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Acada época, chistoriador se esforça para conciliar as exigências da

objetividade eanecessidade que tem de reinterpretar opassado àluz do


presente, Mas em face do que é, em face do que vem, oque diz ahistória?
Neste livro, Ariette Farge reflete sobre aresponsabilidade do historiador
diante do presente: pensar osofrimento, acrueldade, aviolência aauerm •5
sem reduzi-los afatalidades étambém querer explicar os dispositivos os
mecanismos de racionalidade que os fizeram nascer.
As ciências do homem sempre tenderam aconsiderarocampo emoninn.i
como resultante apenas do fisiológico, dos sentimentos. Ora osofrimBnt
humano não éanedótico: oacontecimento singularéum momento de história°
Aopinião das pessoas, afala, oacontecimento que sobrevêm fazem uJnT
lugares políticos da história. Do mesmo modo, adiferença dos papéi se !
nao euma fatalidade; ela está submetida às variações da história
Lugares para ahistória fomenta uma discussão fundamental nar^
historiador: reinterpretar ahistória de acordo com onosso presen eT °
tanto,_a obra de Michei Foucault, com quemAriette Farge publicou em 198p'
Le desordre des famiiies [A desordem das famiiias. inédito em portuonât
lugares para a história
serve aqui de apoio para aanálise de diversas questões que estão em
na escritura da história. ^

autêntica
www.autenticaeditora.com br
coleção história ehistoriografia
0800 28 31377

SBN97S-85-752Õ-542-0
Coleção
HISTÓRIA & HISTORIOGRAFIA
Coordenação
Eliana de Freitas Dutra

Ariette Forge

Lugares poro a história

V.
TRADUÇÃO

Fernando Scheibe

autêntica
d® «<'• sous ,a d.ection SUMÁRIO
Copyright« 2011 Autêntica Editora Uda.
título do original
Des lieux pour rhistoire REVISÃO DA TRADUÇAO
Vera Chacham
"'STORIA E REVlSAO DE TEXTO
historiografia
Eliana deFreitas Dutra Ana Carolina Lins Brandão
Lira Córdova
projeto graficodecapa
Alberto Bittencourt editora responsável
Bejane Dias
edtoraçAo eletrônica
Conrado Esteves Introdução ^
Revisado conforme oNovo Acordo Ortográfico. 1
Do sofrimento
parte dest^pSSSaJopQ^er^^^^^^
mecânicos, eletrônicos 2 avia
Nenhuma
"^eios Estos morados vivos do historio ^^
autorização prévia da Edit^a ^ *erográfica, sem a Ador político 19

autêntica editora ltda.


Belo Horizonte
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30140-071 Rpir^u
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Sobre o legitimidode de buscar outros tipos
Tel.: (55 31) 3222 6819
Sâo Paulo
de interpretoçõo histórico olém daqueles já uti iza os
De olgumos interpretações em história da violência 28
01311-940. Sâo Pauio SP A leituro dos Ditos e escritos
Tel.; (55 11) 3034 4468
n 41
Televendas: 0800 283 13 22 '-'a guerra
www.autenticaeditora.com.br Um objeto filosófico
Um objeto de história ..
, 4o
^««ção (ciP) A guerra no século XVIII _,
Farge, Ariette " ^ ' — ^ o I
Ler a desordem ^a
Belo Horizon^: Autênto MtÍrf20l2(Coí- As Luzes e a tolerância
54
/coordenação Eliana de Freitas Dutra) ®Historiografia. 3
2^^': Des lieux pour rhistoire %
ISBN 978-85-7526-542-0 Ahistório cimentada pela fala?
Eliana1. deHistória-Filosofia
Freitas. II. Título.2III.História
Série. ~d "'^^°f'ografia I. Dutra, Ahistório dito rápido demais
l> 71
'-'O acontecimento
CDD-901
Desfozer evidências y^
Apolovra, o testemunho, a memória
Com Michel Foucault, zombar das origens
Da violência

