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consulToria de

Autismo
esPecialisTas

Tudo Sobre Autismo


Ano 2 - nº 2 - 2019
Possíveis causas • sinTomas • diagnósTico • níveis • TraTamenTos

PrinciPais
TalenTos
escondidos por
trás do espectro
que devem ser
estimulados

diagnósTico Tardio
Como enfrentar as
dificuldades do autismo
na vida Pessoal
e Profissional!

TeraPia dicas
para a
autista judar o

com animais
bem naa conviver
em casaescola,
os amig, com
os...

Os bichinhOs de estimaçãO são um poderoso


supOrte para o desenvOlvimentO cOgnitivO da criança!
editorial

sem
preconceito!
O isolamento social pode ser confundido facil-
mente com timidez. As manias que insistem em
se repetir no dia a dia tendem a ser vistas como a
personalidade da criança. A demora em andar e falar,
geralmente, recebe o nome de preguiça pelos adultos.
Apesar de esses sinais serem comuns na infância,
podem indicar muito mais do que apenas o jeito
de ser. Quando falamos em transtornos da mente,
é importante estar atento aos mínimos detalhes.
Não são raros os casos em que – por desinforma-
ção – as características do autismo são atribuídas
a comportamentos normais das crianças. Por isso,
é muito importante que as particularidades desses
distúrbios sejam compreendidas, principalmente
por pais e responsáveis, pois, como o transtorno
do espectro autista (TEA) se manifesta bem cedo,
avaliar a situação para procurar ajuda o mais rápido
possível é essencial para o bem-estar do pequeno.
Para sanar as dúvidas e garantir a inclusão do
autismo em uma sociedade mais justa, confira
foto GettyPremium.com

o que profissionais e familiares disseram sobre o


assunto. Além de esclarecerem algumas questões,
nossa equipe conversou com mães que puderam
relatar o dia a dia e transmitir toda a emoção de
conviver com o autismo. Você vai se surpreender!

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as dicas para ter mais qualidade de vida!
ÍNdiCe Toque na matéria desejada

6 ENTENDA MElHOR
Saiba qual é a definição do transtorno
do espectro autista

8 COMO SE MANIFESTA
Existem diferentes graus de autismo e os
sintomas se diferem entre eles

14 ASPERGER
Sabia que ele também é
uma condição inserida no
transtorno do espectro
autista (TEA)?

16 NA ESCOlA
São necessários
cuidados especiais para
a criança se desenvolver

18 COMPANHEIROS
Animais de estimação

10
podem auxiliar no
PROCURANDO tratamento. Veja como!
AJUDA
Entenda como é
feito o diagnóstico
e as formas de
tratamento

12 AVANÇO NAS PESQUISAS


Conheça as descobertas da ciência sobre
20 VIDA ADUlTA
É possível viver
normalmente
as causas do distúrbio e desenvolver
habilidades sociais
22 ACIMA DA MÉDIA
Como estimular os
talentos do autista e 30 MãO AMIGA
Associações, ONGs e institutos: qual o papel
melhorar suas aptidões de cada frente quando o assunto é ajudar

24 SENTIDOS
Em muitos casos,
é comum que a
sensibilidade a
estímulos seja maior

26 APOIO
ESSENCIAl
Algumas dicas para
ajudar os responsáveis
a conviverem com

32
o transtorno lado a lado
O autismo, muitas vezes, não caminha sozinho.
Veja outros obstáculos a serem superados

34
A ARTE QUE
IMITA A VIDA
Filmes e livros
que tratam
o tema com
sensibilidade

28 VIDA REAl
Conheça histórias
emocionantes de mães de
crianças autistas
ApresentAção

conheça
o autismo
segundo a organização Mundial
da saúde, cerca de 70 milhões
de pessoas convivem com o
transtorno do espectro autista
TexTo Michele custódio/colaboradora
Design Nícolas Messias/colaborador

M
uitas vezes retratado nas
novelas e nos filmes como
uma pessoa quieta e com
certos talentos para lidar
com números, o indivíduo com autismo
possui outras características que nem
sempre são lembradas: dificuldade de
socialização e de comunicação; e disfun-
ções sensoriais e motoras (confira outros
sintomas na página 8). Além disso, certos
grupos são mais propícios a apresentar o
distúrbio e existem possíveis causas para
o seu desenvolvimento. Acompanhe!

o que é?
“O autismo foi descrito pelo médico
e pesquisador austríaco, Leo Kanner,
em 1943, como um transtorno de de-
senvolvimento grave que prejudica a
capacidade de se comunicar e de inte-
ragir”, relata a psicóloga Andrea Rosa.
Vamos de azul?
Segundo o Manual Diagnósico e Esta-
Você sabia que, no dia 2 de abril, é comemorado o dia mundial
tístico de Transtornos Mentais (DSM-5),
do autismo? sim! a data foi instaurada pela organização das
o transtorno do espectro autista é tido Nações unidas (oNu) em 2007 e tem como intenção conscien-
como uma irregularidade no processo tizar as pessoas sobre o transtorno e a necessidade da inclusão
de neurodesenvolvimento. Ou seja, o social. anualmente, pontos turísticos e históricos de diversas
indivíduo possui algumas funções afeta- cidades ao redor do mundo acendem luzes azuis para relembrar
das, como é o caso da comunicação, do a importância da data. Mas por que azul? a cor foi escolhida
comportamento e da interação social. justamente por ser uma síndrome mais comum em meninos.
Quais grupos mais afetados?
Andrea reforça que a incidência da síndro-
me é aleatória – independente da raça, da cor
ou do credo –, mas a maioria das pesquisas um pouco
mostra que há uma forte tendência genética. de história
O que altera são as características de cada o psiquiatra suíço,
caso, dos mais leves aos mais complexos. Plouller, utilizou
“Alguns autistas fizeram o Exame Nacional do o termo autismo
Ensino Médio (Enem) normalmente, outros pela primeira vez
farão cursos técnicos ou outras profissões em 1906, descre-
ligadas às suas habilidades, e outros, mais vendo o isola-
severos, serão vistos caso a caso”, exemplifica mento frequente
a profissional. “De acordo com o Centro de em alguns de seus
Controle de Doenças dos Estados Unidos, pacientes. Mas
foi somente na
a cada 59 nascimentos, um indivíduo terá
década de 1940
autismo. É considerado quatro vezes mais que o transtorno
comum nos meninos do que nas meninas”, recebeu maior
conta a psicóloga Luz María Romero. atenção, quando
o médico aus-
existe uma causa? tríaco leo Kan-
Algumas teorias, erroneamente, associam ner teve contato
o desenvolvimento da síndrome ao uso de com donald t.,
vacinas. Porém, essa ideia já foi descartada um garoto com
por diversos estudos. “O autismo, de uma um problema que
seria batizado,
forma geral, ainda não tem causa comprovada
posteriormente,
e pode ser decorrente de uma combinação como autismo. o
de fatores que vão desde questões ambien- psiquiatra austría-
tais (alimentação, uso de medicamentos e co hans asperger
hábitos de vida) à predisposição genética identificou uma
de um indivíduo. Apesar de haver alguns condição muito
tratamentos para os sintomas do transtorno, semelhante, que
não há cura para a condição”, pontua Roberto ficou conhecida
Hirochi Herai, doutor em Genética e Biologia como síndrome
Molecular. de asperger.

“É importante colocar que os sintomas, geralmente,


manifestam-se na primeira infância, já que as demandas
sociais começam a surgir e essas dificuldades se tornam
mais claras”, Marina Ramos Antonio, psicóloga

ConsultoriA Andrea rosa, Luz María romero e Marina ramos Antonio, psicólogas; roberto Hirochi Herai, doutor em genética e biologia Molecular, e diretor do Conselho Científico do
instituto Lico Kaesemodel - Projeto eu Digo x Foto gettyPremium.com

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características

universo
paralelo
Dentre os sintomas do autismo,
o isolamento social é um dos
mais lembrados. Contudo, o
problema não é definido apenas
por isso. Conheça os sinais mais
recorrentes que podem ajudar a
detectá-lo precocemente
TexTo Michele custódio/colaboradora
Design Nícolas Messias/colaborador

