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Teatro popular

D. Manuel, o Venturoso
1498: Vasco da Gama
ultrapassou o Cabo das
Tormentas
Inaugurada a rota
comercial em direção às
especiarias orientais
1500: descobrimento do
Brasil
Estado: absolutismo
Reinado: perseguição feita a judeus e
muçulmanos (1496 a 1498)
Massacre de Lisboa (1506): uma das
consequências políticas para agradar aos reis
católicos, cumprindo uma das cláusulas do seu
contrato de casamento com a herdeira de
Espanha, Isabel de Aragão.
Conversões forçadas dos judeus
Inquisição em Portugal (1515)
Estilo Manuelino
Convento de Jesus Convento de Santa
Cristo - Lisboa Maria
Torre de Belém
Gil Vicente
*(?)1452, 1465 ou 1470. Supõe-se tenha falecido em
+: +:1537
Trabalhava junto à corte, como mestre da balança
(ou seja, diretor da Casa da Moeda), a mais
provável.
Em 1502, por ocasião do nascimento do príncipe
D. João III, representou perante a rainha mãe,
ainda acamada, a peça Auto da visitação (ou
Monólogo do vaqueiro). Com ela iniciava o teatro
em Portugal.
Biografia hipotética
O último, "Floresta de Enganos", foi escrito em 1536,
ano que se presume seja o da sua morte.
Em sua biografia quase tudo são hipóteses, inclusive a
cidade portuguesa, que teria sido seu berço natal
(provavelmente em Guimarães)
Três pessoas e um só autor?
 Casado duas vezes, teve cinco filhos, incluindo Paula e Luís Vicente, o qual
organizou a primeira compilação das suas obras.
Em estudos, há referência a três pessoas denominadas Gil Vicente:

 início do século 16, há referência a um Gil Vicente na corte,


participando dos torneios poéticos;

 em documentos da época, aparece outro Gil Vicente, ourives, a quem


é atribuída a Custódia de Belém (1506), recipiente para exposição de
hóstias feita com mais de 500 peças de ouro.

 há ainda mais um Gil Vicente que foi "mestre da balança" da Casa da


Moeda; alguns acreditam ainda ter sido algum mercador.

Gil Vicente - incógnito
Alguns autores defendem, sem provas, que os três
seriam a mesma pessoa, embora a identificação do
dramaturgo com o ourives seja mais viável, dada a
abundância de termos técnicos de ourivesaria nos
seus autos.
Obras proibidas
Alguns dos autos foram impressos sob a forma de
folhetos e a primeira edição do conjunto das obras
foi feita em 1562, organizada por Luís Vicente.

Dessa primeira compilação não constam três dos


autos escritos por Gil Vicente, provavelmente por
terem sido proibidos pela Inquisição.

O índice dos livros proibidos, de 1551, incluía sete


obras do autor.
Transição medieval-renascentista
Gil Vicente foi considerado um autor de transição
entre a Idade Média e o Renascimento.
A estrutura das suas peças e muitos dos temas
tratados foram desenvolvidos a partir do teatro
medieval, defendendo, por exemplo, valores
religiosos. No entanto, alguns apontam já para
uma concepção humanista, assumindo posições
críticas.
Crítica
Em 1531, em carta ao rei, Gil Vicente defendeu os
novos cristãos, a quem tinha sido atribuída a
responsabilidade pelo terremoto de Santarém;
também no "Auto da Índia" apresentou uma visão
antiépica da expansão ultramarina.
Gênero
Gil Vicente classificou suas peças dividindo-as em três
grupos: obras de devoção, farsas e comédias. Seu filho,
Luís Vicente acrescentou um quarto gênero, a
tragicomédia.

Estudiosos recentes preferem considerar os seguintes


tipos: autos de moralidade, autos cavaleirescos e pastoris,
farsas, e alegorias de temas profanos. No entanto, é preciso
lembrar que, por vezes, na mesma peça encontramos
elementos característicos de vários desses gêneros.
Estilo
Gil Vicente vai muito além daquilo que, antes dele, se
fazia em Portugal. Revela um gênio dramático capaz de
encontrar soluções técnicas à medida das necessidades.
A dimensão e a riqueza da sua obra constituem um
retrato vivo da sociedade portuguesa, nas primeiras
décadas do século XVI, onde estão presentes todas as
classes sociais, com os seus traços específicos, seus
vícios e suas preocupações.

