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Especial

Foco na
Aprendizagem
Confira como planejar avaliações
diagnósticas, trabalhos em grupos
e apoio pedagógico como caminho
para recuperar as aprendizagens
Índice
1. Como fazer da avaliação
diagnóstica uma aliada para o avanço
da aprendizagem ................................. 4
2. Trabalho em grupo: como a
colaboração favorece o avanço nas
aprendizagens .....................................27
3. Além do presencial: atividades
remotas ajudam a garantir o avanço
da aprendizagem ............................... 55
4. Gestores: como planejar o apoio
pedagógico .......................................... 83
3
1. Como fazer da
avaliação diagnóstica
uma aliada para
o avanço da
aprendizagem
Prolongamento do ensino remoto
intensificou a necessidade dessa
prática. Educadores contam
Imagem: Gettyimages

suas experiências e falam da


relevância desses dados recuperar a
aprendizagem na retomada presencial
Victor Santos | 04 de Agosto de 2021 4
Com a chegada do segundo semestre
de 2021, as redes públicas de
ensino encontram-se em momentos
diferentes em relação à retomada
das aulas presenciais. Algumas já
realizaram um retorno gradual há
algum tempo, outras se preparam
para consolidar essa volta agora
em agosto, e ainda há um terceiro
grupo que seguirá trabalhando
remotamente. No entanto, todas
elas convergem em um ponto:
as preocupações que envolvem a
aprendizagem dos estudantes ao
longo da pandemia. E o principal
instrumento que as escolas
têm colocado em prática para
mensurar esses conhecimentos
é a avaliação diagnóstica.

“Trata-se de um tipo de avaliação


que pode ser desenvolvido pelo 5
próprio professor para a sua turma
ou aplicada de maneira sistêmica
pelas redes de ensino”, sintetiza
Romualdo Portela de Oliveira, diretor
de pesquisa e avaliação do Centro de
Estudos e Pesquisas em Educação,
Cultura e Ação Comunitária (Cenpec).
“É, literalmente, um diagnóstico:
ela dá um feedback para os
educadores, mostrando os tópicos
que os estudantes apresentam maior
dificuldade e auxiliando, assim, na
priorização dos assuntos que devem
ser tratados, de modo a garantir
que eles consigam progredir”.

A questão é que essa prática, que


sempre foi usada no ambiente
escolar, ganha agora atenção
redobrada. Isso porque o ensino
remoto emergencial, iniciado
em 2020 com a pandemia e o 6
fechamento das escolas, gerou,
inevitavelmente, consequências
na aprendizagem dos alunos.

“Inicialmente, é preciso considerar


que tipo de interação o estudante
teve com a escola nesse período
remoto e por quanto tempo”, explica
Romualdo. “A partir daí, as avaliações
diagnósticas ajudam a identificar o
que o aluno conseguiu aprender e
a comparar com o que se supunha
que deveria ter aprendido ao longo
desse período de interrupção das
atividades presenciais”. Desse modo,
de acordo com o especialista, o
professor obtém uma série de
informações essenciais para construir
um plano de trabalho que atenda
às necessidades dos estudantes.

7
Esse é um processo que envolve
muitas etapas de trabalho
e complexidades para o seu
planejamento, execução e análise.
Nesse contexto, NOVA ESCOLA
buscou ouvir a experiência de duas
professoras de escolas públicas que
elaboraram avaliações diagnósticas.
Elas e o especialista Romualdo
explicam como desenvolver essa
prática de maneira efetiva – e
sempre colocando a aprendizagem
dos alunos no centro do processo.

A experiência de uma
avaliação diagnóstica
municipal
A professora Priscila da Silva de
Medeiros atua há 18 anos com Ensino
Fundamental 1 na rede municipal
de Rancharia (SP), localizada a 508 8
quilômetros da capital paulista,
e possui uma experiência recente
com avaliação diagnóstica. Ela, que
trabalhava até o ano passado com
o 4º e o 5º ano na Escola Municipal
Lázara Nogueira Severo Lins e
atualmente é supervisora de Ensino
Fundamental na cidade, conta que,
no município, a avaliação diagnóstica
é sempre realizada pela equipe de
supervisão da Secretaria de Educação,
com o apoio dos coordenadores
pedagógicos das escolas.

Priscila atuou diretamente nesse


processo em 2021 e compartilha
como foi. “Em abril deste
ano, momento em que ainda
trabalhávamos com o ensino remoto,
convocamos todos os alunos da
rede municipal para uma avaliação
diagnóstica a ser realizada nas 9
escolas. Tudo foi aprovado por um
comitê de volta às aulas composto
por pais, professores e profissionais
da saúde”, relata. “Optamos por
receber 35% de alunos por dia
em cada escola, uma média de
três crianças por sala a cada duas
horas. Então, um grupo comparecia
das 7 às 9 horas, outro das 9 às 11
horas, e assim sucessivamente.”

Além de todos os protocolos


sanitários devidamente cumpridos,
a professora e supervisora
relembra que a logística foi
complicada. “Rancharia é o sexto
município em extensão territorial
no estado de São Paulo. Temos
muitos alunos da zona rural que
precisavam ser transportados
de volta para suas casas após
essas duas horas de avaliação.” 10
Já em relação à elaboração das
atividades, Priscila diz que a palavra-
chave foi equilíbrio. “Juntamente
com a equipe de supervisores
e com os coordenadores das
escolas, nós elencamos quais
seriam as aprendizagens básicas
que deveríamos ter nessas
avaliações diagnósticas”, detalha.
“Para ter um norte, partimos
das habilidades da BNCC e das
expectativas de aprendizagem do
estado de São Paulo. E tentamos
construir um equilíbrio: nada muito
básico, mas nada muito além do
essencial. A partir disso, criamos
as atividades avaliativas.”

Após a realização da avaliação,


iniciou-se o processo de tabulação,
começando pelos professores.
“A tabela é enviada para os 11
educadores preencherem conforme
o desempenho da sala, a partir dos
números que saíram da avaliação
dos estudantes da sua turma.
Em seguida, ele entrega para o
coordenador pedagógico, que faz
uma tabulação geral da escola. Por
fim, eles mandam para a secretaria,
que monta a tabulação geral do
município”, detalha a supervisora.

Construindo a avaliação
diagnóstica na escola
O Maranhão é um dos estados
brasileiros que está consolidando
a retomada gradual às atividades
presenciais em agosto de 2021. Esse
fato confere um peso ainda maior
para as avaliações diagnósticas,
de acordo com a professora Jullie
Anne Kuntz Truss, que atua na rede 12
estadual. Jullie leciona Filosofia para
o 9° ano e dá apoio pedagógico no
Ensino Fundamental 2, no Centro
de Ensino Professor Ezelberto
Martins, na capital maranhense.

Ela explica que as avaliações


diagnósticas já aconteciam de modo
contínuo na escola e ocorriam
no início de cada ano letivo e de
cada bimestre, que lá é chamado
de período. “Normalmente, os
professores levavam em consideração
a BNCC, o currículo, enfim, tudo
o que costumavam passar. No
entanto, a diferença é que o ensino
remoto emergencial fez com que
os educadores priorizassem o
essencial de cada conteúdo em
suas aulas remotas. “Com isso, as
avaliações vão nos ajudar a alinhar
as expectativas: já que houve essa 13
priorização, não necessariamente
conseguimos passar tudo o que era
previsto. Então, de que ponto a gente
parte agora?”, questiona Jullie.

A professoa Jullie conta que o


processo de construção desse
instrumento se dá em cada
instituição de ensino. “É interessante
que cada escola possa organizar suas
avaliações diagnósticas da melhor
forma, a partir da sua realidade.
Muitas vezes, dentro de um mesmo
estado, temos contextos bastante
diferentes”, aponta a profissional.
Ela destaca, por exemplo, que na
sua escola 30% dos estudantes não
possuíam acesso regular à internet e
precisaram usar materiais impressos.

Assim, partindo dessas vivências, a


equipe pedagógica investiu em muito 14
diálogo e em reuniões remotas para
elaborar essas avaliações da maneira
mais uniforme possível. “Procuramos
ter o mesmo número de questões,
e em um formato-padrão que
fizesse sentido para os estudantes,
porque é muito ruim quando cada
componente curricular é avaliado
de um jeito, como quando um pede
por formulário, outro por redação
e outro ainda por envio de fotos da
atividade”, relata a professora, “e
vamos também procurar integrar
as experiências que eles tiveram
nesses meses de ensino remoto,
até para que fique algo mais leve.”

