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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

ESCOLA DE ENGENHARIA DE SÃO CARLOS


Departamento de Arquitetura e Urbanismo

Carlos Alberto Ferreira Martins

ARQUITETURA MODERNA EM CONTEXTO


Uma proposta de revisão bibliográfica

Texto de sistematização apresentado à Escola de


Engenharia de São Carlos da Universidade de São
Paulo como parte dos requisitos para a obtenção
do título de Livre Docente, na Área de
Conhecimento Teoria e História da Arquitetura e do
Urbanismo Modernos, do Departamento de
Arquitetura e Urbanismo.

São Carlos, agosto de 1998


Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 2

Para Ana
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 3

INDICE

INDICE 3
INTRODUÇÃO 4
PARTE 1. O ENSINO DE ARQUITETURA MODERNA BRASILEIRA E O
EMBATE COM A HISTORIOGRAFIA. 11
Arquitetura e Política: Arqueologia de um problema 11
Excurso à pré-história de um problema ou quando o pessoal se torna
intelectual. 14
Arquitetura e Estado: tema e problema 18
Retorno à Arquitetura. A proposta do Curso de Graduação de São Carlos22
A dissertação: Um problema, um objeto, um personagem: 28
Texto e obra na arquitetura: o sentido da questão historiográfica 34
Modernidade, Estado e Tradição: uma nova abordagem 46
O personagem: Lúcio Costa e o espírito brasileiro 57
Uma nova trama também tem as sua lacunas 64
PARTE 2. LE CORBUSIER: MÁQUINA, CIDADE E PAISAGEM 72
Máquina e Natureza na Estética Purista 81
Poesia e Cálculo na Cidade Contemporânea 90
Cidade e Paisagem: os projetos sul-americanos 94
PARTE 3. A ARQUITETURA BRASILEIRA E SEU CONTEXTO 110
A área de Teoria e História da Arquitetura e do Urbanismo na pós-
graduação de São Carlos 113
O Grupo de Pesquisa ArqBras: “A Constituição da Arquitetura Moderna
em São Paulo, 1930-70. 116
BIBLIOGRAFIA BÁSICA DA PESQUISA EM ANDAMENTO 133
Periódicos especializados brasileiros 144
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 4

INTRODUÇÃO

A alternativa de redação de um “texto que sistematize a sua obra ou parte


dela”, como parte dos requisitos para a obtenção do título de Livre - Docente, coloca
o docente e pesquisador, especialmente da Área de Humanas, numa situação
ambígua. Ou ao menos, devo confessar que a mim colocou.

Por um lado, porque a “cultura” da Área - ou a minha percepção dela - ainda


estava, até há pouco tempo, marcada pela expectativa de uma tese, no seu sentido
acadêmico original. E nesta perspectiva, a alternativa do “texto sistematizado” me
parecia, confesso, uma espécie de by-pass.

Por outro lado, a discussão sobre o tema em alguns âmbitos da Universidade


me mostrou, não sem uma certa surpresa, que não existe ainda um consenso
estabelecido quanto ao que se deve exatamente esperar desta “nova” modalidade.

Dessa forma, não restava alternativa - dada a opção de não apresentar,


agora, uma tese original - senão a de reler infinitas vezes a econômica definição
regimental e refletir sobre seu significado.

“Um texto que sistematize a sua obra ou parte dela” remete diretamente ao
questionamento do que configura “a obra” de um docente e pesquisador. Que esta
não deveria ser entendida apenas como o conjunto das publicações de um
pesquisador, parecia bastante claro ao pensarmos em áreas, como a de Arquitetura
e Urbanismo, com uma forte inserção no campo profissionalizante. É claro que os
projetos realizados são parte constitutiva - e fundamental - da “obra” de um arquiteto
que seja também docente. Assim como a produção tecnológica de um engenheiro
ou a experiência clínica de um médico, etc.

A reflexão sobre o significado da “obra ou parte dela” remeteu, no meu caso,


à avaliação do que deveria, na minha perspectiva, ser considerado como a “obra” de
um arquiteto formado há 24 anos que, há 21, se dedica, em tempo integral “mesmo”,
à atividade universitária. E deixemos claro, desde o início, que por dedicação à
atividade universitária entendo não apenas os canônicos ensino, pesquisa e
extensão, mas o conjunto das atividades de caráter didático, científico, cultural,
sindical, político ou do que inapropriadamente segue-se chamando de “atividades
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 5

administrativas” e eu, inclusive no Memorial apresentado a este Concurso, prefiro


caracterizar como “gestão acadêmica”.

Alguns anos atrás, um colega, ao qual me queixava de que o conjunto das


minhas atividades não me permitia dedicar-me especificamente à pesquisa e à
publicação, tanto quanto gostaria, me sugeria que relevasse essa angustia
assumindo que eu seria um docente com vocação para a “construção de
instituições”. Não tenho certeza de que essa tenha sido exatamente a sua
expressão, mas ele se referia ao meu trabalho na concepção e implantação no
Curso de Graduação em Arquitetura e, depois, na formulação da área de Teoria e
História, assim como ao duplo período à frente da coordenação do Programa de
Mestrado de São Carlos. Lembro-me bem, isso sim, de haver respondido que essa
não era, infelizmente, uma solução para a angústia, na medida em que as atividades
institucionais da gestão acadêmica não poderiam ser separadas da reflexão didática
e científica, sob pena de converter-se, aí sim, em atividades “administrativas”. Eu
pretendia, com isso, afirmar a minha convicção de que as opções envolvidas, por
exemplo, na elaboração de uma determinada proposta para o Curso de Graduação
não podiam ser separadas das minhas preocupações como professor ou das
reflexões de um trabalho de pesquisa de mestrado em andamento ou, ainda, de uma
determinada visão da Universidade Brasileira, que estava obviamente marcada por
minha atuação como Presidente da Associação de Docentes de uma universidade
privada e, depois, responsável regional e Vice-Presidente Nacional da ANDES.
Assim como a elaboração de uma determinada proposta para a implantação da Sub-
Área de Teoria e História do Programa de Pós-Graduação não poderia estar
desvinculada das questões e das leituras da situação acadêmica e profissional da
arquitetura, que o desenvolvimento da tese de doutoramento e os anos passados
em Madri, refletindo à distância sobre a situação da área no Brasil, me faziam
colocar. Se esta conversa, incidental, com um colega a quem prezo, voltou à baila foi
porque a decisão de apresentar este “texto que sistematize a (minha) obra ou parte
dela” me colocou outra vez frente a estas questões.

Este texto é, assim, um esforço de reflexão não apenas sobre meus textos,
publicados ou não, mas sobre a sua contribuição - e eventuais repercussões -
específicas para e no debate da área de arquitetura moderna e brasileira. Mas é
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 6

também uma reflexão sobre as suas motivações, intelectuais, políticas e ideológicas


e, talvez essencialmente, sobre os impactos que tiveram em minha atuação como
professor, como orientador e como um modesto militante do processo de defesa - e
permanente construção - da Universidade Pública e Gratuita no Brasil.

Processo que implica, hoje mais do que nunca, em função da campanha que
contra ela movem os interesses do ensino privado - abrigados e expressos pela
grande imprensa e pelo próprio Ministério da Educação - um ingente trabalho na
busca incessante de aprimoramento da competência específica da Universidade, de
sua capacidade de formar quadros profissionais habilitados a responder de forma
consciente aos desafios colocados, social e culturalmente, pelo processo de
expansão - e deterioração - de nossas cidades. E, lembrando de Le Corbusier mas
também de Koolhas, acrescento: preparar-se para os desafios colocadas à atuação
do arquiteto pelas escalas de intervenção implicadas na vida urbana contemporânea
e nas novas espacialidades que acompanham o decantado processo de
globalização.

A natureza e a extensão dos desafios colocados à atuação do


arquiteto/urbanista pelas condições sociais, econômicas, tecnológicas e culturais da
sociedade brasileira contemporânea - ou mais simplesmente da sociedade
contemporânea - não poderão ser enfrentados com base apenas numa velha
formação de ofício que escamoteia - mal - uma persistente tradição anti-intelectual,
que marcou e marca a trajetória da categoria no Brasil. As exceções, Costa sem
dúvida à frente, confirmam, como sempre, a regra.

Pese ao caráter profissionalizante do ensino de arquitetura, o atual estágio do


sistema educacional como um todo, no país e no exterior, está a exigir uma profunda
reflexão sobre os processos e mecanismos de uma educação continuada, que deixa
de ser simplesmente uma proposição humanística para converter-se numa exigência
do próprio processo produtivo.

No nosso caso, isto implica a necessidade de reflexão e de ação imediatas na


reorganização de nosso sistema de pós-graduação, para que ele possa afrontar de
forma eficiente a dupla necessidade de contribuir para o processo de continuo e
sistemático aperfeiçoamento profissional do graduado e, ao mesmo tempo, não
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descurar da carência de formação acadêmica consistente daqueles cerca de 3 ou


4.000 profissionais que atuam como professores nas Escolas de Arquitetura do país.

A docência e a pesquisa são - esta é uma das “teses” deste trabalho - ações
críticas e ativas na configuração do campo cultural da arquitetura. A reflexão crítica e
historiográfica incidem sobre a atuação profissional, como se define no comentário à
dissertação, na medida em que afirmar valore, reforça tendências, contribui para o
esquecimento ou a institucionalização de projetos ou autores e, portanto, age na
“criação de cultura arquitetônica”. E, por isso, traz implicações diretas sobre a
formação das futuras gerações de profissionais.

Nesta perspectiva, não há como abstrair o processo de regionalização


econômica em curso. A geração de arquitetos/urbanistas que ora está entrando na
Universidade está destinada a atuar, profissional ou academicamente, num novo
âmbito social, econômico, tecnológico e cultural. O processo de organização do
Mercosul ultrapassará, nos próximos anos, os limites de mero espaço de liberdade
aduaneira, para converter-se num mercado regional pleno. Já está firmado, desde
dezembro de 1997, o Protocolo que prevê a liberação, num prazo de cinco anos, da
prestação e venda de serviços, aí incluído o exercício das profissões
regulamentadas. A presença no mercado de projeto e obras, de grandes
corporações internacionais, é já uma realidade a merecer detida reflexão sobre os
seus impactos no processo de espacialização das nossas cidades e no próprio perfil
profissional de nossos arquitetos/urbanistas.

Neste novo quadro, é absolutamente urgente superar a secular e histórica


tendência a buscar com afã a atualização, por vezes superficial, com as últimas
novidades do mercado de idéias dos centros hegemônicos e voltar as costas à
realidade cultural e profissional dos nossos vizinhos da América Latina. Não há nisto
nenhuma recaída numa romantização do “latino-americanismo” dos anos 60. Não se
trata de charangos nem zampoñas, mas da necessidade de reconhecer que os
nossos colegas argentinos, uruguaios, chilenos ou mexicanos tem uma reflexão e
uma experiência cultural e profissional acumuladas de altíssima qualidade e de
enorme importância para nós. Em arte e cultura não existem primeiros, segundos ou
terceiros mundos. Costa, Niemeyer e Reidy não eram periféricos a nada. Assim
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como não o é João Gilberto. Assim como não o foram Machado ou Eça. Nem Torres
Garcia, que nos ensinava que nosso Norte é o Sul.

É fundamental, portanto, que a perspectiva de formação do profissional que


atuará no âmbito regional seja assumida, desde já, pelas nossas Escolas. É nessa
perspectiva que se inseria a definição da “Arquitetura e Urbanismo Modernos no
Brasil e na América Latina” como núcleo de concentração das pesquisas na sub-
área de Teoria e História do Programa de Pós-Graduação de São Carlos. Isso não é,
entretanto, suficiente, nem pode estar desligado do esforço de constituição de redes,
formais ou informais, de docentes e pesquisadores internacionais, nem do processo
de articulação das Escolas de Arquitetura da Região do Mercosul - o ARQUISUR -
de que a Escola de S. Carlos vem participando ativamente. Para que a livre
circulação de profissionais não se limite ao procedimento cartorial de mútuo
reconhecimento de diplomas, mas avance na formação de profissionais técnica e
culturalmente habilitados a atuar nos novos âmbitos regionais e internacionais, é
preciso trabalhar imediatamente na construção do “espaço acadêmico ampliado” que
define um dos objetivos centrais da Associação.

Em termos nacionais, é preciso avançar na superação da incipiência e relativa


juventude que ainda caracterizam a área de Arquitetura e Urbanismo, carente de
uma tradição acadêmica equivalente à de outras áreas, sejam profissionalizantes ou
básicas, exatas ou humanas. A atuação junto aos órgãos de fomento à pesquisa e à
formação de recursos humanos deve estar pautada pela preocupação de construção
institucional da área, mais do que pela ilusão do exercício de um poder, ao fim e ao
cabo, relativo e passageiro, de árbitro ou assessor para o julgamento do mérito das
demandas e projetos apresentados. É relevante destacar, pelo acompanhamento
destes últimos anos, que a Área, pese a sua juventude, vem demonstrando, ao
menos em alguns setores e centros específicos, uma notável vitalidade e um
considerável acréscimo de qualidade na formulação e nos resultados das atividades
de pesquisa.

Uma última observação. Nossa perspectiva, e o explicito no texto, ao discutir


a proposta inicial do Curso de Graduação de São Carlos, não é o de formar
historiadores ou críticos de arquitetura e urbanismo, mas profissionais capazes de
atender às demandas que estão colocadas - e estarão cada vez mais - de
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competência técnico-construtiva e de capacidade de compreensão das complexas


exigências e problemas implicados nas novas condições de vida e sociabilidade da
cidade contemporânea. Mas também, capacitados a compreender a dimensão
cultural de sua atuação. E cultural quer dizer, aqui, articulado de forma consciente ao
conjunto de elementos, repertórios e referências, no campo da disciplina e fora dela,
que conformam o contexto no qual - e em relação ao qual - qualquer obra adquire
sentido. Isto talvez signifique, como comentava uma colega, que estejamos falando
do projeto de formação de um “arquiteto culto”. Mas certamente não se trata do
simples exercício de uma “erudição” descomprometida com a dimensão
inelutavelmente propositiva da ação arquitetônica.

Acredito que Mário Pedrosa tinha razão ao caracterizar o Brasil como “um
país condenado ao moderno”. E que Colin Rowe também a tinha ao rejeitar um
convite para participar de um Simpósio sobre o tema “Precedente e Invenção”, com
o argumento de que a discussão era inócua, na medida em que simplesmente não
existe invenção sem precedente. Neste sentido a “cultura”, aqui, tem a ver com o
conhecimento daquelas obras e textos ( e filmes, e músicas, e peças, e...) que
conformaram o solo a partir do qual foi um dia possível acreditar que o Brasil daria
certo, muito mais do que com o atual protagonismo dos “promotores culturais” sobre
os produtores de cultura.

No final do ano de 1992, recém chegado de três anos e meio de


doutoramento na Espanha e ainda em pleno processo de reencontro afetivo com o
Brasil, fui ao Anhangabaú assistir ao show de encerramento da gestão Erundina.
Depois de cinco horas de balanço ao som de Gil, Rita e Matogrosso, por volta da
meia-noite, chegou Caetano, que aguardávamos que viesse com a banda que o
acompanhava no Circuladô. Após desculpar-se porque a banda tivera que viajar
antes, só com seu violão, botou o pessoal para dançar novamente. Para o meu
espanto de recém chegado, durante as duas horas seguintes, todas as letras foram
acompanhadas pela multidão. Num certo momento, ele deixou de cantar, e eu posso
contar aos meus netos que estava presente quando Caetano Veloso acompanhou
ao violão, 50.000 pessoas que cantavam Chega de Saudade sem desafinar. Nesse
momento compreendi que o Brasil havia construído, de fato, uma cultura musical.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 10

Depois disso voltei ao prefácio de Giedion ao texto de Mindlin, de 1956, em


que ele comenta:

“... in Brazil a certain standard of achievement is maintained throughout. While


certain characteristics may be specially apparent in the work of outstanding
individuals, they are also evident in the average level of architectural
production: a situation that does not exist in most other countries.”

Se é verdade que o nível de qualidade média, mais do que a produção de


indivíduos excepcionais é o que mede a cultura arquitetônica de um país, então o
nosso problema é compreender como conseguimos, num espaço de tempo tão curto
quanto transcorrido entre as primeiras obras modernas e o ano de 1956, constituir a
nossa.

E perguntar-nos porque a perdemos de forma tão igualmente rápida.


Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 11

PARTE 1.
O ENSINO DE ARQUITETURA MODERNA BRASILEIRA
E O EMBATE COM A HISTORIOGRAFIA.

...there is something irrational in the rise of Brazilian architecture...


Giedion, 1956

Arquitetura e Política: Arqueologia de um problema


Ainda que, por definição regimental, a avaliação do memorial, assim como a
do texto sistematizado deva estar prioritariamente voltado para a produção posterior
à obtenção do título de doutor, é inescapável um resgate das condições concretas,
políticas e culturais que marcaram minha aproximação ao debate da arquitetura
moderna brasileira.

Retirando a poeira, recentemente, do primeiro esboço de projeto de pesquisa


apresentado, em janeiro de 1980, ao Prof. Arnaldo Contier para solicitar o ingresso
no Mestrado em História Social da FFLCH/USP, fico com a forte impressão de que
ali estão definidos, de forma ainda canhestra é verdade, os eixos de preocupação
que nortearam o trabalho das duas últimas décadas. O subtítulo “Anteprojeto para
uma investigação sobre as condições de implantação da Arquitetura Moderna no
Brasil” indicava, ao menos ao olhar de hoje, uma perspectiva mais abrangente que o
título proposto: Arquitetura e Estado no Brasil. Oito anos mais tarde, a dissertação
representaria um compromisso entre o objetivo geral expresso no subtítulo e a
opção de uma leitura fortemente marcado pelo viés da análise ideológica refletida no
título proposto.

Arquitetura e Estado no Brasil. Elementos para uma investigação sobre a


constituição do discurso moderno no Brasil. A obra de Lúcio Costa 1924-1952 era
um título que, na impropriedade de sua extensão, pretendia indicar um problema de
partida ( a preocupação com a dimensão essencialmente política do discurso sobre
a arquitetura ) que marcava o período de formação de minha geração, uma hipótese
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 12

de definição de objeto (o “discurso moderno”) como chave possível para a


compreensão das articulações entre a prática profissional, via de regra limitada a
obras parcelares ou dissolvida nos parâmetros gerais do planejamento urbano, e o
discurso profissional ainda marcado por expressões recorrentemente “socializantes”,
cujo sentido real parecia escapar ao quadro político concreto do Brasil de Médici e
Geisel e, por fim, um personagem (Lúcio Costa) que parecia representar uma chave
decisiva para a compreensão das intrincadas relações entre texto e projeto, entre
opção artística e compromisso político, entre as necessidades ideológicas do Estado
modernizador e o papel auto-atribuído por intelectuais e arquitetos num
“desenvolvimento nacional” que já não encontrava ressonância na política social e
econômica do país.

Relido agora, aquele primeiro esboço de preocupações provoca um misto de


constrangimento ante a ingenuidade intelectual dos objetivos propostos e admiração
pela segurança na definição dos nexos entre a necessidade intelectual da pesquisa
histórica e a condição de juízo e compreensão dos valores discursivos então ainda
decididamente hegemônicos no âmbito da atuação profissional.

Os primeiros parágrafos de introdução ao projeto são, no sentido da


ambivalência indicada acima, expressivos:

Uma análise, ainda que superficial, do discurso da categoria profissional dos


arquitetos no Brasil, após a experiência limite de Brasília, e mais
particularmente a partir de 1964, revelará a incidência acentuada de
expressões tais como "o papel da arquitetura no desenvolvimento nacional"; "o
verdadeiro papel da arquitetura"; "arquitetura de cunho social" e outras que
indicam uma atitude - ideológica - de negação do reconhecimento da
arquitetura como elemento racionalizador dos ganhos do capital no setor da
construção civil. Tais expressões não são novas no discurso da categoria,
porém aqui são postas em contraste, de um lado com a redução do papel
objetivamente cumprido pelos arquitetos no processo de estruturação urbana, e
de outro, com a ausência de ressonância a esse discurso na política urbana do
regime militar.
Este último aspecto nos parece ser o responsável pela aparente diversidade
assumida por esse discurso nos últimos anos, onde encontraremos defensores
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 13

da necessidade de aproveitar as "brechas” do sistema para desviar os objetivos


da planificação oficial, ou defensores de uma espécie de efeito demonstração:
em que pesem as limitações do quadro político e social, deve-se continuar
realizando obras "Premonitórias", "pequenas bandeiras" do que "deveria ser" a
arquitetura realizada em sua escala adequada.
Nossa opção de trabalho é a de buscar no período de implantação da
Arquitetura Moderna no Brasil e na peculiaridade de sua articulação com o
Estado Modernizador Varguista as razões desse quadro, que já se
convencionou chamar de "crise da arquitetura brasileira". Pois é inegável que,
se o desenvolvimento brasileiro nas cinco últimas décadas não veio confirmar
as teses da civilization machiniste de Le Corbusier, a nível ideológico essa
vertente do Movimento Moderno conseguiu assegurar uma posição
hegemônica a ponto de garantir que, mesmo hoje, o debate da categoria não
consiga ultrapassar (de forma coerente ao menos) os limites do racionalismo, e
a sua permanência no círculo viciado de lamentações pela incompreensão da
"contribuição dos arquitetos ao esforço de desenvolvimento nacional" por parte
do Poder, numa espécie de chorosa saudade do paternalismo autoritário dos
bons tempos desenvolvimentistas. 1

Um pouco adiante, definia-se que:

Resultado das dificuldades próprias de um novato professor de Arte e


Arquitetura no Brasil e de História da Arquitetura e do Urbanismo Modernos, a
proposta de trabalho era também uma perspectiva de ajuste de contas com os anos,
então bastante próximos, da vida estudantil nas condições políticas e culturais da
Universidade, e particularmente da FAUUSP, na primeira metade dos anos 70.

1
MARTINS, C. Arquitetura e Estado no Brasil (Anteprojeto para uma investigação sobre as
condições de Implantação da Arquitetura Moderna no Brasil - 1930- 45). Texto apresentado para
ingresso no Programa de Mestrado em História (Área de Historia Social) da FFLCH-USP. São Paulo,
jan. 80, datilografado. Original no Arquivo do autor.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 14

Excurso à pré-história de um problema ou quando o pessoal


se torna intelectual.
Talvez seja aqui pertinente um breve excurso pela pré-história de uma opção
profissional que foi, antes, cultural e política.

As razões que me levaram ao vestibular de Arquitetura tiveram o mesmo grau


de (in)definição e (in)certeza que afligem os vestibulandos de hoje e de sempre.
Com gosto e uma insaciável curiosidade pelo mundo dos fenômenos físicos, com
fascinação pelas inovações tecnológicas que nos anos 60 anunciavam como ficções
de um mundo distanciado “no futuro” os gadgets correntes na atualidade
informatizada e telematizada, minhas primeiras opções estavam entre a engenharia
eletrônica e a física. Mas o ambiente cultural de um estudante secundarista do G. E.
Presidente Roosevelt durante a segunda metade dos anos 60 estava conformada,
além das fascinações individuais, por um difuso e juvenil entusiasmo pela “arte” pela
“cultura”. O interesse pela música erudita era aprendido nas sessões heroicamente
ingênuas da Juventude Musical de S. Paulo, grupo de jovens entusiastas animado
por José Luís Paes Nunes, à época crítico bissexto de arquitetura no Estado de S.
Paulo. A descoberta da literatura de Gide e Genet era o tema das noitadas de café,
cerveja e entusiasmo no Café Metrópole. O cinema de Welles e Kazan nos atraía
irresistivelmente às sessões do Cine Bijou, assim como Kurosawa e Kaneto Shindo
eram descobertos ao lado da colônia no Cine Jóia. Essa fruição da liberdade juvenil
se identificava à fruição da cidade, à São Paulo vespertina e noturna que ainda
parecia passível de ser dominada pelos tênis entusiastas que nos2 levavam ao café
expresso do Floresta, no COPAN, ao galinheiro do Municipal, ao Cultura Artística
quando alguém nos conseguia um convite.

Um momento de impacto sensorial e ideológico foi sem dúvida representado


pelo Balcão de Genet, montado por Victor Garcia na grande caverna realizada por
Ruth Escobar à custa da implosão de duas lajes de seu teatro, assim como pela

2
Como para todo pós-adolescente, nossos referencias eram filtrados através de uma pequena
gangue. Silvio (Zanchetti) é hoje professor do MDU em Recife, Caio (Cardoso) se tornou diretor da
Alumni em São Paulo, Claudia (Toni) está na USP, Zé (Roberto Prazeres) seguiu a crítica musical,
Walcir (Carrasco) anda pela Veja, pelos teatros e novelas da vida. Que será de Iraí, nossa pequena
musa morena? E Bernardo (Toledo Piza), que me deliciava com a sua flauta (do Musikantiga) e me
apresentou o Huxley de Contraponto?
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 15

radical subversão da sensação de conforto do espectador provocado pela soco na


cara do Cemitério de Automóveis, emblematicamente montado no galpão da antiga
oficina mecânica da Rua Treze de Maio, onde eu havia vivido mais de dez anos.

A política fazia parte de forma difusa desse universo da pequena gang que
vivia com intensidade as belezas de uma São Paulo noturna que era ainda um
universo passível de ser conquistado pelos nossos tênis. A política estudantil tinha
ressonâncias distantes num Colégio que se orgulhava de ser o último a manter
sempre abertos os seus portões. Sabíamos das lutas da Maria Antônia mas eram
mais próximos os embates entre os “chiquistas” e os “tropicalistas”, mais atraente o
debate sobre os hinos militantes de Vandré ou “o sol nas bancas e revistas” de
Caetano.

Assim, no momento de inscrição no Cursinho, a opção pela engenharia


eletrônica foi derrotada pela arquitetura, “que tinha mais a ver com a arte”. O
cursinho era o Universitário, onde tínhamos aula de história da arte e da arquitetura
com Benetazzo e Linguagem Arquitetônica com Baravelli e, depois do
“desaparecimento” de Benê, com Fajardo. Huberman, Hauser e Pevsner eram nossa
preparação para o Vestibular. Uma conferência com Sérgio Ferro, palestras de
Nestor Goulart na Biblioteca Municipal e as colunas de urbanismo de Odon Pereira,
prometiam um mundo que o prêmio do Vestibular parecia não ser capaz de realizar.

A FAU em 1970: a segunda turma na “FAU nova”, a primeira com 150 alunos,
a primeira sem Artigas, Paulo Mendes e Maitrejean. Cento e cinqüenta alunos
recebidos no Atelier um por um grupo de professores que nos prometiam um
primeiro ano em que viveríamos uma “tempestade de informações”, cujo objetivo era
o de estabelecer um “mosaico da atividade profissional”. Mesmo calouros não
precisaram mais do que algumas poucas semanas para perceber que aquilo era a
admissão da total falta de rumo da Escola. Em meados de abril, uma famosa
barricada de pranchetas impedia o acesso dos professores ao Ateliê e um cartaz
impunha nossa única condição: “Só entrem aqui com uma proposta de ensino. E não
nos perguntem qual é. Vocês são os professores.”

As aulas de História da Arte com Flávio Motta, parado ao fundo do Anfiteatro


enquanto Katinsky e Ferro iam e voltavam pelas laterais. A análise das obras de arte
pela identificação das linhas de força. Rodrigo Lefébvre e Flávio Império deslocados
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 16

para o 1º Ano rebelde. Também Gasperini, Gastão, Cauduro. O movimento


estudantil numa polarização curiosamente matriarcal: Ermínia e Cecilinha.

O GFAU, as mesas de ping-pong e alguém que me pergunta se eu não


gostaria de fazer parte de uma revista de nome curioso: OU..., Nome que só fazia
sentido porque a outra era a Desenho. Nossa questão, como a da maioria dos
estudantes naquele momento não era propriamente a Arquitetura, ou a Física, ou a
Medicina. Tratava-se de “transformar a sociedade”, derrotar a ditadura. O Desenho
era o melhor instrumento OU...?

O primeiro cargo numa diretoria: diretor do Centro de Estudos Brasileiros do


GFAU. Uma excursão à FAU Velha para verificar o acervo do CEB resultou na
constatação de uma devastação. Pela repressão, dizíamo-nos. Pela ação bem
intencionada dos colegas que resolveram salvar o acervo - importante, resultado de
doações de artistas engajados com a militância política e cultural do Grêmio - para
tempos melhores, ficamos sabendo aos poucos, anos mais tarde.

Para uma parte de nós, a dúvida cada vez mais forte de que o desenho fosse
naquele momento um instrumento suficiente para compreender a realidade social e
política do país. A convicção cada vez mais presente de que transformá-la
necessitava “instrumentos mais contundentes do que a lapiseira”.

Mas era claro que transformar implicava previamente compreender. Os


defensores do desenho transformador estavam privados de seus principais
mentores. Nós, militantes da denuncia do desenho como instrumento da exploração
“burra” do trabalho na construção civil, também o seríamos, brevemente, com a
prisão e posterior afastamento de Ferro, Rodrigo e Flávio. Enquanto a área da
arquitetura tateava indecisa, o Departamento de História nos oferecia Juarez
Brandão, Chico de Oliveira, Galvão. Afinal, havia instrumentos de conhecimento da
“realidade” dependente. De forma imprecisa, nos dirigíamos à sociologia urbana ou à
renda da terra uns, outros ao planejamento urbano, outros ainda à cientificidade
presumida das modelagens matemáticas. Um texto de Françoise Choay3, lido anos

3
CHOAY, Françoise. “Arquitetura e Urbanismo” in DUFRENNE, Michel. A Estética e as Ciências
da Arte. Lisboa, Bertrand, 1982. vol. 2. pp. 189-224. A obra recolhe as contribuições de um grupo de
especialistas reunido por proposta da UNESCO em 1967. A primeira parte do texto de Choay tem o
emblemático subtítulo de “Uma disciplina que se procura”.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 17

mais tarde, mostra que este processo se desenrolava a nível internacional. À crise
doutrinária da Arquitetura Moderna se respondia com a busca de critérios “objetivos
e científicos” fora dela. O preço a pagar era a perda de especificidade da ação e da
reflexão arquitetônica. Mas então, não o sabíamos.

A FAU era essencialmente um ambiente cultural e político4. O debate


arquitetônico, se existia algo que merecesse esse nome, se dava com os contornos
da militância. O debate sobre a “casa popular”, a experiência cubana de uma
“industrialização trabalho-intensiva”, a necessidade de superar “a estética burguesa”,
o engajamento na vida que ensinava Flávio, pareciam as únicas pontes que se
podia estabelecer com “o mundo lá fora”. Em breve o ressurgimento das entidades
estudantis, as passeatas, o movimento pela anistia e a percepção de que o fim da
ditadura era uma possibilidade concreta mostravam pontes mais concretas e
imediatas.

Em 1973, aproveitando o vácuo da I Bienal Internacional de Arquitetura,


promovemos o I Encontro Nacional de Estudantes de Arquitetura. A realização do
Concurso de Escolas nos coloca o ensejo de reivindicar a presença de um estudante
no Júri Internacional. Para escolhê-lo um outro concurso: de monografias sobre o
tema “Critérios e Métodos de Aferição de Trabalhos Escolares em Arquitetura”5. Um
trabalho sobre a análise da “ideologia capitalista” do ensino superior me garantiu o
primeiro prêmio. E também uma pergunta de Mayumi, encarregada com Sérgio
Souza Lima da seleção: “O trabalho está ótimo. E agora, quando é que você vai
escrever sobre o ensino de Arquitetura? “.

Arquitetura, ensino, escola pública, transformação social, construção da


cidadania, eram manifestações de um elenco de preocupações que demarcava
nossa identidade enquanto geração, tanto quanto nossas irredutíveis diferenças. A
mesma Bienal de Arquitetura que albergava a primeira reunião nacional de

4
Nisto não parece haver, de resto, uma especificidade desses anos. Abrahão Sanovicz em
depoimento ao autor se referia ao significado de Escola para a formação de sua geração, nos
mesmos termos. Depoimento, São Carlos, julho/96.
5
MARTINS, Carlos e SAMPAIO, Vera, Para uma discussão do Ensino de Arquitetura e dos
Critérios de Avaliação. mimeo, GFAU, 1973. Este trabalho não faz parte do material comprobatório
porque eu não disponho de nenhuma cópia. O Dedalus registra um exemplar depositado na
Biblioteca da FAU.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 18

estudantes desde o AI5, trazia em seu catálogo um texto de Saia em que ele
afirmava:

“...não será o sociólogo, nem o economista, nem mesmo operário, quem irá
conduzi o processo de transformação social. Pelo caráter abrangente de sua
formação, pela sua dimensão humanista, caberá ao arquiteto - e só a ele - esse
papel.6

Nenhuma política deliberada para afastar estudantes, engajados política e


culturalmente, do âmbito do projeto de arquitetura poderia ter sido mais eficiente.

Arquitetura, ensino, defesa da Escola Pública diante da escandalosa


proliferação das escolas privadas, eram os motes para uma atuação que o final do
Curso forçava. Uma proposta de trabalho no Setor de Planejamento do FUNDUSP
pareceu a solução salvadora. Três anos depois, o apelo irresistível da perspectiva de
“dar aulas”, mesmo por um terço do salário. A disciplina desejada seria
Planejamento. Mas a vaga era de História. E quem não tinha conseguido aprender,
agora precisava ensinar.

Fim de um não tão breve excurso pela pré-história de um problema.

Arquitetura e Estado: tema e problema


Voltemos ao projeto da dissertação. Se a sua proposição surgia como esforço
de enfrentamento de um problema que dizia respeito à necessidade de compreender
uma inserção política possível para a atuação do arquiteto, alternativa ao discurso
desenvolvimentista retardatário mais ainda hegemônico, sua lenta elaboração se
dava na prática quotidiana da docência na FAUPUCCAMP, na disciplina de Arte e
Arquitetura Brasileira com Áurea Pereira da Silva, na de História da Arquitetura e
Urbanismo, dedicada ao Movimento Moderno, com Ricardo de Azevedo Marques, a
aproximação às questões da arte brasileira recente propiciada pelas conversas com
José Resende e, especialmente, nas discussões com Sophia Telles, iniciadas no
Grupo de Orientação do TGI e desenvolvidas ao longo de inúmeras noitadas de
amizade e estimulantes discussões.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 19

No anteprojeto de pesquisa, antes referido, definia-se o recorte proposto:

O foco de nosso trabalho estará centrado, portanto, na emergência do discurso


moderno na arquitetura brasileira, como processo de configuração do ideário
da categoria, isto é, do conjunto de crenças e noções sobre o papel do
arquiteto e sua inserção na atividade social, no momento mesmo de sua
institucionalização que periodizaremos, ainda que provisoriamente, como o
momento da estruturação do Estado centralizado no Brasil (1930-1945).

A opção de trabalho estava evidentemente “contaminada” pelo debate do


período. O foco sobre o discurso era claramente devedor das reflexões de Durand,
especialmente quanto à caracterização da arquitetura como “ocupação”, definida
pela ação social e política de um grupo especializado que conquista o
reconhecimento social de suas atribuições , mais do que determinada diretamente
pelo desenvolvimento da divisão técnica do trabalho.7 A esta leitura, somava-se a
orientação mais geral do primeiro texto de Tafuri a ter ampla divulgação no meio
estudantil e profissional paulista, em que se estabelece a caracterização da
“ideologia do plano” como o instrumento ideológico fundamental da configuração do
ideário da arquitetura das vanguardas e como raiz de sua crise, a partir do confronto
com a “realidade do Plano” das políticas pós crise de 1929, seja na versão
keynesiana dos países ocidentais, seja nos Planos Qüinqüenais soviéticos.8

É curioso observar, retrospectivamente, que a matriz de análise ideológica


proposta pelo grupo da Escola Veneza, capitaneada por Tafuri, parece não ter
encontrado fora do âmbito paulista, igual penetração. Talvez porque o sentido da
operação conceitual e historiográfica operada por Tafuri e seu grupo não podem ser
entendidos fora do contexto de um esforço por regenerar e dar vitalidade a um PCI ,
fortemente questionado em sua orientação dominante pelo processo de revisão
ideológica que culminaria no Maio de 1968.

6
SAIA, Luís, “O Papel do Arquiteto” in I Bienal Internacional de Arquitetura, São Paulo, Fundação
Bienal de S. Paulo, IAB, BNH, 1973.
7
DURAND, José Carlos G. O Arquiteto (Estudo introdutório de uma ocupação). Dissertação de
Mestrado, DCS/FFLCH/USP, São Paulo, 1972.
8
TAFURI, M., CACCIARI, M., DAL CO,F., De la Vanguardia a la Metrópolis, Barcelona, Gili, 1972.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 20

A própria maneira como a bibliografia preliminar estava organizada indicava


um percurso metodológico e uma proposta de trabalho: Movimento Moderno, Estado
e Ideologia no Brasil, Arquitetura Brasileira. Tratava-se, retrospectivamente, de por a
Arquitetura Brasileira em contexto, situando-a primeiro no âmbito do movimento das
vanguardas internacionais, inserindo-a a seguir na quadro das relações entre cultura
e Estado no Brasil.

Nesta perspectiva, as relações entre Arquitetura Moderna e Estado Varguista


poderiam deixar de ser vistas como paradoxo e passariam a estar enquadradas
numa visão do Estado constitutiva do ideário da Arquitetura Moderna internacional,
particularmente concebida na matriz da “ideologia do plano” de formulação tafuriana.

Se me atenho aqui de forma tão extensa às condições iniciais da formulação


de um trabalho acadêmico é porque estas permitem destacar alguns aspectos
essenciais das motivações e do sentido que marcavam o trabalho de titulação
acadêmica. A indissociabilidade entre ensino e pesquisa, entre a atividade
acadêmica e a reflexão sobre a prática profissional estava aí contemplada, não
como princípio formal e abstrato, mas como convicção e vivência que não eram
apenas pessoais mas faziam parte do contexto de uma geração.

