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l DécioSaes

IJEMOCRACIA

J f/'e.<U, d& ;/tLt:/'e&Sb eh· 00~</IUY


i..· • História • Política • .Sociologia
1.
r.9t.tt/ 'a<Y ár·ca-s, ela- ,w!rh
• Administraçã o • Antropologia • Artes
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Benj ilmln Abd olu Junior
Sarnira You ssef Campedelli i
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Sumário
3&~. g- Preparação do toxto
Mórlo Tod e u Bruçó
1. O conceito de democracia ______ _,
s (Q 1- Arto
Coordenação o A democracia e a ciência política _ __ _ _ _ _ 7
proje to 9rMico/mlolo
An tô n io do Ama ral Rocha A teoria marxiana do E stado 9
Arto·flnnl
Acné Etleno Ardanuy
< A função do Estado 11
O Estado como organização especializada 13
Elai ne Regina da Oliveira
O s tipos históricos de Estado 17
Copa
Ary Normontrn Forma de Estado c regime político 19
Antonio U. Domlêncio
·· ~ ,.,.
COMPRA ,r:· i / (..l ! V ~-' \'
,•
ii
A democracia como forma de Estado e como
regime p o lítico· 23
1 A democracia corno progrnmn _ _ ________ 29
Oí\Tt.\ ~ :5 / ();:,' I '7 (
eZ ~ 1 . . . . .· -
/ " •..· ·__., ..;) :>:_
2. A d emocracia no pré-cap italismo 33
A d emocracia na Histó ria 33
0 :; Estados pré-burgueses e a dcnrncracia 35
A dcmocrac_ia. ~in.tiga 39
A 1e11as: w 1w dc:moc.:racia niio-fibcra/ 41
A dcrnocrncia mccJícvnl 45·

3. A democracia no capitali smo 49

O Estado burguês _ __ 49
A dc mocrnda como fo rma do Eslado burguês_ 52
A democracia burguesa e a "Teoria dos trcs
ISBN 85 08 01873 8
poderes" 54
As variantes da democracia burguesa 58
1987 A democracia como regime político burguÇ s _61
Todos os di reito s reservados A democracia burguesa e a "Regrn da
Editam Atlca S.A. - Ruo Ba rão de lgu<lpe , 110 alternância" 66
Tol.: (PABX) 2'/0-9322 - Caixa Post a l 9656 A apatia políti ca na dcmocrncia. burguesa 69
End. Telegráfico "Bomlivro· - São Pa u lo ·
Dcmocrncia burguesa e dcsigu<ll<ladc políiica _ _ 72
1 ·I
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..
~

4. Socialismo e democracia _ _ __ _ _74


A democracia no programa político sucialís1a _ 7 4
O Estado socialistn _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ 76
As organizações de massa e a dcscstatiznção _ _ _ 7s
O caráter democrático do socialismo 81

5. Vocabulário crítico_~------- SG

6. Bibliografia comentada _ _ __ __ _ 9o

Q uando fundamos na Alemanha um grnndc


jornal, nossa b andeira só podia ser, port anto, a
bandeira da democracia: mas de u niu dcmocr::icia
<Jue destacava se mpre, c m cada caso concreto, 6
car:ítcr especif icam en te proletário que ainda nào
podia estampar, definitivamente, cm seu estan-
1 darte.

I
~.:
Fricdrich Engels
i
-~·--·· · " - · ··· · ·· ·· ·· · · ......_.._............ ·······"····- ·· ···-··

1
O conceito
de democracia

A democracia e a ciência política

Muitas obras recentes sobre o nosso tema propõem


aos leitores vastos repertórios de acepções cm que o ter-
mo democracia vem sendo utilizado, da Grécia antiga até
os nossos dias. Não é esse o objetivo que nos move, ao
escrevermos este pequeno livro. Esclareça-se: é sempre
útil, de um ponto de vista científico, tratar _g_~tcma...dJ1-
dcmocracia do ângulo da h islória das idéias políticas.
-;-rõJãVTã~-propõfrio-nós···c-xccu 1ã~-qur·-tín1a · ôiiêra....Iã.rcfa~--
Nossa tarda não é antagônica, e, sim, complementar
it do hisloriador das idéias políticas. Ela é própria do
cientista polítíco: trata-se de transformar o termo demo- ·
craâa num instrumento de nnálisc da vida política das
sociedades humana.s concretas. Ou melhor: compete ao
cientista político definir democracia de tal modo que esse
termo possa ser utiliz:a<lo, pelos que escrevem a história
das soctéaadcs humanas concretas, para registrar diferen-
ças políticas entre as mesmas. Propç(l99 .. uma. defi.ni_ç~.o
dara e prcc.isa de democracia, o cientista político fornece
s - -------------------------
-· . 9

ao historiador um instrumento de classificação política das transformft~la num conceito integrante de uma teoria da
sodcdadcs humanas concretas. política. Nesse empreendimento, ele conserva algumas das
' .
Antes de passar 11 execução dessa tarefa, o cientista conotações da cxprcssüo, rejeita outras e, finalmente, agre-
político deve, cntreta11to, ouvir o que lhe diz o estu- ga novos elementos ú definição. E tudo isso é feito sob
dioso da história das idéias políticas. Este não lhe propi- a inspiração - ·- e, mais ainda, sob a vigilância -- daquela
cia apenas informação sobre a etimologia (democracia, teoria da política esposada pelo cientista político. O re-
em grego, quer di:r.cr, litcrnlmcntc, "o governo do demos", sultado final dcss<t operação intelectual - · a proposição
isto 6, "do povo") ou sobre as diferentes acepções confe- de um conceito de democracia - deve . corresponder às
ridas por filósofos e pensadores políticos ao termo demo- exigências feitas por essa teoria da política; isto é, ele
cracia. Ele també:n lhe indicn qual tem sido u função da deve ajustar-se intcgrahnentc aos demais conceitos que
expressão democracia no vocabulário político prático, cor- compõem esse conjunto.
rente, elas diferentes épocus. Ora, todos esses elementos f. claro que nenhum cientista político esposa apenas
(etimologia, história do conceito, usos socialmente d ifo n- por capricho uma dentre as várias teorias da política. A
didos da expressão) devem ser levados cm conta pelo teoria escolhida !'.! sempre aquela que parece fornecer os
cientista político, no seu trabalho de propor uma dcfí- conceitos maís eficazes; isto é, concc~tos indispensáveis à
niçfio de democracia. Ele 11ão pode redefinir de modo cxplicaçào dos processos de 'conservação e de transfor-
arbitdrio e totalmente livre a expressão; por exemplo, mação dns sociedades humnnas concretas. O critério, por-
1150 pode recorrer ao termo democracia para nomear tanto, que inspira o cientista político na avaliação das
certas caractcrísticàs da vida política trndicionalmcnle abri- diversas teorias da política e na adt~são a uma dentre estas
~adas sob os rótulo$ ela tirania ou do despotismo. O dcs· é o critério da eficácia na explicação da história das so-
compromisso absoluto com a tradição intelectual e polí- ciedades humarrns.
tica ameaça diretamente a capacidade de comunicaçi'io
social do cientista político; ou melhor, condena-o a 11:10
se: fazer entender e, portanto, a escrever apenas para si A teoria marxiana do Estado
próprio. Também nós, ao nos lançarmos à tarefa de propor
Levar cm conta a tradiçflo intelectual e política não um conceito de democracia, tomamos como ponto de
significa, entretanto, repetir pura e simplesmente as accp~ partida uma dentre <is vá rins teorias d<i política: aquela
çõcs de democracia dominantes nos campos da vida inte- que nos parece ser a mais e[icaz no que concerne à ex-
lectual e da vida política. A tradição intelectual e política plicação da História; é a teoria marxiann da polític<J,
6 a matéria-prima sobre a qual o .cientista político trabalha, cujo eixo principal é o teoria do Estado proposta por
com vistas a obter um novo produto: um conceito de i'vlorx e Engels no conjunto dos seus trabalhos.
democracia que se harmoniic com os demais conceito~ Como postulamos a existência de uma teoria manda-
integrantes de uma teoria da política. Dito de outra for- na do Estado, ímpõc-sc desde logo dois csclarccimcn tos.
ma: o cientista político se reapropria de uma expressão Em primeiro lugar, estamos cientes de que muitos es-
forjada há mais <le dois milênios - dcmocrâda ·-, parn iudiosos · - por exemplo, os italianos Norberto Bobbio
10 11

( 1973) e Lucio Cole.Ili ( 1974) - negam a existência brc o E stado que compõe a teoria marxia na do E stado.
de um n v.c rdadeira teoria do Estado no conjunto dn obra O reagrupamento de todos 6s desajustes não pode resultar
de Marx e Engels. Essa objcçfio só poderia ser plena- numa segunda teoria marxiann do Estado; pode propiciar,
mente rcba tid;'I se enveredásse mos por um a reflexão pro- no máximo, um melhor entendimen to d a evolução inte-
fundn accl"ca do que seja a teoria, cm geral, ou a teoria lectual e política de Marx e En gels.
do E stado, cm particul ar. Não podemos nos lançar a Em q ue consis te, cm linhas gerais, a teoria marxian a
uma ta refa dessa e nvergadura num pequeno livro int ro- do Es tado? Para Marx e Engels, rrns colc1i vi<ladcs cm que
dutório sobre dcmocracin. Limitemo-nos, p ort<lnto, a cs- um;1 pane dos homens cont rola os meios de produção
cla:-cc<.!r s umariamente que so mos menos exigentes do que ( Lcrnis, ferramenta s, máqu inas, matérias-primas) e, ao in-
aqueles estudiosos: tudo o que encontramos sobre o E s- vés de usú- los, dirige a sua utilização pela outra p a r te
ta~lo 1ias obras escritas po r M arx e En gels, n putir de dos h omens (isto é, os que não controlam os meios d e
1 848 (de finições breves e sintéticas, fórmula s operató rias produção), deve existir corre.fatamente o Estado. E sta
e, fin almente, um conceito sistematicamente exposto). com- expressão design a, pnra os do is autores, o grupo de ho-
põe, a nosso ver, uma teoria marxi::i.na do Estado. Quando mens que, nessas coletivi dades, dedicam todo o seu tempo
n~o se levam cm conta esses motcriai s, é impossível enten- ou uma parte dele ao desempenho de at ividades necessá-
der o que seja a sua concepção materialista da História; ri as à conservação dessa relação entre homens controla-
o conceito marxiano de Estado, tal qu al ele nparecc rrns dores dos meios de p rodução e homens utilizadores dos
obras d os dois autores, n partir de O manijcsto comw1fs10 meios de produção.
( l848), Ç elemento -chave da explicação m arxiona d os P nrn Marx e E ngels, existe portanto um a co rrel ação
processos de conservação e transformaçiío d as socied ad es entre a exploração do trabalho de uns homens p or ou tros
ht1manas concretas. e um elenco de atividades, dis tin tas do próprio processo
Em segundo lugar, não descon hecemos a existência c.lc exploração, destinadas a assegurar a continuidade dessa
de imprecisões, des lizes terminológ icos c mesmo contra- rcbçüo de exploração. ~íl coletividade ~~.§_cha _qiy i-
dições inte rnas nas for mulações de Marx e Engels sobre . ·cr.id~ass~_.á9s.iJüs_a..o.tagôni~ (explo radora e explo -
o Es tad o; tais defeitos estilo p resentes alé mesmo cm obras rada ). dçy.e_ali. cxisci.r ..u.m.._CQ.!flQl cxo d~ _a t i vidad cs, distint a~
importantes da bibliografia rnarxi::i.na, como O Dezoito das .,.a\ividadcs.. de.. pXQdJ.l_Ç~p._i~q.~~... ª . prcs.~JY(lL ..csse
!Jrwmírio de L11ís Bonaparte (Marx) e A o rigem da fllmi- cstado ....dc coisas; vale dizer, n assegurar a continuidade
/i(l, da propriedade privada e do Es1ado ( E ngels). Muitos d~·· divh;ão da coletividade cm clusse social exploradora
autores usa m esses de feitos como argumento central ao e clussc socíai explorada. A esse complexo de atividades
question arem a existência de u ma única teoria ma rxi ana Marx e Engels ch ama m Estado.
do Estado. N6s pensamos, ao con tr <Írio, que h á cm Marx
e Enge ls fo rmulações ajus tadas e desajustadas ao co n·
ju nte> d a a ná!iso sobre o Estado cmprccndícla cm cada A função do Estado
texto . E. m:iis ai nda , é n articulação o rgilnica de todas Advirca-sc que acima demos apenas o primeiro passo
11 as formulações ajustadas ao conjunto de cada análise so- na exposição do conceito m a rxiano de Estado. Esse passo
t

,.....----·--· ...... ·····-······-·· ..... .... ,... ......... ---·-·· ··· - ··---.::=-~~

12

já é .su ficie nte para evidenciar o lugar central do elemento ccr o conflito de classes e n frus trar a r~volução social.
fw1ç:üo na conceituação marxiana do Estado. Para Marx E é nesse sentido específico (e não cm qualquer outrn)
e ·Engels, nas coletividades divididas cm classes sociais q uc, para os dois autores, o Estado é uma organiz.ação,
autagônicas ( cxplorndorn e explorada) o Est.-ido se iden- cm (1ltima instá!lcin, a serviço da classe social exploradora.
tifica com o subgrupo de homens, destacado to tal ou Acima sublinhamos o luga r central reservado ao ele-
põlrci a!mentc das tarefas increntes ao processo de p roduçflo, mento fwrçâo pela co nceituação marxian<! de Estado. Ta l
que desempenha a funçã o de p reservar essa cisiio, de im- elemento não é o (mico, como veremos a segui r. Mas
pedir que a divisão da coletividade cm classe social explo-
esclareça-se, entre parênteses. que alguns importantes teó-
radora e classe social explorada d esapareça.
ricos marxis tas do século XX preferiram, diferentemente
Agora, 6 preciso dar um segundo passo: gu;ilificar ele Marx e E ngels. recorrer exclusivamente ao clciuento
.melhor essa f unçüo conservadora. T odos os mcmbrns da . \.~ f1111çiio para conceituar, cm termos por eles considerados
classe social cxplor;:ic.lorn têm, parn além dos ·seus desejos
fi 6is ao núcleo dn doutrina mar.xíst:i, o Estado. Essa ~ a
singulares, um interesse comum : preservar a sua co ndição
postura que cnc:ontrnmos c(lnsubstnnciada .cn1 trabalhos
de detentores do controle dos meios de produção e de
<lirigentcs do processo de produção. Também os membros como os Cadernos tio cârcert:, do dirigente comunista
da classe socia l explorada têm um interesse comum, sime- italiano Antonio Gramsci, ou como o ensaio "Ideologia
1ricamente oposto ao interesse da classe exploradora: e aparelhos ideológicos de Estado", do filósofo comu-
subtrai r -sc à relação de exploração, dcixor de usar os nista francês Louis A lthusser. Nesses importantes traba·
meios d e produção para fins que não são definidos por lhos, Estado equivale ao conj unto de todas as atividades
eles próprios, e, sim, por aqueles q ue dirigem o processo voltadas para a conservação da exploração do trabalho ;
de produçno (os homens detentores do controle dos meios essa perspectiva teórica implica considerar o Estado não .
de produção). Existe, portanto, nas coletividades cindi- corno um subgrupo de homens p eculiares desempenhando,
cJus cm classes sociais antagônicas, um conflito de intcrcs- de modo também peculiar, uma certa atividad e, e, sim,
::;cs. Em tais coletividad es, existe também um s ubgrupo como um certo tipo de atividade, acessível a todos o s
de homens que desempenham a função de preservar essa homens que se propõem a defondcr o interesse da classe
cisão ao agir sobre o conflito de inccrcsscs, contendo-o social exploradora (conservação da relação de cx.ploraçiio).
dentro de certo s limites; ou seja, não propriamente supri-
íl ~ \
mindo-o (o conflilo não pode ser suprimido se perdurar
a rdação de exploração), mas impedindo que ele des<igüe
na revolução social (supressão da relação de cxplorn-
~V' (O Estado como organização especializada
çã0) . Assim, para Marx e Engels, o Estado é o subgrupo ~ Em Marx e Engels, ao contrário, o Estado não é
de ho m ens que desempenham a função de assegurar a meramente uma f unçfto ou urna dimensão da atividade so-
continuidade da .exploração do trnbálho e de. preserva r a cinl total, como pare.cem nos sugerir Grnmsci e Althusscr.
cís<io da cole ti vi d ade em classes sociais antagônicas, nn P~ o E s tado é um "pode~ . esp_~cia l de repres"'"
medida em que estas praticam ações destinadas a amortc- ~ri7>;· ; vale dizer, Cõi1si'stc num grupÕ de homens cspccinís,
....... ,,........ ,....... , .. .... · · · ~··· ·
, ..., ..._·.,.---··- . · ...,.. , -
. .... ....... .. .

15

para os quais reservam a denominação funcionários. E desempenho de uma certa função; e tal grupo deve, ao
úiis~§.mel1~= fgQ.~~éedais:-i1o·sciú iZfo-dc q dcsfiicádos, i1c-s·1ro .. mesmo tempo, se especializar de fato no desempenho de
pf1rcíal tiu totalmcr1iê; ao-prõécsso dc- prodÜÇão-,--·p-ãra quê uma ()utra (unç;1o, que permanece oculta, latente, enco-
põ.!>1Iííff( foscm1)crll1arn - fon-Çaõ· de-a·mortc c·CI; ci conflito dc- berta. Assim, as tarefas administrativas (coletar impostos,
da-ssC:'i___c"f ru_st~!_r ~ revolução social. construir estradas, pontes e ruas) e militares (reprimir os
Indicamos acima o segundo elemento essencial du comportamentos que obstaculizem a continuidade do pro-
conceituação marxiana de Estado: este, mais que umn cesso de produçúo) desempenhadas pelo corpo de fun-
função pura e simples, é o grupo de homens cspecialrncntc cionários se dcstiriam,' na verdade, a amortecer o conflito
destacados para desempenhar essa função. Essa formu- entre as classes sociais antagônicas~ mas aparecem a essa
l~içüo é aparentemente simples; todnvia. ela 6 ambígua. coletividade cindida como atividades voltadas para a dc-
Lendo-a, alguém poderia deduzir que, numa coletividade fcs;,i de uma etnia, a realização dos desígnios de Deus no
cindida cm classes sociais antagônicas, alguns homens mundo dos homens ou a concretização das aspirações do
s:lo abertamente destacados do processo de 1>rodüção p<trn povo-naçno. Essas tarefas administrativas têm um caráter
que possam desempenhar a função expres~·a e declarac/(J instrumental: criam as condições materiais mínimas (rc~
de conter o conflito de classes dentro de certos limites, cursos cm moeda ou em espécie destinados a armar e
e. desse modo, assegurar a continuidade da exploração alimentar as tropas; vias de circulação e ele comunicação
do trabalho.
indispensáveis ü movimentação militar), sem as quais não
Ora, csle ni:io é o sentido da carnctcrização que Marx ~ possível o desempenho das tarefas militares.
e E ngels empreendem do Estado como "poder especial".
Alguém podcrú, com toda razão, perguntar: ~2.- é
·O co.rpo de funcionúrios não se apresenta ostensivamente
possível que tais aparências sejam mantidas? Por ·que a
à coletividade, cindida em classes sociais antagônicas, como
um grupo de homens especializados na função de amor-
êõlctívioãêlc----= -e·: nl.'l-lS especificamente, ·a classe social
tecer o conflito de classes e frustrar a revolução social. c\pl·o r-:xda--=- não dcsven.daã- vcrd'iiôCira. funçü~_das ta re~
Esta é a sua funçüo oculta ou lateme, que permanece r,{s Udn1iffísfi'alívas- c- rr1iffforcs? . 'Is'to · 0c0rrc--porquc, nas
norm'!_lmcnte (isto é, até que irrompa a revolução social) colctiviêltiôcs-c ilídidas -cm dnsscs sociais antagônicas, há
encoberta pela sua função expressa ou decfarada: a de uma repartiçüo de tar<~fas no seio da classe social explo-
defender uma certa comunidade étnica contra os "bárba- radora.
ros" (Mundo Antigo), a de realizar, na Terra, os desíg- Explique-se: nem todos os homens que, nessas colc-
nios de Deus (Mundo Medieval) ou a de satisfazer aos ti vidadcs. controlam de foto os meios de produção, e
interesses do povo-nação (Mundo · Contemporâneo). dirigem portanto o processo dt: produçã o, se dedicam
Neste ponto, podemos avaliar toda a complexidade simultaneamente às tarefas administrativas e militares ne-
do fenômeno designado por Marx. e Engels como Estado. cessárias no amortecimento do conflito de classes. Há . ·
Ou seja: cm cada coletividade, cindida cm classes sociais sempre, cm tais coletividades, um s ubgrupo de homens
antagônicas, u111 grupo de homens deve aparecer diante que se dedicam totalmente (caso dos burocratas profissio-
desta como um corpo, de funcionários especializados no nais) ou parcialmente (caso dos funcionários não-pro-
_
- - - -- ----····--··· ········ ...................... ..................... ........................ . - ----------------
16 17

fissionais ) a essas tarefas. Ora, é essa especialização ç~o cm termos cíeotíficos, dos seus aspectos essenciais,
parcial ou total, mas sempre presente -- que confere <W ii~v~rinntcs . Em ~;cgundo luga r, consideram os guc só o
corpo de funcionários a ap arência de agentes a serviço d:1 rtcno conhcc.;imcnto, crn toda n sun simplicidade, da função
colctiviclndc, e oculta o se u verdadeiro pnpcl de agentes a invariavelmente r.;onscrv adora, dcscmpcnhadn por esse cor-
serviço da classe social exploradora. O corpo de Cuncio- po especial de funcionários, nos permite entende~. as razões
n<irios serve objetivamente ao interesse gcrnl da elas.se profundas pelas quais os Estados concrct?s vuo-sc Jan: ·
social exploradora (preservação da exploração do tra- çando - sobretudo no Mundo Comcmporanco - a uma
balho), embora não aja, necessariamente, por encomenda infinidade ele mividadcs . .
direta dos membros dessa classe. A lé m disso , Marx e Engels sugeriram impl icitn m entc,
Pode-se, agorn, entender a eficácia específica do cm v{trir1s oportur::da<lcs, que o conceito di.: E stado ern
corpo <lc funcion ários no desempenho de uma fonçfü.> nc ra l era um inst rumento ncccss~írio, porém não-sufici ente,
gera l (preservação da exploração do trabalho), que niio "'pa ra a cxplic:içiio dos processos de conscrvaçao - e trnns-
é exclusiv<imcnte s ua, por ser cumprida quotídianamcn te f 0 rmação das socied ades hmnan;is concretas. Ao lo ngo da
por todos os membros da classe exploradora. Ou seja: história da humanidade. a exploração do trabalho de ho-
n esp ecialização nas tarefas administrativas e militares, men s desapossados dos me ios de produção por homens
b em como o distan ciamento com relação às tarefas do que os controlam tem assumido di~ercntcs f~ rm.as : escra-
processo de produção, fornecem uma· base objetiva para vismo, dcspotirn10 nsi<ítico, feudalism o , cap1rnltsrno. Po-
o mascaramento das atividades reais do corpo de funcio - deria o E s tndo se orga niLar do mesmo modo e desempe-
nários. Estes, por serem lromcris especiais, aparec_em como nhar também do m esmo modo a sun função ge mi de
agentes a serviço da coletividade, o que dificilmente ocorre a mo rtecer o conflito de ~lasses ~rn difercnte_s colctivic.ladcs~
com os membros da classe exploradora que se limitem a dominadas por formas diversas d e cxploraçao do trabalho.
desempenhar uma função dentro do processo d e produção .
.; Reproduzimos acima os elementos-chave do conceito
marxiano d e Estado: a organização especializada, a f un- Os tipos históricos de Estado
ção expressa, "oficial", de preservar a unidade ( coletivi-
d ade) , a função latente de reproduzir a cisão ( exploraçflo E. incorreto sustentar que Marx e Engels tenham
do trabalho de uns por outros). Tal conceito é, sem dado uma resposta p recisa, profunda e detalhad a a essa
dúvida, extremamente simples ; e muitos cien tistas sociais. qucsti.\o. Pode-se entretanto dizer que o s dois autores
~
inclusive, objetam que a infinidad e de a tivid ades desen- pelo menos abriram o caminho pnra o tratamen to da
t volvidas pelos Estados concretos, do Mundo Antigo ao questão, <10 alu direm. cm ~~J~_f?.fili.S.!lg.cm_ das .sua~. .Q~r<!s,..
~ Mundo Contemporâ neo, não pode ser comprimida sob o a tipos diversos dêEs~ado, _correspondentes ~(.)S ~difcrc11-
{
~ rótulo da "função de amortecer o conflito de classes". ies ti"pos de relação de produção: Estado nn t!go, Estado
"'~· A essa objeção, devemos responder, cm primeiro luga r. ;fSiátiéo", Estádo feudal, Es~ado__ b1:_1r~~ês moderno. Com
q u e u m conceito não pode ser uma cópia exaustiva de ·essas alusões Marx e Engels sugeriam que, se em todas
. qualquer fenômeno; ele consiste, tão-somente, na enuncia- as coletividades cind idas cm ·classes sociais antagônicas .....

