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Para esta visão, direitos não devem ser universalizados. Para que a humanidade
sobreviva é necessário negar acesso à distribuição de bens, serviços e riquezas a parte
desta mesma humanidade.” (RUIZ, 2014, pg. 181)
"[...] a concepção reacionária de direitos humanos tem lastro suficiente para vir à tona
de tempo em tempos". (p.183)
"Huntington defende que embora haja distintas civilizações, uma única teria como
característica reunir instituições, práticas e crenças que poderiam ser identificadas como
"o cerne da civilização ocidental. São elas: o legado clássico, o catolicismo e o
protestantismo, idiomas europeus, a separação entre autoridade espiritual e temporal, o
império da lei, o pluralismo social, a existência de corpos representativos, o
individualismo (1997,p. 82-86)". (p. 193)
"A pretensa combinação dos fatores que legitimam uma civilização de modo ímpar no
Ocidente a habilitaria para arrogar-se o direito de 'modernizar o mundo'". (p. 193)
"[...] Ainda que sejam possíveis e viáveis diálogos e proximidades entre distintas
concepções, questões centrais relativas à organização societária ou a temas que lhes são
afins (como os direitos humanos) podem conformar concepções distintas acerca dos
mais diversos debates. O que não pode ser descartado é que a crise capitalista em curso
motive diferentes governos e Estados a recuos muito significativos em posições
anteriormente defendidas". (p. 206)
"Ela tem duas matrizes fundantes de explicação: uma, de base teológica; outra laica, de
ordem da defesa do direito natural como algo próprio da esfera da razão. Ambas
dialogam, no sentido de que, por um lado, todos seriam filhos de Deus e, portanto,
teriam recebido, desde seu nascimento, uma série de direitos que, por sua vez, seriam
naturais; por outro, todos seriam iguais perante a lei [...] Nela, é praticamente
consensual entre os que visitam o debate dos direitos humanos a preponderância
destinada a direitos civis e políticos, especialmente o que denominam direito à
propriedade privada". (p.207)
"Em linhas gerais, as ideias que conformam a concepção liberal de direitos humanos
surgiram da crítica que a burguesia, então nascente, apresentava ao modo de produção
feudal de sociedade. Não se tratava de críticas morais [...] tratava-se, portanto, da vida
concreta, real, objetiva, dos sujeitos que tentavam- à luz das posses que já acumulavam
e da evolução da ciência e da tecnologia que (ainda que em níveis muito inferiores aos
atuais) começava a despontar- garantir melhores meios de vida, acúmulo de bens e
riquezas, acesso a serviços e a trabalhadores que pudessem contribuir, com seu trabalho,
para que tais acúmulos se efetivassem. Assim, a defesa do direito de ir e vir tinha razões
concretas [...] a defesa da igualdade de direitos para todos questionava a concentração
de poder nas mãos dos senhores feudais e do clero, em detrimento da maioria da
população". (p.207-208)
"Não há, em Marx, portanto, uma negativa dos direitos humanos, mas uma crítica a esse
homem: Esse homem, o membro da sociedade civil, é agora a base, o pressuposto, do
Estado político. 'É por ele reconhecido como tal nos direitos do homem' (Marx,
2009,p.33, grifos originais). Será com a mesma percepção que o autor apresentará
críticas a concepções de liberdade, de segurança, de igualdade e de direitos humanos
constantes da declaração de 1789". (p.210)
"Foi assim, que revoluções como a mexicana e a russa de 1917 previram em suas
constituições, pela primeira vez em documentos desta envergadura, conceitos de
seguridade social (Comparato, 2008; Trindade, 2002)". (p.218)
"[...] fruto das lutas dos trabalhadores, seus direitos viam-se reconhecidos como direitos
humanos em um Pacto Internacional, aprovado em Assembleia Geral da Organização
das Nações Unidas, indo além das vitórias já alcançadas neste campo com a criação da
Organização Internacional do Trabalho (OIT), em 1948. Registre-se que o artigo
seguinte do mesmo Pacto (8º) reconhecerá o direito de greve (embora em conformidade
com as leis de cada país) e o de livre associação sindical". (p. 218)
"A principal expressão de tais limitações é a defesa de uma hierarquia entre direitos.
Invertendo (...) a perspectiva liberal que lutava por reconhecer supremacia a direitos
civis e políticos e apresentando-lhe uma antítese – a defesa da mesma supremacia a
direitos econômicos, sociais, culturais [...] deixa de perceber que a história evoluiu,
fruto também da própria contribuição – inegável e fenomenal – das lutas dos
trabalhadores. Outra limitação é a de não perceber o acerto apontado pela Resolução da
conferencia de Viena, em 1993, no sentido de que os direitos dos seres sociais são
indivisíveis, inter-relacionados, interdependentes." (RUIZ, 2014, pg. 221)
"[...] acessar condições de vida (ou contribuir para a democratização da sociedade, ainda
que nos limites da institucionalidade burguesa) na sociedade do século XXI implica
articular diversos direitos". (p. 222)
"[...] é forçoso reconhecer que ela cumpriu papel fundamental de polarização e antítese
a concepções liberais ao longo do século passado, sendo a principal responsável por
vários dos avanços obtidos no campo dos debates sobre os direitos humanos". (p. 223)
"Ela provavelmente se refere a um evento tido como marco histórico no debate sobre os
direitos humanos, a Conferencia Mundial de Direitos Humanos realizada em Viena no
ano de 1993. No programa de ação nela aprovado, em seu aprovado, em seu artigo 5º,
como vimos, direitos humanos foram considerados como universais, indivisíveis,
interdependentes e inter-relacionados, superando a contraposição entre as concepções
liberal e socialista no que diz respeito à prevalência de alguma modalidade de direitos
sobre outras [...] acontecimentos de finais do século XX e início do século XXI
modificaram significativamente as intervenções que distintos sujeitos fazem quanto aos
direitos humanos [...] desta forma, optamos por, no título desta seção, utilizar o termo
concepção autodenominada contemporânea". (p.223)
"Um dos limites desta concepção também está relacionado ao contexto da Guerra Fria.
