
volume de água drenado por unidade de área é também igual à área limitada
pelas curvas de retenção.

Exemplo 8.1. Em um poço com raio 0,30 m é feito um teste de bombeamento com
uma vazão constante Qp = 0,0312 m3/s, durante um tempo tp = 8,37 h. Os níveis
iniciais e finais da superfície piezométrica para os 6 poços de observação
utilizados no teste são apresentados a seguir:

Poço de observação 1 2 3 4 5 6
Distância-ao poço (m) 4,60 10,40 19,80 34,50 65,80 91,800
Nível estático (m) 96,49 96,52 96,53 96,55 96,56 96,57
Nível após 8,37h (m) 95,14 95,58 95,88 96,14 96,36 96,43
Rebaixamento após 8,37h (m) U 5 1,04 0,65 0,41 0,20 0,14
H id ro lo g ia

Encontrar o valor da porosidade aparente.

s u p e r f í c ie do t e r re n o
d i s tr ib ui ção do c o n t e ú d o
v o l u m e t r i c o de agua
ünha de água em z,
^ ^ l i n h a de água em z2

vol um e drenado

Figura 8.5. Determinação do volume drenado em um solo homogêneo

Solução: volume de água: Va = 0,0312 m3/s x 30120 s = 939,7 m3;


CO
volume de aqüífero: Vt = 2j n rs dr = 8584 m3
0,3

onde r = a distância radial ao poço e s o rebaixamento;

porosidade aparente: <t>a = Va / Vt = 939 J / 8584 = 0,11

Armazenamento em aqüíferos confinados

Nos aqüíferos conílnados, o mecanismo de cedência de água é devido à


variação do volume do poro pela compressibilidade do aqüífero e pela
compressibilidade da água. O armazenamento específico (Ss) é definido como o
volume de água (Va) entregue por unidade de volume de aqüífero (Vq) e por
redução unitária de altura piezométrica. O armazenamento específico é
considerado constante. Sua dimensão é [1/L].
Água Subterrânea 297

Tabela 8.2,Porosidede efetiva de alguns materiais


(Morris e Johson, 1967)
Material Intervalo Média
Argila 0,01 - 0,18 0,06
Silte 0,01 - 0,39 0,20
Areia fina 0,01 - 0,46 0,33
Areia grossa 0,18 - 0,43 0,30
Cascalho fino 0,13 - 0,40 0,28
Cascalho grosso 0,13 - 0,25 0,21

Va
s s = — — = Pg 4> («p + P) (8-6)
Vq hP

onde: p é a compressibilidade da água (4,8 x IO'10 cm2/dina) e otp é a


compressibilidade do material (4,4 x 10"9 cm2/dina).
O co eficien te de a rm a z e n a m e n to (S) 6 o v o lu m e de ág u a en treg u e pelo
a q ü í f c r o d e á r e a u n itá r ia c e s p e s s u r a c o n s ta n t e (b), q u a n d o s u b m e t i d o a uma
re d u ç ã o u n itária de altura piczom ctrica.

Va
S = — = Ss b (8.7)
A hp

O coeficiente de armazenamento de aqüíferos varia entre 10'6 e 10'3.

Exemplo 8.2. Estime o valor do armazenamento específico e do coeficiente de


armazenamento de um aqüífero confinado com 40 metros de espessura e
porosidade 0,32.

Solução: Ss = 980 X 0,32 (4,4 x IO"9 + 4,8 x IO*10) = 1,53 * 10-6/cm


S = 40 x 102 x U 3 x 10-* = 6,12 x IO'3

Balanço hídrico

O ciclo hidrológico é um sistema fechado com armazenamento de água na


superfície do terreno, em rios e lagos, nos oceanos, na atmosfera e no
subsolo (figura 8.6).
298 H id ro lo g ia

A força da gravidade provoca a precipitação (P) de água sobre o solo e o


oceano, daí a água retoma à atmosfera através da evaporação (E). Da água que
atinge o solo, parte transforma-se em escoamento ou deflúvio superficial (D),
parte é armazenada em depressões (Sj) e parte infiltra-se no solo (I), Também
sobre o subsolo age a evaporação, além da água daí retirada pelas plantas
através da transpiração (T)- Parte da água infiltrada alimenta os
reservatórios subterrâneos (W), que irão escoar e atingir rios e oceanos.
A análise de uma área de interceptação (bacia hidrográfica), cuja única
entrada de água é a precipitação, permite o equacionamento de um balanço de
água em um certo intervalo de tempo. A bacia hidrográfica é idealmente delimi­
tada pelo divisor de água superficial. A água aí precipitada escoa obrigatoria­
mente em direção à seção do rio que define a bacia, ou seja, a saída da bacia
superficial.

Figura 8.6. Ciclo hidrológico como um sistema

Escrevendo-se a equação do balanço volumétrico, conhecido por balanço


hídrico, para o volume de controle definido pela superfície do terreno da
bacia hidrográfica e a atmosfera, em certo intervalo de tempo, tem-se:

(P - E - D - I) At = ASj (8.8)

onde: ASj representa a variação de volume armazenado na superfície.


Se a seção superior do volume de controle fosse a imedíatamente abaixo
da superfície do terreno e a seção inferior a correspondente à linha da água no
aqüífero, a equação de balanço hídrico seria:
r;

Água Subterrânea 299

z
(I - ET -W) At = AS2 = A ( e dz) (8.9)
0

onde: AS2 representa a variação de volume armazenado no sistema radicular


acima da linha de água no aqüífero e W a recarga natural.
O volume de controle também pode ser estendido ao aqüífero propriamente
dito, limitando-o superficialmente pela linha de água e inferiormente pelo
fundo impermeável. Neste caso, a equação de balanço toma-se:

(W -ETf - Qf - Qp) At = S Ah ou 4>a Ah ( 8 . 10 )

onde: ETf = a evapotranspiração das culturas freatófítas, Qf a descarga das


fontes e Qp a descarga dos poços. A adoção de S ou íf>a vai depender do tipo de
aqüífero, confinado ou livre.
Dependendo do tipo de aqüífero, o armazenamento dar-se-á de forma
individulizada. No caso do aqüífero confinado, o coeficiente de armazenamento
pode variar entre IO"6 c 10'3. No aqüífero livre, a porosidade aparente pode
variar entre 0,01 e 0,30.

Exemplo 83. Uma pequena ilha no Caribe com 5.400 km2 de superfície, recebe
anualmcnte uma precipitação média de 135 cm. A ilha é plana, seu solo é muito
permeável, encontra-se em estado natural e nenhuma quantidade significativa
de água é utilizada pelos nativos com propósito definido. A vegetação da ilha
pode ser dividida básicamente em 35% de freatófítas e similares e os
restantes 65% em grama. O consumo de água pela grama pode ser estimada em 60%
durante o ano. A evaporação média anual observada em um tanque classe A é
1903 cm. Estimar a descarga subterrânea atualmente perdida para o mar.

Solução: sendo alta a capacidade de infiltração do solo da ilha, o escoamento


superficial é mínimo, não havendo, portanto, oportunidade para armazenar, nem
evaporar água da superfície. Com essas simplificações, o balanço no
reservatório superficial fica reduzido a: I = P = 135 cm/ano.
A solução obtida para o reservatório superficial faz sentido físico para
intervalos anuais de tempo. Para esse intervalo, é razoável pensar que o
armazenamento efetivo no reservatório de água do solo seja também nulo. O
balanço nesse reservatório toma-se: I - ET - W = 0. Novamente, todas as
quantidades são valores médios anuais. A evapotranspiração mais importante
deste reservatório é proveniente da grama.
A evapotranspiração potencial é estimada multiplicando-se o coeficiente
300 Hidrologia

do tanque (0,75) pela evaporação do tanque: ETP = 0,75 x 190,5 = 142,9


cm/ano. A evapotranspiração real, por seu turno, é igual ao consumo de água
da grama vezes a evapotranspiração potencial e vezes a percentagem da área
por ela ocupada na ilha: ET = 0,60 x 142,9 x 0,65 = 55,7 cm/ano. Assim, o
balanço hídrico no reservatório de água do solo rica: W = 135 - 55,7 = 79,3
cm/ano.
Para analisar o balanço de água no reservatório de água subterrânea,
novamente pode-se admitir que não há grandes mudanças no armazenamento desse
sistema em um ano hidrológico. A equação de balanço toma-se então: W - ET -
q = 0. A evapotranspiração considerada neste caso é a das freatóritas (ET =
1,00 x 142,9 x 0,35 = 50 cm/ano), q é a descarga subterrânea perdida para o
mar. Assim, o balanço de água no sistema subterrâneo fica: q = 79,3 - 50 =
29,3 cm/ano.
A descarga total de água subterrânea perdida para o mar é igual a
descarga unitária multiplicada pela área da ilha: Q = 0,29 m/ano x 5,4 x 109
m2 = 1,57 x 109 m3/ano.
A descarga perdida para o mar podería, em princípio, ser utilizada para
desenvolvimento do turismo nessa ilha, respeitando o equilíbrio necessário no
convíyio entre a água doce e a água do mar.

8.2 Lei empírica de Darcy

Uma solução exata da equação que governa o fluxo subterrâneo é


virtualmente impossível de ser encontrada. A enorme complexidade apresentada
pelos canais de escoamento toma inviável qualquer tentativa nesse sentido.
Essa dificuldade é contornada pela adoção de valores médios nas variáveis
hidráulicas e nas propriedades do meio poroso.
Das grandezas hidráulicas mais conhecidas, a pressão e a massa
específica mantêm o mesmo significado dado na hidromecânica. O conceito de
velocidade, entretanto, é diferente do tradicional, isto é, taxa de variação
do deslocamento em relação ao tempo. Velocidade da água subterrânea ou
velocidade Darcy é um fluxo volumétrico definido pelo volume escoado por
unidade de área total (grãos e vazios) e por unidade de tempo. A velocidade
Darcy é um fluxo macroscópico, definido em um elemento representativo de área
total. A figura 8.7 mostra a água fluindo por um cilindro cheio de areia, a
velocidade Darcy, q, pode ser estimada através da própria definição, isto é,
volume de água recolhido por unidade de área e por unidade de tempo. Assim:

AVa Q
( 8 . 11)
A At A
Água Subterrânea 301

Outra velocidade, chamada velocidade de percolação, v, é definida como a


descarga por unidade de área de vazios. Assim,

_Q = _q
v ( 8. 12)
<(> A <j>

A velocidade de percolação representa a velocidade média dos elementos


de fluido através dos vazios do meio poroso. Dependendo da natureza do
problema estudado, a adoção de uma ou outro velocidade poderá alterar
substancialmente o valor dos resultados.

E nfroda

Figura 8.7. Escoamento em meio poroso

Forças envolvidas no fluxo em meios porosos

Um volume elementar de água subterrânea está submetido a forças devidas


a pressão e a gravidade. Estas duas forças são chamadas de ativas porque são
responsáveis pelo movimento da água subterrânea. Também existem forças
resistivas desenvolvidas quando a água está em movimento.
A água escoa a uma taxa constante pelo elemento mostrado na figura 8.8.
Tomando-se uma linha de fluxo na qual está sendo analisado o balanço de
forças na direção /, tem-se que:

p <j> d A - (p + — d/) <)> d A = (pg 4» d A d 1) sen ô + F (8.13)


d/
302 Hidrologia

Após simplificações e reconhecendo que sen 5 = dz/d/, segue-se que:

F dp dz
--------- = - (— + pg —) (8.14)
<t> dA dl dl dl

O lado esquerdo da equação 8.14 é a força resistiva por unidade de


volume de fluido; dp/d/ é a componente na direção / da força por unidade de
volume de fluido devida a pressão; pg dz/d/ é a componente na direção / da
força por unidade de volume de fluido devida a gravidade. A força F é
proporcional à velocidade Darcy quando o escoamento é viscoso.

Figura 8.8. Forças envolvidas no escoamento em meio poroso

Um melhor entendimento dos fatores que controlam o atrito, quando as


forças resistivas predominam sobre as forças ativas, pode ser encontrado
através da análise de três casos simples:

a) Escoamento em tubo capilar de raio R. A relação entre as forças ativas e a


velocidade média v é a seguinte:

8 ix v F
(8.15)
r2 tj) dA dl

onde: ji é a viscosidade dinâmica do fluido e / a coordenada medida ao longo


do tubo.

b) Escoamento de uma película fina de espessura d sobre uma superfície. A


velocidade média v está relacionada com as forças ativas da seguinte maneira;
Água Subterrânea 303

3 Ji v F
(8.16)
i2 (j) dA àl

c) Escoamento entre duas placas paralelas separadas por uma distância b. A


relação entre forças ativas e a velocidade média v é a seguinte:

12 ji v F
(8.17)
<(> dA ál

Comparando as equações 8.15 a 8.17 e usando a equação 8.14, chega-se a


seguinte equação:

F C ji q dp dz
= - (— + Pg —) (8.18)
<j) dA d/ d2 ál d/

onde: C é uma constante adimensional dependente da forma dos canais do


escoamento, d2 é uma dimensão característica do domínio do fluxo e v é a
velocidade média de escoamento (velocidade Darcy). Na realidade, o escoamento
de um elemento de fluido em um meio poroso é extremamente tortuoso, razão
pela qual o comprimento percorrido por esse elemento de fluido é muitas vezes
maior do que a distância macroscópica entre dois pontos. Portanto, os efeitos
da tortuosidade no movimento de um elemento de fluido estão incluídos nos
parâmetros d e C.
Fazendo C/d2 = k e chamando k de permeabilidade intrínseca do meio
poroso (tem a dimensão de área L2), e resolvendo a equação pela velocidade q,
tem-se:

k dp dz
(8.19)

que é uma das formas mais gerais da lei de Darcy.


A equação 8.19 aplica-se a fluidos com massa específica variável ou
constante e a meios porosos com permeabilidade intrínseca também variável ou
constante. Para aplicações em hidrogeologia, a massa específica pode ser
considerada constante. Assim, a equação 8.19 pode ser simplificada:

( 8 .20)
li d/ pg
304 Hidrologia

onde: a quantidade entre parêntesis é a altura piezométrica, h.

h = — + z (8.21)
Pg

O coeficiente que multiplica a força ativa é chamado Condutividade


hidráulica, K:

K .lü ( 8.22 )

A condutividade hidráulica é um parâmetro hidrogeológico, com dimensão


L/T, que combina as propriedades do fluido e as propriedades do meio.
Quando a massa específica da água é considerada constante, a altura
piezométrica é a força potencial, com o significado físico de energia por
unidade de peso de fluido. Substituindo as equações 8.21 e 8.22 na equação
8.20, surge uma equação simplificada da lei de Darcy:

dh
q = - K— (8.23)
d/

A equação 8.23 é a forma mais utilizada na hidrogeologia. O sinal


negativo indica que o escoamento é sempre na direção da altura piezométrica
decrescente; isto é, da altura piezométrica maior para a altura piezométrica
menor. A diferença em altura piezométrica é sempre igual à diferença de
elevação do nível de água nos piezômetros.
Supondo que o aqüífero seja homogêneo (K constante), então é possível
definir a quantidade escalar:

O = Kh (8.24)

À quantidade escalar O é o potencial de velocidade. O potencial de


velocidade é um artifício matemático muito útil, mas não deve ser
interpretado como energia potencial. O conceito de velocidade potencial é
valido somente quando K é constante.

Exemplo 8.4. A figura 8.9 mostra dois piezômetros, um ligando o freático e


outro um aqüífero confinado. A condutividade hidráulica da camada entre os
dois aqüíferos é 0,72 x IO-4 cm/s. Calcular a descarga por unidade de área
através da camada intermediária, considerando que o fluxo é permanente.
Água Subterrânea 305

Solução: como o fluxo é permanente» qz e K são constantes. O gradiante da


altura piezométrica também é constante. Portanto, pode-se usar a equação 8.23

K
qz = - - (h2 - hi)
b

onde b é a espessura da camada intermediária, e os subscritos 1 e 2 indicam o


fundo e o topo da mesma camada intermediária, respectivamente.
O estrato impermeável inferior foi selecionado como datum para o cálculo
da altura piezométrica. Assim, da equação 8.21 tem-se que:

hj = 6,1 + 6 = 12,1 m e h2 = 2 + 9 = 11 m

tinha de água f V
í
6, m mm 2m
)
r
3m
---------- í
38

6m aquí f er o c on f i nad o

Figura 8.9. Fluxo ascendente entre confinado e freático.

A descarga por unidade de área é a velocidade Darcy:

qz = - 0,72 x 10*4 (11 - 12,1) / 3 = 0,264 x 10-4 cm/s

O fato do escoamento ser positivo significa que é ascendente. Note-se


que o valor de qz é independente do plano utilizado como datum.

Determinação da condutividade hidráulica no laboratório

Os métodos mais confiáveis para a determinação da condutividade


hidráulica e a permeabilidade intrínseca são provenientes dos testes de
bombeamento conduzidos no campo. Embora o valor da condutividade hidráulica
306 Hidrologia

de uma amostra, possa ser encontrado no laboratório com um alto grau de


precisão, as amostras são muito pequenas comparadas com o tamanho do
aqüífero, além do grau de perturbação sempre presente na coleta das mesmas.
Por isso, é extremamente difícil caracterizar a condutividade hidráulica de
um aqüífero através do laboratório.
A condutividade hidráulica e a permeabilidade intrínseca podem ser
medidas diretamente através de permeâmetros. Na figura 8.10 podem ser vistos
dois tipos de permeâmetros mais comumente utilizados. No lado esquerdo
aparece o permeâmetro de carga constante no qual é estabelecido o escoamento
permanente ascendente através da amostra. Neste caso a equação de Darcy pode
ser diretamente aplicada para estimar o valor de K.

Q L
K = ----- (8.25)
Ah0 A

A carga (Ah0) constante através do permeâmetro é dada pela diferença de


altura entre os níveis de entrada e saída do permeâmetro. A descarga Q após
ter atingido o equilíbrio, é calculada simplesmente pela divisão do volume de
água recolhido pelo tempo necessário em recolhê-lo.
O permeâmetro de carga variável é mostrado no lado direito da figura
8.10. A descarga decresce com o tempo, pois a carga hidráulica decresce
também com o descenso do nível de água no tubo na entrada do piezômetro. A
equação da condutividade neste caso é dada por:

a L Ah0
K = — In (---- ) (8.26)
A t Aht

na qual Ah0 é a carga inicial (para t = 0) e Aht é a carga no tempo t.

8 J Equações fundamentais do fluxo subterrâneo

A equação diferencial que descreve o movimento de água subterrânea é


obtida pela combinação da equação de Darcy com a equação da continuidade. A
equação da continuidade envolve entradas, saídas e taxas de variação do
armazenamento em um volume elementar.
A tabela 8.3 mostra valores de condutividade hidráulica para vários
materiais porosos comumente encontrados na natureza.
A g u a Su b terrân ea

Tabela 8.3. Condutividade hidráulica de materiais porosos


_____________(Morris & Johnson, 1967)
Material Intervalo (cm/s) Média (cm/s)
Areia fma (0,2 - 189) x 10-4 2,88 x 10-3
Areia grossa (0,9 - 6610) x 10-4 5,20 x IO'2
Cascalho (0,3 - 31,2) x 10'1 4,03 x 10-1
Silte (0,1 - 7090) x IO'7 2,83 x IO'5
Argila (0,1 - 47) x 10-8 9,00 x IO-8

Figura 8.10. Permeâmetro de carga fíxa e variável

Equação diferencial da continuidade

A vazão mássica através de uma seção transversal do volume de controle


da figura 8.11 é sempre o produto da massa específica, p, vezes a descarga Q.
A vazão mássica de saída menos a vazão mássica de entrada, ao longo de duas
seções normais à direção x, é igual a: [(p Qx)2 - (p Qx)z]. Expressões
similares podem ser escritas para as direções y e z.
Se as dimensões do volume de controle forem pequenas, a vazão mássica na
seção de saída pode ser relacionada com a vazão mássica na seção de entrada
através da expansão em séries de Taylor:
308 Hidrologia

( P Q x)2 = (P Q x ) l + " f j ( P Q * } A x + 0 ( A x 2 ) ( 8 ’2 7 )

O último termo do lado direito representa termos de segunda, terceira,


etc. ordens. Para Ax pequeno, esses termos podem ser desprezados, ficando
desta maneira a equação 8.27 simplificada:

( p Q x) 2 - Cp Q x) i = (P Q x ) A x ( 8 .2 8 )

A descarga Q é por definição o produto da velocidade Darcy pela área


normal ao escoamento.

Qx = Px Az Ay (8.29)

Segue-se após a substituição da equação 8.29 na 8.28 que:

(P Qx>2 ■ (p Q,)i = ^ (p qx) Ax Ay Az (8.30)

Considerando as vazões mássicas de saída menos as de entrada em todas as


seções do volume de controle, devem ser iguais à taxa de variação da massa M
em relação ao tempo. Assim:

d d d 8M
— íp q%) + 7oy ( p q í ) + 7dz (p Ax Ay Az = - ---- (8.31)
dx at

(j,Q)z

Figura 8.11. Volume de controle


Agua Subterrânea 309

O sinal negativo na equação 8.31 toma positiva a taxa efetiva de vazão


mássica de saída, quando retirada do armazenamento.

Escoamento em aqüíferos confinados

O lado esquerdo da equação 8.31 pode ser simplificado através da


expansão da derivada.

d 3qx gp
( p q x) = p + qx —
(8.32)
dx dx dx

O termo no lado direito da equação é considerado pequeno em relação ao


primeiro. Incluindo os termos correspondentes às direções y e z . e expandindo
as derivadas, a equação de balanço de massa fica:

3<ÍX 3qy S ( 3 Z dU
P ( -f*—— - -f- ) Ax Ay Az (8.33)
dx dy dz dl

O próximo passo consiste em introduzir a equação de Darcy s considerar


um aqüifero no qual as direções preferenciais do escoamento coincidem com as
direções do sistema de coordenadas x, y e z. Substituindo ria equação 8.33 a
expressão de Darcy e dividindo por pAxAyAz:

d dh d dh d dh 1 ÔM
(Ky — ) + — (Ky — ) + — (K, — ) = -------------— (8.34)
dx dx dy 1 dy dz dz p Ax Ay Az dt

A taxa de variação da massa por unidade de volume é dado por <jip(ap +


(3)dp. Portanto, o lado direito da equação 8.34 pode ser escrito assim: <j>(ap +
j3)ôp/8t. Finalmente sabendo que dp = pg dh e que Ss = pg 0 (ap + p), tem-se a
equação do aqüifero confinado:

d dh d Ôh d dh 6h
— (Kx — ) +— (IC — ) + — (K* — ) - Ss — (8.35)
ax dx dy ^ 5y dz dz dl

A equação 8.35 é uma equação diferencial linear a derivadas parciais,


cuja solução representa a distribuição espacial e temporal da altura
piezométrica em um aqüifero confinado não-homogêneo e anisotrópico. O sistema
de coordenadas não é arbitrário na equação 8.35, deve ser selecionado de
310 Hidrologia

maneira a coincidir com as direções principais da condutividade hidráulica.


Equações menos gerais, porém mais tratáveis, podem ser obtidas a partir da
equação geral. A equação do aqüífero homogêneo e anisotrópico é a seguinte:

(8.36)

Para aqüíferos homogêneos e isotrópicos a equação fica reduzida a uma


forma ainda mais simples.

a2h a2h a2h Ss ah


(— ) + (— ) + (— ) = (8.37)
3x2 ay2 az2 K at

Neste caso, a seleção da orientação das coordenadas é arbitrário. A


equação 8.37 é uma equação diferencial linear, parabólica, está presente em
diferentes campos da ciência. Soluções desta equação para o caso de condução
de calor em sólidos podem ser utilizadas para a solução de problemas de
escoamento subterrâneo em aqüíferos confinados.
Em muitas aplicações de bidrogeologia, o hidrogeólogo pode considerar o
aqüífero com espessura constante b, e o escoamento horizontal no plano x-y.
Lembrando que o produto do armazenamento específico pela espessura do
aqüífero é o coeficiente de armazenamento, a equação diferencial fica:

a2h a2h s ah
(8.38)
3x2 3y2 K b dt

onde T = Kb é chamada transmissibidade, cuja dimensão é [L2/T]. O


rebaixamento, s, é às vezes usado como variável dependente na equação
diferencial. Assim:

s = ho - h (8.39)

onde ho é um valor conveniente de referência da altura piezométrica,


geralmente a altura inicial. Como ds = - dh, a equação 8.39 toma-se:
. ' ,íX'........

Água Subterrânea 311

S2s 8?-$ S ds
— + — = ------ (8.40)
0x2 3y2 T Ôt

O escoamento subterrâneo às vezes existe de tal maneira que a recarga é


igual à descarga de saída do aqüífero. Nestas condições nãcr há variação no
armazenamento, conseqüentemente não há variação da altura piezométrica em
relação ao tempo. Assim,

32h 02h 02h


— + — + — =o (8.41)
0x2 0y2 0z2

Esta equação é conhecida como equação de Laplace, descreve escoamentos


permanentes em aqüíferos confinados. A equação de Laplace tem sido objeto de
estudo por físicos e matemáticos durante décadas. Existem métodos numéricos
muito eficientes para resolver esta equação, principalmente para o caso
bidimensional.

Exemplo 8.5. Mostre que a solução da equação unidimensional de Laplace é uma


linha reta.

Solução: seja a reta h = Ax + B. A primeira derivada em relação à distância é


dh/dx = A. A segunda derivada em relação à distância é d2h/dx2 = 0, que é a
equação unidimensional de Laplace.

Escoamento em aqüíferos não-conflnados

A água subterrânea é retirada do armazenamento de um aqüífero livre por


drenagem de poros, expansão da água e compactação da rocha; com contribuições
geralmente desprezíveis das duas últimas parcelas em relação à primeira.
Portanto, a taxa de variação do armazenamento pode ser convenientemente
estimada determinando a taxa de variação do volume de água na zona drenada
vezes a porosidade aparente. Em princípio, a localização da linha de água no
tempo e no espaço pode ser computada resolvendo a equação 8.35 com Ss = 0,

8 8h 8 Ôh 8 8h
— (K j — ) + — (Ky — ) + — (Kj —-) = 0 (8.42)
3x 3x 3y T 3y 3z 3z
312 Hidrologia

A equação 8.42 fica reduzida à equação de Laplace para aqüíferos


homogêneos e isotrópicos, porém nesta equação o escoamento não é permanente.
Portanto, o domínio das soluções dos escoamentos resolvidos pela equação 8.42
não são constantes, pois as jposições da linha da água mudam em função do
tempo. Por essa razão, existe variação do armazenamento no aqüífero.
Uma abordagem matemática rigorosa para resolver problemas de escoamento
em aqüíferos não-confínados seria através da resolução da equação 8.42. Uma
realização da solução consiste na obtenção da distribuição espacial e
temporal de linha da água. O fato de a linha de água ser uma realização da
t solução, e ao mesmo tempo ser necessária para definição do domínio da equação
8.42, faz com que a resolução dessa equação seja extremamente difícil. Mesmo
para escoamentos permanentes, onde a linha de água é fixa no tempo, o cálculo
de linhas de água seguindo o esquema indicado não é tarefa fácil.
As dificuldades acima apontadas deram origem à chamada solução de
Dupuít-Forchheimer. Assim, considerando uma linha de água acima de um
contorno impermeável, sendo este o datum, (figura 8.12). A descarga por
unidade de largura perpendicular ao plano do papel, na vertical, é dado por:

Q= qx(x,z) dz (8.43)

Para avaliar essa integral é necessário o conhecimento da velocidade


Darcy, qx(x,z), para cada valor das coordenadas (x,z). Entretanto, quando a
declivid.ade da linha de água é pequena, a velocidade Darcy na linha de água
não é muito diferente da velocidade Darcy no fundo impermeável; assim, pode-
se escrever qx(x,z) = qx(x,zf).

dh
Q = qx(x,zf) zf = - K — zf (8.44)
dx

onde h representa a altura piezométrica na linha da água. Por definição, a


pressão na linha de água, é nula, logo, h=zf. A descarga por unidade de
largura é, portanto, dada por;

dh
Q = - Kh — (8.45)
dx

Na equação 8.45, h representa a espessura do escoamento e a altura


piezométrica. A quantidade dh/dx é a tangente do ângulo que a linha de água
Água Subterrânea 313

faz com a horizontal. A equação 8.45 implica um escoamento completamente


horizontal, bem como em uma distribuição hidrostática de pressão ao longo da
vertical. Em outras palavras, a altura piezométrica ao longo da vertical é
constante.
A solução de Dupuit-Forchheimer para escoamento horizontal, permite o
uso de um volume de controle que se estende desde o fundo impermeável até a
linha de água. Como as alterações da massa específica não são importantes no
aqüífero livre, o balanço de massa é conseguido simplesmente por um balanço
de volumes. A taxa líquida de vazão deve ser igual à taxa de redução de água
armazenada no volume de aqüífero. Portanto, o incremento do volume de água
associado ao incremento de nível de água, dh, segue a definição de porosidade
aparente. Assim, surge a equação do aqüífero livre;

S dh d dh dh
— (K h — ) + — (K h —) = <j>a — (8.46)
dx dx dy dy St

Se o aqüífero for homogêneo é válida a seguinte equação,

a ah a ah ^ ah (8.47)
— (h — ) + — (h — ) = -------
Sx dx dy Sy K St

Figura 8.12.Escoamento em aqüífero livre


314 Hidrologia

A equação 8.47 é a equação não-linear de Boussinesq. O fato de ser não-


linear tem dificuldado a solução através de métodos analíticos, embora tenham
sido encontradas varias soluções exatas e aproximadas para condições iniciais
e de contorno bem particulares. A linearização da equação de Boussinesq é
permissível, quando a variação espacial de h permanece pequena em relação a
h. Neste caso é possível substituir a espessura variável do escoamento por
uma espessura média do mesmo, b, obtendo-se:

a2h a2h K ah
— + — = --------- (8.48)
ax2 8y2 b k at

que é conhecida como a equação linearizada de Boussinesq.

Exemplo 8.6. Encontre uma solução da equação do aqüífero livre em regime


permanente e em uma direção.

Solução: a equação procurada é 5(h dh)/dx = 0. Integrando uma vez temos que
ôh/dx = A. Integrando novamente h2/2 = Ax + B. Note-se que o quadrado da
solução é linear.

Equações com contribuição lateral

A percolação através de aqüitardos sobrepostos ou sotopostos alteram


significativamente o comportamento hidráulico de um aqüífero confinado. No
caso do aqüífero livre, a colocação ou a retirada de água ocorrem através da
recarga artificial ou da evapotranspiração.
Considerando o escoamento em um aqüífero confinado, homogêneo e
isotrópico, sobreposto por um aqüitardo de espessura bi e considerando que o
escoamento no aqüífero confinado é completamente horizontal, pode-se
incorporar no volume de controle, a percolação através do aqüitardo
diretamente na equação de balanço de volumes. O volume de controle estende-se
desde o fundo impermeável até o topo do confinado. O balanço de volumes leva
a seguinte equação:

aQx 5Qy ah
— Ax + — Ay - W Ax Ay = - S — Ax Ay (8.49)
dx dy dt
Á g u a S u b terrân ea 315

Substituindo Qx por - K b Ay — e Qy por - K b Ax obtém-se:

a 2h Ô2h W S ôh
— + — + — = --------- (8.50)
a x2 5y2 b K K b 3 1

A percolação vertical W é uma descarga por unidade de área considerada


positiva quando contribui para o aqüífero. O valor da percolação pode ser
encontrado diretamente a partir da equação de Darcy, na hipótese de não haver
mudanças no aqüitardo.

Ki
W = — (h{ - h) (8.51)
bi

onde Kj, e hj representam a condutividade hidráulica, espessura e altura


piezométrica no aqüitardo, respectivamente.

K bb 1/2
Caso se defina o fator de drenança: [3 (8.52)
K,
e introduzindo-o na equação 8.50, obtém-se a equação do aqüífero com
drenança. Assim:

a 2h a 2h ho-h S ah
— + — + -----= ----------- (8.53)
ax2 ay2 fS2 K b at

Uma análise semelhante para uma contribuição acima da linha de saturação


no aqüífero livre leva à equação do freático com contribuição lateral.

a ah a ah w ah (8.54)
— (h — ) + —(h—) +- = -------
dx dx ay ay K K at

A percolação W pode às vezes ser estimada a partir do balanço hídrico.


Em outros casos pode ser estimada a partir da análise de um permeâmetro de
carga móvel.
316 Hidrologia

8.4 Interação de águas superficiais e subterrâneas

Um sistema é um conjunto de componentes relacionados entre si. Os


sistemas reais incluem elementos naturais (aqüíferos, rios penetrantes no
aqüífero); elementos introduzidos pelo homem, (canais, poços, barragens) e
práticas agrícolas (irrigação por sulcos, por aspersores).
Os fenômenos naturais são aleatóreos. Portanto, o sistema incluirá
componentes determinísticos e estocásticos. O componente estocástico pode ser
subdividido em dois subcomponentes. Um resultante da aleatoriedade da própria
natureza; isso equivale a dizer que, mesmo conhecendo a distribuição
estatística de um fenômeno, não podería ainda ser conhecido o valor de um
fenômeno em um dado instante. 0 outro subcomponente é resultante dos erros
envolvidos na quantificação dessa grandeza.
O sistema natural é modificado ou substituído pela interferência do
homem. Esta interferência é o resultado de muitas ações. O homem muda o
caráter natural do sistema: a) alterando o ambiente natural (construção de
barragens, canalização de rios, perfuração de poços); b) estabelecendo leis
(prioridade de uso das águas); c) desenvolvendo atividades econômicas
(agricultura irrigada); d) exercendo pressão política (apelo dos sem-terra).

Descrição dos componentes

A figura 8.13 mostra o ciclo hidrológico de um sistema no qual o


aqüífero e o rio estão hidraulicamente conectados. As alterações introduzidas
pelo homem (canais, barragens, poços) e as práticas agrícolas (irrigação por
sulcos, inundação) também são mostradas.
Para entender o funcionamento desse sistema, é necessário compreender
primeiro o comportamento de cada um dos componentes, seguido do conhecimento
da interação de cada um com o resto. Nesse sistema pode-se distinguir três
tipos de excitações: a) entradas; b) retiradas do rio; e c) retiradas do
aqüífero. Assim, a estratégia será estudar a interação de dois componentes e
mostrar que possíveis combinações de mais de dois elementos podem ser
reduzidas a grupos de dois.
Uma vez estudada a interação de dois componentes, será fácil reduzir um
problema de três componentes em um problema de dois, para o qual a solução é
conhecida. A chave da solução do problema envolverá a composição de módulos
de dois componentes.
*
Componentes físicos básicos

Os dois componentes físicos básicos são o aqüífero e o rio. Sua


descrição matemática é agora analisada.
Entre os vários métodos determinísticos que podem ser usados para
317
Água Subterrânea

Figura 8.13-Uso conjunto de águas superficiais e subterrâneas.

descrever o estado de um aqüífero, duas grandes orientações são usadas: a)


métodos que usam parâmetros concentrados; e b) métodos que usam parâmetros
distribuídos. No caso de uma bacia hidrogeológica isolada (sem interferência
de um curso de água), o estado do sistema é medido pela resposta a uma
retirada de água do aqüífero. Neste método estima-se o rebaixamento médio
estendido a tedo o aqüífero, sem dar atenção à posição geográfica dos poços,
dos quais a água é retirada e onde resulta a maior diferença entre o valor
médio e o valor real.
Este método é usado em estudos econômicos para analisar o méri
expiotação de um aqüífero para desenvolvimento agrícola em um horizonte
definido de tempo. O fato de muitos poços serem considerados secos, pe os
rebaixamentos médios previstos pelo método, nao invalidam os resu *
econômicos globais. Por outro lado, numa escala com finalidade operati
necessário descrever o sistema com mais detalhe, contando com a re P®J?
dos poços na área, bem como, com os valores reais dos f,
hidrogeológicos. Nesse caso é utilizado o método com parâmetros is •
A estrutura matemática dos métodos que usam parâmetros concen
das equações diferenciais ordinárias;

ds (8.55)
dt
318 Hidrologia

onde: <j>a é a porosidade drenável do aqüífero livre, s é o rebaixamento médio


(a partir de um datum superior), t é o tempo e q ^ é a retirada efetiva de
água por unidade de área. Na equação 8.55 <f>a não tem dimensão, s tem dimensão
de comprimento e % tem dimensão de velocidade (mesma da velocidade Darcy).
A estrutura matemática dos métodos que usam os parâmetros distribuídos é
a das equações diferenciais parciais.. A equação de Boussinesq pode ser
escolhida para representar o aqüífero:
3 ds d ds õs
(8.56)

onde: <t>a é a porosidade drenável (pode variar no espaço), s é o rebaixamento


num ponto de coordenadas horizontais x e y, T é a transmissividade do
aqüífero (pode também variar no espaço) e qç é a retirada efetiva por unidade
de área, sendo negativa no caso de recarga e podendo variar de um lugar para
outro.
Ao invés de descrever o estado do sistema através do rebaixamento,
costuma-se descrever também em termos de altura piezométrica h, medida a
partir de um datum horizontal inferior. Neste caso a equação de Boussinesq
toma a forma:

d âh d dh Ôh
(8.57)

Tanto a equação 8.56 como a equação 8.57 consideram o escoamento


basicamente horizontal. Assim, a componente vertical do mesmo é desprezível
ou sem importância nas decisões de gerenciamento.
A modelagem do rio pode também ser feita através de métodos que usam
parâmetros concentrados ou distribuídos. O método clássico que utiliza
parâmetros concentrados é o método de Muskingum. Este serve para simular a
propagação de ondas de cheia em trechos de rio.
A onda de cheia num curso de água, com velocidade de viagem controlada
pelas características do rio (declividade, rugosidade, etc.), é caracterizada
pela equação da continuidade no trecho:

dS
— = I - 0 (8.58)
dt

onde: S é o armazenamento no trecho do rio, I é a descarga instantânea de


Água Subterrânea 319

entrada no trecho e O é a descarga instantânea de saída no trecho.


Como as descargas de entrada são quase sempre conhecidas, a equação 8.58
contém duas incógnitas, S e O. Portanto, é necessário o uso de uma equação
adicional. Essa equação é a chamada equação de Muskingum, que relaciona o
armazenamento no trecho com as descargas instantâneas de entrada e saída:

S = K [x I + (1-x) O] (8.59)

O parâmetro K tem dimensão de tempo, enquanto que x é adimensional. A


equação 8.59 é muito utilizada quando a cinemática do movimento é pouco
afetada pela dinâmica do processo. A equação 8.59 indica que o sistema
comporta-se linearmente.
Eliminando-se a variável O nas equações 8.58 e 8.59, chega-se a uma
equação diferencial ordinária de primeira ordem em S:

dS
K(l-x) + S = Kl (8.60)
dt

Para encontrar a resposta do sistema a um padrão de descargas de


entrada, pode-se obter primeiro a resposta do sistema a uma excitação
especial: a) impulso unitário; b) pulso unitário; e c) salto unitário. A
experiência tem mostrado que o uso do salto unitário traz soluções
matemáticas mais estáveis.
Resolvendo-se então a equação 8.60 para Kl = 1 (salto unitário) obtém-se
o núcleo salto unitário de armazenamento devido à descarga de entrada:

-t
Ks(t) = K \ 1 - exp ( (8.61)
K(l-x)

do qual o núcleo impulso unitário pode ser obtido:

(8.62)

bem como o núcleo pulso unitário:

5s(t) = K [1 - exp (• .)] para t=l (8.63)


K(l-x)
320 Hidrologia

1 -t
8s(t) - K exp[---------- 1] exp[-------- ], t>l (8.64)
K(l-x) K(l-x)

Os núcleos discretos são obtidos a partir dessas equações para valores


inteiros de t, assim:

1 -n
5s(n) = K [exp(---------- 1] exp[--------- ] n =1,2,3,.... (8.65)
K(l-x) K(l-x)

O armazenamento no rio devido a um padrão arbitrário de descargas de


entrada, I(x), é dado pela integral de convolução:

t
1 ~(t-T)
S(t) = — exp (--------] I(x) dx ( 8 .66)
1-x K(l-x)
o

ou na forma discreta:

1 „ -(n-\)+l)
S(n) = K (exp ( - ------) - 1] ) exp [ ---------- ] l(v) (8.67)
K(l-x) L K(l-x)
I
Na equação anterior, I(u) representa uma descarga média de entrada no
trecho durante o período de rempo (u-l,u), enquanto que S(x>) representa o
armazenamento instantâneo ao final do intervalo de tempo v.
Se a resposta de interesse não for o armazenamento e sim a descarga de
saída, os núcleos de descarga podem ser determinados resolvendo a equação
8.59 para O(t). Assim:

St x
O(t) = --------------- I(t) ( 8 . 68)
K(l-x) l-x

Usando a integral de convolução, obtém-se:

-(t-T ) x
O (t) = exp (--------) I(x) dx - (8.69)
K(l-x) 2 J K(l-x) l-x
0

Esta equação não tem a forma tradicional da equação de convolução, mas


Agua Subterrânea 321

da definição de função Delta de Dirac, D(t);

| D(t-T) I(T) = I(t) (8.70)

e usando a equação 8.69, obtém-se:

-(t-t) x
O(t) = exp[— — ] ------D(t-x) I(x) di (8.71)
K(i-x)2 Kü-x)

O núcleo impulso unitário de descarga de saída é obtido após a


identificação dos termos da equação 8.71.

1 -t x
Ko(t) = ---------exp [----------] ------D(t) (8.72)
K(l-x)2 K(l-x) 1-x

O núcleo acima é singular no tempo zero, Como a função Delta de Dirac é


integrável, os núcleos discretos são regulares e podem ser obtidos facilmente
a partir da equação 8,72.

exp [-1 ! K(l-x)]


So(n) = 1 - para n=l (8.73)
"Õ ^j

exp[l / K(l-x)] - i
5o(n) | / exp[------ ] \ (8.74)
(bx) J ^ K(l-x) J

para n = 2,3,...
Depois que os núcleos discretos forem calculados, as descargas de saída
podem ser estimadas a partir das descargas de entrada através da integral de
convolução:

O(n) = £ 5o(n-\)+l) I(v) (8.75)


o=i

Note-se que quando x = 0 obtém-se o chamado reservatório linear simples,


322 Hidrologia

cuja formulação é obtida a partir do modelo apresentado colocando-se x = 0


nas equações desenvolvidas.

Exemplo 8.7. Para um trecho de rio de 1000 m de comprimento, 10 m de largura


e parâmetros de Muskingum K — 10 horas e x = 0,2, encontre os núcleos
discretos de volume de saída para um intervalo de 4 horas por 12 horas.

Solução: o valor de K para o intervalo de 4 horas é K = 10/4 = 2,5, portanto


K(l-x) = 2,0. Utilizando as equações 8.73 e 8.74 temos que 8o(l) = 0,242,
So(2) = 0,298, 8o(3) = 0,181. Para descargas de entrada de 1(1) = 5.000 m3,
1(2) = 2.500m3 e 1(3) = l.OOOm3, e usando a equação 8.75 as descargas de
saída são, respectivamente: 0(1) = 1.210m3, 0(2) = 2.095m3, 0(3) = 1.892m3.

Interação aqüífero-poço

A primeira interação de dois componentes a ser estudada, diz respeito ao


efeito produzido por um poço sobre o rebaixamento em um aqüífero livre. No
caso de um aqüífero infinito e homogêneo, ínicialmente em repouso e devido à
simetria radial do problema, pode-se usar a equação de Boussinesq em
coordenadas polares.

ôs ô2s a 3s
----------- - a ------— — (8.76)
3t õr2 r õr

onde a = T/<|>a é a difusividade do aqüífero.


Uma solução fundamental da equação de Boussinesq é a chamada solução
fonte: e x p í-r^ a tj/t Como a equação 8.76 é linear, a superposição de
soluções também é uma solução. Conseqüentemente, a integral da solução fonte
também é uma solução.

r exp (-r2/4ax)
s(r,t) = A áz (8.77)

onde A é uma constante arbitrária.


A descarga em direção ao centro de um cilindro de raio r e espessura
igual à espessura do aqüífero, é calculada pela equação de Darcy:
Água Subterrânea 323

c
Q = 4 k T A exp (8.78)
4at

A descarga Q para r = 0 é independente do tempo e tem por valor 47tTA.


Segue-se que para A = 1/47cT, o núcleo salto unitário, Ks(r,t), representa o
rebaixamento no aqüífero devido a uma taxa constante de bombeamento no poço.

1 rexp (-r2/4ax)
(8.79)

A derivada em relação ao tempo do núcleo salto unitário, é por definição


o núcleo impulso unitário, ks.

exp (-r2/4at)
ks = (8.80)
4 Tt T

O rebaixamento devido a um padrão variável de bombeamenn, a uma


distância r do poço e a um tempo t desde o início do bombeamento, é dado pela
integral de convolução:

r exp [ -r2/4a(t-x) ]
s(t) = QCO ------------- áx (8.81)
4 k TJ (t-T)
0

Na equação 8.79 a integral é conhecida na literatura matemática como


integral exponencial W(r2/4at) ou função de poço. Assim, pode-se escrever:

1
Ks = W (r^ a t) (8.82)
4 7t T

Os bombeamentos dos poços não são conhecidas exatamente como funções


contínuas do tempo, no seu lugar são conhecidos ou estimados os bombeamentos
médios no intervalo discreto de tempo. Os núcleos discretos de bombeamento
são definidos integrando-se o núcleo impulso unitário sobre o período de
tempo unitário:
324 Hidrologia

1 rÁ rl
8$(n) = W [-----] - W [--------- ] (8.83)
4 ti T 4<xn 4cc(n-l)

De posse dos núcleos de bomfaeamento é possível, através da integral de


convolução, prever o rebaixamento em um determinado ponto de observação ao
final do período n e devido ao bombeamento médio Q(u) no período (u-1 a u).

n
s(n) = £ Q(v) 8s(n-v+l) (8.84)
V—1

Exemplo 8.8. Encontre os núcleos discretos de bombeamento para um aqüífero


homogêneo com porosidade aparente 0,2, transmissividade 10.000 m2/semana e
distância radial ao poço de 200 m para um intervalo de uma semana por 3
semanas.

Solução: a função W(u) é estimada pela seguinte série de termos:

W(u) = - 0,5772 - ln u + u - u2/4 + u3/18


A difussividade hidráulica a = T/<J)a = 5 x 104 m2/semana

semanas (n) r2/4an r2/4cc(n-l) W(r2/4ccn) W[r2/4a(n-l)] ôs(n)

1 2,0 X 10-1 00 1,2227 0 9,729 x IO'6


2 1,0 x 10'1 2,0 x 10-1 1,8229 1,2227 4,776 x ío-6
3 6,667 x IO'2 1,0 x 10'1 2,1917 1,8229 2,935 x ío-6

Para os esquemas de bombeamento Q(l) = 100.000 m3/sem, Q(2) = 50.000


tn3/sem e Q(3) = 100.000 m3/sem, os rebaixamentos calculados pela equação 8.84
são, respectivamente: s(l) = 0,97 m, s(2) = 0,96 m e s(3) = 1,50 m.

Interação rio-aqüífero

Seja um trecho de rio com seção transversal retangular, interceptando um


aqüífero infinito com propriedades hidrogeológicas (condutividade hidráulica
e porosidade drenável) uniformes e invariantes no tempo. O trecho do rio é
completamente penetrante, o fundo do rio coincide com o fundo do aqüífero.
Água Subterrânea 325

Inicialmente o rio e o aqüífero encontram-se em equilíbrio, a linha de


água no aqüífero e no trecho do rio estão no mesmo plano horizontal, (figura
8.14). Um problema interessante diz respeito a avaliação do volume de água
cedido pelo aqüífero ao rio (volume de retomo), ou inversamente o volume de
água perdido pelo rio para o aqüífero, ambos quando o nível do rio muda de
posição.
A equação linearizada de Boussinesq pode ser utilizada para representar
este fenômeno desde que sejam usadas as condições iniciais e de contorno
adequadas.

ds dh
a — = 0 (8.85)
Ôt 3x2

✓ fundo impermeávei
■T l-".1 \ yv —

Figura 8.14. Interação rio-aqüífero

Essa equação apresenta a mesma estrutura da equação de condução de calor


em sólidos. Muitos problemas de águas subterrâneas podem ser resolvidos
encontrando as condições de contorno adequadas aos problemas de condução de
calor. Essas soluções são apresentadas em manuais especializados.
Inicialmente o sistema está em equilíbrio, a partir daí o sistema é
excitado pela variação do nível do rio, a(t). Assim:

Condições iniciais: para t = 0 , s = 0 para todo x


Condições de contorno:
para x = 0 , s = 0(t) para todo t > 0
para x = oo , s = 0 para todo t > 0
326 H id ro lo g ia

A maneirade resolver a equação 8.85 sujeita às condições iniciais e de


contorno, consiste primeiro em resolver o problema para um tipo muito
especial de excitação. No tempo zero, o nível do rio cai instantaneamente uma
unidade e permanece nesse estado indefinidamente (salto unitário de
rebaixamento).
O rebaixamento no aqüífero devido a um rebaixamento unitário no rio,
pode ser encontrado a partir da solução de problemas semelhantes de condução
de calor em sólidos. Por definição, a resposta a um salto unitário de
rebaixamento é o núcleo salto unitário de rebaixamento. Assim:

Ks(x,t) = erfc ( 8 . 86)

onde: erfcQ é a função erro complementar definida como o complemento da


função erro, isto é:

erfcQ = 1 - er/(.) (8.87)

A função erro de um argumento u é definida como segue:

erf{u) = exp (-v2) dv ( 8 .8 8 )

Os valores da ftinção erro podem ser encontrados em tabelas ou podem


também ser geradas em computador.
Uma vez obtido esse tipo especial de resposta, o rebaixamento no
aqüífero em qualquer lugar e a qualquer tempo, produzido por um padrão
arbitrário de rebaixamento no rio, pode ser encontrado utilizando a equação
de convoluçao:
t
dx
$(x,t) = erfc — dx (8.89)
2-la(t-x) Ôx
0

Em alguns casos, a variável de interese não é o rebaixamento no aqüífero


e sim o fluxo na interface do rio e o aqüífero. Uma maneira tradicional de
estimar o fluxo de retomo consiste em encontrar s(x,t), a partir da equação
8.89, para uma padrão particular de a(t), daí calcular a velocidade Darcy na
interface. Multiplicando-se a velocidade Darcy pela área da seção
transversal, Lb, sendo L o comprimento do trecho e b a espessura do aqüífero,
Água Subterrânea
327

. ds
Qr = -2 L b K — I (8.90)
3x x=0

... 0 fluxo de retomo do aqüífero ao rio, pode também ser calculado


utilizando a teona linear dos sistemas e será por conveniência considerado
posmvo (negativo significa perda do rio). A equação 8.90 estima o fluxo de
retomo para um trecho de comprimento L, originado pelos dois lados do rio.
Utilizando-se a equação 8.89 para o cálculo da derivada do rebaixamento em
relação ao espaço e utilizando a cadeia de diferenciações, tem-se que:

(8.91)

ds
dx x=0 (8.92)

Chamando T - Kb e substituindo a expressão acima


acima na
n equação 8.90, tem-se
o núcleo salto unitário de fluxo de retomo Kr(t). Assim

2 L T
Kr(t) = (8.93)

Sabe-se que a resposta a uma excitação qualquer pode ser obtida a partir
da função salto unitário. Para o caso do fluxo de retomo devido a um padrão
qualquer de rebaixamento no rio a(t), tem-se:

2LT ‘ do(x) áx
(8.94)

Para um padrão arbitrário de rebaixamento no rio a(t) pode-se obter o flu­


xo de retorno aplicando diretamente a equação 8.94. O problema está em en­
contrar uma função que possa representar satisfatoriamente o rebaixamento no
rio e que possa ser integrada no tempo. Outra maneira de resolver a integral é
discretizando a equação de convolução.
Considerando que o nívei do rio varia linearmente com o tempo, a forma
328 H id ro lo g ia

discreta da equação 8.94 toma a seguinte forma:

V
%

Qr(n) = [a(u) - o(u-l)] (8.95)


*
\)-l

onde Qr(n) é o fluxo de retomo calculado ao final do período n.


Fazendo-se uma mudança de variável t-o + 1, integrando-se e chamando
Sr(u) de pulso unitário:

4 L T 1/2 , n l/2
8r(u) u - (u-1) (8.96)

Os fluxos de retomo podem ser calculados ao final do enésimo período


pelo uso da integral de convolução;

Qr(n) - £ [ a ( v ) * o(v-l)] 5r(n-v+l) (8.97)


i
A aplicação dessa fórmula é simples e pode rapidamente calcular os
valores dos fluxos de retomo, desde que sejam conhecidos os parâmetros do
aqüífero.

Exemplo 8.9. Um trecho de rio com 70 m de comprimento penetra em um aquífero


com T = 10.000 m3/semana. e óa = 0,2. Determine os coeficientes de influência
de fluxo de retomo para 3 períodos de uma semana.

Solução: a difussividade a = T/<j)a = 10.000 / 0 2 = 50.000 m2/semana. Da


equação 8.96 temos que 8r(l) = 7,065 x 103t 8r(2) = 2,926 x IO3 e 5r(3) =
2,246 x 103. Para os rebaixamentos do rio a (l) = -0,1 m, a(2) = -0,3 m e a(3)
= -0,1 m; os fluxos de retomo são calculados pela equação 8.97 e tem como
valores, respectivamente: Qr(l) = -707 m3/semana, Qr(2) = -2.412 m3/semana,
Qr(3) = -1.809 m3/semana. Note-se que os fluxos de retomo negativos indicam
fluxos de água entregues pelo aqüífero ao trecho de rio.

PROBLEMAS

1- Utilizando os dados da curva de retenção, plote a distribuição do conteúdo


volumétrico da água acima da linha de saturação, localizada 70 cm abaixo da
superfície do terreno. Supondo que a linha de saturação deva, por um processo
Água Subterrânea 329

de drenagem artificial, descer até uma profundidade de 80 cm, e permanecerem


equilíbrio daí para frente. Utilizando os conceitos básicos de porosidade
efetiva, estime o volume da água por unidade de área, que tem que ser
removido do aqüífero, através da integração gráfica das curvas de retenção.
Estime também o valor da porosidade aparente e compare-o com o valor da
porosidade efetiva.

2- Esferas sólidas e uniformes de raio R são empilhadas dentro de um cubo com


20 R de lado. O empilhamento é perfeitamente simétrico. Encontre a
porosidade. A porosidade depende do raio da esfera?

3- Explique por que a altura da franja capilar é maior num material de


textura fina do que num material de textura grossa.

4- Os seguintes dados foram colhidos numa bacia do leste dos Estados Unidos.
Encontre a descarga subterrânea média mensal em direção ao curso de água
principal que drena essa área. Prepare também a curva de descarga da água
subterrânea. A porosidade aparente do aqüífero foi estimada em 0,11 e a área
da bacia cm 50,6 km2.

5- A permeabilidade intrínseca de um meio poroso é medida com um gás de oeso


específico desprezível no aparelho mostrado na figura. A velocidade Darcy do
gás é 1,65 cm/s e a viscosidade dinâmica 10‘5 poise. Encontre a
permeabilidade intrínsica da amostra e a condutividade hidráulica para a água
(]i=0,0í poise, pg = 980 dinas/cm2)

6- Uma mangueira de 4cm de diâmetro é cheia com areia homogênea com


condutividade hidráulica 2,6 x 10a cm/s. A diferença de pressão entre os
pontos A e C é de 24cm de água. Calcule a descarga de água pela mangueira e a
pressão no ponto B, sabendo que a pressão no ponto A é de 28 cm de agua.

7- A figura é uma versão simplificada de um permeâmetro de carga variável.


Utilizando os princípios básicos, estabeleça uma relação que calcule a
condutividade hidráulica para uma perda de carga de 10 cm em 10 dias.

8- Verifique, por substituição, que exp (-x2/4at)/Vt é uma solução da equação


unidimensional de Boussinesq.

9- Verifique, por substituição, que exp (-r2/4cct)/t é uma solução da equação


radial de Boussinesq.
330 H id ro lo g ia

10- Calcule os núcleos discretos de bombeamento para n = 1,2,...,6 semanas e


r = 200m para um aqüífero homogêneo com porosidade efetiva 0,2 e
transmissividade 10000 m2/semana. Faça um gráfico com os resultados obtidos.

11- Para os seguintes esquemas de bombeamento, determine os rebaixamentos num


piezômetro localizado a 200 m de um poço de produção. Faça um gráfico dos
rebaixamentos em função do tempo (semanas)

12- Um trecho de rio com 250 m de comprimento encontra-se penetrando


profundamente num aqüífero com 100000 m2/semana de transmissividade e 0,157
de porosidade efetiva. Encontre os núcleos discretos de fluxo de retomo para
10 períodos de uma semana.

13- Utilize os núcleos discretos do exercício anterior, calcule e plote os


fluxos de retomo ao final de cada semana por 10 semanas, para os seguintes
rebaixamentos do nível do rio.

Dados do problema 1

p/pg(cm) 0(cm3/cm3)
0,0 0,43
2,2 0,425
4,2 0,421
6,2 0,414
7,7 0,408
9,7 0,401
12,7 0,392
15,8 0,384
20,0 0,374
25,0 0,362
32,0 0,348
42,0 0,331
56,0 0,313
76,0 0,300
106,0 0,281
147,0 0,264
198,0 0,251
282,0 0,240
Água Subterrânea

SAIOA
f

ENTRADA

Figura do problema 5

z
*

Figura do problema 6
332 H id ro lo g ia

A
lOcm 4
a
-h
ho = 4 0 cm

Figura do problema 7

Tabela do problema 4
Mês Linha de água (m) R ecarga (W) ETP freatófita
in íc io fim (cm/mês) (cm/mês)
Abril 14,27 13,99 2,3 2,6
Maio 13,99 14,09 5,0 1,4
Junho 14,09 13,54 0,7 4,8
Julho 13,54 13,48 3,7 3,0
Agosto 13,48 13,11 0,7 3,6
Setembro 13,11 13,14 3,0 1,8
Outubro 13,14 12,93 0,0 U
Novembro 12,93 13,23 5,0 0,9
Dezembro 13,23 13,66 7,2 0,9
Janeiro 13,66 13,72 2,7 0,3
Fevereiro 13,72 13,95 4,2 0,0
Março 13,95 14,27 4,4 1,2
Água Subterrânea 333

Dados problema 11

SEMANA VOLUME (m3)


1 100000
2 50000
3 100000
4 50000
5 100000
6 50000

Dados problema 13
SEMANA REB (m)
1 -0,1
2 -0,3
3 - 0,1
4 0,0
5 0,1
6 0,2
7
t 0,1
8 0,0
9 0,0
10 0,0

REFERÊNCIAS

1 - De WIEST, R. J. M. (1965). Geohydrology. New York: John Wiley. 366p.

2-FETTER, C.W. Jr. (1980). Applied Hydrogeology. Columbus: Charles


E. Merríl. 488p.

3 - FREEZE, R.A.; CHERRY, J.A. (1979). Groundwater. Englewood Cliffs,


Prentice-Hall, Inc. 604p.

4 - Mc WHORTER, D.B.; SUNADA, D.K. (1977). Groudwater Hydrology and


Hydraulics. Fort Collins, Water Resources Publications. 290p.

5 - TODD, D. K. (1959). Ground Water Hydrology. New York: John Wiley. 336p.

6 - WALTON, W. C (1970). Groudwater Resources Evaluation. New York:


McGraw - Hill. 664p.
Capítulo 9

INFILTRAÇÃO E ARMAZENAMENTO NO SOLO

A ndré L . da Silveira, José A. Lo uzada e Lawson F . Beltram e

9.1 Infiltração

Infiltração é a passagem de água da superfície para o interior do solo.


Portanto, é um processo que depende fundamentalmente da água disponível para
infiltrar, da natureza do solo, do estado da sua superfície e das quantidades
de água e ar, inicialmente presentes no seu interior.
A medida que a água infiltra pela superfície, as camadas superiores do
solo vão-se umedecendo de cima para baixo, alterando gradativamente o perfil
de umidade. Enquanto há aporte de água, o perfil de umidade tende à saturação
em toda a profundidade, sendo a superfície, naturalmente, o primeiro nível a
saturar. Normalmente, a infiltração decorrente de precipitações naturais não
é capaz de saturar todo o solo. restringindo-se a saturar, quando consegue,
apenas as camadas próximas à superfície, conformando um perfil típico onde o
teor de umidade decresce com a profundidade.
Quando o aporte de água à superfície cessa, isto é, deixa de haver
infiltração, a umidade no interior do solo se redistribui, evoluindo para um
perfil de umidade inverso, com menores teores de umidade próximo à superfície
e maiores nas camadas mais profundas. Nem toda umidade é drenada para as
camadas mais profundas do solo, já que parte é transferida para a atmosfera
por evapotranspiração.
Nas camadas inferiores do solo geralmente é encontrada uma zona de
saturação, mas sua influência no fenômeno da infiltração só é significativa
quando se situa a pouca profundidade.
Na figura 9.1 pode-se ver a evolução do perfil de umidade em um solo
natural sujeito à infiltração. Em um solo natural o fenômeno da infiltração
pode ser ainda mais complexo se os diversos horizontes, desde a superfície
até a zona de alteração próxima à rocha, tiverem texturas e estruturas
diferenciadas, apresentando comportamentos hidráulicos diferentes.

9.1.1 Capacidade de infiltração e taxa de infiltração

O conceito de capacidade de infiltração é aplicado no estudo da


infiltração para diferenciar o potencial que o solo tem de absorver água pela
sua superfície, em termos de lâmina por tempo, da taxa real de infiltração
336 Hidrologia

Umidade ( m-Vm3 solo)

Figura 9.1. Evolução do perfil de umidade em um solo

que acontece quando há disponibilidade de água para penetrar no solo. Uma


curva de taxas reais de infiltração no tempo somente coincide com a curva das
capacidades d e infiltração de um solo, quando o aporte superficial de água
(proveniente d e precipitações e mesmo de escoamentos superficiais de outras
áreas) tem intensidade superior ou igual à capacidade de infiltração.
Em um solo em que cessou a infiltração, parte da água no seu interior
propaga-se para camadas mais profundas e parte 6 transferida para a atmosfera
por evaporação direta ou por transpiração dos vegetais. Esse processo faz com
que o solo vá recuperando sua capacidade de infiltração, tendendo a um limite
superior à medida que as camadas superiores do solo vão-se tomando mais
secas.
Se uma precipitação atinge o solo com uma intensidade menor que a
capacidade de infiltração toda água penetra no solo, provocando uma
progressiva diminuição da própria capacidade de_. infiltração, já que o solo
está-se umedecendo. Se a precipitação continuar, pode ocorrer, dependendo da
sua intensidade, um momento em que a capacidade de infiltração diminui tanto
que sua intensidade se iguala à da precipitação. A partir deste momento,
mantendo-se a precipitação , a infiltração real se processa nas mesmas taxas
da curva da capacidade de infiltração, que passa a decrescer exponencialmente
no tempo tendendo a um valor mínimo de infiltração. A parcela não infiltrada
da precipitação forma filetes que escoam superficialmente para áreas mais
baixas, podendo infiltrar novamente, se houver condições.
Quando termina a precipitação e não há mais aporte de água à superfície
Infiltração e Armazenamento no Solo 337

do solo a taxa de infiltração real anula-se rapidamente e a capacidade de


infiltração volta a crescer, porque o solo continua a perder umidade para as
camadas mais profundas (além das perdas por evapotranspiração).
A figura 9.2 mostra o desenvolvimento típico das curvas representativas
da evolução temporal da infiltração real e da capacidade de infiltração com a
ocorrência de uma precipitação.
A curva da capacidade de infiltração como mostrada na figura 9.2 é de
difícil determinação experimental, exceto na fase em que a intensidade de
precipitação a supera. A curva exponencial desta fase tem sido estudada
isoladamente por muitos pesquisadores, mas o comportamento da capacidade de
infiltração fora deste penodo pode ser avaliado por algoritmos específicos
Há também equações deduzidas para calcular o tempo de encharcamento ou
saturação superficial, contado a partir do início da precipitação.

9.1.2 Equacionamento geral da infiltração

O equacionamento geral da infiltração é feito a partir da representação


matemática do movimento da água em solos não saturados, isto é, solos com
teor de umidade abaixo da saturação.
O movimento da água em um solo não saturado também pode ser descrito
pela equação de Barcy, originalmente deduzida para solos saturados (capítulo
8):

q = K grad h (9.1)

onde q = velocidade de Darcy; K = condutividade hidráulica do solo; h =


carga piezométrica.
Outra forma de expressão, para fluxo vertical, é dada por:

k dp
q = • - PS (9.2)
p, dz
V.

onde k = a permeabilidade intrínseca do solo; ji = a viscosidade dinâmica da


água; p = a pressão da água no interior do solo; p = a massa específica da
água; g = a aceleração da gravidade e z = a profundidade.
A permeabilidade intrínseca k depende somente das dimensões e da
geometria e organização interna dos poros do solo. Relaciona-se com a
condutividade hidráulica K pela seguinte expressão:

(9.3)
338 Hidrologia

Figura 9.2. Curvas de capacidades e taxas de infiltração.

sendo pg/p chamada de fluidez ou grau de fluidez do fluido.


A extensão da lei de Darcy para solos não saturados exige que sejam
redefinidas a condutividade hidráulica e a carga piezométrica. A conduti-
vidade hidráulica K, por exemplo, varia com o teor de umidade do solo, tendo
como limite superior a condutividade hidráulica saturada Ksat A carga
piezométrica, por sua vez, tem duas componentes principais num solo não-
saturado, em função das energias envolvidas:

h = 9 + z (9.4)

onde, cp = potencial mátrico ou de capilaridade; z = potencial gravitacional


(profundidade). O potencial mátrico geralmente é expresso como a altura de
água equivalente que exerce a mesma tensão da sucção mátrica.
Analogamente ao que acontece com as relações entre potencial mátrico e
teor de umidade, nos casos típicos de solos argilosos e arenosos, também há
distinção nas relações experimentais entre condutividade hidráulica e teor de
umidade para cada tipo de solo.
Na figura 9.3 nota-se que, apesar de um solo arenoso saturar com um teor
de umidade menor, sua condutividade hidráulica saturada é maior. A razão é
que o escoamento em meio saturado é hidraulicamente equivalente a um
escoamento sob pressão em dutos, e aquele solo que contiver poros maiores
conduzirá mais água, já que a vazão é proporcional à quarta potência do
Infiltração e Armazenamento no Solo 339

diâmetro dos canalículos; para exemplificar, são necessários 10.000


capilares de 0,01 mm de diâmetro para igualar a vazão de apenas um com
diâmetro de 0,1 mm.
Por outro lado, a condutividade hidráulica de um solo argiloso pode ser
maior que a de um solo arenoso, quando ambos estão num estado não saturado. É
o que pode ser visualizado na figura 9.4 onde são mostradas como se comportam
as curvas que relacionam a condutividade hidráulica com a sucção mátrica, em
solos argilosos e arenosos.

Figura 9.3. Condutividade hidráulica, umidade e textura.

Em um solo argiloso a condutividade hidráulica decresce mais suavemente


com o aumento da sucção mátrica, porque os poros têm um tamanho médio
reduzido e maior quantidade deles permanecem cheios mais tempo, mantendo a
condutividade de saturação em grande parte do solo. Em um solo arenoso, onde
os poros são maiores, à medida que a sucção mátrica aumenta menos poros
conseguem-se manter cheios por mais tempo, reduzindo a condutividade geral do
solo mais rapidamente. Um solo arenoso só 6 um bom dreno quando está
saturado.
Com as relações abordadas, a condutividade hidráulica de um solo não
saturado pode ser expressa tanto em função da umidade do solo quanto em
função da sucção mátrica. Entretanto, assim como há histerese na relação
entre sucção mátrica e teor de umidade o mesmo acontece entre condutividade
hidráulica e teor de umidade. Mas, uma vez estabelecida uma relação biunívoca
entre umidade e sucção mátrica, na prática significa definir relações
biunívocas entre a condutividade hidráulica e essas duas variáveis.
Para estabelecer-se a equação de variação da umidade de um solo ao longo
Hidrologia
340

do tempo basta associar a lei de Darcy com a equação da continuidade, o que


resulta em:

3© 3 d
K — (<p + z) (9 .5 )
dl dz dz

onde a expressão interna da derivada mais ampla é a taxa ou velocidade de


filtração vertical dada pela lei de Darcy, sendo © = teor de umidade em
volume de água por unidade de volume de solo e z = profundidade a partir da
superfície.

Figura 9.4. Condutividade hidráulica, sucção e textura.

Como o potencial mátrico (p está relacionado com o teor de umidade, a


seguinte relação é válida:

8(p 3cp 3© (9.6)


dz de dz

Definindo a difusividade hidráulica por D = K (3cp / 5©) e utilizando a


equação 9.6 em 9.5, resulta a equação de Richards (ou de Fokker-Planck).

3© â ^ 3 © , ^ 3K (9.7)
ã l = ã i (Dã ^ + d l
Infiltração e Armazenamento no Solo 341

A partir das equações de Darcy e de Richards é possível deduzir ou


explicar as equações de infiltração mais difundidas.

9.13 Equações para cálculo da infiltração pontual

A seguir apresentam-se algumas das várias equações já desenvolvidas para


cálculo da infiltração. Todas as equações apresentadas estão na forma que
despreza a carga de uma eventual lâmina de água sobre o solo.

Equação de Horton

A partir de experimentos de campo Horton (1939) estabeleceu, para o caso


de um solo submetido a uma precipitação com intensidade sempre superior à
capacidade de infiltração, uma relação empírica para representar o decaimento
da infiltração com o tempo (ramo B-C da figura 9.2), que pode ser apresentada
da seguinte forma:

= h + *U e * (9.8)

onde t = tempo decorrido desde a saturação superficial do solo; It= taxa de


infiltração no tempo t; \t~ taxa de infiltração inicial (t - 0); íb= taxa
mínima de infiltração (assintótica).
A taxa mínima de infiltração lb teoricamente seria igual à condutividade
hidráulica saturada se não houvesse o efeito do ar aprisionado no
interior do solo, dificultando a infiltração. Por isso Ib é normalmente menor
que Kw
A equação de Horton pode ser deduzida da equação de Richards (equação
9.7). Considerando-se constantes a difusividade hidráulica D e a
condutividade hidráulica K, a equação de Richards transforma-se na seguinte
equação de difusão:
a© = a^e (9.9)
3t ~ 2
ÕZ

A solução desta equação, para um solo homogêneo de espessura infmíta^e


permanentemente saturado na cota correspondente à superfície, é uma função
igual à de Horton com k = f (D) (Raudkivi,1979).
Essa solução demonstra que k não pode, a rigor, ser considerado como uma
constante do solo, já que a difusividade hidráulica D varia em função da
umidade e.
O ajuste da equação de Horton a dados medidos em campo nada mais é do
í
> 342 Hidrologia
i
que a determinação dos parâmetros Ij , Ib e k, a partir desses dados
\
observados. O parâmetro Ib é facilmente identificável nos experimentos,
i porque representa a condutividade hidráulica saturada aparente do solo
í (aparente porque inclui a resistência proporcionada pelo ar aprisionado nos
poros do solo natural). O parâmetro Ij também é obtido imediatamentedos
í
experimentos, porque é a taxa de infiltração inicial, isto é, a taxa de
infiltração no momento em que é atingida a saturação superficial e começa a
haver escoamento (excesso) superficial, o que equivale a dizer que I* é
>
igual à intensidade da precipitação que saturou a superfície do solo.
Estabelecidos Ib e \ resta apenas determinar o parâmetro k, o que é feito
y através do ajuste da equação 9.8 aos pontos I x t medidos em campo (ver
y exemplo 9.1).
A dificuldade de uso da equação para prever a parcela que vai infiltrar
y de uma futura precipitação reside no fato de que os ajustes prévios dos
parâmetros são profundamente dependentes das umidades do solo vigentes nos
y
ensaios de campo, além de variarem ao longo da infiltração (Parlange e
y Haverkamp, 1989). Para uma boa estimativa dos parâmetros devem ser
estabelecidas previamente relações experimentais consistentes com a umidade
y•»
inicial da camada superior do solo (aproximadamente 50 cm). Pode-se conseguir
► boas relações entre Ij e ©, mas o mesmo não é comum entre k e ©, sendo
y muitas vezes admitido para cada solo um valor médio constante de k.
Horton apresentou a seguinte expressão para o I* (Arruda, 1984)
>
-k’(©i - ©n)/©c
(9.10)
y Xi = Tb + dmur - Xb) e

y onde Imur = a capacidade de infiltração correspondente à umidade limite do


y ponto de murchamento da vegetação, k* = uma constante do solo, ©i = a umidade
inicial, ©n = a umidade higroscdpica e ©c — a umidade correspondente à
y capacidade de campot isto é, a umidade remanescente quando o solo foi drenado
y por gravidade.
Como Horton não desenvolveu o conceito de tempo de encharcamento, seu
y método compara a intensidade de precipitação P com a capacidade de
y infiltração Ij, dada pela equação 9.10, para determinar a infiltração. Se
P<Ii( a taxa de infiltração é a própria P. Para P^Ij a infiltração segue a
y
equação 9.8.
»
Integrando a equação 9.8 com respeito ao tempo obtém-se a equação dos
y volumes infiltrados acumulados no tempo:

y I; - L
y V
f
(1 - e'13) + I t
b
(9.11)
k
Infiltração e Armazenamento no Solo 343

onde Vf — o volume uifiltrado acumulado até a tempo t, contado a partir do


momento em que houve a saturação superficial do solo.

Exemplo 9.1. Ajuste a equação de Horton aos dados da tabela 9.1.

Tabela 9.1 Dados do exemplo 9.1


t P Vobs Vcal
(min) (mm/h) (mm) (mm)
00 38 0,00
06 38 3,80 3,80
10 55 6,14 6,13
14
oo
m

55 8,07
18 55 9,90 9,91
22 55 11,54 11,52
26 55 13,01 13,01
30 55 14,43 14,41
34 55 15,76 15,76
38 55 17,08 17,06
42 55 18,38 18,33

Solução: com a precipitação de 38 mm/h o solo saturou-se superficialmente ac


final do sexto minuto. Portanto, é possível ajustar a equação de Horton para
t 2: 6 min. A equação a ajustar é a equação 9.11 que relaciona o total
infiltrado com o tempo contado desde o momento da saturação superficial. Por
isso, para o ajuste, o t da equação 9.11 deve ser substituído por t - tp ,
onde tp é o tempo de encharcamento, no caso igual a 6 min ou 0,1 h. O ajuste
da equação 9.11 significa determinar os parâmetros li, Ib e k que produzem a
melhor aderência aos dados observados. O grau de aderência pode ser medido
pelo coeficiente de determinação R2 = 1 • N/D, onde o numerador N é o
somatório dos quadrados das diferenças entre os volumes infiltrados
observados e calculados, e o denominador D é o somatório dos quadrados das
diferenças dos volumes infiltrados observados em relação à sua média. Quanto
melhor a aderência mais próximo de 1 é o R2. Com este critério o ajuste da
equação 9.11 pode ser feito por métodos matemáticos de otimização ou por
tentativas, escolhendo-se diferentes valores para li , Ib e k e testando-
se o R2. Por esta última forma obteve-se o seguinte ajuste:

li = 38 mm/h ; k = 5,1/h
Ib = 18 mm/h ; R2 = 0,99996

No ajuste, a variável tempo foi tomada em horas e as lâminas infiltradas


344 H id r o lo g ia

em mm. Os volumes calculados são apresentados na tabela 9.1

Algoritmo de Berthelot: Berthelot (1970) propôs um algoritmo para calcular a


infiltração (entrada) e a percolação (saída) de água na camada superior do
solo, combinando, num balanço hídrico, a equação da continuidade, a equação
de Horton e uma equação empírica para a percolação. O algoritmo calcula a
capacidade de infiltração a qualquer tempo, inclusive nos períodos sem
precipitação, permitindo definir os instantes de tempo onde a intensidade da
precipitação supera a capacidade de infiltração, quando passam a vigorar as
taxas de infiltração dadas pela lei de Horton. Enquanto a intensidade da
precipitação é menor que a capacidade de infiltração calculada, toda chuva
infiltra.
O algoritmo de Berthelot é bastante conveniente à simulação matemática
do escoamento em bacias hidrográficas, porque além de avaliar o que infiltra
ou vai escoar superficialmente também determina a percolação que vai compor o
escoamento subterrâneo ou de base. Conforme a descrição realizada por Tucci
(1979), as equações básicas do algoritmo de Berthelot são as seguintes:

(9.12)
^ = I - T
dt

(9.13)
i = ib + a 0 - v h(£~to)

T = Ib (1 - h0 ' ^ ) (9.14)

sendo: S = lâmina de água armazenada no solo; I = capacidade de infiltração


(lâmina de água/tempo); T = taxa de percolação (lâmina de água/tempo); h=e ;
t = instante de tempo no qual o solo está na capacidade de campo (não há
percolação); I = capacidade de infiltração quando o solo atinge a capacidade
de campo.
Introduzindo-se as expressões 9.13 e 9.14 na equação 9.12 e, logo a
seguir, explicitando S por integração no tempo, entre t e t, obtém-se:

S = S + — [h(t' to)- 1] (9.15)


o ulh

com S sendo a capacidade de campo ( t = to),


o
A equação 9.15 prediz o armazenamento em função do tempo decorrido
desde o estado de capacidade de campo, estando o solo submetido neste período
■ -5*

Infiltração e Armazenamento no Solo 345

às taxas de infiltração da equação de Horton. Admitir a validade da equação


de Horton desde o momento em que o solo atinge a capacidade de campo é uma
simplificação adotada pelo algoritmo, porque d a só valería a partir do
momento em que a precipitação consegue saturar uma fina camada superficial do
solo.
Combinando a equação 9.15 , tanto com a equação de Horton (equação 9.13)
como com a equação da percolação (equação 9.14), chega-se, respectívamente,
às seguintes funções, que completam, ao lado das equações 9.13 e 9.14 o
conjunto de equações básicas do algoritmo de Berthelot (1970):

S = a + bl (9.16)
i i

S = a + bT (9,17)
t t

onde
r
S a = S
O !nh(I - I ) ’ i 0
o fc>

I .TA
b = h o
i inh(I - I ) ’ t I lnh
o b

Os coeficientes a., b. , a e b são constantes do solo e, portanto, as


i i
funções 9.16 e 9.17 são equações de retas.
A figura 9.5 mostra graficamente (linhas cheias) a forma das quatro
funções básicas do algoritmo de Berthelot.
O armazenamento máximo ocorre quando I = I e T = I , obtendo-se o
b b
mesmo valor tanto pela equação 9.16 como pela equação 9.17:
I
S = S - ~ (9.18)
m ax o in n

lembrando que lnh é sempre negativo.


No intervalo anterior a t = t , o solo está com umidade abaixo da
o
capacidade de campo, não havendo, portanto, percolação e reduzindo a equação
da continuidade para:

(9.19)
dt
346 Hidrologia

No intervalo 0^ t o algoritmo novamente admite a validade da lei de


o
Horton em estágios de umidade abaixo da capacidade de campo (trecho tracejado
na figura 9.5), com a seguinte expressão:

I = Ib + dmax ' Jb) ^ (9-20)

onde 1^*= a capacidade de infiltração para o solo seco, admitindo-se esta


situação ocorrendo em t = 0 .
Substituindo-se I da equação 9.19 pela expressão da equação 9.20 c
integrando entre t= 0 e t = t resulta na função de armazenamento abaixo,
o
que não é uma reta:

i - ib
S= Ib l n ----------- + I - I,max (9.21)
lnh
w -h

Algoritmo: dada a precipitação de intensidade Pt , constante entre t e t +


At (At sendo o intervalo de tempo entre t e t+1), podem ocorrer os
seguintes casos:
Infiltração e Armazenamento no Solo 347

1 - Intensidade da precipitação, no instante t, maior ou igual à capacidade


de infiltração no mesmo instante (Pt=tlt). Neste caso a infiltração é
calculada para o instante t + 1 pela equação de Horton abaixo:

At
it+i = ib + d t- ib) h (9 .22)

Na seqüência dos cálculos podem ocorrer as seguintes situações:

a) Se S ^ S 0 calcula-se St+1 pela equação 9.16 , entrando com o valor de It+1


. Após, calcula-se Tt+1 pela equação 9.17 , utilizando o valor calculado de
St+1. A lâmina infiltrada entre t e t+1 é calculada pela integração da
equação de Horton, dada por:

) (9.23)
lnh

A lâmina de água que vai escoar superficialmente no At é, naturalmente,


o que não infiltrou:

V = P At - V (9.24)
e i

O algoritmo fornece também a expressão da lâmina d’água percolada no At


para as camadas mais profundas:

V = V - s + s (9.25)
perc i i+1

b) Se St<S0 e Il+1>I0 , significa que a percolação no fim do intervalo At é


nula: Tl+1= 0. Sl+1 , então, deve ser calculado pela expressão 9.21. Se St<S0
e I[+1<I0 os valores de Sl+1 , T[+1, Vj , Ve são obtidos como no caso a. O
volume percolado é calculado pela equação 9.25.

2 - Quando Pt<It , admite-se inicialmente que toda a precipitação se infiltra


no At. A equação da continuidade pode ter então duas situações:

a) Quando S
O
T + T
t+1
^t+l - + í\A t At (9.26)
2
348 Hidrologia

A capacidade de infiltração no fim do intervalo de tempo é obtida pela


equação 9.16. Se o valor obtido para It+1 é maior que Pt significa que
realmente toda precipitação infiltra no At. Neste caso a percolação é obtida
pela equação 9.17 , o volume percolado pela equação 9.25 e o volume
superficial é nulo. Se o valor obtido para It+l é menor que Pt deve ser
calculado o intervalo At* para identificar o instante de tempo em que a
intensidade da precipitação passa a superar a capacidade de infiltração.
Neste instante há a intersecção 1= P , obtendo-se Stx pela equação 9.16 e Tu
pela equação 9.17. Estes valores introduzidos na equação da continuidade
permitem estabelecer:

2bt(Stx - S,)
At = -------------------- (9.27)
2Pbt + 2a, - Su - S,

As variáveis no fim do intervalo Aí podem ser calculadas como no caso 1,


item a, substituindo o At por At-At*. Os volumes são obtidos pela soma dos
dois subintervalos.
Na figura 9.6 pode-se visualizar este caso.

b) Quando SL<S0

Sí+l = St + P(At (9.28)

Neste caso It+1 é obtido pela solução da equação 9.21. Se o valor obtido
de Il+1 é maior que Pt os volumes superficial e percolado são nulos. Se Il+1<
Pt há um intervalo A^ que identifica o instante em que I = P. Utilizando a
equação da continuidade acima (equação 9.28) determina-se:

S - S
At 1 (9-29)
x Pt

Os parâmetros a serem ajustados por medidas de campo são Imax, I0 , Ib e


k. Os outros parâmetros que aparecem podem ser determinados em função desses,
S0 é determinado pela equação 9.21 quando I = Io. O instante t0 é determinado
pela equação 9.13.
Infiltração e Armazenamento no Solo 349

Equação de Green e Ampt

Essa equação é derivada da equação de Darcy através de simplificações no


fenômeno da propagação da frente de umidade no interior do solo. Basicamente
estas simplificações são as seguintes:

- O solo é considerado totalmente saturado da superfície à


profundidade da frente de molhamento; abaixo, o solo continua com a
umidade de antes da precipitação. A medida que a frente de umidade se
aprofunda permanecem válidas essas condições;
- Na superfície da frente de umidade, que separa o solo saturado do não-
saturado, a tensão capilar é sempre á mesma, a qualquer posição e tempo
da frente.

Em resumo, é um pistão de água preenchendo os poros do solo succionado


para baixo com uma tensão constante.
Da superfície até a profundidade L da frente de umidade, o potencial
capilar tp passa de zero para um valor cpf e o potencial gravitacional varia
de zero a L. As variações destas grandezas entre a superfície e a
profundidade da frente de umidade são d<p/dz = cp^/L e õz/dz =L/L.
Substituindo-se essas relações na equação de Darcy, obtém-se então a equação
de Green e Ampt:

cp+ L
Yf
I = K’ (9.30)
L
H id ro lo g ia
350

onde I - taxa de infiltração; K’= condutividade hidráulica saturada aparente


do solo (equivale ao Ib de Horton).
O volume infiltrado acumulado pelo método de Green e Ampt é dado por.

V f = L ( e ’- ©;) (9.31)

onde Vf = lâmina d’água de saturação da camada L de solo; e ’ = =


teor máximo de umidade; © ^ = volume de vazios por unidade de volume de
solo; ©„ = ar aprisionado por unidade de volume de solo; e ~ teor de umidade
inicial do solo .. „ .v
A equação 9.30 pode ser escrita como (Morel-Seytoux e Khanji, ly/nj.

Sf + v f
I = K3 (9.32)
V
f

Sf = (©’ - ©i) <Pf (9.33)

onde Sf é um fator de sucção-armazenamento.


Isolando-se Vf na equação 9.32 chega-se a

Sf
(9.34)
vf -
I/KM

No momento da saturação superficial a equação 9.34 toma a seguinte


forma:

Sf
v = ----- — (9.35)
p r/KM

sendo Vp = o volume infiltrado desde o início da precipitação até a saturação


superficial e r, a intensidade constante da precipitação que infiltra toda
neste período (I=r).
Foi este o raciocínio desenvolvido por Mein e Larson (1973) na dedução
da seguinte expressão do tempo de encharcamento:
Infiltração e Armazenamento no Solo 351

lembrando que tp = Vp/I e I=r.


Voltando à equação 9.32, nota-se nela a dependência do valor da taxa de
infiltração I em função do volume já infiltrado Vf e da umidade inicial e-v o
que não ocorre com a equação de Horton. Também verifica-se que, se Vf toma-
se grande, isto é, quando a infiltração se processa há bastante tempo, a taxa
de infiltração tende a igualar K \ Na comparação com a equação de Horton,
comprova-se então que K’ é equivalente ao Ib.
Como I = dVj/ dt, pode-se obter por integração uma equação implícita de
V dada por:

Vf
K’t = Vf - Sf ln ( 1 + — ) (9.37)
sf

O ajuste dessa equação do método de Green e Ampt a dados medidos em


campo por infiltrômetros significa determinar os parâmetros Sf e K \ A
exemplo do Ib de Horton, K’ pode ser estimado mais facilmente porque
representa a condutividade hidráulica saturada aparente do solo. Por
tentativas é possível determinar os parâmetros Sf e K* que produzem a curva
teórica de Vf x t que melhor se ajusta aos dados medidos.
Rawls e Brakensick (1989) apresentaram ábacos de estimativa da sucção <pf
e da condutividade hidráulica K \ com base na porcentagem de argila e areia
do solo. Com estes ábacos mais um outro, da porosidade (<(>), que corresponde
ao ©sai, pode-se calcular a infiltração decorrente de uma precipitação, desde
que se conheça a textura do solo (ver exemplo 9.3). Os ábacos referidos estão
desenhados na figura 9.7. O uso dos valores contidos nesses ábacos deve ser
feito com cuidado pois não há, por exemplo, referência à estrutura do solo, o
que pode modificar sensivelmente os parâmetros de infiltração.

Exemplo 9.2. Ajuste a equação de Green-Ampt aos dados do exemplo 9.1.

Solução: a sistemática de ajuste da equação 9.37 é a mesma do exemplo 9.1,


com a diferença de t ser a variável para averiguação da aderência na
expressão do R2. Por tentativas, obteve-se o seguinte ajuste:

Sf = 1,65 mm ; K’ — 18 mm/h ; R2 = 0,99842

Os resultados são apresentados na tabela 9.2.


No ajuste usou-se t - tp no lugar de t, na equação 9.37, sendo o
tempo de saturação superficial, igual a ó min ou 0,1 h.
Hidrologia

°/o A R E I A
20 40 60 00 100

<
o
cc
<

Figura 9.7. Ábacos de Rawls e Brakensiek (1989).


Infiltração e Armazenamento no Solo 353

Tabela 9.2. Resultados do exemplo 9.2

*obs *c alc v ob»


(min) (min) (mm)
06 6,00 3,80
10 8,94 6,14
14 13,21 8,07
18 17,83 9,90
22 22/24 11,54
26 26,34 13,01
30 30339 14,43
34 34,26 15,76
38 38,15 17,08
42 42,03 18,38

Exemplo 93. Calcule, por Green-Ampt, os volumes infiltrados aos lOmin,


30min e 1 h, em um solo com 40% de argila e 50% de areia, com umidade inicial
de 0,30 m3/m3, desde o início da precipitação constante dc intensidade
40mm/h, Use os ábacos de Rawls c Brakensiek (1989).

Solução: para a textura indicada, rctiram-se dos ábacos as seguintes


informações: <pf=260mm, K’ = 1,8 mm/h e 0 sal = 0,45. Dcsprczando-se o volume
de ar aprisionado, o fator de sucção-armazcnamcnto, calculado pela equação
9.33, tem o seguinte valor:

Sf = ( 0,45 - 0,30 ).260 = 39mm

O tempo de encharcamento segundo a expressão 9.36 é:

1 39
t = ----------------- = 0,046 horas = 2,76 min
y 40 40/1.8 - 1

Para cálculo dos volumes infiltrados aos 10 min., 30 min. e 1 h a equação


9.37 não pode ser aplicada, já que na sua derivação está implícito que a satura­
ção da camada superior do solo é instantânea (tp = 0).
Para obter a função Vf = f (t) quando > 0 devemos novamente integrar
a função I - f (Vf), sendo os limites inferiores de integração t = tp c Vf =
Vp e não mais t = 0 e Vf = 0, valores utilizados para obtenção da equação
9.37.
354 Hidrologia

Integrando a equação 9.32 (I = dVf/dt) p?-a os limites indicados


obtemos:

K’(t - tp) = Vf - Vp - Sf ln [(Vf + S,)/(Vp +Sf)]

Nesta equação Vf é a lâmina infiltrada até o instante t = ^ .


Como essa equação é implícita em Vf, os resultados do exercício
apresentados a seguir foram obtidos por tentativas.

^ = 0,046 h
Vp = i tp = 1,84 mm

Vf (t= 10 min) = 4,68 mm


Vf (t= 30 min) = 8,76 mm
Vf (t= 60 min) = 12,92 mm

Equação de Philip

Philip (1957) resolveu analiticamente a equação de Richards, propondo


como solução, para a condição de contomo de saturação permanente na
superfície do solo, uma série do tipo:

z(e,t) = a(©)t1/f2 + b(©)t + c(e)t3^ + ... (9.38)

A partir dessa série é possível deduzir que a taxa de infiltração tem a


seguinte expressão:

1 = C vW + A + D t1' 2 + E t + ... (9.39)

onde t é o tempo decorrido desde o início da infiltração e C, A, D e E são


coeficientes que dependem do meio poroso.
A série acima dá altas taxas de infiltração iniciais, mas oferece
resultados totalmente incoerentes para tempos maiores, porque prediz altas
taxas de infiltração para tempos longos, quando a experiência indica um
decaimento, Essa incoerência advém do próprio método de solução utilizado, o
método das perturbações, onde a gravidade foi considerada como uma pequena
perturbação em relação à capilaridade, o que não é verdade quando o solo
encaminha-se para a saturação.
O procedimento utilizado para contornar esse problema é o truncamento da
série, mantendo-a até o termo A, inclusive. Esse termo, então, passa a ser
Infiltração c Armazenamento no Solo

interpretado come a taxa residual de infiltração equivalente ao Ib de Horton


e ao K ’ da equação de Green e Ampt apresentada anteriorraente
seguinte:V° Ume cumulado deduzido da série truncada é O

Vf = S t1/2 + A t
(9.40)

onde S - 2C é definida como a absortividade do solo.


Introduzindo a absortividade na equação da taxa de
se: infiltração, obtém-
1
I = - S t xa + A
2 (9.41)

O ajuste dessa equação a dados medidos em campo é análogo aos


antenores, sendo A equivalente ao K'(Green e Ampt) e ao I (Horton). Os
parâmetros A e S são os parâmetros de ajuste neste caso
Por analogia com a equação 9.37 de Green-Ampt é possível estabelecer a
seguinte relação aproximada (Parlange e Haverkamp, 1989)

S2 = 2 K’Sf
(9.42)

que pode não se verificar quando S e Sf são ajustados independentemente


através das equações 9.40 (Philip) e 9.37 (Green-Ampt), respectivamente, para
a mesma série de dados observados.
Existem na literatura várias equações empíricas que derivam ou se
assemelham à solução de Philip. Um exemplo 6 a fórmula de Kostyakov, de 1932
que tem a seguinte expressão:
v - J3
f a 1 (9.43)

onde a e b são parâmetros empíricos.

Exemplo 9.4. Ajuste a equação de Philip (eq. 9.40) aos dados do exemplo 9.1.

Solução: a maneira de ajustar é a mesma do exemplo 9.1. Por tentativas,


obtéve-se: S = 5 2 mmyh1/2; A = 18 mm/h ; R2 = 0,99957. Os valores estão na
tabela 9.3.
No ajuste, o t da equação 9.40 foi substituído por t - tp, já que tp = 6
nun ou 0,1 h é o tempo gasto até a saturação superficial.
Hidrologia
356

Tabela 9.3. Resultados do exemplo 9.4

t obs *c a Ic bs
(min) (min) ( mm)
06 3,80 3,80
10 6,14 6,34
14 8,07 8,10
18 9,90 9,73
22 11,54 11,29
26 13,01 12,80
30 14,43 14,29
34 15,76 15,75
38 17,08 17,20
42 18,38 18,63

9.2 Armazenamento de água no solo

9.2.1 Redístribuição interna

Após cessada a precipitação ou irrigação e a reserva de água na


superfície do solo, chegamos ao final do processo de infiltração. Isso não
implíca, entretanto, que o movimento da água no interior do solo tambóm deixe
de existir. A camada superior do solo que foi quase ou totalmentc saturada
durante a infiltração não retém toda esta água, surgindo um movimento
descendente em resposta aos gradientes gravitacional e de pressão. Esse
movimento da água no perfil do solo, após cessada a infiltração, é denominado
drenagem ou redístribuição intema. Dependendo das condições existentes, a
velocidade com que a redístribuição ocorre pode ser apreciável por muitos
dias ou tomar-se rapidamente desprezível. A intensidade da redístribuição e
sua duração determinam a capacidade de armazenamento do solo. Essa é uma
propriedade importante no estudo de diversas questões da engenharia de
recursos hídricos, tomando-se fundamental em projetos de imgação.
A partir dos conceitos apresentados fica claro que o armazenamento não 6
um problema de estática, mas sim um fenômeno temporário ditado pela dinâmica
da água no solo. Esse fato complica sua descrição matemática, o que fez com
que ao longo do tempo fossem introduzidos conceitos não rigorosamente
corretos, mas aceitáveis do ponto de vista prático. Este é o caso do conceito
de capacidade de campo, que será discutido a seguir. A redístribuição intema
tem sua velocidade diminuída com o tempo, até que atinge valores
desprezíveis. A partir desta constatação, definiu-se capacidade de campo como
a água retida pelo solo a partir do instante em que a redístribuição "cessa"
Infiltração e Armazenamento no Solo 357

do ponto de vista prático. Esse conceito implica a utilização de critérios


subjetivos (afinal, o que é desprezível ?) quando da quantificação da umidade
coirespondente à capacidade de campo. Na realidade o processo de
redistribuição, e conseqüentemente da variação do amazenamento, é contínuo
sem que apresente interrupções ou níveis estáticos. Apesar das limitações, o
conceito de capacidade de campo é aceito para definir o limite superior de
água que um solo pode reter. Sua aplicação é mais válida em solos de textura
grossa, já que nestes a diminuição da umidade implica um rápido decréscimo da
condutividade hidráulica, com o fluxo interno tomando-se rapidamente muito
pequeno. Em solos com textura média ou fina o processo de redistribuição pode
persistir de maneira apreciável por um longo período de tempo.
Reichardt (1990) sugere a determinação da capacidade de campo em áreas
de 4 m2 à 25 m2. O solo deve ser saturado até uma profundidade de 3/2 de z,
sendo z a profundidade de interesse, e coberto com lona plástica ou restos de
matéria orgânica para evitar a evaporação. Após 2 à 3 dias^io caso de solos
arenosos, ou 4 à 7 dias para solos argilosos, determina-se a umidade média do
perfil de interesse. Essa determinação deve compreender um mínimo de três
pontos distando mais de um metro entre si, e diferentes profundidades
compreendidas entre zero (superfície do solo) e z. O valor médio, assim
obtido, indicará a umidade correspondente à capacidade de campo.
Outra possibilidade para determinação da capacidade de campo é através
do conhecimento da função que relaciona umidade (e) e pressão capilar (Pc). O
valor de 0 para o qual de/dPc => 0 corresponde à capacidade de campo.
A relação entre Q c Pc é cxtrcmamcnte importante para que se tenha uma
melhor compreensão das interações solo-ar-água. Se considerarmos um solo
inicialmente saturado, o processo de dessaturação (substituição da água pelo
ar) só será significativo quando a diferença entre a pressão do ar e a
pressão da água for suficiente para retirar a água dos poros maiores. A
medida que o processo evoluir a água ocupará poros cada vez menores,com o que
o decréscimo da umidade será acompanhado pelo crescimento da diferença entre
as pressões do ar e da água. Essa diferença é, por definição, a pressão
capilar. Tomando a pressão do ar igual a zero (pressão relativa), temos que a
pressão capilar é a própria pressão da água. Como essa pressão é negativa,
também é comum denominá-la de tensão ou sucção>
A questão que envolve a capacidade do solo reter água não se explica
somente pela capilaridade, mas também pela adsorção. Por isso alguns
estudiosos do assunto preferem dizer que a umidade do solo relaciona-se com a
sucção (ou tensão) matricial e não com a pressão (ou tensão ou sucção)
capilar.O termo matricial diz respeito à matriz do solo. Na parte onde
tratamos do armazenamento da água no solo, vamos admitir que pressão capilar
e sucção matricial são sinônimos.
358 Hidrologia

Pelo exposto, a função © = f(Pç) é fundamental para o estudo da


capacidade de armazenamento do solo. Nos itens que seguem vamos apresentar
conceitos e métodos para determinação da umidade do solo, da pressão capilar
e das suas relações.

9.2.2 Umidade do solo: conceitos e métodos

A umidade do solo pode ser expressa com base na massa ou no volume de


água. A umidade que tem como referência a massa (umidade gravimétrica), é
definida como a relação entre a massa de água e a massa de solo seco. A
umidade que tem como referência o volume (umidade volumétrica), é definida
como a relação entre o volume de água e o volume total (volumes sólido, de ar
e de água). As equações que seguem sintetizam esses conceitos.

m,a
w = (9.44)
m,s

Va
(9.45)

onde, w = umidade gravimétrica, ma = massa de água, ms = massa de solo seco,


9 = umidade volumétrica, Va = volume de água e VT = volume total
As umidades gravimétrica e volumétrica podem ser relacionadas com a
equação:
ds
0 = W * (9.46)

onde ds = densidade do solo e d a = densidade da água^endo:

(9.47)

da (9.48)
Va

Outra relação importante do ponto de vista prático é a que ocorre entre


a umidade volumétrica, a saturação e a porosidade. A saturação é definida
pela relação entre o volume de água e o volume de vazios (volumes de ar e
Infiltração e Armazenamento no Solo 359

água), enquanto a porosidade é definida pela relação entre o volume de vazios


e o volume total. A partir destes conceitos, a seguinte relação pode ser
estabelecida:
© = <j> . S (9.49)

sendo $ a porosidade e S a saturação.


A determinação da umidade do solo em laboratório é um processo bastante
simples. A amostra de solo deve ser coletada (por exemplo,com a utilização de
trado) e sua umidade preservada durante a condução ao laboratório. A pesagem
da amostra antes e depois de seca em estufa (geralmente durante 24h à 105 °C)
permite a determinação da umidade gravimétrica. A determinação da umidade
volumétrica exige ainda o conhecimento do volume da amostra coletada. Esses
procedimentos são laboriosos, lentos e sujeitos a erros de amostragem.

Exemplo 9.5. Vamos supor que uma amostra de solo tenha sido coletada num
anel com volume de 300 cm3. Conduzida ao laboratório, registrou-se uma massa
úmida de 500 g,e após seca em estufa a massa foi de 410 g. A partir dessas
informações determine as umidades gravimétrica e volumétrica.

Solução: ma = 500 - 410; ma = 90 g; w = 90/410; w - 21.95%; ds = 410/300;


ds = 1.37 g/cm3. Admitindo que da - 1 g/cm3, © = 0.2195 . 1.37 = 30%

Dentre os métodos de campo destaca-se a utilização da sonda de nêutrons.


Esse equipamento permite a determinação da umidade volumétrica utilizando uma
fonte de nêutrons rápidos e um detector de nêutrons lentos. Os nêutrons
rápidos são emitidos e se dispersam no solo em todas as direções. A medida em
que há colisão com corpos do solo ocorre uma perda de energia cinética. Essa
perda é máxima sempre que o nêutron colide com uma partícula de massa e
tamanho iguais à sua. Alguns desses nêutrons desacelerados retomam à sonda,
onde são contados por um medidor. A densidade de nêutrons lentos é
diretamente proporcional à presença de hidrogênio, o que permite, dispondo-se
de uma caíibração prévia do equipamento, correlacioná-la com a umidade
volumétrica do solo. A utilização da sonda possibilita a repetição periódica
das medições nos mesmos locais e profundidades, envolvendo um volume
representativo de solo e sem os inconvenientes da coleta e transporte de
amostras.
; Outros métodos, utilizados com menor frequência, correlacionam a umidade
do solo com a resistência elétrica e com a atenuação de raios gamma.
360 Hidrologia

9-2*3 Curva de retenção da água no solo

Como o conteúdo de água no solo é função do tamanho e do volume dos


poros que a contêm, a umidade está intimamente relacionada com a pressão
capilar. No item anterior vimos métodos direto (gravimétrico) e indireto
(sonda) que permitem a estimativa da umidade do solo de forma simples. No
caso da determinação da pressão da água (tensão) também dispõe-se de um
método direto e bastante simples, todavia com restrições importantes. Essa
determinação direta utiliza o tensiômetro, equipamento constituído de uma
cápsula porosa na extremidade inferior conectada a um vacuômetro. Quando
colocado no solo, a água contida na cápsula tende a entrar em equilíbrio com
a pressão da água do solo, o que permite a leitura desta através do
vacuômetro. As maiores limitações do tensiômetro são: o intervalo da leitura
das pressões e o tempo de resposta. No caso da pressão, a leitura está
limitada a valores menores que uma atmosfera. Já em relação ao tempo de
resposta, o registro pelo tensiômetro da pressão de equilíbrio pode demorar
algumas horas, ou, em situações extremas, mesmo alguns dias. Um exemplo de
aplicação do tensiômetro é a determinação do momento de irrigar, conhecida a
pressão da água até a qual a planta apresenta um desenvolvimento
satisfatório. Como limitação prática dessa aplicação, temos que a pressão de
referência deve ser inferior a uma atmosfera.
Uma forma indireta de determinar a pressão capilar consiste em
relacicná-la com a umidade do solo. Essa função é conhecida como curva dc
retenção ou curva característica da água no solo. Sua determinação é feita cm
laboratório através da drenagem crescente de uma amostra inicialmcntc
saturada, ou do umidecimento gradual de uma amostra inicialmente seca. Os
dois métodos fornecem curvas contínuas mas não idênticas. O conteúdo de água
correspondente a uma dada pressão é maior na dessorção (drenagem) do que na
sorção (umidecimento). Essa dependência em relação à direção do processo de
determinação é denominado histerese, fenômeno resultante da diferença entre o
ângulo de contato da água que avança e o da água que recua. A figura 9.8
mostra o comportamento típico de curvas de retenção obtidas em processos de
drenagem e infiltração.
Uma questão importante para o entendimento da relação entre a umidade e
a pressão capilar é relacioná-la com a textura do solo. Em um solo arenoso
predominam os poros grandes, o que faz com o decréscimo de umidade motivado
pelo incremento da pressão seja abrupto. Isso explica o pequeno armazenamento
destes solos mesmo a baixas pressões. Já em solos argilosos as curvas de
retenção mostram a diminuição graduai da umidade, devido à presença de um
grande número de poros com pequenas dimensões. A figura 9.9 ilustra essa
dependência entre o armazenamento , a pressão e a textura do solo.
A determinação da curva de retenção em laboratório tem como princípio
básico a criação de um gradiente de pressão entre as duas faces da amostra de
Infiltração e Armazenamento no Solo

( c m)
capilar
Pressão

Figura 9.8. Curva de retenção da água no solo.


capilar
Pressão

Figura 9.9. Curva de retenção e textura.


362 Hidrologia

solo. No caso da utilização do prato de sucção o gradiente é criado através


do controle da pressão da água (coluna h da figura 9.10-a)f enquanto nas
panelas de pressão tem-se controle sobre a pressão do ar (compressor da
figura 9.10-b). Em geral o interesse é pelo conhecimento das curvas que
retratam uma drenagem progressiva. Para este caso as amostras de solo
coletadas com estrutura inalterada devem ser previamente saturadas, e
submetidas a um conjunto de pressões dentro do intervalo de interesse. Para
cada pressão aplicada,transcorrido um determinado intervalo de tempo, será
atingida uma condição de equilíbrio, o que poderá ser constatado pelo fim da
drenagem da amostra. Para cada condição de equilíbrio teremos um ponto da
curva formado pela pressão aplicada e a umidade correspondente. Ao final do
ensaio o conjunto de pontos obtidos define a relação entre a umidade e a
pressão capilar. A figura 9.10 apresenta de forma esquemática os equipamentos
de laboratório utilizados na determinação da curva de retenção.
Há na literatura uma série de tentativas de expressar a relação entre a
umidade e a pressão capilar através de equações empíricas. Dentre as mais
aceitas, destacamos as equações de Genuchten e Brooks-Corey.
Genuchten (1980) apresenta a seguinte equação para definir a relação
entre a umidade e a pressão capilar:

© s -© r

© = or + (9.50)
[i+(p.pc) T

onde Pc = pressão capilar (cm,cm sinal positivo),© = umidade volumétrica


(cm3/cm3), ©r= umidade volumétrica residual ou umidade volumétrica
correspondente à capacidade de campo (cm3/cm3),©s = umidade volumétrica
correspondente à saturação (cm3/cm3) e (3, m e n são parâmetros que podem ser
obtidos por regressão a partir de dados experimentais de © e Pc.
Brooks e Corey (1966) apresentaram a seguinte equação para estimar o
comportamento da relação entre © e Pc:

; Pc * Pb (9*51)

sendo a saturação efetiva (Se) definida por:


s -sr
Infiltração e Armazenamento no Solo 363

P otm

A m oi tra
de tolo

Prato c e r â m ic o
p oroto

a- Prato de sucção

Am o t tr o
de solo

P ro t o cerâm ic o
p o ro s o

b- Panela de pressão

Figura 9.10. Equipamentos para determinação da curva de retenção.


364 Hidrologia

onde S = saturação, $r = saturação residual (saturação correspondente à


capacidade de campo) e Pb e X são parâmetros que devem ser determinados a
partir de dados experimentais de © e Pc. O parâmetro X 6 denominado índice de
distribuição do tamanho dos poros, enquanto Pb é um valor crítico de Pc a
partir do qual efetivamente ocorre dessaturação.A estimativa desses
parâmetros, segundo um procedimento gráfico, tem como base a equação 9.51
reescrita como segue:

ln Se = -X In Pe + X ln Pb í9-53)

Plotando em escala bilogaritmica os correspondentes valores de Sc e Pc,


constata-se a tendência a uma reta para Pc £ Pb. O prolongamento da reta
define o valor de Pb no ponto de intersecção com o eixo dos valores de Pc, e
X é o coeficiente angular da reta. A figura 9.11 ilustra o procedimento
anteriormente descrito.

ln Pc

In Se V

Figura 9.11. Estimativa dos parâmetros de Brooks e Corey.

Tanto na estimativa dos parâmetros da equação de Genuchten (m,n e jj)


como da equação de Brooks e Corey (Pb e X)y assumimos que os valores de 6 (es
= <f>) e ©r tenham sido estimados previamente.No caso de Qr há a possibilidade
de que este valor seja estimado por tentativas, paralelamente aos demais
parâmetros. Nesse procedimento altera-se o valor de ©r até que se obtenha o
melhor ajuste entre os pontos experimentais e os pontos calculados.
Infiltração e Armazenamento no Solo 365

Exemplo 9.6. Na tabela 9.4 são apresentados valores experimentais da função e


= f (Pç). A partir desses dados estime os parâmetros X e Pb, sabendo que 4> =
44,30 % e 0 r = 12,23 %.

Tabela 9.4. Dados do exemplo 9.6


e (%) Pe(cm)

43,90 10,90
4333 13,00
42,93 14,10
42,62 15,00
42,13 16,00
40,93 17,00
38,59 18,40
24,90 23,60
1858 3030
15,42 37,70
13,42 53,70

Solução: paxa estimativa dos parâmetros X e Pb é necessário que se faça a


plotagcm da função Sc - f(PG) em escala log-log. A cada valor de © informado
corresponde um valor de Sc , que deve ser obtido pela aplicação consecutiva
das equações 9.49 e 9.52. Na tabela 95 são apresentados os valores de S, Se
e P . A partir da determinação dos pares de pontos (SCJ?C) e da aplicação do
procedimento gráfico já descrito , obtém-se Pb = 17 cm e X - 2.9.

92.4 Perfis de umidade

Em algumas situações práticas há interesse na determinação da umidade do


solo em diferentes profundidades e ao longo do tempo. O conhecimento do
volume armazenado entre a superfície do solo e uma determinada profundidade ,
a recarga provocada por precipitações , e a influência sobre a produtividade
das culturas da presença de lençol freático (projetos de drenagem subterrânea
e subirrigação) são alguns exemplos dessas situações. A figura 9.12
representa a função e = f (z) em um solo num dado instante.
Admitindo que houvesse interesse na determinação da lâmina armazenada
entre a superfície do solo (z = 0) e a profundidade z = , teríamos:
366 Hidrologia

S ©(z) . dz (9.54)

Tabela 9.5. Resultados do exemplo 9.6


S(%) Se(%) Pc(cm)
99,10 98,76 10,90
97,80 96,96 13,00
96,90 95,72 14,10
9630 94,75 15,00
95,10 9333 16,00
92,40 8930 17,00
87,10 82,18 18,40
5630 39,17 23,60
4130 24,17 3030
34,80 9,94 37,70
3030 3,73 53,70

sendo S = lâmina armazenada. O volume correspondente seria obtido pelo


produto de S pela área superficial, cujo perfil de umidade é representado
pela figura 9.S. A aplicação da equação 9.54 permite a determinação "exata"
de S, sendo necessário, para tanto, o conhecimento de uma expressão analítica
que represente a variação da umidade com a profundidade. Quando o perfil é
obtido através da determinação da umidade a diferentes profundidades, o
cálculo da lâmina armazenada simplifíca-se para:

n- 1
S = l ( ©i - Azj) (9.55)
i =l

onde n = o número de pontos (profundidades) nos quais a umidade foi


determinada.

Exemplo 9.7. Para exemplificar a aplicação da equação 9.55 vamos supor que
num determinado solo tenham sido feitas quatro determinações de umidade
volumétrica, nas profundidades de 0 cm (superfície do solo), 30 cm, 70 cm e
115 cm. Foram obtidos os valores de 030 cm3/cm3, 0,22 cm3/cm3, 0,17 cm3/cm3
e 0,14 cm3/cm3, o que caracteriza uma situação na qual a umidade decresce com
a profundidade. Utilizando a equação 935, determine a lâmina armazenada
entre a superfície do solo e 1,15 m de profundidáde.
Infiltração e Armazenamento no Solo 367

Solução: S = (0,26 . 300) + (0,195 . 400) + (0,155 .450)


S = 225,75 mm

Os valores de ©j utilizados correspondem à média de duas determinações


consecutivas, enquanto Azj é a diferença entre as respectivas profundidades.
Supondo uma área de 1 ha (10.000 m2) o volume armazenado seria de 2257,5 m3.
Uma simplificação maior ainda em relação às equações 9.54 e 9.55 é
representada pela equação que segue:

S= ©. (9.56)

sendo e = a umidade volumétrica média representativa de toda a profundidade.

Figura 9.12. Perfil de umidade em um solo.

Exemplo 9.8. Utilizando os dados do exemplo anterior, determine a lâmina


armazenada através da equação 9.56.

Solução: S = (0,2075 . 1150) = 238,63 mm

Nesse exemplo o valor da umidade corresponde à média aritimética das


368 Hidrologia

quatro determinações e a profundidade utilizada é a de todo o perfil


considerado.
O estabelecimento de perfis, através da determinação direta da umidade, é
um procedimento apropriado principalmente quando o objetivo é a calibraçãn
de modelos. No caso de projetos correntes geralmente não se dispõe de tempo e/
ou recursos financeiros para essa finalidade. Com isso, deve-se dispor de solu­
ções que exijam o conhecimento de parâmetros do solo de fácil determinação.
Nesse caso enquadram-se a utilização de equações empíricas que representem a
função 0 = f (z), ou ainda soluções das equações que simulam o escoamento em
meios porosos não saturados. Essas equações, devido à não-linearidade e a com­
plexidade das condições de contorno, geralmente só podem ser resolvidas
numericamente. Como o desenvolvimento de métodos numéricos foge aos obje­
tivos deste texto, vamos apresentar a seguir uma equação empírica para a esti­
mativa de perfis de umidade. Como as equações empíricas só devem ser aplica­
das às situações particulares para as quais foram obtidas, é fundamental que
essas condições sejam conhecidas. No caso, a equação que será apresentada
pressupõe uma condição de equilíbrio c a presença dc lençol frcático a uma
determinada profundidade. A equação dc Brooks-Corcy apresentada no item
9.2.3, que relaciona a pressão capilar com a saturação pode, a partir da equação
9.49, ser rccscrita corno segue;

© - ©r yX
- ; y * Pb (9:57)
í> - ©r Pb
,

Os parâmetros X e Pb já foram definidos anteriormente, 0 r = a umidade


volumétrica residual (capacidade de campo) e y = a coordenada verticai,
sendo igual a zero junto ao lençol freático. Se observarmos a equação 9.51
veremos que no lado direito Pc foi substituído por y. Isso justifica-se pelo
fato de que numa condição de equilíbrio a pressão capilar em qualquer ponto é
igual à cota deste ponto, sendo o lençol freático o plano de referência. A
equação 9.57 representa um perfil semelhante ao da figura 9.13, exceção à
parte superior que tem a umidade reduzida pelo efeito da evaporação.
Analisando a equação 9.57 vemos que para y = Pb temos e = (solo saturado),
e que a umidade decresce à medida que cresce y , tendendo a um valor mínimo
igual à @r
Casos práticos de aplicação da equação 9.57 são os projetos de drenagem
subterrânea em áreas agrícolas,onde o objetivo é proporcionar boas condições
de aeração aos cultivos. Em regiões onde prevalecem condições de regime
permanente (tençol freático estacionário) a equação 9.57 pode ser utilizada
para definir a posição ótima do lençol freático. Já em regiões onde
In filtra çã o e A rm a zen a m en to no S o lo 369

prevalecem condições de regime não permanente ( l e n ç o l freático flutuante),a


equação deve ser utilizada conjuntamente com outra que simule o comportamento
do lençol freático ao longo do tempo. Nesse caso admite-se que uma condição
de não equilíbrio possa ser aproximada por uma sucessão de estados de
equilíbrio.

Figura 9.13. Perfil de umidade em equilíbrio com lençol freático.

Exemplo 9.9. Determine o perfil de umidade de um solo que num dado instante
presenta o lençol freático 1.2 m abaixo da superfície do solo,e tem as
seguintes características:

<j> = 38% , 0r = 26% , Pb = 20 cm e X = 3

Solução: na tabela 9.6 são apresentadas as profundidades, tendo o lençol


freático como referência, e as umidades volumétricas estimadas pela equação
9-57.
Os resultados mostram que até 20 cm acima do lençol freático o solo está
saturadoJEntre 20 cm e 60 cm ocorre uma zona de transição, e a partir de 60
cm a umidade é praticamente constante e igual à capacidade de campo.
H id ro lo g ia

Tabela 9.6. Resultados do exemplo 9.9

y ©
(cm) (%)
20,0 38,0
40,0 27,5
60,0 26,4
80,0 26,2
100,0 26,1
120,0 26,1

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372 H id ro lo g ia

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Brasília. Anais. São Paulo: ABRH. 3v. V.2, p 553-570.

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hydraulic conductivity of unsaturated soils, Soil Sei. Soc. Am.
44, p. 892-898.
Capítulo 10

FUNDAMENTOS DO ESCOAMENTO NÃO-PERMANENTE

Carlos E. M. Tucci

10.1 Introdução

O deslocamento da água na superfície da bacia, nos rios, canais e


reservatórios é uma das parcelas mais importantes do ciclo hidrológico.
O escoamento é regido por leis físicas e representado quantitativamente
por variáveis como vazão, profundidade e velocidade. O comportamento do
escoamento é descrito por equações de conservação de massa, energia e
quantidade de movimento.
A equação baseada na conservação de massa do sistema é obtida pela
avaliação das massas intemas e externas que atuam no mesmo. Por exemplo, num
trecho de rio, a vazão de montante, a contribuição lateral e a vazão de saída
são as entradas e saídas que devem preservar a massa do sistema, identificado
como o trecho do rio.
A quantidade de movimento de um corpo é o vetor soma de todas as forças
aplicadas a esse corpo num período t. Segundo Abbott (1979) é uma descrição
(dentre uma infinidade de outras descrições possíveis) do estado de movimento
do sistema de massas. Esta descrição é relacionada com um estado inicial de
referência do sistema. Energia é definida como outra possível descrição do
estado de movimento, usualmente generalizado, na presença de um campo
gravitacional, o que inclui o estado vertical de deslocamento, o qual pode
ser considerado como o estado da capacidade de movimento do sistema.
O escoamento em superfície livre pode ser permanente e não-permanente. O
escoamento é permanente quando o gradiente da velocidade e do nivel são
nulos, ou seja, não existe variação de estado no sistema. O escoamento
permanente pode ser uniforme e não-uniforme. O escoamento permanente uniforme
ocorre quando o gradiente de profundidade com o espaço é nulo e a velocidade,
constante. O escoamento é permanente não-uniforme quando ocorre variação ao
longo do espaço das citadas variáveis. A condição de escoamento permanente é
utilizada por exemplo para: cálculo de remanso em rios, na análise de perfil
de cheias; no escoamento em estiagem, como base para a análise da qualidade
da água; e dimensionamento de obras hidráulicas. O escoamento em regime
permanente em canais é abordado pela maioria dos livros básicos de
Hidráulica.
O escoamento em regime não-permanente considera a variação no tempo e no
374 H id r o lo g ia

espaço das variáveis que retratam o mesmo. Esta situação ocorre na maioria
dos jaofalemas hidrológicos de escoamento superficial e de rios e canais.
O escoamento superficial e, em rios e canais, é retratado por duas
equações: conservação de massa e quantidade de movimento, denominadas também
de equações de Saint Vénant.

10.2 Equações do escoamento

Equação da continuidade

Considere um trecho dx de escoamento (figura 10.1), em superfície livre,


a massa que entra na seção de montante, no intervalo de tempo dt é igual a
pQdL A massa que entra por contribuição lateral, no mesmo período é
pqdxdt A massa que sai na seção de jusante é p[Q+(3Q/3x) dx]dt. A
variação da massa armazenada no intervalo dt é p(3A/ôx)dx dt. Nestas
expressões Q = vazão; A = área da seção; q = vazão de contribuição lateral
por unidade de comprimento do trecho; p = massa especifica.
A equação de continuidade baseada na conservação de massa fica:

p(3A/ôt) dx dt = pQdt + p q dx dt - p [Q +(3Q/ch) dx] dt

Considerando a massa específica constante e dividindo por dx e dt, a


equação anterior fica

3A ôQ
— + ---- = q 0 0 . 1)
3t dx

õy dQ
b— +— = q ( 10.2)
dt dx

onde b = largura e y = profundidade. Nessa última equação é desprezada a


derivada parcial da largura com o tempo.

Equação da quantidade de movimento

A conservação da quantidade de movimento (QM) no trecho é obtida pelo


seguinte: soma dos vetores da quantidade de movimento que entram no trecho,
maios a soma da QM que sai, mais a soma da QM devido às forças que atuam no
corpo de água do trecho, 6 igual à variação da QM do trecho no intervalo de
tempo considerado.
F u n d a m en to s d o E sco a m en to 375

A quantidade de movimento é o produto da massa pela velocidade, ou seja


pvA = pQ e o fluxo de QM através de uma seção 6 pv2A. A quantidade de
movimento que entra no trecho de rio é pQ2/A e a QM que sai do trecho é pQ2/A
+ [3(pQ2/A)/3x] dx. A QM resultante fica

- dx (10.3)
dx

A variação da QM do trecho no tempo é

d(pQ)
(10.4)
dt

As principais forças que atuam sobre este escoamento são: gravidade,


atrito e pressão.

Gravidade: a força, devido à gravidade, é a componente do peso da água na


direção do escoamento (figura 10.2)

Fg = p g A dx sen 0

Considerando a aproximação de que sen© £ tange =So, a componente da


força de gravidade na direção longitudinal fica

Fg = p g A dx So (10.5)

Atrito: a força devido ao atrito resultado da resistência das paredes ao


escoamento é dada por

Ff = - t P dx (10.6)

onde t = esforço cortante: P o perímetro molhado. O esforço cortante é obtido


por

t = p g R Sf (10.7)

onde g= aceleração da gravidade; R= raio hidráulico; Sf= declividade da linha


de atrito. Substituindo o esforço cortante dado pela equação 10.7 na 10.6,
resulta
376 Hidrologia

Ff = - p g A Sf dx (10.8)

Pressão: a força de pressão é estimada considerando que a mesma é


hidrostática. Neste caso existem as forças que atuam sobre os dois limites do
trecho e a força devido a pressão resultante da variação da largura da seção
ao longo do trecho. As forças hidrostáticas que atuam à esquerda e à direita
do volume são, respectivamente, as seguintes:
y
Fe = J p g (y - h)b dh (10.9)
0

Figura 10.1. Termos da equação da continuidade

Ff
b- Planta

Figura 10.2. Termos da equação de quantidade de movimento


Fundamentos do Escoamento 377

y
*

P g (y-h)b dh ( 10. 10)

onde y = profundidade do escoamento; h= variável de integração; b= largura.


A força de pressão hidrostática, resultante da modificação da largura da
seção, é obtida considerando a integração no volume de controle dado por
pg[(y-h)(3b/ôx)dh dx]y=yo. O termo entre chaves representa a variação da
área para uma profundidade y=yo ao longo do trecho. A força resultante fica

db
Fb = Jpg(y-h) [ — ] y=yQ dh dx ( 10.11)

A resultante das forças que atuam nos limites do trecho (equações 10.9 e
10.10) é igual a

d y
ôpy
{ \ p g (y-h)dh j dx = -gA — dx
3x j dx
0

Jc 3b
( 10. 12)
[ ps(y**h) ^ " dh 1 dx

A força resultante da pressão hidrostática é a soma da força resultante


das equações 10.11 e 10.12, o que resulta

3py
Fh = - gA — dx (10.13)
dx

igualando a equação 10.4, que expressa a variação da quantidade de


movimento do trecho no tempo, aos demais termos, simplificando e considerando
p constante, resulta
H id ro lo g ia
378

3Q 3(Q/A) 9y A„ (10.14)
_ _ + --------- + g A — = g A S o - g A S f
at 3x ax
in é rc ia pressão g ra v id a d e atrito

esta é a equação de quantidade de movimento.


Os dois primeiros termos são denominados de termos de inércia, ^o
terceiro refere-se à força de pressão. Os dois termos da direita da equação
são os termos de gravidade e atrito.
Existem várias formas de expressar as equações 10.1 e 10.14 que sao as
equações do escoamento ou equações de Saint Vénant. Na literatura estas
equações são denominadas também de equações unidimensionais do escoamento
não-permanente gradualmente variado. As formas de expressar as referidas
equações baseiam-se nas variáveis dependentes escolhidas. As combinações
usuais são;

a) Q e y (vazão e profundidade), equações 10.2 e 10.14;

b) Q e z (vazão e nível). Neste caso a equação 10.2 fica

dz 3Q
b — + — = q (10.15)
3t dx

Considerando que 3z/3x = 3y/3x -So, a equação 10.14 fica

3Q 3(Q2/A) 3z (10.16)
__ + ---------- t g A — + g A Sf = ü
dl dx dx

c) v e y (velocidade e profundidade). Essas expressões são mais utilizadas


para simular canais de laboratórios. Sendo Q = A v , desprezando a variação
da largura com x e a contribuição lateral, resultam as seguintes equações.

ay av ôy
b — + A —- + V = 0
at dx dx
(10.17)
3v dv 3y
— + v --- + 2 ---
at dx dx
F u n d a m en to s d o E sc o a m e n to 379

10.3 Simplificações das equações de escoamento

A aplicação das leis de conservação de massa e quantidade de movimento


em um canal, permitiu admitir algumas simplificações, adotadas na dedução das
equações. As simplificações são as seguintes:

Fluido incompressível e homogêneo: a compressibilidade da água pode ser


considerada desprezível para a avaliação do escoamento em rios, canais e na
superfície de bacias. O fluido também pode ser considerado homogêneo para a
maioria dos sistemas simulados pelas equações do escoamento.

Pressão hidrostática na vertical: a pressão levada em conta nas equações foi


a pressão hidrostática, desprezando-se a aceleração vertical do escoamento
que ocorre em ondas com variações bruscas, como aquelas formadas devido ao
rompimento de uma barragem. Para analisar a simplificação de considerar a
pressão hidrostática na vertical, Liggett(1975) analisou a relação y/L, onde
y é a profundidade e L o comprimento de onda. Quando y/L « 1 a simplificação
é aceitável, pois a onda teria um gradiente pequeno se comparada com a
profundidade do fluxo. Para um valor de y/L = 0,055, o erro, ao considerar a
aproximação da pressão hidrostática, será de 2% na celeridade da onda.

Aproximação na declividade do fundo: a simplificação adotada durante a


dedução foi de que
OZo
scne = -------= So (10.18)
dx

Na realidade o gradiente do fundo é igual à tange. Considerando a


relação entre as duas soluções, obtém-se

a = cos2e (10.19)

Para um declividade de 0,29 m/m, (Liggett,1975) o erro na distância ao


longo da declividade do fundo é de 2%.

Escoamento unidimensional: na dedução das equações foram desprezadas as


variações de velocidade nas direções transversal e vertical. Sendo assim, a
velocidade média é representativa da variabilidade da velocidade na seção e o
processo é considerado preponderantemente longitudinal, na direção do rio ou
de um declividade principal. Em estuários onde as seções são largas, a
simplificação de uma dimensão não é usualmente válida. Neste caso, modelos
bidimensionais são usados para simular as velocidades nas direções
transversal e longitudinal.
380 H id ro lo g ia

Variação gradual das seções transversais: as equações foram deduzidas


admitindo-se que as seções variem gradualmente, desprezando-se os efeitos
singulares de contração e expansão da seção transversal ou obras hidráulicas
como barragens. Neste caso, o trecho em que existe essas anomalias é tratado
por equações especiais.

Atrito: a declividade da linha de atrito é obtida pelo uso das equações de


movimento uniforme como Chézy e Manning. Essas equações empíricas foram
estabelecidas para escoamento uniforme permanente, no entanto, têm sido
largamente utilizadas para escoamento não-permanente com resultados
satisfatórios.

10.4 Classificação dos modelos de escoamento

Até agora foram discutidas as simplificações adotadas na dedução das


equações de Saint Vénant. Na literatura as equações 10.1 e 10.14 são
denominadas de equações completas, apesar das simplificações mencionadas, já
que podem representar o escoamento na maioria dos problemas em rios, canais,
reservatórios e superfície da bacia.
O escoamento de uma onda num canal produz atenuação e deslocamento da
onda devido:

- ao armazenamento (tanto na calha normal como nas áreas de inundação);


- ao atrito com as superfícies do canal e difusão devido ao gradiente de
pressão.

Nas equações, esses efeitos são representados pela continuidade de massa


que considera o amortecimento devido à variação da capacidade de
armazenamento do sistema e à equação de quantidade de movimento que
representa a gravidade, atrito, pressão e a inércia do fluxo.
Os sistemas de escoamento podem ter diferentes características,
predominando^ em cada caso um ou mais efeitos sobre o fluxo. Chow(1959)
classificou os modelos de escoamento em hidrológicos e hidráulicos. No
primeiro grupo estão os modelos que consideram somente o efeito do
armazenamento no escoamento, desprezando a formulação dos efeitos da equação
de quantidade de movimento. Os modelos hidráulicos, segundo a definição do
referido autor, são os modelos que usam as equações de Saint Vénant.
Outros modelos têm sido utilizado nos últimos anos ampliando-se a
classificação inicial de Chow. Atualmente os modelos ditos hidrológicos são
denominados do tipo armazenamento devido à predominância deste efeito na
definição das equações.
Utilizando a equação 10.17 e substituindo Sf pela expressão da equação
de Chezy dada por
F u n d a m en to s do E sco a m en to 381

.
Sf = —
Q IQI
( 10.20)
C2 R

onde C = coeficiente de Chezy; R = raio hidráulico, resulta

Q - CA 4 R ( So - dy/dx -v/g dv/ôx -1/g ôv/ôt " ( 10.21)

onda cinem.

difusão

hidrodinâmíco

Pode-se observar da equação 10.21, que a mesma se aproxima da equação de


movimento uniforme, quando os termos com sinal negativo são desprezíveis.
Henderson (1966) mostra que estes termos são em geral muito pequenos em rios
com grande declividade onde a força de gravidade é preponderante. Os modelos
que utilizam a equação da continuidade e a equação quantidade de movimento,
desprezando-se os termos de pressão e de inércia, são ditos modelos onda
cinemática.
Em alguns sistemas cm que existem efeito de jusante sobre o escoamento
proveniente de montante, os modelos anteriores não podem retratar este
processo, pois consideram o escoamento unidirecional (montante para jusante).
Introduzindo o termo de pressão no modelo de onda cinemática, este tipo de
escoamento pode ser representado. Neste caso o modelo é dito de difusão. Os
modelos de difusão não consideram os termos de inércia. Estes termos são
importantes quando ocorre grande variação temporal e espacial da velocidade
do sistema. Neste caso, passa a ser importante o uso do modelo hidrodinâmíco
que considera a equação de quantidade de movimento completa.
Na tabela 10.1 é apresentado um resumo das características dos modelos e
a seguir os mesmos são analisados.

Modelos Armazenamento

Os modelos do tipo armazenamento utilizam a equação da continuidade


concentrada e uma relação entre o armazenamento e a vazão de saída e entrada
do trecho, para simular o escoamento no rio ou canal. Este tipo de modelo tem
sido muito utilizado em hidrologia devido principalmente à simplicidade de
formulação e ao pequeno volume de dados usados. A equação da continuidade
(equação 10.1) é transformada, desprezando-se a variação longitudinal da
vazão e da área ao longo do trecho. Neste caso, as variáveis ficam sendo o
382 Hidrologia

armazenamento S, a vazão de entrada I e a vazão de saída do trecho Q. A


equação díscretizada para o trecho Axt sem contribuição lateral fica:

Ax AA
------ = - AQ
At At

sendo S= Ax AA , o armazenamento no trecho e AQ = Q - 1, resulta, sob a forma


diferencial, a equação de continuidade concentrada, onde 1= vazão de entrada
do trecho; Q= vazão de saída.

dS
^ = I - Q (10.22)

Tabela 10.1. Resumo das características dos modelos de escoamento


distribuído efeito de termos de termos de dados
jusante pressão inércia físicos
.Armazenamento não não não não não
Onda cinemática sim não não não opcional
Difusão sim sim sim não opcional
Hidrodinâmico sim sim sim sim sim

Os modelos do tipo armazenamento se diferenciam pela expressão usada na


segunda equação, que relaciona o armazenamento com as vazões de entrada e
saída.

s= f( I, Q, r , Q ’) (10.23)

onde F e Q’ são derivadas de I e Q com relação ao tempo.


Alguns destes modelos são os seguintes:

S= K Q Reservatório linear, simples


S = K [ x I + (1- x) Q ] Muskingun
S= aj SSARR

Para utilização deste tipo de modelo são necessários, na fase de ajuste,


somente os hidrogramas de montante e jusante. Esta é a vantagem principal, já
que na prática é necessário obter resposta rápida além da carência de dados.
Este tipo de modelo pode ser usado quando o efeito preponderante é o
amortecimento devido ao armazenamento e não existam efeitos de jusante sobre
o escoamento, como o devido à maré na foz de certos rios.
Fundamentos do Escoamento 383

Na figura 10.3 são apresentados os hidrogramas de entrada e saída de um


trecho de rio. Pode-se observar que ocorre atenuação da onda de cheia devido
ao armazenamento no leito e à perda de energia devido aos efeitos dinâmicos.
A diferença acumulada de volume que entra e sai do trecho é o
armazenamento no período. A superfície hachurada na figura 10.3a é o volume
armazenado acumulado durante a passagem da onda de cheia, que deve ser igual,
se não houver contribuição ou subtração de vazão, ao volume representado pela
parte não hachurada entre os hidrogramas referidos.
Na interseção dos dois hidrogramas ocorre o máximo armazenamento,
portanto a derivada dS/dt=0, ou seja I=Q. Quando o sistema é um reservatório, a
velocidade tende a ser pequena e a linha de água tende a ser horizontal no lago
formado pelo mesmo. O armazenamento e a cota têm uma relação biunívoca,
h = f(S). Sendo o nível do reservatório h, horizontal, a relação entre h e Q é
também biunívoca h = f(Q). Combinando estas duas funções resulta S = g(Q) e

dS dQ
dt dt

Portanto, a vazão máxima do hidrograma de saída ocorre quando o


armazenamento 6 máximo, na íntersecção dos dois hidrogramas (figura 10.3d).
Esta 6 uma propriedade importante para verificação de resultados e utilização
em alguns casos especiais.
Num rio, o armazenamento não 6 função somente da vazão de saída porque a
linha de água não é horizontal.

Onda Cinemática

As equações básicas utilizadas por este tipo de modelo são a equação de


continuidade distribuída e a expressão simplificada da equação de quantidade
de movimento (equação 10.21). A aplicabilidade deste tipo de modelo deve ser
analisada antes do seu uso.
Ao considerar a declividade do fundo igual à declividade da linha de
atrito, na equação de quantidade de movimento, o escoamento tem as seguintes
simplificações:

- a força de atrito e a de gravidade são preponderantes sobre os demais


termos da equação dinâmica;

-a relação entre a vazão e o nível numa seção é biunívoca. Sendo So= Sf,
a equação dinâmica fica Q = C A J r So. A área pode-se relacionar com o
b b f- ^
nível por um função do tipo A = a h , o que resulta Q = C ah <IR So .
384 Hidrologia

b-Propagação no reservatório

Figura 10.3. Hidrogramas e Armazenamento

- a onda cinemática é mais importante que as pequenas pertubações que se


comportam como uma onda dinâmica. Segundo Lightill e Whitman (1955), as
ondas cinemáticas e dinâmicas estão presentes nas ondas de cheia. A
maior parte da onda de cheia propaga-se mais lentamente que a velocidade
das pequenas pertubações (ondas dinâmicas), já que existe predomínio das
ondas cinemáticas sobre as dinâmicas no escoamento subcrítico;
Fundamentos do Escoamento 385

- O modelo simula somente os efeitos de montante e não pode ser


utilizado para simular escoamento com influência de jusante, que ocorre
em rios e canais próximos a lagos, oceanos, estuários e nos pequenos
afluentes de rios maiores;

- O amortecimento da onda simulado neste modelo é devido ao


armazenamento, não ocorre amortecimento devido a efeitos dinâmicos

Alguns critérios utilizados para avaliar a aplicabilidade deste tipo de


modelo são os seguintes:

a) comparação das celeridades: a condição de que a celeridade da onda


dinâmica seja maior que a da onda cinemática. Neste caso resulta a condição
de que F < 1,5, onde F é o número de Froude. Esta é uma condição necessária
mas não suficiente. Normalmente é uma condição verificada porque o fluxo da
maioria dos escoamentos tem um número de Froude menor que 1;

b) índice K: Liggett e Woolhiser (1967) utilizaram uma equação linear da onda


cinemática e apresentaram o seguinte fator K.

So Lo
K = -- ------ (10.27)
c 2 yo
ro

onde So = dcclividadc do fundo; Lo = comprimento longitudinal do escoamento;


yo = profundidade; Fo = número de Froude. O índice o indica que os valores
foram ünearizados com base num valor médio. Os autores concluíram que,
quando K > 20 o modelo onda cinemática é uma boa aproximação;

c) Ponce et al.( 1978) analisaram as equações de Saint Vénant, baseando-se


numa solução de linearidade, e concluíram que para 95% de precisão, o modelo
de onda cinemática é aplicável quando a ínequaüdade seguinte é verificada

T So Vo
-------- £ 171 (10.28)
yo

onde T = período da onda. Essa equação foi obtida com base na análise de
precisão de uma versão linearizada das equações de escoamento. Fode-se
observar que a equação 10.28 leva em conta não só as características do
sistema e da profundidade média, mas o período da onda, que é um indicador
dos gradientes envolvidos. Portanto, é de se esperar que esta condição seja
mais completa que as demais.
Hidrologia
386 _____________________________________

Exemplo 10.1. Para um canal com declividade de So = 0,0002 m/m, comprimento


Lo = 4 km, velocidade vo = 0,5 m/s e profundidade média de lm, verifique a
aplicabilidade do modelo de onda cinemática.

Solução: segundo o critério das celeridades

0,5
F = = 0,16
Jg y ' ^9,81 x 1

atende a condição.
Segundo critério do índice K

K = SoLo/(Fo yo)= 0,0002 x 4000/(0,162. 1)= 31,2

sendo K > 20, a condição é atendida.


Segundo critério da equação 10.23

T > 171 yo/(So.vo) — 171 x 1 /(0,0002x0,5) = 20 dias,

portanto, o período da onda deve ser de pelo menos 20 dias, o que é uma
restrição muito grande. No entanto, deve-se considerar que a velocidade e a
profundidade são pequenas, caracterizando um escoamento lento.

Modelo Difusão

O modelo de difusão utiliza a equação da continuidade 10.1 e a equação


de quantidade de movimento 10.14, sem os termos de inércia. O modelo de
difusão tem mais aplicabilidade que o modelo de onda cinemática, pois
considera o termo de pressão, o que permite levar em conta os efeitos de
jusante. Este modelo pode ser usado em rios e canais que sofrem efeitos de
jusante e a velocidade não tem gradientes significativos.
Considerando o termo de pressão na equação de quantidade de
movimento, desaparece a relação biunívoca entre armazenamento (ou área para
uma seção) e vazão, pois a equação dinâmica fica

dy
So - Sf (10.29)
dx

Introduzindo a equação de Chezy em 10.29 e reorganizando fica


Fundamentos do Escoamento 387

Q - + Qo*1 I lT-(dy/dx)/So | ' (10.30)

positivo para dy/dx < So. Nesta equação se dy/dx = 0, o escoamento é uniforme
e Q=Qo, onde Qo representa a equação para So = Sf da condição de onda
cinemática. A equação 10.30 permite corrigir uma curva-descarga sujeita a
efeito de jusante, função da declividade da linha de água.
Quanto a aplicabilidade do modelo, Ponce et al.(1978) apresentaram estas
condições para os modelos difusivos, baseando-se na análise de uma versão
linear das equações de Saint Vénant e obteve a seguinte inequalidade como
condição

T So -Jg/y a 30 (10.31)

Exemplo 10.2. Verifique a aplicabilidade do modelo de difusão para os dados


do exemplo 10.1

Solução: utilizando a expressão 10.31, resulta

T i 13,3 horas

Verifica-se que o modelo permite simular ondas com período menor,


tomando-se mais viável o uso deste tipo de modelo.

Exemplo 10.3. Num rio que converge para o mar (figural0.4), na seção A foram
efetuadas medições de descargas e estabelecida uma curva de descarga sem
efeito de jusante. A curva de descarga obtida é Q = 4,22 (Z -1 ) ’ .N a
seção B são feitas leituras simultâneas com a seção A. Estabeleça a equação
para estimar a vazão com base nas leituras em A e B.

