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HISTÓRIA DO BRASIL

REPÚBLICA
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conre~fo
HISTÓRIA
DO BRASIL
REPÚBLICA
da queda da .\,tonarquia
ao íim do fatado \!ovo
Hl~'TÓRIA NA UNIVERSIDADE

I IISTÓRIA ANTIGA ......... r... C...-


HI\ l()MIA I)_ \ A•RI< ..\ J-,N,,,,..M.J.

Hl\ l t)ltlAIHA\l~RU:/\ 1.\1 1',;\ Al..ullfU,.._, l~I\/Jrt.n-

lll~TÕRIADOBRASILCOLÔISIA i,,i_M_,
HI\ l t)RIA 1)() fUtN'III c·c,, f ~\tPOllÃflo.H) <-1,,,, li•
1USTORIA DO BRASIL RCPÚBUCA .1(,,..., ~

HI\ l()NIA \IOl>U t\lA A,aJ,, .41,n/,

C•1~tll,. ,IA Gút'fM


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A h l,wr-, ••••i """'Pt~ f"l'l.utntrullod.tC:-..11


com o qwl aáo n,caw,wncmr cooc.onb.. O Aaot- cmhctt • C.. amad.c..
pd(h 4u..h I ""lll"'"'wl . .--~1 m '-on,,o 'lo( Mf'OIIMIMhu rth iu 6mt ''" iddo>t.
Marcos Napolitano

HISTÓRIA
DO BRASIL
REPÚBLICA
da queda da Monarquia
ao fim do Estado Novo
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Sumário

lntruduç.iu ,,,._......_ 7

Da Rq,úblio da Esp:ida ao condomínio de faundciros:


a consolídaçlO da ordem tepublaCllla · ····--···-.. 13
Modcmid:odc ,cm modcrni,a,,:ãu:
a vida cultural na Primeira Rcpúblic.1 .... Al

A roda da hiStória quer girar mais r:lpido: a crise dos anos 1920. • ......71

Brasil Novo - ruptur.is e continuidades, 1930-1937 ---..·-······-·····""93

l',,stado Novo - - ..... 117

A im·enç-lo da brasilidadc: a vida cultur:a.l na "Er.a Vargas" ___ _,.............. 135

Da crise do Estado Novo nasce uma RepúbUca democrática . ...... _ ..... 155

Sugestões de leitura · - - - · - - - - - - - - · - - - · - -..- -.... 173


Introdução

m, .irio, p.,;...,,. • lkpoihli.c•, rcpn:-.:nw<b

E por um.1 int;igcm de mulher de aprcsuo


cn.1 e pone .i.ltivo, ,csundo umJ túnica
brJ.JlC.1 t wn gono , ennclho. Esse gorro, dum Jdo
ck b.irrcit fri~o·, tu ulil1udo n.1 G,fri.1 .inug.,.
p.lo, l"<T,1\0\ que tinh.,m "Ju lih..·n.,dm. A p.,r
tir ,1., 1r-Jn\•· ,.,._., imag,·m .. imhulo 11• R,p,ihliGI
"'Ji,wminou pelo mundo,):'·''>"" pnntip.1lmcnt<
,,o fumn«>11uaclrn ,l<· 1••i:~nc Ddacnm, inritulado
A l,brrdJde g111J11tÚJ o po1'0, kno cm homcn.igcm
:i lutJ do Pº"º fr.incb comrJ umJ mon,11qui.1
ur.uúci derrub.1d.1 cm 1830. Assim. "rcpúblic.1·
e "libc«i.1de" s.io p&H.1\ que frcquentcmcme <t
contundem dõde o s&ulo ll\., nus nem sempre
"4.: cnconrr.m, n~ hi,córfa t.fcti\.·~1 doo. povo,.

1\o uso do Bra<<il, cnconcramos \';triações


dô,., 1mai;cm imh<>lo d.1 Rcpúbl,c.i, desde "
imprc= nos panfletos rcpublicmos do século
8 tll'iTÓRl,HX.)lll,,\">II RIP(!IIK'A

XJX até as estampadas nas cédufas :uuajs de Real. Em muitos momentos de


nossa história, ela deve cer se sentido traída pelo que se fez em seu nome:
golpes de Estado. d itaduras, n<.'gociatas, ~uprcss.!io de liberdado públic.is,
cxdusáú da maior parte da população <la vida política. Porém, a hisr:(1ria
cb no.i;s:a Rcpllblic n:io é :apenas a ela tr.1.iç:io de icl(::li.s e ,lc fruJJt r:aç:io com
p romcss:is de liberdade e fdicid:K!c (lllC não se (..1,1mprir.1m. t--t , r.1mbém é
a hi,>tÓria de uma ~ic.·dadc cm busca de formas (políticas, c.x:onómiCI.\,
cuhu ra~ e sociais) para ~upcrar vs lcgaclo~ tlc um p.u:sa<lo .secular rnarcitlo
pdn dependência <.'CQnôm ici do exterior, pdo mandonil:mo clm b'T:ln<k'S
pt'o priN:frios dt ttir.u e peta tsC'J'avicl..fo.
Esses lcg.idos. produtos das cscwtura.s soc.iai.s e polídcas criadas no
período colonial (1500- 1822) e mantidas em grande parce pelo regime
monirquico ( 1822· 1889), n:1.o foram combatidos pela elite oligârquiC;1
republicana que ajudou a derrub:tr :t Mon:trquia, pois, e1n g1':'lnde parte,
ela mesma se beneficiava dC$sas c.sLrmur.1,s arc.aicas. Comudo~ ao longo
cln história republicana br.lsilcira, desde o sco início. não fult~ram lide·
ranças, gn1pos e partidos, incluindo muiros .scwrc;s d.is própri~s d ir<.-s
oligírquic.~. <.J UC pcn~aram na pos~ibilidade <k criar um outro liralil. cm
tmlo o p mH> à herança colonial: um paí~ imlu~trialir.ado, moderno e de..
mocrático. enfim, que rcali1~sse plenamente o sentido incrente à palavra
"rcplíblica" com om b'Ovcrno de homens com\1ns voltado para o infcrcssc
<h.· w<los. lidcr,rndo cm nome do bem univcr~al e Ad às liberdade) pl1bli ..
cas. Vale lcmbr.u que a realidade histórica é mais complexa do que um
jogo de interesses e oonAicos binâJ'ios e simplistas. De f:tco. a h.iscóri.a d:1
RepúbliC':'l no Br:lSil envolve m.últiplos processos, e,,entos e personagens
que, muitas vc-.teJJ hu..ando por um mesmo objetivo - a modcrniz~ç:io
das cnrururas arcaicas legadas pdo passado - encontraram caminhos
ideológicos e poHtiC'os diferentes para 3.IC:.l.Oçá•lo: mais à esquerda. mais
à dircira, mais radicais, mais conciliadores, mais dc.:mocráricos ou mais
au1ori1ários, mai ~ indu~ivo.s o u menos i ndu~ivns.
Se a consrruç5o do regime rep ublicano nos seus primeiros a nos
(implantado c:m 1889 pela força de um golpe mil irar) foi basrn.nte mar·
cada pela herança deixada pelo regime monárquico, para oomprccndê..lo,
preci.!>alll~ cmendt:r um pouco do qut: signilicou a Monar<1uia para a
história b rasileira.
9

O Império do Brasil foi responsável pela conmuçáo de um Es-


tado nacional unificado na América ponuguesa, ainda que preclrio e
submetido à..<1 forças políticas provinciais. Ele não de...·<: ~cr visto como
um rcgimé anifi<:ial e ··cxl>6co", uma monarquia curopáz.ada perdida na
Améria, cm meio 3.$ V!lri:as rcpúhlic:1s que cir.ictcriz!lvam o condnCn·
te. ~. faw que o Império do Hr.asil cs,av~ :mcc.m1clo cm sólid~ ,r:uHçõt.-s
curo1>da~ e imit'.-,•a o muddo político europeu c.lo,nin;,1do no .)(;culo x1x
pdas ''monarquia.s constitucio nai)". P()rém, sua grand e obra foi criar
um:1 csnuturn política e jurídica <1uc se urilir~'l\':I do voc:ahul:írio libcr:al
da época (rech~do de palavt':as COl''llO "li~ rd:tde,. e ''direicos" dos cida-
dáos), mas que ao mesmo tempo m.aminh.a o sistema cscravoc.ra1;1, que
era a negação de todos estes valores. Não por acaso. os escravos não eram
considel'ados '"cidadlos-, mas "'bens que se movent, e escavam fora do
alcance d.u limi12da,s leis que deilfliam a cidadania e os direitos civis sob
a Monarquia. Em nome dCS$C mesmo liberalismo, os proprietários (de
ren as e escravos) que cc,ms,ituíam ns clit<.'$ b rasileiros de então afirmavam
o direito absoluw à propricda<lc;, induindo..sc ~í a propricc,fade sobre ou-
rro.) M: t1.:S hum;mo~. O Hrasil, como naçio indc1)(:ndcntc, na~u sob C.)Sa
co n tradiçâo, e, ainda hoje, iníciv d o .séculv xx1. não superou complcfa ..
mente seus rcr-rivcis efi.:ifos sobre a socied ~cle cm .seu conjunto. O Estado
dos tempos mon~rq uicos cr2 visro pelas ciices brasileiras d o século x1x
como a garanria de «ordem e civili7:as·ão" cm uma sociedade con,)idcrada
amorfu, con.sciruida cm sua maior pane por homens livres pobres, negros
escravizados e fodios (viscos como "selvagens~). setn direitos diante do
poder de falo dos grandes propried.rios de cerras. O Império reali:iou a
independência política do Ilrasil com rdaçio à mccrópolc ponugucsa,
mas pouco fez par.i supc:rar o modelo cconômko e social q ue aqui se
implantara nos cempos colot)iais.
Esst· mo<ldo e a visão de mundo que o suncnrava começaram a
M>írcr abalos a pari ir da década d e 1870 e, .)Obl'CI udo, na década d e 1880.
O rcpublic.mismo e :,1 República imp l:mt:,1d a cm 1889, cm grande parcc.
seriam frutos da crise da Monarquia e do sisce:ma csc:ravism. As ciices
econômicas q ue se coroaram republicanas - como a poderosa oligarquia
pauli )f'.t li6ada à exportação de café-, purérn, náo cri1icavam a Mon:m1uia
porque queriam mudar as hierarquias sociais, dcmocrati1..,.1r ,.1 políriCJ. ou
10 tll'i l ÓRUOOll,,\~11 RIP~ill l:"A

acabar com a escravidão, mas porque se senri:un pouco representadas pelo


imperador e viam no reghne monárquico um dinossau1·0 político que já
n:io servia mais aos seus imércs.s<.·s. Ao lado da." oligar(1uias que pa~sa-
ram a apoiar a RcptJblica COnh'a a Monan'1uia, havia o u tro grup<>, o dos
milit:1rc$, que experimcnmv:i um choq ue cn:scentc com as im-r-iruiçó<.."S
mon:írquiQ.s. l)cpois da sangrcma Guerra do l'aragu:ii (1864-1870), o
Exérci10 brasileiro tlcu-M: contá de Mia importància para a dcfosa nacio,,,
nal e, ao m~mo rcmp<>, de sua fragil itl:uJc militar. O i-:xérciro era uma
instituiçio histo ric:imcntc d cspre1.:ida pcl:i elite monarqui.na br.isilcira,
que se orgullava de cer evicado o surgimento do ..caudilhismo miliur''
no .Brasil, ao contrário das viiinhas rcp(1blicas sul-americanas ,•itimadas
por guerras civis iucermináveis entre facções lideradas por chdf!'s políti-
co-militMes locais, os ""caudilhos-. Eferiv:ame.nre, não bavkl uma tradição
caudilhe.sc:1 oo Exérci<o brlSileiro, m:\S seus oflci.:üs mais jovens senciao1
que o Império, com seu siSlema de privilégios na auibuiçáo de cargos e
pntcmcs e ~,_rn <lefc:m J3 C$C:r~\'id:io, crn u m o bstiíc..,110 à co n$t itoiç:io d e
uma burocracia arm;1d a moderna e dkiencc que os beneficiaria.
O n.:publicanismo c.lc c.lcccrminac.los oli~r<."a) e milicarc,__~ coinci-
cliu c:om o Cl'Qccntc <111c~rionamcntQ do i1i~tcma cscravi:>ra. /\ partir tk:
1870, o Império d o Kra.sil era, p rnric:,meme, a última nação c..-scravocrat:i
do mundo. Apesar das prc..-s.sõc.s exrcrnas para enini,1\ii~la, a c..-scravidão
era adminbc~d-a pela polírica imperial de modo a ~cr ~upcrada muim
lcncamc1m:, evitando rupmras sociais e cconômlcas. Assim. as tímidas
refot'mas do sistema patrocinadas pe.la Monarquia não acabl.t'am efetiva•
mente com es.u. chaga social> cada vei ntais condeoadl econômic:t e mo-
r:ilmen1e por lodosos principais JXlÍS~sdo mundo c:tpilalisca que sen·i:tm
de modelo para o Brasil. Do pomo de vista das dices pl'tocupadas com
o cen1a, o Bra.sil tinha que resolver um d ifkil problema: acabar com a
çscravidáo sem mudar muiw as esrrururas e hierarquias sociais. Também
~e perguntavam .l>Obrc o que fazer corn oit m ilhões de dc~c:cndcnce~ de
escravos africanos. vistos como um futor de atraso sob o prisma das teo-
rias raciais do final do século XIX. As leis que acabaram progressivamente
com a escravidão (ou a mantiveram por mais algum cempo, conforme- a
pcr)pecti va), como a Lei do Ventre Livre (1871) e a Lei dos Sexagenárim.
(1885), foram atravessadas por esse debate. Mesmo o import:.mtc movi-
1:-.,10 1>\'ÇÁO 11

mento social aboUcionisra surgido nos anos 1880 não foi capaz de mudar
.a pcr$pecd\'a consc:r"ador.1 e excludente da \'kla polí,ica e social do Bra~il
ao longo do p rocesso que lcYou ao fim da cscraYidáo. Apesa.r disso, é
inegável q ue a história da República desde 1889 significou a entrada na
cena 1>olfrica e ccon6mic:~ de outros gru1-)()~ ~ociais, ((llC pn.-ssionavam
por mais direitos. maior representação política e mai.s panicipação na
distribui<,~() d~s riqu(..."7.:IS n:tci(m:tis.
A h istória da Repl1blica brasileira ac~ a mecade do sécu lo XX, que o
lc:iwr verá cxpo~ ao longo <lcrc livro, é<> rc5uhadu drarn;'itia, tia força
inercial das esuucuras políticas e económiClS exdudences, herdadas da
Colónia (: rcfors·a(l:b ('.Otrc o nn~I do b('Cu lo XIX e X). bOb uma roup:1gcm
republicana, e as lucas sociais múltiplas e plurais para superá·Jas, )('•ando·
se etn conca todos os 1n:.1tizes entre wn polo e outro.
Da República •
da Espada ao
condomínio de
fazendeiros:
a consolidação da
ordem republicana

O GOLPC CONTRA A ~!ONARQUIA


Quando observamos o famoso quadro
Prodmnar,w d" Repúblita, pimado por Benedito
ü lixto cm 1893. podemos u..·r a fa l.~a i.cn~ção de.~
que o n.tSCimcnto do rcgim.c rcpublic.ano no Bra-
sil foi um desfile militar cívico e ordeiro: as linhas
n:r~ <lo qua<l ro, com M.'US ,~..r~nagcns alinh-a<lo~;
o pl.1no gcr.tl da cena que organiz.a .t tda e nos
tr.insmitc uma scns::içâo de ordem pública; a praç.i
ocupada peloi. mi1iures em fonn.1çlo, om indo e
aclam.mdo seu.e; comandamcs que. sokncmcmc.
erguem os braços. Aliás, é bem prov.ívcl que o ob-
jellvo do quadro fosse esse meSJno, de :icocdo com
as n:gr.u ufanis1;.1s da pin1ura hiscórica do século
x1x: crisrnli1ar a imagem de um momento históri-
co grandioso e de person1gens heroicos.. plutados
pela onkm e pdo cÍ\'Í\nto, m ini01i,..imlo a nip-
n1ra rcpoblic:.mz, com a velha. ordem polícic;.1 da
14 tlNTÓRl,' OOU,.\\11 RI P(lla;'A

Monarquia. A represenraçáo de um desfiJe militar tranquilo, que seria uma


espécie de ccnid:ío de na.M:imemo do novo regime, seri:1 complcmcnt".tda
com outra imagem consagrada na nossa mémória nacional: a do povo que
..au~tira a tudo bestializado·. ~ palavras do jomali.sta Ar-istidc.\ Loho, e
c1uc Cl)lava at~ntc da(1uclc mo mcntQ histórico, ao menos n :t famc.n;:t tdn
e na "his,óri:i oAcial• da ''procl~maç:io da Rcpl1blica"', confomlc cn~inada
pdos Uvros didáticos por muito tempo. Mas será que o nascimento da
República no Brn.sil foi tão tranquilo assim~ Será que o Ex.ércüo foi o único
p1'0cagonisca do republkanismo que derrubou o Lnpério no Bruil?

Atclamação da RépUbltca. óleO sobfe cela dê Benécl.to Cabto, 1893


(&eeNO Pinacoteca dO ES!ado ele sao Paulo)

Muitos historiadores ainda se p,el'gunt:un: o golpe militar lide·


r:tdo pelo maredlal Deodoro d1 Fonseca queria me.sino derrublr o
regime monárquico ou 2pen:i.s o miniscério liderado pelo visconde de
Ouro Prcro. o último gabinete da i\•lonarquia? Deodoro não era um
conspirador republicano, ao conmí.flo da jo\'cm oficial idade que abra-
çava os ideais do positivismo e do republicanismo. Mas, para manter
sua lidcr.rnç.i no Exérciro, sabia que não poderia reprimir seus subor•
dinados. amplamente abolicionistas e republicanos. Apesar de c1wol-
~
ll,\ RtP('f.l K".\ ll,\ 1 W A I),\ AQ(.0'<00M i'\I00t: I A:lt-:"111 IR.Q', IJ

vido nos conAiros que opuseram o Exércico e a Monarquia a partir da


ch:am:ada ""Quest.io Militar" ( 1884-1887) -qu:mdo o go\•crno imperi:al
acabou punindo oficiais abolicionistas-, Deodoro ainda afirm:.ava, cm
carta a seu sobrin ho <latnda de setembro <lc l889, que o "'t'm ico susren-
c-áculo do Brasil e1':l a Monarq uia"'. E,uretaJHo, o ,•elho marechal tiolu
Séu~ c.lcll.i.ÍCtos cncrc o) <.1 uc apoiavam D. Pcc.lro 11. corno, por exemplo,
Gaspar Silveira Martins. inimigo político e pessoal de Deodoro no
Rio Grande d<.l Sul, .t agir'.1da provínci:a n:a qu:tl o marechal tinh:a fciw
carreira militar e política. No Campo da Aclamação (amai Praça da
Repúblim), dizia-se que De.o doro derrubou o ministério O uro Preco,
m2s n:'io :a Mon:m,1ui:a, que de faw foi derru~d~ ~omcnrc ~ t~rdc, com
o marechal .idcrindo à causa republica.na. depois de ser informado
q ue Casp:tr Silvei~ Mart ins. seu :tnrigo dcs:ifcto PQlítico, seria o novo
"pti1:neiro-1n i1üstro...
Outro cx:,mvmm1uiMa. Ju~ du Patrodnio, lavrou a ..Ata de Proda,
mação d o novo regime~ inaugurand ~ por d ecreto:
ff

Conc:idaJáo: u povo. u E:tén';jto e a Armada nacional. em p:rkita


c..·omunhio de sentimentos rum nossos c:onci~~~ roidcnto n:L!i
pro\'íncias, ac.1Wun de decmar a deposiç:1.o da dinztia imperial, e
comequc ntcmcn1c, a cx:1i nçJo de'> ~is1cm.1 monárquict>-rcprcs<!nta-
tivo, (Ctr.u1adeN~1lrl,2J;, 16/11/ 1889)

Ob\•iamenre, a implantação da República no Hrasil não ;.1conre-


ccu só por causa de dccrcws, ações motiv.idas por desaforos oo inicia,
tivas individuais de algumas lideranças civis e mil itares. A Monarquia
est ava cm crise h:ivi.i muito tempo, desprestigiada entre as elites civis
e militares nui.s import:uues, apesu de, paradoxalmente, co,uar con1
ccno apoio popular.
O visconde de O uro Preto, membt'O do Partido Liberal. foi cm·
possado como primciro~ministro cm junho de 1889 com a promcs5,;1. de
arejar e modcrnii.1r, poli1icamcmc falando, a Monarquia hn.silcira que,
depois da abolição da escravidão (13 de maio de 1888), porccia ter perdido
su:i. idemicfade e sua múo de ser. Seu projeto de refonnn politiCl tent::1\'2
incorpor.tr algumas bandeiras do movimento rcpublic.i.no, lançado pelo
Man!fosto de 1870, como a maior ~uconomia administrativa para as pro-
16 t11ifÓRUOOll).'>llll PÚll rA

vínc:ias (0$ futuros estados), o fw dos senadores vitalícios e a diminujçáo


dos pocleres p~Lra o Conselho de & ,:ado, resu-ico e l;ele,o órg:io que cr:t o
pilar das decisões pol(ticas esrraté-gicas da Monarquia, sendo frequeme-
mc:ncc nu is import'.mtc (IUCo próprio Parlamento dc:i10. M~ o l~n i<lo
Conservador, o outro partido importancc do lmpério. náo queria mais
mudanças nú regime e bloqueava ç $S;U medida..,; no Parlamcnw.
Desde a década de 1870, a ideia de que o melhor regime para o Bra-
sil seria um:1 rcp(1blic:1 c:n:$(:ia entre õt.S olig:m1ui:ls elas pfQvinc:fa.s mais rict.S
(como S:lo Pau]o, Rio Grande do Su] e Minas Gerais), bem como encre os
milicarc..-s, por mo<ivos <lifcrcnt<.'S dos oli~rcas. P2ra :u primcir.is, a Mon:1r-
quia dificuh:iv:t o :acesso às dccisóc.~ poli1ica.~do go\•cmo ccmral. domin.1do
pdv~ pa.nid o) munan1ui>ras tratliciu n.ai,; - 1.ilx:r.il e Cornscrvadur - e por
i.nsdruiçõe.s fechadas. como o Senado Vicalicio e o Conselho de Estado.
Além cli~, hn"fa o pc.xlL"r pessoal cio imperador, in~·timdonnli1~'ldo no
Podel' Moderador, cap:12 de dissolver o Parlamento e o Ministério. Mesmo
tendo ifnpol'tàttcia eoon601ic.1, enriquedcb. pela exponaçfo do café e pela
cxploraç:iio d~ economia pcc.1.1:iria, os m<.mhros d2s oli~rqui:ls paul~ta,
mineira e g:i.úcha se Stmiam N b-represem:iclos na ,•id:i. polilic:1 bnsileir:.t.
E IJi(: a grande fu nção da Munan1uia c:r..t .!it.:T u pilar tia m;u1111mçâo cio
rcgimC" escravista. cxtimo esse sistC"ma em 1888, para quC" mancê-la? Por
qoc não dirigir o pnís sem a mediação de oma d ice políric.'l (con.sclhciros e
senadores que pareciam mais antiquados que o própl'io impe.rador) paracb
no tc.mpo?
P:ir.i os militares do Exércilo, o problema da Mon:irquia ero
oturo. Mesmo v·.-1lori1..ado )imboliet1ncocc pda naçã.o br-.isilcira eumo
vcncedor(.s da Guerra do Paraguai, o E.xércilo se scmia desprestigiado
como c;orporoc;áo pelo governo. Os militares também c riticavam a e$·
cravidão; muitos oflcfa.is se m.anifescav:tm publicameme pela abolição,
o que era proibido, e se rccus.avam a servir de caçadores de escravos
fugidos. O princípio de recmt:unen10 entre cidad.los livres, base dos
exúcicos nacion2is cri2dos ao longo do.século x1x, e o princípio ele pro--
moção na carreira militar cm fu nção d2 form2ção céc.nic:a e do mérito
pessoal c11tra\ram cm choqoc com o m undo da Monarqoi;,1 bnts ilcira,
onde impcrav;.1m a cscravid5o e o clicntclismo no qual, para 5ubir na
O,\ a t P('&I (C,\ OA I WAD,\ AQÇO'<OOM i" OI)( I A:U\lll 111.Q'i 17

carreira milirar. manter boas relações com a nobre.za era mais impor·
t",rnrt do ((UC o v:alor e o mériro ind ivid uais.
Foram cn<.-s grup~. ao lado (lc lf<lcrcs rcpublicanm popul:arc,., como
Silva Jardim e Lopes Trovão, que ajudaram a desgastar politicamente a
imagem da Monarquia junco à sociedade. Quando foi derrubada pelo
golpe liderado por Deod oro da l'OnM..-ca. ;i Monarquia já (,"l"'d um regime
(1uc ti nl1a penfülo apo ie.» fu n<larncnrais entre as dite~ c:ivl) e militarQ.:. Já
não havfa ninguém para defendê-la de maneira vigorosa, a nl o ser algm,s
poucos senhores de escr:wos exl.rent:unence coo.servadores, principalmence
da o u trora impo rt'.tntc rc:giáo do v.tlc: e.lo 1•ar-..íh a ("'rlRJ). A n.-:..ign;içâo tio
velho imp<:mdo r ao rumar pam o exílio d ou rado cm Paris, sem esboçar
grande n,:as.1io ao golpe de t<'.stado, é o melhor retrato da dcT<:rior:iç:'io <lo
amigo regime. Até Pedro II par~cia es111 c:a11Sado da Mon:arqui:a.

AS CORRE.i'fTES RJ;PUDUCANi\S
Os rc.:puhlic rnt~, em bora t.uncortla~m cnrrc ~i c.1w..: a Mon3rtJuia
não clcvcria mais rll,>cr a 11:1ç.ío br:t!iilcira . não fonnanm o m bloco poli~
tiro e ideológico único e coeso. H :tvia vi ri1s correntes republiCl..llâS que
ci:press:iv:ull visócs d iferent~ de conlo dt:\'t:ria se org:rniz:ar a ~pública
no Hra};I. Os dilcma.s eram vários e, quando chegou a hora de connruir
o novo n:.-gimc e st•:.lS bases c;onstirucion.-iis, cks se rt.'Vel:arnm com nitidt7.,
dividindo a.ind.1 mais o~ republic:i.nos.
O governo deveria ser daccmralil.ldo ou ccmra.lfaado? As classes
popol:arcs deveriam ser incorporad:as plenamente na \•id:, politic..1 da noç.io,
na fonn~ de din:ito univt.·rsal ao voto? A muda nça de n,."g:imc d<.'Vcri~ ser
acomp:anhad:a por mudanÇJ,S na ordem social e coonôm ic.1? Como incor-
porar na sociedade os cx-csa-avos. agora cidadãos livf(S, tcoricamencc com
os mesmos di reitos dos seus antigos donos, mas ainda explorados CGOno~
micamtmc e, ainda por cima, alvo dt." preconceito!> raciais?
N rc.sposl-as a essas pcrgumas variavam dependendo das cor-
rem es repu b licanas. Mas depois da implan taç--lo do regime em 1889,
Gom o crcsccnce- isol:a.mcnro político dos republicanos mais radicais,
as propmrns pol írit:a!> M: tornaram cada vez mai!> pau tadas por valore)
conscrv:.tdorcs e oligárq uicos.
.l8 rusrê>Ruro111,\\n R1P1i11,:;-,1,.

ABOLIÇÃO E IMIGRAÇÃO
A LibclQÇ'lo d05 últimosescíll\·os pcb LciÁut'Cl. (3SSinacb pda p1incCS1 ls.1bd
ern m:Ú() ,-te 1888) e 2 , ·ind:a em r1U$..of.:\ de 1uMlh:-11fon!:S: estr:rngeiro11 p.tr:l S11b.s•
1i1ui1:lm1() cle-obr2~r.:w11U$gun<.bi,b111:1ç('ies$:M) p ~ iudl~()CU, t-iS.
Q uando lin:1lmenh:: ,,,e,o :1 Ab<,liçlc), p h:.a,fa ()l)U C(l,S ~c..'r.tv<).S rd:uiv.uneme
;) p<>pobçlo em $tm lt)1-:.lid:1c:lc. ('.-:.lcub"'-..e qut em~ (l,S 13 mil~ ,le br.i~tleiN)S,
h1vi:1.ccra de 700 miJ c:sa:n-os (cera.de)% da populaçlo). Desde 1872, qu.ando
a populaç¼o ,e.bti\'2 de csct:1,,u cn de l )%, :is :a.lfonW e compns de libcrd::acks
tinh:un diminuído a importincfa da popul:açioescm, ':3. como componente dcmo-
Wific.o cb sodcd1dc, e o cscnvo j:i não ena mio de obn primorài-al cm muit:lS
rCfiWCS do Br.a:sil, como nu pl'O\in<iz do None. Mas :a.lg.w u scco,es fund:imenuis
d11et."Ono1ni:.a, 001110 a l:a,•otm.1 p:mli$t:t, 11ind..1 m:uuinh:un uma dcm:1ncb 11ltJ por
e."T.1~, :M I 11"1('110$..11~ 1R86. ~~plk.11o.m1foholil..'ioni"no d:~ dites 4;1Íci,i,;uho-
r.~ At..!m di~so, ,1 re::si$tioc.. i:1 d~ muh™ a.1,ur.1 o Grn de um si~1cn1:1 i,;ct.'Ubr, :1 c~r..a-
vid-.•, poc.lc ~ e•1llk1,1e.fo pdo fa10 de \(li~ 11 Aboliçio al1r,-ui~ 11 idl'lnid:.H.lc culm-
r:ll e soei.ti eh popubçto deafrodcsccndentcS e cxigitb 2 roors2ni:z:;iç:)O d2 ptópri:t
dcfiniçlo d.:i cid:aieb..ni2. No limite. 2 Aboliç:lO 1brirb unu poro p:lr:l qucsciolW',
:ao menos simbolica.mc-ntc, :u hitt.lrqui::u soci:lis e nd;lis connruidu :.o longo dos
sécul06. dc:S:tp,11.d:mdo os que ué o momento e.sc::,,r.un no topo. A pctspcccht:1. de
h1vcr um2 popul:aç:io nq,p e livre rcivindicmdo novos dirt.itos soci:lis e poliri·
co~ ,,l.mnou uma p:m~ d.1>dieQ t(Uc ,;u,1h.av.1 oom um p,,Í> hr.mco e "Ovili1..1tlo"
cm 1nol~ eul'Olcmri)t:b. A~im, em grande p.mc, u prtUlf1cci1u t.'tlfltr.1o nq;ro
:alimcmou ,b politic.tS imigr.uui,,,.,. cm la,ga Ol.al.i, fXUf'O(_in:tcfa.s pdo.. llO\Ol> gu-
Vt:mos d:1 Rcp,íblk.,, Not.1 pcíS(-'«th•:1, o imigr,'lluc dc,·c,i,1 n,io dJ:k:"n:1.s ~il,i,timir
a 1nà0 d( ob1"1 escrava, m.1LÇ rambé-m o pl'óp,io negro «imo componcaHe t:1c:ial
da $()(icdW,C br.uildra. lmigtand.sn\O ( idooJog.ia do b1"1nquc:amcn10 andawin
de màOs d.adas. Po, is.so. a prcf<:rénda por imigranc<:s bran00$ europeus bdn<» e
aróliooJ (cspranhóts e ita.lianos). cmbor-i ,,1oscdi11p(nsusc 2 vind:a <k akmàe.s.
Qu,101Jo fin,1l111cn1c :a c.SCt.11vkl:io ,1etho11. :1 rnandta oomo Oll cx~1~1vu.,
:-e: in,;crir:un na nov-.1 oolcm ;;ocLil nlo ÍC>i tlcfinkfa apcn,b pd:111, cli1c11, br.lna11,,
cmhor-.a a vor11:1tlc dcm1ll ti\'c:5.'C maill J>o.O. Hom'C co111pki:LS ,tcgod.1\J,c11,•.1ind.1
<11~ :as.sirné:irka.s, c111rc m lihc11:1dos e i.cu;; n ·.scnhoro, e o lk•lino ccon6mko
e ~i.al dos n-oL1~1vo:. v.1ridu oonío,mc .1 rc:gi:io do p,1k Fm SJo P:1ulo. hou,c
uma progreJ.Si\'a marg.inaJização econômica do braço rw..·g.l'O, rck-g;tdo a uabal~
pontuais e daqualilicados. sul.»tituído em mas:sa pda mão de obra imigram(',
No Rio de J.1nciro. uma parte dos afiodacendc:nres 5C trm:1furmou ('m traba~
lhadores braça~ no Porto e: nas íábriCL>, .i~m de: fornece, mão de obl'a p:ua o
1r:1l>afüo J(>lnb,tko. 111,uuc11do ,1 ,raJiçáo JcMlc 1.:1~ u;mpw J., 1111,,é,iQ.
Fnoc 1881 e 1930. c1m~r~111 tJUa.:;c 4 milhOO <lc i111igra11tc::i no Rr.i::iil.
oo n 1 Os\ 1x,nugue)Q. it:1li,mO:t ç c:11~1111,(>i) 1ouli1.rndcJ 79% JC)~ mont:ancc (,"<;r
1abcL1 ,1Kguir). Qu.1x wdos <>:,: irnigr,trrn;.s s\C in::,c,1lar.rn1 no Svl e S1.1<lc::itc. mc.,-
JificanJo o 1,c1111 éwico dc::ic,1~1unQ do Brasil.
OA RtPC'gl te.\ DA l WAD,\ AQC:O'lOOM i'\k)ot: I A:tJ'\1)1 Ili.O', 19

.. lml~o Uquida: Hr11~il, 1&81-19}0 (cm mllharci;)

(1 ·~·! li 11
1881-188$ HH :l2 47 8

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l'«lt~! &.mu, L (ors,), l/1111iri11 M A1Wtrklf LA11-. N>N,wr, l\ (Jlt7V,IIJ.WJ. Sio P,,.do/U,u~
Hr~.aJI.,.: f.i1r1<1..çl11Aku111l~,lt (<i,..,,ao. 2001 . 1'· 14$.

A i,uiguçio r.r., p1.11n)l.in;1d;a pr.los ro:.'u ~ p1íblil.(~. e 1,1> 1r-.il,,:,ll,:,tlore$


n:có:n-d1q:,1do.,. c:t:,m alot.ai.lo.. cm g,o1nllo hmpal,ul,1" 1.lc onde :..1Í,m1 J>.11.l ,l.,.
f.a.u:ndu de caff. A$ péssima.1 condições de crabalho a qu< muiros en.tn ~ubmc--
rklo~ ncss:u f.u.cndu foi 1 e:tun de di\·cr.~ srcves e rC\olus, como 1.,; ocorri<bs
n:a r('güo de Rib('ir:io P'rc:10 cm 191 'l e 1913, No c:~t:ido de S.-.0 P:aulo, ('r., OO·
mum os imigr:uncs fugirem cbs propr-kt:bdcs ruais, insW:tndo-sc n:tS cid:tdcs,
so,brcrudo a cicbdc de São t>1ulo, q ue \·iu sua populaç.i o crescer de nuneit11
imp~h)11,111tc entre 1890 e 1920. C(lm ()$ imig.-,mtCtl. \'cio um.a nc.,v.1 ctiltur.a
política, marcada pelo anarquismo e pdo .s.indical.i.smo rc,'OlucionástO,. muito
fones na üpanha e n.a Itália da époc.a,
F.nfirn, ,1 romhinaçio emrc aboliçâo e imigni~·.;io ,1C:1bou por redoc:nh.ar o
pc-rlil social e: rnd:tl da popul~ bmsilcim, bc:m como insr.a.ur..u ''°''ªSe c:om-
plcx:u relações cnuc :u clirci e os dhusos grupos érn..i e&.. e sociais-que com.pu•
nham a.s c:l.uJ<s lr.ab.,lh:Klor.u.

Podemos id(ntificar três grandes rorremcs republicanas no Brasil,


atUamc.s desde ames do golpe de Estado que dcrrnbou a Monarquia.
H1vb uma corrente libcr.al, cuja b;,~c soci.:il er., formada pelas oligar-
quias org3ni1ad;,1s cm torno dos partidos republicanos rcgion:iis, como o
20 ttl'.ifÔR U (X}IIU~II RI PÚll t:: A

Partido Republicano PaiJ ista (fundado cm 1873) e o Partido Republicano


Mineiro (fundado em 1888). emre outros. Seu projeto político, em linhas
gerais, <lcícndia uma rc:pública liberal, de n.:uurC'1.a fcdcralisca, baSC:lda cm
leis q ue consagravam a lilx:rdadc ind ivid ual, mas com rcs1-riçócs à cxrcnsáo
cb ciclad:mb eleitoral e poliria1. bto sig:nific:1v:1, por exemplo, n:itcr:ar e
~profund::n um:a s(-ric de r<.-stri~ constitucionais~ p:micipaç~o eleitoral
<la população mah pobre, embora idealm<.'11CC afirmassem que "1oc.los ~ão
iguais perante a lei". A ba~c <lv seu pc.><lcr po lítico cm a p ropricclad c rural
e :a cc:o nc,1mi:J ªb'TOC'Xp<.>rt.1.d orn, w brcruclo a d o ClÍé, o mais impc,>mntc
produto d.1 econoinia brasileir.1 112 época.
Outra corrcmc rclcvamc era a posicivis1a, grupo panicufarmcntc
fone entre os miliwts do Exército. mas com alguns núcleos enrre a d .lSSe
média e as elices civis de alguns est:1dos, como o Rio Grande do Sul. Seu
projeto, ao contririo dos libera.is, era construir um go\lt!'rno cemr:1lii.1do
e 1\ltclaJ· que cslimufassc a modcmizaç.io econômica, a alfabcciia.ç.ío d.u
d:as~cs p<)pol:.trcs e cl(...-r-crminadas rcform:as socfais. () Esr:ado clcvcr-i:a ser o
promc,lfor do nacionalismo e do parriorismo, servindo como um~ espécie
(h.· m(.·dfa(lor tios conOiws entre a~ da~ ~odais, alternando prorcçâtl
~ocial a~ i-rabalhadorc:s com rcprcs~o aos :mb1,<cn,ivos. Em <1uc PQC M ta
ccrtn scnsibilid :ade por:.t os problemas s(1d-ais c~;s,cnfC$. os pc,l$ifivÍ$t3S ri·
nham um;i_visão aotorir.íria de polítiCJ., indosive alguns deles esperavam
construir uma '\litatlur.- republicana", cujas aç6e~ d<.-..·criam ser idc.-lmcnrt·
inspiradas pelo conhccimcmo ciemifico e cêcnico. Mesmo em estados da
federaçlo onde os liber:lis er.un domüunres, como São Paulo, havia 1:nui•
lOS políticos inspirados pelo posicivismo ocupaüdo cargos imporu nces e
dirigindo, princip-:ilmentc, as políticas públicas de s;iúdc e cduciç:io.
A 1crccira corrente era a dos radicais f'C'publicanos, também conhc·
cidos como "'jacobinos.. ern alusão à corrence procagonisca da fase mais
radical da Revolução FranC(."Sa, Sua base social eram os S<.·cor<.",. S médios das
gr-.ind<.,.":!, cida<ll":!o, pc:-q utnos fun cio nário~ p l,blico) e tl'abalhadorcs qualifica,
dos. sobretudo do Rio de Janeiro. capital d:,1 Kcpública e epicentro das agi·
mçÕ<."S sociais ui-banas no fi nal do século x1x. lxfcnd i~m rcformM sociais
que distribuíssem a renda e incluíssem as massas na vid3 poliõca nacional.
Os jacobinos me.,;clavam dcmen1os d e um rcpub licani)mo radical rum a
dcfC5.1 de direitos socfais garantidos por um Esta.do fo rte e ccntrali1.1do.
IM RI f'('gl I(' .\ DAI WAD,\ AOC0 '<00Mi'\l0Dt t A:tN"lll IRQ'i 21

Ne.sse pomo, se aproximavam dos positivistas comra o federalismo dos


oligarcas rurais liberais. Essa corrente foi panicul:trmente forte nos dez
primeiro) anos d:a H.cpúblici~ m:as :ic:ahou pcrdc:ndo imponânci-a como
grupo polí1ico independente com o fim do governo Floriano Peixoto.

CONl'I.ITOS POI.ÍTICOS F.SOC IAIS


NO COM EÇO llA R EPÍJKI.IC:A

Podemos dividir a Prim<.:i~ República cm rrç.S gr.1.ndt.--s períodos: 1)


consolidaçáo da ordt:m rcpublic:;ina (1889-1899); 2) insci1ucion:a.liiaçáo d:a
polí,ioi lilx:ral,•oligán1uica ( 1899.. 1922); 3) crise tia hq;.crnonia libcr-..1l,c1li ..
gán1uic.a ( 1922-1930). Vcjamm: cada período de mancir:1 m:ti$ dcralh:ufa.
Nos agirados anos iniciais da República, as crês principais oon-emes
rcpublicam1.s <:xpcrimcm:ririm ~li;mças e dissidências cnm; si. Ont po.siti-
vi,r-~ e jacobinm M: uniram n~~ crí1ic.~ ~) olig..r(lui~ lilx:rais, <.1 uc cr..em
contrárias a reformas soda.is mais profw,da.s que distribuíssem riqucias e
fi.inak'C~Scm a indtistria; ora pc.lSitivi)t:aS e liberais~ aproximaram p:tra
controlar o imp<:to daqueles que defendiam uma p:.ut idpação popular
majs ampll na vida política. Exemplo desses jogos complexos de ali:mç:is e
af.m:amcmos Íc,l i Floriano Pdxot0, milirar que <.~crc.cu :a pn::sidéncfa <.-ntrc
189 1 e 1894, um dos põlít.ico.ç de m:tior prestígio t:iltJ'C positivistas e j:tco-
binos, mas que acabou se aproximando dos libcrai.s pauJi.sc;u ao longo do
seu governo. abrindo caminho na su:t sua:ssão p;-m1 um lonb'O pcríoclo de
hegemonia conserV;}dora deste grupo no governo da República.
E.çse jogo de j)i anç:tS e dissidêücfa..ç 11:lo se limital/'1 às gr1ndes cor-
rentes republicanas c.1uc tinham projetos político:. diftr<.·ndado:. entre 5"i. O
quadro polhico do início cb República era bem complexo, mC$mO dcmro
da linhagem política liberal-oligárquica.
As olig3rqoias rq;:ionais, embora. compartilhassem os valores libe-
rais. cotnpeti:un umas com as outr:.\S, seja pelo poder regiooal, sejl pela
conduç:ío da palític::i nacion:al Oi. eia2dos mais ricM, como Minas Gerais
e São Paulo, que ac.ibariam M" impondo 1ló domínio do 1,ow:rno federal,
buscavam alianças cálicas com as dices de OUll'(» estados imponamcs,
como Bahia. Rio Grande do Sul. Par.1íba e Pcrnamhtico.
22 t11'iTÔR IA OO ll,,\~IIRIPÚll k;A

Demro dos enados, as oligarquias cambém tinham divisões profun·


das. que se e.xpressavain em alianças de imere~ pal'3 mancer em suas
mãos o go\•crno <.·scadual. Fssas div&:lóc..; não cinham relação com <1u<.·scóQ
ideolbgi<:a) ou partidáriá.\ maia) significativas, sendo cxpn.·s..~o. no máximo,
ele um c.nilo diferente de :i.d minb;m,.r a vid:i públic.'3.
Nos municípios, ~,) <lisput:as pelo poder ~.SMtv:tm pelos inrcresS<..-s
c.lc fomilias e dás c.lc gr-,md<.-s propri1,._"f'ários rurais, d,am~do.\ de "coronéis",
t'lue dominavam a vitla looil da mait>r p;1ne do Brasil rural e eram a pc..'tlra
fu ncfomcnr:11 no jogo ele :ili:mç.1s cios :1rr:tnjos olibi:Ír(J\IÍC()!õ <.~'L1du:ii.s.
Nfo r.uo, ao loogo da Priineir.'l República, :tS disput~ políticas den-
Lro d.as oligarqufas se resolviam à bafa_. Es.sa violência i.1 desde o as.sas.sinato
de desa.focos políticos locais atê verdadeir.ts '"guerras civis'" que chegavam
a exigir a incetven çfo do governo fedef:ll, com cemenas ou al.ilhare.s de
monos. A Revolu"'10 Federalista 110 ruo Gr:tnde do S,J (1893- 1895) ou o
Revolta de Juazeiro (1914) no Cc.1r.i são cxc,nplos dessa., dupmas.
Além das disputas entre as oli1:,,:irquias, o Exérci,o brasileiro. ma-
joritariamcnrc positivisf:i e r<.-public~mo, e a M~rinha, fooo de momu•
c.1uista.s, r.imbém foram ~ guerra, nfo conrra um inimigo c.·ii:tcmo, ma~
cntrc ~i. A Revolta <la Ar matla (1893 .. 189/4) foi u momc:n10 mais grave
eles~ ,cnsâo política entre as duas Arma.s nadon:.ús que t<..'(>rÍc:amentc
d<.."\'Criam cs-rar unidas n~ c;lef<.-sa da nação. Além de abrigar monarquism,
a Marinha de Guerra se \•ia dc-.spr~tigiada na polhic..-a, pelo <.--xcc:-.\.Sivo
prolago,üsmo do Exército.
As confusões no andar de cima da sociedade brasiJeira n5.o era,n as
úoicas a lgicar os 11\0S in..icilis cb República. Os "de baixo"' l:tmbêin 1110
estavam pmivos, e ao seu modo, sem ainda conl:trtm com organiiaçócs
sindicais ou políôcas coosi.stcntcs, as classes populares urbanas e rur.a.is não
ficaram ··ausentes~ da história no começo d.a RepúbliC1 brasileini como
muitas V<."?cs afirmou a hisroriografia mais tradicional. fioram proragonbi:as
c.lc cvcruos puHtitos imponamt\, rumo a <lf"..tmática Guerra de Canuc.lo~
( 1893-1897). que, de um confli ro local entre camponC$CS mi.scr.ivcis e o
go,·crno baiano. tWumiu uma importância nacional, com o cnvolvimen·
co do E.xércico brasileiro na repressão ao arraial, pela suposta ameaça à
no,•a otdcm republican;1. Os rebeldes de Canudo)., com efeito, criticavam
o regime rqn1blicaoo. tido como ..o mal na terra'". EntTctanto. mais do
que uma reação monarquisra ou mera manifes:raç.ão do fu.nacismo religioso
arcaico do meio rural br.isilc:iro, como :.a imprensa r<.1. )ublic:1na e positivista
rcprc.~c:n,ou o tvc.'IHO à l1>0ca. a Gucrr..:i de Canudos foi o rcsulrado de
tensões sociais e poliàcas c.msadas pela exuema miséria e exploração do
homem do campo c-0mo mio de obm baraca e massa agt"Egada aos "coro--
néi~,. loc.i), l~c tipo de ooníli10 1;0ci;1I, que mi.,\curava valol'Q rdigi~)
populares e rcvoha política, rambém ocorreu no )ui do Brasil, na Guerra
do Comest0do ( 19 12- 19 16).
Em :imbos os eor1ílicos:, CUl\poneses miseciveis :U'm.ados se eJ\elau-
~uraram cm cumuni,lado, rdigioScl~ ..mcs~iâni~" (lidc.:r.c,la~ por um líc.lcr
rcligio~o) e combatcr:1m forç:LS milirnrc.s <1uc tinham 3p<)io dos gr:mclcs
t:l1..cm.l<..'1 r0$ musu<los c:c.1m as possível$ c:onscquênc:ia.s das rebeliões. Am-
bos foram vcnhdeiras guerras civis, com um saldo 1cigico de milh.,res de
mottos. sobretudo. corre os camponeses. Pda linguagem da religião popu-
1:ar, os c:amp<m<..'$CS apont:w:im as injt1sriÇ,.'lS e as mi.sérias da socictfadc mrJI,
projc.-r.indo um mundo ideal de fulicidadt~ e f~rtura que 5urgiria dcpoh <lo
··fim dos ,cmpos'", depois que o ..scrr.ío virasse mar, e o mar vir.issc sertão..,
conforme a profecia de Antônio Conselheiro, líder religioso de Canudos.
Apesar do discun.o d.a Hi.,\i-6ria ofici~I brJsilcira, S<."g\tndo o qual o
c onll'.ÇO dc: nos.-.:. Ri:pl1blica foi um paciro dcsfik· milit,H M:gui<lo por uma
vida política monôtona e fechada à qual o povo assistia ..bescializado·, o
quadrn revelado pela h.istol'iografia roais: atual é bem oucro, diferente da
fumo.s:a obr.t de lkmxlico Calixro. Dc:finitivamcnrc, nlio .)C morria dc: t('tlio
na jovc.:m Rcpi'1blic:a br.-LSilcira.

CONSOl.llJAÇÀO lJA ORlJF.M RF.l'lJRI.ICANA

Uma vez derrubada a Monarquia. era preciso varrer in.scituiçõcs her-


dadas do Império. Para mi, era necessário elaborar uma nova Constimiçâo.
que subsrimíssc a vdha Constituição de 1824, Ídca p-ara ordenar o regime
monarquisla cm bases liberais dcmro de uma ordem acravocrata.
Os embates emre posicivistas e liberais, entre aqueles que defendian'\
um governo com majs autonomia para os c:nado.s que: compunham o Bra ..
.!>il ("cemralil!.ta1" e "federali5tas"), já 5e fatiam notar no seio do próprio
Ministério republicano do Go"crno Provisório. Campos Sales. ligado ao$
24 t11'ifÓRU0011l,,\'illlt 1Pl) ll,::'"A

cafeicultores paulistas. era um federalista convicto. defendendo maior


poder nclminisi-r:irivo e políric..v p:1rn os estados. Rui B:u¼x,~. minis-rro cb
F:ueoda. liber.t1 convertido à causa republicana. também tinha sim.palia
1>do fodc~ lismo, lknj:amin Con:i.r.inc, ministro d~ Guerr.1, cr.1 o líder do~
positivistas, qttc dcfcndi:.lm um governo ccnuaJ force e intcrvtncor na so-
<'.:icdaclc. Ari.sridc.'i Lobo, ministro e.lo lrucrior, <.·1nava ma~ pn)ximo do5, c.1uc
sonhavam com uma Re.p ública popular e democr.itici.
No c:impo C.."C(m()mico, o Go,.,:mo Provls()ric,1 n..-public:mo, :nravC.:-s
do seu ministro e~, ~7.cnd:::a, Rui Karbos:i, remou estimular o c:apitaHsmo
bruileiro ''por dect'eto". Diagnosticando que havia poua circulaçSo de
dinheiro no ~i) para mo..,imcnrar o mercado inu:mo, dadas as car-.ac..-rcri)..
tica.s d., economia escravista que existiu a1é 1888, o go\•crno permitiu que
vs h:mc()~ cmiti~m papd•mocda ~ m fimc.lv~ de rc::,.crva, apviamlo•sc cm
bônus gove,namemais que de:verkun garantir o valor das emissões banci-
ri~s. Além d isso, inspir:iclo no vigoroso c:1pir:1li$m() bridniço e nonc-amc-
ricano, o go~mo i11ce11livou a cria"~º de sociedades anóninu.s, :unpli.ando
o crédito. MuirA~ cmp~s fo ram criadas artifici.:4lmentc e lança~m açóc.."S
par.a )(:rcm vendidas na boba de v-.1lorc.s, mas careciam de gt-rcnciamcmo <.·
producivid:adc. Algumas a1é eram ..empresas fumasmas'", que: nada produ-
7jam. t\ p~ r cfü.•;o. hot1\'C uma eufi,ria inicial na compra c.le açõc~. com ..
parável ao frene.si dos apostadores de cavalo na hora de encifüar o animaJ
antes d:i fargada das corridas de jóquei-clube. Daí o nome poptilar que
e.ssa política ganhou: "en.cilb:uuenco''. O resuk1do efetivo foi desa.seroso.
Muitas cm presas faliram cm pouGO tempo, k:v:ando consigo as economias
de: m uitos investidores. A emisdo de p2pel-moed.-i sem la.suo produti\•o
real fi.~, com c.1uc a inílaçáo !13ÍSM.: do con1rvlc. A:. finança,; pl',blica:. também
~e clc..,crioraram com os compromis..."O~ ;u:mmiclos pelo E.staclo na garantia
de bónus e na ampliação do crédito. A inércia do mercado interno, com
pooc,1s camadas sociais com rendo, para o consumo, uma das h-cranç:is do
sistema escrJ.visu, era ma.is forte do que supunha o douco mioistro Rui
Barbosa e sua vontade de uansform:u o Brasil cm uma grande e.- moderna
economia capitalista.
?~
_J

A vida política tampouco,,. tranquila. Em junho de 1890, foram


co nv(>C:ubs as dei~ p:ir:a a Alisc:mbleia Consrintintc, q ue, em poucos:
meses, elaborou uina nova Corudruição, n1o sem debates e divisões in-
{trn:b, O sistema de governo foi definido como ··preside.·nc:ialist~'", M:ndo
o presidente da Rcpúblic;a chefe do Poder E.xo:.ulivo. O Poder Lcgisl:.uivo
cr.1 conStituído pela Câmara e pelo Senado, <...i.tjt~ memb ro.~ não eram
majs viralícios, mas eleitos e com m.andaro temporário (ao concrário dos
rcmpos do Império). A primcir.a C<mnitui<i,-:io rcpuhlic:m3 do Kr:i.sil :ibo-
liu as '"instituições monárquicas" (Sen:\do Vitalício, Poder Moderador e
Conselho Jc E.s,ado) c;ririetdas por ccxb.s ~.s Ctlrrcnrcs rc:publiç:ma,s. Além
disso, as prouínâ,u for:un Lr:uuform:idas cm ntrulos, com maiores poderes
;.u)rnini~tr..ttivos, compar-•.mdo~ ao pc:.r(o,lu do rtgimc tkpo~m. Exemplo
dessa auconomia escava na gescão uibuciri.t. Os governos e.scadua.is sob o
regime n..-pub)ic:mo fiav::im QJm as ren da$ brcr:ulns pda <..-xpomç:io, cn·
quanco a União ficava com as rendas geradas pela imponaç-.fo de produtos.
As primeir:>.S era.tu mais polpudlS que :lS segiu1das, pois o Bt":tSil era wna
coonc,)mi-a agroc..-xponador;i.. Esse :lfT".1njc,) fi.sc:.al favoreci;.. os <.~t:.idos agrocx ..
porL3dOn.!S, como São Paulo, cuja riqu('l-:1 crescia di.a :l dia a>m o :aumento
do cun~1mu do <..ifé hra}ikiro no c:xu.-:rior.
A Conslituiçáo n-publjcana crouxc novidades no sistema dcitoral.
embora renha m:.mtido a tend ência u d iminuir o corpo de \'O~ntcs já es·
boçacb no fmal do Império. Deflo.iu•se que o voco iria ser direco, mas oon~
ti nua.ria "a descoberto.. , ou scj.1, não c..-ra St..-crcco. Analfubccos, mendigos-,
$0)d:ados, mulheres e religiosos (ni.jeilos ao voto de obedic:'ncia religios:a)
náu podiam votar, nem M'.r ,•oratlo~. A pruibiçáo do voto <lo:s analf'abcro~
no Br;u,jl duraria quase cc:m a.nos, excluindo a maior pane da população
trabalhadora e pobre da cid~dania política. a timio de ''garamir a qualidade
das eleições··. Os oú,nero.s demonstram. essa exdwâo. Ao longo de todas as
eleições da Primeira República, apenas entre 2% e )% da população pôde
e>:.ercer o direito de voto.
ÔUlra nu.'tlida importante implanr.1da pda nova Constituição foi a
scpar.ição entre Igreja Ouólica e Es1.1do, co111 o citolids1110 deixando de
ser a religião oficial do país. Isso, cnrrc,anto. não signifloou qttc a Igreja
C1tólica deixoo de ter influência. política e mor.il. n~ sociedade brasileira.
26 tll'iT'ÓlW,D.">ll,\~IIII PÚll ,;"A

Ao final dos trabalhos constirucionais, a Assembleia se autor.ransfor.


mou em Congresso Nacional, dividido encre amara e Senado. Deodoro
(la l'on)<._"Ca, cld10 "'presidente constitucional'' pelo Congresso cm ÍC\'crciro
de 1891 . não chegaria ao fina l do mandate>. Os conAitos com seu próprio
MinistéTio, suas lig:u;ões c()m os mon:m1uis1:1s ('agrave <.TÍSC t..>conômica,
:1comp~nhad~ ele iníl~o, minaram ~u:a prcdria lidcr:1m,.-a entre 3..\ diu..~
rcpublic.ma.) e sua pop ularidade c:ntrc a.s cla.-.~s popularc~. O ápice e.lo
cunílito entre lkvdoro e o Congresso tlcu-sc no começo de nO\'cmh ro
ele 1891, qu:mclo este tcnroo :iprov:ir ~ .. l.ci clns K<._~p<.ms:tbilid:1d~". d i-
minuindo o poder do p1ttideme &t República. O \'elho ma1tthal bem
qt1e tentou se manter no go\·crno. mandando fcd1ar o Congresso que lhe
opunha. mas o próprio Exêráro não ga.ramia ma.is apoio ao lider do golpe
de 1889. Cada vez 0.1.'Us, as principais lideranças 1:nilicare.s apoiav::uu seu
vice-preside11te, o in.trecha) Floriano Peix:010, apelidado depois de .. ivfa-
rcchaJ de Ferro"' pela sua mão firme na condução das crises políticas que
se S(.~1ir:1m . ls<,llado, l><.."OCloro renunciou cm 23 de novembro de 1891,
p~~ndo (.l ergo presidencial para o sco via:.
Sobre o 1'Marcchal <lc F(.'1'ro" rcoíram a~ '--x1>ccr-.ui~.) de posirivisr<b
e jacobino~. A ~o m h ra de, velho regime monán111ico, com pouct.>S adcp ro~
nn verdade. :;iliada às tcnsÕC$ sociais e polític..":l.s que se scguiT':im :t0 g-olpc n.."-
publicano, parl.-cfa coloc~r cm risco a jo,;cm Rcp\lblia brASilcira. 1:lorian<.l
cnÍl\·nrou com vigor a~ f\"\•olras <1uc ;mc:açavam a csrabilida(le do regime,
como a Ew.·olra f(dcralisca no Sul e a Rcvolca da Armada que abalou a
p1'ôpria capical <b RepúbJica, mas esceve longe de reali2.ar o ideal positivista
de w'lu dit:l.dura republic:U)a aú tioligárquica e moderni~ador.t, frus Lmndo
aqudes que tinham es.c:a cx1:>ec1.uiv.i. ror tr:í..,; do seu pcxfor csuva o apoio
político da oligarquia pauJisca, cicmc de que a sobrevivência do novo regi-
me era a garamia do seu poder n:l. polícka naàoual.
No fl nal do seu go\·crno, Floriano passou o poder sem maiores sus...
tos para Ptudcnic <li: Morai~. lí<lcr republicano paulist.1 e cxpro.sáo tlw.
valor-C$ libcrois--olig:irquicos. qoe d ispm,1,rn a eleição indireta de 1891 co m
Deodoro da Fonsc.:ca. A "República da Espada" se transformava no "Con-
domínio de Faicndeiros",
O escritor Lima Barrecu, no clássico Triire fim dr Policarpo Qun•
remui. rctrat0\1 a decepção de muitos republicanos convie.tos oom o no\'O
presidente. Quando o personagem central do romance finalmente encon·
tr.t seu ídolo polírico, de nio fuzia ju) ?a foma, não 1inli:a :a flrmt:1;i <le um
"marechal de ferro..:

Quarcsm:l pO<lc: c:ncfio \'c:r mdhor :a f'l;)ionomi:1 do homem que ia


fdx.:u <m !>1.l ~ mãos, durante." quase wn ano, tào fones podt'~,
po<lc:l'Ci Jc lmpcmJor Rorn.uw (...J. Era vulg.ar ç Jc:.olaJor.a. O
bigode." ,-:::1ído: o l:íbio inferior pendente c: mole :a que: ~ :ag:arr.tva
uma gr-.mdc ..mosc:C; os cr,1ços A~ddo.s e g.1'0$$Ciros; não havi:i
ntm o dtstnho do qud:<o ou olhar qut íos..~e próprio, que r(VC-
bsse .1lgum dote superior. Rr:i um olhar mortiço, redondo, pobre
Jc cxptQ)ÓQ:, a nlo )Cf Jc: triliceu que n.i.u lhe aa inJ.iviJual. ma.s
n-:aciv:a, de: r.aç:a; e todo d e c:r.1. gelatinoso - p:arc:d:a não ter nervuc..
Não quis o major IQuarc.smaJ \'ef c:m tajll ;-.inais na.tia que lhe
dtnor~tSt o car.f1er, a inieligênd~ to 1tn1i:xi:r:11nen,o. [...) O seu
t1m 1si:i.smo pc,r :tque\e ídolo polirico era fone, sincero e d esin•
1crcsN1do. Tinha--o n.1 conr.a ele enérgico, de F.no e .supervide111c,
tenaz e conhc:c«lor das ncc:~icb.da do país (... J. Entrt't:mtO. n-:i.o
c:.ra Wm. Com uma au.si:náa total Jc q uaJic.ladcs intdt'CttWJ1,
h:t,•i:t no c:acit<:r do l\12rc:ch:al Flori:mo um:a qu:tlid2d c: p rcdomi 4

nantc:: óbkza de: ánlmo; e: no seu tc:mprnunc:mo, muitu prc:guiçn.


(... ). Pdos lugare:,; qut passou. mrnOlHe nod"d pda indolincia e
dmmor ls ob,·ig,-.ções dos seus c.i.rgOS'.

A fu.lta de ene.rgia, sagacidade e projeto político de flori.ano se. e.vi·


dcnciou na fuci lidadc com que os olib~m;as p,.ulisl3S o sobstiniíram no
cargo de presidente d.., Repúblio, elegendo Prudcn1t de MorJi.s p.ira o
posto. Ma,s ~11 como o major PoliCJrpo Q oarcsma do rom:m cc. moitos
ail\da queri:un ver no flo rianismo algwn resqulcio de ide.alis,no republica 4

no e politivhra. O gu,'cmo de PrU(.kncc de Morais (1894 .. J898) enfrentou


uma conspiraçlo '"jacobina" apoiada pelo próprio vice, Manod Vitorino.
e alguns setores milirarcs. Em 1897, Morais sofreu um atentado comc.,:-ido
por um soldado, mas e.«:tpou ileso. A partir de cm jo, governou o Brasil
sob estado de sírio e consolidou o poder das elites civis, intervindo na Es·
cola }vfjJü:u e fechando o Clube Miliur :.ué 190 L. instituições que er.tnt :as
baM:..;; do.s posicivis1as e ..flor ianisr:1)"' <1ue ainda apost.ivam na volta triu n fal
do "'Marechal de Ferro"'.
28 tll'i TÓR l,HX.)lll,,\">II RI P(! II K'A

Para superar a e.ri.se económica. Prudente de Morais começou a


negociar um vulcoso em.préstimo com bancos ingleses, que se consoli-
(laria no governo )("guintc, exercido pdo 1ambém pauli~ra Campos Sal<.-s
( 1898· 1902).
Nu pre.sidênci:i da RcplÍhlic:, 1 Campos &ales us:ari:a uma fó rmub
políric..-:i ~imples, m~ eficaz ao sco modo, para pacifiC".tr as dispm~ de
poder entre as olig;1rquias orac.luai~ e g~ranti r sustcn1ação ao go\•crno
Íc<lcrnl. \,,,onllccida na l1i111orio1:,,r,:1Íla cornc, Pol ítica dos Govcrnadol'Q,
css:a pr:ítk~ implicava o :apoio ::nnomático do go\l\.'rno fcdcr.il nos grupos
que ~tivessem no governo dos escados, 1\ÍO importando de qu:i.l focçfo
fossem, desde que os governadores por sua va garamisscm seu apoio
no Congresso Nacional para as iniciativas do governo federal. Campos
Sales, coet'tnte com seus princípios libe1·J.is de defesa de um governo
civil com base oo apoio n:is elices oligirquicas ancoradas na econo,nia
cssencialmcnce agrária, dnha daro q\1c não podia confiar no apoio dos
..quartéis" oo das .. ruas" par.i se m:rnrcr no pc,l<ler. Nos <.1 u:1néis, muir.os
oficiais antiolig;~rq uicos, n.1cion.ali.sr-.as e; po.sitivist-as, criti<.~ \~,m o cstil<.l
e o~ v; lo~ políticos olih~r<.1uico~. Na) ruas. principalmcnrc da capital
Íc<lc.:rnl. u ma ma~~.i <lc trabalhadorc~ exduíd ~ da cid;ufania política e
dns ri<Luc1.:1s sociais não se senda rcprcscnt:1da. com r~mio, pela nova
elite republicana. Diante disso, Gmpos Sales dcfcn<lfa qoc o Hrasil de-
veria ser ''govcrna(lo .i parri r dos ~r-Ados", o u s<.'Ja, a partir dos panid<.lS
republicanos regionais reprcscncamcs das d ites agrárias. que deveriam
celebrar wu pacto entre si para garantir a governabilidade do presidente
d:i República, ele mesmo um ttpl'eseot:uue dess:u olig:trquils.
Essa "regra" de apoio mútuo entre as oligarquias pacificou, cm
grande pane, as graves tensões políticas do início do regime, mas., ao
mesmo tempo, inscitucion:t.liiou a fraude eleitoral. Era pressuposto que
o grupo que estivesse no pod<.'r deveria mancê--lo a qualquer preço, o qu<.·
oáo era <lifícil nmna época de vow docoberm e rnandonismo -.cm rnaio,.
rcs surilcias dos coronéis locais. Os mecanismos de fruudc eleitoral eram
muitos: ins tituição do "voto de cabresto'", pelo qual os eleitores eram co-
agidos a votar em de-terminado candidato, sob a vista dos coronéis e seus
jagunços armados; urili1.açáo de nomes de cidadáos morto~ para Íraudar
os votos: adulternçáo das "';um eleitorais'". que consolidavam legalmente
OA R tf"(~I I(',\ OA I WADA AQÇQ'<OOW i'\IODf I A:Li,,'lll lRO'i 29
o remirado das urnas nos municípios. Muitas dessas fraudes vinham dos
tem.pos da Monarquia deposta. mas foram consagradas com.o base do
~isu:ma dcitornl republicano.
O ré.\ultado <l<.,;.sc ~isrcma político Cr'd que os "ários grupo..., políticos
olig3n1uic:os cm ,lisputa se utili1..:iv::1m d:i fr:mdc clciwml gcncm1i7~-.d:, p:ar:a
chc..l?r ou m:mrcr o poder nc» cm1<los e municípios, c,Ti:mdo um clima
tlc tcns.io política con~rancc, que o.:io r-.-ro terminava cm escaramuças
violcnt~ entre :1) fucç6~ olis;in1uias. Em muitas uni<laclcs cl:t fu.lcraçâo
:1c::1lx1v:i :icont<.."CCn<lo um ccno roclâ?.io de lidcr:mç:as o lig;:ír<1uic:as, cxii,'lnclo
novas acomod.2ç6es com o pocler federal. Mas, vi:\ de regra, os es12dos da
Fcderaçio acabaram \•irando ..feudos cleitorai..s'" de determinados grupos
políticos originários da.s oligarquias.
Se. apesar de todas as fraudes, :llgum político nuis independente ou
radiC1.l (que fugisse ao pac10 entre go"erno federal e goven\o eS(2dual) fosse
c.kito para o Congresso, havi~1 o recurso finaJ da ..degola polhica,.: como
n5o hnvi-a justifrl eleitoral indcpcndcnrc p~ra O'l,'3ni~tr 35 eleições. a con-
firm.içi<.l do rcsuh.-do das umas c.~rn fei ra pcl<.\ próprio Coni,rrcsso Nado mi,
da ''Comb.~o tlc Ve,'f'ificaç;io de P0<.lc~". ob\,iamcntc.\ ooncrobda
a11"'dVés
pdo go\'crno Íctlcral. A~im, mcJSmo dciro, o político <111c não h1a..~c parrc
do joi;o do poder pock-ri:a nfo ser "conf'innado" e. porr..mto. não tomar
posse do ci.rgo lcgisl:ui\'o.
Além de Q tabdcccr uma fórm ula política <1uc. ap(.·.sar dos sobres ..
saJcos, vigorou até o fim da Primeira República, o governo Campos
Sales eq uacionou momentaneamente a crise provocada pela inflação
e peb dívida externa ~umvés de aumen to de tax.:i.s de câmbio e de em-
préstimos tomados aos ingleses p:u2 p:i.gar os juros d2 divida anccrio r
(para os próprios bancos ingleses, diga-se), um expediente conhecido
como fimding /oan. Em troca, o go\'emo cedeu aos bancos ingleses,
como g.1rantia, as rendas alfandegârias do pono cio Rio de Janeiro.
Os nac:ionalim1.s ~e agi1aram, ma~ ;u oligan1uia) 1nanda\•am na vida
polítie1 e ignoraram os protestos.
A consolid-ação da República não se deu a.penas no plano intcmo.
Nos seus primeiros anos, houve vários probk'fl1as ele fromeira do Brasil
com Argentina, Colômbia e Bolívia; ameaça,, de :inexaçáo de parte cio
território nacional por pane de fninccscs no Ofopoquc; e problemas com
os ingleses que oobíçavam a ilha de Trindade. Foi um barão, füho de uma
linhagem impo mintc na monar((uhi, <1uc se destacou como a níAcc da
polítici externa n:1>ublicana: José Maria Paranhos Junior, o b3ráo do Rio
Branco. Ele liderou as negociações para firmar boa pane dos acordos que
resolveram esses problemas externos. Como ministro das Relações Exrel'lo-
rQ desde 1902. e como membro negociador das mis.sób brasilcir~ anlQ
c:li~o. o barão e.lo Rio Br.tm:o tOrnou,>C um d ue, politi~ó> rnai) popularQ
da República. Sua mone, em l 912, fez adiar o Carnaval c:trioca, dada ::i.
coir1oçáo popular que se seguiu.