A proposta de não colocar um peso


gigantesco sobre essas avaliações
diagnósticas é, inclusive, um
dos pontos centrais do trabalho.
“Quando a gente fala em avaliação, 15
os estudantes já ficam com receio,
vinculam avaliação a notas. Então,
é importante ter esse olhar de
carinho e de cuidado, mostrar que
estamos juntos e que as avaliações
diagnósticas são, realmente, apenas
para a gente poder trabalhar melhor,
um termômetro para vermos como
a turma está”, pontua Jullie.

Depois do diagnóstico:
mais dados, mais
intervenções
personalizadas
De acordo com a professora e
supervisora Priscila de Medeiros, a
experiência da avaliação diagnóstica
em Rancharia, interior de São Paulo,
foi bastante proveitosa no que diz
respeito às informações obtidas. Na
16
avaliação de Língua Portuguesa do
1º ano, por exemplo, foi identificado
um porcentual de 87% de alunos não
alfabetizados em nível pré-silábico,
ou seja, crianças que ainda estão em
níveis de escrita bem rudimentares.
“No 2º ano, temos 64% de crianças
não alfabetizadas, o que é um
número muito grande – teríamos
entre 7% e 9% num momento sem
pandemia. Quando vamos para o 3º
ano, verificamos que temos ainda
36% de alunos não alfabetizados. Em
épocas normais, essa porcentagem
seria de 2% a 3%, ou seja, temos
um número dez vezes maior.”

A professora Jullie Truss também


ressalta esse trabalho mais orientado
a dados, que, inclusive, se fortaleceu
em sua escola desde o ensino remoto
emergencial implementado em 2020. 17
“Tudo aquilo que é relacionado
ao desenvolvimento dos alunos
está muito mais documentado.
Com a pandemia, realmente nós,
professores, tivemos de nos unir e,
a partir de então, temos conversado
mais, trocado mais. Os professores
estão gerando dados, entendendo
a importância de ter planilhas,
de quantificar, de mensurar.”

Dessa forma, como explica o diretor


de pesquisa e avaliação do Cenpec,
Romualdo Portela de Oliveira, as
avaliações diagnósticas tornam-
se uma das principais fontes desse
tipo de informação. “A leitura dos
dados obtidos vai permitir aos
professores entender as diferenças
que existem entre os seus alunos,
e é provável que eles encontrem
grupos muito distintos. O grau de 18
diferenciação entre estudantes de
uma mesma sala já existia e foi
amplificado na pandemia”, destaca o
especialista. “A avaliação diagnóstica
é a melhor ferramenta disponível
para que o professor possa planejar
adequadamente as atividades
que precisam ser desenvolvidas
para cada um desses grupos.”

A partir da experiência com a


avaliação diagnóstica de sua cidade,
a educadora Priscila salienta que
esse planejamento feito de maneira
adequada é, de fato, a chave para
um trabalho bem-sucedido com
foco na aprendizagem. “Por aqui,
todos os resultados obtidos nesse
tipo de avaliação são discutidos
em horário de trabalho pedagógico
coletivo (HTPC) e em reuniões
de replanejamento. No caso da 19
diagnóstica feita em abril, os
dados auxiliaram no planejamento
dos conteúdos do 3º bimestre. Ao
sistematizar objetivamente o que a
sua sala não atingiu, os professores
conseguiram fazer um planejamento
mais ajustado à realidade da turma.”

A perspectiva de construir um
planejamento mais personalizado,
no contexto de cada turma, é algo
que a professora Jullie também vê
como um dos maiores ganhos das
avaliações diagnósticas. “Durante
esse período, os estudantes
desenvolveram aprendizagens
diferentes. Então, o foco é identificar
o que há de potencial, o que foi
mais desenvolvido e os pontos que
precisam ser melhorados”, comenta.
“As avaliações diagnósticas funcionam
como um instrumento para mapear 20
essas habilidades. Por meio dos
seus resultados, os professores
podem fazer o replanejamento
com base em evidências e não
em inferências”, conclui.

21
Planejamento e
replanejamento
contínuos – e
com cautela
Educadores destacam que o
processo de recuperação e avanço
da aprendizagem é lento e complexo
e requer empatia e diálogo com a
realidade dos estudantes

O trabalho com foco em


aprendizagem, que tem na avaliação
diagnóstica um dos seus principais
instrumentos, é complexo e deve
envolver muita empatia, segundo
enfatizaram os educadores
consultados por esta reportagem.
“É cruel usarmos expressões como
‘prejuízos irreversíveis na educação’.
Estamos colocando um peso nos
professores e alunos, que neste 22
momento precisam de acolhimento”,
reforça a educadora Jullie. No
nosso caso, nós, professores, não
podemos nos culpar porque o
aluno não aprendeu determinado
conteúdo. O que temos de
fazer é, partindo das avaliações
diagnósticas, nos questionar: o que
foi efetivo? O que não funcionou?
E onde não funcionou?”

A professora e supervisora Priscila


de Medeiros também ressalta a
importância desses questionamentos
e de explorar esses diagnósticos
no longo prazo, comparando
e verificando os avanços na
aprendizagem. “Aqui no município,
já aplicamos uma segunda avaliação
em julho de 2021. Foi uma avaliação
periódica de fim de bimestre, mas,
mesmo assim, vai dar para fazer 23
um comparativo com a atividade
diagnóstica de abril, e avaliar o que
avançou e o que não avançou, para
então propor novas intervenções.”

Para o diretor de pesquisa e


avaliação do Cenpec, Romualdo
Portela de Oliveira, é justamente
essa perspectiva de cautela e olhar
para o longo prazo que vai auxiliar
os educadores nesse trabalho com
a aprendizagem após os desafios
trazidos pela pandemia. “A ideia
embutida nas avaliações em larga
escala é justamente obter uma série
histórica para perceber os avanços
e os desdobramentos em cada
contexto”, aponta o especialista.
“É preciso ter em mente que
esse processo de readequação

24
curricular pode levar um bom
tempo e precisa ser feito com
cuidado – sempre dialogando com
a situação concreta dos alunos.”

25
26
2. Trabalho em grupo:
como a colaboração
favorece o avanço
nas aprendizagens
A estratégia coloca o aluno
Imagem: Gettyimages

como protagonista, e pode


ser adaptada para o contexto
remoto, híbrido ou presencial
Paula Salas | 11 de Agosto de 2021 27
Se antes da pandemia as salas de
aula já eram heterogêneas, com as
desigualdades de acesso ao ensino
remoto, os níveis de aprendizagem
em uma mesma turma serão ainda
mais diferentes. Nesse cenário, o
trabalho colaborativo mostra-se
uma boa estratégia para apoiar o
trabalho docente. “É uma quebra
do paradigma de que o aluno só
vai aprender com o professor.
Um estudante consegue aprender
com o outro”, explica Priscila de
Medeiros, professora na rede
municipal de Rancharia (SP).

Há anos cientistas investigam como


o cérebro aprende, e os estudos
trazem informações importantes
para os educadores. Entre eles,
temos a pirâmide de aprendizagem,
a qual mostra que quanto mais 28
interação, maior é a aprendizagem.
Isto é, entre uma aula expositiva
em que o aluno é passivo e uma em
que há um momento de discussão
em grupo, a aprendizagem é mais
efetiva no segundo cenário. "A
neurociência pode nos ajudar a
potencializar nosso trabalho",
afirma Cláudia Siqueira, diretora
pedagógica do Instituto Sidarta
e palestrante no TEDX São Paulo
sobre aprendizagem colaborativa.

Com isso, temos que a neurociência


aponta a colaboração como uma boa
estratégia para o desenvolvimento.
O trabalho em grupo também
resgata uma característica do ser
humano. "As crianças se apoiam por
natureza, elas são colaborativas.
Quem tira isso é a configuração
da sala de aula", aponta Cláudia. 29
"Se não for com a participação
dos alunos [a aprendizagem]
não acontece. Acreditamos na
metodologia de grupos também
para o desenvolvimento emocional e
social dos estudantes", complementa
Amaro Valentin, professor de
Física na Escola Estadual de
Educação Profissional Alan Pinho
Tabosa, em Pentecoste (CE).