Solução: os pontos foram selecionados considerando que quando Za-Zb í SoAx


não existe efeito de jusante.
Transformando a equação 10.30 para níveis, resulta

Q = + Qo -I IdZ/dx | /So '

Substituindo a expressão de Qo pela equação da curva-chave sem efeito de


jusante, sendo So = 0,00004m/mr Ax = 5000, resulta

Q = + 9 ,4 4 (Za - l)1,67 -J | Z b - Za
388 H id ro lo g ia

positivo para Zb < Za . Para Za > Zb+0,2, utilize a equação sem efeito de
jusante.

Modelo Hidrodínâmico

Os modelos hidrodinâmicos utilizam as equações 10.1 e 10.14 de


escoamento e não desprezam nenhum termo da equação de quantidade de
movimento. Este tipo de modelo requer soluções numéricas das equações
diferenciais que necessitam maior quantidade de dados que os modelos
anteriores. As vantagens deste tipo de modelo é a maior precisão e
representação física do escoamento, permitindo simular modificações do
sistema estudado.

Figura 10.4. Exemplo 10.3

PROBLEMAS

1 - Ler referência 4.

2 - Nas seções A e B de um rio distantes entre si de 15 km foram medidas as


seguintes velocidades va=l,i m/s e vb=l,22 m/s. A declividade do fundo é de
0,001 m/m e o coeficiente de rugosidade de Manning 0,03. As profundidades são
ya=4,3m e yb=4,0. Despreze a variação no tempo e estime os termos da equação
de quantidade de movimento (considere largura constante e igual a 30 m).
Fundamentos do Escoamento 389

3 - Considere um rio com largura média de 60m, declividade de fundo de


0,00004 m/m, rugosidade de 0,03. A seção de interesse localiza-se a 3 km da
sua foz, que escoa para um reservatório. Ainda não existem medições de
descarga no local. Estime uma curva de descarga para a seção de interesse
considerando que o reservatório pode subir até 2,0 m acima do fundo do canal.

4 - Num trecho de rio pretende-se propagar um hidrograma entre duas seções


distantes de 30 km. A onda de cheia tem uma base de cerca de lOh. A
velocidade média é de cerca de 1,4 m/s, declividade de 0,0001 m/m e
rugosidade de 0,03. Verifique a aplicabilidade dos modelos onda cinemática e
difusão.

5 -Existem dois reservatórios interligados por um canal, quais os modelos que


você poderia sugerir para os reservatórios e para o canal?

6 - Qual a diferença entre o escoamento num rio e num reservatório? Qual o


tipo de modelo mais recomendado para representar o escoamento num
reservatório? Quando o pico do hidrograma de saída de um reservatório não
ocorre na recessão do hidrograma de entrada?

REFERÊNCIAS

1 - ABBOTT, M.B. 1979. Computational hydraulics. Boston: Pitman. 362p.

2 - HENDERSON, F.A. 1966. Open channel flow. New York: Macmillan 522p.

3-LIGHTILL,MJ.,WHITHAN,G.B. 1955, OnKinematicwavesfloodmovementin


long rivers. Proceedings of the Royal Society o f London. Serie A:
Mathematical and Phisical Sciences, London, v.229, p.281*316.

4 - LíGGETT, JJ. 1975. Basic equations of uusíeady flow. In: MAHMOOD, K.,
YEVJEVICH, v.(ed) Unsteady flow in open channels. 3v. v.l, chapt.2,
p.29-02.

5 - LIGGETT, JJ., WOOLHISER, D.A. 1967. The use of the shallow water
equations inrunnoffcomputation.In: AMERICAN WATER CONFERENCE,
3., 1967, San Francisco. Proceedings. Urbana: American Water
Resources Association. 669p. p.l 17-126.

6 - PONCE, V.M., LI, R.-M., SIMONS, D.B. 1978. Applicability of kinematic and
diffusion models. Journal of the Hydraulics Division. American
Society of Civil Engineers, New York, v.104, n.3, p.353-360, Mar.
I

\:
i

i
C a p ítu lo 11

ESCOAMENTO SUPERFICIAL

Carlos E. M. Tucci

11.1 Componentes do hidrograma

O hidrograma é a denominação dada ao gráfico que relaciona a vazão no


tempo. A distribuição da vazão no tempo é resultado da interação de todos os
componentes do ciclo hidrológico entre a ocorrência da precipitação e a vazão
na bacia hidrográfica.
O comportamento do hidrograma típico de uma bacia, após a ocorrência de
uma seqüência de precipitações é apresentado na figura 11.1. Verifica-se que
após o início da chuva, existe um intervalo de tempo em que o nível começa a
elevar-se. Este tempo retardado de resposta deve-se às perdas iniciais por
interceptação vegetal e depressões do solo, além do próprio retardo de
resposta da bacia devido ao tempo de deslocamento da água na mesma. A
elevação da vazão até o pico apresenta, em geral, um gradiente maior que a
parte posterior ao mesmo. O escoamento superficial é o processo predominante
neste período, refletindo a resposta ao comportamento aleatório da
precipitação.
O hidrograma atinge o máximo, de acordo com a distribuição de
precipitação, e apresenta a seguir a recessão onde se observa normalmente, um
ponto de inflexão. Este ponto caracteriza o fim do escoamento superficial e a
predominância do escoamento subterrâneo. O primeiro ocorre num meio que toma
a resposta rápida, finalizando antes do escoamento subterrâneo que por escoar
pelo solo poroso apresenta um tempo de retardo maior. Na figura 11.1 é
esboçado o comportamento da vazão subterrânea.
A contribuição da vazão subterrânea é influenciada pela infiltração na
camada superior do solo, sua percolação e conseqüente aumento do nível do
aquífero, retratado na figura 11.2 pela linha MN que se movimenta para TS.
Como o escoamento superficial é mais rápido, o nível muda de A para B. Essa
elevação rápida do nível provoca a inversão de vazão ou represamento do fluxo
no aquífero na vizinhança com o rio. Isso é observado na figura 11.1 pela
linha tracejada. O processo começa a inverter-se quando a percolação aumenta
e o fluxo superficial diminui.
A forma do hidrograma depende de um grande número de fatores, os mais
importantes são:
392 H id ro lo g ia

Figura 11.2, Variação do nível do aquífero


Escoamento Superficial
393

relevo (densidade de drenagem, declividade do rio ou. bacia, capacidade de


armazenamento e forma): uma bacia com boa drenagem e grande declividade
apresenta um hidrograma íngreme com pouco escoamento de base. Normalmente as
cabeceiras das bacias apresentam essas características. As bacias com grande
área de inundação tendem a amortecer o escoamento e regularizar o fluxo
Exemplo disso é a bacia do rio Paraguai na região do Alto Paraguai
(Pantanal).
A forma da bacia influencia o comportamento do hidrograma, como pode ser
observado na figura 11.3d. Uma bacia do tipo radial concentra o escoamento
antecipando e aumentando o pico com relação a uma bacia alongada, que tem
escoamento predominante no canal principal e percurso mais longo até a seção
principal, amortecendo as vazões;

cobertura da bacia: a cobertura da bacia, como a vegetal, tende a retardar o


escoamento e aumentar as perdas por evapotranspiração. Nas bacias urbanas,
onde a cobertura é alterada, tomando-se mais impermeável, acrescida de uma
rede de drenagem mais eficiente, o escoamento superficial e o pico aumentam.
Este acréscimo de vazão implica o aumento do diâmetro dos condutos pluviais e
dos custos;

modificações artificiais no rio: o homem produz modificações no rio para o


uso mais racional da água. Um reservatório para regularização da vazão tende
a reduzir o pico e distribuir o volume (figura 11.3b), enquanto a canalização
tende a aumentar o pico, como mostra a bacia urbana;

distribuição, duração e intensidade da precipitação: a distribuição da


precipitação e sua duração são fatores fundamentais no comportamento do
hidrograma. Quando a precipitação se concentra na parte inferior da bacia,
deslocando-se posteriormente para montante, o hidrograma pode ter até dois
picos. Na figura 11.3c são apresentados dois tipos de distribuição temporal
de precipitação, onde se observa que quando a precipitação é constante a
capacidade de armazenamento e o tempo de concentração da bacia são atingidos,
estabilizando o valor do pico. Após o término da precipitação, o hidrograma
entra em recessão.
Para bacias pequenas ( < 500 km2), as precipitações convectivas de alta
intensidade, pequena duração e distribuída numa pequena área, podem provocar
as grandes enchentes, enquanto que para bacias maiores as precipitações mais
importantes passam a ser as frontais, que atingem grandes áreas com
intensidade média;

solo: as condições iniciais de umidade do solo são fatores Q^e


influenciar significativamente o escoamento resultante de precipitações
394 H id r o lo g ia

pequeno volume, alta e média intensidade. Quando o estado de umidade da


cobertura vegetal, das depressões, da camada superior do solo e do aquífero
forem baixos, parcela ponderável da precipitação é retida e o hidrograma é
reduzido.
Em pequenas bacias o escoamento superficial ocorTe predominantemente
sobre a superfície do solo, em drenos com perdas hidráulicas maiores, mas com
maior declividade. Em bacias de grande porte, o processo predominante é o
deslocamento da onda de cheia por um canal definido, de menor declividade,
mas com perda de carga menor.
Para caracterizar o hidrograma e o comportamento da bacia são utilizados
alguns valores de tempo (abcissa), relacionados a seguir:

ti, tempo de retardo: é definido como o intervalo de tempo entre o centro de


massa da precipitação e o centro de gravidade do hidrograma;
tp, tem po do pico: é definido como o intervalo entre o centro de massa da preci­
pitação e o tempo da vazão máxima;
tc, tempo de concentração: é o tempo necessário para a água precipitada no
ponto mais distante na bacia, deslocar-se até a seção principal. Esse tempo é
definido também como o tempo entre o fim da precipitação e o ponto de
inflexão do hidrograma;
tm, tempo ascensão: é o tempo entre o início da chuva e o pico do
hidrograma;
tb, tempo de base: é o tempo entre o início da precipitação e aquele em que a
precipitação ocorrida já escou através da seção principal, ou que o rio volta
às condições anteriores a da ocorrência da precipitação;
tc, tempo de recessão: é o tempo necessário para a vazão baixar até o ponto C
(figura 11.1), quando acaba o escoamento superficial.

O hidrograma pode ser caracterizado por três partes principais:


ascensão, altamente correlacionada com a intensidade da precipitação, e com
grande gradiente; região do pico, próximo ao valor máximo, quando o
hidrograma começa a mudar de inflexão, resultado da redução da alimentação de
chuvas e/ou amortecimento da bacia. Esta região termina quando o escoamento
superficial acaba, resultando somente o escoamento subterrâneo; recessão,
nesta fase, somente o escoamento subterrâneo está contribuindo para a vazão
total do rio.
O escoamento superficial, que caracteriza as duas primeiras partes do
hidrograma pode ser descrito por modelos, que serão apresentados neste
capítulo. Para simular o escoamento superficial é necessário separá-lo do
escoamento subterrâneo e obter a precipitação efetiva que gerou o escoamento.
A recessão identificada pelo escoamento subterrâneo foi descrita em
detalhe no capítulo 8, mas pode ser representada por uma equação exponencial
do tipo seguinte:
Escoamento Superficial 395

Q t = Q o e -cct ( 1 U )

onde Qt = a vazão após t intervalos de tempo; Qo = vazão no tempo de


referência o; ct = o coeficiente de recessão. Este coeficiente pode ser
determinado através da plotagem num papel log-log dos valores de vazão,
defasados de t intervalos de tempo. A declividade da reta permite estimar o
valor de a.

c - Variação da duração e d - efeito da forma


infensidade da p r e c ip ita ç ã o

Figura 11.3. Hidrogramas

11J1 Separação do escoamento superficial

Os escoamentos são em geral definidos em superficial, que representa o


fluxo sobre a superfície do solo e pelos seus múltiplos canais;
subsuperficial que alguns autores defmem como o fluxo que se dá junto às
396 H id ro lo g ia

raízes da cobertura vegetal e; subterrâneo é o fluxo devido à contribuição do


aquífero. Em geral, os escoamentos superficial e subterrâneo correspondem a
maior parte do total, ficando o escoamento subsuperficial contabilizado no
superficial ou no subterrâneo. Para que os mesmos sejam analisados
individualmente é necessário separar no hidrograma a parcela que corresponde
à cada tipo de fluxo.
A parcela de escoamento superficial pode ser identificada diretamente do
hidrograma observado por métodos gráficos que se baseiam na análise
qualitativa apresentada no item anterior. A precipitação efetiva que gera o
escoamento superficial é obtida quando não se dispõe dos dados observados do
hidrograma ou deseja-se determinar os parâmetros de um modelo em combinação
com o hidrograma do escoamento superficial. Na figura 11.4 são apresentados
três métodos gráficos tradicionalmente usados.

Método 1: extrapole a curva de recessão a partir do ponto C até encontrar o


ponto fí, localizado abaixo da vertical do pico. Ligue os pontos A, B e C. O
volume acima da linha ABC é o escoamento superficial e o volume abaixo é o
escoamento subterrâneo;

Método 2; este é o método mais simples, pois basta ligar os pontos A e C por
uma reta;

Método 3: o método consiste em extrapolar a tendência anterior ao ponto A até


a vertical do pico, encontrando o ponto D. Ligando os pontos D e C obtém-se a
separação dos escoamentos.

Um método alternativo aos anteriores é o seguinte: (figura 11.1)


prolongue a tendência do hidrograma antes do ponto A até o ponto B, abaixo do
picc^ e da recessão a partir de C. Desenhe a curva restante definindo o ponto
D. O ponto A é caracterizado pelo início da ascensão do hidrograma, ou do
escoamento superficial. O ponto C é caracterizado pelo término do escoamento
superficial e início da recessão.
Para a determinação do ponto C existem vários critérios, a seguir
relacionados:

a) Linsley et ah (1975) utilizaram a seguinte equação

N = 0,827 A0,2 (11.2)

onde N = tempo entre o pico do hidrograma e o tempo do ponto C, em dias; A =


área da bacia em km2;
Escoamento Superficial 397

b) o tempo entre a última precipitação e o ponto C, que termina o escoamento


superficial é o tempo de concentração. Utilizando uma das equações para
determinar o tempo de concentração (item 11.5.2), é possível estimar
aproximadamente o ponto C. O valor obtido pode não estar em concordância com
o hidrograma observado, mas permite dirimir dúvidas entre mais de um ponto de
inflexão, escolhido visualmente;

c) a inspeção visual é um dos procedimentos mais simples e se baseia na


plotagem das vazões numa escala mono-Iog, (vazão na escala logarítmica). Como
a recessão tende a seguir uma equação exponencial, numa escala logarítmica a
mesma tende para uma reta. Quando ocorre modificação substancial da
declívidade da reta de recessão, o ponto C 6 identificado. Frequentemente
ocorre mais de uma mudança de inclinação da reta, o que pode caracterizar
também o escoamento subsupcrficial, retardos de diferentes partes da bacia ou
o efeito de diferentes camadas dos aquíferos.

O Institute of Hydrology (1980) estabeleceu a separação do escoamento de


séries de vazões diárias de vários postos do Reino Unido, através do uso de
médias móveis. Calculando a média de cinco valores consecutivos de vazão foi
gerada uma série de vazões cm que os maiores valores e as pequenas variações
são filtradas. Unindo os pontos de mudança de tendência da curva resultante,
398 H id r o lo g ia

o volume acima da curva é o escoamento superficial, enquanto que o volume


abaixo é o escoamento subterrâneo (figura 11.5). Esta metodologia foi
utilizada para determinar estes fatores para vários anos de um grande número
de postos, visando à regionalização de vazões mínimas. Para um hidrograma em
específico este procedimento poderá apresentar resultados limitados.

Figura 11.5. Separação por médias móveis (Institute of Hydrology,1980)

Exemplo 11.1. Na tabela 11.1 é apresentado o hidrograma de um evento ocorrido


na bacia do rio Meninos. A área da bacia é de 106,7 km2 e apresenta alto grau
de urbanização. Determine o volume de escoamento superficial.

Solução: na figura 11.6 é apresentado o hidrograma c a identificação dos pontos


A e C O escoamento superficial c estimado pela parte superior da reta ligando
A e C. Estes valores podem ser obtidos graficamente ou por cálculo. Na tabela
11.1 são apresentados os valores obtidos.
A vazão total superficial é 768 nP/s. Para converter este valor de np/s
para mm, divide-se pelo fator

f =10‘3. A(km2). l&JQQ . 60) = 59,3


Escoamento Superficial
399

Convertendo o total de precipitação em escoamento superficial, fica


r tf = / oõ/59,3 = 13 mm

O coeficiente de escoamento fica

C = 13/32^5 = 0,40

Tabela 11.1. Exemplo 11,1


Tempo Precipitação Vazão Esc. Superficial
(30 min.) (mm) (m3/s) (n-p/S)
1 0,9 10 0
2 0,9 10 0
3 1,6 10 0
4 1,9 10 0
5 2,2 22 11,1
6 2,2 40 28,3
7 3,8 68 55,4
8 6,0 108 94,6
9 5,7 136 121,7
10 2,5 í 38 122,9
11 1.9 124 108,0
12 1,3 100 83,1
13 1,6 78 60,3
14 58 39,4
15 44 24,6
16 34 13,7
17 26 4,9
18 22 0
19 18, 0
20 16 0
21 15 0
totais 323 1088 768

113 Determinação da precipitação efetiva

A precipitação efetiva é a parcela do total precipitado que gera o


escoamento superficial. Para obter o hietograma correspondente à precipitação
efetiva é necessário retirar os volumes evaporados, retidos nas depressões e
os infiltrados. Existem as seguintes metodologias utilizadas para a
H id ro lo g ia
400

determinação da precipitação efetiva: a) equações de infiltração, índices e


relações funcionais.

Infiltração

No capítulo 9 foram descritos algumas equações de infiltração e


separação do escoamento, como o método modificado de Horton e Green Ampt. Um
procedimento mais simples adotado na prática para estimar-se a precipitação
efetiva é o seguinte:

a) utilize uma equação como a de Horton e estime os parâmetros;


b) determine as perdas iniciais De e retire a mesma dos primeiros intervalos
da precipitação;
c) a precipitação efetiva é obtida para os intervalos seguintes por

Pf=P - It (H.3)

onde Tt = é a infiltração calculada pelo método escolhido.

5-

As principais dificuldades do uso desse procedimento são as de estimar-


se os parâmetros da infiltração e as perdas iniciais. Quando existem dados de
vazão é possivel determinar o escoamento superficial. Este valor é igual à
precipitação efetiva, o que permite estimar o total de perdas iniciais e a
infiltração.
Escoamento Superficial 401

índices

O índice é um procedimento que adota um fator constante para a separação


do escoamento. Alguns dos procedimentos são os seguintes:

índice a: é o coeficiente de escoamento definido pela relação entre o total


escoado e o total precipitado numa enchente. Este coeficiente é aplicado às
ordenadas do hietograma para cálculo da precipitação efetiva. Segundo Sokolov
et al. (1976) este método tem sido utilizado na Rússia para cálculo de
enchentes. O valor de ct, segundo os referidos autores, variaram entre 0 8 e
0,9;

índice (j). é o índice igual a uma infiltração constante durante a enchente.


Este valor é subtraído de cada precipitação, obtendo-se a precipitação
efetiva. A soma das precipitações efetivas deve ser igual ao escoamento
superficial total (figura 11.7b). Este índice é calculado, dividindo-se o
total de chuva efetiva pelo número de intervalos de tempo. Podem existir
intervalos de tempo em que (f) > P. Para que o volume de precipitação efetiva
seja igual ao do escoamento superficial é necessário distribuir esta
diferença para os demais intervalos dc tempo;

índice W: este índice é semelhante ao anterior e representa a infiltração


média durante o tempo cm que a precipitação é superior à taxa de infiltração.

W = [ P - Q - S ]/ t (11.4)

Figura 11.7. Uso de índices


402 H id r o lo g ia

onde P é a precipitação no período t; Q = escoamento superficial no período


t; S = volume armazenado; t = tempo em que a precipitação é maior que a taxa
de infiltração. O. valor de S é normalmente desconhecido e agregado como
perdas iniciais. Conhecido o total precipitado P e o escoamento superficial
Q, o cálculo de W é obtido para t onde Pi > W.
O uso desses índices pressupõe a determinação do escoamento superficial
ou o uso de coeficiente ajustado com base em outros eventos ou de bacia
próxima com características semelhantes.

Relações Funcionais

Kohler e Richards (1962) verificaram que geralmente a relação entre


precipitação total e precipitação efetiva, durante uma cheia, aproxima-se da
seguinte expressão:

Q = ( Pn + dn ) - d ( 1 1 .5 )

onde Q - p re c ip ita çã o e fe tiv a , o u seja a p re c ip ita ç ã o q u e g e ra e sc o a m en to


s u p e r f i c i a l ; P = a p r e c i p i t a ç ã o to ta l; d = P~Q c n u m c o e f i c i e n t e e m p í r i c o .
N a f i g u r a 1 i .8 a é a p r e s e n t a d a g r a f i c a m e n t e c s - a f u n ç ã o . U m a e q u a ç ã o e m p í r i c a
foi a j u s t a d a p a r a n , s e n d o

n = 2 + 0 ,5 d (1 1 -6 )

onde d 6 d ad o c m p o le g ad a s.
O m é to d o a p re s e n ta d o p e lo S C S (1 9 5 7 ) u tiliz a u m a fo r m u la ç ã o s e m e lh a n te ,
q u e é a seg u in te

(11.7)
C* P

E sta re la ç ã o te m o s e g u in te sig n ific a d o :

volume infiltrado precipitação efetiva


capacidade máxima precipitação total

Substituindo na equação 11.7 a variável d por P-Q, resulta

P2
Q = (1 1 .8 )
E sc o a m e n to S u p e r fic ia l 403

Nessa equação não estão consideradas as perdas iniciais, introduzindo a


mesma (figura 11.8b), resulta

P - Q - Ia Q
(11.9)
S*-Ia P

Os autores verificaram que, em média, as perdas iniciais representavam


20% da capacidade máxima S = S* - Ia, ou seja Ia = 0,2 S. Substituindo na
equação 11.9, resulta

(P-0.2S)2
Q = ----------------- ( 11. 10)
P+0,8S

a - Kohler e Richards b- U.S. Soil C. Service

Figura 11.8. Relações funcionais

Esta equação é válida para P > 0,2S, Quando P < 0,2S, Q = 0, (figura
11.9). Para determinar a capacidade máxima da camada superior do solo S, os
autores relacionaram esse parâmetro da bacia com um fator CN pela seguinte
expressão

25400
S = ------ - 254 (11.11)
CN

Esta expressão foi obtida em unidades métrica, a equação original, em


unidades inglesas, estabelece o valor de CN numa escala de 1 a 100. Esta
404 H id r o lo g ia

cobertura muito impermeável (limite inferior) até uma cobertura completamente


permeável (limite superior). Esse fator foi tabelado para diferentes tipos de
solo e cobertura (tabelas 11.2 e 11.3).

Figura 11.9. Funções do método SCS

Os tipos de solos identificados nas referidas tabelas são os seguintes:

solo A: solos que produzem baixo escoamento superficial e alta infiltração.


Solos arenosos profundos com pouco silte e argila;

solo B: solos menos permeáveis do que o anterior, solos arenosos menos


profundo do que o tipo A e com permeabilidade superior à média.

solo C: solos que geram escoamento superficial acima da média e com


capacidade de infiltração abaixo da média, contendo percentagem considerável
de argila e pouco profundo;

solo D: solos contendo argilas expansivas e pouco profundos com muito baixa
Escoamento Superficial 405

capacidade de infiltração, gerando a maior proporção de escoamento


superficial.

Tabela 11.2. Valores do parâmetro CN para bacias rurais


Uso do solo Superfície A B c D
Solo lavrado com sulcos retilíneos 77 86 91 94
em fileiras retas 70 80 87 90

Plantações em curvas de nível 67 77 83 87


regulares terraceado em nível 64 76 84 88
Em fileiras retas 64 76 84 88

Plantações de Em curvas de nível 62 74 82 85


cereais terraceado em nível 60 71 79 82
Em fileiras retas 62 75 83 87

Plantações de Em curvas de nível 60 72 81 84


legumes ou Terraceado em nível 57 70 78 89
cultivados Pobres 68 79 86 89
Normais 49 69 79 94
Boas 39 61 74 80

Pastagens Pobres, cm curvas dc nível 47 67 81 88


Normais, cm curvas de nível 25 59 75 83
Boas, cm curvas de nível 6 35 70 79

Campos Normais 30 58 71 78
permanentes Esparsas, de baixa transpiração 45 66 77 83
Normais 36 60 73 79
Densas, de alta transpiração 25 55 70 77

Chácaras Normais 56 75 86 91
Estradas de Más 72 82 87 89
terra de superfície dura 74 84 90 92

Florestas muito esparsas, baixa transpiração 56 75 86 91


esparsas 46 68 78 84
densas, alta transpiração 26 52 62 69
normais 36 60 70 76
Hidrologia

Tabela 11.3. Valores de CN para bacias urbanas e suburbanas


A B C D
Utilização ou cobertura do solo
72 81 88 91
Zonas cultivadas: sem conservação do solo
com conservação do solo 62 71 78 81
Pastagens ou terrenos em más condições 68 79 86 89

boas condições 39 61 74 80
Baldios

Prado em boas condições 30 58 71 78

Bosques ou zonas cobertura ruim 45 66 77 83


Florestais: cobertura boa 25 55 70 77

Espaços abertos, relvados, parques, campos


de golf, cemitérios, boas condições
com relva em mais de 75% da área 39 61 74 80
com relva de 50 a 75% da área 49 69 79 84

Zonas comerciais e de escritórios 89 92 94 95

Zonas industriais 81 88 91 93

Zonas residênciais
lotes de (m2) % média impermeável
<500 65 77 85 90 92
TüOÕ 38 61 75 83 87
1300 30 57 72 81 86
2000 25 54 70 80 85
4000 20 51 68 79 84

Parques de estacionamentos, telhados, viadutos, etc 98 98 98 98

Airuamentos e estradas
asfaltadas e com drenagem de águas pluviais 98 98 98 98
paraleiepípedos 76 85 89 91
terra 72 82 87 89
Escoamento Superficial 407

Os valores das constantes nas tabelas 11.2 e 11.3 referem-se a' condições
médias de umidade antecedente. Os autores apresentaram correções aos valores
tabelados para situações diferentes da média. As condições consideradas são
as seguintes:

AMC I - situação em que os solos estão secos. Na estação de crescimento a


precipitação acumulada dos cinco dias anteriores é menor que 36 mm e em outro
período, menor que 13 mm;

AMC II - situação média em que os solos correspondem à umidade da capacidade


de campo;

AMC III - situação em que ocorreram precipitações consideráveis nos cinco


dias anteriores e o solo encontra-se saturado. No período de crescimento, as
precipitações acumuladas nos cinco dias anteriores, são maiores que 53 mm e
no outro maior que 28 mm.

Na tabela 11.4 é apresentada a correspondência entre a situação média


das outras tabelas e as condições de umidade que se diferenciam.

Exemplo 11.2. Para os dados do exemplo 11.1, determine a precipitação efetiva


correspondente ao escoamento superficial obtido.

Solução; nesse caso foram calculadas as precipitações efetivas por diferentes


métodos:

índice <j>: esse método utiliza perda constante. O total das perdas distribuído
pelos 13 intervalos de tempo fica

<(> = ( 32,5 - 13 )/ 13 = 1,5 mm

Como se observa nos dados, existem intervalos de tempo em que a


precipitação total é menor que o índice <|>. Para manter o total de
precipitação efetiva igual ao escoamento superficial, a diferença foi
retirada dos intervalos de tempo restantes. Os valores são apresentados na
tabela 11.5.

índice W: adotando as perdas iniciais e armazenamento correspondente aos


primeiros três intervalos de tempo, já que a partir do quarto a bacia
responde às precipitações, resultam: perdas iniciais e armazenamento- 3,4 mm;
perda constante = (32,5 -3,4- 13 )/10 = 1,61 mm

Os valores calculados são apresentados na tabela 11.5. Considerando-se


408 Hidrologia

que. existe somente um intervalo cm que P (precipitação) < W optou-se por


retirar a diferença dos maiores valores.

Tabela 11.4. Correção de CN para outras condições


iniciais de umidade.
VALORES VALORES CORRIGIDOS VALORES CORRIGIDOS
MÉDIOS AMC I AMC III
100 100 100
95 87 98
90 78 96
85 70 94
80 63 91
75 57 88
70 51 85
65 45 82
60 40 78
55 35 74
50 31 70
45 26 65
40 22 60
35 18 55
30 15 50
25 12 43
20 9 37
15 6 30
Í0 4 22
5 2 13

Relações funcionais: esse tipo de metodologia é utilizada para estimar a


precipitação efetiva de projeto. Altemativamente, pode-se utilizá-la para
verificar sua adaptabilidade na determinação da chuva efetiva.
Considerando que são conhecidas a precipitação acumulada Pac e a vazão
de escoamento superficial acumulada Qac: a equação do modelo Soil
Conservation Service, com o termo de perdas iniciais fica

S - (Pac - Ia) [ (Pac - Ia)/Qac - 1 ]

Utilizando a equação de S função de CN, resulta

CN = 25400/ ( (Pac - Ia ) [(Pac - Ia)/Qac - I] + 254 )


Escoamento Superficial 409

Para o exemplo, substituindo os valores Pac = 32,5 mm; Qac = 1 3 mm e


admitindo que as perdas iniciais correspondam aos 4 primeiros intervalos de
tempo, Ia=5,3 mm, resulta para CN = 89,5. Compatível com os valores da tabela
para uma bacia urbana. Os valores calculados de precipitação efetiva, com
base no CN calculado, são apresentados na tabela 11.5. Pode-se observar, que
o hietograma resultante desset caso apresentou uma precipitação efetiva máxima
menor que os demais. Os métodos de separação por índices apresentaram
resultados muito próximos entre si.

Tabela 11.5. Exemplo 11.2


t P Pe r(<» Pef (W) P a c Qa c Pe f ( SCS)
30 min mm mm mm mm mm mm
1 0,9 0 0 0,9 0 0
2 0,9 0 0 1,8 0 0
3 1,6 0 0 3,4 0 0
4 1,9 0,4 0,3 5,3 0 0
5 2,2 0,5 0,6 7,5 0,15 0,15
6 2,2 0,5 0,6 9,7 0,57 0,42
7 3,8 2,1 2,0 13,5 1,77 1,20
8 6,0 4,3 4,3 19,5 4,58 2,81
9 5,7 4,0 4,0 25,2 7,97 3,39
10 2,5 0,8 0,9 27,7 9,61 1,64
11 1,9 0,4 0,3 29,6 10,92 1,31
12 1,3 0 0 30,9 11,83 0,91
13 1,6 0 0 32,5 12,98 1,15
- ■-1

11.4 Modelos do escoamento superficial

O escoamento superficial é a parcela do ciclo hidroiógico em que a água


se desloca na superfície da bacia até encontrar uma calha definida. Quando a
bacia é rural c possui cobertura vegetal, o escoamento sofre a interferencia
desta cobertura e grande parte dele se infiltra. O escoamento em bacias
urbanas é regido peia interferência do homem através de superfície-
impermeáveis e sistemas de esgotos pluviais.
O escoamento superficial é, portanto, a combinação do fluxo de pequena
profundidade na superfície com escoamento em pequenos canais que constituem a
drenagem da bacia hidrográfica. A representação do escoamento em seus menores
detalhes é difícil, devido à grande variabilidade das condições físicas as
bacias. O escoamento é idealizado com profundidade pequena e grande argura^
Na realidade existe uma combinação de planos contribuindo para pequeno
410 Hidrologia

canais direcionados por declividades predominantes.


Esse escoamento tem sido representado por modelos bidimensionais
(longitudinal e transversal) e unidimensional com as equações completas
(capítulo 10). Esses modelos apresentam sérias limitações devido à grande
variabilidade do relevo, disponibilidade de informações e aspectos numéricos
de solução das equações.
Os modelos usualmente utilizados para representar o escoamento
superficial têm sido classificados em lineares e não-lineares e, em empíricos
e conceituais.

Modelos lineares e não-lineares: um modelo é matematicamente linear quando a


equação diferencial do mesmo é linear. A equação diferencial seguinte
dnx dn_ix dx
An ----- + An-i ------- + .... + Al + Ao x = y(t) (11.12)
dtn d t 1” 1 dt

é linear quando os coeficientes Ao,Ai,...An são independentes de x e linear


invariante quando os coeficientes referidos são também independentes de t. O
modelo é nãc-linear quando pelo menos um dos coeficientes depende de x.
Uma das características do modelo linear é o de possuir o princípio de
superposição. Uma determinada entrada do sistema, yi(t) produz uma saída
xi(t) e a entrada y2(t) produz uma saída x2(t). O princípio dc superposição
é válido, se a entrada yi(t)+y2(t) produz a saída xi(t) + x2(t).
As equações diferenciais do escoamento 10.1 e 10.14 são equações
diferenciais não-lineares, o que indica que o escoamento tem um comportamento
não:linear. A vazão, variável independente do escoamento, depende da área,
profundidade e rugosidade.

Modelos empíricos e conceituais: um modelo é dito conceituai quando as


funções utilizadas na sua elaboração levam em consideração os processos
físicos. Os modelos empíricos (black box) utilizam-se de funções empíricas
que não estão relacionadas com os fenômenos físicos, mas permitem retratar a
saída do sistema em função da entrada.

Os tipos de modelos de escoamento superficial usualmente mencionados na


literatura, são os seguintes:

Linear conceituai: os modelos conceituais utilizam as equações de escoamento


apresentadas no capítulo 10. Esses modelos podem ser do tipo armazenamento,
onda cinemática, difusão e dinâmico. Considerando que as referidas equações
são não-lineares, versões lineares das mesmas foram introduzidas para a
simulação do escoamento.
Escoamento Superficial 411

Linear empírico: quando o hidrograma unitário instântaneo ou discreto tem


suas ordenadas determinadas por métodos como o da inversão de matriz, série
de Fourier, inversão via função de Laguerre, entre outros, o modelo é
empírico. São equações que procuram representar o comportamento matemático de
uma função semelhante ao hidrograma.

Não-linear conceituai: esses modelos utilizam as equações de escoamento


descritas no capítulo 10. A diferença com relação aos modelos lineares é que
nesse caso são utilizadas as versões não-lineares das equações. Os modelos de
armazenamento e onda cinemática são os mais utilizados, nesse caso, já que a
declividade da superfície da bacia em geral é alta, o que aumenta a
aplicabilidade desses modelos.

Nesse texto são descritos os modelos lineares, com ênfase no hidrograma


unitário, que utiliza um método empírico de estimativa das ordenadas.

11.5 Modelo Linear

11.5.1 Hidrograma unitário instântaneo

O hidrograma unitário instântaneo (HUI) é a resposta de uma bacia de


comportamento linear a um impulso unitário instantâneo. O HUI é também
chamado de função núcleo ou função Kcmel.
O impulso unitário instântaneo é representado matematicamente por uma
função Delta de Dirac, que tem as seguintes propriedades:

5 ( t - t ) = 0 para t * x (11.13)

00
%
5 (t -x ) áx = 1 (11.14)
*

-00

Considerando uma precipitação isolada e instantânea P (t=t), figura


11.10a, a resposta da bacia (sistema linear) a esta precipitação impulso
unitário instântaneo P(t) é P(x) p (t-t), onde p(t-T) é o HUI.
Numa precipitação complexa, a entrada da precipitação P(t) na bacia, que
tem comportamento linear e invariante no tempo, tem como resposta o
hidrograma Q(t). A ordenada Q(t) desse hidrograma é obtida pela soma das
ordenadas no tempo t, devido a cada impulso infinitesimal de P (figura
11.10a). Esta soma é obtida pela integral
412 Hidrologia

t
Q(t) = P(t) (x(t ~t) dt (11.15)
0

que é a equação de convolução.


O HUI tem o mesmo volume do impulso unitário


*

|i(t - x) dx = 1 (11.16)
0

Considerando que o sistema receba um impulso unitário instântaneo e


mantenha esta entrada unitária indefinidamente, a resposta do sistema pode
ser obtida pela equação de convolução para P(t)= I, resultando em

t
q(0 p(t-t) dt (1 U 7 )
0

que é a função impulso unitário. Obtendo-se a função impulso unitário é


possível obter o HUI por

dq
U(t) = (11.18)
dt

A equação de convolução foi expressa para uma bacia com memória maior ou
igual ao tempo t. No caso em que t > n, onde n é o tempo de base do HUI, a
equação se modifica para

Q(t) = j P(x) M-(t-T) dx (11.19)


t-n

Exemplo 11.3. O HUI de uma bacia 6 expresso por (e ^)/2 . Determine a vazão
após lh, devido a uma precipitação de I2mm de intensidade constante nesse
período. Na equação, t deve ser dado em horas.

Solução: utilizando a equação de convolução


Escoamento Superficial

C t

a) HUI e convoluçao
414 Hidrologia

Q(lh) = S l 12 ,[(e'(1't)/2)/2] dx = 4,72 mm/h


0

Exemplo 11.4. A resposta de uma bacia, que se comporta linearmente, a uma


precipitação constante de 10 mm/h e duração maior que o tempo de concentração
da bacia é a seguinte:
Q(t) = 10( 1 -

com a vazão é obtida em mm/h. Obtenha o hidrograma unitário instântaneo.

Solução: considerando que o tempo de duração da precipitação é maior que o


terqpo de concentração da bacia, e que a precipitação tem intensidade
constante, a função impulso unitário é obtida por:
q(t) = 10/10 ( 1- etfl ) = (1 - e'^)

O hidrograma unitário é obtido por

li(t) = dq/dt = 1/2

l l ü Hidrograma unitário
o

Equações básicas

O hidrograma unitário c a resposta da bacia a uma precipitação de volu­


me unitário de duração At. Para que a precipitação tenha um volume unitário e
ocorra no intervalo de tempo At, a sua intensidade deve ser i/At (figura 11.1b).
O HU converge para o HUI à medida que o intervalo de tempo converge para
zero.
Para estimar o HU com base no hidrograma unitário instântaneo basta
utilizar a equação de convolução nas seguintes condições:

para 0 < t < At, a precipitação P(t) = 1/At e


t
h(At,t) = 1/At p.(t-T)dt ( 11.20)

para t > At a expressão fica


Escoamento Superficial 415

Ai
h(At,t) = 1/At M- (t - t) dx ( 11.21)
o

O HU é utilizado, normalmente com intervalo de tempo igual aos das


precipitações. Considerando que os parâmetros do HUI que têm unidades de
tempo, sejam utilizados em unidades de At (intervalo de tempo), a vazão após
um intervalo de tempo At fica
1

Qd) = Pi (l(l-X)dx
0

A vazão após 2 intervalos de tempo fica


1 2
Q(2) = Pl ja(2-x)dx + Pz p(2 -t )dx

sendo que

hi = ji(2-x)dx = |i(I-x)dx

h2 = |i(2 - x ) dx

o que resulta

Q(2) = Pi h2 + P2 hi

considerando que
1
hi = |X(Í - x) dx (11.22)
0

a equação de convolução discreta fica


416 Hidrologia

t
ht-i+i (11.23)

i= j

para t ^ n, j = 1 e para t > n , j = t-n+1, onde n é o número de ordenadas do


HU.
Para interpretar a convolução observe a figura 11.10b. A precipitação Pi
gera o hidrograma Pi HU(t-ri), enquanto que P2 e P3 geram, respectivamente,
os hidrogramas P2 HU(t-T2) e P3 HU(t-T3). Os valores de %representam o tempo
em que cada hidrograma inicia. O hidrograma Q(t) é obtido pela soma em cada
tempo t das respostas das três precipitações, representado pela equação
11.23.

Exemplo 11.5. O HU de uma bacia é hi = 0,2, h2= 0,6 e h3 = 0,2. Determine o


hidrograma Q(t) para as precipitações Pi = 10 mm/h e P2= 15 mm/h. O intervalo
de tempo 6 lh.

Solução: utilizando a equação 11.23, resulta

t = 1 Qi = Pt h! = 10 . 0,2 = 2 mm/h
t - 2 Ql = Pi h?. H- P2 hi = Í0 , 0,6 + 15 . 0,2 = 9 mm/h
t = 3 Qs — P i h3 + P2 h2 = 10 . 0,2 + 15 . 0,6 - ll mm/h
1 =4 Q3 = P2 h3 = 15 . 0,2 = 3 mm/h.

As simplificações adotadas pelo uso do HU na determinação do escoamento


superficial de uma bacia são os seguintes:

linearidade: o modelo admite que a transformação de precipitação efetiva em


vazão é linear invariante, ou seja, admite a superposição dos efeitos e o HU
constante no tempo;

distribuição espacial uniforme: a precipitação é a mesma em toda a bacia no


intervalo de tempo de cálculo;

distribuição temporal uniforme ■ A intensidade da precipitação é constante no


intervalo de tempo;

intervalo de tempo At: a escolha do intervalo de tempo ou duração At da


precipitação, depende do tempo de resposta da bacia. O intervalo de tempo
deve ser suficientemente pequeno para que a distribuição do volume e dos
valores máximos instantâneos não sejam distorcidos. Esse intervalo não deve
ser muito pequeno para evitar o processamento de uma quantidade exagerada de
Escoamento Superficial 417

informações. O tempo de pico tp tem sido utilizado como indicador para


obtenção do valor do intervalo de tempo At. Snyder (1938) utilizou At- tp/5,5
e SCS(1957) At = tp/3. Isto indica que os autores procuram ter entre 3 e 5
pontos para representar a ascensão do hidrograma de escoamento superficial,
onde ocorrem os maiores gradientes. Deve-se procurar escolher o intervalo de
tempo mais conveniente entre os valores mencionados. Caso se deseje uma
precisão maior o intervalo pode ser menor que tp/5,5. Sherman(1949) sugeriu o
seguinte: a) bacias com área > 2500 km2, At entre 12 e 24h; b) bacias com
área entre 250 e 2500 km2, At entre 6 e 12 h; c) para bacias com área menor
que 250 km2, adote os critérios anteriores.

O tempo de pico e o tempo de concentração podem ser estimados por


equações empíricas estabelecidas para diferentes regiões. Existem expressões
para cada uma destas variáveis e/ou relações entre si. A seguir são
apresentadas algumas equações.

ic 57 ( H!-)0’385 Kirpich (11.24)


H

onde tc - tempo de concentração em minutos; L = comprimento do rio ern km; H


diferença de elevação entre o ponto mais remoto da bacia e a seção principal.
Segundo Mockus citado por Cray (1970) o tempo de pico, tempo de retardo
e tempo de concentração sc relacionam segundo as seguintes equações:

tc = tp/0,6 ( l í .25)

tm = ite" + 0,6 tc (11.26)

O tempo de pico tem sido expresso por uma função do tipo

LLcg n
tp = C (11.27)
¥

onde Lcg = comprimento pcio rio principal da foz até o ponto mais proximo ao
centro de gravidade da bacia; L - comprimento do rio; S = declividade; n e C são
parâmetros estimados para cada local de interesse. Esse tipo de equação tem
sido ajustada para aigumas regiões, definindo os valores de C e n. Linsley et al.
(1975) apresentou resultados para esses coeficientes utilizando 18 bacias
418 Hidrologia

americanas com áreas variando entre 6 e 1670 km2. O autor estabeleceu a


eqoação para três regiões; montanhosa, pé da montanha e no vale.

Estimativa das ordenadas do HU com base em dados históricos

Quando existem dados históricos é possível determinar o HU com base em


eventos em que foram registradas precipitações e vazões no intervalo
desejado. Os dados são selecionados segundo eventos. O evento é simples
quando apenas um intervalo de precipitação gera escoamento superficial, e é
complexo quando mais de um intervalo de precipitação gera escoamento.

Evento simples: quando existem, nos registros, precipitações extremas com


duração menor ou igual ao intervalo de tempo Át escolhido e com distribuição
temporal espacial uniforme é possível estimar o HU sem grande dificuldade. A
seqüência é a seguinte:

a) Separe os escoamentos através dos métodos apresentados, determinando as


ordenadas do hidrograma de escoamento superficial e a precipitação efetiva;

b) O volume precipitado em mm é obtido do valor de Pef ou se for desconhecido


para o evento, a partir do somatório das vazões e convertidos em mm por:

YQi Nd
h = — ——(mm) (11.28)
A . 103

onde Nd = número de segundos do intervalo de tempo; A=área em km2;Qi = vazão


do intervalo i.

c) As ordenadas do HU ficam hi = Qi/ h

Exemplo 11.6, Determine o HU de uma precipitação isolada de Ih (tabela 11.6).


Determine o escoamento resultante para outro evento com as precipitações
apresentadas na tabela 11.7. A área da bacia é de 35 km2.

Solução: o total de escoamento superficial é de 208 m3/s. A precipitação


efetiva é

208 . 3600
h = ------------- = 21,4 mm
35.1Q3
E sc o a m e n to S u p e r fic ia l
419
Tabela 11.6. Hidrograma do exemplo 11.6
Tempo Vazão
horas m3/s
1 5
2 25
3 50
4 45
6 38
6 25
7 15
8 5

Tabela 11.7. Hietograma para previsão


Tempo Precipitação
horas mm
1 30
2 20

O HU (lh, 1 mm) é calculado dividindo as ordenadas do hidrograma por h,


tabela 11.8. A vazão resultante do outro evento são apresentadas na tabela
1 1 . após o uso da equação de convolução discreta. Por exemplo, para t= 2
Q2 = p2 hi+ Pi h2= 20. 0,234 + 30. 1,168 = 39,72 m3/s.

Tabela 11.8. Resultados do exemplo 11.6


Tempo jHid.Unitário Vazão
(resposta do evento tab.11.7)
horas m3/s m3/s
1 0,234 7,02
2 1,168 39,72
3 2,336 93,44
4 2,103 109,81
5 1,776 95,34
6 1,168 7056
7 0,701 4459
8 0,234 21,04
9 4,68
Hidrologia
420

Evento complexo: quando são conhecidas as vazões e precipitações e


desconhecidas as ordenadas do hidrograma unitário, num evento complexo, o
problema possui mais equações do que incógnitas, portanto é um problema com
infinitas soluções.
Sejam os registros de precipitação com intervalo de tempo At, Pi,P2?...
Pm. As vazões resultantes desses registros de precipitação para o mesmo
intervalo de tempo são Qi, Q2,...Qn. O número de ordenadas do HU é k = n-m+1,
ou seja hi, h2,..hk.
As operações dessas variáveis são:

Qi = Pi hi
Q2 - P2 hi + Pi h2
Q3 = P3 hi + P2 h2 + Pi h3

ou em notação matricial

P . h = Q (11.29)

onde

Pi
P2
0 0 ....
Pl 0 ....
0
0
hl V
Q2
h2
p =
;h = ;Q =
Pm Pm-1 .. Pl .. 0
hk Qn-1
0 0 0 0 Pm

O sistema de equações possui n equações e k incógnitas, como k s n o


sistema tem infinitas soluções.
Algumas das soluções possíveis são as seguintes:

a) Por substituição: nesse caso, existem duas alternativas:

- no sentido da vazão menor para a maior, ou seja

hi = Q1/P1
h2 = (Q2 - P2 hl)/Pl

- no sentido da vazão maior para a menor


Escoamento Superficial
421
hk = Qn/Pm
hk-1 = (Qn-1 - Pm-1 hk)/Pm

Tanto num caso como no outro existem mais equações do que incógnitas e
nem todas as equações são usadas para a estimativa de hi,

b) Mínimos Quadrados ou inversão de Matriz: o método de inversão de matriz é


um modelo empírico utilizado para estimar o hidrograma unitário de eventos
complexos. TVA (1961) apresentou a metodologia descrita a seguir
Multiplicando ambos os lados da equação pela matriz transposta da
precipitação PT resulta

PT. P . h = PT . Q

fazendo

X = PT. P

resulta
X . h = PT. Q

h = X '1 . PT . Q (11.30)

A metodologia minimiza a diterença quadrática ens vazões observada e


calculada, o que pode resultar cm ordenadas negativas e somatório diferente de
1. Esse procedimento fornece maior peso aos maiores valores.

Exemplo 11.7. As precipitações efetivas são, respectivamente Pi=10 mm/h e


P i-20 mm/h. As vazões resultantes são Qi= 3mm/h, Q2= 9 mm/h; Q3 = 12 mm/h e
Q4 = 6 mm/h. Calcule as ordendas do HU.

Solução: as equações são:

3 = 10 hi
9 = 20 hi + 10 h2
12 = + 20 h2 + 10 h3
6 = 20 h3

ou em notação matricial
Hidrologia
422

.10 0 0 3
hi
20 10 0 9
h2
0 20 10 12
h3
0 0 20 6

a) por substituição no sentido da vazão menor para a maior

hi = 3/10 = 0,3
h2 = (9 - 20 . 0,3)/ 10 = 0,3
h3 = (12 - 20 . 0,3)/ 10 = 0,6

A soma das ordenadas deve ser igual a 1. Nesse caso Shi = 1,2, o que
representa uma grande diferença.

b) por substituição no sentido da maior vazão para a menor

h3 - 6/20 = 0,3
h2 = (12 - 10 . 0,3)/20 = 0,45
hi - (9 - 10 . 0,45)/20 = 0,23

Nesse caso, Ihi = 0,98, resultado mais próximo da unidade.

c) pelo método da inversão de matriz, operando com a matriz transposta


resulta

500 200 0 hi 210


200 500 200 * h2 = 330
0 200 500 h3 240

resolvendo esse sistema de equações resulta

hi = 0,2435; h2 = 0,4412 e h3 = 0,3035

A soma total das ordenadas deve ser 1, nesse caso a soma resultou em
0,9882. Pode-se distribuir o erro de forma ponderada. As ordenadas ficam

hi = 0,246; h2 = 0,446 e h3 = 0,308

Utilizando os valores das ordenadas do HU obtidos, com as precipitações


observadas são obtidas as vazões simuladas da figura 11.11
Escoamento Superficial 423

Figura 11.11. Exemplo 11.7

Exemplo 11.8 Determine o hidrograma unitário do exemplo 11.2.

Solução: da tabela 11.1 pode-se obter a precipitação efetiva pelos diferentes


métodos e o escoamento superficical na tabela 11.5. Na tabela 11.9 são
reunidas estas informações
Resolvendo pelo método de inversão de matriz obteve-se, para cada tipo
de precipitação efetiva, as ordenadas do HU, apresentadas na tabela 11.9.
Para as Pef obtidas pelo SCS, o HU apresentou ordenadas negativas devido
à minimização quadrática. Alterando o HU para somatório 1 e desprezando a
quinta ordenada obtém-se os valores corrigidos. Na figura 11.12 são
apresentados os resultados das vazões calculadas utilizando as três
precipitações efetivas.
Pode-se observar que os métodos <|>e W apresentam resultados práticamente
iguais. Esses métodos se aproximam mais dos valores observados* As oscilações
que aparecem no HUs podem ser devido ao seguinte: a) metodologia de
minimização que gera distorções como esta; b) contribuição de diferentes
partes da bacia. Para dirimir as dúvidas e obter o HU médio da bacia são
necessários mais eventos.
424 Hidrologia

Tabela 11.9. Exemplo 11.8 precipitação efetiva


Tempo ♦ w s c s Esc. superficial Esc. superficial
30 min. mm mm mm m3/s mm/At
4 0,4 0,3 0 0 0
5 0,5 0,6 0,15 11,1 0,187
6 0,5 0,6 0,42 28,3 0,477
7 2,1 2,0 1,20 55,4 0,934
8 4,3 4,3 2,81 94,6 1,595
9 4,0 4,0 3,39 121,7 2,052
10 0,8 0,9 1,64 122,9 2,073
11 0,4 0,3 1,31 108,0 1,821
12 0,91 83,1 1,401
13 1,15 60,3 1,017
14 39,4 0,664
15 24,6 0,415
16 13,7 0,231
17 4,9 0,083

Tabela 11.10;valores dos HU


t HU HUC HU HU
horas (SCS) (SCS) (O) (W)
1 0,469 0,47 0,27 0,279
2 0,180 0,18 0,127 0,105
3 0,191 0,19 0,216 0,244
4 0,157 0,16 0,136 0,104
5 -0,002 0 0,113 0,138
6 0,050 0,036
7 0,087 0,093

Seleção de eventos e HU médio

A seleção de eventos para cálculo do HU deve ser muito criteriosa para


evitar tendenciosidade na estimativa do HU da bacia. O ajuste do HU com
eventos de pequena magnitude tendem a subestimar a previsão de cheias maiores
do que aquelas utilizadas no seu ajuste devido à linearidade do método, O HU
é um método linear, que admite tempo de deslocamento da onda constante numa
bacia, enquanto que o comportamento real indica que isso não ocorre, pois
cheias de diferentes magnitudes têm tempo de deslocamento variável. Uma
pequena cheia com intensidade de chuva pequena, tenderá a ter um tempo de
E sc o a m e n to S u p e r fic ia l
425

pico maior que uma cheia com intensidade maior. Nesse caso, admite-se que o
rio não extravasou a sua calha natural.

Figura 11.12. Exemplo 11.8

Para escolher os eventos, deve-se procurar atender os objetivos do


estudo. Por exemple: para um estudo de cheias de grande tempo de retomo,
deve-se procurar trabalhar com os maiores hidrogramas disponíveis, evitando
um grande número de eventos que reduza o pico. Nesse caso, deve-se procurar
ser conservador, já que normalmente o tempo de retomo dos eventos
registrados é inferior ao tempo de retomo do período de prognóstico.
Selecionados alguns eventos e determinado o hidrograma unitário dos
diferentes eventos, é necessário sintetizar um hidrograma unitário para a
bacia, já que certamente cada evento apresentará um HU diferente em magnitude
e distribuição temporal. Isto se deve a não-uniformidade temporal e espacial
da precipitação e às características não-lineares do escoamento. Existem dois
métodos principais para sintetizar um único HU para uma bacia:

- posicionar os HUs com base na origem, obtendo a média das ordenadas


426 Hidrologia

para cada intervalo de tempo (figura 11.13a). Esse procedimento tende a


reduzir o pico e as vazões de cheia;
- posicionar os HU com base nos picos, obtendo a média das ordenadas
para cada intervalo de tempo (figura 13b).

Para as duas situações deve-se procurar manter o volume unitário e


ajustar o hidrograma médio de acordo com os objetivos do estudo, sendo
conservador na determinação das referidas ordenadas.

Figura 11.13. Hidrogramas médios


m
Escoamento Suoerficial 427

Conversão do HU para diferentes durações

Sendo At a duração da precipitação ou intervalo de tempo do HU e Ati a


duração para o qual se deseja o HU, existem duas situações:

At < Atr. nesse caso basta deslocar o HU(d) n vezes, sendo n = Atl/At.
Somando as ordenadas de (cada At e dividindo por n obtém-se o HU para
precipitação Ati = nAt. Esse procedimento equivale-se ao uso da equação de
convolução.

Exemplo 11.9. Determine o HU(lh) com base no HU(l/3h).

Solução; na tabela 11.11 é apresentado o HU (lh). Deslocando o mesmo de 1


intervalo por três vezes. As ordenadas são somadas e divididas por 3.

At > Ati - esta é a situação em que se deseja melhorar a discretização


do HU. Como o HU disponível foi obtido com base em dados com intervalo At
(At>Ati), ao se discretizar para Atl não significa que se obterá maior
precisão ou melhor resolução, já que o HU(At) pode ter filtrado as maiores
oscilações. Por exemplo, dispondo-se de dados diários, determina-se o HU (1
dia). Como a bacia necessita de um intervalo de tempo de 6h, determina-se o
HU (óh) com base no HU(ldia). Nesse caso, provavelmente o HU de ldia filtrou
as variações dentro do dia c é inadequado para estimar o HU de 6h. Para
verificar sc isso rcalmcnte ocorre á necessário obter dados com intervalo de
tempo pequeno.
Na estimativa do HU de duração Atl com base em At, para At > Atl,
utiliza-se da Curva S, que é definida como a resposta da bacia a uma
precipitação .unitária e constante, ou seja é a forma discretizada da função
impulso unitário (figura 11.14a). Para obter esta curva aplica-se
sucessivamente o HU, pois a precipitação é unitária e constante. Esse
procedimento é o mesmo que deslocar o HU de At, várias vezes até que seja
encontrado o patamar observado na figura 11.14b. O patamar ocorre quando o
tempo de base no HU é atingindo. Somando as ordenadas de mesmo intervalo é
obtida a Curva S.
Utilizando o conceito do HUI, a curva S é a integral de convolução para
P(x)=l. Na forma discretizada fica

(11.31)
i=l
428 Hidrologia

Para obter o HU, basta derivar esta função. O HU com intervalo Atl é
obtido por

h(t) = [ S(t+di) - S(t) ]. n (11.32)

ondet n = At/Atl

Tabela 11.11.Exemplo 11.9


t HU HU
(20min) (lcm,l/3h) (lcm ,lh)
1 0,15
2 0,25 0,15 0,050
3 0,25 0,25 0,15 0,133
4 0,15 0,25 0,25 0,15 0,217
5 0,10 0,15 0,25 0,25 0,217
6 0,10 0,10 0,15 0,25 0,167
7 0,10 0,10 0,15 0,127
8 0,10 0,10 0,067
9 0,10 0,033

Exemplo 1U 0. Determine o HU(l/3h) com base no HU (lh) do exemplo anterior.


Na tabela 11.12 o HU foi deslocado de At/Atl intervalos, três vezes (colunas
1, 2 e 3). A curva S é o somatório desses valores e interessa até o intervalo
que o valor tende a ser constante, criando um patamar. Para obter o HU(h/3),
desloca-se a curva S de Atl, nesse caso 1 intervalo de tempo (20mi). A coluna
5 é obtida pela diferença entre S(t) e a coluna 4. O HU(h/3) é obtido pelo
produto de At/Atl pelos valores da coluna 5.

11.5.3 Hidrograma unitário sintético

A situação mais freqüente, na prática, 6 o da inexistência de dados


históricos. Os Mdrogramas unitários sintéticos foram estabelecidos com base
em dados de algumas bacias e são utilizados quando não existem dados que
permita estabelecer o HU.
Os métodos de determinação do HU baseiam-se na determinação do valor de
algumas abeissas, como o tempo de pico e tempo de base e as ordenadas como a
vazão de pico. A regionalização destas variáveis com base em características
físicas tem permitido estimar o HU para um local sem dados observados.
Escoamento Superficial 429

Figura 11*14. Curva S


430 Hidrologia

Tabela 11.12. Exemplo 11.10


t HU (D (2) (3) S(t) (4) (5) HU
(20min) (lh) (20min)

1 0,050 0,050 0,050 0,15


2 0,133 0,133 0,050 0,083 035
3 0,217 0,217 0,133 0,084 0,25
4 0,217 0,050 0,267 0,217 0,050 0,15
5 0,167 0,133 0,300 0,267 0,033 0,10
6 0,127 0,217 0,344 0300 0,044 0,10*
7 0,067 0,217 0,050 0,334 0,344 0
8 0,033 0,167 0,133 0,333 0334
0,127 0,217 0,344 0,333
0,067 0,217 0,050 0,334 0,344
0,033 0,167 0,133 0,333 0,334
0,127 0,217 0,340 0,333
* esse valor tende para 10 devido à oscilação da curva S no
seu patamar.

Snyder: Snyder (1938) foi um dos primeiros a estabelecer um HU sintético com


y
dados dos Apalaches (USA) com bacias de 10 a 10.000 mi de área de drenagem. O
método consiste na determinação dos seguintes fatores:
Tempo de pico:
tpi = Ct (LJLcg)03 (11.33)

onde L = comprimento do rio principal (km); Lcg = é a distância da seção


principal ao ponto do rio mais próximo ao centro de gravidade da bacia (km);
Ct = coeficiente que varia entre 1,35 a 1,65;
Tempo de duração da precipitação, calculado por

tpi

trl = ~5~5 Q*0™*) (11.34)

Quando o tempo de duração da precipitação é corrigido para tr, corrija


tp por

tp = tpl + (tr - trt)/4 (11.35)

A vazão de pico para uma precipitação de duração tr e volume lcm fica


E sc o a m e n to S u p e r fic ia l 431

2,75 Cp A
qp = ------------ (m3/s) (11.36)
tp

2
onde A = área de drenagem, em km ; Cp = coeficiente que varia entre 0,56 e
0,69. Na literatura vários autores têm aplicado semelhante procedimento em
diferentes partes dos Estados Unidos obtendo valores de Cp e Ct com intervalo
de variação superior ao indicado. O coeficiente Ct tem influência sobre o
tempo de pico e depende das outras características físicas que não foram
consideradas na equação acima. O coeficiente Cp está relacionado com a vazão
máxima de uma determinada bacia e depende das referidas características
físicas. Para bacias próximas com características físicas semelhantes pode-
se usar dados de bacias vizinhas para a estimativa desses coeficientes. O
tempo de base do hidrograma unitário é estimado por

tb = 3 + tp/8 (dias) (11.37)

esse valor fica irreal para bacias muito pequenas.


Com base em qp, tp e tb o HU é esboçado, procurando manter o volume
unitário (Figura 11.15). Para facilitar esse trabalho existem curvas para as
larguras de 75% e 50% do pico, obtidas com base em dados de várias bacias dos
Estados Unidos (Sokolov et al. 1975). Estas relações na forma de equações
são:

3,352
W75 (11.38)
1.08
(qp/A)

5,87
W50 (11.39)
1,08
(qp/A)

para qp cm m3/s c A cm km2, W50 e W75 em horas.


Essas relações devem ser usadas com cuidado, pois retratam condições
médias de um grande número de bacias americanas, o que não atende necessaria­
mente a uma bacia em específico.

Exemplo 11.11. Determine q hidrograma unitário sintético pelo método de


Snyder para uma bacia com os seguintes dados: A= 250 km2; L = 17 km; Lcg = 5
km; Adote Ct = 1,50 e Cp - 0,6.
Hidrologia
432

Solução: o tempo de pico fica


tpi = 1,5 (17 . 5)0,3 = 5,69 h
tri = 5,09/ 5,5 = 1,03 h

Adotando tr = 1,0 h e corrigindo tp

xp = 5,69 + (1 - l,03)/4 = 5,68 h

A vazão de pico do HU fica


a- = 2.75 . 0,60 . 250 / 5,68 = 72,6 m3/s
*

As iarguras do Hu são:
\ cíã
W?5 = 3,352/(72,6/250) ' = 12,74 h
Wjo = 5,87/ (72,6/250)1,08 = 22,31 h

O tempo de base calculado pela equação é irreal, porque o menor valor


será 3 fias. Sendo asssim deve-se procurar prolongar as iarguras obtidas,
mantexio o volume unitário. Como o trabalho de esboçar a curva é tedioso e
Escoamento Superficial
433

sujeito a variadas interpretações, pode-se usar as larguras e pontos obtidos


para estabelecer trechos retilíneos que apresente um volume unitário Na
figura 11.15 os pontos A e B são conhecidos. Adotando uma reta entre A e B
os pontos C, D e E são determinados com base nas larguras W75, W50 e no
volume unitário, ou seja

tc = W75 + 0,75 tP = 12,74 + 0,75 . 5,68 - 16,56 h


3
qc = 54,4 m /s
tD = W50 + 0,50 tp = 22,31 +0,50 . 5,68 = 25,15 h
3
qo = 36,3 m /s
tb = 1 l,l.A/qp - W75 -1,5. W50 = - 7,94 h

Esse valor negativo indica que as larguras estimadas pelas equações


Í1.38 e 11.39 superestimaram 0 vaior. Nesse caso pode-se utilizar um
triângulo (figura 11.15) e estimar 0 ponto E com base no seguinte

tb = 5,56 A/qp =* 19,13 h.

Com base nesses valores 6 possível esboçar a curva ou utilizar o


hidrograma triangular.

SCS

O Soii Conscrvaüon Service (SCS.1957) apresentou um método para


determinação do hidrograma unitário em que 0 mesmo é considerado um triângulo
( f g.l 1.16).
A área do triângulo é igual ao volume precipitado Q, ou seja

qp tp qp tc
—------+ —~— - o
2 2 v

e
2 Q

?
sendo te = H tp, a equação acima fica

2Q (11.40)
qp =
( H + l) t p
Hidrologia
434
2 ’
para uma precipitação de lcm, sobre a área A, em km , tp em horas, a
equação da vazão fica

2,08 A
qp = (11.41)
t’p

os autores adotaram H=l,67 com base na observação de várias bacias. O tempo


t’p é o tempo contado do início da precipitação e é igual a

t’p = tr/2 + 0,6 tc (11-42)

onde tr = duração da precipitação, em horas; tc = tempo de concentração em


horas.

tr

Figura 11.16. Hidrograma triângular SCS

O tempo de concentração pode ser estimado por dois procedimentos segundo


SCS (1975):

a) inicialmente verifica-se qual o caminho entre o ponto mais extremo da


bacia e a seção principal. Para cada trecho desse caminho com características
diferentes, pode-se calcular a velocidade com base na declividade segundo as
expressões da tabela 11.13. O tempo de cada trecho será t = L/v, onde
L=comprimento e v a velocidade. Para os trechos em canais utilize a equação
de Manning com a profundidade da seção de extravasamento;
Escoamento Superficial 435

b) a equação para o tempo de pico tP é a seguinte

2,6 L°'S(S/25,4 + l)0'7


tp “ --------------- ------- ------- (11.43)
1900 y0,5

o n d e tp e m h o r a s ; S é o b t i d o p e l a e q u a ç ã o 1 1 . 1 1 ; L = c o m p r i m e n t o h i d r á u l i c o ,
m , y - d e cliv id ad e e m p ercentagem . O tem p o de c o n ce n tra ç ão p o d e ser obtido
p e l a r e l a ç ã o tp = 0 , 6 tc. A e x p r e s s ã o a c i m a f o i a p r e s e n t a d a p e l o S C S p a r a u s o
e m b a c ia s de até 8 k m .

T a b e la 11.13. V e lo c id a d e p a ra s u p e r fíc ie s e m m /s

tipo de cobertura a*
Floresta com solo coberto
de folhagem 0,076
área sem cultivo ou pouco
cultivo 0,143
pasto c grama 0,216
solo quase nu 0,305
canais com grama 0.351
superfície pavimentada 0,610

* v = a s 1/2 ; s = d e c l i v i d a d e e m %

O t e m p o d c c o n c e n tr a ç ã o se m o d if ic a c o m a a lte ra ç ã o d a c o b e r tu r a da
bacia, p rin c ip a im c n tc devido a urbanização. S C S (1 9 7 5 ) a p re se n ta m o d ifi­
caç ã o nos term os da equação 1 1.43, q u a n d o o c o r r e u r b a n i z a ç ã o d a b a c i a .
N a fig u ra 1 1 .17a c a p re s e n ta d a a re la çã o en tre f l , fa to r d e c o r r e ç ã o d e v id o ã
m o d ific a ç ã o no c o m p rim e n to hidráulico e à p e rc e n ta g e m do c o m p rim e n to
m o d if ic a d a . N a fig u ra 1 1.17b é a p re s e n ta d a a re la ç ã o e n tre o f a to r de c o r r e ­
ç ã o f2 e a p e r c e n ta g e m d e área im p e rm e á v e l. O te m p o d e c o n c e n tr a ç ã o c a l­
c u l a d o c o m b a s e n a e q u a ç ã o 11.43 é c o r r i g i d o p e la m u l t i p l i c a ç ã o d o s f a to ­
re s f l e f2.
Para facilitar o cálculo, S C S ap resentou u m h id ro g ra m a ad im en sio n ali-
z a d o e m f u n ç ã o d a v a z ã o d e p i c o e o t e m p o d e p i c o tp. C o n h e c i d o s o s v a l o r e s
d e tr e q p p o d e - s e d e t e r m i n a r as o u t r a s o r d e n a d a s u t i l i z a n d o o s f a t o r e s da
ta b e la 11.14.

2
Exemplo 11.12 Uma bacia rural com 7 km com cobertura de pasto (CN=61), tem
comprimento de 2,5 km e declividade 8%. Esta bacia deve ser alterada para uma
bacia urbana com 30% de áreas impermeáveis, alterando 75% do seu rio. Estime
Hidrologia

as características do HU para as condições atuais e futuras. Adote CN 83 para


as condições urbanas.

Tabela 11.14. HU adimensional

t/tp Q /qp t/tp Q /qp t/tp Q /qp

0 0 0,1 0,015 0,2 0,075


0,3 0 ,16 0,4 0,28 0,5 0,430
0,6 0 ,60 0,8 0,77 0,8 0,890
1,0 0 ,9 7 1,1 1,00 1,2 0 ,9 8 9
1,3 0 ,92 1,4 0 ,84 1,5 0 ,7 5 0
1,6 0 ,66 1,8 0 ,56 2,0 0 .4 2 0
2,2 0 ,3 2 2,4 0 ,24 2 ,6 0 ,1 8 0
2,8 0 ,13 3,0 0,098 3,5 0,075
4,0 0 ,0 3 6 4,5 0,018 5,0 0

Solução: a) condições atuais:

5 - 25400/61-254 = 162,4
:P = 2,6 (2500y'8(162,4/25,4.+l)°'7/(1900. 80,í) = 1,026 hr.
tc = tp/0,6 = 1,71 hr.

Para uma duração de precipitação de 15min ou lh/4,

í’P = 0,25/2 + 1,026 = 1,15 hr.


qp = 2,08. 7/ 1,15 = 12,65 m3/s

b - condições futuras:

S= 25400/83 - 254 = 52,0


tP = 2,6 (2500)0,8 (52/25,4 + 1)°’7/(1900 80,5) = 0,55 h

Corrigindo esse fator por fi = 0,59 e f2 =0,835 obtidos das figuras


11.17, resulta

tp = 0,55 . 0,59 . 0,835 = 0,27 h


tc = 0,27/0,6 = 0,45 hr.
fp = 0,25/2 + 0,27 = 0,40 hr.
qp = 2,08 . 7 / 0,40 = 36,4 m3/s

Na figura 11.18 são apresentados os dois HUs.


Escoamento Superficial
437

a - fator f±

b - fa to r f 2

Figura 11.17. Fatores de correção fi e f2

11.5.4 Transposição de Hidrograma unitário

Quando num local de interesse não existem dados para a determinação do


HU, mas numa bacia vizinha com características semelhantes há disponibilidade
de dados que permita ajustar o HU, a tranposição pode ser realizada
utilizando o seguinte procedimento:

a) determine o HU da bacia com dados;


b) determine os valores de A, L, Lcg, tp e qp da bacia com dados;
c) determine os coeficientes Q e Cp desta bacia com base em
H id r o lo g ia
438

tp (i 1.44)
Ci =
o,7
(LXcg)

qp tp
(11.45)
Cp
2,75 A

d) determine L, Lcg e A da bacia de interesse e utilize Ct e Cp da bacia


vizinha para determinar os valores de tp, tr e Qp. Os tempos de 75% e
50% podem ser obtidos proporcionalmente a tp, do HU da bacia vizinha.

PROBLEMAS

1 - Para alguns dos hidrogramas da bacia do Ribeirão dos Meninos tabela


11.15, estabeleça a separação dos escoamentos pelos métodos gráficos. Compare
os resultados.
Escoamento Superficial 439

2 - Calcule os índices $ e W para as cheias do problema 1 e estime a


distribuição da precipitação efetiva.

Tabela 11.15. Dados para o problema 1 - Ribeirão dos Meninos

Evento 1 Evento 2 Evento 3 Evento 4 Evento 5


t P Q P Q P Q P 0 P Q
30 min mm m J /s mm m-vs mm m T/s mm m T/s mm m T/s
1 0,3 9,0 4,0 11,0 - 8,5 8,5 7,0 0,3 6,5
2 0,3 9,0 6,1 60,0 0,4 84 n .i 7,0 0,4 64
3 0,3 9,0 15,3 140,0 0,8 84 54 16,0 24 16,0
4 0,5 9,0 7,3 178,0 1.6 84 2,8 33,0 7,3 374
5 2,1 9,0 2,8 182,0 2,6 84 1,9 80,0 3,4 51,5
6 5,3 9,0 2,0 180,0 4,6 11,0 1,3 105,0 14 55,0
7 25,7 80,0 1,0 164,0 6,2 18,0 0,3 96,0 04 51,5
8 10,1 150,0 1,0 142,0 3,3 40,0 -
68,0 0,3 44,0
9 2,6 184,0 0,4 116,0 1,5 76,0 -
474 0,2 35,0
10 1,6 200,0 0,4 90,0 0,7 64,0 -
314 - 26,0
11 0,8 204,0 - 68,0 - 44,0 - 23,0 - 20,0
L2 0,3 200,0 - 52,0 33,0 17,5 - 17,0
13 0,3 192,0 - 40,0 25,0 - 15,0 - 14,0
14 0,3 176,0 - 32,0 - 21,0 - 13,0 - 12,0
15 0,3 150,0 - 26,0 - 17,0 - 11,8
16 0,3 100,0 - 22,0 - 15,0
17 0,3 74,0 - 20,0 - 12,0
18 0,3 60,0
19 0,3 46,0
20 0,3 36,0
21 0,3 30,0

3 - Para os dados do problema 1, determine a precipitação efetiva com base no


método do SCS. Qual o valor que recomendaria para CN nesta bacia?

4 - Determine o HU para cada evento do problema 1 e o HU médio da bacia.

5 - Para a precipitação da tabela 11.16, determine o hidrograma resultante


para a bacia do Ribeirão dos Meninos.

6 - Determine o HU para At= 15 min. e para At= lh.


7 - Determine o HU (10 mm, 6h) para a bacia do rio do Peixe, seção com 310
km”. Dados na tabela 11.17.
Hidrologia
440

3 - Utilize os dados do problema 7 e obtenha o HU para uma bacia vizinha com


200 km2 de área, comprimento do rio de 25 Km e L=g = 10 km. A bacia do no
mencionado tem 50 km de comprimento e Lcg - 4 km.

9 Uma bacia rural foi urbanizada, resultando em 30% de á r e a s impermeáveis.


Para a precipitação da tabela 11.17 determine o impacto no h.drograma fina .
Dados- área da bacia 25 km2,comprimento 16 km; declividade 16%; A skuação
amai é de mata natural e a situação futura de canalizaçao de 65 o

L0 - Estabeleça uma análise de sensibilidade no método de determinação do HU


com base no aumento da urbanização.

Tabela 11.16. Dados do problema 5


t P
30 min mm

1 0,5
2 2,5
3 8,0
4 25,0
5 20,0
6 6,0

Tabela 11.17. Dados do Problema 7

t p
6h mm nà s

1 24 8,0
2 6ó 6,0
3 14 6,0
4 - 93,0
5 162,7
6 _ 180,0
7 - 91,0
8 . 50,0
9 _ 29,0
10 - 16,0
11 - 8,0
Escoamento Superficial 441

REFERÊNCIAS

1- GRAY, D.M. (ed) 1970. Handbook on the principies o f hydrology. Huntington:


Water Information Center. Paginação irregular.

2- INSTITUTE OF HYDROLOGY. 1980. Low flow studies. Walingford.

3- KOHLER, M.A., RICHARDS, M.M. 1962. Multi-Capacity Basin Accounting for


Predicting Runoff from Storm Precipitation. Journal of Geophysical
Research, Washington, p.5187-97.

4- LINSLEY, R.K., Jr., KOHLER, M.A., PAULHUS, J.L.H. 1975. Hydrology for
Engineers. New York: McGraw-Hill.

5- SCS. 1957. Engineering Handbook: section 4 Hydrology. Washington: U.S,


Dept. Agr. Supplement A.

6- SCS. 1975. Urban hydrology for Small Watersheds. Washington: U.S. Dept.
Agr. (Technical Rclease, n.55).

7- SHERMAN,L.K. 1949 Tire Hydraulicsof Surface Runoff. CivilEngineering, New


York, v. 10, p .1675-86.

8- SOKOLOV, A.A.,RANTZíS.E.,ROCHE,M. l915.FloodflowComputation.Rans:


UNESCO. 194p.

9- SNYDERJF.F. 1938. Synthctic unit graphs. Transactions American Geophysical


Union, Washington, v.19, p.447-54.

10- TVA. 1961. Matrix operations in hydrograph computations. Knowville.


(Research Paper, n. 1). Tenessee Valley Authority.

11- U.S. Department of Army. Corps of Engineers. 1948. Hydrologic and


hydrograph: Flood Hydrograph Analysis and Computations.
Capítulo 12

ESCOAMENTO EM RIOS E RESERVATÓRIOS

Carlos E . M. T u cci

12.1 Escoam ento em regim e permanente: remanso

No capítulo 10 foram apresentadas as equações unidimensionais do


escoamentouilo^gerrnanente. O escoamento em regime permanente é um caso
particular daquelas equações. Em navegação, controle de inundação e qualidade
da água, entre outros, toma-se necessário a determinação da linha de água do
escoamento em rios para uma situação de regime permanente. O cálculo da linha
de água 6 denominado muitas vezes de remanso, porque 6 realizado para
verificar o represamento provocado no rio. A determinação da linha de água do
escoamento unidimensional gradualmente variado no espaço é descrita a seguir,
pressupondo alguns conhecimentos básicos de Hidráulica.

Equação básica

A equação de energia entre duas seções é a seguinte (figura 12.1)

El = E2 ( 12. 1)

onde El e E2 são as energias das seções 1 e 2, respectivamente.


Substituindo" na equação 12.1 a energia do escoamento para as seções
mencionadas resulta
2 2
a, V
Zi + — Z i + ------- + hf ( 12.2)
2g

onde Zi e Z2 = níveis das seções 1 e 2; a i e oc2 = coeficientes de Coriolis


das seções: Vi e V2 = velocidades das seções; hf = perda de carga entre as
seções. Esta é a equação de energia devida a Bemoulli.
O termo de perda de carga pode ser separado em perda de carga singular
(alargamento ou estreitamento) e perda de carga linear, expressos por

hf = hs + ht (12.3)
444 Hidrologia

hs = C I cü V2i/2g - ca V22/2g (12.4)

onde

x2

Sf dx (12.5)

xl

onde C = coeficiente de contração ou expansão; Ax = distância entre as


seções; Sf - declividade da linha de perda de carga linear, expressa por uma
equação de movimento uniforme como a equação de Manning ou Chezy, Utilizando
Manning fica

Q2 n2
S f = ------------- ( 12.6)

R 4/3 A 2

Figura 12.1. Perfil do trecho


Escoamento em Rios e Reservatórios 445

0 termo da perda de carga pode ser discretizado por vários procedimentos


alternativos. Um dos métodos mais utilizados é o seguinte:

(Sfi + Sn)
hi = . Ax (12.7)
2

O cálculo da linha de água em regime subcrítico é realizado de jusante


para montante. Esta 6 a condição da maioria dos rios naturais. Na equação'
12.2 as variáveis da seção 2 são conhecidas. Da equação de continuidade pode-
se obter que V = Q / A, substituindo as relações apresentadas na equação 12.2
e reorganizando a mesma, resulta

Zi = Z2 + [ l/g (cc2/A^ - al/A f) + C | al/A ? - a2/Af)| +


2
2 2
+ Ax (1/Kci + 1/K c2) ] ( 12.8)

onde Kc = (A.R2/3)/n
Nesta equação as incógnitas são Zi, Al e Ri. Pode-se estabelecer a
relação entre Zi - f(Ai) e Zi - F (Ri) com base na seção transversal, a única
incógnita passa a ser Zi. A equação acima é uma equação não-linear que pode
ser resolvida por tentativas. Este procedimento é descrito a seguir:

a) adote inicialmcnte Zi(o) = Z2 + So Ax, onde So é a declividade do


fundo e o indica a primeira tentativa;
b) calcule o termo da direita da equação 12.8 que 6 igual a Zi(k), onde
k é o número da tentativa;
c) quando entre duas iterações JZi(k-l) -Zi(k)j < s , onde e é a
precisão desejada, Zi(k) é aceito como a cota de Zi. Em caso contrário,
deve-se retomar ao item b para uma nova tentativa.

Este processo de cálculo se repete para outras seções, no sentido dc


jusante para montante, até o ultimo trecho de interesse.
As funções mencionadas entre cota, área e raio hidráulico definem as
características do trecho. Estas relações podem ser determinadas com base em
diferentes pontos da seção transversal, criando uma tabela que relaciona os
valores (figura 12.2). Altemativamente pode-se ajustar uma função de
potência aos valores medidos da seção. Esta última opção pode apresentar
problemas quando existem variações bruscas na forma da seção.
Quando o escoamento apresenta seção com extravasamento de leito, pode-se
utilizar o cálculo do coeficiente Kc por fatias. Este cálculo é tendencioso,
446 Hidrologia

pois logo após o extravasamento ocorre um aumento de rugosidade tanto no


leito maior como no leito menor devido aos vórtices que se formam na
interface. Este cálculo, apesar de ser prática corrente, tende a subestimar
os níveis máximos. O coeficiente Kc calculado pelo método de fatias fica

2/3
K c = £ K ci = £ ( A i R i )/ni (1 2 -9 )

Na figura 12.3 pode-se observar esta discretização.

Parâmetros

Coeficiente a - Este coeficiente corrige o termo de velocidade (v2/2g) devido


à não-uniformidade transversal da velocidade. Este parâmetro é obtido por

S v 3 dA £ v 3A A
a = - = 3

V3 A V3 A

onde v = velocidade de cada segmento dA; V = velocidade média e A = área


total. Normalmente não existem dados para o cálculo do valor do a. Chow
(1959) apresentou uma tabela de variação de valores de a (tabela 12.1).
Escoamento em Rios e Reservatórios 447

Figura 12.3. Discretização do leito com extravasamento

Tabela 12.1. Valores de a (Chow,1959)


Canais a
mínimo médio máximo
Canal regular, vertedores, calhas 1,10 1,15 UO
Rios naturais 1,15 UO UO
Rios cobertos por gelo UO UO 2,00
Rios com inundação de margem uo 1,75 2,00

2
Este coeficiente é importante quando o termo v /2g tem peso
significativo na determinação dos níveis. Em rios com velocidade baixa e
média este termo é muito pequeno.

Coeficiente C; no rio podem existir alargamentos e estreitamentos naturais ou


devido a pontes e aterros. Este coeficiente depende de vários fatores de
forma. Na tabela 12.2 são apresentados alguns valores. Chow (1959) apresenta
coeficientes que consideram diferentes obstruções ao escoamento.

Tabela 12.2. Coeficiente C (Neves, 1960)


Condição Estreitamento Alargamento
Variação brusca 0,5 1,0
Transição brueca 0,1 0,1

Rugosidade n: a rugosidade definida pela equação de movimento uniforme devida


a Manning depende de vários fatores existentes no rio: superfície do canal,
vegetação, irregularidade e alinhamento do canal, obstrução, tamanho e forma
448 Hidrologia

do rio ou canal. Na tabela 12.3 são apresentados os valores típicos deste


coeficiente. Para maior detalhamento desta tabela consulte Chow (1959).

Tabela 12.3 Coeficiente de rugosidade n


Tipo intervalo de n

CANAIS COM REVESTIMENTO


pouco lisas 0,017 - 0,019
alisado 0,010 - 0,013
paredes rugosas 0,019 - 0,021
paredes de terra com vegetação 0,028 - 0,032
RIOS
Limpos e retilíneos 0,025 - 0,033
Limpos e retilíneos com vegetação 0,030 - 0,040
com meandros, vegetação e pedras 0,033 - 0,060
com área de inundação e vegetação 0,075 - 0,150

Exemplo 12.1. Calcule o nível de enchente de uma seção 1000 m a montante da


seção de um porto fluviométrico. A vazão é de 600 m3/s, o nivel da seção de
jusante é 6,20 m. Adote a rugosidade no leito principal como 0,028 e na área
de inundação 0,1. A seção é uniforme e igual a da figura abaixo. A
declividade do fundo é 0,0001 m/m.

Solução: Como o canal apresenta escoamento no leito maior, a seção é dividida


em três partes. O valor de Kc é calculado separadamente para o leito menor
(Kcm) e para as duas partes do leito maior (Kcc e Kcd)

Kc = Kcm + Kce + Kcd

O cálculo é realizado de jusante para montante, A2 e Kc2 podem ser


calculados, além disso Kce =Kcd
A2 = 500 + (6,2 - 5) 600 = 1220 m2

( 6 , 2 . 100)5/3 ( 1 , 2 .2 5 0 )5/3
Kc2 = [------------------- + 2 ---------------------. . . ] = 76.907,66
0,028 (110 ) ’ 0,1.(251,2) '

Substituindo os valores conhecidos na equação 12.8, resulta


Zi = 6,20 + (600)2/ 2 (1/9,81 [ 1/ (1220)2 - 1/Ai ] +
2
1000 [ 1/Kci + 1/(76.907,66)2 ] ]
Escoamento em Rios e Reservatórios
449
600 m

5m

100 m »
<------------
Fig.12.4. seção transversal do exemplo 12.1

ou
Zi = 6,24276 - 18.348,62/A i 2+ 1,8.108 / (Kci)2

onde Ai = 500 + (hi - 5).600, considerando que hi > 5m.

h i 5/3 [250(hi - 5 ) ] 5/3


Kci = ----- ------ + 2 — -----------------
2,9739. IO*4 0,1 [250+ (h i-5 )]2/3

onde hi= Zi - So Ax. Adotando hi = hi e Zi(o)= 6,2 + 0,1 = 6,30. Calculando a


primeira tentativa obtém-se Z i(l) = 6,261 e hi(l)= 6,161. Nra segunda iteração
obtém-se Zi(2) = 6,261 valor aceito como a cota da seção de montante.

12.2 Escoamento não-permanente: contribuição lateral

A simulação do escoamento é o cálculo do hidrograma de uma seção a


partir do hidrograma de outra seção a montante (modelos do tipo armazenamento
e onda cinemática), mais a contribuição do volume lateral que entra no trecho
entre as duas seções para intervalos de tempo concomitantes. Na figura 12.5 o
hidrograma da secão 2 é obtido pela propagação das vazões da seção 1 e a
contribuição em percurso entre as duas seções.
Quando entre as duas seções existe contribuição em percurso que
modifique substancialmente a forma do hidrograma de montante ou que o volume
de contribuição lateral é preponderante, a vazão da bacia contribuinte deve
ser obtida por dados observados ou simulados (escoamento superficial,
capítulo 11).
Para avaliar a importância da contribuição lateral na composição do
hidrograma da seção de jusante, deve-se isolar alguns eventos e calcular,
para cada evento, o volume do hidrograma de montante Vm e o de jusante Vj. A
diferença 6 o volume da bacia intermediária Vi. A parcela deste volume com
Hidrologia
450

relação ao total Vj é um indicador do efeito da contribuição lateral,


estimado por

(Vj - Vm)
Pi = — -------- 100 (12.10)
Vj

nt nt

onde Vm — At £ lt e Vj = A t^ Q t
t=i t=l

Para valores de Pi < 15% a influência tende a ser pequena, acima desse
valor deve-se utilizar com reservas os procedimentos a seguir descritos.
Quando a contribuição lateral 6 considerada pequena, o deslocamento da
onda no rio é o processo principal. Neste caso pode-se adotar uma
distribuição uniforme ou lincarmcnte proporcional para as vazões de
contribuição lateral. A distribuição uniforme considera que a vazão hicral é
constante durante todo o evento. Para estimá-la basta dividir Ví pelo período
do hidrograma. Adotando uma distribuição linear, proporcional ao hidrograma
de jusante, admite-sc que a contribuição lateral tem o mesmo tempo de pico e
evolução das vazões do hidrograma dc jusante do trecho. Neste caso, as vazões
de contribuição lateral são estimadas por

Qi(t) = Qt Pi/100 (12 11)

onde t = intervalo de tempo


A vazão do trecho de jusante, sem a contribuição lateral, fica

Q*i = Qt (1 - Pi/100) ( 12-]z)

As equações anteriores são utilizadas para estimar a contribuição


lateral nas fases de ajuste e verificação da simulação. Na fase de
estimativa, quando não é conhecido o hidrograma de jusante, a contribuição
lateral pode ser estimada com base nos valores de Pi dos eventos registrados.
A contribuição lateral 6 acrescida a vazão propagada de montante cm cada
intervalo de tempo. Esta vazão fica

Q* = Qt (1 + Pi/100) (12.13)

Qt = vazão propagada de montante.


Escoamento em Rios e Reservatórios 451

Figura 12.5. Propagação dc vazão e contribuição lateral

Quando a contribuição lateral é importante e existem dados de vazão em


contribuintes, dcvc-sc utilizar estes dados para estimar a mesma.
Considerando que a bacia onde existem dados é representativa da vazão da
bacia contribuinte, pode-se utilizar a proporção de área. A vazão de
contribuição lateral fica

Qi(t) = Qp (t) Al / Ap (12.14)

onde Qp (t) = vazão do posto com dados; Ap = área da bacia do posto; Aí =


área da bacia contribuinte ao trecho.

12.3 Escoamento não-permanente em reservatórios

Os métodos utilizados neste capítulo para descrever o escoamento em rios


e reservatórios em regime não-permanente são do tipo Armazenamento (capítulo
10) .
O escoamento em reservatório se caracteriza por linha de água
horizontal, grande profundidade e baixa velocidade. Considerando que a
velocidade é baixa, os termos dinâmicos do escoamento são, em geral,
desprezíveis perto da grande variação do armazenamento.
452 Hidrologia

Um dos métodos mais conhecidos para simulação da propagação em


reservatórios é o de Pulz. A metodologia consiste numa expressão
discretízada da equação de continuidade concentrada e na relação entre
armazenamento e vazão do reservatório.
A equação da continuidade concentrada 10.22 pode ser discretízada por

s t+i ■ (It.+ it+i) (Qt + Qt+i)


(12.15)
At 2 2

onde It e It+1 - vazões de entrada no reservatório em t e t+1; Qt e Qt+i =


vazões de saída do reservatório em t e t+1; St e St+1 = armazenamentos nos
tempos referidos; At = intervalo de tempo. Nesta equação existem duas
incógnitas Qt+i e St+i. Reorganizando esta equação com as variáveis
conhecidas de um lado e as incógnitas de outro resulta

Qt+i + 2Si+i/At = It + It+i - Qt + 2-St/At (12,16)

Conhecida a função Q = f(S), pode-se construir outra função


relacionando Q = fi(Q + 2S/At). O processo de cálculo é o' seguinte:

a) inicialmente é necessário estabelecer o volume inicial So. Este


volume depende dos critérios do estudo em análise ou do valor observado
conhecido, no caso de reprodução de um evento. Com base- em So,
determina-se Qo;

b) para cada intervalo dc tempo seguinte deve-se determinar o termo da


direita da equação 12.16, já que o hidrograma de entrada ao reservatório
deve ser conhecido;

c) conhecido o termo da direita da referida equação, também 6 conhecido


o termo Qt+i + 2St+i/Ar. Com este último valor e utilizando a função
Q = f](Q + 2S/At) é determinado o valor de Qt+i;

d) com base no valor de Qt+i determina-se St+i por St+i = f '1 (Qt+i);

e) os passos de b a d se repetem para cada intervalo de tempo.

Para determinar a curva que relaciona a vazão e o armazenamento admiti-


se que a linha de água é horizontal. A curva é obtida pela composição de duas
funções: a) cota x armazenamento e; b) cota x vazão.
A curva da cota versus armazenamento é obtida pela cubagem da topografia
do lago a ser formado pelo reservatório (figura 12.6). Esta relação é
Escoamento em Rios e Reservatórios
______________________ __ ____________________ _ _ .. _ _ ^ 453
apresentada na forma de tabela ou
encontradas nos reseiratónos, esta função pode também ser ajustada a S
função do tipo seguinte: J d d urna
,b
Z = a S
(12.17)
onde Z = cota; a e b são coeficientes ajustados aos dados
A função entre cota e vazão depende do tipo de extravasor. Esta função é
fornecida pelo projetista ou estabelecida em modelo reduzido Os
reservatórios, em geral, possuem dois tipos de extravasores: vertedor oue
normalmente é de superfície e descarregador de fundo. Tanto o vertedor como o
descarregador de fundo podem ter comportas. A equação para o vertedor livre
é expressa por

Q = C L ( Z - Zw) ^ jg\

onde C = coeficiente de descarga, L = largura e Zw = cota da crista do


vertedor. Nesta equação despreza-se o termo de velocidade porque a cota
utilizada não se refere à crista do vertedor, mas a do reservatório, em que o
termo-de velocidade 6 pequeno (Figura 12.7).
A equação do descarregador de fundo é expressa por

Q = C A Í2gAz (12.19)

onde C - cocncícnte de descarga; g = aceleração da gravidade; Az - a


diferença de nível entre montante e jusante.

Figura 12.6. Relação entre cota e armazenamento


Hidrologia
454

Essas equações podem sofrer alterações em função do afogamento de


jusante, características dos condutos de fundo, uso de comportas, entre
outros/C ada projeto tem definida as suas características pelo projetista.
Adicionalmente, deve-se considerar que dependendo do problema em estudo,
simplificações podem ser realizadas. Por exemplo, no estudo de amortecimento
de grandes cheias pode-se desprezar a vazão pelas turbinas de um
aproveitamento hidrelétrico, já que estas são muito pequenas se comparadas
com as vazões do vertedor. Deve-se verificar se esta condição realmente
ocorre em cada caso.

b - D e s c a r r e g o d o r de
f u n d o a f og Jdo

Figura 12.7. Extravasores de reservatórios

Combinando a função 12.17 (ou a tabela de valores Z e S) com a equação


do extravasor resulta a função desejada. Considere as seguintes situações:

a) as funções Z = f2(S) e Z= f3(Q) são fornecidas na forma de tabela:


Utilizando um valor de Zi na função f2, é obtido Si. Com o mesmo valor
de Zi, na função f3 é obtido Qi. Os valores Si e Qi formam a função
Q= f(S) desejada (figura 12.8).

b) normalmente na fase de projeto não existe ainda uma definição


concreta das características do vertedor. Neste caso, pode-se combinar a
função 12.17 (ou a tabela) com a equação 12.18, o que resulta

Q = C L ( a Sb - Zw )3/2 (12.20)

Nesta equação, por conveniência S pode ser utilizado em S/At. A função


fl fica
Escoamento em Rios e Reservatórios 455

Q - CL [ a (S/At)b - Zw ]3/2 + 2 S/At (12.21)

c) quando o reservatório possui comportas, a curva de descarga muda para


cada manobra de comporta. A função fi é alterada, o que necessita um
novo cálculo de Q = f(S). A regra operacional é transferida para a
simulação através da função f3. A mudança desta função ou a operação
pode ser realizada de acordo com os seguintes critérios básicos:

Figura 12.8. Funções de armazenamento

- Manobra de comporta função do tempo: esta é a situação em que são


realizadas modificações das comportas sem um padrão definido, ou sem
relação com uma cota ou vazão específica. Por exemplo, para gerar mais
energia, ou aliviar o reservatório. No algoritmo de cálculo, basta
alterar a função f3 no intervalo de tempo correspondente e estabelecer
a compatibilização da equação de continuidade. Na figura 12.9 são
456 H id r o lo g ia

apresentadas duas curvas de descargas. Considere que até o intervalo t*


a curva 1 é utilizada, no intervale t*+At a curva 2 é válida. Na
prática ocorreu um período de transição na abertura que é, em geral,
pequeno e desprezível. A vazão e o armazenamento no tempo t* são
calculados na curva h Admitindo que no intervalo (t*, t* + Át) é
válida a curva 2, o cálculo do passo c do algoritmo é realizado com a
curva 2;

- Manobra de comporta função do nível ou vazão defluente do


reservatório. Esta etapa envolve a identificação das variáveis que são
geradas na simulação, para a modificação da curva operacional.
Fornecendo a função f3 com esta condição operacional é possivel levar
em conta esta situação. Quando a vazão atinge Q* (ou Z*) ocorre
abertura de comporta. Esta vazão poderá atingir este valor dentro do
intervalo de tempo. Quando o intervalo de tempo de cálculo é muito
grande (1 dia ou várias horas) é necessário reduzir a discretização
para evitar erros. O procedimento passa a ser o seguinte: Identificado
que Q > Q*f calcula-se o intervalo de tempo At*. Neste caso, Qt+i = Q*
e St+i = fí Q*). Substituindo na equação da continuidade fica

At* - (Si+i - Si)/(I - Q) ( 12.22)

onde í e Q - vazão média de entrada e de saída, respectivamente.


Admitc-se que o início e o fim do intervalo permitem uma estimativa da
entrada.

Figura 12.9. Funções de armazenamento com abertura de comporta


Escoamento em Rios e Reservatórios 457

Altemativamente pode-se efetuar um processo iterativo, ou seja após a


determinação de At* com base na equação acima I 6 novamente estimada a
vazão com base na interpolação; Q = (Q* + Qt)/2;

- Manobra de comporta função da vazão afluente. Esta situação pode ser


incluída na primeira, ou seja varia com o tempo função do valor de It.

A aplicação do método depende do tipo de reservatório, declividade do


fundo, volume do hidrograma de entrada e da velocidade de escoamento. Para
reservatórios em que a linha de água não pode ser considerada horizontal esta
metodologia não pode ser aplicada. Para esta situação deve-se procurar
utilizar um modelo hidrodinâmico baseado na solução das equações completas de
Saint Venant ou outro modelo de escoamento, tratando o trecho como um rio. Em
reservatórios onde o volume do hidrograma de entrada é muito maior que o
volume do reservatório a tendência é de que a linha de água deixe de ser
horizontal e o escoamento tenha o comportamento de um rio.

Exemplo 12.2. Determine o hidrograma de saída do reservatório do evento da


tabela 12.4. As funções de armazenamento foram determinadas e apresentadas na
figura 12.10

Solução: Na tabela 12.4 são apresentados os valores calculados segundo o


algoritmo descrito no texto. Exemplificando o intervalo 3, o valor do termo a
direita da equação 12.16 é

li + It+i - Qt + 2Si/At = 10 + 30 -6 + 18 = 52

Tabela 12.4. Exemplo 12.2


I 2St/At 2St+i/At + Qt+i Qt
h m3/s m3/s m3/s m3/s
1 5 16 -
5
2 10 18 26 6
3 30 40 52 13
4 70 96 127 29
5 50 146 187 40
6 40 160 196 43
7 25 140 182 39
8 15 108 141 32
9 10 76 101 23
10 5 - 68 16
Figura 12.10. Curvas de armazenamento do exemplo 12.2

Figura 12.11. Hidrogramas do reservatório do exemplo 12.2


Escoamento em Rios e Reservatórios 459

Nas funções da figura 12.10 obtém-se Qt+i = 13 e St/At = 20. Na figura


12.11 são apresentados os hidrogramas de entrada e saída do trecho.

12.4 Escoamento em rios

12.4.1 Modelo Muskingun

O escoamento em rios se desenvolve numa seção mais estreita, menor


profundidade e maior velocidade que em reservatórios. Um dos métodos mais
utilizados para a simulação do escoamento em rios é o método de Muskingun, do
tipo armazenamento (capítulo 10).
O modelo Muskingun foi desenvolvido por McCarthy (1939) e aplicado no
rio Muskingun. O método se baseia na equação da continuidade (equação 10.22)
e na equação de amazenamento, que pondera o efeito da vazão de entrada e
saída do' trecho. Este modelo é do tipo concentrado no espaço. Considera que a
vazão e o armazenamento no trecho têm a seguinte relação com o nível ao longo
do trecho.

O = a y 11 (12.23)

S = b ym (12.24)

onde O = vazão; S = armazenamento; y = profundidade; e a, b, n e tn = são


parâmetros, A profundidade c a vazão são valores médios do trecho.
Dcsprczando-sc a variabilidade espacial destas funções e combinando as
equações 12.23 c 12.24 resulta

b
S = ----- [X I + (1 - X)Q]m/n (12.25)
a1/n

onde O = X I + (1-X) Q ; I = vazão de entrada e Q = vazão de saída do trecho;


X = um fator dc ponderação das vazões. Este modelo adota que m/n = 1 e
K = b/aI/n , resultando a seguinte expressão para o armazenamento

S = K [X I + (1 - X) Q] (12.26)

Derivando a equação 12.26 com relação ao tempo e substituindo na equação


10.22 da continuidade, resulta a equação diferencial do modelo
460 Hidrologia

dQ dl
K (1 - X) — + Q = I - K X — (12.27)
dí dt
A equação 12.27 é diferencial ordinária e será linear quando os
coeficientes K e X forem constantes. Utilizando a mesma discretização do
modelo Pulz, a referida equação fica

Qt+i = Cl It+i + C2 It + C3 Qt (12.28)

-KX + At/2 KX + At/2 K(l-X) - At/2


onde Cl = ------------------ ; C2 = -------------------; C3 = -----------------
K(l-X) + At/2 K(l-X) + At/2 K(l-X) + At/2

O valor do parâmetro X representa o peso da integração da vazão no


espaço. Devido às condições de estabilidade numérica X ^ 0,5. Considerando
que uma ponderação negativa é irreal, o intervalo de X é

O s .X s 0 5 (12.29)

O parâmetro K tem unidade de tempo e representa o tempo médio de


deslocamento da onda entre montante e jusante do trecho. Considerando que os
coeficientes Cl e C3 devem scr positivos, para que não exista a possibilidade
da vazão estimada ser negativa, o intervalo de variação .possível para o
intervalo de tempo é

2X í At/K s 2 (1 ■ X) (12.30)

Utilizando as duas equações 12.29 e 12.30, pode-se estabelecer a região


em que os parâmetros devem variar, como conseqüência é possivel estabelecer a
discretização temporal (figura 12.12). Na inequalidade 12.30, quando os
parâmetros tendem a romper o limite inferior, a distância entre as seções é
muito grande e c valor de K (tempo médio de deslocamento) 6 muito alto. O
trecho necessita ser discretizado em subtrechos para efeito de cálculo.
Quando os parâmetros tendem a romper o limite superior o intervalo de tempo é
alto e necessita ser reduzido.
Alguns autores têm expressado que, matematicamente estes limites podem
ser rompidos. Do ponto de vista físico significa que, se o limite inferior
for negativo, o intervalo de tempo é muito pequeno se comparado com o tempo
de deslocamento da onda, para que a vazão de entrada no trecho, no tempo
futuro (It+i) tenha influência sobre a vazão de saída (Qt+i). Como o valor
do coeficiente Cl fica negativo, o ponderador fica incoerente fisicamente.
Quanto ao rompimento do limite superior, o intervalo de tempo é
suficientemente grande para representar o deslocamento da onda sobre um
trecho curto, mascarando os resultados.
Escoamento em Rios e Reservatórios 461

Figura 12.12. Regiões de variação dos parâmetros

Ajuste dos parâmetros

Laçada: originaimcnte, a determinação dos parâmetros K e X era baseada no


conceito da cunha de armazenamento, provocada pela influência da declividade
da onda de cheia. No início da enchente ocorre aumento do armazenamento no
trecho segundo um gradiente íngreme, quando o pico passa, a diminuição do
armazenamento dá-se com gradiente menor e sentido contrário. Este processo
pode ser visualizado ao píotar-se o armazenamento versus a vazão ponderada
(Figura 12.13).
O modelo se baseia numa relação biunívoca entre o armazenamento e a
vazão ponderada (equação 12.26). Para obter esta relação deve-se plotar a
mesma, fazendo variar o valor de X. Aquele valor de X que apresente uma
laçada mais próxima de uma função biunívoca é o valor procurado. O valor de K
6 obtido da declividade da reta ajustada à laçada (figura 12.13). Para plotar
a figura 12.13 são calculados os seguintes valores acumulados

Qlt+i = X (It+i - It) + (t - X) (Qt+l - Qt) + Qlt <12*31)

St+i/At = l/2[(Ii+i + It) - (Qt+l + Qt)] + St/At ( l2*32)

Quando a laçada não permite um ajuste convincente de uma única reta, ou


seja, é necessário interpolar uma curva, ou segmentos de reta, o parâmetro
fica sendo função da vazão, já que a inclinação muda com a vazão. O mo e o
passa a ser não-linear.
Hidrologia
[ Xl + íl-x)Q ]

Figura 12.13. Ajuste pela Laçada

Mínimos quadrados: considerando que o melhor resultado é aquele que otimiza o


ajuste da função dc armazenamento com os dados observados, os parâmetros
podem ser obtidos por mínimos quadrados.
Considere a diferença quadrática entre o armazenamento observado c o
calculado

D = [(S d -S o i)2 <12-33)

O armazenamento calculado é obtido pela equação 12.26. Substituindo na


expressão anterior, resulta

D = £ [ K X li + K (1 - X) Qi - Soi ]2 (12.34)

Para obter o mínimo de D, função de K e X, calcula-se as derivadas


parciais de D com relação aos dois parâmetros e iguala-se a zero. A solução
das duas equações para K e X fornece o mínimo de D. As expressões para K e X
são as seguintes:

EQiii dQiSoi + piSoi) + £Qi2 IiiSoi + E1' 2 EQiSoi


(12.35)
K =
:S2
Lii EQi + (IfcQO
Escoamento em Rios e Reservatórios 463

EQ? EiiSoi + eqíSoí Rm


X = ----------------------------------- (12.36)
[D? EQ; + QJiQO2] k

O armazenamento observado é obtido pela equação 12.32. Este método não


garante o melhor resultado, apenas que a diferença quadrática entre os
armazenamentos será mínima. O método dos mínimos quadrados tende a dar maior
peso aos maiores valores, que neste caso estão na vizinhança do pico.

Exemplo 12.3. Ajuste o modelo Muskingun ao trecho do rio Paraíba do Sul entre
Santa Branca e Guarema para a cheia da tabela 12.5.

Solução: antes de ajustar o modelo é necessário verificar se os volumes são


aproximadamente iguais, já que normalmente existe contribuição lateral.
Quando o volume de contribuição lateral é pequeno, a vazão de jusante pode
ser recalculada, retirando-se esta contribuição por um fator proporcional
(equação 12.12). Os valores corrigidos são apresentados na coluna .3 da tabela
12.5.
O cálculo do armazenamento e das vazões ponderadas acumuladas toram
obtidos pcías equações 12.31 c 12.32, para alguns valores de X e
apiescntados na figura 12.15. Nesta figura observa-se que existem duas
tendências retílincas, obtendo-sc dois valores para K : Kl = 0,25 dia (até
400 m3/$) c K2 - 0,364 dia ( >400 m3/s).
Considerando os limites da equação 12.30 resultam

0,1 5 A t á 0,45 dia (para Kl)


0,15* At 3 0,58 dia (para K2)

Os dados disponíveis são diários, para efeito de cálculo é necessário


dados com intervalo menor que um dia. Quando a variação dentro do intervalo é
gradual, de tal forma que permita sua interpelação, o cálculo é efetuado com
os valores interpolados. Os valores diários são considerados no meio do
intervalo. No exemplo, o At escolhido foi de 6h, o que atende os limites. Com
base nestes parâmetros obteve-se as vazões simuladas (figura 12.15).
Para comparação utilizou-se também o método dos mínimos quadrados e
obteve-se K= 0,44 dia e X= 0,32. Os resultados são apresentados na figura
12.15. Observa-se que o método da laçada, por considerar K variável com Q,
apresentou melhor resultado. Caso a minimização fosse realizada por faixas o
seu resultado podería ser comparável ao anterior.
464 Hidrologia

Tabeia 12.5, Exemplo 12.3


t I Q Qc S/At Ql Ql
X=0,2 X = 04
dia m3/s m3/s m3/s mVs m3/s m3/s

1 101 104 96
2 123 109 101 13,5 8,4 13,5
3 408 356 328 64,5 247,0 2694
4 627 604 557 139,5 474,0 4934
5 563 650 600 156,0 495,6 483,0
6 393 516 476 96,0 362,4 336,0
7 163 246 227 22,5 117,2 96,5
8 127 144 133
9 116 123 113
10 107 114 104
106 107 98
lL L ______ i
Lx AI +- (1 - x ) AQD a c u m u l a d o
í m 3/ s )

100 s/A t (rn3/s)

Figura 12.14. Laçadas do exemplo 12.3


Escoamento em Rios e Reservatórios 465

Figura 12.15. Hidrogramas do exemplo 12,3

12.4.2 Modelo Muskingun-Cunge

O escoamento cm rios e canais pode produzir o amortecimento da onda


devido à variação da capacidade de armazenamento e o efeito das forças
dinâmicas do escoamento. Cunge (1969) demonstrou que não existe amortecimento
dinâmico no modelo Muskingun. O fundamento do modelo Muskingun é a relação
biunívoca entre armazenamento e vazão, que para uma seção é a relação entre a
área e a vazão, ou seja o princípio do modelo onda cinemática.
A derivada parcial da área com o tempo pode ser expressa por

3A dA
i SQ (12.37)
dt * dQ xo at

onde o primeiro termo do lado direito da equação é definido para uma seção
xo. A vazão depende de t e x, a sua derivada total é

aQ dQ
dQ = — dt + — dx (12.38)
3t ôx
Para uma vazão constante a sua derivada total é nula, resultando em
Hidrologia
466

dx -dQ /d t
c (12.39)
dt ôQ /dx

onde c = celeridade da onda.


o termo do denominador é substituído com base na equação da continuidade
distribuída sem contribuição lateral (equação 10.1), resulta

dx 3Q/3t dQ
(12.40)
dt 3A/3t dA

Substituindo na equação 12.37 fica

3A 1 3Q
(12.41)
3t c 3t

Introduzindo este termo na equação dc continuidade distribuída, resulta

3Q (12.42)
c
dx

que é a equação da continuidade transformada com base no conceito de que


existe uma relação biunívoca entre vazão c área (modelo Onda Cinemática e
Armazenamento). _
O modelo de difusão utiliza as equações da continuidade (equação 10.1) e
a equação dinâmica sem os termos de inércia. Essas equações são

3y + 1 9Q _ q

3t b âx

Ql QI

Kc

onde Kc = conveyance; y = profundidade; So = declividade do fundo.


Derivando as expressões com relação a x e t, respectivamente, e
igualando os termos dc derivada segunda de y, resulta
Escoamento em Rios e Reservatórios 467

ôQ 6Q
— + c — = D (12.43)
dt ôx 2

onde c = Q 3Kc/3y / (b Kc) e D = Kc /(2 b | Q | ). Esta é a equação de difusão


onde c é a celeridade da onda e D o coeficiente de difusão. Esta é uma
equação diferenciai não-linear, a solução linear da mesma baseia-se num valor
Qo (co e yo) a partir do qual- as perturbações são consideradas pequenas. Os
coeficientes ficam c = 1,5 vo; D = Qo/(2BoSo), onde Bo = largura
correspondente a Qo e So = declividade do fundo.
Discretizando a equação 12.42 segundo o esquema numérico apresentado a
seguir, é obtida a equação numérica do modelo Muskingun.

c+i t t+i t
3Q (qj • qj)
=x (12.44)
dt At At

t+l t+l t t
3Q qj+i - qj + qj+i - qj
(12.45)
2Ax

l+l 1 1+1 t+l


No m odelo M uskingun Ii+l = q. ; It = qj; Qt+1 = q j+ l; Qt qj+l e;
K=Ax/c. Pode-se observar que o parâmetro X é um ponderador espacial da
discretização numérica.
A modificação do hidrograma, à medida que se desloca para jusante, é
devido à variação das seções do rio (morfologia) e dos efeitos das forças
dinâmicas envolvidas. Os modelos do tipo Armazenamento e Onda cinemática
desprezam os efeitos das forças de pressão e inércia* como resultado o
hidrograma propagado pela equação 11.42 se deforma somente devido às
variações de seção. Para um canal de seção constante, o hidrograma simulado
por este modelo não se deforma.
A solução da equação 11.42 por métodos numéricos gera um amortecimento
artificial devido à discretização. Para demonstrar isso, Cunge(1969)
substituiu o esquema das equações 12.44 e 12.45 na equação 12.42 e expandiu
os termos numéricos com base na equação de Taylorcom aproximação de segunda
ordem. A expressão resultante é igual a da equação 12.43 onde

D = (0,5 - X) c Ax.

Comparando a equação 12.43 com a 12.42 verifica-se que o termo da


468 Hidrologia

direita aparece devido à discretização numérica. Para que o mesmo desapareça


á necessário que Dn= 0 e X=0,5. Este termo é denominado de difusão numérica,
que produz amortecimento na onda simulada.
Para que o Modelo Muskingun não tenha amortecimento numérico é
necessário que Dn = 0, mas para que o modelo referido simule uma equação de
difusão, Cunge (1969) igualou a difusão numérica à difusão real. Utilizando
os coeficientes da equação linearizada, o ponderador X fica

X = 0,5 (1 - (12.46)
Bo So c0 Ax

Como definido anteriormente, o parâmetro K representa o tempo médio de


deslocamento da onda, o que é

Ax
K = - (12.47)
Co

Estas equações permitem a estimativa dos parâmetros do Modelo Muskingun


para que o mesme funcione como um modelo de difusão c possa scr estimado com
base cm parâmetros físicos do trecho.
Utilizando a equação de Manning para expressar a velocidade e
considerando que R= y, resulta

(12.48)
3 n

Retomando a equação de Manning, isolando a profundidade e substituindo


na equação anterior, resultam as seguintes equações

0.3 0,4
1,67 So Qo
Co (12.49)

e
0,6 Ax (n B)
K = (12.50)
0,3 0,4
So Qo

O índice o pode ser usado quando a vazão utilizada for Qo. Sempre que
Escoamento em Rios e Reservatórios 469

for conhecida a relação entre a vazão e o nível de uma seção é possível


utilizar as equações anteriores para estimar a celeridade e os parâmetros do
Modelo Muskingun.
A equação 12.48 foi estimada considerando a celeridade da onda
Cinemátíca, portanto o seu uso neste caso está em contradição com o modelo de
Difusão que a proposta de Cunge pretende representar. As equações 12.49 e
12.50 têm sido utilizadas com essa limitação por alguns autores. A celeridade
obtida pelo modelo de difusão foi apresentada na equação 12.43.
Jones (1981) analisou as características de precisão do esquema numérico
do Modelo Muskingun para resolver a equação de difusão e apresentou as
relações entre K/At e X para diferentes níveis de erros de amortecimento e
velocidade (figura 12.16). Na figura 12.16, no intervalo de X entre 0,2 e 0,5
pode-se ajustar uma curva que atenda as duas funções dentro da margem de 2,5%
de erro. Na figura 12.17 é apresentada esta curva e os limites apreseniados
na figura 12.12. Deve-se observar que na figura mencionada a ordenada era
At/K e na figura 12.17 é K/At, o que toma os limites uma função inversa. No
intervalo 0,20 ^ X ^ 0,40 pode-se ajustar uma equação a duas curvas de
precisão ideal da figura 12.16. A equação é a seguinte:
K/At = 0,32 X '1,15 (12.51)

Para o intervalo de X í 0,4 pode-se adotar K/At = 1 sem muito erro. A


seguir são descritos alguns procedimentos para a estimativa dos parâmetros do
modelo com base nesta metodologia.

Sem dados Observados: a escolha de At e Ax de cálculo dependem das


características dos trechos c dos dados disponíveis. Quando Ax é fixado em
função dos dados (largura, dcclividadc ou rugosidade), At é determinado
procurando ficar dentro da faixa de precisão das curvas estabelecidas e
At 3 tp/5, onde tp = tempo de pico do hidrograma de entrada. Para um trecho
de rio com condições físicas aproximadamente uniformes e sem dados históricos,
a combinação das equações anteriores pode ser usada na discretização. Existem
várias alternativas, a seguir apresentamos dois roteiros:

roteiro 1:

a) fixe At= tp/5 ou outro valor que obedeça à condição At ^ tp/5;


b) determine Ax, combinando a equação 12.46, 12.47 e 12.51, o que resulta um
equação não-lincar em Ax

0,761 co At (12.52)
Ax
1,25
[1 - Qo/(Bo co So A x )]
Hidrologia
470

Figura 12.16. Curvas de precisão numérica do Modelo Muskingun-Cunge

Figura 12.17. Relações de restrição e curva ideal


Escoamento em Rios e Reservatórios 471

c) Ax é determinado por tentativa, iniciando com um valor obtido por

2^5 Qo
Axo = ---------- (12.53)
So Bo Co

Essa expressão foi obtida adotando X=0,3 na equação 11.46. O valor de Qo


pode ser adotado como 2/3 da vazão máxima do hidrograma de montante. Este
valor é estimado e pode ser alterado;
d) conhecido Ax é possível calcular K e X das expressões 12.46 e 12.47.
Verifique se a precisão está dentro da faixa de 5%, caso contrário retome
ao item 1 e reavalie Ax.

roteiro 2:

a) determine At como no roteiro 1 e Ax pela equação 12.53;


b) calcule K e X pelas equações conhecidas e verifique se está dentro da
precisão de 5%.

Quando os dados não estão díscretizados, de acordo com o At calculado,


deve-se inv.rpolar os dados de vazão.

Exemplo 12.4. Determine o hidrograma 18 km a jusante de uma seção. As


características módias do trecho são: largura - 30m, declividade = 0,0007
m/m; rugosidade de Manning n=0,045. Os dados do hidrograma de entrada são
apresentados abaixo

Solução: o tempo tp = 200 min e At dos dados 40 min, portanto At = 200/5 = 40


min. A vazão máxima de montante á 130 m3/s. Adotando

Qo = 2/3 .130 = 87 m3/s

A celeridade da onda é
5 (0 .0 0 0 7 )0,3 (8 7 )0,4
c0 = ------------------------------------ = 1,86 mJs
3 (0 ,0 4 5 )° ’6 (3 0 )0,4

A estimativa de Ax é

2,5 . 87
Ax ---------------------------- 5.568 m
0,0007 .30 . 1.86
472 Hidrologia

Tabela 12.6. Exemplo 12.4


tempo vazão de entrada Vazão simulada
40mi m3/s m3/s
1 20 20,0
2 30 20,0
3 60 20,0
4 90 20,0
5 100 21,1
6 130 27,0
7 115 42,2
8 95 63,9
9 80 85,9
10 60 103,0
11 40 102,4
12 20 92,4
13 20 773
14 20 59,4
15 20 41,9
i

A distância do trecho total é de 18 km, adotando 3 subtrechos de 6 km.


Os parâmetros ficam

K = 6.000/1,86 = 3.226 s
X - 031

Sendo At = 40 minutos, K/Àt ~ 1,344. Da figura 12.16 pode-se observar


que a precisão é muito boa. Com base nos valores de X e K e na equação 12.28
foram obtidos os valores de vazão na tabela anterior. Na simulação de vários
subtrechos a vazão de saída do primeiro subtrecho é a entrada do segundo e
assim sucessivamente.
Quando o roteiro 1 é utilizado pela equação 12.53 obtém-se, como
primeira tentativa, Axo = 5.568 m. Utilizando este valor para iniciar as
tentativas da equação 12.52 resulta, após algumas tentativas, Ax = 6.039 m.
Este valor pode ser aproximado para 6.000 m como no caso anterior.

Com dados Observados: o Ax pode ser fixado em função de características


físicas ou ajustado junto com os outros parâmetros. Utilizando a equação da
celeridade com base na equação de Manning, os parâmetros de ajuste passam a
ser o coeficiente de rugosidade n e Qo. Como são várias as tentativas na
busca da melhor solução, deve-se adotar um valor de Ax de acordo com
características físicas ou como múltiplo do trecho total de interesse. As
Escoamento em Rios e Reservatórios 473

outras etapas são iguais ao cálculo anterior,


A busca do ajuste dos parâmetros pode ser realizada pelo processo de
tentativa e erro. Este processo utiliza a seguinte seqüência: a) arbitre um
valor para o parâmetro; b) simule o escoamento e compare com os dados
observados; c) altere o parâmetro procurando obter a aproximação dos
hidrogramas observado e calculado e retome ao item 1. O processo de
tentativa finaliza com o parâmetro que melhor aproximar os hidrogramas, Para
auxiliar este procedimento pode-se utilizar as seguinte estatísticas:

E (Qot-Qct)2
(12.54)
E (Qo t -Qom)2

o = (12.55)

onde Qot e Qct = são as vazões observadas e calculadas do intervalo t,


respectivamente; Qom = vazão média observada; N = número de intervalos de
2
tempo. Os resultados tendem a apresentar boa qualidade quando R tende para 1
e a é suficientemente pequeno, quando comparado com as vazões do hidrograma
de jusante.

Muskingun-Cunge Não-Linear

O modelo nao-lincar é caracterizado pela variação dos parâmetros K e X


em função da vazão ao longo da simulação. A vazão de referência é substituída
pela vazão conhecida no intervalo de tempo de cálculo. Ponce e Yevjevich
(1978) estudaram três alternativas para estimar a vazão: a) média dos valores
no tempo t na entrada e na saída do trecho; b) média dos valores conhecidos,
ou seja Itji-t-i e Qi; c) média de todas as vazões It, It+1, Qt e Qt+1. Esta
situação implica um processo iterativo. Os referidos autores concluíram que
as melhores simulações foram obtidas pela discretização b e c, com resultados
equivalentes. Como o processo pelo critério c é mais trabalhoso a opção mais
recomendada é a b.
A vazão Qo é calculada por

0.4 0.4 0 .4
(12.56)
Qo = [ It + Qt + h+i ] / 3.

Como a vazão varia em cada intervalo de tempo o modelo pode estar


trabalhando com diferentes combinações de K/At e X, alterando a precisão
474 Hidrologia

numérica. As seguintes opções podem ser usadas:

a) estabelecer a discretização com os valores extremos possíveis de vazão que


o modelo pode assumir durante a simulação;
b) modificar o intervalo.de tempo durante a simulação para se adequar a
precisão desejada;
c) desprezar a variação dos parâmetros fora dos limites de precisão. Esta situa­
ção pode apresentar resultados finais aceitáveis.

Zamanillo e Tucci (1987) utilizaram este modelo para simular um trecho


do rio Jacuí entre Itauba e Volta Grande onde existem quatro eventos
discretizados com intervalos horários. O trecho tem 36 km de comprimento,
declividade média de lm/km e para os eventos estudados a contribuição lateral
é desprezível. Para os quatro eventos foram ajustados os modelos Muskíngun-
Cunge Linear e não-linear com base na celeridade calculada pela equação de
Manning. O coeficiente de rugosídade obtido para as duas situações e para
todos os eventos foi dc 0,033, o espaçamento foi fixado em 1800 m. e o
intervalo de tempo em L hora. Para a solução linear foi utilizada a vazão de
referencia de 170 m3/s. Os resultados dos eventos são apresentados na figura
12.18 (dois eventos) e na tabela 12.7 as estatísticas de todos os eventos.
Pode-sc observar dos resultados que o modelo não-linear melhora o ajuste,
acompanhando melhor as variações de vazão.

Tabela 12.7. Estatísticas da simulação

Evento Rl
Linear não-linear
1 0,91 0,97
2 0,83 0,94
3 0,92 0,96
4 0,88 0,98

Verificação e utilização dos resultados

As fases de utilização de um modelo compreendem o ajuste, verificação e


aplicação. Para o modelo Muskingun foram apresentados vários métodos de
ajuste. A escolha do melhor procedimento depende do sistema e dos dados
disponíveis.

Sem dados históricos: o método de Muskingun-Cunge é útil, pois permite


definir os parâmetros a partir das características físicas do rio. Deve-se
ter o cuidado de analisar os resultados obtidos para verificar se existe
Escoamento em Rios e Reservatórios 475

compatibilidade física. Quando um rio sofre extravasamento de calha é


possível usar 0 método não-linear, já que as condições, de escoamento podem
mudar signífícatívamente. O método linear é útil quando a celeridade varia
pouco com a magnitude da vazão.

Figura 12.18. Resultados de Simulação no rio Jacui (Zamanillo e Tucci,1987)


476 Hidrologia

Com dados históricos: inicialmente é necessário verificar se os dados


históricos são representativos do período no qual se deseja utilizar o modelo
(projeto, extensão de série, previsão de cheia, etc). Por exemplo, se os
dados históricos escolhidos para ajuste estiverem entre os níveis hi e h2 e
for utilizado para estimar cheias entre os níveis h3 e h4 da figura 12.19, o
hidrograma provavelmente superestimará a cheia, já que na calha natural o
tempo de deslocamento será menor. Quando a cheia ocorre dentro da calha, o
modelo tende a subestimar cheias maiores que as utilizadas no ajuste e
superestimar as cheias menores.
A avaliação dos resultados para outra cheia ou período diferente daquele
utilizado no ajuste é importante para verificar a qualidade do ajuste e da
capacidade do modelo em representar o escoamento. Quando o objetivo é o de
ajustar um modelo para extensão de séries, o modelo deverá representar bem,
em média, vários anos de simulação. O ajuste e verificação é realizado com
séries de períodos contínuos, o que pode levar a parâmetros diferentes
daqueles obtidos em períodos isolados de cheia. Quando o objetivo do uso do
modelo é para estimativa de cheias, deve-se selecionar os eventos mais
representativos.

Figura 12.19. Variação das condições de ajuste e aplicação


Escoamento em Rios e Reservatórios 477

PROBLEMAS

1 - Considere um reservatório onde a vazão de saída por descarga de fimdo é


Q = A C (2gAh)0'5; onde A = área da seção do descarregador; C - coeficiente
de descarga; Ah = diferença de nível entre a superfície de água e o centro do
orifício. O armazenamento se relaciona com a cota de acordo com a função
12.17. A cota do orifício é zw, determine, analiticamente, o tempo que o
reservatório levará para se esvaziar. O armazenamento inicial é So e a vazão
de entrada nula.

2 - Num reservatório existe um canal de irrigação que retira vazão a partir


da cota Zo. O canal tem rugosidade n, seção retangular, largura B e
declividade S. A equação de armazenamento e do vertedor são respectivamente
as equações 12.17 e 12.18. Estabeleça as equações e o procedimento de cálculo
para determinar a vazão do canal de irrigação e do vertedor com base em um
hidrograma I (t) de entrada.

3 - Considere um canal com seção trapezoidal de base 20 m e inclinação 1:1,


declividade 0,001m/n\ rugosidade 0,025. Determine o hidrograma na seção 30 km
a jusante da seção de montante que recebe uma onda de cheia (tabela 12.8).

Tabela 12.8. Hidrograma do problema 3


tempo Vazão
hora m3/s
5 30
10 70
15 120
20 90
25 80
30 50
35 35

4 - Um pequeno reservatório, utilizado para abastecimento de água e imgação


tem capacidade máxima de 3,7 . 10^ m3. A relação entre o volume e o ní.el é
dado na tabela 12.9. A área da seção de descarga de fundo é 1*5 m * ^ on^ °
objetivo de caracterizar o parâmetro de escoamento do extravasor e ^ ’
foram realizadas algumas medições de descarga, sem entrada de gua
reservatório (tabela 12.10). Determine o seguinte:
* ■ j 70
a) qual o tempo necessário para o nível do reservatório diminuir
478 Hidrologia

m. até 2,0 m. considere que a entrada de montante é nula;


b) no item a considere uma entrada constante de 3 m3/s;
c) ainda no item a considere como entrada o hidrograma da tabela 12.11.

Tabela 12.9. Relação entre S e Z, problema 4


Armazenamento Nível
106 w? m
0 0
0,6 3,0
1,02 5,0
1,23 6,0
1,85 6,5
3,10 7,5
3,70 8,5

Tabela 12.10. Medições de níveis


Medições período variação
início fim início fim
m
1 8:00 15:00 7,5 7,0
2 8:00 14:35 6,0 5,5
3 9:00 16:10 4,5 4,0

Tabela 12.11. Hidrograma de entrada


Tempo Vazão
h m3/s
1 0
2 2,3
3 4,8
4 10,0
5 8,0
6 6,5
7 4,0

5 - Na bacia da figura 12.20 o reservatório na seção A é utilizado para


abastecimento de água da cidade B. Deseja-se conhecer a capacidade deste
reservatório de amortecer hidrogramas de enchente. O reservatório é utilizado
também para atender a demanda de irrigação da área C.
Escoamento em Rios e Reservatórios 479

O volume inicial para simulação deve garantir 60 dias de abastecimento


para a cidade ( q= 0,2 m3/s). A demanda de irrigação é de 0,05 m3/s. A saída
do canal de irrigação foi construída antes do funcionamento do reservatório e
infelizmente está dentro do reservatório. A capacidade máxima deste canal
ocorre no nível 325 m, quando começa a inundar o perímetro.
Determine o hidrograma que sai do reservatório. O hidrograma de entrada
no reser/atório é apresentado na coluna 2 da tabela 12.12. Quando o
reservatório atinge o nível de 324,8 m é aberta a descarga de fundo para
minimizar a inundação no perímetro de irrigação.

Tabela 12.12. Dados do problema 5

Hidrograma Reservatório

tempo I h S Q* Q+
12h m3/s m lQóm3 m3/s m3/s

1 1 319 0 0 0
2 15 320 Oi 0 0
3 30 321 0,8 0 2
4 70 322 2,0 0 4
5 50 323 2i 5 13
6 35 324 4,0 18 32
7 25 325 7,0 32 60
8 18 326 10,0 50 50

* - vazão do vertedor
+ - vazão do vertedor + descarga do fundo

6 - Uma onda de cheia dada pela senóide abaixo entra num reservatório com as
características do problema 2. a) Determine o volume de espera parâ que a
vazão no canal de jusante não extravase. O canal de jusante é retangular com
profundidade máxima yo, largura B, declivídade So e rugosidade n.

I (t) = Q* sen (0,105t/2) t* 60


I(t) = 0 o 60

onde t= é o tempo dado em horas.

7 - Num rio o hidrograma na seção de montante é conhecido, tabela abaixo.


Determine o hidrograma 50 km a jusante. A seção de montante 6 representativa
do trecho e tem as seguintes relações
480 Hidrologia

Q = 10 (h - ho)U9
h = 0,067 A0,9

Tabela 12.13, Dados problema 7


Tempo Vazao
h m3/s
1 10
2 15
3 40
4 80
5 65
6 55
7 ■ 40
8 25
9 10

8 - Utilize o modelo Muskingun-Cunge não-linear e estabeleça as condições de


cálculo e equações para dois trechos de rio com as seguintes
características. Simule a cheia da tabela 12.14.

trecho 1 : So = 0,001 m/m ; n= 0,045; Ax = 50 km; L = 20m.


trecho 2 ; So = 0,0003 m/m; n= 0,03; Ax = 60 km; L = 50m.

9 - Um reservatório com duas comportas está inicialmente fechado, com volume


Escoamento em Rios e Reservatórios 481

inicial de S0 = 2,25.106 m3. Quando o reservatório atingir a cota de 123,0 in é


aberta a primeira comporta (instantaneamente). Quando atingir a cota de 125,0 m
é aberta a segunda. Uma vez abertas as comportas, as mesmas ficam nessa
posição até concluir a cheia. Determine o hídrograma de saída. As caracte­
rísticas físicas do reservatório e as vazões afluentes ao mesmo estão na tabe­
la 12.15.

10 - Ajuste o modelo Muskingun para o trecho do rio São Francisco entre São
Romão e Manga. O rio Urucuia é um afluente importante que desemboca próximo
ao posto São Romão. O restante da contribuição lateral é deprezível. A
distância entre as seções é de 106 km, declividade 0,0001 m/m e* largura média
de 450 m.

Tabela 12.14. Dados do problema 8


t
h nJ/s
1 15
2 60

3 100
4 80

5 65

6 50

Tabela 12.15. Dados do problema 9

hídrograma reservatório

Tempo Vazão Cota Armazenamento Vazão Vazão


12h m3/s m 10Am3 Comporta 1 Comporta 1+2
m3/'s m3/s
1 5 120 0,5 0 0
2 15 121 0,8 0 0
3 90 122 2,0 0 0
4 70 123 2,5 10 0
5 40 124 4,0 28 0
6 25 125 7,0 52 52
7 20 126 10,0 80 80
Hidrologia
482

Tabela 12.16. Dados do problema 10.


Tempo São Romão Barra do Escuro Manga
dia São Francisco Urucuia São Francisco

1 2050 613 1916


2 2693 681 2134
3 3360 616 2823
4 3940 714 3488
5 3750 819 4101
6 4501 1038 4556
7 4804 1050 5086
8 4264 1032 5439
9 3840 969 5223
10 3410 919 5223
11 3220 919 4956
12 2943 876 4681
13 2999 930 4492
14 3260 977 4342
15 3280 989 4457
16 4315 1092 4741
17 5160 1152 5132
18 4804 1184 5725
19 4887 1170 5966
20 5118 1166 5966
21 4959 1206 6042
22 4543 1228 6102
23 4182 1224 6093
24 3772 1168 5979
25 3440 1066 5737
26 3270 989 5405
27 3370 961 5120
28 3066 887 4885
29 2510 771 4457
30 2002 719 4192
31 1970 777 3982
32 2172 642 3531
33 209 555 3291
E sc o a m e n to e m R io s e R eserv a tó rio s 483

REFERÊNCIAS

1 - CHOW, V.T. 1959. Open-channel Hydraulics. New York: McGraw-Hill.

2 - CUNGE, J.A. 1969. On the subject of flood propagation computation method


(Muskingun method). Journal of Hydraulics Research, Delft, v 7, n.2 p
205-30.

3 - JONES, S.B. 1981. Choice of space and time steps in the Muskingun-
Cunge flood routing method. Proceedings Institution o f Civil
Engineers, v.71, n.2, p. 758-72.

4-McCARTHY,G.T. 1939. The UnitHydrographand Flood Routing. Providence:


U.S. Corps of Engineers.

5 - NERC, 1975. Flood Studies Report London, 5v.

6 - NEVES, E.T. 1960. Curso de Hidráulica. Porto Alegre: Globo 577p.

7 - PONCE, V.M., YEVJEVICH, V. 1978. Muskingum-Cunge -vith variable


paramcters Journal of the Hydraulics Division. Àmericam Society of
Civil Engineers New York, vol.104, n.12, p. 1663 - 67. Dec.

8 - ZÀMANILLO. E. TUCCI, C.E.M. 3987. Simulação do escoamento por


Muskingun-Cungc com parâmetros variáveis. In: SIMPÓSIO BRASI­
LEIRO DE HIDROLOGIA E RECURSOS HÍDRICOS, 7., Salvador,
1987. Anais. ABRH. 5v. v.3, p.54-65.
Capítulo 13

AQUISIÇÃO E PROCESSAMENTO DE DADOS

Pierre Chevallier

13.1 Introdução

13.1.1 Os parâm etros da hidrologia

À hidrologia leva em conta todos os parâmetros que entram no fenômeno do


ciclo da água dentro do meio ambiente terrestre. Geralmente, estuda-se este
ciclo da água num volume fechado que se chama sistema hícrológico.
O balanço hídrico desse sistema pode se resumir, para um intervalo de
tempo dado, segundo a formulação simples de conservação da massa:

entradas + armazenamento inicial - saídas + armazenamento final

Infelizmcnte, não é fácíi avaliar e medir fisicamente os parâmetros que


intervém nessa formulação. As razões são numerosas e o objetivo deste
capítulo é o de apresentá-lo e comcnti-lo.
Para simplificar o problema, os hidrólogos têm o hábito de trabalhar num
sistema hidrológíco bem definido que eles chamam de bacia hidrográfica. A
bacia contém de um lado a noção topográfica de divisor de água e de outro a
noção da área de interceptação das precipitações. O ciclo hidrológíco e a
bacia hidrográfica já foram descritos no capítulo 2 deste livro.
Basicamente, quais são os parâmetros da hidrologia? Podem ser divididos
em três categorias:

- parâmetros climáticos : precipitação, evapotranspiração e parâmetros


secundários ligados aos primeiros (radiações solares, temperaturas,
umidade do ar, vento, ...) ;
- parâmetros do escoamento : descargas líquida e sólida e parâmetros
secundários ligados aos primeiros (nível da água, características da
rede de drenagem, área da bacia delimitada pela rede de drenagem,
velocidade, qualidade da água e dos sedimentos transportados,
reservatórios naturais e artificiais...) ;
- parâmetros característicos do meio receptor (geologia, topografia,
solos, vegetação, urbanização...).
486 Hidrologia

Neste capítulo são abordados somente os aspectos da avaliação e


aquisição das precipitações e das descargas. A razão é simples: em termos de
recursos hídricos as primeiras formam as principais entradas, no sistema
estudado e as segundas as principais saídas (com a evapotranspiração já
descrita no capítulo 6).
Não é suficiente medir os parâmetros, é necessário também processar, cor­
rigir, gerar e dar consistência aos dados medidos da maneira mais eficiente pos­
sível. Portanto, a primeira dificuldade da medição é a validação dos dados adqui­
ridos num lugar conhecido em dado instante.

13.1.2 As dimensões temporal e espacial

A dimensão temporal

Todos os parâmetros da hidrologia são variáveis no tempo: o clima, os


escoamentos e o meio receptor têm uma evolução dinâmica, apresentando
tendências que podem, às vezes, serem representadas através de leis
estatísticas.
A amplitude (a escala) desta evolução depende muito do parâmetro
escolhido e do fenômeno estudado. Na figura 13.1 é apresentada a amplitude
temporal dc diversos fenômenos envolvidos no estudo dos recursos hídricos.
Portanto, é necessário observar várias vezes os parâmetros, a freqüência
c a duração do monitoramento, dependendo da rapidez do fenômeno estudado.

Exemplo 13.1. Para avaliar o volume médio escoado do rio Amazonas em Óbidos
(área da bacia: 4 620 000 km2), medições mensais da descarga são suficientes,
no entanto, dezenas de anos são necessários para quantificar possíveis
variações climáticas na bacia; de outro lado, para estudar as enchentes da
bacia superior do arrolo Dilúvio (cerca de 20 km2) cm Porto Alegre precisa-se
de medições de chuva com intervalo de tempo muito reduzido (no máximo 5
minutos) durante um período bem mais curto, que é a duração do evento. Mas
são necessários um número de enchentes (çventos) suficientes para uma base de
cálculo razoável.

Numa escala temporal detalhada, a chuva é um fenômeno eminentemente


variável no tempo com intensidade que muda a cada instante no mesmo lugar. Da
mesma maneira, os escoamentos naturais são sempre turbulentos com variação
instantânea da velocidade e da direção do fluxo. Para medir essas variáveis,
é necessário integrá-las durante um intervalo de tempo suficiente para dar
uma média razoável (de alguns segundos, até alguns minutos).
Aquisição e Processamento de Dados 487

; Müdanças geológicas r - ^
Gíarçde bacia y *
i Mudanças climáticas f' — 1 ! Projélo regional de .
désewplviráenío
Alleíaçãd da paisagem i Zona uttjana
(Ü3 Pefiodiçidad* clinjátid

rT T l Cicló cuiiural;
kv. ..p Enchente (fio médio)
! i-afe-x-l Cheia (rioj peqijeno): ;
Èvenlò chuyosoi
0.000 í 0.01 1 1ÕÕ ÍOOOfT Õ.0001 0.01 1 100 10000"

Tempo (anos) Área (km^)

Figura 13.1. Escala temporal de Figura 13.2. Escala espacial

A dimensão espacial

Da mesma maneira como foi estabelecida a figura 13.1, é possível


estabelecer uma figura 13.2 apresentando a área de influência de vários
fenômenos hidroíógicos.
Segundo a escala do estudo, os processos que vão intervir não são os
mesmos. E o chamado efeito de escala. Em geral é muito perigoso
(especialmente em modelação hidrológica) reunir dados adquiridos numa escala
espacial definida com processos analisados ou métodos elaborados dentro do
quadro de uma escala maior ou menor.

Exemplo 13.2. Não é necessário usar uma análise detalhada dos diferentes
processos de infiltração nas parcelas agrícolas de uma região, para estudar
as enchentes do rio principal desta região cujo regime hidrològico é regulado
por vários afluentes e/ou reservatórios : as descargas obtidas são função de
uma transferência de volumes de água já armazenados na rede hidrológica ou
nos reservatórios, cuja produção é uma combinação entre os escoamentos
superficiais e internos, também já transferidos através da vertente e da rede
básica.

Na hidrologia é muito importante entender que certos parâmetros são


ligados a uma medição pontuai e outros a uma representação espacial, Em
geral, os parâmetros do clima e da descrição do meio receptor são pontuais e
os parâmetros relativos ao escoamentos integram numa seção os processos
488 Hidrologia

resultante da bacia de drenagem definida. O uso simultâneo de dados que não


têm o mesmo sistema de referência é uma dificuldade adicional em hidrometria.

