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"Quando o mundo estiver


unido na busca do
conhecimento, e não mais
lutando por dinheiro e poder,
então nossa sociedade
poderá enfim evoluir a um
novo nível."
 
 
 
 
ROBERTO MOTTA
 

3333333333
OS INOCENTES DO LEBLON
UMA BIOGRAFIA DO IDEALISMO
 
A INSPIRADORA, POLÊMICA E INÉDITA
HISTÓRIA DA CRIAÇÃO E DOS PRIMEIROS DIAS
DO PARTIDO NOVO, CONTADA POR SEU OUTRO
CRIADOR
 
 
 
COM PREFÁCIO DE RODRIGO CONSTANTINO
 
 
1ª EDIÇÃO - 2021
 
 
 
Capa: Luciano Cunha
Revisão: Betty Vibranovsky
Diagramação: Leo Delfino
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
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Para
 
Alexandra, Maria Fernanda e João Felipe
 
 
minha mãe, Marly, e meu pai, Sertório
 
 
meus amigos Marcelo Ciuffo, Stuart Graham e Fábio Beato Costa, que
foram embora prematuramente
 
 
Fábio Lopes Sampaio, amigo de todas as horas há mais de quarenta anos
 
 
 
 
 
 
 
 
Agradecimentos
 
 
Este livro não teria sido possível sem Márcio Duarte, querido amigo
baiano, guerreiro incansável e apoiador de primeira hora. Foi Márcio quem
deu a ideia e me encorajou a seguir em frente.
Agradeço ao meu amigo Victor Bosch por sua amizade, patriotismo e
dedicação ao Brasil.
Agradeço a Roberto Ventriglia, que foi meu braço-direito nas batalhas
eleitorais de 2018 e 2020 e em todo o trabalho realizado pelo Rio de Janeiro
e pelo Brasil.
Agradeço a Rafael Hollanda, Robson Abreu, Rodrigo Sias, Marcelo
Rocha Monteiro, Heleno Palmieri, Renata Silbert, Guilherme Azevedo, Ana
Paula Oliveira, Ana Cláudia Moreira, Marcus Moraes, Dennys Andrade,
José Ernesto Marino Neto, Davi Oliveira, Marcelo Lessa e especialmente a
Fernando Mousinho pela leitura cuidadosa das primeiras versões deste
manuscrito e pelas preciosas sugestões.
Agradeço a M.G. pela ajuda com a redação, correção e edição de
passagens cruciais do texto.
 
 
 
 
 
 
A vida é mais, muito mais labiríntica do que é mostrado em nossa
memória – nossas mentes estão empenhadas em transformar a história em
algo suave e linear, o que nos faz subestimar o papel do acaso.
Nassim Taleb
 
 
 
 
 
Não basta fazer coisas boas – é preciso fazê-las bem.
Santo Agostinho
 
 
 
 
 
É mais difícil conviver com os colegas de partido do que lutar contra
seus adversários.
Jean-François Paul, Cardeal de Retz, 1702
 
 
 
 
 
 
 
 
AVISO IMPORTANTE
 
Este livro menciona o nome de muitas pessoas com as quais tive
contato – ou me associei de alguma forma – durante o período da
concepção e criação do Partido Novo. Essas menções têm como objetivo
documentar e contribuir para o entendimento da sequência de eventos
históricos. A menção de um nome não significa necessariamente que a
pessoa citada tenha aderido ao projeto do partido ou concordado com suas
ideias e premissas.
Da mesma forma, é possível que tenham sido omitidos nomes de
pessoas que tiveram participação relevante nos eventos descritos no livro.
Todo o esforço foi feito para apresentar os eventos como de fato
aconteceram, tendo como referências documentos em meu poder,
depoimentos pessoais e, inevitavelmente, minhas recordações. Erros podem
ter sido cometidos. Sugestões de correções ou inclusões assim como
contribuições de documentos e depoimentos para futuras edições podem ser
enviadas ao autor através do e-mail osinocentesdoleblon@gmail.com.
 
 
Prefácio
Eu Sou Testemunha
Rodrigo Constantino
 
A esperança de uma nova política, feita por gente que nunca foi
político de carreira, gente séria, preparada e com espírito público: o Novo
alimentou isso em mim e em milhares de pessoas. Roberto Motta estava lá
desde o começo, como peça-chave e amigo de longa data de João Dionísio
Amoêdo, o principal financiador do projeto, cujo nome passaria a ser
sinônimo do Partido Novo – um partido que ele, Motta e mais de uma
centena de idealistas criaram.
Neste livro, Motta faz um relato de como tudo começou, revela
detalhes de reuniões e também apresenta um perfil de João Amoêdo. A
trajetória de encontros e desencontros de Motta e Amoêdo termina em
ruptura, estampada num evento social em que ambos sequer se
cumprimentaram. Entender como isso aconteceu é essencial para
compreender o que parece ter dado errado no projeto. Algo se desviou da
meta – ou a meta sempre foi outra e muita gente foi enganada.
Sim, estou decepcionado com o Partido Novo e com João Amoêdo,
e tenho minhas razões. Afinal, participei de tudo – se não desde o primeiro
momento, como o Motta, pelo menos desde a fase inicial do partido.
Participei de inúmeras reuniões fechadas, em “petit comitê”, para ajudar a
criar um DNA doutrinário para o projeto, que era formado, basicamente,
por engenheiros que pensavam somente em um “choque de produtividade”
no poder Executivo. Fui um dos que emprestaram tempo, nome e empenho
para que o Novo fosse associado ao liberalismo, bandeira que defendo há
décadas.
Antes, porém, vale contar como cheguei ao João Amoêdo. Sua filha
foi minha estagiária ainda nos anos de mercado financeiro, na empresa de
gestão de recursos – Family Office – da qual eu era sócio. Era uma menina
muito inteligente e educada, que causou ótima impressão em todos nós. Ela
notou que eu passava um bom tempo falando de política, debatendo em
redes sociais e escrevendo textos sobre o assunto. Eu já era um militante da
causa liberal com certa exposição pública, e dividia meu tempo entre o
trabalho no setor financeiro e minha verdadeira vocação.
Certo dia ela mencionou o projeto que seu pai liderava, e perguntou
se eu tinha interesse em conhecê-lo. Marcamos o encontro. Ali começou
uma longa parceria. Fiz palestras para o Novo, divulguei o projeto, ajudei a
dar uma roupagem liberal ao partido. Por pressão do Amoêdo, aceitei
inclusive me filiar ao Novo quando ele efetivamente nasceu, o que nunca
tinha sido minha intenção: como comentarista e ativista liberal, não quero
estar preso a um partido, qualquer que seja ele. Mas confiei tanto no projeto
que abri essa exceção – da qual me arrependo. Também publiquei imagens
minhas com a camisa do Novo. Ou seja: eu literalmente vesti a camisa do
projeto de Amoêdo e seus colegas.
Onde foi que ocorreu o afastamento? O Novo é um partido que
abriga liberais mais “progressistas” e outros mais conservadores. Até aí,
tudo bem. Eu mesmo recomendava que o Novo deveria evitar cascas de
banana. O projeto era menos ideológico e mais prático: tornar o estado mais
enxuto e eficiente. Temas como aborto e legalização de drogas serviriam
apenas para causar fissuras internas e afastar gente competente. Eu nunca
achei que o Novo fosse um partido conservador, e eu mesmo não tinha me
tornado ainda um liberal mais conservador – o processo estava em curso,
como expliquei em meu livro Confissões de um ex-libertário.
A decepção não veio tanto pela postura “progressista” de muitos
filiados, e sim pela postura do próprio Amoêdo, principalmente durante o
governo Bolsonaro. Sua obsessão em atacar o presidente o tornou uma
espécie de sensacionalista demagogo, um típico esquerdista da velha
política que fica “lacrando” nas redes sociais. Amoêdo passou a culpar o
presidente por tudo de ruim que acontecia no mundo, terminando cada
mensagem com a bandeira do impeachment. Ali ficou claro que ele tinha
um projeto pessoal de poder, e não um projeto de país.
O controle do partido sempre foi exercido com mão de ferro.
Amoêdo foi quem colocou a grana, mas cheguei a acreditar que ele tinha
feito isso por total espírito público. Um homem muito rico, multimilionário,
com três filhas jovens, pode ser tocado por uma experiência pessoal e se
dedicar a um projeto altruísta. Foi nisso que confiei. Acredito que fui
ingênuo.
Muitas denúncias de “caciquismo” mostraram que Amoêdo não
pretendia renunciar ao comando total da sigla que financiara. Mas o Brasil
não precisa de mais um partido com dono. Isso é exatamente a velha
política que pretendemos denunciar e derrotar. Apesar de ótimos quadros no
Legislativo e também no Executivo – como o governador Romeu Zema em
Minas Gerais –, ficou claro que o Novo tinha uma pegada “tucana”, um
foco estritamente economicista voltado para os interesses da Faria Lima. O
laranja passou a ser o novo vermelho, ainda que desbotado. Mas política
não é como um negócio, a escolha de um candidato não é a de um CEO e o
“purismo” pode ser uma forma de ignorar que o ótimo é inimigo do bom e
de esquecer que política é a arte do possível. Passei a ver o Novo como um
PSDB melhorado, e isso está muito distante do partido liberal que imaginei.
Na vida quase nada é binário. Não guardo necessariamente mágoas,
apesar da decepção. Acho que o nascimento do Novo fez bem ao país, e
comparado ao que temos na vida política é, sem dúvida, muito melhor do
que a média. Tem, como já disse, muita gente boa. Mas o Brasil vive
tempos perigosos, com o establishment unido no esforço de derrubar o
presidente eleito para facilitar a volta dos corruptos socialistas. Críticas
pontuais e construtivas em relação ao governo ou ao presidente são
legítimas e necessárias. Mas não foi nada disso que Amoêdo passou a fazer
diariamente. Ele chegou a elogiar um ativismo judicial que claramente se
tornou uma das maiores ameaças à nossa democracia, com sua
partidarização e abuso de poder.
Essa obsessão estragou tudo, na minha opinião. Essa postura
lamentável do Amoêdo destruiu em mim a imagem que eu fizera dele ao
longo dos anos. Eu não me dediquei tanto para ajudar a construir um novo
PSDB, muito menos para contribuir com algum projeto pessoal de poder do
próprio Amoêdo. E é exatamente assim que vejo as coisas hoje. Uma pena.
O livro do Motta, através da simples exposição de fatos e
acontecimentos, ajuda a vislumbrar melhor esse personagem ambicioso,
oculto num homem gentil e com fala mansa. Quando terminei de ler, fiquei
mais convencido de que fui atraído para um projeto pessoal dele, e não era
isso que me interessava. Que o Novo, então, siga seu próprio rumo,
colaborando para bons projetos. Mas aquela fase de defesa quase
apaixonada e incondicional ficou para trás.
Eu me sinto traído.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Introdução
O Sonho Não Acabou
 
Uma das grandes aventuras da minha vida foi ter participado da criação de
um partido. O Partido Novo foi o primeiro da história brasileira a ser
concebido e criado sem a participação de políticos.
Boa parte da minha energia, dos meus sonhos, da minha capacidade de
trabalho e da minha esperança foram investidos nesse projeto, durante oito
anos. O envolvimento com uma atividade dessa natureza afetou decisões
profissionais, pessoais e familiares, com repercussões – positivas e
negativas – que ficarão comigo para o resto da vida.
Viajei por todo o país falando sobre uma nova forma de fazer política, em
nome do bem comum, com menor intervenção do Estado e mais liberdade,
segurança e prosperidade para todos.
Expliquei que política não pode ser negócio. Mostrei quanta riqueza o
Estado retira de nosso bolso – no Brasil, quase 50% do que ganhamos. Falei
da tragédia da segurança pública, um drama inaceitável que tira a vida de
milhares de brasileiros todos os anos e nos submete a um regime
permanente de medo.
Comovi, e fui comovido com o que disse e escutei nessa jornada.
Até que, em 2016, decidi deixar o partido que ajudei a conceber. O partido
seguiu sem mim, como fazem os filhos adultos, acertando talvez mais do
que errando, traçando na história política brasileira um caminho que,
embora muito diferente daquele que eu imaginava, dá sua contribuição para
a mudança de um cenário político corrupto, violento e obsoleto.
Se o Novo não fez e não representou ainda mais, a culpa não é da
multidão de brasileiros que acreditou, apoiou e continua apoiando o projeto,
nem dos candidatos eleitos – em sua maioria, muito acima da média
nacional –, mas de uma liderança partidária sem vocação política e
subordinada a uma centralização excessiva e do equivocado pensamento de
que um partido deve funcionar como uma empresa.
Na verdade, um partido é completamente diferente de uma empresa. Uma
empresa tem um dono, que contrata e demite funcionários. A razão de
existir da empresa é o lucro. O partido é uma organização voluntária,
movida por ideias e sonhos, e sua principal missão é servir como filtro de
acesso à política institucional.
O dono da empresa não representa seus funcionários. O líder político sem
representatividade tem carreira curta.
Não existe ambiente mais propício para desentendimento, traição e
conflito do que a política. Mas, como recomenda Nassim Taleb, devemos
resistir à tentação de impor uma narrativa emocionalmente satisfatória a
uma sequência de fatos passados que, provavelmente, obedeceram mais às
regras do acaso e a imperfeições individuais do que a qualquer plano
maléfico.
É nisso que escolhi acreditar – e por isso é importante registrar os fatos e
contar as histórias por trás desse ambicioso, idealista e muitas vezes
ingênuo projeto de construir um partido político sem as contaminações
usuais. São histórias de gente comum que deixou de lado suas vidas, correu
riscos e enfrentou obstáculos em nome do sonho de um país melhor.
Esse é um registro histórico justo e absolutamente necessário.
Meu projeto é um Brasil decente, seguro e estável, onde possamos criar
nossos filhos com a certeza de que o dia de amanhã será melhor que o dia
de hoje.
Há muito tempo eu tento ser digno dessa ideia, que exige desprendimento,
generosidade e abertura para o novo.
E é do Novo – e dos homens e das mulheres que o criaram – que trata este
livro.
 
 
 
 
Capítulo 1
O Começo
 
Meu pai trabalhou na Petrobras como engenheiro geofísico a vida inteira,
praticamente desde a criação da empresa, levado por meu tio Lindonor
Mota[1], um dos pioneiros da exploração de petróleo no país. Tio Lindonor
protagonizou uma famosa briga com o geólogo americano Walter Link, que
jurava que não existia petróleo no Brasil. Por causa do trabalho do meu pai,
moramos primeiro em Belém do Pará, onde nascemos eu e meu irmão
Danilo, e depois em Salvador, onde nasceram Paulo e Leila.
Em 1973, nos mudamos para o Rio. Meus pais nos colocaram, junto com
um monte de malas, no Opala azul de duas portas e pegamos a estrada. A
embreagem do Opala quebrou perto do Posto Rosa Cruz, na BR 116, alguns
quilômetros ao norte de Teófilo Otoni, em Minas Gerais. Ficamos quase
uma semana morando no carro enquanto um emissário enviado por meu pai
comprava uma peça para o conserto. Chegamos ao Rio em meio a uma forte
tempestade. Meu pai dirigia bem devagar, sem enxergar quase nada, em
uma época em que os carros da classe média não tinham ar-condicionado
nem desembaçador. Nos instalamos em Botafogo, primeiro em um
apartamento emprestado por um amigo, que ficava em uma cabeça de porco
[2]
na praia de Botafogo, e depois em um apartamento que meu pai
conseguiu comprar na rua Voluntários da Pátria.
Eu e meus três irmãos entramos no Colégio Santo Inácio – essa foi a razão
pela qual meus pais escolheram morar em Botafogo. Comecei no sétimo
ano do ensino fundamental, e fiquei conhecido como Bezerra. Eu e Danilo
íamos a pé, sozinhos, para a escola, e Paulinho e Leila iam no Opala com
minha mãe ou a pé com a babá.
Minhas memórias do Santo Inácio não são todas agradáveis. Naquela
época o termo “bullying” ainda não tinha sido popularizado no Brasil, mas
a prática já era bem conhecida. Como eu tinha sotaque nordestino, ganhei
logo o apelido de “paraíba” e virei alvo dos valentões. Minha vida se
transformou em um inferno, e durante muito tempo recriminei meu pai por
nos ter tirado de Salvador, onde morávamos em uma casa no conjunto
habitacional Paulo VI, na então deserta e quase rural Pituba, cercados de
natureza e de amigos.
Quando passei para o ensino médio, as coisas começaram a melhorar.
Ajudou muito a perda do sotaque baiano. Eu continuava tímido e tinha um
círculo de amizades bastante restrito. Passava o intervalo do recreio quase
sempre na biblioteca.
Os garotos populares da escola jogavam futebol. Eles sempre formavam
dois times: Cobras e Lagartos. Dois dos melhores jogadores tiravam par ou
ímpar e faziam a escalação dos seus times. Eu nunca era escolhido. Minha
falta de intimidade com a bola é total (até hoje).
No terceiro ano do ensino médio, minha vida melhorou mais ainda. A
direção da escola resolveu misturar todos os alunos e refazer as turmas. Eu
caí na 34, uma turma à qual devo minhas melhores memórias do colégio.
Na sala ampla, arejada e bem iluminada, como são todas as salas de aula do
casarão do Santo Inácio, eu me sentava no meio, um pouco para o lado
direito.
Ao meu redor, sentavam-se aqueles que se tornariam meus amigos mais
próximos, uma menina e dois rapazes. Éramos tão unidos que nos demos o
apelido de “Camarilha dos Quatro[3]”: eu, Verônica, Marcelo e João.
Nossas cadeiras ficavam em uma região intermediária entre a ordem e o
caos. Na nossa frente ficavam os nerds – naquela época chamados de CDFs
(se você não entendeu a sigla, pergunte pro seu pai). Era a turma que
prestava muita atenção e copiava tudo do quadro-negro. Atrás, ficava o
“fundão”, também conhecido como “cozinha” – os bagunceiros, que não
queriam nada com a hora do Brasil e passavam a aula jogando batalha naval
(era o equivalente da época ao joguinho de celular de hoje). Naquele meio
de campo, encontramos um ponto intermediário entre a seriedade e a zorra
total que nos permitia aproveitar o auge da adolescência ao mesmo tempo
que nos preparávamos para ser alguém, algum dia.
Verônica era um doce: bonita, meiga e sensível. Se me lembro bem, tinha
uma irmã mais nova chamada Vivian. Depois do Santo Inácio, perdemos
contato. (Verônica, se você estiver por aí, mande um sinal.)
  Marcelo era expansivo, brincalhão, generoso, namorador e gostava das
coisas boas da vida, embora sua própria vida não fosse fácil. Ele estava
repetindo o terceiro ano do ensino médio e por isso tinha amigos mais
velhos (naquela idade, um ano de diferença já tornava alguém “mais
velho”). Ele perdera o pai ainda criança e morava com sua mãe, D.
América, em um apartamento na rua Senador Vergueiro, quase esquina com
Praia de Botafogo. João e eu zoávamos de sua preferência por hábitos
sofisticados, adquiridos na convivência com alguns de seus amigos – mais
velhos – cujas famílias eram ricas.
João era tranquilo, quieto, quase tímido, mas inteligente, determinado e
seguro de si. Eu frequentava a casa de sua família – primeiro um
apartamento na Av. Oswaldo Cruz, no Flamengo, e depois outro no Leblon
–, onde era sempre muito bem recebido. Acabamos descobrindo que nossas
mães se conheciam do tempo em que eram jovens e moravam em Natal, no
Rio Grande do Norte.
O pai de João tinha uma clínica radiológica em Botafogo, e João ajudava
na administração. De vez em quando, eu o acompanhava em alguma tarefa.
João dirigia um Fiat 147 da família. Um dia fomos entregar um documento
qualquer da clínica. João parou o carro na frente do Shopping da Gávea e
saiu. Eu fiquei. Dali a pouco um guarda batia no vidro do carro.
“Você sabe dirigir?”, ele me perguntou, com cara de poucos amigos.
“Sei”, respondi.
“Então, tira esse carro daqui antes que eu multe”.
Eu liguei o 147 e dei uma volta no quarteirão até o João voltar.
Nas férias de junho eu fui convidado por João a passar alguns dias em
uma casa que sua família tinha no centro de Petrópolis. João e as irmãs
tinham um grande círculo de amizades, e íamos a reuniões, festas, jogos e
sessões de cinema. Eu me sentia acolhido e bem-vindo.
 
 
 
Em março daquele ano – 1979 – tomara posse como presidente o
General João Baptista de Oliveira Figueiredo, sucedendo o presidente
General Ernesto Geisel. Era a etapa final do regime militar. Chame-o do
que você quiser: revolução, golpe, ditadura. Mas quem tem menos de 55
anos não pode me dar aula sobre isso. Eu vivi aquela época.
Ninguém tem a percepção correta da época que está vivendo. Só
retrospectivamente é possível colocar as coisas e as pessoas em seus
devidos lugares e proporções.
Em 1979, como diz meu amigo Marcelo Rocha Monteiro, as opções
ideológicas disponíveis e aceitáveis eram extrema-esquerda, esquerda
radical e esquerda.  
Computadores pessoais ainda não haviam sido inventados, muito menos
a internet ou o telefone celular. As únicas fontes de informação eram os
jornais (os principais eram o Jornal do Brasil e O Globo) e a televisão, com
meia dúzia de canais (nada de TV a cabo). Minha diversão principal era ler,
mas livros eram caros, e a seleção disponível bastante limitada. Quando eu
comecei a ler em inglês, para melhorar minha fluência, tinha que pegar
livros emprestados na biblioteca do Consulado Americano, na Av.
Presidente Wilson.
Não me lembro de ter discutido política alguma vez com João ou com
Marcelo. Nossa amizade girava em torno de outras coisas. Política eu
conversava com outra turma, mais ligada nisso. Foi com um desses outros
amigos que fui, no auge dos meus 17 anos – e morrendo de medo – à sede
do Partido Comunista Brasileiro, na Cinelândia, pegar adesivos da
campanha pela Anistia Ampla, Geral e Irrestrita.
Quando soube disso, o então coordenador do meu ano do ensino médio,
Georges Frederic Mirault, me chamou na sala dele. Georges era um cara
especial. Filho de um famoso pianista, Aloysio de Alencar Pinto, e bacharel
em direito, Georges cuidava da nossa turma, pelo que lembro, desde que
entrei no Santo Inácio.
 
Quando me sentei na cadeira em frente à mesa dele, Georges me
perguntou, cheio de tato, se eu sabia quem eram as pessoas que seriam
beneficiadas com a anistia e o que elas tinham feito.
Eu não sabia.
Ele me explicou, e eu saí da sala dele um pouco menos ingênuo.
 
 
Subitamente, o ano de 1979 acabou e demos adeus ao Santo Inácio. Cada
um de nós seguiu seu caminho e seu destino.
Perdi totalmente o contato com Verônica.
Marcelo Ciuffo de Aguiar Silva se tornaria um médico psiquiatra
conhecido no Rio, e estaria sempre, de uma forma ou de outra, próximo de
mim.
E o destino decidiu que eu ainda ouviria falar muito do João.
João Dionísio Filgueira Barreto Amoêdo.
João Amoêdo.
 
Capítulo 2
Quando Éramos Jovens e Sabíamos Tudo
 
Como o próprio João já contou[4], o Partido Novo começou com uma
conversa que nós dois tivemos e, durante um bom tempo, foi um projeto
limitado a ele, eu e nossas famílias.
Mas é preciso voltar um pouco mais no tempo para conhecer a história por
inteiro – ou, pelo menos, as partes que eu conheço e posso contar.
 
 
Quando saímos do Santo Inácio, eu fui cursar Engenharia Civil na PUC,
Marcelo foi cursar Medicina na UFF e o João foi fazer Engenharia Civil na
UFRJ e, ao mesmo tempo, Administração da PUC. Mantínhamos um
contato infrequente, mas continuávamos amigos. Lembro de um dia, em
1982, quando saímos para comer uma pizza com um grupo de amigos do
João. O tópico de discussão era as próximas eleições para governador, e o
candidato favorito era Leonel Brizola. No grupo estava uma menina muito
bonita, que atraía todas as atenções. Pouco tempo depois eu a reconheceria
nas telas de tevê: era Malu Mader.
Em 1984, meu último ano de faculdade, fiz vários concursos públicos e,
antes de saber dos resultados, comecei a trabalhar na então Arthur
Andersen, uma empresa de consultoria americana que começava no país.
João foi trabalhar no Citibank e sugeriu que eu fizesse uma entrevista no
banco. Mas, a essa altura, eu já havia sido aprovado nos concursos para a
Vale do Rio Doce (na época uma estatal) e para a Petrobras, onde fui
trabalhar.
O tempo passou e fomos perdendo o contato. Um dia encontrei um amigo
em comum, Marcelo Lessa, colega da Petrobras, que me contou a novidade:
“João saiu do Citibank. Foi contratado para ser diretor de outro banco
ganhando mais que o chefe do seu chefe”.
Essa foi a última notícia que tive do João por um bom tempo. Marcelo
Ciuffo e eu nos reaproximamos – ele já médico formado. Era o final dos
anos 1980, e o Brasil era um lugar complicado para se viver. A inflação alta
tornava a vida difícil, e a criminalidade já projetava sua sombra escura
sobre o dia a dia do carioca. O trabalho na Petrobras – na área de suporte de
sistemas de mainframe – não me satisfazia, e eu não conseguia ver qualquer
perspectiva de melhora; nem para o trabalho, nem para o país.
Coloquei na cabeça que iria embora. Entrei para o curso de inglês Brasas e
comecei a estudar francês na Aliança Francesa. Junto com colegas de
trabalho, contratei um professor de inglês chamado Gary, que nos dava aula
nos canteiros na frente do edifício-sede da Petrobras, na hora do almoço.
Entre os alunos estava Pedro Cintra, que sairia da Petrobras para fazer
brilhante carreira no exterior trabalhando, entre a Europa e os EUA, nas
empresas Amadeus, Intel e agora na Google. Na minha ânsia de ir embora,
inscrevi-me em vários programas de bolsa de estudos no exterior.
Em 1989 meu esforço deu resultado: fui chamado para fazer entrevistas
para uma posição de consultor do Banco Mundial em Washington DC, com
especialização em sistemas DEC/VAX. Fui, fiz as entrevistas e voltei. Um
dia recebo uma ligação dizendo que aquela vaga havia sido cancelada, mas
que surgira outra em uma área que eu também dominava: mainframes IBM.
Será que eu tinha interesse? Lá fui eu outra vez para Washington DC para
mais uma série de entrevistas.
No final do ano, recebi a confirmação do Banco Mundial de que o
emprego era meu, ao mesmo tempo que fui aceito em um programa de
bolsa de estudos para MBA na Universidade de Louvain, na Bélgica.
Escolhi o Banco. Vendi meu Chevette 1984 e no dia 27 de dezembro de
1989, enquanto uma tempestade de verão caía sobre o Rio, peguei um voo para
Washington com conexão em Nova York.
Fui embora para não voltar.
 
 
Parênteses: comentei com colegas da Petrobras sobre o programa de
bolsas da Bélgica e, no ano seguinte, dois deles – Marcos Sobral e Marcelo
Lessa – se inscreveram e ganharam bolsas de MBA. Por sua vez, Marcos
Sobral comentou sobre o programa com um amigo dele, Eduardo
Bartolomeo, que também se inscreveu e foi estudar na Bélgica. Eduardo
hoje é CEO da Vale. Fecha parênteses.
 
Nos Estados Unidos, como disse Guimarães Rosa, eu fui “feliz e infeliz,
alternadamente”. O trabalho no Banco Mundial me realizava
profissionalmente e durante muito tempo vivi uma vida quase perfeita. Três
meses depois de chegar aos EUA, no dia do meu aniversário – 22 de março
de 1990 –, entrei em uma concessionária só para olhar os carros na vitrine,
e saí dirigindo um Honda Civic último modelo – talvez o carro mais
sofisticado que já tive. Até o cinto de segurança do motorista era
automático. Viajei bastante pelos EUA, especialmente pelo Colorado, onde
morava uma americana que namorei por quase um ano. Mas o estilo de vida
era muito solitário e a saudade da família era grande. Esses eram tempos
pré-internet e chamadas telefônicas internacionais eram caras. Eu mantinha
contato esporádico com os amigos do Brasil.
Em 1994 decidi voltar de vez ao Brasil. Fui trabalhar na Shell como
Gerente de Infraestrutura de Tecnologia. Retornei ao Brasil com olhos de
estrangeiro. Tudo parecia estranho e errado, dos apontadores do jogo do
bicho em cada esquina ao trânsito que parecia não obedecer a lei alguma.
Quando minha mudança chegou, fui fazer o desembaraço na alfândega.
Tudo o que eu trazia na mudança deveria ser, por lei, isento de qualquer
imposto, e para isso eu já tinha cumprido com todos os procedimentos
burocráticos no consulado brasileiro em Washington. Mas o fiscal
encarregado da liberação dos meus pertences resolveu mudar a regra e me
cobrar o imposto do qual eu era isento. Quando eu disse que a lei me
isentava de impostos, ele respondeu: “A lei aqui sou eu”. Era assim que o
país me recebia de volta.
Eu me indignava, acima de tudo, com o crime. Nos quatro anos e meio
em que morei nos EUA nunca conheci uma única pessoa que tivesse sido
vítima de um crime. Meu chefe no Banco Mundial, o sueco Anders
Bergvind, deixava a porta de casa destrancada para a faxineira entrar. Isso
em Washington DC, cidade que, na época, era considerada uma das mais
violentas dos EUA.
Retomei contato com Marcelo e João. Marcelo logo se tornou meu
amigo mais próximo e confidente. Casado com Ivna, uma linda morena de
olhos verdes e muitos centímetros a mais que ele, Marcelo já tinha dois
enteados (do primeiro casamento dela) e uma filha, Carolina.
Com João meus contatos eram menos frequentes. Falávamos de vez em
quando por telefone e nos encontrávamos quando eu ia a São Paulo. A
transformação dele tinha sido impressionante: o menino tímido e quieto que
conheci no Santo Inácio tinha se tornado uma das figuras mais conhecidas
do mercado financeiro. Descobri, surpreso, que todos os meus amigos e
conhecidos ligados a finanças falavam dele com respeito. À medida que
subia no mundo dos negócios, ele adotava o esporte como válvula de
escape. Além de já ter completado inúmeras maratonas, ele agora competia
em nível profissional em provas de Ironman, a modalidade mais dura de
triátlon.
Um triátlon é uma competição de natação de 3 mil metros no mar,
seguida por um trecho de bicicleta de 180 km (o equivalente a ir do Rio a
Búzios), seguida de uma maratona – 42 km de corrida. João também fazia
windsurfe, esporte que eu havia aprendido quando ainda morava nos EUA.
João parecia conhecer todo mundo que tinha alguma relevância no
Brasil. Um de seus companheiros de competições era o João Paulo Diniz,
herdeiro de Abílio Diniz, dono do grupo Pão de Açúcar. Ele era próximo de
Fernão Bracher, de quem foi sócio no BBA.
Uma vez fui com ele a uma reunião na Casa das Garças, um think tank
localizado em uma mansão no Jardim Pernambuco, no Leblon. Acabada a
reunião, um grupo se formou em volta do João. Um senhor alto me
estendeu a mão, apresentando-se: “Prazer, Pedro Malan”. Eu só consegui
sorrir e gaguejar: “Eu sei quem você é”.
 
 
Em 2001 aconteceu um incidente que me impressionou pela forma como
expôs a fragilidade da nossa segurança no Brasil. Um dos funcionários da
minha antiga equipe da Shell, Alexandre, se preparava para atravessar uma
rua de Niterói, de mãos dadas com seus dois filhos, quando um carro furou
o sinal em alta velocidade, quase atropelando os três. Ele reclamou em voz
alta – pode ter dito um palavrão – e continuou a andar. Um pouco à frente,
pressentindo algo, ele se virou e viu o carro parar e dele desembarcar um
homem, que assumiu posição de tiro e disparou três vezes uma pistola em
sua direção. Alexandre estava de mãos dadas com os filhos e parado em
frente a um ponto de ônibus lotado. Ele caiu ferido por um dos disparos,
que ricochetou em sua omoplata e perfurou seu pulmão. O atirador retornou
calmamente ao seu carro e saiu sem pressa pela manhã ensolarada de
Niterói.
 
 
 
Em 2002 me casei com a mulher da minha vida, Alexandra, na Igreja da
Glória. Marcelo e Ivna foram padrinhos. Nosso primeiro filho, João Felipe,
nasceu em outubro de 2003.
 
 
Em nossos encontros eu sempre dizia ao João: “Você já resolveu sua
vida. Tem que voltar para o Rio, comprar uma lancha e uma casa em Angra
e aproveitar”. Um dia descobri que ele tinha feito exatamente isso.
No verão de 2004 ele nos convidou para um final de semana na casa que
estava alugando em Angra dos Reis. Fomos eu, Alexandra, João Felipe (na
época com apenas um ano de idade), Marcelo Ciuffo e Ivna. Um episódio
desse final de semana foi muito curioso.
A casa era na beira do mar e, bem em frente, a mais ou menos um
quilômetro, ficava uma daquelas pequenas ilhas paradisíacas que existem
em Angra. Combinamos, Marcelo, João e eu, de ir nadando até lá. Por
segurança – como eu não era nenhum atleta de elite – resolvi colocar um pé
de pato. Quando João percebeu, disse: “Ah, então vou colocar uma roupa de
neoprene para melhorar a flutuação”, como se estivéssemos em uma
disputa. Eu e Marcelo rimos muito disso. Claro que João chegou à ilha
primeiro. A casa também tinha uma mesa de totó – futebol de mesa –, e as
partidas eram, previsivelmente, disputadíssimas. Foi um final de semana
maravilhoso.
 
 
Em maio de 2007, Alexandra, eu, Marcelo e Ivna decidimos tirar férias
juntos e viajar aos EUA. O roteiro incluía São Francisco e a região ao norte
da cidade, uma área de vinícolas chamada Sonoma Valley (que Alexandra
insistia em chamar de Napa Valley, que era a região ao lado). Foi uma
viagem mágica – Marcelo devia estar pressentido o golpe que o destino iria
lhe dar pouco depois. A primeira parada da viagem foi San Diego, para
visitar o João e a família, que estavam morando nos EUA por um tempo,
em uma casa alugada em La Jolla.
Marcelo e Ivna ficaram em um hotel, e Alexandra e eu ficamos
hospedados com João e Rosa. Era uma casa de design moderno, dividida
em vários níveis em declive. Ficamos no nível inferior, em um quarto de
hóspedes bonito, confortável e iluminado. A família Amoêdo havia se
adaptado ao american way of life. À noite, sentávamos juntos nos sofás da
sala de TV para assistir Borat, que acabara de ser lançado, e jogar conversa
fora.
 
 
Em novembro de 2010 nasceu nossa filha, Maria Fernanda. Uma das
poucas visitas que recebemos ainda na maternidade foi a de João e Rosa,
que deram de presente a Maria uma corrente de ouro que ela guarda com
carinho até hoje.
Capítulo 3
Enquanto Isso, O Brasil
 
Enquanto isso, o Brasil seguia seu caminho como sempre: aos trancos e
barrancos. Quando fui embora do país, em 1989, Collor tinha sido eleito.
Uma madrugada, já morando em Bethesda, subúrbio de Washington DC, fui
acordado pelo toque do telefone: do outro lado da linha, meu amigo Fábio
Sampaio me informava que Collor havia congelado a poupança.
Acompanhei de longe o drama do seu impeachment. Quando voltei ao
Brasil em 1994 o presidente já era Itamar, e o plano Real, de combate à
inflação, tinha sido recém-implantado e já dava resultados.
 
Quem tem menos de 50 anos não sabe o que é inflação. A febre de
desvalorização da moeda e aumento de preços foi contraída pelo Brasil no
início dos anos 1980, e atingira seu ápice em março de 1990, quando o
índice de inflação atingiu 80% ao mês. As coisas quase dobravam de preço
de um mês para o outro. O Brasil já tinha feito várias tentativas de debelar
esse monstro. Seis “planos econômicos” já haviam sido tentados: Plano
Cruzado e Plano Cruzado II (1986), Plano Bresser (1987), Plano Verão
(1989), Plano Collor (1990) – foi esse que congelou a poupança – e Plano
Collor II (1991).
 
Quando ninguém tinha mais qualquer esperança, Fernando Henrique
Cardoso, então ministro da Fazenda de Itamar Franco, reúne um grupo de
economistas jovens e ousados e pimba: dá um tiro certeiro no dragão
inflacionário.
 
Agora o Brasil decola, eu pensei. E durante muito tempo mantive esse
pensamento, principalmente depois que, em 1995, FHC foi eleito
presidente. Meu entendimento de política e assuntos associados –
economia, ideologia, filosofia, história e tantas outras coisas – ainda era
incipiente. Tudo o que eu conseguia fazer na época era comparar o currículo
de FHC – intelectual, poliglota, professor de universidades estrangeiras,
comandante do Plano Real – com o de seus predecessores imediatos e de
outras personalidades poderosas do meio político. A diferença era
gigantesca, a favor de FHC. Votei nele em 1994 e 1998, com convicção.
 
Um grande marco da época foi a privatização das estatais de
telecomunicação, dinossauros pré-históricos que só serviam para enriquecer
políticos. Telefonia no Brasil era uma piada. Você comprava uma linha de
telefone fixo. A espera pela instalação levava até quatro anos. Uma linha
telefônica era considerada patrimônio – devia ser informada na sua
declaração de imposto de renda.
 
A privatização ocorreu em 1998, e incluiu todas as empresas estaduais
de telecomunicação – na época, cada estado tinha uma. A empresa do Rio
era a Telerj. Eu já havia saído da Shell e trabalhava na HP, uma
multinacional de informática. Meu nome foi recomendado por Silvio
Genesini, ex-sócio da Arthur Andersen (na época já rebatizada de Andersen
Consulting), para ser um dos gerentes da área de tecnologia da Telemar, a
recém-criada holding que passou a controlar 16 antigas empresas estaduais
de telecomunicação, do Rio de Janeiro ao Amazonas.
 
Comecei no meu novo emprego em janeiro de 1999 e entendi ainda
melhor o estrago que a política patrimonialista faz no Brasil. Uma de
minhas missões foi revisar todos os contratos existentes da área de
informática. Descobri que uma famosa multinacional tinha um contrato
milionário de aluguel de um computador mainframe para uma operadora
estadual, sem que ninguém soubesse dizer onde estava o computador.
Desperdício e ineficiência eram a regra.
 
Embora incomodado com isso – e com coisas que via nas ruas e na mídia
–, eu mantinha uma distância segura da política. O máximo que eu fazia era
escrever. Em outubro de 1999, a revista Você S.A. publicou meu artigo “Por
que os Estados Unidos são o que são – Quatro lições que aprendi na
América[5]”. Fora disso, meu foco era minha vida pessoal e minha carreira.
 
Confesso que não me lembro em quem votei na eleição presidencial de
2002. Acho que foi no Serra. Meu estado de indiferença em relação à
política permanecia o mesmo. Mas, quando o Jornal Nacional mostrou uma
matéria especial sobre Lula, com um trecho em que ele recebia a faixa
presidencial das mãos de FHC, eu me emocionei. O menino de Garanhuns –
um operário! – virando presidente.
 
Esse país está mesmo mudando, eu pensei.
Quanto tempo foi preciso até que percebêssemos o que estava
acontecendo de verdade? – que o Brasil estava sob o comando de uma
quadrilha? É difícil dizer com certeza. Mas os sinais não demoraram a
aparecer.
No período de 2003 a 2006 trabalhei na área comercial de algumas
empresas de tecnologia, e histórias sobre conversas esquisitas e pedidos
estranhos de funcionários de estatais ou de governos se multiplicavam. Mas
não era possível, eu pensava comigo mesmo. É o Partido dos Trabalhadores
que está no poder. Como é que alguém pode estar sugerindo práticas
ilícitas? Nesse período, profissionalmente turbulento, aprendi o que
significava fazer negócios com o governo e como a lei 8.666, que regulava
as licitações públicas, tinha gerado um ecossistema especializado em burlar
licitações. Era inacreditável.
Em 2005 estourou o Mensalão. Segundo uma denúncia, o Partido dos
Trabalhadores havia pago 30 mil reais por mês a vários deputados para que
aprovassem legislação de interesse do partido. O dinheiro vinha dos
orçamentos de publicidade das empresas estatais, canalizados através de
uma agência de publicidade.
Era o primeiro sinal. Mas Lula foi poupado e se reelegeria em 2006.
No final de 2006, em uma viagem de trabalho aos EUA, ouvi falar de
uma tecnologia da empresa ShotSpotter que detectava disparos de armas de
fogo e informava sua localização à polícia em menos de 15 segundos. Vou
ficar rico vendendo isso no Brasil, pensei. Eu sabia que a situação de
segurança era crítica. Se havia algum mercado para aquela tecnologia, era
no Brasil.
Em 2007 criei uma empresa – a American Security International do
Brasil – e negociei com a ShotSpotter a representação comercial exclusiva
para o país. Andei por todo o Brasil fazendo reuniões e apresentações sobre
a tecnologia, ao mesmo tempo que aprendia como funcionava nosso sistema
de segurança pública. Me espantavam o atraso, a improvisação e as práticas
estranhas que eu descobria. Segurança pública viria a se tornar um de meus
interesses principais. Acredito que posso dizer que eu, um engenheiro civil
com mestrado em gestão de empresas, sou hoje uma das pessoas que
melhor compreende – e explica – o processo de degradação de nosso
sistema de justiça criminal.
Como empreendedor, fui extremamente ingênuo. Achei que conseguiria
prosperar vendendo um produto cujo único cliente era o Estado, sem
precisar flexibilizar meus padrões éticos e morais. Foi uma experiência
duríssima. Conseguimos vender dois projetos piloto: um para o governo do
Rio de Janeiro em 2010, que foi instalado na Tijuca (e que ajudou na
proteção à Copa do Mundo de 2014), e outro para o município de Canoas,
no Rio Grande do Sul, em 2011. Embora os resultados dos projetos
tivessem sido excepcionais (Canoas registrou queda de 41% no número de
homicídios[6]), a burocracia excessiva, a lentidão interminável e os pedidos
impróprios – que aconteciam frequentemente – me levaram a uma decisão
amarga: fechar a empresa.
A essa altura o país começava a perceber o que eu já tinha descoberto:
que o Partido dos Trabalhadores tinha se tornado uma grande decepção.
 
Em 2007 me envolvi com uma iniciativa chamada Projeto de Segurança
de Ipanema, criada e conduzida por Inês Barreto, uma líder comunitária,
com o objetivo de cuidar da segurança do bairro. Foi minha primeira
experiência com ativismo. Foi nessa época que mandei uma carta aberta ao
então presidente da OAB do Rio de Janeiro, Wadih Damous, pedindo a
ajuda da entidade no combate ao crime (eu continuava ingênuo).
Comecei a participar da Associação de Moradores de Ipanema. Era
preciso fazer alguma coisa. Comecei a levar sacos de lixo industrial para a
praia e fazer uma faxina geral em um raio de 20 metros ao meu redor. Até
hoje – para vergonha dos meus filhos – mantenho esse hábito.
O ano de 2007 era o primeiro ano do mandato de Sérgio Cabral como
governador do Rio de Janeiro. Entre as novidades, ele havia empossado um
delegado da Polícia Federal como secretário de Segurança, José Mariano
Beltrame. Tudo indicava uma grande diferença entre o novo secretário e
seus predecessores, que marcaram o Rio de Janeiro com desempenhos
medíocres e a utilização da Secretaria como trampolim para a política
eleitoral.
O Rio de Janeiro sentia renascer, mais uma vez, a esperança de que as
coisas pudessem mudar. Por razões profissionais – eu havia acabado de
fundar uma empresa de tecnologia de segurança –, eu acompanhava de
perto as notícias sobre criminalidade. Uma das minhas principais fontes de
informação era a coluna Repórter de Crime, do jornalista Jorge Antônio
Barros, com quem eu, às vezes, me correspondia por e-mail.
Em agosto de 2007, Jorge pediu a seus leitores sugestões de perguntas
para o novo secretário de Segurança. A melhor pergunta seria enviada ao
secretário e a resposta publicada na coluna. Minha pergunta foi baseada em
uma notícia veiculada nos jornais cariocas pouco tempo antes. Um dos
acusados pelo sequestro, tortura e morte do jornalista Tim Lopes em 2002 –
o criminoso Eliseu Felício de Souza, o Zeu –, que havia sido condenado a
23 anos e seis meses de prisão pelo crime, recebera o benefício da
progressão para o regime semiaberto depois de menos de cinco anos preso,
e imediatamente fugira. Minha sugestão de pergunta para o secretário foi:
“Prezado secretário, a fuga desse criminoso revela a existência de uma
lei absurda. Presos condenados por crimes como esse não podem receber
benefício algum. Por que o senhor e os outros secretários de Segurança do
Brasil não se mobilizam e vão à Brasília mudar essa legislação?”
A resposta do secretário não era a que eu esperava. Ele respondeu:
“Roberto, essa é uma tarefa da sociedade. É a sociedade que precisa se
mobilizar”.
Resolvi levar a recomendação do secretário a sério, e segurança pública
veio a se tornar minha pauta principal. Eu não imaginava as surpresas que o
destino me preparava: em 2018 eu dividiria um palco com o próprio
Beltrame, em uma apresentação sobre segurança pública para a equipe do
projeto Segurança Presente, no auditório do Maracanã. Mas as surpresas
maiores vieram no final daquele ano. Primeiro, fui nomeado um dos
coordenadores da equipe de transição do recém-eleito governo estadual,
com a missão de conduzir a transferência da gestão da segurança pública do
Rio da equipe do Gabinete de Intervenção Federal para as recém-criadas
Secretarias de Polícia Civil e Militar. Em seguida fui nomeado Secretário de
Segurança, exercendo o cargo por um curto período.[7].
 
