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MÁQUINAS

ELÉTRICAS I

Vinícius Novicki Obadowski


Gerador CA
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Identificar os aspectos construtivos dos geradores de corrente alter-


nada (CA).
„„ Definir força magnetomotriz e a distribuição do fluxo em operação
como gerador.
„„ Demonstrar a relação da tensão induzida no estator a partir do rotor.

Introdução
O emprego dos geradores CA (corrente alternada) permeia toda indústria
de geração de energia elétrica moderna: à exceção das usinas solares,
todas as outras formas de geração de energia — as que envolvem con-
versão eletromecânica — dependem da operação dos geradores CA.
É o caso de centrais eólicas, hidrelétricas, termoelétricas, entre outras.
O conhecimento dos fenômenos físicos associados aos geradores permite
entender não só a conversão no sentido de geração de energia elétrica,
mas acaba servindo como base para a compreensão do sentido inverso.
Ou seja, os fundamentos são essencialmente equivalentes.
Consequentemente, estudar a geração de CA aprofundará suas no-
ções a respeito do funcionamento das máquinas elétricas de forma ge-
neralizada. Neste capítulo, você verá como definir a força magnetomotriz
e a distribuição de fluxo em operação como gerador, como identificar
os aspectos construtivos dos geradores e como demonstrar a relação da
tensão induzida no estator a partir do rotor.
2 Gerador CA

Aspectos construtivos
Os geradores de corrente alternada (CA) não diferem estruturalmente dos
motores CA. O que ocorre entre eles é a diferença na maneira como se percebe
o fluxo de energia. Para os primeiros, acontece a conversão de energia mecânica
em elétrica e, nos outros, de energia elétrica em mecânica. Consequentemente,
não há sensíveis diferenças, porém é relevante que você saiba disso para com-
preender o emprego duplo das máquinas elétricas. Todavia, cabe salientar que,
ainda assim, há pequenas diferenças construtivas, normalmente associadas
à aplicação da máquina.
Geradores CA podem ser construídos de dois tipos distintos: síncronos
e de indução (assíncronos). Naturalmente, há uma diferença de fabricação,
mas, além disso, a maneira como ocorre a formação do campo magnético e
do fluxo é diferente, embora, externamente, a percepção é que ambos geram
energia. Estruturalmente, ambas as máquinas são similares, sendo compostas
por carcaça, estator, rotor, mancais e demais acessórios (ventiladores, redutores
de ruídos, rolamentos). Do ponto de vista elétrico, você deve reconhecer uma
máquina por meio da análise de seu rotor e seu estator (Figura 1), caracterizando
se ela é síncrona ou assíncrona (de indução).

Figura 1. Estator (ao fundo) e rotor (na frente) de uma máquina de indução.
Fonte: Oleksandr Kostiuchenko/Shutterstock.com.
Gerador CA 3

Você deve analisar a estrutura do rotor: geradores de indução contêm rotores


do estilo gaiola de esquilo ou bobinados (Figura 2); enquanto os geradores
síncronos, por outro lado, serão marcados pela presença de rotores de mate-
rial ferromagnético ou de magneto permanente, sendo um rotor totalmente
arredondado (conhecido como de polos lisos) ou com pequenas saliências
entre cada polo (chamado de rotor de polos salientes). Em outros estudos de
máquinas, você conhecerá as diferenças marcantes entre cada tipo e as razões
para se empregar um ou outro, considerando vantagens e desvantagens. Neste
capítulo, você deve saber como reconhecê-los, pois o fenômeno físico de
conversão de energia ocorre da mesma forma para todos os tipos.

(a) (b)

Figura 2. a) Rotor bobinado. b) Rotor gaiola de esquilo.


Fonte: a) CyrilLutz/Shutterstock.com. b) Fouad A. Saad/Shutterstock.com.