HOWE UMA POLÍTICA DO CJ\FÉCOM LEITE?


Na pt·r)pt·ctiva da hhrorioi;,rafla mab 1r-.4didonal, a Hi~tória do
período situado enn·e os gov<'rnos de Rodrigues Alves (1902-1906)
e \Vashington Luís 0926-1930) é apresentada como uma sucessão
monócon:t de fauodefros oriundos, em sua maioria, d1s olig11'q uias
pauli~t.t e mineira. E.~:rn dinâmica política f'ui :-.inrcti1,;nla na cx prcs:-.âo
.. Política do Café com Leite'.. imposta re!,'Ta de ouro do jogo pc,11ítlco
bt'asiJeiro que fazia as outras oligarqui1s region:üs menos poderosas
gr:wit.irem em torno do eixo S:ío P:tulo-Minas Gerni.s, tscados que rc-
prcscnta\'-am. rc.spcctivamcntc, o ..café" e o '"leite" ela fumosa f(1rmula
política e se rcve,..iva.m no poder, Ess.-. política de rodi1.io no poder teria
sido fix.:tcla cm 1913, no Paclo de Ou1·0 Fino, no qual os reprt..~cnta.ntcs
dos Panidos Rc:public.anos de São Paulo e Minas Gerais se uniram pa.r..1
f.rn:,:r frente ao poder crescente do Rio Gnmde do Sul junto .10 gover-
no federal, na época. c;a,pitancado pelo man;chal Hermes da Fonscc..1.
e pelo senador Pinheiro Machado, do Rio Grande do Sul. Contudo,
as dificuldades cm. manca o acordo cncre as d uas maiol'cs oligarquias
para se ahernarcm no poder federal, dada a proposta do presidente
Wa!>hingwn Luís cm fazer um paulist:i como ~uccssor, reriam marcado
o fim da Primei ra República, cm L930.
Ainda é consenso entre o.s hisLoriadores que a Primeira Repúblici
era apoiada cm instituições m uico conservadoras e limitada por uma
c.linámica polhica que g ra\'ilaV-A c m lorno das oligau111i:is inspirada~
por um libcra li.smo conserv3dor e a ntipopular. Mas 3s versões hiSto-
º" RtP('&I º" 1 WAD,\ AOC:O~row i, 1oot I A:U.PI IRO', 31
I(',\

riográ.fiCJ.S que explicavam a Primeira RepúbJica, conforme descrito no


parágrafo anrerior, bem como os deraJhes. as tensões e as contradições
dc.~sa dinâmica vl'm ~ofrcnclo rcvi~ócs irnporc.1mcs. Por exemplo, his-
toriadores vêm demonstrando que o próprio jogo político das elites
oligárquica$ e SU3$ fo rmas de organização e oc:up:içáo do Esta,lo, $cja
no plano rcgion:11 c.1u fc:dcr:al, não era cio simples, e n:io se re~umia à
''l'olídca <lo Café com l.ci1c"'.
Na hi~toriog,rafia rnai11 n.."t."Cnrc. o '"aton:lo pcrfi::iro" cntn-: Mina11 e
S:io Paulo p:irn se pit.-rpc...·tuarcm no pc,l<lcr n:1do nal vem sendo CQnsi<lcrndo
um mito. Na nov.t persptttiva, o jogo polúiro n-:iciona.1~sava, ao me.nos.,
por seis grandC"S oligarquias rc:g.ionais: São PauJo, Minas Gerais, Oahia. Rio
Grande do Sul, Pernambuco e Rio de Janeiro. As sucessões na Primeira
República e a c.1p;1.cidad.e de cad.1 grupo estadual se articular de 11uneira
bem-sucedid:a a poderosos de oucros estados dependiam ofo apenas da
força cconômjca das suas dites, mas 1-ambém da sua capacidade de or-
gani7.açio política r:mw local qu::,nto m c:ion:11. Em moiro$ momcnros,
por con~ du.~ complexidade, olig.uqufas menores conscguir,1m colocar
seu,) rcpr<.'Senr.intc!i na Prcsid{'flcia. oomo no <.':aSO <le Eritido l'csS0:4 l·ntrc
19 19 c 1922. A oliganp1ia g.itícha, p<>r c"tcmplc.,, tinha gramlc inílué.:ncia
junto :10 Exército e clispurnva com p:.nilist:1.s e mineiros o apoio dos estados
do Norte (arual Nordcne) no jogo polídoo nacional. Porr.mto, podemos
di?er que a política da Primeira República não Sl· resume à .suposr-.t aliança
São Paulo-Minas Gera.is: é possivd mesmo questionar se havia imcrcsscs
comuns esu·acégicos emre os dois maiores estados da Federação.
Além dessas nov:a.s persp«civas nl Histótfa Política, a História Social
e a His1ória Cultun.l ,:unbé:m vêm alargando seus estudos sobre o período
da Primeira Rcpúblic.a. No final dos anos 1970, trabalhos fticos sobre o
movimenco oper.irio, sobre as classes mêdias e sobre o cenentism.o demons-
traram que a vida polític2 e social da Primtil"J República t ra bem mais
animatla e compk·xa do tiuc se pciuav-.t anccl'iurmcntc. Aw rc.,; políticm
q ue iam além do "'condomínio dos f.n-.cndciros". cmbor.1 não conrrola.sscm
as instituições mais impommcs, n:io estavam passivm como meros obscr·
\'.ldores bestializados do "ccarro das oligarquias". Observar c.sses acorcs é,
porr-.uuo, fu ndamcnr:~I para comprccmlcr a cri!it" da Primeira Rep{1blica
nos anos 1920. como \•cremos m3is adiante.
32 t llSf<"'" 1Xm;;11 RI PÚII U

U~ A RE.PÚDUCA 1:-ISTITUCIOKALIZADA.
MAS SEMPRE EM C RISE

Os pn:sidcnccs que suc. ."tlcr:im


. :1 Campos Sales $C bcnefid:1r:1m d:i
ins1i111cionaliz:açáo pnlític:a propiciad:1pd:a Polí1ica dos Governadores, que
rumava a jc.wcm república um "'co ndom inio <lé f.t:1.cndciros". n emralizan ..
d o os pl'Qjt..'tO.iõ n:publicmos difcrcncfados d e pc,l$ÍfÍvistas e jacobinos, <.1uc
tinham :apoio das camad:as médias u,·banas.
A ct1uaçâo da crise hnam.."Cira e ca,11ôrnic.t sr,u;a.s ao fimrling /qdn
também foi um furor imporcame n:i esca.bilizaçáo politiCl da República,
~o menos n<.l cuno p~7.0, p<.·rmirindo ao govcmo cncamp:ar t.~ b.;incos cm
crise, voltar a ser o único emissor de moedas e reequilibrar as finanç.is pú-
bliCLs. O fu ror econ ômico externo ta mbém foi im ponantc. O c:apiraHsmo
mundial no início do século xx se r~uperava da longa crise que aus1r.1
csrngnação entre 1875 e 1895. ()$ mcrcacl~ ,·olravam a M'. aqm.x:cr e a
burguesia dos países cemrais do sisre.m.a vokava a buscar novos me~dos
par-A investir,
O govemo Rodrigues Alves (1902-1906), partindo do princípio de
que a capiral <la R.cpóblic;.1 deveria ser um can:áo de vhirns à :aln1rn d:.1 "dvi-
liz.,çio" europeia, e com isso :atr:lir os irwe.,;tidores estrangeiros, patrocinou
u ma grand e modcrni7.:tçáo urlxtna do Kio ele Janeiro. l'ara viabili1;í-la, o
pl'efeico Pereira P;i.ssos (1904-1905) pl'o moveu UJ'll grande '"bora-ab:ti.'to",
c.k,nolindo dezena~ de imóvd~ aorigt» onde. gt--r-,,1lrm:nrc, Reavam a~ habi,
rações coJe.civas dos mais pobres {os ..cortiços"), e que ccve oomo símbolo a
connruçáo da avenida Central à .scmclh,.nça dos bulcvarcs P'-risicnscs. Para
vencer as epidemias comuns na àcb.de, como a Jcbre amarela, a v::aríola e
o cólera. a palavra de ordem das autoridad<.'$ era a hig:icni1.açáo das ruas e
d:lS pesso1S a qualquer preço - o que 1la in.a.i.or p1rte das vezes se rradu-2:fa
cm maior vigilância e intervenção na vida cotidiana c.la.s da\K"S pupul:~rt.\,
consideradas pelas dites e pelas aumridades oomo culpadas pelas doenças
e pela stia pobn..'""la e ignorãncia, como se não houvesse mcca.nismos csrru~
wrais que as p~tr.tisscm.
A expuls5o d;u popul:u;ôes pobre~ do centro d:i cidade .somou-se
à imposiç~o cb ,,:icina contra a v-arfollt cuja obrig:uoriedade :1 qualquer
cu.!>IO permicia aos agentes pllblicm: de sa(,de. apoiados pela poHcia,
invadirem :u casas e vaci narem as pC$SOas à fo rça. Não havia ne nhum
,
O,\ RtP("&I ((',\ D,\ l "PAD,\ AOC:O~(IQM i-.;10 ot I A:ttWI IRO', 3.)

cuidado com o esdarecimenco das populações ma.is pobres que eram ,


litcralmcnrc, o objew da c:unp~nh;i Mgicni~~. e n~o scu.s ~uje-iw~. A
violação dos lares pelas autoridades. -1 exposição dos corpos, sobretudo
das mulh-eres, ao$ agen tes Jc s:iUd e e :t igno rância popular S()b rc os cfuj.
ros d3 vacina geraram uma ,ens1o sociaJ 1n uico grande, culminando 1u
lkvolra Ja Vacina, cm no\•crnb ro c.lc 1904. A rnoha ganhou cunwrnos
ideológkos mais claros ao ser apoiada pelos alunos da Es<;ola Militar,
rcdmo de posirivis:t'.tS e j:u;obinos, <1uc pretendiam cmposs:ar l ~uro So~
dré, )Cnac.lu r e engenheiro m ilicar, como '"tfüador posicivi~la". O pro1C.\to
prorogoniudo por grupos populares da cidade d urou cerca de 5 d ias e
foi reprimido com violênci.1 pd:as ~uroricbd<..-s, c-0m um ~Ido de m~is de
20 mortos e l 00 feridos.
Em <1oc pesem as agir:içô<.~. nas m a$. o jogo político fo nd:iment;al
d:t Repúblic:l., decid ido no "'ceau·o d.15 olig.1rqui:1S", J\:lo foi abalado. O mi-
nc.:iro Afon~o Pena acabou d citv, govcman<lu entre.: 1906 e 1909. O novo
pre-.sidence defendia cerco grau de imerveução do Estado na economia, ao
contrário de Rodrigm~ Alves, e apoi«.l\1 2 polític.i de valori?~f:iO ~nifk i:11
do café, nmerializada pelo Convênio de 'fauba1é (1906-1908). A poütica
furmali7.:tda ncs:tc :acordo csrabck·da a comprn, de SlC.'lS de c:1fé pelo gover-
no fi.xlcral ~ r,1 íorm.ição de <..-s,oqu<.:$ n.1,11.1ladorcs, além da d<..·s.,•2lori?.ação
conLrolada da moeda nacional pani inccmiv:ar a cxponaç.lo do prodmo.
' lhdo isso paT3 garnmir não apenas :.lS "'dh,isas· {moedas cstrnngcirns Í<..lrtCS,
como o dóbr ou :t libra) necessirias p l r:'l :'l economia brasileira, como llt\l-
b~m para a.)..1icgurar o alro rcm.limcniv da-. dito 01Ícicultor"".

A ECONOMIA NA PRIMEIRA REPÚ81.JCA, CAFÉ E BORRACHA

O aiiec:r.1 o p rltl(..;pal proc.lu10 económic.:o que lt~v;, o Rrasíl aos mercados


mundws entre 1840 e 1950. A pmir de t8G5 até 11 AboUç.ío. a otpanslo cb su1
lavoura significou uma grande ckmauda por nião de obra cscra\'a, tanro no Vale
dv r:,r.1,ba qu.11110 m, Oct.cc P.1uli~1:,1.
O.s °'lnrôcs do c:aíé". romo cr;am conh«idos os gr-.uules plan1;adores, <.e
con.uiruí1";am em um grupo económlo e poliri~me1lle impor('lnte, corru,,do,
se 1 b":Ue cb oligarquia p1ulis:r1, ::i elite rn::ais pode,osa d1 !'rimei~ Repúbllca.
Em 1900, o rofé rcpre5entav:,a 60% das o.poma.ções; a p.Jut.a ai;rocxpon.adorn
b,-.l..'ifeira da primeirn. metade do :,:érulo XX era complcmemada pela borradia
e pelo e.c::1u.
Apa.:u de F,lt inuh:1 rique'):a (e~ o m:.I~ imponarHê p«)c:11110 pcim:irio d:t
«onomia mundi:11 acé ser $1.tbidruido pelo petrólt!O tm me-.kiOi do skulo XX),()
café vivia cri~ cs11u111raiti e cídi<as. A dem.ln(b Ct('SCence pdo pffll-lum dlimu·
IJva a <lp,msio da l.l\'Oura hr.isikira, cau!>Jndo supcrprodt,ç~o ç :, consequente
qt~b de JH<ÇO$, diminuindo .1 rn;ugeen de lucro doi, f.iundeiro, , Além t li~.
q1~n g;.inh,'lv.1 Jinh 'l?ir1) d(' f.u(l er.:im t)i, gr.rndl'!S (:()nM:"rci:al'llc$ \Ili(' Íi,1i:11n :1
ponte C:Otr(' a produção da.i fo.zendas e os mercados mw1dfai.s. P.tra manter e.s·
tâ,d o preço do café, o 8,0\'t"mo federal brosikiro comprava o.s o:ccdcntcS que
nio cr.am ,·cndidos para o e.:uerior. fazendo moqu« reguladora. e manipula"ª
o dmbio. QuatHO mais dcsvalo1iu.cb a moeda b1'3.\iki.,,. cm rcl~o às mocdu
foncscsrr:mgdr:i5. como a Jibr:tcncrtina ou o dóbr, m:iiofC'S cr:un Oi ganhos cios
c.úcicuJtorcs cm "mil-réis•. Cnrmanto, CSS3S mcdicb.s rcndi:1m 2 tomar artigos
de consumo popular que dcpcndfa.n.1 d-a. i.mponaçã.o (como determinlldas rou·
pa.s c alimentos) mais caros para a população cm icral. Coruoli<f.a,.·a~sc. a\.Sim.
uma fórmula d.W.ica na economia br.uikira: a ".soc:ializaçâo das pcrCW" geradas
pdo linandamemo público d e imc-rcsscs 1>ri..,ados.
Enfim, o café rcprcscncav:i :1. W'3.ndc:u do p;l.Í5 com •yoc:aç:lo agricol:{, con·
formedcfc-ndiam amplos sctorc.s <W oligsrquias sgriri.1S,, mas rambcm unns.for.
ma,.·a a economia brasileira cm refém do produto. l>ando,sc conta disso.. muitos
membros da própria dite política. picocupados com a acash.a dependência
cconOrnlei do aR-, pa.1'2ta.m a dcfendcr :t diw:rsiMcaçào d:i produç~o .y,ricol:i..
o pl:ancjamcnto cconõmko e :i industri:iliz.:.ç.\o como c:1minhM pu2 2 modc-r·
n.iz.aç.io da socicdJd.c bruildra e p:u:i o forulccimcnro c:b cconom.h nxional
frente a outnu economias capitali.s.ta.1. Em São Paulo. o capital o:ccdcntc que
era gçrad.o pela economia cafuciri passou a x r Uwcnklo na indfuuia de bens de
consumo nio ducl,'ds (:i.limc,uo,i; e bcbida.s). cuja dc,n.i:nda amncntava à n~,.
dida que u cidadei crcsciam p,r:içat 2 imigraçto. Ênttcranro, como :i c-conomia
e :1. politk::l cb Primcir.1 RcpúbUo cmn volodu par.:i :1 ,':l.!oriz:lçio e :1. protcç.io
dos interesses dos cafcicuhorc.s, :a indusui.alizaç.ão não ti.u.ha cstimuJo tu politica
cconômk:a do governo federal. Em grande pane. CSSC' fui um dm pontos mais
cridcados na criK" 00 poder oligárqui.eo do.s anos 1920. Para os gmpos sociab
que sooh:iv:am ver um llmU lndusrrialiudo e moderno como os mllir2n:::s,
amplos setores das d:uscs mêdi:u utban:is. :a burguesia indumbl na.sccntc
era pro::iso.. :unes de nuis nach, ti.nu a oligarqui.a rural do conuol,c do Estado.

Afonso Pena morreu ames do fim do mandato. e os embales cna'C


miliw'isw e civilistas, liberais e positivistas.. logo voltaram à cena. Hennes
<la Forucct, ministro da Guerra, se colocou como candidato à sucessão.
Nessas deiçOO. a oligarquia paulista. íL"<.luto civil é lilxr.11, apoiada pelo~
baianos e por parte d.a oligarquia mineira. apoioti o candidato Rui l:l1rb()53
na "c.unpanh..1 civil isca", contra a volra dos mil.irares no controle do Esrado.
Hermes da Fonseca era sobrinho-neco do ''fundador da República", e tido
como continuador da .. R<.,:níblica da E.~.pada". Ele tC-\'C apoio cio prciicléntc
cm cxcrdcio depois da mon·c de Afull.\() Pena, o p~ista Nilo l~çanha
( 1909- 191O), dn jovem oAà:iJicbdc mrnt:ir e cio scru1dor g:uícho Pinheiro
Madudo, nome de grande inAuéncia no jogo políri<..1.l (4.-Jcr.11. O senador,
n.:public.ino hi)tórioo e fi.antlador do l'.lrcido Rq,ubliC".mo Rio--grnmknsc
(l'nR, 1882), ao latlo e.los r..unbém g;nichos jlílio c.lc Castilho~ e ~i> Brasil,
ccnraw :1rric..'l1~1r uma frente a,nrra a prcpondcr:inc..fa de Mina$ CcF.IÍS e $:ic,1
P:mlo 112 política nacional, consolidada desde a presidência de C.·unpos Sales.
A campanha dcitoral foi muito dispurada. marcada por comícios
em praça pública por parce dos "'civil.iscas·· em busca do voco urbano nas
capic:tis e gt';lndes c,idades, além das cradicionais arciculações políticas fei-
tas pelas oliga.rqujas rurais. Hermes d:i Fonsect questioo~w:a ~ bases d:a
Política dos Govcmadorcs. defendendo o fim do ..siluacionismo· enadual
b'3rantido pdas fraudes dciror.iis.. ar:ran:~ <lo csrabck"Cimcnto de clispuras
ck:itorais "vc;rdadcir.u e hc.mcsws~. O lema de su:ri ampanha era a \'a$SOUr:t,
''para varn.:r a oorrupção" (rc.·rom~c.lo ma~ tar~k pi.:la <.";lmranha pf"C:)idc,-n ..
cial de Jânio Quadro>, c:m 1960).
1--lcim. Hermes da l'Onsc."GI c:oloc:c,)l.1 cm práric:a seu plano p:.tr:t for
4

çar o rodhio de; poc,k:r nos csr..uJos hostis à s,aa arndidanara, mas o Ít7. de
mandr-.t pouco h:ibil. O plano r(.-sumi:a,sc à Polírica <la~ ~lvas'Õ<.'S, nome
pomposo para cobrir a arcic.ulação de manobras políticas e imervcnção
militar fede.ral em v:irios eSüdos. E1n que pese o discurso mor.11.i.2.ance e
moderflit.:l.dor por tcls das "Sl.lvaçóes", 1t'io bttvil fltflhtm11 muda.nç:i
cfoth'.l na ordem social ou cconômic:i vigen1cs 1l0 pais, pois fahav:i aos
apoiadorcs dessa política de inccnÇÕc.".s anciolig.1.rquicas - operários, setores
da dasse 1nédia e 1:nilirares - a devida organizaç5o para se impor pofüica•
mcncc frente ao poderio de coronéis e oligarcas. Na prática, cm muitos
otac.lw., um grupo olig.árt11.1ico acabou .\ubstituíc.lo por outro da tn~ma
origem social, de oposi~o. tra1_.endo de \·olta a instabilidade política d os
primeiros anos da República..
O prcs:idemc da Rept.'1blica, vendo-se enredado cm uma simação
polític:i cxplooiva, logo n:cuou, e ~u governo a.Mumiu um feirio mai'> oon-
vcncional e conservador. f\ lém disso. a crise econômica, cm cujo epicentro
e.sravam os emprés:dmos para bancar a politiCl de valorização do café e a
desvaloriiaç.\oc:1.mbiaJ, saiu do controleemre 1913 e 1914. A desafortunada
política <.lo presidente, bem como as ous:klias compom1mc:ntah da jovem e
bela prirncir,1-<huna, Nair <lc ·rcffé, oomo os $31'.tl L'i de mí~ica popular no
P:al:ído, t()mar:am-sc o :~1.mto fuv()rito cfa imprcns:1 oposic:ionist3.
No plano ~ci:al, o governo Hermes d:a N)n~'CI foi m,:rcado por
conOi1os impon::t.nt('Scdr.i.máticos. Nos primeiros dias de governo, edodiu
a lkvolta <la Chibata (nO\'cmbrv <.lc l 910), pror.agoni7..ada por marinhcir~
cm :ma moiorb m:g«)$ e pobres. Os rt.'\'olrosos fa:r.iam um:1 <.."Xigênc:i3 b:í-
sia e razodvel: o fim dos castigos lisicos na Marinha de G uerra bnsilefra,
então uma das mais bem cquipad.t.S do mundo. Com a promessa de 11m
dos c.astigos e anistia aos líderes e. aos demais pardcipa.uces d.i revolm. os
m:11·inheiros recw.ram. Jnas logo perceberam cel'em sido engai1:.dos pelo
go\'erno, que cedeu is ex:igêl\cias da alta oficialidade e puniu os revolto-
sos. Houve, entáo, um:.i nova rcbdiáo, na base da llha d..ts Cobras, que
foi bomb;m.Jc:tdn pcl3.s furças lcg:tlisr:is. (.),; sobrcviv<.."ntCS 30 b<,mba«Jdo,
cc~ de 250 marinheiros, <.kpois de se rcndcrcm, for.i.m coloc:i.dos n<.l
navio S:uélifc, o "'n;ivio da monc'\ onde ao mcn~ 1O marinhei~ foram
fu:r.ilado.s e jo~uk~ no mar, antQ mc~mo <lt: d1c:garc:rn a Manat~. 1)e lá,
os que r~ttir:tm fornm <..'flviados para o rrnbalho forçndo nos seringais &1
Ama1.ônia, onde Outro5 ramos morreriam de malária.
No Sul do Rrasil, o funtasm:a dl· Canudos \'Oh.ava a aswmbr-.ar
a República: era a Revolta do Concescado. que recebeu e.sce nome por
ocorrer em um.a região disputada pelos e.scados do P:11-an.i e de Sam:1
C:uarioa. O pivô dessa revolt:1 popular que encolltrou expresdo na lil\-
guagcm rdigiosa e apocilíplic:.i:, 1.il como em Canudos, foram :as açócs
da Br.rzil Railway e da Souchcrn Lumbcr do empresário escadunidenS('
Percival Farquh;ll', que lomou à fo rç.a as terras de posseiros pobres da
região, acirrando as tensões soei-ais locais. Liderados por um "monge·,
JoM: Maria, os cimponc.M:~ se rc:bdar.aru dur,incc 4 anm, provocand o um
conAito com um sald() de 20 mil mortos.
lmpactancc nos c:srados do Norte (acuai NordcSlc), a Polícica das
SalvaçOO pouco interferiu no jogo político dominante dos estados mais
ricos e omnur:tdos politica,neme, corno Sáo 1\mlo e Minas Gerai.>, ma~
permitiu que políticos experientes. como o senador Pinheiro Machado.
buscassem nos esta.dos do None um comraponto ao peso poliôoo pau.Hsra
e mineiro. Essas manobru possibilitaram novas barganhas que acaroraff1
por colocar a ditl" g;a,kha no primeiro plano da polhica rcpublicrna. À
~ntc do Partido Rl'publitanó Conservador, tcntati\'a de uma agrcmiaçâo
com :abranbtênc:b n:idon:aJ, o s,enmlor g:nkho se camliclar(m à \iUC:t.~s:i.o de
Hermes da Fon$CCI, ma\i n~o r~isriu ~ forc;:a dos panido~ rt.1-,obJic:mos
n.:gionab oomantlado)) pdás olig;arquia~ de cada loc-..i.l. A candickuura de
Mach,1do f,,i vi.sra (:orno :un caça pcl~ <lu:u oligan1uias mai) importann:s
q ue <lomínav.1m a c:eno polític:~, $:io l'aulo e Minas Gcr:ii.s. Os <loi.s ~rados
se uoiJ':un para fanç.'lr uma c~mdid:uura imbatível, daodo oristm ao mi10
da invencibilidade dc.icoral da Polílica do OiJC com Leite. consa.grada no
Pacco de Ouro Fino. e.m 1913. Depois do fim do mandato de Hermes da
Fonseca, paulistas e mineit'os volwiam ao comando d:1 política nacional,
com a eleiçlo de Venceslau Deis (1914--1918).
Ogo,·erno de Venceslau Drás (1914-1918) coincidiu oom a Primciri
Goerr.1 Mundi:al. <1ue abalou a gt.vpolitica e n economia moncliais. O Kr:t-
sil pcrmam.:ccu ncut;ro no conflito .:até ouc-uhro de 19 17, embora houvesse
muira agiração, princiJl.41mcnn.· tnt;rc inR·lct.Tuai) e imigr-.rntcs. cm defesa
do latlo francês (e Aliado) ou do .ilc:máo. Conn ufo , ar.it1ucs .ilcmâQ .i na•
,'los mercmn.~ brasileiros que c:<,lmcrciali7.a\'!lm com os Alimlos acahar:.tm
con\'cnccndo o go\'c;rno a declarar 1,rucm ao Império Alemão. D\lnmtc
e~ gucrr-.1. a p~nicipaçfo brasileira f1cou rcdu1ida a uma c:(1uipc médica e
a uma força-tarefa naval com a missão de: patrulhar a cosm africana cmre
Daca.t· e GibtJ.lcar. Os únicos tiros dados pel:.1 esquadra brasileira foran1
contrJ wn c:trdume de co1ü1'1has, ronfundjdas com sub1narinos alemiesl
Assim que :a csqu:adr:a chegou a Gibralt.1r, em 11ovembro de 1918, aguerri
já tinha acabado. Em compcn.saçáo. a gripe: espanhola (vírus Influenza.
tipo A) mataria mais de 200 marinheiros brasileiros.
Enucagostodc 1918<: maio de 1919,cssa pandtmiadcgripcditimou
milhÓC))dc pc~a)cm rodo o n1Um:lo. 1\pc~arck scrcharna<la '\."))panhola", a
epidemia fui diagnosricad-a pda primeira vez nos Estados Unidos. A guerra.
sem d(,..,ída:. facil itou a propagação do \'Írus, não apenas pela circulação de
exércitos entre navios e: campos de batalha. mas rambém pelas dificuldades
coric:lian:u que fragilizaram as popu~tçóes diance tia dOt"nça. No Bl'asil. a
gripe chegou cm scc-embro de 1918. n5o se $.1.bc se rraiida por navios co-
.)'8 " 1'jfÓR U 1X>IIUSl1 5t1Plill rA

merci:tls estrangeiros ou pela missão médica. brasileira que participou da


Pl'imeir:a Guerra Mundial, ma,ando cerca de 300 mil pessoos.
O oonK-xco <la Primdr-.t Gucrrn Mundial rambém ooinciJiu com o
acirramcn tO dos con flit0s sociais e ideológicos n o mundo t0d(), e <> Brasil
não ficou imune. No fina l dn guerra, os opcr:irios europeus pen:cbiam
<1uc sua vida c~mava ainc.la mais diA'cil do que habimalmcmc po r coma da
supcrcxplor-.ição do tr,1balho e da crise t.-cunômica c.ausa<.la pelo coníli10
mune.lia!. Além de fi,rncccrcrn a maior parte <los soldados <1uc mo rreram
nns trincheiras cm no me dos seus: ~p(.-crivo.s países, a d 3$SC op-cr:íri::a te\!\"
que trabalhar e.ft1 dobro p2r.a suscentar o "esforço ele guerra". Apt'Ovtilando
o comcxto, vários líderes revolucionários lig:3dos aos panidos e ao
movimento operário radicalizaram suas críticas ao capüalismo, capeando
a insacisfaçlo da classe opet'ária. O resultado mais d1-.u uicioo desca crise
socfa.l foi :l Revoluç:1o Rus:U, que den ubou a motlat'quia cencen..1ria. que
ainda mand.'lva no imenso p-.1.ís de: 1mmcira aUlocrática, com o poder
conu:ntraclo nas m3os do o.ar e seus pQucos conselheiro$-, e cs~1bclc..x:cu o
primd ro govcmo socialista do mundo.
lnrc.:rnamcntc, a políti~ bf".1.silcira via na~x.-r novos ,noru in ílucnu.~
e ic:lcologia.s, alargando Ql! coníliros par..t alt:m tio <.1uc Qc..·orria no ..,cam,
<lns oligarquias". As c:am:idns urb:m:1:;, da.s..scs m édi3J1 e opcr:irfado c:xigiam
reformas políricas e sociais que as beneficiassem. Mas como esses atores
se forr-.1.lt-(t·ram? Ouranu.· a b'llérra, o parque indrnrrial brasileiro crc-.SCl.'fa
signH'icarivamcnt(, ainda qu( limitado às indúsu'ia.s de bens de consumo
n:'.io dunive.is (têxtil, alimentos), e com ele cresceram :.1 dasse opetlli'ia e sua.s
org;.uli.2..1.çóes siodiCilis e políticas. Em oulrl direçio, a clãSSe média que
crescia com a urbaniaç:ío era cada \'CZ m.iis influcnciacb pelo nacionalis-
mo autoritário. Os mililarcs, sobretudo a joVC'm oficialidade, cxprcs.5.1.vam
as insarisfuções políticas da classe média brasiJeint, na falta de uJn partido
<1ut a rtprcscntasst. Essts grupos, civis e milirarc.s, passaram a dcfcndtr
um gO\•crno ccuu·,il fo ne e in1<:r,•cnior, <111c nK>tlia.ssi: os conOiws C".ula
ve7. m3i.s intensos enrrc a bt1rgucsia industrial e o operariado. Além disso,
def<,,,diam politicas mais vigoro~ de apoio à industriali?..ição, vista como
o aminho para rirar o Brasil do arraso social e económico.
Várias li<ler'ança~ imporcanco, enlre ela.s o pr6prio prc1idt:mc, apoia-
vam tima reforma constitucional que permitisse maior controle do poder
DA RI f'('&l t("'.~ OA I WAD,\ AO ( O ~OOMi\lOl)t I A:Lt.DI IRQ.., .)'9

central sobre a economia das unidades federativ.is, principalmente sobre os


empréstimos contr.iiídm no exterior. A ins1iruirio do \'oro ~c:crcco cr.a ourr.1
demanda i.mporrantc. Mas a oligarquia pauJistacra contra ambas.
Na sucessão de Venceslau Brás, o único político de peso que se
candidatou era Rodrigues Alves, <1uc se mantinha oonser..,ador e a,relado
aos que defendiam o si.Slema polícico oligárquico. Com a monc do todo-
pod<.-r~o Pinheiro Mac:h2do 1 cm 1915, ass.1ssin:u.lo por motivos poucc..1
escbrecidos, o Ilrasil c:u-«in de liderança!i capam de :micular as divcr-
~~ fucçóc:o, e grupo~ c.,ligán1uicm clcntro e c.:ntrc m <.."M-ad<>s <la ícdcr.tÇâ().
Comudo, despontavam lideranÇtS regionais i.mport.1mes. como Borges de
Medeiros, no Rio Grande do Sul, N ilo l'cçanha, no Rio dt· Janeiro, ambol!-
tidos como reformis1as e oom fo rte apoio de parce da classe média. Mas
isso nfo era suficiente p:1r:1 uma :u·ticulaç.io vitoriosa contra as regras n:1.o
o,crir-~ da pulítica hrj,j~ikira l,cgcmôniai e ~0111 l'"d m, partidcn rqmblica,m:!.
regionais. Assim. Rodrigues Alves foi efoico. Mas morreu de gripe espa·
nhol.1 an~ de tom:u posse e se-o vice, o m indro l)cl6m Morei~. assumiu
como presidcncc cm exercício acé julho 1919.
$cm chegar n um consenso para um nome c.scc:~lhidc,1 entre su~ fi.
lei1·:1.S) 1S oltg:uqui.as ou.is imponaOles esc.olher:uu pua ser presidente do
Hra .. il o JX'trdihano Epicácio P~.a, d11.:Íc tia tklcg-..çfo hra~ilcira na Con~
\'enção de Paz de Versalhes. Defensor do ..dvilismo" republic:u10, Pessoa
nomeou e:ivii; para miniSt~rios militares (Pandi:i Calógtr:i.iô, na Guerr:1, t
Raul So:m.~, na Marinha). A :tha oficialiclaclc militar nác.1 b'O.'ltou, mas l'cs,,
soa rúo demjtiu os ministros.
Entre O) opc.'fáriO-\, a agi1.1çáo social r.1mbém cru.da, por causa do:!.
dcicos econômicos e sociais da gucn'a e do clima de insatisfação popular
no mundo wdo, sob o impacro da Rcvoluç.1.0 Russa.
E...iôt:w2m l:mç:ad:t!i :as bases p:ir:, a crise ílnal do modelo oligárquico
da Primeira l{c:p(1blica. que cxpl0<liria com toda a for9t nas rcvohas "tt: 4

neolisca.ç" e oas nunjfestaçóes opeciri~ dos :inos l 920.



Modernidade sem
modernização:
a vida cultural na
Primeira República

OS \ 1AI.FS DO BRASIi. F. AS l'CÍRM lJIAS


DOS 1\ITF.I.F.CTl AIS F. CI F.f\ TISTAS
PARA CURÁ - LOS

A tr.tnsiç.io <lo Império par., :i Rcp\lhlia e


a consolidação do no,•o n:gimc não for.im ap<.-'fl:JS
11:mpo~ de mudança~ otritam1;n1..: pvli1k-" ,1uc
a lrcrnram .1 Face d o F•..,tac:lo br;1~ilciro e dm jogo,
de poder na sociedade. Esse processo te"Vc su.1 OOLl·
tt'lp1tcida no pbno cuh uul e arústioo, escifnub.1l·
do um gr.tnde debJt~ entre in1dec1uai~. li1c:r:11ot
e c i..:ncbtas pn:ocupado~ 1:m ~up.:rar º" ..mal~ c.lc
origem" do Hra$il.
O debate sobre "a idcnddadc br.tSilcira" e
"o lug1r do Br:uil dentro do coocerto das n=-ç6es'"
..urgiu no fim do (mpério, e incn:.ntcntôu-\f c:nire
os ,mos finais do século xrx e ,1 primeira década do
século xx. Nele. os moddos cumpcu.s de ci,·ilila·
çáo e cuJrura davam o tom; nossos intelectuais se espelhavam nas teorias
cm mc,cb na Europa, con~idemcb ó supr:~umo cb civiliz.,ç:io c>ddem:tl.
Assim como os pensadores europeus, acrediuvam nos poderes da ciência e
cm sbccma:- lcóricm tocali,~ntcs 1,ar,1 dfagnoscicar e cur,1r os "maks sociciis"
brasileiros. Os mesmos "i.smos" (m voga n;1 Europ:,1 - positivismo, higie--
ni:.mo, evolucionismo, darwinismo ~ocial - eram apropriados aqui por in ..
reice.mais e dentistas ansiosos em transformar o Brasil em uma civilização à
curQpci11. superando <)S c,b~'f:Ículos hcr<lmlos do p:,~1<lo: :i "ignoriinda,. cb s
elites; a ntlsétfa. e o F.u:alismo das classes populues; a '·degener.l.çáo rxbJ'
pro<hn.id:. pda miscigcna'riio érnic.a; .as ~,-rmuras políticas e c.."Con6micas
arCLic:i.~, resquícios dos tempos coloniais.
lm,piratlos por c.lifcrcmo. ..t.\<..1.tla:." dc pcn~rncnm, O) intdc<..'tuai:.
nem sempre concordavam uns com os outros. Enquanto os adeptos do
pe'Airivismo :icrc..,lir:w:im que um governo turdar im pondo a lei e a ciência
podel'ia mudar para melhor o desáno de wna sociedade, os simpatizaJues
do darwinismo social defendiam que a evoluçáo de uma sociedade era pro-
duw da hu.a e <h compc.1:içio socfal, c.lunmrc a <1u:1I as ''r-.-ç:as .supcrion.-s't
tendem a levar Y.lnt:igen.~ e, em seguid3, impor o progresso :l t0d.os. Os
l1ii;icn~1-a~ ,•iam na ação ele po lírica'> .saniclria.s o caminho fundamental
para vencer as doenças e chegar à ·'civilização·. As ações dccom:ncc-s dessas
polífica.s dc..·veri:tm ser impostas, $0brcrudo, ii.s dam::s popul:,rc..-s para \-'C nccr
a lura concra as epidemias catJSj.d.:lS por doenças infectoconcagiow (OOlera,
varíola, febre am:ucla), impondo novos padrões de higiene pessoal, pl'C\·en ..
çio epidemiológica (campa1ih.a.~ de vacinação) e s:me:unemo urb:lflô. J:'i os
:.ci,ui<lorn do cit:ntilid:.mo apwrav-,1m cod~ ~ tic:h~ na capaci<hidc de a:.
leis cicruífietS explicarem todos os fenômenos sociais<' humanos, além dos
biológicos e fisicos.
Essas teorias revelavam (e awnenta\<a.tn) o preconcei to social e t.lcial
das ciices intclcccuais cm rcbçáo às classes populares, pois acabav·am por
conden:i.r o modo de \•id.1 dos pobres, seus hábitos pessoais de higie·ne,
alimcnraçáo, vida M".Xual. Alfm disso, alimenr.wam a crença, .supostameme
cicntíf'ic., conforme :a época. de que a falc.1 de s;iúdc, de disciplina parn
o trabalho e de capacidade incclcctual era produto da m istura de raças-.
enfraquecendo tod.i a sociedade.
43

Desse modo, as incerpretações sobre o que era o Brasil e quem


er.1m os brasileiros <ornaram. . se basu.nce enviesadas, pois as teorias raciais
e cicntiílci~l'3S ~ rtctbcriam critica~ conmnd<.'IHéS no conccx10 br-.isileiro
á partir dos anos 1920. Contudo, o simpl~ intérCSSé crn compreender o
8r:1$il e n.fletir SQbrc su:a história, cn a tr:md() 0$ efeitos de <1u:ttro s&:ulos:
de <.'$Cr.tvid:ío e coloni:alismo, j.i era algo p~irivo no dd.lQtc imclt:cn.1al. A
redu,ida dice culrul'31 do Br.tsil via a Hcpública como uma opori unidadc
hi~tt>rica para •ac:cnar o rc:IÓ<~io <lo lmpéric.,", cujo legado ~ rav()Crata fc7.
com <.1uc o JXIÍS se :1fast:1.ssc <:m rd:aç:io :aos sei.as mexidos de c:iv-ili1-1c,'iio: a
França, a Inglalt:rra e os Estados U1)idos da Ainêria. Aliit, para nossas
elites republicanas, este úhimo era o exemplo de uma cx-colónfa que tinha
..dado ce.n o" nos corruosos caminhos da história.
Os 1nodelos imporcados desses p.úses pelas elites imelectuais republi.
ctn,"'IS, a ciumada ..Repúblia daí Leu·,u", ofo er.:uu apt·nas polilicos - como
o dcb:.uc ac.ilo1";1do entre ccmralismo ou lcdcn.Jismo - , m~ também cultu·
r:tÍ$. Contudc-,. in<lcJX.-ndcntcmcnte de soas simpatias te(niai.s. os inrek.-cm.1is
n..-publi<.~nos simplcsmeme não viam alrcmniv~s fora do.s modelos.. Com a
\fi~o assim conform:.da {t.: drfonnada). não conM:b'lliam enxergar m gcrmei.
<k nada pan:cido rom u ma c:ivili7.aç:jv na wcicda<li.: b r..tsik:ira ral wmo da
cr:1: pobre. m~tiça e iletr.1<la.
Olh:.rndo para os andares de b.iixo, intck-çwais e cicnri.sras vii m
uma wdcdadc gr-,rndcmcnrc analfabeta (80% da população n:i.o sabia
ler nem escrevei'). prcdomimncemcmc. rural, dominada por crcndkcs
e pela religião, niarc.ada pela miséria ;1bje1a e vitimada por doenças de
toda espécie que ..c:01Tompia.1:n o vigor par.t o tr1balho e a aptidão par1 a
dvilii.1ç:io dos costumes".
Quando olhavam para os andares de cima, cambém não viam aJgo
promissor: boa pane d.a elite econômica, formada sobretudo por r~ndei•
ros, t ra percc:bida como t:1canha. iletrada e pouco .1fcita às boas maneiras
nos moldes da civili1.açáo europeia.
Diante desse quadro social desolador, os intelectuais e suas "igrcji·
nhas teóricas" se sentiam desanimados, mas nem por isso abdicavam de um
bom debate na imprensa (sobrerudo no Rio de Janeiro) e: nos seus espaços
de sociabilidade, corno as facu ldad<.."S (t"!>pec:ialmeme :u c.le Medicina d,, Rio
de Janeiro e de Salvador). a Academia Brasileira de Letras. os museus (com
44 t U'STÓIU,HX)lll,\')11 RI P(!l l ,:,'."A

destaque para os voltados para a pesquisa antropológica: Mweu &nílio


Goddi, em Belém, ou Museu Nacional, no Rio de Janeiro) e os ins,innos
históricos e gcográfi~ (1HG). Mas <.'SSaS insriruiç6cs eram bolad~. ainda
que prestigiadas sociaJmeme. Sem universidades para formar novos qua·
dtos e aprofwtcbr um deba(e intelectual mais amplo, mecódico e denso,
sem um gr.1ndc público ldcor <1uc pudc~c ser doucrina<lo com suas ideias,
restava aos intdccrua~ brasileiros, a(>rncnrn, c nrrc ú fi m e.lo M:culo XIX e o
começo do século XX, se aflr1n::i.rem em seu próprio mundo, nos espaços
restritos em que an,av:i.m e, só eve1uu1lmeme, co111ribufrem com as auto-
ridade.\ govcrnamcnta~ na cura tio) "mab da Mx:i1.--c:lac.fc".

AS TEORIAS SOBRE O BRASI 1. E SOBRF. OS BRASI 1.EI ROS

Nos anos fma.i.s do Império e nos 20 primeiros anos da República,


os incelecruais que se nocabili2.1ram pehs polêmicas sobre a identidade e
os destinos do Brasil forun, em sua maioria, escritores ou críticos lite-
rários ( JUC acaharam c.l<..'l'cnvolvcmJo um pcn)amcnm social marcado por
um.a ''a..msciência c.tt3.strófie1" do .itr:t$(l n.ic:it,mal. para 1~ r a expressão do
crítico A.orooio C.-u1dido.
A nature-a tropical, ~unes 1áo d~c.1111:J.d.1 pelos :J.rtiSU.fõ românticos
cl(k'j tempos cio Império, rambém passou a ser vista como um problcm;i.
Nessa novn concepção, a n aror<.7.a das fe rras br:.1sileirn.s hav-i:t .sid<.l om dtZa-
no aos colono~ tttn'>pelLS, exigindo sua :ad2p1:.1ção e impos.f;:ibili12.ndo :aq ui
a implamaç.io íid dos padrões dvilii:nórios do Velho Comincntc. Araripc
Junior, \l m dos intclcc:roais da &Dr f:poqur bra..silcif':.l, chcgoo mesmo a
dcscnvolv<.-r a teoria da "'o bnubilação brasílic;t"'. O nome complicado sintc~
lÍ~va os cfci1os. supost.1mcntc confirmados pela ciência d:.1 época, do calor
dos trópicos sobre as faculdad<:"s intclocruais dos hom<:"ns. Conforme essa
teoria, a lul e o calor excessivo ªdcrrc1iam" as ideias e os bons costumes,
para azar da civilizaçi.o.
Silvio Romero era um dos cxpo<:"ntcs do debate imdcc,uaJ da época.
Em seu livro Hisuiria da litrrtlltmt bmJi/eird, publicado um ano ames do fim
da Monarquia, afirmava que a socicxbdc (e a culrura) brasileira era o rcsuJta~
e.lo da mistura do pom1gués, cio negro e e.lo índio, temperada pela iníluência
do meio e pela tcodêncfa à imitação da o.1lmr.1 eu ropeia. Ap~ar das mald .ls
45
existentes, era isso que se apresenrava e náo adiantava fingir que não havia
um pot'() lmuilriro, deixando de enxergar suas particularidades, como fnia a
d i1c imperial Romero n;io via muitas qualidack-s na miscigenação t'.a.cial e no
meio tropical, mas d cfi::ndi:1q ut urna ação tu telar d e uma elite, d tvidarncnté
informa<la e a~"$$0rada pelas tcori:t\i c:icncífic:as, p<)(lcri:t mocliflc:ir () d~tino
nacional e \'Cnçtr os 1'm.1k"S de origem" do Hr.i;sil.
' làl como vários outros in1c.:kccuai~ da (-poca. Romero pan..-da \'Cr
as cla..\.SC.\ populan.."'.õ como produt(>ti~ "'mab de orih-cm" <1lK' impec.liam
o rriunfu d:i dviJi7...1çâo n os rrópia,1s: cscr:avid:ic,11 m:mcl()nb;mo., c.~,c..-.lidi,mo
cac.,,nho, minura dt raça~, he.1'3nÇ'a colonial po1Tugues3, doenç.u crônicas, ig-
norinda generalizada. Mas sem dúvida. para de. o problcm.1 principal ena
..misrura de raças·-. especialmente a mmance presença africana na sociedade
brasileira. Romero. assim como Nina Rodrigues (médico maranhense que
k! arteira na prestigiosa Escola de Medicina da Bahia), debruçou-~ sobre
essa qucstio inspirado por lcorias calcad.u no chamado "racismo cienúfico.. e
n<,1 ..,ktcr-minismo gcogr:.ífico'', muito cm \Vl:,'3 nn época entre intdccroni.s na
Europa e nas Américas. Conforme ~$a$ teorias - cujos <.-xpocnroi inn,rnacio,·
nabcr-dm Anhur tk Gobincau e t-h.'flry·rhoma~ l\ucklc - , o grau de ~ur"-..,ª
<las r,u;as" ,JcrcnninaYd o nível de civilr!.açáo pos.'\ívd ,Jc ~cr atingido por uma
sociedade. As ..r.u,:as" t..T :tm pcn.s:,1da.$ de furma hicr.í.rquio 0,1m ~ ..raç:.t ~rinna
br:rnca" n<,l topo d:.. hierarquia, !iq,1\lida de ª,ma.reios.. e "negros" no patamar
inforior, Segundo o ~ ,k·lírio~ radsr:.is de Gobintau. os •ariano~'" seriam uma
supo.sra raça branca originá.ria, prcscme cm rodas as grandes civilizações da
história; assim, quamo mais o · eieruenco branco" pl'edom.inasse em. dete-1'-
nünad:1 sociedade, nuis civilizad.1 ela teJ'il . Par:l Gobineau, a misdge111ç-.lo
IC\"J ri:i u ma socicd:ide:) dcc:adénci:i.
Apesar de constatar a presença ma.e.iça das ~raças inferio res.. no
Br:LSil. Sih•io Romero acreditava no poder da miscigenação, d:>. misrun,
apagando as dif(.'rcnças raciais que t'Stâo na origem do p O\'O brasileiro
e fa1cr1C:lo criunf'.u '\una raça t'mica e original" cm um fi11u ro próximo.
Com ela, viria t:.1mbêm o êxito d:t civiliiação e dos elementos culturais
e raciajs herdados dos ª brancos". Vale lembrar que, a parcir do início do
século XX, Romero ficou menos ocim isra em relação ao Brasil, prognosri ..
cando es!>C processo evolu1ivo de regeoeraçáo da ~raça bra.sileir.a'' apena)
parn o século x:x1v!
Nina Rodrigues era a.inda mais pessim.ina. Para ele, a presença do
negro. sobrerudo os "angolas e bancos•, en nociva e expUC1va tudo de
ruim que cxi~ia no Uf'a.\il: a pl\_-guiça. o crimt. as docnç-..i.s. 1\ mt~tiç.agcm,
longe de "branquear" a população, ou de ser capar. de criar m) futuro urn
··m csri<,v superior e civiliudo", crn um mal :l ser combariclo, poÍ$, :u, invC.:-s
de 11dcv3r '.JS r.a'?S infc rion..~", :ae"Jh:ari:a por "rcb.ai)(~r os hr-.incos".
Rc.1r.icos de prcconccicos aliad~ a um genuíno intcrtSllc cicn1ífioo,
cultural e antrop<,lógi(.v pelo povo hrasilcin:,, ainda <1uc cnvics.1tfo cm
seus Qhjerivos, :tS obras de Silvio R<>mcro e Nina Rodrib'UCS podem ser
vis1as como exemplos de co,uradições e limites da elite io1elec1ual b1mi-
leira na época. .Em tempo: ambos eram mui.nos. embora defendessem o
branqueamemo da sociedade~ A sofisticação imelecruaJ de ambos, em que
pesem os seus preoonceitos, e1'J. a prova do equivoco das ceol'las raciais e,1n
vog:a e q ue eles pt'ó prios defendia.ln.
Na décJda de 19 10, a eugenia começava a penetrar no ambiente
inrcl<.·crual brasildrt), ;ign:g:,indo~sc à.:; antib'3S teorias raciais, d cntiflclst:t.s e
cvolucionist".a.s. O próprio Silvio Romero, a (Y.l,rrir de cnr3o, fui muito in~
ílucncia<lo pda eugenia, fà;,,cndo com tiuc o Íator biológico ganh3$SC mab
relevo cm ~ 11 pc:n.:;arncnto. E.sta itlcolog,ia - <1uc mistur:&\"d cQnhccimcnro
cientifico. vi:;:io :mtorit::írfo de mundo e prccona.-ito r:,tci:tl puro e sim ple5
- dcfcn<lfo uma intcrvcnçá<.l do Fs-mdo nos grupos sociais e n:.1s fum11ias.. As
medidas ddcndi<las pelos cugcnistall incluíam: a intcrt.liçâo de c~sam<.'nws
incer-raciais. a imposição de h,tbilOs de higic.nc e cuidados com a saúde
corpo1'31, o afusrameuco e a escerilização de pessoas com doenças füicas ou
mentajs heredit:iri:u, o isolamento de grupos hmn111°' consjderados ..r.l_
ci:alme111e inferiores". Os m6:li~ da époc.1 er~m seus grandes cn1usia1c:as,
dcf-Cndcndo políticas públicas com base cm conhcrimcmos supostamente
ciemfficos. com o objetivo de "'aprimorar a raça" e, oon) isso. a sociedade,
propondo leis t· campanhas cd ucarivas. Em 1917, foi fundada a Socicdad<."
Eugénica tlc Sáo Paulo, na 1cn1ati\la de influenciar na~ polític:as pública~
de s.1l1de. Em 1923. no Rio de Janeiro $\1rgiu :, L.ig.i de Higiene Mcnral. O
foco central de açio dos eugenistas no Br.uil for::i.m as campanhas sanitárias
para a melhoria da higicne pessoal, pela c.'Clucação moral e pdo saneamemo
<la.s cidades, bem como a C".tmpanha conrr-.i aquilo c:1uc er..t cc,n.,.idcr.1do os
maiores '"vícios morais.. da sociedade hmsilcira da época. como o alcoollS-
MQlll f:'<I D.\l>I 'H).t MQOlRNIZJ.ÇÀQ 47
mo e a proscituiçã.o. Essencialmente conservador, o pensamento eugênico
se conccnrr:tva nm cfoiws destas ma1.d2s nas popubçõt"S pobrts, e n:io
propriamente na~ c.iusas. Par-,1 sc:t1.11 dc:fc:nsorcs, ba.m1ria c:vif',1r (1uc os cfoitos
de doenças e vícios se perpecuassem na reproduç.."lo humana, para que as
pt·ssoas nasc;cssc:m m:iis s:n1d:ivc:is e :ijust'.td:is socfalmcntc.
i\•tas nem só de r.1ci~,2~ "'cicndfko{ vh•ia a inrdccrualidadc nos an(I:)
iniciais da República. Manud Bonfim, por exemplo, cns.-tiou uma crítica
histórica que condenava o c-0&onialismo e o imperialismo como furores ex•
pli~~ti\fOS para o arraso no Hr.isil e na América 1.:arina, dci>:2ndo de lado o
binômio '"raça e mciv" (._'C)nl U (._-,i:pli(açáo par-d tuda.s l!UMa!I 1na:1.das. Joa(JUim
Nabuco, monarquista liberal, mas 1-es-ign.ado com a Repúblie.t, explicava a
SUJ)O.\F.1 inferioridade do oegro como rt:sulrndo d:.i ~r.ivid:io e d:.i ausência de
polí1i~MX:iai~ i.:cwuõrn i(._"3~ <.li.: ptomuçáu e.los libcnos c~u.s tJcx-cndcnc~
Euclides da Cunha foi outro gra11de expoeme. da incelecrualidade.
bra.siJeif'J. republicana, conce1urando em si não apen.:tS a crença nas ceol'ias
r-,.c.iah, ma~ c~botrr~ndu t.&mbém um:. c:ríiic:. ~iológic:i i.: polí1iu , 1uc ia
além dos "'ismos~ e das soluções cienúficas proncas para os ··males do Ilra-
sir. Sua obra monuruenca.l 01 sertões, sobre a Gue,·,·a de CjJ_rndos, é uJ.n
exemplo c.k: (.'Qnvivéncfa (lc M'fltinwntos e cc:ori:1s mnAitann.~ dt·nrro de
um ma.mo autor. Eudidq da Cunha não <kmon~trava a mínima ~imparia
pelos re,oJcosos de Canudos, explicando•os como produlo do meio hostil,
do hibridis1no chs r1ç-J.S e do -uraso c3us:.1do pela oliséria, porélll, seu livro
acahou por dcnunciar a barbárie.: prmvcada pd a inccrvcnçáo do Exúciw e
pela alienação das elices e classes médias Utof'.itle.is em relação ao Brasil pro-
fundo dos serc6es. Euclides d.:i. Cunha defendia que a Guerra de Canudos
tinha c.1uc M:r cumbatid:e com QCOla~, com inu._1,raç.iu cuhuf"dl e ccu.-1ômica
ao mundo moderno. Mas o regime republicano. que ele nmto dc..fcndia.
envb.ria ape1us soldldos e C3..nhóes.

J\ ·REPÚBLICA DJ\S LETRAS":


OS ESPAÇOS DE SOCIAfüUDADE INT ELECTUAL

A Ac:i.derni:i Br:tSileirl de lelra.~ (ABL). fundada em 1897, 1cabou


congrc~ndo os oc:rilorts e incdecruai~ mai5 pre.s1igiado~ do começo da
República. A A81 era a "'torre de marfim• a partir da qual o letrado dC\•cria
48 tU~ TÓR U OO lll).SII RI Pfi J,l l("A

olhar o mundo. e. no seu abrigo, representá-lo liter.uiamence. Machado


de Assis, José Veríssimo, Rui Barbosa, Joaquim Nabuco estavam encre os
seus 30 mtmbm~ fundadores, aos quab Sé acr<.""Sccntaram mab 10 nomes.
Na AHL, mon:1n1uiscas e n::publicanc)S, cicntific~ras e escrito~ poderiam
comp:1rtilh:1r umri repúblic::1 de Íb'll:tÍS, a "Rcpúblic::1 d:as Lctr:i.(.
Apcs.ar do analfilbc.'tismo <lomimmte na populat?o, no cc.1mc.-ço da
Rcpt'1blica a imprensa br-.1.silcir,1 crcsa:u de mandrJ notá\'cl M: compar-.1da
ao) tempo,~ dv Império e tornou~5e um Q p.tÇc> importante para o debate
imclccm~I e mesmo p:ira :a divulga~o &1produç;io literária. V:iriol:i jornais
relevantes ao longo do século xx, e mesmo no xxr, sugiram nessa q>oa: O
Est,uio ,ú S. l\r.ulo (a-Prvvinâa de São l'm,lo. 1875), Folha da M,u,hã (atual
Folha deS.l'a"lo, 1926).Jornlll do Brwil (1891), Comio da Mmthá (1901),
O foma/ (191?), O Globo (1925), O EJTado dr Minas (1928), só para citas
:.1.lguJ\s. Via de reg1'l, os joma.is diíJ'tos e,~u lig:i.dos a foü1íli:'IS t1'1dicionais
e veiculavam idci~1s liberais com cla.ra intenção de imervir na vida política
brasileira. Er:am periód ico$ que cxprcss:1\'3m opinifo. além de veicular norí-
ci:,1$mune.fanas e ootic.fümas.
A Primeira Rcp(1blica t'Amhém viu ~urgir l\"\•i~t'& ilu~rradas c.1u(.·
man:ardm ~poc:a, como a RrviJtd da Srma11JJ (1 900), f (m ..fvm (1 907), O
Ma0JQ ( 1902). Canta ( 1908). l-~tS n.....,isras eram ricamente ilunradas por
(l<;:;çnhisr-.1s t.1lcnto$0S, com foco na ciricanar.i. políiica. ·1;1.mlx~m vcicul~-
ram crônica,>, d"-batcs M>brc rod~ ~ ;a~cro& da \•i<la nacional, publicidad{·
come.reia! e matérias- sobre o dia a dja da sociedade que se aburguesava e
se ime.ressava e.ada ,•e t ma.is em consumir novas ideias e OO\'OS producos.
As revist:as füeririas e de .. iruervençlo inreJeccual"' cambêm foram
um fenômeno m.irc:uuc d:.1 Primeir.1 Repíiblic.1. O Alrnmu,qtU' Brnsildro
G11r11iu (1')03-1914) e a Rrrd1111 do Brasil (1916-1<)25, rcfündada cm
1926,.1927) foram importantes periódicos na fomiaçlo de wn público
leitor t no dcb~uc de idci-as sobre o Bras:il. Olavo Bilac, Sérgio Buarque dt·
Holamla, Monteiro Loham. Mário de Andradl'. foram algmL~ dos colabo-
rndorcs dcss.lS rcvi.st.1s.
A Hceranir.i, seja na forma de poesia ou de prosa, rnmbém era vigo-
rosa cmrc o final do século XJX e início do século XX, embora tenha ficado
o~ u1't."Cida na hisrória da litt:r,uura br.uilcir..1, engavetatla cn1re a grande
prodoç3:o literária dol:i tempos do Império (marcada pelo romanti5mo e
MQlll J'<ID.\111 Sl\C MQDt.11.Nl:A(:).O 49

pelo realismo) e a do modernismo pós-1922. No começo da República, o


o mpo d:a poesia se p:aut:a~ pdo ~imholi.smo e pelo parn~hmismo, dois
movirncncos que, cmborc1 partissem ele ccmáticas diícrcnciatlas - como a
angúsria e o gosto pelo rranscendenml dos simbolistas e a busca de uma
univc~lidaclc estética dos p:1rnasfanos -, comp:trtilhav-.am :a prcforéncia
pelo formalbmo rc:buscado, com si n t'.lJ(C:S complexas e v~bulário ~ofhci~
cado. Cm2 e Souza, Alphonsus de Guimaracns. Raimundo Correa e Ola,·o
Bibe for.1m os J)O(...'fas mai~ impon:mtcs do período. Hil.ic foi de loni:;c o
m:ais prcsrigiado e também um tios liccraws mais populares dt.· sua época,
além de muico influente como intcla::cual nas questões polídcai. Exemplo
disso foi sua colaboração, a partir do início do século XX, na ooru:uução
de uma c;ulrurn nacionalisrn, cívica e p:nrióric:a. O pt.)(;:m:t "!>:irria" é um
dos o:tmplos dessa perspectiva do poeta. que se vê como pane inseparávd
da páuia brasileira, que se confunde rom o solo narural onde vive e onde
csc~r.i cnccrr.1do qu~ndo morrer:

P.it ri:i, b rejo em ri, no cw lenho, por onde


Cirt...---ulo! E wu pcrfw nc, e wmbrd, e :iul. e orv.alho!
E, cm sciv:i. :w teu eh.mo r a minh'll ,-01 responde,
E $l.1bo do rcu cerne ao ciu ele. g.1lho em galho!
[ .. J
Vh·o, choro c:m tC'U pranto; C', c:-m teus di.u fd.ius.
No ahc>, corno urna flor, em ti, pornptio t exulco!
F. eu, morco, - sendo cu cheia de dc:uri,es,

·ru golpc..1da e insuh.1da. - eu tremerei sepulto:


E o:. meu) ru,..,.q) no ch5o, o;,mo :l5 cu:u raÍl,c:~.
Se esr.orctt"lo de dor, sofre,ldo o golpe e o insulto!
(0111w, Ril*'~ ~pfoia~, A Tim/,. 1919)

Além de escrever poesias de cunho patriótico, Bibe foi um dos fun-


dado res da ( iga tlc Dc.:ÍCJa Nacio nal q ue c.uimulava valor~ nacionalista)
e ci,•icos. a.era.vês de conferências, m.at"érias em jornais, obras didáticas e
catnpanhiil públic:is (como a do Serviço Miliu.r Obrig:uório).
Nos primeiros anos tla República, o naturalismo e o rt.-alismo dos
a nos finais do Império ainda davam o tom cm romances e contos. En-
quanto o n:uuralismo se paucava por descrever os tipos e ambientes sociais,
o re:1lismo buw.1:va o mo1or oc;ulro dos jogo~ ~iab, as reg~s n:lo ocrit:I..\,
as dimcnsó<.."S mais ~utis e comradiróri~ do sentimento e das rdaçõcs hu~
manas e sociais. Artur de Azevedo e Machado de Assis eram os maiores
cxpocn1t-s, n.-spectiwmcme, dessa.s du:1$ 1<.'fldências.
J!i no) :1nos finai!! do Império, Machado de As::,.is M: nocabili,;ua 1>c:lo
olhar realista, fino e irônico, que desnudava as relações sociais marcadas
pela hipocrisia, misérias da escravidlo e pelo cliemelismo generali2ado.
No período rcpubliano, Machado tlc Assi~wminuou publicrndogr-.1nd4--s
roman<..U, corno Dmn (',asml4rro ( 1899) e f.'.'fdtÍ
r}drr1 ( 1904). Nc.,;tc último,
reuacou os dilemas políticos e sociais da transição do Império para a Repú·
blio, a JY,lrtir dos coníliros cmrc d o is irrn:los, Paulo (r<..1'ublic:mo, formado
cm tlin:itu) t: Pcdn, (m("<Jico 111,mal't11.1i::,.fa). Arnhu~ dispur.:im na políeic.e e
na vida, sob a sombra do conselheiro Aires, diplomara e quadro policico do
Império, tspécie de 113.J'rador do romance.
Cí:tico e irônico tliantc d;i!I grandcll cxpcuativa.) do.) inrclcctuai~
cicntihcista~ e n:puhlican~ militanrq,:, Mac:hatlo de A~i.) muita.) \'C7.C.."S
foi o alvo dos acaques deles, sobretudo de SiJvio Romero. Ali.is, partiu de
Machado de A)sis uma das mclhort~ críri<.".t!I aos cicnrif'lcisras e às cc:ori:1~
rural i7.an te:. (com .sua prctcnsão tlc d,ct;ar à "Verdade" :.obn.: a naturc7.a
e sobre os home11s): o conco "O Alienisca... O personagem principal do
conto, Si.tn:fo B1c unarte, era c.aricttur.t do intelectual cienliíicista do
Ílnal tio .M:c:ulu XIX. Na ~ua ámia por idcn1 ifiC:1r dinicamcnH: as cau.sa., e
sintomas da loucut'3, Bacaiuane, ao fmal, chega à '"conclusão cienúfica..
de que só ele é o ..alien1do" q ue deve ser internado no asilo por ele
mC)mo fundado.

