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Era uma vez...

histórias infantis e matemática nos anos iniciais do


Ensino Fundamental

Luiza Palmira Freitas Botelho


Universidade Federal de Juiz de Fora
luisabottelho@gmail.com

Reginaldo Fernando Carneiro


Universidade Federal de Juiz de Fora
reginaldo.carneiro@ufjf.edu.br

Resumo
A utilização de histórias infantis e matemática no trabalho do professor em sala de aula
permite desenvolver a criatividade e a imaginação dos alunos, trabalhar matemática e
língua materna conjuntamente, fazer relação com outras áreas do conhecimento e resolver
situações-problema. Esta pesquisa qualitativa tem como objetivo investigar as
possibilidades de trabalhar conjuntamente histórias infantis e matemática nos anos iniciais
do Ensino Fundamental. Utilizaram-se, para produção de dados, notas de campo,
audiogravações e atividades desenvolvidas pelos alunos. As atividades foram pensadas a
partir do livro infantil As centopeias e seus sapatinhos, de Milton Camargo, e
desenvolvidas em um 1.° e um 2.° anos do Ensino Fundamental, em duas escolas públicas
da cidade Juiz de Fora – Minas Gerais. A análise dos dados evidenciou a participação e o
interesse dos alunos, demonstrou ser interessante realizar atividades que tenham como
referência histórias infantis; permitiu abordar conteúdos e conceitos matemáticos, mas
sem deixar de lado a história; e propiciou uma discussão sobre o que é um problema.
Palavras-chave: História infantil. Matemática. Anos iniciais do Ensino Fundamental.

Once upon a time... children stories and mathematics in the early years
of Elementary School

Abstract
The use of children stories and mathematics in the teacher’s work in the classroom allows
students to develop the creativity and the imagination of students, work on mathematics
and mother language together, relate to other areas of knowledge and solve problem
situations. This qualitative research has as main to investigate the possibilities of the joint
work between children stories and mathematics in the early years of Elementary School.
We use, for data production, field notes, audio-recordings and activities developed by the
students. The activities were designed from the children’s book The centipedes and their
shoes by Milton Camargo and developed in a 1st and 2nd year of Elementary School of
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two public schools in the Juiz de Fora city – Minas Gerais. The data analysis showed the
participation and the interest of the students demonstrating that it is an interesting
possibility to carry out activities that have as reference children stories; it allowed to
approach mathematical contents and concepts, but without leaving the story aside; and
provided a discussion about what a problem is.
Keywords: Children stories, Mathematics, Early years of Elementary School.

Introdução

A utilização de histórias infantis nas aulas de matemática pode promover o


maior envolvimento dos alunos nas atividades e desenvolver habilidades, já que “é
facilmente acessível e proporciona contextos que trazem múltiplas possibilidades de
exploração que vão desde formulação de questões por parte dos alunos, até
desenvolvimento de múltiplas estratégias de resoluções das questões colocadas” (SMOLE
et al., 2004, p. 7).
De acordo com Smole et al. (2004, p. 2), “[...] a literatura aparece à criança como
manifestação do sentir e do saber o que permite a ela inventar, renovar e discordar”. Com
esse aporte, este trabalho busca investigar as possibilidades do trabalho conjunto entre
histórias infantis e matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental, a partir da
história As centopeias e seus sapatinhos, de Milton Camargo, evidenciando que é possível
realizar atividades elaboradas a partir delas e permitindo que os alunos desenvolvam de
forma conjunta os conceitos e a linguagem matemática.
Para isso, foram criadas e desenvolvidas atividades em uma turma do 1. ano e em
uma do 2. ano do Ensino Fundamental, em escolas públicas de Juiz de Fora, com quatro
aulas em cada turma. Essas turmas foram escolhidas a partir do envolvimento da primeira
autora com elas, pois já trabalhava com esses alunos.
A fim de apresentarmos as discussões realizadas, este estudo está dividido em
quatro partes. A primeira apresenta os pesquisadores que embasam toda a discussão; a
segunda traz a metodologia utilizada no estudo, assim como a sequência de atividades
elaboradas; a terceira descreve a realização das atividades nas duas turmas e as análises;
e, na quarta parte, algumas considerações finais procuram trazer reflexões sobre o
trabalho desenvolvido.

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As Histórias Infantis e a Matemática

Nesta investigação, discutimos sobre a importância de trabalhar histórias infantis


e conteúdos matemáticos nos anos iniciais do Ensino Fundamental. Com efeito, diversos
autores evidenciam que esse trabalho realizado conjuntamente tem muitas
potencialidades e que ele é possível ocorrer em sala de aula com as crianças.
Utilizar história infantil e matemática pode fazer com que o ensino dessa
disciplina seja mais agradável e lúdico, além de ser uma outra maneira de abordar os
conteúdos e os conceitos matemáticos. Consideramos, aqui, as histórias infantis como
fonte de prazer e de imaginação. Elas permitem a formação de um leitor crítico e criativo.
Nesse aspecto, Silva (2012, p. 39) aponta que compreende que uma razão para o trabalho
com língua materna e com a Matemática é

a formação de um leitor/produtor de textos crítico e criativo, é


indispensável inseri-lo em um variado contexto referencial que
possibilitará o desenvolvimento de sua capacidade de ler, interpretar,
analisar e produzir elementos textuais que possam vir a se constituir em
desafios matemáticos e linguísticos.