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.~:._i_~t,7 um_~ organ izaç5o especial de ~lp_ar:_êr~cia "universa- Poulantzas e Andcrson, bem como noutros traba lhos de
lista , mas de foto volradr1 para a defesa c!Õ - ini~~cssc · d ores marxis
pcsqmsn · tas. A que le cone e't'to e· estas 11oço-cs
g~ral--dc uma única parw·-{"êfasse-e:.;pJcffacJoràT-dii-cül~t1- aparecerão nos capítulos subseqüentes.
·v1dade- "O modo ... de " ""(íl:'\"fff'5' º'5"i":"". -·---d 1· --·· - ··-·· --
~···-- • ____ . • ':' _c;.<-- .. ~""''10 e e ( cscmpenho dc~sa Todavia, a mera rcconstituíção do conceito marxiano
funçao_conservadora _pode ·vãriifr, -cõrrclarnmcntc i'i varia<,::lo de Estado cm geral e a ressalva acerca el a v ariedade de
~rn .forma de cxploraçé'.io· âõ - crabalho. Estava, desse modo tipos his tóricos de Estado não bastam para que nos lan-
d rn,d ic...ad~ a _nece~s~dadc de cons trui r novos concei tos, in<lis~ cemos ~1 proposiç<"io de um concei to de democracia. Antes
fi pcnsuve1s a a~~l1sc das coletividades concretas cindidas de fazê-lo, d evemos introduzir dois novos conceitos.
q
cm .classes so~rn1s: os tipos de Estado (escravista, asiá tico.
! fcud~l, burgucs), correspondentes aos tipos diversos de
'' rcl_açao de produção (escravista, asiática feudal c-ioi-
Forma de Estado e regime político
taltsta). ' ' .,
~ . :csquisa~ores marxistas contcmporânc<)S se lançaram Para chegar .io primeiro desses conceitos, devemos
a tMcfa sugc;ida por Marx e Engels. O mnis bem-sucedido relembrar que o §~d? _é ~e1!!pr~ 11ma org~ní ~uR~º espe-
dentre. eles-~ o greco-francês Nicos Poulnntzus, que cm cial, um cor_pQ de fun cionários cu1a funçao epr,tt1ca r uma
PouvoJ~ ~oli1tque et classes sociales (Poder político e clas- s6~ic. dê · ãtos destinados a a mortecer o confüto entre as
ses sociais
. , -. v. "B ibliografia comcnrad"")
.. propoc- um classes sociâis - antagônicas. Ora, se a f unção desse corpo
cor~ccito sol1~0 e preciso de Estado capi talista (burguC::s). es pecial de funcionários é, n ecessariamente, sem pre a mes-
~!cm do ?1ª1s, P oulantzas fornece, indiretamente _ ist o ma, não o é o padrão de organização interna d o corpo
e, na medida cm que se sente obrigàdo a delinear 0 ccm- de funcionários. Estes defendem, invariavelmente, nas suas
t:aste entre o Esrndo capitalista e os demais tipos hiscó- · a tividades (administrativos e militares), o interesse geral
ncos <lc Estado ~-, elementos indispensáveis ú constrnç.ão da classe exploradora (preservação da ~xplora'.'ãº. ~o tra-
de outros concc1tos: Estado escravista, .Es tado asiürico, batho). Mns isto não quer dizer que tais funciona nos te~
Estado feudal. ·
nhnm de ser sempre escolhidos diretamente pelos membros
~ á . o bis to~iacJor marxista inglês Perry Andcrson rc·- da classe exploradora; eles também podem, apoiando-se
c?n~t1.tu1, crn Lmlzagens do Estado absolurista ( 1974), a cm pretextos vários (escolha divina, tradição, linhage~1
histori a dos . Estados absolutistas concretos· . N a me d'd
i ·a cm etc.), se autonomear. Ou seja : o Estado, como orga111-
1·: que considera o Estado abs0Iu1ista como uma variante do zação esp ecial, pode conter, o u não, u m órgiio ~e repre-
ii..l ~st~do feuda l, acaba contribuindo, ain da que de m odo sentação direta d n classe exploradora; vale dizer, um
indireto, para a construção do conceito de Estado feudal. órgão de representação no sentido estrito da palavra,
·i .Neste pequeno livro, operamos com o conceito pou- pois num sentido lato todos os órgãos integrantes de qual-
lantziano de Estado capitalista (burgu ês). Além disso quer Estado representam a classe exploradora.
rccorr:!1~os üs noções práticas de Estado escravista, Esta~ Existe, portanto, uma possibilidade de variação na
do . as1.at1c~, E stado feudal; fazemo-lo levando crn conl<I forma pela qual o corpo de funcionários dcsempc~ha as
as l - - ·
llH 1caçoes teoncas contidas nos livros men cionados de atividades necessárias no amortecimento do confhto de
20 :Z1

classes. A classe exploradora pode, ou não, se ·fazer ouvir classes soc1a1s antagônicns, reforçando, por meios mute-
no p1~0.ccsso de implcmcntução das medidas que compõem mus e ideológicos, o poderio econômico da cfasse explo-
a _r~olmca <fr E.~·1m:o. Para cspcll.ar tcoricnmcntc cs$a possi- radora, e ncutrnlizand9 cm parte .a força numérica da
b1hdadc de vanaçao, Marx, Engels e , um pouct) ma:s tarde, classe explorada ('esta é majoritária na coletividade cin-
Lenin, usuram a :!xprcssüo formas de governo. Aqui, ndo- dida, enquanio a primeira é minoria) .
tamos a expressão formas de E stado, utilizada por P ou- Se observamos esse campo co.:nplcmcntnr e contíguo
l?ntza~, ? t.ravés d a qual queremos indicar que qualquer ao campo estatal, num momento crít!1;0 para n coletividade
tipo h:slonco d e Estado (escravista, asi6tico, feuda l, bur- cm questão - aquil o que Lenin chamava umn situação
guês) pode organiza r-se in ternamente de diferen tes modos . revolucionária - , nossu atenção se concentrará sobre a
o~ seja, pode abrigar, ou não, órgãos de representação ação revolucionária da classe explorada; tal ação, visando
direta da classe cxplorndora . Pode-se já entrever, a (Xlrtir à cessação da exploração do trabalho, implica o.:.J.l~filS­
dessa forml!lação, a importância que terá o conceito de -P cilo._M.L.limüQS_ imp.o.s.tos.....ao.. c,10 flito. _d.c...clas.scs.....pcl.o
forma de Estado no tratamento que daremos, a seguir, ao Es.tad.o.. _
tema da democracia. Todavb a situaçtio revolucionária é um estado ex-
. Mas o tratamento a essa questão supõe, também, a ccpcionul, e .üío corriqueiro, das coletividades cindidas
rntro<luç:io de um segundo conceito. Q u ando observamos cm classes sociais antagônicas. Quando tal situação n ão
o Estado de uma coletividade concreta cindida cm classes se delineia, impõe-se que. o cientista político volte sua aten-
sociais antagônicas, procuramos: a) verificar se este efe- Ç<lo para outro tipo de ação de classe, distinto da ação
tivamente desempenha, confirmando a hipótese marxiana, rcvolucionüria de classe explorada: a ação da classe ex-
a função conservadora de preservar a cisão atravt!s de ploradora, e.oro.... :V.i:i!íl.S....~.....P.<i.rJi.c.i.p~IJ. Jl!n.t.':l.'l!Ç C1.~e...Ei>J!LQ?
uma ação de amortecimento do conflito de clusscs· b) funcionll.üos__d.o.... E?J.<:).q_9,_ .9.2_J?.rgs~sso de imQ.lcmen tação d?_
apurar a qunl tipo histórico de Estado esse Es tado ~o;i·­ p.olílk!L...dc Est.~!!º. Neste cnso, o cientista político está
c rcto se filia; e) caracterizar a forma <Jssumida por esse observando a relação entre o corpo de funcionários e os
Estado. Todavia, nosso olhar jamais logra-se conccn crnr membros da classe exploradora no âmbito específico do
c~cl,u:ivamcntc sobre o Estndo (st;a função, seu tipo pr.Q..f.Csso ele defi11içãg{'cxecução da política de Estado. A
h1stonco, sua forma); ele se espraia necessariamente essa rclaç5o chamamos regime político.
para o campo sobre o qual incide a política <lc Estado, Essa expressão foi usada num sentido diferente pelo
vale d izer, a ação das classes sociais antagôn icas ( explo- cic n tistn político francês Mauricc Duvergcr, na obra chís-
radora e explorada), com vistas a preservar ou suprimir sica Os regimes políticos (v. "Bibliografi a comcntndn").
a cxplornçiio do trabulho. Poulantzns, procurando fazer de tal expressão um con-
Essa dissociação entre os dois ·càmpos 6 fruto de ceito integrado à sua teoria (marxista) do Estado capita.-
uma operação íntelcclllal; na realidade, os mesmos cstüo lista, definiu-o como a configuração da cena política, cor-
unidos. Todavia, essa operação intelectual é da maior relata à forma assumida pcl-0 Estado capitalista. Aqui,
importância, pois é ela quem revela a existência de um inspiramo-nos cm Poulantzas, no sentido de qlJC procu-
fator -- o Estado - que desequilibra o conflito entre as ramos integrar a noção de regime político à teoria marxia-
- - ----· · --·-· ·--.. -·...... - · - - ·-··--.;......;_;._:,_...;..._ _,...;.__ _,._...._ _ _-ill!!!!'!!l!l"',l!!!l
"'!'J'!!'_ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ _ __

22 23

n a do Estado, conferindo-lhe uma utilid ade específica tico, feudal, burguês); de outro, é u m modo de relacio-
demro d esse quadro teórico. Entretanto , não podemos namento, possível cm qualquer tipo histórico de Estado,
dizer q ue operamos com o con ceito pouiantziano d e regi- entre o corno de func ionários e a classe e xploradora, no_
m e político, pois P oulantzns s ugere implicita mente q ue terreno da imnlcmc ntação da política de E s tadq.
tnl conceito é pa rtc exclusivamente in tcgran te d u teor ia
e.lo EswcJ o capi talis ln. Ora, na passagem acima procuramos
1 ampliar a eficácia do conceito, tornando-o complementar A democracia como formà de Estado e
ao d e Estndo cm geral, e não apenas ao de Estado capit<t- como regime político
··lista ( bti rguês).
1 Esclareça-se finalmente que, na pcrspectivn tconca A democracia, como forma de E s tado,' implica a pr~­
l1
aqui adotada, forma de Estado e regime político não $i'io scnça de alguOLórgão gc rcprescntacàc) direta da classe
s inô nimos, nem são conceitos que se excluam mutuu ~ <:.1fP-lo.r<1dor_<,LD9__ ?_cio cJª, _9.rgnni.z1:i,ç~9 ..es t,!ltal total, mns não
mente. Corno já dissemos antes, ambos são conceitos se resume a isto. Para que haja dcmocmcia, em qualquer
1
complcmcnt4lres, na medida cm que: a) referem-se a tipo histórico de Estado (escravista, asíiítico, feudal, bur-
11
nspcctos diversos do campo político global; de um lado, guês), ~ I2Jcciso também~c tal órgfío, quando cxiscentc,
·~ o campo estalai (padrão de organização interna do E.s- intervenha de fato no eroccsso de dcfiDiçlLQ./~xccucilo .da
tado), e de: outro, o das relações estabelecidas, no terre- política de Estado. Isto é: ..n.ão...b.as.t.a_quc_o_E~tailiutlmg\lc
no da definição/execução da política de Estado, entre o \!..Clls.1..A.s~_o.i6.fo_~:_o_qçl_c~-~-º a m J.Q.9.Q~--P~- ..me tDl>r o_Lfili
corpo de funcionários e a classe exploradora; b) os dois çfas~<L«.õpjrmt.dQr.~ .. ou .o.s_.sc.u s ..dckgudos, para que . haja_
aspectos. acima mencionados, do campo político g lobal dcmocr.ac:ia__Se...tal _Ass.cmbl éia..não. lor. .e a paz_ de . in.tcr.v.j r
'! são cor relat os, passando por variações co11comita11tes. cfctivam.c.n tc ..no ..proccss.Q. d.C.~ ~SÓJ:iO.... e s.c...c~~jY.Ç.r rcdu.z.ida
:1
S u blinhemos este último ponto, pois ele é dn maior ao .. descmpenho. de _u,m_p.apcL dccru.atiYo,....a.JQfma..as.s.wn.ída
li rc l~vância para o tratamento que, a seguir, d aremos ;1 pelo Es < ~9C>...n<iP...G.. a democrática._
u q ucstiio da democracia. Ali o nde varia a for~c Estado, Acima, indicamos o "míninm..._d~f!Q..TJJ.i.Jl:.1,9.Qr co m,ilm"
.\ vari!!. s imultaneamente o regi me político. Assim,. a _-c ad;t que caracteriza, genericamente, a fo~ democrática de
.
:{
foEfil_ dc"'.'E.SJ.fü.!.9...f..orr.cw.orn:i_~ __l,l_D:L,~ç,sj!Il.°é.-.p9Íít.iç.Q: Isto ;os Estado. Agora, .cscla.rcç..a:se-quc,_aind:Ldc.ntr..a._dos limites
permite designar uma certa forma de Estã dõ e 6 regime . d~s.a..J.:Qrnrn._ dc .E~,tad.Q, .. p_Q.ç_i,çm •. X!!r.i.a~__t)}!1J.9 o grnu de
político que lhe é correlato por uma única expr~ssâo. ubrangêndíL~ o . ó.rg<l.o._9.& .. t:!::P.@~.~.Ql_<~<;~.O.. .. sJ.ir.~~.~- d a classe
Agora estamos prontos para inici ar a abo rd agem cxploradora __ quanto ..o sç.l,l... tIIC>cl.o. qc. .intervir .I!PJ.roce_g_o
propriamente dita de nosso tema. Recorreremos à multi- .<lc <ldinição/excc.qçfío.. ~ta..,p_c>.}L\i.ç~ ...Qq f.~~rn.c.!:Q. A Assem-
milcnar e controversa expressão democrachl, pára desig- bléia pode ..conccdcr ..asscnto....a..zodo..Li'ls..membms da classe
nar, ao mesmo tempo, uma forma de Estado e .um regi.me çxp.kl.m.Q.Q.Q.. ( con figu rando·sc, nesse cas o, a existência de
.po.lit.ll:o'. Ou melhor: dcmocrncia; de um lado, é um pa- uma "d~moe:riJci'1AirçJJL~ª classc~ploradora") Q.v._JlmJ.: :.
drão de organização interna das ativ.idadcs estalai ~;, cab í- .tar-<>u a abrigar alguns,. ddegqdos ou r epresetlJ.El!..!_es d.E
vel cm qualquer tipo histórico de Estado (escravista, nsiü- c.o.n.jllll.lQ~l~cxplor.ador.a. (a ''democracia da classe
24 25


~xplox:ad~ra" ~ as.swni~do, ~lcssc-casÔ;.......ll1IL.,carál.c.r.......'..'._rem.:ç- ta<lo), é necessário que os ..1!1cmbros díl classe cxplornd.o.ta
~íl..tlY.o::}. E pode in tcrv1r prcpo11dcrnntcmcntc no início possari:i__Ç..~mLm.ir .. fl.b~.r_!~~r,i~ntc S\líl jntcncful.dc: a) ,na.tli-
do processo de implemen tação d a político de Estad o ( eta- cfo~-fr,_ ..?.!!!'f:'é~_<J~._t,1J!L. Q.~-~res_~~1.t_~_ç_ã~~· do
pa fo rmal do processo d ecisório, correntemente definida proccs~~ci .. tj_g__ 9~01}i~<lo / ~~2..~-l!.~2--~~....P..~_lf.ti<:<;i.. de Estado : b)
como etapa de "criação da lei'', ''legislativa'') ou ao in'lf:>.rih1ir...U!!1-ª .<;ci::rn .!J.!reç@. - seja ela aprovada ou não
contrário, intervir co m a mesma eficácia na f ase it;iciaí pclo- ·corpo de func ionários o u pelo conjunto da classe
e n a fase terminal - "cxccutiv;:\" - do processo de im- exploradora - à polític<~ALE.~~~~ :romc~1~os de c:nprés-
pl~~entaçiio cln política de Estado (caso no qual a Assem- timo os te rmos difundidos pela ciêncw poh11ca neoliberal:
bleia age como um órgão "legislativo-executivo ", e n ão a vitalidade e ;i c[icácia da Assembléia, no seio do ".es tad o,
como um 6rgão meramente "legis.l ativo"), depende de que os membros da e~cx:eloradorn_A9.?-~
Outra forma de Estado, simetricamente oposta à de- de liberdade~ polí1icm:, como a de c~ressfio ~ pcn3-
mocracia, é a d itadura. M arx, Engels e Leni n afi rmaram, rncnto, a de reun ião, a de debate, a de constituição de
:m va n~s p assag·ens das suas obras, que "todo Est~Q.o "pÍ.Írtidos" ou "facções". A ....<:.cruLP..Qlilj_Ç_;;i_çl~m.Qf!.á ti c_u_Qn-
~~.9_1E!durn", querendo com isso dizer qu;tôdõ. E sta- si s te pQ rJ.~r:iJ_o_, __1). \.L. _Y..i..s.4 ns:i.ª..ç.f<!.ilv a de J.<!iS ll9~dadcs _nolí-
1 __

d9_i....uro..Q~g~_nismo .!?Pf-~~~çi_r ,_f al2.a.?;_de an.Jka.r...~-~;~-sr"no ticns_parn_o_co.njllnt.o_.d_o..s m em b ros da ~las5c cxpl.orndoi:a .


::i_siol~ocia_.mat..c.ríul...para..gurantiL. a. ~Ç>Jl!jnu.iUi.1~9... eia . ~;~ Advirta-se que a vigência dessas liberdades não leva,
P.l<?..rnç;,10 d<U-s.~b.aJJ.1.Q. Ora, este é tão-somente o senti do 11 cccssariamcntc, il emergência de antagonismo s no seio da
lato da expressão ditadura. Num sentido estrito ela serve classe explo radora quanto à d ircçilo a ser im pressa à
para designar um padrão de organizaç5o intcr~a do E s- política de Estado, nem à conseqüente for mação de "fac-
tado simetricamente oposto àquele abrigad o sob a exp res- ções" ou "partidos''.
são dem ocracit1: · a não-participação de qualquer órgüo de :f: p o ssível que uma certa plataforma para a política
:cprcscntaçiio direta da classe exploradora no processo de de Estado conquiste, durante um lapso de tempo,_._apoiç
implcrncntaçiio da política de Estado. Quan d o isso ocorr e, unânímc_{..<L4-.q!J ase) no seio d a dasse explo rado ra. Nesse
pode-se dizer que o corpo de funcionários autono meados caso, a...ccna.politic.o.._\l~ffiQ.Çifu.iç_<w~su m_ç__11rri;Liçjs.~o con-
coage f ormalmeme, na medida cm que monopolizn o pro - s.o:u11QL.abrlndo_pnuca_c.spn.ç:o_parn o plurc!.1!.§1!.15.L( faccio-
cesso d cc.:is6rio, a própria cl asse explo radora; mas isto nüo _nal, p;i_tjjdá rio). Com es ta ai;scrção, deixamos claro que o
a imped. e de desempenhar atividades destinadas n ~oarantir eixo de nossa c.ldinição de regime político democrárico
o seu mtcrcssc subs1ancial. niío é a efetividade do "pluralis mo partidário" ?U da "com-
M as a c!,cJ:noc ~acia é também um regime pol ít is_o. petição en tre forças c ivis", m as o elenco de possibili~a_dcs
Corno tal,_ ela consiste na configuração da cenã polética obj .:ivas abertas pelo E stado, na sua forma dcmocrat1ca1
correlata .a forma democrática de Estado. Ou seja, parn à ação organizada - ·- divergente ou consensual - dos
que um E~~ (escravista, asiático feu- membros da classe exploradora, com vistas a intervir de
dal,_ burguQ~) ~r:1n..o~<! .(intcrv~-nção fato no processo decísório estatal.

~
.
.
,
efetiva do orgfio de representação direta da classe cxp lc)- Procuramos acim a recon s truir os conceitos de demo-
'. rador:-i no processo d e im plcmcntnção d.'? política de Es- cracia e de resime político, de rood_o a poder integrá-los
..
:t
26
27
à teoria marxiana do Estado. Contudo, esses · conceitos,
. difcrcJlciamo-nos parcialmente da-
tais como Coram aqui expostos, não se encontram nos dc Duvcrger). Todavia, . . abordàr o rcl'imc político
q ue se lumta n ~ e>
textos de Marx, Engels ou Lenin. Este último, nos seus quelc autor
textos políticos, sempre sublinhou o caráter de classe da . . -b gucs • - na me d'd· 1 a
cm que propomos um
dcmocrno . dco- ur · e pol1t1co .. d cmocra't1'co cm geral, com-
forma democrática de Estado (uma "democracia pa ra a conceito e rcgim át'ca d e E scado
classe exploradora"), bem como postulou a cxistên<.:i ;.1 de plcmentar ao de fo r ma dcmocr i _ -~ licidadc,
diferentes tipos históricos ele democracia (escravista, fcu- Muitos leitores se surprcendcrao com ª,·~~ ~e demo-
dn.I, bt1rgucsa). Mas não chegou a conceituar a forma ." que lhes parccc~a e
. ·xccssiva de nosso concc1
dcrnocrótica de Estado cm geral, embora as suus própria~ , ' , termos m ais característicos
cracia: dele cswo a~s.entc~oº~o "líbcrdndc", "igualdade"'
i
i
an<íliscs políticas requeressem esse esforço, jnmnis rcoli-
.zado, de conceituação. ·i1 do discurso dcmocrottc~, . . •" " ' . uilibrio de po-
: " 'd 1 " "constituc1onahdadc ou cq .
legal!. ac
deres" Nãoe ' estaríamos, a• vista . d.isso, correndo o ns<:o de.
Lenin menciona as variantes históricas da demo-
. ?
cracia de classe exploradora (democracia escravista, feu- b .11-1.,,..r a dcmocrac1a. ,
d al etc. ). Ora, só se pode qt1alificnr e classificar aquilo an ... l '··" ,• -· de resposta, devemos. r cconhccer .. que . prc-
e
que se conhece pela via dos conceitos (como é possível .f\. guisa . b. ·t' o · e pelo menos msso, o
cisamcnlc esse o noss~ o JCt~vo 'da 'ckmocracin pelos mar-
concluir que uma democracia de classe exploradora é, . ~ dado a ques .:l '
por exemplo, burguesa, se não se sabe previamen te o tratamento
. que e ' daquc
. aproxima . 1e que li1 e é dado pela corrente d
que é urna d emocracia de classe exploradora?). Além di sso, x1stns se . · J h Schumpctcr __ a utor e
elitista neoliberal de oscp . (v "Bibliogrnfia co-
.:C:-c~_,sustcncn que, c.om ..a._tr.ansformação_da .colc.ti~L~~--­ . 1- 0 e dc:m ocracw ·
C!!].did.a_-~-m .~1. i;tssç;; soc_i(l_i_~-- ~~taS.9-!:Ü~?:S_J!..~!!!1.._colc.tivlda.dc Capitalismo, socw zsm , "d cs atuais. Os adeptos
, .d ") - e dos seus sc_gu1 or , d
sem dnsscs socinis ( socialismo), aumentam a .cxt~r)sfio menta a . d f' 1írem a d cm ocr"c·in como o meto ,o
desta corrente, ~o e 11• • º vernamcntni s feli..!ill atrav~s
"
e -·õ cra1~ . <ie . d.~;c~;~~i~i;;,~~;~-- <la· ·&m:oc-;;e:-i~~--- com cssi;-
afir.~açti~.ele escá su·g~~i;~d~ 1njpiícú~-:;'1Ciiteq~c já existe
de seleção de. lid~ram; as
. - eleitoral tam cm se
ºº b~ m ost ram pouco e.xi-
,
da compctiçao ' - Esse "realismo poh-
um concei to prévio de forma democrática de Estado cm g . cssão d emocracia.
e ntes com a cxpr f . m ~, c:.:pressão demo-
geral. Nosso procedimento, aqui, consistiu cm segu ir essas . .- 0 de con cnrc <. •
t ico" revela a m tcnç.t . ··1·sc' dos Est ados con-
i
i ndicaçõcs pníticas de Lenin, isto é, proceder à clabora- .
cracia uma e ic,1c1a p
r· r . a rt1cular na ana 1
f
.
das clássicas pro-
ç<io de um concei to de forma democrática de Estado cm
. . .. :--_- a_--·~---
dc se ri astarcm '

