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Wurlitzer
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1 – A Cortina de Trevas
sido atraídos para aquele lugar. Devíamos ter vencido essa batalha
ao amanhecer, pensou o gigante de bronze. De fato, ao amanhe-
cer, vários quilômetros ao norte, eles haviam encurralado os
inimigos entre o vale e a colina. Não ia embora de sua mente o
modo com as coisas haviam acontecido. De algum modo, o
desfecho daquela batalha não pareceu algo natural. Lembrava-
se de cada detalhe dos eventos e decisões tomadas, de quando
havia tocado a trombeta de prata para o ataque e o modo co-
mo, misteriosamente, uma tempestade de areia surgiu do nada
e cobriu Shamesh, fazendo parecer que a noite havia retorna-
do após ter acabado de partir. Aquilo impediu o avanço final
de Olam, dando oportunidade para que os guerreiros de Bart-
zel batessem em retirada.
“Um avanço rápido e letal”, foi o que ele ordenou
quando a tempestade passou e abriu caminho para o ataque
outra vez. “Ninguém se aproxima da barreira de trevas”, foi
sua segunda ordem bem clara. “Ignorem-na! Nem olhem para
ela!”.
Depois de um longo dia de avanço das tropas, estavam
prontos para dar o último golpe. Com praticamente o dobro
de soldados, absoluta disciplina de combate, e a presença de
cinco nasîs, parecia mesmo impossível que os inimigos tives-
sem ainda alguma chance. Porém os guerreiros de Bartzel es-
tavam mais próximos da cortina de trevas do que nunca.
Elôm olhou para trás e viu a plena confiança no olhar
dos soldados, pois eles também enxergavam essas coisas, ape-
sar de estarem obviamente cansados. Além das duas noites
sem dormir, aquele avanço final, em marcha acelerada, havia
consumido praticamente o restante das forças deles. Mesmo
que ele titubeasse, outra vez, antes de dar a ordem para o ata-
que.
Os dois shedins eram apenas espectros daquilo que ha-
viam sido um dia, dois antigos seres malignos e incorpóreos,
os quais, tal como a cidade destruída atrás deles, também exi-
biam em si mesmos a decadência de um passado luminoso.
Elôm acreditou que fossem Naphal, o príncipe e atual líder
supremo dos shedins; e Mashchit, o cruel tartan que ocupava
o posto de general dos exércitos sombrios. Eles eram uma
mistura de fogo e trevas, porém, naquele estado de quase re-
pouso, mais trevas do que fogo. O que parecia ser o corpo
deles apresentava-se estranhamente nebuloso, lembrava, va-
gamente, uma altiva silhueta humana, onde não era possível
distinguir membros ou rostos propriamente ditos. Só os olhos
podiam ser discernidos na face nebulosa, pois eram de fogo
puro, ou talvez, de alguma energia similar. Aquela mesma es-
tranha luminosidade ardente contida pelo invólucro espectral
também aparecia dentro da boca deles enquanto falavam.
Era a primeira vez que ele via um shedim. Provavel-
mente, era a primeira vez que qualquer pessoa visse um, desde
que haviam sido definitivamente restritos à cortina de trevas.
Vê-los fez com que inúmeras lembranças de seu tempo de
treinamento em Ganeden voltassem. Palavras terríveis como:
traição, corrupção, queda, perversidade, demônios, haviam
sido inúmeras vezes pronunciadas durante o treinamento a fim
de descrevê-los. A ferida aberta na antiga sociedade de Gane-
den, que migrou para Irkodesh, parecia que jamais seria cica-
trizada. O colapso da cidade e de todo o mundo, que se levan-
tou em volta dela, permanecia como o maior evento que aque-
flancos.
— Normalmente eles não seriam tão tolos — disse Na-
phal. Porém, naquele instante, o príncipe shedim também se
aproximou da borda e observou mais atentamente a movi-
mentação. Ele olhou, com atenção, para as catapultas posicio-
nadas.
— E quanto aos kedoshins? Por que eles ainda não par-
tiram deste mundo? Quando isso, de fato, vai acontecer? —
Mashchit fez aquelas perguntas estranhando aquele súbito in-
teresse de Naphal na batalha. Até aquele momento, Naphal
apenas assistia parecendo pouco interessado. Nem mesmo
quando Elôm rasgou a frente do exército de Bartzel, com a
formação gigante das três legiões em “v”, e foi adentrando
sem ser detido, Naphal havia prestado atenção como naquele
momento.
— Você sabe — respondeu Naphal, agora observando
cada movimentação dos inimigos. — Por causa da espada... E
daquela maldita profecia… Eles esperam que ela se cumpra.
Quer dizer, nem todos os kedoshins esperam por isso... A
maioria deles entende que o prazo já se esgotou, mas alguns
acham que ainda deveriam esperar um último nagîd nascer e
se submeter ao teste.
— Será que a espada é poderosa? — perguntou
Mashchit. — Será que pode mesmo nos atingir?
— Não vamos esperar para descobrir — disse Naphal.
— O bebê? — perguntou Mashchit com desprezo. —
Deixaremos que ele nasça?
— A Malkot está no primeiro mês de gravidez de acor-
do com nosso informante — revelou Naphal. — Evidente-