Simão 8:h::ama...te achou t ,n si os car.1c1erís:-1icos do perfeito equi.


líbrio m<."ncal <' moral: pareccu•lhe qu<' possuía a sagacidade, a
padênda, a pe~trança, a toltrjncia, a vtraddade, o vigor mo--
ral, a lealdade, codas .tSqualidades enfim que podem formar um
=i,a~1Jo mentecapto. Duvidou lvgo, é cerco, e chegou meimo a
oondufr que era ilu.sl.o; mu, sendo hornein prudente, resolveu
oom'ocar um conselho de amigos. ;a quem interrogou com Ír:rn·
quei::,. A opinião foi afirmativa. - Nenhum defei,o? - Nenhum,
disse cm coro a as.scmbleia. - Ncnhom Yício? - Nada. - li.ido
MQlll l'-:ID.\lll 'jL\t \CQDlRNl;AC).o 51

perfth o? - Tu do. - Não, impossivd, b radou o alitnbta. ( ... ). Era


decisivo. Simão Bac.1martc curvou a cabeça juncamcncC' alC"grC" C'
u iuc, e ainda mais :dt'grc do que t.ri.stt'. Ato contínuo, rccolhc:u-
.SC' à Cua VerdC'. Em \•ão a mulher C' os amigos lhe d iuC'ram <]UC'
fk'HS<, que: c.mtva p,crfc:iro.mcme i.:io e «)Uilibrado: nem rogos
nem mgc.stOO nem lágrimas o d e-tiveram u m .só in.sr..u1tc. - A
questão é científica, dili::t de; n a ta -se dt' uma doutrina nov:a,
cujo primeiro exemplo sou cu. Reúno cm m im nu.~mo a tc:ori;a.
e :a p r:.ific:a. -Sim!io! Sim:fo! meu 1mor! di?i1~lhe :a espos;;a com
o r..»to lavado c:m lágri~. Ma~ o ilu~uc médico, com 1.» olhos
:IC<'SO$ d:t oonvieçllo científlca, u:rnoou os ouvidos 31 s:iudade
<la mulhc:r. e bran dam ente a n:-p d iu. Fc:t'.hada a porta <la C.Ua
Verdt, e,Hregou-se 10 e1;cudo e i cura de si me~,no. Oium os
croni.sta!I q ue d e m orreu <lati a de-.tKM,Cte me.)C.) no me sm o estado
em qut entrou, .sem ttl' podido alc.1,,ç:ir nld1.

l.im~ H~rn:-co e Monteiro Lobaco forn m C)otros exemplos impor~


u oces de escritores engajados em de1)unci:1r :1.$ m:uebs do Brasil. Lobato,
a1é o final dos anos 19 10, foi jornalisra e faze ndeiro do Vale do Par:1íba,
cornando -sc cscriror-jomalina cm tempo integral depois que uma g.randc
geada de.scruju as .suas plantações. E1n 19 19. publicou Urupês., wn livro
que reunia c-01uos e crônicas, parte deles escrilos e publicados nos a.nos
anterior~, inspirados n..1 experiê1lCfa de Lob:uo como fazendeiro. A obr:a
expressa o d.i.agnónico, marcado pdos preconceitos da época. que. a dite
dos f.ttendeiros fnfa do ,rab:ilhador rural. O famoso "Jec,:, criado por
l obaco, er:1 o slmbolo do 1r:1balh:1dor rural considerado atr:1.Sado. igno-
i-.m ,c e c l'o nicam t.:ntc cfocn1c, 1id o C·o mo o maior o hstiÍ<..1110 à civili1.ação
e à modcrni1~1ç.'lo do trabalho na l.l\'ot1r:1, como .se apenas .soa ignorância
individual fos:sc responsável pelas suas mazelas sociais. Ao mesmo tempo.
Lobaco acn.xl irava na ciência e na p<..-dagogia cívica nacionalista conduzida
pelos inrdect ua is pai-..i. resolver 1cxlu~ 0.) "m a les <lo Br.tsil", e nesse :1cruitlo
dC$Cmpcnhot1 om imporrnmc papel não apenas como escritor. m:i.s tam-
bém como emp resário e editor de livros.
Lima Barreto expressou de maneira contundente os impasses e as
frust rações com o 1áo e..\p crado regi me rep ublicano no Jk1)il , den u nciando
o arcaísmo. o conservadorismo e o rncismo das ciices políticas e cconômi-
52 t US TÚRU OOll,\Sll tt l Pli J.l rA

cas da República. Em livros como R.tr:ordaçóes tÍ(J escrivão /iaím Caminha


( 1909) e: Triste fim dt Pvlirnrpo Quaresma (1915), o "pc<1ucno ddad~·lo", os
pob~. os mcstiÇO) e os ft1ncionário.,, plíblioos de: baixo escalão são rctr-.11a~
dos como vítimas d..1 impostura e das barreiras sociais, visíveis e invisíveis,
concra as quais o escritor n:1o receita as fón.n ulas imelecru:tis típicas cfa
época, como o higienismo e a eugenia, Para 1\arrr-w, o problema do Hrasil
era social e poUriw e não fi-ut o de uma hcr,m\-"3 racial tlci;cncrada a ser
con·igida pelo braço force d.1 lei e d.1 ciência. Nesse semido, Lima Barreto
ílertou com o socialismo e o aHarquiSJno. o que nfo ff.1 comum emre os
cM: ri t on=> da época.

Cl!I.TO AO ~ROG Rf.tiSO f.À C lf:.'IC IA

Em suas proposras par.i a construção de uma nova sociedade no


Brasil. a maior pane cb incelecrualidade e dos hornens de ciência brasi·
leiros ,nescfava ceticis1no e volu1uarismo. Pa!'a a 1na.ioria dos médicos,
hac:luaréi:., i.:ni;c:nhc:i m) c1uc com,tituíam a corn.:ncc clc1111 inantc: de pen~ ~
mcnto imclccrual j~ na primeira clécad:t cio século xx. a .solução c:.stava
na aç:1.o fi rme do Escado ju,uo às classes populares com o objetivo de
p romover a "'civiliLaç:lo" (sob mold~'i europeus, co mo vimos) no país,
ou seja, educar e hig:ic:ni1.ar as p~()a.s e as cidad e$, e integrar as vastas
rcb.;Ôcs rur::iis :nrasnd:i.s aos ccmros u rbanos e aos valores ch•i li1::1tórios.
O problem:.1, cmre1an10, é que o o lhar da noss:1 incclectu:tlidade cr:i
conservador e eliLisca.. Muilos dos imelecn1ais 1inham dara noção da
rcspon.sabilid ad c d as oligarq \iias rurais na pcrpctt1.1çâo d o atr:.1so, mas
nem por isso propunham saíd:.1s revolucio nárias para essa situação. como
cr.1 comum na época cn ire imdec1uais europeus e am ericanos. Assim,
grupos polícicos dominantes se serviam desses imclccruais e acé. apoia-
vam algu ns de seus projccos c.ivilizacórios, pois comungavam o mesmo
diagnóstico: os maiores empecilhos à c h•ilizaçâo eram a 1'mcsciçagcm
racial"' e a -degeneração dos coscumcs" entre as populações pobres do
campo e da cidade, frutos da hera.nç,a escravisra, do analfabetismo e d:1
fal ta d e higiene. Como as elices polícicas da Primeira República não se
viam como parte d es~ mak-s - :to alimcniarcm o mandon i.!.mo local
do.s coronêi5 e ao não dc)cnvol\tercm uma política connmdcntc de ai-
MQlll 1:NIO.\lll 'i tM MQl)lll.Nl:,.C,W 53
fubeôzação de massas, saneamento básico e enímuJo à modemiia.ção
cconômic:1 do p:1ís -, .1cab2vam çulpando o pobre por ,1,:u.1 pohl't:7.:l, e
pouco faU:un, no plano das políticas públicas, para que o bem-estar
geral fosse aprimor:;1.do. As dHkuJdades de educar e sanear o país, que
hL!t1oricamcmc carc..-cia de c-sçol2s e hQ.\l)itais - ~tru1ur'.1S básicas-, eram
enormes. A constacação da falta destas csrrumras - caUS.1 principal da
ignor:inci:i e da dc,lCnç;t das m:1ss:1s popubrc-$ -, conrudo, cr.i minimiza-
d:Lpdo diagnóstico qu~ culpava dir~tlmeme m pobres - supost:uneme
afetados pela degeneração raóal por ~u:u mazelas. O que era efeito
virou a c;iusa do arraso nacion:;1.I.
Di:tntc desse di:tgn&lioo c:quivocado, m~ <.-ocrcn1c com o racbmo e
a exclusão soàal e poücica que pauca\l::tlll o pcus.unemo das olig-arquias re.-
pubJicanas dominl.lHes, alguns inceleauais e cie11cisus sugeriam ações polI-
tira» via fa1;u.lu; conrrul.ir a~ dá~~ populares, impor rncdida~ ~nitarista~
e higiênicas por decreto e, no longo pm.zo, escimular o '"branqueame.nco~ da
população br.isilcira. A imigrac;ão c..m mam1 dt~curopcus - ir-.1lianos, ~lcmãc..'$
e espanhóis - prepararia o "'estoque genético'" p:.ira esse branqueamento.
Em grande p,3n-c, :.i imigraç.'10 n.'Ío cr:i visr:a como simpk'$ subs,iruiçâo ela
mio de obra escrava, mas do pt'óprio negro :1frode-scende11te.
O tJlladro dc Modt.\lO Hrocm y Gómc." tradu·,,cm ima1:,-cm o projeto
de bra.nque.amemo da população detêndido por aJgw1s intefecruais e d en-
üuu como solução p~ul o atraso busileiro. Nde, há uina f:unílin pobre
<lc,1 mc:io rural: um bchê branco, mas quc tem ave) negra. mâc mulata e pai
mot'eno-branco. A ,wó ergue as ntlos para o céu, como se estive.sse agra-
d,-ccndo a lkus por S(.i.1 octo ter nascido oomplcramenrc branco, como se
sua cor redimisse os afrodc.sccndcncc.s das infelicidades causadas por sua
suposr.1 inferioridade radal.
)~4 t11'SfÓIU,I. OOIIU.',11 RI p(tJ.I rA

A 1'8CfenÇ3o de cam, de Mode$10 6 rOCO$ y GOmes, 1890


(aceNO Museu Nacional ele Belas Arte& RiO de Janen>)

Sob esse "esforço civilizatório", a capital da República passou


por uma grande reforma urbana d urante o governo de Rodrigues Al-
ves. Ela elegeu lrk priorid1des: :i ampli1çdô e modernizaçlo do velho
porto do Rio de J:1neiro, 1 reforma urb:rna do cemro da cidade e :1
higitni1..açáo fo rçada d:b populaçõt:s pobr<::r.. Sob o comando do prefei ..
lO Pereira Passos, a reforma urbanística do centro mudou a paisagem
soc ial e arqoitctônica do Rio de Janeiro. No lugar de cortiços e hotéis
bar:.uos que abrigavam populações pobres de tr.1balhadorc.s e marginais.
MQlll l '<I D.\lll 'itM \(QDl RNIZACÁÓ 55
o centro do Rio fico u marcado pela be.la avenida Central, buJeva.r de
estilo parislense. Quanto aos pobres, já que nio escava nos planos das
au,oridadcs d iminuir. propriamente, a ll,Ua pobre,...a. fornm cxpulsoll, para
<L'I áreas longínq uas ou para<~ morros, nos quais as bcle-,.:u e confortos
do urb:m ismo moderno niio chc..-gariam j!1m:i is.
Além diSS(), ~gcnres sani('.uist".a~ :icomp:mh:idos de fo rças policiais se
arvor'.rn4m no dirdtodc conirolaro~corposdos pobroscm ant~ con1i,cicn ..
ri1,;í..los ou conimlrá-lv~. Para:~ autoritlatlc~ <.1uc <.."Omlu7.ir.tm :t~ campanhas
$miraris~s, n fi:.bn: am:ucla, ;J varíola e omr:as peste$ n:io pcnniti ri:tm r:1is
sueileias. Seu rnodelo ernm as bein-sucedidas reformas urbanas p2risienses.,
conduz.jd;u: de fonna autorirária pelo baráo Goorgc Hawsman. homem
que tinha medo de '"pestes e rf\'oluçóes'", cal como as nossas elites repubU-
canas. Para as aucoridades brasileiras, ClÇat ratos, cornbater rnosquitos e
V:lcinar s.et·ts humaoos erJJn pane de uma mesma política> freq ueo,ecinentt
aplicada de maneira imposi1iva e violenta nos bairros popularC$.
A!; p<.lpUl:tÇôcs do campo ramhém scrfam objc,o do olh;ir <.;cnríflcc..1
e s~nit~arista enviesado que d~va o tom das politiets públicas das gr.md(.-s
cidad<.·~ brasikir.i~. Em 1916, fruto dt: uma ClCU.'TISa p~<tui.sa no inn;;rior do
paí~. foi p ublicad o o Ht-latário Midiro,,Cimtíjit·v, prv<lll7,it1o pelo In~rituto
de M:mguinh~. crfodc..1 cm 1900, par:i ser o ccnrro d:i pc..-sqni.s:J científica
de combJtc a doenças e p~gas tropicais. Em 1918, formou-se~ l ,iga pró ..
Sanc:am<.·nto do Rra~il. cc:nr-.1ndo rc.i.mir inu:kx:rnais, pofíõ~ e cicnrista)
para pressionar o governo a adotar uma política nacionaJ de saúde. Vale
lembrar que não havia na época um "Ministério da Saúde·· com autonomia
orç-1menciria e 1d.JuiüiSLr:uiva JXLra desenvolver tal políLica e os mwlidpios
crJm meros curr.iis dci,orais de corontls pouco prcocup:ados a>m o bem-
estar da população. A malária. a docnça de Chagas. as divcrsa.s vcnnjnoscs
eram as principais doe.nças a serem combacidas. (Aos pou006', a própria
elite intdt..-crual , apesar dos seus prt-conctiros arraigados, começaria a )>(.'f..
cc:ber <.(tu:: o~ problema) b rasilcirm iam muito além da ignordncia e da m~
,·ont:idc das claw:s popularc~ cm relação 3 civili1.;içâo.)
As c1asSC$ populares no Brasil eram vistas como ig,nomntcS pelas
elires políticas e intelectuais da Primeira República. Além das propostas
higic11i:,tas, havia uma utopia educacional <1ue li~va a ideia de Reptíbli ..
ca às "luv:s"' que iriam iluminar as ··rn:vas intdccruais" onde viviam os
)~6 tll'iT'ÓlW, D.">ll,\'m li PÚll ~A

brasileiros, secularmente dominados pelo colonialismo, pelo S('rvilismo,


pelo analfabetismo e pela religiosid:tde vista como "'rúslica". Muitos re-
publicanos, sobr<..1.udo os positivistas. sonhavam oom uma <.."SCola p(1blica
laica, ancorada cm conteúdo cientifico, c.1uc di~rnin~ valor<.-s cfricos
e p:itri6ticos. Mm; :l Igreja Cacólic:a :1in&, rinh:1 muira forç:1 nn cducaçío,
íorm~I e informal, da popula~o brasilcir:a, e n~o t inha muita simp:ui:i pda
cduc.i<s~o p(1blica e laica, rt(.'\.~ndo perder .sua ascendência ~bf\: ~ ela~~~
po pulan.-s e também ~o bre as <..'amadas mL'tlia.s ela popul:ts.-ão.
N:1 prtidc::t, po uco se F.11Ja para melhor.ir :t cducaç.io no país. N:io
houve, nos primórdios ela Rtpública, uma poH1ica eductcional de massa.
Mesmo nos estados que desenvolveram um projeto de escola pública e
laica, como São Paulo, a.s vagas não eram suJ-kiences para a demanda
histórica reprimida; e, nas escolas existentes, frequenceruence, mecanis-
mos infonuais i,upediam o :.lcesso de cri:a.nças negr1S e pobres, encregues
então à própri.a sorcc. Adcmafa, CS,$;15 crianças dnliam que uabaU1:u cedo
pnr;i c:omplcrar :t renda fumiliar, nfio c:on.s(.1,'Uindc,1 manter-se n:i csc:ob. O
Rio Grande <lo Sul, onde c,1 positivismo d~va o rom da admini.sm1çi.o cs..-
radual, foi o \mico C."bfac.lo a dc.:scnvol\•cr uma polírica de alfalx:1i1;;1;ção de.·
ma>.,~~ mai~ cfic:a7, para o) pad r(,cs b ra!'>ilciro~. No paf~. o Rio dc Janc:iro
e :i.s c:api~is (.'St:.tdv:ii.s :u.:abav:,m c:onccnrrnndo a população alfabcri7.ada.
O ritmo de alfabcti1.ac;~o cm escala nac:ional cr.i. moito lcnw, o que tinh~
implic.-açóc.".S políric.1s direta~. pois O) an.1lfabccos, <1uasc sempre trabalha ...
dores rw·a.is pobres, não podiam votar e escavam sujc.i tos aos desmandos
dos cot'onéis, "donos de gado e de geme-.
O cidadfo-modelo votaJUe CU Primeira República, ,efé1n do con-
scrv:1dorismo d.1$ suas di1cs polídCLS, :t<:abav:i sendo o liomem branco,
alfabetizado, funâonário público ou profLssionaJ liberal, paU1ado por uma
vi.são de Brasil que oscilava entre o pessimismo d.iame das m.azel:lS nacio-
nais e o nacionalismo ufanist:.t. O operário era visto como pane da "malra"
a M"r comrolatla e diM:iplinada par.to trabalho, e o homem do campo era
tido como um semibárbaro, supersticioso. prcgoiç-0so e docnrc. Se fosse
negro. mulato ou índio. ranco pior. Essa condição dJscrimjnacória era
mais grn,·e corre as muJhercs desses grupos sociais, vítimas náo apenas do
p reco11ccito social e racial, mas cambén1 d o machismo de uma MJcicdade
prcconccimosa e patriarcal.
57

ENTRE O REGIONAL1S~10 EO >IACIO>IALISMO


UFANISTA E PATRIÓT ICO

A im2gcm que :1 hinoriogr:1fh frcq uemcmc:mc dissemina i;obrc a


Primeira Repl'1blici, sobretudo :uno. do modernismo ele 1922. é a de uma
épuca c.1u c rnL',turava um vago Sétttimcnw ufani:>ra, muiro ainda basca~
<lo na cx:ilr:~:io da b'r.mdcza e d as bdt.'7..!lS n:u:ur:iis d o fü:1sil, com valon:$
regionaliu:tS prtdomina,ues, corolário da ""política dos estados" na vid:a
cultural. E:15.a imagem não ~ tk todt) '-'luivoca<la. rn~ tsl."t.mc.lc uma
realidade cultural mais complexa.
Livres do cc.:nrr.ilismo dos n.~mJ>oS da Mon:ar(1uia, as provfncfa~.
agora transformadas cm estados fcdcradvos. puderam construir sua pró-
pria vc~lo da hinória brasilcim e rcb'1onal, su.i p rópria Hh'tórh1 O flcial,
e cuhu:u seus ..tipos humanos'°, seu fo lclore e suas paisagens natur.iis
rípica11. Foi tlu ranrc c~::-a ép<Jt:a <.1uc muito.s tip<..k'i e valores ~1irgid«>.'I no
regionalismo liredrio que marCl!:l o final d o Império ganharam sraru.s
de I lbrória~ oficiais k1a i~ e folclores l'\~ionai~. o:.o i;•uícho" e "'o h:.:in.-
dcirame'", por exemplo, transformaram-se cm a tores histôricos e sociais
positivos, cxprcs~o da pujança. dos .seus <.-s,ado.s de origem, Rio Gr.mdc
do Sul e S:io P.1ulo, re.,i;pecliv.imente. Ambos er:u n os símbolos do vigor
R:;ico, d:1 ousadi;.i e coragem. ;.t() mesmo tempo que cr.im rc.prcscmado.s
como lipos hwnaJlOS livres e que se impuset:ltn ao meio geogciflco. Mas
r-,unbérn M11·giram ripos mab oomp lcxm, com ttlltttS ambíguo, ora signo
de. autenticidade cultural, ora signo de a,raso, como "o senanejo- e ~o
caipira". Na litcr:u-ura, esses personagens se desrncam pela cap<1cidade
de ad:aptaçio e resistência :i um meio natural hostil, m::is também pel:a
cspcrtC1.a e malícia d iamc das d ificuldades do dia a d ia.
M:lS 11:So se pense que a Pri1neira Repúbli~ teve de esperar o mo-
derni.smo para \'Cr parr1,; <lc ~ua d ite: convcrtic.la ao naciooali~mo intct;rac.lor
que deseja\•a unir e reinventar o país, dando-lhe uma nova imagem. A
Primeira R<.-pública, antes de 1922, também ,inha seus valores simbóJjcos
de br.isilidade e projelos de imegr:ação nacional, ainda que fossem pmjc1os
intdccn1.'l is om ,anro desconectados do centro decisório do poder. Vi.'I de
regra, :ué 1922> os irnelectuajs nacion:tli.stas se concentr.h·:l.m nos drculos
literários e jornaHs1icos da capital federal. O 1ipo d e ~emimemo naciona~
lista mai:; fo"c na Primeira República foi o "ufanismo". o elogio d.- nação
J~B t11sTQR1,,1, 0011 usn a1 PÚll >;'A

brasileira, sobretudo a partir dos elogios à grandeza rerrirorial e à n::uureza


exuberance do país. Esse tipo de ufunismo com rel:t~o à nacurez.:1 convivia
com os region.alism~ e ambos não chegavam a crnrar cm conflito.
Assim, Sé o tom p1$Simista S()hre o s br.uilcin>$ era predominante
no debate :mcor:ulo cm vcrchdc\i supostamente demíÔc.'1.$, n:io podemos
menosprezar o imporr.mu; movimc:mo inrd<.'(,1"\l:tl cívico, uf:misr.t e nacio,..
nalisra que íioou mai~ pa1cn1c a partir c.lc me.tdos da primeira c.U-c~da e.lo
~éculo XX. Por volta de 1920, através de mc,vimcnn,s (.'(>m O o l'n)pagamla
N:ich,i.na e(> Aç:io Social Nacio nalista, nadonalismo, uf.mismo e civismo
COJ\~rgir.1111, demarcando o oascimen,o de um pl'ojeto nacionalisra :lutO-
riWio que ficaria mais patcmc ao longo dos anos 1920 e 1930. Albeno
Torres foi wn dos i.meleccuai.s precursores dessa ve.n eme. de.scaca11do e.m
SlllS obf'.lS '"a principal raiz dos males bt'JSileiros-: a falca de um poder
ce1\tral forte e interventor, orga.i\izador elas forç.u sociais, sej1 de elice ou
popular, ,risw por ele como dispe,a'$:I.S cm seus regionalismos polfricos e
culm ~ is. e lcnicmcs cm rdaçiio ~o,:; problcm~$ nacionais. A obra ele Alber-
to Torres ,cvc <::ip<.'Cial impacto no Exérciw brnsik:iro, que passou ~ se \'Cr
como a úniC"J or~ni1.as·.io política capa1 dt· rt.~li7ar a connruçtO dt:'-St· idt,-al
ele Enado e ele inrq;raÇ3o nacional. Nat1udc momcn10-. o t-".xército pa11:\.ava
po r om procc~ de rt:C..l'l,':lni1;1<rio doutrinária par3 se afirm~r como awr
polfrico cm <lcfc~ "da n.:i<r-;;io e da pátrfa", inAucnci;ido, sobn;tudo, pdos
oAciai~ que i.im t.~rudar na F.uropa, M)brcrudo na Alemanha. A rcvi~a
Defesa N11ciq11,1I, criada cm 19 16, foi o epicentro dessa corrente de pc:nsa-
menco e estimulo na fornuçâo de wna nova oflci:ilidade que passou a se
en.xerg:tr como •esceio d1 ,,açio'", cujl wüdade era vist1 como ameaç:icfa.
pdos civis e su:i.s disput;l.$ dele1érias por iruercsscs parcid:írios e loalittas.
A obra ma.is expressiva do ufanismo cm tempos inkiai.s da Repú-
blica foi escrita por wn mo1i.arqu.isu, o "conde" Afonso Celso, intiruladJ.
Porq11t mr ufano do mn, pals ( 1908). Nela, o autor rctomav.. o wlto à
gr.i.ndl-'7.a tc1Titorial e à cxuber-d.ncia (la na1Uf'C'1.a brasikir-..1, pcr..pca iva
muito próxima à tradição do roma.mismo dos tempos imperiais. como o
"'primeiro" e o "'segundo" motivos para se orgulhar do Brasil. Nessa obra,
muito conhtcida à época. cnconuamos outras afirmações que acabaram
se 1ornando clichês para definir o Bra.!.il e os brasilcirm. e destoavam tlo5
argumcmos daqueles que acreditavam na dcgencraç.'lo das raças e na. in·
MQll l l"<I D,\li l st"4 \tODl RNl:AÇ,i.() 59
salubridade tropical determinante: o dima ameno de "crema primavera...
~ "imcn~s riqu<."1.as narnr.1is'', a "voc;tç:io da socicc.fadc" par:i "o culto à
ordem)& e ao ..pacifismo'' na relação com os outros povos., o car-.íccr ''ca\'a~
lheiresco'' e ..sem preconceitos" do seu '"povo mesdço... cuja virrude era ter
sido formado por "três raÇtS valorosas··: a pom1guesa, a negra e a indígena
(o autor con~idcr;:wa "o porwguêsl& o reprcscmanrc de uma raç;i) . Afon,.'tO
Cebo rcconl1<:cia os rnérit<» <la grn.ndc civili1.a\":Íc.> europeia, rnas aflnna\'3
que, natw·3.J.menre. quase por uma inércia da história, a brasileira '"chegaria
13, ou seja, te equjpararia a ela.
Ne>sa mc8rna époa, ou1 m.,; ufan~ta~, corno O lavo Kilac, rq>U~
blicaOQ histórico. eram menos indina<los a acreditar m.~ dc.stino pn:~
determinado, por isso defendiam um plano c.le ac.,1io. l~nir:.am pam um
:uivismo dvico, pedagógico e polírico p:ua conscruir o '"':imor à pát.ri:a"
como condição para superar nossas maulas. Com Manuel Bonfun, Ofovo
Bibe CS(.T<..'VCll Atravé.( do Hra.sil (1910), n:1wo1tiv:i \•olrac.l.:i, para :i.s crianças
cm fonnaçfo «.~scohir c.1ue c.:onr-.1\'a a hisrc.\ri:a de dois meninos c.:m bu..l>c.i
do pai e que aca.ba.m pencuando Brasil adentro. O objeLivo era cri.u· um
semime.n.to nacionalista já nas crianças em idade. e.scolar.
Os JX:nsadorcs C1Jólicos, pc.lr $U:.a vc..'7., que pas.sar.i.m a se org:.ani7.:.ar de
mandr-.1 puli1icamcnrc mais cf'ic:11 a parrir da cuol'den.iç:iu de D. &ba~tifo
Leme (arc.ebispo do Rio de Janeiro), também desenvol~ram sua leitura
peruliar do n.adooalismo no movimento Crlll.lda C1cólic.a, que repousava
na dc.-ít-sa da família parriaf'C".11, c.:om papéii bl.'fll definidos(.· hitr.1rqui1ac.los
c.:ntrc o homem e a mulher <lo c:u:il, e tia fé e:uólica uni\'er-.al e hcgcmôni~
ca, corno garan.t.ias da ordem social. Para eles., era como se o Brasil ÍOt'J. do
mwldo católico nío resistisse corno oaçio e como sociedade.

CULTURA POPULAR NO CAM PO E NA CIDADE


Ourra imagem historiográíiCI muito comum sobre o período da
Primeira República é de uma sociedade governada por uma elice orgulhosa
dos seus \-alores oligárquicos que, no afã de impor a Lodos uma cultura e
uma civilização dete-rminada, rcjeit.l\'.l, por conta dos seus preconceitos
sociais e 1".tCiais, toda...-. a...,; manifotaçóes euhur-.tii. qut' bro1a-.scm das classé)
poptilarcs. Portanto. a cxdo.$3o polírica das clasSC$ populares - 5intttit.1da
na frase ..-a questão social é wna que.scáo de polícia", auibuída à \Vashingcon
Luís quando era candid::uo ao governo de S5o Paulo - pareda expressar
1ambém a dificuldade das dit<."S polí1ica~ e incdcctuais cm incorporar~
rnanifcstaç6~ culturais populares como base para uma id cntid;-1dc nacional
comp:1nilh:1d:i e k1,'ltimad:1. f.ss:1 imagem n5o é de ,odo errôn ea, m:IS <leve
ser rdativi?.:id::i p::ira melho r compn..-cns:io d:is oonrr:idiçót-s e das v.íri.is
t·xptriéncias hb16ricas que marcam a vida cultu r:il d o pcriodo.
Em primeiro lugar. muitos intck-ctuais. cm <1uc pc~ seus valorc..-s
clitin:t.$, não ~'l.lvam C<..l,'OS diante ela rica ailtura popular hrasilcir:a. so-
bretudo aq_uela oriunda das populações rurais. Desde o Ílnal do século x1x,
anisw e pensadores buscaram conhecer melhor o ..homem brasileiro.., e
representá-lo atravis de livros, quadros e m(uicas.
Na pintura, ames do furado moderuist3, o academicis1no dava o
tom. Antonjo P:tn-eiras, Rodolpho Amoedo, Benedito C:ilixto e Almeid.1
Júnior eram os pintores mais consagrados cnm: o finaJ do século XlX e
iníci() do ~culo XX. Enrre n:uurc7.as, R'trnros de pcn;ona~rcni <la elite e nus
anfstioos, C.SS<..'$ pinrorcs (".Jmhém cri:i.r.tm c.lOras que .:ijud,u-...m -a rc;çonfl~
gu~r o imaginírio wbrc :u cla~cs popul.:i.r~;~ que.· havia ~i<lo forjado n~
tcmp>s tio Império. Em suas obra.is, havia uma preocupação cm retratar o
trahalh:idor rurnl m~'tlço como o símbolo do .,homem br.1:,;ilciro•.
O Au mincnsc; Parreiras p imot1 tdas on<.k os estudos da pai~gc;m, da
história.,. do~ tipos popularu br.1.sildro~ con\•crgi-am (Sertamjas, He,·kman
"º urtiilJ, A sesta, Imcema, O rnflllÚ>r tÚ trtt~mklas).
Almeida Júnior desucou•se na flgw·ação de "1ipos brasileiros~, em
telas c:tnõnic.u como G1ipira pitando fi,mo (1893) ou O vioklro (1899). O
10111 regionalista dess(s qu:adro.,; t:unbém e.,;cav:t presente cm su:i.s cd.u com

t('mas históricos, como c:m ;I par1idt1 da mo,r;áo ( 1894). c:xpr('ssão do culto


nãSCeme do "bandeirante paulista'".
A obsessão c;m rccrnrar o •homem brasilc;iro'' das cl~'SCS populan.'$
era também uma fonna d e compcm,ar a vinual atL'lénc-ia. du cicravo e a
idcali?..1çâo dos índios das rcprcscnt:,1çóe5 artístic,1s pas.s.ida5. marcas da
culrura ofkial do Império.
Benedito Calixto, outro pauBna, marcou a pintura de temática his...
tórica c:lo períoc:lo rematando um imaginário calcad o na! paisagcn; e nu~
mitos do bandciramiimo caros à elite paulista. pois os heróis bandeirantes
61

e as cenas históricas ligadas às bandeiras e ao desbravamemo do sercâo


br.uileim d urame a Colônia pintados por CaJi.-xlo im.ort::iliz.avam de modo
elogio..;o os ..amcpassa<los" dessa dite que asccn<lcu cconomicarncn1c com
o café e a industriali7.açáo e procurava dcsracar seu prestígio S<)tial.
Desde o século x1x, nom(.'S como Sil\•io Rom(T(> é Melo Mor:u.'$
Filho, c.·nm: ourrm, dec.lk~vam·* :1 de.wcnc.l:tr :i "psicologfa do homem
brasileiro"'. Pelas lcnt~<.lo foldori~mo pracicu.lo por~ inick-ctuais, nay
eia um p rojeto ,k 11d cc.ionar marcriaiti (poemas, formas musicti.s. dan~
lcnd:is, narr.irivas) populares cQn:;idcr.idos "autênricos" ou "típic<.lS,. de uma
região. Nesse processo, a cuh ur.:i. popular mrJJ :1c2bava sendo valorizada.
O F.no é que bem ames do modernismo de 1922, considerado um marco
na construção de uma perspectiva mais posiriva do meio imeleccu..1.1 sobre
a c.u.lmra popular, as elire.s letradas li.nham descobel'tO e reinventado as
"cois3.S do povo". PortaJHO, nem o elememo popular et':l. invisível na cena
cuJ,w·al brasileira d~.s pri mciras décadas republicanas, nem os prcconcci1os
e cxdu$Õcs <lc ((\IC ele crn alvo term inariam com o modernismo.
Em rcs\lmo, n<.l pcrk•<fo <.IUC v;1i d<.$dc o início d:a Kcpúbli<.:3 até
0

1920. crcscc.i.1 cnrn: ~ inrdt"(..11.1ah ,1 valori.,:1çfo do foldon: rur.il junramcn ..


rc c()m a hu)ct (um c-:mc-v o.t111cmátic:a) por icknrificn O.) ..,ipo) popularc)
brasik'lros aurêmic0$". Além di-!iSO, ncss:i époci, as próprias manifi:swçôcs
popt1larcsganhar.i.m novos contornos, sobrcrndo as urbanas. A m(1sica po-
pular e.· o carnaval cr-.im M:u.s principais polos <le expressão, ~<.-cialm<."nrc
no ruo de Janeiro, a capital federal. Embora as dasscs populares urba.nas
e suas fonnas de expressão cultural n5o fosse1n tão valori?adl.s pelo oU\at
folcloris.u qu:tmo 1S matrizes cuJrurais rur:lis, elas j:i foscinaw.n\ muitos
cronistas e escritores.
No Carnaval c.al'ioca, d as.ses e raç..u djforcnccs podiam se .mismrar
nos d.ias de folia, suspendendo as hierarquias sociais e raciais vige:mes.
Contudo, ç.ssa grande festa popular muicas vcics não escondia as ccnsõcs
cxi~tcntQ;; d ifon.:ntcs i;;rupm fo.tcja\latn ele forma..; cli.)tinr-.tS. Havia o hloco
carn:.walc.sco composto. sobrc..'tudo. por negros e mulatos. e o co~o ele-
gante dos brancos que dcsfHavam sobre seus automóveis. As escolas de
samba, que se tornaram marca principal do carnaval de rua brasileiro, só
n:-t..,;ct1 iam no fina l da Primeira Rcplíhlici, di.)semin:rndo-~ a panir do Rio
de Janeiro na, décadas de 1930 e 1940.
A produção musical brasileira assistiu a.o nasci.me mo da. fonografia,
que, a partir de 1902. passou a compecir no mercado com a venda das
part ituras impressas, vigorosa desde o século x1x. A Ca~ Edbon, c.io ém·
prcsário Fr-ed Figt1er, cornou-sc o <:Cntr() da pn.-.duçác) fonográfica no Rio
ele J mciro, disseminando um:i nova cxpcriéncl:a mu~ic:al: :1 mtÍ.SÍC.'!1 ouvi-
da ;it~\·és <lo fonógrafo. o~ hindus, choros e m;ixix(.'$ - c..-stil~ mu~i<..-:ais
c.1uc ía1.iarn su~so c.lC(lc o final do Império, '-"Umagr.in<lo composi1orc..~
como Clüquinh:t Gonr.aga e Ernct,ro Na.7.arcth - ganhavam rcgiMn:>s cm
grav:açõe$ sonoras que popul:ari1.:ivam novos asrro.s, como tk1i:mo, Mário
PiJ\hefro e Eduardo dlS Neves. Um dos letrislaS de maior fam:t da époe:t
era C.1tuJo da raixáo Cearense. que chegou com 17 anos de idade ao Rio
de Janeiro, onde fez sua can·ellu musical. Sua trajetória arc.íscica sinaliza
a tentativa de docar a músic;i popufa.r de algum presdgio nos meios in•
1eltttuais, possibilic;indo um coflj u1Ho de di:i.logos: eotJ'e o folclorism.o
dominante, a poesia culta de influência p.irnasiana e os géneros que já
fu?.iam sucesso no mercado mu.sic::al. C:.uu lo. so1.inho ou cm parccrio
(por exemplo, com An~d<.:w {iç Medeiros ou Jo~o l'crnambuco, grandc..-s
mt'1~icos da época), OOncou \~rios :.ucc:~sos <los primórdios da fonogf",4'la
no Hr~il, corno Nasga corarão (1907), Caboda di caxaugá (19 13) e l.uar
dosrrtáu(19 14) .
No c.1mpo da mlísica cn1dita, o ln.nlnno N ..cion.11 <lc Músic;i. abri·
gou um grupo de composiron.~ c.1ue d<.·Ícndi.i um "nacionalismo musical"
calcado na p<'squis:.t folclórica como forma de produzir mna míuica crudica
brasileira original. As ob,·,s de Alexand,~ L,vy, Luciano Gallec e Alberto
Nepomuceoo s:to expressões desse projeto.
Foi Ncponrnccno quem conseguiu desenvolver o projeto n;icionalis-
ra n.a música C'rudica de maneira mais acabada. Dc.sd<' 1895. compunha <'
apresem:iva canções eruditas em po1ruguê.s1 l'eagindo :10 .. iralianjsmo" que
dominava o bel rt1t11t> no Brasil. Sua frase: "'Não tem pátria um povo que
não canta cm l.ua línguzt'' , sintc1i1.a. CMC prujc10 musical naê:ionaliMa anlt.~
mesmo de o modernismo rê-lo consagrado. F.m 1904. sua "'comédia li rica",
O gararuja, incorporou o.s ritmos populares quç fuziam succs.so nas ruas do
Rio de Janeiro, como a habanera, a polca, o tango, o maxixe e, o lundu.
O oomposi1or foi diretor do preS1igiado lns1im 10 Nacional de Música por
dei anos. Em 1908, dor.mtc soa gestão. organizou-se om recital de c.,nçócs
MQll l l"<ID,\lil st"4 \tODlRNl:AÇ,i.() 63

de Catulo da Paixão acompanhadas com violão~ ins:crumemo considerado


menor e 1íp ico dos "c:apad6dos", ou scj;a, de m:abndros, conformem p re-
conccims das dites da época. Com esse cvcnco. o axioma modernista cs:tavi
:m u nd:,do: os co mp0$iron.-s com formaç:io e interesses crmlirm p recisavam
do popular ~f'.l f.17.cr uma mlísic.:i culnir;ilmc:ncc imponamc e original, e
os compositores e músicos populares prcci.sav.un con,•cnccr as autoridades
e :as cliT<:s d e q ue não eram m:ilandros e bc;iémios sem t.:tlento.

O NASCIMENTO DO SAMJlA
Como c:1111.ir-;1m Cac:l,1110 Vc:h,.o e Gillldm Gil. o \.unha é o fi lho d.1 tlor
e o ~ i do p~tti'. Como p/ncro mu,ii(a) urbano. o s;unba surgiu oa Primei~
ltcplíbl~1 c:m mdo .10 p~liO de: rc:(lcliniic,_;;ÍQ tb" i1:lcntid,1tlo c;uhur,11e polÍlic;-.1
J:1~ popufoc;(!oC> afn....:l~étmtlcnt~ tll'c ~;1,v:1111 sai ,..:lo do émcl ~f•crrci C$,Çrnviftt1,
FUho da dor, pois na mcmórtl do s:unba por muito tempo ccoW o som e o
lamento das scmaLu, Pai do pr.w:-r, pois foi pelo .samb1,. enue outros iêncros
.,rr,,..111,n:ilc:ir(l):, que itlc:nti(l:ulQ 11cgr;1~ e: mc,ric,,1.) 1c:ru.ir.u11 , ulili111;1r IJ 11:1,\l),;t(IO
doloroso e 5C' afumar cm um p1cscmc que a.inda lhe.s rc.scf'\'ava um papel .subal~
temo na so.:ic-dad(.
A 1-.:1l.1vr.11,11mba )urgiu ~rr.,\;i(l,i cm tli.sco pela primcir.a \t"/ cm 1917, t:om
o &.moso •pcto cdcfone"'. composto por Donjyt e intcrpreudo pelo c:incor O~::i-
no. A nos$0S omidos. o ritmo dcw c:rnç¼o C um pouco diferente do que hoje
oonh~m<.» w m<> "s;1111b;i"; 11 rigor, "Pdo u::lefunc" ~ 1v..1~ nrni) oom () "ma •
xiitc· . (>U I OJ gé11cr1J pr,1tic:1Jo peh~ mi'~éll$ ,1fn,,IC$U:rnJemes, ,·1Jh,1J(> p,1r.i ,1
dança a dois e não para o dcs61c de blocos canuvalaoos,
O ..,11nb.18,111l1ou ).1 1.t Íd\~' mulk.,1 1n,1i~ 1m.·1,dnu d,nJuilo c.1uc: 1M,1:,.'(~ om·i-
dos idc:niif'icam <..orno 1:al cfllrt: o, ,1110~ 1930 e: 1940, oom dird10 a k ,ra~ .sobre
m:ll:andr.agem, ~ b:aruc:aib cont.'lgi:anrc e 2 um cor:ll de mulheres., :li "p2.stor.as",
que lhe é típko, As <SCOl;u: de ~mb:i, surgid:u: a p.1rrir de 1928, p;!SSJ.r:Lm a t~
$U!I l,i~tóna in um .amcntc llg;ida -10 $.1.ml,.t,
Em meio às visões exÔ<icas e foldori.âsw sobre o pcwo, que convivia com
o raci.smo explícito, o samba g: afirmou .ao.s poucos como uma música mestiça.
e b,~ildr.1. Se ""-' JHimcitQ) :1110.. tlc ""' o:~1Cnci.1era pcr:,.cguido pcl,1 pol{ci.t.
que consider.ava '\.adi.agem" o ía.10 dC" pessoas andarem com ,,folio C' p.anckiro.
sobrerudo :após o modetnl~mo. o ~mb:t p:i.ssou a .sei a nudo e dec:inr.ido pot
v.irios imdcnuais brancos. Nos anos 1930, o s.imba fo i paularin:imcmC' inoor-
por:tdo 2os discur.so.s culrut:lis o6ci"s, :ir.é como prO\"l de que~-d ires do "Jk:uil
No\'O" da Era V1ugas supos.umcme já não eram :as mc.s.m=1S cb • República Velli.a".
No final d0$UOOS 1930. o 3umba cuiota fui alçado à oondiçâ.o dcg(ncro m uAical
btâ!>ildro J)Ot ococl<nci:i. cxprcs)lo d.1g.ing.1. <la m~lic;:i.gan e (b .ilcgri.a.
64 tU'S TÓl{U IX,) lll,\')11 RI P(!ll ,:,'."A

C llch&; ~ p:i.ne, ti o:,·tm0$ d it..:rque :l$ n()V:b :,boni:11:,?1:M hi.s.1(lrlosr:l.fic:u vim


demonstrando que o samba não era tão pencgtüdo as.sim durame a Primeira Rc-,
pUbliea. 001no acrcdimv.am ~ atudK'liS05 do assunto. tlt;m dci.'l(OU de ser objeto
da critica dos racist.u a parti.r de 1930. De todo modo, 2 accit:iç¼o d o samba
como princir>.al mú$ic:t do inc.ipiente mercido fonogd.fico (: r:tdiolõnico br:l,i-
ldro e ~ímbolo tb "br.1jilid.u;k'" :tjudou muiur.o, ".unbiita) oriundo, tia~ c:b~
popul:lfC'S a mostr:tr .sua arre e se :afimw socfa.lmeme. f'Oi o c:aso de José Barbosa
da Siha, o Sinhô, bmad Sil"a e Angcnor de Olivdra. o Cartola. Nos anos
1930. v:irio.s composirorc.s brancos 2SSumira.m o s:amba como meio de cx-pr~~o
muiic:·11 kgí1im:a < :1 u 11mttci11n,:111< br:i~ildr:a, J:ando 11(1\'t)~ (..'t)nl (m1()!) Siód:al.S ,:
c."'1dko, au gé,icro.
M.:Us do que "reflct.ir'"' uma determinada realidade $0dal. o samba pauou a
abrigar, dcsdcenti.o, a utopia de um p:tis r.tdalmcnte imcgr:tdo e de uma cultu-
ra bra.1âkira popular. nacionaJ e ~6.nfoada. melo a um .só tempo. foi :wim que
d:!< i,"Cni:ro m w,ic1I, tlk::ttl,.~ m:fr., 1;irtlc: tio l,('11 ~u rgin1tnw, :11r,1i,i,1 composito-

~ b,,r:11bli, (:(I Ul() Torn Ji:,bh11,Jo:i(I Gill-:n(•, P1111linlu:, ck1Vil:,l.1r. Chio:, Ru n(1ur.
de 1loland.a. cmrc outros.
Combin2ndo mcbncoli2 e fua. meinórb eh C$Ct2vid~ e uropia de liber-
dade, ·negros'" e *brancos'", pobre.s e ricos, o wnba sonhou um Bnuil integra.do
(111c.. uive,.. 1111 0(..;1 1enl1:1 c:,.i)ci(lu t lc Í;11tJ. M .1~ 11011 IX." i:»(1 tk.i~011 tlc: llt~ mol-
d11r culmr.tlmc1U,:<, tOt.-:tcfo n~~ :m:nid,1,; onde oi. p:t!>-..hl:b d ribl:am .'I i,'1'.tvid .-.lc ,10
som du cnomtcs OOtcria..s, ou de oune.ira su.ssurr.tda, com um -b;mquinho e um
violão'", que nos faz ll1troi<tar no cspfrito a ~ua !Ínropc dançame.

O cinema ra.mbém se firmou no período. Ainda silenciosos, os fil-


mes erlm :icOmJXlnhados frequeoteinente por pi:miu:LS que reproduziam
ou criavam uma crilha mu~ical para a :aç;io na rda. A experiência do cinema
no início do século XX se mesclava ao cmrctcnimcnto circense e ao frene-
si pela novidade técniet. Mas cm mcadoo da décida de 19 10. o cinema
começou a deserwolver seus gêneros 113.J'l'ativos inais populares. como o
melodrama ou a comédia, tornando-se a parlir de enrão a grande diversão
de ma.ss.,s do século '<.X.
Sej:1 no meio rur:tl, seja no meio urt}j,no (:.1ind:1 muito m:ircado peb
memória da pl'imeira gtrJçâo de migrantes do campo para a cidade), a
culrura 1>opular da Primeira Rcpl1blica pode ser vista como um momenro
de transição entre a cultura comunitária. de tradição oral e anônima. e a
cultura d e ma~3. 3UtOr..ll C Cl,da \'ct mais industriali~.ada.
M0 1ll l'<1DA1ll H M \tOOt.11.N l:.,.C).Q 65
ASEMANADEARTEMODERNA
A Semana de Arte Modern:1 <le 1922 - evento ocorrido cm São
P2ulo d ur:uue 11'és dias (13, 15 e J7) de fe\'ereiro daquele ano - costuma
ser tomada por muitOs~tudiOM>) corno um marco de ruptura na l1isrt>ria
da cultura b r:isileir.1 , innugur:mdo o mo<lernismo como movimenro in·
celecrual e arcíscico. Era como se depois daqueles ll'ês dias frenéticos que
~upo1uamcn1c ahalar-.tm a " boa .\OCic.:datlc" pauliiitana, o Bra~il amanl1c..
cesse diference., mais '"moderno·· e mais ..nacioualisra··, no plano cultural.
Se 1930 marcou o fi m d.a Primcir.a R<.:plíblic;:i no plano político, 1922
rcprcscmou o colapso do regime e seus vaJorcs olig.'lrquicos no plano
culmr:al. Obviamente, C.'$$:t per.spcc:tiv:i, c:c.m.srmíJ:i inid:ilmcnte por inre-
lecluats que se aproxiJnararn do Esudo varguista ::ipM o Grn da Primeira
Rcp\lblic.1, dcYe ser problematizada.
A Semana de Arre Modcrnn de 1922 ccvc inegável rcp<.'-rCU$Sio sc1, <.inl
e seu impacto foi crescente na vid.a intelecnctl brasileira, j. medld:1 que os
panicipantc:) de, CV'-.'11fO em M.:t;uidon:s e.la,) tlivc~s vc:"cmo, modernista)
foram ganhando postos e prestígio nas bw'OCtJ.das culturais do Estado.
l¼s:ic:,mt-ntc, a f...mosa Sc.m:.in~ foi um ~~iv.al artí.srico 00.S~ntc noc;~
dado na imprensa local de São rauJo que ~unfa litcraLos, pimorcs, músicos
e i.ncelecruais com a precensão de Matua.liurff a arte. e a cultura brasileira em
rd~ ao n.-s1.1ntc do mundo. l>iga.-5'.~ c:m relação à Europ.1, moddo de
Lradição, 1nas também de ,rangua.rda na época. No Vdho Continente-, desde
o começo do séc1,1lo xx. movimentos artísric:0$ como o a.1bismo. fünirismo,
expressio1\i.sn\o, cllda.i'.smo. emre outros. :too.lavam o gosto da burguesia, que
cunM.:çar,1 a~ do.prt1Kk'.r dos v-,ilol\.'.) orôicm ac.·.-ulémico:, con~rmí<lo.\ ao
longo do século XIX. O realismo como princípio naJ·rativo. as regras de conl ~
posição musical e pictórica, os cernas obri~ tórios para uma obra ser oonsa~
g~da, enfim, todos ~ cânones. rcmáli~ ou formais, eram qut.~liunad~
pelos movimentos de vanguarda. No Br.uil, como diria Oswakl de Andrade.
um dos modcrnisrns majs mHicanccs, o "relógio culrnraJ do lmpl-rio" ainda
marcaV:t as horas. Exagcms à par1e, a fr:isc de Oswald sinlctiza o dc:sconfono
de alguns artisras e intelectuais com o academicismo reinante nns formas
artísticas e com o descompromi~ oligárquico em relaçSo :\ cuhur.1 n1cionril
e popular. hminiiçócs coma a Escola Nacional de Belas Anese a Ac:ult'ruia
l~rasilcira de Letras. ambas scdiad;is no Rio de Janeiro. eram vist:u como
66 tll'iTÓRl,HX.)lll,,\">II RIP(!IIK'A

conservadoras em todos os sentidos. guardi.ies da arre convencional que


deveria ser superada pelo "moderno... O objetivo cb. Semana er.1. :munciar
uma .. boa~no\'a" l"Stétio. E.la comc.."ÇOU a ser pf'(.varada cm 1921 por ~--walcl
de Andrade, Mário de Andrade e pelo pintOr Oi Ca"akanti. que eoruc{,>t1i.-
ram !ip<>iO de Graça Ar.mh:a, litcr2to ,vn~!,'1'2dO e membro fimclador cb
AKI (Academia Hr:&..\ilcira de J.err.1.s). Paradox:;almeme, P..1ulo l'rndo, membro
e.la di1c cifdcuhora p~ul~ta. cujo go~ló e aruaç.io política eram criticac.l~
pcl~ mc,<lerni~t:lS, era c, principal fin.anci:-1tlor da avcnrnm. Aliá» durante a
l'rimcim Repllbliai, n~ :mSL"-nda de um:i polítiai c:ultur:il mais vigc,m)s:1 por
p:u1e do Escado, era conuuu que fnembros mais a.b:maclos da oligarquia fi-
nancias.sem ani.sta.s, promoYendo saraw lilerários e encomendando pinturas.
O que se viu no Teacro Munkipal de São Paulo foi uma mistura
de nunifescaçôes aníscicas diversas (exposição de pimw·a, concertos),
p:'l.lestr.ts e perfonnances poéticas. Tudo orgaflil.ado com a vo,u:i.de de
provocar, "chocar ;i burguesia"', como se dizfa. E uma pane da burgu~ia
pnuli~~, efetivamente. se choc:ou. Menos pdn nbsohua novidade e ous.1·
<lia <..'$téti~ d(.lS arri:m1s moderninas, e; mais pelo (...-xcc.-:ss.ivo c;on.s<..·1-v·..tdori.s-,.
mc.l u récico tid a própria,
A $emana começou c;om u m a confi.:rência de Graça Aranha, <.1uc se
via c:c,lmo patrono <los jovens nrtlsras moclcmi.sr3s, sobre :i .. Emoçio Estétl·
c.1na Anc; Moderna.., orna confi.is~ c..-xposiç:\o .sobre a fulênc;ia dos crit(~ios
~cadêmicos par-.1 dcAnir o <1ue é .,belo", a influência do c.larwini.smo e da
Revolução fra.nccs.'1 no indivíduo, o cspírico irónico da arte moderna, a
absoluca liberdade individual na crfo.ç.âo anística, para conduir que o ..su•
jeito criador", livre d:a.s anurm.s do "pl.Ssadismo", ..enmtri:t e-m oomw"lh1o
cósmio a partir do prJzcr e.~télico livl'C de prcconcci1os". Ufa! E11quanro
Graça Aranha discorria sobre cssC'S cemas, Ernani Braga, pianista, cocava
trechos mwicais modernos ao lado de Ronald de Carvalho e Guilherme
<k· Almeida, po<..·cas de fonnaç:io parnasiana, que liam suas po<.'si-as para
a pl.m.:ia. Guiomar Novac.s, piani):ra corn,.a~r..tla, tainbbn cxcculOu peça~
musie3is. ajudando a 3trnir o públic:o. ApC$1r de tudo. a primeiro noite d-1
Semana terminou sem maiores polêmicas ou ..emoções estéticas...
Na sq;uncla noicc, o clima se agicou. A conferência de Menorri dd
Picd1ia Íoi maiseontundcmc na <leíeszi e.lo "fi.Hurilmo", e a subida ao palco
de Osw:ild e Mário de 1\ndrndc para declamar suas poesias foi acomp.l-
MQlll J'<ID.\111 Sl\C MQDt.11.Nl:A(:).O 67
nhada de sonoras vaias e apupos vindos da pbteia. Diz.em as crônicas que
~ s \'.li:ts for.un comhin:ufa.~ com O$ csmdan,cs amigos de Os·w·.tld p:trA
,...1Jorhar a imcnção de "choque" e ruptura da Semana.
No úJdmo dia, as vafas foram ainda ma.is acalor.idas, acompanhadas
de ovos atirados ao palco, quando Heitor VilJa.Lobos, de longe o :utisra
com maior m'imcro de obras na Scman.i. cx:ccumu ~u.-~ pcç.is.
No S3t,'Uâo tJo ' IC;trro, ccrea tlc 100 u b r.a..,; modem~. entre ela." 20
quadros de Anita M:tlfani, eram apresencadas ao pllblico. Anita, pintora
iJ\flue1)ciadl pe.lo expreuioois.mo, ma,uinh:1 o tom flguí.\Livo nos seus
q uadro~. ma) tlistorcia formas, proporçó<.~ . e abusava tia) cof'C5, c"ir.mtlo
as regras ac:ulêmicis rc:ili.sras. Sua <..-Xpi'Aiçio de 19 17 já tinha rcmliclo uma
pc,1lêmk~ cc,1m Monteiro Lobato, que CSCTC\'W o fumoso <migo "Paranoia
ou mi.uific:aç.1.0" 1 des:anc.'lndo a jov~m p intora.
Ao fun daqueles crês dias, a bandeira da ;me moderna ·'füturi.sta" ainda
não ~~V'A fincada <..·ru:·rc nós, mas a :in:c "passadi~u " j:í não ~-mva mais imune a
crírie1s. A vonrndc de hm,ro só tn...~ria nos :.a~ st.l,'\1in~. M:.i~ JXl'2 "-":lli?.á..-
lo. era pnx.i.so ~redescobrir o BrJ.Sil'". Ou melhor, rd nvemar w.1 cultura.

MODERNISMOS
;\ historiografia e a critica de anc <(UC ~ dchn,1çou sobre o modcrni5"'
mo cswbd<..'Ccn,m uma cronolosia que divide o movimcnro cm uma fase
..imécica" (1922· 1924) e uma f:a.~e "polhic.t" (1924-1928). Se:\ primeir.i
fosc foi marcada pela busca de uma expressão cstéLic.1 inovadora inspirada
nas vanb'Uarcla.s anístiC)S eoropci.i.s. mas :a.inda difo.sa cm tcrrn..s bf'3silciras-.
a s.:.•gunda marcaria a conAuência cnrrc modernismo e nacionalismo, poli~
di.ando dcíinitivamcnlc os grupos modernistas.
A partir de 1928. o modernismo perdeu sua convergência de inrc-
rcsscs e se dividiu cm várias tendências estéticas e ideológicas inconciliáveis.
Nesse ano, Mário de Andr.1dr, o~,vald (lc An(lradc e Mtnoni dd Picchia,
pais·ÍUndadorcs do mo,,imemo, csr,wam cm crês trincheiras ideológicas
djfereme.s, cada qual defendendo um legado modernista di.stinto. Mário de
Andrade aprofundav;1 sua reflexão sobre como F.w:r uma arte moderna no
Br&il tiue náo Í<»Se mera OJpia 5uperfici;-tl ti~ van6u:mJa.;; europei:u,. e <1uc:
oonscgt1issc :a.provcimr a rica tradiç.io popular do país. sobretudo no campo
68 t11';lÓRI.I.IX>U,\',IIJtl PÚll l;"A

musíc.il. Oswald de Andrade, com Tarsíla do Amaral e Ra,~ Bopp, fündou a


com::me d:i ":imropofugi:t , ra<licilh..,.ndo os termos <lo A1auifmo Pm, ..Brasil
de 1924 ao busar uma arte de rupcur., escét:.ic~, e política, aproxirnand~se
de: po:-içõt.-s soci:alist~ mab radicai&, Já Mc:noni dd l'icchi~. com Cassiano
Rie1r<lo e um OOM:uro e: ambidOM> jornalista e lin,-raw ch::amado Plínio Sal~
gado, fundaria o ",·crdc-amardismo'', corrcnlc mai5 conscrv.idora e inclinada
a()s valores de din'.ita. Os rnanifonos tl~tc dui.s últirn~ grupos c:xpn:s:1arn
suas diferenças ídrológícas e .stéàcos. Enquanto os adeptos da "autropofug)a
culmr.11", de csqm.'run, dcfi."lldi:im ~ difun:nç.'lS e os conflitos corno cs5Cnd.i
da cri:1:~o<.-..1lmrnl, o.s modcm israsdc dircitad<.1"Gn.1JX)da Anm" dcft...,cliarn
3 h.armonizaçlo das 1n.:'l.trius cullutJ..is br.lSiJeiras, dentro cb velha u-:idiç~
do rorn:mthmo, Um:.. bn.::vc comp:.u-açio do:!i manifc.-:tO:!i pt-rmirc \'criflcar
as diferenças de a dio e de vis.ão sobre o que seria w113 cukura brailcira.
Enquanto o Man{~k, Ann·opúfogp é m:ti!i irônico <.'ITI rdas,'3o a valo~ ~ te.'.-·
tiu,3 e rclig;i~).S, b11,!iC::mdc, sublinhar a cultvr:t hr~ilcira C(lmO n.~ulrndc;, tlc
um conilico permaneiue, o ma11ifesco verde--amarelisca, cl:tw.1ado Nheengo(t1
Verde-Amarrh, cem um~ linb•t1agcm mal$ solene e tmdicionalisca, cnfu.tt7.an ..
do a cuhura brlSileir.1 como uma hanuooizaç-.fo de coocridos.

Só a Antropofagia nc» un e. Socb.lmcme. Ewnomkameme. filo ·


sofk~unmtc.
Única lei do mundo. Exprcs..\.lo masarad;1 d e 1oclos o.s individua·
!ismos, de todos os oolecivisnl0$. Oe todas as religiões. Oe todos os
ITT1t.1do) de pn.
l üpi, or not tupi t.bat is the quenfon.
(.. ,1 Só me il'lteressa o que nio é n,e-u. lei do homem. Lei do :in.
,ropófugo.
l ... l Queremos a Rcvoluçio C:múb.J.. Maior que a Rcvoluçiio
Fr.anc~. A uniflcaç:io <lc cod:is as f"C'\,;,lr.u dte:aics na di~'5o do
homem. Sem n<M a Europa não teria X'({UCr a sua pobre dcdaraçáo
dos dhehos do homern.
(...l Nunc.'l ÍOmc:K cm:qui·1.ados. Vivemos :ur:l\'és de um dirci10
sonimbulo. Hzcmos Cris10 n:1.SC('r ru Bahia. Ou cm Bdêm d o Pacl
(...1. Ames dos portugueses <lc5Cobrircm o Br:asil, o Br:tSil rinh;i
dcscobc:no ;1 felicidade.
MQlll l','10.\lll 'il\t MODlRNl:AÇ.i.O 69
Conua ó índio de (O<..iidro. O índio 6lho de Marb, a6.lha-
do de Ca1arina de Mêdicis e genro de D. Antônio de Mari2.
A :alegria é a prcw:a d~ nove:.
U•l,mlfntn A111111µfot:,. 1928)

O tapuia i.s.olmMiC" na $Clva, JW 71 \'Í\'er; e íoi morto pda5 arc:ahur..es


< pd:as fla:has inimig:u.. O rupi socfa.liwu-st' sem 1rmor <la mo rte;
e: rM.vu çLc1'nll.ido no >ant;:uc.: Ja n~sa raça. O tapuia é mono. o
mpi é vivo. (...] Tod:a.s :a.s fotm:\$ do jxobinismo na América sfo
tapuia.\. O nacionafüruo $adiv. Jc grarM.l,c 6naJiJadc hUtórica. de
predescin.:içfo humana, es1e é forÇ-Os:imeme mpi.
A Nação é w1u rcuh.mtc Jc ~ ente.$ hi:itúritm, O ín dio, o 111.-gn,. o
e$pad!\Chim, o jes:uha, o nopeiro, o poera, o fa,.endeiro, o poHlioo,
O holai1<ló. O portugue~ Oiniliu. O francó. os n~. ilS montan~
:a miner~ç.'l<>, :i p«uâttl, :a :ig1ic11lw1':l, o S(II, :is légu:is imensas, o
Cnm~iro cio Sul, o cafC. ,l li1c.r.u ura Íran ccs.1, 35 polí1ic.'l.( inglc.Y e
2nlt'rit.·:m:a. os oito milhõcs J e quilómm~ qu:ulr.ados..
'lêmoc; de. accira.r todos e...~ F.trC)f"C.(. 0 11 dcsm 1ir a N.1cionalidadc.
pd o est:U>d c:dmc:mo dt' <listinçC>t'S, pdo do:mcmb~mt'ntO nudcar
cfa iclci.1 que d da Íom,Jmos.
Como acc:imr todos c.sscs &tores? N:ao t'Ollo:dendo p rc<.lomiointi2
a nenhum.