Aviolência e abarbárie desconcertam, enquanto os discursos


sobre elas, sejam históricos, sociológicos ou mesmo oso ,
deixam-nos insatisfeitos. Ainterpretação histórica da violência, dos
massacres passados, dos conflitos edas crueldades, prauc^ente mo
Pennite, na hora atual, "captar" em sua desonentadora am !
se passa sob nossos olhos. Ainsatis6ção está pr«ente em
ausência de pensamento ou, ao contrário, da existenaade
sóUdas mas, hoje, pouco adequadas. P^ece que sena
meios mais elaborados para dizer aviolência e,so
^ ^

hoje, em todo caso resistir-lhe ou obnga-la a na


formas coletivas edesenfreadas que são atualmente
terp tSSodVsÍnalisrrsociais, a
inapreensível ecruel, pode parecer ambicioso jesbordar por
ajusto tentar aaventura da reflexão para nao ^ pensamen-
^quela do sentimento de fatalidade ou de impo _ e
de Michel Foucault não é recente, mas ^P escritos,
e^oTíos permite tentar uma expenência: questões políticas,
respondem em diversos países ^poio para
^^enturais^^ ou fdosóficas, podem servir de p
duções de certa filosofia francesa
^filizo oadjetivo neológico "eventural" bastante ^principal expo"®"'®' Aventurai
o acontecimento (êvéiiement) de que Alain Badiou e

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Lugares para a história Davkxénoa

uma reflexão em vias de reelaboração sobre aviolência, amorte, a


guerra eacmeldade? Mesmo que se tratasse apenas de esboços de Sobre a legitimidade de buscar outros tipos de
pensamentos ou de respostas, estaríamos diante de deslocamentos interpretação histórica além daqueles já utilizados
de problemáticas certamente ricos em ensinamentos.
Ainterpretação, seja filosófica ou histórica, nao é uma coisa
Otrabalho iniciado aqui é, por um lado, um retorno aei- regulamentada de uma vez por todas. Émesmo uma tarefa infimta,
que coloca em pnrneiro lugar ocaráter ilimitado einfinitamente
problemático da coisa aanalisar edaquele que aanalisa. O espaço
deXins
de alguns deles),r°'mas para interrogar sua pertinência
época, daeconstruir
efetuação da interpretação éum espaço constantemente aberto esempre por
retomar. Michel Foucault podia sugerir aesse respeito que um dia
deTmeSrck se estabeleça asoma de todas as técnicas de interpretação do socid
donunio'd:vLlêÍcir^Jeir brutalizado - no edo homem que foram utilizadas desde omundo grego: com a
ajuda dessa soma poderíamos ler ahistória dos homens eaquela
dos saberes tentados. Essa sugestão lhe pemutia outra a
acordo com aqual oimportante na socieda econsiste cer .
uma vez numa franja ceoo pínr.^ ^ Estanamos ainda mais na interpretação do que na coisa. Com efeito,
obrigaria adeixar de lado todo pemamem^s''humanidade que terpretação ecapaz de dar sentido, de riais o
e suas formas de violência' Seria ° acontecimento rebeliões, de "dar um eixo" ao curso das coisas. E^^ J
marcha rumo à "civ liz ão e à '«^a sentimento que nasce em relação àinterpretação, a°P n-°
engodo eque ocaos orSLal é t'' ^ lecida em tomo eapartir dela que produzira outras interpretações,
nosso tempo? Seria oretorn í ' r '^e mais candente de logo outros acontecimentos. . .
bérbaro qu' retoca seusTr .tÍtT' ^ "Com efeito, ainterpretação não "'7t7el7âl7od7enão
maneiras intelectuais de sermos 1 terpretar, que se ofereceria a"^^l^rinterpretação já lá. que ela
barbárie, que acreditávamos extinta vtT se apoderar, e violentamente, de (Foucault,
da Segunda Guerra Mundial Com r °genocídio deve inverter, revirar, despedaçar ago P^^ J interpretação que é
perguntar se uma certaela impotência esufT' 1994h. p. 571). Assim, tem-se "um (p. 571).
de acontecimentos, que não pôde ^^^e "rcular. Esse tempo éobngado arepas^
pelas conseqüências de certos sistemas id Aluz dessas reflexões, como na - ^^retação incessante
estaria hoje tão "borrada" pelo desbra ^^ ^ '"''^"gência
desconfiaria de si mesma edesistiria nâo7"'° realizam constantemente? Oexemp o j-espeito. Constatou-se,
da Revolução Francesa ésignificativo aess interpretações
de interrogar seus princípios emecanisl ^ás, no momento do bicentenário ^ muito mais im-
to os os campos do possível sob pretexto invadir
ogicos estáo mortos. ^ marcos ideo- •reciprocas de julho de 1789 edo £"^°agados pelos discursos
Porcantes do que os próprios "fatos ,q interpretações
sobre eles. Da mesma fonria, pôde-se ver q
eorelativo ao acontecimento num sentido forte H
hlicada nos cadernos W//<i Gillet,
" ctssas páginas foram inicialmente o objeto
- de j .,nri conferência pubbcada no>
nov. 1995