Ao fazer avançar as concepções liberal e socialista de direitos humanos então em
disputa aberta na seara dos debates sobre o tema, as resoluções de Viena não
conseguiram, contudo apontar uma superação que pudesse ser qualificada de dialética
quanto aos limites anteriores [...] a uma maior especificação do que seja o direito à
propriedade [...]". (p. 224)
"[...] não se pretende , no que foi possível aprovar em Viena, a eliminação da pobreza,
mas de suas manifestações extremas [...] o texto saúda países em desenvolvimento que
tenham tomado medidas para tentar superar tal estado [...] tal saudação se dá a um
determinado leque de medidas (que no contexto dos anos 90, já conhecemos
anteriormente como neoliberais)". (p.224-225)
"[...] não se fala em abdicar das dívidas externas geradas por tais programas, que
costumam consumir a maior parte das riquezas de países explorados pelas grandes
potências". (p.225)
"O documento ainda centra sua análise no amplo e a- histórico conceito de pessoa
humana; reafirmando o caráter natural dos direitos humanos e liberdades fundamentais".
(p.225)
"Por outro lado, a leitura da Declaração e Pacto de Ação de Viena permite perceber que
o mesmo documento apresenta elaborações conflitantes com perspectivas de países
como os Estados Unidos [...]". (p.226)
"É de fato, portanto, que aspectos que dão origem a concepções liberais de direitos
humanos permanecem presentes no documento [...] fazem afirmações que conflitam
com o modo de produção hoje hegemônico no mundo- que não efetiva direitos em
perspectivas universais, interdependentes, indivisíveis e inter- relacionadas, marca
histórica mais evidente da aprovação do evento da capital austríaca". (p. 228)
"O que expressa, contudo, seus maiores limites, é a ausência de uma análise
macrossocietária que permita contribuir para identificar as causas das desigualdades
sociais e de outras ordens que geram violações a diversos direitos." (RUIZ, 2014, pg.
229)
"Em resumo, seriam elas: (a) a assunção de problemas políticos, culturais, simbólicos e
de modos de vida a serem apreciados além dos de natureza econômica; (b) a
“marginalização do Estado nacional”, com perda de autonomia e de capacidade de
regulação, em função de intensas praticas transnacionais, da internacionalização da
economia e do maior fluxo de pessoas pelos diversos países; (c) transformações
ocorridas no que denomina “o regresso do indivíduo”, cuja vida privada estaria se
tornando cada vez mais pública e menos individual, após anos de comportamentos e
valorização do micro sobre o macro; (d) o desaparecimento das disputas entre
capitalismo e socialismo, adicionadas por um surpreendente consenso em torna da
democracia (...); e (e) a ampliação de interdependências transnacionais, que
ultrapassariam fronteiras determinadas..." (RUIZ, 2014, pg. 230-231)
"Assim é que uma concepção dialética para o debate sobre direitos humanos busca
articular pilares básicos do método marxiano para a interpretação e a atuação na
sociedade: historicidade, totalidade, dialética, ser social, contradição, dentre outros."
(RUIZ, 2014, pg. 248)
"As concepções socialista e dialética, por exemplo, tem posições similares quanto ao
não reconhecimento de um direito a propriedade privada dos meios de produção de
riquezas. A concepção contemporânea se aproxima da concepção dialética ao defender a
universalidade dos direitos e o reconhecimento de que não há como estabelecer entre
eles uma prioridade hierárquica [...]. A concepção socialista, neste pormenor, diverge de
ambas, afirmando haver distinções nítidas entre direitos que vê como sendo coletividade
(socais, culturais e econômicos, ao menos) ou do indivíduo (civis e políticos). As
concepções reacionária e pós-moderna podem estabelecer pontos de aproximação na
negativa que fazem das metanarrativas para a leitura do campo dos direitos humanos..."
(RUIZ, 2014, pg. 262-263)
"São processos de disputa social, e cada conjuntura – o que implica em analisar que
forças reúnem condições, em cada momento, de impor derrotas as demais – define quais
serão as distinções entre o que se mantém no campo do reivindicado (o legitimo, o
projetado), do direito reconhecido e protegido (o “legal”, o positivado) e daqueles que,
mesmo” eventualmente não passando pelas etapas anteriores já se encontram
vivenciados na realidade social." (RUIZ, 2014, pg. 268)
"A leitura mais adequada de fenômeno de tamanha complexidade é aquela que se pauta
pela dialética, que reconhece a história passada, analisa a presente, projeta e contribui
para a construção da história futura – o que fortalece a necessidade de uma concepção
de direitos humanos que se paute pelo método marxiano de análise da vida social."
(RUIZ, 2014, pg. 274)