 
Voltando a 2008: eu conversava com meu amigo David Zylbersztajn,
primeiro Diretor Geral da Agência Nacional de Petróleo, quando soube que
Fernando Gabeira seria candidato a prefeito do Rio. Considero Gabeira uma
figura singular de nossa cena política e intelectual. Li seu livro O Que É
Isso Companheiro? aos 18 anos e fiquei impressionado. Suas posições
políticas se originaram de convicções, nunca da busca por fama, poder ou
riqueza. Quando suas convicções mudaram, ele mudou de posição. Isso o
levou da extrema-esquerda – da guerrilha das décadas de 1960/70 – para
uma posição de não alinhamento com posições ideológicas puras. Gabeira
fez o mea-culpa a respeito do socialismo que a maioria dos intelectuais
jamais teve a coragem moral de fazer. Ele enfiou o dedo na cara do então
presidente da Câmara, Severino Cavalcanti, acusado na época de receber
dinheiro em troca da concessão do restaurante da Câmara dos Deputados.
As palavras de Gabeira para Severino ainda ecoam no Congresso Nacional:
“A sua presença na presidência da Câmara é um desastre[8]”.
“Por que não conversamos com ele?”, perguntou David. “Quem sabe
podemos ajudar.” Topei na hora – e logo comentei a história com o João
Amoêdo e perguntei: “Você não quer conversar com o Gabeira também?”.
Ele queria, e a primeira reunião foi marcada no escritório do David, que
ficava no início da rua Visconde de Pirajá, próximo ao canal do Jardim de
Alah. Gabeira é uma figura impressionante: calmo, seguro, articulado e
extremamente culto. Ele se expressa com clareza e concisão, e ouve com
atenção. Sua esposa, Neila Tavares, sempre envolvida com suas campanhas,
é inteligente, gentil e observadora afiada da cena política.
João já tinha voltado de vez para o Rio e morava em um apartamento
moderno ao lado do Country Club. Nos encontrávamos de vez em quando,
no Rio ou em São Paulo, onde ele passava alguns dias por semana cuidando
de seus negócios.
O projeto do Gabeira nos entusiasmou. Era a chance de fazer alguma
coisa de concreto pelo Rio. Minha preocupação principal já era com
segurança pública. Participei de algumas reuniões no comitê eleitoral do
Gabeira, que ficava na esquina da Av. Rio Branco com a rua da Candelária.
Um dos coordenadores do programa de governo era o Eloy Fernandez y
Fernandez, e a comunicação ficou com o Moacyr Góes. Preparei um
material apresentando uma série de medidas para dar à Guarda Municipal
protagonismo no combate ao crime, usando inovações tecnológicas e
operacionais (isso em 2008!). Gabeira fazia campanha com o coração;
lembro de alguém dizendo que ele abandonava os scripts preparados e
gravava seus programas eleitorais falando o que lhe vinha à mente – e ele
fazia isso muito bem.
Tão bem que, na votação do primeiro turno, que aconteceu no dia 5 de
outubro de 2008, Gabeira ficou em segundo lugar, com 839.994 votos,
enquanto Eduardo Paes ficou em primeiro com 1.049.019 votos. Dobramos
a energia e o entusiasmo. Infelizmente, como tantas vezes acontece em
política, não era para ser: Gabeira perdeu a eleição no segundo turno por
uma diferença minúscula: de apenas 1,66% de votos válidos. O governador
Sérgio Cabral havia decretado feriado às vésperas da eleição, e muita gente
viajou. Gabeira perdeu a eleição por aproximadamente 45.000 votos. A
imprensa estimou que 90.000 cariocas viajaram no feriado.
Fico imaginando como a história do Rio – e nossas histórias pessoais –
teriam sido diferentes se Gabeira tivesse vencido aquela eleição. De
qualquer forma, aquela campanha teve um efeito importante, ainda que
indireto e não premeditado: foi aí que João e eu começamos a falar mais a
sério sobre política.
 
 
Ainda em 2008, em um dia quente no final de novembro, tocava meu
celular. Era João. “Motta, tem um minuto?” Eu saí da sala de reunião onde
estava e fui para o corredor. João queria minha opinião: Eduardo Paes o
havia convidado para ser secretário de Finanças. Aceito ou não? João queria
saber. “Claro”, eu respondi. “É uma oportunidade fantástica.” Conversamos
muito; João não tinha certeza se teria a independência necessária.
 
O prazo para dar a resposta era de poucos dias. Era realmente uma
responsabilidade grande. No final, João decidiu mandar um e-mail para
Eduardo Paes estabelecendo os termos nos quais ele aceitaria assumir o
cargo. Ele pediu que eu o ajudasse revisando o texto. Era um e-mail duro:
se me lembro bem, havia mais de dez itens com as condições exigidas por
João. A primeira dizia que o secretário deveria ter total autonomia para
tomar decisões técnicas, sem qualquer interferência política. O resto do
texto era no mesmo tom.
 
João enviou o e-mail, e ficamos – os dois – em uma grande expectativa.
Os dias se passavam, e não vinha nenhuma resposta.
 
Uma semana depois, Eduardo Paes anunciava a economista Eduarda La
Rocque como secretária de Fazenda.
Capítulo 4
E Se Fundássemos Um Partido?
 
No período que se seguiu à campanha do Gabeira, João e eu
continuávamos procurando uma forma de ajudar o país. Uma vez, fomos
almoçar no restaurante Gula Gula que ficava na rua Henrique Dumont, em
Ipanema, com uma conhecida dele, diretora de um projeto chamado Rio
Como Vamos, uma ONG que produzia indicadores sobre o Rio. Mas criar
uma ONG não parecia ser o caminho. Ouvimos falar de um milionário
africano que tinha criado uma espécie de “prêmio Nobel” anual para os
melhores gestores públicos da África, e durante um tempo debatemos essa
ideia e rascunhamos um projeto, mas isso também não nos entusiasmou.
Conversávamos com ativistas, empreendedores, políticos – chegamos até a
mandar um e-mail para o então senador Jarbas Vasconcelos em resposta a
uma declaração dele sobre renovação política. Nada ia para a frente.
Até que, no início de 2009, voltamos mais uma vez ao assunto, muito
provavelmente durante um jantar em um restaurante da rua Amauri, em São
Paulo. Falamos primeiro de esportes – de windsurfe e de natação, que eu,
na época, praticava com assiduidade. João comentou sobre um banqueiro,
conhecido seu, que deixara de frequentar a academia porque isso “lhe tirava
o foco”. (Não vou citar o nome do banqueiro.) Rimos daquela tolice.
Quando mudamos o assunto para a política, eu sugeri: “E se fundássemos
um partido?”.
A ideia ficou no ar. Nos inspirava, entre outras coisas, a história de
Sergio Fajardo Valderrama, ex-prefeito de Medellín, na Colômbia, entre
2004 e 2007. Doutor em matemática, Sergio, segundo o que escutávamos,
tinha feito uma gestão independente e técnica com grande aprovação
popular e, em seguida, lançara-se candidato à Presidência com uma
plataforma sem ideologia.
A ideia parecia perfeita: uma política sem ideologia, centrada na gestão,
executada por técnicos e tendo, como única finalidade, o bem comum.
Em março de 2009 já discutíamos qual seria a melhor estratégia. João
tinha dúvidas se seria melhor encontrar uma forma indireta de ajudar ou se
deveríamos entrar direto na política, com um partido diferente.
Em 9 de novembro daquele ano, João sugeriu que começássemos a
pensar os pontos básicos do partido: objetivo, princípios, ações e estrutura.
No dia 18 de novembro, eu enviava a ele um documento chamado “Partido
Novo”, com o seguinte texto:
Um Novo Partido Político Brasileiro
18 de Novembro de 2009
Objetivo
O Novo Partido será o canal de expressão de ideias e de uma visão política que não
encontram ressonância nos partidos e organizações políticas existentes. O debate e a ação
política no Brasil encontram-se dominados e prejudicados por uma divisão maniqueísta,
ultrapassada e estéril entre esquerda e direita, e por uma visão patrimonialista que tem
como principal objetivo o uso da máquina administrativa para objetivos pessoais e
políticos. O resultado é um Estado inchado, ineficiente e com índices de transparência
baixíssimos, incapaz de prover serviços e bens públicos compatíveis com a carga tributária
e com o tamanho da máquina estatal.
Os objetivos principais do Novo Partido são:
Unir todos os cidadãos brasileiros que não aceitam o estado atual de nossas
instituições políticas em torno de uma ação efetiva de mudança.
Trazer para o debate político e para a ação legislativa e executiva ideias modernas
e inovadoras, e uma ação efetiva na construção de um país moderno onde todos
desfrutem de liberdade, segurança, saúde e oportunidades de progresso social e
material.
Promover a inovação e modernização da administração pública, de acordo com as
melhores práticas de gestão.
Desenvolver novos talentos para a gestão e administração pública.
Reduzir a carga tributária.
 
Princípios
Representação política esclarecida e adequada. Voto distrital. Voto não
obrigatório.
Responsabilidade individual. Cada indivíduo é livre para fazer suas escolhas, e
deve arcar plenamente com os ônus e consequências dessas escolhas.
Redução da carga tributária. O Estado é péssimo administrador e investidor de
recursos; é melhor que o dinheiro fique com o cidadão, que pode utilizá-lo da
forma que mais lhe convier.
 
 
 
 

No final de 2009 Marcelo Ciuffo descobriu um tumor maligno no rim.


Foi submetido a uma cirurgia, mas, aparentemente, o médico hesitou
quando deveria ter retirado todo o órgão, e parece que não conseguira
extrair todos os gânglios contaminados.
Em fevereiro de 2010 o resultado de um exame feito por meu pai indicou
um tumor maligno no pâncreas, com prognóstico de três meses de vida.
Começaria uma rotina de internações, quimioterapia e muito sofrimento.
 
 
 

Um dia – não me lembro exatamente da data – fui convidado para uma


reunião no escritório que o João mantinha na rua Afrânio de Melo Franco,
no Leblon, ao lado das Lojas Americanas. O assunto era a criação de um
partido. Lembro que estavam presentes, além de João e eu, Fábio Ribeiro,
sócio do João no mercado financeiro de São Paulo, e Ricardo Taboaço, que,
além de amigo do João, era seu ex-colega de Citibank e executivo
conhecido no mercado financeiro do Rio. Não me recordo da presença de
Marcos Alcântara Machado ou Christian Lohbauer nessa reunião, mas eles
logo passariam a integrar aquele grupo[9]. Todos os que estavam reunidos ali
eram pessoas excepcionais: preparadas, bem relacionadas e muito bem-
sucedidas.
Todos aprovaram a ideia de criar um partido. A discussão passou a ser
então sobre o que era necessário. “Será preciso coletar 490 mil assinaturas,
com um número mínimo a ser alcançado em nove estados”, alguém
informou. “Moleza”, disse outro participante da reunião que ainda afirmou:
“Com organização, em seis meses está tudo pronto”.
Era o primeiro passo.
Logo se estabeleceu entre João e eu uma divisão de tarefas muito clara:
João cuidaria do processo de formalização do partido – a coleta de
assinaturas, os procedimentos jurídicos e o levantamento dos recursos
financeiros – enquanto eu dedicaria a maior parte do meu tempo à
construção do ideário do partido, à divulgação das ideias e à atração de
filiados. Minha paixão era evangelizar; ver o brilho nos olhos das pessoas
quando elas compartilhavam meu sonho de um país melhor e possível. De
certa forma, cada um – João e eu – seguiria a sua vocação.
 
 
 

Em abril de 2010 eu mandava para João um conjunto de slides chamado


“Um Novo Partido”. O primeiro slide definia o que seria esse partido:
Uma organização que prepare e eleja melhores representantes legislativos e
executivos.
Mas por que criar um partido? O segundo slide explicava:
Porque os partidos atuais estão engajados em uma política viciada onde
interesses particulares se sobrepõem aos públicos.
Porque o nível dos representantes legislativos e executivos é muito ruim.
Porque é preciso resolver graves problemas que a atual classe política não tem
interesse nem capacidade de enfrentar.
O terceiro slide listava o que seriam as “crenças básicas” do partido:
Fora com a política profissional.
Fora com o crime na política.
Pragmatismo: ideias que virem ações.
Inovação e criatividade.
Privilegiar a iniciativa e promover a responsabilidade individual.
Os slides seguintes continham o primeiro esboço das regras e propostas
do partido: os candidatos deveriam ter preparação adequada e ficha limpa.
O slide 7 apresentava uma regra importante:
Ninguém pode ser candidato à reeleição no mesmo cargo. Depois do mandato, o
membro volta ao partido para treinar futuros candidatos ou retorna à sua profissão
original.
É exatamente isso: a regra original não permitia nem mesmo uma
reeleição. Eu tinha uma forte convicção sobre esse ponto, compartilhada
pelo João. Só posteriormente é que a regra foi alterada para permitir uma
única reeleição.
 
 
No dia 27 de abril eu publicava na minha página pessoal no Facebook[10]:
Alguém aí topa fundar um novo partido? Sem políticos profissionais. Trazer
ideias inovadoras e ação efetiva, modernizar a administração pública, reduzir
impostos, implantar o voto distrital não obrigatório. Interesse público acima do
privado. Visão de longo prazo. Cumprimento da lei. Iniciativa e responsabilidade
individual. Menos leis, alinhadas com o mundo real. Um novo partido: tô falando
sério. Alguém topa?
O post recebeu um like e quatro comentários. Um deles foi do João:
Também estou dentro. O desafio inicial é termos os conceitos claros,
difundidos e assim agregarmos as pessoas. Nada é impossível.
No dia 28 eu criava uma "causa" – uma página especial para ações
ativistas no Facebook, que não existe mais – chamada "Um Novo Partido
Político":
Meus amigos, a tecnologia se junta com a indignação em um momento
histórico. Chegou a hora de criarmos um novo partido político, que seja a
expressão da nossa insatisfação e o instrumento da criação do futuro que
queremos e merecemos. Chega de reclamar e se frustrar em um sistema que foi
montado para que os mesmos se perpetuem no poder. Vamos mudar o sistema!
Precisamos de 1 milhão de assinaturas, e de todas as sugestões e ideias que
vocês tiverem.
 
 
Enquanto meu pai lutava contra o câncer terminal, minha mãe descobrira
um tumor no seio esquerdo – o direito já havia sido removido – e
começamos a planejar a mastectomia. Marcelo Ciuffo começava as sessões
de quimioterapia.
 
 
Em maio de 2010 enviei ao João um texto que circulava na época,
escrito, pelo que me lembro, por um publicitário famoso, e que começava
com a frase “O problema do Brasil político é a falta de uma proposta para o
país. Partidos e políticos, sem convicções, acabam orientados por pesquisas
e marqueteiros. Como as pesquisas são as mesmas, todos os políticos falam
o que o povo quer ouvir. E não o que o povo precisa ouvir”.
E completava:
Políticos têm que manter suas convicções. Não podem vendê-las na baixa e
comprá-las na alta.
Os políticos ficam procurando marqueteiros, quando deveriam procurar
economistas, gestores, urbanistas e antropólogos.
Hoje, no Brasil, quem tem inteligência é frio. E quem tem coração ou não
tem visão, ou não tem gestão.
O mais interessante era a parte final: os passos recomendados para um
candidato a prefeito do Rio:
1.                Fazer um plano.
2.                Conquistar early-adopters.
3.                Conquistar a Zona Sul.
4.                Conquistar o tecido político.
5.                Conquistar o funding.
6.                Partir para o povo.
 
 
 
 
Meu pai morreu em 2 de maio de 2010. João e Rosa foram ao velório, na
capela do cemitério São João Batista. Marcelo Ciuffo não foi porque estava
hospitalizado, fazendo quimioterapia.
Meu pai foi cremado, e joguei suas cinzas no mar, da Pedra do Arpoador.
Uma semana depois minha mãe entrava na sala de cirurgia para a
mastectomia.
 
 
Foi em maio de 2010 que eu coloquei o Novo no Facebook criando uma
página e um grupo. No dia 24, a pedido do João, eu acrescentava uma
notícia na página: de janeiro a abril de 2010 o governo federal gastara 63%
a mais com publicidade que no mesmo período do ano anterior[11]. João
comentou: “No nosso partido não haverá propaganda do governo, não tem
sentido, nenhum benefício para a população”. No dia 30 de maio eu postei
na minha timeline:
Pessoal, esqueçam as farms, smiles e outras distrações tais do Facebook. Venham para
Um Novo Partido Político - Brasil 2.0. Rebeldia civil, desobediência institucional, tomada
do poder pelos próprios neurônios.
 
Começamos a procurar alguém para fazer o site do partido.
 
 
 
Dado o pontapé inicial, surgiram as primeiras dificuldades – na verdade,
quase uma impossibilidade. Nenhuma figura de peso – alguém capaz de
alavancar a organização e o financiamento do projeto – se interessou em
participar. João procurou várias pessoas de projeção que faziam parte do
seu enorme círculo de relacionamentos, mas ninguém se interessava. Um
dia de manhã, enquanto eu aguardava meu filho terminar uma aula de tênis
no Clube Monte Líbano, meu celular tocou. Era João:
“Motta, vou desistir. Ninguém se interessa, ninguém quer ajudar. Assim
não dá.”
“O que é isso, João?”, respondi. “Desistir nada. Esse é um projeto
importantíssimo. Você vai escrever o seu nome na história do Brasil.”
Essas foram minhas exatas palavras.
 
 
 
Em junho Marcelo Ciuffo fez uma sessão de quimioterapia. Ele deveria
ter tomado dez doses, mas não conseguiu suportar os efeitos e parou na
sétima. No dia 16 de junho, Alexandra, João Felipe e eu jantamos na casa
dele. Marcelo amava a vida e as boas coisas da vida. Ivna – que cozinha
como ninguém – fez salmão na crosta, que comemos acompanhado de
várias garrafas de vinho.
 
 
Aproximava-se a eleição para governador, e tudo indicava que Gabeira
seria candidato. Desta vez o inimigo a ser derrotado se chamava Sérgio
Cabral. Moacyr Góes era de novo o responsável pela comunicação da
campanha. Gabeira não tinha marqueteiro. No dia 9 de agosto, enviei a
Neila, esposa do Gabeira, um e-mail, com cópia para o João, contendo
ideias para o programa de governo. Entre elas, estavam:
[...] a extinção da contratação de agências de propaganda pelo Governo do Estado, a
extinção dos carros oficiais, à exceção dos usados pelo governador e secretários de topo, a
venda dos helicópteros usados pelo Governador, aumento salarial imediato para a Polícia
Militar, integração entre as operações da PM e polícia civil, implantação do Termo
Circunstanciado, para que a PM possa fazer registro de ocorrências de menor potencial
ofensivo, construção de moradias para os policiais e implantação da Ronda do Quarteirão,
seguindo o modelo do Ceará.
Em setembro João achou que precisávamos conversar com alguém de
marketing sobre o projeto do partido – que ainda era só uma ideia – e entrou
em contato com uma famosa publicitária. A resposta dela veio em um
enorme e confuso e-mail, que o João resumiu assim: “Ela me parece estar
acostumada a vender produtos onde a chance de sucesso tem que ser 99%.
O nosso produto, por outro lado, será vendido de graça ao consumidor e já
estamos dispostos a aceitar uma chance de sucesso de 50-60%”. Em um e-
mail de 10 de setembro, eu respondi:
Eu acho que a chance [de sucesso] de criarmos um partido é de 100%, dados os
recursos e esforço necessários. A chance de criarmos um partido que se torne uma força
influente na política nacional eu não consigo estimar, nem acho necessário. O nosso
esforço já terá dado resultados mesmo que o produto seja simplesmente mostrar que há um
grande segmento da sociedade que não se conforma com o esquema atual, e que está
disposto a trabalhar por coisas melhores.
Naquela época ouvimos, pela primeira vez, que havia outro partido em
formação, que iria se chamar Livre. Seria uma dissidência do PV em Minas
– que já teria 100 mil assinaturas.
 
 
O nome do partido foi sugestão de uma das filhas do João. Ao ouvir uma
discussão sobre o assunto, ela teria sugerido: "Não é um novo partido? Por
que vocês não o chamam de Novo?". A ideia era simples e genial. E todos
adoraram o nome.
 
 
No dia 3 de outubro João me mandou um e-mail com um texto publicado
no site de um dos membros de um movimento chamado Endireita Brasil[12],
dizendo: “Precisamos de gente com essa cabeça”. O membro era Ricardo
Salles, que seria candidato a deputado federal pelo Novo em 2018 e depois
ministro do Meio Ambiente do governo do presidente Jair Bolsonaro.
João e eu íamos atualizando e aperfeiçoando o material do Novo no
Facebook. Colocamos um vídeo com denúncias da Cidinha Campos, que
depois foi substituído por um vídeo de Fernando Henrique Cardoso. Com a
aproximação das eleições, o debate esquentava nas redes. Nossas cabeças
iam captando uma imensa quantidade de informações e tentavam processar
tudo aquilo. Em 29 de setembro, por exemplo, eu postava:
E por último: por que aqui todo mundo é de esquerda? Eu não conheço ninguém de
direita. E, se todo mundo é de esquerda, por que no Brasil direitos como segurança,
educação e justiça são desrespeitados diariamente? O que significa ser de esquerda? Para a
maioria, significa isto: usar um certo discurso nas eleições e agir exatamente como os
outros depois. O mundo real, meus amigos, não tem ideologia.
Em uma postagem de 4 de outubro, eu tentava explicar a situação do país
com um exemplo concreto:
Para quem ainda não entendeu: eis aqui os mais votados, que vão decidir nossos
destinos e os dos nossos filhos: Netinho (SP), Tiririca (SP), Moacyr Franco (SP), Leandro e
Kiko do KLB (SP), Popó (BA), Miryan Rios (RJ), Reginaldo Rossi (PE), Batoré (SP) e
Vampeta (SP). Está aí nosso Congresso e nossas Assembleias Legislativas. E nós?
Surgiu uma oportunidade para o João falar com FHC, e eu o encorajei a
aproveitá-la. Pelo que me lembro, o encontro aconteceu, mas, até onde sei,
jamais resultou em qualquer envolvimento de FHC com o partido, ou a
qualquer relação, formal ou informal, com o PSDB.
No final de outubro já tentávamos escolher o logotipo do futuro partido,
e procurávamos pessoas que pudessem nos apoiar nas muitas tarefas com as
quais não tínhamos experiência. Uma dessas pessoas foi o consultor
Cláudio Torres, autor do livro A Bíblia do Marketing Digital. Outro era
Gustavo Portela, um antigo colega do Santo Inácio, que agora era designer
e se ofereceu para produzir a identidade visual do partido. Gustavo nos
apresentou várias propostas para o logotipo. Depois de algum debate,
escolhemos – pelo que me lembro, por unanimidade – a agora conhecida
marca do partido, o “N” com as três pequenas asas do lado esquerdo.
Gustavo também sugeriu a produção de camisetas, que seriam vendidas
para arrecadar fundos para o partido. Comprei uma boa quantidade para
distribuir aos amigos.
Naquele período no final de 2010 e início de 2011, Cláudio, Gustavo,
João, Rosa e eu trabalhamos intensamente definindo as linhas gerais do que
seria o Novo e preparando o partido para participar do processo eleitoral
para prefeitos e vereadores em 2012. Outra pessoa que se interessou muito e
começou a contribuir bastante com o grupo foi Ana Cláudia Moreira.
A expectativa era coletar 500 mil assinaturas em quatro meses; a
realidade se mostraria um pouco mais complicada, como iríamos descobrir.
Foi por essa época que começaram a aparecer ofertas de alternativas
mais rápidas para a criação do partido. Por exemplo: no dia 4 de novembro,
João e eu recebemos um e-mail de um conhecido em comum que dizia:
Conversei com um amigo e ele me fez pensar em uma alternativa. Devem existir
dezenas de partidos nanicos, até sem vereadores. Que tal a gente tentar comprar um desses?
 
A resposta do João foi imediata: 
Infelizmente não dá. Fico imaginando a gente se apresentando: "Nós agora somos os
responsáveis pelo partido XPTO, assumimos a gestão, fizemos um acordo com os antigos
líderes, pois achamos que era muito complicado e trabalhoso conseguirmos 500.000
apoiadores.
 
Era exatamente a minha opinião. “Comprar” um partido – prática
corriqueira no país – me parecia uma violação do princípio mais básico que
nos movia: o de fazer política pelas razões certas e da forma certa. O
conhecido que fez a sugestão de “compra” de um partido acabaria se
tornando um dos caciques do Novo.
 
 
Em novembro também começamos a discutir o estatuto e a estrutura do
partido, com o apoio de um escritório de advocacia. Nesse mesmo mês
contratamos o desenvolvimento do site, um trabalho que eu inicialmente
coordenei e que, a seguir, foi assumido pelo Cláudio Torres. Os domínios
www.partidonovo.com.br e www.novo.org.br foram criados nessa época.
No final do mês já tínhamos representantes escolhidos no Distrito Federal,
Mato Grosso do Sul, Pará e Pernambuco, e João estava fechando o aluguel
de uma pequena sala para a sede do partido em Brasília.
No início de dezembro foi gravado o primeiro vídeo do Novo, produzido
por Ruy Nobre, com um depoimento meu e outro de uma das filhas do
João. O vídeo foi gravado em Copacabana, em um estúdio quase na esquina
de N.S. de Copacabana com Figueiredo Magalhães.
 
 
No dia 6 de janeiro de 2011, João recebia dos advogados a primeira
versão do estatuto, que ele compartilhou comigo. No dia 12, recebíamos as
versões finais.
Começamos a planejar a reunião de fundação do partido.
No dia 11 de janeiro, Cláudio Torres, que monitorava a página do
partido, informava que já tínhamos 35 pessoas cadastradas. No dia 16
março de 2011, começávamos o processo de captação de assinaturas de
apoio com uma postagem na minha página no Facebook:
"Peço a TODOS os meus amigos que cliquem no link, imprimam, preencham e enviem
a ficha de apoio à criação do NOVO (porte pago). Isso não cria compromisso, vínculo ou
filiação – apenas dá ao NOVO o direito de existir como força política. E de oferecer
melhores opções de voto. Essa iniciativa é o resultado de 3 anos de esforços. Não leva mais
que 5 minutos. Envie sua ficha e replique essa mensagem. O futuro agradece."
 
No dia 30 de março, eu publicava o seguinte texto, desta vez na página
do Novo:
 
"É inédito que cidadãos comuns (que nunca tiveram envolvimento com política) achem
que têm direito a voz política própria. É incrível que se mobilizem, atraiam outros
cidadãos, expressem suas ideias de forma clara e objetiva. E o mais difícil de aceitar: que o
façam com seriedade, qualidade e transparência – da mesma forma que conduzem suas
vidas privadas.
Mas é o que estamos fazendo."
 
Eu também produzia, quase todos os dias, uma matéria para o blog do
Novo.
 
 
 
Os aportes financeiros iniciais, até onde sei, foram feitos, na maior parte,
pelo João. A única informação que tenho sobre os valores vem de uma
reportagem da revista Época[13], que diz que, entre 2011 e 2014, a criação
do partido custou R$ 5 milhões. Jamais tive, ou quis ter, qualquer
envolvimento com as finanças partidárias. Havia muitas pessoas mais
qualificadas para essa função do que eu. Além disso, minha situação
financeira, completamente distinta da situação do João, não permitia que eu
colaborasse financeiramente como eu queria, muito menos nas mesmas
bases que ele. Minhas doações ao partido foram modestas; foram aquelas
que minhas condições permitiam. Minha colaboração principal foi em
tempo, credibilidade, suor e trabalho duro. Doei sete anos da minha vida.
 
 
Em 2010, a esquerda experimentava o auge do poder. A economia
cresceria 7,5% naquele ano, a taxa de desemprego era a menor dos últimos
8 anos e a popularidade de Lula batia recordes e chegava a 97%.
Em 2010, Lula elegeu sua sucessora, Dilma Rousseff. Dilma, que havia
sido ministra das Minas e Energia e ministra-chefe da Casa Civil de Lula,
fora apresentada ao Brasil, através de um cuidadoso e persistente trabalho
de marketing, como a “gerentona” do governo.
Em 2010, Sérgio Cabral venceu a eleição para governador no primeiro
turno com 66% dos votos, e Gabeira ficou em segundo lugar, com 20%.
Capítulo 5
Fundação
 
Seguia o esforço de captação de assinaturas e organização formal do
partido. João já tinha montado uma pequena estrutura no Rio, que contava
com uma estagiária e um funcionário: Marcelo Lessa, aquele meu ex-colega
de Petrobras. Depois que voltara do MBA na Bélgica, Lessa trocara a
Petrobras por uma carreira na iniciativa privada. No início de 2011, recém-
saído de uma posição de gerência no Bob’s, Lessa estudava uma oferta para
ir trabalhar na Starbucks. Mas o cargo era em São Paulo, o que significaria
ter que ficar longe da esposa e do filho durante a semana, uma experiência
que ele já vivera e não queria repetir. Foi quando, em um encontro com o
João e a Rosa, ele ouviu deles a história do projeto do Novo. Lessa,
impressionado com o tamanho do desafio e com o trabalho que seria
necessário para criar o partido, aconselhou o João a montar uma equipe de
funcionários. João gostou da ideia e fez ao Lessa a mesma oferta do
Starbucks para que ele, Lessa, se juntasse ao projeto como o primeiro
funcionário do Novo.
Em fevereiro de 2011, Lessa começava a dar expediente no escritório do
Leblon, organizando os bastidores do partido, fazendo contatos com
apoiadores em todo o Brasil e contratando fornecedores. Naquele momento
o objetivo era conseguir as assinaturas até setembro, possibilitando ao Novo
concorrer na eleição de 2012.
O foco do esforço estava na coleta de assinaturas e na criação de
diretórios em nove estados diferentes. Foram contratadas empresas para
criar o site do partido, assessorias de imprensa e de marketing e empresas
especializadas na coleta de assinaturas. A coleta também era feita por
voluntários. Foram organizados treinamentos no Rio e em São Paulo para as
pessoas que iriam trabalhar nas operações de coleta, e Lessa chegou a viajar
a Teresina para encontrar apoiadores e coletar assinaturas.
Certo dia Lessa me chamou para ir com ele a Nova Iguaçu. Fomos no
seu carro. Ele foi dirigindo por ruas desconhecidas até chegar a uma espécie
de garagem, onde um grupo nos aguardava. Era para ser uma reunião de
apresentação do partido, mas a conversa logo tomou um rumo esquisito,
com menções a caciques locais e “acordos” que precisariam ser fechados.
Lessa e eu passamos algumas horas difíceis, pensando em um jeito de ir
embora sem provocar a ira do grupo.
 
A fundação do Novo, tão falada por tanta gente, foi uma reunião formal
realizada para cumprir uma exigência da legislação eleitoral. Era preciso
que um determinado número mínimo de pessoas estivesse presente e
assinasse a ata da reunião. Cada um de nós fez um esforço grande para
convidar a família, amigos e conhecidos para comparecerem em um sábado
de manhã ao salão de reuniões do edifício Lagoa Corporate, no Humaitá, e
assinarem o livro de fundação. O texto do convite enviado foi:
Em continuação ao processo de formação do NOVO, iniciado nos encontros realizados
em dezembro de 2010, iremos agora proceder o registro junto ao Cartório Civil.
 
Como condição precedente para finalizarmos esta primeira etapa, a legislação
determina que os fundadores, reunidos formalmente, aprovem o Estatuto, o Programa e a
nomeação dos dirigentes provisórios do partido.
 
Considerando a concentração de fundadores residentes no Rio, a necessidade de
iniciarmos o quanto antes a coleta das assinaturas de apoio, a ausência de vários
fundadores durante o mês de janeiro e a dificuldade de locomoção dos fundadores de
outros Estados em dia útil, agendamos a referida reunião para o próximo dia 12 de
fevereiro, no Rio de Janeiro.
 
A reunião será realizada a partir das 10h da manhã na Rua Humaitá 275.
 
No intuito de tornarmos a reunião breve, disponibilizamos o Programa, os Princípios e
o Estatuto do NOVO para o seu conhecimento. Estou, junto com os advogados, à
disposição para esclarecermos qualquer dúvida sobre o material.
 
Para que a reunião cumpra o seu propósito, teremos que contar com, no mínimo, 101
fundadores de 9 estados da federação. Peço que você confirme, assim que possível, a
presença através do e-mail secretaria@novo.org.br.
 
Por isso gostaria muito de vê-lo no próximo dia 12 de fevereiro para formalizarmos a
aprovação dos documentos constitutivos, assinarmos a ata definitiva de fundação e o
requerimento para registro do NOVO.
 
Como cidadãos conscientes, é nossa responsabilidade trabalharmos por uma nação mais
eficiente, e um partido político é o instrumento democrático mais adequado para este fim.
 
Até a última hora não tínhamos certeza se conseguiríamos o número
necessário de pessoas. Mas deu tudo certo:  no dia 12 de fevereiro de 2011
o tal livro foi assinado[14] e o Novo foi fundado.
O primeiro a assinar o livro foi João. Marcelo Lessa foi o quarto. A
assinatura da minha mãe, Marly Bezerra Motta, está na 12ª posição, a da
nossa querida amiga Daniela Meyn está na 24ª e a da minha mulher,
Alexandra, na 25ª. Eu fui o vigésimo-sétimo a assinar. Meu sogro Isaac
assinou na linha 29, meu amigo Antônio Leandro na linha 60, Marcelo
Ciuffo na 86 – precedido por seu enteado Felipe na 84 e sua esposa, Ivna,
na 85, e seguido por sua filha Ana Carolina na 87 e sua mãe, a querida D.
América, na linha 88. Carlos Alberto Ghazi, meu colega de primário no
Santo Inácio, assinou na 119ª posição. Ana Cláudia Moreira assinou na 133ª
posição, e Carlos André Hermann na 136ª. Victor Schumer, meu colega de
Telemar, assinou na 137ª.
Tempos depois, Fernando Mousinho chamaria minha atenção para um
detalhe. Ele disse: “Foi muito ruim o João não ter te chamado para assinar
no segundo lugar”. Eu nem tinha percebido isso, nem me incomodei – para
mim, a ordem das assinaturas não tinha nenhuma importância. Mas
Fernando, mais velho e muito mais experiente que eu, já estava vendo o que
eu não via. O tempo lhe deu razão – e me ensinou que, na política, onde as
situações são carregadas de simbolismo, esses pequenos detalhes têm, sim,
enorme importância.
Existe uma história que poucos conhecem: a cerimônia do dia 12 de
fevereiro foi a segunda tentativa de fundar o Novo. Já tinha ocorrido outra,
alguns meses antes, no dia 16 de dezembro de 2010, no apartamento do
João, com a mesma mobilização. Mas os advogados do partido encontraram
um problema com o procedimento adotado. O livro de assinaturas ficara
disponível na sala de estar do João, e as pessoas chegavam, assinavam e
iam embora. Os advogados acharam que isso poderia dar margem a futuros
questionamentos legais. Uma leitura mais rígida da lei dizia que era
necessário que o livro fosse assinado por todos durante uma reunião e que,
só depois de completadas as assinaturas, a reunião poderia ser finalizada e
as pessoas poderiam ir embora. Por isso, foi necessário refazer todo o
procedimento no dia 12 de fevereiro.
Como parte do procedimento de fundação do partido, era necessário
criar o diretório nacional. João seria, naturalmente, o presidente. Ele
nomeou Marcelo Lessa, que ainda era funcionário do partido, para duas
vice-presidências[15]. Para outras duas vice-presidências, João escolheu o
Fábio Ribeiro e um funcionário da empresa que administrava o seu
patrimônio – que vamos chamar aqui de “Gonzaga” –, de quem ainda
ouviríamos falar.
 
E assim foi a fundação do Novo. Agora faltava a parte mais difícil:
coletar as 500 mil assinaturas necessárias para colocar o partido de pé,
preparar candidatos e ganhar eleições.
 
No dia 14 de fevereiro, enviamos um e-mail a todos que tinham
participado da fundação:
Muito obrigado por sua presença e participação na reunião de sábado. Finalizamos com
181 fundadores distribuídos em 10 estados.
 
 Primeiro desafio cumprido!
 
 Vamos ao próximo passo: 500 mil fichas de apoio.
 
 Algumas orientações:
 
  - O mais importante é conquistar as pessoas, fazer com que gostem e divulguem o
projeto. Lembre-se de que não basta colher assinaturas de conhecidos, é de suma
importância montar um “exército” para multiplicá-las. Cada amigo ou conhecido deve virar
um “soldado”, ajudar na criação da onda.
 
 - INDISPENSÁVEL é o preenchimento da ficha SEM ABREVIATURAS com o nome
completo da pessoa, nome completo da mãe, data de nascimento e a assinatura, pois com
esses dados podemos completá-la utilizando o link
http://www.tse.gov.br/internet/servicos_eleitor/consultaNome.htm.
 
 - Importante também é que o Município e o Estado devem ser o do local de emissão do
título e não do nascimento. O e-mail e telefone não são obrigatórios, servem apenas para
localização e para dúvidas caso haja alguma inconsistência nos dados.
 
 - Devemos frisar que assinar a ficha não significa filiação ao partido. A ficha é apenas
o apoio para constituição do NOVO.
 
 - Envie as fichas prontas para:
 
PARTIDO NOVO,
Caixa Postal 12345, CEP 01214-970, São Paulo, SP
ou entre em contato conosco (nucleo@novo.org.br).
 
  - Em anexo estão: os arquivos com os dois modelos de fichas de apoio e um breve
resumo do NOVO. É só baixar, imprimir e fazer quantas cópias precisar.
 
 Contamos com você.
 
 Atenciosamente,
 
NOVO
www.novo.org.br
 
 
 
Em 17 de fevereiro de 2011, o Diário Oficial da União publicava a ata de
fundação e o estatuto do partido.
Foi também em fevereiro que começamos a criar grupos de trabalho para
tarefas como a divulgação do partido e a coleta de assinaturas. Eu me
ofereci para participar dos grupos de divulgação e planejamento político.
Foram criados inicialmente três grupos de divulgação. Eu coordenaria o
Grupo 2, que seria formado por Alexandra Marzo, Ana Cláudia Moreira,
Bernardo Leão, Cristina Campelo, Guilherme Libânio, José Umberto de
Luca, Lívia Pereira, Márcia Tinoco, Maria Helena Hiernaus e Sérgio
Conrado.
 
 
As pessoas envolvidas no projeto, e as que eram convidadas a apoiá-lo,
tinham muitas dúvidas quanto ao processo. Para esclarecê-las, eu propus, e
o João aceitou, publicar no blog do partido o seguinte texto:
Criando um NOVO Partido – A Diferença entre Fundadores, Filiados, Dirigentes e
Apoiadores
 
  A maior dificuldade encontrada por cidadãos brasileiros que desejam criar um novo
partido como forma de expressão política é a complexidade da legislação. São necessários
vários procedimentos, que devem ser executados de acordo com regras rígidas, para que
um partido possa ser considerado criado.
 
  O primeiro passo é a fundação do partido, que acontece em uma reunião com a
participação de, no mínimo, 101 pessoas. Todas assinam a Ata de Fundação, aprovam
algumas medidas (como o programa, estatuto e eleição de dirigentes) e são consideradas
fundadoras do partido. Um fundador é, portanto, alguém que estava presente na reunião e
assinou a ata de fundação. O fundador não tem direitos especiais, nem qualquer tipo de
controle sobre o partido.
 
  Os dirigentes, eleitos pelos fundadores na reunião de fundação do partido, são
responsáveis pela direção das atividades.
 
  Uma vez fundado o partido de acordo com os trâmites da lei, o passo seguinte é a
obtenção do registro no TSE. Para isso é necessária a obtenção de, no mínimo, 500 mil
assinaturas, além do apoio de um décimo por cento do eleitorado nas últimas eleições para
a Câmara de Deputados, em 9 estados.
 
  As pessoas que assinam o pedido de criação do partido são apoiadores. Todo eleitor
pode dar o seu apoio: basta a assinatura e os dados do seu título eleitoral. Observem que o
apoiador não está se filiando ao partido. Ele está apenas dizendo “apoio a criação deste
partido”. Não há nenhum problema se o apoiador for filiado a outro partido. O apoiador
não assume nenhum compromisso com as atividades do partido (embora seja lógico que
ele apoie porque acha válida a proposta do partido).
 
  Só após a obtenção das 500 mil assinaturas e do registro no TSE é que o partido é
considerado criado, e pode então ter filiados.
 
 Em resumo:
  - Fundadores: os cidadãos que assinaram a ata de fundação do partido. Não têm
direitos especiais nem controle sobre as atividades do partido.
 
- Dirigentes: são os eleitos na reunião de fundação para dirigir as atividades do partido.
 
- Apoiadores: os cidadãos eleitores que apoiam, através de sua assinatura, a criação do
partido. Não têm vínculo com as atividades do partido.
 
- Filiados: os cidadãos que se filiam ao partido, através de processo específico, depois
que o partido obtém o registro no TSE.
 
 
 
 
No dia 15 de março de 2011, realizamos na minha casa a primeira
reunião do “Grupo 2 de Apoio ao Novo”. Estavam presentes, entre outros,
Ana Cláudia Moreira, Maria Helena Hierneis, Bernardo Leão, Cristina
Campelo e Sérgio Conrado. Primeiro, Marcelo Lessa fez uma apresentação
sobre o projeto do partido. Depois o grupo discutiu como preparar material
para as apresentações que começaríamos a fazer, inicialmente apenas em
casas de amigos.
Lembro de uma apresentação que fiz, no dia 5 de abril, em um
apartamento na rua Visconde de Albuquerque, no Leblon – não me lembro
quem eram os donos da casa. Talvez tenha sido minha primeira
apresentação, e foi representativa do esforço que fazíamos. Alguém
ofereceu sua casa, convidou vizinhos e amigos e, no dia marcado, lá fui eu,
notebook debaixo do braço e lutando ferozmente contra a timidez e
introspecção que sempre me caracterizaram (até hoje sou assim). Cheguei
ao apartamento às 19h30 (a reunião estava marcada para as 20h), conectei o
computador na televisão, testei tudo e fiquei esperando as pessoas
chegarem. Uns quarenta minutos mais tarde, quando a dona da casa deu o
sinal, eu comecei a minha apresentação, para uma plateia de, no máximo,
dez pessoas.
Uma regra que eu aprendi logo cedo é que o esforço gasto em uma
apresentação é inversamente proporcional ao número de pessoas. Fazer uma
apresentação para um grupo pequeno é muito mais cansativo do que fazer
para uma plateia de mil pessoas. Em um grupo pequeno, as pessoas se
sentem à vontade para exigir atenção individual. Um grupo pequeno
também encoraja as pessoas a te interromperem e a fazer perguntas que são,
na verdade, discursos. Há sempre alguém que resolve te confrontar,
exigindo um debate exclusivo. E assim foi naquele dia.
Eu contei a história do partido, falei das ideias e propostas, respondi
perguntas, debati, ouvi críticas, debati outra vez, ouvi sugestões e conversei
sobre amenidades (outra coisa difícil para mim). Só consegui ir embora
tarde; cansado, muito cansado, mas satisfeito. Eu iria repetir esse mesmo
ritual dezenas de vezes nos meses seguintes – meses não, nos anos
seguintes.
Todo o tempo e esforço que eu viria a dedicar ao projeto do Novo só
foram possíveis porque sempre tive o apoio incondicional de minha mulher.
Mesmo quando as reuniões, palestras e viagens começaram a roubar muitas
horas de convívio com a família, Alexandra sempre entendeu a importância
do que estávamos fazendo e, mais do que me apoiar, se envolvia também.
Além de sentar-se, quase sempre, na primeira fila de minhas apresentações,
ela preparava um “kit palestra”, que incluía lista de presença, prancheta,
canetas, lanches e outros materiais, me maquiava para os filmes e estava
sempre – sempre – pronta para abrir as portas de nossa casa para as
centenas de reuniões que fazíamos, algumas sem aviso prévio, e que
frequentemente avançavam madrugada adentro.
Ela compartilharia comigo a indignação de ver várias pessoas, que
recebíamos em casa e com quem partíamos o pão, se transformarem, sem
explicação, em inimigos ferozes – isso, eu descobriria, é fenômeno comum
na política.
 
 
No mesmo 15 de março de 2011, enquanto fazíamos nossa primeira
reunião de trabalho em minha casa, o blog Diplomatizzando, do
Embaixador Paulo Roberto de Almeida, publicava um texto do economista
Mansueto de Almeida (que viria a ser secretário do Tesouro) com
observações críticas ao projeto do Novo[16]. Dizia Mansueto: “A ideia
parece ser muito boa, mas acho difícil que tenha sucesso por pelo menos
quatro motivos”. Ele os enumerava: “Primeiro, eles partem de uma
concepção ingênua que gestão pública é semelhante à gestão privada de
uma empresa”. Ele enumerava mais dois pontos, e finalmente o quarto:
“Por fim, o Partido Novo não quer ter nos seus quadros “pessoas viciadas
no processo político”. Isso significa que esse partido já nascerá pequeno.
Política é uma atividade profissional”.
Tanto eu quanto o diretório nacional enviamos respostas aos comentários
de Mansueto[17] (a minha resposta foi mais dura e direta). Mas o tempo
mostraria que, nesses dois pontos, Mansueto, corretamente, percebia algo
que não enxergávamos.
No dia 16 de março, João me pediu ajuda para responder a perguntas
feitas pelo jornal Tribuna do Norte. No final de uma das respostas, eu dizia:
Nosso objetivo é criar um Estado justo, eficiente e pacífico onde os indivíduos
possam desenvolver suas vidas de acordo com seus desejos e competências, em
busca da felicidade. Tudo o mais é retórica vazia. Qualquer regime que oprima o
homem e afete sua liberdade está fadado ao fracasso.
No dia 17 de abril, domingo, fizemos uma operação de divulgação do
partido no calçadão de Ipanema, liderada pelo Marcelo Lessa. O ponto de
concentração foi o Posto 10.
Pouco depois, quatro meses depois de ser contratado – em maio de 2011
– e considerando que o projeto agora levaria muito mais tempo que o
previsto para ser completado, Marcelo Lessa colocou seu cargo à disposição
e deixou o Novo, sem que isso afetasse seu relacionamento com o João.
Você provavelmente nunca ouviu falar do Marcelo Lessa. Entretanto, ele
ajudou a lançar várias pedras fundamentais do partido. Enquanto o Lessa
permanece anônimo, muita gente se apresenta por aí como fundador do
Novo, quando a única coisa que fez foi assinar o livro na reunião de
fundação.
 