Diante do cenário que vivemos em


2021, em que é preciso recuperar
e avançar nas aprendizagens,
potencializar as trocas e o
espaço da sala de aula – seja no
contexto híbrido, seja no remoto
– é fundamental. “Um espaço
onde as crianças trabalham
colaborativamente é um ambiente
seguro de aprendizagem. Criamos
ambientes equitativos, não tem o 30
melhor e o pior, mas todos estão
juntos em desenvolvimento, todos
sabem algo”, afirma Claudia.

A heterogeneidade não deve ser


vista como uma dificuldade a ser
superada, mas como a oportunidade
de aproveitar a variedade de saberes
presentes em sala de aula. “As
pessoas pensam de formas diferentes
e tentamos homogeneizar as
respostas. A colaboração potencializa
o indivíduo e coloca o estudante no
centro”, afirma Cláudia. No entanto,
para tal, é preciso que seja realizado
um trabalho intencional. Para saber
como fazer isso na prática, continue
acompanhando a reportagem
para conhecer a experiência de
professores da rede pública e dicas
de como planejar essa estratégia.
31
WhatsApp e o Google
Meet possibilitam as
trocas entre alunos
Na Escola Estadual Professora Judith
Ferreira Piva, em Ribeirão Pires (SP),
os alunos de Dayane Martins Silva,
professora de Língua Portuguesa
para o Fundamental 2, já estavam
acostumados a trabalhar em grupo.
Com a turma de 9º ano, Judith
trabalhou com textos argumentativos
e científicos. A professora conta que,
por WhatsApp, fazia a explicação e
trazia o referencial para os alunos
por texto ou áudio. "Para sintetizar a
sequência didática, eu fazia um tiktok
[resumindo o tópico que haviam
visto]", explica. Em seguida, era o
momento da produção dos alunos.

32
Com o tema decidido, os alunos eram
divididos em grupos para debaterem
o assunto. Para tal, eles criavam
grupos também por WhatsApp.
Depois, toda a turma participava da
construção de um texto coletivo,
utilizando as discussões que
haviam realizado e repassando as
características e partes do gênero
textual que estavam estudando.

O trabalho em grupo também esteve


presente na produção textual na
Escola Municipal Lázara Nogueira
Severo Lins, em Rancharia (SP).
A professora Priscila de Medeiros
criou, com sua turma de 4º ano, um
jornal da escola, o Lazinha News. A
publicação quinzenal trazia notícias
variadas para a comunidade escolar
e os assuntos das reportagens e
entrevistas partiram do interesse 33
dos alunos. "A primeira matéria
de capa era sobre o dia a dia de
um estudante na pandemia. Foi
muito significativo, eles se viam no
trabalho, podiam falar o que estavam
passando", conta a educadora.

A iniciativa era opcional e os


encontros, duas vezes na semana.
Mas, entre os 46 alunos da
professora, 31 participavam do
projeto. Segundo a educadora,
quem não se envolveu era por
falta de acesso à internet.

Além dos encontros semanais,


os alunos também trabalham
em duplas e trios produtivos
para escrever os textos. "A minha
estratégia era unir alunos que
tinham saberes diferentes, porém,
que fossem próximos de forma 34
a que um complementasse o
outro", explica a educadora.

Os grupos encontravam-se
(virtualmente), por Google Meet ou
videochamada do WhatsApp, para
escrever. No início, a professora
participava dos encontros para
poder fazer intervenções e
ajudá-los na produção. Mas,
a partir da terceira edição do
jornal, os alunos desenvolveram
a autonomia para organizar o
trabalho dentro dos grupos e
entregar nas datas determinadas.

A experiência da
aprendizagem cooperativa
no Ensino Médio
Desde 2014, o professor Amaro
trabalha na escola dentro da 35
proposta de aprendizagem
cooperativa – que existe desde
1994 na instituição. Quando os
alunos chegam ao 1º ano do Ensino
Médio, todos fazem uma imersão
de uma semana para entender a
metodologia, a importância das
habilidades sociais e a organização
do trabalho na escola. Após esse
momento, são escolhidos os
coordenadores de cada célula. Isto é,
os alunos que serão líderes dos seus
agrupamentos. Tradicionalmente,
os grupos de trabalho eram de
cinco alunos, porém, no ensino
remoto, adaptou-se para trios.

As aulas funcionam dentro


do modelo Exposição Inicial,
Tarefa Individual, Meta Coletiva,
Fechamento e Avaliação individual
(ETMFA). No remoto, o momento 36
inicial acontece pelo Google
Meet. Depois, os alunos vão para
os grupos discutir a proposta da
aula. Eles utilizam os grupos do
WhatsApp para fazer essas trocas.

Cada aluno recebe uma atividade


dentro de um dos tópicos da aula.
"Se for a mesma tarefa para todos,
não tem porque estar em grupo",
explica o professor. Isto é, os alunos
veem todo o conteúdo na exposição,
mas cada um é responsável por uma
parte. No entanto, na avaliação eles
serão cobrados por todos os pontos.
Dessa forma, a discussão e as trocas
entre o grupo são fundamentais
para chegar na meta coletiva. O que
significa que o grupo é responsável
pela aprendizagem de todos os
participantes. "O aluno já sabe o que
será avaliado. Sabe que se ele não 37
entendeu o que o colega explicou,
será uma questão que não conseguirá
fazer depois", explica o professor.

Dentro dos grupos, os alunos têm


papéis. Com os trios, hoje trabalham
com a figura do coordenador (definido
previamente), do controlador do
tempo e do relator. Os alunos
também podem criar outros
papéis dentro das necessidades
do grupo. "Eles são um ponto de
referência, todos devem continuar
participando ativamente enquanto
é repórter ou se está de olho
no tempo", explica Cláudia.

Ao chegar no 3º ano, os alunos já


têm autonomia para decidir e fazer
essa organização. No início, para
se adaptar ao modelo de trabalho,
o professor conta que toda essa 38
definição é feita pelo professor.
"A gente faz bem mastigado no 1º
ano e vamos evoluindo. Eles vão
percebendo suas dificuldades e
conseguem se organizar de forma
a suprir as necessidades de cada
um sem excluir ninguém", conta
o professor. Os papéis dentro das
células têm rotatividade bimestral
ou semestral no ensino remoto.

Trabalho colaborativo
no ensino híbrido
O trabalho em grupo permitiu que
os alunos de Camila de Oliveira,
professora de Ciências na Escola
Estadual Lauro Gomes, em São
Bernardo do Campo (SP), se
aproximassem. Em uma turma de
6º ano, a partir do projeto de vida
dos estudantes, definiu-se que 39
estudariam o corpo humano na
aula de Eletivas. Camila trabalhou
em parceria com a professora
de Educação Física para trazer
a importância da atividade física
e da alimentação saudável para
a qualidade de vida. "Eles se
conheceram no on-line, porque
vieram de escolas diferentes. Então,
ter de trocar telefone e e-mail
para se encontrarem facilitou essa
socialização", conta Camila.

A sala, já trabalhando no modelo


híbrido, dividiu-se em grupos
de sete a oito alunos. Cada
agrupamento era responsável por
um dos temas levantados. Eles
tinham liberdade de escolher o
formato que apresentariam sua
parte. Poderiam montar uma
apresentação no PowerPoint, vídeos, 40
testes, desenhos e cartazes, entre
outras. Os produtos finais foram
postados no Padlet do projeto.

Para se reunir, cada grupo montou


um WhatsApp e conversavam por
videochamada. Alguns também
utilizaram o Google Meet. "O trabalho
colaborativo dá autonomia para que
eles conversem e tomem decisões
[para o trabalho proposto]", explica
a educadora. Ela conta que é uma
estratégia que pretendem continuar
utilizando no contexto híbrido.

Já em Ribeirão Pires, na escola da


professora Dayane, o trabalho em
grupo também foi utilizado, no
contexto híbrido, em junho e julho
para o reforço das habilidades que
a turma ainda não havia atingido. Os
educadores aproveitaram o interesse 41
dos alunos pela festa junina e as
necessidades de aprendizagem.
"Chamamos de movimentação junina
e trabalhamos as dificuldades dentro
do tema festa junina. Saíram coisas
superlegais", comenta a educadora.

