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SÃO VICENTE DE PAULO

CORRESPONDÊNCIA
––––––––

TOMO II
SÃO VICENTE DE PAULO

CORRESPONDÊNCIA, CONFERÊNCIAS E DOCUMENTOS


I
CORRESPONDÊNCIA

TOMO II (Janeiro de 1640 – Julho de 1646)

EDIÇÃO PUBLICADA E ANOTADA


POR
PIERRE COSTE
PADRE DA MISSÃO

PARIS
LIVRARIA LECOFFRE. J. GABALDA, EDITOR
90, RUA BONAPARTE, 90
1921
NIHIL OBSTAT
Clemente VIDAL, Padre da Missão.
Emílio NEVEUT, Padre da Missão.

PERMISSÃO PARA IMPRIMIR


Paris, 18 de novembro de 1919
F. VERDIER,
Superior Geral.

IMPRIMATUR
Paris, 19 de novembro de 1919.
Ed. THOMAS,
Vigário Geral.
ABREVIAÇÕES E NOTAS
–––––––

C. aut. – Carta autógrafa, i. é, toda inteira das mãos de São Vicente de Paulo.

C. as. – Carta assinada, i. é, escrita por um de seus secretários e assinada por São
Vicente de Paulo.

i.p.d.l.M – indigno padre da Missão (l, por causa do francês de la, em português, da).

N. do T. – Nota do Tradutor.

A introdução indica o que significam as expressões Reg[istro], Reg[istro] 2 e


fornece detalhes mais minuciosos sobre as outras fontes.

Os colchetes ( [ ] ) no corpo da carta indicam palavras ou frases interpretadas


por Pierre Coste a partir de originais ou cópias ilegíveis ou omissas.
SÃO VICENTE DE PAULO
CORRESPONDÊNCIA
___________________________

417. – A LUÍSA DE MARILLAC, EM ANGERS

Paris, 11 de janeiro de 1640.


Senhora,

Recebi três cartas vossas esta semana. Senti com isto tal consolação que só Deus
a pode exprimir, ele que é o único capaz de me concedê-la. Mas esta consolação aqui e
ali sofre algum intervalo, quando me falais do estado de vossa enfermidade. Peço-vos,
Senhora, fazê-lo sempre. E quando estiverdes em condição, deverá ser-vos enviada uma
liteira, para viajar para aqui. Fazei também o possível para vos curar.
Visto que estes senhores1 querem tratar do negócio por escrito, fá-lo-eis, in
nomine Domini, mandando redigir o tratado em vosso nome, como diretora das Filhas
da Caridade, servas dos pobres doentes dos hospitais e das paróquias, sob o beneplácito
do Superior Geral da Congregação dos Padres da Missão, diretor das referidas Filhas da
Caridade. E onde se faz menção, no seu pequeno regulamento, que elas dependerão,
[naquilo que não diz respeito]2 ao hospital, dos superiores de Paris, podereis deixar
expresso o nome do dito superior.
No caso de vos pedirem as cartas de ereção desta instituição, direis que não há
outras, a não ser a do poder concedido ao referido superior, diretor das Confrarias da

.
Carta 417. – Manuscrito São Paulo, p. 60.
11
Os Administradores do hospital de Angers.
22
O Manuscrito São Paulo omitiu evidentemente algumas palavras; as que acrescentamos dão sentido à frase. De
resto, eis o artigo do regulamento: “elas obedecerão aos seus superiores daqui, no que toca à disciplina e conduta
interna, e aos senhores Administradores, nas coisas externas referentes ao regimento do hospital quanto à assistência
aos pobres, e à superiora delas quanto à execução do referido regimento e, em geral, a tudo que ela lhes ordenar”.
Caridade, como se faz em toda parte, especialmente nessa diocese, em Bourgneuf 3, nas
terras, parece-me, de Madade Goussault. Contudo, não estou bem certo disto no caso de
Richelieu, na diocese de Poitiers.
Fareis bem em mandar chamar as Irmãs de Richelieu 4, o quanto antes, uma vez
que, cessando o contágio por aí, elas recomeçarão a trabalhar.
Oram a Deus por vós em vários lugares de Paris. Todos se interessam pela vossa
saúde, não imaginais até que ponto!

418. – A LUÍS ABELLY, VIGÁRIO GERAL DE BAYONNE

14 de janeiro de 1640.

A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja sempre convosco!


Rendo graças a Deus por todas as graças que sua bondade dispensa ao senhor
Bispo de Bayonne, conforme vejo pela vossa carta de 10 de dezembro. Peço a ele lhas
continue dispensando. Ó senhor Padre, como o povo daí está admirado, a meu juízo, por
ver seu prelado vivendo como verdadeiro bispo, depois de tantos séculos em que foram
privados de igual felicidade!
Com toda certeza, senhor Padre, tenho perfeita confiança na bondade de Deus,
que chamou Sua Excelência ao ministério de modo tão distante de ostentação, que ele
lhe dará todas as graças necessárias para perservar e se aperfeiçoar no modo de vida que
ele começou, e que os bons anjos corporais que colocou em torno dele farão o mesmo.
Ó meu Deus, senhor Padre, o que não se deve esperar em favor de um prelado
que tão bem disciplinou sua vida e a de seus servidores, que distribuiu tanta esmola
corporal e espiritual em sua diocese, que cuida tanto dos pobres prisioneiros, que obtém
tanta bênção na conversão dos hereges, que não admite mulheres em sua casa, nem ad
proximiora sacri altaris (nem nas proximidades do sagrado altar), que constituiu seu
conselho com o melhor que pôde e quer agir em sintonia com ele? O que não se deve
esperar, digo eu, em termos de graça e bênçãos sobre tal prelado e sobre aqueles quos
vocavit in sortem operis ejus (que chamou para partilhar do seu labor)? Sem dúvida não
há, por parte de Nosso Senhor, bem ou auxílio algum que ele e vós não devais esperar.
Ó meu Deus, senhor Padre, como causais confusão e humilhação no filho de um
pobre roceiro, que foi guardador de ovelhas e de porcos, que ainda permanece na
ignorância e no vício, tendo a coragem de lhe pedir o parecer! Obedecer-vos-ei,
contudo, com o sentimento daquela pobre mula1 que outrora falou por obediência
devida a seu dono. Faço-o, porém, com a condição de que, do mesmo modo que não se
33
Na circunscrição de Cholet.
44
Bárbara e Luísa.
.
Carta 418. – Dossiê de Turim, cópia do século XVIII tirada do original. Este original foi enviado ao Grão-Duque de
Toscana a 20 de janeiro de 1704 por Francisco Watel, Superior Geral da Missão.
11
O asno, ou antes, a mula de Balaão (Nm 22, 28).
dá importância ao que dizem os tolos, nem Sua Excelência, nem vós, não tenhais
consideração alguma para com o que eu disser, a não ser na medida que o senhor Bispo
o julgar condizente com seu melhor juízo e com o vosso.
Dir-vos-ei portanto, em primeiro lugar, a respeito dos religiosos em geral, ser
melhor, segundo penso, tratar com eles como o fez Nosso Senhor com os do seu tempo,
mostrando, primeiramente, com seu exemplo, como devem viver; com efeito, um padre
deve ser mais perfeito que um religioso como tal, e muito mais o bispo.
Depois de lhes ter falado pelo exemplo, durante um bom tempo (Nosso Senhor
falou esta linguagem durante trinta anos), falar-lhes-eis então com doçura e caridade e,
finalmente, com firmeza, sem, contudo, usar contra eles de suspensão, interdição ou
excomunhão e sem privá-los do exercício de suas funções. Eis, senhor Padre, como agiu
Nosso Senhor. E tenho especial confiança em que um prelado que agir da mesma forma
obterá mais proveito com esta espécie de pessoas do que com todas as censuras
eclesiásticas juntas.
Nosso Senhor e os santos fizeram mais sofrendo do que agindo. Foi assim que o
bem-aventurado Bispo de Genebra2 e, a seu exemplo, o falecido Bispo de Comminges3
se santificaram e foram a causa da santificação de tantos milhares de almas.
O que vos digo, senhor Padre, parecer-vos-á um pouco severo, mas o que fazer?
Tenho tão grande apreço às verdades que Nosso Senhor nos ensinou por palavras e
exemplo que não posso deixar de crer que tudo que for feito de acordo com elas obterá
êxito perfeito, ao contrário do que se fizer em desacordo.
Sim, diríeis, mas eles desprezarão um prelado que agir desta maneira. É verdade
e é necessário sofrê-lo para honrar a vida de Nosso Senhor em todos os seus estados, em
nossas pessoas, em todas as condições.
Mas é também verdade que depois de ter sofrido algum tempo e tanto quanto
aprouver a Nosso Senhor, e com Nosso Senhor, ele vos dará a graça de fazer maior bem
em três anos de vida do que o faríamos em trinta. Que poderia dizer, senhor Padre?
Penso não ser possível fazer de outro modo. Poder-se-iam fixar muitas determinações,
usar de censuras, proibir de confessar, de pregar, de solicitar ajudas. Mas, apesar de
tudo isso, as pessoas jamais se corrigirão. E o império de Jesus Cristo nunca se dilatará
ou se conservará nas almas por este meio. Outrora, Deus armou céus e terra contra o
homem. Ó meu Deus! De que adiantou? Não foi enfim preciso que ele se abaixasse e se
humilhasse diante do homem, para levá-lo a acolher o doce jugo do seu império e de sua
conduta? E o que um Deus não pôde fazer com todo seu poder, o que poderia fazer um
prelado com o seu? Assim, senhor Padre, julgo que o senhor Bispo tem razão ao não
fulminar excomunhão contra esses religiosos proprietários, e também por não impedir
tão logo aqueles, que já examinou e aprovou, de ir pregar, na quaresma e no advento,
nas paróquias rurais, onde não há estações de Via-Sacra, por lhes parecer rígido e
exorbitante. Os párocos e o povo que têm suas devoções particulares ficariam
constrangidos. Se por acaso alguém abusar do ministério, então, vosso sábio
procedimento aplicará o remédio conveniente.
22
São Francisco de Sales.
33
Bartolomeu Donadieu de Griet, Bispo de Saint-Bertrand-de-Comminges (Haute-Garone), falecido a 12 de
novembro de 1637 (La vie de messire Bathélemy de Donadieu de Griet, éveque de Comenge, por E. Molinier, Paris,
1639, in-8º).
Quanto à religiosa que me dizeis ser necessária no seu mosteiro e que não
obstante provoca intrigas e maledicências e pode assim contaminar as outras, eu não sei
o que vos responder sobre isto, senhor Padre, porque vós não vos explicais bem. Se
julgais conveniente, escrevei-me a respeito, será bom dizer-me em quê ela é necessária,
e se pertence a uma Ordem onde as religiosas podem ser transferidas.
Eis, senhor Padre, o que vos posso dizer no presente, com grande pressa e com
muitos intervalos. Vossa caridade perdoará as deficiências que encontrardes em tudo
que vos digo e me fará o obséquio de garantir ao senhor Bispo de Bayonne minha
obediência, e aos senhores Padres Perriquet4, Le Bretton e Dumesnil, meus serviços.
Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e muito
obediente servo,
Vicente de Paulo.

419. – A LUÍSA DE MARILAC, EM ANGERS

Paris, 17 de janeiro de 1640

Senhora,

Meu Deus, Senhora, obrigais-me a escrever-vos com urgência. Como não? Vós
não me informais sobre o estado de vossa doença. Suplico-vos, Senhora, fazê-lo com
exatidão, para que vos envie uma liteira, quando estiverdes em condição de regressar
daí, tão logo vossa indisposição o permitir. Oh! como vossa presença é necessária aqui,
não apenas para vossas filhas, que estão muito bem, mas também para os negócios
gerais da Caridade!
A assembleia geral das Damas do Hospital Geral se realizou quinta-feira
passada. Madame Princesa1 e madame Duquesa de Aiguillon honraram-na com sua
presença. Jamais vi o grupo tão numeroso e com tanta modéstia, ao mesmo tempo. Nela
ficou resolvido receber todas as crianças expostas. Ficai sabendo, Senhora, que nela não
fostes esquecida.
Comuniquei-vos que seria bom, como diretora das pobres camponesas Filhas da
Caridade, as coloqueis sob o beneplácito do Superior Geral da Congregação das
referidas Filhas2. Mas vos rogo, Senhora, fazê-lo quanto antes e partir de Angers

44
Ele era, como Luís Abelly, Vigário Geral de Francisco Fouquet, Bispo de Bayonne.
.
Carta 419. – Manuscrito São Paulo, p. 62.
11
Carlota Margarida de Montmorency, mulher de Henrique II de Bourbon, primeiro príncipe da família, príncipe de
Condé, Duque de Enghien, par e Grão-Mestre da França. Esta caridosa princesa, mãe do grande Condé, perdeu seu
marido a 26 de dezembro de 1646 e morreu em Châtillon-sur- Loing a 2 de dezembro de 1650.
2
Ver carta 417.
3
O tratado foi assinado no dia primeiro de fevereiro.
4
Bárbara Angiboust e Luísa. São Vicente queria dar-lhes a consolação de rever Luísa de Marillac.
2
imediatamente depois de aprovar os artigos, que vos peço redigir o mais depressa
possível3.
Escrevo ao padre Lambert vos envie vossas filhas de Richelieu 4. Mas se tudo
estiver pronto para o vosso retorno, não as espereis. Enviai-lhes antes alguém, para vos
irem esperar em Tours, se julgardes que não possam encontrar-vos em Angers.