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Lugares para a história Da vioiÉNOA

conjunturais não fecharam odebate, que obrigaram mesmo aoutras violentos. Numerosas práticas sociais canalizam as emoções e os
einterpretações, produzindo ao mesmo tempo acontecimentos de afetos enquanto "o" político assume a violência. Assim ocorre,
ordem poimca e, em conseqüência, novos objetos de pesquisa. Em por exemplo, na sociedade de corte, ou, mais recentemente, edi
todo caso, nesse domínio da história da Revolução, não se pode ferentemente, no esporte, que se revela uma prática regrada que se
de ' '"tetpretação cria novas fonnas de aquiescência ou apodera das emoções, das rivalidades e dos afetos. Uma regulação
das tensões políticas passa por fomias da autoridade do podei edas
tZou"d
erudito ou do homem da rua, são criadas apartir dela --do práticas sociais em que o indivíduo interioriza regras e comporta
mentos. O espaço público e o espaço privado adquirem pouco a
ra em^re5ctroisr"7"'"'''° ~ -teipretação épnniei- pouco (tratados de civilidade, aprendizagem da leitura, adestrainento
Attavês de cada movJntoTS! arv^XtrifrÍ' dos coipos, sociedades de sociabilidade, regulamentos escolares,
regulamentos esportivos, associações) ocostume da não vio encia,
OLi ao menos de uma violência controlada, em que o piocesso
história e de sua interpretação A. ' ' , ^ ° produto da civilização permite anumerosas áreas do social conhecer uma re
lativa serenidade.
""T""""""""-p^dj:,d'r;°í
Se aceitamos, com MichelFoucault noeid-
~ No interior dessas áreas, os mecanismos
violência são aum só tempo complexos esutis, i ceis e
i
reinterpretação ao infinito e refimdacão n E claro que é impossível, nestas páginas, entrar nos
um sujeito novo, podemos finalmenteTusr pensamento eliasiano, que levou muito tempo para er
institui, acada momento histórico, arelaçã^dT'"^"'^"'^''' ^a França.
aviolência, como se fabrica um h sociedade com
_ Essa mescla eliasiana certa
discursosobreaviolèncSrasu"""'^^^^
ecomo sua reinterpretação pode traae «-uncientes eiencia histórica; revela-se convincent dos modelos
' °dngam aadotar um outro rosto. ^'^-'ccimentos que culturais e dos sistemas de
representação,
Eistória sociocultural, para ahistoria da v: amasj^ficilm^K pode
ar conta das grandes rupturas levantes, violências
uen-as, genocídios, massacres, atos d • j violência;
Segundo Norbert Elias p findem com suas hiâncias'^ esse processo de ro «r
Ocidente entre aIdade Mê;. ^ do as explicações, apartir de então, /g (jlyez de lineari-
uma progressiva transformação da econo '^^"«erizada por ronvincentes. O forte sistema de caus i a
Um processo de civiliLção m ade?) que sustenta esse modelo de Nor parece obrigar
eaviolência não está mais expost! àvmlê ''
Pouco apouco vê-se proibida, reprimida efrontal,
^^continuidades edas rupturas; inconscien
aqueles que oseguem apensar apartir ^een ^j^ão^^expHcitados de
crr^ndes avatares

cial progressivamente ^violência não controlada conio fenoi explica nada.


detem sozinhos aforçaseeuma
pacificaverdadZ
enq^nm^^^Í"''''
" ° ^^tornos de arcaísmo, o que, no
no intenor dos indivíduos, que se torn '"'""'^^'dção se exerce ceico lacaniano de "béance"'.
-nlo xvril, mais policiadol ^° -
•o
„,er empregado par, ^de com.ita.ç5o do senüdo
«"hiato, on, buraco, uma abertura, um, aurineia que altera
' Po^anto, menos 'Sujeito). (N.T.),