l
geral. ç· retos • bc'l" - > , .. .... como '"d l dcmocratico · · " , cm geral ·
de dcfmJ.ÇaO do i ca .
pos.tas.... ---··-·-··· - do de concrct1zá-lo. ~
:j Quanto à expressão regime político, ela nüo tem
onmsas quanto ªº, .mo_ . tas e schumpctcrianos tem,
;.,~ .j
maior relevo em Marx, Engels e Lenin, já que as ex- Cientíslas poltt1co::; madr~f1s < as algo cm comum:
( ; pressões forma de governo e forma de Estado se destinam, das suas i erenç - ,
,:;: .! portanto - a par , , r ;:i expressão democracia para
·Jc_::..
d nos três a1,.1torcs, a cobri r de modo indistinlo o campo ambos intent am recupera Proct1ram, desse modo,
ii:i político global; na verdade, fomos buscá-Ia cm Poulantias , 1. d Es'ados concretos. .
a ana 1sc os \ 'd 0-10 ,,05 ( libcrnis, dcrnocra-
'f (que, por sua vez, refletira criticamente sobre ns an<íliscs 1.f' veto que os • e ~ , t·
· .:: dcsqua ' tear o . - da expressão na ana tsc
tas radicais etc.) tmpocm ao uso
·..
18
29

pol ítica concreta, por considerarem que é incomensurável


a dis tância entre o "ideal democ rático" e a s p rosaicas A democracia como programa
características dos Estados concretos.
A própr ia teoria marxíana d o E~s t a do . .só . se. com plc~
T odavia, o fa to de que se empregue, numa perspec- l't' co. soc1alts ta. Por::i
lava a través de um programa po' t. . 0 . derradeiro
tiva marxista, o te rmo democracia pa ra qua lificar u ma
Marx e Engels, o capitalismo tendia a s_c~ o
forma d e Estado e u m regime político cabíveis cm q ual-
A •

quer tipo histórico de Estado, pertença ele ao passado tip<» de cole tividade cindida cm classes sociais ant:gom~~~~
A luta revolucionária do proletariado co1.~ t ra da urg~c~o-
(Es tados pré-burgueses) ou ao presen te (Estado h t1rgu2s). . · · .:- 0 de .um
rn1o significa que se esgotem aí, parn os man:is tas, ~is dcvcri<t resultar na co11st1tu1ç.1 . . Esta o opcrnn·,
possib ilidades. de uso da c.,pressiio. Essa corrente teórica -socinlista , cuj<.1 ~ ar.efa central . c~ r~~lir~~d~~~ocx:,rox;~~~
critica o utopismo, vale dizer, as p ropostas d e reorgani- a burgucsi~ , soc1ah~a~ os a~c1~s dcsa p~rição das classes
zação das sociedades humanas cujn inviabilidade prática ~~ modo abnr o camin
. .' - ."
° P
Dní o car{1tcr .mi generis esse s a
d E t do
atestada pelo seu silêncío quunto à cstrat~s!.~_g·-~.~?s meios soc1a1s antagonic ,is. ·. a "elevação
, . . . tcmt>e> q· ue consagrar1 ,1 < •
de <içáo ncce~E~1rip_s .. à..co.ns.c.cuçã.o...çJC.s~..-:.Õ.b.je.tivo. Todâ\·in. prole la no: ao mesmo
. 1 à . ndição d e classe o mm , n
d· · . a te" criaria
'
11cl11ium-· ii'íá-~xísta nega a legitimid ade t eórica do procedi- d o pro lct:::i na( o co
, . ond içõcs de possibilidade de sua pro~r ~a
· " desapariçiio
' d
m en to intelectual p rosp ectivo; ao contrário, considera com o .is e ·t" ,. ) das classes soci ais antagorncas, o Est a ·-º
ta refa c<:ntral. do estudioso das sociedades. humanas fozc; (com n ~x i~5oi1(amortcccdora do conflito de cl asses - nao
_ org;m1zaça • . 1 )
pr,9p1.i?stíaJ.s, apoianclcMc ~n feitura 'ci ~~. t endê ncins · a.t.uais teria mais qualquer função a dcscmpen rnr .
e levand o cm coma a possibilíd ade de uma aç fio coletiva Anós a expcrn:: .• nc1a• rcy_Q..1~IÇ!Ç
· ~~----
1 ,..ria da Comun a de PJ!.;
--· · .. ---·~· .
. •.• !:'_ __ _ . ···- -- E ·.. as hçocs m1
transformuclora, já inspirada pelo próprio procedi mento · . fl871) Marx e ·ngc • ·-ls sistem atiza
· ndo ·-
marxista de detectar tendências em c u rso. .n s .\.._ ··- , . . ial desenvo lveram a su a tconn
nís trad as pela prat ica soe " lítico socia- ·
Os marxistas procuram descar tar as utopias e se do Estado e aprofuIJdaram o seu programa po . d
g uiar por um programa político, que é o lugar onde se 1"15' l '
Desde .
então, sustcnwrn m que.• 0 prolc.tana
. o br.evo-
processa a fu s::io ccitrc a ciê ncia e a política; ou melho r, 1 ~- •• -~ deveria após a vi tória políti co-nu hta r so. r.e a
consiste na metamorfose da análise científica numa placa~
uc1on a~1 . . '.
burgucs m const1tu1 r l,lm_~s.llL9.- .O. - - -
d d t;:ido d~.-carac tens t1cns
~
-
- • ._... . . ..-.. · ~----.-~ ... .
fo rma de nção coletiva transformadora. E é ncsic novo- ·
·--- · io·n-~i's inéditas e es tnbelc~.L~....!.1-~~~
ornani~~c:._~.-.. - .•- -. - domman
-· t e J.t~
i"éírenõ··.:.:..::-õ·ãii-s·~Q'pchíçP.Cs ·.-~r.~~~2:!.~is, ~r.9s12_si;.tL"'.'.~L.~ ......
rncolctanado) e
.. ~
e l ac1onnmen to c n tre clas~c . ~-----:--;- . · · .... - ...• ·---:..-- i
r.--·--:--··--;:;......·..:·;·-····1·-o·'·--;õde func1onun os cstatms, ame a
da elaboração programútica - qu e os m<Úxistas rcintro- organ 1 7~tnta. cor1 .1 d cio
cfüi.cm ·a·.. ~·xpicsi1fõaêíi1ôcrada, depois de a terem usado - -·-:-- d 7-. ·cr perm anen temente c ontro a o p .
~ubs 1 s tcn1c, C'vcria_ s . d trabalhadores manuais
como um instrumento, entre outros, na amm se das s uces- proletariado: est~rn1_ a cargo os h . demissão de fun-
s ivas modalidades de do minação de classe:. Isto é: agorn a nomeação , :.ival!açao de dcscmpcn o i;_ • ,nicadas
e í do Estado scnam s11n1 • •
et expressão democracia, dotada de um novo sentido e
cioná rios. . ~~ tar~ ~~u caráter especialidades; desse
ck
de uma i10vn função, aparece no pensamento m a rxista de modo a per ~r · , :- de todos os traba-
como _sI..cmç..ntn._Q~~@..ma .J?9l.(~$o. modo tornar-se-ia poss1vel a rotaçao . . "mi-
lhadores ' manuais por essas ta rdas , e abn r-sc-rn o e..
30
31

nho. '?(.'Ira a total cJcsestntizaçiio das tarefas administrativas


e militares ( dcsnparição do Estado) . No PE<?.gE_am_a ..P2i_í~.iS.~ 2.9..~ª.l.~~~~. o tcrm,o ~lemocracia
não mais ·serve parn designar variações poss1vc1s da orga-
' . Quatro décadas mnis tarde, Lenin observava, ao rc- nizac;fio cstotal e do regime político. A organiznção estat~t l
flctrr, ;.m. L?':'.1<11 ~t la Révolutiorz (O Estado e n H.cvol ução socialista-proletária e o regime político socialis,t~- proletár~o
- v. B1bhogrnfia comentada"), sobre cssns formulações, S :-10 i11 variantes isto é são dernocrático-prolctanos ou nao
que o novo Estado proJet~írio, além de concretizar a dira-
' ' ; ' p

são socialista-proletários. Assim, democraciQ serve, a ~1ui,


dur~ ( domin<1çã o ) do proletariado sobre a burguesia, de- para designar a p róp ria essênc ia do Estado e do regime
vera se o rganizar com o democracia proletária. Usava essa político socialista-proletários. _.
cxprcss<i o para designar, sinÍct icamcnte; · n"s' características ' T am bém, num segundo nível, o problema pohttco
que, seg undo M arx e Engels, após 1871, deveriam assum ir sociali.'>ta rompe com o primeiro uso (marxista) da ~x:­
o Estado proletário: controle efetivo .dos.funcionários pelos prcssão. E:: que demo cracia prole1ária serve para desig-
t~·ab.-ilhadorcs manu..Q..i.s,._.i:.9.tatividadc no .dcs~mpcnho (fos· ú1- nar não só o Estado socinlis ta-prolctário, mas também ,'l
rcfas aclmif1ist_r,a.~.i.~as e .militares, estabelccimenc~ cio :.
verno .da n1aiQLtü'. '.
::io::
· ··--.. ········· ......... · · · componen~e nào-esrau!l da domí nação d e , cl~sse prol~ta­
rin, ou sep, a nccessidndc de que, no propno momento
Agora perguntamos: será viável rel o mar hoje, no cm que se implanta o Estudo socialista-prolct~1r.io, c?mccc
quadro da lcoria marx.ian a do Estado e de um programa a descstatizaçiio prog ressiva das tarefas adm m1 stra.t1:as e
polít ico socíalis1a, a c.xprcssiio lcninista democracia pro- militares. Nesse nível específico, democracia prolewria de-::__
leuíria? Nossa resposta é afirmativa. l'io qunrto · capí1ulo signa -·-~---(!~~~-~~- nf~o- cs~~t~~: a gestão - de ·-masSã;~fêtiVaõa
d e ste líwo busc_n remos, à luz de ·uma a val iaçiio prévia pelas organizações de traball~adorcs de cnda u01dadc. d~
de grandes experiências históricas, como a Revo lução produção particular e do con1unto ~o nparclho produtivo.
Russa, a Rcvoluç~o Chinesa e a Revolução Cultural, e o desempenho direto, pela p~pu~a~~o ~~m~da, das tare~n:
com o a uxílio de lc~tos marxistas recentes, estabelecer de defesa nacional; a resolu çao prc-Jud1cil1r1a, n os pr~pn~s
..... uma ddiniçilo o quanto possível precisa de democracia locais de trabalh o (fábrica, faze nda) ou de l~<ibttaçao
proletária. (ba irro, quarteirão), dos conflitos interindividuílls etc. ·
Metaforicomcntc, pode-se dizer q ue os trabalhadores
Todavia, é indispensável antecipar, ainda nesta in -
rnarrna is, através do progr ama político socialista, ro~1p.em .
trodução, um aspecto d essa definição; fazcmo~lo com 0
com 0 u so que os intelectu a is situados. d e ntro do~ Imutes
o bjet ivo de escl a recer certos passos m e todológicos e m que
ideo lógicos pcculiurcs às classes exploradoras (Anstóteles,
se desdobra nosso trabalho de reelaboração conceituai. 1ia Grécia escravista Mo ntesquieu, na Fra nça fcuda!-abso-
Ao inco rporarmos, nes te texto, a cxpressà() democracia ' . "fo rm~
Iutistn ) sempre fizeram do expr essão democracia:
ao programa político socialista, rompemos parcialmente
de governo", "forma de Estado" .. Esse ~~do de. u~ar e
com o uso que nós mesmos fizemos da express5o: a dc- parcialmente retomado pelos ci~n t~stas polt~.1cos ma:~1.stus,
rnocrncia como uma das formas possíveis de Estado e quando se trata de detect ar vanaçoes no sc10 dos Estados
·de. regime · político, em qualquer coletividade cindida cm cm (1l tima instância a serviço de uma classe exploradora.
classes sociais antagôr1icas.
Nesse sen tido, os marxistas são tributários dos grandes

..,__...._, ,, "
< '

32

prnsadorcs políticos do passado. Todavia, no n1ome11to de


elaboração do programa político socialista, os marxistas
veem chegado o instante preciso cm que toda a sua fk,xi-
bilídadc (a pos!ura dialética, àa quai Lenin, na sua ela-
boraç;io político-cstracêgka, nos dú os melhores cxcmp!os)
2 .
deve-se ex1ravasar. A expressão democracia é, entiio. sub- A de1nocracu::i
metida a uma tors5o scmfintica (de uma variante do Es-
t<ldo ;l essência cio Estado; do Estado no nüo-Esta<..lo, 011 no pré:-capitalis1no
<intí-Es tado), justifidvel por duas r.nzõcs: n) pnlitico-
-pr«itica: o lermo democracia ainda possuí, por motivos
historicamente explicáveis, eficácia política na arrcgimcn··
taçiío rcvolucion;íria de massa, não devendo portanto ser
abandonado por razões de ordem estritamente intclcctu<1I ;
b) tt:.6rico-mctodológica: na opcraçdo de remanejamento
de significado, muito se destrói, porém algo se conserva
(o que, alí~ís, se relaciona com a persistência de sua cfi- A democracia na História
C<icia política), nfio sendo, ponanto, nem mesmo por
r::izõe~ exclusivamente de ordem teórico-metodológica. . .
No primeiro '
capítulo definimos a democracia como
' . !' f ·o cabíveis em
acon~cllwdo o nba ndono da cxprcssiio . Mas o que se con- uma1 onna
f d Estado e um regi me po i H.: '
t'po e h1s16-1co
.-· . d e E s. t·a do· Além disso, sus tcntn-
quu. qu~~ <~ cxprcss~o democracia pode gnnhar um novo
serva e o que se destrói nesse processo de incorporação
mos. ~
crítica do termo democracia ao programa político socialis-
. . d - . nesse caso. ao programa po-
ta? B o que veremos no quarto capítulo. sign1f 1cado, incorpor,111 o se:. ,· ,;- sobre o nosso tema
lítico sodulista .. w~<is uma cxpo.!>1ç~~to. dessas duas tarefas.
niio poderia se J1r111tar ao cumpmnt.: . . . . . r .
0 tema da democracia. o c1cn t1 st'3 po ltlCO
Ao tratar ' . ' • •· d tipos históricos de
guc opera com a teoria m<\.rx1sta o 5 . definição
f loo mrus que propo1 uma
Estado deve azcr a "' , . d E t do e de cc(Yimc polí-
d f 1 1 dcmocnt1ca e sa . º
gera l e on~ ~ ~. d .11 mais que sustenta r a
tico dcmocratico, ou ,lln a ' ~o ·, r t· Os próprios
os~dbilidadc de uma dcmocrnc1a SOCl<t is ~- . , o
P . I' . . liberais se sentem obng,1dos, malgrad
cientistas po ittcos . . ~ sua dcscon~ídcração para
sua tendência ao formalismo : . ' ·- . . ·~ a "demo-
. a histórb das formas pol1t1cas, a d1:rn11gu1. . .
<.: om .. · · . " ln "democracia . moe1ema " · Ora' ' os c1cnt1s-
cracta antig,i t ' . . • - mais fortes para s~
rns políticos mardx. ist~- t~~~cr~~~~~: histórica das formas
lançarem ao estu o a
. . ..
..
rT
;
;
.
:

34

dcmocr;íticas de Estado e dos regimes político.~ dcmocr{t- feudal) são semelhantes entre si, e radic<ilmcntc diferentes
ticos. Ou seja, se estes incorporam a teoria dos tipos de do Estado burguês.
Es1ado, correspondentes a formas diversas ele exploração Antes de passarmos 1t caracterização da uniúadc exis-
do trabalho (relações de produção), recebem implicita- tente, num certo nível, entre os diferentes Estados pré·bu:-
mcncc n incumbência de responder a uma qucstfio: é pos- gucscs (escravista, feudal), dcvcm~s csclar.cccr que :_xclu1-
sível detectar variações, ao se passar de um 1ipo histórico rcmos de nossa demonstração um tipo particular de Estado
de Estado pa ra outro, na forma democrática de Estad o e
pr~-burgués: o Estado despóri~o (o_u asi.~ític~~, c~.rrespo~­
no regime político democrático? Ou melhor: é possível, dcntc às relações de produçao ditas as1at1cas , domi-
m antid o o respeito a uma definição gcr;.il de d cmocrnci;i, nantes cm colet ividades como o Egi to e a !ndia unti~os
conceituar a democracia feudal, a dcmocrncin burguesa ou o Peru incaico. O modo de produção asiático consiste
etc., C.'.'lda uma dchis correspondendo a um tipo histórico na cxplornção dirctu de comunidades camponesus pelo
de Estado (feudal, burguês etc.)? próprio corpo de funcionários do Estado; nele, a expl?-
Respondendo a essa pergunta, diremos que, para os ração do trabalho se processa fundamentalmente pela via
cientistas políticos inspirados pcln teoria dos tipos histó- tributária ( pagumcnto de rendas a título de · impostos), e
ricos de Estado, essa tarefa é tcoric.-imentc coerente; con- a classe cxplorndorn nfio é outra senão o conjunto dos
tudo, ela ainda está parn ser cumprida. Poulnn rzas, cm funcion5rios estatais.
Pouvoir politique cr classes sociales, procurou construir o O Estado correspondente a esse modo de produção
conceito de Estado capitalista; nessa med ida, tratou exclu- <issumiu, comumcntc, a forma ditatorial ( dcspotiss:io n:~­
sivamente das variações na forma de Estado e no regime nárquíco); contudo, a bípótcsc de uma "d~mocrac1a asrn-
político cabíveis nos limites do tipo capitalista de Estado. tica" não é tcoricnmentc desarrazoada. Deixamos de cxa-
E nenhum autor tentou, partindo da plataforma teórica min{1-la sistematicamente aqui; a nossa dificuldade pessoal
geral contida nesse livro (tipos de Estado, formas de Es- cm comprová-la historicarricntc (as nossas leituras sobre
tado, regimes políticos), construir o conceito de democra- 0 modo de produção asiático só nos levaram a detectar a
cia escravista ou de democracia feudal. existência pregressa de Estados asiáticos despóticos) c_o ~1-
fcrc à abordagem dessa questão n feição de um excrc 1c10
De nossa parte, reconhecemos a rclévância teórica
intelectual pouco adequado às caracterís ticas próprias de
dessa tarefa. Todavia, não poderíamos, neste pequeno livro
um livro introdutório.
introdu tório, seque r tentar (e s ublinhamos que se trataria
de uma tentativa) desempenhá-la. Assfrn, propomo-nos, 079323
neste capí1 ulo, executar uma tarefa mais modesta: cscabc-
Os Estados pré~burgueses e a democracia
lcl:cr um contraste entre as democrncias pré-burguesas (es-
cravista, feudal) e a democracia burguesa. E fú.Jo-cmos Passemos, cntiio, à análise da unidade existente, num
com base ~ia constatação de que, num certo «spccto - certo nível, entre os demais Estados pré-burgueses (cscr<~­
relevante para a carnctcrização das formas de Estado e dos vi sta, feudal). Em que consiste tal unidade'? Nesses dois
regimes políticos - , os Estados pré-burgueses (escravista, tipos de Estado, o corpo de funcionários se organiza se-
.-...
rr
1
.
.

36
---- 37
g~rndo urna m.esma norma: a interdição, consagrada juri- Assim, produrorc:-; diretos que prestam sobretra.Q.alho
dic_amen!c (lei ou costume), do acesso de membros da sob coação físicii. ou' 1iiorol exercida por um terceiro não
classe explorada fundamental nos cargos do Estndo. Nesses têrn ..reconhecida a autonomia dÜ·· ·süá. vonÚ1dc; rião ·iJOd~n1;·
Estados, nenhum integrante da classe explorada funda- porta1~i(.); ·ser funcioníÍrÍOS estatais, de quem se·
exíífo:' no
mental pode ser funcionário estatal; seus membros podem processo de implementação d;1 política de EstadÔ~ -cc1:tas
ch~gar, no. m~x.imo, ~1 condição de serviçais do.s vercfa·· manjfç!>iaÇõcs da vonta<J.~. , ..çpmo.. a .. capac;id<1dc.~ Q.fi .IfüifaY-
deiros fu~cior~ano~. ~css'.1 condição, nüo ocupam um posto inic.:iath;,~5,-·ô··-;.cnso de responsabilidade ~!L- Isto 6: se os
na orgarnzaçao h1crarqu1cn cstau1!; mantêm c~tril:.lmcn1c t rabalffúocffcs"·ri:Yõ-··siíó 'fcconhédâos ····éo-mo cilüidiios (e,
urnn relação de dcpcndênciu pessoal com os funcionários aqui, referimo-nos apenas à expressão mais elementar da
<t que servem. Em sumn, cst<Í abertamente borrada a cidculania: a sua dimensão civil, pré-política, consistente
entrada de escravos no corpo de funcionários do E~aado na capacidade jurídica geral), é !6gico que não possam ter
cscrnvista, assim como a dos servos, no cnso do Esiado acesso it condição de f w1cioncirios éle Estado.
feudal. Podemos, de um. ponto de vist<i analítico, distinguir
Nüo é por umu coincidência ca:rnal que, nas coletivi- unia segunda razão para a íntcrdíção. nns coletividades
dades cm que predomina um ou outro desses modos de escravistas ou feudais, da entrada dos membros da classe
produc,;üo ( csc1:avista, feudal), proíbe-se a entrada dos cxplornda fundamental no corpo de funcionários estatais.
mc1~br~s _da class~ explorada fundnmcntal no corpo de Uma eventual autorização i1 entrada de escravos ou servos
f~mc1onanos estatais. B sob coação física ou morai, cxcr- nesse corpo de funcionários não só os incíwria a reivindi-
c~da por um terceiro (o proprietário dos meios de produ- car o reconhecimento da autonomia de sua vontade noutras
c;ao). que o homem destituído dos meios de produção esferas (como a esfera da produção), como possibilitaria
prcstn ncss<:s modos de produção sobrctrabalho a outn:m. o uccsso de uma ou outru dessas classes a recursos materiais
Ora, se esse homem participa no processo de produçiio sob (armas, dinheiro, prédio)., que seriam de grande valia
coaç<io, is to <\ comra a sua vomade, seria contraditório rc- na luta contra a coação ao trabalho. Nas coletividades
con hcccr <l legitimidade das suas nrnnifcscac;ões de vontade dominadas pelos modos de produção pré- capitalístns, nüo
noutras esferas da atividade social. Ou seja: se é vedada são a fome e o frio - elementos impessoais, naturais -
ao J1omcm que trabalha a pnítica de atos de vontade no que coagem o homem, dcstítu ído dos meios de produçiio,
âmbito do processo de produção, é perfeitamente coe- a prestar sobrctrabalho a outrem; é a coaçiío física ou
rente . qu~ ~e ·.lhe negue a capacidade genérica de praticnr moral exercida por um agente humano perfeitamente indi-
atos de vontade, a sua "liberdade" como "pesson huma- vidualizável (o proprietário dos meios de produção) que
na". C aso tal capacidade lhe fosse reconhecida tornar·sc- o leva a fazê-lo. Nessas coletividades, a classe exploradora
-i a mais difícil jusrificar a interdição das suas' manifesta- não logra ocufwr a prestação do sobretrnbalho; propõe
ções de vontade numa esfera particular (processo de pro- somente justificarivas pura a exploração do trabalho (os
dução). Nçssa hipótese, estar-se-ia, portanto, contribuin::.. escravos devem prcstnr sobretrnbalho porque são estran-
do - nindu que involuntariamente - para a revolta do geiros; os .servos devem trabalhar pnra a nobreza guerreira
trabalhador contra a exploração do trabalho. cristã porque esta os protege dos infiéis smracenos ou cs-
38 l9