N
ão existe uma causa de- A boa notícia é que os pesquisa- ideia é simples: observar a forma como
finida para o autismo, dores não desistem de entender mais o bebê olha para objetos, a maneira
tampouco é possível de- sobre a origem do transtorno e tudo com que ele demonstra querer algo
terminar de que forma o que está a sua volta, sendo que, hoje, e as reações ao ser indicada alguma
paciente reagirá a ele ao longo dos já é possível identificar uma série de direção. Com isso, foi constatado que
anos, já que isso varia muito de pessoa sinais que pode indicar a ocorrência falhas gestuais nos primeiros meses
para pessoa. Portanto, não é exagero do autismo, ajudando no diagnóstico de vida podem ser um forte indício
dizer que o diagnóstico do transtorno precoce e na eficácia do tratamento. de autismo, ou seja, o segredo para
é uma viagem ao desconhecido. “Há Para se ter uma ideia, os especialistas notar o distúrbio está na capacidade
18 anos, quando surgiu a primeira afirmam que os próprios pais são capa- de analisar a comunicação não verbal
associação para o autismo no país, ele zes de perceber os primeiros sintomas dos pequenos. “O autismo se carac-
era conhecido por um grupo muito do distúrbio a partir dos oito meses de teriza por um comprometimento em
pequeno de pessoas, entre elas pou- idade dos filhos e, assim, conseguem várias áreas do desenvolvimento, tais
cos médicos, alguns profissionais da buscar ajuda especializada mais cedo. como a interação social recíproca, o
área de saúde e pais que haviam sido relacionamento com pessoas, a au-
surpreendidos com o diagnóstico de o que diz a ciência? sência de interesse e prazer com os
seus filhos. O autismo é um distúrbio Com o objetivo de compreender outros, uma percepção comprome-
do desenvolvimento humano que vem melhor as características do autismo, tida da sua existência e a empatia”,
sendo estudado pela ciência há quase um grupo de pesquisadores america- acrescenta Luana. Pensando nisso,
60 anos, mas que ainda existem mui- nos, sob a supervisão do professor de confira outros sinais que podem ser
tas divergências e grandes questões psicologia Daniel Messinger, desenvol- indicativos do problema:
para responder”, explica a psicóloga veu uma técnica para detectar o trans- Falta de contato visual: esse sinto-
Luana Zanelli. torno em crianças bem pequenas. A ma pode ser percebido mais facilmen-
de alimentos – dificultando, inclusive, a transição do leite
para ingredientes sólidos, por exemplo.
surdez aparente: muitas vezes, os pequenos que
apresentam o problema não respondem a chamados. Em
outros casos, podem ter pouca vontade de falar, passan-
do boa parte do tempo sozinhos em silêncio, como se
vivessem em um mundo particular.
dificuldade em “quebrar” a rotina: quando já são
um pouco mais velhos e conseguem reconhecer as ati-
vidades que devem fazer no dia a dia, é comum que não
lidem bem com mudanças. Dessa forma, têm necessidade
de realizarem as coisas sempre do mesmo modo, sem
alterar horários,

Nem sempre é igual


Apesar de existirem esses “truques” para analisar o
comportamento da criança e, assim, suspeitar do autismo,
nem sempre isso é viável, justamente porque o distúrbio
pode se apresentar de formas distintas. Inclusive, o trans-
torno do espectro autista (TEA) foi subdividido em três
níveis, levando em consideração sua gravidade e de que
forma afeta a vida dos pacientes. No Brasil, dois manuais
te pelas mães, principalmente durante a amamentação. de diagnóstico têm sido adotados: o Manual Diagnóstico
Assim, é possível que um bebê com autismo não olhe e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM) e a Classifi-
para a figura materna enquanto está sendo alimentado, cação Internacional de Doenças (CID). Veja o que cada
apresentando um olhar perdido. “Geralmente, essas crian- nível estabelece, envolvendo a especificação de problemas
ças não procuram o contato ocular ou o mantém por de deficiência intelectual e linguagem.
um período de tempo muito curto”, afirma a profissional. Nível 1: leve (necessita de pouco suporte)
choro persistente: se a criança fica inquieta cons- A pessoa pode ter certa dificuldade para se comunicar,
tantemente e costuma chorar de forma ininterrupta, mas não limita suas interações sociais. Entretanto, às
pode ser um sinal de alerta. Mas o contrário também é vezes, problemas de organização e planejamento impe-
preocupante, isto é, uma apatia exagerada merece cautela. dem a independência completa. Nesse caso, geralmente,
“Normalmente, o que chama a atenção dos pais é que a consegue estudar, trabalhar e formar uma família.
criança é muitíssimo calma e sonolenta ou, então, que Nível 2: moderado (necessita de suporte)
chora bastante durante períodos prolongados”, completa O paciente apresenta problemas para se comunicar,
a psicóloga. não olha nos olhos dos outros e repete certos compor-
aceitar o colo de qualquer pessoa: esse sintoma tamentos. Assim, a sociabilidade acaba comprometida.
pode ser mais difícil de perceber, até porque se confunde Nível 3: severo (necessita de maior suporte/apoio)
com a personalidade da criança. Contudo, vale destacar É considerado o mais grave, sendo que o indivíduo mal
que, normalmente, os pequenos que têm por volta dos interage com outras pessoas. Normalmente, apresenta
oito meses de idade estranham o colo de pessoas desco- deficiência intelectual e precisa de tratamento para o
nhecidas, enquanto bebês com autismo são indiferentes resto da vida, ou seja, torna-se totalmente dependente
a isso, sentindo-se confortáveis com qualquer um. de terceiros.
resistência ao toque: às vezes, é possível que as
crianças com o transtorno se sintam desconfortáveis ao Agressividade, ansiedade e movimentos
serem tocadas (abraçadas, beijadas...). Além disso, notam-se repetitivos de tronco, mãos e cabeça
incômodos com determinados sons e com certas texturas também são sinais de autismo
consultoria Daniel messinger, professor de psicologia; Luana Zanelli, psicóloga Foto gettyPremium.com

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Diagnóstico e tratamento

Primeiros Passos
A busca por profissionais é essencial tanto para
determinar a existência do quadro quanto
para amenizar os sintomas do transtorno
TexTo IurI SantoS/Colaborador Design rodrIgo da graça

É
comum que, devido uma série de
fatores, como a desinformação e a
fase da vida em que se manifestam
os primeiros sintomas do autismo,
haja uma rejeição por parte dos pais em
buscar diagnóstico. As características po-
dem ser confundidas com reações normais
das crianças às situações do cotidiano ou,
até mesmo, traços de suas personalidades.
Entretanto, é importante estar atento aos sinais ma sejam reduzidos, buscar um tratamento
e sempre manter os responsáveis pela saúde do com uma equipe multidisciplinar. Apesar de
pequeno atualizados. A demora em buscar um o autismo não ter cura, a intervenção de
diagnóstico para o autista pode fazer com que psicólogos e psiquiatras é muito importante.
o tratamento também seja lento, prejudicando Confira, a seguir, como esses profissionais
sua eficácia. “É importante enfatizar que os atuam nesse processo.
sintomas do autismo, geralmente, manifestam-
-se na primeira infância (até os cinco anos de Psicólogo: ele é responsável por identifi-
idade), quando as demandas sociais começam car qual é a técnica mais efetiva para o caso
a surgir e o atraso no desenvolvimento se torna em questão, individualizando a abordagem
mais aparente. Porém, para os especialistas, já com o paciente. “Atualmente, as pesquisas
é possível avaliar os sintomas em bebês com indicam que o tratamento mais indicado
até 18 meses”, explica Marina Ramos Antônio, para o autismo é a Intervenção em Análise
psicóloga e analista do comportamento. A do Comportamento Aplicada (ABA). Para tal,
seguir, entenda melhor quais são as principais é necessária a especialidade na área em que
características do diagnóstico e do tratamento. a formação de base pode ser a Psicologia”,
elucida Marina. Segundo a psicóloga, deve ser
diagnóstico elaborada uma intervenção individualizada
“Ele é clínico, ou seja, deve ser feito por e intensiva, preparada de acordo com cada
meio de observação direta do comportamen- paciente, sendo que procedimentos precisos
to, por profissionais especializados, que sejam com registros mensuráveis devem ser usados
capazes de observar o indivíduo em diversos para comprovar a evolução do tratamento.
contextos”, aponta Marina. Esses comporta-
mentos, segundo o Manual de Diagnóstico e Psiquiatra: é o médico com especialização
Estatístico de Transtornos Mentais (DSM-S), nas manifestações de problemas da mente.
podem ser: movimentos motores, uso de O psiquiatra Leandro Maranhão explica que
objetos ou fala estereotipados ou repetitivos; o tratamento do autismo por esse profis-
insistência em um mesmo tema, adesão sional busca cuidar das doenças que estão
inflexível a rotinas ou padrões ritualizados relacionadas ao autismo. “O tratamento de
de comportamento verbal ou não verbal; cada transtorno comorbido ao autismo segue
interesses fixos e altamente restritos que são as mesmas diretrizes dos demais pacientes
anormais em intensidade ou foco; e hiper não autistas, com identificação dos sintomas
ou hiporreatividade a estímulos sensoriais alvo, estabelecimento dos níveis de gravidade
ou interesse incomum por aspectos senso- dos sintomas, urgência de remissão total de
riais do ambiente. Pelo menos duas dessas determinado sinal e uso de medicamentos
reações devem ser observadas para sequer mais específicos e melhor tolerados para
um diagnóstico. Além dos aspectos de com- cada caso”, finaliza.
portamento, outra característica essencial
para identificar o autismo é observar se há
prejuízo na comunicação social, manifestado Profissionais e exames
pela dificuldade de exprimir e compreender Segundo Marina, uma equipe multidisciplinar costuma ser mais indicada
sentimentos, além da falta de habilidade de para avaliar o indivíduo, porém o especialista responsável por fechar
estabelecer comunicação verbal e não verbal, o diagnóstico deve ser o psiquiatra infantil ou o neuropediatra, ambos
por exemplo. com experiência no transtorno. “os exames pedidos pelo médico
geralmente são realizados com o intuito de excluir outras possibilidades.
tratamento ainda não existe nenhum exame específico para detectar o transtorno
e definir o diagnóstico”, acrescenta a profissional.
É essencial, para que os efeitos do proble-