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Lugares paraa história Da vioiíncia

que aviolência passa aser compreendida em seu duplo desígnio


ntegram-se perfeitamente à conjuntura da época combativa e de destruição e de fundação da ordem social.
Ainterpretação éclara: anima muitos trabalhos de historiadores
sobre afesta e a violência, adesordem earebehao. Citemos de novo
MafFesoli e Pessin: "A violência, a crueldade, a desordem, a festa,
a perda não são mais do que aspectos da vida cotidiana levados a
seu extremo, eeste tenno éacondição de um ressur^mento desta
mesma vida cotidiana". Assim, haveria um drama orgamco da vida
eda morte em que violência efesta teriam seu doce lugar. No
sociológicos abrem ocaminh '"^^balhos filosóficos e horizonte dessas interpretações, que em fihgrana sustentam numero
Girard, .d .iolênci. eosa^ra^oST^i: sas pesquisas, existe uma verdadeira preocupação com aconstrução
preciso, excepcional. Nesse quadro se aproZd '' dos modos de regulação social, regulação que seria temp
noção de contexto no qual vivem emorr P^irtinulamiente a oponto de partida dos modos de organização societana esua c
assim como aanffise dos rituais ou ™munidades sociais minância. Entre esses dois tempos, as violências sao rupturas que,
formas de vida. Os nJZZZZZlZT"" ° fato, consolidam possíveis regulações.
social, meios para os membros da comunidad "rtegração Aviolência e a desordem tem sua fUnção - eessa hipótese
eencontrarem certo conforto em seTs A ^^^la permanece, sem dúvida alguma, fecunda hoje, mais 1"'^ ' '
afirma apresença de um "todo simból' de certa forma sacralizadas; opesquisador. Jl ^^re
laços tecidos pela comunidade de Tu^Z° í^^™°nizaria os tação bastante monoHtica, corre orisco de trabalhar J
rnolencia, nesse contexto, encontra muÍ A
uma "ordem das coisas" que provoZ oZb'" elementos que lhe permitem ligar 71 1
CUJOS gestos não destroem oconjunto 7 ~ - mas ordem, numa perspectiva simbóhca. Passa então a
contrario. Oesquema &equenteZme H'7° P^o todas as indicaçles que se afastam desse
de uma comunidade social ameaça ae trabalhado
historiadores
em éoseguinte-quando
sua reaHzação easimbólica coletiva coZ''"^' P""" sociólogos e social ressoldado. Há aí um tipo de „,ais que ohis-
pelas decisões que são tomadas aseu rsi " ° emaneira sistemática, revela-se exacer a o, g^trema: conhece
decidida tem de fato por meta refund^Z;' ^'olência toriador, em todo caso, se beneficia de uma ^ das coisas
aameaça, distanciando-a esoHdificando '^"'^^udo o fim da história. Fazendo isso, pode ^e
se desagregar. Trata-se aí de uma vi^ °i 7 ^ttanjando-a a seu resultado, exercen o
profetismo às avessas que não faz sentido.
^ démarche, se
i-^q tem algo de
lolencia considerada como uma forma de positiva da está demasiado estreitamente Ugada ao fon^ion ^
como exemplo as primeiras Hnhas da com Ceemos aqui
afFesoli ede Alam Pessm, Z. Violen.ZZfl^Zysy' Perigosamente aplanadora. Não escrevia
fi l),uzirquestionando ohistoriador:
serenidade ofaz
tudo ao mais fraco denominador.^ ^''deve sabersurpreender
n^ctardiae avilania"?
violêsena
que ncia preciso
comolZlZivZZZwZr
reabsorver, eas s'ubsÍ „ ^ ^e^edos que diminuem [.. ] ^PmZvasamentos, desloca-
por uma anáUse em
Com efeito, nesse quadro, desv > Mizer (ou como
"temos não são levados em conta: oque se deve dize 1
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Lugares para a história DavkxÊnoa

