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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE


CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM ESTUDOS DA LINGUAGEM
ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: LINGUÍSTICA APLICADA
LINHA DE PESQUISA: LETRAMENTOS E CONTEMPORANEIDADE

ALANA DRIZIÊ GONZATTI DOS SANTOS

ESCOLA, FAMÍLIA E COMUNIDADE:


voz, cultura e memórias em um programa de letramento familiar

Natal/RN

2016
1

ALANA DRIZIÊ GONZATTI DOS SANTOS

ESCOLA, FAMÍLIA E COMUNIDADE:


voz, cultura e memórias em um programa de letramento familiar

Projeto de tese apresentado ao programa de Pós


Graduação em Estudos da Linguagem, da
Universidade Federal do Rio Grande do Norte, como
parte do processo seletivo de Doutorado no
programa.

Linha de pesquisa: Letramentos e


contemporaneidade

Orientadora: Profa. Dra. Ana Maria de Oliveira Paz

Natal/RN

2016
2

SUMÁRIO

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS .................................................................... 3

2 JUSTIFICATIVA ........................................................................................ 7

3 OBJETIVOS ................................................................................................. 9

4 METODOLOGIA ......................................................................................... 9

5 QUADRO TEÓRICO ................................................................................... 12

6 CRONOGRAMA DE ATIVIDADES .......................................................... 17

REFERÊNCIAS .............................................................................................. 17
3

“Letramento e linguagem estão intrinsecamente ligados


a sistemas econômicos e políticos, assim como a um
senso de família e de comunidade” (KEY, 1998, p. 2).

1 CONSIDERAÇÕES INICIAIS

A relação das pessoas e de instituições sociais com a escrita vem sendo pauta de
diversos trabalhos acadêmicos preocupados com a linguagem e a sociedade. Evidencia-se, por
exemplo, nos Estudos de Letramento, em reflexões voltadas para as questões de letramentos
múltiplos, projetos de letramento, políticas públicas de letramento, esferas de letramento
(escolar, familiar, religiosa, digital, laboral etc), gêneros textuais, entre outras.
Trabalhos sobre o gênero textual memórias inserem-se em investigações sobre novas
perspectivas teóricas que vêm sendo adotadas nesse campo de estudo, principalmente a partir
da compreensão de que “as práticas letradas são produtos da cultura, da história e dos
discursos” (STREET, 2014, p. 9), afirmação que corrobora a epígrafe que abre nosso projeto
de tese. Nesse sentido, entendemos que a rememoração pode revelar e evocar importantes
traços sociais relativos aos mundos de letramento (BARTON, HAMILTON & IVANIC,
1993) de agentes sociais.
Nas escolas brasileiras da rede pública, a partir de 2004, a Olimpíada Brasileira de
Língua Portuguesa (doravante OBLP), iniciativa parceira do Ministério da Educação de
melhoria no ensino de leitura e escrita, começou a trabalhar, em sala de aula, o gênero
memórias literárias com alunos de 7º e 8º anos do ensino fundamental. Tal atividade foi
sugerida com o propósito de resgatar, por meio das memórias de pessoas mais velhas, as
histórias das comunidades onde os alunos vivem. Com essa iniciativa, a OBLP oportunizou
não somente a apropriação desse gênero textual no espaço escolar mas também a articulação
das esferas escola-família-comunidade via linguagem, muito pouco pensada no domínio
acadêmico e político.
No que diz respeito ao Brasil, há uma grande lacuna referentemente à discussão da
temática letramento familiar, decorrente, provavelmente, da ausência de políticas públicas
que se preocupem com a interação, a abertura e o diálogo entre pais e professores,
propiciando o elo entre a escola, a família e, por extensão, a comunidade onde essas famílias
vivem. O que se observa é que não se dá voz a elas para refletir, juntamente com os
professores, as ações pedagógicas, nem também se oferece oportunidades para que estas
participem das ações curriculares e colaborem no letramento dos filhos – com exceção a
convites para datas comemorativas, reuniões de classe e entregas de boletins.
4

