DÉDA, Francino Silveira. Zé Compradre. O IDEAL; Ano II, nº 60; p.03. 20 de junho de 1954.
Acervo Digital do Laboratório de Ensino e pesquisa em História. LEPH; UniAGES; Paripiranga/BA
ZÉ COMPRADE
Duas potências soberanas se movimentam em manifestações diplomáticas, estabelecem-se troca de
notas entre embaixadores, e por fim declaram-se em guerra. Ativa-se a arte militar; movimentam-se os técnicos; são chamados os homens que possuem a ciência de conduzir exércitos em campanha, na bravura do ataque e na defesa das praças. Recrutam-se homens validos e etc.... Corriam o ano de 1864 e 12 de novembro, perto de assunção, os paraguaios capturaram o navio brasileiro “Márquez de Olinda”, onde viajava o presidente de Mato Grosso o coronel Carneiro de Campos. Os paraguaios prenderam a tripulação do nosso navio e confiscaram a carga. Deante de tão grave e tão grande a ofensa a uma nação soberana e pacifica, não era possível vacilar no revinde e assim, foi declarada a guerra entre o Brasil e o Paraguai. Tínhamos as fronteiras desguarnecidas, enquanto Lopes, o tirano paraguaio, tinha 64 homens disciplinados e obedientes a cegueira, contudo, tínhamos nós, embora espalhados na vasta extensão territorial, gente patriótica e capaz de arrojados heroísmos; poucos eram os refratários por índole, por covardia ou por necessidade. A guerra continuava na sua jornada de agonia. Em 18 de setembro de 1865 Estigarribia, em Uruguaiana, perante o nosso destemido Imp. Pedro II, depunha as armas. Em maio do mesmo ano, retomávamos ao inimigo, a cidade Argentina de Corrientes. Barroso, na Bazalha de Riachuelo, com o seu relance tático, com a proa do nosso navio AMAZONAS, inutilizou sucessivamente, três das melhores unidades do inimigo feroz. No convez da PARNAIBA, sucumbe na lute com raro heroísmo defendendo o pavilhão nacional o imperial marinheiro Marcílio Dias. Empenhado nessa luta de vida e morte, o Brasil necessitava de homens e os mandou recrutar dentro do território pátrio; a Bahia primou pelo patriotismo de sua gente com os batalhões de voluntários da pátria. Sempre me ufanei, quando os mais velhos me contavam essas histórias e conheci em Patrocínio do Coité, dois velhos dos tempos da guerra do Paraguai. Um deles chamavam-se Leandro e era morador em um pequeno sítio, no logar mais baixo ao pé da “Ladeira do Costelão”. Rapazote ainda, visitei no seu sítio, o velho Leandro o qual contou-me passagens daqueles velhos tempos; como fora recrutado; as pessoas viagens, mas em si estivera sempre acesa a centelha do amor pátrio e sentiu-se naquele tempo mal, por não ter chegado, em cedo para as linhas de frente, pois tudo já estava consumado com a queda de Lopes. O outro que também conheci e que morreu, fazem poucos anos, era o velho José dos Santos Flores, morador no “Mulungu”, nas proximidades de Lagôa Preta, mais conhecido pela alcunha de “Zé Compadre”; êste, convocado para servir na guerra, novo ainda e apto para o serviço, correu “seca e meca”, agarrou-se a políticos de prestígios; pediu, implorou, alegou ser arrimo de família e por fim não foi ao chamamento da Pátria, ao cumprimento do dever para com a nação ultrajada, como fez a maioria dos bahianos convocados. Essa história sempre ouvi do próprio “Zé compadre” que era meu amigo, mas, eu tinha sempre para o velho, “com os meus botões”, um julgamento pouco lisonjeiro neste particular. Achava mesmo que aquela história era depreciante, ocorrida e contada por um coiteense. Me conformava, entretanto, a história patriótica que valia ser repetida se repetida, do velho Leandro do Costelão. No término da primeira guerra, fui sorteada para servir no exército e sempre em mim ficava a recordação do patriotismo do velho Leandro Costelão, ou o remorso de ser tomado do espirito de fraqueza do velho “Zé Compadre”. Na segunda grande guerra, foi o meu filho para a Itália, serviu nos campos de batalha e voltou são e salvo. Era mais um coitêense que não se enquadrava á fraqueza do velho “Zé de Compadre”, mas ao espírito do velho Leandro costelão. Assim, eu quero crer que na minha terra, desapareceram os homens fracos como o “ZÉ COMPADRE”.