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Fernanda Anatiele Da Silva

Thiago Silva Santos


Fernanda Beatriz Siqueira

Análise social a partir das obras O cortiço e Capitães da areia

Resumo

O objetivo deste artigo é fazer um paralelo entre os objetos de estudo escolhidos


para analisar e comparar. O cortiço, romance naturalista publicado em 1890, e
Capitães da areia obra modernista publicado em 1937.

Traremos como tema uma crítica social existente entre as obras, que já foram
analisadas por muitos críticos literários, tais como Antônio Candido. Nessa
comparação citaremos elementos que são pontes de contatos entre as obras,
desigualdade social, preconceito racial e poder, levantando suas respectivas
semelhanças e diferenças.

Usamos como suporte teórico estudiosos do modernismo, Wilson Martins e


Alfredo Bossi.

Palavras-chaves: o Cortiço, Capitães da areia, literatura brasileira, desigualdade


social, preconceito racial, poder.

Introdução

A problemática acerca da desigualdade social, o preconceito racial e o poder,


não deve se limitar apenas em uma questão social, mas deve ser uma questão de
humanização, que nos remete a uma reflexão mais ampla sobre uma realidade
vivida há séculos, e que ainda em 2021 deve ser levantada e discutida, visto que
muita coisa não mudou.

Para dar início a uma mudança nessa situação predominante e minimizar esse
quadro é importante orientar a sociedade que se encontra inconsciente de seus
direitos e deveres.

Nessa luta também temos como aliados os Romances literários. Podemos aqui
apresentar uma significativa consideração acerca do pensamento do crítico
Antônio Candido, refletindo sobre a importância de suas ideias para crítica
literária brasileira, destacando a relação estabelecida entre a arte e a vida social,
ou seja, a relação dialógica entre ambas.

Desenvolvimento

Para muitos pensadores, estudiosos e políticos, nascer pobre, sofrer preconceitos,


encontrar-se em situação inferior, influencia sim e muito as suas escolhas morais
e formação do caráter durante a sua vida.

“A gente tem que parar de atrelar pobreza com


criminalidade... Ninguém está condenado a ser bom
ou mau.” Rachel Sheherazade.

Aluísio Azevedo foi um dos pioneiros a ter essa visão no Brasil e levantar tais
assuntos em uma obra literária. O cortiço publicado em 1890 é considerado uma
obra-prima do naturalismo brasileiro, embora tenha uma notável influência de
Emile Zola, o vigor e a originalidade da narrativa que abordou os problemas
sociais, possuindo como cenário principal um cortiço são perceptíveis.

O romance analisado aqui foi lançado durante uma época de efervescência


social, em que se abordava críticas pesadas, com temas como, abolição da
escravatura, a igualdade ou diferença entre os perfis étnicos-raciais.

Azevedo buscou traçar um quadro da sociedade brasileira por meio de uma


linguagem cientificista e determinista do homem e dos agrupamentos humanos.
Em seu romance, analisou o caráter do povo brasileiro, ora denunciando a
hipocrisia, a miséria e a exploração da burguesia sobre os pobres, ora
justificando esses aspectos por meio do determinismo.

Capitães da areia, escrito por Jorge Amado em 1937, mostra problemas sociais
que foram denunciados no início do século XX na capital baiana. O romance
traz ao leitor uma realidade urbana de um grupo de meninos, permitindo- nos
refletir sobre as dificuldades que jovens e crianças de rua encaram todos os dias.
Em capitães da areia além do preconceito e pobreza, jovens e crianças também
tem que lidar com um descaso ainda maior, que é o abandono. Além de serem
abandonados por seus responsáveis, também são abandonados pela sociedade
que os enxergam como bandidos, descriminando-os e afastando-os do âmbito
social.

“O tema da infância abandonada e delinquente, escandaloso para a


época, lembra o protesto social do naturalista em suas emanações
proletárias. Por outro lado o conflito que move o romance é
basicamente folhetinesco: pobres contra ricos, fracos contra fortes,
pequenos marginais contra a sociedade opressora.”
(Duarte, 1996, p.114)

Embora o romance seja uma crítica social, pode-se notar que a obra é carregada
de esperança e romantização. Mesclando a pureza e a necessidade da busca pela
sobrevivência dos jovens e crianças envolvidos.