Pensamos que esse contexto mostra-se problemático devido a dois aspectos: as


experiências de letramento vivenciadas nas escolas e os estudos acadêmicos relacionados ao
letramento familiar. Sobre o primeiro aspecto, destacamos comentários tecidos por
professores da rede pública durante conversas informais e notas de campo sobre a importância
da família no desenvolvimento do letramento escolar e no comportamento dos alunos em sala
de aula. A questão é que alunos que demonstram um melhor desempenho na escola,
geralmente, recebem um grande acompanhamento familiar.
A esse respeito, uma professora engajada em um projeto de letramento colocou:
“Algumas famílias não participam da vida escolar dos seus filhos e, com isso, se percebem
dificuldades na caminhada, contribuindo para o fracasso escolar” (Dados do Programa
“Engajando famílias na escola”, SANTOS, 2015).
No que concerne ao segundo aspecto – os estudos acadêmicos relacionados ao
letramento familiar –, discute-se, há pelo menos três décadas, a importância da herança que a
família traz para a história de letramento escolar do aluno. É o que observa Bourdieu (1998, p.
74), ao afirmar que "o rendimento escolar da ação escolar depende do capital cultural
previamente investido pela família". Também a esse respeito, Heath (1982, p. 50) assevera “a
visão geral é que tudo que os lares engajados com o saber escolar têm, outros lares não têm;
assim, essas crianças que não fazem parte de tradições letradas não são suscetíveis a ter
sucesso na escola 1 ”. Isso demonstra ser o ambiente familiar um contexto fortalecedor de
práticas de leitura e escrita e de valores presentes no âmbito educacional dos aprendizes.
Em razão desses argumentos, fundamentamos nosso trabalho na concepção de que a
colaboração da família e a sua história devem ser elementos presentes no ambiente escolar, de
modo a criar aprendizados significativos pelo aluno e elos com o trabalho do professor. Uma
forma de estabelecer essa relação é a partir da escrita, entendendo-a como uma prática social
dos sujeitos em espaços sociais para agir atingindo diferentes objetivos (PAZ, 2010).
A motivação para esse enfoque de estudo vem de nosso percurso acadêmico em
programas de letramento, iniciados em 2011, a partir da participação no programa de extensão
“Letramentos e políticas públicas: a família na escola”, coordenado pela Profa. Dra. Maria do
Socorro Oliveira, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), e de projetos
como “O habitus de estudar: construtor de uma nova realidade na região metropolitana de
Natal”, coordenado pelo Prof. Dr. Moisés Alberto Calle Aguirre, da mesma instituição,
inserido no programa "Observatório da Educação", financiado pela CAPES.

1
The general view has been that whatever it is that mainstream school-oriented homes have, these other homes
do not have it; thus these children are not from the literate tradition and are not likely to succeed in school.
(Tradução nossa)
5

Durante as ações desses projetos, pesquisadores da área tiveram a oportunidade de


atender escolas públicas, trabalhando em sala de aula junto a professores colaboradores,
desenvolvendo programas de letramento familiar. A partir do ano de 2012, iniciamos as ações
desse projeto na Escola Municipal Professor Ulisses de Góis (doravante EMPUG) com a
professora Rita de Cáscia Gomes, focalizando as problemáticas e demandas próprias da
comunidade escolar no letramento familiar.
Nesse contexto, após proposição e concretização de nossas ações com jornais
eletrônicos, discutimos, em dissertação do Mestrado, estratégias, possibilidades e desafios de
um programa de letramento familiar nomeado “Engajando famílias na escola” (SANTOS,
2015), trabalho que demonstrou, entre outros aspectos, a relação entre o desenvolvimento de
programas de letramento familiar e as possibilidades de mudança que eles evocam na escola e
na comunidade, evidenciando, assim, a relevância social de ações dessa natureza. Esse
movimento permitiu-nos a compreensão de que, quando a família sente que seus
conhecimentos são legitimados no espaço escolar, ela colabora, dialoga, reflete e participa de
vivências empoderadoras para todos os envolvidos.
Dando continuidade a essa temática e com a preocupação em dar voz a essas famílias
que se fazem presentes no espaço escolar em programas de letramento, propomos como tema
de pesquisa em nível de Doutorado o letramento familiar, tendo como viés de estudo uma das
práticas de letramento situadas nesse contexto, as memórias coletivas, entendidas como
“evocações do passado” (CHAUÍ, 2000, p. 158), rememorações, narrações ou relatos de fatos
e lembranças que constituam parte da história de vida familiar em suas comunidades.
Com vistas a ressignificar as práticas escolares, iremos nos inserir no contexto de uma
escola pública da capital potiguar e desenvolveremos, durante um ano letivo, com apoio da
equipe escolar, um programa de letramento familiar com enfoque nas memórias orais e
escritas, atividade apoiada pelo recurso online Blog, no qual compartilharemos aspectos
culturais e a voz da comunidade familiar. Dessa ação resultará a confecção de um e-book de
memórias do bairro, de autoria coletiva, na forma de colaboração entre professores, alunos e
seus familiares, entendidos como seres de cultura. Destacamos que, para a realização dessas
ações, foi estabelecido o contato com a direção escolar e a professora responsável pela turma,
sendo esta intervenção acatada. A proposta de ação foi também discutida e redesenhada a
partir das contribuições da escola (ver Quadro 2 - Ações do programa, no tópico 3, e Imagem
1 – Autorização para realização de pesquisa, a seguir), observando-se questões éticas,
próprias da pesquisa de fortalecimento – abordagem metodológica que norteia nosso trabalho.
6