c;rnd innvos etc.). Nesse contexto, não são grandes as demo cracias pré-burguesas, os membros da classe explo-
i lus,õcs da classe explorada. acerca da sua condição (em- rada fundamental não são cid adãos, do ponto de vista
bora a sua passividade diante desse estado de coisns n ão civil ou político; não. _podem se fazer representar dircta-
possa ser rompida todos os dias); é, p o rtan to, extr ema- m.~.n~~---l?E__ _p_r._o cesso d_cci s4-dQ_-.Çs~ªt.~1;· rfom ..se · o"rgaüiiar,
men te m riscado perm itir que os seus membros ponham ns através de p artidos ou facções, com vistas . à_i.O.t(.Q.~_u_ç~~ ..c:i:C.
m ãos sobre os recursos materiais do Estado. rcprc ~c..l!.\.ª_nJ.~s__diretos- no ..seio.. do_.Esta.do .. Nem por isso,
Uma vez qualificada a similaridade' entre os tipos entretanto, a c[assc explorada fundament nl deixa de in-
e scravista e fcud<il de Estado, podemos Investigar a simi - fl11e11ciar _o processo decisório estatal · e a luta partidária
laridade entre a dcmocracía escravista e a <lcmoc raci ;1 ou facciona!; funcionários, delegados e líderes partidários
feud al. Se nas coletividades escravistas ou feudais os <levem, ao formular as suas diretivas de ação, levar cm
membros d a classe explorada fundamental sequer têm re- conta as ações passadas e as reações futuras dessa classe.
conhecida a autonomia de sua vontade (a dimensão civil
da cidadania), é plausível que nilo possam estar presentes,
por pessoa interposta, no órgão de representação direta
da classe exploradora no seio do Estado, e que não pos-
A democracia antiga _____ ,,_._....-,,..-

sam agir, através de partidos ou facções, com vistas a Devemos agora fornecer alguns exemplos históricos

li
~-: .
organizar sua presença na Assembléia, onde se alojam re-
presentantes diretamente escolhidos pela classe cxplornd ora
(dimen são propriamente política da cidadania). Nas de-
mocracias pré-burguesas, assim como os membros d a classe
de democracia pré-burguesa; para tanto, exporemos bre-
vemente as características gerajs de certas democracias
antigas (escravistas), bem como de certas democracias
· medievais (feudais) . Fá-lo-emos movidos por três obje-
explorada fundamenta l não podem se converter cm fun - tivo~: a) testar a operacionalidade de nosso conceito de
cionários de Estado. também não podem indicar repre- democraci a com o forma de Estado e como regime políti-
sentantes para o órgão estatal cm que têm assento os de- co; b ) evidenciar a unidade exi stente, nu m certo nível, ·
legad os d a coletivid ade, nem se organizar partidariamcntc en tre as d iversas democracias pré-burguesas (escravistas ou
para atingir esse objetivo. feudai s), igualmente contrapost as, nesse plano, às demo-
A especificidade das democracias pré-burguesas, com cracias burguesas; e ) demonstrar a reduzida operaciona-
relação às burguesas, não está em que a política de Estndo lidade de certas definições modernas de democracia: aque-
rcsultnntc do processo decisório estatal seja, nas pdmciras, las inspiradas pelo individualismo filosófico, pelo liberalis-
se mpre fav on'ive l aos interesses gerais da classe explora- mo ou pelo jurisdicismo constitucionalista.
dora fundamental. Afinal, também nas democracias bur- Comecemos pelas democracias antigas, implantadas
guesas o resultado do processo decisório estatal é sempre em coletividades nas quais domina o modo de produção
este. <?,__9~~ diS!Ü!_gU..~-~H>_çl_g:_!_ll.9cracias pré-bt!_[g.t..w..fül~.--das_ escravista como, por exemplo, na Atenas dos s6culos V
~~!.g~~.:'i_'~:'.'_:~~-[~~nde simplicidade dõpiõCc-;so decisório e IV a.C. e na Roma dos séc11los II e 1 a.e. A dcmocrn-
esta(~~...•:. da cena j)õlíticanãs·-·priirieíl"ãs-;-pC?.r o·eoJlÇãó-~1 cia ateniense é freqüentemente apontnda como o melhor
e~~e cC!°~!5fc~â~~~~:.~cs!(t1~ _esf.§.~~.s ..~~-··-~egundns. . Nas exemplo histórico de democracia. Os estudiosos que chc-
. ....
41

gam a .essa conclusflo recorrem, na análise histórica, a um ncscs pobres, artesãos e vcndeirns integravam, lado a lado
pro~~d1mc1.lto metodológico radicnlmcntc distinto daque le com os senhores de escravos, a Assembléia (Ec/ésia). To-
aqu i sugerido, ou seja, a nalisam isoladamente certas insti- d av ia, a p;.1nicipnçáo d as classes ligadas à pequena pro-
tuiçõe~ d~ Estado, deixando de lado o modo glot>a l de duç ão na Assembléia não significa que esse orga nismo
orga,mzaçao <lo cor po de funcionários, a política ele Estado e stivesse a serviço dos seus interesses profundos. A Assem~
~ a te mesmo as relações entre ns classes sociais. bléia jamais se fez porta-voz de qualq uer igualitarismo
. Aq~i, tomaremos o cam in ho oposto: nosso ponto de radical, nem dirigiu utaques à propriedade fundiária ou
pnrt1da e a constatação de q ue o Estado ateniense é um a o grande comércio. Ela chegou, no m áximo, a autorizar
I;,s.tap.o .csc cavista ..ou •.. mais ..a inda, dii{ilamem7:- ~-s~ra ~ista. a distribuição', entre essas classes, dos frutos secundários
De um. lado. ele garnntc a conservação do cs'cravismo, .. ao da política imperialista aten iense - isto é, os bens pilha-
determinar o cumprimento de leis que consagrn;n certos dos du rante as guerras. Mas essa política gerou, simulta"
h orncns como propriedade de outros; de outro, ele se em- neamcnte, outros frutos; vale d izer, a ampliação incessante
penha n~ .descnvolv!mento do escravlsmo, ao implementar <lo es toque de cscrnvos (p risio neiros de guerra) em Atc-
uma po~1c1ca guerreira e expansionista, que ~. s imultanea- 11as. A conseqüência principal da política i.;xpansionista
mente, instrumento de escravização. Por isso, não 6 es- ateniense n ão é, portan to, a distribuição dos despojos de
t~·ar1ho que, nesse Estado, os escravo s não sejam reconhe - gucrrn entre as classes populares, mas a ex tensão contínua
ci dos como pessoas, nem possam ser recru tados para 0 das relações de produçüo escravistas c m Atenas. Nessa
corpo de func ionário s (embora possam trabalhar como medida, a Assembléia age, fund mnent almcnte, a favor dos
serviçais d os vc.:rdadciros funcionários, nas a tividades admi- interesses escravistas. Esta relação objetiva se caracteriza
niscratívas rotincirns). até mesmo quando a política expansionista ateniense faci-
;:
Por essa via, chegamos à característica básica da lita a conversão de certos membros das cl asses populares
.j
democracia ateniense dos séculos V e IV a.C.: u enorme cm proprietários de escravos. Afinal, a mobilidade social,
ii massa de escravos - e ntre sessenta e oitenta mil - não islo é, a circulação dos homens pelas diferen tes classes
pode indicar represen tan tes para o organisrn<l - a As- sociais, não abala a existê ncia da e strutura. de classes. Ao
sem bl.êía - a_!i.ªy_q_s ...c:lo ...qua.L o .. conjunto....dos. ..lu.miens .•li- contrário, ela é um poderoso instrumento de estabilização
'/ d a dominação de classe, j á que gera. entre muitos memw
vr~~- , ~D-t.~_ry!!..m...cíc.ti'l.imente- no... processso ..de .. ocíinição...,Çia
po~1~_1 .c~---~~- E.~!~.do. E la está igualmente ausent e das at ivi~'­ bros das cl asses dominadas - e não apenas entre aqueles
d :tdcs políticas pré-parlamentares que encorpam a cena que nsccndem socialmente - . a expectativa de chegarem
política ateniense: debates, discursos, arregimentação, or- individualmente à condição de membros das classes dow
gan iz.nção de facções etc. Tudo isso signific:.::i. ..qu.c_a..dC.019- minantes.
crncía at~11icnsc ..é, é:l llt,Ç~. dt.:. mais nada, uma dcrnocraci.a
dos proprietários de escravos. ........_., .. ·----·""" ............_ Atenas: uma democracia não-liberal
· ·--·-·Álg·~-6~~ p~~j';~á- <)l;jctar .que
simplificamos, já que Muitos historiadores e cientistas políticos que se de-
todos os homens livres, e não apenas os p roprict;irios de dicam a comparar a democracia ateniense e as de moera- .
escravos, eram politicamente cidadãos. e já que campo- cías ditas modernas chegam à conclusão de que a primeirn
42 43
\
é superior às segund as, por ser o m elhor - e talvez único O caráter consensual da democracia ateniense nos
- ,exemplo histórico de democracia direra. Esclareça-se permite s ublinhar, ainda uma vez, a reduzida operaciona-
cntrct~nto, que a qualificação da democracia atenicns~ lidade, no terreno da análise histórica, das definições de
~os scculos V e IV a.C. como democracia direta não é democrncia fundadas cm critérios como o "plurnlismo pó·
rncont~stc. A cs:_e rc;;peito,. existem diferentes posições,
1
lítico efetivo" ou a "efetiva rotação de facções pelo go-
que se. d~v~m nao so a divergências sobre os próprios verno". Os estudiosos que se inspiram cm tais critérios
fatos lustoncos como também à adoção, pelos diversos tem.lerão normalmente - caso não manipulem a seu favor
autores, de definições dist.intas de democracia direta. os dados históricos com vistas a detectar um hipotético
Não abordaremos, aqui, essa questão. Prcfcdrnos "pluralismo" ateniense - a caracterizar o Estado atenien-
chamar ª.
atcnçüo do leitor pa~a outras característ icas da se antigo com o um Esta,do t~tali~ár(o. Se o fü1.crcm, ~sta­
~cmocrac1a .escravista ateniense: as que vêm sendo ava- rão deixando d e levar cm conta o que, a par das d1vcr-
liadas ~1egat.1vamcnte pelos cientistas políticos e historia- siclades, existe de comum entre as democracias "modernas"
dores l1bcra1s ou neo-liberais. · (burguesas) de classe exploradora e a forma ateni.cnse de
Analisemos, em primeiro lugar, o caráter relativnmc n- Estado e de regime político. Tanto nas dcmocrnc1as bur-
t~ co_nscns~a~ da dcn:ocracia escravista ateniense. _6,,_p,oli-_ guesas contemporâneas quanto na democracia cscra~ista
ttca im_pe_riah.sta a.t..:~!:.z:.s? p~rmJ.tiu o estabelecimento de ntcniense, .a classe exploradora move um ataque à ornpo-
. . ~~!1. ~.f!1.Plo consc:~~.c?. entre os proprietários de escravos· e t.ê.ncia burocráticJl, m:.g~nizaf!do-se como "partido" para
i_ry_texvJ.r.JJ.i.tÇJ-ª.D)~ntç_n_Q __p.rç_cesso .9.,~_f:lcfi~!s-ªo ~a Eclítica
.. as . c!.ass_es . da pe9~_:_na. produç·~o. · Iª-J poÚtica trazia varlt'á-
g~g~_Ja!J ~() .<lOS primcirb$.. ,( apresamcnto''dc- noV'Qs escravos) .dc_.Esludo, Inspirando-nos de modo lívrc e parcial cm cer-
~.t~.~.nt~ _as scg1~n;<las (apropi:iação dns. riquezas pilhadas, tas fórmulas do jovem Marx, podemos dizer que a demo-
~mpos1çao d_: tnbu~os aos ~dvcrstírios derrotados). Sua cracia de classe exploradora representa a "desalicnação
1mplcm~ntaçao continua ensejou, portanto, a formação.. de política'' dessa classe. Nessa forma de Estado, a classe
'!fil'!._ah~nçn p~~.~~rnncnte, ? "!.Ire classe dominante e classes explorndora se recon hece pratícamerite_.no ser1 Est?_do (que,
P.Q~ul~res. ~ c:te fato que autoriza o analista político a mesmo através de funcionários autonomeados, Jª desem-
atribuir um carate r consensual à democracia ateniense. penhava uma funçifo ·estabilizadora e con servadora dentro
. Com _c.s~a ~fir~ação, não queremos negar que tenha da coletividad e cindida em classes sociais antagônicas),
havido rcs1stenc1as mternas à política imperialista atenien- e o toma nas suas mãos. Isso é o que há de comum entre,
se. Ou~ o "part~ào" paci~ist~ ~xistiu, prova-o a encenação por exemplo, o Eslí.ldo norte-americano atual e o Esta~o
das peças teatrais do ant1bchc1sta Aristófanes, como Lisís- ateniense antigo; e as incg<ívcis diferenças entre ambos n no
trara, nas próprias festas de Estado (o que, de resto, teste- devem ser usadas parn obscurecer essa característica co-
mu nha o carater democrático do regime político atenien- mum, que procuramos codificar através de nosso conceito
se)·. Mas tal partido foi, enquanto durou a dcmocracin de d cmocraciu.
ateni.cnsc~ cJaramente minoritário. Houve, portanto, entre Mas também segundo outros critérios, presentes -
os c1dad~os, .consenso cm relação u política imperialista, simultaneamente ou não - cm muitas definições co.ntem~
embora Jamais tenha havido apoio unârúme a esta. poráncas de democracia, o Estado ateniense antigo e
reprovado no teste democrático. Assim, por exemplo, os
constitu cionalistas que encaram a separação . ..i.udcpcn<lê1J- e ido como .. cidacUlo pnrti.c ípa.L.I.l.~fil!St~Q-~~~-':'.~.&~cios_~a
ç i a__c~.cq u.Uib cio ..cntrc....Ds....1..tê.s-!!poderc.s'.:. do ..Estado. ( Exccu- cidade. .
_ti_yq, ...Lcgisla1iv.Q...c...J.uclic.ié'.í.ri9) como ·Ó elemento-chave F in almente, o E stado atenie nse antigo tcn?c .ª d~sa­
para a concci1uação de democracia, terão dificuldade cm gradur os estudiosos y~ra .os quais a _àcmoc ra~1-~ 1mpl1ca,
apontar Atenas como um exemplo de democracia. Afinal. além de tudo, a ex1stcnc1a de um com!Jromtsso !ormal
entre wdos os cidadãos acerca da ncccss1dudc de se p~ c­
a i nda que permaneça obscuro o padrifo de distribuição de
scrvar parn sempre as regras que prcsc rcven~ um fu~~to­
capacidade governativa real entre <1 Eclésia, a Bulê e os
namcn to dcmocrútico ao Estado e ao regime. poht170.
ma gistrn d os, sabe-se que a _fulési ª-D.Ü.9 -~GLtJ.n.L9.rg_~.o .Pi:Q::_ uMrl .. A À:·~çja é aqu ela Cl!lQ__ÍUnc10-
Para estes, a,._Ll;i.U.l~ .
..p..à.amente...lcgis.Ia 1ivo._pois ta mruta_dccis.õ.c.s_ de___ca r<ítcr
namc010......infatcrr.up.to... ~Lgar.a.utido_ poi:_.!.J.!!.1~-!~1 sup rc~a
.tcg:ulaoll<Jll!JC..(Q~çJ.CJO.Ü ...C....iunciona\~ como suprema ins- (eçmsti~uiçciQJ., ..guc __s~çr~ liz.a ..R __çrunpm.roi:;s o_cstab.cleci~o
,__t ân cia__ judlci;J da... __
entre 05 c id adãÇ>s,_~ Em po \lcas palavras: parn esta corrcn~
Certos m1 tores consideram se r o._r.csp..cito_ p_c.1::m.;m.ç.u.LL..... te,"· a· ~-~~Zla~Úira dc1nocracia é ::i constituci?nalmcntc ga-
. .t)s_Jib~r~tfük:J?_jpc,ljy_~g,t1_ajs.,..e.u.c.nr..u.das...c.omo._d.i.cc;.it9s__ .Q.(l,tU.~.1?is ra n 11'd a. Q 1"' l , u..u><...>:.~
n;;,-.. ;o,··..........
1<.: tÍ:l-
na
.. ..
democrncia atemcnSC• gun}QtJ CT
~.9-J~q'!}c_~..Q ..Ç[.~t§~i.Q. f4(1 QPmen.fal..par.a . a .aferição _da naUL~.
A •

garantia cons titucionnl de sua própria so.~ rcv1vc_ncia; a


f~·- d emocrática ou não, de gualguci:.._~tado. Eles tam- maioriLçlos_ _çidadj}g1i_.[Ql1D.ldQS.....U.íl_Asscmblç1a P?dia. caso
bém ficarão insatisfeitos com o Estado atenie nse, que não n~~ .quis~ss.~.-v.o_ls'\L..a..su~sfu:Lda...dinnocrnc1a e ap_ro-
fixava de antemão quaisquer garantias individuais, nem ~v..ac.._a,...iils~1filrnção de uma tirania. Isto, <.Jc resto, foi o
rcspcitavn na ação govern ativa quaisquer "limites naturais". cuc ocorr<:u no ano 411 a.C.
rcspcit<.~<lo P.:~?..
1
A esses estudiosos, conceda-se pelo menos que n_çjcmp_ç:u1- N a verdade, o único !imite Estado
..cia..J11cnicnsc tinha um;'\ _vpcaçfo "tot.nlitári.a" : a liberdade ( dc mocrü1ico) atcni~ns .c .. na.. ~ua ação, . foi aquele m1post,o
ele debate en tre facções , majoritárias e minoritárias, niio pelos in.tcresscs cscr_a_yistas; _runda . qµ~ .alt ~n~sse .por_ vezes
se fazia acompanha r de qualquer garantia à incolu m idade a- Jegis1 ~Çfi'o .
0

sobreas form as de .. escrav1dao, º.. ~stado


física e ii lib erdade individual das lideranças derrotadas atc-nicnsé" f ainais propôs a liq uidaç~-~ da cscrnv1dao em.
na Assembléia . .Pela lei sobre o ostracismo, um líder cuja si mesma .
i influência sobre os cidadãos fosse considerada excessiva
J

l
i
pela Assembléia poderia ser condenado ª<? exílio; pela
regra denominada graphé pararwmon, um homem podia A .dem..oc.raçi_~... m~.di~:VÊI
i
~
ser a cusado e julgado por ter feito uma "proposta {lega l"
Impõe-se, fin almente, a menção às democraci as me-
à Assembléia . .h liberd ade cm Atenas n ão se identifica,
portanto - como bem notou o filóso fo ale mão Hegel, dievais; vale dizer, a Estados feudais que assume m a_ eo:-
já nos seus primeiros trnbalhos --, com ganrntias indivi- ma dcmocrútica e fixam as condições para a cmergcnc1a
d uais, concedidas cm respeito a direitos naturais do homem; de uma cena polít ica democrática . Esclar~ça·~c, desde logo,
ela cons iste, untes, na capacidade de o homcm_!.~~nh_~- que não são os grnndcs Estados monarq~1cos (_França,
Ingl ntcrrn, Sacro Império Rornano-Gcrroântco, Remos cs-
:''

46 47

panhóis etc.) que assumem lal forma ou permitem a for- complexo de obrigaçõ es pessoais decorrentes d e sua in-
maçüo. de tal regime político. Durante a Idade Média serção prévia no mundo agrário feudal. Sendo antigos
a democracia <lc classe explo radora se implanta nos ver~ cn mponcscs, eles não pudera!T! se lí vrar integralmente de
dadci ros sub-Estados cm que se vão converrendo as cida- sua condiç ão jurídico-política de servos, ao aden trarem
des, ~ partir do momento (sécu los XI e XII) cm que o perímetro u rbano. Se os comerciantes logra ram , pela
conquistam a uutonomia jurídico-política ·dú:intc do Estado mob il idade espacial incrente ao seu ofício e pelo seu
monárquico central. Tais cidades, agora regidas por· umn poderio econômico crescente, apagar todos os vestígios
Carta, ou Constit11i<,;iio própria, podem-se organizar como da suu an tiga condição servil, o mesmo não ocorreu com ·
tiranias (isto é, ditaduras); mas também podem, altcrna- aqueles parn quem a migração representou, no máximo,
tí vnm ente, 1.~ _QJgaruzar_cnmo.......r.epúhiica.s._aJJ.....ç_onsulados o · acesso à condição de trabalhador a domicílio ou de
(j~J.Q..é ... dcmo.crncias). N esta...última.~c.ate~ c·~iã;· ·i·;~~c­ "operário" da manufatura pré-industrial.
rW.i:i~. ín(lrncrns cidades italianas .. (Florcnça, vê;;i;;.~::Iüca, Mais exatamente: os camponeses que abandonaram
. U.O.lQnba..~u;.) • no período que se estende do século X r a úrcu rural e se converteram cm a11csãos na á rea urbana,
ª~:-..XIV, algumas cidades b~lgas do século Xl'i_ _(B.rugc.s,. bem como os seus descendentes, continuaram a dever a
_L1cgç.......Q.~11d) 1··Ccr-tas-cidades-do -sul ..da HFr.ança.J:M~rselha, prestação de serviços pessoais ou o pagamento de uma
A.dcs,. ...N1m.c.s....e.J.Ç.). . renda a um senhor feudal. Essa relação de dependência
I:: sabido que tais cidades se constituem cm sedes pessoal só foi rompida quando o camponês, cm fuga,
de uma burguesia comercial que, em certos casos (Flo- logrou se instalar num núcleo urbano situndo a grande
rença, por exemplo), detém o controle sobre atividades distância do seu feudo de o rigem (isto l!, forn do alcance
manufatu rciras ou artesan ais realizadas no próprio local, do senho r feudal ) . Aliás, as melhores obras históricas
e, noutros ( Veneza, por exemplo), dedica-se domin antc- sobre a manufatura referem-se à vigência, cm plen a Eu-
mcntc a operações comerciais em larga escala. Quando se ropa do· século XVIII, da prática de pagamen to de uma
leva esse fa to cm conta, surge espontaneamente a per- renda a um senho r feudal, pelo emprego de algum dos
gun ta: essas cidades j~ não se constit uem em (sub) Esta- seus dependentes pessoais cm atividades p rodutivas ur-
dos propriamente b urgueses ou cm germes do Estado b anas. Os comerciantes, para dispor de trabalhadores em
burguês dentro do E stado feudal ( monarquia central)? do micílio ou para a manufa tura, tinha m, c m geral , de ·
A resposta a essa questão tende a ser negativa, se pagar um "aluguel" ao senhor de quem dependia m, ou
consideramos que a autonomia jurídico-política dessas então deviam, alternativamente, dispensar os seus traba-
cidades diante do monarca e da Igreja não significa a lhadores cm certos dias dn semana, para que estes pudes-
independência total da economia urbana medieval diante sem cumprir as suas obrigações pessoais ( serviços e obras
da economia agrária feudal. A teia das relações sociais num domínio rural) relativamente ao senhor.
feudais não se limita apenas a organizar o espaço rural: Tudo isso significa que, nas coletividades dominadas
ela tnmbém invade o recinto das cidades medievais. Os pelo modo de produção feudal. não só os trnbalhadorcs
nrtcsãos que aí foram se instalar não puderam, só por rurais, mas também os trabalhadores urbanos (artesãos
esse fato, cl.iminar as marcas do seu passado rural e o trabalhando u domicílio . ou cm manufaturas), estiveram
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48