Mesmo diante de um esforço de uma análise retrospectiva é extremamente


difícil - e provavelmente inócuo - discernir de forma precisa a articulação entre cada
momento de reflexão e elaboração dos temas da dissertação com as vivências e
embates concretos de um período marcado por uma intensa, e às vezes
extremamente confusa, retomada do esforço de definição de uma política
consistente para o ensino de arquitetura e, particularmente, da definição de um nexo
entre o âmbito escolar e a política de atuação profissional.

Entre a proposição inicial e a entrega do texto da dissertação passaram-se


oito anos. Marcados pela definição de uma perspectiva militante da docência que,
por vezes, deixava-nos na dúvida entre a ação do pesquisador, a do docente
engajado na defesa da educação pública e a do militante sindical. Anos
intensamente preenchidos pelos embates didáticos da PUCCAMP, pelo processo de
construção da Associação de Docentes local, pelos Encontros Nacionais de
Docentes que levaram por fim à criação da ANDES, definida no Congresso Nacional
que nós, juntamente com os colegas da ADUNICAMP, organizamos em Campinas.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 21

Liberdades democráticas, a defesa do ensino público e gratuito, “direito de


todos e dever do Estado”, a autonomia da Universidade como condição de
construção da competência acadêmica, eram vividas não como palavras de ordem
distantes da vida quotidiana do fazer acadêmico, mas como a construção necessária
das próprias condições desse fazer, comprometido com as “reais necessidades da
população brasileira”. Formulação clichê, sem dúvida, mas que retratava bem a
enérgica, embora difusa, vontade de articular produção de conhecimento e
preocupação com as condições concretas da sociedade brasileira.

A decisão, sempre auto-questionada, de incluir a Proposta da ANDES para a


Universidade Brasileira9, de cuja primeira versão completa, divulgada em 1985,
participei como redator, na lista de meus trabalhos publicados obedece à convicção
de que a reflexão teórica sobre os domínios específicos da arquitetura e de seu
ensino não estava - ou não deveria estar - desvinculada da defesa de uma
Universidade pública, gratuita, autônoma e competente, síntese e eixo da concepção
de trabalho da ANDES naquele período.

Estávamos todos ainda imersos em um clima onde a busca de uma política


para a arquitetura não tinha como ser desvinculada de uma política para o país. O
eventual constrangimento da constatação de uma certa ingenuidade romântica em
todo esse envolvimento deve ser relativizado (para evitar um anacronismo) pela
compreensão de que aquele era um momento em que a política da arquitetura ainda
se revolvia no embate de antigas hegemonias, já esgarçadas pelo confronto com o
processo vivido pela sociedade brasileira, enfrentada a novas dúvidas. Mas não
ainda tomada pelo cinismo militante dos falsos pragmatismos ou pelo pragmático e
interessado deslumbramento pela artisticidade da arquitetura, concebida como
senha de ingresso no mundo maravilhoso - e lucrativo - do showbiz. Parafraseando
um antigo texto de José Rezende, não deixa de ser emblemático que a arquitetura
oscile hoje, indefinida, entre o Caderno de Imóveis e o Divirta-se. Naquele momento
ainda estávamos - ou queríamos estar - nos Cadernos de Nacional. E às vezes
estávamos - os docentes, não os arquitetos - no Jornal Nacional.

9
AAVV. A Proposta da ANDES para a Universidade Brasileira, Belo Horizonte,
ANDES/APUBH/UFMG, 1985.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 22

Da mesma forma, os debates sobre as tortuosas e complexas relações entre


a esfera pública e a privada, entre a dimensão de aparelho de Estado e o sentido
coletiva que queríamos atribuir à missão da Universidade10 não eram alheios ao
esforço de reflexão sobre uma arquitetura que constituiu e consolidou sua
hegemonia “à sombra do Estado” mas em nome - e na perspectiva - de servir à
Nação. A histórica e recorrente incapacidade do país em constituir a cidadania e
estabelecer assim, de forma clara, a distinção entre as esferas do público e do
privado, enfrentada naquele momento como problema político concreto em relação à
Universidade, era também uma chave necessária para a compreensão da força e
dos impasses do projeto moderno na arquitetura do Brasil. E talvez, muito
especialmente, dos avatares desse projeto em São Paulo.

Retorno à Arquitetura. A proposta do Curso de Graduação de


São Carlos
É neste quadro que deve ser inserida a decisão de abandonar, em 1985, a
PUCCAMP, para assumir, em tempo integral, a tarefa de participar da concepção e
implantação do Curso de Graduação em Arquitetura da Escola de Engenharia de
São Carlos. Vale relembrar que o Departamento mantinha já, desde 1971, um
Programa de pós-graduação em nível de Mestrado. A esta questão voltaremos
adiante.

Condição curiosa ou sinal dos tempos, coube a dois auxiliares de ensino,


elaborar o núcleo conceitual da Proposta de Implantação do Curso de Graduação
em Arquitetura, o segundo da USP e o primeiro de uma Universidade pública no
interior do Estado11.

10
AAVV. O Saber e o Poder. O Público e o Privado. Rio de Janeiro, ANDES/Marco Zero, 1984.
Minhas intervenções no Seminário que deu origem à publicação estão registradas às paginas
XX=VV.
11
A proposta encaminhada à Congregação da EESC era evidentemente, mais ampla que essa
definição de núcleo conceitual e foi elaborada por uma Comissão do SAP. Circunstâncias específicas
do processo de discussão na Escola fizeram que Agnaldo Farias e eu fossemos agregados a
posteriori a essa Comissão e encarregados de elaborar o núcleo de definição conceitual do Curso,
bem como definir as diretrizes gerais da estrutura curricular para as áreas de Teoria e História,
Projeto e Linguagem e Representação. Era um dos supostos e argumentos da proposta o
aproveitamento da capacidade intelectual instalada na área de Ciência e Tecnologia na Escola e no
Campus.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 23

Há dois aspectos centrais nesta empreitada que interessa, para os objetivos


deste texto, destacar. O primeiro diz respeito à concepção de que o Curso deveria
buscar um perfil próprio, consentâneo com o momento do debate e da reflexão sobre
a produção da arquitetura vivido no país. Definíamos então a necessidade de
assumir que a atividade de projeto de Arquitetura constituía o núcleo central da
atividade do arquiteto. Essa caracterização, quase acaciana, implicava o
entendimento de que campos de atuação como o Planejamento Urbano, a
Comunicação Visual e o Desenho Industrial, embora abertos à participação de
arquitetos, não eram exclusivas desta categoria e demandavam uma formação
especializada, em nível de pós-graduação. Não deveriam, portanto, comparecer em
pé de igualdade, no âmbito da formação básica da graduação, em pé de igualdade
com o Projeto de Arquitetura.

O segundo, que definia essencialmente o escopo e objetivos da área de


Teoria e História, mas tinha implicações para o conjunto da proposta do Curso,
propunha assumir como referencial básico e objeto de reflexão fundamental o que
chamávamos de “campo da modernidade”.

Por tal expressão compreendíamos, genericamente, o período histórico e as


condições sociais econômicas, culturais e artísticas que configuravam o “mundo
moderno” do particular ponto de vista da arquitetura. Dois pressupostos informavam
essa caracterização e, ao mesmo tempo, dela se valiam. O primeiro era o de que
uma Escola de Arquitetura, implantada nas condições específicas da metade dos
anos 80, deveria assumir claramente a sua inserção desde o Brasil. A segunda era,
sem dúvida, devedora de uma opção quiçá emblematicamente expressa na
formulação de Mário Pedrosa, do Brasil como “um país condenado ao Moderno”.
Tratava-se do entendimento de que já não cabia à Escola ser o espaço de
reprodução acrítica dos pressupostos e procedimentos projetuais do “movimento
moderno” ou do projeto moderno hegemônico no Brasil, em qualquer das suas
variantes, mas tampouco deveria esta embalar-se na tendência da rejeição e
negativa, igualmente acríticas, de uma produção que havia demostrado solidez e
qualidades de força próprias que justificaram seu reconhecimento internacional,
assim como uma significativa adesão nacional, particularmente ao longo das
décadas de 40 a 60.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 24

Imprecisa ou vaga, essa definição programática tinha, entretanto, o mérito de


ser uma clara tomada de posição, cujo alcance se pode melhor avaliar se a
colocarmos no contexto do debate arquitetônico de quase uma década e meia atrás.
Baste lembrar que 1985 é o ano da realização do XIII Congresso Brasileiro de
Arquitetura, em Belo Horizonte, e que, ironias da história, embora denominado
Vilanova Artigas, marcou de fato a consagração de Éolo Maia, Podestá e o grupo
dos “pós” mineiros, que propunham para o Brasil os procedimentos de referências
tipológicas e formais que, de forte sabor europeu, assumiam aqui, é justo notá-lo,
um bom humor e uma fina ironia que sua posterior difusão e consolidação
acabaram, no geral, por perder.12

Essa tomada de posição - estratégica - acarretava desdobramentos na


concepção do papel e do peso específico da área de Teoria e História na estrutura
curricular do Curso proposto13, assim como na própria articulação vertical das
disciplinas.

O primeiro ano era proposto como um momento de apresentação aos alunos


de um “panorama repertorial” do campo da modernidade, em que se estabeleciam,
num nível deliberadamente introdutório, aspectos históricos e conceituais envolvidos
na problemática da constituição da cidade moderna da Revolução Industrial, dos
novos temas e desafios colocados à Arquitetura e ao Urbanismo, assim como dos
procedimentos e questões que foram historicamente configurando a “arte moderna”.
Em termos de periodização, atínhamo-nos essencialmente ao quadro da segunda
metade do século XIX avançando até as primeiras formulações das “vanguardas
históricas” durante as três primeiras décadas do XX.

A introdução do estudo da Arquitetura Brasileira se dava logo na seqüência,


no segundo ano, e se caracterizava por estar centrado na análise do período 1930 -
1970 e por estabelecer como estratégia central a articulação entre os temas e
questões da arquitetura moderna brasileira e as formulações paradigmáticas das

12
Cfr. MAIA, É., VASCONCELLOS, J., PODESTÄ, S., Três Arquitetos, 1980-1985, Belo Horizonte,
s/ed., 1985.
13
Na proposta original, a carga horária total das disciplinas de Teoria e História significava cerca
de 20 % da carga total, bastante elevada tanto em relação aos padrões tradicionais das Escolas
Brasileiras quanto às Escolas internacionais normalmente reconhecidos como centros fortes na área
teórica. Barcelona e Veneza, por exemplo, tem essa proporção pouco abaixo dos 10%.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 25

vanguardas internacionais ao mesmo tempo que enfatizava as relações entre a


Arquitetura e a produção cultural, em especial no âmbito das Artes Plásticas. A
importância dada a esta relação, que pretendia expressar a necessidade de
compreensão da Arquitetura como fato cultural, se expressava no próprio nome da
disciplina, Arte e Arquitetura no Brasil. Com a secura própria das ementas oficiais, a
nossa estabelecia para o anos de 1985, os objetivos da disciplina, formalmente
dividida em duas semestrais:

“Objetivos: (1º semestre)


Introduzir ao aluno na compreensão da Arquitetura como elemento integrante
do processo de produção cultural no Brasil. Estabelecer as articulações entre
as produções artísticas e arquitetônicas brasileira e internacionais.
(2º semestre) : Aprofundar a reflexão sobre as relações entre arquitetura e
produção cultural, considerando a ambiência sócio-política e econômica do
Brasil no segundo pós-guerra.” 14

Assim como a disciplina do segundo ano, Teoria e História da Arquitetura I,


ministrada para o terceiro, também partia do suposto de que é o olhar da
modernidade que estabelece as referências e valores do passado e, retomava a
tematização do “campo da modernidade” buscando estabelecer os seus nexos com
os fundamentos do mundo moderno, em seu sentido mais amplamente aceito pelos
historiadores, na produção e reflexão do Renascimento e do Barroco, passando pela
Ilustração para deter-se afinal com mais acuidade na gênese das formulações
arquitetônicas do final do século XIX das manifestação do “movimento moderno até
meados do séc. XX.

O quarto ano ficava assim, na proposta inicial, dedicado ao debate das teorias
e questões da produção contemporânea, genericamente compreendida como aquela
que se embate com o campo de questões colocados pela teoria e pela produção
internacionais a partir da segunda metade dos anos sessenta. Neste caso,
obviamente não se trata de um enfoque histórico mas de uma abordagem que

14
Cfr. Ementas das disciplinas SAP 353 e 354. Arte e Arquitetura no Brasil I e II. Serviço de
Graduação, EESC/USP.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 26

pusesse em destaque as articulações - e seus problemas - entre as formulações


internacionais e as novas tendências da produção brasileira.

Duas questões centrais para a estratégia didática do Curso diziam respeito a


problemas que permaneceram - ou permanecem - em aberto no processo de auto-
avaliação contínuo que tem caracterizado o Curso de Graduação de S. Carlos e que
são relevantes para o tema deste texto.15

A primeira se refere ao papel específico das disciplinas de Projeto e sua


articulação com as demais áreas na estratégia didática e, em conseqüência, na
estrutura curricular. A afirmação da atividade projetual como “núcleo central da
atividade do arquiteto” não implicava, para nós, a aceitação da idéia da disciplina de
Projeto como espinha dorsal do Curso.

Entendíamos, e pessoalmente sigo convencido, que a concepção de


dorsalidade das disciplinas de Projeto pecava por implicar a suposição de um caráter
instrumental, diretamente operativo e subsidiário às demais disciplinas, prejudicando
assim a compreensão de seus campos e problemas disciplinares próprios, cujo
reconhecimento é fundamental para a formação ampla que deve ser o objetivo do
Curso de Graduação. Para usar uma linha de argumentação freqüente nas
discussões do período de implantação e que retomei recentemente em conferência
pronunciada no XV Congresso Brasileiro de Arquitetos16, tratava-se de reconhecer
que as condições específicas da produção arquitetônica e as condições gerais do
ensino universitário desde os anos 80 não mais permitiam conceber a escola como o
lugar onde se ensina as técnicas e procedimentos relativos a um determinado
projeto de arquitetura socialmente consolidado como hegemônico. Tampouco era - e
é - possível, num quadro de massificação da universidade, investir num esquema de

15
Num processo que para alguns chega a ser excessivo, o Curso, aos seus 13 anos de existência
já passou por duas propostas de reorganização integral, afora os arranjos parciais no âmbito de
disciplinas ou seqüência. Em 1989 ensaiou-se uma tentativa de implantação do esquema de atelier
integrado, que não foi adiante. Desde 1997 o Curso está novamente em processo de reorganização
curricular, atendendo agora ao processo geral das Escolas do país de reflexão sobre as mudanças
propostas pela alteração do Currículo Mínimo em 1996 e pela necessidade de elaborar as diretrizes
curriculares exigidas pela nova LDB.
16
MARTINS, Carlos, “Especialização versus formação generalista”: o mercado e o ensino”,
Conferência da Mesa Temática “O Controle da Produção”, XV Congresso Brasileiro de Arquitetos
Oscar Niemeyer,. Curitiba, IAB, 29/10 a 01/11. O texto da conferencia está no prelo e deverá ser
publicado nos Anais do Congresso até o final deste ano.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 27

trabalho, o atelier, que tem como suposto fundamental a emulação, na escola, do


processo de aprendizado característico do estágio nos escritórios profissionais.17

Propunha-se, como alternativa, a adoção da estratégia de definição de


“núcleos temáticos horizontais” que dariam referências comuns às diferentes
disciplinas de um mesmo ano letivo, garantindo condições de organização de cada
disciplina em funções das questões específicas de seu próprio campo disciplinar e
evitando, por outro lado, sua excessiva autarquização. Assim, por exemplo, a
introdução ao repertório da modernidade era o núcleo proposto para o primeiro ano,
a habitação e a paisagem brasileiras eram o tema articulador dos trabalhos do
segundo ano, etc.

Valeria a pena, talvez, destacar um aspecto, que a muitos pareceu


surpreendente, da proposta do Curso de Arquitetura de São Carlos, especialmente
dado o grande peso específico da área de Teoria e História. São Carlos propunha,
desde 1989, que o TGI consistisse necessariamente num projeto arquitetônico, não
importando em que escala. Pretendia-se, assim, afirmar de maneira inequívoca que
a ênfase sobre Teoria e História não significava a perspectiva de formar
historiadores ou teóricos da arquitetura mas arquitetos habilitados a compreender o
contexto e o significado cultural de suas referências e de seu trabalho.

A segunda questão, igualmente relevante para a definição da estratégia


didática e, a médio prazo, de maiores implicações conceituais tanto para a área de
Teoria e História como para a de Projeto, dizia respeito à compreensão das relações
entre Arquitetura e Cidade. Pese à critica explícita da confusão entre as esferas da
Arquitetura e as do Planejamento Urbano, a área de Teoria e História mantinha-se
ainda organizada sobre o desenvolvimento de duas “subseqüências”: que seguiam
paralelamente, do primeiro ao quarto anos do Curso. A primeira buscava estabelecer
os nexos e articulação entre a Arquitetura e a produção cultural, mais
especificamente no âmbito das Artes Plásticas. A segunda percorria, conceitual e
historicamente as relações entre o Urbanismo e os processos mais gerais do

17
É verdade que o esquema de atelier segue sendo a base da proposta de ensino em vários
países com uma forte tradição de prática arquitetônica consistente, como é o caso da Espanha, da
Itália ou da Argentina, que adota basicamente o modelo hispânico. Entretanto as enormes diferenças
de modelo universitário, nestes casos apoiado no sistema de livre ingresso, tornam extremamente
problemática qualquer relação imediata.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 28

fenômeno da urbanização nos distintos momentos e recortes do processo de


produção capitalista da cidade.

Tal separação, conceitualmente problematizada à luz da reflexão teórica


desenvolvida pela área ao longo da segunda metade dos anos 80 e início dos 90
veio a ser colocada em questão no interior do Departamento desde 1993, já
influenciada pela discussão da montagem da Sub-Área de Concentração em Teoria
e História do Mestrado, e implicou na reorganização (fusão) das disciplinas da Área
de segundo a quarto anos. Assim, por exemplo, as disciplinas Arte e Arquitetura no
Brasil, ministrada por mim e História do Urbanismo e da Urbanização no Brasil,
oferecida por Nabil Bonduki, vieram a se unificar, a partir de 1995, na disciplina
Teoria e Historia da Arquitetura e do Urbanismo no Brasil, com carga horária
dobrada e ministrada conjuntamente pelos dois professores.

A mesma questão, a das relações entre arquitetura e cidade veio a


manifestar-se inevitavelmente na compreensão do escopo e da abrangência das
disciplinas da Área de Projeto, seja como discussão dos níveis de escala em que as
disciplinas deveriam trabalhar, seja como debate sobre as vantagens e problemas
de estabelecer uma especialização entre disciplinas mais centradas no edifício, na
escala de setor urbano ou em dimensões territoriais.

Este é um processo ainda não esgotado no âmbito do Curso. No entanto o


que interessa aqui é destacar que entre 1986 e 1987, essa discussão revelava
problemas conceituais e de abordagem metodológica que também se expressariam
no trabalho científico, como retomaremos adiante.

A dissertação: Um problema, um objeto, um personagem:


A trajetória deste texto, alternando o argumento entre problemas teóricos,
dificuldades e dúvidas reveladas no próprio exercício do ensino de graduação e
embates concretos no âmbito da gestão acadêmica, seja à escala nacional da
intervenção do movimento docente, seja à escala local e específica do processo de
implantação de um Curso de Graduação, não é gratuita.

Se para um leitor externo, as questões colocadas nos textos devem poder ser
compreendidas por si só, para o autor empenhado em redefinir os nexos que
articulam o desenvolvimento do próprio trabalho não há como escapar às condições
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 29

gerais e aos embates concretos que definem o contexto em que os discursos


teóricos se constituem e se propõem. Pensá-los fora dessa perspectiva seria atribuir-
lhes um mero valor de erudição ou de trabalho acadêmico vazio. Reconhecê-los
como tal seria assumir uma derrota.

Afirmamos atrás que já no momento de apresentação do primeiro esboço do


projeto de pesquisa para a dissertação havíamos definido um problema (a dimensão
essencialmente política do discurso sobre a arquitetura que marcava o período de
minha formação), um objeto ( a constituição do discurso moderno no Brasil) e um
personagem (Lúcio Costa, considerado como o responsável pela operação teórica
que viabiliza a aceitação ideológica da arquitetura moderna de raiz corbusiana como
instrumento adequado para a contribuição específica da arquitetura no processo de
construção de uma identidade nacional.

A articulação entre eles demandava a definição de um tema e de uma chave


metodológica. Não foi, naturalmente, gratuita a opção pelo Mestrado no Programa
de História. Havia naturalmente a possibilidade de realizar o trabalho diretamente na
área de História da Arquitetura na FAUUSP mas eu me sentia carente de
instrumentos teóricos e metodológicos mais adequadas à tarefa a que me propunha.
E considerava, apenas em parte com razão, que deveria encontrá-los num Programa
específico de História.

Creio ser possível afirmar que a dissertação expressa, com os seus


problemas e limites, a marca desse compromisso. A percepção, anteriormente
relatada do cunho essencialmente político do discurso profissional, remetia para a
reavaliação do próprio papel do Estado enquanto agente social transformador por
excelência, forma pela qual comparecia no discurso da esquerda tradicional. Neste
sentido foram extremamente proveitosas a convivência e os debates no ambiente da
História, tanto, ao menos quanto as disciplinas no sentido formal. A presença entre
outros, de Aarão Reis Filho, que então desenvolvia sua pesquisa sobre a esquerda
brasileira, de Francisco Foot Hardman, já conhecido como companheiro de militância
mas não como historiador, de Maria Helena Capellato, com seu trabalho sobre a
Revolução Constitucionalista, contribuiu, ainda que de maneira não linear para a
fixação de dois eixos de preocupação: a reavaliação do papel do Estado Brasileira
na visão da esquerda e a compreensão do forma particular pela qual o discurso
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 30

histórica constitui uma dimensão operativa sobre o processo de fixação e


transformação de valores.

A forte presença, já indicada, da matriz tafuriana da análise ideológica no


projeto inicial da pesquisa, foi revigorada - e redirecionada - pelo contato como o
livro de De Decca e, mais particularmente, pela introdução de Chauí.

Revendo agora meus grifos de então, encontro:

“Se, durante os anos 50, mantendo uma concepção clássica no pensamento


brasileiro, que vê no Estado o demiurgo da história, os intelectuais pretendiam
fornecer planos e metas aos governantes e ao povo, no pós-64, acuados e
reprimidos pelo Estado, os intelectuais imaginaram pertencer ao mesmo campo
onde foram lançados os proletários - o campo dos vencidos. (...) “No correr dos
anos 70, o intelectual, e em particular o historiador, medita acerca de seu
próprio trabalho, seu lugar e seu papel, sua relação com a classe operária e
sobre os resultados palpáveis da ideologia dominante na determinação dos
temas e dos métodos da pesquisa.”

E mais adiante:

“... ao desmontar o discurso acadêmico que tornou possível falar em


“Revolução de 30”, De Decca revela não só a existência de um discurso
fundado na memória dos dominantes, mas ainda reflete sobre a reprodução da
ideologia pela intelligentsia de esquerda, pois o trabalho historiográfico tende a
permanecer no interior dessa ideologia como se fora seu ambiente natural”.18

Que estas citações, assim como o próprio texto de De Decca não apareçam
no texto da dissertação indica que o seu efeito foi mais conceitual e metodológico do
que temática. Ou dizendo de outra maneira, abriu a possibilidade de uma
perspectiva de trabalho que permitia equacionar o papel do trabalho historiográfico
na constituição do campo temático e repensar a dimensão operativa do trabalho do
historiador. No nosso caso isto significava a necessidade de reconstruir o processo
pela qual o discurso programático dos protagonistas havia sido assimilado pela

18
Cfr. CHAUÍ, M. “A História a Contrapelo”, prefácio a DE DECCA, E., 1930. O Silêncio dos
Vencidos, São Paulo, Brasiliense, 1980. Os trechos citados estão às pp. 13 e 14.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 31

historiografia até se converter em narrativa canônica e, enquanto tal, redefinir a


valoração das posições e protagonistas e participar da constituição, enquanto
discurso normativo, do ideário profissional.

Uma questão a destacar aqui é que se resulta evidente que, no âmbito de


uma historia da arquitetura, a reconstituição do processo de montagem do conjunto
de valores e do “papel social auto-atribuido pela própria categoria”, que podemos
chamar de ideário, não é suficiente para dar conta de todos os mecanismos pelos
quais a arquitetura se realiza socialmente, naquele momento ainda estávamos
convencidos de que a “análise ideológica” era a matriz teórica fundamental para
compreender o processo brasileiro.

Como o colocávamos na introdução à dissertação:

A arquitetura tem, enquanto forma particular de expressão artística uma dupla


imbricação: no terreno da produção envolve uma intervenção na divisão social
do trabalho mais ampla que qualquer outra das artes plásticas e, no terreno da
visualidade, cumpre o papel, também com maior amplitude que outras
manifestações visuais, de estruturar a “ordem de visibilidade”, na acepção de
Le Bot. A compreensão da arquitetura , portanto, e o seu valor como elemento
auxiliar para a compreensão da história de um determinado período, não se
oferece `a simples atividade relacionadora - quase sempre tendente a uma
visão mecânica - entre os produtos arquitetônicos e as condições econômicas,
sociais e políticas de uma sociedade, ou à tentativa de ler as formas
arquitetônicas como expressão espacial direta das idéias da classe ou dos
setores dominantes dessa sociedade.(...) Nossa preocupação é a intelecção
de um tipo particular de discurso arquitetural, o moderno, em um contexto
específico, o da sociedade brasileira da primeira metade do século.” 19

Nesse quadro de problemas e referências, a Dissertação foi finalmente


tomando forma em três partes (capítulos) que respondiam às inquietações que se
iam individualizando.

19
MARTINS, C. Arquitetura e Estado. Elementos para uma investigação sobre a Constituição do
Discurso moderno no Brasil. A Obra de Lúcio Costa 1924/1952. Dissertação de Mestrado,
FFLCH/USP, 1988. O trecho citado está à p. XIII. Doravante citaremos como MARTINS (1988).
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 32

O primeiro buscava definir o papel da historiografia na consolidação de


valores arquiteturais e o processo concreto de construção de uma trama narrativa da
arquitetura brasileira. Por razões que valerá a pena comentar adiante, o texto deste
capítulo, apesar de nunca publicado, teve uma curiosa “fortuna crítica”, sendo talvez
o texto de minha autoria que mais repercutiu no país. Voltaremos a ele em seguida.

O segundo, assumindo claramente a matriz ideológica, indisfarçavelmente


20
colada ao Tafuri de Para una crítica de la ideologia arquitectónica , buscava
compreender as origens e condições da marcante relação entre arquitetura moderna
e Estado no Brasil, polemizando, a um lado, com as leituras que insistiam no caráter
paradoxal dessa relação (arquitetura moderna, “bolchevismo construído” e Estado
centralizador e autoritário)21 e, a outro com aquelas que reduziam a um jogo de
interesses materiais ou de prestígio característico dos “intelectuais à sombra do
poder”, um nível de convicção que afinal havia resistido a pelo menos quatro
décadas22.

Dizíamos:

“Trata-se portanto da necessidade de reconstituir um processo de interlocução


que envolveu dois sistemas discursivos: o do movimento moderno,
especificamente na sua configuração corbusiana e o do chamado pensamento
autoritário brasileiro, que, para o efeito que nos interessa. Preferimos
caracterizar como o dos ideólogos do Estado-Nação”

Os riscos e limites dessa operação já estavam presentes, ao menos enquanto


preocupação. Veremos ao tratar do terceiro capítulo que, ao longo do processo de
elaboração da dissertação - que, como já foi comentado, se deu em grande parte
dentro da sala de aula - essa matriz foi progressivamente se revelando como
pertinente mas insuficiente para dar conta dos processos de constituição e
estabilização de uma linguagem especificamente arquitetural, sem a qual toda a

20
Esse o título do ensaio específico de Tafuri no já citado De la Vanguardia a la Metrópolis.
21
A leitura do paradoxo arquitetura moderna “socializante” versus Estado autoritário é quase
constitutiva da própria narrativa historiográfica. Ela aparece já, ainda que diplomaticamente
dissimulada no texto de Goodwin, que caracterizamos como o momento fundante, de “montagem”da
trama narrativa. Cfr. GOODWIN (1943).
22
Na dissertação tomamos os trabalhos de Micelli como representativos desta posição.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 33

operação ideológica que um autor ou corrente possa elaborar não encontra os meios
próprios de institucionalização.

“No entanto, enquanto procedimento investigativo estaremos ainda num nível


de análise genericamente pertinente para qualquer formação discursiva.
Correndo, portanto, o risco de tentar apreender a arquitetura, e a trama de
significados que engendra nas suas múltiplas imbricações com o universo das
representações sociais, fora de sua especificidade.

É necessário pensá-la enquanto forma de organização espacial da vida em


sociedade. Organização em que há dois níveis distintos de atuação: o que
poderíamos chamar de “infra-estrutural” e o da organização simbólica do social
através da “ordem de visibilidade”.

Como a noção de ordem de visibilidade era, para nós, clave para a definição
do “eixo de mirada” da dissertação, vale a pena resgatar aqui, a formulação de Le
Bot:

“A instituição de uma ordem de visibilidade, como modelo ideal e norma


perceptiva, ocorre por meio de demarches que são, simultaneamente,
empíricas e reflexivas. A aspecto empírico tem, sem dúvida, supremacia
quando se trata da produção de formas no espaço (...) (num) campo limitado e
relativamente pouco conflitivo. (...) O aspecto reflexivo se torna mais evidente
toda vez que problemas análogos se colocam à escala de uma comunidade
onde o poder se encontra dividido e hierarquizado em instâncias distintas,
reconhecidas como tais . A definição das finalidades e das soluções passa
então a resultar de um cálculo intencional, político propriamente, uma vez que
seu objeto é o sistema social em sua dimensão sistemática (...) pouco
importando se os produtores de formas, em sua intenção consciente de
sistematicidade, coloquem em jogo, na verdade, uma ideologia inconsciente de
23
suas finalidades objetivas.”

23
Cfr. LE BOT, Marc. “Arte/Design” in Malasartes (3): 20.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 34

Texto e obra na arquitetura: o sentido da questão


historiográfica
Era inevitável que um arquiteto, “bandeado” para a pós-graduação em
História, colocasse como primeira questão a elucidar o próprio sentido do fazer do
historiador da arquitetura. Num ambiente marcado pela politização do discurso
justificativo da prática profissional, que já apontamos, e por uma persistente tradição
anti-intelectual, que discutiremos mais adiante, era preciso certificar-se de que o
trabalho historiográfico tinha um sentido e um objetivo para além do campo da
erudição. Isto é, tratava-se de retomar o antigo - e árduo - debate do caráter
operativo da história da arquitetura, assim como de buscar estabelecer, num
ambiente historiográficamente rarefeito, algumas premissas teóricas e
metodológicas que para os historiadores de ofício não se constituíam propriamente
em novidades mas que eram, para um projeto intelectual que apenas se indicava,
estratégicos.

Pensar o sentido da historiografia era pensar a relação entre texto e obra,


entre texto e projeto, entre o discurso verbal e a constituição da “ordem de
visibilidade”. E isso demandava estabelecer

A tensão entre a ótica de abordagem metodológica e as condições e o caráter


das fontes documentais envolvidas numa investigação histórica, envolve, na
história da arquitetura, uma particularidade que merece ser indicada.
Um trabalho de arquitetura deixa pelo menos três tipos de rastro documental
direto. Especialmente num período caracterizado por uma forte inserção de
vontade - vontade de rompimento, vontade de inauguração - os arquitetos
afirmam seu projeto através de textos, teóricos ou doutrinários; de desenhos e
de obras. Se cada um desses níveis documentais exige em princípio
abordagens metodológicas específicas, o enfoque histórico, no esforço de
apropriação abrangente do objeto arquitetural, deverá utilizar-se do seu
entrecruzamento.

Em seguida chamávamos a atenção para a interveniência de um novo nível


documental, além dos textos de arquitetos, seus desenhos e obras: o do texto crítico
ou historiográfico e para as questões aí implicadas:
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 35

A intervenção de um quarto nível documental, o da crítica ou da historiografia,


é mais complexo e operativo do que indicaria simplesmente chamá-lo de
secundário. Duas questões estão aqui imbricadas. A primeira diz respeito à
tensão entre história e crítica. O esforço de abranger com o olhar de historiador
fatos e produções muito próximos no tempo, como a arquitetura
contemporânea, envolve uma articulação das perspectivas da crítica e da
história. Articulação certamente complexa mas positiva e necessária.

Tratava-se aqui de reivindicar, apoiando-nos em Banhan24, de um lado a


impossibilidade de uma crítica sem perspectiva histórica e de outro, o caráter inócuo
de um texto histórico sem juízo de valor, isto é, sem perspectiva crítica.

Nos socorríamos também de Bonta, que era ainda mais direto na sua defesa
de uma dimensão ativa da análise textual, indicando sua incidência direta nos
processos de percepção e apropriação dos sentidos da obra arquitetônica:

La experiência verbal no puede substituir a la experiencia artística. Pero la


experiencia artística puede ser descripta verbalmente, y el análisis verbal
puede modificar y de hecho modifica, a la experiencia artística." 25

O reconhecimento de que a crítica e, pensávamos, a historia - tem uma


dimensão ativa na configuração do campo da experiência artística, no nosso caso
arquitetônica, era decisivo”:

O reconhecimento de que a crítica - e a história - tem uma dimensão ativa na


configuração do campo arquitetural permite equacionar melhor a polêmica
sobre o caráter operativo do estudo da história na praxis arquitetural. Não se
trata já, como propunha Zevi, de pensar os aportes de procedimento que a
investigação histórica pode trazer como contribuição ao ato projetual em si,
mas de pensar a leitura crítica e histórica como elementos que se agregam à
obra. A obra é reconstituída pela sua inserção numa trama que, por ser outra,

24
Cfr. BANHAN, Reyner, El crítico como historiador, El historiador como Crítico, in Summarios (4):
7
25
Juan Pablo BONTA tem um trabalho clássico sobre as transformações no tempo das matrizes
de leitura do Pavilhão de Barcelona, de Mies. O texto aqui citado é “Arquitectura hablada” in
Summarios (4): 8
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 36

desloca o ponto de vista e reconverte o objeto. O processo de leitura é um


mecanismo de recarga semântica que opera sobre a obra e, através dela, no
campo da cultura arquitetônica. 26

Mas era fundamentalmente em Argan que íamos buscar a referencia de uma


fazer historiográfico que nos ajudasse a superar antinomia, que julgávamos
problemática, entre a leitura da obra e a obra “ela mesma”. O historiador de
Arquitetura não está, para Argan, sozinho nesse dilema:

"De hecho, la história de la arte es la única entre todas las histórias especiales
que se hace en presencia de los hechos y, por lo tanto, no tiene que evocarlos,
reconstruirlos ni narrarlos, sino solo interpretarlos. (...) (sin embargo) la obra de
arte no vale para nosotros de la misma manera que valia para el artista que la
hizo para los hombres de su tiempo; la obra es la misma, pero las conciências
cambian".27

Estas eram as referencias que nos permitiam uma conclusão que era antes a
afirmação prévia da possibilidade e do sentido de nosso trabalho:

Ao mudarem as consciências, exatamente da medida em que na arte não


interessa a coisa em si, mas o seu impacto de presença absoluta diante de um
sujeito que lê e relê, o historiador: "...debe reconstruir sobre sus hombros toda
la cadena de juicios que fueram pronunciados sobre as obras de las que se
ocupa".28
Juízo sobre as obras e urdidura de tramas, interrelacionando-as em sua própria
série (história interna) e com todo o campo da cultura de um período (história
externa), a tarefa do historiador passa a constituir o próprio campo do que
pretende investigar. O historiador é parte da história, e não apenas porque,
como lembra Carr: "... o ponto em que ele se encontra, determina seu ângulo
de visão sobre o passado". Ele faz história aqui também no sentido de que
ajudará a determinar a trajetória de seu objeto. Afirmar valores, reforçar
tendências, contribuir para o esquecimento ou a institucionalização de projetos

26
MARTINS (1988): 5
27
Carlo Giulio ARGAN, El historia del Arte in Historia del Arte como Historia de la Ciudad.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 37

ou autores, é estar participando do processo permanente de ressemantização


da obra, ou seja, é estar também ele, historiador, agindo diretamente na
"geração de cultura arquitetônica".

Essa compreensão do papel ativo da crítica e da historiografia era em sí um


programa de trabalho:

Partir de uma verificação cuidadosa dos procedimentos e eleições da


historiografia não é portanto, partir da exterioridade de uma leitura de interesse
puramente acadêmico, mas tentar explicitar como e quando a praxis
historiográfica se articula ao seu objeto, recarregando-o ao nível de sua
significação, instituindo-o como norma e, por essa via, influenciando
diretamente o campo do exercício profissional.

E uma vez mais era Argan quem nos indicava a importância de lembrar que
todo juízo estético ou moral é sempre um juízo histórico, cuja importância está além
da veracidade:

La realidad del hecho narrado es indudablemente diferente de la realidad del


hecho acaecido, pero la narración que se hace hoy de hechos acaecidos en el
pasado tiene, para la vida que se vive hoy, un valor que el hecho acaecido,
como tal, no puede tener".29

Olhando em perspectiva essas “descobertas” parecem algo acacianas. Mas o


fato é que sua discussão veio, em distintas oportunidades, a provocar não poucas
manifestações de interesse e/ou discordância que parecem, ambas, indicar que, ao
menos para os arquitetos, elas ainda guardam interesse.