Com sua turma de 9º ano, Dayane


focou no trabalho com as conjunções.
A professora propôs um debate entre
quem estava na sala de aula com
quem estava em casa sobre o uso de
fogos de artifício. Para a interação,
utilizou o Google Meet e o aplicativo
do Centro de Mídias para que, por
vídeo ou chat, os alunos debatessem
sobre os benefícios e prejuízos
da prática. Após a apresentação
dos argumentos dos dois lados,
construíram um texto coletivo.
Nesse momento, ela aproveitou
para fazer intervenções que os 42
fizessem refletir sobre a importância
das conjunções para a construção
da argumentação. No final, ainda
tiveram um jogo com perguntas
sobre o que haviam aprendido. "Eles
avançaram. Na avaliação vimos que
83% da turma já dominava essa
habilidade", reflete a educadora.

A experiência também permitiu


aumentar a participação dos alunos
nas atividades remotas e presenciais.
"Eles sentiram-se mais valorizados
e conseguimos aumentar os alunos
que retornaram", afirma a educadora.
Para fechar o terceiro bimestre, em
outubro, eles também planejam
repetir a iniciativa utilizando
como tema o Dia das Crianças.

43
Como planejar o
trabalho em grupo
Confira 9 dicas do que é importante
ter em mente para aproveitar
ao máximo os agrupamentos

1. Não tenha medo de ousar:


O trabalho em grupo é uma
poderosa estratégia para avançar
nas aprendizagens e desenvolver
competências cognitivas e
socioemocionais. Porém, nesse
processo não é preciso acertar de
primeira a estratégia que melhor
funciona para sua turma. "Não
temr problema nunca ter feito
esse trabalho, estar com medo,
mas acredite que as crianças são
potentes. Se permita ousar e esteja
aberto a errar", afirma Cláudia.

44
2. Proponha atividades que exijam
a colaboração: Momentos de
sistematização ou em que “cada um
faz o seu”, não necessitam de um
trabalho em grupo. Os agrupamentos
devem vir acompanhados de uma
proposta desafiadora. “Devem
demandar que os alunos troquem,
criem hipóteses e argumentem
para chegar na resolução”, explica
Cláudia. Para planejar esse tipo de
atividade, a especialista sugere: “São
aquelas que o professor também
não sabe responder, que ele também
precisa pensar em caminhos”.
Pensar em exercícios que aproximem
os conteúdos do cotidiano dos
alunos e que os façam pensar em
aplicações práticas pode ser um
caminho interessante para tornar
o aprendizado mais significativo,
45
conforme explica Rachel Lohan, em
entrevista para o Instituto Claro.

3. Pense estrategicamente na
divisão dos grupos: Tenha em mente
o perfil da turma para equilibrar
os grupos, de forma que ninguém
domine, que seja um agrupamento de
alunos com níveis de conhecimentos
diferentes, mas não a ponto que
um domine, e que os estudantes
tenham habilidades complementares.

4. Definam papéis para os alunos


dentro dos grupos: Tradicionalmente,
existem cinco papéis que devem estar
presentes para uma boa dinâmica
em grupo: o repórter (aquele que
registra as ideias e compartilha
com todos), o controlador do tempo
(monitora o tempo e estabelece o
ritmo do grupo), o harmonizador 46
(ajuda na tomada de decisão e
garante que todos participem), o
facilitador (lê as orientações e
garante o entendimento), e o monitor
de recursos (verifica que todos
tenham os materiais necessários para
realizar a atividade). Os alunos podem
ter mais de uma responsabilidade,
no caso de grupos com menos de
cinco alunos. Também é possível
criar outros papéis, dentro da
necessidade da sala. Para saber
mais, confira entrevista com Rachel
Lochan, autora do livro Planejando
o Trabalho em Grupo – Estratégias
para salas de aula heterogêneas.

5. Estabeleça combinados para


um bom trabalho em grupo: Essas
regras devem ser retomadas com
frequência para que os alunos se
apropriem e concretizem as atitudes 47
que são esperadas deles. Alguns
combinados que Cláudia sugere é
o de garantir que todos possam
falar e solicitar as ideias dos outros;
tenha o direito de ajudar e o dever
de ajudar; e que ninguém termine
enquanto todos não terminarem.

6. Faça uma observação atenta dos


grupos: Além de pensar na divisão
do grupo, o professor deve estar
atento no momento da dinâmica.
Deve circular para observar o
desempenho dos agrupamentos e se
estão funcionando bem, e fazer as
intervenções quando necessário.

7. Faça uma avaliação da dinâmica:


Peça que os alunos façam uma
autoavaliação de como foi sua
colaboração no grupo. "É uma
forma de ter a visão pessoal de 48
cada criança diante da experiência
que viveu", explica Cláudia. A
partir desse registro, o educador
deve utilizar como insumo para
orientar o seu olhar para a próxima
dinâmica para garantir agrupamentos
equitativos e produtivos. É
uma forma de acompanhar
e garantir a produtividade e
a qualidade das trocas.

8. Garanta a rotatividade: É
importante que todos possam
experimentar os diferentes papéis
e que possam trabalhar com todos
os colegas. Essa estratégia também
permite que o aluno desenvolva
mais competências socioemocionais.
"Pessoas que se dispõem a sair
de sua zona de conforto são
mais adaptáveis, mas isso precisa
ser feito com intencionalidade", 49
explica a especialista. Por isso,
organize e planeje mudanças
na organização da turma.

9. Pense em formas de adaptação à


sua realidade: "É possível organizar
as salas em grupos respeitando
o distanciamento social", afirma
Cláudia, que compartilhou uma foto
que trazia a organização abaixo.

50
Para tal, teste arranjos que garantam
o cumprimento do protocolo
estabelecido pela rede e deixe a sala
organizada para receber a turma. Para
o remoto, também é possível pensar
em caminhos dentro da realidade
da sua turma. Na reportagem
trouxemos a experiência de
educadores que usaram o WhatsApp.

Parceria entre os
professores
A troca entre os educadores também
é uma boa estratégia para superar os
desafios impostos pela pandemia

Os professores também podem se


beneficiar com a colaboração. Na
rede municipal de Poços de Caldas,
a professora de Artes Gabriela
Mallman uniu-se com a de Ensino
51
Religioso para planejar e preparar
as atividades. "Vemos os conteúdos
que cada uma vai trabalhar e
pensamos como podemos integrar",
explica. Nesse processo, além
de ter alguém com quem trocar
sobre as estratégias, também tem
outra pessoa para compartilhar as
percepções sobre o aproveitamento
e participação dos alunos.

Nesse período, as educadoras


têm focado em atividades para o
desenvolvimento socioemocional
com iniciativas, como o diário do
distanciamento, em que os alunos
tinham de fazer registros durante
a pandemia. Também foi feito um
trabalho com os símbolos religiosos e
artísticos, em que os alunos tiveram
de criar um que os representasse.
52
Esse trabalho em parceria permanece
no contexto híbrido, o que tem
sido benéfico, pois, com as aulas
mais curtas, de 30 minutos, os
alunos têm 1 hora na semana para
se dedicarem às propostas.

53
54
3. Além do presencial:
atividades remotas
ajudam a garantir
o avanço da
aprendizagem
Educadores da rede pública de
quatro estados compartilham suas
experiências que ajudam a entender
Imagem: Gettyimages

o papel dessas estratégias em um


contexto em que o ensino 100%
presencial ainda não é uma realidade
Victor Santos | 18 de Agosto de 2021 55
Chegamos ao segundo semestre de
2021 ainda lidando com a covid-19
e com todas as suas consequências
na área da Educação. O avanço da
vacinação até permitiu a gradual
reabertura de parte das escolas,
funcionando com número reduzido
de alunos. Ao mesmo tempo, há
redes que seguem trabalhando de
maneira remota, enquanto outras
planejam e vislumbram o retorno
gradual. Neste cenário, alguns alunos
e famílias não se sentem seguros
de voltar a frequentar as escolas,
seguindo com os estudos em casa.

Em todas essas diferentes


situações, é possível notar que o
trabalho remoto, de uma forma
ou de outra, continua presente
no cotidiano escolar. Isso reforça
a importância de escolas e os 56
educadores seguirem pensando no
ensino para além do presencial.