Consultoria Leandro Maranhão, psiquiatra; Marina Ramos Antônio, psicóloga e analista do comportamento Foto GettyPremium.com

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causas e cura

Buscando
razões
A ciência se esforça para descobrir
as causas e, assim, encontrar a cura
para o transtorno
TexTo IurI SantoS/Colaborador
Design adrIana oShIro

V
ocê já deve ter ouvido ou lido,
algumas vezes, coisas como
“cientistas encontram possível
causa para tal doença”, “nova
descoberta pode curar determinado trans-
torno” ou “médicos identificam vírus rela-
cionado a certa enfermidade”. Apesar disso,
parece nunca haver um estudo conclusivo
sobre a causa e a cura de algumas condições.
A justificativa disso está, justamente, na
necessidade de seguir uma série de proce-
dimentos científicos para que se chegue a
uma comprovação final. E esse é o caso do
autismo. Mesmo que já existam indícios de
quais fatores podem levar ao surgimento
do transtorno, não é possível “bater o mar-
telo” em uma teoria. “De acordo com as
pesquisas, já é possível afirmar que existem
componentes genéticos – alterações em 800
genes já foram descobertas – e hereditários
que potencializam a chance do surgimen-
to, aliados a fatores ambientais”, explica a
neuropsicóloga Nazareth Ribeiro.
Qual será o motivo? Psychiatry, aponta que o autismo pode acon-
Segundo as pesquisas mais recentes, a tecer devido a um problema nos astrócitos,
hereditariedade representa 50% das causas células presentes entre os neurônios, respon-
do desenvolvimento do autismo. Enquanto sáveis pela sua sustentação e nutrição. Além
isso, entende-se que o restante deve estar disso, essas estruturas são essenciais para a
relacionado a fatores ambientais. Segundo formação dos neurônios.
Nazareth, as condições exógenas, como o
ambiente de criação, complicações durante Existe cura?
a gravidez e infecções causadas por vírus, Até o momento, a única forma de tratar
também podem aumentar a possibilidade. o autismo é reduzindo os efeitos causados
Contudo, essas são apenas condições para a pelo transtorno. Sendo assim, ainda não há
manifestação do problema que, na verdade, uma cura para ele. Apesar disso, pesquisas
não explicam como ele acontece. Estudos indicam caminhos possíveis para combatê-
apontam que o surgimento do autismo -lo: o projeto Fada do Dente, da Universida-
ocorre quando uma anomalia – de de de São Paulo (USP), por exemplo, utiliza
provável causa genética – atinge as células dos dentes de leite de crianças para
sinapses (região entre os neurônios, estudar o comportamento dos neurônios de
por onde se passam os impulsos pessoas autistas. Isso é possível porque essas
nervosos). O estudo da neurologista amostras são formadas por células-tronco
Huda Zoghbi do Baylor College, nos e, assim, capazes de serem transformadas
Estados Unidos, insinua que uma em qualquer outra parte do corpo. A partir
alteração no funcionamento de desse mecanismo é possível fazer testes de
proteínas chamadas neuroligi- forma segura. Pesquisas feitas por meio desse
nas e neurexinas (responsáveis método já conseguiram, também, identificar
pelo funcionamento correto das que os astrócitos são responsáveis por liberar
sinapses) seria responsável por a molécula inflamatória chamada interleucina
causar o autismo. Quando es- 6 (IL-6), que pode estar relacionada com o
sas duas estruturas estão afetadas, autismo. Com base nesses indícios os pes-
comprometem os sinais inibitórios e quisadores foram capazes de, por exemplo,
os excitatórios das sinapses; esse efeito fazer testes in vitro utilizando anticorpos
refletiria nas capacidades de comporta- que agem contra a ação da IL-6, reduzindo
mento e linguagem. Além disso, um estudo o seu efeito nas células do cérebro.
mais recente, publicado na revista Biological

fatores de risco
nazareth afirma que alguns aspectos podem influenciar na
probabilidade do surgimento do transtorno. Confira:
• Sexo (meninos são de quatro a cinco vezes mais propensos
a desenvolver autismo do que meninas);
• histórico familiar (famílias com algum integrante com autismo
têm mais chances de ter outro familiar portador);
• algumas crianças com problemas de saúde específicos ten-
dem a ter mais risco de desenvolver autismo do que outras.
Epilepsia e esclerose tuberosa estão entre eles;
• Idade dos pais (quanto mais avançada a idade dos pais, mais
chances de a criança desenvolver autismo).

consultoria nazareth Ribeiro, neuropsicóloga foto gettyPremium.com

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asperger

SuperdotadoS
Atualmente, a síndrome de Asperger também faz
parte do transtorno do espectro autista (TeA)
TexTo Michele custódio/colaboradora Design adriana oshiro

d
escoberta no ano de 1944, pelo pe-
diatra austríaco Hans Asperger, a
síndrome de Asperger foi chamada
de “psicopatia autista”. Com vários
sinais parecidos com o autismo, o transtorno
foi diagnosticado como um distúrbio à parte.
Porém, desde a quinta edição do Manual Diag-
nóstico e Estatístico de Transtornos Mentais
(DSM-5, na sigla em inglês), o Asperger foi
incluído como uma das formas do transtorno
do espectro autista (TEA). Ou seja, as duas
condições que eram tratadas de formas dis-
tintas começaram a ser vistas como parte
de uma mesma falha no desenvolvimento,
diferenciadas apenas pelo grau de prejuízo
causado à pessoa. “Muitos indivíduos que
eram diagnosticados com Asperger, agora,
receberiam um resultado de TEA, sem compro-
metimento linguístico ou intelectual”, explica
Décio Natrielli Filho, médico do Centro de
Estudos e Pesquisas Dr. João Amorim (CEJAM).

acima da média
“Aspergers são crianças inteligentes, com
capacidade cognitiva acima da média e al-
tas habilidades, que apresentam desafios
em relação a alguns comportamentos e na
socialização”, conceitua a fonoaudióloga Pa-
trícia Cristina Andrade Pereira. A síndrome
é caracterizada por problemas em relações
sociais, mas não há atraso significativo na
linguagem falada ou receptiva do paciente.
como identificar?
Segundo a psicanalista Marcia Melega, o transtorno apresenta se necessário, farmacológicas, que podem
características que incluem indicações de existência de comprome- auxiliar os pacientes a se desenvolverem
timento social, como anormalidades nos gestos para comunicação conforme as metas e necessidades pessoais”,
não verbal, fracasso em desenvolver relacionamentos com seus conta Décio. Os caminhos para que o indi-
pares, falta de reciprocidade em expressar prazer pela felicidade víduo possa levar uma vida normal incluem
de outras pessoas, não saber corresponder a estímulos emocionais encorajar os comportamentos a seguir:
ou sociais e apresentar pouco ou nenhum interesse por padrões de • Melhorar a comunicação social
comportamento. • Estimular o relacionamento com fami-
Os pacientes precisam de ajuda para compreender as mensagens liares, no ambiente escolar e sociais
implícitas da língua portuguesa, como lidar com piadas, ironias, • Incentivar o desenvolvimento de uma
sarcasmos, metáforas e outras figuras de linguagem presentes no vida independente e, se possível, acadêmi-
nosso cotidiano. “TEAs com altas habilidades, muitas vezes, preci- ca (indivíduos com transtorno de Asperger
sam de terapias que envolvem estudos avançados, como a leitura costumam apresentar ótimo rendimento
de livros com temas indicados para crianças mais velhas. É preciso acadêmico, incluindo formação universitária).
acompanhar os temas de interesse do indivíduo para que ele não
se sinta desmotivado, sobretudo, quando apresenta repertórios
restritos, ou seja, é excelente em uma área ou temas específicos”,
pontua Patrícia.