Ko.t parte das proposições, obras e polêmicas modcrnisr.1s fu13 m


c>:pn:~sas por r<.-vhras que surgiram depois d<: 1922: K/11:«.m (1922); '/'i-rrn
Roxa r outnu trmls (;an ...M:(. 1926); Rr11ista ,l.u llmril (M'.tc:rnbro c:lc 1926 a
janeiro de 1927). Venú ( 1927). A11trqpofagia (1928-1929). fota (1927·
1929), Novínima Oulho 1925 a janeiro de 1926). As rcvis:ms moderni.stas
civt:ram vicl~1 curra, mas mararam épOCl na consrruçáo das polémicas<: na
afi rmação do apírito de grupo de d ivc:~ focçút.~ do movimc:m o. Nela!!,
os a rtistas procur,1.v.lm t.-xplic:,u S\la.s obra.se intenções <Z"tétic:.ls para os o u·
rros ardsras e cririoos de arre, formando uma rede de lciruras que, na época.
era importante para d isseminar um movimento an íslico-culrural.
O muderni~mo brasileiro, portan10. é plural e e.leve M-r ma.is apro-
priadamente chamado de ..modernismos". Em comum às \'.Írias correntes.
havia a cenmdva de superar o imp.we do inrelectual do pós·Primeim
Guerra no Brasil, que escava dividido entre se isol:ir na "corre de marfim''
(la lit<:racura dQintc-rc:ssada e distanté cios problemas do mundo real, <: o
e~pírito mission.írio para m udar a realidade nacional. ou Séja, usar a arre
por:t interferir na p<>líric:i, i,ock-d:adc e na c:ulmr:i brafilcir:as.
F.su nova m4~<> pt'<lagógica :issumid:a por intdt.."<.'tU:tis e aninas mo-
4h._,.ni.!.cas corn:.va-.se mais explícita na medida cm (1uc- ~ obr-.1) <: as rcílcxôQ
iam )C aRrmarw.lo cm meio a um dc..'hate ptÍbli<:o, mas ainda sem inílucnci:u
:is polítit.-as culmr.iis d o fatulo. lCrm()$ como '"moclcrnc,l"', "n:u::ional"' e
"popular" iam g-:i.nhando novos sentidos, servindo de base conceicu2.I p:1.r:'l
os projclos de "dcsariSlocr.1tizar" a cuhum, como csa'C\'CU Amonio Candi-
do. Mas a jomada parecia longa e difícil. Era preciso superar categorias que
mais prejud.iCJ.v:uu do que ajudavam -:i. entender a "realic:bde brasileira-,
posto que se inesdavan'I a preconceitos ligados a quesc6es de "r.tça", "meio''
01..1 ..mcsLiçagcm dcgencraliva"'. No lug.1.r des1as visócs, os modernistas
cl<.fcndiam a invc..-nçi<> de •uma nova wlnir.1 brasileira'', que conciliasse a
rr:.uJic;ão popul.ar imcmorfal c<>m a novidade <..~1éli<.-a das vanb11Jardas. Pa111
de), a culnu.i, dcvidamcnrc f'\'Íormada, M:ria a vcrda<ldr:1 saída para CO(IO~
os impa.»c.:11 e a cura par.t os mak•..., nacionais. Cada ,•c;, mai..\ diJSf3ntc~ cio
pcssimism<> inrdct.-r--ual dos primeiros anos ela Hcplihlica, os modernistas
propunham uma arirudc aflrmafiva e cnn1sfa.smada na criação de nov<.lS
valoro C)."l"fricos e <.a'\1lrurais, a partir de- uma a\ii.o pc.xlagógic:t 41UC não visava
apenas educar as massas, mas também reeducar as elites sobre as -coisas
do Brasil'', não só amwés da arte em si que produz.i:un, mas ocupando
u1mbém eles próprios cJ.tgos n1 burocrocia ClJcuraJ dos d iversos rúveis do
poder p1iblico e publicando m:uéri:as cm jornais e re\•islaS.
Não por acaso, quando veio a Revolução de l 930, que prometia
vat·te1· os "políticos c:u'Comidos~ do comando do Estado brasileiro, muitos
incckcmais modcrnlscas st cnmsiasmaram, alguns até se cng.ijaram nas no,.
vas burocr-.tcias cul rurai.s criadas por Cc.:1,Jlio Varga), como o MiniMério da
Educiç~o e ccrt05 muscu.s e institut<>s, como veremos m:.1is adiante. A p:.1nir
daí, o govtmo federal incorpor.uia alguns ideais modernistas e assumiria
um novo papel que envolvia a construção de um idc.'.1.1 de "brasiJidade",
,nais homogêneo e in1egrado, 4.'Um o obje1ivo de >11J>t!r.1r os regionalismo.>
qoc imperavam ll.1 Primeira República.
A roda da história

quer girar
mais rápido:
.
a crise
dos anos 1920

AC. IT A<,:Of.<; POI.ÍTICAS Ml C0\1 F.<,:O


llA lll'.CA llA llF.1920

Apcs:ir dos conAiws políticos e sociais que


S;.\Cudiant a República d~de :t sua impl:tJ\UÇ1o, u
vári;a.s facçõ~ olig.írquic.1.S, a p:mir de su.tS b;1~cs
política\ <.-i1ratluai\, mantinham o cuntrulc ,lo
F.,;rac.fo hr.lsilciro. Os JX1rtidc..1,; republicano~ regio-
na.is ma.is fortes, por efas oom.rol:.tdos, er:un o ei..\':o
do poder polilico d;i Primeir.t RepúbliC'.1. As pou-
,~ 1cnia1ivas dl.'. criação <lc partido~ políric~ Jc
ahrangência nacional, mmo o l•arrido Republica ..
no Federal ( 189,H898) e o Partido Republicano
Cooservador (criado em 19 10), ,uo conseguü-Jft)
mudar esse eixo oligárquko•rcgionalina da polfri ..
,a bt'.a!!lilcit.1 quc ).t1bme1ia a Uni[tO ao!io intercsSl.'.S
das principais oligarquias estaduais, tendo SJo
Paolo e Minas Gc'3is como epicentros de arr;mjos
72 tU'STÓl{U IX,)lll,\')11 RI P(!ll ,:,'."A

que envolviam as elites baianas. pern:unbucanas, carioc.,s e gaúchas como


pl'ocagoniscas imponances.
En1f'é1an10, d<.'Sc:le a déada de 1910, ).()brc1udo ent re milita~. in-
1tk-<:1uais e membros das das~ mé<lias tias capitais, crc.-.c-ia a insa1isfaçâo
com esse modelo ,lc política (jUC cnfrnc1uccia :a União e, con.S(...'t1ucntc-
memc, o d cscnvolvimcnro d:a sodcd ~dc e d.:a (...'COnomi:l do fü.:asi l cm sua
tot.ilitfac.le. Mai.s radicais ainda cr.im as críiicai. do movimcn10 operário
e.pie crescia, sobrc,udo. cm São Paulo contra náo apena~ a política oligár-
c1uica, mas t:tmbém conrr:1 o capirolh:mo e :a supcrcxplornç:fo do tralx1lho
tm fáb ricas e htvourns.
As disputas eleitora.is cvemuaJmeme adrradas e as artiaaJaçócs
políticas emre os candjdacos .swtentados pelo.s setores das oligarquia.s es-
taduais nfo muda\lam a essência liberal-oligárquic:1 da politiCl brasileiJ-a e
do podtr central. Poréin, em que pese a blincbgtm das oligarq_ujas cootr.'I
a.cores e movimentos polílicos que pudascm ;una.çar a sua hegemonia, o
fi n:il dn l'ri m(...-i~ Guerra Mund inl dcm:iruiri::i oma nov:1 fu.sc n:.t hi~tórfa <fo
l'rimeir.t Hr..v\lblk-a. A décad:.1 de 1920 verii a cri.se Anal do regime.
Na MJCC5Sâo de Epir~cio ~oa. S.io Paulo e Min.t~ Gcr-,1i~ se uniram
lançando :t camlidatura de Arrur lkrn:trdQ, político minciru que e.Ta r:mi-
cul:inncntc odi:ido pclo.s militarc,,i. Corrco o bomo de que Anur Hcmar<k-s
planej:.1vn C.':l.:-tinbl\lir o Exércico bmsilciro, caso eleito. Aré c.i.rras falsas, ani-
buídas ao candid,uo, foram publicadas nos jornah c.-m otnubro c.lc 1921,
nas quais ele, suposwncnrc, fuiia críticas a Hc.rmc.s da Fonseca e. a lOdos
os militares. Para complicar a siruaç5o, o marechal Hermes d;1. Fonseca,
ex-presidenle CU RepúbliC;l, eJ·a direcol' do Oube Milicar desde m:i.io de
1921. Mesmo comprovada a falsidade das cin'aS, a im~gcm do c,ndidato
já csca,•a oompromnida junto aos quartéis.
Por uás desse episódio úpico de intrigas palacianas, ha,1ia a crescen•
cc insarisfaç-..io dos militan.-s Gomas bases da política oligárquica e com o
~.uo de o fa1ado bra~ilciro lhl"S pan...'<:'.cr um "t:ondomínio de faicndeirm".
Entretanto. as maiores lidc;r.mça:; do Exército, como o próprio Hermes da
l;onscca, não tinham um projeto político alternativo muiro claro e deline-
ado, limitando,.~ a f.tzcr críticas de ordem moral à aru:tçâo das oligarquias
e ao~ polÍtioos. às fraude.,; deiwrai.s e à~ 1u...i;oci.ira.s para ocupar w. c-.ug~
públicos. O Exército, que se arvorava como ·rund;,1dor da Rcpúblic.l.. , se
,
lt J Q l>A l'lA Hl'i t,lRL\ Q l I RV IRAR M.\t\ R.ÂPIDO 7.)

sentia despre.stigiado no jogo poHtico nacional das elites civis. Nos qum éis.
:1liment:t,t2-SC a viJJ:30 <le <1ue os políriws civis er:am corruptos e 56 tinham
olhos para os seus estados de Ol'igem , negligenciando a consolidaçto de
uma polí1ia nacional forre, ca~,:r,. ele modcrni;,~r todo o n ,...~il,
A publicação dos livros de AJbcno Tones. O problr11111 m1cio111tÍ
br11.Jileiro (1912) e A orga11ir,açio 11dcW,111J (191/4), corno vi mos. causou
fone impacto e forneceu argumencos pa.rn aqueles que defendiam um
F'.$t:ado fu rte e imcrvcntor, c::tpa7. <lc m(."<líar os conAiro.li :;oc:fais e subor-
djnar o regionalismo aos interesses d.1 naçio brnsileira. Torres era un1
imdcc..1ual rcpublic..-:ino j:í nos 1cm~ do Império, que fora minisno do
l mcrior e membro do Supremo Tribunal Federal (srn, mas cu::a\r.1 dcsi-
lmfüfo com a.s d i1o; lihcr;1b u ligán1uica~ <1uc tlominavam a Rcpi'1blica. O
projeto político que apresentou de maneira sistemática e organizada em
.seu:; livro:; passou :a :;cr encampado c.'tda ver. mai.s pelo:; militares. que se
viam como os únicos atores políticos cap;12es de levá-lo adiante.
E.im-e os setores civis, a candidatura ..café com leite.. de Bernardes
t".tmbém cnconrrou fone o posi~~<.l. P·.u~ se conrnapor :t chi, o~ opositor<.-s
l:anç:u"am 1 .. Re:aç:fo Republic:an:a", :tpoi:td:l por Rjo de Janeiro, B::afü:t,
Pernambuco e Rio Gramk: do Sul. apn:~c.:111:mdu como c.:am.litlatu Nilo
Peçanha. poli(ico muito popular no CS(.tdo do Rio de Janeiro. O progra-
ma d csscs oposic:io nisr:.ts defendia o fonak-ci mcnto da:; 1-:0rças Arm:tdas e
a :lutonom..ia ao Poder Legislativo em rebção 3 presidênd:1 da República.
F.Jc:; também não se cs-qucc«.:ram d os operários, cm processo çrC$CCntCde
o rg:iniuç:lo sindic:a.J e luta por m elhore$ condiç6e.c; de lr:.tbalho, e propu-
,!,l,'.r;tm a criaçifo de alguns d ireito~ sociai~ que procci,cs~m <..~<.-~ trábalha~
dores. VaJc lembrar que as jorn:lda.s de trabalho eram longuíssimas, com
mais de 12 horas de turno n:i.s f.íbricas, onde não havia dcs-can.soscmanal
o u fét'tas remuneradas.
Na eleição r~lizada cm março de 1922, o candidato siruacioni,sca,
Arthur lkm:ud.e.s, S1iu vitorioso. Como sempre, os resultados eleitorais
haviam sido fraudados. O Clube Militar <.1u<.-stionou forma lmente os r<.-sul~
tJdos da eleição, propondo um Tribunal de J-lom-a parn recomar os vo1os e
dcRnir o rcsulra<lo. O O:mgrcsso Nacional. dominado pela presidência da
República, não acciwu a propost.i.
74 tlNfÔR I,' (Xllll,\\11 RI PÚJ.1 k,"A

Temendo um levante milirar, o presidente Epitâcio Pessoa trans-


feriu oficiais. fechou o Clube Militar e prendeu o ex-presidente Hermes
(la l¾>nscca cm julho de 1922. Assim. antes mesmo d<.· se iniciar a pr<::-
sidência de Bernardes, a-, initiativas do g<wcnu> parctiam tonf'irrnar as
p iores suspeitas dos m ilitarc:s de <.1uc o Exército br:isilciro poderia vir a ser
cxti010. A n.-a~~o foi imedi:m: com o início de um movimento que fic:1ria
conhecido como "1cnc111hmo".
Em 5 <lc julho ele 1922. dias antes ela IX~ de Bcrn:m.lc.•h alguma.;
guarnições cio Rio ele J:mciro se s1,1bk..,•ar:tm contra a pri5:io ele Herm es e
comr:1 o fec h:unen10 do Clube Militar. Apcs:a.r de muica agi1açjo inicial,
um ou outro tiroteio entre milhares rebeldes e lcg.tlisw, apenas 17 solda-
dos que escav.un no Force de Copacabana resolveram efecivamenre partir
para a luca aberta contra as ÍO!ÇlS govemisus, dispostos a chegar ao Palácio
do Catete (sede do governo) ou morrer tentafldo. Em sua marcha pefa
a\·cnjd.1 Adântka. ganharam o apoio apenas de um civil. Os .. 18 do fone..,
como :;criam cham:idoi; p<))'tCrÍ<,mncntc. F«:,r:.im i;cnclo ahatid<.l$ a tiros ou
presos um a um. O lc~ntc foi focilmcntc dcrroc-.tdo, mas se cons:tg;r<.l\l na
m(.-mória dos militar\~ como o marco 1cro do n·nl-nrismo.
lkmarclQ tomou pt))llC .\oi, c5tado d e )Írio, .situaçâo <1uc .\U.~pi.:ndia
as "garanri35 consdmcionais" paF.t os cidadãos. <.p.ic seria m:1mido até
novembro dc 1923. Os dias ~gitados do comc."ÇO da Rcp(1blica p~rccfam
estar Jl" volta à c11.-na,
Os ..u.·nemcs.. simpaüz.amcs do novo movimento eram jovens ofi-
ciais rebeldes, e defendiam o Exército como ..s:tlvador da Pátria~. dentro
d:i. ideologi.:1 nacionalista e p:uriótic1 e1uáo muilo ÍOJ'ce nos quaJ'téis. Mas
não cont:1v:un com 2poio de boa pan e dos coronéis e generais. sempre
sujeitos a perder seus c.argos de comando e, portamo, mais fiéis ao gover-
no que os no1neara.
No Sul, d<:Sde jandro de 1923, as facções da clirc gallcha mais uma
vc1 luta\'am entre ) i, fa1.c11do volt.tr o fontasma da s.rngrcnr-,a Rl'voluçâo
1:cc;Jcralist.1 do fin3 J do século XIX. O nome pompo.so que esta nova gucrrn
cnm: as facções sulistas ganhou . Revolução libertadora, esconde na ver-
dade um mOlivo prosaico: impedir a quarta posse consecutiva de Borges
de Medeiros, presidente do Rio Grande do Sul. Borges de Medeiros era
alinh3do com os grupos positivistas partidários de uma ..dimdur.1 rcpubli·
~
0

A l O l>A llA Nl'i r(lR1'\ Q l 111. (,IRAII. MAl\JtÂP-100 7J


cana". O grupo que llie opunhaera liderado por Assis Brasil, partidário do
íi-dcr.il ismo de ind in:a~o mais libcr.il, qt1c foi dcrrot3d o por M<Xk'trm nas
ékiçóc..-s cs1adu.üs. Mui1os Qtanciciros (como eram d 1amados o~ gr.ind('S
fuzendeiros do esrndo), descontentes com o governo escaduaJ gaúcho, o
apoiaram. A elite gaúcha end.o se d ividiu entre os thimrmgot (partidários
de Horgcs de Mcdei~) e m11r11ga1os (panid~rios de AMb Hr:a~il), 1.urando
ao la<lo d e Mr._-c:lcirl», ~t.tva Gc,úlio Va~ (nome q ue iria maréar a lüst6..
ria brasileira a partir de 1930).
Fmnrados con'I a falta de apoio miJitar de Artur Bernardes, os ma-
r..ti;ato.s rc....uh·crarn nc1;ociar um ir.nado c.lc pa1., rm.,lia<lo pdo b'O''crno fi:..
,lcral. l'do :1eordo, aceitaram fi nalmente a c.1uana p 0 $SC de ML'tlciro$. e cm
troa, c-onscgui~ m <1uc ~ Constimiç.io gaüch~ ~ n:formac.l:i., impedindo
a quinca r«.lciç;ío do velho caudilho. Contudo, quando Medeiros deixou
o governo estadual, cm 1<)28, conseguiu dcgcr seu mdhor d iscípulo: Gc-
nílio Varg:as.
Com o Sul p:u;iflcad o, e.~ com l~ milir-.m,'$ revoltos~ di~pcrs~,
presos ou morcos, o governo juJgou que a politia. brasileira voltaria ao
monótono jogo parlamentar emre governo e oposição. com o prime.iro
dand o as <.~n as.
l'ort.:m. além <la ins..tbf..ção nos c.1uartéis e <las inJcfccth·d~ dbputa)
em re grupos oligárquic.os, a Primeira República tinha um grupo opositor
conrundeme. q ue nfo se concemava em questionar os resultados desca
ou dac.1uda eleição: o mo\•imcmo opl·rário, O pomo comum c.·ncrc toda)
a) tendências e grupos q ue formavam CJIM: movimen te,, cr_. o objcti\'O de
consentir um a outra sociedade, baseada na iguaJd:tde, governada pelos
próprios tr1balludores.

"QUESTÃO SOCIAL" E O MOVThl ENTO OPERÁRIO

A famosa fras,· '"a questão oocial é um CISO (lc polícia", arribuída a


\'<'ashingmn Luís quando ainda era candidato ao governo de S;io Paulo cm
1920, aparece em muitos livros c.omo uma espécie de 1ÍIJg1tn da Primeira
República no traro dos confli ros sociais m:tis sérios. Na verdade, de não
formulou a fraSt' exa1arncnte ne-"Cs ccnm». Ao ap~ nrar sua plarafonna
ao go"crno C$rn.dual de Sã.o Paulo. cm ja neiro de 1920. afirmara: ..a agira·
76 t11'S fÓIU,1.00IIU.',II RIP(tJ.l rA

ção operária é wna questão que interessa mais à ordem pUblica do que à
ordem soci.:tl''.
Dito ou não dito, cl«:Ma ou dac1uda manc:ira, o fato é que, na prnrica
política da Primeira Rcplí blica a questão social era rncsmo trarada como
um C3S() de p<,líd:,. Líclcres sindicais er:am pn:sos, e muir!ls ~·C"/..t."S ron ur::i-
dos por polic;fais. Gr<.-v~ e manifc.s.-a~ eram reprimidas com c;:xc~iva
"iol<:nci:i policial. Gráfica~ que imprimiam os jornais operário~ ac:&b~,·am
inva<lidas e dc:pn:datlas.
Con1;1.1do, na époai, também h:ivin políticos <1uc - percebendo que
s6 a tepl'ess.'io n:1o seria suÍlc:ienre par:i c:ontrolar a agir:iç;l.o operária -
chegavam a propor a criaçáo de uma legislação trabalhista que garamissc
alguns direitos aos trabalhadores, como férias, menores jornadas de tra-
balhos e desc::u1so senunaJ. De furo, havia uma percepção general.i2.ada,
mesmo entre me,nbros das elites, de que o crabalhldor no Bras.il tr:\
lratado como um cidadão inferior, sem remuncraç.io suficiente para viver
uma vida digna e submetido :.t :iltas jorn:id:v; de trabalho n:.t.$ fiib ri~.s.
Vale lemb rar que, n o sct<.lr rural, as condições de n-:rbalho e explora,
ção c:r;i,m :.intla pic.1 r1.:s, com ci.m1><.m<.-S<.'S e ,,.,.balhadort~ ru,..-is vi\'cndo
no limite <la sohn.:\'i\'ência. ,1,em ac:C:.)SU a C.)<.·ola~. h~pitai~ ou moradia1t
minimamcmc dignas, moiw prbximo.s da \'ida coticli:.tn~ dos csc-r:.ivos
dos cc;mpos do Império. Algumas organi12çõcs .socialisras, desde 6ns do
5éculo x1x, ap~ntavam propostas para mclhor-,1.r a condições dos rr-.a,
balhadorc.s. mas tinha..m pouc:a força pollljca. Nas eleições, um ou outro
Hder sociaHsca apoiava ralicameme uma candidacur-J. mais progressista,
co1no 110 c:aso do depuc.ldo federal e prefeito de Vassouras (RJ), Maw·ício
dt l2ccrda, qut apoiou Nilo Pcç.,nh.-. p2r.a a prtiiidênda.
Os jovens milical"("S cenemiscas se preocupavam com a "questão so~
cia.J'' e até simpaci.2.,wam com algumas reivind.ic:açôes operárias. mas não
cs,avam disposcos a incorporar o movimento opçrário cm suas rebdiôcs.
Par-.a o~ 1c 11eruiMas, a .. rc,·oluçáo" (1UL'. prc,cn<liam fa1cr no paf~ dcvcria ser
obra d e militares patrióticos. e nio d e operários que poderiam sobvertcr a
ordem social e a união nacional com suas ideias anarqu isras e sod:tlisras.
Com cfeiw, as lucas e os projetos que motivavam a "agicaç.ão operá,
tia" eraru de ou1 ra narure"la, mai~ r..1.dical. Nck~. qucstion,w:Mic rnmbém a
p ropriedade privada e a d csigoaldadc d e renda .
lt l O l>A llA Nl>;TÓR14Ql11 R GIAAR M.\t\ RÂPIDO 77

No final dos anos 1910, o movimento operário ganhou muito des..


taque na socied1.de e na imprensa. Mas as lucas OEX'rárias no Brasil come.
ç.aram bem ante,;: nflo podem~ aqute<:r ait huas de operários br.isikiros
ncgn:,s e rnularos, muitos deles ex-escravos, trav-ad~ desde o fim do século
XLX. Os rr:1b:ilh:1dorcs <los prind~1is ponos br.isilciros, como Rio de J:méi-
ro e S.1nro,.s, org:miz.1r.1m grcvt..-s hisroric:imcmc imponanu..-s. l'ommo, é
preciso wmar cuidado com o mico historiográfico que oom,idcra a imigra ..
çâo e o anarc:<»,,;indicalismo mu.ido pelo$ imigranto {italianc» e cspanhói~
p rindp:tlmcntc) como O$ n.-:spons:h'Cis pelo · n::iscimcnt<) d:as lurns opcr:irias
organi2:idas 1)0 Brasil'•. Comudo, é inegá,·el que os imigrantes europew
deram forç.1 par.i um movimento opc1'ário ma.is radical e combat..ivo.
Como vimos, os capitais gerados pdo c.úê e a necessidade do go-
''erno de promover supecivics na balat1ça comercial para pagar os jw·os da
divida e:<ltrn.a acabaram por eslintulal' o crescin1e1uo do pal'que industrial
paulist,-. sobrcwdo no sclor de bens não dur.ívcis. Com de, cresceu a ofor-
ra de t.-mprcgos para C.l$ imi1:,'Tilntc.s <1uc chegavam à cidade de Siio Paulo cm
mam1. engrossando signih~tiV:lm<.-ntc ~ d;issc opcr:iri:;i.
A idt:ologia amirco~indic.ilisr.i dav-d o tom h(:b't:mônico das orga ..
ni?.açôo ~indicai~ opc.:rJria~ hra)ikir,u do começo <lo sl'Culo XX. Tra?A.:n<lo
para o Krnsil p.ilavr:.1s de ore.km nascidas na Europ-1 cm mc::Jdos do século
x1x, os anarquistas conccbi:;im a fi.iwra soci<.-dadc governada por uma fi,...
dcr-d~·ão de sindic-.uos de.· tr-dbalh:;idorcs, 5'.'m p~trõ~. propriedade privada
ou Estado. /u lucas cotidianas e as greves parciajs dos operários deve.riam
convergir para a sonh:tda "gt'eve geJ'al~. que, na visio dos líderes 3.J.tarquis-
cas, seri:i uma espécie de :ipocalipse do siscem:1 capitalista. O t'XiocÍflio dos
dirigcn1cs e ideólogos :marquiscas era simples e dirclO: se os opcdrios são
a ma.iorfa esmagadora da sociedade capitalisrn, basra ce:rem -oonsdência
de d.we··, organização policie.a e objetivos claros que a fucura sociedade
revolucionária virá, um; hora ou ourra. Mas é claro que o govc..-rno, ~ c.litt'S
uligár<1uicas, m burgu~ da ind(u1ria, a~ da~scs ml,lias, as in~ituiç6õ
tradicionais, como :,1 Igreja Católio. não estavam dis~tos a capin1l3r tão
fucilmcncc e tinham muito poder e inslTUmcntos, sobrcn1do jurídicos e
policiais, para repri mir os opcr-.í.rios e seus sindic2cos.
Em 1906, surgiu a Coníedcraçáo Operária Urasileira (coa). Em
1907, a cidade de São Paulo oonhcccu a primeira grande grC\•c operária
de sua hislória. A dala de Primeiro de Maio, oonsagrada mundialmen ..
,e c:m homenab,çm :ao~ opc:r:írios mortos pda políd:t em 1886 duF.imc:
uma manifcnaçã.o nos E.scados Unido;s, era um momento cspccfa.l para
o mc)VÍmcmo <>per.frio q ue a comcmo r::1v~ cm vário$ cidades do mundo
com grandes comícios e par.Uisaçóes (quase sempre reprimidos com muita
violência policial). No 1:ka.sil, ororria o mwno.
Além da força dos sindicatos, os a11arquis(as apostavarn no ua ..
balho <k cduc:aÇio e c;onscicmi1.:i~o d<.l~ ind ivíduo.) que: form.1v:;1m a
classe operária feito através da imprensa. Em várias cidades brasileira.s,
circulavam jornais anarquistas (muitos deles escritos em imliano): A11a111i
(190 1), O Ubmário (1904), ·,;"ª l.ívre (1 905), A Voz ti,, Tmbalhntl,,,
(órgão oAcial do coo), A í'lrbr (1917), Cm11í11al. Nas suas póginas, no-
mq como Eclgar 1..cucnroth, EvcF-mlc, l>i:1.$. José Oiticica, Ncno Vasco,
enue outros, despon1avam cotno lider.tnçis opedrels, sempre visadas
pda n:prc:).~âo po licial.
Ao longo da Primeira Guerra Mundial, cresceu a classe operária e,
com da, a pr6pri~ agita~o ,indic:.il. Entre 1917 e 1920, houve no Hrasil
um lmporramc ciclo de greves operárias.

A GRANDE GREVE OE 1917


Alem da crise cconômic::i causad2 pd-a Gr.mde Gucua e as rcivincüaçôcs
çl;í,siç;i~ qi.u: h.n·i.;e muno UCl.lpav~nn :1p;1ur.1opc::niri:1- j,onucfa de 8 bora,'), me•
llmr<"~ c,) ._mclic;~ de 1r,b.lll10. Ílm do 1r,d,.1ll10 ele c,i_iuç.u e mull,c~. tlcM.':111:,0
:-t"nl;.urnl -. o 0 1(1p irn t.b Cn::vc tlc: 1917 Íl>i :1 luc.l contra o irn()'INO "ptii· J\.hri.t"
(campanha d<: ajuda 6nancdra à há.lia que ~~va em·()Mda na gul'fra) que ai~
gum: indusubis italianos impll$tt2ffi 10s tl':'lb11h:tdora de .suu Bb,ic:u.
A gtl:''c: tc:\'e ini'do nas fitbriros 1i'ii1ds do Tpimns;a e d,1 Mooca., b:Lirros Opt·
d.rios paultstttnos. e k esp:llha.r.1m pda çidaJc: de S:io l'.-iulo, durando cxro.i de
um mês. Em um dos inúmeros conflitos de rua, sempre rcptimidos pcfa policia
e pela J:Orç.t Pública. mom:u o sapateiro espanhol Antonio Marrinc:z, de 2 1
:mv:i. que llC «om:ui,, um )Í1nhulo J;1 lu1.,) 001) trnb.alh.klQ1cl) e um c.l()) prin,ci"»
m:lnircs d;i ctulill opcr.iri.1 br-.a,;ildra. C..lcul:a·.sc: \(Uc, em indldo:. de julho. cc:rc.1
de 4; mil ()per:hios eu:w:am p2r1Jiucl-Os em deun::is de fibl'ie:u. M:u: o que 1xa~
reci:l um movimtnro fone e coc-so cnfrentól\'2 probltmti dt org2.nil:1çlo imern:t.
O Comitê de lxfes.1 rrotetá.ria não conseguiu .se transfunnar em porta•vm dos
opcr.í.rio$. que negociaY,un de maneira fragmentada oom os indusniai.'S, ~mpre
~ a ~JMtla Jo ~ l.klo e seu aprar;uo rcpra,ji'"· O g(r1•cm<,. p.iiut:ido pçlo lilJc;·
AS.O IU. llA tfü t()RL\ Q l I RV IRAR M.\b RÂPIOO 79
r.allsmo oligíré)uico dê i::u:as elires Ji,i~·rne::, ju~uf,c:::w:1 ,it::1 ,c<:u~!'l em me.:li:;i, os
con8itos entre p;u:rócs e empregados por ser um problema que cn,-olvia a qucbna
de um c:on1t.1t() priv.tdo por pane dos greviSLU, m.as 1la verdade n:1.o hethava em
mandar a polk:ia rn1ura os tr-.thalh.:idore.1:.
Al'('sar de minoritário dentro do contingente de trabalhadores brui.lciro;"S,
cm sua maior 1».tcc ainda lig:ick» ao scror a;gririo. o r.idietlL'imo da c:WK ope-
rária fo. com tiue a " q1k:SflÍO )Qdar· p.1~~).Sc .i ser ddwitb ,u politica br~ilcir.1,
Embot:l tc-nh:tm sido pooos ti conquist:1s cfcri,•:a.s, :t greve gencr2liucb de 19 l 7
preocupou a burguesia pauHstlna c-m :ucc-nsão.

Lembremos que no final de 1917, no lmpêrlo Russo, predominan·


cernente ;ig:r:í,rio, domin;ido por uma monarquia <1ue p~rccia inabahivcl, a
rcl:uivamcmc pequena d;u.sc: oper.íria tomou o poder sob a liderança dos
bolchc.'\·i<1m.~ e íc-,. a pr-imeir:t fl.."\'()luc;:i() i;ociali.sta bcm~!,'.ua:dKla tia Hi.!;rúria.
O que p:irecia u1ll.:l u<opi:l. disume tornava-se, subiwneote., uma realicbde
hiMúrica co ncn:t.a. ;111ima11<.k1 a luta n.:voluciunária operária ou muntlu w<lo.
O sucesso da ~ 'olução Russa, no final de 1917, fez. com que pane
das lider.i.nças do movimcnw opc.~r:irio br.isileiro, ainda prcdominanr<,mcn~
lC anarquisr.u, repensasse suas C$tratégias de h.m1. As noticias que chcg.,wam
da Rússin no final de 19 17 não cr;Jm moi ro daras. pOtlC(l se Stbin sobre
o Partido t\olchc,,iquc liderado por Vladimi r l,enin, que rinha se :apoiado
nos sovktts (consdhos) de ..operários, soldados e camponeses.. para romar
o poder. O m0<.ld<.1 de .. i nsurrciçã<.) e çonqui.sta do Enado que tinh:i dado
certo na Rú.~ia foi incorpor:ido por p:'lrte dl! liderança.~ opeclrias bra.~i-
lciras. tendo como epicentro<> Rio d e Janeiro, capital <la Rcpt'1blica. Para
essas lideranças, jjltes de acabar com o Es<ado, como defendfa o anarquis-
mo, <..·ra prc:c i~ 1omá..lo, <-ai como os operários ru~5m fh..cram, inmmr-,rndo
uma '"dfradura do proletariado.. que acabasse com a propriedade privada e
implantasse o socialismo. Seguindo esse modelo, cm meio a um conjunto
de gttvc.li oper.irias, :1lguns militam ~ do movimemo operirio c:arioc2 Qosé
Oiticica, Astrojildo Pereira. Cario:,; 1)ia.s. Ric.1rdo Perpétua, José Elias da
Silva, Joio da CoSLa Pime11ta) planej:1ram um Jev:uue que de,,e1'ia tomar
conta da apitai da Rtpública, e, na scqul'ncia, do país inteiro. Espct.1\"Jlll
conta.r com o apoio de soldados do Exércilo que cm greves anteriores ti·
nham dcmonsuado cena simpati-a pela çausa opccir-i-a. Afinal, a base social
das b:aix:1s p:uerues do Êxérci10 er:i :a mcsm:.1 dos operários, :1mbos er.un
rccmtados nos secon:s mais pobres d:i. sociedade.
Mas o plano de insurreição não deu cerco. A polícia carioca já escava
sabendo do lc.."V:tntc, m2rcaclo para o dia 18 de novembro. As hnas $C r<.'$U-
miram a um coníromo mais sério no bail'ro de São Cr-istO\'.Í.O, rapic.lam<.·ntc
vencido pelas forças do governo.
Os 2cc,mt<.'CÍmt.'11tO!i de 1917 e 1918 dc;monst"r:.avam qt1c as txpec-
12civas dos u-Jball1.idorc.ç M: incc...,1sificaV',11n, cslimuladas pda conjuntura
revolucionária internacional. Foi nesse momcmo que. cresceu o debate
entre as elites políticas tradicionais sobre a necessidode de uma legislação
pro,ccionbca p:tra os <:1pt'f.1ri~. M2s cal c.ld~tc nfo gerou r~ulc:K!os muito
co11cn.i-c.~. l'or llua \'C'I.,, o i;ovcmo tQ,pomku com mai.s rcprc:ss.áo policial.
Muitas lideranç.as :ut1rqu.iscas esm.1.ngeiras foram expulsas do país e a vigi•
l:lncia S<.lbrc as org:;ini1.aç(1CS sindicais flcou aind.i mah :teimada.
Alguos UJcrcs operário~ e ~indicai~ avaliaram (1uc a~ grcvo p:4rcciarn
se esgotar se.1n grandes resultados, ve.nc.idas pela repressão; crescia o nú-
mero dos que p1SSat'am a defender 3. afaçlo de u1u pattido operá.l'io que
condu1J~M: :o lu1a,) c.l.:i d:4sM: OJ'lol.:ríri,4 de maneira ccnt r.ili1~da, impondo d1.'.
cima para baixo as esrracégia.s de organização e luta.

J\ CRli\Ç.Í\O DO PARTIDO COMu"NlSTJ\ DO BRJ\SIL


NA IJl'.C:AIJA IJ~ 1920

O cerco às organizações sindicús e a dillculdade das lideranços e sin•


dicaros anarcossindicalisrns cm coordt~nar uma aç~o conjunta cnrn.: si dianR·
e.lo f\x:ruc.lCM:imcnto e.la n:pl\.~o d o 1,ovcmu, aU:m Jo t1'iuofo da Rc\•oluçáo
Russa de 191 7. üveram grande impacto sobre algumas lideranças operârias.
E1n março de 1922, wn 013.Jtifesro assin:i.do por an:.trquist.'.l.S como E.dg:i.rd
l..cucnroch, Amonio L>ominguts, António Cordon 111ho, Emílio Manins,
Jo.10 PcrQl, José Rodrigues. joá() Penteado. Rodolfo Fclippc e Rican:lo Cip·
pob reoonhecfa. que a linha política liberciria (ou seja, de i1tspir1ç~ anar•
quisr.a), a1é ent.io dominamç no movimtnco, não apr1.'S1."fltav.i ~um rcsulrado
correspondente à cnonnc MJma de csforçc;~ e sacritlcioS. Para do., i~-. ):(': de~
via à falta de uma ;;1.ção 1netódica, de mais propagancb e de organiuçáo. Os
si.gn:u.:Srios .se autodenominavam ·:marqu.iscns-<0mw1in:is revolucio!lários".
Em meio a ti\e debarc au10crítico, foi fi.mdado no mesmo mês o
Partido Comunista do Brasil (rcs). Não por acaso. cntn: os fundadores
A l Q l>A llA t11)fÓIU.\QVI R(ã,11.AR M.\f'J R,ÂPIOO 81

do PC8 constam os nomes de imclecruais e operários que haviam mili~


tado no anarquismo, como Abílio de Nequece (eleito s:ecrecário-geral),
Astrojildo 1\-rcira {(1uc mai.:i tarde também :,eria deito para o c.rgo de
secretário-geral), Or-.í,'lo Brandão, Joâo da Com Pirncnra. E,•crardo Dias.
emrc outros. A inAuênd:i da Rt.·Yoluçí.o Russa e do!i princípios rc..'Q ricos e
org.mi1:arivos bolchcvi<1Ut'$ cr2 dar.a e p~tcnrc. Logo no seu I Congresso, o
1•cH dcmon~rava ,m a intenção de participar da ln1cmacion.;il Comu,lista
(ou III Internacional), Ófl~O fundado cm 1919 ~ diatlo cm Mos<."Qu <."Qm o
objcdvo de Org:'Jni1.:ir e :iglutinar os parridos comuniroi.s cm coclo o munclo.
Para ser aceito como mefnbro da Intern:'lcionaJ Comunista, o novo panido
precisava aflm1ar suas diferenças cm relação a anarquistas e socia)jsras. .Em
relaç.io aos primeiros, os comunistas diferiam na defes."1 d:t exisrê.ncia de
uJ.n p:ll'cido único, centralizado e disciplinado (ao conu'ário do princípio
da au,onomi:'l e des~n1rali2:açlo de sindicatos e fedel'aç6es, C:tl'O 30 anar-
cossindkalfamo) e na quest'.io da necessidade de manler o Estado depois
da lkvoloçiio, JXlí:t a construção do comunismo. dc$dc que governado pela
"dit::u:h.ira do prolct".tri:tdo" e n:io pd<.lS rq:m,'$Cntanrcs da bor1:,tt1csia ou das
oli1;:ar<1uias rur-.-h rr-~dicionais. Em rdaçio am .:,()(..ialis,~. ~ comunistal!-
criticavam o princ:Ípio de uma transição grath1al, pacífica e democrática
para o roci3lismo. arravés <l:i con<1ui$ta do Esrodo pelo voto dm operários
e rmb.alhador<.'S cm geral, sem ;a n<.."CC.Ssidadc d:a rupmra revolucionária vio-
k-rua com a wcicd~d<.· c.pitalbca ou da '"<li1aclur-.1 do prokcariado".
A partir da fündação do Pen, o movimento opc:rário br.uilciro ficuia di-
\,jdido emre anarquisc.tS e comwtisw, com relativo predon.únio dos pl'imeJtos
até n'letdos dos aJ\os 1930. J:i os .socialiSUMiemocr:iücos n:to conseguir.t.in se
organizar de íonn:a partâd:iria, permanecendo poli, icunente isol:ados no mo--
,,jn1enco opcr.úfo br.isikiro, com simpaciz.amcs restritos a alguns imdcauais.
Depois de 1930. enquanto anarquistas e comunistas dispurav:un as
b.a.sc,ç sindicais do opt·r-.triado, o E.stado brasileiro começou ;a parrocinar
a criaç.áo tlc sinc.licitu.s ofü:iaii co111mlados pelo Mini~tério do ' lhbalho,
criado cm 19.11, como veremos mais :,1d iantc.
O PC8 demorou mais um ano até ser aceito como um:.1 "'Seção da
111 lnrcm.acional", Entre os critérios de aceicaçâo esta\'am: ter unidade e
d isciplina de açáo, defender a ..<li1:ulura do prolc1ariado", não ques1ionar
as dccisôcs: da Internacional. cxp \llsar os ..dissidentes" (mesmo simpá-
82 t11'iT'ÓlW,D.">1t,\'ma1p(111~A

ricos ao socialismo · genérico") e conuolar as suas ;.células.. nas bases


operárias. Com relaçio ao l'C:B, a [memacion:t.l suspeicava da presença de
muicos miliumtC) e d iri~·nta que, no firndo. continuavam mais fiéis ao
anarquismo do <1uc ao bolchc."ViSmO. Outra cxigéncia da Internacional
era <1ue os JXlrtid oscomu nisr:is csrivcs~m p rcporacl(.)$ p:ir:i nru:ar também
de fo rm:t c.:hmdcsdna, não res-u-ingindo su~ a~ÕC.$ ao~ momentos dele-
gal idade e libc.:rdac.lc de ação. l~cc lÍltimo principio organi,~tivu acabaria
~e rcvclan<lu im portante p ara explicar por <.1uc, e n tre tant3S or,;aniT.aç{x:.:.
c xistcmcs, o 11('. 6 resistiu m elhor à reprcss3o d o governo conm 1 o movi-
mento opeclrio, muito imensa nos anos 1920.
Apcs.ir de ser um panido pequeno, com menos de 100 mifüantcs
no território brasileiro, o PC& cl1amou a atenção d.lS autoridades e foi colo-
cado na ilegalidade três meses após sua fun daç.lo. Nem por isso deixou de
d ispU1ar a hegemooi.:\ I\OS sindicatos oper:il'los com os .:\narquis1as. P:tJ'.:\ os
comunisl~, os sindicatos deveriam amar sob o comando do partido e seu
C ()mitê C cnrrnl. cxanimcnrc o contr:iri() d o que pcnsaY.tm o:; :1n:m.1uisras,
que i nsis,fom na amonomia de sindic:.nos e org:.mi1..fl~ de base opcniri:a.
Os comunista~ do ll( 'K t nu:ndiam qut a {-Conomi:1 br-.i:silc:ira cr-.t um
pnxluro <la di,·i~o entre inrt:~ ''agrari~r.t~ e 11crnifi:udai.s" clc,11 oligarct~
larifo ndiários. :ipoiaclos. supos,amcnrc, pdo opiralismo inglês, e intcros.s<..-s
"industri:.1lirnis" d-a nascente hu11,l\1<.-sia, apoi::id-a pelos norrc-ameficanos.
Nc.-s.sa visito, a ~iruação políric~ do n ra~il <."Ta rkla como "sc:micolonfal"', ou
seja. um pais falsa.n1cmc indcpcndcmc, coralmc:mc ooncrolado pelos wimpe-
ri:lliscas~ com apoio dos seus aliados Ulternos. Portamo, era pl'eciso realiz.:u'
uma "revoluçio nacio11.:\J" p:11a liben:u o país do i111perillismo c:2pitalis-ta.
~ modd o de :m.ílise era :1dap1.ado d.15 1cori2s cm ,·og:a n.:\ tp00, deícndi-
das pelos dll'ig<nccs da lntc:ma.cional Comunista e aplicado a vários países da
Ásia e da América do Sul.
Em que pese o dogmati.smo de ide.ias e doutrinas dcf<.11didas pelo
P<'.8, ele 001bc..-guiu .se afi n n ar como o pção política entre a~ lidcrdn~ e sin-
dicato5 da da.ssc opcr:iria. f:m 1927. d e voltou a scrl~I. passando a :.uu:u
de maneira mais livre cm sindicaw s e fábricas e parricipando da.s eleições
legislativas com o nome de Bioro Operário, no ano seguinte rransformado
em ooc (Bloco Opedrio e Campu,lê.,). O panitlo com,cguiu eleger 1fn
parlamcnr.1r~ . Mas o _período de legalidade durou pouco.
,
AlOl>A DA Hlif(lRlA.QI.' 1 RY lltAR N,\l'>RÂPIOO 8.)

Em agoscode 1927, o governo promulgou a Lei Celerada, uma dura


lei <lc conrrole de movimcmo$ polític~ e: sociais de com~t:.ur:io ao regime:,
Qf)t.-cialmcncc voltada par-.t a rep1'<.."SSâo de> movi mcnto opcrá,'io. Nos CC.'f..
mos dess..'1 legislaçáo, agremiações polícic,s que arenrassem contra a ..ordem
púbJica'' ou promovessem greves poderiam ser fechadas. cendo seus jornais
e f't"\•br-«t.\ proibidos e.· sti.u dirigcnccs presos. Como ela atingiu, .sobretudo,
....., litk:r-.tnç~ anan:1ui11ta!'l. mais di~pc~\ e iJ10lad:u, acabou, par.td oxalmcn ..
te. por f.worecer o crescimento dos comunistas dentro dos siudicacos. que
ocup:tt':un os e_sp~lÇOS dos antigos lidere$ presos e afastados.
"lé.:nr.imlo bt~t'3r aliado~ que u ajudaSM:m a lutar cu11tra ~ novo
q1i.:1dro rcprcs!)i\'(), o r<:R dcc.;diu <1uc era p rcá10 se aproximar dos •rmcnrcs
rcbcldc..-s" 1 :1té então vist0s como meros ••rc..formiw.i.s moderados" qt1e não
defendiam, de fa10, a das.~ operária e os c:1111p0ncscs.
Mas qual era o projeto ideológico dos jovens milic.ucs rebeldes? O
que <.."Íc.'.Tivamcntc <.1 ucriam C<.lm suas suc~sivas rchclic)cs <1uc agirarnm os
:m ~ 1920?

"0 MOVl1! ENTO DOS TDIGWIB"

Depois da ~volta do Forte de Cop:aob:an:a_, cm julho de 1922, o


Hrasil pcnnancceu sob ~r:-Klo de 3itio, uma prcrr('l,'3ri,•a legal do governo
que lhe pcrmitfa ~ument:tr ti, tição n.:pn:,siva da polícia e do Exércir<..l para
agir contra dissidtnles, impedi1\do reuni6es e comícios, pl'OCuraodo com
isso cw.u.iar o espaço público de qualquer aç.io de comcscaçâo ao regime
político. Artur Hcrn:irdçs rc,'Ogou o csmdo de sítio no fiool de 1923. e o
clima polídco pan.-cia se normali?ar. Mas os "n:ncntcs" não cst:.w:am dispos.-
tos a se d ispcrsar.
Apesar da derrota de 1922, os mifüarcs críticos ao governo con-
tinuavam acrcdimndo que o Exército deveria •salvar" a nação brasilcir.a
do lilx.-ralismo clitisra e oligárquico, e passaram a St" organiur para uma
··segunda rc:volca.. tcncmisra. E.scolhcram o mesmo dia 5 de julho de 1924
em homenagem aos revoltosos do Forte de Copacabana. Ne-SS3 data, os
quanéis da cidade de São Paulo se rebelaram e tomaram vários locais escra-
régicos <la ci<.ladc. obrig.ancfo o prcsidence ~r-.tdual (como era nomeado o
governador). Carlos de Campos, a se retirar com as tropas l~list'ls.
84 tll'if'ÓRJ,.1,00IIU~II RIP(J,l k;"A

1,24, 80M8ASS08RJ!SÁO PAUi.Oi

Our,uuc 23 di~ a cidade de São ra u lo íoi govcro.ula (>(los 1ene111Cj - soh


o com:i.ndo do gcn-c-r:i.1 Isidoro o~~ lo1>cs. com mcd~~ do prcfcico e cb /u·
~xi:it;:it) V)mt'rdal de S:ic> P·.1ul() - qut' 1e,rn1V2tt1 org::u1i;c1r ;i :1(fmi11b1r.i,ç:'io
perante a s.itw.çi.o caótica que afi:tou o cotidiano da cida.de. Caktda•K que entrt'
l 00 e 200 mil pa.lfOO,'I teriam fugido par,1 o intc.rior (de um total de 700 mil
h:1bi1.ir11c)). O fi.:odo tl.1 populaçlo foi ciu~ltlo, sobrehklo, pdos intenso~ bon,.
budcios reilizados pelas uop.i.s lcg.aUsw conu:i os b:tirros opecirios da cidade,
Brt..,. MOc)C'l e Per.:li,.o, quarkfo morrer.lm boa JUrtt' J:1) 500 vi1im:1$ í.11.ais (b
•C"'Olra. O bomb.uddo rambán era um "',«ado• a.os operários. cuju Lidc1-anças
am1rqt1i$t.JS l ('flC:l\':ltn 1ugimh'.11r um OC,1111ili: p:1rn apc;,i:ir n li::\':mtc llO-. m ilittafe!>
e auibuir um carâtc-r soci:ilism li rcbdüo. Os cencncc.s rebelados cm Sio Paulo
1ct.u.'!;1r;un c.." ,1 ajml.:i. pui~ tcmi,un perde,· o 001111\)lc: 11.l ,itu;N,.:iO po lítit..l e n ,io
rinh2m ncnhum.2 inrcnç:lio de s-ub,..-crrer 2 ordem socW, permitindo que o ope·
r:1ri:ul<, ~ l<,null:Sr. () pro1ugo,ui:m1 priru;ip:11 J:, ~ lrn.

casa bombardeada no bairro operério do 8rés.


rural'll.e a Revoh.a;;&o de 1924.

Os milic:tres também se revolrar.tm tnt outros cst:tdos, como Sergi-


pe. Rio G r.mdc do Sul e Amaionas. Nem: úhimo. innaurou-sc a Comuna
de M:mau.$, gn1po que durante om mês implantou \Jm go\'cmo local
A l Q DA llA Hl>; f(lR l.\ Q l l l R(i,IRAR M.\ l\ R.ÂPI OO 8)~

muito próximo de um socialismo de maôz nacionalisra, c;om imposição


de impostos aos mai.s ricos, conJlscos de bens bancirios e c.obrança de im.
posr0.'! atrasa.cios de tmprcsas inglc.-sa.s. A::, cxptritncfas de governo urbano
cm Manaus ou Sáo Paulo, cond uúdas pcl<>s rencnr~ n::vohosos, dul"Jr,un
mcno!J ele um m~.
i-:.m linhas b"-'r.ti~ o~ milit.1~ não tinh:1m om projeto polírico muito
bem ddin<."átlo. Assu~r.ir-.tm as di1<.-s oligârt1uiet.), ma~ não rivcrnm um apoio
cÍL'ti.,'ó das mas.-.:-r.. opcr,:irias. O, tenentes rchdc.lcs eram marCJdc.» pelo iclcal
<lc ..s.,h':ldonismo" milirar que n:i() rinh:i simpatia pelo apoio civil cm suas
rebdi<X"S, l.inda mais vinda de operários radjcais. Nem lioha de peosa,·nemo,
a rcvoluç;io era uma rarcfu para militares "profü.sionais e patrióticos". E só.
Expulsos das capitai.s pela ação repressiva d.as autoridades gover-
nrunemais, os revoltosos se espalharam em ,•átfas colunas pelo interior
do Brasil, ocupando pequeoas e médias cidades e combatendo :IS força!
lcgalisc.as. O grupo que saiu da capital p.auli..m1 sofreu uma gr.1.nde dcrro1a
cm Mato Grosso. Nocom<..v:> d e 1925, oswbrcvivcmcs dn c:olon:t p:mlisra
n.1m:m1m p;a~ o Sol do {Y.IÍS, par:r St:- jonr:a,r ;a uma c<.llona comandada pelo
capit:io 1.uf~ Carl~ l'JUf(.~, C.IUC h:wfa Se l\'\'Olt~c.lo cm $~oro Ângelo {it,)
no final c.lc julho de 192'1. Era o comcçc, da aventura e.la Coluna 1 ~ . a
m:tior,:i.g:a tcncmh-w da Hist(,rin do Kr.lsil.
l>ur:rntc mais de dois .anos, a Colona Prestes pcrcom.:-u ccrc..-;a de 25
mil quilômetros pelo interior do tku;il, tcnr-,rndo mobili?.ar a população
ruraJ contra a oligarquia e o mandonismo dos coronéis locais. Formada por
pouoo mais de mil combatentes, emre civis e militares, enfrentou tropas
legaJisca.ç composcas pela parte do Exércico fiel :10 go\'erno federal, ,ropas
policiais locais e :11é jagunços :a serviço dos comné.i.-.. A "Colun:.1 Invicta'',
como foi chamada, não perdeu batalhas, mas lambém não ganhou a guer-
ra. A populaç~ camponesa não aderiu à causa dos renemes, :1té por fu.Jra
de informação e dl· 011,,..niz:11çôc..-s políticas locais capazes de mobilizá ..Ja.
No começo de 1927. a Coluna~ euc.ll'ninhou para o exílio na Bolívia,
inaugurando uma fu.sc de disput:,15 entre suas lidcr.mç:LS e rcAcxóc.s mais
profundas oobrc como fazer a ..revolução brasileira".
O '"salvacionismo" milicar, conrudo, mosrra\•;1 seus limices, pois
~ a coragem e o voluntarismo dos ~ lL" in1egr.uHe.s náo ba..,;tavam para
mudar o l:hasil. De todo modo. nomes como Luís C.1rlos Prcncs. Mig-ud
86 tU~TÓRUOOlll).SII RI Pfi J,ll("A

Cosra., ju..'Uez Távora, Cordeiro de Farias, João Cabanas se roma.raro muito


conhccid~, ocupando J~ginall e páginas de jornais e livros desde emio.
Mui1os ddc.s ainda desempenhariam um papel polí1ico imporcamc nos
anos seguintes. por vaes cm lados oposcos, como Prestes e Távorn, que
rompc:r:im p ublicamcmc um com o ourro cm 1930. O p ri mdro foi parn
a cs<1ucrda e o Sc.a--gundo par-.1 a dirci1:a. Ambos rc,:p~nram as linhagcn~ e
ambiguidades do tcncmismo dos anos J920.

i\S DISSIDÊNCIAS OLIGÁRQUICAS


f. O l'IM DA l'R IM f.lllA Rf.l' ÍJHUCA

O colapso da Primeira República e de seus arranjos politicos. que


cxdufam ourras forps sociais que njo vics.sçm das oliwin.1uias rurais tr.t~
c,lidon:ais, não .'.IC deu pd;a l!Onh.iJ:. rtvoluc,'io prolcraria <lc.:: :.n:ar(1t1illra~ <.'.
comuni.sras. Os algoies do regime foram as prôprias dissidências olig.ír-
<1\1icas ali:cad:as a uma parte ímpor~nrc dos "rcncnr~ '\ os jovens militan..'S
rebelde~. Ma~ o encontro c,.la~ dil!Si<l~ncia~ oligán:1uic.al1 com 0.'.1 "'rcncn ((.~
não foi direto e rápido. Foi fruto de uma série de anirulaçõcs políticas
feiras a panir de 1927.
Por <.JUC as di~idências oligárquicas, <1m~ <.'3CÍ5th1m d c,.~dc o comt'Ç<.l
e.la lkpública, ganh,; u;1m uma tJirncm,áo import".anrc para a cri:)C hnal <lo
regifne implantado em 188?? Se a Primeira RepúbliCl era marcada pelo
d o mínio dis oligarquias que, apesar das dispuras cl,:iwr-.ais e oonAiros, ter#
minavam por ~e cnrcnc,.lcr e compor o p,i11<..ipal g ru po nu pod<.'1' do go\'t'.rno
fedei-ai. qual novidade. as di.ssidências oligárquicas rep1·esema.r.un para a
polític..'l brasileira no fi.n:tl dos a.nos 1920?
Até meado~ dos ano~ 1920, a di.'.lpu1a p-0li1 ica entre facçóo das
oligarc:p1ias se limitava a <111cstÓC$ sup erficiais na polfrica, como a mbi~
ções pessoais dos chefes patcidários mais poderosos, diferences estilos de
go\·crno ou de adminisrraçi:o públio.. Não havia uma profunda divisão
ideológica ou projetos de socic<ladc ahcrna1ivoJ cm disputa dentro <IC)St"S
grupos. A maior parte dessas facções dos partidos regiot1ais abraçava o
libe,r1Jismo e o feder:tlismo. Nri e<:"onoo\io.) o. m:a..ior p:me das oligarquias
aceitava a lolvoaçáo agrícola" <l.i economia bra)ilcir:i, <:1ue, obviamen1e,
lhes era f.n·orávcl. como grandes donos d e terras e produtorc.:s de bens
A l Q DA DA tfü f()RlA. Ql lR V laARM.\t. RÁPIOQ 87

agrícolas volrados para a exponação. Todos se acusavam muruamenre


de fraudar eleições. e como a fraude era, efetivamente, generalizada, :ué
n~so as facções cr.1m semelhantes.
tvlas, corn(>vimQ.\, a d("Cada de 1920 viu crescer a agitação dos M' l'(H(:S
da SQdt.•c.bclc br:Jsilcif'3 que não tinham csp~ço no jogo d:i polírica olib'2rquica
e dc..fendi:1m omro~ projt't~- Uma pc<(Ucna parrc da e ~ m,xlia u~ na.,
ain,la que dqx:mlcnte dO-\ cmp,x:g°"' gcr-.td~ pda c.."OOnomia agroc."<J)()l'f.l~
,lora, pcrt.-cbia <1ue a política de v.t.lori7.açáo do café etusa ...·a ,lcsu,1uilíl-,rio
C3mbfol <1m.:, :i:o fim, se rr:msfurm:iv:i cm inflação de proclucc)s de primeira
nett:S:Sidade, pois qu.-ue tudo erJ imponado no Br-JSiJ daqueles t~npos:.
Muicc» imdccm.ús e lideranças políticas rcformist.t.S se indjgnavam com as
fraudes eleitorais e com o mandou.ismo dos grandes latifundiários sobre as
populações pob1·es 110 ime.rior do Brasil Julgavam que isto era um iJnpedi·
mento p:tl'a :\ definitiva e.ntf':'lda do Br:tsil no quadro das n:tÇóes ""ci\•ilindas
e modernas". Havia a.ind.'l uma burguaia induS(rial incipicmc, muilo lig;,da
:t0s capitais 1:,,crnclos pelo ctfi:. m:i.s qoc c;omt.'ÇIV:t :t pcru:bcr <1uc só h:n-cri:t
uma t."Í(..1:iv..1 indo.sufali7.a.f?ÍO do Krasil se os inu;rcsscs agr.írios fossem oon·
Cl"..1bal,10ç~d°"' por uma políric-..t C.'Conómk~ fccfor-.11 d(· ino:ntivo à indlÍ~fria
br.uilt:ir.t. t)o bicio de baixo ,la p irâmide ~ ial. o:. opcrário11 Qt'..tvam cada vt..7,
mais O'l,rani7~0.S e combarivos, :1pcsnr d~ rcpn:ssio polida!.
Os jo\·cns {c;ncnrcs, cm grande pane, ecoavam, ainda que de manei~
r-,1 \•aga e confusa. u.sas crhic:as, com a diferença <1uc finham armas par.a

reforçar suas opiniões. Não por acaso. os programas e as proclamações


das revoltas cenentistas defendiam mo1-alidade e1eicor;tl. controle de preços..
leis de proteçio :.10 tralxllhador, divido de propried:tde p:ir.t :1ume1u;1.r os
pequenos proprict-:lrios rurais, c.,;1ímulo à indus1ri2li-z.:iç:ío do Dr:i.sil. E par.a
1t.aliur tudo isso. grande pane das )jderanças ccnemis-cas passou a defender
uJn Estado fone, ;1moritá.1'io e ince.rvencor, que nfo fosse um met'o apêndi•
cedos imeressçs regionais e oligârquicos.
Ao longo dos ano.,; 1920, uma 1>artc da~ oligarquia) tr-..tdicionai~
começou a se convencer de qoc essas demandas não eram descabidas. e
se simplesmente desconsideradas podcria.m levar o país a uma gucrm d vil
de rcsuhado incerfO, envolvendo conflito de- classes sociais e nio apenas
de facções c:la~ elice). Ob"iameme, o projeio de revolução c:le tenente)
e dissidências oligárquic..1.S não questionava o d ireirn 3 propriedade. as
tradições cultu rais e religios.u e as hierarquias sociais, como fuzfam os
comun~ras e :anar<1uiMa.s.
EmR1-anco, o que poderia ocorn:r se houvesse uma C\'entual oonver~
gência de revoltosos vindos das elices e das classes médias com secores do
operariado rebelde?
E»e cr.r o <1uaclro a ~'f t.-virado. "làl fX"~l>(.'Ctiva foi ~in1c1ir~a na fr.i~
proft.:ritb cm 1929 pdo l;O\'Cm<ulor de Minas Gc:rais. 1\mõnio Carto,. ao
justificar a necessidade de reformas profundas na politica e promover avançoo
sociais, lincb que moderJdos: °'façainos a revoluç:to, .t.ores que o po,,o a faç.t".

RU~ OA REVOLUÇAO DE 1930


N.r ~1;unda mcradc <la d{"C.Lda de 1920, :a~ diMklCncias olig;if\1uica)
passaram a defender um projcro político mais disposto a incorporar, ,tlnda
que timidameme. as críticas de outros setores sociais. Especialmence enu-e
âS elites excluíc:b..s do jogo politioo priocipal, como os gaúchos e os "oor-
tbta.\", a11mcn1ar:am ;u, erftiOI~ ao estilo c ao) ,,alorc~ políticos tio~ lihcr..ti~
paulistas c mineiros <1oc mandavam na política nacional brasileira.
Mesmo em Sío Paulo surgi11.n dissidéncfas i1npo1t:uues. A fund:tç~
do P:tn.ido D~noo·3Lico (Po), em 1926, foi uma e.xpressio d:tS criticas ao
c<m,ervatlori)mo do Partido Republicano l'aulism (PRP). parritlc, <JtJe ~
confundia com a o1ignrqufo. domin:mtc no cs:wdo e no Krn.sil.
O ttn:i.me do mand:uo de Artur Bem:udes foi conduido sob ~t:ido
de sítio. cmrc julho de 1924 e dcicmbro de 1926. A rcpressio polític.1
ficou m:ii.s sofisticada. Em São Pw lo. foi criada a primcir:i dck-g.tcia csp<.'-
ciali?.ada cm repressão politica, o Dops. Mais de 10 mil processos foram
in.naurados. Colônias penais foram cri.ada.s n:a Amazônia. A vigilância
sobre a classe operária fico u ainda mais acirrada.
Para a sua.-ssáo do politico mineiro, foi indicado om pa1.1lista, Wa~
shingwn Luís, rom f.ama de administrador moderoo e t.ficitmc. elogiado por
suas rc.aliuçócs no mandato na presidência do cscado de São Paulo (na épo-
ca, os go\'ernadores ttJ.m d urnados de pre:s.idemes). No cargo. Washington
Luís estava disposto a recompor as bases da cnabi)jdadc polfric:;a. e C<ionômica
tia Reptíblica e acalmar as di.ssidências oligátquiCA). Mas não desruidou da
rcprcs:s.io 50brc os mo\rimcntos sociais. promulgando a já citada Lei AníOOI
A I.Q ll.A l).A t1h f(llUA. Q l,_l l li. V IRAR N,\ l\ R.ÂPI OQ 89

de Toledo, conhecida como "Lei Celerada.. por sua truculência contra os


''delitos ideológicos" (em agosto de 1927). P1·omm·et1uma refonna coiutitu-
donal. (!ando à União a prcrro~uiv.;i cm legislar sobre <1u<."St6l'S trab.-.lhht.b,
démOnStr,mdo o quanro o tema tinha entrad() na p.1uta nacional JX"la p~o
cio movimcnt<>Opt.-r:írio e pck>medo dt um-:i n.wluç::io prolcciri:1 :;ob ins·
pi~ç:i.o bc.1ld,cviquc. No começo do seu mand;tt0, consc:guiu :ué o apoio
da oligarc:1uia õ3(1d1a, M:mpre dispos1a a <.1uctionar a hc:g(.·moni:I p.-.uli~.
nomcanclo G<.ilíliv Var<.;~ corno ~u min~,:r() da Fa1.cmfa.
Enm:t:mf(l, no proccs:;o suc~sório, \'V'::ishington Luís cometeu um
eno de dkulo, indicando omro pluli.sca, )lilio P1~ res, para subst:ituí-lo. O
prccirio equilíbrio compcchivo emrc S5o Paulo e Minas Gerais, uma das
bases da estabilidade política da Primeira República, se rompeu, em um
momemo em que n::io foi possível recompor :lS alianças para dar sustenta·
ç:1o à polÍlica siucicionista, alicerce central do regifne.
AI:> lado dos gaúcl1os.. os mineiros pre,eridos 11~1 sucessão fonnaram
n Ali:mç., Liberal, cm sc.."tembro <lc 1929, encabeçada por Gt..·tülio V:tfl.':1$
e João l'<.SSOa, ~na c:c.1mpctir com a chapa cnc:abc:çadi por J(1lio Pru.tcs.
A c~mp~nha (li Aliinç; Liberal foi in<.wador.1, dc.·fcndcndo de mandr.1
mai~ a.mtu ndcnrc propu~,:; n.:formi~tas a >erc:m wndu1itlas pelo ÍU111ro
b'Qvcmo, obvi:imcnrc dentro d:i <mkm social vib't!mc. O tema do nabalhc.t.
da moralidade eleitoral, do desenvolvimento econômico com b:i.sc na in~
dll.Sfria e d-a educação deram os rons dos comícios. Mas a máquina política
do PRP e do governo f«icl'al por de dominado foi mais forte e eficaz.. Nas
eleições de m.aio de 1930. Júlio Prestes saiu \Titorioso.
Em que pese a indign.:tçlo dos vencidos e 1s óbvfas acus:1çóe.s de
fr:iude, :1 polí1ic:i p:uccl.1 ...oltar :ios crilhos de sempre. M:tS n:lo foi isso que
oco11't\1. Muitos u:ncmes tinham retornado do cxilio e cominu.a\•am a coris·
pirar comra o governo. Nos quffléis, fu.b.va-se e1n wna ''Terceira Re-.'ôh:i ·,
cm continuidade às dt· 1922 e 1921. Mas dc.ssa ,·cz.. comando com pane das
oli~rquia.-. d i~ idc111a.. :.obrctudo mincir-~ e gal1cha~. di~po.ua.s a p1.1;.1r cm
armas, a cois.'I prometia ser mais o~ni?.ad:i e :micul.,.da. Importantes líderes
civis que tinham apostado na dcrro<ada Alianç.1 Liberal, como Antônio Car~
los e Osvaldo Aranha, encabeçavam as arriculaçócs com os militares rebeldes.
Do lado dos rencnces, entreranm, nfo havia consenso 1obre quem
lideraria a ... ICrceira RCYolra". O mais fumoso miliror rebelde, Luis Carlos
Prestes. assumira posições mais à esquerda no ~u exi1io em Buenos Aires
e negou-.se a liderar o 010\'imemo armado contra a oligarquia., pois defen-
(lia uma ação mais aniculada com camponl.'S<:S e operários. dc\•i(lamcncc
c<>manclada pelos rcbddcs rnilirarc$. Prcsccs ainda não era oficialmente urn
c1u:1dro do J~niclo Comunh;ra, como viria a :iconrcct..-r nos ano.s 1930, m::is
esrav-.t pr(>ximo de um socialismo n.'Voh1don;irio ( I UC njo se dispunh:1 a
aderir aos projl'10~ moderados e rcíom,i.s1:a~ da~ olig-.trquias dissidente.
O a.s..-.:-m:in:uo ,lc Joâo P<.'™13, p~itlcnte da Pamíba, cm uma eonfci..
t3ria do RL'Ofc clcu novo impulso à <.1.m .spirnçft0 conn:a o rcb'1mc. Os jornais
fl2e1"Jm grande :tlarde sobrt o caso, sugerindo um :uentado polícico contra o
ex-candidato a vicc-prcsidcmc da Aliança Llbcral orquestrado pc-los a.lfados
dos vitorio.ses. (Na "erd.1d.e, o moÜ\'O do assassinato estava mufro ntais liga-
do a questões de políti~ escadua.l m.esc-l.1dts com moliYaÇóes pass.ion.1.is.) A
indig,1.1.çfo ein parte cb opi1frlo põblic:t, que j! tinha críticaç :\O domínio cfa
oligarquia pauJisra, foi aproveitad..'l JXUõl jusüfk.u uma nova rebelião.
No começo de c,1urubro ele 1930, i:,'Uamiçôcs milit::!rcs rebeldes
apoiadas por lideranças civis das dissidências oliwírquicas relx;laram~5c cm
Min;i.) {;çr-.1.is e no Rio Gr.inde do Sul. A partir (lt~ t-::.r-.w.fo. os r,~olroso~
rapidamLTltC chegaram à fronteira ,k São l'·.tulo, onde~ t:JSJX:r"a\'3 uma
grande batalha enne :.t~ furç:1s lcg:ilisras e a po-derosa l.:Orça Pública pauli.sr:.i.
Pernambuco e Par-.tíba rambém se n:bcla~m, dominando quase t0do c,1
Num:, à excc~o Ja ttahia. M<.-smo <:m São Paulo, ainda conrrola(lo pdo
PRP, o P.irtido D<"mocrâtico tornou-se aliado da Revolução.
Quando a guerr;1 civil de grandes proporções parecia ser inevit:lwl e
fora de co1urole, em 24 de outubro, ull\1 jmua militar depôs o presidente
W:ashingcon luls, pivô da crise com as ou1r:u oligarquias cs1.1.duais. A c-$pc-
rança de generais e almiraill<'S era negociar com os rcbdd('S e acomodar os
interesses políticos em jogo em um;1 grande conciliação política nos mol•
dcs crndkionais. Conmdo, os rebeldes não se dispuseram a tal, criticando
,lurarncncc O) polícitoll ~carcomido~" da "vdha• R<.1)11blica.
No dia 3 1 de oun1bro. Gcn"ilio Vargas. que ,u é p0rticipar:a do governo
·,~rcomido" Washington Luís, chegou ao Rio de Janeiro na condiç.io de
líder da "Revolução de 1930·. Foi aclamado pela multidão e apoiado pelos
..cene1Hc:(•, que, enfim, 1inh:un d,egado ao pt:Kler. Ern 3 de novembro, Var•
g.ts foi empossado oomo chefe do Go\'crno r>r<J\•isório da no\'J República.
AI.Q DA llA t11'ifÓR1A.Ql I RV IRAR M.\bRÂPl[)Q 91

A REVOLUÇÃO OE 19i!O E A HISTORIOGRAFIA


l,'ma d:is maiore:s poll micu hi:saoriogrJfieis busileir.lS t.e dtu e:mre o., anos
1960 e 1980 cm tomo du inK"rptctaÇOC$ acerca da ~vluçâo de 1930 e s,cu
impacto cktivo na hL!lóri;a do Br.asil. l Lavia acontecido uma n;volução, efetiva·
meucc:? f..,,._-.,i rcvi:iluç,io linh., rc:p~cnmlo a a)o(clh.io d.a burguesia indumldl ou
as olig;:irqu~s di.sF..1'ç.'I~ conrinua~m no poder? Q.w ci1tb2 sido o papel do ope-
mi:tdo e ,:b •1ut::1 de d.uses" nos eventos que de,rub:m.m 2 Primdn. RcpubliCl?
F..»:~ .ernm ::i~ prindp;iit 1'p 1~1(1<s, pur.1 ~ ,11i;iit :,~ neipt)~l:~i vuri;1v.1f11, oonformi:!
:as ~cns ceóriClS e icloológi<a.s dos dh-c-1sos h.istori:ldorcs que se debruç.trillll
sobre o tcma. llouvc uê-.s posições cm dcbaoc sobre a Revolução de 1930.
Uma primdri, p(:()içlo, lig.,J" atU imdcau.)h. do i';u 1iJ o Gumun i.)lJ , ,lc-
fcndcu a te.se de que d.1 foi uma ~m·oluçio burguc-$i.· . que opôs a olig.uquia
ofcdri à dilc indumial. ~pot'lda pd.u daMCS médi~. O ccnc:tuis:mo .1'.Cri::1 c:xa·
1.u nc:nlc: J c-p~.io c.1.., r.1di,c,li)mn tb d,1-:)C média, c:unlc., nnc: um d o-, aumre$
dcss::i corrente, Virp,iJio Smr:::i Rosa.
Nos :t.nos 19(,0, surgiu outr:i tese, d e- claboraç-lo mais sofuticacb e coerente
()(1111 :1$ f(mlcs 1l(1Uu 11t:umis t: Joul.,,s, Aut()l'eS, cQ111() R()r b F.ms1v , tldcndier:1111 :1
idda de- q ue- o mO\·imc-m o ocorrido cm 1930 si&ni&ou um rc-.uranjo politico:
cau!OU ccno .."uio de poder"' momcmâuco, preenchido pelo ·'~cado de com.-
promis~" e pd.t ,dinn.t1,,fo ,I;. buroc,u;i;1 (c:tlcr,tl tJuc M1~1c111.1va Gcuílio Varpt:.,
hábil n:i acomodaçào dos intcrc$SC$ <:m jogo.
Vor fi m. nos :anos 1970 e 1980, uma posi.ç:lo hisroriogr:ific.2 tuik21, de-
fendida por falgur de Oc:<a.11, (;ri1i,oou 11 pr6prb c1i~1ê,1ci~ c.lc u11111 · ,evolução·
cm 1930, CS\'21b .udo o fato polid co que levou Gmllio V:u~ 1 0 poder idc-nd-
ficando-o como mcr;a opcraç:io ideológica e discursiv:t org;miWa pua afasc.tr
..,. vc:rc.l.K.lcim d a~ TC\'Oll1cion;Íria" d(> 1:ioJcr, o~ opcdritXI'- 1\ar~ Qll dcfcn~)r'CS
dc5Sa corrcmc. não hou\'C' "vazio de poder· . ma.1 a impla.uuçio, no no,,, jogo
político que ~gr.iva o Estado. de ·uma l'IO\~ hc:g«."ll'l<>nia", tXA:rdda agar.a pda
burguofa indu,;tri..tl.