Dessa forma, em um momento


em que as redes e os educadores
colocam cada vez mais o foco no
avanço da aprendizagem, iniciam
avaliações diagnósticas e consolidam
iniciativas como o trabalho com
agrupamentos de estudantes, é
essencial entender qual é o papel
que esse trabalho remoto ocupa no
processo de aprendizagem e mesmo
na retomada de certos conteúdos
que eventualmente tenham ficado
prejudicados desde a instalação do
ensino remoto emergencial em 2020.

Para entender como isso está


acontecendo nas escolas públicas,
NOVA ESCOLA conversou com quatro
educadores de diferentes estados 57
Roraima, São Paulo, Pernambuco
e Rio de Janeiro, cujas redes se
encontram em momentos distintos.
Eles compartilharam as suas
principais experiências, estratégias
e expectativas em relação ao ensino
remoto nesta retomada. Dentro dessa
perspectiva, há um ponto em comum:
é o professor quem conhece a sua
realidade e quem melhor vai saber
utilizar esses recursos, não como um
fim em si mesmo ou uma tábua de
salvação, mas como parte integrante
de um amplo trabalho voltado à
consolidação das aprendizagens.

A gamificação
como estratégia
A professora Suelen Araújo Barbosa,
que leciona para o 4º ano do Ensino
Fundamental na Escola Municipal 58
Martinha Thury Vieira, em Boa
Vista (RR), faz parte do grupo de
docentes que seguem trabalhando
remotamente em 2021, com a
possibilidade de retorno presencial
em setembro. Ela conta que,
graças a tudo que aconteceu no
ano passado, as crianças chegaram
em 2021 com certa defasagem.

Com uma especialização na área


de tecnologias educacionais e já
há alguns anos trabalhando com
projetos em sala de aula, Suelen
resolveu utilizar essas experiências
para agir em relação às questões de
aprendizagem. “Eu sempre trabalhei
com jogos, mas nunca remotamente.
Conheci a gamificação em um curso
de atualização profissional e resolvi
aplicar. Acredito que era a melhor
opção para engajar os alunos de 59
forma remota, porque o que eles
tinham disponível para estudar eram
o WhatsApp e o aparelho celular,
geralmente dos pais”, relata. “O jogo
on-line já faz parte da realidade das
crianças, então porque não utilizá-
lo para elas aprenderem também?”.

Nasceu, então, o projeto “Gamificação


para aprender a lição”. “Eu recebo o
planejamento que vem da Secretaria
da Educação e verifico, dentro da
BNCC, o que é mais importante para
os alunos do 4º ano aprenderem,
aquilo que eles precisam de fato
concretizar”, detalha Suelen. “A
partir disso, vou criando as ‘missões’
do game, algumas para serem
realizadas individualmente, outras
em grupo, sempre trabalhando
o conteúdo de sala de aula. E
envio tudo pelo WhatsApp”. 60
A professora ressalta o papel ativo
que os alunos exercem nesse
processo. A sala é dividida em
quatro grupos, e cada um desses
agrupamentos no WhatsApp possui
um ‘líder’ que recebe as ‘missões’
a serem feitas em equipe e as
repassam para os seus colegas –
sempre, é claro, sob observação
e intervenções da docente. “Fico
estimulando os alunos o tempo todo
para que eles se engajem nas missões
em busca dos ‘búttons’ e ‘medalhas’
virtuais que eu distribuo. Também
organizo grupos de estudos e de
ajuda entre eles. Uma das alunas,
por exemplo, gravou ela própria
um tutorial ensinando os colegas a
gravarem a tela do celular”, relembra.

Suelen comenta que a escola já


realizou avaliações diagnósticas, mas 61
que ela mesma procura identificar
como está a aprendizagem por
meio de estratégias próprias, como
pequenos simulados e atividades
em plataformas como o Google
Forms. “Para os alunos que estão
com mais dificuldade, além desse
estímulo e envolvimento com os
colegas, também faço um trabalho
mais específico. Deixo gravadas
algumas aulas e explicações em
atividades paralelas numa pasta
do Google Drive, que eles podem
utilizar de maneira autônoma”,
explica a educadora. Para ela,
presencial e remoto podem se
complementar no futuro. “Mas,
para isso, é necessário um trabalho
organizado e diferenciado”.

62
Aprendendo poesia
(e muito mais) por
meio de slams
Na Escola Estadual Joaquim Eugênio
Lima Neto, em São Paulo (SP), a
professora Lídia Moura Batista, que
dá aulas de Língua Portuguesa para
os anos finais do Ensino Fundamental,
passou o ano de 2020 totalmente
no modelo remoto. Mas, desde o
começo de 2021, já atua de forma
semipresencial. Inicialmente, havia
um rodízio de professores, mas hoje
todos os educadores já retornaram
à escola. As turmas de estudantes
se dividem e frequentam as aulas
em dias alternados, com metade
dos alunos em cada sala, além de
carga horária presencial reduzida.

63
Tanto nos momentos totalmente a
distância quanto no formato atual,
em que o remoto ainda é usado,
Lídia aponta a maior dificuldade.
“Claro que a falta de acesso a
recursos tecnológicos interfere,
porém, mais do que isso, eu vejo
que os alunos não têm uma cultura
de estudar e de aprender on-line, e
por isso muitos se perderam”. Desse
modo, no processo para estimulá-
los a pesquisar e estudar por meio
desses recursos digitais, foi preciso
realizar algumas experimentações.
“Testei todas as possibilidades,
com ferramentas como WhatsApp,
Padlet, Microsoft Sway, Google
Classroom, lives sobre literatura.
Porque se você consegue chegar
a dez alunos numa ferramenta,
cinco em outra, dois em outra e
mais um aqui, você já chegou em 64
dezoito pessoas, né?”, analisa Lídia.
“Diversificando as possibilidades
de aprendizagem, é possível atingir
um número maior de estudantes”.

No entanto, esse foi só o primeiro


passo, já que existe todo um esforço
posterior para criar uma rotina de
estudos com essas ferramentas.
Para isso, uma das suas principais
iniciativas foi a organização de slams,
que basicamente consiste em um
trabalho envolvendo competição
de poesia falada on-line. “Isso
surgiu muito da observação do
perfil dos alunos, que são muito
críticos, mas não levavam esses
posicionamentos para questões
sociais”, conta a professora. “Vi
no slam uma possibilidade deles
se envolverem com o mundo que
os cerca”. Em 2020, Lídia trabalhou 65
essa modalidade com o 9º ano do
Ensino Fundamental e também
com o 1º ano do Ensino Médio.
Neste ano, a atividade acontece
com turmas de 8º e 9º ano.

Assim, inicialmente, a professora


incentiva pesquisas sobre o slam
e temas sociais, tudo via Google
Classroom. Depois, aos poucos,
tenta provocar os alunos a produzir
e enviar nos grupos de WhatsApp
o seu próprio ‘grito’ em formato de
poesia. Ela sempre garante, antes
da gravação, a correção dos textos
também via Classroom, porque,
apesar da oralidade, é preciso
verificar características textuais
como rima e batida. “Atividades
como essas são interessantes, pois,
além de mexerem com emoções
e expectativas, muitas vezes, os 66
alunos nem percebem que estamos
trabalhando determinados conteúdos
e, ao final, se impressionam dizendo
‘nossa, então eu sei fazer poesia!’”.

Apesar de satisfeita com o resultado


de ações como essas, a professora
Lídia considera que o ensino remoto
sozinho não dá conta de agir nas
aprendizagens. “Penso que havia
até certa resistência por parte
de algumas pessoas, e esse caso
do slam mostrou que é possível
aprender remotamente, sim, mas
sem substituir o presencial e,
principalmente, sem abrir mão do
acompanhamento do professor,
que continua essencial”, opina a
educadora. “Porque na sala de aula
a gente faz isto: se o aluno está
parado, perguntamos por que ele
não conseguiu fazer determinada 67
atividade e o orientamos. No
remoto, a lógica deve ser a mesma:
precisamos verificar se o aluno
visualizou a atividade e, caso negativo,
investigar por que isso ocorreu”.