 
 
No final de 2010, eu acompanhei Marcelo Ciuffo a um exame de PET
scan de rotina. Desde que ele ficara doente, era comum que eu o
acompanhasse em consultas e procedimentos médicos. O PET scan é aquele
exame em que você se deita em uma maca estreita e é empurrado para
dentro de um tubo enorme, que faz um barulho horrível.
Quando o procedimento acabou, Marcelo se levantou e fomos juntos até
a console do equipamento, onde o técnico olhava as imagens. Marcelo era
médico e sabia interpretar o que via. Não foi preciso que o técnico dissesse
nada. Na imagem apareciam várias metástases. O câncer havia retornado.
Nos meses seguintes, o progresso da doença e a dor resultante foram
tornando inviável sua rotina doméstica. Em junho de 2011, depois de ser o
padrinho de batismo da nossa filha, Maria Fernanda, na Igreja da
Ressureição, no Arpoador, Marcelo decidiu se internar pela última vez em
um hospital, como forma de aliviar seu sofrimento, sabendo que não mais
sairia dali.
Marcelo, meu melhor amigo, um anjo em forma humana, morreu em 15
de julho de 2011. A missa de 7º dia foi realizada no sábado dia 23, às 9h30,
na Igreja da Paróquia da Ressurreição, na rua Francisco Otaviano em
Ipanema – a mesma igreja onde ele batizara a minha filha.
Marcelo faz muita falta em nossas vidas.
Capítulo 6
Os Pioneiros
Passei a dedicar ao Novo boa parte do meu tempo livre, da minha
energia e da minha capacidade intelectual. Entramos em um ritmo intenso
de organização de reuniões e palestras para apresentar as ideias do partido,
e ao mesmo tempo coletar as assinaturas necessárias para a formalização no
TSE.
Nem tudo eram flores. Aliás, quase nada eram flores naquele começo.
Rejeição era a regra. Naquele tempo, como ainda ocorre hoje, muita gente
fazia questão de me dizer, em alto e bom som, que não queria nenhum
envolvimento com política. Por exemplo, no dia 3 de abril de 2011, eu
enviei um e-mail aos ex-colegas de uma das empresas onde trabalhei
convidando-os a conhecer o projeto do Novo. A resposta de um deles foi:
Caro Motta,
 
Obrigado pelo convite.
Não tenho interesse.
 
Grande abraço,
 
Em compensação, no dia 4 de abril de 2011, recebíamos um contato de
uma lenda viva do windsurfe brasileiro, Bob Nick, que queria conhecer o
Novo. Bob me acompanha até hoje.
Montei um blog pessoal e publicava artigos com frequência, falando das
ideias e do projeto do partido. Lendo os textos daquela época, me espanto
como evoluí em minhas posições. Como exemplo, um desses textos
terminava declarando: “Portanto, aos que nos cobram posicionamento
ideológico: não somos de direita nem de esquerda”. Como mudei .
Outra questão sobre a qual não hesito em dizer que mudei totalmente de
posição foi a liberação ou legalização das drogas. Durante muito tempo
acreditei nessa falácia, até que Marcelo Rocha Monteiro me educou a
respeito da realidade do tráfico de drogas[18].
 
 
Chegara a hora de apresentações para grupos maiores. Na noite fria da
quinta-feira, 19 de maio de 2011, fiz minha primeira apresentação pública
sobre o partido, na Universidade Cândido Mendes, em Ipanema, junto com
Marcelo Lessa. Conseguimos o espaço graças à Ana Cláudia Moreira. Foi
um dia de muita alegria: a plateia, embora pequena, era composta de
pessoas interessadas e atentas, entre as quais estavam vários amigos
queridos. O vídeo gravado naquele dia[19] mostra um Roberto jovem e
seguro de si – embora ainda ingênuo e sem qualquer experiência prática em
política –, que fala sobre um projeto que seria, talvez, o mais importante de
sua vida. Estas foram algumas das coisas que eu disse:
O Novo é uma iniciativa política diferente de todas as que vocês já viram no Brasil até
hoje. O Novo é um partido político que foi fundado com foco em duas coisas [...] primeiro
é preciso gestão, o Brasil precisa de uma gestão pública eficiente e de qualidade. A
segunda coisa que o Novo propõe é a cidadania, manifestada na eleição de cidadãos
comuns.
 
Até onde a gente sabe, nenhum partido no Brasil propõe com convicção a redução de
impostos. O político brasileiro tradicionalmente é a favor de mais impostos [...] nós
acreditamos na redução de impostos e na eficiência na gestão dos recursos públicos. Essas
coisas são básicas, a gente não abre mão disso.
 
Nós somos também único partido brasileiro que foi criado sem a interferência de
nenhum político [...]
 
A gente defende um Estado mais eficiente, porque sem um estado mais eficiente não
existe uma sociedade igual, justa e democrática. São palavras ocas dizer que no Brasil
existe justiça social quando você tem um problema qualquer, entra na justiça e o seu
processo leva 20 ou 30 anos para ser resolvido. Não existe igualdade quando você precisa
de atendimento médico, e se você não tem muito dinheiro, um plano de saúde bom, você
não tem atendimento médico.
 
Outra coisa na qual a gente acredita é a participação do cidadão comum. Isso é uma
parte integral do nosso projeto. Muita gente pergunta: mas por que os políticos do Novo
vão ser diferentes dos outros políticos? Porque os políticos do Novo vão vir de vocês. É
parte integrante do nosso projeto que as pessoas que vão se candidatar a cargos eletivos
sejam pessoas comuns, representativas da sociedade. [...]
 
Nada é mais poderoso do que uma ideia cuja hora chegou.
 
No vídeo, é possível ver que eu usava no pulso direito uma pulseira
amarela, produzida pela fundação do ciclista Lance Armstrong. A fundação
foi criada por Lance em 1997, quando ele foi diagnosticado com câncer
testicular. A pulseira simbolizava o apoio àqueles que lutavam contra o
câncer.
Marcelo Ciuffo tinha me dado a pulseira.
Na mesma noite da apresentação na Cândido Mendes, recebi um e-mail
do meu amigo Alexandre Arraes:
Aceite uma crítica construtiva. Faltou emoção! Política é envolvimento e sem emoção
fica mais difícil. O Lessa estava muito sisudo. Quando desceu da mesa, relaxou e parecia
outra pessoa. A apresentação em si, apesar de objetiva e do tamanho certo, poderia
emocionar mais. As pessoas decidem as coisas com um pouco do racional, mas muito mais
com o emocional.
Sei que é difícil emocionar sem ser piegas ou apelativo ou lugar-comum. Esta me
parece que é a missão a enfrentar.
 
 
 
Em maio começamos a produzir um vídeo de animação para divulgação
do Novo. Nesse mesmo mês, vi, no Facebook, um anúncio do Liber, um
partido libertário.
Tínhamos contratado uma agência para ajudar na produção do material
de divulgação, mas, à medida que o projeto ganhava corpo, ficávamos mais
desconfortáveis em ter textos com posicionamentos importantes sendo
escritos por alguém que não era parte do núcleo do projeto. Além disso,
vários dos textos eram confusos e tinham informações erradas. Acabamos
desistindo da agência.
 
Em julho de 2011, o site do Instituto Mises Brasil publicou uma matéria
crítica ao Partido Novo[20]. Entre outras coisas, o texto dizia:
A "eficiência na gestão pública" parece ser a única bandeira do Partido Novo,
"um partido formado por empresários", por pessoas que sabem administrar, que irão
trabalhar com metas, e isso torna irônico o nome Novo, pois todo esse papo é velho
e muito comum na política.
A crítica, que nos pareceu injusta e superficial, doeu.
 
 
No dia 16 de novembro de 2011, às 19 horas, no Hotel Marina, no
Leblon, foi realizada aquela que pode ser considerada a primeira reunião
geral de trabalho do Novo. Os participantes foram João, Rosa, Carlos
Werneck, Luiz Russo, Luiz Guilherme Gama, eu, Regina, Geovana, Luiza
Amoêdo, Carla Costa e Lívia Pereira. Nessa reunião, entre outros assuntos,
discutimos a dificuldade de conseguir o engajamento das pessoas no projeto
e na coleta de fichas de apoio. Estabelecemos que haveria reuniões
semanais de trabalho no Hotel Marina, o que acabou não acontecendo.
Em 13 de dezembro de 2011, Alexandre Arraes levou João e eu para
uma conversa com a então vereadora Andreia Gouveia Vieira. Andreia era
uma parlamentar excepcional, e procurávamos uma oportunidade para
juntar forças, mas a conversa não evoluiu.
Em fevereiro de 2012, João me convidou para integrar um “Comitê
Executivo do Novo”. A primeira reunião foi realizada no dia 5 de março, no
salão de festas do prédio dele. A segunda aconteceu em 19 de março, no
Hotel Marina. Não me lembro de ter havido uma terceira.
No sábado seguinte, 24 de março de 2012, foi realizada em São Paulo a
primeira reunião nacional de coordenadores do Novo, em um escritório na
Av. Juscelino Kubitschek, no bairro do Itaim Bibi.
 
 
Um ano depois, em março de 2013, começamos a discutir a montagem
dos diretórios. Entre os nomes cogitados para serem dirigentes do partido
no Rio, estavam Carlos Alberto Ghazi, Bernardo Santoro e Ricardo
Taboaço.
Na sexta-feira, 22 de março de 2013 – meu aniversário –, João, Bernardo
Santoro e eu nos encontramos no Iate Clube para falar sobre os próximos
passos para o partido. Bernardo já era um veterano da política, embora
ainda muito jovem, e nos impressionou com seu conhecimento sobre o
funcionamento de partidos e sua visão da cena brasileira. Ele já havia
coletado mais de 2.000 fichas de apoio.
Foi por essa época que conheci Andrew Hancock. Andrew é um jovem e
brilhante executivo do mercado financeiro, membro do Instituto de
Formação de Líderes e sempre presente nas boas iniciativas em prol do Rio
e do Brasil. Logo a seguir conheci Felipe Dias, amigo de Andrew. Ambos
sugeriram o nome de um terceiro amigo – André Strauss – para participar
do diretório do Rio. Na terça-feira, dia 28 de maio, eu me reuni com
Andrew, Strauss e Felipe Dias no escritório do João no Leblon. O projeto de
criação do partido ganharia um novo impulso a partir da entrada dos três,
que compartilhavam comigo uma insatisfação extrema com a realidade
brasileira e a disposição de fazer algo a respeito.
Naquela altura, o partido já tinha 78 mil assinaturas certificadas e 403
mil fichas já preenchidas, ainda a serem apresentadas aos cartórios
eleitorais.
 
 
Foi em junho de 2013 que eclodiram as primeiras manifestações
populares desde o impeachment de Collor. Inicialmente motivadas pelo
aumento nas passagens de ônibus, as manifestações logo assumiram caráter
de protesto genérico contra um sistema político corrupto e ineficiente.
Várias capitais registraram tumultos, ônibus incendiados, tentativas de
invasão de prédios públicos e conflitos com a polícia. Observávamos com
cautela aquilo tudo. O Brasil começava a acordar de anos de uma
embriaguez insensata e corrupta.
 
 
“Motta, gostaria que você assumisse a presidência do diretório estadual
do Rio”, João me disse um dia, no final de maio de 2013, em uma reunião
com a presença da Rosa. “Parabéns, presidente”, me cumprimentou ela.
Assinei o termo de posse em 10 de junho, e no dia 25 de junho de 2013 o
TRE do Rio de Janeiro recebia um ofício assinado por mim na qualidade de
presidente do diretório estadual do Partido Novo, solicitando o registro dos
órgãos de direção partidária do estado do Rio e dos municípios do Rio e de
Angra dos Reis, e encaminhando em anexo certidões de 11.087 assinaturas
de apoio. Outros diretórios estavam sendo criados no Distrito Federal,
Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, Rio Grande do Norte, Roraima,
São Paulo e Espírito Santo.
Em 20 de junho de 2013, fizemos uma apresentação com plateia lotada
no auditório do Shopping Leblon, que foi aberta pelo economista e escritor
Rodrigo Constantino. Intelectual preparado, orador nato e muito corajoso,
Constantino foi uma das primeiras vozes a denunciar o desastre criado pelo
PT. Incansável defensor do liberalismo, ele teria papel fundamental no
processo de formação do Novo, participando de inúmeros eventos e
apresentações e atuando, muitas vezes, como nosso mentor.
Naquela noite, a plateia do auditório do Shopping Leblon recebia boa
parte da elite do mercado financeiro do Rio.
Ainda tínhamos o receio de que o projeto esfriasse e nunca saísse do
papel. Aquela apresentação nos reanimou e marcou o início de uma nova
fase. A partir dali os acontecimentos começaram a se acelerar, com reuniões
e apresentações cada vez mais frequentes, e contatos com grupos
interessados em todo o país. Foi nessa época que começamos a organizar
melhor o cadastro de apoiadores, por exemplo. Sugeri utilizarmos o
diretório do Rio como projeto piloto a ser seguido pelos demais diretórios.
Começamos a pensar nos preparativos para as futuras filiações e a debater
quais seriam os conceitos principais do ideário do partido. A administração
do site e da página do Facebook foram transferidas para o escritório de São
Paulo.
 
O escritório do Leblon estava sempre movimentado e cheio de gente.
Além das pessoas contratadas, estavam sempre presentes João e Rosa, que
se entregaram de corpo e alma ao projeto e gastavam muito tempo e esforço
respondendo a comentários, postagens e e-mails.
Lembro de ter achado curioso isso, que o líder de um partido político –
especialmente alguém na condição social do João – se entregasse ao projeto
a ponto de ficar muito envolvido com tarefas operacionais que consumiam
tempo precioso. Mas havia outras tarefas urgentes esperando: a definição do
ideário e da estratégia política.
Abracei essas tarefas e as levei para nossas reuniões semanais.
Decidimos criar grupos de trabalho temáticos, dedicados a cada uma das
questões. Tínhamos grupos dedicados à preparação do processo de filiação
(para quando o partido fosse formalizado), preparação para eleições, coleta
de assinaturas, divulgação do partido, promoção da liberdade econômica e
da competitividade e o GEN – grupo de estudos do Novo.
Os grupos de trabalho tinham uma função dupla: ao mesmo tempo que
somavam esforço e talento individual para preencher as lacunas no
arcabouço teórico do partido, os grupos serviam também como ferramenta
de envolvimento e motivação das pessoas. Muito mais tarde fui encontrar
nos escritos de Saul Alinsky, o bruxo da guerra cultural esquerdista
americana, a justificativa teórica para aquilo que eu já tinha descoberto na
prática: dar as pessoas a oportunidade de contribuir para uma causa comum
é, muitas vezes, o que de mais importante um partido ou movimento
político pode fazer por elas.
Criamos fóruns de discussão online no Google Groups: um fórum
nacional, do qual participavam João, Rosa, Marcos Alcântara, Fábio
Ribeiro, Christian Lohbauer, Fábio Barbosa, ex-CEO do Banco Real (com
quem nunca encontrei), e eu; e outro fórum para a turma que começava a
formar o Novo do Rio de Janeiro.
 
 
No dia 1º de julho de 2013, João fez uma palestra na PUC do Rio, no
auditório B6 do 6º andar da ala Frings, no Edifício da Amizade. Mais uma
vez, contamos com a participação do Rodrigo Constantino. O evento teve
pouca audiência porque, pouco antes do horário marcado, um temporal
caíra sobre a cidade, paralisando o trânsito.
Alexandre Arraes, já veterano da política, acompanhava o desenrolar do
projeto meio de perto, meio de longe. Um dia, ele sugeriu que eu
conhecesse um de seus amigos, o “Beto”, que tinha muito interesse no
projeto do Novo. Quando eu abri a porta do escritório do Leblon,
imediatamente reconheci o Beto: era Carlos Roberto Teixeira, que fora
diretor de TI e meu chefe na Shell, e que iria, em breve, fundar o VoteNet,
uma iniciativa inovadora de promoção da consciência política eleitoral
usando a tecnologia.
Foi nessa época que conheci Wilson Cukierman, através de um e-mail
que ele havia mandado para o Novo. Wilson foi executivo do mercado
financeiro, morou em Israel e hoje é diretor de uma importante escola no
Rio. Seus filhos Dan e Ilan eram presenças frequentes nos eventos do Novo.
Wilson é uma pessoa gentil, agradável, preparada e genuinamente
preocupada com nosso país.
Naquela época também se juntou a nós André Segadas, outro jovem que
mandava e-mails para o partido. Apareceu também o grande velejador Guto
Brito, levado pelas mãos do Bob Nick. O advogado Fabrício Rodrigues
também entrou no projeto, trazido por Felipe Dias. No final de agosto era
Manolo Salazar que mandava um e-mail oferecendo-se como voluntário, e
no início de setembro Orlando Puppin, que havia sido diretor da Shell e –
descobri depois – irmão do Gilson Puppin, meu antigo professor de álgebra
no Santo Inácio.
Logo a seguir eu conheceria Gabriel Renault Magalhães, trazido por
Strauss. Outros que entraram nessa época foram Raphael Rottgen, Renan
Dejon, Gabriel Menegale (futuro coeditor do Boletim da Liberdade),
Maurício Martins (que assumiria a responsabilidade por criar o Novo
Niterói), Igor Blumberg, Juliana Volpe, Daniel Runkel, Juliana Ribeiro e
Abner Velasco.
Foi nessa época também que conheci Fernando Mousinho,
pernambucano, executivo aposentado, lutador de jiu-jitsu e boxe, pai de
uma família linda e bem-sucedida e, como eu, indignado com os rumos
deste país tresloucado. Fernando é uma das pessoas mais inspiradoras que
tive a oportunidade de conhecer. Ele está sempre me aconselhando,
apontando erros e me cumprimentando pelos acertos.
 
 
Comecei a fazer reuniões semanais no escritório do João, com horário
certo: segunda-feira às 20h. Às vezes João participava. As pessoas
apareciam, conversavam, ficavam, chegava mais gente. Debatíamos todos
os assuntos: educação, saúde, segurança, economia, transporte. Pessoas
cansadas, saídas de um dia de trabalho exaustivo e com famílias esperando
em casa, sacrificavam seu tempo pelo que parecia, ainda, um sonho quase
impossível. Um trazia o outro. As histórias desses encontros encheriam um
livro. Não vou lembrar de todos os nomes, mas alguns desses pioneiros
merecem menção especial.
Otávio Cintra, que tinha entrado comigo na Petrobras (ele é irmão do
Pedro Cintra, que foi da minha sala no Santo Inácio, também havia sido
funcionário da Petrobras e hoje é Senior Finance Operations Manager da
Google na Califórnia), foi um dos primeiros a entrar no projeto do Novo,
em abril de 2011. Para minha surpresa, Otávio, que nunca tinha se
interessado por política, se tornou participante ativo do Novo e, quando
criamos formalmente o diretório estadual, eu o convidei para assumir o
cargo de vice-presidente.
Robson Abreu, sargento da Marinha – hoje suboficial – especializado em
operação de radares e controle aéreo tático, nasceu e foi criado no morro do
Caracol na Penha. Robson é um dos sujeitos mais preparados, cultos e
determinados que eu conheço – um conservador raiz, que construiu a si
mesmo em meio a um ambiente de pobreza e hostilidade.
Victor B., comprometido com o Brasil e com a causa liberal, amigo até
hoje. O dentista José Lopes Teixeira, com quem eu conversava muito
sempre que podia. O auditor fiscal e guerreiro da liberdade Marcelo Silva,
dono de uma combinação rara de inteligência, espírito inovador e
generosidade. Marcelo, que entrou em contato conosco por e-mail no dia 22
de setembro de 2014, é mais um conhecido daquela época que se tornou
meu amigo.
Renata Silbert, que tinha estudado comigo no Santo Inácio (embora não
fôssemos amigos naquela época), foi uma das forças por trás da atração de
filiados e da divulgação das ideias do Novo e veio a se tornar uma amiga
querida.
Sandro Gomes, empreendedor e comerciante, homem de sorriso fácil e
percepção política aguçada, e que estaria presente em muitos momentos da
minha futura trajetória.
Márcio Assis Brasil, importante executivo do setor de telecomunicações,
apoiador participante e comprometido.
Sálvio Formisano, quase um sobrinho, que eu vi nascer e crescer.
André Zacaron e Manu Lane – ele médico especializado em cirurgia
bariátrica, ela em nutrição –, um casal de cuja amizade desfruto até hoje.
Fernanda Torós, PhD em economia pela Universidade de Illinois Urbana-
Champaign, que fez carreira no mercado financeiro e hoje é CEO da
WeSpline, uma startup de tecnologia, além de uma trabalhadora incansável
pela aproximação do Brasil com Israel – ideia que ela trouxe para o Novo
quando começou a participar de nossas reuniões, logo no início.
Leonardo Fiad e Andreia D’Oliveira, ele advogado, ela empreendedora,
observadores afiados da cena política, amigos queridos, inteligentes e
espirituosos – a definição de uma boa companhia –, sempre dispostos a
partilhar pão e vinho em torno de uma boa conversa.
Marco Paulo Costa, um dos primeiros a participar de nossas reuniões,
sempre com opiniões fortes e posturas firmes.
Alessandra Pinho, uma das líderes do movimento Vem Pra Rua no Rio
de Janeiro. Bonita, inteligentíssima, muito bem-informada e articuladora
política nata, Alessandra teve papel fundamental na organização do
movimento pró-impeachment da Dilma no Rio.
Marcus Werneck, uma lenda do mergulho nacional, hoje consultor
financeiro. Tayssa Sato, filiada e apoiadora que muito ajudou na
comunicação com novas pessoas e na organização dos eventos. Um dia ela
sumiu. Onde está você, Tayssa? Maria Fernanda Gomes também entrou no
Novo Rio de Janeiro no início, e sempre foi participante ativa e
entusiasmada. Rinaldo Paulino de Souza, apoiador de primeira hora,
responsável pelas primeiras imagens em vídeo do Novo Rio de Janeiro.
Marcelo Goes, velho amigo que se juntou com entusiasmo ao nosso grupo.
Rafael Hollanda, jovem brilhante e idealista, dono de vasta bagagem
cultural e de grande sensatez e coragem moral. Tenho a honra de chamar
Rafael e sua família de amigos.
Acácio Dorta, outro jovem cuja perspicácia, bom humor, inteligência e
coragem marcaram os tempos iniciais do Novo.
Outras pessoas que  conheci naquela época, no início do início: Davilson
Brasileiro, o querido casal Alessandra Santiago e Breno Gentil (na época
recém-chegados do exterior), o outro querido casal Guilherme Piccard e
Isabela da Cunha Rocha, Carlos Nepomuceno, Diego de Souza, Eduardo
Sholl Machado, Felipe Fabres, Felipe Lungov, Fernando Segalote, Flávio
Cabral, Flávio Maia, Frederico Lanza, Gianelli Rodrigues, Gustavo
Agostini, Gustavo Lima, Gustavo Mousinho, Ida Breyer, Igor Akhnaton
Kardush, Ítalo Tertuliano, João Pedro Schara Francese, João Pizysieznig
Filho, José Clark, Kátia Leituga, Krysamon Cavalcante, Laura Yanovick,
Lucas Jazbik, Luiz Armando Daudt, Marcus Cortez Brito Leite Póvoa,
Milton Alves da Silva, Roberto Argento, Rodrigo Mousinho e Tito Santos.
Essa era a turma que participava das reuniões, organizava os eventos, ia
às ruas divulgar as ideias e ajudava, de formas variadas, a colocar de pé o
sonho de um partido diferente.
 
 
No dia 6 de agosto de 2013, realizamos um evento no auditório do
edifício Leblon Corporate, de novo com a presença do Rodrigo
Constantino. Nesse dia, Constantino fez uma das mais brilhantes exposições
a que eu já assisti sobre a catástrofe causada pelo domínio do país pela
esquerda.
Começavam os ataques ao projeto do partido. No dia 10 de agosto, o site
Brasil 247 publicou uma matéria chamando o Novo de “partido de centro-
direita[21]”. Alguns dias depois, um jornal de Maceió chamava o Novo de
“extrema direita”.
Nesse mesmo mês, Marina Silva apresentou ao TSE o pedido de
registro[22] do seu partido, o Rede Sustentabilidade, mesmo sem ter todas as
assinaturas necessárias, sob alegação de que os cartórios eleitorais estariam
descumprindo prazos. O registro acabaria sendo negado pelo TSE, mas o
comentário sobre os prazos dos cartórios estava correto: era imprevisível o
tempo que a burocracia eleitoral levava em cada etapa do processo. Por
exemplo: o processo de registro dos diretórios do Rio, iniciado havia
sessenta dias, andava a passos de tartaruga. No dia 27 de agosto, terça-feira,
fui à Procuradoria Regional Eleitoral perguntar sobre a razão da demora.
Não me lembro o que me disseram, mas, depois da minha visita, o processo
começou a andar.
No dia 28, fizemos um encontro do Novo em São Paulo, no Radisson
Hotel da Av. Cidade Jardim, também com Rodrigo Constantino.
No dia 2 de outubro, o TRE deferiu o pedido de criação dos diretórios do
Rio.
A estrutura do Novo, naquela época, era essa:
Diretório Nacional:
João Dionísio Amoêdo – Presidente Nacional
Fábio Ribeiro – Vice-Presidente Nacional
José Carlos Santos – Secretário Administrativo
Marcos Alcântara Machado – Secretário Nacional de Finanças
 
Diretório Estadual do Rio de Janeiro
Roberto Motta – Presidente
Otávio Cintra – Vice-Presidente
Luiz Guilherme Gama – Secretário de Relações Institucionais e Legais
Maria Helena Hierneis – Secretária Administrativa
 
Diretório Municipal do Rio de Janeiro
Ricardo Taboaço – Presidente
André Strauss - Vice-Presidente
José Cláudio - Secretário Administrativo
 
No dia 9 de outubro de 2013, o “fale conosco” do partido me
encaminhou um e-mail de um interessado em participar do Novo. Assinava
o e-mail o advogado Alexandre Teixeira de Freitas Rodrigues, que viria a
ser um dos dois primeiros deputados estaduais eleitos no Rio pelo partido
em 2018.
 
Capítulo 7
O Hotel Marina Quando Acende
Um dos eventos mais memoráveis do Novo aconteceu no dia 8 de
outubro de 2013 no Hotel Marina, no Leblon – aquele citado na música
Virgem, da cantora e compositora Marina Lima, que diz: “O Hotel Marina
quando acende / Não é por nós dois[23]”.
Os salões reservados lotaram. Estavam presentes, entre outros, o cineasta
Marcos Prado, produtor do filme Tropa de Elite, o empresário Fred D’Orey,
criador da Totem, ambos ex-colegas do Santo Inácio. Todas as cadeiras
estavam ocupadas e havia muita gente de pé. Abri a reunião falando do
projeto e apresentando o João, que falaria depois de mim. Encerrei minha
apresentação com estas palavras:
Apresento João Dionísio, meu colega de Santo Inácio, engenheiro e administrador de
empresas, que fez brilhante carreira no mercado financeiro e hoje é conselheiro de várias
empresas. Para quem acha que o NOVO não vai longe, eu gostaria de informar que o Joao
é também atleta de elite, e já completou vários Ironman, a prova de elite do triátlon
mundial. 
 
Em seguida falou João.
No dia 19 de novembro, fizemos outro evento no mesmo Hotel Marina,
no qual a economista Elena Landau fez uma apresentação sobre sua
experiência com privatizações no governo FHC.
Naquele novembro, a aproximação do verão deflagrou uma onda de
arrastões nas praias da cidade. Eu dei uma entrevista ao Bom Dia Rio
explicando a gravidade da situação e pedindo providências[24].
 
 
As apresentações não paravam. Descobrimos o Clube Israelita Brasileiro
(CIB)[25] em Copacabana. Seu presidente, Altamiro Moysés Zimerfogel – o
Miro – nos recebeu de braços abertos. Ali realizamos apresentações com
convidados como Paulo Rabello de Castro e Carlos Andreazza. Hélio
Beltrão, fundador do Instituto Mises Brasil e da editora LVM[26], apresentou
uma série de palestras sobre as Seis Lições de Mises. Em uma dessas
palestras, conheci Alex Catharino e o professor Ubiratan Jorge Iório, dois
expoentes do liberalismo e conservadorismo. Também recebemos o
professor Marcos Cintra, para falar sobre sua ideia de imposto único.
Tínhamos casa cheia sempre.
Me preocupava a quantidade de pessoas desconhecidas que estavam
frequentando o escritório do João no Leblon. Propus então que
encontrássemos outro local, que significasse menos exposição para ele e
mais segurança para todos. André Strauss sugeriu que usássemos os
escritórios da empresa da qual ele era sócio, em um prédio próximo, o que
fizemos durante um tempo a partir de janeiro de 2014. Foi lá que recebi
pessoas remanescentes de um projeto de reativação do antigo Arena, o
partido político do governo na época do regime militar. Uma das pessoas
com quem conversei, o Dr. Marcelo Kokis, médico conservador de boa
estirpe, se tornou meu amigo (e ortopedista).
Era um trabalho exaustivo, mas eu adorava. Mas era exaustivo. Em cada
uma dessas reuniões eu apresentava o projeto do partido, ideia por ideia, e a
apresentação era sempre seguida de alguma discussão, às vezes de debate
acalorado. Quase nenhuma reunião levava menos de duas horas. Foi assim
que atraímos dezenas de pessoas qualificadas e interessadas no projeto de
um Brasil melhor: com trabalho duro, ideias originais e disponibilidade para
conversar e discutir.
É assim que faço política até hoje.
 
 
As reuniões aconteciam sempre às segundas-feiras, às 20h, no Leblon.
Eu estava lá, toda segunda, mesmo que aparecesse só uma pessoa – e isso
aconteceu várias vezes. Além disso, eu estava sempre disponível para tomar
um café com qualquer um que estivesse interessado em saber mais sobre o
projeto. Eu, que nunca gostei de café, devo ter bebido uma safra inteira –
uma não, várias.
Uma vez, um rapaz chamado Gustavo me convidou para tomar um suco
no Bibi Lanches, no Leblon. Enquanto eu tomava meu açaí, descubro que o
“rapaz” (ele tem cara de garoto mesmo) é diplomata do Itamaraty e estava
terminando seu PhD em Administração Pública pela Universidade de
Illinois-Chicago. Gustavo Maultasch de Oliveira é, simplesmente, um dos
pensadores mais originais sobre política, ideologia e liberalismo que eu
conheço – um gigante intelectual e pessoa agradável, modesta e gentil.
Ainda hoje conversamos com frequência e sempre aprendo muito com ele.
Outra vez eu cruzei com o Lars Grael e não resisti: dei o meu cartão e
falei do projeto do Novo. Dias depois ele me mandava uma mensagem:
“Conversa com essa amiga”. A amiga era a Fabiana Bentes, que eu logo
convidei para um café no Rio Design Center no Leblon. Conversamos umas
duas horas, durante as quais eu devo ter falado uns 5 minutos (ela vai me
matar quando ler isso ). Fabiana, que se mostrou articulada, consciente e
determinada, era CEO da ONG Sou do Esporte, consultora do BID, atleta
de elite e seria, um dia, secretária de Estado de Desenvolvimento Social e
Direitos Humanos do Rio de Janeiro.
Outra história: conheci um senhor em uma das apresentações, trocamos
cartões e ele me convidou para um café. Nos encontramos no Shopping
Leblon, em frente à Casa do Pão de Queijo. Ele era meu xará – Roberto
Font Júnior – e professor de inglês. Entusiasmado pela ideia do Novo, já
tinha ido a várias apresentações. Pela primeira vez ele tinha a chance de se
sentir verdadeiramente parte de um projeto político que tinha relação com
sua vida, seus anseios, suas preocupações. Conversamos, comendo pães de
queijo, por mais de uma hora.
Multipliquem essas conversas e encontros centenas de vezes, com
pessoas de todas as idades e situações, em todos os locais da cidade e vocês
entenderão como era a minha rotina.
Gustavo, Fabiana e Roberto eram parte de uma multidão, espalhada pelo
Brasil, que compartilhava comigo um sonho. Realizá-lo era a minha missão.
 
 
No final de 2013, o escritório do Leblon trabalhava fazendo a
estruturação dos diretórios existentes, identificando novas lideranças
regionais e lidando com a enorme quantidade de postagens no Facebook. Já
fazia algum tempo que havíamos começado a prática de realizar uma
reunião geral mensal do Novo Rio de Janeiro, quase sempre no Clube
Israelita Brasileiro.
 
 
No dia 24 de novembro, jantamos com Mansueto Almeida no Rio. O
jantar, organizado pelo Felipe Dias, foi uma aula sobre o Brasil.
Participaram do jantar, além do Felipe e eu, João, Andrew e Gabriel Renault
Magalhães.
No dia 16 de dezembro de 2013, uma segunda-feira, às 19h, realizamos
uma reunião geral do Novo Rio no Clube Israelita Brasileiro. Eu abri a
reunião e João falou depois. A seguir cada um dos grupos de trabalho
(divulgação, ideário, coleta, eleições, governança e filiação) apresentou
suas ideias, propostas e primeiros resultados. Felipe Dias encerrou
apresentando um panorama econômico.
Aprendi bastante com o Felipe sobre economia e liberalismo. Muito
jovem, Felipe já era excepcionalmente culto e bem-informado, e mudou
minha forma de pensar sobre várias questões. Foi Felipe quem me deu de
presente um livro sensacional, Além da Democracia, que fala sobre os
problemas enfrentados pelas modernas democracias ocidentais. Foi a
primeira vez que comecei a pensar sobre os problemas e defeitos do sistema
político que consideramos quase sagrado. É um livro fantástico, leitura
obrigatória. Foi nas discussões com Felipe que comecei realmente a
entender como é maléfica a intervenção do Estado em nossas vidas, mesmo
quando a intenção é a melhor possível.
Em paralelo, seguia a coleta de assinaturas. Fazíamos um ranking
periódico dos membros do diretório do Rio por quantidade de assinaturas de
apoio coletadas. Por exemplo, no ranking de 7 de março de 2014, o
primeiro lugar foi de Ana Cláudia Moreira, com 127 assinaturas, e o
segundo foi de Marco Paulo Costa, com 109 assinaturas.
 
 
O ano de 2014 começou com eventos no Clube Israelita Brasileiro,
reunindo cada vez mais gente. Em maio, recebi um convite para substituir o
João em uma apresentação sobre o Novo para o grupo carioca do Instituto
de Formação de Líderes (IFL), uma entidade que forma lideranças com
base nos valores de estado de direito, liberdade individual, livre mercado e
respeito à propriedade privada. A apresentação foi no dia 26 de maio, na
residência da Paula Guedes, presidente do IFL no Rio. Eu não seria o único
apresentador. Havia um outro convidado, o então secretário municipal de
Transportes, Carlos Roberto Osório, que já preparava sua futura e bem-
sucedida candidatura a deputado estadual.
Como Osório tinha outro compromisso em seguida e precisava sair mais
cedo, ele falou primeiro, apresentando os planos da prefeitura para o
transporte público. Depois foi minha vez. Com o entusiasmo de quem fala
sobre aquilo em que acredita, expliquei o Novo, sua criação e seu ideário.
Lembro de ter criticado a arrogância implícita no pensamento exposto pelo
Osório (arrogância do raciocínio, não do Osório, que é, provavelmente, o
político mais gentil, educado e refinado que eu conheço[27]) – a arrogância
do conceito de planejamento centralizado, que dá a burocratas sentados em
um escritório refrigerado o poder de tomar decisões que afetam as vidas de
milhões de pessoas, sem que essas pessoas tenham sido consultadas.
Enquanto fazia a minha exposição, alguém abre a porta e se senta ao
lado da Paula. Olhando pelo canto do olho, eu o reconheci e congelei: o
recém-chegado era nada mais, nada menos que Paulo Guedes. Paulo era o
pai da Paula, e eu não sabia. Eu me senti totalmente envergonhado de falar
sobre liberdade econômica enquanto Paulo Guedes – um dos maiores
economistas do país – assistia.
Meu encontro seguinte com Paulo Guedes também seria acidental. No
início de 2018, Flávio Rocha havia se lançado pré-candidato à Presidência
da República e ainda procurava um partido. Em fevereiro alguém do MBL
(Movimento Brasil Livre) me ligou dizendo que o Flávio estaria na cidade
para um evento sobre varejo, será que eu gostaria de conhecê-lo e ir junto?
Encontrei com Flávio e sua comitiva para um café em Botafogo, e seguimos
para o teatro Oi Casagrande, onde estava sendo realizado o evento Pós-
NRF, que seria encerrado por ele com um discurso. Acabado o evento, eu já
me preparava para ir embora quando me convidam para uma reunião ali ao
lado. “Reunião com quem?”, perguntei. Paulo Guedes.
Caminhamos até o escritório do Paulo, na esquina de Ataulfo de Paiva
com Afrânio de Melo Franco – curiosamente, no canto oposto da mesma
esquina onde ficava (ou ainda fica) o escritório do João, que foi o primeiro
escritório do Novo.
O objetivo da reunião era conseguir o apoio do Paulo à candidatura do
Flávio Rocha. Paulo é sempre brilhante, e durante umas duas horas falou
sobre tudo o que nos interessava: economia, política, até sobre segurança
(Marcelo Rocha Monteiro, que também estava presente, adorou). Mas no
final disse que já tinha um candidato a presidente: Jair Bolsonaro. Veja:
estávamos em fevereiro de 2018, uma época em que muita gente ainda dizia
que a eleição seria ganha com tranquilidade por Alckmin.
Mal sabia eu que estava testemunhando a história viva.
 
 
Parênteses para viajar no tempo: não me lembro quando ouvi falar pela
primeira vez sobre o MBL. Deve ter sido no Facebook. Minha curiosidade
aumentou quando o Leo Fiad e a Andreia D’Oliveira assistiram a uma
manifestação organizada por eles em São Paulo e voltaram fascinados com
o grau de organização. Um dia, Alexandre Borges realizou um evento com
o MBL no shopping Fashion Mall. Um dos participantes era o Kim, o outro
– eu acho – era o Renan. Fiquei impressionado com o Kim, apesar de achá-
lo jovem demais para receber a reverência que já começava a atrair. Alguns
conhecidos se envolveram com o MBL, que começou a se organizar no Rio,
com uma base inicial em Niterói. Quando começaram as grandes
manifestações pela saída da esquerda do poder e a favor do impeachment da
Dilma, o MBL marcou presença com carros de som e organização, embora
nunca chegassem a ter no Rio a mobilização, o tamanho e o impacto que
tinham em São Paulo.
Em algum momento desse período, eu agendei uma reunião do João com
a cúpula do MBL. A reunião aconteceu no escritório do Novo em São
Paulo. A ideia era que pudesse ser traçada alguma ação conjunta entre o
MBL e o Novo, ou que os expoentes do movimento pudessem se candidatar
pelo partido, mas não houve entendimento.
Em junho de 2017, quando eles vieram ao Rio, Alexandra e eu os
recebemos em nossa casa para um jantar. Vieram Kim, Renan, Holiday e
Arthur, além de alguns membros locais do MBL. Todos eram articulados e
tinham um conhecimento incomum de política, e a conversa foi até as duas
da manhã. Também estava presente Marcelo Rocha Monteiro. Foi nessa
noite, depois de uma conversa do Marcelo com o Kim em torno de um prato
de lasanha bolonhesa, que o MBL começou a colocar segurança pública em
sua pauta.
Marcelo Rocha Monteiro e eu criamos um plano nacional de emergência
de segurança pública[28] e, com a ajuda do Leo Fiad, um projeto de lei com
modificações na legislação penal[29]. Através dos contatos do MBL,
consegui apresentar o plano ao então ministro Moreira Franco e ao
presidente da Câmara dos Deputados Rodrigo Maia, infelizmente sem
nenhum resultado concreto. Mas ainda hoje, um dos interlocutores que mais
respeito quando o assunto é segurança é o policial civil paulista Lucho
Andreotti, ligado ao MBL.
No dia 15 de setembro de 2017, Kim participou de um histórico evento
do Ministério Público do Rio de Janeiro. O seminário, cujo tema era
segurança pública e ideologia, durou um dia inteiro, e tinha vários outros
palestrantes; entre eles, eu e Alexandre Borges. Nós três – Kim, Alexandre
e eu – fomos os últimos a falar, no final da tarde. A visibilidade e a
abordagem do evento – uma denúncia da influência da ideologia
esquerdista na destruição do sistema de justiça criminal do Brasil –
incomodaram a esquerda, que sempre monopolizou a pauta de segurança
pública. Quando saímos para almoçar, já havia militantes acampados na
porta do prédio do Ministério Público. Ao voltarmos do almoço, fomos
hostilizados. Depois viemos a saber que, enquanto nós três palestrávamos,
uma notória militante da extrema esquerda carioca tentara invadir o
auditório, sendo impedida a muito custo pela segurança.
No final de semana de 11 e 12 de novembro de 2017, eu participei de um
painel sobre segurança pública no 3º Congresso Nacional do MBL, em São
Paulo. Meus colegas de painel foram Marcelo Rocha Monteiro e Benê
Barbosa, o maior especialista brasileiro em armamento. Nosso painel
aconteceu no maior salão, no qual estavam, com certeza, mais de mil
pessoas – minha maior plateia até então.
Foi assim que fui parar naquela reunião com o Paulo Guedes, em
fevereiro de 2018. O MBL flertava com o apoio à campanha de Flávio
Rocha à Presidência da República. Eu cheguei a viajar com o Flávio pelo
norte e nordeste, assessorando-o no assunto segurança pública. No início de
março de 2018, tive a honra de dividir com ele – e com Marcelo Rocha
Monteiro e Benê Barbosa – o palco do Teatro Riachuelo, na Cinelândia, no
Rio de Janeiro, em um evento sobre segurança pública organizado pelo
Movimento Brasil 200[30].
Foi nesse evento que conheci muitas pessoas do MBL Rio de Janeiro,
como o grande José Maria Filho, o Zema, que na época era o coordenador
do MBL na Baixada Fluminense. A partir dele, conheci Vinícius Ziza,
Bruno Christo, Bruno Souza, Renato Borges, Rafael Pereira, Rogério
Ramos, Matheus e muitos outros. No evento do Teatro Riachuelo, foi
lançada a campanha “Eu Apoio As Nossas Tropas”, em apoio à intervenção
federal na segurança pública do Rio, que havia sido decretada em fevereiro.
Em julho de 2018, fui a São Paulo gravar com Kim e Arthur o quadro de
entrevistas “Teste do Sofá”[31]. Em outubro, voltei a São Paulo para o 4º
Congresso Nacional do MBL, dessa vez levando meu filho João Felipe.
Vimos Paulo Guedes e Salim Mattar serem aplaudidos por um auditório
ainda mais lotado do que aquele para o qual eu havia palestrado no ano
anterior. Em determinado momento, a multidão começou a gritar:
“Privatiza! Privatiza!”.
Em janeiro de 2019, organizei o encontro de uma comitiva de deputados
recém-eleitos com o então ministro da Justiça Sergio Moro, com o objetivo
de pedir o endurecimento da lei penal[32]. Estavam presentes à reunião,
realizada no dia 30 de janeiro às 14h, além de Kim Kataguiri, os deputados
Marcel Van Hattem, Alexis Fonteyne, Paulo Ganime, Vinícius Poit, Lucas
Gonzales e Tiago Mitraud – eleitos pelo Novo –, Luiz Lima, Bia Kicis,
Carla Zambelli e o amigo Maurizio Spinelli. Entreguei ao ministro Moro o
texto do projeto de endurecimento da lei penal elaborado com Marcelo
Rocha Monteiro e Leo Fiad[33]. Moro folheou o documento sem comentar.
No final, anunciou que na segunda-feira seguinte já estava encaminhando
ao Congresso uma nova legislação, que ficaria conhecida como Pacote
Anticrime.
Ao longo de 2019, fui me afastando do MBL por perceber uma mudança
de rumo, que foi primeiro sinalizada por uma dificuldade de comunicação
com eles e confirmada quando anunciaram, para o 5º Congresso Nacional
do movimento, a participação de José Sarney, Michel Temer, Fernando
Collor, Lula e Dilma Rousseff. Respondi com uma nota pública de repúdio.
A nota dizia[34]:
Comunico meu REPÚDIO ao "painel de debate" do MBL com Sarney, Temer, Dilma, Collor e – se não estivesse
preso – Lula. Isso afronta minhas convicções, a confiança e os votos de milhares de pessoas e também a narrativa que
projetou o MBL: o combate à corrupção e à esquerda.
 
Esse “painel de debate” do MBL é mais do que um ato equivocado, feito no pior momento; ele é um gesto político
incompreensível, inexplicável e inaceitável.
 
Coloquei fé, apoiei, participei das manifestações com eles. Estou decepcionado e expressando meu repúdio a essa
atitude inconsequente, irresponsável e infantil, que trata a política como um concurso do meme mais zoeiro.
 
 
Meu afastamento dessa nova direção que o MBL tomou não afetou o
reconhecimento da contribuição que o movimento deu para a remoção de
Dilma e do PT do poder, e para o engajamento de uma nova geração de
jovens na política.
Mas pouco depois o MBL começava uma guerra aberta contra o
governo. Eu não podia me calar; isso foi motivo de uma outra nota
minha[35], de 10 de junho de 2020:
Em setembro do ano passado manifestei repúdio ao "painel de debate" da convenção do MBL com Sarney, Temer,
Dilma e Collor. Era um mau sinal. Hoje manifesto meu repúdio ao uso, pelo MBL, de táticas da extrema-esquerda que
tanto combatemos. Para fazer isso, já temos o PSOL.
 