Mistério da ciência
Ainda não se sabe ao certo quais seriam as causas do TEA.
Sabe-se, atualmente, que se trata de um grupo de pacientes com
sintomas característicos, mas que podem corresponder a diversas
síndromes neuroevolutivas. Além disso, também influenciam
fatores de interação gene-ambiente, desenvolvimento
dos neurônios, elementos imunológicos e pré-natais.

estabelecendo metas
“Não existe um tratamento específico
para o Transtorno de Asperger. Encon-
tramos uma variedade de abor-
dagens psicossociais e,

“Todo Asperger
é autista, mas
nem todo autista
é Asperger”,
Patrícia Cristina
Andrade Pereira,
fonoaudióloga

Consultoria Décio natrielli Filho, médico do Centro de estudos e Pesquisas Dr.João Amorim (CeJAm); marcia melega, psicanalista; Patrícia Cristina Andrade Pereira, fonoaudióloga
foto gettyPremium.com

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Interação

Na escola
Depois da família, o primeiro ambiente de interação
do autista e, por isso, é tão importante
TexTo IurI SantoS e VIctórIa rangel/colaboradoreS Design rodrIgo da graça

n
a maioria dos casos, os sinais iniciais criança em se comunicar através do contato
do transtorno começam a ser ma- visual, expressando-se vocalmente, buscando
nifestados logo nos primeiros anos o outro para estar junto, interagir e comparti-
de vida do indivíduo. No começo, é lhar”, aponta a psicóloga Tatiana Serra. Dessa
natural que uma das primeiras preocupações característica, podem surgir questionamentos
dos pais seja a forma com a qual essa criança sobre como essa criança irá se comportar
irá interagir com o mundo. “Um dos primeiros na escola e no convívio diário com outras,
sinais claramente observáveis é a ausência por isso é necessário estar atento e buscar a
de comunicação, referindo-me à intenção da opção mais estimulante durante a educação.
na escola machucar seus ouvidos. Para lidar com essas
Esse é o primeiro ambiente em que o autista necessidades, é dever da escola compreender
lidará frequentemente com outras pessoas como integrar o aluno a um ambiente que seja
que, em geral, ele não conhece. Por isso, é saudável, em que ele se sinta confortável para
necessário tratar com delicadeza e preocu- aprender, respeitando suas demandas. Esse
pação a escolha da escola e, acima de tudo, apoio deve vir em conjunto com os familiares
manter um canal de diálogo muito claro com ou responsáveis pela criança, a fim de discutir
os profissionais que venham a ter contato suas características e elaborar técnicas para o
com a criança - isso é importante para que desenvolvimento escolar. A instituição pode,
eles encontrem a melhor forma de integrá-la por exemplo, investir em materiais individuais
e ensiná-la. “Existem escolas especiais e a para os alunos autistas; os docentes precisam
indicação de qual frequentar depende de cada ter mais atenção na maneira como o conteúdo
caso. Às vezes, pode ser na escola especial que da matéria é transmitido ao aluno, de modo
os profissionais e os pais optem por ensinar que ele não se perca na explicação do profes-
a criança sobre o ambiente social e quais sor; e as avaliações precisam ser elaboradas
os comportamentos a serem emitidos nele”, de acordo com metas pessoais dele.
explica Tatiana.
Segundo a psicóloga, na maior parte das as amizades
vezes é normal que a criança frequente a escola É natural que, com a dificuldade de intera-
comum e, nesse caso, é essencial que sejam ção, o autista também apresente complicações
feitas adaptações, considerando as dificul- para construir laços de amizade; entretanto,
dades do aluno. O processo de socialização isso não é impossível. “Para todos nós, a ami-
é tão importante nas primeiras fases da vida zade é extremamente importante – e isso
justamente porque é possível que, desde cedo, inclui as pessoas com autismo. Amizade é um
o autista comece a se inserir em determina- porto de segurança e, para essas pessoas com
dos papéis a compreendê-los. Esse esforço, autismo, sentir-se seguro e compreendido é
entretanto, é mútuo já que, quando se fala essencial”, afirma Tatiana. A questão é que
em inclusão, pressupõe a responsabilidade da o autista, por não compreender parte dos
própria sociedade para integrar pessoas com aspectos do que é uma relação interpessoal,
necessidades particulares. “A etapa principal acaba não se aproximando tão facilmente.
dessa integração é colocá-los o quanto antes “Para que ele tenha relações de amizade, é
na escolinha, por volta dos dois a três anos preciso que sinta empatia, afinidade com a
e, a partir daí, começar a ensinar comporta- pessoa, que os laços de amizade sejam muito
mentos sociais, como interação, colaboração, fortes. Mesmo assim, quando uma outra pes-
partilha...”, recomenda a psicóloga. E isso tudo soa, com menor afinidade, entra em seu grupo
deve ser feito de maneira sistemática e fracio- de convívio, ele tende a se fechar”, exemplifica
nada, para que os critérios utilizados sejam a designer de atividades pedagógicas, Janaína
suficientes para mensurar o aprendizado do Spolidorio. Entretanto, isso não impede que a
aluno. criação de laços ocorra. Janaína aponta que,
com as amizades, o autista aprende melhor
o ambiente o funcionamento das relações entre pessoas.
Os autistas também são conhecidos por
terem hipersensibilidade a alguns estímulos “A criança autista trabalha bem com rotinas. Ela precisa
externos. Nesse caso, a roupa que o autista que a escola estabeleça sequências de ações, a fim de
veste pode incomodá-lo, o toque de alguém é que se sinta confiante para participar”, Janaína Spolido-
capaz de assustá-lo e até alguns sons podem rio, designer de atividades pedagógicas.

Consultoria Janaína Spolidorio, designer de atividades pedagógicas e pós-graduada em consciência fonológica e tecnologias aplicadas à educação; Tatiana Serra, psicóloga e diretora
do Núcleo Tatiana Serra - Intervenção e Formação Comportamental Foto GettyPremium.com

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terapia com animais

Faça um “aumigo”!
o contato entre o autista e o animal traz inúmeras
vantagens, e os cães são os preferidos para a
missão de estimular o paciente
TexTo Rebecca cRepaldi/colaboRadoRa Design adRiana oshiRo

c
omo pudemos ler nas páginas ante-
riores, o diagnóstico do transtorno do
espectro autista (TEA) é clínico, ou seja,
se faz por meio da observação direta
do comportamento do paciente por profissionais
especializados. Quanto mais precoce for a análise,
maiores as chances de amenizar as consequências
do distúrbio e alcançar melhores resultados com
os tratamentos, como a intervenção de psicólogos
e psiquiatras. E por falar em tratamentos, você
sabia que existem alternativas que ajudam e po-
tencializam as opções convencionais? Conheça
as terapias com animais!

Funciona mesmo!
Nunca se deve deixar os medicamentos e o
acompanhamento psicológico de lado, seja para o
autismo ou para qualquer doença. O ideal é somá-
-los a outras opções! “Para o transtorno bipolar,
por exemplo, terapias alternativas combinadas a
certos tratamentos podem ser indicadas e apre-
sentam grande eficácia, como a musicoterapia, a
arteterapia e até a terapia com animais, os chama-
dos cães terapeutas”, destaca a psicóloga Regina
Helena Scatena. Para os casos de pacientes com
TEA, elas trazem muitos benefícios, então, que
tal apostar nesses bichinhos? “Adotar um animal doméstico traz muita
alegria, desenvolve o afeto e o toque
clínicas (acariciar), ensina a cuidar, eleva o bom
Atualmente, existem lugares que já se espe- humor, distrai... Entretanto, a adoção precisa
cializaram nesse ramo, prestando atendimento
ser responsável e pensada antes. Afinal,
tanto nas áreas de psicologia, com a Terapia
animal não é bicho de pelúcia!”. Virgínia
Cognitivo-Comportamental (TCC) e a Análise
de Comportamento Aplicada (ABA), quanto Ferreira, psicanalista e professora da
em Intervenções Assistidas por Animais (IAA), Faculdade de Medicina de Petrópolis (RJ)
englobando pessoas com deficiências múltiplas
e transtornos emocionais.
cães de assistência
A International Assistance Dogs (ADI), instituição
A criança autista que regulamenta profissionais do mundo todo
obedece às instruções quando se trata desse tipo de terapia, dividiu os
do terapeuta 60% mais cães de assistência em alguns tipos, de acordo
quando os comandos
com a necessidade do paciente. Dentre eles, te-
envolvem interagir
mos os cães-guias, os cães-ouvintes e os cães de
com um cão
serviço. Esses últimos servem para os indivíduos
com diabetes, epilepsia e autismo. Os animais são
treinados para aprenderem comportamentos que auxi-
liem o autista em momentos de dificuldade, como durante
as condutas negativas, já que eles possuem habilidades
para bloquear fugas, dormir com a criança e auxiliá-la a
conciliar o sono, além de diminuir o isolamento e desen-
volver a afetividade e a socialização dos pequenos.