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p rivados da cidadania na sua acepção elementar, ''civil".
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:: Pode-.sc , porcanto, deduzír que, nas repúblicas urbanas
da Idade Média, nem todos os habitantes eram politíca-
tncntc cidad:1os. De fato, o Grande Conselho, cm tais
3
repúblicas, era um organismo governamental rese rvado
aos represen ta ntes in dicados pelas class es sociaís "pa trí-
A democracia
ci a s" (burguesia mercantil, nobreza rural domiciliada n<t
cidade). J;í n "plebe" urbana (trabalhadores a domicilío,
no capitalisn10
operá rios das man ufa turas) logrou no 'm áximo cons tituir,
através de insurreições, governos pnrnfolos e "ilegais''. O
surgimcnlo destes não representou, na verdade, a inc !usüo
d a "plebe" na democracia urbana medieval, mas, como
bem nos most rn a fil ósofa francesa Simone \Veil, num
cn ~ aio s<..)brc a insurreição florentina dos Ciompi, no século
XIV, a emergl'.!ncia de uma situação - a nálogu àquelu
verificada nas revoluções contemporilncas - de dualidade o Estado burguês
d e poder.
Na maioria das cidades-Estado iralianas, a democra- Muitos cientistas políticos, ao abord are m o tema
cia urbana medieval começa a declinar no século XIV, da dcmocracía, Jimirnrn-sc a analisar as chnmadas '_'dcm~­
sendo s ubstituída pela Signoria (dit;:idura unipcsso.al ). Em cracias modernas" e não se preocupam mu ito cm , 1~ves n ­
pa íses como a França e a Inglaterra, as democracias ur- gar se é possível aplicar o qualificativo, "dcmoc~at1c~" a
ba nns existentes conviveram, com maior ou menor difi- Es tados e regimes políticos de outras cpocos lustóncas.
culd::tdc, co m o Estado moná rquico central , até que a Esse procedimento - seja ele intencional ou não.- . traz-
au tonomia jurídico- política urbana fosse liquidada com -lhes dividendos seguros. Ao ocultarem a cont1nu1dadc
a implantação do mais centralista de todos os tipos histó- existente entre as divers as manifestações h~stóricas da de-
ricos de E stado: o Estado (nacional) burguês. mocracia de c lasse exploradora. tais cs:ud1osos preparam
0 terreno para a eleição da "democracia moderna" (bur-
f> lJCs a) como o "modelo universa l de dernpcrµ,Ç_ip.:.'· I so lan-
do a " de mocracia moderna" dos casos historicamente ante·
riores de dcmocracíu, esses cientistas políticos est_abcle-
ccm as bases para a operação teórica seguinte, ~ons~stcn_tc
cm fixnr a " democracia m oderna" como a rcal'.zaçao lus-
',t tô rica finai e definitiva do ideal da democ racia e como
....
0 horizonte político para o qual dcvcriio tend er todas as
coletividades humanas.
·:.'. ;.-·. .
~-.:....:...;..__:-~-~~-...:.-~lm!!ll------~----
··\ ., .:..:.·
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51

N<lo concordamos nem com a tese acima nem com Numa coletividade qualquer, é impossível que as
o pro,ccdimcnto intelectunl que prepara o terr~no para n relações de produção capitalistas (capital X trabalho
s ua enunciação. Todavia, ambos se apóiam num fato in~ assulmindo) se reproduzam incessantemente se o Estad_o
cont~st~vcl: a democracia burguesa representa um salto nfio assumir as características que sintetizamos atravcs
qua/.1tallvo com relação às democracias pré-burguesns (es- do qualificativo "burguês" . A prestação de sobrctrabalho.
cravista, feudal). :f! este salco gualitativo - o contraste pelo produtor direto, ao proprietário dos ~cios de pro-
entre a democracia burguesa e as democraci as pré-bu rgue- dução só pode assumir a· fo rma de um livre contrato
sas, a par da t~nidadc existente entre a mbas - que tenta- entre i~uais (contrato de trabalhC1 ) ; portanto, o mercado
remos caractem:ar no presente capít ulo. etc 1rnb.,1ho só pode funcionar quotidianamente se o Es-
Comecemos conceituando o. Estado burgtrês. Diz-se tado atribuir ao homem desapossado a faculdade de ofe-
que um Estado 6 burgu ês quando,..c.lc_um...lad.o.._.c,lc define recer, " li vrcmcntc" (isto é, compelido apenas pcln ncccs-
.!od_~L,~er! s. índ~.Q11dcncclfil.n.tc......QL.illiL.Q.OS.içiio .no sidndc de sobrevivência, e não por terceiro), a sua força
.. EEQ.CC~~S..@.L...de P.Is.~g!!S!lO_ (c!a~.Q_Ç]ill!oradora, c lasse de trabalho a quem queira compr<.Í.·la. Caso o Estado
.S.~!9.I.<!.cJ~J,_~2!1.lQ.2rn capa'.?cs de_ru:iltlf.é.lL~~os'. c~c vcm- mantivesse os homens dcsápossados na condição" de escra-
tade. e quando, de out{Q,... nã<_t~.ilLQLL'.llqu.er~~ira vos ou de servos, o contrato de trabalho não poderia se
formal ao i~grcss~-d~.!!!2.._fl)bros A.<i:.,çJ~1.s.~~--<l?ill!.o..i:a.da.Jun­ difundir, e o mercado de trabalho não poderia funcionor.
çl.;.!~8.LW.ll..a__n5o fa larmos das _$:_f'!l_ais c_!~~~~- popu-- Mns isso não t; tudo. Ao mes m o tempo que viabiliza
larcs ) no set!. _çÇ>rQQ.. .Q.5L funcionários. . . a constituição do m ercado de trabalho, o Estado burguês
Como se vê, o E stado burguês contrasta duplamente obriga cada homem desapossado, já convc.rtido ~m .t~aba­
com os Estados pré- burgueses (escravista, feudal) : de ihador assalariado, o se ver como persona!Idade md1v1dual
un: lado, ,o~jumo_....d..c._r.cgras que clc___c_Qij..í.L...L[i:L;::_s;~ 11 • e a se destacar s ubjetivamente do grupo ao qunl objctiva-
.J?JJ.rJ-Ç.Qlll vis t as.....;.u:iis.cip.lirrn r <l s rclaçõcs..s.a.ciai.';l_- ._.o_s.e.u, . .. . mc1'1te pertence (o dos trabulhado1·es assalariados, por opo-
.<f.taito :._-:-~~t_~i..ill:Li..JLJQQ.Qs os hom.cns~R..Çndentemcntc síçiio ao dos capitalist as). Desse modo, o Estndo f:ustra
•. <la çJ.m~ .. .sQ.ç_i.i\LL.qlli:...pcrtcnc~n1, capacidade ii;ídt~~- g·~~""di, u soli dnricdadc qllc deveria nascer entre homens 1gual-
.trans.fol'.lllll.Ud.~.e.m_.s.uj'!i tos i o d hdduaiL.dc:_.direil os e mcn tc explorados por um cnpi ta lista e intensamente inter-
· deveres.. (cidadãos 110 plano civil) ; de outro, .,.o_r_ç_ç_nua::.. - rela cio nados no processo capitalista de traba lho (grande
. 1:1Jsn~ ...E~E....~L.. suu burocracia de Estado é fQDll.!:l]~C;nJ.~L. indústria moderna) •
::i~c.npi~~-i!..~ cl~~~--~~iais!...~~-s~~.5~,tpo d~.. f 1;1~1cío­ Finalmen te, o Estado burguê s, por se organizar inter-
ll~f.~QS.. .. ~_s~~.!.!'le -~ -~P?.r.ª~~~.<:1_.~e uma organização fundada namente segundo critérios formalmente "universalistas",
.n<1..•.tri..t;I.E.r.qi.1/z.pç[!_q_,_c!.!!_,c_C?...~!J.Pet~li.ci;;;-t;;'di\.idli~ú . .(,;1,ro~m- pode-se apresentar it classe explorada ~omo urna comu-
.f.l~~!'.!º). J<í nos Estados pré-burgueses, nem o dircilo.. Ír~ta nidack l}umonn votada à rcalizaçflo dos mtcrcsscs con?u~1s
igu<Jlmcntc os desiguais, nem o corpo de funcionários a todos os "indivíduos", intlcpcn dcntcmcntc d e sun pos1.ça~
(burocracia ) se organiza. segundo as regras formais do 110 processo social de produção. Ao fazê-lo, une subJett-
burocratismo_
vamcnte num outro coletivo (o povo~naçc"io) os homens
52
53
já destacados subjetivamente do coletivo elementar (classe
social) ao qual objetivamente pertencem. uma parte daqueles ciue já o são no plano cívil. ~esmo os
· Poula ntzas, cm Pouvoir po/ítique et classes sociales, Estados burgueses ccn sitários do século XI?C cst?? longe
caracteriza sintt.!ticamcntc esse modo particular, próprio de cons tituir exemplos acabados de cidada nia ??l'.ttc~ . res-
ao Estado burgu~s, de amortecer o conflíto de classes e trita ils classes domínuntcs. A s restrições ccns1tanas . .n?o·
frustrar a revolução social. Para esse au tor, o Estado bur- cfornas" à participação eleitoral se ap6iar:1 cm cntcnos
i quantítàtivos (nível de re ndimento, extcnsao da prop_rie-
~ g uês, d nd.as._as_caracteósticas... .do__seu d i rcita__( tra tamc !JJ_Q___
f i g t...rn.L1o_s_çj,ç_sjg_yíli.~ )._ç_d~LmQ..d.Q__cJ.~J>.IMlli..~açµp .. i n te rn n dadc) ; assim, n linha de dcm a~ca?ão, ~º- pia~~ poht1co,
·1 _(bu,r_ocrat.i~fl}_Ç_Li...,R~9g.~--=Bflb4~/q.4emil.-9-9_P,_cmto ..9-.ç entre cidadãos e não-cidadãos nuo e aqui tao muda quanto
1 v:!~ta___i_9~9_l§.gico e político, sobre_~ c1as.1L.Q,_wJorada: a) numa democracia escravista, corno a ateniense {nesta._ os
;j
~ '!ki.!q___cl__e Jst?~r!~n. '!_li ~o (~Horn i_z<:lç_!i.o ..~ª- ..~~~~~.e - c,xplor ada, excluídos d a cidadania política n ão são "pobres" e, sim,
i .. individualização" dos seus membros); b) o efeito él;;--- escravos).
...(!-U?.!..l!§.~rr!f!Sf1P:. ..c/g __
)!!'}.~~ade_ ( rcunificaÇão" ~subjetiva desses Advirta-se, entretanto, que a especificid ade do Estado

1
'
homcns.. _já "i.!l.Q.ivJ.qJJ_<!l.iz.ados::..uuma_.comunidadc J rnagil]á-
ria: ~- e~vo~.!!ªÇª.Q.)_... _ .
burguês, nesse aspecto, não nos obriga a alterar nossa
definição geral de democracia como forma de Estado.
, é um
Tambem, nas d emocracms
· b urg ltesas
' ,_ 9-P-arlamcnto
·.. . ............. -··-
6 :- _d~p.ri:.s.cnL.1c;àn.._dir.~&-çt..'L.cJ...asse cxg 19..r<l?Q..G.. ~ue
A democracia como forma do Estado burguês p~~~ha .. .com._ a. :bÜroer.a .CSlatal...a.JnCllm.b.tnc1a__p~
eia .. C3
de implcm~.nt.ar_a_poiítica.. G.e_E.s1StdQ. T odavm, o estudioso
E ssa breve exposição sobre o conceito de Estado das democracias burguesas só pode chega r ~ essa ~oncl u­
burgui!s j6 nos permite determinar em que sentido a de- são _ e aqui reemerge a especificidade -. i;nedlantc. a
mocra cia burguesa representa um salto qualitativo corn observação da prática parlamentar (seus Imutes lcga~s,
re laçfio às democracias pré-burguesas. Comecemos anati- seus instmmc ntos, seus resultados) . A mera observaçao
<;a ndo a democracia como forma do Estado burguês. Se do processo de composição da rep rc sen t aç~o · parlament:r
os membros de todas as .~J.<J$Scs...sociais ...exp1o.tador~s-ou· · é, neste caso, insuficiente para nos conduzir a co_n:lusao
ex plorndas, são declarados cidadãos .no___pl;lno.-ci.\Líl,...só _ que é imediata quando analisamos a compos 1ç.ao da ·
restam, no plano da forma de Estado e _Q.o. rcgim~_p.olítico, A ssembléia a teniense ou do Grande C onselho da~ cidades
d uas alrcrnativas: a) a cidadania político --é . ncgada_aos me d 1eva1s
. · - de que o Parlamento é um orgamsmo. re-
membros de todas as classes sociais (ditadur,a__ y_l!.!~~~sa); prcsentativo da classe cxplorndora. Afinal, o p'rolc_tnnado
b) a cidadania política é concedida aos rnembros-Hde todas participn do processo de indicação da rcprescntaçao par-
as classes sociais (democracia ~urguesa)_. Nii() .. b~..lugar, lamentar, e é, na história da humanidade, a primeirn cla~se
num Estado burguês, para . a....cidadania.. p.olítkiLJ.estríta, explorada fundament al a fazê-lo. Só estudando o fu ncio-
reservada à classe exploradora.. (e, eventualmente tam- namento quotidiano concreto do Purlamento pode-se .ch~­
bém ·ás clns'sês ..irilcrm·cdÍárias aliadas). Não é vi ável, para gar à conclusão de que a representação parl_<n_ncn:ar md1~
o Estado burguês, declarar politicamen te cidadãos apenas cada pelos membros de todas as classes sociais nao 1.ogra
j amais agir, no seu conjunto, como representante do s mtc-
.. . · · ·. . . ... . .--··· - -------------l!!l!!m--mm!!ll!!!!!!!!
f. ~ :

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rcsscs gerais do proletariado (expropriação do capital, so- rigorosamente cquilibrndos. Contrariamente, um Estado
cialização dos meios d e p rodução. supressão da divisão scr'íã't ti1Iit'utial-sc-u·!l1'C.los três poderes i nvadissc o terri-
en tJ·e trabalho íntcJcctunl e trabalho manua l). Em suma, tó rio dos demais, liquidando a sua indcpcndêiicia e d ese-
.!L...fru:r~mc111..o._p.o_®,_1ü2ri g::: r delegados incJic~_J?.el9s . quilibrando, a seu favor, a rclaçflo entre e les.
-.P~:<?JEJ~~.r_i.o.s;_ cm qualqu er caso, ele é burguês pelo seu fun- Como os proponentes desse critério detectam a cx is ~
c1onamcnco.
tt:ncia de scparaçno, independência e equilí brio de pode-
Abordaremos as li m itações políticas impostas ao fun- res'? Em geral, começam pcl u dcfiniçf!o apriorística da
cionamen to desse Parlamento. "aberto" a todas as classes conipetêm.:ia de cada um dos três p oderes: a) ao .P.odc.r
sociais, quando formos caracterizar a d emocracia como Legisla tivo ~~i_r!?_.~t;la bq!~ft:Jál_!!;.;i;;:Çç~ :-d.I: carátct
regime político burguês. A s uspensão provisória de nossa s1 1hsnü1'fi\íó) ; b) aQ Ppdcr Executivo co.mp.c tma ere<.:uta.L....
demonstração é conven iente, já que aqu elas lim itações são .as.....lciS-.(.dccisõcs de caêM(':'r "ió"si(úmcpt;iLusgulamcntar);
também, direta ou indiretamente, impos tas u ação parti- e) _)i.Q. l'Qç!Qr J uclici<írio~ .Sºmpctiria fis.calizac. ..ta11to...as .•a.~Lvi­
dária das classes sociais. .9.adcs legislativas (a fim de upurar s-~---~~ leis clubo r~~s
Por ora, queremos sublinhar a simplicidade radical pelo_ P.n.rlaJJJ!dJ!..O__çstari au1_Qu não cm co!1tra~;!Q_,Ç:_2!.!!_ a
e a amplitude operacional de nossa definição de democra- Lei ..SJ.iprnm.?....:_JL Çgr!§.!i!..U.içfi<?J q uanto o processo de exc-
cia burguesa. De um lado, tal definição é simples, porq ue cuç;1~ d as le is ( :i fi rn de veri fi car se estas .estari:lnf:scf1Yd0'-
s u stenta que o Esrado burguês impõe invaria velmente li mi- ap licadas corretamente) .. ··
tes, definidos pelos interesses da classe exploradora, à A seguir, esses autores estabelecem que, caso a con~­
ação do "órgiio da democracia" (Parlamento); <le outro, petência assim definida de cada um dos três poderes esteja
e l a dispõe de ampli tude operacional, por rejeitar certos sendo respeitada pelos demais, configura-se, cm tal Estado,
cri téríos "rigorosos" - dc(cndidos por jurist<is constitu~ uma situação ele ...~i<P.ar.:.1 ç.lkh.J.n.dÇJ2Cillillnda__c_cq11 ilíbri 0 de
ciona!istas, por liberais etc. - que, em nossa perspectiva
; tcórict1, só poderiam ser usados como base paru o cstabc-
.poqç.r.~ú4..JUiç_~l2...C:illl~l:
O c ritério proposto pela "Teoria dos três poderes''
.!
..
j;
Jcci mcnto de subclasses de democracia burguesa. ·
nüo 1.>oderia ser incorporado à nossa definiç ão de dcmo-
f cr;1cia b urguesa, mesmo se o fizéssemos acomf~nn har _d_a
l,,
ressalva seguinte: o resultado final dessa relaça o cq_u1h-
A democracia burguesa e a "Teoria dos brnda en tre poderes separados e indcp ~ndcntes cont111ua
três poderes" a ser, como também ocorre nos Estados burgueses cm que
hi1 desequi líbrio de p oderes, a implementação de uma
O mais con hccído dentre esses critérios "rigorosos" política estntal favorável aos interesses do capital. Alguns
6 o da ".separação, independência e equilíbrio entre os autores inspirados pela teoria política marxista - caso do
poderes": um Estado seria dc.f!l.<.?CE4.~.i_Ç,9..J.].Uanclo ..as-8,la- cientista político inglês Ralph Miliband, cm O Eslado na
mados "três, _podC~f:.~_'.::'(ExÇj:_ü}i.v.o. L~<>.lativo c._JudicÜ- sociedade capitalista ( 1969 ) - realizam essa iocorpora~
r ip ) fossem efetivamente scpa.r!l.~O.~ . UI].~. _do~!~m1r­ c;iio, contcntando·sc cm apor um s inal negativo (''contra
<fnsscm p ermanentemente · s ua indcpcndê11.c;isL..C....cstiv.css.cm o proletariado''), em s ubs tituição ao sinal positivo ("a
.. . "" '""'"'"·----~'*'""'---------:r::z:m=m::m:=im;z:;;;;;;:=
1:, i·
', ~·
(

S6

íavor de todos os cidadãos") tr . d . pctênc ia de cada um dos poderes n ão garante que u


separnç;io, independência e •e 'l 'baç.a o pelos liberais, :'1 capacidade govern ativa real se reparta de modo equili~
E." . e JUt ' no dos poderes.
ssil mcorporação crítica d. brado e ig!1a/itário entre b urocratas e repr esentantes polí-
d e sinal ( J • • ' me tnntc uma mera tro ~n
'1
".;
• •
. . ( e pos1t1vo pa ra negntivo ) da "T . d "' ticos. B possí_"'..C.! . l!nrn~parti~.2...9esegu\.l i_b!.ad.a_~_s!csigual
poderes" nos parece incon .,
vcntcn te po~ diversa
' . cona os três
- c~e_S~fl...-.C:-ªP.~.Ç.!da<.!.~ .. -~C_21.11bos., inclusive no caso de a
. · ~ . ' . . s rnzoes.
A •
·• primei rn dclns está cm q competência formal d e cad a poder ser respeitada pelos
do Es tado "moderno·· a ~·e . ~~sa tcorn1 pnonza, no seio d e m ais. Para tantÕ: basta que a Constituição de um Est ado
"poderes" O , ' iv1s.10 entre o que denomin-1
· rn, n nosso ver a d 'st' - f ' burguês qu a lquer defina um dos dois grandes ramos <lo
a ser estabelecida na - t. I' d, ' i rn çao undarnc ntal aparelho estatal como responsável por um número maior
- , . ' ana ise o aparel ho de Estad b
gu cs, e a distinção e ntre t>urocracia ú ,. o ur- de m CJtérias {te11~..as gue se constituem em obie to de decisão.
c rcprnscntaç:'io política ( 1- J:. up~ autonomcndo) ~I). Se a burocracia estata l pod e, sem violar a Cons-
' __ paramentares diretamente . d'
Cill~r.clos
d membros de toda;-;;s- -·._--:.. - in i- tituiçno, tratar co ncretame nte de mais matérias que a
Estado democrático-burguês .--~-s!ass~s ~o.7g1.[2). No rcprescntaç5o pa r lamentar, com o é p ossível sustentar que
processo decisór io esta tal s , ?sdagentcs participantes do
. ·e cm cm antes de m · d o respeito e) competência for;nal de cada "poder" é sinô-
em dois ~i;randcs· blocos· · · o d os que ag . 1'cm lc > · ais d na a, nimo de equilíbrio de poder es? O s adeptos da " Teoria dos
compc1ê nc ia (nfer'd · ·
1 a internamente) e 0 d os
glttnl í.1 os pela
• ' < .
timados por um m an dato , . ~uc agem lcg1- três poderes" muitÕprovavchnentc não têm resposta para
. Pode r Judiciário são b poht1co. ? ra, _Q..,5 int<:grantes....do essa q uestão , pois se esmera m na análise f o rmal das Cons-
elos m, urocratas, e nao delegados indicados tituições burguesas, mas se pr eocupa m pouco com a obscr-
~ cmbros de todas as classe. -. . . , -·;··.-.
nc;
.~..:~J110 _para ·--os--· --- ·-
EUA ' t.- .'------
· s d soc1a1s
..----·- e vai ,.i
(isto.. -·----~-.t_\.lo v<1ç iio do seu conteúdo.
--· ........ _ 3 u a1s on e a .J?.O"ul a - d
~vcn tualmcntc clc_g,er 0- ....:-· -;-·-·-l~- .. - .-- ..-:t ça<?_. po _~ P o r o utro lado, n em mesmo nesses novos termos -
- .._ -·- 5 JU1zcs e e primeira rnst:-u .
.n<to os d'-•s i·n·s·-t a,--;;-·--.. -·--·--·;· .. ........ ------..--..-....
·~.___!le ias superi ores · es , -.- nc1a,
·----·..-·:mas
... ~eartição de capaci dade _ govern~real ~.~_s.__r.amos
internamente segundo· 0 s 'té-- · - ' tes sao esco lh idos do aparelho cs~~-tal, ao i nvés de respeito f\ competência
··T . • cn nos do burocrat's ) A
. co rrn cios três poderes" ocult . ' . J mo . formal de cada um dos três pode res - é conveniente a
iuí;-;cs e f . .' . . -.~----ª a un idade ex ist ente cn.tr.c
Li • li llCl Orlclrl OS (CIV IS o u m ilitares) a d 1 incor poração d o critério da separação, inde pendência e
í:"~ :-. Pode r J udiciá rio eqiiidista11te do Poder L ·º1 - ~e arar o eguilíbrio dos poderes à nossa definição de de mocracia
Pode r Executi vo. cg1s .rt1vo e do burguesa. Quando se o bserva o conjunto de medidas (fis-
r .Em segundo
. .lug <ar' a "Teona
· dos trc:;
, .pod eres" é f. cais, monetárias, policiais, educacionais e tc.) que com-
mn Js ta , po is define a "scpar· ..- . d - ~-:.QI.­ põem a política de Estado, como aferir de modo p reciso
brio dos poderes" com • açao, li~ c~endcncia, cqui lí- e seguro a existência ou não d e equilíbrio entre os dois
ê ·. . . . ·. o a prcservaçao rntegral das co m-
~ct ncias , apnonst1ca mentc definidas (l ,. ·I . gra ndes ramos estatais? A menos que se a tribuíssem va-
fisca li zar)• d e cada um dos tr' .. d. :~1s ar, executar, lores (simples ou ponderados ) a esses diferentes tipos de
. . d , ~ . es po crcs . Ocorre que .
ca a compc tcn cin formal não . , ü. medida estatal e, a seguir, se somassem os va lores das me-
um mesmo Í . . ' corresponde mvari avclmcn tc
. . ugar no processo concrctó de d f . - did<:LS definidas por um mesmo ramo es tatal , a mensura-
implcmcntaç;io da política .de Esrad _e 1~1çao e
·- o. O respeito
,
a com- ção desse equilíbrio seria p raticamen te ímposs(ve1.
• M_~_:_..:_•"•'-
":.:::·-:·-
::=·=.:
-·=· ==;;::;.;
·-""••;;,;.:
• •==~·.....;.;;==----=-.:---~--"'-------------------------···----·· •

\....