Fecha parênteses. Voltemos a 2014.
Capítulo 8
Novas Portas
Em 2014 comecei um mestrado em gestão na Fundação Getúlio Vargas.
Na entrevista de admissão, com o Prof. Marco Túlio Zanini, falei
entusiasmado sobre o projeto do Novo. Quando as aulas começaram, o
Partido Novo continuou a ser assunto de sala de aula, especialmente quando
eu me deparava com professores cuja linha de pensamento tendia para o
lado oposto ao do liberalismo. Eu não havia entendido ainda o que Olavo de
Carvalho já dizia nos anos 1990, e que só fui entender com clareza quando
li Intelectuais e Sociedade, de Thomas Sowell: existe um consenso no
mundo acadêmico em torno de posições de esquerda. É um monopólio
“progressista”, silencioso, invisível e onipresente.
Qualquer tintura ideológica um pouco mais forte que a social-
democracia pode destruir uma carreira acadêmica. Liberalismo econômico e
conservadorismo político, mesmo em suas formas mais tímidas, são
persona non gratas na academia, onde muitos vivem de recursos públicos,
inventando projetos malucos e teses radicais para conseguir protagonismo.
Como explica Thomas Sowell, quanto mais rebelde, esdrúxula e radical a
ideia, mais destaque o acadêmico consegue. O problema é que, depois, esse
lixo intelectual é consumido pela sociedade como dogma.
A coisa é tão complicada que, dois anos depois, quando pensei em fazer
um doutorado, um dos professores da banca examinadora (não vou citar o
nome da instituição), depois de conhecer a minha história, me fez a seguinte
pergunta: “Como você se sentiria tendo um professor esquerdista?”.
Mas eu ainda não tinha consciência disso quando me sentei nos bancos
da FGV. Aprendi muito ali. Os pontos altos do curso eram as aulas do Prof.
Álvaro Cyrino – nas quais ele usava estudos de caso de Harvard – e do
Prof. Marco Túlio, que era também o coordenador do curso.
O mestrado abriu novas portas, não só pelas aulas, mas porque decidi ir a
fundo na exploração das fontes de conhecimento que me apresentavam.
Segui uma recomendação do meu amigo Márcio Colmerauer: o que você
tira do mestrado depende do esforço que você coloca nele. Quando um
professor entregava o plano de aulas com a lista de referências
bibliográficas, eu comprava todos os livros que conseguia encontrar. Os
livros em inglês eram os mais fáceis: esses eu comprava no site da Amazon
americana. Pouca gente sabe que a Amazon vende livros usados, que
costumam ser muito baratos (cheguei a comprar livros por 1 ou 2 dólares).
Eu comprava e lia tudo. E assim fui percebendo que, muitas vezes, a aula
do professor era só uma versão diluída e altamente simplificada de um
assunto riquíssimo.
Foi assim que descobri autores como Geert Hofstede, o psicólogo social
holandês, criador da teoria das Dimensões Culturais. Seu livro Culturas e
Organizações: O Software da Mente explica, com base em estudos
estatísticos de décadas, como adquirimos a cultura e como essa cultura
produz as diferenças que observamos entre os países. Descobri também
Peter Drucker (A Sociedade Pós-Capitalista), Douglass North (Institutions,
Institutional Change and Economic Performance), Michael Porter
(Competitive Strategy) e muitos outros que não caberiam aqui (mas estão
listados na bibliografia no final deste livro).
Um dia, pegando carona de volta para casa com o Prof. Marco Túlio,
descobrimos que morávamos em prédios colados – literalmente, se eu abrir
um buraco na parede da minha sala caio quase dentro do apartamento dele.
Fomos nos aproximando; de vez em quando íamos caminhar na praia e um
dia levamos nossas filhas – que são quase da mesma idade – para brincar.
Eu ia com frequência ao seu gabinete na FGV trocar ideias e falar de
projetos e política. Em pouco tempo nos tornamos amigos, e a amizade
passou a envolver nossas famílias.
Marco e sua esposa, que também era professora da FGV, tinham
comprado uma propriedade em Araras que reformaram totalmente, com a
intenção de montar um centro de estudos e conferências. Passamos lá vários
finais de semana regados a vinho e boa conversa. Nossas filhas ficaram
amigas e iam com frequência brincar na casa uma da outra. Também nos
encontrávamos em nossas casas para almoços e jantares, e Marco e sua
esposa sempre ouviam com curiosidade meus relatos sobre o Novo. Aqui
cabe uma observação: a esposa do Marco tinha uma visão do mundo
nitidamente social-democrata e progressista – de esquerda – e identificação
com pautas conflitantes com o ideário que eu construía no Novo, o que,
muitas vezes, me colocava em situações difíceis em nossas conversas.
A esposa do Marco também era professora do mestrado. Seu nome era
Carmen Migueles.
 
 
No domingo, dia 16 de fevereiro de 2014, fizemos o primeiro Dia do
Novo, um evento de rua nacional que acontecia simultaneamente em várias
cidades, para coleta de fichas de apoio. Nessa altura, já tínhamos cerca de
346 mil certidões e mais de duzentas mil fichas em processo de certificação.
Finalmente, em julho, o partido dava entrada com o processo de registro
no TSE, apresentando mais de 500.000 assinaturas certificadas. Agora era
esperar.
No dia 16 de agosto, realizou-se a primeira Reunião Nacional do partido
em São Paulo, no Renaissance Hotel Marriot, na Alameda Santos. Fui
convidado para fazer uma das palestras e aceitei com prazer[36]. Subi ao
palco de terno e abri meu coração:
Vocês não sabem a emoção que eu sinto de estar aqui hoje. Eu não sei como estou
conseguindo falar [...] conheço algumas pessoas que estão envolvidas no projeto do Novo
há bastante tempo. Eu me lembro de uma reunião, em uma sala do Rio de Janeiro, há três,
quatro ou cinco anos atrás, três ou quatro pessoas ao redor de uma mesa, falando sobre
mudar o Brasil [...] por que a gente não cria um partido? Mas, para criar um partido,
precisamos de 500 mil assinaturas [...] e cá estamos nós com as 500 mil assinaturas.
Em seguida, fiz agradecimentos:
Eu queria fazer um agradecimento sincero ao João, que é um cara de coragem cívica e
disposição espetaculares, e queria agradecer também à Rosa, que teve um papel enorme
nesse projeto.
Agradeci ao Marcos Alcântara, ao Cristian Lohbauer e ao Fábio Ribeiro,
e entrei no assunto principal:
Temos duas formas de descrever o Novo. Uma forma é dizer que ele é um movimento
de cidadãos que estão insatisfeitos com o país e querem mudanças profundas. Uma outra
forma de descrever o Novo é dizer que ele é o único partido político do Brasil, existente ou
em formação, que está sendo criado sem o envolvimento de nenhum político.
A plateia aplaudiu, eu respirei fundo, andei para o lado direito do palco e
continuei a falar das ideias e propostas do partido.
A atração principal do evento foi Bernardinho. Durante muito tempo,
João teve a esperança, que chegou a virar expectativa, de que Bernardinho
fosse o candidato do Novo na primeira eleição para o Executivo (que
provavelmente seria em 2016). Não existe nada mais imprevisível do que
política, mas eu acho que Bernardinho teria sido um bom candidato.
No dia seguinte, 17 de agosto, um domingo, foi realizada uma reunião
interna com pessoas que estavam organizando o partido em vários estados.
A reunião foi marcada por muita discussão e debates, alguns bastantes
acalorados, sobre a autonomia que os diretórios teriam após a formalização
do partido pelo TSE. Lembro que dois dos participantes mais interessados
nessa questão eram Patrícia Bueno, filiada ao Novo de São Paulo – que
seria candidata a deputada em 2018 – e Rodrigo Saraiva Marinho, do Ceará.
Os dois – principalmente Rodrigo – subiram a temperatura da discussão,
resistindo com firmeza ao que identificavam como uma centralização
excessiva na estrutura do partido.
Foi nesse evento que conheci Hélio Beltrão.
Hélio, cujo nome completo é Hélio Marcos Coutinho Beltrão, é filho de
Hélio Beltrão, que foi ministro do Planejamento em 1969 e ministro da
Previdência de 1982 a 1983. Mas o Hélio pai ficou mesmo conhecido como
o primeiro ministro da Desburocratização do Brasil, de 1979 a 1983. Isso o
tornou extremamente popular; me lembro de suas aparições na TV
anunciando medidas de combate à monstruosa burocracia deste país, que
até hoje nos afoga.
Hélio Beltrão, o filho, participa da luta pela liberdade no Brasil. Além de
fundar e ser membro do conselho consultivo do Instituto Millenium, fundou
e preside o Instituto Mises Brasil e a editora LVM. Desde nosso primeiro
encontro, sempre esteve à disposição para ajudar com o projeto do Novo.
Foi com Hélio e com o Rodrigo Constantino que tive minhas primeiras
aulas sobre Liberalismo (e Libertarianismo).
 
 
No dia 25 de agosto, Christian Lohbauer veio ao Rio, e fui encontrá-lo
no Copacabana Palace. Tomamos um café e falamos sobre a estratégia do
Novo e os desafios que nos aguardavam. A impressão que tive do Christian
sempre foi a melhor possível – talentoso, bem-informado, preparado e bem-
intencionado.
 
 
No dia 11 de setembro, fizemos uma reunião geral do Novo Rio de
Janeiro no Clube Israelita Brasileiro, com o salão completamente lotado.
Foram 334 convidados previamente registrados e outros tantos que se
registraram na hora. Eu abri o evento, e João falou depois de mim. Foram
estas as palavras que usei na abertura:
Bem-vindo ao NOVO
 
Obrigado por sua presença na Reunião Geral do NOVO Rio de Janeiro.
 
O NOVO defende uma democracia republicana com economia de mercado, gestão
pública de qualidade e verdadeira representação eleitoral. Acreditamos que o indivíduo é o
único gerador de riquezas. Defendemos uma visão de longo prazo. Acreditamos nas
liberdades individuais, e não do Estado babá, que precisa interferir na vida dos cidadãos a
todo momento. Acreditamos na igualdade de todos perante a lei. Somos contra todos os
privilégios.
 
Acreditamos na simplificação da legislação. Acreditamos no livre mercado com o
mínimo de intervenção estatal. O Estado deve oferecer excelência nos serviços essenciais –
saúde, educação, segurança e justiça. Acreditamos na necessidade de redução da carga
tributária, que esmaga o cidadão e sufoca a economia.
 
Criamos um partido diferente, com ficha limpa também para filiados, onde dirigentes
partidários não podem ser candidatos para que não usem o partido em benefício próprio, e
onde os candidatos só podem ser reeleitos uma vez para o mesmo cargo. Um partido criado
sem o envolvimento de nenhum político – para que pudéssemos pensar como cidadãos,
sem a influência de nenhum outro interesse além de entregar um país melhor aos nossos
filhos.
 
Porque a política, antes de tudo, tem que fazer sentido. Porque democracia não é
suficiente; é preciso cidadãos que sejam dignos dela – e é preciso ter esses cidadãos no
poder.
 
Todos são bem-vindos.
 
 
 
Eu continuava produzindo grande quantidade de textos sobre o partido,
que postava no blog e no Facebook. Um dia um dos meus textos foi
comentado por Stephen Kanitz. Ele era um ídolo, um guru dos negócios –o
responsável pela edição anual das Melhores e Maiores da revista Exame,
que listava as empresas brasileiras com melhor desempenho a cada ano.
Imediatamente mandei uma mensagem pelo Facebook, trocamos telefones e
eu liguei para ele no dia 17 de setembro. Ficamos mais de duas horas
falando sobre o projeto do Novo. Stephen fez várias sugestões inovadoras e
originais. Ele tinha um cadastro com mais de dois mil nomes dos melhores
executivos e profissionais de negócio do país – por que não os convidar a
formar uma tropa de elite para ajudar o Novo? Ele chamava essa tropa de
Equipe 2.000. Outra ideia interessantíssima era a transformação do Senado;
os estados passariam a ser representados lá por seus vice-governadores, e
não mais por senadores eleitos para isso. Naquela época, Stephen já tinha
também uma grande preocupação com o ativismo judicial.
Stephen ficava em São Paulo, onde o João passava a semana. Liguei para
o João e agendei um encontro dele com o Stephen. Eles conversaram, mas
não houve nenhum resultado imediato.
Eu encontraria Stephen pessoalmente só muitos anos depois, em uma
visita sua ao Rio. Presenteei-o com um exemplar do meu primeiro livro, Ou
Ficar A Pátria Livre, e ganhei um boné verde bordado com letras brancas
que formavam a frase “Make South America Great Again”.
 
 
No dia 22 de setembro de 2014, João foi o convidado do evento Fashion
Monday, que o Alexandre Borges organizava na Livraria Cultura do
shopping Fashion Mall, e no dia 30 organizamos outro evento no teatro do
Fashion Mall, com 307 pessoas na plateia. Eu fiz a abertura, João falou em
seguida, e depois falaram Rodrigo Constantino e o advogado, político e
amigo Rodrigo Mezzomo.
 
 
 
É fácil criticar as posições do passado com o olhar privilegiado do
futuro. O fato é que, nas eleições de 2014, Aécio Neves era a grande
esperança dos brasileiros que não aceitavam outro mandato presidencial nas
mãos da esquerda. Era Aécio ou Dilma – e muita gente, eu inclusive, fez
campanha para Aécio, discutiu com amigos e parentes e entrou, pela
primeira vez, em batalhas nas redes sociais por causa da política.
 
No início de outubro, eclodiu um debate interno: o Novo deveria ou não
se posicionar nas eleições presidenciais? Finalmente, o diretório nacional
fez uma consulta aos líderes do partido sobre uma eventual manifestação de
apoio do Novo à candidatura de Aécio Neves. O líder de Rondônia foi a
favor: “Não podemos cogitar a possibilidade de um quarto mandato do PT”,
disse ele em um e-mail de 9 de outubro. Outro líder, do Rio Grande do Sul,
foi contra: “Voto no Aécio e faço campanha para ele. Mas não vejo o que
teremos a ganhar ao declarar apoio. Sou contra. Radicalmente contra!”. Eu
respondi: “Nem tudo o que fazemos é porque vamos ganhar alguma coisa
com isso. Terrível vai ser não fazer nada e a Dilma ganhar”. Um líder de
Santa Catarina disse: “Acredito que perderíamos mais credibilidade ainda
se nos mantivermos calados neste momento tão importante”.
O jornal O Dia oferecera ao João a possibilidade de publicar um artigo
na sua página de Opinião, na edição de domingo. João me perguntou se eu
tinha interesse, e eu enviei um texto, que foi publicado por O Dia em sua
edição de 5 de outubro de 2014[37]:
A Fraude do Radicalismo
 
Nessa época é comum ver o político de punho fechado. “É preciso mudar o que está
aí”, ele diz. “É preciso uma mudança radical”.
 
O Brasil está cheio de radicais, de pessoas comprometidas com a mudança. O que
importa é ser intransigente e esbravejar.  São os radicais da piada pronta, sem preparo e
sem entendimento de como funciona o mundo. “Vamos parar de pagar a dívida pública”,
anuncia um deles, sem saber que o dinheiro que tem na poupança faz parte desta dívida.
 
Os radicais fizeram uma Constituição que nos garante inúmeros direitos, e o país
continua violento, injusto, corrupto. Proclamam-se como sagrados nossos adolescentes,
que não podem ser presos ou punidos, mas podem mendigar pelas ruas e crescer em
reformatórios. Nossos legisladores radicais, incapazes de legislar, nos legaram um Código
Penal que permite que assassinos andem livres, uma Justiça que leva décadas para julgar, e
leis trabalhista e tributária campeãs mundiais de complexidade, atraso e injustiça social.
 
Escolhemos representantes sem nenhum critério. Elegemos indivíduos só porque foram
bons esportistas, ou estiveram no BBB, ou são filhos de caciques políticos. Elegemos
garotos que nunca tiveram um emprego, nunca souberam o que é um chefe – gente que
nunca emitiu uma nota fiscal, varreu uma sala, ensinou uma matéria ou cuidou de um
paciente.
 
São esses radicais que criaram a lei que regulamenta as mesas de sinuca dos botecos de
São Paulo. São eles que querem proibir a importação de publicações estrangeiras. São eles
que resolveram trocar todas as tomadas do país. São eles que inventam as regras e
regulamentos que complicam nossa vida. É por causa deles que somos achacados por
fiscais, guardas de trânsito e burocratas corruptos. São eles que comem caviar nos jatinhos
da FAB.
 
O verdadeiro radicalismo é reduzir o desperdício de dinheiro público, o número de
cargos comissionados, a carga tributária, o salário dos parlamentares, o número de leis. É
diminuir a burocracia e aumentar a competição entre as empresas, reduzindo preços para o
consumidor. É garantir a plena cidadania e a igualdade de todos perante a lei, com uma
polícia que nos proteja e uma Justiça que resolva nossos problemas rapidamente. 
 
É acabar com o voto obrigatório, para que o voto seja um gesto voluntário e consciente.
 
Porque política não é profissão, mas uma missão de serviço ao país a ser cumprida por
quem tem a seriedade, a competência e a determinação necessárias. 
 
O resto é pura fraude.
 
 
A votação do primeiro turno das eleições presidenciais foi no mesmo dia
em que o artigo foi publicado. Dilma teve 41,59%, Aécio ficou em segundo
com 33,55% e Marina Silva em terceiro com 21,32%. Haveria segundo
turno.
 
No dia 10 de outubro, o diretório nacional resolveu divulgar a seguinte
nota no Facebook:
"O povo brasileiro, nas últimas décadas, obteve duas conquistas importantes: um
Estado democrático com as instituições de direito e a estabilidade econômica. Há ainda
uma terceira conquista fundamental a ser alcançada: a redução do tamanho e da
interferência do Estado, devolvendo maior autonomia e liberdade ao cidadão. Somente
desta forma teremos um ambiente menos propício à corrupção, permitindo maior geração
de riquezas e melhor qualidade de vida para todos.
Gostaríamos muito de ir às urnas para eleger um candidato que se comprometesse com
esta proposta. Infelizmente, no Brasil, essa iniciativa não é defendida de forma clara e com
convicção por nenhum dos partidos políticos existentes – e por isso o NOVO está sendo
criado. O momento, portanto, não é de avanços, mas deve ser, ao menos, de preservação. A
democracia brasileira e o poder de compra da nossa moeda estão cada vez mais ameaçados
por um governo que adota uma ideologia ultrapassada, é péssimo gestor e tem como
objetivo se perpetuar no poder a qualquer custo.
Nesta situação, não podemos nos omitir. O projeto do PSDB não é o projeto do NOVO,
mas preservar as conquistas obtidas é fundamental para progredirmos e implementarmos o
modelo em que acreditamos.
No dia 26, vamos manifestar o nosso descontentamento com o que vivenciamos nos
últimos anos. Vamos votar no candidato da oposição ao atual governo e continuar
trabalhando arduamente para tornar as ideias do NOVO conhecidas, entendidas e aceitas,
transformando o Brasil em um país admirado."
 
No dia 24 de outubro, uma pesquisa feita pela revista Isto É e pelo
instituto Sensus mostrava Aécio Neves com 54% das intenções de voto,
contra 45% da Dilma. No dia da votação do segundo turno, fomos às urnas
cheios de esperança. Votei de manhã cedo. No início da tarde, o clima era
de euforia contida; rumores nas redes sociais diziam que Aécio já
providenciava um jatinho para se deslocar para Brasília e comemorar a
vitória. Muitos já ensaiavam uma celebração pela derrota do PT. Mas,
quando os resultados foram anunciados, Dilma Rousseff tinha sido reeleita
com 51,64% dos votos.
A reeleição da Dilma seria a gota d’água para muitos de nós. As
perspectivas para o futuro eram, mais uma vez, desastrosas. Havia genuíno
desespero nas pessoas. Lembro que, ao final de um dos eventos no Fashion
Mall, uma senhora – esposa de um de nossos companheiros – veio falar
comigo, agitada: “Vocês precisam ir para Brasília urgente!”. Mas o partido
ainda não tinha nem o registro.
 
 
No dia 29 de outubro, João e eu voltamos ao Fashion Mall para nova
apresentação, e dessa vez o convidado especial foi Alexandre Borges, que
falou sobre doutrinação cultural. Na hora das perguntas alguém mencionou
o momento desesperador que o Brasil vivia, sofrendo uma “infiltração do
mal” em todas as instituições – um sentimento parecido com o que existe
hoje, enquanto escrevo este livro, em meio a uma pandemia e mais uma
crise política. Foi assim que respondi[38]:
O Brasil não vai acabar amanhã. O Brasil não vai acabar. O Brasil é muito maior do
que o PT, vocês são muito maiores do que o PT. O que a gente encontra no nosso dia a dia
do Novo de gente inteligente [...] do jeito que tem infiltração do mal, tem infiltração do
bem. Todo dia eu recebo um e-mail de um cara da Receita Federal, do Ministério Público,
da Polícia Federal. As pessoas de bem estão em todos os lugares. Talvez elas estejam com
medo [...] A gente só precisa fazer essa coisa acontecer.
 
Em seguida, alguém fez uma pergunta sobre doutrinação cultural e o que
fazer para esclarecer as pessoas mais humildes, evitando que caiam nas
falácias divulgadas pela esquerda. Sobre isso eu fiz o seguinte
comentário[39]:
  [...]estudei em um colégio tradicional no Rio de Janeiro. Na semana passada eu bati
boca com uma ex-colega de colégio [...] ela comentou um post meu e disse “concordo com
tudo isso que você falou, mas para mim socialismo é a gente querer que todo mundo tenha
a mesma oportunidade”.
Eu disse para ela: “Querida, isso é solidariedade. Você está confundindo. Socialismo é
quando todos os meios de produção pertencem ao Estado”. É como o Alexandre (Borges)
falou: esse combate está na hora da gente fazer no dia a dia. Chegou um amiguinho com
camiseta do Che Guevara, não dá mais para dar aquele sorriso condescendente e deixar
para lá, porque eu não vou me indispor com o cara. Tem que sentar o cara aqui e
[perguntar] você sabe quem é [Che Guevara]? Você já foi a Cuba?
Sem que eu percebesse, as questões dos valores morais e da guerra
cultural começavam a entrar no meu radar.
 
Capítulo 9
Da Alemanha à Tijuca
No meio de 2014, fizemos um contato com a Fundação Friedrich
Naumann, ligada ao Partido Democrático Liberal alemão (FDP), através de
sua então presidente, a gentilíssima Beate Forbiger. A Naumann era
conhecida por apoiar organizações liberais brasileiras e patrocinar
intercâmbio para entusiastas da liberdade. Fomos convidados a enviar um
representante a um workshop sobre estratégia política que seria realizado na
Alemanha, na cidade de Gummersbach. João sugeriu que eu representasse o
Novo. A Naumann pagaria hospedagem e transporte, e eu pagaria uma taxa
de 260 euros.
Embarquei no dia 10 de outubro para Frankfurt e de lá peguei um trem
para Colônia, onde me esperava um carro para me levar até Gummersbach.
Era a minha primeira visita ao país, e a Alemanha foi uma surpresa para
mim: o país parecia uma versão melhorada dos Estados Unidos. A
organização, a beleza dos lugares – tanto na zona rural quanto nas cidades
–, a limpeza, a variedade dos hábitos, tudo me impressionou.
As estradas eram absolutamente perfeitas. Os banheiros públicos,
impecáveis. As casas, grandes e pequenas, eram bem cuidadas nos mínimos
detalhes. Era inimaginável pensar que aquele país tinha sido arrasado pela
guerra.
O workshop foi conduzido pelo alemão Wulf Pabst e pelo sul-africano
Nick Clelland, que começaram do básico, explicando os fundamentos da
atividade política até chegar ao planejamento estratégico. As três dezenas
de participantes – vindos das Filipinas, Mongólia, Costa do Marfim, Índia,
Tibet, Rússia, Jordânia, África do Sul, Indonésia, Kosovo, Honduras,
Paquistão, Zimbabwe, Bulgária, Ucrânia, Malásia e Guatemala – eram
divididas em grupos para a realização de diversos trabalhos e exercícios,
que deveriam evoluir até o trabalho final, quando todos se engajariam na
preparação do plano estratégico para um partido político. E aí é que estava a
cereja do bolo: cada um dos participantes faria uma exposição sobre o
partido ao qual pertencia, para que um deles, e somente um, fosse escolhido
para ter seu plano estratégico formulado pelo grupo.
Adivinhem qual foi o partido escolhido?
Foram dias em que aprendi que muitos dos nossos problemas e questões,
que achamos que são específicos do Brasil, são, na verdade, problemas de
todos os países – são os problemas da política, questões universais de
aquisição, manutenção e uso do poder.
Sentávamo-nos todos os dias em uma enorme mesa em formato de “U”.
No meu lado esquerdo se sentava Mian Imran Masood, do Paquistão, e no
lado direito Thomas Walters, da África do Sul.  Se você acha a política
brasileira complicada, imagine a do Paquistão. A África do Sul tem
problemas parecidos com os nossos, especialmente a criminalidade, que lá é
tão grave ou pior que no Brasil. Meus dois vizinhos de mesa eram gente
finíssima, mas, enquanto Thomas era discreto e quase tímido, Mian tinha a
autoconfiança e a postura de quem tinha uma posição poderosa e uma
carreira promissora – ele já havia sido ministro da Educação e da Saúde do
Punjab. Quando conheceu a minha história, passou a me chamar
jocosamente de “El Presidente”.
Durante o processo de escolha do partido para o qual prepararíamos a
estratégia, cada um falou de seu partido e do contexto do seu país. Uma das
maiores satisfações que tive na vida foi explicar àquele grupo quem era
Lula (que ainda era considerado, pela maioria dos que estavam ali, como
quase um santo).
A Fundação Friedhich Naumann fora criada após a Segunda Guerra
Mundial. Todos os partidos alemães têm uma fundação. Existe orçamento
no parlamento alemão para as fundações dos partidos políticos. O
desembolso dos recursos é baseado na média dos resultados das últimas
quatro eleições. Como eu era membro de um partido que trabalhava pelo
fim do financiamento público de partidos, foi interessante saber que o
Estado Alemão via nesse financiamento um instrumento importante de
manutenção do sistema democrático.
Conversando com um membro do FDP, o Partido Democrático Liberal
alemão, falamos do papel do Estado e de como é complicado atingir um
equilíbrio. Eu perguntei em que ponto o Estado alemão ainda poderia se
aprimorar. Para minha surpresa, sua resposta foi que a polícia poderia ser
melhor. “Hoje, se você é vítima de um crime ou delito que eles consideram
menor – alguém roubou um objeto seu, por exemplo –, eles não dão muita
importância, pouca coisa acontece”. Eu falei sobre os 57.000 assassinatos
anuais no Brasil, os 92% de inquéritos de homicídios que não apontam
culpados e os 2% de investigações de assaltos que são solucionados. O
queixo dele caiu.
Fiquei surpreso ao constatar que o termo liberal não parecia ter o mesmo
significado para todos que estavam ali. Conheci naquele grupo vários
liberais que eram políticos profissionais, sempre com cargos no governo, o
que afrontava o conceito de liberalismo que pregávamos na época.
Uma das coisas que anotei, e jamais esqueci, foi uma observação de Nick
Clelland, que era membro do partido Aliança Democrática da África do
Sul: "Nosso desafio é descobrir como gerenciar um partido político liberal,
onde cada um tem sua opinião e cada um quer decidir os destinos do
partido. Precisamos investir menos energia e esforço lidando com nossos
membros e focar mais no cidadão que vota ou pode votar em nosso
partido”.
Eram palavras proféticas.
 
 
 
De volta ao Brasil, no dia 13 de novembro de 2014 realizamos nosso
primeiro evento fora da zona sul, no Instituto Superior de Educação do Rio
de Janeiro – ISERJ[40] –, na rua Mariz e Barros, na Tijuca. O evento só foi
possível graças a uma autorização especial para que usássemos o auditório
do instituto. O auditório era gigantesco – era, na verdade, um enorme teatro,
com um palco espaçoso e alto. Minha primeira preocupação foi: como
vamos encher todas essas cadeiras?  
Aquela apresentação foi um marco. Por incrível que pareça, havia muita
resistência por parte de algumas pessoas em sair da zona de conforto do
Leblon e bairros vizinhos. Ir à Tijuca foi um ato de ousadia (e já estávamos
até planejando a próxima apresentação em Irajá). Além disso, faríamos uma
apresentação em uma instituição pública dominada – como quase todas
eram, e ainda são – pela mentalidade do Estado onipresente, a quem tudo
cabia resolver. E se a turma da esquerda resolvesse atrapalhar? E se desse
confusão? Fomos à Tijuca preparados para o pior.
Foi na palestra do ISERJ que incorporei uma dica que Fábio Ribeiro
havia me dado ao assistir o vídeo de uma das primeiras versões da minha
apresentação. Ele tinha dito: “Motta, você fala bem, mas o tom está muito
negativo. As pessoas chegam ao final desanimadas”. Ele tinha razão; a
partir daí entendi que, quando as pessoas te dão licença para que você entre
momentaneamente na mente e no coração delas, é importante que você
deixe uma mensagem de esperança. Até hoje sou grato ao Fábio pela lição.
Quatrocentas pessoas se inscreveram para o evento do ISERJ, vindas de
vinte municípios diferentes. Uma pesquisa feita no momento da inscrição
indicou que, na opinião dos inscritos, os principais problemas do Brasil
eram corrupção, educação e impunidade.
Convidei vários membros do grupo para subirem ao palco e dizerem
algumas palavras. Lembro que Rafael Hollanda e Marco Paulo Costa
falaram. A abertura foi feita pelo Andrew Hancock:
Eu sou voluntário, meu nome é Andrew. Estou como membro do diretório do Rio de
Janeiro como voluntário. Sou profissional liberal. Estou muito feliz de fazer parte desse
novo instrumento para a gente fazer política da forma correta no Brasil que é o Novo.
Queria trazer ao palco Roberto Motta, presidente do diretório do Rio de Janeiro.
Subi ao imenso palco um pouco nervoso, vestindo a camiseta branca do
Novo e uma calça jeans. Atrás de mim, os slides eram projetados em uma
tela gigante. Comecei a falar com a mão esquerda no bolso da calça. Entre
outras coisas, eu disse:
A mensagem do Novo é muito simples. Ela não é nenhuma ideia revolucionária e não
envolve nenhuma ideologia exótica criada por homens barbudos do século passado. A
mensagem principal do Novo se resume em duas ideias. A primeira é que política não é
negócio. Política não é meio de enriquecimento. Política é uma forma de servir à
comunidade. A segunda ideia é que políticos e administradores públicos precisam ser
competentes. Essas são as duas coisas mais importantes desta apresentação.
E para explicar o porquê dessas ideias eu queria contar para vocês a história de duas
mulheres.
Duas Marias.
Na tela atrás de mim foi projetado um slide com a foto antiga de uma
mulher, aparentando entre 30 e 40 anos, cabelo preto cortado curto e usando
um vestido branco. Eu continuei:
Ela nasceu em 1886 em Mariana, no interior de Minas Gerais. Ela nasceu durante a
administração do presidente Prudente de Morais, terceiro presidente da República do
Brasil. Levava uma vida humilde. Tinha um pedaço de terra que ela cultivava com o
marido. Em 1926 Dona Maria teve o seu quinto filho. A família fabricava tijolos em uma
olaria caseira, colocava os tijolos em lombo de burro e saía vendendo pelo interior de
Minas. Dona Maria foi uma mãe dedicadíssima. Depois da Segunda Guerra Mundial, foi
lançado no Brasil o primeiro antibiótico, a penicilina, que era anunciado como remédio
milagroso. Dona Maria não sabia direito o que era aquilo. Mas ela juntou o dinheiro que
tinha em casa e levou os cinco filhos para tomar uma injeção de penicilina [...]
O filho caçula de Dona Maria era o meu pai.
Contei um pouco da história da minha família, do Brasil de quando eu
era jovem, da minha ida para os EUA e de como isso tinha mudado a minha
cabeça, e voltei ao tema central:
Aqui entra a função principal do Novo: ser um instrumento de participação do cidadão
comum na política. Vamos selecionar, preparar e eleger pessoas cujo único compromisso é
com o bem-estar da sociedade.
Nós somos contra o político profissional. Política é coisa para amadores. Na definição
da palavra amador: aquele que ama. Que ama sua família, que ama sua cidade, que ama o
seu país. O Novo foi criado para que esses cidadãos amadores, sérios e trabalhadores
tenham uma chance na política.
Acreditamos que a liberdade precisa ser respeitada. A liberdade de ir e vir em paz, a
liberdade de se expressar, de ter sua casa protegida, liberdade para dormir tranquilo de
noite.
Falei das ideias e propostas, do estatuto do partido, e depois perguntei:
“Vocês lembram que eu disse que ia contar a história das duas Marias?”.
Nesse momento foi projetado de novo o slide com a foto da minha avó.
A primeira foi Dona Maria José, minha avó que morreu muito antes de eu nascer. A
única coisa que a família tem dela é essa foto.
O slide na tela mudou: agora era projetada uma foto recente de uma
garotinha sorridente, em um vestido rosa e roxo.
A segunda Maria é a minha filha, Maria Fernanda. Ela tem quatro anos, e foi por causa
dela e do seu irmão que eu me envolvi no projeto do Novo.
 
 
Quem também falou, pela primeira vez, foi Leonardo Fiad.
Excepcional é uma palavra que serve bem para descrever o Leo. Ele
assistira às apresentações no Shopping Leblon e no Hotel Marina, e acabou
pegando o meu contato em uma apresentação no Shopping da Gávea. Aos
poucos foi se integrando às nossas atividades, sempre muito tranquilo –
tranquilidade é outra palavra que descreve o jeito zen do Leo e que disfarça
seu imenso preparo, cultura e inteligência. Eu não tinha a mínima ideia do
que ele fazia. Era muita gente, muita agitação e muita adrenalina ao meu
redor, e eu não conseguia acompanhar tudo. Até que, no dia do evento do
ISERJ, fiquei surpreso com o que ele disse.
Um dos problemas que ainda tínhamos era a falta de pessoas suficientes
para responder às perguntas que eram feitas sobre o partido no Facebook.
Pedi ao Leo então que preparasse um “FAQ” – um texto com as perguntas
mais comuns e suas respostas.  Quando eu recebi o texto, fiquei chocado: o
texto do Leo era perfeito, não só no estilo, na clareza e na didática, mas no
entendimento de todos os conceitos e princípios.
Imediatamente convidei Leo para almoçar. Nos encontramos no
restaurante que fica no subsolo do edifício do Clube de Engenharia, na Av.
Rio Branco. E naquele almoço eu descobri que o Leo – com sua cara de
garoto, aparentando vinte e poucos anos – era advogado e tinha um cargo
importante. Iniciamos uma amizade que logo incluiu nossas famílias – sua
esposa Andreia Oliveira, empreendedora e empresária, foi também
participante ativa do Novo, coordenando várias atividades como o Grupo de
Trabalho sobre Liberdade Econômica e Competitividade. Nossa amizade
dura até hoje e, agora, inclui o Guga.
 
 
Pouco depois o grupo de estudos do Novo divulgava a primeira lista de
livros recomendados para os filiados iniciantes:
1. A Lei, de Frederic Bastiat
2. A Anatomia do Estado, de Murray Rothbard
3. As Seis Lições, de Ludwig von Mises
4. Economia numa Única Lição, de Henry Hazlit
5. A Mentalidade Anticapitalista, de Ludwig von Mises
6. O Caminho da Servidão, de Friedrich von Hayek
 
 
Com o apoio da Fundação Naumann, decidimos organizar um Seminário
de Formação de Multiplicadores do Novo, com o objetivo de promover uma
melhor integração do nosso grupo no Rio. O evento foi realizado no final de
semana de 22 e 23 de novembro, nas salas Arcos da Lapa e Corcovado do
Novotel Santos Dumont, na Av. Marechal Câmara, no centro da cidade.
O seminário foi conduzido por um consultor especializado, um ser
humano excepcional e grande conhecedor da boa política, chamado
Marcelo Puppi, que nos deixou precocemente no início de 2021. Marcelo,
que veio a ser eleito prefeito de Campo Largo, no Paraná, em 2017,
combinava experiência, didática e capacidade de emocionar. Umas vinte
pessoas participaram do seminário, que incluía dinâmicas e exercícios e deu
a cada um a oportunidade de se expressar e conhecer os outros. Enquanto
Marcelo Puppi operava sua mágica, eu tirava fotos. Em um determinado
momento, Marcelo parou o que estava dizendo, fez uma pausa na frente do
grupo, olhou na minha direção e disse: “Já mediei muitos eventos como
esse, mas nunca vi um líder que tirasse fotografias de sua equipe”. Querido
Marcelo, hoje eu posso dizer: na minha longa estrada nos negócios e na
política, eu nunca vi alguém conduzir reunião ou seminário com tanta
sensibilidade como você. Vá com Deus, meu amigo.
Sugerimos ao diretório nacional adotar o modelo de seminário do
Marcelo Puppi em outras cidades. No dia 15 de dezembro de 2014, fui
convidado para uma reunião do diretório em São Paulo com a presença do
Marcelo e da Beate, para discutir o assunto. Estavam presentes João,
Marcos Alcântara, Fábio Ribeiro, Christan Lohbauer e Bia Gentil. Por
alguma razão, a ideia não vingou.
 
 
Em novembro, a revista Veja publicou uma entrevista com João nas suas
famosas Páginas Amarelas – a primeira seção da revista –, ilustrada com
uma foto grande e a citação: “Nossos filiados, uma vez no poder, terão
como missão reduzir o poder de quem lá chegou, como eles”.
 
 
No dia 17 de novembro, recebi um e-mail de Ricardo Guadagnin,
empresário de Cabo Frio. Era meu primeiro contato com o grupo que iria,
um dia, criar o núcleo do Novo na cidade.
 
 
Eu trabalhava no meu computador uma noite, já no final do ano de 2014,
logo após a reeleição de Dilma, quando recebo um e-mail de um Procurador
de Justiça do Ministério Público do Rio de Janeiro. Gelei. A primeira coisa
que me veio à cabeça foi: o que é que eu fiz de errado? Meu interesse
principal já era segurança pública, e eu frequentemente publicava artigos
com críticas ao sistema de justiça criminal. Fiquei preocupado. O e-mail
solicitava uma reunião comigo. Marcamos encontro em um restaurante do
Fashion Mall. Pedi ao Marcus Moraes que fosse também, por segurança
(vai que o Procurador me prende). Cheguei ao restaurante com medo e
apreensão. Quebrado o gelo, conversa aqui, conversa ali, eu descubro,
surpreso, que o Procurador de Justiça do Ministério Público, Marcelo
Rocha Monteiro, tem exatamente a mesma visão que eu tenho sobre a crise
da segurança brasileira, e uma posição moral idêntica. Ele se surpreendeu
também que um engenheiro civil e político amador entendesse alguma coisa
sobre segurança pública.
Da surpresa mútua nasceu uma parceria e uma amizade que se mantém
até hoje. Já fizemos dezenas de palestras por todo o país, explicando a
realidade do sistema de justiça criminal brasileiro.
Além de Procurador de Justiça, Marcelo é professor de Direito há mais
de vinte anos, apreciador de ópera e de Frank Sinatra, leitor voraz,
intelectual formidável, palestrante de enorme talento – já vi plateias rolando
de rir com suas observações irônicas e mordazes – e um amigo de caráter,
firmeza e disponibilidade inigualáveis.
O encontro com o Marcelo é prova de que a política nos dá inúmeras
oportunidades de descobrir pedras preciosas em meio à lama geral. É só
prestar atenção e estar disponível.
Eu sempre estou.
 
 
Alguns dias depois, Marco Túlio me convidou para uma visita ao BOPE.
Meu colega de turma no mestrado da FGV, o major da Polícia Militar
Maurílio Nunes – hoje tenente-coronel e comandante do BOPE – nos
recebeu no dia 21 de novembro. Marco levou também na visita um grupo
de amigos e ex-alunos dele: Augusto Sales, Ovídio Rovella e César Franco.
Chegara a hora de começar a preparar a dissertação do mestrado.
Conversei com Marco e ele me recomendou adotar Carmen como
orientadora oficial.
 
 
 
No final de 2014, o diretório do Novo no Rio de Janeiro tinha,
provavelmente, o maior grupo de apoiadores entre todos os diretórios:
aproximadamente 200 pessoas, altamente motivadas, algumas muito
qualificadas, participando das atividades partidárias. Era, realmente, um
partido de cidadãos comuns e sem caciques – um fenômeno inédito na
política que despertava curiosidade, interesse, admiração e inveja.
Eu adotei a prática de dar espaço nas apresentações para que outros
falassem. Era preciso treinar nossos futuros políticos. Marcelo Rocha
Monteiro era meu parceiro mais frequente, mas Leo Fiad, Manu Lane,
Márcio Assis Brasil, Marcus Werneck, Marcus Moraes, Rafael Hollanda,
Marco Paulo Costa e outros subiram em palcos por todo o Rio para dar seu
recado.
 
 
No dia 11 de dezembro, João fez uma apresentação em Natal, no Rio
Grande do Norte.
 
 
Marco Túlio e Carmen Migueles nos convidaram para um final de
semana em Araras. Fui à peixaria que fica ao lado do Forte de Copacabana,
no Posto 6, e comprei mexilhões, camarões, lulas e uma garoupa inteira. No
sábado, na cozinha de Araras, juntei tudo em uma panela e preparei uma
mariscada.
Depois fomos tomar banho no rio que cruzava o terreno deles.
No dia 1º de janeiro de 2015, Dilma Rousseff tomava posse de seu
segundo mandato.
 
 
 
No dia 21 de janeiro, fizemos uma apresentação no Clube Israelita
Brasileiro. Os apresentadores foram eu e Marcus Moraes, e a abertura foi
feita por Manu Lane[41]. Manu dava treinamento para um grupo de
estudantes que teriam a missão de divulgar o Novo nas escolas e
universidades, além de organizar outro grupo de oratória.
Aqui vem uma história curiosa. Marcus Moraes foi responsável por uma
das startups mais bem-sucedidas do mercado de venture capital no Brasil,
uma empresa de data center que ele fundou com um sócio – Sidney Breyer,
outro cara sensacional – e que foi vendida por milhares de vezes o valor do
investimento original. Marcus tirou então dois anos sabáticos, que dedicou
à leitura e ao estudo, principalmente dos pensadores liberais. Marcus me foi
apresentado pelo Felipe Dias em uma reunião no dia 10 de março de 2014.
Logo na primeira conversa já percebi que Marcus seria uma grande adição
ao projeto do Novo, e marquei uma reunião para apresentá-lo ao João. Para
minha surpresa, decepção e (confesso) um pouco de vergonha, João não
demonstrou nenhum interesse na conversa, e a reunião foi curta e
embaraçosa. Marcus continuaria interessado, ajudando e contribuindo muito
sempre que podia. Através dele conheci o publicitário Bruno Dreux e o
cineasta Neto Favaron, que foi responsável pelas melhores imagens em
vídeo de eventos do Novo e por minhas fotos em futuras campanhas
políticas.
Em 15 de agosto de 2014, Marcus me mandou um e-mail para que eu
encaminhasse ao João. Nesse e-mail Marcus explicava a sua visão
estratégica para o Novo e os desafios que deveriam ser enfrentados. Vale a
pena citar aqui alguns trechos desse e-mail:
Caro João Dionísio,
Tenho plena convicção que a situação geral do Brasil é grave e se deteriora
rapidamente, os problemas vão além da corrupção e violência endêmicas, inflação e baixo
crescimento econômico, estes são antes as consequências de uma situação moral e política
caótica que precisa ser detida antes que as bases da sociedade organizada, leia-se família,
religião, alta cultura e império das leis, sejam solapadas de tal forma que a recuperação se
torne virtualmente impossível em um prazo imaginável.
Em minha opinião, tamanha desordem não aconteceu por acaso, não foi, em hipótese
alguma, consequência de uma sucessão de fatos aleatórios e eventuais ações desconexas de
agentes oportunistas, mas antes a ação consciente, coordenada e consistente de dezenas de
grupos organizados, alinhados ideologicamente e com o objetivo de tomar para si, de forma
duradoura, um poder totalitário ao qual não será possível reagir [...]
Vivemos em uma sociedade hipnotizada que percebe os sintomas, entre os quais a
corrupção que, não por acaso, é o mais notado, mas nem de longe imagina as suas causas e
menos ainda tem ideia de para onde caminhamos [...]
Urge opor este processo de forma enérgica e organizada. O Novo, na minha visão, deve
ser, antes de tudo, um instrumento desta oposição. Para tal é necessário promover a
coalizão ampla de todos os grupos que, mesmo com profundas diferenças de ideias,
acreditem e desejem uma sociedade baseada na liberdade individual, no respeito à
propriedade privada e na limitação – esta clara e intransponível – da divisão e alternância
do poder governamental [...]
Ao enfrentar tamanho desafio não poderemos jamais nos utilizar do axioma básico da
mentalidade revolucionária, à qual queremos combater, de que os fins justificam os meios.
Portanto, que possamos agir até mesmo de forma ilegal quando se tratar de descumprir leis
imorais, mas nunca, nunca ir de encontro à moral absoluta e universal que deve reger as
ações dos homens de bem.
Marcus e eu discutimos também a criação de um “Foro do Rio de
Janeiro” – em oposição ao Foro de São Paulo – que materializaria a ampla
aliança a ser formada e liderada pelo Novo, em defesa da liberdade.
 