Benefícios que traz


Um estudo publicado por uma universidade norte-americana Pesquisas atuais que
afirmou que crianças autistas que convivem com animais res- utilizaram escaneamentos
podem melhor à terapia social. de acordo com a psicóloga cerebrais concluíram que é
sirlene Ferreira, os animais também podem ajudar nos casos possível, sim, prevenir e, até,
de ansiedade - uma das comorbidades do autismo. além disso, minimizar danos relacionados a
a Taa (Terapia assistida com animais) estimula outras carac- qualquer doença cerebral ou física
terísticas, como: com atividades para o cérebro,
• incentivo ao desenvolvimento psicomotor, à linguagem e à como é o caso da interação
comunicação não verbal; com animais de estimação
• elevação dos níveis de autoestima e competência social;
• Melhora do contato visual;
• aumento de condutas afetivas, como a expressão de sorrisos;
• diminuição de condutas negativas, como agressões verbais consultoria regina Helena scatena, psicóloga da Clínica megamed;
sirlene Ferreira, psicóloga; Virgínia Ferreira, psicanalista e professora da
e físicas a si mesmo, ao terapeuta e a objetos; Faculdade de medicina de Petrópolis/Faculdade arthur sá earp neto
• Redução do isolamento. (FmP/Fase), no rio de Janeiro foto gettyPremium.com

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vida adulta

é possível seGUIR
eM FReNTe
As pessoas com autismo não só podem
como devem ir para a faculdade,
trabalhar e encontrar um par romântico
TexTo Michele custódio/colaboradora
Design Nícolas Messias/colaborador

G
eralmente, o transtorno do espectro autista
(TEA) é diagnosticado ainda na infância. No
entanto, em alguns casos, ele é descoberto
apenas na fase adulta. Tudo depende do grau
apresentado pelo transtorno e do nível de funcionalidade
do indivíduo. Por exemplo, existem quadros em que são “Quanto mais leve o
poucas as defasagens intelectuais e o paciente manifes- grau de autismo e de
ta apenas dificuldades nas interações sociais. “O adulto sua funcionalidade,
autista pode apresentar deficiência em compreender mais fácil será manter
regras sociais, manter diálogos e entender piadas e me- um relacionamento
táforas, além de problemas em receber e dar afeto com amoroso”, Roberto
naturalidade. O indivíduo não compartilha seus senti- Hirochi Herai, doutor
mentos, não se envolve com interesses alheios, encara a em genética e
vida de forma objetiva, prefere falar de poucos assuntos biologia molecular
específicos e não percebe quando os outros não estão
mais interessados”, indica a psicóloga Luz María Romero.

Meio ambiente
A psicóloga Marina Ramos Antonio ressalta que,
para a pessoa autista que deseja cursar faculdade, é
importante ter um acompanhamento intensivo e longo
de terapia, pois várias questões precisam ser analisadas
e desenvolvidas para que o paciente se sinta confiante.
Por exemplo, as habilidades e o possível potencial es-
pecífico do indivíduo precisam ser ressaltados, bem
como dificuldades e déficits comportamentais que
podem acabar restringindo algumas opções, como
estudar uma área que exige muita interação social.

Mercado de trabalho
O mesmo pode ser aplicado quando a intenção
é começar a trabalhar : o autoconhecimento é
imprescindível. “Eles preferem trabalhar sozinhos
do que em equipe. Além disso, é necessária uma
preparação prévia para a realização de entrevistas de
emprego – preferencialmente, o entrevistador deve
conhecer a condição do entrevistado”, aconselha
Luz. Uma boa opção para as pessoas que têm TEA
e que desejam ingressar no mercado de trabalho é
apostar na modalidade home office (escritório em
casa), adotada em diversas empresas e que possui
a vantagem de trabalhar no próprio lar, tendo os
mesmos direitos dos outros funcionários

relacionamento
E quando o assunto é o coração, a regra é clara!
“É necessário um conjunto de habilidades como to-
lerância, afeto e condições de interagir socialmente
para que um relacionamento seja possível”, pontua
Mariana. Como já dito anteriormente, o TEA é uma
disfunção que acarreta dificuldades de comunicação e
de interação, circunstâncias que dificultam o começo
e a manutenção de uma relação amorosa. No entanto,
segundo o doutor em Genética e Biologia Molecular,
Roberto Hirochi Herai, é preciso ter consciência da
própria condição e das limitações causadas pelo
quadro. Outra recomendação importante é para os
pais, que devem dar condições para que o filho au-
tista tenha independência, ou seja, é preciso que eles
estejam dispostos a orientar o jovem a expressar seus
sentimentos e criar autonomia afetiva.

História real
a psicóloga andrea rosa relembra um caso que teve o prazer de
acompanhar durante a profissão:
“um paciente com asperger, hoje com 20 anos, está estudando letras,
namorando uma menina muito especial e começando a dar novos e
concretos rumos em sua vida. ele é atendido por mim desde os 12 anos e
é um exemplo de que todas as estratégias, parcerias e, principalmente, o
apoio e a confiança familiar resultam em êxito no tratamento”.

Consultoria Andrea rosa, Luz maría romero e marina ramos Antonio, psicólogas; roberto Hirochi Herai, doutor em genética e biologia molecular, e diretor do Conselho Científi-
co do instituto Lico Kaesemodel - Projeto eu Digo x Foto gettyPremium.com

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habilidades

AindA mAis
especiAl
Descubra talentos acima
da média que podem ser
desenvolvidos pelos autistas
TexTo Victória rangel/colaboradora Design adriana oshiro

d
esde pequenos, os seres humanos são
ensinados a ter padrões de compor-
tamento a fim de conviver em socie-
dade de uma maneira mais prática.
Esse tipo de pensamento, que une elementos
para formar sentidos, não é, contudo, o mesmo
de indivíduos autistas, que se atentam exclusiva-
mente a pequenos elementos isolados. Isso quer Máquina do abraço
dizer, resumidamente, que pessoas autistas têm temple grandin é uma autista grave, psicóloga e Ph.d. em Zoo-
um modo diferente de compreender o mundo tecnia que desenvolveu uma espécie de “máquina do abraço”,
responsável por fazer pressão sobre seu corpo e reduzir seu
em comparação as pessoas sem o transtorno.
desconforto, acalmando-a. hoje, conhecida no mundo todo,
Esse tipo de percepção varia de pessoa para ela ministra cursos e oferece consultorias a fazendas sobre
pessoa e existem casos de autistas que, em suas instalações e cuidados voltados para rebanhos. além disso,
particularidades, podem desenvolver talentos temple foi tema de um filme biográfico homônimo, que ganhou
especiais. São as chamadas ilhas de habilidade sete prêmios.
(ou de genialidade).
na sala
como funciona? dar determinado assunto e mostrar a ela do terapeuta
O cérebro humano é dividido em duas que essas habilidades podem ser utilizadas a terapeuta ocupacio-
partes, que trocam as informações por uma para estudar as demais matérias. O convívio nal Janaína silva Jun-
espécie de “ponte”. Para os autistas, um desses social também deve ser estimulado para queira elencou algumas
lados se desenvolve mais do que o outro, e que o autista possa ampliar conhecimentos”, atividades que podem
a comunicação entre os hemisférios cere- explica a designer de atividades pedagógicas ser desenvolvidas pelo
brais pode ser comprometida. Nesse caso, e pós-graduada em consciência fonológica profissional em conjun-
algumas habilidades podem se sobressair a e tecnologias aplicadas à educação, Janaína to com o autista para
estimular e explorar
outras no comportamento do indivíduo. É aí Spolidorio.
essas afinidades:
que surgem os autistas supertalentosos, que • habilidades da vida
possuem uma surpreendente facilidade para incentivo na medida certa diária, tais como o
uma área específica de seu interesse. Um aspecto importante a ser levantado treinamento do toa-
é que, mesmo que a pessoa autista tenha lete, vestir-se, escovar
Particularidades algumas habilidades excepcionais, ela ainda os dentes, pentear ca-
Cada indivíduo autista possui caracte- precisa desenvolver outros conhecimentos belos, calçar sapatos e
rísticas próprias em relação ao transtorno e básicos para comunicar essa característica outras habilidades de
é difícil incluir cada uma delas em alguma de interesse e efetivamente desenvolvê-la. preparação;
categoria que possa classificar, exatamente, Além disso, repare se aquela atenção especial • habilidades motoras
finas necessárias para
qual é o grau de autismo que a pessoa possui. do autista a algo específico tem motivações
a realização de caligra-
Dentre essas características podem estar uma passageiras ou se é uma afinidade a ser efe- fia ou cortar com uma
facilidade incomum para lembrar de certos tivamente trabalhada ao longo da vida. “Por tesoura;
eventos, talento para tocar músicas ouvidas exemplo, a criança sabe tudo de avião, mas, • habilidades motoras
apenas uma vez e habilidades especiais com passam alguns meses, ela muda de interesse utilizadas para andar de
números, por exemplo. Mas isso não quer e passa a gostar de mapas, e por aí vai. Então, bicicleta;
dizer que todos os indivíduos com autismo ter certeza de que estamos estimulando a • o sentar adequado,
possuam uma inteligência acima da média. habilidade em que realmente ele tem interesse percepção de compe-
Segundo o psicólogo Klayson Santana, apro- permanente também é importante”, finaliza tências, tais como dizer
ximadamente 70% dos autistas têm algum a psicóloga Tatiana Serra. as diferenças entre co-
res, formas e tamanhos;
nível de deficiência intelectual e somente
• consciência corporal
cerca de 10% dos indivíduos com o transtorno
“Caso seja possível, matricule e sua relação com os
têm excelentes habilidades intelectuais para outros;
a sua idade.
a criança em cursos de seu
• habilidades visuais
interesse maior para que ela
para leitura e escrita;
explorando estratégias possa se desenvolver também • brincadeira funcio-
Mas como saber se isso acontece com com profissionais que tenham nal, resolução de pro-
algum parente autista? “A família pode in- conhecimento sobre o assunto. blemas e habilidades
centivar esses talentos de várias formas dife- Sempre a estimule a buscar sociais;
rentes, fazendo com que a criança encontre o aperfeiçoamento”, Janaína • integração dos senti-
dos, realizada por meio
informações sobre seu tema de interesse e, Spolidorio, designer de atividades
da abordagem de inte-
também, mostrando novos temas que podem pedagógicas e pós-graduada em gração sensorial com
ser relacionados. A escola pode utilizar as consciência fonológica e tecnologias objetivo de diminuição
estratégias criadas pela criança para estu- aplicadas à educação de estereotipias.