Brasil Novo
rupturas e
continuidades:
1930,1937

O GO\lf.RI\O PROV ISCÍRIO

O r:ípido triwlfo dos que se rebelar.tfl1


contra o goH~roo Washingto11 lui$ ~. por ube-
ld, dcrrub,u.im c1 Primei ra Rt pi'ihli(._;1., <..fiou um
dirna de euforia 11,1 vida polític.t brasiJcir.1. O
TI(l\'U contcxrc, indie;1va q ue 3S o ligarqoi.t.!> mais
conscrvadoros que dominaram~ Rcptíblic;i desde
seu início es1:1va01 afanadas do poder ceorr:i.1. Esce
~:ria con1rolado por um Gov<.'fno Provisório até
<1uc unM nov-..t Cm,..,,ituiçâo fo,sc dahormla.
O Congresso N,1cionaJ foi disrolvido e fo-
ram nomc.1dos interventores cm rodos os c.sr;1dos.
qUlSe Lodos veter..tnos das revolus ceneruist:l.S. A
p:ihvr.i de ordem er.1 construir um n OH) Esudo
qrn: não fmsc m<."ra 1:xpre~o do jogo polhit.o
dominado pd.u oligarquias mais podcros.i.s e SC:Ui
partidos rcpoblicanos regionais.
94 tlN TÓRl,'001~\11 RI P(lll a;'A

Mas os grupos que com.aram o poder em 1930 - uma coligação de


dissidências oligárquicas e •cenences'" - c:unpouco eram unidos. Se codos
concordavam que cr.a preciso construir um novo poder ccn1ral e reformar
":irios a.-.pc:Ctú S da s()<.':iédadc b rasilcim, divergiam quanto a,,s caminhos
pnr:t chcg:1r!l CSS\."$Objc1ivos-. Os ..,cm!ntQ."', reunidos no Clube 3 de Oum-
bro, tlcfondi:am um governo forre e cc:nrr.1li1.ado que mrd as~ .a socicd;idc
e i111crvic_.,.,c 11a econom ia. Já o~ lidere) polhic..1J~ do novo regime.:, <1ue eram
oriundos das d irQ política) traclitionais, ~e d ividiam entre a o pção p()r
um libcr:ilismo :ibcm,1 a algum:1S reformas $0Ci:.lis e o :mrorirnrismo como
c:uninho p:i.ra a moderoiz.1çfo do Brasil. Os gaúchos) he,deiros do posili-
vismo que dava o 10m da polfrica csC2.du.i.l dcsdc o final do sécuJo XIX, eram
mais inclinados à ideia do ES1ado imervemor. As dissidências oligárquicas
mineil:as, outro imporcance polo de sustentação do novo J'tgime, apoi:.wam.
o libel':tlismo como principio> temperado pelo pragm:uis1no polfrjco que
lhes pcrmiti:.1 compor com os aulOrilários.
1)csdc <.1uc chcgarnm :i<., p<.l<lcr, os t,trUpos do novo regime manrl-
nham-sc cm tenso <..'((uilíbrio. E, cm meio is Ct;nsõcs cnrrc lilx;~is e; au,
roriclrios, consolida.,,..i,sl· a lid1.:r-.inça de G .-nílio Varg:as que, <k manti~
hábil e p ragmátiai, f.11.ia o papel d e mL"tli:Hlor tlc inti.:n:~cs cm conílito,
L"Yirnndo romnr mc..'<lidas L-Xtrc..-mas a fuvor ou contra as tcndêndn.s políticas
cm disputa. O que unia todos os grupos., no momemo imediato à wmada
<ll· poder, era isolar o~ p.aulisr-~ <lo PM.P, ~ gr:rn<l~ perdedores de 19.30.
Essa, cmrctamo. não era uma cardà fácil. Além da imponânc.ia política
d.1 oligarquia paulista, havia ao menos dois cenl:lS sensíveis que envolviam
o esudo de S:lo P1ulo e lig::l\":uu s-eu desüno 1 polític-J nacion1l: o c:Úé e l
"quest:i.o opcclrb".
A economia br.uilcira, fcig.il e pouco produdva. dependia das divisas
getadas pela expon:1ç.ão do café paulista. A gr;.1nde crise do capirali.smo
mundial. iniciada com a qut-bra da Bolsa de Valores de No~·a York cm
ou1ub ro tlc 1929, 1inha e:iu~do ~ra1l<k1> perda" aos caÍcia1horcs, O~
mcl"C.ldos intcrn.-icionai.s se rcrrníram. o crédilO p:,tra cxport.tçâo diminuiu,
Não por a.caso, o novo governo - que prometia divcrsifka r a economia
brnsilcira e não mais organiz:Ua cm função das políticas de valoriiaçio
tio café q ue t:uuo desagradaV'.im ali cla~s méd ias dali gr.rndcs cidado e
a burgocsi:J indusrrial - lCYe que fuzcr curamente o comr:irio. Em 1931.
~RA'IU '40',0- Rl'Pl lllt.i\'i 1 ('()Nfl~lflDAOl 'i 95
para indignaçáo de muitos "revolucionários'", Varg-as autorizou a compra
de estoques de café com recursos públicos, :t.lém do pe~o de dívid..1S dos
caíciculror1:.:1 oom o Estado e a qudma de milhares tlc sacas do produto.
No fim<lo. usava a mesma fõnn ula da Primeira Rcpllblica de ..S<>Cializar as
perda$"', com <) governo c:ompr::mdo o cxc:t."$$() de produçfu, cio e:tfé par.a
diminuir~ of4,·tT'.t do merc:ido e, consc;quenrcmcntc-, :mmc-nrnr os preços
intcrnadonai~ do produto.
O n<,,vt;> b,'O\'crno, ponanm, n-wnlKx:ia tiuc a economia hra.\ilcira
cr.1 a,lmplcrnmentc- dcpcntlc-ntc do café. O p:iís oompr.av:a <.1ua5e todQS os
maouF.uurados do ex1erior, produLia pouco alimenco para sua populaç1o,
por cont.1 dos imensos latifúncUos improduli\'OS ou volt.1dos pa.ra a agro-
exporcação e precisava de divisas. ou seja, moe.das estrangeirJS aceitas no
coJnércio i11ternacional, como o dólar e a libr.i, para imponar os pl'odutos
e pa~r sua dívid.1 externa. A a.hern2Ü\'2 a ess:1 política de valori.z.1çfo do
café seria modific::u, de maneira radicaJ e abrupta, a cstrumra social e eco-
n(,mica cfo Hrasil o que não <.-srav:.i no.s planos dos novos f:.'O\'crnanrcs-.
Os •rcvuluci<.m:í.ri<.)S de 1930, TI(.\ fi.md<.l, qucrfam apcn:cas uma reforma
polí,ia e não uma n......•oluçâo wcial.
A ''qtK~cio opt:rária" cra parric:ularmt:ntc ,\C:nsívd na cidatlc de $ão
Paolo. A capiral do csr:.iclo c:c.mccntravu um gr.incfe c:onr-ingcntc de operá·
rios, <.'flt:io ainda moito ligados idc;ologiçamcnre ao anaroossindicalismo. A
repressão do b'Ovcmo tinha cnfraqu<:ddo o ímpeto <lc luta das o"Wlni1..iç6~
sindica.is, mas o fuco é que a classe operária. ainda que diminuta. era uma
realidade social e política que ga11hava impord.11cfa política e econômica
cada ,'t'.L nuior lll vidl brasileir.i. Em Sj.ntos, o sindictlisino de blSe co-
munista era import:mcc, conccntrJdo nos u-alxill12dores do grande porio
por onde emrava e saia a major pane dos bens econômicos imponados e
exportados. Ainda concentradas em poucas cidades, a das se operária e suas
organizações sindicais e polítie.tS não foram protagonistas principais dos
c.:vcruos polhictr.. <:1uc c:ulrn ina.r.-1111 na <:1ucda da Prinu.:ira Rcpl,blica, rna~
cr.t um futor de rens.í.o ,ocial a ser considcr:.ido no novo rc:gimc. Não por
aci.so, uma das primeiras medidas burocráticas do Governo Provisório foi
a criação do Ministério do Trabalho, cm 193 1.
Em São Paulo, o opcr.iriado e w. "tencnu:.s" ensaiaram uma aproxi•
mação qoe dcsagradoo as elites tradicionais p:.n,1lisr.is. A criação do Parti·
96 t11'i T'ÓlW,D.">1t,\'ma1p(111 ~ A

do Popular Paulista (PPr), Uderado por Miguel Costa, um dos líderes ,fa
Rc:\•olução de: 1924 e da Coluna Preste:$, c:rn :a c:,:pr""t,,sáO mais dar.a des:;a
aproximação. O l'f'P <.'Stava muito longe de ser um partido de C<.'11déncias
anarquisras ou comw1is:ras, mas a mera poss:ibilid..1de de um parcido de
mass:t.S ligando os cenentes mais radicais aos operários deixou a siruaçlo
cm São ~ mio :lin<fa mais explosi\1'3.. A poderosa oligarquia do est:'ldo b:in-
c:lcir,mu:. tksalojada do poder cm nívd k."<lcral, ainda dominava o po<.lcr
regional. Era apoia<l:i pcbs c.h:;:;e:;: média$, que con.sider:1\1:tm Gc.'tlílio V:u-
gas e o autoritarismo do Governo Provisório luna "dit:tdut:i usurpad ora do
poder", di.sposra a humilhar os paulistas.
No fin3J tle 193 1, muitos lí<len.~ liberais e fcdcralb:r:i:; de outros ~ta-
dos c.1uc h:.aviam apc.1fodo a rc....,•olradc 1930 rnmbémcsmv:.am dc.-cep<.ionados
com o ~,ilo pcr~on:all5ca de V~rg:b e pn.::oClll'>:&<.k~ com <."X~ivo 1,,pd d~
..,cncmcs'" no Governo Provisório. O quadro para uma nova guerra civiJ
escava dado.

A RF.VOI.TA rAUUSTA OE 1932, H TSTóRTA E MEMÓRIA

A ch.:un:i.da "Rt:\'Oluç.to Conuiru<ionalL~c:i de 19,U ... como 2, hi~toriogr:ifi:i.


o6d:ll p::iulist2. (cujo m:tior exemplo fo i Alfredo L:.llis) nomeou ::i rcvoh2 conr12 o
Co\-crno Provisório de Getúlio. f: p2.ne de um quadto m:tl:s 2.mplo de conflitos
políticos e sociais que .se seguiram à queda da Primeira República.
A l(cvoluçâo de 1930 hav~ sido fruto de urna alfança enu e di.ssklênc:ias oli~
gárquicas e milimcs tcbeldC$ (~ ,cncnrisw"), a1 dcub@ sob um progn.nu di~
fuso. Os ..,cvoludonirios'" dcfcndbm 2 mor:1.li1.::1ç:.o eh<. ckiçocs. con.n:tntcmcn~
te fr2.U<bdu n2 J>rimcir::i RcpUblia. e o desenvolvimento «onómico do Br::isil
afutn.do d.a depcndC'ncia histórica do café exportado. As Hdc-ranç2.s de Ccn.i.Ho
Vargas. cx~mininro da P, imeira M.cpública, e do general Gócs Monteiro d:,,c o
Ex:érd10 ainda não esrav.am coo50lid::ldaJ.. Mim, ao longo de 193 1, as ren~
cnnc os dhen~ grupos que se unlr:un p:t1':I. :1.c::1b2.r com o domínio p2ullsrn do
Êst:tdo bruilciro momamm..sc dar:li e cvidc.ntc.s. P:u::i u olig:uqui1s dis.<.idcntc.s
que :tpobum a Rc\·oluç.io de 1930 era pr«iso "rcconscjrucionaliui' o 81':l.Sil
cm ouátcr de urgênci:a, co1wocando clciçócs para uma Assembleia Constituimc
que rcpactu:t$SC o jogo do poder tnU( 3."I tlitesc-Ms, J.í par.1 os-mM:1m.:s"', 1"t"uni-
dos n2S Legi~ Re.,.olucionid.2,s e flO Clube 3 de Ouruhro, o melhM caminho
p3.r:t mot2.lh:1.r e desem·olwt economiQmenrc o Br::i.~il eu um:t d icadut2 que se
apoiMsc ru.1 m;a.s.s;,u uab.alh:ador.i.s e r1..-'io dcpcndcsK ma.Í.'S do jogo dcitor~ das
dite., olig_.fr()\1C$..
97
F..1n $:li) l½ul<), o é:S1'-2do que m:iis perder.a Cl()m o fi m d1 rnn,en:·, Rep,íhJi.
Cl , :u tensõe;, polidc:'ls desü n:ltuw"t er:im particul.u mente graves. Mesmo o
l\lrlido Oemoc.rátioo, dissid~ncia do t)arrido Rqmblkano P.mli,ta que apoi.:irn
.t Rc\oluç.io dc 1930, n,io íicou .sa1is(d1ocom ;a nome:IÇIO do intcrvc11mr 110 o-
mio. ocoroncl )oi<> Albctto. pcmambu<ano. tcnc.ntin.ii e esquerdista. A prcsd:o
co,ura de foi 1:um1.que Jo.1o Aberto rc-nun<iou tm julho d e 1931, m:as:i situ-iç:io
cm Sio Pmllo não se acalmou. AJCm d-de, Migud Cona, o Udcr cb coluna histó-
riQ. junto com Luís Carlos Pratc.s.. era uma sombra pcrigoS.t que p;iirav,.1.sobrc
as cfüa paulisw. Costa C'tt.sa.i.iwa um.a apro:tlm.iç.âo com o operariado. au-avés
da fornus--ão do P.u údo P'opul.u Pauli.s ta.
No começo ck 19.U, Vargis d:i.r:1.mcnrc m:anobnV'1 p::tra CS\·niar o poder
do.s rcncmi.st:l.s m-llis r.:tdic:üs, f.ucndo um movimento de rc3proxim:iç¾o com
as v.inas olig.arqui1S r<"gjotuis que aii;fa.m a · rcconstirucioO..Uiução" do Brasil,
que no fuudo era um caminho para ,,oltarem a ter iidluênda policie~ Nessa
dircçio. Rio Grande do Sul. u.ahia e n1<snl0 Minas Gerais. para não falar de
Sào P1ulo. e.s1:w1.m e.m pé de i ucrr1 com o GO\,cmo Provisório. Cm ÍC\'Crtfro
de l 9J2. 1 promu1ga,çào de um1 nM':l Lei C.lciror.tl, dclinindo 1 s ddçócs p:a.r:1
:1 Constituinte, p"ll'Cci:a ser o map:1 d:i csmtda pua acalnur o ambiente politko.

t>ara contemplar o.s paulisw. VW'.,.as nomeou Pedro de 'folcdo como imervcn"
coe. ele era "paulista e eh•il". tal como cxigfa a )~rente Única l'aulina, sw'gida cm
fevereiro de 1932. fruto d:i uni!lo do f'Rl' com o f'D.
'li.ido p:u-cci.2 se encaminhar p2.r:a o aceno... m:li 1 dc-prcd:içio d:i. sede do
Ditirio Cttri0<11, crítico do Go.,.crno Pro.,.isório, azedou no\f':1m:ente as rcl-2.çócs
e111 rc ,u <.>llg.u qui:11!' lil,,c:rais e Q• lencntist,1$, â)m .t~ primdn.tS aci.1s:mcfo (~ \1lti 0

mQ,\ ricl., de:;truiç:io 111.1 j(lrn.il.


F1n f. o:. ,k: rn.1k,. ,t )ilu,ll,;;., ,lc Sâo l\11110 M: nulicali,.ou. A \ i~il,1de Q,ç..,,11,cfo
A,:inh:i, cons:idcmdo o polí1icoô\'il m.1i< JHó,imo doi. "tcnct110"', minimo tLt fo.
1-C"n<la do ~.m:rno Pro,.•i~rio, foi vi~u conk.l um;a provo<.uçfio ptl:is dhC$ libtrais
pauli!su,I.)., NtJ dl.l 13 de m:i.io, a to111,uiv;1de u,m1.1r dca~1lto II s«ledo l\lrtiJ o Po,.
pul~r l',,uliH;1 terminou cm 1in.Jtcio. t.:~,m 1111;111~ e Ícrido:,. A -'igl,1tlH inici.iis dt1s
mono,,. - Martin..., Mit31§ti.1, ÍH;1w,io e \..:amargo {MM1x·) - ncm,c.1ri..t ,1 :,c,c.ic:t.fatlc
.:«reta criada c:mlo p;1r;1 prepar.it umôl rcvoh.1 :ar111.tda contra CC't{1lio.
F..s~ tt"Volta e,c-plodiu cm 9 de julho. São Paulo cspcr,11w. :i adesfo de tod;a.s
as Íacçoes Q:f'J.du.us in.s:msf'dtaJ com o b'O\'Cm o de GctúlN.J. i\fas es.tc c:onscguiu
..._p;1,.igu11.r o R.M.l Cr;mJc do Sl1I. l~hi;1. e Minu Gcr..._i~. csv;1.úa11<lo uma pt.:,nívcl
.1li.1mç.1com u$ p;auli:,c.a'l.
/\ opin jjo 1ttíblica p;iulist.t 1>arecia ecoar:, pgl.avra de or-:lem dcícntlid:1 por
Monteiro Lob:110: "hcgcmoni2 ou .st'p31'.tçior, N,a ~,d.,dc. nenhum grupo po·
lit:ico do estado .se org;miza,..,. s,cri:trnC'ntC pua s,c ,çcp,uu do Bmil. As dites
pau.li.stu.J 5abiam que o c.st.adQ, por 111:a.ii rioo que Ío3ôSC, p~.sa.r.- d.., mtamc do
1\r.i!!cil. de 'ICU5 rcxunc)s, mcrc:1&:Me impmtos.
98 tlliTÓRUIX)IIU'>II RIPÜll>.A

$lo Ptwlo oomb.11tu :a$ lr()l):lf d,o govenHl íedeul por ')u:'lse t ~ t!'l<$d.
Ape,;.'l1' do poderio reb1ivo do C$t.'ldo, e da ampla mobiJiuçío da sodeJ.ade p:iu·
lht:i, sobrc:mtlo W:t.'lo dilo e: cl.N,c:1> m&li~, o c:nf1c:m2m('t1to mili1,1r nlo foi
be,"•suc«fülo. Em me.ti()$ de s:erembn.l, o oom:aod.1n1t•gtt2l, gener;:il Berroldo
Klingcr. já negocia,·:,. uma pai scparadamc.nt(-:. contrariando parte da opinião
pU.blica pauliml. A rcndiç:io \'cio 2;) de outubro.
O pragmátko Ccnilio .s.abia que o Bra.si.l também prccúava de São l'au~
lo. e c,•itou retaliaçócs cxceuiv-u :aos p:auli.scas. O ifcrcntcmenrc de 1924.
quando :'l cid.1de foi :,uC:'ld:'l de forma " iolen1:1 e :i. rtpt"e$$!iO foj (li.s~eminada
c..orur,1 seu, habi1:1t11cs. ilcs.ia "e;, o gt)'·c:rno Íc:tlcral prc:Íc:riu u ma rc:prc».Ío
~dC'liV'.a, c:rn'i:imlo piam o t"XÍliO m lídc:rc'~ m;iis dir-c:1:11nc:ntc: c:m·<,h•ido$ n:1
l l'!\IJlt:1 (n h:1n i d1JJ 11() H)l.al).

A imHabilidadc dos ~nos cntTC 1931 e 1932 e~ um sin~I d:ca pn.'(.'..Íria


convivência polítia que car.1.cteriuri:1 os 30 aoos s.tguintes d.a hisrórfa
republiC'\n:a bra.sileir.1. Por um lado, h:avi.:t uma olig:arqui:a de base rurJJ
dividid:a cm~ li~rais :ur.1ig:i.dos i, ,·elh:i., prát.ic:H polhic:a.s tradicionais
(fraude eleitoral, liberali.smo con.scrvado1; corondismo) e n:formado1n
dispo$l0S i modcrnii.1.r a. economia, reconhecendo a necessidade pr.1gm~l·
tica de <liviclir o p()d cr com ou~ grup<;~ políticos e ~ociai.$. A buJTt,UL~ia
industrial, impomnte cm algtms esr:ulos c()m<,1 S.iv Paulo e Rio de Janeiro,
ainda era pcqucn:,1 e p<..lli,icamen,e dependen te cios f.t1.efK.lcims que domi·
navam a eCQn()mfo nacional. Por outro. no andar de b:,1ixo d:.t socit.'<lade,
h;i"fa t1m3 classe opcr.íri-a qoc se exprcssav:.1 :ma1,,:.S de sl1.1s Ofb~ni1.3çôcs
sindica.is. mas n:io tinha nível de organi2:1ç.fo polJti~ par:1 impor um
projeto polltico socialista e revoludon.i.rio à sociecb.de em seu conjuüto.
No meio, uma classe 111.edia pequena, depeodence dos empregos e fiel aos
valores das olig.trqui:u às qu.·üs servi.1, seja como ÍuJ)cion1rios públicos, sej:'I
como profüs:ionais liber.l.is (médicos, :advogados, comerc-iames 1 geremes).
fü1c era o prcclrio "~rado de compromi.s~" inaugur.1<.lo cm 1930,
no <rual a força im.·rc:ial da velha ~ocit...Ja<le rur-,11 cocxi~1ia <:om a bu!tea da
m,x.lenfr1.aç.ío wci:al e econômica. Cabia ao Governo ProviM>rio t.'quilibr.ar
~as demanda$, sem ameaçar a ordem ~ocial mai.$ profunda. Mas a $OCÍC-
dade brasileira. pela primeira vez na sua história, parecia dividida cada \'f!'I
mais cm projeto$ e visões de mundo inconcili:í.vcis.
mV.'iU W'0-11.l'P IUR.A'II ('ONTl~lllPAOl'I 99
UMA SOCIEDADE EM EBULIÇÃO
Êr.t p rocis(>institucionoli1.ar c lq,r:Jlizar o novo regim e O<111anto ames.
p:ara evitar nov.u rtVolt:u e n,•a:úar a principal critica d os liberais paulinas
,·cncido.s, a de (1ue Varga) era um ''di1ador usurpador e ilegítimo". De fato.
,,;íric,s atores ~ciais cxii;iam mai:, particip:iç:io na vid.:t política nocional e.
em gt.1.1lde parte, a d1amacb Revoluç:to de 1930 linha conseguido adesões
a partir de uma p romessa de mab parti<:ipação e tlcmocr.«:ia. Não cr.i mai)
possível ignorá-los.
O lcvamc p-.iuli.sra. cmbor,1 tc..-nha sido dc.--rro12do n~ :inn2.s, fc-, com
que o Governo Provisório agiJiz.assc a convocação da Assembleia Cons-
riruimc. Otnro dc.'$d ohrnm ento import:mte da nova posturo de Cc.'ttllio
V.1.rgas, e d o gt'upo ma.is pragm.:iüco que o cercava, foi a diminuiç:l.o do
poder dos ..tcncmcs"' e de seu ímpeto p:.ira renovar as instituições rcpubli-
can:tS e ~ubjugar as oli1:,o:1rqui:as rroclicionai.s a qualquer p reço. Dcp<JÍS de
e.xpetimenur wn auge do seu podet' emre 1931 e 1932, com a :ull:'lç:fo
tio CJulx: 3 de Outubro, o~ tcncnt~ta~ cumo grupo polÍtico aurt>nomo
foi sendo esvaziado pelo go\•emo Vargas e pelo próprio Exército, disposto
:1rt;a,lmpor e rcfor~r :1 hicrarqui:a inccrn:1. l':J:~ Varg.i.s, :algumas lidcr.in~
ças desse movimcmo poderiam ser aproveitadas como quadros do novo
regime~ m:.lS não de.veriam dar o tom d.a política nacional. O regime. não
podia, pcl:a $ll:I própri:a origem nas c.~itcs regionais que rompçr:am com 2
Primeira Repúblic.1., se a.fost:u completa.mcmc d.u olig;uqufa.s tradicionais,
sob o risro de perder apoio nos C$t~dos da federação onde d.1s ;.1ind .1 cr:.m
muito infl uentes. V1rgas e1lleJ1dia que 1 reconstruç:fo do Estado rwno a
uma maior ccntr.1fo.açfio pulhita e 1noc:lcrni1.ac,'áo t--conômica <kvcria ser
combinada com a manutenção da ordem soei.ai.
Para a aha oficialidade do Exérciw brasill~iro, o n·ncntismo era
vi~co como uma f'aca c.lc dois l)Umc:i.. Por um lado, era comiidcr.i.do um
movimemo importante, ao exigir maior protagonismo dos 1nilitares na
vida polfrica. Por omro, expressava a faha de comando das alra.s paccmcs
milirarc.s (coronéis e generais), pois os procagonist,:is do movimento eram
milimrc:s da baix:;1 oficialid ade (tenentes e capif:ncs) q ue, cm princíp io.
deveriam se subordiu:i.r às 1.has p1temes. Nos 1nos 1930> percebendo
que esta <Lucbra de hicrar<Jtaia e a forma impecuosa pela qua l os cenentc:i.
awavam na vid:;1 política eram ameaças à un idade do Exército. iniciou-se
100 t11'iT'ÓlW,D.">1t,\'ma1p(111 ~A

uma ampla reforma adnünlsmuiva na área militar. Conduzida por Góes


Mo ntei!'() e Eurico Gasp:n Dutr:a, essa reforma vi5:1V2 fort2k"(:er o gcne-
ral:uo e 1-eforç:U' os elos hierárquicos com a baixa oficiaHdade. Monteiro
resumiria <.-se-a C)tralégia com :1 írasc: '•( preciso ac:abar com a ,,olíri(."'3
no Exército, para fucr a polílica do Exército"'. ls.so signifi c-iva que o
Extrcito, como ins1ituis-'át> buroc:rácica de l-:...,tac.lo, dc\•eria interfe rir na
polítim nacional. Para esse.s militares. o Exército deveria funcionar como
uma espécie <lc poder fUtebr $(.l brc a sodabdc, a p:1rtir do que :i alt:1
oflcialid:1de milira.r julgava ser os "interesses nacionais": modemi2ar :1
economia arr.i,'<:s d-a indu.!trriali:r.-aç:io, promovçr o culw :40 n:1cion2lismo
acim:.1 dos i1u c.rcssc:5 rcgionali.s1:.1.s, promowr a i,u~gr.u;:fo do 1crri16rio
n acic,mal e garantir a o rdem social ''criMâ e ucidcnt;1r. Este t'1ltimo pon ..
to traduzia o medo de u ma revoluçáo social.is1a prolc1árla que mudasse
compkt::1mcntc a csrrutura e os v:.ilorcs dominantes na $OCÍccbclc.
Com o esV32i:.unenro do 1enemismo como força política ;1.ucõnoma,
as sws lidetaJlÇ;tS acJ.b3J'J.m por se dispersa.t· entre os movimencos de es-
<1ucrd.e (i>c K e Aliança N:u;ioll;ll l.ibenac..lor.i) ,~ de dircica (Ação Inu:g~list-a
Br.1silcir:1) que surgiram cmrc 1932 e 1935. Muitos outros tcncmist~lS
Íc>ram i ncorporac.lc)) como c.1u.atlnl.\ pulí,it."C.l'i e admini),r.ttivc,:. d o ~ovc.:mo
federal, rcndtudo-sc ao novo jogo político das d ices dvis.
Nos :mos 1930, o mundo vivia oma C:'f'Oc:i de cfcrvcscênci-:t idcoló--
gic:t, dividido enue dit-eit:t e esquet'da, fusdscas e comwüsw, com ambos
criticando a •Jcmoç~ ci~ liberal". A política lib<.·ral, baseada na representa-
ção p:irlament:tr ~olhicla pelo voco dos cid:i.dãos e na .sep:i.mç:ío e!\trc fa-
t..idu e w cicdac.lc civil, ..:ra coll!>idcrac.la incap:11, c.lt ab~or.•cr ~ cunflitoll de
classe das sociedades industTiais e urbanas. Os principios libcrajs clássicos,
cnfuti1.ando os d irciros individ uais, a premência d~ contratos privados
e o livre,.mercado, pareciam condenados diante da nova realidade social
e gc.~política do mundo. A crise cconômici. de 1929 rinha sido a prova
de sua ineflc:kil no ampo cfa economi:1, pois fora pro\•ocad.3, em grande
partt, pcl.1 concof'l\'ncia sem resra.s entre os sr2nclcs grupc» industl'iais
que dominav:1m os mercados.. Fascislas e comunistas. a panir de motivos,
métodos e caminhos d ifcrcntc.'i, dcfcndi:.1m um F,.stado forte e nu-d ar que
controlasse 3 vida dos indivíduos e das massas, além de regulamentar a
economia. afastando-se do liberalismo político e econômjco, O Brasil não
ficou imune a esse debate incernacional.
Os fascistas e coda a extrema <lircita autoritária defendiam o
corporativi~mo como forma id<.-al de organiu r a sociedade. O corpo..
r:Jti\tismo coni;Í$tia cm fu.1.cr com <1uc o E.nado o r~mi1.assc a $(Kicd adc
na forma de oorpor-.1çó<..~ profls.sionais que n:uni)Scm cmprcsári~ e
crabalhadorc.s, c ujo~ C\·enruab. conflitos de in1erc~scs .!,Criam nuclado~
pela burocracia central tlc maneira a planejar as :uividatlc~ económica~.
cm no me do desenvolvimento e har mo nia nac:iomiis. Obviamente, para
os tr:tbalhadores, essa soluçfo trufa mais &nus do que b6ous, pois 2
tendência do E.s1ado era se render à influência e à pressão dos grupos
econômicos mais poderosos. Ne~e modelo de soc.i«tade, o jogo eJeiro·
ral, mesmo limitado às camadas médias d a populaçio, era visco como
um f.u or de risco à escabili&tde.
Nos anos 1930, o mundo se viu dividido emre esses dois projetos
ide.ais de so,cicdade. antagônicos e.ncre si em mdo, menos na crítica que.
fo:z..i-am à de.n1oa':lcia "'burgue.sa. e liberar. O resuJcado de tamanha eferve.s-
céncfa e: debate político foi ttm· a socic:d-adc brasileira conhcocu form~ de
ação e o rgani1.a~o colcriYas como n u nca aconK'CCra anra.
A c..-onv(,ciçâo pam as eleições, vi.snndo :1 C..-<..lm~iç:io da A~mblcia
Constitoimc, e os novos ~ni<los, organi7.açõcs políti<..11.s de mas-53: que
surgiam, agitaram os anos <1uc vão de 1932 a 1935. Nesse pcr(odo, são
pc..-rccptÍ\'c..-i:. ao mcno~ <.1ua1-ro i:;rand l.:.) tcnd ênc.ia.s político-idculógicas:

1. Ai,,orit,tri.mu, tiemifirist,r. es$l ce11dênci1 tstt\'l encravad:t no


míclro do poder que dirigia o Esl.3do pós- 1930. O:isic.11111:!ntc,
reunia políticos civis, militares e imdcccuaís que defendiam
um tsrado force, bt1nx:r.nii..1do e interventor (sobrc;cudo na
economia, na <..-ducaçáo e nas relações de rrabalho), mesclando
dc111cnros do oorporati\'isl1lo com valon.~ libt:r.1is, como o apoio
à iniciariv.1 privada na economia.
2. Librmlismq: reunia muitas lideranças oligárquicas tradicionais.
com adesão de boa parte da classe média url:xma e dos profis-,
sionai~ liber.ii~. Para CSS3 linha idt..'()lógica, as in.stiluiç~ e os
v.1lorc-.s liberais ainda dc....criam nortear a sociedade (li\'rc-inicia-
tiva na ec:onomja, direüo inviolável de propâedade, liberdade
individual, Jiberciade de exp ~, federalismo, independência
cncrc ~ rr6 poderes do l~ca<lo - Excculivo, L.1..-gisl:uivo e Judi-
ciário). Entretanto, conforme a tradição oligárquica cfo libera-
lismo brnsilcirv, :t política dcw...-ria ser um clube fcc:h:ufo, com
rc.-gr-As clci1orais <1uc impcdi~cm ;as mas~s de exercer seu dirc:iw
de voto t: fa;ercm se rcprcsc:ncar no P..irbmcnto. l·~t'.b, ma.mo
par.a o~ liberais, tk,'(:riam ser objeto tlc rigorc.oo con1rolc social
e inculc:1ção mor.ti e iclc.."Ol()gica (:()ll$Cr\•:tdc..lr:t, $<.ia ix:l:1 rcligii'io,
seja pelo civismo. Os liber.tis se co,ucituír.un no principal foco
de 1e1uáo concra o governo Vargas. Eram críticos do Es.tado in-
cervemor, mas não hesitariam eni apoiar o governo na. repressão
aos movimentos populares e aos comunistas.
3. &qurrdlnnoJ (reform/1111 r rrooluriomlrit>): c.om a Revoluç.1o de
1930 e o rcconhcdme.iuo da importância e legfrimidadc da
''c.1ucsrâc.1social,. pelo f..sr:tclo, hom-c nm:f asccn$lo do movimcn·
to sindical-opc..-r:irio indc.--pcndcntc entre 1932 e 1935, JX~ri<.l<l<.1
<lc i:;randc agitaçJo operária, aind.1 pouoo estudado pelos hi:_...
roriadorc:s. l~r..t o) comuni,.ta>. a S1ícla para a cri~ capitalista
Cf3 a rcvoluç.'lo liderada pelo partido cm nome dos operários e

a mponC.'$CS, q\lc di..,•cria insrnumr \lma "ditadura do prolct.1rfa-


do", acab.tr com a proprkda<lc privada e oonsrruir a ~ocitda<l<:
comunista igualitária. Além disso, havia setores da d ilS.S(' média
(sobrerudo enuoe a baixa cl:.tSse mêdia) que, me.uno sem aderir ao
comm1ismo, defeJldi:tm o 11acion1li.smo económico e:\ iüterven-
ç:lo cs1:1tJI ,u economi:1 para indwui.alitar o Brasil e li\•r;ir o país
da influência das grandes potências econômicas da época, como
Inglare1·ra e Estados Unidos. O próprio Partido Comunista es•
rava dividido torre a dtí.;.~ da revolução operária radical e uma
polh ica de aliança~ que uniSM: os setores dt:111ocrá1icos e pro~
grcssistas da sociedade oonrra o fu.scismo. Em 1934, socialistas,
nacionalistas e comunistas acabaram convergindo na formação
da Alianç.a Nacional Lllx-nadora (AN L), uma frente amifascista,
org:mi-i.ada cfcti\•amencc entre m:rrço e julho de t 935, c.1uando
chegou a contar com ccrc..1 de 400 mil Rli3dos.. As principais
FRA'iU NQ\0- R. l'Pllflt..,\',l ('QNfl'SlllDAOl'i 103

críticas da AN'Leram conr.ra o capital financeiro e contra o lati·


fií ndio, considcr.1dos imp<.-"<limcncos para :a democr.iti1~'r~º da
sociedade e modcrnt"/,ação da economia.
4. Fmcismo: o priucipal grupo fuscism brasileiro (mas nOO o úni·
co) era a Ação Imeg.ralisra Brasileira (AJB), criada em outubro
de 1932. A haM: social do~ int<..-gr.ilis1as locali1.ava-sc na classe
média, .l.Obrctutfo (lc o rigem imigrante (lo Ccmru~Sul do Bra:.il.
O integralismo organizou-se uadonaJmence, sob a liderança de
alguns i1uelec1ua.is como Plínio Salgado, Migue.l Reale, Gust:l.\'O
llam.,M>, a partir ,lo nnxldv pai-.unilit,1r ,lo~ parri<loll fascista>
europeus. Esse mQ<ldo impliava uma c~tntttlf3 de milícia .
com cheÍ<..'$, subchefes, uniformes, p:ir.td:is solenes. A iclt'Olob'la
int~nJi.s1a m ilitu1-;1\•:.t nacionalismo, civismo, co1por:11ivismo e
catolicismo ultracon.ser\ladoi:, criticando comunistas e liberais..
Conforme :a doorrin:i d:t AIB, o Estado lnrcgral d<.."Veria ser o
fiador d~~ v.1lorcs, (nendo com <1ue a sociedade se mobili1.,b-
se pda naçáo. Ao comrário dos auLoritários pr.1gm:irioos, mais
pre.ocupados com a criação de uma bu1'0ct.tda estatal tutelar, os
fuscisras defendiam uma organi1.ação civil de massa para mo-
b ili1.ar poli1i~mcmc a wcic<ladc, .l.Ob o t.-Umando dl'. um du.:fc
personalista, tendo como modelo os lideres fascistas europeus.
AdolfHider e Benico Mussolini.

/\ /\SSE\<J Bill/\ CONSTITlJl!'HE DE 1933/1934

As eleições para a Assembleia Consriniintc for.1.m regradas pelo novo


Código Eleitoral, lançado cm 1932, que lCOla\la ampliar a rcpn,::scmaçio
e moralizar as d eiçócs. Pela primeira vn, o voto e.ra secreto, a.s mulheres
podiam vocar e haveria uma jusriça eleitoral independente para monitorar
os re.sulcados e coibir as fraudes..
Alé:m d.as grandes tendências idoológicas, dcuna.s de panidos polí-
ticos fora1n crildos depois da Revoluçáo de 1930, muitos corn e.x.istêt1cia
efêm<.'f.l e intel'CSS(S meramente fisiológicos (ou seja, para defender imercs-
ses particu lares de 1;,rupos oom poc:ler ec<>númico ou d1cfes políticm looi!i).
Os nomes dos panidos da épOC3 ra·clam uma m isnirn de nacionali5mo.
corporativismo e regionafümo - Pa.rcido da Lavoura. Partido Economisca,
P:irrido dos Empreg:1.do:; do Comérdo. E..ssas tendências :tc:iba.r::,m ~e en-
conuando na Assernbleia Constiruince e deram os tons do debate.
Al~m d(h c:rndidaws dcitos pelo ~i.stcma de rcpr~<.·n1açio, havia
u ma b:rnoda "'profissional" (íuncionários pl1bHcos. cmprc~dos. cmprcg~-
c.lorcs) c:t,eolhic.la por ddtgadúSollindicai.s. C..cr<.'3 de /40 dcpu t.1d~ éOnsrituin ..
res foram eleicos dessa forma, entre os 254 que comptmham a AssembJeia,
com apoio ele setores cio governo <111c cldi:ndi!1 uma experiência inspir:1.<l::1
no modelo corpor.l.civo oa polític:i brasileil':i.. O resulc:ido geral, emrecamo,
mo')..-rou :t Í<.m;.1 p~i.ucntc da:; oli~rqui:t') n.-gion.ii.s de linh;igem libt-rnl.
A lgrcj:a C:u61ica, cradicionalmcntc inílucntc na sociedade e na \•id.1
polf,ica hr-..~ikira, ta111IX:m náu ficuu alheia cm mr.:io a t"dlHa muhifüaç.io.
Os imeloctuais cacôlicos, apoiados pelo aJco dero da lgreja. organizaram
a Aç.io Cuólic.'3. l-1c$ te-miam <1uc C)$ scrorc:s laicos e pc~irivÍ$W.S que ~ta-
va.m no poder do Esc:.tdo realizassem reformas sociais e educadooais n:.1
Consciruiçio que pudessem ameaÇ:.tr a influência cacôlica oa sociedade
br.i.sileira, fundamental p2r;a oomprc4,-ndt~r os valore.."& mc,)t'.1is dominantes..
A1~m di~, a l iga EJei1or:tl C:uóliCJ. conseguiu impor uma :igenda no
c.ld,;uc dcimr.tl e cun).tituintc, L"'' itandu c1uc <.> c..1'(111tr<lisrno e -..~ rropo!ita!>
laicas levassem a um desvio da tradição cacôlk..1 que imperava na sociedade
bro.silcira. sobrcc-udo n:i ddlniçâ<.) c.:onstinidon:il sobre o popd d:.i famílin
e o sistema eduClcionaJ. Exemplo da press:1o católica sobre a Constituince
foi a oficiali1.aç;io do cas2mcnto religioso e do ca:;amcnco indissohívcl (com
a proibição do divórcio).
Os candidacos par-.t a Con~tituintc c.1uc se aprtscntaram corno hcr..
dciros do lc.ncnüsmo tiveram fraca vocação, restrita sobrcLUdo ao Rio de
Janeiro e a Pernambuco.
O Governo Provisório mostrou sua face autoritária, impondo um
rcgimcnco imcrno à Assembleia e apresentando um ameprojcw de Cons.-
tituiçtfo que só podi2 ser "'emend.ado" pelos constituintes elei10s. e n:1o
redigido novamemc a partir do começo. Enrre o final de 1933 e julho
de 1934, os debates na Asscmblci.a Cons1irnintc ÍOr;am acalorados, e o
resultado foi uma Con.u icuiçáo avançada. mas de pouca cfcri\•idade no
dia a dia da sociedade.
~RA'IU '40',0- Rl'Pl lllt.i\'i 1 ('()Nfl~lflDAOl 'i .105

Mesmo aprovando o aumento dos poderes da União, sobre.tudo no


cimpo da legisb.c,-:io t(.1)t1Ómici e sod:11, freme; :ios <:$r:1dos, o princípio
fcderalisra foi mamido. O voto p~1ria a ser obrigatório e scc:n:co, mas
continu.;1r-i:t vedado at)S analfubét()S. As rcivindic:1çÕ("S dos tralx1lh:ulorts
foram p.trcialmc-me aceiw, com a cl'iação da Justiça do Ttab21ho, do S;t l:i-
riv rnfnimo, jumatla c.lc ui10 hor-.1) diárias e féria) anuai.),., ma) c.lcmc.mtriam
para ser implementadas efetivamente. Nesse. ponto, o go\-'erno teve uma
dcm.l ta, poi.s dcfcndi2 a c;xinênc:ia de um ~indic,no (mico por cm.-gori2
profi,s~ional. pard melhor co111rol:i>los Jcncro e.lo prindpio cotpor.ttivo,
mas a Assembleia acabou aprovando a pluralidade sindical.
A Consrimiçio csrabck-ccu que a primeira clcipo dcp<.l i.s da su2
promuJgaçáo seria indirc1a, como ddC:ndiam os membros do Governo
J>roviOOrio, csrabdc.."CCn<lo eleições din:·ai$ somente <lcpois do fim dc,1 man·
dato presidencial. Assii:n, ficou n1.1is f.kil :1 conf11·ma~fo de Gerúlio V.1rgas
já no poc.lc.:r. E.m julho de 1934. 175 dcpm..tdm vor-,u·..tm cm V..irga'>, contra
71 que deram os votos a outros CJ.ndidato.s, priuàpalmence ao conterrâneo
e :rnrigp aliado de Vargas, Borges de M<.xlciro.s.
Em mc:fo ao equilíbrio precário da nova fuce da política brasilc:ira,
Gcnílfo Varg:.is, se nfo cm un:mimidadc, dcmonnrava grande cipoc:i<ladc
de lidar com d~~mandas opos-rns, neurrali?.:tr adversários, c..-srimular divi~
sões e se a.ílrmar como a possibilidade mais viável no governo do pafa..
Mas sua lidcr.mça pcssool, no contrário do <(UC muit.is vc1.cs se pensa.
est:w:'l longe de ser consoli<bda, seja enlre as elices regionais, seja filice os
grupm populam..

AS " MTNORIAS" VÃO À tuTA,


NEGROS E MULHERES NOS AGITADOS ANOS 1930
Nos anos 1930, cm mdo .is luc:.u gerais d.1 sociedade que se org.ani.zaV'.t â dj.
rci!I e â esquerda para mudar a vida poliria e social. comcçarJJU a surgir paums
de rcivindie.açóc:, c,1tcdíic;1) de grup(» w n~iJct;1J~,,. ""mi11vri;1:, .oc:iai,\• . MulhC"
fr;S e negro:, p:i.s...;&1'.lnl a M": oipni'.l:ir1.ie mar'Cira :1u1õnom:a. d isposu~ a inrcrfctir

n2 políde2 br:i.slle-ir1 e c:onquisur ditdros espedficos que super:tsr,em os velhos


preoonc:eitos de unu sociedade p;:itriarc:tl e u.cis:r:t. Ji nos ::.nos 1920, mulheres:
de- todas as dmes, m.balh.1.doras pobres ou mad:imes: ricas da socicd.;1.d(', troam
crhkas "'º mundo público dominado pdo.s homens, ,1,Íncb qtic $Oh pcr.speçtiva:;
Jifcrc11lQ. P..tr~ a:, opct.í1i;b. ;atuinJo ne)j )inJiea10). :1 oorlt:1t1im1 Jc igua..ldadc
~ l:'IV;) lib-:ith à lu1:1 gerll OC)ntr.a () ,..s1em:a ciph2li$t:1. P:,r.t lb mulhen::$ ,fa due
leruda, 2 luta k Íl)l.-a,·2 n<> direil() de ,'C)tQ. Em 1932, o Código E.lei1oral fiiul •
mente pfCViu o voto feminino, ainda que com .ilgumas mtriçi,cs. confümado
n.1 Connirujs-ão de 1934.
~ aÍTodC$CCndcntcs brasileiros tamhim prassat',tm a se <>rg.aoiurdc maneira
autônoma e sisrcm:itin 2 panir dos anos 1920. As rdvindk::içóc.s iniciais V1.ria·
\'llnt conforme o csc:ido. N:a &hi.i. surgiu um disauso idcntitãrio com base rw
heranças africutu. l:m São Paulo.. os -homcns de cor", como eram chamados
os ncgtOS;, ~ p.'luuram por um di$CIH$Q ma.i, "a~imil'icionistl'', luundo pcb
inl!oer~o c:m wntliçfic:..,. ,k iguald:1(lc 11..1 -.o<.lnl.1dc: hr.,nc1 e: hurgucs,1. No Rio
de J:mcim, ~ vi,-io d.1 "'moüçtgcnt t:omo vou~o d.t )()(._ic:tl.1,lc: bta,)ilc:irJ c:m
mai, d(lmin:1111(". Fm ú)mum a Wc.10$ ~ grupo~ t' di~u~ d:1 mili1:'inc;i:I 11q;m,
lt:,vi.a 11 t:rf11t.'ll IM) rndsn•t•, à cl<Si.gu:1f.d:1(k i:lc (~nu11id:11il,es e a(l pn:u>ucdr().
Nm 311(.k\ 1930, ~urgiu a pri1neira gr:11111.e ocg:u1i-'~'lçfl() 11egu tltt 8r;asil, d11m.1d:i
de Frente Nc::gr.a 8 1,i:,ik.in, (F~K). Algun:, do:. :,cu:, lidero, 1)(1r,1doulmc111c, :,.e
encantaram com o f.ucismo e o nacionalismo autoriWio. cm sinronia com pane
du dites b1':'lnc:as da époc::t. M:t~ 1 ex1>Crifnci2 d::t rN8 ~ou outras organiuções
depois <b Scp;w1<h Guerr:1. Mundial, j:i csboç:i.ndo unu ctitic:a m:i..is pro.fund:1. ~
csrrurur.:is soct-ai.s e «onómk:U que cstaV\lm por r.ris &1 exdusio racfa.l e do ptc·
conceito. Lm J9)0. foi realizado I Coug.rc.sso do Negro Bruilciro. rca6nnando
a luta pda igualdade racial.

O L ~VANTE COM lJN ISTA DE19l.5

Com a promulgação da Con.sciruiçâo de 1934. que trazia alguns


av:u1ços democr:ilicos em termos de direitos políticos e soei.ais, o Brasil
pan.:da iniciar uma nova fa~ crn ~u.t hil11ória. Entrcran10. cm u1n cx;11nc.:
mais dctalhaclo, a conjunnira de época não indicava q ue as Qitfutu ras
polític..tS e \':.l.lores herdados da Primeira Repúblic-J. estivessem superados.
1\ s oligarquias regionais M: rt\'dar.im ~inJa arua,m.-s t vigorosa.s no dcbac-c
ela Assembleia Constirnintc, clcccpcionand o muitos q ue acn.'tliravam cm
reformas antioligárquicas mais profu11dj$. como fora pro1netido pela Re.
voluçio de 1930. Em meados da déc:\da de 1930, a economia ainda ern
clepcndcntc do sc1or agrucxporradur, sem nenhuma polhic-J de inclustriali~
z.açlo 3 ,•i.sL3. Se alguns direitos tr.1b:t.lhist:1S para os opecirios haviam. sido
consolidados ntt Coostituiçáo, 3 situ:tçio do tr1Mlh1dor rural no Br:i.sil
co111inuava dr.unática. Para de, não ha\'ia per~pec1iva c:le uma reforma
agrária. ainda q ue moderada. ou de assistência social mínima q ue mclho-
~IV,',U NQ\'Q- Rl'P IUU'II CQNTISlllP,'Ol'i 107

cassem seu nível de vida.. Apenas do ponto de vis:ra político-eleitoral podia


se ful:ir em algwn avanço signifkatiYo, com a instituiç:1o do voto secreto,
do vo10 feminino e c:la justiça dci10,-,,1,I. E.m compen:,açáo, os :analfabc:tos -
scndo o analfuhctisrno a condição <la maioria <los eleitores (1uc vinham <las
classes popul:i~ - cc;mtinu::wam proibido:; ele vor:ar.
A cfcrvcscl:nda polítici do período. por outro lado, havia gcrndo
nov·,u organir.açóc:s. como ;i ANI .• Essa org:miY.a<s'flo c.'f.l formada por vários
s;rupos dcmoc-r:itic:o:;. ~t.)c::iali~ta.s e antiíascistas <1uc denunciavam v avanço
,la c:xtrcm:i direita e d o conscrv:tdorismo :tutorit:irio, n:1 sodcd::ulc e no
próprio governo Vargas.. Embora minoritária n:t As$tJllbleia Constiruinte,
a ANl. conscgu.iu 1nobiHur ;u ruas, levando os tra.balhadorcs que continu.1-
vam a lutar por me.lhores salários e condições de trabalho.
No primeiro s-:omestre de 1935, a ANL reuniu milhares de cidadãos
em assembleias e comícios, defendeodo un\ pt'ogram.a de refonn:1.S radicais
que p~,r;a pela suspcns5o do pagamento d.1 dívida externa brasileira, a
n:1donttli1.aç'io de cmpr<:s!LS CStnmgcira.$. a rcfuTm:t agi.iria volr,ada par:t a
divisá<.l dm l~tiftíndios e ~ consolid~C?o de lihcrdad<."$ d<.mocr.hic.1s que
pcrmith.~.:m ;a livre org:ani'1.aç;'.io panidária e a ~nicipa~-;i:o tle 5<:W~ po,
pula,u. na vida política. A entidade reunia até muitos revolucionário:, de
1930, Ínt.$frod<.l5 oom <.) conscrv:1dorismo cio g:ovç-rno V~ ri;n.s. como :1lgt.ms
"t<.'1lemcs'" que h,Yiam deixado o governo. O prcsidc.'1lfe de honra da ,\NL
era 1.uís Carl~ P!'Thto., líder da já lcodári; Coluna Prcsn.·~. Isolado no
exílio em Buenos Air<".s <", depois de 1930, cm Monccvid(u. Prcstts rccu.sar.1
a anistia do governo brasileiro e rompera com. seus a.iuigos companheiros
da Coluna, 1cusaHdo-os de :aderir :\ 1\ova ordem poUtica pós-1930 em
lroc:a de recompensas polídCLS e m:neri:iis. O C1minho que levou Prestes
do c.squcl'dismo socialista do final dos anos 1920 para a oonvcl'sáo fanai ao
comunismo radjcal, por volta de 1931, não foi cra.nquilo. Mas o fato é que
os líderes da Inr<.'fnadonal Comunista, que na prálica mandavam no 1•c
br.uilciro, percebiam no t.:x~lídcr d a Coluna o fu turo Hdt:r da .. Revolução
Hra.silci ra'". F.m fins de 1931, Prcstc..s viajou dandcstinamcntc para Moscou.
Os soviéticos. sob a liderança amocrútica de Josef Stalin, tinham
planos p~u;i estimular uma revolução socialisca na Amé-rica do Sul, com
amplo apoio da lnttrn:1cional Comunista (lc). Na avaliação ela 1c, Prc~tc:,.
parcci:.1 o líder mais ous:.1do, e3rismático e aglutinador de v:í.Tias tcndên·
cias, pelo seu prestígio. Em 1934, d e foi aceito oflc.ialmente no rce e em
abril de 1935 voltou, secreramence, para o Brasil com a missão de trans-
formar o pais na primeira Replíblic.a S0,•ié1ica das Améri~. Com de,
"ier.im vários agcnlCS da IC~ e-Orno a alcmâ Olga Bcnário, que acabaria se
c:as:mdo com o bra$ilci ro.
F.m julho de 1935, Prestes divulgou tim m:mifcsu..l pc.xlindo a der-
rubada do governo "otliOM> de Vargas"' e defendendo "'1otlo poder à ANI "'.
Alguns dias tlcpoi), aprovcirando a oportunidade causada pela rad irnfi7..a ..
ç.io dc,1s rcrmos dt:SSC m:m ifcsro, o governo Vari;:lS $USpcndeu ns nriviJ:idc.'S
d:'I Alianç;t) :'!brindo caminho para a repress:1.o ao inoviinenco.
Apesar da grande adcs..í.o à ANt, o movimento se dispersou depois
de ser declarado ilegal, demonstrando a &.,gilidade de sua organização.
Além disso, muitos me1nbros da ML nío tinham simpatia por uma toJna-
d:\ viole,u:\ do poder, preferindo apo$t:a.r 1u vtt eleitoral par.1 conqui$laJ' o
go\·crno nacional. V.tlc lembr.u que o Brasil. cm princ.ípio, teria clciçóc:s
presidenciais cm 1938 e um p:.trtido fone, de ma$S:IS, cnpa1. de an:ic:ular
os serorcs progrcssisrn.s da classe mé<li;a e do opcrari:ido, poderia ter um
candidato com chanc(~ n,-.:ii.s de con(1ubfa r o pudt-r do ,,oro.
J>ara o~ c:omuniua~ mai~ ratlicab, :t proibis-io <la A NI confirma ..
va soa te$C J c que :.ts elites brasileiras: não permitiriam qt1e a socic.'<facle
m\lda.ssc pelo voto e pela ação de um movimcmo de massas p:i.cífico.
fa~a conclu~ o dt.:u Força ao~ militan1çs comun is1as que anaavam no seu
interior defendendo um levamc armado. Depois da proibição da ANL. o
PCO e a 1c apostaram e1n wn levante revolucionál'io; a JideranÇâ de Presces
e sul iníluência nos qu.3rLéis sonudas a.o peso con1ui:üsca no movimen-
to oper.lrio seriam a g:arantia da vitória. Mesmo sem a ANL, o c~uninho
para a revolução comunista no Brasil parecia traçado e invcncívd. A /\Nl
funcionaria corno um movimemo de massas. capai de mobiliz.ar ,•ârios
sc:1on.-s da sociedade: que: não accit,wam n<.·m o liberalismo oligárquico,
nem o fulcinno. O l'<'I\ organi7.aria os operário~ e o~ soldadm, <1uc M:riam
a tropa de choque da wnhadn revolução. Os primeiros deveriam apoiá-
la na forma de greves e de m ilícias armadas, e os segundos. com sua
fo rmação militar, se rebelariam ainda nos quanéis, impedindo qualquer
reaç.áo tio Exérci10 legali~(a na repressão ao levante. O plano era e~se, ma!.
a realidade foi bem diferente.
~RA'iU W\Q· ll, l'Pllllt..\'1 1 ("QNflSlflDAOI', 109

No final de novembro de 1935, ,,írios quartéis se rebelaram, eru


N:u:il, Rt."Cifc e n o Rio de J:meiro. Depois dt: quatro <li~ ele combates,
nas ru~u e 110s quartéis, o lev:uue c.omunista foi completamente derrotado
pelas forças milirarQ; fiéis ao governo, As bas~ opc:r.írias do P( K n:í:o csra-
\'3Jn dc,•idamenlc organindas e preparadas para o levante, e praticamente
não aderi ram. 1\ "'grandt n.....,·oluçáo" partcia maii com uma "'rebelião rc-
nemista", carre.gada de volumarismo e únpero dos rebeldes. mas pouco
:1rtic.11la<fa com ourros setor<:$ wc:iais.
A repressão policial que se seguiu foi incensa e cruel. Sob ::i li-
dcrnnç~ de l;ilimo Muller, ironic:amcnu: um ex-membro da Coluna
Prestes cxpul~o por mi condul':i com as fina nças do movimenco, a Po-
lícia E:,,pccial e.lo l}i~iriw Fcdcr-..tl (Rio c.lc Janc.:iro) co1Hh17.i11 a <."aprnra e
os imerrogacôrios de comunistas e simpatizames. Muicos membros da
J\NI. que não tinham p:1rt icipado e.lo k-van tc comunh;n1 rnmhém foram
presos. O governo declarou •estado de guert'3'. e, na prádca, as ga1':ln-
ti:ls e os direitos da Constituiçfo de 1934 foram suspensos. Muiros dos
pr<;sos foram barb:u.imcntc torru~dos, com :apoio :ué d:.a plllícia s<.."Crcta
n:izista, a Gest:i.po. O interesse dos naUsta.i er.>., sobrecudo? pelos cid:a-
dáu~ alc.:mács c.:nvolvidos na con~piraçáo tomuni~ta c::ontr.t o i:;uvcrno
Vargas, como Olga Denário e Harry Berger. Olga foi presa jumo com
1.oís C~rlo s Prestes cm março de 1936, depois de uma gr.mdc c;1çada
policial. Postel'iorrneme, efo. foi depon.1da p::i.ra a Alemanha, grávida
do brasileiro, mom.~ndo cm om campo de concemração ames do flnal
d:i. Segunda Guerra Mundial. Uma gr:mde c:i.mp:i.nha internacional
eondu'l.ida pda mãe de Protci cunM'.13uiu l'Ctirar a fil ha do ca~al, Anira
Lcocádia, da Alemanha nazista. Prcsu:s só seria libcnado cm l 945 (mas
nem :.1 prisfo, nem :.1 derrota do k-v;mtc ab:tl.ariam :t lenda cm rorno do
seu nome). O Partido Comunista Brasileiro foi desanicufado, c.om a
prisio da ma.i or parcc dos seus líderes.
No mesmo :1110 foi inscituído o Tribun.al de Segurança Nacional,
subordinado à Juniça J,.,lilirar, p;ira realizar julgamentos rápidos, no:, quais
os acusados mal ~,adiam se defender, violando os rimais dos processos
jurídicos tradicion;iis. Cerca de 1.400 p csso:.15 foram scntcnciad;is por esse
rrihunal até dc:wnbro de 1937.
1.l O t1NTÓRIA OOUAS11 11PÚIIX,A

A CONSTRUÇÃO DE U~IA ORDE~1 POLÍTICA AUTOR1TÁRIA


O lev::mte c..vmu nisrn d c:n-ot:ado, além de reforçar O :mric(>muni.smo
d:'ls dites civis e mili1ares brasileiras, sierviu para consolidar o pode.r pessoaJ
<lcGct:í1lio Varg:as no comando do farado brasileiro. Até os inK-gralisras, que
nfü) tinham sim p:ub p<,1lírica pelo p rc.si<lcntc, tiveram qut ~ sub<,,rdin3r,
mo,nemane;imente, ?t sua autoridade e lidetança na luc-;i. oonrra o inimigo
comum c.lc arnlx». os o.>muniMas. Os gmpo.\ liberais, M:mprc assumc.l~
com qualquer desordem social que pudesse 3.J.Ue:tç.ar suas propriedades..,
,,rivilégic.lS sociais e valores mor:ib, apoiar.am a rc.-pre-i;:,,;'io aos c;omunisrns.
Dentro do aho csc..1lão do governo, a ameaça comunista serviu para
justificu 3 opç:io cfoquclcs <1uc defendiam um3 ordem :nl(o rit:íri:i csc:3n-
car:1.da, sobretudo oficiais inili1.1.res de aha pare111e e alguos ministros. As
poucas vous libera.is dencro do go\·erno foram sendo marginaliz..1das poli-
ticamente. En trcr:mro, oficialmente, o i;«.wcrno Varg:tS p romcri~ m:mtcr as
eleições presidenciais de 1938 e fazer o país volur à nomlalidade co1tsti-
tuciunal. l'ol"c.:m , a opção por pmrnuvcr um golpe: c.k l-~tac.lu n.:ali1;;.iJo não
para de.rmbar o presidence Vargas, mas para reforçá-lo de.nero de uma nova
ordem .autoritá ria plena, j:i c.~1.tva n<,l seu hori?oncc.
Além dos aspectos conjuntunii.s que fa,.'Orco:ram o "'au1ogolpc" do
governo Vargas, que seda realizado efeti\lameme e.m l O de novembro de
1937, a oon srn1çáo d~ o rdem .amori,:iria foi c.srimulad~ pda c.-l~boração de
várias douu-inas polítk..1.s. Defendidas por incclcctuais de renome i época,
como A1.cvcdo Amaral, C>livcirn. Vianna e Francisco ú mpos, essas dou-
Lrin:is pregavam refonn:tt estrutumis no Estado br~ ileiro que reforç:l.Ssem
a hurocr,1c:ia, o rnnuok d a c..,luc:ação, a rcprcs)âo e a prup..ii:;anda poH1ica,
como pilares de um "governo fo rce··. O argume:mo central dos pensadot'es
autoritários era c.1uc a modernização da .sociedade brasildra na di rc.'Çáo de
u ma "d,.•ili1.açâo inc.lm,lfial" deveria ser feita de mancir.i tt1td::ida, condu ..
zida por um ~governo fone.., para evitar que os conflitos sociais gerados
nesse processo dcstruisscm a ordem cst.tbclccida. Ouuo ponto cm comum
do pensamento iucorilário que emergiu nos anos 1930 era a dcfes.1 da
5ubmissáo das oligarquias regionais aos inccrcsscs nadonais. A · no\'3 polí-
tica do Brasil" deVfri.1 ser m~ior que a hegemonia imposta pelos p rincip:ii~
c11ado5 d:t feder.içá<>, apagantlo <le uma ,·e1. por todas a..;; so1nbr-.as da Pri-
meira República. Para os id eólogos autorit:.irios. era necessário um c::hcfc
IU

político personalisca que conduzisse esse processo, cuja aucoridade e estilo


de governo nio fossem quescionados periodicameme nos pleicos eleitorais,
colocrndo c:m risco a~ dirccri,<.-s cs1r.ilégicas do Jcscm·olvimcnw nacior'31.
NôS an()!I 1930, isro significa,,a, na prátic.'.3, n:furçar o pc:xlcr e a autoridade
p(.·ssoal de Gc-rúlio V:irg:i$.
Se havia pontos çm comum cmrç Q~S v:iri:is corrcnr<.~ d o pensa-
mento aucori1ário (cicn1 iílcbt.Ll>, f.i.!.Cist-as e cnólico~) - como o anticomu~
ni.smo, o antilibcrnlismo, o nacionalismo omscrv.ulor e o Q.1rpc::m11·i\•i.smo
como ick':.11 de organi7~-içio social -1 c...-xistiam também muitas clifcrcnç:,s.
Os ..cientificisc:is.. autoriti rios tendiam a concili:ar a lutda do Est:ldo coin
a manucenç.i.o de certas liberdades individuais restritas ao mundo privado
dos cidad..1.os, limicaudo-o a controlar a vida pública e a planejar a econo-
mia nacional. Os católicos n.io v.lloriiavam. canco o Escado corno único
ator 1-esponsiveJ pela Ot'dem soci:U, cb.ndo ,n:üs importincia à f.unília
patriarcal e à Igreja como fundamentos morais dessa ordem. Os fascistas
rcncli:tm a fundir o 1-~clo. o p:irticlo e a soc:kxladc <..m u m:i org:.mi1.aç..io
polírici única, o c1ue era nq,r,ulo pelas outr.i.s conen tes :wwrid.r-ia.s.
A::. burocradas civil e militar p:1~1"3m a ter um p.ipd cc.:nrral nesse
p«.K:a.~o polfricv e ~ocial, c:vlcx:amlo•l!C cumo mccliacloras entre 011 intcro-
scs- privados ele F.u.cndciros e donos ele indústri:.1s e o g;o,·erno fod~I. Em
grande p~rtc, a partir d:.i scgund:.i metade dos anos 1930, o poder crcsa.:nrc
de Getúlio VarS<b se apoiav.t nac.111das burocrAci:b. A nQ\..,. forma de F.s:ra<lo
que se desenhava - mais a:111.ralizado, regulador e imcrvc1lcioniS1a na cc<r
nomia - nunca chegou a :uneaçar o poder das velhas elices regionais, mas
as submeteu a outro projelO político e eco1)6miro, pautado pela indus-
1ri:ali.t:aç;io. E.m cesc, 2 burocracia cécnio subordinada ao go~rno federal
de.veria disciplinar os quadr0$ JX>líricos e os inccrcs.scs regionais e, para
tal, foram criados vários ôtgãos burocrálicos. Já em l931, for3.1n criados o
Ministério d:1 Educaçâo e Saúde e.· o Minisr~rio do Trabalho, voltado para
a ,mela wbl'e as d~~ popularo e a prcp;ar-..tçáo das prúpria.s di1i:.s oa.s ca•
rdàs de governo e lid cr.mç:i. Em 1933, o l)cp:.trtamcmo Nacion:.tl d o Café
prometia regulamentar e planejar tecnicamente a prodt1çâo, a cstocagcm
e o oomérdo do i mportante produto, cvi(ando que a competição dcsen•
freada c.le 1mxlutorcs e comcrciances privad~ c,ia~ urn cxceS5.o de oícrra
da bebida e baixasse SC\1.$ preços. Em 1934. íoi criado o Dq,anamen to de
Propaganda e Difus.-\o Cttlmral, para cemralizar a propaganda oficial. Em
1936, foi criado o lnsrinuo Nacion~I de F.'.&rntística e Canog~fi2, base.:
(lo amai lns1i1u10 Bra~ikiro de Geografia e 11.st-aríslica (1tK.t). L~sc Íuror
buroccitico sô cresceria depois de 1937.
O Exércüo brasileiro passou por um processo de reorganiz::tçfo
burocrá1ica, 10rnanclo#~c mai) ccnu··.i.li7.ado e hk-rarquk,.ado, o que rc~
p rcscnrou a lic.1uidaçá<> du cStilo rcncnti)ta de irucrvcnçáo mili,ar na
politic:1. Torna..ndo...se tun efeti\.'o ator político instalado 110 cor.ição do
Estado, o Exército se via como a irutitui~o central 1u med i.aç:to dos
(onflico.s wciai.s e polh icu), O principal Ire.ler militar era o gcm:ral Gól~
Monrcin,. 1,oi:,~ apó~ :1 <1ucd:t da Primeira Rcpúblic:3, de escreveu (> livro
A ReV(J/upic de 30 I' a fi1zalitlat!e política dv Hxbâto. defendendo a ideia
de que o Exército era :t "co11ccmr.1çáo da n3cion:alida.de". G6cs Monteiro
era um dos pl'incipais tmusiastas de um golpe de &tado que efetivasse
u ma nova or<lcm auwriciria e modcrnÍ7J1,n rc, cujo :iliccrcc central clc,.-crin
5cr, jus,amcmc, o Exército br.i.s:ilciro.
O próprio Getúlio Varg.1.s. cm muitos discursos prommdados antes
mesmo do Golpe de 1937, denunciava '"a decadência da democracia liberaJ
e individualisr,t.
Se liavia a di:-.pu:-.içfo dt muito:-. político:-. e inrckuuai:-. par-.4 um n:..
g.ime autoritário, era preciso esperar wna oportunidade para implantá-lo,
com o meJlOt' risco de oposiçfo.