 
Capítulo 10
As Assinaturas
Se você quer fundar um partido, a captação de assinaturas de apoio é
fundamental. É uma tarefa chata, trabalhosa, cara e até – como descobrimos
– potencialmente arriscada. É sobre isso que vou falar agora. Se você não
está interessado nesse assunto, pode pular este capítulo.
Inicialmente foi feita uma tentativa de contratar empresas especializadas
nessa atividade. Essa experiência inicial não foi bem-sucedida. O custo do
serviço era alto, e a qualidade ruim. Acabamos descobrindo que, como
ganhavam por assinatura coletada, muitos funcionários das empresas
simplesmente forjavam assinaturas, o que fez com que o partido fosse
intimado a prestar depoimento na Polícia Federal. Felizmente logo a polícia
se deu conta de que o partido, na verdade, tinha sido a vítima[42].
Com isso, mudamos para um sistema misto: contratamos empresas com
melhores credenciais, ao mesmo tempo que fazíamos operações de coleta
de fichas com voluntários em todo o Brasil. Essas operações eram feitas
geralmente em finais de semana, em locais de grande circulação. No Rio
fizemos várias mobilizações nas ruas da praia, que são fechadas ao tráfego
aos domingos (Av. Atlântica e Vieira Souto), na orla da Lagoa Rodrigo de
Freitas, na Barra da Tijuca, na Praça Saenz Peña, nas saídas do metrô, na
estação das barcas da praça XV, na Rodoviária e na estação de trens da
Central do Brasil.
Nessas operações um grupo de voluntários se revezava durante horas,
abordando as pessoas que passavam. Era um trabalho que exigia paciência,
desinibição e jogo de cintura. Às vezes, antes de assinar, a pessoa queria
debater com você a situação do país e os detalhes do projeto do Novo. Ao
contrário do que acontece hoje com, por exemplo, o Aliança Pelo Brasil –
um partido ainda em formação quando escrevo isso –, naquela época,
ninguém conhecia o Novo. Para muita gente, parecia pilantragem.
Em compensação, algumas regras da justiça eleitoral eram mais simples;
por exemplo, os apoiadores – as pessoas que assinavam as fichas – podiam
ser filiados a outros partidos, o que hoje é proibido.
A assinatura de apoio era coletada através do preenchimento de uma
ficha. Na parte de cima, estava escrito:
Manifesto, assinando abaixo, meu apoio para a obtenção do Registro Legal do
PARTIDO NOVO
(a assinatura deste formulário não representa filiação partidária)
 
A ficha tinha campos para nome do apoiador, nome da mãe, data de
nascimento, e-mail, informações do título de eleitor (número, zona, seção,
município e estado) e, claro, a assinatura. Logo descobrimos o óbvio:
ninguém sabe o número do título de eleitor, nem o leva na carteira.
Passamos, então, a pedir que a pessoa colocasse apenas seu nome completo
e o nome da mãe. Com essas informações era possível, posteriormente,
entrar no site do TSE – e mais tarde, em um sistema desenvolvido pelo
próprio partido – e completar a ficha com o número do título, zona e seção
Criamos uma versão da ficha com porte pago: era só preencher e colocar
no correio, sem necessidade de selo. Além disso, todos nós fazíamos um
esforço para coletar as assinaturas entre família, amigos e conhecidos. Eu
andava com dezenas de fichas dentro da mochila.
 
Em fevereiro de 2011, já tínhamos um projeto piloto que coletava, em
média, 2.500 assinaturas por dia. Ao longo do tempo, foram desenvolvidos
métodos e abordagens que facilitavam o trabalho, e preparamos
recomendações para os voluntários que participavam das operações de
coleta de assinaturas. Segue um exemplo dessas recomendações:
Dicas de coleta
Onde colher assinaturas: Entre amigos, parentes e conhecidos, e em locais onde você
frequenta, como escola, trabalho, igreja, clube.
Ao abordar, trate apenas de 1 ou 2 pontos. Você não precisa apresentar todas as
diretrizes e programa do NOVO para que uma pessoa assine a ficha de apoiamento,
apresente 1 ou 2 pontos que você acredite ser do interesse da pessoa e, em seguida, peça
que ela assine a ficha.
Tenha algumas fichas já assinadas. As pessoas se sentem mais seguras em assinar
algo que já foi assinado por outras pessoas.
Tranquilize a pessoa que está assinando. Se a pessoa ficar desconfiada ou
preocupada em assinar uma ficha para um partido político, explique que o apoio não
resulta em filiação e a tranquilize afirmando que a assinatura não acarreta nenhum
compromisso com o NOVO.
Não perca tempo. Se a pessoa parecer mais interessada em questionar ou discutir os
pontos do programa ou em contra-argumentar, agradeça e procure outra pessoa. Não perca
tempo discutindo ou apresentando detalhes do programa ou estatuto.
Não se estresse. Ao conversar com várias pessoas, eventualmente você encontrará
pessoas radicalmente contrárias ou mesmo pessoas que simplesmente te ignorarão. Não se
preocupe com elas.
Tente diversas alternativas e aprenda com seus erros. Apesar das dicas, cada pessoa
tem mais facilidade para abordar pessoas de uma forma e pessoas diferentes respondem de
forma diferente aos mesmos estímulos. Então, teste diversas formas de colher assinaturas e
veja qual forma se encaixa melhor à sua personalidade e ao seu público-alvo.
Tenha perseverança: Geralmente (e com razão), as pessoas estão saturadas com a
política nacional. Persevere. Algumas pessoas conseguiram mais de 100 assinaturas por
dia. É possível!
 
As assinaturas coletadas eram então encaminhadas ao escritório, onde as
informações eram validadas e completadas usando o sistema do TSE ou do
partido. Depois as fichas eram separadas por zona eleitoral e encaminhadas
ao TRE para validação.
O processo de validação era uma caixa-preta. Entregávamos, por
exemplo, mil assinaturas em um cartório da justiça eleitoral e, algumas
semanas depois, recebíamos de volta uma certidão na qual constava que
apenas metade das assinaturas haviam sido validadas – mas o TRE não
informava a razão da rejeição.
A coleta de assinaturas foi o grande caso de sucesso do Novo:  do início
de 2011 ao meio de 2014, foram coletadas mais de 1 milhão de fichas de
apoio em 17 estados. Entretanto, apenas quinhentas e duas mil assinaturas
foram validadas pelos cartórios. Quase 50% das assinaturas coletadas foram
rejeitadas pela justiça eleitoral. Em determinadas zonas eleitorais, o índice
de rejeição passava de 60%.
Um incidente curioso acendeu uma pequena luz sobre o mistério do
processo de validação de assinaturas. Uma das pessoas mais ativas no Novo
a partir de 2013, e que iria, no futuro, assumir um cargo no diretório, teve a
sua ficha de apoio rejeitada pelo TRE. Como, evidentemente, os dados
estavam 100% corretos, era importante entender o motivo da rejeição. Após
duas tentativas frustradas, ele conseguiu entrar com uma petição ao juiz
eleitoral solicitando a revisão da ficha de apoio. Em uma conversa informal,
a funcionária que o atendeu deixou escapar que o fato de ele não ter votado
no segundo turno das últimas eleições provavelmente fora decisivo na
rejeição de sua ficha.
 
 
Capítulo 11
O Partido Como Empresa
 
Tudo na vida tem começo, meio e fim – e assim foi com minha excelente
aventura de criar um partido político. O final, para mim, começou em
algum momento entre 2014 e 2015.
Foi quando João trouxe, para ajudá-lo na gestão do partido, aquele ex-
funcionário da empresa que administrava seu patrimônio – “Gonzaga” –,
que tinha sido nomeado vice-presidente na época da fundação do partido,
no início de 2011.
Uma das primeiras ações do “Gonzaga” foi me ligar. Quando atendi o
celular, estava olhando a rua, da janela da minha sala. “Gonzaga”
telefonava para avisar que eu não poderia mais usar meus slides nas
apresentações. “Só slides oficiais”.
Por entre as folhas das árvores, eu via os carros passando lá embaixo
enquanto tentava entender o que estava ouvindo.
“Slides oficiais?”, perguntei. “Você está falando daqueles slides cheios
de texto, sem nenhuma foto e com termos que só são compreendidos por
1% da população?”
A conversa não progrediu.
Era evidente que o problema não eram os meus slides. Mas eu ainda não
tinha clareza da onda que estava se formando.
 
 
 
Em 4 de fevereiro de 2015, o diretório nacional emitiu um documento
chamado “Reunião do Novo – Organização Interna”. Logo no início, o
documento informava:
Prioridades do NOVO:
 
1) Organização interna (montar o NOVO como uma empresa).
 
E mais adiante, ele estabelecia a seguinte regra:
Todos os políticos com mandato devem ser encaminhados para o “fale conosco”.
 
O que o documento queria dizer era isto: se por acaso o presidente de um
diretório fosse procurado por um deputado, senador ou governador, ele
deveria se recusar a conversar e solicitar que o político enviasse um e-mail
para o “fale conosco” do partido.
 
 
 
No dia 26 de fevereiro, Marcelo Rocha Monteiro e eu fizemos uma
apresentação para um grande público no salão de um hotel na Barra da
Tijuca, na zona oeste do Rio. Dois dias depois, a revista The Economist
mencionava o Novo em uma matéria:
[...] Em breve, essas pessoas terão um novo partido político para representá-las.
Chamado simplesmente de Novo, o partido defende abertamente o livre mercado,
um estado mínimo, impostos baixos e liberdades individuais. Isso ampliaria o
estreito espectro político do Brasil. O Partido dos Trabalhadores da presidente Dilma
Rousseff é decididamente de esquerda. O principal partido da oposição, o Partido da
Social-Democracia Brasileira (PSDB), é mais amigo do mercado, mas, como o
próprio nome sugere, não é de forma alguma thatcherista.
 
 
 

Na segunda-feira, 2 de março de 2015, fizemos uma reunião interna do


Novo Rio de Janeiro. Os grupos de trabalho que participaram da reunião, e
os seus respectivos coordenadores, foram os seguintes:
- Mobilidade Urbana – Maria Fernanda Gomes
- Sustentabilidade – Ricardo Negreiros e Daniel Runkel
- Segurança Pública – Marcelo Rocha
- Liberdade Econômica – Andreia D’Oliveira
- Governança/Diretoria de Eleições – Gabriel Renault
- Saúde – André Zaccaron
- Oratória – Manu Lane
- Grupo de Estudantes – Lucas Jazbik
- Grupo de Professores – Isaias Oliveira
- Grupo de Estudos do NOVO (ideário e filosofia) – Pedro Faraco
- Recepção de Novos Participantes – Tayssa Sato
- Grupo de Inovação – Cezar Taurion
- Base de Conhecimento – Leonardo Fiad
 
 
Nessa época, o Leo Fiad e a Andreia D’Oliveira já faziam parte do grupo
responsável por me ajudar a responder aos e-mails que chegavam, em
grande volume, ao Novo Rio de Janeiro. Eram pessoas de todas as situações
e todos os municípios, querendo informações, tirando dúvidas ou dando
sugestões. Alguns dos e-mails eram enormes; as pessoas abriam seus
corações. Por exemplo, no dia 8 de julho recebemos um e-mail de Manu
Campos, moradora do Grajaú, que dizia, entre outras coisas: “tenho muitas
ideias e projetos, e quero contar minha história para vocês. Sozinha eu sei
que não consigo fazer muito, mas juntos somos muito fortes”.
Cada um dos contatos era respondido de forma completa e cuidadosa, e
frequentemente gerava uma reunião ou um encontro. Era um trabalho feito
com atenção, dedicação e carinho.
 
 
 

No dia 15 de março, junto com um grande grupo do Novo, fui a uma


manifestação contra Dilma e o PT em Copacabana. Nos encontramos às 9
da manhã em frente ao então restaurante Astor, em Ipanema (onde fica hoje
o Boteco Boa Braça, do meu amigo Flavio Sarahyba), e fomos caminhando
até o ponto de encontro no Posto 5, na Av. Atlântica, onde a manifestação
começou.
Reeleita com uma margem apertada de 51,64% dos votos válidos, Dilma
Rousseff tinha lançado um plano de ajuste fiscal que incluía mudanças nas
regras de benefícios previdenciários, corte de gastos e de programas sociais,
o que contrariava toda a sua plataforma de campanha. Ela estava sendo
acusada de estelionato eleitoral, e sua popularidade caíra de 52% em
dezembro para 7% à época dos protestos.
No dia 24 de março, Marcelo, Leo e eu fizemos uma apresentação no
auditório da Unisuam, em Bonsucesso, quando conheci meu hoje querido
amigo André Nakamura. No dia 5 de abril, Leo, Andréia, Marcelo e eu
fomos à Cinelândia para outra manifestação, organizada pelo MBL Rio, em
frente à Câmara de Vereadores.
 
 
 
O partido começara a emitir uma série de comunicados. Um deles, de
abril de 2015, informava:
Comunicado 07 – 2015
São Paulo, 12 de abril de 2015
 
Assunto: Expansão dos Núcleos do NOVO
 
Pela representatividade atual do NOVO, trataremos internamente todas as
representações do NOVO como NÚCLEOS.
 
Diretório Nacional
 
Traduzindo: estava proibido o uso da palavra “diretório” – exceto, é claro,
no caso do diretório nacional.
 
 
 
No dia 11 de abril, ampliamos nosso raio de ação com uma apresentação
em uma quadra na Taquara, organizada com a ajuda de uma ativista de uma
comunidade local. Além de mim, falaram Marcelo Rocha Monteiro, Marcus
Werneck e Márcio Assis Brasil. Wilson Cukierman e seus filhos estiveram
presentes. No dia seguinte, um domingo, Alexandra e eu fomos a mais uma
manifestação “Fora, Dilma” em Copacabana, dessa vez levando o João
Felipe e a Maria Fernanda (no seu carrinho de bebê).
 
 
 
No final de abril, “Gonzaga” resolveu vir ao Rio.
No dia 28, estava agendada uma apresentação no município de Duque de
Caxias. Foi um evento planejado com muito cuidado, com a ajuda de
Milton Alves e Alex Forte. Era nossa primeira apresentação na Baixada
Fluminense, uma região marcada pela pobreza e pelo crime. Já que estaria
no Rio, “Gonzaga” iria assistir à apresentação. Convidei também a
professora Carmen Migueles, que havia sido secretária de Cultura do
Município de Duque de Caxias de 2005 a 2007, na administração de
Washington Reis. Embarcamos todos em uma van na praça Eugênio Jardim,
em Copacabana, rumo a Duque de Caxias.
A apresentação – feita no grande salão de uma casa de festas – ocorreu
normalmente, embora a plateia prestasse muito mais atenção nas partes em
que falamos sobre crime do que quando falamos de economia ou liberdade.
Segurança continuava sendo o assunto que mais mobilizava as pessoas.
Aliás, nossa própria chegada ao local ocorreu com atraso, devido, segundo
comentários, a um arrastão realizado em uma das vias próximas. No final
da apresentação, fomos cercados por pessoas que queriam dividir conosco
suas esperanças e frustrações.
Retornamos já de noite, cansados, mas imensamente satisfeitos e com a
sensação de missão cumprida.
Alguns dias depois, fomos avisados pelo comando do partido que “não
seria mais autorizada nenhuma apresentação fora da zona sul do Rio”,
porque o partido “ainda não está preparado para ir aos subúrbios”.
 
 
 
“Gonzaga” também participaria de nossa reunião geral, marcada para o
dia 30, dois dias depois, no auditório do Lagoa Corporate.
No dia da reunião, um problema familiar me atrasou. Enquanto eu não
chegava, “Gonzaga” conversou com minha equipe, ainda no hall de entrada.
Depois eu soube que a conversa consistiu inteiramente de críticas a mim.
O programa da reunião previa a apresentação de cada um dos grupos de
trabalho do Novo Rio de Janeiro. E assim foi feito: os representantes de
cada grupo falaram de suas ideias, das propostas e resultados, com a mesma
energia, entusiasmo, orgulho e dedicação de sempre.
Terminadas as apresentações, eu agradeci a todos, e comuniquei que
iríamos ouvir as palavras do representante do diretório nacional, o sr.
“Gonzaga”.
Não me recordo exatamente as palavras que ele usou. Talvez ele tenha
dito que estávamos fazendo “montes de areia na beira do mar” ou
“colocando um band-aid em um paciente de UTI”. Foi alguma coisa desse
gênero. A memória exata me falha agora – e ainda bem. Porque a essência
do que ele disse, de forma bem clara, foi: nada do que vocês estão fazendo
tem qualquer sentido ou utilidade. A única coisa que queremos de vocês é
que arrecadem recursos e cumpram as determinações do diretório nacional.
E completou: “quem não concordar conosco, que se mude”.
Ou, como ele disse a outro interlocutor: a função do filiado é pagar a
mensalidade e votar em quem o partido mandar, mais nada.
Estava claro que “Gonzaga” estava cumprindo uma missão.
 
 
 
 
 
No início do ano seguinte, fui fazer uma palestra em Salvador a convite
do núcleo local do Novo. Na primeira oportunidade que tiveram, meus
amigos baianos me mostraram uma pilha de papel: eram mensagens de e-
mail do “Gonzaga”, cada uma mais grosseira e desrespeitosa que a outra.
 
 
 
 
O que aconteceu no Rio estava acontecendo em todo o Brasil.
Voluntários, pessoas comuns movidas por um ideal, que construíram do
zero um partido político com sacrifício e risco pessoal, eram tratadas com
arrogância, despreparo e desprezo.
Em maio de 2015, explodiu uma revolta no grupo de WhatsApp que
reunia os coordenadores dos núcleos do partido pelo Brasil, causada pelas
ações insensatas e desrespeitosas do “Gonzaga”. Os que ousaram protestar
foram Saulo Vieira, de Aracaju, Alexandre Paiva, de Florianópolis, e eu.
No dia 4 de junho, o diretório nacional emitiu o “Comunicado 08”:
Comunicado 08 – 2015
São Paulo, 04 de junho de 2015
 
Assunto: Inativação de Núcleo e substituição de Líder
 
Dentro dos princípios de eficiência e da transparência que serão a base de todos
os nossos procedimentos, o Diretório Nacional tomou as seguintes decisões:
 
-  Desativação do Núcleo Aracaju
-  Troca de liderança em Florianópolis
 
 
 
O idealismo e a generosidade no trato com as pessoas começavam a ser
substituídos por algo muito diferente, como descobriu um grupo de
apoiadores de Joinville. Eles haviam enviado um e-mail para o diretório do
Novo São Paulo, no dia 16 de junho, com cópia para mim e para o João,
que terminava dizendo:
 
Gostaríamos de sugerir um encontro de parte de nossos apoiadores com vocês em São
Paulo ou outro local que preferirem para que possamos nos conhecer e entender os
caminhos possíveis para o futuro próximo.
 
A inacreditável resposta do diretório de São Paulo foi esta:
 
Tendo em vista o seu bom relacionamento com o núcleo de Florianópolis, o mesmo
deveria ter lhe informado que solicitações sobre núcleos futuros devem ser feitas pelo "fale
conosco" no site (novo.org.br).
O grupo de Joinville respondeu:
 
Francamente, como somos todos voluntários oferecendo nosso tempo e esforço para a
concretização desse projeto, eu esperava um pouco mais de carinho na resposta do DN.
Afinal, voluntários trabalham em troca de motivação, e esse tipo de tratamento não
contribui em nada para isso, pelo contrário.
Quando vi o que tinha acontecido, respondi ao grupo:
 
O diretório do Rio de Janeiro está à disposição para recebê-los e falar sobre a nossa
experiência.
 

 
 
No dia 26 de junho de 2015, recebi um e-mail de Leopoldo Butkiewicz,
um amigo do Novo de São Paulo. No e-mail, Leopoldo e Clynton Cortez
manifestavam a intenção de fazer uma visita ao Rio de Janeiro e conhecer
nossa experiência. O encontro ficou marcado para 14 de julho. Nesse dia,
Maria Fernanda Gomes, Marcelo Rocha Monteiro e eu encontramos o
Leopoldo e o Clynton para almoçar.
 
Leopoldo é um cara sensacional: maduro, bem-humorado e motivado.
Clynton é igual. O almoço foi uma troca de ideias entre pessoas
apaixonadas pelo mesmo projeto. Nos despedimos fazendo planos para um
próximo encontro, dessa vez em São Paulo – possivelmente uma palestra
para atração de filiados.
 
No dia 29 de julho, Leopoldo mandou por e-mail uma proposta concreta:
faríamos uma palestra em Ribeirão Preto em setembro, junto com um
seminário para a troca de experiências entre a equipe do Rio de Janeiro e o
grupo de apoiadores de Campinas, Rio Claro, Piracicaba e Ribeirão Preto.
 
Em 10 de agosto, chegou outro e-mail do Leo:
 
Prezados,
Bom dia!
Tudo bem?

No sábado tivemos uma pequena reunião com o “Gonzaga”.  Fomos alertados de que não
há interesse do NOVO em realizar integração entre grupos estaduais ou regionais[...]

Vocês já tinham comentado sobre isso, mas da maneira que agimos não esperava que tal
fato ocorresse da maneira que ocorreu [...]

Insistimos nessa reunião com o “Gonzaga” que toda a nossa ação foi comunicada ao
Diretório Estadual, prévia e posteriormente, inclusive, com a concordância do Diretório
Estadual com nosso encontro, desde que fosse realizado a portas fechadas.

[...] Eu particularmente acho um erro que colaboradores voluntários do NOVO, sejam de


onde forem, não possam se comunicar, trocar experiências e visões de trabalho ou de
política [...]
 
Leopoldo
 
 
 
 
No dia 7 de agosto de 2015, João me mandou uma mensagem: “Motta,
passa lá no partido na segunda-feira para conversarmos”.
 
Na segunda-feira, dia 10, eu batia na porta do escritório do Leblon.
 
Ele me recebeu sozinho. Sentamos e ele foi direto ao ponto: “Conversei
com o pessoal do diretório nacional e não estamos satisfeitos com o seu
desempenho. Decidimos por unanimidade retirar você do cargo de
presidente estadual”.
 
Não sei o que ele esperava ouvir de mim. Mas o que eu consegui dizer
foi: “Ok, João. Sem problemas”.
 
Ele olhou para a mesa, olhou para o lado. Afinal, olhou para mim e
acrescentou: “mas ano que vem tem eleição para a prefeitura, e nós
contamos com você”.
 
 
 
 
 
Saí do escritório meio sem direção. Marcelo Rocha Monteiro, Leo Fiad,
Andreia D’Oliveira e eu tínhamos agendado uma apresentação em Volta
Redonda no dia 12 de agosto, quarta-feira – dali a dois dias – e não
podíamos faltar ao compromisso.
 
No dia marcado, embarcamos no carro do Marcelo e seguimos para
Volta Redonda. Foi uma longa viagem, durante a qual discutimos o que
estava acontecendo e o que poderíamos fazer a respeito. Na chegada, nos
aguardavam Rodrigo Arbach e André Amêndola.
 
Fizemos um enorme esforço para guardar o segredo – ninguém sabia
ainda da minha saída da presidência – e esconder nosso desânimo e
decepção. Afinal, nossa missão ali era justamente motivar apoiadores e
criar entusiasmo com o partido. Ficamos hospedados no Hotel Dexter, o
mesmo nome do serial killer de uma série de TV.
 
Sentado no restaurante do hotel – um espaço imenso, meio escuro e,
naquele momento, vazio –, eu aguardava a hora da apresentação
mergulhado em aflição e tentando controlar a vontade de desistir de tudo e
voltar para casa. Afinal, depois do que acontecera, o que eu ainda estava
fazendo ali?
 
Seguramos nossos sentimentos, fizemos a apresentação e fomos jantar
com o grupo de voluntários locais.
 
Assim que retornamos de Volta Redonda, no dia 13 de agosto de 2015,
enviei o seguinte texto aos filiados do Rio por e-mail:
 
Prezados Amigos,
 
Seguindo o processo de renovação acertado com a Executiva Nacional, e observando o
regulamento e o calendário eleitoral, comunico a minha saída da direção do NOVO Rio de
Janeiro. Está na hora de encarar outros desafios e abrir espaço para novas lideranças.
 
Minha experiência nesses seis anos foi enriquecedora. Tive a chance de articular e
compartilhar minha visão sobre o Brasil e sobre o que podemos fazer para que nossos
filhos vivam melhor que nós. Minha recompensa foi conviver com vocês. Agradeço ao
João Dionísio, fundador e presidente do NOVO, a oportunidade e a confiança, e a cada um
de vocês o privilégio da nossa convivência. O novo responsável pelo Rio de Janeiro, André
Strauss, tem meu apoio incondicional.
 
Recebam meu abraço e meu desejo de que permaneçamos em contato e trabalhando
juntos por um país melhor.
 
Roberto Motta
 
 
No dia 19 de agosto, eu recebi o seguinte e-mail do diretório nacional do
partido:
 
Olá, Motta, tudo bem?
 
Estamos reestruturando os e-mails do NOVO e vamos precisar encerrar a sua conta de
e-mail: roberto.motta@novo.org.br
 
Se você precisar de algum tempo para salvar seus e-mails e avisar as pessoas da
mudança, por favor me avise.
 
Aguardo seu contato,
 
Rafael
 
 
 
 
 
Em 27 de agosto, foi realizada uma reunião geral do Novo Rio de
Janeiro, em um auditório da rua Desembargador Izidro, na Tijuca.
Previsivelmente, o tópico principal foi minha saída da presidência. A
discussão esquentou, liderada por Pedro Werneck, produtor rural, líder
conservador de Teresópolis e parente distante de Carlos Lacerda, que
criticou a forma como a minha saída tinha ocorrido, lembrando, entre outras
coisas, da inevitável interrupção de todo o trabalho em andamento na
construção do partido no estado.
 
Algum tempo depois de comunicada a minha saída, o nome de André
Strauss havia sido anunciado como meu sucessor. Strauss pediu para
conversar comigo, e eu o recebi em minha casa. Ele fez uma tentativa de
explicar o que estava acontecendo, sem muito sucesso. Em seguida,
confirmou minha apreensão dizendo uma frase que ficou marcada na minha
memória: “Não tenho a menor intenção de fazer isso que você faz, receber
pessoas na sua casa a toda hora”.
 
De fato, minha casa vivia cheia de gente do Novo, desde o início. Minha
vida estava entrelaçada com o partido, e assim permaneceria por muito
tempo, apesar do que acabara de acontecer e do que ainda viria pela frente.
 
 
 
 
João me convidou para ir a Brasília, acompanhar o julgamento do TSE
sobre o pedido de registro do Novo. Na manhã do dia 15 de setembro, fui
encontrá-lo em seu apartamento, de onde fomos no seu carro até o
aeroporto de Jacarepaguá, com uma parada no escritório da João Fortes
Engenharia, empresa da qual ele era conselheiro. Embarcamos no avião que
o João possuía em sociedade com amigos. Eu nunca tinha entrado em um
avião particular. Voamos em céu de brigadeiro até Brasília. Do aeroporto
fomos direto para o auditório do TSE. Acompanhamos a sessão sob grande
tensão, pois era impossível prever o resultado do julgamento. Finalmente, o
registro do partido foi aprovado e a legenda recebeu o número 30.
 
Tiramos uma foto com a bandeira do Novo no salão de entrada do TSE.
Na fotografia sou o único que não está de terno escuro e gravata laranja.
Seguimos para uma comemoração no restaurante Delfina, no Lago Sul.
João fez um breve discurso; essa foi uma das duas únicas vezes em que ele
mencionou publicamente meu papel na concepção do Novo (a outra foi na
entrevista ao Luciano Pires).
 
 
 
 
No dia 19 de setembro, com o partido oficialmente criado, pude solicitar
minha filiação através do site.
 
 
 
 
No dia 7 de novembro, o partido atingia a marca de 966.290 curtidas no
Facebook, à frente do Partido dos Trabalhadores e atrás apenas do PSDB.
Eu ainda lembrava do dia em que comemoramos mil curtidas.
 
 
 
 
No dia 15 de novembro, montamos uma barraca do Novo na pista da
Vieira Souto, fechada aos carros no feriado. Uma foto desse dia mostra
minha filha desenhando em um quadro branco no qual está escrita a frase
“Filie-se ao Novo”. No mesmo dia barracas similares foram montadas em
Campo Grande, Ribeirão Preto, Recife, São Paulo e São José dos Campos.
 
No dia 23 de novembro, João fez uma apresentação sobre o partido no
Teatro Clara Nunes, no Shopping da Gávea. Era a primeira apresentação no
Rio da qual eu não participava. Desta vez eu me sentava na plateia. Não
muito distante de mim, estava Bernardinho, que acenou quando me viu.
 
 
 
 
 
No dia 2 de dezembro de 2015, o então presidente da Câmara dos
Deputados, Eduardo Cunha, aceitou uma denúncia por crime de
responsabilidade contra a presidente da República, Dilma Rousseff.
 
 
 
 
No final de dezembro o Partido Novo atingiu um milhão de seguidores
no Facebook e 5.808 filiados.
Capítulo 12
O Dinheiro ou a Alma
No dia 30 de novembro de 2015, eu defendi minha dissertação de
mestrado, cujo título era “Os Efeitos da Cultura Nas Relações Entre Estilo
de Liderança, Confiança e Comprometimento: Comparando Equipes de
Operações Especiais no Brasil e Estados Unidos”. A defesa do trabalho foi
diante da banca composta pelos professores Marco Túlio, Carmen
Migueles, Maria Betânia Borges Barros e Hélio Irigaray.
 
A cerimônia de formatura foi no dia 3 de março de 2016. Fui escolhido o
orador da turma. No meu discurso eu disse:
 
Aprendemos estratégia, processo decisório, estrutura das organizações; mas também
aprendemos a pesquisar, a ler de forma produtiva e a confrontar diferentes explicações
sobre a realidade.
 
Aprendemos a fugir das teorias totalitárias que ambicionam ter todas as respostas.
 
Aprendemos a importância da ética, da transparência e da governança, temas
fundamentais nos dias de hoje, em que todos os valores morais do nosso país parecem ter
sido invertidos.
 
Vamos precisar de coragem cívica e moral para honrar o que aprendemos nessa casa.
 
Coragem para levantar nossas vozes – nas empresas, nas entidades públicas e nas
associações de classe – e dizer que o caminho para o desenvolvimento e uma vida melhor é
pavimentado com estudo, com trabalho e com empreendedorismo.
 
Não há outro caminho.
 
Nessa casa, todas as portas em que batemos se abriram, e todas elas levam em direção
ao futuro.
 
Entremos por elas sem medo.
 
Chegou a hora da despedida. Adeus, Fundação Getúlio Vargas, muito obrigado.
 
E que nenhum de nós esqueça a sua missão: deixar, para as futuras gerações, um legado
de prosperidade, de transparência e de justiça na gestão do país.
 
 
 
 
 
O ano de 2016 seria movimentado. Eu não tinha mais nenhum cargo no
partido, mas ainda era visto por muitos como seu representante e principal
divulgador.
 
Em janeiro fui convidado para ir a Salvador, fazer uma palestra para o
núcleo local. Aaron Britto me esperava no aeroporto e fomos direto ao Ki
Muqueca, onde passei horas relembrando o sabor da comida baiana e
conversando sobre o que estava ocorrendo no partido. Foram muitas
perguntas e questionamentos; para a maioria deles, eu não tinha resposta ou
explicação.
 
Depois de tudo de ruim e estranho que acontecera em 2015, estar em
Salvador, um dos lugares que mais amo no mundo – e estar lá cumprindo a
missão que eu mesmo me dei –, era uma sensação maravilhosa, daquelas
que só são possíveis quando pessoas se reúnem em torno de um mesmo
propósito, muito maior que elas.
 
Foi nessa viagem que conheci o médico Márcio Duarte, que até hoje é
meu amigo e foi o responsável pela existência deste livro. Foi nessa viagem
que conheci a fantástica, extraordinária e excepcional Manuela Silveira,
cardiologista, triatleta e defensora da liberdade, cujos textos nas redes
sociais ajudaram a iluminar alguns dos momentos mais escuros de nossa
história recente.   Foi nessa viagem que conheci o médico intensivista
Eduardo Abreu – em um almoço no restaurante Coco Bambu, pelo que me
lembro. Foi nessa viagem que conheci Mariângela Pinheiro e Priscila
Chammas Dáu – a Capitalista Morena das redes sociais –, que em 2016
seria candidata a vereadora pelo PSL (via o Livres), candidata a deputada
federal em 2018 e novamente a vereadora em 2020, nessas duas últimas
eleições, pelo Novo.
 
Quero acreditar que mudei rumos e influenciei trajetórias com aquela ida
a Salvador.
 
 
 
 
 
 
 
Em fevereiro recebi novo convite para palestrar, dessa vez em Sorocaba.
No dia 21 de fevereiro, eu era recebido pelo estudante Nikolas Diniz e pelo
médico Vinícius Rodrigues. Vinícius conhecera o Novo em 2012, quando
ainda morava em Marília. Como qualquer pessoa que não fosse de esquerda
naquela época, ele se sentia órfão politicamente, sem qualquer partido que o
representasse. Quando um colega lhe falou do Novo, Vinícius começou a se
informar sobre o partido e resolveu ajudar na coleta de assinaturas de apoio,
e em 2014 participou do primeiro encontro nacional em São Paulo, aquele
em que eu havia falado.
 
Em outubro de 2015, quando já morava em Sorocaba e o Novo já tinha o
registro no TSE, Vinícius criou no Facebook a página Partido Novo
Sorocaba. A partir dos contatos feitos ali, ele começou a organizar
encontros semanais com outros interessados na proposta do Novo. Essas
reuniões, que aconteciam nas manhãs de domingo com um grupo de
quarenta pessoas, eram divididas em duas partes. Na primeira parte da
reunião era feita a leitura do estatuto do partido, e na segunda parte o grupo
discutia de que forma aqueles conceitos poderiam ser aplicados na realidade
municipal de Sorocaba. Rapidamente o grupo se tornou grande conhecedor
do estatuto.
 
Sorocaba – eu não sabia – era conhecida como a capital mundial da
coxinha (o salgadinho), e a primeira coisa que fizemos foi ir à padaria mais
famosa da cidade experimentar a especialidade.
 
Os voluntários tinham investido muito esforço na organização do evento,
que aconteceu no Hotel Royal, onde também fiquei hospedado. Nikolas,
que estava bastante nervoso, abriria a minha apresentação – o que ele fez
muito bem. Apresentei minha palestra “Que País é Esse?” para um
auditório lotado e atento. Lembro muito bem da conversa que tive com um
dos apoiadores do partido, Márcio Gattaz Dias, que me impressionou por
seu entusiasmo e determinação em fazer alguma coisa pelo país. Depois da
apresentação, fui convidado para jantar. Fomos a um pequeno restaurante
com um grupo de umas doze pessoas, sentadas ao longo de uma mesa
comprida. Fizemos os pedidos. Quando a comida chegou, uma pessoa do
grupo, Rafael, um motorista de táxi, perguntou: “Alguém se incomoda se
rezarmos?”. Ninguém se incomodou, e abaixamos as cabeças e oramos
agradecendo aquela refeição. O momento ficou marcado: ali estava eu, com
um grupo de pessoas que acabara de conhecer, cada uma com sua vida, suas
dificuldades e seus sonhos, unidas em torno de um ideal e, naquele
momento, da mesma fé.
 
Vinícius Rodrigues viria a desempenhar papel importante nos
acontecimentos do Novo nos meses que se seguiram, e que reverberariam
também em Sorocaba. Em 2021 Vinícius seria nomeado secretário
municipal de Saúde.
 
 
 
 
No dia 13 de março de 2016, participei de uma manifestação pelo
impeachment da Dilma em Copacabana, e discursei de cima do carro de
som do MBL[43]. A multidão cobria a Av. Atlântica de um extremo ao outro.
Foi isso que eu disse:
 
Eu tenho um sonho.
Eu sonho com um país onde todos sejam iguais perante a lei.
Onde a Justiça trate da mesma forma o rico e o pobre, o político poderoso e o cidadão
comum.
Eu tenho um sonho.
Eu quero andar pelas ruas do meu país sem sentir medo, sem ter que segurar a bolsa
apertada contra o peito. Meu sonho é um país onde não morram 60 mil pessoas
assassinadas todos os anos.
Eu tenho um sonho.
Eu sonho com um país onde a política não seja um balcão de negócios, onde senadores,
deputados e ministros do Supremo vão ao trabalho dirigindo seus próprios carros.
Um país onde assassinos perigosos sejam presos e condenados a cumprir longas
sentenças, sem direito a visita conjugal e a saídas nos feriados. 
Onde eu possa abrir o jornal e dizer ao meu filho: "Olha, filho, que exemplo bonito, que
país decente este em que vivemos".
Eu sonho com um país que não gasta um centavo com reforma de estádios porque todo
o dinheiro foi usado com a reforma de escolas.
Eu sonho com um país em que os jovens pensem em criar, inventar, empreender, e não
em fazer concurso para fiscal.
Um país que não usa dinheiro de nossos impostos para divulgar ideologias criminosas.
Um país que não faz o elogio da pobreza e da ignorância.
Eu sonho com um país onde todos têm acesso às mesmas oportunidades, mas também
têm o direito de fazer escolhas diferentes e o dever de assumir responsabilidade por essas
escolhas.
Um país que não escolha seus líderes baseado na bolsa-disso ou bolsa-aquilo.
Eu sonho com um país que ganhou o prêmio Nobel.
Eu sonho com um país que não gastou uma fortuna para trocar todas as tomadas de
todas as casas, porque existem outras prioridades. Eu sonho com uma cidade que, antes de
fazer aquários e museus com vista para o mar, cuidou de suas favelas.
Cuidou de suas calçadas.
Cuidou de suas crianças.
Eu tenho um sonho.
Eu sonho com um país onde os políticos não sejam milionários, um país onde o melhor
negócio não seja fazer negócio com o Governo.
É preciso ajudar o cidadão a ser independente.
Isso significa três coisas: dar uma educação básica de qualidade; dar a oportunidade de
ter uma profissão ou um negócio, e garantir segurança, justiça e saúde.
Eu tenho um sonho.
Eu abro os olhos e vejo meu sonho acontecendo aqui e agora!
Vejo milhões de outras pessoas sonhando o mesmo sonho.
Eu vejo o juiz Sergio Moro, o promotor Deltan Dallagnol.
Vejo mulheres e homens que não ficam calados diante das injustiças.
Que não pagam e não aceitam propinas.
Que exercem sua profissão, seja ela qual for, com dignidade, decência e justiça.
Às vezes me perguntam: Roberto, por que você está se envolvendo com política? Você
acredita mesmo que vai conseguir mudar alguma coisa?
Para essas pessoas eu tenho uma resposta. Eu respondo usando uma frase do meu
amigo João Dionísio Amoêdo.
Ele diz: algumas coisas você faz porque acha que vão dar certo. Outras você faz porque
elas precisam ser feitas.
Eu tenho um sonho.
 
 
 
 
Uma grave crise havia se instalado no governo Dilma Rousseff, e todos
viviam de olho na televisão, acompanhando os acontecimentos que se
sucediam em velocidade extraordinária.
 
Na quarta-feira, 16 de março, o juiz Sergio Moro retirou o sigilo de
interceptações telefônicas do ex-presidente Lula. As conversas gravadas
pela Polícia Federal incluíam um diálogo gravado na própria quarta-feira
entre Lula e a presidente Dilma Rousseff. Dilma havia nomeado Lula como
ministro-chefe da Casa Civil (a nomeação acabou suspensa pelo STF).
 
Na conversa telefônica, Dilma avisava Lula que estava enviando
‘Bessias’ com o termo de posse para o cargo de ministro da Casa Civil. O
diálogo era, claramente, uma tentativa de obstruir a Lava Jato, porque a
nomeação daria foro privilegiado a Lula e o tiraria do alcance do juiz Sergio
Moro. 
 
Aquelas palavras ecoaram por todo o Brasil:
 
Dilma: Seguinte, eu estou mandando o 'Bessias', junto com o papel, para a gente ter ele
e só usa em caso de necessidade, que é o termo de posse.
Lula: Aham. Tá bom, tá bom.
Dilma: Só isso, você espera aí que ele está indo aí.
Lula: Tá bom, estou aqui. Fico aguardando.
Dilma: Tchau.
Lula: Tchau, querida....
 
Começamos a ligar uns para os outros. “Temos que voltar às ruas
imediatamente”, foi a conclusão. Larguei tudo o que estava fazendo e fui
para nosso ponto de encontro tradicional, em frente ao Posto 5, em
Copacabana. Quando cheguei lá, no final da tarde, havia umas 30 pessoas.
Pouco depois já eram 100, depois 500, e em breve estávamos cercados por
uma multidão, que cantava músicas como essa:
 
Fora, petista
Bolivariano
A roubalheira do PT tá acabando
Sua conduta
É imoral
Fere os princípios da CF nacional
 
Olê, olê
Olê, olê
Vamos pra rua pra derrubar o PT
 
Não acho que verei algum dia espetáculo mais bonito que o daquela
noite. Eu vestia uma camiseta do Novo e carregava uma bandeira do Brasil.
De repente, a multidão começou a se movimentar, pegando uma das ruas
transversais e entrando na Av. Nossa Senhora de Copacabana. Eu vi uma
das ruas mais movimentadas da cidade – naquele horário geralmente cheia
de carros e ônibus – ser completamente tomada por um oceano de gente.
Andamos muitos quarteirões agitando bandeiras do Brasil, cantando,
olhando nos rostos uns dos outros e sorrindo, surpresos com a súbita
descoberta do nosso poder de mobilização. De vez em quando algum petista
revoltado aparecia em uma janela para gritar palavrões ou jogar ovos e água
na multidão. Mas a sensação que predominava era de paz e alegria. Eram
milhares de pessoas ocupando as vias principais de um dos bairros mais
movimentados da cidade, sem uma única briga, sem qualquer confusão.
Jamais esquecerei aquele dia.
 
 
 
 
Em meados de março, procurei João no novo escritório do partido e
perguntei: “Você acha que devo ser candidato a prefeito nas eleições deste
ano?”.
A pergunta não poderia ser mais objetiva e direta.
 
Ele disse que ia conversar “com a turma de São Paulo” e me daria uma
resposta em breve.
 
Duas semanas depois, eu estava preso em um engarrafamento em frente
ao Gávea Golf Clube, em São Conrado, quando João me liga no celular.
“Falei com o pessoal, e achamos uma boa ideia você se candidatar. Mas tem
que fazer o processo seletivo”.
 
 
 
 
Marco Túlio e Carmen tinham uma empresa chamada Symballein, que
prestava serviços de consultoria a clientes privados e a entidades públicas e
governos. Com a nossa crescente proximidade, começamos a falar sobre um
projeto de trabalho. Marco já tinha me convidado para dar aulas para alunos
de alguns programas de MBA que a FGV conduzia em conjunto com
universidades estrangeiras. Como eu era fluente em inglês, e conhecia bem
a situação econômica e política do país, não tive qualquer dificuldade.
Em 2014 e 2015, dei aulas para grupos do Corporate International
Master, um programa de mestrado oferecido em conjunto pela FGV, pela
ESADE Business School de Barcelona e pela Georgetown University dos
EUA. Em 2015 e 2016, também dei aulas para turmas do programa de
EMBA da ESADE, para grupos do programa Microeconomics of
Competitiveness da Universidade de Lisboa, e aulas sobre o panorama de
negócios do Brasil para um grupo da Universidade de Wharton.
Marco e eu estávamos cada vez mais próximos. Passávamos finais de
semana em família.
Um dia me perguntaram: será que eu gostaria de fazer parte do quadro de
consultores da Symballein? Aceitei o convite, e minha foto passou a constar
do site da empresa. Também investi muito tempo e esforço na montagem de
um material de divulgação do centro de estudos que seria montado na casa
de Araras. Nunca fizemos nenhum trabalho juntos, mas, quando eu visitava
o escritório deles – que ficava na rua Rainha Elizabeth, ao lado de um
restaurante –, falávamos sobre os projetos da empresa. Lembro
especialmente de um projeto gigantesco em que eles trabalhavam, para a
Secretaria Estadual de Educação.
 
 
 
O dia 14 de abril de 2016 amanheceu com céu completamente azul,
pontilhado de nuvens brancas. Peguei um ônibus para Cabo Frio. Tinha sido
convidado para palestrar pelo grupo de apoiadores do partido na cidade. Fui
recebido por Dulphe Kpseg, um dos organizadores, e conheci um grupo de
pessoas especiais: Cacau, Ricardo Guadagnin, Marco Antônio, Gerson
Gomes, Milton Lima e muitos outros com os quais até hoje me encontro
sempre que vou à cidade.
Em Cabo Frio apresentei a minha palestra Que País É Esse?[44].
 
 
 
No dia 17 de abril, um domingo, a Câmara dos Deputados votou o
impeachment de Dilma. Fomos todos a Copacabana para uma manifestação
gigante. Manifestações similares ocorreram por todo o Brasil. Na Av.
Paulista, Geraldo Alckmin e Aécio Neves foram vaiados pela multidão.
A Câmara dos Deputados aprovou o impeachment por 367 votos a favor
e 137 contra.
 
 
 
 
Em algum momento de março, a pedido do João, me inscrevi no
“processo seletivo” do partido. O que foi esse “processo”? Primeiro, fiz
duas “provas” online. As “provas” eram perguntas sobre política, algumas
formuladas de modo rudimentar. Em seguida, recebi um e-mail
confirmando que passara para a “segunda fase”: uma entrevista. O e-mail
terminava com um “Boa sorte!”.
No dia 26 de abril, eu compareci à nova sede do Novo Rio de Janeiro, na
rua Aníbal de Mendonça, 132. Lá fui “entrevistado” pelo João, que me
conhecia desde 1979 e com quem eu tinha criado o Novo. A seguir, fui
entrevistado por Ricardo Taboaço. Foi uma conversa curta, estranha e
constrangedora.
Taboaço era personalidade respeitada no mercado financeiro e, por tudo
o que eu sabia, profissional extremamente bem-sucedido. Mas, além de
pouco entender de política eleitoral, sua trajetória no Novo tinha sido, até
então, marcada pela ausência – por sua não participação na absoluta maioria
das atividades que realizamos.
E agora Taboaço estava ali, me “entrevistando” para julgar se eu deveria
ou não ser escolhido como o candidato a prefeito do partido.
O outro pré-candidato a prefeito era Ricardo Negreiros, consultor de
gestão. Leo Fiad tinha se candidatado a vice-prefeito. Era isso que eu sabia
naquele momento.
Fiz as “entrevistas” e fui para casa tocar a minha vida.
Pouco tempo depois, meu telefone tocava. Era a Carmen – Carmen
Migueles – me informando, para minha completa surpresa, que tinha se
inscrito como pré-candidata a vice-prefeita pelo Novo. Eu nem sequer sabia
que ela tinha se filiado ao partido.
 