Foi, de qualquer maneira, essa perspectiva de resgatar a importância do “fato


narrado” que ofereceu a chave do que permanece até hoje como a única tentativa
(certamente incompleta) de reconstituir a montagem do “fato narrado” arquitetura
moderna brasileira.

28
Carlo Giulio ARGAN, op.cit., pp 25-26.
29
Carlo Giulio ARGAN, op.cit., p 20
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 38

A opção tomada foi a de selecionar aquelas obras qu constituíam


historiografia no sentido forte, isto é, que ultrapassavam os limites de análise de
obras ou autores isoladas e se punham na perspectiva de uma leitura abrangente do
“fato” arquitetura moderna brasileira.

Identificávamos cinco textos que constituíam os momentos fortes do que foi


se revelando como uma urdidura complexa mas não inextricável: Goodwin (1943),
Mindlin (1956), Ferraz (1965), Bruand (1975) e Lemos (1980).

Não cabe retomar aqui a especificidade da contribuição de cada um deles na


montagem de uma trama narrativa que se tornou, pese ao esforço “contra a
corrente” de Ferraz, hegemônica. A esse capítulo chamamos “Arquitetura Moderna
Brasileira: Uma trama recorrente”.

Mais tarde, na introdução à tese de doutoramento, assim resumíamos nossa


leitura:

Podemos afirmar que a linha dominante da historiografia da arquitetura


moderna no Brasil é esboçada por Goodwin em seu Brazil Builds30, de 1943.
Em termos gerais, a emergente arquitetura moderna brasileira é mostrada
como um esforço em dupla direção: teria como objetivo a atualização do país
em termos culturais, isto é, o pôr-se em dia com relação às vanguardas
européias e, ao mesmo tempo, o resgate das qualidades construtivas, formais
e telúricas da arquitetura tradicional brasileira. As características positivas
básicas desta (a adequação ao clima e às condições técnicas e materiais; a
capacidade de assimilar e adaptar os modelos importados da metrópole; a
inserção harmônica na paisagem, etc.) estariam, assim, reconstituídas naquela,
a moderna, e seriam o suporte do que nela haveria de especificamente original
e, enquanto tal, de contribuição própria ao desenvolvimento da arquitetura
internacional.
O texto de Goodwin foi publicado com o respaldo institucional do Museu de
Arte Moderna de Nova York, que realizava então uma exposição das fotos e
projetos mostrados no livro, e apareceu no momento em que avançavam as

30
Philip L. GOODWIN, Brazil Builds. Architecture Old and New: 1652/1942, Nova York, MoMA,
1943.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 39

obras do conjunto de Pampulha, que revelaria a força criadora e a liberdade


formal de Niemeyer, e em que se estava concluindo a construção do Ministério
de Educação e Saúde Pública, o primeiro grande edifício público construído
segundo as fórmulas corbusianas, no mundo ocidental.
O caráter "oficial" dos edifícios modernos não é, para Goodwin, desprezível:
"Enquanto o clássico dos edifícios federais de Washington, o arqueológico da
Real Academia de Londres e o clássico nazi de Munique dominam triunfantes,
Brasil teve a coragem de romper com a rotina e tomar um novo rumo, o que
resultou em que Rio possa orgulhar-se de possuir os mais belos edifícios
públicos do continente americano."31
Sua lógica narrativa, que se tornaria recorrente na historiografia brasileira,
fixava a indissociabilidade entre a projeção internacional da arquitetura
brasileira e sua "originalidade", sua identificação a um projeto de articulação
entre modernidade e tradição, assim e como sua subordinação às
necessidades ideológicas de afirmação do aparato estatal como "agente
modernizador".32
Essa linha interpretativa geral foi seguida e aprofundada por Mindlin33, em
1956, que assinala o barroco de Minas Gerais como um primeiro momento em
que aquele processo de contínua adaptação às particularidades técnicas e
climáticas nacionais dos modelos metropolitanos permitiu a expressão da "alma
nacional" em um conjunto de obras de valor estético universal34. Mindlin foi
também o primeiro (na historiografia) em atribuir a Gustavo Capanema, Ministro
da Educação do primeiro governo Vargas, a estratégia deliberada de fazer da
arquitetura moderna uma "linguagem oficial" do Estado brasileiro e de apoiar de

31
Ibid., p. 92.
32
A partir do texto de Goodwin, e na pauta da interpretação aberta, dedicaram-se à arquitetura
brasileira vários números especiais de revistas internacionais. Cf., entre outras, The Architectural
Review, março 1947; The Architectural Forum, novembro 1947: L'Architecture D'Aujourd'Hui,
setembro 1947 e agosto 1952.
33
Henrique E. MINDLIN, Modern Architecture en:(*tem esses ":"?) Brazil, Amsterdã, Meuelenhof,
1956. Publicado simultaneamente em traduções francesa e alemã por V. Frèal e Callwey Verlag,
respectivamente.
34
O barroco de Minas Gerais foi objeto de uma pesquisa exaustiva em Germán BAZIN,
L'Architecture Religieuse au Brésil. Paris, s.f. (1973)
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 40

forma consciente a vinculação do emergente grupo de arquitetos modernos a


Le Corbusier.
É significativo que o livro de Mindlin seja aberto por um prefácio de Giedion no
qual este caracteriza a arquitetura brasileira como um foco da renovação
arquitetônica internacional que encontraria paralelo apenas na produção
finlandesa dos anos quarenta e cinqüenta35.
A dinâmica permanente da arquitetura tradicional brasileira era, para Mindlin, a
constante oposição entre a intervenção de movimentos originários da
metrópole e a lenta, mas contínua, decantação de uma face própria, cujas
características básicas seriam a severidade, a solidez e a ausência de
ornamento.
Há que assinalar que esta estratégia narrativa tem como suposto e finalidade a
identificação entre o desenvolvimento especifico que assumem as premissas
doutrinárias e o repertório formal corbusiano na produção do chamado "grupo
carioca" (Costa, Niemeyer, os irmãos Roberto, Reidy, o próprio Mindlin, etc.) e
a totalidade da "arquitetura moderna brasileira. Esta estratégia de exclusão e
silenciamento de todas as correntes diferenciadas ou alternativas tem o mesmo
sinal e sentido que a operada a nível internacional a partir da segunda metade
da década dos vinte, com a tentativa de eliminação da memória historiográfica
de todo projeto, obra ou autor que não estivesse devidamente alinhado aos
princípios excludentes do que viria a ser o "estilo internacional".
O êxito internacional da arquitetura do grupo carioca, já então reconhecida
como "a arquitetura brasileira" e a hegemonia política interna do "nacional-
desenvolvimentismo" varguista deram sustentação a essa estratégia e
credibilidade a essa historiografia.
A única tentativa de estabelecer uma versão "contracorrente" foi a de Ferraz36,
que não apenas reivindica para Warchavchik o papel de pioneiro da arquitetura
moderna no Brasil, situando suas primeiras obras modernas em quase uma
década de anterioridade ao projeto do Ministério, mas também tenta contrapor

35
Siegfried GIEDION, "Brazil and Contemporary Architecture", prefácio em Mindlin (1956), pp. IX-
X.
36
Geraldo FERRAZ, Warchavchik e a introdução da Arquitetura Moderna no Brasil: 1925/1940,
São Paulo, M.A.S.P., 1965.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 41

à influência de Le Corbusier sobre o grupo carioca uma outra, "mais produtiva e


claramente internacionalista", a de Gropius sobre o "grupo paulista".
É verdade que tanto Goodwin como Mindlin, ou inclusive o próprio Lúcio
Costa37, em suas tentativas de estruturar a narrativa do desenvolvimento da
moderna arquitetura brasileira, cometem algumas omissões graves. Tenta-se
apagar da memória marcos tão significativos como as primeiras casas
modernas de Warchavchik, os projetos "expressionistas" de Flávio de Carvalho
ainda nos anos vinte ou o trabalho da equipe de Luís Nunes em Recife, durante
os primeiros anos trinta.
No entanto, a estrutura narrativa estava já incorporada à tradição
historiográfica, disseminada nas escolas de arquitetura, e era dominante nas
revistas e associações profissionais.
O levantamento mais exaustivo da trajetória da arquitetura brasileira, realizado
por um historiador profissional, surgiria com Bruand38, que manteria,
explicitando-a, a linha narrativa dominante. Apesar de corrigir algumas lacunas
muito evidentes nos livros anteriores (como as ausências de Warchavchik e
Nunes), ele dá como certo que a arquitetura moderna no Brasil não pudesse
poderia ter seguido outro caminho do que aquele indicado pelos ensinamentos
de Le Corbusier, dada a falta de condições técnicas e sociais (industrialização
mais desenvolvida, mão de obra qualificada, produção de aço, etc.) para uma
eventual adesão à vertente representada por Gropius ou Mies. Também reforça
a interpretação de que a opção pela linguagem moderna de origem corbusiana
deveu-se à clarividência de alguns líderes políticos com poder de mando
(Capanema e mais tarde Kubitschek) e que a principal conquista da arquitetura
moderna no Brasil foi o modo particular -e formalmente rico - como se
articularam os elementos da tradição nacional aos requisitos da modernidade
internacional.

37
Lúcio COSTA, "Depoimento de um Arquiteto Carioca (Muita Construção, Alguma Arquitetura e
um Milagre)", Correio da Manhã, 15.06.1951. Reeditado como Arquitetura Brasileira, Rio de Janeiro,
M.E.C. (Col. Cadernos de Cultura), 1952.
38
Yves BRUAND, L'Architecture Contemporaine au Brésil, (Tese doutoral), Paris, s.e., 1975.
Publicada em português como Arquitetura Contemporânea no Brasil, São Paulo, Perspectiva, 1981.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 42

Na leitura da narrativa que assim sintetizávamos, buscávamos detectar a


leitura particular de cada autor sobre os pontos que iam se afigurando como
constitutivos e nodais da “urdidura” histórica: o papel do Estado, a relação com a
tradição, a ação de Le Corbusier, o caráter “nacional “ da arquitetura moderna (outro
aparente paradoxo), a relação entre arquitetura e cultura, a relação entre arquitetura
e cidade.

Vale a pena, ainda, a reprodução, de um momento da conclusão, pelo seu


caráter programático, isto é, por estabelecer a transição entre a análise da
historiografia consolidada e a proposta de uma revisão. A identificação do que
chamávamos de “uma trama e seus vazios” era por si só uma programa de trabalho.

Vejamos:

Sabemos que o processo de constituição de uma trama tem a sua própria


historicidade. Neste caso, uma historicidade que, por assim dizer se agrega e
passa a incorporar o próprio objeto que investiga. Para dizê-lo de maneira mais
precisa, o esforço de reconstrução narrativa do processo de constituição da
arquitetura moderna no Brasil passa a fazer parte do embate por essa mesma
constituição; a configurar, juntamente com o texto polêmico ou doutrinário, com
o desenho e a obra, o campo da cultura arquitetônica.
O que ao início deste capítulo apresentamos como uma proposição teórica
emprestada de Bonta, ficou demostrado na maneira enfática como Mindlin,
Bruand e Lemos e, por oposição, o próprio Ferraz, apresentam o texto de
Goodwin como fator decisivo de consolidação da linguagem racionalista no
Brasil. Note-se que os autores não apenas afirmam que o texto foi decisivo
para o reconhecimento pela crítica internacional do valor e da importância da
arquitetura brasileira, mas insistem em que ele foi um fator de legitimação
interna, gerador de aceitação popular e de encomendas.
O texto não apenas agrega significado à obra realizada mas pode, em
circunstâncias históricas precisas, orientar a produção e ampliar as
possibilidades concretas de ampliá-las.
Este percurso, talvez excessivamente longo e algo redundante, pelos
momentos mais significativos da historiografia da arquitetura brasileira
pretendeu identificar o percurso de constituição de uma trama.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 43

Trama que se articula a outros elementos e estratégias no campo institucional


no intuito de transformar um dos projetos da arquitetura brasileira
contemporânea em sua vertente dominante. O texto que busca descrever de
forma convincente uma cena é também ele, independente de sua consciência
disso, agente constituinte e ativo na transformação ou na reiteração dessa
cena.
Enquanto tal, também aquele percurso é o resultante de conflitos, adesões e
embates. Também ele tem os seus momentos heróicos, pioneiros e sua fase
de maturidade, de lenta sedimentação.
No entanto as relações entre a narrativa e seu objeto não são lineares.
Paradoxalmente, talvez, esta parece demostrar maior fôlego que o projeto que
ajudou a instituir, apresentando hoje uma sobrevida já significativa em relação
ao reconhecimento da crise de legitimidade social do seu objeto.

O esforço acadêmico de reconstituição da trama historiográfica revelava,


afinal, ou ao menos assim o pretendíamos, a sua dimensão operativa, não no campo
do projeto, mas da possibilidade de compreensão de seus alcances e limites:

Apreender a lógica da estruturação dessa trama, localizar suas invariâncias e


suas omissões, sua estrutura causal e seus vazios, pode, a nosso ver, ajudar a
compreender o alcance e os limites do seu próprio objeto, o projeto dominante
da arquitetura brasileira contemporânea.

Definidos os pressupostos, apresentávamos, o argumento daquele roteiro


elaborado a várias mãos e refinado durante quase quatro décadas:

A trama está constituída. Sigamo-la esquematicamente. Há uma arquitetura


tradicional brasileira que é o resultado da lenta depuração dos aportes
estilísticos da metrópole colonial. O processo de adaptação dos modelos
culturais portugueses às condições sociais, às disponibilidades técnico-
construtivas e ao clima brasileiro consegue por vezes gerar uma produção com
valor estético e feição própria. Goodwin e Mindlin apontam esse processo mais
ou menos generalizadamente e destacam o barroco de Aleijadinho. Lemos
agrega, como momento de reinvenção, a arquitetura bandeirista. O
neoclassicismo da Missão Francesa inicialmente e o ecletismo depois vão fazer
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 44

do século XIX um período de mudança de referência cultural e de ruptura


radical entre os modelos eruditos importados e a produção vinculada a um
saber tradicional. No início do século, o crescimento das principais cidades, o
afluxo de mão de obra imigrante o europeísmo das elites agudiza a dominação
do ecletismo. O neocolonial, que poderia ser uma reação, não consegue
ultrapassar a condição de uma de suas variantes. A transformação modernista,
deflagrada pela semana de 22, não consegue apresentar uma produção
moderna em arquitetura mas, pelo contrário, se confunde ingenuamente ao
tentar fazê-lo. Apesar das tentativas pioneiras, especialmente em São Paulo, a
nova linguagem, importada, não consegue se afirmar. O marco significativo da
mudança é a passagem de Costa pela direção da ENBA, numa espécie de
bomba de efeito retardado que irá detonar quando se encontrarem os homens
certos, no momento certo: Costa e o seu grupo jovem e talentoso, o
esclarecido Capanema e o mestre internacional. O prédio do Ministério marcará
não apenas a primeira realização em grande escala da proposta de Le
Corbusier mas o resgate do processo, interrompido mais de um século antes,
da adequação dos modelos europeus às condições sociais e especialmente
climáticas do país. Essa adequação é a principal marca de originalidade da
nascente arquitetura moderna brasileira e deve ser enfatizada pelo recurso a
soluções construtivas e simbólicas tradicionais como forma de granjear o
reconhecimento internacional. Este vem através do texto de Goodwin e é por
seu efeito que as resistências internas são finalmente quebradas. Novamente
os homens certos se encontram no momento certo e o esclarecido e ambicioso
Juscelino permite a Niemeyer exercitar a sua genialidade apoiada no cálculo
brilhante do poeta Cardoso, no conjunto da Pampulha. A partir daí, contando
com reconhecimento internacional, com domínio apurado sobre a técnica do
concreto e com a criação das novas escolas, a qualidade da produção
arquitetônica deixa de ser privilégio de algumas personalidades de exceção
para se afirmar como linguagem socialmente aceita, num crescendo até a
experiência limite de Brasília.
Bem, esta trama está montada. Interessa-nos a sua lógica e a sua coerência.
Interessa-nos mais as perguntas que ela não se faz, as suas zonas de
obscuridade.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 45

Iluminar estas zonas, enfrentar essas perguntas, talvez exija outra trama.
Uma primeira questão é de ordem metodológica. Embora esse esquema toque
nas relações entre arquitetura e outras esferas da produção cultural, o faz mais
quando a ausência de sincronismo causa um ruído estranho à sua linearidade.
É o caso da assincronia entre a arquitetura e a Semana. Resultado de uma
visão de alteridade, embora possa afirmar o contrário, a matriz interpretativa
que analisamos não parte do entendimento da arquitetura como parte
integrante do campo da produção cultural. Por isso não consegue inserir em
sua trama que a arquitetura, apesar de seus condicionantes e procedimentos
específicos, tem de enfrentar os mesmos desafios e buscar respostas às
mesmas questões que estão colocadas para o conjunto da produção cultural de
um momento histórico dado.
Outro ponto que nos parece importante é o tratamento dado pela interpretação
dominante à questão da "originalidade" da arquitetura brasileira, apresentada
como condição de legitimação internacional e não fundamentalmente como
uma necessidade do processo - ou estratégia - de institucionalização interna da
linguagem moderna. Esse viés releva o fato de que a articulação entre tradição
e modernidade não é um problema exclusivo da arquitetura mas uma questão
central de todas as áreas da produção cultural nesse período. Esquece ou
ignora que tampouco é uma questão "originalmente" brasileira.
Por fim, aquilo que nos parece o nó gordio da estrutura interpretativa analisada:
a constatação da importância do papel das encomendas oriundas do aparelho
estatal não tem correspondência num esforço consistente de interpretação das
relações entre modernidade, arquitetura e Estado.
Apoio de mecenas esclarecidos e ambiciosos que utilizam a arquitetura para
sua afirmação política pessoal ou esforço de articulação do recurso
arquitetônico ao projeto ideológico de construir a imagem da modernização?
Ou ainda, projeto específico dos produtores culturais que vêem na ação
através do Estado a estratégia necessária de afirmação de sua produção?
Nesta questão, que é central, a interpretação dominante não se pergunta se a
afirmação através do Estado foi uma condição circunstancial ou se é estratégia
inerente ao projeto construtivo na sua vertente corbusiana. E por isso é incapaz
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 46

de inserir em sua trama questões como a ausência de repercussão direta na


produção brasileira da estadia de Wright. Giedion, reconhecendo
implicitamente as lacunas, disse que o impacto da presença de Corbusier no
Brasil, em contraponto à inocuidade de sua passagem por Nova York, está na
esfera do irracional.39

E concluíamos, voltando à referência do historiador de ofício:

Convém lembrar novamente a Veyne: se não há lógica na história senão com


aquela que o historiador monta a sua trama, então a inexplicabilidade de um
evento deverá ser buscada na própria lógica interna da trama escolhida, afinal
"... o que se denomina explicação não é mais do que a maneira da narração se
organizar numa trama compreensível"40

Modernidade, Estado e Tradição: uma nova abordagem


Ao argumento resumido da “narrativa dominante”, havíamos contraposto
“lacunas” e chamado a atenção para as perguntas que a narrativa não se fazia.
Destacávamos como “nó gordio” a ausência de um “esforço consistente de
interpretação das relações entre modernidade, arquitetura e Estado. Outras
questões derivavam desta. A nebulosa relação estabelecida na trama dominante,
entre a astúcia política de dirigentes convertidos em mecenas e os agentes da
renovação arquitetônica, não permitia esclarecer se a iniciativa desse “paradoxal”
casamento estaria na ação lúcida e antecipatória dos Capanema e Juscelino (como
afirma a narrativa dominante) ou numa clara estratégia política dos arquitetos
modernistas no sentido de conquistar o aparelho de Estado como instrumento e via
fundamental de institucionalização.

Outro problema estava na enfática e recorrente caracterização de uma


“originalidade” da arquitetura brasileira, presente não apenas na reconhecida
contribuição a um arejamento formal do repertório arquitetônico internacional mas
também no suposto ineditismo de uma sintaxe arquitetônica moderna que não

39
MARTINS (1988): 71-76
40
Paul VEYNE, Como se escreve a história, p 51.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 47

rompe de forma absoluta com a tradição nacional, antes incorporando-a através do


recurso a soluções tradicionais, como o combogó ou a treliça mineira, ou, na
perspectiva defendida por Lúcio Costa, promovendo um reencontro não com as
formas do passado senão com o seu “espírito”.

Assim o segundo capítulo estava estruturado para tentar responder, ou


melhor, redefinir os termos dessas formulações.

Nos dois primeiros itens, Arquitetura e organização do espaço produtivo e


Arquitetura Moderna e Estado, nos apoiávamos basicamente nos textos já citados
de Tafuri e Argan, mas também em Banhan, Benévolo, Choay e Frampton, assim
como em fontes primárias (Le Corbusier, Hannes Meyer) para reafirmar a dupla
imbricação entre arquitetura e espaço social, já indicada no capítulo anterior.
Essencialmente interessava mostrar, a partir de autores de diferentes extrações
teóricas, que a arquitetura moderna, concebida enquanto uma proposta de
redefinição profunda do estatuto da disciplina e não apenas como uma revolução
estilística, assumia de forma clara e corajosa a proposição de deslocar o seu foco de
atenção das operações formais dos edifícios isolados para assumir como seu objeto
privilegiado de reflexão e intervenção, o espaço da cidade moderna, isto é, o espaço
da produção.

Numa operação que é talvez mais evidente nas formulações da Bauhaus mas
que diz respeito a toda a vertente construtiva do movimento moderno, a arte, e a
arquitetura, deslocadas de seu papel tradicional pela expansão do sistema
capitalista industrial, se propõem a afastar-se da região mítica e metafísica em que
eram concebidas para pensar as condições de sua integração no processo de
transformação social.

O que há, portanto, de especificamente transformador na visão construtiva é a


radicalização de seu caráter racional, abstrato, como condição para a sua
inserção no campo da produção técnica. A arte busca agora integrar a
atividade estética aos procedimentos científicos e tecnológicos, condição para
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 48

se apresentar, diante da materialidade do processo produtivo, como uma


necessidade social. 41

Para em seguida, e mais uma vez com Tafuri, destacar a dimensão de


instrumento de necessidade social com que a arquitetura moderna repensa e
redefine o seu próprio estatuto e, por extensão, o seu ideário:

Nessa perspectiva, a arquitetura aceita com lucidez a sua própria


mercantilização, enfrenta o desafio de sua reprodutibilidade técnica e chega
mesmo a se antecipar à economia política ao elaborar a “ideologia do plano”,
concebido como o elemento que permite integrar o design, em seus vários
níveis de intervenção, num projeto unitário destinado a reorganizar o processo
de produção, distribuição e consumo na cidade do capital. 42

Mais do que para enfrentar a questão, de resto anacrônica, de manter-se nos


limites desse ideário ou criticá-lo por sua ingenuidade frente à própria noção de
progresso, interessava aí mostrar que uma forma particularmente estreita de relação
com o Estado era, mais do que uma especificidade ou originalidade da arquitetura
moderna no Brasil, condição constitutiva do ideário moderno, ao menos, repetimos,
no âmbito de sua raiz construtiva:

Portanto, o raciocínio construtivo implica necessariamente uma relação


particular com o Estado, que se apresenta, seja ao nível das políticas culturais,
seja enquanto elemento regulador das contradições sociais, como o único
agente social capaz de instrumentalizar a arquitetura em seu auto-atribuido
papel de elemento organizador do processo de espacialização do processo
43
produtivo.

Em Arquitetura e Estado, chamávamos a atenção para o caráter não


consensual (por definição) da problematização das relações entre arquitetura e
Estado, avançada por Tafuri e pelo grupo da Escola de Veneza, para reafirmar

41
MARTINS (1988): 78.
42
MARTINS (1988): 80.
43
MARTINS (1988): 80.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 49

nossa posição de reconhecimento do caráter instigante da releitura das diferentes


vertentes do movimento moderno pela matriz da análise ideológica.

Mesmo anteriormente à releitura tafuriana, o clássico Orígenes de la


Urbanística Moderna, de Benévolo já chamava a atenção para o processo bipartido
que caracteriza o pensamento e a ação urbanística ao longo de todo o século XIX,
isto é , ao longo do processo de reconhecimento da cidade industrial como
problema. Como se sabe, Benévolo contrapõe a reação anti-urbana que caracteriza
genericamente os movimentos e propostas do “socialismo romântico”, originários
dos setores vinculados ou humanitariamente solidários aos pobres e aos
trabalhadores, e caracterizados pela indissociabilidade entre forma espacial e projeto
social, a aqueles originados do setores mais lúcidos das classes dominantes e
materializados nas primeiras tentativas de instituição de medidas legais ordenadoras
do crescimento e das formas de espacialização urbana, que marcam o início da
intervenção sistemática do Estado.

Para Benévolo o Movimento Moderno seria a oportunidade e a tarefa de


reunir novamente os programas urbanísticos e políticos, na síntese capaz de
refundir o que estivera fraturado durante mais de setenta anos. Para nós, o caráter
globalizante e homogeinizador da leitura de Benévolo era, antes, um entrave à
compreensão das formas específicas de articulação, institucional e política, entre os
diferentes movimentos e vertentes das vanguardas e os aparelhos estatais dos
distintos países.

A conclusão de Benévolo corresponde, na verdade, afirmávamos, à imagem


que o Movimento Moderno apresenta de si mesmo. Se é correto que o conjunto do
movimento moderno se inseria na presunção de um horizonte socializante, genérico
e tornado possível pela crença na potencialidade do desenvolvimento técnico como
realizador virtual das necessidades humanas44, isto obviamente não significou uma
adesão incondicional e idêntica às experiências históricas da realização do
socialismo. As relações, conturbadas mas umbilicais entre a experiência da Bauhaus
e a social-democracia da República de Weimar; o entusiasmo e posterior drama do

44
Talvez a mais emblemática formulação desse genérico horizonte socializante seja o ensaio de
Hannes Meter, Die Neue Welt, traduzido e publicado em MEYER, H., La Arquitectura en la lucha de
clases y otros escritos, Barcelona, Gili, 1972, com seleção, prólogo e notas de Dal Co.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 50

engajamento das vertentes construtivistas na construção do Estado soviético, as


ambíguas relações entre os racionalistas italianos e o Estado fascista ou a posição
claramente conservadora de Le Corbusier, que defendia em 1922, a construção
como estratégia para evitar a revolução, mostram a diversidade interna, política e
ideológica, do “movimento moderno” em relação às circunstancias e estratégias
concretas da genérica “relação com o Estado”.

Por um lado, a leitura das fontes que permitia caracterizar o ideário da


vertente construtiva, permitia afirmar:

(... ) é a análise da lógica interna dos pressupostos do movimento moderno que


nos permite afastar leituras fundadas na exterioridade arte-política e apontar a
relação com o Estado como elemento inerente à configuração do ideário do
movimento moderno de raiz construtiva. 45

Por outro, a necessidade de reconhecer as diferenças, interna corporis, que


problematizavam a própria noção de “movimento moderno”, com a carga de
homogeneidade ideológica, poética e lingüistica que a expressão acarretava - ou ao
menos permitia aos espíritos mais avessos à reflexão analítica - era, no nosso
percurso investigativo, essencial para a compreensão da forma particular de
inserção dos protagonistas da constituição de uma arquitetura moderna brasileira no
quadro ideológico modernizante e nacionalista do primeiro período Vargas.

Os avatares da relação entre linguagem moderna e regime político na


Alemanha, na Itália e na própria União Soviética, mostravam como, para além de
questões propriamente ideológicas, a “incapacidade” das massas populares em
responder de forma consciente e positiva à estética abstrata da arquitetura
moderna46 colocava um novo problema para a arquitetura moderna, especialmente
nos anos 30: o de repensar as relações entre modernidade e identidade nacional.

45
MARTINS (1988): 84.
46
O trabalho de Franco Borsi, publicado em 1987, mas que não conhecíamos à altura da redação
da dissertação é um excelente sumário dos processos de reapropriação do repertório classicizante
tanto pelos regimes autoritários como pela chamada “Nova Tradição”, imperante nas democracias
formais do Ocidente durante os anos 30. Cfr. BORSI, F., The Monumental Era. European Architecture
and Design 1929-1939, New York, Rizzoli, 1987.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 51

Por uma lado, a experiência italiana, em particular, havia demonstrado a


inutilidade operativa das relações mecânicas entre tradicionalismo formal e
autoritarismo político. De outro, a própria caracterização de “tradicionalista” ou
“moderno” se revelavam, na consulta às fontes, antes uma adjetivação auto-
valorativo ou de depreciação dos oponentes, que categorias de análise e
enquadramento unívocas.

Tratava-se, então, de superar as tentações de aplicação mecânica às


condições brasileiras de paradigmas analíticos e buscar as condições gerais do
ambiente ideológico brasileiro dos anos 20 e 30 que poderiam ajudar a compreender
a forma particular de articulação entre o que genericamente se chamou pensamento
autoritário no Brasil e as formulações programáticas iniciais dos chamados pioneiros.

Utilizando uma expressão cunhada por Von Moos para explicar as afinidades
entre Le Corbusier e Nehru, que possibilitaram a realização de Chandigarh47, e
apoiado nos trabalhos de Medeiros, Chauí e Lamonier48, buscávamos estabelecer as
relações entre o ideário moderno recém introduzido e o ambiente ideológico das
primeiras décadas do século:

A convergência ideológica, para usar a expressão, não se limita, a nosso ver, a


este ou aquele agente político em posição de mando mas a um projeto social
que, com suas diferenças internas e com os percalços e embates conhecidos,
foi se afirmando como projeto político e concepção dominantes, pelo menos, ao
longo de toda a primeira era Vargas. 49

Assim, interessava-nos ultrapassar o personalismo das relações privilegiadas


com Capanema ou com Juscelino, incapazes a nosso ver de explicar a larga
extensão da aceitação do projeto moderno como arquitetura oficial desde o Estado
Varguista até o auge desenvolvimentista e populista dos primeiros anos 60.

47
Cfr. VON MOOS, Stanislaus, Le Corbusier. Elements od a Sintesis, Barcelona, Blumen, 1977.
Pp. 215-20. Ed. orig.: 1969.
48
MEDEIROS, Jarbas, Ideologia Autoritária no Brasil 1930-45; CHAUÏ, Marilena, Apontamentos
para uma crítica da Ação Integralista Brasileira; LAMOUNIER, Bolivar, Formação de um Pensamento
Político Autoritário na Primeira República.
49
MARTINS (1988): 89
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 52

Para tanto, procedíamos a identificar os pontos de “convergência” entre as


visões de Costa e Warchavchik e o “pensamento autoritário”, que aquí vamos
apenas indicar como atinentes a: visão organicista do desenvolvimento social, visão
paternalista e pedagógica da arquitetura na atenuação do conflito social; a visão do
papel da habitação popular e, finalmente, a concepção do intelectual e do artista
como portador de uma visão acima das classes sociais e intérprete dos anseios da
“nação”.

O segundo capítulo se encerra com aquela que me parece a mais nuclear das
proposições do trabalho, em relação ao tema específico da relação entre Arquitetura
e Estado. Identidade e Estado no Projeto Modernista foi publicada em 1992, e
ganhou, assim como o primeiro capítulo, vida própria, talvez pelo seu caráter de
síntese de uma proposta de olhar sobre as relações entre o projeto moderno na
arquitetura brasileira e o Estado, salvo ignorância minha, inédita.

Em realidade, a operação proposta consistia em deixar de pensar as relações


entre o Modernismo em Artes Plásticas e a Arquitetura Moderna a partir do
descompasso temporal sempre apontado na Semana de 22 ou da busca de relações
analógicas imediatas entre os universos imagéticos ou procedimentos compositivos
entre diferentes linguagens. Propunha-se como chave de análise a consideração,
explícita em Le Corbusier, do arquiteto moderno como um intelectual vinculado às
tarefas gerais da modernização da sociedade. Isto é, tratava-se de deixar de pensar
as relações entre a Arquitetura Moderna e o Modernismo em Artes Plásticas e
passar a considerar a Arquitetura Moderna Brasileira como parte constitutiva do
Projeto Modernista.

Os trabalhos de Brito e Zílio50 estimulavam a análise mais detida da forma


particular de resposta que o Modernismo brasileiro dava à equação, que já vimos
não ser exclusivamente brasileira, modernidade versus identidade. Brito,
especialmente, indica a “opacidade da memória” de um país de passado colonial e
carente de uma presença culturalmente forte anterior à chegado do colonizador
ibérico. A estratégia da reconstrução narrativa de um passado glorioso como fonte

50
Cfr. BRITO, Ronaldo. O Trauma do Moderno in TOLIPAN, Sergio, Sete Ensaios sobre o
Modernismo, Rio de Janeiro, FUNARTE, 1983. ZILIO, Carlos, A Querela do Brasil, Rio de Janeiro,
FUNARTE, 1982.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 53

de identidade nacional nos estava vedada. Aí terminava nosso paralelismo com a


Itália, para voltarmos a um item anterior.

Antônio Cândido, na sua formulação clássica, nos indicava a necessidade de


atentar para a articulação entre a tendência à expressão das características locais e
o reconhecimento da pertinência a um universo amplo e pluriforme como constitutiva
de uma espécie de constante básica da vida cultural brasileira. Na sua conhecida
formulação:

“Se fosse possível estabelecer uma lei da evolução de nossa vida espiritual,
poderíamos talvez dizer que toda ela se rege pela dialética do localismo e do
cosmopolitismo...”51

Comentávamos:

Essa tensão entre local e universal pode ser pensada como uma característica
inerente à produção cultural mais significativa de um país cuja condição
subordinada, colonial ou não, não obscurece o fato de ser, ele próprio, criação
do sistema econômico ocidental em expansão e, portanto, parte integrante de
seu próprio movimento.
Com a produção modernista, a partir da década de 20, ela adquirirá, entretanto,
contornos e configurações mais precisas. A ambiência do primeiro Pós-guerra,
com seu surto de industrialização, com o crescimento e a complexização da
vida urbana, a presença massiva e atuante dos contingentes de imigrantes, o
conhecimento e a repercussão dos acontecimentos internacionais - da própria
Grande Guerra à Revolução Bolchevique - contribuem para marcar uma
sensação, ambígua certamente, de pertinência, cada vez mais indissociável, ao
sistema internacional. Mas também de inelutável diferença.52

Os trabalhos de Paz e particularmente Manrique nos abriam a possibilidade


de pensar o dilema da identidade brasileira no contexto histórico dos movimentos de
vanguarda que ocorrem por toda a América Latina durante a década de 20. Esses
movimentos apresentam grandes diferenças e um denominador comum:

51
Cfr. CANDIDO, Antonio, Literatura e Sociedade, São Paulo, Nacional, (5a. ed.) 1976.
52
MARTINS (1988): 111.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 54

“...consistente en ser, simultáneamente, un despertar a la modernidad, abri los


ojos hacia lo que Europa hacia de revolucionário en esse momento (...) y al
mismo tiempo un abrir tambiém los ojos del arte a la conciencia da la propia
realidad social (...) en busca de algo capaz de definirnos y diferencarnos frente
a Europa.” 53

Lafetá54 e Zílio nos permitiam avançar na caracterização da forma particular


como o modernismo brasileiro buscara nos procedimentos das vanguardas
européias as bases para a operação, simultaneamente estética e ideológica, de
subversão da linguagem bacharelesca e “oficializadora” da Republica Velha pelo
recurso ao folclore e ao popular. No âmbito plástico, é Zilio quem chama a atenção
para o paradoxo da apropriação, pelos artistas brasileiros, do à visualidade primitiva
operado pela vanguarda européia como “um instrumento para afastar as camadas
de ideologia” que haviam atado a arte européia ao olhar renascentista.

Na sua leitura da “Negra” de Tarsila, Zílio afirma que a pintora se antecipa a


seus companheiros, por explicitar a inversão de olhar que deveria marcar a
produção brasileira. Se para Brancusi e Picasso a arte negra funcionava como
sugestão plástica, em Tarsila, a referência é indireta. Mais que um procedimento
plástico, “o modelo mais presente para ela é a figura do negro, retirada dos mitos de
sua infância na fazenda”.

Tarsila é assim emblemática daquela operação “face de Jano” indicada por


Manrique. Olhar para o primitivo, o exótico era, para nós, contraditoriamente, olhar
para dentro, para o próprio solo ou, no caso de Tarsila, para a senzala no andar de
baixo da casa grande.

Um trabalho chave para a articulação da proposta de leitura desse processo


de articulação de um projeto modernista foi o de Luciano Martins55. Estabelecendo
um paralelo com a constituição clássica da intelligentsia russa no final do século XIX,
Martins aponta que os intelectuais modernistas não chegam a constitui um projeto

53
Cfr. MANRIQUE, Jorge A., “Identidad o Modernidad? “ in BAYÓN, Damián, América Latina en
sus Artes, México, Siglo XXI, 1974.
54
LAFETÄ, João Luiz. “Estética e Ideologia. O Modernismo em 30” in Argumento, nº 3, 1974.
55
MARTINS, Luciano. La Genèse d’une Intelligentsia: Les Intellectuels et la politique au Brésil,
1920-1940, Paris, CEMS, 1986.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 55

de sociedade. Antes, permaneceram como os agentes da missão auto-atribuída de


elaborar um projeto de nação.