420. – A LUÍSA DE MARILLAC

Paris, 22 de janeiro de 1640

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Voltei ontem à tarde da zona rural e encontrei a carta que escrevestes ao Padre
Dehorgny, do dia 14 deste mês. Vossa carta me leva a pensar que não recebestes as
minhas. Eu vos escrevi todas as semanas e há apenas três dias que o fiz pela última vez.
Isto me faz pensar que minhas cartas não vos foram entregues.
Aqui vai a resposta às principais coisas que me escreveis. Em primeiro lugar o
que diz respeito aos artigos [dos]1 senhores Administradores do hospital2. Parece-me
que faríeis bem em mandar redigi-los no vosso nome, como diretora das pobres Filhas
da Caridade, sob o beneplácito do Superior Geral da Congregação dos padres da
Missão, diretor das referidas Filhas. Quanto às condições, não sei o que vos dizer sem as
ver. Mas se quiserem que estejam conformes aos artigos do regulamento e que as
despesas sejam por conta delas, penso serem necessários ao menos cem francos para
cada uma ou vinte e cinco escudos.
Quanto a vosso retorno, peço-vos seja o mais cedo possível. Providenciai uma
liteira e aluguai dois vigorosos cavalos.
Eu vos teria enviado uma liteira, não fosse a incerteza sobre o que vos seria
melhor, uma liteira ou uma padiola. Esta última me parece mais cômoda. Suplico-vos,
Senhora, nada poupar e, custe o que custar, arranjar o que vos for mais cômodo.
Um senhor de condição me tira a caneta da mão e me obriga a dizer-vos que vos
aguardo com aquele coração que Nosso Senhor e sua Santa Mãe sabem.
Sou, em seu amor, V.S.
Vicente de Paulo.
3

.
Carta 420. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
1
O original traz a partícula francesa que e não de. Ficando assim, a frase não tem sentido. Não poderíamos afirmar
que nossa mudança corresponde bem ao pensamento de São Vicente. Com efeito, pode ser que o Santo, por distração,
tenha deixado o membro da frase inacabado. Nesta hipótese, seria necessário deixar o que e acrescentar algumas
palavras depois de les maítres de l’hôpital (os donos do hospital).
2
Os Administradores do hospital. São Vicente os chama ora de donos do hospital (maítres de l’hôpital, ora de pais
dos pobres ( pères des pauvres ).
1

2
421. – A LUÍSA DE MARILLAC

Paris, 28 de janeiro de 1640.

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Fiquei muito consolado por me terdes informado sobre a natureza de vossa
enfermidade, esperando que o clima vos restabelecerá.
Se arranjardes uma padiola, como vos escrevi– pois uma carroça na estrada de
Orléans a Paris vos atormentaria demais– bastar-vos-á ter convosco uma filha. Podeis
mandar as outras por via fluvial até Tours e de lá, de carroça, até aqui20.
Quanto a Madame Turgis, meu pensamento é que ela permaneça por lá pelo
tempo que me dissestes e talvez para sempre21. O que me relatais como dificuldade não
é considerável.
Estava esquecendo-me de vos dizer, relativamente ao vosso regresso, que vos
teria enviado um coche, não fossem as três léguas de estrada ruim entre Chartres e Le
Mans, intransitáveis nesta época do ano. Acresce que não podemos desviar os coches de
suas viagens ordinárias sem que o público proteste22.
Disse-vos o meu ponto de vista em relação aos artigos e às precauções que
deveis tomar23.
Faríeis bem em trazer esta boa jovem e as filhas das quais me falais24.
O que vos disse M., vosso filho, é verdade. Se for possível dizer-me o dia em
que estareis em Chartres, caso passeis por lá, ele vos irá esperar lá. E lá, se estiverdes
passando bem, podereis pegar o coche.
É bom providenciar o dinheiro aí para não ficardes desprovida no caminho.
Faremos aqui o reembolso do que nos apresentardes.
Estou na esperança de vos ver com boa saúde e com desejo de que o seja quanto
antes, sem contudo vos apressar.
Aí está uma estampa que mandaram imprimir na Caridade. Sois a primeira pessoa a
quem envio um exemplar. Um pintor a fez gravar. O custo é de oitenta escudos25.
.
Carta 421. – C. aut.– Dossiê da união, original.
20
Indo a Angers, Luísa de Marillac tinha levado com ela várias de suas filhas, sem saber ao certo com quantos o
hospital ficaria. Deixou lá apenas nove : madame Turgis, Elisabete Martin, Cecília Inês Angiboust, irmã de Bárbara,
Clemência Ferre, Madalena Monget, Genoveva Caillou, Margarida François, Maria Matrilomeau e Bárbara
Toussaint. Elisabete Martin ficou com a função de superiora.
21
Ela voltou para Paris antes do fim do ano.
22
O Cardeal Richelieu tinha dado para a Congregação da Missão, como dote para a nova casa de Richelieu, a renda
dos coches de Loudun(Cf.Carta 293). Embora livre para mudar os coches do seu trajeto ordinário, São Vicente devia
ter em conta os interesses do público para não descontentá-lo.
23
Ver cartas 414, 417 e 419.
24
Provavelmente postulantes.
25
A Casa-Mãe das Filhas da Caridade possui um quadro do século XVII que poderia muito bem ser a obra do pintor
de que fala aqui São Vicente. Nosso Senhor tem as mãos estendidas, como chamando para ele. Os pés nus repousam
sobre o globo terrestre. Em cima da cabeça, a inscrição: Deus caritas est (Deus é amor). Em baixo, à esquerda, um
padre dá a comunhão a uma doente deitada no leito. À direita, uma “irmã da confraria, com um copo na mão, espera
o momento de apresentá-lo à doente. São Vicente e Luísa de Marillac vão difundir a estampa do “Senhor da
Caridade” (Cf. Cartas de Luísa de Marrilac, Carta 3). Esta estampa é a última das reproduzidas por Georges Goyau
em seu livro sobre As damas da Caridade do Padre Vicente, Paris, 1918.
Vossas filhas estão bem , graças a Deus e trabalham bem. Quanto a mim, sou, no
amor de Nosso Senhor, Senhora, vosso muito humilde servo,
Vicente de Paulo.

422. – A LUÍSA DE MARILLAC

Paris, 31 de janeiro de 1640.

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


A carta que me escrevestes por outra mão, que me foi entregue ontem, e que me
fala da diarréia que vos acometeu, me causou não pequena dor pelo mal de que sofreis.
Bendito seja Deus, por te sido do seu agrado! Espero de sua bondade vos devolva a
saúde e redobro as preces para este fim. Mas o que me dizeis, Senhora, voltar pelo rio?!
Ó Jesus! Guardai-vos disto! Peço-vos mandar fazer uma padiola e alugar, ou antes,
comprar dois bons cavalos, e viajar de lá até aqui por esse transporte. Pagaremos aqui o
preço deles. Eu fiz o mesmo, certa vez, e o ar livre me fez tão bem que, em menos de
três dias, me sentia tão refeito que passei para a carruagem da falecida Madame
General1, ao que me parece. O senhor Grandnom escreve sobre isto, como o vereis por
sua carta, a um homem importante de Angers.
O senhor Du Fresne me disse, espontaneamente, sem que disso lhe falasse, que
seria bom me enviásseis um recibo das duas mil libras que tem para vós, como também
uma pequena carta para ele, na qual o autorizeis colocar esta quantia em nossas mãos ou
nas de um outro, como vos aprouver.
O senhor vosso filho se oferecia ontem para ir encontrar-vos em Angers, mas
não o julguei necessário. Dizei-nos vosso sentimento a respeito.
Vossas filhas trabalham bem. Ana, a mais velha, me disse que Maria  é rigorosa
demais. Oh! como precisamos de vós para o andamento geral das coisas! Espero da
bondade de Deus vos reconduza com saúde. Em nome de Deus, Senhora, fazei o que
puderdes para este fim e para vos manter na maior alegria que vos for possível.
Rendo graças a Deus por se achar melhor nossa cara irmã Isabelle, e agradeço
humildemente nossa querida Madre, superiora da Visitação Santa Maria , pela
lembrança que tem de mim. Vou celebrar a Santa Missa por ela e por toda a sua santa
Comunidade.
Bom dia, Senhora. Rogo-vos de novo ter cuidado de vossa saúde. Sou no amor
de Nosso Senhor, vosso muito humilde e obediente servo,
.
Carta 422. – C. aut.– Original em Dourdan (seine- et- Oise) com as Filhas da Caridade.
11
Madame de Gondi, esposa de Felipe Emanuel de Gondi, General das Galeras.

Provavelmente Maria Joly.

Elisabeth Martin.

Clara Madalena de Pierre, anteriormente religiosa no primeiro mosteiro de Paris, onde fizera profissão a 28 de maio
de 1623 e que tinha deixado em 1626 para entrar no segundo mosteiro, quando da sua Fundação. Foi colocada à
frente dos conventos de Angers, de Tours e de Saumur. Foi nesta última cidade que veio a falecer em 1674, com a
idade de 71 anos.
Vicente de Paulo.

Há algum tempo, recebi as duas cartas anexas.

Destinatária: A Senhora Le Gras, diretora das Filhas da Caridade do Hospital


Geral de Angers, em Angers.

423. – A LUÍS LEBRETON

Paris, 01 de fevereiro de 1640

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Acabo de receber vossa carta de três de janeiro. Nela vi as bênçãos que Nosso
Senhor concede aos vossos trabalhos. Agradeço a Deus e peço-lhe conservar-vos por
muitos anos para a sua glória e o bem desta pequena Congregação. Suplico-vos, senhor
Padre, fazer para isto o que puderdes. Moderai vossos trabalhos e alimentai-vos bem. A
pequena indisposição que acabais de ter foi por falta disto, temo eu.
Liquidei a letra de câmbio das cem libras que pegastes com o senhor Marchand,
há dois meses, aproximadamente, assim como as cinquenta libras do câmbio. Farei o
mesmo, com o auxílio de Deus, com tudo que tomardes de empréstimo. Peço-vos,
senhor Padre, não deixar de pegar o que vos for preciso.
Louvo a Deus por terdes, o R.P. assistente  e vós, aprovado o último projeto que
vos enviei, e respeito as modificações que acrescentais. Vou examinar tudo com
particular atenção e em breve vos escreverei.
Penso, senhor Padre, que fareis bem em trabalhar sem cessar, pelo nosso
estabelecimento em Roma. Podeis alugar para isto um pequeno alojamento, ou até
mesmo comprar uma pequena casa, se a encontrardes por três ou quatro mil libras, em
qualquer lugar, dummodo sit sanus(enquanto seja sadio). Não importa se for num
subúrbio. Não queremos realizar ações públicas na cidade. O quarteirão de fora do
Vaticano não é muito afastado. Estou certo de que a bondade do senhor Marchand vos
disponibilizará esta soma, que pagaremos aqui no momento fixado. É necessário nos
aclimatemos neste lugar, quero dizer, na cidade ou no subúrbio.
Vou enviar vossas cartas ao Senhor de Trévy, e ao senhor vosso primo a sua
carta e os três breves de Roma.
Nossos missionários para a diocese de Genebra, em número de cinco, partiram,
há três dias. Temos o propósito de enviar-vos um, se conseguirdes o estabelecimento.
.
Carta 423. – C. aut.– Dossiê de Turim, original.

O padre Estêvão Charlet, da Companhia de Jesus, assistente da França.

Pelo contrato de 3 de junho de 1639, São Vicente se comprometera a fornecer dois padres e um Irmão e pelo de 26
de janeiro de 1640, a dobrar o número. Os cinco missionários em questão são Bernardo Codoing, Pedro Escart,
Jacques Tholard, Duhamel e Bourdet.
Quanto à bula de nossa segurança como estabelecimento, rogo-vos mandar-me o
projeto resumido que vos enviei. Dentro de oito ou dez dias, escrever-vos-ei se é preciso
ater-se a este último, com as referidas modificações.
Enviar-vos-ei igualmente a ordem que a Providência dispôs na instituição de
nossa Companhia. Não quis mandar escrever nada sobre isso, até o presente. Mas me
parece ser a vontade de Deus que o façamos, uma vez que nos é notificada por fonte tão
difedigna.
Sou, entretanto, no amor de Nosso Senhor e de sua Santa Mãe, muito humilde e
muito obediente servo,
Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Lebreton, padre da Missão, em Roma.

424. – A JACQUES THOLARD, PADRE DA MISSÃO, EM ANNECY

Paris, São Lázaro, 01 de fevereiro de 1640

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi a vossa carta com tão sensível alegria que não consigo exprimi-la, e ela
não tem outro motivo a não ser o de que é uma carta do Padre Tholard, que meu coração
estima muito mais do que posso dizer. Entretanto, fiquei igualmente aflito lendo o que
me relatais sobre vossa cruz, à qual a Providência vos prendeu. Não foi com certeza
para vossa perda, como temeis, mas, como em São Paulo, para que virtus tua in
infirmitate perficiatur (vossa virtude se aperfeiçoe na fraqueza).
A graça de Deus vos tendo bastado no momento mais forte da tentação, tendes
motivo de esperar a mesma eficiência na graça que agora vos dá e que se manifesta na
pureza de intenção com que começais a atender as confissões, possuído pelo temor de
ofender a Deus nessas horas e no remorso quando a violência da tentação, tirando-vos a
liberdade, faz sucumbir a natureza, vacando rei licitae (entregando-se a um trabalho
lícito). Finalmente, a graça de Deus se manifesta ainda na firme resolução de preferir
morrer a fazer voluntariamente o mal...
Como sabeis, o pecado deve ser de tal modo voluntário que, se faltar o
consentimento da vontade, não há pecado nas ações em que objetivamente pareceriam
existir...

.
Carta 424. – C. aut. – Dossiê de Turim, original. O assunto tratado nesta carta é tão delicado que tivemos de omitir
alguns tópicos.