56 59

Nossa .dcfiniçào de democracia burguesa como forma Assim, nossa definição de d emocracia b urguesa, por
ele ? stado e, port.anto, m enos exigente d o que aque la de- consid erar n va riabiliduclc da relaçã o de fo rças entre os
c orrente de uma 1ncorporaçfio críticn da "Tcorh do" ,.~,. dois grandes ramos estatais (burocracia e Parlamento)
d " f ( " 'i..:.,
po c:rcs . 'a ra que a forma do· Es iado burguês possa ser dentro d o s limites de uma única forma de E st ado burguês
c_on~iderada d crn ocráüca, niio é ncccssú rio qu e h aja cqui- (dem ocrática) , admite o recurso ao procedimento da s ub~
l1!' no entre ;1s capacida d es governa tivas reais da burocra- classificação. Q µresi<Jencialism o (por exemplo , os EUA
cr;1 d : .Estado e do Parlamento. Um E stado burgu cs é dc- _atu<i i~ . o parla~~t"t.'J..W!]_.!1110 (po r exemplo, a Frai:i_ç~. do "
mocrnt1co .51Y..nndo um__9rg,? o _Q.Q_Jeprcscnta_Ç_ão !J.ircta da lli.?.§.:i.~!..e rra ou <i __,Htília atual) ou o sist.Ç!!..!.<J._de gabmete
_classe cxplor~ (compos to por l1omcns - ir;dica<l~--~~fio-· · ·· ( ~pi.cic. çlc comb.i11a.cão en1 rc os dois ant.c.ci.o.r.cs; a Tn?1l!.:..
apenas por. es ta, ma s também pelo conju nto da co lct ivi- terra at u<!.l.. por exemplo) podem, portanto, ser co ns tdc-
dad~ )< pa rt1l ha, de m odo equilibrado ou mio, co m a bLL(Q- ~-a dos "classes" da de mocraci a b urguesa. A s ubcla ssifica-
. :rac1<.~ .cst_a ta l nuton'.?E:l!:.ªda, a capacidad e d e implementar ção t raz a v;.mtagcm de difi c ultar certos formalismos,
~l p~!Jtrca .de Estado. A democracia burguesa, nessa pers- como aquele consis tente cm aproximar, no plano tc6ri c~,
p cct1 va, so deixu de existir quando o Parlamento burg uês o E st ad o burguês presidcn~i.al ~ çiu.c._t1nt':_. º presi-
~crdc toda ª, sua capacidad e governa ti va rcnl e se t rans- den te . i ndicado Rel a colet1v1dadc oupcl()'l'Yarlãmcn to,
1orma num orgüo de "cobertura" , des tinado a contribuir ~o os seus .!.lli..nist rg_~ detêm cons id_~rávcl capacid ade
P_ª~ª a ocultaçilo das verdadeiras cnractcrísticas (d ita to- .iQ_v_çJ]).Q..tÍ.'til) dos cham ados " E s tados fort es" ( nos quais a
n a 1s) da forma ele Estado. burocracia esta t;1I , rcprcscn tada em geral po r um che fe,
governa sozinha). Ess e tipo d e exercício formalista tem
atraíd o até mesmo um c ient ista político arguto como
As variantes da democracia burguesa M a uricc D uvcrger q ue tem- se aven turado , por vezes, cm
especulações - certamente sofi sticad as e recheadas d e
. Essa dcfiniçfo de democracia burguesa, pela sua :.lm- nuanças - sobre o caráter " monáfq\lico" dos Estado s
pl 1tucie, pode englobar inúmeros estágios da relação de p rcside nciais.
11
,:l fo rças entre bt1 rocracia d e Estado e P a rlamento. A (mi ca A definição ampl a de democracia b urguesa tnmbérn
f .• h ip ó tese que tal d efin ição, p crcmptoriamcn te, exclu í ~ a nos imped e de relacio nar unilateralmente essa form a do
n da monop~ lização absolu ta. da capacidade govcrn;itivn Estado b urguês com um úni co modo de investidura d o
L~
,'I ~ca l pelo Parlamento burguês. Afinal, o · Estado burguês chefe d e Estado (QJ1on:1..~ULg1i..s:....<;levc s!m!?.~lizar, aos olh9~,
cln coletividade, .•:..~D.l.lL..c!.-~.aRarelho es~ata!,
.~ )
,·: ·J
11
e, antes de mais nada, a s ua burocracia, civil e militar.
•j
) Se º. ~arlamen to desaparece u por momentos cm vúri as do topo ;1 base) . Ou seja : a dcmo crac1n burguesa nao e,
co l cttvid~dcs capitalistas, o mesmo ja mais. ocorreu com a
1~_gr.iwmlç,_uma.~dc_ igu almente se
bur~crac:a de Esta,d~; por isso, '"9 Parlamc~o burguês acomodar ao modo monárg_uico de invcst1durn do chcfo
.Q..ç dc chc~ar. no maxrmo, E....E!:rtilhar corn esta a_ _c;.~lp.aci-

l
· de E sta<lo. Lc 1;;brcmos, de passagem, que vários países
.cfadc de impl ementar a política de- E stado, e nrio mais capitalis tas europe us, cm que o Parlamento ~ detent.o r
que isso.
.. de capacid ade governativa real, conservam, ainda hoJC,
~i
ffi
nn
.. -;.· ··· ....... _
.............. .

f ;;:
r ...

so 6'1

o mo~o. ~anárquico de investidura (critério hereditário esta se faça presente sob n forma da ameaça ou ostcn·-
de d.ef.1mçao do chefe de Estado, ausência de consulta à tação de força ).
colctrvidade para esse fim etc.). Esse é 0 caso da In- Não é, portanto, conveniente qualificar o E stadÓ
gl_a_t_c..r~~·...~º.s..países escandinavos, âa Béfg'i·c·a:··da·Rô.forl'êfã burguês democrático como aquele qu e reprime men os ;
etc. · · · .... ... . .. ......... ...- ......
mas dcve~sc reconhecer que ele, pelo seu modo de orga-
~!naJmcnt~, .queremos sublinhar a inconveniência de niwçiio interna, cria tendencialmente condições políticas
f .: .
:: •
se Utth7.ar a d1stmç5o (presente nos textos de Grarnsci) mais desfavoráveis no exercício da repressão. Co1:0.Q.....O..'i.._~
c.n ~rc as duas armas - repressão e persuasão - à dispo- _p;.u:lamc.u.tª.rcs__~.fl.QJ.119.içrr.Oos.p.ela cple 1i:>'l~l~-:i çle, mostram-se
: ~h s 1çao de qualquer Estado como critério para distinguir r eticentes com relação à aplicação da violência sobre uma .
u~ E~tado d_cmocrático-burguês de um Estado burguês parte dessa colcüvidade, po.is.A_d.csta ,- c ..nãa..QJLQJJr9...C.UICÍ <J~­
:r d1tatonal. Dcrxand_o de lado o perigo de cairmos, por
força. ~ess~ ,rc_mát1ca, .cm formulações quantitativas de
qY,ç__._~~çs.!.?~-~ ...C> .. :<:~ . mandato, ... Assim, o P..<i.r]?_f!!~nto . bu~- .
guê$ f f!nde ~-3~.f.Y.iX...::-:-::-~mesmo na hipótese de todos os ·
1
rcduz1d.1 ef1;acia concc1tual (como, por ~xernplo, "o Es- seus membros defenderem abertamente os interesses ge-
tudo burgtJcs é democrático quando reprime menos e rnis do capital - ..f.Q.m.~_..a_n tcparo .~?.~lr~- ~~-at.fl_q\:!.~S .P..9 li,- .
pcrsuad; :nais (. ·. . ~"), convém esclarecer desde Jogo que ~J.~i.s...::.'!.}!_litare~ __ çi_
n...b.urnc.c.a.cia_ às .. class~..P.~P.-~~~es. Mas, ·
o cxcrc1c10 da vmlencia estatal sobre os membros das como dissemos anteriormen te, essa tendência e neutrali-
cltlsses p opulares não d epende exclusivamente do modo zada em caso de emergência de uma crise política aguda
pelo qual se distribui a capacidade goYernatíva real entre ou, no limite, de uma situação revolucionária.
os ramos do aparc~lho estatal (forma de Estado). Ou seja:
o gra_u de rc_rress~o estatal às classes populares depende,
tambcm, da 11:1cns1dade do conflito de classes . Assim, um A democracia como regime po1itico
~stado ,b~irgucs que se organize internamente sob forma burguês
dem?crat1ca pode, num quadro marcado pela ascensão do
movJmcnto re_volucionário de massas, se lançar à mais in- Para que a formo de um Est.ado burguês qualquer
tensa rep.ressao. A esse respeito, lembre-se de que, na seja efetivamente a democrática, é necessário que, corre-
dcmoc_rnc1a parlamentar alemã de 1919, a polícia assassi- latamente, o regime político - vale dizer, n configuraçào
nou friam ente, entre outros, os líderes espartaquístas Rosa da cena política - também o seja. Vimos anteri ormente
Lux~mbu~·go e Karl Licbknecl1t, e de crue, na democracia que a forma democrática de Estado burguês representa,
~rcs1<lencial mexicana de 1968, o exército assassinou a num ccno nível, um salto qualitativo com relação às fo r-
tiros de metralhadora estudantes que se manifestavam cm m as democráticas de E stados pré-burgueses. Agreguemos,
praça. pú~Iica._ ln versamente, um Estado burguês que se agora, que também o regime político democrá lico-burguês
~,rgan'.zc internn1:1ente. sob for~a ditatorial p ode, cm pc- representa um salto qualitalívo com relação aos regimes
~ todos de cal_mflrta social e pol1tica (como os que sucedem políticos democrúticos pré-burgueses.
a~ fases mars agudas de repressão policial-militar), se A democracia, como regime político burguês, desig-
dispensar de praticar a repressão (embora, indiretamente, na o conjunto de condições fT'1ínímas - as chamadas
..... --·····-····-- ·--------:.__:.:,::..-.;~....;.._-------------------_,.,.......,._.'"""
· .. .,.., .,. """-·=
---- ----""""""- -----
62 63

liberdades políticas - qu~Ltam aos membros de todas Analisemos, in icialmente, os limites impostos à liber-
~.~.s~:;__l;9_c.i_ais (e não apcuas àq~Íclcs d a classe expio·~·;_ dade política geral mi ma democracia ?urgu~ s~ .__Mcs•no
dom e das clas:;cs intermediárias aliadas, como nas demo- autores liberais consi9_~mun que, sem a unpos1 c<10 de cer-
crac ias pré-burguesas ) !!..2fgE_nização partid ária com vis tas -to~--ii~Tt;;S- no exercício das liberdades políticas, l1 regime
ü i ~d icaç_<~~ ~~in!~~an_tes ~arfo mc·iir·õ--Ii.ürgüª·s·:··· Em político dcmocréÍtico é inviável. T odav!ª· esses autores
muitas analises po l1trcas 10sp1radas g enericamen te na tco- definem rnis limites de um m od o peculiar: a seu ver, a
rin marxista do Estado encontramos a d cclaraç<lo de que, democracia "moderna'', diferentemente dn :llltiga (ate-
f. no Eslac.Jo burguês, essas liberdades podem, no melhor niense), não tem vocação pnra o "suicídio". I sto significa
1
!, dos casos - no caso de tal Estado ser uma democracia
í que ~1 ação part idária - pré-parlamentar ou parln~ent ar
- , ser formais, entendida esta palavra corno sinônimo de _ das classes sociais deve excluir q ualq uer rcntattva de
irreal, imaginário. liquidnr aquilo d e q ue estas são, a seu ver, igual me~te
A nosso ver, considerar que as liberdades políticas, bcncfici;í rias: da liberdade política geral ou dns próprias
n~t democracia burguesa, são irreais equivale a apagnr as "regras do jogo democrático". Simplificando: para i_ais
difere nças entre esse regime político e o burguês ditatorial. aut~rcs , um regim e político "rnoderno'.' é <lcmocrát1 co
Tu is liberdades séio de fato, na d e mocracia burguesa, guan do existe libe r dad e política para . fazer tudo , salvo
form ais; mas po r "formais", en tenda-se, aqui, n ão irreais oarn liquida r a p rópria lib e rdade política.
c....s~ m_J.or_!!_.wlizqda.~ ( codi.J.icn,,çlas _E~IQ. __~_s!nd~<:t.~r.avl!s -~ - Incorporar essa visiio ncerca dos _li~1ites i~npostos,
__ç1~.
l numa democracia "moderna", ao excrc1c10 da h bcrdadc
Essas libe rdades são, portanto, form ais, reais e con- política implicaria, mais uma vez, reduzir a eficácia ~pc­
cretas. Um regime político burguês só é efetivamente rncional do conceito de dcmocrn cia burgucsu. Nos regimes
dcmocr:ítico c1unndo o Estado assegura de ͪ'º as Jib cr- políticos burgueses concretos que os no;s.os critérios a~­
--~adcs políticas_. (exp~são, .reuni ão, 9.~gg.Dizaç_f!..<;>__ p,~J:!.içlá- plos permitem C)Ualificar como dcm ocrat1cos , as ~?n~tt­
- r ia) c odificadas pelos textos legais. CasQ contriirio, e le tuiçõcs conferem à burocracia cstatnl fa culdades 1l11~11ta­
não passa de uma ditadura disfa rçada, e deixa de nos das __ inclusive n fa culdade de suspender tod as as hber-
interessa r aqui (embora in teresse aos es tudiosos voltad os dadcs r.9J(t iÇà·s~... j)i1~'ú~ill~tc~_-::.=:· cfü;·õ ··-a····" ordêh1- ·si'5êiáT'
( p;Õ·p~i~ dad c privada, exploração d o trabalh o, ap~ rclho
1 par a a conceituação ôc ditadu ra burguesa).
€ claro que a afirmação acima c o nstitui apenas um de E stado burguês) esteja sendo ameaçada. 1s to e: C!.'!!,.
/l
:~ prime iro passo na análise dns liberdades políticas pr6- _gis.~.~Q_21íticas aguda s ou cm si tuações~ rc_volucionárias,_ a
prias i\ democracia burgues a. O passo seguinte con siste burocracia de Esta do pode, com a anucncia do Parlamen-
e m esclarecer q ue: a) .a liberdade pol íti ca gera l, rcsullantc to. liqu idar a democr(lcia p a ra ga rnnt ir a sobr.c vivência d~
d o c umprim ento efet ivo d as liberdades políticas partic u- cal!i!.fllismo; esta é, de resto, a função da f1g~ra. const~­
lares, não é, na_ democracia burguesa, ilimitada e, si m, tucio11al do estado de sítio. O que, portanto, limita ~ 11:
.limitada; b) ~-nE..crêladcs põlfticas particulares não são, bcrdadc política geral nas democracias b_urguesns nao .e
na democracia burguesa,Jfl_ualin-eme usufru-ídãs pelas ciirc~ um eventual acordo quanto à conveniência de ~e c:tcrn1-
rentes cl asses sociais. zarem as "regras do jogo dcmocrátko", m as os interesses
64
65
gerais do capital. Quando estes são ameaçados, a buro~
cracia estatal e o Parlamento - bÜrgu6s providenciam nclo Isto não quer dizer que sejam invariantemente intci:-
a · eternização das "regras do jogo democrático" e, sim, ditadas aos partidos 'da revolução S?Cial (cujo pro~rama
a sua s uspensão, através da impiemcntação de medidas combina socialização dos meios de produção e d issolu-
ditas "excepcionais". ção do aparelho de Estado burgLiê.s), nas democracias bu:-
gucsas. a ução partidária legal , a disputa com os demais
Se consideramos que são estas - e não aquelas
apontadas pelos. autores liberais - as verdadeiras limita- partidÓs de cadeiras no Purlanlcnto ou as utivid~de~ par-
J;1mentarcs. Essa p roibição pode oc_prrer, mas nao e uma
ções impostas ao exercício da liberdade política nas de-
nccessidac!e inscritu na pi:ópria natur~za do regime polí-
mocracias burguesas, temos necessariamente de ver com
tico democrático-burguês. n entretanto próprio desse re-
outros olhos as fórmulas que caracterizam o regime polí-
gime permitir a um partido rcvo luc~omírio o uso tcio~so­
tico democrático "moderno" como o regime do. "pluralis-
m eme parcial e limitado do Parlamento, bem como dos
mo purtidário" oÜ da "livre comp~~i9ª.?....J2.~!l~.~t<lria". O instrumentos. (as liberdades políticas) em pregados na
plurafíS'iiio·. -e . a.fivrc '' êonip«;üçúo, no
'r egime político de-
conquista cfo um lugar nesse organismo estatal. Ou seja:
mocrático-burguês, são apenas relativos, pois deles estão pro.í. bc~sc, aqs punidos . tcv.oJudonácios, ..a .. d~fesa,_:n.9_ ._t_c:.r­
C)(cluídos os partidos dn revolução social; vale dizer,
rcno dns campanh us clcitor~!~....q_~- ·~.2..Ê.~-. ~-X.~<?. P.~E~~~.~­
aqueles que niio só adotam o programa socialista, como tnr da t'ótálidad(! do sc·u.programa político. Uma parte
também considernm que a dissolução do apai:clho burocrá- de·'. seu· programa - aqucfa..qiic prop.Õc· a· dis.s~Jução do
tico burguês e a organização de um corpo de funcionários apnrclho estatal burguês e o define como cond1çao parn a
diretamente controla do pelos trabalhadores são condições implantaÇão cíeüva âo socialismo - deve permanecer
indispensáveis da socialização efetiva dos meios de pro- ausente da ação partidária legal.
duçUo. Assim, o parti9o revolucionário deve, se quiser ter
Os limites do pluralismo e da livre competição na partidpação nas eleições iegisl<ltiv~s ou ~o Parlamento,
democracia burguesa são, portanto, bastante precisos. Po- o mitir os seus " mei os" . e limitar-se a divulgar os seus
dem disputar assentos no Parlamento tanto os partidos "fi ns" .. Corno "fins"... (socialização detiva dos meios de
que defendem abertamente o capitalismo quanto os ditos produção) e "meios''. (qissolução do apnrel~o de Esta-
"soci~Jj~tas..::.,. __qµs., _,P.O[. não incluírç11Lno.. seu.-programa o do burgu~s) estão, aqui, cstreita~cntc rclac1onado~ ~os
'. :_q~;ii).'!ntc.lamcnto elo apat:c.!.h.2_ de Estado burguês, acabam "meios" sendo parte integrante dos "fins"). essa hm1ta-
por aceitar a ?.obrcvivência do capitalismo, aind~ que sob çüo equivale a impedir o partido da." revolução social de
·11ov.a. forma (afin~çào dos meios de produção, pôr cm prática, no terreno legal e parlamc}1tar, ~ ~ro.­
quando.. n.q~ é ..a,companhada pela liquidação do burocra- grama rcvolucionúrio. O Parlamento, sc:vc, ao partido,
tismo e pela instauração do controle operário sobre o no máximo como tribuna para a denuncia de certos as-
corpo burocrütico estatal, dcságua num capitalismo de pccfõS. d~_ç:_a_P.itat.G.m.~..e1e não rode aproveitar-se
Esta.~o e não na efetiva socialização dos meios de pro· c1~ ·H sua--111scrção-..no-~p.irclho-de Estado ~a
dução). di~solu_çf\Q.JJ.as..lorças....am1a~s, a liquidnçii~u
0 ·-:~tclamento.-.<:la-bumcr~ Caso tente faz.e-lo,
66
67

de s ua própria predominância parlamcnt<Jr. Como d izem


alguns cientistas polfricos : democracia (burguesa) é "pos-
sibilidade de altcm iincía" e não "alternância propria-
mcnta dita".
Só pondo de lado o critério da/ "altc rn ância efeti va"
A democracia burguesa e a "Regra da poderemos consid erar democrático ,não a1>cnas O!> regimes
alternância" -·-·-..--·--·-····--·- políticos atuais d os E UA e da Ingla terra (onde, no pós-
! -guerra, dois partidos se rcvczant no controle do Parla-
Vimos acima que o Itluralismo par:ti.Q[ui Q_e a com- mento) ou os da França e Itália (onde, no p6s-guerrra.
pctíç~_ .. P.~!:t:i_ç!~E.i~ são, na democracia burgues~ I a p redomin ância parlamentar se distribuiu entre três ou
can:icntc Imutados. Mas, feita esta rcssalvn, não se po- q uatro pa rridos), mas também o regime político mexi-
d_cna, co'.~º tantos autores liberai~, considerar .que o rc- 1 cano da atualidade. Neste regime - definido por muitos
g1mc_ pol1~1co .(burguês) .. s6 é deniocr<itico onde há pre- (por exemplo, Duvcrgcr) como um r egime de partido do -
d,ommâttcia alternada dos diferentes partidos p9líticos ( di-
i
.~ mirranllJ, distinto ao mr.!smo rcmpo dos regimes pluralis tas
namo~ .n6s: aqu:lcs partidos que estão comprometidos, t e dos regimes de partido tíriico - um mesmo partido
estratcgica ou ta'hcamcnte, com a conservação do aparc- ( PRl ) detém a predominância parlamentar desde a sua
llto estat al burguês ) no Parlamento? Ou melhor: o cri té- fundaçflo, em 1946; se isto tem ocorrido, é porque.:, à
rio li~cral da "alternância dos partidos no gçvcrno" é parte o clicntcli smo e a corrupção eleitorais (presentes
suscct1vcl de ser agregado, s,.s:m preW,.(i.o.s de" Q[Qcm teó- a té mesmo na louv ad<t democracia bipartidária norte-ame-
rica _?~ .. ?..P.~r~tiv.~. à nossa definição de regime.pa'lítiéõ' ricana ), o PRI tem logrado se apresentar às classes po-
democrático-burguês_? pulares rncxic::mas corno o herdeiro du bandeira (mítica)
Incorporar, ainda que com ressalvas, esse critério da Rcvo!uç:io Mexicana de 19 l 0-17. Só mesmo um inr!·
à . definição de democracia burguesa Ímpli-;:aria7° ainda· quívoco p en dor para o fo rm alismo impediria o observa-
uma vez, reduzir a eficácia operacional do ·conceito. dor de entender que foi o relativo consenso pop11far esta-
belecido cm torn o desse " P artido da Re vo luç ii.o M exicn-
Afinal, estaríamos excluindo d a classe ·das democracia s
burguesas aq ucles regimes políticos cm <JUC um partido
1 na" o principal obst<ículo à concr etirnçii.o, no México
logra prese rvar, por toda uma quadra histórica 1 a sua
pred~mim1nci~i parlamentar, graças ao apoiÓ prc stado à
l. pós- 1946, das "possibilidades de alternância".
De resto, a predominância alternada de partidos po-
s ua 1inhn de ação política por certas classes · sociais. Na líticos diversos no Parlamento burguês sequer $Ígnifica o
ve~d~dc'. o regi~e político dcmocrátíco-burgu~s irnplíca a con trole altern ado d a, política de Estado p or diferentes
ex1stenc1a de liberdades po líticas que permitam a cada frações da classe dominan te (capit al fi n an cei ro, capital
p artido polítko, comprometido {estratégica ou tatíca~ comcrcinl, burguesia agrária) . São seguramente rar os.
mente) com -a conservação do aparelho de Estado bur- para não dizer incxi s tct~tcs, ()S casos hí ~ t6ricos de red efi-
guês, lutar pela liquidação da predominância parlamentar nição da hegemonia política no seio da classe domin ante.
de outros partidos do mesmo gênero e pela instauraçiio atrnvés da compctíç5o partidária por assentos no Parla-
. • • •• - ff ~ . .... :... . . . . _. ._ _ _ _. . , . . . ., . \ •• _ -·

r
j.
..
'

66

mcn to. Dificil mente a fraç ão de classe dominante q ue


con tro ~a, no seu conjunto, o aparelho de Estado p er mite
que permitiu o d est rona mento da velha _burguesia c?mc r~
cial e 0 ;icesso de urna nova burguesia monopolista a
69

