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Democracia e Segurança nos Estados Africanos – Uma Análise do caso de

Moçambique.

Tese a ser submetida ao Instituto Superior de Relações Internacionais (ISRI) como


comprimento parcial dos requisitos necessários para obtenção do grau de lincenciatura
em Relações Internacionais e Diplomacia.

O candidato O supervisor

____________________ _______________

i
Declaração de autoria

Declaro pela minha honra que o presente trabalho é inteiramente da minha autoria e que
nunca foi anteriormente apresentado para a avaliação.

ii
Agradecimentos

Agradeço ao meu bom Deus em primeiro lugar, pois ele sempre me acompanhou e me
auxiliou na minha caminhada académica, agradeço igualmente aos meus pais que de
forma muito abnegada deram suporte moral, e financeiro para que conseguisse chegar
ao fim do curso.

Durante a caminhada a minha família em geral teve um papel preponderante durante a


minha formação, sem deixar de lado os colegas do curso que tiveram um papel
importante na minha passagem pelo Instituto Superior de Relações Internacionais como
estudante.

Agradeço também a todos meus professores por me terem tornado no que sou hoje,
capaz de escrever esta tese, é tudo graças a eles, a capacidade deles de administrar
conteúdos de forma clara e objectiva.

iii
Dedicat
ória

Dedico este trabalho aos meus pais André Zandamela e Albertina Nhancale e aos meus
irmãos Lúcia, Rosalina e André pelo amor incontestável que depositado em mim.as
minhas tias Ermelinda e Fernanda Nhancale pela contribuição incondicional sempre que
precisei, dedico também a todos amigos e colegas que contribuíram para a realização do
trabalho especialmente ao Celso Folege e Celestino Silva, Amaisa Chongola, pelo apoio
moral e material. Dedico também aos meus Pais espirituais Pr. Luís B. Maposse, Mãe
Leonor e Gerson Dimande.

iv
Siglas e abreviaturas

AGP – Acordos Gerais de Paz

CMP – Congresso Para Mudança Progressiva

CMP1 - Congresso para Mudança Progressiva

CRM - Constituição da República de Moçambique

FADM - Forças Armadas de Defesa de Moçambique

FDS - Forças de Defesa e Segurança

FPLM – Forças Populares de Libertação de Moçambique

FRELIMO- Frente de Libertação de Moçambique

MDM - Movimento Democrático de Moçambique

MNR- Movimento Nacional de Resistência de Moçambique

PDP – Partido Democrático do Povo

PPD - Partido Popular Democrático2

PRM - Policia da República de Moçambique

RDC- República Democrática do Congo

RENAMO- Resistência Nacional de Moçambique

SIPRE- Instituto Internacional de Pesquisa para a Paz de Estocolmo

SISE - Serviços de Informações e Segurança de Estado

URSS - União das Repúblicas Socialistas Soviética.

1
Congress for Progressive Change (CPC)

2
Peoples Democratic Party (PDP)

v
Introdução
O presente trabalho tem como tema “Democracia Liberal e Segurança Nacional nos
Estados Africanos: Reflexão sobre o Caso de Moçambique”. Esse tema é estudado na
delimitação temporal entre 1990 e 2013, tem como delimitação espacial, todos os
Estados africanos, particularmente Moçambique.

A análise é feita a partir de 1990, pois nesse ano iniciou-se o processo de


democratização de muitos Estados africanos, incluindo Moçambique, apesar de no caso
deste país, ter se adoptado o modelo democrático liberal em 1990, com a aprovação da
primeira Constituição multipartidária. O estudo estende-se até 2013, por se considerar
que foi o ano em que houve a escalada da tensão político militar em Moçambique,
sendo um dos sinais mais preocupantes de ameaça à segurança nacional causada por
falta de consenso em assuntos militares, económicos e políticos ligados ao exercício da
democracia liberal, desde a assinatura dos Acordos Gerais de Paz (AGP), em 1992.

Em termos de espaço, o nosso trabalho destaca Moçambique como caso de estudo. Essa
menção deve-se ao facto de, durante muitos anos, Moçambique ter sido considerado um
grande exemplo de transição democrática pacífica. Mas desde 2012, atravessa
momentos de insegurança interna, causados de alguma forma por questões ligadas ao
exercício da democracia liberal.

Contexto

Muitos países africanos, após as suas independências, debateram-se com a existência de


um partido único como herança das lutas de libertação nacional. Esse cenário, em
alguns casos deu origem a guerras civis, tendo culminado com a formação de partidos
da oposição com grande aceitação popular. Alguns desses partidos, têm demonstrado,
sucessivamente, tendências belicistas, desse modo, o processo de consolidação
democrática nos Estados africanos e sua segurança nacional são postos em causa, pois
de entre outras manifestações, são contestados resultados eleitorais recorrendo-se à
força armada.

Olhando para os mais recentes conflitos internos em África, notamos que tem nas suas
causas, questões próprias da democracia liberal. São exemplos dessa realidade, os
conflitos pós-eleitorais na Costa de Marfim e no Senegal, em 2012; os conflitos para a

1
instauração de liberdades políticas e maior abertura democrática na Tunísia, no Egipto e
na Líbia, em 2011. Os confrontos militares em Moçambique, envolvendo o Governo e a
Renamo junta-se a estes outros que assolam o continente, possivelmente esses conflitos
tenham outras grandes razões e cada um deles com suas especificidades, mas o facto em
comum é de serem apresentadas razões ligadas a processos democráticos, sobretudo
processos eleitorais e liberdades fundamentais.

Moçambique é um dos países em que se pode estabelecer com alguma facilidade a


relação entre a democracia e a segurança nacional, uma vez que logo após a
independência, viveu uma guerra cujo término deu lugar a instauração da democracia
liberal, com a realização das primeiras eleições gerais em 1994. Essa guerra envolveu o
Movimento Nacional de Resistência de Moçambique (MNR) e o Governo, liderado pela
Frente de Libertação de Moçambique (FRELIMO).

Desde essa altura, emergiu a percepção de falta de transparência nos processos


eleitorais, partidarização das instituições públicas do Estado e de desigualdades
económicas e sociais, que tornaram-se factores determinantes para a eclosão de
confrontações entre as forças governamentais e forças da ex MNR e actual partido
político, Resistência Nacional Moçambicana (RENAMO).

Com o cenário acima apresentado, adicionado ao pressuposto fundamental que serve de


suporte para a expansão da democracia, de que num Estado que instaura ideais liberais,
onde o liberalismo e a democracia tornam-se na ideologia dominante, os cidadãos tem
poder sobre decisões de guerra e, consequentemente, a segurança é maior e a
possibilidade de guerra ou ameaça a segurança é remota (Owen, 1994:89), é legítimo se
estabelecer uma relação entre a democracia liberal e segurança nacional.

O exercício da democracia liberal acaba tendo impacto sobre a segurança nacional em


vários países africanos, com o exemplo dos conflitos pós-eleitorais, ou conflitos para
mais liberdades políticas.

Justificativa
É pertinente estudar este tema porque a manutenção da paz e controle de ameaças
militares que colocam em causa a segurança nacional, é um assunto de topo de agenda
para quase todos Estados no mundo. Importa ainda estudar a segurança nacional
fazendo uma relação com a democracia liberal, de forma a conhecer os contornos da

2
relação entre esses dois conceitos. Importa ainda conhecer o nível em que essa relação
pode ser positiva levando a segurança, ou negativa levando a insegurança nos Estados
africanos, olhando de forma muito particular o estudo de Moçambique.

Problematização
Muitos teóricos acreditam que as relações entre Estados democráticos liberais tendem a
ser mais pacíficas do que entre Estados não democráticos. Segundo Doyle (1983:34), os
Estados democráticos não se digladiam, ou seja não lutam entre si. Essa afirmação
refere-se à paz a nível internacional, mas não a nível interno, de onde surgem várias
fontes de ameaça a segurança nacional particularmente em Estados africanos.

Nesse contexto, Sousa (2005:61), ao afirmar que “ a democracia é o regime político em


que o poder está limitado, em que a alternância no governo está eleitoralmente
assegurada, em que os governados mantêm todos os seus direitos cívicos perante os
governantes e em que a liberdade e a competitividade políticas estão presentes”, induz-
nos à percepção de que os principais factores internos que possam levar-nos a conflitos
armados e ameaças à segurança nacional podem ser acautelados com o exercício eficaz
da democracia liberal.

Olhando para o contexto africano, podemos assumir que a democracia liberal ainda não
é efectivamente implementada, pois notamos que nos últimos anos, em alguns países
como a Nigéria, Zimbabwe, Senegal, Quénia e Costa do Marfim, os processos
eleitorais, tornaram-se fontes de instabilidade e ameaça a valores centrais do Estado
como integridade territorial e unidade nacional. Além desses países, na Libia, no Egipto
e na Tunísia, a segurança nacional foi posta em causa por manifestações violentas com
o intuito de promover e garantir mais liberdades políticas, e mais recentemente, em
Moçambique eclodiu um conflito militar entre as forças da Renamo e as forças
governamentais devido, essencialmente a questões ligadas ao processo eleitoral,
inclusão e igualdade.

Nos casos acima mencionados, para garantir a segurança ao nível do Estado, os


governos devem ter habilidade para conter ataques ou defender-se quando estes surgem
contra si (Glossário de Estudos de Paz e Conflitos, 2004:38). Assim, com base na
democracia liberal os Estados podem reduzir as possibilidades de um Estado ir à guerra
contra o outro através da inclusão e participação política, aspectos que fazem com que o
processo de tomada de decisões obedeça uma avaliação minuciosa pelos diferentes

3
actores de nível nacional e não fique apenas a mercê de um governante ou de um grupo,
como acontece em sistemas de governação não democráticos. Porém, a possibilidade de
conflitos internos que podem constituir ameaça à segurança nacional persiste.

Nessa vertente de factores internos contra a segurança nacional, a democracia liberal


pode ter impacto positivo ou negativo. O impacto positivo surge quando são obedecidos
os princípios democráticos, principalmente a igualdade, a tolerância política e a
separação e interdependência de poderes. Quando esses princípios não são respeitados,
surge o impacto negativo da democracia liberal nos Estados, pois há recurso a violência
para a manifestação de posições de diferentes grupos políticos e sociais.

Portanto, no contexto africano, onde num mesmo Estado temos vários grupos com
posições divergentes, onde a democracia liberal ainda deve ser adaptada às realidades
locais, e onde se verificam casos de conflitos motivados por aspectos próprios da
democracia liberal como eleições e busca por liberdades políticas, questiona-se: Qual é
o impacto da democracia liberal na segurança nacional dos Estados africanos?

Questões de pesquisa

 Em que condições a democracia liberal pode constituir ameaça à segurança


nacional em Estados africanos?

 Como é que se caracteriza a segurança nacional dos Estados africanos durante o


processo de democratização?

 Que relação se pode estabelecer entre a democracia liberal e a eclosão de


ameaças a segurança nacional?

Objectivo Geral
 Compreender a relação entre a democracia liberal e a segurança nacional nos
Estados africanos.

Objectivos Específicos
 Caracterizar a segurança nacional dos Estados africanos durante o processo de
democratização;

4
 Conhecer as condições em que a democracia liberal pode constituir ameaça à
segurança nacional dos Estados africanos;

 Estabelecer uma relação entre a democracia liberal em Moçambique e a


estabilidade politica.

Hipóteses
 A democracia liberal pode constituir ameaça contra a segurança nacional dos
Estados africanos quando não são observados, de forma rigorosa, os seus
principais pilares;

 No processo de democratização reduziram-se as ameaças externas contra a


segurança nacional dos Estados africanos, ao mesmo tempo em que houve
abertura para a manifestação de posições divergentes entre actores intraestatais;

 A deficiente aplicação dos princípios básicos da democracia liberal resultou em


reivindicações que culminaram ameaças a segurança nacional.

Metodologia
Neste trabalho, para alcançar os nossos objectivos de forma coerente e rigorosa, usamos
métodos e técnicas de pesquisa em ciências sociais, concretamente os métodos:
Histórico, Comparativo e Monográfico e também a técnica documental.

Método histórico - este método consiste em investigar acontecimentos, processos e


instituições do passado, para verificar sua influência na sociedade de hoje, pois as
instituições alcançaram sua forma actual por meio de alterações de suas partes
componentes, ao longo do tempo, para uma melhor compreensão do papel que
actualmente desempenham na sociedade, deve remontar aos períodos de sua
formação e de suas modificações (Marconi e Lakatos, 2009:91).

Este método foi útil pois, ao longo deste trabalho recorremos a factos do passado para
explicar a dinâmica do modelo democrático liberal nas sociedades africanas,
concretamente em Moçambique, de forma a analisar a sua implicação em questões
ligadas a segurança nacional.

Método Comparativo – este método lida com a investigação de indivíduos, classes,


fenómenos ou fatos, com o intuito de ressaltar as diferenças e similaridades entre

5
eles. Sua ampla utilização nas ciências sociais deve-se ao fato de possibilitar o estudo
comparativo de grandes agrupamentos sociais, separados pelo espaço e pelo tempo
(Marconi e Lakatos, 2009:92).

Acreditamos que por se tratar do estudo da relação entre a democracia liberal e a


segurança nacional dos Estados africanos, é importante comparar os estágios da
relação democracia liberal – segurança nacional, em alguns Estados africanos para
podermos perceber os aspectos convergentes e divergentes entre esses casos.

Método monográfico: segundo Trivoños (1987:1333), citado por Marconi e Lakatos


(2009:273-274), o método monográfico, que também é considerado estudo de caso, é
uma categoria de pesquisa cujo objecto é uma unidade que se analisa profundamente, é
o tratamento escrito de um tema específico. Ou um estudo científico de uma questão
bem determinada e limitada, realizada com profundidade e de forma exaustiva.