Atender a todos e
monitoramento constante
“Será que eles estão aprendendo
alguma coisa?” Esse era o
questionamento que o professor
Murilo Cassimiro e seus colegas
mais se faziam no ano de 2020,
quando começaram a colocar em
prática o ensino remoto emergencial.
Murilo atuava como professor de
Geografia para os anos finais do
Ensino Fundamental na Escola
em Tempo Integral (ETI) Prefeito
João Lyra Filho, em Caruaru (PE).
Agora, em 2021, é coordenador 68
pedagógico da mesma instituição.
A preocupação dos docentes fazia
sentido: quando conseguiram
estruturar aulas síncronas pelo
Google Meet, observaram que dos
470 estudantes do 6º ao 9º ano
matriculados, algo em torno de 120
conseguiam acessar esses encontros.

“Foi preciso pensar em estratégias


para se chegar aos outros alunos,
dentro do que era possível realizar”,
lembra o educador. “Então, o
coordenador na ocasião teve a ideia
de enviar cadernos de atividades
pelos grupos de WhatsApp, para
ao menos garantir o vínculo com a
escola. A ideia funcionou tão bem que
foi incorporada pela rede”. Naquele
momento, explica o educador, a
questão da aprendizagem era um
ponto muito complexo, e a opção da 69
escola foi evitar avaliações e focar
mais na análise da situação dos
alunos, identificando se estavam
conseguindo visualizar e realizar as
atividades disponíveis remotamente.

Em 2021, a escola segue 100%


remota, com previsão de retorno
em 13 de setembro. Agora atuando
na coordenação, Murilo conta que,
ainda que todos estejam um pouco
mais adaptados ao trabalho remoto,
e que avaliações diagnósticas de
Língua Portuguesa e Matemática
tenham sido realizadas em abril, os
desafios para se chegar a todos os
alunos e consolidar a aprendizagem
continuam. “No começo do ano,
após a entrega dos livros didáticos,
surgiu a ideia de enviarmos resumos
semanais nos grupos de WhatsApp,
algo que também tem dado certo”, 70
destaca o coordenador. “Todas as
sextas-feiras os professores colocam
um resumo do conteúdo trabalhado
nas aulas síncronas da semana. A
ideia é de que o aluno que não pôde
acompanhar essas aulas pegue o
livro, encontre o que foi trabalhado
e realize seus estudos e atividades”.

Além disso, existe o trabalho da


Secretaria de Educação com o
projeto Aula em Casa Caruaru, com
videoaulas que passam na TV, no
YouTube e em outras mídias sociais.
“Esse trabalho é importante porque
as aulas são gravadas em cima do
conteúdo dos materiais didáticos da
rede, que agora contarão com um
caderno de progressão, focado nas

71
habilidades a serem desenvolvidas,
e outro de fortalecimento e
recuperação, centrado em
competências já trabalhadas”, explica.

Com isso, o educador enxerga duas


perspectivas de trabalho remoto que
se complementam. “De um lado,
nós temos esses vídeos que vêm da
rede e que são muito importantes
para apoiar o trabalho do professor”,
analisa. “E, do outro, temos o nosso
trabalho aqui na escola, com as
planilhas de monitoramento individual
que fazemos de todas as turmas, a
busca ativa, as atividades elaboradas
pelos professores, e o próprio
diálogo com a comunidade e entre
os professores, sempre buscando
olhar atentamente as questões de
aprendizagem de cada estudante”.
72
A importância das
formações e de um
olhar individualizado
Apesar de já ter familiaridade com
ferramentas Google para a Educação,
Felipe Nóbrega, professor de História
e atual diretor da Escola Municipal
Walmir de Freitas, em Volta Redonda
(RJ), conta que iniciou um verdadeiro
mergulho nessa plataforma em
março de 2020, quando ele e
toda a sua equipe se lançaram
no trabalho remoto. A experiência
rendeu tantos frutos que, em 2021,
surgiu mais um desafio: trabalhando
junto a outros professores, o
educador assumiu a coordenação do
Centro de Mídias Educacionais da
Secretaria Municipal de Educação.

73
A partir dessas vivências, ao
falar de aprendizagem para além
do presencial, Felipe ressalta o
papel-chave das formações de
professores nesse processo. “Em
2020, lá no Walmir, fizemos um
grande trabalho de formação com
os professores, deixando-os por
dentro desse mundo digital”, recorda.
“A partir de então, todas as nossas
aulas são desenvolvidas com as
ferramentas Google, como Slides,
Docs, Formulários, Jamboard e
o Google Sala de Aula”. Em 2021,
já atuando no Centro de Mídias,
ele conta que trabalha com uma
perspectiva similar, ainda que com
um olhar para toda a rede. “Por
meio do centro, visamos desenvolver
mídias educacionais e operacionalizar
a formação, sempre inserindo
os educadores além da mídia 74
digital – porque se os professores
aprenderem a utilizar devidamente
esse formato, conseguem também
enriquecer o que vai em papel”.

O educador compartilha alguns


exemplos desse olhar para impresso
e digital. “Nas formações de 2020,
nós pensamos o que poderíamos
utilizar de recursos para que os
estudantes tivessem maior proveito.
A principal iniciativa foi usar e
abusar de recursos visuais e inserir
o máximo de vídeos”, relata. “Quem
estava on-line teve uma vantagem
maior. No entanto, consolidamos
estratégias como fixar o Google
Slides como padrão de formatação.
Isso forçou o professor a não utilizar
muito texto e possibilitou que, ao
imprimirmos esses materiais com
menos texto e muitos recursos 75
visuais, eles mantivessem o
mesmo nível de qualidade para
quem só estudava no papel”.

O trabalho de acompanhamento
desses alunos deu-se em
muitas frentes: busca ativa por
WhatsApp, por telefone ou mesmo
pessoalmente; lives no Facebook
para tirar as dúvidas da comunidade;
e reuniões de acompanhamento
semanal entre professores para
alinhamento de prioridades,
entre outras iniciativas com foco
na aprendizagem. No retorno
semipresencial programado para
setembro, mais ações devem ser
adotadas. “Os dados da nossa escola
mostram que houve perdas, tanto
para quem acompanhou no meio
impresso quanto no formato digital”,
reflete o educador. “Mas é muito 76
complicado colocar no remoto todas
as expectativas de recuperação de
aprendizagem daqui por diante. Ele
pode auxiliar, sim, mas não pode
ser o carro-chefe nesse processo”.

Para o diretor e coordenador do


Centro de Mídias de Volta Redonda,
é hora de experimentar e testar,
e mais do que nunca, entender a
centralidade do professor nessa
dinâmica. “Agora, é preciso olhar
para cada indivíduo e elaborar
um bom plano de recuperação de
aprendizagem, baseado em elencar
o que é essencial, fazer uma boa
avaliação diagnóstica e, a partir
dos resultados, possibilitar que o
professor trace os planos de ação
para os seus alunos, porque cada

77
sala é um mundo particular”, indica
Felipe. “É difícil saber qual vai ser
o caminho daqui por diante, mas
ninguém sabe melhor do que o
professor. Por isso, é tão importante
formá-lo. O professor é a base para
qualquer coisa que você queira fazer.”

78
Para se aprofundar
Separamos alguns conteúdos de NOVA
ESCOLA que abordam em detalhes
algumas das experiências e estratégias
mencionadas pelos educadores
nessta reportagem. Confira!

Ferramentas Google

Ensino remoto: como tirar o melhor


proveito do Google Classroom

Ensino remoto: como reinventar


sua aula com PPT e Google Slides

Ensino remoto: como estimular a


criatividade e a colaboração dos
seus alunos com o Google Docs

Ensino remoto: como potencializar


suas aulas com o Google Forms
79
Alfabetização: 5 atividades
para estimular leitura e escrita
no Google Jamboard

Ensino remoto: como perder o


medo e fazer do vídeo a melhor
ferramenta para seus alunos

Planejamento e atividades
para professores

Incentive a autoria dos


alunos e organize slams
durante o ensino remoto

Jogos lúdicos e jogos pedagógicos:


o que são e como usá-los
até no ensino remoto

Construindo jogos matemáticos


com poucos recursos
80
Planejamento: como montar o
quebra-cabeça das atividades híbridas

Gestão escolar

Coordenadoras pedagógicas
dão dicas de como preparar
uma formação a distância

Coordenação pedagógica: como


fazer uma formação sobre
habilidades e competências

Como auxiliar os professores no


acompanhamento da aprendizagem
durante a pandemia.