13.13 Representação espacial: inform ação geográfica

Para representar a informação espacial e temporal, usam-se geralmente


mapas de diversos tipos, estabelecidos a partir de levantamentos de campo, de
fotointerpretação, de análise da resposta espectral de uma imagem enviada por
um satélite de observação da terra (Landsat, Spot, Meteosat/Goes, Noaa...) ou
de qualquer outra fonte de informação geográfica. Para considerar a dimensão
temporal, um mapa do mesmo parâmetro pode ser preparado para diversos
intervalos de tempo (em relação com a variabilidade temporal do parâmetro).
Durante os últimos anos, com a capacidade de geração desta informação
espacial, foi necessário desenvolver ferramentas especiais para gerar e
processar estes dados espacializados: os chamados sistemas de informações
geográficas. Existem diversos programas de computação nessa área, geralmente
dedicados a tarefas limitadas (processamento de dados de satélites, de
topografia, de zoneamentos de parâmetros...). Mas alguns programas são
capazes de juntar toda essa informação, superpondo os diferentes mapas (um
deles, muito conhecido, é o Arc/Info; o INPE brasileiro usa o SIG/SITIM).

Exemplo 133. Para estudar os processos hidrológicos de uma pequena bacia é


possível superpor vários mapas de descrição do meio receptor, como
apresentado na figura 13.3.
Entre os diferentes parâmetros de descrição do meio receptor, um deles
tem um papel particular: a topografia. Em primeiro lugar, ela representa a
maneira mais simples de definir a paisagem e permite avaliar as
características da drenagem numa região. Em segundo lugar a topografia
resulta da história geomorfológica da região sob controle do clima
(especialmente dos regimes de chuva e de evapotranspiração) e da geologia;
assim ela é um testemunho excepcional do ciclo da água na região estudada.
A informação topográfica é geralmente dada por mapas, que apresentam
curvas de níveis e pontos cotados (referências de nível). Para automatizar os
cálculos e para completar a informação foi desenvolvida a técnica do modelo
numérico de terreno (MNT, ou Digital Terrain Model> DTM ). O método consiste
em estabelecer uma grade regular quadrada (figura 13.4) no mapa e adquirir a
cota precisa a cada ponto de interseção (representação varredura ou raster).

Exemplo 13.4. O modelo numérico de terreno permite uma representação de uma


bacia em três dimensões como apresentado na figura 13.5, que dá uma imagem
espetacular da morfologia da bacia e uma visão da organização da drenagem
dentro da bacia.
Aquisição e Processamento de Dados 489

Mapa topográfico

Mapa geológico

'Mapa dos solos


Mapa da vegetação
(culturas)

Figura 13.3. Superposição de vários mapas através do uso de um STG.

Figura 13.4. Representação raster da topografia.


490 Hidrologia

Figura 13.5. Representação em três dimensões do modelo numérico de terreno da


bacia de Booro-Borotou (1,36 km2, Costa do Marfim)

13.2 Aquisição de dados de precipitações

13.2.1 Generalidades

É essencial lembrar que a aqquisição de dados de chuva de boa qualidade


é bastante difícil, embora a medição e os aparelhos sejam simples. Portanto,
é muito raro encontrar uma série de dados pluviométricos ou pluviográficos
confiável. Antes de criticar ou de analisar a consistência dos dados, é
necessário ter um bom conhecimento dos métodos de aquisição, dos aparelhos
usados, dos lugares de instalação e, ainda, da personalidade dos
observadores...
Basicamente, existem duas maneiras de medir a chuva:

- pontualmente, com pluviômetros ou pluviógrafos;


- espacialmente, com radares.
Aquisição e Processamento de Dados 491

As medições com radares serão detalhadas no capítulo 23.


O pluviômetro e o pluviògrafo são aparelhos que permitem medir as
precipitações. A diferença entre ambos é que o pluviògrafo registra
automaticamente, num suporte, os dados, ao contrário do pluviômetro que
precisa de leituras manuais a intervalos de tempo fixos.

13.2.2 Instalação do aparelho

Existem várias normas de instalação dos pluviômetros e pluviógrafos


apesar das tentativas de homogeneização internacional, realizada pela
Organização Meteorológica Mundial.
Admite-se de forma geral que a interceptação da chuva deve ser feita a
uma altura média acima da superfície do solo (entre l m e l , 5 m). O aparelho
deve ficar longe de qualquer obstáculo que pode prejudicar a medição
(prédios, árvores, relevo, etc.). A figura 13.6 apresenta uma regra
geralmente adotada para cumprir essa necessidade.

Figura 13.6. Instalação de piuviômetro/grafo : a distância entre a superfície


de interceptação deve ser maior que duas vezes a altura do maior obstáculo,

13.2J. Pluviômetro

O pluviômetro é um recipiente de volume suficiente para conter as


maiores precipitações dentro do intervalo de tempo definido para a freqüência
das observações (em geral 24 horas). Acima desse recipiente 6 colocado um
funil com um anel receptor biselado que define a área de interceptação. O
anel deve ficar bem horizontal.
Esta área também não é normalizada. Encontram-se áreas de 100, 200, 314,
492 H id ro lo g ia

400 ou 1000 cm2 (pelo menos para os equipamentos mais freqíientes). A


princípio o resultado não depende da área; mas é preciso não se enganar no
momento de calcular a lâmina precipitada :

V
P = 10 - (13.1)
A

onde P = precipitação acumulada em mm; V = volume recolhido em cm3 ou em ml;


A área de interceptação do anel em cm2.
Existem provetas calibradas diretamente em milímetros para medir o
volume de água coletado no pluviômetro. A precisão de todas as medições de
precipitação é o décimo de milímetro.
Em geral, os pluviômetros são observados diariamente de manhã cedo (a
hora, que é fixada, depende do órgão operador). Uma norma internacional pede
que o acúmulo das precipitações em 24 horas (se forem várias observações,
das são adicionadas), observadas antes do meio-dia, seja atribuído ao dia
anterior. O observador escreve todos os valores numa planilha com anotações
complementares, se for necessário. A ausência de precipitação também é um
valor observado que não pode ser confundido com uma falha (lacuna) de
observação.
^ Por razões especiais (geralmente dificuldade de acesso) a freqüência de
visita ao pluviômetro é menor (decadíária, mensal, até anual). Neste caso,
prevê-se um volume maior do recipiente e coloca-se uma camada de óleo dentro
do aparelho para impedir a evaporação das precipitações coletadas.

13.2.4 Pluviógrafo

A variabilidade temporal dos eventos chuvosos toma necessário o uso de


equimento automático (pluviógrafo) permitindo medir as imensidades das
chuvas durante intervalos de tempo inferiores àqueles obtidos com as
observações manuais feitas nos pluviômetros.

Equipamento

Existe uma grande variedade de aparelhos, usando princípios diferentes


para medir e gravar continuamente as precipitações. Pode-se examiná-los
segundo as quatro etapas da aquisição: medição, transmissão do sinal,
gravação, transmissão do registro.

Medição: as principais técnicas encontradas são (figura 13.7): a) cubas


Aquisição e Processamento de Dados 493

basculantes; b) reservatório equipado com bóia; c) sifão e pesagem de um


reservatório suspenso e sifão.

Transmissão do sinal: as formas de transmissão do sinal podem ser: a)


mecânica (pena colocada na ponta de uma alavanca ligada ao movimento do
sensor de medição); b) elétrica (sinal digitalizado: interruptor de lâmina
flexível, fotoelétrico, cápsula de mercúrio; potenciômetro; etc...).

:a) funil (b) funil

eixo jç j

1 se enche

sifonagem

Figura 13.7. Pluviógrafos: b) cubas basculantes b) reservatório equipado com


sifão

Gravação: As formas de gravação da informação podem ser:

a) escrita em um suporte de papel: 1) fita colocada em volta de um tambor com


rotação de 24 horas até 8 dias; 2) rolo adaptado a um movimento de
desenrolamento (transportador de carta) com funcionamento de 1 mês até
meses;

b) memorizada em um suporte eletrônico ou magnético: 1) memória residente, *0


cartuchos ou disquetes móveis; 3) fitas magnéticas;

c) transmitida em tempo atual.


494 Hidrologia

Transmissão do registro: Os registros são transmitidos de forma: a) manual


(suportes móveis); b) a cabo (telefone, ligação informática); c) sem cabo
(rádio terrestre, satélite).

Precisão

A precisão das medições pluviográficas depende dos dois parâmetros


envolvidos: o valor da precipitação e o tempo. A precisão de medição esta
relacionada em parte com a área de interceptação (quanto maior é o volume :
recolhido, tanto melhor é a precisão) e por outra parte com o sistema de
medição (um registro contínuo com aparelhos de sifonagem fomece uma precisão
melhor que um registro descontínuo com cubas basculantcs).

Exemplo 13.5. A precisão em altura de um pluviógrafo bascuíante de 400 cm2 é


de 0,5 mm (volume de cada cuba). A precisão de um aparelho de pesagem de 200
cm2 chega a 0,1 mm. A precisão no tempo, também é muito variável. No caso de
uma gravação em suporte de papel, ela depende da velocidade do adiantamento.

Exemplo 13.6. No caso dc uma chuva com intensidade dc 120 mm/h durante 10
minutos, uma velocidade de adiantamento dc 20 mm/h permite perceber esta
intensidade forte numa faixa de 3,3 mm; sc a velocidade for dc 3 mm/h, a faixa
dc 10 minutos fica reduzida a 0,5 mm, o que compromete irremediavelmente a
leitura da intensidade realmentc ocorrida.
Na tabela 13.1 é apresentado o intervalo mínimo dc tempo utilizável
segundo a velocidade do movimento.

Tabela 13.1. Intervalo mínimo de tempo (minutos) em função da velocidade do


movimento do pluviógrafo.
velocidade < u 1,6/3,1 3,2/9,9 10/19,9 20/49,9 >50
(mm/hora)
intervalo 60 30 15 5 2 1
mínimo (min)

No caso de uma gravação por equipamento eletrônico a precisão pode


chegar a um segundo.

Descrição de alguns aparelhos do mercado

Na tabela 13.2 são resumidas algumas características de equipamentos


comuns. O custo de um pluviógrafo no mercado internacional (sem taxas locais)
se situa (segundo modelo e acessórios) entre USS 1.000 e 3.000.
Aquisição e Processamento de Dados 495

Tabela 13.2. Características de alguns pluviógrafos.


tipo origem área sensor suporte duração precisão precisão
(cm2) precipit. tempo
(mm) (min)
IH PLG 4 Brasil 200 pesagem/ tambor 24 horas 0,1 5
sifão
IH PLG 7S Brasil 200 pesagem/ tambor 8 dias 0,1 30
sifão
Lambrecht Alemanha 200 bóia/sifão desenro- 1 mês 0,1 5
lador
Précis França 1000 cubas tambor 24 horas 0,1 5
Mecanique
Oedipe França 400 cubas cartucho > 6 meses 0,5 1/60

ia i4 is i« ,/ ia ra *o 21 22

Figura 13.8. Extrato do diagrama da chuva de 24/11/1990 registrada em


Pejuçara/RS (pluviògrafo IH PLG-4)
496 Hidrologia

Processamento dos dados

O processamento dos dados adquiridos em suporte eletrônico é feito


diretamente com uso de um computador ligado a uma leitora adaptada ao tipo de
suporte utilizado (em alguns casos esta ligação pode ser direta).
Os dados gravados em suporte de papel são tratados manualmente ou semi-
automaticamente através de uma mesa digitalizadora que pode transmitir
coordenadas para um computador carregado com um programa específico. A figura
13.8 apresenta o diagrama de uma chuva registrada com um pluviógrafo IH PLG 4
(ver as características na tabela 13.2) e a figura 13.9 mostra o hietograma
obtido depois do processamento através de uma mesa digitalizadora.

14:24 15:36 16:48 18:00 19:12 20:24

Figura 13.9. Hietograma da chuva de 24/11/1990 registrada em Pejuçara/RS

13.3. Aquisição de dados de escoamento

13.3.1. Medição de cotas

Existem diversos métodos para medir a descarga líquida dc um curso de


água. Salvo em alguns casos específicos, não é possível, na prática, conhecer
diretamente a descarga em um dado instante, sendo as medições demoradas e
caras. Para conhecer a vazão ao longo do tempo estabelece-se uma relação
ligando a altura do nível da água com a vazão, pois é muito mais fácil medir
a referida altura. O conhecimento dessa relação (curva-chave) permite
substituir a medição contínua das descargas por uma medição contínua das
cotas (níveis da água).
Para estabelecer a curva-chave existem vários métodos que podem ser
classificados em duas categorias:
Aquisição e Processamento de Dados 497

- os métodos teóricos que usam as equações gerais da hidráulica;


- os métodos experimentais que estabelecem a curva-chave a partir de
vários pares cota/descarga medidos experimentalmente com uma
distribuição, se possível, bem regular.

Cotas

Para medir o nível (a cota) de um curso de água a maneira mais simples é


colocar uma régua vertical na água e observar com regularidade o nível. Para
manter a qualidade das observações, a régua (ainda chamada linímetro) é
nivelada com referência a um datum (o ideal é usar uma referência de nível do
levantamento geral da região, o que nem sempre é possível).
As réguas são geralmente constituídas de elementos verticais de 1 metro,
graduados em centímetros. São placas de metal inoxidável ou de madeira
colocadas de maneira que o elemento inferior fique na água, mesmo em estiagem
excepcional (figura 13.10).

rio.

O observador, como no caso da pluviometria, faz leitura de cotas com uma


rotina definida pelo órgão operador da estação, pelo menos uma vez por dia. A
precisão dessas observações é, no caso geral, a centímetro e,
excepcionalmente, o milímetro (pequena bacia equipada com um vertedor
calibrado).
498 Hidrologia

Escolha de um lu gar de instalação

Na verdade não há regras gerais para escolher o lugar de instalação de


uma estação fluviométrica: os fatores intervenientes são numerosos demais
para serem listados em um simples inventário. A princípio, a estação deve ser
colocada num trecho reto, com uma seção transversal onde a velocidade do
fluxo é, se possível, estável a qualquer cota, tanto em estiagem como era
cheia. Deve existir a jusante uma seção de controle estável que permita
manter idênticas as condições de escoamento ao longo do tempo. Em pequenos
rios, se essa seção de controle não existir, pode ser construída.
Em geral, é muito difícil achar o lugar ideal e a escolha de uma estação
obedece a outras considerações: proximidade de ura possível observador,
acesso, lugar de obras projetadas, existência de uma ponte que pode ser usada
para medir as vazões, etc... Precisa-se achar as melhores condições e existem
boas estações contrárias à lógica da hidráulica.

Linígrafo

É mais prático associar i régua um aparelho automático, chamado


linígrafo, que grava continuamente ao longo do tempo as variações do nível.
Isto permite registrar os eventos significativos de curta duração ocorrendo
especialmente em bacias de pequenas áreas.

Equipamento - Como no caso dos pluviógrafos é possível classificar os tipos


de linígrafos segundo as quatro etapas da aquisição: medição, transmissão do
sinal, gravação, transmissão do registro.
Quanto à medição as principais técnicas encontradas são: a) bóia
flutuante (figura 13.11); b)sensor à pressão de gás (circuito aberto ou
fechado) (figura 13.12); c) sensor eletrônico (deformação de uma membrana e
correção das variações de temperatura.
Quanto %transmissão do sinal: a) mecânica (pena ou codificador colocado
na ponta de uma alavanca movimentada com cabo e roldana), com sistema de
redução da amplitude do sinal em uma escala definida (1:10 é o mais comum,
mas se encontra também 1:1, 1:2, 1:2,5, 1:5 ou 1:20); b) eletrônica (cálculo
e digitalização do sinal emitido pelo sensor).
Quanto à gravação: a) em suporte de papel, que podem ser: fita colocada
em volta de um tambor com rotação de 1 hora até 1 mês ou gráfico adaptado a
um transportador de carta com funcionamento de 1 até 6 meses; b) memorizada
em um suporte eletrônico ou magnético que podem ser: memória residente,
cartuchos, disquetes móveis ou fitas magnéticas; c) transmitida em tempo
atual.
Quanto à transmissão do registro: a) manual (suportes móveis); b) a cabo
(telefone, ligação informática); c) sem cabo (rádio, satélite).
Aquisição e Processamento de Dados 499

tambor gravação
*1 botijáo de r
ar comprimido

O | roldana
reiogio
manómetro
a mercúrio

Figura 13.11. Linígrafo de bóia Figura 13.12.Linígrafo de pressão

Precisão: como para as medições pluviográflcas, a precisão das medições


realizadas com linígrafos depende por um lado das cotas e por outro lado do
tempo da medição.
A precisão na medição das cotas é, em geral, o centímetro, salvo em
casos de medição feita com estruturas hidráulicas calibradas e de escoamento
tranqüilizado onde ela pode chegar ao milímetro. Em geral a turbulência dos
escoamentos faz com que os mesmos apresentem variações rápidas, aleatórias e
de amplitude variável (de alguns mm até várias dezenas de cm). A cota a levar
em conta é aquela correspondente à média dessas variações.
A precisão do tempo da medida tem uma importância menor que no caso da
pluviografía, pois a variação da grandeza medida apresenta, variações muito
mais regulares. Uma precisão de 5 minutos já é bastante boa e é usada no caso
de estudos de pequenas bacias com tempo de concentração rápido e duração
curta da cheia (exemplo: escoamentos urbanos). Alguns aparelhos com aquisição
automática possuem uma precisão variável: normalmente é realizada uma só
observação a cada 30 minutos, o que é suficiente para escoamentos com poucas
alterações; mas, se a variação do nível for superior a um determinado valor
(pré-determinado; por exemplo de 1 cm em 5 minutos), o intervalo que separa
duas gravações pode ser reduzido de 30 minutos a um minuto, o que permite
registrar, com precisão adequada, um evento rapidamente variável; este
intervalo é conservado até ter uma variação abaixo do critério adotado.

Descrição de alguns aparelhos do mercado: na tabela 13J são resumidas


algumas caracteri^firac ri#» j_
500 Hidrologia

internacional. O custo de um linígrafo no mercado internacional (sem taxas


locais) se situa (segundo modelo e acessórios) entre US $ 2.500 e 10.000.

Tabela 13.3. Caraterísticas de alguns linígrafos.


tipo origem redução sensor suporte duração precisão precisão
alturas tempo
(cm) (min)
IH Brasil 1/10 bóia transporta­ 1 mês 1 5
dor carta
OTT X Alemanha 1/10 bóia tambor 8 dias 1 30
OTT R16 Alemanha 1/10 bóia tambor 1 hora a 0,1 a 1 1 a 30 ■
1 mês
Foxboro Canadá 1/20 pressão gráfico 1 mês 1 120
fechado circular
Neyrtec França 1/10 pressão transporta­ 1 mês 1 5
.
aberto dor carta
Chole França - eletrônico cartucho > ó méscr’ 1 I a "30 '

Processamento dos dados: o processamento dos dados limnigráficos precisa ter


o registro do nível de referência, isto é a cota medida na régua do início do
registro de dados.
Os dados provenientes da aquisição em memória eletrônica são processados
diretamente através do equipamento adaptado à leitura dessa memória. Neste
caso, o registro digital 6 realizado a intervalos fixos. Se o registro nào
apresentar nenhuma variação entre dois ou vários intervalos, os valores
inúteis são eliminados. Os dados gravados em um suporte de papel são tratados
manu&lmente ou semi-automaticamante da mesma maneira que os dados
pluviográfícos. A principal diferença reside no fato que estes dados são
contínuos e é preciso conferir se o início de um registro está em
correspondência com o final do registro anterior. A figura 13.13 apresenta o
diagrama de uma cheia complexa registrada com um linígrafo IH (ver as
características na tabela 13.13).

13.3.2 Medição de vazão -

Para determinar as curvas-chaves (relação entre o nível da água de um


rio e a sua descarga líquida) é necessário conhecer um certo número de pares
cota-vazão medidas em condições reais. Existem vários métodos de medições de
vazões que podem ser classificados em cinco categorias :
A q u isiç ã o e Processamento de Dados
501

- por capacidade;
- por medição das velocidades do fluxo da água;
- por diluição de um traçador,
- por fórmulas hidráulicas e/ou dispositivo hidráulico correspondente;
- por outros métodos (óptico, eletromagnético, similitude com modelo
reduzido em laboratório, avaliação visual, etc...)

Figura 13.13. Cheia de 24/11/1990 registrada no arrojo Turcato - Pejuçara/RS


(linígrafo IH)

As três primeiras categorias são as mais usadas e a segunda deve


representar mais de 80% das medições de vazão realizadas no mundo em geral e
no Brasil em particular. Por esta razão o mesmo é apresentado em detalhe,
depois de uma rápida descrição do método por capacidade. A seguir o método de
medição por diluição de um traçador será resumido. Para os métodos
hidráulicos o leitor poderá consultar os manuais de hidráulica geral. Os
outros métodos são curiosidades desenvolvidas em casos especiais que pode-se
encontrar na literatura especializada.

Medição de vazão por capacidade

É o método mais simples e o mais lógico, consistindo em interceptar todo


fluxo da água em um recipiente calibrado e cronometrar o tempo de enchimento
de um volume conhecido. Infelizmente este método pode ser usado só com uma
vazão muito pequena. O limite superior é alguns litros por segundo com um
502 Hidrologia

recipiente que não pode ultrapassar 100 litros, o que já representa um peso
considerável a manipular.
Ainda que apresente esses inconvenientes, esse método, de ótima
precisão, é usado para medir descargas de rios ou canais (irrigação, por
exemplo) muito pequenos, equipados com vertedor triangular, permitindo a
concentração do fluxo da água em jato.

Medição de vazão por medição das velocidades do fluxo da água

Princípio: a descarga líquida numa seção de um rio é, por definição, o volume


de água que atravessa esta seção durante a unidade de tempo. Isto é : a
descarga dQ que atravessa uma área infinitamente pequena dS (figura 13.14)
pode ser escrita na seguinte forma , onde V é a velocidade do fluxo :

dQ = V dS (13.2)

Figura 13.14. Definição da descarga líquida

Para obter a descarga que vai atravessar a seção total, é suficiente


operar a dupla integração da fórmula elementar sobre a área total da seção,
(figura 13.15).
O conhecimento da velocidade do fluxo em todos os pontos de uma seção
permite calcular a vazão. Na prática, as medições de velocidade se operam em
um número limitado de pontos representativos da velocidade. Geralmente os
pontos são escolhidos em várias verticais distribuídas na seção (figura
13.16).
Existem vários métodos para calcular a vazão, a partir do valor da
velocidade medida em pontos. Um dos mais usados é o método de integração por
vertical realizado graficamente. Ele consiste em:

a) construir para cada vertical o gráfico da velocidade em função da


profundidade, sabendo que ela é nula no fundo; interpolar a curva das
velocidades e medir com um planímetro a área assim delimitada, q, que
Aquisição e Processamento de Dados 503

representa uma vazão média por unidade de largura no lugar d^Vertical;


b) construir a curva dessas vazões por unidade de largura longo da largura
do rio; a área assim delimitada, Q, representa a descarga líquida do rio..

Figura 13,15. Representação esquemática da descarga líquida que atravessa a


seção de rio.

Seçào tranversa!

Integração
da vertical

v ^ |o c idQ^ QJ m/s)

Figura 13.16. Cálculo da descarga líquida pelo método de interação por


verticais.
504 Hidrologia

Exemplo 13.7. A medição de 14/12/89 no Rio Taboão, em Pejuçara (RS), deu as


seguintes..velocidades para a vertical n.5. As medidas indicadas se referem a
elevação acima do leito.

Profundidade Velocidade
cm m/s
0 (fundo)
4 0,356
8 0,493
12 0,535
17 0,552
22 (superfície)

A integração da parabólica construída a partir destes valores dá uma


vazão por unidade de largura no local da vertical de 0,103 m2/s. Nas outras
verticais obteve-se os seguintes resultados :

Distância da Vazão por unidade


margem direita de largura
m m3/s

o,o1
0,5 0,059
1,0 0,076
2,0 0,084
3,0 0,084
4,0 0,103
5,0 0,047
5,552
1 - margem direita
2 - margem esquerda

A integração dos resultados de cada vertical, segundo a largura do rio,


conduz a uma descarga de 0,402 m3/s. Como exercício, o leitor poderá
construir as curvas correspondentes verificando os resultados através da
planimetria das áreas obtidas.

Equipamento: usa-se para medir a velocidade da água principalmente molinetes


Aquisição e Processamento de Dados 505

equipados com uma hélice que gira quando é colocada no sentido do fluxo da
água. Existem vários tipos de molinetes e hélices. O princípio mais usado é
que a rotação em tomo do eixo abre e fecha um circuito elétrico. Contando o
número de voltas durante um intervalo de tempo fixo, obtém-se a velocidade de
rotação da hélice que está relacionada com a velocidade do fluxo, através de
uma fórmula do tipo:

V = aN + b (13.3)

onde V - velocidade do fluxo; N = velocidade de rotação; a e b são constantes


características da hélice. As constantes a e b são fornecidas pelo fabricante
e podem ser verificadas em canais especiais de calibragem. O valor a,
denominado passo da hélice, é a distância percorrida pelo fluxo em uma volta.
Para contar os impulsos gerados pelo molinete utiliza-se um conta-giros.
Existem também vários modelos: a) muito simples: luz piscando ou bip
acompanhado com cronômetro; b) mais elaborados: contadores com dígitos
mecânicos (tipo velocímetro e carro) ou eletrônicos e cronômetro integrado.
Para escolher uma hélice, a velocidade aparente média da água deve ser
avaliada, pois com uma velocidade de rotação alta demais, o conta-giros pode
dar resultados errados (limite de 1 a 2 voltas por segundo com um contador
simples, no máximo 20 voítas/s com um aparelho sofisticado), e com uma
velocidade de rotação baixa demais a má integração da turbulência do
escoamento pode prejudicar a medição.
Segundo as condições do terreno o uso do molinete pode ser feito de
várias maneiras (figura 13.17):

a) fixado cm uma haste, com o operador ficando de pé na água (.medição a vau)


ou numa ponte;

b) fixado na ponta (ou acima) de um lastro (peso entre 10 e 100 kg) que
possui uma forma especial (de peixe) a fim de manter a hélice orientada no
sentido contrário ao fluxo; o lastro é movido por um cabo eletroportador (que
conduz também os impulsos); o comando do sistema se faz através de um guincho
colocado em um suporte com roldana acima de uma ponte ou de barco, ou ainda
instalado na margem do rio com um sistema de roldanas (teleférico).

A seção transversal do rio é materializada por uma ponte, um cabo


graduado ou mesmo uma simples trena (caso de uma largura pequena). Com uma
largura acima de 500 m ou no caso das vias navegáveis, não é mais possível
estender um cabo de margem a margem; a posição do barco na seção, neste caso,
é calculada a partir de referências (hastes com bandeira) instaladas nas duas
margens e de um distanciômetro a laser, usando um nível topográfico instalado
na margem, um círculo hidrográfico que permite medir ângulos horizontais a
506 Hidrologia

partir do barco, por sextante ou com um aparelho de posicionamento a partir


de satélites (GPS).

Precisão e limites - É geralmente admitido que para obter uma precisão


razoável deve-se efetuar entre 6 e 20 verticais na largura com 4 a 8 pontos
de medições de velocidade por vertical. O tempo de medição deve ficar na
faixa de 30 a 60 s (o valor de 50 s é o mais usado). Mas é óbvio que estes
números podem ser alterados em função das condições particulares do local.

Figura 13.17. Exemplos de dispositivos de medições : (a) com haste, (b) com
barco, (c) com teleférico

As velocidades limites que podem ser medidas com molinete são de cerca
de 2,5 m/s com haste e de cerca de 5 m/s com lastro. Acima desses valores os
riscos para o operador e o equipamento chegam a ser altos. Em boas condições
admite-se que a precisão relativa da vazão assim medida é de cerca de 5%.
Pode chegar a valores bem piores...

Métodos derivados - Em certas condições utilizam-se técnicas diferentes de


medição:

a) em caso de alta velocidade ou de deficiência do equipamento, a velocidade


superficial pode ser medida usando flutuadores naturais ou artificiais,
cronometrando o tempo de percurso de uma distância fixa (marcada com
referências na margem do rio);
Aquisição e Processamento de Dados 507
-•* - - •***- - —,»■ - t -»• •• •

b) em caso de rio de grande largura, usa-se um outro método de: integração <*a
velocidade (método do barco mdvel); o barco se desloca com unia velocidade
constante de uma margem a outra, com o molinete fixado numa leme especial a
uma profundidade constante. A decomposição da velocidade, do barco e das
velocidades indicadas pelo molinete possibilita estabelecer a velocidade
média da água na profundidade escolhida. A medição se repete a várias
profundidades.

Medição de vazão por diluição de um traçador

Às vezes, não é possível realizar medições com molinete. As principais


razões são:

- velocidade da água alta ou escoamento com muita turbulência num leito


muito irregular (um exemplo típico : os rios de montanhas);
- perigo devido a um transporte importante de corpos sólidos pelo rio
(árvores, lixos diversos,...) ou a uma impossibilidade técnica de
entrar na água (leito encaixado, cachoeiras,...).

^ As medições podem ser realizadas injetando no rio uma certa quantidade


de um traçador químico e depois medindo como este traçador se diluiu. O
princípio é o seguinte:

C
Q= q- (13.4)
c

onde q = vazão da injeção do traçador, c = concentração inicial do traçador;


C = concentração das amostras depois da diluição no rio; Q = vazão do rio.
Essa equação pressupõe uma injeção contínua com vazão constante. Com um
princípio semelhante pode-se efetuar uma injeção instantânea.
Os produtos utilizados são vários, principaimentes corantes, e devem
respeitar algumas condições:

- o produto não deve reagir quimicamente com a água ou com substâncias


n contidas na água e no leito;
^ ( G>a análise precisa ser facilmente realizada e com precisão razoável;
- o produto não pode ser tóxico para fauna, vegetação ou consumo humano,
nem corrosivo e facilmente solúvel;
- o procedimento precisa ser barato.

Os produtos atualmente mais usados para estas medições são o bicromato


de sódio e a rodamina.
508 Hidrologia

13.4 Curva-chave (relação cota-descarga)

Este item é uma adaptação autorizada do livro de Jaccon e Cudo (1989).


Os títulos dos parágrafos correspondem aos títulos dos capítulos do referido
livro.

13.4.1 O conhecimento do campo, algumas definições

O leito de um curso de água

O leito do rio define as condições do escoamento por meio da sua forma e


pela sua rugosidade. Um dos problemas essenciais para a definição da relação
cota-descarga é o desconhecimento da variabilidade ao longo do tempo dessas
duas características.
A geometria do leito do rio pode ser examinada através do seu traçado,
do seu perfil longitudinal e da seção transversal. O traçado depende
principalmente da geologia local (rochoso ou aluvionar). O perfil
longitudinal (considerado de montante para jusante) é representado por duas
linhas: a inferior corresponde ao traço do fundo do leito e a superior ao
traçado da superfície livre da água (figura 13.18). À declividade do fondo é
uma carac;erística pouco variável no tempo que depende da topografia da
região. Mas a declividade superficial é variável com a descarga.
A seção transversal tem. vários elementos geométricos que variam em
função do nível da água (o zero da régua sendo o nível de referência). Estes
elementos são:

- a área molhada (S): é a área da seção transversal ocupada pela água


(em m2);
- o perímetro molhado (P): é o comprimento da linha de contato entre a
superfície molhada e o leito (em m);
- o raio hidráulico (R-S/P): é o quociente da área molhada pelo
perímetro molhado (em m);
- a largura superficial (I): é o comprimento da linha horizontal da área
molhada (em m);
- a profundidade média (hm): é o quociente da área molhada peia largura
superficial (em m).

A determinação das curvas, área molhada função do nível da água e raio


hidráulico função do nível da água, é indispensável para o traçado da curva
de calibragem (curva-chave),
A natureza do leito intervém no processo de escoamento por meio da
rugosidade do leito e da mobilidade dos materiais. A rugosidade geraimente é
í Aquisição e Processamento de Dados 509
_______ __ - - , _- - --------------------------------------- i -____________________ ___________ t _________________

avaliada pelo valor do coeficiente K da fórmula de Manning-Strickler (tabela


13.4):

U = KRW JW (13.5)

onde U = a velocidade média do escoamento em m/s; R = o raio hidráulico em m;


J = a declívidade superficial. Na tabela 13.4 são apresentados alguns valores
do coeficiente K,

Tabela 13.4. Valores indicativos do coeficiente de rugosidade


Natureza do leito K
Concreto 67
Natural limpo de fundo liso e horizontal 50
Natural limpo de fundo rugoso 33
Natural com yegetação 20 a 10
_______ »

A mobilidade do leito que se manifesta sobretudo no fundo, 6 um fenômeno


frequente. Ela é ligada à natureza do fundo e pode ser muito importante. O
exemplo do perfil transversal do rio Solimões em Manacapuru (AM) à
apresentado na figura 13.19. Essa é a maior causa de alteração da curva-
chave.
510 Hidrologia

Largura (m)

Figura 13.19. Perfil transversal da seção de medição do rio Solimões em


Manacapuru (AM)

A relação cota-descarga

A relação cota-descarga de uma seção permite calcular a descarga que


corresponde a uma dada altura dc água. Esta relação é determinada por uma
representação aproximada do traçado da curva de calibragem, feita a partir
dos resultados das medições e apoiada na análise dos parâmetros dc
escoamento. A relação cota-descarga é apresentada sob três formas, geralmente
associadas: à representação gráfica, à fórmula matemática e à tabela de
calibragem.
A representação gráfica é a forma mais utilizada; a relação h/Q é
representada por uma curva traçada em um sistema de eixos retangulares
geraimente sob a forma h=f(Q) que é o padrão internacional (figura 13.20.a).
Existe também o contrário: Q=f(h) (forma adotada pelos hidrólogos franceses,
por exemplo - 13.20b).
Toda relação h/Q pode ser representada, na sua totalidade ou por trechos
sucessivos, por expressões matemáticas. As duas formas mais utilizadas são:

a) forma exponencial:

Q = a(h - ho)n (13.6)

onde h = o nível da régua correspondente a vazão Q, ho = o nível para o qual


Aquisição e Processamento de Dados 511

a vazão é nula; a e n são constantes determinadas para um local;

b) a forma poiinomial:

Q = aQ + avh -fajh2 + ... + *Jin (13.7)

são mais freqüentes as representações do polinômio de primeiro (reta),


segundo (parabólica) ou de terceiro grau (cúbica);

A tabela de calibragem é a forma representativa final. Um exemplo é


apresentado na tabela 13.5.

Tabela 13.5. Exemplo de tabela de calibragem (arroio Turcato, Pejuçara-


RS), descargas em m3/s
h 0 1 2 3 4 5 6 7 8 9 h
cm cm

20 0,060 0,076 0,092 0,108 0,124 0,140 0,156 0,172 0,188 0,204 20
30 0,220 0,241 0,262 04283 0304 0,325 0,346 0,367 0,388 0,409 30
40 0,430 0,457 0,484 0,511 0338 0365 0392 0,619 0,646 0,673 40
50 0,700 0,736 0,772 0,808 0,844 0,880 0,916 0,952 0,988 1,02 50
60 1,06 1*10 1,14 U7 u i U5 U9 1,33 136 1,40 60

Figura 13.20. Relação cota-descarga; a) representação internacional, b)


representação francesa.
512 Hidrologia

A relação cota-descarga 6 unívoca quando um valor de descarga


corresponde somente a uma cota; caso contrário, a relação é não-unívoca. Os
principais tipos de calibragem podem-se apresentar da maneira seguinte;

Calibragens unívocas: a) seção estável com um só controle: geometria regular


(figura 13,21,a) e geometria irregular (figura 13.21.b); b) seção estável com
vários controles (figura 13.21.c)

Calibragens não-unívocas; a) seção ou controle instável: pequena instabilida­


de ern águas baixas (figura 13.22.a), grande instabilidade resultado de várias
curvas unívocas (figura 13.22.b) e muito grande instabilidade resultado do
rebaixamento e assoreamento do leito a cada cheia que geram várias curvas em
laço (figura 13.22c); b) declividade hidráulica diferente entre cheia e
vazante: pseudo-univocidade cheia/depleção (figura 13.23.a), pseudo-
imivocidade ocorre somente na cheia (figura 13.23.b) e regime heterogêneo
devido as condições de escoamento que se modificam a cada ciclo
cheia/depleção (figura 13.23c)

Figura 13.22. Calibragens não-unívocas com seção ou controle instável.


Aquisição e Processamento de Dados
513

Figura 13.23. Calibragens não unívocas com declividade hidráulica diferente


entre cheia e vazante.

13.4.2 Traçado da curva-chave

O traçado da curva de calibragem é a primeira fase da transformação das


cotas em descargas, O traço é realizado a partir dos dados disponíveis, mas
na maioria dos casos a ausência de medições em cotas altas ou baixas impõe
uma extrapolação da curva em suas extremidades.

Inventário e crítica dos dados disponíveis

Três tipos de dados compõem a informação original: aqueles que concernem


à própria estação, as observações linimétricas e a listagem das medições.

Estação de medição: o dossiê técnico da estação constitui o primeiro


documento a ser consultado. Ele dá informações relativas:

* ao equipamento da estação;
- à situação da régua relativa a um eventual controle ou a uma
singularidade do leito;
- à situação e à descrição da referência de nível (RN);
- aos perfis longitudinal e transversal;
- ao histórico das obras que afetaram a geometria do trecho;
- a operações diversas como: relatórios de visita dos hidrometristas,
trabalhos de limpeza e conserto, eventos excepcionais (cheias,
interrupção do escoamento, etc...) e troca do observador.

Na realidade, nem sempre há dossiê ou quando existe, é freqüentemente


uma simples Ficha técnica muito incompleta e imprecisa.
Hidrologia
514

Dados linimétricos: a informação básica é constituída de um conjunto de pares


compostos de uma cota linimétrica e de uma data e hora exata da observação
desta cota. Esta informação toda é reunida e classificada para constituir uma
cronologia que geralmente é transferida para um suporte .informático a fim de
tomá-la acessível e disponível sob múltiplas formas. _ ,
A comparação das informações do dosstê técnico da estaçao e da
cronologia linimétrica serve para verificar a homogeneidade desta ultima ou.
se for necessário, permite decompô-la em subcronologias homogêneas. Cada uma
dessas cronologias é caracterizada.

- pelas datas extremas que limitam o período de validade;


- pelas cotas máximas e mínimas observadas durante este período.

Listagem das medições: cada medição de vazão associa dois termos


característicos do escoamento:

- a descarga, com uma precisão variável segundo o modo de operação


utilizado, as condições de escoamento e a experiência dos operadores;
- um termo cota, incluindo as cotas inicial, final e intermediárias, e o
nível variou significativamente durante a medição.

Uma lista cronológica é constituída a partir de todas as medições


realizadas em uma estação. A tabela 13.6 dá um exemplo de uma lista assim
estabelecida.

Tabela 13.6. Medições de descarga realizadas no arroio Turcato em


Pejuçara/RS
Número Data Hora Cota Descarga Realizada por
cm 1/s

1 14/12/1989 11H58 40 402 Chevailier-Agustin


2 20/02/1990 14H0O 32 293 Chevallier-Agustin
3 22/05/1990 13H45 39 461 Aiunos-Agustin
4 27/06/1990 14H35 64 1030 Nilza-Agustin
5 01/08/1990 15H28 57 737 Nilza-Agustin
6 03/09/1990 14H30 45 483 Agustin-Lavitor
7 22/11/1990 14H40 59 762 Agustin-Lavitor
8 20/12/1990 09H36 48,5 627 Chevallier-Pedrinho
9 09/01/1991 16H26 47 489 Agustin-Lavitor
10 06/02/1991 15H54 40 319 Raupp-Domingos
11 07/03/1991 16H25 33 204 Agustin-Lavitor
Aquisição e Processamento de Dados 515

Uma análise crítica das medições é necessária. Ela é baseada:

- na verificação das cotas associadas à descarga medida;


- no controle dos elementos geométricos obtidos durante a medição;
- numa análise do método utilizado, do material empregado e do método
de cálculo.

Traçado do gráfico: o gráfico é traçado em papel milimetrado com graduação


aritmética de forma a obter uma visão global não deformada da posição e da
repartição dos diferentes pontos. A escolha das escalas também deve ser
adaptada ao conjunto de dados disponíveis; uma regra simples pode ajudar a
escolhê-las: o número máximo de pontos deve-se situar no ângulo formado pelas
semi-retas de declividade 30 e 60 graus. Por razão de comodidade é
recomendado usar escalas tão simples quanto possíveis. O uso de cores e
símbolos para identificar os pontos facilita a análise da dispersão.
Antes de traçar uma curva, convém verificar se a posição dos pontos está
de acordo com as hipóteses feitas sobre o funcionamento hidráulico da
estação. As seguintes situações podem ser destacadas:

- a uma instabilidade geométrica é associada uma organização cronológica


c a uma instabilidade hidráulica, uma organização cíclica das
descargas de cheia c de depleção;
- um ponto, cm posição anormal no papel, pode ser a única testemunha de
uma situação de calibragem temporária.

A curva de calibragem é traçada por trechos sucessivos, independentes


entre si, quando cm alguns setores a densidade dos pontos for insuficiente. E
importante cercar bem as singularidades do traçado, minimizando os desvios da
curva. Na prática a posição da curva é escolhida de maneira a repartir
equitativamente os pontos de cada lado do traçado (figura 13.24).
O traço da curva deve ser feito de maneira a minimizar prioritariamente
os desvios dos valores considerados confiáveis.
A precisão do traçado depende exclusivamente do número de pontos e de
sua repartição no intervalo de variação das cotas extremas observadas. Também
deve-se lembrar que toda insuficiência no trabalho de campo, aparece
irremediavelmente no momento do traçado da curva de calibragem.

Extrapolação da curva de calibragem

A relação h/Q deve ser definida em todo o intervalo de variação das


cotas de uma série linimétrica homogênea. Este intervalo, limitado pelas
cotas mínima e máxima observadas é designado por intervalo de definição da
calibragem. Em geral o número de medições é insuficiente e/ou a distribuição
516 Hidrologia

é ruim e a curva de calibragem incompleta: ela deve então ser extrapolada em


suas extremidades. Os métodos de extrapolação diferem de acordo com a
extremidade da curva a ser prolongada na direção superior (águas médias e
altas) ou na direção inferior (águas baixas). É recomendado fazer a
extrapolação na direção superior antes da extrapolação na direção inferior,
pois ela pode resultar numa alteração geral do traçado da curva, se o número
de medições for reduzido.

Figura 13.24. Repartição dos pontos e traçado

Extrapolação logaritmica: o princípio é de aplicar na parte superior da curva


um ajustamento de uma expressão matemática exponencial:

Q = a (h - h0)n (13.8)

O procedimento mais simples consiste em plotar as medições num papel com


escalas logarítmicas, determinar graficamente o valor no que retifica melhor
a parte superior da curva e extrapolar a reta até a cota máxima observada.
Este método é aplicável com as seguintes restrições :

- relação h/Q caracterizada por um bom alinhamento das medições de águas


médias e altas sobre o papel log-log;
- medições existentes até uma cota suficientemente elevada para que a
direção da reta seja bem-definida;
- perfil transversal sem discontinuidade de forma nas cotas
extrapoladas;
- controle de jusante permanente entre cotas médias e altas.

Uma distribuição irregular dos pontos observados (concentrados numa


Aquisição c Processamento de Dados 517

faixa estreita de cotas, por exemplo) pode dar um resultado tendencioso.

Método de Stevens: a fórmula de Chézy é apresentada sob a forma:

(13.9)
SÍR

A quantitade S-Tr representa um fator geométrico e a quantidade c i 7 um


fator de declividade que varia muito pouco nos limites da aplicação. Isto
significa que a função Q = f(s4k) é representada por uma reta que passa pela
origem. Então é possível, a partir da curva S$R = f(h), inteiramente definida
pelas características geométricas da seção, avaliar Q, extrapolando a reta. A
figura 13.25 apresenta um exemplo.

SR 1/2

Figura 13.25. Extrapolação da curva-chave pelo método de Stevens.

Além do fato de que o escoamento deve ser quase uniforme, o método de


Stevens só é aplicável se o perfil é estável ou se o número de medições
alinhadas é suficiente.

Superfície molhada e velocidade média: a extrapolação da curva h/Q é feita


considerando-se separadamente as duas componentes da descarga: a) a área
molhada S(h) é conhecida com uma precisão até a cota máxima; b) a velocidade
média do escoamento, cujo crescimento com a cota, em águas médias e altas,
muito menos rápido do que a descarga.
518 Hidrologia

Este método então se resume à extrapolação da curva das velocidades U(h)


que se faz geralmente através da aplicação da fórmula de Manning-Strickler:

a) seja por cálculo da velocidade média para todo valor da declividade


superficial medida no campo, com a rugosidade K sendo estimada a partir das
medições;

b) seja por considerar que a velocidade U varia com a quantidade R2/3, sob a
condição que as observações de campo permitirem verificar a estabilidade da
declividade superficial em águas altas.

O método não tem restrição de aplicação, salvo em caso de seção


transversal com grande instabilidade. Há também necessidade de operar as
medições numa seção bem definida sem jamais mudar de lugar.

Águas baixas: a extrapolação da calibragem para cotas baixas tem por objetivo
completar a curva até a cota mínima observada. No caso de rios não perenes, a
cota para a qual a descarga se tome nula, constitui um ponto de referência
para o traçado da curva. No caso de rios perenes, a extrapolação pode-se
apoiar num método logarítmico, se existir um controle de jusante estável,
caso contrário, as medições de águas baixas são indispensáveis. -

Exemplo 13.8 (exercício). Usando a tabela 13.6, o leitor poderá estabelecer um


trecho da curva-chave do arroio Turcato em Pejuçara e extrapolar a curva nas
direções superior e inferior, usando o método logaritmico.

13.4.3. Calibragem de estações não-unívocas

Não são apresentados os detalhes da calibragem de estações não-unívocas,


mas apenas um breve resumo dos princípios destas metodologias. O leitor que
deseja aprofundar-se no assunto poderá consultar Jaccon e Cudo (1989).

Estações instáveis

O método de representação de uma calibragem não-unívoca, por um feixe de


curvas unívocas transitórias, necessita de definição precisa dos períodos de
validade relativos a cada uma das calibragens. Este método é perfeitamente
adaptado quando a instabilidade, sobretudo geométrica, é de caráter
descontínuo e ele constitui geralmente o único recurso possível, quando a
descalibragem apresenta um caráter progressivo.
Aquisição e Processamento de Dados 519

Estações com variação da declividade da linh a su p e rficial da água

Existem estações intencionalmente equipadas com duas réguas limnimé-


tricas, suficientemente distantes uma da outra, para medir a declividade
superficial. Nesse caso a relação cota/descarga se calcula através de uma
superfécie de calibragem Q = f(h, h ’), sendo h a cota da régua principal e h*
a cota da régua secundária. A representação gráfica desta superfície é feita
mediante um feixe de curvas com desnível ou com nível de jusante constante,
Quando o desnível é um bom indicador da declividade hidráulica, o método
consiste em estabelecer uma curva média (do desnível normal) associada a uma
curva de correção da descarga.
No caso de uma estação equipada com uma régua só, a variável segundária
que, associada à cota, pode permitir explorar a superfície de calibragem, só
pode ser encontrada na cronologia das cotas. Em certas condições, esta
variável é a velocidade de variação da cota num determinado intervalo de
tempo: ela é designada de gradiente linimétrico.
Um outro método consiste em utilizar para a variável secundária o
intervalo entre a cota h e a cota máxima hx atingida pela cheia anual. Ele é
aplicável somente no caso de um linigrama anual regular e que apresenta
gradientes de cheia e de depíeção próximos.
Cada um destes três métodos tem condições 'particulares de aplicação
(Jaccon e Cudo, 1989). Mas de fato, o método do gradiente linimétrico é o
mais usado, pois ele corresponde ao caso mais freqüente.

13.5 Redes hidrológicas

13.5.1 Objetivos

A água constitui um patrimônio da humanidade e precisa ser gerenciada e


protegida da melhor maneira possível. Isto é possível através do conhecimento
dos recursos hídricos, não só a um dado instante, mas ao longo do tempo e com
a maior duração possível.
As instituções que participam do gerenciamento dos recursos hídricos
possuem e monitoram geralmente um certo número de postos de observação
(estações) que constituem uma rede hidrológica.
Existem vários tipos de estações hidrológicas: a) os postos de
hidrometria geral que permitem ter um conhecimento contínuo dos cursos de
água em todas as condições de descarga; b) os postos de alerta e de gestão,
instalados para um objetivo específico; c) os postos temporários instalados
para um estudo especial e uma duração limitada.
A densidade (número de postos por unidade de área), a distribuição, o
equipamento, as grandezas observadas (precipitações, descargas, qualidade da
520 Hidrologia

água, concentração em sedimentos, etc) dependem de vários parâmetros, entre


os quais os seguintes: a) da função do orgão operador (coordenador,
agricultura, energia, pesquisa, instituição de desenvolvimento regional,
etc); b) das particularidades locais (clima, relevo, poluição, tipo de uso,
etc.) c) das verbas e do pessoal disponível.

13.5.2 Exemplo de uma rede nacional : o DNAEE/CGRH

A Coordenação Geral de Recursos Hídricos (CGRH) do Departamento Nacional


de Águas e Energia Elétrica (DNAEE) do Ministério da Infra-Estrutura é
encarregada da centralização dos dados hidrometeorológicos brasileiros. Ela
funciona através de uma unidade central em Brasília e é representada em
várias capitais brasileiras nas agências da Companhia de Pesquisas de
Recursos Minerais (CPRM).
O DNAEE opera diretamente, ou contratualmente com a CPRM, somente uma
parte dos postos pluviométricos e hidrométricos, sendo a maior parte de
competência de cerca de outros 90 estabelecimentos públicos ou particulares
diferentes; mas ele coordena as operações de gerenciamento e de difusão de
toda informação.
O DNAEE edita os inventários de postos pluviométricos c fluviomctricos
de todo país. unificando a codificação deles. Para a hidrometria, o país é
dividido em 8 bacias hidrográficas; cada uma delas é subdividida cm várias
sub-bacias. No caso da pluviometria, o país é dividido cm graus quadrado,
assim permitindo uma localização rápida dos postos que pertencem também a uma
bacia e a uma sub-bacia hidrográfica.
Em 1987, o DNAEE recensou 11.578 postos pluviométricos e as 6.354
estações fluviométricas (tabela 13.7). Em 1991, 4.624 estações funcionavam no
Brasil (as outras foram fechadas ou abandonadas, mas com os seus dados
arquivados) sob responsabilidade do DNAEE (Coimbra, 1991). Os dados são
acessíveis ao usuário através de várias publicações, entre as quais as
principais são os documentos de inventário dos postos pluviométricos e
fluviométricos e os boletins regionais, apresentando o acervo das observações
numa determinada região durante um determinado período.

13.53 Exem plo de uma rede de proteção da saúde humana

Para combater o onchocercerciasis, uma doença que afeta os olhos dos


homens e que é transmitida por um inseto do tipo simulídeo, cujas larvas se
desenvolvem em trechos de rios com velocidade alta do fluxo, a Organização
Mundial da Saúde iniciou um programa de eliminação daquelas larvas colocando
produtos inseticidas por via aérea nas regiões contaminadas.
A extensão do programa cobre uma parte importante da África do Oeste
Aquisição e Processamento de Dados 521

(figura 13.26). A rede, instalada pelo ORSTOM a partir de 1984, consiste em:

- 60 estações equipadas com um linígrafo, um pluviógrafo, um codificador


e uma balisa emissora do tipo ARGOS;
- 2 bases de operações aéreas equipadas com um posto de recepção das
reemissões dos satélites NOAA, um computador de gestão em tempo atual da
informação recebida e um rádio terrestre para comunicação com as
aeronaves (aviões e helicópteros):
- 8 postos de recepção para controle da rede na sede dos serviços
hidrológicos nacionais envolvidos e no Centro Orstom de Montpellier
(França).

Tabela 13.7. Estações fluviométricas registradas no Brasil pelo DNAEE (1987)

Bacia Principal área* número de densidade


km2 estações estações/km2
1-Rio Amazonas 3900000 471 0,12
2-Rio Tocantins 757000 221 0,29
3-Atlântico Sul,trechos Norte/Nordeste 1029000 591 0,57
4-Rio São Francisco 634000 706 1,11
5-Atlântico Sul, trecho Leste 545000 1464 2,69
6-Rio Paraná 1245000 1903 153
7-Rio Uruguai 178000 286 1,61
8-AtIântico Sul, trecho Sudeste 224000 712 3,18
* parte brasileira

135.4 Exemplo de uma rede de prevenção contra cheias catastróficas

Algumas bacias hidrográficas possuem cheias tão rápidas e súbitas que


precisam de uma rede de monitoramento específica. É o caso dos rios da bacia
des Gardons no Sul da França (área total de 3 600 km2). O clima mediterâneo
provoca cheias extremamente destruidoras no período dos temporais freqüentes
de verão, com intensidade excepcionalmente alta nas montanhas des Cévehnes
(figura 13.27).
A rede que funciona desde 1980 consiste em:

- um centro principal que colhe e difunde todas as informações;


- 15 estações automáticas tendo no máximo 7 sensores: linimetna,
pluviometria, velocidade e direção do vento, temperatura, umidade do ar,
insolação e pressão atmosférica;
- cada estação emite os dados através de uma emissora de rádio terrestre
522 Hidrologia

e de um posto de retransmissão que cobre toda bacia;


- alimentação elétrica com painéis solares.

Figura 13.26. Zona de intervenção do programa OMS/OCP

13.6 Bancos de dados

13.6.1 Princípios

H óbvio que o trabalho de aquisição, elaboração, revisão, crítica,


processamento, consulta, alteração de dados hidrológicos se opera com maior
rapidez com a ajuda de ferramentas informáticas chamadas bancos de dados.
Existe, através do mundo, uma grande variedade de bancos de dados
hidrológicos geralmente adaptados a sistemas informáticos de grande porte.
Começaram a aparecer há alguns anos programas computacionais adaptados aos
microcomputadores e este parágrafo é illustrado através do exemplo dos
Aquisição e Processamento de Dados 523

softwares propostos pelo ORSTOM (França): Hydrom para hidrometria e Pluviom


para pluviometria. No entanto, precisa-se mencionar que o DNAEB usa um banco
instalado em um sistema de grande porte que possui extensões adaptadas à
microinformática (SIH-MSDHD), assim permitindo uma melhor flexibilidade nas
operações de entrada e saída de dados. Pode-se mencionar também a existência
e a difusão comercial do programa completo de banco de dados
hidropluviométricos para microcomputador, Hydata, elaborado pelo Institute of
Hydrology (Wallingford, Inglaterra).

yN^Emetor

Q j Centro principal

q Estação rádio
_ Ligação rádio

O -20 Km

Figura 13.27. A bacia des Gardons.

13.6.2 Exemplos: Hydrom e Pluviom

Hydrom

O programa Hydrom (Cochonneau, 1991) foi totalmente desenvolvido pelo


Laboratoire d’Hydrologie do ORSTOM (França). Dedicado principalmente aos
serviços hidrológicos encarregados de redes regionais ou nacionais, Hydrom
pode também ser usado no quadro de estudos de pequenas bacias hidrográficas
em meio rural ou urbano. Hydrom funciona em microcomputador XT/AT, equipado
com disco rígido (capacidade mínima de 10 megabytes), e tela gráfica. Algumas
funções necessitam periféricos complementares como, plotter (padrão HPGL),
mesa digitalizadora, leitor de cartuchos, ou comunicação com uma estação
receptora de dados teletransmitidos.
O sistema de banco de dados hidrológicos Hydrom permite a gestão de:
524 Hidrologia

- três arquivos de base: identificações dos postos, histórico dos postos


e cotas instantâneas;
- quatro arquivos elaborados: arquivos das medições, preparados a partir
de medições de campo, arquivos de calibragens, determinadas a partir das
medições, arquivos de descargas instantâneas, calculadas automaticamente
com as calibragens e as cotas instantâneas e arquivos das descargas
médias diárias, calculadas automaticamente a partir das descargas
instantâneas;
- diversos arquivos segundários, entre os quais: arquivo de hélices de
molinetes, arquivo das características dos linígrafos.

Pluviom

Paralelamente ao Hydrom, a ORSTOM desenvolveu um sistema de dados


phiviométricos (Boyer et al., 1991), usando os mesmos equipamentos e uma
apresentação parecida. Este programa permite a gestão:

- dos postos de medição;


- das características da aparelhagem (caso dos pluviógrafos);
- das alturas de chuvas medidas com intervalo de tempo constante de pelo
menos um dia (pluviometria);
- das alturas dc chuva medidas com intervalos de tempo variáveis a
partir de algumas dezenas de segundos (pluviografia);
- dos dados que permitem conhecer o histórico dos postos de medição.

REFERÊNCIAS

1- ALDEGHERI, M, 1979. Mesure des dêbits á partir des vitesses. Manuel


d:hydrometrie de PORSTOM t.4., ORSTOM, Paris.

2 - BADER, J.C., LE BARBÉ, L., SERVAT, E. 1989. Télétransmission des


données hydrologiqnes dans le cadre du programme de lutte contre
POnchocercose. Proceedings of the Sahel Forum : The State o f the Art
o f Hydrology and Hydrogeology in the Arid and Semi-Arid Areas of
África. Ouagadougou: Burkina Paso (18-23 febr.89). IWRA PubL p.792-99.

3- BOYER, J.F., CRESPY, A., DIEULIN,C., GUISCAFRE,J., RAOUS,P. 1991.


Pluviom. Sistema de gestão de dados pluviométricos. Versão em Português
de HOFMAiNN, HX. e CHEVALLIER, P., ORSTOM, Montpellier.

4- COCHONNEAU, G. 1991. Hydrom. Sistema de gestão de dados hidrométricos.


Versão em Português de HOFMANN, HX. e CHEVALLIER, P., ORSTOM,
Montpellier.
A quisição e Processamento de Dados 525

5 - COIMBRA, R.M. 1991. Rede hidrológica nacional. Boletim ABRH, n 44.

6 - DNAEE/DCRH 1987. Inventário das Estações Fluviométricas.Ministéno das


Minas e Energia, Brasília.

7- DNAEE/DCRH 1987. Inventário das Estações Pluviomêtricas, Ministério


das Minas e Energia, Brasília.

8- JACCON, G., CUDO, K J. 1989. Hidrologia. Curva-chave; análise e traçado.


DNAEE, Brasília.

9- JACCON,G.,GUIMARÃES,V.S. 1983.Calibragememestaçõesfluviométricasda
bacia Amazônica. Aplicação do método do gradiente limnimétrico. Anais
do Simpósio Brasileiro de Hidrologia e Recursos Hídricos. Blumenau.

10- LENCASTRE A. 1958. Manual de hidráulica geral. Lisboa, AEIST

11- MINISTÉRE DE LENVIRONNEMENT 1990. Lm France et Fhydrologie


opérationnelle. Réseaux de télétransmission et gestion des raux.
Collcction "Labei France".

12- REMENIERAS, G. 1960. Uhydrologie de Vingénieur. Paris, Eyrolles.

13- ROCHE, M. 1963. Hydrologie de surface. Paris: Gautier-Viiars.


Capítulo 14

VAZÃO MÁXIMA E HIDROGRAMA DE PROJETO

Carlos E . M. T u cci

14.1 Conceitos

A vazão máxima de um rio é entendida como sendo o valor associado a um


risco de ser igualado ou ultrapassado. O hidrograma de projeto ou hidrograma
tipo é uma seqüência temporal de vazões relacionadas a um risco de
ocorrência. Esta seqüência se caracteriza pelo seu volume, distribuição
temporal e valor máximo (pico do hidrograma).
A vazão máxima é utilizada na previsão de enchentes e no projeto de
obras hidráulicas tais como condutos, canais, bueiros, entre outras. O
hidrograma de projeto 6 necessário quando o volume, a distribuição temporal e
o pi:o são importantes no funcionamento da obra hidráulica, como no caso de
reservatórios e cnsecadciras.
A vazão máxima e o hidrograma são necessários para o controle e
atenuação das cheias numa determinada área, dimensionamento de obras
hidráulicas de drenagem urbana, perímetro de irrigação, diques e extravasores
de barragens, entre outros. A estimativa destes valores tem importância
decisiva nos custos e na segurança dos projetos de engenharia. AWWA(1966)
relatou que cerca de 20% das falhas de 193 barragens deveram-se a
subdimensionamento dos vertedores.
A determinação da vazão e o hidrograma, resultante de precipitações
ocorridas ou com possibilidade de ocorrer, podem ser divididas em duas
classes principais: a) representação de um evento específico; e b)
dimensionamento. No primeiro caso existe um compromisso com a precisão, as
vazões são obtidas com base na precipitação da bacia e nas condições de
umidade do solo e perdas iniciais reais. Esta simulação é utilizada para
retratar condições ocorridas para a análise operacional de obras,
extrapolação de dados e previsão em tempo real.
No dimensionamento, as vazões devem reproduzir condições críticas
possíveis de ocorrer com um determinado risco. Essas condições são
identificadas dentro das mais desfavoráveis. Deve-se definir o risco de um
projeto de acordo com os objetivos do projeto e, dentro destas condições de
risco, explorar as situações mais desfavoráveis. Por exemplo, no cálculo de
bueiros o risco adotado é de 2 a 10 anos, pois aceita-se que as ruas poderão
ser inundadas r.om a referida fremiennia* o dimensionamento de vertedor de
528 Hidrologia

grandes barragens deve ter um risco mínimo, pois o impacto do rompimento da


barragem é destrutivo e o tempo de retomo adotado tem sido de 10.000 anos. A
definição das situações mais desfavoráveis, após a escolha de um risco,
envolve as condições iniciais de solo, perdas por retenção e infiltração,
distribuição temporal e espacial da precipitação.
O risco é a probabilidade que um valor seja ultrapassado. Este risco é
obtido pelo ajuste de uma distribuição de probabilidade aos valores anuais da
variável em estudo (nível ou vazão). Neste caso, a probabilidade (P) é o
risco da vazão ou nível ser ultrapassado num ano qualquer. O tempo de
retomo deste valor é T = 1/P. O risco que uma vazão, com uma probabilidade
associada, ocorra nos próximos anos é obtido pela expressão

PR = 1 - ( 1 - 1/T)N (14.1)

onde N = número de anos. Esta última expressão 6 utilizada para verificar o


risco de uma obra dentro de sua vida útil.

Exemplo 14.1. A ensecadeira de uma barragem deverá ser utilizada por 4 anos
de construção. Estime qual deve ser o tempo de retomo da vazão de projeto,
para que o risco no período citado seja de 10%.

Solução: A probabilidade aceita para os quatro anos dc construção é de 10% ou


PR = 0,10. Sendo N = 4, da equação 14.1, obtém-se T.
0,10 = 1 - (1 - 1/T)4 e T = 38,5 anos

Segundo Sokolov et al. (1975), quando uma grande inundação pode causar
danos catastróficos à vida humana e às propriedades, a cheia de projeto deve
ser estimada com base na precipitação máxima provável (capítulo 5). Para
áreas de menor potencial de dano, as cheias são definidas com base nos
aspectos econômico e político-social. Os aspectos econômicos identificam a
relação benefício-custo da obra, ou seja o custo da construção deve ser
inferior ao dano provocado pela enchente. Viessman et al,(1977) apresentaram
os tempos de retomo normalmente utilizados para pequenas obras hidráulicas
(tabela A.l, anexo A). Snyder (1964) apresentou alguns critérios para
dimensionamento de barragens, reproduzidos na tabela A.2 (anexo A).
Sokolov et al. (1975) apresentaram os critérios russos de definição do
risco do projeto, tabela A.3. Nas tabelas A.4 a A.6 são apresentados os
critérios recomendados pela Comissão brasileira de Grandes Barragens
(Eletrobras, 1987). Todos os critérios combinam risco de perdas materiais e
humanas com critérios de projeto. Estes critérios não garantem segurança
total da obras, mas permitem reduzir a chance de que ocorra uma catástrofe,
sem que o custo seja extremamente alto.
yazão Máxima e hidrograma de Projeto 529

14.2 Vazões M áxim as

A vazão máxima pode ser estimada com base a) no ajuste de uma


distribuição estatística; b) na regionalização de vazões; e c) na
precipitação.
Quando existem dados históricos de vazão no local de interesse e as
condições da bacia hidrográfica não se modificaram, pode ser ajustada uma
distribuição estatística. A mesma é utilizada para a estimativa da vazão
máxima para um risco escolhido. Quando não existem dados ou a série é
pequena, pode-se utilizar a regionalização de vazões máximas (capítulo 15) ou
as precipitações. A regionalização permite estimar a vazão máxima em locais
sem dados com base em postos da região. As precipitações máximas são
transformadas em vazões através de modelos matemáticos. Este método é útil
quando a bacia sofre modificações.
A precipitação máxima é determinada com base no risco ou tempo de
retomo escolhido para o projeto. A vazão resultante não possui
necessariamente o mesmo risco, se comparado com os métodos anteriores, devido
aos diferentes fatores que envolve a transformação da precipitação em vazão.
Os principais fatores são as condições iniciais de perdas do solo, de
escoamento dos rios c reservatórios, além da distribuição temporal e espacial
da precipitação.

14.2.1 Vazões máximas com base em série histórica

No capítulo 4 foram descritas as principais distribuições estatísticas


utilizadas em hidrologia. Estas distribuições são utilizadas no ajuste dos
valores de vazão máxima. As séries amostrais de vazão podem ser anuais ou
parciais. As séries anuais são as vazões máximas ocorridas em cada ano. Neste
procedimento são desprezados os outros valores máximos ocorridos dentro do
ano. Como resultado, o segundo ou terceiro maior valor num determinado ano,
pode ser superior ao maior valor observado num ano menos chuvoso. O ajuste de
séries parciais utiliza os valores máximos escolhidos a partir de uma
determinada vazão selecionada. Esta vazão é escolhida de tal forma a nao
incluir vazões pequenas e de existir pelo menos um valor por ano. Os eventos
devem ser independentes entre si. ,
A utilização de séries parciais somente apresenta resu a
discrepantes com relação ao uso de séries anuais, para tempo de retorn
pequeno. Alguns autores (NERC,1975) recomendam o uso de séries pare ^
quando os registros existentes são reduzidos e deseja-se estimar a vazao
tempo de retomo pequeno. Neste capítulo são abordadas as séries anuais.
530 Hidrologia

Seleção das Vazões

Algumas recomendações na escolha das vazões são as seguintes: a) para


cada ano hídrológico, com período completo, selecione a vazão máxima
instantânea; b) na grande maioria dos postos fluviométricos não existe
linígrafo, sendo necessário utilizar a vazão máxima diária ou a maior vazão
das leituras diárias. (Nas listagens fornecidas pelas entidades que coletam
dados esses valores são selecionados mensalmente); c) quando o posto dispõe
de linígrafo, procure obter o valor máximo. Quando houver ura ano de dados
incompletos, verifique se o período que falta é nos meses secos. Compare com
postos vizinhos, observando se a maior enchente na região está contida nos
meses de falha. Utilize este ano e seu valor, se a falha for no período seco
e/ou houver razões fortes para que o pico não tenha ocorrido no período de
falha.

Condições das vazões escolhidas

O ajuste de uma distribuição de probabilidade aos dados históricos


baseia-se no seguinte: a) a série dos valores amostrais de vazão máxima anual
devem ser independentes; b) o processo natural de ocorrência das mencionadas
vazões é estacionário; c) a amostra é representativa da população.

Independência das vazões - Para vazões máximas anuais a chance de ocorrer


dependência entre valores extremos é pequena, devido ao tempo que separa cada
enchente. A escolha da vazão máxima é realizada, em geral, dentro do ano
hídrológico. O ano hidrológico corresponde ao período de 12 meses a partir do
início do. período chuvoso e o fim da estação seca. Na região Sudeste do
Brasil, para a maioria dos rios, o ano hidrológico inicia em outubro e
termina em setembro. No Rio Grande do Sul inicia em maio e termina em abril.
Bxistem regiões em que a cheia pode ocorrer em qualquer mês do ano, pois o
i^gime não apresenta uma sazonalidade bem definida.

Série estacionária - Uma série é estacionária quando não ocorrem modificações


nas características estatísticas da sua população ao longo do tempo. Por
exemplo, a não-estacionaridade de uma série pode ser provocada: pelo aumento
da urbanização, resultando numa mudança gradual das características do
escoamento; pela construção de reservatórios ou diques, alterando a série de
vazões a jusante da barragem; pelo desmatamento, por exploração ou queima,
mudando o comportamento do escoamento.

Amostra representativa - A confiabilidade dos parâmetros calculados com base


na série histórica depende do número de valores da série, das incertezas e da
sua renresentaíividadft A ----*— ---- — i
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 531

amostra e os da população é definida como incerteza por Yevjevich(1972). As


principais fontes de incertezas são os erros: de processamento e medição da
vazão; devido à não-homogeneidade e; da falta de representatividade da
amostra.
Considere uma série de vazões máximas de N anos. Se este período abrange
uma seqüência de anos chuvosos, a estimativa de seus parâmetros será
tendenciosa. Esse erro aumenta à medida que se deseja estimar tempos de
retomo maiores. Benson(1960), utilizando uma série gerada de 1000 anos de
vazão máxima, mostrou que para estimar uma cheia de 50 anos são necessárias
séries de 39 anos, para que as estimativas fiquem na faixa de 25% do valor
correto, 95% das vezes. Caso seja considerado 80% das vezes, o período de
dados necessário seria de 15 anos. Alguns autores consideram que uma série
amostrai de N anos, pode estimar vazões com alguma confiabilidade para tempos
de retomo de até 2N. Na realidade não é o número de anos, mas a
representatividade dos anos da série que permite uma boa estimativa dos
parâmetros da população.

Exemplo 14.2. No no Itajaí-Açu, cm Blumenau, existem registros de marca de


todas as enchentes que ultrapassaram 9,00 m no posto Iinimétrico. Esta série
iniciou cm 1852. As maiores marcas são apresentadas na tabela 14.1.

Tabela 14.1. Níveis de enchentes cm Blumenau


Ano nível
(m)
1852 16,30
1888 17,10
1911 16,90
1983 15,34
1984 15,50

Entre 1912 e 1982 não ocorreu nenhuma enchente com cota superior a
13,00m. Portanto, utilizando estes 71 anos para ajustar uma distribuição
estatística, os resultados seriam tendenciosos, mesmo para estimativa de
riscos inferiores a 50 anos.

Para identificar a representatividade da amostra pode-se utilizar os


dados de precipitação, que em gerai são mais longos, para verificar se o
período de vazão disponível é representativo de uma seqüência mais longa.
532 Hidrologia

Ajuste de Distribuição Estatística

As principais distribuições estatísticas utilizadas em hidrologia para


ajuste de vazões máximas são: Empírica, Log-Normal, Gumbel e Log-Pearson III.
Os conceitos e equações básicas das citadas distribuições foram descritos no
capítulo 4. Beard (1974) examinou enchentes de 300 estações nos Estados
Unidos comparando diferentes métodos, e concluiu que as distribuições Log-
Normal e Log-Pearson III foram as únicas distribuições que não apresentaram
resultados tendenciosos, enquanto que esta última apresentou resultados mais
consistentes. O autor recomendou o uso da Log-Pearson III com coeficiente de
assimetria regionalizado para amostras pequenas. A seguir são apresentadas,
de forma resumida, as distribuições Gumbel e Log-Pearson III, além de
exemplos ilustrativos sobre a aplicação das mesmas em vazões máximas.

Distribuição Gumbel - As principais relações utilizadas no ajuste da


distribuição Gumbel pelo método analítico são as seguintes:
-e'y
P(Q* Qo) = 1 - c (14.2)

onde P(Q £ Qo) é a probabilidade da vazão Q ser maior ou igual a Qo, e

y = (Q - H)/a (14.3)

chamada de variável reduzida, sendo p e a parâmetros da distribuição e


estimados com base na média e desvio padrão dos valores da série

a = 0,78 s (14.4)

p = x - 0,5772 a (14.5)
onde x e s são a média e o desvio padrão das vazões.
A equação de posição de plotagem utilizada na verificação do ajuste dos
valores da amostra para esta distribuição é a seguinte

i - 0,44
P(Q > Qo) = ---------- (14.6)
N + 0,12

onde i = é a posição das vazões (ordem decrescente): N = tamanho da amostra.

Distribuição Log-Pearson III - A distribuição log-Pearson III possui três


parâmetros: média, desvio padrão e coeficiente de assimetria dos logarítimos
das vazões. A estimativa destes parâmetros é obtida por:
*

Vazão Máxima e hidrograma de Projeto


533

IlogQi
x = (14,7)
N

EOog(Qi-x)'
s = (14.8)
N-l

N £ (log Q - x )'
G = (14.9)
3
(N-l)(N-2) s

A estimativa da vazão para um tempo de retomo T é obtida por


logQT = x 4- K (T,G) s (14.10)

onde K(J\G) é obtido com base na tabela A7 (anexo A). Para valores dc G entre
- l e i o valor de K pode ser estimado por

2 G G ,
K = - i [ ( Kn - - ) - + 1] -1 } (1-1.11)
G 6 6

onde Kn é o coeficiente para G = 0 da tabeia A l, (Anexo A)


À equação de posição de plotagem recomendada para a distribuição log-
Pearson III é a seguinte:

í - 0,4
P = (14.12)
N + 0,1

Limites de Confiança - A incerteza de uma estimativa depende da diferença


entre os parâmetros da população e da amostra usada. Os limites de confiança
procuram medir o grau de incerteza. Para cada estimativa da vazão, com um
determinado tempo de retomo (risco) pode-se estimar os limites superior e
inferior, entre os quais a vazão estimada se manterá, aceito um grau de
confiabilidade denominado nível de significância. Neste capítulo são
utilizados os limites de confiança da distribuição log-Pearson III, que são
calculados por
(LogQ)a = x + K a s (14.13)

onde (LogQa) é o logaritmo da vazão no limite de confiança com nível de


significância a; K a é o parâmetro para o limite de confianca de nível de
534 Hidrologia

signifícâncía a. Este parâmetro é calculado com base no tempo de retomo

2
Zp -H Zp -a b
Ka = limite superior (14.14)
a
t
2
Zp - *Zp -a b
K(i-oc) limite inferior (14.15)
a

2 2
Za 2 Za
onde a = 1 ---------- ; b = Z p ------; e p = probabilidade; Zp = valor de K
2(N-1) N
para a probabilidade p; Z a = 6 o valor de K para o nível de signifícâncía a e
G = 0; N = o tamanho da amostra.

Exemplo 14.3. Ajuste as distribuições Gumbel e Log-Pearson III aos dados do


posto Rio do Sul no rio Itajaí-Açu, apresentados na tabela 14.2.

Solução - Ajuste da distribuição Gumbel: A média, o desvio padrão e os


parâmetros da distribuição ficam: x = 813 m3/s, s - 370,9 m3/s c a = 289,3
e p = 646,1. A equação da distribuição fica y = (Q - 646,l)/289,3.
A reta teórica 6 traçada com base nesta última equação e apresentada na
figura 14.1. Os pontos plotados nesta figura foram obtidos colocando as
vazões em ordem decrescente e calculada as probabilidades com a equação 14.6.
Ajuste da distribuição Log-Pearson III: Utilizando as equações 14.7 a
14.9 para cálculo da média, desvio padrão e coeficiente de assimetria dos
logaritmos das vazões do posto referido obtém-se: x = 2,866' s = 0 199357 e*
G * 0,010874
A equação 14.10 fica log Qt = 2,866 + 0,199357 . Kt. Neste caso como
-1,0 s G s 1,0 pode-se utilizar a equação 14.11 para Kt , função do tempo dc
retomo. As vazões de alguns tempos de retomo foram calculadas por esta
equação e traçada a curva teórica de probabilidade desta distribuição, como
apresentado na figura 14.2. Por exemplo, para o tempo de retomo de 10 anos
Kt = 1,283 e Qt = 1324 m3/s.
Os intervalos de confiança foram estabelecidos para um nível de 95%.
Utilizando as equações 14.13 a 14.15 foram calculados os limites da figura
14.2. Para exemplificar, a seguir é apresentado o cálculo para o tempo de
retomo de 10 anos. Z a = Zo.05 = 1,645; Zp = Zo.i = 1,282. Os coeficientes
ficam
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 535

1.6452 2 1,6452
a = 1 --------------= 0,965 ; b = 1,282 ----------- = 1,576
2 (40- 1) 40

1,282 + -11,282'- 1,576 . 0,965


K a = ---------------------------------------- = 1,6915
0,965

Utilizando o valor dc K a na equação acima, resulta Qls = 1597 m3/s. Para


o limite inferior K i-a = 0,966 e Q u = 1144 m3/s.

Tabela 14.2. Vazões máximas de Rio do Sul


Ano Vazão Ano Vazão Ano Vazão
m3/s m3/s m3/s
1942 465 1943 1090 1944 324
1945 270 1946 801 1947 645
194 d 1080 1949 338 1950 922
1951 476 1952 518 1953 780
1954 1470 1955 846 1956 605
1957 1190 1958 666 1959 535
1960 682 1961 1020 1962 801
1960 - 1962 - 1963 720
1966 - 1967 441 1968 364
1969 823 1970 623 1971 1000
1972 1210 1973 1120 1974 458
1975 1050 1976 735 1977 969
1978 750 1979 668 1980 871
1981 460 1982 701 1983 . 2130
1984 1905

Ajuste de distribuição considerando marcas históricas

Num posto fluviométrico com série contínua de N anos podem existir


informações históricas de marcas de água que ocorreram antes da instalação do
posto que gerou a série contínua. Estas marcas devem ser as maiores de um
período de H anos, sendo H o número de anos que englobe a série contínua e o
período em que as marcas de enchentes foram os maiores valores (figura 14.3).
Essas informações devem ser incorporadas à análise de freqüencia,
permitindo melhorar o ajuste da distribuição.
j4

536 Hidrologia

PROBABILIDADE DE VALORES MENORES (%')

1, 1 1, 5 2 3 4 5 10 15 2 0 3 0 40 5 0 100 200 500


INTERVALO OE REC OR R Ê N C I A ( an o» )
•■’ ■1■11■11‘ ■1111111‘ I ■
! 11■11
-I ■1I I I i • I I I ■■I I .
...
..
..
..
..
..
..
..
..
..
..
..
...
.. I I I I L1
.1Li. I I
_ 1I M l . l . IXlL.

-1 0 1 2 3 4 5 6
V ARIÁVEL R E D U Z ID A (V)

Figura 14.1. Ajuste da distribuição Gumbel

■tti USWRC(1975) recomenda o uso do seguinte procedimento: a) os eventos


't\rI-‘ históricos da série descontínua devem ser os maiores do período anterior ao
registro contínuo; b) selecione z eventos que são os maiores do período de H
fa» anos. Deve-se procurar utilizar todas as marcas históricas, mas ter o cuidado
>***
de selecionar corretamente os eventos ‘ históricos, pois é preferível
desprezar alguns valores baixos quando a informação não é muito consistente;
c) para os z eventos escolhidos deve-se dar peso 1. Aos eventos restantes são
dados pesos
H-z
w = — (14.16)
N*

N* = o número de valores restantes da série contínua; d) Os parâmetros


estatísticos são obtidos por

w Ilo g Q + Ilo g Qz
x = ---------------------- (1 4 .1 7 )
H

„ _ r w l (logQ - X) 2 + £ (logQz -
s - l —--------------------------- ] (1 4 .1 8 )
H-l
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 537
( m 3/*>

H0>®K(O
VAZÃO

Figura 14.2. Distribuição Log-Pearson III e os limites de confiança

H
G = ■[w £(log - x)3 + £ (logQz - x)3] (14.19)
(H-1XH-2) s'

onde Qz = as vazões dos z elementos,


e) A posição de plotagem é calculada por

i - 0,4
p ----------- para 1 < i < z (14.20)
H + 0,1

m - 0,4 (14.21)
P ^ _ ----- para (z + 1) ^ i < (z -f N)
H + 0,1

onde i = ordem do evento no conjunto dos dados observados posicionados e


forma decrescente; m = w i - (w-1) (z + 0,5); 0 O cálculo da curva e
probabilidade e dos intervalos de confiança segue o mesmo procedimento j
descrito.

Exemplo 14.4 Na bacia do rio Itajaí-Açu existem registros de ocorrências de


enchentes que datam de 1851 (figura 14.3). Tucci e Krebs(1986) apresentar
538 Hidrologia

uma série de vazões para Apiuna com base nos dados no local e na regressão
com níveis de Blumenau. A série histérica de dados contínuos de Apiuna é de
1934 a 1984. Ajuste a distribuição log-Pearson III para a série, considerando
as marcas de enchentes.

1852 1984

• • • • • • • |0000000000000000000 I
(8 marcas) 1934 1984

0 - série contínua
• - maiores eventos históricos do período entre 1852 e 1934

Figura 14.3. Exemplo de vazões baseadas em marcas históricas

Solução: Na tabela 14.3 são apresentados os valores em ordem decrescente dos


z valores. Na tabela 14.4 são apresentados os N* valores. No problema z =12;
N*=47; H = 133 e; w =(133 -12)/47 =2,5745

Tabela 14.3. Ajuste com marcas históricas para Apiuna, z valores


Ano Vazão Probabilidade Tempo de
m3/s (%) retomo
1880 5450 99,5 222,0
1911 5300 98,8 83,2
1852 4950 98,1 51,2
1984* 4500 97,3 37,0
1983* 4327 96,5 28,9
1891 3450 95,8 23,8
1855 3150 95,0 20,2
1868 3150 94,3 17,5
1957* 3090 93,5 15,5
1980* 3050 92,8 13,9
1898 2900 92,0 12,6
1900 2900 9U 11,5
* valores da série contínua
Os parâmetros de ajuste com marcas históricas ficam: x = 3,1566; s =
0,228; G = 0,2099. Na figura 14.4 são apresentadas as curvas com marcas
históricas e sem marcas históricas. Pode-se observar que a série de 1935 a
1984 é tendenciosa para tempos de retomo altos.
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 539

T {ono*}

Figura 14.4. Ajuste da distribuição com dados de marcas históricas

14.2.2 Vazão máxima com base na precipitação: Método Racional

A vazão máxima pode ser estimada com base na precipitação, por métodos
que representam os principais processos da transformação da precipitação em
vazão e pcio método racional, que engloba todos os processos em apenas um
coeficiente. Os métodos que estimam a vazão máxima e o hidrograma de projeto
serão descritos no próximo item.
O método racional é largamente utilizado na determinação da vazão máxima
de projeto para bacias pequenas (s 2 km*). Os princípios básicos desta
metodologia são: a) considera a duração da precipitação intensa de projeto
igual ao tempo de concentração. Ao considerar esta igualdade admite-se que a
bacia é suficientemente pequena para que esta situação ocorra, pois a duração
é inversamente proporcional à intensidade. Em bacias pequenas, as condições
mais críticas ocorrem devido a precipitações convectivas que possuem pequena ~y
duração e grande intensidade; b) adota um coeficiente único de perdas,
denominado C, estimado com base nas características da bacia; c) não avalia o
volume da cheia e a distribuição temporal das vazões.
A equação do método racional é a seguinte:

Qmax —0,278 C I A (14.22)


540 Hidrologia

Tabela 14.4. Valores da série contínua (N vazões)


Ano vazão P Tr Ano Vazão P Tr
m3/s % anos m3/s % anos
1975 2760 89,9 9,9 1946 1280 43,5 1,77
1954 2630 88,0 8,3 1951 1260 41,6 1,71
1973 2310 86,1 7,2 1960 1240 39,7 1,65
1948 2250 84,1 6,3 1958 1220 37,7 1,60
1972 2210 82,2 5,6 1934 1121 35,8 1,55
1961 2160 80,3 5,1 1947 1100 33,9 UI
1978 2156 78,3 4,6 1938 1082 31,9 1,46
1935 2040 76,4 4,2 1937 1057 30,0 1,40
1971 2030 74,5 3,9 1940 1032 28,1 1,38
1976 1975 72,5 3,6 1970 1020 26,1 1,35
1941 1960 70,6 3,4 1974 951 24,2 1,31
1966 1930 68,7 3,2 1959 936 22,2 1,28
1955 1890 66,7 3,0 1981 927 20,3 1,25
1979 1847 64,8 2,8 1941 918' 18,4 U2
1939 1821 62,9 2,7 1952 909 16,4 1,19
1977 1764 60,9 2,5 1956 895 14,5 1,16
1963 1750 59,0 2,4 1941 881 12,6 1,14
1969 1730 57,1 2,3 1967 859 10,6 1,11
1950 1680 55,1 2,2 1949 702 8,7 1,09
1953 1610 53,2 2,1 1964 648 6,8 1,07
1962 1550 51,3 2,0 1945 566 4,9 1,05
1982 1539 49,3 1,97 1968 562 2,9 1,02
1936 1533 47,4 1,9 1944 495 1,0 1,00
1965 1460 45,5 1,83

onde I = a intensidade da precipitação em mm/h; A = a área da bacia em km2 e;


C = coeficiente de perdas. A vazão máxima Qmax é dada em m3/s.

Intensidade - O tempo de concentração pode ser estimado pelas equações


apresentadas anteriormente no capítulo 11. O tempo de concentração também
pode ser estimado por uma equação derivada com base no método da onda
cinemática para precipitação constante.

447 (L .n )0,6
tc = (14.23)
0,3 j0,4
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 541

onde tc em minutos; L = comprimento do rio em km; n - rugosidade de Manning;


S = declivídade (m/m); Ie = precipitação efetiva em mm/h, sendo Ic = I c !
Alguns valores de n são apresentados na tabela 14.5.

Tabela 14.5. Valores do coeficiente de Manning


Cobertura da bacia n
asfalto suave 0,012
asfalto ou concreto 0,014
argila compactada 0,030
pouca vegetação 0,020
vegetação densa 0,350
vegetação densa e floresta 0,400

A precipitação é obtida das curvas de intensidade duração e freqüência


do local em estudo. Quando a equação 14.23 for utilizada, o processo de
cálculo toma-se iterativo, pois para determinar a intensidade í é necessário
conhecer a sua duração, que é igual ao tempo de concentração. Quando a
imensidade é expressa na forma da equação do tipo

a Ti
I = ------------- (14.24)
(t + c)d

onde Tr = tempo dc retomo, a, b e c são coeficientes que àepQnácm do local^e


t = duração. Neste problema t = tc, substituindo a equação 14.24 na equação
14.23, resulta

m
I = ----------------- (14.25)
(s r (U + c ) d

mde m = aTbr; s - 447 (L.n)°*h/[S'U C”-4]. Calculando urn valor inicial para Io,
:om base no tempo de concentração obtido da equação de Kirpich ou o
capítulo 11) e substituindo no denominador da equação 14.25, obtém-se o va o
ie li. O valor correto será obtido quando a diferença entre duas iterações
nsignificante (1 - 5%).

Coeficiente C - A estimativa do coeficiente C é baseada em tabelas e tcm


alguns aspectos subjetivos. Na tabela 14.6 são apresentados v aor^,
recomendados pela ASCE (1969). Na tabela 14.8 são apresentados valores de
542 Hidrologia

segundo adaptação do critério de Fruhling e utilizados pela Prefeitura de São


Paulo (Wilken,1978)5 Os coeficientes para áreas agrícolas são apresentados na
tabela 14,7. Neste caso o coeficiente C fica

C = 1 - (CT + C ’2 +C’3 ) (14.26)

As variáveis são identificadas na tabela 14.7. Considerando o


comportamento natural da bacia é de se esperar que o coeficiente varie com o
tempo de retomo ou com a magnitude da enchente, pois com o aumento da
intensidade as perdas não continuam as mesmas e o coeficiente deve aumentar.
Para levar em conta esta variação é utilizado um multiplicador para o valor
de C de acordo com o tempo de retomo (tabela 14.9).

Exemplo 14.5. Determine a vazão máxima para tempo de retomo de 50 anos para
uma bacia com 30% de área cultivada; 70% da bacia com cobertura natural com
árvores e declividade média 8 m/km. O solo tem permeabilidade média. A bacia
tem 2 km 2, desnível de 24 m c comprimento de 3 km. Os valores da curva
de intensidade duração e freqücncia são: a = 1265,7; b = 0,052; c = 12;
e d=0,77.

Solução - O tempo de concentração pode ser estimado pela equação de Kirpich,


3 0385
neste caso: tc = 57 (3 / 24) - 59,64 minutos. Considerando tc = t =
59,64 min e utilizando a equação i-d-f resulta,

Tabela 14.6, Valores do coeficiente C (ASCE.1969)


Superfície C
intervalo valor esperado
pavimento
asfalto 0,70 - 0,95 0,83
concreto 0,80 - 0,95 0,88
calçadas 0,75 - 0,85 0,80
telhado 0,75 - 0,95 0,85
coberturargrama solo arenoso
plano (2%) 0,05 - 0,10 0,08
médio (2 a 7%) 0,10 - 0,15 0,13
alta (7%) 0,15 - 0,20 0,18
grama, solo pesado
plano (2%) 0,13 - 0,17 0,15
médio (2 a 7%) 0,18 - 0,22 0,20
declividade alta (7%) 0,25 - 0,35 0,30
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 543

Tabela 14.7. Valor de C para áreas rurais (Williams, 1949)

Tipo de área c*
1 Topografia
terreno plano, declividade de 0,2-0,6 m/km 030
terreno, declividade de 3 - 4 m/km 0,20
morros, declividade de 30 -50 m/km 0,10
2 Solo
argila impermeável 0,10
permeabilidade média 0,20
arenoso 0,40
3 Cobertura
áreas cultivadas 0,10
árvores 0,20

Tabela 14.8. Valores de C adotadas pela Prefeitura São Paulo (Wilken,1978)


Zonas C
Edificação muito densa:
Partes centrais, dcnsamcnte construídas de uma cidade
com ruas e calçadas pavimentadas 0,70 - 0,95
Edificação não muito densa:
Partes adjacente ao centro, de menos densidade de habi­
tações, mas com ruas e calçadas pavimentadas 0,60 - 0,70
Edificações com poucas superfícies livres:
Partes residenciais com construções cerradas, ruas
pavimentadas 030 - 0,60
Edificações com muitas superfícies livres:
Partes residenciais com ruas macadamizadas ou pavimen­
tadas 035 - 030
Subúrbios com alguma edificação:
Panes de arrabaldes e subúrbios com pequena densidade
de construção 0,10 - 035
Matas, parques e campos de esportes:
Panes rurais, áreas verdes, superfícies arborizadas,
parques ajardinados, campos de esporte sem pavimentação 0,05 - 030
544 Hidrologia

Tabela 14.9. fator de coiTeção de C (Wright-MacLaughin, 1969)


Tempo de retomo (anos) Cf
2 a 10 1,00
25 1,10
50 1,20
100 1,25

1265,7. 500,052
I = --------------------- = 57,8 mm/h
(59,64 + 12)0’77

0 coeficiente de descarga fica

Ccui = 1 -(0,2 +0,2 +0,1)— 0,5


Cfl = 1 - (0,2 + 0,2 + 0,2) = 0,40
C = 0,3 . 0,5 + 0,7 . 0,40 = 0,43.

Corrigindo para o tempo de retomo fica

C = 0,43 . 1,2 = 0,52.

À vazão resultante é

Q = 0 2 7 8 . 0 ^ 2 . 57,8 . 2 = 16,6 m3/s

A determinação da vazão quando o tempo de concentração c calculado


pela equação da onda cinemática é descrita a seguir. Como o escoamento ocorre
parte na bacia e parte no canal, adotou-se n =0,03. Na equação 14.25, os coefi­
cientes são: s = 582,8 e m = 1551,2. A referida equação fica

1 = 1551,2/(582,8 T"’4 + 12)()'77

para Io = 57,8 mm/h, resulta II = 37,21 mm/h na equação acima. Após algumas
iterações o valor converge para I = 31,3 mm/h.
A vazão resultante é

0 = 0,278. 0,52.31,3 . 2 = 9,1 m3/s

Este valor é inferior ao anterior. Esta equação depende do coeficiente


de rugosidade que 6 difícil de estimar para uma bacia pequena em que parte
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 54 5

importante do escoamento ocorre na superfície da mesma. A equação de Kirpich


tende a subestimar o tempo de concentração e, em conseqüência, superestimar a
vazão. De outro lado a equação da onda cinemática considera que o escoamento
ocorre num plano representado pela bacia, com pequena profundidade, que na
prática não ocorre. O escoamento tende a ocorrer numa rede de pequenos
riachos interligados, onde a constribuição dos planos tem comprimento de
poucos metros.

14.3 H idrogram a de projeto

O hidrograma de projeto ou o hidrograma tipo pode ser determinado com


base em dados históricos de vazão ou com base na precipitação, com um risco
escolhido.

14.3.1 Hidrogram a de projeto com base na vazão

O hidrograma de projeto envolve duas variáveis fundamentais, a vazão


máxima e o volume. O risco está relacionado com uma das variáveis e não com
as duas simultâneamente. Além disso deve-se adicionar a distribuição temporal
do volume como outra condição do hidrograma de projeto a ser definida. A
determinação deste hidrograma com base em dados de vazão, pode basear-se em
diferentes critérios, que admitem alguma simplificação. Alguns dos métodos
existentes para a estimativa do hidrograma de projeto são os seguintes:

Hidrogram a critico - Sokolov et al. (1975) apresentaram a prática russa que


se baseia no hidrograma critico observado para definir a forma do hidrograma
de projeto. O procedimento é o seguinte:

a) selecione o hidrograma histórico mais crítico quanto a distribuição


temporal;
b) ajuste uma distribuição estatística às vazões máximas instantâneas (Qp) c
para as vazões (Qm) correspondentes à duração (td) do hidrograma de cheia;
c) determine a vazão instantânea (Qp) e a vazão Qm, para o tempo de retomo
escolhido;
d) calcule o coeficiente K = Qp/Qx, onde Qx é a vazão máxima do hidrograma
observado;
e) calcule as ordenadas do hidrograma de projeto por Qt = K.Qi, onde Qi sao
as vazões do hidrograma observado;
f) as vazões resultantes devem ser ajustadas para que o somatório resultante
apresente volume igual a V (V = Qm td).

As principais limitações deste processo são: a) o volume e pico nao


ocorrem necessariamente no mesmo evento, para o mesmo risco, o que pode
546 Hidrologia

tomar difícil o ajuste mencionado; b) nada indica que as condições de cheia


se repetirão para a combinação prevista. Este procedimento pode ser elaborado
para diferentes padrões de hidrogramas para o locai de interesse em função de
diferentes padrões de hidrogramas críticos observados.

Estatística dos hidrogramas - Pfastetter (1976) utiliza a estatística das


vazões máximas de diferentes durações para construir um hidrograma
característico. O procedimento é o seguinte:

a) ajuste uma distribuição estatística às vazões máximas para diferentes dura­


ções (por exemplo, vazão máxima de 1, 2, 5 e 10 dias), variando da instantânea,
ou diária, ao tempo de base dos hidrogramas observados na bacia;
b) escolhido o risco T, são determinadas as vazões Ql, Q2, Q3,... Qn, para as
durações dl, d2, d3, ...dn, respectivamente; e,
c) as vazões do hidrograma são: Qnl = Ql com duração dl, que corresponde ao
máximo. Para a duração d2, a ordenada é Qn2 = (Q2 d2 - Ql d l) / (d2 -d l). Para
a duração di a vazão fica Qni = (Qi di - Qi-1 di-l) / (di - di-i). As abeissas
correspondentes à subida e descida do hidrograma são definidas de acordo com
a maior freqüência verificada nos dados observados. Por exemplo, na vazão de
duração de dois dias, a vazão máxima de I dia c conhecida, o valor seguinte
pode estar antes ou depois do pico. O segundo valor c posicionado dc acordo
com a maior freqüência observada nos dados. O hidrograma resultante terá o
volume correspondente a maior duração escolhida, para o tempo dc retorno T ,
com pico Qnl.

Este método apresenta também as mesmas limitações do anterior e pode


filtrar os gradientes de vazões dos eventos mais críticos.

Exemplo 14.6. Determine o hidrograma de projeto de 50 anos para o posto de


Marcelino Ramos no rio Uruguai. A série de dados disponíveis é de 1940 a
1975.

Solução - Na figura 14.5 são apresentadas as curvas ajustadas para as


durações de 1, 2, 3, 5, 10 e 15 dias. Na tabela 14.10 são apresentadas as
vazões para o tempo de retomo de 50 anos, divididas pela sua duração. A
vazão calculada para o hidrograma e a posição da abeissa são apresentadas na
tabela 14.10. Para exemplificar, para a duração de 5 dias fica

Qn4 =(Q4 d4 - Q3 d3)/(d4 - d3)=(10400. 5 - 12400 . 3)/(5 -3) = 7400.

Na figura 14.6 é apresentado o hidrograma construído com base nas vazões


da tabela 14.10. Pode-se observar neste, hidrograma que o tempo de pico é
muito reduzido.
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 547

Figura 14.5. Curvas de probabilidade para Marcelino Ramos

Tabela 14.10. Resultados do exemplo 14.7


Duração Qi abcissa Qni
inicial*
3,
dias m3/s dias m /s
1 19100 0 19100
2 14500 1 9900
3 12400 1 8200
5 10400 i 7400
10 7800 1 5200
15 6333 2 3400
* número de dias antes do pico
da abcissa inicial (figura 14.6)
548 Hidrologia

1 4 3 2 Hidrogram a de projeto com base precipitação

O hidrograma de projeto é usualmente determinado com base na


precipitação. O hidrograma pode ser associado ao seguinte: a) precipitação
máxima provável, para projetos de importantes obras hidráulicas: b)
precipitações associadas ao risco ou probabilidade de ocorrência.
A estimativa do hidrograma de projeto com base na precipitação á
composta das seguintes partes: a) discretização da bacia; b) precipitação de
projeto; c) perdas e condições iniciais; d) escoamento superficial e
subterrâneo; e) escoamentos em rios e reservatórios.
No capítulo 5 foram descritos os métodos de determinação da precipitação
máxima e sua distribuição temporal e espacial. As perdas por infiltração,
depressão do solo e interceptação foram analisadas nos capítulos 6 e 9.
Métodos para estimativa da precipitação efetiva foram descritos no capítulo
11 juntamente com a propagação superficial pelo hidrograma unitário. A
propagação em rios e reservatórios foi apresentada no capítulo 12. Neste
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 549

capítulo são descritos os critérios para a combinação dos métodos


apresentados nos mencionados capítulos para a obtenção do hidrograma de
projeto.

Discretização da bacia

Na figura 14.7 é apresentada uma bacia e a sua subdivisão. O hidrograma


de projeto é obtido pela transformação da precipitação de projeto em cada
sub-bacia e a propagação da mesma através dos canais e reservatórios, até a
seção de interesse. Quando a bacia hidrográfica é suficientemente pequena
para que a distribuição espacial e temporal da precipitação média não crie
tendenciosidade no escoamento, pode-se simular o hidrograma de projeto sem
discretizá-la em sub-bacias. O critério de subdivisão em bacias deve levar em
conta o seguinte: uniformidade espacial da precipitação; homogeneidade da
cobertura vegetal, tipo de solo e relevo; locais de interesse e obras
hidráulicas que interferem no escoamento.
Estas condições dificilmente são encontradas, mesmo em poucos
quilômetros quadrados. A discretização deve considerar principalmente as
macrodiferenças das bacias e depende da experiência do hidrólogo. Em cada
sub-bacia existirá uniformidade da precipitação e dos parâmetros do modelo e
um hidrograma de saída.

Precipitação de projeto

O hidrograma de projeto resultante não terá vazão e volume com o mesmo


risco, além disso o risco associado está relacionado com a precipitação
escolhida, o que não é necessariamente o risco da vazão ou do volume máximo
resultante. O risco é escolhido de acordo com o projeto.
A precipitação utilizada na definição do hidrograma de projeto necessita
ser caracterizada quanto ao seguinte: total precipitado na duração;
distribuição espacial: precipitação total média sobre a bacia; distribuição
temporal: precipitação média sobre a bacia em cada intervalo de tempo. A
precipitação é escolhida de acordo com sua duração. A duração da precipitação
total deve ser maior ou igual ao tempo de concentração da bacia. A
precipitação é estimada com base no seguinte: na PMP (precipitação máxima
provável); estatística das precipitações; evento extremo ocorrido na região.
Os métodos para estimativa da precipitação foram descritos no capítulo 5.

Distribuição espacial - A precipitação máxima pontual não é a mesma para toda


a bacia (apenas para bacias pequenas < 25 km2). Durante um evento chuvoso as
precipitações máximas ocorrem sobre uma área pequena, reduzindo-se com_0
espaço. Para a estimativa da precipitação média, função da precipitaç o
máxima pontual podem ser usados os seguintes critérios:
550 Hidrologia

« B| p S u o -b a cia com contribuição


c o n c e n t rada

Q y 8« P Sub-bacia com contribuição


C n distribuída

Trecho de rio

Seção de interesse

b- Subdivisão esquematica

Figura 14.7. Discretização


Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 551

a) curva altura-área-duração: utilizada quando existem dados suficientes para


obtê-la, ou através de funções desenvolvidas para outras regiões (figura
5.18).

b) isoietas de projeto: esta metodologia utiliza isoietas elípticas espaçadas


de acordo com um padrão estabelecido, tendo como precipitação média o valor
total estabelecido. US Corps of Engineers, citado por Viessman et ai. (1977)
utilizou isoietas elípticas (figura 14.8) relacionadas com as durações da
precipitações totais (figura 14.9). Para a duração escolhida, a percentagem
da precipitação média de cada isoieta é obtida com base na área que cada
isoieta cobre. Por exemplo, para a isoieta A, que cobre uma área de 16 mi2,
na curva para duração de 96 hrs, corresponde a 140% da precipitação média
total. A precipitação de cada isoieta é obtida multiplicando a precipitação
total pela percentagem. A precipitação de cada sub-bacia é obtida de acordo
com o método das isoietas. Estas isoietas podem ser movimentadas buscando
maximizar a resposta da bacia;

c) isoietas observadas: são isoietas de um evento crítico sobre a bacia ou


bacia vizinha, desde que tenha compatibilidade meteorológica. A metodologia
de uso das isoietas observadas consiste em: 1) estabelecer as isoietas da
precipitação tom a duração do evento; 2) obter a precipitação máxima pontual
do evento (Pm); 3) dividir os valores de precipitação das isoietas por Pm; 4)
as isoietas do evento com precipitação de projeto P, são obtidas,
multiplicando este valor pelos fatores calculados no item anterior.

Distribuição temporal - Inicialmente é necessário definir o intervalo de


tempo, que depende do tempo de pico e tempo de concentração da bacia. O
intervalo de tempo deve ser menor ou igual a 1/5 do tempo de concentração e
1/3 do tempo do tempo de pico. A menor duração da precipitação deve ser menor
ou igual ao intervalo de tempo escolhido. As durações restantes devem ter
espaçamentos que permitam a discretização representativa do hietograma.
Quando a bacia é subdividida em sub-bacias, o intervalo de tempo deve ser
compatível com a simulação de cada sub-bacia e seu tempo de concentração.
Os métodos de estimativa da distribuição temporal da precipitação de
projeto foram descritos no capítulo 5. Os principais métodos são: 1) baseados
nas estatísticas da distribuição temporal, como apresentado por Huff; 2)
baseado na curva intensidade-duração e frequência, método de Chicago,
utilizado para bacias urbanas; 3) distribuição padrão, como a apresentada
pelo Bureau of Reclamation, que procura maximizar a resposta da bacia; 4)
baseado num evento histórico ocorrido.
Com base nos critérios apresentados existe um grande número de
combinações possíveis dos diferentes critérios apresentados para a definição
552 Hidrologia

13 01 E TA ISOlETA G ENERALIZADA
\ AR EA Cmí 2 1

A 1S OBSERVAÇÃO :
8 10 0
1) O sentido pode ser orientado
r 320 em quolquer direção
D eoo
2) A precipitação e' ob t i da da
E iaoo figura
F 37C0
G 7100 (Corps of Engineer, 1965)

Figura 14.8. Isoietas elípticas

da precipitação de projeto. Algumas seqüências possíveis são as seguintes:

Método A - Baseado nas estatísticas dos valores pontuais: 1) determine as


curvas de altura-área-duraçao (capítulo 5) ou utilize relação da literatura
se não houver dados suficientes; 2) ajuste uma distribuição de probabilidade
às precipitações máximas dos postos para diferentes durações. No caso de não
existirem pluviõgrafos ajuste a distribuição com precipitações de durações
maiores ou iguais a 1 dia e converta para durações menores (consulte capítulo
5), 3) determine a precipitação máxima pontual de cada duração, para o risco
escolhido, na bacia de interesse; 4) localize os valores no mapa que englobe
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 553

a bacia e utilize o método de Thiessen para calcular a precipitação máxima


média pontual. A precipitação máxima pontual e o valor que ocorrería numa
área de no máximo 25 km2* A precipitação máxima média pontual é o valor
ponderado para toda a bacia; 5) como o valor obtido representa o máximo
pontual, utilize a curva do item 1 para obter as precipitações médias
espaciais para as durações escolhidas até o tempo t, onde t £ tc (tempo de
concentração); 6) determine a distribuição temporal de acõrdo com algum
critério de maximização ou evento histórico crítico para a bacia.
554 Hidrologia

A distribuição temporal, com base em evento crítico observado, é obtida


com base no seguinte:

Pm . P(t/D)
Pmb(t/D) = ------------- (14.29)
PT

onde Pm = precipitação máxima média da bacia na duração total; P(t/D) =


precipitação observada no intervalo t da chuva de duração total D; PT =
precipitação de duração D; Pmb(t/D) = precipitação na bacia no intervalo t/D.
Esta metodologia combina a ocorrência da precipitação máxima num ponto
com as distribuições espacial e temporal, dentro de uma visão de projeto, ou
seja de buscar as condições desfavoráveis possíveis de ocorrerem.

Método B - Baseado na ocorrência de um evento extremo: 1) determine as


isoietas do total precipitado de um evento extremo; 2) ajuste uma
distribuição de probabilidades das precipitações do posto com série longa
mais representativo destas ocorrências na bacia; 3) determine a precipitação
máxima pontual para a duração do evento extremo, com o risco escolhido; 4)
determine a precipitação máxima média com base nas isoietas do evento; 5)
distribua a precipitação média total ao longo do tempo com base no
pluviògrafo mais representativo para a bacia, ou aquele que apresentar as
condições mais severas.

Exemplo 14.7. Determine o hietograma de projeto de 50 anos para uma bacia


localizada próxima a cidade de Santa Maria, com área de drenagem de 330 km2.
Na tabela 14.11 (coluna 2), são apresentadas as precipitações máximas do
posto de Santa Maria (CETESB.1979). O rio tem comprimento de 17 km,
declividade média de 0,0005 m/m.

Solução - O tempo de concentração desta bacia pode ser estimado com base na
equação de Kirpich
173
te = 57 ( )0,385 = 11 horas

Adotando o intervalo de tempo de 1 hora e interpolando para os valores


desconhecidos, obtém-se os valores de precipitação da coluna 2. Utilizando a
figura 5.18 com a área de 330 km2 obtém-se os coeficientes de redução da
precipitação para as durações utilizadas (coluna 3). A precipitação média é
apresentada na coluna 4. Na coluna 5 são determinadas as precipitações de
cada intervalo. Nos seis primeiros intervalos ocorre a vazão de pico e as
maiores precipitações. O método do Bureau of Reclamation procura maximizar a
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 555

v a z ã o m á x im a , d is trib u in d o o s m a io re s v a lo re s p a r a o te r c e ir o q u a r til d a d u r a ­
ç ã o d e 6 h o ra s . N e s te c a s o a d o to u -s e u m a p e q u e n a a lte ra ç ã o n a s e q ü c n c ia d o
r e f e r i d o m é t o d o . O m a i o r v a l o r f i c a n o 4 Q i n t e r v a l o , o s e g u n d o n o 5 U, o t e r c e i ­
r o n o 3 Ü, o q u a r t o n o 6Ü, o q u i n t o n o 2 U e o s e x t o n o I a. ( c o l u n a 6 ) . O s d e m a i s
i n t e r v a l o s s ã o m a n t i d o s i g u a is

Tabela 14.11. Exemplo 14.7

duração P Cred Pr AP AP*


h mm mm mm mm
i 80,6 0,69* 55,6 55,6 8,7
2 107,1 0,76 81,4 25,8 9,9
3 121,6 0,82* 99,7 18,3 183
4 136,1 0,84 114,3 14,6 55,6
5 144,4 0,86 124,2 9,9 25,8
6 152,7 0,87* 132,9 8,7 14,6
7 159,0 0,88 139,9 7,0 7,0
8 165,3 0,88 145,5 5,6 5,6
9 170,0 0,89 151,3 5,8 5,8
10 174,6 0,89 155,4 4,1 4,1
11 178,5 C,90 160,7 5,3 5,3
12 182,4 0,90 164,2 3,5 33
13 185,8 0,91 169,1 4,9 4,9
14 189,1 0,91 172,1 3,0 3,0
P - p r e c ip ita ç õ e s a c u m u l a d a s
A P * - p r e c ip ita ç õ e s r e o r g a n i z a d a s
p a r a m a x im iz a r o p ic o

Nos métodos anteriormente descritos não foi mencionado o caso no qual a


bacia é subdividida em sub-bacias devido à variação das características
físicas e das precipitações. Neste caso a análise da distribuição temporal e
espacial é realizada para toda a bacia, enquanto que a precipitação de cada
suh-bacia é calculada com base nas isoietas que abrangem a mesma. A
distribuição temporal é obtida com base no pluviógrafo mais próximo ou em
padrão escolhido.
Um procedimento alternativo baseia-se no cálculo da precipitação média
máxima da bacia. A seqüência é a seguinte: a) determine a precipitação média
espacial de toda a bacia para cada evento ao longo do ano e escolha o maior
valor anual. A duração deve ser maior ou igual ao tempo de concentração; b)
ajuste uma distribuição estatística as precipitações médias máximas anuais;
c)determine a precipitação média máxima para o risco escolhido; d) escolha um
evento crítico conhecido na bacia ou na região para determinar a precipitação
nas sub-bacias no tempo e no espaço. A distribuição temporal é adotada com a
556 Hidrologia

mesma proporcionalidade da observada (equação 14.29). A distribuição temporal


observada é aquela do posto mais próximo e representativo.

Exemplo 14,8. Na região Metropolitana de São Paulo existe um grande número de


postos pluviométricos e pluviográficos. A determinação da precipitação de
projeto para sub-bacias do trecho do rio Tietê entre a Penha e Edgard de
Souza (figura 14.10) utilizou dados de postos com séries desde 1938 a 1984
(Promon, 1986). Nem todos os postos possuiam dados em todo o período,
portanto foram utilizados os postos com dados disponíveis em cada ano. Do
total de 20 postos, 12 possuem série de 38 a 84 e o restante série iniciando
em 58. Para o conjunto foram estabelecidas as áreas de influência com base no
método de Thiessen.
Para cada dia da série foi estimada a precipitação média e para cada ano
foi selecionada a maior precipitação média. Estas precipitações médias
máximas foram ajustadas à distribuição de Gumbel (figura 14.11). A
distribuição espacial foi obtida com base num evento extremo ocorrido de 1 a
2/2/83 (figura 14.10). Os valores deste gráfico foram divididos pela média do
evento que foi de 114,5 mm. Para o cálculo da precipitação de uma sub-bacia,
basta calcular o fator de ponderação médio e multiplicar pela precipitação
obtida do ajuste pela distribuição de Gumbel. A distribuição temporal foi
obtida utilizando o evento registrado pelos pluviógrafos. Foi adotada a
distribuição do posto mais representativo de cada sub-bacia.

Condições Iniciais

As condições iniciais adotada para o modelo utilizado devem procurar


condições desfavoráveis de projeto e com chance de ocorrência. Não é
recomendável combinar situações desfavoráveis de pouca probabilidade de
ocorrência, pois o hidrograma passaria a ter um risco muito maior que o
previsto. Por exemplo, numa bacia em que as maiores imensidades de
precipitação ocorrem no verão, quando o solo está em geral seco, não devem
ser combinadas com solo próximo da saturação, que é condição do inverno
quando as chuvas são pouco intensas mas de longa duração.
As condições iniciais são definidas com base no conhecimento do
comportamento da bacia e da distribuição da precipitação ao longo do ano na
bacia, procurando explorar as condições mais críticas.

Estimativa dos Parâmetros.

Os parâmetros dos modelos devem ser definidos na seguinte ordem de


preferência: 1) com base em dados históricos no local de interesse: ajustando
o modelo aos dados observados e verificando para a faixa de valores em que as
vazões do hidrograma de projeto serão geradas: 2) ajuste dos parâmetros com
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 557

Figura 14.10. Isoíeta de ponderação


558 Hidrologia

VALORES OE Y

1,01 1,1 1,5 2 10 100 1000 10000


INTERVALO OE R E C O R R Ê N C I A T íonoa)

Figura 14.11. Distribuição das precipitações médias máximas

base em dados de posto vizinho, que tenha bacia de característica semelhante


e obtenha a transposição dos parâmetros para a bacia de interesse; 3)
estimativa dos parâmetros com base no conhecimento físico da bacia e uso de
tabelas da literatura. Neste caso é importante verificar a magnitude dos
valores obtidos com base em outras bacias, mesmo que seja de outra região.

Exemplo 14.9. Determine o hidrograma de projeto de 50 anos para uma bacia


localizada próxima da cidade de Santa Maria, descrita no exemplo 14.7. A
bacia tem um solo com capacidade de escoamento acima da média. A cobertura da
bacia é composta de 30% de pasto, 60% com soja e 10% com florestas muito
esparsas. As precipitações de 50 anos de Santa Maria são apresentadas na
tabela 14.12.

Solução - De acordo com o tipo de solo c cobertura, na tabela 11.2 obteve-se:


solo tipo C - pasto (30%) = 75 (normais); soja (60%) = 82 (cm curvas de nível);
florestas (10%) = 86 (muito esparsas); ponderando:

CN = 75 . 0,3 + 82 . 0,6 + 86 . 0,1 = 80.

A precipitação efetiva acumulada é obtida pelo uso da equação 11.2, onde


S = 25400/80 - 254 = 63,5. A equação fica

( P -0 ,2 .6 3 ,5 )2 ( P - 12,70)2
Pef =
P + 0 ,8 .6 3 ,5 = P + 50,8
Vazão Máxima e hidro grama de Projeto 559

Tabela 14.12. Exemplo 14.9


duração P Pef APef
h mm mm cm
1 8,7 0 0
2 18,6 0,5 0,05
3 36,9 6,7 0,62
4 92,5 44,4 3,77
5 118,3 66,0 2,16
6 132,9 78,7 1,27
7 139,9 84,8 0,61
8 145,5 89,9 0,51
9 151,3 95,1 0,52
10 155,4 98,8 0,37
11 160,7 103,6 0,48
12 164,2 106,8 0,32
13 169,1 111,2 0,44
14 172,1 114,0 0,28

As precipitações P devem ser acumuladas para o uso na equação acima . Os


valores da coluna 2 da tabela 14.12 são acumulados. As precipitações efetivas
foram calculadas e são apresentadas na coluna 3. A precipitação efetiva de
cada intervalo é apresentada na coluna 4.
Utilizando o hidrograma unitário triangular do SCS;

tP = 0,5 + 0,6 . 11 = 7,1 h;

qp - 2,08 . 330/7,11 = 96,7 m3/s

Aplicando o HU triangular às precipitações efetivas da tabela 14.12,


convertidas em cm, e efetuando a convolução obtém-se as vazões da figura
14.12, que é o hidrograma de projeto para 50 anos de tempo de retomo para a
bacia referida. Neste exemplo a bacia não foi subdividida e não existiam
dados para ajustar o HU a valores observados. Na solução do exemplo a vazão
de base foi desprezada. Para bacias em que o aqüífero apresenta grande
regularização esta vazão pode ser importante e necessita ser somada aos
valores do escoamento superficial.

Exemplo 14.10. A cidades de Igrejinha e Três Coroas, localizadas na bacia do


rio Paranhana sofrem enchentes (Figura 14.13). Qual é o impacto que poderia
produzir a construção de um reservatório numa sub-bacia a montante, para
controle de enchentes? Na bacia existem três postos pluviométricos com série
560 Hidrologia

longa. Os dados são apresentados na tabela 14.13. A bacia possui área de 477
km2. As características de cada trecho são apresentadas na tabela 14.14.
Determine a enchente de 100 anos de tempo de retomo sem o reservatório e com
o reservatório, para as duas cidades. Os dados do reservatório projetado são
apresentados na tabela 14.15. Na tabela 14.16 são apresentadas as
precipitações acumuladas dos postos, para o tempo de retomo de 100 anos.

Figura 14.12.Hidrograma de projeto para 50 anos.

Tabela 14.13, Dados da Bacia


Bacia áreatc ponderados de Thiessen
km2 h Pl P2 P3
1 225,2 2,7 0,40 0,48 0,12
2 162,0 2,3 0,70 0,30
3 29,8 1,6 0,50 - 0,50
4 59,8 1,5 1,00

*Tc = tempo de concentração


Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 561

Tabela 14.14. Dados dos Trechos


trecho rugosidade largura comprimento declividade planície planície
de de
inundação inundação
m m m/ra m m
A-B 0,04 70 8700 0,0027
B-C 0,04 95 7900 0,0011 4,0 1200

Tabela 14.15. Relação Vazão-Armazenamento do Reservatório


Vazão Armazenamento/At
m3/s m3/s
4 250
14 806
25 7200
88 7836
159 9146
259 10135
379 11672
594 13589
905 17404

Solução - Intervalo de tempo: O tempo de concentração da menor bacia é de 1,4


hs e da maior 2,7 hs. Considerando que At £ 1/5 tc, para a bacia com menor
tc, At a 15 min;
Duração: A duração da precipitação deve ter um tempo superior ao tempo de
concentração de toda a bacia. O tempo de concentração da bacia é

tc — (Ofcacia 1 ^ ^ tre c h o A-B ^ ^ tre c h o B-C

sendo (t)bacia { - 2,7 hs. O tempo de deslocamento nos trechos pode ser
estimado com base na equação de Manning, adotando n = 0,04 para o leito menor
e 0,08 para o leito maior. Sendo (t)trecil0 - Ax/v, considerando uma
profundidade de 5m (enchente) e adotando R = y (profundidade), resulta

8700x0,04 1
t(A-B) "
0,64 h
5 ^ (0,0027)^ 3600
Hidrologia
562

B,

▼q

® Z v
Q B3

<=□

Q
G 84
x___

©
B qci q d i s t r i b u í d o
B a c i a c onc ent rada

A ReservotoYio

Trecho
E

Q - Bac i o b - D i s c r e t i z a ç ã o esquemática

Figura 14.13. Bacia do rio Paranhanha

No trecho B-C, ocorre extravasamento, fazendo Q = £ Qiou Q = QI+Q2 +Q3>


onde Qe = Qi = Q3. Neste caso

2Q e+Q2 1/2
(5x95)5^ ( 0 ,0011)
1x600x12/3
v= + = 0,94 m/s
A 0,08 0,04 (2x5 + 95)2/3 1200 + 5x95
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 563

7900
t = ----- = 2,33 h
0,94

tc = 2,7 + 0,64 + 2,33 = 5,67 hs.

Tabela 14.16. Precipitações acumuladas (T-=100anos)


tempo Posto 1 Posto 2 Posto 3
15min mm mm mm
1 30,2 30,2 30,2
2 46,2 42,8 42,0
3 54 6 50,4 50,4
4 62,2 58,0 .'7,1
5 67,2 62,2 61,3
6 71,4 66,4 654
7 75,6 69,7 68,8
8 79,0 73,1 72,2
9 814 75,6 74,8
OO

10 79,0 78,1
CO

tl 87,4 80,6 79,8


12 89,9 83,2 82,3
13 90,7 84,0 84,0
14 93,2 86,5 85,7
15 95,8 88,2 88,2
16 97,4 89,9 89,9
17 98,7 91,6 91,6
18 100,4 92,4 92,4
19 101,6 94,1 94,1
20 103,3 94,9 94,9
21 104,2 95,8 95,8
22 105,8 96,6 97,4

Considerando 22 intervalos de tempos de precipitação e 30 intervalos de


‘empo de vazões foram simuladas as sub-bacias identificadas na figura 14.13
através do modelo do SCS. Foi adotado CN = 63 para todas as bacias. Na
distribuição da precipitação foi considerado que o valor máximo cai dentro
dos 25% da duração.
O escoamento nos trechos de canais foi simulado pelo modelo Muskingun-
Cunge não-linear com base nos dados da tabela 14.14. No primeiro trecho foram
utilizados 10 subtrechos e no segundo 4. Na figura 14.14 são apresentados os
hidrogramas resultantes na cidade de Três Coroas para as duas condicões icom
564 Hidrologia

e sem reservatório), enquanto que na figura 14.15 são apresentados os


resultados para a cidade de Igrejinha. Pode-se observar destes resultados que
0 reservatório amortecería consideravelmente o pico da enchente.

PROBLEMAS

1 - Qual a diferença entre a vazão máxima obtida pela curva de probabilidade


de vazões máximas e a vazão máxima obtida do hídrograma de projeto?

2- Para determinar o tempo de retomo do nível de enchentes são utilizadas


vazões máximas anuais ou níveis máximos anuais? Justifique.

3 - Quando deve-se utilizar o hídrograma de projeto? Justifique.

4 - Quando é necessário discretizar uma bacia hidrográfica em sub-bacias e


subtrechos de rios? Quais as características que devem ser examinadas?
Relacione e discuta cada uma.

5 - A precipitação máxima de 1 dia para o tempo de retomo de 100 anos de uma


bacia próxima de São Paulo é 130 mm. Determine a distribuição temporal pelo
método do üureau of Reclamation e Huff. A bacia tem tempo de concentração de
cerca de 12 horas.
f W) O V 2 V A

Figura 14.14, Hídrograma de 100 anos em Três Coroas


Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 565

Figura 14.15. Hidrograma de 100 anos em Igrejinha

6 - Determine a vazão máxima dc uma bacia com 30% de área de vegetação


rasteira, 30% com vegetação densa e 40% com área residencial. A declividade
da bacia c suave. A bacia tem 1,2 km2. Calcule a cheia de 5 anos de tempo de
retomo. Verifique o aumento da vazão máxima para a urbanização de toda a
bacia com área residencial ( adote os dados que não forem fornecidos).

7 - Determine a vazão máxima de uma bacia próxima de Porto Alegre com tempo
de retomo de 10 anos. A bacia atualmente é rural com cobertura de 50% de soja e
50% de eucaliptos. A declividade é moderada. Nesta área será implantado um
loteamento residencial em 30% da bacia. Estime o impacto da urbanização sobre
esta cheia, em função da área de bacia, declividade e comprimento.

8 * Nas tabelas 14.17 e 14.18 são apresentados os dados de dois eventos da


bacia do rio Mathias em Joinville. Determine o hidrograma de projeto para 5,
10 e 50 anos de tempo de retomo. O posto pluviográfico mais próximo é o de
São Franscisco do Sul. A bacia tem área de 1,86 km2, o comprimento do rio
principal é 2,8 km, 20% de área impermeável e declividade de 11,3%. Na tabela
14.16 são apresentados dois eventos registrados na bacia.

9 - Para a bacia do exemplo 11.11, determine a enchente de Tr = 50 anos para


566 Hidrologia

bacia em condições atuais e após a sua urbanização. As precipitações são da


cidade de Porto Alegre.

10 - Na tabela 14.19 são apresentados os dados de enchente da cidade de


Brusque. Ajuste as distribuições de probabilidade e compare os resultados.

Tabela 14.17. Rio Mathias, evento 1


At P Q At P Q At P Q
10 min (mm) (m? /s) 10 min (mm) (m? /s) 10 min (mm) (m-\/s)
1 6,8 0,2 13 0,81 25 0,28
2 9,2 1,74 14 0,66 26 0,26
3 4,7 3,55 15 0,58 27 0,25
4 1,0 4,0 16 0,49 28 0,25
5 U 3,4 17 0,45 29 0,23
6 6,3 3,2 18 0,4 30 0,23
7 1,5 3,55 19 0,37 31 0,22
8 0,3 3,46 20 0,34 32 0,22
9 0,05 2,99 21 0,34 33 0,22
10 0,3 2,27 22 0,32 34 0,22
11 0,1 1,33 23 0,29 35 0,20
12 0,1 1,02 24 0,29

Tabela 14.18. Rio Mathias, evento 2


At P o At P Q At P Q
10 min (mm) (m Vs) 10 min (mm) (m Vs) 10 min (mm) (m? /s)
1 0,18 0,17 13 0,9 4,95 25 0,47
2 4,9 0,23 14 0,6 4,58 26 0,45
3 5,8 0,93 15 0,38 3,64 27 0,42
4 0,35 1,74 16 0,2 2,51 28 0,38
5 0,45 1,68 17 0,25 2,04 29 0,38
6 0,4 1,33 18 0,02 1,43 30 0,37
7 0,9 1,93 19 0,01 0,89 31 0,35
8 1,1 1,02 20 0,02 0,79 32 " 0,34
9 4,2 1,09 21 0,1 0,71 33 0,32
10 7,2 5,03 22 0,63 34 (0,31
11 ;4,9 5,37 23 0,58 35 í0,29
12 (3,9 5,37 24 0,52 36 (),28
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 567

Tabela 14.19. Vazões máximas em Brusque.


Ano Vazão Ano Vazão Ano Vazão
m3/s m3/s m3/s
1930 133 1948 243 196 -

1931 417 1949 151 19675 -

1932 207 1950 173 1968 80


1933 184 1951 160 1969 198
1934 185 1952 138 1970 135
1935 195 1953 202 1971 157
1936 218 1954 335 1972 360
1937 152 1955 128 1973 240
1938 239 1956 119 1974 234
1939 175 1957 211 1975 296
1940 285 1958 194 1976 248
1941 128 1959 112 1977 479
1942 239 1960 205 1978 638
1943 123 1961 304 1979 285
1944 173 1962 159 1980 368
1945 153 1963 208 1981 296
1946 197 1964 - 1982 214
1947 243 1965 1319 1983 610
1984 971
i

REFERENCIAS

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York. (Manuais and Reports of Engineering Practice n. 37).

2 - AVAVA. 1966. Spillway design Practice. New York.

3 - BEARD, L.R. 1974. Flood Frequency Techniques. Austin: Center of Resources


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4 - BENSON, R. 1960. Evoíution of Methods for evaluation the occurence of


floods. Geologicai Survey Water-Supply Paper, Washington, n.l580-A.

5 - CETESB. 1979. Drenagem urbana: manual de projeto. São Paulo. 467p.

6 - ELETROBRAS. 1987. Guia para cálculo de cheia de projeto de vertedotres.


Rio de Janeiro. 288p.
568 Hidrologia

7 - NERC. 1915. Flood Studies Report, Lonáon: Natural Environment Research


Councih 5v.

8 - PFASTETTER, O. 1976, Deflúvio superficial. Rio de Janeiro: DNOS.

9 - PROMON, 1986. Estudos Hidrolôgicospara o projeto de ampliação da calha


do rio Tietê entre as barragens da Penha e Edgard de Souza, Promon
Engenharia, 51 p,

10 - SNYDER, F.F., 1964. Hydrology of Spillway Design: Large Structures -


Adequate data, ÀSCE, J. Hyd. Div. 90, N. HY3 (maio) p 239-59.

11 -SOKOLOV,A.A., RANTZ, S.E., ROCHE, M. 1915. F lo o d flo w co m p u ta tio n .


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12 - TUCCI, C.E.M., KREBS, A.J. 1986. Zoneamento de áreas inundáveis. Porto


Alegre: Instituto de Pesquisas Hidráulicas da UFRGS. 123p. (Recursos
Hídricos. Publicação n.IS)

13 - USWRC. 1975. Guidelines for determining flood flow frequency. Water


Resource Councü, Washington. Não Paginado.

14- VIESSMAN, W., KNAPP, J.W., LEWIS, G.L., I ÍARBAUGH.T.n. 1977.


In tro d u c tio n to hyd ro lo g y. New York: ÍEP

15 * USWRC. 1975. Guidelines for determining flood flow frequency. Water


Resource Council, Washington. Não Paginado.

16 - W3LKEN,P.S. 191%. Engenharia de drenagem superficial. São Paulo: CETESB


477p. . .

17 - WRIGHT-MACLAUGHLIN ENGINEERS. 1969. Urban storm drainage


criteria manual. Denver. 2v.

18 - YEVJEVICH, V. 1972. Probability and Statisties in Hydrology.


Fort Collins: Water Resources Pubiication. 302p.
Máxima e hidrograma de Projeto 569

anexo a

Tabela A. 1. Tempo de retomo de projeto para pequenas


obras hidráulicas (Viessman et al,1977)
tipo de obra tempo de retomo
(anos)
drenagem que atravessa
rodovias de acordo com a
intensidade do tráfego 10 a 50
pista de aeroporto 5
drenagem pluvial 2 a 10
pequenos diques 2 a 50
drenagem agrícola 5 a 50

Tabela A.2.Critérios de dimensionamento do vertedor de


barragens (Snyder,1964)
superior categorias pequena
intermediárias

armazenamento (acre-pé) > 50.000 1000 a 50.00C < 1000

altura (pé) > 60 40 a 100

possível mas nenhuma


perda de vida considerável pequena dentro da mesma
da capacidade magnitude
financeira do do custo
perdas excessiva proprietário da
barragem

PMPrcheia cheia padrão: 50 a 100


cheia de projeto do
mais severa baseada nas anos de
vertedor
possível mais severas tempo de
na bacia tempestades retomo.
para a região
570 Hidrologia

Tabela A.3. Classificação numérica de obras hidráulicas (Sokolov et al.,1975)


Obra Hidráulica Classificação Classificação
primária 1 primária 2

Prim eira categoria


Hidrelétrica com capacidade
> 1MW I II
Estrutura hidráulica nos mais
importantes rios de navegação II III
Portos de rios (carga anual
>3 milhões tons) II III

Segunda categoria
Hidrelétricas com capacidade
entre 0,3 a 1 MW II III
Estrutura hidráulica em
rios navegáveis III IV
Portos de rios (carga anual
0,7 a 3 milhões tons) III IV

Terceira categoria
Hidrelétricas com capacidade
de 0,05 a 0,3 MW III IV
Estrutura hidráulica cm
rios navegáveis de
importância local III IV
Portos de rios (carga anual
0,15 a 0,7 milhões tons) III IV

Q uarta categoria
Hidrelétricas com capacidade
<0,05 MW IV IV
Estrutura hidráulica em
pequenos rios navegáveis de
importância local III IV
Portos de rios (carga anual
<0,15 tons) IV IV
1- primária - reflete o potencial de destruição associado com a falha
da obra hidráulica, que neste caso seria severa;
2- secundária - quando o potencial mencionado é menos severo.
3- classificação: I: Tr=10.000 anos; II: 1.000 anos; III: 200 anos;
IV: 100 anos.
Vazão Máxima e hidrograma de Projeto 571

Tabela A.4. Cheias recomendadas para dimensionamento do CBGB, Comitê


Brasileiro de Grandes Barragens (Eletrobras, 1987)
Perigo Dimensão Cheia de projeto para vertedor
pequena tempo de retomo de 50 a 100 anos
Baixo média tempo de retomo de 100 a 1/2
cheia máxima provável (CMP)
grande 1/2 CMP a 1CMP
pequena tempo de retomo de 100 a 1/2 CMP
Médio média 1/2 CMP a 1CMP
grande CMP
pequena 1/2 CMP a 1CMP
Grande média e 1 CMP
grande

Tabela A.5. Classificação do potencial do Perigo-CBGB (Eletrobras,1987)


Categoria Perdas dc vida Perdas econômicas
Baixo nenhuma esperada (nenhuma mínima (região não
estrutura permanente para desenvolvida, estrú-
habitação humana) turas e cultivos
ocasionais)
Significantc até cinco (nenhum dcscnvol- apreciável (terras
vimento urbano e não mais cultivadas, industri-
do que um pequeno número ais c estruturadas)
de estruturas habitáveis)
Alto mais do que cinco excessiva (comunidades
indústrias e agricul­
turas extensas)

Tabela A.6. Classificação da dimensão de barragens do CBGB (Eletrobras,1987)


Categoria altura volume


m 106 m3
pequena 5 - 15 0,05 - 1.0
média 15- 30 1,00- 50,0
grande > 30 >50
572 Hidrologia

Tabela A.7. Valor de K para a distribuição Log-Pearson Tipo III

PROBABILIDADES
G
0,50 0,20 0,10 0,04 0,02 0 ,0 1

3,0 -0,396 0,420 1,180 2,278 3,152 4,051


2,6 -0,368 0,499 1,238 2,267 3,071 3,889
2,2 -0,330 0,574 1,284 2,240 2,970 3,705
1,8 -0,282 0,643 1,318 2,193 2,848 3,499
1,4 -0,225 0,705 1,337 2,128 2,706 3,271
1,0 -0,164 0,758 1,340 2,043 2,542 3,022
0,6 -0,099 0,800 1,328 1,939 2,359 2,755
0,2 -0,333 0,830 1,301 1,818 2,159 2,472
0,0 0,0 0,842 1,282 1,751 2,054 2,326
-0,2 0,033 0,850 1,258 1,680 1,945 2,178
-0,6 0,099 0,857 1,200 1,528 1,720 1,880
-1,0 0,164 0,852 1,128 1,366 1,492 1,588
1-1,4 0,225 0,832 1,041 1,198 1,270 1,318
-1 ,8 0.2S2 0,799 0,945 1,035 1,069 1,087
--V 0,330 0,752
o
CO
Tf

0,888 0,900 0,905


-2,6 0,368 0,696 0,747 0,764 0,768 0,769
-3,01 0,396 0,636 .0,660 0,666 0,666 0,667
Capítulo 15

REGIONALIZAÇÃO DE VAZÕES

Carlos E. M. Tucci

15.1 Introdução à regionalização

A dificuldade de obtenção de dados para os estudos em hidrologia e


recursos hídricos, levaram o hidrólogo a buscar formas de transferências de
informações de um local para outro na bacia.
A escassez de dados tem dois parâmetros básicos, a disponibilidade
temporal e espacial da informação. Muitos postos com poucos anos, não
retratam necessariamente uma amostra representativa de muitos anos (postos
correlacionáveis).
Devido aos altos custos dc implantação, operação c manutenção de uma
rede hidrométríca, toma-se importante a otimização das informações
disponíveis. A regionalização consiste num conjunto de ferramentas que
exploram ao máximo as informações existentes, vísando à estimativa das
variáveis hidrológícas em locais sem dados ou insuficientes. A regionalização
pode ser usada para: melhor explorar as amostras pontuais e, cm consequência,
melhorar as estimativas das variáveis; verificar a consistência das séries
nidroiógicas; identificar a falta de postos de observação.
A regionalização pode ser elaborada para:

- funções estatísticas de variáveis hidrológícas: curva de probabilidade


de vazões máximas (cheias de T anos, capítulo 14 e 17), médías ou
mínimas; curva de probabilidade de precipitações máximas entre outras;
- funções específicas que relacionam variáveis: curva de regularização,
curva de infiltração, curva de permanência;
- parâmetros de modelos hidrológicos: características do hidrograma
unitário; parâmetros de outros modelos hidrológicos.

Distribuições estatísticas

Entre os métodos do primeiro tipo, que corresponde à regionalização de


funções estatísticas, existem três tipos básicos de procedimentos:

a) Métodos que regionalizam parâmetros de uma distribuição estatística - Este


574 Hidrologia

procedimento considera que uma distribuição estatística ajusta bem os dados


dos postos da região escolhida. Inicialmente é ajustada uma distribuição
estatística aos dados das diferentes bacias. Sendo (i e a osparâmetros,
A A A A A A

obtdm-se as estimativas jii, a i; p.2, 02;....; jxn, on, onde n é o número de


bacias ou postos.
A seguir os parâmetros obtidos são relacionados com as características
físicas e meteorológicas das bacias, resultando nas seguintes expressões:

tt = fi (A, P, S„.) (15.1)


a = f2 (A, P, S,..) (15.2)

onde A = área; P = precipitação; S =* declividade, ou seja, são


características físicas e climáticas das bacias.
Para os postos sem dados ou com dados insuficientes, os parâmetros ji e ct
são estimados com basenas equações regionais 15.1 e15.2, após a
determinação das características físicas e climáticas dos mapas disponíveis.
Conhecidos os parâmetros da distribuição estatística, as vazões com o risco
desejado são determinadas para o local em estudo.

b) Métodos que regionalizam a vazão com um determinado risco - Como no caso


anterior, são ajustadas distribuições às vazões de diferentes postos. A vazão
de alguns tempos de retomo de interesse são obtidas das i atribuições
ajustadas a cada posto, ou seja

Q* = gi(ni,cn,Ti); QÍ = gi&ii.<ji.T2); Q* = gi(ni.oi.Tm)


1 *• iz Tm
2
Q = g2(fX2,CF2,Tl); Q i =g JX2.02.T2); Q* = g2(H2.CT2,Tm)
x iZ im

Q jj Sn(yi l ,CJn,Tl), Q —gn(jin,Cfn,T2);..... Q — gn(jin,C7!i,Tm)


iz Tm

onde m = o número de tempos de retomo escolhidos. 0 índice superior indica o


posto ou bacia e o inferior o tempo de retomo; gi(uí,ai,Tj) é a solução da
equação J\p(xi)dxi = 1/T, onde p(x) é a distribuição do posto i com
parâmetros jai e ai.
Com base ^nestes valores a regressão é estabelecida entre as vazões e as
características físicas das bacias, obtendo-se as seguintes relavões:

Q t i = G i(A í\S ,..)


QT2 = G2(A
Regionalização de Vazões 575

QTm = Gm(A,P,S,..)

onde Gj (A,P,S,...) é a equação de regressão para o tempo de retomo Tj.


Para bacias sem dados são utilizadas diretamente as equações acima.
Neste procedimento pode-se utilizar diferentes distribuições para os postos.

c) Métodos que regionalizam uma curva de probabilidade adimensional e o


fator de adimensionalização - Este método adimensionaliza as curvas
individuais de probabilidade com base no seu valor médio, e estabelece uma
curva adimensional regional média dos postos com a mesma tendência. A curva
adimensional regional de probabilidade pode ser expressa por

Fi(QT/Qm) = IÍT (15.3)

onde T = tempo de retomo; Qm - valor médio; Qt = valor com tempo de retomo


T. O valor médio é regionalizado em função das características físicas e
climáticas das bacias, através de uma equação de regressão

Qm - F2(AJ\ S,...) (15.4)

onde F2(ArP,S,.„) é a equação de regressão.


Este procedimento foi adotado num extenso estudo de regionalização de
vazões máximas na Inglaterra (NERC.1975). Separando os dois componentes
importantes da curva de probabilidade, a vazão média e a curva adimensional
de probabilidade, 6 possível estimar cada uma das partes, de acordo com as
informações disponíveis. Este procedimento é útil principalmente para locais
com série curta ( <10 anos).

Funções específicas

Na regionalização de funções, que relacionam variáveis hidrológicas são


normalmente usados dois procedimentos;

a) ajuste de uma função matemática aos dados de cada posto e


regionalização dos parâmetros da função matemática;
b) adimensionalização da função, obtenção de uma curva média com base
nas curvas adimensionais dos diferentes postos e a regressão entre a
variável de adimensionalização e características físicas e climáticas.

A primeira opção é útil quando a curva apresenta modificação de


tendência, de acordo com as característica da bacias, ou seja, mesmo
576 Hidrologia

geograficamente próximas existem situações em que difícilmente duas bacias


distintas poderão apresentar uma curva adimensional única. Este é o exemplo
da curva de permanência que, de acordo com o tamanho da bacia, pode
apresentar inclinações variadas, mesmo tendo formação geológica e superficial
semelhante. O segundo caso é útil, quando a função dos vários postos podem
apresentar tendência semelhante, se agregadas por sub-regiões.

Parâmetros de modelos hidrológicos

Os modelos hidrológicos nem sempre apresentam relações definidas entre


as características físicas do sistema e os seus parâmetros. A estimativa
destes parâmetros pode ser realizada quando se dispõe de dados observados no
local de interesse. Quando isto não ocorre, a estimativa pode ser obtida com
base na experiência de outras bacias. Um dos procedimentos é a regionalização
destes valores. Os critérios normalmente utilizados são:

a) determinação de equação de regressão entre o parâmetro ou combinação


de parâmetros e características físicas e climáticas das bacias, que
possam ser estimadas com base em mapas existentes ou preparados;
b) definição do intervalo de variação possível dos parâmetros com base
em informações características das bacias.

Estes procedimentos apresentam algumas limitações devido á


interdependência dos parâmetros, o que pode criar tend meiosidade nas
estimativas. Este tipo de regionalização não á abordado neste capítulo, mas
valores típicos de parâmetros são apresentados nos outros capítulos que
tiatam de modelos usados nas diferentes fases do ciclo hidrológico. Neste
capítulo são apresentadas a regionalização de algumas distribuições
estatísticas e de duas funções específicas que são normalmente utilizadas em
hidrologia e recursos hídricos.