Consultoria Klayson santana, psicólogo; Janaína silva Junqueira, terapeuta ocupacional; Janaína spolidorio, designer de atividades pedagógicas e pós-graduada em consciência fonoló-
gica e tecnologias aplicadas à educação; Tatiana serra, psicóloga e diretora do núcleo Tatiana serra - intervenção e Formação Comportamental foto gettyPremium.com

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sentidos

PercePção
do mundo
Comum em quem possui o
transtorno do espectro autista (TeA),
as alterações no processamento
sensorial comprometem o bem-
estar do indivíduo
TexTo Michele custódio/colaboradora Design adriana oshiro

V
ocê já parou para pensar na impor-
tância que os sentidos têm na nos-
sa vida e nas nossas experiências?
Imagine como deve ser ir à praia e
não sentir nenhum dos estímulos existentes
naquele local, não perceber o sol esquentando
a pele, o cheiro do mar, o som que a água faz
ao chegar na areia, o sabor salgado que fica na
boca após um mergulho ou, então, não ver a
beleza que essa natureza pode oferecer. Agora,
pense em como o contrário também deve ser
incômodo, ter hipersensibilidade a barulhos ou
cheiros que, para qualquer pessoa, parecem
normais. Essas alterações podem sinalizar
uma doença conhecida como Transtorno de
Processamento Sensorial.

explicando o termo
Processamento sensorial é o modo como o
nosso cérebro compreende os estímulos externos,
ou seja, o que vemos, ouvimos e sentimos. “Alguns
autistas sentem desconforto ou dor frente a um
estímulo que é agradável para a maioria das
pessoas ao seu redor. Outras vezes, estímulos
que são exagerados parecem não fazer sentido,
precisam ser amplificados para que o paciente
o perceba”, explica a fonoaudióloga Patrícia Dois extremos
Cristina Andrade Pereira. Esse transtorno basicamente, a dife-
ainda não conta com um diagnóstico médico. rença entre as duas
“O organismo
Entretanto, a inclusão na quinta edição do classificações é que,
da pessoa na hiposensibilidade,
Manual de Diagnóstico e Estatístico de Trans-
autista mostra a criança busca expe-
tornos Mentais (DSM-5) do critério de hiper
peculiaridades rimentar sensações, ou
ou hiposensibilidade a estímulos sensoriais
neurológicas, que em pacientes com TEA aumentou a atenção
seja, sente a necessi-
os acompanham dade de intensificar os
para o estudo de indivíduos com alterações estímulos. Já na hiper,
e afetam seu no processamento sensorial. o paciente sente um
desenvolvimento grande incômodo com
integralmente sintomas os incentivos, o que faz
e ao longo Os sintomas do Transtorno de Proces- com que ele os evite. a
das diferentes samento Sensorial envolvem, geralmente, seguir, conheça alguns
fases da vida”, uma sensibilidade aumentada a estímulos sintomas característicos
das duas distinções:
Patrícia Cristina sonoros e táteis. Algumas pessoas podem
Andrade Pereira, apresentar, por exemplo, alterações no hu-
hipersensibilidade
fonoaudióloga mor e mudanças no comportamento com • Muito seletivo com
a presença de um barulho ou um toque, o os alimentos
que faz com que ele se afaste do incômodo • cobre as orelhas
causado. Essas modificações também podem quando escuta algum
interferir nas interações sociais, no proces- barulho
samento de outras informações do ambiente • não gosta de ser
e na capacidade de sustentar a atenção em tocado
atividades diárias. • anda na ponta dos
pés
• não gosta de estar
Mais qualidade de vida!
molhado
O cuidado se dá por meio de atividades • reclama de cheiros
adaptativas para que a criança consiga supe-
rar as suas dificuldades e seja integrada ao hiposensibilidade
seu meio ambiente. Segundo a psicanalista • Gosta de gritar
Macia Melega, se houver comorbidades (como • sobe em lugares altos
autismo ou Transtorno do Déficit de Atenção • Mastiga coisas não
com Hiperatividade, TDAH), é preciso adaptar comestíveis
o tratamento de acordo com todas as ne- • apresenta pouca res-
cessidades do paciente. “Na suspeita de que posta à dor
• Gosta de andar des-
uma pessoa apresente o transtorno, torna-se
calço
importante uma avaliação multiprofissional, • brinca com a comida
que irá direcionar a terapia, que pode envolver
profissionais de diversas áreas, como neuro-
logia, psiquiatria, psicologia, fonoaudiologia,
terapia ocupacional e pedagogia”, destaca o
psiquiatra Décio Natrielli Filho.
Consultoria Décio natrielli Filho, psiquiatra; macia melega, psicanalista;
Patrícia Cristina Andrade Pereira, fonoaudióloga foto gettyPremium.com

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Dicas

A Atenção de pAis
Conheça algumas formas de a família e os entes
queridos melhorarem o bem-estar do autista
TexTo IurI SantoS/Colaborador Design rodrIgo da graça

C
omo o autismo é um transtorno com manifestações
precoces, o autista depende, é claro, de algumas figu-
ras adultas, assim como as demais crianças. Em um
primeiro momento, os pais serão responsáveis pelos
primeiros contatos e interações dessa pessoa. Entretanto, com
o passar do tempo, é natural que os pais optem por um cuida-
dor, pela exigência da rotina. É claro, profissionais da educação
também participarão desse processo, entretanto, fazem parte
de outro grupo de convívio da criança. Para saber a melhor
forma de lidar com o autista, os adultos devem dialogar e estar
em sintonia com o neuropediatra e todos outros profissionais
envolvidos. Para a convivência com pais e cuidadores, existem
alguns fatores que devem ter a atenção especial e exigem uma
sensibilidade a mais. Por isso, a seguir, destacamos algumas
orientações que podem ajudar na relação com o autista.

não há nada de errado!


Apesar de demandar cuidados es-
peciais na criação, em suma, o indiví-
duo não é diferente de nenhum outro.
Compreender que, como os demais,
o autista possui suas particularida-
des e compartilha necessidades
iguais a outras crianças é o pri-
meiro passo para integrá-lo.
“É fundamental entender
que, antes da condição de
autista, aquela criança
possui as características
e necessidades que todo
infante possui. Isto é:
ser cuidado, respeitado,
estimulado e incenti-
vado a interagir com
o meio que lhe cerca”,
explica a psicóloga Anna
Paula Rezende.
e cuidAdores
não ignore a ajuda profissional orientações dentro e fora do mundo virtual”,
É importante seguir à risca as instruções indica a terapeuta ocupacional Janaina Silva
de todos especialistas envolvidos no processo, Junqueira. Esse tipo de atitude não é impor-
afinal, eles são as pessoas mais indicadas para tante apenas para o autista, mas também para
tratar do assunto. Às vezes, pode parecer que os pais. “Grupos de mães são bem importan-
essa ajuda é uma intromissão na criação, mas tes, não só para o bem-estar da criança, mas
essa ideia deve ser eliminada, já que esses delas mesmas”, aponta Tatiana.
profissionais são importantes, justamente,
para facilitar o processo. “Para garantir adaptações que auxiliam
o bem-estar do autista, é necessário Segundo a neuropsicóloga, uma das coisas
buscar ajuda profissional e tratamento que é comum a todos eles é a capacidade de
cientificamente eficaz”, reitera a neu- pensar e agir concretamente, então, quanto
ropsicóloga Tatiana Serra. mais claro e objetivo for o ambiente onde eles
estejam, melhor será a integração. Por isso,
busque histórias parecidas vale a pena pensar em adaptações na rotina
Uma ótima forma de aprender para que ela fique mais agradável à percep-
formas de lidar com a situação é ção do indivíduo. Clareza e objetividade são
buscar pessoas que passaram a chave! “Isso proporciona previsibilidade e
pelo mesmo cenário. Com segurança para eles. Uma vez aprendida essa
certeza existem outras parte, vale a pena alternar a ordem das coisas
famílias que também de maneira sútil e programada, para evitar
querem ouvir suas reações inesperadas”, adiciona a Tatiana.
histórias e, com
essa troca, é pos- desfaça-se dos preconceitos
sível crescer. “Lu- “A exclusão e o abandono persistem como
tem por todos os realidade na vida de muitos autistas e suas
seus direitos, pes- famílias. A inclusão social das pessoas com
quisem, encon- autismo deve começar em casa”, aponta Anna
trem grupos Paula. Parece óbvio, mas pode ser que, às
de apoio e vezes, alguns estigmas permaneçam, mesmo
depois de consultar os profissionais indicados.
Desfazer-se desses preconceitos é essencial
para integrar o autista socialmente, assim
como educar o máximo de pessoas possí-
veis, para que elas não cometam os mesmos
erros. “As diferenças, ou o diferente, habita
em todos nós e isso não é um erro, mas uma
oportunidade de sermos melhores naquilo
que imaginamos conhecer”, finaliza Janaina.

