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Pablo Neruda deixou, ao morrer, oito livros inéditos de poesia, escritos quase
simultaneamente: O coração amarelo, Livro das perguntas, Elegia, A rosa
separada, Jardim de inverno, 2000, O mar e os sinos e Defeitos escolhidos,
publicados pela L&PM Editores com traduções cuidadas, feitas por poetas
brasileiros. Nos poemas de O coração amarelo estão presentes os temas preferidos
do autor — amor, amizade, reminiscência do passado. Mas percebe-se também,
nestes versos, uma nota leve, bem-humorada e melancólica, como uma despedida
de uma grande vida ou um prenúncio dos negros tempos da ditadura pela qual seu
país, o Chile, passaria.
EDIÇÃO BILÍNGUE
O Coração Amarelo
Edição Bilíngue
www.lpm.com.br
L&PM POCKET
LIVROS DO AUTOR NA COLEÇÃO
L&PM POCKET:
A Barcarola
Cantos Cerimoniais (Edição bilíngue)
Cem Sonetos de Amor
O Coração Amarelo (Edição bilíngue)
Crepusculário (Edição bilíngue)
Jardim de Inverno (Edição bilíngue)
Livro das Perguntas (Edição bilíngue)
Residência na Terra 1 (Edição bilíngue)
Residência na Terra 2 (Edição bilíngue)
Terceira Residência (Edição bilíngue)
Últimos Poemas
As Uvas e o Vento
ÍNDICE
Uno / Um
Otro / Outro
Otro Más / Mais Outro
El Héroe / O Herói
Una Situación Insostenible / Uma Situação Insustentável
Filosofía / Filosofia
Sin Embargo Me Muevo / No Entanto Me Movo
Piedrafina / Pedrafina
Canción del Amor / Canção do Amor
Una Estatua en el Silencio / Uma Estátua No Silêncio
Integraciones / Integrações
Gatos Nocturnos / Gatos Noturnos
Rechaza Los Relámpagos / Rechaça Os Relâmpagos
Desastres / Desastres
Recuerdos de la Amistad / Recordações da Amizade
Enigma para intranquilos / Enigma Para Intranquilos
El Pollo Jeroglífico / O Frango Hieroglífico
Mañana Con Aire / Manhã Com Ar
El Tiempo Que No Se Perdió / O Tempo que não se
perdeu
Otra Cosa / Outra Coisa
Subúrbios / Subúrbios
UNO
Os jornalistas dirigiram
sua maquinaria extravagante
contra meus olhos e meu umbigo
para que lhes contasse coisas
como se eu estivesse morto,
como se eu fosse um vulgar
cadáver especializado,
sem levar em conta meu ser
que me exigia caminhar
antes de que eu regressasse
a meus costumes espantosos:
estive a ponto de voltar
a submergir na maré.
Porque minha história se duplica
quando em minha infância descobri
meu depravado coração
que me fez cair no mar
e acostumar-me a ser submarino.
Y si aminorados sufrían
nadie les escuchó un susurro.
E se aminorados sofriam
ninguém lhes escutou um sussurro.
Y en esta duda yo no sé
si dedicarme a meditar
o alimentarme de claveles.
NO ENTANTO ME MOVO
Entonces desencadené
mis inaceptables instintos
y la insaciable vanidad
que me lleva a tantos errores:
con esfuerzo desenrollé
mi nariz hasta convertirla
en una trompa de elefante.
Y con mortales malabarismos
lleve a tal grado la destreza
que a Piedrafina levanté
hasta las ramas de un cerezo.
Então desencadeei
meus inaceitáveis instintos
e a insaciável vaidade
que me leva a tantos erros:
com esforço desenrolei
meu nariz até convertê-lo
em uma tromba de elefante.
E com mortais malabarismos
levei a tal grau a destreza
que Pedrafina ergui até
os ramos de uma cerejeira.
Cerca de ti es cerca de mí
y lejos de todo es tu ausencia
y es color de arcilla la luna
en la noche del terremoto
cuando en el terror de la tierra
se juntan todas las raíces
y se oye sonar el silencio
con la música del espanto.
El miedo es también un camino.
Y entre sus piedras pavorosas
puede marchar con cuatro pies
y cuatro labios, la ternura.
Porque sin salir del presente
que es un anillo delicado
tocamos la arena de ayer
Y en el mar ensena el amor
un arrebato repetido.
INTEGRAÇÕES
Centella, tú me dedicaste
la lentitud de mis trabajos:
con la advertencia equinoccial
de tu fosfórica amenaza
yo recogí mis preferencias,
renuncié a lo que no tenía
y encontré a mis pies y a mis ojos
las abundancias del otoño.
Aprendí la velocidad
para dejarla en el espacio
y de mi lento movimiento
hice una escuela innecesaria
como una tertulia de peces
cuyo paseo cotidiano
se desarrolla entre amenazas.
Este es el estilo de abajo,
del manifiesto submarino.
Y no lo pienso desdeñar
por una ley de la centella:
cada uno con su señal,
con lo que tuvo en este mundo,
y me remito a mi verdad
porque me falta una mentira.
RECHAÇA OS RELÂMPAGOS
Centelha, tu me dedicaste
a lentidão de meus trabalhos:
com a advertência equinocial
da tua fosfórica ameaça
recolhi minhas preferências,
renunciei ao que não tinha
e encontrei a meus pés e a meus olhos
as abundâncias do outono.
Aprendi a velocidade
para deixá-la no espaço
e de meu lento movimento
fiz uma escola desnecessária
como uma tertúlia de peixes
cujo passeio cotidiano
se desenvolve entre ameaças,
Este é o estilo das profundezas,
do manifesto submarino.
E não o penso desdenhar
por uma lei da centelha:
cada um com seu sinal,
com o que teve neste mundo,
e me remeto à minha verdade
porque me falta uma mentira.
DESASTRES
En Valparaíso caían
alrededor de mil las casas
y desayuné en los escombros
de mi perdida biblioteca
entre un Baudelaire sobrevivo
y un Cervantes desmantelado.
Em Valparaiso caíam
ao redor de mim as casas
e fiz o desjejum nos escombros
de minha perdida biblioteca
entre um Baudelaire sobrevivente
e um Cervantes desmantelado.
Em Santiago as eleições
me expulsaram da cidade:
todos se cuspiam na cara
e a julgar pelos jornalistas
no céu estavam os justos
e na rua os assassinos.
Es mi deber de sacerdote,
de geógrafo arrepentido,
de naturalista engañado,
abrir los ojos del viajero:
El transeúnte me clavó
sus dos ojos incomprensivos
y se alejó en la luz del sol
sin responder ni comprender.
Y me dejó — triste de mí —
hablando solo en el camino.
MANHÃ COM AR
Arrepende-te do oxigênio,
disse ao viageiro surpreendido,
não se tem direito de entregar a vida
à exclusiva transparência.
E preciso entrar na casa escura,
entrar no beco da morte,
tocar o sangue e o terror,
compartir o mal espantoso.
O transeunte me cravou
seus dois olhos incompreensivos
e se afastou na luz do sol
sem responder nem compreender.
Terminaram-se os lamentos.
OTRA COSA