Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Édouard Manet, “Le déjeuner sur l’herbe” [1862-1863], Museu d’Orsay, Paris.
A “tradição moderna” de que fala Antoine Compagnon seria absurda, pois seria uma tradição feita
de rupturas: na medida em que cada geração rompe com o passado, a ruptura em si torna-se tradição.
O autor inicia sua análise a partir de uma citação de Octavio Paz, segundo quem a “tradição
moderna” é uma aporia, um impasse lógico, uma tradição voltada contra si mesma, que ao mesmo
tempo afirma e nega a arte, que decreta, simultaneamente, sua vida e sua morte. A tradição moderna
seria então tradição da negação, consequência do reconhecimento do novo como valor.
A “crônica intermitente” da tradição moderna passa pelo que Compagnon aponta como Os cinco
paradoxos da modernidade: a superstição do novo; a religião do futuro; a mania teórica; o apelo à
cultura de massa; por fim, a paixão da negação. A cada um desses paradoxos da estética do novo
corresponderia, respectivamente, um momento de crise da dita tradição: 1863, ano em que Manet
pintou os quadros “O almoço na relva” [Le Déjeneur sur l’Herbe] e “Olympia” – momento que
Compagnon também data simplesmente como contemporâneo de Baudelaire; 1913, com as colagens
de Picasso e Braque, os caligramas de Apollinaire, os ready-made de Duchamp, os primeiros
quadros abstratos de Kandinsky e A la recherche du temps perdu de Proust; 1924, data do primeiro
Manifesto do Surrealismo, corresponderia à mania teórica; da guerra fria a 1968, corresponde ao
apelo à cultura de massa e da relação da arte com o mercado através da pop art e da atuação de
artistas como Andy Warhol, Jasper Jones, Rauschenberg; a quinta crise, correspondente ao quinto
paradoxo, seria datada a partir dos anos 80, em que a consciência do moderno teria se tornado mais
aguda, chegando aos questionamentos sobre a pós-modernidade.
Desenvolvendo e articulando questões postas pelas análises da modernidade de Hegel – o fim da arte
–, Nietzsche – o eterno retorno – e Walter Benjamin – a história dos restos da história e o
reconhecimento de Baudelaire como marco histórico de ruptura, para quem o novo é desesperado
pois arrancado do desastre de amanhã –, Compagnon constrói um interessante e pertinente raciocínio
filosófico e literário, pautado por reflexões sobre a história e a arte. Sua perspectiva estética,
baudelaireana, desenrola-se sobre a compreensão de uma dialética da consciência do moderno e sua
falência ou recusa. Assim, compreende a própria arte como testemunho da ilusão do moderno, capaz
de esvaziar a noção temporal de progresso e assim abrir a história para um vazio.
Tags: CUPANI Alberto (Aut), Editora da UFSC (E), Filosofia da tecnologia: um convite