O GOLPE DE 1937 EA CRIAÇÃO DO EST ADO NOVO

Apl~r da marcha accler.ida para a con.srrução de uma ordem auro-


rit-ári.i escancarada, com novas formulações doutrinárias e no\'OS :ipa.r;a,os
burocráticos, o ano de L937 começou com a promessa do go,,crno de que
haveria eleições presidenciais cm janeiro de 1938 encerrando o mandato
constirucional de Getúlio Varg;as. As candidaturas j2 c..'Stavam postas e, no
fundo, nenhtuna agrada,"d o governo. As principais eram as de José Améri-
co de Almeida, Armando Salles de Oliveira e Plínio Salgado.
José Américo de Almeida, cx ..aliado do presiden te Vargas, era
c:on~idcrado próximo dos ideaii. ccncnci51as, maiuen.sfvcis a um farado
interventor e às questões wciais. Tinha sido ministro de Vargas. mas
~RASU '40\Q-11,l'Plll lt.,\'II ('(lNTINl!IO,'()l'I 113

já não contava com a confiança do presidente. Ainda assim, era vislo


como o candidato oficial, e tinha apoio de Minas Gerais e de vários
a tados do Norc.lcs1c.
Armarulo Salk'$ de Oli\•cira representava o fedcra] i,!,mO é o lihcr.tlis,,
mo. sob uma fach:1d:1 m:1is mcxlem:1e rcformisr:t, defendida pelo P~1níclo
1>cmocrático de S:io l'~ulo. As \"Clh;is d ires do 111w n~o se cmpolg:m1m com
a sua cimpanh~ presidencial, e ~c.1uda altm,1 prcfcri;11n * aproximar <lc
G(._·uilio e ganhar JX>Sto~ na burocracia fi.-.:lc·ral a cc>rrcr o ri~ c.lc pcn:lcr
o poder para dissi<lentc$ cm $CU próprio estado de origem. Aind:i a~im.
Amlando SaJles agi-eg:iva correntes que nío ti1tlurn simp26a pelo ,enentis-
mo. nem pelo aucoricarismo como soluções para os problemas n.1cionais.
Plínio SaJg-ado era o chefe do imegrolismo e.. ra1 oomo Hitler frzera
na Alemanha, disputava :i eleição para, posteriormente, inscaur.u wna
ditadura de panido único, o "'Estado Incegr.11" brasile:iro. Este consistiria
cm uma c1apa superior de comrolc dos indivíduos e das massas an nome
ele idc:.lis nacionalist3~ e de umn nc..w:.l menr;llidadc, c.1 uc mismr.iv:1 valores
cnólicos com cullOs óviws fusc~~s. como o culto ao "chcfu» e manifcsfa~
ç6~ .simbólico dl~poc.lcr e união, como {lc~.fik-s uniformi?.ados.
Oi! candidarm já c:,,tavam cm campanha aberra, com a maioria
dc..1s ddtorc:,i prcfcrinc.l<.1 Armanclo $:illc.'$ ou José Américo, quando, cm
mc.1dos do ano, a imprensa começou a noticiar a dcscobcrra de um no,·o
lcvanic comuniMa cm pf\·paração. O documcnw, tJul· supostamcnrt o
comprovava, foi batizado de PJ,mo Cohen, em alusão ao líder comunis1a
húngaro Bêla Kuhn. O suposco plano de tom:.1.d.a de poder pelos comu..
rüfüu, col\fonne descrilo 1\0 documento, era deulh:ido e pro\'OCOu p:\-
nico n:a opinilo pública: h:ivcrb s:aqucs, foúl:unen1os de lidcr.mç:as civis
e religiosas, depredações, invasões de propriedades priv.1das e lares, com
violação d.as mulhel'es "burguesas··. Mais tarde, revelou-se que o Plano
Cohen tra faJso e tinha sido elaborado pelos intcgraliS(aS para provocar
uma reação c.bu. milícia~ f;..IM:~tas. O ducurncnm, ao ~cr entregue para o
governo, foi aprovciwdo por este de maneira opormni.sta p;,ua j ustificar
um novo golpe de Estado. J\ té hoje, não se sabe se a elaboT.1.ção do Plano
foi fei ra sob encomenda do próprio governo para produiir o pânico e
n:a,•iv.ir o amicomunismo e, consct1uemcmenre, jm,1if'icir o reforço cio
poder de E.srndo para ..proteger"' a sociedade.
114 tll'it(>Rl,H~ll,\~ll ltlPlt M l;'A

O fuco é que a escr.uégia fuvoreceu Vargas. A histeria anôoonnmi.sca


novameme tomou OOtlta da imprensa ede vá.rios setores soci:us influentes, en-
tre do os liberais, dando argumentos para <1uc: houV(.'SSC um golpe de r~cac.lo
..preventivo". Obviamente, ningu6-n que fosse minirnarnémc informado. a
comcç.'lr pdo :aho csc:al:ío do g<)''t!l'OO) k'\':IV.t a sério uma n()\'!l :1mcaç:t oomu-
ni~12 daqucli;: ponc. O l'articlo Com\1ni-\12 csF.iva <.ksrroçado, seus dirii,JCnt~
c:il:IV',11n prcws e M.:US pouc~ milfram<:S di~pcn,o:, e danc.lo;1inos. o~ dos com
a lnn:m:Kional C,omunista tinham :iido w rr:Kk~ pela "-'Pn::i,áo.
Nnquda c:onjunmr:1. o qoc m:1is :lS~usrava o SOYcrno \larga$ crn a
possibilidade de vic6rfa de Armando Sal)t"$ de Oliveira ou mt"$mO de Plí-
nio Salg.1do. e náo os comunisLas. A opção liberal sigoifica.1-i.l. na vis.ão de
Vargas e de seu circulo de pode.r. a volta ao comexto pré-l ')30. quando as
oligarquias d:w:un o tom do governo federal. A opçlo imegr.tlista tampou-
co e.ra bem-\•ista por setores milicaJ'es e aucoril~rios que tt'am concririos
:à política de mobilizaçáo de mass.as, mesmo de íciçáo ultraconser~dora,
cl<.fcn<li<l:i pd :.l AIM. A opçio <1oc !SC desenhava pnrn Va11,'3s. apoi:ufa pelo
Exérc:ho e pelos pri nc:ipai.s ministros, cm um n.:gimc autoricirfo e nndar,
in~piradc.1 nm. intdcauab cfa corrente auwritária •ocntiflci~ta"', ma:, n:io
nl."CC.S!lariam c.:ntc fa~i.sta. A:s!lim , a o pção pdu i:;ulpc de farado rornuu ..sc
<lcclar:ida e domin:intc dcnrro do prôpri<.1 gm'Crnc..1 que já l.'St:IV:.l no poder,
com apoio passivo <.l U :.nh'o de outras forças políticas a mames na sociedade.
O Exércho f'oi o Aador <k.finitivo dessa opçio.
Em tlns de setembro de 1937, o Congresso Nacional, acuado e
dominado pelos govemisras, aprovou o novo '"estado de guemi' e sus•
pendeu M g:traú lias co1utilucion:tis por um perfodo de t rês meses. O
caminllo para o golpe fico u maLç f.kil. Em outubro, miniscros e :u.stsso-
rcs políticos dcfcndfam a continuidade do mandato de Getúlio Vargas,
con,..·enceudo os governadores e elites políticas regionais de que não serfa
possível a n.""ali:iação de clciçô<.'s <.·m 1938, sob o risco d<.' um novo período
c.le im,1ahilidadc poH1ica.
Os imcgralisrns (inham sido convencidos pelo go,.-cm o a apoiar o
golpe cm troca da nomeação de Plínio Salgado como ministro da Edue.t-
ção do OO\'O regime. N:1 verdade, alguns me.ses depois da instauração do
110,•o n:gimc, m in1cgrali.s1a,; M: rebelarain ao J>t:R"t'bel'c ru a armadilha de
Gen'1lio. que nunca. esteve dispono a ceder de fut0 apaço ao movimento
incegralisca ou permicir-lhe o acesso aos alcos poscos de Estado. Gerúfjo era
um prof~ion:al d:a po líria. Plínio Salg:ufo revelou-se um am.:ador.
No dia l Ode novembro de l 937, sob a juscificariva de nova ..co-
moção imescina gravef . Varg.is anunciou o seu golpe de Estado, o fecha-
mcn10 doCongrc.'S.SO Nacional e: :a Sl~pc:ns:io da Constituição vigente. No
lugar dela, o governo aprcscncou uma das consciruiçócs mais autoricirias
da história br:asilcir:a: prt..--via a pena de morte, o fim da :unonomi:, ndm i-
nistrati\•a federativa e a deiçáo ind ireta para presidente com mandato de:
.sci!i ano~. Ca!i() c:u rioM> na hi,stória tl:ts c:t,n~tituiç6cs mod erna~ incluía o
"es(ado de emergê.ncia'' como anigo perene da Consüruiç1o, durante o
<1ual fitariam .su~pcns:a-~, par;tloxalmcnrc, ;a,; garantia~ con~tirucionai~ ao~
cidadãos, já (>.Scassas.
Com apoio inilira.t· e poUtico, a autoridade pessoal de V:.-ugas foi
n:furçada pdo "aumi.;olp,c.:n <1uc inaugurou o faratlo Novl1. De: tão aix:r-,1tlo
e discucido, o ato de força não surpreende.u ninguém. Os que poderiam
cvcnnialmcnrc r<.'2gir, como 06 comunisrns, socialisr:1s e :rlianc:isrns, j:i
estavam reprimidos h.·wia algum tempo. Náo ex.isfr,,1 ninguém fone o sufi-
cicnrc p:ir:t evitar a, m o rte ct1 fr.ígil dcmoc.T.1cia <.M.I rdcmbr:,u :is prom essas
democr:1ci2:1Jues ltaídas da Revoluçio de 1930.
Estado Novo

VARC;,.>.;; SF. COI\.SCll.lDA Ml PODF.R

No dia 27 de novembro de 1937. menos


de um m~ depois cb implan1:.ção do Es1:ado
Novo, n.:ali1ou,,c uma ccrio,ônia um canw
curiosa quamo exemplar do novo comcx10 po-
lílico brasileiro. N;i l'raia <lo Russel, no H.io de
hrnciro, cm frcncc a 1.1m altar sobre o qu:il pendia
uml eoorme b::tndeir1 nlciooal, 1ocbs 1s ban-
deiras e.lo~ 22 c-nados bra!!oildros então fl(bti.:ntl'S
foram queimadas, uma a urna, cm uma p irn. A
cerimônia arnda oomou com uma missa campal.
condu1ida pdo arcebispo do Rio de J:.mc.iro. D.
Seb1Stiâo Leme. e co0:1 um discurso de Varg.is.
no qual ele justificou :a proibiçlo d:a.t OOudeirtt
rei;ionais, ;al~m dt.: oultO!!o ~ímbolo!!. õla<luai!!o bra,
silciros. O .i.10 ,;imbólico, nas palavras do pmi-
dcntc, visava ,;opçr:,r um;i. época de "instirniçõcs
1.18 t11'iTÓR UOOll,,\~IIRIPÚll k;A

inadequadas"' e '"rivalidades regiona.is", com o objetivo de consoJidar a


.. unidade política. e social do Brasil' .
O golpe do l~ tac:lo Novo - como ficaria conhecido -. justificado
pcl:1 suposta ameaça cornunÍ!lla revelada pck) Plano Cohen, rjnha ou,ros
objetivos políticos m:1is impommt(."S e uri:.>cnn.-s. Com a pcr:sp(.ttiva de pcr-
dt-T o poder pcfa via dciwrnl e pro~vdmcntc ass:is,ir ?a volta d:1hegemonia
(la~ gr-,rndc~ olig.;rquias rcgionai~. o grupo ,1uc of'.i.v·.1 no poder desde 1930
cm ,orno d e Va'l;'~ deu u m rocatlo dan, à nar,.i o: o t-:'itado iria tutelar e
condu1:ir :i wcic<ln<lc br.i.silcir:,) cnq1.1::1dr:mclo sob uma polírie1 nacional
ce1\traliiador.1 qu:tlquer outro ente feder.uivo (estados, mmticipios), com:\
proibiçáo da cxinência de partidos políticos.
Reunido em tomo de Getúlio Vargas e apoiado pelo Exê.rcico, o
núcleo de poder, encrec:uuo, não enava isolado da sociedade. Angariou
apoio de indusuiais e de boa pane das elites regionais agrárias que, apesar
dos discursos amioligárquicos do presidente, a.inda Linha muho poder e
influênci:i nos scos cst:i<los de origem. Muiros membros dti.$ oligarq11i35,
<1uc h:wfam sido rotulados como "carcomidos", adcrir:im oo novo regime
forne,-ccndo <.1ua<I ro:, burocrá.rico~ e m:rnr<.:n,lo <:~fora~ r1.:gion;.1is d<: poder.
l>orta nto, apc.sar tios di~u™~ naeionali.>ra:- e a:nrrdli7.atlo~ não
d<.."Vcmos compreender o 1-~rado Novo como o fi m da influência das oligar-
qufas agr~rias r(..."g:ionais na. política brasileira, mas sua r<...idaprar,.-ão a uma
nova din;imica política e adminisrrati\•a, mai~ ccmr-.1li7a<lor-.1, por parte do
E.stado. Sua fon te maior de poder, a poss4" de grandes propriedades 1ur.ti.s,
pet·manecia imacca, pois a poÜtiC'l de modernização industrial propost:1
pelo Escl.do Novo nlo ame1ç:1v:t :\ esrrulurl 1grária, que oonrinu1ri:1 sendo
uma área dominacb por rdaçóe.,; de tr2ball10 arcaic:1s, grandes kuifundiá-
rios e uma economia \'Oleada par.1 o S("tor ag.rocxponador.
Com os co1nunist:lS e libel"'.lis reprimidos e silenci:l.dos, Y:l.!gaS só
via na época uma força política ci.paz de rirá-lo do podtr: os inrcgraliSlas,
Poréru , c<,mo ,•irn~. ~<...Ju,ido pela pmmt~a e.li: ocupar o cobiçado e prcs·
tigioso e;irgo de ministm da Educação, considcr:,1do como uma ponte parn
comandar a domrinação das massas populares, Plínio Salgado apoiou o
aurogolpc de Vargas. Apesar da dcsconAança de outras lideranças i nccgra•
li~ra.s sobre as reais inccnçóe.s c:le Var~s em <lar opaço am incegrali~ras no
novo regime. o ;.tpoio do sco chefe máximo e c.mdid:uo :,10 posto de fu turo
t"AOO NOl'O j 19

djrador fu.scisra neutralizou as evenma.is criticas do movimento ao golpe de


1937. Eferuado o golpe, nilo só Plínio Salgado acabou nio sendo nomeado
ministro, como também Gcuílio Varga~ mandou dissolV('r a AI R com base
no dctn:ro que proibia rodo~ os partidos políticos bra$ilciro.,;.
Oii incci;,'l':ilh;ras, pcra:bcndo-sc cng:m:ido~, tcnt:1r.1m d crmba r Ccrtí-
lio :arr:,vés de um levante :.arm:u.lo. Em m:aio de 1938, milícias inu:gr~listas
in\•adiram o~ jardins da ~itléncia oficial do prai<lc:ncc no Rio de Janeiro
e batalharam u,ntra a scgurans.-a do pa~kio por V'.Í.rias hora~. Ma.\ o apoio
cio Exército :t Getúlio fi,i dc.."<.ish·o, e os intcgral~-ra$ furam clcrrorados, ac:a-
b21'1do com suas priocip:Us lideranças presas ou exiJadas.
Por que o Exército, marc.ado por valores ancicomunisrns, nacio-
nalistas e autoritários, rambém não ti11ha simpatia pelos imegralisras.
apes:.tr de compartilhar com eles esses vaJores~ Em primeiro lugar. porque
o incegralismo er:\ orga.i1iudo a p.11 lil' de uma estrulura p:tra1nilitar, com
milícias civis, supostameme prcpar.1das para o comb,ue. que não eu;1-
v3m sob as orclcns cio Exército brn.silciro, buroc:r:iric:o e profissional. Os
generais mais inRucnccs, como GÓ<.:s Moncciro e Eurico Dut~, rcmittm
não~ perder o controle dc~as milíci~~ como rambém a de)organi1a1s";4o
tia p rbpria h il:r.m1uia militar. já <1uc muitos oficia» e rnbofo.:iai') eram
simp~iticos 3 AIR. Além disso. como vimos, o im<-1,'Tilli.sm<.l era uma ick'Oloi;ia
que mobili1.,wa politicamente as mass..is, e o projeco político que pautav;1
os generais do F.~frcico no F.srndo Novo não vi-a com bon) olho) e..~~ mo..
bilizaçáo popular. ainda que conservadora e ancicomunista, pdo simples
futo de que ela poderia tomar o Estado t·efétn de um panido político ou
de rnn líder e1rism:itico.
Em resumo, o núdco civil e milit.a r q ue comandava o Estado N O\'O
~ pautava por wna ideologia autoritária que procurava fortalecer a buro--
cracia e o pacrioüsmo cívico, sem mobiU2ar as n.l:l.SSlS a p:u·cir de milícias
civis ou d<." um panido único<.· ocncrali?.:1.do, como pn.1,r.wam os fascinas.
O reforço <la liderança e do cuho à pc.,;:,,oa do prc)idcncc da Rcpt'1 ·
blica. Getúlio V.irgas, criava \lm:.'I rcfcrênci:J p:ara 3 ordem e a hierarquia
sociais, mas não significou, ao menos atê 1942, a cx.prc.ssio de um líder
carismático e autônomo. O poder pessoal de Yarg-as era a ponta de um
inbrrg polftico e burocrático que vinha sendo co1huuído bem anto tio
golpe de 1937. mas se consolidou apt}s a impfonraçáo do Estado Novo. A
120 tll'ifÓRUOOlll,.\'>11 RIPÚllk.:'"A

sua autoridade pessoal, ne.sca perspectiva aucoricária, provinha do apoio


da burocracfa civil e m il ir.ir, d~ inrtr\'cnrorias cstaduab e do seu cirgo
como prcsidcnté da Rcpí1blica sem ~ombra ele outros poderes republica~
nos, como o Poder Legislativo ou Judiciário. Mas isso e.n ava longe de se
constituir em um poder tocalitário e.xercido por um:i liderança pessoal
~ut6noma <: inconrc..u,1\'d.

A 1,:.-,TRLJT LJRA POLÍTICA 1)() ~$TAi)() NOVO

O Esrado Novo foi o momento de consolicbçáo no processo de cen-


tralização polícica e burocrátk.a em curso desde 1930. O obje.âvo central
d~ ccntrali1.ac;:'io, além de <..-vit:.ir que os vdhos :rnr:ctgoni.smos polfrico-
clcirorab t·ntrc :u uligarqui:.s l\'f;Ít>nah cat~a~m noV>..) insrabilidadli.
políticas e sociais {como na Primeira Rc.pública), era o de conduzir um
p1'0cesso de modemiz.lção económica sem ameaçar a o!'den1 social. No
contexco dos a.nos 1930, havia a crença de que o ope-1·at'iado, se 1'1:1.0 fosse
vigiado, tloutrin:HJo e tutdatlo pdo Estado, ~1.:ria uma prc.:sa f.k il par.1 a
p ropaganda oomonisra (as dificcis condiç~ de vida do operário. obvia•
mencet 1l:lo lhe tornavaJn um dt:"Íensor n.acur:tl do sistema capicalista).
Mas~:além do corurol.c policial e ideológico sobre o o per.triado, crJ preciso
implanrnr algomas medida$ legais de pror<.'çáo ao tTabalh;idor. O f.sta<lo
Novo impôs c:ssa inrcrprcraçâo à sock·d:.tde de maneira aowritária, pois
muicos políticos liberais m2.nifesuv:am resis1énci:.1 ~ i1~1erferénci:\ do Ett:\do
na regulação da cconomfa e das rdaçõc-.s de lrabalho, vistas como campos
de ução exclusivos d:.t inicialiV3 p rivada.
A d inâmica política do E.srado Novo se apoiava cm uma cstrumm
po lític.1 baseada em um Poder E.xccucivo superdimcnsionado, pois o Con-
gresso (Poder Lcgisla6vo) tinha sido fechado cm 1937 e o Poder Judiciário
c.srnva. subordinado à prl's idéncia da R<..'Pública. Esse cargo era o ápice do
Podtr Executivo e se confundia com a própria pessoa de Getúlio Varg;is,
complementado pc:fos ministérios e pelas inccr.·cncorias estaduais. nomea-
das pelo pre.<idence.
Um dos órgãos burocráticos mais imponames do rcgimt, aiado cm
1938, era o Dtparramen10 Admini~tr..1ivo tio Serviço Plíbliro (Daip). O
D-asp era responsável pda seleção. profissionali7açâo e in.spcç.ío de todo o
'"."""'"'º 121
serviço público, fuzendo o papel de um "superminiscério.. ooncrolador da
m:íquin:1 ~·t:u::il. No ní\'d ~t:id u.:LI, os dep:mamcnt():. simil:ires, c:h:1m:u.los
jocos:unenre de •·daspin.hos". eram uma espécie de conselho adminjstrativo
que assessorava o inu:rvcntor cs1adu.tl cm matérfa adminisnati\,a, Mas
também crim um espaço político de :miaçáo das cli1c.s políticas regionais
que nC{:,'UCiavarn ~nl:. inter~ juntO ao governo Ít.·dcr.tl.
Para funcionarem como espaços de plauej:unenco e assessoria do
governo c..-cmrnl, for:1m criados Ó'l,~OS ,écnicos da burocracia fcdcr:11.
como o Instituto Br:isileiro de Geografia e E.sc:.uísric.1 (rncc, 1938), o
ó.>mdho de Minas e Mccalurgia ( 1940). o Conselho Nacional do Pcrró~
leo (1938t :t Comiss.ío Executiva do Plano Sidcr(1rgico Nacional 0942),
a Cmmknaçáo c.lc /,..1ohili7.as--ão Ec;.'(J11ômica (1942) e o Con~dho Na~
cionaJ de Política Induscrial e ComerciaJ ( 1CJ44). Muitos desses órgãos.
ele eficida \'ll ri:ivcl, nn prátici, F..-1.i::im parte d o C$fi.:irçc,1 p:irn coorclcn:ir
o deseuvolvimenco económico nacional, mas ca.mbém eram. espaços de
negociaç1o de interesses pt'ivados dos grandes industrilis e grupos econô-
mico:. com <.l poder plí blico.
Fin.ilmen1t\ não podemos esquecer que, demro d:1 burocracia do
far.uJo, a~ Força"> J\rmada>, principalmcntc o Exérci10, 1iw:ram 11111 papd
político fu.ndamcncal no Estado Novo: ajudaram a i.mplamâ-lo em 1937.
dernm .su.nem:içâo política ao prc:;id eme. até mah O\I menos 1914 . e o
derrub:u·a.m em l 945. A panit· do Estado Novo, as Forças Amudas, e
parric;ularmcntc o Exército, consolida~m seu protagonismo político, jí
n:ío mais acravés da Jjderança ii.olada de a.lguns generais ou d.,s revoltas
fl:ncnt i~tas que atropelavam a l1icl'3rquia ir1KTna, ma!! pol' rndo de uma
amaç.ão organizada e coesa (apesar de continuarem cxfatindo conflico.s de
interesse e corn:ntc5 de opinião opostas dcnrro dos quartéis). O general
Góes Monteiro. o mais im.ponaiue líder militar do período, ao lado do
general Eurico Outra, afinnava que as Forças A.-madas eram "a insriruição
n.acion:tl por exceJência, que poderi.a org:miz:tr a.~ dem.1is força.~ d1 n:icio-
nalidadc... Nasceu, a partir de então, um esrilo de intcm:nçáo milirar na
polhia que se baseava cm \•.1lorcs ideológicos ,ais como defesa da ordem
social. anticomunismo c..-xtrcmo. modcrnil.açáo a:onômica e patriotismo
nacionalina. &se intervencionismo milirnr oscilava entre o libcrnli.smo
antipopular das oligarquias e a imposição de soluções aucoriciri.lS para. os
impasses polílicos e conflitos sociais.
Atrav{-s c.kssa estrutura política vigente cncrc 1937 <: 194 5, o
Estado Novo <l<."$Cnvolv<:u u ma rutcla autoritária que tanto assegurava
cerra CQ<.."$:ÍO d:ts elices cm suas divcl'S!lS fr::1çõcs e grupos de intcn..~c,
<1u:mro cc,mtrol:ava a classe operária. A partir do fina l dos anos 1930, p:trn
ganhar apoio de operários e lrabalh:u.lorc.,; urbanos cm geral, o t-:~cac.lo
Nvvo inv~tiu cm polit·icas ~ciais e sindicai~. <.-i.1lminando cm 1943
n:a Con.soli<l::ição elas Leis de 'li-:1bnlho (c:1:1). c.1uc scr5o annlisa<las mais
2dianre. Antes d isso, foi im pleme,Had:t a Justiça do TrabaJho (1939),
para mcdi2r conflilos entre patrões e empregados, e insLiruido o saJirio
mínimo (1940). Os sindicatos foram oficialaados e passaram a receber
verbas do governo, perdendo a auconomkl dada pela Constituiçio de
1934. Nesse processo> :tS lideranças mais combati\l':l.S - fossem socialisl:t.s,
.inarquistas ou comunistas - foram afustadas ou acabaram subordinadas.
O Ministério do 'lr:ibnlho, um dos ap:1111tos mais imporr:mrcs cio Esr:aclo
Novo, cc,rntrol:iv:i. rigc,iros:i.mcntc a <..-stn1nirn sindk~I.
A p-.irtir dt 1939, a propai,anda ofkial (;m como d a Abriira ~Jc Vargab
pa~u a investir na im:•gcm de "pai dm po h rc::.''. A piada tios upt:)).itor~
<lo f,.roidc,i Novo d i7:ia q1.1c Varg:is cr:i. sobr<..'fl.1do, a ..mâc dos ricos", bem
mais gcncl"OS3 e menos scvt.:ra com 3S d ites do q1.1c com os rrabalhadorcs..
A crírica é coerente com a ob~·rva\io da inAuêncfa que os grandes ca ..
picalisras e. as ditts o)jgârquic.as cradkionaLS. supoS1a.mencc afastadas da
policie.a nacional em 1930, :ti.nda concinuaram a exercer :.pós 1937. A
úo ica difereoça er:t que ago~ Va.l'g:ts> como chefe de Est:tdo, f.uia discursos
voltados para os "u2b:alhado1'C$ do Br.uil" ~ promulgav:i :algumas medidas
pt'Otecionistas que eram bem-vistas pdos operários e comrasravam. com a
negligêncfa dianre da "questão social" por pane dos políticos liberais que
domina~m a Primeira Rcp(1bl ica. Com rdaçâo aos rrabalh2dorcs rurais e
camponcsQ. porém , o fa1ado No\'O nfo atuou par,1 rctir.Uos d o círculo de
poder dos coronéis e da miséria secular a qt1e estavam condcn;.1dos. A r:R:áo
era simples: os operários mOO.nos eram um imponantc foco de rebeldia
social d<.-'Sdc o começo do s&:ulo xx, e entre c-les os mais sub\-crsivos eram
os an:m1ui.st;u e os 001nunis1:1s, que atuavam cm prol da m•oluçâo social.
Os campon~. apC$.1r da grande tensão social existente nas áreas n1rais.
ainda não conheciam organizações e movimemos influenciados pela ideia
de uma revolução ~ci:al (eles só ~urgiriam nos anos 1950).
l~sa nova cs1ru1ura de l~cado tentava rc:ali,.ar os princípios dcícn~
djdos por teóricos do autoritarismo, como Francisco Cunpos e Oliveira
V1anna, que propagavam ideias como "'racion:tlid.1de ;1.dminisr.raciv:C,
<lirigismo cconôm ioo, unidade polhiC".1 e supremacia da au1orid:1dc ctmr.d
sohrc os c.ua<lm da k:dcrasã<>. A obM:Máo pela "organi1.ac,io", imp~ra <le
dma para baixo, aparece em codos os discursos aucoric:í.rios da época como
uma necessidade sem alrem:uiv~, democd.cica, posto que o Brasil era vino
<:o mo uma M>Cinl:u.li.: "fr.:ígil" e.: c..·tmAitiva, .sem u ma dite nacional <..'a paz tlc
~ impor moral e politicamente ao conjunte;> cb .!,C)t.it:dadc. Em o f..srnclo.
conduz.iclo por um, burocr:u.ia técnici e mtd:ir, qoc deveria g:ar:intir o
descnvolvim~nto nacional ncss:is condições e, :i.o m~smo t~mpo, proc~gcr
a ord<m sodaJ uadicional, fundada na primazia d.1.s dices oligárquicas e
burguesas e n()s valores c:nólic:os.

A 1.lJTA PF.I A i 'J Dl,STR IA I.I ZACÂO

Após a Revoluç1o de 1930, o Jlovo regime pareril nio ltr wnl


polític:a. econ6miet muito cl:1r:1, oscilando entre uma defesa puramente
rct()ric:a tio dcsc:n'"oh•imcnt() ind o.strial e m<:didas pr..ítica$ <lc valori1.aÇ30
do café e de otmos pnxhnos ªb'Tlcol:.is ,·olmdos para o mcraado e>.t erno.
No tlnal do~ 'lnos 1930, eue qu:idro começou a mud.u. O acir-
ramemo dos conflitos gcopolíLic:0$ cmre as pocênc:ia.s capitali.st.u mais
d<;$Cnvol\lidas do m1.1 ndo, qt1e levaria à rcrrh,:I Scgtmd:.1 Gucm1 Mondial.
deixou mais d ara a necessidade de indusrriali;,;ação do Brasil, sob o risco
de perder su:.1. autonomia políLic.1 e n:io conseguir defender-se: em caso de
agressão externa. NJo por acaoo, os milhares e.ramos majores cncusiascas da
industrialiiaçáo pesa.da, qoe dc..""Vcria começar pela criação de siderúrgicas
e pelo dcscnvolvimcnro da indústria do pcuóleo. Sc:m <."SSCS dois setores,
qualquer país se lOrnava milüarmcncc frágil. tcmerariamcmc dependente
do poderio industtial dt.s potências que caminhavam pa.r.1 o pior oonflito
mundial da história.
O Bra, il tinha orantle.,; recu~os naturais 1 como minérios e lárcx, e
amplo potcnci3I parn produiir 3limcntos. Sua estrutura :,1grária baseada
no latifúndio agroexporrador, suas grandes extensões de lerras improdu-
tivas, seu parque indusrt'i:tl pequeno e quase todo voJcado p::tra produçfo
tle K-cidos e .-ilimcncos semi#indm1riali1..ado~ não Íoworcciam o pleno d e·
scnv<>lviméntO <lc um parque ind ustrial amplo e moderno. Além disso,
a inid:itiv::1 prÍv-!t<l:i (burgm..~Í:J indu,iitrbl) não rinh:i <.'3pirais suAdent(~
p;ira cri,:.Jo. Hhwricimcnrc, o Hr:a~il era dcpcndcme <le capic-.1is e: ti.."Cn<.l~
logia vindos tio ex1crior.
A partir tio l,nal tfo.li anos 1930~ Q Estado pa.~wu a aruar <lireramcn•
te no ~tmpo <.-conômic:0 1 vis:mdo cs,imufor o desenvolvimento indunri:il.
Como pl:rnej:idora e reguladora dessas poJfrjc:as, 3 bmocr.1cia esr:ataJ
tentava direcionar os recursos huma.nos e financeiros para decerminados
setores da economia considerados mais imeressames e estimular a produ-
çio ~rícola e indwu'ial. Nos anos 1940, o Eslado brasile.iro passou a criar
empresas estar:1.is para produtir bens i1'\dustrialiudos que exigia.ft1 ouis
invcsümcmos, como as do setor de máquülas e siderurgia. Entre.ramo,
reiteramos <Luc cs~ no\,1 ~ pd do t-:Sratlo não .liignifi<.~Y:t n submii:;$:io doo
gropos priv;ufos cm nome; de lima <."Conomia nacion:il (;Sf",ni7.:tda. A fo rma
(h.· funcionamc...... w dos orwrnismos burocf",fricos privikgi-:wa as dirc..·~ cCl),,
nômica>, tanto do ~tor ªbroc:.xporr-,.uJvr quanto do setor industrial. l•or
<.-xcmplo. :i,é 194 1. foram compradas e qucim:id.1s ccrc:.1 de 78 milhó<.'$ de
s:1cas de a fé, para gar:1ntir o preço do produw no mercado imc;rnacional,
pf\-S<.'.f,rando a rnafb'Cm de lucro d~ cafdc..·uhorcs, uma mc..'tlida muiro
próxima daquelas políticas pralicadas na Primeira República. A novidade
era que os iucel'esses da.s oJigarquias atadas ao seu agrat'ismo tradicional
de\'eriam p:tSSar pelo crivo de um planejamenlo escuaJ co1n visu. a acingir
u m no,·o p:u.;unar de dcscn\'olvimc.nto nacional, \ oh;1do p:ir:i a indus-
1

trialização. Não por acaso, grandes industriais, como Robcrco Simonscn


(fundadol' da Federaç:lo das lndúmi:u do Estado de São Paulo - Fiesp),
fa~ldo Lodi (Confí.-dcração Nacional da Ind(I.Slria - t.;NI), Américo Gia ..
netri ( F{.-dcr.a~o lndm,trial dc Minas Gerai~) t: Guilherme Guinlc (Comi!!~
5áo E.xcc,1tiva do Plano Siderúrgico Nacional). eram frcqt1enrndorcs dos
circulos do poder polírico no Estado Novo.
Os recursos in\.'estidos pelo Estado no desenvolvimento indusrriaJ
poc.leriam ah~ propiciar hencsses à sociedade no longo praw, ger.ando cm~
p regos e rendas. lvfa5 era d e F.no da q uem bancava 35 despesas. Em otitr.is
i,,1Arx, NO''O 125

palavras, o Esrado, através de impostos e cribucos. recolhia dinheiro de


wda :a socied:adc e inv~tia, qo:tsc .\Cmprc, cm :ir(;.15: <1ue envolvi:un gr;inclC$
aportes, como a s ic.lcrurgia ou a inÍr.il~Uutura (cstrad~. energia. porto~).
Essas atividades não desperrav:.un o interesse dos capitais privados. pois
exigiam muiros in,-e$timcmos pr(.,..ios e não war:mriam gr:mdt.~ lucros no
cuno pr.110 como ou1ro~ ~ mo~ da indt',srria.
A partir de l 937, houve wna renradva cst:.ua.l de regular a economia
também uo plano excerno oom visu a.: redução da dependência fi nanceira,
controle das rransícrências par.a o <.-x1<.-rior, csrímulo a moe1nismm de pou~
pança intcrnm. t·:m 1938, o sovemo h ra:,ilciro st~pcmku o p.1gamcn10 <la
divida externa.
A n:,6rie2 nacional~ta do Esrndo Novo, cnrrcr:mw, n~o (k-vc obs--
cun.,"'(;cr a aná.lbc hi:.tórira m:ü.:, ,ri1ica e aprofirnc.l,u J;,. Muit~ dccrt'tu~ki.>
q ue nacionalizaram secores importa.ntes da economia. como o setor de
petróleo, baocirio e e.oergil elécrica, foram ineficazes conu·a j. pressão dos
intcrc~~ priv-,ulu~ c.~rr.ingdl'U-\ c.1uc dorn in;iv;1rn cSSC) M.'turn.
N ém disso. foj durame o Estado Novo que a influência cultural e
econõmiCl escadunidense s-upb.ncou a cr:adicional prese11ça de franceses e
ingk~(.~ nc.~ rcspc..-cth..,u á rl'3), A C(1ca,Cola, por l."Xcmplu, rid.1 rnmo sim,
bolo máximo do e.apitai ismo n o rn:,amcrican u. chegou ao füa>il c.:m 19/42.

A IDEOLOGJJ\ Ei\ RcJ\LIDADE SOCIAL


l)lJRANT~O FSrAllO 'IOVO

Afinal de contas, em meio a tantas contradições e inceres.ses que


cemava conciliar. como se pode deflu ir, política e ideologic..'Ul.1.ente, o Es-
r-.tdo Novo? li.ir-.tv.'l ...sc de um Esradu fa~dsra totalirário? O nacionali.smo
apregoado pelas suas dites políticas cr..t efetivo o u mera rctc)rica para iludir
as nussa.s? O Estado Novo conse,guiu impor o modelo corporativista :i
socicda<le b~iltira, como defendiam os seus ideólogos autoritários?
Nus di.scu~ ele suas liclc:ranças e ideológico~. u E.srndo No1,·o era
definjdo como "dem.ocracia autoritária", expres.do conttadilôria em sj
mesma. O projeto ioici:tl dos ideólogos es~d~ novistas era o~ n i.ul.r uma
estru tura poH1ica corpor.u iva, altamente ven icali7..ida, garan1ida 1~10 cuho
à pcr.;onalidadc do prC$idcnc-c da República e pela roteia de t.im &cado
126 tlN fÔR l,' (Xllll,\\11 RIPÚJ.l k,"A

sustenrado por uma burocrada técnica Só assim. conforme os defensores


desse projeto, os conflitos regionais e sociais poderiam ser superados. g.1.-
ran1indo o "<lc."Sem·olvimcntoc a in1cgraç!io nacionab". Na prá1iai, por6n,
c.S.Sé modelo corporativo cn<:onml\".t r<:Si..\tC:ncia.\ dentr<> dos scwrcs mais
pragm:írico.s <Jo próprio g()V<:rno e de bo:, p3rtc d:tS clifcs n.-gion3is e da.s.scs
médias urbanas, .!inda fortemente marc:id;as por ~1lorc:s liber.1is. A rigor,
a i<kologia corporati\•i~1a projc1~da na Úrt'.t de 1937 foi lctr'.t mona cm
t'lu:uc todos m ~l.'torcs da vida br:uilcim, e pou<.'(> moc.liÍléQu a~ a,:tn.ttu~
soc:fais vig<.."llH.'S. A {mic:a :ín.-a <.1 uc, a risor, cb se impbntou1 foi no sindio -
lismo oGci:aJ atrelado ao Esrado.
A ideologia nacionalisr:i., por sua vez, scr..,ia pa.ra inculca.r um
comporramemo político nas classes populares. e me.lhor comrolá-las, des-
qualifiC:llldo os conflicos socjais que supostarueme :uneaçavaru a unidade
n:tcionaL Ao n\et1uo ,empo, propicil\'j. maior cofilo eJH1'f: :lS eliLes, n.t
lcncadva de blindar o go\·erno lêdcra.J dos secuJarcs imercsscs e conflitos
localistas e n.-gionais. A rctóric:t nacionalist:.l do Estado No\'O ,ambém
servia (:Y.lra ~firmar o papd do f.srndo como construtor da "bl'iilsilidadc",
cxprc~sad.i por novos valores <,,"1.1lm rai~ nacionali.sta> <.JUC dc.."Vcriam conso-·
lidar a ligaçá() da~ ditai com a~ mas11as populares. ' ll1Clo i~ ~oba rntda
cio presidente da H.cpúblic:.t, o "tr:ib~lhador ntlmero , ... C:()mo d i?.ia o
propag,nda da época. A b~sili<.fadc cnado.. novina d c;veri.1 propic;iar um
encontro simbólico ,·nrrc todo.s o~ grupos sociais, na Íormaç:io d<.- um no\'O
Mhomem brasileiro", acima das divisôc.s de classe e região.
O Estado Novo, mesmo cricicando as formas liberais de organi•
2:.:1ç.io polílica e social, e defendendo as supost:l.S vinudes do :tucoric:1-
rismo no controle i;obre a sociedade, n2o deve ser confundido com um
Estado totalitário de tipo fascisca. Nunca houve o dcscnvolvimenco de
mecanismos institucionais ou políticos para controlai' o indivíduo e
c.1nalizá-lo para um determinado organismo polt'rico-id<.-ológico, como
u m pan idu de ma~,>a5 o u urna milícia par.ic:-.tacal, como foi comum
na Alemanha naz.isra. por exemplo. lnscituiçôcs trad icionais. como a
Igreja Cacólica e as Forças Armadas, continuavam ccndo primazia na
formação de valores religiosos ou parri6ticos que não se anula\fam, nem
competiam enrrt ~i. A economia nunca foi e:omplerarnentc au1án1uio
(:unossuficicntc), cst.itinda ou controlada por princípios corpornti..,os
l:,IAOQN"''O 127

que anulavam os agences privados e a livre circuJação no mercado, aliás.


cad:a vez. mais inregr:ufo 2() c:.ipit:ilh,mo mundial.
A e.strumra burocrática do Ministél'io do Trabalho e dos sindicatos
a ele imcgr.ido~ pcrmantuu, ao menos :ué me.~d4» de 1943, 2pen :a!I isso,
uma estrutura mcramcmc burocrátic.1 de controle soci:i.l. N5o houve,
até esse ano, uma efetiva id eologia <lé mo hilizaçáo Optr,h-ia cm tomo
da figura de Vargas, acé emão assemelhada mais à de um pai, às vezes
severo, do q ue 2 um líder c:1ri.$m:ific:o de massas, comc,1 foi J 11.,1 n l}omingo
Perón, na Argencina da mesm:1 época. Quando V:U'gas resolveu esboçal'
um:1 polírica mais <lirc:,amcnu; lig~da 3 mohili1;1ç:fo dos 1r.1lxilh2dorc.')
cm torno de s-u;i liderança pessoal, o E.ti.ido Novo caiu, prcssion~1do pela
d irc civil e m ili1·;tr tjUC não via t:o m llOII) o lho~ Q)<I rnuc.lança tk ci xu tlc
poder. Para eles, o poder de Vargas devcfla se swtenc:ar na sua posição
burocr:ític:t cm conexão com as elites PQlírica$ e C.."Conc,lmic.1s. A bnsc..1 de
um apoio n.a classe operária, na perspectiva dessas elices liberais cradi-
cionais, poderia dar um.a força ao poder pessoal de Vargas que 1110 Uies
inu.:rcssava, Vale lembrar qm~Vargas nun~ tinha sido uma unan imid.ide
emre as o ligarqui:u, como :uesc:un :is im'l llltras opMiçóes e revoltas que
de rinha c.: nfn.:ntado ;ué o a;olpc do E:n:ulo Novo.
Um dos aspcc.los idcoJógicos mais curiosos da retórica ofkiaJ do re-
gime estado-noVlna era o con:;rantc u:10 ela p:ilavr.i "dcmocracfa.. enquanto
praticava o auto1·it:1.1·ismo e usava e abusava de ce11su.r.a, da vigilância policij)
e das insc-iroiç6':s burocrâtias impositivas e.~ nm.:larcs. V~rgas <.li?ia defender
um:i ..dtmocraci:i sociaJ", fo nn:a suposumtnte aprimorada d:a dtmncracia
moderna, voltada p;:ira a rtali-,.açâu da jm,tiça 5.tx:fal e p.ar.1 a proct--çâo do
tr.ib-alhador pobre. A "democracia política.. liberal, voltada para a liberdade
do indivíduo, era criticada como um símbolo da$ dcsig,u:ildadc.s e do de$-'
caso do antigo regime pré· 1930 para com a · questio saciar. O 1mbalha•
dor urbano no Brasil do Esrado Novo era bombardeado com mensagens
p:atriótic:a.~ que o consideravam :a base da gmnde2.1 nxion:tl e Le.ru:h•am
dotar o trabalho de valor<.-s transcendemais e sublim<.-s, ainda <1uc o salário
cominuassc baixo para a 1m1ioria e a mi.séria íossc sua realidade coddiana.
Quando muito, o f.st.ido Novo criou .ilguns mce3nismos de oompcns.ição
ma1crial e mediava. através da Justiça do ' Ji-abalho. conAitos cnrrc tn1ba·
128 tlN TÓRl,'001~\11 RI P(lll a;'A

lhadores e pacróe.s. Oiame do que ha\lia ames. isso não era pouco para os
trah:1lh-adores, e ness:is medi&~ lõC :mcor.:ava pane d:i :ides:io dek'$ :, V:irgas.
1'-.ara f.worcccr :a imagem do go,•c:rno e do regime;, foi criado o
Dcpanamcnto de lmprcns.1 e Pmpag.ind.i (01r), cm 1939. Na verdade,
o governo já di,spunh.i de um órgão oficial de propaga11da de.Mie 1935,
mas nada comparado ao tamanho e à abrangência do novo Deparramenco,
<1uc cui&l\':a da propag:mtla oficial e da ccnsur:t 3 imprt.."0$3 e aos meios d(."
cc,lmunic:aç:io :ao m~mc,l rcmpo. O DW se b:a.sc..~v:a nas nov-.is técnicas de
comunicaçlo de m.a.ss:t, ampláme1He uciliz.1d.u pelM regimes ,oi:aJidJ'ios
<1uc ~urgir,1m no.> anos 1930, como o n~rú~1no alemão e o fuciMuo i1aliano.
Para os lCÔricos do autorhari.smo, a propaganda deveria se comunicar por
meio de imat:,rcns c símbolos, poi$ ~ masi;as populare\; cr:-tm vi.sras como
ingênu:ai e scmiment~is, sem capacid~1d c de rndodnio crítico. Essas téc-
nicas induí.:tn\ a ou.nipu.la~o psicológica dos rec.eprotes da me1\S3Sem
propagandísrica e o uso de n<wos meio~ de: comunkaç:io, comc.l o ci ncrna <·
o d.dio, cujas tecnologias se aprimoraram nos anos 1930.

O RRASII . l'A ( ;t:OPOI.ÍTICA M LJNDIA I .

A crb.c mundial da década <lc 1930, cm um mun<lu aintla aOOlatlo


pdo.s problcm.is econômicos evidenciados cm 1929, enfraqueceu as po-
tências capitalista:; ccmrnii;, permitindo <JUC paí.s<.., clcpcnclcnt~ como o
Brasil djversific.i.ssenl suas parcel'i:lS econômicas. Obviamente, esse jogo
diplomárico e comercial era complexo e arrisetdo, po is c..m um mondo
cada ' '(.."l. mais dividido e conflagrado era dific:il se.· mamcr ncurTO e cquidis..
t.intc dos conffüos gcopolíücos. No CISO do Br:as:il, 2 trJ.dicion:il inlluC:ncfa
i nglc.a e francesa era cl i~purada pur m.w·d~ potências. como E.'lrado~ Uni<lo~
e Alemanha. Em grande parte, a goopolfrica brasileira dos anos 1930 foi
marcada pdo:; interesses desse:; dois países.
Vi.rgas, sabendo que seria. impossível romper com os nonc-amcti-
C!l.nos, m.1~ 1:.unbém sem quc~r deixar de se :aprovefr:ir do cre«imenro
<la economia ale.má, man1cve...se nculro até o oomt,ço da Segunda Guerra
Mundial, cm 1939. Até esse ano, diga-se, a principal parccrfa econômica
do Brasil no mundo era c.om a 1\lcmanha na1ista.
Aos ollios da oposição, ramo a liberal quanto a comunista, a recórlca
n:1.don:1lis12 e as pciticas :mroridri:ts assumiclas pck> Ê.$t:tclo Novo w ma~
vam o regime 1nuito parecido com os fuscismos que dominavam países
import'Jntcs da Europa oos anos 1930. Flclivarncmc, nos ahos ~ló<.'S
do Esrado brasileiro, náo fo..ltw:un simpaüza.ntes do naz.ifuscisrno mesmo
ame..,; do Golpe de 1937. l'ara cSto, e.> MIC.."'CSSO ("COnômicu e.la Alemanha
nazista, renascida ocono1nicamenre das cinzas da Primeira Guerra Mlu1-
cli:il> e d::i Itália fusci.sta cr::im cxcmplo!.i a serem $C1;uicl0'$. Nesses países, o
corporacivis1no e a repl'e s~o haviam ;tfuscado a ame::i.ça comunista>a eco-
nomia n:ac:ion:al ~n.-ci:a se livrar d.a inAul:nc;i.a dos cipit'Alin~s cstr~ngc:iros e.~
a ên fose no miliL3rismo expansionista os ha\•ia recolocado no jogo político
inu:rnacional, temidos ;11é pda.s vdha~ puu':ncia.s capir-..eliuas como Franç-a e
lnglaterra e pd..1 nova potência oomunlSca, a União Soviética. Mas, no caso
br:uikiro, co mc,1 vimos. nem as N:,rça.$ Armad:i:s, nem a lgn.ia C.'lrólict,
nem Getúlio Vargas. pessoal.ruente, tinh:.un muita indituç,.•fo pelo modelo
foscist:1-cocal.icfrio, embora náo t~w:is~m o aucorita.l'ismo com algumas
d<.~ do modelo corporarivisra Ctlmo fom,~ de go\'<.~mo e mrcl:4 social.
Emrtr:rnto, 2.1é a mcLade ela Segunda Guerr:i, mui1.1,; lidcranç:i.,; po-
li, ica11 tio l·:...raclo Novo dcf'cndiam a t ~ de <1uc o lk,1.sil ckvcria cnrrar no
Gonflico ao lado da Akmanha.. cujo triunfo militar parecia certo. fllinco
Moller e Eurico l>utra eram os maiores cntusia.sras de~ alianç;.1. Afinal.
até o começo de 1943, os Exércitos de Hitler não tinham perdido nenhu-
ma baralha sequer e dominavam boi parte d.-e Europa e do norcc da Áfriat.
Mas náo er.1 as.sim que V:.1rg:a.s:, Osv:i.ldo Aranh:i (mini.,;tro da.,; Rel:a-
ç6o E.xtcrio~ entre 1938 e 19-'i'í) e uutr,1.s litlcr:ança) i.-nporr:antcs p1.: nsa~
\Iam. Muitos menos o prcsidemc Fmnklin RooSC'\ldt e boa pan e da dice
polítia e econômica oortc-amcricana, que desenvolveram :,1 "Política da
Boa Vizi.nhançl." para se aproximar poücica e culturalmente de brasileiros
e latino-americanos cm geral, cvirando que as d ites políticas do continente
fossem comamin1d3S pe]o vírus do naz.ifa.scismo. Em outubro de 1940, os
intttesscs do.s t- UA M: tornaram mais claros, com a criação de uma agl:ncia
de coordcn:ição de programas de colaboração c:mrc a potência do norte
e os países lacino•amcricanos. chamada Offir.e of the ôx,rdinator of lut<r..
America11 Affeirs (OCIM1.), dirigida pelo milionário Nelson Rod<fcllc..-r.
Para o chanc,,Jer Osvaldo Aranha, o Brasil deveria fazer parte da
aliança oddencal com:utd:ida pelos Estados Unidos e lngl.atem contra o
na/ifascismo, vi.,,.co por muitO-'I liberais e mQmo por stiorc~ conscrvadon.-s
tradicionais corno uma ame.aça ráo o u mais tcrrf\'d do que o próprio oornu ..
nism(). Aftn:11. a idcolog:i:i. r:idJ;t:J, a violência policial e o con trole abS()luw
das consciências individuais e c;l:a vid:a c;uhur:al pd~ n..-gimcs ro~li,.irios de
c.lirdta <.TJm uma ameaça à) tr.ic.liçõcs humanbcas, rcligio"'" e liberais c;1uc
infom1a,•:1m m uita:. tlc$.'J.a$ pcssoali.
A ix1rtir de 1940, o governo nortc-amcric:mo sabia que a cntr:ufo
dos tirados U nidos na Segunda Guerr:i era tuna que.s1fo de tempo, apes:u·
de uma boa parte da opinião pública do país ser contra o envio de uo-
pas para acuar em um conflito que julgava ser um problema unicamente
ew·opeu. Alem disso, as mafores ameaç;tS aos interesses none-amel'icwos
n1o es1:avam ft3 Europa, 11):l.$ no P.td fico, onde o Império J;-iponês dese1'1-
volvia uma política expansionista bastante agrcssiv~, :uncaça.ndo interesses
goopolíticos e cc:<,lnômicc..lS dos f.l lA na Ásfa. Vale lembrar, o Japão, dC$<lc
meados dos anos 1930, era um aliado c.,,;rrarégico dos fascismos europeus.
A~~im, para Roo~(.vc,:lr, .i gm·rra concr.i o J-'pfo camll<:m dc\•cria ~cr uma
guc:rra contra o n,17.ÍfuM:~mo europeu.
Ma.s afinnl. o <1. uc o Krasil rinha n 1;,:r com wclo csrc xad rez dn polí-
tica internacional dos anos 1930 e começo dos :mos 1940? O que om país
subdesenvolvido e, \'ia d<.· rt--gra, padfko cinha a v<.·r com a 1crrívd S,-sunda
Gtu~rra Mundial que acomccia, sobl'crudo, cm ctrras cmopc:ias? Por que o
Brasil intet'essava ta.mo às principais poréndas em disputa~
O Br.:LSil, por ronta de SU.3 posiçio estf"Jlégica no continente a.ineri-
c.,no e de seus recursos naturajs, era contjado pe:fos potências cm coníli10.
A panir do começo de 1940, os Estados Unidos passaram a pressionar o
governo brasileiro a se aliar às democracias ocidentais. e oorrar os supriJnen•
cos de marérias~primas para a Alemanha, exigindo <..-"ICclu.sividadc na com ..
pra c:lc mincr.ii-. brasikiro:. (OOuxira, fcrro-níc:1ucl, <liamanl~ industriai~,
minério de mang;;mês. mica. titânio. entre ootros). E.s:5c5 minerais eram
e.sn,uégicos para a indúStTia bé.lka. Outro produro prí.m:irio imporrantc
para o esforço industrial de guerra era a borracha, cuja macéri-a..prima, o
lá1e:x, era produ,ida em poucos lugal"t"S do mm.do, emre eles, na Am;tzônia
brasileira. Como os j:.1ponC$CS dominavam a outra parte do m undo que
l ">IAl'l()NQ'l,'O 131

produzia o látex, o sudeste asiátjco, o Brasil se tornava praticamente o


único fornecedor mundial em grande escala para as poténcias aliadas.
Além disso, a posição geográfica do Br.asil o 1ransforn1av·,1 numa c:v
pécic dé ''porta de éntrnda" das Américas ém <:ruo de urna irwasâo nazi.Sta.
Ocp<.Jis c1uc vcnccr:1m :i França cm 1940, Qli n:11Jsr:i.s dominawm também
~ c-0lc.\nias frana.~ cio norte da África, pomo n:l:uivamcntc próximo cio
Nord4."SCt brasileiro e, oon.:cc.1uentcmcnrc. <.lo continente americano. Apaar
de muito improv.-í.vd, no <."tJmcs.-c,• tia g ucrrn havia uma pr(vcupaçâo real d os
Aliaclo.s com uma pOiõ:iÍ\'CI invai;âo n:a1Jfu.sci$tn :io CQndncmc americano,
agravad.1 pelas h~ictç6cs da Argentina em se juncar l aliança aotifuscisca
liderada pdos Estados Unidos. As grandes colônias alem.is e italia.1i.1s no
SuJ do Brasil passaram a se,r visc:as com desi.:onfiança. pois eram tidas como
ali.adas potenciais dos E.xét·citos alenúes em caso de invas:io do território
br:uilefro. Sobre el:\s, aliis, o Esc.1.do Novo desenvoh,eu uma in\pbdvel
política de vigilância e nacionaJiz:açáo cuhural, proibindo. por exemplo, o
e nsino ele nlcm3o e itali:mo na)) cs<.l)l:is com\lnir:iri:i.$ e rdii:,•i o:ms <l:1 rcgi3o.
Par.1 Oli brcncrn,ili br..&Silciro.s, :iÓ havia sentido cm entrar na S<.'g\mda
Gu,-rr-A M· ho\WCS).C .ile,uma v-,rnr-Agcm militar rc;rl, wmo o rcc<.1uipamcn10
do m:ncrial m ili,ar e a ~uh.\tituiçío do obsokt<J marcrial IX:liw das F<Jrça">
Ann:.td::is brasileiras. lnc:<.lrp<.nando <.'$SC ptQjcw. V.ir~ e os gnipo:i ind\l$•
criai:i br;i.silciros .su.srcnmY.1m q\lc a alia nça com os HJA dl~·cria ter orna
con1raparrida na fo rma tlc um impulso par-.a o 1>rojtro (lc in(lu~criali'1.ação
do Brasil. Nc.ssa direção, uma série. de acordos diplomáticos e mifüa.i-a foi
assinada com os CUA encre l 940 e l941. Em j:u1eiro de l942, pressionado
pelos EUA, o go..-erno brasileiro rompeu relações diplon1:hicas com as po-
tências do Eixo. O Dr.isil íinalmcmc tinha escolhido um lado na guerra e,
como contr.ipanida. obrcvc. algumas vamagcns oconómicas. como a cons-
trução da Usina Siderúrgica de Volta Redond:t (Companh ia Siderúrgica
Nacional), financiada pelos t.UA. Mas cambém pagaria um preço ale-o pela
~ua dc..-ci~o diplom:h ica.
Entre fevere iro e j\llho. vários n avios brasileiros fora m rnrpcdcados
e afundados por submarinos alemães e iraHa.nos. a maioria no Caribc e
no Atlântico Norcc, ausando dezenas de mortos. Em agosto, a guerra
chegou mais 1>erto du 1erri1ório b rasileiro, e ck m:rnei r-A panicularmen1e
trágica. Em :;1 penas cinco dia_s. um único submarino alemão (U507) afim.
132 tlNfÔRl,'(Xllll,\\11 RI PÚJ.lk,"A

dou cinco navios mercames brasileiros, mat:.1.0do mais de 600 pessoas,


civis n :t csm:awidor:1 rn.1ioria. Acé cnr:lo, apcs:1r de rom p er rcl:aç~ com
o Eixo, o Brasil se declarava neutro em relação ao envio de tropas para a
gucrrn. Mas depoi.$ <lo "Agosto Trág:ico"', e da t,'T:lndc c(1moç:io popul:1r
causada pelas centenas de mortes dos seus cid.1dios, o governo btasileiro
rccunhccru o "'estado <lc bdiJ:,kCrància" cntrc u Brasil e as potC.:ncia> <lo
Eixo. Houve protestos populares contra o nazismo, organizados por es•
tut.l.mcc~. e m:mifosr:açõts popul:trt.-s conrr-.t t.·sJahckcimcn,os comcrci:th
de ila.lianos e alemães, principalmente. Em Curitiba, até uma loja de um
comcrci:mtc sirio-lib:rnês <pie vendia H.'C:iclos de mu.ssclin:r foi saqucacb ,
poh :t mulcid:lo cmcndcu que o nome c r:a um:t homcn:igcm ao d ir-.td<.1r
i1aJiano, IknilO Mussolini.