~uc ? processo de renovação, por via da competição par- condição ele fra ção ht:gcmõnica. ~'a~bém . (oi ,~ ~i~uid~­
ttdún a e da. representação parlamentar, leve à liquidação çfio da clcrnocrada burguesa brnsi letra (d 1ta ohgarqu1-
~
i d~sse contro1e. Nos momentos ·cm que a coletividade in- ca") pela Revolução de 1930 que destron ou a v~lha bur-
i dica os seu_s delegad os ao Parlamen10 , o aparelho de guesia comercial, expor tadora <lc produtos agncolas, e
1
! Esta d o fur: ciona como uma "máquina el ei toral" cm favor abriu caminho parn a hegemonia políti ca da ascendente
i <~a fra?ão cuja influência ideológica e políti ca se foz sen-
r
l tir. m_ai_s fortemente cm seu seio. P<Jr isso, são raras as
burgu esia industrial.
Em suma, quando proc urnrnos testar n eficácia de
I' rc?cfrn1ções de hegemonia po lítica , no se io da classe do· classe do pl uralismo pn rtidário e da compct_i~ão partid_'í-
mman tc, _a tra vés de eleições. A esse respeito, não i ntcr- ria increntes ao reg ime político dcmocrahco-burgucs ,
prct~m os mcor retamcn te a alternância, nos EUA, en tre 0 constatamos que os seus efeitos, nesse terreno, s ão bas-
P?rh.do Republicano e o Partido DernocnWco ou a aller- tnnlc limitados. Tais mecanismos niio são instrumentos
na nc1a, nn lngla!crra, entre o Partido Conserva.dor e 0 clccisi V() s da revolução social (classes trabnlhadoras ma-
Partido Traba lllista. Esses partidos siiu igualmente repre - nua is) ou da conquista de hege monia polí~ica (frações
sentantes do capital monopolista ( o que n ão e limina im- não-hegemónicas da classe domin ante). A rigor, esse rc-
portan tcs d ivergências táticas entre eles, corno pudemos ~ime político permite, no limite, uma certa "ve~tilaçã~"
constatar na p assagem da administração · Cor ter à admi- ~lo aparelho de Estodo burguês; vale~ dize r, a ;1~culaçno
nistraç<io Rcag~n) . Foi a convergência entre · os progra- de diques ou facções da própria fruçao hcgcmomca pelo
mas d esses partidos que consolidou o bipartidarismo com nparclho de E stado b urguês. Não se d_eduza, c~t rctanto, de
altcrnâ ncin anglo-snxü, e permi tiu que es te fosse ~pon­ tal enunc iado, que essa " ventilação" e d_esprov~da de qual-
.e
t~do por cien li.stas políticos do p o rte de Seymour Mar- quer importância política. Que ess~ c1rculaça~ ~ode te~
tm_ L lpset ou de Duverger) como um exemplo a ser se- efeitos considerá veis sobre a luta social (embora nao logre
guido pelas democracias "latinas" (Frnnça, Itália). deslo car os classes sociais e frações desta s das suas respec-
Se tiv~r~10~ cm conta que nem mesmo a conquista tivas posições com relação ao aparelt~~ de .Estud_o ).' atesta-
cJu . pred o m1nanc1a p arlamen.tar por um par tido rcprcsC!1· -o a substi tu ição , nos EUA, d a poltt1ca 1mpcnalista mo-
t~t 1vo de uma fração não-hcgemôn ica significa , ·ncccssa- de rada de Carter (acobertada pela expressão "política dos
namcn te, a conquista do c.on.trolc..._dq. __ Jlrp_ç~io_ ..decisório direitos humanos") pela política imperialista agressiva de
es t<J.t~\ çntcndcrcmos porque, frcq!icntcmcntc, fraçÕcs nU~~-­ Rcagan ( convcnciona!mcntc designada c omo "política de
-hcgcm ô nicas de cl asse dominante têm de participar na beira de abismo").
~c.flagr~ç.ão de "revoluções" (ou melhor, movimentos po-
1:t1co-m1~Harcs com apoio ~e· massa) - o u, pelo me nos ,
A apatia política na democracia burguesa
t~m de, 1.nstru11,1er~talizá-Ias -·- para ter acesso à hcgcmo-
n 111 poht1ca. Assim, por cx:cmplo, foi a liquidação da di- É incon vcnie nte concluir essas cons iderações s obre
tadura portuguesa por urna "revolução" mili ta r, cm 1974, 05 limites desse pluralismo partidá rio e dessa competição
........ - ~---------------------------

70 71

r~~rti<l<íria sem uma breve rnenção ao tema da "apatia po- -burgueses, isso se explica pelo fato d~ ela constituir um
ht1ca nas democracias modernas". Adeptos do i·t· · efeito não da falta de educação e de cu ltura dos cida -
r bc J ' •
neo t ·ra ·. 111sp1rado cin Schumpetcr, sustentam que uma
e l ismo
dãos (pois, nesse caso, o progresso da instrução levaria
cer~~ a~at1~ política, observável nas democracias "moder- à diminuição tam bém progressiva da apatia política),
nas
" • n·10 ' e uma anoma1·~a,· ao .cqntrano: ' · para tais auto- mas da própria forma democrática de E s tado burguês. O
res (corno o nortc-amcncano Lipset), a jtílatia política Parlamento burguês é um organismo cujos integrantes,
da {rrand•'
~·-··-· ,_,.__mass"
_____ . _,.,_...,_os~
r i.
. Cl·'d•ad'a.os ..e-dese1avef;
' . ' ..... "-POl'-·SC ·-~tí-
·- - -- cons a despeito de terem sido indicados pelas massas traba-
t uir em condição
.. · ... · · de
da···d·C:.... d o.. regime ·· bom .. .. ~ ·"''unclo.munc.tuQ...~. d e cstab1lt- ·· lhadoras votantes, es tão politicamente separados d estas.
polltico democrático. Se unâo"o·cr ···:.. ·- A longa duração do mandato parlamentar (cm geral qua-
ncoh bera! , ·a apãtiá politlêã" 5·6·-se..cÕiiv·c~t; cm "prob;~,~~~ tro a n os), o c:1rátcr espaçado das eleições parlamentares
para as_ d_cmocracias "modernas" quando ela ultrapassa ou a irrcspon.$abilidadc objetiva dos parlamentares diante
certos hm.1tcs; vale dizer, quando se transforma cm indi- das massas votantes (as Constituições democrático-bur-
(erença diante do próprio regime político democrático guesas proíbem de modo direto e aberto - é o caso du
moculando n_os cidadãos os germes de uma futura revolt~ Constituição italiana atual - ou de modo indireto e t{t -
contra o regime. cito o mandato imp erativo, a revogaçtio de mandatos pe-
. D~ix~z:t10S de lado a dec laração desses autores sobre los eleitores etc.) obrigam a massa trabalhadora votante
~ dcsc1ab1 hdade da apatia política, pois el a contém um a assumir uma postu ra invariavelmente apática com rela-
JUl. gamcnto político cujas implicações só se to rna riam visí- ção ao Parlamento. ·
veis ca_so nos lançássemos à análise do programa político Se o Estudo democrático-burguÇs proscreve todo e
<l:fcnd1do pelos adeptos dessa corrente. Como essa tarefo qualquer mecanismo de controle dos representantes par-
nao pode ser cumprida ::iquí, contentemo-nos em escla- lamentares pela massa votante, esta só pode desconfiar
recer que, a nosso ver, a apatia política, quando definida das potencialidades da ação parlamentar como instru-
de modo resrritivo - como reduzida participação das mento de concretização das suas aspirações. I sso ex-
~rn~sa~ _trabalhadoras no funcionamento q uotidiano das plica o clima de relativos ceticismo e indiferença que
1?s11:u1~ocs da democracia burguesa - , não é uma coii- impera nas eleições; deixando de lado os guc se abs-
r~ngencia, ~nas um invariante do regime político democrá- tGm, notc·se que os que comparecem às urnas parecem
t 1co-b urgues. O abstencionismo eleitoral (jnvariavelmente estar ali "para cumprir um dever", e freqüentemente de-
~lev~do), o reduzido número de cidadãos regularmente claram que o resultado das eleições nada vai mudar, salvo
inscnt?s ~m. p~rtidos engajados na competição eleitoral o nome dos govc mantes (é este clima que os meios de
ou a _1ncx1stcncia de mecanismos pelos quais os votantes comunicação e os militantes partidários tentam ocultar,
podenam controlar a ação tlos dirigentes partidários e dos ao criarem uma cfcrvesc~ncia e uma excitação artificiais
seus representantes no Parlamento são caracteríslicas per- na "boca de urna" ). Não se deve, cntr.ctanto, identificar
mar1entes das democracias burguesas. esse ceticismo com uma despolitização absoluta das mas-
Se ª, apatia política, no sentido estrito acima aprc- sas trabalhadoras; nada nos permite dizer que ele impli~
semad º• e permanente nos regimes políticos democrático- que algo mais que a mera apatia diante do funcionamento
·-·"-· -- - ----'!!!1!11
-... 1!11'_- - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - - .

72
73
colncrcto da democracia burguesa. Tal apati
na , ser expressão de uma ostur· . . a pode, afi- que as libercladcs políticas particulares , além de serem
oucras formas d~ - ~. a pos1t1va com relaç<lo a limiwdas ( limitaçt10 que Cavorccc, como vimos, a classe
. e aç<io poht1ca · a aç:
e. mesn;o, a ação claramente iÍcgal. ao extraparlame ntar exploradora cm detrimento da classe cxpl oruda), são de-
,\·i1;11alnw111e usufru ídas pel as d iferentes classes sociais.
Alem do mais, note-se que . d
e de funcionamento do p l os...mo os de orga11izaçiio Sobre esta desigualdade - analisadn por Lenin em
. ar amento burguês . f Como iludir o povo (1919) - , lembre-se de que, no
s1sterna partidário cara t • . con crern ao
d e cnst1cas que rcforçan . capitali smo, a dí st ri buiç~o dos meios materiais (dinheiro,
a ma ssa trabalhadorn volante dia nte d· . . .1 ? _apatia
democracia burgues ·l D d .is ms11tu 1çocs da ~ prédios, equ ipamc ntos etc.) necessários ao exercício das
. .
d 1c1dadc <.
das eleições .1 i
a os o espaçamento e
.. · a pcno-
. -~ liberdades políticas particulares (prop aga nda, organiza-
r.
t nrcs dian te dos votdn; rrc~ponsabil1dade dos parlnmcn- i' ção da rnúquina partidária etc.) é invariantemente desi-
gozados por aqueles ;sp~ ~d ampla gama de privilégios
0
l
!. gual. A ssi m, a burguesia se serve mais intensamente <las
1
m odo irrcrr ular e ... 'm t ri os tendem a iuncionar de
"' "
votantes. Na democracia b
nn cr aços frou
. xos c_orn as massas
! li berdades políticas do que o p roletar iado. Este, nn ação
que desenvolve no terreno da dcmocrncia burguesa, é
, urgucsa, os par11dos , .
e l tudos aq uclcs que defendem . - :u m- portanto lim itado não apenas pelo comprom isso da buro-
scm, no en tan to, propor a d' . 1u~ programa socialista c r <.tcia estatal com o capital is mo { compromiSso que se
burguês - só se d' . isso uçao do ap a relho esta ta l encontra codificudo nas Constituições democrático-bur-
m<im1zam no mome t d , .
de votos ( são partidos clcitoratist· ) n ..o a conquista guesas), como t~1mbém pela s ua pobreza relativa. Esta
nhum lugar irnportan;c ~ . . as ' e nao reservam fH.:- obscrvaçiio sobre o acesso des igual das cl<1sscs sociais anw
- .is massas votantes l tagônicas às liberda des políticas não faz parte, a rigor,
11 rzação interna (são 1 d r a sua orga-
dc Du vergcr, " partidos od os, pdara .~mprcgar a expressão do t rabalho de co11cci:uação do regime político dcmocrá-
. . e qua rns ) . Nenhum 1 , tico-burgu0s. Na verdade, cssn desigualdade ~ "externa"
aumento voluntario da .. artíci :- . . " apc o '10
tui, portanto, cm solução P ara paç<10 polit1ca se :onsti- ao regime, por ser determinada pela distribuição desigual
l ítica na dcm . b P 0 problema da apatrn po-
de lugares (produ1or direto não#proprictário, proprietário
de!er - d ocracia urguesa, pois ehi, como vimos é dos meios de produção não-produtor) no pro cesso social
mma
- .
' e·1cas permanentes da f '
a pelas caract cris
d cmocratlca de Estado bu ~ d . d<1 produção. Todavia, seria inconveniente terminar este
mocn:!tico-burguês.
Jo rgues e o rcgunc r . orma
po lllco de- capítulo sem uma menção, ainda que breve, a essa limi~
tação indireta, decorrente do caráter capitalista da coleti- ·
vidadc, imposta à liberdade política n a democrncia bur-
guesa.
Dei:n.ocracia burguesa e desigualdade
poli.taca

rc.il To~as as lin~itaçõcs impostas à liberd ade política gc-


,. .pnoa/'r· cm?cracia burguesa, demonstram oue :i iou~ua
d. "' ' 'ca e nesse reg1me, · · . ·i --<>· "~· "---
....... ....... ·-·--.!.. ·-.. irreal ou {Jctícia· e isto por-
- - - -·- ~
75

4 na de 1959 - não levaram , quaisquer que te nham sido


as íntcnçôcs dos dirigent~s revoluciontírios, à formação
de coletividades socialistas nesses países. Tendo sido der-
Socialismo e democracia rotadas importantes experiênci as políticas - como a do
comrolc opcnírio, na Rússia de 1917-18 e a das comu-
} nas. na China de 1958-76 - , e tend o o "mod~lo de
socialismo" que es tigmatiza va tais expcriêncías ( isto é, o
modelo d ito "russo") se espraiado por outras coletivida -
des pós-revolucionárias (Cubn, Vietnã etc. ), sob as apa-
rê ncias do ''sociali smo rcnl" se encontra, por toda parte,
u ma nova forma de capitalismo: o c apita lism o de Estado.
Nesta varia nte do modo de produção capitalista - iro-
nicamente viabilizad a pela eclosão de revoluções popula-
A democracia no programa político res - , é a...11urocrncia de Estado, no s eu conjunto,~em
socialista d~- 0-eontm.le efetivo dos meios de produção e dÕ
produto final, R.9.f se( 9... g.rupo socia LSl}.~~mg~ tanto. as
. Nos capítulos nntcriorcs, concc-1tu:1mos unidades de produçâ() consideradas individuãlmcntc (ãl'ra-
e Hl como f ormn de Estado e como r · . a .dcmocra-
. véS do s istema de direção unipcssoal) t uanto o conjuntó
seguir caracterizamos as democracias cgr~l~ pol 1t1co, e a da_.cconomia a:icion<lL(.atrav1~s .~ _pla~1ifica ora -' -
cravista, feudal) e a democracia bur uc~:c- urg~cs~s (~s­ isto ~. a elaboração dos célebres p la n os qüin quenais -
dc conclusão, devemos determinar ~ l . Agorn, a guisa implementada pelos ministérios ). Ao impedir que os pro-
expressão democracia no programa upgo~~ti~ocupacf? Ip_cla dutores diretos controlem de fato os meios de produção
Nest a opcr - . soc1a 1sta. e dirijam o processo 'social de produç5o, essa burocracia
açao, articulam-se o procedimento . , .
_(de.lecção, no presente hist6rico de tendência c1cnttf1~0 estatal explora os trabalhadores manua is. Sob as aparên-
mdlcam as reais possibilidades d~ trnnsformaç:'jos que fJá cias de uma ..burocracia", esconde-se portanto uma nova.
turo ' das çolct'1v1'd a d es capitalistas) e a · · . · t"' , no, . u- espécie ele burguesia: a burguesia de Estado. Para man-
(clabornção de um p , . < mr.ct~ 1va polittca ter-se como classe dominante, esta conta com importnntcs
- regra ma p ohtico soc1al1sta cu·a d'
;11~n;;10 prospc:tiv~ se apóia no trabalho científico J~ d~~ trunfos políticos: a t radição revolucionária (da q ual ap<i-
ccçuo de tend1.:ncrns). recc, por obra da ação ideológica e política do partido,
Esclareça-se que se , . como a principal lcgatária), a eliminação da insegurança
' enc,1ramos ainda o socialism
como programa, e não como realidade histórica é ~o~º (própria do capitali smo privado) d os trabalhadores ma-
~~ e s ~or;sid;~mos que as grandes revoluções p~pular;; nuais quanto ao emp rego e à velhice etc.
ccu -º . - como a Revolução Russa de 1917 a O verdadeiro socialismo não se identifica, portanto,
Rcvoluçao Chmesa vitoriosa em 1949 a R 1 - ' com o capitalismo de Estado (cuja expressiio ideológica
, evo uçao Cuba-
domin ante tem sído a proposição de um " socialismo de
::...:.:._.... .
- '·. ·- ··w··- --.:.---..

76

77
Estado"). f;lc-f.Q.U.SL~lC
.....Jl.a...cfctiva í\P.r.9..e!íaç~~?~!f.2..Cios
dc_ mod_w;fl9.. ~_çf_Q__p_r.: 9_d_uJQ_ P.cl_c__ !?.r.2.P.~i.Q~~dire to. . . d vem exercer o poder de Estado
No verdadeiro socinlismo, si'ío os trabalhadores mãiluuh;-
lliadores manuais e
. , • dito Para tanto, ,e
·~m de ornanizar ::i • •
um
d
quc gerem cada unid ade de produção e o conjunto da eco- propriamente . " r . , ) qualitativamente d1stmto o
novo Esrado (socrn ist.1 ' . 1· t '"' p-oJctãrio terá algo
nomia nacional, através.de comitês que organizam as n1i- . o Estado soem is .... 11
vidadcs p rocluti~as particulares e se articulam pa ra a ela-
Est ado burgucs. b . (e também com os
cm co mum - com o Estado _urguc~ ele ainda cons istirá
Estados historicarn~nt~. :rn_te~l~~~'>~ ·a favor dos interesses
boração de um plano econômico global. Aqui,' ··-ao...in.l:'.(s_
d~ direção uni pessoa( .A~~ .':!!'U?.!:~~Jh QQJ!l.Í_ !._l~~....S~.§!~?-~E.c­
..... num corpo de func1on.tr1os g . 1 Ao mesmo
d riãac-e mprcsã"Cã9.=iUY.~~Ul9_ P1<1'!9 . bu roerá ti co ( í nc um- d terminada classe sacia .
b0fiCG'"°·aõ:: n·i'inls.tr.aj..,_domina.._a.__~_ç-~ 2.... P.!~..DifisjtÇ!Ç_~*· ~:.~--- gerais d e1 uma e .- . , do Estado burguês pelo
!.?. ~_<.2!' . . nro dutorcs....diz:c.tos... · tempo, ta ~ .
E tado se d1tcrcnc1ara
r 'd«;ão da divisão do tra (1 10
b IJ
fato de: a) impli car a E1qu~ da. b) não mais se organizar
J><ira nós. portanto, o socia lismo continua n ser fun- seio do aparelho de sta o, .
da m en talmente um programa político, por n<"io se ter con- no . , . do burocratismo.
cretizado híswricamcntc. Por isso, deixamos aqui de lado segundo os pnnc1p1os, . . ochlista implica, portanto, a
O programa polrnco s • d 1 .1e Estado sem
o "socialismo n:a/" e.: nos abstemos de qualquer rcflcx<io d .~ d um novo mo e o u
nosso ver. a ~ oçao . ~·
'
sobre as possibilidades da democracia nas coletividades de uma coletividade qualquer
o qual o carntcr socia.is_ta - E pr1·mciro lugar, esse
assí m organ izadas, embora a noss<t pcrspcciivu teórica . .: d f1cçao. - m · ..
nüo passarn e mcrn " uímico" - dm-
( guc leva à caracterização dessas coletividades como c(1- Estado deve resulta r de um processo q. de " fusão"
p iJa/is1as de E.rrado ) não coloq ue oostúculos no trnru-
gido pela classe do_s trabalhadores. maTnualn 1spr~esso liquida
menro desse tema (essa nova espécie de Estado burguGs - li tatal burgucs. ' ·
seguramente pode sofrer, do mesmo modo que o Esrndo interna do apare .10 es ·-mpartimcutalização horí-
a especia lizaçilo rnterna e ª- co se exprimem con-
burguÇs dássico, variações q uanto u forma). Resta-nos, . 'd d · estatais - que
nesse caso, responder à pcrgun ta: como e por q uc.: é zontal da$ a t1v1 a cs d b guês através da prolifera-
no Esta o ur ' - . -
possível incorporar a expressão democracia ao programa eretamente - , . /!tos (ministérios, admm1straçao
político socialista"? çiio de ramos ou subap~i e . . , . ) o Estado soei a-
, . ~ ·ito JUd1crnno e 1e. · . .
civil, pol1c1a, cxcrc ' . subaparclhos cspeciah-
lista deve, porta~to, rcag~"upi'3cr aº~os pelo Esind~ burguês,

l)~is
zados e cornpart1mcntaclo.' g d' . - do tnbalho
O Estado socialista essa concentraçiio (liquidação da i:i_saodo po;Jer de
d 0 ) v'abilizará
1 o cxcrc1c10
. no seio do Esta ·a·s Isto significa que
Pura que o socia lismo efetivamente se implante cios trnba lhado rcs manu, i • . .
numn coletividade, é indispensável que: a classe dos Estado p ., .. . . rovincíais, centrais)• csp,1-
os órgãos de Estad.o (l~ca1~, l p deverão possuir múltiplas
lrabalhadores manuais (o "proletariado", num sen tido
lhados pelo espaço_ tcm tor:a '·ca organiznção da defesa
competências (gcstao ccono_md~ o' ação judiciária etc.) .
amplo) exerça o poder político (imposição dos seus in-
teresses gera.is' às demais classes sociais legadas pelo capi~ . ( r cinmcnto <.JllOll ian , < ,
talismo) por duas vias d istintas. De um Jado, os traba- nac1ona , po
d
1 e, o processo d ccis
. 6r1'0 estatal • tornar-se-a
Conccntran o-s
viávcl o exercício do contro1e, p
elos trabalhadores ma-
.•. .. . - ~ ..,..-- ··- ~ ·-

79
78
'
i . 1·ais oroaniza-
11 uais,sobre os Cuncionúrios estatais, e dificultar-sc-<l a E tado ropriamente d HO. . · • 0
aparei ho de s P :- .- 0 funcionários md1cados pew
monopolização das decisões estatais por estes. çõcs, cujos membros nao S.:l • os próprios trabaiha-
'Em segundo luga r, o Estado socialist3 não mai:; se los trabalhadores manuuis c,ds1m, s e moradores devem
. , ianto pro utorc ' .
organiza intcrn11mcnte segundo os princípios do burocra- dores mao\la1s, cnqt . ntc de wrcfas adm1-
. cro sempre cresce
tismo. O recrutamento ele funcionários através de pro- •abocanhar um T num Desse modo, estnr.10 ,.. deflagrando
cessos formalizados de aferição da competência individual nistratívas e nu itares. d , d statização progressiva da
para as tardas administrativas ou ccprcssivas é, nesse Es- e dirigindo o processo _e esc... ndo iniciativas concretas
tado, substituído por uma nova prática: são os próprios . ·ct d ·sto i;,
colct1v1 a e, 1
·~ cswrno tom...
• -
,
gr"ctu a\ (ou o àepere-
. ocar a extrnçao " ' .
trabalhadores manuais que indicam os func ionários sc- com vistas a prov • n"'d··· tem de <1utoma-
. <lo T· 11 processo " ..
gu ndo critérios ideológico-políticos (o compromisso cfc- cimewo) do E sta · · , t [ormulaçõcs de Mane.
1i vo do candidato com o programa político socialista), e
os sugerem ccr as d
tico (como n. ) nem pod e d.cpcn der da iniciativa a
nfio mais segundo o critério da competência tecnoadmi- Enocls e Lenin ' ponto, de .resto,
:>
bu rocracia soei a ista.
• r · Sobre es(l e \'1lt'1mo . a' r'ios de um Estado
nistrativa. Além disso, o funcionamento interno quoti- . ·11s- es· os u11c10n
diano desse corpo de funcionários não mais obedece ao n'io devem pairar t L, o . l trabalhadores ma-
' . . · d , indicados pc os • • ' . . .
princípio da hierarquização segundo a competência: os soc1ahsta, nin a q ue 1d tenderão sci:npre, instmtl-
funcionários mio devem prestar contas a um "superior" nums, .
e po r eles contro a os,favor da transformaçao
w •
- d·,,s
supostamente mais competente, mas aos trabalhadores vameute ou nao, a ,?góir._e.m elativas, ein privilégios bu-
manuais que os índicaram. Tais funcionários são porta- suas vantagens, pro'<IS nas e r
dores de um mandato imperativo ou fechado (que os rocráticos . d t do 0 que é per-
obriga a cumprir instruções estritas), que pode ser revo- Essa relação ele son~a-zer~el~º~o e seu transforma num
gado a qualquer momento (o que ocorre no caso de os <lido por um dos termos da ç d d, Estado e po-·
t o termo) entre po er e .
funcionários descumprirem as instruções de que são porw g anho para
tadorcs) por iniciativa das próprias massas trabalhadoras . . o ou r·d ela via . na- o - cstat"'l < "
r1ão e a1)enns
der poht1co exerci o p , . , de se organizar o po-
munuais. A uova burocracia socialista é, port<.into, direta- . · . odos poss1ve1s , .
U m dentre vanos m
, · . verda d e essa 1.:o;; a úmca xna-
mcn te controlada pela classe dos trabalhadores manuais. der político proletano; na 1 . e'ssa relação complexa
.
ne1ra.
e aso n.1:-o se cstabc , .
cça
bsistcntc e as organ1za-
.
elho burocra11co su . .
entre o apar ba1hadoras manuais, a esta-
As organizações de massa e a ções de base das massas tra . de produção se con-
l · · ação dos meios .
desestatização tiz.<w~o ou a ':º cllvtz tos de implantação não do soc1a·
verterão cm mstrumcn f m·l de exploração do
De outro lado, a classe dos trabalhadores manuais . .. d uma nova or , -
hs1110 e, sim, seja. ~ f . r ios estatais passnrao a
deve exercer crescentemente o poder político por uma os unc1onar .
trabalho. O u · . . s de produção estatiza-
segunda via ~nãowestatal); vale dizer, através de orga- l ·fetivo dos meio
deter o contro e e do-se assirn numa nova
· · ados converten
nizações de base - implantadas.. no 1ugar de produção dos ou co 1ct1vri , . d Estado. Saliente-se,
e de mo~adia - que não se encontram integradas ao c\asse exp o l rad ora. a burguesia e
·
....... ,,.,,, .. .......... .......... ..........._,__.__..
' _._......
. ,, _. ________ ·- - -- --,-- -- -- - - -- - -- - - - - - - - - - - -'""\l'W•f(J 1- ~:.:,.',!','~. ,:,""--. ..........