Para Gil (2008:18), “o metodo monográfico, parte do princípio de que um estudo de


caso em profundidade pode ser considerado representativo de muitos outros, mesmo de
casos semelhantes”. Com base no método monográfico, estudamos a relação entre a
democracia liberal e a segurança nacional dos Estados africanos, estudando
profundamente o caso de Moçambique em especial. Daí pudemos fazer algumas
generalizações para casos similares, tendo em conta que Moçambique é um caso
representativo pela forma como foi conduzido o processo de democratização.

Técnica Documental: consiste na recolha de dados e está restrita a documentos


escritos, constituindo o que se denomina de fontes primárias (Marconi e Lakatos,
2009:95). A técnica documental equipara-se a técnica bibliografica que consiste na
colecta de dados que são aplicados directa ou indirectamente em forma de documentos,
livros e outras fontes secundárias (Gil, 2008:248).

Usamos esta técnica por ser a base de qualquer trabalho cientifico, acreditamos que as
fontes segundárias dão sustento e cientificidade em todos os preconcietos e crenças que
temos sobre determinadas matérias, esta técnica nos decipa do sensu comum, nos
levando a alicersar a nossa pesquisa em fontes fiavéis para viabilizar a pesquisa.

3
Triviños, Augusto Nibaldo Silva, (1987); Introdução à pesquisa em ciências sociais: a pesquisa
qualitativa em educação. São Paulo.

6
Técnica de entrevista - para Mazzotti (1999:1684), citado por Marconi e Lakatos:
(2009:278), a entrevista é uma conversação efectuada face a face, de maneira metódica,
que pode proporcionar resultados satisfatórios e informações necessárias.

A técnica documental e a técnica de entrevista, foram instrumentos importantes na


obtenção de dados de diversas fontes, para fazer a confrontação de informações e
enquadrá-las na dimensão teórica de modo a sustentar as hipóteses deste trabalho assim
como alcançar os nossos objectivos.

Estrutura do trabalho

O presente trabalho é constituído por cinco partes principais, sendo a primeira a parte
introdutória onde temos o tema delimitado no tempo e no espaço, o contexto e a
problematização do tema, os objectivos, hipóteses e questões de pesquisa. A seguir
temos o primeiro capítulo, intitulado Marco Teórico e Conceptual, onde temos a teoria
liberal explicando a sua formação, precursores, pressupostos, sua aplicabilidade no
trabalho e as suas críticas. Ao longo deste capítulo discutimos igualmente os conceitos
de Democracia, democracia liberal e segurança nacional.

No capítulo seguinte, o segundo capitulo, intitulado a segurança nacional nos estados


africanos no processo da democratização, apresentam-se as principais características do
processo de democratização em África, paralelamente ao estágio de segurança nacional
nos Estados africanos. Ainda nesse capítulo, falamos dos constrangimentos da
democracia liberal no contexto sociopolítico africano. De seguida, no terceiro capítulo
abordamos a aplicação dos principios da democracia liberal paralelamente à segurança
nacional dos Estados africanos.

O quarto e último capítulo trata da relação entre a democracia liberal e a eclosão de


conflitos em Moçambique, aborda-se igualmente neste capítulo a transição democrática
em Moçambique bem como da aplicação de princípios fundamentais da democracia
liberal. Na parte final do trabalho, temos as conclusões obtidas do estudo sobre a
democracia liberal nos Estados africanos como factor de segurança ou insegurança
interna: uma análise do caso de Moçambique.

4
Alves Mazzotti, Alda Judith; Geandsznajder, Fernando, (1999) O método em ciências naturais e
sociais: Pesquisas quantitativas e qualificativa, Thoson, 2a ed. São Paulo.

7
CAPITULO 1

MARCO TEÓRICO E CONCEPTUAL

Sempre que procuramos explicar um fenómeno em ciências sociais há necessidade de


fazer um enquadramento teórico do assunto em causa, e para o caso deste trabalho,
achamos que a teoria que melhor explica a relação entre a democracia liberal e
segurança nacional nos Estados africanos é a Teoria Liberal.

O Liberalismo é a teoria escolhida para este trabalho visto que “no liberalismo procura-
se estender o funcionamento doméstico das sociedades a uma escala internacional,
propondo arranjos e mecanismos que possam organizar o relacionamento entre os
Estados da mesma forma que as instituições da sociedade civil o fazem internamente”
(Pecequilo, 2004:140). Nessa óptica podemos entender que os resultados da relação
entre actores domésticos num estado liberal pode se reflectir também nas relações desse
Estado a nível externo.

Surgimento da Teoria Liberal


Os primeiros marcos da aparição do liberalismo como abordagem das Relações
internacionais deram-se nos séculos XVI e XVII. Nesses séculos os ideais liberais
foram os principais factores que impulsionaram as três grandes revoluções Liberais, a
revolução Gloriosa, a revolução Americana e a revolução Francesa (Pecequilo,
2004:137).

Como teoria de relações internacionais, o liberalismo tem suas origens no iluminismo,


no liberalismo político e económico do século XIX e no idealismo Wilsoniano do
Século XX bem como no iluminismo, que é a principal fonte dos ideais liberais,
encontra-se a ideia grega de que os indivíduos são seres racionais, capazes de entender
as leis de aplicação universal que governam a natureza e a sociedade humana (Mingst,
2009:56).

Uma vez que a democracia prima pelo domínio da lei, uma boa aplicação destas por
parte dos homens pode levar-nos a paz e estabilidade, mas o contrário pode levar-nos a
conflitos e instabilidade.

Precursores da Teoria Liberal

8
O liberalismo tem precursores do campo político e económico. Para o nosso tema, é
mais relevante a perspectiva política do liberalismo da qual os principais precursores
são: John Locke (1998)5, Jean Jacques Rousseau (2008)6, Immanuel Kant (1795)7 e J.
Stuart Mill (1909)8. Estes deram contributos para formulação de regras de convivência
política, como a igualdade, liberdade e direitos fundamentais, primeiro no Ocidente, e
depois se tornaram valores universalmente aceites no mundo no geral e no continente
africano em particular.

Pressupostos da Teoria Liberal


As ideias essenciais do Liberalismo estão associadas ao iluminismo e ao idealismo,
sendo os seus principais pressupostos ligados a ideia da liberdade. O conceito de
liberdade significa o estado de ser livre ou de estar em liberdade. Na visão dos liberais,
esse conceito significa liberdade de pensamento, expressão e religião que, nas palavras
de Aranha (1993:217), supõe um estado de direito em que sejam evitados o arbítrio e as
lutas religiosas. Ao serem evitados os arbitrios, consequentemente os a convivencia
dentro de estados com diferentes grupos etnicos, culturais, políticos e religiosos, como a
maioria dos estados africanos poderá ser harmoniosa.

Os principais pressuposto do liberalismo são:

 O Estado deve ter um Papel mínimo na sociedade, servindo basicamente como


um árbitro em disputas entre indivíduos e garantindo a manutenção das
condições sob as quais o indivíduo poderá usufruir dos seus direitos ao máximo
(Viotte e Kauppi, 1999: 118).

 O estado não é um actor unitário, ele é composto por vários grupos de


interresses, organizações, opinião pública, dentre outros. Nem sempre estes são
racionais, estão à mercê de percepções erradas dos governantes ou da opinião
pública. Para os liberais a segurança não é o único tema da agenda internacional,
o Estado precisa lidar também com temas sociais, económicos, monetários,

5
Locke, John (1998) Dois tratados sobre o governo, 1ª Ed. Matins Fontes São Paulo.
6
Rousseau, J. (2008),  El Contrato Social, Maxtor, Valladolid.

7
Kant, Immanuel, (1795) Perpetual Peace: A Philosophical Sketch
8
Mill, John Stuart (1909), On Liberty, Harvard Classics: Vol. 25, PF Collier & Sons Company, New
York.

9
ecológicos, energéticos, alimentares, comerciais dentre outros (Viotte e Kauppi,
1999: 119).

 A natureza humana é basicamente boa e o povo pode melhorar suas condições


morais e materiais, possibilitando o progresso da sociedade. O mau
comportamento dos seres humanos, como injustiça e guerra, é produto de
instituições sociais inadequadas ou corruptas e mal-entendidos entre líderes
(Mingst, 2009: 55). Se usarmos o sistema democrático, a conduta das lideranças
terá menor significado para a vida política dos Estados, visto que haverá
participação e inclusão, num sentido de igualdade e, sobretudo, de um governo
do povo segundo a ideia central da democracia.

 A segurança é essencial e as instituições ajudam a torná-la possível. As


instituições proporcionam uma estrutura garantida de interacções e sugerem uma
expectativa de interacções futuras (Mingst, 2009: 58). Este pressuposto
demonstra a importância das instituições na garantia da segurança nacional e a
institucionalização tem sido um dos maiores desafios dos Estados africanos que
conservam ainda um sentido personificação do poder político. Portanto, a
democratização abrirá espaços para a passagem à institucionalização efectiva.

 O progresso das sociedades humanas se dá a partir dos indivíduos que nela


habitam, devendo estes indivíduos terem asseguradas as condições legais e
legitimas para alcançar este progresso sem constrangimentos ou temores
(Pecequilo, 2004:138).

 A democracia, a disseminação de seus valores e prática resulta na criação de um


sistema baseado em igualdade e solidariedade que eliminará incentivos a
conquista e que levará a compartilha de princípios entre os homens, promovendo
a homogeneização e paz das sociedades (Pecequilo, 2004:140).

 Estados democráticos tendem a manter relações pacíficas entre si e que, a


medida que governos desta natureza aumentam, surge uma zona estável de paz e
prosperidade (Pecequilo, 2004:139-148);

Os defensores do liberalismo argumentam ainda que a difusão de sistemas políticos


democráticos significava que as questões da guerra e paz não mais estariam confinadas

10
a um pequeno grupo de elites políticas e militares, como o era no passado. Em vez
disso, os líderes teriam de estar preocupados com a opinião pública doméstica, que
agiria como um freio em muitos movimentos rumo à confrontação internacional e ao
surgimento de hostilidades.

Com base nos pressupostos do liberalismo, concluímos que esta é a teoria que melhor
explica o tema deste trabalho porque aborda a interacção a nível doméstico e
internacional. Daí que podemos tirar aspectos valiosos para entender a segurança
nacional em Estados africanos.

1.1. Aplicabilidade da teoria Liberal no presente trabalho

Fazemos o uso desta teoria no presente trabalho, pois ela é aplicável a assuntos como
democracia, direito internacional e economia. Sendo assim, olhando para o tema
acreditamos que os pressupostos desta teoria combinam perfeitamente com o assunto
que pretendemos abordar.

Esta teoria é útil também, para o estudo da relação desejável entre a democracia e a
segurança dos Estados, pois o liberalismo assenta na ideia de que a melhor forma de
garantir a segurança a nível internacional e a implantação de democracias. Assim, esta
teoria ajuda a explicar a relação entre a democracia e a segurança nacional em Estados
africanos com enfoque especial para Moçambique.

Conceitos Chave
A Democracia, democracia liberal e a Segurança nacional são os principais conceitos
neste trabalho. Nesta parte do trabalho discutimos as definições desses três conceitos de
forma a enquadrá-los no contexto do nosso trabalho.

Democracia
O conceito da democracia caracterizou-se por discussões infindáveis. O termo
democracia significa governo do povo e etimologicamente, nasce na Grécia Antiga,
onde sua prática era então direito exclusivo dos senhores (cidadãos) excluindo assim,
desse direito os escravos e outras categorias de pessoas, como estrangeiros, mulheres,
crianças e idosos (Mendes, 1994:76).

11
Quando falamos de democracia, conforme a definição acima, referimos a uma ideologia
ou forma de estar num Estado, mas o processo para se chegar a esse nível denominado
democracia, chama-se democratização. Nesse âmbito, segundo Pasquinho (2002) citado
por (Dahl, 19979) a democratização resulta da conjugação da liberalização e inclusão,
no que se considera de regimes poliárquicos, pois nenhum grupo está em condições de
exercer qualquer hegemonia sobre o poder político, uma vez encontrando-se distribuído
por toda uma série de detentores.

De acordo com Sousa (2005: 61), a democracia é um regime político em que o poder se
encontra limitado, em que a alternância no governo está eleitoralmente assegurada, em
que os governados mantêm todos os seus direitos cívicos perante os governantes e em
que a liberdade e a competitividade políticas estão presentes. Com essa definição, a
democracia assenta em pilares como a liberdade, a participação política, a alternância na
detenção do poder político e, sobretudo, a limitação no exercício de poder dos
governantes sobre os governados.

Neste trabalho consideramos democracia a combinação positiva de todos pilares que


levam o povo a decidir por si quem deve governar, socorrendo-se de princípios de
liberdade ao pluralismo de ideias, bem como a alternância do poder, sem descorar a
transparência, primado da lei, prestação de contas, como forma de garantir o equilíbrio
de poder divergência positiva no xadrez político nacional.

Democracia Liberal
Democracia liberal refere-se ao sistema de democracia com base no parlamento, aliado
ao sistema de mercado livre na área de produção económica, baseando-se ainda num
sistema de eleições regulares e competitivas conduzidas com base no sufrágio universal
e igualdade política. A democracia liberal é uma forma de governo democrático que
equilibra o princípio de governo limitado com a ideia de consentimento popular. As
suas características liberais residem num conjunto de mecanismos de verificação
internos e externos governo (check and balances), com vista a garantir a liberdade e a
oferecer aos cidadãos protecção contra o Estado (Sousa, 2005:61).