Sobre detalhes construtivos de máquinas síncronas de ímãs permanentes, que é um


tipo específico de gerador, você pode verificar a dissertação de Teixeira (2006).
4 Gerador CA

Força magnetomotriz e distribuição de fluxo


como gerador
A operação como gerador elétrico pode ser resumida à conversão de energia
mecânica em elétrica, em que a presença de torque e rotação imposta por uma
máquina primária em um rotor submetido a um campo magnético faz surgir
uma tensão elétrica no estator. Considerando que a finalidade do gerador
CA é prover energia a uma carga, pode-se supor que, estando essa máquina
conectada a circuito fechado à carga, o surgimento da tensão faz com que uma
corrente elétrica passe pelos terminais do gerador até a carga, transmitindo
energia. Porém, você também sabe que uma corrente elétrica passando por
um condutor produz um campo magnético que induz uma força no rotor como
reação. De outra forma, a manifestação física da produção de energia no estator
ocorre como um conjugado resistente no rotor da máquina. Isto é, o gerador
elétrico busca frear o rotor, porém, com o equilíbrio do conjugado imposto
pela máquina primária com o resistivo oriundo da geração, a velocidade
estabilizará em um ponto de rotação (CHAPMAN, 2013).
Agora que você conhece conceitualmente o porquê do conjugado resistivo,
é importante também que você saiba como calculá-lo. Nesse caso, comece
entendendo o fenômeno desde o princípio. A equação 1, a seguir, demonstra
como ocorre a indução de força em um condutor.

F = i ∙ (l × B) (1)

onde F é o vetor de força mecânica, i é o valor da corrente elétrica que


passa pelo condutor, l é o vetor de comprimento que representa o condutor, e
B é o vetor densidade de fluxo magnético.
Como estamos tratando de uma espira, o surgimento de uma força dar-se-á
em sentido perpendicular aos vetores l e B, cujos detalhes para segmento do
comprimento da espira são mostrados na Figura 3.
Gerador CA 5

l para dentro da página

B l
θab r B
F r, F para dentro da página

τbc = 0

(a) (b)

F
r, F para fora da página
θcd
r

l para fora da página B B

τda = 0 l

(c) (d)

Figura 3. Vetores de força (F), densidade de campo magnético (B) e de comprimento (r)
representados para cada um dos quatro segmentos da bobina: a) ab; b) bc; c) cd; d) da.
Fonte: Adaptada de Chapman (2013).

Logo, como a espira pode ser considerada um binário, essa força mecânica
produz um torque:

𝜏=F×r
(2)
𝜏 = r F senθ

onde r é o raio referente à distância do ponto médio da espira (centro do


eixo de giro), F é o módulo da força mecânica descrita pela equação 1, e θ é
o ângulo entre a força e o vetor de comprimento.
Para o segmento ab (Figura 3a), o sentido da corrente é para dentro da
página, enquanto que o campo magnético B aponta para direita, e o produto
vetorial l × B aponta para baixo. Logo, a força induzida nesse segmento de
condutor é:
6 Gerador CA

F = i(l × B) = ilB (para baixo) (3)

e o conjugado resultante é:

𝜏ab = F r senθab = rilB senθab (4)

Os segmentos bc e da serão analisados em conjunto, pois apresentam ve-


tores em direções similares, como fica evidente pelas Figuras 3b e 3d. Nelas,
você consegue perceber que os vetores r e F têm o mesmo sentido — como
o torque é produzido pelo produto vetorial deles, o resultado é nulo. Logo,
a contribuição desses segmentos para o torque da espira não é considerada.
Por fim, o segmento cd, também similar à análise feita para o segmento ab,
apresenta sentido da corrente para fora da página, e campo magnético B
apontando para direita. Nesse caso, o produto l × B aponta para cima. Logo,
a força induzida nesse segmento de condutor é:

F = i(l × B) = ilB (para cima) (5)

e o conjugado resultante é:

𝜏cd = F r senθcd = rilB senθcd (6)

Em mãos das contribuições de conjugado de cada segmento, é possível


calcular o conjugado total:

𝜏total = rilB senθab + 0 + rilB senθcd + 0 (7)

Pela equação 7 e com o apoio visual fornecido pelos vetores na Figura 3,


é possível afirmar que os valores de θab e θcd são idênticos por simetria. Con-
sequentemente, obtemos a equação 8:

𝜏total = 2rilB senθ (8)

onde θ, nesse caso, é o ângulo entre o conjugado e o vetor de comprimento


da espira. Note que o valor 2rl é a área da espira retangular. Alternativamente,
você pode escrever a equação 8 substituindo esse termo:

𝜏total = ABi senθ (9)


Gerador CA 7

Para essa dedução, considerou-se apenas uma espira, porém, se houvesse


mais espiras, esse valor de torque total seria também resultado no número
de espiras. Lembrando-se de que essa análise é uma simplificação de uma
máquina CA real, a equação descreve em termos aproximados o comporta-
mento da máquina.
Ainda é possível apresentar de uma forma mais geral a equação 9. Da teoria
eletromagnética, sabemos que um campo magnético em um caminho fechado
é produzido por uma corrente líquida (equação 10). Se considerarmos que o
caminho para a definição desse campo é dado por C, chega-se à equação 11:

(10)

(11)

Com base nessa equação, você pode generalizar a equação 26, mostrada
mais adiante, para uma máquina elétrica qualquer. Como a corrente líquida na
espira analisada tem valor i, podemos substituir e obter a seguinte equação 12:

(12)

Nesse caso, perceba que há uma componente constante que depende da


geometria física da máquina elétrica, que tipicamente é representada pela letra
k, o campo magnético constante é chamado de Bestator, por se tratar do campo
magnético produzido pela parte fixa da máquina, e Brotor é o campo magnético
produzido pela espira girante. Reapresentando a equação 13 em uma forma
mais compacta, obtemos a equação 14:

𝜏total = kBrotor Bestator senθ (13)

𝜏total = kBrotor × Bestator (14)

Perceba que essa última equação traz a ideia de que a interação entre os
campos magnéticos do estator e do rotor conduz à produção de conjugado
resistivo. Simplificadamente, é como se o gerador produzisse um ímã arti-
ficial contrário ao movimento do rotor, buscando freia-lo. A compreensão
desse fenômeno independe do fato de a máquina ser um gerador síncrono ou
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assíncrono, pois, em ambos, a análise eletromagnética é igual. A diferença


entre eles está na formação do campo magnético, em que, no primeiro, ele é
oriundo do rotor por meio de um eletroímã, enquanto que, no segundo, ele
depende de uma fonte de excitação externa (como um banco de capacitor) para
prover os reativos necessários à magnetização da máquina.

Tensão no estator a partir do rotor


Conforme apresentado e discutido na seção anterior, a tensão que surge no
estator deve-se ao movimento do rotor, pois o rotor em um gerador é respon-
sável pela produção de campo. Você pode entender que, ao ser movimentado
pela força produzida na máquina primária, o campo magnético se desloca,
enquanto que os condutores do estator estão “parados”. Entretanto, se você
mudar seu referencial fixo do estator e posicionar-se sobre o rotor, perceberá
que, na verdade, o campo magnético está parado, e as linhas de campo são
cortadas pelo estator.
Essa descrição serve para retomar aquele conceito do eletromagnetismo
que versa sobre o deslocamento de um condutor em um campo magnético,
fazendo com que surja uma tensão nele. Com base nesse princípio, você esti-
mou o cálculo da corrente e do conjugado resistivo produzido pelo gerador e
da interação dele com o campo magnético do rotor. Porém, estimar a tensão
é de grande importância, pois ela está diretamente relacionada à velocidade
do rotor (BIM, 2009).
Tomando a Figura 4 como referência e com base na teoria eletromagnética,
sabemos que:

eind = (v × B) ∙ l (15)

onde v é o vetor velocidade do condutor, B é o vetor densidade magnética,


e l é o vetor que representa o comprimento do condutor no sentido do campo
magnético. Considerando que o formato da espira é retangular, deve-se veri-
ficar a contribuição de cada um dos segmentos (ab, bc, cd, da) para a tensão
induzida. Consequentemente, deve-se calcular a tensão induzida total como
a somatória de eab, ebc, ecd e eda.
Gerador CA 9

Densidade de fluxo no entreferro:


B
edc Entreferro B (α) = BM cos (ω mt – α)
c Estator vrel
l Rotor
c–d

d ecb BM
ω

eind b
a–b

vrel
eba
B
a A tensão está na realidade apontando para
dentro, porque aqui B é negativo.

(a) (b)
Figura 4. a) Visão simplificada da bobina do rotor. b) Visão frontal da máquina (visão do
estator, rotor e entreferro).
Fonte: Adaptada de Chapman (2013).

A fim de facilitar a visualização e demonstrar como os valores são obtidos,


considere a Figura 5 como referência.