Resumíamos assim nossa leitura das motivações e limites imediatos desse


projeto:

Contribuir, no plano específico da produção cultural, para a transformação do


território em nação, da população em povo, implicava reconhecer que a
questão nacional se apresentava no Brasil do pós-guerra como esforço de
reação e resposta, ainda que pluriforme, a três níveis, a princípio distintos, de
problemas: a necessidade de afirmação de independência econômica e
soberania política diante da voracidade imperialista das potências
internacionais, agudamente demonstrada pela Guerra Mundial tinha seu
componente cultural no esforço de demonstração de equipotência cultural, da
possibilidade de permanente atualização com a vanguarda internacional. Em
segundo lugar, a necessidade política e econômica de unificar um território e
uma população ainda fortemente marcadas pela tradição regionalista colocava
os limites da possibilidade de utilização da “matéria prima” regional no processo
de produção cultural. Por último, mas certamente não menos importante, a
construção de uma identidade nacional era uma condição necessária para a
superação da ameaça à coesão social interna, representada pelo caráter pluri-
étnico da composição da população trabalhadora urbana e, em alguns casos,
agrária. 56

Diante desse quadro étnica e culturalmente multifacetado, o recurso a uma


origem totêmica ou a um passado glorioso como referência de identidade seria
inócuo. Tratava-se, pois de construir uma identidade e não de recuperá-la. A
identidade como projeto, tão bem expressa na idéia andradiana de “construir a
língua brasileira” é a operação radical que define o sentido e o caráter do
modernismo brasileiro, assim como seu drama e seus limites. Dizia Brito:

“Paradoxal modernidade: a de projetar para o futuro o que se tentava resgatar


do passado. Enquanto as vanguardas européias se empenhavam em derrubar

56
MARTINS (1988): 121.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 56

os ícones da tradição, a vanguarda brasileira se esforçava para assumir as


condições locais, positivá-las, enfim. Este era o nosso Ser moderno.” 57

Chegando próximo à formulação central (a tese) desse capítulo, indicávamos


que a ambigüidade da relação dos modernistas com o país refletia de forma ampla
os dilemas e limites da ação intelectual no, e diante do, Brasil. O artista não podia
contentar-se em criar a sua obra. Era necessário também criar o seu público.
Vivendo em um país de analfabetos, em ausência de um público e um mercado, a
definição de seu próprio papel enquanto grupo social os conduzia, na formulação de
Luciano Martins, a se atribuir “o papel de demiurgos, de heróis civilizadores da
nação”.

Empenhados na dupla superação da cultura ornamental e da ausência de um


público, a questão da educação torna-se crucial para todo o esforço intelectual
moderno no país.

As propostas para a educação popular, a reforma do ensino, a construção,


enfim, de um “campo cultural” a partir da universidade, constituem os eixos de
preocupação de boa parte dos intelectuais ao longo dos anos 30 e são essas
preocupações que irão colocar os intelectuais em uma relação direta, e por vezes
contraditória, com o Estado. 58

Paradigmática, pela lucidez, era como apontávamos uma carta de Mário de


Andrade a Paulo Duarte:

“Num país como o nosso. Em que a cultura infelizmente ainda não é uma
necessidade cotidiana de ser, está se aguçando com violência dolorosa o
contraste entre uma pequena elite que realmente se cultiva e um povo
abichornado em seu rude corpo. Há que forçar um maior entendimento mutuo,
um maior nivelamento geral da cultura que, sem destruir a elite, a torne mais

57
BRITO (1983): 15.
58
Diante deste quadro, a perspectiva de Micelli não pode menos que parecer redutiva. Parece
bastante aquém do convincente aceitar que a atuação de intelectuais e artistas modernistas em
instâncias políticas fosse o preço a pagar “pelo êxito em monopolizar as instâncias de financiamento
que lhes deram o controle das concessões públicas dos serviços e recursos nessa área e a
autoridade intelectual para externar juízos em assuntos culturais” . Cfr. MICELLI, Sérgio, Intelectuais
e Classe dirigente no Brasil, 1920-1945, Rio de Janeiro, DIFEL, 1979, pp. 159-60. Ver tb. MICELLI, S.
(org.). Estado e Cultura no Brasil, São Paulo, DIFEL, 1984.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 57

acessível a todos, e em conseqüência lhe dê uma validade verdadeiramente


funcional. (...) Tarefa que compete aos governos.” 59

Para em seguida complementar, preparando a transição para o terceiro


capítulo, centrado sobre o personagem, agora inserido no campo que de jus lhe
cabia: o de um intelectual, imbuído como os seus companheiros de geração e
convicções, de uma tarefa para além da disciplina específica:

E, através dos governos, dizemos nós, aos intelectuais. É a auto-atribuida


tarefa de construção da identidade nacional que orienta o projeto modernista a
pensar e propor a ação cultural como política cultural. Por isso, pelo menos
tanto quanto pela vocação repressiva e controladora do varguismo, o Estado
será, no Brasil do pós 30, não apenas o árbitro, mas o promotor privilegiado da
produção cultural.

O personagem: Lúcio Costa e o espírito brasileiro


Na trama narrativa analisada no capítulo 1, Costa aparece como o
personagem chave do momento fundante da Arquitetura Moderna no Brasil, não
exatamente como o grande arquiteto, mas como o líder que comandou,
especialmente a partir de sua conturbada passagem pela direção da Escola
Nacional de Belas Artes, o jovem grupo de arquitetos empenhados na renovação da
arquitetura brasileira. Fazem parte do contexto dessa narrativa, a capacidade
pessoal de liderança, a sua condição anterior de delfim de José Mariano Filho, o
líder do movimento neocolonial no Rio de Janeiro, e uma quase legendária
conversão às novas propostas européias ocorrida quando das conferências de Le
Corbusier no Rio de Janeiro, em 1929.

Sua condição de nome indicado pelo “governo revolucionário” para


modernizar o ensino de Arquitetura e seu heróico embate com o conservadorismo
dominante dos catedráticos da ENBA, que lhe valeu o respeito dos estudantes e
uma longa greve em defesa de sua continuidade na direção, fazem da momentânea
derrota frente aos conservadores, com sua demissão da direção, apenas um intróito

59
Carta a Paulo Duarte, datada provavelmente de final de 1937, reproduzida em DUARTE, Paulo,
Mário de Andrade por ele mesmo, São Paulo, HUCITEC/PMSP, 1985, pp. 150-4.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 58

à grande aventura da renovação que estaria por vir. A grande oportunidade se


apresenta logo depois dos “annés de chomage” dedicados ao estudo de Corbusier
como “livro sagrado da arquitetura”, com o confuso episódio do concurso para o
Ministério da Educação e Saúde e a finalmente conseguida presença de Le
Corbusier em 1936, a partir da qual estariam lançadas as bases para um processo
de renovação arquitetural que, em menos de duas décadas faria do obscuro país
sul-americano um “sopro de frescor no panorama da arquitetura internacional” e
conquistaria tal grau de qualidade e de aceitação interna que provocaria a surpresa
do todo poderoso secretário geral dos CIAM, Giedion, levado a declarar, em prefácio
ao livro de Mindlin, de 1956, que havia “algo de irracional no desenvolvimento da
arquitetura brasileira”.

A trama da renovação supunha, assim, do lado dos arquitetos, um momento


de “revelação” ante as palavras do mestre, idéia reforçada pela expressão “livro
sagrado” usada pelo próprio Costa para se referir ao livros de Le Corbusier.
Supunha também, do lado do Estado, a surpreendente lucidez dos homens de
Estado, em especial Capanema, que não apenas teve a coragem de desvincular o
resultado de um concurso cujo júri ele havia presidido, do processo de construção do
Ministério, como conhecia suficientemente o panorama da arquitetura internacional
para apoiar o convite a Le Corbusier, entre outras cosias porque ele era “o único
mestre da arquitetura internacional que já havia construído um Palácio”.

Messianismo demais para uma trama que só poderia, de fato, merecer o


epíteto de “irracional”, que, na expressão de Giedion, significava algo menos que
maravilhoso.

Essa construção narrativa já não encontrava, entretanto, apoio na própria


documentação tornada disponível posteriormente ao texto de Bruand, em particular
ao arquivo Capanema, depositado no CPDOC da FGV do Rio de Janeiro e que
vinha sendo objeto de alguns trabalhos recentes.

Nossa reconstrução do personagem Costa, buscava atualizar essa trama,


analisada no primeiro capítulo, por um lado operacionalizando uma nova
abordagem, conceitualmente montada no capítulo 2 e, por outro, fazendo uso das
novas disponibilidades documentais.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 59

Os textos de Costa, anteriores a 1930, a data da “conversão”, mostravam um


jovem arquiteto preocupado com os desvios de um “neocolonial de laboratório” e
empenhado na busca do “espírito da arquitetura brasileira”, mais do que na
recuperação artificial de suas formas. O próprio Costa havia indicado essa
possibilidade ao afirmar, num texto posterior60, que durante o seu período de adesão
ao neocolonial “havia procurado a coisa certa, da maneira errada”.

De fato, os textos de Costa dos anos 20 mostram um olhar sensível e agudo


que busca perceber nos exemplos marginais à grande arquitetura religiosa e oficial
do período colonial, inclusive nas pequenas “casinhas anônimas” da beira de
qualquer estrada:

“verdadeiro espírito de nossa arquitetura, (...) robusta, forte e maciça, (...) de


linhas fortes e tranqüilas.”61

Por outro lado, os jornais da época mostram também que a indicação de


Costa para a direção da ENBA por Francisco Campos, fora saudada por Mariano
Filho como uma vitória do neocolonial. Apenas seis meses mais tarde, manifestará o
seu sentimento de líder traído por aquele que,

“.. na véspera da indicação fazia praça de credo nacionalista ... (e) se fizera
da noite para o dia agente secreto do internacionalismo judaico”.62

Nossa leitura preferia ver em Costa as mesmas hesitações entre o resgate da


Arte Nacional e as novas propostas internacionais reveladas por Mário de Andrade
em artigo de 1929:

“Por mais que certas tendências se tenham incrustado em minha cabeça não
acho isso um mal não. Mas não posso também achar um bem, apesar de todo
o meu entusiasmo pelo que seja brasileiro. Meu espírito a esse respeito anda
numa barafunda tamanha que resolvi adquirir idéias firmes sobre o caso”. 63

60
COSTA, Lúcio, Depoimento de uma Arquiteto Carioca, Rio de Janeiro, MEC, 1952.
61
COSTA, Lúcio, “A Arquitetura Tradicional e o Aleijadinho” in O Jornal, 1929. Reproduzido em
Lucio Costa: Sobre Arquitetura, GFAU/UFRGS, Porto Alegre, 1962.
62
MARIANO FILHO, José, “Escola Nacional de Arte Futurista”, O Jornal, 22/07/1931.
63
Apud FORJAZ CRISTIANO DE SOUZA, Ricardo, Trajetórias da Arquitetura Modernista,
PMSP/SMC, 1982.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 60

À mesma época, em artigo que relata seu processo de elaboração do projeto


para a Embaixada da Argentina, Costa explica que experimentou vários estilos,
tendo a todos descartado, inclusive aos

“... estilos francamente modernos - como tive a oportunidade de ver


recentemente na Europa muita coisa (porque) são, mesmo quando adaptados
com moderação às idéias de Le Corbusier, arriscados. Pode ser gosto do
momento, questão de moda, parecer amanha ridículo, extravagante, intolerável
como hoje parece o “Art Nouveau” de 1900.” 64

Assim, concluíamos que, ao menos no período imediatamente anterior ao


episódio da ENBA, as posições de Lúcio Costa a respeito da arquitetura
contemporânea não eram a manifestação de indecisão individual de um arquiteto
diante dos novos movimentos europeus mas a expressão de um momento prévio de
amadurecimento da reflexão modernista sobre as complexas relações entre a busca
de uma arte que expressasse a identidade nacional e as posições de vanguarda,
ainda compreendidas como “estilo” e sob o fogo cerrado da denuncia conservadora
de seu caráter de arma ideológica do “internacionalismo judaico”. Em outras
palavras, afirmava-mos que a adesão básica era à causa da identidade. Somente
anos mais tarde, Costa elaboraria a operação teórica fundamental: demonstrar que a
arquitetura moderna, e especificamente a de Le Corbusier, era o instrumento
adequado para resgatar o “verdadeiro espírito da arquitetura brasileira”, libertando-
se da cópia de suas formas, para reinventar, no futuro, a nova face de sua
identidade.

No item A Base Conceitual, nos detivemos na análise de Razões da Nova


Arquitetura, corretamente considerado o manifesto fundacional da arquitetura
moderna brasileira.

Escrito em 1934, mas publicado apenas em 193665, em plena efervescência


do debate provocado pelo Concurso do Ministério, o texto apresenta, pela primeira

64
COSTA, Lúcio, “O Palácio da Embaixada Argentina”, O Jornal, 28/04/1928, Reproduzido em
XAVIER, Alberto (org), Lucio Costa: Obra Escrita, FAU/UnB, 1966.
65
Em Registros de uma Vivência, Costa indica que o texto era o “Programa para um curso de
pós-graduação do Instituto de Artes, dirigido por Celso Kelly, na antiga Universidade do Distrito
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 61

vez, uma argumentação ordenada e completa de defesa dos novos movimentos


arquitetônicos. Agenciando sua reconhecida erudição, Costa recorre aos seus
conhecimentos de história da arquitetura para desmontar, uma a uma, as acusações
de bolchevismo, judaísmo ou internacionalismo assacadas contra as novas posturas.

A operação teórica fundamental, entretanto, estava, dizíamos, na maneira


como Costa distingue a posição de Le Corbusier no interior do Movimento Moderno
europeu.

Socorrendo-se da tradicional antinomia entre “clássico e gótico”, como


princípios permanentes cujo movimento dialético “concretiza a própria história da
arte ocidental”, Costa aí introduz a questão da identidade, ao afirmar que:

“... nos países de tradição latina - inclusive as colônias americanas de Portugal


e Espanha - a arquitetura barroca soube sempre manter, mesmo nos
momentos de delírio, a que , por vezes, chegou, certa compostura, até
dignidade, conservando-se a linha geral da composição, conquanto elaborada,
alheia ao assanhamento ornamental.66

Também na arquitetura moderna permanece a coreografia dialética entre os


dois perenes princípios. Mesmo considerando o movimento moderno como esforço
de síntese entre o principio orgânico-funcional (“gótico”) e o principio plástico-ideal
(‘clássico”), Costa afirma a permanência de atavismos raciais ou culturais, nesse
movimento perene em que a obra

“.. ou desabrocha como uma flor ou se domina, e contém, como um cristal.

A técnica moderna permite essa fusão, mas não a garante. É por isso que na
arquitetura moderna de origem “nórdica”,

“... estimulados pelo nacionalismo racista. No seu apelo aos últimos vestígios
de aspereza gótica que se possam, porventura, ainda esconder sob o brilho da
“kultur”- é fácil reconhecer no modernismo alemão os traços inconfundíveis

Federal, criada por Anísio Teixeira...”. Não temos conhecimento de publicação anterior à Revista da
Diretoria de Engenharia (PDF), de junho de 1936.
66
COSTA, Lúcio, “Razões da Nova Arquitetura”, reproduzido em Lúcio Costa: Sobre Arquitetura,
GFAU/UFRGS, Porto Alegre, 1962.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 62

desse barroquismo, apesar das exceções merecedoras de atenção, entre as


quais, além de Walter Gropius, a da obra verdadeiramente notável de Mies Van
der Rohe: milagre de simplicidade, elegância e clareza...”

Operação certamente corajosa, a de caracterizar Gropius e Mies como


exceções. Corajosa mas não desinteressada: simplicidade, elegância e clareza são
exatamente as atribuições do clássico. O que permite, na seqüência, concluir:

“Filia-se a nova arquitetura, isto sim, nos seus exemplos mais característicos -
cuja clareza nada tem do misticismo nórdico - às mais puras tradições
mediterrâneas, àquela mesma razão dos gregos e latinos, que procurou
renascer no Quatrocentos, para logo depois afundar sob os artifícios da
maquiagem acadêmica - só agora ressurgindo, com imprevisto e renovado
vigor. E aqueles que, num futuro não tão remoto quanto o nosso comodismo
de privilegiados deseje, tiverem a ventura - ou tédio - de viver dentro da nova
ordem conquistada, estranharão, por certo, que se tenha pretendido opor
criações de origem idêntica e negar valor plástico a tão claras afirmações de
uma verdade comum.
Porque, se as formas variam - o espírito ainda é o mesmo, e permanecem,
fundamentais, as mesmas leis.”

Nesse trecho que conclui o texto, identificava-mos o núcleo argumental da


operação conceitual - e ideológica - que fez de Costa, o personagem central do
processo de constituição da arquitetura moderna brasileira.

Recuperemos a síntese da trama, antes transcrita. A arquitetura “brasileira”


surge como resultado do movimento de expansão do Ocidente, em pleno influxo do
Renascimento e representa a presença em América daquela metrópoles coloniais
que eram herdeiras da tradição “de gregos e latinos”. Essa arquitetura, “de linhas
calmas”, “robusta” adquirirá face própria como resultado de “um lento processo de
decantação”, em que se adaptará às condições do clima e da terra, expressando,
nas suas linhas severas, tanto “a verdade construtiva” dos materiais e técnicas
disponíveis quanto a própria severidade da “estrutura social colonial”. São as
sucessivas vagas de movimentos “internacionais”, o neoclassicismo antes, e o
ecletismo depois, que interromperão, descaracterizando-o e desnacionalizando-o
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 63

esse processo. E é a Arquitetura Moderna, na sua “expressão mais característica”,


isto é, Le Corbusier, que permitirá a síntese final da “nova ordem” espacial, em que
tradição, identidade e modernidade serão reconhecidas como “expressão de uma
verdade comum”. É Le Corbusier quem permitirá à arquitetura brasileira reencontrar
a verdade e o equilíbrio de sua origem, porque bebeu “nas mesmas fontes”.

O fato de que a “arquitetura moderna brasileira, venha, no futuro a ter seus


“exemplos mais característicos” acusados por vezes de “barroquismo” é certamente
relevante, mas para um outro trabalho. Importava na dissertação, e importa aqui,
indicar a operação conceitual que permitia a Costa oferecer uma chave para a difícil
equação entre brasilidade e modernidade. E inserir-se assim, de pleno direito, no
campo dos personagens referência do projeto modernista.

No decorrer do capítulo, detínhamo-nos na análise da obra arquitetônica de


Costa até o início dos anos 50, chamando a atenção para a necessidade de
estender ao campo da linguagem especificamente arquitetônica, o raciocino
elaborado de forma brilhante nesse texto pois, assim como um projeto literário
expresso num manifesto deve justificar-se em produção literária, a teoria da
arquitetura devia ainda provar-se no campo das obras. Não é, no entanto o que cabe
recuperar aqui.

Dizíamos, na Conclusão:

A Arquitetura é ação no campo expressivo e, enquanto tal, está


necessariamente imbricada no processo pelo qual, na elaboração conflitiva das
representações que constróem de sua própria vida, os homens se constituem
enquanto seres culturais, isto é, históricos.
Não se trata da reivindicação, própria do século XIX, de pensar a história no
projeto, mas a de pensar o projeto na história. Melhor, como história.
E, neste caso especificamente, como história que se configura num campo
chamado Brasil moderno, condenado ou não, contraditório sem dúvida, mas
moderno. Portanto como história fadada à irrealização se não pensada no
interior do esforço e da estratégia de todo um setor da intelligentsia brasileira
que, insatisfeito ou impossibilitado de aceitar uma ação precipuamente contida
no campo expressivo, se auto-atribuiu o papel de demiurgo da nação e
transformou o seu projeto cultural em civilizatório.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 64

O modernismo brasileiro - ou uma de suas vertentes, a de Mário, Rodrigo,


Drummond e Costa - concebe a sua ação como política cultural. Como um
projeto, portanto, somente realizável através dos mecanismos
institucionalizadores do Estado.
A historiografia de arquitetura se ressente de um viés que é extensivo a boa
parte da reflexão sobre o Brasil, especialmente sobre o pós-30: o de pensar o
Estado, reificado, como o elemento ativo na geração do campo cultural.
Cremos haver mostrado que, ao menos no que diz respeito à questão cultural,
ele é, antes, o espaço privilegiado de luta entre diferentes projetos culturais. É
talvez isso que lhe dá tão fortemente o papel de árbitro decisivo do campo
cultural.
A releitura do discurso moderno na arquitetura brasileira, no momento mesmo
da sua constituição, será portanto um elemento de contribuição ao
conhecimento dos mecanismos culturais em construção, ou já atuantes, num
momento decisivo da própria história do país. 67

Uma nova trama também tem as sua lacunas


Relida dez anos depois esta conclusão apresenta seus problemas. Talvez o
mais grave deles seja a indicação de que nos mantínhamos ainda numa perspectiva
de compreensão da história da arquitetura como um instrumento auxiliar para o
conhecimento da história social.

Mas parece, ao objetivos deste texto, mais importante indicar que no trabalho
aí sumariado, estava contido, ao menos para o seu autor, menos uma conclusão
que um programa de trabalho, cuja realização se daria tanto na atividade de ensino
quanto no desenvolvimento do metier do pesquisador. E ao qual, a construção
institucional não era, nem é, estranha. De certa forma, estávamos ainda, assim
pensava eu, às voltas com o caráter inacabado do programa modernista, expresso
de forma contundente no compromisso ainda não saldado - e por isso mesmo
renovado - com a educação.

67
MARTINS (1988): 190.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 65

O fato é que acabamos por voltar, seja no ensino, seja em novos momentos
de elaboração teórica, ao tema da dissertação, o que lhe dá um estranho sabor de
incompletude. Por circunstâncias do momento de sua conclusão, a dissertação não
foi publicada enquanto tal, tendo vivido uma curiosa fortuna crítica, reproduzida
precariamente em xerox, apresentada parcialmente em congresso ou seminários,
extensivamente utilizada na sala de aula, ela foi, mesmo para o seu autor, se
caracterizando como um trabalho em progresso.

Durante e logo depois da conclusão formal do mestrado, algumas temas e


questões continuavam zumbindo ao meu ouvido.

O principal deles era, sem dúvida, o da dissociação escandalosamente


aparente entre o Le Corbusier herdeiro das “legitimas tradições clássicas”, e da
“razão de gregos e latinos” da leitura de Costa e aquele que aparecia nos textos de
difusão e, particularmente, na literatura pós-modernista, então em recente e
entusiástica voga no Brasil, como expressão paradigmática do “funcionalismo”, como
“uma figura semilegendária, um Frankenstein monomaníaco que, com poderes
virtualmente sobre-humanos, dirigiu o curso do urbanismo para um formalismo
mecanicista e povoou a terra com monstros destrutores da vida”, para recuperar a
expressiva descrição de Norma Evenson68 de uma leitura que, vê-se, não era
apenas brasileira embora aqui fosse suficientemente macaqueada. Esse zumbido
seria enfrentado com o tese de doutoramento.

Outros foram aparecendo por ocasião das obrigatórias releituras da


dissertação.

A apresentação do minha comunicação69 ao IIIe. Rencontre da Fundação Le


Corbusier, em Paris, em 1991, acabou por me revelar, de forma curiosa, que a
proposta de abordagem desenvolvida na dissertação não interessava apenas ao

68
EVENSON, Norma, “The Yesterday’s City of Tomorrow Today” in BROOKS, Henry Allen, (org.)
Le Corbusier. The Garland Essays, New York/Londres, 1987, pp. 241-9. O volume recolhe os ensaios
publicados originalmente na coleção, também organizada por Brooks, The Le Corbusier Archive, 32
vols., New York/Paris, Garlan/Fondation Le Corbusier, 1982-1984.
69
MARTINS, Carlos, “État, Nature et Culture aux Origines de l”Architecture Moderne au Brésil. Le
Corbusier et Lúcio Costa, 1929-1936, in FLC, Le Corbusier et la Nature (Rencontres de la Fondation
Le Corbusier), Paris, 1991, pp. 19-28. Esse texto foi traduzido e publicado em Caramelo, nº 6, pp.
129-36. Alguns de seus argumentos iniciais são retomados também no artigo em “De aquella luz
nació una arquitectura”, publicado em BLOCK, nº 2, em 1998.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 66

tema da arquitetura brasileira mas continha uma sugestão que poderia se revelar
estimulante para os historiadores voltados ao estudo do mestre internacional.

Nesse encontro, num dos momentos de debate, William Curtis sugeria que a
compreensão plena da obra de Le Corbusier só seria completa com um
mapeamento das condições e formas de recepção da poética corbusiana nos
distintos países do mundo em que sua arquitetura deixou uma marca forte. Por
coincidência minha comunicação começava por um breve resumo do foco central da
dissertação para, em um certo momento, afirmar:

É esse quadro ideológico e cultural que pode explicar a importância da


presença de Le Corbusier no Brasil em 1929 e, depois, em 1936. O impacto
dessas duas breves visitas indica uma espécie de “afinidade” entre suas
concepções e as aspirações, sem duvida difusas, do grupo de jovens
intelectuais e arquitetos “modernistas” do Rio de Janeiro. Por um lado,
sabemos que a presença de Le Corbusier em outras cidades, na mesma
época, não teve maior repercussão que algumas manchetes de jornal. Por
outro, a presença de Frank Lloyd Wright no Rio, em 1931, praticamente não
teve conseqüências, apesar de ter dirigido um workshop durante duas semanas
com os jovens arquitetos do escritório Warchavchik e Costa.

Nesse momento, percebi que Von Moos, levantou os olhos e ajeitou os


óculos, sinal de que passava a prestar atenção. Pude então continuar:

Nosso trabalho tenta demonstrar que as concepções de Le Corbusier no que


se refere às relações entre as tradições construtivas e a modernidade, e
especialmente a sua “descoberta poética” da natureza sul-americana, foram as
chaves para a sua aceitação e posterior afirmação como influência majoritária e
hegemônica na arquitetura moderna brasileira. E também que a “tradução e
adaptação” das idéias de Le Corbusier ao ambiente cultural e ideológico
brasileiro, realizadas por Costa, foram decisivas para essa aceitação.

Na atenção de Moos, e no questionário a que foi submetido depois pude


perceber que o tema da “leitura” era uma chave cujo interesse ultrapassava os
limites da arquitetura brasileira e indicava a necessidade de por cada uma das
manifestações locais ou nacionais, da arquitetura moderna, em seu contexto, por
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 67

história e por convicção, universalista. Por isso mesmo, quando convidado pelos
jovens editores da revista Caramelo a publicar “algo”, considerei que um texto
concebido para ouvintes - e leitores - estrangeiros e, portanto, supostamente pouco
familiarizados com as questões específicas do processo brasileiro, talvez tivesse,
também aqui, o seu interesse.

Outro momento importante, para mim, de releitura da dissertação, foi a


apresentação da comunicação ao Seminário “O Ensino de História na Formação do
Arquiteto”, na FAU/USP, em 1994. Tendo apresentado um texto inicial muito mais
longo que o tempo de exposição permitia apresentar, fui levado a fazer uma
exposição oral apenas de quando em quando ancorada no texto. O oportunidade de
rever o texto do primeiro capítulo, sete anos depois de sua conclusão, e dois depois
do próprio doutoramento, fez com que ficassem evidentes as lacunas e debilidades
de minha própria trama e de sua conclusão. A versão publicada é a transcrição
dessa apresentação, com todos os problemas de forma decorrentes da própria
condição de transcrição. Atrevo-me, outra vez, a fazer aqui uma citação longa,
porque creio que o esforço de síntese oral (eu tinha um minuto para concluir a minha
fala) às vezes ajuda na concisão.

Um minuto para concluir. Peço perdão pelo atropelo no desenvolvimento deste


esquema. Em meu trabalho de mestrado, naquele momento, me interessavam
duas coisas: entender a constituição dessa trama e fundamentalmente localizar
os seus vazios. O que esta trama não explica? Quais são os seus problemas e,
nesse sentido, quais são as questões que uma revisão da historiografia nos
coloca como projeto de trabalho, como questões para o nosso trabalho de
hoje?
Eu diria que há cinco pontos que me preocupam, e vou simplesmente enunciá-
los. O primeiro é o seguinte. Todos nós somos absolutamente concordes em
que a arquitetura é algo que se dá necessariamente no campo cultural; e, no
entanto, a nossa historiografia não insere a arquitetura numa história do campo
cultural, a não ser pelo negativo, como, por exemplo, para apresentar a nossa
estranheza pela fato de a Semana de 22 não conseguir nenhum projeto de
arquitetura moderna para mostrar. Em nenhum momento, a nossa historiografia
discute a relação entre arquitetura e a questão da abstração e do realismo nos
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 68

anos 40 e 50; em nenhum momento da historiografia, a arquitetura é inserida


no campo que obviamente lhe compete, que é o campo do debate cultural no
país, em seu sentido mais amplo.
Segundo ponto: essa forma particular de articulação entre tradição e
modernidade, que em todos os textos aparece como sendo uma espécie de
raiz da originalidade - e o tema da originalidade da arquitetura brasileira é um
tema recorrente - tampouco me parece tão evidente assim. Na verdade uma
arquitetura moderna que não seja de fato tão a-histórica (ou anti-histórica)
quanto certas leituras apresentaram, uma arquitetura moderna que seja
preocupada com o resgate, com o reengate com a sua tradição, não é uma
especificidade, uma originalidade, do Brasil. Basta pensar, e nem vou falar de
outras situações latino-americanas, no desenvolvimento da arquitetura
moderna na Itália para saber que, se as soluções podem ter sido originais, o
problema não o era. Pensar a relação tradição - modernidade não era um
problema, nem exclusivo, nem original, do Brasil.
O terceiro ponto que me preocupava, numa dissertação cujo tema central era o
da relação entre arquitetura e Estado no Brasil, é que a narrativa, em última
instância, sempre atribuiu valor de causalidade à ação lúcida de homens de
Estado. Para a historiografia a nossa arquitetura só foi possível porque num
certo momento existiu um Capanema, num certo momento existiu um
Juscelino, e nós ficamos nos perguntando como se dá esse paradoxo de
homens de um Estado autoritário que elegem a arquitetura moderna como sua
face oficial.
A questão que eu me colocava, como conclusão do trabalho, era uma pergunta
invertida: Se inserida a história da arquitetura no campo mais geral da história
da cultura no Brasil e, em particular, se pensarmos a arquitetura moderna
dentro do projeto modernista como um todo, não seria o caso de perguntar ao
contrário: Porque o projeto modernista no Brasil apostou, foi atrás e brigou para
ter no Estado seu agente privilegiado, seu agente fundamental, de
institucionalização?
Não perguntaremos porque os homens de Estado procuraram a arquitetura
moderna mas porque esta estava convencida de que o Estado era o único
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 69

canal viável para implantar a arquitetura moderna, assim como a literatura


moderna, a música moderna e assim por diante.
E por fim, apenas mais dois pontos, que eu deixarei apenas nomeados. (O livro
de) Bruand talvez seja a melhor expressão de uma enorme dificuldade teórica e
metodológica que o nosso trabalho em história da arquitetura enfrenta até hoje.
Não é (sequer) preciso ler o Bruand, basta olhar o índice para perceber que,
para nós, a história da arquitetura e a história do urbanismo e a história da
cidade, são duas histórias separadas. Bruand faz uma história da arquitetura,
termina, e começa de novo uma história do urbanismo no Brasil. Se a
separação entre arquitetura e urbanismo é, em si, problemática, quando
estamos falando em arquitetura moderna, isto é, naquela que assumiu que a
cidade - e não mais o objeto isolado - é o seu campo e o seu objeto privilegiado
de reflexão e atuação, essa separação é ainda mais grave.
E, por fim, mesmo, talvez devamos pensar como tarefa essa inserção, esse
projeto de inserir a reflexão sobre a historia da arquitetura dentro de uma
reflexão sobre a história da cultura no Brasil. Pensar a história da cultura, não
no sentido da cultura tradicional, beletrista, mas no seu sentido amplo, o que,
para nós significa também, no âmbito de uma cultura técnica. O que seria da
leveza estrutural característica da cultura brasileira sem a contribuição de um
Baumgart? Que peso teve especificamente a passagem para os novos padrões
e normas de cálculo propostas por Baumgart e por seus colegas na feição
própria, na forma, da arquitetura brasileira?
Nós não temos enfrentado estas questões realizado o seu juízo com a devida
atenção. Por isso temos, de certa forma, “patinado” numa história da
arquitetura brasileira que tem dificuldade em pensar sua relação com a cultura,
que tem dificuldade de pensar sua relação com a cidade. Que tem dificuldade
em pensar sua relação com a técnica. 70

As duas observações finais, referentes às dificuldades conceituais de uma


historiografia que não enfrenta de maneira adequada as relações entre arquitetura e

70
MARTINS, C., “A Constituição da Trama Narrativa na Historiografia da Arquitetura Brasileira”, in
Revista Pós, (Número especial O Estudo da História na Formação do Arquiteto), FAUUSP, julho/95,
p.94-5.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 70

urbanismo assim como aquelas que se estabelecem entre a “cultura técnica” e o


desenvolvimento da linguagem arquitetônica são também indicações de lacunas,
percebidas a posteriori no trabalho de mestrado.

Uma e outra, expressam já o processo de revisão do texto, ou melhor do


enfoque da dissertação, implicados pelo inicio do doutoramento. Como veremos em
seguida, o trabalho de investigação sobre a poética corbusiana dos anos 20 e 30
levava necessária e imediatamente a enfrentar as noções de indissociabilidade entre
técnica construtiva e processo de determinação formal, assim como a perceber que
a concepção de “unidade do sistema arquitetônico”, desenvolvida em 1928 e
detalhada no livro Prècisions..., de 1930, afirma enfaticamente a indissociabilidade
“sistêmica” entre arquitetura e urbanismo.

Em relação à primeira delas, à qual voltaremos adiante, havíamos publicado


em número especial da revista Rassegna, dedicado às relações entre o
desenvolvimento tecnológico das estruturas em concreto armado e a elaboração
formal do movimento moderno, um pequeno artigo sobre as origens do concreto
armado no Brasil e alguns dos primeiros exemplos significativos de sua utilização no
âmbito da arquitetura moderna brasileira.71 Por um lado, a própria historiografia,
seguindo nisso as declarações enfáticas dos protagonistas, aponta a fundamental
importância do desenvolvimento técnico-construtivo - em particular do concreto
armado - por outro verifica-se uma franciscana pobreza de referências específicas à
contribuição específica dos projetistas e calculistas72 que ajudaram a dar à
arquitetura brasileira aquele que é reconhecido como um de seus principais
elementos característicos: a leveza estrutural.

A segunda questão é, evidentemente mais complexa do que a simples


caracterização de “lacuna” poderia indicar. Os temas das relações entre arquitetura
e cidade e entre arquitetura e urbanismo, que estão naturalmente articulados mas

71
MARTINS, Carlos e FARIAS, Agnaldo, “Intermezzo Braziliano” in Rassegna, *** completar ***
72
Haveria que indicar, como a confirmar a regra, as exceções de Baumgart, que é destacado por
sua contribuição à renovação estrutural representada pelo edifício do Ministério, e a Joaquim
Cardoso, que, entretanto, ganha destaque na crônica da arquitetura pela aparentemente inusitada
coincidência entre a condição de engenheiro calculista e poeta. Mesmo na esfera específica de uma
história do concreto armado, sem exigir a reflexão sobre as relações entre este e a arquitetura
moderna, pouco temos além do pioneiro livro de Vasconcellos , C. A., A História do Concreto Armado
no Brasil, São Paulo, Pini, 2 vol. 1989.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 71

não se confundem, passariam a ser decisivos no trabalho de investigação, seja


porque constituíam um dos núcleos temáticos da tese de doutoramento, seja porque
começavam a se revelar, ao início dos aos 90, como questões chaves para a
reflexão e a prática profissionais tanto no exterior quanto no Brasil. Com evidentes
implicações para o ensino, não terá sido gratuito que ao final da tese estivéssemos
convencidos da necessidade de reverter a estrutura dividida da Área de Teoria e
História do Curso de Graduação de São Carlos, como já referimos anteriormente.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 72

PARTE 2.
LE CORBUSIER: MÁQUINA, CIDADE E PAISAGEM

“To me his deepest significance lies on the fact he was a true


liberator in the fields of architecture and city planning. Only the future
can reveal how those who have been liberated will use the freedom
opened up to them by his courage and imagination.”
Mies van der Rohe

A proposta de trabalho para o doutoramento aparecia como um


desdobramento direto das questões que haviam ficado pendentes ou sido
levantadas na dissertação, não apenas em função de pouco tempo transcorrido
entre a defesa da dissertação e o ingresso no doutoramento. Uma das idéias
centrais da dissertação - a de que Costa é o personagem chave na elaboração
teórica que justifica a adesão à doutrina e à sintaxe corbusianas como caminho para
o resgate da identidade com o “espírito da arquitetura brasileira” - nos colocava
diante de um novo paradoxo: como articular as imagens do “paladino do urbanismo
funcionalista” e do “profeta da civilização maquinista”, recorrentes na literatura de
divulgação e na crítica pós-modernista a Le Corbusier, com o seu reconhecimento
como a principal e hegemônica referência na constituição de uma arquitetura que
brevemente ganharia projeção internacional e surpreenderia o panorama
arquitetônico por sua marca de liberdade formal, por alguns criticada como
“formalista”, e por sua vocação de estabelecer com a paisagem natural, relações que
se apresentam, ora como analogia formal, ora como contraponto estruturante das
próprias soluções projetuais.73

Cabia então superar as referências algo redutivas da literatura corrente e


buscar compreender quais as formulações da doutrina e quais as características da
poética corbusiana que teriam revelado ao olhar, sabidamente culto, de Costa, as
possibilidades da decisiva operação teórica que ele realizara em Razões da Nova
Arquitetura.