Jacques Tholard, nascido em Auxerre, a 10 de junho de 1615, foi recebido na Congregação da Missão a 20 de
novembro de 1638 e ordenado sacerdote a 17 de dezembro de 1639. Morreu depois de 1671. Mostrou durante toda a
sua vida, por onde passou, as qualidades de um excelente missionário. Foi colocado em Annecy (1640-1646),
Tréguier, onde foi superior (1648- 1653), Troyes (1658-1660), São Lázaro, Fontenebleau e outras casas. A província
da França e a de Lyon o tiveram como Visitador no generalato do Padre Renê Alméras.
Conheço um santo eclesiástico que jamais ou raramente atende confissões sem
cair nestas fragilidades. Contudo, jamais se acusa em confissão, a não ser na confissão
anual, na qual se acusa, não da substancia da coisa, mas de não ter detestado bastante o
prazer que a miserável carcaça experimenta nisso e pelo temor de que sua vontade tenha
contribuído de algum modo nesse ato. E se credes em mim, senhor Padre, não vos
confessareis jamais, a não ser na mesma ocasião e da mesma maneira como ele, que é
um dos melhores e mais fervorosos eclesiásticos que conheço na terra. E mais, é
reconhecido por todo mundo como tal.
Certo, mas não é o meu caso. Ele dispõe de algum sinal, talvez, pelo qual
reconhece que não tinha liberdade quando foi levado pela violência da natureza. Mas eu
não estou nesse caso, pois me parece que eu poderia evitar isso.
Não, senhor Padre, não o creiais. Esses movimentos e seu efeito não dependem
de vossa vontade. E ela não poderia impedi-los, na agitação da natureza. Por
conseguinte, a coisa não é voluntária em vós, como nem também nele, e em ninguém
mais...
Sim, mas não seria melhor abster-me totalmente de atender confissão? Ó Jesus!
De modo algum. Deus vos chamou para a vocação em que estais. Nela vos abençoou e
conservou. Dilatastes muito, por este meio, o império de Deus e salvastes numerosas
almas. Continuareis a fazer tudo isto com mais graça e êxito, como espero.
Ó Jesus, senhor Padre, como poderíeis reparar o desagrado e o prejuízo para a
glória de Deus e às almas que resgatou com seu precioso sangue, se abandonardes o que
fazeis? Lembrai-vos, senhor Padre, que só se colhem rosas em meio a espinhos e não se
fazem ações heroicas de virtude a não ser na fraqueza. São Paulo não abandonou a obra
de Deus porque padecia de tentações. Nem abandonamos o cristianismo porque nele
sofremos grandes e horríveis provações. E nem podemos deixar de viver pelo fato de
que nossa vida reside na concupiscência da carne, na concupiscência dos olhos e no
orgulho da riqueza...
Será bom passar por cima destes assuntos do modo mais ligeiro possível. É a
primeira advertência que se faz, comumente, e que não se fique angustiado com isto...
Eis, senhor Padre, o que vos devo dizer diante de Deus e dentro da doutrina e
dos ensinamentos dos santos. Não vos preocupeis com o que, segundo dizeis, vossos
confessores vos dizem sobre este assunto. Eles não estão bastante esclarecidos e não
têm suficiente experiência disto. Não vos confesseis disto de modo algum, a não ser da
maneira como vos disse. Ofereço-me para responder diante de Deus por vós, de quem
sou, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde servo,
Vicente de Paulo.

425. – A LUÍSA DE MARILLAC

Paris, 04 de fevereiro de 1640.


Cf 1 Jo 2,16 (N.do T.)

.
Carta 425. – C. aut. – Original com as Filhas da Caridade da Rua Monceau, em Paris.
Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Podeis imaginar, mas não sentir, a minha alegria ao receber vossa carta de 28 de
janeiro. Ó Jesus, Senhora, como dou graças, com todo amor, a Deus, porque estais
passando melhor. Peço-lhe de coração vos devolva as forças, para poderdes voltar logo.
Com todo prazer, Senhora, recebemos este nobre senhor entre os ordinandos e o
hospedaremos e serviremos do melhor modo possível, tanto em atenção ao senhor Padre
de Vause que vo-lo recomendou, quanto, por causa da gratidão pelos favores que lhe
deveis, e ainda, pelo que nos diz respeito, por causa de vós.
O Padre Lambert me comunica que ia enviar vossas filhas de Richelieu na
charrete da casa. Se Nosso Senhor vos der alguma luz sobre Bárbara , a respeito da
direção, servi-vos dela e enviai outra em seu lugar.
Nossas filhas daqui trabalham bem, graças a Deus. Confessei-as com muita
consolação, há três dias.
Fiquei muito ocupado esta manhã, na oração, pensando num alojamento em La
Villette, onde vejo muitas vantagens. O senhor Pároco oferece sua paróquia. Vê-lo-
emos.
Que faremos da irmã de Maria, de Saint-Germain, que é gaga? Parece muito boa
moça. Mas não sei se ela tem bom senso. Sua boa irmã nos pressiona para recebê-la.
Não me dizeis nada sobre o que vos propus a respeito da padiola.
Tiram-me a pena da mão. Devo ir à missa que se vai celebrar em Notre-Dame,
pela Caridade de Lorena.
Bom dia, Senhora. Sou, em Nosso Senhor, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras, diretora das Filhas da Caridade do Hospital


Geral, em Angers.

426. – A LUÍSA DE MARILLAC, EM ANGERS

São Lázaro, 10 de fevereiro de 1640.


Bárbara Angiboust, da casa de Richelieu.

Para a direção do hospital de Angers ( ver a carta 481 e, na correspondência autografada de Luísa de Marillac, as
cartas 103 e 108).

La Villette se situava então, como La Chapelle, fora de Paris. Hoje, são dois populosos quarteirões da capital.
.
Carta 426. – Manuscrito São Paulo, p. 63.
Senhora,

Recebi vossa carta de 27 do mês passado. Ela me trouxe tanta consolação que
nada depois foi capaz de me contristar. Bendito seja Deus porque estais agora melhor de
saúde e porque estais planejando vosso retorno! Oh! como sereis bem recebida e com
que ansiedade vos aguardam! Louvo a Deus porque as damas dessa cidade dão prova de
aceitar o exercício da Caridade do Hospital Geral e lhe peço pelo êxito deste santo
empreendimento, em sua honra. Não vos enviei os relatórios das damas daqui,
Senhora? Penso tê-lo feito e espero já os tenhais recebido. Do contrário, enviá-los-emos
quando de vosso regresso. Não deixeis de pô-los em prática. Fazemos assim com
frequência com as Caridades do interior. O tempo é pouco para mandar-vos fazer uma
cópia. O mensageiro parte dentro de quatro dias.
Vossas filhas se comportam bem, graças a Deus. Recebemos mais duas que
poderemos ajuntar às outras, com dois dias. Há muito tempo estamos adiando,
esperando vossa volta. Estas boas jovens de Lorena estão muito ansiosas.
Estou esperando para dentro de seis horas a filha do senhor Cornuel 2. Ele deixou
uma renda de seis mil libras para os condenados às galés. Trataremos da maneira como
dar assistência a eles3.
Admiro-me por nada dizerdes de vossas filhas de Richelieu. Elas vos foram
encontrar.
Muito bem! Termino com novas ações de graças a Deus, pois, por sua graça,
bem cedo nos veremos.
Enquanto espero este abençoado dia, sou no amor de Nosso Senhor...

427. – UM PADRE DA MISSÃO A SÃO VICENTE

Bar-le-Duc, fevereiro de 1640.

Em cada distribuição de pão, foram entregues roupas a vinte e cinco ou trinta


pobres.
Há pouco tempo pude vestir um total de duzentos e sessenta, contados. Mas vos
direi, senhor Padre, quantos pude, sozinho, vestir espiritualmente pela confissão geral
e pela sagrada comunhão? Num mês apenas, contei mais de oitocentos. Espero que
nesta quaresma faremos mais ainda. Todos os meses damos ao hospital uma pistola e


Fundaram em Angers uma associação de Damas da Caridade ao modelo da de Paris.
22
Claudio Cornuel, antigo intendente das finanças do Tribunal de Contas.
33
São Vicente teve muito trabalho para conseguir esta herança, reivindicada pelos herdeiros. Ele suplicou, insistiu,
pediu a intervenção de Mateus Molé, então Procurador Geral. Conseguiu, afinal, que um capital capaz de assegurar a
renda de seis mil libras fosse entregue nas mãos deste último e administrado por ele e seus sucessores no cargo. Desta
renda serão tirados os fundos necessários para a manutenção das Filhas da Caridade a serviço dos pobres forçados e
para remunerar condignamente os padres de Saint-Nicolas que desempenhavam as funções de capelães (Cf. Abelly,
op. cit. , t I, cap. XXVIII. P. 128).
.
Carta 427. – Abelly, op. cit. 1. II, cap. XI, sec. I, 1ª Ed.
meia em favor dos doentes que para lá enviamos. Como, no meio deles, há cerca de
oitenta mais doentes que os outros, damos-lhes soja, carne e pão.

428. – A ANTÔNIO LUCAS

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Bendito seja Deus, senhor Padre, pela graça que vos concede, a vós e a vossos
companheiros, de trabalhar tão valorosamente, como me diz o senhor Cuménon 1! Mas
como vós estais passando? Moderastes um pouco o excesso de vosso fervor? Suplico-
vos fazê-lo, em nome de Nosso Senhor. Se vós ou alguns dos vossos companheiros
precisardes de algum remédio depois da missão, peço-vos voltar para aqui ou descansar
onde estais, depois da missão. Em seguida ireis pregar as duas pequenas missões, ao
mesmo tempo, mas não sozinho, como me dizeis. Enviar-vos-ei os coirmãos Germain 2 e
o jovem Guérin3 ou apenas o primeiro, no lugar do senhor Padre Telutatz 4, que
mandareis de volta, depois da missão.
Encontrareis por aí bacalhau, manjubas, manteiga, frutas, passas 5 para a
sobremesa? Comunicai ao Padre Portail aquilo de que vós precisais, por favor.
Saúdo os coirmãos da casa e sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso
muito humilde servo,
Vicente de Paulo.

Peço-vos poupar vossa saúde e encarregar Louistre6 do que resta a fazer e


colocar em ordem na Caridade. Suplico-vos, senhor Padre, confiar-lhe este cuidado.
Não é conveniente estabelecer esta Caridade e a do Rosário; além disso, o Geral dos
jacobinos não está de acordo. Nossas notícias são: o senhor Padre Boucher está melhor
de saúde, tínhamos ontem dezoito fazendo retiro espiritual e hoje dezessete, dos quais
três são de Sorbona.

Destinatário: Ao senhor Padre Lucas, Padre da Missão em Saint-Prix7.

.
Carta 428. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
Nome de leitura duvidosa.
22
Richard Germain, nascido em Vaudry (Calvados). Entrou, já padre, na Congregação da Missão a 22 de junho de
1639, com a idade de 36 anos, colocado em Roma (1642-1643).
33
Jean Guérin, nascido em Remíremont. Foi recebido na Congregação da Missão a 4 de fevereiro de 1639, com a
idade de 21 anos. Não confundi-lo com Jean Guérin, superior de Annecy, nem com Juliano Guérin, que exercerá mais
tarde seu apostolado na Tunísia, entre os escravos.
44
Nome de leitura duvidosa. Não encontramos nem este nome, nem outro semelhante no catálogo da Congregação
da Missão.
55
Traduzimos assim o nome francês “quatre mendiànts”, dado a quatro espécies de frutas secas: figos, avelãs
graúdas, uvas e amêndoas. Era quaresma, por isso São Vicente não alude a carnes, nem a ovos.
66
João Louistre, nascido em Mantes. Ingressou na Congregação da Missão a 14 de março de 1837, com a idade de 24
anos. Fez os votos a 14 de março de 1642. Havia um Irmão Coadjutor com o mesmo nome.
77
Seine-et-Oise.
429. – PADRE ROUSSEL1 A SÃO VICENTE

Bar-le-Duc, fevereiro de 16402.

Soubestes da morte do padre de Montevit3 que tínheis enviado para aqui. Sofreu
muito na sua longa doença. Posso dizer sem mentir que jamais vi tão grande e serena
paciência como a sua. Jamais lhe ouvimos palavra que denotasse a menor impaciência.
Suas conversas exalavam uma piedade fora do comum. O médico nos disse várias vezes
que jamais tratara paciente mais obediente e simples. Comungou muito frequentemente
durante a doença, além das vezes que o fez em forma de viático. Seu delírio de oito dias
inteiros não o impediu de receber lucidamente a Unção dos Enfermos, pois ele
recobrou os sentidos, quando lhe administraram este sacramento e voltou logo após ao
estado anterior depois de recebê-lo. Enfim, ele morreu como desejo e peço a Deus
morrer.
Os dois cabidos de Bar honraram seus funerais, assim como os padres
agostinianos. Mas a maior honra é que para o seu enterro foram uns seiscentos a
setecentos pobres que acompanhavam o corpo, todos com vela na mão e que choravam
como se estivessem no enterro do próprio pai. Os pobres realmente lhe deviam este
reconhecimento: ele tinha contraído a doença curando-lhes as enfermidades e
aliviando-lhes a pobreza. Estava sempre no meio deles e só respirava seus ares
empestados. Ouvia-lhes as confissões com tanta assiduidade, de manhã e de tarde, que
jamais pude convencê-lo de fazer ao menos uma vez um passeio para descanso.
Fizemos enterrá-lo junto ao confessionário no qual pegou a doença e fez a bela
colheita dos méritos de que agora goza no céu.
Dois dias antes de sua morte, seu coirmão padre caiu doente com uma febre
contínua que o manteve em perigo de morte por oito dias. Está agora passando bem.
Sua doença foi consequência de trabalho demais, de demasiada e assídua presença
entre os pobres. Na véspera do Natal, ficou 24 horas sem comer e dormir. Só deixou o
confessionário para celebrar a missa.
Nossos congregados são maleáveis e dóceis em tudo, exceto nas advertências
para repousar um pouco. Creem que seus corpos não são de carne ou que suas vidas
não devem durar mais que um ano.
Quanto ao irmão4, é um moço extremamente piedoso. Serviu a estes dois padres
com aquela paciência e assiduidade que os doentes mais exigentes o poderiam desejar.
.
Carta 429. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. XI.sec.I, 1ª ed., p.384. O original desta carta estava em 1747 no seminário
de Toul (Collet, op. cit.., 1ª Ed., t. I, p. 299, em nota).
11
Jacques Roussel, nascido em Nevers a 2 de fevereiro de 1598, foi recebido na Companhia de Jesus a 5 de agosto
de 1614. Foi professor de gramática, de humanidades e de retórica e quatro vezes reitor, particularmente em Bar-le-
Duc. Morreu em Autun, a 20 de janeiro de 1647.
22
São Vicente recebeu esta carta entre 21 e 28 de fevereiro (Cf. cartas 428 e 433).
33
Germano de Montevit, nascido em Cambernon (Manche). Foi recebido na Congregação da Missão a 19 de abril de
1638, com a idade de 26 anos. Morreu em Bar-le-Duc, a 19 de janeiro de 1640.
44
O Irmão Davi Levasseur.
430. – UM PADRE DA MISSÃO A SÃO VICENTE

[Saint-Mihiel, início de 16401].