Desigualdade social

Desigualdade social é o fenômeno em que ocorre a diferenciação entre pessoas


no contexto de uma mesma sociedade, colocando alguns indivíduos em
condições estruturalmente mais vantajosa que outros, manifestando-se em todos
os aspectos: cultura, cotidiano, política, espaço geográfico...

Desde a construção das civilizações durante o período neolítico, quando as


sociedades passaram a viver os excedentes que produziam, as diferenças
começaram a surgir. O problema nesse caso é a intensificação da pobreza e da
falta de equidade nas condições oferecidas para que os diferentes indivíduos
possam produzir suas próprias condições de sobrevivência.

O teórico Jean Jacques Rosseu afirmava que a desigualdade é um fenômeno que


tende a sempre se intensificar no contexto social. As famílias mais pobres
possuem um menor acesso à instrução e às informações necessárias para
investirem e multiplicarem suas rendas. Para Rosseu, o que causa a desigualdade
social é exatamente a divisão social do trabalho, com a criação da propriedade e
dos bens particulares e não distribuíveis. No Brasil, a desigualdade que já é
tratada como um problema crônico, encontra-se ainda maior, segundo estudiosos
da PUCRS. Entre o final do segundo trimestre de 2020 ocorreu um grande
aumento da desigualdade econômica do período devido a uma má administração,
e tendo como agravante a pandemia da Covid-19.

Emerson da Cruz Inácio, do departamento de Letras clássicas e vernáculas da


(FFLCH) da USP, avalia o cortiço como um livro muito atual ao opor o universo
distinto de uma maneira tão descritiva, observando questões que continuam
atuais, como a luta de classe, a luta da sobrevivência, que se revela por meio dos
explorados e exploradores. João Romão é visto como um falso abolicionista que
escraviza seus empregados.

Na obra é abordada a transição do trabalho escravo para o trabalho livre,


entretanto João Romão como outros capitalistas em ascensão se aproveitam da
situação para submeter os trabalhadores, principalmente os ex- escravizados a
um outro tipo de dominação, ou seja, o pobre continua submisso e o rico cada
vez mais rico.

A desigualdade social em capitães de areia apresenta-se por meio de dois


extremos da sociedade brasileira: por um lado os protagonistas do enredo e
várias personalidades em torno deles, desde o padre e prostitutas que
representam a classe baixa, por outro lado a elite de Salvador, classe
privilegiada, que representa um meio social superior, estabelecendo um contraste
evidente.

Esse cenário marcado pela pobreza, a falta de instrução e condições indignas são
consequências de um povo marcado pela desigualdade social.

Preconceito racial

Martin Luther King, em um dos discursos mais famosos da história disse que
sonhava que seus filhos pudessem um dia viver em uma nação na qual eles não
fossem julgados pela cor da sua pele, mas pelo conteúdo do seu caráter.
O racismo é sim um grande problema em nosso país, 97% da população acredita
que há vítimas de atitudes racistas no Brasil, segundo a última pesquisa do
Datafolha de 2019.

Não há conclusões unânimes, mas a ciência e os especialistas caminham para o


entendimento de que o preconceito seja um conceito aprendido.

O naturalista sueco Carl Linnaeus (1707- 1768) distinguiu quatro raças


principais, que em 1767, que iam do homo sapiens eropaeus( branco, sério e
forte), ao homo sapiens afer( negro, impassível e preguiçoso) é notório o juízo
de valor de caráter lado a lado com a cor da pele.

Oracy Nogueira apresentou investigações pioneiras e contribuições originais ao


estudo de relações raciais. Oracy argumentava que se compreendermos como o
racismo atua é mais fácil encontrar as formas mais adequadas e eficaz para seu
combate.

O preconceito de marca própria do Brasil é definido no critério de aparência na


cor da pele, nele é possível contrabalançar a desvantagem da cor por algum
atributo associado a ela, como fama, instrução, ocupação ou riqueza. Já o
preconceito de origem, característico dos Estados Unidos, reside na
descendência. Ser negro ou não é inegociável, independente do contexto ou
condição social, portanto uma mulher branca dos olhos azuis pode sofrer
preconceito se originalmente, descendente de negros.

Em seu artigo Oracy afirma, considera-se como preconceito racial uma atitude
desfavorável, culturalmente condicionada, em relação aos membros de uma
população, seja devido à aparência, seja devido a toda ou parte da ascendência
étnica que lhes atribui ou reconhece.