Assim, ao disponibilizarmos esses materiais para cada um dos níveis de


desenvolvimento da criança, poderemos proporcionar a elas situações-problemas que
despertem seu interesse e as desafiem a buscar diferentes soluções para o que foi proposto,
como explicitam Zacarias e Moro (2005).
Despertar esse interesse para a resolução de problemas a partir da interpretação
das histórias pode ser o ponto de partida para que a criança se sinta envolvida e
incentivada a aprender novas noções matemáticas e a compreender também conteúdos já
ensinados.
Dessa forma, a história infantil “pode ser uma estratégia de garantir um ensino de
matemática que faça sentido para quem está aprendendo e que dê significado aos
conteúdos matemáticos ensinados” (COLINS; MACHADO; GONÇALVES, 2016, p.
77). Utilizar a história como caminho para o ensino da matemática possibilita, segundo
esses autores (2016, p. 77), “um contexto em que o aluno se expressa de maneira natural
e informal por meio de uma leitura lúdica e dinâmica”, potencializando suas
aprendizagens para a compreensão da matemática e a resolução de problemas.
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Além disso, para Souza e Carneiro (2015), a conexão entre história infantil e
matemática permite o diálogo e a reflexão sobre ideias, conceitos e aspectos matemáticos,
além de possibilitar abordar conteúdos de outras áreas do conhecimento e oferecer à
criança o contato com diferentes visões de mundo. Esses autores ainda destacam que

Conectar literatura infantil e matemática possibilita a criação de


situações de ensino que permitem explorar as relações entre língua
materna e matemática; [...] e permite também o desenvolvimento da
comunicação matemática, podendo levar o aluno a compreender
conteúdos matemáticos e a linguagem matemática” (SOUZA;
CARNEIRO, 2015, p. 237).

Para os autores (2015, p. 238), além do texto literário, as ilustrações também são
indispensáveis nesse processo, já que elas auxiliam a compreensão de um conceito
matemático e também possibilitam “desenvolver a observação; comparar situações e
diferentes formas de representação; aprender conceitos e propriedades matemáticas; e
familiarizar-se com a linguagem matemática”.
A partir do exposto, fica claro que a conexão estabelecida entre histórias infantis
e matemática permite aos alunos envolver-se em situações contextualizadas, que lhes são
familiares e os motivam a se posicionar de modo ativo e criativo na aprendizagem de
conceitos e ideias matemáticos.
Além disso, afirmam Souza e Carneiro (2015, p. 239) que é possível utilizar
a narrativa da história como estratégia de pensamento, permitindo a formação do sujeito
leitor, e também abordar “o aspecto imaginário dos textos, as ilustrações presentes nos
livros, a possibilidade de trabalhar com resolução de problemas matemáticos, bem como
a elaboração de problemas e histórias matemáticas; e apresentar aos alunos materiais
manipuláveis e recursos visuais”.
Observamos que é interessante que a criança aprenda conteúdos matemáticos a
partir da leitura de livros infantis, mas como isso deve acontecer? De acordo com Zacarias
e Moro (2005, p. 278),
as próprias histórias podem trazer dados importantes para que alguma
solução a esses problemas seja encontrada. Também é o caso de
estimular as crianças a explorar e a formular problemas para serem
resolvidos por elas próprias e pelos colegas. As questões colocadas
farão com que elas debatam, dialoguem, critiquem e criem diversas
estratégias de solução.

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Assim, essa abordagem permite que os alunos escolham a temática da história,
que se crie um ambiente em que todos pensem e dialoguem sobre matemática. E propicia
compreender a importância da resolução de problemas, fugindo dos problemas
convencionais1 e das aulas apenas como lousa e giz.
Para isso, é necessário escolher prévia e atentamente o livro com que se pretende
trabalhar, planejar as atividades e os problemas que serão levados às crianças a partir
desse texto e analisar quais objetivos se pretende alcançar com eles.
Também é fundamental que os alunos conheçam a história, se interessem por ela
e que se evite tornar essas atividades repetitivas, para que o livro não perca seu sentido e
não passe a ser lido apenas com o objetivo de realizar atividades matemáticas.
Diante das ideias dos autores aqui expostos, percebemos as potencialidades
presentes no trabalho realizado com histórias infantis e matemática, para despertar nos
alunos o interesse e a participação nas aulas dessa disciplina, sempre apontadas como
monótonas e muito difíceis.
Dessa maneira, consideramos importantes as aulas de matemática desenvolvidas
a partir de histórias infantis, já que elas proporcionam um maior interesse dos alunos e,
em decorrência, fazem com que eles se envolvam na atividade, permitindo diálogos
construtivos e desafiadores para além do conteúdo matemático. O trabalho com histórias
infantis é rico no desenvolvimento de habilidades como a relação entre a língua materna
e matemática e a linguagem matemática, assim como outras já citadas anteriormente.
Por fim, o ensino matemático com base nas histórias infantis pode desenvolver
um ambiente com aulas mais lúdicas, divertidas e envolventes, que marquem o aluno
positivamente, permitindo que ele internalize os conceitos a serem aprendidos e os leve
por toda a trajetória escolar, de maneira positiva.