Comecei, ao chegar, a distribuir esmolas. Há tantos pobres que não consigo


atender a todos. Trezentos e mais estão em necessidade extrema. Senhor Padre, digo-
vos, na verdade, que há mais de cem semelhantes a esqueletos cobertos de pele e de
aspecto tão horrível que, se Nosso Senhor não me desse força, não teria coragem de
olhar para eles. A pele é como mármore bronzeado e de tal forma encolhida que lhes
expõe os dentes ressequidos, os olhos e o rosto contraídos. Enfim, é o que há de mais
assustador para se ver. Procuram algumas raízes no mato, para cozê-las e comer.
Gostaria de recomendar estas grandes calamidades às orações da Companhia. Há
muitas mulheres morrendo de fome. Entre elas há jovens, e temo que o desespero não
as leve a cair em miséria maior que a temporal.

431. – SANTA JOANA DE CHANTAL A SÃO VICENTE

[ Annecy, fevereiro de 16401 ].

Meu caríssimo Padre,

Bendito seja nosso divino Salvador que nos trouxe felizmente vossos caros
filhos, para sua maior glória e para a salvação de muitos.
Todos se alegraram em Nosso Senhor, mas com certeza o senhor Bispo de
Genebra2 e eu experimentamos indizível consolação. Parece-nos serem nossos
verdadeiros irmãos, com os quais sentimos perfeita união de coração, assim como eles
conosco, em santa simplicidade, franqueza e confiança. Conversei com eles e eles
comigo, como se fosse entre filhas da Visitação. Têm todos grande bondade e candura.
O terceiro e o quinto 3 precisam de ajuda para sair um pouco de si mesmos. Di-lo-ei ao

.
Carta 430. – Abelly, op. cit, 1. II, cap. XI, sec. I, 1 ed., p. 380.
11
Esta carta foi escrita em 1640 por um missionário que acabava de chegar a Saint-Mihiel, onde já estava em março
do mesmo ano (Abelly, ibid ).
.
Carta 431. – Santa Joana-Francisca Frémyot de Chantal, sua vida e obras, t. VIII, p. 222, carta1671.
11
Os missionários de Annecy tinham partido a 29 de janeiro para o local do seu destino (Cf. carta 423).
22
Justo Guérin, nascido em 1578, em Tramoyes (Ain) e recebido nos Barnabitas, a 10 de dezembro de 1599, foi
eleito Bispo de Genebra em 1639. Morreu a 3 de novembro de 1645 ( Vida de Dom Justo Guérin, religioso
barnabita, da Congregação de São Paulo, bispo e príncipe de Genebra, por Dom Maurício Arpaud, Annecy, 1678,
in-8.
33
Jacques Tholard e Estêvão Bourdet.
superior4 que é verdadeiramente um homem capaz de tanta responsabilidade. O senhor
Padre Escart é um santo.
Distribuí para cada um uma tarefa religiosa. Faço tudo isto e o farei sempre,
com a ajuda de Deus, com grande amor, para vos obedecer, meu caríssimo padre, e
para nossa mútua consolação. Com efeito, há muito a falar a estas queridas almas. O
bom padre [Duhamel] me declarou muito singelamente suas dificuldades. É um
coração virtuoso, equilibrado nos juízos, mas terá dificuldades para perseverar. Pedi-
lhe com insistência não pensar nem em sair, nem em permanecer, mas se aplicar
judiciosamente à obra de Deus, abandonar-se generosamente e confiar na Providência.
Estimaria muito que se firmasse, pois inspira bastante esperança.
Enfim, todos são amáveis, foram motivo de muita edificação nesta cidade, nos
três dias que aqui estiveram. Assemelham-se muito ao espírito do meu caríssimo Pai.

432. – A LUÍSA DE MARILLAC

[fevereiro de 16401]

Esperamo-vos com o afeto que Nosso Senhor sabe. Vireis no momento


oportuno, para o bem dos forçados.

433. – A LUÍS LEBRETON

Paris, terça-feira depois da quaresma1, em 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi vossa carta de 16 de janeiro. Louvo a Deus porque estivestes com Dom
Ingoli e porque ele parece não estar contrariado com a dificuldade que lhe
2

apresentamos, quando da proposta que sua bondade nos fez. Aguardaremos com afeto
os favores que nos faz esperar.

44
Bernardo Codoing.
.
Carta 432. – Manuscrito São Paulo, p. 33. Este manuscrito acrescenta uma frase que omitimos, porque pertence à
carta 213.
11
Em fevereiro de 1640, São Vicente aguardava Luísa de Marillac, então em Angers, para tratar com ela da obra dos
forçados que ia ser confiada às Filhas da Caridade (Cf. Carta 426, nota 3). Nenhuma outra data convém melhor a esta
carta da qual o Manuscrito São Paulo nos conservou o trecho acima.
.
Carta 433. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
28 de fevereiro.
22
Secretário de propaganda.
Louvo a Deus, além disso, pela caridade que ele prestou por vosso intermédio ao
senhor Cônego de Notre-Dame da Rotunda3. Penso que é necessário satisfazê-lo da
maneira como desejar, na questão de que me falais, se for consideravelmente útil. No
início, a gente se acomoda da maneira como é possível. Mas, se as condições vos
parecerem prejudiciais, ó Jesus, senhor Padre, ele não levará a mal se lhe disserdes com
sinceridade o que podemos e o que não podemos.
Seria muito de se desejar que o negócio de Sainte-Bibiane 4 tenha êxito. Mas a
coisa é por demais difícil: Notre-Dame de Loreto Marquesana 5 é cara e mais ainda o
palácio onde mora o Cardeal Bichi 6. Não sei o que vos dizer sobre a pequena igreja de
Saint-Jean7, porque não me dizeis o preço. Quanto ao preço de Notre-Dame de Loreto e
o do palácio de Bichi, estão acima de nossas forças. Não convém pensar na ajuda que
propondes a respeito do palácio. Volto ao que vos escrevi sobre uma pequena casa bem
arejada, não muito distante do Vaticano, que poderíamos, contudo, aumentar com o
tempo. E mesmo se não fosse tão próxima deste santo lugar e ali não houvesse igreja,
não importaria. Com efeito, não trabalhando em Roma, podemos passar sem igreja.
Bastará uma pequena capela, a não ser que haja possibilidade, com o tempo, de
trabalhar com os ordinandos. Mas cada coisa a seu tempo. Atualmente, somos
encarregados de todos aqueles do reino da França que recebem as ordens nesta cidade.
Não vos digo nada sobre nossa principal questão, a não ser que me encontro em
perplexidades diante das dúvidas que me sobrevêm e a resolução a tomar sobre a última
maneira que vos propus. Primeiramente, se bastaria um voto de estabilidade. Para a
observância da pobreza e da obediência, fulminaríamos a excomunhão, solenemente,
num certo dia do ano, durante o (ao qual todos seriam obrigados a comparecer e
entregar nas mãos do superior o que tiverem) contra os que guardarem dinheiro, à parte,
consigo mesmos ou alhures. Assim procedem os Cartuchos. Faríamos o mesmo com os
desobedientes. Outra alternativa seria, em vez de excomunhão, mandar fazer juramento
solene, todos os anos, de observar a regra da pobreza, da castidade e da obediência.
Suplico-vos, senhor Padre, informar-vos com o R. P. assistente8 a fim de saber se apenas
o voto de estabilidade bastaria para constituir no estado religioso. Todo mundo aqui tem
tanta aversão a este estado que faz dó. Se, não obstante, ele for julgado útil e
conveniente, será preciso fazê-lo. A religião cristã era outrora contestada em toda parte.
E, no entanto, era o corpo místico de Jesus Cristo. Bem-aventurados aqueles que,
confusione contempta, [desprezando a humilhação], abraçam este estado.
O estado eclesiástico secular recebe muito de Deus, neste momento. Dizem que
nossa humilde Companhia contribuiu muito para isto, por causa do trabalho com os
ordinandos e com o grupo dos eclesiásticos de Paris. Há muita gente qualificada que

33
O Panteão atual. O cabido da Rotunda existe ainda.
44
Igreja edificada no IVº século no local ocupado, outrora, dizem, pela casa de Santa Bibiana, não longe da porta
San-Lorenzo.
55
Igreja construída em 1507, pela Confraria dos Padeiros, ao norte do fórum de Trajano. O santuário tão conhecido
de Notre-Dame de Loreto fica em Marches. Daí a palavra Marquesana, empregada aqui por São Vicente.
66
Antigo Núncio na França.
77
Havia em Roma várias igrejas com este nome. Pensamos que aqui se trata da igreja de São João diante da Porta
Latina, edificada em 772, perto do lugar onde, conforme a tradição, São João Evangelista foi mergulhado numa
caldeira de óleo fervendo.
88
O assistente francês da Companhia de Jesus.
abraça, no presente, este estado. O Senhor de La Marguerie 9, antes primeiro presidente
da província, se fez simples padre, há apenas dez dias. Temos, entre os ordinandos, um
Conselheiro do grande Conselho e um chefe do Tribunal de Contas – que quer
permanecer como tal1010– que se tornam simples padres, por devoção; o Senhor de
Mégrigny, advogado geral no Tribunal de Impostos1111, se retirou com o senhor
Brandon1212 para Saint-Maur1313, com o mesmo intuito. Nós não pudemos recebê-lo em
nossa casa por seis meses, conforme pedia, por causa da regra que temos, como sabeis,
entre nós, de não admitir conosco senão as pessoas que desejam pertencer à Companhia,
exceto os que querem fazer o retiro espiritual, por dez dias.
Que vos direi da conversa que tivestes com o senhor Embaixador 1414, a respeito
do prelado italiano de que me faláveis, a não ser que estabelecemos como regra e nos
mantemos na prática exata, pela misericórdia de Deus, de jamais nos imiscuir nos
negócios do Estado, e de nem mesmo falar sobre eles1515. E isto, pelas seguintes razões:
1º: Porque quod supra nos nihil ad nos (não temos nada a ver com o que está
acima de nós).
2º: Porque não compete a pobres padres, como nós, intrometer-nos e nem falar a
não ser das coisas que dizem respeito a nossa vocação.
3º: Porque os negócios dos príncipes são mistérios, que devemos respeitar e não
investigar ou esquadrinhar.
4°: Porque a maior parte das pessoas ofende a Deus, ao fazer juízo sobre as
coisas feitas pelos outros, em especial pelos grandes, sem conhecer as razões pelas quais
fazem o que fazem. Com efeito, quem ignora os princípios que comandam certos atos,
que conclusão pode deles tirar?
5º: As ações a empreender são problemáticas, a não ser as que a Sagrada
Escritura determina. Fora disto, ninguém tem o dogma da infalibilidade em suas
opiniões. Sendo isto verdade, como de fato o é, não é grande temeridade julgar as
opiniões e as ações dos outros?
6º: O Filho de Deus, modelo pelo qual devemos pautar nossa vida, se calou
sobre o governo dos príncipes, embora pagãos e idólatras.
7º: Nosso Senhor instruiu os apóstolos para não se imiscuirem com curiosidade,
não somente nos negócios dos príncipes, mas também nos de uma pessoa particular. Ele