Consultoria Anna Paula Rezende Pereira, especialista em Psicologia Clínico Institucional/


Residência Hospitalar; Janaina Silva Junqueira, terapeuta ocupacional; Tatiana Serra, psicóloga
e diretora do núcleo Tatiana Serra - Intervenção e Formação Comportamental
Foto GettyPremium.com

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sessão especial

Depoimentos
Conviver com o autismo não é fácil.
Veja o que mães de crianças autistas “Começamos
a investigação em
têm a dizer e lembre-se: dezembro de 2017: levei ao
você não está sozinha! neuropediatra, realizamos alguns
TexTo Victória rangel/colaboradora exames e o laudo saiu em julho de 2018.
Design gabriel eli
Não é fácil, pois devido às sensibilidades
“Com sensoriais, não são todos os ambientes que
aproximadamente três podemos frequentar, devido à luz e aos sons
anos de idade, descobrirmos altos. Na escola, ele teve uma boa inclusão, gosta
que aquele lindo menino, que possuía muito de brincar lá. No meu trabalho, precisei
15 tipos de bolas (de diferentes tamanhos reduzir as horas para poder ter uma dedicação
e cores) e tinha uma organização fora de maior para ele, pois tenho que levá-lo
série, foi diagnosticado com autismo infantil para as terapias praticamente todos os
comportamental. Então, fizemos vários exames, dias. É uma rotina bem corrida”,
fomos a grupos de estudos, palestras e, em 2003, Rosangela Colares - mãe de
descobrimos o CAPS, em Viamão, que funcionou José Luis (2 anos)
por um tempo. Atualmente, ele tem onze anos.
A cada dia temos uma barreira para enfrentar
e, com o corpo dele em desenvolvimento,
a gente sempre esbarra em uma nova
dificuldade”, Ana Borges - mãe de “Ele sempre foi uma
menino autista (11 anos) criança tranquila e apresentava
o desenvolvimento normal. Por volta
de 1 ano e 8 meses, ele parou de falar; a
última palavra foi água. E daí veio o declínio. Em
poucos meses, as crises eram terríveis, qualquer
quebra de rotina era um problema. Batia cabeça, se
batia, esteriotipias... Quando voltou das férias, eu já alertei
a escola que desconfiava de que ele era autista. Eles o
observaram por algumas semanas, agendaram uma reunião
e já me entregaram o relatório para eu ir atrás de médicos
e terapias. Ainda não faz um ano que isso aconteceu, mas
ele já não tem tantas crises, não se bate, voltou a falar
algumas palavras, brinca de faz de conta... Hoje, ele
só faz Terapia Ocupacional no CAPs perto da minha
Esteriotipias são casa, pois é impossível pagar todas as terapias. Em
moviementos de fevereiro, pretendemos iniciar a musicoterapia
autoestimulação,
e, se possível, a terapia ABA”, Fernanda
muito praticado
pelos autistas!
Cristina Silva Sepe - mãe de
menino autista (3 anos)
“Meu filho foi
diagnosticado com
autismo aos 11 anos. Na escola
recebeu ajuda de uma mediadora
para auxiliar no comportamento, mas ela
chegava muito depois dele e saía bem antes.
Ela também mediava outras crianças ao mesmo
tempo! Para passar de ano, precisou ser avaliado
por relatório. Agora, ele irá para o 7º ano (...). Além do
autismo, que o faz se isolar sem interação social, ele
tem dislexia, disgrafia, disortografia e PAC (Transtorno “Tive que mudar
do Processamento Auditivo Central), exigindo alguém radicalmente minha vida por
ao seu lado para explicar o que está sendo falado e conta do autismo. Tinha meu trabalho,
ajudar com os exercícios. A lei diz que, se o autista 25 anos administrando restaurantes. E, de
precisar, a escola tem que fornecer a mediação. repente, tive que fazer uma escolha para me
Mas, se tratando de escola particular, você só dedicar somente ao meu filho e às terapias: sair do
consegue algo por meio de um advogado. meu trabalho. Tinha oito anos de casa e fiz acordo,
Meu filho é um menino muito puro, pois não dava para conciliar cargo de confiança com
com um coração cheio de amor”, terapias e noites sem dormir, sem horário para nada.
Alane Carneiro, mãe de Na época, foi muito difícil sair do emprego, nunca
Zandor (12 anos) me imaginei ficando em casa, pois desde os 14 anos
sempre trabalhei fora. Veio então um período de muita
“No ano luta. Entrei em depressão, vieram também muitas
passado, eu o levei a um dificuldades financeiras, porque meu marido teve
neuropediatra que deu, finalmente, que assumir as contas da casa e ficou muito
o laudo médico, constatando que meu pesado para ele. Com o passar do tempo,
filho era autista. Foi um alívio tão grande, pois fui superando aos poucos”, Irene
eu nunca tive medo do que o meu filho poderia Alves - mãe de Cayo (9 anos)
ter. Eu vejo outras mãezinhas falando que tiveram um
momento de luto. Eu respeito muito isso, mas eu não tive
esse sentimento porque meu filho não morreu. O que eu
sinto é mais vontade de lutar por ele. Hoje, ele tem cinco anos
e, desde seus três anos, eu venho lutando por ele. (...) Tem dias
em que a fé é maior do que o cansaço, outras vezes, o cansaço é
maior que a fé. Eu acredito muito em Deus e, nesses momentos,
Ele sempre me dá provas de que estou no caminho certo.
Quando eu acho que o Gabriel não está evoluindo mais ou
que não está aprendendo, ele faz uma coisa nova, e isso me
enche de vontade novamente. Sempre fui muito forte, mas
percebi que também sou humana e preciso me cuidar.
Hoje, faço terapia para poder ajudar melhor o meu
filho. Eu costumo dizer que nós, mães de filhos
especiais, somos fênix”, Kelly Bispo de
Souza Teodoro - mãe de Marcos
Gabriel (5 anos)

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Em busca dE apoio

todos Por uma causa


Associações, ongs, institutos...
entenda o que é cada termo e como
esses órgãos podem ajudar
TexTo IurI SantoS/Colaborador
Design GabrIEl ElI

C
onsiderando que esse transtorno envolve uma diversi-
dade de fatores complexos, é fácil imaginar que exista
uma dificuldade em garantir bem-estar e qualidade de
vida do paciente. Contudo, existem grupos de pessoas
dispostas a encontrar caminhos para facilitar o acesso dos autistas,
por exemplo. Organizações não-governamentais (ONGs), associa-
ções, institutos... Apesar de diferentes, muitas dessas instituições
buscam, cada uma ao seu jeito, promover ambientes mais saudá-
veis, tanto para autistas quanto para os que convivem com eles.

Como funcionam?
Mesmo que possuam características distintas e passem por
processos legislativos e burocráticos diferentes, ONGs, associa-
ções e institutos podem ser confundidos. Por isso, é importante
tipificar cada uma dessas formas de organização.
Associação: essa é a terminologia jurídica para definir uma
associação entre indivíduos com objetivos comuns. Elas bus-
cam promover algum benefício social e, segundo o Código Civil
Brasileiro, são a “união de pessoas que se organizam para fins
não econômicos”.
ONG: é, em termos gerais, uma instituição composta por
membros da sociedade em busca de um objetivo comum. Elas
podem, por exemplo, ser associações para fins jurídicos.
Instituto: esse é um termo que possui uma definição genérica,
como uma organização com propósitos específicos. Entretanto,
é consensual usar o termo para definir organizações com fins
educativos e científicos. Essa palavra, entretanto, não engloba
aspectos jurídicos e burocráticos.