Um Estado é considerado de democracia liberal, quando, pelo menos do ponto de vista


legal e institucional, possui características que permitam que haja liberdade e respeito

9
Ahl, R, A. (1997) Poliarquia Participação e Oposição. Editora da Universidade de São Paulo, São
Paulo.

12
pelos mais elementares direitos humanos. Assim, a democracia liberal é um sistema
político marcado não só por eleições livres e justas, mas também pelo estado de direito,
separação de poderes e pela protecção das liberdades básicas de expressão, reunião,
religião e propriedade (Zakaria, 1997: 24). Esta é a visão sobre a qual nos vamos guiar
no presente trabalho.

Segurança Nacional
O conceito de segurança nacional neste trabalho só pode ser entendido partindo da
definição do conceito de segurança no sentido mais amplo. Apenas depois de
conhecermos o conceito de segurança no geral podemos conceptualizar a segurança
nacional e contextualizá-lo.

A segurança é um conceito dinâmico mas com características imprescindíveis como o


objecto, o tipo de ameaças, os valores que são postos em causa e a
possibilidade/dificuldade de cooperação e abrangência. No seu trabalho original,
“National Security as an ambiguous simbol” Wolfers (1962:32) advoga que a
segurança deve ser vista no sentido objectivo como ausência de ameaças sobre valores
centrais que sejam objecto de ataque.

A segurança é um dos objectivos centrais do Estado para defender os seus interesses


dentro e fora das suas fronteiras. Não é uma relativa liberdade sobre a guerra, nem
ausência de ameaças, mas uma relativa liberdade de ameaças porque as ameaças são
omnipresentes sobre o Estado.

Segundo David (2001:57), a segurança é a ausência de ameaças militares e não militares


que podem pôr em causa os valores centrais que uma pessoa ou uma comunidade
querem promover e que implicam um risco de utilização de força. Por conseguinte,
importa afirmar que na reflexão do tema em apreço analisa-se a segurança do Estado,
visto que o Estado é o principal objecto de segurança (Buzan, 1991:22).

A segurança nacional pode ser entendida também como a capacidade de um Estado para
garantir a sua sobrevivência através da auto-protecção. É um processo de conjugação de
capacidade ofensiva e defensiva do Estado para prossecução do interesse nacional.
Assume-se que tudo pode ser alvo de segurança desde que se assegure a sobrevivência
do Estado. Relativamente a este fim do Estado, a segurança nacional não implica,

13
exclusivamente, o uso da força mas também o uso de distintos poderes do Estado
(Smouths et al, 2003:451).

A Segurança Nacional designa a ausência de ameaça a valores centrais e que devia ser
absoluta e completa, pois a ameaça é contra os valores importantes e algo supremo que
não importam os meios para garantir a existência do Estado (Evans e Newnham, 1998:
449).

Com esses conceitos de segurança, percebemos que unanimemente, quando fala-se de


segurança significa ausência de ameaças, sobre um determinado objecto tangível ou
intangível. Esse objecto pode ser desde o ser humano (pessoas), ou uma construção
social (comunidades, instituições, incluindo o Estado) que reservam para si
determinados valores considerados imprescindíveis. Neste caso a segurança nacional,
refere-se a ausência de ameaças ao Estado como instituição e também as pessoas que
nele vivem.

Neste capítulo vimos que o liberalismo é a teoria que melhor se enquadra no presente
trabalho, dada a sua relação com democracia bem como nos estudos sejam eles
abrangentes ou restritos de segurança. A definição dos conceitos democracia,
democracia liberal e segurança nacional, notamos uma relação de complementaridade
entre eles, bem como encontramos neles um suporte inequívoco em termos conceptuais.

Podíamos ter arrolado outras teorias e mais conceitos, mas achamos que dentre vários
estes de forma resumida espelham e nos levam com mais clareza aos nossos objectivos
da pesquisa.

14
CAPITULO 2

A SEGURANÇA NACIONAL NOS ESTADOS AFRICANOS NO PROCESSO DE


DEMOCRATIZAÇÃO

O presente capítulo apresenta os principais marcos e as principais características do


processo de democratização em África, paralelamente ao estágio de segurança nacional
nos Estados africanos. Em primeiro lugar, fazemos uma abordagem histórica da
democratização a nível global e em África. A seguir apresentamos a transição
democrática em África, as suas características e os constrangimentos do processo de
democratização no contexto sociopolítico africano.

O Processo de Democratização à Escala Global


A democratização, apesar de ser um assunto que passou a ser abordado com mais
destaque após a guerra-fria, é um processo que vem se alastrando já desde o século
XIX. Na perspectiva de Huntington (1991:39), democratização significa a disseminação
do regime democrático representativo pelo mundo, segundo este autor esse processo
evoluiu em três fases, denominadas três ondas de democratização.

A primeira onda da democratização abrange o período entre 1828 e 1926, nessa altura,
de 64 nações independentes, 24 eram democráticas. Entretanto, entre 1922 e 1942,
houve um retrocesso em termos de Estados independentes democráticos, pois as nações
independentes haviam se reduzido a 61, e apenas 12, preservavam o sistema
democrático. Depois desse período de regressão, surgiu a segunda onda de
democratização que transcorreu de 1943 a 1962.

A democratização em África é enquadrada na terceira onda. Por isso, prestamos


especial atenção a esse período. A ideia de Terceira Onda resulta da democratização
subsequente a 1974, e foi impulsionada por vários factores, de entre os quais: A erosão
da legitimidade dos governos autoritários, que mostravam-se incapazes de conter
levantamentos militares e o fracasso económico; O melhoramento dos níveis de vida, de
educação e a urbanização em muitos países, ao mesmo tempo em que crescia o
sentimento de cidadania, as expectativas e a capacidade da sua expressão; A mudança
de abordagem das instituições religiosas que passaram a opor-se aos governos
autoritários, em vez de defender o status quo; e a tendência de promoção dos direitos
humanos, democracia e liberdades fundamentais no geral (Huntington, 1991:65).

15
O advento da terceira onda de democratização coincidiu com um período de mudanças
na estrutura do Sistema Internacional, como consequência directa do fim da guerra-fria.
Por isso, a terceira onda de democratização é muitas vezes ligada a transições
democráticas após 1989. Segundo Large e Sisk, (2006:50), desde o fim da guerra-fria,
em 1989, já havia cerca de 100 países que fizeram a transição para a democracia desde
os anos 1970, sendo que 40 países haviam transitado para a democracia nos anos 1990 e
os restantes nos anos 2000.

Segundo Large e Sisk, (2006:56), a democratização no mundo, na sua generalidade,


derivou de 6 principais situações a seguir:

1. Colapso do regime vigente - a democratização ocorre através da incorporação de


um Estado anteriormente autoritário numa democracia preexistente, por exemplo
a Alemanha do Leste foi incorporada num regime de democracia liberal aquando
da sua reunião à República Federal da Alemanha.

2. Derrube do regime vigente - a democratização ocorre como resultado da revolta


popular que retira o governo e, através de um processo de negociação com as
forças de segurança do governo e novas eleições, introduz-se um novo governo.
Por exemplo: o derrube do antigo presidente Slobodan Milosevic na Sérvia.

3. Liberalização gradual do regime vigente, mas mantendo o controlo – acontece


em situações em que, muitas vezes após golpes de Estado, os militares anunciam
um processo de democratização e o retorno à ordem civil, mas não propriamente
o afastamento do governo, como aconteceu no Paquistão em 1999.

4. Negociação do regime vigente com elementos da oposição - esse tipo de


transição é também conhecida como transições de pactos devido a ênfase na
barganha e na negociação. São exemplos dessa situação as negociações entre o
último governo do apartheid, liderado por Frederick De Klerk e Nelson
Mandela na África do Sul, que culminaram com a adopção de uma nova
Constituição, e as negociações entre os regimes militares na América Latina com
os partidos políticos da oposição.

5. Democracia emergente de negociações de paz em casos de guerra-civil – os


acordos firmados para o fim da guerra tem conteúdos democráticos, como

16
aconteceu no caso da Bósnia através dos acordos de Dayton, nos quais estipula-
se uma nova Constituição com uma democracia de partilha de poder. Podem ser
mencionados outros exemplos, como o da Namíbia, Afeganistão e Moçambique.

6. Introdução da democracia pela comunidade internacional através de


administração de transição - o maior exemplo desta situação é o do Timor-Leste,
onde depois do referendo para a independência, em 1999, e da intervenção
militar das forças australianas, as Nações Unidas foram chamadas a administrar
o país enquanto este preparava os procedimentos e construía capacidade
institucional de um Estado, para exercer de facto a sua soberania.

Portanto, de entre as seis situações em que pode emergir a democracia, existem duas
que caracterizam, especificamente, o continente africano nos últimos anos: negociações
para o fim de guerra-civíl e o derrube do regime vigente. Nesse contexto, a
democratização tem estado associada a momentos de conflitos armados,
consequentemente a ameaças à segurança nacional. Por isso, de seguida abordamos a
transição democrática em África na perspectiva de conhecer os seus contornos
específicos.

Transição Democrática em África


Para entender a transição democrática em África, é preciso antes de mais, clarificar que
no contexto político, se considera transição a um conjunto de “mudanças fundamentais
do que era antes para um novo contexto, como estado de guerra ou conflito violento
para um novo contrato social de construção da paz; de um governo autocrático e
centralizado para um governo representativo, da subjugação ou dominação política para
independência ou redefinição das relações de poder” (Large e Sisk, 2006:51).

Tendo em conta que a construção de muitos Estados africanos deu-se dos anos 1960 a
1990, o processo de democratização em África enquadra-se no período chamado por
terceira onda. Porém, cada Estado teve suas especificidades nesse processo de transição,
o que tornou a transição democrática em África, bastante heterogénea.

Enquanto alguns Estados passaram para um sistema democrático por vias pacíficas, em
outros Estados, a democracia emergiu como consequência de guerras civis, com o
objectivo de criar multiplicidade de ideias políticas, visto que perduravam regimes
mono partidários resultantes dos processos de descolonização.

17
Além de motivações internas, a democratização em África foi também impulsionada por
mutações políticas ocorridas à escala internacional, mormente a queda do muro de
Berlim e o fim da Guerra Fria, que deu mais visibilidade ao processo de
democratização, visto que no período da guerra-fria muitos Estados africanos não
haviam adoptado o regime democrático, principalmente nos moldes de democracia
liberal.

No período da guerra-fria, houve uma tendência à instalação de regimes mono


partidários de inspiração marxista-leninista, o que significou o banimento e a repressão
de qualquer forma de contestação aos regimes instalados ou manifestação de pluralismo
político. Assistiu-se ainda, durante a guerra-fria, ao surgimento de regimes autoritários
de inspiração direitista, como o do auto-intitulado imperador Bokassa, da actual
República Centro-Africana e o de Mobutu Sese Seko, no Zaire, actual Congo
Democrático.

A limitação de pluralismo político, um dos maiores valores da democracia liberal,


durante a guerra-fria nos Estados africanos, gerou um clima de insatisfação generalizada
do qual emergiram grupos contestatários com variados objectivos, mas que em comum
procuravam instaurar ideais liberais democráticos, como sucedeu em Moçambique.  

Com efeito, se a polaridade da Guerra Fria tinha permitido a convergência dos sectores
militar, político, económico e cultural, em África, na década de 1990, a supremacia do
poder militar sobre os demais sectores deixava de ser óbvia, sobretudo quando o
desfecho pacífico do confronto bipolar parecia realçar o potencial da interdependência
económica sobre a rivalidade político-militar (Buzan e Hansen, 2010:160). O fim da
guerra-fria foi um momento de viragem para muitos Estados africanos, do mono
partidarismo ao multipartidarismo e da autocracia à democracia.

Características da Segurança Nacional nos Estados Africanos no Contexto da


Democratização.

Nesta parte do trabalho caracterizamos a segurança nacional nos Estados africanos no


contexto da democratização. Nesse contexto, vale lembrar que para este trabalho
consideramos a segurança nacional como reflexo de ausência de conflitos armados, pois
a existência de ameaças é muito relativa e depende do ângulo de visão de cada Estado,

18
líder ou pesquisador. Assim, para falar da segurança nacional em Estados africanos
dentro do contexto da democratização, temos como principal indicador a existência ou
não de conflitos armados ligados ao processo de democratização em África desde 1990.

Segundo Grasa e Mateos (2010:10), baseados nos dados do Instituto Internacional de


Pesquisa para a Paz de Estocolmo (Stockholm International Peace Research Institute
-SIPRI), de 1990 a 2007, 12 países africanos viveram situações de insegurança nacional
devido a conflitos armados, nomeadamente: Algéria, Angola, República Democrática
do Congo (RDC), República do Congo, Eritrea-Ethiopia, Guiné-Bissau, Libéria,
Ruanda, Serra Leoa, Somália, Sudão e Uganda.

A maioria dos casos de conflitos acima mencionados tem relação com processos
eleitorais, visto que “em muitos exemplos em que processos eleitorais são
fragmentados, eles são seguidos de conflitos violentos. A Serra-Leoa, Guiné-Bissau e
República Centro Africana sucumbiram para guerras civis nos anos 1990 devido a
factores relacionados a eleições. As eleições induziram a conflitos que ameaçaram até a
sobrevivência do Estado-Nação” (Kanyinga, Okello e Akech, 2010:2). Assim,
demonstra-se que características próprias dos Estados africanos podem estar na origem
da dificuldade de adequação do modelo democrático liberal no continente.

De 2007 até a actualidade, alguns dos conflitos relacionados ao processo de


democratização em África tiveram seu término e restabeleceu-se a paz nesses países.
Entretanto, emergiram outros conflitos com recorrência à violência política, com a
particularidade de terem sido ligados a luta pelo poder político, como os casos dos
conflitos pós-eleitorais no Quénia em 2008, na Costa do Marfim em 2011 e golpes de
Estado com destaque o caso da Guiné-Bissau.