73
Não considerarei, para efeito desta discussão, as relações “líricas” alegadas por alguns dos
nossos arquitetos, que relacionam as linhas curvas de sua arquitetura à suavidade da paisagem e às
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 73

Aqui se colocava um aspecto importante para a caracterização do percurso


do pesquisador. Se, como disse antes, a entrada na investigação do tema da
dissertação estava fortemente marcada pela matriz da análise ideológica, a natureza
dos problemas que as conclusões da dissertação levavam a explorar na doutrina e
na obra de Le Corbusier impunham relativizar essa matriz ou, ao menos, incorporá-
la como dimensão constitutiva mas não exclusiva, da poética purista.

Na Introdução da Tese, iniciava por afirmar, o nexo entre o meu trabalho


anterior e a definição do tema:

Para um arquiteto, pesquisador e professor brasileiro, uma tese doutoral sobre


Le Corbusier não é exclusivamente o resultado do interesse acadêmico por um
dos protagonistas do agora tão criticado "movimento moderno". Para nós, falar
de Le Corbusier é falar da matriz determinante de uma das vertentes da
produção arquitetônica brasileira. Vertente que não foi, é verdade, a única - e o
resgate histórico de projetos alternativos é um trabalho que já se está
realizando - mas foi a que se constituiu em hegemônica, e por isso a
compreensão de Le Corbusier é fundamental para qualquer tentativa de
entender os rumos, os marcos e as fragilidades do que se convencionou
chamar "arquitetura moderna brasileira" e do que, também convencionalmente,
se chamou nos últimos anos, sua "crise".74

Fazendo, a seguir, um resumo da leitura da constituição da narrativa, concluía


explicitando a hipótese central que vinculava a proposta de tese ao trabalho anterior:

No encerramento do nosso trabalho sobre a relação entre a arquitetura


brasileira de raiz corbusiana e o suporte ideológico do estado "modernizador"
varguista, indicávamos algumas conclusões e uma hipótese de trabalho.
As conclusões poderiam ser apontadas de forma esquemática, como segue:

curvas da mulher amada. Estas leituras devem, creio, ser aceitas como liberdade poética e não como
hipótese orientadora de leitura.
74
MARTINS, Carlos, Razón, Ciudad y Naturaleza. La Génesis de los conceptos en el urbanismo
de Le Corbusier. Tese de Doutoramento. Escuela Técnica Superior de Arquitectura de Madrid /
Universidad Politécnica de Madrid, 1992. 536 p. Nas citações posteriores a tese aparecerá como
MARTINS (1992). A numeração de páginas estará referida ao volume original, para facilitar a
comprovação. Preferi, entretanto, citar os trechos na língua portuguesa, da versão traduzida, que
será publicada pela Editora HUCITEC.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 74

a) A historiografia "clássica" da arquitetura moderna brasileira constituiu-se


menos como elemento de avaliação crítica que como instrumento de reforço do
processo de hegemonização de uma vertente específica do movimento
moderno no Brasil, filiada diretamente às proposições corbusianas;
b) Essa hegemonização, ou seja, o processo pelo qual, uma vertente
determinada afirma-se como representação do conjunto da produção esteve
garantida, a nível interno, pela escolha do aparato estatal como instância e
canal legitimador privilegiado;
c) Apesar do papel isolado que possam haver desempenhado algumas
personalidades em postos de mando no aparato estatal já não se pode aceitar
a tese da escolha pelo Estado da linguagem moderna, mas, ao contrário, deve-
se buscar compreender como e porque a facção "corbusiana" da arquitetura
moderna no Brasil optou pelo Estado como via necessária para sua
institucionalização.
d) Nesse processo a atuação de Lúcio Costa é fundamental, não apenas - e
nem, talvez, principalmente - por sua obra construída mas pelo seu labor
teórico, ao assentar as bases doutrinárias e conceituais da operação de
articulação entre tradição nacional e modernidade como ponto chave da
estratégia da arquitetura moderna no Brasil;
e) Isso não configura uma "originalidade" interna ao panorama cultural
brasileiro dos anos vinte e trinta. Antes, inscreve-se na estratégia do setor
dominante do movimento modernista brasileiro, representado por nomes como
Mário de Andrade, Carlos Drummond e Heitor Villa-Lobos;
f) O específico dessa estratégia cultural (articulação entre tradição e
modernidade) em um país ibero-americano, com as características do Brasil,
está na impossibilidade de reivindicar um passado cultural próprio. Sem
tradição cultural significativa anterior ao processo de colonização e sem poder
assumir como especificamente seu o passado colonial, será necessário inverter
os termos da operação e apresentar a identidade nacional como projeto, como
porvir, como esforço de resgate dos traços próprios do caráter nacional e sua
inserção no futuro;
g) No esquema conceitual de Costa, aceito pela historiografia, como já
assinalamos, a característica básica da tradição arquitetônica brasileira é sua
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 75

capacidade de absorver os modelos introduzidos desde a metrópole e adaptá-


los às condições climáticas, técnicas e à paisagem nacional. Esta operação é
possível pelo "arraigamento” na alma nacional" dos valores da simplicidade, do
equilíbrio, da proporção, enraizados na vinculação histórica, via península
ibérica, "às mais puras tradições mediterrâneas". E sendo que, dentre os
mestres do movimento moderno, Le Corbusier é o mais diretamente vinculado
a essa tradição, fica, nesse esquema, claramente justificada a adesão a sua
doutrina e aos seus procedimentos projetuais.
Essas eram, de forma breve, as conclusões do trabalho de pesquisa e
conduziam inevitavelmente a uma hipótese de continuidade: se aquele
esquema narrativo parece tão forçado e artificial e, no entanto, foi capaz de
sustentar conceitualmente a produção de uma arquitetura que chegou a ter o
reconhecimento internacional do seu caráter inovador, da sua riqueza plástica
e formal, é porque, talvez, se tenha apoiado em uma leitura da produção
teórica e projetual de Le Corbusier que não por inusual seria necessariamente
impertinente.
Dizendo de maneira mais explícita, a hipótese era de que aqueles elementos
que a crítica (favorável ou não) apontava como as características mais
acentuadas da arquitetura brasileira estivessem, sim, presentes, ao menos
como possibilidade de desenvolvimento, na teoria e na sintaxe corbusiana.
Elementos como a monumentalidade - excessiva para uns -, a vocação a
inscrever-se mais no marco natural que no meio urbano, a articulação de
elementos e soluções formais da arquitetura tradicional na linguagem moderna,
não seriam apenas "especificidades" ou sintomas do "exotismo" da arquitetura
moderna brasileira, mas também o resultado de uma leitura particular e da
adequação às condições técnicas, culturais e ideológicas do Brasil dos anos
trinta e quarenta, dos postulados, da sintaxe e da visão de mundo inerentes às
propostas de Le Corbusier, especialmente da maneira como se constituem na
sua poética as noções de - e as relações entre - razão, cidade e natureza.

No trabalho de doutorado pretendia-se, portanto, identificar nas formulações


de Le Corbusier do período de sua primeira visita ao Brasil, elementos que
justificassem a consistência da leitura de Costa e que permitissem compreender o
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 76

posterior desenvolvimento da arquitetura brasileira na perspectiva por ele indicada:


não a de simples apropriação formal de um “estilo corbusiano” mas o de uma
identidade profunda de princípios e procedimentos que constitutia a base para a
busca de expressão própria.

Essa perspectiva definia um roteiro de trabalho que implicava a investigação


sobre as características da doutrina purista, elaborada por Jeanneret (antes mesmo
de adotar o pseudônimo de Le Corbusier) e Amedée Ozenfant e divulgada
essencialmente nos números de L’Esprit Nouveau entre 1918 e 1925, tentando
identificar aí as chaves para a superação do que nos aparecia como alguns mal-
entendidos cruciais para a compreensão da doutrina corbusiana - dos quais o
provocado pela famosa máxima da “casa como máquina de morar” é o mais famoso
exemplo. Este é basicamente o escopo do capítulo 1.

Propunha, a seguir, uma releitura das formulações urbanísticas, desde a Ville


Contemporaine, de1922 até os projetos urbanos esboçados durante a viagem sul-
americana de 1929, que Tafuri já apontava como elaboração prévia do imenso
trabalho proposto para Argel entre 1931 e 1942. Neste caso interessava buscar
localizar nas formulações urbanísticas a concretização das concepções poéticas
puristas como forma de superar as leituras redutivas do “urbanismo funcionalista”. O
capítulo 2 da tese desenvolve essencialmente a primeira parte desta questão,
detendo-se na análise do projeto de 1922 e na proposta para Paris, o Plan Voisin, de
1925, agregando ainda um mapeamento das principais manifestações de recepção
crítica do livro Urbanisme, que apresenta os dois projetos, tanto à época de sua
publicação quanto na vaga de reação às propostas corbusianas iniciada pelo famoso
texto de Munford de 1962.

A leitura dos projetos urbanísticos para a América do Sul foi deslocada para o
terceiro capítulo quando começou a tomar forma uma das idéias centrais da tese, a
de que esses projetos não significavam um simples abandono dos postulados
puristas mas eram o resultado de um complexo processo de reorientação do “olhar”
de Le Corbusier, indelevelmente marcado pela experiência do vôo, que para ele
significa a conquista fenomênica da vue d’oiseau, mas também a possibilidade de
descoberta da exuberância natural e da escala do continente americano. Afirmamos
na tese que essa nova “descoberta da América”, registrada na verdadeira epifania
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 77

que é Prècisions... transforma decisivamente o “olhar” de Le Corbusier, levando-o a


abandonar o “procedimento laboratório” pelo qual elaborara o seu modelo da Ville
Contemporaine para passar a operar a partir da configuração topográfica e territorial
sobre as quais as cidades projetadas estabelecem o seu “caráter”.

O terceiro capítulo buscava ainda responder a uma questão aparentemente


menor mas que se revelava plena de implicações: o que teria levado aquele que
tinha sido o principal responsável pela organização do I CIAM, em 1928, a deixar de
participar do II Congresso, marcado para Frankfurt e dedicado ao tema estratégico
da “habitação mínima”, para pronunciar uma série de conferências na distante
América do Sul?

Embora a literatura de difusão corrente insista em apresentar o Le Corbusier


do início dos anos 30 como a mais expressiva liderança do movimento moderno
internacional, a investigação desse período pode reconstituir os debates internos do
movimento nos anos cruciais de1928 e 1929 e mostrar como, apesar de sua imagem
pública de propagandista, ele se encontrava totalmente isolado no panorama
europeu dominado pelos adeptos da “neue sachlicheit”. A viagem à América do Sul
se inseria, para Le Corbusier, dentro da estratégia de construção de uma “entente
latina”, o que vem a dar pertinência - e oportunidade - à leitura de Costa.

O debate com os adeptos da “nova objetividade”, que atinge o seu ponto mais
ácido na virulenta crítica de Teige, a que Corbusier responde com o famoso Defense
de l’Architecture, foi objeto ainda da elaboração de um quarto capítulo que preferi
não inserir no corpo da tese por questões de continuidade argumentativa. Serviu,
entretanto, para compreender a impropriedade da caracterização de sua arquitetura
e de seu urbanismo como “funcionalistas”. Ao contrário, ele é firmemente
denunciado pelos teóricos e arquitetos da “nova objetividade” como um formalista
que abandonou suas formulações iniciais, traindo as convicções racionais de seus
companheiros de jornada, para dedicar-se a um “incompreensível jogo com as
formas do passado”.

O conjunto das questões colocadas implicava enfrentar uma literatura crítica


proverbialmente vasta e a confrontá-la com as fontes primárias, para o que foi
fundamental, obviamente o período de pesquisa na biblioteca e no arquivo da
Fundação Le Corbusier, em Paris.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 78

Em termos bibliográficos, indicamos inicialmente que:

À diferença do que ocorre com a sua produção especificamente arquitetônica,


a contribuição corbusiana à teoria e à pratica urbanísticas desde o primeiro
pós-guerra quase não foi objeto de estudos de conjunto que buscassem
sintetizar de maneira satisfatória as diferentes colaborações parciais
elaboradas nas últimas décadas. (...) Colocando de forma mais explícita: não
há, com relação ao urbanismo de Le Corbusier, obras equivalentes ao que
significaram para a compreensão da sua arquitetura os trabalhos de Besset
(1968), Moos (1968), Petit (1970), Monnier (1986) ou Curtis (1987), com as
possíveis exceções de Evenson (1968) e Hilpert (1978) para confirmar a
regra.75
No que se refere especificamente a sua trajetória como urbanista, Le Corbusier
teve nas últimas décadas o que se pode chamar de uma "fortuna crítica"
bastante atribulada. Da aparentemente irrefletida exaltação dogmática dos
anos cinqüenta, à rejeição em bloco de suas formulações e propostas em anos
mais recentes, tem-se a sensação de estar diante apenas de uma inversão de
sinal, operada por uma crítica igualmente incapaz de identificar o que há de
específico na contribuição corbusiana à constituição do urbanismo moderno e,
mais importante, à reflexão sobre a cidade moderna.76

Era ao mesmo tempo fundamental indicar as dificuldades envolvidas nessa


tarefa, não apenas pela sua dimensão de desafio historiográfico, mas pelas suas
implicações num debate doutrinário ainda não encerrado:

75
A referência era a Maurice BESSET, Qui était Le Corbusier, Genebra, Skira, 1968, (2ª ed.:
1987); Stanislaus von MOOS, Le Corbusier, Barcelona, Blume, 1977. Ed. orig: Le Corbusier.
Elemente einer Synthese. Frauenfeld, Huber, 1968. A versão inglesa, corrigida e ampliada, é de
1979; Jean PETIT, Le Corbusier lui-même. Genebra, Rosseau (Col. Forces Vives), 1970; Gerard
MONNIER, Le Corbusier: Qui suis-je?, Lyon, La Manufacture, 1986; Willian J. R. CURTIS, Le
Corbusier, Ideas and forms. Oxford, Phaidon, 1986; Thilo HILPERT, La Ciudad Funcional: Le
Corbusier y su visión de la Ciudad, Madri, IEAM, 1983. Ed. orig.: Die Funktionelle Stadt.
Braunschweig, Fried. Vieweg, 1978. O excelente trabalho de Hilpert tampouco constitui uma visão de
conjunto na medida em que se detém na formulação da Carta de Atenas e constitui uma leitura antes
sociológica que histórica. O primeiro esforço de uma visão de conjunto do urbanismo de Le Corbusier
é realizado em Norma EVENSON, The Machine and the Grand Design, N. York, Braziler, 1969.
76
MARTINS (1992): 18-19.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 79

Moos já assinala o duplo caráter e a ambigüidade que parecem presidir


inexoravelmente toda tentativa de crítica do urbanismo corbusiano ao constatar
que a noção de Ville Radieuse representa, ao mesmo tempo, "um ideal
visionário" que contribuiu para liberar o urbanismo de "seculares sujeições" e o
ponto de referência de uma ideologia urbanística co-responsável "pela triste
realidade da arquitetura e do urbanismo do pós-guerra".77
Difícil tarefa a da crítica, obrigada a mover-se entre, por um lado, uma defesa
que não pode já ignorar as experiências concretas de aplicação, mais ou
menos mecânica, dos postulados da Carta de Atenas e o preço representado
pela sobrevivência da mitologia do progresso permanente - garantido por uma
suposta civilization machiniste-, e por outro, a condenação em bloco, que peca
por atribuir ao "urbanismo moderno" - e a Le Corbusier em particular -
responsabilidades que antes pertencem à própria lógica das condições gerais
do desenvolvimento urbano nos anos do segundo pós-guerra.(...) Há algo de
ironia da história em que o velho arquiteto, que guardava frustrações
sucessivas ao ver-se afastado de todas as possibilidades práticas de pôr em
ação sua teoria, seja considerado o principal responsável dos fracassos e
seqüelas do urbanismo internacional. Ao menos desde um famoso texto de
Munford de 1962, imputa-se-lhe a responsabilidade que a Ville Contemporaine
tenha sido a influência dominante nas escolas de arquitetura durante trinta
anos, pelo fato de enlaçar as "duas concepções que separadamente haviam
dominado o movimento moderno", quer dizer, a noção do "ambiente
maquinista, estandardizado, burocrático" e o seu complemento no ambiente
natural, "tratado como espaço visual aberto, provido de luz solar, ar puro, áreas
verdes e longas perspectivas visuais".78
Na mesma linha estava a crítica feroz de Jane Jacobs, para quem "a cidade de
sonho de Le Corbusier teve um imenso impacto em nossas cidades" na medida
em que sua concepção, "como um trabalho de arquitetura, tinha clareza,
simplicidade e harmonia" e era "tão ordenada, tão visível e tão fácil de
compreender" que sua atração havia de ser "irresistível para planificadores,

77
MOOS (1969), Trad. cit., p. 183.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 80

construtores, projetistas, e para promotores, locadores e autoridades


urbanas."79

Para tentar compreender a sobrevivência de críticas como as de Munford ou


Jacobs, e a sua posterior instrumentalização pela literatura pós-modernista, era
necessário colocá-las no contexto da crise geral das expectativas em um progresso
ilimitado e garantido pela pseudo-neutralidade da técnica e, mais concretamente, na
verificação dos limites e problemas das novas cidades planificadas “segundo os
princípios corbusianos”, das quais Brasília terá sido, talvez, o exemplo mais
emblemático.

Foi fundamental a abordagem proposta por Evenson, que afirma que a


contribuição de Le Corbusier ao pensamento urbanístico moderno não é ainda um
capítulo fechado e a reflexão sobre o seu papel e o seu significado segue ainda
mantendo atualidade. A esse respeito comentávamos:

Inicialmente, recorda-nos a necessidade de matizar o afã crítico daqueles que


olham a "uniformidade e a esmagadora escala dos novos complexos urbanos
como uma câmara de horrores" e retrospectivamente apresentam "os velhos
slums congestionados como vizinhanças humanas e vitais".80
Por outro lado, recorda que a crítica ao mal aplicado zonning funcional, à
renovação urbana insensível, à monotonia dos arranha-céus de cristal, não
deve fazer esquecer que Le Corbusier não foi, em realidade, o inventor de
nenhuma dessas coisas. "Um sintetizador mais que um inventor", diz Evenson,
seu visionário desenho urbano "refletia as correntes que prevaleciam no
pensamento de arquitetos e urbanistas".81
Em nossa perspectiva, essa caracterização é pertinente considerando-se a
evolução, a longo prazo, do urbanismo de Le Corbusier, mas incorre no perigo
de substituir a homogeneização e a indiferenciação próprias da crítica acrítica
do movimento moderno pelo esquecimento de que as formulações urbanísticas

78
Lewis MUNFORD, "Yesterday's City of Tomorrow Today", Architectural Record, nº 143,
novembro 1962, p. 141.
79
Jane JACOBS, The Death and Life of Great American Cities. Nova York, Random, 1961, p. 23
80
EVENSON (1987), p. 249.
81
Ibid., p. 246.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 81

de Le Corbusier sofreram não menos transformações que sua produção


arquitetônica. E que suas proposições, em distintos momentos, haverão podido
ter diferentes influências no processo de configuração desse corpo
heterogêneo que até pouco insistíamos em chamar "movimento moderno". Se
é verdade que Le Corbusier tentou deliberadamente ser uma espécie de
sintetizador das diferentes concepções que disputavam a hegemonia no quadro
dos CIAM, também o é que ele partia, para isso, de suas próprias concepções
de fundo.

Tratava-se, então, de buscar identificar essas concepções de fundo. Não é


possível, refazer aqui, nem mesmo de forma resumida o percurso argumental dos
diferentes capítulos da tese. Me limitarei a destacar, de forma sucinta, algumas das
caracterizações conceituais que constituíram as chaves para a leitura operada em
relação aos projetos sul-americanos.

Máquina e Natureza na Estética Purista


Não por acaso, o primeiro capítulo da tese, dedicado á investigação da
estética purista, se iniciava, logo após uma breve situação histórica da emergência
do purismo como reação ao cubismo, somente compreensível dentro do “retorno à
ordem” e do clima neoplatônico que marcava o ambiente parisiense dos anos 20,
pela caracterização da noção de “máquina”.

Dentre todas as noções estruturantes da poética purista nenhuma terá sido,


certamente, tão decisiva e, ao mesmo tempo, responsável por tantos mal-
entendidos, intencionais ou não. Basta pensar na enorme confusão que a
compreensão simplista da expressão “a casa como máquina de morar”,
normalmente citada, ademais, fora de seu contexto” gerou e continua gerando, na
literatura especializado ou no ensino.

A verificação dos textos do período purista mostra antes de mais nada, uma
utilização polissêmica da palavra máquina82:

82
A citação que se segue é um conjunto de excertos do item “Máquina, Metáfora e Analogia”. Cfr.
MARTINS (1992). pp. 62-74.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 82

Ela aparece, em primeiro lugar, como metonímia, como símbolo e expressão


do processo industrial e, por extensão, do conjunto das transformações sociais,
econômicas e culturais que aparecerão reiteradamente sob a fórmula de
civilization machiniste. Em outros momentos, o próprio Le Corbusier tem a
necessidade de precisar que refere-se "à máquina ela mesma", um utensílio
aperfeiçoado como extensão dos membros e sentidos do homem, capaz de
realizar, com uma precisão inatingível para o artesão, as formas mais puras.
Mas a máquina é, também, e com freqüência, uma enteléquia, uma metáfora
da realização da ordem, expressão figurada da eficiência de um dispositivo que
leva a cabo sua finalidade, seja esta da ordem das necessidades materiais (a
machine à habiter) ou espirituais (a machine à emouvoir). É com esse caráter
que pode funcionar como ponte semântica entre a seleção mecânica e a
natural, como recurso imagético justificativo da contínua oscilação entre a
analogia mecânica e a biológica no discurso lecorbuseriano.
Esta polissemia é fonte de não poucas dificuldades e ajuda a compreender
muitas das imprecisões da crítica ao "maquinismo" de Le Corbusier e, mais
especificamente, ao caráter "maquinista" da estética purista.
A máquina aparece em primeira instância, no discurso lecorbuseriano, como "a
máquina ela mesma, a verdadeira máquina, aquela que deveria transtornar
nossa existência." Designa aqui então, metonimicamente, a produção
industrial; é o motor e o símbolo da reorganização da produção que é, por sua
vez, o elemento decisivo no processo de condicionamento e transformação das
relações sociais e que abre um novo horizonte de possibilidades para a história
do ser humano.83 No marco geral do otimismo maquinista que caracteriza as
vanguardas construtivas, a visão de Ozenfant e Jeanneret, sem menosprezar a

83
Este sentido, mais literal, do "maquinismo" não é o menos importante para uma caracterização
genérica das diversas poéticas das vanguardas construtivas. Entretanto é o que menos nos interessa
desenvolver aqui, seja porque é o que corresponde a uma visão mais difundida (e, em certa medida
"naïf") na "crítica das vanguardas" seja porque a sua adequada compreensão exige uma remissão às
condições sociais, tecnológicas e políticas dos contextos nacionais específicos em que atuam, que
escapa completamente ao objetivo deste trabalho. É evidente que "as possibilidades do maquinismo"
não têm as mesmas implicações ideológicas pensadas no quadro da experiência social-democrática
de Weimar que no projeto soviético de construção do "Estado Operário" ou na França dos anos 20.
No entanto, implicam uma visão genericamente "universalista" e são a base da crença em um vago
"horizonte socializante", do qual é uma boa amostra o artigo de Hannes MEYER, "Die Neue Welt" de
1926, reproduzido em Mara de BENEDETTI e Attilio PRACCHI, Antologia dell´Architettura Moderna:
Testi, manisfesti, utopie, Bolonia, Zanichelli, 1988, pp. 444.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 83

dimensão quantitativa, ou seja, as possibilidades abertas à produção em larga


escala que tanta presença terá nos escritos e na produção projetual de Le
Corbusier, não põe menos ênfase no aspecto "liberador" da máquina em
relação ao "trabalho do espírito":
Expressão do seu predominante idealismo, essa liberação propiciada pela
máquina ao trabalho do espírito tem o sentido da potencialização da
capacidade humana - e da própria natureza - para realizar, para concretizar e
materializar, as formas ideais concebidas pela razão:
"Se da beira do mar tomamos um seixo rodado, escolhido como o mais
redondo entre milhões de outros; se tomamos na mão com dignidade, em um
gesto que a estatuária fixará, qualquer fruto que se aproxima à esfera, (...) é
por que nós aspiramos ao fato geométrico. (...) Mas em lugar do seixo calcário,
ou da imperfeita laranja, a máquina faz reluzir diante de nós os discos, as
esferas, os cilindros de aço polido, mais precisos (au plus fin) do que o que
tenhamos visto até então, talhados com uma precisão de teoria e com uma
acuidade que a própria natureza não mostra jamais."84
A máquina é, então, em seu sentido mais direto, instrumento, extensão
potencializadora dos membros do homem e de sua capacidade natural de fazer
que seus produtos concretizem o rigor e a precisão da idéia, da geometria.

Considerada a polissemia, a caracterização mais importante, para os


objetivos da tese, era, talvez, a da máquina como enteléquia. Esta, a única capaz de
dar sentido à caracterização do Partenon como uma terrible machine à emovoir será
fundamental também para compreender o sentido e o alcance da machine à habiter.
Voltarei a este ponto. Antes, cabe também indicar que o “maquinismo” de Le
Corbusier, como já havia indicado von Moos, é antes uma filiação à tradição clássica
francesa que uma adesão ingênua a uma visão mecanicista do progresso.
Igualmente relevante para a compreensão adequada do “funcionalismo” corbusiano
é a sugestão de leitura de Steadman, que mostra o anacronismo da oposição
simplista entre “orgânico” e “funcional”:

84
Le Corbusier, La Leçon.de la Machine,.(1924) Grifado no original.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 84

Porém aparecerá também, e o fará com freqüência, como metáfora da ordem,


como enteléquia, como contraponto humano à perfeição funcional das criações
da natureza.85 A beleza da máquina é, então, descoberta como potencialização
da beleza dos seres naturais. (...) Nesta analogia, que não é apenas formal
senão "funcional", entre o ser ordenado mecanicamente e o ser vivente torna-
se explícita a concepção que permite que, nos seus textos doutrinários de
arquitetura ou urbanismo, Le Corbusier utilize alternativamente - e às vezes
indistintamente - a metáfora maquinista e a biológica. (...)
Em outro momento do mesmo texto a analogia se apresenta em sentido
inverso - são agora os seres viventes os que "funcionam" como máquinas,
como expressão das leis da física, que aqui se extende e inclui a biologia -,
afirmando assim a sua crença na base comum e inclusiva das leis naturais.
A máquina é apresentada não apenas como extensão destinada a aperfeiçoar
a ação dos membros do homem mas também como extensão potencializadora
dos seus sentidos, ou seja, como o conjunto de recursos, de artifícios no
sentido amplo, que lhe permite ir mais longe no conhecimento da natureza,
assim como na sua ação sobre ela, apresentando então possibilidades cuja
dimensão só encontra expressão pelo recurso à linguagem mítica:
"Esse farol de Sauter-Harlé que se eleva como o mais puro dos deuses negros
enviava a distâncias fabulosas um raio de intensa luz através das noites de
chuva sobre o oceano. Esse microscópio, espécie de ourivesaria para um rei
do amanhã, revelava coisas inconcebíveis, que o deixavam transtornado. Ele
se encontrava no sonho, diante do milagre, do bom Deus."86 (...)
Seria difícil, e escapa a nossos objetivos, avaliar em que medida essa
polidirecionalidade da analogia é uma opção teórica consciente em Le

85
Como o indica von MOOS, mais que uma novidade da visão de Le Corbusier, há neste aspecto
a filiação à tradição iluminista francesa. Comentando a crítica de Sedlmayr, para quem "quase não se
pode imaginar um ídolo mais baixo do que a máquina", afirma: "Nem Pascal, nem Descartes, nem
Leibniz estariam de acordo com isto. Nem Voltaire, que se maravilha: «L´homme est tellement
machine». Sem falar de La Metrie e de seu «Homme machine». A fórmula da máquina para viver,
como tantas outras emitidas por Le Corbusier, encontra assim suas raízes no Século das Luzes,
apesar do que, durante decênios, será denunciada como uma ficção frivolamente futurista e anti-
humanista." Cf. MOOS (1968), p. 93. É sintomático que Après le Cubisme tenha sido posto sob a
autoridade dessa tradição: cada um dos seus capítulos começa com uma epígrafe tomada de
Voltaire, Poussin, Rousseau e Montesquieu.
86
Le Corbusier, La Leçon.de la Machine,.(1924).
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 85

Corbusier ou uma demonstração a mais da conhecida mutabilidade de seus


argumentos. No entanto, a sua já indicada filiação à tradição iluminista poderia
explicar, ao menos parcialmente, essa polivalência. Steadman assinala que até
o século XVIII a palavra "orgânico", atualmente usada com a conotação de
"biológico", tinha o sentido de "utilizado como instrumento". A implicação,
interessante para pensar o papel específico do "maquinismo" de Le Corbusier
no quadro genérico do funcionalismo moderno, é que os termos "mecânico" e
"orgânico", atualmente em oposição quase diametral, possuiram significados
originalmente próximos, referidos aos objetivos e à teleologia.87
A visão da máquina, portanto, ainda que central na estética purista, não está
isenta de ambigüidades e indefinições. Concebida como resultado da lógica e
do cálculo, a máquina expressa de maneira pura o Número e, por isso, de
acordo com a estética purista, leva em si mesma a beleza. Ao realizar as
formas ideais "com uma precisão de teoria e uma acuidade que a própria
natureza jamais nos mostra", a máquina (e seus produtos) "nos aparece então
como a deusa beleza".88 (...)
Mas essa beleza, que é, para os puristas, real e constitutiva do mundo
moderno, não é suficiente para defini-la como obra de arte. Sua precisão, sua
perfeita expressão do cálculo e da geometria gera "um entusiasmo sincero
porém fora de lugar" porque "pensamos então na obra de arte".89
A caracterização das relações entre “máquina” “beleza” e “Arte”, decisivas
para toda a argumentação posterior e, especialmente, como creio haver
demonstrado nos capítulos 2 e 3 da tese, fundamental para a superação das leituras
redutivas de suas proposições arquitetônicas e urbanísticas, passa pelo
estabelecimento de uma distinção chave entre “beleza mecânica” e “Beleza”, atributo
da “Arte”. Voltarei a este ponto, adiante. Mas desde já, fica claro que as relações

87
Cf. STEADMAN, Philip. Arquitectura y Naturaleza: Las analogías biológicas en el diseño,
Madrid, Blume, 1982. Ed. orig.: Cambridge Univ. Press, 1979. Ver especialmente, para este ponto, o
cap. 2, "La Analogía Orgánica", pp. 23-38. O texto oferece, sem dúvida, sugestões muito
estimulantes, como voltaremos a comentar no referente à idéia de "seleção mecânica". Sem
embargo, em nossa opinião, minimiza a importância do recurso à geometria, reiterativo em Ozenfant
e em Le Corbusier, como base comum para as analogias entre máquinas, seres vivos e obras de
arte.
88
Le Corbusier, La Leçon.de la Machine,.(1924)
89
Le Corbusier, La Leçon.de la Machine,.(1924)
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 86

entre arte e máquina são, na poética purista, mais sutis do que estamos
acostumados a encontrar na literatura corrente:

Já se assinalou que talvez a mais importante contribuição do Purismo - e do


seu texto fundador - tenha sido trazer os temas da cultura industrial
provenientes do Deutsche Werkbund para os meios de vanguarda
influenciados pelo Cubismo, aproximando assim a vanguarda pictórica
parisiense à arte construtiva centro-européia.90 Essa aproximação não é,
entretanto, ingênua nem incondicional. Para os puristas, o objeto de produção
industrial tem sua própria carga de beleza na medida em que esteja bem
formulado como problema e cumpra sua função adequadamente (a cadeira
como máquina de sentar; a casa como máquina de habitar) sem que por isso
converta-se em obra de arte (máquina de emocionar).
Na estética e na ideologia puristas a arte não pode ser feita à máquina, "porque
depende do inconsciente do artista", nem tem por que sê-lo, na medida em que
não se destina à massa consumidora mas à elite:
"A arte de nossa época está em seu lugar quando se dirige às elites. A arte não
é coisa popular, menos ainda "puta de luxo". A arte é um alimento necessário
somente para as elites que devem recolher-se para poder conduzir. A arte é de
essência altaneira."91
A natureza da relação entre maquinismo e arte na estética purista é, portanto,
de outra ordem.
Resultado da geometria e ao mesmo tempo instrumento que possibilita a
realização de objetos mais próximos da perfeição (da forma ideal), a máquina
não deve ser nem a produtora de obras de arte nem tema da arte, senão uma
lição a seguir no conhecimento da natureza:
"A lição da máquina está na pura relação de causa e efeito. Pureza, economia,
tensão em direção à sabedoria."92
Além da caracterização das nuances que envolvem a utilização que faz Le
Corbusier da idéia de máquina, uma outra noção é fundamental para a compreensão

90
DUCROS, Après.le Cubisme..(1987), p. 47.
91
LC, Vers.une architecure..(1923), p. 79.
92
LC, La Leçon.de la Machine..(1924).
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 87

de sua poética da cidade e, particularmente, do papel desempenhado nesta poética


pelo desenvolvimento técnico.

Trata-se da noção de beleza mecânica. Não é o caso de desnvolver aqui toda


a sua genealogia. Baste com reter que essa noção decorre diretamente da
concepção de que o âmbito da cultura, material e espiritual, está submetida, assim
como o universo material, a uma lei geral da evolução. Não apenas os seres vivos
mas também os artefatos criados pelo homem estariam, numa perspectiva que
Steadman caracteriza como devedora de Lamarck, sujeitos à ação aperfeiçoadora
da seleção mecânica, decisiva para a caracterização do objeto tipo e do standard:93

É importante ressaltar a noção purista de que a evolução geral é comandada


pela "lei da economia", entendida como determinação da seleção das formas
naturais em resposta a funções constantes. (...) Também os objetos de
primeira necessidade criados pelo homem teriam estado, em todos os tempos,
sujeitos a uma depuração baseada nas próprias funções "econômicas",
ampliadas neste caso por seu caráter dependente do corpo humano a que se
associavam e ao qual complementavam. Tal é o caso dos "continentes" (copos,
garrafas, frascos, etc.), dos objetos de transporte, das armas, objetos de
prazer, instrumentos musicais.
"Comprova-se que todos estes objetos, verdadeiros prolongamentos dos
membros humanos, estão feitos na escala humana. Por esta razão,
harmonizam, por um lado entre si e, por outro, com o homem. (...) através do
fenômeno da seleção mecânica estabeleceram-se essas formas que quase
poderiam chamar-se permanentes, todas aparentadas entre si, todas com base
na escala humana, que contêm as curvas da ordenação matemática, quer
dizer: curvas de maior capacidade de conteúdo, de maior resistência, da maior
elasticidade, etc... Estas curvas obedecem às leis que regem a matéria.
Conduzem-nos, naturalmente, a satisfações de ordem matemática."94
Duas conseqüências, decisivas para a estética purista, derivam dessa
caracterização, uma relacionada às artes decorativas e outra referente ao
terreno específico da arte.(...)

93
As citações a seguir são excertos de “Seleção e forma-tipo”. Cfr. MARTINS (1992): 107-13.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 88

No primeiro caso a determinação matemática das formas aperfeiçoadas


através da seleção mecânica implica o fortalecimento da visão otimista da
produção industrial e a afirmação da analogia fundamental com a produção
natural, pré-industrial. Para os puristas a máquina não estabelece uma ordem
produtiva e estética nova, apenas "aplica com mais rigor que nunca as leis
físicas da estrutura do mundo".95 (...)
Já fizemos referência a que Steadman considera mais pertinente a filiação da
concepção purista da evolução das formas a Lamarck do que ao darwinismo
propriamente dito. Resulta interessante que, ademais, ofereça uma
"genealogia" da visão lamarckiana indicando sua filiação à filosofia naturalista
da Ilustração da mesma maneira como o darwinismo aparece geralmente
ligado ao contexto do progresso industrial e tecnológico do século XIX e à ética
vitoriana do trabalho e da competição.96 (...)
Neste sentido pode compreender-se melhor o contínuo embate entre a
exigência, por parte dos puristas, de um reconhecimento e uma aceitação da
realidade do universo maquinista e seu esforço pelo restabelecimento da
harmonia com a ordem natural. A contradição, difícil de negar hoje em dia, era
em todo caso inerente à tradição ilustrada. Como o era, também, o forte
componente moral da doutrina purista. (...)
Podemos, então, compreender, tanto no sentido da "unidade" entre o homem e
seu meio como no da "moralidade" subjacente a essa concepção, as
exigências apresentadas por Le Corbusier em seu texto dedicado à Exposição
de Artes Decorativas de 1925, de uma "arte decorativa" que se despojasse da
decoração e se limitasse à produção industrial de objetos adequados às
necessidades (besoins) dos indivíduos, definidos estes no que têm de mais
universal: suas necessidades e características fisiológicas. Esta perspectiva
revela, não sem paradoxo, uma certa base "materialista" da noção de
harmonia:

94
O&J, Purisme (1921), Trad. cit., p. 171.
95
O&J, Purisme (1921), Trad. cit., p. 171.
96
STEADMAN (1979), Trad. cit., pp. 158, 164.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 89

"Se nossos espíritos são diversos, nossos esqueletos são semelhantes, nossos
músculos ocupam o mesmo lugar e realizam as mesmas funções: dimensões e
mecanismos estão então determinados.(...) Sensíveis à harmonia que dá a
quietude, reconheceremos o objeto que esteja harmonizado com nossos
membros. (...) Portanto os objetos-membros humanos estão conformes com
nosso sentimento de harmonia ao estar conformes com nosso corpo."97
Porém o reconhecimento dessa harmonia não implica a admissão desses
objetos enquanto tais no universo da arte, nem tem sentido, portanto, falar da
sua perenidade. No mesmo texto, Le Corbusier reivindica taxativamente a
hierarquia:
"Primeiro a Sixtina, quer dizer, as obras onde verdadeiramente se inscreveu
uma paixão. Depois máquinas de sentar, de classificar, máquinas-tipo. (Estas
são) problema de purificação, de limpeza, de elaboração, antes que problema
de poesia."98

Existe, portanto uma beleza mecânica, tanto nos objetos naturais quanto nos
desenvolvidos pelo trabalho humana. Esta é resultado do lento processo de seleção
mecânica, que obedece, assim como a seleção natural, a uma lei maior, a lei da
economia.

