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RESENHA CRÍTICA RELACIONANDO O CURTA-METRAGEM ILHA DAS

FLORES COM O TEXTO DE SAWAIA “PSICOLOGIA E DESIGUALDADE


SOCIAL: UMA REFLEXÃO SOBRE LIBERDADE E TRANSFORMAÇÃO
SOCIAL.”

FORTALEZA-CE
2017
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O documentário Ilha das Flores é uma filme de curta metragem


produzido no ano de 1989 por Jorge Furtado e nos traz à tona uma questão pertinente e
atual: A desigualdade social e as implicações da exclusão social. Propomos-nos a
articular a obra cinematográfica com o artigo de Bader Burihan Sawaia (2009)
publicado na revista Psicologia e Sociedade, intitulado: “Psicologia e desigualdade
social: uma reflexão sobre liberdade e transformação social” no qual trata do debate
sobre a desigualdade sob a ótica e contribuição de autores das ciências humanas e
sociais em geral como também da psicologia social.

O narrador do curta satiriza repete constantemente a frase “Os seres


humanos são animais mamíferos, bípedes, que se distinguem dos outros mamíferos [...]
principalmente por duas características: o telencéfalo altamente desenvolvido e o
polegar opositor e seres livres”. Após cada cena exibida do ciclo do trabalho e do
esquema de troca de produtos para o consumo humano- no caso tomates; até chegar ao
seu despejo como lixo que nem os porcos são autorizados a saciar a fome mas que acaba
por ser utilizado para alimentação de pessoas numa das comunidades de Porto Alegre,
Ilha das Flores. Lá, existe a mais pura expressão da miséria, negação e de exclusão da
população. O mesmo homem que possui consciência e inteligência que se diferencia dos
demais animais por ser racional; transformar a si e o meio em que vive é aquele que se
comporta como um animal irracional sem controle no sentido metafórico da expressão,
ao desconsiderar o outro e se aproveita de suas mazelas afim de impor sua supremacia
privando-o de condições mínimas para sua subsistência, de dignidade e liberdade de
decidir o melhor para si seja na vida econômica, política, social. Tudo o que aquele
grupo de mulheres e crianças esperando a cerca se abrir para poder recolher os restos de
comida puderam pensar em fazer foi em reagir passivamente para garantir sua
sobrevivência, impossibilitados de sair de sua condição social.

Sawaia em seu artigo aponta para um debate dentre os intelectuais da relação


entre subjetividade, desigualdade e transformação social e que esta relação dificulta a
ação, a emancipação dos homens independente se a subjetividade determina
desigualdade ou vice versa. Com isso busca superar a separação ou de hierarquia de
uma sobre a outra de determinante/ determinado, singular/ social, razão/ emoção, corpo/
mente se inspirando em Vigotski, Marx e Espinosa chegando à conclusão de que ambas
operam em conjunto e simultaneamente, de forma dialética.
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Os sofrimentos palpáveis e até mesmo visíveis de pessoas em situação de


pobreza segundo a reflexão dos estudos de Espinosa são produto de algo mais penoso;
da falta do direito a liberdade e a dignidade oriunda das relações construídas da relação
minada de afetar e ser afetado ou apenas reação. Essa inflexão ou falta de possibilidades
tem também uma dimensão mais ampla na sociedade, se reproduz e perpetua na cultura
e no contexto social dos povos no qual até convergência com a realidade brasileira no
qual “O corpo político que nasce do medo e da impotência exprimirá essas condições
em suas instituições” (Sawaia apud Chauí, p.367) e de um ciclo vicioso de alienação e
passividade.

Se pensarmos a luz das contribuições do artigo de Sawaia, a superação da


situação de servidão da comunidade de Ilha das Flores não será possível somente pelo
fim atacando o sujeito que explora- seja empresário ou a nível maior, capitalismo ou se
culpabilizando o indivíduo por não se esforçar para mudar de vida; mas no foco de
reprodução de desigualdade, o sofrimento ético-político- que se caracteriza pela relação
entre as ameaças da desigualdade e da resposta do individuo que se sujeita aos afetos
impostos. Não é algo que depende da força e desejo subjetivo, e sim que incorporem
subjetividade e ação coletiva unificada. Vemos então que as desigualdades geram
conseqüências na vida material e subjetiva das pessoas, seja pela vontade não exercitada
na prática de resistência, indignação e/ou pela luta por mudanças.

As cenas sucessivas apresentadas mostram a desigualdade, que se destaca senhor


Suzuki e dona Arlete, que possui poder de compra e de escolha e as mulheres e crianças
de Ilha das Flores, que não possui do mesmo e só resta aceitar os restos de comida
encontrados. A liberdade nestas histórias que se entrelaçam é ilusória, o comerciante
está mais preocupado em lucrar, a dona de casa em consumir desenfreadamente e a
ilusão de que as famílias de Ilha das Flores são livres sendo que não tem opções de
escolha de onde viver, onde morar, o que comer, o que vislumbrar para o futuro.
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REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ILHA DAS FLORES. FURTADO, Jorge. Porto Alegre: sp: sd, 1989. Acesso  internet
dia 23/08/2010http://www.youtube.com/watch?v=KAzhAXjUG28 (12 min.)
;dur,00:10:28min. 

SAWAIA, B.B. Psicologia e desigualdade social: uma reflexão sobre liberdade e


transformação. Rev. Psicologia e Sociedade. 2009;21(3):364-72. Disponível em:
http://www.scielo.br/pdf/psoc/v21n3/a10v21n3.pdf

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