Caminhos da Pesquisa...

Para realizar o trabalho aqui apresentado, utilizamos a pesquisa qualitativa,


que, para Bogdan e Biklen (1994), tem por princípio considerar o ambiente natural como

1
Segundo Smole e Diniz (2001), os problemas convencionais ou padrão são aqueles que contêm frases e
parágrafos curtos; oferecem “pistas” para a(s) operação(s) a ser efetuada(s); indicam, no seu enunciado,
todos os dados necessários para sua resolução; apresentam uma única solução; a solução é numérica e é
encontrada a partir da aplicação direta de algoritmos.

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a principal fonte de dados e o investigador como o instrumento essencial da investigação.
Dessa maneira, passamos a investigar as possibilidades do trabalho conjunto de histórias
infantis e matemática nos anos iniciais do Ensino Fundamental.
Compreendemos que “os investigadores qualitativos frequentam os locais de
estudo porque se preocupam com o contexto. Entendem que as acções podem ser melhor
compreendidas quando são observadas no seu ambiente habitual de ocorrência”
(BOGDAN; BIKLEN, 1994, p. 48). Dessa forma, é preciso conhecer o ambiente em que
se faz a pesquisa, o contexto e as interações que ocorrem ali; por isso, foram escolhidas
escolas em que a pesquisadora, já inserida há alguns meses, conhecia o ambiente e os
envolvidos nas atividades.
Pensando na importância da descrição da investigação qualitativa e da análise dos
dados “em toda a sua riqueza, respeitando, tanto quanto o possível, a forma em que estes
foram registados ou transcritos” (BOGDAN; BIKLEN, 1994, p.48), as atividades
desenvolvidas foram gravadas em áudio e foram também elaboradas notas de campo
registradas pela própria pesquisadora.
A partir do objetivo da pesquisa, as observações e as atividades desenvolvidas
permitiram que verificássemos uma grande interação das crianças nas aulas, a forma como
elas percebiam os problemas e as operações matemáticas, e seu envolvimento com o
enredo da história.
Além das observações e das gravações em áudio, foram utilizadas para a coleta de
dados as notas de campo, que são o relato escrito daquilo que o pesquisador experiencia,
vê, ouve e pensa no decurso da recolha de dados, em que é considerado tudo que é
produzido durante o estudo (BOGDAN; BIKLEN, 1994).
Para investigar as possibilidades do trabalho com histórias infantis e matemática
nos anos iniciais do Ensino Fundamental, escolhemos o livro As centopeias e seus
sapatinhos2, de Milton Camargo, que não apresenta os conceitos e os conteúdos
matemáticos explícitos na história, mas permite abordá-los a partir das situações
vivenciadas pelas centopeias.
As atividades foram desenvolvidas em duas turmas, sendo um 1.° e um 2.° ano do

2
Essa narrativa conta sobre duas centopeias que foram comprar sapatos. Chegando à loja, a
vendedora precisou subir e descer muitas vezes para buscar a quantidade suficiente de sapatos
para suas clientes. Por isso, no fim a vendedora ficou muito cansada e desmaiou.
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Ensino Fundamental de duas escolas públicas diferentes na cidade de Juiz de Fora.
Inicialmente, apresentamos aos alunos o livro, dizendo o título, o autor e o
ilustrador e, em seguida, fizemos algumas perguntas, como: “O que vocês estão vendo na
capa do livro?”, “O que acham que acontecerá nessa história?”, “Quais devem ser os
personagens?”, “Em que lugar essa história deve acontecer?”. Depois disso, realizamos
a leitura da história.
Após a leitura, propusemos que as crianças fizessem um desenho que, para elas,
representasse a história. Utilizando as ilustrações do livro, elaboramos alguns problemas
para que fossem, inicialmente, realizados oralmente, mas poderiam utilizar papel e lápis
para resolvê-los. Os problemas são:
 A mãe da Centopeinha estava arrumando a mesa do café da manhã para ela e sua
filha, quantos lugares teria que colocar na mesa? E se recebesse a visita da
Joaninha?
 Se na mesa de café da manhã houvesse dez pães de queijo, quantos pães cada
centopeia iria comer? (Centopeinha e sua mãe)
 Há cinco chapéus e cinco sombrinhas no guarda-roupa das centopeias, quantas
combinações podemos realizar para Centopeinha e sua mãe saírem para comprar
sapatos?
Após a resolução desses problemas, organizamos as crianças em duplas e pedimos
que elaborassem uma situação-problema e trocassem com os colegas de outra dupla, para
que solucionassem. Depois conversamos sobre as questões que surgiram e analisamos os
problemas elaborados, assim como as soluções propostas.
No segundo momento da atividade, realizamos a construção de uma centopeia
coletiva, e cada criança ganhou uma parte dela e os dois pezinhos dessa respectiva parte,
para que pintasse da forma como quisesse, utilizando as cores amarelo, verde, rosa, azul
ou laranja. Depois elas montaram a centopeia conjuntamente, com o auxílio das
professoras. Com a centopeia montada, perguntamos: “Quantos pezinhos tem a nossa
centopeia? Ela tem todas as cores que foram propostas pela professora?”. Após essas
primeiras observações, analisamos as cores que apareceram nessa construção e
elaboramos um gráfico. Com o gráfico pronto, fizemos alguns questionamentos para sua
interpretação:

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 Qual cor mais apareceu?
 Qual cor menos apareceu?
 Se somássemos a cor “azul” com a “verde”, que quantidade teríamos?
 Por que tal cor apareceu mais vezes?
 Se tirássemos a cor “amarela” da centopeia, quantas cores ficariam?
 Nossa centopeia é maior ou menor que a centopeinha da história? (Levamos a
ilustração da centopeia da história, para que fosse possível essa comparação.)
Após as atividades, conversamos com a turma para saber se gostaram ou não do
que havia sido realizado, de qual parte mais gostaram e de qual momento não gostaram,
o que aprenderam de matemática. Pedimos que cada aluno registrasse em seu caderno,
pela escrita ou por meio de desenho, como havia sido a experiência.

Apresentação e Análise dos Dados

As atividades que serão apresentadas a seguir foram realizadas em duas escolas


públicas, uma estadual e uma municipal, ambas localizadas na Zona Norte da cidade de
Juiz de Fora, em um 1.° e um 2.° anos do Ensino Fundamental, respectivamente.
Por ser um número grande de atividades, elas foram realizadas em dois dias nas
duas turmas, até mesmo para que as crianças não ficassem cansadas. No primeiro dia,
havia 26 crianças no 1.° ano,13 meninos e 13 meninas. Já no 2.° ano eram 23 crianças, 15
meninos e 8 meninas.
Apresentaremos a seguir oito episódios – quatro em cada ano escolar –, que
ocorreram nos dias em que as atividades foram realizadas. Destacaremos as falas e a
participação dos alunos e das professoras regentes das turmas.

Realização das atividades: 1.° ano

As atividades aconteceram em 11 e 12 de setembro de 2018 no período da tarde, em


uma escola municipal da cidade de Juiz de Fora.

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Episódio 1:

Ao apresentar o livro que seria trabalhado, A centopeia e seus sapatinhos, de Milton


Camargo, li o nome do ilustrador e perguntei se eles sabiam o que era ilustrador; rapidamente
uma criança disse que era quem desenhava; ao dizer o nome da editora, perguntei se eles sabiam
o que era, e a maioria da turma disse que não sabia, então expliquei, dizendo que era onde o
livro havia sido montado e publicado. Em seguida, perguntei o que eles estavam vendo na capa,
e as crianças responderam: uma árvore, uma borboleta, uma floresta e, por último, uma
centopeia, que uma criança confundiu com uma lagarta.
Questionei: “O que vocês acham que vai acontecer nessa história?”, eles demoraram
um pouco para responder e, depois de repetir a indagação, uma menina respondeu: “A
centopeia vai procurar os sapatinhos dela”. Com isso, fiz a leitura da história para a turma.
Durante a leitura algumas crianças interagiram, dizendo: “A centopeia precisa
de muitos sapatos, não é pouco não”, “É, ela tem muitos pés!!” e “Os sapatos ficariam
largos se os pés fossem grandes”. Ao final, quando a Joaninha desmaiou, todas as
crianças deram risada, e eu perguntei:
Professora: Por que a Joaninha desmaiou?
Em coro a turma respondeu: Porque ela estava muito cansada!.
Professora: Cansada de quê?
Uma criança: De tantos sapatos... e de tanto descer escada!
Professora: Por que ela teve que subir e descer várias vezes?
Uma criança: Porque não tinha sapato do tamanho.
Outra criança: Porque ela tem muitos pés.
Então eu confirmei, reforçando a ideia de que a Joaninha precisou descer e subir muitas
vezes porque precisava pegar muitos sapatos. Ao final desse momento, pedi para que eles
desenhassem o que mais gostaram ou o que a história representou para eles.

Esse momento buscou apresentar às crianças alguns aspectos da obra para que eles
desenvolvessem a imaginação e mostrassem seus conhecimentos prévios a partir da
imagem da capa. As perguntas realizadas ao final da leitura permitiram perceber se as
hipóteses iniciais se confirmaram ou não e também observar a iniciação aos pensamentos
matemáticos, pois, de acordo com Passos e Oliveira (2007 apud SOUZA; CARNEIRO,
2015, p. 237), “a leitura e o entendimento da narrativa favorecem e potencializam
processos cognitivos importantes para capacitar a criança a penetrar no estudo da
matemática como uma área de conhecimento que exige a compreensão da sua linguagem
específica e de raciocínios próprios para a solução de problemas”.
Percebemos que a narrativa presente no livro escolhido influenciou muito o
pensamento das crianças durante a resolução e a elaboração de problemas nas atividades
posteriores e foi um caminho para que elas pensassem sobre o processo matemático. Esse
fato evidenciou a importância de abordar atividades que envolvam o texto, para que não

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se trabalhe apenas com as atividades matemáticas, em detrimento da história infantil. Ao
enfatizar apenas a matemática presente nas histórias, as crianças podem associar o livro a
essa disciplina e perder o gosto pela leitura.