Para a estética purista, os produtos desse processo de aperfeiçoamento nos


comovem porque são expressão do Cálculo. Esta forma de beleza é a que se pode
encontrar nos objetos de uso cotidiano, resultado que são da lógica da máquina,
presidida pelo cálculo. Oferecem uma beleza contingente, sujeita às transformações
sucessivas e inevitáveis da próprias condições técnicas da sua realização. Nada tem
a ver, entretanto, com a Beleza da Arte, cujo atributo fundamental é a perenidade,
resultado que é de uma operação da Paixão.

97
"Besoins-Type, Meubles-Type" em Le Corbusier, L'Art Décoratif d’Aujourd’hui(1925), p. 76.
98
Ibid., p. 77.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 90

Poesia e Cálculo na Cidade Contemporânea


As conseqüências da formulação anterior na concepção urbanística de Le
Corbusier, tais como se expressam, inclusive, na proposta da Ville Contemporaine,
são decisivas para o nosso problema.

Como é sabido, a primeira parte de Urbanisme é dedicada a restabelecer uma


genealogia das “grandes cidades” do passado, para demonstrar que “a geometria e
o ângulo reto estiveram sempre associados a todo ato humano”. A cidade egípcia,
Babilônia, Pequim ou as cidades romanas testemunham

“o espirito que chega aos confins de sua potencia, de sua grandeza,


expressando-se mediante o ângulo reto (...) único, constante, puro, capaz de
associar-se à ideia de gloria, vitória dos tiranos, à ideia de toda pureza, celula
das religiões”.99

Essa leitura, que Coulquhoun chamou “metahistórica, tem a função de


demostrar, por contraste com a racionalidade das cidades do passado, o drama da
cidade moderna, que o desenvolvimento do maquinismo transformou de maneira
ameaçadora:

"... submersos na grande cidade por uma invasão súbita, incoerente,


precipitada, imprevista e sufocante, oprimidos e desconcertados, nós nos
abandonamos, nós não atuamos mais. E o caos chegou, com suas
conseqüências fatais. A grande cidade, fenômeno de força e movimento, é hoje
uma catástrofe ameaçadora por já não estar animada de um espírito de
geometria".100
Essa conclusão é, sob todos aspectos, exageradamente simplificadora da
complexa dinâmica da cidade moderna. Mas possui uma coerência interna e uma
força de persuasão que ajudam a compreender o papel que a partir disto jogará no
nascente urbanismo moderno.

No capítulo "Le sentiment déborde”, Le Corbusier explicita essa genealogia


auto-atribuída. A filiação à cultura do passado não é, certamente, incondicional,

99
Le Corbusier, Urbanisme, Paris, Frèal, 1925, p. 24.
100
Ibid., Idem.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 91

senão que busca estabelecer uma clara distinção entre a linha civilizatória que
esteve apoiada no "espírito geométrico" e aquela que se caracterizou por apartar-se
dele:

"Definição do sentimento moderno: nossa cultura moderna conquistada por


Ocidente finca suas raízes na invasão que apagou a cultura antiga. Conheceu
o infortúnio do ano 1000 e logo se foi levantando lentamente no curso de dez
séculos. Sobre um primeiro instrumental de admirável engenhosidade,
inventado pela Idade Media, escreveu momentos de grande clareza no século
XVIII. (...) Estabelecidos os princípios fundamentais da razão pelo século XVII,
pelo XIX, em uma obra magnífica, aprofundou-se na análise e na
experimentação e criou um instrumental completamente novo, formidável,
revolucionário e revolucionador da sociedade. Herdeiros desse labor,
percebemos o sentimento moderno e sentimos que uma época de criação
inicia-se. Felizes, em poder dos meios mais eficazes que nunca, nos empurra
imperativamente um sentimento moderno. Este sentimento moderno constitui
um espírito de geometria, um espírito de construção e de síntese. A exatidão e
a ordem são seus requisitos."101

A formulação é, desde logo, pouco clara: um sentimento que se constitui em


espírito. Convém aclarar esses termos, especialmente na medida em que a noção
de uma "paixão" que está além do cálculo, que distingue a obra de arquitetura da
mera solução de um problema de engenharia ou a verdadeiro arte da mera pintura, é
um tema reincidente nas formulações corbusianas. É o próprio LC que tenta
esclarecer:

"O sentimento é um imperativo categórico contra o qual nada se mantém. O


sentimento - sorte ambígua de certas palavras - é precisamente o que não se
sente, não se mede. (...) Poderíamos chamá-lo simplesmente intuição."

101
Ibid., p. 36. É evidente que esta citação poderia ser extraída integramente de um dos seus
textos sobre pintura, ou sobre arquitetura. O fato de que Le Corbusier, independentemente da
argumentação "técnica" em relação à circulação mecânica, à industrialização da habitação ou à
separação das funções urbanas, coloque os antecedentes históricos nos mesmos termos que o faria
(e o fez) para justificar suas proposições pictóricas ou arquiteturais mostra que ele concebe
inicialmente a cidade como um fato estético.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 92

Para em seguida insistir, ainda outra vez:

"Mas a intuição, além da simples manifestação do instinto, pode definir-se, para


assegurar-nos, sobre a base de elementos racionais; podemos dizer que a
intuição é a soma de conhecimentos adquiridos."102

Assim, o sentimento, aquele que complementa o trabalho do cálculo, que o


pode elevar à esfera da arte é, por sua vez, o resultado sedimentado do exercício da
razão através das gerações.

A atividade moderna inscreve-se então no "imperativo categórico" de


aproveitar o enorme potencial de meios técnicos disponível para restaurar essa
trajetória. Assim como para a pintura, segundo indica em Après le Cubisme e nos
textos de L'Esprit Nouveau, ou para a arquitetura,conforme se vê em Vers une
Architecture, também no urbanismo o objetivo a alcançar é ser digno daquela
herança, é conseguir plasmar obras que mereçam a perenidade.

Isto o leva a retomar, agora em têrmos urbanísticos, o tema da "beleza


mecânica" já desenvolvido em La Peinture Moderne103. O cálculo, nos diz Le
Corbusier, é uma pré-condição, não uma garantia. A condição da cidade como obra
de arte é, assim como na escala individual do edifício, o resgate do "além" do
cálculo, é a utilização da geometria como base de e para a poesia:

"O trabalho da razão se acrescenta sem fim, sua curva é ascensional; ele cria o
instrumento; é o que chamamos o progresso. Os sentimentos da paixão são
constantes (...) Podemos arriscar a hipótese de que as grandes obras
emotivas, obras de arte, nascem da feliz integração entre a paixão e o
conhecimento."104

Esta é uma chave para a compreensão do pensamento urbano de Le


Corbusier, de suas contradições, simplificações e debilidades. Talvez o seja também
de sua força e sua influência. Sua cidade tem como paradigma a máquina, apenas
na medida em que a obra de arte da nova era também deve tê-la. A máquina como

102
Ibid., p. 33.
103
Cfr. MARTINS (1992), cap. 1, especialmente item 2. Pp. 41-62.
104
"Pérennité", em: Le Corbusier, Urbanisme (1925), pp. 43-44.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 93

metáfora da ordem e não como criação perecível da técnica. Por isto sua cidade
deve ser obra do poeta, mais que do engenheiro:

"Além dos fins utilitários escruta o imperecível: o homem. O engenheiro é uma


pérola. (...) O poeta vê todo o colar."105

A cidade não é, para Le Corbusier, resultado exclusivo do cálculo. Se assim


fosse, seria perecível. É resultado da paixão, que intervém no processo de decisão
entre as alternativas de solução oferecidas por aquele:

"A cidade está profundamente enraizada nas regiões do cálculo. Os


engenheiros, quase sem exceção, trabalham para ela. Assim se construirá o
instrumental da cidade. Será o essencial para o que é útil e, portanto, perecível.
E à cidade corresponder-lhe-á fazer-se permanente, o que resultará de outras
coisas que do cálculo. Tratar-se-á da arquitetura, que é tudo o que está além
do cálculo."106

Esta visão da cidade como fato essencialmente tem, para a compreensão das
proposições urbanísticas corbusianas, conseqüências radicais. Sabido que boa parte
de Urbanisme é dedicada a explicar minuciosamente o funcionamento cidade
proposta pelo modelo da Ville Contemporaine, é surpreendente que a literatura não
tenha dado a devida atenção à oposição que le Corbusier estabelece entre a “alma”
e o “mecanismo” da cidade:

"... tomaremos uma decisão capital: colocaremos acima disso que é o


mecanismo da cidade, aquilo que podemos chamar a alma da cidade. A alma
da cidade é o espetáculo inútil aos gestos práticos da existência, isso que é
simplesmente a poesia. (...) A mecânica da cidade não é mais que uma
questão de adaptação. (...) adaptamo-nos, mal ou bem, ao incômodo, que
passa, como passa a perfeição mecânica amanhã destronada."107

Para em seguida prevenir que se, na seqüência do livro, ocupar-se-á


fundamentalmente da "mecânica da cidade" é necessário deixar estabelecido

105
Ibid., p. 44.
106
Ibid., p. 49-50. Grifo nosso.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 94

"... que essa harmonização mecânica permanece deste lado das sensações
profundas e definitivas ligadas a nosso ser sensível, à organização sentimental
que detém o segredo de nossa felicidade ou de nosso infortúnio."108

Caracteriza-se, assim, uma distinção, decisiva para o estabelecimento de uma


poética purista no âmbito urbanístico, entre a “alma” da cidade, aquilo que nela é
perene, porque resultado da ação do espírito, e o seu “mecanismo”, contingente e
destinado à contínua desatualização, porque expressão da técnica, cuja
característica básica, no mundo maquinista, é a permanente transformação.

É a partir dessa afirmação que podemos entender que, no capítulo chamado


Atenas do seu Voyage d’Orient, de 1911, Jeanneret ocupe mais de dez páginas
descrevendo a Acrópole e não mencione uma vez a cidade de Atenas. Esta é
contingente, resultado do cálculo e da evolução técnica. Aquela é fruto do espírito,
resultado da operação da “paixão”, daquilo que está “para além do cálculo”. É a
“alma” de Atenas, perene como a Arte grega, perene como o espírito de que
procede.

Cidade e Paisagem: os projetos sul-americanos


Não cabe aqui uma análise detalhada de cada uma das operações projetuais
envolvidas nas propostas que apresenta em forma de esboços e de descrições em
Prècisions..., para Buenos Aires, Montevidéu, São Paulo e Rio de Janeiro.

A "recuperação" da importância de Précisions... no conjunto da obra teórica


corbusiana é relativamente recente109 e isso não é, certamente, gratuito. Já se
chamou a atenção110 sobre a tendência, cristalizada na historiografia tradicional, de

107
"Classement et choix", em: Le Corbusier, Urbanisme (1925), pp. 54-55.
108
Ibid., p. 55.
109
Se tomamos como indicador, ainda que saibamos que não pode ser exclusivo, a fortuna do texto
com relação a suas traduções, verificamos o seu atraso com respeito aos demais textos de Le
Corbusier. A primeira tradução ao alemão (Frankfurt, Ullstein) é de 1964, quatro anos posterior,
portanto, à primeira reedição francesa (Paris, Vincent Frèal, 1960); em castelhano aparece por
primeira vez em 1977 (Buenos Aires/Barcelona, Poseidón); a tradução italiana é de 1979 (Bari,
Laterza). E, um último dado significativo, a primeira edição em língua inglesa é de 1991 (Precisions
on the present state of architecture and city planning, Cambridge (Mass.), MIT Press, trad. de Edith
Schreiber Aujame).
110
Cf., entre outros, Mary McLEOD, "Le Corbusier and Algiers", Oppositions, nº 19-20, 1980, p. 55.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 95

dividir a obra corbusiana em dois grandes períodos considerados merecedores de


atenção: o primeiro, compreendido entre a chegada definitiva a Paris, ou em alguns
casos entre a elaboração do esquema Dom-ino, em 1913, e a realização da "Villa
Savoye”, até 1929 e o segundo, entre a Unité d’Habitation de Marselha em 1946 e
os últimos monumentos de Chandigarh, isto é, até 1965. À primeira, costumam
aplicar-lhe categorias como racionalista, abstrata, cartesiana, maquinista; a segunda
costuma ser considerada a partir de caracterizações como "brutalista", poética,
expressiva, evocadora do primitivo ou do arcaico.
Aparentemente, a revalorização do período compreendido entre as duas
guerras mundiais teve seu ponto de partida no já citado texto de Tafuri quem, ao
chamar fortemente a atenção sobre os projetos para Argel, o fazia também sobre as
experiências que os antecedem de forma imediata e, em conseqüência, sobre o livro
que plasma esse momento da reflexão corbusiana.111

Por outro lado, o trabalho de Tafuri parece também marcar uma tendência ao
considerar os planos de América do Sul como "ponto de partida" conceitual cujo
completo desenvolvimento se daria nos distintos planos para Argel, realizados ao
longo da década seguinte112. É evidente que essa interpretação tem fortes
argumentos no desequilíbrio dos esforços, tanto projetuais como propagandísticos,
do próprio Le Corbusier113. No entanto, não houve realmente, como veremos mais
adiante, um desinteresse seu pela possibilidade de viabilização dos projetos sul-

111
É interessante verificar que os -poucos- trabalhos que se detêm na análise dos projetos urbanos
de 1929 dão-se principalmente na órbita da pesquisa e/ou da publicação italianas. Cf. TAFURI
(1972)(1969); Marcello FAGIOLO, "Le Corbusier 1930: I Piani per l'America Latina e per Algeri",
Ottagono, nº 44, março 1977; Francesco TENTORI, Vita e Opere di Le Corbusier, Roma/Bari,
Laterza, 1979, especialmente pp. 75-86; Francesco TENTORI e Rosario DE SIMONE, Le Corbusier,
Roma/Bari, Laterza, 1987, especialmente cap. 6: "Proposte per le Cittá dell'America Latina", pp. 95-
104.
112
Tentori é um dos primeiros em resgatar a importância da viagem de 1929: “è stata trascurata
l'enorme importanza per L-C do viaggio in América.(...) sono probabilmente um dei momenti più
intensi e felici della sua vita." Cf. TENTORI (1979), p. 75.
113
Somente em relação aos planos urbanísticos gerais de Argel (quer dizer, sem contar com o
desenvolvimento de projetos parciais) a Fondation Le Corbusier tem arquivadas 335 pranchas, contra
os escassos croquis relativos aos projetos sul-americanos de 1929. Cf. FLC, Architecture: Plans et
Archives, Paris, s.f. (1989). Os planos de Argel ocupam ainda boa parte da atividade propagandística
de Le Corbusier até inícios dos anos 40. Ver, para uma análise dos distintos planos para Argel e sua
inserção na tradição do urbanismo colonial francês, Jean Pierre GIORDANI, Le Corbusier et les plans
pour Algier, (Tese de Doutorado), Paris, Université de Paris I, 1987. Para uma análise exaustiva das
implicações políticas da postura lecorbuseriana no período, particularmente sua relação com o
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 96

americanos, mas uma conjugação de fatores, essencialmente políticos, que


determinaram que a maior parte desses estudos permanecesse na fase de
croquis114. O exemplo do plano de Buenos Aires, único dos quatro planos
urbanísticos esboçados em 1929 que teve um desenvolvimento posterior, demonstra
que esses croquis, rapidamente esboçados, eram considerados como bases reais e
válidas para um plano urbanístico concreto e não como meros exercícios de fantasia
urbana.

Esse "desvio da atenção", por parte da crítica, da viagem sul-americana até


suas "conseqüências norte-africanas" é, talvez, responsável pelo fato, indicado pelo
próprio Tafuri em um texto uma década e meia posterior, de que a melhor descrição
da viagem de 1929 siga sendo ainda a do próprio Le Corbusier em Précisions.115

Se indicou que a redação de Précisions assume para Le Corbusier o caráter


de uma espécie de "summa" de sua elaboração teórica e conceitual anterior116. Esse
caráter deve ser compreendido no marco dos significados da viagem de 1929 para a
trajetória de Le Corbusier: fim da etapa dos encargos privados e dedicação plena e
consciente aos "grands travaux"; início da busca da "opção latina"; pesquisa sobre
os caminhos até um "urbanismo sensível".117

Précisions é provavelmente o momento em que se formula de maneira mais


explícita a busca de algo como uma fenomenologia da percepção espacial na obra
de Le Corbusier. Se é inegável que a formulação da noção de promenade
architecturale é anterior - assim como algumas passagens dos textos de juventude,

"movimento sindicalista" francês e o período de Vichy, ver Mary McLEOD, Urbanism and Utopia: Le
Corbusier from Regional Sindicalism to Vichy, Dissertação de PhD, Princeton University, 1985.
114
À exceção de Buenos Aires, cujo "plano" foi retomado a partir de 1938, tampouco mereceu da
crítica a devida atenção,: embora mantivesse os princípios gerais dos esboços de 1929.
115
Cf. TAFURI, Manfredo, "Machine et memoire: The City in the work of Le Corbusier" em: BROOKS
(ed.), 1987, pp. 203-218. Ver especialmente nota 28, p. 217.
116
A formulação é inicialmente de Tentori: "Le conferenze che deve tenere (...) lo stimolano a fare
una summa retrospettiva di tutta a sua opera." Cf. Francesco TENTORI, Vita e opere di Le Corbusier,
Bari, Laterza, 1979, p. 75. Também Cf. William CURTIS, Le Corbusier: Ideas and forms, Oxford.
Paidon, 1986, p. 121.
117
Cf. LIERNUR (1987), p. 41. A idéia do "urbanismo sensível" está formulada pelo próprio Le
Corbusier que apresenta assim as propostas sul-americanas em La Ville Radieuse: "Comoções sul-
americanas (1929). Introdução a um urbanisme sensível. O clima, a região, a topografia são os
incitadores à diversidade dentro da unidade de uma regra humana." Cf. LC, La Ville Radieuse (1935),
p. 220.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 97

especialmente no Voyage d'Orient - ou que em Urbanisme já se indiquem algumas


tentativas nesse sentido, há agora dois elementos fundamentais: o "descobrimento"
da dimensão cognoscitiva da experiência do vôo e a vivência de um espaço natural
surpreendente em função, ao mesmo tempo, da escala dos territórios, cuja
"ocupação" assume para Le Corbusier conotações míticas, e do seu caráter ainda -
relativamente - "intocado" pela primeira fase da civilisation machiniste.

É o próprio Le Corbusier quem, no Prefácio da reimpressão de 1960, escreve:

"As conferências da América do Sul, improvisadas no ano 1929 ante um


auditório freqüentemente renovado (...) tratam do homem e de seu ambiente.
(...) Abriram, seja dito com modéstia, portas e janelas. Permitiram a seu autor
ver claramente dentro de si mesmo, ser "ingênuo" uma vez mais, contentando-
se com determinar os problemas e encontrar a resposta mais natural."118

A resposta “mais natural” é aquela que a paisagem lhe sugere. Os cinco


edifícios cruceiformes colocados sobre uma plataforma artificial construída sobre o
Rio de la Plata funcionam, poeticamente como gigantescos menires a comentar,
com o instrumento do ângulo reto, a “horizontal sublime” formada pelo limite entre a
pampa e o rio.

Não é gratuito que Le Corbusier evoque, para justificar poéticamente a sua


proposta, uma experiência fundamental:

"Eu gostaria de conduzi-los a experimentar uma coisa sublime, pela qual o


homem, no curso dos apogeus, manifestou seu domínio; eu denomino-o "o
lugar de todas as medidas". Vejamo-lo: Eu estou em Bretanha; essa linha pura
é o limite do oceano sobre o céu; um vasto plano horizontal estende-se para
mim. Eu aprecio com voluptuosidade esse repouso magistral. Aqui estão
algumas rochas à direita. A sinuosidade das praias de areia encanta-me como
uma dulcíssima modulação sobre o plano horizontal. Eu andava. Subitamente
me detive. Entre o horizonte e os meus olhos um acontecimento sensacional
produziu-se: uma rocha vertical, uma pedra de granito está aí, ereta como um

118
Não dispomos da reedição francesa de 1960. Cf., exclusivamente para o Prefácio, a tradução de
Johanna Givanel, Barcelona, Poseidón, 1978. A citação é da pp. 10-11, o grifo, nosso. As demais
citações do livro são, salvo menção expressa, tradução nossa, a partir da 1ª edição.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 98

menir; sua vertical faz com a horizontal do mar um ângulo reto. Cristalização,
fixação do sítio. Aqui há um lugar onde o homem se detém, porque há uma
sinfonia total, magnificência de relações, nobreza. O vertical define o sentido do
horizontal. Um vive por causa do outro. Aí estão as potências da síntese."119

Em sua primeira chegada a Montevidéu120, desde o navio, Le Corbusier


desenha o promontório e a cidade que se anuncia por um pequeno arranha-céus.
Mais tarde, afirmará:

"... o arranha-céus lá no alto não me diz nada muito reconfortante; ele está
demasiado longe."121

A "solução" apresentada para o problema da circulação, "que se avizinha", é a


conhecida fórmula do "arranhamar”:

"Do alto do platô (cerca de 80 metros) eu sigo para o mar, a nível constante, a
rua principal da cidade, vinda do norte, vinda do campo. Façamo-la seguir em
nível fazendo que ramifique em dois, três, quatro ou cinco braços (ou dedos)
que irão até (...) acima do porto. As ruas estarão no ar e deter-se-ão
bruscamente no ar, a pique."122

Há aí um evidente problema de ordem funcional: que aconteceria aos


automóveis que circulasse, por essas autopistas que se detém “bruscamente”

Parece evidente que sua preocupação maior é outra, como o sugere o


argumento com que conclui sua descrição:

"E se, com um gesto simples, havendo criado no lugar adequado (au bon
endroit) os organismos específicos de uma cité d'affaires, sonhamos um
instante com a beleza da cidade, com o orgulho que despertará nos cidadãos,
veremos elevar-se da água, como prolongamento do promontório, um desses
espetáculos arquitetônicos magníficos que, em pequena escala, já conhecemos

119
"Architecture en tout, Urbanisme en tout", em Le Corbusier, Précisions (1930), p. 76.
120
As condições e as possíveis repercussões da estadia de Le Corbusier em Montevidéu são, até
agora, as menos conhecidas dentro do que se estudou sobre a viagem de 1929.
121
Le Corbusier, Précisions (1930), p. 238.
122
Ibid., p. 239.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 99

em Marselha (o velho forte); em Antibes, o forte; na villa Adriana de Tívoli (a


grande plataforma a pique sobre o planura de Roma), etc. Mas, quão mais
majestoso desta vez!"123

Das quatro cidades que visita e para as quais apresenta alguma proposta124,
São Paulo é a única que não podia ver inicialmente desde o mar.

Quando visita a cidade, o centro estava marcado por importantes viadutos,


um em ferro e outro, do início do século, em concreto armado, que permitiam o
cruzamento sobre o eixo viário central da cidade. É bastante provável que a
"solução" de São Paulo lhe tivesse ocorrido, uma vez mais, a partir de um elemento
preexistente na paisagem, neste caso, urbana. Considerando a extensão horizontal
da cidade e sua relação de comunicação e transporte com polos exteriores (com a
capital, Rio de Janeiro, ao norte; com o porto de Santos, ao leste; com a zona
cafeeira, ao oeste) surge a "proposta":

"... apoiar de colina a colina, de topo a topo, uma régua horizontal de 45


quilômetros, logo uma segunda régua igual, mais ou menos em ângulo reto,
para atender aos outros pontos cardinais. (...) Essas auto-estradas que
proponho são gigantescos viadutos. Não façais uns custosos arcos para
sustentar os viadutos, podeis apoiá-los sobre umas estruturas de concreto
armado que poderão constituir os escritórios no centro da cidade e as moradias
na periferia."125

Se é pertinente indicar um processo de paulatina "abstração" da cidade -no


sentido de que a estruturação urbana de Buenos Aires merece uma análise mais ou
menos detalhada, a de Montevidéu deduz-se por extensão daquela e a de São
Paulo resume-se à verificação da tendência à verticalização do centro-,
aparentemente Rio de Janeiro é o limite desse processo.

123
Ibid., Idem.
124
Le Corbusier visita, ainda, Assunção, em Paraguai, e Mar del Plata, em Argentina, mas não
realiza aí, até onde conhecemos, nenhuma conferência, nem registra nenhuma impressão específica
sobre as cidades.
125
"Corollaire...", em: Le Corbusier, Précisions (1930), p. 242.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 100

Nas antípodas de Buenos Aires, a cidade "a que a natureza nada havia
contribuído" e que, portanto, era "pura criação do espíritoencontra-se Rio de Janeiro.
Nas notas preparatórias das conferências de Rio, aparece esta formulação, com que
se supõe deveria começar a palestra, logo depois dos costumeiros agradecimentos:

"Que é Rio? natureza / é necessário fatalmente dominar um problema estético /


minhas idéias serão capazes de responder-lhe?/eu sou artista acima de tudo
"126

A proposta de Le Corbusier é bastante conhecida. Mas é importante destacar


que toda a sua descrição é expressa em uma linguagem essencialmente poética,
que leva Le Corbusier a formular sua visão da cidade em termos de uma "partida"
contra e com a natureza. A expressão surge em um contexto e como conseqüência
de um estado pletórico do criador que "sente" e "compreende":

"Quando tudo é uma festa (...) quando se está no Rio de Janeiro (...) quando se
escalou as colinas (...) quando se subiu a um avião (...) quando, pelo avião,
tudo se tornou claro, e haveis aprendido essa topografia - esse corpo tão
acidentado e tão complexo -, quando, vencida a dificuldade, haveis sido
surpreendido de entusiasmo, haveis sentido nascer as idéias, haveis entrado
no corpo e no coração da cidade (...) quando sois arquiteto e urbanista, e
coração sensível às magnificências naturais, e espírito ávido de conhecer o
destino de uma cidade (...) então, no Rio de Janeiro (...) acomete-vos um
desejo violento, talvez louco, de aqui também tentar uma aventura humana, o
desejo de jogar uma partida afirmação-homem contra e com presença-
natureza."127

A conseqüência desse "desejo louco" é uma das passagens mais citadas e


conhecidos de Le Corbusier:

126
AFLC C3.7.125. Grifado no original. Esta declaração é especialmente significativa se
consideramos que, nessa data, Rio no é, absolutamente, uma cidade insignificante do ponto de vista
econômico e demográfico. Além da sua significação política como capital do país, Rio havia vivido um
intenso crescimento demográfico: 35.000 habitantes em 1750, 112.000 em 1825; 522.000 em 1890 e
ao redor de 1.600.000 a finais dos anos vinte. Cf. José CORTEZ, "Umgestaltung der Stadt Rio de
Janeiro, Architekten Cortez und Bruhns", Der Stadtebau, vol 23, nº 4, 1928, pp. 100-104. Dados na p.
100.
127
Le Corbusier, Précisions (1930), p. 236.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 101

"Do avião eu desenhei para o Rio de Janeiro, uma imensa auto-estrada que
ligava a meia altura os promontórios abertos sobre o mar, de maneira a
comunicar rapidamente a cidade, pela auto-estrada, com as zonas salubres
das mesetas."128

Mas logo depois dessa justificativa, em aparência funcional, vem a descrição


em tom sensual do movimento que enlaça as colinas e baías:

"Um braço dessa auto-estrada pode chegar até o Pão de Açúcar; em seguida
desenvolve-se em um curva ampla, majestosa, elegante, acima da Baía
Vermelha, da baía de Botafogo; toca a colina onde termina a Praia da Glória,
domina ao fundo esse sítio encantador, roça o promontório de Sta. Teresa e,
lá, no coração da cidade ativa, abre-se, inclinando um braço para o golfo e o
porto mercante e termina sobre o teto da cité d'affaires. O outro braço dirige-se,
acima dessa extensão da cidade que se afunda no estuário de terras e poderia
prosseguir seu curso em direção à a estrada que sobe para São Paulo. Se se
acreditasse útil, nada impediria que, por cima das coberturas dos arranha-céus
da cité d'affaires, a auto-estrada seguisse por cima do golfo, por uma passarela
larga mas leve, e chegasse às colinas de Niterói, frente ao Rio."129

A citação é um tanto extensa, mas importante para assinalar como, na


descrição que faz Le Corbusier, nota-se a busca desse caráter de solução unitária e
globalizante sempre enfatizado pela crítica. Também para mostrar como o discurso
tenta equiparar marcos paisagísticos e pontos funcionalmente definidos da cidade. O
edifício-estrada bifurca-se no "coração da cidade ativa", quer dizer, no centro atual
da cidade, marcando os dois grandes eixos circulatórios da cidade: a saída para São
Paulo, já então o principal eixo de circulação de mercadorias e pessoas, e para a
cité d'affaires na posição duplamente estratégica de fechar visualmente a baía (o
que Le Corbusier chama "o golfo") projetando-se para o mar, em direção à Europa, -
assim como a grande plataforma de Buenos Aires ou a futura cité d'affaires de Argel
- e permitindo o enlace com Niterói, cidade satélite e expansão lógica da capital.

128
Ibid., p. 242.
129
Ibid., p. 242-243.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 102

A análise dos projetos urbanos elaborados durante a viagem de 1929 era,


como disse ao início desta parte, fundamental para poder compreender quais as
referências e quais os procedimentos da poética purista que puderam ter servido de
base a uma leitura de Lúcio Costa, tão aparentemente estranha às versões
correntes da historiografia.

Não há, nas formulações de Le Corbusier em Precisions... nada que possa


ser caracterizado de funcionalista. A busca de um equilíbrio “clássico” na relação
entre o gesto construtivo e a paisagem instaurada é evidente. Assim como é
evidente o retorno à imagem recorrente da Acropole. Pouco se diz ( e menos se
intervém) no “mecanismo” das cidades. Os grandes gestos construtivos buscam, de
forma evidente, estabelecer as referencias monumentais que deveriam ficar
eternizadas como expressão da “alma” dessas cidades.

Transcrevo a seguir as conclusões da tese porque não creio que conseguisse


hoje uma descrição mais concisa dos pontos centrais de articulação entre as
motivações e dúvidas iniciais, decorrentes da dissertação, e a investigação realizada
sobre os temas específicos da tese:

Assim, a modo de conclusão, indicaremos alguns pontos em que o trabalho


realizado permitiu responder a algumas das indagações que lhe deram origem
e a algumas das questões e leituras propostas pela literatura crítica em torno
ao tema e ao período tratados.

1) Sobre as relações entre Purismo e cidade.


As relações entre a teoria purista e a elaboração teórica do urbanismo
corbusiano parecem obedecer a uma ordem de preocupações mais complexa
que o simples gesto de projetar à escala urbana a idealidade dos prismas puros
ou o esforço de submeter a cidade existente a um exercício de profilaxia
geométrica, como costuma indicar a literatura mais generalizadora.

Mais que identificar ações de determinação formal de um (Purismo) sobre o


outro (urbanismo), tentamos verificar se, e em que medida, há
correspondências de procedimentos e preocupações em uma e outra esfera de
atividade. Quando afirmava a possibilidade de correspondências entre os "dois
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 103

trabalhos de destinos tão distintos" porque "o objetivo e o subjetivo são os dois
pólos entre os quais surge a obra humana"130, Le Corbusier induzia a erro. O
equívoco não está na afirmação em si, mas na insinuação implícita de que o
terreno do trabalho plástico pertence à esfera do subjetivo e o do urbanismo ao
âmbito da ação objetiva. Isto não é, especialmente no caso do seu urbanismo,
verdadeiro. Admitindo que o discurso de justificação técnica das suas
propostas, ainda que se possa haver demonstrado inconsistente, não era
charlatanismo consciente, é inegável que a organização das sínteses espaciais
no conjunto de problemas formulados é uma opção de ordem estética. Isto é
claro no caso da polêmica com Perret e, acreditamos haver demonstrado, está
também presente na relação com o plano de Agache para o Rio.

A aporia da relação entre ciência e arte na teoria purista tem o seu equivalente
na relação não resolvida, nem prática nem teoricamente, entre técnica e
estética ou, nos termos de Le Corbusier, entre engenheiro e arquiteto. Que em
ambos casos a distinção final se indique na intervenção da "paixão" do criador
é já bastante concludente. No urbanismo de Le Corbusier, como em sua teoria
pictórica ou em sua pintura, o controle técnico das variáveis é fundamental,
mas não suficiente para os objetivos que se atribui à Arte, seja pictórica,
arquitetônica ou urbanística.

A cidade corbusiana assim como sua pintura - ou ao menos à sua exigência


para a arte pictórica - destina-se ao prazer do espírito. Como ele próprio o
expressou em uma imagem tão sugestiva, o mecanismo da cidade é algo que
se sente obrigado a detalhar para garantir-se a credibilidade - própria e alheia -
para poder tratar da alma da cidade. A escolha destes termos não terá sido
gratuita. Le Corbusier havia aprendido, por experiência própria em sua La
Chaux-de-Fonds natal, dedicada à manufatura relojoeira, que o mecanismo é
dependente da técnica e por isso sujeito ao anacronismo e à obsolescência. A
alma - e não o coração - significa o eterno e imutável, e só é concebível e
apreensível pelo espírito. A cidade corbusiana, assim como a arte dos sonhos
puristas, aspira a ser expressão do seu tempo e, ao mesmo tempo, a alcançar

130
Na legenda da reprodução de um de seus quadros na contracapa de La Ville Radieuse, com cuja
citação abrimos o cap. 1. Cfr. MARTINS (1992), p. 36.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 104

a permanência do intemporal. Sua contradição reside, ao fim e ao cabo, em


pretender "funcionar" a serviço da produção e do consumo taylorizados e
manter-se na tradição dos recorrentes exemplos do passado, quer dizer, em
conceber-se como obra de arte, como espaço da ostentação e afirmação do
poder e objeto de fruição contemplativa.

É nessa perspectiva que se pode compreender o paralelismo dos


procedimentos de formalização em uma e outra esferas de atividade, que foi
destacado nos dois primeiros capítulos.

2) Continuidade e ruptura tipológica nas propostas sul-americanas.

A avaliação das propostas sul-americanas enquanto ruptura da doutrina ou dos


supostos formais da Ville Contemporaine exige alguns matizes. O primeiro
deles está em estabelecer distinções entre as próprias propostas de 1929. Não
acreditamos que hajam elementos suficientes para afirmar que o esquema de
Buenos Aires signifique uma ruptura com relação à tipologia da Ville
Contemporaine: mantém o arranha-céu cruciforme como tipo construtivo
privilegiado para o centro de negócios e o immueble à redents para a moradia
dos quadros diretivos. O fato de projetar a cité em direção ao rio,
estabelecendo a distinção entre centro geográfico e centro de poder (político ou
econômico) só poderia ser considerado como ruptura caso se entendesse a
Ville Contemporaine como plano físico e não como modelo espacializado.
Haveria que considerar ainda, se tem razão Hilpert131, que o plano de 1922 está
dirigido a Paris, quer dizer, a uma cidade radioconcêntrica por história e
vocação. A própria formalização pela primeira vez em desenho da Ville Verte
por ocasião das conferencias em Buenos Aires é expressão desse processo de
aplicação de doutrina mais que de ruptura132.

131
"Cada cidade inscreve-se -diz Hilpert-, sem confusão possível, em um lugar e em um instante
preciso. As cidades imaginárias, elas próprias são sempre, mesmo se seus autores o negam, o
produto de condições históricas concretas." Cf. Thilo HILPERT, "Le lieu de la Ville Radieuse", A.M.C.
Architecture Mouvement Continuité, nº 49, 1979, pp. 91-96. Assim como o lugar da Ville Radieuse é
Moscou, o da Ville Contemporaine es Paris. Note-se, por exemplo, que na Oeuvre Complète 1910-
1929 ele apresenta, sem qualquer reparo, alguns desenhos do projeto de 1922 sob o título de Plan
Voisin.
132
Liernur chama a atenção para o fato: "No desenho da sexta conferência introduz-se um tipo de
relação entre circulação e edifício que até esse momento não é possível encontrar na obra de Le
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 105

Os casos de Montevidéu, São Paulo e Rio de Janeiro sim introduzem uma


ruptura com respeito à tipologia dos edifícios e, obviamente, à relação
morfológica edifício-cidade. Tentori analisou os avatares do tipo edilício nesses
três projetos tomando por referência o modelo cruciforme133. Assim, em
Montevidéu o próprio arranha-céu projeta-se em direção ao mar e assume
inteiramente a escala do centro de negócios; em São Paulo, estende-se à
escala de toda a cidade e no Rio volta a uma(*sug: à) escala de edifício mas já
na forma de três cruzes articuladas pelo próprio eixo do edifício-estrada. A
leitura parece pertinente ainda quando haja de matizar que essa "evolução"
não é desprovida de dúvidas e vacilações. Como vimos, Montevidéu tem ao
menos duas variantes e uma delas é linear e não cruciforme. São Paulo pode,
em certo sentido, ser pensada como um arranha-céu cruciforme estendido,
mas isso não descartou a percepção por Le Corbusier da necessidade de
explorar as relações possíveis entre o grande viaduto e os arranha-céus,
cruciformes ou convencionais. Já fora do contexto do cruciforme, mas a
respeito das relações entre as mega-estruturas lineares e os edifícios, é
interessante notar que na reelaboração da proposta para o Rio, que Le
Corbusier esboça em 1936, coexistem o grande edifício-autopista, agora
duplicado em extensão, e inúmeros arranha-céus cartesianos "semeados" por
todo o espaço da cidade.