Imagem 1 – Autorização para realização da pesquisa na escola parceira

Fonte: Acervo da pesquisa

Em função disso, nosso objetivo geral é discutir o viés cultural de práticas letradas de
colaboradores (professor, alunos, familiares e agentes externos) em um programa de
letramento familiar envolvendo escola-família-comunidade, por meio do gênero textual
memórias coletivas. Com vistas a esse propósito, estabelecemos as seguintes questões de
pesquisa: Quais as histórias de vida e os aspectos culturais que podemos resgatar por meio das
memórias de letramento familiares? Que dispositivos podem ser usados para dar voz a esses
agentes familiares? De que maneira essas formas culturas contribuem para a construção de
saberes na prática docente? Que atividades, recursos, rotinas e artefatos podem organizar esse
trabalho, impactando e fortalecendo o vínculo escola-família-comunidade?
Metodologicamente, orientamo-nos pelo paradigma de pesquisa qualitativo
(ERICKSON, 1990; BORTONI-RICARDO, 2008) de natureza crítica e fortalecedora
(CAMERON, 1992; OLIVEIRA, 2004, PEREIRA, 2006). Acreditamos, conforme o nosso
traçado de pesquisa, que observar, ouvir, entender a diversidade dos colaboradores e conhecer
o seu contexto são dados que "revelam questões maiores que envolvem identidade, poder,
relações sociais, significados e, seguramente, modelos de letramento”, conforme afirma Street
(2011, p. 47).
Assumimos como referencial teórico os estudos de letramento (STREET, 1984,
2011, 2014; BARTON, HAMILTON & IVANIC, 1993; HAMILTON, 2000; KLEIMAN,
1995, 2005, 2006, 2016; ROJO, 2009; PAZ, 2010; OLIVEIRA, 2010a, 2010b; OLIVEIRA;
TINOCO; SANTOS, 2011; MARINHO & CARVALHO, 2011), com foco em questões de
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letramento familiar (HEATH, 1982, 1983; PITT, 2000; CAIRNEY, 2005; SANTOS, 2015;
OLIVEIRA, 2016). Justificamos este encaminhamento por considerar que “o termo
letramento ganha fôlego realçando o caráter político, ideológico, social (...) das práticas de
leitura e de escrita” (MARINHO & CARVALHO, 2011, p. 19). Serão trabalhados, também,
conceitos de cultura (GEERTZ, 1973; LARAIA, 2006), cultura do silêncio (FREIRE, 1976),
silenciamentos e voz (KEY, 1998), comunidade (AFONSO, 2001; WATKINS, 2005;
OLIVEIRA, 2010a), gêneros textuais (BAZERMAN, 2011) e memórias coletivas (CHAUÍ,
2000; MARINHO, 2004; HALBWACHS, 2006), com vistas a ressignificar as práticas de
letramento mobilizadas em prol do desenvolvimento da relação escola-família-comunidade.
Entendemos que esses construtos mostram-se relevantes para amparar discussões acerca de
fortalecimento, empoderamento e transformação nas esferas familiar, comunitária e escolar.

2 JUSTIFICATIVA

Nosso projeto evoca relevância teórica em três esferas de estudo: a da Linguística


Aplicada (LA), a dos estudos sobre letramento familiar e a das reflexões sobre memórias.
No que se refere à LA, área “mestiça e nômade” (MOITA LOPES, 2009, p. 19)
preocupada com a linguagem como social, podemos dizer que a construção de conhecimentos
sobre as memórias coletivas, como uma prática de letramento engajada, mostra-se como um
estudo relevante às demandas atuais do campo, pois evoca a atenção para uma problemática
de natureza situada, envolvendo os usos da linguagem que entrelaçam escola e família.
O estudo das práticas de letramento no domínio da família enquadra-se nas
preocupações acadêmicas mais recentes da área, especialmente ao considerarmos a
responsabilidade e o compromisso que a LA deve ter com a sociedade (LEFFA, 2001). Ao
assumirmos a construção de ações de fortalecimento e legitimização do letramento familiar
em contexto escolar, extrapolamos a noção de sala de aula como espaço único de ensino-
aprendizagem. Na perspectiva que adotamos, o ensinar e o aprender leitura e escrita partem
das práticas sociais, atravessando fronteiras e mobilizando, para tal, saberes da comunidade e
da vida social.
Conforme indica a literatura sobre o assunto, as discussões acerca do letramento
familiar estão longe de ser esgotadas, especialmente no Brasil, onde o valor de programas
desse âmbito está apenas começando a ser pauta de estudos acadêmicos (OLIVEIRA, 2016).
O construto, inicialmente discutido por Heath (1982) e amplamente utilizado em países como
Estados Unidos e Austrália, no nosso país, só tornou-se objeto de pesquisas a partir de 2008,
8

em dissertações e teses acadêmicas (TAVARES, 2008; GOULART, 2010; EUZEBIO, 2011;