8()
61
entre parên teses, que esta rn1o .- . .
rninnntc. tln História a se . .scr,1 n pnmc.1ra classe do- escolas primárias européias). Assim, os computadores,
d0~ ?:::::lo:; de ·n odu :- ~pornr na propned adc cs tmnl ao invés d e determinar uma inevitável expansão do apa-
ducor dire to· ;ssím çt.10 lp~ra explorar o trabalho do pro- relho b urocrático cstatà l, podem-se conver ter em instru-
. ' arn >crn procedeu 0 d
c1011 ários e snccrdotes l d' grupo os fun- mentos ágeis de gestão nas m ãos de funcionários politi-
1 o mo o de pro d :- . r. •
AI ~ , uçao as1.itJco. cnmcntc controlados e de trabalhadores manuais organi-
gucm podera sempre objct
I~rogramn político socialista - ar qu,e es.~~ c:emento do zados cm comitês de empresa ou de bairro. Em suma: a
s1va da coler 'd· , 1, • a descsta t1z,1çao progrcs- informática não é um obstáculo à dcsestatização das co~
t\ t auc, a partir da pró . .
Estado socialist·i - . . , pna implantação do letividades socialistas que incorporarem os seus frutos; ao
. 1
· ' - e 1rrea rzavel ua práf . é
pw. E, por exemplo . • rcn. uma uro- contnírio, ela pode facilitar u progressiva reabsorção das
scgundo a l . ,: o que ~ustcntam os adeptos da tese rnrcfas administrn tivas e militares, ditas ''estatais", por
. . g ua
rna1s mode rnas·· C)(ige
complexidade d
.
ª . · .
- as socJcdades mdus- essas coletividades.
na vida cconô~ic;-soci~J 1~1crvençao c~esc.:cnte do Estado
funcionários cspcdalizad . duma quantidade crescente de
nicas. os, otad os de con hecimentos léc- O caráter democrático do socialismo
'
.t: impossível responder e
essa c rítica neste úlli , om alguma profundidade a 'f. <?.... P2del:__político proletário, exercido _simultanea-
d elibe radamcnt" o r1'scmoodcap1tulo. Assumimos portan to, men te por .c!..l.l~s~ (a ..~o Estado ç_a das or&ª=-.-
"• · e aparece d' niz~çõcs ... d.c .. .basc.) , que denominamos, a.9.iE; ...E.'!!!.!EE!.!!.E..~O...
dos lei tores, como ade tos de _rmos, . iante dos olhos
mos pelo menos .fazer ~ ~ssc uma. utopia. M as qucrc- S!J..ÇÜJ.U.~1iL Como já havíi:unôSãfirmado no primeiro capí-
s ucJnr ... s. " ) - t • , rcspcuo, d uas ol>scrvaçõc< tulo, ao introduzirmos a expressão democracia no p ro-
" · .. us cses accrc d - "
a "complexidade das soei da d a relaçao necessária entre grama político socialista, rompemos parcialmente com um
ção crecenrc do Estado e:- a cs rnodernas" e a intcrvcn- outro modo de usá-la, presente neste mesrno texto. No
anos vindouro'· J>o's . . . v,to passar por dificuldades nos socialismo, dcmocra.cj'!.... 11.~.o __é_.umª das for mas . p_q_s_~ íveis
.,,, 1. m1c1ou-se no p , · . .
nopolis ta avançado dos a SO roprro capitalismo m o- do· E'.s'iact~ ..~ •. -aj!1h....íLPIQP.!ia .E§!.ência qi_~_~ta,d,q .$ociai is~-·
do E stado assistencialistan~s . , um ~ro~csso d e retração . proletário. Tal expressão indica, aqui, o controle efetivo
W elfare Sta te) ; b) . . ~n rervencro~ista (o chamado da bur'õcracia estatal p elos trabalhadores m anuais. ~
0
paíse s capitalistas av~~~!~esso ~ccnológ1co registrado nos o termo democracia cobre também, no socialismo, a
décadas, pode ser aproveit:~· urantc as duus úllimas outra dim.cnsão 'do·-p-ô·~~i:~.P-~lítico dõStrâbai~dOrê~ma­
sem que isso impliq ( o pm~ um Estado soci alis ta nuais ; vale dizer, o exerdcio desse poder político pel1!...:Yia
C]Í IC técnica prestador~C
tares. A · f .' .
d:
SC~~~~ÇílO n~c.cssár!a de uma
ç s adm1mstrat1vos e mil i-
11ão-estatal
·•#'••·· -
{organizações-de-base) .
Nessa pcrspcctiva , não se pode usar a expressão
m ormat1ca vem-se tornando
por força d · .. ' n os anos 80 _ democracia para dc:>ignar um dos regimes políticos pos-
< a sunphf1cação crescente d r .
cada vez mnis acessível - .ªs. mguagcns - , síveis no socialismo; o regime político no socialismo só
utitizaçiio crescente d ,ªºs nao-cspcc1alis tas ( veja-se a p ode ser · democrático. E .demqcracia socialista sign ifi ca,
e computadores por crianças nas
aqui, a libcr~ad.~...J?.~J[~ica geral ~~~0or_:_~aS-coi.::.-
. -
.....-....-... .........
~~~=~~.,...,..,~'""'""'--.....,..._,,,,,_,.. _____.......,

83

rentes poiít.i,cas ...{ entre as quais podem existir importan- ( tais quais eles são legados pelo capitalismo à coletivid a-
tes d i ver gênci as lá tícas) que dcfendem ...9JQ.Ciali.s.m.o_'i.C= ... de pós-rcvolucioniirin) dos trabalhadores ma nuais, q ue
sun do a ó_c.ic.~_dos.......tr.ab..aih..arloreS·-·iiiãii'~-ªis ( sociafüuc;iio s:io, ao mesmo tempo, pequenos proprict;'irios (como o
dos mci.os ..d.e.. prodl\Çâo_J!J..ªlL~J.!P..!.Ç,~_sji...Q_~a...di>!.is.ãCL.~mL campesinato mi:cJio) ou podcrn vir a sê-lo (como o pro-
traba lho. intelectual e trabalho manual mais extinção ru:Q- letariado rural, que pode aspirar, diferentemente do pro-
grcssiva do ·-Estad.Q.. s9ciali.~_t_~)~;~=~--- ... ____ ....__._ ...... . letariado da grande indústria moderna, à repartição do
Finalmente, ressurge a pergunta com que conclufa- meio de produç ão - a terra - e à conquista da con-
mos o primeiro capítulo deste livro: na expressão demo- dição de pequeno proprietário). Já a reorganização so-
cracia proletária, ou democracia socialista, o que se con- cialista do aparelho de Estado se choca com as aspira-
serva dos significados historicamente anteriores do termo? ções dos antigos funcionários estatais (trabalh adores as-
Exist e algo de comum, na ótica marxista, entre as de- salariados nilo-manuais), pois estes querem preservar,
mocracias pré-burguesas, a democracia borgucsa e a de-
mocracia prolctári~i (socialista), a ponto de recorrermos,
cm todos os casos, à mesma expressão; democracia?
Nossa resposta nos remete de volta ao mais tradi-
!
!
quando não ampliar, os privi16gios burocráticos. E o
ataque i'i divis<io entre trabalho manual e trabalho inte-
lectual fere os interesses objetivos da c lasse média (tra-
b alhadores não-manuais), que tenderá a lutar pnra que
·1
cional indicador - presente já entre os filósofos gregos 'f a "cspcc:ializaçiio" e ;1 "hicrarquizaçiio de dons e méri-
- da existência de u m "governo d o povo": que este tos" se mantenham s ob o "socialismo".
seja, de fato, um "governo da maioria". Ora, assim Portanto, a tran sformação socialista é a revolução
como as democracias de classe exploradora foram, todas, de uma minoria (trabalhadores manuais puros e simples)
"governos de maiorias" (tal m aioria sendo, no caso, o e, não, de um.-1 maioria (todos os trabalhadores, indis-
conjunto dessa classe, presente diretamente no Estado <)U tintamente). E o poder político proletário, exercido por
aí representada por delegados), também a democracia so- dupla via, é um "governo da maioria" apenas no sentido
cialista se constitui cm "governo da maioria". de que é o conjunto da nova classe dominante (Ira balha-
Mas de que "m.aiorio" estamos falando nesse último <lorcs manuais) que o exerce. Por isso, é impens<1vcl, no
caso? A nosso ver, democracia socialista não equivale ao ponto de partida d e uma coletividade socialista, um plu-
governo da maiori a da coletividade, tal qual esta se aprc- ra lismo político ilimitado que nüo traga o risco de uma
scrltu imediatamente ap6s a dissolução do aparelho d e Es- restauração do capitalismo privado ou da implan tação de
tado burguês. A transformação estritamente socialista n ão um capitalismo de Estado. O pluralismo pol ítico, na d c-
é, como querem certas correntes marxistas, a "revolução rnocracia socialista, abrange exclusivamente as conentes
d o maioria social" ou a "revolução social de todos os tra- (corporificadas em diferentes partídos ou cm tendências
balhadores". A socialização dos meios de produção con- d iversas dentro de um mesmo partido) comprometidas
vém objetivamente aos trabalhadores manuais não-pro- com o modo radical, próprio aos trabalh ado res manuais
pri etários, como o proletariado fabril ou o p roletariado puros e simples, de conceber o socialismo (para simpli-
dos serviços, mas não corresponde aos interesses objetivos ficar, diríamos: um socialismo p roletário, e n ão o so-
________ ...._,,_~'"~-·-----------------------------·

84 85

cialismo pequeno-burguês, o socialismo de Estado ou tipo de desenvolvimento que convém à coletividade? A


me~m~>. o radical!sn:o .agrário). Esta limitação não cx- escassez de bens e serviços deve ser en carada cm termos
c! ~t, .(! c!:lro, =i cxJstcncia de partidos não-socia!istas, desde absolutos ou relativos? Tal escassez> qualquer que seja
que estes se contentem cm desempenhar um papel su- sua forma , já foi vencida?
bul tcrno e estejam alijados de qualquer mecanismo, prá- Nessa coletividade fu tura, a fórmula proposta por
tico ou formalizado, de "alternância" entre partidos. Rousseau, em O contrato social - a oposição entre inte-
Todavia, a relação entre maioria e minoria, no so- resse geral e interesse particular - , encontra afinal um ter-
cialismo, não é tão simples assim. A minoria que aí go- reno ad equado. Liquidadas as classes sociais antagônicas,
verna (o conjunto dos trabalhadores manuais puros e sim- o conflito de interesses entre elas deixa de ser a fonte prin-
ples) se choca, inicialmente, não só com a antiga bur- cipal de antagonismos n a coletividade, e a oposição entre
guesia corno também com as demais classes traba lhadorns as aspirações da coletividade (aferidas segundo u "regra da
(carnpesi na lo médio e pobre, proletariado rural, antiga maioria") e as aspirações individuais (expressões da sin-
burocracia cst<ttnl. classe média); por isso assume o ca- gularidade de cada ser humano) perde o seu caráter for-
r:itcr de uma nova classe dominante. Mas fá-lo na es- mal, convertendo-se no motor da vida social,.
perança de liquidar, cm médio prazo, todas essas dife-
renças de classe e <.Ic obter a adesão final dos antigos
membros elas demais classes sociais, já transformados cm
seres rnult idimcnsionaís (produtores, intelectuais, políti-
cos), aos resultados d~1 política socialista proletária. As-
sim. a mi11orict' presente (trabalhadores manuais) age, no
socialismo, cm nome da maioria futura (o homem mul-
tid imensional da coletividade sem classes sociais, sem di-
visfio ·· entre trabalho manual e trabalho intelectual, e sem
Estado).
Caso a política socialista proletária leve efetiva-
mente, no fu tu ro, à emergência de tal coletividade, a ex-
pressão democracia tenderá, talvez, a sofrer mais uma
metamorfose. Isto é: ela não mais servirá para designa r
a essência do Estado (socialista proletário) e o regime po-
lítico socialista, pois estes terão deixado de existir. Neste
novo contexto, pós~cstatalt ela se reduzirá à sua signifi-
cação clemcniar: a "regra da maioria". Tal r egr a permi-
tirá a resolução dos ínevitávefa conflitos que os homens
multidimcnsionais, liberados de sua condição de seres de
classe, travarão cm torno de questões como: qual é o
67

democrático~burg uês concede a todos os homens a ci-

5 dadania propriamente política.


C lasse social : posição ocupada por uma série de homens,
no processo de produção, relativamente aos meios
Vocabulário crítico de produção (controle, não-controle). As classes so-
ciais fundamentais, numa coletividade, são aquelas q~c
ocupam essas posições antagônicas , mas esse sistema
,. invariante de posições antagônicas abriga, historica-
i mente, diferentes classes sociais proprietárias dos meios
de produção e diferentes classes sociais produtoras di-
retas dcsapossadâs, já que as forças da produção (tec-
nologia, nível de aprendizado, grau de divisão do tra·
balho) concretamente se transformam.
Democracia: uma das formus que po de assumir qualquer
Burocratismo: modo particular de organização do apare- Estado a serviço de uma classe social exploradora,
lho de E stado, fundado cm duas grandes regras: a) o bem como um dos regimes políticos que podem se or-
recrutamento de funcionários estatais · e formalmente ganizar sob t<:1l Estado. Mas, como elemento do pro-
aberto a todas as classes sociais; b) o recruta mento e grama político socialista, democracia passa a designar
a promoçãR d~ func ion ários es tatais seguem, formal e a essência do Estado socialista, o regime político socia-
n~are~tcmcnte, o critério ·da con\petê ncia individual, lista e o exercício, pela via n ão-estatal, do poder polí-
cnstalizando;-se, dessa forma, uma hierarquia burocrá- tico de uma classe social não-exploradora.
tica d e competências. O burocratismo é elemento de D emocracia burguesa: forma de Estado cm q~... classe
dc fin içiio do Estado burguês , co ntribuindo para distin- social exploradora (capitalistas) logra, por predominar
gui-lo dos Estados historicamente anteriores. invariavelmente no Parlamento, formalmente aberto a
Cidadania : condição de sujeito individual de direitos e todas as classes sociais, repartir com a burocracia de
d eve res atribuíd a a a lguém pelo Estado . Os d irei tos do Estado a capacidade de definir e implementar a polí-
cid~dão podem ser civis - como a liberdade pessoal, tica de E stado. Também é, correlatamente, o regime
a liberdade de trnbalho ou a liberdade de exprimir o político no qual a competição partidária com vistas à
seu pensamento - ou políticos - como o direito dê conquista do controle do Parlamento existe, mas é do-
vo tar ou o de se candidatar a cargos eletivos. O Es- minada invariavelmente pelos partidos políticos objeti-
tado burguês, qualquer que seja a sua forma (demo- vamente comprometidos com a conservaç ão do capita-
crática ou ditatorial), converte todos os homens, inde- lismo.
p endentemente de sua posição no processo social de Demoaacias pré-burgiu:sas: formas de Est ado em que o
prod ução, cm cidadãos no plano civil; mas só o E stado P arlamento existe, mas já está formalmente reservado
-- . --··----___...;....---~~-----~!!l!!l!!l!ll!l!!!!!!!!!911!1~
8!)
138

ú classe exploradora e, eventualmente, às classes inter- Esrmlo socialista: tipo particular de Estado, no qual a
mediárias aliadas, bem corno formalmente interditado burocraci a é diretamente controlada pelas massas tra-
à classe explorada fundamental. Também é, correla- bn\hadoras ma nuais, repartindo a capacidade governa-
lamentc, o regime político no qual a classe explorada tiva real (gestão econõmica, justiça, defesa nacional,
nflo dispõe da faculdade de se organizar com vistas a policiamento etc.) com organizações de base, não-esta-
introduz.ir seus representantes políticos no seio do Es- tais, dos produtores diretos.
tado. Forma de Estado: modo pelo qual se relacio nam, ao
Democracia proletária: Estado cm que a burocracia é di- nível du definição e implementação da política de Es-
retamente controlada pela classe dos trabalhadores ma- <ado, as diferentes partes (ramos, subaparelhos) do
nuais,..·/ Rcginie político no qual só os partidos, tendên- aparelho de Eswdo.
cias ou correntes comprometidos com o socialismo Hegemonia (de· fração): capacidade de uma das fraç ões
.1.
proletário (socialização dos meios de produção, dis- da classe dominante fazer i>rcdominar os seus interes-
solaçâo do aparelho burocrático burguês e supressão ses peculiares no terreno do processo decisório estatal.
da divisão entre trabalho intelectual e trabalho ma- Poder de: Estado: capo~idade de umn dentre duas cl.isscs
nual) podem conquistar posições no aparelho de Es- sociais antagônicas obter, do aparelho de Estado, uma
lado e nas organizações de base. Reabsorção de umn polí tica que garanta os seus interesses gerais, em de-
parcela crescente de tarefas administrati vas e mili tares trimento dos interesses da outra.
por organizações de base dos trabalhadores manuais, Poder político: capaci'dade genérica de uma dentre duas
não-est<itais e implantadas no lugar de produção ou de dasscs sociais antagônicas impor os seus objetivos po~
moradia. líticos (satisfação dos seus interesses de classe) , pela
Estado: organização especializada no desempenho da. fun- via estatal ou extra-estatal, à outra classe social. O
ção de atenuar o conflito entre as classes sociais anta- poder de Estado é espécie do gênero poder político.
gônicas e de estabilizar, por esse modo, uma coletivi- Regime político: conjunto das condições sob _as. quais,
dade ci ndida por tal antagonismo. num tipo particular de Estado e dentro dos limites cs-
Esrado burguês: tipo particular de Estado que converte tabclccídos pela fornrn de que este se reveste, se dcsc~­
· ' todos os homens, indepen<.lcntcmentc de sua posição no volvc a ação (partidáriri, faccionai) da classe domi-
processo de produção, cm sujeitos individuais de di- nante com vistas a participar, juntamente com os
reitos e deveres (cidadania, no plano civil), e que se funci~nários estatais, do processo de implementação
organiza internamente segundo os princípios do bu- d n política de Estado.
rocratismo.
Estados pré-burgueses: Estados historicamente anteriores
ao Estado burguês. Negam aos membros da classe ex-
plorada fundamental a cidadania, tanto no plano civil
como no político, e não se organizam internamente scv
gundo os príncípios do burocratismo.
_.._ _ __ _ _ _ __ .._ _ _ _ _ _ _""'"""_ _,_,,.,,..,......,.,.,..;·- - ·- - ........- ...__ _ _ _ _ __ __ __ _ _ _!bll!I!!!

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t
tt 91

a teoria do Estado esposada pelo a utor - não se ex-

6 plicita1n in teirament e.
D uvERGER , Maurice. Os regimes politicos. 2. cd. São
P au lo, D if us<io E uropéia do Livro, 1966. (Cal. Sabe.r
Bibliogra.fia comentada Atual. )
Esse representante da corrente de ciência política dita
"institucionnlista" aprcscma, aqui, múltip los cr it~ri os de
classificação dos regimes políticos, sem, no entanto,
/ propor uma definição geral de regime político que uni-
fique satisfatoriamente esses critérios. De qualquer
modo, a consulta a esta obra é obrigatória pai:a os
que se interessarem em aprofundar o esrndo do terna
democrachi.
FINLEY, Moscs. Dhnocra1ie antiqu e et démocratie mo-
Apresentamos abaixo uma pequena lista de textos derne. Paris, Payot, s . d.
<tllc foram decisivos para o nosso trabalho de elaboração Esse especialista norte-americano da antiguidade greco-
conceitu ai. lnspiramo-nos genericamente na teoria mar- -romana salienta, nqui, as diferenças entre a democra-
xianc.l do Estado e não seguimos um único texto ou um cia ateniense (direta, ilimitada, pa rticipntíva) e a de-
único a utor. Na verdade, procedemos por extração, apro- mocracia norte-americana atual (representativa, cons-
vcit ando aspectos parciais de inúmeras análises, inspiradas titucional, desmobilizadora ).
ou n iio na teoria política marxista.
KoFLER , Lco. Concribución a la historia de la sociedad
B ALIBAR, l::ticnnc. Cinq étudcs du rnaiérialisme histori- l. burguesa. Buenos Ai rc~. A morrortu, 1974.
que. P aris, François Maspcro, 1974. No capítulo "D emocracia. y ol igarquía cn . la ciudad d e
No capítu lo U ("La rcctification du 'Manifeste Com- la Baja E dad M edia", esse p esquisador de l íngua gcr-
munistc' "), esse fil ósofo marxista francês qualifica o mánica, influéhciad o pela tc()ria marxista d a História,
poder político proletário como poder de Estado decli- caracteriza a natureza de classe das democracias urba-
n a nte (tendênc ia à extinção gradual do Estado) e nas medievais.
como poder crescentemente exercido através de orga- ., LENIN, V. L'f::tat et la R é volwio11 . Paris/Moscou, Ed .
nizações dos produtores diretos.
Socinlcs/Ed. du Progres, 1969.
BoBBIO, Norberto. O futuro da democracia; uma defesa Ao longo dessa brochura escrita às vésperas da Re-
das regras do jogo. São Paulo, Paz e Terra, J 986 . volução de 191 7, esse militante bolchevique russo pro-
Descrição avançad<1, de um ponto de vista liberal, da cura estabelecer a linha de dcmarcaç5o entre o Estado
forma dcm ocrátka de Estado no capitalismo do século burguês e o Estado proletário, bem como entre a de-
XX. As premissas teóricas desse trabalho - isto é, mocracia burguesa e a democracia proletária.
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La <iemocrac.:ia socialista soviética. Moscú, Pro- pendentes às diferentes re lações de produção, e con-
grcso1 s . d. 1 ceitua, ainda que de modo impreciso, a democracia
Dessa coletânea taz. parte a conteré nciu "Acerca dei ! como forma de E stado cupiwlista e como um dos re-
[
Estado" ( 19 l9), cm que o autor d ife rencia as formas gimes políticos possíveis sob o Estado capitalis ta.
de g overno possíveis nos limites de cada tipo histórico SCHUMPETER, J oseph A. Capitalismo, socialismo e demo-
de Estado a serviço da classe exploradora. cracia. Rio de Janeiro, Fundo de Cultura, 1961.
L1PSET, Scymour Martin. A sociedade americana. Rio Na parte IV ("Socialismo e democracia"), esse econo-
de Janeiro, Zahar, 1966. mista e sociólogo austríaco lança os fundamentos da
Na parte III ("A democracia numa perspectiva compa- concepção elitista neoliberal de democracia, ao carac~
rativa") esse adepto do dilismo neoliberal compara os tcrizar a concorrência e lei torai entre partidos como
diferentes Estados democráticos ocidentais (''democra- um método de seleção de lideranças para as atividades
.4,
cias anglo-saxiis ", .. den1ocracias latin as") , sustentando governamentais (isto é, como um instrumcnt() de com-
que o bipanidarísmo, e uma certa apatia política do posição das cli tcs governamentais).
povo, criam as condições mais favoráveis ao bom fun-
cíorH1mcmo da democracia.
MIAILLE, Michcl et ai. La justict! en Clzirze; des cents 1
flcurs aux cen ts codcs. Paris, Maspero, ! 979.
Obra de um coletivo de juristas franceses sobre o di-
reito e o E stado na China pós-revolucionária ( 1949-
- 78) . Contén1 uma análise detalhada dos avanços e re-
1
cuos registrados no processo de dcsestatiz.ação da jus-
tiça, das atividades administrativas, do policiamen to etc. l
MossÉ, Claude. Âlenas: a história de uma democracia.
2. cd. Brasília, Ed. da Universidade de Brasília, I 982.
A · l. a cdiç<io é de 1971.
Nesse texto, a historiadora lança dúvidas sobre o cur{1-
ter direto da democracia ateniense, sugerindo implici-
tarnente que esta se cnc<mtra, dada a importância polí-
tica prática de certos órgãos "executivos" (pequeno
Conselho, estrategos), mais próxima das democracias
representativas modernas.
Pou LANTZAS, Nicos. Pouvoir politique et classes sociales.
Paris, Maspcrn, 1968.
Livco pioneiro, onde esse marxistu grcco~francês lança
as bases para uma teoria dos tipos de Estado, corres-

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