 
 
Alguns dias depois quem me ligava era Marco Túlio. “Roberto, a
Carmen precisa conversar com você. Ela pode ir em sua casa?”.
Pouco tempo depois chegava a Carmen. Ela se sentou no sofá marrom da
sala, enquanto eu me sentei no sofá branco de dois lugares, de costas para a
porta de entrada. Na cozinha, Alexandra lavava a louça do almoço e ouvia
tudo.
“Tem uma coisa esquisita acontecendo, Roberto”, me disse Carmen. E
explicou: ela tinha feito a entrevista para a candidatura a vice-prefeita, e a
conversa tinha sido muito boa. Mas muito boa mesmo, enfatizou. Taboaço e
João tinham se interessado muito por seus conhecimentos de gestão e por
sua experiência na área pública (como secretária de Cultura de Duque de
Caxias).
“E aí, Roberto”, ela completou, “eu recebi um convite para ir a São
Paulo amanhã, para outra reunião. Mas não sei por quê, não sei o motivo”.
Ela disse isso e ficou em silêncio, me olhando.
Eu não soube o que dizer. “Talvez eles estejam de olho em você para
algum cargo”, comentei.
“Não tenho nenhuma pretensão política”, ela disse. “Você sabe, nosso
interesse mesmo é vender serviços de consultoria. Não sei o que está
acontecendo. Mas amanhã, assim que retornar, te ligo”.
 
 
 
No dia seguinte ela me ligou – tarde. Já deviam ser mais de dez horas da
noite.
“Roberto, foi muito esquisito. Quem estava me esperando na porta do
elevador era o Fábio Barbosa (ex-CEO do Banco Real). Me reuni com todo
o diretório nacional. Sinceramente, não sei o que está acontecendo. Mas
está tarde, amanhã te ligo para conversarmos com calma.”
Essa foi a última vez que ouvi a voz da professora Carmen.
 
 
 
No dia 3 de maio, recebi um e-mail enviado pelo remetente “Partido
NOVO - Quero Ser Candidato querosercandidato@novo.org.br ”:
Prezado, iremos divulgar o resultado da segunda etapa do processo seletivo para
prefeito / vice-prefeito nesta sexta-feira, dia 06/05/2016.
 
Atenciosamente.
Equipe do NOVO
 
 
 
 
Alguns dias depois, no dia 5 de maio de 2016, recebi uma mensagem do
André Strauss. “João quer falar com você”. Imediatamente me perguntei
por que o João precisava mandar um recado pelo Strauss. Pensei isso, mas
respondi: “Ok”. Ele completou: “Sábado à noite, na casa dele”.
No sábado, dia 7 de maio, fui andando pelo calçadão da Vieira Souto até
a casa do João. Quando cheguei, me esperavam três pessoas: João, Taboaço
– presidente do diretório municipal – e André Strauss, meu sucessor como
presidente do diretório estadual.
Taboaço falou primeiro. Lembro de suas palavras: “Motta, você é o
melhor representante do Novo no Rio de Janeiro. Você é o símbolo do
partido”, e mais algumas frases nesse tom, que soaram como aqueles
elogios que precedem uma notícia complicada. Depois do Taboaço, falou
João. Strauss ficou calado olhando para o chão. Do lado de fora das janelas,
muito embaixo, as ondas quebravam na areia da praia do Leblon.
João finalmente entrou no assunto: “Achamos que, em vez de ser
candidato a prefeito, você deve sair candidato a vereador e liderar os outros
candidatos”.
Lembro de ter pensado: liderar? Os candidatos a vereador competem uns
com os outros. Lembro de ter pensado também como seria ruim para os
candidatos receber a notícia, nesse momento adiantado, de que eu seria
candidato e poderia tirar votos deles.
Pensei, mas nada falei. Ainda estava tentando processar o que ouvia.
João continuou falando por algum tempo, depois Taboaço retomou a
palavra. Eram variações sobre o mesmo tema. A ideia era essa: eu seria
candidato a vereador, e o Novo não teria candidato a prefeito. Até que todos
se calaram.
Era minha vez de falar.
Sem saber como começar, eu me ouvi dizer: “É claro que minha intenção
é colaborar com o partido”. Essas palavras seriam seguidas de outras. Era o
começo de uma frase.
Mas não consegui terminar a frase. Ao ouvir as primeiras palavras, e de
uma forma tão brusca que me surpreendeu, Taboaço se levantou e apertou
minha mão. “Eu sabia”, ele disse. “Sabia que podíamos contar com você”,
disse encaminhando-se para a porta. “Agora tenho que ir para outro
compromisso”, e foi embora.
Ficamos eu, João e Strauss, que inventou uma desculpa e saiu.
Sem saber o que dizer, eu também me despedi e fui embora.
Resolvi caminhar até minha casa.
Fui pensando, atordoado.
 
 
 
Quando cheguei em frente à Casa Laura Alvim – uns 10 minutos de
caminhada –, me dei conta do que tinha acontecido. Peguei o celular e
liguei para o Strauss.
“Olha só, Strauss”, eu disse, controlando meu tom. “Se o partido não
lançar nenhum candidato a prefeito, tudo bem. Mas se isso for uma história
da carochinha para me enrolar, vai ficar muito chato”.
 
 
 
No dia seguinte, domingo 8 de maio, enviei o seguinte e-mail aos três:
 
Caros João, Taboaço e Strauss,
 
Pensei muito sobre nossa conversa de ontem e conversei com várias pessoas.
 
Não está claro que a melhor opção para o NOVO, e para os candidatos a vereador, seja
minha entrada na disputa com eles. Além disso, é preciso considerar o impacto dessa
decisão sobre os filiados do Rio de Janeiro e minha própria motivação.
 
Me parece que a missão de liderar e motivar os candidatos a vereador será muito
melhor cumprida se eu for candidato a prefeito. Tenho todas as qualificações necessárias
para trazer votos para o NOVO, e já tenho apoio financeiro e social.
 
Entendo que a Direção Nacional é soberana na escolha da estratégia do partido, e, mais
do que ninguém, trabalho para o sucesso do NOVO. Entretanto, uma decisão como essa
precisa de mais discussão e reflexão.
 
Não ter candidato a prefeito significa aceitar que seremos governados por mais quatro
anos por pessoas incompetentes e corruptas. Serão mais quatro anos de desânimo e
frustração. Foi para acabar com isso que criamos o NOVO. Não entrar na disputa agora
significa passar uma mensagem de falta de determinação e vontade – justo o contrário do
que queremos transmitir.
 
Como candidato a prefeito trarei reconhecimento, recursos, filiados e votos para o
NOVO. E esperança para os que apostaram em nós.
 
Por isso tudo comunico a vocês que preciso refletir e conversar mais, com a turma do
Rio e com vocês, antes de tomar uma decisão sobre a mudança de minha candidatura.
 
Abraço,
 
Roberto
 
 
 
 
Menos de uma semana depois, o Partido Novo anunciava, como sua
candidata à prefeitura do Rio de Janeiro, a professora Carmen Migueles.
 
 
 
 
Passados alguns dias do anúncio, por volta de duas da tarde, eu
conversava com Alexandra quando tocou o telefone. Era um dos dirigentes
do partido que estiveram na reunião de sábado. Fui atender no quarto do
meu filho, João Felipe, perto da janela, onde o sinal de celular era melhor.
“Motta, não esquenta com isso, não”, disse ele. “Esse negócio de
processo seletivo é besteira. É que nós somos coxinhas[45]. Vamos apanhar
muito nessa eleição, por isso precisamos de um candidato da área de
humanas.”
 
 
 
Leo Fiad recebeu a notícia de que tinha sido aprovado para candidato ao
cargo de vice-prefeito, mas declinou.
Capítulo 13
Incontrolável
A decisão do partido provocou um choque no Novo Rio de Janeiro.
Quando a notícia se espalhou, minha casa ficou cheia de amigos e
companheiros de partido. Foi criada uma petição online a meu favor, que ao
final angariou mais de 700 assinaturas. Até que alguém, lendo o estatuto,
verificou que um dos artigos dava aos filiados o direito de fazer indicações
de candidatos para a convenção partidária, bastando reunir um número de
apoios correspondente a 10% dos filiados do diretório municipal. Mas as
assinaturas teriam que ser entregues até 22 de junho.
Conversa com um, conversa com outro, logo se formou um time disposto
a me ajudar nessa campanha, com a liderança informal do Marcus Moraes.
Mas, assim que o grupo começou a trabalhar, tivemos nova surpresa: no
exato momento em que comecei a entrar em contato com filiados e pedir
apoio, iniciou-se uma onda de ataques contra mim nas redes sociais, por e-
mails e mensagens de celular, questionando a legitimidade da minha
pretensão de ser candidato e ofendendo minha honra.
Como aquilo podia estar acontecendo? Durante muito tempo não tive uma
explicação razoável. Hoje, ainda não sei se tenho.
Quem reclama da virulência dos “minions” de hoje em dia, e de seus
ataques nas redes sociais, não faz ideia do que aconteceu comigo naquela
época.
 Pessoas que nunca tiveram qualquer contato comigo, nem tinham ideia da
minha participação na história do Novo, passaram a divulgar calúnias a meu
respeito e a me ofender abertamente nas redes sociais. Pessoas que
conviveram comigo durante anos, que frequentavam minha casa, comiam
na minha mesa e brincavam com meus filhos, passaram a me difamar e a
espalhar as piores mentiras sobre mim. Era um verdadeiro esforço de
assassinato de reputação.
  Uma das que mais me feriu foi a narrativa de que eu estava falido e
precisava ser eleito para conseguir me sustentar. Era uma óbvia mentira,
facilmente desmontada. Sempre vivi do meu trabalho como especialista em
tecnologia, gestor de empresas e empreendedor, e da renda do patrimônio
que acumulei com meu próprio esforço. Além disso, se meu objetivo fosse
financeiro, fazia muito mais sentido ter aceitado a proposta para concorrer a
vereador, em que a chance de ser eleito seria maior, do que concorrer a
prefeito, posição para a qual a disputa seria muito mais difícil. Isso era
evidente.
Mas a mentira perversa influenciava quem não me conhecia. É preciso
entender o pior aspecto dessa história: essa calúnia vulgar não foi espalhada
por políticos profissionais, corruptos e populistas; ela foi disseminada por
pessoas da elite carioca, apoiadoras de um partido que pretendia renovar a
política nacional. Sei os nomes de várias pessoas que fizeram isso.
 
 
 
O partido resolveu então divulgar oficialmente a narrativa de que eu teria
sido “reprovado” no processo seletivo por não ter as qualificações mínimas
exigidas – fez isso em uma nota oficial –, dizendo que, portanto, a
campanha de coleta de assinaturas que eu realizava não teria validade.
O toque final, que durante muito tempo prevaleceu como versão oficial, e
que até hoje é a única versão da história conhecida por muita gente, foi
quando o partido denunciou publicamente que eu só queria ser candidato
porque tinha um projeto pessoal, em vez de pensar no que era melhor para
o país.
 
 
 
Assim que a petição a meu favor foi colocada no ar, enviamos um e-mail
para minha base de contatos pessoais pedindo apoio e assinatura na petição.
E aí aconteceu um problema: o técnico encarregado de enviar o e-mail – de
uma empresa terceirizada –, sem entender direito o contexto, achou que se
tratava de um material oficial do partido. Tentando ser proativo, e sem que
ninguém tivesse pedido, ele incluiu no e-mail o logo e a assinatura do Novo
– o que, compreensivelmente, deu a quem sabotava minha candidatura a
oportunidade para mais um ataque contra mim.
Mas o que se seguiu foi inaceitável: o partido enviou a todos os filiados
um e-mail, assinado pela "Equipe NOVO", classificando meu pedido de
apoio de "iniciativa fraudulenta".
Quando nos demos conta do ocorrido, enviamos imediatamente uma
retratação a todos os que haviam recebido o e-mail inicial com a assinatura
indevida, explicando o que havia acontecido (erro material cometido de
boa-fé) e fazendo uma oferta de retirada de seus nomes da petição, caso
desejassem. Das 300 pessoas que já haviam assinado a petição eletrônica
até então, apenas duas fizeram essa solicitação, que foi prontamente
atendida. Também foi enviado um e-mail com um pedido público de
desculpas à direção do NOVO.
Apesar disso, a mesma "Equipe NOVO", sempre escondida atrás do
anonimato, repetiu, em mensagem posterior, a mesma menção a uma
"iniciativa fraudulenta", mencionando mais uma vez o meu nome – mesmo
após o devido esclarecimento ter sido prestado.
Por último – no primeiro teste de uma tática que iria se repetir nos anos
seguintes contra outras pessoas que ousaram se opor às decisões dos
controladores do partido –, fui informado que uma “Comissão de Ética
Partidária” tinha aberto sindicância contra mim. No dia 17 de junho, recebi
este e-mail:
De: Partido NOVO - Filiação [mailto:filiacao@novo.org.br] 
Enviada em: sexta-feira, 17 de junho de 2016 17:58
Para: r*******@******.com.br
Assunto: Pedido de esclarecimentos
 
Prezado filiado Roberto Motta,

Conforme determinação da Comissão de Ética Partidária (CEP) do NOVO, após receber


manifestações de filiados em canais oficiais do NOVO, solicitamos que sejam esclarecidos
no prazo de 5 dias os questionamentos a seguir:
 
 1. O Sr. tem conhecimento do abaixo-assinado anexo enviado para vários filiados e
simpatizantes?
 2. De alguma forma o Sr. participou desta ação?
 3. Em sabendo do fato, que medida o Sr. tomou a respeito?
 
 Informamos ainda que todo contato sobre o assunto deve ser tratado diretamente com o
e-mail ´comissaodeetica@novo.org.br´ e que o prazo de resposta tem início a partir do
envio deste comunicado.
 
 Att. 
Equipe do NOVO
 
 
Respondi com um e-mail, enviado em 21 de junho, onde explicava o
ocorrido – que já era de pleno conhecimento de todos – e que terminava
assim:
 
Aproveito o ensejo para solicitar a V. Sas. que me forneçam as seguintes informações:
 
(i) qual o nome da(s) pessoa(s) que formularam o requerimento ao Conselho de Ética
Partidária?
(ii) há alguma infração estatutária imputada à minha pessoa?
(iii) quem são os componentes da Comissão de Ética Partidária?
(iv) quais os nomes dos subscritores dos dois e-mails do NOVO que me associaram a
um ato supostamente fraudulento?
Até hoje espero a resposta.
 
 
 
Apesar disso tudo, e apoiado por um grupo de fiéis amigos – entre eles,
Marcus Moraes, Marcelo Rocha Monteiro, Marcelo Silva, Otávio Cintra,
Leo Fiad, Andreia D’Oliveira e Gustavo Lima –, embarquei em um grande
esforço de coleta de assinaturas de apoio para que meu nome fosse levado à
convenção partidária e submetido aos filiados.
Mas eu precisava das informações de contato dos filiados do Rio. O
partido que defendia que todos são iguais perante a lei se recusou a me
fornecer o cadastro de filiados, um direito expressamente previsto no
estatuto, usando diversas desculpas. 
Depois de muita insistência e inúmeras trocas de e-mails, recebi uma
mensagem me convidando a comparecer ao escritório do partido. Quando
cheguei lá, recebi das mãos do próprio presidente nacional do partido uma
lista impressa, com os nomes dos filiados fora de ordem alfabética, as
informações eleitorais ilegíveis e sem qualquer informação de contato.
Era dessa forma que o partido que ia renovar a política brasileira cumpria
com a obrigação determinada em seu próprio estatuto.
 
 
 
 
Enquanto isso, o partido recebia manifestações como esta de Pedro Cintra,
ex-colega de Santo Inácio:
 
Aos membros da Executiva Nacional do Partido Novo,
 
Sou filiado ao Partido Novo e gostaria de saber qual foi o critério utilizado para que o
Roberto Motta não fosse selecionado como pré-candidato a prefeito do Rio de Janeiro.
 
Conheço o Roberto há quase 40 anos, tendo estudado e trabalhado com ele durante
vários anos, e posso dizer com confiança que ele seria um excelente prefeito, com sua
capacidade de trabalho e execução, sem falar na sua inteligência e habilidade de se
expressar de forma clara e convincente.
 
Agradeço atenciosamente por uma resposta,
Pedro Pessôa Ladvocat Cintra
 
Ao mesmo tempo, e depois da campanha de ataques públicos lançada
contra mim, muitos dos e-mails que enviávamos com pedidos de apoio
eram respondidos com ofensas. Cada resposta dessas era um soco no
estômago.
 
 
 
 
Apesar de todos os obstáculos, da avalanche de ataques morais e ofensas
públicas, e do enorme desânimo e decepção que caíra sobre minha família e
sobre mim, na segunda-feira, 20 de junho de 2016, às 12h30,
acompanhando dos amigos Marcelo Silva e Otávio Cintra, cheguei ao
escritório do partido para entregar as 112 assinaturas de apoio, mais do que
a quantidade mínima exigida.
 
A pessoa que se encontrava lá – e que, por enquanto, prefiro deixar no
anonimato – se recusou a receber a documentação, só aceitando fazê-lo
após muita insistência minha, do Marcelo e do Otávio, que tinham me
acompanhado justamente para servir como testemunhas, se houvesse mais
uma surpresa me esperando.
 
 
 
 
O partido então enviou e-mails e telefonou para boa parte das 112 pessoas,
perguntando se elas haviam realmente assinado a ficha de apoio e, mais
uma vez, pressionando-as a mudar de posição, avisando que minha
pretensão era ilegítima, pois eu não estava qualificado para ser candidato.
 
Outras narrativas foram criadas para justificar os ataques contra mim.
Passaram a dizer que o indeferimento da minha candidatura era porque eu
havia deixado a presidência do diretório estadual do NOVO Rio de Janeiro
em agosto de 2015, e, portanto, estaria impedido de apresentar minha
candidatura a cargo eletivo nos doze meses subsequentes, conforme
previsto no artigo 37, parágrafo 5º, do Estatuto do partido. Ocorre que o
artigo 98, inciso XVIII, do mesmo Estatuto, em contradição com o primeiro
artigo citado, estabelecia que o prazo de vedação é de 12 meses anteriores a
outubro do ano em que se realizam as eleições. Essa segunda norma sempre
prevaleceu, por consenso, no âmbito do partido – até que eu começasse a
representar um problema.
 
A situação ficaria pior ainda: enquanto usavam essa alegação sem sentido
para me barrar, o partido aprovava a candidatura de uma dirigente partidária
de Minas Gerais – Carolina Antunes – que havia sido nomeada para o
cargo de vice-presidente estadual do Novo MG em 12 de agosto de 2015 –
data posterior à minha saída da presidência do diretório do Rio.
 
Quando isso foi descoberto, e o fato exposto, subitamente a dirigente
desistiu da candidatura.
 
 
 
 
 
A alegação seguinte foi que eu não teria entregado todos os documentos
necessários; uma mentira, pura e simples. Entreguei no dia 21 de junho de
2016 todos os documentos necessários, e tenho em meu poder um
documento oficial do NOVO, assinado por uma de suas funcionárias,
atestando a entrega.
 
 
 
 
 
O desespero em barrar minha candidatura foi tão grande que argumentaram
até que eu não tinha entregado os originais das assinaturas de apoio,
exigência que não constava do Estatuto ou de qualquer determinação do
partido. Vejam: o próprio partido entrou em contato por e-mail e telefone
com vários dos 112 apoiadores para confirmar que haviam assinado o termo
de apoio.
 
A exigência da entrega de “originais” – insinuando com isso que existiria a
suspeita de falsificação de assinaturas de apoio – tinha o inconfundível odor
de uma política velha e cansada, que o partido tinha sido criado justamente
para mudar.
 
 
 
 
No dia 5 de julho de 2016, recebi um e-mail do "Núcleo/Diretório Rio de
Janeiro" do Partido Novo, com o seguinte texto:
 
Prezado filiado,
 
Segue em anexo a intimação em relação aos pedidos de impugnação recebidos por esse
Diretório em relação a sua pré-candidatura. O prazo de resposta segundo o artigo 106 do
estatuto do novo é de 5 dias.
 
Favor acusar recebimento.
 
Atenciosamente, Equipe NOVO Rio de Janeiro
 
 
O e-mail continha um anexo com 27 pedidos de impugnação, sem a
identificação de seus autores. Os pedidos não continham nenhuma
documentação comprobatória, e solicitavam a minha impugnação com base
em três alegações: que eu havia sido reprovado no processo de seleção, que
eu denegri a imagem do Novo no Facebook (sem indicar a postagem em
que isso teria ocorrido) e que eu teria enviado um "e-mail fraudulento". No
mesmo dia enviei uma resposta demonstrando o equívoco da argumentação
apresentada e a inverdade das alegações feitas contra mim. Até hoje não
houve resposta do partido.
 
Quando a autoria dos pedidos de impugnação foi revelada, descobriu-se que
quase todos vieram de funcionários ou dirigentes do NOVO de outras
cidades que não o Rio de Janeiro. Apenas dois pedidos vieram de pessoas
do Rio de Janeiro, uma das quais era (e ainda é) funcionária assalariada do
NOVO.
 
 
 
 
 
A decepção se espalhava entre amigos e apoiadores. Um deles comentou,
em um e-mail de 10 de julho:
 
Cada vez mais inacreditável.
 
Fico pensando se agem tão arbitrariamente no simples comando de um partido político,
como agiriam se viessem um dia a comandar o Brasil?
 
 
 
 
Esse era o resumo: era inacreditável que algumas das pessoas com as quais
eu tinha me associado para criar um partido que iria revolucionar a política
brasileira, tinham, em questões de dias e pelas piores razões possíveis, se
engajado em um processo de destruição da minha imagem pública, só para
impedir que eu exercesse o simples direito de submeter o meu nome à
apreciação dos filiados para uma candidatura majoritária.
 
Mas era isso mesmo que estava acontecendo.
 
 
 
 
 
No dia 11 de julho de 2016, a direção partidária municipal reuniu-se para
analisar uma longa lista de acusações contra mim. Minha candidatura foi
rejeitada. A ata da reunião poderia ter sido retirada de um dos livros de
Kafka.
 
 
 
 
Quando soube da decisão do partido, Alexandra imediatamente enviou
um e-mail ao João exigindo que ele explicasse por que eu não poderia ser
candidato. A resposta do João foi:
 
Obviamente se ele não foi aprovado é porque houve um entendimento de que ele não
atendeu os quesitos como experiência na área pública e ou histórico de sucesso em gestão
nos últimos anos e ou conhecimento básico sobre a prefeitura do Rio.
 
“Que qualificações são essas?”, ela insistiu. Trocaram quase dez e-mails,
até que ela desistisse de tentar obter uma explicação. Seu último e-mail para
o João, no dia 25 de maio, tinha este texto:
 
Infelizmente não convenceu, e por isso tantos estão descontentes e de fato se
desfiliando. Estes requisitos não eram pré-requisitos para se candidatar às vagas e você o
autorizou a se inscrever já sabendo das qualificações dele, ou seja, tudo errado!
 
Uma pena esta amizade de 36 anos se desgastar por você não ter tido a coragem de
sentar-se com ele e conversar de homem pra homem, já que ele não era um candidato
qualquer, mas sim um amigo leal, frequentador da sua casa, fundador e apaixonado pelo
NOVO, merecia uma explicação digna e não esta confusão de informações dos dirigentes,
onde fica evidente que houve uma posição pessoal sua interferindo no processo. Uma pena!
 
Só quem perde é você e o partido, mas vamos em frente porque o projeto de um Brasil
melhor, este sim não abandonaremos jamais!
 
 
 
 
No dia 17 de julho de 2016, eu pedi desfiliação do Partido Novo.
 
 
 
 
No dia 31 de julho, fui à manifestação pelo impeachment de Dilma em
Copacabana, e discursei em três carros de som diferentes. Esse foi o meu
discurso:
Olhe ao seu redor.
Olhe ao seu redor: os prédios, o posto de gasolina, os quiosques da praia, os bares, os
automóveis nas ruas, o helicóptero lá em cima.
Tudo tem a mão do Estado.
Para que essas coisas existissem foi preciso pagar 10%, 30%, 55%.
Foi preciso conseguir uma permissão, tirar um alvará, fazer registro na junta, aprovar o
projeto na secretaria, esperar a vistoria.
Até carrocinha de pipoca precisa de licença da prefeitura.
O Estado brasileiro é um parasita, que suga o esforço de cada cidadão.
Está na hora de mudar o país
É preciso começar uma nova era.
Política não é negócio.
Política não é meio de enriquecimento.
Administradores públicos precisam ser competentes.
Chega de eleger ex-BBBs. Chegar de eleger comediantes.
Chegar de eleger gente que elogia a mandioca.
Precisamos diminuir o tamanho do Estado brasileiro.
Precisamos aumentar a liberdade e a riqueza do povo.
Um Estado grande é um Estado corrupto.
É um Estado que faz de tudo –
produz petróleo,
decide os livros que você pode ler,
Os brinquedos que seu filho pode usar,
qual a tomada da sua casa.
O Estado grande decide até assuntos importantíssimos,
Como, por exemplo, o dia nacional do macarrão (25 de outubro, de acordo com a Lei
13.050, de 8 de dezembro de 2014, assinado pela ex-presidente da República, a senhora da
mandioca).
O Estado grande faz tudo pra você.
Menos cumprir com suas obrigações essenciais: saúde básica, segurança, educação e
justiça.
Em 2014 o BNDES emprestou mais de 200 bilhões de reais a juros baixos para grandes
empresários. 200 bilhões = mais que os orçamentos dos ministérios da Saúde e Educação
SOMADOS.
Somos um país que endossa o paternalismo.
Chega.
É preciso recomeçar do zero.
É preciso construir um país próspero e seguro para todos.
E essa construção tem uma regra muito simples: todos são iguais perante a lei.
Seja você um vendedor ambulante ou um ex-presidente da República.
Viva o Brasil.
Fora, Dilma.
 
 
Um pedaço do quebra-cabeça: um dos pioneiros do Novo, que participou
das entrevistas com os candidatos (mas não da minha), me disse que
testemunhou um dos dirigentes do Novo – um dos três que estavam naquela
reunião de sábado à noite na casa do João – dizendo, no escritório do
partido, em voz alta: “O Motta não pode ser candidato porque o Motta é
incontrolável”.
 
 
 
Outro pedaço: há poucos meses, no início de 2021, Fabiana Bentes foi
convidada para uma conversa com um mandachuva do Novo do Rio. Ele
fez um convite para que ela se filiasse ao partido. Fabiana se surpreendeu:
“Mas eu fui reprovada no processo seletivo em 2016! Por que vocês
mudaram de ideia?”. A resposta do mandachuva foi direta, seca e sem
nenhum constrangimento: você foi reprovada porque era muito próxima do
Roberto Motta.
 
 
 
No dia 31 de agosto de 2016, o plenário do Senado condenou Dilma
Rousseff à perda de seu cargo sob a acusação de ter cometido crime de
responsabilidade fiscal. Dilma, entretanto, não perdeu seus direitos
políticos, como previa a lei.
 
 
 
 
 
Em determinado momento, no meio da batalha pelas assinaturas,
cansado e emocionado, enviei um e-mail de agradecimento aos
companheiros que lutavam comigo, e recebi esta resposta do Marcelo Silva:
 
Caro Motta,
 
Também estou emocionado porque foi você que me trouxe esperança de um Brasil
melhor quando eu já não acreditava que era possível na minha geração.
Sua energia é a mesma que irriga muita gente [...]
Mesmo que a gente não ganhe agora, o legado deste movimento é manter as esperanças e
o espírito de luta do grupo. Dos 200 apoiadores ativos que você calorosamente recebeu.
Acredite. [...] Resiliência é nossa maior virtude. E a luta é o que cura as lágrimas das
injustiças porque todo líder passa.
Abraços com afeto,
Marcelo de Sousa Silva
 
 
 
 
 
Esse era o Partido Novo que eu havia criado e que, para mim, deixava de
existir ali.
Capítulo 14
São Paulo
Em 2015, Dennys Andrade, um filiado do Partido Novo de São Paulo –
executivo de marketing, pai de três filhos e autor de dois livros (por
enquanto) – criou um blog chamado 30 Diários[46] para a comunicação entre
filiados. No dia 28 de novembro daquele ano, foi publicada no blog a
matéria “Almanaque do Partido Novo”. Esse texto, atualizado várias vezes,
e ainda no ar, é uma coletânea de fatos e curiosidades sobre o partido.
Com o passar do tempo, por falta de alternativas, o blog virou o canal de
comunicação principal dos filiados de São Paulo. Até que, um dia, Dennys
recebe uma ligação dos Estados Unidos: era o tesoureiro do Novo pedindo
que Dennys retirasse do blog todas as referências ao partido, pois as pessoas
estavam achando que ele – Dennys – era o porta-voz oficial do Novo.
Quem clica hoje no link do Almanaque[47] verá, no início da página, esse
parágrafo:
Este BLOG deixou de apoiar o Partido NOVO em julho de 2016, tendo como
causa o esgotamento das tentativas por parte dos filiados em apontar os erros de
navegação e de ouvir, em retribuição ao tempo, energia e até reputação pessoal
empregados em torno de um projeto em que todos acreditavam, uma única
mensagem, repetida exaustivamente: “Acreditem em mim” (João Amoêdo).
 
 
O Novo foi concebido no Rio, mas nasceu, quase ao mesmo tempo, em
São Paulo. Lá ficava o escritório que João dividia com seu sócio, Fábio
Ribeiro, e onde começou a funcionar o diretório nacional. Logo foi criado
uma presença local, sob o comando de Christian Lohbauer, doutor em
ciência política pela USP. O diretório municipal era presidido por Erich
Tavares, e o diretório estadual por Maria Beatriz Figueiredo. Os dois, junto
com Beatriz Znidarsis, operavam o “Fale Conosco” de São Paulo,
respondendo às mensagens de filiados e apoiadores.
A ideia do Novo teve, em São Paulo, a mesma aceitação que em outros
lugares. Os voluntários surgiam em grande número e diversidade de
talentos. Em um ambiente de decepção com a política tradicional, o Partido
Novo exaltava o “indivíduo como agente de mudanças” e o único gerador
de riquezas, ideias atraentes em um ambiente sedento por “liberdade com
responsabilidade”.
No ano de 2015, multidões tomavam as ruas pedindo o impeachment de
Dilma Rousseff. Naquele momento, a ideia de participar de um projeto
político baseado em valores compartilhados e com princípios claros e
genuínos atraía muitos interessados. Entre eles, estavam personalidades
como o membro da casa real brasileira e atual deputado federal Luiz
Philippe de Orleans e Bragança. Outros nomes de destaque eram Alexandre
Gama, Beatriz Sander, meu querido e aguerrido amigo Luiz Eloy Oliveira,
Patrícia Bueno, Naomi Yamaguchi, Tamara Bertoldo, Júlio Casarin e o
especialista, consultor e investidor em hotelaria José Ernesto Marino Neto.
O Novo engajava pessoas que jamais pensaram em envolvimento com
política. Mas os problemas não tardaram a aparecer; eles apontavam para
um divórcio entre a teoria e a prática dos dirigentes.
Um exemplo: em 2015, José Ernesto Marino Neto disponibilizou um
grande imóvel no Morumbi, próximo à favela de Paraisópolis, para que o
partido criasse um centro de formação e de encontros, e enfrentou
desinteresse e resistência. Depois de grande esforço, ele conseguiu
autorização para organizar uma apresentação do partido no imóvel. No dia
marcado, com a casa lotada de simpatizantes, Marino foi, inesperadamente,
impedido de falar pela direção do partido, sob a alegação de que ele não era
um “palestrante credenciado” do Novo.
Era um mau sinal vindo dos líderes do projeto cujo pilar era a confiança
nos indivíduos.
 
 
Em fevereiro de 2016, o Novo São Paulo tinha a seguinte estrutura de
voluntariado:
Apoio Jurídico: Ives Braghittoni e Luiz Módolo;
Gestão de Voluntários: Suzana Herzka;
Coordenação do Novo nas Ruas: Alfredo Fuentes e Isabel Barcello,
com as seguintes equipes:
Centro – Jaime e Uriel Puskas;
Zona Norte – Roberto Paiva e Robson Bombonatti;
Zona Oeste – Dennys Andrade e Nilton Rossano;
Zona Sul – Paulo Lázaro de Moraes e Luiz Aguilar;
Zona Leste – João Marcello Ortega e Nicholas de Oliveira.
Captação: Arthur Rozenblit;
Coordenação dos Diagnósticos: Fernando Meira;
Estrutura Administrativa e Financeira Municipal: Cláudia Bachega;
Saúde: Paulo Lázaro de Moraes.
 
 
 
A militância do Novo paulista era dividida entre filiados – conhecidos
como os “A30” – e voluntários – chamados de “V30”. A distinção tinha
uma origem curiosa e, em retrospecto, significativa: os V30 eram
voluntários que participavam das ações e atividades externas de divulgação
do partido, mas não podiam participar das reuniões mensais do diretório,
pois, diferentemente dos filiados A30, não pagavam uma contribuição
mensal.
Na noite de 10 de maio de 2016, reuniram-se, pela primeira vez, os
filiados A30 e os voluntários V30. O local era a Fecomércio, e o motivo da
reunião era o anúncio do resultado do processo seletivo de pré-candidatos.
Os A30 e os V30, reunidos para conhecer os nomes dos aprovados para
concorrer nas eleições daquele ano, estavam imbuídos do espírito de uma
frase do presidente do partido, João Amoêdo, que dizia: “O que nos motiva
não é a certeza do sucesso, mas o senso de obrigação que temos com o país
e com as futuras gerações”.
Ninguém esperava uma vitória espetacular do NOVO na primeira
disputa eleitoral, claro – mas todos esperavam que o NOVO competisse. E
os filiados queriam competir: segundo Alfredo Fuentes, então presidente
estadual do partido, em entrevista concedida a Clynton Cortez para o
podcast do 30Diários[48], o núcleo paulistano “esperava umas dez, vinte, no
máximo trinta candidaturas, e apareceram duzentas”.
O presidente do diretório municipal, Erich Tavares, abriu a reunião
anunciando que a qualidade dos pré-candidatos fora altíssima e que o
diretório poderia ter aprovado candidatos para concorrer às oitenta vagas
disponíveis na Câmara de Vereadores. Entretanto, disse ele, os dirigentes
preferiram aprovar apenas os candidatos mais bem avaliados, evitando uma
“canibalização” das candidaturas.
Era uma decisão controvertida e, na opinião da maioria dos militantes,
claramente equivocada. O partido já afirmara que os candidatos não teriam
recursos partidários à disposição. Logo, não havia qualquer justificativa
financeira para lançar um número reduzido de candidatos. Além disso,
qualquer um que conheça os rudimentos do sistema de eleição proporcional
adotado no Brasil sabe que o número de cadeiras conquistadas no
Legislativo é proporcional ao total de votos conquistado por todos os
candidatos do partido somados.
Portanto, quanto mais candidatos, melhor – especialmente se, como
dissera o representante do partido, a qualidade dos inscritos fora tão alta
que o diretório poderia ter aprovado candidatos para concorrer a todas as
vagas.
A decisão do partido não fazia qualquer sentido.
A crítica se transformou em revolta com o anúncio seguinte: o partido
não lançaria candidato à prefeitura de São Paulo.
Vinte filiados haviam se inscrito para a vaga de pré-candidato à
prefeitura; desses vinte, treze foram aprovados para a segunda fase do
processo. Mas nenhum fora considerado apto a concorrer à eleição.   Os
A30 e V30, reunidos pela primeira vez, ouviram com assombro a
explicação da então presidente do diretório estadual paulista: “Nenhum dos
concorrentes possuía ‘luz, carisma e propriedades pessoais acima da
média[49]’”.
Mas os presentes sabiam que, entre as candidaturas apresentadas para a
prefeitura, estavam Luiz Philippe de Orleans e Bragança e lideranças como
Davi Oliveira e Naomi Yamaguchi.
A explicação não tinha qualquer lógica.
Os presentes questionaram se esse rigor extremo não era
contraproducente e danoso ao objetivo de longo prazo do partido. Nas
palavras de um dos filiados presentes, “por mais exata e acertada que seja a
régua do partido, há momentos em que a sensibilidade humana deve falar
mais alto”. Disse outro: “Temos que usar esta eleição para aprendizado,
pois não vamos ganhar. Não precisamos de outra eleição apenas para
aprender como fazer uma campanha para vereador”.
Luiz Aguilar, líder da equipe de Inteligência Eleitoral, apresentou uma
análise dos resultados e da legislação. A decisão de não lançar candidatura à
prefeitura paulistana seria danosa, afirmou ele, não apenas emocionalmente,
mas também do ponto de vista racional. Ela resultaria em perda de tempo
de exposição na mídia, nos debates, na veiculação gratuita em horário nobre
e no engajamento de filiados e simpatizantes.
Nenhum argumento foi considerado pela direção do partido.
Os filiados e apoiadores presentes, então, votaram pelo lançamento de
um candidato à prefeitura de São Paulo. Essa decisão tomou a forma de um
abaixo-assinado, elaborado por Rodrigo Sanches e encaminhado ao
diretório nacional.
A bola agora estava com o diretório. Cabia a ele dissipar a impressão de
que a centralização excessiva estava levando o Novo no mesmo rumo dos
outros partidos e praticar o que pregava: respeito pela liberdade individual e
pelo indivíduo como agente de mudanças.
Na semana seguinte acontecia nova reunião, dessa vez com a presença
do presidente nacional do partido. Filiados e voluntários voltaram à
Fecomércio e apresentaram, de novo, seus argumentos. Depois de ouvir a
todos, João anunciou que estava atrasado para pegar um voo e saiu sem
responder aos questionamentos. Apenas repetiu que não haveria candidato à
prefeitura e que aquela era a decisão correta.
“Confiem em mim”, ele disse, e foi embora.
 
 
Um dos filiados que havia participado do processo seletivo para a
candidatura à prefeitura, Davi Oliveira, decidiu utilizar o recurso do
estatuto que previa a ida para a convenção partidária do pré-candidato que
reunisse um número de apoios correspondente a 10% dos filiados do
diretório municipal. Era a mesma posição que eu adotara no Rio: exigir que
o partido cumprisse o próprio estatuto.
Mas, quando os documentos com as assinaturas de apoio chegaram ao
diretório de São Paulo, Davi recebeu um telefonema do partido. Os
dirigentes questionavam o motivo daquela mobilização, já que estava
decidido que não haveria candidato. Para Davi, a resposta era óbvia: os
filiados queriam um candidato e não concordavam com o posicionamento
do partido, e o recurso estava previsto no próprio estatuto.
Era evidente que o diretório teria o poder de veto – e foi exatamente isso
que fizeram, depois de tentar, sem sucesso, tentar convencer Davi a retirar
sua candidatura.
Davi ainda recebeu uma oferta para ser candidato a vereador, mas não
aceitou e se desfiliou logo após a convenção do partido.
 
 
 
No final do mês de maio de 2016, filiados do Brasil inteiro assinaram um
manifesto do 30 Diários. Segue um trecho abaixo:
“Os eventos relacionados às primeiras eleições a serem disputadas pelo
NOVO têm levado a um crescente número de questionamentos quanto aos
processos internos e decisórios e suas consequências, a curto e longo prazo. A
preocupação com a evolução do partido e seu projeto de Brasil é compartilhada
por filiados de todo o país.
Confiando no espírito liberal e na boa-fé dos fundadores, reafirmamos o
nosso desejo de trabalhar de maneira construtiva na busca de um projeto de
partido alinhado com a expectativa de todos. Tomados por este sentimento
comum, resolvemos, amparados pelo Estatuto e por aclamação, publicar esta
carta aberta, convocando os filiados a reafirmar os valores e princípios que nos
uniram: confiança, transparência, ética e o respeito mútuo e democrático,
consagrados em seu Estatuto.
(…) comunicamos por meio deste documento o desejo de oficializar a
CORRENTE NACIONAL DE FILIADOS DO NOVO, o CONFIA-NOVO, cujo
objetivo será o de aglutinar os anseios e aspirações dos filiados, contribuindo de
forma construtiva para o crescimento e o desenvolvimento do NOVO.”
 
 
No dia 4 de junho de 2016, quarenta filiados[50] de quatro estados
brasileiros reuniram-se na casa de Paulo Lázaro de Moraes e fundaram o 1°
movimento independente de filiados ao Partido Novo, o CONFIA. Baseado
no tripé “Filiados – Dirigentes – Parlamentares”, a corrente defendia os
principais valores do Novo, com o objetivo de contribuir para que o partido
cumprisse sua missão.
Ao final daquele mês, o movimento já contava com a participação de
150 filiados de seis estados.
O estatuto do partido previa que todos os pré-candidatos deveriam ser
votados e aprovados pelos filiados na convenção partidária, a ser realizada
em 31 de julho[51]. Mas houve apenas a apresentação dos candidatos
aprovados pelo “processo seletivo” e uma votação simbólica, ratificando a
decisão do diretório e relegando os filiados a meros espectadores.
Foi um banho de água fria. A mensagem era clara: as decisões não
passariam pelo indivíduo, e o filiado seria apenas um soldado obediente.
Seguiu-se uma onda de desfiliações em São Paulo.
 
 
 
Júlio Cesar Casarin, candidato a vereador pelo partido em São Paulo,
processou o então presidente do diretório municipal e o próprio partido,
pedindo ressarcimento por danos materiais e morais resultantes de ataques
do próprio partido à sua campanha. Diz um trecho da ação[52]:
Para espanto do autor, numa estratégia totalmente equivocada, que provou ser um
tiro no pé, o partido começa a tratar filiados de forma “bovina”, dizendo em alto e
bom som nas reuniões que “Aqui é partido que tem dono, manda quem pode, obedece
quem tem juízo”. Isto era voz corrente nos encontros e o autor tem dezenas de
testemunhas.
 
Em outro trecho, Júlio descreve a razão da perseguição de que foi
vítima:
 
Alguns amigos da diretoria confessaram ao autor que o partido tinha seus
escolhidos e “preferidos” para eleger e que estes seriam beneficiados de todas as
formas [...] O autor era visto como uma ameaça, pois sua forte militância política o
levava a ter um prestígio nas redes sociais, que, se transformado em votos, o guindaria
aos primeiros lugares entre os postulantes do NOVO aos cargos no legislativo
municipal e isto não era desejado pelo partido. Segundo tais amigos, o autor estava
sendo boicotado de todos os eventos, convites, hangouts, verbas, [...]
 
 
Júlio então descreve a tentativa final de sabotagem de sua campanha:
 
[...] A dez dias do pleito e a poucas horas do maior evento de sua campanha [...] o
autor publica mais um vídeo em sua página do Facebook, desta feita falando sobre
questões relativas ao IPVA (imposto estadual). E pasme, Excelência; na própria
página do autor, sem qualquer autorização para tal, de forma sórdida e rasteira, o
presidente municipal do Novo 30 (partido pelo qual concorria o autor) escreve com
todas as letras: ISTO NÃO É PROPOSTA, É ENGANAÇÃO!!!!
[...] o autor foi impugnado, sabotado, preterido, destroçado pela sua própria sigla
partidária.
Antes do julgamento da ação, o presidente municipal propôs o
pagamento de uma indenização a Júlio Cesar para que ele encerrasse o
processo, o que foi feito. Com isso, o juiz considerou extinta a segunda
ação contra o partido[53].
 
 
 
Passados dois meses de minha palestra na cidade, o grupo dos
apoiadores do Novo em Sorocaba, liderado pelo Dr. Vinícius Rodrigues,
continuava com as reuniões semanais de estudo do estatuto. O grupo
incluía, até onde eles sabiam, todos os filiados da cidade. Mas em abril de
2016 eles descobriram, no site do TSE, que o número oficial de filiados do
município era maior do que o número de participantes das reuniões: havia
filiados que ainda não faziam parte do grupo. Eles, então, entraram em
contato com o partido, através do “fale conosco”, solicitando as
informações de contato dos filiados da cidade, para que todos pudessem ser
convidados para as reuniões do grupo.
 
A resposta da Renata, do “fale conosco”, foi:
 
Infelizmente, não podemos passar essas informações, pois não temos autorização para
isso. Nosso Estatuto prevê a divulgação de dados dos filiados apenas para pré-candidatos,
para que possam divulgar suas propostas.
Vinícius respondeu explicando que a questão estava claramente definida
no artigo 12 do estatuto: era direito de qualquer filiado obter informações
sobre outros filiados, e não só em período eleitoral.
A próxima resposta do partido veio assinada por “Gonzaga”:
Nossa interpretação do estatuto é que informações de filiados devem ser fornecidas
para pré-candidatos a fim de divulgarem suas propostas. Mesmo se não fosse esta a nossa
interpretação, as condições sistêmicas atuais nos impediriam de atender esta demanda, pois
temos mais de 8.500 filiados.
“Sem problema”, respondeu Vinícius, percebendo naquela resposta um
subterfúgio. “Nosso grupo está disposto a contratar os serviços de um
profissional para criar e organizar o cadastro, sem qualquer custo para o
Novo”.
A posição do partido continuou a mesma.
“Gostaríamos de marcar uma reunião presencial com algum
representante do núcleo estadual”, pediu Sorocaba.
“Peço que informe em detalhes qual seria o objetivo da reunião”,
respondeu “Gonzaga”.
Vinícius então envia um último e-mail com a explicação detalhada, que
termina assim:
Essa reunião é para nos acertarmos! Afinal, quando nos envolvemos inicialmente
com as ideias do NOVO, durante uma palestra do João, ele disse que buscava sócios,
e não filiados. O que sócios fazem quando não se entendem sobre o estatuto da
empresa? Sentam-se à mesa e conversam sobre os rumos, os planos e as
interpretações de cada lado! Buscando ouvirem e serem ouvidos pelo bem maior que
é o projeto, nesse caso, o NOVO.
A resposta de “Gonzaga”, enviada em e-mail de 25 de abril, foi:
Todos os assuntos que serão abordados na reunião já foram esclarecidos. De
modo objetivo, não vemos necessidade de haver reunião para tratar destes assuntos.
Conversando com filiados de São Paulo, Salvador e Rio, Vinícius e seu
grupo descobriram que coisas semelhantes ocorriam nas outras cidades; a
postura do diretório era a mesma.
Vinícius ainda recebeu um último e-mail de uma pessoa ligada ao
presidente, que dizia: “Pare de questionar, confie no João. Ele é muito
competente, foi ele que construiu o partido”.
A resposta de Vinícius foi:
Um partido político não é uma casa. Se eu construo uma casa para mim,
posso definir quem entra e quem não entra, e defino suas regras e horários de
funcionamento, porque é a minha casa. Mas o partido é como um filho; você o
cria, educa, passa os seus valores, mas ele não pertence a você. Uma vez que o
partido exista, a sociedade pode entrar nele e mudar os seus rumos. O João acha
que o partido é uma casa, e não um filho.
Algumas semanas depois, todo o grupo de Sorocaba também se
desfiliava do partido.
 