15.2 Análise dos dados básicos

A análise dos dados básicos está implícita na maioria dos estudos


hidrológicos, mas na regionalização deve ser orientada para que a escolha e
seleção das informações sejam examinadas de acordo com a variável
regionalizada. Por exemplo, no caso de vazões mínimas a parte inferior da
curva de descarga e a mobilidade do leito são fatores importantes na
qualidade dos dados de um posto. Numa região, parte dos dados não devem ser
utilizados devido à sua qualidade ou por serem insuficientes.
Os dados hidrológicos, cartográficos e descritivos da região a ser
regionalizada devem ser reunidos. Os dados descritivos são a localização
geográfica e política da região, rios principais e seus afluentes, cobertura
Regionalização de Vazões 577

vegetal, relevo, formação geológica, distribuição climática, entre outros.


Estes dados permitem visualizar e entender o comportamento hidrológico das
bacias.
Os dados físicos se referem ao mapeamento das informações anteriores.
Para regiões com grande área ( >100.000 km2) utiliza-se um mapa global em
escala de 1:1.000.000 ou 1:500.000 para localização, e mapas de 1:250.000,
1:100.000 ou 1:50.000 para obtenção das variáveis físicas das bacias.
Os postos disponíveis são relacionados pelos DNAEE no boletim
fluviométrico (DNAEE,1983). Inicialmente são selecionados os postos de acordo
com alguns critérios mínimos tais como:

- disponibilidade de vazões;
- série com pelo menos cinco anos de dados. Este limite inferior não é
suficiente para um estudo estatístico, mas considerando que outros
postos possuem série longa é possível que estes dados agreguem
informações na região. No caso da curva de permanência e regularização
este limite de anos para a série é insuficiente, com exceção das séries
que, mesmo com poucos anos, englobam o período crítico regional.

Os dados dos postos selecionados devem scr analisados quanto à qualidade


da curva de descarga, mobilidade da seção e confiabilidade dos dados
históricos (vide capítulo 13).
Os postos, na segunda fase, são selecionados com base nas informações
mencionadas, em critérios como os apresentados na tabela 15.1, que podem ser
adaptados de acordo com a situação da região. Esses critérios devem ser
revistos pela usuário para cada bacia, procurando adaptá-los às condições
gerais de informação, pois o objetivo é a diferenciação da qualidade dos
dados entre os postos. As notas atribuídas a cada posto permite que na fase
da regionalização sejam identificados mais facilmente os postos com melhor
qualidade de dados.

153 Regionalização da Vazão máxima, média e mínima

15.3.1 Definição das variáveis

A vazão máxima se refere aos valores extremos que podem produzir


enchentes nas margens. As vazões máximas podem ser controladas por obras
hidráulicas como condutos, bueiros e vertedores, permitindo a drenagem o
escoamento. A estimativa da vazão máxima toma-se importante para o contro e
de inundação e dimensionamento das referidas obras hidráulicas.
A vazão máxima pode ser estimada a curto ou a longo prazo. A estimativa
a curto prazo é o acompanhamento de um evento a tempo real resultante de uma
578 Hidrologia

Tabela 15 1. Critérios para classificação dos postos para regionalização


(IPH,1983)
Vazão Máxima

Grau Características H Q

A Postos fluviométricos de características excelentes 51,15 *1,15


cujas descargas máximas medidas estão dentro de 10
a 15% do valor máximo de cheia observada, com uma
boa seção transversal para extrapolação, sem trans-
bordamento e estável.
B Postos bons com extrapolação da curva de descarga 31,25 *140
menor que 50% do valor máximo medido de vazão.
Seções transversais boas, sem extravasamento e es­
tável.
C Postos aceitáveis com extrapolação adequada da cur­ 31,75 5240
va de descarga e com eventuais transbordamentos.
D Postos geralmente inaceitáveis pela grande extrapo­ 32,00 <3,00
lação da curva de descarga e transbordamento exces­
sivo na seção.
E Postos com extrapolação inadequada da curva de des­
carga. Não são considerados no estudo
Vazão mínima
Grau Característica
A Pouca ou nenhuma extrapolação inferior da curva-chavc (<50cm));
Existência de uma única curva-chave na parte baixa, demonstran­
do estabilidade da seção de medição, especialmente do fundo.
Boa cobertura de medições de vazão na parte inferior da curva.
B Extrapolação de alguma importância (entre 50cm e Im). Algumas
alterações do talvegue e do fundo, sem migrações marcadas;
dispersão das medições de vazão na parte inferior da curva-
chave. Oscilações da área da seção de escoamento.
c Extrapolação grande da curva-chave ( > l,00m ). Grandes alte­
rações no fundo do rio e pequenas modificações do talvegue;
Dispersão nas medições de vazão. Existência de duas ou mais
curvas-chave na parte inferior. Aceitável com restrições.
D Grandes extrapolações inferiores da curva-chave ( 3 l,20m );
Alteração total do talvegue e do fundo do rio. Grandes disper­
sões de medições. Inaceitável para regionalização.
H = relação entre a maior cota observada e a maior cota com vazão medida;
Q = o mesmo do anterior para vazões.
Regionalização de Vazões 579

precipitação. A previsão a longo prazo é a previsão estatística da vazão


máxima (diária ou instantânea) em qualquer ano. A vazãò máxima está ligada a
um determinado risco e pode ser obtida por uma distribuição de probabilidade
(capítulo 14). A regionalização da vazão máxima envolve a estimativa da curva
de probabilidade para um local sem dados ou com dados escassos. A vazão média
anual de um rio é a média diária de todos os valores do ano. A vazão média de
longo período Qip é a média das vazões médias anuais ou a média das médias.
A vazão média permite caracterizar a capacidade de disponibilidade
hídrica de uma bacia e seu potencial energético, entre outros usos. A vazão
média de longo período é a maior vazão possível de ser regularizada numa
bacia.
As vazões mínimas no contexto deste capítulo, se caracterizam pelos
menores valores das séries anuais. A vazão mínima, é associada a uma duração
t. Por exemplo, a vazão mínima de um ano qualquer com duração de 30 dias,
indica que é o menor valor do ano da vazão média de 30 dias consecutivos. Na
prática, pouca utilidade tem a vazão mínima de 1 dia, enquanto as durações
maiores, como 7 dias ou 30 dias apresentam maior interesse ao usuário, já que
a seqüência de vazões baixas é a condição mais crítica na utilização da
água.
A curva de probabilidade de vazões mínimas permite a estimativa do risco
de que ocorram vazões menores que um valor escolhido. Esta curva de
probabilidade é utilizada em estudos de qualidade da água, regularização de
vazão para abastecimento dc água e irrigação, entre outros.

153.2 Fases do desenvolvimento da regionalização

A regionalização das curvas de probabilidades de vazões, descrita neste


texto, segue o terceiro procedimento descrito no primeiro item deste
capítulo.
As fases da regionalização podem ser as seguintes:

Análise dos dados básicos: seleção e análise dos dados para a regionalização
(item 15.2);

Curva adimensionai de probabilidade: determinação da curva adimensional de


probabilidade para os postos selecionados e definição de uma curva regional;

Regressão da vazão de adimensionalização: estabelecimento da regressão da


vazão de adimensionalização com variáveis físicas e climáticas das bacias
selecionadas;

Regiões homogêneas: verificação da necessidade de subdividir em sub-regiões


de comportamento hidrologicamente homogêneo, estabelecimento das funções de
58(J Hidrologia

regionalização, estimativa da vazão desejada e variãncia da estimativa;

Mapeamento das vazões específicas: para algumas regiões toma-se necessário a


representação gráfica dos resultados da regionalização.

15.3.3 Seleção dos dados

Uma breve descrição da análise dos dados básicos foi apresentada no item
anterior. Os dados selecionados para determinação da curva de probabilidade
de vazões máximas, médias e mínimas devem atender o seguinte:

Amostra representativa: os postos selecionados devem ter pelo menos cinco


anos de dados. A amostra não é necessáriamente representativa para séries
curtas, na vizinhança de cinco anos, mas o conjunto dos postos pode scr
representativo do comportamento das vazões em estudo para a região;

Vazões independentes: dois eventos são considerados independentes, quando a


ocorrência de qualquer deles não afeta o resultado do outro. A seleção de
valores extremos para compor a série amostrai é realizada dc forma distinta
para vazões máximas e mínimas. No caso de vazões máximas pode ser escolhida a
maior vazão dentro do ano hidrológico. O ano hidrológico corresponde ao
período de 12 meses, começando com o início dos eventos chuvosos e fim da
estação seca. Para a seleção da amostra de vazões mínimas o período deve se
encontrar entre estações chuvosas.

Série Estacionária: uma série de vazões é estacionária quar.do não ocorrem


modificações nas características estatísticas da sua população ao longo cio
tempo.
As causas para uma série não ser estacionária ao longo dc vários anos
podem estar relacionadas com as modificações da bacia hidrográfica. A seguir
relacionamos alguns exemplos dessas alterações: a) aumento da urbanização
provocando uma mudança gradual nas características do escoamento; b) a
construção de reservatórios ou diques, alterando a série dc vazões a jusante
da barragem; c) o desmatamento, por exploração ou queima, mudando o
comportamento do escoamento.
Quantitativamente essas alterações podem ter significãncia ou não na
variável que se deseja regionalizar. A construção de uma barragem num
afluente, pode modificar as vazões máximas e mínima em graus diferentes, de
acordo com o tamanho da bacia. Esta avaliação pode ser realizada
estatisticamente com base num teste paramétrico (teste de hipótese de média e
desvio padrão ÍPH, 1983).
Regionalização de Vazões 581

A curva de probabilidade de vazões de um determinado local pode ser


expressa por

P[Qi * Q] = F(Q) (15.5)

onde F(Q ) = função de distribuição de probabilidades; Q = é a vazão em


estudo; P = p ro b ab ilid ad e ; Qi = vazão escolhida. E sta c u rv a d e p ro b a b ilid a d e
p o d e ser a d im e n s io n a liz a d a po r u m a v azã o m é d ia Qm, re su lta n d o e m

P[Qi/Qm ^ Qi/Qm] = G(Qi/Qm) ( 1 5 .6 )

A determ inação da curva de probabilidade de u m p o sto foi d e sc rita no


capítulo 14. Na regionalização por este m étodo utiliza-se a distribuição
em p írica. As vazõ es são o rd en ad as de form a d ecre sce n te p a ra v a z õ e s m á x im a s e
m éd ias c c re s c e n te para v azõ es m ínim as. A p ro b a b ilid a d e é o b tid a d a e q u a ç ã o
seguinte

P[Q i/Q m - Qi,Qm] = (15.7)

o n d e i = o r d e m d a v a z ã o ; N = ta m a n h o d a série. E x is te m o u tra s f o r m u la ç õ e s de
posição dc plotagcm q u e se a d a p t a m a valores de d eterm in a d as distribuições
( c a p í t u l o 4) .

C urva regional

A su p o siç ã o q u e fu n d a m e n ta a c u r / a regional de p ro b a b ilid a d e é a de que


as curvas de cada posto, em bora não coincidentes, apresentam a m esm a
tendência. P lo tan d o em papel probabilístico os valores d e v a z ã o a d im e n s io n a l
c as c o r r e s p o n d e n t e s p r o b a b i l i d a d e s , p o d c - s c o b s e r v a r u m a t e n d ê n c i a u n i f o r m e
dos p o n to s ou u m a g ra n d e dispersão. N o p rim eiro caso, p o d e -se ter u m a região
homogênea com m esm a tendência. No segundo, provavelm ente é necessário
i d e n t i f i c a r as s u b - r e g i õ e s h o m o g ê n e a s .
Caso a dispersão não seja significativa, a ten d ên cia definida pelos
pontos locados poderá ser linear ou não-linear. No prim eiro caso, pode-se
considerar que os valores se distribuam segundo a função estatística que
serv iu de b ase p a ra e la b o ra ç ã o do papel (escala) de p ro b a b ilid a d e utilizado e
no s e g u n d o c a s o isto n ã o o c o rre .
582 Hidrologia

Normalmente as vazões mínimas, independente de suas durações, se ajustam


adequadamente à distribuição de Weibull, enquanto que as vazões máximas se
ajustam a distribuições de extremos como Gumbel.
A curva regional de probabilidade dos postos da região pode ser obtida
pelos seguintes procedimentos:

a) ajuste gráfico dos pontos médios. Os pontos médios são determinados,


pela média aritmética dos valores adimensionais de vazão Q/Qm que caem
em intervalos iguais pré-estabelecidos da variável reduzida y
(distribuição Gumbel). Por exemplo, calculam-se as médias de Q/Qm nos
intervalos de y limitados pelos valores -3,5 a -3,0; -3,0 a -2,5; -2,5 a
-2,0; ....4,0 ou o maior valor de y encontrado na série. A relação
entre y e a probabilidade é obtida por y = -ln (-ln P).
b) ajuste de uma distribuição estatística como a de Gumbel aos pontos
médios;
c) ajuste da curva teórica de Gumbel a todos os pontos dos postos da
região.

Exemplo 15.1. Para a regionalização de vazões máximas do Alto Paraguai,


região I, (IPH,1983) foram testados os trcs procedimentos mencionados. Na
figura 15.1 são apresentados os pontos médios e o ajuste da distribuição de
Gumbel. Na figura 15.2 são apresentados os ajustes dos procedimentos a e c.
Pode-se observar que o ajuste pelos critérios b e c não apresentam resultados
convincentes, já que a curva média não representa a distribuição dos pontos
ao longo de toda a curva. O critério que melhor ajustou os pontos dos postos
da região I foi o primeiro.

Curvas homogêneas e não-homogêneas

Para determinar a curva de probabilidade de uma região podem ser


empregadas as séries coincidentes de vazão (séries com preenchimento) ou
séries não-coincidentes (sem preenchimento).
Na figura 15.3 são comparadas as curvas regionais obtidas com e sem
preenchimento de série por regressão linear, para a região 1 do Alto Paraguai
(IPH,1983). Pode-se observar que a diferença entre as curvas é muito pequena.
NERC(1975) e Crespo (1982) obtiveram resultados semelhantes. Normalmente, as
séries preenchidas por regressão filtram as oscilações que aparecem na curva
regional sem preenchimento, resultando numa curva média coincidente. As
oscilações que aparecem na curva média não preenchida são devido ao pequeno
número de pontos para os tempos de retomo maiores (poucas séries longas) e a
incerteza sobre a probabilidade atribuída a certos valores de vazão, ou seja,
alguns valores podem ser outliers, produzindo flutuação nos valores médios.
egionalização de Vazões 583

1,01 1,1 2 10 100


Tempo re to rn o

Figura 15.1. Ajuste da distribuição de Gumbel aos pontos médios da Região I


do Alto Paraguai (TPH,1983)

Tempo retorno

Figura 15.2. Ajuste da curva de Gumbel e gráfico aos pontos da região I do


Alto Paraguai (IPH,1983)
584 Hidrologia

— r - n r im ------1— r i r 11 n[ i-----1— T T T i r r i i i í 1 r ij i i II 11 llj I ! | l l!B

1 ! i
1
:

1,6
: • |

•x
1,2

i
■ * T
O f

Qm ;• *
m
0,8 x

• Com preenchimento
X Sem preenchimento
0,4

Tempo re to rn o

Figura 15.3. Comparação dos pontos médios com c sem preenchimento na região í
do Alto Paraguai (IPH.1983)

Extrapolação da curva regional

NERC(i975) apresenta uma metodologia para extrapolação superior da curva


regional. Embora o procedimento de extrapolação tenha sido desenvolvido para
curvas regionais de probabilidade de vazões máximas, pode ser aplicado
igualmente para vazões mínimas.
O procedimento é baseado nas mesmas suposições adotadas no método da
estação-ano. Considerando a existência de N postos independentes (ou seja,
com vazões não correlacionadas) em uma mesma região homogênea, os valores
adimensionalizados dos registros destes postos podem ser considerados como N
realizações de um mesmo processo. Sendo assim as observações dos N postos
poderão ser agrupadas e consideradas como provenientes de um mesmo posto.
Dois fatores são, portanto, essenciais: a) todos os postos pertençam a uma
mesma região homogênea; e b) não exista correlação entre vazões de postos em
um mesmo grupo. A seguinte seqüência pode ser adotada:

a) o conjunto dos postos fluviométricos na mesma região homogênea é


dividido em 4 ou 5 grupos formados por postos com observações não
Regionalização de Vazões 585

correlacionáveis entre si;


b) os quatro (este número é uma sugestão, pode-se escolher menos ou
mais) valores adimensionais mais extremos de vazão Q/Qm são selecionados
em cada grupo;
c) o tempo de retomo do maior valor é igual ao número total de anos do
grupo M, O segundo valor tem o tempo de retomo M-l e assim,
sucessivamente, até o quarto;
d) Os valores extremos, juntamente com os seus tempos de retomo, são
locados no gráfico da curva regional de probabilidades, orientando sua
extrapolação.

Exemplo 15.2. Para a região I do Alto Paraguai, os postos foram reunidos em


quatro grupos. Os quatro maiores valores de cada grupo são apresentados na
tabela 15,2, juntamente com os valores de y, a variável reduzida da
distribuição de GumbeL Na determinação dos pontos extremos foram
estabelecidas três classes acima de Q/Qm = 3,23, já que abaixo deste valor a
curva está bem definida. Os pontos obtidos são apresentados na figura 15.2 e
tabela 15.3. Deve-se ressaltar que os postos não são totalmente
independentes. Procurou-se adotar como critério de independência o valor do
coeficiente de correlação linear menor que 0,7 na regressão entre postos, ou
seja coeficiente de determinação menor que 0,5.

Procedimento semelhante foi adotado na Regionalização do Rio Grande do


Sul (Tucci,199i). Na figura 15.4 é apresentada a curva de probabilidade
obtida para a Região I do Estado (Rio Uruguai). Neste caso,, foi possível
extrapolar com melhores informações, pois as séries são mais longas e em
maior número.

Tabela 15.2. Valores das variáveis para cada grupo


Q/Qm y Q/Qm y Q/Qm y Q/Qrn y

1.59 4,34 1,81 4,57 1,97 4,36 1,68 4,36


1.57 3,30 1,806 3,53 1,66 3,32 1,53 3,32
1,48 2 ,7 9 1,57 3,03 1,44 2 ,8 2 1,48 2 ,8 2

1,42 2,45 1,52 2,69 1,38 2,48 1,47 2,48

43 anos 54 anos 41 anos 41 anos


grupo 1 grupo 1 grupo 3 grupo 4
586 Hidrologia

Tabela 15.3. Pontos para extrapolar


Classes de y número de pontos Q/Qm y(médio)

3,25 - 3,75 4 1,64 3,37


3,75 - 4,25 0 - -

4,25- 4,75 4 1,76 4,41

Tempo r e t o r n o

Figura 15.4. Curva adimensional da região I do Rio Grande do Sul

153.5 Equação de regressão

A equação de regressão é estabelecida entre a vazão média de


adimensionalização e as características físicas e climáticas das bacias com
dados. As características (variáveis independentes) escolhidas devem explicar
a variação da vazão, além de poder ser obtida facilmente através de mapas
existentes (ou preparados no estudo).
Algumas destas variáveis utilizadas são: área de drenagem (A),
precipitação média anual (P), declividade do rio (D), densidade de drenagem
(DD), comprimento do rio (L). A equação de regressão Fica

Qm = f( A, P, D, DD, L ) (15.8)
Regionalização de Vazões 587

onde a função f(.) normalmente utilizada é uma equação de potência do tipo

Qm = a Abi>C.Dd DDe.Lf (15.9)

Esta equação pode ser transformada numa equação linear através da


transformação por logarítimos, ou seja

ln Qm = In a + b InA + c lnP + d InD + e InDD + f lnL (15.10)

Os coeficientes a, b, c, d, e, f são obtidos pelo método dos mínimos


quadrados. O nível de correlação obtido é medido pelo coeficiente de
determinação não-tendencioso e pelo erro padrão da estimativa. Neste caso
pode-se utilizar o erro padrão fatorial que é af = es e s é o erro padrão dos
logaritmos da vazão Qm. O erro padrão fatorial é multiplicativo e o intervalo
A A
de um desvio padrão encontra-se entre Qm/af e af.Qm.
O coeficiente de determinação não-tendencioso é o seguinte
2
S
R2 = i -— 7 (15.11)
sy"

onde s - £(lnQoi - lnQci)7(N-p-l); sy2= ^(lnQoi - lnQo)2/(N-l); N = tamanho

da amostra; p = número dc variáveis independentes; Qoi= vazão observada de


ordem i; Qci = vazão calculada pela regressão de ordem i.
Inicialmcntc não são conhecidas as variáveis independentes que melhor
explicam a variável dependente. Portanto, é necessário procurar a melhor
combinação de variáveis independentes que represente a distribuição dos
valores da variável dependente.
O modelo mais eficiente será aquele que: a) permite estimar com pequeno
erro os valores de y; b) inclua o menor número possível de variáveis
independentes para reduzir o custo e o tempo de obtenção desses valores no
processo de predição. Para atender a esses objetivos conflitantes existem
vários métodos de pesquisa (Draper e Smith, 1966), quando o número de
variáveis é consideravelmente alto. Na regionalização, o número de variáveis
independentes é normalmente pequeno e é possível examinar todas as regressões
possíveis.
O número de combinações de p variáveis independentes em uma equação de
regressão é obtido por 2P. A vantagem deste método é a de examinar as
diferentes equações e poder interpretar melhor os resultados. Por exemplo, o
número de equações possíveis em uma análise com 2 variáveis independentes é
4, ou seja
588 H id ro lo g ia

y = b
y = aiX i + b
y = a2 X 2 + b
y = alX i + a2 X2 + b

Quando o número de variáveis dependentes for superior a 6 é conveniente


o uso de métodos estatísticos de escolha das variáveis na regressão múltipla
(capítulo 17).
A melhor equação pode ser escolhida com base nas estatísticas dos
resultados. Algumas destas estatísticas são: a) a estatística F para
verificar a significância do modelo; e b) o valor do coeficiente de
determinação. O primeiro é uma condição necessária, pois testa a hipótese do
modelo apresentar alguma correlação com a variável independente, enquanto que
o segundo dá o grau de correlação do modelo.
O ^acréscimo de uma nova variável na equação poderá reduzir a variância
dos resíduos e aumentar o coeficiente de determinação. Existirá a situação em
que o acréscimo de nova variável não resultará em acréscimo relevante para o
coeficiente de determinação. Na figura 15.5 observa-se que após três
parâmetros o acréscimo adicional de R2 é mínimo.

Figura 15.5. Relação entre R2 e p


R e g io n a liz a ç ã o d e V a z õ e s 589

E xem plo 15.3. Na regionalização de vazões máximas do Alto Paraguai


(IPH,1983) foram definidas trcs sub-regiões. Para as regiões I e II foi estabele­
cida uma equação de regressão da vazão média de cheia, devido ao reduzido
número de postos da região II. As variáveis independentes da regressão foram
as seguintes: arca da bacia, precipitação anual, declividadc, densidade de drena­
gem e comprimento. Foram analisadas todas as combinações possíveis. Na ta­
bela 15.4 são apresentados os melhores resultados para cada combinação de
variáveis. Pode-se observar, na referida tabela, que o melhor resultado ocorre
com três variáveis. A equação resultante é a seguinte

Qm = 0,40 A0,636 PA3417 DD 0,273

onde A = área de drenagem, em km2; PA = precipitação média anual em m; DD ==


densidade de drenagem em junções/km2.0 acréscimo da densidade de drenagemna
regressão melhorou um pouco a regressão, mas pode ser desprezada quando
houver dificuldade para estimativa desta variável. Neste caso é estabelecida
a equação com duas variáveis.

153.6 Regiões homogêneas

A definição dc uma região homogênea está relacionada com um determinado


tipo dc comportamento do sistema hídrico, Na regionalização hidrolégica a
homogeneidade é entendida como a semelhança na resposta das funções regionais
obtidas, que neste caso são a curva adimensional de probabilidade e a equação
de regressão.

Tabela 15.4. Resumo das regressões da vazão média de Cheia para postos
da Região I e II do Alto Paraguai (IPH.1983)

Número de variáveis independentes R2 ar

variáveis não-tendencioso

5 área, precipitação média anual, 0,811 1,36


declividade, densidade de dre­
nagem, comprimento.
4 área, precipitação média anual, 0,820 1,35
declividade, densidade de dre-
nagem.
3 área, precipitação média anual, 0,828 1,34
densidade de drenagem.
2 área, precipitação média anual 0,793 1.38
1 área 0,564 1,60
590 Hidrologia

As curvas individuais de probabilidade nem sempre apresentam uma


tendência única com pequena dispersão, como também a equação regional de
regressão pode apresentar baixos valores do coeficiente de correlação. Isto
pode ser decorrência do seguinte:

-as bacias não têm comportamento necessáriamente semelhante: a tendência


semelhante numa curva adimensional de probabilidade se refere
principalmente a proporcionalidade entre os eventos de cheia. Para
exemplificar, um trecho de jusante de um rio, com fluxo em área de
extravasamento poderá produzir vazões menores para os mesmos eventos que
uma seção a montante fora do trecho com extravasamento, não mantendo a
proporcionalidade esperada pela curva adimensional (figura 15.6);
-o tamanho das amostras pode criar tendenciosidade: a inclinação dada
pelos pontos de cada curva pode ser fortemente dependente do tamanho da
série, resultando em tendências diferentes na curva adimensional. Isto
pode ser observado na parte superior da curva adimensional regional de
probabilidades regional, onde existe uma nuvem de pontos muito
dispersa. Quando numa região existirem muitos postos com série curta,
poderão ser obtidos resultados tendenciosos.

F igura 15.6. M o d ific a ç ã o da te n d ê n c ia da cu rv a a d im e n sio n a l


Regionalização de V azões 591

Critérios de subdivisão das regiões

Alguns dos critérios que poderíam ser utilizados na subdivisão em


regiões são os seguintes:

Tamanho das bacias: agrupar as bacias pequenas, médias e grandes. Em estudos


anteriores (NERC,1975 e Crespo, 1982) mostraram que agrupando os postos
segundo o tamanho das bacias os resultados obtidos não mostraram
comportamento distinto;

Rio principais: reunindo os postos segundo os rios principais. Nem sempre é


possível obter bons resultados neste caso, porque os rios de grande porte
mudam as características físicas e meteorológicas de montante para jusante.
Exemplo disto ocorre no rio Paraguai, onde nas suas cabeceiras a declividade
é alta, contrastando com o Pantanal, onde o movimento é lento;

Geografia: a similaridade das características geográficas das regiões permite


definir preliminarmente as sub-regiões. Esta divisão é muito conveniente para
uso futuro dos resultados e pode ser aplicado para grandes áreas. NERC (1975)
utilizou este critério no Reino Unido;

A definição da região, segundo os critérios acima, pode ser realizada


com base cm métodos matemáticos e estatísticos. Esses critérios verificam,
se uma região, preliminarmente escolhida, apresenta bom ajuste dos elementos
principais da regionalização, que neste caso são a equação de regressão e a
curva de freqüância.
Existem vários procedimentos para determinar as regiões homogêneas
segundo o critério geográfico mencionado acima. Uma das seqíiências é a
seguinte:

a) Determine a curva de probabilidade adimensional para cada posto. A curva


pode ser definida somente pelos pontos através das equações de posição de
plotagem;
b) Procure reunir os postos com tendência semelhante, principalmente para
tempos de retomo intermediários onde o número de pontos é grande. Os postos
devem pertencer a uma região geográfica e hidrológica compatível. Por
exemplo, dificilmente postos de uma vertente da Serra do Mar podem ser
agrupados com outro da vertente oposta, se fortuitamente apresentarem a mesma
tendência. A agregação podería ocorrer se mais postos tiverem a mesma
tendência. Desta forma são definidas preliminarmente as regiões;
c) Determine a equação de regressão de todos os postos segundo critérios
descritos anteriormente. Determine os resíduos da regressão (Qo - Qc).
Coloque os valores em mapas com o sinal respectivo. Postos com mesmo sinal
592 Hidrologia

tendem a agrupar-se numa região. Os valores em mapa permitem visualizar a


distribuição dos erros;
d) Procure compatibilizar as regiões da curva de freqüência com a região da
equação de regressão. A equação de regressão deve ser definida com uma
amostra estatisticamente aceitável, já que um número reduzido de postos com
correlação alta pode não ser representativo da região. O tamanho da amostra é
N - p + 1 (N = número de postos; p = variáveis independentes da regressão).
Procure com que a equação de regressão defina uma mesma região da curva de
freqüência ou que englobe regiões inteiras.

Exemplo 15.4. A curva de probabilidade de vazões máximas de toda a região do


Alto Paraguai é apresentada na figura 15.7. Pode-se observar a grande
dispersão. A equação de regressão para toda a região apresentou R2 = 0,66 o
que é muito baixo. A região foi dividida em três (figura 15.8), com base nas
curvas de probabilidade e na equação de regressão. As três curvas são
apresentadas na figura 15.9 e uma equação de regressão para regiões I e II
com R2 = 0,83 e outra para a região III com R2 = 0,88. As duas partes
superiores da bacia representam bacias com grande declividade e isoietas com
precipitação significativa ( > 1500 mm). A região III representa o Pantanal
onde o escoamento tem uma drenagem muito baixa.

i ; r i m i -------r i~ P m i 1------ 1— T T T T T r r i_ i i í i q i— [ 11 ifr] — r i nnn

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1,001 1,01 1,1 2 10 100 1000
Tempo r e t o r n o

Figura 15.7. Curva adimensional de toda a região do Alto Paraguai (IPH.1983)


Regionalização de Vazões 593

A regionalização das diferentes vazões não necessita ter a mesma


subdivisão em regiões, pois as características do escoamento são diferentes.
Normalmente existe a tendência de que vazões máximas e médias tenham uma sub­
divisão semelhante ou igual, enquanto que na vazão mínima a subdivisão é
maior devido ao efeito da variabilidade dos aqüíferos.

153.7 Estimativa da vazão e sua variância

Vazão máxima - A vazão máxima é estimada com base na média das vazões
de cheia Qm e no valor adimensional QT/Qm da curva regional de probabilidades

Qt = QT/Qm . Qm (15.12)

A vazão adimensional é obtida da curva de probabilidade da região em que


está localizada a bacia em estudo, a partir do valor escolhido para o tempo
de retomo T.

Figura 15.8, Regiões de vazão máxima para o Alto Paraguai (IPH,1983)


594 Hidrologia

A vazão média de cheia é calculada com base na disponibilidade de dados


na região. Quando não existem dados, ou a série é menor que 3 anos, a vazão
média de cheia é calculada pela equação de regressão estabelecida para a
região. Quando existem de 3 a 5 anos de dados históricos, a vazão média pode
ser estimada por séries parciais. Este procedimento (NERC.1975), leva em
conta o fato das séries parciais tenderem a dar boas estimativas de vazão
para pequenos tempos de retomo;
Para estabelecer a distribuição de valores máximos em uma série parcial
é necessário definir uma vazão Qo acima da qual a mesma é considerada
extrema. A escolha desta vazão é subjetiva e foi adotado o seguinte critério;
a) a vazão Qo deve ser escolhida de tal forma a resultar em 3 a 4 picos por
ano; b) as vazões máximas devem ser independentes entre si. O critério de
independência adotado é o de que, as vazões devem estar separadas pelo tempo
três vezes maior que o tempo da vazão máxima do primeiro pico, e a vazão deve
reduzir entre picos, de dois terços do primeiro; c) desta forma, são
escolhidas M cheias independentes durante os N anos de registros. Utilizando
a distribuição de Poisson, a vazão média de cheia é obtida por:

Qm = Qo + B (lnL + 0,5772) (15.13)

onde B = [ £ (Qi -Qo)]/M ; L = M/N.

1,001 1,01 1,1 2 10 100 1000

Tempo re to rn o

Figura 15.9. As curvas adimensionais do Alto Paraguai (IPH,1983)


Regionalização de Vazões 595

P a ra s é r ie s h is tó r ic a s s u p e r io r e s a 5 anos, a v a z ã o m é d ia d e c h e ia é
e s tim a d a p e la m é d ia a r itm é tic a das vazões e c o m p arad a com os o u tr o s
p r o c e d im e n t o s .

V a z ã o m í n i m a - A v a z ã o m ín im a c o m d u r a ç ã o t e te m p o d e r e t o m o T é o b t i d a p o r

Q T ,t = Q T ,t/Q m ,t . Q m ,t ( 1 5 .1 4 )

onde Qm .t é a vazão m é d ia m ín im a d e d u r a ç ã o t, o b t i d a p e l a e q u a ç ã o de
re g re ssã o , e Q T ,t/Q m ,i é o te r m o a d im e n s io n a l da c u rv a de p ro b a b ilid a d e
r e g io n a l p a ra o te m p o de r e to m o T . N e s te c a s o , o u so d e s é r ie s p a r c i a i s
d i f i c i l m e n t e p o d e s e r a p lic a d o d e v id o a p o s s ív e l d e p e n d ê n c i a e n t r e a s v a z õ e s .

V a riâ n c ia d a E s tim a tiv a - A v a r i a n c i a d o p r o d u to d e d u a s v a r i á v e i s s e m


c o rre la ç ã o é d a d a p o r

v a r x .y = [ E ( x ) f v a r y + [ E ( y ) ] 2 . v a r x ( 1 5 .1 5 )

o n d e E (x ) e E (y ) s ã o o s p r im e ir o s m o m e n to s d e x e y , r e s p e c t i v a m e n t e .
A p lic a n d o e s t a e x p r e s s ã o n a e q u a ç a o 1 5 ,1 2 , o q u e s i g n i f i c a d e s p r e z a r a
c o r r e la ç ã o e n t r e as v a r iá v e is , r e s u lta

v a rQ T = [E ( Q t / Q tti) ] 2. v a r Qm + [ E ( Q m ) ] 2 v a r Q T /Q m ( 1 5 .1 6 )

A v a r i a n c i a d a m é d ia d a s v a z õ e s é e s ti m a d a p o r

2
v a r Qm = a /N ( 1 5 .1 7 )
2
o n d e a = v a r i a n c i a d a p o p u la ç ã o ; N - ta m a n h o d a a m o s t r a .
C o n s id e r a n d o o c o e f i c i e n t e d e v a r ia ç ã o C v - a /Q m , a e q u a ç ã o 1 5 .1 7 f ic a

(Cv.Qm)2
v a r Q m = ------ -- ---------- ( 1 5 .1 8 )

o c o e f i c i e n t e d e v a r ia ç ã o C v r e g io n a l p o d e s e r o b tid o c o m b a s e n a s v a z õ e s
Q ij; o n d e i = a n o e j = p o s to . O c o e f ic ie n te d e v a r i a ç ã o d e c a d a p o s t o é
596 Hidrologia

C v (j) = (15.19)
Qmj

e o coeficiente de variação regional é

[(nj-l)CvG)

(15.20)
m

Quando a média das vazões 6 estimada pela equação de regressão é


necessário conhecer N da equação 15.18 para estimativa de sua variância. NERC
(1975) demonstra que a estimativa a partir das características físicas das
bacias, resulta em uma variância de estimativa idêntica a que seria obtida
para um registro entre 1 e 2 anos. Foi sugerido o uso do valor de N = 2 e Cv
calculado pela equação 15.20.

Exemplo 15.5. Para a região do Alto Paraguai o coeficiente de variação da


região I é Cv = 0,344. A equação 15.18 fica

var Qm = (0,344)2 Qm2/2 = 0,059 Qm2

Para testar a adoção de N = 2, o erro padrão da estimativa do logaritmo


da média das vazões de cheia calculada com N anos de registros é

Ep(logio Qm) = 0,434 Cv/Tn

substituindo os valores de Cv = 0,344 e Ep = 0,127 da região do Alto


Paraguai, obtém-se N = 1,4. Isto significa que sendo o coeficiente de
variação e o erro padrão da estimativa, para um dado posto, idênticos aos
valores regionais, a variância da estimativa da média das vazões de cheia com
base nos registros do posto, seria inferior a variância da mesma estimativa
Regionalização de Vazões 597

com a equação regional, quando os registros no posto tiverem extensão um


pouco maior que 1 ano. Isto comprova a importância de se contar com registros
de vazão, mesmo curtos, já que a estimativa das vazões de cheia tem grande
variância, quando obtida a partir de equações de regressão regional.
A variância da vazão adimensional pode ser estimada por

E(qr-q)2
var QT/Qm = ----------- (15.21)
N

onde qr = vazão adimensional da curva de probabilidade regional para o tempo


de retomo T; qj= vazão adimensional para do posto j para o tempo de retomo
t ; N =número de postos ou curvas individuais utilizadas na definição da curva

regional.
Note que a dispersão das curvas individuais em tomo da curva regional
pode variar com o tempo de retomo. Devido a isso, a variância da estimativa
da vazão adimensionalizada será função do tempo de retomo.

Exemplo 15.6. N a figura 15.10 c a p re s e n ta d o o d e sv io p a d r ã o fu n ç ã o .d o te m p o


de retorno para a região I do Alto Paraguai, para tem po dc retorno ^ 5 anos.
P o d c - s e o b s e r v a r q u e a m e s m a tende a u m a reta n u m papeí iogarítm ico.
A lternativam ente c possível aproxim ar a variância por um a expressão de
potência.

var QT/Qm = a T (15.22)

iinde a e b s ã o p a r â m e tr o s a ju sta d o s aos p ontos. S u b s tit u in d o as e q u a ­


ç õ e s 1 5 . 2 2 e 1 5 . 1 8 n a e q u a ç ã o 15 iò e resolvendo para o desvio padrão de Q1
resulta

C = K Qm (15.23)
QT

a N 0
1/2
onde K = Cv| [ (QT/Qm)" + " ]/N )
Cv"

Exemplo 15.7. Na bacia do rio Itajaí-Açu existem 22 postos com vazões, que
foram utilizados para determinar duas regiões. As curvas regionais
adimensionais de cheia das regiões são apresentadas na figura 15.11 (região
II: afluentes da margem esquerda menos o rio Hercílio e região I. o restante
da bacia). A equação de regressão para toda a bacia é

0.766
Q = 1,48 A
598 Hidrologia

Figura 15.10. Desvio Padrão função do tempo de retomo

O valor de K é também apresentado na figura 15.11. Para estimar a vazão


de 50 anos de tempo de retomo na região II numa bacia de 2000 km2, resulta
Qm = 1,48 (2000)0,766 = 500 m3/s

O valor de Q50/Qm da figura 15.11 é 2,35 e K50 = 0,57.


Q5o = 2,35 . 500 = 1175 m3/s

CT5o = 0,57 • 500 = 285 m3/s

153.8 Vazão máxima instântanea

A vazão máxima obtida na regionalização está próxima da vazão máxima


média diária porque os valores utilizados são a maior vazão de duas
observações diárias. Nos projetos, normaimente deseja-se conhecer a vazão
Regionalização de Vazões 599

máxima instantânea, que é o maior valor ocorrido. Com base em duas


observações diárias a tendência é de subestimar a vazão máxima instantânea
em bacias pequenas.

Figura 15.11. Curvas adimensionais de probabilidade para o rio Itajaí- Açu

A diferença entre o máximo instantâneo e o máximo diário depende do


tempo de concentração da bacia, ou seja, do tempo de resposta. Para bacias
pequenas, o tempo de concentração é reduzido com grande gradiente de vazão e
variância. A medida que a bacia aumenta, o gradiente fica reduzido e a
diferença entre a vazão máxima instantânea (Qmx) e a vazão máxima diária
(Qmd) diminui. Outros fatores como a declividade e comprimento do rio,
densidade de drenagem, imensidade e distribuição da precipitação influenciam
na relação citada.
Fuller (1914) estabeleceu a relação entre Qmx e Qmd, onde Qmd não ocorre
necessariamente no mesmo dia. Na realidade, o autor estabeleceu a
distribuição estatística das duas séries para obter a relação. Esta análise
foi realizada para dados de grandes bacias do leste americano, resultando na
seguinte expressão:
600 Hidrologia

Qmx _0 3
K = — = I + 2,66 A ' (15.24)
Qmd

onde a área A é fornecida em km2.


Gray (1973) relacionou os resultados de outros estudos apresentados por
Eiiis para algumas regiões dos Estados Unidos. Na tabela 15.5 estão os
resultados apresentados por Gray (1973), Fuller (1914) e Correia (1983).
Para obter equação semelhante foram levantados dados de alguns postos da
região Sul (Tucci,1991). Infelizmente o número de postos com línígrafo é
pequeno. A relação entre as duas vazões mencionadas foi calculada para cada
posto com cerca de ó enchentes (os linígrafos são recentes). Com base nestes
dados foi ajustada a seguinte expressão

Qmx -0,58
— = 1 +■ 15,03 A (15.25)
Qmd

onde Rr = 0,72. A limitação principal deste resultado é a falta dc dados dc


postos de bacias pequenas, onde estas equações serão mais utilizadas.
A relação entre a vazão instântanea e a vazão mõdia máLima depende dc
vários fatores, como mencionado anteriormente. As expressões apresentadas
retratam esta relação somente com base na área da bacia, são necessários
dados e desenvolvimentos para aprimorar esta relação.

Tabela 15.5. Equações entre Qmx e Qmd da literatura


Região Equação Amostra

Leste USA (Fuller) K= 1 -f 2.66A-W


Mont. Rochosas (foothills) K=3,9 Aj0'-- 60 - 300 mi2
ÍCypress Hills K=10 A e° ’A6 50 - 200 mi2
Central Plains K=11 ACW6 45 - 255 mi2
Manitoba Encarpment K=3,7 A;0-38
V
1 5 - 5 0 mi2
Portugal (Correia) K=I + 1,2 A'0-036 4 - 3460 km2
............................ ...............

Ae=área efetiva que contribui para a cheia mddia anual

15.3.9 Mapeamento da vazão específica

O mapeamento de vazões específicas de uma bacia objetiva permitir a


visualização espacial das vazões. Esta 6 uma forma de condensar espacialmente
Regionalização de Vazões 601

as informações, permitindo ao planejador um primeiro exame dos recursos


hídricos da região. Alguns exemplos de mapeamentos são os seguintes:

- mapas de isolinhas de vazão máxima com um determinado tempo de


retomo, permitindo avaliar as regiões sujeitas a vazões altas durante
inundações;
- mapeamento da vazão mínima de 7 dias de duração e 10 anos de tempo de
retomo para qualidade da água;
- vazão média de longo período que caracteriza a vazão máxima
regularizável de uma bacia.

À vazão específica é, por definição, a vazão da bacia dividida pela sua


área. Este valor varia para as bacias de acordo com sua área de drenagem.
Existe uma tendência geral da vazão específica reduzir com o aumento do
tamanho da bacia ou do comprimento do rio. Esta regra é mais pronunciada para
vazões altas e médias. Evidentemente, anomalias encontradas em algumas bacias
poderão alterar esta tendência. Algumas das razões que provocam esta
tendência são:

- nas cabeceiras, em gerai, se concentram as maiores precipitações e as


maiores dcclividades do rio;
- à medida que o comprimento do rio aumenta, maior é o amortecimento do
escoamento devido ao efeito de armazenamento e ao atrito do leito;
- o efeito de armazenamento é marcante para rios onde ocorre
extravasamento e, cm geral, a redução da vazão específica varia com a
distância a jusante e, cm conscqücncia, com o aumento da área da bacia.

Para realizar o traçado dc isolinhas de vazão específica é necessário


subdividir a região em sub-bacías. O tamanho médio das bacias deve
representar a área média das mesmas para a qual este mapa poderá vir a ser
utilizado. Esta subdivisão deve ainda seguir um caminhamento baseado no
relevo geral e forma da bacia, procurando cobrir a região mapeada com um
número suficiente de sub-bacias que permita o traçado gráfico posterior.
Essas bacias não necessitam ter dados históricos, já que a vazão específica
será calculada com base na equação de regressão.

Exemplo 15.8. Para quantificar essas tendências considere a equação de


regressão da média das vazões de cheia para as regiões I e lí do Alto
Paraguai, dada por

Qm = 0,4 A0,634 . PA4,44


602 Hidrologia

dividindo pela área A, resulta a equação da média da vazão específica de


cheia

4,44
0,4 PA
qm =
0366
A

Observa-se desta equação que a vazão específica de cheia varia


inversamente com a área da bacia, onde o expoente indica o nível de
dependência. Desta forma o mapa de vazões específicas é válido para um
tamanho de bacia no qual foi elaborado. Na região do Alto Paraguai foi
elaborado um mapa da vazão média de enchente com bacias da ordem de 800km2.
Considerando uma faixa de variação de 25% na área da bacia, resulta uma
variação de 10% na vazão específica.
Para utilizar o mesmo mapa para outros tamanhos de bacia, a vazão
específica obtida deve ser corrigida pela equação de regressão. Neste
exemplo, obtida a vazão específica com base no mapa para uma bacia de área de
2200 km2, qm = 190 1/s.km2, a mesma pode ser corrigida pelo fator

fm = (A/Amapa)-0*3^ = (2200/800)"0'366 = 0,69

onde Amapa é a área da bacia utilizada para construir o mapa c A é a área da


bacia para o qual se deseja a vazão. A vazão específica fica

qm = 0,69 x 190 - 131,2 1/s.km2

e a vazão média de enchente

Qm — 13132/1000 x 2200 km2 = 288,66 m2/s

A seguinte seqüência pode ser utilizada para 0 mapeamento:

1- escolha um mapa na escala conveniente de acordo com o tamanho da


região e da bacia de tamanho médio a ser utilizado;
2- inicie a subdivisão de jusante para montante, dividindo primeiro as
acias principais. Procure estabelecer uma numeração seqüencial;
3- calcule a vazão específica com base na regionalização para cada sub-
oticiâj
4- os valores das vazões específicas são locados no centro de gravidade
das bacias A nuvem de pontos resultantes é utilizada para interpolar
as curvas de igual valor de vazão específica. Os valores escolhidos para
Regionalização de Vazões 603

interpolação dependem da tendência da variação dessas vazões. Deve-se


procurar espaçar convenienteraente estas curvas, de tal forma que haja
uma cobertura conveniente de isolinhas na região. Após o traçado
preliminar das curvas, deve-se adaptá-las à topografia do terreno, já
que existe a tendência da vazão específica alterar-se com o relevo;
5- estabeleça um fator de correção para bacia com área diferente daquela
usada no mapeamento. O fator é estimado por fm = (Amapa)_a, onde a é o
expoente da área na equação de regressão. O uso de fm fica qm = qmapa .
fm . Aa, onde qmapa é a vazão específica obtida do mapa.

O mapa de vazões específicas tem duas finalidades principais: a)


visualização espacial dos recursos hídricos; e b) permitir uma rápida
estimativa da vazão desejada. No primeiro caso, o próprio exame do mapa
permite ao usuário ter uma noção das áreas carentes de água nos períodos de
estiagem (vazão específica mínima), das bacias sujeitas a maiores enchentes
(vazão específica máxima) e do potencial médio (vazão específica média).
A vazão em m3/s é obtida pelo produto da vazão específica média da bacia
pela sua área de drenagem. Este valor deve ser adotado como preliminar, pois
o uso da curva de frcqücncia e a equação de regressão permitirão estabelecer
um valor mais confiável

15.4 Regionalização da curva permanência

15.4.1 Curva de permanência

A curva de permanência relaciona a vazão ou nível de um rio e a


probabilidade de ocorrerem vazões maiores ou iguais ao valor da ordenada.
Esta curva pode ser estabelecida com base em valores diários, semanais ou
mensais. Esta função hidrológica é utilizada em estudos hidrelétricos,
navegação, qualidade da água, entre outros.
Existem dois procedimentos principais para a deternunação da curva de
permanência, que são os seguintes*, a) metodologia empírica; e b) ajuste de
uma função matemática.

Metodologia empírica

A metodologia de determinação da curva de permanência consiste em


estabelecer n intervalos de classe de vazões (ou níveis). Os intervalos podem
ser estabelecidos de acordo com a magnitude das vazões procurando ter uma
quantidade razoável de valores que caiam em cada intervalo. Tucci(1991)
adotou um número fixo de 50 intervalos de classe. A subdivisão de cada
intervalo pode ser baseada na escala logarítmica devido à grande variação de
604 Hidrologia

magnitude das vazões envolvidas. Neste caso a amplitude de cada intervalo é


calculada por:

d = [ ln (Q m x) - In ( Q m i) ] / 5 0 (1 5 .2 6 )

onde Qmx = vazão máxima da série; Qm i = vazão mínima da série.


Os limites inferiores dos intervalos foram calculados por:

Qj = E X P [ Q m i + 0' - 1) d ] (1 5 .2 7 )

onde Qj é o limite inferior do intervalo j.


A frequência ( fi) de cada intervalo é obtida contando o número de
vazões da série que cai no intervalo. Acumulando os valores de fi no sentido
da maior vazão para a menor, obtém-se os valores di de permanência. A
probabilidade (em porcentagem) de uma vazão Q ser maior ou igual a Qí é:

di
Pi = — * 100 (15.28)
Nv

onde Nv e o número total de valores.

Ajuste à função matemática

Considerando que a curva resultante acompanha uma função matemática,


Beard (1943) sugeriu a função usada na distribuição log-normal para
representar a curva de permanência. O ajuste de uma distribuição para um
posto não é um procedimento melhor que o anterior, mas considerando que o
objetivo é a regionalização destas curvas, o ajuste de uma distribuição
permite uma sintetização maior das informações, facilitando a regionalização.
As limitações deste procedimento são as seguintes: a) a correlação
serial das vazões implica que a amostra não possui 365 N valores, ( N é o
número de anos) e a probabilidade é estimada com tendenciosidade; b) a curva
teórica ajusta toda a faixa de valores e pode apresentar anomalias no trecho
de interesse, que é o ramo inferior da curva.
A tendência é de que a função matemática não retrate a forma da função
de distribuição empírica e o ajuste crie tendenciosidade nos extremos. Neste
caso, bastaria utilizar a função empírica, desprezando o ajuste de uma
função matemática, mas a regionalização da distribuição empírica toma-se
difícil devido à modificação de sua forma com as características das bacias.

Exemplo 15,9. Na figura 15.12 pode-se observar o ajuste da curva log-normal e


a distribuição empírica para um posto da bacia do rio Uruguai (Tucci,1991).
Regionalização de Vazões 605

Na figura 15.12b a abcissa é apresentada numa escala cartesiana normal e na


figura 15.12a numa escala de probabilidades. Pode-se observar que na primeira
figura a escala mascara as diferenças encontradas nos extremos, criando tem
denciosidade de avaliação, já que esta curva normalmente é utilizada no seu
ramo inferior. Na literatura normalmente a curva é plotada na escala aritmética,
o que facilita o erro de avaliação.
A tendência de ajuste inadequado da distribuição estatística log-normal
foi encontrada na maioria dos postos do Rio Grande do Sul. As vazões Q50 e
Q95 representam uma faixa de vazões onde a curva é mais utilizada, na tabela
15.6 são apresentados os valores de Q5o e Q95 obtidos da curva empírica
(observado) e da curva de permanência ajustada pela log-normal (calculado).
Pode-se observar em termos absolutos o nível de erro, inadequado para as
estimativas correntes. Na maioria das bacias as vazões Q50 e Q95 podem ser
utilizadas para ajustar uma equação do tipo exponencial., utilizada na log-
normal. A mesma retrata bem o trecho entre 50% e 95% da curva de permanência.
Na figura 15.13 é apresentado o exemplo de uma curva empírica e a curva
exponencial estimada com base nas vazões referidas.
A curva de permanência obtida com base na distribuição log-normal,
estimada através das vazões Q50 e Q95, fica:

Q = EXP ( p.a + b) 0*5-37)

onde a = - [ln (Q 5 0 /Q 9 5 ) ]/0,45 ; ò = ln Q50 - 0,50 a; p = probabilidade no


intervalo 0 - 1; Q = vazão cm m3/s com probabilidade p; Q50 e Q95 = vazões
para as probabilidades de 50% e 95%, em m3/s.

Tabela 1 5 . 6 . C o m p a r a ç ã o d a s e s t i m a t i v a s d e Qso e Q 9 5 o b t i d a s a p a r t i r d a s
c u r v a s e m p ír ic a s e d a distribuição L o g - n o r m a l. Postos do rio P e lo ta s

Posto Q50 Q95


m3/s m3/s
Observado Calculado Observado Calculado
I
i 8,65 12,75 2,32 3,13
2 38,77 39,57 7,06 8,88
3 14,77 13.21 1,86 2,56
5 7,28 8,90 1,46 1,55
6 100,21 114,95 17,32 28,42
7 17,18 22,15 4,93 6,13
606
Hidrologia

Log(Q)

0,14
7,63 - CURVAS
7,22 • • • Em p írica
6 ,5 3 — Lo g -n o rm a l

0 ,5 7
0 0,10 0 ,2 0 0,30 0 ,4 0 0 ,5 0 0 ,6 0 0,70 0,80 90 1,0
% Tampo

b -Ajuste da distribuição Log-normai (abscissa em escala aritmética).


Figura 15.12. Comparaçao da escala gráfica da curva de permanência
Regionalização de Vazões 607

Figura 15.13» Ajuste dc uma função exponcncial ao setor inferior da curva de


permanência (entre Q50 e Q95).

15.4.2 Regionalização

Para regionalizar as curvas de permanências existem dois procedimentos,


mencionado no primeiro item deste capítulo. Especificamente, as situações são
as seguintes:

- regionalização dos parâmetros da distribuição. Os mesmos são


correlacionados com características físicas das bacias;
- regionalizar vazões com determinadas probabilidades (Usualmente Q50 e
Q95), obtidas da curva empírica, definindo a curva de permanência no
trecho de interesse. Normalmente 0 trecho de interesse desta curva 6 a
sua parte inferior. Esta opção apresenta algumas vantagens, pois 0
trecho tende a apresentar uma reta numa escala logarítmica, como
apresentado anteriormente.

A regressão das vazões com as características físicas e meteorológicas


das bacias tende a dar bons resultados para 0 valor de 50% que é próximo da
média de longo período, enquanto que para Q95 0 resultado pode apresentar
dispersão.
608 Hidrologia

Exemplo 15.10. Nas bacias do Rio Grande do Sul e parte de Santa Catarina foi
utilizada a segunda metodologia descrita. Num primeiro estágio a área de
drenagem e a precipitação anual foram utilizadas como variáveis independentes
na regressão com as vazões. Observou-se que o ganho adicional por incluir a
precipitação foi mínimo para todos os postos, sendo aconselhável, neste caso
utilizar apenas a área de drenagem. A definição das regiões baseou-se no
resíduo da equação de regressão. As equações de regressão para a parte
superior da bacia do rio Uruguai são as seguintes
Q50 = 0.01517 * A0’982
onde R~ =0,99 e a f = 1,16, A em km2 e Q em m3/s
Q95 = 0.00263 * A 1’018

onde R2 = 0,96 e <rf = 1,37


Conforme se observa, as estatísticas e af, associadas à regressão de
Q95 são inferiores que a relativa a Qso. Este comportamento pode ser
considerado normal e decorre das maiores incertezas associadas ao setor
inferior das curvas-chave dos postos fluviométricos. A s maiores diferenças
registram-se naqueles postos para os quais existiam poucos anos de dados p a r a
a estimativa da curva empírica. Dada a falta de representativid.ade das séries
disponíveis, os valores de Q50 e Q9 5 deduzidos das curvas empíricas desses
postos podem ser considerados tendenciosos.
Por exemplo, para uma bacia de 500 'km na referida região, as vazões
seriam calculadas com base nas regressões ,

Qso - 0,01517 (500)0,982 = 6,78 m3/s

Q95 = 0,00263 (500)1’018 = 1,47 m3/s

A equação da vazão, função da probabilidade, fica

Q = exp(-3.397 p + 3,612)

Pode-se obter uma melhoria das estimativas ao se incorporar nas


regressões variáveis explicativas adicionais, como algumas variáveis
relacionadas com as características geológicas das bacias.
As limitações deste procedimento são as seguintes: a) as regressões
obtidas permitem apenas a estimativa do setor da curva de permanência entre
Qso e Q95; b) as curvas deduzidas são usadas para bacias sem reservatórios de
regularização a montante.
Regionalização de Vazões 609

155 Regionalização de Curvas de regularização

155.1 Regularização de vazões

O escoamento em rios apresenta uma variação sazonal que frequentemente


impede seu uso ao longo de todo o ano. A regularização de vazão através de
reservatórios é uma prática utilizada para usos como: abastecimento de água,
irrigação, produção de energia elétrica, navegação e diluição de despejos.
A regularização de vazão depende de como a demanda será solicitada ao
sistema fluvial. Na irrigação a demanda somente é necessária em alguns meses
do ano. No abastecimento de água a vazão é solicitada durante todo o ano,
aumentando no verão.
Para estabelecer o volume de um reservatório é necessário conhecer a
demanda e sua distribuição no tempo. No entanto, numa avaliação preliminar
das condições de regularização de um rio, algumas premissas podem ser
estabelecidas, tais corno: demanda constante, desprezar a evaporação e
utilizar uma série de uma bacia próxima.
Uma das principais dificuldades que o hidrólogo encontra é de não
dispor de dados no locai de interesse. Para obter a série no local desejado
são utilizadas as mais diferentes práticas, desde o uso da vazão específica
até a aplicação de modelos precipitação-vazão. A regionalização da curva de
regularização visa à utilização de vazões dos postos da região para melhor
estimar esta relação no local sem dados. Neste caso ficam mantidas as
limitações de uma demanda constante e o uso de uma estimativa da evaporação.
Métodos indiretos de determinação do volume de regularização são: a)
baseado na curva de permanência (Pinto et al, 1973); b) baseado em curvas de
probabilidades de vazões mínimas (Gomide, 1983). Estes métodos permitem a
estimativa do volume em locais sem dados, através da regionalização das
curvas utilizadas. Estes procedimentos apresentam algumas limitações nos
critérios de determinação do volume.
A determinação do volume de regularização com base nos valores
seqüênciais da série histórica, pode ser obtido por métodos clássicos como o
de Rippl. Este é um método gráfico muito trabalhoso para ser utilizado com um
grande número de postos. Além disso tomou-se obsoleto devido às facilidades
computacionais hoje existentes para o tratamento dessas informações. Este
método tem sido utilizado de forma computacional. Neste método o volume de
regularização obtido atende a demanda durante todo o período da série
histórica.
Para cada volume de reservatório existe uma vazão que pode ser
regularizada com um nível de probabilidade de garantia. A combinação de
vários volumes e vazão permite o traçado das curvas de regularização. Existem
várias curvas de acordo com o nível de probabilidade adotado (figura 15.14).
No capítulo 18 são descritos detalhes da determinação desta curva.
610 Hidrologia

A curva de regularização pode ser expressa por

V = fi( q, p ) (15-29)

onde V é o volume; q = vazão; p = probabilidade.

Figura 15.14. Curvas de regularização

Modificando as variáveis envolvidas para

a = V/(Qm lano) (15.30)


P = q/Qm (15.31)

onde Qm é a vazão média de longo período.


Introduzindo a adimensionalização das equações 15.30 e 15.31 na equação
15.29, resulta numa função adimensional do tipo

<* = fe ( M (15.32)

Com base nos valores obtidos da simulação pode-se ajustar uma função do
tipo seguinte, fixando uma probabilidade p.

a = a Pk (15.33)
onde a e b são obtidos por mínimos quadrados.
Regionalização de Vazões 611

15-5-2 Regionalização

Considerando que as curvas adimensionais das equações 15.32 ou 15.33 são


obtidas para cada posto, pode-se verificar a possibilidade de que postos de
bacias com características semelhantes tenham a mesma tendência, já que as
vazões mensais, que são as variáveis do processo, podem ser correlacionáveis.
Neste caso, dois procedimentos podem ser seguidos: a) estabelecer a
regressão entre os parâmetros a e b da função da equação 15.33 com base em
características físicas das bacias estudadas; b) ajuste de uma curva média
com postos de tendência semelhante.
Domokos e Gilyen-Hofer (1990) utilizaram o primeiro critério,
regionalizando a e b com base no coeficiente de variação, obtendo resultados
com uma tendência aceitável, mas sem indicar os coeficientes de correlação
obtidos. Tucci(1991) testou este mesmo procedimento e os resultados foram
ruins, não indicando qualquer tendência para as bacias do Rio Grande do Sul.
Verificou-se que os parâmetros ajustados apresentavam pequena variância entre
grupos de regiões, indicando que poderíam apresentar a mesma tendência.
Os dois trabalhos mencionados indicaram a importância da
representatividade da série histórica na determinação das curvas e posterior
regionalização. Os primeiros autores mencionaram que a,- séries com mais de 50
anos poderíam ser utilizadas, devido à grande variância da estimativa que
deveríam scr provocadas pela pequena representatividade de séries menores.
Tucci (1991) mostrou que é importante o período critico regional estar
contido dentro da série histórica, o tamanho da série é irrelevante desde que
contenha este período crítico.
As séries normalmente apresentam falhas. O preenchimento de falhas pode
ser realizado com base na regressão com postos vizirhos. A extensão de séries
para períodos mais longos deve ser realizada com cuidado através da
regressão. O uso de modelos hidrológicos precipitação-vazão permite a
utilização da informação histórica, contida na precipitação através da
extensão das séries de vazões com base na precipitação.

Exemplo 15.11. Para a bacia do rio Uruguai foram calculadas as curvas


regionais de regularização adimensionais (Tucci,1991). Na figura 15.15 são
apresentadas as curvas do rio Canoas, um dos formadores do rio Uruguai. Pode-
se observar que somente um posto não apresentou a mesma tendência. Para
outras sub-bacias foi utilizado o mesmo procedimento, obtendo-se resultados
semelhantes. Os postos que não apresentam a tendência dos demais são os que
têm série mais longa. Para analisar este aspecto foram reunidos os postos de
série longa (1940-1984) e série curta (1951-1984) de bacias dos rios Canoas,
do Peixe e Ligeiro (figura 15.16). Constatou-se que a curva obtida com os
postos que não possuem a década de 40 subestimam o volume para a demanda
escolhida. Isto se deve ao período crítico que ocorre entre os anos de 1942 a
612 Hidrologia

( Q / Qm). 100

Figura 15.15. Curva de regularização - Rio Canoas


V / ( Q m . Ano). 1 0 0
Regionalização de Vazões 613

1944, além de toda a década apresentar valores baixos de vazão. Na figura


15.17 são apresentadas as curvas dos dois grupos de postos, mas para a curva
do grupo de postos com série longa foram retirados os valores de 1940 a 1950
e determinada novamente a curva de regularização. Pode-se observar que as
duas curvas médias são aproximadamente equivalentes, o que indica claramente
a falta de representatividade do período de 1951-1984 (34 anos).
Para verificar se a causa da redução da vazão era apenas um problema de
variação aleatória do clima, utilizou-se da precipitação de um posto com
série longa na região onde estas condições aparecem. O posto é da cidade de
Passo Fundo com série de precipitação desde 1923 (62 anos). Na figura 15.18
são apresentadas as precipitações adimensionalizadas com base na sua média.
Observa-se que o período de 1940 a 1950 está abaixo da média e representa a
principal estiagem dos 63 anos analisados.
Deve-se ressaltar que ocorreu um grande desmatamento na bacia do rio
Uruguai após a década de 50 que podería ter contribuído também para o aumento
da vazão média, apesar do nível de estudo atual não ter identificado
claramente esse impacto. Considerando que as séries que não abrangem a década
de 40 são tendenciosas, do ponto de vista amostrai, utilizaram-se somente
postos com séries que englobassem a década referida.
A determ inação da curva regional dc regularização foi b a s e a d a nos
s e g u i n t e s c r i t é r i o s : a) p e l o m e n o s très p o s t o s pura d e f in i r u m a re g iã o ; b)
verificar a p o ssib ilid ad e dc usar os outros postos co m s e r i e s m e n o r e s ; c)
curva m edia o b tid a pela m é d ia dos valores de v o lu m e de c a d a u c m a n d a .
I n i c i a l m e n t c tc s t o u - s c o ajuste dc u m a c u r v a d o tipo da e q u a ç ã o 15.33 para
to d o s os p o s to s da região, m as vcrificou-sc que o ajuste era ruim para va­
lores m a io r e s dc v o lu m e; d) definição dc um intervalo dc v azã o udim ensi-
o n a i o n d e a c u rv a regional p o d e ser utilizada d e v id o ao g rau dc ajuste dos
valores.

Tabela 15.7. Valores da curva de regularização adimensíonal da região II -


Contribuintes do rio Uruguai do trecho nacional.
Vazão Volume Vazão Volume Vazão Volume Vazão Volume
2 0 4 0,006 6 0,148 8 0,606
10 uoo 12 2,130 14 3,124 16 4,208
18 5,378 20 6,820 22 8,760 24 11,007
26 13,318 28 15,857 30 18,489 32 21,564
34 24,897 36 28,467 38 32,225 40 36,100
42 39,975 44 43,850 46 47,725 48 51,600
50 55,475 52 59,350 54 63,295 56 67,344
58 71,428 60 75,525 62 79,650 64 85,058
Vazão = (Q/Qm).10G ; Volume = [V/(Qm.ano)] . 100
614 Hidrologia

( Q/Qm ) 100 (%)


Figura 15.17, Curvas de regularização - todos com série curta

Figura 15.18. Passo Fundo - Precipitação adimensional


Regionalização de Vazões 615

Na figura 15.19 são apresentadas as curvas de algumas regiões. As


estatísticas do ajuste das curvas indicaram coeficientes de determinação
acima de 0,95. Na tabela 15.7 é apresenta a curva da região II na forma de
tabela.

Uso das curvas para estimativa do volume

Para o cálculo do volume necessário para regularização da vazão, sem


considerar a evaporação, pode ser utilizada a seguinte seqüência:

1 - determine a vazão média da bacia em estudo. Neste caso é necessário


regionalizar a vazão média de longo período (item 15.3).
2 - sendo a demanda desejada q, calcule m = (q/Qm).100, onde Qm é a
yazão média de longo período;
3 - com o valor calculado no item anterior entre na tabela da curva
adimensional da região em que se encontra a bacia, obtendo o valor
seguinte

r =(V/Qm.ano).100 (15.34)

Figura 15.19. Curvas de regularização - regiões I, II e III


616 Hidrologia

4 - 0 volume1é obtido por

V = 0,3154 . r . Qlp ( 106 m3) (15.35)

Para considerar a evaporação, sugere-se aqui uma metodologia


simplificada, sujeita a verificações posteriores. Pode-se considerar que a
evaporação seja uma demanda adicional, obtida por

mc = 0,00317 E.A/Qlp (15.36)

onde E é a evaporação total média anual em mm; A a área do reservatório para


2/3 do volume útil, em km2.
A demanda adimensional total, neste caso é
*
m “ me + m (15.37)

Exemplo 15.12. Determine o volume necessário para garantir a demanda


constante de 5 m2/s, numa bacia de 1000 km2, com precipitação média anual de
1720 mm, localizada na bacia do rio Canoas (Evaporação anual = 1300 mm e Área
do reservatório para 2/3 do volume = 10 km2).

Solução: a) sem considerar a evaporação:


A vazão média é obtida por Qm=0,017 A °'"p 0,87 onde A=área em km2CP em
m, que é a equação para esta região. Substituindo os valores, resulta

Qm = 0,017 (1000)0,99 (1,72)°'87= 25,43 m3/s

A vazão adimensional fica

m = Q /Q ip . 100 = 5/25,5 .100 = 19,6%

Entrando com este valor na tabela 15.7 da Região II obtém-se o valor de


r = 6,53%. O volume é obtido pela equação 15.44

V = 0 /3 1 5 4 . 6 ,5 3 . 2 5 ,5 = 5 2 ,5 3 . 106 m 3

b) considerando a evaporação:

me = 0,00317 E. A / Qm

me = 0,00317 . 1300. 10 (25,5 = 1,62%


Regionalização de Vazões 617

m* = 19,6 + 1,62 = 21,22

Utilizando novamente a tabela referida, obtém-se r = 8,00%, e o volume


fica

V = 0,3154 . 8,00 . 25,5 = 64,3 . 106 m3

A regionalização das curvas de regularização permite a primeira


estimativa da capacidade de regularização em locais sem dados. Este tipo de
informação é importante para estudos de planejamento e na quantificação de
projetos de pequena escala. Deve-se considerar que a utilização dessas curvas
não elimina os estudos hidrológicos para projetos de aproveitamentos da água.
As limitações são as seguintes: a) a regionalização da curva de
regularização considera demanda constante; b) a evaporação é considerada de
forma simplificada, resultando em estimativas grosseiras deste valor. Quando
este valor é pequeno o impacto no volume é insignificante; c) essas curvas
são usadas para bacias sem reservatórios com regularização a montante.
Para incorporar mais informações à regionalização seria necessário a
utilização da precipitação e modelos hidrológicos para extensão das séries
hidrológicas. Com um número maior de postos com série longa é possível
incrementar a confiabilidade dos resultados regionais.

PROBLEMAS

1 - Identifique alguns métodos segundo as classificações de regionalização,


descrita no início do texto.

2 - Qual a diferença de resultado que pode ser obtida entre os procedimentos


de regionalização das curvas de probabilidade de vazão?

3 -Por que a vazão específica máxima tende a diminuir com a área da bacia?
Quais são as tendências esperadas para vazões mínimas e médias? Analise as
situações possíveis.

4 - A maioria dos dados de bacias brasileiras são de bacias maiores que 500
km2. Considerando que a regionalização é realizada com estes dados, o que se
deve esperar dos resultados para bacias pequenas, 10 a 100 km2?

5 - Numa bacia existem dados de vazões iniciando em 1972 (postos com séries
mais longas). Os postos com precipitação são em grande número e possuem série
618 Hidrologia

iniciando em 1930. Como você podería utilizar as precipitações para melhorar


a representatividade temporal das vazões na regionalização?

6 - As vazões máximas são obtidas dos arquivos como o maior valor de duas
medidas diárias (postos sem linígrafo). A regionalização com estes dados
representarão qual vazão? Como você obtería a vazão máxima ínstântanea?

7 - Qual a diferença em usar a regionalização de vazões máximas para estimar


a vazão com um determinado tempo de retomo num local sem dados e o método do
Soil Conservation Service?

8 - Por que numa curva de probabilidade adimensional regional ocorre uma


dispersão muito grande de pontos na parte superior da curva?

9 - Qual a aproximação adotada na estimativa da variância da vazão (vazão


máxima, média e mínima)?

10- Por que a curva de permanência apresenta variabilidade com as


características das bacias?

11- Quais são os usos que o hidréiogo faz da curva de permanência e da curva
de probabilidade de vazões mínimas? Quais são as diferenças entre essas
funções hidroldgicas?

12- Qual a interpretação da vazão com 95% da curva de permanência de 1 dia e


a vazão mínima de 2 anos de tempo de retomo e 1 dia de duração? Por que a
duração é importante para a vazão mínima?

13- Qual o uso da curva de regularização? Como você podería utilizar esta
curva para uma bacia com alguns aproveitamentos em cascata? Dispondo da série
de vazões, qual o interesse de regionalizar a curva de regularização?

14- Qual o erro que se comete em não considerar a evaporação ou considerá-la


de forma simplificada na análise de regularização?

REFERÊNCIAS

1 BEARD, L.R. (1943). Statistical analysis in Hydrology. Transactions


American Society o f Civil Engineers, New York, v.108. p.1110-60.2

2 CORREIA, F.N., 1983. Métodos de análise e determinação de caudais de


cheia Lisboa: LNEC.
Regionalização de Vazões 619

3 CRESPO, C E J 1982. Regionalização de vazões máximas do Rio Grande do Sul


e Santa Catarina, Dissertação de mestrado, Instituto de Pesquisas
Hidráulicas, UFRGS.

4 DALRYMPLE,T. (1960). Flood Frequency Analysis: part 3 Flood Flow


Tcchniquçs.Geotogical Survey Water Supply Paper, Washington, n. 1543-A.

5 DOMOKOS,M. E GELYÉN-HOFERA., (1990). Regionalized estimation of


reservoir capacity-yield curves in Hungary. In; Ljubljana
Symposium, 1990. Regionalization hydrology. 260 p. p. 239-51.

6 DNAEE, 1983. Inventário das Estações Fluviomêtricas, Departamento Nacional


de Águas e Energia Elétrica.

7 DRAPERJV. e H. SMITH, (1966). Applied regression analysis. New York:


John Wiley. 407 p.

8 FULLER, W. E. 1914. Flood flows, Transactions. American Society of


Civil Engineers, New York, v.77, p.564-617.

9 GOMIDE, F.L.,(1933). Dimensionamento de sistemas de reservatórios, in:


Curso de Engenharia hidrológica. São Paulo: EPUSP, 2v. v.2, p. 1-34.

10 GRAY, D.M. (ed), 1973. Handbook on principies of hydrology. Huntington:


Water Information Center. Não paginado.

11 IPH, 1983. Metodologia para regionalização de vazões. Porto Alegre.


3v. em 6.

12 NERC,(1975). Flood studies report. London. 5v.

13 PINTO, N I , HOLTZ, A. e MARTINS, J.A.(1973) Hidrologia de superfície.


2 ed. São Paulo: Edgard Blúcher. 179p.

14 TUCCI, C E . (coord) 1991. Regionalização de vazões do Rio Grande do


Sul. Porto Alegre: IPH/UFRGS. 2v. em 4.
*

Tt
X
ri

I
Capítulo 16

CONTROLE DE ENCHENTES

Carlos E. M. Tucci

16.1 Enchentes

Quando a precipitação é imensa a quantidade de água que chega


simultaneamente ao rio pode ser superior à sua capacidade de drenagem, ou
seja a da sua calha normal, resultando na inundação das áreas ribeirinhas. Os
problemas resultantes da inundação dependem do grau de ocupação da várzea
pela população e da freqüência com a qual ocorrem as inundações. A ocupação
da várzea pode ser para habitação, recreação, uso agrícola, comercial ou
industrial.
O desenvolvimento histórico da utilização de área; livres explica os
condicionamentos urbanos hoje existentes. Devido à grande dificuldade de
meios de transporte no passado, utilizava-se o rio como a via principal. As
cidades se desenvolveram às margens dos rios ou no litoral. Pela própria
experiência dos amigos moradores, a população procurou habitar as zonas mais
altas onde o rio dificilmente chegaria. Com o crescimento desordenado e
acelerado das cidades, principalmente na segunda metade deste século, as
áreas de risco considerável, como as várzeas inundeveis, foram ocupadas,
trazendo como consequência prejuízos humanos e materiais de grande monta.
A população de maior poder aquisitivo tende a habitar os locais seguros
ao contrário da população carente que ocupa as áreas de alto risco de
inundação, provocando problemas sociais que se repetem por ocasião de cada
cheia na região. Quando a freqUência das inundações é baixa, a população
ganha confiança e despreza o risco, aumentando signifícativamemte o
investimento e a densifteação nas áreas inundáveis. Geralmente a enchente
assume características catastróficas. As áreas hoje desocupadas devido a
inundações sofrem considerável pressão para serem ocupadas. A ocupação das
áreas urbanas impróprias pode ser evitada através do planejamento do uso dos
solos das várzeas, o qual deve ser regulado no Plano Diretor Urbano das
cidades.
Na figura 16.1 é apresentada a curva de custo anual devido a prejuízos
das enchentes nos Estados Unidos. Pode-se observar nesta curva uma tendência
média crescente. Esta tendência indica valores da ordem de 3 bilhões (dólares
de 1983) para o início da década de 80.
622 Hidrologia

As condições meteorológica e hidrológica propiciam a ocorrência de


inundação. O conhecimento do comportamento meteorológico de longo prazo 6
muito pequeno devido ao grande número de fatores envolvidos nos fenômenos
meteorológicos e à interdependência dos processos físicos a que a atmosfera
terrestre está sujeita. As condições hidrológicas que produzem a inundação
podem ser naturais ou artificiais. As condições naturais são aquelas cuja
ocorrência é propiciada pela bacia em seu estado natural. Algumas dessas
condições são: relevo, tipo de precipitação, cobertura vegetal, capacidade de
drenagem (capítulo 11).

Figura 16.1. Evolução dos prejuízos de inundação (Hudlow et al,1984)

decliVH a ° S n°™ al.mente drenam nas suas cabeceiras, áreas com grande
declmdade produzindo escoamento de alta velocidade. A variação de nível
urante a enchente pode ser de vários metros em poucas horas. Quando o relevo
acidentado as áreas mais propícias à ocupação são as planas e mais baixas
J stamente aquelas que apresentam alto risco de inundação. A várzea de
mimdaçao de um no cresce significativamente nos seus cursos médio e baixo
onde a declmdade se reduz e aumenta a incidência de áreas planas
•VvííV - ■

''gJZJX '-*.-.

Controle de Enchentes 623

As precipitações mais intensas atingem áreas localizadas e são em geral


dos tipos convectivo e orográfico. Essas formas de precipitação atuam, em
geral, sobre pequenas áreas. A precipitação ocorrida em Porto Alegre, em 13
de fevereiro de 1981, com cerca de 100 mm em 1 hora é um exemplo. As
precipitações frontais atuam sobre grandes áreas provocando as maiores
inundações dos grandes rios.
A cobertura vegetal tem como efeito a interceptação de parte da
precipitação que pode gerar escoamento e a proteção do solo contra a erosão.
A perda desta cobertura para uso agrícola tem produzido como conseqüência o
aumento da freqüência de inundações devido à falta de interceptação da
precipitação e ao assoreamento dos rios.
As condições artificiais da bacia são aquelas provocadas pela ação do
homem. Alguns exemplos são: obras hidráulicas, urbanização, desmatamento,
reflorestamento e uso agrícola. A bacia rural possui maior interceptação
vegetal, maiores áreas permeáveis (infiltração do solo), menor escoamento na
superfície do solo e drenagem mais lenta. A bacia urbana possui superfícies
impermeáveis, tais como telhados, ruas e pisos, e produz aceleração no
escoamento, através da canalização e da drenagem superficial. Os resultados
da urbanização sobre o escoamento são: aumento da vazão máxima e do
escoamento superficial, redução do tempo de pico e diminuição do tempo de
base. A urbanização e o desmatamento produzem um aumento da freqüência da
inundação nas cheias pequenas e médias. Nas grandes cheias o seu efeito é
menor, pois a capacidade de saturação do solo e o armazenamento são atingidos
e o efeito final pouco difere.

16.2 Avaliação das enchentes

A variação do nível ou de vazão de um rio depende das características


climatológicas e físicas da bacia hidrográfica. As distribuições temporal e
espacial da precipitação são as principais condições climatológicas. As
mesmas somente podem ser previstas deterministicamente com antecedência de
poucos dias ou horas, o que não permite a previsão dos níveis de enchente com
antecipação muito grande. O tempo máximo possível de previsão da cheia, a
partir da ocorrência da precipitação, é limitado pelo tempo médio de
deslocamento da água na bacia até a seção de interesse.
A previsão dos níveis num rio pode ser realizada a curto ou a longo
prazos. A previsão de cheia a curto prazo ou em tempo atual, também chamada
de tempo-real, permite estabelecer o nível e seu tempo de ocorrência para a
seção de um rio com antecedência que depende da previsão da precipitação e
dos deslocamentos da cheia na bacia. Este tipo de previsão é utilizada para
alertar a população ribeirinha e operadores de obras hidráulicas.
A previsão de cheia a longo prazo quantifica as chances de ocorrência da
inundação em termos estatísticos, sem precisar quando ocorrerá a cheia. A
624 Hidrologia

previsão a longo prazo se baseia na estatística de ocorrência de níveis no


passado e permite estabelecer os níveis de enchente para alguns riscos
escolhidos. Á metodologia para estimativa dos níveis para um determinado
risco foi descrita no capítulo 14.

Previsão de Cheia em Tempo Atual

Para efetuar a previsão de cheia a curto prazo são necessários: sistemas


de coleta e transmissão de dados e metodologia de estimativa. Os sistemas são
utilizados para transmitir os dados de precipitação, nível e vazão, durante a
ocorrência do evento. O processo de estimativa é realizado através do uso de
modelos matemáticos que representam o comportamento das diferentes fases do
ciclo hidrológico, Complementarmente é necessário um Plano de Defesa Civil,
quando a enchente atinge uma área habitada, ou no caso de operação de
reservatório um sistema de emergência e operação.
A previsão de níveis de enchentes pode ser realizada com base em (figura
16.2): a) previsão da precipitação; b) conhecida a precipitação; c) vazão de
montante; c) combinação dos dois últimos. No primeiro caso é necessário
estimar a precipitação que cairá sobre a bacia através do uso de equipamento
como radar ou de sensoriamento remoto. A seguir, conhecida a precipitação
sobre a bacia, é possível estimar a vazão e o nível por modelo matemático que
simule a transformação de precipitação em vazão.
A previsão, quando é conhecida a precipitação na bacia, utiliza uma rede
telemétrica de coleta e transmissão de dados (no caso anterior esta rede não
é dispensável) e o referido modelo matemático de transformação de
precipitação em vazão. A antecedência de previsão é menor neste caso e está
limitada ao tempo médio de deslocamento da enchente (figura 16.2a). A
previsão a curto prazo, com base em posto à montante da seção de interesse,
depende das características do rio, ou seja da área controlada da bacia.
Neste caso, o tempo de antecedência é menor que os anteriores (figura 16.2b),
Quando a bacia intermediária, da situação anterior, apresentar uma
contribuição significativa, a combinação dos dois processos anteriores é
utilizada na previsão em tempo atual (figura 16.2c). A apresentação dos
modelos de previsão em tempo atual foge ao escopo deste livro e pode ser
encontrado ria literatura especializada.

163 Medidas para controle da inundação

As medidas para o controle da inundação podem ser do tipo estrutural e


não-estrutural. As medidas estruturais são aquelas que modificam o sistema
fluvial evitando os prejuízos decorrentes das enchentes, enquanto que as
medidas não-estruturais são aquelas em que os prejuízos são reduzidos pela
melhor convivência da população com as enchentes. É ingenuidade do homem
Controle de Enchentes 625

TEMPO

a) previsão com base na precipitação

t t+r
TEMPO
b) previsão com base no nível ou vazão

TEMPO

Figura 16.2. Previsão em tempo atual


626 Hidrologia

imaginar que poderá controlar totalmente as inundações; as medidas sempre


visam minimizar as suas consequências. Na década de 30, o projeto de controle
de cheias e uso da terra para a agricultura do rio Pó, na Itália era um
exemplo de projeto de recursos hídricos bem-sucedido. Em 1951, uma combinação
de precipitações intensas e altos níveis da maré, destruíram os polders,
causaram 100 mortes e a perda de 30.000 cabeças de gado, além das perdas
agrícolas (Hoyt e Langbein,1955).
O controle da inundação, obtido por um conjunto de medidas estruturais e
não-estruturais, permite à população ribeirinha minimizar suas perdas e
manter uma convivência harmônica com o rio. As ações incluem medidas de
engenharia e de cunho social, econômico e administrativo. A pesquisa para a
combinação ótima dessas ações constitui o planejamento da proteção contra a
inundação ou seus efeitos.
Em 1936, nos Estados Unidos, foi aprovada uma lei em nível federal,
sobre controle de enchentes, que identificava a natureza pública dos
programas de redução de enchentes e caracterizava a implantação de medidas
físicas ou estruturais como um meio de reduzir estes danos. Desta forma, não
era necessário verificar as relações de custo/benefício para justificar a
proteção das áreas sujeitas a . inundações. Com isso, acelerou-se o
desenvolvimento e ocupação das várzeas, o que resultou em aumento dos danos
ocasionados pelas enchentes. As perdas médias anuais, devido às enchentes,
aumentaram e a disponibilidade dos fundos públicos foi insuficiente para
atender a esta tendência. Em 1966, o governo reconheceu que as medidas
anteriores não eram adequadas e deu ênfase a medidas não-estruturais, que
permitiríam à população conviver com a cheia. O comitê criado pela American
Society of Civil Engineers sobre controle de enchentes, relatou, em 1962, o
seguinte (Task, 1962); "As limitações da presente (em 1962) Política Nacional
de Controle de Enchentes, a qual é baseada principaimente na construção de
obras de controle de inundação, são reconhecidas neste relatório, o qual
enfatiza a necessidade para a regulamentação das várzeas de inundação como
uma parte essencial de um plano racional de redução das perdas das cheias".
Em 1973, foi aprovada uma lei sobre proteção contra desastres de
enchentes, dando ênfase a medidas não-estruturais, encorajando e exigindo o
seguro para enchentes e regulamentação do uso da terra e proteção das novas
construções para enchentes de 100 anos tempo de retomo. Em 1974 foram
aprovados, dentro da Legislação de Desenvolvimento de Recursos Hídricos,
artigos específicos sobre enchentes que previam medidas não-estruturais e a
distribuição de custos, como no artigo 73 da Lei de 1974; "Em pesquisa,
planejamento ou projeto de qualquer Agência Federal, ou de qualquer projeto
envolvendo a proteção contra inundações, deve ser dada prioridade às
alternativas não-estruturais para redução de prejuízos de inundação,
incluindo, mas não limitando às construções à prova de enchentes,
regulamentação das áreas de inundação; utilização das áreas de inundação para
C o n tro le d e Enchentes 627

usos recreacionais, pesca, vida animal e outras finalidades públicas e


relocação com vistas a formulação da solução economicamente, socialmente e de
meio ambiente mais aceitável para redução dos danos de enchentes".

16.3.1 Medidas Estruturais

As medidas estruturais’ são obras de engenharia implementadas para


reduzir o risco de enchentes. Essas medidas podem ser extensivas ou
intensivas. As medidas extensivas são aquelas que agem na bacia, procurando
modificar as relações entre precipitação e vazão, como a alteração da
cobertura vegetal do solo, que reduz e retarda os picos de enchente e
controla a erosão da bacia. As medidas intensivas são aquelas que agem no
rio e podem ser de três tipos (Simons et al., 1977): a) aceleram o
escoamento: construção de diques e polders, aumento da capacidade de descarga
dos rios e corte de meandros; b) retardam o escoamento: Reservatórios e as
bacias de amortecimento; c) desvio do escoamento, são obras como canais de
desvios.
Na tabela 16.1 são resumidas as principais características das medidas
estruturais. Algumas dessas medidas são descritas a seguir:

controle da cobertura vegetal. A cobertura vegetal interfere no processo


precipitação-vazão, reduzindo as vazões máximas, devido ao amortecimento do
escoamento. Alóm disso, reduz a erosão do solo que pode aumentar,
gradualmente, o nível dos rios e agravar as inundações. O reflorestamento de
bacias envolve um custo significativo, o que toma esta medida freqüentemente
inviável;

controle da erosão do solo: o aumento da erosão implica a redução da área


de escoamento dos rios e consequente aumento de níveis. O controle da erosão
do solo pode ser realizado pelo reflorestamento, pequenos reservatórios,
estabilização das margens e práticas agrícolas corretas;

diques ou polders: São muros laterais de terra ou concreto, inclinados ou


retos, construídos a uma certa distância das margens, que protegem as áreas
ribeirinhas contra o extravasamento. Os efeitos de redução da largura do
escoamento confinando o fluxo são o aumento do nível de água na seção para a
mesma vazão, aumento da velocidade e erosão das margens e da seção e
redução do tempo de viagem da onda de cheia, agravando a situação dos outros
locais a jusante. O maior risco existente na construção de um dique é a
definição correta da enchente máxima provável, pois existirá sempre um risco
de colapso, quando os danos serão piores se o mesmo não existisse.
628 Hidrologia

Tabela 16.1. Medidas estruturais (Simons et al. 1977)

MEDIDA PRINCIPAL PRINCIPAL APLICAÇÃO


VANTAGEM DESVANTAGEM

MEDIDAS EXTENSIVAS;
Cobertura vegetal Redução do pico de Impraticável pa- Pequenas bacias
cheia ra grandes áreas

controle de perda Reduz assoreamento Idem ao anterior Pequenas bacias

MEDIDAS INTENSIVAS:

Diques e polders Alto grau de pro- Danos significa- Grandes rios


teção de uma área tivos caso falhe

Melhoria do canal:
- Redução da Aumento da vazãc) Efeito localizado Pequenos rios
njgosidade por com pouco
desobstrução ■ investimento

- Corte de Amplia a área pro- Impacto negativo Arca de inunda-


meandro tegida e 'acelera em rio com fundo ção estreita
o escoamento. aiuvionar

Reservatórios:
-Todos os Controle a jusante Localização Bacias
reservatórios Difícil intermediárias

-Reservatórios Mais eficiente com Vulnerável a Projetos de


com comportas o mesmo volume enos humanos usos múltiplos

-Reservatórios Operação com o Custo não Restrito ao


para cheias mínimo de perdas partilhado. controle de
enchentes

Mudança de Canal:
-Caminho da Amortecimento de Depende da topo- Grandes bacias
cheia volume grafia

-Desvios Reduz vazão do Idem ao anterior Bacias médias e


canal principal grandes
Controle de Enchentes 629

modificações do rio: As modificações na morfologia do rio visam aumentar a


vazão para um mesmo nível, reduzindo a sua freqüência cie ocorrência. Isto
pode ser obtido pelo aumento da seção transversal ou pelo aumento da
velocidade. Para aumentar a velocidade é necessário reduzir a rugosidade,
tirando obstruções ao escoamento, dragando o rio, aumentando a declividade
pelo corte de meandros ou aprofundando o rio. Essas medidas, em geral,
apresentam custos elevados.

reservatórios: O reservatório retém parte do volume da enchente, reduzindo a


vazão natural, procurando manter no rio uma vazão inferior àquela que
provocava estravasamento do leito. O volume retido no período de vazões altas
é escoado após a redução da vazão natural. O reservatório pode ser utilizado
quando existe relevo conveniente a montante da área atingida, mas exige altos
custos de construção e desapropriações.

16-3*2 Medidas não-estruturais

As medidas estruturais não são projetadas para dar uma proteção


completa, isto exigiria a proteção contra a maior enchente possível. Esta
proteção é fisicamente e economicamente inviável na maioria das situações. A
medida estruturai pode criar uma falsa sensação de segurança, permitindo a
ampliação da ocupação das áreas inundáveis, que futuramente podem resultar em
danos significativos. As medidas não-estruturais, em conjunto com as
anteriores ou sem essas, podem minimizar significativamente os prejuízos com
um custo menor. O custo de proteção de uma área inundável por medidas
estruturais, em geral, é superior ao de medidas não-estruturais. Em Denver
(Estados Unidos), em 1972, o custo de proteção por medidas estruturais de um
quarto da área era equivalente ao de medidas não-estruturais para proteger os
restantes três quartos da área inundável.
Johnson (1978) identificou as seguintes medidas não-estruturais:
instalação de vedação temporária ou permanente nas aberturas das estruturas,
elevação de estruturas existentes, construção de novas estruturas sob
pilotis, construção de pequenas paredes ou diques circundando a estrutura,
reiocação ou proteção de artigos que possam ser danificados dentro da
estrutura existente, reiocação de estruturas para fora da área de inundação,
uso de material resistente à água ou novas estruturas, regulamentação da
ocupação da área de inundação por cercamento, regulamentação de subdivisão e
código de construção, compra de áreas de inundação, seguro de inundação,
instalação de serviço de previsão e de alerta de enchente com plano de
evacuação, adoção de incentivos fiscais para um uso prudente da área de
inundação; instalação de avisos de alerta na área e adoção de políticas de
desenvolvimento. As medidas não-estruturais de inundação podem ser agrupadas
630 Hidrologia

em: regulamentação do uso da terra, construções à prova de enchentes, seguro


; de enchente,, previsão e alerta de inundação.

Regulamentação do uso da terra ou zoneamento de áreas inundáveis: para


regulamentar é necessário estabelecer o risco de inundação das diferentes
cotas das áreas ribeirinhas. 'Nas áreas de maior risco não é permitida a
habitação e pode ser utilizada para recreação desde que o investimento seja
baixo e não se danifique, como parques e campos de esportes. Para cotas com
menos riscos são permitidas construções com precauções especiais. Além disso,
são efetuadas recomendações quanto aos sistemas de esgoto cloacal, pluvial e
viário. Esta regulamentação deve ficar contida dentro do Plano Diretor da
cidade.

Construção à prova de enchente: é definida como o conjunto de medidas


projetadas para reduzir as perdas de prédios localizados nas várzeas de
inundação durante a ocorrência das cheias.

Seguro de enchente permite aos indivíduos ou empresas a obtenção de uma


proteção econômica para as perdas eventuais.

Previsão e alerta: é um sistema composto de aquisição de dados em tempo real,


transmissão de informação para um centro de análise, previsão em tempo atual
com modelo matemático, e Plano de Defesa Civil que envolve todas as ações
individuais ou de comunidade para reduzir as perdas durante as enchentes.
A combinação destas medidas permite reduzir os impactos das cheias e
melhorar o planejamento da ocupação da várzea. Como o Zoneamento de inundação
pressupõe a ocupação com risco, toma-se necessário que exista um sistema de
alerta para avisar a população sobre os riscos durante a enchente. O seguro e
a proteção individual contra enchente são medidas complementares, necessárias
para minimizar impactos sobre a economia da população.

16.4 Controle de Inundação com obras hidráulicas: medidas intensivas

As principais obras de controle de inundação no leito do rio são:


reservatórios, diques ou polders, ampliação da seção do rio, corte de
meandros e redução da rugosidade. As vazões e o hidrograma de projeto
utilizados para a avaliação do funcionamento das obras projetadas são
determinados segundo métodos descritos no capítulo 14.

Reservatório

O reservatório de controle de enchentes funciona retendo o volume do


hidrograma durante as enchentes, reduzindo o pico e o impacto a jusante do
Controle de Enchentes 631

barramento. Na figura 16.3 observa-se o hidrograma natural de um rio.


Considerando um volume V do hidrograma capaz de ser retido por um
reservatório, pode-se observar a redução da vazão máxima e o hidrograma
resultante.
Um reservatório sem controle de operação é aquele que não dispõe de
comportas de vertedor ou de fundo e a cheia é regulada pelas condições do
vertedor livre. Quando existem comportas é possível utilizar com mais
eficiência o volume disponível para controle da enchente. No período chuvoso
os primeiros hidrogramas tendem a ser de menor porte até que as perdas sejam
atendidas e o solo saturado. Estes hidrogramas podem ocupar o volume
disponível no reservatório, resultando pouco espaço para reduzir o pico das
cheias maiores subseqüentes (figura 16.4a).
A regra operacional pode ser a seguinte: a) o reservatório deve procurar
operar de tal forma a escoar a vazão natural até que a jusante sejam
atingidas as cotas limites (Qcrit); b) a partir deste momento utilize o
volume do reservatório para manter ou reduzir a vazão (figura 16.4b). Estas
condições operacionais dependem do projeto do reservatório e de seus órgãos
extravasores.

Figura 16.3. Efeito do Reservatório

Para a busca das melhores condições de projeto e operação é necessário


simular o escoamento no reservatório, identificando qual é a operação mais
eficiente. No capítulo 12 foi descrito um método de propagação em
reservatório que permite estudar as diferentes alternativas de operação do
mesmo.

Exemplo 16,1- Numa bacia hidrográfica deseja-se construir um reservatório. A


relação cota-volume é apresentada na tabela 16.2. O reservatório não possui
comportas no vertedor. A vazão máxima limite para não inundar a jusante é de
632 Hidrologia

270 m3/s. Estime a altura e a largura do vertedor do reservatório para que na


cheia o rio não extravase a jusante. Considere como condições iniciais a cota
de 2m. O coeficiente de descarga previsto para o vertedor é 2,00. O
hidrograma de entrada é apresentado na figura 16.5.

Tabela 16.2. Curva cota x volume


c o ta S /A t
m m 3 /s
A t= 3 6 0 0 s

0 ,0 0
1 .0 1736
34 5000
7 ,0 6666
1 0 ,0 8680
1 1 ,0 10416
1 2 ,5 14166
1 4 ,0 19000
1 7 ,0 35000

Figura 16.4. Operação do reservatório


Controle de Enchentes 633

Solução: O hidrograma de saída depende da curva cota versus vazão do


vertedor. O vertedor depende de duas variáveis: largura e altura da crista.
Neste caso deve-se pesquisar combinações dessas variáveis para obter-se o
menor custo e a vazão máxima desejada a jusante, Na prática, são considerados
aspectos locais de geologia e construção que no enunciado não foram
ressaltados. Para efeito de exemplo foi adotada uma largura de 2Gm e
pesquisadas alturas da crista que permitam obter a vazão máxima a jusante
menor ou igual a 270m3/s. O modelo utilizado foi o de Pulz, descrito no
capítulo 12, e a curva cota vazão foi obtida com base na equação 12.18. Os
hidrogramas resultantes são apresentados na figura 16.5. Pode-se observar que
a crista projetada é de 7,8 m.

Figura 16.5. Resultados do Exemplo 16.1

Dique

O dique permite proteção localizada para uma região ribeirinha. Deve-se


evitar diques de grandes alturas, pois existe sempre o risco de rompimento
para uma enchente maior do que a de projeto. No caso de rompimento, o impacto
é maior do que se o mesmo não existisse.
Hidraulicamente o dique reduz a seção de escoamento e pode provocar
aumento da velocidade e dos níveis de inundação (figura 16.6). Para que isso
não ocorra as condições de fluxo não devem-se alterar após a construção do
dique. Estas condições podem ser simuladas em condição de regime permanente
para as vazões de projeto (capítulo 12). Esta metodologia não deve ser usada
para escoamento sujeito ao efeito de maré, pois resultará numa cota
634 Hidrologia

superdimensionada. Para tanto deve-se utilizar um modelo hidrodinâmico.


Os diques são normalmente construídos de terra com enrocamento e de
concreto, dependendo das condições locais.

n í v el c o m

Figura 16.6. Impacto da construção do dique

Na construção de diques para a proteção de áreas agrícolas, o risco de


colapso adotado pode ser mais alto que em áreas urbanas, sempre que os danos
potenciais sejam somente econômicos. Quando o colapso pode produzir danos
humanos o risco deve ser menor e a obra complementada por um sistema de
previsão e alerta em tempo atual. Tanto em bacias rurais como urbanas é
necessário planejar o bombeamento das áreas laterais contribuintes ao dique,
caso contrário, chuvas sobre estas bacias laterais ficam represadas pela
maior cota do rio principal ou acumuladas no seu interior, se não existirem
drenos com comportas (figura 16.7).

Exem plo 16.2. N u m tr e c h o d e rio c o m a s e ç ã o c o m p o s t a s e m e l h a n t e a d a fig u ra


1 2 .4 c o m ia r g u r a to tal d e 6 0 0 m , c la rg u r a d o le ito m e n o r c ig u a l a 4 5 m . A
p r o f u n d id a d e d o le ito m e n o r c d c 4 m . C a lc u le as c o ta s d a lin h a d c á g u a a n te s e
a p ó s a c o n s t r u ç ã o d o d i q u e . A d e c l i v i d a d e n o r i o c d c 10 c m / k m , a r u g o s i d a d e d o
le ito m e n o r 0 ,0 3 5 e a d o le ito m a io r 0 ,1 0 . C o n s id e r e o s d iq u e s c o n s tr u íd o s a
u m a d is tâ n c ia d e 3 0 m d a s m a r g e n s c a r u g o s id a d e ig u a l a d o ic ito m e n o r. A
v a z ã o d e p ro je to é d e 2 7 3 m 3 /s. O tre c h o q u e d e v e se r p ro te g id o te m 10 k m . A
ju s a n t e o rio te m s e ç ã o a p r o x im a d a m e n te r e ta n g u la r s e m e x t r a v a s a m e n to c la r­
g u r a d e 5 5 m . E s ti m a - s e a c o ta d e 6 ,8 m p a r a a c h e i a n a tu ra l n o in íc io d o tr e c h o
s e m e x t r a v a s a m e n t o ( f ig u r a 1 6 .8 ). D e s p r e z e a á r e a e n t r e o d i q u e e a m arg em .
635
Controle de Enchentes

Figura 16.7. Dicjue - Drenagem da bacia lateral

Região inundada

T rech o sem

inundação
V,
10 '
/ / 12

Figura 16.8. Exemplo 16.2


636

Solução: Inicialmente é necessário calcular a linha de água para a situação


natural. Considerando a condição de jusante com vazão de 273 m3/s e nfvel?de
^ “ C‘f S 3 montante P3™ seí ões espaçadas de lkm. Na
tahela 16.3 sao apresentados os principais valores. A metodologia utilizada
C, f CU° .d,ee[emanS° descnt0 no caPÍtulo 12. Considerando as novas
seções (figura 16.8) com o dique e calculando a nova linha de água obtém-se
os valores da tabela 16.3. Na figura 16.9 pode-se observar os resultados

Tabela 16.3. Resultados do exemnln ifi?

m m/m m- m3/s m m- m3/s m


1 1000 0 ,0 0 0 1 1400,0 46066.6 7,13 326.5 28749,4 7,75
2 1000 0 ,0 0 0 1 1439.6 47383.8 7,10 326.5 28749,4 7,66
3 1000 0 ,0 0 0 1 1480.2 48533.1 7,07 327.0 28808,4 7,57
4 1000 0 ,0 0 0 1 1521.8 49812.6 7,04 327.6 28870,0 7,48
5 1000 0 ,0 0 0 1 1564.3 51120.8 7,01 328.2 28933,9 7,39
6 1000 0 ,0 0 0 1 1607.7 52456.1 6,98 328.8 29000,1 7,31
7 1000 0 ,0 0 0 1 1651.9 53817.0 6,95 329.5 29068,8 7,22
8 1000 0 ,0 0 0 1 1696.9 55202.0 6,93 330.1 29140,0 7,13
9 10 0 0 0 ,0 0 0 1 1742,7 56609,8 6,90 330.8 29213,8 7,04
10 1000 0 ,0 0 0 1 1789.1 58038,9 6,88 331.6 29290,2 6,96
11 1000 0 ,0 0 0 1 1836.2 59486,8 6,86 332.3 29369,3 6,87
0 0 ,0 0 0 0 374,0 33114,2 6,80 374,0 33114,2 « j

Figura 16.9. Linha de água


Controle de Enchentes 637

Ampliação da calha e redução da rugosidade

Para a seção de um rio que escoa uma vazão Q, a cota resultante depende
da área da seção, da rugosidade, raio hidráulico e da declividade. Para
reduzir a cota devido a uma vazão pode-se atuar sobre as variáveis
mencionadas. Para que a modificação seja efetiva é necessário modificar estas
condições para o trecho que atua hidraulicamente sobre a área de interesse.
Aprofundando o canal, a linha de água é rebaixada evitando inundação, mas as
obras poderão envolver um trecho muito extenso para ser efetiva, o que
aumenta o custo (Figura 16.10a). A ampliação da seção de medição produz
redução da declividade da linha de água e redução de níveis para montante
(figura 16.10b). Estas obras devem ser examinadas quanto à alteração que
podem provocar na energia do rio e na estabilidade do leito. Os trechos de
montante e jusante das obras podem sofrer sedimentação ou erosão de acordo
com alteração produzida.

16.5 Zoneamento de áreas de inundação

O zoneamento das áreas de inundação engloba as seguintes etapas: a)


determinação do risco das enchentes; b) mapeamento das áreas de inundação; c)
zoneamento. O primeiro item foi apresentado no capítulo 14. A seguir são
descritos os aspectos do mapeamento e do zoneamento.

16.5.1 Mapa de inundação de cidade

Os mapas de inundação podem ser de dois tipos: mapas de planejamento e


mapas de alerta. O mapa de planejamento define as áreas atingidas por cheias
de tempos de retomo escolhidos. O mapa de alerta informa em cada esquina ou
ponto de controle, o nível da régua no qual inicia a inundação. Este mapa
permite o acompanhamento da evolução da enchente, com base nas observações da
régua, pelos moradores nos diferentes locais da cidade. Essa informação
normalmente é transmitida através de estações de rádio.
Para a elaboração desses mapas são necessários os seguintes dados: a)
nivelamento da régua a um zero absoluto; b) topografia da cidade no mesmo
referencial absoluto da régua linimétrica. Cota da rua no meio de cada
esquina das áreas de risco; c) estudo de probabilidade de inundações de
níveis para uma seção na proximidade da cidade; d) níveis de enchentes, ou
marcas ao longo da cidade que permita a definição da linha de água; e) seções
batimétricas ao longo do rio no perímetro urbano. Caso a localização da seçao
de observação se encontre fora do perímetro urbano, a batimetria deve ir até
a referida seção. O espaçamento das seções depende das modificações do leito
e da declividade da linha de água, mas espaçamentos entre 500 e 1000 m são
suficientes; f) cadastramento das obstruções ao escoamento ao longo do trecho
638
Hidrologia

urbano como pontes, edifícios e estradas, entre outros.


Quando a declividade da linha de água ao longe da cidade d muito pequena
e não existem arroios significativos no perímetro urbano os itens d, e e f
são desnecessários. No caso das obstruções, essas podem ser importantes se
reduzirem significativamente a seção transversal.

^ coto da margem

Q Aprofundamento da seção

c h e ia

b-Ampliação lateral da seção ou reduça'0 da rugosidade

Figura 16.10. Ampliação da seção


Controle de Enchentes 639

Na prática, é muito difícil a obtenção de todas as informações


relacionadas acima, portanto, é conveniente dividir o estudo em duas fases.
Na primeira fase, dita preliminar, seriam delimitadas com precisão reduzida
as áreas de inundação com base em mapas topográficos existentes e marcas de
enchentes. Na segunda fase, com a delimitação aproximada das áreas de
inundação, a topografia com maior detalhe seria realizada nas áreas
defmidas, juntamente com a batimetria do rio, e calculados com precisão os
dois mapas referidos.

Mapeamento prelim inar

Nas cidades de porte superior a 10.000 habitantes existem projetos de


abastecimento de água. Para esses projetos é realizada uma topografia com
espaçamento de 5m em 5m. Estes mapas não possuem a precisão desejada para
este tipo de estudo, mas podem ser utilizados preliminarmente. Os erros podem
ser minimizados com visitas in loco, fotografias aéreas e verificação de
pontos característicos do levantamento. Nem sempre estes mapas se referem à
cota absoluta desejada; nesse caso é necessário procurar o RN desejado e
estabelecer a referência com o mapa disponível. A seguir pode-se estabelecer
a relação entre o zero da régua linimétrica e o RN escolhido, utilizado na
elaboração do mapa topográfico.
Considerando que os níveis de enchentes são conhecidos na seção da
régua, para transportá-lo para as seções ao longo do trecho urbano é
necessário conhecer a dcclividade da linha de água. Esta declividade pode ser
obtida através das marcas de enchentes ou medindo a mesma durante a estiagem.
Este último procedimento pode apresentar erros, já que se existirem
obstruções ao escoamento durante as enchentes, a declividade pode-se
modificar significativamente.
Para a determinação da declividade da linha de água deve-se recomendar,
ao topògrafo, o seguinte: a) nivelar todas as marcas de enchente existentes
na cidade; b) medir o nível de água com espaçamento entre 500m e 1000 m ao
longo do trecho urbano, anotando a cota da régua para o momento do
levantamento.
Para verificar o trabalho do topògrafo pode-se utilizar o seguinte: a)
conferir se a declividade é decrescente na direção do fluxo; b) para
verificar o nivelamento das marcas na vizinhança da seção da régua
linimétrica some ao zero da régua os valores observados no linígrafo e
verifique se correspondem às marcas niveladas. Deve-se considerar que a marca
de enchente não corresponde ao nível máximo ocorrido, já que o rio mancha a
parede quando o nível se mantém por algum tempo. No caso do rio ficar muito
pouco tempo no pico, a marca deve aparecer para níveis menores.
Os critérios para determinação da linha de água e os níveis de enchente
ao longo da cidade são os seguintes:
640 Hidrologia

M apa de Planejamento: a) conhecida a curva de freqüência de níveis de


inundação na seção da régua linimétrica, obtenha os níveis absolutos
correspondentes aos tempos de retomo desejados; b) defina as seções ao longo
do rio. Essas seções são escolhidas com base nas marcas existentes e/ou nos
níveis medidos a cada 500m e 1000 m; c) calcule a declividade da linha de
água para os diferentes trechos definidos pelas seções referenciadas. A
declividade é calculada com a distância medida ao longo do rio. Deve-se tomar
cuidado quando existirem pontes e/ou estradas que obstruam o escoamento; d)
para os níveis calculados nas seções do posto, obtenha as cotas
correspondentes para as outras seções, utilizando a declividade da linha de
água obtida.

Mapa de alerta - No estudo preliminar, as informações disponíveis nem sempre


permitem a elaboração do mapa de operação.

Mapeamento definitivo

Neste caso é necessário o levantamento detalhado da topografia das


áreas de risco com o tempo de retomo menor ou igual a 100 anos. A escolha do
tempo de retomo é arbitrária e depende da definição do futuro zoneamento.
Caso tenha ocorrido uma enchente com tempo de retomo superior a 100 anos,
deve-se escolher o maior valor ocorrido.
O levantamento detalhado engloba a determinação das curvas de nível com.
espaçamento de 0,5m ou l,0m, dependendo das condições do terreno. Em algumas
cidades o espaçamento pode ser muito detalhado. Nesse levantamento deve
constar o nível do meio da rua de cada esquina das áreas de risco.
Além da topografia é necessário o levantamento das obstruções ao
escoamento, como pilares e encostos de pontes, estradas com taludes,
edifícios, caracterizando em planta e, em seção, o tipo de cobertura e
obstrução.
Com a batimetria ao longo da cidade é possível determinar as cotas de
inundação, de acordo com o seguinte procedimento: a) um modelo de escoamento
permanente, para cálculo da linha de água, deve ser utilizado. No capítulo 12
é descrita a metodologia. O método é utilizado, inicialmente, para ajuste das
rugosidades, com base nas marcas de enchentes e na curva de descarga do
posto fluviométrico. Para tanto, a linha de água é determinada para a vazão
máxima registrada, no posto fluviométrico, e o nível correspondente no
sentido de jusante para montante. A rugosidade correta será aquela cuja
linha de água se aproximar das marcas de enchente; b) conhecidas as
rugosidades pode-se estabelecer a linha de água para as vazões
correspondentes aos diferentes tempos de retomo e, em conseqüência, elaborar
o mapeamento das áreas atingidas.
No caso do mapeamento para alerta, o procedimento é semelhante, já que o
C o n tro le d e E n c h e n te s 641

ajuste também é necessário. As linhas de água serão determinadas para


diferentes níveis na seção do posto. Com a declividade da linha de água é
possível obter a cota correspondente a inundação em cada esquina.

Exemplo 1 6 J - No estudo das cidades do Vale do Itajaí foi realizado um


mapeamento preliminar de planejamento. A seguir são descritos os
procedimentos adotados.

Mapas topográficos das cidades: para as diferentes cidades foram obtidos


mapas topográficos dos mais variados níveis de qualidade. Em geral esses
mapas foram preparados para a elaboração de projetos de abastecimento de água
e possuem curvas de níveis espaçadas de 5m. Com a finalidade de minimizar o
problema foram realizadas, em todas as localidades, visitas com o objetivo de
atualizar os mapas disponíveis através da comparação de detalhes topográficos
locais com aerofotos e com a própria verificação dc pontos característicos
com os RNs do IBGE. Esses mapas devem ser considerados como preliminares e,
para as áreas com maior risco de inundação, poderão ser elaborados
futuramente mapas topográficos mais detalhados;
Nivelamento das réguas linimétricas: nas cidades foram niveladas as
réguas, adotando-se também a referencia IBGE;
Declividade da linha de água: o rio Itâjaí-Açu e seus afluentes
apresentam declividadcs da linha de água muito altas sendo» portanto,
necessário conhecer esse parâmetro para melhor estimar as cotas de enchentes
no interior das cidades. Adotou-se como critério o nivelamento das marcas das
enchentes, a cada quilômetro, ao longo do rio nas áreas urbanas e a
determinação da declividade da linha dc água no período de visita, que
ocorreu cm um período dc estiagem. A análise dessas dcciividades permitiu
estimar as cotas de inundação para diferentes valores ocorridos na régua.
Esse trabalho estendeu-se, também, junto aos principais arroios que escoam
para o rio principal;
Estimativa das cotas de inundação: para as cidades com dados foi
determinada a curva de probabilidade de vazões. Os tempos de retomo de 5,
25, 50 e 100 anos foram escolhidos e obtidas as vazões correspondentes. As
vazões foram convertidas em níveis pela curva-chave. A transferência deste
nível ao longo da cidade foi realizada com base nos desníveis das
declividades das maiores enchentes.
Para exemplificar, a seguir descrevemos os procedimentos para a cida­
de de Rio do Sul. A referida cidade localiza-se na confluência dos rios Itajaí
do Oeste e Itajaí do Sul. As marcas de enchentes desta cidade foram nive­
ladas, o que permitiu obter as dcciividades dos níveis das enchentes ocorri­
das em 83 e 84. apresentadas na figura 16.11. A curva de probabilidade foi
ajustada, observe o exemplo 14.3 (capítulo 14), e as cotas obtidas através da
curva-chave. C onsiderando que não se dispõe de seções transversais
16.5.2 Zoneamento

0 zoneamento própriamente dito é a definição de um conjunto de regras


para a ocupação das áreas de maior risco de inundação, visando à minimização
futura das perdas materiais e humanas em face das grandes cheias. Conclui-se,
daí, que o zoneamento urbano permitirá um desenvolvimento racional das áreas
ribeirinhas.
A regulamentação do uso das zonas de inundação apoia-se em mapas com
demarcação de áreas de diferentes riscos e nos critérios de ocupação das
mesmas, tanto quanto ao uso como quanto aos aspectos construtivos. Para que
esta regulamentação seja utilizada, beneficiando as comunidades, a mesma deve
ser integrada à legislação municipal sobre loteamentos, construções e
habitações, a fim de garantir a sua observância. Sendo assim, o conteúdo
deste capítulo tem a finalidade de servir de base para a regulamentação da
várzea de inundação, através dos planos diretores urbanos, permitindo às
prefeituras a viabilização do controle efetivo. O Departamento de Águas e
Hidrologia

Energia Elétrica do Estado de São Paulo (DAEE), apresentou uma proposta para
os artigos da seção de Recursos Hídricos das Leis Orgânicas municipais do
referido Estado, onde o zoneamento era recomendado nos seguintes termos:
"Art. 2o Caberá ao município, no campo dos recursos hídricos:
IV - proceder ao zoneamento das áreas sujeitas a riscos de inundações
erosão e escorregamentos do solo, estabelecendo restrições e proibições ao
uso, parcelamento e a edificação, nas áreas impróprias ou críticas de forma a
preservar a segurança e a saúde pública”.
O Water Resources Council (1971) definiu Zoneamento por: "Zoneamento
envolve a divisão de unidades governamentais em distritos e a regulamentação
dentro desses distritos de : a) usos de estruturas e da terra; b) altura e
volume das estruturas; c) o tamanho dos lotes e densidade de uso. As
características do Zoneamento, que o distingue de outros controles é que a
regulamentação varia de distrito para distrito. Por essa razão, o Zoneamento
pode ser usado, para estabelecer padrões especiais para uso da terra em áreas
sujeitas â inundação. A divisão em distritos de terras, através da comunidade
é usualmente baseada em planos globais de uso, que orientam o crescimento da
comunidade”.

Condições técnicas do zoneamento

O risco de ocorrência de inundação varia com a respectiva cota da


várzea. As áreas mais baixas obviamente estão sujeitas a maior freqüência de
ocorrência de enchentes. Assim sendo, a delimitação das áreas do zoneamento
depende das cotas altimétrieas das áreas urbanas.
O rio possui normalmente um ou mais leitos. O leito menor corresponde a
seção dc escoamento em regime de estiagem, ou de níveis médios. O leito maior
pode ter diferentes lances, de acordo com a seção transversal considerada e a
topografia da várzea inundável. Esse leito, o rio costuma ocupar durante as
enchentes. Quando o tempo de retomo de extravasamento do leito menor é
superior a 2 anos, existe a tendência da população em ocupar a várzea nas
mais diversas e significativas formas socioeconômicas. Essa ocupação gera,
por ocasião das cheias, danos de grande monta aos ocupantes dessas áreas e,
também, às populações a montante, que são afetadas pelas elevações de níveis
decorrentes da obstrução ao escoamento natural causada pelos primeiros
ocupantes (figura 16.14).
A seção de escoamento do rio pode ser dividida em três partes principais
(figura 16.13), descritas a seguir.

Zona de passagem da enchente (faixa 1) - Esta parte da seção funciona


hidraulicamente e permite o escoamento da enchente. Qualquer construção nessa
.13. Regulamentação da zona inundável (U.S.WATER RESOURCES
COUNCIL,1971).
646
Hidrologia

área reduzirá a área de escoamento, elevando os níveis a montante desta seção


(figura 16.14). Portanto, em qualquer planejamento urbano, deve-se procurar
manter esta zona desobstruída.

Zona com restrições (faixa 2) - Esta é a área restante da superfície


inundável que deve ser regulamentada. Esta zona fica inundada mas, devido às
pequenas profundidades e baixas velocidades, não contribuem muito para a
drenagem da enchente.

Zona de baixo risco (faixa 3) - Esta zona possui pequena probabilidade de


ocorrência de inundações, sendo atingida em anos excepcionais por pequenas
laminas de agua e baixas velocidades. A definição dessa área é útil para
informar a população sobre a grandeza do risco a que está sujeita. Esta área
não necessita regulamentação, quanto às cheias.

A primeira faixa depende das condições hidráulicas do escoamento da


enchentes,^ as demais são escolhidas com base no risco que se deseja assumir
na convivência com as enchentes.
A zona utilizada para a passagem de enchente é delimitada através do
calculo de remanso para uma vazão, correspondente à cota que define a área
sujeua a inundação. Utilizando a referida vazão, a cota. i partir da qual as
Obstruções provocam acréscimos de níveis menores que h*, é aquela quedefirc
esm zona. O valor de h* pode ser definido como um v a l o r U c i r ^
pequeno para nao agravar as condições existentes.

Regulamentação das zonas de inundação

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Controle de Enchentes 647

importante de áreas planas em patamares intermediários devido, também, aos


inconvenientes do restante do relevo acidentado das cidades.
A regulamentação da ocupação de áreas urbanas é um processo iterativo,
que passa por uma proposta técnica que é discutida pela comunidade antes de
ser incorporada ao Plano Diretor da cidade. Portanto, não existem critérios
rígidos aplicáveis a todas as cidades, mas sim recomendações básicas que
podem ser seguidas em cada caso.
Water Resources Council (1971) orienta a regulamentação com base em
distritos, defmido-se em cada um o seguinte: a) um texto que apresente os
regulamentos que se aplicam a cada distrito, junto com as providências
administrativas; b) um mapa delineando os limites dos vários usos nos
distritos.
O zoneamento é complementado com a subdivisão das regulamentações, onde
são orientadas as divisões de grandes parcelas de terra em pequenos lotes,
com o objetivo de desenvolvimento e venda de prédios. Portanto, essa é a fase
de controle sobre os loteamentos. O Código de Construção orienta a construção
de prédios quanto a aspectos estruturais, hidráulicos, de material e vedação.
A regulamentação das construções permite evitar futuros danos. A seguir
relacionamos alguns indicadores gerais que podem ser usados no zoneamento .

Zona para passagem das enchentes: essa faixa do rio deve ficar desobstruída
para evitar danos de monta e represamentos. Nessa faixa não deve ser
permitida nenhuma nova construção e a Prefeitura poderá, paulatinamente,
relocar as habitações existentes.
Na construção de obras como rodovias e pontes deve ser verificado se as
mesmas produzem obstruções ao escoamento. Naquelas já existentes deve-se
calcular o efeito da obstrução e verificar as medidas que podem ser tomadas
para a correção. Não deve ser permitida a construção de aterro que obstrua o
escoamento. Essa área poderia ter seu uso destinado a agricultura ou outro
similar às condições da natureza. Adicionalmente, seria permitido a
instalação de linhas de transmissão e condutos hidráulicos.
Em algumas cidades poderão ser necessárias construções próximas aos
rios. Nessa circunstância, deve ser avaliado o efeito da obstrução e as obras
devem estar estruturalmente protegidas contra inundações.

Zona com restrições: Esta zona pode ser subdividida em subáreas, mas
essencialmente os seus usos podem ser: a) parques e atividades recreativas ou
esportivas cuja manutenção, após cada cheia, seja simples e de baixo custo.
Normalmente uma simples limpeza a reporá em condições de utilização, em curto
espaço de tempo; b) uso agrícola; c) habitação com mais de um piso, onde o
piso superior ficará situado, no mínimo, no nível do limite da enchente e
estruturalmente protegida contra enchentes (item seguinte); d) industrial-
comercial, com áreas de carregamento, estacionamento, áreas de armazenamento
Hidrologia

de equipamentos ou maquinaria facilmente removível ou não sujeitos a danos de


cheia. Neste caso, não deve ser permitido armazenamento de artigos perecíveis
e principalmente tóxicos; e) serviços básicos: linhas de transmissão,
estradas e pontes, desde que corretamente projetados.

Zonas de baixo risco: nesta área, delimitada por cheia de baixa frequência,
pode-se dispensar medidas individuais de proteção para as habitações, mas
orientar a população para a eventual possibilidade de enchente e dos meios de
proteger-se das perdas decorrentes, recomendando o uso de obras com, pelo
menos, dois pisos, onde o segundo pode ser usado nos períodos críticos.

Regulamentação das construções: a proteção das habitações com relação às


enchentes depende da capacidade econômica do proprietário em realizá-la.
Com a implantação de um plano, a municipalidade poderá permitir-as
construções nessas áreas, desde que atendam condições como as seguintes
(Tucei e Simões Lopes, 1985): a) estabelecimento de, pelo menos, um piso corn
nível superior à cheia que limita a zona de baixo risco; b) uso de materiais
resistentes à submersão ou contato com a água; c) proibição de armazenamento
ou manipulação e processamento de materiais inflamáveis, que possam pôr em
pengo a vida humana ou animal durante as enchentes. Os equipamentos
elétricos Jevem ficar em cota segura; d) proteção dos aterros contra erosões
através de cobertura vegetal, gabiões ou outros dispositivos; e) prever os
efeitos das enchentes nos projetos de esgotos pluvial e cloacal; f)
estruturaimente, as construções devem ser projetadas para resistir à pressão
hidrostática, que pode causar problemas de vazamento, entre outros, aos
empuxos e momentos que podem exigir ancoragem, bem como às erosões que
podem minar as fundações; g) fechamento de aberturas como portas, janelas e
dispositivos de ventilação; h) estanqueidade e reforço das paredes de porões;
i) reforço ou drenagem da lage do piso; j) válvulas em conduto; k) proteção
de equipamentos fixos; 1) ancoragem de paredes contra deslizamentos.
A decisão sobre a obrigatoriedade de proteção das novas construções na
zona de inundação é um processo que deve passar por uma discussão ampla da
comunidade envolvida. No entanto, deve-se ter presente que, logo após as
últimas enchentes, houve desvalorização imobiliária das áreas de risco. Com o
passar do tempo, essas áreas adquirirão gradualmente valor imobiliário,
devido ao natural espaçamento no tempo das cheias e assim, a implementação de
um plano de zoneamento poderá trazer custos maiores de desapropriações (se
forem necessárias) ou dificuldades no processo de obediência à
regulamentação. Essa situação somente sofrerá modificação com a ocorrência de
nova enchente, com mais danos. Essas condições são mais graves na zona de
passagem da cheia, na qual a municipalidade necessita gradualmente remover as
obras que obstruem o escoamento.
Quanto às construções já existentes nas áreas de inundação, deverá ser
Controle de Enchentes 649

realizado um cadastramento completo das mesmas e estabelecido um plano para


reduzir as perdas no local, bem como àquelas provocadas pelo renianso,
resultante da obstrução do escoamento. Várias são as condições existentes que
deverão ser analisadas caso a caso. Algumas situações podem ser: a) para as
obras públicas como escolas, hospitais, e prédios administrativos deve-se
verificar a viabilidade de protegê-los ou removê-los para áreas seguras, a
médio prazo; b) as subabitações como favelas e habitações de população de
baixa renda, devem ter sua transferência negociada para áreas mais seguras;
c) para áreas industriais e comerciais pode-se incentivar as medidas de
proteção às construções e, se for o caso, de toda a área, às expensas dos
beneficiados.
Quando ocorrem remoções ou transferências, o poder público deve estar
preparado com planos urbanos para destinar estas áreas para outros usos ou
finalidades de lazer, parques, evitando que venham a ser ocupadas novamente
por subabitações.

Exemplo 16.4 - Os resultados obtidos de cotas de inundação para as cidades


do Vale do Itajaí não permitem ainda um detalhamento completo do zoneamento
das mesmas, mas permitem desde já fornecer orientação sobre as áreas de
risco. Procurou-se delimitar a área de inundação de baixo risco pela cota
correspondente a 100 anos de tempo de retomo ou pela maior cheia ocorrida,
adotando-se a maior das duas.
Nos mapas dessas cidades são apresentadas as áreas atingidas pelas
cheias de 5 e 25 anos de tempo de retomo. A seguir, são apresentados alguns
comentários sobre as condições de enchentes na cidade de Rio do Sul.
As condições de inundação mais críticas ocorrem na confluência dos rios
Itajaí do Sul e Itajaí do Oeste e a jusante deste ponto. As cheias de 25 e
100 anos pouco diferem devido à topografia local. As áreas de maior risco
encontram-se junto à confluência, na margem esquerda do rio Itajaí do Oeste e
na margem direita, após a confluência. A profundidade nas margens pode ser
superior a 5m, o que provoca velocidades consideráveis, principalmente onde
não existem maiores obstruções, como nas ruas.
A cheia de 5 anos de tempo de retomo apresenta superfícies maiores
junto à curva do rio, logo após a confluência. Essas áreas devem ter cuidados
especiais pois tem a chance de ser atingidas, em média, a cada 5 anos e 50%
de chance nos próximos três anos.
A área delimitada pela cheia de 25 anos é muito extensa e preocupante,
pois tem a chance de 34% de ocorrer nos próximos 10 anos e abrange um setor
comercial importante na cidade. A população deve ser orientada para o risco e
verificar se é mais econômico proteger os prédios ou mudá-los para local mais
seguro.
As recomendações apresentadas nos itens anteriores poderão, num plano
preliminar, ser de ajuda à população e dar orientação para a ocupação urbana.
650 Hidrologia

Para definição das faixas e estabelecimento da regulamentação é necessário o


seguinte: a) levantamento de seções batimétricas ao longo dos rios, dentro do
perímetro urbano de interesse; b) levantamento topográfico da área de
inundação, com curvas de nível de 0,5m em 0,5m; c) cadastramento e definição,
em planta e perfil, de todas as habitações, estradas, pontes e condutos na
área de inundação.

Exemplo 16.5 - Rezende e Tucci (1979) avaliaram as condições de inundação da


cidade de Estreia às margens do rio Taquari e recomendaram ao Plano Diretor
da cidade duas faixas de regulamentação. Na primeira faixa entre a cheia
normal e a cota correspondente a 10 anos de tempo de retomo (26,00 m) foi
recomendado que fosse preservada e mantida livre de obstruções, devido às
condições de escoamento do trecho do rio Taquari. Na faixa entre o referido
nível e a cheia de 100 anos foram recomendados usos e construções com
proteção contra inundação. Na legislação urbana foi definido que as curvas
abaixo da cota de 26,00 m são de preservação permanente e paisagística.

16.6 Avaliação dos prejuízos das enchentes

Segundo o U.S. Ármy Corps of Engineers (1976), os prejuízos por


inundação podem ser classificados em tangíveis e intangíveis. Os prejuízos
tangíveis são classificados em danos físicos, custos de emergência e
prejuízos financeiros.
Os danos físicos incluem os custos de separação e limpeza dos prédios, e
as perdas de objetos, mobília, equipamentos, elementos decorativos, material
armazenado e material em elaboração. Os custos emergenciais se referem à
evacuação, reocupação, habitação provisório como acampamentos, alertas, entre
outros. Os custos financeiros são aqueles devidos à interrupção do comércio,
da fabricação de produtos industriais e aos lucros cessantes. Os custos
intangíveis se referem aos danos de enchente que não têm valor de mercado ou
valor monetário, como a perda de vida ou obras e prédios históricos.
Os métodos utilizados para a avaliação dos danos causados pelas
enchentes são (Simons et al., 1977): a) curva nível-prejuízo; b) método da
curva de prejuízo histórico; c) equação de dano-agregado.

16.6.1 Curva nível-prejuízo

O desenvolvimento deste método é citado em U.S. Army Corps of Engineers


(1976). Consiste na determinação de curva que relaciona prejuízos e
probabilidade ou tempo de retomo. Para determinar esta curva é necessário
obter as seguintes relações: a) curva de descarga; b) curva de probabilidade
de vazões máximas; c) curva de nível versus prejuízo.
A curva de descarga é a relação entre a vazão e o nível de água na seção
Controle de Enchentes 651

de medição. A curva de freqüência de probabilidade de vazões é obtida com


base nos procedimentos descritos no capítulo 14. Para obter a relação entre
o nível na seção da régua e a probabilidade, basta efetuar a combinação das
duas curvas.
A grande dificuldade está na determinação da relação entre nível e
prejuízo. Para tanto é necessário um cadastramento de ocupação da várzea e a
estimativa do prejuízo para os diferentes componentes dessa ocupação. Esta
estimativa pode ser realizada para construções-padrão como residências,
ocupação industrial e comercial, quando for o caso, além de uso agro-
pastoril. Nos Estados Unidos as entidades como Soil Conservation Service,
Corps of Engineers e Administração Federal de Seguros procuram relacionar,
para cada tipo. básico de construção, a altura a partir do piso com a
percentagem de dano do valor total do prédio. Nas figuras 16.15 e 16.16 são
apresentados, respectivamente, exemplos da comparação das curvas propostas
pelas três organizações para os casos de uma casa de um e de dois pisos,
ambas sem porão. A composição dos custos por áreas da cidade, através de
amostragem, permite uma avaliação global dos danos envolvidos.
Individualmente, uma indústria ou um estabelecimento comercial podem levantar
os seus prejuízos potenciais de acordo com o nível de água.
Conhc.cfda a relação entre profundidade e prejuízo é possível estabelecer
a relação entre prejuízo e probabilidade, pelo uso das duas últimas curvas
(figura 16.17). A curva prejuízo-probabilidade permite a estimativa do custo
médio dc inundação para uma cidade ou, individualmente, para uma indústria,
sem estabelecimento comercial ou uma residência. Adicionalmente, ela permite
informar os riscos econômicos envolvidos na instalação em área sujeita à
inundação. O custo médio de inundação é obtido pela integração da curva
prejuízo versus probabilidade (figura 16.18).

16.6.2 M étodo da curva de prejuízo histórico

Este tipo de metodologia foi proposta por Eckstein (1958) e baseia-se na


determinação dos prejuízos de cheias ocorridas nos últimos anos. Plotando
este prejuízo com relação aos níveis, permite-se o traçado da curva,
relacionando níveis versus dano. As limitações deste procedimento são: a)
admite que, nos últimos anos, o crescimento da região tenha sido praticamente
nulo na área de inundação e que não tenham havido relocação; b) admite que os
prejuízos provocados pelas cheias tenham sido repostos; c) que os valores
dos prejuízos devem estar uniformizados, ou seja, deve considerar a inflação
dos períodos; d) que o procedimento de avaliação dos prejuízos deve ser o
mesmo nas diferentes enchentes, para que não haja tendenciosidade de
avaliação.
652 Hidrologia

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0 .10 20 30 40 50 60 70 80

% de danos do valor total (estrutura e.bens)

Figura 16.15. Curvas de profundidade-dano para uma casa de um


pavimento sem-porão- (Simons et al.,1977)

16.6.3 Equação do prejuízo agregado

James (1972) apresentou a equação de dano agregado, que se baseia no


crescimento linear entre o dano e o nível médio de inundação da várzea. A
equação é a seguinte:

CD = KD h M U A (16.1)

onde CD = dano total, devido a enchente para um evento; KD = um índice de


dano de enchente, em unidades monetárias por unidades de profundidade de
inundação; h = profundidade média de inundação; M = índice de valor de
mercado de desenvolvimento da área de inundação, em unidades monetárias por
unidades de desenvolvimento; U = a proporção de ocupação, ou seja, proporção
Controle de Enchentes 653

da área de inundação desenvolvida pela área total inundada; A = área total de


inundação.

0 10 20 30 40 50 60 TO 60

% de danos do v al or rota! ( e s t r u t u r a e bens)

Figura 16.16. Curva de profundidade-dano para uma casa de dois


pavimentos sem porão (Simons et al., 1977)

O índice KD é definido por:

k
K q
- —
-
dD (16.2)
dy

onde D = dano; y = a profundidade. Esta derivada é obtida com base na relação


entre dano e profundidade. Homan e Waybur (1960) determinaram este valor para
cheias de cerca de 5 pés de profundidade (l,5m) e obtiveram KD - 0,052.
James (1964) apresentou um valor médio de 0,044. Quando na cheia existe
grande quantidade de sedimentos ou alta velocidade, o valor de KD cresce,
nível médio da enchente e o índice do valor de mercado são obtidos para cada
local. O fator U também é obtido por dados locais.
654 Hidrologia

Kates (1965) apresentou uma seqüência de procedimentos para a avaliação


dos prejuízos de áreas de inundação com crescimento, ou modificações de danos
potenciais, com o tempo. A seqüência é a seguinte: a) utilize um modelo
regional de economia para projetar o crescimento urbano regional através do
período de análise; b) defina os limites das áreas de inundação com base em
análise hidrológica e aloque o crescimento urbano nesta área; c) especifique
cada estrutura na área de inundação por localização, tipo, conteúdo e valor
econômico, como função do tempo; d) desenvolva curvas apropriadas,
relacionando danos na estrutura com nível como função do tempo; e) agregue as
curvas individuais de dano para permitir a avaliação de toda a enchente
refletindo a mudança no tempo.

Figura 16.17. Método Nível-Prejuízo

PROBLEMAS

1 - Por que as medidas estruturais são mais caras que as medidas não-
estruturais?

2 - Quais os principais impactos que envolve o corte de meandros para


controle de inundação de um trecho de rio?3

3 - Quando é viável a canalização de um rio para controle de enchente’’ Quais


sao os benefícios ? x
C o n tro le d e E n ch en te s 655

4 - Como você definiría um plano de determinação dos níveis de inundação para


um local sem dados?

5 - Quais as medidas complementares ao zoneamento da planície de inundação?

6 - Para as vazões máximas anuais da seção da figura 16.18: a) determine a


curva de probabilidade de vazões máximas (tabela 16.4); b) determine as
vazões máximas de 5, 20 e 100 anos de tempo de retomo da curva obtida do
item anterior; c) determine as cotas de inundação correspondente às cheias
mencionadas, com base na curva-chave da tabela 16.5; d) determine em planta

Tabela 16.4. Vazões máximas da seção A

N Q ( m 3/s ) N Q ( m 3/s ) N Q ( m 3/s )

1 1 3 8 0 ,0 12 5 7 5 0 ,0 23 9 0 0 0 ,0
2 3 1 0 0 ,0 13 5 2 0 0 ,0 24 2 3 0 0 0 ,0
3 6 8 5 0 ,0 14 1 4 1 0 0 ,0 25 2 5 0 0 ,0
4 9 6 0 0 ,0 15 4 3 0 0 ,0 26 8 1 0 0 ,0
5 1 9 2 0 0 ,0 16 3 8 0 0 ,0 27 9 0 0 0 ,0
6 8 3 0 0 ,0 17 1 1 2 0 0 ,0 28 5 8 0 0 ,0
7 1 4 3 0 0 ,0 18 5 9 0 0 ,0 29 3 3 0 0 ,0
8 4 6 8 0 ,0 19 9 9 0 0 ,0 30 1 1 0 5 0 ,0
9 8 1 0 0 ,0 20 9 5 0 0 ,0 31 4 4 0 0 ,0
10 7 1 8 0 ,0 21 5 1 0 0 ,0 32 6 1 0 0 ,0
11 9 1 0 0 ,0 22 7 0 0 0 ,0 33 7 9 5 0 ,0

Tabela 16.5. Curva chave na seção A

Cota (m) Q(m3/s) Cota (m) Q(m3/s)

3,50 2400,0 8,00 10000,0


4,00 3100,0 8.50 11000,0
4,50 3800,0 9,00 12000,0
5,00 4600,0 9,50 13000,0
5,50 5450,0 10,00 14000,0
6,00 6300,0 10.50 15000,0
6,50 7150,0 13,00 20000,0
7,00 8000,0 13,50 21000,0
7,50 9000,0 14,00 22000,0
656 Hidrologia

as linhas de igual probabilidade de inundação. Considere que a declividade da


linha de água ao longo da cidade seja de 50cm/km

7 - Quais são as medidas que poderíam ser estudadas para controle de


enchentes para um local onde a bacia tem de cerca de 3000 km2 com declividade
média do rio de 1 m/km. A cidade possui cerca de 30.000 habitantes onde cerca
de 5% encontra-se na área de inundação.

Figura 16.18, Problema 6.


Controle de Enchentes 657

REFERÊNCIAS

1- ECKSTEIN, O, 1958. Water resources development, the economics of project


damage in urban areas. Water Resources Bulletin. Minneapolis, v. 11,
n.2, Apr.

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flood damage to residential, commercial and industrial properties in Ca­
lifórnia. S t a n f o r d R e s e a r c h I n s t i t u t c .

3- HOYT, W.G., LANGBEIN, W.B. \955.Floods. Princeton: Princeton University


Press, Princeton. 469p.

4- JAMES, L.D. 1964. A time-dependent planning process for combining


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economic cosí of flood. Stanford University, Institute in Engineering
Economic Systems.

5- JAMES, L.D. 1972. Role of economics in píanníng flood plain íand use.
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Engineers. New York, v. 98, n.6, p. 981-92.

6- J O H N S O N , W. Phvsical and economic feasibility o f nonstrutural


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flood plain management" measures. D a v i s : I i v d r o l o g i c E n g i n n c e r C e n t e r .

7- KATES, R.W. 1965. Industrial flood losses: damage estimation in the


Lehigh Valley. University of Chicago, Department of Geography.
(Research Paper 98).

8- REZENDE, ti. e TUCCI, CE. M., 1979. Análise hidráulica e hidrológica


dos problemas de inundação urbana na cidade de Estrela, RS .
Relatório Técnico, p.29.

9- SIMONS, D.B. et al. 1977. Flood flows, stages and damages. Fort
Collins: Colorado State University.

10- TASK, 1962. Guide for the development of flood plain reguiation. Journal
of the Hydraulics Division. American Society of Civil Engineers. New
York, v.88, n.5, p.73-119,Sept.

11- TUCCI, C .e SIMÕES LOPES, M. 1985. Zoneamento das áreas de inundação:


rio Uruguai. Revista Brasileira de Engenharia Caderno de Recursos
Hídricos. Rio de Janeiro, v.3, n. 1, p.19-45, maio.
658 Hidrologia

12- U. S. Army. Corps of Enginners. 1976. Guidelines fo r flood damage


reduction. Sacramento.

13- WATER RESOURCES COUNCIL, 1971. Reguíation o f flood hazard areasto


reduce flood losses. Washington. Não paginado.
Capítulo 17

HIDROLOGIA ESTATÍSTICA

Robin T. Clarke

17.1 Conceitos de Hidrologia Estatística

17.1.1 Variabilidade Hidrológica

No estudo do ciclo da água, tanto nos aspectos hidrológicos como nos da


química da água, as inferências estatísticas mais freqüentes sobre seqüências
de medidas registradas, em intervalos discretos de tempo, são ilustradas a
seguir:

a) na tabela 17.1 são apresentadas duas seqüências de cheias anuais (vazão


máxima diária do período de 1934-1984) para dois locais da bacia do rio
ítajaí (Santa Catarina, Brasil). Estes dados são dos postos do rio Hercílio
em Ibirama (bacia de 3314 km2) e no próprio ítajaí em Apiúna (9242 km2).
Falhas na sequência, um fato comum nas sóries hidrológicas, interrompem a
curva. A característica semelhante das duas sóries é que as cheias extremas
ocorrem no Final dos dois anos de registro (1983 e 1984).

b) nas tabelas 17.2 e 17.3 são apresentadas as vazões médias mensais para os
primeiros 5 anos e para os últimos 5 anos de registro da série, para um posto
localizado num tributário do rio Uruguai, rio Lavatudo em Fazenda Mineira
(bacia de 1147 km2). Enquanto existe alguma evidência de um ciclo anual, com
média mensal tendendo para ser menor nos meses de novembro a janeiro, existe
muita variabilidade de ano para ano. O abastecimento de água que utiliza
esta vazão necessita considerar esta grande variabilidade, para evitar
racionamento no abastecimento.

c) na tabela 17.4 são apresentadas seqüências de medições de radiação solar,


radiação efetiva, temperaturas do bulbo úmido e seco e velocidade do vento e
direção para um período de 24 horas em novembro de 1990, registrado por uma
estação automática na cidade de Manaus, Amazonas. A seqüência é parte de um
grande conjunto de dados horários de vários anos, coletados com o objetivo de
estudar o balanço de energia dentro da Amazônia e como o clima é afetado pela
deflorestação. Os dados de radiação apresentam, em particular, uma clara
0 1 1 t i i " a / " » c>í~i A i^ n a r*m fn n ^ ÍA r*1 q t - i H c iA f*
660 Hidrologia

Tabela 17.1. Vazões máximas diárias anuais, em m3/s, de Ibirama (bacia


de 3314 km2) no rio Hercílio e Apiúna (bacia de 9242 km2) no rio Itajaí em
S. Catarina, para o período de 1934 a 1984.