99
Elias Laisné, Senhor de La Marguerie.
1010
Thomás le Gauffre, nascido em Grand-Lucé (Sarthe), recebido como auditor no Tribunal de Contas em 1628 e
Conselheiro-chefe em 1636, falecido em 1645. Era amigo de Claudio Bernard, cujas obras de caridade ele continuou,
e de Jean Jacques Olier a quem muitíssimo ajudou na evangelização do Canadá.
1111
Francisco Voysin, Senhor de Villebourg, nascido a 14 de março de 1613, admitido como Conselheiro no
Conselho-Mor a 22 de fevereiro de 1638, morto de apoplexia, a 19 de abril de 1660. Legou cerca de 100000 escudos
para o Hospital Geral.
1212
Feliberto Brandon, Senhor du Laurent, admitido como Conselheiro no Parlamento, a 18 de fevereiro de 1622.
Deixou este cargo depois da morte de sua mulher Maria de Ligny, sobrinha do Chanceler Séguier, para entrar no
estado eclesiástico, a conselho do Padre Condren. Foi um dos fundadores do seminário São Sulpício. Feito Bispo de
Périgueux em 1648, depois de recusar a diocese de Babylone, que lhe propunha São Vicente. Ocupou a Sé de
Périgueux até a morte, em 11 de julho de 1652. Suas relações com o abade de Saint-Cyran não lhe afetaram a
ortodoxia.
1313
Saint-Maur-les-Fossés (Seine), onde os Beneditinos de Saint-Maur possuíam uma abadia.
1414
Francisco Annibal, Duque d’Estrées, Conde de Nanteuil-le-Haudoin, Par e Marechal de França.
1515
São Vicente só saiu desta prática para tentar remediar as misérias sem número da política de Mazarino (Nota do
tradutor: ele reflete a mentalidade do tempo e uma certa teologia da “sacralidade” do poder e da autoridade).
disse a um deles, falando de um outro: si eum volo manere, quid ad te? (se quero que
ele permaneça, que te importa?).
Por todas estas razões e uma infinidade de outras, suplico-vos, senhor Padre,
manter-vos em nossa pequena prática de jamais nos entreter, menos ainda de nos
intrometer, nem por palavras, nem por escrito nos negócios dos príncipes. Dai a
conhecer ao senhor Embaixador, se vos fizer a honra de vos falar sobre isso, que tal é a
prática de nossa pequena Companhia. Suplicai-lhe vos desculpe se, ao vos honrar,
abrindo-se a vós, lhe referistes os sentimentos do público sobre o negócio do qual vos
falava e fostes além do que devemos, seguindo nossas pequenas regras. E para vos
firmar cada vez mais na observância exata desta pequena regra, peço-vos, senhor Padre,
no dia seguinte ao recebimento desta, ou quanto mais cedo após, fazer a oração sobre
esta matéria, atento aos pontos acima e pedir a Deus para a Companhia a graça de ser
sempre fiel à observância desta pequena regra.
Não é necessário mandar-me alguma resposta sobre este assunto. Estou certo de
que estais de acordo com tudo que vos estou dizendo e que vale a pena observar esta
prática.
Logo que obtiverdes a faculdade de fundar nossa casa, enviar-vos-ei o padre e o
clérigo que pedis. Se comprardes uma casa por três a quatro mil libras somente, deveis
enviar-nos a cópia do contrato, assinada e selada, nos devidos termos, a fim de servir de
garantia para aqueles que nos fornecerão o dinheiro, e para saldarmos a letra de câmbio
que tirareis em nosso nome, dentro do espaço de um mês do recebimento da letra.
Quanto a este jovem piemontês, nós o receberemos e o faremos estudar, se no-lo
enviardes e o julgardes apto para ser um bom missionário.
Envio-vos uma procuração do senhor Padre Dehorgny, comendador do Espírito-
Santo de Toul, para resignar a casa em favor da Companhia causa unionis1616 (por
causa da união). Segue junto um atestado do senhor Vigário Geral de Toul, para o
mesmo fim.
Suplico-vos, senhor Padre, trabalhar nesta questão com vossa habitual prudência
e diligência. O senhor Padre Le Bret vos relatará a dificuldade por que passa este
negócio, por causa da oposição que tendes motivo de temer da parte do comando geral
do Espírito-Santo1717.
Termino a presente para ir ver o bom Padre Renar, que manda chamar-me. Ele
está grave e perigosamente doente.
Deus dispôs do nosso bom padre de Montevit, que vós conhecestes no
seminário. Sua morte aconteceu em Bar-le-Duc, com fama de santidade, no colégio dos
Jesuítas. Eles nos fizeram a caridade de o acolher na casa deles, junto com os outros
padres, enquanto ele trabalhava para alimentar corporal e espiritualmente quinhentos ou
seiscentos pobres. Estes últimos o acompanharam até o túmulo, dois a dois, vela na
mão, chorando como se o morto fosse o próprio pai. O R. P. escreveu-me coisas
admiráveis sobre o fato1818. O senhor Padre Boucher está no seu lugar e caiu também
doente, por causa do grande trabalho que assumiu no meio dos pobres. Nosso Irmão
1616
Ver carta 293, nota 1.
1717
Estêvão Vaius, bispo in partibus de Cyrène, grão-mestre da Ordem do Espírito-Santo.
1818
Trata-se da carta 429.
Mateus voltou ontem à tarde de Metz, Toul e Verdun, tendo enviado sua encomenda a
Nancy. Continuamos a dar assistência a esse pobre povo, com quinhentas libras por
mês, a cada uma das referidas cidades. Infelizmente, senhor Padre, receio muito não
poder continuar por muito tempo. É tanta a dificuldade de arranjar 2500 libras todos os
meses1919.
Recomendo a vossas orações nosso falecido e nosso doente, como também as
necessidades dos nossos pobres. Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso
muito humilde servo,

Vicente de Paulo, padre da Missão.

Alinhavei, às pressas, o que o senhor Dom Ingoli pede. Mas está tão mal que
tenho vergonha de vo-lo enviar. Peço-vos, senhor Padre, corrigi-lo e entregar-lho,
assegurando-o de minha obediência.

Destinatário: Ao Padre Lebreton, Padre da Missão, em Roma.

434. – A LUÍS LEBRETON

De São Lázaro, Paris, a 01 de março de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi aqui, às duas horas, vossa carta de 28 de janeiro. Ela me fala: 1º, de
nosso principal negócio1; 2º, do que o senhor Padre Le Bret tratou com o senhor vice-
gerente sobre o vosso estabelecimento; 3º, o que me dizeis das igrejas de que vos falam
e do alojamento; 4º, da oferta que vos faz o senhor Cônego da Rotunda; 5º, das
expedições que vos solicitei, relativas aos impedimentos matrimoniais; enfim, o que se
passou com o senhor Cardeal de Bagni.
Quanto ao primeiro item, penso que é bom não perder tempo, em nosso principal
negócio, na modificação ou mudança que vos comuniquei, na carta de 10 de dezembro,
da qual me fazeis menção. Sua Eminência2 mandou-me dizer que, quando o estado das

1919
O Irmão Mateus Régnard fez cinquenta e três viagens a Lorena, levando de cada vez somas variando de 20.000 a
50.000 libras, espreitado por bandos de ladrões atentos à sua passagem e cientes do que levava. Sempre chegou ao
seu destino com seu tesouro. Sua companhia era considerada uma salvaguarda. A Condessa de Montgomery, que
hesitava em fazer a viagem de Metz a Verdun, só se decidiu depois de conseguir o Irmão Mateus como
acompanhante no caminho. A rainha Ana d’Austria escutava com prazer, dos próprios lábios do irmão, o relato de
suas aventuras. Ele deixou por escrito o relatório, hoje perdido, de dezoito perigos dos quais escapou (collet, op. cit.,
t. I, p. 319, em nota).
.
Carta 434. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
A questão dos votos.
22
O Cardeal Richelieu.
coisas estiver um pouco mudado, ele poderá escrever a respeito. Não deixareis, contudo,
de propor a questão como é, cujo projeto vos peço mandar-me.
Quanto ao segundo ponto, estou muito contente com o que o senhor Padre Le
Bret, segundo me dizeis, tratou com o vice-gerente e penso ser bom não perder tempo
com isso.
Quanto às igrejas e ao alojamento, nós somos muito pobres para pensar em
Notre-Dame de Loreto. Penso ser necessário ater-nos ao que vos escrevi: comprar uma
pequena casa, a preço módico, contanto que haja um jardim e num local onde seja
possível expandir, com o tempo.
Meu Deus! Que faremos quanto ao câmbio? Vou procurar saber se é possível
enviar o dinheiro por algum navio de Marselha. Fazei o mesmo.
Vejo grandes dificuldades na oferta da Rotunda. Agradecei com afeto a este
senhor que no-la fez.
Escrever-vos-ei em seguida sobre os pareceres a respeito dos casamentos
inválidos.
Suplico-vos, entretanto, comunicar ao senhor Cardeal Bagni o que tive a ventura
de lhe dizer de outra vez: espero que ele aprovará um dia o que lhe pedimos.
E agora vos rogo, senhor Padre, como fiz na carta anterior, observar com
exatidão nosso pequeno regulamento de não nos entreter sobre questões de Estado e de
mortificar a curiosidade de saber e se entreter sobre negócios do mundo. Um de nossos
irmãos que vai e vem, levando dinheiro para os pobres de Lorena, me disse ficar
encantado e cheio de alegria quando está aqui, por jamais ouvir falar de notícias de fora.
Ele fica muito espantado com o uso contrário, nas comunidades religiosas por onde
passa. O senhor Padre Coudray me escreveu a mesma coisa de Toul, e que é preciso
manter esta prática preciosa e observá-la.
Bom dia, senhor Padre, sou v. s.

Vicente de Paulo, padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Lebreton, padre da Missão, em Roma.

435. – UM PADRE DA MISSÃO1 A SÃO VICENTE

Saint-Mihiel, março de 1640.

Na última distribuição de pão que fizemos, estavam presentes mil cento e trinta
e dois pobres, sem contar os doentes, muito numerosos e que nós assistimos com
alimentação e remédios adequados. Todos rezam pelos benfeitores com tão grande
sentimento de gratidão que chegam alguns a chorar de ternura, até mesmo ricos que se
tocam com isto. Não creio que estas pessoas por quem se oferecem a Deus tantas e tão
.
Carta 435. – Abelly, op. cit., 1.II, cap. XI, sec. I, 1º ed., p. 380.
11
O que escreveu a carta 430.
frequentes preces, venham a se perder. O pessoal da cidade louva muito estas
caridades e diz altamente que vários teriam morrido sem estes socorros, expressando
publicamente o reconhecimento que têm para convosco.
Um pobre suíço abjurou, há alguns dias, sua heresia e depois de ter recebido os
sacramentos, morreu muito cristãmente.

436. – A UM PADRE DA MISSÃO

[Antes de 1642]

À pergunta que lhe foi feita se há lugar, no fim das missões, para solicitar
testemunhos do trabalho realizado e dos frutos obtidos, o Santo responde:
“... que fariam bem em nada pedir. Basta que Deus lhes tenha conhecido as boas
obras e que os pobres tenham sido aliviados, sem querer levantar outros testemunhos1.

437. – A LUÍSA DE MARILLAC

[Entre 1638 e 16501]

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Receio que não possais recusar a caridade que esta pobre mulher reclama de vós
sem alguma falta de caridade para com o vosso próximo. Isto não vos obrigará, como
me parece, a alimentar o filho até a sua morte. Será preciso colocá-lo nos Meninos
Expostos. Se a mãe assumir uma pequena criança de peito que seja de condição, ela
mandará alimentar o seu filho no campo, pela metade da despesa. Enfim, Deus proverá.
Isso também se aplica ao vosso filho; não vos deixeis levar a temores do que vai
acontecer com ele. Entregai o filho e a mãe a Nosso Senhor. Ele dará conta de vós e do
vosso filho. Deixai apenas que ele faça sua vontade em vós e nele, e esperai por ela, ao
longo dos vossos piedosos exercícios. Eles são suficientes para vos levar a ser toda de
Deus. Oh! como basta pouco para ser totalmente santa: fazer a vontade de Deus em
tudo.
[Sou, no2] amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde servo,

.
Carta 436. – Collet, op. cit., t. I, p. 292.
11
Collet anota que São Vicente mudou de opinião depois, e remete quanto a isto, a uma carta de 21 de janeiro de
1642.
.
Carta 437. – C. aut. – Original em Paris, na casa das Filhas da Caridade da rua du Fauconnier, 11.
11
Datas da instituição dos Meninos Expostos e do casamento de Michel Le Gras.
22
Estas palavras e a assinatura foram inabilmente cortadas quando quiseram reduzir o original às dimensões do
quadro que o contém.
Vicente de Paulo.

438. – UM ECLESIÁSTICO A SÃO VICENTE

[Entre 1639 e 16431]

Vendo as cartas que chegam da Lorena, enviadas por vós ao senhor Padre N., e
que ele me mostrou, preciso confessar-vos que não pude lê-las sem derramar lágrimas,
e com tal abundância que fui obrigado a interromper várias vezes a leitura. Louvo a
nosso bom Deus pela sua paterna providência sobre suas criaturas e rogo-lhe continue
a dispensar suas graças sobre os vossos padres que se dedicam a essa tarefa divina.
Resta-me a tristeza de ver esses obreiros caridosos conquistando o céu e levando tantos
outros a conquistá-lo, enquanto eu, em minha miséria, nada faço a não ser rastejar
sobre a terra como um animal inútil.

439. – A LUÍSA DE MARRILAC

Quinta-feira de manhã. [Entre 1639 e 1642]1.