BARBOSA, 2014; MENDES, 2015; SANTOS, 2015; BRITO, 2016) – trabalhos que, em sua
maioria, possuem como enfoque a descrição de práticas de letramento familiares.
No contexto brasileiro, inauguramos, junto ao grupo de pesquisa “Letramento e
Etnografia” (UFRN), liderado pelas Profas. Dras. Maria do Socorro Oliveira e Ana Maria de
Oliveira Paz, a implementação de “programas de letramento familiar”, já presentes em
vários países desenvolvidos, por exemplo, nos Estados Unidos (PITT, 2000), o que revela que
são necessárias mais ações no âmbito nacional para que possamos lutar por políticas públicas
em favor de famílias, principalmente, em situação de risco.
No que diz respeito às memórias familiares, encontramos poucos trabalhos,
destacando-se como referências seminais os trabalhos de Heath (1982, 1983). A autora, a
partir da análise de práticas de base cultural em três contextos diferentes, mostra que cada
comunidade tem sua própria história de letramento e que esta influencia significativamente no
desenvolvimento escolar das crianças. Compreendemos, dessa forma, que esse tipo de
trabalho se faz necessário para que o estudo das práticas letradas seja ampliado e as ações
com histórias de letramento comunitárias e familiares possam ser favorecedoras de um
trabalho mais produtivo na escola.
A relevância social desta pesquisa consiste no fato de ela se revestir de uma dimensão
ética, muitas vezes ignorada em pesquisas (TELLES, 2002). Nosso contexto pode evocar
práticas de leitura e escrita ao professor que o ajudem a mobilizar um espaço de cultura
múltiplo na prática pedagógica, revelando possibilidades e saberes para seu letramento no
trabalho (PAZ, 2008). O papel deste profissional é de extrema relevância visto que as
escolhas que os professores fazem em relação aos conteúdos e às ações que propõem são
criticamente importantes (EGAN-ROBERTSON, 1998, p. 484). Nesse sentido, acreditamos
que a implementação do programa e os eventos nele desenvolvidos podem construir
conhecimentos que beneficiem sua atuação docente.
Além disso, recuperar as histórias coletivas das comunidades a que pertencem os
alunos é uma forma de poder desenvolver práticas de letramento situadas que valorizem o
protagonismo do aluno, o exercício da cidadania e a responsabilidade social.
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3 OBJETIVOS

3.1 Objetivo geral


Discutir o viés cultural de práticas letradas de colaboradores em um programa de
letramento familiar envolvendo escola-família-comunidade, por meio do gênero textual
memórias coletivas.

3.2 Objetivos específicos


Quadro 1 – Apresentação dos objetivos específicos, em consonância com as questões de pesquisa
Quais as histórias de Que atividades, recursos,
De que maneira essas
vida e os aspectos Que dispositivos rotinas e artefatos podem
formas culturas
culturais que podemos podem ser usados para organizar esse trabalho,
contribuem para a
resgatar por meio das dar voz a esses impactando e fortalecendo
construção de saberes
memórias de agentes familiares? o vínculo escola-família-
na prática docente?
letramento familiar? comunidade?

3.2.4 Apontar como as


3.2.3 Destacar a práticas e os eventos de
3.2.1 Resgatar 3.2.2 Utilizar
maneira que essas letramento realizados
histórias de vida e dispositivos que
formas culturais podem organizar esse
aspectos culturais por possibilitem dar voz a
contribuem para a trabalho, impactando e
meio de memórias de esses agentes
construção de saberes fortalecendo o vínculo
letramento familiares familiares
na prática docente escola-família-
comunidade.
Fonte: Acervo da pesquisa

4 METODOLOGIA

Este projeto enquadra-se no paradigma qualitativo de pesquisa, com subsídios em


Erickson (1990) e Bortoni-Ricardo (2008), pelo fato de entendermos que o contexto sócio-
histórico em que nos situamos revela significados importantes para a condução de ações que
envolvam, entre outros aspectos, crenças, práticas sociais, ideologias, interpretações e
negociações dos colaboradores, incluindo as do pesquisador – visto como participante ativo e
não apenas como um observador distanciado a “coletar” dados, em uma relação de
(re)construção de conhecimentos intersubjetiva.
Nessa perspectiva, procuramos “entender e interpretar fenômenos sociais inseridos
em um contexto” (BORTONI-RICARDO, 2008, p. 34) gerando dados de pesquisa
preocupados com essa realidade. Essa metodologia, também, proporciona a possibilidade de
trabalho com categorias que surjam ao longo de análise – não pré-estabelecidas – ligadas ao
recorte de pontos observados no seu contexto.
A preocupação com a situcionalidade, própria deste paradigma, mescla-se ao nosso
interesse por uma abordagem de natureza fortalecedora (empowerment) (CAMERON, 1992;
OLIVEIRA, 2004; PEREIRA, 2006) que vá além da descrição de uma realidade social. Essa
10

abordagem preocupa-se, particularmente, com a importância de se proporcionar retorno aos