Episódio 2:

Durante a realização do primeiro problema, o qual era: “A mãe da Centopeinha estava


arrumando a mesa do café da manhã para ela e sua filha, quantos lugares teria que colocar? E
se recebesse a visita da Joaninha?”, com os alunos em trio, fiz a leitura do problema e eles
rapidamente deram resposta correta, por isso, ampliei as questões:
Professora: O que aconteceu quando a Joaninha chegou?
Alunos: Colocou mais três (lugares)!
Professora: Três?
Alunos: Um!
Professora: Ah, colocou mais uma... Então o que aconteceu? Antes da Joaninha
chegar, tinham quantos?
Alunos: Dois!
Professora: Então, o que aconteceu?
Alunos: Colocaram três!
Professora: Colocou mais três ou colocou mais um?
Alunos: Um!
Professora Regente: Por que colocou mais um lugar?
Alunos: Porque a Joaninha chegou.
Professora Regente: E o que aconteceu quando ela chegou?
Aluna: Pegou a cadeira.
Professora Regente: Chegou mais uma pessoa, o que aconteceu?
Aluno: Tomaram café!
Nesse momento, nós queríamos que eles entendessem que, quando a Joaninha chegou
para tomar café, aumentou uma pessoa. Por isso, foi preciso explicar:
Professora: Pegou uma cadeira e ficou três, né? Então, olha só, diminuiu o número
de pessoas ou aumentou o número de pessoas?
Alunos: Aumentou!
Professora: E se tivesse apenas a Centopeia mãe e Centopeia filha, e a Centopeia filha
fosse embora, quantos lugares seriam?
Algumas crianças responderam dois e algumas, um. Perguntei o que aconteceu quando
ela foi embora, e eles responderam que havia sobrado uma cadeira.

Elaboramos esse problema pensando nas ilustrações presentes no livro, já que


Souza e Carneiro (2015) destacam que “a ilustração pode auxiliar a compreensão de um
conceito ou ideia matemática”, e nesse problema trabalhávamos conceitos de adição e
subtração a partir da arrumação da mesa.
Consideramos que a resolução de problemas que envolve o tema da história é
importante, já que incentiva as crianças “a aprender novas noções matemáticas e a utilizar
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melhor as já aprendidas” (ZACARIAS; MORO, 2005, p. 278). Nesse episódio,
conseguimos observar a apropriação de ideias da adição e da subtração, percebidas nas
falas das crianças, sem que precisassem do algoritmo formal dessas operações.
Essa discussão possibilitou verificarmos situações que vão ao encontro das ideias
de Zacarias e Moro (2005), que defendem a resolução de problemas que partam de
situações contextualizadas, despertando a criança para a atividade e permitindo que ela
crie diferentes soluções para o problema apresentado.

Episódio 3:

Ao pedir a resolução do segundo problema, que falava sobre a quantidade de pães de queijo,
em que a questão era: “Se na mesa de café da manhã houvesse dez pães de queijo, quantos
pães cada pessoa iria comer, se tivesse a Centopeia mãe e a Centopeia filha?”. A primeira
resposta, vinda da maioria da turma, foi dois. Nesse momento, uma criança respondeu:
Aluno: Cinco pra cada um! (Levantou as mãos para mostrar que era cinco para cada
um).
Professora: Cinco pra cada um? Será que é verdade?
Alunos: Sim!
Professora: Como vamos saber se é verdade?
O mesmo aluno que havia dado a resposta correta explicou: Tinham dez (mostrou as
duas mãos), deu cinco para um (afastou uma das mãos) e deu cinco para outro (afastou a outra
mão) e não sobra nada, acabou.
Professora: Não sobra nada por quê?
Alunos: Comeram tudo!
Professora: Isso, comeram tudo... E se a Joaninha chegasse? Teria como dividir igual?
As repostam ficaram divididas, algumas crianças respondem que sim e outras que não.
Por isso, a professora regente explicou novamente que são dez pães para três pessoas, e que
teria que dividir igualmente. Eles então responderam que não. Ela perguntou se alguém ficaria
com mais ou com menos. Um aluno disse que ia partir os pães. “Ia partir os pães para que
desse mais?” eu perguntei, e eles responderam que sim. Uma criança disse que alguém ficaria
com menos e, então, eu questionei se alguém ficaria com muito mais e eles disseram que sim,
mas uma criança teve a ideia de dividir os inteiros e partir aqueles que sobrassem durante a
divisão. Indaguei se daria para fazer mais alguma coisa ou se essa última ideia era a melhor
forma, a maioria dos alunos disse que essa seria a melhor forma. Então, compreendemos que
eles entenderam o problema e passamos para o próximo.