A l'ORÇAliX.l'EVICIONAluA URASIUllRA

A p:1r1ir J11dct.-l:1r.K,':h1 de guerr.,a ~.) "p()l~11(,.'1:w d t1 F.bcc,M, o., mo,::1r.uu <>l pre-
p:1rn 1h·1» par.i ., tmvit1 Jewldado!.' lm1~ilei".1~ i', F.o">p;1, (•ucle: c.leve:ri.J:rtl ac tiar wb
as ordens do J.:.Wrcito dos Estados Unidos. l !ouve wtu grande dificuldade para
m:rucar soldados cnuc a pop1.1Jação bra.1lkira, pois muitm elos convocados ou
mc:..,ino ,~,luruírioi. 1inh,1m pmhlcm,1~.'iéri<l!I< ,lc ....11íde. t.'Cnnu \·c ,minc)i,ci.. (.,lu
de dcnics e m:b OOll(liç(,ei, f'i.!l i(;!b (~•id(.) à ,di,ncm:11,--:io precári;1,
Porim, mesm<> enfrenrnnd<> dilic.'\1lda,dei, hum:rn;is < matC"ri.1i.s, 11 Fon,~1 F.x-
pcdicioniria Br:isilcin (1LB} foi cmOOrc:Kb cm meados de 1944, envi.indo 25
mil homens para a !titia. Além disso. foi. orµuiz.:ido um g.rupo d e aviação de
<;;1c;;1, cml,ri.íi.1 d,, hJr1,-J Aén:,1 Rr;~lcirn (FAR). F.r,1 11m,1 form:1 t.Qntum.lcmc de
dernon,, 1r.1r c1uc o F,)1,1tlo No"tc)lo1v.1 ,li) la,loc.l.b tlem1K.r.ld.1~ tK.kle111.th 001111~1
o iuz.if.udtmo, cmboia de mesmo não fone um 1cgiine demoer.itiro-lilxul. A
p1rtkip:lÇ10 de tc),•e-ns ofi cbis br:u:ildr~ n:t FCI~c.:imbtm ajudou ::i aumentar a
inAuim:kl dos F..s1ados Unidos n<> F,,cérd10 br,,asileiro, supenndo o 1mdkional
prcdominio d:as J.oucrinas nnlimrQ. Írat'M,:es;AS e .ilem,1,s.
Ainda que tenh.1 tido uma p.11tidp:tçâo pequena na Segunda Cucrr.1, :1
f[B atuou cm bamlhas importantC$ contra o txército alemão na freme ir.tli.ana,
c.vmo :1 Je M(mlc C.b1do e a Je Momc-..'ie. F.m Monte CbCc~, ..1 ffR panici(k)U
de um2 lur.l i..1ngren1.i. cnírcnrnndo, ;1k111 dos2l,cm/ki. be111 po.sicion:idos no alio
d:i 1noornnh2, um invet1l-O rlgOtOSO com o qu:iJ ~ SQkl.;ados br2S:ilelros ntlo ena~
\':tnt 2co.srunudos. 1'1ra os italfanM, :t pudcip::iç5o hr:1.~iklr::i it con.~idtra.d:1 uma
contribuição $JgniOO'là\•a na cha.m2d.1 "Gu(rr.l ck Libermç.io" local cont:r.t o
n2r.ifascismo, oom<.>ate5t.un <lS ,·.í_ri05 monumcnto:i e memoriais ao, ..pr.ici.nhl1S•
bra~ilcir'Q~ que luur.un e n1ot1c1,un n.tt1udc 112í~.
t.">IAOO N0\10 .133

da H-8 ru guerr-.t vem r~~ti.erul(> !'lten~() Crê!,C'ên1 e d::i h is-


A p:1rcid1).1Ç:I()
tcwiogr-.afi!'I e d::i cultura de
m:LSS,'l no Br.uil. oomQ mQ.Slr-.tm os muitos livros e
filmes produtidas 2 ~s.sc ,~ ito. Oe.nuc os ,·i1ios uah.alhos que~ dd>tuÇ.lm
sohrc o u~umo. v-.tl< destacar os csrndo11 que, ,dém do,; asp«c~ que d i,.cm
rcspcico dirctuncmc ~ l listóri2 Milit:tr do conflito, rcmerc.m 2 ourras qucstócs
históricas C' culrur.1is, Por o:cmplo, CSSlS nov:u pesquisas rcvcb.nun que, aos
olhos do.s nonc-amcricanos, os bar.a.lhõcs raciais mistos da íEB C'ra.m Yisros com
dcxon.6auça e curiosid..tck. pois negros e brancos nortc-anmicanos não luta·
vam lado a lado. dada a ttadiç'lo Kgrcgacioni.«a do pais.

A G UêRR/\ I! /\ CR1SI! DO l!STADO NOVO


Se não foi decisiva para o dcsfcdio da Segunda Gum• Mwidial, a
enrrada do Brasil no conffico abalou a poliôca incerna. Os opositores liberais
de V:.rw1,s e do EimJdo NO\·o .se 2pr0\'<.irar:i.m (Y.lnt 2ponc-..1r orna contr:1dic;ão
f;.mdamc..'.1'1C.tl do rc..-gimc: <1u::il a wcl\'.11ciá i<kológia e.lo um t;U\'crno que do-
minava um país de maneira tlit'.ttc,ri:~I e ao m~mo tempo lurnva ao lado da$
democracias libcr2i5 contr.t o n:11.ifusdsmo na Sct:,'l.md:i Gt1crra?
Dentro do governo, a opçlo pelo lado Alil.do 1:narcou o :tfosume1uo
de quadros impommcs, idemificados com o '"panido gc-rmanófilo.. (que
de.fe.ndia aliança oom os alemães), como Francisco Campos. Lourival
Fontes e Filimo Muller. Pa.rado:ulm.ence. os co1nu11istas, cassados i.t.npie-
do$:unente por V.,rgas e sua polida desde o Jev.1nte de 1935, p1Ss:tran'l :t
.tp(liar o gm·cnw, cm nome da "un iáo nacional contra o rnr1.ifuM:L\mo",
con.sidcrndo a maior :1mc.1~ ao socialismo e ii Un ião Sovil-tic;,l, ";;1 p.írria
dos nabalhadon::s''. Na visão do 1)()l, pam vencer a Alemanha n a1isra qual-
qutr .lliança l'f'a válida.
A aproximação do desfecho da gucm sinalizou para os Escados
Unidos que o governo Vargas não era mais u1:n aliado preferendaJ, pois
o discurso n:tciooali.sca do Esudo Novo par:i a ecoooinia do p:ti'. s o:1.o se
enqu:Klrava no projc,o de rcorganiuç:io d:a economia mundi:.ll, b:&SC2da no
livre-comércio e circolaçâo de bens e c.1pitais sem controle estatal, defen-
dida pelos Estados Unidos.
Para os crabalhadorcs brasileiros, a guerra causou muitos probk-
mas. Além de serem recrutados par,1 lur-.tr na Europa, em 1942, a disci-
plina das f.íbrica..s ficou muito parecida à dos quartéis; férias e fulras fo ram
134 t11'iT'ÓlW,D.">1t,\'m a1p(111~A

proibid..1.s e a jornad:i de trabalho foi aumenrada paro dez horas. Para os


m1balh~don:ti rurais que se ,r:msformaram no.s "sold:u.los da horr:icha"
enviados aos confins da Amazônia, muicas vezes fugidos d.u implac.í.vcis
secas do senão nordestino, as promessas de condições dignas de vida e
morad i.i dea:ntc nfo se mau:ri:ali1:ar.1m, Com o flm da gucr~ . :a:cabar.i.m
abandonados à sua própria sorte.
Por \•olra de 1943, V:1rg:1s <.'$t! I Y.l comcç:mdo ~ ser criticado por sc-
torcs civis e militares que defendiam 2 rcaliz.:Lçáo de eleições e a \'Olca aos
marcos conistituóonais: liberais:. l'ara contmhalançar a pcr<l.a <lc influência
junco às eHtes. Vargas bu.sc:tria apoio no operJ.tiado urbano, grupo funda-
mt.·m:il cm h.m,,..as d ei~ . Maj c.~:i m:anobr.i seria o oomc~·o <lo Am do
Esrndo Novo, como veremos adiante.

~~
u

A inve11ção
da brasilidade:
a vida cultural
na "Era Vargas"

li\ Tf.l .f.C:TlJA IS, f.;.TAllO F. A


CON;.TRl !CÃO llA 'IAC:10\IAl.lllAllf.

Como vim<..lS. a discu~iio sobre p:irrb e


civismo J\O meio iJHeJeau.'ll brasileiro n..'io foi in-
vcnt.,da pdo modernismo de 1922, muito men<K
pda lk.,.oluç.iodc 1930. Ma'I. x,n di'1vitla, dmbo~ m
movimcmos. c,cfa qo:i,I cm su:.t ârct de inAoêocia a
cultur.1 e :t policic:t - estimularam esse debate e fo-
r.tm além, e,1...ej1ndo um 1\0\•0 capítuJo da rel:u;·.lo
c:nm: F..rndo, intclc..'tt\lab l' polí1ica cuhural.
()., nm·c~ dono\ do poclcr, a começar pelo
próprio Ccnilio V.irgas. sabj.uu da impol'tl.ncia
dos imelecrnais o:\o apenas n:t assessoria das polí-
cicas gov<.~namcnrais, como quadros da burocracia
est.atal, 1·c..formando J cc.luuçdo e a culrura, ma~
t,1mbém oomo aqueles que poderiam lcg.itimar
o novo regime; na imprensa, n:.i~ ;1,11cs e jumo ~
I36 t US TÚRU OOll,\Sll tt l Pli 1,1 rA

sociedade d-vil, sistematizando novos valores ideológicos do "Brasil Novo"'.


Entre os intelec1u-:ais, muiros n1o apenas conoordar:1111 com a neccssicb.de
<lc um "E.nado func e ccnna1i:,.ado". uma das qucslóés qué Sé discutia na
época, mas também ajudaram a organizá.lo, como ideólogos e burocratas.
Vários desses intelectuais fonn:;i r:.un parte da cli1c buroa·á1ica do b-.ido
p~ .. ( 930, fornc.ttram t1uadrc.)s par.t os postos de 3.SM:SS()ria de) Poder f.xé·
cutivo, amando nos ministérios. por exemplo, e como adminisrrado1-es
dirclOs e funcion:irios técnicos dos órgãos de culrura csrn.tais.
l't)rt.'lnt(), a rcl:tÇ:io emre imdcctu:1is e os valor(.'5 auto ritários <..1 u c
em:u\av:lm do Estado 1\ÍO deve ser v ist:t como p2SSi v:i., rom homeo.s lett:l.-
dm e artistas "bem-intencionados" tornando-se vítimas das m.anipu1açócs
de políticos (.~v crrnlhÕ<.'$. As $Oluçõcs ,mr<..lridrias p.i~ a "qu~tfio n:acioru1r'
ou parJ o êlmpo cuhur:U, sobrt:1udo aqudas que envolviam 3 ttluc.tçáo
ela$ ma.s~s e a impmiç.10 de valore$ nacionalisr:1) à$ dites rcgionai~. eram
compartilh~das por v~ri<>s intek'(,'t\l:tis idcologicamcnre dis.-int0$ cncrc si,
como liberais, fuscistas, católicos e posiLivistas.
Com i$$0, ~bdcccu"St: uma vi,:i de mão d up l~ en tre o Fsrad o e tais
inrdccmais. O go\'t'fflO ÍC<.kral aumcnn.lu o <.~aço de ~ruação dd<.-s, rrarando--
os n.áo apenas como meros ftu1ciomi.rios públicos cm rcpanições obscuras, m.,s
~mbém como fur~1doro; e :i~rcs d:.is polític;1S de F.sr.ado. Os intcl(.'(:tuais,
por sua V(."7,. p-.issar-.im a \'cr no F.stado um meio par-.t co~truir os v.1lor<.-s da
"brJSilidadc'', fo,jando mua nação-povo in«grada < blindada cona'a os itgio-
nalism<.lS d<.'S.'lb'TI.'gadorcs da Primcir.a Rcpúblk:i. O r<...'Suhado dcs;:;l :,ç.1.0 no
in11,:rior do fatado, ~e bcn..,sutt<litb, c.b·cria sc:I' a Íorm.lÇáo c.lc um novo ~'.11Ci..
memo de ~brasilidade- que wlisse.elites e classes populares. Essa era a palavra
de ordem no mundo do cultura e das artes ao longo da década de 1930.
A <1uc~tâo central era: como valori7ar o Brasil e in\'entar uma ... hrn~
silida.de" posiliva. se na herança do debate inrelecrual he1tlado do final do
século x1x pn.xlominava um conjunto de R~ri~ pcss:imis:ras sobre a sodc..
dadc brasileira? 1.cmbrcmo.s <1ue o debate estabelecido a panir da ·Gcraç.ío
de 1870'"', cuJpaodo os efeitos cb ir1.istura de r.)ÇaS e do 1neio tropical pat:l.
explicar o "au·.aso nacional", duvidava da vocaç.áo da sociedade brasileira
para integrar os "cstn.gios superiores da ch•il iiação· e f:.t:icr o p.1ís ser respei-
tado na "oon1unidade das n:1ç6es''.
Nas trilha~ dos movi mcncos moderni)l.t.S se abrir.1m llOV'.LS penpecti~
va,s par.1 pensar -1 nacionalidade brasileira, valorizando as raças misn1radas e
A IN\'I ~AOOA ISR.A',1111).\{'I 137

o meio grográfko tropical não como problemas, mas como estímulos para
c n conm 1r um caminho orig inal ~ r:i um.a sociedade plcnamcnrc ci\'ili7.,:d:a.
Para tal, foi preciso reforçar a) vi rcu(lt:i cio "ser brasileiro", valorh.ando M:US
tipos lmman os e sua cultura popular. para al6n dos elogios à natttT<.7.a
gr:mdio:m e exuberante.
M~1s l:unbérn surgiu um novo pensa1nemo <:tfrico quf st debruçou
sobre os grandes problemas nacionais - o atraso cconômko e as relações
socfajs arcaicas. sobrerudo no meio rural - a partir de teorias diferentes
daqud:as que h:aviam prcdomin:ado no sé<.1.110 XIX,

OS INTÉRPRETES DO BRASIi,
O NOVO PENSAMENTO SOCIAL llllASILfilRO
DA DÉCADA DE 1930

() rnod0'11i)flll> t lc 1922 e a... m1Rl11nyl) no ,l rr.toj,1 J>t) IÍ1k.o cnl 1930 colo--
carim a "quedo nac:iouaf' no centro do ddmt cu!rural e polídco. êra prcc:i.,o
ri:vil>:lr :,~ "'cc:ori:h ,lc Rr.t,il"', hcrd..111:l~ do lmpéfio e ,lo t:omc:ço da Rc:1·"Jhlk.1,
cuj:::a t,\f.isc cr:i. coloacb ou rus virrudcs d:a ,ururcu rropk:ll gr211dios:1 ou. seu
oonrr.hi.o. n:i "dCRCflcr:ac;:10'" hum:an:a e soci:J auud:i pelos rrôpicos e pd:i ml<;.-
111r.1 de: rJÇll', Os :1morcs que d !:'Íc:nc,H;un r-sc::s po n tos: de: ,•h1:" foi,.!',('m otim ii.us
ou pcssimistu, cm v:iri:is OC1Siócs se dcix:::iv:1m IC\1:1r por ,·isócs muiw .,'CUS
11up<rfic..·il.1i¾ pret:-on c,;einl()S:1~ (IU c:et1n11J cic:mific.1.s b~nt:r,,11;,~mtt:f,
NO$ .inos 1930, em <;QntrJ{IOUIO ;i m:1.s 11n1Ui$t::S 1.-ons.gr.1J;1~ $0Urc o Rt-:~I.
surgiu um ºº"º tipo de pcns:uncnro social. nui.s afinado com moddos d cnàfi-
C()mc:ç,,v:1111 .1 ~ i1111-.or n~ aiud<>ll $()1.:iológiM, lliMoric.,gr.í-
01.1~ e 1córi<:~ ({(lc
6cos ou antropolôgicos. Ao menos ui:$ autores s.io fundamentais pua cmcnde:r
o LlO\'O pc-nsamemo social brasileiro a partir do.s anos l 930, d.tda sw g.rande
influênd.1n.1~tléc.1(1.~:, 1~1cri(>r0: Gili:l<'.r1v Fn::,•rc. Sérgi<> R11,m1uc Jc H<,Lrncl,1
e Caio Prado Júnior, Os dois p1imci1™ tinham uma relação mais di.reca com
.,s vc:ncntd 11~lc:rni~1:11> 1;p1c ~urgiran, a Jl;lrtir dc 1922. e o ,ilcimc> inmrporou
unu reorla que. :aré oç :'lnQ!! 1930, poucos intelecrwii: urill7.":'1 v:tm corno feri-:::a,
menu de :ttUUsed:i .-~!idade bl'uilelra: o m:11-xís:mo.
F.m 1933, Frq rc publicou o dássko Gzsn xr•mtl4"Ó' sen:v,/a, no qual drt'c:n-
4

dia :as \'irrudcs, ainda qlK' n:1o cscon~ os dcl"titos, d:i •dviU:t::1,;:}o do :tçllar"'
<.-..,lonial. Implantada pelos ponugunes no Nordeste, 11 panir do "érulo XVI,
dJ 5eria, segundo o autor, um c:xcmpk, oni;in~ de: um silstema econômico e
social bem-sucedido. A •dviliz..:tç:io do açU:car'", sob o domínio 2utoritirio do
patriarc1li:s1110 dos fidalgo.) pon:ugues,cs instttl.1&» n:i cas;1 gr:tnde, oonstruiu
4

um sistema soei.ti hierárquico, mas oo mesmo tempo integrado, sobretudo cm


tcrmm racllli~. pro1, iciando um:1 111Q.tiç:,1;gem origin;al e11tre br-.111C~ ncg«r. e
138 tlN TÓRl,'001~\11 RIP(llla;'A

índwu. Assi1n, onde qu:ue to,fot O$ :1.111ore.s d:1 Jp1)C!'I (e dê :i111e.s) vbm ,lefdli»
a SC'l't'm superados, como o mandonismo Jocal, o meio uopical e a mistur.1 de
~:u, Freyre eib..etga,a um modelo :l ser copiado, uma •demOCf':l.ci;a social":\
brasileira, herança bendita dos portuguesa.
No mesmo ano, Caio Prado Júnior publioou Evalv.(.do jit>lltia1 do Brasil, no
qual f.wa uma m•iÃO cótic.i (U história política e oconômka bm.ldra. dc:w:k os
tempos <0lonfak Pl'Jldo Jímior cnF.uixava o conffit0$0Cial como m0tor do procc$·
l,,Q hhu\rku ~ a :mku~t~'.:i.o e.1u~ :iç(,d poU11ic:1llo e ittlt'f'a,jQ c.le:cb!>~ (rt:onômiro,;).

cm um'11 pe.rspccâ\•:t inov:i.dor.i, inspiricb no m:trXismo. Esse s:isrema filosófico foi


in~pirAtl() m1.s olm1.s (!e:: K:irl M11n: e 1inh:1 ô)lrl() princípi() l* .:in~liic:: (l,,s Jh•c::N..~
c.unpos d,a. sodccbde hum:m.1 a p:mir d:t crítia <W refações de poder e dos confü.
10$ ci1is:K-».s pêl<>S l111e~$ r.o:in(,inkx:>tdeíaulicfos pelw t,,'Tll(X)t S()d:u~:1(> kmt,,'()
(l:i l1i:,1órii1. P;1r.a o m;uxi:snu). a hh.uhiá hu11l;U!ll linha mn '"':r.cmitlu" que: uuia p:u·
sado. pl'CKlltc e furu10. tendo como horizonte a futura sociedade ~.sem classct e
:,,c:111 c:uoRit(ll:). a '><11..ia .l,11tlc: comun h l,l. Ouuú li, ro impo1un1c do .11110,, FomNt(iirJ
d4 Dr,uíl rq>r1m1ponJn«1 (1942). dcstnvoMa e amplia,-a essa perspectiva. fucndo
urn.1a,úli~ u •igin,11d:i lêwm,i~:,iu d,b (:!>lrutur-~~ <;(Xi,li( c:cco11e)mk:n do p.1Í!> dodc:
os tempos coloni.1is. f.*ln <Ãio Prado Júnior, o •sentido cb colo,ti~ " . com b:lSC
na «onomi-:i. wocxporudott de b.1~a csc:t.h (n:t cpoc:2 colonitl, tendo o '3ÇÚC:U
<.:Qmo ln,:c::), n<, l:11iÍli11JJ1.1 e n :i c::stu,·iJâ(I, 1inh11 n cu c 1J(> e.> Rr-..isil de:: r.11 fonn:1
que seus cfoicos se f.uhm sentir aincb no sérulo >:tt, perpetuados po, interesses
1,<ili1i,t>Y tt11e: i11111etli;im Ullli.l 11M)t!cmi1;1,c,:;i(, m,.1l$ ;empla ,t;, $~1Cie(l,Klc:.
Sérgio Buuquc de l lolanda wnbém deu um.t oonuibuiçio origin.tl à ait-á,.
lbc do Rrn,il. No liv1u R.tlr.o' do fl,4,if (1936). rc:vi,uu u i1it111\enlc: u:- lq}l1lt\,
1>olítkos e cuhu,-aiA da colonitaç2o e cb acravid.W, cm po~p«civa difcrmtc dos
dois :aurores 2mcriorincmc cit:tdos. 1~ de. :a c.oloniuç!IO potruguCt:a tinha co,u ..
1n..aklo un1 Si$t<ITI~ polí1iw que m~:l;av.a in tc"=SSCS pri,~1doi c: públicos, wrn prc•
dominincfa do primd ro sobre o segundo. O •h orncm cordi.il" seria :a o:prcss5o
mais oni;inal Jesu heu,'tÇI colonial - p;Lr.t Sérgio Rl.lllfqu~ a "oordi.1h,.fo.de"' n;n)
era .,;st1 como \'irtudc, nem ncccs.w famcmc s.igni6cav:i · bo1 cduoç.io" e rcspci·
10 às n:grn..) nior..,is e pl1blic;..1~ Ao oontr:hiv, cr.1 um 0ITT1Jc.uh IJ impbntaçlv da
Jcm(,c.:r;1ciie e c.l,1 fn0t.lcm i1.W:t0 dc1iv.L,., l)Oil :,.ig.niíic.:.1\•,1 ;11 indir.:1Ç.ÍI) JM lol rooh-cr
conAicos soei.ais .1 partir das 1cgm do mundo pri~o. au;l\'és de air.mjO!> famfüa,.
rcs, con upçfo e 1roc1 ck fovoro, rcforç:irklo ,u hic:rnn.1ui,a~1,od1is c:xisrcnrcs e: i1n-
pedlndo a dis..~em in:::11;~0 de um:i mentalld:tde 1~1>uhllc:uu e democr:lirk:a flO B™"II.
Postcrionnemc:~ c:ssas visões sc:ri:2im al"o de: qucsrion.tnk'fnos pcb hiSto-
riografia.. :uumpologi:t e sociologia. Aind..2 ass.im, lei' c-ss:is o bta.s cl:issicas é um
cxctddo fundamcn uJ d.e ÍOC'm3Ç"lo intd«tw.1. AJCm do que, virias das :tnáliscs
nelas Jeg1wolviJII.$ oontinuam ainda .atuab e inrtig_antQ. P,in esses irnportan·
tcs autores, ·pcma.t o Brasil" cr.l nio apenas nH•rguJh:u cm um problema. mas
1,.1ml,ém bt1.5ar ~ ll1Ç6a.
A IN\'t~ÁOOA ~R.A)II I0.\01 139

A HORA E A VEZ DOS DITELECTUAIS


Como vimos, na primeira mande da década de 1930, a sociedode bra-
sileira vive11ciou momentos de mobiliza~\o social - marcad.1 por ideoJogias
de dirc:it:l e de: esquerda - inéditos e.m sua história. A,r, de: direit-a ac:ab:tr.uu
se comando hcgemônic.as na "ida política e no núcleo do governo fcdcraJ.
ajudando a constm.ir a política autoritária \ligeme, sobretudo, na dicadura
do E.nado Novo a ~nir <lc 1937. A1é em1 J,,~. cnm;r,mw, n:io pod<.-·trtc.lS
nc:gligcndar a plu,..tli<ladc de po~iç&:~ imdc..'C1uá~ e o dcb:uc wbrc como
<kvcri:t ser o Hm~il <lo futuro e qual o papd do fatac.k, n~ prt)CCSSO.
Oli imclc..'(..'f\l:lÍ$ se <lividirnm cm v:írfa.s posiç{)C$, (..'$'Céticas e ick-ológi~
cas, cem.indo inAocnc;i:ir o mídc<.) c.lo poder e formarnr a "culn1rn brasilci~
r-i'. tkm .io~cu (.~tilo d1.; lidcr,.:mça t,olítica, Gc-1tilio V.irg;.~ tcn1áv.1 abrigar
~ clive:~ p~ iç6cs intcb:tuai:1 sob <> fatido. crianclo várias inWmiç6cs
para controlar os interesse$ cm c:onffho, acom0<lando St."fOrcs intclcc:mais
<li c.~nçma direi~. lib(.-rnis conscrvadon..-s e <lcmcx:dcicc.):., car6licos, posi~
tivista~. A1é ow ..mo .ilgun~ wci.ilhr;i~ uo.1rar-,1m pw10~. ainda tiuc "uh,1) ..
rcrno~. na b un,crac:ia culmml. O h~vc:mo prt)<.11rava C)timular a adesão
dos imeleccUâis e arriscas à '"causa nacion;U"', mesmo que lida a partir de
d jve1~ts perspectivas ideológicas. O que n:lo se admitia, sobretudo depois
da implantação do Estado Novo. er.1 a am.iç.i o de imcleauais d iretamente
junco aos sindicatos operários ou a publicação de criticas diretas aos valores
ideológicos oficiais e à figu('j. do pl'esidence da Repúblie.:t.
Emre os imelectuais adesist:u do novo l'egime podemos meodonar:
ÜSSi::mo Ricardo (verde-amare.lista), Cecília Meireles {católica modernis-
ta). Oliveira Vianna (posiâvisca e eugenista), Gwta\'O Barroso (fuscista).
Na oposiçio :.10 Estado Novo, havia comunist~ corno Jorge Amado, Gta-
cili:u\o R:unos e José Lins do Rego, socialisw, como Oionélio M:ich:.1do,
calólicos, como Murilo Mendes, e libcr.i.is, como Erico Veríssimo.

A POLITICA CULTURAL
E A ílUROCRATIZAÇÁO DA CULTU RA

A política culrn ral gesr-.1da ao lon,:,,o dos ano) l 93-0, com maior orga~
ntt.1Ç30 e di recionamento a partir de 1937, foi o viés privilegiado de nçâo
140 tlliTÓRUIX)IIU'>II RIPÜll>.A

d06 imelecruais q ue dirigiram ou assessoraram vários órgãos burocr.iricos


criados n:a épOC3.
A política cuhu,..al govcn1amcn1al cinha como dxo o Mini.scério da
Educação, ocupado <k'Sdé 1931 púr GuSt'J\'O Capancma e o Dcpam.mcntO
ele Propag:md:t e Difusão Cultur:11, d irib'ldo por LouriV!ll Fontc.."S, <.Tioclo
no mc..-smo ;ano, embrião do fumro 1)c;-p:arrnm<.'fl10 c;lc;- lmprc:n~ e Pro-
paganda ( 1939). NO,M." ~cncitlo, ambo~. Capancma e Fone o, podem .ser
c(mJ1iclcraclos t.» paradigmas do burocrara ..intclccrual <lo período vart,'lJ~ta,
muico atuan,c..'l; :inrcs mesmo <la im pl:mraç:io cio FsL1Jo Novc,l de 1937. Se
Capanema era exprtss:fo da misuu.t, um 121ltO paradox..1.l, ele c:11olicismo
conserv.1dor. vanguarda modemis,a e liberali51110 reformador, Fomes tinha
sU11:patia pdo integralismo e sonhava em oon.scruir um regime fascisc:t no
Brasil calcado no oomrole da cu.lmra e na propagand.1 de massas. Não por
acaso, ele perderia o cargo oo DIP em 19421 quando o BrasiJ se aliou àç
dcmocr.1cias conu-.1 o naz.~ci5mo na Segunda Guerra Mundial.
O Mini$tl-rio <la f.ducnç..'lo sob o CQm:mdo de C:ipancma abri1;3va
inccl<.'Ct\tais de diversas filiações ideológicas. O cht..fc de seu g.tbinetc, pc.n
cx4mp lo, cr.t o poeta O.rios Drummo n4I d e Andrad e, gran<le autor <la
pc}C)ia moclcmi)ra e simp.t1i1anrc <lo c()muni)rno.
Além de Gustavo Capancma e 1.ouriv:.il Fomes. ourros nomes csr:io
presentes <le mancir.1 r<.-gular junto à bunx:ra<.i~ culmr..11 conscruida ~pós
a Rc\'Olução de 1930. E<lgard Roqu<.11c.. Pinw. inmxluwr da r,di0tlifi.1~0
no Brasil, foi diretor do Museu Nacional. do Serviço de. Radiodifus.io Edu-
cativa e do ln.stiruto Nacional do Cinema Educativo. Nesses espaços ruJ.
lui-:tis, ele cencav:1. deseovolver projetos voludos p:1r:1 a educ:i.ç-.1.o de m:.usas,
de c:.1r.hcr cívico e conscn".ldor. Roqueue-Pinco tinha aversão :l cultura de
massas, ao cinema come.reia! e à música popular. Quando de doou sua
emissof'j_ de rádio pata o governo, em l936, o fez com a condição de que
nela jamais se fi1.CSSc propag:mda comercial ou se rocaSS<.· música popular.
Gus1avo lhrro~o era dirc.1or do Museu H i... córico Nacional (MHN),
fu ndado e dirigido por ele dc.sdc 1922. Sua trajc.."tória pessoal é uma ,1inttsc
do intcloctUal que amava cm várias ÍTcn«:S culn1rais e políticas. Desde a pri~
mcira década do sécuJo xx, foi jornalist;1 no Ccarâ, seu cst;1do nacal, dircwr
<la Escola de Menoro da Polícia do Oi.i.ll'ito Federal (ai-uai Rio de Janeiro),
secretário do interior e de jusriça no Cc.1..rá. por onde se: elegeu dcput.1do
federal (1915-1918). Participou de missã<s diplom:íricas, e de.sele 1922
dfrigia o MllN. Nos ::u.1 os 1930, foi diJ'igente da Ação lncegra.lista Brasilei.
r-.1. dcfcndtndo abertamente o antissemitismo (a perseguição aos judeu))
como política c.lc Estado, tal comú .l>C fa7.ia na Alcrnanlia na:Ú!ota. Sua!J obras
lir<.-r.íri:i.s min ur:1m rem:i.s foldóric:Qi;, h~i-óric.vs, linguistic:oi;, :além de pur:a
domrin:t imcgr:tli.n:t. Mc..-smo com o Golpe de 1937 e :i n..-prcss:io à AIR,
Harroso não foi <.ltm itido Jc» ~CU) cargo) públicos, arnmo~fa11<.k,~sc à no,•a
n.:alidatlc política. Na vcrd:Hlc, cvmo diretor do MNH sobreviveu ao firn e.lo
fat1dc,1 Novo. laq;:imlo o posto some nte com su:1 mc,1rtc, cm 1959.
Rodrigo Mello de Fr.tJ\CO Andr.tde é um exemplo de imeleau:J pal'-
dcipantc do modernismo que se tornou um quadro imponancc da nova
burocracia cultural. Aruaudo no jornalismo desde os anos l?20, quando
participou da R.eviJ111 do Bmsil, começou a trabalhar 110 reC\:?'m..cri.ado NU.
nistério & Educaç.1o e C uhura logo após .a Re\•oluçlo de 1930. A p;lrtiJ'
de então, dcsracou·sc na discussão sobre a defesa do patrimônio histórico e
:nquitt..-rônico. sendo um dos fimcfaclo rcs do Serviço d<,1 l'~trim(mio Hi.st<)-
rioo e Arrí1>tico Nacional (Sllf-l,\N), órg:io criado cm 1937 e dirigiclo por de
nos 30 :mos M:guinrc."b, Ao huJo ti<.- Mário <lc Andr-,l(Jc, intdC<..'1\1:tl pauli1>ta
t111c era um cio~ lillcl'Q tlo~ modcm~ra~. H.mlrigo Mdlo de 1:rnnu, Antlrndc
cl1borou a lcg:i.sl~ç.io b:ísi01 de proteção no p:.:1tri mônio culrural, cmboD
entre os d oi.s houvesse cen as d iferenças d e concepção. Enq uanto Mário de
Andra<lc .se prt-ocupava com a prcscrvaçi_o do t(UC hoje é chamado de "pa ..
trimônio imalcrial", legado da tradiç.io or.tl dasda.ssc.s populares. Rodrigo
de Mello Franco ac.abou por enfa1i23..r a preservação e o cornbarnenco dos
graJ'ldes monume1\tos arquicecónicos criados pela ;1.dnlinisu"lç:lo colonial e
pela presença d:a lgn!j:i C:uólic:a desde o stculo xvr, com cspechtl foco n:a
arquitetura barroca. Ambos consideravam o barroco o nascimento de uma
culcw·al original no Brasil colonial, que já não en mera cópia dos padrões
culturais e arquitclônicos europeus.
Úll~iano Ricar<lo, jornali~r.i t.: ocricor paulü.ca com pa~agt:m pdo
modernismo. oonci nuou 3tuando na imprcn~ e produz.indo lirc111n1r.1
oficial para o Estado. l)çsdc 1936, cngajou·sc na produção de uma revisão
hislórica das lxi.ndciras, da ndo um (Om naciona.lisra à historiografia das
cxp,1:diçúes dos ba.ndeirances par.1 o sertão, a1é entáo vistas corno exprosáo
dos valores e virtudes regionais d,.1 "raça paulista". Em 1940, tsO'C\'C\l Mar~
142 " 1'jfÓR U 1X>IIUSl15t1 Plill rA

,ha para onre, uma das obras mais represenc:.uivas da ideologia nacionalista
do Estado Novo, na qual ligava este à uadição "inregrador.i" das bandeiras
paulisra), como se CS'-IS Í~m cxprc&áo de um scncimcnto de bra.silidade
cm i,""C.ttaçâo dt-sdc os tempos coloniais.
Depois de 1930, ÍOl".tm c.TÍ:i.doi; :i Sccrc-L'lria de f.<luc1çâo 1\;lusiCll e
Anisrica ($ema), o Serviço N:adon:.I do 'feuro (\N 1), o l~1init0 Nacional
tio l ,ivro (1N1 ), o Museu <la Inooníldênci;e. cm Ouro Preto c o Museu Im#
pcri:tl cm l'ctrôpoli~.
A Scma foi prop o~m1 por Heitor Villa-1,oboi; cm 1932, cnrusiasmn-
do com o oovo contexto polilico do Brasil. qut: estimulava p:uriotismo e
nacionalismo. O grande composilOr e maesno. .10 contrário de $\1.l par-
ticipaçio na Semana de 1922, quando quis chocar a pJareia. propunha
agor.t uma música de caráter nac.ionalist:.t e que :.tjud~ a congregar :.tS
lU3$$."IS, sob o parrodnio do Estado. A ideia era dissemüu.r o caJHO e.oral
erudito, o diamado ..,an10 orfcônico", exercitando auivés dele a disciplina
e o dvismo entre :.tltJnos e profcsson:s do si.srcm.a escolar. O ma~1"t() par-
ticipoo de divc:rstS manifi..~1'.tçócs plíblicis do cmro orfcõnico e compôs
obr~ sinfónicas grandiosas, como as Hnchia11n,,, série na tiual mbrurav~
dcmt..'1110'1 da t.,1h11ra mmia1I p<Jpttlar com a m1hica cn1<lita.
O l'lL foi criado com a prc:tcn.sâo de d:.thof'3r uma gr:mdc l-.i1ciclQ~
pitlia Hra.<ilrira, ;i,llm de disscmin:n bibliotecas n:u cidadl'S d<..l pais. l'Oi
tlirigido por Augmro Mc..-ycr, CKriror t:,rat'icho liJ.,?do ao modernb.mo. Do
IN'L par-âcipou rambêm aqude que era caJ\'CZ. o gmnde intdccrual brasileiro
da époc:t: Mário de Andrade. A relaçlo de M:úio de Andrade oom o Estado
dirigido por V.1.rgas era a.inbígua. Mino era wu eorusil.sta cb interveoçfo
C$Ca12I n:i cullura, mas, ao a,n1r.írio da época cm que foi .sccrct.i rio de
cultura da cidade de São P,ulo (1934-1938), Mário se rcsscncia da fuha
de :.tutonomia polfric:t jwuo ao governo central A SlU consciência libera.)
também não se sentia muiro à \'Ontadt· trabalhando para uma diradura
~impii1ica aos fa:1c~n1Ul>.
Além de trab:,1lharcm nos órgáo.s burocr:.iticos mencionados. os in-
rclccmais an1aram na imprensa e cm rcvbrn.s culrurais pmroc.inadas pelo
Estado. Os jornais e as rcvist:t.S oficia.is eram dirigidos por inrele<:tuais afi#
nados rum o Esrado Nmu, como O Dia e A Manhã (Ca~ia,m Ricardo), A
Noitr (Mcnotti dd l'icchia). Culmra Pqlítim (Almir 1\ndr:.tdc).
AINVt~ÀODA~R.A!tllllJ.\01 143

Omro exemplo da íntima relação emre o mundo letrado dos


in,clcc.1u:iis e o~ imcress(..'S d:i política de F.~r.ado íoi a clcit,-;io de Vargas
para a Acadc1nia Ura..~ilcira de Letras (AHI) cm 1943. Vargas não era
propriamente um e.scritor, mas isso pouco imponava para os e.nvolvi·
do~ n:i rr:msformação ele V.1rgas cm .. imorr:il''. como eram chamados
os membros da Aca<kmia, A AKI e o E~r.1do, dQdt o~ primórdio) da
República. eram e.mão espaços de arnação das clitC's leuadas que se
reveuvam enue os cargos públicos e a atividade lirerária, e nela se
con~2gra\'am como ~ri1orc.-:s reconhecidos oflcialmenfc,

PROll l /ÇÀO C l JI .TlJRA I.


E PROJITOS CULTURAIS EM CONI'LITO

O pnX..Q)O culcur.11 p:itrodnatlo pdo l·~r-"'Jo Jc\•t:ria rc)g;uar a


nacionalidide das raízes populares, dando forma à "alma nacional"' que
"a<lo rmccfa n.is da$SC$ popolan.-s", prindp~lmc...,,c n<.lS camponeses (IUC não
tinham influ~ncia tio~ mci~ de comunicaçfo, como o r:átlio e o cinc.:ma,
sacurados de obras estrangeiras que desagradavam os imdecmais naciona-
listas. .. O povo" passou a ser visto como fonte de inspfraçio pat:l os novos
\':llor~~ t.~t(:{icos e ideológicos, uma ~pécic de matéri:i foldóric.~ "'bnna e
incon:scicntc.:" <111c d c,"Cria ~cr lapidada pvr um ..~bcr superior" \'indo tio
mw1.do letrado e erudito. "O povo" fatnbém era alvo das ações pedagógicas
e da propaganda do far-.tdo. Connido, muitos dos projetos de dirigismo
culcur.11 por parrc do Esfado fkar.un ~ú no tliM:urw, com pouca t.'2padJac:lc
de. moldar as classes populares como queriam alguns inteleccuais.
Em primeiro lugar, h:1.via limites 1u interve11çáo dos inteJec.rulis abri.
gados no f.s1ado. mesmo na fa51..· mab aucorirária do gowmo Varg;is. A vida
cultural d as ma.nas urbana~ Qt:n-:t mah volta<la para o con~umo tlc filma
e cJ.nçôes que n5o tinham a du.ncela dos imeleccuais eruditos. Com.êdias e
mdodramas hollywoodianos, Alim.'S e cançô('.S camava.lescos ou romàmicos
se choca\'am com o prujc10 tlo!t inu:lcc1uais tlc c..iar uma cultura cm baso
letradas e erudiw. ainda que inspiradas tlO folclore nacional.
P:lmdox.llmeme, o Est:ldo Novo, ao estimular 'l moden\i:taç1o eco-
nõmica, acabou também inct:mivando a cultura de ma~5a, veicul:u:la pelo
meraido de filmes. programas de entretenimento nos nidios. revistas im·
pressas de variedades: e canções populares. Nn.ses campos onde os produtos
culm1'3k, él".tm proclu:t.idos e \'endidos dcnrro d:LS rt.-gr.is de merca<lo e cb s
demandas de gMto popular, a ação dos intelecrnais era limfrada. Os seus
projtios culnir.1is p:ar~:ciam se choc::ar com o mundo rtw.al d:a culn1r.a e da')
prcfcrénci;is sociais mais amplas.
O c..-cntro c.lc poder do governo, a conu.,çar pelo próprio p~ idcmc
da República, esrimulav.i as duas fuces de sua polírica culrural - aquela an-
cor.id:i cm projc-cos i ntd(...'Chtnb; clirii;i.stas e lc.--rr:ulos e oucr:1 m:ti.$ pcrmdivd
à dinãrnic:t do met·cido de bens culturais massificados e divel'sos, sem um
comcl,do ideológico doutrinário. Estimulando o primeiro grupo. V:argas
ganhava l~gitimicladc. No segundo, aumentava sua popularidade junto às
ma~~. o.1r.ir(:gia essencial a partir du início e.lo Euado No\'O. i-:,u.:mplo
dess:t contradição dentro das políticas culrw·ais foi a atuação do Esrado
como dono ele cmprcs:t.S ~ diofi) nic.:as. A Hádio Mf.C c..-ra volt:icb cxd1.l.$lva-
menu~ para uma pl'o gra,naçlo ··Jite1'0cttlcurar, como se d.iiia na época, à
base de pale.su':lS e música erudica, enqu3.1no a R:ídfo Nacional en voJradl
par.4 o cnrn.~<.~nimcmo d~ m:.iss.is e susfcnG-ida pcJ:.i publicidade comercial.
A mús.ic:i foi outro c:a.mpo de dispma nos anos 1930. O go-.-erno
patruc:inou iniciatÍ\,..d'> lii;ac.la) à 1m'L,.iet nudita e au 11•, o (...'tl11cati\'O tia
mllsica foldóôca de origem rural, mas, ao mesmo ccmpo, normatizou a
poblicidadc comcrci::il radiofô nica cm 1931 e dco C.'$p39,l nas S\13S r;idios
ao samba, muico cricicido por imelecruais erudicos. Em concr.1.pomo, a
..,-scola nacionalista" na músic.-e C.T1.1dita, defendida por Mário de Andra~
de, Villa-Lobos e pelo jovem C:.unat'go Gu:unieri, procurav:a desem·ol...er
u ma mí,~ica ) in Íônica lip icamcruc br-d!iilcira, mc.clanc.lo form;a) univcrsai)
e valori-zad.u na tradição d ássica com sonoridades e malcriais da cultura
popul3r, das danças e cant"igas reunidas pcl:.is pesquisas foldóriais.
No final dos anos L930, surgiu o ''samba exaltação~. de concel1do
ufunisra, cívico e nacionalisra. O moddo desse tipo de samba em a canção
....\qu:uefa do Br:t.$il"' que, em stm letra, dec:uual/'3 :as bele?:li d.1 o:uuret."I
brasileir.-e e o conv(vio harmônico (lt «raças"' no país, ao mesmo tempo
que, cm sua pane musical, incorpor.1V:.1 o som das big brmds do ja:u. norte-
americano e dos arranjos sinfônicos sofistietdos.. 1~.sc tipo de samba se
comrapunha àqt1cl~ que exaltavam a boêmia e a malandragem, típico~ do
Gomeço da década de 1930. que eram ah'o da censura do OIP por desviar~se
da idcologi:1do I rab~lho e: do civismo.
Se h,l\•ia mt'L'!icas populaf'Q ufaniStas, também havia canções de ccor
rnais critico. oomo .. Rcccnscamcnt0" (d'-' Assis Vak:ntc, 1940), grande
~uc:csso n:1 voz ele Canncm Miranda, c1ue c:olo~v:a cm <h'.1Vidn :t confiança
dos pobres no Es1:tdo, sugerindo um jogo de dissi1n ul:aç6es e 1esis1énci:u:

F.m 1940
lá no mom, oomcçara.m o rccc.:n,'!C.:amc:nto
F. o :.gente rece~dor
c~mim,vu a minha viJa
foi um horror
l-. qu.lndo viu a minha in:k) ~m :1li:1nç1
encarou fXU'':I :a c:ri,nç:i
que no chão d orrni.1
E pc:rgunrou ~e meu moreno cr:i. da);ntc:
~ $e er.'I d o l).uenre ()11 er:i ,b foli:.1
Obaiic:ncc cu M.)U a ruJv q~1c; é ilia lc.i
fiquei l<>go SOS!,tf;,l(fa e filiei enc:fo:
O mc:u morem> é br-.bikiro, (; Íu:tiJdro.
e é quem sai <;()m ::t b:tndeira d<> seu OOc,lh:'í<>!

O CINF.MA F.OUCATIVO QUE O VF.NTO LEVOU ...


Nos anos 1930, o cil'l('tna J.l tinha uma hinótla de 40 anos, mas ain.-
d:a cr.a um:1 novid:lClc no ampo pcd:igógico. Os imdccruak br-:ldlcirru que
;m1;,1,·11.m ne:isc: c.ampo, oomo falgi.v Roqtie:tte•Plnto, ficu r.i.m Í;IS<;in;i<loi com
() pou:nçi,,I ah,cuiv() Jo) lilmcf JcntTO e for.a d.1) ct1Wl,u. $cj;, 11.1 Íonn:, de
tlocumcr11Jri~ cien1ÍÍ11,...(» e cuhur-.ti). ~j;a n-a de Ílt\.'(ie 1111c 1.u11bé:ff1 1h·Q,.'>CIII
fins did,hico~. o cinem:1 começou a sc:r Jl<f1i.:ido como veículo de cduc.aç-..lo.
A invençã,o do ·cinem;.1 falado· cm lins dos anos 1920 tinha :abmo um''°''º
c:11npo técnico. orticubndo i m.igcn.s e sons, fu,·orccendo a tnnsnü.ssio de
mensagens idcológk~ para as massas populatcs, cspcc.ialmcncc \·ohado pau
aduh~ i;cm e~colaridadc é cria~ em proct:)S() de formação e~ol:ir. Mas
con,-0 realiur ~I 1)roj,e10 educarivo ,em um p:iís ::irr:i~adooo1no o 8t:1$il? Como
concenr12r recurso!. pari produzir filmes, sempre uros, finon ci::indo recno~
logi:u- so6uicad~ e tccursos humanos cm l:arg:i csc::ila? Como faur chqµr o
ftlme cdueatiH) :h ).,1f;i, Jc 1.. incm;i e à.s csool:i.,?
146 t11'jfÓIU,.1.00IIU.',II RIP(t J.l rA

O $:urgim,e,u() do lns.1iuuo N.:idonal do Cinema F..due:uiv() (l nt.-e), ern


I?.¼, dirigido por Roqumc-t>into, tintt:I por objetl\'O wpenu estes desa6os e
incorporar o dncma, ck6nitio.·amente-, oomo d emento de cducaÇ:00 das mass.u.
Ocmro da tradição intclocrual vigente, acrcdit.J.,•a·K que li,) mass.u Kriam m.W
~ n.s(\'dS a uma ctftteaçjo anoor;1d,1 an iina~ns e ~ 1u im<1110Jt vdculadru pd<b
ftln~ do q1k': ;a, um.1ctluc:u,,:io l)J(Ct<Li <m li~·(~ 1córit.":b e oonccito, ;a,h'l!Ultl),
O ln~ l<nlOl• ;.e C<.ap.acil:u por:1 prc:xlu,jr fi lmQ \lc doi~11p()!$: "filrl'w:~ clll1C:11i ~
popul:ut'S", voh:idos p:.u::i :is s:ifo..s de dncm'l. e · filmes cduadvos cscol~cs~,
a sc:ttm exibidos na.s 01CObs. Além disso, o lncc acabou nunbém produzindo
rcgi.,tros cicnc-.ífic05 e c:ulturai~ 1,-olt.1do~ para a ío,maç:lo e divuJgação cicnóiica..
O .)()nho llO,JtCti.kl-Oro do I ncc: cr.t c..hcg;ar l~ ma:,,...,ts: no~ n~üs di_..1,into rim.úo
do lva,il, m.r, n;a; p r.i1ict, 0b pouco 1t1:iistlc mil pt1..1jc1u1tsdb.uibuíd o-- pdo ~ ''c:1-
11<• ~ l,;(u1<,>cn!rn v-.un cm ~d:1( de $o P:1ulo, Mim,~ (~r,1~ e O~rito Fé<.kr:11. O
lrutituto produziu ccr~ de 250 filmes até 1947 (quando se cnccrrou a ditc'ÇXI de
Roqumc-Pi.uro), a nuioria dirigida por l lumbmo Mauro, oomrot.tdo pdo ôrpo
e com.idcrado um ,;sande dnca.sca brasilci10 à época. Em 19-i.O, Mauro dillgi.u Os
b.t,Jt:i,umo. íilmc: 111,c mi:.mr,W;t ling1Mgc:1n ,fo doom'Cn f;lrio e: 110 11\clodr.1rn.1
p :1r:1 1..1:m1ar .i i,:+g;1llO> p:1uli,..,b llci,hrn\~.+dore-dos -c11i10 t.olon i:1i, h r:bileiro:..
O çi11cm;a comcl"(.i.11 br:l:\iikirv rnmll<m 1c:nt01.1 i11CQ")>(1r;1r ;1s dirccri:,~ (lc·
d~ógic:is do lncc. Dentro dcn-:i ccndfoci"t. o mamo J lumbcno :vfauro d.itifiiu
Argi~. outro filme que misrunv-.1 difusão de conhecimento dc.nufico. com di·
álogos que parcc:Wll aulas, e melodrama, ao contar a h.iscôria de amor de uma
11101,,1 r ic 1 e: il1l)tr.td,1 por um ;anc:.J'ic) in1crc,.)acfo c:1n u:tiiflli(.;1 imlígc:n.t.
O (;,,oé <3uc p:11cd:& (,1l1ar .1lgurna t.oi~,1 p.tra e~ Íllmo ~nh:1rc:m Olt 1..1:>-
r:tÇôcs e :1s m~:lltclt d:1~ m,1)-us p,opul.1rc:5. O ri1mo lcn10 d;;i n:t1T:u i,·;a, o~ r01c:irt~
fulhos. b:ise2dns cm dHJogos solenes e 1t2trais, e 2 ccnogr:lfi.2 limic:tda n:kl e.r.im
pitoo p:lr:l o d.nem-a hoUyv.-oodi:ano e SC'.'US cspct:icu1os tOCnkos impactantes,
que jâ no 6nal dos a.nos l 930 domina,'am o d rcuito de exibição no Brasil 1:.m
1939. o plllilico i'IVl.lcri.i ,u é ~r ol:wig,n.fo ,1 ver lJ~ fllmC) do l,u n ,n QUJl.cy.. 111:»
p rdC:ri.a tnci.fll-1) ,·c:r ... F" 1,w11,, kwu.
N:it]ud ., q,o<:a, ,;ó ;is C.'h:md 1:ad2s C1mav.1ksaii. furiam alguma 50mbr.a ao
cinema. Clitadunldcruc junto 1S pl::icciu popu1:U"!$, :linda. :wim longe de 2mc:lÇ2r
o seu domínio de mercldo. M:is efas n:io f.ui::un pane dos planos educativos dos
soJcncs intclcctu.:ti.s do Estado Novo.

AS REFORMAS WUCACIO>IA1S

O Ministério da Ed.uC3Ç:io er:i. o ponto de con,-ergênci:.1 de intclec-lua.is,


inclusive rnuitm oposirores <lcdaratlos do Estado Novo. O prestígio e o
poder político de Cuna,·o Capanem3 à frente desse Ministério davam um
A IN\'t"ICÁODA~R.A',1110.\('I 147

caráter de insciruiçáo relativamence aberta dentro de uma ordem aucoritá·


ria, em que o debate era possível, ainda que dencro de cercos Limices. Coube
ao Ministério organi,.ar uma grande rcfonna (-ducacional, conciliando. na
medida do po..,;sívcl, os divcf'SC)$ projetm crn dispura. E de$ nâo cr.im fucil•
mente acomc,l<l:ivds, pois cxprCJ;J;av:am pe~'J>C.'t.1"jvas idc.vlóg:ic:as e rc6ricas
muito diícrcnt<..'S de intc;k-cruais e cduc~dorcs. Não por :ictso, os dcbarc.-s
wbn.:: a reforma da c(luc.aç-.io hr-.a)ildr-.1 ~trocin.edos pdo Minbtério, c-0.-
nhccida comv Rt..fonna C,apancma, c5tcn(k'l"'.tm•sc cJ~lc mcaclo~ <los anos
1930 aré 1944. Desse gr.mdc ddx11c, particiix1r.1m v::írí:is corrcmc5 pt.."<la-
Sógicas, mas o grande confmnco deu-se entre c:\lólicos e "e.scofanoviscas".
Os intekctuai.s c.1.tóHcos conservadores, org.1.nfaados desde os anos
l 920 com apoio da Igreja Ca,ólica, procuravam defender o papel funda-
mem::tl do ensino 1-d.igioso (lei.l-se, cacólico) no )>l\'X'eSSO de modernização
da sociedade brasileira. M polfcicas de exp3nslo de um ensino público e laico
náo cinham a simp.ufa da Igreja, que se via como responsável pela formação
<kl$ valores mornis e por m3ntcr o a.mhc."C:imt.-nto escolar conciliável com as
de.li.minas católic:as. Além disso, a lgrtj.i oom.i.nd:av:;i um.a v.1ru1 n.'(lc escolar
pri\..,1.da. UusaV""J pavor a~ inrclocmai.)c:nólicma <li))Cminaç.foc.lc um çn~i ..
no laico, man:rialhr..t t: cicntiflC~ta, sobretudo entre ~ d ~ popul:m.~ sub--
mcridas ao <.."llsino "primário•. Ao mesmo tempo, a lgrcj:;1 pcra.-bcu (jUC não
p<.xiia d<..'SQ1i(far da formação superior d-as ciices. pois d.1s .s<:rfam rcspons.1.vcis
pda) polítkas p,íbliC".b, e n.io dc\'triam romper mm a cra<.liç.Jo (.~tóliC".i., visra
como essencial para mamcr as hicrarqufa.s sociais e os valores uadicionais
da fanuli:.3 palri:.arc.al no processo de modemizaçáo e urban.iz.lçâo crescemes.
Por outro lado, havia educadores que, mesmo sem querer rompet'
complc1.1mcntc com :is crcnç.1s religiosas (pois muito.,; deles eram cató-
licos). defendiam a complcca .separação cncrc Est-ado e lgrcja, sendo o
primeiro o eixo de wna política educacional laica, visando à formação de
quadros profissionais, técnicos e superiores que acompanhassem e servis,,
M.:nt à rn0<.lcrni1.aç.ío da M>cic...Ja<lc e da <..'tonomia. E..ct:S M:torC) lançar-..ern o

Maniftsto das Pio11l'iros da CScola No1,a ( 1932), as.si nado por Anísio 'lcixcira.
Fernando A.z.cnxlo, Cecília Mdrclcs, Roqucnc~Pinto e Hermes Lim.1.. O
manifesto defendia, de- maneira conrundcnrc, uma escola pública, gratuica
e laica, com md.od<b de ensino mai.) modernm e cstimulan1cs c:lo que a
velha rócnica da rcpcriçáo e mcmori?.Jç.i..o. Valori:iav:.i rnmbém o mérito do
148 tJIS TÓf{ l,.\, OO lll,,\')!lllPliJ.l r A

aluno no processo de aprendizado, estimulando sua autonomia inrelecrual.


Ess:t escola, que segundo o nuuifesro :linda não exisria como siste1na edu-
cacional int<.."grado no Brasil, d(."vtria stt um ckmcnco de (lcmocra1i1.;ação
<la sociedade. ajudando a superar as <lifcrcnç.as socio('Conõrni~ de origem.
Os cscobnovi.st:t$ clcfi:mli:,m, :iclcmais, o conrrole do si.srcma csa,lar pelo
fü1:ado t uma escola "única" () \IC fornccc.'SSC uma cducição ib•ual, de <1uali-
cl:idc, p-c1r-.t 1oclo:;;, ricos e pobro..
Um do.s grnmlc:s c."t.mAir~ entre Clt(,licos cunscrvadvrcs e C5<."C.>lam,...
YÍ$taJ; se deu por QCasi:io ,la fimcl!.~'3o da Univcr~i<l:ide do l)i,strico ficdcral
(uoF), em 1935, durante a ad1nini.stnçlo do prefeito progrcssist:1 do Rio
de Janeiro, rcdro Ernesto. A 1.ZOF deveria ser uma univcrsi<ildc aberra às
experiências de formação supe.rior defendidas pela Escola Nova. oom Afrâ-
nio Peixoto, um dos sign1cátios do nu.nife.sro de 1932. à freme da reicoria.
Ml! sob a acusaçfo de e.sta.r abrigando simp:ui:ant~ do lev:i.me comu1\ist:\
de l 9:i5. Pedro Erna10 tC\~ que ceder às prcssóa para demhir o reitor e
v:irioo pr<1fusrorcs. O próprio prcfciro. muito popubr no Kio de J:mcirQ,
acabaria preso cm 1936. A panir daí, o controle <la , m foi di.spu~ d<.1
por cnólioos e inrt:·grali~r-.tll, c a próprfa unh•c·rsiclaclc foi fcchad.i cm 1939,
ahwrvida pela Faculclaclc Nacional ,k Filo.):Ofia da Univn~idadc do füa~il.
connolacla pelo Mini:;rério da Edocaçio e diri1:,'lda pelo inrclc..x.1-ual c.1r(llicc.1
Alceu de Amor()S'O Lima.
A educação básiGi cambéin fui objcro de· um grande debate, pois
era oonsidcrada csLratégica na formaç.io futura das classes populares e do
"'novo homem brasileiro··. Como deverfa ser a estrutura do e11sino? O e.n.
sino deveria ser prollssion:tli1.:uue (prepa.r:U)do o :tluüo para o cr:tb:tlho) ou
propedêutico (preparando-o para seguir nos nÍ\•cis e.~olarcs superiores)?
O Estado deveria impor um ensino laico, com base no conhecimento
ciemffico e esped:tliudo? Como vencer o analfabeüsm.o que aindl. domi•
na,•a i,,randc pane da população? O que fazer com os adultos que haviam
largatlo a <..~cuia nos anos iniciai~?
E$$:t.s qocs,ócs Cr.'lm rc.'$pondidas de maneira diferenciada conforme
a ideologia de e.ida corrente pedagógica. Mc:smo vencidos no jogo político,
os adcpcos da "Escola Nova" ainda m:rncivcra.m S\1:1 inAuC·ncia dt-pois de
1937. Por oulm fado, c:u61icos e simpati1.ames do fascismo ganhar.im mais
espaço no debate oficial depois do Estado Novo. Até as fo rças Armadas
Clnh.1.01 seu projeto pedagógico p róp rio, calcado nos ideais militares de
civismo e p:nriotismo. O rt.\uhado dc:ssc gr:mdc debate foi u ma reforma
que procurou acomodar inrCl'Q.~-s e posições.
A Igreja foi atendida pela manutenção do ensino religioso na escola
pública, ainda que opcional. As Forças Atm...1das conseguiram impor a disci·
plina Jt falut.."cl~O FMc.i minhrrnda por proÍl-SSOft,l,. formad~ nos man lwais
milita~ tlc p reparação do corpo e culto à tli.~ciplina o,k1-iva. Attuclcs tiuc
defendiam um.a escola bica conseguiram aumemar o espaço para o ensino
dJS disciplinas cie1uificas. E as elites ecooôn)icaç que, julltO com setores
tio ~o,·crno, pl'Q..\io navam por urn cnsino profis~ionali:1anrc pard a.s classe:>
populares, wmbém con~guiram imp<>r um $i$tcma t:<lm::acion:,I par.tido,
patrodnaclo por enticl;idcs lib':ldas ao w mérdo e;! inc.hístri:.a como c,1 Scnai
(Serviço Nacion3J de Aprcndii.:agcm lndu.'íuial). Através de "~s Orgl-
nicas'', o Estado criava anão um si5lema (scolar a!wncnt( regrado para
cada :írca de formação: ind(asnfa, comércio, agrkuln.mt, além <lo CO$ino
sccund1rio dividido cm ~n.~ cécniC<1s--profissionalin 1ncçs e propedêuticas.
.EmretanLo, o ensino primário cm massa nunca ch(gou às regiões ru-
r.tis mais remoras, e 0001 o aumemo expl'essivo da migração para as cidades.
cs.-imulada pela indusrri,Ji7.a'?,o dos anos 1940 c,.m dhm(c, .a capacidade <lo
po<k-r público cm c:ri;ar c:i.wla~ n~ bairr~ di~r-Antc.-: tio Q:ntro semp re foi
muito menor do que a demanda das populações. Assim, apesar do grande.
debate sobre educação dos anos 1930. à.a nio se transfor1nou em wna
polí1ia pública que inrc.."S~sc go,·crno fcckr-AI, estados e munidpi~, nem
~ig nificou d ar priur-iclaclc m áxima à cscolari7.açáo cm massa da pupulaçâo.
O ensino superior e mesmo o ensino secundá.l'io continuaram restritos às
elites e a .se101-es mais :tbasu.dos d.:ts d 1SSeS mêdi:lS.
l~oomo a alfahcti1.açáo cr.t o primeiro JX4.~J par.a um cicladfto .se tornar
clcit0r. as conscqoências polírica.s das o ~ cducacionaiJS d o governo e do
an:tlfabetismo eorre os :tduJros co1ninu:uarn. reforçando a exclusão soci:tl.

CULT URA, CENSURA E PROPAGANDA


O Deparramrnw de Imprensa. e Pro~ganda, criado em 1939, era o
grande aparai o burocrátiro do E.!.1ado Novo. Atuava na cen.mr.t e na propa~
ganda de massas. cm várias áfC.lJSC meios dccomunicaÇ.lo, corno na imprensa.
rádio. tearro e cinema. Conrrolava até as inu.gens rurístic:t.S do Brasil vohadas
p:t.r.1. o exreriol' e organilava t\lentos rulcurais, esporti\lOS e ch•ioos, como o
(lo Dia do 'lr':abalho. ºlinh.asob M'.u con1rolcos ,dc:partamcnc~ <..'St:nluais, que
deveriam prOm<)\'Cr o Estado Novo e a figura de Vart.1S jumo à \•ida politiai
e social dos csr:ados brasileiros, c..-<mtrobclos por imcrvcnron.."$.
Após 1937, a prop:iwanda ddimi~va o dcb~tc inrek-crual, din.-cio-
namlo a proc.lução idt..-ol6gica do~ intd cctuai~ e vetando cem.is proibidm.
A propaganda do fa t:tdo Novo \'al<>riT.:t\'3 o trabalho e o trab:tlh:td(>r como
car<.-g()ri:ts iclcali1~'l<l:1s t.'$$Cndais J)!lr:l :i g;r:ind<.?.:t n:1do n:il, na ccnt!1riv:1 ele
formar u!Uj d ~se operária ordeira e discipli1)ada, imune à açáo dos inili-
tanccs comuniHas, aJl3.fquistas ou socia.listas. Essa va.lorizaçáo simbólica do
trabalho e.ra acompanhada de políticas trabalhistas efetivas, como a reserva
de metc.:1do para crabalh:adores busileiros, a ..educação para o trabalho~,
a ..organiz.1ç:1o cienflflca" do processo de produçfo, :tS leis trilxi.lhislas de
proteção aos empregados e. por fim, a orga.nii.içáo burocrád~ cc.nuõ1d.1
no cc..u por:tti\'lsmo. Como vim<.l$. <.-stc ck"\"<.<ria hnrmoni1.ar a$ d as.ses, $Ob o
paCToc:ínio do $indicalismo bor<.)(.;rárico e $Oh connole do Estado.
Os intckx:ni.ih a serviço do Estado forjavam conceitos, ~ímbolo~
e imagcn) de ,-alori1açâo do trahalho, <lo nacion;.1li~mo óviw e do cul..
to ao presidente d 11 Kcpúhliai. Varg:is. O nu• prod1,11.i:.1 moitas pe<?,S de
propab1'nda, como os cin<.jomais, matérias de jornais (ofici.üs), paníl<."tos,
cartilhas infunrb, progr.1ma:, <le r:idio. ·iodo c..~.M: apar.1ro !)(.· in.!ipir3va nas
cécnicu de propaganda de massa lmporradas dos Estados Unidos e.da Eu-
ropa e se basea\l:l. na crença de que as massas só podem peru.ar e se expt'tSS3.!
atr:i.,-és de imagens e sentimentos, e nio de co1lceilos abslr:.uos e racionais.
Prcconcci1os à par1~ a propag:mda se mos,rav:t dl0z..
1

As ÍCslas dvicas, muito comuns a partir de L939. procura\lam agi't'-


gar as multidões de trabalhadores em como da figura de V~. e, por
conscl1uência, <.m wmo do Estado Novo, visto como guardião dos valorts
naciunab e da urdt:m MJ<:ial. O rádio foi urili1.a,Ju de maneira dil:-icnrc pela
propag3nda oficial, ;.tltcmando uma program;.1ç.i.o de çnffctcnimcnro com
a publicidade ofkial, cujo c,ccmplo maior cm a Hqm do Brasil tntnsmitida
para todo o território do pais. A R:idio J,.,tauá. por exemplo, era ligada ao
Mini~rério do 11"".abalho e vci<..''U lava uma progr,unaçáu dirigida aos trabalha~
dores, reforçando a imagem pessoal de Varg.,s, o "uabalhador número I '".
Se todo esse aparato falhasse na conformação das consciências em
wrno do Esmdo Novo, a cen~ur:i e .a repre,-s:io policial se: en~rrci;:1rfam
dos opositores.
A censura. n-ali1..2da:,. p.inir de 1939 1;1mbém pelo n11•, não cr.1 org;a-
nrtada apenas par.a inculca.r n..1.S classes populares os valores do Estado Novo.
mas também para impedir <lctcnninadu,"I remas no <lcbau: do públi(.'U leitor
de jornais. Em gm.nde pane. o intervencionismo censório na imprensa.
cujos jom:ais cm 11.1~1 m:aiorfa eram <lc propric&1clc de g:rup<)S fumili::trc.'$
tradicionais, foi o responsável pelo incómodo das elites liberais em relaç1o
:t Gt't(1lio V:trgas. M~mo depois d:1 su;a quc.·d:t, (Ju:tndo <1uis mud;ar M12
imagem política para se adaptar aos no,·os tempos da dcmocr::icij clc:itoral,
nun(.cl ~ ria pen.loado por rer (.'t-TCcado a libcn.la<.lc: de cxp l'C>s~o <.la) dite:>
e seus jornais. O DIP, por outro lado, publicava uma das mais prestigiadas
rcvisr~s d::a época, n Cultura Polítírn. Curi053mcnrc. css:1 revista n..•vck1va
cena pluralidade de posições sobre diversos tenus rulcura.is e políticos.
A prod.uçio licer.írkl começara a década de 1930 demonstrando uni
g~ndc vigor crfacivo e cririco, çom a c.mcrg~cia do romance de e<.-m.as se....
ci1is. M:u o clim:t repressivo pós-1937 fez com que el1 perd~~ forç:a no
flna l e.la <lé<.."3tla. i\ tl11r.1 vida da.s da~-:,, popula~ foi narr.«la cm grande>
roma.i.1c,es realistas dos anos 1')30, ta.i.s como O quinze (1930, Rachel de
Quciro,.), Mminq ti, <1tgmho ( 1932, José l.ins do 11.<'f!}>), Jubúzb,í (1935.
Jorge Amado) ou Os rmos (1935, Oionélio Machado). Mas essa pei-specliva
critic.l se tornou impossívd oo clima de caça aos comunistas e no ambiente
político dominado pelo aworittriçino de E.«ado e ctn.illra do fin.1.I cb déad.1..
Apc:.al' da mcndona<.l:a .iproximação com temas e personagem,
populai'tS, o encom.ro entre intclccruafa lcndos e dasscs popubrc:s cr.i
muito dificil. Não havi.l um público lciwr di~minado e. mesmo atuando
coin o apoio do aparato esratal, muitos inteleaua.is se sentiam isolados das
massas, apesar de toda sua vonrade de engaja.mcnw nas "auw nacionais"
ou 1u.s "c:au.~as sociais'".
A poesia melancólica, lírica e engajada de Carlos Drummond de
Andrade expressou bem esses dilemas do mundo imclccrual. isobdo das
classes populares e. ao mesmo tempo. tentando mudar o mundo. como no
poema •o Operário no Mar"'. de 1940:
JJ~2 t11'iTÔRU 0011,\')II RI PÚII k;A

Par.a onde va.i o operário? l tria \•crgonha de chanci-lo meu irmão.