analisar), por exemplo, dos momentos em que aprópria violência supostos chefes) saíam da sombra eeram estudados em suas inten
parece lacerar osimbóUco efazer de tal modo que aordem que se ções e práticas.
guirá seja forçosamente estraçalhada por essa experiência traumática?
Como interpretar aviolência quando esta se aparenta àbarbárie e
A leitura dos Difos e escritos
nenhuma justificação aposteriori permite recolocá-la num sistema
coerente? Permanece impensável enefasto deixá-la justamente no Nos quatro volumes dos Ditos cescritos, não há nenhuma
doimmo do mpensavel, do caos eda barbáne, que são nae.os de interpretação sistemática da violência, nenhum modelo go a
proposto, e isso é bom. Em compensação, ao fio das paginas e
das questões colocadas aMichel Foucault, aviolência se en
freqüentemente nomeada e por vezes refletida. Ea parti
material disperso que nos perguntamos se não jaziam g
elementos próprios para reinterrogar aviolência, para pensar
representava um custo social m^olrerm do passado assim como aquela que nos invade hoje. em esqu
que não éde modo algum uma questão de lançar as ^
conjunto das interpretações passadas, mas que se trata
se certas ferramentas que Michel Foucault nos da po e
Os atores sociais dotón^T cenll quÍf"' certa forma de reflexão. ..
distância das explicações Dsi^nlr^ • ^justo título, tomar Em sua Q.dxa da paz, de 1517, fedesse
instrumentos cegos da violência m"'"' multidões anatureza ensinou apaz eaconcor la » brigam ese
-das pela selvagena ou pelo^nm T -"^u- ^^tado natural, não se pode crer que ' os homens que bnga
populares, as violências coletivas eas sobre as emoções combatem são dotados da razão humana -
os atores sociais eseguir seus gestos --^^ncontrar Michel Foucault (1994Í, p. 145) sustenta, é
ações. Os levantes são então divisíwis em P'='"'="'^os esuas ^"tcada, uma afirmação filosófica totalmente op^
tenta reconstituir: no interior de cada cen ° '-^toriador
lógicas práticas que determinaram edepoK''"'"''"' ° ordem, sem encadeaniento, sem fonna, (poucAULT,
esuas manifestações. As práticas que rerem^®'"'"^'" hannonia". "O mundo í coordenadas
analisadas em lógicas; olevante éfâto d 4c, p. 546) Vivemos sem pontos de re er assim, na ori-
ediferenciados que são adaptados aos lugarereT°"""'"'°^ ^frginárias, em miríades de acontecimentos p ^liberdade.
por vezes, improvisam um sentido que^emiin haveria aordem, nem arazão, ne ^jgfmitivo sobre o
gestos eoutras ações. Assim, pôde-se traLl! ' postulados, longe de trazerem um nevo sobre
de Edward PalmerThompson (e de sua etnom' ^^tninho do historiador, permitem construir
^^que Foucault chama adiscórdia. Colocan
cora-
lugares da
[Thompson, 1971, p. 76-136]), sobre cer^s f
ciai epolíticadas revoltas, levantes ou revoluçõeT '"S^^^ade so- da existência social, considerando os co baixeza eem
^'^^drdia edo disparate, definindo ocomeço ^
=on,po„.n.„„. P«.icul.„, , ^ derrisório, o homem é então o ajeito fl dominem
(e nao somente os outrorif"'""'^Tdiferendaçâo
homens, e é assim que nasce dos valores;
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Lugares para a história
Da vkxínoa