A vivência descrita nesse episódio permitiu visualizar as formas diferentes de


resolução que as crianças apresentaram para um problema de divisão. Esse episódio
evidenciou também que os alunos novamente realizaram uma operação, sem a
necessidade do algoritmo da divisão, o que corrobora a perspectiva de Passos e Romanatto
(2010, p. 51) da necessidade de

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enfatizar, por meio de metodologias diferenciadas, os conceitos
matemáticos, sobrepondo-se às regras e técnicas que são memorizadas
e, por muitos, esquecidas. Devemos ressaltar que não é para se
abandonar regras e técnicas e nem mesmo a memória. No entanto, tais
aspectos envolvendo o aprendizado da Matemática só têm sentido se
forem articulados aos conceitos e princípios matemáticos.

Além disso, as crianças pensaram em diversas soluções para o mesmo problema,


reafirmando o pensamento de Zacarias e Moro (2005, p. 278), quando afirmam que o
trabalho com livros de história permite trabalhar a questão de

propor problemas de aritmética elementar para as crianças irem


resolvendo. E as próprias histórias podem trazer dados importantes para
que alguma solução a esses problemas seja encontrada. [...] As questões
colocadas farão com que elas debatam, dialoguem, critiquem e criem
diversas estratégias de solução.

Ressaltamos também que o fato de discutirmos a divisão exata e depois a que


possuía resto explicitou que as crianças, mesmo muito pequenas, já podem apresentar
ideias da fração, pois elas sugeriram que os pães de queijo que sobrassem fossem partidos
e divididos entre as Centopeias e a Joaninha.

Episódio 4:

No momento de montagem do gráfico, a fim de visualizar quantas e quais cores


apareceram na centopeia montada pela turma, primeiro perguntei qual a cor que mais aparece,
eles disseram que era o rosa. Pedi para olharem para a centopeia para confirmar a informação.
Depois questionei qual cor tem menos e, rapidamente eles responderam: “amarelo!”,
novamente pedi para que confirmassem olhando para a centopeia.
Para a análise do gráfico, perguntei quanto havia de cada cor, e eles deram as respostas
corretas rapidamente. Fiz algumas questões para que utilizassem a adição; por exemplo, se a
gente somasse a cor rosa com a cor laranja, quanto teríamos? As respostas foram diversas, por
isso precisei repetir a pergunta, dando ênfase à quantidade de cada cor e, assim, eles
conseguiram dar a resposta.
Perguntei também quantas opções de cor havia no gráfico, e eles logo responderam:
“cinco!”. Com isso indaguei: “Se a gente tirasse a cor verde e a cor amarela, quantas cores
ficariam?”. E eles disseram: “três!”. Uma criança disse que ficaria zero, então, voltei à
questão e a realizei, mostrando os dedos da mão para que eles conseguissem visualizar que
duas são retiradas, ficando apenas três. Questionei o porquê a cor que mais apareceu foi rosa,
e uma criança disse que foi porque todos escolheram rosa.

Esse episódio permitiu perceber quantas informações um gráfico contém e como


os alunos conseguiram percebê-las. O trabalho com gráficos no Ensino Fundamental é
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importante, para que eles consigam interpretar e analisar os diferentes tipos presentes em
situações cotidianas, já que eles aparecem em jornais, revistas, programas de TV, internet,
etc. e apresentam informações sobre os mais diversos assuntos.
A partir dessa atividade também foi possível que as crianças aprendessem novos
conceitos, auxiliando-as nesse processo de aprendizagem. Para Moisés (1997 apud
SILVA, 2012, p. 52):

A formação de conceitos na criança ocorre em um processo longo, em


um curso em que um elo de ligação de um conceito ao outro faz surgir
um novo conceito, mas a descrição e a verbalização dos mesmos não é
imediata. É um processo que vai se formando e expandindo a cada nova
experiência [...] entre conceitos construídos no cotidiano.

Isso esteve muito presente nessa atividade, já que utilizamos os conceitos de


subtração, adição e da relação entre o algarismo e a quantidade, para que os alunos
construíssem conceitos presentes no gráfico e na sua análise. Mesmo com a realização
dessa atividade, para que os conceitos propostos sejam aprendidos, de fato, pelos alunos,
eles devem ter mais contatos com os gráficos em outras atividades.

Realização das atividades: 2.° ano

As atividades, nessa turma, aconteceram em 12 e 14 de setembro de 2018 no período


da manhã, em uma escola estadual da cidade de Juiz de Fora.

Episódio 1:

Ao ler o último problema, que dizia: “Há cinco chapéus e cinco sombrinhas, quantas
combinações é possível realizar para Centopeinha e sua mãe?”, a resposta imediata da turma foi
dez. Perguntei se eles não precisavam desenhar para ver, eles disseram que não; então,
questionei como chegaram à resposta e eles disseram que era cinco mais cinco, que dá dez.
A partir dessa resposta, percebi que eles não entenderam que deveriam fazer as
combinações e, por isso, houve a necessidade de explicar mais de uma vez que era preciso juntar
a sombrinha com o chapéu. Reforcei a ideia de que eles podiam fazer desenhos para conseguir
juntar a sombrinha com o chapéu e, ainda assim, algumas crianças somaram (cinco mais cinco)
e mostraram como resposta o dez.
Depois de alguns minutos, e de muitas vezes ter voltado à explicação e ter dito que não
era pra somar, um aluno encontrou a resposta, fazendo o desenho e juntando um a um.