colaboradores e mobilizar recursos, focando-se em uma conduta ética e em um processo de
relação que age “em favor” do contexto para introduzir transformações nos agentes sociais.
O conceito de pesquisa fortalecedora é definido como uma “ação coletiva
desenvolvida pelos indivíduos quando participam de espaços privilegiados de decisões, de
consciência social dos direitos sociais.” (PEREIRA, 2006, p. 1). Nessa abordagem, considera-
se o trabalho coletivo e democrático, os interesses dos colaboradores e o diálogo.
Podemos acrescentar que a pesquisa de fortalecimento se constitui, de acordo com
Cameron (1992), como “pesquisar sobre, para e com”, ou seja, uma abordagem preocupada
com os conhecimentos e a voz dos pesquisados, as negociações e aberturas, a situcionalidade
da pesquisa e o seu feedback para a comunidade. Oliveira (2004), ao tratar desse tipo de
pesquisa, salienta a questão da responsabilidade social, que deve estar imbricada ao fazer do
pesquisador. Para a autora, usar essa abordagem envolve “a construção de um conhecimento
compartilhado, voltado para o desenvolvimento humano” (OLIVEIRA, 2004, p. 135).
Este projeto insere-se nesse paradigma de pesquisa pelo fato de entendermos que “as
escolas e, especialmente, as salas de aula provaram ser espaços privilegiados para a condução
de pesquisa qualitativa” (BORTONI-RICARDO, 2008, p. 32). Em outras palavras,
entendemos que o ambiente escolar mostra-se como contexto de cultura rico para evocar
significações e questões culturais envolvendo agentes sociais e problemáticas situadas. Além
disso, entendemos que a relação escola-família-comunidade se insere no bojo das pesquisas
de fortalecimento quando tratamos da transformação de uma realidade local.
A geração de dados será realizada na EMPUG, escola situada no bairro de Nova
Descoberta, em Natal – RN. A equipe escolar é representada pela professora responsável pela
turma em que ocorrerão as ações e por outros colaboradores (direção, coordenação e
professores). Nossos colaboradores, além da equipe escolar e dos agentes externos, serão,
também, os alunos e os familiares da turma em questão.
A partir de parceria com a professora, ocorrida desde o ano 2012 2 , julgamos
interessante implantar nosso programa em uma turma de primeiro ano do ensino fundamental,
durante o ano letivo de 2017. O programa de letramento familiar será executado durante os
dez meses letivos do ano, contando com ações de leitura e escrita voltadas para a
transformação dos saberes de nossos colaboradores.
Sua implementação contará com os seguintes passos:

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A parceria se deu devido à participação de ambas, como bolsistas, em projeto já referido, coordenado pelo Prof.
Dr. Moisés Alberto Calle Aguirre. Para mais informações, ver Santos (2015).
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Quadro 2 - Ações do programa3


1 Realização de parceria com a escola
2 Participação de reuniões pedagógicas e apresentação do programa aos colaboradores
3 Primeira rede de conversas com as famílias: determinação de suas histórias de vida, seus mundos de
letramento, seus objetivos, suas forças e seus interesses
4 Realização de entrevistas com as famílias
5 Realização de workshops com as famílias
6 Ações na comunidade: visita ao Batalhão Militar, à UFRN, ao Barracão Clowns e à Praça Lúcia
Amedista, participação no Desfile Cívico do Bairro e outras demandas que aparecerem nas memórias
7 Ciclo de leituras: colaboração da bibliotecária e da professora da turma para a escolha de livros - leituras e
discussões colaborativas em sala de aula e em casa
8 Ações da comunidade: palestra de agente externo envolvido com o bairro (algumas possibilidades: o
vereador Ary Gomes e/ou algum soldado do Batalhão)
9 Colaboração com a professora de informática para a realização de um Blog de histórias colaborativas
criadas por famílias e alunos
10 Segunda rede de conversas com os colaboradores: compartilhamento de histórias de vida educacionais
11 Realização de workshops com as famílias e os alunos
12 Organização de um e-book de histórias colaborativas criadas por famílias e alunos (relatos orais e escritos
de membros da mesma família e do grupo de colaboradores), por meio do processo de reescrita com as
publicações do Blog e com contribuição dos comentários e da circulação das postagens
13 Processo de edição do e-book de histórias colaborativas
14 Processo de publicação do e-book
15 Terceira rede de conversas entre família, alunos e equipe escolar: compartilhamento dos saberes
construídos durante o ano e discussão de propostas para continuidade de ações familiares
16 Lançamento do livro de histórias colaborativas
17 Ação para doação de livros à escola e às famílias
18 Retorno da pesquisa para a escola – encerramento do programa com uma amostra dos achados da
pesquisa para a comunidade escolar
Fonte: Acervo da pesquisa

Durante a execução do programa, geraremos os dados da pesquisa a partir de 5


(cinco) instrumentais: (i) as notas de campo, consideradas como memórias da pesquisadora
acerca dos eventos de letramento mobilizados; (ii) as fotografias registradas durante as ações;
(iii) a transcrição dos vídeos em momentos cruciais do programa, como as rodas de conversa
e entrevistas aos colaboradores; (iv) o Blog, recurso eleito por propiciar colaboração e
circulação rápida das práticas de letramento no domínio da cibercultura; e (v) o e-book com as
memórias de letramento e a culminância de todos os momentos desenvolvidos.
Adotaremos, como recurso de análise, a triangulação dos instrumentos, considerando
a natureza heterogênea dos dados. Para a análise qualitativa, criaremos categorias, com base
nos dados gerados, valorizando as práticas de letramento desenvolvidas na rede de interações
entre a família-escola-comunidade, com foco nos aspectos culturais dos contextos
focalizados.