Um elemento que, igualmente, nos parece inequivocamente demonstrado é


que as propostas sul-americanas continuam sendo cités e não villes. Ainda
considerando que as megaestruturas abrigam atividades de escritórios e
moradias, dissolvendo portanto a tipificação uso-forma suposta na relação
entre cruciformes e redents, tanto por sua localização no terreno da cidade
preexistente como pelo percentual da população que poderia ser alojada, as

Corbusier -salvo talvez no traçado dos acessos à Villa Savoye, da mesma época- que constitui outra
de suas idéias confluentes. Estamos referindo-nos à coexistencia de uma forma orgânica das
circulações com uma forma cartesiana dos edifícios." LIERNUR (1987), p. 45. A observação é
pertinente quanto ao desenho, mas cabe assinalar que essa relação já está detalhadamente descrita
em Urbanisme,
133
Cf. TENTORI (1979), pp. 82-84. Essa análise é retomada em ABALOS & HERREROS (1987), pp.
43-45.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 106

propostas mantêm o caráter essencial de "postos de mando" e sua destinação


"natural" para a elite134.

3) o "lugar" dos "projetos sul-americanos".

Acreditamos que a partir da análise feita pode-se aceitar que a) as propostas


formuladas durante a viagem de 1929, apesar de que se tenham mantido -
exceção feita ao caso de Buenos Aires - a nível de esboços, constituem
propostas urbanas, conseqüentes com o trajeto especulativo da reflexão
urbanística corbusiana e merecedoras, em si mesmas, de análise e reflexão; b)
que a manutenção dessas propostas a nível de esboços verificou-se por um
conjunto de circunstâncias e condicionantes alheias à intenção de Le
Corbusier, insistentemente manifestada aos seus contatos americanos, de
realizar aí um dos seus grands travaux e c) representa ainda uma lacuna, no
corpo da literatura crítica corbusiana, que este trabalho não tem a pretensão de
haver satisfeito por completo, a reconstituição das circunstâncias, motivações e
conseqüências da viagem de 1929.

A incorporação da paisagem como elemento referencial privilegiado no


processo de projetação de Le Corbusier vinha-se intensificando no período
imediatamente anterior à viagem sul-americana, como ele próprio o indica nas
conferências de Buenos Aires. Parece pouco aceitável que a adaptação dos
"princípios fundamentais", elaborados desde 1922, aos sítios das cidades sul-
americanas se devesse exclusiva ou fundamentalmente a impossibilidades
topográficas de aplicação formalmente mais rígida do esquema da Ville
Contemporaine135. As interpretações que põem ênfase na ruptura136 parecem

134
Não é possível portanto aceitar a análise, embora pertinente e bem documentada, de Gerosa
quando afirma: "Assim, precisamente na América Latina, vem sendo produzido um novo tipo urbano,
a cidade concentrada (sem periferia) em união com a paisagem e fortemente caracterizada no plano
formal." Pier Giogio GEROSA, "Elementi architettonici per la tipologia urbana. Le Corbusier 1914-
1957", Lotus International, nº 24, 1979, pp. 120-128. Grifado no original.
135
Nada haveria impedido, por exemplo, sua aplicação ao caso de São Paulo que, embora não fosse
o "terreno ideal" da formulação "de laboratório", não estava assentada sobre uma topografia
especialmente impeditiva.
136
Ainda matizando o substrato ideológico -crise na confiança na máquina como instrumento
realizador da utopia maquinista- da virada formal, Frampton talvez exagera a "alteridad"(*além desta
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 107

tender a considerar mais o resultado formal da Ville Contemporaine como


paradigma da espacialidade urbana purista que os procedimentos e supostos
de elaboração formal (privilégio da frontalidade da visão, valorização simbólica
do ângulo reto, redução dos tipos a formas básicas) que, em termos gerais,
estão mantidos nas propostas sul-americanas137. Nesta perspectiva, inclusive
os famosos "golpes secos", as "primeiras impressões", dos quais, afirma Le
Corbusier, surgiram as propostas para Buenos Aires e Rio, têm sua justificativa
na noção purista da relação entre concepção e composição, que alguns anos
mais tarde Le Corbusier formulará programaticamente em termos de "conceber
primeiro, construir depois"138.

Fica ainda por realizar, e acreditamos haver indicado a pertinência da empresa,


o relato e a análise detalhada, e em conjunto, da viagem de 1929 e das suas
conseqüências no desenvolvimento posterior das formulações urbanísticas de
Le Corbusier, por um lado, e nos grupos emergentes vinculados à arquitetura e
ao urbanismo modernos nos distintos países da América Latina, por outro. No
caso de Buenos Aires, o trabalho de Liernur constitui uma contribuição
importante que terá de ser considerada em qualquer trabalho mais ambicioso.
As relações que pudemos indicar, no caso do Rio, entre os trabalhos de Le
Corbusier e Agache, fazem supor que seria interessante também verificar o
possível "diálogo" com Forestier no caso de Buenos Aires já que, em todo caso
trata-se das relações entre Le Corbusier e a doutrina urbanística da Societé

palavra não ter trad. ao port., acho que assim está estranho pois "alteridad" se refere a LC e não às
propostas, sug: "exagera a idéia do "outro" LC nas propostas") das propostas urbanas de 1929. Ver
Keneth Frampton, "El otro Le Corbusier: la forma primitiva y la ciudad lineal 1929-1952", Arquitectura
(Madri), nº 264-265, janeiro-abril 1987, pp. 30-37. Consideradas desde o ponto de vista da relação
com a paisagem -que não se reduz à dimensão topográfica- elas podem ser consideradas(*rep, sug:
"Elas podem ser consideradas desde o ponto...paisagem-, para usar..., como o encontro"), para usar
a expressão de Abalos e Herreros, o encontro de "algo longamente entrevisto", o que parece
confirmar as inequívocas referências à fascinação experimentada na viagem juvenil frente à síntese
"acústica" entre a Acrópole e sua paisagem.
137
Parece-nos em princípio mais aceitável a posição de Monteys, quando afirma: "É possível pensar
portanto (...) que os projetos "reais", por assim dizer, são em certo modo uma aplicação dos
enunciados teóricos sobre terrenos reais". Cf. Xavier MONTEYS, "La morfología del territorio y la
urbanística de Le Corbusier" em Le Corbusier Maquetas (1987), pp. 28-45. Ver também Id. "Le
Corbusier y la ciudad moderna", Arquitectura (Madri), nº 286-287, outubro 1990, pp. 53-71.
138
Cf. LC, "Concevoir d'abord, construir ensuite", L'Architecture d'Aujord'hui, nº especial, 1933, pp.
29-30.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 108

Française des Urbanistes139. Montevidéu persiste como a etapa menos


conhecida da viagem. Sabemos que seu interlocutor privilegiado foi o arquiteto
Mauricio Cravoto, que publica, em 1930, uma proposta de plano diretor para
Montevidéu, de que existe um exemplar dedicado na biblioteca pessoal de Le
Corbusier. Mas não sabemos muito mais.

O caso do Brasil ou, mais precisamente, das influências que tiveram as


proposições corbusianas desse período, é mais conhecido (ao menos no
Brasil), mas ainda não se sistematizou o alcance dessa influência no tema da
relação entre cidade e paisagem. Já se assinalou a evidente repercussão,
especialmente depois da viagem de 1936, das propostas corbusianas em
alguns marcos da arquitetura brasileira tão notáveis como os Conjuntos da
Gávea e Pedregulho, de Reidy; o próprio Plano diretor do Rio de (1938-1948)
ou o Aterro da Glória, esse pequeno pedaço de Ville Verte em que se
cristalizou a já então larga experiência de Burle Marx, por não falar, também,
de Brasília.

Mas fica ainda por explorar a hipótese de uma influência em termos menos
evidentes - inclusive pela relação temática e de escala - que os destes
exemplos. Casos como o da Casa do Baile de Pampulha, de Niemeyer, em que
a marquise ondula em contraponto com a margem do lago ou de alguns
projetos de menor escala e que, mesmo inscritos no contexto urbano, parecem
dialogar preferentemente com o horizonte140, parecem indicar que um certo
deslocamento do foco de interesse do mundo da técnica para uma
essencialidade da paisagem não é uma "invenção" brasileira mas uma leitura -
atenta por certo, como o reconheceu sempre ele próprio - de um momento
específico das formulações de Le Corbusier. Momento em que nosso autor se
propõe emular o "ordenador" que, na Acrópole, "havia tomado suas raízes

139
Nos projetos para Argel, Jean-Pierre Giordani discutiu as relações entre as propostas urbanísticas
de Le Corbusier e a tradição do urbanismo colonial francês. Cf. Jean-Pierre GIORDANI, Le Corbusier:
les plans pour Alger, Paris, Université de Paris, 1987, 452 p. (inédito)
140
Cf. Sophia TELLES, "Lúcio Costa: Monumentalidade e Intimismo", Novos Estudos CEBRAP, São
Paulo, CEBRAP, nº 25, outubro 1989, pp. 75-94.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 109

plásticas do humilde abrigo do homem" para "discernir o espírito das linhas que
fundiria em um todo a criação natural e a criação humana."141

141
LC, La Maison de l'Homme (1942), p. 175.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 110

PARTE 3.
A ARQUITETURA BRASILEIRA E SEU CONTEXTO

Todo o processo envolvido durante o período do doutoramento teve uma


importância e implicações bastante mais amplas do que simplesmente a
oportunidade de empreender uma determinada investigação temática, com
contribuições originais e o reconhecimento formal da suficiência como investigador.
O ingresso no Programa da FAUUSP, com previsão de estágio sanduiche na Escola
de Arquitetura de Madrid, já continha a expectativa de desenvolver, ao lado das
atividades formais, um programa de viagens para visita e documentação de obras
relevantes do primeiro período da arquitetura moderna européia, além, obviamente
da visita ao máximo possível de obras de Le Corbusier.

O enfoque adotado no desenvolvimento do trabalho de investigação, com


uma ênfase sobre a reflexão estética que até então era inusual no meu trabalho,
supunha também a necessidade de realização de atividades de formação adicionais,
seja na forma de cursos complementares, como os oito cursos ou ciclos de
conferências assistidos, a grande maioria deles relativos à história da arte e à
estética modernas ou contemporâneas. Fui também muito beneficiado pelas
circunstancias do período em que permaneci na Espanha. Ao final de 1990 obtive a
concordância do Departamento, de meu orientador junto à FAUUSP e da FAPESP
para a transformação da bolsa sanduiche em doutorado integral, com o
compromisso de terminá-lo antes dos quatro anos regulamentares.

A possibilidade de permanecer em Madri entre dezembro de 1989 e junho de


1992, isto é, precisamente sobre o período de extrema efervescência cultural que
caracterizou os anos prévios à Exposição de Sevilha, ao Jogos Olímpicos de
Barcelona e à capitalidade cultural de Madri, foi extremamente importante do ponto
de vista do acesso à informação cultural e artística. Na área de artes plásticas este
foi um período privilegiado, que me permitiu usufruir de um grande número de
excelentes exposições internacionais. O trabalho de investigação sobre a estética
purista não ficou, assim, limitado a uma análise textual mas pode ser
complementada com a leitura das obras dos autores puristas e de boa parte de seu
contexto. Construtivismo y Dada, Coleção Beyeler, Berlim Ponto de Encontro no
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 111

Museu Nacional Reina Sofia, Gráfica Centro-Européia dos Anos 30, Cercle e Carré,
Torres Garcia, Vanguardas Italianas do Entre-Guerras no Instituto Valenciano de
Arte Moderna, O Cubismo em Praga, O Pop inglês no Centro Juan March, Lissistsky,
e Arte Conceitual no Centro Cultural Caja de Pensiones, a grande retrospectiva de
Malevich no Stedelij Museum de Amsterdã, a visita ao Museu do Die Brücke em
Berlim, entre inúmeras outras propiciaram um contato direto com as obras do
período que não poderia ter sido suprido de outra forma. O momento do pós 1989 foi
também o período de abertura inicial da União Soviética para a circulação
internacional das obras até então censuradas internamente, como por exemplo a
exposição Konzeptionen, sobre a arquitetura soviética dos anos 20 e 30, em que
pudemos perceber que o próprio rótulo de Construtivismo, até então de validade
genérica não dava conta da multiplicidade de poéticas e movimentos dos
efervescentes anos 20 e 30. A isto se somava a realização anual de ARCO, uma
grande feira de arte contemporânea, com presença das melhores galerias da Europa
e algumas das fortes norte-americanas, além de simpósios e conferências com
personalidades de primeira plana do mundo da arte, como Le Bot, Sazhman,
Castelli, Steimberg, Bonito Oliva e tantos outros.

Ao mesmo tempo, em Madri, funcionam de forma permanente três galerias


dedicadas exclusivamente à arquitetura, a do MOPU, a do Círcullo deBellas Artes e
a do Colégio de Arquitectos.

Porque este nível de detalhes? Para dizer que durante os três anos e meio de
Madrid, tive a possibilidade de ver, ouvir, estudar mais arte e arquitetura que em
toda a minha carreira anterior no Brasil.

Este quadro não é certamente estranho a uma das principais transformações


em meu enfoque da história da arquitetura, operado durante a elaboração da tese e
que ela, certamente, reflete. Como indiquei anteriormente, durante todo o período
de docência e pesquisa correspondente à realização do Mestrado, minhas principais
referências teóricas e minha matriz analítica estavam fortemente marcadas pela
análise ideológica, pese à preocupação com um “retorno à especificidade
disciplinar”. Isto se manifesta na própria conclusão da dissertação quando reafirmo
minha convicção de que a história da arquitetura “é um valioso instrumento auxiliar
na compreensão de um período histórico” de tanta significação na vida do país.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 112

É evidente que esta afirmação é verdadeira, na mesma medida em que pode


ser aplicada a qualquer outra história parcelar. A história da música, ou da técnica,
ou do teatro, etc. trazem, obviamente, contribuições para o conhecimento de uma
determinada sociedade em determinado período. A questão fundamental estava, ao
meu juízo, em perceber que este é um papel auxiliar e não o seu objetivo central.
Dizendo de outra maneira, a experiência do doutoramento, tanto ou mais do que a
tese em si, me indicava uma nova perspectiva de trabalho, mais profícua inclusive
na perspectiva de reafirmar o “caráter ativo da historiografia na geração do campo
cultural da arquitetura”.

Esta transformação no olhar para com os textos e as obras foi o que permitiu
voltar da Espanha com uma proposta de montagem da área de Teoria e História
para o Programa de Mestrado de São Carlos.

O séjour europeu havia reforçado, por contraste, a minha concordância com a


formulação de Pedrosa. O moderno não era apenas a nossa condena, mas a nossa
condição constitutiva. A presença em várias escolas de arquitetura e o contato com
o meio acadêmico europeu haviam possibilitado perceber que a voga do pós-
modernismo ingressava num período de “ressaca” e se ensaiava um forte
movimento de retorno e revisitação da produção canônica do “movimento moderno”
a par de um esforço, italianos à frente, de recuperação de personagens e trajetórias
obscurecidas que permitiam a reavaliação de “outras modernidades”.

Um terceiro aspecto do período vivido na Espanha havia sido igualmente


decisivo. O contato com uma outra tradição acadêmica, não francófila como a nossa,
tinha sido extremamente interessante em termos de adestramento a um outro tipo
de rigor na atividade de pesquisa. A Universidade Espanhola, como é sabido, tem na
tradição alemã a sua mais forte referência, desde, pelo menos, a geração de 98,
com as grandes lideranças intelectuais de Unamuno e Ortega y Gasset. Traduzindo
de forma coloquial, a orientação que eu recebia na ETSAM, poderia ser traduzida
por “Você tem o direito de fazer ensaio, depois de repassar toda a bibliografia sobre
o seu tema”.

Outro componente, particularmente estimulante, desse “choque” com a


cultura acadêmica e arquitetônica espanhola, possivelmente também vinculado ao
influencia alemã, foi perceber que no ambiente intelectual espanhol, ao contrario do
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 113

que sucede no Brasil, é obrigatório, para o especialista em Estética, o domínio da


teoria e do debate sobre Arquitetura. Não é gratuito que os grandes nomes da
Estética espanhola, de D’Ors a Rupert de Ventós, de Trías a Argullol sejam ou
tenham sido catedráticos ... das Escolas de Arquitetura.

Esse quadro, estimulante e desafiador, me convencia, por contraste, como


disse antes de que 1) éramos (somos) no Brasil profundamente ignorantes em
relação à compreensão das poéticas dos distintos autores e movimentos do que
continuamos genericamente chamando de “movimento moderno”; 2) essa ignorância
nos impossibilitava de compreender de forma adequado todo o significado e a
importância da própria arquitetura moderna brasileira no contexto internacional; 3)
nós deveríamos fazer a história dessa produção sob pena de ficarmos destinados a
reclamar do europeicentrismo com que outros a fariam; 4) a compreensão efetiva do
significado da arquitetura moderna brasileira supunha não apenas a sua inserção no
contexto internacional mas também à luz de uma reavaliação da produção de outros
países latino-americanos e, finalmente, 5) a tarefa de revisão crítica e historiográfica
da arquitetura moderna brasileira era, necessariamente, uma tarefa coletiva, que
exigia um esforço concentrado de auto-formação paralelo à investigação e à
docência.

A área de Teoria e História da Arquitetura e do Urbanismo na


pós-graduação de São Carlos
Diante desse conjunto de perspectivas, era possível avaliar que o
Departamento de Arquitetura e Urbanismo da EESC tinha uma capacidade
intelectual instalada considerável para os padrões do ambiente nacional. Pese a um
relativo atraso nos processos de titulação formal, contávamos com um bom núcleo
de docentes com larga experiência anterior de ensino e pesquisa.

Para não citar a todos, podíamos contar, a médio prazo em termos formais
para a pós-graduação, mas de fato desde então - falo de 1992/3 - com docentes
como Nabil Bonduki, já então uma referencia nacional na área de habitação popular;
Carlos Andrade, que vinha de concluir um importante trabalho sobre o sanitarismo
de Saturnino de Brito, Fernanda Fernandes, com uma sólida formação italiana,
Cibele Rizek, na área de sociologia, mas com vasta experiência docente em ensino
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 114

de urbanismo e vários outros colegas em processo de titulação, que viriam a se


incorporar posteriormente.

Neste quadro, avaliáva-mos como fundamental implantar imediatamente a


área, mesmo à espera de que parte do quadro docente concluísse seus
doutoramentos.

Durante o segundo semestre de 1992 elaboramos uma proposta, que permitiu


a abertura de vagas para a área desde o primeiro semestre de 1993.

A proposta da Área, assim aparecia resumida no folder de 1993:

“A sub-área Teoria e História da Arquitetura e do Urbanismo objetiva


estabelecer as bases conceituais para a compreensão das teorias e da prática
projetual da arquitetura e do urbanismo no contexto de seus condicionantes
históricos, isto ;e, sociais, econômicos, tecnológicos e culturais.

Para atingir este objetivo geral serão enfatizados:

1. A interconexão necessária entre as dimensões estético-cultural e técnico-


construtiva da obra de arquitetura em suas distintas escalas de intervenção;

2. A cidade como objeto privilegiado de reflexão e espaço de intervenção


preferencial da arquitetura desde a estruturação do projeto moderno;

3. A compreensão da modernidade em arte e arquitetura como condição básica


para a intervenção crítica no debate da produção teórica e projetual da
contemporaneidade.

A reflexão sobre a produção e o debate contemporâneo a nível internacional


estará articulada à investigação sobre as condições específicas da intervenção
profissional no âmbito nacional e internacional. A sub-área propõe o
desenvolvimento de pesquisas de Mestrado sobre a problemática da
constituição e desenvolvimento da Arquitetura e do Urbanismo Modernos no
Brasil e na América Latina.

Claramente caracterizado um núcleo de interesse de pesquisa que tinha por


objetivo otimizar a capacidade de orientação e evitar a tendência à abertura temática
em leque, tão característica da área, era necessário garantir também o oferecimento
de um “núcleo duro” de disciplinas que estivesse mais voltado a oferecer a
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 115

possibilidade de uma sólida formação de base do que a acompanhar pari-passu os


interesses imediatos de pesquisa dos docentes. A perspectiva era garantir o
oferecimento desse núcleo e, somente a partir daí, credenciar disciplinas mais
“personalizadas”

Em 1993 foram credenciadas seis novas disciplinas, que vieram a incorporar


duas outras anteriormente existentes vinculadas à perspectiva de vir a definir uma
área de Linguagem, o que chegou a ocorrer.

As novas disciplinas eram:

Arte e Industria na Arquitetura Moderna


O Espaço da Cidade I: gênese e formação do urbanismo moderno
O Espaço da Cidade II: as vanguardas e a metrópole
Teoria e História da Arquitetura Moderna no Brasil
Seminários de Arquitetura Contemporânea
Seminários de Estética Contemporânea

A este núcleo inicial, vieram incorporar-se depois:

A Cidade no Século XIX. Representações e projetos


A Leitura do Projeto de Arquitetura
Arquitetura do Ciclo Cafeeiro
Arquitetura no Brasil - Pós 1960
Habitação Social no Brasil: Revisão histórica e perspectivas de intervenção
Teorias e Concepções da Modernidade
Urbanismo e Planejamento Urbano no Brasil - Pós 40

Não é o caso de fazer aqui um histórico do desenvolvimento do Curso, de


resto conhecido na Área. Registro apenas que, fruto de um esforço geral de
restruturação das linhas de pesquisa e um considerável aumento no número de
professores titulados, mas sem dúvida também, pelo novo perfil que a implantação
da Área de Teoria e Historia ajudou a definir, o Programa passou de conceito B- na
avaliação da CAPES relativa ao biênio 92/93 para o conceito A relativo ao Biênio
94/95, agora confirmado com a nota 5 atribuída ao biênio 96/97.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 116

O Grupo de Pesquisa ArqBras: “A Constituição da Arquitetura


Moderna em São Paulo, 1930-70.
Pese ao envolvimento na Coordenação da Pós-Graduação, com a evidente
carga de atividades de gestão decorrentes da implantação da nova área e do
processo de restruturação geral do Programa, encaminhamos ao CNPq, em
fevereiro de 1994, o Projeto Integrado de Pesquisa “Constituição da Arquitetura
Moderna em São Paulo, 1930-70.

O projeto inicial partia da caracterização de que a crítica e a historiografia da


arquitetura moderna no Brasil estiveram marcadas, durante um longo período, por
uma narrativa que reforça e justifica uma visão hegemônica da constituição da
arquitetura moderna no Brasil, “transformando uma determinada vertente dessa
produção na arquitetura moderna brasileira”. Essa caracterização estava detalhada e
justificada no primeiro capítulo de nossa dissertação de Mestrado, e foi publicada,
em forma resumida, no texto “A Constituição da trama narrativa na historiografia da
arquitetura moderna no Brasil”,(Revista Pós, FAUUSP, S. Paulo, 1995.)

Destacava-se ainda que se podia identificar como traços metodológicos


fundamentais dessa vertente historiográfica algumas lacunas: a ausência de esforço
de articulação entre a narrativa arquitetônica e o estudo da produção cultural em
geral e, em especial, das artes plásticas; a ausência de um esforço de articulação
com o desenvolvimento do que chamamos de “cultura técnica”, entendendo nessa
noção o conjunto de alterações no sistema produtivo, direta e indiretamente
relacionados às alterações verificadas tanto nos programas apresentados à
atividade projetual quanto nas possibilidades e questões colocadas pelo
desenvolvimento de produtos e processos técnico-construtivos. Destacava-se ainda,
como uma lacuna crucial, a quase total separação entre arquitetura e urbanismo,
“parecendo ignorar que um dos elementos programáticos fundamentais do
movimento moderno é a tentativa de dissolução dos limites entre edifício, cidade e
paisagem”.

Por outra parte, chamava-se a atenção para um problema metodológico


importante, relativo à caracterização das relações entre as trajetórias da arquitetura
moderna no Brasil e a reflexão teórica e projetual da arquitetura e do urbanismo
modernos no âmbito internacional. Propunha-se então a reflexão e o mapeamento
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 117

das referências e interlocuções plurais entre autores, correntes e tradições


assentadas internacionalmente e a produção nacional, tentando superar assim a
noção simplificadora das influencias, normalmente restritas ao influxo quase
onipresente da teoria e da sintaxe corbusianas e a uma vaga e genérica referência à
“influência wrightiana” na fase inicial de Artigas.

Considerava-se, igualmente, que a superação desses limites e lacunas do


discurso historiográfico dominante passava, além do esforço de conceituação
adequada, pela superação da carência estrutural de uma base documental
sistematizada.

No projeto inicial estava, portanto, caracterizado um duplo objetivo: o de


contribuir para a revisão da historiografia “clássica”, através de uma reflexão
sistemática sobre seus pressupostos e procedimentos metodológicos e, por outro
lado, o de estabelecer, no âmbito específico do recorte proposto, um trabalho de
levantamento e sistematização documental “que permita o aprimoramento da
historiografia da arquitetura moderna no Brasil, superando leituras e interpretações
porventura desprovidas de base documental, bem como sugerindo novos vieses de
análise.”

Dado este objetivo mais geral, a pesquisa supunha também “e de forma


indissociável, um empenho em identificar as condições, práticas e teóricas, as
referências e os protagonistas da constituição da arquitetura moderna em São
Paulo.” Isto é, tratava-se de superar uma visão da arquitetura paulista como
resultado da prática individual de alguns poucos protagonistas e contribuir para
estabelecer as condições específicas de conformação do que poderia caracterizar
como a ambiente cultural e o contexto arquitetônico em S. Paulo, no período
considerado. Para tanto, a pesquisa propunha inicialmente um elenco de arquitetos
cuja trajetória profissional cabia investigar, genericamente divididos em dois
“grupos”: o dos arquitetos fortemente marcados pela formação e/ou interlocução
italiana e os vinculados à chamada escola paulista.

Durante a primeira fase da pesquisa, genericamente entre set. 94 e dez. 95,


o trabalho esteve centrado em três eixos:
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 118

a) definição e socialização entre os membros da equipe do quadro referencial


teórico, através de seminários internos, leituras comentadas e aprofundamento das
definições do projeto de pesquisa;

b) início do levantamento documental, adotando como estratégia inicial o


levantamento sistemático das revistas brasileiras de arquitetura e urbanismo
anteriores a 1950. Esta opção considerava a necessidade de um levantamento
bibliográfico dos periódicos não indexados pela Biblioteca da FAUUSP nos vários
volumes de seu Índex da Arquitetura Brasileira, que cobrem 1950-70, 1971-80,
1981-83, 1984-94, respectivamente.

c) concepção, organização e montagem inicial do Banco de Dados


informatizado e início da sua alimentação através das primeiras fichas de artigos em
periódico, fichas de dados dos periódicos levantados, fichas de autores (resumo de
trajetória profissional e relação de fontes) e fichas de obras. As dificuldades
operacionais mas também as vantagens da concepção e montagem iniciais pela
própria equipe da pesquisa estão circunstanciadamente descritas no Relatório
Parcial de Atividades, apresentado CNPq, em fevereiro de 1996.

A estratégia geral do levantamento supunha um cruzamento entre o


rastreamento (nas revistas) de artigos referentes a temas de interesse geral da
pesquisa e o início de estruturação de pequenas monografias (fichas de autor) que
servissem de instrumento para a caracterização de algumas trajetórias profissionais
significativas. Foi a análise comparativa dessas trajetórias individuais que permitiu a
identificação de alguns momentos e/ou temas significativos de entrecruzamento,
decisivos para a reorientação do projeto e estruturação da Fase 2.

Em particular, um dos resultados dessa fase inicial de levantamento foi a


definição de uma hipótese adicional ao projeto inicial que redundou na definição de
um terceiro “grupo de autores”, genericamente chamado de “cariocas em S. Paulo”.
A hipótese era a de buscar rastrear a presença, no cenário arquitetônico de S.
Paulo, e já nos anos 40, de arquitetos formados na tradição carioca da Escola
Nacional de Belas Artes que se deslocaram profissionalmente para S. Paulo e aí, em
contato e às vezes em associação direta com arquitetos paulistas formados na
tradição da Escola Politécnica, poderiam ter atuado como “vetores diretos” da
interlocução Rio - S. Paulo, de forma paralela ou complementar às modalidades
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 119

tradicionais dessa interlocução (contato com os arquitetos cariocas de primeira linha,


visitas a obras, atuação direta desses profissionais em S. Paulo, etc.). Deste
desdobramento derivou a incorporação, ao elenco de arquitetos estudados, dos
“cariocas” Abelardo Riedy de Souza, Paulo de Camargo e Almeida e Hélio de
Queiroz Duarte, bem como dos “paulistas” Zenon Lotufo e Ernest Robert de
Carvalho Mange.

Como indicávamos no Relatório de Atividades nº 2: “pese a suas diferenças


de trajetória ou intervenção, estes autores parecem constituir um objeto privilegiado
para investigar a interlocução entre a formação carioca oriunda do grupo renovador
da ENBA e aquela dos engenheiros-arquitetos da Escola Politécnica, ajudando a
compreender as condições e características específicas da produção paulista a partir
dos anos 50.”

Podemos sumariar assim os principais resultados e produtos do período


inicial:

a) um primeiro resultado significativo foi a confirmação da hipótese da


importância do tema das interlocuções italianas com a transformação do “subgrupo
italianos” em subprojeto específico, possibilitado pela conclusão do Doutoramento do
Prof. Renato L. Sobral Anelli, que teve aprovado pelo CNPq, com vigência a partir de
mar. 96, o subprojeto “Interlocuções com a arquitetura italiana na constituição da
arquitetura moderna em S. Paulo”

b) concepção e realização da exposição “Os Desenhos da Arquitetura”,


promovido pela Galeria institucional AS Studio, de 15 de set. a 15 de out. 1995, com
desenhos de projetos realizados entre 1927 e 1970, coordenada por mim e contando
também com a curadoria do prof. Renato Anelli e do bolsista recém-doutor Fernando
Vazques Ramos.

c) Organização e participação no VII Seminário de Arquitetura Latino-


americana, promovido pela FAU-USP e pela EESC-USP, em agosto de 1995, com
apresentação de trabalhos por mim e pelo prof. Renato Anelli. Cabe aqui destacar
que a organização do SAL, fortemente assumida pelo Grupo de Pesquisa, tinha
também uma importância estratégica para a inserção do Programa de Mestrado,
especialmente para a área de Teoria e História, em função da própria definição de
seu núcleo de atividaes de pesquisa.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 120

d) consolidação do Relatório de Pesquisa “Abelardo Riedy de Souza:


trajetória profissional”, apresentado pelo bolsista recém-doutor Fernando Vázques
Ramos ao CNPq, como relatório final de bolsa.

e) consolidação da estrutura do Banco de dados Informatizado, que passou a


servir de referência para vários Grupos congêneres, aos quais oferecemos
assessoria para a montagem de bancos similares: Grupo de Pesquisa em
Arquitetura Moderna na Bahia, coordenado pela Profa. Ma. Beatriz A. Galvão, do
MAU-UFBa; Grupo de Pesquisa em Planejamento e Urbanismo no Brasil,
coordenado pela Profa. Ma. Cristina Leme, da FAU-USP; Grupo de Pesquisa em
Habitação Popular no Brasil, coordenado pelos profs. Ma. Ruth Sampaio da FAU-
USP e Nabil Bonduki, do DAU-EESC-USP. Destaque-se, neste sentido a
colaboração que se iniciou com o grupo de pesquisadores do Departamento de
Patrimônio Histórico da PMSP, que resultou no estabelecimento de convênio formal
de cooperação em que um dos aspectos centrais é o apoio técnico e assessoria na
montagem do Banco de Dados daquela instituição.

O projeto de renovação da pesquisa, encaminhado em fev. 96, indicava a


perspectiva de continuidade do trabalho de estruturação do Banco de Dados, e já
previa o desdobramento do escopo inicial de abrangência dos autores estudados.
Com a implantação do subprojeto específico dos “italianos”, o elenco era acrescido
dos nomes de Warchavchick e Rudofsky e eram redimensionadas as presenças de
Calabi e Palanti.

Ao grupo de “paulistas” definidos anteriormente (Artigas, Bratke, Cascaldi,


Milan) se agregavam os paulistas da “arquitetura nova (Sergio Ferro, Rodrigo
Lefébvre, Flávio Império, Mayume Watanabe e Sérgio Souza Lima), além de Kneese
de Melo. Aos “cariocas” Abelardo de Souza, Hélio Duarte e Paulo de Camargo e
Almeida, cujo levantamento havia sido iniciado na fase anterior se agregavam
paulistas ou cariocas que passaram a ocupar uma posição relevante na
caracterização da produção em S. Paulo nos anos 40 e 50: Ernest R. de Carvalho
Mange e Zenon Lotufo.

Na definição dos objetivos específicos do projeto se destacavam:

a) um mapeamento preliminar dos vínculos entre os arquitetos em estudo e


seus colegas de outros Estados, na perspectiva de contribuir para a reconstituição
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 121

do quadro da cultura arquitetônica e urbanística no Brasil a partir dos anos 30 e


compreender os mecanismos e vetores de difusão do ideário moderno a partir dos
principais centros;

b) identificar, ainda que preliminarmente, as visões da cidade e as


concepções urbanísticas dos arquitetos estudados, e seus vínculos com as
proposições então vigentes no âmbito internacional, considerando como opção
metodológica, que essas concepções estão presentes e podem ser identificadas
mesmo em projetos à escala do edifício;

c) investigar as relações entre os arquitetos estudados e aqueles profissionais


mais diretamente envolvidos com a atuação urbanística ou de planejamento urbano
atuantes na administração pública;

d) investigar a interlocução entre os arquitetos em estudo e seus colegas de


outros países da América Latina, em particular mapeando a sua participação nos
Congressos Pan-Americanos de Arquitetos.

e) levantar e analisar a leitura e a repercussão da obra desses arquitetos no


exterior e, em particular, nos países latino-americanos, através do levantamento da
imprensa especializada, dos congressos e da atuação das entidades profissionais.

O Subprojeto “Interlocuções com a arquitetura italiana na constituição da


arquitetura moderna em S. Paulo” teve seu desenvolvimento, no período entre
março de 96 a agosto de 97 aprovado pelo CNPq e renovado pelo período de mar.
98 a fev. 2000.

Nesse período, a pesquisa permitiu a continuidade e o alargamento dos


trabalhos iniciados com a tese de doutorado do Prof. Renato Anelli, “Arquitetura e
Cidade na Obra de Rino Levi”, defendida em out. 95. Alguns artigos publicados e
palestras realizadas por esse pesquisador são referentes ao aprofundamento e
complementação deste trabalho, graças à análise de novos dados obtidos nesta fase
da pesquisa

A análise do amplo material resultante do levantamento bibliográfico em


periódicos nacionais, acrescido pelo material levantado durante o período de
pesquisa na Itália (sanduíche fev/94 a fev/95), que não se restringiam ao objeto do
doutorado, permitiu um conhecimento mais abrangente das bases sobre as quais se
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 122

ergue a obra dos arquitetos estudados. A continuidade do contato com os


professores do Instituto Universitário de Arquitetura de Veneza, em especial com o
Prof. Francesco Tentori, que tem atuado como consultor internacional da pesquisa,
resultou na programação de uma viagem de pesquisa em arquivos e bibliotecas
italianas, realizada entre 15 jan e 14 fev/98 com apoio do CNPq.

O trabalho com o material italiano concentrou-se nos seguintes aspectos:

1 - A evolução do interesse pela arquitetura popular no meio arquitetônico


italiano durante o entre-guerras, revelou que a abordagem neo-realista do pós-
guerra possui raízes profundas no período anterior.

2 - O tratamento especial conferido, por alguns arquitetos italianos, às


heranças artísticas do passado. Os partidos adotados no projeto para exposições
realizadas durante o período fascista são retomados nos principais museus do pós-
guerra, constituindo um campo experimental para a relação da arquitetura
contemporânea com as cidades italianas.

3 - O contexto cultural criado ao redor de Adriano Olivetti permitiu a


experiência de uma arquitetura integrada às artes, design e urbanismo, realizando,
com contornos específicos, uma combinação dos ideais do arquiteto integral italiano
com o projeto gropiusiano da arquitetura que abrange da “colher à cidade”.

4 - Um primeiro histórico da produção na Itália dos arquitetos estudados,


situando-os em meio à arquitetura do período.

A análise do material bibliográfico levantado nos periódicos brasileiros sobre


os arquitetos em questão, enriqueceu alguns pressupostos iniciais da pesquisa e
revelou novos pontos que necessitam de aprofundamento nas próximas etapas. Os
principais são:

1- A produção projetual de Gregori Warchavchik nos anos 50, pouco


conhecida e que revela uma fase totalmente distinta da inicial.

2 - A importância da atuação editorial de Lina Bo Bardi, menos conhecida do


que sua obra projetual, mas de igual importância.

3 - A destacada atuação de Rino Levi na definição dos estatutos profissionais


do arquiteto no Brasil.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 123

4 - A rica participação de artistas plásticos italianos em algumas obras de


Giancarlo Palanti.

Durante esta primeira etapa da pesquisa afloraram diversos temas que


definem uma articulação mais direta com as demais vertentes da pesquisa
desenvolvidas no âmbito do projeto integrado. Como definido no projeto de
renovação os objetivos específicos do subprojeto na próxima etapa da pesquisa
estão diretamente vinculados a esses temas:

1 - Identificar as transformações ocorridas no estatuto de atuação profissional


do arquiteto, inicialmente estruturadas na concepção do arquiteto integral italiano.
Pode ser identificada na trajetória de Rino Levi uma aproximação com a concepção
de trabalho em equipes multidisciplinares. Também na trajetória de Lina Bo Bardi
este assunto deverá ser aprofundado, pois suas exigências de finalização do projeto
no junto ao canteiro somente poderão ser compreendidas se analisadas dentro
desse contexto. Para uma melhor identificação das especificidades italianas,
pretende-se aprofundar o entendimento do modelo alemão de equipes
multidisciplinares, acompanhando seu surgimento na Werkbund e Bauhaus e
acompanhando sua evolução nos Estados Unidos.