ωm Vab

θab
c Vab
d
b B B
Vcd
a θcd

Vcd
(a) (b) (c)

Figura 5. a) Movimento da espira. b) Vetor deslocamento do segmento ab e vetor den-


sidade de campo magnético. c) Vetor deslocamento do segmento cd e vetor densidade
de campo magnético.
Fonte: Adaptada de Chapman (2013).
10 Gerador CA

Portanto:

etotal = eab + ebc + ecd + eda (16)

onde cada uma das tensões refere-se à tensão induzida em cada segmento
marcado como subscrito. A fim de que você compreenda o princípio físico, cada
uma das tensões será calculada individualmente. Para o segmento ab, tem-se que:

eab (v × B) ∙ l (17)

Dado que a velocidade da espira é tangencial a esse segmento, enquanto o


campo magnético aponta para a direita, o produto vetorial v × B (Figura 5b)
resulta em um vetor que aponta para dentro da página, cujos sentido e direção
são os mesmos do vetor de comprimento l. Logo:

eab = vBl sen(θab) (18)

Avaliando o termo ebc:

ebc (v × B) ∙ l (19)

Nesse caso, para um mesmo instante de tempo, metade do segmento bc gira


em uma direção, enquanto que a outra metade gira com sentido oposto. Isto é,
metade do segmento contribui com um produto (v × B) que aponta para dentro
da página, e outra metade que aponta para fora da página. Além disso, o vetor
de comprimento l está perpendicular ao produto (v × B). Consequentemente,
o segmento bc contribui com zero para a tensão induzida total. Logo:

ebc = 0 (20)

Avaliando o termo ecd:

ecd (v × B) ∙ l (21)

Similar ao segmento ab, no segmento cd, o produto vetorial v × B aponta


para fora da página, cujos sentido e direção são os mesmos do vetor compri-
mento l. Logo:

ecd = vBl sen(θcd) (22)


Gerador CA 11

Por fim, avaliando o termo eda:

eda (v × B) ∙ l (23)

Análogo ao segmento bc, o vetor de comprimento também está perpen-


dicular ao produto vetorial v × B. Consequentemente, a contribuição desse
segmento para a tensão também é zero.
A tensão induzida total é dada por:

eind = vBl senθab + 0 + vBl senθcd + 0 (24)

Note que θcd = 180 – θab. Por meio das identidades trigonométricas, sabemos
que o ângulo senθ = sen(180 – θ). Logo:

eind = 2vBl senθ (25)

No início desta seção, foi apresentado que seria discutida uma única espira
retangular girando em torno de seu eixo em um campo magnético estático.
Note que o deslocamento dessa espira é representado pelo ângulo θ. Se você
traçar um paralelo com uma máquina CA real, identificará que seu eixo gira,
normalmente, a uma velocidade de rotação constate (em radianos por segundo),
dada por ωt. Sabendo que essa é a velocidade de rotação da espira, conhece-
remos, então, que a velocidade de deslocamento, v, da espira é:

v = rω (26)

onde r é o raio do centro do eixo de rotação até a parte mais externa da


espira, e ω é sua velocidade angular. Substituindo na equação 25, você terá que:

eind = 2rωBl senωt (27)

Com essa substituição, perceba que é possível fazer uma nova substituição
na equação 27, pois 2rl é a área A da espira retangular (lembre-se de que os
segmentos ab e cd na direção da página têm comprimento l, e o segmento 2r
é o comprimento de bc e da). Portanto:

eind = ABω senωt (28)


12 Gerador CA

Antes de obtermos a expressão final para tensão induzida, recorde que,


da teoria eletromagnética, sabemos que fluxo magnético dividido pela área é
igual ao módulo do vetor densidade de campo magnético.

(29)

Portanto, a expressão final é dada como:

eind = ϕω senωt (30)

Nesse exemplo, foi discutida a situação de apenas uma única espira subme-
tida a um campo magnético. Se houvesse mais espiras, cada uma contribuiria
da mesma forma para a tensão induzida. Logo, em uma máquina real com
N espiras:

eind = Nϕω senωt (31)

Com isso, você pode perceber a influência do rotor em movimento na tensão


induzida no estator. Com base nessa equação, é construída toda formulação
para máquinas elétricas.

BIM, E. Máquinas elétricas e acionamento. Rio de Janeiro: Elsevier, 2009.


CHAPMAN, S. J. Fundamentos de máquinas elétricas. 5. a. ed. Porto Alegre: AMGH, 2013.
TEIXEIRA, F. H. P. Metodologia para projeto, construção e ensaios em máquina síncrona de
imã permanente - MSIP. 2006. Dissertação (Mestrado em Engenharia Elétrica) – Escola
de Engenharia de São Carlos, Universidade de São Paulo, São Carlos, 2006. Disponível
em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/18/18133/tde-27112006-085220/. Acesso
em: 16 abr. 2019.

Leitura recomendada
RAJINI, V.; NAGARAJAN, V. S. Electrical machine design. [S. l.]: Pearson, 2018.

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