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Datas a serem planejadas junto à equipe escolar e às famílias. As atividades também estão sujeitas a mudanças
de acordo com as necessidades dos colaboradores.
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5 QUADRO TEÓRICO

Os Estudos de Letramento, aporte teórico central desta pesquisa, consideram as


práticas de leitura e escrita como sociais, ou seja, promovem uma perspectiva de que os usos
da linguagem envolvem instituições, relações de poder, objetivos sociais, práticas culturais e
situações específicas (BARTON, HAMILTON & IVANIC, 1993). Nos estudos brasileiros,
Kleiman (1995, 2005, 2016) revela algumas concepções basilares acerca do conceito,
destacando que o letramento é uma prática coletiva, situada, colaborativa e social, que circula
em diferentes domínios. Por isso, esta mobiliza diversos saberes, envolve ações, possui
propósitos específicos e considera o sujeito como histórico e social.
Nessa direção, Oliveira (2010a) ressalta a complexidade desse fenômeno social,
elencando cinco princípios: (i) são múltiplos, pois envolvem uma pluralidade de contextos
(em casa, no banco, na igreja, no trânsito e em diversas esferas sociais), atividades e sistemas
simbólicos, (ii) são dêiticos, em razão de serem situados e, por isso, se transformarem
segundo condições sócio-históricas, (iii) são ideológicos, porque revelam posicionamentos
identitários, crenças e disposições, (iv) são culturais, em razão de fazerem parte de práticas de
letramento locais/globais, e (v) são críticos, por estarem preocupados com as relações de
poder e mudança social.
Nos estudos de letramento, dois conceitos são centrais: as práticas de letramento,
postuladas por Street (1984, p. 1) como “usos culturais e atividades relacionadas ao uso da
leitura e/ou da escrita”, e os eventos de letramento, definidos por Heath (1982) como
“ocasiões em que a língua escrita é parte da interação dos participantes”.
Amparados por essas conceituações, entendemos que as práticas de letramento são os
usos socioculturais do letramento, os quais abrangem não somente a materialidade do texto
que está sendo lido ou escrito mas também as significações tecidas na interação – domínios,
recursos, rotinas e participantes ocultos que definem esses usos (HAMILTON, 2000).
Tais práticas se materializam em ações sociais concretas e situadas, ou seja, em cenas
observáveis de integração da escrita nas interações das pessoas, chamadas eventos de
letramento. Salientamos a importância desse conceito para a área por ele ser considerado a
unidade básica de análise dos letramentos (KLEIMAN, 2016).
Compreendemos, assim, que variadas situações cotidianas de leitura e escrita são
subsidiadas por práticas de letramento, materializadas em eventos de letramento. O conceito
de letramento, dessa forma, vai além da alfabetização ou da escolarização – apesar de a escola
ser considerada a agência de letramento privilegiada em nossa sociedade.
13

É preciso observar que “[...] muitos dos letramentos que são influentes e valorizados
na vida cotidiana das pessoas e que têm dupla circulação são também ignorados e
desvalorizados pelas instituições educacionais” (ROJO, 2009, p. 106). Desse modo,
pesquisadores, como Street (1984), defendem a importância de tornar visíveis essas práticas
marginalizadas e mostrar que o local e o global não são excludentes, enfocando, por exemplo,
a distância entre a escola e os letramentos que acontecem fora dela.
Isso é possibilitado pela orientação crítica que pode ser dada ao letramento,
conforme comenta Oliveira (2010a), trabalho que, posto em prática na escola, parte das
necessidades de linguagem da comunidade situada para (re)definir os currículos escolares em
prol de propósitos comuns, visando envolver a voz comunitária em aprendizagens situadas.
Nesse âmbito, inserem-se os projetos de letramento, formas de aprender preocupadas com
“princípios democráticos de ação social em que professores e alunos são parceiros”
(OLIVEIRA; TINOCO; SANTOS, 2011, p. 61).
Os projetos de letramento partem de uma pedagogia culturalmente sensível
(ERICKSON, 1987), envolvendo ações de leitura e escrita desencadeadas pela prática social.
Apagar a polarização entre escola e vida, nesse contexto, pode se dar a partir de alguns
pressupostos trazidos por Oliveira, Tinoco e Santos (2011, p. 52-56): (i) aprendizagem
situada, (ii) ensino orientado para a resolução de problemas, (iii) rede de atividades, (iv)
desterritorialização dos lugares de aprendizagem, (v) tempo escolar reinventado, (vi)
distribuição de tarefas, (vii) inserção num sistema de redes de comunicação e (viii) o
professor como agente de letramento4.
Em ações dessa natureza, pautadas na ampliação de mundos de letramento, centram-
se os programas de letramento familiar, construto que se constrói a partir da relação entre a
valorização sensível das forças já trazidas pelos colaboradores e a promoção de novos
elementos de transformação e mudança para sua realidade (CAIRNEY, 2005), sendo isso
realizado a partir da promoção de diálogos, formações, cursos, atividades de leitura e escrita e
outros recursos que possam promover o empoderamento.
É com esse olhar que trazemos o letramento familiar, conceito que evoca a
mobilização de práticas de leitura e escrita feita por membros da mesma família,
fundamentando a ideia de que há valor nos conhecimentos trazidos pelo aluno à escola por
suas gerações familiares. Assim, entendemos que o lar pode ser ou tornar-se um espaço de
incentivo aos múltiplos letramentos da sociedade, a partir de ações como, por exemplo, a