Senhora,

Não me lembrei ontem, quando vos disse que iria hoje a vossa casa 2, que tinha
ordem do senhor Arcebispo3 de me encontrar hoje com Madame Duquesa de Aiguillon
em Rueil, juntamente com o senhor de Saint-Leu 4. Vede o que for melhor, ou dar outra
ordem às filhas ou que vá falar-lhes o senhor Padre Dehorgny ou o Padre Soufliers, e
qual dos dois. Desejo-vos bom dia e sou, Senhora, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

.
Carta 438. – Abelly op. cit. 1.II, cap. XI, sec. I, 1º ed., p. 378.
11
Tempo durante o qual os padres da Missão se aplicaram ao socorro da devastada Lorena.
.
Carta 439. – C. aut. – Original com as Filhas da Caridade de Saint-Méen.
11
O lugar das palavras “Quinta-feira de manhã” e a presença simultânea em Paris de Jean Dehorgny e Francisco
Soufliers não permitem colocar esta carta fora desta data.
22
Provavelmente para fazer a conferência.
33
João Francisco de Gondi.
44
André du Saussay.
440. – A LUÍSA DE MARILLAC

De São Lázaro, sexta-feira, meio-dia [Entre 1639 e 1651]1

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Estou, há alguns dias, com 500 libras, as quais vos envio, pela dívida que temos
convosco.
Mas eis que o senhor Prior2 me pede agora cerca de três mil libras que nos
cedeu, há mais ou menos três meses, sem que lhas pedíssemos, para devolvê-las quando
quisesse. E muito embora nos tenha entregue moedas de prata, pede-nos luises 3 ou
moedas com peso legal. Parece que nos ofereceu esta soma com esta finalidade. Ora,
nós fomos pegos de surpresa, um pouco desprevenidos.
Poderíeis, Senhora, emprestar-nos esta soma? Nós a devolveremos quando
quiserdes e procuraremos convertê-la em moeda legal. Falo das três mil libras que me
parece ainda tendes convosco. Pela graça de Deus, nada há no mundo mais seguro, para
vós.
A assembleia foi adiada para segunda-feira. Se achais conveniente chamar de
volta a irmã Maria Mônica, fazei-o.
Bom dia, Senhora. Estou bem, graças a Deus, e sou vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

441. – A LUÍSA DE MARILLAC

De São Lázaro, segunda-feira, meio dia [Entre 1639 e 1651]1

Senhora,

Não me dissestes onde se encontra o senhor Padre de Vause. Não vos parece
conveniente o convidemos para vir almoçar aqui em casa? Gostaria que preparásseis

.
Carta 440. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
O lugar assinalado, “São Lázaro”, não permite recuar a carta para antes de 1639. Por outro lado, esta carta é
anterior à morte de Adriano Le Bon, Prior de São Lázaro.
22
Adriano Le Bon.
33
Luís é uma moeda antiga.
.
Carta 441. – C. aut. Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Antes de 1639, as irmãs ainda não estavam em Richelieu. Em 1641, irmã Perrete já fazia parte da comunidade.
esse encontro para quinta-feira. Se não for possível, vou procurar vê-lo na sua própria
residência.
Será bom dizer a essa filha de Angers venha direto para aqui. Talvez ela não
encontrasse prontas as de Richelieu, ou estas já teriam partido.
Vi ontem a sobrinha de nossa irmã Henriette 2. Já que as coisas aconteceram
desta maneira, é bom fazer uma experiência com ela. Escreverei ao senhor Bispo de
Beauvais3, no caso de levarem-na à justiça.
Não tenho mais nem congestão, nem febre, pois assim apraz a Deus. Vou sair
logo agora. Procurarei ter a ventura de vos ver, num dia desta semana.
Vosso servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

442. – UM ECLESIÁSTICO1 A SÃO VICENTE

[Cerca de 16402]

Entre as pessoas que fizeram sua confissão geral posso afirmar-vos que havia
mais de 1500 que jamais tinham feito uma boa confissão. Além disso, a maior parte
tinha permanecido na miséria de enormes pecados, durante dez, vinte e trinta anos, os
quais declararam singelamente que nunca os teriam confessado a seus pastores e
confessores ordinários. A ignorância era grande. Mas ainda maior a malícia. A
vergonha que tinham de declarar seus pecados chegava a tal ponto que alguns deles
não se decidiam a expô-los, nem mesmo nas confissões gerais feitas aos missionários.
Mas afinal, tocados vivamente pelo que ouviam nos sermões e nos catecismos,
acabavam se rendendo, e revelavam com sinceridade suas faltas, com gemidos e
lágrimas.

443. – A LUÍS ABELLY

Paris, 26 de abril de 1640.

22
Irmã Perrete, que foi mais tarde colocada em Cerqueuse (Calvados). “É uma filha muito boa, escrevia dela Luísa
de Marillac (Cartas, 1. 328); nunca existiu mais submissão, pelo menos, não maior”
33
Agostinho Potier.
.
Carta 442. – Abelly op. cit., 1,II, cap. I, sec. I 1ºed., p.2.
11
“Um eclesiástico de condição e virtuoso, que tinha assistido e mesmo trabalhado”, diz Abelly, na missão cujos
frutos descreve, acontecida num grande povoado de Anjou.
22
Abelly escrevia em 1664 que esta carta remontava a “mais de 20 anos”.
.
Carta 443. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Escrevo ao senhor Bispo de Bayonne1 e lhe digo uma palavra sobre o assunto a
respeito do qual me fazeis a honra de escrever-me, isto é, que o falecido Senhor
Fouquet2 não era de modo algum favorável a que o referido senhor bispo pense no
estabelecimento de religiosas em Bayonne por longos anos. O senhor bispo me deu a
conhecer razões muito importantes de seu intento, embora eu pense não lhe ter
manifestado minha opinião sobre o caso. E o meu sentimento é conforme com o do
senhor seu pai. Os inconvenientes são notáveis e o bem que se espera, bem menor do
que a expectativa de que me escreveis.
Sua Excelência, porém, é o mestre e eu muito temerário, ao vos dizer o que vos
digo. Compete a Sua Excelência discernir a vontade de Deus nisso, como em tudo mais,
e a mim, submeter-me. É o que faço, como a tudo que vós, senhor Padre, lhe
aconselhardes. É o que faço com toda a humildade e afeto possível, sendo, no amor de
Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Tive a felicidade de encontrar vosso irmão numa arbitragem com o senhor de


Cordes. Ó senhor Padre, como fiquei contente!

Destinatário: Ao senhor Padre Abelly, Vigário Geral e oficial de Bayonne, em


Bayonne.

444. – A DUQUESA DE AIGUILLON

De São Lázaro, segunda-feira, de manhã [Abril ou maio de 16401]

Madame,

Os Senhores de Liancourt, de la Ville-aux-Clercs 2, de Fontenay3, e algumas


outras pessoas de condição se reuniram ontem aqui para começar a trabalhar em favor
11
Francisco Fouquet.
22
Francisco Fouquet, pai do Bispo de Bayonne e do superintendente das finanças. Morrera em 22 de abril.
.
Carta 444. – C. aut. – Original comunicado pelo padre José Maria de Elizondo, Capuchino.
11
Ver a carta 459: a obra da nobreza lorenense só começou em 1640.
22
Henri-Auguste de Loménie, Conde de Brienne e de Montbron, Senhor da Ville-aux-Clercs, secretário de estado,
falecido a 05 de novembro de 1666 com a idade de 71 anos.
33
Francisco du Val, Marquês de Fontenay, Senhor de Mareuil, de Villiers-le-Sec e de Jaguy-en-France, marechal dos
campos e exércitos de Sua Majestade, Conselheiro do rei, no seu Conselho de Estado. Exercera por duas vezes as
funções de embaixador em Roma.
das pessoas de condição de Lorena que estão nesta cidade 4. Não podeis imaginar,
Madame, as bênçãos que vos desejaram, por causa do grande bem que fazeis aos
religiosos e religiosas, e ao pobre povo de Lorena. Disseram que, não tivésseis feito
senão esse bem, já devíeis esperar grande recompensa no reino eterno.
Tratamos de como fazer chegar vossas quinze mil libras até aquela província. O
Senhor de Fontenay, que foi governador de Nancy, disse ser preciso mandar vir duas
tropas de cavalo, para reforçar o comboio em que irá, e que o senhor du Halier fará isso
de muito boa vontade, se lhe escreverem, e sem custo, ou com muito pouco.
A economia não será pequena para vossos pobres, se pudermos trocar o dinheiro
em prata que nos entregaram, por dinheiro em ouro. Há doze mil e quinhentas libras de
dinheiro em prata com moeda muito ruim. Suponho que o Senhor Chenevis não há de
querer fornecer-nos espécie por espécie. Ele nos mandará entregar lá as pistolas por
doze libras, para receber aqui por dez. Encarreguei, contudo, a nosso Irmão Louistre, de
saber dele esta manhã.
Envio-vos a requisição que apresentamos aos senhores deputados responsáveis
pelas amortizações5. O senhor Bispo de Saintes6, que é um deles, estima, Madame, que,
se vos aprouver recomendar o caso a esses senhores, eles nos isentarão, porque
considera justo o negócio. Fizemos menção de vós, Madame, na requisição. Suplico-
vos, humildemente, vo-la faça ler, e verificar as razões que alegamos, para transmiti-las
a esses senhores.
Peço-vos humildemente perdão, Madame, de tanta importunação que vos causo.
A inigualável bondade que Nosso Senhor vos deu para conosco me leva a essa
confiança, e me faz ser, em seu amor e no de sua Santa Mãe, vosso muito humilde e
muito obediente servo,

Vicente de Paulo.

Terei a honra de vos avisar, quando for o tempo, para que vossa caridade tenha a
bondade de ir ver esses senhores, dos quais vos mandarei a lista.

Destinatária: A Madame Duquesa de Aiguillon.

44
Na obra da assistência à nobreza lorenense refugiada em Paris, São Vicente teve como principal auxiliar o barão de
Renty, um cristão como poucos se encontram. Foi muito feliz a ideia do Santo de levar, pelos seus pares, ajuda aos
nobres reduzidos à indigência, sem recorrer às Damas da Caridade, já muito sobrecarregadas. Resolveu-se, logo na
primeira assembleia, estabelecer o número e a qualidade dos nobres lorenenses necessitados, refugiados em Paris. O
Senhor de Renty fez a pesquisa. As reuniões se faziam em São Lázaro, no primeiro domingo de cada mês. Elas
continuaram até o fim das perturbações, durante cerca de sete anos, sempre com o mesmo zelo e o mesmo êxito. Sete
ou oito nobres fidalgos participavam delas. Eles iam pessoalmente levar aos refugiados os socorros e uma palavra de
consolação. Quando a paz permitiu aos nobres voltarem às suas terras, a assembleia os ajudou com suas esmolas a
fazer a viagem e a subsistir, durante algum tempo (Cf Abelly, op. cit., t.I, cap. XXXV, p. 167; Maynard, op. cit., t.IV,
p. 128).
55
Comissários nomeados pelo rei, depois da Declaração de 19 de abril de 1639, para procederem à procura, taxa, e
liquidação dos direitos de amortização.
66
Jacques-Raoul de la Guibourgère, nascido em 1589, era viúvo de Yvonne de Charette e pai de vários filhos quando
recebeu as ordens sagradas. Subiu, em 1631, à sede episcopal de Saintes, ocupada antes pelo seu tio. Passou depois
para Maillezais e enfim para La Rochelle, quando a sede episcopal foi transferida para lá. Poucos bispos foram tão
intimamente ligados a São Vicente quanto ele. Morreu em 1661.
445. – A JEAN DE FONTENEIL

Paris, 01 de maio de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Rendo graças a Deus pelas bênçãos que derrama incessantemente sobre vossa
Congregação e vossos trabalhos, e vos suplico muito humildemente, senhor Padre,
rogar-lhe pela remissão de meus pecados e a graça, para mim, de uma boa morte.
Vossa bondade me dá confiança para vos importunar muito frequentemente. Vou
diminuir a frequência, quando vos aprouver.
Suplico-vos, senhor Padre, acrescentar o presente favor aos precedentes, isto é,
de fazer chegar os pacotes inclusos até Bayonne e Dax, com segurança, e o mais
depressa possível. Servi-vos de mim, em recompensa.
Sou, no amor de Nosso Senhor, de vós, dos senhores de Cruseau e de todos os de
vossa santa companhia, senhor Padre, vosso muito humilde e muito obediente servo,

Vicente de Paulo.

Suplico-vos, senhor Padre, mandar entregar o pacote incluso ao senhor Padre


Benoît , em Notre-Dame de la Rose, perto de Sainte-Livrade2.
1

Destinatário: Ao Senhor de Fonteneil, Cônego de Saint-Seurin de Bordéus, em


Bordéus.

446. – A SANTA JOANA DE CHANTAL

Paris, 14 de maio de 1640.