Capítulo 15
Rio Grande do Sul[54]
Mateus Bandeira conheceu João Amoêdo entre 2013 e 2014,
apresentados por um amigo em comum.
 
Mateus era CEO de uma das empresas de consultoria mais prestigiadas
do Brasil, a Falconi Consultores de Resultado, firma que ele, Mateus, tinha
recebido como missão reestruturar. Como parte dessa missão, Mateus já
fora responsável pela mudança do nome – a empresa antes se chamava
INDG. Era mais uma posição em uma carreira que começara como analista
de sistemas, seguira na Secretaria de Fazenda do Rio Grande do Sul,
passara pelo Ministério da Economia, pelo Senado, pelo tesouro estadual na
administração da governadora Yeda Crusius, pela Secretaria de
Planejamento do estado e pela presidência do Banrisul. Mateus também
tinha sido bolsista da Fundação Estudar, fundada por Jorge Paulo Lemann,
Beto Sicupira e Marcel Telles.
 
Embora interessado no Novo, Mateus preferiu não se filiar ao partido
para não prejudicar a consultoria. Em abril de 2016, Mateus e João se
encontraram em um seminário organizado por estudantes brasileiros da
Universidade de Chicago – o mesmo no qual falou Sergio Moro. Meses
depois, João foi convidado a falar sobre o Novo em um dos eventos
mensais que Mateus realizava em São Paulo e, no final de 2016, João
assistiu, como convidado especial, ao evento anual organizado pela Falconi,
que reuniu os ex-ministros Pedro Malan e Gustavo Franco. 
 
João então convidou Mateus para uma conversa, que aconteceu em um
almoço na Churrascaria Fogo de Chão, na Praia de Botafogo, no Rio, na
quinta-feira 19 de janeiro de 2017. Segundo Mateus, João explicou a
situação do Novo e disse que o partido se preparava para lançar candidatos
ao governo em vários estados. No Rio, o plano era lançar Bernardinho;
também já tinham candidato em Minas Gerais. “E precisamos de sua ajuda
no Rio Grande do Sul”, completou.
 
“Claro que ajudo”, respondeu Mateus. “Vamos encontrar um bom
candidato”.
 
“Queremos que você seja o candidato”, disse João.
 
De jeito algum, respondeu Mateus. Ele não tinha interesse nem
disponibilidade. Nem filiado ao partido ele era. Mas certamente ajudaria o
partido a encontrar um candidato, só isso. E assim ficou a conversa.
 
Na semana seguinte Mateus se reuniu com Falconi, o sócio principal que
dava nome à empresa, para falar sobre questões relacionadas à
reorganização – e essas questões acabariam levando Mateus e outros três
sócios a deixarem a consultoria.
 
Quando João soube da notícia, ligou e renovou o convite: “Vem com a
gente”.
 
Mateus levaria três meses até tomar uma decisão. Era um desafio grande.
O estado tinha apenas 400 filiados e, como o partido não faria coligação,
não teria nenhum tempo de TV. Nesse meio-tempo, ele conversou com
muita gente, incluindo ex-conselheiros da Falconi e empresários gaúchos.
 
E resolveu aceitar.
 
 
 
 
 
Em outubro de 2017, Mateus se filiava. Com o apoio de Winston Ling,
ajudou a convencer o deputado estadual Marcel Van Hattem, então no PP, e
uma estrela do liberalismo no país, a vir para o partido. Marcel também
recebeu o incentivo de muitas outras pessoas. “Mas ele vai ter que fazer o
processo seletivo”, disse o diretório. Processo seletivo? Para um
parlamentar excepcional, cujo trabalho em favor da liberdade era público e
notório? Mas Marcel não viu problema algum nisso: o “processo seletivo”
foi feito e ele foi para o Novo, dentro do prazo previsto na lei para troca de
partido – a janela partidária.
 
Alguns meses depois, Mateus participou em São Paulo de um evento do
banco JP Morgan, no qual estava presente Rogério Chequer, um dos dois
fundadores do movimento Vem Pra Rua. Mateus ficou sabendo que
Chequer tinha dois convites – um deles do PSL – para sair candidato a
deputado federal, e sugeriu que o Novo conversasse com ele.
 
Feito o convite, Chequer aceitou: seria candidato ao governo de São
Paulo.
 
E aí começou a acontecer uma coisa estranha: nada.
 
Nenhuma providência era tomada para preparar a candidatura de
Chequer. O tempo passava e, preocupado, Chequer procurou Mateus, que,
por sua vez, procurou o então presidente do Novo (João havia se afastado
para se candidatar a presidente da República). Por telefone, Mateus ouviu a
explicação do presidente do partido para a falta de providências:
 
"A gente acha que ele não é o candidato ideal."
 
Atordoado com a explicação, Mateus ligou para o presidente do diretório
estadual de São Paulo, que estava furioso, mas não podia ajudar. Mateus
então ligou para uma dirigente nacional do partido, que recomendou: “Você
tem que falar com o João".
 
Embora João não fosse mais presidente, foi só depois de uma conversa
com ele que se chegou a um acordo: Chequer apresentaria um plano de
governo, e o partido decidiria sobre a candidatura.
 
O plano de Chequer foi aprovado e em maio de 2018 o Novo lançava as
candidaturas de Chequer a governador e de Christian Lohbauer ao Senado.
 
 
 
 
 
 
Para a estratégia de campanha de Mateus Bandeira, era importante que o
partido lançasse um candidato ao Senado pelo Rio Grande do Sul. Depois
de hesitar, o partido convidou um ex-presidente do Instituto de Estudos
Empresariais, que não aceitou. O partido então convidou o advogado Bruno
Miragem, que conversou com Mateus.
 
Bruno aceitou o convite e, depois de aprovado nas sabatinas partidárias,
tomou as providências iniciais: transferiu a titularidade do escritório de
advocacia para sua esposa e pediu licença da universidade.
 
Mas, no início de abril, Bruno liga para Mateus e diz: “O partido não
formalizou minha candidatura”. Mateus então liga para o presidente
nacional do partido.
 
"Não vamos ter candidatura ao Senado", responde o presidente. “É
decisão tomada.”
 
Mas nada havia sido comunicado nem ao Mateus nem ao Bruno.
 
“Então o partido também não terá candidatura ao governo do estado”, foi
a resposta de Mateus. “Vocês têm 24 horas pra resolver isso”.
 
Antes do prazo estipulado, o partido entrava em contato: “Resolvemos o
problema”, informaram a Mateus. “Vamos publicar um edital de processo
seletivo, e o Bruno poderá se candidatar”.
 
Não foi preciso. Diante desse quadro, Bruno Miragem desistira da
candidatura.
 
Mateus então convidou Bruno para ser candidato a seu vice-governador.
E aí surgiu um novo problema.
 
“Não é assim que funciona”, informou o partido. “Essa decisão tem que
passar pelo diretório."
 
“Vou inscrever a chapa com o nome do Bruno", respondeu Mateus. “E
vocês façam o que quiserem.”
 
O partido acabou aceitando.
 
 
 
 
 
No dia 6 de setembro de 2018, o então deputado federal e candidato
favorito à Presidência da República, Jair Bolsonaro, era carregado nos
ombros de uma multidão em Juiz de Fora quando foi ferido com uma
facada no abdômen. Uma onda de espanto e comoção varreu o país.
Bolsonaro estava fora da campanha, e correndo sério risco de morte.
 
Era um momento grave e trágico, sem comparação na história recente.
 
Naquele dia, Mateus Bandeira, cidadão brasileiro e candidato do Partido
Novo ao governo do estado do Rio Grande do Sul publicou, na sua conta da
rede social Twitter, uma mensagem:
 
“Deputado @jairbolsonaro, estimo tuas melhoras e, como candidato ao governo do Rio Grande do Sul pelo
@partidonovo30, saibas que tu contas com nossa solidariedade para superar este episódio e continuar na corrida
presidencial.”
 
Pouco tempo depois ele recebia uma ordem do partido: "Apaga esse
tuíte".
 
Mateus não apagou.
 
 
 
 
 
Próximo ao final da campanha, Mateus foi convidado para um debate de
candidatos na TV Record. Era uma grande oportunidade. O debate estava
marcado para o último sábado de setembro, dia 29, às 13h25.
 
Faltando poucos dias para o debate, Mateus recebeu um recado do
diretório estadual: “João mandou te avisar que ele vai fazer o encerramento
no Parcão (apelido do parque Moinhos de Vento, em Porto Alegre) no
sábado às 14h".
 
Era quase exatamente na hora do debate.
 
Mateus ligou para o coordenador de campanha do João – que em 2020
viria a ser o candidato a prefeito do partido na cidade do Rio de Janeiro –
para pedir ajuda. Recebeu o conselho: “Você precisa se entender com o
diretório estadual".
 
Quando Mateus afinal conseguiu falar com o João, ouviu exatamente a
mesma coisa: "Você tem que se acertar com o diretório".
 
Mas era evidente que o problema não era o diretório estadual.
 
Não houve nenhum tipo de acerto.
 
 
 
 
O encerramento da campanha presidencial do Partido Novo foi realizado
no Parque Moinhos de Vento, com a presença de Bernardinho e da
militância partidária, exatamente no mesmo dia e hora em que o candidato
do partido a governador, Mateus Bandeira, participava do debate da Record.
 
Alguns meses após o fim da campanha, Mateus se desligava do Novo,
junto com uma centena de filiados.
 
Sua carta de desfiliação[55], divulgada publicamente, dizia:
 
O Novo surgiu com o claro propósito de ser diferente, firmando-se como
alternativa aos brasileiros cansados da velha política. Pretendia ser novo na
atitude, na participação voluntária, no desejo de transformação, na busca pela
liberdade [...]
 
Queríamos uma sigla sem dono, construída efetivamente pelas pessoas.
Idealistas, buscávamos construir uma nova cultura política [...]
 
Porém, com o passar do tempo, fomos percebendo que a teoria do Novo não
se refletia na prática. Desde a campanha, discordamos de diversas atitudes
tomadas pelo Diretório Estadual e pelo Diretório Nacional. De forma
centralizadora, as decisões são impostas de cima para baixo. Também, os
dirigentes não percebem a importância de um firme posicionamento contra a
hegemonia de esquerda no atual momento. Confundem toda política com velha
política, negando a máxima de que a política é a arte do possível.
 
Todas as tentativas de colaborarmos foram desconsideradas. Grupos de
filiados de diversos estados registraram fatos que comprovam o descompasso
entre a realidade e o que o partido prega [...]
 
Devido aos fatos expostos e por não vermos no horizonte chance de mudança
na condução do partido, decidimos pela desfiliação. Saímos do Novo, mas
levamos conosco todos os valores que nos uniram. Continuaremos empenhados e
buscando espaços de participação onde possamos colaborar para melhorar a
política nacional.
 
Porto Alegre, 3 de abril de 2019.
Capítulo 16
Depois da Tempestade
Sempre escrevi muito. Ao longo dos anos o material foi se acumulando, e
eu tive a ideia de fazer um livro. Trabalhei meses revisando tudo e
preparando um capítulo especial sobre o assunto que me interessava mais:
segurança pública. Só havia um problema: nenhuma editora se interessava.
Para um autor estreante e desconhecido, sem o aval da academia, publicar
um livro é tarefa quase impossível. Se for um livro de ensaios sobre
política, cultura e criminalidade, como era o meu – esquece.
Em maio de 2016, retomei a ideia. Surgia então uma nova alternativa para
autores na minha situação: o financiamento coletivo, ou crowdfunding.
Através de sites especializados você podia apresentar sua ideia ou projeto, e
os interessados contribuíam para a sua realização (o site ficava com um
percentual das contribuições).   Escolhi o site, montei a campanha e ficou
tudo pronto no final de maio. Cada pessoa que contribuísse com um valor
mínimo ganharia um livro.
No dia 14 de junho, lançamos a campanha, que foi até 11 de agosto,
atingindo o objetivo através da contribuição de 362 pessoas. Levantamos
recursos suficientes para a impressão e envio de 1.000 exemplares do livro
Ou Ficar A Pátria Livre: Ideias Para o Bom Combate Contra Pilantras,
Tiranos e Populistas e o Monopólio Ideológico da Virtude , que hoje está
esgotado.
Nos últimos dias do financiamento coletivo, ainda faltava um valor
significativo para viabilizar o projeto. De repente, entrou uma doação
naquele valor. Imediatamente entrei em contato com o doador, Felipe
Aprigliano, disse que gostaria de conhecê-lo e o convidei para almoçar. Nos
encontramos na cidade, no restaurante do prédio da FIRJAN. Felipe era
uma pessoa simples, com uma vida normal, e interesse genuíno em
melhorar o Brasil. Sou muito grato a ele por ter viabilizado a publicação do
meu primeiro livro.
 
 
 
Em julho de 2016, Juliana Volpe, que esteve entre as primeiras pessoas a
se envolver no projeto do Novo, me chamou para conversar. Junto com dois
sócios, Juliana tinha criado a iDTV, uma startup que inventou um nicho
único de mercado: o fornecimento de serviços de TV corporativa para
plataformas de exploração de petróleo e navios-sonda. Embora ainda
pequena, a empresa já tinha filiais em Houston e Dubai e presença em
Londres. Ela estava de malas prontas para um MBA nos EUA e precisava
de alguém que a substituísse como CEO da empresa.
Embarquei naquela nova missão, que me traria muita satisfação nos anos
seguintes.
 
 
 
O interesse pela política seguia comigo. No final do ano realizamos em
um auditório do Edifício Argentina, na Praia de Botafogo, o primeiro
evento do i9, uma iniciativa concebida pelo Leo Fiad para abrir novos
caminhos para atividade política de qualidade. O nome do evento foi Os
Liberais e o Brasil Pós-Impeachment. Estiveram presentes, entre outros,
Alexandre Borges, Pedro Duarte, Priscila Chammas e Bernardo Santoro.
Beate Forbirger e Helio Beltrão abriram o evento com o painel “A
Redescoberta do Liberalismo no Brasil”.
 
 
 
Em novembro de 2016, fui procurado por alguém que eu não conhecia –
João Sardinha, que havia sido candidato a vereador pelo Novo no Rio de
Janeiro (era a sua primeira e, segundo ele, última candidatura). Nos
encontramos para um café no Cine Odeon, na Cinelândia. O motivo do
contato, ele me disse, é que muitas pessoas que haviam se candidatado a
vereador pelo Novo no Rio, inclusive ele, estavam revoltadas com a atitude
do partido, ou pelo menos de seu líder. Sardinha então teve a vontade de
conhecer e conversar comigo – alguém que, até aquele momento, era
apresentado dentro do partido como um “desertor”.
O motivo da revolta dos candidatos: em uma das últimas reuniões antes
das eleições, o presidente do partido, João, deixara claro – segundo
Sardinha – que havia um candidato favorito que receberia a maior parte do
apoio. Segundo outro candidato presente à reunião, João teria dito que a
campanha era como a corrida ciclística “Tour de France”, onde todos eles
trabalhariam para um escolhido vencer.
João Sardinha teve então conhecimento das doações do próprio João a
esse candidato, que seria Leandro Lyra. O apoio do presidente do partido a
um candidato preferido pegou de surpresa até os próprios funcionários do
escritório do Novo no Rio. Quando questionados por Sardinha sobre as
doações do presidente a apenas um candidato, eles inicialmente negaram,
afirmando tratar-se de uma “teoria da conspiração”; depois, constrangidos,
confirmaram o fato, sem dar (na verdade, sem poder dar) qualquer
explicação. Quando apenas o candidato favorito foi eleito, vários outros
candidatos se sentiram usados e pediram uma reunião para conversar
comigo.
A reunião acabou nunca acontecendo, mas o Sardinha – um cara sério,
idealista e agradável – é meu amigo até hoje.  
A candidata a vereadora que tinha sido a segunda mais votada no Rio em
2016 – ou seja, aquela que era a primeira suplente – deixou o partido logo
após as eleições, insatisfeita com o tratamento que recebera dos dirigentes.
O único vereador eleito, Leandro Lyra, iria, dois anos depois, se
desentender com a direção do partido – um desentendimento que chegou à
Justiça – e se desligar dele em 2020.
Antes de sair, em abril de 2018, Leandro Lyra enviou ao diretório
nacional do partido um memorando sobre a reforma do estatuto feita pelo
partido pouco antes, em junho de 2017. Segundo o documento de
Leandro[56], a reforma, que foi feita sem qualquer divulgação interna ou
externa e sem nenhuma transparência, fez alterações no estatuto que, “além
de irem contra princípios democráticos, republicanos e liberais, atentam
contra as próprias diretrizes e ideias defendidas pelo NOVO”. O resultado
foi a concentração ainda maior de poder no Diretório Nacional, em
particular no presidente, inclusive retirando os deputados federais da
convenção.
 
 
Entre as qualidades conhecidas de um certo deputado carioca do PSOL,
amante da piscina do hotel Copacabana Palace, não está a de defensor do
meio ambiente. Apesar disso, no dia 21 de agosto de 2019, em sua conta no
Twitter, o deputado questionou o Partido Novo sobre o fato de o ministro
Ricardo Salles ser filiado e estar, de acordo com o deputado, “à frente das
políticas de devastação ambiental do governo Bolsonaro”.
No dia seguinte, 22 de agosto de 2019, a direção do Novo publicou,
prontamente, nas redes sociais, um esclarecimento em relação ao
ministro[57]. O partido informou que não indicara Ricardo Salles para o
Ministério do Meio Ambiente e nem influenciava sua atuação. Enfatizou,
ainda, que Salles não representava o Novo e respondia diretamente ao
presidente Jair Bolsonaro.
O partido foi criticado pelo posicionamento; vários dos críticos acusaram
o partido de ter se rendido à narrativa da esquerda e, com receio de
desgaste, jogado seu filiado, Ricardo Salles, aos lobos – ou melhor, aos
PSOListas. O próprio deputado do PSOL renovou sua crítica, afirmando
que o Novo não teria tido “coragem de se posicionar sobre as atrocidades de
Salles”.
Em seguida, iniciou-se dentro da própria organização do partido um
movimento contra o ministro Ricardo Salles. Alguns dias depois da nota
oficial do Novo, no dia 25 de agosto de 2019, um deputado estadual eleito
pelo partido no Rio de Janeiro publicou em sua conta no Twitter a notícia de
que ele e mais dois filiados – um ex-candidato ao governo do Rio pelo
Novo em 2018 e um ex-candidato a deputado federal pelo Novo, também
em 2018 – tinham entrado, no dia anterior, com um requerimento contra
Ricardo Salles na Comissão de Ética do Partido[58].
O requerimento solicitava que Salles fosse suspenso do quadro de
filiados enquanto o partido avaliaria a possibilidade de sua expulsão
definitiva.
No dia 7 de maio de 2020 a Comissão de Ética do partido decidiu pela
expulsão do ministro Ricardo Salles do Novo.
A ironia da história é que, no momento em que escrevo este texto, em
abril de 2021, nenhum dos quatro personagens dessa história – o ministro
Ricardo Salles e seus três acusadores[59] – pertence mais ao quadro de
filiados do partido.
 
 
 
 
Capítulo 17
Ideologia, Eu Quero Uma Pra Viver
Quando o Novo foi concebido, ele não tinha qualquer ideologia explícita
ou pensamento teórico formulado. Nosso objetivo era apenas melhorar o
Brasil.
 
Eu nada conhecia sobre liberalismo. Zero. Tive minhas primeiras lições
assistindo às palestras que Rodrigo Constantino fez para o grupo inicial do
partido. A primeira vez que ouvi falar de Escola Austríaca, achei que era
uma escola do Rio, como a Escola Americana e a Escola Alemã. As
primeiras informações organizadas que tive sobre Mises e Hayek foram nas
palestras de Helio Beltrão.
 
Nos anos em que morei nos EUA eu havia experimentado na prática, na
vida real, a enorme diferença entre o padrão de vida americano e o
brasileiro, e comecei a relacionar essa diferença a alguns contrastes
gritantes entre o Brasil e os EUA. Por exemplo: notei que quase tudo que eu
comprava nos supermercados e lojas dos Estados Unidos era importado.
Inexistia o preconceito governamental contra importações que eu conhecia
no Brasil. Os carros dos Estados Unidos eram quase todos japoneses. A
castanha de caju, de altíssima qualidade, que eu comprava no mercado de
Washington era mais barata que a castanha de segunda linha à venda no
Brasil. Casas, carros, educação: tudo nos EUA era financiando a prazos
longos e com juros baixíssimos. O americano detestava o governo federal,
ao contrário do brasileiro, mas respeitava e participava do governo local,
também ao contrário daqui. Era possível morar em praticamente qualquer
lugar, porque em quase todos os lugares havia emprego e oportunidades –
ao contrário do Brasil, onde tudo se concentra nos grandes centros urbanos.
Os pobres americanos moravam em casas que dariam inveja à classe média
brasileira. A maioria desses pobres possuía carros (segundo Alan Reynolds,
no livro Income and Wealth, em 2001 aproximadamente 72% dos
americanos classificados oficialmente como abaixo da linha de pobreza
eram donos de um automóvel).
 
Essas observações me ensinaram o que dava certo em termos de política
pública e cultura nacional. Mas só fui encontrar o embasamento teórico
para aquela experiência de vida muito depois de voltar ao Brasil.
 
O Novo não foi lançado como um partido liberal. Esse nunca foi o
posicionamento quando o criamos. O primeiro slogan do Novo, ainda bem
no início, era “Gestão e Cidadania”. Criamos um partido cujo objetivo era
profissionalizar a gestão pública e permitir o acesso de cidadãos comuns à
política. No início era só (ou tudo) isso.
 
Muitos apoiadores da filosofia liberal se identificaram com as propostas
iniciais e as práticas do Novo, e se juntaram a nós. Existia também, entre os
primeiros participantes, um número elevado de libertários, o que tornava as
discussões interessantes, e às vezes fazia subir a temperatura. Eu nunca
tinha ouvido falar de libertarianismo.
 
Como disse o Felipe Dias, em uma discussão por e-mail em 3 de
dezembro de 2013:
 
[...] temos que lembrar que o Novo não é um partido liberal, ele é um partido que adota
o liberalismo porque entende que esse é um caminho mais eficiente e correto para o
desenvolvimento de uma sociedade melhor. Há uma diferença. Um partido liberal colocaria
as escolas com vouchers de educação ou aboliria as escolas públicas, mas nós precisaremos
pensar como trazer eficiência para escolas, no modelo brasileiro atual.
 
 
No dia 22 de dezembro de 2014, eu enviei o seguinte e-mail para o
fórum de discussões do Novo Rio de Janeiro:
 
Tenho respeito por pensadores que estudam profundamente assuntos e esclarecem e
explicam conceitos e ideias.
 
Mas meu respeito é ainda maior por aqueles que, mesmo sem ter o mapa completo na
mão, começam a navegar.
 
Nosso objetivo é chegar em um país melhor. Um país próspero, onde possamos viver
com liberdade e segurança.
 
O navio que vai nos levar lá é o NOVO. Usamos instrumentos de navegação: um deles
é o liberalismo (outro é a ciência econômica, outro o direito, etc.).
 
É um erro confundir o meio de transporte ou o instrumento de navegação com o
objetivo final.
 
Esse era o meu pensamento. Em outro e-mail, de 30 de março de 2015,
eu dizia:
 
Vale a pena lembrar mais uma vez: o NOVO não se posiciona nem se classifica como
um partido liberal. Não se esqueçam disso.
 
E aí temos um segundo ponto: nós temos, sim, um projeto para o Brasil, que não se
limita a repetir que o Estado é um mal e precisa acabar. Nosso projeto é reduzir o tamanho
do Estado e aumentar a eficiência das áreas essenciais, reduzindo impostos,
desregulamentando e implementando várias outras ideias e propostas que estão atualmente
em discussão entre nós. Provavelmente isso tomará a forma de um documento a ser
divulgado em breve.
 
 
 
 
 
À medida que o tempo passava, é justo dizer que o Novo foi, sim,
incorporando firmemente no seu ideário conceitos do liberalismo
econômico e até algumas pitadas de libertarianismo.
 
Na minha opinião de hoje, em 2021 – opinião construída ao longo de
muitos anos e de duras e custosas lições de vida e política – ficou faltando
ao Novo incorporar aspectos do conservadorismo político, especialmente
preocupações com a guerra cultural (única forma de reverter a dominação
absoluta que a esquerda exerce hoje sobre todas as instituições); com a
defesa incondicional da liberdade, opondo-se a todo tipo de totalitarismo,
de esquerda ou de direita; com a defesa do modelo republicano, opondo-se
ao ativismo judicial e a qualquer interferência na separação dos poderes; e
com a apresentação de uma pauta clara de valores morais – esta última,
elemento essencial para enfrentar as questões mais críticas do país: a
impunidade e a destruição do sistema de justiça criminal.
 
 
 
 
 
 
Desde o início, os pontos principais do ideário e do programa do partido
eram discutidos em nossas reuniões semanais, em debates que entravam
pela noite. Todo mundo tinha uma opinião, e a maioria não hesitava em
dizer o que pensava. Queríamos um partido que representasse uma ruptura
com o modelo tradicional, paternalista, populista e patrimonialista de fazer
política, e que refletisse nossos valores.
 
Eu recebia um enorme volume de sugestões por e-mail e Facebook.
Muitas vezes, após as apresentações, eu era abordado por simpatizantes
entusiasmados que me entregavam calhamaços de papel com estudos sobre
os mais variados assuntos (reforma tributária era um dos temas favoritos).
Meus registros mostram uma ampla variedade de sugestões, que iam do
requisito de ficha limpa para candidatos até ideias menos ortodoxas, como,
por exemplo, revogar todas as leis que criminalizam o não pagamento de
tributos.
 
Conceitos como liberdade individual, livre mercado e eficiência na
gestão estiveram presentes desde o início. Outros, como a ideia de criar
mecanismos para evitar que política fosse transformada em uma profissão,
em vez de ser apenas o exercício temporário de uma representação da
sociedade, surgiram depois.
 
O fato é que as discussões entre os participantes e apoiadores foram
muitas, longas e acaloradas, e geraram extenso material. Ao mesmo tempo
que elas ocorriam, a cúpula do partido, que, à exceção do João, ficava toda
em São Paulo, tinha as suas próprias conversas, nas quais – não há dúvida
disso – a palavra final era do João.
 
O produto final – o que ficou conhecido como os “princípios e valores”
do Novo – foi um dia apresentado a todos e, como correspondia mais ou
menos ao que a maioria pensava, foi aceito sem grandes problemas.
 
Os valores eram: Liberdades Individuais com Responsabilidade,
Indivíduo Como Único Gerador de Riquezas, Igualdade Perante a Lei,
Livre Mercado, Indivíduo Como Agente de Mudanças e Visão de Longo
Prazo.
 
Além disso, foram definidas algumas regras que, embora o nome não
seja o melhor, foram chamadas de princípios:
 
- Filiados e candidatos devem preencher os pré-requisitos da lei Ficha
Limpa.
 
- Limitação ao carreirismo político: é vedado ao filiado eleito para cargo
no Poder Legislativo se candidatar a mais de uma reeleição consecutiva
para o mesmo cargo (a redação original vedava qualquer reeleição). É
também vedada a possibilidade de afastamento do mandato eletivo para
concorrer a outro cargo ou ocupar cargo no Executivo.
 
- Gestão independente: a gestão partidária não pode ser feita por
candidato a uma eleição ou por ocupante de cargo eletivo.
 
- Vinculação do candidato às suas propostas: deve haver a definição
prévia de um Compromisso de Gestão e do Compromisso de Atuação
Legislativa prevendo metas a serem cumpridas.
 
- Independência dos suplentes e vices: ambos são escolhidos em
convenção de modo independente da candidatura ao cargo principal.
 
- Não utilização do Fundo Partidário.
 
- Uso de um processo para seleção de candidatos qualificados.
 
 
 
 
 
Acredito ser justo afirmar que a esmagadora maioria dos que
participaram das discussões sobre a definição dos valores e princípios tinha
pouca experiência prática com política (como atuação em partidos ou
campanhas) e quase ninguém tinha experiência eleitoral como candidato.
 
Era o meu caso, por exemplo. Minha experiência se resumia à
participação, curta e limitada, na campanha do Gabeira. Não só minha
experiência prática era quase inexistente como eu também não tinha
qualquer formação teórica sobre estratégia política. Os livros que eu leria, e
que me informariam sobre os conceitos básicos da prática política e da
disputa eleitoral – livros como A Mente Moralista, O Cérebro Político, A
Arte da Guerra Política e Regras Para Radicais –, ainda me aguardavam
no futuro distante.
 
É difícil citar aqui tudo o que eu li ao longo dos anos e que contribuiu
para a visão de política que tenho hoje – uma visão peculiar, só minha, e
que ainda está em processo de evolução. Mas vale mencionar alguns dos
principais autores: Thomas Sowell (Economia Básica e Os Intelectuais e a
Sociedade), David Horowitz (A Arte da Guerra Política), Saul Alinsky
(Regras Para Radicais), Niall Ferguson (A Grande Degeneração), Henry
Hazlit (Economia Em Uma Única Lição), Hayek (O Caminho da Servidão),
Mises (Ação Humana), Roger Scruton (Como Ser Um Conservador),
Russel Kirk (A Mentalidade Conservadora), Christopher Hitchens (Hitch
22, Arguably) e Bastiat (A Lei). Uma lista um pouco maior do que eu li e
me influenciou está na bibliografia no final do livro.
 
Além disso, hoje tenho anos de experiência prática com a política,
primeiro no Novo e depois em outros partidos e movimentos. Fui
testemunha e participante ativo de um dos períodos mais conturbados da
política brasileira, que se iniciou em 2013 com as primeiras manifestações
populares, passou pela queda da Dilma e do petismo e pela eleição do
Bolsonaro, e ainda não acabou. Conheci e convivi com alguns dos
protagonistas mais importantes desse período. Testemunhei sucessos
espetaculares e fracassos inacreditáveis, vi pessoas anônimas alçadas ao
poder e à fama, e homens poderosos e famosos serem destruídos
completamente.
 
O conhecimento e a experiência que adquiri inevitavelmente mudaram
minha visão em relação a pontos sobre os quais, no início, eu tinha posição
dogmática e inflexível, fruto de ingenuidade, idealismo desinformado e
falta de vivência.
 
Mudei. É possível acompanhar a evolução do meu pensamento ao longo
dos anos lendo meus livros e artigos, e assistindo aos vídeos que produzi.
 
Os valores que definimos para o Novo permanecem, para mim,
imutáveis – mas, hoje, eu os reescreveria usando termos de mais fácil
entendimento e de maior eficiência emocional. Não creio que expressões
como “Indivíduo Como Único Gerador de Riquezas” ou “Indivíduo Como
Agente de Mudanças”, ou mesmo “Visão de Longo Prazo” mobilizem o
grande público, o cidadão comum cuja mobilização é essencial. Vejam: uma
coisa é o conceito e outra é a comunicação – a forma com a qual esse
conceito é expressado. David Horowitz e Saul Alinsky – dois dos maiores
teóricos da guerra política, o primeiro da direita e o segundo da esquerda,
respectivamente – explicam bem isso, assim como Drew Westen em O
Cérebro Político. Daniel Kahneman analisou em detalhe a forma como as
pessoas captam e processam informações; está tudo no seu fantástico livro
Pensando Rápido e Devagar. A forma de apresentação de uma mensagem é
tão importante quanto o seu conteúdo.
 
Eu não sabia nada disso quando redigimos as expressões que definiram
os valores do partido, em 2011. Agora sei.
 
 
 
 
 
O mesmo se aplica aos “princípios” do Novo. Minha experiência prática,
e a própria história do partido de 2016 até hoje, sugerem que algumas
dessas regras devem ser modificadas ou simplesmente abolidas.
 
O Partido Novo não foi criado para obedecer, ad eternum, a um conjunto
de regras imutáveis. Essa não é a razão de sua existência. Ele foi criado
para tornar o Brasil um país melhor para se viver. Regras são um
instrumento, não a finalidade. Acredito que posso afirmar isso com
autoridade; fui um dos criadores do partido.
 
Examinemos o caso da não utilização do Fundo Partidário. A disputa
eleitoral é uma guerra. Você não pode entrar em uma guerra e esperar
vencer se você abre mão de armas legais que são usadas por seu
adversário. Mas então é certo usar dinheiro público para financiar
campanhas políticas? Eu continuo achando que não. Porém, enquanto o
Fundo Partidário e o Fundo Eleitoral existirem, e estiverem disponíveis aos
nossos adversários, não faz qualquer sentido não os usar. Percebam:
devemos continuar sendo contra o financiamento público de partidos e
campanhas, e trabalhar para que isso, um dia, acabe. Enquanto isso não
acontece, não vamos abrir mão dessa arma, ou jamais chegaremos a ter o
poder necessário para, efetivamente, alterar as regras de financiamento
público de campanhas. Afinal, temos ou não temos confiança na nossa
capacidade de usar recursos públicos de forma própria, ética e eficiente?
 
Outro passo importante é esquecer a visão ingênua expressa na
afirmação de que “política não é profissão”. Claro que é – e uma das
profissões mais importantes para a sociedade e a democracia republicana
moderna. Como observou Fernando Mousinho uma vez, em uma conversa
comigo, “todos somos políticos desde que nascemos. Quem dedica tempo
integral, recebendo ou não remuneração, pode ser caracterizado como
político profissional”. Nesse sentido, política é uma atividade altamente
especializada e que exige dedicação integral – vinte e quatro horas por dia,
todos os dias. Não existe político profissional em tempo parcial. É evidente
que o sujeito precisa ter preparo, e a evolução da sociedade e da democracia
dependem do preparo dos seus políticos. Isso significa dizer, entre outras
coisas, que se espera que o candidato a político tenha alguma história; que
tenha uma profissão – médico, bombeiro, mestre de obras, advogado, piloto
de avião – com alguns anos de experiência; que já tenha assumido
responsabilidades profissionais e liderado pessoas. Mas, a partir do
momento em que ele se lança em uma carreira política, essa passa a ser sua
nova profissão. Negar isso é se recusar a enxergar uma realidade óbvia e
presente em todas as modernas democracias ocidentais.
 
Soa bonito dizer que “política não é profissão” – mas a realidade mostra
o contrário. Por exemplo, nas eleições de 2020 para vereador no Rio de
Janeiro, o único eleito pelo Novo – uma pessoa cuja trajetória acompanho, e
de quem gosto e respeito, cabe enfatizar – foi um jovem que nunca teve
qualquer atividade profissional que não fosse a política, desde os tempos
de universidade.
 
E, como política é profissão, é importante que o político tenha liberdade
para fazer a gestão de sua carreira, ajudando a promover as suas ideias e o
ideário do partido, e aproveitando as oportunidades que surgem, quase
sempre inesperadamente. Se alguém, após ser eleito vereador, tem a chance
de ser eleito deputado federal dois anos depois (no meio do mandato de
vereador), qual o sentido de negar-lhe essa oportunidade? “Ele tem que
cumprir o mandato para o qual foi eleito”, respondem alguns. Por quê? Se
ele tem preparo, se tem as ideias corretas e faz um bom trabalho, por que
fazê-lo perder a oportunidade de se tornar deputado federal, onde seu
trabalho terá uma abrangência muito maior?
 
Quem discute essas questões geralmente não considera um ponto
importantíssimo, só bem compreendido por quem já participou de uma
disputa eleitoral: estar exercendo um mandato eletivo dá ao candidato uma
imensa vantagem competitiva em uma eleição. Explicando de forma mais
clara: um vereador que concorre a uma eleição para deputado federal tem
muito mais chances de ser eleito do que um cidadão comum, mesmo que
não use a máquina pública.
 
Além disso, se o vereador for eleito deputado, outro candidato do mesmo
partido – com preparo similar e o mesmo ideário – irá substituí-lo como
vereador. O partido nada tem a perder, ao contrário.
 
Então, qual o sentido dessa regra? Hoje a minha opinião é: nenhum. É a
mesma opinião do vereador Leandro Lyra, eleito pelo Novo em 2016 e que
tentou concorrer para deputado federal em 2018. Suas pretensões foram
barradas pelo partido em uma disputa confusa, obrigando-o a recorrer à
Justiça, que acabou lhe concedendo o direito de ser candidato. Leandro –
um candidato excelente, com preparo e conhecimento muito acima da
média – teve uma boa votação, mas não conseguiu se eleger.
 
Em todo esse processo, Leandro foi atacado nas redes sociais, ofendido e
acusado de ter traído seu compromisso com o partido. Provavelmente
devido a isso, pouco tempo depois ele se desligaria do Novo.
 
Perderam todos – o candidato, o partido, os eleitores e os filiados.
Perderam o Rio de Janeiro e o país.
 
As mesmas considerações valem para a regra que proíbe que um
parlamentar se licencie do seu cargo para exercer um cargo no Executivo.
Ela foi criada com as melhores intenções, e minha participação. Mudei de
ideia. O motor principal da política é o poder de realizar, de efetivamente
fazer com que coisas concretas aconteçam. Esse poder está
desproporcionalmente concentrado no Executivo. Ter a chance de exercer
por algum tempo uma função no Executivo como secretário de Estado ou
ministro, por exemplo, é uma oportunidade valiosíssima para que o
parlamentar coloque suas ideias – e as ideias do partido – em prática e
adquira conhecimento e experiência.
 
Além disso, a projeção e o protagonismo que o parlamentar passa a ter o
colocam em outro patamar do ponto de vista de futuras disputas eleitorais –
desde que, é claro, ele tenha bons serviços prestados à população. O
Congresso tem 513 deputados – quem sabe o nome de todos eles? Mas
existem apenas duas dezenas de ministros. A Assembleia Legislativa do Rio
tem 70 deputados; a maioria é desconhecida do público em geral. Mas o
nome dos secretários estaduais e municipais estão quase todos os dias na
mídia.
 
“Ah, mas você só pensa em eleição”, alguém vai comentar. Eu não – a
democracia. O sistema democrático republicano, baseado no voto universal
obrigatório, tem um motor: as eleições. O político que não consegue se
eleger não existe. O partido que não consegue eleger políticos, não vai
existir por muito tempo – e jamais vai conseguir fazer do Brasil um país
melhor.
 
E, no entanto, um deputado estadual eleito pelo Novo em 2018 no Rio de
Janeiro teve que renunciar ao mandato no início deste ano (2021) para que
pudesse assumir o importante cargo de secretário de Desenvolvimento
Econômico do Município do Rio de Janeiro.
 
Novamente, perderam todos.
 
 
 
 
 
Por último, a regra que virou uma piada de mau gosto: a gestão
partidária não pode ser feita por candidato ou por ocupante de cargo eletivo.
 
Vamos relembrar o espírito com o qual essa regra foi criada: a ideia é
que o partido não possa ser controlado por um candidato que use o partido
exclusivamente para se eleger (fato comum no sistema partidário
brasileiro).
 
A ideia por trás da regra era (e continua sendo): se você tem pretensões
eleitorais, não deve ser gestor do partido.
 
Como a regra foi burlada: o controlador e presidente do partido se
desligou para concorrer às eleições presidenciais de 2018, e depois das
eleições reassumiu a presidência.
 
Qual a diferença entre isso e ele ter se mantido na presidência do partido
durante todo o tempo? Será que a influência dele sobre a máquina do
partido acabou durante o curto período em que ele esteve fora da
presidência?
 
É uma pergunta justa, honesta, que precisa ser feita.
 
 
 
Há muita especulação sobre a possibilidade de o Partido Novo ser uma
“filial” do PSDB, ou um projeto camuflado de poder dos mesmos grupos
políticos que ditam a política brasileira há décadas. Minha resposta é a
seguinte: só quem permaneceu no partido depois da minha saída e ficou
responsável por ele – seus dirigentes – é que pode dizer o que aconteceu a
partir de 2016. Mas até meu último dia como presidente estadual do Rio de
Janeiro, em agosto de 2015, eu posso afirmar que o Novo era exatamente o
que foi descrito neste livro: a primeira tentativa de se criar um partido no
Brasil sem a interferência de políticos.
 
Um projeto arriscado, ingênuo, muitas vezes refém da inexperiência e,
depois, da mosca azul que morde os que se aproximam do poder – mas um
projeto sincero e genuíno, ao qual centenas de cidadãos comuns, por todo o
país, dedicaram seu esforço, seu tempo e seu dinheiro, e no qual
depositaram suas últimas esperanças de um futuro melhor.
 
Eu tenho um compromisso com essas pessoas, que eu honro até hoje. Foi
pensando nelas que escrevi este livro.
 
É evidente que eu nunca tive acesso a todas as conversas ou fui incluído
em todas as reuniões que aconteceram nos anos em que o Novo foi
formado. É provável que muitas coisas tenham acontecido das quais eu
nunca tive conhecimento. Mas minhas discordâncias – em certas questões,
profundas e éticas – com o rumo que o partido tomou, as circunstâncias que
provocaram a minha saída e as atitudes inconcebíveis vindas de pessoas que
diziam buscar a renovação da política não são elementos suficientes para
concluir que tudo era uma farsa, criada para inserir no jogo uma nova força
política, com cara moderna e cheiro de nova, que não passa de um
instrumento de perpetuação dos mesmos grupos de sempre.
 
É preciso lembrar que concebemos a ideia do Partido Novo em uma
época em que Luiz Inácio Lula da Silva era considerado grande estadista e
redentor dos pobres, e na qual o PSDB de FHC e Aécio Neves era
considerado um partido de direita.
 
É importante não menosprezar as dificuldades que enfrentamos ao tentar
lançar um partido que pregava um Estado enxuto em um país que sempre
acreditou que a solução de todos os problemas passa pelo Estado. Naquele
momento, e com todas as dificuldades que enfrentávamos, pareceu mais
sensato adiar o debate sobre as questões morais – e isso foi um gigantesco
erro.
 
A existência de uma direita que não se envergonha de se denominar
assim é um fenômeno relativamente recente no Brasil – começou a surgir de
2014 para cá. Mais recente ainda é a existência de quadros políticos com o
preparo cultural e intelectual para efetivamente sustentar ideias e programas
liberais e conservadores.
 
O tardio e ainda pequeno espaço conquistado pela direita[60] é
permanentemente ameaçado pela dominação que a esquerda continua a
exercer sobre a máquina do Estado, sobre o ensino público e privado, sobre
quase toda a atividade artística e cultural e sobre a mídia. O discurso de
“diversidade” dos progressistas significa apenas a aceitação de uma
variedade de matizes dentro da própria esquerda.
 
É uma batalha para a qual a direita não está preparada e ainda não tem os
recursos necessários. Uma das maiores evidências disso é a forma como o
termo “liberal” está sendo cooptado pela esquerda brasileira, igual ao que
aconteceu nos Estados Unidos.
 
Se, no nascedouro, o Novo não tinha identidade ideológica clara, é
evidente hoje, em 2021, que o preço de manter essa pseudoneutralidade
pode ser alto demais: a transformação do partido em reduto cada vez mais
progressista, a serviço do mesmo establishment populista, autoritário e
concentrador de riqueza que o partido foi criado para mudar.
 
Capítulo 18
De Costas Para O Jogo
 
Em algum momento entre o final de 2015 e o início de 2016, foi
realizado um evento em Niterói cuja atração principal era uma palestra de
João Amoêdo, presidente nacional do Partido Novo. Com a confusão
gerada pela minha saída da presidência estadual e a especulação em relação
às primeiras candidaturas do partido, era grande a expectativa em torno do
que ele diria. Alguns companheiros e amigos, ainda mantendo a esperança
de alguma boa novidade, se encheram de entusiasmo, vestiram suas
camisetas laranja e atravessaram a baía para ouvir boas-novas e, quem sabe,
ter uma chance de convencer o presidente nacional do partido a retomar o
rumo original do projeto.
 
Pelo que me contaram, a esperança não durou muito. Em determinado
ponto da palestra, João teria pronunciado uma frase que, durante muito
tempo, rodou nos círculos do partido.
 
Ele teria dito que os filiados ao partido deveriam ser como os voluntários
que trabalhavam na organização de eventos esportivos como a Copa e as
Olimpíadas.
 
Esses voluntários, quando participavam de um evento, ficavam de costas
para o jogo.
 
Capítulo 19
De Volta Para O Futuro
 
No dia 14 de março de 2021, o jornal O Estado de São Paulo publicou
uma matéria com o título “Racha no Novo vai além de conflitos por
impeachment e oposição a Bolsonaro[61]”. Um trecho da matéria dizia:
 
Por fim, embora a ideia de promover um processo de seleção dos candidatos do Novo,
para que tenham aderência aos valores e princípios do partido, pareça uma boa solução na
teoria, na prática não está funcionando como se imaginava. [Christian] Lohbauer conta
que, no processo seletivo dos candidatos às eleições municipais de 2020, algumas
perguntas feitas pela banca examinadora foram "muito mal formuladas". "Quantos votos o
João teve nas eleições de 2018?" era uma delas. "Quais são os autores liberais mais
conhecidos?", outra.
 
"Nós não temos pessoas com capacidade de interpretar o ambiente político com a
missão de escolher pessoas para serem políticas. Não é que a gente seja idiota. Estamos
tentando fazer a coisa certa, mas não temos os entrevistadores mais preparados para ouvir
todo mundo pelo Brasil afora", diz. "A gente errou muito em 2020, porque não soube se
adaptar, ser maleável, e não se permitiu errar, escolher mais gente, competir em mais
lugares. Quis escolher só gente nota 10, na visão sei lá de quem. A sociedade é
heterogênea, as pessoas são diferentes, não têm formação política. Não estou dizendo que
tem de nivelar por baixo, mas o resultado está aí: lançamos 34 candidatos a prefeito em
5.570 municípios e elegemos apenas um."
 