4
“um mobilizador de recursos, atento às necessidades, potencialidades e saberes dos membros da comunidade de
aprendizagem (a escola) e voltado para a construção da autonomia do aluno.” (OLIVEIRA, 2010b, p. 12).
14

leitura compartilhada de livros, o engajamento em atividades escolares, o apoio às ações


comunitárias, a contação de histórias/memórias, o envolvimento com o aprendizado dos
alunos e a participação5 em eventos de letramento de diversas esferas sociais.
Os letramentos mobilizados evocam, ainda, outros cinco conceitos relevantes para
nossa pesquisa: (i) cultura como sistemas simbólicos, devido a nosso interesse por
conhecimentos, como crenças, trazidos por nossos colaboradores; (ii) voz, pois procuramos
proporcionar espaço para que os nossos colaboradores expressem suas vidas e identidades;
(iii) memórias coletivas, devido ao interesse por resgatar histórias de letramento dos
colaboradores; (iv) gêneros textuais, a partir dos construtos da Nova Retórica; e (v)
comunidade de prática, por entendermos que programas de letramento familiar inseridos na
escola são pautados por um senso comunitário e por propósitos sociais.
Em relação à cultura, destacamos que nossa concepção não considera termos como
culto e inculto, tampouco cultura letrada como superior a alguma outra produção cultural.
Partimos, assim, de processos antropológicos, sociais e históricos e da premissa de que
cultura, em sua complexidade, consiste em produções humanas, agrupamentos sociais ou
redes de atividades nas quais haja um comportamento coeso de caráter local (situado) e
dinâmico em relação a costumes, moral, crenças, artes ou outros hábitos (LARAIA, 2006).
A esse respeito, Geertz (1973) entendia o fenômeno da cultura como teias
construídas pelo homem, que se relacionam a símbolos e significados os quais orientam
grupos sociais. Essa concepção se pauta pela ideia de que “a cultura humana é um conjunto de
textos (...) o antropólogo deve saber ler por sobre os ombros daqueles a quem esta cultura
pertence” (GEERTZ, 1973, p. 452). Nessa perspectiva, os sujeitos estão imersos em
determinada realidade cultural, compartilhando ideias a partir de uma construção coletiva que
pode gerar arenas de conflito, devido à heterogeneidade cultural, assim como silenciamentos.
No que diz respeito a áreas fronteiriças, como a linguagem, Egan-Robertson &
Bloome (1997) consideram que há duas dimensões do estudo sobre a cultura: a primeira seria
a descrição de formas de vida de um grupo particular e a segunda enfocaria algumas questões
como a relação da cultura com sentidos, pensamentos, ações e linguagem.
Para os agentes sociais expressarem as suas concepções e construírem suas
narrações, resgatamos um importante conceito para o nosso estudo: o de voz, entendido como
o poder de “dizer” o mundo como uma ação transformadora (FREIRE, 1976). Em oposição a

5
Destacamos que mesmo em famílias de meios analfabetos, há ricas práticas de base cultural envolvendo
eventos de letramento, visto que esses agentes estão inseridos em uma sociedade grafocêntrica. O problema é
que, muitas vezes, a escola não privilegia certas habilidades e certos “modos de aprender”, ignorando o grupo
social a que pertence o aluno e adotando um modelo autônomo (STREET, 1984) de letramento.
15

esse conceito, a noção de silenciamentos (KEY, 1998), aludida, ainda, a cultura do silêncio,
segundo Freire (1976), refere-se à falta desse poder, ou seja, um isolamento de si e dos outros,
provocado pela falta de ferramentas para expressar suas experiências. Esse comportamento é,
muitas vezes, gerado por percepções arrogantes (KEY, 1998) das próprias instituições, como
a esfera laboral e até a escolar, as quais, baseadas nos capitais de letramento6 de um indivíduo,
acabam excluindo-o ou distanciando-o de relações sociais, promovendo a descrença da pessoa
em si mesma, que, assim, silencia-a.
Nesse processo, não é somente sua voz que é calada, mas sim a sua história, a sua
cultura e a sua identidade, visto que, de acordo com Egan-Robertson (1998, p. 460), “negar ou
desvalorizar os recursos linguísticos de uma comunidade pode ser entendido como uma
maneira de negar um atributo de personalidade”7.
O enfrentamento a essas marginalizações se dá, em nosso trabalho, pelas memórias
coletivas, recursos que encontramos para que vozes plurais sejam ouvidas em nossas ações de
letramento. Essas podem ser compreendidas, de forma geral, como a capacidade de armazenar
informações e registrá-las, constituindo-se de significados, lembranças, atualizações e
narrações que são “a garantia de nossa própria identidade” (CHAUÍ, 2000, p. 158).
Sobre os trabalhos acadêmicos envolvendo memórias, Marinho (2004, p. 32)
comenta: "é desafiadora a tarefa de tentar descrever os efeitos do ato de escrever sobre os
sujeitos que escrevem suas memórias. Eles não apenas lembram, reconstituem, mas se
constituem através dessa escrita". Essa citação reforça a ideia de que evocar as memórias em
um contexto desfavorecido em questões de poder mostra-se como uma ação de promoção
identitária transformadora.
Pensando dessa forma, as memórias podem ser utilizadas para compreender,
(re)conhecer e vislumbrar modos de vida. Assim, entendemos com Chauí (2000, p. 130) que
“a memória é o que confere sentido ao passado como diferente do presente (mas fazendo ou
podendo fazer parte dele) e do futuro (mas podendo permitir esperá-lo e compreendê-lo)”.
Essa discussão, atrelada ao contexto educativo, revela a importância de memórias
(passado) e de experiências compartilhadas (presente), na convivência familiar, como
mecanismos de conexão entre os membros desse círculo. Mais do que isso, acreditamos que
tais ações podem ter impactos positivos no letramento (futuro) de uma criança engajada
socialmente em ações de linguagem.
6
O conceito é uma analogia à ideia de capital cultural (BOURDIEU, 1998), sendo entendido como a
acumulação de conhecimentos relacionados ao uso das práticas sociais dominantes de leitura e escrita, “fruto de
seu acesso ao mundo mediado pelo outro social” (OLIVEIRA; TINOCO; SANTOS, 2011, p. 45).
7
Negating or devaluing the linguistic resources of a community can be understood as a way of negating an
attribute of personhood. (Tradução nossa)
16