Minha muito digna e muito amável Madre,

Não sou capaz de vos agradecer com suficiente humildade e afeição pelas
inigualáveis bondades que incessantemente dispensais aos nossos missionários e a mim.
Rogo a Nosso Senhor o faça por mim, minha querida Madre, e que seja ele vossa
.
Carta 445. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
Benoît Bécu.
22
Sainte-Livrade é hoje sede central da região, em Lot-et-Garonne.
.
Carta 446. – C. aut. – Original no convento da Visitação de Montluel.
recompensa. Vós lhe forneceis móveis, minha cara Madre: praza à bondade de Deus
seja ele mesmo a mobília e o ornato precioso de vossa querida alma, para que brilhe
como um sol, no céu como na terra!
Estamos em dívida, como sempre, e em falta, por não vos ter escrito, há mais
tempo. A única causa, me parece, é a espera para vos escrever sobre a última resolução
a respeito da questão do visitador, e isso, de semana em semana. Mas [as dificuldades] 1
e a importância da questão manterão ainda em suspenso o andamento do caso, por oito
ou dez dias somente2.
Pensamos que é conveniente, entretanto, dizer-vos, minha cara Madre, que o
senhor Comendador vos enviará o senhor Padre Roton, seu capelão, dentro de dez ou
doze dias, no mais tardar, com a última deliberação que deve tomar com Sua
Excelência, o senhor Arcebispo de Sens. Como o dito senhor Comendador vos explicará
sucintamente o estado da coisa, não vos direi nada sobre isso a não ser: 1º que
conhecemos cada vez mais a utilidade do visitador, para uma visita em caso de
necessidade; 2º que pensamos ser conveniente tenha ele o poder que os santos cânones
atribuem a um visitador, independentemente dos Ordinários, e use dele, sem, contudo,
mudar nada nas regras, com todo respeito, ponderação e deferência possíveis; 3º que se
vós, minha querida Madre, escreverdes aos... (vereis?) que eles agiram da mesma
maneira, ou, pelo menos, alguns que conheço, com a Congregação das Filhas de Notre-
Dame3, a respeito do boato de uma bula que sua fundadora mandou escrever sobre
alguma coisa referente ao fato em questão; 4º que o remédio único é que...; 5º que é
mais oportuno deixar as coisas como estão e entregá-las à conduta da Santa Providência
do que proceder de outro modo; 6º que nossa digna Madre é a única pessoa à qual,
pensamos, Nosso Senhor dará a conhecer sua santa vontade, como fundadora desta
santa ordem. Sua divina bondade comunica às pessoas com essa qualidade as luzes
importantes sobre a obra que lhes confiou.
Eis, minha querida Madre, os meus pontos de vista, que vou antes conferir com
muito cuidado com o senhor Arcebispo de Sens4.
Fiz a visita na cidade e nos subúrbios 5. Vou fazer-vos um relato de como vão as
coisas, na carta que vos enviarei pelo senhor Padre Roton.
Volto aos vossos missionários6. Dir-vos-ei, minha querida Madre, que me parece
que Deus vos deu de imediato um discernimento tão claro como se os tivésseis educado.
Ó minha querida Madre! Vós sois minha mãe e a deles, e como os considero felizes por
estarem convosco. Sou igualmente feliz, pois vossa caridade me cerca de tanta bondade,

11
Palavras de leitura duvidosa.
22
São Vicente, o Comendador de Sillery e Octave Saint-Lary de Bellegarde, Arcebispo de Sens, tinham a missão de
estudar em conjunto duas questões de muita importância para a Ordem da Visitação: se convinha nomear Visitadores
e, no caso, como delimitar-lhes os poderes.
33
As irmãs hospitaleiras da Caridade de Notre-Dame, fundadas em Paris, em 1624, pela Madre Francisca da Cruz. A
autoridade eclesiástica, antes de aprovar-lhes as constituições, tinha confiado o exame delas a São Vicente, ao Padre
Binet e ao Padre Vigier.
44
Procuraram tornar ilegíveis no original, sobrecarregando-o de rabiscos, as linhas que precedem, desde L’unique
cause, si me semble (A única causa, me parece...). Omitimos duas passagens que não fomos capazes de decifrar.
55
Nos mosteiros da cidade e do entorno.
66
Os padres da Missão de Annecy.
a mim, que sou no amor de Nosso Senhor, minha muito digna Madre, vosso muito
humilde e muito obediente servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A minha R. Madre Chantal, superiora do primeiro mosteiro de


Annecy.

447. – SANTA JOANA DE CHANTAL A SÃO VICENTE

Viva Jesus!

[Annecy, maio de 16401].

Meu caríssimo Padre,

Recebemos vossa carta de 14 de maio com muito atraso. Crede que o afeto e o
desejo que Deus nos deu de querer bem e prestar serviços a vossos caros filhos não
produzem [efeito] algum comparável ao nosso amor. Gostaríamos de ter o poder de
fazer mais. Mas eles são tão bons que fazem caso de pouca coisa. De resto, a santa
edificação e a utilidade de suas vidas, os trabalhos contínuos para a maior glória de
Deus e o proveito das almas levam a dizer a cada um que são enviados de Deus e que o
Padre Codoing tem o espírito de Deus.
Nosso bom padre, o senhor Comendador2, me escreve que, se for preciso,
cuidará que a casa de Troyes envie ainda dois padres e um irmão. Deus sabe como o
bom coração do senhor Bispo de Genebra3 o aceitará. Esta diocese, com efeito, tem
quatrocentas e cinquenta e cinco paróquias católicas e cento e quarenta e cinco com os
hereges, seiscentas no total, grandes paróquias e muito populosas. Por isso, o senhor
Padre Codoing fala que seriam necessarios quatro anos para percorrê-la. Vede, meu
caríssimo Padre, se o reforço da equipe não seria bem empregado. Vossos caros filhos
estão extasiados por encontrar um povo tão bem disposto. Glória seja dada à
Santíssima Trindade! Oh! como é grande a coroa que vos está preparada, meu
caríssimo Padre, e ao nosso caríssimo Pai, o senhor Comendador, pelo bom uso que
faz desses fiéis obreiros!
Penso que esta missão daqui levará mais almas para o paraíso do que várias
outras, pela graça de Deus.

.
Carta 447. – Santa Joana Francisca Frémoyt de Chantal, sua vida e suas obras, t. VIII, p. 282, carta 1709.
11
Esta carta responde à de 14 de maio.
22
O comendador de Sillery.
33
Justo Guérin.
448. – A LUÍS LEBRETON

Paris, 01 de junho de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi ontem três de vossas cartas ao mesmo tempo, uma do segundo, a outra
do terceiro domingo depois da Páscoa e a última de 18 de abril, me parece.
Eis, resumidamente, a resposta às três.
Louvo a Deus e sinto indizível consolação por tudo que Nosso Senhor faz aí em
vosso favor, embora não tenhamos ainda o que pedis para os nossos negócios. Mas
bendito seja Deus porque ainda não foi do seu agrado e por todo bem que fazeis nessas
condições!
Se o principal não foi possível durante este pontificado1, in nomine Domini!
Dou graças, entretanto, a Deus, pois o Monsenhor vice-gerente vos deu
permissão verbal de comprar uma casa em Roma e de nela vos estabelecer. Penso terem
razão os que desejam não fiqueis em lugar de ares não saudáveis ou tão afastados.
Suplico-vos, senhor Padre, ficar atento a uma e outra coisa, sobretudo à primeira.
No começo é preciso contentar-se com pouco. Se pudermos enviar-vos quatro
mil libras para isso, será tudo. O título da capela será o da “Santíssima Trindade”, por
favor, e a casa se poderá chamar “casa da Missão”.
Vedes inconveniente em receber a caridade que vos querem fazer pelas missas?
Não o vejo, ao que parece, quanto a visitar os pobres do entorno, nem em vos oferecer
ao Monsenhor vice-gerente para receber os eclesiásticos candidatos ao retiro espiritual e
para o ensino das cerimônias sagradas. Mas isto com o tempo, quando tiverdes o reforço
que vos enviarei, tão logo souber que tendes efetivamente uma casa. Se isto for urgente,
pegai o dinheiro com o senhor Marchand e nós o reporemos aqui. Se não o for,
mandarei entregar o dinheiro ao senhor Núncio ou ao senhor Mazarino2.
Ainda não estive com o senhor Núncio, por razões importantes que não vos
posso escrever, e não poderei eu mesmo estar com ele antes que os negócios daqui e daí
não estejam encaminhados. Esta semana mandarei vê-lo, por intermédio de uma pessoa
que está sempre com ele e que mo prometeu. Já o teria feito, se ele tivesse retornado dos
campos.

.
Carta 448. – Dossiê de Turim, original.
11
O pontificado de Urbano VIII (1623-1644).
22
Julio Mazarino, nascido em Pescina, nos Abruzes, em 1602, tinha, na juventude, estudado na Espanha e servido no
exército do Papa. Logo ao ingressar no estado eclesiástico (1632), foi investido de cargos importantes. Vice-legado
de Avinhão (1634) e depois Núncio na França (1634-1636), demonstrou nestas funções a habilidade e a
maleabilidade dos mais finos diplomatas. Antes de morrer, Richelieu o recomendou ao rei Luís XIII.
Que vos direi sobre a proposta de Dom Ingoli 3? Nada, por certo, senhor Padre, a
não ser que a acolho com toda a reverência e humildade possíveis, como vinda de Deus.
Faremos o possível para atendê-la. Mas não temos em nenhuma das duas companhias
ninguém do Condado de Avinhão. Não obstante, parece-me ser absolutamente
necessário que o bispo e os dois que o devem acompanhar sejam da mesma companhia.
Celebrei a santa missa depois do que ficou escrito acima. Eis o pensamento que
me sobreveio: como o poder de enviar ad gentes pertence na terra só a Sua Santidade,
ele pode por conseguinte enviar qualquer eclesiástico por toda a terra, para a glória de
Deus e a salvação das almas, e todos lhe devem obediência. Segundo esta máxima,
verdadeira a meu ver, ofereci a Deus esta pequena Companhia, que se coloca em
disponibilidade para com sua Divina Majestade, no sentido de ir para onde Sua
Santidade o ordenar.
Creio porém, como vós, ser necessário que Sua Santidade haja por bem que a
direção e a disciplina dos enviados pertença ao Superior Geral, com a faculdade de
chamar de volta e de enviar outros no lugar. Tudo isso, contudo, de tal sorte que sejam,
em relação a Sua Santidade, como os servidores do Evangelho em relação ao seu patrão,
se Sua Santidade disser: Ide para lá, serão obrigados a ir; Vinde para aqui, eles virão;
Fazei isso, e eles serão obrigados a fazê-lo4.
Temos poucos na Companhia com os talentos necessários a uma missão de tal
importância. Mas há alguns5, pela graça de Deus.
Não pude falar com Sua Eminência6 sobre o negócio do Padre Le Bret.
Entender-me-ei com a Madame Duquesa de Aiguillon, sua sobrinha. Saúdo o padre Le
Bret com todo respeito possível e sou muito humilde servidor dele e vosso,

Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Machand, banqueiro da corte de Roma, para mandar


entregar, por gentileza, ao senhor Padre Lebreton, padre da Missão em Roma.

449. – JUSTO GUÉRIN, BISPO DE GENEBRA, A SÃO VICENTE

Junho de 1640.

33
Pensamos que se trata aqui da Missão da Pérsia. Foi realmente em junho de 1640 que o novo Bispo de Babilônia,
Jean Duval, com o nome religioso de Bernardo de Santa Tereza, da ordem dos Carmelitas descalços, deixou a França
com destino a Ispahan, aonde chegou a 7 de julho com três religiosos de sua ordem. Monsenhor Ingoli, secretário da
Propaganda, tinha pedido a São Vicente para dar ao prelado dois auxiliares.
44
Alusão ás palavras do centurião a Jesus, no evangelho de Mateus (Cf Mt 8,9) (nota do tradutor).
55
São Vicente tem em vista especialmente, cremos, o Padre Lambert aux Coutaux, que ele proporá, por exemplo,
mais tarde, para a coadjutoria de Babilônia.
66
O Cardeal de Richelieu.

.
Carta 449. – Abelly, op. cit., 1.II, cap. I, sec. II, § 4, 1ªed., p. 34.
Prouvesse a Deus pudésseis ver o íntimo do meu coração. Na verdade eu vos
amo e honro com toda a extensão de meu afeto. Eu me confesso o maior devedor de
todos os homens do mundo à vossa caridade, pelos grandes benefícios e pelos frutos
que os senhores padres missionários, vossos queridos filhos em Deus, produzem em
nossa diocese. Eles são tais que não consigo exprimi-los e só poderão acreditar neles
quem os vir. Fui testemunha ocular deles, por ocasião da visita que comecei depois da
Páscoa. Todos os amam, lhes querem bem e os louvam a uma só voz. Na verdade,
senhor Padre, a doutrina deles é santa, como a sua maneira de viver. Dão a todos
grande motivo de edificação, por sua vida irrepreensível.
Terminada a missão numa aldeia, partem para outra e o povo os acompanha,
derramando lágrimas e dizendo: “Ó bom Deus! Que faremos nós? Nossos bons padres
vão embora”, e por muitos dias vão ainda procurá-los em outras aldeias.
Pessoas de outras dioceses vêm se confessar com eles e acontecem admiráveis
conversões por meio deles. Seu superior 1 tem grandes dons de Deus e um maravilhoso
zelo pela sua glória e pela salvação das almas. Prega com grande fervor e fruto. Com
certeza, somos extremamente reconhecidos ao senhor Comendador de Sillery por ter
provido ao seu sustento. Oh! como é admirável a divina Providência por ter inspirado
suavemente, no coração deste bom senhor, arranjar-nos esses obreiros evangélicos!
Foi o bom Deus que fez tudo isso, sem intervenção de persuasão humana alguma,
levando em conta nossa necessidade e a má vizinhança em que estamos da infeliz
cidade de Genebra.

450. – A LUÍSA DE MARILLAC

[Entre 1636 e 16411].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Eis uma boa jovem, que vem de trinta e duas léguas daqui, para ver se ela é apta
para a Caridade. Peço-vos examiná-la. Seu pai a acompanha e a traz expressamente para
este fim.
Quanto a mim, sou no amor de Nosso Senhor, v. s.

V. D.

Destinatária: A Senhora Le Gras, em La Chapelle.

11
Bernardo Codoing.

.
Carta 450. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Datas extremas da permanência de Luísa de Marillac em La Chapelle.
451. – SANTA JOANA DE CHANTAL A SÃO VICENTE

[Annecy, entre 1626 e 16411].

Meu Deus! Meu verdadeiro e muito querido Padre, seria possível que meu Deus
me fizesse a graça de vos trazer por esses nossos lados! Seria a maior consolação que
poderia receber neste mundo. E me parece que seria por uma especial misericórdia de
Deus para com minha alma. Ficaria aliviada de modo inigualável, a meu ver, acima de
qualquer sofrimento interior de que padeço, há mais de quatro anos, e que me serve de
martírio.