Anos Ibirama Apiuna Anos Ibirama Apiuna


1934 * 1111 1960 487 1240
1935 1342 1914 1961 897 2160
1936 625 1507 1962 582 1550
1937 619 950 1963 510 1750
1938 797 1111 1964 * 648
1939 1250 1742 1965 708 1460
1940 271 1033 1966 998 1930
1941 263 918 1967 477 727
1942 566 881 1968 298 562
1943 649 1960 1969 872 1730
1944 236 495 1970 483 1020
1945 474 566 1971 1040 2030
1946 763 1280 1972 1010 2210
1947 592 1100 1973 1240 2310
1948 981 2250 1974 697 95 i
1949 438 702 1975 1406 2760
1950 281 1680 1976 801 1575
1951 556 909 1977 741 1640
1952 393 1620 1978 1002 2156
1953 726 1890 1979 1090 1847
1954 897 * 1980 * 3086
1955 969 3090 1981 589 927
1956 566 1220 1982 490 1539
1957 1300 936 1983 2475 4327
1958 526 1984 2125 4314
1959 520
Hidrologia Estatística 661

Tabela 17.2. V a zio média mensal, em m3/s, para o rio Lavatudo em Fazenda
M ineira (bacia de 1147 km2). Primeiros 5 anos de registro.

Mês Ano 1 Ano 2 Ano 3 Ano 4 Ano 5


Janeiro 1,83 13,90 0,95 32,17 9,87
Fevereiro 3,03 4,99 27,09 29,75 24,21
Março 3,15 8,21 457 16,06 10,16
Abril 2,16 3,15 258 7,20 2,78
Maio 12,28 1,70 1,60 8,18 21,26
Junho 33,36 16-55 355 78,18 19,51
Julho 34,38 11,87 5,73 50,46 20,22
Agosto 53,69 4-39 10,84 22,99 18,67
Setembro 43,52 6,83 22,72 9,02 40,38
Outubro 13,10 4,43 10,29 10,46 22,09
Novembro 7,44 9,91 3,90 3,51 10,31
Dezebro 4,83 1,27 4,14 6,07 24,41

Tabela 17.3. Vazio média mensal, em m3/s, para o rio Lavatudo em Fazenda
Mineira (bacia de 1147 km2). Últimos 5 anos de registro.

Mês Ano 45 Ano 46 Ano 47 Ano 48 Ano 49

Janeiro 5,95 13,40 3453 15,82 45,78


Fevereiro 20,60 957 37,85 15,68 31-56
Março 2650 358 859 15,12 10-59
Abril 27,60 21,78 52,66 46,40 21,26
Maio 18-20 24,10 118,90 4855 34.77
Junho 25,60 18,10 37,01 35,18 7,10
Julho 16,90 16,80 39,88 17,84 23,00
Agosto 2450 17,90 50,32 557 49,68
Setembro 23,60 26,00 32,05 4551 90.77
Outubro 2650 30,70 69,30 17,76 26,46
24,00 63,00 19,99 750 9,32
Novembro
13,72 9,79 9,14
Dezembro 4,83 2850
662 Hidrologia

Tabela 17.4. Registros de dados meteorológicos obtidos por estação automática


em Manaus para um dia de novembro de 1990. Os dados são totais ou médias
horárias, calculadas por medições com intervalo de 10 segundos. As horas se
referem ao horário de Greenwich.
SolR NetR We Dry Wspeed Wdir
-2,0 -26,9 23,0 235 0,2 80,5
-1.7 -19,4 23/2 23,7 0,4 64,9
-1.8 -2,1 23,1 23,4 01 585
-u -13,6 23,2 23,5 0,0 57,6
-1,4 -13,6 23,1 23,2 0,0 51,7
-0,8 -9,6 23,3 23,4 0,0 181,4
-0,4 -7,6 23,4 23,6 0,1 135,8
-0,9 -10,2 23,2 23,4 0,1 129,5
-1.1 -11,3 23,1 23,2 0,0 65,7
4,5 -4,0 23,3 23,4 0,0 80,2
58,0 30,3 23,7 23,9 0,0 134,2
128,4 76,8 24,0 24,7 0,1 74,2
289,7 186,4 24,4 26,0 0,3 87,8
639,9 424,5 25,1 28,2 0,7 97,7
542,0 355,7 255 29,1 0,7 93,2
508,8 333,6 255 29,7 0,9 72,8
695,1 455,2 25,6 30,8 1,0 56,3
682,8 442,2 25,7 31,7 0,8 91,9
520,6 330,5 25,6 31,7 0,9 595
394,3 235,5 25,7 31,8 0,5 78,0
207,0 92,5 25,3 31,2 0,2 94,7
29,8 -24,4 24,8 295 0,0 87,1
-2,4 -42,7 24,4 285 0,3 88,8
-2,4 -42,2 24,4 28,0 0,3 97,2
SolR -radiação solar em Watts/m2; NetR- radiação
efetiva em Watts/m2; Wet - temperatura do bulbo
úmido em graus Celsius; Dry -temperatura do
bulbo seco em graus Celsius; Wspeed: velocidade
do vento em m/s; Wdir-direção do vento em graus.

d) a tabela 17.5 mostra valores de 8 variáveis medidas em 30 diferentes


enchentes numa bacia de primeira ordem no rio Booro-Borotou, Costa do Marfim,
^drica (bacia de 1,36 km2). As cheias ocorreram durante o período de junho de
1984 a outubro de 1987. Diferente das tabelas anteriores, os dados dessas
observações estão espaçados em intervalos de tempo variáveis, coirespondente
irregularidade da ocorrência da precipitação. A primeira variável, volume
Hidrologia Estatística 00-í

de cheia foi ordenada de forma decrescente. As outras variáveis seguem a


rnesma secjii^ncia.

Tabela 11.5. Valores de 8 variáveis medidas em cada uma das 30 diferentes


enchentes ocorridas no rio Booro-Borotou, Costa do Marfim, África do Oeste,
durante o período de Junho de 1984 a Outubro de 1987. A área é de 1,36 km2.
664 Hidrologia

Todos os quatro exemplos mostram duas características: a) as observações


' são ordenadas no tempo; b) as observações, dentro de cada seqüência seguem
uma mesma tendência geral, com considerável flutuação na vizinhança da mesma.
Diferente das seqüências matemáticas, onde os pontos caem sobre curvas
suaves, as seqüências de observações hidrológicas mostram pontos espalhados
numa larga amplitude. A seguir serão descritos como os métodos estatísticos
podem ajudar a descrever o comportamento das variáveis hidrológicas, como a
flutuação irregular que segue uma tendência.

17.1.2 Modelos Estatísticos

Para várias aplicações hidrológicas é suficiente observar a tendência


apresentada pela variável plotada (qt), que consiste na soma de duas
componentes: a parte sistemática e a parte aleatória. A parte sistemática é
comumente representada pela função f(t), dependente do tempo. Esta função
usualmentc contém alguns valores fixos, que necessitam ser estimados com base
nos dados disponíveis. Estes valores são denominados de parâmetros e
representado pela letra Grega Ô que pode ter vários componentes, 0i,
ei,..,9k. Desta forma a função 6 expressa de maneira mais completa por f(r;0)
onde 0 é um vetor com k componentes.
A pane aleatória representa a flutuação com relação à componente
sistemática, usualmentc representada peío símbolo et ou at, onde o índice
muica que este componente também varia com o tempo. Desta forma qt, c a
vnriávei dc interesse, que pode ser espressa por

qt = f(i;0) f £t ([7,1)

Considerando as simplificações apropriadas sobre £i (discutidas depois),


equações como a 17.1 representam uma família de modelos estatísticos. É uma
família devido ao seguinte: a) a forma precisa da função f(.) necessita scr
definida; c b) os valores numéricos do parâmetro 9, juntamente com outros
p.irâmctros que descrevem a variável aleatória Et, necessitam scr
especificados. Normalmente, os problemas encontrados na modelagem estatística
de séries hidrológicas incluem o seguinte:

1) determinação da forma explícita de f(t;0) mais apropriada para um


modelo particular;
2) estimativa eficiente dos parâmetros desconhecidos 9 (e outros
parâmetros envolvidos na estimativa de et).

As tabelas de 17.1 a 17.4 apresentam exemplos de dados que modelos do


tipo expresso em (17.1) podem representar. Os 48 anos de cheias anuais da
tabela 17.1 para o rio Hercílio em Ibirama pode ser representado, num
Hidrologia Estatística 665

p r i m e i r o m o m e n t o , p o r u m m o d e lo s im p le s d o tip o q t = jj. + e t, o n d e q t é a c h e ia
anual no ano t A p a rte s is te m á tic a do m o d e lo , \iy é um p a r â m e tr o ,
in d e p e n d e n te do te m p o , o te r m o a le a tó r i o et, que pode ser p o s itiv o ou
n e g a tiv o , re p re s e n ta a f lu t u a ç ã o anual com re la ç ã o ao v a lo r f ix o (i.
E v i d e n t e m e n t e q u e s e h o u v e r m u d a n ç a s n a s b a c ia s o u o u tr o s f a t o r e s , c o m o
c o n s t r u ç ã o d e b a r r a g e m q u e a lte r a a te n d ê n c i a d a s c h e ia s a o lo n g o d o r e g is tr o
de c h e ia s , não é a p r o p r ia d o c o n s id e ra r que a p a rte s is te m á tic a é um a
c o n s ta n te ; a n á li s e s e s t a t í s t i c a in d ic a r ã o se a não-estacionalidade d e s te tip o
é im p o r t a n t e .
N o c a s o d o r e g i s t r o d e v a z õ e s m é d ia s m e n s a is (q t) d o o r io L a v a tu d o ,
a p r e s e n t a d a n a s t a b e l a s 1 7 .2 e 1 7 .3 , s e r á r a z o á v e l e x p l o r a r u m m o d e lo d o tip o

qt = a + (3i c o s (2 m /i2 ) + (32 s e n (27U/I2) + a (1 7 .2 )

A p a r t e s i s t e m á t i c a d o m o d e lo n ã o é m a is c o n s ta n te , m a s d e p e n d e d e t e
c o n té m tr ê s p a r â m e t r o s a , (3i e (32. D a m e s m a f o r m a q u e o a n te r io r , s e a
t e n d ê n c i a d a s m é d ia s m e n s a is m u d a r e m a o lo n g o d o p e r í o d o , a p a r t e s is te m á tic a
t e m q u e s e r m o d i f i c a d a p a r a le v a r e m c o n ta e s ta n o v a te n d ê n c i a . O b s e r v e q u e o
m o d e lo d a e q u a ç ã o 1 7 .2 n ã o te m e s ta c io n a l id a d e , j á q u e q t v a r i a s a z o n a lm e n t e
c o m r e í a ç ã o a u m v a l o r f ix o a . A s f u n ç õ e s d e c o s e n o e s e n o t r a d u z e m u m a
v a ria ç ã o c íc lic a s is te m á tic a , o b serv ad a na s a z o n a iid a d e do p ro c e sso
c lim á tic o .
N o s d a d o s d a t a b e l a 1 7.4 p a r a r a d ia ç ã o s o la r to ta l e e f e t i v a , o b s e r v a - s e
u m c o m p o r t a m e n t o m a is c o m p lic a d o p a r a o c o m p o n e n t e s is te m á tic o . D e n tr o d a s
h o r a s c o m c l a r i d a d e , a t c n d c n c ia é a p r o x im a d a m e n te h a r m ô n i c a , e n q u a n t o q u e
d u r a n t e a n o i t e o c o m p o n e n t e d o tip o d a e q u a ç ã o 17.1 é m a is a p r o p r ia d o .

1 7 .1 .3 M o d e l o s e s t a t í s t i c o s u s a n d o v a r i á v e i s e x p l i c a t i v a s

O s e x e m p l o s d is c u t i d o s a n te r io r m e n te u s a n d o o s d a d o s d a s t a b e l a s 17.1 a
7 ,4 u tiliz a ra m m o d e lo s e s ta tís tic o s com um c o m p o n e n te s is te m á tic o
r í a c i o n a d o c o m o te m p o t (q t). E s s e s m o d e lo s d e s c r e v e m o c o m p o r t a m e n t o e
m a v a r i á v e l e n ã o p r o c u r a m e s t a b e l e c e r o r e l a c io n a m e n to e n t r e d u a s o u m a is
a riá v e is h id ro ló g ic a s . F r e q ü e n te m e n t e é n e c e s s á r io d e fin ir e s te tip o e
r i a c i o n a m e n t o , q u a n d o is to o c o r r e o c o m p o n e n t e s is te m á tic o d o m o d e lo in c u e m
a riá v e is h id ro ló g ic a s . A s s im , p a r a e x p lo ra r o re la c io n a m e n to e n tre vazao
íé d ia m e n s a l q t e p re c ip ita ç ã o m en sal no m ês t, t - t , . . . , a f o r m a g e r a
quação 1 7 .1 6 m o d ific a d a p a ra

(1 7 .3 )
qt = f( p t,p t- l,...;0 ) + &

E x e m p l i f i c a n d o , s u p o n h a q u e q t é o e s c o a m e n to d e c h e i a d e u m ^ as
ite um pequeno in te r v a lo de te m p o t, e que p t, p t- r í—- s
666 Hidrologia

profundidades' da precipitação efetiva durante os intervalos t, t-i, .... Se


considerarmos que a bacia, quando saturada, funciona como um sistema linear
e, que qt contém um componente aleatório et, então o modelo relaciona qt e pt
da seguinte forma

qt= ho pt + h i pt-i + h2 pt-2 + .... hk pt-k+i +et (17.4)

A parte sistemática do modelo contém agora k parâmetros hi, i =0,l,„k-l


(ordenadas do hidrograma unitário, definido no capítulo 11). Pode-se
expressar de forma geral o modelo estatístico com variáveis explicativas da
seguinte forma

qt = f( (pt); (Et); (st);...; 0) + a (17.5)

tendo vários conjuntos de variáveis explicativas (pt)= (pt, pt-i, );


{Et)={Et,Et-l... J; (st) = (st —} que, por exemplo, pode representar
precipitação, evaporação potencial, estado de umidade do solo entre outras.
Na família de modelos estatísticos contendo variáveis explicativas, a
função linear é o tipo mais simples, como na equação 17.4. Seja qual for a
forma da função f(.) as variáveis explicativas podem ser causativas ( no
sentido que precipitação e estado de umidade do solo determinam o escoamento
superficial) ou elas podem ser simplesmente variáveis úteis para a estimativa
de qt sem, necessariamente, implicar uma relação causativa. Por exemplo,
durante um longo período de recessão, a vazão qt pode ser uma boa indicadora
do valor de qt+l, na falta da precipitação. Portanto, usando um modelo da
forma qt+1 = 0 qt + a , qt não é uma variável causativa de qt+i.

17,1.4 O componente aleatório a

Até agora foi mencionado muito pouco sobre as propriedades do a, termo


considerado como aleatório, contudo o mesmo possui uma distribuição de
probabilidades. Considerando o seguinte:

a) que o seu valor médio (valor esperado ou Esperança, identificado pelo


símbolo E) da variável aleatória a é zero, isto é E[a]=0;

b) para a maior parte deste texto consideramos que a é estatisticamente


independente; ou seja, que a distribuição de probabilidade conjunta
P(ai,a2,a3,...), para cada conjunto de a fica

P(ai,a2,a3,..) = P(ai)j>(a2)JP(a3)„. (1 7 .6 )

onde P(ai) é a distribuição marginal de ai. Assim, usando o modelo qi


Hidrologia Estatística 667

= |i + a para a vazão média de enchentes da tabela 17.1, a simplificação


de independência estatística implica que nenhuma informação será perdida
em alterar a seqüência no qual os valores de qt são escritos. A
simplificação de independência estatística é muito forte, e a
verificação disso corresponde a uma parte importante do processo de
selecionar um modelo estatístico apropriado, ajustá-lo (estimativa dos
seus parâmetros) e verificar se as simplificações do modelo são válidas
para um conjunto de dados em estudo;

c) ao considerar que (a ) tem a mesma distribução de probabilidade,


admite-se que as distribuições marginais P(ai), P(et2),..tenham a mesma
forma matemática, com os mesmos parâmetros. Noinício do estudode
modelagem é necessário adotar uma distribuição emparticular. A análise
deve verificar se a escolha inicial da distribuição é apropriada para os
dados em estudo.

Em resumo, o modelo estatístico tem parâmetros de dois tipos: aqueles


associados com a parte sistemática do modelo e aqueles associados com uma
distribuição de probabilidade em particular que usa um componente aleatório
et.

17.1.5 Parcimônia na construção de um modelo estatístico

Tem sido apresentado que cada modelo estatístico contém alguns


parâmetros associados com o seu componente sistemático e outros associados
com o componente aleatório. Se formos pródigos no uso de parâmetros, ou seja
usando um modelo com número de parâmetros igual ao número de dados, veremos
que o modelo se ajusta exatamente aos dados: o componente sistemático passará
por todos os pontos dos dados. Na prática, contudo, esse modelo terá um
desempenho muito ruim nas aplicações discutidas no item seguinte.
Um princípio cardinal na construção de modelos estatísticos, em
hidrologia como em outras ciências, é que devemos usar o menor número de
parâmetros necessários para descrever adequadamente as características dos
dados. Essencialmente, o modelo é como um resumo de um documento técnico, se
o resumo é um documento longo o mesmo não atinge a sua finalidade. De outro
lado, se um modelo estatístico falha para descrever características dos dados
a serem modelados, o modelo não satisfaz, tanto quanto o resumo do relatório
técnico não satisfaz se é condensado de tal forma que omite as principais
conclusões. Felizmente, a teoria estatística fornece procedimentos
quantitativos que permite garantir, em muitos casos, se a inclusão de um
parâmetro adicional acrescenta apreciável informação, já incluída dentro de
uma estrutura particular de modelo.
Parcimônia, na construção de um modelo estatístico, é o princípio de
668 Hidrologia

limitar os parâmetros a um número pequeno que adequadamente resuma as


características dos dados.

17.1.6 A lguns usos hidrológicos de modelos estatísticos

Tem sido usado o termo construindo para descrever o processo de


formulação de modelos estatísticos de dados hidrológicos. Como colocar
tijolos, formulação de modelos é um processo iterativo; iniciando com um
modelo escolhido que, por inspeção gráfica dos dados ou de outra forma, pode
representar razoavelmente suas principais características. A seguir,
determina-se onde o modelo falha nas suas intenções; isto é realizado
plotando os valores ajustados pelo modelo e comparando com os valores
registrados. As discrepâncias entre os valores ajustados e os observados dará
idéia como o modelo escolhido deve ser modificado. Alterando o modelo da
melhor maneira é possível continuar o processo iterativo até que nenhuma
melhora seja encontrada.
Cíaramente o ajuste de modelos estatísticos aos dados hidrológicos é um
processo que exige constantes iterações entre o modelador e o seu computador.
Esta iteração traz dois perigos:

- modelagem pode ser um objetivo em si só, o modelador perde o sentido


prático para o qual o modelo foi originalmente desenvolvido;
- o modelador pode acreditar que seu modelo é a realidade hidrológic.i.
ao contrário de ser uma grande simplificação dc algo muito mau
complicado. Em casos extremos, observações de campo do comportamenic
hidrológico que não se aproximam das predições do modelo podem scr
desconsideradas; mas frequentemente estas aberrantes observações são u
realidade, indicando sérias limitações no modelo estatístico.

No restante deste item serão apresentados alguns exemplos de objetivos


para os quais modelos estatísticos foram usados. Esta lista não é exaustiva,
mas serve para introduzir aplicações que serão discutidas ao longo de todo o
capítulo.

a) Estimativa de enchentes com um período de retomo T; Os dados da tabela


17.1 são as vazões máximas médias diárias observadas em dois locais no rio
ítajaí, para cada ano do período 1934-84 (alguns anos com falhas foram
omitidos). Chame a vazão máxima média diária de cheia anual, A cheia anuai
com freqüência de uma ocorrência, em média, em T anos, é uma medida da
ocorrência da cheia, de interesse dos engenheiros que dimensionam o vertedor
de uma barragem; para planejamento preocupado com o desenvolvimento de
residências; para engenheiros na construção de estradas em vales de rios;
para industriais ao considerar um local de uma nova fábrica e estações de
Hidrologia Estatística

energia.
Usando um modelo da forma qt = + et com uma distribuição de
probabilidade apropriada P(&) para o componente aleatório et = qt - \i, pode-
se observar que \i é a média anual das enchentes, considerando que E[et]=0.
Uma estimativa Xo da cheia anual com período de retomo T anos pode ser
obtida pelo seguinte procedimento: 1) estime por procedimentos eficientes os
parâmetros da distribuição P(.); 2) determine se a distribuição ajustada
representa adequadamente a seqüência de cheia anuais, se isto não ocorrer,
modifique para tanto; 3) quando um modelo satisfatório for identificado,
resolva a integral

00

f (q; 9)dq ^ 1/T (17.7)

Xo

sendo f( ) a função probabilística de qt.

b) Em países desenvolvidos, registros de enchentes tão longos como os do rio


Hercílio em Ibirama e o rio Itajaí em Apiuna são exceções e não uma regia,
mesmo que os registros existam por muitos anos, existem falhas que destroem
sua continuidade. Um engenheiro ao projetar um vertedor de uma barragem, ou
um planejador regional ao descobrir que tem uma série pequena de registros
disponíveis, necessita explorar se existem registros longos de cheias anuais
para outros locais em bacias vizinhas. Se existem registros longos de
enchentes na vizinhança é possível transferir informação para o local de
interesse, ou seja, usando estes registros para adicionar informações sobre
a freqüência das cheias extremas. Várias possibilidades existem para efetivar
esta transferência: um procedimento é o de usar uma distribuição bivariada
apropriada para as enchentes nos dois locais e calcular a distribuição e
probabilidade condicional para as cheias anuais no local de registro curto,
conhecida as enchentes no local de registros longos.

c) Um problema que é ainda mais crítico que o descrito no item b, oconre onde
não existem registros na vizinhança do local de interesse. Um proc imento
então usado é o de reunir vários registros de enchentes de uma região e
buscar relações estatísticas entre características de enchentes (norm men ,
cheia média anual) e variáveis que descrevem as características da ama os
locais de registro. Estas variáveis explicativas podem incluir m i as
declividade do canal, percentagem de áreas cobertas por superfície e gua,
medidas do regime de precipitação e assim por diante. ti os
relacionamentos estatísticos, conhecidas as variáveis explicativas para
Hidrologia
670

registro, é possível estimar as características da cheia (<? ãPítuI° I5)-


, . „ , , uso doméstico, uso
d) Planejadores preocupados com o supnmento de água asse ^ Q
agrícola, geração de energia ou indústria, n e c e ssit^ e$te 4ment0
suprimento é suficiente e confiável. Isto nao sigmfics» _ , _
nunca deve falhar, mas que a freqüência de falhas é falh arão é
das falhas, quando ocorrerem serão curtas e que a m agJ , , * . . ,
? . . . , . .Rodeio estatístico do
muito grande. Se a água é retirada do no, um P __-
, r unia torma na qual o
comportamento do escoamento através do ano romece 1 . _
, . , , , • i -
planejador pode explorar, por simulaçao, a frequencí^ ç — na Qual as falhas
ocorrem para uma dada regra de retirada. , , , .
~ t •j j . . rnodelo estatístico do
Com este problema o planejador pode construir um , * .
. , , i + ^ harmomcos serão
tipo da equaçao 17.2 (provavelmente mais termo5* . ,
x \ r\ , 1 1 .a • , Xri° O USO de vazões
necessários). Dependendo das circunstancias será necesS^ . . , .
... „ , A vánas alternativas de
medias para penodos menores que um mes; e se existem . , ,
. . i J i ,.r , . . , ^n v o lv er um modelo
locais de retiradas em diferentes nos, será necessáno âeh
u. • , , , . , ..., , . , , escoamento cm cada
multivanado que leve em conta a vanabilidade sazonal do
i , , c i A .A . ^oamento aumentar e
local de retirada e romeça alguma tendência para o es^
diminuir.

e) Os exemplos prévios analisaram modelos estatísticos d°. cscoarncn °*


• x -j
regiões scmi-ándas, o escoamento* é, esparso e muitas
• vc^^Cs , intermitente;
. ! vpara
avaliar o potencial de uma região quanto à disponibilí^UScníIo pi^C'í:Uta<*a°
para agricultura, não existe, normalmente outra altcmativ^ scn o a 0 uso dc
precipitação diária que é mais facilmente disponível c n °S ° n^as'
Modelos estatísticos, para a ocorrência de prccipitaçí*7 1 a ° dc scu
total, quando a mesma existe, têm sido desenvolvidos pa™ ° C ^.u 0 dc
probabilidades de seqüências de dias secos e úmidos; ad0^ 0 simP 1 lcaÇõcs
razoáveis sobre a capacidade de umidade do solo e taxas à? e^ aP^ra^ 0’
provado que é possível estimar as probabilidades de disÇcim 11 a e de ^>ua
no solo, para um tempo normal de plantio, que garant^ 0 crescimení0 da
cultura em estudo. Modelos de precipitação deste tipo P^rtenccm a uma
importante classe de Modelos Lineares Generalizados (G L ^ S'*

0 Modelos de formulação geral (equação 17.1) podem ser uSa. ° S para obter a
previsão a curto prazo de níveis de enchentes, os quais venficar se
os avisos de cheias são necessários. Previsão são estimatívaS d° escoa™enío
que ainda não chegaram a seção de saída, resultante PreciPltaÇã°
ocorrida. O tempo de antecedência para o qual a previsã^ pode ser obtida d
limitado pelas características de resposta da bacia m o ^ lada* ^ a Prática*
podem ser necessárias previsões de precipitações que aind3 cairam•
Um importante aspecto dos modelos estatísticos na pr£vlSa° de encdentes
é a possibilidade de obter-se intervalos de previsões P ^ a estimativa de
Hidrologia Estatística 671

futuros níveis de enchente; ou seja, intervalos que têm uma probabilidade


específica do nível da enchente estar contido. O cálculo desses intervalos é
teoricamente possível quando um modelo do tipo 17.1 foi ajustado com uma
consideração válida sobre o componente aleatório, como especificado no item
17.1.4. Um intervalo de confiança baseado na verossimilhança pode ser
calculado para o parâmetro do modelo 0, e sua região de confiança pode, em
teoria, ser usada para derivar os intervalos para a previsão de vazões
futuras.

g) Todos os exemplos acima referem-se ao planejamento e operação de sistemas


de recursos hídricos nos seus aspectos quantitativos, discutidos em termos da
modelagem do relacionamento entre variáveis hidrológicas como qt e tempo, ou
entre qt e variáveis explicativas. Quando à qualidade da água também deve ser
considerada, o número de variáveis resultantes da análise química e biológica
é grande. Uma importante atividade preliminar é a preparação de um resumo
mostrando as características essenciais de cada variável. Enquanto os olhos
humanos podem absorver as características de 10 números, para 100 números é
muito difícil esta análise, muito menos para 1000. Neste capítulo são
discutidas as técnicas apropriadas para resumir um grande conjunto de dados,
ilustrandu suas principais características.

17.1.7 Programas computacionais para ajuste rápido de modelos estatísticos

Procedimentos gráficos é um componente importante no ajuste de modelos


estatísticos para dados hidrológicos. Seguindo o desenvolvimento moderno dos
pacotes estatísticos de cálculo como GLIM, GENSTAT e iMATLAB para uso
iterativo com computadores pessoais, a análise gráfica tem resultado numa
técnica muito mais flexível para exame de dados. O uso de procedimentos
gráficos tem uma participação central nos métodos descritos neste capítulo e
os leitores são orientados para familiarizarem-se com os pacotes mencionados.

17.2 Ajuste de distribuições estatísticas

17.2.1 Modelo nulo

Neste item é considerado um modelo simples no qual a variável yt é


expressa na forma

yt = \x + et (17.7)

Admite-se que o componente aleatório do modelo satisfaz a condição


E[et]=0; E[ei2]= a 2; e E[aes] =0 para qualquer t * s. É realizada uma
672 Hidrologia

simplificação importante, onde yt (e em conseqüência et) são estatisticamente


independentes, todos com a mesma distribuição de probabilidade. A ênfase do
capítulo é sobre a estimativa dos parâmetros do modelo para diferentes
distribuições de yt em problemas onde os métodos estatísticos são usados para
responder questões sobre a freqüência de eventos hidrológicos extremos. O
modelo simples (equação 17.7), que não inclui variável explicativa, ou seja
variáveis que explicam, num maior ou menor grau, como yt varia, é chamado de
modelo nulo. No modelo nulo, cada dado de yt tem o mesmo valor esperado jx.
Quando a variável explicativa está incluída, o valor esperado de cada yt
será diferente, dependendo dos valores das variáveis explicativas xt.
Nos próximos capítulos são apresentados modelos mais complexos onde a
componente sistemática p, do lado direito da equação (17.7) é substituída por
formas envolvendo variáveis explicativas. Mais tarde neste capítulo é
considerado o caso onde jx é substituído por uma combinação linear de
variáveis explicativas. Modelos com as simplificações mencionadas
(independência estatística de yt, onde todos os yt têm a mesma distribuição
de probabilidades) são apropriados para um grande número de problemas
hidroidgícos, particuíarmente para aqueles em que yt são o maior e o menor
valor de um ano hidrológieo. Assim, neste capítulo, serão descritos modelos
estatísticos para vazão máxima anual, vazão mínima anual, precipitação anual
e para a precipitação máxima anual de duração de 30 minutos. Observa-se que a
vazão total anual pode ser ou não considerada, com segurança,
estatisticamente independente de ano para ano. Numa bacia pequena, de
primeira ordem, com resposta rápida, a vazão total anual segue um regime
anual e a consideração de independência anual é justificada. Contudo, vazão
média anual para uma grande bacia com grande capacidade de armazenamento para
água subterrânea provavelmente apresentará correlações de ano para ano. Os
modelos apresentados neste capítulo não serão apropriados.

17.2.2 A função de verossimilhança

Para fixar idéias, suponha que yi, y2, ...yN são vazões máximas (para
cheias anuais) observadas numa seqüência de anos. Os dados do rio Itajaí em
Apiuna (tabela 17.1) são dados típicos desta função. A simplificação de
independência é válida, e não existe necessidade para a seqüência ser
contínua, ou seja a ordem das observações não é importante. Se, contudo, for
necessário em alguma fase do estudo verificar se a resposta da bacia tendeu a
mudar ao longo do registro, talvez como conseqüência do uso da terra, então a
ordem na qual as observações ocorreram será crítica para a análise
estatística.
Considere que a distribuição de probabilidade, comum a todos os yt, é
f(y;Q), onde 9 é um vetor contendo um pequeno número de parâmetros,
normalmente dois ou tres. A quantidade jj. da equação (17.7) será função de 9
Hidrologia Estatística 673

já que por definição o valor esperado do operador E[.] : fica

00

E[yt] f(y;0)dy = n (17.8)


-00

onde a integral será função dos parâmetros 9. Como yt é estatisticamente


independente, a probabilidade de obter as observações yt é

f(yr.0).f(y2;0)- - f(yN'-0)dy i-dy 2 ■ - dyN (17.9)

assumindo que yi, y2, ... yN é uma amostra aleatória de uma população
infinita. Conhecida as observações yt, a função de verossimilhança
L(0;yi,...yN) é definida por

N
U9;yi,...yN) - \\ f(y ;e) (17.10)
t= i

ou seja, a função de verossimilhança é proporcional a probabilidade de obter


as dadas observações, considerada como uma função dos parâmetros
desconhecidos 0. A função de verossimilhança é particularmente importante
porque, quando o modelo estatístico é correio, a função L(0) contém todas as
informações dos dados. Contudo, modelos diferentes resultarão em funções de
verossimilhança diferentes e uma das tarefas necessárias é a de encontrar o
modelo mais apropriado para representar as características dos dados
disponíveis. Algumas situações ocorrerão, nas quais não será possível
concluir que um modelo é mais apropriado que outro (ou outros). Neste caso,
cada modelo, igualmente aceitável, terá sua própria função de
verossimilhança.
Tendo definida a função de verossimilhança é apresentada a estimativa
dos parâmetros 9. Para tanto é considerada a superfície definida por L(0)
(onde, para simplificar a notação, o termo yt da expressão de verossimilhança
não é considerado) à medida que 0 varia. Evidentemente que para diferentes
valores de 0, resultam diferentes valores para L(0). De todos os valores
possíveis de 0 pode-se intuitivamente esperar que o valor de 0 mais
apropriado será aquele que maximiza a probabilidade dos valores observados de
yt, ou seja, que maximiza a função de verossimilhança L(0). Formalmente, para
uma função de verossimilhança L(0) de uma função de k parâmetros 0, a
estimativa de máxima verossimilhança 0 de 0 é definida como o valor de 0 para
o qual L(0) £ L (0), para todo o 0. Na equação 17.10 pode-se observar que
674 Hidrologia

L(0) é um produto de termos como f(yt;0). Utilizando logarítmicos de L(0)

N
/(0) = £ log f(yt;9) (17.11)
t= i

Os valores de 0 que maximizam /(9) também maximizam L(9). Os valores de


A
0 que maximizam L(0) e /(0) podem ser obtidos derivando e resolvendo as
equações

5/ dlogL 1 5L
---- = ----------- = ------------= 0 (17.12)
50 50 L 50

Estas equações em geral não têm solução explícita para 0 (a solução não
pode ser encontrada na forma q igual a uma expressão contendo somente os
valores observados de yt). Como conseqüência será necessário resolver as
equações iterativamente; alguns exemplos são apresentados a seguir. Quando o
vetor de parâmetros 0 têmapenas dois ou três elementos, é recomendável píotar
as superfícies L(8) ou /(0) por métodos que são demonstrados abaixo.

Ajuste da log-normal de dois e três parâm etros pela máxima verossimilhança

Log-normal com dois parâmetros- A distribuição log-normal de dois parâmetros


de yt é
1
f(y;|i,a2) = — ( log y - y. )2 (0 s y <a>) (17.13)
2a2

O logaritmo da função de verossimilhança, /(ja,o2) na qual os dois


parâmetros anteriormente definidos por e=[01,92] são agora denominados de
01=ji e 02=a2, fica

l(ii,a2) = - N log, a - (1/2) log (2n) - Y log yt ------T [


L 2o2 L L
t
log yt - m- J2
do qual
Hidrologia Estatística 675

dl
= O resulta em — ) Qog yt - p,)2 = 0
ãíi a2 L

a/ N 1 r
= 0 resulta em - - + — ) (log - ^)2 = 0
ôa a
« f
a3
-5 fc-*

Estas duas equações têm a solução explícita

|i = £ (log yt)/N

a “ = Z (log yt - A r / N .

Os dados do rio Itajaí em Apiuna foram apresentados na tabela 17.1.


Utilizando estes dados para ajuste da log-normal obtém-se p =7,27 e a 2^ 0,253
(a= 0,50). Para observar se a distribuição log-normal é uma boa representação
da seqüência de cheias anuais para Apiuna, pode-se utilizar um procedimento
gráfico, onde uma sequência ordenada de valores são plotadas contra os
valores esperados da ordem estatística da distribuição normal. A plotagem é
realizada entre a seqüência ordenada dos logaritmos dos valores observados de
Apiuna com os quantis da distribuição normal correspondentes à probabilidade
calculada por P = (t-0,375)/(N+0,25), onde t é a ordem e N o tamanho da
amostra.
Se os registros de cheias anuais de Apiuna são bem representados por uma
distribuição normal a seqüência de logaritmos das cheias devem ter uma forte
tendência linear com os valores P. Na figura 17.1 pode-se observar que à
tendência 6 linear.
A distribuição log-normal ajustada para os registros de cheia com dados
de Apiuna têmdois parâmetros p e a. Uma forma modificada desta distribuição,
que oferece maior flexibilidade na modelagem de dados, utiliza três
parâmetros, denominados por p, a e a, ou seja

f(y;p,a,a)= exp ------(log [y-a] - p)2 ( a í y <co) (17.14)


(y-ajai^re 2a2

Considere que o parâmetro a é fixado e conhecido, denominado por ao.


676 Hidrologia

Usando a variável yt* = yt - ao o cálculo das estimativas de fio e ôo é obtido

|io = I (log yt*)/N

a 2 - n * A \2 / vr
ao = E (log yt - |i{)) /N

O valor correspondente do logaritmo de verossimilhança /(po, ôo, ao)


para este valor de ao é

1
/(A0.ô02>ao)= -Nlog ò0 - Nlog(2rc)/2 -Zlog y * - I(l°g y t* - Ao)2 (17-15)

Fazendo variar o valor de a, al,a2,.„an é possível construir uma função


de verossimilhança condicional, mostrando como /(jlo,ôo?ao) varia com ao. O
valor de ao para o qual a verossimilhança condicional tem sua máxima define a
estimativa de verossimilhança de ji e a. Ilustrando com a seqüência de valores
de cheias anuais do rio Hercílio cra Ibirama, foram testados valores de a
variando de 0 a 200, de 50 em 50. Na tabela 17.6 pode-se observar os
resultados, onde o máximo obtido foi a = 0. Este valor pode ser verificado,
pesquisando-se na vizinhança de a=0, já que o intervalo de 50, utilizado para
a pode ser grande. Observa-se que a estimativa de ao deve ser menor do que o
valor mínimo y(l) da amostra, para que yt não seja negativo.

9,0-

8 ,0 -
O
CJ»
o

7,0
a o d o o

- 3,0 0,0 3,0


Desvio do distribuição normal

Figura 17.1. Distribuição das vazões de Apiuna.


Hidrologia Estatística 677

Tabela 17.6. Ajuste da distribuição log-normal de três parâmetros para uma


seqüência de vazões máximas anuais (vazões máximas diárias anuais) para o rio
Hercílio em Ibirama: 51 anos de registro, faltando 3 valores. Os logaritmos
da verossimilhança calculados para a série de valores do pârametro a, que
define o limite inferior da distribuição.

a logL
0 8,594

a logL
50,00 4,437

a logL
100,0 -0,4701

a logL
150,0 -6,628

a logL
200,0 -15,56

Tendo a estimativa dos parâmetros do modelo log-normal, é possível


estimar as cheias anuais com período de retomo de T anos pelo cálculo de yo
que satisfaça a equação seguinte

yo
1
exp — [log y - (1]2 dy = 1 - T-1 (17.16)
A
o 2Ô1

no caso da distribuição com dois parâmetros (com três parâmetros, teríamos


log(y-a) em yez de y em (17.16)). Se, por exemplo, a cheia desejada é T=100
anos, que corresponde à probabilidade de P = 1/T = 0,01, pode-se utilizar a
tabela da distribuição normal padronizada - ou, de forma mais conveniente,
uma rotina de computador - para obter a abscissa que define uma probabilidade
cumulativa de 0,99 ou 99%. Para os dados de Apíuna, já vimos que \i = 7,27
m3/s, ô = 0,50 m3/s; a tabela da distribuição normal padronizada (com média
zero, variância um) mostra que a abscissa 2,32 define uma probabilidade
cumulativa de 0,99. A distribuição log-normal ajustada, usando os dados e
Apiuna, e transformada nesta distribuição pela transformação x=(log y - pOA*-
678 Hidrologia

Portanto, (log Y0- jl)/â = 2,32, log Y0=2,32 x 0,5+ 7,27, e o valor de Y0 é

exp(2,32 x 0 5 + 7,27)= 4582^5 m3/s

17.23 Métodos dos Momentos

O método dos momentos vinha sendo mais utilizado pelos hidrólogos


porque é computacionalmente mais simples de ser calculado, antes do advento
de programas estatísticos generalizados, mesmo sabendo que a estimativa por
este método é inferior que a da máxima verossimilhança. Com as facilidades
computacionais atuais, o método dos momentos pode ser justificado apenas em
casos muito especiais; a simplicidade do cálculo não é mais uma justificativa
aceitável.
Isso não quer dizer que o método dos momentos não possa ser utilizado em
estágios intermediários de estimativas. Normalmente o método da
verossimilhança requer a solução de equações por métodos iterativos que
exigem estimativas iniciais dos parâmetros, seguido de processos iterativos
da máxima verossimilhança; o método do momentos é útil para iniciar essas
estimativas.
Os textos de hidrologia anteriores punham considerável ênfase na
estimativa pelo método dos momentos. Neste capítulo, contudo, a ênfase das
estimativas é no método da máxima verossimilhança. O método dos momentos
consiste em igualar os momentos dos dados com os momentos da distribuição de
probabilidades adotada. Assim, se y, s2 são a média e a variança da seqüência
de dados yi, y2, .. yn, estimativas 01 e 02 de uma distribuição dc dois
parâmetros f(y; 0i, 02) são estimadas, usando o métodos dos momentos pela
solução das duas equações seguintes para 01 e 02;

J.O, y «y;0i-02)dy (17.17)

- jl, digamos, que será função de 0j e 02; e

' CO
s (y - n)2 f(y; e j.e ^ dy (17.18)
-0 0

o , digamos, que também será função de 9j e 02; onde a distribuição de


probabilidades tem três parâmetros, o terceiro momento é calculado dos dados
(=2(yt-y) 3 /N), pode ser igualado ao terceiro momento e calculado por
Hidrologia Estatística 679

00

(y - n)3 f(y; ©1; 02; ®3)dy

O ponto essencial é que uma equação é obtida igualando os momentos da


amostra com os momentos da distribuição para cada parâmetro a ser estimado.
Em casos particulares, a estimativa pelos momentos e pela verossimilhança são
equivalentes. Como estas estimativas não são geralmente iguais é demonstrado
pela estimativa de e o para a distribuição log-normal. As estimativas dadas
pelo método de momentos (veja equações 17.17 e 17.18) são obtidas pela
solução das equações

y = exp (p. + a^/2)

= exp (2jx + o^).[exp (o^) -1]

A solução é

í = d/2) ln [y2/ (l+s2/y2) ]

estas estimativas são diferentes das obtidas pela máxima verossimilhança.

17.2.4 As distribuições Gamma de dois e três parâmetros

A distribuição Gama de dois e três parâmetros tem sido largamente


utilizada em hidrologia com a finalidade de modelar as freqüências de cheias
anuais. Usando os símbolos ji e k (substituindo 01 e 02), a distribuição de
dois parâmetros pode ser escrita como

f(y;H.,K) = (kl\i)K y * '1 exp [-Ky/p]/ T(k) 0^y<oo (17.19)

onde a (i = média e; |I2/ k = variância ( O coeficiente de variação é 1/ / k).


Dada uma amostra (por exemplo de cheias anuais) que são estatisticamente
independentes, o logaritmo da verossimilhança pode ser escrito por
680 Hidrologia

= N k Íog(x/|i) + (K-l)Xlog yt - Nlog T(k) (17*20)

As equações 3//3|í ^G, dljô k=0, podem ser resolvidas numericamente


obtendo-se as estimativas de ji e k, ou seja
A
ja = y (17.21)

a io g r ( K ) . ____
log K --------------- = log y - log y (17.22)
ÕK

A quantidade d log F( k)/3 k é a função digama, que pode ser facilmente


programada. Observamos que a equação (17.22) somente envolve k; podemos
resolvê-la pelo uso iterativo da equação;

*i+1 = tc. [In k. - 3 ln F(k)/3 kk;=k ] / (In y - ETy).

No caso da distribuição Gama com três parâmetros,

f(ym.Kr) = (K/p.)K(y-a)K *exp [-K(y~a)/|i] / T(k) a > y < co

A estimativa dos parâmetros é um pouco mais difícil. Temos várias opções


para calcular as estimativas; uma delas é o uso do método de verossimilhança
condicional já empregado com a distribuição log-normaí com três parâmetros.
Isto é, usamos uma seqüência de valores fixos do parâmetro a, digamos
ao,al,a2,.t..an( e para cada valor ai (i=í,..n) nessa sequência, calculamos
estimativas dos parâmetros p, k pela resolução das equações (17.21) e
(17.22). Substituímos estas estimativas na expressão (17.20) para
conseguirmos /(jx,k; ai). Assim conseguimos a relação entre /(jx,íc;ai) e ai;
graficamente, ou pelo cálculo, podemos definir o valor a na seqüência
ai(i=l,..ji) que maximiza /. Esta é a estimativa da máxima verossimilhança do
parâmetro a; usando este valor de a, calculamos as estimativas jx, k
correspondentes. Como no caso com a distribuição log-normal com 3 parâmetros,
observamos que a estimativa do parâmetro a não pode ser menor do que o valor
mínimo dos dados yl,y2„...

17.2.5 Escolha entre distribuições log-normal e gamma

De forma geral as distribuições Gamma e Log-normal são similares na


forma da assimetria, com uma longa cauda superior. Esta é a característica
que pemute as distribuições representarem as cheias anuais e outros extremos
Hidrologia Estatística 681

hidrológicos, onde a assimetria esta invariavelmente presente. A pergunta que


normalmente aparece é qual distribuição é mais apropriada? Atkinson (1984)
apresentou um método para esta avaliação, que é o seguinte:

a) ajuste o modelo log-normal aos dados (com base numa amostra N


estatisticamente independente);
b) usando o modelo log-normal ajustado gere 100 amostras de tamanho N;
c) para cada amostra gerada calcule o máximo da função de log-
verossimilhança considerando: l)modelo log-normal (LN); 2) considerando
o modelo Gamma (G);
d) plote LN contra G, mostrando no gráfico os valores de LN e G para a
seqüência de dados históricos:
e) repita as seqüências a até d ajustando a distribuição Gamma no lugar
da log-normal.

Para explicar a interpretação destes pontos, considere primeiro que os


pontos (LN,G), derivados de N valores observados caem dentro da nuvem de
pontos gerados (100 amostras de N valores). Neste caso não é possível
distinguir entre a log-normal e a gamma. Suponha, no entanto, que quando as
100 amostras da distribuição Log-normal foram geradas, os valores maximizados
da log-verossimilhança da distribuição gamma para os valores observados são
grandes com relação à LN, fazendo com que os valores observados caiam longe
da nuvem de pontos gerados. Isso indica que o modelo gamma é mais apropriado.
Finalmentc, suponha que, quando as 100 amostras simuladas foram geradas pela
distribuição gamma, os valores maximizados do log-verossimilhança de LN são
grandes com relação ao da máxima verossimilhança do logaritmo G, fazendo com
que os pontos observados caiam fora. da nuvem dos 100 pontos. Isso indica que
a Log-normal é a distribuição mais apropriada.

17*2.6 Distribuição Gumbel

A distribuição é definida por

f(y: cc,u)=a exp[-a(y-u) - exp{-a(y-u))] <y <» (17.23)

:om parâmetros a e u; sua média e variância são u+y/a e tx-/6ot2


espectivamente, onde a constante de Euler é aproximadamente 0,577. Como a
og-normai e a distribuição Gama, têm uma assimetria positiva. Dada uma
mostra y2, y2—yN* a de verossimilhança é dada por

(17.24)
/(u,a)= -N log a - a E(yr u) - Iexp[-a(yt-u)]
682 Hidrologia

das derivadas d l / d u=0 e d l/d c c = Q obtém-se

Xexp[-a(yt-u)] = N (17.25)
e
N /a - I(y t-u) + I(y t-u)exp [-a(yr u)] = 0 (17.26)

Pode-se escrever estas equações numa forma mais simples

1/a =y - I yt exp (-a yt) /£ exp( -a yj) (17.27)


e
exp(-a u) = £ exp (-a yt) / N (17.28)

Estas equações não têm solução explícita, mas podem ser resolvidas pelo
método de Newton-Raphson, utilizando a solução dos métodos dos momentos como
primeira estimativa. Nota-se que a primeira equação não envolve o parâmetro
A
a. Obtida a solução de a por esta equação, podemos substituí-la em (17.28)
para obter a estimativa de u.
Al tem ativamente, pode-se resolver as duas equações diretamente pcJo
método de Newton-Raphson. Considerando as estimativas de u,a obtidas pelo
método de momentos como uo e Oo, estes valores podem-se alterar para uo+Au e
Cto+Aa, onde Au e Aa são soluções das duas equações lineares seguintes:

al l Au + ai2 Aa = bl (17.29)
a21Au + a22Aa = b2 (17.30)
onde = -a 2 Z; a12 = a21 = N - Z + a W; a22 = -N/a2 - V; bj = -Na + a Z ;
b2 = -N/a + I(y t-u) - W; Z = Xexp [-a (yt-u)]; W = X(yt-u)exp [-a(yt-u)]; e
V = X(yt-u)2exp[-a(yt-u)];

Exemplo 17.1. Ajuste a distribuição Gumbel aos dados de vazão máxima do posto
de Ibirama no rio Itajaí-Açu.

Solução: Utilizando os dados de Ibirama (tabela 17.1), os valores iniciais,


obtidos pelo método dos momentos são uo = 585 e ao = 0,002919; estas
estimativas iniciais, obtidas pelo método de momentos, resultam da solução
de:

783,7 = u +0,577/a
193060 = n2 /(6 a2)
Hidrologia Estatística 683

onde 783,7 e 193060 são a média e a variância da amostra. Apõs cinco


iterações o cálculo converge para a estimativa de máxima verossimilhança que
é u = 602,98 e a = 0,00341848.
A função acumulada de distribuição é

F(y;u,a) = exp [-cx(y-u)]

onde a cheia de tempo de retomo de T anos é relacionado com F e y por

F(y; u, a ) = 1 - lfT
yT = u - (1/oc) ln [ -ln (M /T)]

Pode-se verificar a bondade do ajuste visualmente pela plotagem ordenada


da amostra, ou seja yt versus os padrões da distribuição de probabilidades
correspondentes à probabilidade (t-l/2)/N para t=l,..N. Se os dados de cheia
anual para o rio Hercílio em Ibirama estão bem ajustados pela distribuição de
Gumbel, os pontos se distribuirão segundo uma linha reta. A figura 17.2
mostra que, aproximadamende, isso ocorre. Apenas os pontos correspondentes às
duas maiores enchentes de 1983 e 1984 caem fora da tendência.
Também é importante a plotagem da máxima verossimilhança na vizinhança
do seu máximo, por razoes que serão discutidas a seguir.,Na figura 17.3 é
apresentado o contorno da função na vizinhança do máximo, mostrando que a
função é elíptica.

17.2.7 Distribuição WeibulI

A distribuição WeibulI pertence a mesma família da distribuição Gumbel


do item anterior. Esta distribuição é também chamada de extremos tipo III.
Gumbel é denominada também de distribuição de extremo tipo I. Esta
distribuição é útil para representar a distribuição de vazões mínimas anuais.
A função de distribuição é a seguinte
F(y) = 1 - exp [ -(y/a)k ] (y>0) (17.31)

e função densidade de probabilidade


f(y) = (k/a) (y/a)k l exp[ -(y/a)k] (17.32)

onde k e a são parâmetros. Da mesma forma que a distribuição Gumbel, esses


valores podem ser estimados pela maximização da função log de verossimilhança
utilizando o método de Newton-Raphson. Com os valores iniciais de k e a
obtidos pelo método dos momentos, as variações na iteração são obtidas pela
solução do seguintes sistema de equações lineares:
684
Hidrologia

2400-
observados

1600-

O oo o
o o ooo
ÔOO-I oo a
Quantis

oo o

OO
O O OO O

400 800 1200 1600 2000 2400


Qua nti s ca lc ul a do s

Figura 17.2. Ajuste da Distribuição Gumbel aos dados do posto Ibirama.

Figura 17.3. Função de verossimilhança.


Hidrologia Estatística 685

Àk + a12 Aa =

a21 ** + a22 Aa = b2 (17.33)


onde
a . „ = -N/k2 - £ [ln(yt/a)]2.(yt/a)k
11

a12 = 'N/a + (1/a) ^(yt/a) + Wa) £ P11 Cyt/«)Kyt/«)


Nk/cx2 - k(k+l)/cc2 £(yt/a)k
a22
-N/k - £ [ln(yt/a)].[l-(yt/a)k]
bl =
b_ = (k/a).£ [1 - (yt/aft (17.34)

onde yi são os valores observados. O cálculo dos valores iniciais necessitam


de um pouco mais de cálculo que no caso do Gumbel. Para a distribuição de
Weibull, a média, variância e coeficiente de variação são dados por

E[Y] = a r ( l+ l/k ) ; var(Y) = cx2 [r ( l+ 2 /k ) - I ^ d + l/k ) ]


cv = r ( l+ 2 / k ) / T 2 ( l+ l/ k ) - 1.

A última equação pode ser resolvida para k e na primeira equação,


substituindo k, obtém-se a.

Exemplo 17.2, Ajuste a distribuição de Weibull às vazões mínimas do posto


Ibirama no rio Itajaí-Açu.

Solução: Utilizando vazões mínimas anuais do rio Hercílio. dados apresentados


na tabela 17.5, a média, variância e o coeficiente de variação obtidos são,
respectivamente 7,791; 25,790562 e 0,405915.
Resolvendo a equação

r(l+ 2 /k )/T 2(l+ l/k ) = 1,405915

o que permite calcular o valor inicial de k=l,6. Substituindo na equação da


média, obtém-se a=5,6. Utilizando esses valores obtém-se, após seis iterações
A A
os valores de a =0,99329 e k = 1,72591.
Plotando os valores ordenados de yt com as probabilidades t-0,5/N, onde
neste caso, N=48 e t=l,2,„48 pode-se observar que a tendência dos valores
aproxima-se a uma relação linear. Na figura 17.4 são apresentados os
686 Hidrologia

resultados, onde se observa um valor estranho para o ano de 1983, que foi de
31.8 m3/s.
Como foi mencionado anteriormente, é uma boa prática plotar a função de
A A
verossimilhança na vizinhança do seu máximo k== 1,72591 e a = 8,99319. Na
figura 17.5 são apresentadas as curvas nessa vizinhança, observando-se também
uma função elíptica.

17.2.8 Precisão das estimativas de máxima verossimilhança

Um dos aspectos do procedimento da máxima verossimilhança descrito acima


foi a plotagem da sua superfície na vizinhança do seu máximo. A curvatura da
superfície neste ponto está diretamente relacionada com a precisão das
estimativas de máxima verossimilhança; intuitivamente, se a superfície de
verossimilhança é plana nesta região, com pequenas curvaturas e gradientes
pequenos, o ponto de máximo será determinado com pouca segurança e a
estimativa por verossimilhança terá pouca precisão. De outro lado, se a
curvatura é pronunciada e os gradientes grandes a estimativa da superfície
de máxima verossimilhança será claramente definida com grande precisão.
Assim, a curvatura da superfície de verossimilhança proporciona uma medida da
precisão; além disso, a curvatura da superfície dc verossimilhança é
relacionada com a taxa de mudança do gradiente na vizinhança do máximo.
A teoria estatística mostra que a precisão da estimativa da máxima
verossimilhança é dada pelo inverso da matriz das segundas derivadas
2 2 a
-d l/d& , calculada no máximo da verossimilhança. Mais espccificamente, se 9
é um vetor de estimativas de máxima verossimilhança do parâmetro 9, a matriz
A
var9 da variâncias e covariâncias é dada por qualquer das três relações
equivalentes:

e [-a2//se2]; E [-a2//ae2 ]e 4 ; [-a ty a e 2] ^

A teoria estatística também mostra que, quando os dados são completos


(quando N é grande), as estimativas de 9 são aproximadamente distribuídas
segundo a normal, o que significa que a distribuição normal de dimensão p
produz os valores verdadeiros do parâmetro 9 e a matriz de variância-
covariância é

var 9 = - E [ 9^ ] * (17.35)

e, quanto maior for o valor de N, melhor é a aproximação pela distribuição


normal. Escreve-se verdadeiro entre aspas porque os modelos estatísticos
687
Hidrologia Estatística

24.-

9
observados

O
16-
O
oo
oo
o
oo
oo
Quantis

0.-H o o
o 0o
oo
9 9

O
9 O

0 o
-----------r 1—
12. 16 24. 30. 36.
0 6 .

Quantis calculados

Figura 17.4. Ajuste da distribuição as vazões mínimas de Ibirama.

Figura 17.5.Função de verossimilhança do problema 17.2.


688 Hidrologia

usados para descrever as características de, por exemplo, cheias anuais, não
são mais do que aproximações; estaremos-nos iludindo se acreditarmos que
cheias na natureza necessariamente seguem a distribuição log-normal, gamma,
gumbel, ou qualquer outra distribuição.
Com a ajuda de análises estatísticas cuidadosas, contudo, tem-se
condições de rejeitar aqueles modelos estatísticos que não são consistentes
com os dados e concluir que um, ou vários modelos remanescentes servem
igualmente bem. Se vários modelos são bons, a decisão da escolha entre eles
deve ser realizada com base em outros elementos além da estatística. Para
qualquer modelo adotado será desejável obter os limites de confiança para
seus parâmetros. Os limites de confiança aproximados podem ser obtidos usando
os termos da diagonal dado pelo lado direito da relação (17.35). Usando o
A
fato de que cada componente do vetor 0 é distribuído aproximadamente segundo
a normal, o intervalo de confiança aproximado de 95% para o componente 01 de
A A A
0 são dados por 01 ± 1,96 vvar 0i, var 01 sendo dado pelo primeiro elemento
A
na diagonal principal da matriz var0. Limites de confiança para 99% e 99,9%
são calculados usando os desvios da normal 2,58 e 3,29 em substituição de
1,96.
Limites de confiança aproximados assim calculados são apropriados quando
um parâmetro é considerado individualmente; se os limites de confiança são
calculados para todos os p parâmetros do vetor 0íT as p condições de
confiança não serão simultaneamente verdadeiras. Quando as condições de
confiança são necessárias para todos os parâmetros simultaneamente é
necessário usar a região de confiança conjunta que, com N grande, 6
apresentada pela teoria estatística como sendo

2 /(ê;x) -2 /(0;x) s x 2 (17.36)


p,w
onde 100(l-a)% é a probabilidade de confiança; o valor tabelado da

distribuição %2 para p graus de liberdade tendo uma probabilidade a no seu


limite superior; e p é o número de elementos no vetor 0. Essencialmente, a
relação (17.36) define aqueles 0 valores que são suficientemente próximos ao
A
valor 0 onde o log-verossimilhança têm seu máximo.

17.2.9 Intervalos de Confiança para a cheia de T anos

No item anterior foram apresentadas maneiras de obter as regiões de


confiança para os parâmetros 0 da distribuição de probabilidade. Na maioria
das aplicações hidrológicas, contudo, os parâmetros dos modelo tem menos
interesse que os quantis da distribuição que eles definem. Neste item 6
Hidrologia Estatística 689

apresentado o problema de definir as condições de confiança dos quantis


A A
derivados da distribuição ajustada f(x;9), onde 0 é obtido pela máxima
verossimilhança. O símbolo usado anteriormente neste texto para representar o
quantil era Xo onde Xo é a solução da equação

X 0 A
G = f f(x;0) dx - P = 0 (17.37)
- 03
onde, para uma cheia de T anos, P= 1/T.
Um método direto de calcular o limite de confiança aproximado de 95%
para Xo é peio uso da aproximação da distribuição normal Xo ± 2 /(varXo),
onde varXo pode ser calculada com a ajuda da variância e convariância da
equação var 0 = [-E (52//d0jô0j)]'1. Considerando que Xo é função de 01,
02,... pode-se escrever, quando N é grande, que

varX0= [(3G/30!)2 var©! + (3G/302)2var 02 +

-r 2(aG/ô8<) (3G/502) covíQ j^)]/ [f(Xo,0[,02) j (17.38)

onde os termos adicionais devem ser incluídos quando existirem os parâmetros


03, 04.... As variâncias e covariâncias são obtidas diretamente da expressão
A

da matriz var 0; 3G/90J, por exemplo é

X
õG/õBi = J °df/dQi dx (17,39)

0 método acima não é algebricamente elegante, mas é direto do ponto de


vista computacional, contudo considera que Xo é aproximadamente distribuído
segundo a distribução normal, e desconhecido em condições em que esta
consideração 6 válida. Outra alternativa é retomar a superfície de máxima
verossimiLhança, como segue.
Considerando que a região definida pela inequalidade (17.36) dá uma
região de confiança de 100(l-a)% para o parâmetro 0 do modelo, para cada
ponto 9 que cai nesta região ou dentro de seus limites pode-se calcular um
valor Xo usando a equação (17.37); escolhendo vários pontos 9 podemos gerar
vários valores de Xo, o maior e o menor destes valores define o interv o
100(l~a)% da região de confiança para o quantil Xo. Pode ser demonstrado que
é necessário apenas calcular Xo para os valores de 0 que caem dentro os
limites de confiança da região definida por (17.36). Na tabela 17.7 sao
apresentados os limites de confiança de 95%, que foram calculados por este
692 Hidrologia

é *
vanáveís explicativas para predizer y: combinação das estimativas de P e a e
dadas por diferentes conjuntos de dados.

173 2 Aplicações hidrológicas de regressão linear

O objetivo deste capítulo não é relatar a teoria estatística apropriada


para a solução dos problemas acima apresentados, pois já existem textos
excelentes destinados a esta finalidade. Nós nos preocupamos antes, com a
apresentação de um relato de algumas das muitas aplicações de análise de
regressão linear nas ciências hídricas.
A seguir são apresentados alguns exemplos, ilustrando a amplitude de
aplicação da análise de regressão linear nas ciências hídricas.

a) O modelo Thomas-Fiering é um procedimento para derivar seqüências


artificiais de descarga média mensal (fluxo), com características
semelhantes, sob aspectos importantes, àquelas do registro de fluxo mensal
observado numa estação fluviométrica de um rio. As seqüências artificiais
geradas pelo modelo Thomas-Fiering são usadas; por exemplo, para simular o
comportamento de um sistema de recursos hídricos que abstrai água do rio
próximo ao local do medição. O modelo, conforme comumente formulado, consiste
em doze regressões lineares simples, nas quais o fluxo de fevereiro (y) é
correlacionado com o fluxo de janeiro (variável explicativa x); o fluxo de
março é correlacionado com o fluxo de fevereiro (variável explicativa x)....
As doze regressões qfev = + Pfev qjan + ef£v; qmar = + (3mar qfev
+ Eniaj-;.- são usadas para gerar as seqüências de fluxo artificiais
escolhendo o eíev, a partir de componentes normais com variâncias
apropriadas, e acrescentando a esses componentes aleatórios os componentes
sistemáticos oq-cv + pfev q ^ , + J3mar . Claramente, existe a
possibilidade de incluir, além de variáveis explicativas, o fluxo dos outros
meses precedentes; usar distribuições outras do que a normal, a fim de gerar
os componentes aleatórios e, e assim por diante.

b) Yevjevich (1972) discutiu um exemplo no qual uma curva-chave parabólica Q=


Po + P[H + P2H é ajustada a descargas medidas Q e níveis H, usando 13 pares
de observações (Q,H). Como os parâmetros Pq, pj, pj ocorrem linearmente na
equação para a curva-chave, o componente sistemático do modelo estatístico
para Q têm a forma de regressão múltipla.

c) A concentração de sedimento em suspensão c é comumente relacionada à


descarga fluvial (vazão) q por uma equação da forma c = aqP. Observações de c
Hidrologia Estatística 693

apresentam diferenças com relação à expressão no lado direito dessa equação,


se os desvios forem aleatórios pode-se dar a forma

c = a qP + e

O componente sistemático do modelo será claramente não-linear nos


parâmetros a e p. Contudo, pode-se obter uma relação linear entre os
logaritmos de c e q na forma

ln c = a* + p* (ln q) + e

de modo que o modelo estatístico agora é expresso sob a forma de regressão


linear.

d) Os exemplos das tabelas 17.1 a 17.4 deram um conjunto de valores contendo


falhas de observação. Denominando y como uma seqüência de, digamos, cheias
anuais, em um local de medição com registro imcompleto, e por Xj, x2, ...Xp
as cheias anuais em postos de medição próximos, com registros nos quais não
faltam valores, a regressão múltipla pode ser usada para estimar valores que
faltam na seqüência y. Contudo, será necessário aplicar a análise de
regressão com especial cuidado para assegurar que sejam satisfeitas
suposições básicas.

e) Quando as características de cheia devem ser estimadas para um local sem


registros de vazão, é comum usar registros de cheia de outros postos dentro
da região, a fim de relacionar (por exemplo) a cheia anual média q e
características da bacia (área A, declividade de canal S, percentagem P de
área de bacia que é lago ou reservatório ...), como variáveis explicativas.
Para tanto é comum utilizar-se de modelos de regressão múltipla na forma

ln q = P0 + P^ln A) + fcOn S) + fcOn P) + ... + e (17-42>

Neste caso, também deve haver cuidado, porque os registros serão de


comprimentos diferentes, de modo que as cheias anuais médias q necessitarão
de diferentes pesos na análise. Quando o relacionamento entre o escoamento de
tormentas q, e a chuva efetiva Pt, P,.j, P,_2» estiver na forma

<lt = hçPj + hjP^, + h2Pt_2 + ... + hkPt.k + e (l7 '43)

é essencialmente uma regressão linear, sendo os parâmetros h0, h,, .~hk as


ordenadas do hidrograma unitário. É necessário cuidado especial no ajuste do
694 Hidrologia

modelo para assegurar que as ordenadas sejam fisicamente significativas;


alguns procedimentos ajustam o modelo utilizando restrições para as
ordenadas.

1 1 3 3 Os fundamentos da regressão linear

Pressupomos o modelo
yt = xtTP + e, (17.44)

com as suposições E[Ej]=0; E t e ^ a / ; e E[etes]=0 para qualquer s*t. Também


pressupomos que os erros ou resíduos ^ sejam normalmente distribuídos. Para

calcular as estimativas de p dos parâmetros p calcula-se o valor p que


minimiza a soma dos erros quadráticos, e e, onde e é o vetor N xl com elemento
típico Eji isto é, as estimativas de (3 minimizam

R(P) = (y-Xp)T(y-XP). (17.45)

As estimativas P, portanto, satisfazem

XT(y - X jj) = 0
dando

XTX i = XTy (17.46)


OU

P = ( ^ X ) '1 XTy. (17.47)

Substituindo para P na expressão (17.48)» obtemos o valor mínimo da soma


dos quadrados

R(P) = (y - X p)T(y • X P) = yT(I - x ( x V 1 XT1 y. (17.48)

Usaremos esta relação freqüentemente, junto com a seguinte forma


alternativa:

R(P) = yTy - pT (XTy). (17.49)

A relação (17.49) é a base para a análise de variância (ANOVA), na qual


a soma total dos quadrados para as observações [yt] - isto é.
Hidrologia Estatística 695

2 2 2 T at T
yj +y2 +...+yN =y y - é dividida em dois componentes, JJ X y e a diferença

R(P). Textos estatísticos (veja, por exemplo, Draper e Smith, 1966) mostram:

a) que, se o vetor p têm p elementos, e o vetor y têm N componentes, os


T ~ t
graus de liberdade, associados com os componentes y y, pX y e R(P) são
N, p e N-p, respectivamente.

b) que dadas as suposições acima concernentes ao as quantidades


* _
PX y/p e R(P)/(N-p) são ambas distribuídas como X2 com p e (N-p) graus
de liberdade, quando à hipótese nula que P=0 é verdadeira.

T
c) em qual caso, a relação dessas duas quantidades, [pX y/p] dividida
por [R(P)/(N-p)], é distribuída como uma razão de variâncias, ou
estatística F, com p e N-p graus de liberdade. Existem tabelas para essa
estatística, porém os seus quantis podem ser facilmente calculados por
GENSTAT, ou por outros pacotes computacionais.

Na prática, estamos interessados em obter o modelo mais adequado para


explicar como varia a variável yt testando uma série de modelos de regressão
linear, envolvendo um número cada vez maior de variáveis explicativas. Assim,
começando com o modelo mais simples

Yt = Po + ^

onde yt é uma constante P0 desconsiderando o termo aleatório; acrescentando


uma variável explicativa x1( resulta no modelo

yt = P0 + Pi v + Et-

e depois, talvez, uma segunda variável explicativa x2, de modo que o modelo
agora seja

yt = Po + h + ?2 x2 + ^

e assim por diante. Usando a equação (17.49), cada modelo ajustado dará um
novo valor de R(P) que se tomará menor a cada novo parâmetro ajustado. De
*
fato, se fôssemos ajustar N parâmetros, R((5) seria zero, já que apenas temos
696 H id r o lo g ia

N valores de dados yt para ajustar N parâmetros P0, Pj» - P n- i * Se chamarmos


A
a seqüência de valores de R(P) correspondentes aos modelos de números
crescentes de variáveis explicativas, por R(f30); -R(Po»Pi); RCPo»Pi»p2)—
então podemos resumir o processo todo, conforme apresentado na Tabela 17.8,
na qual consideramos que k variáveis explicativas é o número máximo que
desejaríamos incluir.
-T T
Deve ser observado que a expressão "p X y", que ocorre em diversos
lugares na tabela 17.8, é diferente de uma linha para outra, dependendo do
número de parâmetros ajustados. Assim, onde apenas é ajustado J30, a matriz X
consiste em uma única coluna de uns, sendo de dimensão N xl: onde P0 e pj são
ajustados, a matriz X é da dimensão Nx2, tendo uns na sua primeira coluna e
os valores de N da variável explicativa x l na sua seguna coluna, e assim por
diante.
*T T
Em particular, o valor de P X y corresponde ao ajuste de p0 é, portanto
-2
apenas Ny , e é conveniente subtrair essa quantia, juntamente com seu grau de
liberdade correspondente, da última linha na tabela 17.8. Maior simplificação
pode ser obtida se rearranjarmos a tabela para dar as diferenças R(p) que 6 o
resultado de ajustes sucessivos com parâmetros adicionais. À tabela assim
obtida é a 17.9.
Devem ser mencionados dois aspectos das tabelas 17.8 e 17.9. Primeiro,
conforme mostrado na tabela 17.9, cada parâmetro novo (e sua variável
explicativa associada), que é incluído no modelo, resulta em redução da Soma
Residual dos Quadrados R(p) que, conforme já foi observado, desaparecia
totalmente se fôssemos ajustar N parâmetros. Freqüentemente, as reduções da
Soma Residual de Quadrados, associados com os primeiros parâmetros, são
substanciais, as reduções tomando-se sucessivamente menores com cada
parâmetro adicionei incluído. É um dos objetivos do ajuste de modelos
determinar em que ponto a redução da soma residual de quadrados toma-se
pequena demais para justificar a inclusão de parâmetros adicionais no modelo.
Em segundo lugar, a apresentação nas Tabelas 17.8 e 17.9 pressupôs que apenas
um parâmetro adicional seja acrescentado em cada passo, de modo que os graus
de liberdade para a soma residual de quadrados é reduzida de uma unidade a
s

cada passo. As vezes, contudo, precisaremos acrescentar grupos de parâmetros,


em lugar de acrescentá-los um por vez. A Tabela 17.9 pode facilmente ser
modificada para incluir este caso. Por exemplo, se ajustássemos (30« seguido
do grupo p1,j32,...pp seguido mais uma vez pelo grupo Pp+1,|3p+2,-..P?+q, então
a Tabela 17.9 seria modificada para a forma mostrada na tabela 17.10.
697
Hidrologia Estatística

Tabela 17.8. Resumo do procedimento para o ajuste de modelos lineares com


número crescente de parâmetros P0; —Po* Pi7 -Pk> correspondentes
a 0, 1, 2, ..Jc variáveis explicativas xlf Xj, ...xk

Parâmetros Ajustados Graus de liberdade Soma dos quadrados

1 pV y
Po
N-l R(Po)
2 pV y
Po> Pi
N-2 R(Po.Pi)

3 pV y
Po» Pl» P2
N-3 RtP0.P1.P2)

k+1 pV y
Po* -P k
N-k+1 R(Po- 4 )
N yTy

Tabela 17.9. Análise de tabela de variância (ANOVA), denvada diferenciando j i


Tabela 17.8. A tabela mostra a redução na função de soma de quadrados R(P)

Graus de liberdade Soma dos Quadrados

Ajuste de Pj 1 R(Po)-R( M i )

Ajuste de p2 em 1 R(P0.Pi)-R(P0.Pi>P2)
além de Pj
Ajuste de P3 em 1 R(P0.P1.P2)'R(P0.P1’P2.P3)

além de

Ajuste de P^ em 1 R(Po»Pl»"*Pk-l^’^ P o ,^ 1,*“^


além de Pp—P n
Erro N-k R(Po--Pk)

Total N-l yTy ' Ny2


698
Hidrologia

Tabela 17.10. Particionamento (distribuição, divisão) de somas de quadrados e


graus de liberdade
Graus de liberdade Soma dos Quadrados

Ajuste de P R(P0)-R(P0,P1,...pp)

Ajuste de P ^ . - P ^ q R(Po,Pi.-Pp)-R(Po.P,....Pm )
apds ajustar Pi,...pp
Erro N-p-q ^(Po3i»-Pp+q)
Total N-l yTy - Ny2

17.3.4 Caso especial: regressão linear simples

4w níí° CaS° de Uma variável explicativa, digamos x, a análise de variância


ANO VA acima toma-se a tabela 17.11 (onde acrescentamos uma coluna adicional
a tabela, Quadrados Médios, estes valores são as Somas dos Quadrados
divididas pelos graus de liberdade correspondentes).

Sx x -I(* fx)2. Sxy=£(xt-i)(yr y) e Syy=X(yt-y)2=yTy-Ny2

Tabela 17.11. ANOVA


df SQ QM
Regressão sobre x 1 Sxy2/S „ V ' Sxx
(i.e. ajuste de j3j) [i.e. R(Po)-R(P0,Pj))

Erro N-2 ^yy"^xy2/Sxx (Syy-Sxy2/Sxx)/(N-2)


{i.e. R((3q,Pj))

Total N-l s
yy

Se a hipótese nula, onde 0, . 0, for correta, de modo que a variável x


náo tenha valo, par, explicar como y varia, as duas quantias na coluna
entitulada QM são ambas distribuídas como y 2 com 1 e N-7 <m»,c a* vu^ a a
respectivamente; e a sua relação é então distribuída como a estatística F com
H id r o lo g ia E sta tístic a 699

1 e N-2 graus de liberdade. Como teste da verificação de incluir x como uma


variável explicativa do modelo de yt, comparamos o valor numérico do F
calculado a partir dos dados com o valor tabulado para 1 e N-2 graus de
liberdade.
Embora a álgebra apresentada pareça assustadora à primeira vista,
aconselha-se o leitor a passar algum tempo dominando os princípios que a ela
conduzem, embora as fórmulas em si não sejam importantes para a pessoa que
trabalha com isso. Os cálculos são facilmente realizados por qualquer bom
programa estatístico.

Exemplo 173. Estabeleça a regressão linear das vazões anuais de cheia de


Ibirama (y) com as vazões de cheias de Apiuna (x) (tabela 17.1).

Solução: Como existem menos falhas na seqüência do rio HercOio em Apiuna do


que para o rio Itajaí-Açu em Apiuna, pode-se explorar se as cheias anuais em
Apiuna (x) podem ser usadas para preencher os valores que faltam para as
cheias anuais (y) em Ibirama. Assim considerando a regressão linear de y com
x, plotando inicialmente os pontos para ter uma idéia de como x e y variam
conjuntamente. Na figura 17.6 as duas cheias extremas para os anos de 1983 e
1984 se destacam claramente, e ambas têm um efeito substancial sobre a
análise conforme será visto mais adiante.
Na tabela 17.12, o sumário de análise mostra a soma total de quadrados
T -2
y y-Ny = 9025393 dividida em dois componentes: um (Regression) para o ajuste
de pj, com valor 7265785, e o outro (Residual) para R (P0>Pi)> com valor
1759608. A tabela mostra os quadrados médios (soma dos quadrados divididos
por graus de liberdades) e, mais abaixo, a relação de variância (chamada de
v.r) de 183,81.
Para testar se a variável Apiuna é útil para predizer valores da
variável Ibirama (ou, mais formalmente, testar a hipótese nula Pj=0)
comparamos a razão de variância com os valores tabulados da estatística da
relação de variância com 1 e 45 graus de liberdade. O quantil de 95% da
distribuição de razão de variância é F=4,057. Os quantis de 99% e 99,9% são
encontrados como sendo, respectivaraente, 7,234 e 12,39; como a relação de
variância calculada de 185,81 está bem acima da parte superior da cauda da
distribuição que seria apropriada se fosse verdadeira a hipótese nula,
rejeitamos essa hipótese, concluindo (conforme é óbvio do traçado na Figura
17.6) que a seqüência de cheias de Apiuna é extremamente útil para predizer
cheias anuais que faltam em Ibirama. Na tabela 17.12, Percentagem de
variância explicada é possível observar que a regressão linear simples
E[y]-{5o+Pix tinha R(P0.Pi) igual a (100-80,1) = 19.9% da soma total de
Quadrados 196204, de modo que a regressão foi responsável por uma parte
700 Hidrologia

considerável da variação em y.
Para testar se a variável Apiuna é útil para predizer valores da
variável Ibirama (ou, mais formalmente, testar a hipótese nula Pj=0)
comparamos a razão de variância com os valores tabulados da estatística da
relação de variância com 1 e 45 graus de liberdade. O quantil de 95% da
distribuição de razão de variância é F=4,057. Os quantis de 99% e 99,9% são
encontrados como sendo, respectivamente, 7,234 e 12,39; como a relação de
variancia calculada de 185,81 está bem acima da parte superior da cauda da
distribuição que seria apropriada se fosse verdadeira a hipótese nula,
rejeitamos essa hipótese, concluindo (conforme é óbvio do traçado na Figura
17.6) que a seqüência de cheias de Apiuna é extremamente útil para predizer
cheias anuais que faltam em Ibirama. Na tabela 17.12, Percentagem de
variância explicada é possível observar que a regressão linear simples
E[y]=Po+Pix tinha R(Po.Pi) igual a (100-80,1) = 19.9% da soma total de
Quadrados 196204, de modo que a regressão foi responsável por uma parte
considerável da variação em y.

2400-

^ 1600-
I BIR AMA

9 0 0

600- • o
0 9*

O-
900 1600 2400 J200 4000 4800

APIUNA m 3/ s

Figura 17.6. Vazões máximas anuais de Ibirama versus as de Apiuna.

Mais abaixo, na tabela, na parte entitulada Estimativas de coeficientes


de regressão, coluna entitulada estimativa, as estimativas numéricas de J3q e
f3j são 12,5 e 0,4775, dando uma equação de regressão de y = 12,5 + 0,4775x
Hidrologia Estatística 701

(ou, cheia anual estimada em Ibirama = 12,5 + 0.4775 * cheia anual observada
em Apiuna). Também são apresentados os enos padrão do (30 e j3x, a partir dos
quais, caso necessário, podem ser calculados intervalos de confiança para |30
e p1( como 12.5 ± t x 63,8 e 0,4775 ± t x 0,035, onde t é o valor do t
estatístico com 45 graus de liberdade, lido a partir de tabelas. Para uma
probabilidade de 0,05 nas duas caudas da sua distribuição o valor de t é
2,014; onde os limites de confiança de 95% para p0 e P2 são 12.5 ± 2,014 x
63.8 e 0.4775 ± 2,014 x 0,035, ou (-116,0; 141,0) e (0,407; 0,548),
respectivamente. Observamos que os limites de confiança para P0 incluem o
valor zero, que é pelo menos consistente com a realidade.

Tabela 17.12. Regressão linear entre vazões máximas de Ibirama(y) e


Apiuna(x).

*** Análise de Regressão ***

Variável dependente: Ibirama


Termos ajustados: constante, Apiuna

*** Resumo da Análise ***

d.f. s.s. m.s.


Regressão 1 7265785. 7265785.
Resíduo 45 1759608. 39102.
Total 46 9025393. 196204.

Porcentagem da variança explicada: 80,1%


* Mensagem: As seguintes unidades têm grandes resíduos:

17 -2,73
50 2,31

* Mensagem: As seguintes unidades têm alta leverage:

50 0,250
51 0,248

*** Estimativas dos coeficientes da regressão


estimativa s.e. t
constante 12,5 63,8 0,20
Apiuna 0,4775 0,0350 13,63
702 Hidrologia

Deve-se lembrar que a finalidade de ajustar o modelo estatístico foi


estimar as cheias anuais que faltam em Ibirama, usando o registro mais
completo em Apiuna^ As cheias anuais em Apiuna, para as quais faltam as
cheias de Ibirama, são 1111, 648 e 3086 m V 1. Utilizando a regressão obtém-
se as cheias de Ibirama que faltam, ou seja 543, 322 e 1486 m V 1
respectivamente. Usando os valores da estatística t calculada anteriormente,*
podemos, caso necessário, calcular limites para as estimativas.

REFERÊNCIAS

1 - ATKINSON, A.C., 1984. Plots, transformations and regression. Oxford,


Inglaterra. Clarendon Press.

2 - DRAPER, N e SMITH, H., 1966. Applied regression analysis. New York.


John Wiley & Sons

3 - YEVJEVICH, V., 1972. Probability and statistics in hydrology. Water


Resources Publications, Fort Collins, Co.
Capítulo 18

REGULARIZAÇÃO DE VAZÕES EM RESERVATÓRIOS

Antonio Eduardo Lanna

18.1 Introdução

A variabilidade temporal das vazões fluviais tem como resultado visível


a ocorrência de excessos hídricos nos períodos úmidos e a carência nos
períodos secos. Nada mais natural que seja preconizada a formação de reservas
durante o período úmido para serem utilizadas na complementação das demandas
na estação seca. Como a ocorrência das vazões é aleatória, ou seja, não há
possibilidade de previsão de ocorrências a longo prazo, não é também possível
prever-se com precisão o tamanho da reserva de água necessária para
suprimento das demandas de períodos de seca no futuro. Isto leva o planejador
de recursos hídricos a duas situações ineficientes .: superdimensionar as
reservas às custas de investimentos demasiados no reservatório de acumulação,
ou subdimensionar as reservar às custas de racionamento durante o período
seco. Entre essas duas dimensões estaria aquela ótima.
No entanto, a situação é mais complexa do que o acima exposto,
exatamente por que as vazões são aleatórias. Assim, existirão períodos nos
quais determinada dimensão de reservatório será suficiente e outros em que
não. A exceção ocorre nos casos extremos em que seja implantado um
reservatório excessivamente grande, que permita atender sempre a demanda, ou
excessivamente pequeno, que nunca o faça. A dimensão ótima para um
reservatório deverá ser considerada em função de um compromisso entre o custo
de investimento na sua implantação e o custo da escassez de água durante os
períodos secos. O primeiro custo é diretamente proporcional e o segundo é
inversamente proporcional à dimensão do reservatório. Quanto menor for a
capacidade útil de acumulação de água, ou seja aquela que pode ser
efetivamente utilizada, mais provável 6 a ocorrência de racionamento.
Portanto, apenas na situação de extrema aversão ao racionamento seria ótima a
decisão de construir-se um reservatório que sempre pudesse acumular água para
atender à demanda.
Há um risco de que o raciocínio previamente elaborado leve à errônea
conclusão que para o atendimento a qualquer demanda hídrica seja suficiente a
construção de um reservatório com capacidade útil suficientemente grande de
acumulação. Isso porque, obviamente, a capacidade útil de acumulação de um
reservatório poderá ser efetivamente utilizada se houver durante algum
704 Hidrologia

período úmido água suficiente para enchê-lo. Já se introduziu um número


suficiente de complexidades ao problema para ser aconselhável iniciar a
apresentação das soluções práticas. Mas, apenas para constar, e com risco de
assustar o estudante, é possível citar-se outras mais : a demanda pode também
ser variável e, mesmo, aleatória como a vazão, e existem perdas de água em um
reservatório, por evaporação, infiltração e vazamentos. O fato é que o estudo
de um reservatório de regularização de vazões exige o conhecimento de sua
dimensão, das vazões afluentes, da demanda a ser suprida e das perdas que
poderão ocorrer.
Neste capítulo serão apresentados diversos métodos para análise do
problema. Em comum eles apresentam o detalhe de serem métodos computacionais,
embora alguns tenham sido originalmente desenvolvidos como métodos gráficos.
Esta opção foi realizada a partir da constatação de que a popularização dos
computadores pessoais exige que, mesmo em cursos introdutórios, sejam
exploradas as enormes possibilidades que a computação eletrônica trouxe à
hidrologia.

18.2 Problema simplificado de dimensionamento de reservatório

SupÕem-se nesta situação que se deseja determinar a menor capacidade


útil de um reservatório suficiente para atender a maior demanda constante 'íe
água possível, num período hipotético de 5 anos. Utiliza-se como exempio o
reservatório localizado na seção fluvial referente ao eixo do açude de
Araras, no rio Acaxaú, Estado de Ceará. A área da bacia de drenagem é de
2
3.587 Km . Os deflúvios médios mensais estimados nesta seção para o período
de 1913 a 1917 são apresentados na coluna 2 da tabela 18.1. Uma extrema
simplificação que se faz é supor que a única retirada de água que é feita do
açude é por descargas operadas. Não ocorrem perdas por evaporação, nem por
infiltração.
Como a demanda é constante ao longo do tempo ela será notada por X. Pelo
princípio de conser/ação de massa vem que :

N
S0 + Z q, = N . X + SN ( 18 . 1)
t=l

ou seja, o armazenamento inicial no açude (Sq) somado aos deflúvios afluentes


ao açude durante um período de N intervalos de tempo (qt), deve ser igual à
soma das descargas retiradas do açude neste mesmo período, dada pelo produto
N . X, mais o armazenamento final (Sf). Supondo-se que o armazenamento
iniciai é idêntico ao final, ou que a diferença entre eles é pequena diante
da soma das afluências, vem ;
705
Regularização de vazões em reservatórios

N
l <k= N .X
t=i

donde se conclui que a descarga máxima atingível nessas circunstâncias é

X = E q,/N (18.2)
t=i

Observando-se a expressão à direita da igualdade, conclui-se que a


descarga máxima regularizável no açude é a média aritmética dos deflúvios
afluentes no período t. Ao final da coluna 2 da tabela 18.1 apresenta-se a
soma dos deflúvios afluentes mensais ao açude. Sua média é 33,3 Hm /mês, que
é a máxima descarga regularizável nas circunstâncias estabelecidas.

Supondo que o açude tenha capacidade útil infinita, os armazenamentos


em qualquer intervalo de tempo t serão dados por .

S(t) = So + ^q i - t X (18.3)

i=l

As diferenças acumuladas obtidas pela equação 18.3 mostram os acréscimos


ou decréscimos dos armazenamentos no açude. O açude estará cheio no mes ,
com um acréscimo de 746,6 Hm3, e com armazenamento mínimo no mês 49 comum
decréscimo de 669,7 Hm3 sobre o valor inicialmente armazémado. Co™
hipótese formulada, as saídas do reservatório somente poderao-se realiz
através da descarga operada, igual a 33,3 Hm3 ao mês, nao
carências de água ou vertimentos. A carência de água se 4Q
qualquer valor de armazenamento inicial que faça o armazename _
ser positivo ou pelo menos nulo. Ou seja, o armazenamento uucia. deve ser

igual ou maior que 669,7 Hm . ., . intervalo


Por outro lado, o açude deverá estar com plena capacidad
5. Sendo o armazenamento iniciai maior que 669,7 H r f , o armazenamento neste
mês deverá ser igual ou maior que 669,7 + 746,6 = 1416,3 Hm 0 descarga
é estabelecer a menor capacidade úul de armazenamento que gara*ta a^escarg
máxima regularizável, ela será obtida exatamente com
706
Hidrologia

Tabela 18.1. Curva de diferenças acumuladas - açude Araras (1913-1917)


temp<d Deflúvio s Diferençasí Temp<d Deflúvio s Diferenças
mês acumuladas mês acumuladas
Hm3 Hm3 Hm3 Hm3
1 01 -33,1 31 0,0 -89,3
2 5,4 -61,1 32 0,0 -122,6
3 416.6 322.2 33 0,0 -156,0
4 326,8 615.7 34 0,0 -189,4
5 164.3 746.6 35 0,0 -222,7
6 13,5 726.8 36 0,9 -2151
7 0,3 693.8 37 1,4 -287,1
8 0,0 660,4 38 11 -319,3
9 0,0 627.0 39 41 -348,5
10 0,0 593.7 40 4.8 -377,1
11 0,0 560.3 41 2,7 -407,7
12 0,6 5211 42 01 -4-10,6
I 13 2.3 . 4961 43 0,0 -474,0
14 21 465.4 44 0,0 -507,3
15 2.3 434.3 45 0,0 -540,7
16 3.6 404.6 46 0,0 -574,1
17 1.7 372.9 47 0,0 -607,4
18 0,9 340.4 48 0,6 -640,2
19 0,1 307.1 49 3.9 -669,7
20 01 274,0 50 34.1 -669,0
21 0,0 240.6 51 750,6 48.2
22 0,0 2011 52 128,4 1431
23 0,0 173.9 53 83.1 193,1
24 0,0 140.5 54 401 199,9
25 0,3 107.5 55 01 166,7
26 0,5 74.6 56 0,0 133,4
27 0,5 41,8 57 0,0 100,0
28 21 10.6 58 0,0 66,6
29 0,1 -22,6 59 0,0 33.3
30 0,0 -55,9 60 0,1 0,0
1XDTAL í >002,2
Regularização de vazões em reservatórios 707

183 Problema real de dimensionamento de reservatório:


método da simulação
O exemplo anterior ignorou alguns aspectos importantes do problema,
entre eles a existência de evaporação. Outras condições reais poderão ser
melhor incorporadas caso se adote uma metodologia de análise da operação com
uso de simulação matemática. A figura 18.1 ilustra o fluxograma desta
simulação.
O modelo solicita inicialmente informações gerais sobre a execução que
permanece fixa durante cada simulação. Em seguida são solicitadas as
condições iniciais : intervalo inicial de simulação e armazenamento inicial.
Estas condições devem representar uma situação real, para evitar que os
resultados da simulação sejam por elas afetados indevidamente. Geralmente
existe um intervalo de tempo quando, com grande certeza, pode-se assegurar
que o reservatório estará cheio ou vazio. Por exemplo, ao final ou no início
da estação úmida, respectivamente. Finalmente são introduzidos valores
tentativos para a capacidade útil do reservatório, C, e a demanda a ser
atendida, D.
Na execução é adotada a equação de balanço hídrico do reservatório :

S(t+1) = S(t) + q(t) - D - E(t) + P(t) (18.4)

onde S(t) = armazenamento no início do intervalo de tempo t; q(t) = deflúvio


afluente durante o intervalo t; D = descarga operada visando ao suprimento da
demanda; E(t) = evaporação do reservatório durante o intervalo de tempo t;
P(t) = chuva sobre o reservatório durante o intervalo de tempo t;
A evaporação E é computada pelo produto de uma taxa de evaporação e(t),
em altura de lâmina de água evaporada por unidade de tempo, que pode variar
com as estações do ano, pela área do espelho líquido do reservatório, A. A
chuva sobre o reservatório é calculada pelo produto de uma altura de
precipitação por intervalo de tempo p(t), que varia temporalmente, pela mesma
área do espelho líquido. É praxe, diante desta analogia, computar-se o efeito
destas duas variáveis de forma conjunta. Se a área for dada em Km2, e a chuva
e taxa de evaporação em mm, aplica-se a equação :

E’(t) = E(t) - p(t) = [e(t)-p(t)J . A / 1000 (18.5)

na qual E’(t) seria a evaporação descontada pela chuva. A divisão por 1000
serve para compatibilizar unidades, resultando em valores de E’(t) em Hm3.
A área do espelho líquido é calculada em função do volume armazenado no
reservatório, através de uma função que pode apresentar, entre outras
possíveis, uma estrutura polinomial da forma :
708
Hidrologia

Figura 18.1. Fluxograma da imulação da operação de reservatório.


Regularização de vazões em reservatórios 709

Área = C + C . S + C . S2+ C . S3+ C . S4 (18.6)


U I L 3 4

onde C ... C são coeficientes.


0 4
Quando a evaporação descontada pela chuva não for parte muito
significativa do balanço, e a variação do armazenamento em um intervalo de
tempo não for grande, pode-se calcular a evaporação em um intervalo com
referência à área no início do intervalo de tempo. Em outros casos, será
necessário um procedimento iterativo em que a área média durante o intervalo
de tempo é usada. Seu valor é estimado inicialmente como igual ao do início
do intervalo. Aplicando-se a equação de balanço hídrico calcula-se o volume
armazenado ao final do mesmo intervalo e então a área média, como (Área
inicial + Área final)/2. Este valor é usado como nova estimativa da área
média. O procedimento é repetido umas poucas vezes, geralmente não mais que
3, até que o valor da área média calculada seja próximo à estimativa prévia.
Duas condições físicas devem ser obedecidas pelo armazenamento final em
qualquer intervalo de tempo S(t+1). Ele deve ser não superior à capacidade
útil de armazenamento C e deve ser não inferior a zero. Caso ocorra um valor
superior a C o excedente será vertido. Caso seja calculado S(H-i) inferior a
zero concluí-se que existe incompatibilidade entre a capacidade útil do
reservatório e a demanda a ser suprida.
É importante alertar que o texto tem-se referido ao armazenamento útil
do reservatório e não ao seu armazenamento real. O primeiro armazenamento é
aquele que pode ser efetivamente utilizado para atender à demanda. O último é
dado pela soma do armazenamento útil com o armazenamento do chamado Volume
Morto. Este é formado para atender à exigência dos equipamentos de captação
de água e para acomodar sedimentos. A figura 18.2 ilustra a situação. Diante
disso, na prática, aos volumes computados, nos métodos aqui apresentados,
deverá ser acrescido o volume morto a ser formado. A relação área versus
volume deverá ter uma área não nula quando o armazenamento útil for nulo :
este é a área do espelho líquido quando o reservatório estiver na cota
superior do volume morto.
Sendo obedecidas as condições físicas citadas, concluí-se haver
compatibilidade entre a capacidade útil do reservatório C e a demanda D. No
entanto poderá estar ocorrendo um excesso de capacidade, ou seja, a
capacidade estabelecida é mais que suficiente para atender à demanda. Isso
será comprovado caso o armazenamento mínimo observado ao longo da simulação,
for muito superior a zero ou se o armazenamento final for muito superior ao
que se espera obter no intervalo final da simulação. Para evidenciar isto,
pode-se imprimir estes dois valores ao final da simulação, quando se poderá
optar pela alteração seja de C ou de D.
710 Hidrologia

N Í V E L MÁXIMO

Figura 18.2. Relações entre volumes total, útil e morto.

A tabela 18.2 apresenta o resultado de uma simulação do reservatório


>
mencionado no item anterior onde foí adotada a capacidade útil C = 1.400 Hm3
e D = 33 Hm3. Nesta situação ignorou-se a evaporação e a chuva sobre o
reservatório. Adotou-se como condição inicial o reservatório cheio no início
do intervalo de tempo 5. Observa-se que como já havia sido indicado na tabela
18.1, o reservatório fica vazio no intervalo de tempo 49. Esta simulação foi
realizada com objetiva único de atender à restrição de armazenamento mínimo
sem verificação do armazenamento final. Seria o caso de questionar os
resultados apresentados já que a não ser pela situação inicial,
arbitrariamente estabelecida, o reservatório não encheu nem mesmo ao final da
estação úmida do intervalo 49 ao 54. Isso, no entanto, será deixado para o
exercício proposto no final deste capítulo.
A tabela 18.3 apresenta o resultado obtido pelo método de simulação onde
a evaporação foi incorporada. Adotou-se hipoteticamente uma taxa constante de
evaporação descontada pela chuva igual a 100 mm por mês e uma relação área do
espelho líquido versus volume armazenado estabelecida pela equação :

Área (Km2) = 100 + 0,05 . S (Hm3) (18.7)


Regularização de vazões em reservatórios 711

Tabela 18.2. Método de simulação - açude de Araras - sem evaporação.


Capacidade = 1.400 Hm3; Demanda suprida = 33 Hm3. Colunas: (1) Intervalo de
tempo (meses); (2) Deflúvios (Hm3/mês); (3) Demanda suprida (Hm3/mês); (4)
Evaporação (Hm3/mês); (5) Armazenamento (Hm3).

(1) (2) (3) (4) (5) (D (2) (3) (4) (5)


31 0,0 33 0,0 573,7
32 0,0 33 0,0 540,7
33 0,0 33 0,0 507,7
34 0,0 33 0,0 474,7
35 0,0 33 0,0 441,7
6 13.5 33 0,0 1380,5 36 0,9 33 0,0 409,6
7 0,3 33 0,0 1347,8 37 1,4 33 0,0 378,0
8 0,0 33 0,0 1314,9 38 U 33 0,0 346,3
9 0,0 33 0,0 1281,9 39 43 33 0,0 317,4
10 0,0 33 0,0 1248,9 40 4,8 33 0,0 289,2
11 0,0 33 0,0 1215,9 41 2,7 33 0,0 258,9
12 0,6 33 0,0 1183,5 42 03 33 0,0 226,4
13 2,3 33 0,0 1152,8 43 0,0 33 0,0 193,4
14 2,2 33 0,0 1122,0 44 0,0 33 0,0 160,4
15 2,3 33 0,0 1091,3 45 0,0 33 0,0 127,4
16 3,6 33 0,0 1062,0 46 0,0 33 0,0 94,4
17 1,7 33 0,0 1030,7 47 0,0 33 0,0 61,4
18 0,9 33 0,0 998,5 48 0,6 33 0,0 29,0
19 0,1 33 0,0 965,7 49 3,9 33 0,0 -0,1
20 0,2 33 0,0 932,9 50 34,1 33 0,0 1,0
21 0,0 33 0,0 899,9 51 750,6 33 0,0 718,6
22 0,0 33 0,0 866,9 52 128,4 33 0,0 814,0
23 0,0 33 0,0 833,9 53 83,1 33 0,0 864,2
Á
24 0,0 33 0,0 800,9 54 40,2 33 0,0 871,4
25 03 33 0,0 768,9 55 03 33 0,0 838,6
26 03 33 0,0 735,8 56 0,0 33 0,0 805,6
27 03 33 0,0 7033 57 0,0 33 0,0 772,6
28 23 33 0,0 6723 58 0,0 33 0,0 739,6
29 0,1 33 0,0 639,6 59 0,0 33 0,0 706,6
30 0,0 33 0,0 606,7 60 03 33 0,0 673,7
712
Hidrologia

Tabela 18.3. Método de simulação - açude de Araras - Com evaporação.


Capacidade útil = 2.100 Hm3; Demanda suprida = 33 Hm3. Colunas: (1) Intervalo
de tempo (meses); (2) Deflúvios (Hm3/mês); (3) Demanda suprida (Hm3/mês); (4)
Evaporação (Hm3/mês); (5) Armazenamento (Hm3).
(D ( 2) (3) (4) (D (2) (3) , (4) (5)
821.4
7743
7273
680,8
634.4
6 133 32 202 2060,0 589.1
7 02 33 20,3 2007,0
8 544.7
0,0 33 20,0 1954,0
500.1
9 0,0 33 19,7 19012
10
458.8
0,0 33 192 1848,7 40
11 0,0 33 192 17962 43 2,6 33 12,C 375,9
12 0,6 i 33 18,9 1745,1 4Í 022 33 11,8 3312
13 2,3 33 18,7 1695,7 43 0,02 33 11,6 286,9
14 22 33 18,4 16462 44 0,0 33 H,4 2422
15 2,3 33 182 159721 45 0,0 33 112 1982
36 3,6 33 17,9 15502 46 0,0 33 10,9 1542
17 1,6 33 17,7 15012 47 0,0 33 10,7 1102
18 0,8 33 172 14512 48 02 33 102 672
19 0,1 33 172 14012 49 3,8 33 10,3 28,1
20 02 33 17,0 1351,6 50 34,0 33 10,1 19,0
21 0,0 33 16,7 1301,8 51 7502 33 10,0 7262
22 0,0 33 16,5 12522 52 128,4 33 13,6 8082
23 0,0 33 162 1203,1 53 83,1 33 14,0 844,4
24 0,0 33 16,0 1154,0 54 402 33 142 837,4
25 0,2 33 15.7 1105.6 55 0,1 33 14,1 790,4
26 0,5 33 15.5 1057.6 56 0,0 33 13,9 7432
27 0,4 33 1512 1009.8 57 0,0 33 13,7 696,7
28 22 33 15,0 964,0 58 0,0 33 13,4 6502
29 0,1 33 14.8 9163 59 0,0 33 132 604,0
30 0,0 33 14.5 868.8 60 0,1 33 13,0 558,1
Regularização de vazões em reservatórios 713

Verificou-se inicialmente que não foi possível manter a mesma demanda


atendida pela situação sem evaporação com a capacidade útil 1.400 Hm3 . Por
tentativas, calculou-se a capacidade necessária como 2.100 Hm3. Nota-se que o
armazenamento mínimo ocorreu no mês 50 e foi um pouco acima de zero, ou seja,
19,0 Hm3. Isso indica que se poderia diminuir um pouco mais a capacidade útil
o que não foi feito por julgar-se o valor suficientemente próximo a zero. No
entanto, permanecem as restrições previamente endereçadas ao volume final.
O método de simulação apresentado é bastante flexível. Ele permite, por
exemplo, considerar-se uma demanda variável, sazonal ou anualmente. Ou seja,
se houver uma projeção de aumento da demanda ao longo do tempo, ou se ela
varia intra-anualmente, de acordo com a estação, isso poderá ser considerado
usando-se uma variável dimensionada D(t) para representá-la. O mesmo ocorre
com as taxas de evaporação e de chuva, que poderão variar com o tempo.

18.4 Relação demanda suprida versus capacidade útil

Esta relação mostra os diversos valores de demanda que poderão ser


supridos por capacidades úteis distintas, resumindo as possibilidades de
regularização em uma seção íluvialv A tabela 18.4 apresenta para período de
1913 a 1917 no açude de Araras;-considerando a evaporação e chuva no
reservatório de acordo com os parâmetros anteriores.
Observa-se que na medida em :que a demanda é reduzida, e com isso a
capacidade útil de regularização- requerida, as saídas por evaporação
preponderam sobre as descargas. A capacidade 440 Hm3 estabelece um ponto
limite, onde não se poderá suprir qualquer valor de demanda, já que a
evaporação consumirá toda água disponível no mês de agosto do último ano de
análise.
A questão sobre a dependência do período de análise sobre os resultados
fica clara na mesma tabela 18.4. Nela a relação demanda suprida versus
capacidade útil é apresentada para as mesmas condições previamente utilizadas
no açude de Araras, utilizando-se, no entanto, um período maior de
estimativas de deflúvios afluentes, de 1913 a 1962, com 50 anos.
A surpreendente diferença não pode ser explicada por alterações na média
dos deflúvios. Ela tem valor 33 Hm3 no período de 1913-1917 e diminui para 31
Hm3 no período até 1962. A possibilidade disso ocorrer já havia sido
evidenciada antes com os baixos valores de armazenamentos finais. A
explicação pode ser obtida pela ocorrência, anos de 1951-1960, de uma das
secas mais intensas registradas no Nordeste, e este subperíodo determina o
grande decréscimo das descargas supridas. Esta análise permite uma conclusão
importante de que o período de análise pode afetar a relação capacidade
versus demanda, o que serve de alerta contra a utilização de pequenos
714 Hidrologia

períodos de deflúvios ao dimensionamento de reservatórios.


Outra conclusão relevante é relacionada à inadequação do critério de
estabelecer-se a relação capacidade versus demanda tendo por base uma aversão
total à ocorrência de falhas de suprimento. Para uma capacidade 2100 Hm3, na
maior parte do tempo poderíam ter sido supridas demandas muito maiores que
aquela estabelecida, haja vista a ocorrência freqüente de vertimentos.
Contudo, a demanda é dimensionada em apenas 2,5 Hm3/mês devido ao subperíodo
extremo de seca, que ocorreu uma vez nos registros históricos considerados.
Nas colunas finais da tabela 18.4, apresenta-se a relação entre a
capacidade de armazenamento e a demanda suprida para a seção fluvial de
Araguainha no rio Araguainha, bacia do rio Araguaia, na Região Centro-Oeste,
com área de drenagem de 670 Km2, baseada nos deflúvios de 1968 a 1985. Os
resultados comparam as situações de regularização de região úmida com outra
semi-árida, ambas sujeitas a altas taxas de evaporação. Por questões de
uniformidade foi suposto que a taxa de evaporação descontada da chuva e a
forma geométrica do reservatório, e portanto sua relação área versus
armazenamento, fossem idênticas nas duas regiões. Neste segundo caso pode ser
verificado que as demandas supridas decaem com menor velocidade quando
diminui a capacidade de regularização. Fara permitir s comparação ao longo
das próximas análises, ambas as seções fluviais serão consideradas.

Tabela 18.4. Relações capacidade versus demanda - açude Araras: Área de


drenagem 3587 Km2. Colunas: (1) Capacidade de armazenamento (Hm3); (2)
Demanda suprida (Hm3/mês) -1913 a 1917; (3) Demanda suprida (Hm3/m cs)-1913
a 1962.açude Araguainha: Área de drenagem 670 Km2. Significado das colunas;
(4) Capacidade de armazenamento (Hm3); (5) Demanda suprida (Hm3/mês) - 1968 a

(1) (2) (3) (4) (5)


2100 33 24 4500 65
1700 25 1,7 4000 62
1430 20 1.1 3500 59
1180 15 04 3000 55
930 10 0 2500 51
690 5 2000 46
560 2,5 1500 41
520 1.7 1000 36
490 1,1 500 29
465 04 250 21
Regularização de vazões em reservatórios 715

18.5 Garantia de atendimento à demanda

Para contornar a crítica anterior relacionada à aversão total a falhas


de suprimento pode-se modificar ligeiramente o modelo de simulação
apresentado na figura 18.1. Considera-se agora que uma falha ocorrerá apenas
de houver a condição S(t) < 0 em um número de meses maior que o tolerado.
Cada vez que esta condição ocorrer considera-se que houve uma falha de
atendimento à demanda projetada e introduz-se a correção S(t) = 0. Na tabela
18.5 apresenta-se o resultado considerando o período completo de 60 anos no
Açude de Araras admitindo-se a ocorrência de 60 e 120 falhas, ou seja,
garantias de que em 90% e 80% dos meses a demanda projetada .será atendida. Na
tabela 18.6 apresenta-se a relação para as mesmas garantias de atendimento em
Araguainha.

Tabela 18.5. Capacidade útil versus demanda no açude de Araras.


Capacidade Demanda Demanda
suprida suprida
(90%) (80%)
Hm3 (Hm3/mês) (Hm3/mês)
2100 8,0 15
1700 7,0 14
1430 6,0 13
1180 5,5 12
930 5,0 10
690 3,0 8
560 1,0 6
520 04 5
490 0,1 4
465 0,0 34

Verifica-se que o atendimento das demandas no açude de Araras com


garantias 90% e 80% resultam em demandas substancialmente maiores que aquelas
garantidas em 100% dos intervalos de tempo, principalmente para os maiores
valores de capacidade. A maioria das falhas ocorreu nos subperxodos de Julho
de 1954 a março de 1957 e de maio de 1958 a março de 1961, que correspondem a
situações extremas de seca em que as vazões do rio Acarau em Araras foram
próximas a zero.
Já em Araguainha o incremento da demanda atendida, embora significativo,
não é tão pronunciado, mostrando outra típica diferença entre as
regularizações em regiões semi-áridas e úmidas.
Embora este critério de dimensionamento da capacidade, tendo por base a
716 Hidrologia

garantia parcial de atendimento, apresente um progresso diante daquele em que


é estabelecida uma garantia de 100%, ele ainda foge a certos aspectos da
realidade. Pode-se imaginar que a operação de um reservatório visa ao
atendimento de diversos tipos de demandas com prioridades distintas. Assim,
havería uma classe prioritária, que deverá ser atendida com grande garantia,
próxima a 100%. Este podería ser o caso do atendimento às necessidades
básicas de consumo humano. Outras classes de demanda apresentam menores
prioridades. Um reservatório podería ser dimensionado visando à maximização
de um esquema de atendimentos que reflita estas prioridades. Outro aspecto
que podería ser considerado é o clima regional. Em regiões semi-áridas, onde
são ffeqüentes as ocorrências de períodos de vazões nulas, deveria haver
maior tolerância a situações de não atendimento à demanda do que em regiões
úmidas.

Tabela 18,6. Capacidade útil versus demanda no açude de Araguainha.


Capacidade Demanda Demanda
suprida suprida
(90%) (80%)
Hm3 (Hin3/mês) j(Km3/mês)
4500 77 92
4000 74 87
3500 71 85
3000 66 80
2500 61 75
2000 57 70
1500 53 65
1000 46 60
500 39 53
250 35 47
125 29 39

Em função desta constatação, o modelo de simulação apresentado pode ser


mais uma vez modificado. Supõem-se que o objetivo do dimensionamento pode ser
transcrito da seguinte forma: considera-se como demanda-alvo, ou seja, aquela
que deverá ser suprida sempre que seja viável, um valor D que possa ser
atendido em 60%, em média, durante os 5 anos mais críticos, 80% nos 10 anos
mais críticos e 90% nos 20 anos mais críticos. Ou seja, o reservatório terá
sua operação simulada. Serão localizados os subperíodos mais críticos com 5,
10 e 20 anos, em termos da média do suprimento realizado. A capacidade útil
do reservatório será aceita se as médias dos subperíodos críticos superarem,
respectivamente, 60%, 80% e 90% do valor estipulado da demanda.
Regularização de vazões em reservatórios 717

Duas alternativas existem quanto à fixação dos subperíodos críticos. Em


uma delas poderá haver sobreposição dos subperíodos. Ou seja, um subperíodo
menor poderá estar contido, parcialmente ou não, em outro maior. Na outra
alternativa não poderá haver sobreposição e os subperíodos críticos deverão
abranger subperíodos distintos,
O modelo de simulação foi alterado para considerar este critério, em
suas duas alternativas. A tabela 18.7 apresenta os resultados para o açude de
Araras. Para capacidade de 690 Hm3 não houve demanda superior a zero que
pudesse ser estabelecida com os percentuais de atendimento fixados. Nota-se
que as condições estabelecidas para subperíodos maiores foram sempre mais
difíceis de serem implementadas, quando houve sobreposição de subperíodos.
Não havendo essa sobreposição as demandas atendidas são um pouco maiores para
uma mesma capacidade em relação à outra alternativa. Além disso, os
subperíodos maiores determinaram em todos os c a s o s a dimensão estabelecida.

Tabela 18.7. Relação capacidade versus demanda para atendimento de 60% nos
3anos, 80% nos 5 anos e 90% nos 10 anos mais críticos - açude de Araras
1913/1962.
Capacidade Demanda Percentuais Demanda Percentuais
suprida suprimento suprida suprimento
Hm3 (Hm3/mês) 5,10,20 anos (Hm3/mês) 5,10,20 anos
* * ** **

2100 3,5 66,80,90 3,70 61,100,100


1700 2,7 67,80,90 2,80 61,100,100
1430 2,0 69,82,91 2/25 61,100,100
1180 u 67,80,90 1,65 61,100,100
1100 u 67,80,90 1,40 61,100,100
930 02 67,80,90 0,35 61,100,100
690 0 0
* com sobreposição
** sem sobreposição

Na tabela 18.8 a mesma análise é realizada para a seção de Araguainha.


Nota-se que as conclusões são análogas às anteriores, em que pesem as
diferenças de valores. Na situação sem sobreposição dos subperíodos críticos
não foi encontrado um com 10 anos que não tivesse partes comuns com os
menores, devido à pequena extensão dos registros de deflúvios. -
Concluindo, o método de simulação permite analisar as necessidades e
investimento em capacidade de armazenamento para suprir as demandas dentro e
praticamente qualquer esquema preestabelecido. Ele tem como limitações 0 a °
de necessitar de séries de deflúvios na seção de barramento e de requerer
718 Hidrologia

conhecimento do armazenamento inicial. Elas não são, porém a maior restrição


à sua utilização.

18.6 Método baseado nas diferenças em relação a seqüências de deflúvios


mínimos

Este método apresenta similaridade com relação ao método da curva de


diferenças acumuladas. Neste último existe um período que determina os
valores de capacidade necessária. Ele é o período de vazões mínimas, quando
ocorrem as condições mais críticas de suprimento e, portanto, quando o
armazenamento de água é totalmente utilizado, esvaziando completamente o
reservatório. Este período, que será chamado de período crítico, pode ser
distinto dependendo da demanda a ser suprida. Supondo que o reservatório
esteja cheio no início do mesmo, resulta que no instante mais crítico toda a
capacidade de armazenamento terá sido utilizada.

Tabela 18.8. Relação capacidade versus demanda para atendimento de 60% nos
anos, 80% nos 5 anos e 90% nos 10 anos mais críticos - Reservatório de
Araguainha - 1968/1985.
1---------------
jCapacidade Demanda Percentuais de Demanda Percentuais de
suprida suprimento em suprida suprimento em
. Hm3 HnvVmês 5, 10, 20 anos Hm^/mês 5,10,20 anos
4500 75 73,80,90 79 61, 95,-
4000 71 73,81,90 77 61, 96,-
3500 67 72,81,91 75 60, 89,-
3000 64 73,80,90 69 62, 91,-
2500 60 73,80,90 65 60, 92,-
2000 55 70,81,91 60 62, 97,-
1500 50 66,82,91 52 60,100,-
1000 44 66,80,90 45 62,100,-
500 37 69,82,91 40 60, 99,-
250 33 69,81,91 36 60, 99,-
125 29 70,80,90 33 60, 94,-
* com sobreposição
** sem sobreposição

Dessa constatação conclui-se que se forem computadas as seqüências de


deflúvios mínimos com diversos períodos de extensão, serão obtidas as
alternativas de período crítico. Computando-se as diferenças entre os
volumes totais a serem supridos e os deflúvios totais em cada período crítico
alternativo seriam obtidas as capacidades de armazenamento útil necessárias.
Regularização de vazões em reservatórios 719

sempre aceitando-se a suposição que o reservatório esteja cheio no seu


início. A tabela 18.9 ilustra o procedimento.
Na primeira coluna são colocados os meses da seqüência de vazões. Por
brevidade eles são apresentados de 5 em 5 meses. Na segunda coluna apresenta-
se o somatório da demanda a ser suprida. Supõem-se que seu valor seja 81
Hm3/mês. Dessa forma os valores são calculados com I x 81, sendo I o número
de meses. Na terceira coluna são colocados os valores mínimos dos somatórios
dos deflúvios com período igual ao número de meses. Por exemplo, o mês com
menor vazão observada teve-a com valor 0. A seqüência de 5 meses com menor
somatório de vazões apresentou o valor 55 e para 10 meses, 163. A coluna 4
apresenta a capacidade de armazenamento necessária para suprir a demanda nos
períodos críticos, supondo que no seu início o reservatório esteja cheio. Seu
valor será calculado pela diferença entre as necessidades (coluna 2) e o
suprimento natural no período crítico (coluna 3). A última coluna apresenta a
localização do último mês do período crítico com a extensão dada.
Supondo o reservatório cheio no início do período crítico, ele deveria
ter o valor 81 para suprir o período mais crítico com extensão 1 mes, 350
para 5 meses, etc ... Obviamente, o maior valor de capacidade útil definirá
aquela necessária para suprir a demanda durante toda a seqüência de vazões.
Seu valor é 4050 Hm3 e ocorre para o período crítico com extensão 115 meses.
Na realidade, caso fossem pesquisados os períodos críticos com qualquer
extensão entre 1 e 216 meses, o valor de capacidade seria 4097 e o período
crítico correspondente ao de extensão 119 meses que não aparece na tabela
18.9. A tabela 18.10 apresenta as capacidades necessárias para os diferentes
suprimentos. Nota-se que quanto maior for o suprimento, maior será a extensão
do período crítico, ou seja, do período que exigirá maior armazenamento
acumulado para suplementar suas necessidades.
A mesma análise é repetida para o açude de Araras e seus resultados
apresentados na tabela 18.11.
Este método tem a vantagem de automatizar o cálculo das capacidades sem
necessidade de iterações, como no método de simulação. As restrições a sua
utilização são as mesmas do método de simulação, acrescidas de que não é
considerada a evaporação, da exigência de que a demanda atendida seja
constante, e da suposição de que no início do período crítico o reservatório
esteja cheio. Para introdução da evaporação pode-se considerá-la, de forma
aproximada, como um valor mensal constante a ser subtraído dos deflúvios,
referente a um volume útil armazenado médio entre 2/3 ou 3/4 da capacidade
útil. Este é o valor médio dos armazenamentos, que na prática é encontrado
nos reservatórios reais, embora seja sujeito à confirmação. Os resultados
serão aproximados, mas eliminarão em parte uma incorreção que é importante
quando se trabalha em regiões semi-áridas, principalmente.
720 Hidrologia

Tabela 18.9. Computação da capacidade de armazenamento pelo método das


diferenças para as seqüências de deflúvios mínimos do rio Araguainha em-
Araguainha - 1968-1985. Colunas: (1) Demanda; (2) Suprimento; (3) Capacidade;
(4) Intervalo crítico.
Período 1 2 3 4 Período 1 2 3 4
1 81 0 81 173 110 8910 5122 3788 114
5 405 55 350 48 115 9315 5265 4050 118
10 810 163 647 50 120 9720 5997 3722 118
15 1215 259 956 57 125 10125 6482 3643 129
20 1620 402 1218 59 130 10530 6792 3738 131
25 2025 627 1398 66 135 10935 7355 3580 138
30 2430 723 1707 69 140 11340 7619 3721 143
35 2835 1063 1772 61 145 11745 8976 2768 143
40 3240 1184 2056 69 150 12150 9405 2744 154
45 3645 1414 2231 71 155 12554 9709 2846 155
50 4050 1601 2449 69 160 12959 10563 2397 162
55 4455 1761 2694 70 165 13364 10871 2493 167
60 4860 2151 2709 83 170 13769 13574 196 173
65 5265 2251 3014 83 175 14174 13852 322 178
70 5670 2540 3130 71 180 14579 14505 75 178
75 6075 2803 3272 81 185 14984 15089 -105 186
80 6480 2930 3549 83 190 15389 15405 -15 190
85 6885 3547 3338 86 195 15794 15876 -81 198
90 7290 3704 3585 94 200 16199 16100 99 203
95 7695 4007 3688 95 205 16604 16799 -194 209
100 8100 4310 3790 105 210 17009 16976 34 213'
105 8580 4541 3964 106 215 17414 17308 106 215

18.7 Extensão à consideração de risco de desatendimento

Outra vantagem do método anterior é que existe possibilidade de se


introduzir a consideração do risco de não atendimento à demanda de forma
expedita. As seqüências de vazões mínimas nas quais o método se baseou são as
mais severas no período de dados. Suponha agora que sejam também
identificadas as segundas, terceiras, quartas, etc. seqüências mais severas
de estiagem. Por exemplo, a segunda sequência seria aquela mais severa não
idêntica à mais severa de todas. As tabelas 18.12 e 18.13 apresentam os
valores acumulados de deflúvios em extensões que vão de 1 ao número total de
meses de observação, nos cinco períodos sucessivamente mais críticos, onde
foram eliminados alguns intervalos por questões de compactação.
Regularização de vazões em reservatórios 721

Como as seqüências apresentadas são a mais severa, a segunda mais


severa, etc., até a quinta mais severa, em 16 anos, nos casos dos
reservatórios de Araguainha e de Araras, pode-se associar a elas tempos de
retomo. Por exemplo, pela fórmula de Weibull :

T = (N + 1) / m (18.7)

onde T = a estimativa do tempo de retomo da série ordenada segundo o grau de


severidade; N é o número de anos da série em análise; m é o ordem de
severidade da série de mínimas.

Tabela 18.10. Relação suprimento versus capacidade de regularização -


reservatório de Araguainha - 1968-1985.
Suprimento Extensão período Capacidade
crítico
Hm3 meses Hm3
4,05 1 4,0
8,10 2 8,3
12,15 2 16,4
16,20 7 34,9
20,25 7 63,2
24,30 17 118,0
28,35 17 186,9
32,40 17 255,7
36,45 30 370,1
40,50 31 495,2
44,55 54 691,8
48,60 80 957,6
52,65 80 1281,5
56,70 80 1605,5
60,75 80 1929,5
64,80 103 2270,5
68,85 105 2688,4
72,90 119 3133^2
76,95 119 3615,1
81,00 119 4097,0

As tabelas 18.14 e 18.15 apresentam as capacidades de regularizaçao


necessárias para cada série calculadas pelo mesmo procedimento previamente
adotado. Os tempos de retomo associados a cada série são apresenta os
estimam o valor de risco de não atendimento. Ou seja, as capaci a
722 Hidrologia

referentes à série de mínimas com severidade 5 atendem às demandas com falhas


ocorrendo, em média, a cada 3,8 anos no reservatório de Araguainha e 12,2
anos no açude de Araras.
A interpretação para a capacidade referente à série mais severa merece
algum comentário. Mantendo o que se adotou previamente, essa capacidade seria
suficiente para atender à demanda com falhas ocorrendo em média a cada 19 e
61 anos. A lógica dessa interpretação é: já que com as capacidades
estabelecidas, não ocorreríam falhas de atendimento à demanda ao longo dos 18
ou 60 anos de dados analisados em Baira e Araras, respectivamente, estima-se
que em ocorrendo falhas elas, em média, seriam observadas a cada 19 e 61
anos. Isso implica admitir-se que se houvesse mais um ano de observações ele
estabelecería uma falha de atendimento, o que não é possível de se comprovar.

Tabela 18.1LRelação suprimento versus capacidade de regularização: açude de


Araras.
Suprimento Extensão Período Capacidade
Crítico
Hm3 meses Hm3
1,54 57 64,9
3,09 82 154,1
4,63 82 280,7
6,17 82 407,2
7,71 117 5643
9,26 117 744,9
10,80 117 925,4
1234 117 1106,0
13,89 129 12993
15,43 248 1592,4
16,97 249 1976,6
1832 249 2360,8
29,06 249 2745,1
21,60 249 31293
23,15 249 3513,6
24,69 310 3918,6
2633 310 4397,0
27,78 331 4901,9
2932 331 5412,7
30,86 331 59233
Regularização de vazões em reservatórios 723

Tabela 18.12. Valores mínimos acumulados de vazão (Hm3) afluentes ao açude de


Araguainha com níveis de severidade de 1 a 5.
Extensão Nível Nível Nível Nível Nível
meses 5 4 3 2 1
1 5,8 53 2,6 0,0 0,0
20 4993 4473 4163 4073 401,7
40 1217,8 1195,7 1190,4 1170,6 1168,5
60 2133,7 2131,6 2128,4 2128,2 2059,9
80 3073,3 3013,8 2969,0 2918,7 2885,5
100 4328,8 4314,3 4300,9 4295,8 4285,8
120 5541,6 5541,6 5541,6 5541,6 5541,6
140 7687,4 76303 7581,7 7573,8 7550,1
160 10524,4 10524,4 10524,4 10508,3 10488,9
180 14157,0 14157,0 14157,0 14157,0 14157,0
200 16150,5 16093,6 160553 16054,1 16038,3
216 173083 173083 173083 17308,3 173083

Tabela 18.13. Valores mínimos acumulados de vazões afluentes ao açude da


Araras com níveis de severidade de 1 a 5.
Extensão Nível Nível Nível Nível Nível
meses 5 4 3 2 1

1 0 0 0 0 0
50 203 203 20,5 203 203
100 329,1 328,6 3283 3283 3283
150 10273 9393 9353 935,1 935,1
200 19983 1985,1 1882,9 1840,6 1838,6
250 27223 2722,0 2705,7 2395,7 2294,6
300 3708,0 3708,0 3708,0 3708,0 3708,0
350 6476,9 6476,8 6476,8 6476,8 6476,8
400 7249,0 7248,4 72473 72473 72463
450 101753 101753 98823 9658,4 96573
500 15613,7 156073 15568,7 15216,6 148053
450 16862,7 16861,0 16858,8 168563 16853,0
600 185173 185173 185173 185173 185173
Tabela 18.14. Relação suprimento versus capacidade de regularização
diferentes riscos, açude de Araras.

Demanda em Hm3 Capacidades úteis requeridas em Hm3


Tr ,Tr Tr Tr Tr
12,2 15,25 2033 30,5 61
anos anos anos anos anos
134 58,9 60,4 62,0 633 64,9
4,63 262,3 266,9 271,6 276,2 280,7
7,71 533,6 541,3 549,0 556,7 5643
10,80 882,4 893,2 903,9 914,7 925,4
13,89 1243,9 1257,8 1271,7 12853 1299,3
16,97 1909,3 1926,2 1943,2 1960,1 1976,6
20,06 2665,4 2685,4 27053 27253 2745,1
23,15 3422,8 3445,7 3467,8 3490,9 3513,6
26,23 4296,0 4322,3 43483 4374,6 4397,0
, 27,78 4790,8 4818,6 4846,4 4874,2 4902,0
29,32 5295,4 5324,8 5354,1 5383,4 5412,7
30,86 5800,0 5830,9 5861,8 5892,6 59233

Tabela 18.15. Relação suprimento versus capacidade de regularizaç


diferentes riscos. Reservatório de Araguainha.
Regularização de vazões em reservatórios 725

Essa concepção de risco de falha não é a mesma adotada no método de


simulação. Na simulação, risco de falha é dado pelo cociente entre o número
de meses com falhas e o número total de meses da simulação. No método
apresentado, considera-se falha a ocorrência de desatendimento à demanda uma
ou mais vezes durante determinado subperíodo.

PROBLEMAS

1 - Os resultados das simulações apresentadas nas tabelas 18.2 e 18.3 foram


criticados por serem os volumes armazenados finais no reservatório
considerados inadequados, a) Estabeleça e justifique um critério de adequação
para este volume; b) Refaça as simulações, calculando as demandas que
poderíam ser supridas com as mesmas capacidades úteis indicadas.

2 - Para os deflúvios mensais afluentes ao açude de Araras no período de


1913 a 1917, apresentados na tabela 18.2, estime as demandas que podem ser
supridas com capacidade útil 2.100 Hm3 com 90% de garantia.

3 - Aplique o método das diferenças em relação às sequências de deflúvios


mínimos aos deflúvios apresentados na tabela 18.2, recalculando a relação
suprimento versus capacidade útil apresentada na tabela 18.11.

4 - Refaça a tabela 18.1^ adotando, como série de deflúvios, aquela


apresentada na tabela 18.2.
Capítulo 19

GESTÃO DOS RECURSOS HÍDRICOS

Antonio Eduardo Lanna

19.1 Introdução

Os recursos hídricos são bens de relevante valor para a promoção do bem-,


estar de uma sociedade. A água é bem de consumo final ou intermediário na
quase totalidade das atividades humanas. Com o aumento da intensidade e
variedade desses usos ocorrem conflitos entre usuários. Uma forma eficiente
de evitar e administrar estes conflitos é a gestão integrada do uso, controle
e conservação dos recursos hídricos. Isto envolve a consideração de uma
grande diversidade de objetivos (econômicos, ambientais, sociais, etc ), usos
(irrigação, geração de energia, abastecimento, etc ) e alternativas. Deste
quadro, o planejamento dos recursos hídricos aparece como uma atividade
complexa, que envolve grande número de disciplinas e que deve ser aplicado
por equipes multi e interdisciplinares. Devido à importância estratégica
deste recurso e à sua vulnerabilidade, haja vista os problemas de poluição,
sua gestão não pode ser executada de forma eficiente para a sociedade através
da sua admissão em propriedade privada. Diante disso, a Constituição
Brasileira atribuiu à União e aos Estados a propriedade dos recursos
hídricos. Nessas circunstâncias o poder público deve estruturar um Sistema de
Gerenciamento de Recursos Hídricos para coordenar e articular os seus
diferentes usos e controles. Esses diversos aspectos serão considerados neste
capítulo. Inicialmente serão introduzidos alguns conceitos econômicos
relacionados à avaliação de investimentos e formação de uma infra-estrutura
produtiva. A Engenharia de Recursos Hídricos se insere neste processo - seus
propósitos são sintetizados abrindo oportunidade para a classificação dos
tipos de uso da água. A diversidade destes usos remete o texto para a
consideração dos projetos de uso múltiplo que, além de oportunizarem o
compartilhamento de recursos e obtenção de economias de escala, aparecem
inevitavelmente com a intensificação do uso da água. O quadro até então
apresentado permitirá vislumbar a complexidade e a interdisciplinariedade do
planejamento dos recursos hídricos.
O planejamento dos recursos hídricos é levado a cabo através de uma
série de documentos idealmente articulados que se diferenciam quanto aos
objetivos, à abrangência setorial e geográfica, e ao detalhamento. Uma
tentativa de definição e classificação é apresentada em coniunto com
728
Hidrologia

considerações sobre a harmonização e articulação de diferentes documentos.


Os aspectos legais dos recursos hídricos são então brevemente
comentados, particularmente os relacionados com a sua propriedade estatal. O
Estado e a União, para assumirem efetivamente a propriedade deste recurso
estratégico, em nome e para benefício da sociedade, devem estruturar sistemas
de gerenciamento que incorporem as diretrizes de um Modelo de Gestão
adequado. Esses sistemas devem promover a articulação entre as diversas
entidades e instituições públicas e privadas que atuam na área dos recursos
hídricos, facultando que o uso, controle e conservação da água, seja
realizado com benefícios para a sociedade.

19.2 O processo de formação de capital

Um pequeno lavrador, em um país que adote um regime econômico baseado na


livre iniciativa, cultiva o necessário para sua subsistência. Um dia resolve
restringir parte do consumo de uma colheita, com o objetivo de comercializá-
la. Com o dinheiro obtido, adquire um equipamento que lhe permite obter uma
maior eficiência agrícola, incrementando sua produção. A partir daí opta por
manter uma certa restrição ao consumo e, com isso, aumenta o número de
equipamentos e a área de sua propriedade. Continuando com sucesso, em algum
tempo poderá tomar-se um médio agricultor, com um nível de consumo superior
ao inicial. r
Nesse exemplo ocorreu, em escala reduzida um processo de formação de
capital. O agricultor tinha à sua disposição recursos naturais, na forma de
terras agricultáveis e clima. Tinha o recurso do trabalho, seu c talvez de
sua família. Tinha igualmente tecnologia agrícola para tomar mais eficiente
sua atividade, através de orientações para um manejo adequado do solo e
sementes aclimatadas à região. Pela restrição que estabeleceu em seu consumo
ele pode como que transformar bens de consumo, arroz e feijão por exemplo, em
bens de capital, equipamentos agrícolas. Através da formação dessa infra-
estrutura ele pode atuar com maior eficiência e aumentar, tendo sucesso
tanto o seu mvel de consumo como a sua capitalização ou seja, adquirir bens’
de capitai e expandir sua atividade.
Esse processo de formação de capital se repete com características
álogas, embora em proporções bens distintas, em qualquer sociedade em
desenvolvimento econômico, independente do regime econômico adotado Cabe
alertar contudo que nem sempre a restrição ao consumo é adotada por decisão
pessoal do trabalhador, mas lhe é imposta pelo poder público ou pelos agentes
econonucos. Também nem sempre o usufruto da formação do capital é repartido
nas mesmas proporçoes com que foi exigido o sacrifício prévio. E muitas vezes
acumulaçao de capital ocorre, não através do sacrifício pessoal de quem o
o b s ^ l ’ maS’ também’ através de roubos- Pilhagens e opressão econômica. Não
bstante esses aspectos condenáveis, ao se focalizar a sociedade em sua
729
Gestão dos recursos hídricos

globalidade, a analogia com o agricultor pode-se aplicar sem maiores


ressalvas. A figura 19.í ilustra esse processo de formação de capital sob
essa ótica social global. , ,
Os recursos naturais disponíveis, na forma de terra, água, minenos,
etc., somados ao trabalho da população, geram bens de consumo e de capital.
Exemplos de bens de consumo são alimentos, roupas, educação e segurança
pública. Os bens de capital são aqueles que produzidos em determinado momento
deverão ser utilizados em fase posterior para produção de mais bens de
consumo ou outros bens de capital. Os bens de consumo podem ser também
classificados em bens de consumo final ou intermediário. No primeiro caso,
como o próprio nome indica, a produção dos mesmos visa a satisfação de uma
necessidade social. No caso intermediário, trata-se com bens cujo consumo faz
parte de um processo produtivo que resultará no aumento da disponibilidade de
bens e serviços, de consumo ou de capital, para a sociedade. A água pode ser
classificada tanto ^omo um recurso natural e, conforme o uso que lhe é
destinado, como bem de consumo intermediário ou final. Por exemplo, quando
usada para irrigação ou usos domésticos, respectivamente.

Figura 19.1. Processo de formação de capitai.

19j Elementos de análise de projetos sob os pontos de vista social e privado

O uso de recursos para formação de bens de capitai é denominado


investimento. Algumas considerações sobre a eficiência ^econômica e um
investimento se fazem necessárias. Os recursos correntes têm geralmente
' Hidrologia

alternativos. As vazões de um rio podem ser usadas para irrigação ou


abastecimento industrial, por exemplo. Sob o ponto de vista financeiro, o
custo do investimento é aquele que pode ser determinado no mercado onde estes
bens são transacionados e que deve ser pago pelo investidor de forma a
adquiri-los. Já dentro de uma preocupação de eficiência econômica, no uso dos
recursos hídricos, o custo do investimento é o benefício do qual se é privado
em função deste mesmo investimento. Este benefício é aquele que podería ser
obtido pelo uso dos recursos na segunda alternativa mais rentável, que seria
efetivamente adotada, caso o investimento analisado não fosse. Ele é
denominado em economia como o custo de oportunidade do investimento. Para
melhor esclarecer esses conceitos, é necessário apresentar alguns exemplos, o
que será feito nos próximos parágrafos.

Exemplo 19.1. No caso específico da água algumas situações mostram claramente


a distinção dos pontos de vista financeiro e econômico. O uso das águas de um
rio em uma seção para abastecimento de uma cidade tem, no que diz respeito à
água unicamente, custo financeiro nulo, quando não houver cobrança pelo
mesmo. O custo econômico, entretanto, seria o benefício do uso alternativo,
irrigação, por exemplo, que deixa de ser realizado em função da adoção da
opção de abastecimento.

Exemplo 19.2. Para a construção de um reservatório há necessidade de se


desapropriar uma determinada área. Esta área, sem o reservatório, seria usada
para a pecuária, com um ganho médio anual de 100 kg de carne por hectare O
custo da desapropriação será de $ 100.000,00 unidades monetárias. Qual o
custo financeiro e o custo econômico desta área inundada? Os dados indicam
que o custo financeiro será o da desapropriação, igual a $ 100.000,00. Já o
custo econômico será o que a sociedade perde com o uso da área para
reservatório : 100 kg de came por hectare a cada ano.

Voltando ao problema do agricultor, suponha que uma alternativa seja a


venda de sua propriedade e a aquisição de uma pequena loja comercial na
cidade. Ao adotar outra alternativa de investimento, ele se privou daquela
, um enfoque puramente econômico, a decisão de investimento adotada
(expansao da atividade agrícola) será eficiente caso os seus benefícios
superem os do uso da loja comercial, o chamado custo de oportunidade.
O exemplo mostra igualmente a possibilidade de existência de outros
aspectos a serem considerados, ligados a preferências pessoais do agricultor.
Ele poderá valonzar mais a vida no campo do que na cidade e estar propenso a
realizar um investimento não eficiente economicamente em função disso. Em
análises mais abrangentes, isso correspondería à introdução de outros
aspectos de natureza não-econômica no julgamento de opções de investimento.
Gestão dos recursos hídricos 731

Exemplo 193. Suponha que o reservatório do exemplo anterior crie uma


barreira natural para a migração de peixes. Isso representa um custo
ambiental que deve ser levado em consideração na análise do projeto, embora
não possa ser comparado com custos e benefícios de natureza econômica.
Uma decisão importante a ser tomada por uma sociedade é sobre a divisão
na produção entre os bens de consumo e os bens de capital. Tal como ocorreu
com o agricultor no exemplo anterior, a produção de bens de capital implica a
diminuição de bens de consumo e a restrição do bem-estar da sociedade,
naquele momento. Essa restrição, caso resulte na formação de capital,
permitirá que no futuro aumentem as disponibilidades, seja de bens de
consumo, seja de bens de capital, que darão continuidade, de forma mais
intensa, áo processo de formação de capital. Pode-se dizer que houve ganho
econômico ou que o investimento tem viabilidade econômica, quando o
sacrifício proposto no presente resulta em bens no futuro que superam em
valor aqueles sacrificados. Mas somente haverá eficiência econômica quando
qualquer outra alternativa de investimento dos recursos resulte em
quantidades de bens no futuro que valham menos que os obtidos no projeto
analisado. Na seleção de projetos ou de investimentos, se busca a eficiência
econômica. Diante disto, a orientação deve ser. realizar o investimento, mais
rentável entre todas as alternativas existentes. Isso justifica o artifício
de se denominar por custo de oportunidade ao benefício que seria obtido na
segunda melhor alternativa ao investimento realizado e exigir que este tenha
benefícios superiores a este seu custo econômico.
Já sob o ponto de vista financeiro a análise é mais direta : uma despesa
financeira deve ser sempre coberta por uma disponibilidade financeira. A
disponibilidade financeira resulta de poupança, receitas ou empréstimos. A
poupança é formada pela restrição ao gasto de disponibilidades financeiras. A
receita é resultante das transações de bens, em geral resultantes do
investimento realizado. Os empréstimos são captados pelo investidor cnando
necessidades futuras de pagamentos, ou despesas financeiras futuras. Um
investimento será financeiramente viável quando houver disponibilidade
financeira para atender ao compromisso de pagamento de uma despesa.
Outra consideração importante refere-se ao ponto de vista sob o^ qual as
análises econômica e financeira são realizadas. Cabe aí a distinção entre
projetos e análise de investimentos públicos e privados. Os primeiros devem
ser realizados em benefício da sociedade como um todo, e serão pagos por ela
através de seus impostos e outros tipos de recolhimento, indireta ou
diretamente relacionados com os projetos. A análise, sob este ponto de vista
social, tem grande relevância nos projetos de recursos hídricos, já que boa
parte deles são públicos e como tais buscam gerar benefícios para a sociedade
como um todo. Já os investimentos privados, têm em geral alcance mais
limitado, pois visam primariamente a gerar benefícios ao empreendedor e serão
por ele financiados. No entanto, o empreendedor faz parte da sociedade. Por
_________ Hidrologia

isto, poderia-se argumentar que os benefícios e custos, que sobre ele


incidem, são os mesmos que incidirão sobre a sociedade. Em conseqüência, a
análise de um projeto privado, sob ponto de vista público, não necessitaria
de qualquer alteração. Os benefícios e custos que incidem sobre o agente
privado, que faz parte da sociedade, serão os benefícios e custos que
incidirão sobre esta mesma sociedade, ou os benefícios e custos sociais do
projeto.
Esta afirmativa seria cometa se não houvesse pelo menos dois eventos
que fazem com que os custos e os benefícios privados não reflitam custos e
benefícios sociais. Um primeiro caso seriam as transferências de pagamento.
Retomando o exemplo 19.2, suponha que a construção do reservatório integre
um projeto público. A desapropriação da área resultaria em pagamento que a
sociedade faria à parte privada que é proprietária da terra. No entanto, para
a sociedade como um todo, incluindo esta parte privada, houve unicamente uma
transferência de pagamento, sem custo econômico. O pagamento realizado pela
sociedade, excluída a parte privada, é igual à receita obtida por esta parte.
Considerando a sociedade como um todo, não houve custo nem benefício
resultante dessa transação financeira.
Analisando as conseqüências unicamente sobre a parte privada, houve uma
transação em que 100 kg de carne por hectare/ano foram negociados por
$100.000,00. Sob o ponto de vista social ou seja, da sociedade como um todo,
houve tão-somente a perda de 100 kg por hectare/ano, o custo social que
devera ser justificado pelos benefícios do projeto. Está aí a diferença entre
o ponto de vista privado e social.
_ 0uíro event0 9ue pode fazer com que os custos e os benefícios privados
nao sejam custos e benefícios sociais são as chamadas extemalidades, ou os
efeitos colaterais dos projetos, que atingem a terceiros. Vários exemplos
podem ser apresentados. A poluição hídrica causada por uma fábrica, efeito
colateral do empreendimento que atinge aos usuários de água do trecho fluvial
a jusante da emissão, seria uma extemalidade negativa ou um custo externo. O
estimulo à economia regional que tal empreendimento acarretaria, resultado da
demanda por msumos e da oferta de produtos que fazem parte do processo
industrial, sem uma extemalidade positiva ou benefício externo. Um
reservatório cnado para viabilizar a navegação no trecho fluvial a jusante
da banagem através do aumento das vazões de estiagem, permitiría o aumento
da d luiçao dos efluentes deste mesmo trecho, resultando em uma extemalidade
positiva. Em paralelo, ele inviabilizaria atividade turísticas e esportivas
de canoagem que eram realizadas nos rápidos deste trecho fluvial de jusante o
que desestimularia a economia regional, acarretando indiretamente uma
extemalidade negativa.
Nos exemplos de extemalidades positivas e negativas apresentados fica
dUaS natUrezaS destes efeitos: ^ u m a s são transmitidas por
ligações físicas com o agente, como é o caso da poluição industrial e a
Gestão dos recursos hídricos 733

diluição de efluentes. Outras são trasmitidas por ligações econômicas: o


estímulo econômico de origem industrial e o desestimulo econômico resultante
da inviabilização ao turismo e atividades esportivas. As primeiras são
denominadas extemalidades tecnológicas e as segundas extemalidades
pecuniárias. _ ■
O problema das extemalidades é que elas nem sempre são consideradas na
análise de projetos privados, embora, obviamente, o devam ser em projetos
públicos, já que são custos ou benefícios gerados para a sociedade. O
industrial do exemplo realizará sua análise econômica privada ignorando o
custo social da poluição e o benefício social do estímulo à atividade
econômica. Sob. o ponto de vista social, aos custos e benefícios considerados
pelo industrial deverão ser agregadas essas extemalidades. Alguma
dificuldade pode existir para suas projeções e mensurações era. termos
econômicos. . . . ,
A existência de extemalidades em projetos de investimento privados
poderão resultar em uma escala ineficiente sob o ponto de vista social. Ao
não considerar o custo social da poluição hídrica no processo de maximização
dos benefícios líquidos privados, o industrial poderá estabelecer uma escala
superdimensionada para a indústria. Da mesma forma, ao ignorar os estímulos
econômicos trazidos à região, ele poderá estar subdimensionando a esca.a em
relação à socialmente ótima. O poder público, municipal, estadual ou federal,
poderá agir em ambos os caso de forma a induzir uma escala socialmente ótima
para os investimentos privados. No primeiro caso, pela tarifação adequada da
poluição, situação em que o industrial será induzido a tratar total ou
parcialmente seus efluentes, eliminando em parte ou no todo este custo
externo. No segundo caso, através de subsídios, pode-se induzir ao industria
o aumento da escala de seu empreendimento, obtendo-se os benefícios externos.

