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Natal/RN
2016
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Natal/RN
2016
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SUMÁRIO
2 JUSTIFICATIVA ........................................................................................ 7
3 OBJETIVOS ................................................................................................. 9
4 METODOLOGIA ......................................................................................... 9
REFERÊNCIAS .............................................................................................. 17
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1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS
A relação das pessoas e de instituições sociais com a escrita vem sendo pauta de
diversos trabalhos acadêmicos preocupados com a linguagem e a sociedade. Evidencia-se, por
exemplo, nos Estudos de Letramento, em reflexões voltadas para as questões de letramentos
múltiplos, projetos de letramento, políticas públicas de letramento, esferas de letramento
(escolar, familiar, religiosa, digital, laboral etc), gêneros textuais, entre outras.
Trabalhos sobre o gênero textual memórias inserem-se em investigações sobre novas
perspectivas teóricas que vêm sendo adotadas nesse campo de estudo, principalmente a partir
da compreensão de que “as práticas letradas são produtos da cultura, da história e dos
discursos” (STREET, 2014, p. 9), afirmação que corrobora a epígrafe que abre nosso projeto
de tese. Nesse sentido, entendemos que a rememoração pode revelar e evocar importantes
traços sociais relativos aos mundos de letramento (BARTON, HAMILTON & IVANIC,
1993) de agentes sociais.
Nas escolas brasileiras da rede pública, a partir de 2004, a Olimpíada Brasileira de
Língua Portuguesa (doravante OBLP), iniciativa parceira do Ministério da Educação de
melhoria no ensino de leitura e escrita, começou a trabalhar, em sala de aula, o gênero
memórias literárias com alunos de 7º e 8º anos do ensino fundamental. Tal atividade foi
sugerida com o propósito de resgatar, por meio das memórias de pessoas mais velhas, as
histórias das comunidades onde os alunos vivem. Com essa iniciativa, a OBLP oportunizou
não somente a apropriação desse gênero textual no espaço escolar mas também a articulação
das esferas escola-família-comunidade via linguagem, muito pouco pensada no domínio
acadêmico e político.
No que diz respeito ao Brasil, há uma grande lacuna referentemente à discussão da
temática letramento familiar, decorrente, provavelmente, da ausência de políticas públicas
que se preocupem com a interação, a abertura e o diálogo entre pais e professores,
propiciando o elo entre a escola, a família e, por extensão, a comunidade onde essas famílias
vivem. O que se observa é que não se dá voz a elas para refletir, juntamente com os
professores, as ações pedagógicas, nem também se oferece oportunidades para que estas
participem das ações curriculares e colaborem no letramento dos filhos – com exceção a
convites para datas comemorativas, reuniões de classe e entregas de boletins.
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The general view has been that whatever it is that mainstream school-oriented homes have, these other homes
do not have it; thus these children are not from the literate tradition and are not likely to succeed in school.
(Tradução nossa)
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Em função disso, nosso objetivo geral é discutir o viés cultural de práticas letradas de
colaboradores (professor, alunos, familiares e agentes externos) em um programa de
letramento familiar envolvendo escola-família-comunidade, por meio do gênero textual
memórias coletivas. Com vistas a esse propósito, estabelecemos as seguintes questões de
pesquisa: Quais as histórias de vida e os aspectos culturais que podemos resgatar por meio das
memórias de letramento familiares? Que dispositivos podem ser usados para dar voz a esses
agentes familiares? De que maneira essas formas culturas contribuem para a construção de
saberes na prática docente? Que atividades, recursos, rotinas e artefatos podem organizar esse
trabalho, impactando e fortalecendo o vínculo escola-família-comunidade?
Metodologicamente, orientamo-nos pelo paradigma de pesquisa qualitativo
(ERICKSON, 1990; BORTONI-RICARDO, 2008) de natureza crítica e fortalecedora
(CAMERON, 1992; OLIVEIRA, 2004, PEREIRA, 2006). Acreditamos, conforme o nosso
traçado de pesquisa, que observar, ouvir, entender a diversidade dos colaboradores e conhecer
o seu contexto são dados que "revelam questões maiores que envolvem identidade, poder,
relações sociais, significados e, seguramente, modelos de letramento”, conforme afirma Street
(2011, p. 47).