Também no aspecto linguístico o valor documental da


sua obra é inestimável e constitui uma grande fonte de
informação sobre o início do século XVI em Portugal.
Temática
Em sua obra criticou a sociedade portuguesa da
época: não lhe escapou classe social alguma. Suas
peças eram, em geral, representadas nos paços
reais, com a corte presente.
Os cenários e os recursos técnicos eram pobres
Os temas engenhosos, as personagens decalcadas
da realidade e a agilidade do diálogo, além do
humor
Principais obras
Principais obras: Auto da Barca do Inferno, Auto
da Barca do Purgatório e Auto da Barca da Glória
(a chamada Trilogia das barcas), Auto da Índia,
Farsa de Inês Pereira.
Apesar da dificuldade que poderá ocorrer na
leitura e representação de suas peças, por causa da
linguagem antiga, vale a pena conhecer esse
autêntico gênio do teatro português de todos os
tempos.
Farsa de Inês Pereira.

Inês Pereira é uma jovem solteira que sofre a


pressão constante do casamento, e reclama da
sorte por estar presa em casa, aos serviços
domésticos, cansando-se deles.
Imagina casar-se com um homem alegre, bem-
humorado, galante e que goste de dançar e cantar.
Isso se percebe na primeira conversa estabelecida
com sua mãe e Leonor Vaz, sua amiga.
Visão pragmátrica do matrimônio
Essas duas têm uma visão mais prática do
matrimônio: o que importa é que o marido cumpra
suas obrigações financeiras, enquanto que Inês está
apenas preocupada com o lado prazeroso, cortesão.
1º candidato
O primeiro candidato, apresentado por Leonor
Vaz, é Pero Marques, camponês de posses, o que
satisfazia a ideia de marido, na visão de sua mãe,
mas era extremamente simplório, grosseirão,
desajeitado, fatos que desagradam Inês. Por isso
Pero Marques é descartado pela moça.

2º e 3º candidatos
Aceita então a proposta de dois judeus casamenteiros
divertidíssimos, Latão e Vidal; todavia, estes se
interessam apenas pelo dinheiro que o casamento
arranjado pode lhes render, não dando importância
ao bem-estar da moça.
4º candidato
Então lhe apresentam Brás da Mata, um escudeiro.
Este é exatamente do jeito que Inês esperava, apesar
das desconfianças de sua mãe.
Revelação
Eles se casam. No entanto, consumado o casamento,
Brás, seu marido, mostra ser tirano, proibindo-a de
tudo, até de ir à janela. Chegava a pregar as janelas
para que Inês não olhasse para a rua. Proibia Inês de
cantar dentro de casa, pois queria uma mulher
obediente e discreta.
Viuvês
Encarcerada em sua própria casa, Inês encontra sua
desgraça. Mas a desventura dura pouco pois Brás
torna-se cavaleiro e é chamado para a guerra, onde
morre nas mãos de um mouro quando fugia de forma
covarde.
Retorno ao passado
Viúva e mais experiente, fingindo tristeza pela morte
do marido tirano, Inês aceita casar-se com Pero
Marques, seu antigo pretendente.
Aproveitando-se da ingenuidade de Pero, o trai
descaradamente, quando é procurada por um ermitão
o qual tinha sido um antigo apaixonado seu.
Ditado popular
Marcam um encontro na ermida e Inês exige que
Pero, seu marido, a leve ao encontro do ermitão.
Ele obedece colocando-a montada em suas costas
e levando Inês ao encontro do amante. 
Consuma-se assim o tema, que era um ditado
popular de que "é melhor um asno que nos
carregue do que um cavalo que nos derrube".
O velho da Horta
A ação se inicia quando a Moça vai à horta do Velho
buscar hortaliças, e este se apaixona perdidamente por ela.
No diálogo entre ambos estabelecem-se dois planos de
linguagem: a linguagem galanteadora do Velho,
estereotipada, repleta de lugares-comuns da poesia
palaciana do Cancioneiro Geral, cujo artificialismo Gil
Vicente parodia ironicamente, e a linguagem zombeteira e
às vezes mordaz da Moça que não se deixa enganar pelas
palavras encantadoras do pretendente e não se sente
atraída nem por ele , nem por sua fortuna, nem por sua
"lábia" cortesã. São duas visões opostas da realidade: a
visão idealizadora do Velho apaixonado e a visão realista
da Moça.
Alcoviteira
Uma alcoviteira promete ao Velho a posse da jovem
amada e, com isso, vai extorquindo todo seu dinheiro. Na
cena final, o Velho, desenganado, só, e reduzido à pobreza,
pois gastara tudo o que tinha, deixando ao desamparo suas
quatro filhas, reconhece o seu engano e se arrepende.

A Alcoviteira é açoitada, e a Moça casa-se honestamente


com um belo rapaz. A introdução ao texto da peça
esclarece que a farsa foi encenada em 1512, na presença de
D. Manuel I, rei de Portugal.
Auto da Lusitânia
O Auto da Lusitânia, uma das últimas peças de Gil vicente,
foi escrito em 1531 e representado pela primeira vez em
1532, perante a corte de D. João III quando nasceu seu filho,
D. Manuel.