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Nesse momento, trabalhamos o produto cartesiano, que é uma das ideias presentes
na estrutura multiplicativa (PASSOS; ROMANATTO, 2010) e que, por isso, é abordado
nos anos iniciais, ou seja, queremos saber quais são as maneiras possíveis de combinar os
cinco chapéus com as cinco sombrinhas que as Centopeias tinham.
Estávamos esperando que os alunos entendessem rapidamente o que foi solicitado,
porém, eles apresentaram muita dificuldade e precisaram da ajuda do desenho para que o
problema fosse solucionado. Esse episódio mostra a importância do registro para ajudar
a criança pensar e confirma a consideração de Selva e Brandão (2000 apud ZACARIAS;
MORO, 2005, p. 296) de que “o registro escrito apoia os cálculos realizados,
possibilitando a reorganização do processo de raciocínio e favorecendo o avanço no
registro das operações”.
Além disso, permitiu à pesquisadora perceber que, às vezes, por falta de
compreensão do conceito – nesse caso, do que era uma combinação –, as crianças têm
dificuldade para resolver a situação-problema. Esse fato pode ocorrer também porque a
matemática se utiliza de termos que Machado (2011) denomina de anfíbios, que são
aqueles têm diferentes significados na língua materna e na matemática, como, por
exemplo, aparar as arestas, chegar a um denominador comum e o xis da questão.

Episódio 2:

No momento em que pedi para que eles criassem um problema, algumas duplas
pensaram em problemas cotidianos, como: “A rua estava quebrada por um problema de
encanamento” e “A nuvem aparece em um dia e, no outro, não aparece mais”. E ainda, em
alguns problemas que traziam fatos relacionados à história: “A Joaninha desmaia porque
busca muitos sapatos” e consideraram que isso era um problema; em outra dupla, as crianças
me disseram que eram as centopeias que deveriam buscar seus próprios sapatos.

Na elaboração do problema, as crianças tiveram muita dificuldade e, por isso, essa


atividade precisou de muitas intervenções das professoras, para que os alunos
conseguissem elaborá-los. No episódio descrito, percebemos que eles relacionaram fatos
da história aos problemas que queriam formular, confirmando que utilizaram o contexto
da história para auxiliar no processo de situações-problemas, o que permitiu “a reflexão
e/ou o diálogo sobre os elementos, aspectos, ideias, conceitos matemáticos e outras áreas
do conhecimento, bem como sobre as diferentes visões de mundo” (SOUZA;
CARNEIRO, 2015, p. 237).
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Ainda nesse episódio, ressaltamos que as crianças extrapolaram a construção de
problemas matemáticos e criaram situações relacionadas a problemas corriqueiros que
acontecem em nossa vida. Isso evidenciou uma outra representação de problema, que a
pesquisadora não estava esperando encontrar, e levou-a a enfrentar uma situação
inesperada, o que acontece diversas vezes em sala de aula.
Além disso, proporcionou o desenvolvimento cognitivo e imagético da criança, já
que a professora não desestimulou o pensamento do aluno. Ainda, mostrou que a
elaboração de problemas permite que os alunos criem suas próprias histórias matemáticas,
“sobre situações que lhes sejam familiares e que envolvam um problema a ser resolvido
por ideias matemáticas” (KLIMAN; RICHARDS, 1992 apud SOUZA; CARNEIRO,
2015, p. 238).

Episódio 3:

Perguntei também se eles achavam que a centopeia que construímos era maior ou
menor que a da história, e a maioria da turma rapidamente respondeu que era maior. “Quantos
pés vocês acham que a nossa centopeia tem?” e as respostas novamente variaram muito, por
isso, pedi para que falassem um de cada vez e fui anotando as possibilidades no quadro: 20,
40, 41, 22, 33, 21, 50, 30, 100. Em seguida, contei com eles quantos pés a centopeia que
fizemos tinha e descobrimos que ela possuía 42 pés.
Conversei com eles que houve pessoas que chegaram bem perto da resposta, como as
que disseram 40 e 41. E, como estávamos comparando a nossa centopeia com a da história,
disse para a turma que a centopeia da história possuía 14 pés, e eles compreenderam que a
nossa era muito maior.

Destacamos nesse episódio o fato de algumas crianças chegarem próximas da


quantidade de pés da centopeia somente pelo olhar, mostrando que é possível que
consigam ter uma noção em relação a quantidades.
Além disso, foi perceptível, nesse momento, o interesse das crianças em contar e
observar atentamente elementos presentes na história, o que vai ao encontro do
pensamento de Nunes e Bryant (1997 apud ZACARIAS; MORO, 2005) de que a
centopeia elaborada envolvia “valores que estavam relacionados a elementos da história
e, por isso, devem ter sentido para as crianças”.