A memória gravada a partir, por exemplo, de documentos, torna-se coletiva ou


social. Halbwachs (2006), amparado teoricamente em pressupostos advindos das Ciências
Sociais, afirma que as memórias são eminentemente coletivas, mesmo que aparentemente
particulares, pois sempre perpassam grupos sociais e as interações dos indivíduos com a
sociedade. Por extensão, essa perspectiva salienta que, se o sujeito é social, sua memória
também o é.
Articulando a noção de memórias coletivas aos estudos de gênero textual,
fundamentamos nossa reflexão no campo da Nova Retórica, particularmente no dizer de
Bazerman (2011, p. 23). Segundo esse pesquisador, os gêneros são:
Formas de vida, modos de ser. São frames para a ação social. São ambientes para a
aprendizagem. São os lugares onde o sentido é construído. Os gêneros moldam os
pensamentos que formamos e as comunicações através das quais interagimos.
Gêneros são os lugares familiares para onde nos dirigimos para criar ações
comunicativas inteligíveis uns com os outros e são os modelos que utilizamos para
explorar o não familiar.
Evidente está que, a partir desta perspectiva, o gênero atravessa a ação social,
estabelecendo, portanto, relação com as atividades do mundo, sejam referentes ao
aprendizado dos agentes sejam estimulando seu pensamento. O gênero como (inter)ação
promove a ideia de que a partir da escrita podemos realizar mudanças e agir na vida social.
Nessa perspectiva, não se ensina o gênero como algo abstrato e desvinculado de seu uso. Ao
contrário, ensinam-se outras coisas com os gêneros (OLIVEIRA, 2010a). Essa é uma
abordagem na qual a prática social orienta a imersão do aluno em gêneros que atendam a seus
propósitos particulares e imediatos. Esse encaminhamento mostra-se como uma alternativa
favorável para contribuir com a agência de colaboradores em programas de letramento.
O trabalho com os gêneros envolve atividades de linguagem desenvolvidas
colaborativamente, agenciadas por grupos denominados de comunidades de aprendizagem
(AFONSO, 2001; WATKINS, 2005; OLIVEIRA, 2010a). Entendemos que em uma
comunidade “cada membro é um participante ativo, há um senso de pertencimento, a
colaboração entre os membros da comunidade é frequente e a diversidade dos mesmos é
compreendida” (WATKINS, 2005, p. 21). 8
Essa organização de trabalho ganha força ao causar uma reordenação da sala de aula,
promovendo, nesse espaço, o diálogo sobre elementos significativos para os membros da
comunidade e envolvendo seus interesses intelectuais, sociais e culturais (AFONSO, 2001).
Nessa perspectiva, a sala de aula passa a ser considerada um espaço de cultura (EGAN-
ROBERTSON; BLOOME, 1997).
8
“[...] each member is an active participant, a sense of belonging has developed, collaboration between members
of the community is frequent, and diversity of members is embraced.” (Tradução nossa)
17

6 CRONOGRAMA

Vejamos, a seguir, o cronograma de execução de nossas atividades projetadas:

Tabela 1 – Cronograma de ações projetadas para o curso de Doutorado


Atividades Período de execução
2017 2018 2019.1 2019.2
1. Frequência nas disciplinas do Doutorado
2. Realização do exame de proficiência em língua estrangeira
3. Realização de leituras na área
4. Geração de dados
5. Participação em congressos da área com a publicação de artigos e o
engajamento em minicursos
6. Estabelecimento de categorias para a análise dos dados
7. Elaboração da tese
8. Qualificação da tese
9. Defesa da tese
10. Apresentação dos achados da pesquisa para a comunidade envolvida
e doação de um exemplar da Tese de Doutorado para a EMPUG
Fonte: Acervo da pesquisa

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