Ele sabe que náo í:, 1uu1ca. foi meu innáo, que não nos entendere-
mos nunc::t. E me dcsp~l.1.... o u t:tlvt:'L seja cu pr6 prio q ue me do-
prcu asclL\olho.s. f .••J. Agor.1 csr:iamin~ndo no m.,r. F.u pcns:t\';l
que isso íosst privilégio ck alguns saruos e de navios. ?o.•las não hj
nenhuma s:u uidade no oper:irio, e n:\c:, vejo rod:is nem hélices no
seu corpo• .ip.arc:.ntcm<.."IHC banal. Simo que o nu.r ~ acov.uJvu e
dcixou-o p:w::ir. ( ...J. Únku c prec:iriu :.geme dc lig:içio cm~ nós,
9:U wITClo cada va. maii frio atra\'dsa as grandes ma~ liquii.l.u,

chOCl-t.t «mera as fo, maçóeS: s:ilina.s, as ÍC>l'1alo.:is da cot~, .1s ow-


du...~s. :ur.wes..<:.i mdo e vem beij:ir,me o rQ,S,(O, trn.e.r-me um:1 espe~
rançi de co111prccnsão. Sim, quem s.1bc ~ u m d ia o comprt'.cnd«C'i?
((.Arln, l)rummnnd dC' Andmdc, S111rlnu,rt1J do 11n;WÚ, 1940)

os INT~l.~CTtJAIS F.O ~IM no F.STAI)() I\OVO


O ;mtifa~ci~rno crt..""oCcntc.: e a k ...'\: dhu.:niiu pulírica tio l~do No\'O
a p:nt ir de 1943 deram nov() fr)lcgo ao debate intdccmal. sobrc-mdo no
campo oposiciooisca.. Surgia, oaque1e c.oncexco. wn oovo tipo de engaj;1-
m1.:n10 incd l"Ctual , ,n ar<....itl:uncntc antifascista e ul>°""itor d a tlim.lura v..1r..
guism. De artífices do aucoricarismo conservador de direita. a maior pane
dos intclcc:rm,is iria se transformar «.~m fo ro de criticas- do Esrado Novo,
inspirados cada va ma'5 em valores dcmocr:hicos e de esquerda.
As mudti.nças de furma e oomcúdo da poliriQi v:irguim. após 19-/43,
p1.reCei:n esLar no centro de um rearmojo gera] dos ~Lares poU[iOOS, incluindo
aí os intdt.'Ctuai~. Em cerro M'.mido, a invc:n çftu de uma n uva política tlc
massas ancorada n~ sindicatos de trnbalh~dort.."S h.:7. com que muims ilus6<..-s
e expectativas conserv:tdoras em. torno de Varg:as ~ dau{S$f'ln. Os liberli.s que
c:ri1ic,wam Varg.i.s por M:r um ditador "fa.scb.1al,J agord n:miam tp,ic d i: sc rur•
nasse um dicador Mpopulist:i". O próprio Vai·gas. aliado das democracias na
Segunda Guerra, não podia manter os intdccmaissimpátioos ao nazi fascismo
no 3ho csalão govcrnisra, F.n.cndo com que eles perdessem espaço político
no go,..cmo. l'or outro lado. o socialismo e o comuni~mo cxcrccr.í.o Qda vct
m:lis o Í'l.U'ínio sobre os intelectwis, prc!J)2rJndo :i grande virada ideológie1 :i
e.Miuerda do mundo irndecrual br..nileiro dru anw 1950 e 1%0, <:1ue p.1-,;sará
a formular a questão nacfonal e popular sob outros bases idcológic:a5.
ÃINVt~ÀQPA6KA',lllll,\t'I 153

A virada críâca do mundo imdeauaJ em refação ao Escado NO\'O


tc.-..,•c como m:1rco o Congr~ Brasileiro de E'~ri1ort'S, n;:db..ido cm j:aneiro
de L945 no Teuro Municipal de S.í.o l,.aulo. O clima imdca.ual na c:tpit.1.1
pat1lisca era francamente anõvarguista, apesar do concroJe, da repressão e da
adesão de algun:. c:scritor('g (como Mt.·noni <ld Picchia e Cassiano Ricardo)
prestigiados nas elites regionais ao governo federal. O C\'Cmo, organizado por
libc...-r.1i.s (Scrgio Millicr), sodali.sr:-s (l)ionC:1io j\tl:Jch!1do) e c:omuni.s~LS Oorgc
Amado), retomou o princípio do frenci~mo incelec1ual an1ifa.c;cisra que ins-
pimr:t a Aliança Nacional l.i\x:rradcm1c.lc1, :mos :rnrc...-., do c:ongn.',S..l,t>. Apc:sar
da proibição do DIP, o conga-esso aprovou, solenerneme, uma "dedaraçio de
prindpio:,", li<la pelo comunisr-A A:,trojildo l'c,:n:ir-,1. tiuc M." ~ icion:wa abcr,
camence pda democracia, pela realização de deiçõcs para a presidência da
Repúblic:t e pell liberd:tde de expre"'1o. O docwnemo conduh: ·o Con-
gr<."'-'° umi.itk.Td ur~cmc ;1just'dr,sc: U!). prindpio~, da ur8ani1:içãu polfrica tJo
Braill aos princípios aqui enundados. que são aqueles pelos quais se batem
:-s for~ ~rm:i.cbs do Hr.u il e d~ N~çc.~ Unidas."
Um mês depois, o governo promulgava um Alo Adiciona.l à Consti-
ruiçio, propondo um:a ngcncb de n..xlc:mocrnri1:w;::i<.l. Era o começo do fi m
do Escado Novo. ~ nio de Getúlio Varg:.is ?l fre1ue d.:t polí1ja nacional.
Da crise do •
Estado Novo nasce
uma República
democrática

MAIS l \1 C,01 PI: 1)1: f.'iT,~1)0, l)~S T A


\'l!Z CONTRA CM/\ OIT/\DUR/\ ..
Uma da.li mJ.iorcs dificuldades d., his1orio-
gr3fo é cxplic.;n com d:m.'7.a por que um rc;imc
<1UH.lrir:irio, com :implo.s f\.'QlTSOS rcp«:ssivos.
<.~pitancado por um prc;.;id <.'fl(.,:..c,lirador imposto
tom dpoioc.la, f o rça., AnnatlA., tm 1937, foi (li.;..
po..to po r ~<.~ mc-;mos milir:.trcs cm o utub ro de
191'5. O que reria :tcont(...'O<.fo entre a implanwção
do Fstado '\!ovo, quando~ solução au1orirári2 se
impú:, unu dmplu .tpoio e tJUd~ nc.:11li urn;1 n_°"iv
tênci.i cfi.:ri\'a, e S\Ll deposição, quamlo :.t ditadura
de Gcn'1lio V..1.rgas não mais se susrcncava entre as
dites políticas civis e militares?
A cmr.td.i cfo B1a,il na Sq5umla Guerra
Mundi:.tl ao l;ido dzis democracias liberais e :.1s mu-
danças no núcleo político do Estado Novo, com
as saídas dos simpacizamcs do Eixo, sinaJiiaram
uma oov-.aconjunmrn i:,olíticac:1uc impunha ad.tp--
taçócs J "'dcmoçracia atnoritáril" cm ~·igor.
156 "1'jfÓRU1X>IIUSl15t1Plill rA

O BRASIL E A NOVA GEOPOÚTICA MU NDIAL DO PÓS-GUERRA

A Segunda C um,1 fui um momento fundamental do sécldo XX LU. rrol'giil,.


ninçio da ordem mundial. Os Mranjos geopolíticos<: dipk>m!tieos <:uroptUS
que vinham do sécul<> XIX. abab do.s 1xb P1irncit:1 Guerra r>.'1undial. pd:a Rc-
,,oJuçio Russ:a e pelos fa.sdsmos, nio \':'l]iam mais. A]Ml disso, fon da Euro-
pa, uma nov-.a potênd..i económica pnh:t,-a uma dimcn.sio poJiãca mundbl: os
Estados Unid0$. À freme da.s Nações Unidas. como eram chamados os Aliados
que c:omba«:ram o 1:.ixo (;\lcmanh;a. lt.álla. e Japio). ~ no1tc-amcricaJ1~ já pro,.
jmv.un uma nova ordem mundial para o pós·Guerr:a ~ck 1943. junco com
os ingleses e soviéticos. A Uni:1o So,iética comunist:1 lidcml:a por Josef Sulin
ador.:a,':I um sistema politko e cconómko oposto 3S dcmocrcadas ocidcnuis,
mas naqudc momento da guerra todos csta,-:un contra os regimes n.uifasdsw.
·1cmcndo uma marginaJiiaçáo diplomática e «onômica do pais entre os ''t11'"
ccdotts. o Ur.sil pa.i ticipou do dotÇO de gucn~. enviando soldados i Eu,·opa e
ajucbndo 1 dcrrow o n:l1.ifudsmo. O lkuil csm-a entre Oi 50 paiscs que fun-
danm a O ~ d3S Nações Vnid:ts (ONU) cm l 945, ficando com :i mi.ss5o
honorífica de n:al.iw- o discurso de abertura a partir da segunda Assembleia Geral.
l lomcnagcns à pane. os Hderc.s brasikiios ficaram dcccpdon.idoscom o lu;;ar que
foi it.SCIVado ao paj'aS na nova ordem mundfa.l. O Uc.uil qucri.ascr monbro pc,ma,.
ncnu~ do clube restrito do Consdho de Seg.ur:anç:a d2 ONU, verd~tío órg~ de
poder dentro <U entidade, m,s foi vct:ido pelos soviéticos.. que temi:lm que o pus
sanprc \'OClSSC jumo com os Estados Unidos, seu cr:tdiciotul :ilfado. no Con.sdho.
No pôs•C ucrr.l, a América Latina não era mais prioridade dos &rados Uni,.
dos. m.ais prcoeupados com a turopa e c-0m a Ásia. paJCO$ p,indpai.s da Guerra
frb, como ~ 2 «'!' ch2mado o conAho dlplo,nárico e ml.llr:u· com o bloco
SM'lêtico 2 putir de 1947. A do cspcr.>da :ijud2. cconómic:a p:ar.a 2. indu.mi2Ji22,.
ção pcwb. ruo veio, nem sequer o rccquip:uncnto miJiur a baixo custo :acalen-
tado pelo t::xéteito brasileiro.
O 01'3.lt.il ainda continuou dcpcndcn1c da exportação de ufé para pagar
suuconw.

A rigor, a própria Cons:ciniição d e 1937. apesar de ser francamencc


ancidemocrática, p revia a realização de um pk-bi.scim para confinn2r ou não
sua vigência. A consulta popular dc,·crfa ocorrer ao final da ..primeira fase do
mandato presidencial~, previ.Slo p:tr.1 dur.l! 6 an06; que, portamo, fora atin•
gida em no,·embro de 1943. Com a desculpa do "e..srado de guerra" com as
po1ência> do E.ixo, o pk:bi5Ciro foi adiado pelo p,nideme. M:m clar-.t definida
para :,1contcccr. Va,rgas cnÍTI:;nta,-a oposiçâo crescente de grupos liberais que
em fins de 1944 passaram a contar com o apoio nos quartéis. Assim, o presi·
dente e :1lgun~ assessor~ mah, próximos comti?r.tm 2 ptnsar c m 2lrcrn:iti\-:&S
par-.1 .sua sobrcvi,.'1,:ncia política <:m uma conjumur-.1 na qual a corWOClÇ"..Í.O do
plebiscito ou mesmo de eleições gerais seria inevitável.
Percebendo ser impossível lut::tr contra processo de redeniocraciza.
ção, exigência para a lcgitimar.io do governo :u)im <1uc a guerra acaba,.1:sc.
e vcn<lo &ct()R ~ influcnici <la i1o<:i<.."(la<lc adensar a) criticas liberais. Getúlio
V.:i.rgas e. seus principais assessores começaram a procurar novas bases so--
ciais de apoio. Ê neSLe 11\omeOlo que Slltge o tralxtlhislllo e se consolid1 :i
imagem ck um Getlllio Vargas "lí,lc.:r <lema~~~". pela tiual de M:ria lcm ..
braclv 11:1 Hi!itória dv H~il.

AC I.T f.A "l'IVF.N ( :ÀO DOTRA KAI.J I ISMO"

A imagem de Varg:is como lidl:?rallÇJ. it1comesci\lel na conjunrun


poHlici imedi:1c:1..menre posterior ?l Revoluçfo de 1930, ou como "Uder Clris.
rmític:o• d~ ma~;u tr.thalh;•dcml) c.lC:,(lt: M."1.1 M1rgimc11to no tc1\.4rio pulíric:o
brasileiro. é um ranto c.-x:11:,~r:.tcl.a. Na vcrcbdc, Vnrs:,ts cnc1bc."9J11 o Cow..Tn(l
Provisól'io em 1930 mais peJo futo de cer sido o caJldid.lco à presidente der-
rocado na.~ eleiçóes no ano ;uuerior e por vir de tuna olig:arqui:1 regional
inAucntc. c1uc tomara a iniciariva militard3 R<..'\>t,Juç.ío. M~mo pn..vc:upado
com a qocsriio opcr..iria, o no,..o regime mio se carnacri:1.c.m, imcdfo.ramcntc.
peb construção de unu lide.r:i.nÇ) pe1'$0n:tlist.t e c:ui.~m:ilica voluda par:1 :i
sedução das massas tr.1halh:ador.i.s. <:omo vimos, a liderança politiC.l pessoal
de V;;,'1,-r.tS no comando do faf:ldo só se consolido\1 após muirn.s mrbulêncfas.
vencidas uma 2 uma p<.-la sua capacidade política cm acomodar demandas
de setores inAucmcs, ncuLraliz..'lf inimigos e :idapl-ar·sc às circunst,\nci:as. Sua
asccndCllcia junto à elas.se operária também foi um prOttSSO co1tsLrujdo de
maneira lcnra e plantjada, com impulso cfcti\.'O somc..'fltC após a impla.nração
do E.srado Novo. Foi a panir de 19-f2 que o núclc:o ix,lícico do governo se
deslocou, pauJaünamcmc, para o Ministério do Trabalho. Seu novo cirular-
Alexandre Marcondes Filho - p:k$0u a arlicular um.:1 relação mais orgaJü2:3da
e efetiva cmrc a presidência da República e os sindicatos oflciajs,
Oo:dc 1939, o Dia do ~ll'.lbalt,o era uma k-sta oficial pl1blica e de ma.!&!,
n:ali1:ada no C$tádio de São Janu.írio, T'C\mindo milh.1.rcs de trabalhadores cm
158 tlN fÔR l,' (Xllll,\\11 RIPÚJ.l k,"A

torno das autoridades do Estado Novo. A cada solenid'lde, \ ~'lfgas anunciava


uma nova medida do Estado em defesa dos ~cralxllhadores do Brasil", como
a criação ela Ju,ciça do ' lhb.lho (1939), a f,xaçáo do valor cio ,alário mínimo
(1910). a •Marcha I"" Ocm:" ( 1912), a Cc:m,oliclaçáo das Leis do Trabalho
(1943) e:, Lei da Pn.."Vidênd:1 (1944). AJX$1r ele prom<."tcr :J crfac,-:io<l:a k-gisl:iç:io
social parA o ma~lh3dor mr2l desc:le 194 1, deixou c.:ssc sc:ror for-.a <l:as políricis
tl"'.tbalhisr~ do l~r.tdo Novo, t....•i1.1n<.lo conflito!! roma\ l>a!!<."ll <k: 50.)tcnr.ição do
t,'U'\'l'fflO m,s <.-:st:tdc~, airKla dqx~ndcntc <l-r; t.1ligan1uia$ ~"Km.ais.
Em 1943, o l,;O\.'Cmo :anunciou, CQm pompa e ciramn3ndo, :i cn
(Consolidaçlo das Leis do TrabaU\o), um gr:tnde corpo de leis que reuni:.
e sislcma.üzava coda a legislação crabafüista bl'asilcira, mesclando proteção
ao crabalhador com mecUdas de conuole das organizações operárias, Gom
grande poder de cutela sobre elas a partir do Miniscério do Trabalho. A=·
1eira de rrabalho foi reformub.da, nonnacj2ando os col\tratos emre patrões
e empregados, e pos.sibiHt.1ndo o comrolc burocr:ítico pdo &Cldo da vida
profissional dos 1n1balhnd(1au. Muicos ,lircit(l$ foram rdn:r:.ulos n:t ClT ,
como férias, <l<.-sci.nso s<.-manal, condições de S(.·gor:mça e hibri<.-nc dos- loc:Jis
de rr.ibalho, ain<ki qm: na p,..J,ica n.io ÍQ.)M:m cfi:riv.tm<.'fltc aplicado) pelo~
p;nri)<..~, nem ÍC.-tSSCm alvu ,lc fhca li7.as{io cfic:;11. pqr parrc <lo governo fu.lcral.
Vara muiros hisrorfadon.~, a o T foi inspir:tda nn Cana tk/ /.alJ(Jro d(1 Í.1.SCismo
ic-..tlhano, mas novas pcsqoisas: rém d<.monstrndo qoc as font<.-s de in.spirac;~t.1
<.la c:i r Íoram diversas, com alh'llOS ponw!I inspirado.\ na lcgislaç;i.o de de~
do o'abalhador pmposca por partidos e go\'crnos social-dcmocr.uas..
Essas medidas foram recebidas com.o '"benesses... do Estado pela maio,.
ria. dos uab:Uh:1dore-s br:uiJeiros que vivfa.ru em col\diçóes de excrema explo-
r:aç:io e não tinham uma cradiç;io de livre org.:ufri.:iç.io sindical. No final dos
anos 1930, o anarquismo era wna corrente quase desaparecida da militância
operária mais atuaoce, e o comunismo ainda n.:io tinha se fümado como
alrcrnari"a siodiG1.I cfcõva, a,é pela gr.iodc rcpn-ssão .sofrida pdo llanido Co-
munista dodc 1935. A11sim, o fac ado pôc:lc aluar corno "organizador" de uma
d,JS,';C opcr:iria que tinha sofrido g.r3ndcs mudanças dcmogr.ífic.1s ao lont,,~
dos a.nos 1930, pas.s.1ndo a ser composta majorimriamcnrc por brasileiros
naros, oriundos das dass('s populares urbanas ou migrados reccnccmcmc do
c:tmpo, e náo m:tl!I por opera.rim. estrangeiros rum lartç.J. experiência cm mi-
lirâ.ncia sindical. A Lei dos 2/3, promulg:.1da cm 1931, nacionaliwra a classe
m.c,u,..., IX> l \1'AOO 'lJ\'ON.\'iCl l .... A RI p(·1111C,\ D! WOCltÁ I K'A IJ~9

operári• . exigindo que esra fraç.10 fosse ocupada °"' f.ibricas (e mmbém nas
cmprtS:;1S comerciais) por b~siltirt~ de n:i.sc.imento.
A nacionaliiaç..í.o da dassc: operária, a propaganda cm torno de
V.'lt'g<lS co1no "pai dos pobres"' e a imensa campaJ.1ha de filiação aos sindi·
ca1os oflt.;almcntc rcconlu.."Cidos, promovid:a pdo Mininério do 'lhlbalho
a parár de 1942. consolidaram a liderança varguisra na cl.wc operária
br:u:ilcir:.J. De c:iudilho milic:n e quadro olibo:irquico, Vnrg:as rr!tm,formou
sua im.agem, tornou-~ "p:ai dos po brcs" e '"líder de mass:1.s'•. Uma mi.~tur:a
tlc p ropaganda de ma.s!>a, cooptação de lidcran~ :,indicais, R-'J>r'C~fto e
percepç~ de que o Esr;1do ouco1-gava direitos sociais ine.'<lscemes ames de
1930 foi l·mprt..~ad~ nc.·Mc p rt.lC<.'"MO, Não por aca~. c:is:t apro,cimação de
Getúlio Vargas com as mo=s foi perttbida pelos liberais e pelos militares
coi:no wlu perigosa m1nobr:1 visando l conciouidade do seu governo.

Ourante o Estado Novo. a propaganda: do governo


enfatizou a rtlaç&o de varo- oom os trabatiadores
(iObfetuCI:> operarl0$) c:om especial atençao
para a festa oficial cb Dia do Trabatlo
Não se pode dizer que Vargas renha aposrado apenas no apoio
dos oper:íri~ JY.lf".I se m.:um:r no po<lcr. O presidente sahb c.1uc, sem o
apoio do~ d,éÍc:i polícicos est.1duais, dé não conseguiria se manter na
direção do governo, principalmence sob um fururo regime polirico
baseado em dcic;c.'\c.s rct,,ularcs. Desde 1937, mui,as lidc111nças políd c.~
regionais haviam se acomodado n:as no\'~ <.·s:crucur.is de poder criadas
pelo Escado Novo e não lhes imeressava romper com Vargas. Os in-
terventores escaduais. nomeados pelo presideme, aJiaram--se a quadros
políricm tradicionais, oriundos dos 1,ar1idos regionais olig:h<1uico~ da
Prirm:ir.1 Rcplíblica. Com a pcr&pccti\•a tia rctlcmocrati1.açâo, cm 19/45,
eles passaram a arcicular a criação de um parcido polirico que. reunisse
as cli1cs r<.-gionai.s mais pr-Agm~tk:.i.s cm rorno do projcco nacionali.srn ç
in<luMriali1.antc <.lc.:ntro do c..;nnpo <.lc inRuênda J c Vart,;i~.
Como sempre, Varg:as remou conciliar imeresses opostos e se 1nan-
cer e1n equilíbrio encre eles. Porem, cada vez. rnais, aumentava a oposiçáo
.io M:U governo e ao E.~1ado Novo crn ~ua ror.ilid:u.lc.

OS I.IRF.RAIS ROM P~M O Sll.f.NCIO:


NJ\SCI:OANTlGCTUUSMO
J\ pcrc:cpção ,Jc <1uc \larga) pn:par.tva uma nova ba~c .1,ocial tlc
apoio, cujo eixo seria a classe opeciria, aguçiou ainda 1nais o amigecu•
lismo dos setores liberais, rradicionalmcncc cliri.scas. Par-.1 cncs, Varg.1s
já 1inha urna im.ib'\'.lll consolidada <.lt.:Mk 1937: a do Jitador au1orirário,
repressot' das oposições e mauipulador de instituições e lideranç.as po,-
lítictS. Setores releva.ntes das oligarquias e das classes médias em que o
libcrali~mo tinha mais inAuência. como São Paulo e Min:b Gcr.1is. ~
tornaram focos imporramcs do antigcnilismo.
En.) outubro de 1943, me1nbros da elice Jiberal d.as Minas Gerais
lançaram o J.11111ifnu, do1 Minl'iros, documento que te\'C grande impacto
políticu. O maniÍC:Mc;> cknac:ava. a ncccss.icl,nlc d e n:dcnmcr.a1i1...lçáo com
base na realiz.ação de eleições livres e na ,·olra. das liberdades civis básicas.
denunciando a co1\trldiç:ío em que o governo estav.:t mergulhado, 20 lucar
pela democracia na Europa, mas náo a praticar dcn1ro do próprio país. O
goYcrno reagiu punindo v:irio.s dos signacirios. :.icusado.s de insuAar "'nosso
pior inimigo: as divergências internas". Vargas prome.reu a normalização
da vida política do país para logo após o flm d1 Segunda Guerra, em ..:un-
bicncc próprio de p;r:r. e orxkm•.
Em d(7.tmhrodo mc!ímOano, Armando Sallcsdc Oliveira, c.and idató
:t prcsiclcntc cm 1937 e inimigo de primcir:1 hor.:i ,lo E.stado Novo, lon9,>u
:a p~rtir do exíl io um manifcrn.l pd:i n.·dcmocr:ni,:~ç:io imitul:ufo Cann nos
lmuilt!iros. Ndc, apda\•a a(M. ~cnlimcnw)) Ml~t.amcntc dc,nocráciceh do))
militares. para que luta~m t.vntr:t a diradurn do Esrndo Novo. Em 1937,
seu :apelo p:ira c1ue o f.xérciro n:i.o :ipoi:tS$C o golpe n3o der:a rcsulwdo, mas
em Ítns de ) 943, o concexco era outro.
Naquele momento, a posiçáo política das Forças Armadas era pa-
radoxal. Consideradas a base da estabilidade política do regime, elas não
ficaram imunes à mudança da geopolítica mund.i;tl oco1·rida à medida
que as potênci:'I.S fascistas iam perdeodo :\guerra.A criaç.'io da f1C_B) t:\mas
VC'l.CS adfada por Gclúlio, expôs os miljlares br.isileiros à influência direta
dos l-4tndos Unidos. assumindo cad:) ve1. mais :a defcs:i de um ide.ti de
<l<:moc111ci:i libera) como sua mi.ss:io <.-sfr.irL-gica. No comcxco brasilcir<.l,
is))o signifk-~1\~ rcforç.ar uma tradiçfo polícica dirista. c.1uc n;io via com
bon~ olhoi1 a mobili7...açáo política da cl~c trabalhadora cm torno de um
partido de massas de ideologia rociaJisra O\I trabalhista, de manih.'$mçôes
sind icais politi7:idas ou de uma liderança carism:irica que <lomin.i.ssc o
ambknre JX>lhico. o~ milir-.arc:.)), cm grande parte compartilhando a visão
de mundo das oligarquias (criticadas por dcs cm omros aspectos, como
o seu regionalismo desagregador), desconflavarn de q ue a mobiHzação
de opeclrios sob a lider:ulça de Varg1S colocaria em risco a ordem social
e a "coeslo 112cion::il". Emrec:uuo, 2 ah:i cúpula do Exército aind:i se
maminha fld ao rc,gimc que ajudara a conSlruír, demorando acé fins de
1945 para derrubar o presideme e aderir à cese da "redemocr.ui2açio sem
Varg;is", como apregoavam os liberais.
Ao lonoo de 1944, soh o )igno a,nrnrn e.lo anrigc.:rnliMno e das c.lcY
confianças gcncr.1liiadas de que Varg.i.s prep.nava nlgum-1 manobr.l para se
pcrpcrnar no poder, se.tores civis e milirarcs passaram a criticar duramente
o prcsidcmc. considerando,.o um obstáculo ;i redcmocrncização. A sua
própria condição de "pre~idcn1c-dirador", paradoxalmcn1e, cnÍrac.1ut-cia
sua c:indidan,ra à presidência cm fomras eleições. pois isso diminuiria a
162 t11'iTÔR l,H X) ll,,\~IIRIPÚll k;A

legitimidade da eleição e engrossaria os argumentos de que a transição


dem()(:dtica era ~pen:is uma fachad:i par.a o "cominuísmo".
A esrracégi:.l de Vargas de lançar-se como candid:uo ú11ico à presi-
dC.·ncia d~ Rc:pl1blica cm um.a funi r:a clciç.lo ou plcbhci10 mo~r~v.a-sc pr.i-
licam cntc inviável nesse como.to de oposiçáo crescente .io Estado Novo.
f".Àn mc:tdO.'> de 1944, rnc:,.rno sem e.lata par,1 a eleição, a OJx»içâo lihcral
ami~tulisra lançou Eduardo Gome.s, herói renemista e sobrevivente d..1.
R(."\'Olm do Forre de Co~cib:ma cm 1922, como seu e~nclicbto ao c1rgo
de pmidence da República.
O início de 1945, C(.lm :a aproxim:aç.l<.l c.b \•i1óri;i ali2d:a n:a Europ:a,
foi marcado por ações ainda mais contundentes da oposição a111ige1ulis-
1a. frn j aneiro, como virno.s, o C'.c.mi;,rc~o lk.a~ilcirc, de: 1-~rirurc~ lan~"Ou
um manifosco pela democratização do Brasil. demonstrando que o apoio
dn imclccrualidatlc ao governo V:1r~ fiair.t rcdm.ido a imck"C.1"U:li$ m(.'-
nore.s, já sem capacidade para ditar a age.nd:i do debate que se desenhaY.l
no meio culcw·aJ nlais reconhecido e valorizado. Muicos inceleccuais que
n:1 d('<..":ld:a ;all{crior haviam sido sc.--dm·id~ pelos \'alc.l rc.--s amorit~rios fo..
ram ddlnitivamcme cont:.uuinados pd:t luta :1mifascis12, convertendo-~
para o campo tlcmocr:hico. lntdcctuai) auúlico~, liht:r.-1b e cornunhi-~ .
mesmo discordando entre si cm sua visáo de mundo e seu m.oddo de
soci(.-dadc ideal. convergiram naquela conjunrura par.i :t clcfcs:t da demo-
cracia e das liberdades civis.
Em fevereiro, o jornal Corrt'io da Manhã, influcnu; órgão da im ..
prens:a c:.uioc:t, rompeu o controle do DIP e publicou uma long;i emre-
vhta de Jus~ 1\méricu d..: Al meida, cx ..m inistro <lc Varga~ e canc.litlato à
presidência cm 1937. Almeida acusava Gc1úlio de ser u1n oportunista
('"um homem providencial") e o pO\fO de cst~r anestesiado pcl:t propagan-
d:t, :1credit:tndo em wua legislação trabalhista que só era '"avançada no
papel"', pois não era posta cm prática.
fict\•l dn.ro que as b:ues :iutorit:irias do Estado NMo perdiam ri
legitimidade nos M:tOl't"S mais infl uenres da socie(ladc brasildra. Nc-S)t"
ambiente de oposição crcsc;cmc, o regime ainda tem ou uma u :rnsição
controlada para a democracia, mesmo com a $ignifka riva diminuição do
apoio ao presidente.
,
D.\{'R~ I 00 l~iAOQ i\O\'QN,\';Cl l"\IA RI P('IIKA DI MQÇRÁ I ICA 16.)

DEMOCRATIZAR COM OU SE.~1 GE.TÚLIOl


Era inevirâvd dar uma resposta às oposições que não fosse mais re-
pn.'S5ão e mais censura ?l im prensa. Aincfo em fcverd ro de 1945. e) govemc,l
Varwis resolveu com-ar a inid:1riv-.a polílic:a, p:ara evitar c.1uc a oposição desse
o com da tr.rn~iç:io pulítica para um novo n.-gimc.
A primeira medida do governo foi a promulgaçáo do AlO Adicional
n. ?, que pl'evia a realização das eleições em data ainda a ser marcada..
Logo depois, propôs tUlt novo Código EleiroraJ e marrou as eleições pre-
sidenciai.s para dc,.cmbro, junw com 3-'> clciçõc:~ p.ira o P..arlam(.'fl10, Vd:b
rt:~ras dciwrais, V;u"óª~ pc.Kk,Yia cum:orrcr na$ dciçóc~ prl:'oitlcnciai» tJ~lc
q ue dcix;~sc ele f(.'T p rcsiclcmc d:t República. l'ublicamt.-ntc cli1,ia c1uc nác,1
tinh.:t interesse en1 concorrer ao cargo, mas poucos confiavam no homem
que dera um "autogolpe" de Estado em 1937 e tasg:u~ a Constituiç:fo
que de mesmo, como presidente deito cm 1934, jurara defender. Mas se
colecionava cada vn ma.is inimigos, V,ug.a.s- ainda oonsegufa fàzer novos
:•lindos no jogo politic:c,l.
Em :i.bril de 194 5, o govt~mo (i(..-çrcrou :anisri:.a a u.xlos os presos
políticos, hcncflcian<lo, wbrcrudo, m comunisr-&, dur-,1mcntc reprimido~
desde 193). Aliado momentâneo na lma conm1 o naúfuscismo, o Escado
Novo reicou relações djplomáticas com a União Soviética, no mesmo mês.
A Jn:fo estendida aos oomuniscas - que desde 1943 cinharn emitido sinais
de apoio ao governo Vargas cm nome da ''União Nacional" na b'llerr.t
conmi o f..1.scbmo - contrabalan~va a pc-rd a cn:set:ntc de infüu.":ncia no).
sctc,rcs conservadores. crianrlo uma conjuntur.1 política complc:xa na q ual
o presidente acenava para vários grupos políck~, mas, bem ao seu estilo.
não se coi:nprometia efetivamente com nenhum.
Denue os comunis-r.1s libertados das C'ldeia.~. o mais notório era,
M'.lll dúvida, l.uí~ Carlos Pn.:sta., preso pol' c.1ua.M: dc7 anos. Ow·ancc ~ua
prisão. Olga lknário. sua esposa e mãe de sua filha. fora dcporrad.i wm
aucoriiaçâo de Vargas pam a Alemanha. onde morreu cm um campo de
cooce,Hroç,i o. A históri:i. do líder co1n u1tisr.1 brlSileiro Linhl se tornido
mundi:1lmeme notória, e sua ap:1riç:io em comícios públicos depois que
saiu da prisão era muilo concorrida. Aind:a na cadeia, de cinha sido eleito
sccrcr.irio-gcrnl do Partido Comunista, rornando-se sua lidcr:,mça máxima.
Para surpresa de muitos, e condenação geral da imprensa conser·
va.dora anticomunista, Prestes endossava a opçlo dos comuniscas que
apoiav-,un a <k·mocratr,.ação. ma) n:'io ~· opunham à continuidade de
Cccúlio. Na avaliação cfos cornunist"'.t.S, o naciOnálismo e<:<mõmicú do
governo V:ui;as ér:i um conrr:ipomo válido :io .. imperialismo c:ipitali~~i",
considc~do o maior inim igo do comuni.smo e da cfo.ssc opcr:íri:t. Esta,
além do mab, era vi.)ivdmcntc simpática ao praidemc. Com a Lei An·
titmstc, cm junho de 19'15. <luc clifaculrav:t a conéentraçfo <lc cmp f'Qia$
conrrofod:i.s pclc,1 capitnl ~ar:mgciro, o governo :itendi:1 :aincla m:iis :ios
setores polí1icos O:\ciooalisas, o que oaquele momemo contemphh·a as
diretrizes do PCB. Em 1945, comunistas e trabalhistas csta\l.l.m lado a lado
na defesa de uma Asse.mbleia Nacional Constituinte com Getúlio ainda
no poder. Ao contrário dos liberais, os comunistas uio condiciou;.wa.m :.t
volt:t da democracia à s:úda do presidente.
Os liberais dcícndiam a 1esc contrária: primeiro, GccúUo dcvcri.a ser
clcrrub:.ulo, par:i :;ó clcpois :t novn \.,onstir;uiçio ser dob<.1r:1dn sem a som-
bra. do ditador. Com a <.~ndid:an1r.1 de Eduardo C<.lmcs cm isccnsão, <.lS
gru1>0~ ;rntigcn1lb•a~ organi1.::1.l'"dm a União Dcmoc...TJtica Naci<.lllal (tm-.:),
o primeiro dos gramlcll partido:- nacionab Jillr<~i<lo) no pruccs,o de rc<lc•
moc-r:ui1~1çáo ele 19/45. hmdad:.t no dia 7 de abril, .'l llDN era inici-:ilmentc
uma frente hcfcrogênC;1 de inimigos do E.s,ado Novo. R.cuni.i oligar~s
rradidonais <.lriund~ da Primei~ República (Octavio Mangabt·ir-.-, Jl1lio
P1"t"Scc.s). socialistas moderados (Hc1'mes Lima e João Mangabeira que mais
carde fundariam o Panido Socialisca Brasileiro), dlssidemes da Revolução
de 1930 (Juraci Magalhlles, Ju:u<"2 H vora, José Américo de Almeida), li-
berais dedar2dos, sign:u:írios do Mm,ijf'Sto dos Mintiros (Afonso Arinos,
Virgílio de Mdlo Franco e Pedro Aleixo). Os udcni.scas ccncavam angariar
apoio militar e uorre,.americano para. evemualmence, derrubar Getúlio
pda força. A imagem doditadordisscmin:ada pela UOJ\ t'rn a dt um político
inescrupuloso e ardiloso, tiuc poderia eompromc.tc:r o li\•rc ;ogo d t'iCOral.
Com o tempo. :i unN se firmou como um partido liberal elitista, oítico
du relação entre sindicutos e Esrado e da intervenção cstaral na economia.
Porcanco, ao comrário do que defendiam os gcmliscas.
Os serom lig;ulm ao governo, obviamcncc, oáo ílCar.un paralisado~
na oorrida pn:s.idcntial. A burocracia sindical e previdenciária. fu~ lcci·
da pda ação do Ministério do Trabalho desde 1942, fundou o Panido
Tr:LlY.ilhis,a Hrasilciro, c:m maio de 1945. A:, imcrvcntori:a!> <..-staduais se
anicularam, com apoio discn::co do pr(.'sid<:ntc, para org;rnir.ar o Panido
Soda! Democrático (PSD). Fundado em julho de 1945, o PSD reuniu os
\lários grupos regionais que apoiavam Gerúlio ou eram beneficiários do
F..s:~do Novo. como Ag;amcnon Magalhães (PF), lkntxlico Valadares (Me;)
e E.rnani l'<.::ixoto (RJ). Para ~e contrapm a Eduardo G oma,, v l'Sll lançou
outro milicar para a pre.sidência da República, o general Eurico Outra,
UJU3 das lideranças miliures mais importances do Esudo Novo. Mas s6 às
\'l:llpcr-d.\ das dciçúc.~. Varga.s apoiou a camJitlatura tlc Dutr.t.
;-\ entrada c.lc um novo ator cm t.--cna - a classe o perária - acabaria
pc,1r complk11r ainda m~is o proa:sso po lírico, culminando na dcpos-iç:io
forçada de Varg.,s.

/\ VOLT/\ 0/\ l'Ell EO QUER.EMISMO


A 1:orça l~xpc.xliciunária Bra-.ikira, d c.:pois c:lc.: b;nall1.t) viruri~a.s ;im.-
plamc.:ntc comemoradas pela imprensa. ~,·a com a data marcada parn
o retorno criunfal ao Brasil. O primeiro escllio desemb:u·c.uU no Rio de
J:iueiro em 18 de julho de 1945, quando se agu:ird:wa 11111a grande ma-
nifcs,açáo popular. Os t,ulcnista$ esperavam que a volta triunful <la FF.fl 3c
tr:msform:mc cm um grande pn:m.'3 tO conmi Varg:is e o f.srndo No,·o. O
q ue se viu, no encmco, foi o comdrio. A nuuifes1:1çlo popular 1):'I.S rua!
do Rio de Janeiro saudou os pracinhas. mas também saudou Vargas com
entusiasmo quando ele 3pan..'C.Cu no Am do desfile milit;n.
F,::s-rividad<.--s à pane, Eurico Outra, ainda ministro da Cocrr:1 do
governo, tinha d issolvido o corpo expedicionário, ,cmeroso de que a
oficialidade que lmara na Ew'Opa. contagiada pelos valores dcmocr.Ílicos
libcrajs, civ<..'SSC à su:1 d isposiç.1.o uma tropa prcsdgiad:1 e experiente cm
combate, disposta a derrubar a diradura varguista. 1\final, os c1uartéis j2
estavam agitados desde o fim do ano amc1ior, e a volta da ru podcl'ia con-
taminar aindt 1nais a oficialidade ancigeculista na direção de wn golpe de
Estado. Com a dissolução da flB, oAciais e soldados proflSSionais voltaram
a St" incorporar à.s mas amig:,s jurisdiçó~ militarc~, ettt1uanco o~ pracinhas
q ue eram civis ante$ da irem para a gucrr.) ,·olmram a sê-lo. litcmlmcncc.
l66 tlN TÓRl,HX;> U,.\\11 RI P(lll a;'A

do dJa paro a noire., sem direico à pensão ou a emprego, rendo ganhado d..1
sua expet·lência na guerra apenas medalh..,s e cicatrizes.
A manifQ1.;aç.áo popular pró-Gcn'1lio no dia ela volta da t+t\sinaliwu
(1uc as ruas ainda cstavarn Cúm Vargas, m(.°SmO (1ucquiSC$$Cm d emocracia.
O f:uo era c1uc o crlsm:i d o <lirodor, c:()n!;truído e r(..for91do pela pro p:i-
g:ind a do n w, ~ mc;did ::as de p rou,-ç;io ~o tr.ib~lho, m ~umcmm do sal~rio
mínimo e o tom n:lcionalbt'.t e ~1crn.;il e.los M"U) d iscurw) 1inham se cnrai ..
:ulo n o cor.is,-ã.o das m:u.isas trabalhadora) ur-han;u.
7..

A ama<i,-:io d o opcr:trfado no processo <lc rcdcmocrari7.!l'rÍO se am-


<:r~i2,1ri2 no chamado ..queremismo'\ movimenco lanç:tdo em maio> que
recebeu esse nome a par1ir do seu slog,m principaJ: '"Queremos Getúlio!"
O empresário paulisra Hugo Borghi, penenceme ao circulo de correligio-
n.irios do presidente, foi o responsável por lançar o movimemo e er.1 seu
principal p:urocin.tdor. O quereinismo deslaüchou no segundo semestre
de 1945, espalhando-se por várias Colpitais cst.1duais. Os quercn1LS1as dc-
Ít.'Tlc,Ham a tese ela a)n voc:aç:lo de nm:i Co~-rin1inrc e da rcali1...1çio elas
clc:içóe$ prcsid<.'flci:.iis com a m;i.nu(çnção de C<.,.(1lio V:i.fh'3S no poder. M.ais
tio <ruc isw, <lcfcrl(.liam a kgitimidadc de sua c:mdiJacuf"'.t ~ presidência t·
promcriam lu r..tr pda ~ua vitória dcitor.•I.
Var~is continu:;1va nc1:,o:1ndo s un c.1ndid.an1rn , m:i.s clogbv.i o movi-
m<,·mo qucrcmi.ma. As dc.sconAanç;i,s <la oposição, de que de se lançasse
candidato e fosse imb,uíwl com o apoio <la) m~. só aumcnr-.,vam. on .
cialmemc, o qucrcmismo não era organizado pelo PTB, mas esse parcido e
o rco er:un os seus principais apoiadores, represemando as duas principais
co1Tences do movimenro operário naque.Je co1uexrn.
As nunifcst~çócs queremisw fora m vistas pdos oposico~s de Getú-
lio como a senha pa.ra um novo -golpe" para d e se manter no poder, dcss.-i
vez. oom um caráter n1.:tis à esquerda, :1pofado pelos comw1istas.
A relação <.'fltrc as massas trabalhadoras, os oomunisras e o líd<.T
cari~má1ico ,arnbém cr,1 mah·i~la pelo) Esradm U nitlos, pdo alto teor
de nacionalismo econômico que poderia emergir desta aliança polfric:3.
Situação semelhante, embora catalisando ourras força.s polítiClS e rrndi-
çôes sindicais, vivia a Argentina, com a ascensão de Juan Domingo Pcrón
eomo ligação mire seiorti milital'<..-s na cionali.sta) e movimeruo ,;in d icai.
Na Argentina, entretanto, o Partido Comunista e os EUA cswvam rontr.i
Perón. No Brasil, a habilidade de V..1Igas e a aliançi firmada com os LUA na
Scgun<fa Guerra n:io ll'.avi.lm lc:v:.do a r:11 simaçlo.
E.m se1cmbro de 1945, Adol f lklic Jr.. cmb3ixador americano.
proferiu um d iscur~ú no sindicato dc:,s jornalisr-~ do Rio tle Janeiro. O
disc:un;o t.~cav::a muito longe de $Íg:nificnr umn critic:1 dfrer:a :1 V:ugas ou
um rompimento deliniti\•O dos Esta.dos Unidos com o govemo brasileiro.
Mas l3<;rle CS:ta\la visivclmeme preocupado com a entrada das massas tra-
balhadoras no proce.s.so de redemocratização, simação que, sob sua ótica.
remerfa ao nefas(o exemplo argentino, em que Juan Domü1go Perôn cinba
con~u-uído uma ba-M: cldwr..il popular imb,uívcl. E.m su.i F-.1la, lkrlc.: Jr.
cnfotiwva <,JUC .. Vargas não cm Pc:r()n" e dogfava a convoaiçâo tias dciçôcs
m:m:ndas par:1 clcr.cmbro, comu do , expressava prcocu p:iç:io C(>m o <1ocrc-
mismo e com a cresctllle pl'eseJ\ça dos comuJ\ist:'IS na vida públic:t e 1\ll
manifestações de massa.

GF.TÚ!.TOVARGAS, UMA F.SFTNGF. NA rot.iTTCA Rl\ASn.F.Tl\A

f.ntrc 1930 e 1954, tim 11(m1c Jgi1o u :, poli1ie:1 lir.1~ilcir.1: Cei,ílio V.,'l;a:,.
;\.fc:.111<.• 111..1:, .Hu" cm <1uc n i.., c::uevc , .., uJ111.111tlv ,1,, F~1.1do hta)ildrv. en-
tre 1946 e 19$0. V.a,-g;a:. eleve: 21 ,.ua ,.mnbr.i, OISJ:lli1,an-1.lu t.orrclig:ion:friu,,
:ttu1ndo nos b:midorcs e prcinr:mdo su:t \'Olt1 ao cugo de presidente d2 Rc-
pUblic1. Se cm 1930 de chegou â prc-sidênd1 a partir de um lcv-unc ~odo
djsposto a afanar a oligatquia paulista do poder, cm J9SO ck foi deito e
consagrado pelo voto popular.
Atinai, quem foi e o que pensava Getúlio Va1gas? 1~ 1 que $CU nome e K"u
l~do 1.ind.2 hoje mobilium ôdios e pclixóts? É muito difid) :l!inh2r V:u'S1'i 1
um.1 hd~id.ldc ideológka QXn;n1c oo l(lngo de su~ tc:tm::ir.a polítk..L. formo(N~
pulittl~mcmc n<• po!.i1r\•inn<• g.,.illd1(), u 4t1c cxplic;;, cm p;,iMc $lM $imp:ui.i pd.a
..i,:•l uud.1, lliJ F.sutlo )),C)brc a :..)(ia.tklc. M.a:, 1.1111hém er-.1 lilho lL, (~iga1q11i.a e,
rumo 1,11, p1micipa~ do jOf,'O pc~itioo nadollQI ;1ntcs mesmo de 1930. fun..uuo.
ele não propriamente um ·avcn1u~iro" quando :m.1:bou :i frC'mc do Covcrno ~
visôrio cm L930, nus um político profissional. Comcguiu \mccr scw advcmlios
e inimigos, conJOlidando S('U poder pasoaJ na f'omu de wna diudura violenta cm
19.~7, o que lht ,,aJeu o róc:ulo de íucina dado po1muieos dos sew críticos, Em
me:ados dos :i..nos 19·i0, V:1..1p se emaheleceu como lídtr m,halhisc:a, com gr:ande
popubridade enrre os oper:irios, m:a.~ nio er:a propriamente um socialiua, nem al~
guêm que xroo.iu~ na. d.Ms.iodc riqutt:a.<; com as m:u.sas populares - posrur;a que
lhe valeu o fÓt\lto (lc; J)llllul»u e dc;n1.igugo. Ô>mlun :1w<.l,u ~· ~ f,allQ. poc..lc;mos
168 t11'iT'ÓlW,D.">1t,\'ma1p(111~A

111)()01:ir :.i prroeup,l\"'.)O i,n ':1n:.1l~r :.i economb n:icion!'l l ~ b.:a..e th ir..:l11~1rblbo.:.i-
ç:ic>, 11'1 !'1 ~ sem 1.e&.'t'$S:m:11ntnre ser um 11.Jci()n:tlis,2 r.,dil.*:JL
Seu estilo de go•.-crno aru-alizava n .,tjh;:i fórmub bmsikira, herdada dos
1empos imptri:i.is, iie "'d ecidir J>()r t-!et.."".lntaçlo", o que $il;_1\ ifiea...-2 e.spe:n, que
1od!'ls :.i.s ÍOl'Ç\S em dispu1:l 11e desg_;-.st2tSem :ao s,eu redor, par.1 que ele h)ma,sse
uma dccisio, .E.k era mcsrrc- cm acomodar incc:rcs:sc.s policie.os com um cargo.
com um.2 benesse:. com um.1 foti.:i llO poda. Os libe1'.li.S 1inh:un-lht &·Ho ru(1tt.1I.
sej.a pela '"u--.:iiç.io de d a:ssct em 1;ll':IIO de su.a aprollim2çlo das mwas u~,h,dh.1-
dor.u. stja pela dC'.scon6auça gcnullu. ck que d e cn um .il.Utorit.úio inco1TiglYd
, 'OCacfonado para manobra:s polídcas e goJp~ de Üt.ildo..
&u ,.ui,..ídioc:m 24 de: ,t:go:,to tk 19S4 p.1rcü1 dccrc:t:tr u lim ,k5.u:1 inílt~n-
c~ n.ii vid::1 b1~silc-ira. NC$$c dia. o ,•dho líder, isolado poli,iwncmc tlO l)i~cio
do Catctc. $C'nl :.ipoio sufi ciente cncrc :u eliteS ci\•i,i e milit:i.rcs. ::1mcaçado ck
dc:po,iç.i o por um novo "u h im,oo milirnr-, c:ri1ic..~111.l o ~ d ird1a e l C,S(1ucn.l.1, tlc::u
um liro no cor:t~ S1iu •cb vicb p:an cnrnr n:a l linôri:a", como c-Je mesmo

A5. m.1s~;11; 1r.ab:ilh;1dorni que n:io n tlcfcnd,er.un cm ,·id:,, :ué p c1, rqi1c c:l~iv:,a-
mcnte nuna. ha\iam sido ch:amic:bs p-.m ral pdo próprio Varg-u, se rcbd :ll'llll
depois da sm morre, Ítum'1.ndo um p.olpc: cm 1954. A somb12. do .,~uismo
pe011:111eQ:u ,•i\·;1, in~ir,mJ,c,1 11rc)jc1()$ tl;:i es(Jllt:r(b "11;;tdom1l popl1br'\ c(l,!11()
0

e, iud.;in:ili,,m.1 er;:041()m i<:o, :1 l111;a por J ireirc,, 1r;1\):1l11isrn.s e :, Jistribuíçi(• dr.


renda. Seus herdeiros poJirkos dimos e indiretos, como JOOo Gouhtt e Lco
11cl Rá,i,l.t. lcu,u,.r.un C'.ill'il.) I.MnJc.ir.,~. e: <.on1m clt:),, 111ili1.;1ra e: ôvi..) (f.1ri,1111
um nv,·o ~,lpc. r:111 1964, 1lc~u m ,1i.) cÍM.111_ F-5.-1.1\'.tlll t.li,1111,1~1"-\" :,I"'&*'' t.b
vc,,
memória. nadon.i..l a.\ hC'raoças d.o "popul..i.smo", ma.s os JXÓp1io5 governos mfü~
1,11c,di1;,uori.,1ii. nfto !Cli :1m t:omp.Jc1:unc:n1c i.!ll1c:H~.1c~ p rojcto-.),10 t',1(.io n .1li-, mu
o..011(H1lit.:O de in)JlÍf-a,;.:li11 v,u-gui~1:1. FJd10 ('2ta proidC:nd,, ,fa Rcpllblk.1 C'.lll
1994, o senado• l'.!ç11u,ndo l lcorlquc C:atdoso anm'ICb1b que. fin1l menrc. tinha
:K""JIMdo a ""Fra V.2rg,1s-. poi,; )CU go,,·cm<> promt'fr.t diminuir o poo do F'.st.1d o
na eoonomi:t e c:stimular o c:1pic;ilis-mo de: inici;nh•:1 privatb. Mas :i d dç;i o d e:
Luiz Inicio Lufa d:a Sih·1, o.Aid er sindica) critico do 1uclamcnto dot s.indic:l~
tos: ao Ur.ado, our11 invcnç5o d2 "Êra V:uys:"', rcaviV2ria 2 prescnç::. csr:u:al n:1
cconomfa e os discw:sos de jusciç:t socW .,.oleados 1lOS •u:ilnlh2dorcs do Brasil".

A presença d~ comuniscas na vida pública foi o pomo denacado


pelas m:mch<.'tcs dos jornais antigcrulisra.s. A uoi,.. cnquamo faz ia cam-
panha dcilor.al, não 1cvc maiores pudores cm bu.sc:1,r apoio nos gencr;i.is
mais inAuentcs do Exérciro e na embaixada norte-americ.ina para derrubar
Varg1S. Ali:Ss, 1 uoi,., nuna st livraria dessa comradiç:1o que e-st:i nri su:1
origem: dcfcnc:lt: r a democr.icia e clamar por golpes de E:.,1ado quando o~
rcstiltados eleitorais não lhe eram fuvor.h'ci5.
O.\C'Rl:)I 00 t~tAOO 1'l:,)\'Ol',l.\'S,Cl l''\U IH P('IIIKA m wont. I l('A 169

O ESTADO NOVO 1'ASCEU DEUM GOU'EDEESTADO


E ACABOU POR UM GOLPE DE ESTADO

As crcsccnrcs m:mifcsr:açõcs c1ucrcmi\il!L\i e a ame<:ip!.ç:\Q cfas eleições:


cnadu:ais, inicialmcn1e p revist:u para março de 1946, fo ram 1-etrat':ldai; como
m:mobra'> <:tmtinui.n:u ele Gcuílio. C<:nno os intcn·entorés teriam c.1uc sair
cios SC,.'lJS c:1rgo\i JXlra con u,rrcr às dciçõcs, seriam substiruidos por aclmi·
nisu·adores completame,ue t.6s ao gove'l'HO cencrál» com á possibilidade de
ullan.:rn a mác1uina :ulmini)tm1·i\,.,1 par-d manipular o plcim. Ao mcmJ) cra
essa a desconfiança da UDN. que passou a denunciar a manobra. As Forças
Armadas se .1gir:ar.1m, cogir.ir-.am um golpe,~ o mini~rro d:a Guerr.1, Góc:i.
Momdro. n~lho corrdigion:írio de Getúlio. conscgufo comer os golpist.15..
Gcrlllio ainda n:ío se dt.·ddir~ ofkialmente cm rclnç.1<.l , o pleito
presidenc:i:tl, nem se bnç:mdo candid ato , nem apo iando nenh uma d:lf
canclid atura\i já pc,.sta\i. NC$c amhicnrc $3mrado c.lc articulações palacia ..
nas, Jna11ifesr,1ções de rua e mobilizações políticas imensas. a imprensa
antigl·ruli~1a l~p:1lhou :1 noríc ia, ~(.m ba~c real. c.lig:1~:sc. que G<.·nílio
suspenderia as dc.ições e convocaria uma Consrimime~ atendendo às
reivindicações <lo qucrcmismo.
A nom~Jç.ío do polêmico Benjamim V:ugas, irmão de Getúlio,
co mo chdi: ela l'olícia do l)istTito Fakral, $Uhstiniinclo João Albcrro. foi
a goc:l..d'igua oo baJde das d esconfianças d.a oposiçio. Joio Albeno n1o
cinlm a mínim.i ~hnparia pela) m.iniÍl.""SCaçÕ<..~ tiuc.:rcmi:sla), d,q;anc.lo a
proibir wn g.ra..nde comício marcado para o dia 27 de oumbro e. com isso.
desagrada ndo o prcsidt.'l1tC, Hcjo, e.orno era oonhcc:ido o irmão de Getúlio,
el'J um 1rucu len10 notório e dirigia um:a verdadeira milíd:a reau12da entre
os agregados dos V:J'l,'<IS no.s confi ns do Rio Gran<lc do Sul, scmpn.: fiel.
politictme1ue, ao ir1nio.
Não há m.iiorc-s i11dkio) c.locumcnt'aisc.1u1.: au1ol'i1.cm a hi,)toriog,a ..
fia a endossar a tese de um golpe cominuista em marcha. Mas. na época.
a oposição não quis esperar par.1 v<.·r. A nomeação de &nj.imim Yargas
fc~ a oposição fic:ar :ainda mais unid2 e aumcn1ou 2 desconfiança dos
quartéis. Em 29 de ootubro. o Alto Comando do Exérdro. articulado
por Cóes Momeiro e Cordeiro de F1rfo.s. com apoio resignado de Eurico
Du1r.1, dtu u m uhimaro :to p rcsidcrHc 1 exigindo a d ernissâo cio ~cu irrnáo
na chefia da Polícia.
Surpreendenrememe. Vargas acatou o ultimato milimr e aceitou
ser deposco pelos mmcares, ab:tndonando o Palácio d..1 Gu:tn..1bar.l., re-
sidênci21 do p resid eme. A 1101a oncial de Vargas fa lava cm "1raiçáo.. dos
generais conspiradores, mas accita\la sua dcposiçâo como fato consu-
mado. José Linharcs:, présid cntc do Supremo ' Jiibu nal Fédcrnl, assumiu
imcrin:imcntc a p rc$idênd:i :ué :a pos$C dos d eito$ na futura clciç::io,
com apoio dos rnil ir-.1:rc.s. A nm:a de Ccn'1lio prenunciava :t í:amos:t carta-
lt)tamtnto c.k 1954 (c.11.1ando ~ ~uic::idariá diat1tc de mais u1n uhimato
milit..u para sua deposição):

Ddx:u o govt"rno para c.1uc:: pvr ntinh.a Cll,US-a não )t'. Jcrr-.unc ~nguc::
brasildro. Na.o t,>ua.rcla.rd ódios, nem pm·erH,'Ó<.'s pessoois. Sinto que:
o povo, ao qual nut)C;I falcd no amor que lhe df'\•oco e M <lefe.Q dos
seus direitos, esd comigl). kle me furá ju.s.riç-..

ror que Gcc'11io n~o resistiu à sua deposição força<tl cm 1945? Su-
postanie.n.te, um Hder de massas carism.itico, com apoio de e.scmruras par-
tid:í.rias (1rrn e l'CR), :i.ind:i q ue indpicnccs, e de um movimento de mussas
como o qucrcmi!imo t<..-ri:1 t0das as condições de mobiliw.r as n,~s rontr.t <.lS
c.1uanéb e paládu~. Ma.> a tkx:isio c.lc G<..1t'iliu V;a~~ t'.nl a<..'.lr-.tr o ultimaro
militar sem c(m\•e,_x::ar nenhuma rcs~tência tah't..7. revele a cs:;t"llcia <lv DNA
policico do gemlismo e de se.us herde.iros políticos, como João Gou.lan,
o presideme deposto pelo Golpe de 1964. A linhagem polüica getulista,
:iioda que defendes.se reíorn11.~ e incorpor:i.ç:fo d.is massas u-abalh:idor:u. nn
vida política, nJo abria mão de realizar este prOCC.$SO ,uravés do comrolc
elas cstnnu rJs burocrátic:l$ e juríclic:tS do Estado. e não por meio ele um
(arriscado) movimento de mtlS.\,.,s. F..ra pelos fios do Es,ado, além de suu
capacidade de manter a ordem social e agrc..-gar forças políticas tradicionais,
c.1uc a rnodcrni,açáo deveria M:r Ídtá. Fora e.li~. é de se ~upor qm: Gc,l,lio
consicler.tSsc qt1ak1ucr ação política como aventureira, imprevisível e in·
controlável Apelar para a sempre imp1-evisível politização das ruas catvei
fosse deinlS:iado p:i.rl um esmdista co,uervador, sinemitioo e calculista.
Est:i pode ser uma ch:ave par:i comp reender a esfin~ polític:11 de Getúlio
Varg:as e do gerulismo, cuja sombra pair.iria por coda a República a partir
de 1946. agh1tin:mdo devoções e ódios apaixonados na mc-.sma medida.
D.\CR.t-1 00 l'>T,U,)J 'l;J\.ON:.\S('l l"\IA RI P('IIIIC.,\ m \UX-t.Á I K"A l 7j_

Mesmo afusrado do poder, retirado para sua fazenda na longínqua


$:io Horj;a (1t1>), Varg:1s não fY.ICOll de fner política, Embora hesit.a~sc cm
apoiar Oucra. um dos c:andjdacos que haviam ajudado. ainda que passiv;i-
mence, na sua de~ição, o pragm:nismo e o calculismo de Vargas falaram
m:ais alto, 1mpcdido de se ~ inclid:a,ar p:ara a~ dciçõts presick'11ciais, Gcnílio
manifestou oficialmente o apoio do PTB a Eurico Outra. candidato sem
carisma que n:io ,inh.i a prefurênd:t d0$ opcr:írios.
Uma gafe polhica de E.duardo Gom~ comribuiu mui10 para sua
,krrom na~ dci~'Qci1. Em um comício, o candidatt, da IJUN dis.)c tiuc nâo
predsava dos votos de ''marmiteiros··, ou seja, dos cr::tbalhadores pobres.
para se ckgt..- prc~i,lcntc. Ma') na<1uclc contexto dcitor.11, :ipc..~r tlt: apc:11:1')
l O'¾i da população ter direito a voto. de não poderia ter se dado ao luxo de
prescindir do apoio operário. Até porque, se houve uma conquist:1 i1:npor-
r-.rnre dcpoi:i. ,lc 1930, foi a t.n:M:cn1c rnur-..i.li,.áçáo das ddçüc~. ~aran1 itla
pefa independência da justiça elejcoral e pela maior pluralidade de atores
p<.llíricos, indoindo~sc aí a cl~ssc opcrirfa. É p<.1ssívcl <1uc a mcrn~li<ladc
polítiQ do heroico brigadeiro de 1922, bem como de boa pane dos ljber.iis
que fahn-:im cm dcmocr.1c:ia conna Gc..-rúlio V:ngas. tenha parndo na l'ri·
meir.t Repúblici, qu:111do 1s olig1tquias e os co1'011éis fraud1vJ.Jn as eleições
e tlc:.írakla\';am M.:U diti,)mo político. M~ os u.::rnp<J,) c:ram uutn~.
A partir dezembro de 1945, o voco dos ~m.amliteirosfl iria efetiva·
me1\l~ decidir quem seria o p1'eSideme do Br~il, in:1ugur:u\do um novo
capítulo na hi..,-rória tia lkpública bra.o,ilcira. Ao mc:n~ até c:1uc: um (M.ttro
golpe de E.nado, o de 1964, interrompesse aquela frágil e contrJ.dicóril
experiência Jcrnocr,hica qut se inaugur-.,w-a sob as ci,w.a) do Esrado No\lO,
Sugestões de leitura
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Su,.,..,,,._,, L. OnptUtu/,, 1111 N(,tlJ.Sio ~ul0; Comran,hbõ. Lctta. 1~.
~'H'&'Aff.7,\(.\K, ~1,,.,11: lkl\1''ff. Hdc:t1•M.1rl.,e C:on.\. V,mJ,1 \l.arl.i IUIJt.so(u1w,.), ,;,,.,,.,,-(:,,p,wm,11,
l •.:1.I. ltu J-: J,u~lruc t.J11ur,1 JGYIP.u ç l\.,r:a, 1000.
' l'IUNIMOt .. H(ltsl,o. IM~fllÍutnll. o (.-.ii,mu br-eikúv IU. Jêud.l J... .-\O.~ P.a\llu: l)Llcl IC)i'9.
V, • , ,,o, M6nic11 r O, inttl«I\Uii< 111 pot,1:ia culru11I do En1do ~o. ln: f!t (!<1 • •", JorJ;c• [)1 ,e_.,. 11.•, 1.
de A N. O fln11il rrfl"l,!i.,-,1,w. o tempo do n.Kio1Vl-<11~1ttmo. Rio dr )1nciro; CivifüA(io Bni,ilC."irt,
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Vtl'o l"lli\, Kobcr11>, l!Jt1" IN/k.111. hu1ú.rb ailuu;al C' poll:mku lüttirW no Uu.wl ~lo l',111,Jo: Comp:rnh.ia
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