Assumimos como referencial teórico os estudos de letramento (STREET, 1984,
2011, 2014; BARTON, HAMILTON & IVANIC, 1993; HAMILTON, 2000; KLEIMAN,
1995, 2005, 2006, 2016; ROJO, 2009; PAZ, 2010; OLIVEIRA, 2010a, 2010b; OLIVEIRA;
TINOCO; SANTOS, 2011; MARINHO & CARVALHO, 2011), com foco em questões de
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letramento familiar (HEATH, 1982, 1983; PITT, 2000; CAIRNEY, 2005; SANTOS, 2015;
OLIVEIRA, 2016). Justificamos este encaminhamento por considerar que “o termo
letramento ganha fôlego realçando o caráter político, ideológico, social (...) das práticas de
leitura e de escrita” (MARINHO & CARVALHO, 2011, p. 19). Serão trabalhados, também,
conceitos de cultura (GEERTZ, 1973; LARAIA, 2006), cultura do silêncio (FREIRE, 1976),
silenciamentos e voz (KEY, 1998), comunidade (AFONSO, 2001; WATKINS, 2005;
OLIVEIRA, 2010a), gêneros textuais (BAZERMAN, 2011) e memórias coletivas (CHAUÍ,
2000; MARINHO, 2004; HALBWACHS, 2006), com vistas a ressignificar as práticas de
letramento mobilizadas em prol do desenvolvimento da relação escola-família-comunidade.
Entendemos que esses construtos mostram-se relevantes para amparar discussões acerca de
fortalecimento, empoderamento e transformação nas esferas familiar, comunitária e escolar.
2 JUSTIFICATIVA
3 OBJETIVOS
4 METODOLOGIA
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A parceria se deu devido à participação de ambas, como bolsistas, em projeto já referido, coordenado pelo Prof.
Dr. Moisés Alberto Calle Aguirre. Para mais informações, ver Santos (2015).
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Datas a serem planejadas junto à equipe escolar e às famílias. As atividades também estão sujeitas a mudanças
de acordo com as necessidades dos colaboradores.
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5 QUADRO TEÓRICO
É preciso observar que “[...] muitos dos letramentos que são influentes e valorizados
na vida cotidiana das pessoas e que têm dupla circulação são também ignorados e
desvalorizados pelas instituições educacionais” (ROJO, 2009, p. 106). Desse modo,
pesquisadores, como Street (1984), defendem a importância de tornar visíveis essas práticas
marginalizadas e mostrar que o local e o global não são excludentes, enfocando, por exemplo,
a distância entre a escola e os letramentos que acontecem fora dela.
Isso é possibilitado pela orientação crítica que pode ser dada ao letramento,
conforme comenta Oliveira (2010a), trabalho que, posto em prática na escola, parte das
necessidades de linguagem da comunidade situada para (re)definir os currículos escolares em
prol de propósitos comuns, visando envolver a voz comunitária em aprendizagens situadas.
Nesse âmbito, inserem-se os projetos de letramento, formas de aprender preocupadas com
“princípios democráticos de ação social em que professores e alunos são parceiros”
(OLIVEIRA; TINOCO; SANTOS, 2011, p. 61).
Os projetos de letramento partem de uma pedagogia culturalmente sensível
(ERICKSON, 1987), envolvendo ações de leitura e escrita desencadeadas pela prática social.
Apagar a polarização entre escola e vida, nesse contexto, pode se dar a partir de alguns
pressupostos trazidos por Oliveira, Tinoco e Santos (2011, p. 52-56): (i) aprendizagem
situada, (ii) ensino orientado para a resolução de problemas, (iii) rede de atividades, (iv)
desterritorialização dos lugares de aprendizagem, (v) tempo escolar reinventado, (vi)
distribuição de tarefas, (vii) inserção num sistema de redes de comunicação e (viii) o
professor como agente de letramento4.
Em ações dessa natureza, pautadas na ampliação de mundos de letramento, centram-
se os programas de letramento familiar, construto que se constrói a partir da relação entre a
valorização sensível das forças já trazidas pelos colaboradores e a promoção de novos
elementos de transformação e mudança para sua realidade (CAIRNEY, 2005), sendo isso
realizado a partir da promoção de diálogos, formações, cursos, atividades de leitura e escrita e
outros recursos que possam promover o empoderamento.