Em resumo, podemos afirmar que a transição democrática em África foi acompanhada


por diversos conflitos. Esses conflitos verificaram-se na sua maioria após a realização
das primeira eleições nos Estados africanos. Naquele período, também, houve
confrontos causados por lideranças autoritárias e ditatoriais, como na RDC. Dai que, o
estágio da segurança nacional em estados africanos no contexto da democratização era
negativo, apesar de haver alguns estados que tiveram uma transição pacífica. A
existência de conflitos em democracias liberais africanas, deveu-se a alguns

19
constrangimentos na adequação da democracia liberal à realidade sócio-politica
africana.

Os factores que fizemos referência a cima tem ligação com questões identitárias nota-se
ainda que as razoes de fracasso da democracia em África estão intrinsecamente ligadas
a não observância, ou não respeito, das estruturas, sociais, étnicas e valores culturais
que estes povos tinhas antes do processo de democratização, a que salientar que ao
ignorar estes factores endógenos, já tira de per si o valor deste modelo em termos de
aceitação e identificação dos africanos com esta abordagem.

As dificuldades de aplicação dos pressupostos básicos da democracia liberal nos


Estados africanos, pode ser encontrada a partir da própria configuração ou do processo
de construção do próprio Estado africano, visto que, na maior parte provem de um
processo de descolonização e a sua delimitação territorial não foi feita seguindo as
estruturas da etnicidade.

Sendo assim, o primeiro desafio torna-se o da implantação da própria nação, as divisões


existentes nos estados africanos põem em causa a legitimidade dos líderes eleitos, dai
que se verificaram grandes percentagens de abstenção nas primeiras eleições
multipartidárias em vários Estados africanos.

Constrangimentos da democracia liberal no contexto sociopolítico dos Estados


africanos
Nesta parte do trabalho olhamos para a aplicação da democracia liberal em Estados
africanos, sobretudo as especificidades que emperram a sua consolidação. De acordo
com Kanyinga, Okello e Akech (2010:5-8), podem ser levantadas várias razões da
dificuldade de consolidação da democracia liberal em Estados africanos, com destaque
para as seguintes:

i) Democratização sem um processo simultâneo de mudança nas


instituições de governação ou ainda no Estado em si.
Alguns países adoptaram a política de multipartidarismo no princípio dos anos 1990
sem um ajustamento extensivo das suas constituições e do quadro institucional no qual é
praticada a politica (Kanyinga, Okello e Akech, 2010:5). Naturalmente, o exercício da
politica sem a devida cobertura constitucional e normativa cria um clima de
desconfiança no qual, qualquer actor politico, usa os meios que tiver a sua disposição

20
para o alcance, controle e manutenção do poder politico. Isto resulta em conflitos
armados ou não armados, visto que não há um quadro institucional credível e adequado
à nova realidade de democracia liberal no país.

Kanyinga, Okello e Akech (2010:5), citam como maiores exemplos dessa realidade os
casos do Kenya e do Zimbabwe, onde os conflitos em processo eleitorais ocorreram na
sequência de projectos de revisão constitucional falhados. Pode se acrescentar os
conflitos resultantes de tentativas de revisão constitucional visando aumentar os poderes
do Presidente, estender o tempo dos mandatos ou permitir uma recandidatura.

ii) Adopção do sistema de governação executivo presidencial e sistema


eleitoral do tipo “winner-take-all”
Na maioria dos países africanos, desde a década de 1990, as eleições são semelhantes a
um jogo de soma zero, em que está institucionalizado um sistema de “winner-take-all”,
ou seja, o vencedor ganha tudo. Esse sistema, aplicado em sociedades etnicamente
divididas, como a maioria das africanas, cria adversariedades. Isto é, em alguns
momentos as aspirações de uma determinada comunidade são depositadas em um
indivíduo e a sua derrota eleitoral tem como efeito imediato, a alienação de toda a
comunidade. Assim, a ideia de Estado-nação e unidade nacional é posta em causa,
prevalecendo as questões étnicas e comunitárias.

iii) Eleições como ocasiões de lutas entre grupos sobre a hierarquia de


valores
As eleições em África têm sido momentos em que a vitória ou derrota, não são medidas
apenas em termos materiais concretos, mas também em termos simbólicos. Por outras
palavras, em África, de acordo com Kanyinga, Okello e Akech (2010:6), subsiste a ideia
de “one of our own”. As comunidades defendem a presença de um dos seus membros
num cargo governamental ou de serviço público. Isto é visto como um ganho
psicológico e simbólico que, caso não se acautele constitui um factor de instabilidade
política que pode atingir proporções violentas como é o exemplo do Zimbabwe.

iv) A Transição para a Democracia criou novas Demandas e novas Formas


de Competição de Identidades
Em muitos países africanos, há proeminência das identidades na prática da política. Esse
cenário foi muito notável nos processos eleitorais dos anos 1990. Contudo, a
consolidação das identidades em competição nas sociedades democráticas africanas

21
ocorre em detrimento da cultura cívica. Embora exista, em muitos casos, a cultura de
participação política, o seu efeito na prestação de contas ou responsabilização no Estado
é menor. Há maior dinâmica da consolidação das identidades em relação a consolidação
do Estado.

Segundo Enra (2009:51), também faz parte das razões da instabilidade política em
democracias africanas, a fragilidade e a quase inexistência da sociedade civil, a
inconsistência da estrutura do Estado e suas instituições e por fim, a ausência da
estrutura económica moderna eficiente.

Segundo Nilson e Abrahamsson (1994:327), certos Estados africanos invocam a


democracia como sistema de governo que os rege, mas em muitas ocasiões mostram
actos de negação ao mesmo sistema quando protestam contra os resultados das eleições,
a recusa de entrega do poder em caso de um partido da oposição ganhar as eleições e a
violação dos direitos humanos. As razões apresentadas que justificam a dificuldade de
aplicação satisfatória da democracia liberal em Estados africanos, não podem ser vistas
como características de todos os países africanos. Cada país tem a sua configuração
étnica, social e política, dai que tem suas particularidades no concernente a aplicacao da
democracia liberal.

Neste capítulo, percebemos que a democratização em África é enquadrada na terceira


onda, na qual o seu principal marco foi o fim da guerra-fria. Isso teve reflexos notáveis
em Estados africanos pois, muitos estavam alinhados ao marxismo-leninismo, no
contexto da luta contra o imperialismo, dai que com a derrocada da União das
Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) tiveram de adoptar a democracia.

A transição para a democracia foi conflituosa em vários Estados africanos, devido a


variados factores. Contudo, há que realçar que a aceitação de resultados eleitorais foi o
grande motivo de crispações que atentaram a segurança nacional em África. Em
resumo, podemos afirmar que a segurança nacional de estados africanos no contexto da
democratização foi caracterizada por constantes ameaças, como aconteceu na Costa de
Marfim e Moçambique, devido a adequação dos Estados africanos ao modelo
democrático liberal que implicava mudanças radicais na vida política e social dos
Estados. Mas, trouxe benefícios, através da redução de conflitos inter-estatais e
tendências separatistas.

22
CAPITULO 3

PRINCIPIOS DA DEMOCRACIA LIBERAL versus SEGURANÇA NACIONAL


EM ESTADOS AFRICANOS
Neste capítulo estudamos a aplicação da democracia liberal como ideologia política,
bem como a sua relação com a segurança nacional dos Estados africanos que a têm
como seu sistema político, com o propósito de conhecer as condições em que a
democracia liberal pode constituir ameaça à segurança nacional. Primeiro apresentamos
os principais aspectos ou pilares da democracia liberal, destacando aqueles que
influenciam a segurança nacional dos Estados que a praticam.

De seguida demonstramos alguns exemplos em que a aplicacao dos principios da


democracia liberal levou a violencia e insegurança nacional, tais como a violencia pos-
eleitoral no Kenya e na Nigeria, assim como abordamos o caso do Ghana como
exemplo positivo da aplicacao dos principios da democracia liberal e a segranca
nacional.

2. Principios da Democracia Liberal na Seguranca Nacional em Estados


Africanos
De acordo com a discussão do conceito de democracia liberal, apresentado no primeiro
capitulo deste trabalho, a democracia liberal fundamenta-se em principios ligados não
só a esfera politica, mas tambem à esfera económica e de direitos e liberdades
individuais. São exemplos desses principios, a participação dos cidadãos, a igualdade, a
tolerância politica, a responsabilização, a transparência, eleições regulares livres e
justas, liberdade económica, respeito pelos direitos humanos, sistema multipartidário e
Estado de direito (Kamp, 2011:6).

Na existência de vários princípios da democracia, devido as suas diferentes tipologias e


a interpretações divergentes e contextuais, independentemente do contexto, quando
tratamos da democracia liberal, os seus princípios devem estar assentes em três pontos
básicos que apresentamos a seguir.

Segundo Boye (1998:37), o primeiro princípio geral é da existência da competição entre


indivíduos ou grupos de indivíduos, organizados em partidos políticos para ganhar o
poder e cargos públicos, regularmente, em intervalos e sob procedimentos pacíficos pré-

23
estabelecidos e aceites pelo povo no geral; o segundo princípio refere-se aos direitos dos
cidadãos participarem na escolha de suas lideranças através da realização de eleições
livres, transparentes e justas; e finalmente o princípio do reconhecimento e a garantia
jurídica do exercício das liberdades civis e políticas e direitos reconhecidos por
convenções e direito internacional, como parte integrante dos direitos humanos tais
como a liberdade de expressão, tolerância política, liberdade de associação, liberdade de
imprensa, direitos e segurança da pessoa e da propriedade.

Os pilares da democracia liberal são aplicados em países com contextos políticos,


económicos e sociais diferentes como no continente africano. Assim, olhamos de
seguida a aplicação de dois desses pilares, a tolerância política e a realização de eleições
regulares, livres e justas. Consideramos que esses são pilares cruciais para uma
convivência democrática sã, estabilidade e segurança nacional nos Estados,
particularmente em África.

2.1. Tolerância Política


No que se refere à tolerância política, Correa (2004:26) defende que ela pode ser vista a
partir de cinco diferentes considerações: como resultado de uma justa e igualitária
liberdade de consciência e de expressão; como o mais adequado método de confronto
entre diferentes doutrinas compreensivas de bem numa sociedade pluralista; enquanto
recurso político de defesa das liberdades individuais contra um Estado intolerante ou
contra grupos intolerantes dentro de uma sociedade liberal; como virtude democrática
dos cidadãos no uso da razão pública e na apresentação de argumentos no fórum
político e, por fim, enquanto abstenção dos povos liberais de impor à força os princípios
liberais aos povos não liberais.

Geralmente, a ideia de tolerância política está ligada a liberdade de expressão, ao


pluralismo de opiniões e ao respeito pelos direitos humanos. No exercício da
democracia liberal, dentro do espírito de tolerância política, espera-se que mesmo
havendo diferenças entre a população de um Estado, baseadas na raça, religião e cultura,
estas sejam superadas abrindo-se espaço para a discussão, debate e acomodação dos
diferentes pontos de vista (Kamp, 2011:6).

Assim, a tolerância politica é um pilar muito importante para os Estados africanos se


tivermos em conta que, na sua maioria, congregam vários e diversificados grupos

24
étnicos como consequência do processo da construção desses Estados que obedeceu as
fronteiras delineadas arbitrariamente pela administração colonial europeia, e também
pela opção da Organização da Unidade Africana (OUA) em manter essas fronteiras para
evitar conflitos. Por outras palavras, vários grupos étnicos foram divididos em termos
de pertença estatal, ocupando alguns deles territórios de dois ou mais Estados vizinhos.

Por outro lado, “a diferença étnico-regional com os correspondentes movimentos


tendencialmente separatistas baseados numa afirmação de identidade específica de cariz
cultural, histórico ou geográfico”, é apontada por Ferreira (200:174), como um dos
factores relacionados a tolerância política, conducentes a insegurança em África.
Portanto, esse princípio é bastante sensível para os Estados africanos em particular,
visto que se não for respeitado aumentarão as possibilidades de tensões e conflitos, que
resultam na insegurança nacional.

Um dos marcos mais recentes da ausência de tolerância política e consequente


sentimento de exclusão de certos grupos identitários, deu-se no em 2012 no Malí, onde
os tuaregue10, grupo que já manifestava a sua insurreição desde o período da
independência do país, em 1960, revelou abertamente as suas pretensões separatistas
para deter o poder sobre o território do norte e a valorização da sua identidade cultural,
seus hábitos, valores e acima de tudo a sua religião.

Os tuaregue alegavam que são discriminados pelos seus hábitos e têm sido
negligenciados pelo governo de Bamako. Não tinham acesso a certos serviços e a forma
por eles adoptada foi a insurreição e pretensões separatistas com recurso à violência 11.
Esse pretexto esteve na origem de instabilidade e insegurança nacional que perdurou até
a intervenção militar da França (ex- potência colonizadora), em 2013.

O Malí não é o único caso em que alega-se haver intolerância política. Podemos citar o
caso de Angola, onde para além dos partidos da oposição, agências noticiosas nacionais
e internacionais, assim como ONGs, reportam frequentemente casos de intolerância
política e de repressão dos direitos e liberdades, principalmente da imprensa e
organizações da sociedade civil.
10
Um povo berbere constituído por pastores semi-nómadas, agricultores e comerciantes que reivindica o
controlo do norte do pais, e apesar de serem tradicionalmente nómadas, constituíram importantes centros
nos países em que estão presentes, como Agadez, no norte do Níger ou então Gao, Kidal e Timbuctu no
Mali (www.noticiasterra.com).
11
http: /../www maliensdelexterieur.gov.ml, (2012). Consultado em 19/07/ 2014.