“De uma das escolas atendidas, por exemplo,


recebemos o vídeo de um aluno autista, com
importante dificuldade de comunicação, que
falou com a sua professora utilizando fantoches
na tendinha de teatro montada na sala de AEE”,
Carolina Videira, presidente da ONG Turma do Jiló
no autismo des específicas. “Alunos com TEA pedagogos, psicólogos, administra-
Compreender esses termos é geralmente necessitam de um cons- dores, assistentes sociais... É im-
necessário para que seja possível tante repensar no que diz respeito portante preparar os profissionais
integrar essas palavras na explica- a questões que parecem ‘tradição’ para lidar com situações externas
ção. Veja: associações de inclusão na escola, como o mobiliário, a ro- à sala de aula, assim como ajudar
e com fins educativos estão dire- tina, os ruídos, o tempo, as regras, a encontrar maneiras de incentivar
tamente ligadas ao transtorno do o conteúdo e os recursos didáticos”, a expressão do aluno.
espectro autista (TEA). Por isso, aponta Carolina Videira, presidente A Associação de Pais Inspirare,
por vezes, elas podem ser chama- da ONG Turma do Jiló. por exemplo, busca visitar empresas
das de institutos ou ONGs, já que Segundo a presidente, é pensando e escolas a fim de fazer um trabalho
possuem uma finalidade definida e nisso que a organização, com a ajuda psicoativo sobre educação. “O mé-
buscam transformar suas ações em de parceiros, promove reformas e todo engessado de nossa educação
benefícios para a sociedade. Esse equipa uma sala destinada ao Aten- não tem muito espaço para as diver-
é o caso, por exemplo, da Turma dimento Educacional Especializado sidades e diferenças. O profissional
do Jiló, uma associação que busca (AEE). Para isso, eles contam com precisa abraçar a causa e entender
garantir a educação inclusiva em uma equipe de acessibilidade, consti- que não somos iguais e, por isso,
escolas públicas. Além de trabalhar tuída por arquitetos, fisioterapeutas precisamos de manobras acadêmi-
no desenvolvimento pedagógico e e profissionais de comunicação. A cas para estimular esse aluno para
de preparação do corpo docente, Turma possui, também, outras equi- que ele consiga bons resultados
eles buscam adaptar o ambiente pes para tratar de diversos assuntos, pedagógicos”, finaliza Simone Alli
para melhor atender às necessida- com profissionais como músicos, Chair, diretora da associação.

coNsuLToRia Carolina Videira, presidente da ong Turma do Jiló; simone Alli Chair, diretora da Associação de Pais inspirare FoTos gettyPremium.com

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OutrOs desafiOs

ElEs podEm
caminhar juntos
entenda quais
são as doenças
e os transtornos
relacionados ao
autismo
TexTo IurI SantoS/Colaborador
Design GabrIEl ElI

Q
uando pensamos em al-
gum transtorno, é natural
que procuremos, primeiro,
suas características parti-
culares: sintomas, causas... Entretanto,
algo importante e que também deve
despertar a curiosidade são problemas
que podem estar associados a ele. As
comorbidades são aqueles distúrbios
que estão mais comumente atrelados
ao diagnóstico de outros. Isso não quer
dizer, é claro, que são dependentes; en-
tretanto, são relacionados. No caso do
autismo, esse cenário é bem significati-
vo, visto que a prevalência de algumas
comorbidades é alta e, levando isso
em consideração, o próprio tratamento
depende do controle delas. “São muitas
as que podem ocorrer com o autismo,
como transtorno de ansiedade, depres-
são, transtorno do sono, transtorno bi-
polar, epilepsia e transtorno de déficit
de atenção e hiperatividade”, aponta o
psiquiatra Leonardo Maranhão. Segundo
o Manual Diagnóstico e Estatístico De
Transtornos Mentais (DSM-5), cerca
de 70% das pessoas com algum grau
de autismo podem ter um transtorno
mental comórbido, e 40% podem ter
dois ou mais.
transtornos de ansiedade ansiedade podem ser destacados o uma prevalência considerável de casos
Esse grupo engloba diversos pro- Transtorno de Ansiedade Generalizada em que os dois são comórbidos. “De
blemas que, como indicado no DSM-5, (TAG), Transtorno Obsessivo Compul- forma similar, a síndrome do X frágil
compartilham como características sivo (TOC), Fobia Específica e Fobia também apresenta diversas comorbi-
em comum o medo e a ansiedade ex- Social, por exemplo. dades, dentre elas o autismo e proble-
cessivos. O manual descreve o medo mas psiquiátricos, como ansiedade e
como a resposta emocional a ameaça deficiência Intelectual (trans- agressividade”, explica o doutor em
iminente real ou percebida, enquanto torno do desenvolvimento Inte- Genética e Biologia Molecular e diretor
ansiedade é a antecipação de amea- lectual) do Conselho Científico do Instituto
ça futura. Dentre os transtornos de Nesses casos, o paciente apresenta- Lico Kaesemodel – Projeto Eu Digo X,
rá problemas para desenvolver alguns Roberto Hirochi Herai. Apesar disso,
processos intelectuais. O distúrbio se o especialista indica que, diferente do
expressa tanto na progressão das fun- autismo, a síndrome do X frágil é uma
ções sociais, quanto de conceitos e condição genética bem definida que
práticas. Segundo o DSM-5, o crité- pode ser diagnosticada por um teste
rio para o diagnóstico da deficiência de DNA, possuindo, também, expres-
intelectual é o déficit no raciocínio, sões físicas demarcadas, como orelhas
expresso, por exemplo, na solução de grandes e face alongada.
problemas, na aprendizagem acadêmi-
ca e na empírica. Além disso, a pessoa Epilepsia
apresentará problemas adaptativos, Essa condição médica é relati-
resultando em dependência. Para es- vamente comum em portadores do
tabelecer o diagnóstico, os primeiros transtorno do espectro autista (TEA).
sinais de déficit intelectual e adaptativo Caracterizado por convulsões e per-
devem ser observados no início do das de consciência, essa doença pode
desenvolvimento. Esse transtorno é acometer qualquer um; entretanto, é
uma das comorbidades mais comuns comum que autistas a apresentem.
nos casos de autismo. Apesar da ciência não ter determinado
exatamente qual é o motivo da relação,
transtorno de déficit de segundo a fundação Epilepsy Founda-
atenção e Hiperatividade (tdaH) tion, acredita-se que os dois problemas
O problema é caracterizada por um compartilham alguns mecanismos neu-
padrão sintomático de alguma de suas rológicos que podem contribuir para
características: desatenção e hiperativi- o surgimento de ambas. A fundação
dade/impulsividade. Para ser diagnosti- ainda indica que um terço dos indiví-
cado, o paciente deve apresentar seis ou duos que possuem TEA também têm
mais sintomas da primeira, da segunda epilepsia.
ou de ambas. Com isso, o indivíduo pode
ser predominantemente desatento, pre-
dominantemente hiperativo-impulsivo
ou possuir apresentação cruzada. Para
que seja identificada comorbidade com
o autismo, o indivíduo também deve
cumprir os critérios diagnósticos do
transtorno.

Síndrome do X frágil
Trata-se de uma doença genética CONsuLtOria Leonardo maranhão, psiquiatra e diretor
caracterizada por alguns sintomas si- da Clínica médica Assis; roberto Hirochi Herai, doutor
em genética e biologia molecular e diretor do Conselho
milares aos do autismo, sendo que há Científico do instituto Lico Kaesemodel -
Projeto eu Digo x fOtOs gettyPremium.com

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Filmes e livros

Arte como AliAdA


Conte com a ajuda da ficção para conhecer melhor o autismo
TexTo Michele custódio/colaboradora
Design Gabriel eli

a
o produzir uma obra, os O garoto que podia voar
autores possuem a habi- Produzido em 1986, o filme retrata
lidade de transpor a vida o transtorno de uma forma poética,
factual para uma realidade mostrando a vida de um adolescen-
imaginária, em que tudo é possível. Ao te que possui autismo não verbal e
ter contato com essas produções, o sonha em poder voar. A obra brinca
indivíduo tem a chance de conhecer com o fato da população começar
diferentes visões sobre um mesmo a acreditar nos poderes do menino,
tema – nesse caso, o autismo. Além de principalmente quando ele salva a
poder explorar histórias emocionantes vizinha de uma queda muito grave.
e inspiradoras de quem já lidou com O menino que
a síndrome. Veja alguns exemplos! desenhava monstros
Jack só sai de casa para ir ao
FilMes médico, apresenta dificuldades para
Tudo que eu quero criar relações com outras pessoas e
Wendy é uma jovem autista que é diagnosticado com a síndrome de
vive uma rotina inflexível. Ela é fã da Asperger. Ele acredita que monstros
franquia Star Trek e decide participar moram embaixo da sua cama, até que
de uma competição de escrita. Para eles começam a se tornar reais. O
realizar esse sonho, a protagonista livro aborda os medos mais secretos
engana sua cuidadora e seus familiares dos indivíduos e como eles podem
e embarca em uma aventura solitária. virar realidade.

liVros
Memórias de um
amigo imaginário
Max é um menino que possui um
amigo imaginário, chamado Budo.
Juntos, os dois vivem inúmeras aven-
turas que, muitas vezes, parecem reais
e abordam temas como a lealdade,
a amizade, a convivência com o au-
tismo e, principalmente, o poder da
imaginação.
FoTos Divulgação e reprodução Retornar
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EditORA-ChEFE Tais Castilho EditORA Jaqueline Lopes REdAçÃO Thainá Zanfolin e Érica Aguiar dESiGN Zu Fernandes (Editora-chefe), Adriana Oshiro, Gabriel Eli e Rodrigo da Graça ©2019 EDITORA ALTO
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