É com esse olhar que trazemos o letramento familiar, conceito que evoca a
mobilização de práticas de leitura e escrita feita por membros da mesma família,
fundamentando a ideia de que há valor nos conhecimentos trazidos pelo aluno à escola por
suas gerações familiares. Assim, entendemos que o lar pode ser ou tornar-se um espaço de
incentivo aos múltiplos letramentos da sociedade, a partir de ações como, por exemplo, a
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“um mobilizador de recursos, atento às necessidades, potencialidades e saberes dos membros da comunidade de
aprendizagem (a escola) e voltado para a construção da autonomia do aluno.” (OLIVEIRA, 2010b, p. 12).
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Destacamos que mesmo em famílias de meios analfabetos, há ricas práticas de base cultural envolvendo
eventos de letramento, visto que esses agentes estão inseridos em uma sociedade grafocêntrica. O problema é
que, muitas vezes, a escola não privilegia certas habilidades e certos “modos de aprender”, ignorando o grupo
social a que pertence o aluno e adotando um modelo autônomo (STREET, 1984) de letramento.
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esse conceito, a noção de silenciamentos (KEY, 1998), aludida, ainda, a cultura do silêncio,
segundo Freire (1976), refere-se à falta desse poder, ou seja, um isolamento de si e dos outros,
provocado pela falta de ferramentas para expressar suas experiências. Esse comportamento é,
muitas vezes, gerado por percepções arrogantes (KEY, 1998) das próprias instituições, como
a esfera laboral e até a escolar, as quais, baseadas nos capitais de letramento6 de um indivíduo,
acabam excluindo-o ou distanciando-o de relações sociais, promovendo a descrença da pessoa
em si mesma, que, assim, silencia-a.
Nesse processo, não é somente sua voz que é calada, mas sim a sua história, a sua
cultura e a sua identidade, visto que, de acordo com Egan-Robertson (1998, p. 460), “negar ou
desvalorizar os recursos linguísticos de uma comunidade pode ser entendido como uma
maneira de negar um atributo de personalidade”7.
O enfrentamento a essas marginalizações se dá, em nosso trabalho, pelas memórias
coletivas, recursos que encontramos para que vozes plurais sejam ouvidas em nossas ações de
letramento. Essas podem ser compreendidas, de forma geral, como a capacidade de armazenar
informações e registrá-las, constituindo-se de significados, lembranças, atualizações e
narrações que são “a garantia de nossa própria identidade” (CHAUÍ, 2000, p. 158).
Sobre os trabalhos acadêmicos envolvendo memórias, Marinho (2004, p. 32)
comenta: "é desafiadora a tarefa de tentar descrever os efeitos do ato de escrever sobre os
sujeitos que escrevem suas memórias. Eles não apenas lembram, reconstituem, mas se
constituem através dessa escrita". Essa citação reforça a ideia de que evocar as memórias em
um contexto desfavorecido em questões de poder mostra-se como uma ação de promoção
identitária transformadora.
Pensando dessa forma, as memórias podem ser utilizadas para compreender,
(re)conhecer e vislumbrar modos de vida. Assim, entendemos com Chauí (2000, p. 130) que
“a memória é o que confere sentido ao passado como diferente do presente (mas fazendo ou
podendo fazer parte dele) e do futuro (mas podendo permitir esperá-lo e compreendê-lo)”.
Essa discussão, atrelada ao contexto educativo, revela a importância de memórias
(passado) e de experiências compartilhadas (presente), na convivência familiar, como
mecanismos de conexão entre os membros desse círculo. Mais do que isso, acreditamos que
tais ações podem ter impactos positivos no letramento (futuro) de uma criança engajada
socialmente em ações de linguagem.
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O conceito é uma analogia à ideia de capital cultural (BOURDIEU, 1998), sendo entendido como a
acumulação de conhecimentos relacionados ao uso das práticas sociais dominantes de leitura e escrita, “fruto de
seu acesso ao mundo mediado pelo outro social” (OLIVEIRA; TINOCO; SANTOS, 2011, p. 45).
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Negating or devaluing the linguistic resources of a community can be understood as a way of negating an
attribute of personhood. (Tradução nossa)
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6 CRONOGRAMA
REFERÊNCIAS