O Estado de Mato Grosso do Sul – 8 de junho de 2021
Tudo isso e muito mais, além do cinismo institucionalizado na cultura miliciana do
vale-tudo nos tempos do nazismo de Hitler, e do fascismo de Mussolini, Franco e Salazar. Hoje tem muita gente que não viveu aqueles tenebrosos dias mas gostaria de revivê-los, como membros da “supremacia branca”, como algozes e não como vítimas. É triste, mas até compreensível, em se considerando a ignorância e o negativismo de que são possuí- dos. Hanna Arendt, filósofa alemã de origem judaica, citada na CPI da Covid-19, em “Origens do Totalitarismo” descreve como o nazismo, o fascismo e os totalitarismos usam a mentira para justificarem e encobrirem seus erros e crimes. Ela foi lembrada frente aos “depoimentos” (lamentável descaramento de pessoas que um dia foram chamadas de autoridades da República) do general Eduardo Pazuello, Ernesto Araújo, Fábio Wajngar- ten e outros defensores de Bolsonaro, atual presidente do Brasil. Arendt (1906-1975), uma das mais brilhantes intelectuais do século XX, passou por três respeitáveis instituições acadêmicas (Universidade de Heidelberg, Universidade de Marburg e Universidade de Freiburg) sendo influenciada por Martin Heidegger, Aristó- teles e Immanuel Kant. Consta que aos dezesseis anos já teria lido as obras de Soren Kierkegaard. A filósofa, exercendo o papel de jornalista, acompanhou os “julgamentos de Nu- remberg” e, com aguçado senso analítico, traçou o perfil dos réus. Desagradou as lide- ranças judaicas que imaginavam os nazistas como “super-demônios” pensantes e capazes de agir por iniciativa própria, em todos os momentos de suas “missões” genocidas. Arendt percebeu que dentro dos vistosos uniformes cheios de estrelas, encontra- vam-se arrogantes e medíocres cumpridores de ordens, na base de “um manda e o outro obedece”. Gananciosos e embrutecidos seguidores de um “genocida chefe”, só pensavam na glória de cargos e das benesses materiais daí decorrentes. Faziam qualquer coisa para não caírem em desgraça, para não serem punidos, rebaixados ou descartados. Para a filósofa, muitas pessoas, apesar dos diplomas, eram apenas charlatães que se autodenominavam cientistas para praticarem atrocidades e ficarem impunes. Serviam como escudos para as práticas genocidas dos superiores. Na maioria das vezes estavam fora da linha hierárquica, atuavam em estruturas paralelas. Influentes e à espera de re- compensas operavam como fantoches. Tais práticas se repetem no Brasil de hoje. Os fanáticos seguidores, diz Arendt, se deixavam convencer, inebriados pelas men- tiras e charlatanismos de uma ideologia que prometia tudo, inclusive exterminar impune- mente os adversários de suas preconceituosas ideias. Os negacionistas, destilavam obs- curantismo e tudo faziam para destruir as liberdades democráticas. Tal como hoje, defen- diam o armamento coletivo, a violência e a impunidade. Paul Roland, historiador, referindo-se aos fascistas e nazistas, diz que “na vida real, os criminosos e os assassinos são pessoas inexpressivas, sem personalidade, assim como sem compaixão e consciência”. Hoje, são os anarquistas que se lançam, em “moto carre- atas”, quais cavaleiros de aço, contra as instituições. Seguem um líder, bradando Mito! Mito! .
Aldo Fornazieri, analisando o contexto político brasileiro, sem contestar as conclu-
sões de Arendt, se contrapõe dizendo que os “Filósofos políticos modernos, de Maquiavel a Hegel, diziam que no senso comum há a verdade e o erro infinito, o extravio. Os políti- cos demagógicos, mentirosos e criminosos sabem e se valem disso. Sempre existirão aqueles que se deixarão enganar, mesmo indivíduos com formação universitária. A am- plitude e o grau do engano dependem das circunstâncias”. Fornazieri vai além, em se tratando da pandemia no Brasil: “À luz da legislação nacional e internacional, parece ser factível imputar a Bolsonaro a prática de crimes con- tra a humanidade”. E faz uma detalhada retrospectiva jurídica desde a Convenção de Pre- venção e Repressão do Crime de Genocídio (1948), que entrou em vigor em 1951, até os dias atuais. LANDES PEREIRA. Economista e professor universitário com doutorado.