que classes dominem outras classes, e é assim que nasce a idéia de


liberdade" (Foucault, 19941, p. 145). escreve ainda Foucault, "com suas intensidades, seus furores secretos,
suas grandes agitações febris assim como suas síncopes, é o corpo
Ailusão do progresso ede um processo de apaziguamento é mesmo do devir" (1994i, p. 147).
amquilada, mas acapacidade do sujeito permanece intacta, numa
sene de descontinuidades empturas que fazem sua história: "a his- A partir dessas constatações, o historiador adota uma postura
tona sera efetiva na medida em que introduzir odescontínuo em específica: pela introdução do conhecimento indica os meios para
nosso propno ser" (1994Í, p. 145). Pois, em suma, "a humanidad" aluta, para o combate. Se traz àluz, pelo conhecimento, as regras
nao prognde lentamente de combate em combate até uma reci constituem os fenômenos de dominação ede violência, om
procidade umversal em que aguerra será substituída para sempre ce os meios de refletir sobre essas regras, eos homens do pr
podem analisar melhor aquüo pelo que passam ou as violências que
gras evai assim de dominação em dominação" (1994Í „ 145i os regem. Assim, o devir da humanidade pode ser olhado coni
uma série de emergências em que se reinterpretam as regras ^
l^ncia, o que necessariamente as transforma. Apartir
^ regras precedentes por outras regras Cabe'" conhecimento, os fenômenos de racionalida e a ^
de então, demarcar os sistemas de violência quTr''"'"'' ' "ào apenas tomados visíveis mas outras formas de racion
autorizadas a colocá-los em jogo. „ „.
Aliás, nesse domínio particular de racionalida pipon,
M.chel Foucault é precso. Numa
Pouc^:r^tÍl^ío
um outro olhar sobre aquela que éanoss""'^^^ P-violência,
M-chel ^«^1980 (Foucault, 1994b, p. 38 Csc,.),
aviolência éum fenômeno que se rol P° subUnhar que Revieu\ declara que "entre vio en ^joiência é
toda humanidade, todo pressuposto Ek'é há incompatibilidade" e que "o mais peng
einverte os esquemas mais fiincionahstas Oh stamente sua racionalidade". Responden o ^ ^
demarca sua emergência em momentos ou àqueixa erasmiaiia, acrescenta: Meu pro j^cionahdade
que, em seguida, vão instituí-la de novr '°"''"«^M°^-chave P'"ocesso da razão, mas determinar anatureza e ^razão". O
novas estruturas (pode-se então eterrou" ê tão compatível com aviolência. Não c ~ j^grazão dos
^9Uema éclaro: acoisa não émais : j^ias analisar a
conseqüência, aluta permite eventualmente " ^niens no momento em que se exerce a ^ de trans-
mente aviolência, ao criar condições Z '""mentanea-
ções do social sejam organizadas edepZ e^dú T ^^türeza da racionalidade que produz essa vio e
desfeitas. Estamos, éclaro, bem longe da Z ' eventualmente seu curso. voltemos para as
calmo qne se dirige progressivamente para oh, Cr. combato arazão" permite que u ^^violência.éuma
Eles
encontramo-nos em lugares factuais onde 5-^'^^^Çòes eos dispositivos que autorizara
de lutar contra aviolência, pois como esc t P°'^'bilidades in ,^^^^^ntes a cada momento histórico e, diversas formas,
»7). "«(.«i, p. ^ariante, eles de modo algum osão. específicos acada
nascem a partir de de racionalidade
outros modelos, fazer eme"^Tutro^mf^ • ssim, a violência - ou ao menos as o e única a
^ mecanismos. "A história", cad ^
comento~pode ser questionada de mane ^ontecimento
da histól, no momento de cada
Lugares para a história

violento. Ela não émais (ou épouco) considerada apostcriori como lei que toma emprestada a raiva como modo de flincionamento
uma forma que dá nascimento atal ou tal fenômeno de consolidação Assim definido, o suplício não se toma evitável? Oencarniçamento
do social; ela esta isolada amontante através do conjunto de seus dos atores sociais em lutar, em estabelecer novas falas epraticas, não
mecamsmos. portanto se toma um objeto que pode ser transfonnado se deve tanto a sua visão de um mundo que precisa se dirigir aum
por outras fonuas de racionalidade.
Bem supremo, mas a uma configuração precisa eprecedente de
Mas então "como são racionalizadas as relações do poder" onde surge um projeto novo capaz de barrar de uma nova maneira
(OUCAULT, 1994g p. 160) entre os homens numa sociedade (aque o desastre que sobrevém.
le por exemplo, de uma classe sobre outra, de uma nação sobre Aguerra: sobre esse assunto Michel Foucault se exprin ' ^
outra, de uma burocracia sobre uma popuhcàn 1,
as mulheres, dos adultos sobre as criaiiças)? Coln gamente em "Droit de mort et pouvoir sur Ia vie", quinto °
de Avontade de saber (1976), edepois nos seus cu^os. eer
objeJ capítulo àluz do que foi dito antes esclarece singu annen e
Colocar essa questão é também em ^ p. 160). conflitos de hoje. Num rprimeiro momento, Mie eaueiras
o puae-
meio, enquanto historiador ecidadão de 7'""°'f ° ; ^ víV
interroga sobre a maneira como, no século X ,' d aual
uma violência que se instaura num lugar preciso ec"' se tomar tão sangrentas e se pergunta
a relaçao de poder tem rnmK' compreender que ^ocaminho paradoxal adotado pelas socieda ^p^^cAULT,
Hberdade quanto co^o m instituir tanto feito de tal sorte que "os massacres se toniaran < ^
3S próprias raízes da racionaliX^d"^ conhecendo erevelando p. 180) num período em que se é uma
fornecer os meios de canaHzar m eventualmente precauções com sua saúde, sua ^^niiinto das
de violência. "Se há reTa^Íde^pTdr' questão que se encontra em defnsagem em relaçao
sobre o acesso da humanidade à 3um só
deeporque há Hberdade
dominação por toda n
[...]" (FcuJ:; '°do campo social,
^ tudo isso, Michel Foucault responderá ' avesso,
^empo violenta, drástica, lógica, inesperada, contraditórias,
memri::~C:/:-:::--°-'.dade. Elas se expri-
muItipHcidade das falas singulares tanr'"'° discursos quanto na
^zendo ficar de
por baixo do discuno. Sua nomeação s ^cianto P^esde o fmi da Idade Clássica (peno soberano,
olhar sobre aviolência; ahistória se faz n'''''' "f"" fabricam outro uia ruptura se fomia; a uma sociedade so a ameaçado
os acontecimentos são singularidades irr d''!''°"'''=""^onto de que expõe seus súditos àmorte quando e^P^° contisco da vida,
qtie exerce seu poder como uma instância sociedade cuja
singulares. Uni egemplo cornado armnr, situações cofpo^ sangue de seus súditos, suce r^^to, amorte tendo
a proposição. Comentando o ritual do v ^ esclarece uão émais oconfisco. Com e epidemias
aquele da roda) epartindo dessa definir~^^^^^^° "^otadamente ^ecido um pouco (as sociedades con uova: aquela
aorVd,..- -É " «Id"."''''""J"""" astadoras e foines mortais), aparece um em conta
çao dos homens em termos de barbárie ede Q População. Um novo espaço nasce on e saúde de uma
Foucault (1975, p. 37) escreve: "Inexphcável talv^ ' processo da vida, as probabilidades de vicl ^ protegidas.
nao irregular nem selvagem"; não é"uma raiva C»e!d. ^ então, o poder não^conipoem eque' , sujeitos sobre os
está mais em geres vivos sobre
°domínio Ciltimo éamorte, mas em face de
Lugares para a história