Capítulo 20
As Perdas
 
No dia 13 de novembro de 2017, Alexandra e eu fomos à estreia de um
documentário sobre Fernando Gabeira dirigido por Moacyr Góes.  O
evento, que estava marcado para as 20h no cinema Estação NET Ipanema,
na rua Visconde de Pirajá 605, do outro lado da rua do antigo escritório de
David Zylberstajn, atrasou mais de uma hora. Aproveitamos para comprar
pipoca; na fila esbarramos com Ronaldo Gomlevsky, o jornalista
responsável pela revista Menorah e pelo programa de rádio Confronto
Metropolitana, do qual tantas vezes participei e que tive a honra de
comandar, substituindo o Ronaldo quando ele precisou se ausentar por
motivo de viagem. Encontramos também com o próprio Gabeira. Fotos
registram esse momento.
 
Entramos na sala de projeção e, na hora de sentar, uma saia justa: “João
está ali atrás com a Rosa”, disse Alexandra. Apagaram as luzes e o filme –
excelente – começou. Quando acabou, acenderam as luzes e nos
levantamos. Alexandra me esperou no hall do cinema enquanto eu ia ao
banheiro. Quando voltei, me deparei com a seguinte cena: Alexandra me
esperando, já quase na saída e, um pouco antes dela, em pé, Rosa Amoêdo.
Ela esperava o João que, de repente, apareceu.
 
João e Rosa estavam entre Alexandra e eu.
 
Como se obedecêssemos ao script de alguma novela das oito –
ambientada no Leblon, naturalmente –, olhamos todos para o chão, fingindo
que ninguém via ninguém.
 
Eu caminhei em direção a Alexandra, peguei sua mão e fomos embora.
 
E essa foi a última vez que encontrei com o João.
 
 
Capítulo 21
O Que Precisa Ser Feito
Muita gente pergunta: é possível recolocar o NOVO em seu caminho?
Claro que é.
 
Para isso, a primeira providência é atualizar o estatuto do partido para
evitar que o controle fique nas mãos de um dono e de seus prepostos.
 
A segunda providência é corrigir as regras que se mostraram
equivocadas, eliminando mecanismos autoritários – como o uso da infame
comissão de ética para expurgar dissidentes – e incorporando, de forma
estruturada e clara, uma posição verdadeiramente liberal-conservadora aos
princípios e ideias.
 
É preciso deixar explícita a importância dos valores morais, do fomento
de uma cultura de liberdade e respeito à vida, e da proteção aos direitos
naturais do indivíduo em todas as áreas da sociedade – no trabalho, na
cultura, no ensino, na segurança pública e no mercado. Isso significa,
inevitavelmente, uma oposição direta moral, cultural e política às práticas
coletivistas e totalitárias da esquerda.
 
O terceiro passo é o mais inspirador: fazer, mais uma vez, uma grande
caminhada pelo Brasil refundando o partido. Andar pelo país de norte a sul,
apresentando ideias, incentivando o debate, atraindo e identificando talentos
e lideranças, semeando a ideia de liberdade com responsabilidade, e do
liberalismo e do conservadorismo como princípios básicos da prosperidade,
da segurança e da liberdade que este país pode conquistar em pouco tempo.
Traduzir esses conceitos para que sejam entendidos pelas pessoas comuns,
sem falsa erudição e sem a afetação típica de “especialistas” transplantados
da academia ou de mesas de operações cambiais. Comunicação é essencial.
É fundamental engajar todas as classes, oferecendo oportunidade para a
ambição de cada um.
 
Esse novo partido precisa de um processo de escolha de candidatos
informado tanto pela necessidade de construir representatividade genuína
quanto pelo reconhecimento de que o julgamento final sobre as qualidades
de um candidato virá das urnas. Isso significa adotar uma postura de
humildade, a partir da qual o partido se limita a verificar que os candidatos
cumpram com requisitos básicos e tenham alinhamento moral e filosófico –
demonstrado não em “provas”, mas em uma história de vida – com as ideias
do partido. As urnas farão o verdadeiro processo seletivo.
 
Essa era a ideia original.
 
A postura arrogante de quem acha que sabe tudo – e que já foi descrita
pelo economista Thomas Sowell como a visão dos ungidos – deve ser
substituída pelo reconhecimento de que surpresas são parte integrante do
processo eleitoral e de que o partido, em vez de tentar inutilmente evitá-las,
com alto custo institucional e moral, deve, ao contrário, aprender a tirar
vantagem delas, criando um processo que Nassim Taleb chamaria de
antifrágil. Em outras palavras: o partido não tem a capacidade de decidir
quem vai ganhar, nem precisa ter. O segredo do sucesso eleitoral estará no
reconhecimento, por parte dos eleitores, de que o partido representa posições
morais e filosóficas e práticas políticas que não são encontradas em
nenhuma outra organização.
 
É evidente que um partido como o descrito acima não pode ter dono,
acionista majoritário ou controlador. Um partido de homens livres, com
convicções firmes e baseado nos princípios do liberalismo e do
conservadorismo não será, de forma alguma, um partido fácil de ser
gerenciado. Mas aí está a questão: um partido como esse deve ser liderado.
E essa talvez seja a maior contribuição à sociedade que pode ser feita por
um partido rejuvenescido e reunido com versões aperfeiçoadas de suas
ideias originais: tornar-se uma incubadora de líderes políticos, pessoas com
coragem, determinação, abnegação e generosidade suficiente para dedicar
boa parte de sua vida ao serviço da Pátria.
 
A esses líderes o partido deve apoio, orientação, estrutura e um
mecanismo de sustentação nos momentos difíceis que inevitavelmente
ocorrem em uma carreira política.
 
Essa nova organização partidária precisa ser aberta para a sociedade. É
preciso correr esse risco.
 
Não há nenhum mecanismo de controle apropriado a uma organização
liberal ou conservadora que possa ser usado como obstáculo à tomada de
poder no partido por forças dissidentes.
 
O preço da liberdade é a eterna vigilância. O que impedirá a
transformação do partido em mais uma organização política a serviço do
status quo é o seu DNA, materializado nas ações e na militância dos seus
apoiadores e filiados. É exatamente isso que caracterizava o Partido Novo
que eu ajudei a criar.
 
A existência de um dono ou controlador não garante segurança ou
estabilidade. Pelo contrário; esse modelo submete as aspirações políticas e
os ideais de milhares de pessoas – os filiados - aos caprichos, inseguranças e
necessidades de poder de poucos controladores.
 
“Mas qual é o primeiro passo para a mudança?”, vocês podem perguntar.
E eu respondo: o primeiro passo já foi dado.
 
O primeiro passo é este livro.
 
Agora é com vocês.
 

 
Epílogo
Os Inocentes
 
É possível que, ao chegar a este ponto do livro, o leitor sinta falta de uma
explicação definitiva sobre por que algumas pessoas, próximas de mim e, na
minha percepção, até amigas, agiram da forma que o fizeram.
 
Até hoje me martela essa questão. Por que destruir a amizade de uma
vida inteira, usando subterfúgios e manobras, e contaminar a pureza de um
projeto idealista com práticas da política arcaica que nos propusemos a
combater?
 
Não tenho essa resposta.
 
Na política, como na vida, as ideias importam muito; porém as pessoas
importam mais. As pessoas comandam os processos de implantação das
ideias, e o poder, frequentemente, as leva a abandonar ou desvirtuar essas
ideias.
 
Pessoas originalmente bem-intencionadas, que acreditaram que seu
enorme sucesso profissional e financeiro as qualificava automaticamente
para posições de liderança política, caíram vítimas das armadilhas que
esperam os que se envolvem com essa atividade sem o preparo intelectual e
o comprometimento moral necessários.
 
Para essas pessoas o poder é um veneno terrível.
 
Assim aconteceu com os inocentes do Leblon.
 
Sobre a origem no Leblon, não resta dúvida.
 
Quanto à inocência, que o leitor seja o juiz.
 
Posfácio
Refugiados da Utopia ou Por que Me Tornei
Conservador
Minha experiência na política me convenceu da importância dos valores
morais. Política sem moral é uma das piores atividades nas quais o homem
pode se envolver. Mas, no Brasil de hoje, é preciso determinação e coragem
para defender essa posição.
Predomina na política o relativismo moral. Segundo esse pensamento, o
que define se uma ação é certa ou errada é seu objetivo.
Os fins justificam os meios.
Exemplos não faltam. Eu sofri isso na pele, dentro de um partido que
ajudei a criar e construir e, depois, em praticamente todos os passos
posteriores.
A política sem moral é, invariavelmente, voltada para o
engrandecimento pessoal do político ou para o seu enriquecimento.
A política sem moral flerta permanentemente com regimes totalitários,
com o populismo mais rasteiro, e subscreve, ou considera aceitável, a
pregação revolucionária de esquerda.
O exemplo mais ultrajante, violento e destrutivo desse tipo de política
foi a anulação das condenações de um certo criminoso, ex-presidente da
República, que havia sido condenado em todas as instâncias da Justiça
brasileira.
Para mim se tornou evidente que a moral deve preceder a política e a
economia. Mas eu tinha dificuldade – dentro do campo estrito do liberalismo
– de encontrar confirmação para esse posicionamento. Até que um dia,
lendo autores importantes como Edmund Burke, Russell Kirk e Roger
Scruton, descobri que outros pensavam da mesma forma.
Talvez o livro mais importante tenha sido O Imbecil Coletivo, de Olavo
de Carvalho, que li em algum momento em 1997 ou 1998.
Esse livro começou a mudança na minha cabeça.
Através dele descobri que era possível criticar as vacas sagradas da
“cultura” nacional.
Foi quando descobri que não era só eu que achava tantas coisas
absurdas no Brasil. O Imbecil Coletivo é, acima de tudo, um manual de
como raciocinar. É uma leitura obrigatória.
Eu, que comecei na política como liberal, me descobri conservador.
O conservadorismo é o aperfeiçoamento do liberalismo – é a defesa da
liberdade, não só nos planos econômico e político, mas também no aspecto
moral.
Conservadorismo sempre existiu como forma de pensamento desde a
Antiguidade Clássica, mas o marco do conservadorismo moderno foi o
trabalho do estadista irlandês Edmund Burke, por volta de 1790. Em sua
obra mais importante, Reflexões Sobre a Revolução na França, Burke
previu que a Revolução Francesa terminaria em um desastre, porque seus
fundamentos abstratos, supostamente racionais, ignoravam as
complexidades da natureza humana e da sociedade.
O conservadorismo ressurgiu em 1950 graças ao americano Russell
Kirk, que era lido por Ronald Reagan (dono de uma grande biblioteca), e
cujo pensamento orientou até a campanha de Donald Trump. O inglês Roger
Scruton é outro autor importante do conservadorismo atual: seu livro Como
Ser Um Conservador é leitura essencial.
 
 
 
O primeiro fundamento do conservadorismo é a crença em uma ordem
transcendente, uma lei natural que funciona como a consciência da
sociedade.  Os problemas políticos são, no fundo, problemas morais.
O conservador acredita em preceitos morais e éticos que independem da
época em que ele vive.
Ele sabe que uma racionalidade estreita não pode, sozinha, satisfazer as
necessidades humanas. A realização plena da vida humana não depende da
construção de uma sociedade perfeita, utópica, nascida dos devaneios de
planejadores todo-poderosos e implantada a ferro e fogo através da
destruição de todo o legado da humanidade.
Os homens não são anjos; portanto, não é possível construir um paraíso
terrestre. O conservador reconhece nessa utopia política quase uma religião,
e se recusa a adotá-la.
A satisfação do ser humano depende, na verdade, do cumprimento de
um pacto transcendente, feito entre os que já morreram, os vivos e os que
ainda vão nascer. É em nome desse pacto que nos dedicamos a proteger e
cuidar de nossas famílias, de nossa cidade e do nosso país, e a trabalhar para
conservar a liberdade, a lei, a educação, os empregos, a saúde e o meio
ambiente. Conservar é o ato que dá nome ao pensamento: conservadorismo.
Em vez de se apegar a dogmas ferrenhos, o conservador guia sua
atividade política por princípios gerais. Esses princípios foram formulados
ao longo de anos, com equilíbrio, através do desenvolvimento dos costumes
e tradições. Mas até esses princípios precisam ser aplicados com prudência,
de forma adequada a cada nação e cada época.
Tanto o impulso de renovação quanto o desejo de conservar são
necessários ao perfeito funcionamento de uma sociedade. A hora de adotar
uma ou outra estratégia depende das circunstâncias.
É preciso reconhecer que nem toda mudança é positiva; inovações ou
reformas inadequadas ou mal planejadas, em vez de sinalizar progresso,
podem representar o início de graves conflagrações sociais.
O conservador desconfia, acima de tudo, de mudanças radicais.
 
 
 
A ordem social, considerada essencial pelo conservador, é reflexo e
fruto da ordem interna pessoal de cada indivíduo.
Essa ordem, completada por justiça e liberdade, dá a cada indivíduo a
oportunidade de construir seu próprio caminho, tendo como base os
costumes, tradições e instituições que herdamos dos nossos antepassados.
Essa herança cultural e social orienta nossa vida diária usando toda a
sabedoria e experiência acumulada pela humanidade durante centenas de
gerações.
Toda a civilização que vemos ao nosso redor levou séculos para ser
construída, mas pode ser destruída em pouco tempo. Esse é o objetivo dos
revolucionários. O conservador sabe disso.
Por isso não existe “conservador radical”.
No conservadorismo não existem radicalismo, extremismo ou
revolução.
A essência do conservadorismo é a busca da estabilidade, respeitando as
tradições, escolhendo o que funciona, separando o bom do ruim e
promovendo independência e o progresso pelo trabalho.
Os conservadores acreditam na igualdade diante de Deus e perante a lei,
mas reconhecem no conceito de igualdade material uma impossibilidade
lógica e moral – já que a condição de cada um depende sempre, em maior ou
menor grau, do resultado dos seus esforços – e um instrumento de criação de
regimes totalitários. Todos os homens têm os mesmos direitos, mas não têm
direitos às mesmas coisas.
Os direitos de propriedade e de liberdade estão intimamente conectados.
Quebrada essa conexão, o Estado se torna senhor de tudo e de todos.
 
 
 
 
A missão principal do político conservador em nosso tempo é combater
a ação nefasta dos radicais de esquerda, erradamente chamados de
“progressistas”.
Para esses radicais só existe uma única pauta: a destruição completa das
instituições e da ordem social para a construção de uma nova ordem, criada
a partir do nada, baseada na centralização totalitária do poder nas mãos de
um pequeno grupo de iluminados.
O século XX viu, inúmeras vezes, que esses experimentos acabam
sempre da mesma forma: em ditaduras sanguinárias, campos de
concentração, censura, miséria e fome.
A missão do conservadorismo é impedir isso, e conservar nossa
liberdade, segurança e direitos. Por isso, ser conservador nos dias de hoje é
combater a ideologia de gênero, o racismo “do bem”, a censura nas redes, o
“desarmamento” civil (que mantém o monopólio das armas nas mãos dos
criminosos), os ataques ao ocidente, o ativismo judicial e o terror sanitário.
O conservador não deve ser confundido com o reacionário, que deseja
um simples retorno a uma época imaginária no passado, na qual tudo era
perfeito. Nunca existiu época assim. Na verdade, o reacionário é a imagem
espelhada do revolucionário: os dois desejam uma mudança radical, o
reacionário para voltar ao passado, e o revolucionário para criar uma utopia.
O conservador sabe que o caminho para o progresso é uma evolução
cautelosa, com prudência, sem experimentos radicais, respeitando a tradição,
a liberdade e os direitos, e adaptando os conceitos teóricos às exigências
práticas da vida real.
 
 
 
 
Os políticos brasileiros, em sua maioria, não são conservadores. São
raros aqueles que conhecem e acreditam nas ideias do conservadorismo, e
pautam sua vida e atuação política por essas ideias.
Há alguns meses, escrevi um texto nas redes sociais mostrando como a
esquerda sempre gera ditaduras, o que nunca acontece com o
conservadorismo. Lendo as respostas, fiz uma terrível constatação: pensei
que iria argumentar com discípulos de Marx, mas acabei discutindo com
alunos de Paulo Freire.
O grau de desconhecimento e demonização das ideias conservadoras no
Brasil é total, e pode ser ilustrado por uma pequena história.
Aconteceu na campanha eleitoral de 2020.
Fui convidado a participar de um debate com três outros candidatos.
Um deles era um rapaz que, embora se classificasse como “liberal”,
limitava-se a repetir clichês progressistas. Quando o tema passou a ser
segurança pública, vi uma oportunidade de desmascarar a verdade sobre
suas ideias.
Usei um truque que nunca falha.
Falei do tráfico de drogas e – citando fatos e dados – expliquei o papel
central que ele desempenha na catástrofe do crime no Brasil.
O jovem “liberal” – na verdade, um esquerdista e, como todos,
profundamente despreparado – reagiu furiosamente aos meus comentários.
Depois de defender o "uso recreativo" da maconha e a estatização do
tráfico de drogas, passou a atacar meu conservadorismo.
E aí vem a parte mais irônica, engraçada ou – dependendo do ponto de
vista – trágica dessa história.
O jovem candidato narco-liberal, depois de dizer horrores do meu
conservadorismo, se despediu dizendo que só prometia a seus eleitores
"sangue, suor e lágrimas".
Essa frase é de Winston Churchill, primeiro-ministro do Reino Unido
durante a Segunda Guerra Mundial.
Churchill foi o homem que enfrentou a Alemanha nazista.
Churchill foi dos maiores estadistas conservadores da história.
 
 
 
A grande questão da política atual é a questão moral. Todo o resto é
secundário. A capacidade de distinguir o certo do errado, e optar pelo certo –
mesmo quando isso significa um alto custo político e pessoal – é
característica essencial em um político.
Não é possível entrar em qualquer acordo com corruptos, populistas,
socialistas ou comunistas. Não faz sentido trabalhar com aqueles cujo único
objetivo é te destruir. A aliança de crime, extremismo de esquerda e
populismo está destruindo o Brasil. Esses são nossos inimigos, não
importam as cores bonitinhas que eles vestem e os slogans fofos que eles
usam.
Nossa civilização foi construída em cima da filosofia grega, do direito
romano e da ética e moral judaico-cristã.
Tem muita gente tentando destruir isso:
Os terroristas que atacam Israel e a Europa Ocidental.
Os progressistas que defendem pautas como imigração sem controle,
tolerância com culturas intolerantes e liberação das drogas.
Os radicais de esquerda que buscam reescrever a história,
menosprezando e demonizando grandes conquistas e líderes do passado.
Os que sabotam o direito com teorias como o "garantismo penal" e o
"direito penal do inimigo".
Os que sabotam a filosofia, produzindo "doutores" tatibitates, porta-
vozes de um radicalismo de aluguel.
E aqueles que promovem ideologia como se fosse cultura e
"desconstroem" sistemas de ensino, trocando matemática, português e
ciência por promoção de conflito étnico, confusão de gêneros, luta de
classes, demonização da prosperidade e apologia das drogas.
É preciso resistir a esses ataques.
Por isso me tornei conservador.
 
 
 
 
Como conservador, não acredito em nenhuma ideologia. Minhas ações
são determinadas por meus valores e princípios.
Na minha opinião, ser conservador no Brasil de hoje é defender, no
mínimo, liberdade econômica, liberdade de expressão e de ir e vir, direito
inviolável à propriedade privada e à legítima defesa armada, igualdade
perante a lei, combate rigoroso ao crime, às drogas e à corrupção, soberania
nacional, educação sem ideologia, redução do Estado e de impostos, fim da
ideologia de gênero e do ativismo judicial, respeito pelas religiões e voto
auditável.
 
Não acredito em revoluções, apenas no progresso construído com
trabalho e sacrifício.
 
Não acredito em nenhum tipo de coletivismo ou socialismo e rejeito
todos os regimes totalitários.
 
E sou dedicadamente anticomunista.
 
Eu não choro pelo Brasil. Eu luto por ele. Quem tem que chorar são os
bandidos e os corruptos.
 
 
 
 
 
Cronologia
Linha do Tempo dos Principais Eventos do Livro
 
1979 – Os criadores do Partido Novo se conhecem no Colégio Santo Inácio.
2008 – João e Roberto colaboram com a campanha de Fernando Gabeira à prefeitura do
Rio.
2009 – Acontecem as primeiras conversas sobre a criação do partido.
2010 – São definidas as linhas gerais do partido e começa a coleta de assinaturas.
2011 – Realizada a reunião de fundação do partido.
2013 – São criados os diretórios estadual e municipal do Rio. Roberto assume a
presidência estadual.
2014 – O Partido Novo entra com o processo de registro no TSE, apresentando mais de
500.000 assinaturas.
2015 – Roberto deixa a presidência do diretório estadual em agosto. O registro no TSE é
aprovado em setembro.
2016 – Roberto se desliga do partido.
 
Apêndice
Projeto de Lei de Reforma da Legislação Penal
Brasileira
Este é o texto da proposta de alteração da legislação penal, de autoria de
Leonardo Fiad, Marcelo Rocha Monteiro e Roberto Motta, que foi entregue
ao então ministro da Justiça, Sergio Moro, em uma reunião no Ministério da
Justiça em 30 de janeiro de 2019[62].
 
O texto original é apresentado aqui, com notas explicativas.
 
Justificativa do Projeto
 
Este projeto de lei tem por objetivo principal extinguir o regime
semiaberto de execução de penas privativas de liberdade, além de
promover alterações nas regras atinentes ao regime aberto e ao
livramento condicional.
 
O regime semiaberto, que se pretende extinguir, consiste, tal como
concebido pelo Código Penal (art. 33, § 1º, “b”), na execução de
penas privativas de liberdade em “colônia agrícola, industrial ou
similar”.
 
O Brasil, todavia, possui pouquíssimas colônias penais com essas
características, o que, na prática, acaba por equiparar o regime
semiaberto ao aberto. Isto é, os presos em regime semiaberto
cumprem suas penas fora do estabelecimento prisional, sem qualquer
controle ou vigilância, tendo apenas o dever de pernoitar no presídio.
 
Esta situação, aliada ao atual sistema de progressão de regime
(que demanda, objetivamente, em geral, o cumprimento de 1/6 da
pena no regime inicial a que condenado o réu, e, no caso específico
dos crimes hediondos, 2/5 da pena para réus primários e 3/5 para
reincidentes; e sob o aspecto subjetivo, a mera lavratura de ‘atestado
de bom comportamento carcerário’ pelo diretor da unidade prisional),
vem contribuindo para o descrédito do sistema criminal brasileiro na
medida em que despe a pena das funções que lhe são inerentes: a
punição proporcional à gravidade do crime, o caráter pedagógico
(geral e especial) e a proteção da sociedade. Um réu primário
condenado a 6 anos por homicídio simples, por exemplo, em 1 ano
passará do regime fechado para o semiaberto nos moldes acima
descritos; um réu primário condenado a 5 anos e 4 meses por roubo à
mão armada estará de volta às ruas em 11 meses.  Nenhum país que
se pretenda civilizado, que ponha em primeiro lugar a proteção da
vida, liberdade e propriedade dos seus cidadãos, pode conviver com
esse descompasso[63].
 
Para mitigar esse quadro, o projeto prevê que as penas de
reclusão, que sancionam os crimes mais graves, devem ser
cumpridas em regime fechado; as penas de detenção, a seu turno
(salvo necessidade de transferência para o regime fechado nas
hipóteses previstas), devem ser cumpridas em regime aberto, ora
definido como execução da pena em domicílio, com monitoração
eletrônica (artigos 1º e 2º)[64].
 
Além disso, o projeto altera alguns dos requisitos para a
concessão do livramento condicional (cumprimento de 2/3 da pena
se o condenado não for reincidente em crime doloso e tiver bons
antecedentes; e cumprimento de 4/5 da pena nos casos de
condenação por crime hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins e terrorismo ou se o condenado for
reincidente em crime doloso).  Adiciona também, como requisito
para a concessão do livramento condicional, a aptidão do
condenado atestada em avaliação criminológica realizada por
equipe multidisciplinar (artigo 3º).
 
Em um cenário nacional de conflagração, insegurança e
descrédito das autoridades públicas, que gerou, inclusive, inédita
intervenção federal na área de segurança pública no Estado do Rio
de Janeiro, estamos certos de que este projeto constitui o primeiro
passo de uma grande virada para a devolução da tranquilidade e
paz aos brasileiros sitiados pela criminalidade.  E de que a Casa do
Povo, com senso de prioridade e em perfeita sintonia e conexão
com os seus representados, não se furtará a liderar este processo.
 
 
Rio de Janeiro, março de 2018.
Projeto de Lei
O quadro comparativo a seguir apresenta as sugestões de modificação da
legislação propostas pelo projeto. Para cada alteração é descrito seu objetivo
e apresentada a legislação atual e como ela ficaria após a mudança.
Artigo 1º:
Objetivo: eliminar o regime semiaberto.
Mudança: altera a redação do artigo 33 do Decreto-lei
2.848/1940 (Código Penal) e suprime a alínea “c” do §
1º.
Redação Atual da Lei:
        Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida
em regime fechado, semiaberto ou aberto. A de detenção,
em regime semiaberto, ou aberto, salvo necessidade de
transferência a regime fechado.
        § 1º - Considera-se:
        a) regime fechado a execução da pena em
estabelecimento de segurança máxima ou média;
        b) regime semiaberto a execução da pena em
colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;
        c) regime aberto a execução da pena em casa de
albergado ou estabelecimento adequado.
Nova Redação da Lei:
Art. 33 - A pena de reclusão deverá ser cumprida em
regime fechado. A de detenção, em regime aberto, salvo
necessidade de transferência para regime fechado.
§ 1º.  Considera-se:
a) regime fechado a execução da pena em
estabelecimento de segurança máxima ou média;
b) regime aberto a execução da pena em domicílio,
com monitoração eletrônica. Redação:
 
 
 
 
Artigo 2º:
Objetivo: altera as regras do regime aberto
transformando-o em prisão domiciliar com
monitoramento eletrônico
Mudança: altera o §1º e o §2º do art. 36 do
Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940
(Código Penal).
Redação Atual da Lei:
 
Art. 36 - O regime aberto baseia-se na
autodisciplina e senso de responsabilidade do
condenado. 
        § 1º - O condenado deverá, fora do
estabelecimento e sem vigilância, trabalhar,
frequentar curso ou exercer outra atividade
autorizada, permanecendo recolhido durante o
período noturno e nos dias de folga. 
        § 2º - O condenado será transferido do regime
aberto, se praticar fato definido como crime doloso,
se frustrar os fins da execução ou se, podendo, não
pagar a multa cumulativamente aplicada. 
 
Nova Redação da Lei:
Art. 36 - O regime aberto baseia-se na
autodisciplina e senso de responsabilidade do
condenado. 
§ 1º - O condenado deverá permanecer em seu
domicílio com monitoração eletrônica, somente
podendo ausentar-se para tratamento de saúde,
com prévia autorização judicial.
 
§ 2º - O condenado será transferido para o
regime fechado se praticar fato definido como
crime doloso, se frustrar os fins da execução ou
se, podendo, não pagar a multa cumulativamente
aplicada.
 
 
 
Artigo 3º:
Objetivo: cria uma pena mínima de 40 anos
para o criminoso que comete crime doloso com
violência ou grave ameaça.
Mudança: o artigo 63 do Decreto-lei
2.848/1940 (Código Penal) passa a vigorar
acrescido de um parágrafo único.
Redação Atual da Lei:
 
Art. 63 - Verifica-se a reincidência quando o
agente comete novo crime, depois de transitar em
julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o
tenha condenado por crime anterior.
Nova Redação da Lei:
Art. 63 - Verifica-se a reincidência quando o
agente comete novo crime, depois de transitar em
julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o
tenha condenado por crime anterior.
P. único: Ao réu condenado pela terceira vez por
crime doloso cometido com violência ou grave
ameaça será aplicada pena de 40 (quarenta) a 50
(cinquenta) anos de reclusão.
 
 
 
 
Artigo 4º:
Objetivo: elimina-se o prazo de cinco anos a
partir do qual um crime anterior deixa de ser
considerado para efeito de reincidência.
Mudança: revoga os incisos I e II do art. 64 do
Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940
(Código Penal).
Redação Atual da Lei:
 
Art. 64 - Para efeito de reincidência:
        I - Não prevalece a condenação anterior, se
entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a
infração posterior tiver decorrido período de tempo
superior a 5 (cinco) anos, computado o período de
prova da suspensão ou do livramento condicional, se
não ocorrer revogação; 
        II - Não se consideram os crimes militares
próprios e políticos.
 
 
Nova Redação da Lei:
Art. 64 - Para efeito de reincidência não se
consideram os crimes militares próprios e os
crimes políticos.
 
 
 
 
Artigo 5º:
Objetivo: aumentar o tempo máximo de
cumprimento de pena para 50 anos,
Mudança: altera a redação do artigo 75 do
Decreto-lei 2.848/1940 (Código Penal),
Redação Atual da Lei:
 
Art. 75. O tempo de cumprimento das penas
privativas de liberdade não pode ser superior a 40
(quarenta) anos. 
 
        § 1º Quando o agente for condenado a
penas privativas de liberdade cuja soma seja
superior a 40 (quarenta) anos, devem elas ser
unificadas para atender ao limite máximo deste
artigo.
 
        § 2º - Sobrevindo condenação por fato
posterior ao início do cumprimento da pena, far-
se-á nova unificação, desprezando-se, para esse
fim, o período de pena já cumprido.
 
Nova Redação da Lei:
Art. 75 - O tempo de cumprimento das
penas privativas de liberdade não pode ser
superior a 50 (cinquenta) anos.
 
        § 1º - Quando o agente for condenado a
penas privativas de liberdade cuja soma seja
superior a 50 (cinquenta) anos, devem elas ser
unificadas para atender ao limite máximo deste
artigo.
 
        § 2º - Sobrevindo condenação por fato
posterior ao início do cumprimento da pena,
far-se-á nova unificação, desprezando-se, para
esse fim, o período de pena já cumprido.
 
              § 3º - O cálculo para concessão de
livramento condicional ou qualquer outro
benefício será feito com base na pena
efetivamente imposta na decisão condenatória.
 
 
       
Artigo 6º:
Objetivo: aumentar o tempo de cumprimento de
pena exigido para a concessão do livramento
condicional.
Mudança: altera a redação dos incisos I, e V, do
art. 83 do Decreto-lei nº 2.848, de 7 de dezembro
de 1940 (Código Penal) e acrescenta novo inciso
VI.
Redação Atual da Lei:
 
  Art. 83 - O juiz poderá conceder livramento
condicional ao condenado a pena privativa de
liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde
que:         
 
        I - Cumprida mais de um terço da pena se
o condenado não for reincidente em crime doloso
e tiver bons antecedentes; 
 
              II - Cumprida mais da metade se o
condenado for reincidente em crime doloso; 
 
        III - comprovado:         
 
              a) bom comportamento durante a
execução da pena;     
 
              b) não cometimento de falta grave nos
últimos 12 (doze) meses;            
 
        c) bom desempenho no trabalho que lhe
foi atribuído; e      
 
              d) aptidão para prover a própria
subsistência mediante trabalho honesto.
 
              IV - tenha reparado, salvo efetiva
impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela
infração;           
 
              V - cumpridos mais de dois terços da
pena, nos casos de condenação por crime
hediondo, prática de tortura, tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, tráfico de pessoas e
terrorismo, se o apenado não for reincidente
específico em crimes dessa natureza.      
 
            Parágrafo único - Para o condenado por
crime doloso, cometido com violência ou grave
ameaça à pessoa, a concessão do livramento
ficará também subordinada à constatação de
condições pessoais que façam presumir que o
liberado não voltará a delinquir.        
 
Nova Redação da Lei:
 
  Art. 83 - O juiz poderá conceder livramento
condicional ao condenado a pena privativa de
liberdade igual ou superior a 2 (dois) anos, desde
que:         
 
        I - I - Cumpridos mais de dois terços da
pena se o condenado não for reincidente em crime
doloso e tiver bons antecedentes;
 
        II - Cumpridos mais de quatro quintos da
pena, se o condenado for reincidente em crime
doloso ou não tiver bons antecedentes;
 
        III - comprovado:         
 
              a) bom comportamento durante a
execução da pena;     
 
              b) não cometimento de falta grave nos
últimos 12 (doze) meses;            
 
        c) bom desempenho no trabalho que lhe
foi atribuído; e      
 
              d) aptidão para prover a própria
subsistência mediante trabalho honesto.
 
              IV - tenha reparado, salvo efetiva
impossibilidade de fazê-lo, o dano causado pela
infração;           
 
V - Ter sido considerado apto em avaliação
criminológica realizada por equipe
multidisciplinar;
 
VI - Cumpridos mais de quatro quintos da
pena, nos casos de condenação por crime
hediondo, prática da tortura, tráfico ilícito de
entorpecentes e drogas afins, e terrorismo, se o
apenado não for reincidente específico em
crimes dessa natureza.
 
 
 
 
Artigo 7º:
Objetivo: aumenta a pena mínima para
homicídio.
Mudança: altera a redação do artigo 121 do
Decreto-lei 2.848/1940 (Código Penal).
Redação Atual da Lei:
 
        Homicídio simples
 
Art. 121. Matar alguém:
 
        Pena - reclusão, de seis a vinte anos.
 
        Caso de diminuição de pena
 
        § 1º Se o agente comete o crime impelido
por motivo de relevante valor social ou moral, ou
sob o domínio de violenta emoção, logo em
seguida a injusta provocação da vítima, o juiz
pode reduzir a pena de um sexto a um terço.
 
        Homicídio qualificado
 
        § 2° Se o homicídio é cometido:
 
        I - mediante paga ou promessa de
recompensa, ou por outro motivo torpe;
 
        II - por motivo fútil;
 
        III - com emprego de veneno, fogo,
explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso
ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum;
 
        IV - à traição, de emboscada, ou mediante
dissimulação ou outro recurso que dificulte ou
torne impossível a defesa do ofendido;
 
        V - para assegurar a execução, a
ocultação, a impunidade ou vantagem de outro
crime:
 
        Pena - reclusão, de doze a trinta anos.
 
Nova Redação da Lei:
 
Homicídio simples
 
Art. 121. Matar alguém:
 
        Pena - Pena – reclusão de 12 (doze) a 20
(vinte) anos.
 
        Caso de diminuição de pena
 
        § 1º Se o agente comete o crime impelido
por motivo de relevante valor social ou moral, ou
sob o domínio de violenta emoção, logo em
seguida a injusta provocação da vítima, o juiz
pode reduzir a pena de um sexto a um terço.
 
        Homicídio qualificado
 
        § 2° Se o homicídio é cometido:
 
        I - mediante paga ou promessa de
recompensa, ou por outro motivo torpe;
 
        II - por motivo fútil;
 
        III - com emprego de veneno, fogo,
explosivo, asfixia, tortura ou outro meio insidioso
ou cruel, ou de que possa resultar perigo comum;
 
        IV - à traição, de emboscada, ou mediante
dissimulação ou outro recurso que dificulte ou
torne impossível a defesa do ofendido;
 
        V - para assegurar a execução, a
ocultação, a impunidade ou vantagem de outro
crime:
 
        Pena - reclusão de 20 (vinte) a 40
(quarenta) anos.
 
 
 
Artigo 8º:
Objetivo: elimina o regime semiaberto e a
progressão de regime.
Mudança: revoga o art. 35 do Decreto-lei
2.848/1940 (Código Penal), e arts. 112, 113, 114,
115, 116, 117 e 118, da Lei 7.210 de 11 de julho
de 1984 (Lei de Execução Penal).
 
 
 
 
 
Bibliografia
 
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       PIOVEZAN, C.; BRIGUET, P.; TAVARES NETO, C.;
MONGENSTERN, F.; LINS GRILLO, L.; ROCHA MONTEIRO, M.;
CZELUSNIAK, M.; FREYESLEBEN, M.; GRECO, R.; SPONHOLZ,
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            WILSON, Edmund, Rumo à Estação Finlândia, Companhia de
Bolso, 2006.
 
[1]
O “Mota” do sobrenome do meu tio tem um “t” apenas, embora o sobrenome do nosso avô,
José Lourenço, fosse “Motta”, com dois “t”s. Não me perguntem por quê.
[2]
“Cabeça de porco” era o termo usado para descrever prédios com grande quantidade de
apartamentos minúsculos.
[3]
A Camarilha dos Quatro é como ficou conhecida uma facção composta por quatro membros
do Partido Comunista da China que ganharam proeminência no período de implementação da Grande
Revolução Cultural Proletária (1966-1976): Jiang Qing (esposa de Mao Tsé-Tung), Zhang Chunqiao,
Wang Hongwen e Yao Wenyuan.
[4]
Entrevista a Luciano Pires, no LiderCast 125 de 17/09/2018. Disponível em:
http://portalcafebrasil.com.br/resumos/lidercast-125-joao-amoedo. O trecho relevante contém o
seguinte diálogo:
Luciano: (...) Um belo dia você está lá, entra uma luz pela janela e vem uma voz e fala assim:
João, vá mudar o Brasil. Como é que foi, o que foi isso, cara?
João Amoêdo: Foi mais simples, eu estava jantando com um amigo meu, que a gente estudou
junto num colégio, ele é carioca, estava por aqui por São Paulo e aí eu falei para ele, fulano, eu tinha
vontade de ir para administração.
Luciano: Quem é o fulano?
João Amoêdo: Roberto.
Luciano: O Motta?
João Amoêdo: Roberto Motta.
Luciano: Esteve nesta cadeira aqui umas semanas atrás.
João Amoêdo: Então, eu falei para ele, Roberto, eu tinha vontade de fazer alguma coisa para
melhorar a gestão pública [...] E aí ele me colocou em contato lá, na época, com uma pessoa próxima
ao Gabeira [...] E aí resolvemos colocar essa ideia de pé em 2010, no final de 2010.
[5]
https://www.linkedin.com/pulse/20140928034923-458602-quatro-li%C3%A7%C3%B5es-
que-aprendi-na-am%C3%A9rica
[6]
https://www.terra.com.br/noticias/brasil/policia/homicidios-caem-41-apos-sistema-de-
deteccao-de-tiros-no-rs,06b84fc7b94fa310VgnCLD200000bbcceb0aRCRD.html
[7]
O nome oficial do cargo passara a ser Secretário de Estado Executivo do Conselho de
Segurança Pública. A Secretaria sob meu comando era a antiga SESEG (Secretaria de Estado de
Segurança), que deveria ser extinta em seis meses, conforme plano de governo. As duas polícias já
tinham sido transformadas em secretarias independentes. A SESEG foi extinta menos de um mês
após a minha nomeação.
[8]
https://www.youtube.com/watch?v=rGsipC91sSk
[9]
Em entrevista à revista Época, em setembro de 2014, João declarou: “Inicialmente éramos um
grupo pequeno, umas dez pessoas. Alguns estudaram comigo no colégio, fizeram faculdade juntos, e
outros eram meus sócios no mercado financeiro”. Disponível em:
https://epoca.globo.com/tempo/eleicoes/noticia/2014/09/bjoao-dionisio-amoedob-gente-quer-acabar-
com-os-privilegios.html
[10]
https://www.facebook.com/roberto.motta1/posts/122568714423189
[11]
https://oglobo.globo.com/politica/de-janeiro-abril-de-2010-governo-federal-gastou-com-
publicidade-632-mais-do-que-no-3004046
[12]
Um “think tank” conservador.
[13]
https://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/11/partido-novo-o-intruso-liberal-na-politica-
brasileira.html
[14]
https://cdn.novo.org.br/novo/conheca/historia-do-novo/
[15]
https://vimeo.com/24563518 e https://www1.folha.uol.com.br/fsp/poder/po0503201107.htm
[16]
https://diplomatizzando.blogspot.com/2011/03/oartido-novo-um-contraponto-mansueto.html
[17]
https://diplomatizzando.blogspot.com/2011/03/partido-novo-um-debate-que-se-engaja.html
[18]
O assunto é extenso e não será discutido aqui, pois já foi abordado nos meus dois primeiros
livros, Ou Ficar A Pátria Livre e Jogando Para Ganhar: Teoria e Prática da Guerra Política.
[19]
https://www.youtube.com/watch?v=ixvPoKyP06U&t=13s
[20]
https://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1034
[21]
https://www.brasil247.com/poder/conselheiro-do-itau-cria-partido-de-direita-o-novo
[22]
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2013/08/1332072-mesmo-sem-apoio-suficiente-rede-
de-marina-silva-entra-com-pedido-de-registro-no-tse.shtml
[23]
https://www.youtube.com/watch?v=ZkMcoDwV-y4
[24]
https://youtu.be/1vm2At5MUCw
[25]
Que, depois eu soube, teve entre os seus fundadores um dos avôs da minha esposa
Alexandra.
[26]
A LVM editou meu segundo livro, Jogando Para Ganhar: Teoria e Prática da Guerra
Política.
[27]
Fato curioso: na campanha eleitoral de 2016, eu recebi Osório – então candidato a prefeito –
em minha casa para uma apresentação. Foi de longe o candidato com a maior aceitação pelo público
feminino...
[28]
 https://drive.google.com/file/d/1S7STuF6L_lDda2-ADhE3PdnPJuChLFxv/view?
usp=sharing
[29]
Ver Apêndice no final deste livro.
[30]
https://youtu.be/0-6ZyfYI6NQ
[31]
https://youtu.be/49DhNnC9yks
[32]
https://youtu.be/Qu0oYdsKgI4
[33]
O texto do projeto está no Apêndice no final deste livro.
[34]
https://twitter.com/rmotta2/status/1172103726921859072?s=20
 
[35]
https://twitter.com/rmotta2/status/1270772015163736064?s=20
 
[36]
https://youtu.be/_yZiX-JmT5s
[37]
https://odia.ig.com.br/noticia/opiniao/2014-10-05/roberto-motta-a-fraude-do-
radicalismo.html
[38]
https://youtu.be/p7NRQ97venk
[39]
https://youtu.be/KBzaSO0aKdU
[40]
https://youtu.be/kCYW3CrZfXk
[41]
https://youtu.be/pLTgyQGLbGA e https://youtu.be/gJjp_L3znRQ
[42]
https://epoca.globo.com/tempo/noticia/2015/11/partido-novo-o-intruso-liberal-na-politica-
brasileira.html
[43]
https://youtu.be/EgIq2L67Oi8
[44]
https://youtu.be/6OfKO-1nbQw
[45]
Termo usado na época para denominar os liberais e qualquer um que não fosse apoiador do
PT.
[46]
https://30diarios.wordpress.com
[47]
https://30diarios.wordpress.com/2015/11/28/almanaque-do-partido-novo/
[48]
https://soundcloud.com/30diarios
[49]
https://30diarios.wordpress.com/2016/05/11/nasce-uma-alma/
[50]
Estavam presentes Marcelo Rocha Monteiro, Luiz Philippe de Orleans e Bragança,
Tamara Bertoldo, Alexandre Gama, Beatriz Sander, Dennys Andrade, Luiz Eloy Oliveira, Naomi
Yamaguchi, Luiz Aguilar, Leandro Monteiro, Riva Monteiro, Nicholas de Oliveira, Nilton Rossano,
José Ernesto Marino Neto, Alexandre Gama, Beatriz Sander, Davi Oliveira, Rafael Leal, Cassiano
Polesi, Luiz Módolo, Rodrigo Sanches, Júlio Casarin e Roberto Motta.
[51]
Segundo explicou Alfredo Fuentes em sua entrevista a Clynton Cortez.
[52]
https://drive.google.com/file/d/17OYrUecuwGSdYk6yfmDPuD4N9ELrLjeu/view?
usp=sharing e https://esaj.tjsp.jus.br/cpopg/show.do?
processo.codigo=0G0005ER70000&processo.foro=16&processo.numero=1006275-
07.2017.8.26.0016&uuidCaptcha=sajcaptcha_a9e47d9239cb4d2db78864a0cab42c2c
[53]
https://esaj.tjsp.jus.br/cpopg/show.do?
processo.codigo=0G0005KRJ0000&processo.foro=16&processo.numero=1010009-
63.2017.8.26.0016&uuidCaptcha=sajcaptcha_76f869110baa42858bcd0ca1ef11a76f
[54] Este capítulo é baseado em um depoimento concedido ao autor em março de 2021.
[55]
https://drive.google.com/file/d/1D59rgNblRDpyDzTPwbGa0hBj77QPCv0g/view?
usp=sharing
[56]
https://drive.google.com/file/d/10dc8v4EaXaePCh6B-P8efClXbySK9jrl/view?usp=sharing
[57]
https://twitter.com/partidonovo30/status/1164643211840806912?s=20
[58]
https://twitter.com/ChicaoBulhoes/status/1165663610661670912?s=20
 
[59]
https://blogs.oglobo.globo.com/ancelmo/post/apos-pedir-saida-de-salles-marcelo-trindade-
decide-deixar-o-partido-novo.html,
https://www.facebook.com/rangel.ricardop/posts/540843233354537/ e https://g1.globo.com/rj/rio-de-
janeiro/noticia/2020/12/05/deputado-chicao-bulhoes-vai-assumir-a-secretaria-de-desenvolvimento-
economico-inovacao-e-desburocratizacao-de-eduardo-paes.ghtml
[60]
Entendendo “direita”, essencialmente, como a visão de que cada um tem o direito e dever de
cuidar de si; ao Estado cabe garantir esse direito. Já a “esquerda” acredita em um Estado todo-
poderoso que deve resolver tudo para todos, o tempo inteiro.
[61]
https://politica.estadao.com.br/noticias/geral,racha-no-novo-vai-alem-de-conflitos-por-
impeachment-e-oposicao-a-bolsonaro,70003646759
[62]
https://youtu.be/Qu0oYdsKgI4
[63]
O chamado “pacote anticrime”, Lei n. 13.964, de 24 de dezembro de 2019, trouxe algumas
modificações na legislação, inclusive nas regras de progressão de regime carcerário. No caso do
crime de roubo com arma de fogo, por exemplo, a pena mínima passou a ser de 6 anos e 8 meses, e
não mais de 5 anos e 4 meses, e a lei passou a exigir o cumprimento de 40% da pena – ou seja, o
cumprimento de 2 anos e 8 meses, no caso de aplicação de pena mínima – para permitir a progressão
para o regime semiaberto.
 
[64]
Ou seja, o projeto extingue o regime semiaberto, fazendo com que as penas por todos os
crimes mais graves – como homicídio, roubo com ou sem arma, extorsão, extorsão mediante
sequestro, estupro, tráfico etc. – ou de média gravidade – como furto, estelionato, receptação etc. –
sejam cumpridas em regime fechado.

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