25
Num contexto geral, a tolerância política, pelo simples facto de pressupor a aceitação de
diferenças, pode ser um instrumento fulcral para o sucesso dos princípios democráticos
e de governação, uma vez que as diferentes sensibilidades que compõem o Estado terão
as suas posições reflectidas na governação, criando assim o sentimento de nação e
unidade nacional, o que reduz a propensão a conflitos internos.

2.2. Eleições Regulares, Livres e Justas


Quando se refere a eleições regulares, está-se a invocar um dos maiores sinais de
democracia liberal, ao mesmo tempo um dos principais indicadores de cultura
democrática nos Estados. Essa assumpção ganha azo com a visão apresentada por Kamp
(2011:16), de que a democracia não é um estado absoluto, mas um processo continuo
que parte da promoção de direitos básicos, a realização de eleições através da
participação efectiva de toda a população, de e em todos os níveis sociais, exercendo
controlo sobre todos os assuntos que afectam as suas vidas. Portanto, a realização de
eleições operacionaliza o significado etnológico do conceito de democracia, pois o povo
é quem governa, o poder está nas suas mãos.

A relação directa das eleições com a democracia foi fortemente impulsionada pelo
liberalismo político do século XVIII e XIX, visto que “nas sociedades liberais,
normalmente, a democracia é concebida como um sistema político onde as decisões são
tomadas mediante deliberação e votação de agentes racionais, limitados pelos direitos
fundamentais, em âmbito institucional, tendo como base a regra da maioria, ou seja, a
regra que prescreve que a decisão de todos é aquela endossada pela maioria dos
cidadãos” (Couto, 2012:63). Nessa concepção, a votação por agentes racionais (povo)
demonstra a manutenção da assumpção central da democracia como governo do povo, e
a observância das liberdades e direitos fundamentais.

A realização de eleições no contexto africano, vem do período das primeiras


independências, tendo conhecido nova dinâmica com a transição democrática dos anos
1990. De 1960 a 1970 foram realizadas apenas 28 eleições nos novos Estados africanos,
mas a partir dos anos 1990 (terceira onda da democratização) a realização de eleições
aumentou para 65 eleições por década, sendo que no período entre 2000 a 2005, foram
realizadas, em África, 41 eleições num intervalo de cinco anos (Leon, 2010:3).

26
Podemos com base na variação do número de eleições realizadas nos países africanos
nas últimas décadas, dizer que as eleições já são prática em Estados africanos e essa
cultura foi adoptada como a fórmula adequada para o acesso ao poder político,
repudiando-se assim, todas as outras formas. No contexto actual, os Estados africanos
“reafirmam o seu compromisso em realizar regularmente eleições transparentes, livres e
justas, em conformidade com a Declaração da União relativo aos Princípios que regem
as Eleições democráticas em África” (Carta Africana sobre Democracia, Capítulo VII,
artigo 17).

Segundo Kamp (2011:19), em democracias liberais as eleições devem ser competitivas,


periódicas e inclusivas. Isto é, os partidos da oposição e candidatos devem usufruir da
liberdade de discurso, reunião e movimento, necessários para manifestar abertamente,
as suas críticas ao governo em vigor e apresentar políticas e candidatos alternativos para
os eleitores. Os eleitos devem prestar contas aos cidadãos, a sua eleição não é vitalícia
mas periódica, tanto que os cidadãos devem retornar periodicamente (na maior parte dos
países africanos, num intervalo de 5 anos) para reelege-los ou optar por outras
alternativas.

De modo que as eleições sejam de facto a manifestação da vontade do povo, existe o


princípio de inclusão. Sobre esse princípio, pretende-se que a definição de eleitores seja
mais abrangente, que esse direito de eleger seja para todos cidadãos nacionais, ou por
outras palavras, pretende-se um sufrágio universal. A inclusão é um dos aspectos mais
notáveis da diferença entre a democracia liberal e a democracia clássica ateniense. Na
democracia ateniense só eram considerados cidadãos os aristocratas, os indivíduos
livres (não-escravos), do sexo masculino, filhos de pai e mãe ateniense, maiores de
dezoito anos (Touchard, 1970:38). Eram excluídas por exemplo mulheres, e tornava-se
assim num governo de minoria e não da maioria como se pretende actualmente.

Actualmente, em África realizam-se eleições regulares, de modo geral. Entretanto o


cumprimento estrito da ideia de eleições livres e justas é muitas vezes questionado. Isto
acontece devido a recorrência a conflitos após as eleições com justificações ligadas a
falta de transparência ou ao incumprimento dos requisitos que nos levariam a eleições
realmente livres e justas. Para fundamentar essa realidade, tomamos como exemplo os
casos de violência eleitoral na Nigéria e no Kenya, onde a não-aceitação de resultados
eleitorais e a ineficácia das instituições que gerem os processos eleitorais, abriu espaços

27
para a manifestação de violência que atingiu dimensões étnicas, ameaçando a unidade e
a segurança nacional.

2.3. Alguns exemplos de insegurança nacional causada pela violência eleitoral


No caso da Nigéria, segundo, Ighodalo, (2012:20), a questão da violência num contexto
eleitoral na Nigéria deu-se em 2001, quando depois da votação e anúncio dos
resultados, o Congress for Progressive Change (CPC) rejeitou abertamente os
resultados das eleições presidenciais alegando que, em vez de Goodluck Jonathan do
Peoples Democratic Party (PDP), com 22,4 milhões de votos, o seu candidato o
General Mohammadu Buhari, com 12 milhões de votos era o justo vencedor, visto que
as eleições foram fraudulentas.

Enquanto o caso estava sob tratamento judicial, diferentes grupos aproveitaram-se do


momento de instabilidade política para cometer actos de violência comunitária criando
insegurança no país, principalmente na região Norte. Na opinião de Ighodalo (2012:22)
as incertezas políticas criaram um espaço para a revitalização de grupos contestatários
que manifestaram as suas posições conflituantes com as do Governo, que anteriormente
às eleições estavam numa fase dormente. De entre esses grupos, o Boko Haram é o mais
radical que actualmente continua a semear insegurança nos estados do Norte da Nigéria.

Os distúrbios contra os resultados começaram nos estados de Bauchi e Gombe, e se


estenderam rapidamente para outros estados no norte, como Kaduna, Kano, Sokoto,
Katsina, Adamwa e Nasarawa, onde duraram três dias. 12 A violência pós eleitoral se
alastrou pelo norte da Nigéria, tendo como consequência a morte de cerca de 121
pessoas, centenas de feridos e 15 mil tiveram de abandonar suas casas. A fraca gestão
dos processos eleitorais abre espaços para a violência e renascimento de reivindicações
de carácter étnico e religioso que ameaçam a segurança nacional.

Segundo Ighodalo (2012:22), um dos maiores problemas da violência eleitoral, para


além das acusações de fraudes, é que o sistema maioritário de winner takes all não é
saudável para o Estado Nigeriano, profundamente dividido em termos étnicos. Na
Nigéria, de entre tantos grupos étnicos, existem sete principais, sendo os Hausa-fulani
com 29% e os Yoruba em 21%, os maioritários. Dá para perceber que é difícil satisfazer
as aspirações do povo nigeriano como tal. Sendo assim, deve se estabelecer uma politica

12
http://old.visaonews.com/index.php?option=com_content&view=article&id=8754:violencia-pos-
eleitoral-na-nigeria-mata-121-pessoas&catid=86:mundo&Itemid=172 – consultado a 08/05/14

28
de tolerância política e acomodação, barganha, compromisso e consenso para a
prevenção de conflitos.

2.4. Insegurança Nacional Causada pela Violência Eleitoral no Kenya


A história democrática do Kenya remota desde o alcance da sua independência da Grã-
Bretanha, em 1963, uma vez que imediatamente após a independência o Kenya adoptou
um sistema multipartidário. Porém, entre 1969 e 1992, o KANU era o único partido
politico reconhecido no país, vigorava o mono partidarismo. Apesar disso, o Kenya não
ficou imune à onda de democratização dos anos 1990, visto que em 1992, foi retomado
o sistema multipartidário e, mesmo antes das eleições de 1997, o governo levou a cabo
reformas do processo eleitoral eliminando algumas das leis consideradas opressivas
concernentes a liberdade de reunião e de expressão (Kioko, 2010:3).

Mesmo com as mudanças ou reformas para a consolidação da democracia liberal e da


realização de eleições em 1997 e 2002 com relativa estabilidade, as eleições de 2007
foram marcadas por violência que atingiu, assim como na Nigéria, um carácter étnico e
regional. A erupção da violência pós-eleitoral no Kenya resulta de um conjunto de
factores precedentes a realização das eleições em Dezembro de 2007.

Segundo Kanyinga e Okello (2010:11), Mwai Kibabi decidiu, unilateralmente, designar


membros para a Comissão Eleitoral do Kenya. Essa decisão contradizia os acordos
alcançados em 1997 de que todos os partidos políticos nomeariam seus representantes
para a Comissão Eleitoral. Adicionado a isso, existem 3 razões que antes e durante a
votação serviram de sustento da contestação de resultados. Em primeiro lugar, não
houve actualização do registo de eleitores, pois permaneciam no registo, nomes de
pessoas já mortas; Segundo, não houve uma campanha de ajuda e instrução para a
votação de pessoas com baixo nível de literacia; Terceiro os observadores nacionais e
estrangeiros tiveram dificuldades para ter acesso livre às assembleias de voto.

Neste caso, a constituição e funcionamento de instituições democráticas que garantam


eleições livres e justas, era ameaçada, reforçando-se a ideia de que num contexto
democrático liberal, é preciso que as instituições principalmente as ligadas aos
processos eleitorais sejam apartidárias.

Realizadas as eleições, surge o problema da aceitação dos resultados, um dos principais


factores da violência eleitoral em África. De acordo com Gitau (2010:12), os resultados

29
das eleições confirmados pela Comissão Eleitoral davam vitória a Mwai Kibaki com
46.4 % dos votos sobre Raila Odinga com 44.1% do total de votos. Logo após o anúncio
dos resultados, gerou-se violência nos bairros de Nairobi e outras grandes cidades,
perturbando-se a ordem pública durante dois meses. Inicialmente, os principais alvos da
violência eram as populações da etnia Kikuyu na qual pertencia o candidato vencedor
Mwai Kibaki, nos bairros de Nairobi e na cidade de Kisumu.

A violência resultou milhares de mortos e cerca de 500.000 deslocados (Human Rights


Watch, 2008). Esses números demonstram a gravidade que a violência pós-eleitoral
pode ter sobre a segurança humana e como consequência sobre a segurança nacional,
sobretudo devido a sua conotação étnica.

A dimensão étnica do conflito no Kenya surge quando, a alguns meses das eleições,
Mwai Kibaki fundou o seu partido de reeleição, o Partido Para Unidade Nacional
(PNU) e o principal líder do KANU, a oposição, Uhuru Kenyatta, anunciou o seu apoio
à reeleição de Mwai Kibabi, apesar de terem sido adversários nas eleições de 2002. Essa
situação levantou a questão étnica porque Kibaki e Uhuru são da comunidade Kikuyu, e
a atitude de Uhuro foi vista pelos restantes grupos étnicos como uma solidariedade
étnica e “confirmação” de que a elite Kikuyu pretendia ascender e monopolizar o poder
excluindo todos os outros grupos étnicos (Kanyinga e Okello, 2010:12).

Mais uma vez, a questão da inclusão aparece como um facto extremamente sensível
para as democracias liberais africanas. De acordo com Kanyinga e Okello ( 2010:12),
não só a questão étnica influenciou a violência nas eleições no Kenya, mas houve outros
factores como as injustiças no desenvolvimento regional, a alocação de recursos, a
questão da terra e contradições históricas no seio das regiões do país.

2.5. Ghana como Exemplo de Segurança Nacional em Democracias Liberais


O Ghana é visto, a nível global, como um dos países africanos onde a democracia
liberal tem registado um rápido e consistente processo de consolidação aliado a
estabilidade e segurança nacional. A condução de eleições livres, justas e transparentes
aparece como o indicar frequentemente usado para avaliar a democracia liberal no país.
Em termos históricos, o Ghana foi o primeiro país da independência dos regimes
coloniais europeus, neste caso da Grã-Bretanha em 1957.

30
Segundo Boafo-Arthur (2008:18), muitos factores podem ser levantados para explicar o
sucesso da democracia liberal na garantia da segurança nacional e estabilidade no
Ghana. De entre os quais, destaca-se a experiência do passado de ditadura militar, o
melhoramento das relações civís-militares e o papel das organizações da sociedade civil.

No que se refere a experiência do passado da ditadura militar, Boafo-Arthur (2008:43),


sublinha a importância de o Ghana estar localizado na África Ocidental, região que foi
considerada o centro dos golpes de Estado no continente africano, onde a cultura do
militarismo tornou-se parte da política da sub-região, tendo contribuído imensamente
para várias formas de instabilidade e recurso a guerras civis para a resolução de assuntos
políticos, aliado ao facto dos militares do Ghana terem contribuído fortemente para as
operações de manutenção de paz da ONU. Isso significou a aquisição de experiência por
parte dos militares e dos civis sobre os males da guerra (Olukoshi, 2001:1) 13 citado por
Boafo-Arthur (2008:43).

Nesse contexto, surgiu a percepção de que uma má administração civil é melhor que um
regime militar em termos de garantia de liberdades e direitos fundamentais. Olhando
desse modo, vários outros países africanos poderiam ter essa percepção, visto que os
males dos regimes militares sobre os direitos e liberdades individuais eram evidentes
para todos os países. Sendo assim, outros aspectos devem ser encontrados como
motivos para a condução democrática estável no Ghana, como o papel das organizações
da sociedade civil.