os quais odoiiiínio exercido éavida. Passa-se, diz Foucault, agerir abominável" deixa de ser corroborada por interpretações sini
a vida, a espécie. E as guerras vão se realizar nesse novo contexto, licas em que osagrado se instaura apartir do fim da violenc
não mais em nome apenas do soberano, como sem dúvida se dava racionalidade não quer dizer progresso nem bem, einterroga a
no século XVII, mas em nome da existência de todos. Assim, cada instante permite compreender suas configurações eass p
populações se acharão paradoxalmente levantadas umas contra as destruí-las. Épreciso então compreender
outras em nome da necessidade que têm de viver. "O princípio, que fazem jorrar aviolência. Um espaço ascomplexo
fomias dese a re
poder matar para poder viver, que sustentava atática dos combates
se tomou pnncípio de estratégia entre Estados, mas a existência historiador, cujo procedimento éde revelar os mecanis
em questão naoe mais ada soberania, éaquela, biológica, de uma uais que conduzem áviolência, mostra ' «tes se
mecanismos existem, outros podem existir, contrários,
Lca"
raça X fo-T ' p. 180).
(Foucault, 1976, da espécie, da •bn„d. , Violêna., " » "
organizações de poder que se inscrevem em e uma vez que
do pSerTxT""' em que anatureza da racionalidade oada éfatal nem mesmo obrigatório em sua apa ' mesmo
tis ooL eSr ' " compatí- todo mecanismo é um jogo que se desmonta, epor
de morte sei c7 se abole, num outro jogo.
horurmlrto/ntr'
do poder não én ^
-q-nto onLero dos
elevado. Arazão de ser
costumes mas humamtano, uma suavização dos
.vld. .. pSÍ ""'«Pl-
sobre aespécie eaponular~"^°'^^ obsoleta, mas areflexão
ou mesmo incitar a^erra '^'^^dicionar aentrada em guerra
d^-r que onazismoTan^tu^^^^
nalidade do abominável éuma lei P^btica em que aracio-
Como não compreender anarHr
do Mal étributária da singularidade d ^
subordinado aos processos aup I ^ política? O mal está
opróprio tema que organiza esslfp"os° ° ^
Ao final dessa reflexão
sobre oque ésugerido sobre aviofêncl"^''"'^"'^ '^'=^'=' "^0
escritos, possamos tomar posição em r 1 ~ '^'^<=''lade nos Ditos e
mais não fosse para demarcar em cadll!!" ^
todo pressuposto linear de continuidade eT"'° de
ede destinação, os tipos de racionalidade ou °dgem
vers com aviolência. Em vez de ser considerJ
sequencia social, a violência pode ser mpio.
^pnndp. dp p„L. sr r»so, a~racionahdade
°Ir-- do

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