19.4 Engenh aria dos recursos hídricos

A Engenharia de recursos hídricos integra um processo de formação de


capital no qual o recurso natural básico é a água. Quando o padrão espacnü
de disponibilidade de água, ou seja, a distribuição dos locais onde a ®
disponível, não está em sintonia com o padrão esp ad aid as necessidad _
centros de consumo, ou seja, a distribuição dos locais onde ex
necessidades relacionadas com os recursos hídricos, a solução P
satisfação das necessidades em suas plenitudes é a procura de água em ° u
locais onde seja disponível. Isso poderá levar-nos a buscar água no s
ou superficialmente, em outras localidades. De forma oposta. qua^do ^
problema é excesso hídrico (cheias) a solução poderá ser obüda das
construção de canais, bueiros ou outras estruturas que desv.em parte^ ^
águas para locais onde possam ser acomodadas adequadamente. E d f .
situações anteriores o padrão espacial de disponibilidade hidnca
734 H id ro lo g ia

alterado para sintonizá-lo com o padrão espacial das demandas.


Existe também a possibilidade de que a soma das disponibilidades em
determinado período de tempo seja suficiente para satisfazer a soma das
necessidades no mesmo período, referindo-se a questões quantitativas apenas.
No entanto, existem subperíodos internos ao período mencionado nos quais esta
situação não ocorre e há carência de água. Obviamente, neste caso também
deverão existir subperíodos com excesso de água. A solução do problema
anterior poderá ser encontrada, como o foi antes, pela busca de fontes de
água em outros locais que serão utilizadas durante os subperíodos de
escassez. Outra possibilidade é a criação e exploração de reservas de água,
ou reservatórios.
Um reservatório visa à acumulação de água (ou formação de reservas) nos
subperíodos de excesso de água e uso das reservas previamente formadas nos
subperíodos de excassez. Isso poderá tanto atenuar cheias quanto estiagens,
nas estações hidrológicas ümidas e secas, respectivamente. Desta forma o
padrão temporal de disponibilidade da água pode ser alterado de forma a ser
adequado ao padrão temporal das necessidades.
O padrão qualitativo dos recursos hídricos, tanto quanto o quantitativo,
deve ser objeto de consideração e de adequação das disponibilidades com as
necessidades. Ele é intrinsecamente vinculado ao padrão quantitativo. Por
exemplo, o comprometimento qualitativo das águas de um rio pelo despejo de
águas servidas pode ser atenuado tanto pelo tratamento destas águas quanto
pelo aumento das vazões que pode diluir os poluentes.
Concluindo, as funções da engenharia de recursos hídricos são as
adequações espaciais e temporais, qualitativas e quantitativas dos padrões de
disponibilidade aos padrões das necessidades hídricas. Para melhor avaliar a
extensão desta tarefa há necessidade de se discorrer sobre os usos da água.

19.4.1 Tipos de uso

Os usos dos recursos hídricos têm se intensificado com o desenvolvimento


econômico, tanto no que se refere ao aumento da quantidade demandada para
determinada utilização, quanto no que se refere a variedade dessas
utilizações. ^ Originalmente, a água era usada principalmente para
dessedentação, usos domésticos, criação de animais e para usos agrícolas a
partir da chuva e, menos freqüentemente, com suprimento irrigado. À medida
que a civilização se desenvolveu outros tipos de usos foram surgindo,
disputando os usos de recursos hídricos muitas vezes escassos e estabelecendo
conflitos entre os usuários. A tabela 19.1 apresenta as principais categorias
dos uso da água. Os usos acham-se inseridos em três classes:

Infra-estrutura social: refere-se aos usos gerais disponíveis para a


sociedade nos quais a água entra como bem de consumo final.
735
G e stã o d o s recu rso s h íd rico s

sociedade nos quais a água entra como bem.de consumo finai.


Agricultura, florestamento e aquacultura: refere-se aos usos da água como bem
de consumo intermediário visando à criação de condições ambientais adequadas
para o desenvolvimento de espécies animais ou vegetais de interesse para a
sociedade. Este interesse pode ser de ordem econômica, ambiental, etc.

Indústria: usos em atividades de processamento industrial e energético nos


quais a água entra como bem de consumo intermediário.

Tabela 19.1. Principais categorias de uso da água (adaptada de Nações Unidas,


1976)
1-Infra-Estrutura 2-Agricultura e 3-Indústria 4-Em todas 5-Conservação
social a aquicultura as classes e preservação
de uso

Dessedentação (C) Agricultura (C) Arrefecimen­ Transporte, Consideração


Navegação (NC) Piscicultura(NC) to (C) diluição e de valores
Usos Pecuária (C) Mineração (NC) depuração de opção, de
domésticos (C) Uso de Hidreletrici- de efluen­ existência
Recreação (NC) estuários (NCJL) dade (NC) te (NC) ou intrínse­
Usos públicos (C) Irrigação (C) Processamento cos (NCU)
Amenidades Preservação de industrial(C)
ambientais (NC) banhados (L) Termoeletri- - .

cidade (C)
Transporte
hidráulico(C)

Quanto à forma de utilização existem três possibilidades:

Consuntivos (C): referem-se aos usos que retiram a água de sua fonte natural
diminuindo suas disponibilidades, espacial e temporalmente.

Não-consuntivos (NC): referem-se aos usos que retomam à fonte de suprimento,


praticamente a totalidade da água utilizada, podendo haver alguma modificação
no seu padrão temporal de disponibilidade.

Local (L): refere-se aos usos que aproveitam a disponibilidade de água em sua
fonte sem qualquer modificação relevante, temporal ou espacial, de sua
disponibilidade.

A dessedentação, usos domésticos e usos públicos da água se referem


àqueles usos que são atendidos por sistemas de abastecimento de água. Estes
736
H id r o lo g ia

sistemas são dimensionados para atender às demandas que dependem diretamente


da população a ser atendida. A projeção da população determina a estimativa
da demanda» O suprimento pode ser realizado a partir de mananciais
superficiais» rios ou lagos (reservatórios), ou mananciais subterrâneos
(aquíferos). No caso de rios, como o regime fluvial é variável, as condições
críticas de abastecimento surgirão na estação de estiagem. Quando, com
freqüência inaceitável, a disponibilidade de água na seção de captação for
inferior à necessidade de suprimento, poderá ser construído um reservatório
de regularização. Seu objetivo será armazenar água durante a estação úmida,
de modo a formar reservas hídricas que complementarão as disponibilidades
durante a estação seca. Um lago natural já é um reservatório de regularização
que, não obstante, poderá ser ampliado para aumentar sua capacidade de
armazenamento visando ao atendimento das demandas.
Os aquíferos subterrâneos são reservas naturais que apresentam um regime
de disponibilidade hídrica praticamente constante, quando não submetidos à
sobreexplotação. Esse termo designa a situação em que se extrai mais água de
um aquífero subterrâneo que a sua recarga natural, o que ocasionará seu
rebaixamento e diminuição de disponibilidade hídrica. Testes de bombeamento
poderão estabelecer taxas de extração adequadas.
Os padrões,de qualidade para sistemas de abastecimento de água são muito
exigentes-o que determina, em geral, o tratamento das águas previamente às
suas distribuições e consumo em estações de tratamento de água (ETA). As
águas subterrâneas podem oferecer uma alternativa qualitativamente mais
adequada, e, mais facilmente evitada a poluição de aquíferos subterrâneos do
que de nos ou lagos, embora na despoluição destes mananciais ocorra
exatamente o contrário. Daí a necessidade estratégica de preservação
qualitativa'dos aquíferos subterrâneos, como reserva hídrica para as futuras
gerações, atividade que tem assumido a maior relevância em regiões
industrializadas e com alta densidade demográfica, que apresentam alta
demanda^ í^rescída. de alto potencial de poluição.
Os sistemas de abastecimento de água produzem efluentes que podem ser
conduzidos a seus destinos finais por sistemas de esgotamento sanitário.
Estes sistemas podem ser tão simples como os de fossas sépticas, que
apresentam alto risco de poluição do aquífero subterrâneo, como aqueles mais
eomp.exos que exigem a coleta e transporte dos efluentes em redes de esgotos
até uma Estação de Tratamento de Esgotos (ETE) para, finalmente, serem
lançados de volta ao no ou em outros corpos de água. O grau de eficiência do
tratamento de esgotos determinará a poluição que este lançamento estabelecerá
no corpo hidnco de destino. Um problema que ocorre com grande freqüência,
enva^da ausência ou do tratamento inadequado dos esgotos. Isso acarreta a
poluição fluvial, com consequente aumento do custo de abastecimento a
usuános de jusante, seja devido à necessidade de tratamentos de água mais
e a orados, seja pela necessidade de suprimento em outros mananciais não
G e stã o d o s r e c u r so s h íd rico s 737

O uso da navegação relaciona-se a sistemas hidroviários. Estes sistemas


têm por objetivo permitir o transporte fluvial. A capacidade de transporte é
técnica e economicamente estabelecida pela largura do canal de navegação e,
principalmente, pela sua profundidade. A largura e profundidade natural podem
ser ampliadas por dragagens e derrocamentos do leito dos rios. Como o regime
de vazões dos rios é variável, a profundidade em cada seção fluvial varia ao
longo do tempo, sendo crítica durante a estiagem. Para aumentá-la pode-se
implantar, a montante da seção crítica, reservatórios de regularização,
visando aumentar as vazões de estiagem. Outra alternativa é a construção de
barragens de navegação a jusante da seção crítica, objetivando elevar o seu
nível de água. Ambas obras exigem a construção-de eclusas de navegação para
permitir que os barcos as ultrapasse. Os aspectos qualitativos não são
relevantes para esse uso.
Já no caso de recreação e amenidades ambientais os aspectos qualitativos
sao tão ou mais importantes que os de ordem quantitativa. Mesmo nas situações
em que não haja contato direto com a água, como na apreciação cênica, as
exigências qualitativas são muito estritas.
Os usos de água na agricultura e pecuária ocorrem em estabelecimentos
rurais, podendo determinar a implantação de pequenos sistemas de
abastecimento com nenhum ou simplificado sistema de tratamento. A
quantificação da demanda pode ser realizada cm função da intensidade da
atividade agrícola, número de pessoas envolvidas e de cabeças de gado. A
irrigação «é estabelecida para suplementar a oferta natural de água, para os
cultivos, realizada pelas chuvas. Em regiões áridas ou semi-áridas ela pode
ser a única fonte hídrica. O dimensionamento das necessidades de água para
irrigação é um processo complexo que exige a realização de balanços
hidroagrícolas que levam em consideração o clima, o solo, as culturas,
métodos de irrigação e área cultivada. Devido às grandes demandas hidncas
resultantes não é, em geral, economicamente eficiente cogitar-se o tratamento
de água. A tabela 19.2 ilustra com dados de 1960 o consumo de água para
irrigação nos Estados Unidos e ex-União Soviética em relação ao uso
industrial e abastecimento doméstico.

Tabela 19.2. Usos da água na ex-URSS e Estados Unidos em 1960 em milhões de


Hm3, Kitson (1984).
RÚSSIA ESTADOS UNIDOS
PAÍS
Total Consuntivo % Total Consuntivo %
u so
120,0 98,6 82,2 201.0 122,9 61,1
Irrigação
30,6 8,4 27,5 130.0 65,0 50,0
Indústria
Abastecimento 5,0 2,0 40,0 23,1 16,5 7,4
738 H id ro lo g ia

A piscicultura, o uso de estuários e a preservação de pântanos e


banhados correspondem aos usos não-consuntivo ou local, nos quais são criadas
ou preservadas condições para o desenvolvimento de espécies com valor
comercial. No caso de piscicultura, pode ser explorado o ambiente natural, ou
criados lagos ou tanques de peixes que reproduzam condições ideais. O uso de
estuários aproveita as condições especiais do contato entre água doce e
salgada. A preservação de pântanos ou banhados visa à manutenção da
diversidade biológica destes ambientes para propiciar o desenvolvimento de
espécies sensíveis.
O uso industrial da água visa ao seu aproveitamento para arrefecimento
de processos com geração de calor, como fonte de energia hidráulica ou para
geração de vapor com altas pressões, objetivando a geração de energia
elétrica, como elemento de desagregação ou diluição de partículas em
mineração, como insumo de processo industrial e, flnalmente, como meio fluido
para transporte. Com exceção da geração de energia em hidrelétricas, existem
perdas de água no processo, seja por evaporação ou por diluição de
substâncias, que tomam consuntivos os usos industriais, A demanda hídrica
destes usos de consumo intermediário depende da quantidade de bens de consumo
final que são produzidos. Restrições qualitativas sobre a água consumida
podem estar presentes nos processo de arrefecimento e geração de vapor, e
quando a água entra como insumo de processo industrial.
Em grande parte das atividades humanas, e especificamente naquelas que
usam a água, existe a geração de resíduos. A água pode ser usada como meio de
transporte desses resíduos, e para suas diluições e depurações. Nesses
processos de depuração a água entra como veículo para substâncias como o
oxigênio, fundamental para o desenvolvimento de microorganismos aeróbicos»
que transformam os resíduos em substâncias estáveis. A capacidade de
manutenção deste processo de depuração em coipos hídricos é relacionada com a
quantidade de oxigênio encontrado na massa de água, a qual é limitada e
dependente da temperatura do meio. O processo de oxigenação é propiciado
tanto por turbulências na interface ar-água, sendo por isso intenso em
cachoeiras ou trechos fluviais agitados, como também pela atividade
forossintética de algas e macrófitos submersos. O lançamento contínuo de
resíduos oxidáveis na água pode promover uma demanda acelerada de oxigênio,
para sua oxidação biológica, eventualmente superior à taxa de reoxigenação.
oob este desequilíbrio esgota-se o oxigênio e perecem as formas de vida dele
ependentes, incluindo peixes. Também cessa o processo de degradação aeróbico
e em seu lugar surgem condições anaeróbicas, as quais geram alterações
substanciais no ecossistema, caso persista o desequilíbrio. Estas alterações
são percebidas como poluição, mas representam unicamente uma adaptação às
condições vigentes, sendo que o processo de degradação anaeróbica dos
resíduos continua até estabelecer-se um novo equilíbrio (Marques, 1993). Este
uso da água, quando limitado à C a f W r i H a H / » H a c c í m i l < i r > o / » A
p
Gestão dos recursos hídricos 739

sem causar o desequilíbrio citado, não ocasiona poluição e nem os custos


sociais e ambientais dela decorrentes.
Outras formas de lançamento, cuja capacidade de assimilação é baixa ou
nula, é a de substâncias tóxicas, carcinogênicas, teratogênicas e
mutagênicas. Elas causam danos ambientais e sociais muitas vezes
irreversíveis e que freqüentemente são identificados apenas a longo prazo,
quando não mais poderão ser penalizados os causadores e nem tomadas medidas
saneadoras.
Os usos referentes à conservação e preservação satisfazem uma categoria
mais complexa de demandas da sociedade modema, relacionadas com as suas
vinculações com o ambiente natural. Até agora foram tratadas as atividades de
apropriação dos recursos hídricos, nas quais esse recurso ambiental apresenta
valor de uso. Existem outros tipos de valores sociais que devem ser
considerados na Engenharia de Recursos Hídricos, e que serão definidos a
seguir.
O valor de opção da água é valor derivado do seu uso potencial para
promover o bem-estar da sociedade. Ele se contrapõe ao valor de uso já que
este se refere ao uso corrente, enquanto, aquele, a um uso provável que
poderá ocorrer no futuro. Esta classe de valores pode ser associada à
estratégia de preservação de opções de uso, tendo em vista a - incerteza
inerente ao futuro de longo praze, que poderá tomar certos bens relacionados
com a água com valor social expressivo. Tal situação ocorrería na preservação
de um banhado em face da sua diversidade biológica, como fonte de possíveis
riquezas no futuro.
Valor intrínseco é o valor intrinsecamente associado aos recursos
hídricos independente da possibilidade de seu uso, corrente ou potencial,
para promover o bem-estar da sociedade. Altemativamente, são valores
estabelecidos pela sociedade em uma base de 'não uso , o que determina uma
satisfação social pela simples existência de um bem ambiental (valor de
existência). Por exemplo, à conservação de um rio situado em região em estado
natural podería ser atribuído um valor intrínseco ou de existência, mesmo que
nenhum uso corrente ou potencial pudesse ser atribuído aos seus recursos. Ou,
um valor intrínseco derivado de uma preferencia estabelecida pela sociedade
(brasileira ou mundial) em não usá-lo, agora ou no futuro. Nesta classe de
valores emergem questões filosóficas e de ética ambiental de grande
complexidade que são tratadas por Pierce e Tumer (1991).

19.4.2 Uso múltiplo

No passado as pequenas demandas hídricas podiam ser atendidas pelas


disponibilidades naturais sem maiores investimentos que aqueles necessários
para a captação. O desenvolvimento econômico foi mais intenso nas regiões de
«v.nrsns hídricos. O aum ento no o u lacio n al e do Dróorio
740
Hidrologia

desenvolvimento econômico acabaram por reduzir as disponibilidades hídricas


em alguns locais e por tomar atraentes outras regiões carentes de recursos
hídricos, exigindo maiores investimentos para obtê-los.
A sociedade moderna ampliou consideravelmente a diversidade de usos da
água. O quadro tornou-se complexo com o aparecimento de demandas
conflitantes. Nas regiões industrializadas, de exploração mineral e de
concentração populacional, existe a degradação dos recursos hídricos
estabelecendo conflitos com aqueles usuários que demandam condições
qualitativas melhores.
As disponibilidades de água podem ser inicialmente aproveitadas para o
suprimento de demandas singulares através de projetos que visem ao
atendimento de um único propósito. Por exemplo, uma região na qual é
estabelecido um projeto de agricultura irrigada. Devido ao efeito
multiplicador destes projetos, poder-se-á, em algum tempo, estar diante da
necessidade de satisfação de diversas demandas hídricas de outras naturezas,
induzidas pelo projeto iniciai. Por exemplo, abastecimento doméstico]
navegação, controle de cheias, de estiagem, da poluição, etc . Logo, em um
estágio mais avançado de desenvolvimento econômico, existirão pressões para
que o sistema seja utilizado atendendo a múltiplos propósitos. Isso não
impede, porém, què um projeto pioneiro de desenvolvimento regional contemple,
desde o início, diversos usos. Por exemplo, um projeto de irrigação que
preveja uma via navegável para escoamento da produção, uma pequena
hidrelétrica para fornecer energia para as bombas de recalque, um parque
industrial, de primeira geração, para processar a produção agrícola. Isso
tudo, sem esquecer o abastecimento doméstico de água e energia elétrica aos
agricultores.
Mais rotineiramente no entanto, e por vício de estruturas institucionais
organizadas por setores da economia, as diversas finalidades poderão ser
contempladas independentemente por sistemas de recursos hídricos não
integrados. Neste caso o setor energético implementaria suas hidrelétricas, o
agrícola seus distritos de irrigação, o de transporte suas hidrovias, etc. A
operação desses sistemas não-integrados será desenvolvida sem contratempos
até um estágio de utilização intensificada em que serão estabelecidos
conflitos entre os diversos usos da água. Nesta situação surgirá a
necessidade de harmonização dos diversos usos e sistemas, seja por
regulamentações, seja pela expansão da oferta, já em uma base de
gerenciamento integrado, de forma a ampliar ou adequar as disponibilidades
hídricas com as diversas demandas.
Os conflitos de uso das águas podem ser classificados como ;

Conflitos de destinação de uso: esta situação ocorre quando a água é


utilizada para destinações outras que não aquelas estabelecidas por decisões
políticas, fundamentadas ou não em anseios sociais, que as reservariam para o
Gestão dos recursos hídricos 741

atendimento de demandas sociais, ambientais e econômicas. Por exemplo, a


retirada de água de reserva ecológica para a irrigação.

Conflitos de disponibilidade qualitativa: Situação típica de uso de água em


rios poluídos. Existe um aspecto vicioso nestes conflitos, pois o consumo
excessivo reduz a vazão de estiagem deteriorando a qualidade das águas já
comprometidas a priori peio lançamento de poluentes. Esta deterioração por
sua vez, toma a água ainda mais inadequada para consumo.

Conflito de disponibilidade quantitativa: Situação decorrente do esgotamento


da disponibilidade quantitativa devido ao uso intensivo. Exemplo : uso
intensivo de água para irrigação impedindo outro usuário de captá-la,
ocasionando em alguns casos esgotamento das reservas hídricas. Este conflito
pode ocorrer também entre dois usos não-consuntívos. Exemplo: operação de
hidrelétrica estabelecendo flutuações nos níveis de água acarretando
prejuízos à navegação.

Em conjunto com esses conflitos ocorrem incrementos das demandas


hídricas devido ao aumento populacional, agravando o problema de
abastecimento, particularmente nas regiões semi-áridas. Outro problema é o
controle de inundações que se tomou imperativo nas regiões que sofreram o
efeito simultâneo da urbanização não planejada, que impermeabilizou o solo e
invadiu o leito maior dos rios, e do manejo do solo não adequado, que
assoreou os cursos de água.
O estágio de apropriação dos recursos hídricos no Brasil atingiu um
nível em que conflitos de uso são fartamente detectados nas regiões mais
desenvolvidas ou mais carentes de água. Além daqueles- relacionados com a
qualidade de água, notados nas bacias urbanizadas e industrializadas, existem
também conflitos quantitativos. Na Bacia do rio Jacuí, RS, ocorrem problemas
dessa natureza entre a geração de energia e a navegação, entre a navegação e
a irrigação de arroz, e entre a irrigação do arroz e o abastecimento de água.
Este último conflito ocorre na Bacia do rio Araranguá, SC, agravado por
problemas qualitativos originados na mineração do carvão. Os problemas e
qualidade e quantidade de água na Região Metropolitana de São Paulo exigem
soluções a curto prazo. No rio São Francisco começam a ser intensificados os
conflitos entre a irrigação e a geração de energia. No Centro-Oeste e orte
ocorre a poluição dos rios pela atividade de mineração. ^
Conclui-se, portanto, que o uso múltiplo dos recursos hídricos po er
ser uma opção iniciai, mas também será uma conseqüência natural ^
desenvolvimento econômico. A integração harmônica destes usos é a opça
existente e que tem como alternativa conflitos entre usuários.
742 Hidrologia

Vantagens do uso múltiplo integrado

Ao implantar-se ou expandir um sistema de recursos hídricos com


atendimento integrado a múltiplos usos, a capacidade final do sistema não
será necessariamente igual à soma das capacidades individuais daqueles
sistemas que teriam capacidade de atender a um único uso cada um. Isso
decorre da própria natureza das demandas hídricas. Com freqüência, o padrão
diário ou sazonal da demanda de um tipo de uso poderá ser tal que o sistema
de suprimento trabalhe com folga em determinados períodos. Durante estes
períodos poderá ser previsto, sem qualquer expansão, o atendimento a outro
uso.
Suponha que um sistema deverá abastecer de água um distrito de
agricultura irrigada. Apenas durante certos períodos do ano ocorrem déficits
agrícolas que necessitem ser atenuados pela irrigação. O sistema estaria sem
uso no restante do tempo. Seria possível, neste caso, prever um uso
alternativo nestes períodos de ociosidade. Note-se porém que o sistema de
abastecimento agrícola durante o período sem uso poderá estar na fase de
formação de reservas hídricas essenciais para garantir o abastecimento
futuro. Não haverá nesta situação possibilidade de se dar um uso alternativo
à água em acumulação.
t 0utro tipo de possibilidade oconrerá quando a captação e retomo de água
destinada a um uso não consuntivo se faça de forma a permitir o seu uso
alternativo. Neste caso não existirão conflitos e o sistema poderá atender a
ambos usos sem aumento de capacidade. Note-se, porém, que na medida em que os
padrões temporais das demandas hídricas alternativas não sejam coincidentes
entre si e com o padrão temporal das disponibilidades hídricas, poderá haver
conflitos.

Exemplo 19.4. Suponha que um sistema seja composto por um reservatório que
adequa o padrão temporal da disponibilidade com o padrão temporal da demanda
hidnca para a geração de energia elétrica, um uso não-consuntivo. Caso se
pretenda incluir o atendimento ao abastecimento agrícola o padrão temporal da
demanda agrícola deverá ser sintonizado com o da demanda de energia elétrica,
hm outras palavras, a demanda de energia em qualquer instante deve exigir um
turbinamento de água cujo volume seja pelo menos igual à demanda agrícola. Na
situaçao em que isso não ocorra, o atendimento ao abastecimento agrícola
poderá ser feito apenas de forma parcial.

A promoção do uso conjunto sem expansão de sistemas de recursos hídricos


po e ser referida como compartilhamento do sistema. No exemplo apresentado o
compartilhamento foi realizado sobre a própria descarga hídrica do sistema.
m outros casos poderá haver o compartilhamento das estruturas. Por exemplo,
um reservatório deverá ter um vertedor para escoar grandes cheias. A dimensão
G estão d o s recu rso s h íd rico s 743

do vertedor depende da hidrologia da bacia de drenagem e não da capacidade do


reservatório atender a uma dada demanda hídrica. Assim, seja para promover o
atendimento a uma demanda singular ou a várias demandas, o vertedor terá a
mesma dimensão e possivelmente o mesmo custo. Ao serem agregadas ao sistema
diversas demandas, o custo deste vertedor poderá ser rateado entre elas.
A segunda vantagem do uso múltiplo e integrado está nas economias de
escala captadas na implantação do sistema, Elas ocorrem quando os custos de
investimento, operação e manutenção por unidade da dimensão do projeto
diminuem com a dimensão total. Isso faz com que seja mais vantajosa a
construção de um projeto que atenda a vários usos do que se construir vários
projetos isolados que atendam a usos singulares. Esta vantagem é obtida em
função de outro tipo de compartilhamento decorrente da obteção de uma maior
produtividade do trabalho, por meio da especialização, da maior diluição dos
custos fixos que independem do número de usuários e de um maior poder de
barganha com a aquisição de grandes quantidades de insumos. Como este efeito
decorre da escala maior do empreendimento, ele é denomindo economia de
escala.

Desvantagens do uso múltiplo integrado

As desvantagens do uso múltiplo e integrado dos recursos hídricos são de


caráter gerencial. O compartilhamento dos recursos hídricos por diversos
usuários deverá exigir o estabelecimento de regras operacionais
freqüentemente complexas para que a apropriação da água seja realizada de
forma harmônica. Além disso haverá necessidade de centralização das decisões,
com a possibilidade de serem estabelecidas entidades multissetoriais de
grande porte e difícil administração. Em uma administração pública
grandemente centralizada e organizada por setores econômicos, a constituição
deste tipo de entidade apresenta grandes dificuldades políticas e
institucionais.
Não obstante este aspecto, é importante frisar que o uso múltiplo dos
recursos hídricos não é uma opção que faz o planejador, mas uma realidade que
ele enfrenta com o desenvolvimento econômico. A opção existente é a de
integrar estes usos de uma forma harmônica, em que pese a complexidade da
administração, ou deixá-los de uma forma desintegrada enfrentanto, como
conseqüência, conflitos entre os usuários comprometendo a eficiência do uso.
Diante das considerações prévias, conclui-se pela necessidade de se
abordar com maiores detalhes as definições e os conceitos relacionados com a
gestão dos recursos hídricos e propor algumas orientações para a atividade de
planejamento destes recursos. Isto permitirá introduzir em uma segunda parte
alguns condicionantes legais e teóricos à atividade de gerenciamento de
recursos hídricos para que, na parte final, sejam esboçadas as formas com que
esta atividade está sendo organizada no país.
744 H id r o lo g ia

19.5 Definições

A gestão de recursos hídricos é uma atividade analítica e criativa


voltada à formulação de princípios e diretrizes, ao preparo de documentos
orientadores e normativos, à estruturação de sistemas gerenciais e à tomada
de decisões que têm por objetivo final promover o inventário, uso, controle e
proteção dos recursos hídricos. Fazem parte desta atividade os seguintes
elementos cuja definição foi parcialmente adaptada da ABRH (1986):

Política dos recursos hídricos: Trata-se do conjunto consistente de


princípios doutrinários que conformam as aspirações sociais e/ou
governamentais no que concerne à regulamentação ou modificação nos usos,
controle e proteção dos recursos hídricos.

Plano de recursos hídricos: Qualquer estudo prospectivo que busca, na sua


essência, adequar o uso, controle e o grau de proteção dos recursos 'hídricos
às aspirações sociais e/ou governamentais expressas formal ou informalmente
em uma política de recursos hídricos, através da coordenação,
compatibilização, articulação e/ou projetos de intervenções. Obviamente, a
atividade de fazer tais planos é denominada Planejamento dos Recursos
Hídricos.

Gerenciamento dos recursos hídricos: Conjunto de ações governamentais


destinadas a regular o uso e o controle dos recursos hídricos e a avaliar a
conformidade da situação corrente com os princípios doutrinários
estabelecidos pela política dos recursos hídricos.
As ações governamentais são refletidas através das leis, decretos,
normas e regulamentos vigentes. Como resultado dessas ações ficará fixado o
que é denominado modelo de gerenciamento ou de gestão dos recursos hídricos,
entendido como a configuração administrativa adotada na organização do Estado
2para gerir os recursos hídricos. Por exemplo, um modelo que vem sendo
amplamente utilizado é o que adota a bacia hidrográfica como unidade
administrativa ao contrário de serem adotadas unidades de caráter político
como o Estado, Município, etc .
No Brasil, a lei específica para a gerenciamento dos recursos hídricos é
o Código de Aguas, estabelecido pela Lei 24.643 de 10 de Julho de 1934.
Existem vários instrumentos legais que detalham e disciplinam as atividades
do setor. Estes instrumentos legais são provenientes de um modelo de
gerenciamento de recursos hídricos orientado por tipos de uso o que
estabelece frequentemente conflitos, superposições e a desarticulação da
legislação, exigindo, portanto, aperfeiçoamentos.
As definições anteriores de gestão e gerenciamento de recursos hídricos
propoem uma diferenciação entre as mesmas, embora freqüentemente estas
Gestão dos recursos hídricos 745

palavras sejam tomadas como sinônimos. A gestão é considerada de forma ampla,


abrigando todas as atividades, incluindo o gerenciamento. Este é considerado
uma atividade de governo.

Sistema de gerenciamento dos recursos hídricos: Conjunto de organismos,


agências e instalações governamentais e privadas, estabelecidos com o
objetivo de executar a política dos recursos hídricos através do modelo de
gerenciamento dos recursos hídricos adotado e tendo por instrumento o
planejamento de recursos hídricos.
Existem diversas entidades federais, estaduais e municipais com
atribuições de aplicar os instrumentos legais vigentes no setor dos recursos
hídricos brasileiro. Esta estrutura organizacional e legal forma uma
administração confusa, desarticulada, organizada por usos, que dificulta o
uso múltiplo e integrado dos recursos hídricos, exigindo aprimoramentos. ^
Em resumo, a gestão dos recursos hídricos eficiente deve ser constituída
por uma política dos recursos hídricos, que estabelece as diretrizes gerais,
um modelo de gerenciamento, que estabelece a organização legal e
institucional e um sistema de gerenciamento, que reúne os instrumentos para o
preparo e execução do planejamento de recursos hídricos.
À necessidade de estudo e aperfeiçoamento da gestão dos recursos
hídricos decorre da sua complexidade que deverá ser aumentada
substancialmente com as pressões que o futuro trará. Estas pressões serão
motivadas por diversas causas, algumas das quais são listadas a seguir.

Desenvolvimento econômico: ocasionando o aumento das demandas de água, seja


como bem intermediário, seja como bem de consumo final*

Aumento populacional: trazendo a necessidade direta de maior disponibilidade


de água para consumo final e, de forma indireta, forçando um aumento de
investimentos na economia para criação de empregos e, com isso, uma maior
demanda de água como bem intermediário.

Expansão da agricultura: aumentando o consumo regional de


irrigação, com possíveis conflitos, quando a água é escassa e j exis ir
outros usuários concorrentes.

Cessões regionais: voltadas a reivindicações de uma maior equidade ^ ^


jondições inter-regionais de desenvolvimento econômico, qualidade a ^ v s a
>em-estar social, pressionando os recursos hídricos no sentido o a
lestes anseios.

Vludanças tecnológicas: que trazem demandas específicas sobre os re


746 Hidrologia

hídricos, por um lado, e possibilitam novas técnicas construtivas e de


utilização da água, modificando a situação vigente de apropriação destes
recursos; estas mudanças poderão permitir um aumento físico dos sistemas de
uso e controle da água e, conseqüentemente, um aumento da abrangência de seus
efeitos, espacial e temporal.

Mudanças sociais: trazendo novos tipos de demandas ou modificando o padrão


das demandas correntes das águas.

Urbanização: acarretando uma maior concentração espacial das demandas sobre


os recursos hídricos e impermeabilizando o solo com o conseqüente agravamento
das enchentes urbanas.

Demandas sociais: que venham ocasionar alterações nos padrões espaciais e


temporais correntes do uso da água, bem como trazer novos tipos de demanda em
função da modificação dos hábitos e costumes da sociedade.

Demandas ambientais: que venham intensificar as exigências relacionadas com a


qualidade ambiental, motivando a aprovação de legislação mais rigorosa
relacionada com o uso dos recursos hídricos e seus impactos ambientais.

Incerteza do futuro: permeando todos estes fatores existe a incerteza sobre


quando, como e onde ocorrerão as pressões mencionadas, obrigando o planejador
a exercitar imprecisos exercícios de futurologia.

A conseqüência é que diversos tipos de necessidade deverão ser


contemplados, um grande volume de recursos utilizados, grandes regiões serão
afetadas na atividade de gestão dos recursos hídricos. Com o conseqüente
aumento físico dos projetos e da região que será afetada, a atividade de
planejar e de implantar os projetos levará mais tempo havendo a necessidade
de que as demandas futuras sejam previstas com antecedência suficiente para
que possam ser supridas quando ocorrerem.

19.5.1 Interdisciplinaridade da gestão dos recursos hídricos

Glenne, citado por Goodman (1976), listou conhecimentos envolvidos na


atividade de gestão dos recursos hídricos, conforme apresentado na tabela
19.3, com algumas adaptações. O quadro mostra ser impossível para uma única
pessoa, ou mesmo um pequeno grupo de pessoas, ter o domínio necessário destas
disciplinas. Isso leva necessariamente à formação de grupos
interdisciplinares para a execução da gestão dos recursos hídricos. Como
conseqüência, surge o problema de inter-relacionamento de profissionais com
conhecimentos distintos. Para possibilitar isso, há necessidade de que cada
747
Gestão dos recursos hídricos

profissional atuante em mna equipe de gestão de recursos hídricos tenha


conhecimentos básicos em diversas outras disciplinas que nao aquela que
domine Por exemplo, um especialista na área dos recursos hidncos deve ter
uma boa base em diversas disciplinas técnicas e conhecimentos gerais de
diversas disciplinas classificadas como não-técnicas ou semitécmcas. Isso
permitirá a formação de equipes interdisciplinares de gestão dos recursos
hídricos.

Tabela 19.3 Disciplinas do Planejamento dos Recursos Hídricos

Não-técnicas Semitécnicas Técnicas


Domínio Principal
Economia Planejamento Hidráulica
Administração Meteorologia Hidrologia
Occanologia Saneamento Ambiental
Direito
Saneamento -Básico
Ciências políticas Engenharia de Minas
Geografia Tramento de Esgotos
Sociologia
Psicologia Biologia Estruturas Hidráulicas
Botânica Erosão e Sedimentação
Comunicação
Zoologia
Piscicultura Domínio Conexo
Recreação Computação
Saúde pública Modelagem Matemática
Antropologia Análise numérica
Geologia Instrumentação
Agronomia Sensoriamento Remoto
Química Estatística
Ecologia Análise de Sistemas

19.5.2 P rin cíp io s orientadores da gestão dos recursos hídricos

Os princípios orientadores da gestão racional do uso cm iid e c


proteção dos recursos hídricos foram sintetizados por Veiga da Cunha al.
(1980):
1 A avaliação dos benefícios para a coletividade resultantes da utilização
da água deve ter em conta as várias componentes da qualidade de vida : nível
de vida, condições de vida e qualidade do ambiente.
Este princípio é auto-explicativo. Os benefícios devem ser considerados
da forma mais ampla e abrangente, em termos de suas contnbuiçoes à qualidade
de vida. Isso leva em conta o nível e condições de vida ou seja, dentro de
determinada condição que pode ser ditada pelo ambiente, tradições e cultura,
748
Hidrologia

que nível de vida, representado pela possibilidade de acesso à satisfação


social, pode ser atingido e que padrão mínimo deve ser alcançado
compulsoriamente. A inserção da qualidade ambiental reflete a íntima relação
entre a qualidade do ambiente e a satisfação social, no presente e no longo
prazo.

2 - "A unidade básica de gestão dos recursos hídricos deve ser a bacia
hidrográfica."
A bacia hidrográfica, através da rede de drenagem fluvial, integra
grande parte das relações causa-efeito que devem ser tratadas na gestão.
Embora existam outras unidades político-administrativas a serem consideradas,
como o municípios, Estados, regiões e países, estas unidades não apresentam
necessariamente o caráter integrador da bacia hidrográfica, o que tomaria a
gestão parcial e ineficiente caso fossem adotadas.

3 - "A capacidade de autodepuração dos cursos de água deve ser considerada


como um recurso natural cuja utilização é legítima, devendo os benefícios
resultantes desta utilização reverter para a coletividade; a utilização dos
cursos de água como meio receptor de efluentes rejeitados não deve, contudo,
provocar a rotura dos ciclos ecológicos que garantem os processos de
autodepuração."
O transporte, diluição e depuração de efluentes já foi anteriormente
considerado um uso dos recursos hídricos. Os corpos de água têm uma
capacidade de assimilação de resíduos, no entanto deve-se estabelecer um
limite para este uso, sem o que haverá poluição e degradação de suas águas.
Esta capacidade de assimilação deve ser adequadamente rateada entre a
sociedade, evitando o seu comprometimento unilaterai. Por exemplo, uma
indústria ao lançar seus efluentes em um rio poderá utilizar toda sua
capacidade de assimilação, impedindo que outros usuários o façam, sem que
ocorra a poluição. Esta capacidade deve ser rateada entre os potenciais
usuários como um recurso natural de propriedade pública e, sendo assim, este
rateio deve promover o máximo de satisfação para a sociedade.

4 - A gestão das águas deve abranger tanto as águas interiores superficiais


e subterrâneas como as águas marítimas costeiras."
Este princípio introduz na gestão dos recursos hídricos a unidade do
ciclo htdrológtco, que acarreta a inviabilidade de gerir separadamente o que
é naturaimente uno. A qualidade das águas anteriores afetará a qualidade das
águas costeiras A gestão quantitativa e qualitativa das águas superficiais
afetará a quantidade e qualidade das águas subterrâneas e vice-versa.

5 - A gestão dos recursos hídricos deve considerar a ligação estreita


existente entre os problemas de quantidade e qualidade das águas."
749
Gestão dos recursos hídricos

Este princípio amplia o anterior ao evidenciar que os aspectos


qualitativos são indissociáveis dos aspectos quantitativos da água. A
qualidade da água é estabelecida pela concentração de substâncias que nela
são diluídas. O aumento de concentração, e conseqüente comprometimento da
qualidade, pode acontecer tanto pelo aumento da emissão destas substâncias
quanto pela diminuição quantitativa do volume de água que a dilui. Ao serem
estabelecidas obras que afetem o regime quantitativo dos corpos de água as
suas qualidades serão também afetadas, devendo estas questões serem tratadas
de forma conjugada.

6 A gestão dos recursos hídricos deve processar-se no quadro do


ordenamento do território, visando a compatibilização, nos âmbitos regional,
nacional e internacional, do desenvolvimento econômico e social com os
valores do ambiente".
O ordenamento territorial estabelece a compatibilização entre a oferta e
a demanda de uso dos recursos ambientais, evitando conflitos e promovendo a
articulação das ações. O uso de um recurso ambiental raramente ocorTe de
forma isolada. Para ficar apenas em um exemplo, a gestão dos recursos
hídricos tem repercursões na gestão do uso do solo, e vice-versa. Desta
forma, recursos hídricos não podem ser geridos de forma isolada, mas sua
gestão deve ser articulada no quadro da gestão de todos os recursos
ambientais, que é realizada pelo ordenamento territorial.

7. "A crescente utilização dos recursos hídricos bem como a unidade destes em
cada bacia hidrográfica acentuam a incompatibilidade da gestão das águas com
sua propriedade privada."
Alguns recursos ambientais como o solo podem ser geridos com razoável
eficiência através da admissão da propriedade privada. Isto decorre de que a
maioria das conseqüências de uma boa ou má gestão, como por exemplo o grau e
fertilidade e de erosão decorrentes do manejo agrícola, é espacialmente
limitada, atingindo via de regra a própria área onde se verifica, ou seja, a
propriedade agrícola. As perdas de fertilidade e de solo têm ocorrido, em
certas regiões de forma preocupante, mas os proprietários tendem a reagir
adequadamente às campanhas de conservação, pois os prejuízos decorrentes de
não fazê-lo serão sofridos na sua maior parte por eles mesmos. Isto sigm.ica
que os efeitos colaterais ou, como foi previamente definido, as
extemalidades negativas, são pequenas. Já no caso dos recursos hidncos o
mesmo não ocoitc pelo fato de ser um recurso fluido e móvel. A poluição de um
rio é um exemplo que mostra que nem sempre o seu causador é o que sofre su
conseqüências. . .
Existem certas correntes que argumentam que se a água fosse propn
privada este problema de poluição não ocorrería. O proprietário ao cons
a poluição podería exigir aos seus causadores ressarcimento dos prejuízos. »
750 Hidrologia

entanto existem enormes dificuldades para que esta tarefa seja realizada
devidamente. Inicialmente, para a constatação da poluição que somente pode
ser realizada visualmente quando atinge níveis elevados. Depois para se
quantificá-la, a não ser usando-se de amostragem freqüente e exames
laboratoriais caros e inacessíveis a grande parte da população. Em seguida, o
problema da identificação dos poluidores, tarefa que exige uma fiscalização
permanente, incompatível de ser assumida por uma parte privada. Finalmente a
questão de responsabilização legal, que gera contenciosos que se arrastam por
vários anos, com custos inacessíveis. Ocorre neste caso dificuldades
insuperáveis de negociação e de responsabilidade legal entre as partes
envolvidas, devido às dificuldades de identificação do problema e de seus
causadores, e aos grandes custos e tempo necessários para o acerto entre as
partes. Diante disto, há uma tendência mundial em estabelecer a água como bem
publico, de propriedade do Estado (União e suas divisões). Isto no Brasil é
objeto de dispositivo constitucional, como será visto adiante.

8 - "Todas as utilizações dos recursos hídricos, com exceção das


coiTespondentes a captações diretas de água de caráter individual, para a
satisfação de necessidades básicas, devem estar sujeitas a autorização do
Estado, "
Este princípio visa a assegurar na prática o exercício de propriedade da
água pelo Estado e estabelece um instrumento importante de gestão, pela
possibilidade de compatibilizar o uso à oferta dos recursos hídricos.

9 - "Para pôr em prática uma política de gestão das águas é essencial


assegurar a participação das populações através de mecanismos devidamente
institucionalizados."
A participação direta da sociedade nas decisões visa a estabelecer uma
descentralização de decisões, a consideração de diversos pontos de vista na
gestão e um comprometimento consciente da população com as medidas que sejam
implementadas. Este processo de participação publica é de difícil implantação
aevido à falta de costume e à inexistência de mecanismos institucionais que a
viabilizem. Uma das experiências de maior sucesso que tem sido desenvolvidas
e a criação de Comitês de Bacia Hidrográficas, que reúnem representantes de
entidades públicas e privadas, de usuários e de associações comunitárias,
interessados na gestão dos recursos hídricos de uma bacia. A estes comitês
são atribuídas funções de decisão sobre as medidas a serem implementadas para
promoção do uso, controle e conservação da água na bacia,

10 - A autondade em matéria de gestão dos recursos hídricos deve pertencer


ao Estado".
Sendo os recursos hídricos propriedade do Estado (na sua concepção mais
ampla que agrega a União e as Unidades Federativas no Brasil) cabe a ele a
Gestão dos recursos hídricos 751

autoridade de gestão. Este princípio estabelece portanto limitações à


participação da sociedade na gestão, justificada pela constatação de que
poderão existir interesses sobre os recursos hídricos de uma bacia que
extrapolam os interesses da população local. Exemplos disto são a energia
elétrica, que pode ser gerada em um rio para ser consumida em centros
distantes, e a proteção ambiental, que pode ser do interesse de toda
sociedade e das gerações futuras, e entrar em conflito com os interesses
locais. Estes exemplos mostram que a gestão dos recursos hídricos se
desenvolve através de um processo de negociação social, que pode envolver
parte substancial da sociedade atual e das gerações futuras. A autoridade de
gestão deve pertencer ao Estado para permitir que esta negociação seja
realizada de forma legítima, considerando todos os interesses envolvidos das
gerações presentes e das futuras.

11 - "Na definição de uma política de gestão das águas devem participar todas
entidades com intervenção nos problemas da água. Todavia, a responsabilidade
pela execução desta política deve competir a um único órgão que coordene, a
todos os níveis, a atuação daquelas entidades em relação aos problemas da
água." _ . . ,
Sendo múltiplos os usos da água diversas entidades deverão participar de
sua gestão. A articulação e harmonização dos diferentes interesses deve ser
da responsabilidade de um organismo único, viabilizando a necessária
coordenação, em todos os níveis de decisão existentes. Este organismo tem
sido projetado na forma de Conselhos Nacionais ou Estaduais de Recursos
Hídricos, que reúnem representantes de ministérios e secretarias estaduais
relacionados com a água e seus usuános. Maiores detalhes sobre este tipo de
desenho institucional serão apresentados no item que trata de sistemas de
gerenciamento dos recursos hídricos.

19.5.3 Organização da atividade de planejamento

A parte da Gestão dos Recursos Hídricos que trata da realização de


estudos e preparo de documentos, com vistas a orientar e adequar as
intervenções humanas no setor dos recursos hidncos, é o Planejamento.
O Setor dos Recursos Hídricos é parte integrante do sistema econômico,
participando com outros setores das atividades gerais e concorrendo por
investimentos. Para ser entendido o seu espaço há necessidade de se conhecer,
mesmo que sucintamente, suas ligações com o todo. A tabela 19.4 apresenta
alguns setores econômicos, com suas funções e elementos. O exemplo
apresentado mostra uma faceta importante que é a superposição dos setores em
certas funções. No caso apresentado, os setores de transporte e recursos
hídricos se superpõem nas atividades ligadas à navegação fluvial. Os setores
dos recursos hídricos e de saúde terão superposição nos aspectos ligados ao
752,

saneamento. Estas situações demonstram a dificuldade de se planeiar de for™


e s ^ u e . p o r setores da economia. Por outro lado, o pianejameurn S e g a d o ^
todos os setores sena de uma complexidade excessiva. g

Tabela 19.4, Setores econômicos


SETOR FUNÇÃO ELEMENTOS COMPONENTES
Rodovias
Transporte Estradas Vicinais
Rodoviário Estações Rodoviárias
Empresas de Transporte

Aeroportos
t r a n sp o r t e Transporte Aerovias
Aéreo Empresas Aéreas

Transporte Elementos comparáveis ao acima


Urbano apresentados

ortos e vias Elementos comparáveis ao acima


navegáveis Apresentados
Esgotos
Saneamento Estações de Tratamento de Esgotos
Emissário de Esgotos
Depósito de Lodos
r e c u r so s Abastecimento Reservatórios
de Estações de Tratamento de Água
HÍDRICOS Água Sistemas de Distribuição

Irrigação
Elementos comparáveis ao acima
ap resen tad o s

Outras funções Outros elementos


AGRICULTURA

SAÚDE

EDUCAÇÃO

OUTROS SETORES
Gestão dos recursos hídricos 753

Para viabilizar a realização do planejamento há necessidade de se


limitar sua abrangência regional, sua abrangência setorial e seu
detalhamento. Essas limitações são instrumentais, já que o planejamento de
uma região poderá ter impacto em regiões vizinhas, assim como o planejamento
do setor dos recursos hídricos poderá ter efeitos no setor de transportes,
saúde e outros. Diversas classes de documentos têm sido sugeridos para
organizar o planejamento dos recursos hídricos. A tabela 19.5 apresenta uma
classificação baseada na adotada pelo Conselho Americano de Recursos Hídricos
e pela ELETROBRÁS.

Tabela 19.5. Categorias de Documentos


JURISDIÇÃO SETOR ESTAGIO
Internacional Multíssetorial Política de Recursos Hídricos
Nacional Setorial (todas Plano de Recursos Hídricos
Regional interestadual as funções) Inventário ou estudo de pré-
viabiíidade.
Estadual Funcional Estudo de Viabilidade
Regional intra-estadual Projeto Básico
Local Projeto Executivo
«a

19,SA Jurisdições de planejamento

As classes são auto-expiicativas. O Planejamento Internacional


envolvería várias nações. O Planejamento Nacional terá uma abrangência
nacional. Os Planejamentos Regionais poderão abranger uma região estendendo-
se por vários estados, caso em que seria interestadual ou uma região situada
em um estado, quando seria intra-estadual. Finalmente, os planejamentos
estadual e municipal envolvem, respectivamente, o Estado e o Município.
A divisão do planejamento em jurisdições atende a própria divisão
político-administrativa de uma nação. Existem competências, no âmbito federal,
estadual e municipal. Existem Superintendências Regionais Brasileiras para as
regiões Norte (SUDAM) e Nordeste (SUDENE), organismos federais de
planejamento cuja área de atuação abrange vários estados situados em uma
mesma região. Existem legalmente cursos de água federais e estaduais, além de
tipos de uso cuja outorga é feita pela União (geração de energia, por
exemplo) e outros que podem ser feitos pelo Estado. Não fossem essas questões
a divisão por jurisdição também seria justificada devido à necessidade de ser
limitada a abrangência espacial do planejamento, por questões operacionais.
É notada uma tendência ao desenvolvimento de planejamento no âmbito de
bacias hidrográficas. Eles poderiam-se enquadrar na classe de Planejamento
Regional, seja interestadual, seja intra-estadual. Há uma maior lógica neste
754 H id ro lo g ia

tipo de limitação, que enfatiza as inter-relações físicas entre os usos da


água em uma bacia hidrográfica, do que nas demais que são estabelecidas para
atender exclusivamente a aspectos político-administrativos.

19.5.5 Planejamento quanto aos setores

No que diz respeito à setorização econômica, o planejamento pode


envolver vários setores, caso em que seria multissetorial. Quando são
envolvidas todas as funções de um único setor da economia, trata-se de um
planejamento setorial, por exemplo, planejamento dos recursos hídricos.
Quando o planejamento se refere a uma função apenas, será. funcional. Por
exemplo, o planejamento do setor de saneamento. O mais abrangente é o
multissetorial. Ele abrange e coordena o planejamento de todos os setores da
economia. Planos Nacionais de Desenvolvimento são produtos do planejamento
multissetorial.
O Planejamento Setorial se dirige a dado setor econômico. Por exemplo, o
setor dos recursos hídricos. Ele deverá abranger todas as funções do setor. O
Planejamento de Recursos Hídricos deverá considerar todos os usos e controles
afetos aos recursos hídricos procurando a harmonização dessas atividades. Não
existem exemplos brasileiros de Planejamento de Recursos Hídricos numa escala
nacional. O Departamento Nacional de Águas e Energia Elétrica publicou um
documento com o título Plano Nacional de Recursos Hídricos (DNAEE,1985) que
agrupou os diagnósticos dos problemas de recursos hídricos nas principais
bacias hidrográficas brasileiras, sem apresentar propriamente um plano
completo, mas seu esboço preliminar. Podem ser encontrados alguns casos de
planejamento regional de recursos hídricos, geralmente afetos a uma dada
bacia hidrográfica. Um exemplo antigo deste tipo de plano é o do Vale do rio
Jaguaribe (SUDENE, 1964).
O Planejamento Funcional se dirige a uma função do setor econômico.
Devido à setorização institucional, que ocorre em vários países, este
planejamento é o mais comum. Existem no Brasil, relacionados com a área dos
recursos hídricos, a política nacional de irrigação e planos nacionais de
energia elétrica, por exemplo, oriundos de uma gestão de natureza funcional.
Podem ser encontrados também planejamentos estaduais dessas naturezas.
A necessidade de planejamento setorial de recursos hídricos é evidente
diante dos conflitos neste setor, que têm-se tomado mais graves com o
incremento dos usos. A oportunidade de um planejamento multissetorial talvez
não seja tão evidente à primeira vista. No entanto, deve ser entendida a
íntima relação entre os recursos hídricos e os setores como o de transporte
(hidrovias), saúde (saneamento), agricultura (irrigação), urbano
(abastecimento, saneamento, lazer, etc.) e energia (hidrelétrica). Na
verdade, esta separação em setores é resultado mais da organização político-
admmistrativa do que de uma divagem real das atividades inerentes a cada
Ü

Gestão dos recursos hídricos 755

um. Há uma clara necessidade de coordenação entre as atividades envolvidas


que poclerá ser obtida apenas com a intervenicncia do planejamento
multissetorial.
Outra necessidade para este tipo de planejamento surge dos
macrozoneamentos regionais, entre estes o chamado Zoneamento Ecológico-
Econômico, a fim de que estabeleçam as vocações de cada região e promovam um
uso sustentável dos seus recursos naturais. Os recursos hídricos são uns dos
componentes principais deste macrozoneamento e, por isso, um Planejamento
Regional Multissetorial deve originar o documento mencionado.

19.5.6 Estágios de planejamento

É na categoria de estágios de planejamento que ocorrem as maiores


divergências entre as diversas classificações. As seguintes categorias são
propostas, agregando os estágios de planejamento do Conselho Americano de
Recursos Hídricos com os da ELETROBRÁS :

Política de recursos hídricos: Os propósitos de uma política é o


estabelecimento de princípios doutrinários e diretrizes gerais de
planejamento visando à coordenação das intervenções a serem implementadas. Os
seguintes itens devem ser abordados:

- definição das metas gerais e dos objetivos programáticos;


- estabelecimento de políticas de desenvolvimento, limites orçamentários
e prioridades;
- disseminação de guias programáticos; e
- avaliação da situação corrente, projeção de sua evolução e dos
resultados das decisões realizadas nesse estágio.

Trata-se, portanto, de um estágio inicial de planejamento em que a visão


geral das demandas e potencialidades é mais relevante que detalhes sobre
planos e obras a implementar. Deverão ser consideradas em uma política as
distribuições de renda, população, recursos hídricos e o uso da terra, seja
do ponto de vista nacional ou regional. Por isso a Política deve ser dirigida
a jurisdições de planejamento mais amplas como as regionais, estaduais e
nacionais.
Os seguintes elementos poderão constar em uma Política:

- avaliação das demandas, sob um ponto de vista amplo;


- hipotetização das metas e objetivos de planejamento;
- identificação de problemas e oportunidades nos quais o uso e controle
dos recursos hídricos são fatores básicos para dar atendimento às
metas de planejamento.
756
H id ro lo g ia

~ recomendação de metas e objetivos de planejamento;


recomendação de decisões políticas;
- coordenação de prioridades;
- revisão de programas existentes ou propostos para dar atendimentos às
metas de planejamento;
compatibilização preliminar da Política de Recursos Hídricos com a
Política Ambientai
- proposta de Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos.

Plano de enquadramento dos recursos hídricos: Este documento deve identificar


as necessidades e anseios sociais, os problemas regionais do setor dos
recursos hídricos ou de algumas de suas funções, executar avaliações
preliminares sobre adequação dos recursos disponíveis para atender às
demandas, apresentar um inventário dos dados e informações básicas existentes
e recomendar investigações para aquelas sub-regiões que requeiram análises
mais detalhadas. E também o momento adequado para realização dos estudos de
impacto ambiental de planejamento, que avaliem a compatibilização dos Planos
comosZoneamentosEcológico-Econômicosououtrosdocumentosrelacionadoscom
o estabelecimento de restrições gerais à apropriação dos recursos ambientais
dentro de uma visão regional.
Como foi adiantado na caracterização acima, nesse estágio de
planejamento a jurisdição costuma ser regional e não existe ainda a
consideração específica sobre projetos. Os itens a seguir deverão ser
apresentados :

identificação geral dos problemas e necessidades;


listagem das alternativas possíveis para solução;
inventário dos recursos disponíveis e oportunidades gerais de
desenvolvimento dos recursos hídricos;
avaliação preliminar da adequação global dos recursos disponíveis para
atender às demandas;
avaliação preliminar da adequação ambiental do uso dos recursos;
recomendação de investigações específicas a serem realizadas.

A seguir são listados alguns elementos que poderão constar em um plano


de enquadramento :

inventário e avaliação preliminar das informações disponíveis;


avaliações e projeções preliminares dos usos de água e demandas
ambientais;
avaliação preliminar das disponibilidades hídricas e de solo;
- avaliação do Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos existente
para abordagem do problema;
Gestão dos recursos hídricos 757

- inventário do estado presente de desenvolvimento e apropriação dos


recursos hídricos;
- inventário geral dos meios disponíveis para satisfação das
necessidades;
- avaliação preliminar das soluções alternativas para atendimento às
metas de planejamento;
- identificação de áreas-problema que necessitem atenção prioritária;
- recomendação de ações que possam ser executadas de imediato e daquelas
que necessitem de estudos complementares para serem consideradas.

De forma resumida a tônica desse estágio é dirigida ao inventário de


informações, meios disponíveis, soluções alternativas e áreas prioritárias
para ações imediatas. São recomendados estudos complementares sobre aspectos
relevantes a respeito dos quais existem informações insuficientes.

Inventário ou estudo de pré-viabilidade ou plano diretor: Este estágio de


planejamento consiste na avaliação das necessidades e anseios sociais, de uma
forma ainda geral, e de medidas alternativas de caráter estrutural e não
estrutural para atender as metas de planejamento. Portanto, já há^ a
consideração específica de projetos, através das medidas estruturais e não-
estruturais. _ . .
O inventário ou estudo de pré-viabilidade ou plano diretor constitui-se
em um guia para o detalhamento do estudo no estágio seguinte. Ele devera
identificar e recomendar projetos a serem executados por entidades federais,
estaduais, municipais e privadas. A ênfase deverá ser dirigida a estabelecer
os cursos de ação a serem executados no futuro imediato, que se integrao as
opções de ação que serão disponíveis no futuro a longo prazo, O estudo
dirige-se à projetos e medidas de caráter localizado sobre uma região ou
bacia hidrográfica, já havendo nesse estágio uma seleção prévia daqueles mais
adequados com base em análises preliminares de custo-benefício e de Estu os
de Impacto Ambiental de planejamento. As alternativas selecionadas serão
analisadas em detalhe no estágio seguinte de planejamento.
Os seguintes itens devem constar do Inventário ou Estudo de r
Viabilidade ou Plano Diretor:

- avaliação geral das medidas alternativas de atendimento às metas e


objetivos de planejamento e de atendimento às restrições e car
ambiental; . bem
- estabelecimento de prioridades de atendimento a metas e o je
como a problemas e oportunidades específicas; ^ Clicas e
- recomendação de projetos a serem executados por agências Pu
privadas.
758 H id ro lo g ia

Os seguintes elementos poderão constar do plano nesse estágio :

- estimativa das demandas hídricas e ambientais atuais e futuras!


- estimativa das disponibilidade hídrica e de solo;
- avaliação preliminar das alternativas de gerenciamento da quantidade e
qualidade de água;
estimativas preliminares dos custos, benefícios e conseqüências de
medidas e projetos alternativos;
- comparação de alternativas;
cogitaçao de ações a serem executadas de imediato e de projetos a
serem executados no futuro;
- recomendação de ações a executar de imediato e no futuro, incluindo a
seleção de projetos e medidas a serem detalhados no estágio seguinte.

Estudo de Viabilidade: O propósito desse estágio é o de permitir a decisão


sobre quais projetos e medidas, estruturais e não estruturais, serão
executados. O detalhamento das análises deverá permitir estabelecer se uma
dada alternativa poderá ser implementada, a que custo, se existirão recursos
orçamentários para sua implementação (Análise Financeira), os propósitos e
usos que a alternativa atenderá e em que escala e, finalmcnte, as
conseqüencias benéficas e adversas de sua implantação (análises econômica e
de impactos ambientais ou sociais). Do quadro resultante será possível a
recomendação da alternativa a ser implementada, sob ponto de vista técnico.
Contudo, todas as demais alternativas detalhadas deverão ser apresentadas no
estudo de forma que as decisões, a serem tomadas necessariamente na área
política, possam ratificar ou retificar de forma circunstanciada a
recomendação técnica.
Resumidamente, o estudo de viabilidade deverá analisar medidas e
projetos em detalhes suficientes para determinar se eles atenderão aos
propósitos de forma consistente com as metas, objetivos e critérios
estabelecidos de planejamento. Caso afirmativo, deverá ser verificado se as
medidas e projetos são viáveis sob qualquer ponto de vista, entre os quais se
acham os de engenharia, econômico, financeiro, legal e político.
Os seguintes elementos poderão constar de um estudo de viabilidade :

quantificação de usos específicos de água e de parâmetros ambientais


pertinentes;
quantificação das disponibilidades hídricas e de solo;
confronto entre as demandas e disponibilidades hídricas, sob aspectos
quantitativos e qualitativos, espaciais e temporais;
preparo de projetos preliminares e estimativas de custos;
- execução de análise econômica, financeira, de impactos ambientais e de
impactos sociais;
759
Gestão dos recursos hídricos

- comparação entre as alternativas;


- recomendação sob ponto de vista técnico da alternativa, ou grupo de
alternativas, mais adequado.

Após a seleção da alternativa a ser implementada passa-se à execução de


Projetos ou Regulamentos que estabelecerão as obras e medidas a serem
adotadas.

Projeto básico: É a fase em que uma obra ou medida não-estrutural, tal como
foi concebida no inventário ou estudo de viabilidade, é detalhada e orçada.
Isto deverá permitir a elaboração de documentos de licitação da construção da
obra e de fornecimento de equipamentos e sua montagem, ou de contratação de
serviços diversos. É a fase em que deverão ser preparados os Relatórios de
Impacto no Meio Ambiente (RIMA).

Projeto executivo: É a etapa final de planejamento onde são processados os


desenhos de detalhamento das obras civis e dos equipamentos, necessários a
suas execuções e montagens, respectivamente.

19.5.7 Composição das categorias de planejamento

Uma composição adequada dos diversos tipos de documento de planejamento


em cada categoria deverá considerar a compatibilidade de detalhamentos. Por
exemplo, não se pode considerar racional em um país de grande superfície e
diversidade dc clima, solo e problemas como o Brasil um Plano Nacional
Multissetorial. _ _ , .
Geralmente a jurisdição nacional é mais própria para o estagio^ de
política podendo referir-se a um setor ou mesmo a uma função. A política
nacional de irrigação é um exemplo. No outro extremo poderíam haver estudos
de viabilidade funcionais locais. Este seria o caso de estudos de projetos
específicos, como de um sistema de irrigação. Um documento intermediário é o
Plano Diretor, realizado no âmbito de uma bacia hidrográfica.

19 j . 8 Vantagens do planejamento.

A questão que fica após todas estas considerações é sobre que vantagens
podem ser esperadas de uma atividade racional de planejamento ? A resposta
que se pode dar é que existem diversas iniciativas de intervenção econômica
em uma sociedade em desenvolvimento. Estas iniciativas podem ser muitas vezes
conflitantes ou complementares. São conflitantes quando concorrem pela
utilização dos mesmos recursos e são complementares quando uma gera recursos
para a outra. A articulação destas iniciativas é, portanto, importante como
forma de tomá-las mais eficientes. O planejamento age como um instrumento de
760
Hidrologia

inspiração e coordenação destas iniciativas. A inspiração é realizada através


do conhecimento das prioridades sociais cujo suprimento deverá ser de alguma
forma estimulado pelo poder público. A coordenação é efetivada através da
legislação e de diretrizes programáticas aplicadas pela administração
publica. Alguns resultados, que poderão ser obtidos com a articulação
promovida por um planejamento adequado são :

a) destinação dos recursos naturais, incluindo os hídricos, para os usos com


maiores prioridades sociais. Isso poderá ser obtido através de um adequada
política de outorga de cotas ou de cobrança pelo uso da água.

b) estabelecer um padrão comum de avaliação de projetos, permitindo a


eliminação daqueles com maior probabilidades de serem inviáveis ou pouco
eficientes. Uma das dificuldades que serão verificadas na atividade de
análise de projetos é a grande incerteza com que se tem de trabalhar. Esta
incerteza, inerente às projeções do futuro, existe também com relação às
mformações sobre o presente. Elas atingem tanto a questão de
disponibilidades hídricas, mas, também, e principalmente, as questões
econômicas, políticas e sociais. Desta forma, muitas vezes, a atividade de
planejamento poderá parecer um exercício inócuo de futurologia. Para evitar
isso, uma onentação será o estabelecimento de padrões comuns de avaliação de
projetos os quais, mesmo sem poder ultrapassar os problemas de incerteza
pelo menos estabelecerão regras comuns que permitam uma hierarquização
reiajva quanto ao atendimento das metas propostas.

c) evitar conflitos entre usos em setores ou funções distintas. Através de


planos setonal e multissetorial poderá haver uma coordenação e.vre os
diversos planos funcionais e setoriais, equacionando os conflitos possíveis
previamente às suas ocorrências, quando soluções mais eficientes poderão ser
empregadas. r

f L r C° S T en? í aÇã° co°Perativa ^ s e t o r i a l . Esta ação cooperativa


entre entidades de diversos setores, viabilizada por planos multissetoriais
S - Um„ \ ! r 0r eflClênCÍa d0 uso dos ^cursos e evitará desperdícios,
-üp.ivaçao ae esforços e conflitos de uso.

e) obtenção de dados confiáveis e previsões racionais que poderão ser usados


por outras entidades en»o.,idas no planejamento. A L iV a d e de e o le u d e
ados e de projeções é difícil e envolve uma série extensa de estudos nem
sempre viável de ser realizada por entidades funcionais de pequeno porte
púbicas ou pnvadas. A existência de entidades de p lan eL ^ n m
multissetonal e setonal que realizem essas tarefas permitirá o us“
resultados por tais entidades, resultando na viabilização de uma maior
761
Gestão dos recursos hídricos

eficiência das atividades de planejamento.

f) permitir a aquisição e reserva prévias de locais que serão destinados a


obras ou áreas de proteção no futuro, evitando problemas sociais e legais de
desapropriação, custos incrementais e desperdícios. Diversos exemplos existem
para comprovar a necessidade dessas medidas de antecipação ao desenvolvimento
de uma região. Poderão . ser adquiridas áreas onde serão formados
reservatórios, construídos canais ou outras estruturas, impedindo ou
controlando suas ocupações de forma que, quando for necessária a implantação
da obra prevista, não existam problemas a esse respeito. Poderão constar do
plano de uso de solo de uma cidade (chamado às vezes de plano diretor) a
proteção de certas áreas com alto risco de inundação para parques, de forma a
não dificultar a passagem das cheias, o que víria a acarretar inundações a
montante. Áreas de proteção ambiental poderíam ser formadas como forma de
proteção ao ambiente natural em face das agressões que o desenvolvimento
econômico não planejado poderá trazer,

g) escalonamento adequado de projetos. Nesse escalonamento serão evitados


projetos de grande porte que permaneçam ociosos por longo tempo,
configurando-se um desperdício de recursos. Serão aproveitaras economias de
escala com a construção de projetos a múltiplos propósitos. Serão. evitadas
medidas emergenciais, geralmente caras e ineficientes, para aten er s
demandas aue não seriarn detectadas sem um planejamento criterioso. Igualmente
serão impedidas expansões de sistemas ou relocações cuja necessidade possa
ser prevista anteriormente à implantação.

h) obtenção de condições de financiamento vantajosas. Estas condiçoes poderão


ser obtidas através da demonstração da competência administrativa dos
responsáveis pelo projeto. Poderão ser obtidas igualmente pela mtrod^ ° n ®
projetos de usos que partilhem dos custos e contem com lmhas especiais d
financiamento, a juros subsidiados.

9.6 Gerenciamento de recursos hídricos

As instituições brasileiras na área dos recursos hídricos vêm sofremio


ma série de alterações a partir da aprovação da Constituição de 1988 e to
onstituições estaduais. A Constituição de 1988 estabelece c0™ °jjens ^ tJQS
...os rios que banhem mais de um Estado, sirvam de limi _
iaíses, ou se estendam a território estrangeiro ou dele P o n h a m -
II Art. 20). Os demais rios são bens dos estados. A competencí fl
obre a água é da União (Inciso IV do Art. 22). Já no caso do meio m b ^
l0 contrário dos recursos hídricos, é assegurado aos estados a compe
egislar suplementarmente à União (parágrafos 1, 2 e 3, Art. M).
762 Hidrologia

Esses dispositivos constitucionais levam a necessidade da União e dos


estados se estruturarem para realizar o gerenciamento dos recursos hídricos
nos rios de suas propriedades. Esta necessidade é estabelecida
constitucionalmente no caso da União, a qual compete " instituir sistema
nacional de gerenciamento de recursos hídricos ..." (Inciso XX do Art. 21).
Em algumas constituições estaduais, como a do Rio Grande do Sul, existe
menção explícita a sistemas estaduais:" Fica instituído o sistema estadual de
recursos hídricos, integrado ao sistema nacional de gerenciamento desses
recursos, adotando as bacias hidrográficas como unidades básicas de
planejamento e gestão (Art. 171).
No caso do meio ambiente, a União estruturou seu Sistema Nacional do
Meio Ambiente como constituído " pelos orgãos e entidades da União, dos
Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e pelas fundações instituídas
pelo Poder Publico, responsáveis pela proteção e melhoria da qualidade
ambiental" (Art. 3, Decreto 99.274 de 6 de Junho de 1990). Na estrutura
deste sistema encontra-se o conselho de govemo, como orgão superior, o
Conselho Nacional do Meio Ambiente, como orgão consultivo e deliberativo, a
Secretaria Nacional do Meio Ambiente da Presidência da República, depois
Ministério do Meio Ambiente, como orgão central, e o Instituto Brasileiro do
Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis - IB AMA, como orgão executor
Em face dos dispositivos relacionados às águas, a União e os Estados vem
discutindo formas de estruturação de seus sistemas de gerenciamento de
recursos hídricos, de forma a aperfeiçoar a estrutura vigente. Cabe assim a
apresentação de alguns princípios orientadores para estes sistemas, através
da dissecação das funções a serem cumpridas pelo Gerenciamento dos Recursos
Hídricos.

19.6.1 Funções do Gerenciamento dos Recursos Hídricos

O Gerenciamento dos Recursos Hídricos é promovido pelas ações do poder


público que visam à adequação dos usos, controle e proteção das águas às
necessidades sociais. Ele é implementado através da execução apropriada de
cinco funções gerenciais a seguir definidas e detalhadas, de acordo com Lanna
et al. (1990):

Gerenciamento dos usos setoriais da água (GERUSA) : trata das medidas que
visam ao atendimento de demandas setoriais de uso de água. Este gerenciamento
e levado a efeito através de planejamentos setoriais e ações de instituições
publicas e privadas ligadas a cada uso específico dos recursos hídricos :
a astecimento público e industrial, esgotamento sanitário, irrigação
navegação, geração de energia, recreação, etc. Idealmente, estes
p anejamentos setoriais deverão ser compatibilizados entre si no âmbito de
Cada bacia hidrográfica e com o planejamento global do uso dos recursos
Gestão dos recursos hídricos 763

ambientais, no âmbito regional ou nacional. Estas funções de


compatibilização, entretanto, são objeto de gerenciamentos outros que serão
apresentados a seguir.

Gerenciamento interinstitucional (GERINT): tendo como palavras-chaves os


termos coordenação e articulação, é a função que visa: a) à integração das
demais funções gerenciais entre si; b) à integração dos diversos órgãos e
instituições ligados à água com especial ênfase à questão qualidade versus
quantidade; c) à integração do Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos
ao Sistema Global de Coordenação e Planejamento, através, dentre outros
instrumentos, do estabelecimento de uma Política de Recursos Hídricos.
A execução desta função gerencial é tarefa de todas as entidades que
participam de um sistema de recursos hídricos, mas, em geral, atribui-se a
uma entidade a promoção, a orientação, o estímulo e a coordenação de tais
integrações interinstitucionais. Tal entidade deverá ser o órgão superior do
sistema mencionado, como por exemplo, um Conselho Interministerial. A
existência desta função atende ao princípio número 11 de gestão dos recursos
hídricos, previamente discutido.

Gerenciamento das intervenções em bacias hidrográficas (GERIBA) : trata da


projeção espacial das duas funções anteriores no âmbito específico de cada
bacia hidrográfica, visando: a) compatibilizar os Planejamentos Setoriais
elaborados pelas entidades que executam na bacia o Gerenciamento dos Usos
Setoriais da Água, em Planejamentos Multissetoriais de Uso da Água; b)
integrar ao planejamento do uso dos recursos hídricos e dos demais recursos
ambientais da bacia, as instituições, agentes e representantes da comunidade
nela intervenientes.
Este gerenciamento deve ser executado através da operação de
instituições adequadas, geralmente na forma de Comitês, Consórcios,
Associações e Agências de Bacias, e atende ao princípio 9 de gestão,
previamente discutido.

Gerenciamento da oferta da água (GEROFA): é a função de compatibilização dos


Planejamentos Multissetoriais de Uso da Água, propostos pelas entidades que
executam o gerenciamento anterior, aos planejamentos e diretrizes globais de
planejamento estabelecidos pelo poder público que é, constitucionalmente, o
proprietário dos recursos hídricos. Também poderá compatibilizar as demandas
de uso da água entre si, quando esta função não puder ser realizada pela
entidade responsável pelo Gerenciamento das Intervenções na Bacia (um Comitê,
por exemplo), seja por conflitos e outros problemas operacionais, seja por
sua inexistência. O instrumento utilizado para o cumprimento dessa função
gerencial é a outorga pelo poder público do direito de uso dos recursos
hídricos, incluindo o lançamento de poluentes. Deve ser entendido que o uso
764 Hidrologia

global dos recursos hídricos, hoje em dia, não pode resultar de mera
agregação das pretensões, demandas e planos de usuários setoriais. É preciso
que haja uma compatibilização e um rateio através de cotas (outorga do
direito do uso) e/ou tanfas (cobrança pelo uso) estabelecidas pelo poder
público, a fim de que o uso global das águas implique o máximo de benefícios
para a sociedade. Existem vantagens em centralizar-se o poder de outorga do
uso da água em entidade unica, na forma de um Departamento de Recursos
Hisricos, por exemplo, devido às dificuldades operacionais que um desenho
institucional com vários órgãos de outorga poderíam causar. Esta função
atende ao princípio 10 de gestão, previamente discutido.

Gerenciamento ambiental (GERAMB): refere-se ao planejamento, monitoramento,


licenciamento, fiscalizaçao e admínistraçao das medidas indutoras do
cumprimento dos padrões de qualidade ambiental efetivadas através de um amplo
leque de instrumentos administrativos e legais : estabelecimento de padrões
de emissão, cobrança de multas e taxas de poluição, promoção de ações legais,
etc. Esta função gerencial, a rigor, deveria ser considerada de forma a
abranger a de Gerenciamento da Oferta da Água. Afinal, o Gerenciamento
Ambiental deve tratar da oferta de todos os recursos ambientais entre os
quais se encontra a água. A separação em duas funções pode inclusive ser
criticada por não atender ao princípio 5 de gestão, que ressalta a ligação
estreita entre as condições qualitativas e quantitativas das águas. Esta
separação visa espelhar uma realidade institucional, que o Brasil e vários
outros países apresentam, na qual existem entidades específicas de
Geienciamento Ambiental separadas daquelas que promovem a outorga
quantitativa do uso da água. Existem porém excessões, mesmo no Brasil, como é
o caso do estado do Paraná, e uma tendência mundial de, pelo menos, vincular
estas duas entidades a uma mesma Secretaria ou Ministério do Meio Ambiente.

19.6.2 Dificuldades de implementação de um sistemas de gerenciam ento dos


recursos hídricos

As principais dificuldades de implementação de Sistemas Nacionais e


Estaduais de Gerenciamento de Recursos Hídricos que cumpram as fiinções
anteriores podem ser atribuídas a precariedade na execução do Gerenciamento
mtennstitucional, Gerenciamento das intervenções na bacia e Gerenciamento
a oferta da água. Trata-se justamente das funções que compatibilizam os usos
das águas as pretensões e planos dos diversos organismos que intervém nos
Recursos Hídricos. Tal deficiência acarreta a desarticulação dos elementos, o
que acaba por descaracterizar o conjunto como Sistema, ao mesmo tempo em que
obstaculiza a consecução de Planejamentos de Uso, Controle e Preservação de
Recursos Hídricos. As consequências danosas resultantes deste desequilíbrio
podem ser agrupadas em dois itens:
Gestão dos recursos hídricos 765

O arbítrio dos conflitos de uso da água são remetidos a Conselhos ou


Secretarias de coordenação. Estas entidades, que deveríam ser uma instância
superior do Sistema de Recursos Hídricos acabam por serem obrigadas a exercer
uma postura administrativa que foge às suas incumbências originais e às
dotações que lhes são atribuídas em termos financeiros, materiais e de
pessoal. Os conflitos de uso das águas, em vez de serem diagnosticados
previamente, serão abordados somente a partir do momento em que se
concretizarem, quando as soluções são obtidas com maiores custos economicos,
sociais, ambientais e políticos.
Ocorre a desarticulação do gerenciamento dos recursos hídncos
relativamente ao processo de planejamento do desenvolvimento nacional ou
estadual. Em conjunto com a anterior, esta conseqüência toma o gerenciamento
dos recursos hídricos meramente residual, e não global, na medida em que se
tenta "administrar" o que sobra das águas, depois que os principais agentes
utilizadores tomaram suas decisões e fizeram seus planos. Corolário disso é
que o planejamento e desenvolvimento de forma isolada dos setores da
economia, como se as conseqüências e os produtos fossem estanques,
ocasionarão conflitos de uso que se somarão aos já existentes. Tudo isso
deixa claro que um verdadeiro gerenciamento global dos recursos hídricos
implica levar em consideração os usos múltiplos da água e os usos múltiplos
do solo nas suas bacias hidrográficas, o que só será possível quando o
gerenciamento dos recursos hídricos integrar-se efetivamente ao gerenciamento
global do desenvolvimento e do meio ambiente. Por sua vez, esta integração só
se realizará através da mediação do Gerenciamento das intervenções nas bacias
Hidrográficas, do Gerenciamento da oferta da água e do Gerenciamento
interinstitucional, em conjunto com as demais funções gerenciais.

pro blem a s

1 - Um sistema de recursos hídricos será implantado em uma bacia prevendo o


abastecimento a uma cidade e a uma indústria. Não está previsto o tratamento
dos esgotos de nenhum destes usuários. Para viabilizar o atendimento das
demandas será construído um reservatório de regularização de vazões a
montante da captação, em área agrícola e de interesse ambiental. Em sua
operação o reservatório deverá estabelecer um certo controle de cheias que
beneficiará as populações a jusante. Listas os possíveis custos e benefícios,
sob as óticas financeira e econômica, e dos pontos de vista social e privado.

2 - Liste e explique os possíveis custos externos de projetos de a)


irrigação; b) controle de cheias; c) navegação; d) geração de energia
hidrelétrica. Se possível apresente exemplos reais ou hipotéticos.

3 - Apresente, discuta as causas e apresente alternativas de solução de


766 Hidrologia

conflitos de uso de água que você conheça.

4 - Que causas levaram a administração pública organizar-se por setores da


economia ? Como isso pode prejudicar o uso múltiplo e integrado dos recursos
hídricos ?

5 - Descreva uma bacia que você conheça, listando os principais problemas


reais ou potenciais de recursos hídricos. Sugira a realização de planos que
deverão encaminhar à solução ou evitar o surgimento dos problemas apontados.
Defina que tipos de plano são necessários, de acordo com a classificação
apresentada, e detalhe seus objetivos.

6 - Consulte a Constituição Brasileira e a do seu estado e comente os artigos


que dizem respeito aos recursos hídricos.

7 - Analise o sistema de recursos hídricos de seu estado. Verifique quais são


as entidades que executam as funções gerenciais definidas no item 19.6 1
Comente as dificuldades e carências do Sistema aludido e as alternativas para
o seu aprimoramento.

8 - A atividade de planejamento dos recursos hídricos pode ser conciliada com


a demanda de menor participação do poder público nas decisões econômicas 9 De
que formas ?

9 - O solo, a água e o ar são três recursos naturais estratégicos para a


promoção da vida humana. No Brasil o regime de propriedade dos mesmos é
distinta. Admite-se a propriedade privada do solo, a água é propriedade
publica e nada é estabelecido no que diz respeito ao ar. Comente essa
situação, explicando-a ou justifícando-a.

10- Apresente um esboço de Sistema de Gerenciamento de Recursos Hídricos no


âmbito de um estado e da União. Justifique sua proposta.

11- Suponha que você faça parte de um grupo de pessoas preocupadas com os
P lemas de recursos hídricos de uma bacia hidrográfica. Diante disso, o
grupo resolve criar um Comitê de Bacia Hidrográfica. Quem vocês convidariam
í r , Í 5artlC,par d° Comitê 7 Rascunhe um Regimento para o mesmo. Que
tratéípas você proporia para implantar o Comitê ? Que estudos você
in T n n Y erem Patrocinados Pe'0 Comitê para ser formada uma base de
qU£ Pf rmira a 101113(13 de decisões racionais no gerenciamento dos
recursos hídricos da bacia ?
767
Gestão dos recursos hídricos

REFERÊNCIAS

1 - ABRH. 1986. Boletim Informativo 25. Associação Brasileira de Hidrologia


e Recursos Hídricos. Junho de 1986.

2 - DNAEE. 1985. Plano Nacional de Recursos Hídricos^ Consolidação


de documentos básicos. Departamento Nacional de Águas e Energia
Elétrica, 321 p.

3 - GOODMAN, A. S. 1976. Education and training in water resources planning.


J. of the W a t e r Resources Planning and Management Division. Proc. ASCE
102 (WR2). Novembro.

4 - KTTSON, T. 1984. Regulated river basins. A review of hydrological aspects


for operational management. UNESCO: Serie Technical Documents in
Hydrology. Paris.

5 - LANNA, A.E., CÁNEPA, E.M., GRASSI, L.M., DOBROVOLKI, R. 1990.


Gerenciamento dos recursos hídricos : conceitos, críticas e
recomendações. Boletim Informativo da Associação Brasileira de
Recursos Hídricos, n. 43.

6 - MARQUES, D. L. M. 1993. Contribuição pessoal ao capítulo.

7 - NAÇÕES UNIDAS. 1976. The demand for water. Natural Resources-Water


Series no 3, Nova York.

8 - NATIONAL WATER COMMISSION. 1972. Water Resources Planning.


Relatório preparado pelo Consulting Panei on Water Resources.

9 - PEERCE, D .W., E TURNER, R. K. 1990. Economics o f Natural Resources


and the Environment. Harvester Wheatsheaf, Londres.

10- SUDENE. 1964. Plano Geral do Vale do Jaguaribe. Superintendência


de Desenvolimento do Nordeste, Recife.

11- VEIGA DA CUNHA, L., GONÇALVES, A. S., FIGUEIREDO, V. A. E


LINO, M. (1980). A gestão da água: princípios fundamentais e sua
aplicação em Portugal. Fund. Caloustre Gulbekian, Lisboa.

12- WRC.1970. Standards for Planning Water and Land Resources. United States
Water Resources Council.
Literatura consultada

13- JAMES, L.D. e LEE, R.R. 1971. Economias


o f Water Resources Planning.
McGraw-Hill Book Co.
Capítulo 20

DRENAGEM DE ÁGUAS SUBTERRÂNEAS

Nelson Luna Caicedo

20.1 Conceitos básicos

O processo de dessaturação ou drenagem consiste na remoção da água


gravitacional do meio poroso, seguida pela substituição de ar, geralmente à
pressão atmosférica. O deslocamento da água pelo ar ocorre, porque a pressão
da água no poro toma-se menor do que a pressão do ar no mesmo. Assim, ar e
água convivem simultâneamente nos poros, onde a pressão do ar excede a
pressão da água, em quantidade suficiente para deslocar parte dela.
Entretanto, a água adere-se às partículas sólidas, mais fortemente que o ar,
o que faz com que a interface água-ar seja curva, resultando em forças
superficiais que se opõem ao movimento da água.
A energia superficial (a) é uma força superficial por unidade de
comprimento, que atua ao longo do perímetro da interface em direção tangente
à superfície curva. No equilíbrio, a força resultante da energia superficial,
iguala-se à força de deslocamento produzida pela pressão capilar (pç). A
pressão capilar na interface é, por definição, a diferença entre a pressão do
2
ar e a pressão da água. Assim, 2jrra = rcr pc, segue-se que:

2a
( 20. 1)

Pc

O raio de curvatura da interface água-ar diminui quando há um aumento de


pressão capilar. Com isso, no processo de dessaturação, a água desocupa
primeiro os grandes poros.
O fato de a água e do ar conviverem no espaço poroso, requer o
conhecimento de um parâmetro diferente da porosidade para caracterizar o
volume relativo de água no aqüífero. A fração de água de um volume
representativo é, por definição, o conteúdo volumétrico de água (©):
Va
9 = — (20.2)
Vt
770 Hidrologia

onde: Va é o volume de água e Vt o volume total.


O conteúdo volumétrico de água varia de zero, em um meio poroso
completamente seco, a um valor máximo igual a porosidade, quando a água ocupa
todos os espaços porosos.
No processo de dessaturação a água desocupa gradativamente os grandes
poros, portanto, o conteúdo volumétrico de água diminui com o aumento da
pressão capilar, fato expresso pelas curvas de retenção (figura 20.1). Essas
curvas caracterizam a habilidade que o meio poroso tem em reter água quando a
mesma está sendo drenada.
O conteúdo volumétrico de água tende para um valor constante, quando a
pressão capilar aumenta indefmidamente. O valor de © para o qual d©/dpc
tende a zero, é chamado retenção específica, ©r A retenção específica é uma
característica razoávelmente constante para um mesmo material, especialmente
em areias e cascalhos. Como dado prático, o conteúdo volumétrico de água de
uma amostra submetida a uma pressão capilar de 1/3 de bar, é considerada
retenção específica.

Porosidade efetiva e aparente

A porosidade efetiva ou produção específica é um parâmetro adimensional,


uma relação entre o volume drenável e o volume total. A porosidade aparente,
por outro lado, é uma relação entre o volume de água removido do aqüífero e o
volume resultante de aqüífero drenado. A porosidade aparente, quando
determinada a partir da sua definição, é um parâmetro que incorpora a
presença de ar próximo da linha de água, a estratificação dos materiais e a
posição da linha de água. A porosidade aparente é considerada constante no
tempo, implicando uma entrega instantânea de água, quando o nível cai
bruscamente. O valor da porosidade aparente (<j>a) é sempre menor do que o
valor da porosidade efetiva Oj)^. A tabela 20.1 mostra valores da porosidade
efetiva de materiais naturais mais comuns, esses valores foram encontrados
através de ensaios de laboratório.

Armazenamento em aqüíferos confinados

Nos aqüíferos confinados, a entrega de água é devida à variação volumé-


trica do poro e da água. Essa variação é originada pela compressibilidade do
aqüífero e pela compressibilidade da água. O armazenamento específico (Ss) é o
volume de água entregue pelo aqüífero por unidade de volume de aqüífero e por
redução unitária de altura piezométrica. O armazenamento específico é consi­
derado constante e sua expressão é:
771
Drenagem de águas subterrâneas

s , = — — = pg 4> (Op + P) (20-3)

onde: (3 = a compressibilidade da água (4,8 x IO"10 cm2/dina), ctp- a


compressibilidade do material (4,4 x IO"9 cm2/dina); \ = a redução de altura
piezométrica [L]; p = o masa específica da água [M/L3]; g = a aceleração da
gravidade [L/T2]; <p = a porosidade do material [-].

Tabela 20.1. Porosidade efetiva de alguns materiais


(Morris e Johson, 1967)
Material Intervalo Média

Areia fina 0,01 - 0,46 033


Areia grossa 0,18 - 0,43 030
Cascalho fino 0,13 - 0,40 038
Silte 0,01 - 039 030
Argila 0,01 - 0,18 0,06

Figura 20.1. Curvas de retenção

O coeficiente de armazenamento (S) 6 o volume de água entregue por um


aqüífero de espessura constante, por unidade de área e por redução umtána
de altura piezométrica. O coeficiente de armazenamento é o produto do
armazenamento específico pela espessura do aqüífero (m).
772
Hidrologia

Va

20-2 Soluções analíticas no regime permanente

Neste item são apresentadas soluções analíticas para resolver problemas


de drenagem em escoamento unidimensional e permanente. Mesmo sabendo que as
soluções analíticas servem para resolver problemas simplificados, muitas
situações importantes podem ser modeladas utilizando as soluções aqui
apresentadas. Além disso, as soluções analíticas podem dar alguma idéia sobre
o que pode ser esperado de uma representação fisicamente mais real. Os
conceitos de velocidade Darcy e continuidade foram abordados no capítulo 8 e
serão seguidos estritamente da mesma forma como foram estabelecidos.
Problemas em escoamento permanente são aqueles para os quais as variá­
veis envolvidas (descargas, velocidades, parâmetros, etc.), permanecem cons­
tantes ao longo do tempo. As ferramentas básicas para resolver problemas em
escoamento permanente são a lei de Darcy e a equação da continuidade. A con­
tinuidade no escoamento permanente, implica na igualdade entre a vazão más-
sica de entrada e de saída de um volume de controle. A lei de Darcy relaciona a
velocidade com o gradiante da altura piezométrica local. A combinação dessas
duas equações gera uma equação diferencial, a mesma que resolvida juntamen-
íe com condições de contorno, fornece uma solução analítica. Os seguintes ca-
sos ilustram a metodologia exposta.

Escoamento em direção a uma trincheira em aqüífero confinado

Considere um aqüífero confinado, com condutividade hidráulica K e


espessura m. O canal e a trincheira estão separados por uma distância L. O
comprimento do canal e da trincheira é b (perpendicular ao plano da página).
A altura piezométrica no canal, hj, e na trincheira, h2, permanecem
constantes ao longo do tempo (figura 20.2),
A descarga em direção à trincheira é igual a velocidade Darcy vezes a
área da seção transversal. Assim,

dh
Q = - Kmb ( — ) (20.5)

Na equação ( 2 0 5 ) , K, m, b e Q permanecem constantes. Integrando-se


entre os limites h = hJf x = 0; h = h 2 , x = L, resulta a descarga em direção
à trincheira ao longo do comprimento b.
Drenagem de águas subterrâneas 773

Kmb
Q = — (b^ - h2) (20.6)
L

Integrando-se a equação (20.5) entre os limites hj, x = 0 e algum ponto


arbitrário, h, na direção x, pode ser obtida uma equação geral para a altura
piezométrica h, entre 0 canal e a trincheira. Assim,

Qx
h = h , ------ O s x iL (20.7)
Kmb

Escoamento em direção a uma trincheira em aqüífero livre

A solução do caso anterior foi simplificada, porque o fluxo transversal


é constante. Isso ocorre, porque o escoamento é confinado entre estratos
impermeáveis.
No caso do escoamento não-confinado ilustrado na figura 20.3, a situaçao
se complica pela dependência existente entre a seção transversal do fluxo e a
altura piezométrica, cujo valor queremos determinar.
Seguindo as simplicações de Dupuit-Forchheimer abordadas no capítulo 8,
a descarga ao longo da trincheira pode ser calculada pela seguinte expressão:

dh (20.8)
Q = - Kbh ( — )
dx
774
Hidrologia

na qual K, b, e Q são constantes. Integrando-se a equação (20.8) entre ós


limites h = h,, x = 0, e h = h2, x = L, resulta a descarga ao longo da
trincheira. Assim:
Kb 2 i
Q = — fri - hd (20.9)

Depois de estimar o valor da descarga, a distribuição da altura


piezométrica na direção x, h(x), entre o canal e a trincheira, é encontrada
integrando-se a equação 20.8 entre os pontos h = h2, x = 0 e um ponto
arbitrário. O resultado dessa integração dá como resultado a seguinte
equação:
2 Q x 1/2
0 3 x s L ( 20. 10)
K b

A equação 20.10 mostra que a linha de água tem uma forma parabólica.

Considerando um caso intermediário de escoamento permanente em direção a


uma trincheira onde em algum ponto entre
o canal e a trincheira o escoamento
toma-se livre (figura 20.4).
Drenagem de águas subterrâneas 775

Figura 20.4. Escoamento cru direção a uma trincheira em


aqüífero parcialmente confinado

A descarga Q neste caso pode ser encontrada através dos resultados dos
dois casos anteriores. No entanto, a distância R ao ponto onde o escoamento
toma-se livre deve ser determinada. No intervalo 0 í i í R, o escoamento é
confinado e a equação (20.6) pode ser usada para calcular a descarga Qj,
nessa parte do aqüífero:

Kmb x
Qj = ------ (hj - m) (20.11)
R

onde foi feita a substituição de hj por m e L por R.


No intervalo R S i i L o escoamento é livre e a equação (20.9) pode ser
usada para calcular a descarga Q2, através dessa segunda parte de aqüífero:

Kb 2 ,
Q2 ---------- (m - hp (2 0 .1 2 )
2 2(L-R)

onde m foi substituído por ht e (L-R) por L.


776 Hidrologia

Como o escoamento é permanente, a continuidade garante que Qj seja igual


a Q2 e igual a Q. Com essa condição pode-se usar as equações 20.11 e 20.12 e
resolvê-las para as incógnitas Q e R. Assim, resolvendo-se para R:

2 m L (hj - m)
R = --------------------- (20.13)
2
m (2hj - m) - h2

Resolvendo-se para Q:

K b 2
q - — (2 h, m - m (20.14)
2 L

Á forma da superfície píezométrica também pode ser encontrada a partir


das equações 20.7 e 20.10. Assim:

Qx
h = h| - 0 s x s R ( 2 0 .1 5 )
K m b

h = « m2. L Q ( í . R ,l '« R í x í L ( 2 0 .1 6 )
K b

Escoamento em direção a uma trincheira em aquífero livre com infiltração

Na figura 20.5 o escoamento permanente em aqüífero livre entre o canal e


a trincheira é influenciado por uma infiltração uniforme e contínua. À taxa
de infiltração, W, por unidade de área drenada, poderia ser expressa, por
exemplo, em m3/dia/m2.
Neste caso a descarga Q através de um volume de controle, não é
constante como nos problemas anteriores. Nesse volume a descarga de saída
(Qs) é igual a descarga de entrada (Qe), mais a descarga correspondente à
infiltração uniforme. Assim:

Qs * Qc + w &0 (20.17)

ou indo ao limite quando Àx 0,

dQ
— = W b (20.18)
dx
777
Drenagem de águas subterrâneas

x. (20.19)
Q = Wb x + C x

Invocando-se a equação 20.8 que relaciona a descarga atravás de qualquer


seção transversal e igualando-a com a equação 20.19, obtém-se.

W b x dx + Cj dx = - K b h dh (20.20,

Integrando-se a equação 20.20 obtém-se:

W b x2 ~ K b h' (20.21)
------ + Cj x + Oi -

onde as constantes C, e C2 são determinadas pela condição x 0 e x = L.


Conhecendo-se C, obtém-se a descarga Q através da equação 20.
■ W I-W -#
778 Hidrologia

Wb Kb , ,
(2022)
“ ~2 (2X ‘ L) + 2 L ^ ^

Conhecendo-se Cx e Cj, a equação 2021 pode ser usada para resolver pela
altura piezométrica, h.

2 j 2. X W X
1/2
h = hx - (hx - h^ — + — (L - x) (2023)

Finalmente, deve-se salientar que não existe nada em contrário para o


uso de valores negativos de infdtração, pode corresponder a uma retirada
uniforme e continua de água, da mesma forma como acontece com a
evapotranspiração.

Exemplo 20.1.: Dois drenos a céu aberto separados por uma distância de 12
metros, têm seus respectivos níveis de água a 6,1 m e 1,5 m acima de um
estrato impermeável de referência. Estime a posição da linha de água entre os
drenos, para o aqüífero homogêneo cora condutividade hidráulica 0,5 m/dia e
recarga constante de 02 m/dia.

Solução: Usando-se a equação 2023, para x = 0, 3, 6, 9 e 12 metros tem-se


h - 6,10; 626; 5,84; 4,67 e 1,5 metros.

202 Escoamento radial transitório

O escoamento no qual a altura piezométrica muda com o tempo é chamado


transitório. O escoamento em direção a um poço, a percolação em direção a
reservatórios circulares de captação de água e de mineração, são exemplos de
escoamentos radiais. Estritamente falando, o fluxo radial em um plano é
bidimensional, mas o uso de coordenadas polares tira vantagem da simetria do
fluxo radial, permitindo ao mesmo tempo que a equação diferencial seja
escnta apenas com uma variável espacial, a coordenada radial r.
. _ A resposta a um bombeamento constante em umpoço localizado num aqüífero
infinito, homogêneo, isotrópico e completamente penetrante, pode ser estudada
pela solução da equação radial de Boussinesq:
32s 1 âs ds
a ( — + -------- ) « — (2024)
d i2 r 3r at

onde: a - a difiisividade hidráulica, [LVn; r - a distância radial ao poço,


. S*3 / \ ° ^«xam cnto, diferença entre um valor de referência e a altura
piezometnca,. [L].
Drenagem de águas subterrâneas 779

Com as seguintes condições iniciais e de contorno:

s(r,0) = 0
s(oo,t) = 0

lim r Ü = . _ ? (20.25)
r-»o ôr 2nT

A te r c e ir a c o n d iç ã o e x p re s s a o fa to d o p o ç o s e r tra ta d o c o m o u m s u m id o u ­
ro . A s c o n d i ç õ e s i m p l i c a m n u m s a lto b r u s c o d a d e s c a r g a , d e z e r o a Q n o t e m p o

t = 0. .
As condições sob as quais a equação 20.24 e as condições 20.25 foram
derivadas, são satisfeitas para o aqüífero confmado com espessura constante.
A utilização em aqüíferos livres restringe-se a situações nas quais: 1) as
componentes verticais do fluxo são desprezíveis, e 2) a variação de
armazenamento por expansão da água e por compressão do aqüífero são pequenas
em relação à drenagem gravitacional dos poros. Na prática, nenhuma dessas
condições é satisfeita plenamente na vizinhança do poço, principalmente
depois de uma brusca mudança na descarga de bombeamento.
A solução da equação do fluxo radial transitório, juntamente com as
condições iniciais e de contorno, pode ser feita utilizando-se a variável de
Boltzman, u = r2/4at. Essa variável permite a transformação da equação de
Boussinesq na seguinte equação diferencial ordinária:
d^s 1 ds
— + (! + - ) - = 0 (20.26)
du2 u du

com as seguintes condições:

s(oo) - 0

ds Q
lim u — = --------- (20.27)
r-»0 du 4 7C T

Integrando-se a equação 20.26, obtém-se:

ds
u — = Ci exp (-u) (20.28)
du

onde C x é uma constante de integração, calculada pela segunda condição da


780
Hidrologia

equação 20.27. Substituindo essa constante na equação 20.28, integrando-se e


usando a pnmeira condição da equação 20.27, obtém-se:

00

S=
v r exp (-x)
=
4 7t T J
£ ] dx (20.29)
u

onde x é a variável de integração.


A integral na equação 20.29 é conhecida como integral exponencial, seus
valores encontram-se tabelados em livros de matemática aplicada. Na
iteratura de água subteiTânea, a integral exponencial é conhecida como
função de Theis ou função W(u).

Q
s = W(u)
4 n T (20.30)

^ ^ SCr expandida em uma série infinita de termos da


seguinte maneira:
2 3
W(u) = - 0,5772 - ln(u) + u - — +
(20.31)
4 18

p axa valores de u menores que 0,01, a função W(u) é aproximada apenas


^ p]es" ° 1S Pnm£ir0S 16171103 da série- ficando reduzida a uma forma muito

s = ln( - ) - 0 ^ 7 7 2 | válido para u < 0,01


4k T (20.32)

Note-se que u é pequeno, quando a distância radial ao poço é pequena


e/ou quando o tempo é muito grande. Para grandes distâncias,
tem precisão somente para tempos muito demorados.

mdnrio t f 2í i r 1™ ° ; . al0r d° reda^xamonto em um aqüífero confinado: 1) no


própno poço e 2) a uma distância radial de 25 m. O poço foi bombeado durante
7 horas com uma descarga de 0,0315 m3/s. As propriedades do aqüífero são- S -
0,001 e T = 0,0094 m2/s.

Solução: A v « i l ,d do B otem » „ , ^ ^ calcn]aia a


9,4 n r/s. Assim,
D r e n a g e m d e ág u a s subterrâneas 781

Uj = (03X 03) / 4(9,4)(7)(3600) = 9,499 x 10-8


u j = (25)(25) / 4(9,4)(7)(3600) = 6396 x IO*4

Já que Uj < 0,01 a equação 2032 pode ser usada para calcular o

rebaixamento no poço (r} = 03): s2 = 0,0315 / 47i(0,0094) (/n(l/9,499 x 10'8)


- 03772) = 4,16 m
Para u2=6396 x IO"4, W=6,747, s2 = (0,0315)(6,747) / 4tc(0,0094) = 1,8 m

20.4 Determinação de características hidrogeológicas

Os métodos mais confiáveis para a determinação da condutividade


hidráulica e a permeabilidade intrínseca, são provenientes dos testes de
aqüífero conduzidos em campo. Embora o valor da condutividade hidráulica de
uma amostra, possa ser encontrado no laboratório com um alto grau de
precisão, as amostras são muito pequenas comparadas com o tamanho do
aqüífero, além da perturbação sempre presente na coleta e transporte da
amostra. Por isso, é extremamente difícil caracterizar a condutividade
hidráulica de um aqüífero através de medições no laboratório.
A condutividade hidráulica e a permeabilidade intrínseca podem ser
medidas diretamente através de permeâmetros. No permeâmetro de carga
constante, no qual é estabelecido o escoamento permanente ascendente através
da amostra, a equação de Darcy é diretamente aplicada paia estimar o valor da
condutividade hidráulica K.

Q L
K - —— (20.33)
hoA

A perda de carga (h^) através do permeâmetro, nada mais é do que a


diferença de altura entre os níveis de entrada e saída do permeâmetro. A
descarga Q é calculada após atingir o equilíbrio, dividindo o volume de água
recolhido durante um intervalo de tempo, Na equação 20.33, L é o comprimento
e A a área do permeâmetro.
No permeâmetro de carga variável a descarga através da amostra decresce
com o tempo, pois a carga decresce com o descenso do nível de água no tubo de
entrada do piezômetro. A condutividade neste caso relaciona-se
logaritmicamente com as perdas de carga.
H id r o lo g ia

a L h0
K = — ln ( — ) (20.34)
Aí llj

onde, h0 é a carga inicial (para t = 0), h, é a carga no tempo t, A e a são


as áreas do permeâmetro e do tubo, respectivamente.
A seguinte tabela mostra valores de condutividade hidráulica para vários
materiais porosos comumente encontrados na natureza.

Tabela 20.2. Condutividade hidráulica de materiais porosos


(Morris & Johnson, 1967)
Material Intervalo (cm/s) Média (cm/s)

Areia fina (0,2 - 189) x 10-4 2,88 x IO"3


Areia grossa (0,9 - 6610) x IO*4 5,20 x 10-2
Cascalho (0,3 - 31,2) x IO'1 4,03 x IO'1
Silte (0,1 - 7090) x 10-7 2,83 x 10-5
Argila (0,1 - 47) x 10'8 9,00 x 10’8

Testes de aqüífero

Os parâmetros de um aqüífero são obtidos a partir de testes feitos em


campo. A determinação do coeficiente de armazenamento, porosidade aparente,
condutividade hidráulica e transmissividade permitem que os rebaixamentos
previstos pelas soluções matemáticas se aproximem dos rebaixamentos
observados no campo, nos pontos de observação. A partir daí, os modelos de
previsão de rebaixamentos, juntamente com os parâmetros hidrogeológicos,
podem ser usados para cumprir várias finalidades: dimensionar a explotação de
um aqüífero, determinar os efeitos do bombeamento sobre corpos de água (rios,
canais, lagos), garantir abastecimento, estimar fluxos de água no interior de
uma mina, estimar o avanço de uma pluma de contaminação, etc. Os testes
feitos em campo são caros e demorados, razão pela qual é necessário planejar
o teste com muito cuidado, afim de tirar maior informação com menor
investimento.
As propriedades do aqüífero são determinadas pela comparação de
rebaixamentos observados e calculados; portanto, é importante que a geometria
do aqüífero, as condições de contorno e as condições iniciais dos
rebaixamentos no lugar do teste, obedeçam às condições estabelecidas pelas
equações teóricas no máximo possível. Essas condições devem servir de
diretrizes na escolha do lugar do teste, no caso de não ter sido selecionado
por outras razões. As informações geológicas fornecem subsídios
D r e n a g e m d e á g u a s subterrâneas 783

importantíssimos na locação dos contornos do aqüífero, no grau de


extratificação, homogeneidade e isotropia do aqüífero.
A construção e a locação de poços de observação são muito importantes no
teste de aqüífero. Um poço de observação geralmente é protegido por um tubo
perfurado, o diâmetro é dimensionado em função do método a ser utilizado para
medir o nível de água, entre 5 e 10 cm. Em aqüíferos livres, o poço de
observação deve ser protegido completamente pelo tubo perfurado, até atingir
o fundo impermeável; essa providência garante a representatividade da altura
piezométrica média ao longo da vertical. No caso dos aqüíferos confinados,
cuidados devem ser tomados no sentido de isolar completamente as entradas de
água nos extratos superiores, bem como evitar fugas de água do próprio
aqüífero confinado. A adição de um selo no espaço deixado pelo tubo e a
parede do furo acima do estrato confinado, resolve esse problema. Na parte
perfurada do tubo, a água deve ter livre trânsito entre o aqüífero e o tubo,
a adição de uma camada com condutividade hidráulica maior (filtro) do que a
condutividade hidráulica do próprio aqüífero, diminui a resistência ao fluxo
nessa zona. Deve-se retirar água do poço de observação várias vezes para
estabelecer uma boa transferência entre o poço e o aqüífero.
A locação e o número de poços de observação dependem do tipo de teste,
dos recursos disponíveis e da localização do poço de bombeamento. Sendo
possível, é desejável ter mais de dois poços de observação. Se as condições
limitam o número de poços de observação para dois ou três, devem ser locados
em pontos diferentes de um mesmo alinhamento a partir do poço de bombeamento.
Se vários poços de observação são usados, devem ser locados em alinhamentos
radiais a partir do poço, fazendo aproximadamente 90 graus entre eles. Esse
cuidado vai ajudar a descobrir algum desvio na simetria do cone de depressão.
O espaçamento apropriado entre poços de observação é definido pelo grau
de penetração do poço de bombeamento no aqüífero, se o aqüífero é confinado
ou livre, e da duração prevista para o teste. As componentes verticais do
fluxo, produzidas pela penetração parcial do poço no aqüífero, são geralmente
desprezíveis em distâncias correspodentes a 14 vezes a espessura do
aqüífero.
O raio de influência expande-se mais rapidamente nos aqüíferos
confinados do que nos aqüíferos livres, portanto, as distâncias entre poços
de observação no aqüífero confinado podem ser maiores do que no aqüífero
livre. Essas distâncias podem ser previstas desde que se tenha conhecimento
aproximado dos valores dos parâmetros hidrogeológicos.
As amostras de materiais constituintes do aqüífero, devem ser colhidas
durante a instalação do primeiro poço de observação para estimativa da
condutividade hidráulica e da transmissividade no laboratório. Também podem
ser estimados valores aproximados do coeficiente de armazenamento c da
porosidade aparente. Esses valores, juntamente com a descarga e a duração
prevista do teste, vão permitir a previsão de rebaixamentos a diferentes
784 Hidrologia

distâncias do poço, bem como da locação antecipada dos poços de observação.


A descarga durante o teste deve ser medida e controlada. As medições
podem ser feitas através de dispositivos hidráulicos (orifícios, calhas,
medidores) ou através de medições diretas do volume bombeado na unidade de
tempo. Com o aumento do rebaixamento no poço, há também aumento da descarga
do aqüífero durante o teste; conseqüentemente, é necessário aumentar a vazão
da bomba através de uma válvula. O controle da descarga de bombeamento por
uma válvula, durante o teste, é feito com uma descarga menor que a descarga
máxima da bomba. Portanto, o teste deve começar com a válvula parcialmente
fechada, para depois ser aberta, afim de compensar o aumento da descarga do
aqüífero produzido pelo aumento de rebaixamento no poço de bombeamento.
A descarga Q que aparece nas equações desenvolvidas previamente,
corresponde à descarga do aqüífero e não é necessariamente igual à descarga
de bombeamento. Por exemplo, pode-se bombear uma descarga constante mas parte
dessa descarga pode ter origem no próprio poço. O armazenamento da água no
poço é geralmente desprezível, mas pode ser considerável quando o diâmetro do
poço for maior que um metro, principalmente quando a descarga é pequena.
A água do teste deve ser destinada convenientemente de maneira a não
afetar os resultados. A água deve ser transportada através de tubulações ou
canais, a distâncias maiores que o raio de influência máximo do cone de
depressão. Esse cuidado evita a possível recarga do aqüífero com a água do
próprio teste, principalmente para testes de longa duração (72 horas ou mais)
onde grandes volumes de água são retirados do aqüífero.
Para medir os rebaixamentos nos poços de observação, um método
suficientemente preciso consiste na utilização de uma trena de aço pintada
com giz. O procedimento consiste em passar giz, no primeiro metro da trena,
introduzi-la até que a parte da trena pintada penetre parcialmente na água do
poço. A trena desce sempre a partir de um datum (geralmente o topo do tubo do
píezômetro), após levantada, a parte molhada é subtraída da referência
inicial. Esse método toma-se inconveniente para grandes profundidades (50
metros ou mais), onde devem ser usadas sondas elétricas ou acústicas.
Os níveis de água nos poços de observação e bombeamento devem ser
monitorados, quando possível, vários dias antes da execução do teste.
Qualquer tendência encontrada nesse período, pode ser extrapolada durante o
teste e os rebaixamentos observados corrigidos de acordo. Na medida do
possível, todas as medições devem se corrigidas em relação a uma mesma
referência, através do nivelamento das bocas dos poços de observação e
bombeamento.
Os rebaixamentos nos poços de observação são medidos durante o teste a
intervalos de tempo predeterminados. O rebaixamento toma-se sensível nos
poços de observação próximos ao bombeamento. Nesses poços, os rebaixamentos
devem ser colhidos a intervalos de 1 ou 2 minutos nos primeiros 10 minutos do
teste, e logo aumentar para intervalos de 10 minutos durante a primeira hora.
D r e n a g e m d e ág u a s subterrâneas 785

A partir daí. 'pode-se fazer medições a cada meia hora, até o teste atingir 2
horas. Medições horárias são necessárias entre 5 e 12 horas de bombeamento. A
partir de 12 horas, o intervalo de medição pode ser aumentado para várias
horas. A plotagem adequada em papel semilogarítmico do rebaixamento, em
função do tempo, ajuda na escolha dos tempos ótimos de leitura. Um
procedimento semelhante é usado para prever os tempos adequados nos poços de
observação mais afastados. -
A duração do teste, depende do uso e da precisão desejada para os dados.
Geralmente as melhores estimativas das propriedades dos aqüíferos são obtidas
por testes com mais de 24 horas de duração. Isto é particularmente verdadeiro
para aqüíferos livres pela influência da drenagem vertical na porosidade
aparente; às vezes, são conduzidos testes por mais de 72 horas. Uma boa
prática consiste em continuar as medições após o término do teste, pois os
rebaixamentos observados na recuperação do aqüífero, são também utilizados
para estimar as propriedades hidrogeológicas do aqüífero.

Solução de Theis

Ao término do teste, os rebaixamentos e os respectivos tempos, em cada


ponto de observação, são analisados de várias maneiras. O método de Theis usa
o seguinte procedimento;

a) plotar em papel log-log transparente, rebaixamentos s(t) versus r2/t, onde


r é a distância entre o poço de observação e o poço de bombeamento e t é o
tempo de observação do rebaixamento.

b) plotar em papel log-log opaco, a função W(u) versus u. O tamanho de caaa


cicio do papel log-log deve ser igual ao correspondente do gráfico anterior.

c) sobrepor os dois gráficos mantendo os eixos W(u) e s(t) paralelos. Ajustar


até que a maioria dos rebaixamentos observados caia sobre a curva tipo, W(u;.
Os eixos correspondentes devem manter-se paralelos durante o deslocamento.

d) selecionar um ponto arbitrário (não necessariamente sobre a curva) e


2
anotar os valores de u, W(u), e os correspondentes r / t e s(t).

e) calcular a transmissividade e o armazenamento (porosidade aparente) usando


as coordenadas acima determinadas e as seguintes expressões:

T = 2 2 2 ° s = 1 1 1 -1 (20-35)
4 71 s I2
786 Hidrologia

O procedimento acima descrito nada mais é do que um método gráfico de


determinação de S e T, e fa r com que a equação de Theis se ajuste aos
rebaixamentos observados. Normalmente, as propriedades do aqüífero
determinadas para cada poço de observação não têm o mesmo valor por várias
razões: variabilidade espacial das propriedades do aqüífero, componentes
verticais do fluxo, erros de medição e contribuições retardadas. Note-se que
o método de Theis, bem como outros métodos, estimam valores médios em um
volume de aqüífero. Portanto, algumas pequenas heterogeneidades são
mascaradas ou integradas.

Exemplo 20.3. Os seguintes dados foram colhidos em um poço de observação


localizado a 20 ra d o poço de bombeamento durante um teste em um aqüífero
livre. Estimar a transmissividade e a porosidade aparente, sabendo que a
descarga-de bombeamento é 1,872 m3/min.

Solução: Inicialmente deve-se calcular para cada tempo o valor de r2/t.

s (m) 0,025 0,050 0,055 0,110 0,170 0,180 0,220


t (min) 4,5 7,5 8,5 16,0 24,0 26,5 36,0
2 2
r /t (m /min) 88,9 53,3 47,1 25,0 16,7 >5,1 11,1

s (m) 0,300 0,370 0,450 0,530 0,620 0,640 0,650


t (min) 64,0 97,0 162,0 258,0 408,0 488,0 513,0
2 2
r /t (m /min) 6,25 4,12 2,47 1,55 0,98 0,82 0,78

A seguirmos dados são plotados em papel log-log, rebaixamento versus


r2/t. Observe-se que um valor pequeno de recarga, embora passível de existir,
não foi, suficiente-para causar uma redução na taxa de aumento do rebaixamento
(curva sempre crescente, mesmo em tempos pequenos). Seguindo o procedimento
alinhavado anteriormente, conforme a figura 20.6 as coordenadas do ponto de
sobreposição são:

W(u) = 1 ,0 u = 0,1
S = 0,183 r2/t = 6 2

Das equações 20.35, obtém-se:


T = (1,872)(1,0) / 4jt(0,183) = 0,814 m2/min
♦. = (4)(0,814)(0,1) / 6 2 = 0,053

Note-se que u é maior que 0,01 para todos os pontos do teste.


Drenagem de águas subterrâneas 787

Figura 20.6-Ilustração do método de Theis

Solução de Jacob

Os dados do teste de aqüífero podem também ser analisados utilizando o


método de Jacob, baseado e sujeito às mesmas restrições da equação aproximada
de Theis. Os rebaixamentos observados versus os tempos de observação são
plotados nos eixos coordenados de um papel semilogarítmico. Para testes com
grandes períodos de duração, (ou seja para valores de u < 0,01), os dados
devem-se alinhar ao longo de uma reta. Escrevendo-se a equação aproximada de
Theis em termos de logaritmos decimais, pode-se relacionar a declividade da
linha reta com a transmissividade.

2,303 Q r 2,246 a ^
s(r,t) = --------- *{ log t + lo g (-------- )V (20.36)
4 n T ^ xi J

A declividade da reta (rebaixamento versus o logaritmo do tempo) é o


coeficiente 2303Q / 47cT. Assim:

2,303 Q
T ----------- (20.37)
4n As
788 Hidrologia

onde As representa o rebaixamento por ciclo de papel logarítmico.


O coeficiente de armazenamento pode também ser estimado extrapolando a
linha reta até o tempo ^ onde s(r,t) = 0. Da equação 20.36 com s(r,t) = 0,
tem-se que log (2,246 a ^ / r2) = 0, de onde conclui-se que 2,246 T tç / r^S
= 1. O coeficiente de armazenamento S pode então ser estimado através da
seguinte equação:

2,246 T tg
S = ------------ (20.38)
r2

Antes de estimar T e S, não é possível identificar as observações para


as quais u foi menor que 0,01. Portanto, não há certeza que todas as
observações utilizadas para inteipolar a linha reta cumpram essa condição.
Recomenda-se, portanto, fixar um valor máximo de u para o qual as
observações, podem servir para interpolar uma linha reta (por exemplo 0,05).
Os valores de T e S assim determinados, são utilizados para estimar u. As
observações cujos valores de u superam 0,01, são excluídas de uma segunda
estimativa de interpelação. Assim, estima-se novos valores de T e S.

Exemplo 20.4. Os seguintes dados foram colhidos durante um teste em um


aquífero confinado . A distância radial ao poço é de 61 m e a descarga de
bombeamento Q = 1,894 nf/min. Estimar os valores da transmissividade e do
coeficiente de armazenamento.

s(m) 0,20 0,30 0,37 0,415 0,45 0,485 0,53 0,57


t(min) i 2 3 4 5 6 8 10
s(m) 0,60 0,635 0,67 0,72 0,76 0,81 0,85 0,875
t(min) 12 14 18 24 30 40 50 60
s(m) 0,925 0,965 1,000 1,045 1,070 1,100 1,120
t(min) 80 100 120 150 180 210 240

Solução: Os dados são plotados em papel semilogarítmico, conforme mostra a


figura 20.7. Uma pequena curvatura aparece nos dados plotados para tempos
pequenos. Esses pontos não são considerados para a interpolaçâo da linha
reta. A declívidade da linha reta é As = 0,4 m por ciclo de papel. Portanto,
da equação 20.37 estima-se a transmissividade.

T - (2,303X1,894) / 4?t(0,4) = 0,868 m2/min


Drenagem de águas subterrâneas 789
•.metros

Figura 20.7. Ilustração do método de Jacob

A linha reta é extrapolada para s = 0 e t^ = 0,4 min. Da equação 20.38


calcula-se o armazenamento.

S - (2,246)(0,868X0,4) / (61)(61) = 2,0 x 10"4

O tempo que corresponde a u = 0,01 é:

t = r2S / 4Tu » (61)(61)(2,0 x Ifr4) l 4(0,868)(0,01) = 21 min

Assim, pontos com tempos inferiores a 21 minutos não devem ser incluídos
na determinação da linha reta.

Análise de dados de recuperação e im pacto

Depois de fechar a bomba em um teste de aqüífero, o nível de água no


poço de observação começa a subir. Essa fase é conhecida como recuperação, u
rebaixamento durante a recuperação é dado pela seguinte equação:
790
Hidrologia

Q r2 r2
s(r,t) = ~ J W[-----J - W[---------- n 1> b (20.39)
4 kT 4aT 4a(t-t2)

onde t2 é o tempo de bombeamento. Se u for menor que 0,01 a equação 20.39


fica reduzida a uma expressão ainda mais simples:

Q t
s(r,t) = ------ In ^ - — - }• t > í- (20.40)
4 n T

Uma aplicação importante da análise de dados de recuperação consiste em


estimar a transmissividade através dos rebaixamentos no próprio poço, princi­
palmente quando as condições não permitem a instalação de piezômetros. Da­
dos mais precisos são geralmente obtidos durante a recuperação, do que no bom­
beamento, pois a água na recuperação não é perturbada pela bomba. O procedi­
mento para a análise de dados de recuperação quando u c menor que 0,01, con­
siste na plotagem em papel semilogarítmico, do rebaixamento versus o corres­
pondente valor de t/(t-t2) na escala logarítmica. Note-sc que t ó o tempo contado
a partir do início do bombeamento, e i2 é a duração do bombeamento. Da equa­
ção 20.40, tira-se a relação entre a deciividade As por ciclo dc papel c a transmis-
sívidade.

2,303 Q
T = -------- (20.41)
4n As

Exemplo 20.5. Encontrar o valor da transmissividade a partir dos seguintes da-


dos de recuperação. A descarga durante a fase dc bombeamento c Q = 1,79
m /min, a distância radial ao poço c r = 4,6 m e o tempo de bombeamento i-, =
443 min.
Solução: O primeiro passo consiste em calcular o valor dc ( i/ m -,)

s(m) 1,640 1,595 1,535 1,490 1,445 1,400 1,305 1,235


1,200
t(min) 443,5 444,0 444A 445,0 445,5 446,0 447,0 447,5
448,5
t/t-t2 887 444 296,3 277,5 1782 148,7 111,8 99,44 8155

s(m) 1,060 0,930 0,845 0,755 0,700 0,590 0,521 0,451 0,384
t(min) 451,0 455,0 459,0 464,0 469,0 479,0 489,0 499,0 514,0
t/t-t2 56,38 37,92 28,69 22,10 18,04 13,30 10,63 8,91 124
Drenagem de águas subterrâneas 791

Figura 20.8. Ilustração do método de recuperação

A plotagem do rebaixamento versus t/í-t2 c mostrada na tígura 20.S. A


dcciividade da rota é 0,58 m por ciclo. Da equação 20.41 tcm-sc:

T = (2,303) (1,790) / 4tc (0,58) = 0,566 m2/min

Os dados de impacto são obtidos através da injeção de um volume


conhecido de água dentro do aqüífero em um intervalo de tempo muito pequeno,
capaz do teste ser considerado instantâneo. Os testes de impacto são, ^às
vezes, utilizados para estimar a transmissividade de aqüíferos com baixa
condutividade hidráulica, ou quando não se justifica um teste completo. A
transmissividade obtida do teste de impacto é a correspondente ao volume de
aqüífero em tomo do poço onde foi feita a injeção. Os rebaixamentos
resultantes da perturbação são, geralmente, medidos no próprio poço. Quando
u=r2/4at é suficientemente pequena, a transmissividade pode ser estimada a
partir da declividade de uma reta que interpola os rebaixamentos observados
com os valores correspondentes a (1/t), conforme mostra a figura 20.9 e a
equação 20.42. Deve-se salientar que a teoria se aplica igualmente para uma
retirada instantânea de água.

s(t) = __ZL_ (20.42)


4 n T t

Exemplo 20.6. Estime o valor da transmissividade a partir dos seguintes dados


Hidrologia

de impacto. O volume retirado de água é 0,148 m3

s(cm) 7,9 7,6 6,1 5 2 4,9 4,6 4 3 37 -i a

l/X l/m i.) 0,8 0,75 0.68 042 0,46 0,44 0,4^ o ií 033 0 J0

s(cm) 2,8 2,4 2,1 1,8 U 12 0 9


1/t Cl/min) 037 033 021 0,18 0,15 0,12 0,08

'2 ° '4 0,6


1 / t , min-1

Figura 20.9-Ilustração do método de impacto

» mais « A “ v= 0t r r 2 r ” “ S “ “ é d°
correspondente ao tempo infmito F 3 ongem’ 1ue d o tempo
(por exemplo s = 63 e 1/t = 0 6) e nsand^ ° Um 1301110 qUalquer sobrc a rcr-»
da transmissividade 3 m m d o 3 equa?5° 20-42- estima-se o valor

T = (0>148X°>6) / 4ít(0,063) = 0,11 m2/min


203 Escoamento potencial

deHDarcy- na qual a « « >


permanecem constantes foi discutida no capímloT. Assim-*™ ágUa‘aqüífero
Drenagem de águas subterrâneas 793

(20.43)

A altura piezométrica, h, é uma gTandeza escalar, a derivada da qual


(com sinal trocado) 6 um vetor representando força por unidade de peso de
fluido. Quando a massa específica do fluido é constante, a altura
piezométrica representa o potencial de força, significando energia por
unidade de peso de fluido.
Para aqüíferos homogêneos, isto é, com condutividade hidráulica
constante, é permitido criar uma nova variável escalar 4> = Kh. A velocidade
Darcy toma, neste caso, a seguinte forma:

(20.44)

O potencial de velocidade, $>, é um artifício matemático muito utilizado


na resolução de problemas práticos de drenagem, não deve ser interpretado
como energia potencial, nem sua derivada deve ser confundida com uma força. O
conceito de potencial de velocidade é válido somente quando o aquífero é
homogêneo.

Linhas equipotenciais e linhas de corrente

A equação de Laplace em duas dimensões escrita em termos de velocidade


potencial é válida para representar o fluxo em meio homogêneo e isotrópico.

2 2
ô 4> S <> -
(20.45)
dx2 dy2

As funções í>(x,y) que satisfazem a equação de Laplace são chamadas


funções harmônicas. As curvas no plano x-y para as quais <j)(x,y) = constante,
são chamadas equipotenciais. Uma equipotenciai é o lugar geométrico dos
pontos com mesmo potencial. Para aqüíferos não-confinados, as equipotenciais
representam a configuração topográfica do freático, como se fosse um mapa
topográfico da superfície do terreno. Para aqüíferos confinados, as
equipotenciais representam a configuração da superfície piezométrica. A
componente da velocidade Darcy numa dada direção 6 encontrada diferenciando a
velocidade potencial nessa direção, conforme a equação 20.44.
Supondo que uma direção seja orientada paralelamente a uma linha
equipotenciai em um ponto particular P (figura 20.10), a função <j>(x,y) é
794
______________________ _ H id r o lo g ia

p T s r í n I 13 equip0£encial- Conclui-se então que a velocidade Darcy no ponto


Darcy se” n Z a T Í 3 Uma ecluiPotencial. O fato da velocidade
Darcy ser normal às linhas eqmpotenciais tem grande utilidade na
visualizaçao do fluxo e na solução de problemas através da rede de fluxo
JNa hidrogeobgia é muito conveniente descrever-se o comportamento do
fluxo através de uma família de curvas tangentes, em qualquer ponto ao vetor
X S * Darc>, )' «OW). 35o chamada,
junçaes de fluxo ou funções de corrente. O lugar geométrico dos pontos nara
° S ,qU31S ^ X,y) é constante é Gamado linha de fluxo ou linha de corrente
Cada constante representa uma linha de fluxo diferente das demais
O vetor velocidade, q, no ponto P (figura 20.10), tem componentes q e
qr A declividade da linha de fluxo no mesmo ponto é, por definição* a
denvada { dy/dx Essa derivada é igual a qy/qx. Segue-se que:

qy dx - qx dy = 0
(20.46)

Para uma linha de fluxo particular que passa por P, ri(x,y) * Q


(constante), logo a diferencial total é nula: 1

âú
á'ôi = — dx + — dy = 0
dx dy (20.47)

Igualando-se as equações 20.46 e 20.47, conclui- se que:

50
qy = (20.48)
dx
dy

20 ioPo« r . T , t ; r Z r pr ‘ pc,° m“ mo ^ p* **•»


W ,y) ~ (constante); conseqüentemente, o diferencial
total será nulo:
5<j> a<j>
d(()i = — dx + — dy = o (20.49)
âx Qy

Segue-se que a declividade da equipotencial em P 6 igual a:


f \
dy
= - (~ + fí _ q* 1
dx 3x + d y ~ ' 7 (20.50)
v. J ♦ qy/qx
Drenagem de águas subterrâneas 795

A equação acima é o inverso, com sinal trocado, da declividade da linha


de fluxo no mesmo ponto P. Logo, a linha de fluxo é ortogonal à linha de
corrente no ponto de interseção. Portanto, as linhas de corrente e as linhas
equipotenciais são ortogonais entre si.

Figura 20.10. Linhas equipotenciais e de corrente

Note-se que as funções de corrente têm dimensão [L2/Tj ou [L3/LT], isto


é, vazão por unidade de comprimento. A diferença entre os valores numéricos
de duas linhas de fluxo consecutivas é igual à descarga entre essas linhas,
por unidade de comprimento normal ao plano x-y, Como o fluxo não pode cortar
as linhas de corrente, a descarga por unidade de comprimento entre duas
linhas de fluxo consecutivas é constante no domínio do escoamento.
A altura piezométrica das superfícies molhadas por corpos de água é
constante. Tais superfícies são chamadas contornos equipotenciais e
correspondem a superfícies matemáticas com <j> constante. Se os níveis de água
mudam com o tempo, a altura piezométrica das superfícies molhadas mudam
também com o tempo, sendo constante somente em um dado instante de tempo. A
superfície de um aqüífero no fundo do poço é um exemplo de superfície
equipo tencial.
Superfícies impermeáveis construídas pelo homem (cortinas, pranchas,
estacas, etc.), bem como fundos rochosos e argilosos, são consideradas linhas
de corrente.

Escoamentos potenciais elementares

A equação de Laplace para o escoamento unidimensional de um aqüífero


confinado na direção x é dado pela equação:
796
H id ro lo g ia

(20.51)

Integrando-se a equação tem-se que cty/dx = constante. Mas essa constante


6 por definição a velocidade Darcy na direção x. Portanto:

d<(>
Z = " q* (20.52)

Integrando-se novamente essa equação resulta a função potencial para o


escoamento unidimensional e uniforme:

~ - qx x + constante (20.53)

As linhas equipotenciais, portanto, representam uma família de retas


paralelas ao eixo y. As linhas de fluxo também representam uma família de
retas horizontais e paralelas ao eixo x, Da equação 20.48 tem-se que:

d = J- qx dy + f(x) = J qy dx + g(y) (20.54)

onde: f(x) e g(y) representam funções a serem determinadas. Como o escoamento


estudado é na direção x, segue-se que qy = 0, conseqüentemente i3 = g(y).
Conclui-se, portanto, que a função corrente representa uma família de retas
paralelas ao eixo x.

ú - J- qx dy = - qx y (20.55)

A linha de corrente i)0 = 0 corresponde ao fundo do aqüífero y = 0,


qualquer outro valor corresponde a y. Portanto, a diferença - d0
representa a descarga do aqüífero por unidade de comprimento normal ao plano

A situação mais comum de fluxo radial é o fluxo em direção a um poço. A


água em um poço escoa através de uma seção transversal constituída por um
filtro ou um tubo perfurado. Entretanto, há poços que não precisam de tubo
nem de filtro, quando o aqüífero não apresenta risco de colapso nem de
desmoronamento. O poço é dito penetrante quando o filtro ou o tubo penetra
completamente na espessura do aqüífero.
Uma zona com grande condutividade hidráulica junto ao poço, acelera o
Drenagem de águas subterrâneas

escoamento. Isso consegue-se adicionando uma camada de cascalho ou britá ao


redor do poço, ou pela retirada dos finos do aqüífero naturai. Em qualquer um
dos casos o raio dessa zona é considerado como raio do poço e a perda de
carga nessa zona é chamada perda de carga no poço.
O fluxo em direção a um poço completamente penetrante em um aqüífero
homogêneo e isotrópico é radialmente simétrico. Em outras palavras, a
distribuição do potencial 4) em cada plano normal ao eixo do poço é uma
circunferência. A equação de Laplace em coordenadas polares, fornece a
distribuição de <j) no escoamento radial.

d2ò 1 dij>
—- + -------- = 0 (20.56)
dr2 r &

Fazendo-se 4>’ = dcjs/dr, a equação de Laplace fica transformada em uma


equação mais simples:

dd>* dr (20.57)
— + - - 0
V r

cuja solução mostra que o potencial 6 distribuído logantmicamente com a


distância radial ao poço, r.
( 2 0 .5 3 )
tjj = Cj ln (r) + C2

Contornos equipotenciais são, evidentemente, círculos concêntricos com


centro no poço (r = 0). A região de validade de r é obviamente r > rp. onde
r é 0 raio do poço, ali incluído o raio do filtro.
P A descarga do aqüífero em direção ao poço é calculada pelo produto da
velocidade Darcy vezes a área da seção transversal: Q = 2vxm d<j>/dr, onde m
a espessura do aqüífero. Essa expressão é válida para q u a lq u e r vdor de n
Substituindo-se na equação 20.58 0 valor da constante C y por Q/2jnn, tem
que:

(20.59)
<t> = ln (r) + C2
2 n m

Usando-se as coordenadas polares (r,e), a função potencial e a função


corrente estão relacionadas pelas seguintes expressões:
798
Hidrologia

a* 1 atf
^ 5r r de (20.60)

Da equação (20.54) segue-se que:

f
tf _ j r _ de + constante (20.61)

Mas como r 3$/3r = Q/2ttm, a função corrente tem como expressão:

tf = © + constante
2 7i m (20.62)

Fazendo na equação 20.62 = 0, obtém-se ^ = 0; para 02 = 2rr, obtém-se


2 " Q/m' A deSCar§a P°r unidade de espessura de aqüífero (m) será igual
portanto, a ^ = Q/m. ’

p - >*»■**•

b, ^Q ^ r ) + hp
(20.65)

onde: h , e rp representam, a altura piezométrica e o raio no poço

Piezométrica aumenta indermidamente,


fisicamente não aceitável E n u ^ t n r T ™ ^ também “ definidamente, condição
um aqüífero <luando um P°?o isolado é bombeado em
^ r r « S S d T n .T T 150 f ldent™ tó *»nde. um pseudo

lugares d i f e r e » . Nessa

z z S : ; : ,o e a -

T = In ( - )
2 ti (h 2- h j) (20.64)
D r e n a g e m d e ág u a s subterrâneas 799

Método das imagens

Quando um poço completamente penetrante retira água de um aqüífero


confinado próximo de um rio também completamente penetrante, a água é
retirada não somente do aqüífero, mas também do rio. Se a retirada de água do
poço não influi no nível do rio, então o rio constitui um contorno
equipotencial (recarga). Essa análise aplica-se estritamente ao aqüífero
confinado e ao poço e rio completamente penetrantes; entretanto, os
resultados aplicam-se também a situações nas quais o aqüífero é livre e o rio
parcialmente penetrante.
Como o fluxo em direção ao poço não é radialmente simétrico, a solução
não podería ser igual às soluções até aqui discutidas. O sistema real de
natureza semi-infmita pode ser substituído por um outro sistema
matematicamente equivalente, formado por um aqüífero infinito, um poço de
bombeamento real localizado nas coordenadas x = a, y = 0 e um poço de recarga
localizado nas coordenadas x = - a, y = 0. O rebaixamento em qualquer ponto
do plano semi-infinito x > 0, é calculado pela soma dos rebaixamentos
produzidos pelos poços real e imaginário. A figura 20.11 ilustra graficamente
o método das imagens.

#•
Q
s In ( - ) (20.65)
2 TC T r

onde:

Exemplo 20.7. Um poço vai ser construído a uma distancia de 100 m de um rio
que abastece um aqüífero livre. Sabendo-se que o raio do poço é 0,3 m e a
condutividade hidráulica do aqüífero é 10 m/dia, encontre a descarga do poço,
quando os níveis do poço e do rio encontram-se a alturas de 3 m e 15 m,
respectivamente, acima de um datum.

Solução: Isolando Q da equação 20.65 e substituído valores tem-se:

Q = (4x3,1416x10x9x12) / /n{(4xl00xl00+03x03)/0,3x0,3) = 1043,6 m3/dia

Uma fronteira impermeável (descarga) suficientemente longa, localizada a


uma distância x = a do poço de bombeamento é teoricamente idealizada pela
substituição do aqüífero semi-infinito por um aqüífero infinito com um poço
de bombeamento imaginário localizado nas coordenadas x = -a, y = 0.
A razão pela qual um poço de bombeamento imaginário serve para simular
800 Hidrologia

contornos impermeáveis, pode ser entendida imaginando-se que a água no ponto


x = 0 não escoa para lugar nenhum, alí tem a mesma tendência de fluir
igualmente para o poço real ou para o imaginário.

Q Q
f

Construção de redes de fluxo

Para construir uma rede de fluxo pode-se utilizar a seguinte seqÜência:

a) desenhe numa escala conveniente os domínios do problema;


b) construa a rede de fluxo através de quadrados curvilíneares de tamanhos
apropriados, obedecendo a regra básica de ortogonalidade nos pontos de
intersecção;
c) respeite todos os contornos do problema (recarga, descarga, etc.);
d) tire vantagem da simetria (no caso de existir), começando o desenho pelas
partes simétricas;
e) não use mais de 4 ou 5 tubos de corrente na primeira tentativa,

PROBLEMAS

1- Considere fluxo unidimensionai na direção horizontal em um aqüffero


confinado e homogêneo. O fluxo ocorre entre dois canais paralelos
completamente penetrantes no aqüífero, separados por uma distância de 100 m.
A diferença de elevação de níveis de água entre os dois canais é 1 m e a
espessura do aqüífero 2 m, Para estimar a descarga do aqüífero foi medida a
descarga no canal de menor elevação em duas seções diferentes separadas por
801

uma distância de 1000 m. Foi encontrada uma diferença de 3 //s que pode ser
atribuída ao aqüífero. Estime a conduávidade hidráulica.

2- Um poço está sendo utilizado para rebaixar o nível do freático em um


distrito de irrigação. Sabe-se que o “ “ de%e^ ‘o ^
condutividade hidráulica 15 m/dia e estoratividade de 0,5 %. Estime o vator
do rebaixamento a 7 m de distância ao final de um dia de bombeamento, quando
o mesmo está sendo feito a uma taxa de 2725 m3/'dia.

3 Um ooco é bombeado por um tempo muito longo e a uma taxa de 0,074 m3/s de
L a u f e r o confinado, f diferença de elevação da superfície P -o m é tn c a em
dois piezômetros localizados a distâncias de 6 m e 46 m do poço é 1,42 .
Calcule a transmissividade do aqüífero.