81
82
4. Gestores: como
planejar o apoio
pedagógico
Seja no presencial ou no remoto, seja
Imagem: Gettyimages

no período regular ou no contraturno,


a estratégia é essencial para garantir
o sucesso escolar dos alunos
Paula Salas | 25 de Agosto de 2021 83
A defasagem é uma bola de neve
que os alunos vão carregando ao
longo de toda a vida escolar. A
cada ano, se nada for feito, ela vai
aumentando. Se os professores não
ajudarem o estudante a desfazê-la,
esta pode arrastar o aluno ladeira
abaixo e resultar em reprovação
ou abandono escolar. Para superar
essas dificuldades, surge na escola o
trabalho de apoio pedagógico. Apesar
de ser uma estratégia conhecida, foi
uma prática que ganhou destaque
durante a pandemia, quando
muitos alunos foram prejudicados
e tiveram suas aprendizagens
comprometidas por conta dos
desafios e das desigualdades
de acesso ao ensino remoto.

Tradicionalmente conhecido em
muitas redes como reforço escolar 84
ou recuperação, o apoio pedagógico
consiste em atividades oferecidas no
contraturno a um grupo de alunos,
para desenvolver aprendizagens que
estão em defasagem. Rosaura Soligo,
coordenadora de projetos no Instituto
Abaporu e especialista em gestão
escolar, explica que a mudança
na nomenclatura está relacionada
à concepção de aprendizagem.
Antes, entendia-se que o aluno
aprendia pela repetição, então as
mesmas atividades ou propostas
semelhantes eram repetidas no
contraturno. Já o novo termo remete
à busca de opções para fortalecer
as aprendizagens. "É identificar os
saberes que a criança tem para
pensar em melhores propostas
que se ajustam àquilo que ela
precisa aprender", complementa.
85
Na Escola Municipal de Ensino
Fundamental Profª Helina Coutinho
Lourenço, em São Paulo (SP), a
professora Rosimeire Coutinho Alves
é responsável pelo apoio pedagógico
de turmas do 3º ao 9º ano. O foco
das atividades é a consolidação da
alfabetização em Língua Portuguesa e
Matemática. Duas vezes por semana,
os alunos que tiveram dificuldades
nessas áreas na avaliação diagnóstica
participam das atividades do Projeto
de Apoio Pedagógico (PAP) da
Secretaria Municipal de Educação.

Com o ensino remoto, a professora


relata a dificuldade na adaptação do
trabalho que fazia anteriormente.
"O apoio pedagógico é muito
presencial, próximo do aluno. Sem
as turmas na escola, ficamos
preocupados em como seria". 86
Rosimeire precisou, a partir das
orientações e material fornecido
pela rede, buscar novas estratégias
para incentivar a participação dos
alunos nas atividades de recuperação
durante o ensino remoto. "Comecei
a elaborar jogos no Word Wall e
postava no Google Sala de Aula. Tive
um bom feedback dos alunos", afirma
a educadora. Os resultados foram
observados por outros professores,
que começaram a notar a melhora
dos alunos que participavam do apoio
no rendimento nas aulas regulares.
O formato de jogo, com pontuação,
chamou atenção dos estudantes,
que foram compartilhando os
links com os colegas e passaram a
“competir” entre si. “Eles queriam
estar em primeiro lugar no ranking,
jogavam mais e aprendiam mais
também”, conta a educadora. 87
Com a retomada gradual das aulas,
a professora voltou a atendê-los
de forma presencial. Por conta do
número de alunos, o revezamento não
é necessário. A professora também
tem trabalhado com jogos, como
palavras cruzadas, quebra-cabeças,
caça-palavras, dominó da subtração
e jogos geométricos. "Conseguimos
tirar a criança da rotina da sala de
aula e ter um momento diferenciado",
destaca a professora. Ela diz que há
planos de trabalhar também de forma
presencial com os jogos digitais. Já
quem continua 100% de forma remota
— que são poucos casos — ainda
está trabalhando com os materiais
disponibilizados pela professora e
usando os jogos on-line. Aqueles que
não têm acesso à internet retiram
as atividades impressas na escola.
88
Fabiana Rizzi, coordenadora
pedagógica da escola, conta que nos
momentos de formação continuada
dos professores há um trabalho
de discutir as necessidades dos
alunos, priorizar as habilidades a
serem desenvolvidas e procurar
embasamento teórico nos
documentos de referência da rede
para pensar as atividades propostas.
“A professora Rosi foi além. Ela
criou ferramentas que estimulam
os alunos a participarem. Partiu de
um documento da rede para criar os
jogos. Toda a ação vai ao encontro
de um trabalho desenvolvido no
coletivo”, afirma a coordenadora.

Para Rosimeire, o apoio dos gestores


é fundamental para o planejamento
das atividades e para fornecer os
materiais e recursos necessários. 89
"Tem de estar ao lado e acreditar
que vai dar certo", diz a professora.
"Neste momento, recuperar as
aprendizagens com atividades
significativas está valendo a pena,
o trabalho que fazemos está
sendo reconhecido", completa.

Apoio pedagógico que


permanece remoto
Assim como na escola paulistana,
os alunos de Ensino Médio da Escola
Estadual Cônego Joaquim Monteiro,
em Matias Barbosa (MG), participam,
desde abril, de um programa de
fortalecimento das aprendizagens
criado pela Secretaria de Educação.
Em agosto, foram incluídas também
as turmas de Anos Finais.

90
Focado em Língua Portuguesa
e Matemática, é destinado aos
estudantes que tiveram progressão
continuada em 2020, não alcançaram
60% na avaliação diagnóstica
ou abandonaram os estudos em
2020 e retornaram neste ano.
Especificamente para o 6º ano,
também participam aqueles que
ainda não têm a alfabetização
consolidada. "A ideia é dar bagagem
maior aos alunos para que não
tenham atraso na aprendizagem do
ano que cursam e, assim, melhorar
o fluxo escolar", explica Leandro
Dornellas, diretor da escola.

Apesar da instituição já estar


funcionando de forma híbrida, o apoio
pedagógico, por enquanto, permanece
no modelo remoto. "O acesso é
pelo Google Sala de Aula, grupos de 91
WhatsApp e via e-mail. Para aqueles
que não têm acesso, encaminhamos
o material impresso", salienta o
diretor. A equipe também já está
planejando o atendimento presencial.

Segundo o diretor, os efeitos do


trabalho já estão sendo sentidos.
Os alunos perceberam que estão
com bons resultados. “Estamos com
mais devolutivas [e participação]
do que no ano passado. Eles
estão tendo suporte para realizar
as atividades". Ele diz que tem
a perspectiva de aumentar a
participação e aproveitamento dos
alunos. A ideia é dar continuidade
ao programa nos próximos anos.

92
Atendimento individual
e envolvimento de
todos os docentes
Após realizar o 1º ano do Fundamental
no modelo remoto, muitas turmas
de 2º ano têm enfrentado desafios
para avançar no desenvolvimento
da leitura e da escrita. Pensando
nisso, a Escola Municipal Itaubal,
em Itaubal (AP), criou um apoio
pedagógico focado nesses alunos.

A sala de 2º ano tem apenas 14


alunos. Com isso, o atendimento
individualizado é possível. Para
organizar o trabalho, todos os
professores participam e, seguindo
uma escala durante a manhã e à
tarde, os alunos vão à escola por
duas horas para o reforço. “Foi uma
93
sugestão dos professores [fazer de
forma individual]. Cada um ficou
responsável por um aluno”, explica
Jeane Gurjão, diretora da instituição.

Apesar de todos os professores


participarem, quem é responsável
pelo planejamento das atividades
é a professora da turma. Ela o
compartilha com os colegas, que
são responsáveis pela execução.
“Cada professor trabalha dentro
desse planejamento, mas tem
sua própria metodologia. O que
observamos [que tem funcionado]
é trabalhar mais o lúdico, jogos
com palavras”, afirma Jeane.

A partir dos resultados positivos


com o 2º ano, o apoio pedagógico
foi estendido para o 5º ano. As
aulas regulares de todas as turmas 94
permanecem de forma remota com
entrega quinzenal de atividades
impressas. A escola ainda aguarda
o avanço na vacinação para o
retorno de forma híbrida.