Sobre o papel das organizações da sociedade civil, Boafo-Arthur (2008:48), afirma que
a emergência de várias organizações da sociedade civil, think thanks e organizações
não-governamentais, constituiu uma plataforma de participação dos cidadãos nos
processos políticos. Essas organizações “impulsionaram programas educativos,
empenharam-se na análise de assuntos da sociedade com a intenção de manter a
população informada não só sobre eleições mas também sobre questões económicas do
país” (Boafo-Arthur, 2008:49). O resultado imediato desse empenho das organizações
da sociedade civil foi o papel fundamental por elas desempenhado para a realização de
eleições pacíficas em 2000 e 2004.

13
Olukoshi, Adebayo (2001), Towards Developmental Democracy: A Note, United Nations Research
Institute for Social Development, Cape Town

31
Como consequência do envolvimento dos cidadãos na construção de uma cultura
democrática, a aceitação e assumpção da democracia como sistema de relacionamento
entre os governantes e os governados, ultrapassou a dimensão étnica que caracterizou
outros países, ganhando um carácter verdadeiramente nacional.

Portanto, notamos que o Ghana embarcou para o processo da democratização com a


intenção maior que a realização de eleições livres e justas, mas sim com a intenção de
tornar funcionais todos os elementos influentes na garantia da liberdade e o gozo dos
direitos fundamentais.

De modo geral, as eleições tem sido um momento de afirmação e consolidação da


democracia liberal e tem sido regulares nos Estados africanos. Entretanto a observância
de requisitos necessários para que as eleições sejam efectivamente livres e justas tem
sido a maior dificuldade nas democracias liberais africanas. Nesse contexto, Savun
(2012:25), defende que em África, a elite não encara o processo de eleições com regras
que priorizem a politica da tolerância.

Pelo contrário, adicionado a falta de capacidades em termos de fundos e logística, para


atingirem os seus objectivos, eles (a elite politica nos Estados africanos) manipulam os
instrumentos constitucionais e normativos que dariam credibilidade aos processos
eleitorais. A elite no poder exerce autoridade sobre todas as instituições de modo a
manter-se no poder.

Em resumo, olhando para as eleições livres e justas como pilares da democracia liberal
que afectam a segurança nacional, com os exemplos da Nigéria e do Kenya nota-se que
apesar de realizarem-se de forma regular, as eleições tem sido manchadas por alguns
factores, estando alguns sob controlo dos Estados e outros não. Por exemplo a aceitação
de resultados estão sob controlo do Estado, bem como os candidatos podem deixar de
instrumentalizar as suas etnias com intuito de ascender ao poder, mesmo sem a
legitimidade que as eleições conferem, através do uso da violência que atenta, em
última instância à segurança nacional.

2.6. Outros Factores de Insegurança Nacional nas Democracias Liberais


Africanas
A tolerância política e a realização de eleições, não são os únicos factores da
democracia liberal que tem o potencial de afectar a segurança nacional em Estados

32
africanos. Existem tantos outros aspectos como a existência e funcionamento correcto
das instituições democráticas e a personificação do poder político, ou regimes neo-
patrimoniais.

No que concerne a instituições democráticas, nota-se que para a implementação integral


dos preceitos democráticos, é necessário que haja instituições cujo funcionamento
transmita confiança e segurança a todos os cidadãos. Nesta ordem de ideias, assume-se
que “o sucesso da democracia num país é dependente da existência de instituições
fortes. Essas instituições incluem os três braços da governação: a legislatura, o
executivo e o judiciário” (Kamp, 2011:7). Esse requisito, é fruto do princípio de
separação e interdependência de poderes e dos check and balances.

Quando nos referimos a separação de poderes, no contexto africano, muita atenção é


prestada para o papel do executivo, pois muitas vezes é o órgão que tem mais poderes
de influência sobre o judiciário e o legislativo. O executivo deve estar sujeito à
regulamentação legal e ao princípio de legalidade nos seus actos, visto que a democracia
é inconcebível sem a existência do estado de direito, logo se um líder de um país sente-
se acima de qualquer sanção judicial ou sanções políticas (eleições, voto de confiança
do parlamento), estará, naturalmente, inclinado para o abuso de poder” (Boye, 1998:41).
Assim, é preciso que as instituições desempenhem suas funções independentemente.

No esquema de check and balances, o poder judicial aparece como o mais sensível, uma
vez que prima pelo cumprimento integral das normas de interacção entre os actores
políticos do sistema democrático, principalmente num contexto democrático liberal
onde há pluralismo de expressão e espaço para a participação dos cidadãos. A
fundamentar isso, está a ideia de Boye (1998:41), de que o fracasso no sistema judicial
coloca em risco a obediência da constituição e das demais normas. Assim cria-se espaço
para, por exemplo, haver manipulação dos resultados eleitorais, impunidade e
irresponsabilidade sobre a tolerância e direitos humanos, que no nosso ponto de vista,
em última instância, concorrem para insatisfação e insegurança nacional.

No que concerne ao poder legislativo, Boye (1998:43), considera que na África


subsaariana, o espectro geral de parlamentos resultante do sistema de partido-único,
continua a revelar-se pela dominação de parlamentares eleitos, membros do partido em
governação, e muitas vezes, resultante eleições fraudulentas. Nessas circunstâncias, é

33
difícil assumir que os parlamentares estão no pleno cumprimento do que, em termos
clássicos, seria a sua função, de legítimos representantes do povo. Portanto, no seio do
povo aumenta o sentimento de exclusão dos processos políticos, tirando a legitimidade
dos órgãos no poder.

Nas democracias liberais, as instituições são imprescindíveis porque constituem o


elemento que torna possível, através das suas garantias, a livre interacção das forças
democráticas. Entretanto, é necessário garantir que elas funcionem efectivamente de
acordo com a lógica inerente à sua natureza e objectivos. Caso contrário, essas
instituições manter-se-ão meramente formais e serão permissivas à monopolização do
poder por grupos sociais, que fazem valer seus próprios interesses em vez dos interesses
da sociedade no seu todo (Boye, 1998:38).

A fraqueza de instituições, cria por consequência, a personificação do poder político. É


nesse contexto de personificação do poder político que se fala da separação entre as
instituições e as pessoas. Em relação a esse ponto, Leon (2010:4), afirma que a
personificação do poder e a repressão dos direitos humanos são os factores mais críticos
da democracia liberal em África.

Com o contexto acima apresentado, de facto podemos afirmar que a personificação do


poder político cria condições para o surgimento de conflitos no processo de transição do
poder em África. Exemplo dessa realidade foram os acontecimentos no Senegal em
2012, com protestos e violência entre os simpatizantes dos dois candidatos à segunda
volta das eleições presidenciais, em virtude da recandidatura de Abdoulaye Wade, e a
sua recusa em deixar o poder a favor de Macky Sall, vencedor das eleições14.

Outro exemplo de insegurança decorrente da personificação do poder político e


ausência ou fracasso das instituições são as manifestações pelas liberdade políticas e
civis na Tunísia, no Egipto e na Líbia, em 2011, que convencionou-se chamar
primavera árabe. Isso criou insegurança nacional tanto que até a actualidade, tanto a
Líbia assim como o Egipto vivem situações de confrontos e instabilidade política.

Este cenário reflecte o conceito neo-patrimonial do poder em África, pois “alguns


Estados democráticos foram adoptando princípios formais e instituições de governação

14
http://www.eisa.org.za/pdf/pb01.pdf - consultado em 20/06/2014

34
na base do pluralismo político e realizam eleições regulares no cumprimento das
recomendações de parceiros internacionais. Entretanto, na realidade, isto é feito como
um meio de consolidação e legitimação da natureza monopolística do poder, pois há
manipulação das eleições entre outros tipos de práticas de acesso ao poder, contrarias à
legitimação popular através do voto” (Boye, 1998:50).

Portanto, o regime neo-patrimonial está na origem de vários artifícios contrários às


normas democrático-liberais, usados para a legitimação do poder político. Assim, a
propensão para conflitos é cada vez maior.

Na abordagem desse capítulo, foi possível tirar conclusões sobre a aplicação de


princípios democrático-liberais em Estados africanos. Uma das conclusões a que
chegamos é que, os pilares da democracia liberal, não ignorando os seus valores,
tornam-se nocivos à segurança nacional se não forem observados tendo em conta o
contexto sócio-politico dos Estados africanos.

Em segundo lugar, neste capítulo percebemos que a democracia liberal pode constituir
ameaça a segurança nacional dos estados africanos na medida em que não há
observância estrita dos seus pressupostos básicos, como a tolerância política, a inclusão
e a realização de eleições livres justas e transparentes.

35
CAPITULO 4

DEMOCRACIA LIBERAL EM MOÇAMBIQUE E INSTABILIDADE POLITICA


EM MOÇAMBIQUE
Neste capítulo abordamos a relação entre a democracia liberal e a eclosão de confrontos
militares entre as Forças de Defesa e Segurança (FDS) de Moçambique e as forças da
Renamo. De princípio faz-se um breve olhar sobre o processo de transição democrática
em Moçambique. A seguir apresentamos uma breve análise dos factores da democracia
liberal que tenham contribuído para a eclosão do conflito militar em Moçambique, bem
como caracterizamos o contexto conflitual à luz dos pilares da democracia liberal.

4.1. Transição Democrática em Moçambique


A transição democrática em Moçambique não está dissociada do processo de
democratização a nível do continente africano, no âmbito da terceira onda de
democratização nos anos 1990. Olhando para as condições gerais de transição
democrática, Moçambique enquadra-se na democracia emergente de negociações de paz
em casos de guerra-civil, visto que viveu 16 anos (1976-1992) de guerra, cujo objectivo
era, na narrativa da Renamo, a instauração da democracia liberal.

Tendo a democratização em Moçambique sido precedida por um longo período de


guerra, numa era de mudanças a nível global, para Lala, (2007:108), além do nível
doméstico, a democratização em Moçambique enquadra-se no contexto global e
regional. No nível global, o fim da guerra-fria significou a redução das fontes de apoio
aos beligerantes e o reforço do discurso generalizado de liberalização económica
acompanhado pela democratização. No nível regional, o fim do regime do Apartheid na
África do Sul, significou o fim do apoio a um dos beligerantes, a Renamo, e gerou-se
um estímulo positivo para o estabelecimento de sistemas democráticos liberais na
região.

Na guerra dos 16 anos, procurava-se por parte da Renamo, reverter o sistema político
ora em vigor, ligado ao marxismo-leninismo adoptado por Moçambique, à semelhança
de muitos outros Estados recém-independentes em África. De facto, “com a
independência de Moçambique em 1975, foi adoptada uma Constituição, a qual definia
o papel da Frelimo como força de liderança do Estado e da sociedade, bem como

36
assegurava a legitimação do regime de partido único, eliminando, deste modo, qualquer
forma de pluralismo social” (Lala e Ostheimer, 2003:8). Por isso, o fim da guerra dos
16 anos foi também, o momento do inicio da democratização em Moçambique.

Nesse contexto, de acordo com Lala e Ostheimer (2003:8), Moçambique empenhou-se


na edificação do seu processo de democratização, através do acordo de paz firmado em
1992. Talvez seja por essa razão que “o sistema multipartidário implantado em
Moçambique caracterizou-se, desde o início, pelo legado do anterior conflito estrutural
e pelo antagonismo existente entre a Frelimo e a Renamo” (ibid.).

A assinatura dos acordos de paz, em Roma em 1992, entre o Governo moçambicano e a


Renamo, seguida da realização das primeiras eleições gerais (presidenciais e
legislativas) multipartidárias, constituiu o marco central da democracia liberal em
Moçambique. Mas o processo de transição para o liberalismo, do ponto de vista
económico, e da democracia liberal do ponto de vista político, teve seus primeiros sinais
ainda na década de 1980.

Do lado económico, além das questões internas, influenciaram a mudança de


Moçambique, questões externas, sobretudo o inicio gradual da derrocada da URSS.
Nessa altura, “os financiamentos da URSS e dos países da Europa do Leste estavam a
diminuir. Alguns dos principais financiadores da Europa Ocidental, como por exemplo
os países nórdicos, condicionavam a continuação do apoio a Moçambique à nossa
adesão às instituições de Bretton Woods” 15. É nesse contexto que Moçambique adere
às instituições de Bretton Woods em 1984, adoptando princípios de liberalização
económica.

Do lado político, a mudança do mono para o multipartidarismo e a adopção da


democracia liberal, foi codificada na Constituição de 1990. Segundo Lala e Ostheimer
(2003:8), a Constituição de Novembro de 1990 teve como principais mudanças a
garantia dos direitos básicos individuais, tais como, liberdades de crenças, opinião e
associação; pluralismo partidário; independência dos tribunais; eleições livres e
secretas; e uma eleição directa do Presidente da República. Desta forma, a questão das
liberdades e direitos fundamentais e a questão de eleições periódicas era salvaguardada.

15
Eneas Comiche em Grande Entrevista na STV, 22 de Maio de 2012

37
Se olharmos para a ideia de que a transição democrática em África foi defeituosa por
não ter sido acompanhada por um processo simultâneo de adaptação ou de reformas
económicas e institucionais (Leon, 2010:3), podemos considerar Moçambique, um caso
excepcional pois, obedeceu-se um processo gradual de reformas económicas e sociais.

Contudo, a existência de um processo simultâneo de mudanças económicas e sociais de


cariz liberal, não pode ser considerado factor único para determinar-se que Moçambique
teve um processo de transição democrática melhor ou pior que dos outros países
africanos, pois, “um Estado democrático pode ser observado directamente pela
existência de instituições estatais funcionais, deixando claro a separação de poderes, o
serviço público a prestar serviços sociais e legais ao cidadão e o Estado a prover
segurança ao indivíduo e às comunidades/colectividades” (Lundin, 2012:18).