Com o objetivo de promover uma reflexão acerca do tema diversidade étnico-


racial foi realizado um estudo teórico sobre o tema preconceito racial,
estereótipos e racismo, discutindo-se a importância da literatura na construção da
identidade negra e analisou-se o livro Capitães da areia. O livro foi analisado e
os resultados indicaram que a obra carrega as marcas do contexto em que foi
escrita e expressa estereótipos direcionado à imagem do negro. Concluiu-se a
importância de trabalhar essa obra em sala de aula, possibilitando a
desconstrução dos estereótipos, acabando com o preconceito racial que afeta
negativamente a construção da identidade negra.

Em uma pesquisa acadêmica a estudante de letras, Luciane abordou o tema A


representação da mulher negra na obra O Cortiço, especificadamente duas
personagens, Bertozola e Rita Baiana, uma ainda sendo escravizada, a outra uma
negra livre. Embora Rita baiana fosse uma negra livre era tratada de forma
pejorativa e vista como inferior em relação a seus companheiros, deixando
evidente como os negros sofriam preconceito racial, principalmente as mulheres.
A visão sobre a mulher negra naquela época e ainda hoje é bastante
questionável, ao se perguntar, o que mudou de lá pra cá. Certamente muito
pouco caso contrário não haveria tanto preconceito em pleno século XXI.

Poder social

Poder social diz respeito à vida dos seres humanos em sociedade, ou seja, trata-
se das relações sociais estabelecidas entre si.

Dentro destas relações cabe não só a capacidade de ação como determinação de


um indivíduo sobre o outro. Pode-se dizer que o ser humano não são só sujeitos,
mas também objetos do poder social.

O poder social aqui citado não é algo que se possui, mas uma relação que se
estabelece entre indivíduos ou grupos sociais.

Só pode haver esse poder em uma relação em que a vontade ou interesse de


alguém se faz valer no comportamento do outro. Segundo Gerard Lebrum
obediência às normas e a submissão ao poder estão ligadas à repressão, em caso
de infração. Podendo assim, concordar-se com a teoria do poder soma zero, que
implica na perspectiva do poder que um possui é porque o outro não possui.

Diante dos pontos levantados sobre o poder social, pode-se levantar duas
vertentes;

O cortiço mostra e muitas vezes justifica como o comportamento dos


personagens é influenciado pelo meio, pela raça, assim como a mistura de raça
serve para degradação humana. João Romão é um exemplo da busca incansável
por uma alta posição social, para obter seus objetivos ele faz uso do poder,
aproveitando-se da vulnerabilidade dos mais fracos. Movido pela inveja passa a
trabalhar arduamente e explorar ainda mais seus empregados. Faz uso do poder
para obter mais poder.

Em Capitães da areia tem a presença de um líder Pedro bala, que mesmo diante
das dificuldades e dos problemas sociais que enfrenta carrega consigo esse dom
de liderar. Sendo assim podemos levantar a questão de como seria o final desse
após ele ter alcançado o cargo de sindicalista.

O dominado não deve virar dominador, para isso é necessário um processo


educacional com o intuito de liberar a mente das estruturas sociais para que o
dominado não reproduza esse instinto e passe a utilizar de forma inadequada a
sua posição.

Conclusão

É notório que o abandono de menores e as mazelas existente no Brasil não


podem ser vistas isoladamente. Deve-se contextualizar a evolução do sistema
desde a sua origem.

O menor é abandonado muitas vezes porque existe o desemprego, a falta de


investimento educacional, a desinformação sexual, a não legalização do aborto,
enfim a patologia socioeconômica.

Tratando-se da rejeição sofrida pelos que pertencem a classes inferiores é


importante lembrar, que embora o Brasil seja um país miscigenado é perceptível
o preconceito racial e social, em que, os negros, pobres e favelados são as
maiores vítimas desse descaso. Tais mazelas que persistem em se fazer presentes
até hoje em nosso país jamais terão solução sem educação e orientação.
Bibliografia
Bosi, Alfredo. História concisa da Literatura

Amado, Jorge. Capitães da areia. 92 edição. Rio de Janeiro

Martin, Wilson, O Modernismo, A Literatura brasileira.

Azevedo, Aluísio. O cortiço

http://www.uel.br/eventos/semanadaeducacao/

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