2 - Desdobrar os estudos sobre “síntese das artes”, desenvolvidos com Rino


Levi para a atuação de Gregori Warchavchik e Giancarlo Palanti. Se a colaboração
de Warchavchik com os artistas da Semana de 22 na Casa Modernista já foi
rastreada por Ferraz (1966) e Farias (1989) o mesmo não ocorre com sua obra nos
anos 50, menos conhecida. Já a colaboração de Palanti com artistas italianos
(Bramante Buffoni, Amintore Buffoni e Roberto Sambonet) necessita ser explorada,
identificando suas trajetórias e localizando-as em meio às artes plásticas na Itália.

3 - Situar a ação de Lina no meio cultural brasileiro, extrapolando os limites


geográficos iniciais da pesquisa e incorporando a sua atuação na Bahia.

4 - Complementar a evolução do tema da cultura popular na Italia com o


período do segundo pós-guerra, e contextualizá-lo na produção arquitetônica neo-
realista, em especial os conjuntos INA-casa (programa habitacional desenvolvido
pelo Istituto Nazionale di Assicurazione). Estabelecer paralelos com a produção
projetual e editorial de Lina Bo Bardi no Brasil. Delimitar a postura da arquiteta em
meio ao contexto brasileiro.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 124

5 - Traçar paralelos entre as concepções museográficas de Albini, Rogers e


Scarpa, na Itália, e as desenvolvidas por Lina Bo Bardi nos seus museus brasileiros.
Aprofundar a conceituação de tempo/história/memória envolvida nesse tema.
Identificar o papel dessa atuação frente ao restante da atuação cultural de Lina Bo
Bardi.

Além do desenvolvimento específico do subprojeto, o trabalho do Grupo de


Pesquisa, neste eixo do projeto geral, já apresentou como resultados a conclusão da
Dissertação “Lina Bo Bardi: arquiteto”, da Profa. Maria de Fátima de M. B. Campello,
da U. F. Alagoas, orientada por mim e defendida em maio de 97. Estão em fase de
conclusão mais duas dissertações de mestrado vinculadas ao tema: “Painéis e
Murais na obra de Rino Levi, da mestranda Ana Lúcia Machado, orientada pelo Prof.
Renato Anelli e “Paisagem e Jardim na obra de Rino Levi”, da Profa. Ma. Beatriz
Camargo Capello, da U. F. Uberlândia, orientada por mim, ambas com defesa
prevista até dezembro de 98.

O desenvolvimento da pesquisa relativa à trajetória profissional de Abelardo


de Souza, Paulo de Camargo e Almeida e Hélio de Queiroz Duarte teve
desdobramentos diferenciados, em função dos elementos e questões evidenciados
pela pesquisa.

A trajetória profissional de Abelardo de Souza teve, como indicado acima,


uma primeira sistematização parcial no Relatório final de Atividades do recém-doutor
Fernando Vázquez. Neste se indicava especialmente a contribuição de Souza à
configuração do ambiente arquitetônico paulista desde a sua atividade em
associação com Hélio Duarte e Zenon Lotufo, entre 1946 e 48, resultante em um
número expressivo de projetos de programas diversificados (residências, edifícios,
clubes, entidades profissionais, escolas, igrejas, etc.) e com abrangência geográfica
por todo o Estado de S. Paulo. O arquivo de projetos, doado no período da pesquisa
ao Centro de Documentação da Biblioteca da FAU-USP não está ainda catalogado
mas já permite vislumbrar uma produção copiosa e significativa (cerca de 300
projetos).

Após a ruptura da associação com Duarte e Zenon, a atividade projetual de


Souza passa a estar caracterizada por uma colaboração relativamente assídua com
Miranda Martinelli nos projetos específicos de paisagismo e pela realização de
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 125

alguns edifícios residenciais ou de uso misto bastante representativos no panorama


paulistano da virada dos 40 para os 50, como o Edifício Três Marias (1953*) ou o
Conjunto Residencial do Sumaré (1951*). Sua contribuição para a temática dos
edifícios-galeria, especialmente através do Conjunto Nações Unidas (1954*) está
sendo desenvolvida, sob minha orientação, na dissertação do mestrando Ricardo
Oliveros, com conclusão prevista para março de 99.

Um trabalho extremamente interessante e que resultou numa dissertação de


ótima qualidade foi o desenvolvido sobre a crítica de arquitetura, pela mestranda
Clara Luiza Miranda na dissertação “A crítica nas revistas brasileiras de arquitetura -
anos 50”,desenvolvida sob minha orientação e defendida em agosto de 1998.

A trajetória profissional do engenheiro-arquiteto Paulo de Camargo e Almeida


revelou desde o início particularidades que justificaram o seu desdobramento na
elaboração de um projeto específico para uma dissertação de Mestrado,
desenvolvido desde março de 1996 pela arquiteta Ana Lúcia Cerávolo, bolsista de IC
na fase 1 do projeto, e que vem sendo apoiado por Bolsa de Mestrado da FAPESP
desde maio de 1996. A dissertação está fase de conclusão e tem sua defesa
prevista para março de 1999.

Paulo de Camargo e Almeida, hoje quase completamente ignorado pela


historiografia, teve uma participação ativa e constante no panorama arquitetônico
brasileiro, desde sua formação em 1930 até sua morte em 1973. Atuou, no Rio de
Janeiro e em São Paulo, como docente, representante de várias entidades
profissionais, sendo presidente do IAB durante dois períodos consecutivos (1942-6);
teve presença destacada em vários congressos nacionais e internacionais; foi
premiado em diversos concursos; além de ter desenvolvido pesquisas no âmbito
específico da industrialização das construções.

No desenvolvimento do trabalho, vem sendo explorados, como eixos centrais


de investigação, quatro núcleos temáticos, que se destacaram no transcorrer da
pesquisa e constituem elementos de interseção com os núcleos temáticos da
pesquisa geral: a) sua preocupação permanente com a temática da industrialização
das construções, central nas formulações teóricas e projetuais da arquitetura
paulista dos anos 60 e 70; b) sua concepção de arquitetura como atividade integral,
na qual são indissociáveis as dimensões de ensino e pesquisa, c) sua atuação
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 126

permanente na esfera política e na organização profissional e na cooperação com


arquitetos e organismos internacionais; d)sua contribuição específica enquanto
docente e pesquisador. O trabalho está apoiado ainda num esforço sistemático de
localização e documentação de sua produção projetual no Rio e em São Paulo.

Do núcleo inicial dos “cariocas” a trajetória profissional de Hélio Duarte foi a


que terminou por sugerir os desdobramentos de maiores implicações no
desenvolvimento da pesquisa.

Após a sua formatura na ENBA em 1931, e de uma breve passagem por


Recife, Duarte se estabelece profissionalmente em Salvador onde, além de uma
significativa produção de arquitetura residencial verticalizada (estudada pelo Grupo
de Pesquisa da FAU-UFBa), tem contato com o pensador e educador Anísio
Teixeira, então Secretário de Educação da Bahia, e participa da implantação do
projeto de escolas-parque. Esta experiência inicial definiu um interesse permanente
pela temática da arquitetura para a educação que marcará daí em diante toda a
trajetória profissional desse arquiteto. A partir de sua transferência para S. Paulo, em
meados dos anos 40 essa temática terá a possibilidade de se manifestar de forma
mais ampla, incluindo a sua participação (decisiva segundo nossa hipótese de
trabalho) na experiência do Convênio Escolar entre 1949 e 1953, a realização, em
conjunto com Mange, Gonçalves e outros na implantação dos primeiros edifícios
modernos voltados para o ensino profissionalizante no bojo da implantação em todo
o Estado das Escolas do sistema SENAI - SENAC e, posteriormente a sua ativa
participação no campo do planejamento de Campi Universitários, com destaque para
o plano elaborado para a U. Federal de Sta. Catarina (1956) e para a sua
participação como diretor técnico do Plano de Construção da Cidade Universitária de
S. Paulo (CUASO) entre 1957 e 1960.

Os primeiros levantamentos indicaram aí um filão extremamente promissor e


levaram à organização de um núcleo temático em “Arquitetura e Educação”, com
desdobramentos no Convênio Escolar (1949-54), na arquitetura para educação
profissionalizante, especialmente centrada nos projetos para o sistema SENAI
(1952-60) e na análise de alguns projetos para campi universitários, com destaque
para as atuações de Duarte, já referida, e para a experiência de Paulo de Camargo e
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 127

Almeida como primeiro Diretor Executivo do FUNDUSP, órgão executivo que


sucedeu a Comissão do Plano da CUASO.

Nesta fase do trabalho foi iniciado um levantamento preliminar dos projetos


para o SENAI-SENAC, especialmente os realizados por Mange e Duarte e
Gonçalves. Neste período, o trabalho sistemático de levantamento esteve entretanto
centrado na produção do Convênio Escolar junto à PMSP, identificando e
processando, inicialmente o material de referência bibliográfica existente. Um
primeiro aspecto que se destacou foi o da forte expressão numérica do trabalho
realizado bem como a diversidade de obras projetadas e construídas.

Como ficou registrado acima, o trabalho de “varredura” sistemática da


bibliografia e dos periódicos esteve concentrada no período 1945-55, isto é, para um
período imediatamente anterior à emergência da chamada “escola paulista”. Isto não
significa entretanto que o desenvolvimento deste item tenha sido descurado.

Essa concentração na caracterização do contexto da cultura arquitetônica


paulista nesse período estava desde o início caracterizada (nos projetos das fases 1
e 2) como indispensável para a própria compreensão das condições de constituição
do “projeto paulista”. Um levantamento em profundidade de alguns aspectos e/ou
momentos dessa produção já vem sendo realizado, especialmente vinculado ao
desenvolvimento de algumas dissertações de mestrado, sob orientação do
coordenador da pesquisa.

A obra de Artigas nos primeiros anos 50 é objeto de levantamento e análise


na dissertação de mestrado de Antonio Castelnou, centrada nos projetos realizados
por Artigas para Londrina (1949 a 1952), analisados na perspectiva de avaliação da
sua repercussão no ambiente urbano e na configuração de um “contexto
arquitetônico moderno” naquela cidade. Este momento é particularmente
interessante para o consolidação de um enfoque sobre o “subgrupo paulista” na
medida em que nele se entrecruzam três recortes temáticos de interesse da
pesquisa com um todo: a “dimensão urbanística” do projeto de edifícios; o estudo
dos mecanismos de “difusão” do ideário e da linguagem moderna para fora dos
grandes centros e, finalmente, a repercussão na produção brasileira do debate sobre
a monumentalidade e o tema do “core”, marcados internacionalmente pelo
redirecionamento do debate urbanístico nos CIAM e especialmente pelas posições
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 128

de Sert. Esta dissertação está com o memorial de qualificação já consolidado e tem


sua conclusão e defesa prevista até o final de 98.

A pesquisa para a dissertação de Paulo Castral está centrada no


levantamento e análise da arquitetura residencial de Paulo Mendes da Rocha
durante os anos 60 e 70. Busca-se identificar os procedimentos projetuais básicos
deste arquiteto estabelecendo relações com os elementos gerais que configurariam
uma sintaxe da escola paulista (o tratamento do concreto aparente, a opção
estrutural pela grande laje, as estratégias de implantação, etc.) e, por outro lado, a
sua inserção no contexto cultural mais amplo, especialmente no que respeita à
produção concretista nas artes plásticas. Este trabalho está em fase de elaboração
do memorial de qualificação e tem sua defesa prevista para ago. 98.

A mestranda Elaine Rodrigues de Oliveira, orientada pelo Prof. Carlos


Andrade, vem desenvolvendo pesquisa sobre a obra do arquiteto paulista Osvaldo
Corrêa Gonçalves, apoiada por Bolsa de Mestrado do CNPq (cota do Programa).
Ainda que essencialmente monográfica, a pesquisa apresenta várias interseções
com o projeto geral: a participação de Gonçalves como arquiteto integrado à equipe
do Convênio Escolar sob a liderança de Duarte; sua participação na elaboração de
projetos para o sistema SENAI-SENAC, no contexto da colaboração com Duarte e
Mange, especialmente em obras para a Baixada Santista e para o interior de S.
Paulo; sua participação no processo de organização profissional da categoria, assim
como sua atuação como divulgador e propagandista dos postulados modernos,
especialmente no âmbito urbanístico.

A mestranda Ana Paula Koury vem desenvolvendo pesquisa para a


elaboração da dissertação sobre o “Grupo Arquitetura Nova”, apoiada com Bolsa de
Mestrado da FAPESP. Na sua formatação definitiva, optou-se por centrar o foco na
produção teórica e projetual de Sérgio Ferro, Rodrigo Lefébvre e Flávio Império,
considerados como núcleo do “grupo” que se caracterizou, na segunda metade dos
anos 60, por uma postura de recuperação e revisão crítica do ideário e das
proposições projetuais da escola paulista “clássica”.

Consideramos que a coordenação e condução de uma pesquisa com o


escopo e a abrangência desta deve buscar de forma permanente um equilíbrio entre
o esforço de atingir os objetivos específicos propostos em cada uma de suas fases e
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 129

a percepção dos novos focos temáticos que o seu próprio desenvolvimento sugere
ou estimula. Consideramos ainda que a eventual redefinição de enfoques, a
capacidade de perceber e explorar

Durante a segunda fase da pesquisa esta foi uma questão metodológica


central: a da compatibilização entre um procedimento inicial de levantamento e
estruturação das informações em formato monográfico (essencialmente a
reconstituição das trajetórias profissionais) e a estruturação, no decorrer do projeto e
em função dos pontos de entrecruzamento das trajetórias, de núcleos temáticos
mais inclusivos (exigindo a ampliação dos arquitetos estudados) e definidos
conceitualmente de forma a atender aos objetivos centrais do projeto. Em outras
palavras trata-se de buscar formar de organização das informações e estratégias de
conceituação e análise que permitam atingir partir de um elenco de trajetórias
individuais para a constituição de um quadro compreensivo dos diferentes aspectos
e dos momentos privilegiados na caracterização do “contexto cultural e
arquitetônico” de S. Paulo no período em que a pesquisa se concentra.

A avaliação do desenvolvimento dos vários segmentos da pesquisa, aí


incluídos os trabalhos mais específicos desenvolvidos pelos mestrandos nos levou a
propor, como base para a fase 3 da pesquisa, os seguintes núcleos temáticos:

1) Quadro geral. Caracterização da situação urbana em S. Paulo na fase de


metropolização acelerada (1940-60). Trata-se da estruturação de dados estatísticos
e cartográficos que permitam avaliar as tendências gerais de desenvolvimento da
metrópole paulista e estabelecer um pano de fundo sócio-econômico-espacial para a
atuação dos arquitetos no período.

2) IV Centenário. Análise específica do período entre a realização da primeira


fase do Plano Prestes Maia (1945) e as comemorações do IV Centenário de S.
Paulo (1954) como um momento peculiar das relações entre arquitetura, urbanismo
e vida cidadã. Trata-se de perceber, para além do caráter de efeméride, um
momento privilegiado em que o conjunto da opinião pública coloca os temas da
arquitetura e do urbanismo como temas centrais da constituição da cidadania.
Constitui, portanto, um momento privilegiado para a comparação entre o ideário da
categoria profissional e a visão externa dos problemas da cidade, da arquitetura e do
urbanismo.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 130

3) Novos programas e novas tipologias. Identificação e conceituação de


novos programas e novas tipologias que configuram alterações estruturais na cartela
de demandas apresentadas à categoria profissional (edifícios de uso misto,
conjuntos, edifícios galerias, novas escalas de redes de equipamentos urbanos,
nova escala dos programas de instalações fabris, etc.). Como hipótese básica
pretende-se identificar nesses programas e tipologias as condições concretas para
um novo momento da formulação , prática e teórica, das relações entre arquitetura e
cidade.

4) Arquitetura e Educação. Aprofundamento da análise e complementação do


levantamento da temática Arquitetura e Educação. Trata-se, como indicado
anteriormente, de completar a análise das atividades do Convênio Escolar, avançar
no levantamento e caracterização dos projetos para instalações de educação
profissionalizante e nos planos e projetos para a educação universitária. Este núcleo
temático implica, naturalmente o mapeamento e a caracterização das doutrinas
pedagógicas em pauta no período e o rastreamento de suas filiações filosóficas.

5) Arquitetura e produção. Identificação e mapeamento, nos diversos


momentos e protagonistas das posições e propostas em relação à economia da
produção civil, em particular destacando as concepções arquitetônicas presentes no
debate e nas propostas de industrialização da construção civil bem como nas suas
implicações quanto à estruturação do canteiro e à divisão do trabalho na arquitetura.

5) Arquitetura e produção cultural. Trata-se de definir o contexto cultural


paulista no período e, em particular as relações entre a arquitetura e as artes
plásticas naquilo que se convencionou chamar de “processo de internacionalização
da informação artística”, caracterizado pela criação dos museus, pela realização das
primeiras Bienais de Arte e Exposições Internacionais de Arquitetura.

Naturalmente estes núcleos temáticos não são estanques. Antes constituem


pólos de organização do trabalho, de conceituação e de levantamento e análise de
dados e projetos, que ajudam a balizar o funcionamento geral da equipe e a
estabelecer linhas básicas de articulação dos projetos individuais.

Esta estruturação da pesquisa respondeu, na atividade do Grupo e


notadamente no ano de 1997, à necessidade de otimização da articulação entre os
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 131

diferentes projetos individuais, do esforço de orientação e do aprimoramento dos


processos de levantamento e análise da documentação..

Uma primeira análise parcial do material levantado e tentativa de


caracterização do significado da ação do Convênio Escolar no contexto paulistano
do período foi sistematizada no texto “Arquitetura e Metrópole: elementos para a
caracterização do Contexto Arquitetônico em S. Paulo, anos 40 e 50”, apresentado
ao II Seminário DOCOMOMO Brasil, em Salvador, em set/97.

Neste trabalho se destacam alguns aspectos de análise preliminar que


constituem diretrizes para o desenvolvimento da pesquisa na próxima fase:

a) não se trata da análise de projetos de edificação isolada, sendo necessário


avaliá-los na perspectiva de um processo de estruturação uma rede de
equipamentos públicos em um momento muito particular, isto é de um conjunto de
edifícios pensados como parte de uma estratégia de implantação de serviços na
malha urbana de uma cidade em intenso processo de expansão horizontal;

b) esse episódio representa a primeira intervenção estatal paulista em grande


escala adotando a expressão de uma linguagem inequivocamente moderna em
arquitetura;

c) o caráter multi-programático dos projetos (escolas, bibliotecas, parques


infantis, teatros) reforçando a noção de rede mas também implementando a
concepção da escola como “condensador social” que integra o treinamento escolar
da criança a um processo mais amplo de organização comunitária;

d) a contribuição da experiência do Convênio Escolar à consolidação da


temática da arquitetura escolar enquanto um elemento forte na constituição do
ideário da arquitetura moderna em S. Paulo;

e) desdobramento institucional da estrutura profissional do Convênio Escolar


que se desdobra a partir de final dos 50, dando origem ao Depratemento de Projetos
(EDIF) da Secretaria de Obras da PMSP e ao FECE (Fundo Estadual de
Construções Escolares) no âmbito estadual. Note-se que é no trabalho do FECE que
surgirão os primeiros colégios brutalistas de Artigas, Paulo Mendes outros arquitetos
da chamada escola paulista.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 132

Na seqüência a esta primeira análise, foi realizada a identificação, fichamento


e reprodução do material iconográfico primário. No trabalho de levantamento junto
ao arquivo do Departamento de Projetos e Edificações da Secretaria de Obras da
PMSP (EDIF), foram identificados e localizados os originais dos projetos para 10
bibliotecas infantis, 21 escolas de educação infantil, 2 escolas de aplicação ao ar
livre, 15 Ginásios Estaduais, 65 Grupos Escolares, 01 teatro mirim e 6 Teatros
Populares Municipais (dos quais três estão construídos). (Ver listagem total, por
ordem cronológica de projeto no Anexo 1.3)

Foi realizada a catalogação de todos os projetos, reprodução heliográfica das


pranchas básicas de cada projeto (2 a 4 pranchas por projeto) e está em andamento
o tratamento digitalizado desse material. Num primeiro momento foi realizada a
transcrição em AutoCAD 14 de cerca de trinta projetos representativos da
diversidade de programas, soluções de implantação e autoria.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 133

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ed. Marsilio.

Periódicos especializados brasileiros

1. AB: ARQUITETURA BRASILEIRA.


Rio de Janeiro, RJ, 1972.
Periódico anual.
Continuação da revista: ABA. Arquitetura Brasileira do Ano
Acervos:
FAU-USP: 1972/87 (7-18): não corrente.

2. ABA. ARQUITETURA BRASILEIRA DO ANO


Rio de Janeiro, J, 1967-1971.
Periódico irregular: vol. 1 (1967/68)-vol. 6 (1971).
Subtítulo em inglês : Brazilian Architecture Annual. Suplementado por :
CAB.Cadernos de Arquitetura Brasileira.
Continua com o título: AB. Arquitetura Brasileira,1972-, a partir do sétimo volume.
Acervos:
EESC-USP: 1967/70 (1-2): não corrente.
FAU: 1967/71 (1): não corrente.

3. AC. ARQUITETURA E CONSTRUÇÃO


São Paulo, SP, 1966-.
Acervos:
EESC: 1966/67 1(0-5): não corrente.
FAU:1966/67 1(0-5): não corrente.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 145

4. ACRÓPOLE : ARQUITETURA, URBANISMO, DECORAÇÃO


São Paulo, SP, 1938-1971.
Periódico mensal
Acervos:
EESC-USP: 1944/71 (62,78,122,126-128,132-133,137,140-146,154-155,157-
159,162,176-282,284-327,330-337,339-349,355,357-367, 369-370,372-373,377-
378,380-382,384-385,390-391)
FAU-USP: 1938/71 (1,3-4,8-9,12-28,31-34,36-391)
EPEC-USP: 1938/71 (8-9,17,22-23,27-28,31-34,36-58,60-73,75-80,83,85-88,90-
91,93,95,100,102,104-107,111-112,114,118,120-124,126-128,131,133-140,143-
146,151,159-160,164,166,169-170,176-182,190,192-194,196,199-230,232-
255,258-297,299-306,315,318,321,343,345,348,351,353-365,367,374,377,379-
383,386-388,390-391)

5. AMÉRICA MAGAZINE
São Paulo,
O no.2, do ano de 1962, foi dedicado à Cidade Universitária “Armando Salles
Oliveira”
não consta no Dedalus
Fonte: Bruand.

6. ANAIS DO CONSELHO FEDERAL DE ENGENHARIA E ARQUITETURA


Rio de Janeiro, RJ, Conselho Federal de Engenharia e Arquitetura, do Ministério
do Trabalho, Indústria e Comércio do Brasil, 1943-.
Periódico anual.
Acervos:
EPBC-USP: 1943/44 (1-2)
FAU-USP: 1943/44 (1-2)

7. ANTEPROJETO
Rio de Janeiro, RJ, Faculdade Nacional de Arquitetura, Universidade do Brasil,
1947-1959.
Acervos:
Não há coleção deste periódico em São Paulo.
Coleção na FAU-UFRJ e na Biblioteca Nacional, RJ

8. ANUÁRIO DA FACULDADE NACIONAL DE ARQUITETURA, UNIVERSIDADE


DO BRASIL
Rio de Janeiro, RJ, 1958-.
Periódico anual.
Acervos:
FAU-USP: 1958/64 (1-4): não corrente.

9. ARCHITECTURA NO BRASIL
Rio de Janeiro, RJ, 1921-6
Publicação mensal.
Acervos:
Biblioteca Nacional
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 146

10.ARQUITETO
São Paulo, SP, 1966.
Publicação suspensa em 1966.
Acervos:
FAU-USP: 1966 1(1-10): não corrente.

11.ARQUITETO
São Paulo, SP, Sindicato dos Arquitetos do Estado de São Paulo, 1972-.
Publicação irregular.
Acervos:
FAU-USP: 1972/92 (1-63,65-67,72,74-86,89-93,98-101): não corrente.

12.ARQUITETURA &G
Belo Horizonte, MG, Escola de Arquitetura, da Universidade de Minas Gerais, s/d.
Acervos:
Não há coleção deste periódico em São Paulo.

13.ARQUITETURA E CONSTRUÇÕES
São Paulo, SP, Instituto Paulista de Arquitetos, 1929-32.
Publicação irregular.
Acervos:
EPBC-USP: 1929/31 1; 2(13,18-19,21,24); 3(1,4-6): não corrente.
FAU-USP: 1929/32 (1,3-8,10,12-13,15-17,21-22,24); N.SER. 3-4: não corrente.

14.ARQUITETURA E DECORAÇÃO
São Paulo, SP, 1953-8.
Publicação bimestral.
Acervos:
EESC-USP: 1953/57 (1-4,6-13,15-18,20-24,26): não corrente.
FAU-USP: 1953/58 (1-27): não corrente.

15.ARQUITETURA E ENGENHARIA
Belo Horizonte, MG, Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Minas Gerais, 1946-.
Publicação irregular.
Acervos:
EESC-USP: 1951/63 (16,20-22,24-41,43-55,58-60,64,66): não corrente.
EPBC-USP: 1949/65 (11,14,24,27,29-35,37,39,41-49,51-60,64-66,68): não
corrente.
FAU-USP: 1950/65 (14-67): não corrente.

16.ARQUITETURA E URBANISMO - PINI


São Paulo, SP, Pini, jan/85-.
Acervos:
O Grupo de Pesquisa em Arquitetura e Urbanismo no Brasil possui a coleção
completa deste periódico.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 147

17.ARQUITETURA E URBANISMO
Rio de Janeiro, RJ, Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Rio de Janeiro, 1936-.
Publicação bimestral.
Acervos:
EESC-USP: 1939/40 4(6); 5(1-2,4): não corrente.
EPBC-USP: 1936/40 1(1-4); 2(2-6); 3; 4(1-3,5-6); 5: não corrente.
FAU-USP: 1936/41 1(1,4); 2-6: não corrente.

18.ARQUITETURA MACKENZIE
São Paulo, SP, Diretório Acadêmico da Faculdade de Arquitetura Mackenzie,
1958-.
Acervos:
EESC-USP: 1958(1): não corrente.

19.ARQUITETURA
Rio de Janeiro, RJ, Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Rio de Janeiro, 1961-.
Periódico mensal.
No período de 1961-2, o título do periódico era IAB-Guanabara.
Acervos:
EESC-USP: 1961/68 (1,3-37,39-42,44-78): não corrente.
EPBC-USP: 1963/68 (8-21,26-32,34-35,37-54,57-78): não corrente.
FAU-USP: 1961/69 (1-78): não corrente.

20.ARQUITETURA. CADERNO ESPECIAL


Rio de Janeiro, RJ, Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB), Rio de Janeiro, 1962-
69.
Publicação Mensal.
Acervos:
FAU-USP: 1969(1): não corrente.

21.ARTES PLÁSTICAS
São Paulo, SP, Órgão dos Artistas Plásticos de São Paulo, 1948-.
Publicação irregular.
Acervos:
FAU-USP: 1948/49 (1-4): não corrente.

22.BEM-ESTAR. URBANISMO E HABITAÇÃO


São Paulo, SP, Gráfica São José
Publicação bimestral
Acervos:
EESC-USP
FAU-USP

23.BOLETIM DO CONSELHO FEDERAL DE ENGENHARIA E ARQUITETURA


Rio de Janeiro, RJ, Conselho Federal de Engenharia e Arquitetura, 1960-.
Publicação irregular.
Acervos:
EESC-USP: 1960/66 (1-4) : não corrente.
FAU-USP: 1960 1(1) : não corrente.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 148

24.BOLETIM DO INSTITUTO DE ENGENHARIA


São Paulo, SP, Instituto de Engenharia, 1917-.
Publicação irregular.
Acervos:
IPT: faltam apenas 3 números (nos. 10, 13, 23).
EPBC-USP: estes 3 números foram encontrados nesta biblioteca.

25.BOLETIM.
Rio de Janeiro, RJ, Faculdade Nacional de Arquitetura. Universidade Do Brasil,
1959-.
Publicação irregular.
Acervos:
FAU-USP: 1961/65 (20-21,23-24,26-33,66-77) : não corrente.

26.BRASIL ARQUITETURA CONTEMPORÂNEA


Rio de Janeiro, RJ, Edições Contemporânea, 1953-.
Publicação irregular.
Acervos:
EESC-USP: 1953/57 (1-7,10-11): não corrente.
FAU-USP: 1953/58 (1-12) : não corrente.

27.CADERNOS DE ESTUDOS
Porto Alegre, RS, Centro de Estudos Universitários de Arquitetura, 1958-.
Publicação irregular.
Acervos:
FAU-USP: 1958/63 (1-19) : não corrente.

28.CASA E JARDIM
São Paulo, SP, Efece, 1953-.
Publicação mensal
Acervos:
EESC-USP: 1953/96 (1-14,16,18,20,23-85,87-90,92-94,96-215,217-226,228-
231,233-234,236,238-239,242-248, 250, 253, 256, 259, 262, 269, 285, 293,297-
299,301-404,407-468,472,475,479-501)
FAU-USP: 1953/96 (1-214,216-403,405-497)

29.CASA: REVISTA DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E ARTE DECORATIVA


Rio de Janeiro, RJ, O Construtor S.A., 1923-.
Publicação mensal.

30.CENTRO REGIONAL DE CONSTRUCCIONES ESCOLARES PARA AMERICA


LATINA (CONESCAL)
México, MX, CONESCAL, 1965-.
Publicação trimestral.
Acervos:
EESC -USP: 1965/74 (1,24,31-32,40) : não corrente.
FAU-USP: 1965/83 (1-56,58-63) : não corrente.
EPEC-USP: 1965/76 (1-3,9,19-30,32,35-40) : não corrente.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 149

31.CHÃO: REVISTA DE ARQUITETURA


Rio de Janeiro, RJ, Tridimensional, 1978-1979.
Publicação irregular
Acervos:
FAU-USP: 1978/79 (1-7) : não corrente.

32.CJ ARQUITETURA: REVISTA DE ARQUITETURA, PLANEJAMENTO E


CONSTRUÇÃO
Rio de Janeiro, RJ, EFECE, 1973-.
Publicação irregular.
O titulo varia: Casa e Jardim - Arquitetura.
Acervos:
EESC-USP: 1973/77 (0,2-16) : não corrente.
FAU-USP: 1973/78 (0-20) : não corrente.
EPEC-USP: 1973/77 1-4(1-16) : não corrente.

33.CTC REV DE ENGENHARIA


Rio de Janeiro, RJ, 1931-63.
Continuação da Revista Didática da Escola Politécnica (1901-31)
Acervos:
FAU: 1944-60: não corrente.
EPBC: 1931-63: não corrente.

34.DEPOIMENTOS. CENTRO DE ESTUDOS BRASILEIROS


São Paulo, SP, Grêmio da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, da
Universidade de São Paulo (GFAU), 1960-.
Publicação anual.
Acervos:
FAU-USP: 1960/66 (1-2) : não corrente.

35.DIGESTO ECONÔMICO
A revista Digesto Econômico começou em dezembro de 1944. Ela teve uma
circulação mensal ate 1950, período coberto pela pesquisa.
Acervos:
FEA-USP: todos os números desta revista (1944-1950) podem ser encontrados
nesta biblioteca.

36.EPUC. ENGENHARIA-ARQUITETURA
Rio de Janeiro, RJ, Diretório Acadêmico, da Escola Politécnica, da Pontifícia
Universidade Católica, 1955-1960.
Acervos:
EESC-USP: 1955/59 (1-2,4-13) : não corrente.
EPBC-USP: 1955/60 (1-13) : não corrente.
FAU-USP: 1955/59 (1-10,12) : não corrente.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 150

37.ESTRUTURA. REVISTA TÉCNICA DAS CONSTRUÇÕES, ENGENHARIA E


ARQUITETURA
Rio de Janeiro, RJ, Editora Estrutura Ltda., 1957-.
Acervos:
EESC-USP: 1957/82 (1-12,14-26,28,30-56,58-64,67-68,72-73,77- 78,86,90-92,94-
95,101) : não corrente.
FAU-USP: 1957/69 (1-66) : não corrente.
EPEC-USP: 1957/85 (1-78,81-101,103,110-111) : não corrente.

38.FORMA. ARQUITETURA, ARTES PLÁSTICAS, TEATRO


Rio de Janeiro, RJ, 1954-.
Acervos:
FAU-USP: 1954/56 (1-6) : não corrente.

39.FORMA. REVISTA DE ARQUITETURA,ENGENHARIA E ARTES PLÁSTICAS


Rio de Janeiro, RJ, 1930-.
Publicação mensal.
Acervos:
FAU-USP: 1930/31 1-8: não corrente.

40.HABITAT. ARQUITETURA E ARTES NO BRASIL


São Paulo, SP, 1950-1965.
Publicação mensal.
O subtítulo varia.
Acervos:
EESC-USP: 1924/28 (7-8,16,35,56) : não corrente.
EPBC-USP: 1924/43 (4,9,25,35,92,164-165,167-174,176,177,180-191,194-
199,201-211,213,216-218,227-228) : não corrente.

41.MIRANTE DAS ARTES


São Paulo, SP, Mirante das Artes, 1967-8.
Publicação bimestral.
Acervos:
FAU-USP: 1967-68: não corrente.

42.MÓDULO: REVISTA DE ARQUITETURA E ARTES PLÁSTICAS &K


Rio de Janeiro, RJ, Módulo, 1955-.
Publicação bimestral.
Acervos:
EESC-USP: 1956/88 (5,11-12,20-21,27,29-33,45-49,51,57,65,83, 97-100) : não
corrente.
FAU-USP: 1955/89 (1-100) : não corrente.
EPBC-USP: 1956/58 2(5-11) : não corrente.
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 151

43.NOTICIÁRIO TORSIMA. PARA O ENGENHEIRO, ARQUITETO, CONSTRUTOR


SAO PAULO, SP, 1957-66.
Este periódico continua como: NOTICIERO SIMA 12,1967
Acervos:
EESC-USP: 1957/66 2(3-4,6-12); 3(1-11); 4(1-2,4-12); 5(1-3,6-12); 6-10; 11(1-4,7-
10) : não corrente.
EPEC-USP: 1960/65 5-10: não corrente.

44.RELATÓRIO, DO CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA, ARQUITETURA E


AGRONOMIA, DA 6a. REGIÃO
São Paulo, CREA, 1968-1975.
Acervos:
EESC-USP: 1968; 1971; 1973/75: não corrente.
EPBC-USP: 1967/74: não corrente.
FAU-USP: 1968/69: não corrente.

45.REVISTA DE ARQUITETURA
Rio de Janeiro, RJ, 1934/5-.
Acervos:
Não há coleção deste periódico em São Paulo.

46.REVISTA DE ENGENHARIA
Editor Instituto de Engenharia
Publicação mensal
O Boletim do Instituto de Engenharia foi extinto em dezembro de 1941. Quase um
ano depois, em setembro de 1942, foi criada a Revista Engenharia que dá
continuidade ao trabalho desenvolvido pelo Boletim.
Acervos:
IPT: todos os números desta revista, de 1942 a 1950, se encontram na Biblioteca
Central do Instituto.

47.REVISTA DO CLUBE DE ENGENHARIA


São Paulo, SP, Clube de Engenharia, 1887-.
Publicação mensal.
Acervos:
Coleção completa arquivada na biblioteca do Clube de Engenharia: 1887; 1995
EPBC: 1887-1981 (completa)

48.REVISTA DO S.P.H.A.N.
Rio de Janeiro, RJ, SPHAN, 1937-.
Continua como Revista do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (1946-48);
Diretoria do Patrimônio Hist. e Art. Nac.; 1937; 1946.
Acervos:
FFLCH-His: 1937-45 (completa)
FAUUSP: 1946-87 (completa)
Arquitetura Moderna Brasileira em Contexto 152

49.REVISTA MUNICIPAL DE ENGENHARIA


Rio de Janeiro, RJ, Prefeitura do Distrito Federal (PDF),1932-93.
Publicação: bimestral até 1942 e trimestral de 1943 até 1969. Após essa data foi
editada irregularmente.
O nome do periódico variou:
De Jan. de 1932 a Out. de 1937 - Revista da Diretoria de Engenharia
De Nov. de 1937 a Dez. de 1959 - Revista Municipal de Engenharia
De Jan. de 1960 a Dez. de 1977 - Revista de Engenharia do Estado da
Guanabara
De Jan. de 1978 em diante - Revista Municipal de Engenharia; Prefeitura do
Rio de Janeiro
Acervos:
FAU-USP: 1937- 92: não corrente.
EPBC-USP: não corrente.
EESC-USP: não corrente

50.REVISTA POLYTÉCHNICA
São Paulo, SP, POLI-USP, 1904-.
Publicação irregular.
Acervos:
Poli: 1904-94: não corrente.

51.TÉCNICA
Salvador, BA, Fundação para o Desenvolvimento da Ciência na Bahia, 1940/1.
Acervos:
EESC-USP: 1943/59 (11-14,34-36,38-40) : não corrente.
EPBC-USP: 1955/59 (34-40) : não corrente.

52.URBANISMO E VIAÇÃO
Rio de Janeiro, RJ, 1939-43.
Acervos:
EPBC: 1939-46: não corrente.

São Carlos, agosto de 1998

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