4.2. O Estado de direito, participação política e liberdades fundamentais


em Moçambique
O Estado de direito é um pressuposto indispensável em regimes democráticos liberais,
pois, segundo Beetham (1998:9), designa uma situação em que a democracia tem um
carácter representativo e pluralista, com responsabilização para com o eleitorado, em
que há obrigação das autoridades públicas de cumprir com a lei e justiça administrada
de forma imparcial e que ninguém estará acima da lei.

A existência do Estado de direito está patente no artigo 3 da Constituição da República


de Moçambique (CRM), expressa da seguinte forma “A República de Moçambique é
um Estado de Direito, baseado no pluralismo de expressão, na organização política
democrática, no respeito e garantia dos direitos e liberdades fundamentais do Homem.
(CRM, 2004:2). Isto é, as demais normas do ordenamento jurídico moçambicano devem
ser adequadas ao primado da lei, da garantia de direitos e liberdades fundamentais.

Em termos concretos, a criação de um Estado de direito, assim como a garantia de


direitos e liberdades, já estava prevista na Constituição de 1990. Entretanto, segundo
Lala e Ostheimer (2003:16), embora Moçambique possua um quadro legislativo
adequado para um Estado de Direito, verificam-se determinados impedimentos na sua
implementação apropriada, em face de factores históricos, culturais e institucionais
existentes.

38
Um dos factores históricos de grande peso na dificuldade de consolidação do Estado de
direito é a “simbiose entre o Estado e o partido Frelimo durante a era socialista e a
retenção do sistema presidencial, que não só fortaleceram a hegemonia do partido no
governo, como também originaram um impacto negativo na independência do sistema
judicial” (ibid.). Assim, quando a independência do judicial é posta em causa,
consequentemente, o princípio de separação de poderes é defeituoso, minando todo o
processo democrático de qualquer país.

Em termos de participação política, a CRM no seu artigo 74, estipula a formação de


partidos políticos como momento central da participação política, pois “os partidos
expressam o pluralismo político, concorrem para a formação e manifestação da vontade
popular e são instrumento fundamental para a participação democrática dos cidadãos na
governação do país” (CRM, 2004:22).

Deste modo, com o Estado de direito e a participação política garantidos, pelo menos
em termos normativos e institucionais, o pluralismo de expressão torna-se numa
característica central da democracia liberal e indica um avanço qualitativo da
democracia em Moçambique, visto que “a participação dos cidadãos no processo
político, a sua capacidade de influenciar a formulação das políticas públicas, a
receptividade do governo às demandas da população e a transparência com que trata os
seus assuntos são indicadores da qualidade da democracia” (OSISA, 2009:53).

Essa característica tem contribuído para a inclusão que, em última análise, abre espaços
para a tolerância política que é um aspecto bastante sensível nas democracias liberais
africanas e moçambicana em especial, visto que Moçambique não é excepção em
relação aos outros países africanos em termos de diversidade étnica, cultural ou
identitária.

No que se refere a liberdades fundamentais, a Constituição de 1990 estabeleceu as


liberdades fundamentais e os pilares de um sistema político multipartidário, prevendo
que o sistema eleitoral seria de tipo maioritário para os poderes executivo e legislativo
(OSISA, 2009:88). Este é mais um dos pilares da democracia liberal que esteve previsto
mesmo antes das primeiras eleições gerais em 1994. No contexto actual, a garantia de
liberdades fundamentais, direitos e deveres dos cidadãos, nos é dada no Capítulo I, entre
os artigos 35 a 48. Portanto, no caso de Moçambique, em termos normativos e

39
institucionais foram criadas, desde 1990, condições para o exercício pleno do Estado de
Direito, da participação política e de liberdades fundamentais. Porém, a prática desses
princípios tem sido dificultada por diversos factores internos e externos ao país.

4.3. Eleições regulares, livres e justas em Moçambique


A realização de eleições multipartidárias em Moçambique, tem sido regular, ocorrendo
num intervalo de cinco anos. Depois da assinatura dos acordos de paz, em 1992,
Moçambique realizou quatro eleições gerais (presidenciais e para a Assembleia da
república) e três eleições autárquicas. As eleições gerais de 1994, 1999, 2004 e 2009,
resultaram na vitória da Frelimo e dos seus candidatos, Joaquim Chissano e Armando
Guebuza, sobre os outros partidos e candidatos, com destaque para a Renamo e seu
candidato Afonso Dhlakama de 1994 a 2009 e o Movimento Democrático de
Moçambique (MDM) e seu candidato Daviz Simango, nas eleições de 2009.

A realização regular de eleições não é o aspecto fundamental, mas sim a observância de


eleições livres e justas, acima de tudo. As eleições de 1999 foram as mais contestadas
pela oposição, mas a Comunidade internacional declarou as eleições de 1999, como
tendo sido “livres e justas”. Contudo, segundo Lala e Ostheimer (ibid.), fácil se torna
vislumbrar que estas foram justas, só e apenas, nas urnas, pois em todo o processo, não
foram observados requisitos fundamentais de garantia de igualdade e justiça como a
abstenção de usufruto dos recursos do Estado pelo partido no poder durante a campanha
eleitoral; igualdade de acesso dos representantes dos partidos às mesas de voto;
igualdade de tratamento das reclamações referentes a irregularidades; e aceitação dos
resultados eleitorais por todos os participantes.

A não-aceitação dos resultados foi o principal problema registado desde as primeiras


eleições em Moçambique. Embora Moçambique não tenha presenciado os casos de
extrema violência e fraude que têm afectado certos países africanos, seus processos
eleitorais têm, contudo, sido marcados por acusações de fraude, alto nível de
desconfiança entre os partidos políticos e alguns incidentes graves, o que sinaliza para a
fragilidade das instituições democráticas no país.

Segundo a OSISA (2009:8), na relação entre os partidos políticos, sobretudo entre os


dois maiores, tem havido situações de intolerância e, por vezes, de violência no
desenvolvimento de actividades políticas, com especial gravidade em períodos

40
eleitorais. A tensão política característica dos processos eleitorais já deu lugar a alguns
episódios particularmente graves de violência política, resultando num grande número
de mortes, com destaque para o caso de Montepuez, em Outubro de 2000, na sequência
de manifestações promovidas por simpatizantes da oposição que, um ano depois,
protestavam contra os resultados eleitorais das eleições de 1999 (OSISA, 2009:95).

Apesar de todos os constrangimentos que se possam registar, a realização de eleições


em Moçambique tem sido regular e, segundo relatórios de nível nacional, sobretudo
internacional, elas tem sido livres justas e transparentes. Porém, é de notar uma
dominação do partido no poder, a Frelimo, que na visão da oposição, tem pautado por
fraudes no período anterior (com recurso a legislação eleitoral), durante e depois das
eleições.

Prova disso é que em todas as eleições já realizadas, apesar de não ter se registado casos
de extrema violência que atentassem a segurança nacional como em outros Estados
africanos, há sempre dificuldades de aceitação de resultados, mas ainda não se pode
afirmar que este pilar da democracia liberal leva a insegurança nacional em
Moçambique.

4.4. Segurança Nacional no Contexto Democrático Liberal em


Moçambique
Em democracias liberais, o pressuposto teórico da segurança baseia-se no contributo da
escola de Copenhaga. A segurança nacional deve-se sustentar em três pilares a saber: as
bases física, que tem em vista a defesa do território e da população nacional, legal e a
base institucional. A ideia do Estado em termos de Segurança deve ser vista no sentido
em que todas as bases encontram-se no mesmo nível, por se conjugarem para garantir a
sobrevivência do Estado (Buzan, 1991: 65-90).

Analisando a segurança nacional em Moçambique tendo em conta a base institucional


-legal, recorremos à CRM (2004) e a lei 17/97 de 1 de Outubro, que contém a Politica
de Defesa e Segurança de Moçambique. Segundo esta lei, as principais forças que
constituem a arquitectura de segurança de Moçambique são as Forças Armadas de
Defesa de Moçambique (FADM), responsáveis pela defesa nacional, a Policia da
República de Moçambique (PRM) responsável pela segurança interna, e os Serviços de
Informações e Segurança de Estado (SISE) responsáveis pela segurança do Estado.

41
Nos acordos de paz de Roma em 1992, foi acordada a constituição das FDS de
Moçambique tendo em vista a construção de um Estado democrático liberal. Assim, na
alínea b, do número 2 do protocolo IV, atinente as FADM, as partes declararam que as
forças seriam “apartidárias, de carreira, profissionalmente idóneas, competentes,
exclusivamente formadas por cidadãos moçambicanos voluntários, provenientes das
forcas de ambas as partes, servindo profissionalmente o País, respeitando as ordens
democráticas, e o estado de direito, devendo a sua composição garantir a inexistência de
qualquer forma de discriminação racial, étnica, de língua ou de confissão religiosa”.
(Boletim da República, 14 de Outubro de 1992, I serie).

Segundo Calton Cadeado16 em Moçambique logo após a democratização já não há


terrorismo de estado, já não cultura de medo protagonizado pelo estado, há prestação de
contas dentre outros elementos que compõem o conceito democracia. Ademais o nosso
entrevistado avançou que não se pode olhar para democracia apenas pelo nível de
realização de eleições.

A princípio, a questão da segurança nacional demonstrava ser bastante importante para


a construção de um estado moçambicano verdadeiramente democrático. Dai que, era
preciso satisfazer ambas partes, ora beligerantes, o que foi estabelecido no número 2,
referente aos efectivos, de que os efectivos das FADM em cada um dos ramos previstos,
serão fornecidos pela FAM e pelas forcas da Renamo, na razão de 50% para cada lado.
Esse princípio de equilíbrio também foi observado no que se refere as forças não
policiais, responsáveis pela segurança interna, com a integração de homens que, na
altura da guerra, pertencia ao lado militar da Renamo.

A adopção de princípios de equilíbrio e todas outras formas de defesa da democracia e


estado de direito, mesmo com contestações nos processos eleitorais, o carácter
relativamente pacífico das contestações, fez com que Moçambique fosse um dos países
africanos que melhor fez a transição da guerra para a paz e do monopartidarismo para
multipartidarismo17. Entretanto, essa imagem foi colocada em causa, quando pela
primeira vez depois de 22 anos de paz, ocorreram confrontações militares entre as
FADM e as forças da Renamo em 2013, que ameaçaram a segurança nacional

16
Docente de Estudos de Segurança no Instituto Superior de Relações Internacionais (ISRI) entrevistado
no dia 30 de Abril de 2014 no Campus do ISRI.
17
http://www.kas.de/wf/doc/kas_4372-544-1-30.pdf?040415181610

42
4.2.1. Confrontos Militares em Moçambique
Depois de 22 anos de paz em Moçambique, o ano de 2013 foi marcado com o
ressurgimento de confrontações militares entre o Governo e a Renamo. As diferenças
entres essas duas partes já se haviam evidenciado, particularmente em momentos
eleitorais, entretanto, não haviam atingido o nível de recorrência á violência.

O primeiro grande indício de recurso a via militar por parte da Renamo, deu-se quando,
a 17 de Outubro de 2012, Dhlakama, presidente da Renamo, instala uma base militar na
região da Gorongosa, no centro de Moçambique e começa a treinar antigos veteranos,
exigindo uma nova ordem política. O líder da Renamo ameaçou voltar à guerra,
afirmado que só abandonará a base quando o governo da Frelimo enviar emissários ao
local para renegociar o Acordo Geral de Paz (AGP) e a revisão do pacote eleitoral 18. A
Renamo reclamava, de entre outros pontos do AGP, a retirada compulsiva de generais
provenientes da Renamo nas FADM, enquanto os provenientes das antigas FPLM
continuavam no activo.

De acordo com Ivan Mazanga19, “vários pontos constantes no AGP não foram
respeitados, sobretudo, a constituição de forças armadas e policiais apartidárias e
equilibradas e a reinserção social dos antigos guerrilheiros da Renamo”. Dessa forma, o
principal instrumento de fim da guerra dos 16 anos e do inicio pleno da construção de
um Estado democrático liberal em Moçambique era posto em causa.

“Diante dessa situação, a relação tensa foi se agravando a ponto de, em cumprimento de
princípios democráticos liberais tais como a tolerância politica, a liberdade de expressão
e a inclusão, começaram negociações entre o Governo e a Renamo. Nessas negociações,
foram clarificadas as reivindicações da Renamo que viriam a constituir os quatro pontos
levantados para a mesa de negociações, tais como a revisão do pacote eleitoral, as
questões de defesa e segurança, a despartidarização do Aparelho do Estado e questões
económicas20. Olhando para os quatro pontos das reivindicações da Renamo,
percebemos que a questão eleitoral, que tem sido origem de insegurança em alguns
Estados africanos, aparece como ponto central. Entretanto, não é apenas a questão de

18
http://www.dw.de/conflito-em-mo%C3%A7ambique-entre-a-renamo-e-o-governo/a-17175392
19
Ivan Mazanga, Chefe de Programas e Cooperação na Liga Juvenil da Renamo, entrevistado a 14 de
Agosto de 2014, no café continental-Maputo.
20
Ibdem.

43
fraudes e não-aceitação de resultados que cria descontentamento, mas também é o
funcionamento das instituições que gerem o processo eleitoral”.

O retorno a confrontações militares tornou-se mais claro quando “quatro polícias e um


militante da Renamo foram mortos num ataque contra uma esquadra da polícia em
Muxúnguè, província de Sofala. Esse ataque é justificado pela Renamo como retaliação
à invasão da sua sede”21. Depois desse ataque, vários outros sucederam, tendo como
palco central a região da província de Sofala. Nessa altura, o governo moçambicano, em
reacção à escalada das tensões, enviou as Forças Armadas à base onde estava
Dhlakama, o que foi interpretado como uma declaração de guerra que colocou fim aos
acordos de paz, segundo o porta-voz da Renamo, Fernando Mazanga22.