A peça trata das bodas de Lusitânia e Portugal


(personagens mitológicos), mas Gil Vicente, como muitas
vezes faz, mistura no enredo e nos diálogos muitos temas,
personagens, e cenas que constituem como "diversões" à
margem do tema maior.
Fantasia alegórica
 O texto tem ressonâncias no presente de Gil Vicente, que busca
formar um panorama de sua terra, apreendendo a totalidade de suas
raízes culturais.
O Auto da Lusitânia classifica-se como uma fantasia alegórica. A peça
é dividida em duas partes distintas:
- na primeira parte, assiste-se às atribuições de uma família judaica;
- na segunda parte, assiste-se ao casamento de Portugal, cavaleiro
grego, com a princesa Lusitânia. Dois demônios, Belzebu e Dinato,
que aparecem no texto vêm presenciar o casamento e escutam o
diálogo entre Todo o Mundo e Ninguém.
Personagens
 O autor deu o nome de Todo o Mundo e Ninguém às suas
personagens principais desta cena. Pretendeu com isso fazer humor,
caracterizando o rico mercador, cheio de ganância, vaidade,
petulância, como se ele representasse a maioria das pessoas na terra
(todo o mundo). E atribuindo ao pobre, virtuoso, modesto, o nome de
Ninguém, para demonstrar que praticamente ninguém é assim no
mundo.
"Todo o Mundo" era um rico mercador, e "Ninguém", um homem
pobre. Belzebu e Dinato tecem comentários espirituosos, fazem
trocadilhos, procurando evidenciar temas ligados à verdade, à cobiça,
à vaidade, à virtude e à honra dos homens.
Todo mundo e Ninguém
Entra Todo o Mundo, rico mercador, e faz que anda
buscando alguma cousa que perdeu; e logo após, um
homem, vestido como pobre. Este se chama Ninguém e
diz:

Ninguém: Que andas tu aí buscando?

Todo o Mundo: Mil cousas ando a buscar:


                         delas não posso achar,
                         porém ando porfiando
                         por quão bom é porfiar.
 Ninguém: Como hás nome, cavaleiro?
Todo o Mundo: Eu hei nome Todo o Mundo
                         e meu tempo todo inteiro
                         sempre é buscar dinheiro
                         e sempre nisto me fundo.
Ninguém: Eu hei nome Ninguém,
               e busco a consciência.
Belzebu: Esta é boa experiência:
             Dinato, escreve isto bem.
Dinato: Que escreverei, companheiro?
Belzebu: Que Ninguém busca consciência.
              e Todo o Mundo dinheiro.
Ninguém: E agora que buscas lá?

Todo o Mundo: Busco honra muito grande.

Ninguém: E eu virtude, que Deus mande


               que tope com ela já.

Belzebu: Outra adição nos acude:


              escreve logo aí, a fundo,
              que busca honra Todo o Mundo
              e Ninguém busca virtude.
 Ninguém: Buscas outro mor bem qu'esse?

Todo o Mundo: Busco mais quem me louvasse


                         tudo quanto eu fizesse.
Ninguém: E eu quem me repreendesse
               em cada cousa que errasse.
Belzebu: Escreve mais.
Dinato: Que tens sabido?
Belzebu: Que quer em extremo grado
              Todo o Mundo ser louvado,
              e Ninguém ser repreendido.
 Ninguém: Buscas mais, amigo meu?

Todo o Mundo: Busco a vida a quem ma dê.


Ninguém: A vida não sei que é,
               a morte conheço eu.
Belzebu: Escreve lá outra sorte.
Dinato: Que sorte?
Belzebu: Muito garrida:
              Todo o Mundo busca a vida
              e Ninguém conhece a morte.
 Todo o Mundo: E mais queria o paraíso,
                         sem mo Ninguém estorvar.
Ninguém: E eu ponho-me a pagar
               quanto devo para isso.
Belzebu: Escreve com muito aviso.
Dinato: Que escreverei?
Belzebu: Escreve
              que Todo o Mundo quer paraíso
              e Ninguém paga o que deve.
 Todo o Mundo: Folgo muito d'enganar,
                         e mentir nasceu comigo.
Ninguém: Que mais buscas?
Todo o Mundo: Lisonjear.
Ninguém: Eu sou todo desengano.
Belzebu: Escreve, ande lá, mano.
Dinato: Que me mandas assentar?
Belzebu: Põe aí mui declarado,
              não te fique no tinteiro:
              Todo o Mundo é lisonjeiro,
              e Ninguém desenganado.

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