4- Um poço de bombeamento está equidistantemente localizado e r n ^


limitado de um lado por uma fronteira impermeável e oo ouüo por uma
fronteta de carga constante, conforme mostra a figura. Utilizando o método
das imagens, desenhe os poços de bombeamento (o) e recarga (x) que senam
necessários para eliminar essas fronteiras.

5- Dois poços de produção separados por uma distância de 75 m um do outro,


bombeiam a uma taxa de 0,05 m3/s em um aqüífero com transmissividade 0,065
nP-ls. Considerando que o raio para o qual o rebaixamento é num é 12rf) m,
calcule e plote o rebaixamento ao longo da linha que une os p<xos.

fr o n t e ir a
T 7 7 7 ’~r7~r T / s y T T 7 7 ~ 7 7 7 -7 7 7 7 .
im perm eóvei

Figura do problema 4
802
Hidrologia

6- Uma barragem de tenra com 13 m de espessura e 7,5 m de altura tem o nível


de água a montante a uma profundidade de 6,2 m e o nível de jusante a 2,2 m.
A barragem tem 72 m de comprimento e condutividade hidráulica de 0,527 m/dia.
Estime a percolação através da barragem.

7- Estime o potencial nos pontos A e B do maciço da figura, em relação à


linha de saturação. A linha de saturação está em equilíbrio.

terreno

100 m
90 m
80 m
70 m
60 m

zero

Figura do problema 7

8- Em uma área de mineração, um dreno a céu aberto com 300 m de comprimento


encontra-se normalmente orientado à direção do fluxo subterrâneo regional.
Antes da abertura do dreno, foi feita uma campanha de campo na qual foram
medidas a declividade da linha de água e a condutividade hidráulica, com
valores médios de 3% e 1,22 m/dia, respectivamente. Estime a descarga no
dreno sabendo que o fundo do mesmo encontra-se a uma profundidade de 2 13 m
abaixo da linha de água. Estime também a descarga no dreno, caso o mesmo
estivesse orientado segundo um ângulo de 45° em direção ao fluxo.

9- Na mineração de carvão a céu aberto da mina de Butiá-Leste, RS há


necessidade de rebaixar o nível do ffeático em 1,6 m (no mínimo) por baixo do
mvel regional. Para isto pode-se colocar drenos circulares com 5 cm de raio
sobre o estrato impermeável localizado a uma profundidade de 1,8 m por baixo
ao mvel estático. A recarga dessa zona pode ser considerada em 1200 mm/ano
correspondentes a precipitação anual da região. O valor da condutivade
nidráulica foi estimado através do teste do piezômetro em 17,28 m/dia.
Drenagem de águas subterrâneas 803

Encontre o espaçamento apropriado entre os drenos.

10- Dois drenos a céu aberto separados por uma distância de 12 metros, têm
seus respectivos níveis de água a 6,1 m e 14 m acima de um estrato
impermeável de referência. Estime a posição da linha de água entre os drenos,
a cada 3 metros de comprimento. Considere um aqüífero homogêneo com
condutividade hidráulica de 0,5 m/dia.

11- Use os mesmos dados do problema anterior, porém considere um aqüífero


heterogêneo. A condutividade hidráulica da primeira metade é 0,5 m/dia, e a
condutividade hidráulica da segunda metade 0,2 m/dia. Compare os resultados
com os do exemplo anterior.

12- Considere o aqüífero homogêneo do problema 10, porém com uma taxa de
recarga constante de 0,2 m/dia.

13- Considere o aquífero heterogêneo do problema 11, porém com uma recarga
constante de 0,2 m/dia. Compare os resultados com os do problema 11.

14- Considere o aqüífero homogêneo do problema 10, porém com um pequeno poço
localizado no meio do caminho entre os dois drenos. Escontre a linha de água
entre os drenos, sabendo que a vazão do poço é 1,0 m3/dia. Foi a vazão do
poço suficientemente grande para abaixar a linha d água?.

15- Na mina de Butiá-Leste, RS, foram colhidos dados de recuperação. Estime o


valor da transmissividade.

Q(m3/min) = 0,0233 Vazão do poço


R(m) = 2,5 Distância radial ao poço
Nn Obs - 9 Número de observações de tempo e recuperação.

Tempo Recuperação Tempo Recuperação


t/(t-t2) m t/( t- t2) m

301 340 51,00 2,10


201 3,48 3443 1,82
151 3,25 26,00 141
121 2,91 21,00 142
101 2,73
____________ HidroJogia
REFERÊNCIAS

1- De WIEST, R. J. M. 1965. Geohydrology. New York: John Wiley, 366p.

2- FETTER, C. W. Jr. 1980. Applied hydrogeology. Bell: Howell, 488p.

3- FREEZE, A.; CHERRY, J. 1979. Groundwater. Englcwood Cliffs: Prcntice-


Ha 11, Inc. 604p.

4- LOHMAN, S. W. 1977. Hidráulica subterrânea. Barcelona* Editorial


Ariel, 191 p.

5- Mc WHORTER, B.; SUNADA, D. K. 1977. G ro u n d w a te r h y d ro lo g y a n d


hydraulics. Water Resources Publications, 290p.

6- TO DD, D. K. 1959. Ground water hydrology. New York: John Wiley, 336p.

/ - WALTON,W.C.
Híll, 664p.
1970.Groundwaterresourceevaluation.NewYork- McGraw-
Capítulo 21

DRENAGEM URBANA

Rubem Porto, Kamel Zahed F., Carlos B icei e Francisco Bidone

21.1 Conceitos

Durante muito tempo o objetivo principal da drenagem urbana foi remover


as águas pluviais em excesso da forma mais eficiente possível para evitar
transtornos, prejuízos e riscos de inundações. A partir de tal enfoque as
ações concentraram-se na execução de projetos e obras e na análise econômica
dos benefícios e custos dessas 'medidas, ditas estruturais.
Medidas estruturais são necessárias e mesmo essenciais para a solução de
um grande número de problemas de inundações urbanas. A experiência nacional e
internacional mostra, entretanto, que tais medidas, além de onerosas, não
representam por si só solução eficaz e . sustentável dos problemas mais
complexos de drenagem urbana.
Melhores soluções para esses problemas são alcançadas a partir de uma
compreensão mais integrada do ambiente urbano e das relações entre os
sistemas que o compõem. Dependem também de uma atuação mais abrangente por
parte dos responsáveis pelo setor que necessariamente deve envolver aspectos
legais, institucionais, tecnológicos e sociológicos. Em outras palavras, o
conceito do que se entende por drenagem urbana extravasou o campo restrito c’a
engenharia para se tomar um problema gerencial, com componentes políticos e
sociológicos.
O termo drenagem urbana é entendido aqui, no seu sentido mais amplo,
como o conjunto de medidas que tenham por objetivo minimizar os riscos a que
as populações estão sujeitas, diminuir os prejuízos causados por inundações c
possibilitar o desenvolvimento urbano de forma harmônica, articulada c
sustentável
Soluções eficazes de drenagem urbana dependem dos seguintes fatores:

-existência de uma política para o setor que defina objetivos a serem


alcançados e os meios (legais, institucionais, técnicos e financeiros)
para atingi-los;
-existência de uma política para ocupação do solo urbano devidamente
articulada com a política de drenagem urbana, principalmente no que se
refere à ocupação das várzeas de inundação;
-processo de planejamento que contemple medidas de curto, médio e longo
prazos em toda a bacia, e integre as medidas de drenagem de águas
pluviais no complexo maior do ambiente urbano;
-existência de entidade eficiente que domine as tecnologias necessárias
implante obras e medidas, desenvolva atividades de comunicação social’
promova a participação pública, estabeleça critérios, aplique leis e
normas e, enfim, exerça, de forma positiva, a liderança do setor;
-domínio da tecnologia adequada para planejamento, projeto, construção e
operação das obras; e
púbSlkaZaÇã° ^ CampanhaS de educa?ã0 e esclarecimento da opinião

21.1.1 Impactos da urbanização

As consequências da urbanização que mais diretamente interferem com a


drenagem urbana sao as alterações do escoamento superficial direto Essas
alterações podem ser dramáticas como mostra a figura 21.1 que relaciona o
crescimento das vazões máximas de cheia, com a área urbanizada da bacia e a
**** servida por obras de drenagem. Para os casos extremos, verifica-se que o
£ í nUmah baCia urfaanizada Pode chegar a ser 6 vezes maior do que o
pico desta mesma bacia em condições naturais. 4
D r e n a g e m U rbana 807

A Figura 21.2 mostra como se inter-relacionam os diversos processos que


ocorrem em uma área urbana e a tabela 21.1. explicita melhor as relações de
causa e efeito. Verifica-se que os problemas resultantes desses processos
referem-se principalmente ao aproveitamento de recursos hídricos, controle de
poluição e controle de inundações. Soluções eficientes e sustentáveis para
esses problemas são aquelas que atuam sobre as causas e abrangem todas as
relações entre os diversos processos.
As conseqüências da urbanização sobre o clima, contrariamente aos im­
pactos hidrológicos, são de pequena escala (tabela 21.2) mas podem, a longo
prazo, introduzir alterações significativas no balanço hídrico, com impactos in­
clusive sobre a qualidade das águas devido, por exemplo, a alterações da quali­
dade das águas de chuva, diminuição de vazões mínimas, etc. A variação do
microclima de áreas urbanas tem sido objeto de pesquisas nas últimas décadas.
A quantificação dessas variações é bastante difícil, pois os processos se desen­
volvem de forma lenta e contínua.

Tabela 21.1. Causas e efeitos da urbanização sobre as inundações urbanas.


CAUSAS EFEITOS
Impermeabilização Maiores picos e vazões
Redes de Drenagem Maiores picos a jusante
Lixo Degradação da qualidade da água
Entupimento dc bueiros e galerias
Redes de esgotos deficientes Degradação da qualidade da água;
Moléstias de veiculação hídrica;
Inundaçõesxonseqüências mais sérias
Desmatamento e
Desenvolvimento Indisciplinado Maiores picos e volumes;
Mais erosão;
Assoreamento em canais e galerias.

Ocupação das várzeas Maiores prejuízos;


Maiores picos
Maiores custos de utilidades públicas

A urbanização tem também conseqüências não hidrológicas que interferem


significativamente nas questões de drenagem urbana, principalmente se forem
consideradas as condições brasileiras das últimas décadas, marcadas pelo
crescimento acelerado e caótico das populações urbanas. Os impactos mais
importantes são citados a seguir:

Conseqüências sobre a ocupação do solo: a) proliferação de loteamentos


808
---------- ------ ---------------- Hidrologia
e x e c u t a d o s s e m c o n d iç õ e s t é c n i c a s a d e q u a d a s - b ) o c u o a c ã o • 7 ~ ~

construção * £ £ £
ir:? 545/ “
f - S S £ £ *

P ro ce sso s ^Ue ocorreram numa área urbana (Hall, 1984).

Tabeh 2 U . Alienação de parâmet™ climáticos devido à urbanização


(Landberg, 1970, citado por Uehara, 1985). Ç

P r e c ip ita ç õ e s to ta is 5 a 10% maior


T e m p e r a tu r a d o ar 0,5 a 1,0 °C
maior
U m id a d e r e l a t i v a 2 a 8% maior
N e b u lo s id a d e 100% maior
D r e n a g e m U rb an a 809

C o n s e q ü ê n c ia s d o c o m p o r ta m e n to p o lític o e a d m in is tr a tiv o : a) o c re s c im e n to
a c e le ra d o a c irra a d is p u ta por re c u rso s e n tre os d iv e rs o s s e to r e s da
a d m i n i s t r a ç ã o u r b a n a e f a z p r e v a l e c e r a t e n d ê n c i a d e a t u a r c o iT e tiv a m e n te e m
p o n to s is o la d o s : b) m e d id a s p a ra d is c ip lin a r a ocupação do s o lo são
d ific u lta d a s por c o n flito s de in te r e s s e s e c) p o lític a s de m é d io e lo n g o
p r a z o s s ã o i n v a r i a v e l m e n t e r e le g a d a s a s e g u n d o p la n o .

O i m p a c t o d a u r b a n i z a ç ã o te n d e a a u m e n t a r a n e c e s s i d a d e d e a m p l i a r a
c a p a c i d a d e d o s c o n d u to s c o m c o n s e q u e n te a u m e n t o d e c u s to . N o r m a l m e n t e e s te
p ro c e sso e v o lu i a p a rtir das pequenas á re a s d e n tr o de um c o n te x to de
a p ro v a ç ã o de lo t e a m e n t o s . A d re n a g e m s e c u n d á r ia , que são os p rin c ip a is
c o n d u t o s p l u v i a i s s ã o s o b r e c a r r e g a d a s p e lo a u m e n t o d o f l u x o , m a s o s im p a c to s
m a io r e s o c o r r e m s o b r e a m a c r o d r e n a g e m .
A o c u p a ç ã o d a b a c i a h i d r o g r á f i c a te n d e a o c o r r e r n o s e n t i d o d e j u s a n t e
p a r a m o n t a n t e , d e v i d o à s c a r a c t e r í s t i c a s d o r e le v o . Q u a n d o o p o d e r p ú b l i c o n ã o
c o n tr o la a u r b a n iz a ç ã o in d is c ip lin a d a d as c a b e c e ira s da b a c ia o u n ã o a m p lia a
c a p a c id a d e d c m a c r o d r e n a g e m , a fre q ü ê n c ia d a s e n c h e n te s a u m e n ta s íg n ifíc a ti-
v a m e n te , p ro v o c a n d o a d e s v a lo riz a ç ã o d e p ro p rie d a d e s e p re ju íz o s p e rió d ic o s .
N e s s e p r o c e s s o , a p o p u l a ç ã o lo c a l i z a d a a j u s a n t e , s o f r e as p io re s c o n s e q ü c n c i-
a s. c m r a z ã o d a o c u p a ç ã o a m o n ta n te .
A s q u e s tõ e s b á s ic a s n e s te c a s o sã o : a) o s c u s to s d e a m p lia ç ã o d a m acro
d r e n a g e m d e v e m s e r p a g o s p o r to d a a c o m u n i d a d e ? ; b ) s e r á f a c tív e l i m p e d i r a
o c u p a ç ã o d e s s a s á r e a s ? A s p r e s s õ e s p a r a o c u p a ç ã o d o e s p a ç o u r b a n o e a s in v a ­
s õ e s to r n a m d i f í c i l e s s e c o n t r o l e . P o r ta n t o , d e n t r o d a r e a l i d a d e b r a s i l e i r a e s s a s
q u e s t õ e s n ã o p a r e c e m te r r e s p o s t a s , j á q u e d i f i c i l m e n t e s e r á p o s s í v e l i m p e d i r o
l o t e a m e n t o o u o c u p a ç ã o d e á r e a s v a z ia s , s e o p o d e r p ú b l i c o n ã o d e s a p r o p r i á - l a s
c o c u p á -la s d c fo rm a a d e q u a d a .
A re s p o s ta té c n ic a a e ss e p ro c e s s o é o d is c ip lin a m e n to d a o c u p a ç ã o u r­
b a n a a tra v é s d e u m a d e n s ific a ç ã o c o m p a tív e l c o m o s ris c o s d e in u n d a ç ã o .
P a ra ta n to , é n e c e s s á r ia a q u a n tific a ç ã o d o im p a c to d a s d if e r e n te s c o n d iç õ e s
d e u r b a n iz a ç ã o s o b r e o e s c o a m e n to . N o p la n e ja m e n to d o e s p a ç o , e x is te m v á ria s
m e d id a s d e c o n tr o le q u e p o d e m s e r a d o ta d a s , a n te s q u e o e s p a ç o s e ja o c u ­
p a d o , p a r a m in im iz a r a s e n c h e n te s . A lg u m a s d e s s a s m e d id a s s ã o o u s o d e
p e q u e n o s re s e r v a tó r io s e m p a rq u e s e o c o n tro le s o b re a im p e rm e a b iliz a ç ã o
d o s lo te s , r u a s e p a s s e io s . E s s e tip o d e c o n tr o le p o d e s e r e x e r c id o n o s e s tá g io s
in ic ia is d e d e s e n v o lv im e n to u rb a n o c o m re c u rs o s r e la tiv a m e n te lim ita d o s . N o
e n ta n to , se as a ç õ e s fo re m re ta rd a d a s e a p o p u la ç ã o o c u p a r o s e s p a ç o s , as
s o l u ç õ e s t e r ã o c u s t o s m u i t o a lto s . A s s o l u ç õ e s e s t r u t u r a i s c o m o a m p l i a ç ã o
d a c a lh a d o s rio s , a tra v é s d o s e u a p ro fu n d a m e n to o u a la r g a m e n to , c o n s tr u ç ã o
d e r e s e r v a tó r io s e d iq u e s , e n tr e o u tro s , s ã o s o lu ç õ e s q u e p o d e m s e r e v ita d a s
com o p la n e ja m e n to d a o c u p a ç ã o u rb a n a . D e v e s e r c o n s id e ra d o a in d a q u e
a lg u m a * d e s s a s s o lu ç õ e s e s tr u tu ra is a c e le ra m o e s c o a m e n to e p o d e m a g ra v a r
a s in u n d a ç õ e s e m o u tr o s p o n to s d a b a c ia .
810
Hidrologia
2 1 .L 2 P la n o s d i r e t o r e s d e d r e n a g e m u rb a n a

A e la b o r a ç ã o d e p la n o s d ir e to r e s d e d r e n a g e m u r b a n a é m e d i d a a lta m e n te
re c o m en d á v e l e c o n s titu i e s tra té g ia e s s e n c ia l p a ra a o b te n ç ã o de boas
s o lu ç õ e s d e d r e n a g e m u r b a n a . P la n o s b e m e la b o r a d o s p o s s i b i l i t a m :

- e s tu d a r a b a c i a h i d r o g r á f i c a c o m o u m to d o e , c o n s e q ü e n t e m e n t e . c h e g a r a
s o lu ç õ e s d e g r a n d e a lc a n c e n o e s p a ç o e n o te m p o , e v i t a n d o m e d id a s d e
c a r á te r r e s tr ito q u e n ã o r a r o apenas d e s lo c a m e m esm o a g ra v a m as
in u n d a ç õ e s e m o u tr o s lo c a is ;
- e s ta b e le c e r n o r m a s e c r ité r io s d e p r o j e t o u n if o r m e s p a r a t o d a a b a c ia
ta is c o m o o p e r í o d o d e re to m o a s e r a d o ta d o , g a b a r i t o s d e p o n te s e’
tr a v e s s ia s , e tc ;
- id e n tif ic a r á r e a s q u e p o s s a m s e r p r e s e r v a d a s o u a d q u ir id a s p e l o p o d e r
p ú b lic o a n te s q u e s e ja m o c u p a d a s o u s e u s p r e ç o s s e t o m e m p ro ib itiv o s *
- e la b o r a r o z o n e a m e n to d a v á r z e a d e in u n d a ç ã o ;
- e s ta b e le c e r o e s c a lo n a m e n to d a im p l a n t a ç ã o d a s m e d id a s n e c e s s á r i a s d e
f o r m a te c n i c a m e n te c o r r e t a e d e a c o r d o c o m o s r e c u r s o s d is p o n ív e is ;
- p o s s ib ilita r o d e s e n v o lv im e n to u rb a n o de fo rm a h a rm ô n ic a p e la
a rtic u la ç ã o d o p la n o d e d r e n a g e m c o m o u tr o s e x is t e n te s n a r e g i ã o ( p la n o s
v iá r io s , d e tr a n s p o r te p ú b lic o , d e a b a s t e c i m e n t o d e á g u a , e ic ) ;
- e s c la r e c e r a c o m u n id a d e a r e s p e ito d a n a tu re z a e ’ m a g n itu d e dos
p r o b le m a s e f o r m a s d e s o lu ç ã o p r o p o s ta s ;
-d a r re s p a ld o té c n ic o c p o lític o à s o lic ita ç ã o d c re c u rs o s c
-p rm le g ia r a ad o ção d e m e d id a s p r e v e n t i v a s de m e n o r c u s to e m a io r
a lc a n c e .

Etapas

. ° pr°CteSS0 de PianeJamento de uma bacia urbana é constituído geralmente


s l -UT et3PaS: a) determinaÇão das características da baeta- b)
f t T s^ c ) l m T P° rtamT t0 hldr0lÓg'C° da bacia P“ * condições atuais e
c a S s - d d í 2' - 0 d“ P0SSÍVdS m£dldaS est« s e não-estruturais
diferentes Dolítioac £ cenários que quantifiquem os resultados de
o u lm r í . atUaÇã0: e) deüneação da várzea de inundação e f)
da apiicaç2°
eficiênciat da consecução d° p,an°
dos seus em
objetivos. ™ ^

Princípios

de drenagem urbana*^ S3° essenciais à elaboração de qualquer plano diretor


811
D r e n a g e m U rban a

- o s u b s i s t e m a d e d r e n a g e m é p a r t e d e u m a m b ie n te u r b a n o m u ito m a is
c o m p le x o e d e v e s e r a r tic u la d o c o m o s o u tr o s s u b s is te m a s . O s u b s i s t e m a
d e d r e n a g e m n ã o d e v e s e r u m f im p o r s i s ó , m a s u m m e io q u e p o s s i b i l i t e a
m e l h o r i a d o a m b ie n te u r b a n o d e f o r m a m a is a m p la ;
- v á r z e a s d e in u n d a ç ã o s ã o á r e a s d e e s c o a m e n to e a r m a z e n a m e n t o n a tu r a is
c u j a c o n f o r m a ç ã o f o i d e l i n e a d a p e lo p r ó p r io r io . N e n h u m a o c u p a ç ã o d a
v á r z e a p o d e s e r f e i t a s e m q u e s e te n h a d e a d o ta r m e d id a s c o m p e n s a t ó r i a s
m u ito o n e r o s a s . A p r e s e r v a ç ã o d a v á r z e a é in v a r i a v e l m e n t e a s o lu ç ã o m a is
b a r a t a p a r a o s p r o b le m a s d e in u n d a ç ã o , a lé m d e o f e r e c e r o u tr a s v a n ta g e n s
com o p re se rv a r o e c o s s is te m a , c r i a r á re a s v e rd e s e o p o rtu n id a d e s de

re c re a ç ã o ; , . ,
- á g u a s p lu v ia is re q u e rem e sp a ç o . U m a v e z so b re o s o lo , a á g u a ir á
e s c o a r e x i s t a o u n ã o u m s is te m a d e d r e n a g e m a d e q u a d o . S e m p r e q u e se
e lim in a o a rm a z e n a m e n to n a tu r a l sem que se a d o te m m e d id a s
c o m p e n s a t ó r i a s , o v o lu m e e lim in a d o s e r á e x ig id o e m o u tr o l o c a l . C a n a is ,
g a le r ia s d e s v io s e r e v e r s õ e s d e s lo c a m a n e c e s s id a d e d e e s p a ç o e d e v e m
s e r p r o je ta d o s te n d o e s s e fa to e m v is ta . E m s ín te s e , to d o o p r o b l e m a d e
d r e n a g e m é u m p r o b le m a d e a lo c a ç ã o d e e s p a ç o e
- q u a n t i d a d e e q u a l i d a d e d a á g u a s ã o v a r iá v e is d o m e s m o p r o b l e m a e d e v e m
s c r c o n s i d e r a d a s e m c o n ju n to . E m á r e a s o n d e a q u a l i d a d e d a á g u a e s tá
d e t e r i o r a d a , a s c o n s e q ü ê n c ia s d a s in u n d a ç õ e s s ã o m a is g r a v e s e m e d id a s
c o m o , p o r e x e m p l o , a c o n s tr u ç ã o d e r e s e r v a tó r i o s d e a m o r t e c i m e n t o p o d e m -
sc se t o m a r in v iá v e is . Ao c o n tr á r io , á g u a s p lu v ia is de boa q u a lid a d e
c o n s titu e m re c u rso s p o te n c i a lm e n te u tiliz á v e i s p a ra ir r i g a ç ã o ,
a b a s te c im e n to i n d u s tr ia l, re c a rg a de a q ü íf e r o s , re s e rv a tó rio s de
r e c r e a ç ã o , c o m b a t e a in c ê n d i o s , e tc .

U m p la n o d i r e t o r d e d r e n a g e m u r b a n a é , e m p r in c íp io , u m a p e ç a t é c n i c a e ,
p o r ta n to , deve ser e la b o ra d o por e q u ip e s c o m p e t e n te s que u tiliz a rã o as
f e r r a m e n ta s te c n o l ó g i c a s m a is a d e q u a d a s a c a d a c a s o . C o n s t i t u i t a m b é m u m
d o c u m e n t o d e v a l o r p o l í t i c o im p o r ta n te e , p o r t a n t o , é e s s e n c i a l q u e c o n t e c o m
o a p o io d a c o m u n i d a d e e d o s p o d e r e s d e c is ó r io s . D iv e r s a s e s t r a t é g i a s p o d e m
ser u tiliz a d a s p a ra c o n fe rir p e so p o lític o ao p la n o . E n tre o u tra s p o d e -se ,
por e x e m p lo , a trib u ir fo rça de le i ao p la n e ja m e n to , o b te r o a p o io da
c o m u n i d a d e a tr a v é s d e c a m p a n h a s d e c o m u n ic a ç ã o s o c i a l e c o n s t i t u i r f u n d o s
f i n a n c e ir o s p a r a g a r a n t i r f lu x o e s tá v e l d e r e c u r s o s .

212 Hidrologia urbana

H id ro lo g ia u rb a n a pode ser d e fin id a com o o e s tu d o dos p ro c e sso s


h id ro ló g ic o s em a m b ie n te s a f e ta d o s p e la u rb a n iz a ç ã o . T ra ta -s e de um a
d e f in iç ã o a m p la q u e a b r a n g e to d a s a s in t e r - r e l a ç õ e s e s q u e m a t i z a d a s n a f ig u r a
21 2 Q u a n d o o i n t e r e s s e m a io r é a d r e n a g e m u r b a n a o e s c o p o d o s e s tu d o s p o d e
812 H id ro lo g ia

ser bastante simplificado e geralmente se limita ao estudo das cheias.


A figura 21.3, adaptada de Hall (1984) ilustra o procedimento padrão de
um estudo de drenagem urbana em 5 passos. Estes passos constituem uma
metodologia de projeto que deve estar necessariamente subordinada à política
do setor, conforme visto anteriormente.
Nessa figura a determinação da tormenta de projeto, da chuva excedente e
do hidrograma de projeto pertencem ao campo da hidrologia urbana. O passo 1,
escolha do período de retomo, situa-se em um contexto socioeconômico,
enquanto o passo 5, dimensionamento de estruturas hidráulicas e/ou definição
de outras ações, referem-se à fase de projeto das medidas a serem implantadas
na bacia.
Os processos hidrológicos contidos nos passos 2, 3 e 4 foram
apresentados em outras partes deste livro, principalmente nos capítulos 5, 9,
11, 14 e 16 e, portanto, o texto seguinte se limitar-se-á a discutir os
aspectos de interesse específico da drenagem urbana.

21.2.1 Bacias pequenas e médias

As técnicas hidrológicas de estudos de drenagem urbana aplicam-se a


bacias hidrográficas de pequeno ou médio porte e, portanto, é importante
dispor de algum critério de distinção entre essas bacias para poder escolher
os métodos e os parâmetros hidrológicos mais adequados a cada tipo de bacia.
A distinção entre esses tipos de bacia será sempre imprecisa e
dependente de certo grau de subjetividade, dada a natural variação dos
parâmetros que influem no comportamento hidrológíco da bacia. Os critérios
mais comuns, entretanto, classificam como bacia pequena aquela cuja área de
drenagem seja inferior a 2,5 km2 ou o tempo de concentração seja inferior a 1
hora. Para bacias médias os limites superiores são, respectivamente, 1000 km2
e 12 horas.
As principais conseqüências dessa classificação referem-se à escolha do
método para cálculo das vazões cheia e à forma de determinar os parâmetros
hidrológicos utilizados nesses métodos. Em bacias pequenas usa-se o método
racional (capítulo 14), porque as hipóteses deste método adequa-se às
características de comportamento hidrológico dessas bacias. Já para bacias
médias normalmente se utilizam técnicas baseadas na teoria do hidrograma
unitário, porque estas permitem considerar a variação da intensidade da chuva
no tempo e o amortecimento na bacia. A aplicação do método racional a bacias
médias não é recomendável, porque superestima as vazões de pico.
A tabela 21.3 auxilia a escolha do método de cálculo de cheias, pois
aponta os atributos que devem estar presentes no método escolhido em função
da classificação da bacia como pequena ou média.
813
D r e n a g e m U rb an a

Polftica ■ Propositos, Estratégia, Planejamento

Escolha do
Aspectos PASSO 1 Período de
Sociais e
Retorno
Econômicos

Determinação da
PASSO 2
Tormenta de
Meteorologia
Projeto
i
i
i ,..

Determinação do
Hidrologia PASSO 3
Escoamento
Pedologia
Superficial Direto
Uso do Solo

PASSO 4 Determinação das


H idro lo gi a
Vazões de Projeto

Dimensionamento
PASSO 5 dos Estruturas
Hidrdulica
Hidráulicas

F i g u r a 2 1 .3 . S e q u ê n c i a d e p a s a o s d e u m e a r n d o d e d r e n a g e m u r b a n a

2 1 .2 .2 E s c o lh a d o p e r ío d o d e r e to r n o

P e r í o d o d e r e t o m o é o in v e r s o d a p r ° b a b d i d a d e d e u m d e t e r m m ^

h id r o l ó g i c o ser i g u a la d o ou e x c e d id o em um v a z ã 0 c o m p e r ío d o
p o rta n to , q u e u m a d e te rm in a d a o b ra s e rá p ro je ta d a p - c o n f e r id o à
dê retomo T
anos, aurom.ricameme d e e r d e - a e o grau d e
pro ao ^
população ou. em oulraa palavras, o naco a q u eb ra P ° P ^ ^
s u j e i t a , m e s m o d e p o is d a c o n s tr u ç ã o d a o b r a . T r a t a , P
Hidrologia

qual o risco aceitável pela comunidade. Evidentemente este é um critério a


ser definido em esferas políticas, uma vez que, pelo menos teoricamente, é a
própria comunidade e seus representantes que deverão decidir o grau de
proteção desejável e o quanto estão dispostos a pagar por ele.

Tabela 21.3. Classificação de bacias (Ponce,1989).


Característica Bacia pequena Bacia média
Variação da intensidade da Constante Variável
chuva ao longo do tempo

Uniformidade da chuva no Uniforme Uniforme


espaço

Escoamento superficial Predominante em em superfícies e


superfícies canais

Armazenamento na rede de desprezível desprezível


canais

Estudos econômicos podem orientar a escolha do período dc retomo, mas a


necessidade de considerar custos e benefícios de difícil quantificação, e
ainda mais, a impossibilidade de levar cm conta uma série dc aspectos que
eticamente não devem ser expressos em termos monetários, limitam bastante a
aplicação de métodos puramente econômicos para o estabelecimento do período
de retomo. Em áreas urbanas a situação é ainda mais complexa, uma vez que
quanto maior o período de retomo maior será o porte das obras e, portanto,
não só o custo será maior mas também a interferência no ambiente urbano.
Por interferência no ambiente urbano devem scr entendidos aspectos como
relocação de populações, desapropriações de imóveis, interrupções dc tráfego,
prejuízos ao comércio durante as obras e uma série de outras perturbações. Es­
ses^ fatores significam custos adicionais e também têm implicações políticas de
difícil tratamento. É comum, portanto, o equívoco cm escolher períodos de re­
torno pequenos para minimizar custos e interferência. Tal atitude tem invaria­
velmente conseqüências adversas, pois encoraja a ocupação de áreas impróprias
devido à falsa sensação de segurança.
As dificuldades em estabelecer objetivamente o período de retorno fazem
com que a escolha recaia sobre valores aceitos de forma mais ou menos ampla
pe o meio técnico. Muitas entidades fixam os períodos de retorno para diversos
tipos de obra como critério de projeto. Os valores da tabela 21.4 são comumente
encontrados na literatura técnica [DAEE/CETESB, 1980] e desfrutam de certo
consenso internacional.
D ren a g em U rban a 815

Tabela 21.4. Períodos de retomo para diferentes ocupações da área


(DAEE/CETESB ,1980).

Tipo de Obra Tipo de ocupação da área T (anos)

Microdrenagem -'Residencial 2
Comercial 5
Áreas com edifícios de serviços ao público 5
Aeroportos 2-5
Áreas comerciais e artérias de tráfego 5 - 10

Macrodrenagem Áreas comerciais e residenciais 50-100


Áreas de importância específica 500

A diferença entre os conceitos de período de retomo e risco é


importante para a escolha do valor desejado. Entende-se por risco a
probabilidade de uma determinada obra vir a falhar pelo menos uma vez durante
sua vida útil. Esse conceito leva em conta que uma obra projetada para um
período de retomo T expõe-se todo o ano a uma probabilidade 1/T de vir a
falhar. É intuitivo que ao longo de sua duração essa obra terá um risco de
falha maior do que 1/T, porque se exporá repetidamente a essa probabilidade.
O risco é (capítulo 4)
l N
R = 100 [ 1 - (1 - - ) (2 U )
T

onde R = risco em porcentagem; T = período de retomo; N = vida útil da obra


em anos.
Como se observa na tabela 21.5, as obras de drenagem urbana buscam
reduzir a freqüência de inundação ao longo de sua vida útil. Para uma obra de
vida útil de 50 anos (normal para obras de drenagem urbana) os riscos são
praticamente de 100%. Portanto, observa-se que; - o objetivo principal das
obras de microdrenagem é esgotar as vazões oriundas das chuvas mais
freqüentes e implicitamente admite-se a ocorrência de alagamentos com
freqüência razoavelmente alta; - as obras de macrodrenagem não constituem
solução definitiva para os problemas de inundações e é conveniente que sejam
complementadas por outras medidas que visem aumentar a proteção oferecida
pelas obras.

21.23 Cálculo do tempo de concentração

Uma vez obtida a tormenta de projeto e a chuva excedente (passos 2 e 3


da figura 21.3), a determinação de vazão de pico ou do hidrograma de projeto
pode ser feita por meio das técnicas apresentadas nos capítulos l i e 14.
816 H id r o lo g ia

Essas técnicas transformam um hietograma de chuva excedente (entrada nc


sistema) em um hidrograma de vazões pela alteração da forma do hietograma de
entrada.

Tabela 21.5. Risco R em % para diferentes valores de T e N.


T (anos) Vida útil da obra (anos)

2 5 25 50 100
2 75 97 99,9 99,9 99,9
5 36 67 99,6 99,9 99,9
10 19 41 93 99 99,9
25 8 18 64 87 98
50 4 10 40 64 87
100 2 5 22 39 63
500 0,4 1 5 9 18

Os parâmetros que controlam a forma do hidrograma têm dimensão de tempo


e os mais comuns são o tempo de concentração, tc, o tempo de retardamento,
ti, e tempo para o pico, tp, que foram descritos no capítulo l i . Uma vez que
estes parâmetros estão relacionados entre si (equações 11.24 a 11.27)
tratar-se-á aqui apenas do tempo de concentração.
Existe uma grande quantidade de fórmulas que fornecem o valor de tc em
função de características da bacia (área, declividade, comprimento do
talvegue, rugosidade das superfícies e outras) e, eventualmente, da
intensidade da chuva. Essas fórmulas tem origem em estudos experimentais de
campo ou de laboratório e, portanto, devem ser aplicadas em condições que se
aproximem daquelas para as quais foram determinadas.
A dispersão de resultados entre elas pode ser muito grande. Kibler
(1982) mostra um exemplo no qual, para a mesma bacia urbana, as diversas
fórmulas mostraram valores variando entre 9 e 36 min. As vazões de pico
correspondentes (T = 25 anos) vanaram entre 3,3 e 1,8 nrVs. A determinação
do tempo de concentração por meio de fórmulas empíricas está sujeita a
imprecisões e incertezas significativas que se devem ao tipo de escoamento
que cada fórmula procura representar. Nesse aspecto distinguem-se três tipos
de escoamento:

- escoamento em superfícies, constituídos fundamentalmente por lâminas


de água escoando sobre planos e prevalecem em bacias muito pequenas. As
velocidades são baixas devido às pequenas espessuras das lâminas e
dependem da declividade e rugosidade da superfície e também da
intensidade da chuva. Como a extensão dos escoamentos geralmente não é
D r e n a g e m U rb a n a 817

m a io r d o q u e 5 0 a 1 0 0 m e tr o s a s f ó r m u la s q u e r e f l e t e m e s t e tip o d e
e s c o a m e n to são a p lic á v e is a p a rq u e s de e s ta c io n a m e n to , a e r o p o r to s e
b a c i a s u r b a n a s m u ito p e q u e n a s . F ó r m u la s d e s s e tip o g e r a l m e n t e a p r e s e n ta m
o v a l o r d e tc e m f u n ç ã o d o s f a to r e s a c im a r e la c io n a d o s ;
- e s c o a m e n t o e m c a n a is n a t u r a i s , p r e v a l e c e m e m b a c ia s d e m a i o r p o r t e e m
q u e o s c a n a is são b e m d e f in id o s . A s v e lo c i d a d e s s ã o m a io r e s q u e n o s
casos a c i m a , p o is o s c a n a is c o n d u z e m a á g u a d e f o r m a m a is e f ic ie n t e .
N e s s a s b a c i a s o v a l o r d e tc d e p e n d e m e n o s d a r u g o s i d a d e d a s u p e r f íc ie e
d a i n t e n s i d a d e d a c h u v a , p o is o te m p o e m q u e o e s c o a m e n to o c o r r e s o b r e a
s u p e r f í c i e é m e n o r q u e n o c a n a l . U s u a lm e n te a s f ó r m u la s q u e r e p r e s e n t a m
esse tip o de e s c o a m e n to a p r e s e n ta m o v a lo r de tc em fu n ç ã o do
c o m p r i m e n t o d o c u r s o d e á g u a e d e s u a d e c li v id a d e , e
- e s c o a m e n to em g a le r ia s e c a n a is a r tif i c ia is , p re v a le c e m em b a c ia s
c u j a s c o n d i ç õ e s n a tu r a is f o r a m s i g n if ic a tiv a m e n te m o d i f i c a d a s p o r o b r a s
d e d r e n a g e m e a s v e lo c i d a d e s s ã o e v id e n t e m e n te m a is a lta s q u e n o s c a s o s
a n t e r i o r e s . A lé m d o s j á c ita d o s , o v a l o r d e tc 6 n o rm a lm e n te e x p re sso
t a m b é m e m f u n ç ã o d e p a r â m e tr o s q u e r e f l e t e m as a lte r a ç õ e s in tr o d u z id a s
ta is : c o m o a p a r c e l a d a b a c i a q u e c o n t a c o m s is te m a s d e d r e n a g e m o u a
e x t e n s ã o d o s c u r s o s d e á g u a c a n a liz a d o s .

E m u m a b a c i a u r b a n a n o r m a l m e n t e e s t ã o p r e s e n t e s o s tr ê s t i p o s d e e s c o a ­
m e n to s c o m m a io r o u m e n o r s ig n ific a d o , d e p e n d e n d o d a s c a r a c te r ís tic a s d a b a ­
c ia . A s e g u i r s ã o a p r e s e n t a d a s a l g u m a s d a s f ó r m u l a s m a i s u t i l i z a d a s ( K i b l e r ,
1 9 8 2 ) a c o m p a n h a d a s de c o m e n tá rio s p a ra o r ie n ta r a e s c o lh a a d e q u a d a . N a s e q u a ­
ç õ e s a s e g u i r tc é o b t i d o e m m i n u t o s .

Kirpich:
( 2 1 .2 )

o n d e L = c o m p r i m e n t o d o t a lv e g u e e m k m ; S = d e c l i v i d a d e d o t a l v e g u e e m m /k m .
A e q u a ç ã o f o i d e s e n v o l v i d a c o m d a d o s d e 7 p e q u e n a s b a c i a s r u r a is o

T e n e s s e e c o m d e c l i v i d a d e s v a r i a n d o d e 3 a 1 0 % e á r e a s d e n o m á x i m o 0 ,5 k m .
E m b o r a a s in f o r m a ç õ e s q u e a fó r m u la n e c e s s ita (L e S ) s e ja m u m a in d ic a ç ã o e
q u e e l a r e f l e t e o e s c o a m e n t o e m c a n a i s , o f a t o d e te r s i d o d e s e n v o l v i d a p a r a
b a c i a s t ã o p e q u e n a s é u m a in d i c a ç ã o q u e o s p a r â m e t r o s d e v e m r e p r e s e n t a r o
e s c o a m e n to e m s u p e r fíc ie s . Q u a n d o o v a lo r L é s u p e rio r a 10 k m a fó rm u la
p a r e c e s u b e s t i m a r o v a l o r d e tc.

C a lifó rn ia culverts practice:


(21.3)
818 H id ro lo g ia

onde H - diferença de cotas entre a saída da bacia e o ponto mais alto do


talvegue em m. Essa equação é uma modificação da anterior, substituindo-se
S = L/H.

Federa! Aviation Agency:


tc = 22,73 ( 1,1 - C) L0,50 S'0,33 (21.4)

onde C = coeficiente de escoamento do método Racional. Desenvolvida para


drenagem de aeroportos, é válida provavelmente para os casos que predomina o
escoamento em superfícies de pequenas bacias.

Onda Cinemática:
tc = 447 (n L)°’S S 03 I '°'4 (21.5)

onde n —rugosidade de Manning; I -- intensidade da precipitação em mm/h. Essa


equação foi deduzida a partir das equações de onda cinemática aplicada a
superfícies, baseando-se na hipótese de precipitação constante igual ao tempo
de concentração e na equação de Manning. Essa equação é adequada para
pequenas bacias onde o método racional pode ser aplicado c a superfície é
predominante.

SCS Lag fórmula:

0.8 1000
tc = 3,42 L ( — ( 2 1 .6 )
CN

onde CN = número da curva (método SCS); tc em min, L cm km e S cm m/m. A


tormula do SCS foi desenvolvida em bacias rurais com áreas de drenagem de até 8
km e reflete fundamentalmente o escoamento em superfícies. Para aplicação em
bacias urbanas o SCS sugere procedimentos para ajuste em função da área imper­
meabilizada e da parcela dos canais que sofreram modificações. Essa fórmula supe­
restima o valor de tc em comparação com as expressões de Kirpich e Dooge.

SCS - método cinemático:

1000 r L
(2 L 7 )

onde V = velocidade média no trecho em rn/s. A fórmula se baseia no fato de


que o tempo de concentração é o somatório dos tempos de trânsito dos diversos
trec os que compõem o comprimento do talvegue. Na parte superior das bacias,
D r e n a g e m U rb an a 819

em que predomina o escoamento em superfícies ou em canais mal definidos, a


velocidade pode ser determinada por meio da tabela 21.6. Em canais bem
definidos e galerias deve ser usada a fórmula de Manning.

Tabela 21.6. Velocidade médias para cálculo de tc em m/s

Descrição do Declividade em %
escoamento 0-3 4-7 8-11 12 -

-Em superfície
florestas 0-0,5 0,5-0,8 0,8-1,0 1.0-
pastos 0-0,8 0,8-1,1 1,1-1,3 1,3-
áreas cultivadas 0-0,9 0,9-1,4 1,4-1,7 1,7-
pavimentos 0-2,6 2,6-4,0 4,0-5,2 5,2-

-em canais
mal definidos 0-0,6 0,6-1,2 1,2-2,1
bem definidos calcular pela fórmula de Manning

Dooge:
-0,17
21,88 S (21 .8)
tc

Foi determinada com dados de 10 bacias rurais com áreas na faixa de 140
a 930km2. Seus parâmetros refletem o comportamento de bacias médias e
escoamento predominante em canais.
Das equações apresentadas pode-se concluir o seguinte:

- a fórmula de Kirpich foi obtida em pequenas bacias rurais com canais


bem definidos e declividades altas. É de se esperar, portanto, que forneça
bons resultados nestas condições. Canais bem definidos indicam que os
escoamentos ao longo de seu curso prevalecem sobre os escoamentos em
superfícies. Indicam também que as bacias não são muito pequenas (prova­
velmente A > 2,5 km2). Entretanto, à medida que o parâmetro L cresce, a
velocidade média de escoamento atinge valores grandes e pouco realistas.
Para uma declividade de 0,003 m/m a velocidade chega a 3,12 m/s para um
comprimento L de 100 km,
- a fórmula da onda cinemática é a solução teórica das equações que
regem o escoamento turbulento em um plano e é de se esperar que funcione
bem em pequenas bacias, uma vez que, neste caso, prevalece esse tipo de
escoamento. A tendência é de que o valor de tc seja superestimado, à
H id r o lo g ia

medida em que a bacia aumenta.


- a fórmula da FAA - Federal Aviation Agency deve representar bem os
escoamentos em superfície, uma vez que foi desenvolvida para situações
em que prevalece este escoamento.
- a fórmula do SCS parece superestimar o valor de tc para valores baixos
de CN. De fato, essa fórmula só apresenta resultados compatíveis com as
outras para CN próximo de 100 e para valores de L menores do que 10 km,
o que geralmente corresponde a bacias com área de drenagem inferiores a
15 km2 O termo [(1000/CN) - 9]u>7 é um fator de ajuste que varia de 1,
para CN = 100, até 5,3, para CN = 50. Para CN = 100 a equação fica

* i t 9,8 _-0d
tc = 3,42 L S (2L9)

que fornece valores de tc próximos aos fornecidos pela fórmula de Dooge


para L até 10 km. Verifica-se que o tempo de concentração é muito
sensível ao valor de CN e, como este parâmetro é um indicador das
condições da superfície do solo, a fórmula do SCS aplica-se a situações
em que o escoamento em superfícies é predominante.
de maneira geral as fórmulas analisadas apresentam comportamentos
semelhantes até L = lGkm e, a partir daí, passam a divergir. Esse
comportamento é esperado, uma vez que os estudos que as originaram
referem- se, de forma geral, a bacias desse porte.
- o método cinemático é o mais correto do ponto de vista conceitua1,
pois permite levar em consideração as características específicas do
escoamento da bacia em estudo. É também o mais trabalhoso, pois exige a
divisão ^dos canais em trechos uniformes è a determinação de suas
características hidráulicas para a aplicação da fórmula de Manning.
- a fórmula de Dooge foi determinada a partir de dados obtidos de bacias
de ^maior porte que as demais. É de se supor, portanto, que seus
parâmetros reflitam melhor as condições de escoamento em canais.
Tendo em vista as discrepâncias apontadas, recomenda-se o seguinte: a) é
sempre conveniente calcular a velocidade média do escoamento na bacia e
compará-la com os valores fornecidos pela tabela 21.6, a velocidade média é
obtida por V = L/tc; b) alguns parâmetros da bacia, tais como o coeficiente
de escoamento superficial direto, rugosidade, e o número da curva, são
determinados com grau de incerteza relativamente alto. É conveniente proceder
à análise de sensibilidade do hidrograma de projeto com relação a estes
parâmetros.

21.2.4 Efeitos da urbanização

O efeito do desenvolvimento sobre a vazão máxima e o hidrograma pode ser


D r e n a g e m U rb an a 821

o b t i d o a t r a v é s d a s e q u a ç õ e s d o m é t o d o d o S C S ( c a p í t u l o 1 1 ) . O m é t o d o d o S o il
C o n s e rv a tio n S e rv ic e re c o m e n d a q u e o v a lo r d e C N , p a ra u m a o c u p a ç ã o m is ta
d o s o lo , s e ja c a lc u la d o p e la m é d ia p o n d e ra d a d o s C N s, a d o ta n d o c o m o fa to r d e
p o n d e ra ç ã o as á re a s c o rre s p o n d e n te s a c a d a v a lo r d e C N . A e x p re s s ã o u s a d a
p a r a u m a b a c ia u r b a n a é:

CNm = p CNp + i CNi (21.10)

onde CNm = número da curva para ocupação mista; CNp = número da curva da
parcela permeável da bacia; CNi —número da curva da parte impermeável da
bacia. Admite-se CNi = 95; p = fração permeável da bacia; i = fração
impermeável da bacia i = 1 - p.
O s parâmetros de forma de hidrograma (tc, tp, etc.) devem também ser
ajustados, pois as velocidades do escoamento na bacia também se alteram. O
SCS propõe a seguinte fórmula para ajuste de tc (Mc Cuen, 1982).

FA = 1 - PRCT(-6789 +335CN - 0.4298CN2 - 0.02185CN3) 10 6 (21.1 F

o n d e P R C T = a p o r c e n t a g e m d o c o m p r i m e n t o d o t a lv e g u e m o d i f i c a d o o u e n tã o
a p o r c e n t a g e m d a b a c i a im p e r m e á v e l . E t s a e q u a ç ã o fo i a j u s t a d a à s f i g u r a s a p r e ­
s e n ta d a s n o c a p ítu lo 11. C a so o c o rra m a m b a s as m o d ific a ç õ e s o fa to r é c a lc u la ­
d o d u a s v e z e s, u m a v e z p a ra P R C T = PLM (o n d e P L M é a p o rc e n ta g e m d o
c o m p rim e n to m o d if ic a d o ) e o u tra p a ra P R C T = P I (e m q u e P I é a p o rc e n ta g e m
i m p e r m e a b i l i z a d a d a b a c i a ) . O f a t o r d e a j u s t e f i n a l , FA,^ é o b t i d o p e l a m u l t i p l i ­
c a ç ã o d o s d o is v a lo re s a n te rio rm e n te c a lc u la d o s . S e g u n d o o m é to d o d o S C S , n a
fó r m u la a c im a d e v e c o n s ta r o v a lo r d e C N c o r r e s p o n d e n te à b a c ia m o d if ic a d a c
n ã o o v a l o r d e C N d a b a c i a r u r a l.

Exemplo 21.1. Uma bacia de 3 km2 tem declividade 2%, comprimento de 3,5 km e
solo tipo B. Atualmente é toda ocupada com pastagem, mas os planos de
desenvolvimento da bacia prevêem que 33% da bacia ficará impermeabilizada e
que 700m do córrego serão canalizados. Estime o valor de CN e tc para as
condições futuras da bacia.

Solução - a) condições atuais: para solo do tipo B, ocupado com pastagens,


tem-se CN = 59 e da fórmula do SCS para o tempo de concentração:

tc = 3,42 x 3,50'8 [(1000/59) - 9)]°’7/0,02°’5 = 281 min

que corresponde a uma velocidade média de escoamento na bacia de


p
»
822
H id ro lo g ia

p V = 3,5/(281 x 60) = 0,21 m/s


• que é muito baixa.
m
m b) ajuste para condições futuras: - no ajuste de CN a condição prevista é-
33% impermeável (CN = 95); 67% continuarão como pastagens (CN 5qÍ '
• portanto, a média ponderada será P 8 ns (CN - 59), e,

CNf = 0,67 x 59 + 0,33 x 95 = 71


p
p No ajuste de tc, aplicando a fórmula do SCS para o novo CN, tem-se:
i.
p tc = 3,42 x 3,5«-« [(1000/71) - 9J°'7/0,020’5 = 206 min

P A velocidade média do escoamento será

p V = 3,5/(3,43 x 3600) = 0,28 m/s


p
P Entretanto, conforme recomenda a metodologia dn s r ç -Ono u*
}&2*S£2SS;
famres * f M para PLM e
P F A 1 nao reflete totalmente os cteitos do desenvolvimento dn h-irin caK

^SSSSSSi £ £ £ * Bmh6PLM■70üam>* 2
F A c l - 20(-6789 t 335 x 71 . 0.4298 x 712 - 0,02185 x 7 1 W 4 = 0,86
p
p FAi-1 -33(-6789 + 335 x 71 - 04298 x 71! - 0,02185 x 713)10-6 = 0,77

P AjMaodo o valo, de * . 205 min p„> « fto ™ condiçfe tsm.sc


P “ “ “ * FA‘ ' FA’ ’ 205 * 0,16 X 0,77 = 135 min ou 2.25 h

qu= íA m Í ° 1 X ‘ « fe liac l T s° T “ T ' ) 3500/(2J “ 3600) = ° '«


baixa, confirmando as observações S I / " í*^'* 2 ‘'6' “ ’bora “ “ba
do SCS. rvações feitas antenormente a respeito da fórmula

2 U Caracíerísticas da drenagem urbana

•«gados à rede 'pública2 a ^ d ' ^ ^ edificações com os coletores de pluviais


publica, na drenagem superficial das s a lta s que n L b e a
D r e n a g e m U rb an a 823

p a rc e la s u p e r fic ia l d a s ru a s , c a lç a d a s , p á tio s e o u tra s á re a s im p e rm e á v e is o u


p e rm e á v e is q u e g e ra ra m e s c o a m e n to s u p e rfic ia l. O e s c o a m e n to p ro v e n ie n te d a s
s a r je ta s , q u e e n tr a n a r e d e a tra v é s d o s b u e iro s , e o p r o v e n ie n te d o s c o le to r e s
r e s id e n c ia is s ã o d r e n a d o s p e lo s c o n d u to s p lu v ia is q u e a lim e n ta m o s c o n d u to s
s e c u n d á r i o s a t é o s p r i n c i p a i s s i s t e m a s c o m p o s t o s d e p e q u e n o s r io s ( a r r o i o s , r i a ­
c h o s o u rib e irõ e s ) q u e c o m p õ e m a m a c ro d re n a g e m u rb a n a .
A d r e n a g e m u r b a n a é d i m e n s i o n a d a e m d o i s n ív e is p r i n c i p a i s : m a c r o d r e ­
n a g e m e m ic r o d r e n a g e m . A d is tin ç ã o d a s d u a s s itu a ç õ e s n e m s e m p r e é c la ra ,
m a s p o d e - s e c a r a c te r iz a r c o m o m a c ro d re n a g e m o s e s c o a m e n to s e m fu n d o s d e
v a le q u e n o r m a lm e n te s ã o b e m d e fin id o s m e s m o q u e n ã o c o r r e s p o n d a m a u m
c u r s o d e á g u a p e r e n e . E s s a s b a c i a s p o s s u e m á r e a d e p e lo m e n o s 5 k m 2, d e p e n ­
d e n d o d a c id a d e e d o g ra u d e u rb a n iz a ç ã o . O te rm o m ic ro d re n a g e m a p lic a -s e a
á re a s o n d e o e s c o a m e n to n a tu ra l n ã o é b e m d e fin id o e, p o r ta n to , a c a b a s e n d o
d e t e r m i n a d o p e l a o c u p a ç ã o d o s o lo . E m u m a á r e a u r b a n a , a m i c r o d r e n a g e m é
e s s e n c ia lm e n te d e f in id a p e lo tra ç a d o d a s ru a s ,
N os ite n s s e g u in te s d e s te c a p ít u lo serão a b o rd a d o s s e p a ra d a m e n te as
m e to d o l o g i a s p a ra t r a ta m e n to da m ic r o e m a cro d re n a g e m . E n q u a n to na
m a c r o d r e n a g e m s ã o u t i l i z a d o s in d ic a d o r e s m a c r o s d a o c u p a ç ã o e d o e s c o a m e n t o ,
na m ic ro d re n a g e m são c o n s id e r a d o s d e ta lh a d a m e n te a to p o g ra fia , q u a d ra s,
s a r j e t a s , b u e i r o s o o s c o n d u to s .

2 1 .4 M i c r o d r e n a g e m u rb a n a

2 1 .4 .1 T e r m i n o l o g i a d o s e l e m e n t o s b á s i c o s d o s i s t e m a p l u v i a l

O s p r i n c i p a i s te r m o s u tiliz a d o s n o d im e n s io n a m e n to d e u m s i s t e m a p lu v ia l
são:

G a le r ia : c a n a liz a ç õ e s p ú b lic a s d e s tin a d a s a c o n d u z ir as á g u a s p lu v ia is p r o ­


v e n ie n te s d a s b o c a s d e lo b o e d a s lig a ç õ e s p riv a d a s ; Poço de Visita: d is p o ­
s itiv o s lo c a liz a d o s e m p o n to s c o n v e n ie n te s d o s is te m a d e g a le r ia s p a r a p e r­
m itir o s e g u in te : m u d a n ç a d e d ire ç ã o , m u d a n ç a d e d e c lív id a d e , m u d a n ç a de
d iâ m e tro e in s p e ç ã o e lim p e z a d a s c a n a liz a ç õ e s ; Trecho: p o r ç õ e s d e g a l e ­
ria s s itu a d a s e n tr e d o is p o ç o s d e v is ita ; Bocas de lobo: d i s p o s i t i v o s l o c a l i ­
z a d o s e m p o n to s c o n v e n ie n te s n a s s a r je ta s p a r a c a p ta ç ã o d e á g u a s p lu v ia is ;
T\ibos de ligação: s ã o c a n a liz a ç õ e s d e s tin a d a s a c o n d u z ir as á g u a s p lu v ia is
c a p ta d a s n a s b o c a s d e lo b o p a r a a s g a le r ia s o u p a r a o s p o ç o s d e v is ita ; Meio-
Fio: e le m e n to s d e p e d r a o u c o n c r e to , c o lo c a d o s e n tre o p a s s e io e a v ia
p ú b lic a , p a r a le la m e n te a o e ix o d a ru a e c o m s u a fa c e s u p e r io r n o m e s m o
n ív e l d o p a s s e io ; Sarjetas: fa ix a s d e v ia p ú b lic a , p a r a le la s e v iz in h a s ao
m e io -fio . A c a lh a fo r m a d a é a re c e p to ra d a s á g u a s p lu v ia is q u e in c id e m s o b re
as v ia s p ú b lic a s e q u e p a r a e la s e s c o a m ; Saijetões: c a lh a s lo c a liz a d a s n o s
H id r o lo g ia

cruzamentos de vias públicas, formadas pela sua própria pavimentação e desti­


nadas a orientar o fluxo das águas que escoam pelas sarjetas; Condutos força­
dos: obras destinadas à condução das águas superficiais coletadas de maneira
segura e eficiente, sem preencher completamente a seção transversa] dos con­
dutos; Estações de bombeamento: conjunto de obras e equipamentos destina­
dos a retirar água de um canal de drenagem, quando não mais houver condição
de escoamento por gravidade, para um outro canal em nível mais elevado ou
receptor final da drenagem em estudo.

21.4.2 Elementos físicos do p r õ j l ^

Os principais dados necessários à elaboração de um projeto de rede pluvi-


al de microdrenagem são os seguintes:

Plantas - a) planta de situação da localização dentro do Estado- b) planta


geral da bacia contribuinte: escalas 1:5.000 ou 1:10.000. No caso de não
existir planta plani-altimétrica da bacia deverá ser delimitado o divisor
topográfico por poligonal de campo nivelada; c) planta plani-altimétrica da
área do projeto na escala 1:2.000 ou 1:1000, com pontos cotados nas esquinas
e em pontos notáveis;

Levantamento topográfico; O nivelamento geométrico em todas as esquinas,


mudança de direção e mudança de greides das vias públicas;

Cadastro: de redes existentes de esgotos pluviais ou de outros serviços que


possam interferir na área de projeto;

U rbanização: Os seguintes elementos relativos à urbanização da bacia con­


tribuinte, na^ situação atual e previstas em plano diretor: tipo de ocupação das
áreas (residências, comercio, praças, etc.); porcentagem de ocupação dos lo­
tes; ocupação e recobrimento do solo nas áreas não urbanizadas pertencentes
à bacia;

Dados relativos ao curso de água receptor: As informações são as seguintes:


indicações sobre níveis de água máximo do curso de água que irá receber o
lançamento final; levantamento topográfico do local de descarga final.

21.4.3 Definição do esquema geral do projeto

Traçado da rede pluvial - A rede coletora deve ser lançada em planta baixa
(escala 1:2.000 ou 1:1.000), de acordo com as condições naturais de
escoamento superficial. Algumas regras básicas para o traçado da rede são as
seguintes:
D r e n a g e m U rb an a

os divisores de bacias e as áreas contribuintes a cada trecho deverão ficar conve­


nientemente assinalados nas plantas; os trechos em que o escoamento se dê
apenas pelas sarjetas devem ficar identificados por meio de setas; as galerias
pluviais, sempre que possível, deverão ser lançadas sob os passeios,
o sistema coletor em uma determinada via poderá constar de uma rede única
recebendo ligações de bocas de lobo de ambos os passeios; a solução mais ade­
quada deverá ser estabelecida economicamente em cada rua em função da sua
largura e condições de pavimentação.

Bocas de Lobo - As bocas de lobo devem ser localizadas de maneira a conduzir


adequadamente as vazões superficiais para as galerias. Nos pontos mais baixos
do sistema viário deverão ser necessariamente colocadas bocas de lobo com
vistas a evitar a criação de zonas mortas com alagamentos e águas paradas.

Poços de Visita - Os poços de visita devem atender às mudanças de direção, de


diâmetro e de declividade, à ligação das bocas de lobo, ao entroncamento dos
diversos trechos e ao afastamento máximo admissível.

G alerias circu lares - O diâmetro mínimo das galerias de seção circular deve
ser de 0,30 m. Os diâm etros comerciais correntes são os seguintes: 0,30;
0,40; 0,50; 0,60; 1,00; 1,20; e 1,50 m. Alguns dos critérios básicos de pro­
jeto são os seguintes: as galerias pluviais são projetadas para funcionam en­
to à seção plena para a vazão de projeto. A velocidade máxima admissível e
função do m aterial a ser empregado na rede. Para t u b o de concreto a velo­
cidade máxim a admissível é de 5,0 m/s e 0,60 m/s para a velocidade m íni­
ma; o recobrim ento mínimo da rede deverá ser de 1,00 m, quando forem em­
pregadas tubulações sem estrutura especial. Quando por condições topográ­
ficas forem utilizados recobrimentos menores, as canalizações deverão ser
especialm ente dim ensionadas do ponto de vista estrutural; nas mudanças de
diâm etro os tubos deverão ser alinhados pela geratriz superior, como e in­
dicado na figura 21.4.

Disposição dos componentes

Traçado prelim inar - Através de critérios usuais de drenagem urbana, devem


ser estudados diversos traçados da rede de galerias, considerando os dados
topográficos existentes, o pré-dímensionamento hidrológico e hidráulico,
concepção inicial que for escolhida como a mais interessante será mais
importante para a economia global do sistema do que os estudos posteriores oe
detalhamento do projeto, de especificação de materiais, etc.
Esse trabalho deve-se desenvolver simultaneamente com o p
urbanístico das mas e das quadras, pois caso contrário ficam impostas ao
sistema de drenagem, restrições que levam sempre a maiores custos. O sistem
826 H id r o lo g ia

de galerias deve ser planejado de forma homogênea, proporcionando a todas as


áreas condições- adequadas de drenagem.

Figura 21.4. Alinhamento dos condutos.

Coletores - Existem duas hipóteses para a locação da rede coletora de águas


pluviais: a primeira sob a guia (meio-fio) e a segunda, a mais utilizada sob
o eixo da via pública (figura 21.5). O recobrir,tento mínimo é de 1,0 m. sobre
a geratriz superior do tubo. Além disso deve possibilitar a ligação das
canalizações de escoamento (recobrimento mínimo de 0,60m) das bocas de lobo.

Bocas de Lobo - A locação das bocas de lobo oferece as seguintes


recomendações: a) serão locadas em ambos os lados da rua, quando a saturação
da sarjeta o requerer ou quando forem ultrapassadas as suas capacidades de
engolimento; b) serão locadas nos pontos baixos da quadra; c) recomenda-se
adotar um espaçamento máximo de 60 m entre as bocas de lobo, caso não seja
analisada a. capacidade de escoamento da sarjeta; d) a melhor solução para a
instalação de bocas de lobo é em pontos pouco a montante de cada faixa de
cruzamento usada pelos pedestres, junto às esquinas; e) não é conveniente a
sua localização junto ao vértice de ângulo de interseção das saijetas de duas
ruas convergentes pelos seguintes motivos: os pedestres para cruzarem uma
rua, tenam que saltar a torrente num trecho de máxima vazão superficial; as
torrentes convergentes pelas diferentes sarjetas teriam como resultante 'um
escoamento de velocidade em sentido contrário ao da afluência para o interior

Poços de visita e de queda - O poço de visita tem a função primordial de


permitir o acesso às ^canalizações para efeito de limpeza e inspeção, de modo
que se possam mantê-las em bom estado de funcionamento.
D r e n a g e m U rb an a 827

r SENT100 OE
8L 8L

<> ESCOAMENTO
O
SL r BL ^
► /
1
T

S itu a çã o recomendada S itu a çã o não recom endada

a ) Rede coletora no eixo do via público

2
S_l
*co B L — B o c a d# L o b o

B LM - Soco d* L o b o do M onton to

0L J BLJ — Boca do L o b o do Juoonto

BLM
r

S itu a ç a o usuol

b ) R e d e coletoro sob o guia


Figura 21.5. Rede Coletora.

Sua locação é sugerida nos pontos de mudanças de direção, cruzamento de


ruas (reunião de vários coletores), mudanças de declividade e mudança de
diâmetro. O espaçamento máximo recomendado para os poços de visita é
apresentado na tabela 21.7. Quando a diferença de nível entre o tubo afluente
e o efluente for superior a 0,70m, o poço de visita é denominado de quebra.

C aixa de Ligação - As caixas de ligação são utilizadas quando se faz ne­


cessária a locação de bocas de lobo intermediárias ou para evitar-se a che­
gada em um mesmo poço de visita de mais de quatro tubulações. Sua fun­
ção é similar ao do poço de visita e diferenciam-se destes por nao serem
828
H id r o lo g ia

visitáveis. Na figura 21.6 são apresentados exemplos de localização de caixa


de ligação.

Tabela 21.7. Espaçamentos dos poços de visita (DAEE/CETESB,1980).


Diâmetro Espaçamento
(ou altura do conduto)
(m) (m)
0,30 120
0,50 - 0,90 150
1,00 ou mais 180

21.4.4 Vazões de projeto

N o c a p itu lo 1 4 , fo ra m d e s c rito s o s m é to d o s p a ra d e te r m in a ç ã o d e v a z õ e s
d e p r o j e t o s e m b a c i a s h i d r o g r á f i c a s . P a r a b a c i a s p e q u e n a s d e a té 2 h a , q u e c a r a c ­
te riz a m as b a c ia s d a m ic ro d re n a g e m , é u tiliz a d o o m é to d o R a c io n a l. O m é to d o
R a c io n a l, c o m o d e s c rito a n te rio rm e n te , d e p e n d e d a in te n s id a d e d e p re c ip ita ç ã o
m a x i m a ( c a p í t u l o 5 ), d o t e m p o d e c o n c e n t r a ç ã o , d a á r e a d a b a c i a e d e u m c o e f i-
c ie n te d e e s c o a m e n to .

O tempo de concentração em bacias urbanas é determinado pela soma dos


tempos dc concentração dos diferentes trechos. O tempo dc concentração dc uma
determinada seção é composto por duas parcelas

tei = tc(i-I) -f tpi


(21.12)

onde tc(i-i; - tempo de concentração do trecho anterior; tPi= tempo de


concentração do trecho i. O tempo de concentração inicial (ts) nos trechos de
cabeceira de rede, que corresponde ao tempo de escoamento superficial pelos
quarteirões, vias e sarjetas, é muitas vezes adotado como de 10 minutos. No
entanto, esse valor pode estar superestimado, se a bacia for muito
impermeável e com grande declividade. Em caso de dúvida deve-se calcular o
tempo detalhado.
Quando vários trechos de rede, ou seja, várias bacias, com tempos de
concentração diferentes afluem a um determinado trecho de ordem i existem
diversos valores de tc(i-i). Neste caso, utiliza-se o maior tc das bacias
afluentes de montante.
O s tre c h o s e m c o n d u to s s ã o c a lc u la d o s p e la e q u a ç ã o d e m o v im e n to
u n i f o r m e , o u s e j a t = L /V , o n d e L = d is tâ n c ia a o lo n g o d o c o n d u to - v =
v e l o c i d a d e n o c o n d u t o . C o m o a v a z ã o a i n d a n ã o f o i c a l c u l a d a , e s s e va’l o r é
e s tim a d o .
D r e n a g e m U rb an a 829

As áreas contribuintes a cada trecho de rede são determinadas pela


análise das plantas de projeto. Essas áreas são medidas em ,Janta. Nos demais
trechos as áreas são adicionadas progressivamente pelas áreas locais de
contribuição. As áreas locais correspondem às parcelas contribuintes nos
quarteirões adjacentes.

21.4.5 Dimensionamento hidráulico

Capacidade de condução hidráulica de ruas e sarjetas

As águas, ao caírem nas áreas urbanas, escoam inicialmente pelos terrenos


até chegarem às ruas. Sendo as ruas abauladas (declividade transversal) e tendo
inclinação longitudinal, as águas escoarão rapidamente para as sarjetas e destas,
ruas abaixo. Se a vazão for excessiva, ocorrerá: alagamento e seus reflexos,
inundação de calçadas; velocidades exageradas, com erosão do pavimento.
A capacidade de condução da rua ou da sarjeta, pode ser calculada a
partir de dua* hipóteses: a) a água escoando por toda a calha da rua; e ) a
água escoando só pelas saijetas.
Para a primeira hipótese, admite-se a declividade da rua (seção transver
sai) de 3% (figura 21.7) e altura de água na sarjeta h l = 0,15 m. Para a segunda
hipótese, admite-se declividade também de 3% e h2= 0,10 m. _
O dimensionamento hidráulico pode ser realizado pela expressão de
Strickler-Manning:
v . n ” s ,fl <2 U 3 >
830
H id r o lo g ia

Figura 21.7. Seção da sarjeta.

o n d e V = v e l o c i d a d e n a s a r j e t a e m m /s ; S = d e c l i v i d a d e d a r u a e m m / n r K -
c o e f i o e n t e d e r u g o s t d a d e , a d o t a d o ig u a l a 6 0 p a r a p a v , m e n t o c o m u m d e V f j
p u b h c a s ; R a .o h i d r á u l i c o e m m ( R = A/P; A = á re a e P= p e r ím e tr o m o lh a d o ).

E x e m p l o 2 1 .1 . C a l c u l e a v a z ã o m á x i m a q u e e s c o a p e l a s a r j e t a e p o r t o d a a ru a

n a íll°
nai ia ° Sde
da via de n0,005
n ô fm/m
“í quais sao ™ pÚblic»’ P”™
as vazões? declividade longim” ,'

SoíuçãQ - a) capacidade total da calha da rua: Nesse caso. a largura de cada


lado fica 0,15/0.03= 5m. A área da se?ão pode ser aprox.mada por um m ^ o
e fica A-(0,15 . 5,0)12 = 0,375 m2. O perímetro d obtido pela altura no meio

r tilm P ^ t . ^ S n c T d° triângUl° f(° ’I5)2 + (5'0)2]W’ 0 * *

Q = V A = K A S W RW = 60. 0,375.(0,005)^(0,375/5,15)2/3 = 0,277 m3/s

Para os dois lados da rua resulta Q = 0,554 m3/s

b) capacid.de das sarjetas, K = lOm. O procedimento < semelhante, resultando

d» - « ^

Bocas de Lobo

J Íp o V nriSncinCaS T * ™ (bocas de lobo) Podera « r classificadas em três


ralos combinados. C a l ° tip ^ n c h li ^ ? ° * * SarjetaS ^ reIha5)'-
(rebaixamento) em relação ao nNel h janações quanto a depressões
; em reiaçao ao nível da superfície normal do perímetro e ao seu
D r e n a g e m U rb an a 831

número (simples ou múltipla) (figura 21.8).

Capacidade de engollmento - Quando a água se acumula sobre a boca de lobo,


gera uma lâmina de água com altura menor do que a abertura da guia. Esse tipo
de boca de lobo pode ser considerado um vertedor e a capacidade engolimento
será
Q = 1,7 L y3/2 (21.14)

onde Q = vazão de engolimento em m3/s; y = altura de água próximo à abertura


na guia em m; L = comprimento da soleira em m. Nas figuras 21.9 e 21.10 são
apresentados gráficos que permitem determinar a vazão total com base na
largura, altura e largura da depressão do bueiro, declividade transversal e
altura projetada de água.
Quando a altura de água sobre o local for maior do que o dobro da
abertura na guia a vazão é calculada por

Q = 3,101 L hm (yi/h)1/2 (21.15)

onde L = comprimento da abertura em m; h altura da guia em m; yl carga da


abertura da guia em m ( yi = y -h/2). Para carga.? entre uma e duas vezes a
altura da abertura da guia ( 1 < yi/h < 2), a opção por um ou outro critério
será definido pelo projetista.
As bocas de lobo com grelha, funcionam como um vertedor de soleira
livre, para profundidade de lâmina até 12 cm. Se um dos lados da grelha for
adjacente à guia, este lado deve ser excluído do perímetro L da mesma.A vazão
é calculada pela equação 21.14, substituindo L por P, onde P é o perímetro do
orifício em m. Para profundidades de lâmina maiores que 42 cm, a vazão é
calculada por
Q= 2,91 A y Xtl (21.16)
2
onde A = área da grade, excluídas as áreas ocupadas pelas barras, em m ,
altura de água na saijeta sobre a grelha.
Na faixa de transição entre 12 e 42cm, a carga a ser adotada é definida
segundo julgamento do projetista.
A capacidade teórica de esgotamento das bocas de lobo combinadas é
aproximadamente igual à somatória das vazões pela grelha e pela abertura na
guia, consideradas isoladamente.

Exemplo 21.2. Dimensione uma boca de lobo para uma vazão de 94 1/s na sarjeta
e uma lâmina de água de 0,10m.

Solução: a) como boca de lobo de guia: da equação 21.14 pode-se isolar L,


H id ro lo g ia
x r~
à) BOCA DE LOBO OE GUIA

£ 1 iI t = T ^ 7>

sem depressão

b )B O C A DE LOBO COM G R E LH A

£ i ------- i .— L , . i 1 i J*

sem depressão

C ) BOCA DE LO B O C O M B IN A D A

sem depressão

d ) BOCA DE L O B O M U L T lP L

Er '' Jjl ' ' ' "1, ‘J

e ) BOCA DE lobo com fenda horizontal longitudinal

sem depressão

Figura 21.8. Tipos de bocas de lobo (DAEE/CETESB,


1980).
D r e n a g e m U rb an a 833

W = largura da depressão em m; a - altura da depressão em m;


í = declividade transversal do leito carroçável em m/m.

Figura 21.9. Capacidade de engulimento (DAEE/CETESB,1980).

resultando

L = 0 / (1 ,7 y 3/2) = 0 ,0 9 4 / ( l ,7 ( 0 ,1 0 ) 3/2 = 1,75 m .

Logo, haverá necessidade de um comprimento de 1,75 m de soleira. Pode-


se adotar 2 bocas de lobo padrão com L=1,0 m cada e guia com h=0,15m. Da
figura 21.10 retira-se (depressão a=o cm, abertura da guia padrão = 0,15 m);
yo/h = 0,10/0,15 = 0,67 e QfL - 55 l/s,m. Como Q = 94 1/s, L = 1,71 m. Seme­
lhante ao anterior.
b) Como boca de lobo combinada: b.l) boca de lobo guia padrão (h=0,15 m
e L=L,0 m) e; b.2) boca de lobo grelha padrão (a - 0,87 e b = 0,29 m).

b.l) Q = 1,7 L Y 3/2 = 1,7 . 1,0 . (0,10)3/2 = 5 4 1/s

b.2) Q = 1,7 P Y3/2 = 1,7 . (0,87 + 2 .0 ,2 9 ) . (0,10) = 78 1/s

Qtotal = 132 1/s ( > 94 1/s)


DA GUIA EM
ABERTURA

Figura 21.10. Capacidade de esgotamento das bocas de lobo simples com


pressão de 5cm, em pontos baixos das sarjetas (DAEE/CETESB, 1980).
Drenagem Urbana 835

Fatores de redução da capacidade de escoamento - As capacidades de escoamento


anteriormente citadas podem, segundo alguns autores, sofrer redução no valor
calculado, a fim de aproximar o resultado teórico das limitações existentes
nos casos reais.
No caso das saijetas, uma vez calculada a capacidade teórica,
multiplica-se o seu valor por um fator de redução que leva em conta a possi­
bilidade de obstrução de sarjetas de pequenas declividade por sedimentos. Na
tabela 21.8 são apresentados valores recomendados de fatores de redução.
A capacidade de esgotamento das bocas de lobo é menor que a calculada
devido a vários fatores, entre os quais: obstrução causadas por detritos,
irregularidades nos pavimentos das ruas junto às sarjetas, alinhamento real.
Na tabela 21.9 são propostos alguns coeficientes de redução para estimar esta
redução.

Tabela 21.8. Fatores de redução de escoamento das sarjetas


(DAEE/CETESB, 1980).
Declividade da sarjeta Fator de redução
%
0,4 0,50
1-3 0,80
5,0 0,50
6,0 0,40
8,0 0,27
10 0,20

Tabela 21.9. Fator de redução do escoamento para bocas de lobo


(DAEE/CETESB, 1980).
Lozaiização na Tipo de Boca % permitida sobre o valor
sarjeta de lobo teórico
Ponto baixo De guia 80
Com Grelha 50
Combinada 65
Ponto Intermediário De Guia 80
Grelha longitudinal 60
Gelha transversal ou
longitudinal com
barras transversais 60
combinada 110% dos valores indicados
para a grelha correspondente
* valor que multiplica os indicados nas grelhas correspondentes.
836
Hidrologia
2 Í .4 .6 G a le r ia s

O d im e n s io n a m e n to d a s g a le ria s é r e a liz a d o c o m b a s e n a s e q u a ç õ e s h i­
d r á u l i c a s d e m o v i m e n t o u n i f o r m e , c o m o a s d e M a n n i n g ( e q u a ç ã o 2 1 .1 3 ) , C h e -
z y e o u t r a s . O c á l c u l o d e p e n d e d o c o e f i c i e n t e d e r u g o s i d a d e c d o ti p o d e g a le r ia
a d o ta d o . P a ra m a io re s d e ta lh e s , q u a n to a o s c o e f ic ie n te s d e ru g o s id a d e c o n s u lte
D A E E /C E T E S B (1 9 8 0 ).

E x e m p l o 2 1 .3 . D e te r m in e u m a g a l e r i a c i r c u l a r p a r a e s c o a r a v a z ã o d e 9 4 1/s
o b tid a n o e x e m p lo a n te r io r , c o n s id e r a n d o a d e c liv id a d e lo n g i t u d i n a l d a ru a
ig u a l a 0 ,0 0 1 m /m . O c o n d u to é d e c o n c r e to c o m K = 0 ,7 5 m .

S o lu ç ã o - A á re a é A = n D 2/4 , s u b s tit u in d o n a e q u a ç ã o d e M a n n in g e is o la n d o
o d iâ m e tr o r e s u lta

Q 0 ,0 9 4
D = 1,55 ( — --------------------) = 0,461 m
7 5 ( 0 , 0 0 1 ) 1/2

P o d e - s e a d o ta r D = 0 ,5 0 0 m .

2 1 .5 M ac ro d re n a g e m

E n tc n d c - s e p o r m a c r o d r e n a g e m as i n te r v e n ç õ e s e m f u n d o s d c v a le q u e
c o le t a m á g u a s p lu v ia is d e á r e a s p r o v id a s d e s is te m a s d e m i c r o d r e n a g e m o u n ã o .
N e s s e s f u n d o s d e v a le o e s c o a m e n to é n o r m a lm e n te b e m d e f in id o , m e s m o q u e n ã o
e x is ta u m c u rso d e á g u a p e re n e .
O b ra s d e m a c r o d re n a g e m b u s c a m e v ita r a s e n c h e n te s d e v id o à b a c ia u rb a ­
n a , is to é , c o n s t r u ç õ e s d e c a n a i s , r e v e s t i d o s o u n ã o , c o m m a i o r c a p a c i d a d e d e
tra n s p o r te q u e o c a n a l n a tu ra l c b a c ia s d e d e te n ç ã o .

Dimensionamento Hidrológico

A c a n a liz a ç ã o p r o je ta d a d e v e s e r c a p a z d e c o n d u z i r a c h a m a d a v a z ã o d e
p ro je to , c u ja d e te r m in a ç ã o já fo i a p r e s e n ta d a em o u tr o s c a p ítu lo s . Os
c r ité r io s u s u a im e n te r e c o m e n d a d o s p a r a a d e t e r m i n a ç ã o d a s v a z õ e s d e p r o je to
s ã o :- o s c á lc u lo s h id r o l ó g ic o s d e v e m c o n s i d e r a r a o c u p a ç ã o f u tu r a d a b a c ia ; -o
p e r ío d o d e r e to m o r e c o m e n d a d o é 1 0 0 a n o s .
C o m o a s b a c ia s p a s s ív e is d e o b r a s d e m a c r o d r e n a g e m te n d e m a s e r b a c ia s
d e p o r t e m é d io , n o r m a l m e n t e s e u tiliz a m m é to d o s d e c á l c u l o d e c h e i a s b a s e a d o s
n a te o r ia d o h i d r o g r a m a u n itá rio . A t e n d ê n c ia a tu a l é c a d a v e z m a is a c e n tu a d a
D r e n a g e m U rb an a 837

no s e n ti d o d a u tiliz a ç ã o d e m o d e lo s d e s im u la ç ã o m a t e m á t i c a e m fa c e das
i n ú m e r a s v a n t a g e n s q u e e s s e s m é to d o s a p r e s e n ta m , c o n f o r m e s e r á v is to n o ite m
21.7.

Etapas de Projeto

É s e m p r e c o n v e n i e n t e q u e o p r o je to s e d e s e n v o lv a d e f o r m a s i s t e m á t i c a e m
u m a s u c e s s ã o d e e ta p a s :

projeto p relim in ar - a p a rtir d o s d a d o s d is p o n ív e is e d a s in fo r m a ç õ e s c o le ta ­


d a s , c o m v is ita s à b a c ia , s ã o le v a n ta d a s as p o s s ív e is a lte r n a tiv a s d e s o lu ç ã o ,
d e te c ta m - s e e v e n tu a is in te rfe rê n c ia s e e la b o ra -s e u m e s tu d o h id ro ló g ic o p re ­
lim in a r. C o m e s s e s e le m e n to s , é p o s s ív e l d e te r m in a r as p r in c ip a is c a r a c te r ís ti­
c a s d a o b r a . É im p o r ta n te m a n te r c o n ta to c o m to d a s as e n tid a d e s p ú b lic a s e
p riv a d a s q u e p o s s a m te r re la ç ã o c o m o p r o je to , n ã o s ó p a ra a o b te n ç ã o d c
in f o r m a ç õ e s té c n ic a s , m a s ta m b é m p a ra a n te c ip a r c s o lu c io n a r e v e n tu a is p r o ­
b le m a s fu tu r o s d e in te rfe rê n c ia s d iv e rs a s , q u e p o d e rã o d ific u lta r a e x e c u ç ã o d a
o b r a . N e s ta e ta p a s ã o d e s c a r ta d a s a p e n a s a s a lte rn a tiv a s q u e se d e m o n s tr e m
c ía r a m c n te in v iá v e is .

p ro je to b á s ic o - a q u i a a te n ç ã o c o n c e n tr a - s e s o b r e u m n ú m e r o r e d u z id o d e
a l t e r n a t i v a s n ã o e l i m i n a d a s n a p r im e ir a f a s e . E s p e c if ic a m - s e e e x e c u t a m - s e o s
le v a n ta m e n to s to p o g rá fic o s e g e o ló g ic o s n e c e s s á r io s ^ O s l e v a n t a m e n to s de
cam po p e rm itirã o a p r o f u n d a r o s e s tu d o s d a s a lte r n a t iv a s e , p o r c o m p a r a ç a o
e n tre e la s , e s c o l h e r - s e a m e lh o r . A a l t e r n a t i v a e s c o lh id a é e n tã o d e ta l h a d a .
E la b o ra m -s e d esen h o s, m e m o r ia is de c á lc u lo , e s p e c ific a ç õ e s té c n ic a s ,
d e t e r m i n a m - s e q u a n t i d a d e s e m é to d o s c o n s tr u tiv o s . A o f in a l d e s t a f a s e , d e v e m
e s ta r p r o n to s os d o c u m e n to s que p e r m ita m li c i t a r a o b r a , o u s e j a , e s ta r a o
d is p o n ív e is to d a s as in f o r m a ç õ e s n e c e s s á r ia s p a ra a c o ta ç ã o de p re ç o s.
E x e c u t a m - s c t a m b é m o s e s tu d o s h i d r o l ó g ic o s e h i d r á u lic o s d e f in itiv o s .

projeto executivo - u m a s é rie de a s p e c to s n ã o p o d e m s e r r e s o lv id o s n a fa se d c


p r o j e t o b á s i c o p o r d i v e r s a s r a z õ e s . E n t r e e l a s i n c l u e m - s e , p o r e x e m p l o , a s p e c to s
q u e d e p e n d e m d o s m é to d o s c o n s tru tiv o s e s c o lh id o s p e la c o n s tr u to r a , d e ta lh e s
s o b r e s i n g u l a r i d a d e s e i n t e r f e r ê n c i a s n ã o p r e v i s t a s , e tc . E s s e s p r o b l e m a s u s u a l ­
m e n te s ó s ã o r e s o lv id o s d u ra n te a o b ra . N e s ta fa s e s e r ã o e la b o r a d o s c á lc u lo s
e s tr u tu ra is , d e s e n h o s d e fo rm a s e d o c u m e n to s n e c e s s á rio s p a ra a e x e c u ç ã o d as

m e d iç õ e s .

desenhos "como construídos" - embora não constitua uma fase de projeto, é


muito importante que, após a execução da obra, sejam elaborados os desenhos
que incorporem as modificações introduzidas no projeto original e os detalhes
sobre as interferência. Esses elementos serão essenciais para os serviços de
838 H id r o lo g ia

manutenção e reforma dos canais, além de poder orientar futuras obras na


área.

Dimensionamento Hidráulico

O d im e n s io n a m e n to h id rá u lic o p o d e se r feito, c o n s id e r a n d o o s re g im e s de
esco am en to : re g im e fluvial e un ifo rm e; re g im e fluvial g r a d u a lm e n te variado;
regim e não-perm anente.
O primeiro tipo de regime não permite considerar as possíveis
influências do nível de água de jusante e os efeitos de singularidades sobre
a linha de água. Como esse regime só se estabelece em trechos longos e
uniformes, é necessário certifícar-se de que essas condições são válidas e
que não existem efeitos de remanso, o que é raro em áreas urbanas. Usualmente
utiliza-se o regime uniforme na fase de projeto preliminar.
O re g im e g ra d u a lm e n te v ariad o é o m a is u tilizad o , p o is p e rm ite d e te r­
m in a r a linha d e água, c o n sid e ra n d o a p re se n ç a de s in g u la rid a d e s c m u d a n ­
ç a s d e v a z ã o ao lo n g o trec h o , além de r e m a n s o c a u s a d o p o r c o n d iç õ e s dc
c o n to rn o a ju san te. É fu n d a m e n ta l sua u tilização cm caso s dc g alerias c o ­
b erta s, p ois elev açõ es da lin h a dc á g u a p o d e rã o c a u sa r a fo g a m e n to co m c o n ­
se q u ê n c ia s graves.
N o ’eg im e n ão -p e rm a n e n te , ó possível co n sid era r alteraçõ es das variá­
v eis d e in teresse n o e s p a ç o e no tem p o . O tra ta m e n to m a te m á tic o c c o n s id e ra ­
v e lm e n te m a is c o m p le x o . E s s a alternativa c a d o ta d a cm c a so s e s p e c ia is co m o ,
p o r e x e m p lo , p a ra p rev er a fo g a m e n to dc red e dc g alerias su je ita s a efeitos
h id ro d in â m ic o s,. levar e m co n ta efeitos de m a ré , o p e ra ç ã o de c o m p o rta s c
outros.

21.6 Reservatórios de Detenção

O armazenamento natural do escoamento superficial existe em várias


formas, como: armazenamento na vegetação; infiltração e armazenamento no
subsolo; armazenamento em pequenas depressões superficiais; armazenamento
dinâmico nos cursos de água e nas várzeas de inundação.
O desenvolvimento de uma bacia hidrográfica provoca o aumento dos picos
dos hidrogramas de cheias, em face do aumento da área impermeabilizada da
bacia, da redução de seu tempo de concentração, e da eliminação de
armazenamentos naturais. Para contornar o problema criado com a urbanização
das bacias sobre o comportamento das cheias, que causam inundações nas áreas
ribeirinhas, diversas medidas estruturais e não-estruturais podem ser
adotadas. Entre as primeiras, discute-se aqui o uso de bacias de detenção,
que são reservatórios de armazenamento de curtos períodos, que reduzem as
vazões de pico dos hidrogramas das cheias, aumentando o seu tempo de base.
Geralmente, as bacias de detenção não reduzem o volume do escoamento
?

839
D r e n a g e m U rb an a

direto, apenas redistribuem as vazões ao lbngo de um tempo maior, formando um


volume útil temporário, com parte do escoamento direto. Esse volume
corresponde à área compreendida entre os hidrogramas afluente e efluente da
bacia. , .
O efeito de um reservatório de detenção sobre um hidrograma de cfteia
pode ser visto na figura 21.11. Os reservatórios de detenção são totalmente
drenados, em geral, em menos de um dia. A sua área de ocupação, normalmente,
é seca è pode ser utilizada para fin* recreacioftais. O armazenamento do
escoamento superficial nos reservatórios de detenção, tem o potencial de
produzir os seguintes benefícios: reduzir problemas de inundações
localizadas; reduzir os custos de um sistema dé galerias de drenagem, devido
à redução das dimensões das galerias; melhorar a qualidade da água; minorar
pfoblémas de erosão nos pequenos tributários, devido à redução das vazõesj -
aumentar o tempo de resposta do escoaínento superficial; melhorar as condições
para reuso da água e recarga dos aqüíferos; reduzir as vazões máximas de
inundação a jusante.
840 Hidrologia

Critérios de dimensionamento

Os critérios de'dimensionamento das bacias de detenção são normalmente


os seguintes;

controlar a vazão máxima efluente * fixando a vazão máxima efluente em um


valor ígual a 85% ou menos da vazão correspondente às condições da bacia
antes do desenvolvimento da bacia hidrográfica.

garantir segurança contra rompimento - dimensionando um extravasor para


garantir o escoamento de vazões extremas. Quando o reservatório é formado por
um barramento, prever proteção para rápidos gaigamentos.

garantir operação sem manutenção - evitando válvulas manuais ou automáticas.


Evitar que fique uma lâmina de água constante muito rasa, que proporciona o
crescimento de vegetação e o afloramento de camadas de lama.

considerar eventos freqüentes - garantindo que a bacia seja eficaz também


para a$ vazões de baixo período de retomo.

Às bacias de detenção são projetadas, em geral, para controlar as


conseqüências dc chuvas locais, de curta duração e alta intensidade, pois
estas são as causadoras das inundações dos pequenos cursos de água. O efeito
da redução dos pico do hidrograma de uma cheia é sentido com maior eficiência
l o g o a jusante da estrutura, diminuindo seu efeito paia jusante.
As bacias de detenção dimensionadas para controlar apenas uma cheia
extrema com grande período de retomo exige um volume de armazenamento
reiativamente pequeno. Entretanto, são muito ineficazes para as cheias
menores e também para reduzir as cheias mais a jusante. As bacias projetadas
para controlar apenas as cheias menores, podem eventualmente reduzir as
máximas descargas das cheias maiores, dependendo do efeito da laminação da
cheia no vertedor de segurança. Uma bacia de detenção pode ter uma ou mais
estruturas de descarga normais, além do vertedor de emergência, que permite
passar cheias maiores que aquelas do projeto da bacia.
A figura 21.12 apresenta um esquema representativo de uma baci-a de
detenção com descargas múltiplas. Do ponto de vista construtivo, as bacias de
detenção podem ser criadas pelo barramento de um rio, de uma ravina ou de um
canal, escavando-se uma bacia no solo existente ou por uma combinação de
escavação e barramento. Devem dispor de um vertedor, cujo propósito é o de
garantir a segurança do barramento, evitando um rompimento durante a passagem
de uma onda de cheia excepcionai. Em alguns casos, é necessário dispor uma
bacia de dissipação a jusante da descarga ou do vertedor, para evitar erosão
localizada. Em quase todos os casos, é necessário instalar uma grade de
841
Drenagem Urbana _______________ __ _____________________

I Z ~ para evitar quT a descasa s e j a obstruída por folhas ou detritos.


p í a sT efltu ar um projeto mais conservativo. deve-se especificar um
certo grau de controle para um^numero ^ ^ /^ c m e g id a

prévia ao desenvolvimento. N ^ ^ c n t é n ^ para —


se^o r ter^um
denteproje
na ctoondição
mus
econômico, deve-se prev descarga inferior é menor e é utilizada
em alguns » s o s para forçar o depdsi.o de
sedimentos. A descarga superior é utilizada nas grandes cheias.
T o po do bor roqefr
£ntrada
E je v o ç S o _
do caoal cMo .lí. Eííií'.0___ do veftedor
SoídO 4UP«r,or B acio de
d issip a d o
Saída inferior

ELEVAÇAO

21.7 Modelos Matemáticos em Drenagem U rbana

o uso de modelos matemíricos em hidrologia, e o”


urbana começou na década de 1960, para
computadores digitais poderíam ser utilizados com muit
842 Hidrologia

simular processos hidrológicos. Desde então, os meios técnicds presenciaram o


aparecimento de grande número de modelos, dos mais simples aos mais
complexos.
É interessante notar que, em termos de aplicação prática, a evolução tem
sido no sentido de utilizar modelos simples, deixando de lado a complexidade
dos primeiros modelos que surgiram. A espantosa evolução da tecnologia de
computadores, tanto na área de equipamentos, como de programação tem
contribuído para tomar esses modelos mais acessíveis em termos de custo e
facilidade de uso.
A quantidade de modelos é tão grande e o custo dos computadores vem
caindo tanto, que é conseqüência natural que mais e mais pessoas se
aproveitem das possibilidades oferecidas pela modelagem matemática. Analisar
a enorme quantidade de modelos existentes e aprofundar-se nas técnicas de
simulação hidrológica seria impraticável em apenas um capítulo. Neste item
pretende-se apenas mostrar em que os modelos de simulação hidrológica podem
auxiliar o engenheiro de drenagem urbana e quais são suas limitações. Através
de exemplos, procurar-se-á ilustrar a aplicação de alguns modelos,
enfatizando a potencialidade dessas técnicas. Os modeios citados como
exemplos foram desenvolvidos por entidades públicas e podem ser obtidos junto
a essas instituições.
A apresentação desse item deve responder a uma questão básica : Por que
utilizar um modelo, se diversos sistemas complexos de drenagem urbana foram
construídos no passado, sem a sua ajuda ?

Fundamentos do modelo ABC

O modelo ABC (Porto et ai., 1992) é um conjunto de métodos hidrológicos


clássicos que funcionam articuladamente e são apoiados por interfaces de
diálogo com o usuário, rotinas gráficas e um banco de dados de relações
intensidade-duração-freqüência de todo o Brasil. É apresentado neste texto, a
título de exemplo para demonstrar a aplicação de modeios matemáticos à
hidrologia urbana. O modelo ABC aplica-se a problemas de drenagem urbana, em
especial aos que podem ser classificados como sendo de macrodrenagem.
Sua aplicação apresenta vantagens sobre o conhecido método racional,
pois se aplica sem restrições a bacias com áreas de drenagem superiores a 100
ha. Não obstante, o modelo ABC se aplica a bacias com áreás inferiores, bem
como a grandes bacias urbanas (superiores a 50 km2), segmentando-se a bacia,
para considerar a diversidade de distribuição da chuva e ocupação do solo.
O modelo está escrito em linguagem Quick Basic, versão 4.5. Pode ser
executado em computadores compatíveis com o IBM-PC, em sua configuração
mínima. Os principais módulos do modelo são a seguir descritos:

Bacia - Neste módulo, o usuário define as características da bacia em estudo.


Drenagem Urbana 843

O modelo calcula o tempo de concentração.

Chuvas - Módulo para escolha da chuva de projeto. O modelo permite que sc


defina um hietograma, ou calcula a partir de uma das 114 equações de curvas
intensidade-duração-freqüência disponíveis. O hietograma é gerado pelo pro-
cesso dos blocos alternados.

Infiltração - Este módulo objetiva calcular a chuva excedente, a partir de


três processos alternativos de análise de infiltração: Horton, SCS e índice

Geração de um hidrogram a - Esse módulo gera um hidrograma de escoamento


superficial direto para a bacia escolhida, por três processos alternativos de
hidrograma unitário: método de Clark, método de Santa Bárbara e método do
SCS.

Amortecimento de ondas de cheia em reservatórios - Neste módulo, pode-se


obter o hidrograma efluente de um reservatório, a partir do conhecimento de
um hidrograma afluente e das características das equações das curvas cota-
volume do reservatório e da curva de descarga do vertedor.

Amortecimento de ondas de cheias em canais - Esse módulo permite calcular o


hidrograma transladado e amortecido em um trecho de canal, peio método de
Muskingum.

Composição de hidrogramas - Neste módulo, pode-se somar hidrogramas de sub-


bacias diferentes;

Exemplo 21.4. Modelo ABC - Para exemplificar o uso de um modelo de simulação


de evento de cheias, propõe-se discutir um exemplo hipotético. Suponha uma
bacia A (figura 21.13), que se encontra em processo de alteração de sua
cobertura vegetal. Na situação atual, o valor de CN referente à cobertura do
solo atual é 67.
Para uma chuva com duração de 4 horas, com intensidade uniforme de 20
mm/h, foi verificada uma vazão na seção P, que corresponde à capacidade do
canal. Com a alteração da cobertura vegetal da bacia A, o valor de CN passará
a 80, com aumento da vazão máxima do hidrograma. Foi projetada uma barragem
no ponto P, para criar um reservatório de regularização. Pretende-se
dimensionar a largura do vertedor dessa barragem, para reduzir a nova vazão
de pico à capacidade do canal.
O restante dos dados são resumidos a seguir e na tabela 21.10:

- Canal da bacia B2: Comprimento = 3600 m, velocidade do escoamento =


1,0 m/s; X (Muskingun = 0,25 (ver capítulo 12);
i

- Barragem: curva cota-volume vol = 1,32 106 (h -50)


curva do vertedor Q = 0,49 L (h - 100)lí5
o n d e h é o n í v e l d o r e s e r v a t ó r i o e m m ; Q e m m 3/ s e v o l e m m 3; L = l a r g u r a
d o v e rte d o r e m m . è

Tabela 21.10. Dados do problema 21.4.


Bacia área Tc CN área impermeável área impermeável diretamente
da bacia ligada ao canal
km2 h % %
A 200 6 (5) 67 (80) 10 2
Bl 15 1 67 30 3
B2 15 1 67 5 0

--------- Delimitação de bacio

Figura 21.13. Bacia do problema 21.4.

se<muir.
□cg irA S° !U?ã° d0 pr° Wema ProPosto está «sumida nas ações descritas a

hL Í T I 0 d° hAÍdr0grama no P°nt0 P P ^a a situação atual: introdução dos


dados da bacia A, na situação atual; introdução dos dados da chuva; Cálculo
idrogram ada bacia A; introdução dos dados da bacia B l; cálculo do
B2 mSfroduc5o ^ 1 3f 1Cf eciment0 do hidrograma de B l, no canal da bacia
B2, introdução dos dados da bacia B2; cálculo do hidrograma da bacia B2; soma
Drenagem Urbana 845

dos hidrogramas das bacias BI e B2; Soma dos hidrogramas das bacias B ( BI e
B2) e A.

b) obtenção do hidrograma no ponto P, para a situação futura: alteração dos


dados da bacia A ( Tc e CN ); cálculo do hidrograma da bacia A, para a nova
situação; soma dos hidrogramas das bacias B ( BI e B2) e A.

c) amortecimento do hidrograma referente à situação futura no reservatório:


introdução dos dados do reservatório; introdução do hidrograma afluente ao
reservatório (obtido no passo anterior); amortecimento do hidrograma para
diversas larguras, até obter a vazão máxima de descarga desejada.

A figura 21.14 e as tabelas 21.11 e 21.12 resumem os resultados obtidos.


Como pode ser visto, esse problema foi resolvido de forma simples, através do
modelo. A facilidade de aplicação permite que se explore os resultados,
através de análise de sensibilidade, alterando-se parâmetros de determinação
duvidosa, verificando-se sua influência sobre os resultados.
Por exemplo, se o valor de CN da bacia A atingir o valor de 90, qual é a
conseqüência sobre os resultados do estudo? Processando-se novàmente o
hidrograma da bacia A com CN = 90, obtém-se uma vazão máxima de 404 m3/s.
Somando-se esse hidrcgrama com o da bacia B e amortecendo no reservatório
proposto (largura do vertedor de 22 m), a vazão máxima de saída iguala 254
m3/s. Uma alternativa prática, caso o reser/atório já estivesse construído,
seria manter um volume de espera. Foi processado o modelo ABC,
iterativamente, determinando-se que um volume de espera de cerca de 3.5 Hm3,
que corresponde a uma lâmina inicial 2,7m abaixo da crista do vertedor é
suficiente para reduzir a vazão máxima vertida a 162m3/s, que é a capacidade
máxima do canal. Outras especulações, como por exemplo, testar os efeitos de
diferentes distribuições espaciais e temporais da chuva poderíam ser feitas
facilmente.

Tabela 21.11. Vazões máximas.

Local Vazão(m3/s)
A atual 121,5
Bi 21,9
B2 24,9
BI amortecido 21,6
B2+B1 amortecido 46,8
P atual = A + BI +B2 amortecido 162,8
A futuro 272,2
P futuro = A futuro +B2 +B1 amort. 313,5
846
Hidrologia

Tabela 21.12. Característica do extravasor.


Largura do Vazão máxima Lâmina máxima sobrei
vertedor (m) vertida (m3/s) o vertedor (m)
20 152 2,30
22 158 2,21
25 166 2,11
30 177 1,95
Va z ã o ( m 3 / s )

Figura 21.14. Resultados da bacia do exemplo 21.4.

REFERÊNCIAS

1 - DAEE/CETESB 1980. Drenagem Urbana 2 ed. São Paulo.

2 - HALL, M J. 1984. Urban Hydrology. Essex: Elsevier.

S S Geophisicài

4■srs s s o°; washtog“ " :u s


Drenagem Urbana 847

5 - McCUEN, R.H. 1982. A Guide to Hydrologic Analysis using SCS


Methods. Englewood Cliffs: Prentice-Hall.

6 - PONCE, V.M. 1989. Engineering Hydrology: Principies and Practice.


Englewood Cliffs: Prentice-Hall.

7 - PORTO, R., ZAHED F°, K., e GIKAS, A.N. 1993. ABC3 - Análise de
cheias complexas Manual do Usuário, São Paulo: Fundação Centro
tecnológico de Hidráulica.

8 - UEHARA, K. 1985. Necessidade de estudos de novos critérios de


planejamento de drenagem de várzea de regiões metropolitanas. In;
SIMPÓSIO BRASILEIRO DE HIDROLOGIA E RECURSOS HÍDRICOS,
6„ 1985, São Paulo. Anais. São Paulo: ABRH. v.3, p.111-119.
Capítulo 22

O MEIO AMBIENTE E OS RECURSOS HÍDRICOS

Antonio Benetti e Francisco Bidone

22.1 Introdução

A água é um bem que deve ser utilizado pelo homem para sua sobrevivência
e melhoria de suas condições econômicas, sociais e comunitárias. Além disso,
a água é também um meio onde habitam organismos que necessitam condições
ambientais adequadas para a sobrevivência.
Este capítulo trata dos principais aspectos de qualidade e poluição dos
recursos hídricos. Nesse contexto, são abordados: a caracterização do
ambiente aquático, seus múltiplos usos e os padrões de qualidade associados;
as formas como a ação antropogênica causa impactos sobre o meio, de que
maneira esses impactos são medidos e analisados, através do monitoramento e
da interpretação dos resultados; procedimentos de minimização dos ímpaenos,
através do tratamento adequado das fontes de poluição e do planejamento
territorial; aspectos político-administrativos de controle de poluição.
O conteúdo desenvolvido é complementado com uma proposta de roteiro para
a elaboração de um estudo de impacto ambiental.

22.2 Caracterização do ambiente aquático

A água é um mineral líquido formado por dois átomos de hidrogênio e um


de oxigênio. Encontra-se polimerizada, com moléculas unidas por pontes de
hidrogênio [(HzOjnj.
Devido à sua capacidade de solubilização de gases e de erosão dos
continentes, a água não se encontra pura na natureza, e sim como uma
dissolução aquosa de sais, gases e matéria orgânica. Praticamente todos os
elementos químicos encontram-se dissolvidos de uma forma ou de outra em águas
naturais, ainda que em baixas proporções.
Existem, basicamente, dois grupos de elementos químicos na água. O
primeiro, chamado conservativo, apresenta concentração estável ao longo do
tempo. Nesse grupo incluem-se o cloro e o sódio, que apresentam grande
importância ecológica por sua influência sobre a pressão osmótica e
equilíbrico iônico, resultando na classificação de organismos aquáticos em
função da tolerância a diferentes salinidades. Um segundo grupo de elementos,
não conservativos, apresenta concentração variável no tempo; estão ai
850 Hidrologia

incluídos o nitrogênio e o fósforo, nutrientes essenciais ao metabolismo e


limitantes do desenvolvimento dos organismos aquáticos.
Entre os gases dissolvidos na águà, os mais importantes são o oxigênio e
o gás carbônico. O 0 2 possibilita a respiração dos organismos aquáticos,
enquanto que 0 C 02, na água, forma ácido carbônico que se dissocia em duas
etapas:

C 0 2 + H20

H2C 0 3 = HCO5 + H+
II
C O f + H+

A matéria orgânica presente na água incrementa 0 metabolismo no meio


aquático com reflexo em suas propriedades físicas e bioquímicas.
Existem muitos outros elementos que, mesmo a baixas concentrações,
apresentam influência nos organismos presentes no meio aquático. Entre eles
estão o silício, ferro, manganês, cobre, zinco, mercúrio, cádmio e chumbo.
As águas naturais classificam-se em água marinhas e continentais. A
primeira ^caracteriza-se pela presença de cloreto de sódio e tem uma
composição íômca estável e quase uniforme, variando apenas a concentração
total de um local para outro. As águas continentais caracterizam-se pelo
bicarbonatojie cálcio e são muito heterogêneas. São chamadas águas doces por
apresentarem uma concentração salina muito baixa. Em certos locais, como
estuários, há uma mescla de água doce com marinha, formando a chamada água
salobra.
. Entre ^ áSuas continentais encontram-se os rios e lagos. Os rios, pela
declividade de seus leitos, apresentam um fluxo de água contínuo da nascente
até a foz. Em função das características de movimentação da água nos rios
(turbulência, quiescência, correntezas, baixas velocidades) estabelecem-se
comunidades aquáticas adaptadas àquele meio. Nos lagos, ao contrário, não há
um fluxo de água contínuo, uma vez que a água encontra-se em depressões
rechadas. A circulação da água nos lagos provém, principalmente, da ação do
vento na sua superfície. As comunidades aquáticas estão relacionadas com os
fatores abidticos existentes.

22J Os usos múltiplos dos recursos hídricos

Dentre 0s recursos naturais, um dos que apresenta os mais variados


gitimos e correntes usos, é indubitavelmente a água. Nos dias atuais em
nmçao dos progressos sociais e industriais que vem atravessando a
O Meio Ambiente e os Recursos Hídricos 851

humanidade, pode-se enumerar, entre outros, os seguintes usos múltiplos.

- abastecimento público;
- consumo industrial;
- matéria prima para a indústria;
- irrigação;
- recreação;
- dessedentaçao de animais;
- geração de energia elétrica;
- transporte;
- diluição de despejos, e
- preservação da flora e faxina (fonte proteíca).

Os quatro primeiro usos referidos exigem a retirada da água do


manancial, ao passo que nos demais não se observa tal necessidade. A diluição
de despejos, por outro lado, é prática que vem sendo abandonada, tendo em
vista as exigências atualmente vigentes na legislação ambiental no que se
refere à emissão de efluentes. Os usos apontados serão abordados
resumidamente a seguir, de acordo com suas particularidades.

223.1 Abastecimento público (doméstico)

Sem dúvida alguma é o uso mais nobre da água e se manifesta praticamente


em todas as atividades do homem: manutenção da vida (água para beber),
higiene pessoal e das habitações, combate a incêndios, entre outras.
Quando a água é consumida individualmente (pessoa ou família), em alguns
casos não sofre tratamento. Ainda assim, deve apresentar padrões mínimos de
higidez e palatabilidade, sem o que seu uso pode acarretar o aparecimento das
doenças de veiculação hídrica.
No caso de consumo coletivo, a regra é fornecer a comunidade um sistema
de abastecimento de água, que pressupõe a existência das seguintes unidades:
captação de água bruta (in natura), adução, tratamento, reservacão e
distribuição.
Na fase de tratamento (misturação, floculação, decantação, filtração e
desinfecçao), são removidas da água aquelas impurezas que podem comprometer,
ainda que indiretamente, a saúde humana. Destacam-se aqui os organismos
patogênicos, os metais pesados (tipo mercúrio, por exemplo) e algumas
características físicas como cor e turbidez, que se não comprometem do ponto
de vista químíco/biológico, podem tomar a água estéticamente repulsiva e
comprometida.
Em casos excepcionais, o tratamento tal como proposto, não condiciona a
água por completo, e a . potabilidade só pode ser alcançada por processos
avançados de tratamento.
Hidrologia

2 2 3 .2 Consumo industrial/m atéria prim a para indústrias

Nesse caso a água é utilizada dentro das seguintes condições:

a) participando do processo, mas não entrando em contato com a matéria prima


(refrigeração e água para caldeira);

b) integrando-se ao produto fabricado (produtos alimentícios e indústrias de


bebidas);

c) entrando em contato com a matéria prima ou produto final. Nessas


condições, o grau de pureza é bastante alto, podendo exigir a retirada de
substâncias, tipo íons metálicos e sais minerais, que interfiram na qualidade
e composição do produto final;

d) como elemento importante e participativo nos serviços complementares de


fábricas e indústrias (higiene de operários, limpeza de equipamentos, entre
outros).

2233 Irrigação/dessedentação de animais

Embora especial atenção deva ser dispensada aos aspectos biológicos e


tóxicos da água, a mesma é utilizada para a rega dos mais diversos tipos de
culturas (hortaliças, vegetais e frutos crus ou com casca). Há que se adotar
medidas preventivas para culturas irrigadas que utilizam água de procedência
duvidosa (cozimento, por exemplo).
No caso de dessentaçao de animais a qualidade da água deve ser avaliada
antes de distribuída para consumo. Pode ser necessário o tratamento antes do
consumo.

2 2 3 .4 Recreação

O uso da água para recreação pode ser classificado de duas formas


distintas.-a) contato direto ou primário (natação, surf), e b) contato
indireto ou secundário (esportes náuticos, pesca esportiva).
O contato direto impõe condições mais restritivas à qualidade da água-
esportes como a natação, por exemplo, oferecem risco à saúde humana, sé
detectados na água elementos como òleo e graxas, teores elevados de matéria
em suspensão e, pnncipalmente, organismos patogênicos e metais pesados.
Tanto os organismos patogênicos como os metais, não fazem parte natural do
meio aquático e a sua existência nesse meio sugere a contaminação de origem
fecal e de ongem mdustnal, respectivamente.
O contato secundário, embora menos restritivo, tem mostrado através de
O Meio Ambiente e os Recursos Hídricos 853

acidentes como o de MInamata, no Japao, onde significativa parcela da


população contaminou-se irreversivelmente pela ingestão de peixes,que haviam
acumulado mercúrio em seus tecidos, que também nesse tipo de uso deve haver
maior controle por parte das autoridades competentes. Felizmente, já se
dispõe no Brasil de legislação ambiental referente ao assunto (CONAMA, 1986).

22.3.5 Geração de energia elétrica

A energia hidráulica transformada em energia elétrica tem sido um dos


usos mais freqüentes dos recursos hídricos. As hidrelétricas utilizam
barragens para regularizar a vazão e criar o desnível necessário à produção
de energia. Essa barragem cria um lago a montante onde a profundidade aumenta
e a velocidade diminui. A qualidade da água represada pode produzir
estratifícação térmica que interfere na geração de gases e na formação de
algas, produzindo a degradação das condições do lago e do escoamento a
jusante da barragem.
As termelétricas utilizam também grandes volumes de água, para geração
de vapor e controle térmico das instalações. Entretanto, para uso nesse caso,
existem condições qualitativas particulares que devem ser preenchidas pela
áeua, a fim de não haver comprometimento dos equipamentos ícaso de
incmstações em tubulações, caldeiras e aparelhos, por exemplo). A descarga
da água utilizada nesse caso pode representar também no receptor final,
impacto ambiental relevante, especialmente de ordem térmica.

223.6 Transporte

A comunicação via aquática, no transporte de cargas e pessoas,


principalmente pelo custo elevado e escassez do petróleo, fará com que, já a
curto prazo", seja dada mais ênfase à navegação. - .
No Brasil, a grande coleção de águas existentes coloca a comunicação via
aquática como um potencial meio alternativo econômico de transporte, embora
em alguns casos haja a necessidade de implantação de obras (tipo eclusas)
para o desenvolvimento do mesmo.

223.7 Preservação de flora e fauna (fonte proteíca)

Qualquer dos tipos de usos da água observados anteriormente, deve


pressupor que a utilização dos mananciais não altere seus aspectos físicos,
químicos e bacteriológicos, de forma a impactar a biota aquática.
No ambiente aquático, as bactérias convertem a matéria org íca e
inorgânica, que é utilizada pelas algas para seu desenvolvimento; estas
alimentam os zooplanctons (protozoários, rotíferos e crustáceos), quç P0^ s
rumo alimentam os peixes. Estes evoluem em tamanho e servem de ímen o
854 Hidrologia

homem, sendo importante fonte proteíca.


Evídentemente, medidas mitigadoras de qualquer interferência importante
no ciclo referido devem ser previstas na fase que antecede os usos múltiplos
da água enfocados. Assim, assumem decisiva importância os Estudos e
Relatórios de Impacto Ambiental dos aproveitamentos dos recursos hídricos nos
seus múltiplos usos.

22.4 Aspectos de qualidade das águas associados aos usos

Por centenas de anos, apenas os sentidos da visão, sabor e olfato eram


determinantes na avaliação da qualidade da água. Com a evolução das técnicas
de detecção e medidas de poluentes, foram estabelecidos padrões de qualidade
para a água, isto é, a máxima concentração de elementos ou compostos que
poderíam estar presentes na água, de modo a ser compatível com a sua
utilização para determinadas finalidades. Assim, foram estabelecidos padrões
de qualidade de água para usos como abastecimento público e industrial,
preservação da vida aquática, irrigação, recreação, agricultura, navegação e
paisagismo. Esses padrões foram estabelecidos, usualmente a partir de
experimentos realizados em centros de pesquisa de países desenvolvidos.
No Brasil, o Conselho Nacional de Meio Ambiente estabelece uma
classificação das águas do território nacional em doces, salobras e saunas
e, para cada uma, classes, segundo os usos predominantes. Existem cinco
classes para águas doces, duas para salinas e duas pala salobras.
Uma vez definidos os usos da água em um manancial, estará definida a sua
classe e também a qualidade que a água desse manancial deverá representar.
Por, exemplo, considerando o caso de um rio (água doce) onde a água á
utilizada para abastecimento público, após tratamento convencional da água,
recreação e irrigação de hortaliças. Pela legislação brasileira (ÇONAMA,
1986) esse manancial é de classe 2 e deve obedecer, no mínimo, as seguintes
condições (entre outras):

concentração de oxigênio dissolvido superior a 5,0 mg/1;


- coliformes fecais até 1000 organismos para cada 100 ml de amostra;
- demanda bioquímica de oxigênio até 5,0 mg/1;
- mercúrio até 0,002 mg/1 e
- cianetos até 0,2 mg/1 CN.

Caso a qualidade da água não apresente as condições especificadas,


medidas de controle da poluição devem ser adotadas. O enfoque dado na
egis ação brasileira de controle da qualidade da água baseia-se em usos da
água e correspondente limite aceitável de poluição. Como esses limites foram
estabelecidos normalmente em países de condições ambientais diversas do
SSO, podem ocorrer avaliações equivocadas, em certos casos. Por exemplo, em
0 Meio Ambiente e os Recursos Hídricos 855

relação à preservação da vida aquática, poderão - existir, em determinado


local, espécies adaptadas a um meio natural onde à concentração de um
elemento não lhe é tóxica, mas sim a organismos presentes em mananciais de
outras regiões, onde os padrões foram estabelecidos.

22.5 Poluição das águas

22.5.1 Fontes de poluição

A exploração da natureza pelo homem afeta toda a biosfera, alterando o


equilíbrio existente. Especificamente, em relação às águas, muitas são as
atividades que causam poluição. O termo poluição pode ser definido como
alteração nas características físicas, químicas ou biológicas de águas
naturais decorrentes de atividades humanas. Apresenta-se, a seguir, algumas
fontes de poluição que têm assumido importância significativa nos dias
atuais.

Esgotos sanitários

Compreendem as águas servidas, utilizadas para higiene pessoal, cocção


de alimentos e lavagem de utensílios. Originam-se em prédios residenciais,
comerciais, administrativos, hospitalares e industriais.
Os esgotos sanitários apresentam uma composição praticamente uniforme,
que é constituída, primeiramente, por matéria organica biodegradável,
mícrorganismos (bactérias, vírus, etc.), nutrientes (nitrogênio, fósforo),
óleos, graxas e detergentes. Na tabela 22.1 são apresentadas as
características do esgoto sanitário de Porto Alegre, RS,

Águas residuárias industriais

As águas residuárias industriais apresentam uma variação muito grande


tanto na sua composição como na vazão, refletindo seus processos de produção.
Originam-se em três pontos (já referidas anteriormente):

a) águas de processo: águas que têm contato com a matéria-prima do produto


processado;
b) águas de refrigeração: usadas para resfriamento e
c) águas sanitárias: efluente de banheiros e cozinhas.

A rápida e diversificada expansão industrial após a 2a Guerra Mundial


introduziu no ambiente substâncias tóxicas a baixas concentrações, como
hidrocarbonetos aromáticos, metais pesados e substâncias radioativas. Na
856
Hidrologia

tabela 22.2 apresentá-se a caracterização de águas residuárias de alguns


ramos industriais.-.

Resíduos sólidos

Os ^ resíduos sólidos são os rejeitos originados de atividades


industriais, hospitalares e agricultura. A composição do lixo depende de
fatores como nível educacional, poder aquisitivo, hábitos e costumes da
população. A tabela 22.3 apresenta a composição do lixo de São Paulo.

Tabela 22.1. Caracterização do esgoto sanitário de Porto Alegre RS


(DMAE 1973, 1983).
MEDIDA UNIDADE CONCENTRAÇÃO
FÍSICAS
PH - 6,9
Sólidos Seimentáveis mg/1 4,0
Sólídos totais mg/1 464.0
Sólidos Suspensos mg/1 174.0
Sólidos Dissolvidos mg/1 290.0

INORGÂNICAS
Nitrogênio total mg/1 . 37,14
Fósforo mg/1 12,13

ORGÂNICAS
DBO mg/1 284
DQO mg/1 442
Óleos e graxas mg/1 48
MBAS mg/1 2,52

BIOLÓGICAS
Coliformes totais NMP/lOOml 5,6x107
Coliformes fecais NMP/lOOml ' 1,6x 107

METAIS
Cádmio MG/L and a 0,04
Chumbo mg/1 ND a < 0,1
Cobre mg/1 ND a 0,060
Cromo mg/1 ND a 0,045
Zinco mg/1
-------------- - ND a 0,29
0 Meio Ambiente e os Recursos Hídricos 857

Tabela 22.2. Caracterização de águas residuárias de alguns


ramos industriais
RAMOS INDUSTRIAL POLUENTES MAIS SIGNIFICATIVOS
Curtumes Material em suspensão, matéria orgânica,
sulfetos e cromo.

Têxtil Ácidos e álcalis, cor, material em


suspensão, óleos e graxas;

Óleos vegetais Matéria orgânica, nutrientes, material


suspensão, óleos e graxas;

Matadouro/Frigorífíco Material em suspensão, nutrientes, matéria


orgânica, cor e microrganismos;

Galvanoplastia Metais pesados, cianetos, acidez., material


em suspensão e dissolvido;

Siderurgia Acidez, metais pesados, fenóis, óleos e


graxas.

Tabela 22.3. Composição do íixo de São Paulo, 1979 (Lima, L987)


COMPONENTE % EM PESO
Matéria Orgânica putrecível 37,80
Papel e papelão 29,60
Metal ferroso 5,4
Trapo, couro, borracha 2,20
Plástico fino e grosso 9,00
Vidro, terra e pedra 14,60
Madeira 0,80
Metal não-ferroso 0,10
Diversos 0,50

A decomposição do lixo produz um líquido altamente poluído e


contaminado, o chamado chorume. Em caso de má disposição dos rejeitos, o
chorume atinge os mananciais subterrâneos e superficiais. Esse líquido contém
concentração de material orgânico equivalente a 30 a 100 vezes o esgoto
sanitário, além de microrganismos patogênicos e metais pesados.
858 Hidrologia

Águas de drenagem urbana:

As águas pluviais têm um efeito de lavagem sobre o solo, conduzindo, aos


cursos de água, impurezas e detritos encontrados em ruas e pavimentos. Os
primeiros quinze minutos, especialmente, são uma série fonte de poluição.
Na tabela 22.4 são apresentados valores médios da concentração da vazão
de drenagem pluvial de uma bacia urbana do centro de Porto Alegre, RS.

Tabela 22.4. Qualidade da água de drenagem pluvial em Porto Alegre


(Ide, 1984)
MEDIDA UNIDADE CONCENTRAÇÃO
pH - 7,2
Sólidos totais mg/l 1523
Sólidos Suspensos mg/1 1395
Sólidos Sedimentáveis mg/l 36,4
Fosfato mg/1 0,347
Amônia mg/l 1,0
DBO mg/1 31,8
DQO mg/1 176
Colíformes Fecais NMP/100 ml U x lO 7
Ferro mg/1 30,33
Zinco mg/1 0,77
Chumbo mg/1 0,19

Fontes acidentais

As fontes acidentais abrangem as situações em que não há um despejo


contínuo de poluentes no ambiente. Incluem-se aí, acidentes ocorridos em
depósitos^ de produtos perigosos, derramamento de òleo por vários petroleiros
e explosões de caráter radioativo como em Chemobyl. Apresentam um efeito
catastrófico para o ambiente, já que são lançados sem controle, em grande
quantidade e de maneira concentrada. A recuperação do ambiente pode levar
muitos anos.
O transporte de material tóxico por navegação, rodovias e ferrovias é
também um exemplo típico de risco potencial ao meio ambiente.

Fontes atmosféricas

A queima de combustíveis fósseis emite para a atmosfera óxidos de


enxofre e nitrogênio, onde são oxidados para ácidos sulfúrico e nítrico e/ou
convertidos em aerossóis de sulfato e nitrato. Esses compostos retomam ao
O Meio Ambiente e os Recursos Hídricos 859

solo/água sob a forma de chuvas ácidas. Há evidências de acidificação de


águas superficiais em decorrência desse fenômeno, com possibilidades de
solubilização de metais pesados presentes nos solos e sedimentos de lagos.
Outros efeitos decorrentes da poluição do ar pela emissão, por exemplo,
dos aerossóis, têm sido pesquisados. Decorrem dessas emissões as aberturas na
camada de ozônio e efeito estufa, este com implicações no regime hidrológico
das águas continentais e marinhas.

22.5.2 Aspectos físicos, químicos e biológicos da poluição

Várias características físicas, químicas e biológicas podem ser


consideradas importantes no meio aquático. A condição do meio ambiente
aquático é identificada por essas características, denominadas muitas vezes
de parâmetros ambientais ou de qualidade de água.

Tem peratura

Pode ser considerada a característica mais importante do meio aquático.


A temperatura caracteriza grande parte dos outros parâmetros físicos da água
tais como a densidade, viscosidade, pressão de vapor e solubilidade dos gases
dissolvidos.
A temperatura influencia, por exemplo na operação das ETAs (estação de
tratamento de água), nas unidades de foculação/sedimentação, deposição de
Iodos e estxatifícação térmica em reservatórios e diminuição da solubilidade
do oxigênio.
O efeito da temperatura sobre as características químicas da água,
decorre da influência que' a mesma exerce sobre as reações químicas. À
velocidade da reação química duplica para cada 10°C de aumento da
temperatura, acelerando as reações que se relacionam com a atividade
microbiana (reações bioquímicas). A temperatura é um dos fatores que governam
a existência e interdependência dos organismos e espécies aquáticas
(bactérias, peixes, algas e plantas aquáticas, entre outros). O seu efeito
não pode ser considerado isoladamente de outros fatores ambientais.

Oxigênio dissolvido

A quantidade de oxigênio dissolvido na água é um índice expressivo de


sua qualidade sanitária. Aguas superficiais de boa qualidade devem estar
saturadas de oxigênio. Uma água saturada pode ou não estar poluída, mas a
saturação indicará que não está contaminada por matéria oxidável.
A concentração de oxigênio diminui com o aumento da temperatura. Varia
de 15,62 mg/1 a 0°C para concentrações nulas de cloreto a 6,13 mg/I a 30°C,
860
Hidrologia

para concentrações de cloreto da ordem de 20000 mg/1.

PH

O pH é o logaritmo negativo da concentração de íons hidrogênio expressa


em moles por litro:

1
pH = l o g -----
[H+]

Seu valor varia de 0 a 14. Soluções com pH menor que 7 chamam-se ácidas;
soluções com pH maior que 7 chamam-se alcalinas. Quando o pH for igual a 7 á
água é denominada de neutra.
Esse parâmetro é importante para praticamente todas as áreas da
engenharia sanitária;

o nível de pH indica o tipo de água que exerce efeito corrosivo sobre


tubulações e equipamentos de sistemas de água e esgoto;
' na coagulaçãc química e sedimentação em estações de tratamento
de água;
os processos biológicos ou químicos de estações de tratamento de
esgotos se desenvolvem de acordo com o nível desse parâmetro;
pode-se identificar a toxidez de certos compostos (com metais
pesados), em relação à vida aquática, ern particular os peixes, e
- mdustrialmente, tem faixas apropriadas para utilização em cada tipo
de indústria.

Cloretos

Os cloretos ocorrem em todas as águas naturais e podem ser resultado do


contato da água cora depósitos minerais e cora a água do mar, a poluição por
esgotos (domésticos e industriais) ou ao retomo de águas utilizadas em
irrigação agrícola.
Em geral, quantidades razoáveis não são prejudiciais à saúde, mas
transmitem à água sabor salgado, repulsivo. Podem servir também, no caso de
águas doces, como indicadores de contaminação por esgotos. Embora possa ser
fítotdxico para algumas frutas, os usos agrícolas de água com concentrações
ü rig td S men° reS ^ 100 mg/1 n3° PreJudicam era princípio as culturas
O uso industrial de águas com cloretos está relacionado com o processo

p ic e s r SegUmtóS dem° nStram ° S llmÍteS dC P ™ alguns


0 Meio Ambiente e os Recursos Hídricos 861

- fabricação de açúcar: 20 mg/1;


- fabricação de papel: 75 mg/1;
- bebidas carbonatadas: 250 mg/1 e
- limpeza de equipamentos de processamento de alimentos. 250 mg/1.

Óleos e graxas

Norm^lmente estão presentes nas águas como emulsão de despejos


industriais ou similares, embora a decomposição do plâncton ou de formas
superiores da vida aquática possam originá-lo. Geralmente, são insolúveis em
água, mas podem aparecer emulsionados por detergentes, álcalis ou outras
substâncias químicas. Quando lançados no mar ou outro corpo receptor,
bloqueiam a fonte de oxigênio, prejudicando o ambiente aquático que passa a
sofrer alterações em sua fauna, flora e demais características físicas,
químicas e biológicas.

Detergentes

A denominação atual para os detergentes é surfactantes, que representa a


condensação de agente ativo em superfícies. São amplamente empregados nas
atividades domésticas e industriais. Constituídos por moléculas orgânicas com
propriedade de formar espuma muito estável e difícil de ser quebrada,
representam sérios problemas nas ETAs e ETEs (Estações de Tratamento de
Esgoto).
O tipo mais comum é o ABS (aiquii-benzeno-sulfonado), detergente
sintético, resistente à ação biológica. Teve seu uso substituído nos países
avançados pelo LAS (alquil-sulfonado-linear), que é bio-degradável.

Pesticidas

Os pesticidas são utilizados principalmente na agricultura, sendo fonte


de poluição e toxidez à vida aquática. São elementos químicos empregados no
combate às pragas e podem ser classificados segundo seu uso biológico em
inseticidas, larvícidas, ovicidas, formicidas, bermicidas, carrapaticidas c
herbicidas, entre outros.
A poluição das águas pelos pesticidas pode ocorrer de forma direta e
indireta. Na primeira forma, pode-se enquadrar o combate às larvas, por
exemplo, quando um larvicida é introduzido diretamente na água. A forma
indireta é a mais usual; o pesticida usado na agricultura atinge o solo e é
carregado pelas águas de chuva para os riachos, rios, lagoas e mares.
De um modo gerai, os pesticidas inorgânicos são tóxicos às plantas, ao
homem e aos insetos. Os pesticidas clorados, não biodegradáveis, são os mais
persistentes no meio ambiente. Os organofosforados, embora mais tóxicos, são
862

í n U^ erS1SteiUe^ (faciImente hidrolisáveis), permanecendo no solo e na água


no máximo por algumas semanas. g

Substâncias tóxicas e carcinogênicas

Enquadram-se nessa classificação um significativo número de substâncias


produtos „„ radieis químicos que podem aparece, „a ígua de ôrigeas d v" L
Enumera-se , segui, alguns desses elementos com se u s r c s p c c " / o s J i Z

- Arsênio: ingestão de 100 mg envenena seriamente o organismo É


carcinogêmco; s
- Bário: 550 a 600 mg são fatais ao homem. Causa bloqueio nervoso ou
aumento da pressão sanguínea por vasoconstrição*
- Cádmio: altamente tóxico, pode determinar a hipertensão arterial
anemia, retardamento de crescimento e morte1
- Cromo: quando inspirado causa câncer. Na água, o cromo trivalente
S H 2 í í m S SígIf Cad0 S,anitári0- 0 hexavalente, em concentrações
de até 11 mg^ pode ser tolerado pelo homem por vários anos-
' Ih X P°r dÍa nã° Sã0 Prejudiciais. Na água potável o
limite aceitável nao deve exceder 0,2 mg/I-
Fluoretos: ate 1,0 mg/1, protege os dentes. Entre 8-20 mg/1 causa a
fluorose dental e deform.çifo dos ossos. Doses excesstvas ie“ m
morte em uma sò dose; m
' temDob°Á ^erfefe*t0 cumu|advo’ pode ser letal sc ingerido por muito
elementof ^ apresentam 0,01 mg/1 ou menos desse

Íí tÓXÍC° Para h° menS £ animais ern concentrações acima de 0 01


- Z t * “ ! f “d a * « * • < * « * . . * c L i n o . ^ 0 e '
(c o lo c o = rL T o sa s). " * * * “

22.6 Monitoramento de qualidade da água

série ^ T c o m J o s to s T g S ^ d L L ^ ^ 3 “° ambÍCnte aquá£ico>uraa


difusão, transformações químicas e microb^M *SUa concentraÇão: dispersão,
transferidas: a) m ia . atmosfera d dgIf a5' As substâncias podem ser
solução e subseqüente deposição "da ^ a ^ T 0 ^ ^ sedimentos-
acumulação de produtos químicL no tecfdTrfn 3 5 ° ^ ntacrobiota, via
sempre um poluente lançado na áeua é nela h ° r^ an ‘Sm° S' D essa fo rm a. nem
se nos sedimentos^ material^biotógiel ’ P° dend° * 3

ter os t e S t e s ^ e t í v o r 3 * * * ** m°nit0ramento da qualidade da água pode


0 Meio Ambiente e os Recursos Hídricos 863

- avaliação da qualidade da água para determinar sua adequabilidade


para os usos propostos (ex.: abastecimento público, recreação,
irrigação);
- acompanhar a evolução da qualidade do manancial ao longo do tempo,
como reflexo do uso do solo da bacia e de medidas de controle da
poluição adotadas;
- avaliação do ambiente aquático como um todo, considerando, além da
água, sedimentos e material biológico.

Em função dos objetivos serão determinados a localização dos pontos de


amostragem, o material a ser coletado (água, sedimentos, material biológico),
parâmetros a serem analisados, período e freqüência de amostragem.
As amostras devem ser coletadas juntamente com informações hidrológicas
de vazão, nível de água e velocidades de modo a possibilitar a estimativa de
cargas, balanço de massas e entradas para modelos de qualidade de água.
Os pontos de coleta de água em uma rede de monitoramento são
estabelecidos principalmente para verificar o impacto que fontes de poluição
apresentam sobre a água, ou se sua qualidade é adequada ao uso pretendido.
Por isto, é normal a escolha de um ponto branco, isto é, um local que não
sofreu impacto de atividades humanas. Na figura 22.1 apresenta-se um exemplo
de locais ce monitoramento de um rio em cuja área de drenagem encontram-se
diversos usos.
A amostra deve ser representativa da água que se está amostrando. Elas
poderão ser simples, compostas ou integradas. Amostras simples são utilizadas
quando a água apresenta uma composição constante ao longo da seção
transversal e do tempo. São coletados no meio da seção, a meia profundidade.
Quando houver uma variação acentuada das características da água na seção
transversal de um rio, utiliza-se amostragem integrada. Essa amostra é uma
mistura de coletas simples feitas da superfície ao fundo e ao longo da seção.
Amostras compostas são utilizadas quando houver variação na concentração de
poluentes ao longo do tempo, em uma mistura proporcional à razão de amostras
simples coletadas num mesmo ponto ao longo de um determinado período ( por
exemplo 24 horas).
Os métodos de amostragem poderão ser manuais ou automáticos. Este último
método utiliza equipamentos especialmente projetados, dispensando a presença
constante de um operador para as coletas de amostras.
A coleta de amostras em lagos e reservatórios dependerá muito das
condições locais, uma vez que há muitas variações naturais devido a fenômenos
de estratificação térmica, ação dos ventos e chuvas. Em poços, antes da
coleta deve haver bombeamento suficiente para assegurar que a coleta seja
representativa da água subterrânea amostrada.
Existe um intervalo de tempo entre a coleta de amostras e a realização
das análises feitas em laboratório. Nesse intervalo de tempo ocorrem mudanças
864
Hidrologia

químicas e biológicas na água. Para retardar essas mudanças faz-se a


preservação das amostras- Os métodos de preservação utilizados são controle
de pH, adição química, refrigeração e congelamento. Dessa forma é possível:
a) retardar a ação biológica; c) retardar a hidrólise dos complexos e
compostos químicos; c) reduzir a volatilidade de constituintes e d) reduzir
efeitos de absorção na superfície do recipiente amostrador.

(1) Ponto branco


(2) Captação de água para abastecimento público
(3) Zona rural, nascentes
(4) Zona de recreação
(5) Captação de água para abastecimento industrial
(6) Ponto a jusante de lançamento industrial
(7) Captação de água para irrigação
(8) Foz do rio

Figura 22.1. Locais de monitoramento - rios (WHO,1978)


O Meio Ambiente e os Recursos Hídricos 865

Uma preservação completa não é possível e por isso existe um prazo


máximo de tempo em que a análise deve ser feita, variável em função da
determinação. Poderão ser desde 48 horas como DBO até 6 meses para metais
pesados. Entretanto, tanto menor o intervalo de tempo entre coleta e análise,
mais confiável será o resultado.
Além da água, o monitoramento poderá abranger sedimentos e material
biológico. Muitos poluentes agregam-se em partículas suspensas na água que
depositam-se no leito do rios. A coleta de sedimentos é feita com
equipamentos especiais, como as dragas de Ekman ou Peterson.
A avaliação da qualidade do ambiente aquático através de material
biológico é muito representativo das condições existentes. A avaliação poderá
ser feita pela coleta de amostras e análise de poluentes presentes nos
organismos, em laboratório (por exemplo, metais pesados). Outro método seria
expor um determinado organismo à água no trecho que se deseja examinar
observando o seu comportamento ao longo do tempo.
A avaliação do grau de poluição do ambiente pode ser feito através de
bioindicadores. Schafer (1985) analisou diversos métodos: sistemas de
sapróbios, déficit de espécies, índice de diversidade, índice de similaridade
e índice do grau de autopurificação. Baseiam-se no fato de que a-poluição
modifica a presença e a dominãncia de organismos aquáticos em relação a um
ambiente não afeiàdo pela poluição.
Em relação à água, a avaliação poderá ser feita pela composição dos
resultados obtidos com os padrões de qualidade estabelecidos para a classe em
que está enquadrado o manancial. Outro método que vem tendo aplicação
crescente é o da utilização de índices de qualidade da água. Apresenta a
vantagem de fácil entendimento para um público leigo, mas interessado em
conhecer o grau de poluição de mananciais utilizados na comunidade em que
vive. Muitos índices de qualidade da água têm sido desenvolvidos. Ele se
apresenta como um número graduado de 0 a 100, representativo da qualidade da
água amostrada. É obtido a partir dos parâmetros mais representativos para a
qualidade da água com seus respectivos pesos relativos. No desenvolvimento do
índice, os parâmetros e pesos foram estabelecidos a partir de consultas a
especialistas no assunto.
Um exemplo de índice de qualidade da água é o proposto pela National
Sanitation Foundation (NSF) dos Estados Unidos. Apresenta-se como uma
formulação geométrica do seguinte tipo:

i=l

onde, IQA .= índice de qualidade da água, número de 0 a 100; n - número de


866 Hidrologia

parâmetros; qi ~ qualidade da água para o i parâmetro; wj = peso atribuído


para o parâmetro i.
Os parâmetros adotados são oxigênio dissolvido (% de saturação),
coliformes fecais, pH, DBO, nitratos, fosfatos, temperatura, turbidez e
sólidos totais.

22.7 Planejamento ambiental

22.7,1 Tratamento de águas residuárias

Aspectos quantitativos e qualitativos dos esgotos

A reunião de várias formas de despejos constitui o que se convencionou


denominar esgoto sanitário. Esses despejos têm sua origem nas mais diversas
fontes, e podem ser agrupados em quatro grandes tópicos, quais sejam:

a) esgotos domésticos: efluentes de residências;


b) esgotos provenientes da área comercial: restaurantes, bares, hotéis;
c) esgotos provenientes da atividade industrial: provenientes dos mais
diversos tipos de indústrias, deimo de imensa faixa de variação, não serão
abordados neste livro, que dará ênfase a esgotos domésticos, e
d) esgotos provenientes da atividade pública: apresentando características
domésticas, mas gerados em escolas, hospitais e em instituições de caráter
público.