4.2.2. Legitimidade e enquadramento Legal das partes em conflito no contexto


democrático liberal

Com o decorrer dos ataques e confrontações militares em Moçambique, olhando para o


contexto democrático liberal, levantam-se questões sobre a legalidade e a legitimidade
das atitudes de ambas partes. Nessa óptica, visto que a legitimidade expressa a aceitação
do povo, que nas democracias liberais é demonstrada no voto, a princípio o governo tem
maior legitimidade que a Renamo, pese embora, a Renamo também, por ser um partido
político e representar interesses de uma parte da população moçambicana, goza de
alguma legitimidade dentro do espírito de tolerância política e inclusão.

Segundo Eurico Mavie23, “Em termos de legalidade, a atitude do governo


moçambicano, vista dentro dos princípios das democracias liberais, responde ao dever
das FDS de proteger a população tanto de ameaças internas assim como externas à sua
segurança e deve também às responsabilidades do governo eleito sobre o povo. O acto
mais ofensivo do Governo, foi o ataque à base de Satundjira porque foi a primeira vez
que, oficialmente, o Ministério da Defesa Nacional (MDN) assumiu a mobilização de
homens à base da Renamo e a autoria daquele ataque, como reacção aos ataques da
Renamo. Por seu lado, independentemente das suas reivindicações, a atitude da Renamo
não enquadra-se, pelo menos em termos legais, no exercício a democracia liberal”.

21
http://www.africa21online.com/artigo.php?a=3843&e=Pol%C3%ADtica – Consultado em 18/07/14
22
http://www.vermelho.org.br/noticia/227464-9

23
Eurico Mavie, Instrutor na Escola de sargentos de Boane e analista politico, entrevistado aos 23 de
Setembro de 2014 na sede do Comité Central da Frelimo as 16 horas.

44
Segundo o artigo 203 da CRM, o Governo, sendo o Conselho de Ministros, “assegura a
administração do país, garante a integridade territorial, vela pela ordem pública e pela
segurança e estabilidade dos cidadãos, promove o desenvolvimento económico,
implementa a acção social do Estado, desenvolve e consolida a legalidade e realiza a
política externa do país”. (CRM, 2004: 64). Por seu lado, no artigo 77, “é vedado aos
partidos políticos preconizar ou recorrer à violência armada para alterar a ordem política
e social do país (CRM, 2004: 23). Com essa base legal não cumprida, baseamo-nos da
ideia de que na segurança nacional, as bases legal e institucional devem funcionar em
simultâneo, para afirmar que neste caso havia realmente insegurança nacional.

Embora os confrontos ocorriam na zona centro do país, a segurança nacional era de


alguma forma ameaçada, pois segundo declarações do Brigadeiro da Renamo, Jerónimo
Malagueta, o seu partido iria recorrer aos seus homens armados para impedir a
circulação rodoviária e ferroviária no centro do país, contra uma alegada concentração
do exército nas antigas bases militares do movimento, na região da Gorongosa, centro,
onde o seu Presidente, Afonso Dhlakama, se encontra instalado24.

Depois de feita uma breve análise dos confrontos militares em Moçambique inserindo-
os no contexto democrático liberal, percebemos que realmente, independentemente da
sua magnitude, os sucessivos ataques a população civil e confrontações militares,
principalmente no troço entre o Rio Save e Muxungue os confrontos atentaram a
segurança nacional. A fundamentar isso está o número de vítimas directas dos
confrontos, ou seja, segundo o Primeiro-ministro, Alberto Vaquina, dirigindo-se ao
parlamento, para além de dezenas de mortos, por causa da inseguranca, cerca de 6.727
pessoas foram obrigadas a deslocar-se da região da Gorongosa, província de Sofala, no
centro do país25.

Portanto, podemos dizer que, apesar do número de mortos não ter sido nas proporções
da Nigéria e do Quénia, e de não ter se caminhado para instrumentalização étnica, em
Moçambique, dos finais de 2012 até a actualidade, viveram-se momentos em que a

24
DW África/Correspondentes/LUSA – consultado em 10/05/14
25
http://comunidademocambicana.blogspot.com/2014/03/tensao-politico-militar-aumenta-numero.html -
consultado em 15/07/14

45
segurança nacional foi posta em causa, devido a má aplicacão de alguns principios
básicos da democracia liberal.

46
5. Considerações Finais

Ao longo do trabalho falamos da democracia liberal e a sua relação com a segurança


nacional, podemos ao longo do trabalho notar uma relativa complexidade em termos
reais de mostrar de forma muito específica sem nenhuma abstracção a sua relação
directa ou até mesmo a falta de relação.

Vimos ao longo deste trabalho que o liberalismo seria teoria que melhor se enquadraria
para responder a necessidade de enquadramento teórico, dada a sua relação com
democracia bem como nos estudos sejam eles abrangentes ou restritos de segurança.

Percebemos ainda que a democratização em África é enquadrada na terceira onda, na


qual o seu principal marco foi o fim da guerra-fria. Isso teve reflexos notáveis em
Estados africanos pois, muitos estavam alinhados ao marxismo-leninismo, no contexto
da luta contra o imperialismo, dai que com a derrocada da União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas (URSS) tiveram de adoptar a democracia.

A segurança envolve em primeira estancia ameaças, sejam elas militares ou não


militares, no caso de países africanos, a democracia e o processo de democratização são
um grande factor de ameaça a segurança. Nota-se que não se pode olhar apenas para
democracia como factor determinante para garantir segurança ou insegurança.

As razoes de fracasso desta em alguns pontos de África estão intrinsecamente ligadas a


não observância, ou não respeito, das estruturas, sociais, étnicas e valores culturais que
estes povos tinhas antes do processo de democratização, a que salientar que ao ignorar
estes factores endógenos, já tira de per si o valor deste modelo em termos de aceitação e
identificação dos africanos com esta abordagem.

As dificuldades de aplicação dos pressupostos básicos da democracia liberal nos


Estados africanos, pode ser encontrada a partir da própria configuração ou do processo
de construção do próprio Estado africano, visto que, na maior parte provem de um
processo de descolonização e a sua delimitação territorial não foi feita seguindo as
estruturas da etnicidade.

Sendo assim, o primeiro desafio torna-se o da implantação da própria nação, as divisões


existentes nos estados africanos põem em causa a legitimidade dos líderes eleitos, dai

47
que se verificaram grandes percentagens de abstenção nas primeiras eleições
multipartidárias em vários Estados africanos.

Neste trabalho foi possível tirar conclusões sobre a aplicação de princípios democrático-
liberais em Estados africanos. Uma das conclusões a que chegamos é que, os pilares da
democracia liberal, não ignorando os seus valores, tornam-se nocivos à segurança
nacional se não forem observados tendo em conta o contexto sócio-politico dos Estados
africanos.

Em segundo lugar, nesta tese percebemos que a democracia liberal pode constituir
ameaça a segurança nacional dos estados africanos na medida em que não há
observância estrita dos seus pressupostos básicos, como a tolerância política, a inclusão
e a realização de eleições livres justas e transparentes.

Para o caso especifico de Moçambique, verifica-se que, não obstante a adopção de uma
nova constituição em 1990, assistia-se ainda uma bipolaridade formada pela Frelimo e a
Renamo, as outras formações não tinham a robustez necessária para servirem de
alternativa para os eleitores.

A limitação de pluralismo político, um dos maiores valores da democracia liberal,


durante a guerra-fria nos Estados africanos, gerou um clima de insatisfação generalizada
do qual emergiram grupos contestatários com variados objectivos, mas que em comum
procuravam instaurar ideais liberais democráticos, como sucedeu em Moçambique.  

Podemos considerar neste trabalho que a democracia um processo inacabado, que nos
impõe grandes desafios no sector da segurança, da mesma maneira que a segurança nos
impões grandes desafios para a democratização dos estados africanos. O fortalecimento
da democracia e o cumprimento dos seus valores básicos, pode levar a todos os estados
a segurança no seu lado mais restrito bem como alargado.

A transição para a democracia foi conflituosa em vários Estados africanos, devido a


variados factores. Contudo, há que realçar que a aceitação de resultados eleitorais foi o
grande motivo de crispações que atentaram a segurança nacional em África. Em
resumo, podemos afirmar que a segurança nacional de estados africanos no contexto da
democratização foi caracterizada por constantes ameaças, como aconteceu na Costa de
Marfim e Moçambique, devido a adequação dos Estados africanos ao modelo

48
democrático liberal que implicava mudanças radicais na vida política e social dos
Estados. Mas, trouxe benefícios, através da redução de conflitos inter-estatais e
tendências separatistas.

49
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Fontes Primárias
 Calton Cadeado, Docente de Estudos de Segurança no Instituto Superior de Relações
Internacionais (ISRI) entrevistado no dia 30 de Abril de 2014 no Campus do ISRI.

Foi pertinente entrevista-lo visto que ele é um académico renomado e respeitado a nível
nacional, tem esperiacia longa e comprovada em estudo da ciência de Relações
Internacionai, Estudos de Paz e Segurança.

 Eurico Nelson Mavie, Instrutor na Escola de sargentos de Boane e analista politico,


entrevistado aos 23 de Setembro de 2014 na sede do Comité Central da Frelimo as 16
horas.
Foi importante entrevistar um funcionário das FADM, que tem uma relação e contanto
com assuntos de segurança no seu quotidiano.

 Ivan Mazanga, Chefe de Programas e Cooperação na Liga Juvenil da Renamo,


entrevistado a 14 de Agosto de 2014, no café continental-Maputo.
Por se tratar de um estudioso de matérias de Relações Internacionais e sendo parte
integrante da RENAMO como partido politico, integrante nos órgãos sociais deste
partido ouvir a sensibilidade dele foi importante para este trabalho.

Documentos Oficiais
 Boletim da República, 14 de Outubro de 1992, I Serie - Imprensa Nacional,
Maputo.

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 União Africana (2007), Carta Africana sobre a Democracia as Eleições e a


Governação, Addis-Abeba.

55
56
Índice
Introdução..........................................................................................................................1

Contexto.........................................................................................................................1

Justificativa....................................................................................................................2

Problematização.............................................................................................................3

Questões de pesquisa.....................................................................................................4

Objectivo Geral..............................................................................................................4

Objectivos Específicos...................................................................................................4

Hipóteses........................................................................................................................5

Metodologia...................................................................................................................5

Estrutura do trabalho......................................................................................................7

CAPITULO 1....................................................................................................................8

MARCO TEÓRICO E CONCEPTUAL...........................................................................8

Surgimento da Teoria Liberal........................................................................................8

Precursores da Teoria Liberal........................................................................................8

Pressupostos da Teoria Liberal......................................................................................9

Aplicabilidade da teoria Liberal no presente trabalho.............................................11

Conceitos Chave..............................................................................................................11

Democracia..................................................................................................................11

Democracia Liberal......................................................................................................12

Segurança Nacional.....................................................................................................13

CAPITULO 2..................................................................................................................15
A SEGURANÇA NACIONAL NOS ESTADOS AFRICANOS NO PROCESSO DE
DEMOCRATIZAÇÃO....................................................................................................15

O Processo de Democratização à Escala Global.........................................................15

Transição Democrática em África...............................................................................17

Características da Segurança Nacional nos Estados Africanos no Contexto da


Democratização...........................................................................................................18

Constrangimentos da democracia liberal no contexto sociopolítico dos Estados


africanos.......................................................................................................................20

i) Democratização sem um processo simultâneo de mudança nas instituições de


governação ou ainda no Estado em si..........................................................................20

ii) Adopção do sistema de governação executivo presidencial e sistema eleitoral do


tipo “winner-take-all”..................................................................................................21

iii) Eleições como ocasiões de lutas entre grupos sobre a hierarquia de valores.......21

iv) A Transição para a Democracia criou novas Demandas e novas Formas de


Competição de Identidades..........................................................................................21

CAPITULO 3..................................................................................................................23

PRINCIPIOS DA DEMOCRACIA LIBERAL versus SEGURANÇA NACIONAL


EM ESTADOS AFRICANOS........................................................................................23

2. Principios da Democracia Liberal na Seguranca Nacional em Estados Africanos


23

2.1. Tolerância Política............................................................................................24

2.2. Eleições Regulares, Livres e Justas..................................................................26

2.3. Alguns exemplos de insegurança nacional causada pela violência eleitoral....28

Insegurança Nacional Causada pela Violência Eleitoral no Kenya.............................29

Ghana como Exemplo de Segurança Nacional em Democracias Liberais..................30


2.4. Outros Factores de Insegurança Nacional nas Democracias Liberais Africanas
32

CAPITULO 4.................................................................................................................36

DEMOCRACIA LIBERAL EM MOÇAMBIQUE E INSTABILIDADE POLITICA


EM MOÇAMBIQUE......................................................................................................36

4. Transição Democrática em Moçambique.............................................................36

4.1. O Estado de direito, participação política e liberdades fundamentais em


Moçambique................................................................................................................38

4.2. Eleições regulares, livres e justas em Moçambique.........................................40

Segurança Nacional no Contexto Democrático Liberal em Moçambique......................41

4.2.1. Confrontos Militares em Moçambique..............................................................43

4.2.2. Legitimidade e enquadramento Legal das partes em conflito no contexto


democrático liberal......................................................................................................44

Considerações Finais...................................................................................................47

Bibliografia......................................................................................................................50

Artigos de revistas electrónicas...................................................................................53

Fontes Primárias..........................................................................................................54

Documentos Oficiais....................................................................................................54

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