Apoio das aprendizagens


com materiais impressos
Na Escola de Educação Infantil e
Fundamental Francisco Nemesio
Cordeiro, em Tianguá (CE), além das
aulas regulares, os alunos do 1º ao
5º ano recebem materiais impressos
extras focados nas aprendizagens em
defasagem. A escolha da estratégia
considerou o perfil dos estudantes
e a falta de acesso às ferramentas
digitais. “A tecnologia é muito legal,
mas quando se tem recurso para isso.
Se todos tivessem um computador,
poderíamos usar vídeos, jogos ou 95
videochamadas. Mas tenho alunos
que às vezes não conseguem nem
baixar um aplicativo”, reflete Bruna
Santos da Silva, diretora da escola.

No contraturno, uma vez por


semana, quem tem acesso à internet
encontra-se com o professor em
uma aula pelo Google Meet. “Mas
quem mais precisa tem dificuldade
de participar das aulas. Não
conseguimos atingir 100% daqueles
que tinham necessidade”, conta
a diretora. Os responsáveis pelas
aulas são os próprios professores
da instituição. Para preparar
as atividades, eles partem das
habilidades que foram consideradas
essenciais para cada ano e dos
resultados de avaliações diagnósticas.
“Avaliamos todos e depois sentamos
[a equipe gestora e os docentes] para 96
fazer um plano de ação, entender
a situação de cada ano e pensar no
apoio pedagógico”, ressalta Bruna.

Em setembro, a escola deve voltar


a funcionar de forma híbrida. Para
essa retomada, está sendo feito
um planejamento de como será a
recuperação das aprendizagens.
“Estamos elaborando outro plano
focado no que o aluno mais
precisa. Pensamos que deve ser
no contraturno e envolver o aluno
para que ele seja protagonista.
Não poderemos voltar ao ensino
tradicional de antes da pandemia.
Vamos buscar [outras] estratégias
de aprendizagem, usar jogos [por
exemplo]”, comenta a diretora.

97
Para além do contraturno
Em Fortaleza, na Escola de Ensino
Médio em Tempo Integral Jenny
Gomes, como o apoio pedagógico
no contraturno não é possível, a
recuperação das aprendizagens
é realizada no período de aula.
"A recuperação é contínua.
Bimestralmente, temos as avaliações
e, depois do diagnóstico, começamos
a recuperar", explica Marcos
Bezerra, diretor da instituição.

Semanalmente, os estudantes
têm 45 aulas, 15 delas de quatro
disciplinas, que são eletivas.
Nelas, há um aprofundamento
dos conteúdos curriculares e
recuperação das defasagens dos
alunos. "Nós orientamos a escolha
das eletivas de acordo com as 98
dificuldades de cada aluno [que
são mapeadas a partir de uma
avaliação diagnóstica semestral]",
diz Bezerra. Para as eletivas do
1º ano do Ensino Médio, o gestor
conta que há um enfoque maior em
Língua Portuguesa e Matemática para
suprir as defasagens que os alunos
trazem do Ensino Fundamental.

Esse trabalho, segundo o diretor,


foi responsável pela escola não ter
nenhuma evasão durante o ensino
remoto. Para ele, as avaliações
contínuas são fundamentais,
em especial a diagnóstica
realizada a cada semestre.

99
"É preciso fazer uma verificação para
conhecer as dificuldades individuais e
ter um perfil do que cada estudante
necessita. A partir disso, traçar
planos e ver o que vai ser necessário
ofertar na escola", finaliza.

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O que deve ter um
bom apoio pedagógico
A especialista Rosaura, do Instituto
Abaporu, aponta caminhos para
planejar e organizar o fortalecimento
das aprendizagens dos alunos

1. Base em resultados de avaliações.


Tanto para determinar quem precisa
do apoio pedagógico, quanto
para acompanhar os avanços
e necessidades dos alunos, ter
avaliações diagnósticas frequentes
é fundamental para orientar o
trabalho do professor. “O apoio
só terá qualidade caso esteja
ajustado às necessidades reais
dos alunos,”, resume Rosaura.

2. Foco em aprendizagens essenciais.


“Não dá para fazer caber no 101
contraturno escolar o currículo
de antes da pandemia. Hoje são
outros conteúdos que precisam ser
priorizados”, determina a especialista.
Por isso, ela coloca que, a partir da
realidade local e dos documentos de
referência, a equipe docente e gestora
precisa definir coletivamente quais
são os objetivos de aprendizagens
essenciais a serem desenvolvidos.

3. Atividades personalizadas. “Não


existe um planejamento que se
aplica a todos, mas este deve ser
pensado para cada turma, que é
composta por alunos com diferentes
conhecimentos”, exemplifica. “As
melhores estratégias são preparar
propostas a partir do que os alunos
precisam e testar outras abordagens
para não fazer mais do mesmo”,
complementa. Ela explica que, se for 102
o mesmo professor do ensino regular,
ele já sabe o nível de conhecimento
dos alunos e o que funciona melhor
com a turma. Se não for esse o caso,
fazer uma ponte com esse outro
educador é importante para entender
melhor as necessidades dos alunos.

4. Olhar inovador. "Não faz sentido


repetir atividades que não deram
resultado. Elas precisam ser
modificadas", explica a especialista.
Essa ideia parte do princípio
que os alunos que precisam de
apoio pedagógico já tiveram uma
experiência anterior na qual não
conseguiram atingir plenamente
determinada habilidade. Por
isso, o professor precisa buscar
outras estratégias para garantir
a aprendizagem dos alunos.
103
Os papéis dos gestores
no apoio pedagógico
A direção e a coordenação pedagógica
ocupam lugar fundamental na
articulação de um trabalho que seja
significativo para os estudantes.
Entenda as funções da equipe gestora:

• Orientação do trabalho. Para o


diretor Marcos, a equipe gestora
ocupa, nesse processo, o lugar
do piloto. "Precisamos partir das
dificuldades dos alunos para
direcionar o foco das ações. O
gestor é fundamental para dar
rumo, definir aonde quer chegar
e nortear esse trabalho", diz.

• Apoio e formação dos professores.


Para a coordenadora Fabiana, cabe
à equipe gestora contribuir para a
104
formação do professor que dará
o apoio pedagógico. “Temos de
caminhar em conjunto, encontrar
estratégias para o desenvolvimento
integral do aluno. Eu tenho de
pegar o que o professor tem e
aprimorar esse conhecimento
para potencializar o trabalho
dele”, explica a educadora. “Os
alunos já passaram por um
processo de ensino que não
foi suficiente para desenvolver
[aquelas habilidades], por isso
os professores precisam trazer
uma metodologia diferenciada”,
complementa o diretor Leandro.

• Estímulo aos alunos e famílias.


Além de incentivar os professores,
outro ponto relevante é engajar os
estudantes e as famílias. “Mostrar
[para o aluno] que não é um 105
problema estar com dificuldade,
que aquela aula vai ser importante
para ele e que vai conseguir superá-
la”, explica Leandro. O mesmo
deve ser feito com as famílias
para evidenciar a importância de o
aluno participar dessas atividades
no contraturno escolar. “Nosso
papel é estimular o professor na
metodologia diferenciada, o aluno
a frequentar a aula e a família a
acreditar no programa”, resume.

• Organização administrativa e
financeira. Se não conseguir
aproveitar os professores da escola,
a direção deve contratar novos
docentes, a partir da liberação do
recurso via Secretaria. No caso
de Leandro, ele explica que é um
orçamento que já está liberado
para o programa de fortalecimento 106
das aprendizagens e conta também
com recursos para compras de
livros, equipamentos, materiais
de papelaria e impressões. Dessa
forma, cabe ao gestor fazer
todo esse gerenciamento.

• Acolhimento. O período de
pandemia foi muito desafiador, e
no apoio pedagógico é fundamental
acolher os estudantes. Essa
tarefa não é apenas da gestão,
mas também da equipe docente.
“É preciso dar atenção ao aluno
e entender como ele está no
ambiente escolar e se tem suporte
da família. A escola precisa fazer
esse acolhimento, acreditar no
desenvolvimento do estudante e
fazer acontecer [a recuperação das
aprendizagens]”, finaliza Leandro.
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Edição
Lisandra Matias

Texto
Paula Salas e
Victor Santos

Diagramação
Tiago Araujo

Ilustrações
André Asahida

N ov a e s c o l a • 2 0 2 1 108

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