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Episódio 4:

Primeiro, perguntei qual cor teve mais quantidade e eles responderam rosa e verde,
percebendo que houve um empate. Disseram que todas as cores poderiam dar empate, e eu
expliquei que não teria como isso acontecer, já que não havia pessoas suficientes para completar
o que faltava nas outras cores. Questionei quantas pessoas coloriram com cada uma das cores
presentes no gráfico, e as crianças conseguiram identificar corretamente as quantidades.
Professora: Se a gente somar a cor verde com a cor rosa, quanto dá?
Alunos: Oito... Doze!
Professora: Doze, porque tem seis no verde e seis no rosa, então seis mais seis é igual
a doze.
Professora: Se fizéssemos o verde menos o azul? Quanto daria?
Alunos: Quatro... Três...

Nessa situação vivenciada, buscamos reforçar os conceitos de adição e subtração,


e ainda destacar o empate que aconteceu com as cores, além de interpretar as informações
presentes no gráfico. Apreender conceitos matemáticos de maneira contextualizada fez
com que esse processo fosse mais significativo e envolvente para as crianças, o que foi
possível visualizar nessa atividade. Por isso, trabalhamos adição e subtração a partir do
gráfico, “buscando propiciar aos alunos condições para entender/contextualizar a
matemática, provocando um redimensionamento dos conceitos já conhecidos”
(NEUENFELDT, 2006 apud SOUZA; CARNEIRO, 2015, p. 244).

Algumas Considerações

O trabalho com histórias infantis e matemática, realizado conjuntamente, mostrou-


nos caminhos e possibilidades de potencializar o ensino de noções e conteúdos
matemáticos e também da língua materna, permitindo que as crianças desvendassem
possibilidades e estratégias para a resolução das atividades propostas.
Diante do exposto, fica clara a importância de realizar esse trabalho, a fim de que as
crianças entrem em contato com livros de histórias infantis e também permita que elas
desvendem e aproveitem a história de outras maneiras.
Portanto, esse trabalho é possível de ser realizado em sala de aula, de maneira a
promover maior interesse das crianças para as atividades matemáticas e ainda como uma
forma de desenvolver a imaginação. Ele também possibilitou a exploração das ilustrações
da história, que muitas vezes passam despercebidas, e a elaboração e a resolução de

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problemas matemáticos contextualizados. Ressaltamos o cuidado de não tornar as
atividades repetitivas e de retirar a ideia principal da narrativa escolhida.

Integrar a literatura nas aulas de matemática representa uma substancial


mudança no ensino tradicional da matemática, pois, em atividades deste
tipo, os alunos não aprendem primeiro a matemática para depois aplicar
na história, mas exploram a matemática e a história ao mesmo tempo.
(SMOLE et al., 2004, p. 2)

Desse modo, consideramos os resultados aqui apresentados importantes, já que


em algumas situações tivemos interações que aconteceram além do esperado, como no
momento em que alunos formularam problemas cotidianos e não matemáticos. Isso nos
fez refletir sobre a importância de permitir que a criança participe do processo de ensino
e aprendizagem e que tenham liberdade para criar.
Além disso, as crianças apresentaram conceitos matemáticos de fração, das
operações, de gráfico, de maneira lúdica e sem a necessidade de utilização de fórmulas e
procedimentos matemáticos que são enfatizados na escola, demonstrando que, mesmo
sendo muito pequenas, já conseguem ter noções matemáticas que serão abordadas
somente em outros anos e em níveis escolares futuros.

Referências

BOGDAN, Robert C.; BIKLEN, Sari Knopp. Investigação qualitativa em educação: uma
introdução à teoria e aos métodos. Porto: Porto Editora, 1994.

CAMARGO, Milton. As centopeias e seus sapatinhos. São Paulo: Ática, 2009.

COLINS, Fábio; MACHADO, Arthur G.; GONÇALVES, Tadeu O. Alfabetização


matemática e literatura infantil: possibilidades para uma prática integrada. Revista de
Educação em Ciências e Matemática, Amazônia, v. 13, p. 75-84, 2016.

MACHADO, Nílson J. Matemática e língua materna: análise de uma impregnação


mútua. São Paulo: Cortez, 2011.

PASSOS, Cármen L. B.; ROMANATTO, Mauro C. A matemática na formação de


professores dos anos iniciais: aspectos teóricos e metodológicos. São Carlos: EdUFSCar,
2010.

SILVA, Adelmo C. Literatura infantil e a formação de conceitos matemáticos em crianças


pequenas. Ciência & Cognição, Rio de Janeiro, v. 17, p. 37-57, 2012.

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SMOLE, Kátia C. S.; DINIZ, Maria I. Ler, escrever e resolver problemas: habilidades
básicas para aprender matemática. Porto Alegre: Artmed, 2001.

SMOLE, Kátia C. S. et al. Era uma vez na matemática: uma conexão com a literatura
infantil. 5. ed. São Paulo: Centro de Aperfeiçoamento do Ensino de Matemática - CAEM,
2004.

SOUZA, Ana Paula G.; CARNEIRO, Reginaldo F. Um ensaio teórico sobre literatura
infantil e matemática: práticas de sala de aula. Educação Matemática Pesquisa, São
Paulo, v. 17, n. 2, p. 231-257, 2015.

ZACARIAS, Eloísa; MORO, Maria Lucia F. A matemática das crianças pequenas e a


literatura infantil. Educar, Curitiba, v. 25, p. 275-299, 2005.

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