O volume de esgotos gerados em uma comunidade depende do volume


produzido de água. Para fins de estudos de concepção e projetos técnicos,
adota-se como parâmetro de projeto um volume de esgotos igual a 80% do volume
de água produzido para a comunidade em estudo. Incorpora-se a esse volume
aquele ^gerado pelas infiltrações em rede, contribuições pluviais
parasitárias, vazões industriais, entre outras. Dependendo dos comprimentos
de rede, pelos volumes adicionais referidos, o volume de esgotos pode superar
o volume de água produzido.
Qualitativamente, os esgotos domésticos são formados por cerca de 99,9 %
de água e 0,1% de impurezas físicas, químicas e biológicas. Dentre as de
natureza física, pode-se referir as partículas insolúveis ou sólidas, em
suspensão no meio líquido; nas de natureza química, enquadram-se as
substâncias orgânicas (proteínas, gorduras, hídratos, fenóis) e inorgânicas
(nitrogênio, fósforo, enxofre, metais pesados,entre outros); nas de natureza
biológica, situam-se as bactérias, vírus, leveduras, vermes e protozoários.
0 Meio Ambiente e os Recursos Hídricos 867

Tratam ento de esgotos

Os esgotos são tratados por duas razões fundamentais: proteção da saúde


pública e preservação do meio ambiente.
Explicam a primeira razão arrolada, a redução do índice de mortalidade
infantil e elevação da expectativa de vida, por exemplo, que somente podem
ser pretendidas pela correta disposição e tratamento de esgotos. A segunda
circunstância justifíca-se pela ação deletéria que a matéria orgânica,
detergentes, defensivos agrícolas lançados nos corpos de água, exercem sobre
peixes e outros organismos aquáticos.
Assim é que o objetivo principal do tratamento dos esgotos, é a remoção
da água das impurezas físicas, químicas e biológicas, principalmente os
organismos patogênicos. O tratamento pode ser classificado em função das
impurezas a retirar e do grau de remoção desejada. Resultam, assim:

Tratam ento prelim inar: destinado à remoção de sólidos grosseiros como trapos,
escovas de dentes, tocos de cigarro, excretas, areia e gordura;

Tratam ento prim ário: destinado à remoção do material em suspensão, não


grosseiro, que flutue ou sedimente, mas que requer o emprego de equipamentos
com tempo de retenção maior que no tratamento preliminar, tipo decantadores
ou flotadores, os quais produzem o lodo primário que deve ser tratado antes
de sua disposição;

Tratam ento secundário: destinado à remoção de sólidos dissolvidos e finos


sólidos suspensos que não sedimentam. Esse material não pode ser removido por
gravidade; há a necessidade de se fornecer condições favoráveis à
proliferação de microrganismos na massa líquida, de forma que essa biota,
alimentando-se da matéria orgânica suspensa ou solúvel, transforme-a em sais
minerais e novos microrganismos. À massa biológica dá-se o nome de lodo
secundário ou biológico, que pode ser separado do líquido ou mantido no
processo por um determinado período de tempo, após o qual é descartado. Dessa
forma, o tratamento secundário transforma a matéria solúvel do esgoto em
matéria orgânica insolúvel (microrganismos). Os microrganismos mais
importantes do esgoto são as bactérias; assim, o tratamento biológico
consiste em fornecer condições apropriadas ao desenvolvimento dessas
bactérias, para que as mesmas utilizem o esgoto da forma mais adequada.
Quando a energia necessária às bactérias é obtida através da oxidação dâ
matéria orgânica, com a utilização do oxigênio na respiração, as mesmas são
ditas aeróbia. Já quando as bactérias não precisam do oxigênio para respirar,
são chamadas anaeróbias. Finaimente, quando as bactérias têm a propriedade de
utilizar o oxigênio, se presente (portanío, aeróbias), e fermentar
anaerobicamente na sua ausência, são ditas facultativas,
868
Hidrologia

Pode-se classificar, então, o tratamento biológico de esgotos em aeróbio


(com fornecimento de oxigênio ao sistema), anaeróbio (oxigênio ausente), e
facultativo, se no mesmo tratamento existirem regiões aeróbias e anaeróbias.
O lodo gerado pelo tratamento secundário precisa ser convenientemente
acondicionado. Em alguns casos, essa operação pode ser mais dispendiosa do
que o próprio tratamento.

Tratam ento terciário ou avançado: é utilizado quando se deseja dar um


polimento final ao líquido tratado, removendo nutrientes (sais de nitrogênio
e fósforo), organismos patogênicos e metais pesados. Embora com uso
consagrado em alguns países desenvolvidos, ainda é reduzido este tipo de
tratamento no Brasil, onde boa parcela da população ainda não usufrui de
qualquer tipo de saneamento.

22.7.2 Medidas preventivas de preservação dos recursos m u i 1CU3

A qualidade de água de mananciais que compõem uma bacia hidrográfica


está relacionada com o uso do solo na bacia e com o grau de controle sobre as
fontes de poluição.
O controle sobre as fontes de poluição se dá basicamente através do
tratamento de águas residuárias sanitárias e industriais. Existe tecnologia
disponível e sua implantação depende da disponibilidade financeira para a
implantação das obras de engenharia. Entretanto, as alterações na qualidade
da água estão diretamente relacionadas com as alterações que ocorrem na bacia
hidrográfica, como vegetação e solo. Assim, um programa de controle de
poluição das águas deve necessariamente, contemplar um planejamento
temtorial na bacia hidrográfica.
Analisando-se características como clima, cobertura vegetal, geologia,
topografia, drenagem, tipo de solo, pode-se chegar a um zoneamento adequado
de usos do solo na bacia. Dessa maneira, seriam determinadas áreas de
preservação de mananciais, reservas florestais, áreas agrícolas, distritos
industriais, áreas de expansão urbana, enfim o uso do solo obedecería as
características naturais da bacia hidrográfica. O planejamento territorial
associado a outras medidas de caráter preventivo é um instrumento eficaz e
ae baixo custo para controle de poluição.
Outras medidas eficientes podem ser adotadas, basicamente através da
educaçao e acesso a informações. Entre elas estão o emprego de técnicas
adequadas de manejo do solo, o que diminuiría a erosão. Também a
racionalizaçao do uso de agrotóxicos e fertilizantes, aplicados em uma
quantidade muito supenor a necessidade. Pesquisa desenvolvida nos Estados
Umdos avaliou que somente 0,1 % dos agrotóxicos lançados, atingem a praga
para a qual foi utilizado (Younos e Weighann, 1988).
A reutilização do lixo é um outro método para diminuir a utilização de
0 Meio Ambiente e os Recursos Hídricos 869

recursos naturais e a poluição das águas, havendo ainda uma vantagem


econômica. Papéis, metais, plásticos são reaproveitáveis e urn composto
orgânico útil pode ser obtido para aplicação agrícola. A disposição final de
resíduos deve ser feita em locais adequados, impermeáveis para evitar
contaminação de aqüíferos. O desconhecimento de características geológicas
pode conduzir, por exemplo, a localização de depósitos de produtos tóxicos em
área de recarga de aqüíferos artesianos, comprometendo-os por muitos anos.
Uma expansão urbana desordenada poderá causar impermeabilização
progressiva do solo, resultando em aumentos do escoamento superficial e
transbordamentos de riachos e córregos urbanos, normalmente bastante
poluídos. Medidas preventivas como ordenar o crescimento urbano para áreas
menos críticas, execução de pavimentos, com materiais permeáveis, construção
de bacias de retenção, implantação de áreas e proteção são úteis para
prevenção desse problema.
Outro aspecto importante no planejamento territorial é a proteção das
áreas marginais aos cursos de água, normalmente sujeitas a inundações
periódicas. Essas áreas devem ser protegidas da ocupação urbana através do
zoneamento da mesma.

22.73 Aspectos polítíco-administrativos do controle da poluição das águas

Algumas características específicas do homem têm causado grande impacto


sobre o meio ambiente. Entre elas, a necessidade de energia externa ao seu
metabolismo, para utilização na produção de bens, transporte e aquecimento de
ambientes.

O crescimento demográfico reflete-se numa maior necessidade de produção


de alimentos, com a incorporação de novas áreas agrícolas. Para o ambiente,
esta ação desenvolvida pelo homem tem-se traduzido numa ruptura do equilíbrio
ecológico, com a redução do índice de diversidade das comunidades, pela morte
de espécies e favorecimento de outras.
A partir da conscientização do homem de que o modelo de desenvolvimento
até aqui praticado tem causado grande devastação, há um esforço,^ atualmente,
no sentido da conservação, isto é, atitudes que evitem a degradação excessiva
de ecossistemas. A preocupação e interesse da sociedade brasileira com a
preservação do meio ambiente está refletida tanto na Constituição e e
como nas constituições estaduais. Em todas, há itens _específicos referentes
ao meio ambiente em geral e recursos hídricos em particular.
Os problemas de poluição dos recursos hídricos não se limitam ao esp Ç
físico de um município ou mesmo estado e país. Programas de controle
poluição são mais eficientes, quando desenvolvidos num contexto region ,
nível de bacias hidrográficas. . ,
Sendo as disponibilidades hídricas limitadas e existindo um vanauo
870 Hidrologia

número de interesses, na sua utilização, é natural a ocorrência de conflitos


no uso da água. Esses conflitos apresentam-se tanto do ponto de vista
quantitativo como qualitativo-. Assim, usuários da água para irrigação de
culturas entram em conflito com usuários para abastecimento público;
indústrias que utilizam um manancial para diluição de despejos têm conflitos
com o órgão de-saneamento; empresa de energia elétrica entra em conflito com
orgão ambiental, pelo impacto devido à construção de uma hidrelétrica. Muitos
outros exemplos poderíam ser citados.
Para administrar esses conflitos, toma-se importante a existência de um
sistema de gerenciamento de recursos hídricos. Participam desse sistema
entidades públicas, privadas e comunitárias com interesses no uso e
preservação dos recursos hídricos. O sistema estabelece as metas de qualidade
da água e os critérios para utilização da água, atuando no sentido de se
atingir os objetivos e administrar os conflitos. Em nível mundial, este tem
sido o modelo adotado por vários países, com uma estrutura institucional
refletindo as condições geográficas e políticas próprias de cada um.

22.8 Sistematização para avaliação de impactos ambientais

O conteúdo apresentado a seguir, é um cojunto de diretrizes que podem


ser utilizadas para o desenvolvimento de um Estudo ne impacto Ambiental
decorrente de obras dc irrigação e drenagem.
. - Conforme postula a Resolução CONAMA n.001/86, um projeto de sistema dc
irrigação e drenagem deve ser precedido de um EIA (Estudo de Impacto
Ambiental), de forma que a sociedade em geral e não somente a população
atmgida, possa ter noção exata da repercurssão ambiental que a obra e suas
unidades constituintes irão causar (entenda-se o ambiental abrangendo os
meios físico, biótico e socioeconômico).
Lamentavelmente* o que se tem visto são vários volumes de relatórios,
que reproduzem um grande número de dados (aspectos quantitativos), sem
tomecer a interpretação qualitativa desses dados, que é a real expectativa
aos órgãos ambientais físcalizadores.
A elaboração de um EIA podería passar pelas seguintes etapas, com suas
respectivas subetapas:

Etapa I - Diagnóstico ambiental;


1.1 * Meio Físico
1.2 - Meio Biótico
1.3 - Meio Socioeconômico e Cultural.
Etapa n - Prognóstico ambiental (evolução do meio-ambiente)
II.l - Impactos ambientais sem o empreendimento
n, íí'? ' J tmPacl°s ambientais com o empreendimento
etapa III - Plano de controle ambiental
0 Meio Ambiente e os Recursos Hídricos 871

III. 1 - Programas referidos ao Meio Físico


III.2 - Programas referidos ao Meio Biótico
I I I 3 . Programas referidos ao Meio Socioeconômico e'cultural.

Exemplo 22.1 - Considere um sistema de irrigação e drenagem destinado à


cultura do arroz, este tipo de sistema utiliza grande quantidade de água^e
freqüentemente exige um barramento a montante no manancial para regularização
da vazão. A seguir é apresentado os tópicos básicos utilizados no
desenvolvimento do EIA de um projeto deste tipo que envolve o perímetro de
irrigação e a barragem de regularização.

Etapa I - Diagnóstico Ambiental


LI - Meio Físico

Áreas direta e indiretamente afetadas -No exemplo em questão, a área


diretamente afetada pode ser definida como sendo aquela que ficará submetida
aos impactos primários (áreas submersa, irrigada/drenada, de preservação, de
empréstimo e bota-fora), Como área indiretamente afetada ou de influência,
pode ser caracterizada a bacia hidrográfica contribuinte para o lago da
barragem, mais a área de interesse de jusante, abrangendo a sistema de
irrigação e drenagem;

Aspectos climáticos - Compreenderá a análise de variáveis hidrológicas tais


como precipitação, evaporação, evapotranspiração, umidade relativa do ar e
temperatura, caracterizando por completo o micro, o meso e o macroclima da
região;

Recursos hídricos - Deverão ser levantados aspectos quantitativos e


qualitativos das águas superficiais e subterrâneas da área impactada,
mediante a avaliação dos parâmetros físicos, químicos e bacteriológicos das
mesmas. Análise dos plâncton (fitoplancton e zooplanton) poderão ser
necessárias na análise conclusiva da qualidade dessas águas. Se a região for
agriculturável, serão indispensáveis análises de herbicidas e pesticidas
organoclorados/fosforados. Algumas coletas de dados são necessárias para
observar uma variação sazonal completa;

Geologia, geomorfologia e hidrogeologia - Realizar levantamentos


litoestratigráficos, tectonicos, morfológicos e hidrogeológicos, visando
definir aspectos como potencial mineral, sismicidade natural, regiões e
unidades geomorfológicas, dinâmica morfológica natural e principais
aquíferos;

Recursos do solo - A região impactada deverá ter seus solos classificados e


872
H id r o lo g ia

suas aptidões agrícolas definidas,, com o auxílio de levantamento pedológico


completo da área agriculturável. É Indispensável a caracterização dos usos
atuais do solo;

1.2 - Meio Biótico

Vegetação - Avaliar qualitativamente e quantitativamente a vegetação da área


de estudo, definindo tipologia, diferentes habitais, composição florestal,
estágios sucessionais. Identificar áreas adequadas à produção de germoplasma,
espécies ameaçadas de extinção, espécies vegetais de valor econômico,'
científico ecológico e medicinal e macrófitas aquáticas. Analisar as
estruturas horizontal e vertical, a regeneração natural e a distribuição
diamétrica das composições florestais;

Fauna - Deve ser verificada a ocorrência de artrópodos (aracnídeos,


crustáceos, insetos, miriápodos) e de moluscos de importância medicinal e
agrícola na área diretamente afetada. Realizar o reconhecimento das espécies
de répteis e anfíbios, avifauna e mastofauna, com a identificação e descrição
generalizada dos habitantes das espécies mais comuns da região.

1.3 - Meio Sccioeconômico e Cultural

Envolverá levantamentos relativos à estrutura populacional e suas


atividades e relações com o meio ambiente da região, abordando a situação
demográfica, o processo histórico de ocupação regional, o quadro urbano, a
infra-estrutura regional, atividades econômicas, saúde pública, educação,
recreação e lazer, levantamentos arqueológico e paleontológico.

Etapa II - Prognóstico Ambiental

Compreenderá a análise da evolução dos meios físico, biótico,


socioeconômico e cultural, com a caracterização dos impactos positivos e
negativos, sem e com o empreendimento. Dar-se-á ênfase aos aspectos
decorrentes do empreendimento.

Meio físico - a) clima: estabelecer a tendência da temperatura, do vapor


d água na atmosfera, da precipitação, da evaporação e da evapotranspiração
(alterações do regime hidrológico);

b) recursos hídricos: relativamente às águas superficiais, observar no


reservatório, a relação da água com o uso agrícola da bacia e a possibilidade
de assoreamento em presença da maior ou menor cobertura vegetal. Avaliar
através de modelos de simulação, as prováveis alterações qualitativas da
0 M e io A m b ie n te e o s R e cu rso s H íd rico s 873

água, principalmente no que se refere a condições anóxidas, eutroficação e


estratificação térmica. Para jusante do barramento, ponderar a regularização
dos caudais necessários à irrigação e os seus efeitos (erosão, contenção
contra cheias, etc.), e a relação dos mesmos com eventuais obras existentes
(captações, por exemplo). No que se refere às águas subterrâneas, observar a
ocorrência de alimentação contínua com águas do reservatório e de novas
surgèncias para jusante da barragem, e as alterações prováveis de qualidade
em presença do lago;

c) geologia, geomorfologia e hidrogeologia: avaliar os riscos de sismos e o


aporte de sedimentos na área do lago, o eventual aumento ou perda de umidade
do solo na área irrigada/drenada, o comportamento dos aquíferos e os níveis
piezométricos resultantes.

d) recursos do solo; avaliar o impacto erosivo das obras, as alterações


decorrentes na fertilidade do solo, principalmente a possibilidade de
salinização do mesmo (pela perda de água por evaporação ou acúmulo de água
por falta de drenagem).

Meio Biótico - a) vegetação: avaliar a repercussão do desmatamento na área


irrigada/drenada e do desaparecimento de espécies por submersão na área do
lago. Verificar a mudança de ambiente na orla ao lago e dos . canais de
drenagem. A erosão e o deslizamento nas encostas são impactos sérios. Na área
do lago, é indispensável uma avaliação criteriosa da biomassa inundada, sem o
que não será possível estimar o grau de eutrofização e aquilatar o
agravamento qualitativo da água destinada à imgação;

b) Fauna: com relação à avifauna, poderá representar um impacto negativo a


necessidade de migraçãotemporária. A mastofauna poderá também ser
impactadas, com a morte de eventuais espécimes. Algumas espécies dc
ictiofauna poderão apresentar dificuldades de reprodução, pela mudança de
regime do manancial; a jusante do barramento, a vazão regularizada poderá
intensificar a pesca predatória. Poderá ocorrer a morte de répteis por caça e
afogamento. O desequilíbrio populacional devido à migração, poderá favorecer
o surgimento de valores potenciais.

Meio socioeconômico e cultural - Os impactos sobre o homem decorrerão da


transferência compulsória da população afetada (lago e área de
irrigação/drenagem). Analisar a desagregação das relações sociais e a
desarticulação dos elementos culturais. A apreensão e insegurança, face a
incerteza das futuras condições de vida, são impactos relevantes a avaliar. O
impacto sobre o patrimônio cultural, histórico, paisagístico, arqueológico e
paleontológico da região, deve ser incluído na avaliação.
874 H id r o lo g ia

Etapa III - Plano de Controle* Ambiental


III. 1 - Programas referidos ao Meio Físico

Clima - Medida importante como o plano de enchimento do lago pode ser


proposta neste item, É necessário prever-se a implementação de estação
meteorológica na área de influência direta;

Recursos hídricos - O monitoramento hidrológico da bacia hidrográfica é


indispensável. Devem ser monitorados aspectos como estratificação térmica,
eutroficação e desenvolvimento de plantas aquáticas na área do lago.
Implementar postos linimétricos para jusante, com previsão da vazão mínima
nos períodos de estiagem. Prever análises qualitativas sistemáticas da água
(superficiais e subterrâneas), e o controle dos níveis piezométricos;
Geologia, geomorfologia e hidrogeologia - Devem ser abordados aspectos como
recomposição de-áreas degradadas, controle sobre a evolução da erosão,
transporte e sedimentação na bacia, e sobre atividades sísmicas da área de
influência;

Recursos do solo - Programar a recomposição do solo de áreas degradadas,


definir práticas conservacionistas nas terras utilizáveis para as atividades
agro-silvo-pastoris, controlar o uso de agrotóxicos e a salinização dc :>olo.
111.2 - Programas referidos ao meio biótico

Vegetação - Propor controle da dinâmica das recuperações natural e


artificial, da dinamica sucessional e do sistema de enriquecimento, e do
desenvolvimento de macrófitas aquáticas. É importante e preservação de
faixas, para a manutenção do equilíbrio do ecossistema;

Fauna - Programar o salvamento da fauna terrestre e a observação da dinâmica


populacional desta e da avifauna. Prever o repovoamento da ictiofauna, o
salvamento de répteis* e a observação da dinâmica populacional dos mesmos.
Programar o controle integrado de vetores de doenças, e a fiscalização para a
eliminação da caça e pesca predatórias.

111.3 - Programas referidos ao Meio Socioeconômico e Cultural

E fundamental a elaboração de um programa de reassentamento para a


população que será inundada (área do lago). Da mesma forma, uma programação
consciente deve ser desenvolvida para o assentamento na área
imgada/drenada. A produção agrícola deve ser programada. Os produtores
rurais devem ter acesso a equipamentos de educação e lazer. Programar
serviços de transporte e assistência técnica adequada ao manejo da área
ungada, e à recuperação de áreas alteradas, remodelando os tenenos
O M e io A m b ie n te e o s R e cu rso s H íd rico s 875

impactados. Proporcionar a permanência de marcos visuais e o resgate (se


possível e necessário) do patromônio arqueológico/paleontológico da região.

REFERÊNCIAS

1- CONAMA. 1986. Resolução CONAMA n. 20 de 18 de junho de 1986.


R e s o lu ç ã o d o C o n a m a - 1984/86. Brasília: SEMA. 92p. p.72-79

2- DMAE. 1973. A p lic a ç ã o da gera çã o e x íe n d id a e suas v a r ia ç õ e s


n o tr a ta m e n to de e s g o to s s a n itá r io s da c id a d e de P o r to A le g r e .
Departamento Municipal de Água e Esgoto. Porto Alegre

3- DMAE. 1983. T r a ta m e n to de e s g o to s a n itá r io : Io d o s a tiv a d o s


c o n v e n c io n a is e p r e c ip ita ç ã o q u ím ic a : e s tu d o em e s c a la p ilo to .
Departamento Municipal de Água e Esgoto. Porto Alegre. 68 p.

4- IDE, C.N. 1984. Q u a l i d a d e d a d r e n a g e m p l u v i a l u r b a n a . Porto


Alegre: UFRGS - Curso de Pós-Graduação em Recursos Hídricos e
Saneamento. 137 p. Dissertação de Mestrado em Engenharia Civil.

5- LIMA, L.M.Q. 1987 T r a ta m e n to de lix o . São Paulo: Hemus.

6- SCHÀFER, A. 1985. F u n d a m e n t o s d e e c o l o g i a e b i o g e o g r a f i a das águas


c o n t i n e n t a i s . Porto Alegre: Editora da UFRGS. 532 p.

7- WHO. 1988. A ssesm ent of F r e s h w a te r Q u a lity . Genebra. 80p.

8- WHO. 1978. G e n is I W a te r . operational guide. Genebra, não paginado.

9- YOUNOS.T.M., WEIGMANN,D.I. 1988. Pesticides:acountinuingdilemma.


J o u r n a l W a t e r P o l l u t i o n C o n t r o l F e d e r a t i o n , Washington, v.60, n.7,
p. 1199-205, Jul.
Capítulo 23

HIDROMETEOROLOGIA COM RADAR

Marcos Lacerda Pessoa

23.1 Introdução

Tradicionalmente, a medição da precipitação é feita por meio de


pluviômetros e pluviógrafos. Inicialmente mecânicos e mais recentemente
eletrônicos, estes instrumentos são utilizados para a estimativa da
quantidade de chuva ocorrida em uma bacia hidrográfica, a partir de
informações n o p o n t o (capítulo 5). Atualmente, porém, outros equipamentos têm
sido utilizados para a observação e a quantificação da precipitação. Entre
estes, destacam-se o satélite e o radar meteorológico.
Através de satélite, é possível observar o deslocamento das grandes
massas na atmosfera, como por exemplo, a evolução destas na América do Sul ou
sobre uma região geográfica do Brasil. Pode-se também, por exemplo, utilizar
a técnica de Scofield 8c Oíiver (Oliver e Scofield, 1978; Scofield. e Oliver,
1980) para estimar, em sistemas convectivos, a quantidade ,de á g u a
p r e c i p i t á v e l , isto é, a quantidade resultante da transformação hipotética de
todo o vapor de água de uma coluna da atmosfera, em água líquida, podendo
essa estimativa ser feita tanto para um ponto, como para uma determinada
área.
Por meio de radar, é possível registrar eventos de precipitação em
escalas bem menores do que se consegue com satélite, dentro de um raio de
aproximadamente 180 Km. Outra grande vantagem do radar, é a possibilidade de
quantificar a precipitação de forma quase contínua, tanto no tempo (por
exemplo a cada 5 min) quanto no espaço (por exemplo a cada 500 m).
Provavelmente seria economicamente impraticável obter uma resolução desta
qualidade por meio de postos pluviométricos, devido aos altos custos de
implantação, operação e manutenção de redes pluviométricas dessa densidade.
Como os eventos de precipitação podem ter grande variação no tempo e no
espaço, e o posto pluviométrico fomece medições p o n t u a i s da precipitação na
bacia, podem existir perdas substanciais de informação durante certos eventos
(figura 23.1). O radar, por outro lado, oferece uma medição volumétrica da
precipitação, fornecendo com um alto nível de detalhe a distribuição espacial
desta, tanto na direção paralela à superfície da Terra, como também na
vertical, Como inconveniente, porém, há que se mencionar o fato de que
embora o radar esteja instalado na superfície da Terra, as suas medições sao
878 Hidrologia

de sensoriamento remoto, possuindo, por conseqiiência, as dificuldades


inerentes às medições indiretas. Por exemplo, há a necessidade de se
c a l i b r a r os sinais eletrônicos que retomam do alvo ao radar meteorológico,
para que seja fornecida a grandeza física desejada, isto 6 , i n t e n s i d a d e d e
p r e c i p i t a ç ã o distribuída na área da bacia hidrográfica.
Neste capítulo, são introduzidos os conceitos básicos sobre o chamado
r a d a r m e t e o r o l ó g i c o c o n v e n c i o n a l , descrevendo-se a utilização de seus dados
em algumas aplicações hidrometeorológicas.

RAOAP

Figura 23.1. Uma ilustração mostrando as naturezas diferentes das medições de


precipitação por radar e por posto pluviométrico.

23.2 Princípios do radar

Radar é um sistema eletromagnético para detecção e localização de


objetos. Seu nome deriva das palavras R A d i o D e t e c t i o n A n d R a n g i n g O
principio básico de operação de um radar é extremamente simples: um
H id r o m e te o r o lo g ia c o m R adar 879

transmissor emite um pulso de energia eletromagnética, o qual se propaga a


partir de uma aptena móvel. Tal sinal viaja com a velocidade da luz, e ao
encontrar um objeto é parcialmente refletido, retomando ao aparelho pela
mesma antena que o gerou, sendo porém, pela atuação de um comutador
automático, encaminhado para um receptor (figura 23.2).
A intensidade do eco é obtida eletronicamente pela medida da energia que
retoma. Pode-se também observá-la, juntamente com a posição espacial do
alvo, de. maneira visual, através dos chamados indicadores do radar: o
Indicador de Posição no Plano ( P l a n - P o s i t i o n I n d i c a t o r ou P P Í ) e o Indicador
de Distância-Altura (R a n g e - H e i g h t I n d i c a t o r ou R H Í ) , os quais são ilustrados
na figura 23.3, O primeiro deles mostra os ecos em um p l a n o quase
horizontal, constituindo-se, em termos práticos, em uma espécie de mapa dos
alvos na horizontal. O segundo é obtido pela rotação da antena em um plano
vertical, captando, conseqüentemente, informações sobre o alvo segundo esta
direção.

Figura 23.2. Esquema básico de funcionamento de um radar meteorológico.


880 H id r o lo g ia

0o

Figura 23.3. Indicadores do radar.

A freqüência (f) das ondas de rádio usadas nos sistemas de radar


meteorológico varia de 1.500 até acima de 30.000 MHz. Usualmente, utiliza-se
em hidrometeorologia com radar o comprimento de onda X, ao invés da sua
freqüência. Como estes dois parâmetros são relacionados por c = W (onde C é
uma constante), o comprimento de onda pode ser facilmente calculado. Costuma-
se dividir o espectro de microondas em diversas bandas, conforme apresentado
na tabela 23.1.
H íd r o m e te o r o lo g ia c o m R adar 881

Tabela 23.1. Relação entre os comprimentos de onda


operacionais, as bandas e as freqüências.
Comprimento de onda (cm) Banda Freqüência (MHz)
1 K 30000
3 X 10000
5 c 6000
10 s 3000
20 L 1500

A relação teórica entre as características da partícula atingida e a


quantidade de energia que retoma à antena do radar, é calculada baseando-se
no contexto da denominada Teoria de Rayleigh, a qual descreve o espalhamento
de uma onda plana por uma esfera.
Esta teoria é válida para valores de um coeficiente a menores que 0,13.
sendo:
7t D
a * — (23.1)
X

onde X representa o comprimento de onda da energia irradiada e Dg é o


diâmetro da partícula atingida.
Fora dessa região de validade, pode-se utilizar o equacionamento.
proposto pela chamada Teoria de Mie, o que é geralmente evitado pelo fato, do
espectro ser desconhecido dentro do volume iluminado.
À partir da Teoria de Rayleigh, pode-se avaliar como uma gota d’água
espalha a energia eletromagnética que recebe. Constatou-se que parte da
radiação interceptada é absorvida como calor pela gota e parte é reirradiada
como energia eletromagnética de mesmo comprimento de onda. A absorção por
calor pode-se constituir numa fonte de perda de sinal (caso, por exemplo, dos
radares de Banda C), porém tende a desaparecer para o caso de grandes
comprimentos de onda.
A aproximação de Rayleigh leva à definição de uma quantidade teórica
proporcional à energia de retomo e equacionada da seguinte forma:

5 | , I 2 r>6
* l k l Dg
a= (23.2)
Xa
2
onde | k j é uma função do índice de refração do alvo, sendo aproximadamente
0,93 para chuva.
A quantidade a 6 denominada seção transversal de r e t r o e s p a l h a m e n t o de
882 H id r o lo g ia

radar { r a d a r c r o s s - s e c t i o n o f a h a c k ~ s c a t t e r e d p a r t i c l e ) , a qual se constitui


em um fator de avaliação da-natureza e do tamanho do alvo, caracterizando-o
de uma maneira especialmente util no cálculo da energia do eco que deverá
retomar do mesmo.
Quando se considera toda a região coberta pelo feixe do radar, a energia
média que retoma das partículas atingidas é expressa por:

(23.3)
uni d.
de
vol.

onde r é a distância alvo-radar e Cj é uma constante que engloba um fator


numérico e vários parâmetros específicos de cada equipamento (comprimento de
onda da energia emitida, forma e largura do feixe, comprimento do pulso,
potência transmitida, ganho da antena, etc.).
Através da equação 23.2, verifica-se que o aumento do comprimento de
onda do radar faz com que a diminua rapidamente, e, portanto, a quantidade de
energia que é retomada do alvo, Pr (equação 23.3), decresce
proporcionalmente. Isso significa que com o aumento de X o radar passa a não
detectar as partículas menores que os radares de X pequeno são capazes de
registrar.
Esse mesmo processo causa a atenuação do feixe do radar (isto é, a
diminuição da energia propagada), o que restringe consideravelmente a
utilização dos radares de X pequeno. Isso pode ser explicado pelo fato de
que os a das partículas medidas por um radar de X pequeno são muito maiores
do que os medidos por um radar de X grande. Portanto, uma percentagem
significativa da energia do feixe pode ser absorvida e dispersada pelas
partículas. Assim, quando o feixe de um radar de X pequeno atravessa uma
tempestade, sua energia total é diminuida ou atenuada, de tal forma que a
qualidade das estimativas é geralmente prejudicada.
O valor de £ Dg (equação 23.3) é por conveniência referido como fator de
refletividade, representado usualmente pela letra Z. Caracteriza-se desta
forma, claramente, o fator de refletividade de radar como sendo proporcional
à sexta potência dos diâmetros das gotas, desde que satisfeitas as condições
de validade da Teoria de Rayleigh.
No caso de gotas cuja relação entre os diâmetros e o comprimento de onda
não mais atendem a condição de espalhamento de Rayleigh (Equação 23.1),
define-se um fator de refletividade efetivo:
883
H id r o m e te o r o lo g ia c o m R adar

E
unid. a
de voL (23.4)
Zef =
n 5 |k

Verifica-se, todavia, que para a grande maioria d“ “ çS“ J


diâmetro das gotas é pequeno em relação ao compnmento de onda do radar
Assim para comprimentos de onda de radiaçao iguais ou superiores a 5cm a
£ " ' « a y = gh é aplicável (equação 23.1). p d o q™ « “
em hidrometeorologia com r a ta , 0 fator de refletmdade Z. o ,»al
6 3
comumente expresso em mm .m ou em dBZ, sendo.

6 -3 (23.5)
Z(dBZ) = 10 log[Z(mm .m )]

O fator Z é proporcional à energia média de retomo Pr e pode ser

precisamente calculado a partir de Pr. Uma tarefa que tem sido atribuída
àqueles que trabalham com radar meteorológico, é relacionar o aur e
refletividade Z com a intensidade de chuva R.
A relação Z-R tem sido, na maioria das vezes, expressa po q Ç
do tipo:
(23.6)
Z = a .R

nnrie ns valores de a e b têm variado significativamente.


011 O métodos comumente empregados na obtenção desses
a) a comparação das informações de postos pluviom étncos com as de radar,
(b) a medição direta do tamanho das gotas de chuva. relacões Z _R
Encontra-se, na literatura, um grande numero de relações ZK
experimentais. A tabela 23.2, apresenta algumas delas.
884 H id ro lo g ia

A equação Z-R mais comumente empregada é a de Marshall & Palmer, sendo


igualmente conhecida por relação Z-R padrão.
Para a maior parte dos estudos hidrometeorológicos, faz-se necessário
obter m a p a s horizontais de p re c ip ita ç ã o , que representem os valores de
refletividade de radar ou de intensidade de chuva média, em um determinado
elemento de área {pixel ). Em geral, os p ix e ls utilizados são quadrados (por
exemplo, com 2km de lado), os quais fazem parte de um sistema de g rid
cartesiano. No próximo item é descrita a maneira de obtenção desses mapas.

23.3 Mapas indicadores de posição no plano à altitude constante

São conhecidos pela sua sigla IPPAC, ou então por CAPPI (C o n sta n t
A ltitu d e P lan-P osition Indicator).
A uniformização das posições em altura, nas quais o radar efetua medidas
de precipitação sobre toda sua área de cobertura, é muito importante. Na
operação rotineira do radar, com a antena girando a elevações fixas ou
altemando-se sucessivamente a cada volta, tal situação é praticamente
impossível. A condição que, neste caso, mais se aproxima daquela de posições
amostradas pelo radar a altitudes constantes, é a operação com a antena a 0o
de elevação. Nessa situação, além do inconveniente do bloqueio parcial ou
mesmo total do feixe, ocorre que as posições iluminadas pelo raüar a
distâncias cada vez maiores, se elevam correspondentemente cada vez mais
sobre a superfície, como resultado líquido do efeito combinado da curvatura
da Terra e da refração da radiação na atmosfera. Não há, assim, maneira de se
obter, através de varreduras da antena a uma única elevação, observações
sobre a área de cobertura do radar e em posições situadas à mesma altura.
Como a varredura a cada elevação amostra uma casca aproximadamente cônica no
espaço, é necessário dispor-se de dados derivados de varreduras a várias
elevações, para se obter, do conjunto, mapas ho rizo n ta is das intensídades de.
precipitação. Essas observações estão na interseção de uma casca de calota
esférica concêntrica com a Terra e à altura média desejada, com as cascas
cônicas geradas pelas varreduras. As cascas cônicas têm uma espessura que
acompanha a abertura do feixe do radar (Calheiros, 1982). A figura 23.4
esquematiza o processo, numa seção transversal que contém o radar.
Nota-se que, dependendo da altura do CAPPI, as elevações menores não
chegam a contribuir com dados para a composição de um mapa de precipitação;
ao passo que o máximo de elevação em que a antena pode operar, limita a
distância do radar em que se inicia o CAPPI. De um modo geral, quanto menor a
altura do CAPPI, mais próximo do radar ele se inicia e termina.
A figura 23.5 mostra a seção transversal S T (indicada na figura 23.4),
ilustrando o processo de como os segmentos de várias varreduras são
combinados para a formação do CAPPI (Marshall, 1957).
H id r o m e te o r o lo g ia c o m Radar 885

Coscos quase côn icas, de esp essura ig u a l a


largura do feix e do R ad ar, gerados p eias^
v crred u ras da antena a d ifere n te s elevaçõ es

Figura 23.4. Varreduras da antena do radar a diferentes elevações.

Quando a antena está localizada numa elevação baixa, os obstáculos de


terreno podem reduzir o alcance radial efetivo do radar e diminuir a
distância máxima atingida pelo CAPPI. O espaçamento entre posições de
interesse (na realidade regiões espaciais anulares), pode ser preenchido
programando-se apropriadamente as elevações a serem varridas pela antena e
tendo em vista a largura do feixe, obtendo-se a necessária continuidade no
CAPPI resultante.
Usualmente, os CAPPIs são gerados utilizando-se um algoritmo para o
processamento digital dos dados de radar armazenados em fita magn tic
computacional.
A figura 23.6 mostra algumas das diversas maneiras de se representar
dados de um CAPPI,
886 H id ro lo g ia

Feixe do R a d a r a

Figura 23.5. Uma ilustração da técnica de combinar segmentos de varreduras a


diferentes elevações para gerar um CAPPI.

A figura 23.7 mostra CAPPIs de um evento de precipitação que se desloca


em relação a uma bacia hidrográfica. Através da figura percebe-se a grande
variabilidade espacial e temporal do evento. Interessante, ainda, é observar
na referida figura a localização do posto pluviométrico em relação ao evento.
Nota-se que o mesmo não registra, por algum tempo, nenhuma precipitação sobre
a bacia.
887
Hidrometeorologia com Radar

O O o o o o o
O O O O O O
O o O o! o
o o
o o
— h
o o to o o o O o O O a 8 a 8 J.2km
— 8 IO IO 8 a o ffe p ra s e n fa ç ã o
o o o o Q o o
o o o O 1o p o r ralo r& a
2 o 8 TO TO 8 8 u
o o 2 2 o o 2 2 2' 2 n u m é ric o *
o 8 8 8 o o o Pag intonaidaüoa
2 2 2 2 6 6 2 2
o 2 2
o O O o o o (e m m m . h )
6 6 6 2 6 2 2 2 o
o -d 2
2 2 o O O o o o
6 6 6 2 2 2 2
2 2 6
— 2 2 o o 0 O O u
6 6 2 5 7 5
2 2 2 6
2 2 o o O O o o
2 2 2 2 3 7 5
O 2 2
O o o o o o o
O O O O 2 2 2 2
O O 0
O O o o o o o
O O O O O O O O O O li.
CCtnin

Figura 23.7.
o deslocamento sobre uma bacia hidrográfica, de
uma tempestade
observada por radar.
H id r o m e íe o r o lo g ia c o m R adar 889

23.4 Fatores que afetam a precisão das medidas realizadas através de radares
meteorológicos

Um radar está calibrado do ponto de vista meteorológico, se existe uma


relação Z-R que permite avaliar, com certo grau de precisão, a chuva média
que precipita sobre determinada área da bacia hidrográfica.
A calibração meteorológica de um radar é uma tarefa árdua. Um dos
procedimentos usuais é o de ajustar uma relação Z-R, por meio de informações
obtidas através de uma rede de postos pluviométricos dispostos sobre a bacia.
Por melhor que seja a relação determinada com base em um posto
pluviométrico, à medida que se caminha, no sentido do afastamento deste
posto, a precisão da relação Z-R diminui. Baseando-se nesse fato, estudos
foram realizados (Huff, 1966) no intuito de quantificar tal decréscimo da
precisão Z-R com a distância ao posto, o que está ilustrado na figura 23,8.
Verifica-se que será tão mais representativa a relação Z-R em relação à
chuva que cai sobre uma bacia, quanto mais postos esta possuir, isto é,
quanto mais densa for a rede pluviométrica. Uma análise sobre esse assunto
foi realizada por Wilson (1969), objetivando mostrar, através de dois locais
analisados (Illinois e Oklahoma, EUA), como varia a precisão da calibração do
radar com a alteração da densidade da rede pluviométrica. O resultado desse
confronto está reproduzido na figura 23.9.
Além destes fatores, à medida que o local de interesse se afasta do
radar, piora a qualidade das informações registradas para avaliação da chuva,
através do fator de refletividade. Atualmente já se tem empregado
coeficientes de correção nas relações Z-R, a fim de minimizar estas
distorções ocasionadas pela alteração das informações com a distância alvo-
radar.
Existe a possibilidade da ocorrência de alguns eventos meteorológicos
que, juntamente com os efeitos dos fenômenos de refração, podem resultar na
produção, pelo radar, de informações distorcidas, incorretas ou mesmo falsas.
Como exemplos desses fenômenos, pode*se citar (figura 23.10):

a) tempestades com grande grau de variabilidade em seu perfil vertical. Esse


é um fenômeno que pode resultar em estimativas ruins do valor precipitado,
fato que se agrava quando o feixe do radar intercepta uma ch u va de p edra
(granizo) ou a denominada camada de derretimento de neve {layer o f m elting
sn o w , ou simplesmente m elting layer).

b) ocorrência de precipitação ao longo do feixe e de água sobre o equipamento


de radar. Isso pode conduzir à atenuação dos sinais;

c) formação de precipitações a baixas altitudes (nevoeiros acentuados,


algumas nuvens menos elevadas). Tais precipitações podem, eventualmente,
H id ro lo g ia

Figura 23,8. Precisão da relação Z-R calibrai* a partir de um posto


pluviométrico como função do distanciamento deste posto (Huff, 1966).

Figura 23.9. Precisão da relação Z-R calibrada a partir de uma rede


piuviométrica como função da densidade desta rede (Wilson, 1969).
891
Hidrometeorología com Radar

( +

eq u a ç a o z / r n a o r e p r e s e n t a t iv a
LONGAS DISTANCIAS

R g m 2310. Alguns fatores ,u= podem fe ta , . bom desempenho de um rada,


& meteorológico.
892 H id r o lo g ia

n ã o v ire m a s e r d e te c ta d a s p e lo f e i x e d o r a d a r , te n d o e m v i s t a a p o s s ív e l
n e c e s s i d a d e d e s e e s t a b e l e c e r u m a e l e v a ç ã o m ín im a p a r a a a n t e n a , a f im d e
s e e v i t a r i n te r f e r ê n c ia s d e m o n ta n h a s , d e p r é d io s e d e e c o s n a tu ra is do
te r r e n o .

d) fen ô m en o d a propagação anômala. E s s e é o e f e ito c a u s a d o , q u a n d o o f e ix e


i n t e r c e p t a u m a c a m a d a d e a r p e r t o d a s u p e r f íc ie d o s o lo e e s t a p o s s u i u m
a lto í n d i c e d e r e f r a ç ã o . C o m o r e s u l t a d o , o f e ix e p o d e s e r d e s v i a d o e a té
m e s m o i n t e r c e p t a r o s o lo ;

e ) p r e s e n ç a d e v e n to s la t e r a i s . E s s e f e n ô m e n o p o d e f a z e r c o m q u e u m a c h u v a
o b s e r v a d a a tr a v é s d o r a d a r , v e n h a a a c o n t e c e r e m u m lo c a l d ife re n te do
i n d i c a d o p e l o a p a r e lh o . É u m f e n ô m e n o tã o m a is s i g n i f i c a t i v o , q u a n to m a is
b a ix a fo r a v e lo c id a d e d e q u e d a d a s g o ta s e m r e l a ç ã o à v e lo c id a d e do
v e n to ;

f) e v a p o ra ç ã o d a á g u a p r e c ip ita d a s o b re a s u p e rfíc ie d a T e rra . T a l o c o rrê n c ia


p o d e r e s u l t a r e m e c o s q u e v e n h a m a s e r c o n f u n d id o s c o m p r e c i p i t a ç ã o . E s s e
f e n ô m e n o é m a is c o m u m q u a n d o o a r p r ó x im o à s u p e r f í c i e é r e l a t i v a m e n t e
seco;

g ) lo n g a s d i s t â n c i a s . A m e d i d a e m q u e a p r e c i p i t a ç ã o e n c o n t r a - s e a m a io r e s
d i s t a n c i a s d o r a d a r , d e p i o r q u a l i d a d e s ã o a s in f o r m a ç õ e s p a r a a a v a li a ç ã o
d a s im e n s id a d e s , a p a r tir d o s d a d o s d e re fle tiv id a d e . A lé m d is s o , pelo
e fe ito da c u r v a tu r a da T e rra , as p re c ip ita ç õ e s o c o rrid a s a d is tâ n c ia s
m u i t o g r a n d e s d o r a d a r p o d e m n a o s e r a tin g id a s p e lo f e ix e .

h ) re la ç õ e s Z - R n ã o re p re s e n ta tiv a s . C o m o a re la ç ã o e n tre a re fle tiv id a d e d e


r a d a r e a in t e n s i d a d e d e p r e c i p i t a ç ã o é b a s t a n t e c o m p l e x a , p o is d e p e n d e d e
i n ú m e r o s f a t o r e s f ís ic o s c u jo s e f e ito s p o d e m v a r i a r d e m o d o s i g n i f i c a t i v o
d e u m a t e m p e s t a d e p a r a o u t r a , n ã o s e r ia r e a l í s t i c o e s p e r a r q u e u m a ú n ic a
té c n ic a p a ra a m e d iç ã o de p re c ip ita ç ã o por ra d a r p u d esse ser
s u f i c i e n t e m e n t e g e r a l p a r a s e r a p l i c a d a p a r a t o d a e q u a l q u e r s itu a ç ã o .

A p e s a r d a s d iv e r s a s d if i c u l d a d e s , c o m o a s i n d ic a d a s a c i m a , c o n s e g u e - s e ,
a tra v é s d e té c n ic a s d e c a lib ra ç ã o , m in im iz a r o s e rro s d e m e d iç ã o p o r ra d a r d e
ta l m o d o q u e e s t e v e n h a a f o m e c e r m e d iç õ e s p r ó x im a s d a r e a l i d a d e . A f ig u r a
2 3 .1 1 a p r e s e n t a o r e s u lta d o d a a p lic a ç ã o d e d a d o s d e p r e c i p i t a ç ã o c a li b r a d o s
e não c a lib ra d o s , em um m o d e lo h id r o l ó g ic o d e te rm in ís tic o , que v is a à
s i m u l a ç ã o d e v a z õ e s e m s is te m a s u r b a n o s d e d r e n a g e m ( m o d e lo WASSP). À f ig u r a
m o s tra com o as p re c ip ita ç õ e s o b tid a s a tr a v é s do ra d a r c a lib ra d o podem
a p re s e n ta r vazões s im u la d a s de q u a lid a d e c o n s id e ra v e lm e n te s u p e rio r à
d a q u e l a s o b t i d a s p o r m e io d e p o s to s p l u v i o m é t r i c o s .
H id r o m e te o r o lo g ia c o m R adar 893

G r a y m a n e E a g l e s o n ( 1 9 7 1 ) d e s e n v o lv e r a m m o d e lo s p a r a a n a l i s a r o s e rro s
de ra d a r, os q u a is fo ra m c la s s if ic a d o s em e rro s de g ra n d e e de pequena
e s c a la s . E r r o s n a m e d i ç ã o d e e v e n to s d e g r a n d e s á r e a s e e m te m p o s d e g n rn d e
e s c a l a , ta is c o m o t o t a i s d e p r e c ip ita ç ã o a c u m u l a d a o b s e r v a d o s s o b r e u m a *
h i d r o g r á f i c a c o m u m a g r a n d e á r e a d e d r e n a g e m , s ã o d e n o m in a d o s d e erros
grande escala. E s s e tip o d e e r r o f o i r e p r e s e n ta d o d a s e g u i n t e m a n e i r a .

T o t a is d e p r e c ip ita ç ã o m e d id o s p e lo r a d a r (2 3 .7 )
xt =
T o t a is d e p r e c ip ita ç ã o v e r d a d e ir o s

s e n d o q u e a v a r i á v e l a l e a t ó r i a x t fo i c o n s id e r a d a c o m o s e n d o d i s t r i b u í d a

s e g u n d o u m a l o g - n o r m a l , c o m m é d ia ^ = 1 ,0 e d e s v io p a d r ã o -
Os erros de pequena escala s ã o a q u e le s d e c o r r e n t e s d e v a n a ç o e s l o c a ^
na re la ç ã o e n tre a i n te n s id a d e de p r e c ip ita ç ã o e a re fle tiv i a
s e n d o m e d id o s e m te r m o s d a s e g u in t e e q u a ç ã o :

M e d i d a o b tid a p e l o r a d a r (2 3 .8 )
x =
M e d i d a o b tid a p o r p o s to s p l u v i o m é t r i c o s
894 H id ro lo g ia

o n d e a v a riá v e l x é ta m b é m d is trib u íd a s e g u n d o u m a lo g -n o rm a l, s e n d o q u e a
m é d ia é d a d a p e lo e r r o d e g r a n d e e s c a l a e a v a r i â n c i a é f u n ç ã o d o s s e g u in te s
f a to r e s :
a) te m p o s o b r e o q u a l a m é d i a d o s e c o s é c a l c u l a d a , t;
b) á re a s o b re a q u a l a m é d ia d o s e c o s é c a lc u la d a , A R ;
c) d is tâ n c ia a lv o -ra d a r, r,
d) c a r a c t e r í s t i c a s e s p a c ia is d a te m p e s ta d e .

O d e s v io - p a d r ã o ctx o b e d e c e a u m a re la ç ã o d a fo rm a :

loSiO CTx = ci + =2 • loSi0 1 + c3 • logio AR + c4 . r (23.9)

Os e f e ito s das d if e r e n te s c a ra c te rís tic a s das te m p e s t a d e s fo ra m


c o n s id e r a d o s d e s p r e z ív e is no e s tu d o de G ra y m a n e E a g le s o n (1 9 7 1 ). As
v a r i a ç õ e s d o s p a r â m e tr o s d a e q u a ç ã o a c im a f o r a m a s s e g u in t e s :

(-1 ; 0 ) p a r a C j;

( - 4 ,3 8 ; - 0 ,2 4 ) p a r a c 2 ;

( - 0 ,4 5 ; - 0 ,2 8 ) p a r a c 3 ; e
(0 ,0 1 ; 0 ,0 2 ) p a r a c 4 .

O u s o d e p o s to s p l u v i o m é t r i c o s p a r a a c a l i b r a ç ã o d o r a d a r m e te o r o ló g ic o
te m o e f e ito d e r e d u z i r a v a r i â n c i a d o e r r o d a s m e d iç õ e s p o r r a d a r . D ado y =
ln x, onde x é o e rro de pequena e s c a la , a m é d ia da re la ç ã o a ya/o y é
re p re s e n ta d a p o r:

R= £2 . e-(22 /Rc)(A/n)I/2
(*/A)W ( 2 3 .1 0 )
23

o n d e A é a d e n s id a d e d o s p o s to s , e m K m 2/ p o s t o ; R c é a d i s t â n c i a n a q u a l a

c o rre la ç ã o e s p a c ia l d a c h u v a c o m e ç a a o s c il a r ; a y é o d e s v io p a d r ã o d e y,

q u a n d o p o s to s p l u v i o m é t r i c o s n ã o s ã o u s a d o s p a r a a c a l i b r a ç ã o ; a y a é o d e s v io

p a d r ã o d e y , q u a n d o o s p o s to s p l u v i o m é t r i c o s d e c a l i b r a ç ã o e s t ã o d is p o n ív e is

n a d e n s i d a d e d e A , e m K m 2/p o s to ; e o y é a m é d i a d a r a z ã o a y a / a y . U m e x e m p l o
d e a p l i c a ç ã o , é a p r e s e n ta d o a s e g u ir :

E x e m p lo 2 3 .1 . A figu ra 2 3 .1 2 rep resen ta a fu n ç ã o d e co rrela çã o e s p a c ia l de


p r e c ip ita ç ã o acum ulad a e m u m a área d e 1 0 .0 0 0 K m 2.
895
H id r o m e te o r o lo g ia c o m R adar

A c h u v a n a r e g i ã o e s t á s e n d o m o n ito r a d a p o r r a d a r , h a v e n d o u m ú n ic o
p o s to p l u v i o m é t r i c o p a r a a u x i l i a r n a c a l i b r a ç ã o . P e r g u n ta - s e : q u a n t o s p o s t o s
p lu v io m é tric o s s e ria m n e c e s s á r io s a d ic i o n a r , a f im de que h o u v esse um
d e c r é s c i m o , p o r u m f a t o r d e 2 , n o d e s v io - p a d r ã o d o s lo g a r i t m o s d o s e r r o s d e
p e q u e n a e s c a la d o ra d a r ?

0
to
oo
•u
u

D is t a n c i a entr® doi® ponto® no «spaço

F i g u r a 2 3 .1 2 . F u n ç ã o d e c o r r e la ç ã o e s p a c ia l.

S o lu ç ã o : F a z -se u so d a e q u a ç ã o 2 3 .1 0 . C o m u m a e s ta ç ã o p lu v io m é tn c a , a
re la ç ã o e n tre o s d e s v io s - p a d r õ e s c a li b r a d o s e n ã o - c a l i b r a d o s d o s lo g a r itm o s
d o s e r r o s d e r a d a r é a s e g u in t e :

80
( n / 1 0 0 0 0 ) 1/2 [1 - e
2 ,3

D e s e j a - s e u m a r e d u ç ã o d e G y p a r a 0 ,2 5 . A u m e n ta r o n ú m e r o d e e s ta ç õ e s

p a ra d e z , im p lic a A = 1 .0 0 0 k m 2/p o s to . D e s s a f o r m a , a tr a v é s d a s u b s tit u iç ã o


n a e q u a ç ã o 2 3 .1 0 , te m - s e o s e g u in te :

M oU
<jy = 1 ------(rr/1000) .
y 23

U s a n d o - s e o ito e s t a ç õ e s , A s e r ia ig u a l a 1 .2 5 0 k m 2/ p o s t o , o u .

W OO 1/2
a í = 1 - — ( k / 1 2 5 0 ) 1/7 [1 - e
y 2 ,3
894 H id r o l o g i a

o n d e a v a r iá v e l x é t a m b é m d i s t r i b u í d a s e g u n d o u m a l o g - n o r m a l , s e n d o q u e a
m é d i a é d a d a p e lo e r r o d e g r a n d e e s c a l a e a v a r i â n c i a é f u n ç ã o d o s s e g u in te s
f a to r e s :
a) te m p o s o b r e o q u a l a m é d i a d o s e c o s é c a l c u l a d a , t;
b) á re a s o b re a q u a l a m é d ia d o s e c o s é c a lc u la d a , A R ;
c) d is tâ n c ia a lv o -ra d a r, r,
d) c a r a c t e r í s t i c a s e s p a c ia is d a te m p e s ta d e .

O d e s v io - p a d r ã o crx o b e d e c e a u m a r e l a ç ã o d a f o r m a :

l o SlO ° x " c l + c 2 • Io ê i o 1+ c 3 * Io ê io A R + c 4 . r (2 3 .9 )

Os e f e ito s das d if e r e n te s c a ra c te rís tic a s das te m p e s t a d e s fo ram


c o n s id e r a d o s d e s p re z ív e is no e s tu d o de G ra y m a n e E a g le s o n (1 9 7 1 ). As
v a r i a ç õ e s d o s p a r â m e t r o s d a e q u a ç ã o a c im a f o r a m a s s e g u in t e s :

(-1 ; 0 ) p a r a c x;

( - 4 ,3 8 ; - 0 ,2 4 ) p a r a c 2 ;

( - 0 ,4 5 ; -0 ,2 8 ) p a r a c 3 ; e
( 0 ,0 1 ; 0 ,0 2 ) p a r a c 4 .

O u s o d e p o s to s p l u v i o m é t r i c o s p a r a a c a l i b r a ç ã o d o r a d a r m e te o r o ló g ic o
t e m o e f e i t o d e r e d u z i r a v a r i â n c i a d o e r r o d a s m e d iç õ e s p o r r a d a r . D ado y -
ln x, onde x é o e rro de pequena e s c a la , a m é d ia da re la ç ã o a ya/ a y é
r e p r e s e n ta d a p o r:

R. 1/2
$ = l - — ( n lA ) m [1 - e-(2^ c)(A™ ] ( 2 3 .1 0 )
2 ,3

o n d e A é a d e n s id a d e d o s p o s to s , e m K m 2/ p o s t o ; R c é a d i s t â n c i a n a q u a l a

c o r r e l a ç ã o e s p a c ia l d a c h u v a c o m e ç a a o s c il a r ; ay é o d e s v io p a d r ã o d e y,

q u a n d o p o s to s p lu v io m é tr i c o s n ã o s ã o u s a d o s p a r a a c a l i b r a ç ã o ; <jy a é o d e s v io

p a d r ã o d e y , q u a n d o o s p o s to s p lu v i o m é t r i c o s d e c a l i b r a ç ã o e s tã o d is p o n ív e is

n a d e n s i d a d e d e A , e m K m 2/p o s to ; e o y é a m é d i a d a r a z ã o a y a / c y . U m e x e m p l o
d e a p l i c a ç ã o , é a p r e s e n ta d o a s e g u ir :

E x e m p lo 2 3 .1 . A figu ra 2 3 .1 2 rep resen ta a fu n ç ã o d e co rrela çã o e s p a c ia l de


p r e c ip ita ç ã o acum ulad a e m um a área d e 1 0 .0 0 0 K m 2.
895
H id r o m e te o r o lo g ia c o m R adar

A chuva na região está sendo monitorada por radar, havendo um único


posto pluviométrico para auxiliar na calibração. Pergunta-se: quantos postos
pluviométricos seriam necessários adicionar, a fim de que houvesse um
decréscimo, por um fator de 2, no desvio-padrão dos logaritmos dos erros de
pequena escala do radar ?

i
11
i

D i s t ô n c i o ent r® doi® p on t o® no «®poço

Figura 23.12. Função de correlação espacial.

Solução: Faz-se uso da equação 23.10. Com uma estação pluviométnca, a


relação entre os desvios-padrões calibrados e não-calibrados dos logaritmos
dos erros de radar é a seguinte:

1/2
80 -(2,3/80)(10000/7t)
(TT/10000)1/2 [1 - e ] « 0,5
2,3

Deseja-se uma redução de Oy para 0,25. Aumentar o número de estações


para dez, implica A = 1.000 km2/posto. Dessa forma, através da substituição
na equação 23.10, tem-se o seguinte:

o? - 1 - - <*/1000)'“ d - . <M2
’ 13

Usando-se oito estações, A seria igual a 1.250 km2/posto, ou:


1/2
Ni OVJ 1/2 -(2^/80X1250/71) ^u
a v = 1 - — (tt/1250)1/2 [1 - e
y 2,3
896 Hidrologia

Para A = 1.667, seis estações, Oy - 0,27. Portanto, a resposta deve ser

sete estações, o que leva a A = 1.429 e Oy = 0,25.

23.5 Algumas aplicações hidrometeorológicas do radar

Os livros-texto de hidrologia têm tradicionalmente discutido técnicas,


métodos e conceitos que são fundamentalmente baseados na estimativa da
precipitação de uma bacia hidrográfica através de dados de postos
pluviométricos. A melhoria da descrição dos campos de precipitação por meio
do uso dos dados quase contínuos, tanto no tempo quanto no espaço, fornecidos
pelos radares, permite a extensão dos estudos e dos trabalhos hidrológicos e
meteorológicos.
Dados digitalizados de radar meteorológico têm estado disponíveis
praticamente desde a II Guerra Mundial. Entretanto, o progresso da
hídrometeorologia com radar tem sido lento, pela relutância de alguns em usar
uma fonte de dados com erros que eram pobremente documentados e não
totalmente compreendidos. A situação, porém, está mudando e um número enorme
de novos métodos tem sido desenvolvidos de tal forma que os dados de radar
possam ser utilizados com um maior grau de confiança do que no passado
(Palmer et al., 1983; Krajewski, Í987 a.b; Hitch e Hems, 1988). Algumas
técnicas hidrometeorológicas são a seguir discutidas, chamando-se atenção
para quanto o radar já tem contribuído para as mesmas, ou quando existe um
significativo potencial para sua futura contribuição.

Previsão de vazões e sistemas de alerta a inundações

Atualmente, pode-se utilizar dados de precipitação em tempo real em


modelos hidrológicos, para prever, com um certo nível de precisão, a vazão
nos rios. À qualidade desses dados de vazão, bem como o horizonte de previsão
(isto é, a antecedência com que a vazão 6 prevista), dependem sobremaneira da
qualidade dos dados que são fornecidos aos modelos. Em geral, faz-se
necessária uma rede de postos pluviométricos, e a implantação de um sistema
de telemetria tende a tomar a aquisição dos dados mais rápida e confiável.
Em grandes bacias hidrográficas ou em locais onde o clima 6 caracterizado
pela acentuada variabilidade temporal e espacial, faz-se indispensável uma
boa representação dos fenômenos de precipitação. Isso pode ser somente
alcançado através do radar meteorológico, tendo em vista os custos
relativamente altos para aquisição e manutenção de redes pluviométricas com
densidades equivalentes às que o radar pode oferecer.
Além disso, com a disponibilidade de modelos hidrológicos distribuídos,
H id r o m e te o r o lo g ia c o m R adar 897

como o modelo RADEN - Radar para Enchentes Pessoa, 1986), pode-sc


representar, de forma realística, as propriedades físicas das bacias
hidrográficas, bem como os fenômenos hidrometeorológicos. Isso proporciona
não somente previsões de vazão com melhor qualidade, como permite a análise
de situações futuras, como as referentes à ocupação e uso do solo. Por
exemplo, pode-se avaliar como a vazão de um rio seria afetada a partir da
construção de um núcleo urbano localizado em determinada região da bacia ou
como um desmatamento afetaria essa vazão. A figura 23.13 esquematiza, de uma
maneira simplificada, como um modelo hidrológico, determinístico, de
parâmetros distribuídos, para a transformação de precipitação de radar cm
vazão, em geral funciona.
Através de modelos desse tipo, pode-se auxiliar o controle de cheias,
tanto no desenvolvimento de medidas estruturais (canais, diques,
reservatórios), como não estruturais (avisos, seguros-enchentes, etc).
No primeira caso, além dos benefícios em termos de segurança da obra,
pode-se ter uma maior eficiência no dimensionamento e operação dos
reservatórios. A operação hidráulica em tempo real de reservatórios, quando
baseada em um sistema de previsão hidrometeorológica de boa qualidade, pode
representar um considerável ganho para, por exemplo, as companhias de energia
que operam esses reservatórios. Com a possibilidade de se antever uma
tempestade através do uso de dados de radar, pode-se aumentar o horizonte dc
previsão de vazões naturais, o que leva a um melhor controle dc decisão,
podendo-se gerenciar, com maior segurança e confiabilidade, a evolução dos
níveis de vazões nos reservatórios.
No caso de medidas não estruturais, é bastante claro que planos de
emergência são muito mais bem implementados, se houver um aviso antecipado da
hora e local da inundação (Braga, 1981),
Para citar um exemplo concreto, o Centro Tecnológico de Hidráulica
(convênio USP/DAEE), em São Paulo, opera atualmente um sistema sofisticado
para o monitoramento contínuo do tempo meteorológico e para a emissão dc
alertas a inundações, o qual é fundamentalmente baseado em dados de radar, os
quais são utilizados em modelos de previsão hidrológica. Através deste
sistema, podem-se acionar diversos órgãos e instituições (como, por exemplo,
a defesa civil, o departamento de trânsito, a polícia, o corpo de bombeiros,
etc.), dependendo da magnitude de um evento meteorológico que esteja-se
aproximando para determinadas áreas onde esses eventos, ou as enchentes de cs
decorrentes, podem causar consideráveis perdas e danos. (Braga e Barros,
\992). .
Um outro exemplo é o sistema de alerta a inundações desenvolvido
Universidade de Salford, Inglaterra, por meio do qual informações ^
satélite, radar e postos pluviométricos são integradas para a pro uçao
previsões mais confiáveis de chuva e vazão (figura 23.14).
898 Hidrologia

Fase m eteorológica ( medição


de pracípitoçoo, previsã o de
precipitação, e tc)

Definição da Dacia

Topografia

Vegetação

Ocupação e uso do
solo

Foee de eecoam en
to "em c a ia i*

F i g u r a 2 3 .1 3 . E s q u e m a s im p lif ic a d o d e f u n c i o n a m e n t o d e u m m o d e lo d is tr ib u íd o
p a r a a tr a n s f o r m a ç ã o d e c h u v a d e r a d a r e m v a z ã o .
H id r o m e te o r o lo g ia c o m Radar 899

2 6 -F E V -1 9 8 7 05100

Os dodos de radar estdo calibrados por postos pluviométricos

F i g u r a 2 3 .1 4 . I n te g r a ç ã o d e s a t é l i t e , r a d a r e p o s to s p l u v i o m é t r i c o s .

D re n a g e m u r b a n a : P o lu iç ã o h íd r ic a , s a n e a m e n to , e n c h e n te s

A s e n c h e n t e s u r b a n a s tê m s id o m o tiv o d e g r a n d e p r e o c u p a ç ã o n a m a io r ia
d a s c i d a d e s d o p l a n e t a . C o m o a u m e n to g e r a l d a s p o p u la ç õ e s u r b a n a s , m e lh o r ia s
nos s is te m a s de d re n a g e m to m a m -s e im p e r a t i v a s . V azões não c o n tr o la d a s ,
d u r a n t e p e r í o d o s d e p r e c i p i t a ç ã o e x c e s s iv a , p o d e m l a n ç a r g r a n d e s v o lu m e s d e
e s g o to n o s c u r s o s d ’á g u a n a tu r a is , e c o m o c o n s e q u ê n c i a , a p o lu iç ã o e m r io s
q u e d r e n a m á r e a s u r b a n a s te m a u m e n ta d o c o n s i d e r a v e l m e n t e e m d iv e r s a s c id a d e s .
900 H id ro lo g ia

Segundo Forshaw e Walters (1990), um grande problema que contribui


significaúvamente para a dificuldade em se gerenciar um sistema de drenagem
urbana é a variabilidade espacial dos eventos de precipitação. Essa
afirmativa é justificada apresentando-se um exemplo real (a Cidade de Bolton,
na Inglaterra), onde se verifica que aproximadamente 70% dos extravasamentos
dos esgotos para os rios são decorrentes de precipitação localizada em
pequenas áreas da bacia de drenagem.
Como na operação de tal sistema utilizou-se inicialmente o método de
Thiessen para a estimativa da chuva, na área por postos pluvíométricos, havia
grande dificuldade com respeito à representação espacial dos fenômenos de
precipitação.
Para solucionar tal problema, a Cidade de Bolton achou por bem utilizar
dados de precipitação obtidos por radares meteorológicos, tendo em vista que
a aquisição e a manutenção de redes telemétricas para a quantificação da
chuva mostraram-se mais onerosas.
Estudos foram então desenvolvidos (Pessoa, 1990; Pessoa e Cluckie, 1990;
Pessoa, 1991) no sentido de adequar os modelos hidráulicos e hidrológicos
existentes para que os mesmos se beneficiassem dos dados de alta resolução
espacial e temporal fornecidos pelos radares meteorológicos (figura 23.15).
Atualmente, utilizam-se dados de radar em quase toda a Inglaterra, para o
projeto, a reabilitação e o controle em tempo rea! de sistemas de drenagem
urbana, com vantagem sobre as técnicas tradicionais que usavam somente
informações no ponto, fornecidas por pluviômetros.

Projeto de barragens

Os métodos mais utilizados para a estimativa das vazões de projeto de


barragens podem ser classificados em estocásticos e detenninísticos. Os
métodos estocásticos são baseados no cálculo estatístico da vazão com um
associado período de retomo.
Conforme Pessoa (1991a), entretanto, tal determinação pode variar
sobremaneira dependendo da técnica estatística adotada (distribuição, método
de ajuste, etc.). Os métodos determinísticos, por outro lado, são
considerados mais realísticos pelo fato deles tratarem dos próprios processos
físicos e não das suas probabilidades de ocorrência. Através desses métodos,
pode-se estimar a denominada Vazão Máxima Provável (PMF, do inglês P robable
M axim um F lood). A PMF é usualmente obtida a partir da Precipitação Máxima
Provável, PMP.
Em 1989, Pessoa apresentou um método mais reaiístico para a estimativa
da PMP, utilizando dados de tempestades reais, observadas por radares
meteorológicos. Através de tal método, faz-se possível a utilização de
modelos hidrológicos sofisticados, de parâmetros distribuídos, para a
obtenção da vazão de projeto para barragens (PMF).
H id r o m e te o r o lo g ia c o m Radar 901

P O S T O S P L U V lG M E T R íC O S
o { T E L E M E T R IA )

CONTROLE
OOS
VOLUM ES

PRO CESSAD O R
CENTRAL

Figura 23,15. Conceito de um sistema para previsão de vazão e controle em


tempo real de vazões urbanas (Pessoa e Cluclde, 1990).
902 Hidrologia

A figura 23.16 apresenta uma esquematização da metodologia desenvolvida


por Pessoa (1989) por meio da qual tempestades de radar são transpostas para
a bacia de projeto e maximizadas por três processos (no tempo, no espaço e
por umidade, conforme indicado na figura), para a estimativa da PMP.

Figura 23.16. Transposição e maximização de tempestades de radar para a


estimativa da PMP (Pessoa, 1989).

Navegação marítima

Um exemplo muito oportuno quanto aos benefícios decorrentes do uso de


dados de radar diz respeito às rotas de navegação no Atlântico:"Os gastos com
o traçado da melhor rota possível equivalem aos de um navio-tanque, de
tamanho normal, durante meia hora. Com uma previsão meteorológica adequada,
pode-se poupar tempo e recuperar até 24 vezes o dinheiro que tenha custado o
serviço de previsão” (Correio da UNESCO, 1975). Radares meteorológicos de
Hidrometeorologia com Radar 903

pequeno porte, como alguns radares de banda X, poderíam ser instalados em


posições estratégicas, como em pequenas ilhas, plataformas, ou mesmo em
alguns navios, para favorecerem o monitoramento, em tempo real, das
precipitações sobre os oceanos.
Além disso, os navios consomem dinheiro quando ficam imobilizados num
porto. Com chuva os estivadores não podem descarregar um navio; por outro
lado, manter um navio num porto sem que ninguém o descarregue, pode custar
milhares de dólares por dia. Portanto, um bom serviço de monitoramento da
precipitação, através do uso de radar, para atender às necessidades de um
porto, faz com que se poupe uma considerável soma de dinheiro.

Navegação fluvial

Os rebocadores que arrastam barcaças pelos rios do -Brasil não


precisariam recorrer ao instinto para evitar bancos de areia e escolhos, se
houvesse disponível um serviço de informação hidrometeorológica por radar que
pudesse prever, com antecedência, uma tempestade, com a decorrente previsão
de subida no nível do rio. Cada centímetro a mais de calado pode significar
muito mais carga a ser transportada.

Descargas elétricas na atmosfera

As tempestades convectivas podem ser associadas com as descargas


elétricas atmosféricas (isto é, raios). A observação desse fenômeno tem sido
realizada através de radar por muitos anos (para uma revisão sobre o assunto,
ver Doviak e Zmic, 1984). Os ecos de radar são produzidos pela reflexão dc
canais ionizados que carregam correntes elétricas criadas por flashes tanto
do tipo nuvem-solo quanto intranuvem. Uma teoria mais recentcmentc
desenvolvida (Collier, 1989) sugere que "a seção transversal de radar é
função da orientação do canal relativa à onda incidente de radar e algum
nível de temperatura e densidade de elétrons". Assim, radares com comprimento
de onda maiores que lOcm podem facilmente detectar raios a longas distâncias,
e, portanto, o uso destes para estudar a relação entre as descargas elétricas
atmosféricas e a estrutura das tempestades deve crescer consideravelmente em
um futuro próximo.
Pode-se, igualmente, detectar e localizar as descargas elétricas
atmosféricas através de sistemas do tipo LPATS (Lighlning Position And
Tracking System) e LLP (.Lightning Location & Protectiorí). Por meio de tais
sistemas pode-se visualizar em tempo real a progressão da atividade
elétrica das nuvens, e associar cada raio com a sua localização espacial
(latitude e longitude), hora e data de ocorrência, polaridade, forma da onda,
etc. O sistema LPATS está implantado, no Brasil, na Companhia Energética dc
Minas Gerais - CEMIG (ver Araújo et al., 1990) e tem demonstrado ser útil na
904 Hidrologia

operação de sistemas elétricos, além da sua importante contribuição para


pesquisa e desenvolvimento na área de raios, com vistas a melhorar o
desempenho dos sistemas de transmissão, distribuição e telecomunicações.
Houve tentativas de determinação da velocidade e direção de caminhamento
de tempestades através de sistemas do tipo LPATS (Araújo et al., 1990), mas
estes registram unicamente as tempestades com raios. Dessa forma, a adveção
destas pode ser a grosso modo estimada, mas é somente através do uso conjunto
do LPATS com os dados de radar, de satélite e de estações meteorológicas à
superfície que se consegue realmente localizar as tempestades e modelar o
caminhamento destas.
A figura 23.17 mostra um exemplo de um evento observado pelo sistema
LPATS, indicando o caminhamento dos raios produzidos por uma tempestade que
se move em relação a uma linha de transmissão de energia elétrica. A Figura
também mostra a visualização da tempestade se movimentando sobre a mesma
linha de transmissão, através de dois PPIs de radar (15h00min e 17h00min). A
figura apresenta, ainda, um perfil vertical da tempestade, observado por um
RHI de radar, por meio do qual se visualiza a profundidade da tempestade na
atmosfera. Através da figura, percebe-se a dificuldade em obter-se,
unicamente através do LPATS, uma idéia correta quanto à real direção de
deslocamento das tempestades. O LPATS não fornece, também, a distribuição
espacial da chuva, nem a localização das células mais intensas. Para isso,
recomenda-se o uso conjunto de dados de sistemas do tipo do LPATS, com os dc
radar, e também com informações de satélite.

Chuva Ácida

O fenômeno da chuva ácida (ou deposição ácida) pode causar grandes danos
à ecologia quando a concentração do poluente é alta. A vida aquática é
particularmente vulnerável (Schindler, 1988), mas o solo pode também ser
afetado de diferentes formas (Skefíington, 1987), assim como a qualidade da
água (Cosby et al.f 1985), as árvores (Andersson, 1986) e edificações
(Manning, 1987). A previsão de tais eventos envolvem o uso de modelos
numéricos que incluem a representação dos mecanismos de deposição. Além
disso, o conhecimento sobre a distribuição da precipitação é necessário para
calcular a lavagem de uma pluma de poluição e o efeito decorrente desta a
jusante. A composição de dados de radar, de satélite, de estações
meteorológicas e de sondagens, em associação com modelos numéricos,
possibilita a melhor estimativa a ser derivada em tempo quase real para
grandes áreas (Collier et al., 1989). Isso se faz fundamentai para a melhoria
dos sistemas de aviso, não somente de eventos prováveis de poluição por
sulfato e nitrato, mas também de materiais radioativos.
Hidrometeorologia com Radar 905

L in h a d e tra n s m iss ão d e
— s- Ae— » - - "energ ia e lé tr ic a .
, • T # •
D e sc arg a e íé tn c o (r o io i A
\ * * J n te rv a k a ó e Tempo p r é -
e s ta b e íe c id o s , a c o r d a s
" W l - . - - d escarg as n a te ia do com
putador se a lte ra , p a ra fã
c iiito r o visualizoçâo.

Direção de cam ioham ento


d a tem pestade, estim odo a
T S y rir do s is te m a L P A T S .

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víeuafcaada pe*o P P f do
rad ar, p erm itin d o u n ia
in fe rê n c ia m a s < ^ tíq
ve) d a suo d ireção as
aom if^ a m e n to e evo fcj-
çoo.

Figura 23.17. Rastreamento de descargas atmosféricas pelo LPATS, e de


tempestades pelo radar meteorológico.
906 Hidrologia

Desenvolvimento de estudos sobre precipitação

As medições de precipitação, sejam por postos pluviométricos, radares,


satélites, disdrômetros ou por qualquer outro meio, são sujeitas a erros
amostrais. Além disso, os -instrumentos podem estar medindo naturezas
diferentes do fenômeno de precipitação. Um exemplo disto, como já foi
mencionado, é o pluviômetro, que registra informações de precipitação no
ponto, enquanto que o radar proporciona dados volumétricos do mesmo evento
(figura 23.1).
Para solucionar essas dificuldades decorrentes das diferentes maneiras
que cada tipo de aparelho amostra a precipitação e para obter medições com
alta resolução espacial e temporal, tem-se combinado dados de disdrômetros e
pluviômetros (Hosking e Stow, 1986) com os dados de radar (Stall and Huff,
1971; Konrad e Kropfli, 1975; Goldhirsh e Musiani, 1986) e dados de satélites
(Browning e Collier, 1982), obtendo-se, assim, uma descrição mais completa e
detalhada dos campos de precipitação.
As redes de postos pluviométricos são inevitavelmente sujeitas a erros
amostrais que, particularmente para os eventos de curta duração, podem
introduzir tendenciosidades significativas. Como resultado disso, modelos
estocásticos de precipitação têm sido estudados, com objetivos
hidrometeorológicos (para uma revisão, ver Georgakakos e Kavas, 1987). Porém,
a aplicação desses modelos é geralmente dificultada pela deficiência dos
dados, tanto em qualidade quanto em quantidade. Essa situação será certamcntc
alterada com a criação de extensos bancos de dados de radar. Entretanto,
novos problemas serão provavelmente introduzidos nas análises utilizando
históricos de chuva de radar, e, portanto, a necessidade de modelagem da
precipitação deverá persistir. Dever-se-á, igualmente, realizar estudos no
sentido de adequar os modelos aos dados de entrada distribuídos no espaço,
fornecidos pelo radar.
Zawadski (1973) desenvolveu estudos utilizando radares para analisar
estatisticamente os campos convectivos de precipitação de mesoescala. Estudos
têm sido igualmente desenvolvidos, considerando-se o dimensionamento fractal
das chuvas de radar (Lovejoy, 1982; Lovejoy e Mandelbrot, 1985), propondo-se
que, na atmosfera, escalas grandes e pequenas são relacionadas entre si por
magnificação, em conjunto com estratificação e rotação. Assim, faz-se
importante desenvolver modelos multidimensionais realísticos da
precipitação, se a descrição estatística verdadeira dos sistemas puderem ser
reproduzidas.

Desenvolvimento de estudos sobre climatologia urbana

O número de áreas urbanas tem crescido no Brasil, e em vários países,


desde a Revolução Industrial (Oke, 1985). Por muitos anos tem-se verificado
Hidrometeorologia com Radar 907

que as cidades possuem climas que são significativamente diferentes das áreas
rurais que as cercam (Chandler, 1965)- Em particular, têm sido desenvolvidos
diversos estudos com referência ao efeito de que a temperatura em áreas
urbanas pode ser vários graus superior àquela nas áreas fora das cidades
(para uma revisão, ver Oke, 1982).
Oke (1985) investiga as diferenças que têm sido observadas ou previstas,
entre as áreas urbanas e as regiões rurais que as cercam, analisando locais
em zonas temperadas e tropicais. Dessa investigação toma-se claro que a
urbanização produz mudanças em parâmetros hidrometeorológicos, o que afeta o
tempo e o clima. Infelizmente, tais alterações não são sempre de fácil
identificação a partir das variações naturais. Mesmo assim, com o
desenvolvimento das cidades, vilas e núcleos populacionais, mudanças de longo
termo poderão ser reveladas, por meio de estatísticas hidrometeorológicas.
Para que tal análise venha a ser realizada, faz-se necessário a existência de
extensos bancos de dados hidrometeorológicos. Além disso,"para a verificação
da interação dinâmica de áreas urbanas, faz-se necessário que os bancos
hidrometeorológicos contenham dados de sondagens e de radares meteorológicos1
(Changnon e Huff, 1986). Modelos numéricos de mesoescala proporcionariam,
igualmente, uma maior dimensão a tais estudos.
Segundo Collíer (1989), "os dados de alta resolução fornecidos por
radares, referentes a regiões urbanas- quando usados em conjunto cor.i modelos
numéricos, deverão fornecer informações valiosas para estudos futuros sobre
os efeitos da urbanização nos fenômenos de precipitação e velocidade do
vento".

Desenvolvimento de estudos sobre alterações climáticas

Os arquivos de dados de radar se constituirão em fontes valiosas de


informações para a realização de investigações sobre os efeitos de alterações
climáticas no ciclo hidrológico.
Como exemplo de estudos nesta direção, pode-se citar o trabalho de Nemec
(1985), que examina as alterações nas vazões de rios produzidas por mudanças
na precipitação induzidas por uma possível alteração de clima.
O conceito de combinar diferentes tipos de dados meteorológicos com
dados biológicos e ecológicos, tem se tomado conhecido por monitoramento
climático integrado (Izrall, 1983; Munn, 1986). Com um apropriado arquivo de
dados, sendo este constantemente atualizado, faz-se possível desenvolver
modelos que simulem diferentes aspectos relacionados com as alterações
climáticas. Um exemplo disso é o trabalho de Potter et al. (1975), que
apresentam um modelo que relaciona alterações climáticas à remoção de
florestas tropicais. Há que se mencionar, igualmente, o trabalho de Salati et
al. (1985), que trata do impacto do deflorestamento da bacia Amazônica na
precipitação. Tais modelos, juntamente com um apropriado banco de dados
908 Hidrologia

hidrometeorológicos, contendo dados detalhados de precipitação obtidos por


redes de radares meteorológicos, devem permitir, no futuro, uma avaliação
mais apropriada de tendências e a identificação de alterações ecológicas
inesperadas induzidas por atividades humanas.

Comentários

Neste capítulo foram apresentados alguns conceitos básicos sobre


radares m eteorológicos convencionais e m encionadas aigum as aplica­
ções hidrom eteoroiógicas para os seus dados. Nos países m ais desen­
volvidos, os radares contribuem efetivam ente para a boa qualidade das
previsões de tempo, beneficiando enorm em ente as diversas atividades
produtivas. Os radares, hoje, proporcionam às sociedades e às com uni­
dades produtoras um serviço de apoio às ações dc desenvolvim ento c
segurança dos potenciais econôm icos. No Brasil o uso do radar é re­
cente, mas o seu núm ero tem aumentado bastante. A crcdita-se que, em
um futuro reíativam ente próxim o, nós seguirem os a tendência dos pa­
íses m ais desenvolvidos e im plantarem os uma rede nacional de rada­
res m eteorológicos.

PROBLEMAS

1 - Descreva o satélite, o radar e o posto pluviométrico nas suas


características diferenciadas de registrar eventos de precipitação.

2 - Por que as medições de precipitação por radar são consideradas de


sensoriamento remoto ?

3 - Um radar de banda S 6 mais apropriado do que um radar de banda X para


quantificar a precipitação cm regiões onde as intensídades de chuva são
geralmente elevadas ? Justifique.

4 - Descreva três fatores que podem afetar a qualidade dos dados de


intensidade de precipitação obtidos através de radar.

5 - 0 que é a propagação anômala e quando ela ocorre ?

6 - O que são o PPI e o RHI ? Descreva-os.

7 - 0 que são os CAPPls e como eles são obtidos ?

8 - A parte superior da figura 23.18 mostra uma tempestade sobre uma bacia
Hidrometeorologia com Radar 909

hidrográfica. Quanto mais escuro o hachureado, maior é a intensidade de


precipitação. O instante representado corresponde, em relação ao início do
evento, a t = 2h 30min. Essa tempestade teve uma duração total de 4h e a
distribuição no tempo das alturas de chuva está indicada na parte inferior da
figura, a qual representa a chuva registrada pelo posto pluviométrico e a
chuva média na bacia obtida através dos CAPPIs de radar. Baseando-se nessas
informações, e tendo em vista que a estrutura celular (isto é, a distribuição
espacial) da tempestade praticamente não se alterou durante as 4h:

a) indique na figura superior o sentido e a direção prováveis do caminhamento


da tempestade;
b) estime a velocidade média de deslocamento da tempestade (valor
aproximado);
c) na sua opinião, por que o gráfico da chuva por radar, mostrado na parte
inferior da figura, está sistematicamente abaixo do gráfico correspondente
aos registros do posto pluviométrico ? Em que situações isso podería
acontecer ?
d) na situação específica da figura, você teria mais confiança na
quantificação da precipitação sobre a bacia através do radar ou do posto
pluviométrico? Justifique.

9 - A função de correlação de chuva acumulada em um determinado local começa


a oscilar a distâncias de separação de lGGKm. Havendo dez postos
píuviométricos em uma área de 5.000 Kin^, assim como um radar, qual seria o
aumento relativo esperado na qualidade dos dados ao se usar o sistema
radar/postos ao invés de simplesmente radar ?

10 - No item 23.5 deste capítulo (na seção Desenvolvimento de estudos sobre


precipitação, são mencionados os disdrômetros. Faça uma pesquisa sobre esses
equipamentos e procure responder para que eles servem, como funcionam e o que
propriamente medem.

11 - Faça uma lista de pelo menos quatro atividades, não hidrometeoroiógícas


que, na sua opinião, poderiam-se beneficiar através do uso do radar
meteorológico. Justifique a inclusão de cada atividade na sua lista.

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914 Hidrologia

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Capítulo 24

E L E M E N T O S D E E N G E N H A R IA D E S E D IM E N T O S

Marc P. Bordas e Franz R. Semmelmann

24.1 Ciclo Hidrossedimentológico

Em seu movimento rumo à saída de uma bacia hidrográfica, a água


por esta interceptada flui sobre (ou dentro) as rochas e os solos que for­
mam ou revestem as vertentes e as calhas da rede de drenagem. Os obs­
táculos que então encontra determinam os caminhos que eia vai seguir e
a velocidade com que se deslocará, e dissipam boa parte de energia de
que está orovida, ao propiciar que partículas sólidas sejam removidas c
transportadas vertente ou rio abaixo, pelo fluxo líquido. Embora esporá­
dicos, os deslocam entos dos sedimentos carregados pelo escoamento su­
perficial e outros processos acabam provocando o remanejo c a redistri-
buição pela bacia de ponderáveis massas dc partículas sólidas, a ponto
de poderem eventualmente alterar o ciclo hidrológico e, certamente, afe­
tar o uso, a conservação e a gestão dos recursos hídricos.
Assim , paralelam ente ao ciclo da água, existe outro ciclo, aberto,
intim am ente vinculado ao ciclo hidrológico e deste totalm ente depen­
dente, que envolve o deslocamento, o transporte e o depósito de partícu­
las sólidas presentes na superfície da bacia. Por analogia com o ciclo
continental da água, pode ser chamado de ciclo hidrossedim entológico,
apesar das m oléculas de água, os sedim entos não terão como voltar ao
meio de onde provêm.
Há bem pouco tempo, o ciclo hidrossedimentológico não despertara
interesse semelhante àquele dispensado ao ciclo hidrológico. Raros são os
manuais de hidrologia que a ele se referem, a não ser indireta e parcial­
mente para tratar dos prejuízos que os sedimentos podem causar a algum
aproveitam ento hidráulico (o caso mais notório diz respeito ao assorea­
mento de represas). A gestão integrada dos recursos hídricos, os riscos de
degradação dos solos, dos leitos dos rios e dos ecossistemas fluviais e es-
tuarinos, ou de contaminação dos sedimentos por produtos químicos, leva­
ram a reconsiderar essa postura e a dar maior atenção aos problemas que
podem decorrer das alterações do ciclo hidrossedimentológico natural.
Não é sem razão que ocorreu tal mudança de atitude. Estudos sobre os
916 Hidrologia

custos dos impactos decorrentes da remoção não controlada dc sedimentos


de bacias hidrográficas dos Estados Unidos (Clark ct ai., 1985; Ribaudo e
Young, 1989) apontaram prejuízos anuais fora das áreas cultivadas de USS
6,8 bilhões, aos quais se somam outros 2,2 decorrentes da erosão nas la­
vouras. Estimativas mais recentes, citadas em ABRH (1991), indicam que o
quadro podería ser ainda mais preocupante: os prejuízos orçariam USS 20
bilhões por ai%© para a América do Norte, dos quais 12 corresponderíam a
prejuízos nas áreas cultivadas (o n - fa r m ) e 8 às bacias ou áreas sem uso
agrícola
Além dos efeitos negativos decorrentes da erosão e degradação do solo nas
lavouras, esses prejuízos se referem principalmente a custos rei acionados a:

- perdas de produção agrícola decorrentes do recobrimento de áreas lavou­


ras por sedimentos estéreis e do encharcamento das mesmas, resultantes
da obstrução de drenos naturais;
- assoreamento de reservatórios;
- manutenção de sistemas de irrigação c dc drenagem;
- dragagem de vias navegáveis e portos;
- tratamento de água para uso industrial c doméstico;
- manutenção de rodovias, ferrovias c oleodutos;
- remoção de sedimentos das zonas atingidas pelas inundações.

Nas regiões tropicais c subtropicais, nas quais a maior agressividade dos


regimes pluviométricos faz com que esses fenômenos sejam naturalmcntc mais
intensos que nas regiões temperadas, é dc se esperar que o desequilíbrio do cicio
hidrossedimentológico tenha potcncíaímcntc conscqücncias ainda mais preju­
diciais.

24.2 Processos e componentes do cicio hidrossedimentológico

Assim como é possível distinguir os principais fenômenos que compõem o


ciclo hidrológico (interceptação, evaporação, infiltração, etc), c também possí­
vel identificar os processos que regem o deslocamento de partículas sólidas, que
em conjunto constituem o cicio hidrossedimentológico. Esses processos são de-
sagregação, separação ou erosão, transporte, decantação (ou sedimentação), de­
pósito e consolidação.

Desagregação - A desagregação se refere ao desprendimento de partícu­


las sólidas do meio do qual fazem parte; ela pode-se dar sob efeito de reações
químicas, flutuações de temperatura, ações mecânicas ou outros fatores natu­
rais que não envolvem diretamente o ciclo hidroiógico. Mas o impacto das gotas
de chuva sobre o solo é o processo que, após a ação do homem, mais contribui
para essa desagregação. Todos esses processos têm por resultado final deixar
Elementos de Engenharia de Sedimentos 917

uma massa de partículas sólidas exposta à ação do escoamento superficial das


águas de chuva que não se infiltraram no solo ou não foram evaporadas,
constituindo, portanto, um estoque de material sólido suscetível de ser posto
em movimento pelas águas superficiais ou outros processos de escoamento. Dele
provêm todas as partículas sólidas que serão remanejadas pela ação das águas,
exceção feita daquelas transportadas ou depositadas pelo vento, e que a água
pode encontrar no seu caminho rumo ao oceano.
O estoque de material sólido, finalmente constituído por esses
processos, é composto de elementos de vários tamanhos e feições entre os
quais costuma-se distinguir alguns grupos principais:

- argila, com diâmetro d < 0,002 mm (2 microns);


- silte, 0,002 < d < 0,060 mm;
- areia, 0,060 < d < 2 mm;
- cascalho, 2 mm < d < 60 mm;
- seixo, 60 mm < d < 200 mm e
- pedras/pedregulho/matacão, d > 200 mm.

A esses elementos ditos primários, devem scr acrescidos os-agregados,


constituídos por conjuntos de elementos primários, unidos entre si pela ação de
partículas dc argila, maícria orgânica e outros materiais agregantes cujos diâme­
tros podem alcançar alguns milímetros.
A densidade media dos elementos primários varia com a natureza da rocha
da qual procedem, na maior parte dos casos adota-sc o valor dc 2,6o que corres­
ponde â densidade do quartzo. A densidade dos agregados c menor c c gerai-
mente estimada em 1,6/1,8.
As partículas, ou conjuntos formados por estas, que assim sc des­
prenderam do seu meio de origem, encontram -se na superfície do solo
ou nas paredes dos leitos cavados pelas águas superficiais, mas podem
cvcntualm cnte encontrar-se no seio do próprio escoam ento, como no
caso das partículas mais finas arrancadas pelo impacto das gotas.de chu­
va e levadas pelo escoamento.

Erosão - Entende-se por erosão o processo de deslocamento de seu local


de origem das partículas solidas da superfície do solo ou das paredes dos leitos
dos córregos e rios, sob efeito do escoamento. Esse deslocamento ocorre quan
do as forças hidrodinâmicas exercidas pelo escoamento sobre uma partícula ul­
trapassam a resistência por cia oferecida. A resistência tem sua origem, pnnet
palmente, no peso da partícula e nas forças de coesão. A coesão constitui a força
de resistência por excelência das partículas mais finas, enquanto o peso da par
tícula é a principal força resistente para as areias e o material mais graúdo. ^
primeiro caso, os sedimentos são qualificados de coesivos, no segundo de nao
coesivos ou granulares.
918 H id r o lo g ia

TVansporte - O processo de transporte do material erodido pela água pode se


dar de várias maneiras. As partículas mais pesadas deslocam-sè sobre (ou junto
ao) o fundo por rolamento, deslizamento ou, eventualmente, por saltos curtos
(fenômeno de saltação). Constituem a chamada descarga sólida de fundo ou
arraste. As mais leves deslocam-se no seio do escoamento e constituem a des­
carga sólida em suspensão. Estas podem provir da bacia vertente (neste caso
constituem o que se costuma chamar de deplúvio (wash-load), ou do fundo c
paredes da calha, enquanto o arraste é exclusivamente constituído de material
encontrado no fundo.

Decantação - A decantação (ou sedimentação) designa o processo pelo qual as


partículas mais finas transportadas em suspensão, tendem a restabelecer
contato com o fundo do leito sob efeito da gravidade. No processo de
sedimentação encontram a resistência do meio fluido em que estão envoltas,
que as impede ou freia sua queda para o fundo, sobretudo por efeito da
turbulência.

Depósito - Designa-se por depósito a parada total da partícula em suspensão


recém decantada sobre o fundo, ou daquela transportada por arraste. Difere da
decantação, embora seja por vezes com esta confundida, pois uma partícula
recém-decantada pode continuar movimentando-se após entrar cm contato com o
fundo, de acordo com as forças hidrodinâmicas existentes rente ao fundo.

Consolidação - A consolidação segue-se ao depósito das partículas. Designa o


acúmulo de partículas sobre o fundo e a compactação do depósito resultante
sob efeito do próprio peso dos sedimentos, da pressão hidrostática ou
qualquer outrofenômeno que venha a aumentar a densidade dos depósitos
(efeito do esvaziamento de uma represa por exemplo).

A seqüência dos processos presentes no ciclo hidrossedimentológico á


ilustrada na figura 24.1. Dos seis processos descritos, dois (a erosão e o
depósito) se sobressaem pela maior importância de suas consequências e por
seu papel-chave na redistribuição dos sedimentos dentro de uma bacia
hidrográfica.

2 4 3 As alterações do ciclo hidrossedimentológico

Com o passar do tempo, os processos em ação no ciclo


hidrossedimentológico acabam por moldar as feições das bacias hidrográficas
(principalmente quando sua intensidade é maior do que os processos vinculados
à dinamica interna), dando-lhes as formas que hoje conhecemos (figura 243):
E le m e n to s d e E n g en h a ria d e S ed im en to s 919

L e g e n d a : D G c D G ’= P r o d u t o s f i n a i s d a d e s a g r e g a ç ã o ; E = erosão ( E l do m a ­
terial m a i s g r a ú d o , E 2 d o m a is fino); T = t r a n s p o r t e ( T A p o r a rra ste,
T s c m su sp en são ; T s = E2 + D P L ); D P L = dcplúvio, d e sc a rg a sólida
o riu n d a da b acia vertente; D C = d e ca n ta çã o ; D = D ep ó sito ; L = G on-
s o lid a ç ã o do depósito.

Figura 24.1. Trajetória de partículas sólidas ao longo do ciclo


hidrossedimentológico

- perfis longitudinais dos cursos d*água e dos interflúvios mais suaves


que originalmente, em decorrência da erosão das cabeceiras e da formação
de depósitos nas partes mais baixas;
- rede de drenagem mais densa e mais entalhada na parte superior da
bacia do que na inferior, cercada por várzeas cuja extensão lateral
aumenta geralmente ao se aproximar o rio de sua foz;
- leitos que também vão-se alargando de montante para jusante, e cujo
maiciial de fundo vem simultaneamente diminuindo de tamanho.

Essas formas estruturam-se funcionalmente de modo a compor os três


grandes conjuntos que constituem as peças mestras do sistema natural de
produção de sedimentos de qualquer bacia, ou seja;

A) interflúvios ou vertentes que constituem a área de captação e


proó;.vão dos sedimentos;
B ) le ito s o u c a lh a s e m q u e se c o n c e n tr a o e s c o a m e n to e q u e têm p o r
p a p e l p r in c ip a l a p r o p a g a ç ã o até a s a íd a d a b a c ia d o c o m p le x o
920 H id r o lo g ia

água/sedimentos produzido pelos interflúvios, e


C) planícies aluviais ou várzeas que circundam as calhas e que
funcionam como receptores dos sedimentos produzidos mais a montante,
quando os rios transbordam, ou como áreas fornecedoras de sedimentos
no resto do tempo.

Blocf y _________ Ar«iq________ ^ Siit«______ ^ Argj|o

* I
' M ATERIAL 0£ FUNOO PR ED O M IN A N TE i
i

Figura 24.2. Sistema fluvial e processos hidrossedimentológicos


E le m e n to s d e E n g e n h a r ia d e S e d im e n to s 921

T odas essas feições resultam de u m d em o rad o p ro cesso dc adaptação,


p ro d u to d a d e g r a d a ç ã o len ta do relevo s o b a ção d o s p ro c e s s o s p re s e n te s no
ciclo h id ro s s e d im e n to ló g ic o , e sem a influ ên cia do h o m e m , a n ã o ser exccpci-
o n a lm e n te . N o s is te m a fluvial assim cria d o p re d o m in a m a e ro s ã o no trecho
su p erio r da red e d e d re n a g e m , o transporte no trecho m e d io e os d ep ó sito s no
c u rs o inferior. O n d e e x iste solo, a e ro são nas vertentes (c o n h e c id a c o m o e ro ­
são g e o ló g ic a , p o r o p o s iç ã o à erosão acelerada dc o rig em an tró p ica) p ro c e s ­
so u -se em ritm o c o m p atív el c o m a fo rm ação do m esm o , g ara n tin d o dessa for­
m a a e v o l u ç ã o e q u i l i b r a d a d o s is te m a , m a n t i d a s as c o n d i ç õ e s t c c t ô n i c a s e c li­
m áticas.
A p r e s e n ç a e a a çã o do h o m e m v ieram alterar esse q uadro. S u as in ú m eras
a tiv id ad es a c e le ra ra m a e ro s ã o natural d o s interflúvios, a u m e n t a r a m as a g re s­
s õ e s às c a lh a s d o s rios e a c a b a r a m a u m e n ta n d o o s d e p ó sito s e a in sta b ilid a d e
d o s leitos fluviais. E n tre as atividades que m ais afetam o ciclo h id ro s s e d im e n to ­
ló g ico d e s ta c a m - s e o d e sm a ta m e n to , a agricultura, a u rb an ização , a m in eração ,
a c o n s tr u ç ã o de estrad as, a retificação e o b a rra m e n to dos cu rso s dc água. C on-
s e q ü e n t e m e n t c e r o s õ e s c d e p ó s i t o s v e m - s e m u l t i p l i c a n d o , c, c o m e l e s , p r o l i f e ­
ra m os p r e ju íz o s l ig a d o s ta n to à re d is trib u iç ã o d o s v o l u m e s d c s e d i m e n t o s cro-
didos, c o m o , e m alg u n s casos, à deterioração da qualidade d esses sed im en to s, a
p o n to de io rn á-la p e rig o s a para a vid a aquática. R iscos c p reju ízo s a ssim criados
p o d e m ficar restritos ao locai d a agressão, m as g c ra lm cn te são e s p a lh a d o s pelas
a r c a s s i t u a d a s m a i s a j u s a n t e , às v e z e s e m p o n t o s m u i t o d i s t a n t e s do. f o c o q u e
lhes d e u o rig e m . P o r o u tro lado, sã o c o n h e c id o s c a so s em q u e á reas a m o n ta n te
d c u m t r e c h o d o rio, p a l c o d c in te rfe rê n c ia a n tró p ic a , fo r a m t a m b é m a fe ta d o s ,
p o r e x e m p lo , p o r e ro s ã o regressiva.
A s a lte ra ç õ e s d a í d e c o rre n te s p o d e m scr ráp id as ou lentas, e s p e ta c u la re s -
ou insidiosas. A f o r m a ç ã o de v o ço ro cas, a e ro s ã o das m a rg e n s d o s rios, ou o
a s s o r e a m e n t o d e r e s e r v a t ó r i o c o n s t i t u e m as m a n i f e s t a ç õ e s m a i s f a c i l m e n t e
p e rc e p tív e is d e s s a s a lte ra ç õ e s; o m e s m o n ã o a c o n te c e c o m o re b a ix a m e n to ou
a s o b r e l e v a ç ã o d o f u n d o d e u m rio, q u e d e m o r a m g e r a l m e n t e v á r io s a n o s a n ­
tes d e s e r e m d e t e c t a d a s ; e s s e fa to d if i c u lta s o b r e m a n e i r a a s o l u ç ã o d o p r o b l e ­
m a , ( s u p o n d o q u e a i n d a h á c o m o r e v e r t e r a s i t u a ç ã o e n c o n t r a d a ) . E, p o r t a n t o ,
f u n d a m e n t a l d e t e c t a r e m t e m p o h á b il as a lt e r a ç õ e s q u e p o d e m e s ta r o c o r r e n ­
do no ciclo h id ro ssed im en to ló g ico . A m a n eira m ais p rática dc fazê-lo consiste
em m e d ir as d e s c a rg a s só lid as e v azõ es líquidas e piorar os v o lu m e s anuais
acu m u lad o s de sed im en to s em função dos v o lu m es de água correspondentes:
a c u r v a a s s i m o b t i d a p e r m i t e c o n h e c e r as t e n d ê n c i a s d a e v o l u ç ã o d a p r o d u ç ã o
efetiva de s e d im e n to s e prever possíveis deseq u ilíb rio s d o ciclo h id ro ssed i-
m e n to ió g ic o . A fig u r a 2 4 .3 ilustra e sse p ro c e d im e n to : m o s tr a o s e fe ito s d a
c o n stru çã o d a b arrag em de G rand C anyon sobre a hid ro ssed im en to lo g ia do
rio C o l o r a d o ( U S A ) .
922 H id r o lo g ia

Figura 24.3. Diagrama duplo acumulativo dos volumes de água e sedimentos


transportados pelo rio Colorado ao Grand Canyon, USA. (Bureau of
Reclamation, USA- citado por SUNDBORG/WHITE ^m UNESCO 1982).

D e te c ta r as alteraçõ es em c u rso no ciclo h id ro s s c d im c n to ló g ic o constitui


a p e n a s u m p rim e iro p asso . D a d o cssc p asso c n e ce ssá rio s a b e r o n d e elas v ão-sc
m a n i f e s t a r e, f e i t o i s s o , v e r i f i c a r s e p o d e m s e r i m p e d i d a s o u c o n t r o l a d a s . H á .
p o rta n to , q u e tentar re s p o n d e r u m a p rim eira perg u n ta: estará d e te r m in a d o o tre­
c h o d a tra je tó ria s e g u i d a p e l a m i s t u r a á g u a - s e d i m e n t o d a s c a b e c e i r a s ate a foz
su je ito a so frer u m re b a ix a m e n to p o r erosão, ou u m a so b rc ícv a ç ão p o r d e p o si­
ç ã o d o s só lid o s e m trânsito?'

24.4 Erosão ou Depósito?

Teoricamente, 6 fácil formular o problema - pelo menos em termos


genéricos - basta determinar se a descarga sólida que entra no trecho de
calha considerado é superior ou inferior à capacidade de transporte do
escoamento desse trecho. Se for superior, haverá depósito; se for inferior
haverá erosão (caso essa seja possível). Bastaria, portanto, conhecer duas
grandezas: a descarga sólida que penetra no trecho de canal considerado
(ainda chamada de descarga sólida de abastecimento) e a capacidade de
transporte.
Na prática o quadro é bem mais complexo, pois, como já foi visto
anteriormente (item 24.2), existem várias modalidades de transporte, e,
portanto, vários valores da descarga de abastecimento e diversas expressões
E le m e n to s d e E n g en h a ria d e S ed im en to s 923

da capacidade de transporte. Além disso, as capacidades de transporte não


possuem um valor máximo único: existe um valor limite que esse máximo não
pode ultrapassar, mas abaixo desse limite o valor máximo é suscetível de
variar de acordo com as circunstâncias. Assim a capacidade de transporte por
suspensão será alterada pela própria carga de sedimentos em trânsito. Por
sua vez a capacidade de transporte por arraste pode diminuir ou aumentar de
acordo com a existência, sobre o fundo, de deformação locais (rugas,
dunas...) de geometria variável, que dissipam, por atrito, parcelas (também
variáveis e às vezes substânciais) da energia de que o escoamento é dotado, e
que não podem ser mais utilizadas para o transporte dos sedimentos.
Tentando sintetizar e procurar um critério para aparecimento de erosão
ou depósito, podemos expressá-lo este por:

G sta - XT (24.1)

após simplificar o problema ao considerar somente uma descarga sólida, dita


total, que reune suspensão e arraste em um único termo. Na expressão acima,
Gslji= Descarga sólida total de abastecimento; T = a capacidade de transporte
total q X - um operador que dá conta das possibilidades de adaptação da
capacidade de transporte.
Q u a n d o X p r o p o r c i o n a r o v a l o r m á x im u m m a x im o ru m T in;iX à c a p a c i d a d e
d e t r a n s p o r t e , h a v e r á d e p ó s i t o s e G^la > T max. H a v e r á e r o s ã o s o b d u a s c o n d i ç õ e s ;
G s(a < T min e s e o m a t e r i a l d e f u n d o p u d e r s e r r e m o v i d o . S e e s s a ú l t i m a c o n d i ç ã o
n ão o co rrer h av erá nova alteração da c a p a c id a d e de transporte, q u e passará a
crescer de novo. E ssa últim a situação p o d e ocorrer em é p o c a de e n ch e n te , cm
trecho de fu n d o ro c h o so recoberto, e m épocas de águas m éd ias, p o r u m a c a m a ­
d a d e areia.
L id a r c o m p ro b le m a s de ero são e d e p ó sito de s e d im e n to s requer, portanto,
o c o n h e c im e n to d a c ap acid ad e d e transporte de u m escoam ento a superfície
livre e d a d e s c a rg a só lid a d e ab astecim en to . E ssas d u a s n o ç õ es, fu n d a m e n ta is
p ara en ten d er e praticar a engenharia de sedim entos, são a seguir exam inadas.

24.4.1 C apacidade de transporte

R efere-se à q u a n tid a d e m á x im a de sólido que u m e s c o a m e n to a superfície


livre p o d e tra n sp o rta r. N ã o deve ser c o n f u n d id a c o m a c o m p e t ê n c i a d o e s c o a ­
m en to , a qual d e sig n a o m aio r ta m a n h o das partículas sólidas que esse pode
carrear.
O ciclo se d im en to ló g ico é acionado p ela energia de qu e d isp õ e a água em
m o v im e n to . U s a n d o c o m o referência a m a s s a d e á g u a c o n tid a n o v o lu m e d e fluido
924 Hidrologia

acima da unidade de superfície do fundo da calha, a energia (E) disponível


no volume de referência vale:

E = y.q.At.1 (24.2)

pois corresponde à energia perdida pelo volume de água AW = q.Àt ao percorrer


o trecho da calha de comprimento unitário. Nessa expressão y = o peso
específico do líquido; q = a vazão líquida por unidade de largura, e I = a
declividade da linha de energia.
A potência dissipada vale, portanto:

P - y.q.I (24.3)

ou

P = t. V (24.4)

se ela for expressa em função das variáveis dependentes do escoamento (x =


tensão de cisalhamento na parede, igual a yhl (sendo h ~ a profundidade média
do escoamento), e V = a velocidade média do fluido).
A dissipação dessa potência ocorre por efeito de atrito no fundo da
calha e por transporte dos sedimentos, de modo que:

Yql = GqOa + t o ])s (24.5)

expressão em que o índice a se refere às perdas por atrito e o índice s às


que envolvem o transporte dos sedimentos.
A capacidade de transporte total de sedimentos Tt sendo função da
parcela (yql)s, a mesma tem por expressão genérica:

T t = f(yql)s = ffyql - t a D a l (24.6)

S e no s referirm o s e sp e c ific am e n te à c a p a c id a d e de tran sp o rte p o r arraste,


q u e deve ser u s a d a in ic ia lm e n te para s a b e r se o c o rre rá ou n ã o d e p ó sito s o b re o
fu n d o d a c alh a , a m e s m a valerá:

Tar = f Yqi - CraOa - (Tqi)ss (24.7)

já que obviamente (7ql)s = (yql)^ + (yql)ss. O índice ar refere-se ao


transporte por arraste; o índice ss ao transporte em suspensão.
Elementos de Engenharia de Sedimentos 925

O conhecimento da capacidade de transporte que importaria expressar


está, portanto, intimamente ligado ao conhecimento da dissipaçao de energia
por atrito e por suspensão. É assunto muito complexo e constitui um dos
núcleos principais da mecânica fluvial, que é a parte da engenharia de
sedimentos que se dedica ao estudo dos processos que ocorrem no leito dos
rios. O estudo desses fenômenos foge ao escopo do capítulo. Basta, por
enquanto, indicar que, na prática diária, são usadas as fórmulas de descarga
sólida por arraste para expressar a capacidade de transporte por arraste,
considerando que cías traduzem o maximum maximorum da descarga sólida de
fundo que o escoamento pode transportar. Os valores assim determinados variam
muito de uma fórmula para outra; isso toma seu emprego aleatório e explica a
existência de pesquisas destinadas a identificar experimentalmente as
condições em que ocorrem os depósitos de sedimentos em águas correntes.

24.4.2 Descarga sólida de abastecimento

A descarga sólida de abastecimento dc um trecho dc calha pode ser deter­


minada direta ou indirctamente. no primeiro caso por medição in lo c o , no segun­
do, através de fórmulas que expressam a descarga, seja cm função das caracterís­
ticas hidráulicas do trecho de rio situado irnediatamente a montante daquele cm
estudo, seja cm função das características da bacia contribuinte Por ser ainda o
método mais confiável, dar-sc-á maior destaque á medição dc descarga sólida,
discutido no item (24.5).

Fórm ulas de descarga solida

Essas fórmulas são muitas: algumas expressam a descarga sólida por ar­
raste, outras a descarga sólida em suspensão ou ainda a descarga sólida total.
Para serem aplicadas elas exigem o conhecimento de algumas características
hidráulicas do escoamento (profundidade, velocidade ou vazão) e das propri­
edades do sedimento transportado e/ou em contato com o fundo. De acordo
com a finalidade procurada, far-se-á uso de um tipo de fórmula ou dc outro:
querendo prever a erosão ou formação de depósito na calha, usar-sc-á uma
fórmula de arraste; avaliar o assoreamento de uma represa requererá, além
disso, o cálculo da descarga sólida em suspensão, enquanto que a estimativa
da descarga total será mais apropriada para o diagnóstico do estado de equilí­
brio do ciclo hidrossedimentológico (ver item 24.3), para citar somente alguns
exemplos mais comuns.

Descarga sólida por arraste - As fórmulas usadas para o cálculo dessa


modalidade de transporte são de três tipos:

a) as que fazem uso de valores críticos das características hidráulicas acima


H id r o lo g ia
926

dos quais o escoamento se toma competente para o transporte de partículas de


um certo diâmetro, ou de uma mistura de sedimentos granulares de diferentes
tamanhos. As características usadas são a tensão de cisalhamento sobre o
fundo (t = yhl), a velocidade média, ou a vazão. Pertencem a esse grupo as
equações propostas por

Duboys (1879) gs = K (x - xc) (24.8)

Shields (1936) gs = Kql (x - Xc) (24.9)

Meyer Peter e Müller (1948) gs = K (xx - xc)3/2 (24.10)

Schoklitsch (1934) gs = KI3/2 (q - qc) (12.11)

nas quais as propriedades do sedimento intervém através do fator K. e os demais


símbolos designam, respectívamente gs = descarga sólida em pêso, por unidade
de largura; % = tensão de cisalhamento sobre o fundo; I = dcclividade da linha de
água; q = vazão por unidade de largura; u = vciocidade media do escoamento; x
= fator de correção da forma da seção e das ondulações do fundo; o índice c
indica valores críticos para os quais ocorre erosão do fundo.
Desse grupo a fórmula mais usada hoje em dia é a de Meyer Peter e Müller
que também tem por expressão:

q2* I 3Ba2/"
------- = A + B --------- Í24.12)
D D

onde, q = vazão unitária (1/m.s); q g a = descarga sólida unitária por arraste


(Kg/m.s); 1 - declividade da linha de energia do escoamento; D - D35 =
diâmetro representativo da mistura de sedimentos que constituem o leito de
um rio (mm) (diâmetro referente a 35% do peso do material que passa); À = 17
e B = 0,4;

b) as que consideram que a turbulência é a maior responsável pelo transporte


de sedimentos de fundo. Nesse grupo destacam-se as contribuições de Kalinske
(1947) e Einstein (1950). Esse autor apresentou uma fórmula para o cálculo da
capacidade de transporte do material do leito baseada em considerações sobre
as probabilidades de uma partícula encontrar-se em transporte ou não, quando
exposta a um escoamento.
Elementos de Engenharia de Sedimentos 927

<})* = f($*) (24.13)

fórmula na qual 4>* e têm por expressões respectivas

>S | qB ] 1 ’S
=
'b ys J g D3((3-l)
(14.14)

log 10,6 Cps ' Pf) D


ú* = Ç Y (24.15)
l°g(10,6X . x /D 65
pf r; i

onde, <£*= intensidade do transporte de sedimentos do leito; ig = porcentagem


de uma faixa granulométrica de diâmetro D de sedimentos transportada por
arraste; i^= porcentagem da faixa granulométrica de sedimentos de diâmetro D
presente no leito; qg= arraste de sedimentos do leito, em peso, por unidade
de tempo e de largura de uma seção transversal; y$= peso específico do
sedimento; y = peso específico do fluido; (3 = ys/y; g - aceleração
gravitacional; D = diâmetro Ja faixa granulométrica considerada; De5 =
diâmetro de sedimento tal que 65% das partículas apresentam diâmetro menor;
d* = intensidade do escoamento; X = diâmetro característico de faixa
granulométrica de sedimento que constitui o leito; Rb’= raio hidráulico do
leito para a rugosidade devido às partículas; S = declividade da linha
energia; x= fator de correção relacionando D55/S e cisalhamento com a
svperfície do fundo; Ç= correção do escoamento efetivo que atua sobre vários
diâmetros de sedimentos; Y= correção para a força de alçamento que atua sobre
partículas na transição entre leitos rugosos e lisos; 5: espessura da sub-
camada limite.
A escolha dos procedimentos de cálculo da descarga sólida por arraste,
de acordo com a condição de disponibilidade ilimitada de sedimentos para a
capacidade hidráulica do escoamento, deve-se orientar nas condições para as
quais tais expressões foram desenvolvidas.
Como a complexibílidade dos procedimentos preconizados por Einstein
não parece garantir uma precisão superior a das demais fórmulas propostas,
houve quem propusesse simplificar essa fórmula. É o caso de Brown (1950) que
propôs a variante simplificada conhecida como fórmula de Einstein-Brown.
928 Hidrologia

c '
gv X
— - f (24.16)
wd yp - dd
V. J

que fica reduzida à

êv
— = 40 (24.17)
wd 7(P - Dd

quando t/(y((3-l)D > 0,09; sendo w a velocidade de sedimentação da partícula


de diâmetro D.

c) as que relacionam a descarga por arraste à potência do escoamento: Fórmulas


de Bagnold (1966), Engeíund-Hansen (1967), e, mais rcccntcmcntc, Yang (1972)
e Ackers -White (1973).

Descarga sólida em suspensão - Às partículas sólidas, em trânsito na parte


superior da veia líquida, são mantidas em suspensão pela turbulência do
escoamento e possuem uma velocidadè de deslocamento longitudinal que se
aproxima da velocidade das partículas líquidas que as sustentam (isso não é
verdade para os sedimentos mais graúdos). FÍessas condições e para o material
de diâmetro D a descarga sólida em suspensão, por unidade de largura da seção
transversal, pode ser obtida pela integração do produto da velocidade do
fluido (u), pela concentração média (c) entre os limites superior (nível de
água) e inferior (y0) do transporte em suspensão. A descarga em suspensão
unitária é, portanto;
d
qss u c dy (24.18)
y0

onde, qss = descarga sólida em suspensão por unidade de largura da seção


transversal de um rio (t/sm); u = velocidade do escoamento num ponto de
uma vertical da seção transversal de um rio (m/s); c = concentração da des­
carga sólida em suspensão em um ponto de uma vertical da seção transver­
sal de um rio (t/m3); y = distância acima do leito; no caso yu = d(! - 2D (m);
d0 = profundidade total do escoam ento numa seção transversal dc um
rio(m); d = profundidade do escoamento numa verticai em que ocorre trans­
porte em suspensão (m).
Elementos de Engenharia de Sedimentos 929

O valor de c é obtido pela seguinte expressão, conhecida como equação de


Rouse.

C
(24.19)
d - a

onde, ca = concentração da suspensão numa vertical ao nível y = a acima do


leito; y = elevação de um ponto acima do leito; z = w / (ku*); w = velocidade da
queda de partículas de diâmetro D; k = constante de von Kármán (= 0,4),

u* - velocidade de cisalhamento no fundo do rio

to = yhl = tensão de cisalhamento sobre o fundo; p = massa específica do


fluido; h = raio hidráulico (no caso, igual à profundidade do escoamento); 1
= declividade da linha de energia.
Define-se a descarga sólida média em suspensão (qss) por unidade de
largura de uma seção transversal como sendo

qss = g .q (24.20)

onde q -- vazão por unidade de largura da seção transversal dc um rio


(m3/s.m); c = a concentração média da suspensão por unidade de largura.
Para o cálculo da descarga sólida cm suspensão dc uma seção transversal,
considera-se que a mesma c constituída por n faixas dc largura unitária, caracte­
rizadas cada uma por uma distribuição vertical de velocidades e/ou concentra­
ções, de modo que se pode obter a descarga em suspensão (Qss) pcia seguinte
expressão:

Qss ■= q1c1 + q2c2... +qncn (24.21)

onde Qss em t/s.


Na prática, aplica-se a equação acima acrescentando a cada elemento o
fator li, 12 ... In que corresponde à largura, em metros, do segmento da
seção transversal da qual a vertical de amostragem é considerada
representativa. Para cada uma dessas verticais estabelecem-se, através de
medição, os valores de concentração e vazão.

Descarga sólida total - Existem várias expressões da descarga sólida total,


alcançadas geralmente pelo somatório da descarga por arraste obtida por uma
930 Hidrologia

das expressões anteriores e da descarga em suspensão calculada a partir dos


valores alcançados pela descarga por arraste.
Para isso Einstein (1950) usou a equação de arraste, enquanto Bagnold
(1966) determina a suspensão a partir da potência do escoamento não usada no
arraste. Alguns autores propuseram equações de uso direto, como Laursen
(1958) e Bogardi (1965). As precisões obtidas por essas fórmulas fazem com
que prefiram-se alguns métodos mais expedidos, como o de Colby (1957) que
requer algumas medições simples a campo.

Produção de sedimentos de uma bacia

Expressar a descarga sólida produzida por uma bacia em função das carac­
terísticas físicas da mesma é uma via ainda pouco explorada, se comparada com
os outros dois métodos existentes para avaliar a descarga sólida de abastecimen­
to. Trata-se de uma metodologia complexa, da qual nãp se pode esperar resulta­
dos muito precisos.
Há pouco tempo utilizavam-se métodos que foram desenvolvidos por
estimativas ' de perdas por erosão, para expressar essa produção,
principalmente a Equação Universal de Perdas de Solo (USLE), (Wischmeier e
Smith, 1978) associada ao emprego de uma taxa de transferência (Sediment
Deli ver/ Ratio SDR) que traduz a diminuição da produção bruta que pode ser
estimada pela USLE, em decorrência dos depósitos ocorridos na bacia. Tanto a
equação como a taxa de transferência (SDR) resultam de expressões empíricas,
ainda limitadas no seu uso pelo fato de considerar somente a produção anual
de sedimentos.
Rrogressos importantes têm sido registrados com o advento da simulação
matemática, do sensoriamento remoto, e de Sistemas de Informações Geográficas
(GIS). Atualmente já existe uma expressão relativamente simples para
expressar a produção de sedimentos associados a chuvas isoladas que caem
sobre uma pequena bacia. Trata-se da Equação Modificada de Perdas de Solo
(MUSLE) sugerida por Williams e Bemdt (1972) segundo a qual essa produção
valería:

(24.22)

onde, E = peso de sedimentos produzidos por uma chuva isolada; qp = o pico de


vazão associado à chuva considerada; Q = o volume de água escoada durante
a cheia produzida pela chuva isolada; K = o coeficiente médio de
erodibilidade dos solos da bacia; LS = o fator topográfico médio da bacia; C
= um coeficiente que traduz o tipo de vegetação que ocupa a bacia; P =
coeficiente vinculado às práticas de conservação do solo usadas na bacia; a e
(3 = são dois parâmetros característicos da região onde se encontra a bacia.
Elementos de Engenharia de Sedimentos 931

Na região em que os autores desenvolveram a fórmula (Estados do Texas e


Nebraska - USA), esses parâmetros valem respectivamente 95 e 0,56 no sistema
de unidades americano.
Modelos conceituais distribuídos que simulam os diversos processos em
jogo no ciclo hidrossedimentológico foram, ou estão sendo, desenvolvidos para
expressar os sedimentos produzidos por chuvas isoladas sobre uma bacia. CRE-
AMS (Knisel et al.,1980); ANSWERS (Beasley ct al., 1981) são alguns deles.
Uma tentativa (projeto WEPP, USDA, 1987) atualmente desenvolvido pelo De­
partamento de Agricultura dos Estados Unidos com o intento de substituir a
USLE poderá vir a ser uma resposta ao problema aqui levantado.

24.5 Medição da descarga sólida

A imprecisão decorrente do uso de fórmulas de descarga sólida, e aquelas


associadas às estimativas da produção de sedimentos de uma bacia, fazem com
que o procedimento ainda mais confiável para conhecer a descarga sólida, seja
a sua medição direta, apesar das deficiências que ela pode apresentar, das
quais a principal é, sem dúvida, seu alto custo.
Para execução das determinações quantitativas da descarga sólida por
medição, existem diferentes enfoques, orientados pelas finalidades
específicas às quais se destinam os dados e elementos colhidos.

I o Enfoque - Tipo do movimento dos sedimentos em transporte: Do pomo de


vista do fenômeno transporte de partículas de sólidos minerais por um
escoamento pode-se distinguir diferentes movimentos ou trajetórias das
partíctilas que compõem a descarga sólida: arraste, sahação e suspensão. As
trajetórias das partículas movidas por essas modalidades de transporte
diferem entre si. Devido à troca de partículas sólidas, entre as diferentes
modalidades de transporte de uma partícula de dado tamanho, a quantificação
do transporte na base deste enfoque toma-se difícil. Adotando uma
simplificação, chegou-se a conceitos operacionalmente viáveis.

^sm = ^sam + ^ssm (24.23)

onde, Gsm = descarga sólida total medida; Gsam = descarga sólida em arraste
medida; Gssm = descarga sólida em suspensão medida.
Arraste e suspensão, conceituados por critérios operacionais, são
medidos separadamente por intermédio de instrumental adequado.

2o Enfoque - Procedência dos sedimentos transportados: Observando os


sedimentos em transporte notam-se diferentes tipos genéricos de sedimentos.
932 Hidrologia

Distingue-se entre sedimentos em transporte encontrados e não encontrados no


leito de um rio:

a) sedimentos em transporte fluvial provenientes de leito de rio são


deslocados por arraste ou em suspensão. Constituem a descarga sólida dos
sedimentos contidos no leito de um rio (Gg) ou bed material discharge

GB = GBa + GBs (24.24)

onde a e s identificam os componentes arraste e suspensão da descarga


sólida; B se refere a material contido no leito.

b) sedimentos em transporte não encontrados - ou ocorrendo somente em


porcentagens não significativas - no leito de um rio. Tais sedimentos
são provenientes da bacia contribuinte à seção de controle, onde foram
erodidos. Parte dos sedimentos erodidos foram transportados até o
sistema de calhas da rede fluvial. Essa parte dos sedimentos é designada
por deplúvio (wash-load}, Observa-se ainda que a quantidade de deplúvio
não chega a atingir a capacidade de transporte do escoamento. Uma vez
que a proporção desses dois componentes varia ao longo do rio, c se
modifica no tempo, e, uma vez que a natureza dessa variação não pode ser
prevista a priori, necessita-se recorrer a procedimentos empíricos na
determinação da descarga sólida em suspensão.

3o Enfoque - Critérios operacionais: A medição da descarga sólida num


escoamento, começando a partir da interface água-ar, pode ser efetuada com
uma certa facilidade até uma distância de 0,5 até 0,lm acima do leito.
Aproximando a tomada de amostras na lâmina em escoamento, mais em relação ao
leito, aumenta a possibilidade de coletar-se inadvertidamente, junto com o
sedimento em transporte, algum material parado na superfície do leito,
principalmente nos casos em que ele não apresenta um fundo plano.
Para fins práticos exclui-se, neste enfoque, parte da lâmina em
escoamento dos processos de coleta de amostra e distingue-se então entre
descarga sólida em suspensão medida e não-medida.
Uma vez que na maioria das investigações procura-se determinar a
descarga sólida total (Qs), o emprego direto dos resultados das medições da
suspensão requer um exame da significância do componente não-medido, bem como
uma avaliação das possibilidades de se determinar a descarga não-medida por
estimativa ou por cálculo.
As técnicas de medição a serem empregadas dependem da modalidade de
transporte que se tem interesse em monitorar. Destaca-se de antemão que a
medição da suspensão é de execução mais fácil que a do arraste.
Elementos de Engenharia de Sedimentos 933

24.5.1 Medição do transporte de sedimentos em arraste

A obtenção de valores da vazão de sedimentos transportados por arraste


apresenta dificuldades de ordem prática, pois as medições diretas e indiretas
implicam, muitas vezes, a implantação de dispositivos no leito do rio, que au­
mentam a resistência ao escoamento naquele ponto. A instalação dc um instru­
mento, mesmo cm caráter temporário, pode resultar cm desvio das trajetórias
das partículas das quais sc pretende estabelecer a frcqücncia dc passagem e sua
massa cm determinado ponto.
Requisito geral dos dispositivos para a medição de arraste 6 que sua
influência sobre as condições locais de escoamento seja minimizada e
conhecida.
O objetivo da medição do transporte de sedimentos em arraste é a
determinação do transporte ocorrido, função da disponibilidade e da
capacidade de transporte. No caso em que as duas condições limitantes foram
satisfeitas a descarga sólida em arraste medida toma-se igual à descarga em
arraste transportada a plena capacidade do escoamento.

Qsam ~ QBa (24.25)

Entre os diferentes procedimentos empregados costumam-se. agrupar os


procedimentos cm métodos diretos e indiretos de medição.

Métodos diretos de medição de arraste

O efeito acumulado do transporte de sedimentos em arraste pode ser


estimado por levantamentos batimétricos. Tais levantamentos fornecem apenas
indícios qualitativos sobre o transporte. No caso em que os levantamentos
foram efetuados no mesmo ponto ou trecho, respectivamente, observa-se a
ocorrência de modificações positivas (acumulação) ou negativas (erosão), a
partir da elevação do leito.
Com base em programas de observação dos leitos fluviais conhecem-se
vários regimes de escoamento e conformações características do leito
associadas. Tais formas se referem a marcas de ondulação, dunas, leito plano,
antidunas, etc. Observando por exemplo a passagem de dunas num trecho de um
rio, pode-se estimar a descarga por unidade de largura pela seguinte
expressão:

H (24.26)
3sa estim. - ( 1 - ^ ) Uf] -

, *
onde, qsa estím. = estimativa de arraste por unidade de largura do leito,
934 H id r o lo g ia

= porosidade do sedimento do leito; Ufl = velocidade média de propagação das


formas de leito; H = altura das formas do leito.
A velocidade de propagação e a altura das formas do leito podem ser
medidas por batimetria, fotografia, video, etc.
Uma outra forma de medir a descarga sólida por arraste consiste no em­
prego de traçadores (pintura de partículas, emprego de material sintético de fá­
cil detecção, radioisótopos, etc.). Essa técnica opera com material marcado com
características idênticas (ou quase iguais) aos sedimentos minerais, injetado no
material do leito. Este material pode ser facilmente identificado quando espa­
lhado pelo escoamento, mesmo em pequenas quantidades. A propagação das
partículas marcadas serve para determinar a velocidade media da propagação
dos sedimentos do leito. A descarga sólida em arraste pode ser calculada pela
expressão (Crickmore, et aL, 1990).

9sam = 1 um x (24.27)
onde, qsam = descarga sólida por arraste em volume, medida por unidade de
tempo; 1 = largura de transporte por arraste numa seção transversal de um rio;
unl = velocidade média da propagação dos sedimentos arraste; x = espessura
da camada de sedimentos do leito transportados por arraste,
espessura da camada de sedimentos do leito transportados por arraste.
A espessura da camada de sedimentos transportados por arraste pode ser
determinada por amostragem e cálculo de verificação. A velocidade média dos
sedimentos transportados por arraste é considerada igual ao deslocamento do
centro barimétrico da área pela qual se dispersou o traçador. Essa condição
pode ser considerada como satisfeita, quando as propriedades físicas (peso
específico, forma das partículas e a natureza da superfície dos grãos) dos
sedimentos e do traçador forem compatíveis ou iguais. Geralmente se emprega
como traçador, material que corresponde à faixa granulométrica representativa
da composição do leito. Os levantamentos da propagação do traçador são feitos
por rasteamento e constituem a parte mais extensa dos trabalhos de campo.
Deve-se ainda verificar no campo a espessura da camada de sedimentos do leito
em transporte que, devido à erosão durante a passagem de uma enchente, pode-
se aproximar a zero.

Métodos indiretos de determinação da descarga sólida em arraste

Consideram-se neste trabalho dois grupos de medidas indiretas: a coleta


de amostras do material em transporte e o sensoriamento de manifestações
secundárias da passagem de sedimentos em arraste.

Amostragem da descarga sólida em arraste - Como amostradores empregam-se


captadores de arraste, que são colocados no fundo do rio e, apòs um tempo
E le m e n to s d e E n g en h a ria d e S ed im en to s 935

padrão de coleta, recolhidos para o exame do total do material retido.


Nesse grupo de instrumentos distinguem-se por sua forma:

- amostradores em forma de cunha (providos de uma abertura frontal, a


parte posterior do amostrador é fechada) Exemplo: Amostrador modelo DON
(DNAEE, 1967);
- amostradores providos de retentores de sedimentos. A retenção é obtida
por redução da velocidade no interior do amostrador. Os modelos mais
conhecidos desse tipo: BLTMA, VUV, Karolyi, Helley-Smith, etc (DNAEE,
1967).

Esses instrumentos, quando calibrados, apresentam resultados


reproduzíveis somente se forem empregados em condições em que se observa
compatibilidade entre sua forma e a geometria das formas do leito, relação
favorável entre as granulometrias do leito retidas e não retidas pelo
amostrador. Para obter a descarga sólida por arraste, o volume de amostra
colhida deve ser corrigido por um coeficiente de eficiência hidráulica e
levar em conta a componente granulomótrica que passou pelo amostrador.
Uma segunda classe de dispositivos para medição do arraste consiste dc
estruturas permanentes; uma vez que alguns desses dispositivos não abrangem
toda a largura de transporte de uma seção, podem também scr considerados
amostradores. Exemplos desse tipo dc dispositivo são as cestas, engastadas no
leito do rio, ficando a parte superior de.sse dispositivo ao nível do leito.
Enquadram-se nessa categoria também pequenos dispositivos construídos
no leito do rio e que constituem elevações ou soleiras atravessando-o, fossas
longitudinais, instaladas apenas em parte da seção e barragens de retenção.
Algumas dessas estrururas são projetadas para serem usadas por longos
períodos; nesse caso se avalia volumetricamente o material acumulado durante
um evento de transporte por arraste ou após certos intervalos de tempo.
Algumas dessas estruturas podem apresentar instrumentação especial que
permite a observação concomitante ao evento. Do material retido são colhidas
amostras representativas para a análise granulométrica e densitométrica.

Uso de sensoriamento remoto na determinação do transporte em arraste de


sedimentos do leito - Partículas em transporte colidem e emitem sinais que
podem ser monitorados e registrados. Sons, impactos contra-sensores, etc.,
podem servir de indicadores da ocorrência, freqüência e intensidade de
movimentos de sedimentos do leito.
Em estudos de laboratório foram testados instrumentos que registram a
oclusão, interrupção e atenuação de sinais eletromagnéticos (luz, som,
ultrasom, laser, etc.), entre uma fonte e um sensor, ocasionadas pela
passagem de sedimentos. Esses instrumentos apresentam limitações pois, sob as
diferentes condições apresentadas numa seção de rio ao longo do tempo, os
936 H id ro lo g ia

sinais registrados nem sempre permitem uma interpretação segura. Fenômenos


que dificultam a interpretação dos sinais registrados sao, entre outras causas, a
presença concomitante de partículas de diâmetros diferentes, distância variável
entre uma partícula que passa a seção e o sensor, passagem de sedimentos pela
seção de controle em diferentes posições e orientações com relação ao feixe, sen­
sor, e a passagem simultânea de duas ou mais partículas entre o sensor e a fonte.

Outros métodos - Como forma alternativa de quantificar a descarga sólida por


arraste deve-se considerar a transformação do arraste em suspensão, sabendo
que a medição de certos tipos de sedimentos - por exemplo areia, etc. - em
suspensão não apresenta maiores dificuldades técnicas.

24.5.2 Medição do transporte de sedimentos em suspensão

Instrumental para determinação da descarga sólida em suspensão

Tomando-se como base a expressão Qss = Q.c toma-se objetivo principal


dos levantamentos sedimentométricos a determinação da concentração média da
mistura água e sedimento em suspensão. Para essa finalidade coletam-se
amostras da mistura água e sedimentos por ocasião da medição de vazão de um
rio, com vistas à obtenção de uma alíquota representativa que permite
determinar a concentração média. Para alcançar esse objetivo foi desenvolvido
um grande número de coletores dc amostra, dos quais se apresentam alguns dos
principais tipos.
Em águas paradas ou escoando a baixas velocidades podem scr usados
coletores desenvolvidos para a coleta da qualidade dc água. Exemplos típicos
desses são os amostradores Kcmmcrci c Àmbuchl, dc forma cilíndrica, vertical
ou horizontal, com dispositivos que fecham ambos os lados instantaneamente.
Em águas fluviais, que escoam com maior velocidade (>(),!m/s), c ne­
cessário utilizar dispositivos que assegurem que as velocidades de escoamento
do rio e a de ingresso dc amostra no coletor sc assemelham. Diferenças en­
tre as duas velocidades (aceleração ou dcceleração) podem provocar uma
separação parcial das duas fases cm escoamento c, conseqüentcmentc, uma
modificação da concentração da mistura água sedimento. Instrumentos des­
tinados ao emprego em águas fluviais são sondas que, ao atravessarem a lâ­
mina em escoamento, colhem amostras representativas. Chamadas dc in te ­
g ra d o res v ertica is são fabricadas no Brasil, Estados Unidos, França, ctc. Captam
amostras da concentração da suspensão em recipiente removível alojado no
corpo do amostrador. Um exemplo desse tipo de amostrador é o USD49,
fornecido com bocais calibrados de 1/4, 3/16 c 1/8 dc polegada. Uma versão
especial desse tipo de instrumento opera com um comando acionado à dis­
tância, para abrir e fechar um registro de entrada dc amostra que se dá de
E le m e n to s d e E n g en h a ria d e S ed im en to s 937
' " " " ................... I " .l . ~ ~ " ' - ' ■ ■■ ■

maneira concomitante com a saída do ar. Esse tipo de instrumento - por


exemplo o amostrador USP61 com bocal de 3/16” de diâmetro - pode ser usado
como integrador por pontos em verticais (figura 24.4) de amostragem com até
60m de profundidade (Vanoni,1977).

Figura 24.4. Posições ocupadas pelo coletor de amostras durante a


integração vertical

Além dos instrumentos acima descritos, usam-se amostradores instalados


num ponto de uma seção, que colhem alíquotas de volume predeterminado da
mistura de água e sedimento. São usados para o monitoramento em intervalos
fixos de tempo, ou em função de um programa com base em volumes escoados, ou
ainda em função da elevação do nível de água. Representam esses instrumentos
a geração dos amostradores automáticos para o monitoramento das vazões em
pesquisas, etc.
Um amostrador projetado para determinar de forma direta a descarga sóli­
da - o modelo DF12 - funciona como retentor de sedimentos em suspensão com
diâmetro à 0,050 mm, com tempo dc coleta da ordem de 10 min.
Os instrumentos que empregam métodos indiretos de determinação da
descarga sólida em suspensão são:
- instrumentos cujo funcionamento é baseado na atenuação, dispersão,
interrupção de uma emissão eletromagnética ocasionada pela passagem de
H id r o lo g ia
938

sedimentos entre emissor e sensor;


- instrumentos com fonte radioativa são sensores do retro-espalhamento da
emissão, descritos em Crickmore et al. (1990).

Programas de amostragem da descarga sólida em suspensão

O instrumental descrito permite obter amostras da mistura água e


sedimento em qualquer ponto de uma vertical acima de uma faixa de cerca de
0 lm do leito (figura 24.4). Para racionalizar os procedimentos foram
estabelecidos programas básicos de coleta.
Geralmente emprega-se um dos dois tipos do programa básico de coleta que
abrangem toda a seção transversal. Para os rios cuja distribuição lateral da
vazão é conhecida em diferentes níveis de escoamento, utiliza-se o método de
coleta de amostras da suspensão nos centróides de segmentos da seção
transversal que possuem igual fração da vazão líquida, (Equal Discharge
Incremeni).
Para os rios em que não houve estabelecimento prévio da curva-chave,
recomenda-se utilizar o programa de amostragem a uma velocidade constante de
trânsito do amostrador em todas as verticais, que são equidistantes entre si,
(Equal Transit Rate). As amostras colhidas, através desse programa, podem
servir ainda para a determinação da velocidade média nas verticais de coleta,
empregando a seguinte relação:

Va / T £
^m - (24.28)
Ab

onde, Um = velocidade média do escoamento numa vertical; Va = volume da


amostra; Ta = duração da coleta de amostras; = área da seção do bocal do
amostrador Ambos os procedimentos acima referidos estão descritos nas
Normas e Recomendações Hidrológicas, editadas pelo DNAEE (1967),

24.5.3 Simplificação de programas de amostragem da descarga sólida em


suspensão

Examinando os resultados da coleta de amostras de suspensão feitas sob


diferentes condições, pode-se definir coeficientes de compensação da variação
lateral da concentração em uma seção transversal e definir o número mínimo de
verticais de amostragem. A questão: Quantas verticais são necessárias para a
determinação da descarga sólida em suspensão?, não pode ser respondida sem
ter-se uma referência quanto ao nível de precisão pretendido, grau de
homogeneidade das condições do trecho a montante, etc; inicialmente em seções
E le m e n to s d e E n gen h aria d e S ed im en to s 939

regulares de até 150m de largura são feitas as coletas em 10-15 verticais.

24.5.4 Outras medições

Além das medições das descargas sólidas de arraste e suspensão, costuma-


se executar algumas outras medições a campo que auxiliam na determinação dos
volumes de sedimentos transportados por um curso d*água.

Amostragem de material do leito

Trata-se da coleta de informação indispensável para uso das fórmulas dc


cálculo da descarga sólida por arraste. A determinação da natureza do leito
(fixo - móvel), da composição das paredes e do fundo de um rio, baseia-se na
coleta de amostras. Para essa finalidade foram adaptados coletores de amostra
do leito; em rios de águas paradas empregam-se amostradorcs limnológicos
(dragas, caçambas, etc.), enquanto que para rios de escoamento rápido foram
desenvolvidos amostradores especiais do tipo BM-54 e BMH-60. Todos esses
amostradores devem ser testados quanto à sua vedação, pois a amostra colhi­
da, para não comprometer sua reprcsentatividade, deve ser protegida contra a
perda de componentes pelo escoamento no trajeto entre o leito c u superfície
da lâmina d ’água.
Em trabalhos de reconhecimento em rios de fundo constituído por
sedimentos semicoesos a coesos, pode-se empregar um dispositivo do modelo
R o ck Isla n d , considerado o instrumento que fomece amostras de caráter
qualitativo.

Batimetria de reservatório

Os reservatórios interceptam a maior parte das descargas sólidas


transportadas na rede fluvial. A determinação dos volumes de sedimentos neles
depositados fomece indicações preciosas e às vezes decisivas sobre a
produção de sedimentos pelas bacias hidrográficas. Essa determinação é
geralmente feita por comparação entre levantamentos topo-batimétricos feitos
antes da construção da barragem e depois de um período de operação do
reservatório, com uso de ecobatímetros. Esses levantamentos são associados à
coleta de amostras do material de fundo para determinar o peso específico e o
adensamento dos depósitos. Os procedimentos usados obedecem a normas que
variam com as situações e cuja apresentação foge ao escopo dessa abordagem.

24.6 Morfologia Fluvial e Engenharia Costeira

Até o momento os problemas com que lida a engenharia de sedimentos foram


examinados dentro de uma ótica uni ou bidimensional. Para cobrir
940 H id ro lo g ia

integralmente a matéria, seria necessário considerá-los nas suas três


dimensões e abordar, portanto, o problema da estabilidade e das deformações
das configurações em planta do leito dos rios. Pela sua complexidade, a
questão escapa da apresentação dos elementos básicos de engenharia de
sedimentos que este capítulo tinfta por objetivo abordar. Cabe somente chamar
a atenção sobre a existência dessa terceira dimensão dos problemas e deixar
registrada a questão para quem tiver interesse específico no estudo da
engenharia de sedimentos.
A engenharia de sedimentos abrange também o deslocamento de sedimentos
sob efeitos de ondas e de correntes marinhas ou estuarinas. Esse importante
aspecto da engenharia de sedimentos não foi aqui abordado por ser o escopo
deste livro limitado aos assuntos de hidrologia continental.

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