452. – A FRANCISCO DU COUDRAY

Paris, 17 de junho de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Enviamos tudo o que temos para os religiosos e para as religiosas 1. Vereis pela
carta que escrevo ao Senhor de Villarceaux 2, e que deveis lacrar, o parecer da Madame
Duquesa de Aiguillon sobre a distribuição. Seria bom, talvez, que vós a entregásseis
pessoalmente a ele.
Mateus3 vos leva vossa pequena encomenda. Vossa despesa seja compatível com
ela.
Quanto às duas mil libras que recebestes do senhor Padre de Saint-Nicolas 4 para
os religiosos, em nome de Deus, senhor Padre, nada desvie para outro uso, seja qual for
o pretexto de caridade que possa haver. Não há caridade alguma dissociada da justiça ou
que nos autorize fazer mais do que podemos, razoavelmente.
Não vos direi nada sobre o negócio do senhor Padre Fleury 5, a não ser que
estimaria muito se ele se entendesse com o Padre Midot e que conteis com ele, de
.
Carta 451. – Abelly, op. cit., 1.II. cap.VII,1ªed., p.316.
11
Em 1626, Santa Chantal já tinha voltado de Paris, havia quatro anos. A carta não pode ser anterior a esta data. Por
outro lado, a Santa morreu em 1641. A carta mais provavelmente é de 1640, porque nesse ano São Vicente pensou
em ir a Annecy (cf. 1. 452), e não o vemos com projeto semelhante em outro tempo.
.
Carta 452. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
Lemos no fim de um atestado assinado a 20 de dezembro de 1639 pelos dominicanos do grande convento de Toul:
“Podemos dizer e dizemos com toda a diocese de Toul: Bendito seja Deus que nos enviou esses anjos de paz, num
tempo tão calamitoso, para o bem desta cidade e a consolação de seu povo e para o nosso bem, em particular, a quem
fizeram e fazem ainda todos os dias caridade com seus bens, dando-nos trigo, lenha, frutas, socorrendo assim a nossa
grande necessidade!”(Collet, op. cit., t. I, p. 291).
22
Anne Mangot, Senhor de Villarceaux, intendente de três bispados. Morreu como referendário a 10 de abril de 1655.
33
O Irmão Mateus Régnard.
44
Provavelmente Georges Froger, pároco de Saint-Nicolas-du-Chardonnet, em Paris.
55
François de Fleury.
comum acordo, sobre vossas divergências, enquanto estiver por lá o senhor presidente
de Trélon6 que poderá acalmar os pequenos ardores. Seria de se desejar que estes
senhores concordassem que as coisas fossem recolocadas no estado em que antes
estavam. Mas a Providência tendo disposto de outro modo, através do bom e santo
Prelado falecido7, resta acatá-la. Acresce que não se pode esperar que a justiça disponha
de outra maneira e nem é conveniente tentá-lo.
As visitas que fiz até o presente a Richelieu8 e a Troyes9 se realizaram com tanto
fruto e bênção que pude verificar a verdade do que se diz dos Cartuchos: entre os meios
pelos quais eles se conservam na sua primeira observância está a visita anual.
Isto me levou a pensar que é conveniente façamos as nossas todos os anos. Não
podendo eu mesmo ir pessoalmente fazê-las em Lorena, envio o Padre Dehorgny, cuja
simplicidade, piedade e exatidão, na observância do pequeno regulamento da casa, vós
conheceis. Suplico-vos, senhor Padre, recebê-lo nessa qualidade e manifestar para com
ele a mesma confiança que para comigo mesmo. Sabeis que fostes vós que no-lo
encaminhastes, a gratidão que tem por isso, e mais, a estima que tem para convosco.
Espero que agireis de tal sorte que todos da casa tirem proveito desse acontecimento que
jamais se realiza sem grande fruto e bênção.
Acabo de enviar o Padre Lambert a nossa casa de La Rose, para o mesmo fim, e
espero fazer o mesmo, nos meados de outono, em favor de Troyes, Genebra e outros
lugares, se Deus me conceder saúde.
É bom que nosso referido coirmão (o Visitador) não seja conhecido em Toul
pelo ofício que cumpre, por muitas razões. Ele vos levará nossas pequenas notícias e a
certeza de que vos abraço em espírito, com toda a humildade e afeto possível, e que sou,
no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo,
padre da Missão.

Destinatário: Ao Padre du Coudray, padre da Missão, na casa Saint-Esprit, em


Toul.

453. – A MADRE FRANCISCA-ELISABETH PHELIPPEAUX1


66
Sobrinho do Comendador de Sillery.
77
Chales Chrétien de Gournay, morto 04 de setembro de 1637.
88
Em novembro de 1638 e em novembro de 1639.
99
Em julho de 1639.
.
Carta 453. – C. aut. – Original comunicado pelo senhor Barão de Bich, de Aosta.
11
A Madre Francisca Elisabeth Phelippeaux de Pontchartrain entrara, com idade de dezesseis anos, no primeiro
mosteiro da Visitação. Tinha trinta anos quando foi fundado o estabelecimento de Saint-Denis, do qual foi a primeira
superiora (30 de junho de 1639-5 e de junho de 1642). Terminado o seu triênio, voltou para o convento da rua Saint-
Antoine. Deixava em Saint-Denis uma comunidade ainda pequena, mas bastante fervorosa. Ficou no mosteiro de
Chaillot de 1653 a 1655 e foi enviada para Madeleine como superiora, em 1665. O cronista dos mosteiros da
Visitação escreve a seu respeito (História cronológica, p. 561): “ Ela só respirava Deus, sua glória, sua perfeição,
São Lázaro, 30 de junho de 1640.

Minha cara Madre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Se a profissão de nossa cara irmã de Chaumont 2 puder ser no próximo sábado,
dia de vossa santa festa3, espero que Nosso Senhor me dê a graça de ir servir-vos; ou
também no dia seguinte, domingo. Se assim não for, eu não o poderia na segunda-feira,
porque empenhei minha palavra no sentido de servir a pequena Chandenier 4, que deve
tomar o hábito neste dia em vossa casa da periferia, e terça-feira temos nossa assembleia
dos eclesiásticos5. Além disso, penso que poderei partir quarta-feira para a minha
viagem de quinze ou vinte dias6. Farei porém o possível para esperar uma quinta-feira,
se for necessário. Deus sabe, com efeito, com que coração desejo servir a esta cara filha
e quanto sou, no seu amor, minha querida Madre, vosso muito humilde e obediente
servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A minha Madre, superiora da Visitação Santa-Maria de Saint-


Denis, em Saint-Denis7.
454. – JEAN DEHORGNY A SÃO VICENTE

[Saint-Mihiel, junho ou julho de 16401].


com um fervor tão extraordinário que não podia conceber que uma jovem, seguidora exata de todos os exercícios da
regra, fosse capaz de experimentar dificuldade. Era como um verdadeiro serafim, ardendo inteiramente de amor, à
frente de sua pequena comunidade que conduzia como um outro Moisés em seu pequeno deserto”. Morreu a 02 de
julho de 1674.
22
Maria Chaumont, filha de Luís de Chaumont, Senhor d’Athieules, e de Maria de Bailleul, dama de honra de Ana
d’Austria e irmã de Nicolau de Bailleul, superintendente das finanças.
33
A festa da Visitação da santa Virgem.
44
A família de Rochechouart de Chandenier deu ao segundo mosteiro da Visitação de Paris três de seus membros:
Maria Luísa, Catarina Henriette e Maria Henriette, sobrinhas-netas do Cardeal de La Rouchefoucauld e irmãs dos
dois padres de Chandenier, muito intimamente ligados a São Vicente. Maria Luísa e Catarina Henriette passaram
para o terceiro monsteiro, quando da sua fundação. Depois de treze anos, voltaram juntas para o segundo. Maria
Luísa teve a felicidade de fazer profissão diante de Santa Joana de Chantal, em 1653. Morreu como uma
predestinada, a 03 de janeiro de 1694, com a idade de 74 anos (Année sainte, t. I. pp. 40-54). Maria Henriette foi
eleita superiora quatro vezes, em 1670, 1673, 1691 e 1694. Lemos na l’Histoire chronologique, t. II, p. 445: “Nossa
muito honrada Madre Maria Henriette de Chandenier nos governou com tanta prudência e moderação que nos
pareceu sempre um raro exemplo de todas as virtudes, incessantemente unida a Deus, tranquila em todos os
acontecimentos, zelosa, sem temeridade, em manter a observância. Experimentamos durante mais de nove anos a
felicidade de sua direção, de que gozamos ainda no presente, com muito prazer, pois não terminou ainda o quarto
triênio”.
55
Para a chamada Conferência das Terças-Feiras.
66
A viagem não aconteceu ou, pelo menos, foi adiada ou abreviada.
77
O mosteiro de Saint-Denis foi fundado por Madre Helena Angélica Lhuillier, superiora do primeiro mosteiro de
Paris, graças ao apoio da rainha Ana d’Áustria, apesar da oposição dos habitantes e de Armando de Bourbon, príncipe
de Conty. São Vicente foi o primeiro superior. Ao que relata o autor da notícia consagrada a este mosteiro na Histoire
chronologique, p.529, o Santo dizia não respirar senão Deus ao entrar no convento de Saint-Denis, onde, declarava
ele, “o espírito do Instituto florescia como no seu primeiro fervor”.
.
Carta 454. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. XI, sec. I, 1ªed., p. 381.
11
O ano é dado por Abelly. Por outro lado, Jean Dehorgny não passou em Lorena a não ser parte do mês de junho e
de julho (Cf. cartas 452 e 459).
Dir-vos-ei, senhor Padre, coisas admiráveis desta cidade que poderiam parecer
incríveis, se não as tivéssemos visto. Além de todos os pobres mendigos de que vos falei,
a maior parte dos habitantes da cidade e sobretudo a nobreza padecem tanto de fome
que chega a ser inexprimível e inimaginável. E o que é mais deplorável é que não
ousam pedir nada. Alguns dentre eles se animam a fazê-lo, outros prefeririam morrer.
Eu mesmo falei pessoalmente com pessoas de condição que nessas ocasiões só fazem
chorar sem parar.
E outra coisa muito estranha, uma viúva, não tendo mais nada, nem para ela,
nem para os três filhos, vendo-se reduzida a morrer de fome, escorcha uma cobra e a
coloca sobre brasas para assá-la e comê-la na sua penúria. Nosso coirmão aqui
residente, tendo sido avisado disso, foi ao local, viu o caso e lhe deu remédio.
Não morre cavalo algum na cidade, seja qual for a doença, que não seja logo
levado para se comer. Há apenas três ou quatro dias, foi vista uma mulher esmolando
publicamente, com o avental cheio dessa carne infecta, que ela dava a outros pobres,
em troca de pedacinhos de pão.
Uma jovem ficou vários dias pensando em vender o que tinha de mais caro no
mundo, para obter um pouco de pão, e chegou mesmo a buscar várias vezes ocasiões
para isso. Louvor e gratidão a Deus por não as ter encontrado e estar agora fora de
perigo!
Outro caso deplorável é que os padres, todos, graças a Deus, de vida exemplar,
sofrem as mesmas dificuldades e não têm pão para comer. Um pároco, a meia légua da
cidade, se submeteu a puxar o arado, atrelado com seus paroquianos no lugar dos
cavalos. Não é lamentável, senhor Padre, ver um padre e um pároco reduzido a este
estado? Não é mais necessário ir à Turquia para ver os padres condenados a trabalhar
a terra, uma vez que, às nossas portas, eles mesmos se submetem a isso, constrangidos
pela necessidade.
De resto, senhor Padre, Nosso Senhor é tão bom que parece ter privilegiado
Saint-Mihiel com o espírito de devoção e de paciência. No meio desta extrema
indigência de bens temporais, eles são ávidos dos espirituais: no catecismo, chega a
haver até duas mil pessoas à escuta. É muito para uma cidade pequena onde a maior
parte dos casarões estão desertos. Os próprios pobres são muito atentos à participação
na catequese e em se apresentar aos sacramentos. Todos em geral demonstram grande
estima ao missionário que está aqui para instruí-los e aliviá-los. E há quem se julgue
feliz por ter falado com ele, uma vez. Mas também ele se aplica, com grande caridade e
muito trabalho, nestas fronteiras. Chegou a tal ponto de se sobrecarregar com
confissões gerais, sem tomar alimento, que acabou ficando doente.
Fico admirado de ver como, com tão pouco dinheiro recebido de Paris, ele
consegue dar tanta esmola, tanto em particular como em geral. Vejo nisto claramente a
bênção de Deus que multiplica os bens. Lembrei-me do que a Sagrada Escritura diz do
maná: cada família pegava uma mesma medida e era suficiente para todos, fosse maior
ou menor o número dos que o recolhiam. Vejo aqui algo semelhante, quando nossos
padres, com maior número de pobres, fazem o mesmo número de distribuições, sem
ficar em dívida com ninguém.
455. – JEAN DEHORGNY A SÃO VICENTE

Bar-le-Duc, julho de 1640.

Em primeiro lugar, todas as semanas nossos missionários distribuem roupa a


uma quantidade de pobres, particularmente camisas. Eles recebem as roupas velhas
para levá-las, consertá-las e dar para outros, ou então, fazem retalhos para pensar os
feridos ou ulcerados.
Em segundo lugar, eles tratam aqui mesmo de uma multidão de doentes com
sarna. Havia anteriormente de ordinário vinte e cinco deles e ainda restam doze. É uma
doença muito comum em toda a Lorena. Ela se disseminou por outras cidades. Em
todas, proporcionalmente, havia doentes. Todos, graças a Deus, foram tratados, em
toda parte, com todo desvelo e caridade. Todos se curaram por um remédio
soberanamente eficaz que nossos irmãos aprenderam.
Enfim, em terceiro lugar, nossos padres daqui fazem despesa considerável, mas
muito útil, recebendo os pobres em trânsito. Com efeito, nossos missionários de Nancy,
de Toul e outros lugares lhes encaminham com frequência multidões de pobres a serem
enviados para a França. Esta cidade é de fato a porta da Lorena e eles lhe fornecem o
alimento e algum dinheiro para a viagem.

456. – A FRANCISCO DU COUDRAY

Paris, 10 de julho de 1640.


.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Está aqui Mateus que vos levou vossa encomenda. Tomaremos conhecimento,
pelo senhor Presidente1, da situação do negócio do senhor Fleury, e veremos o que fazer.
Escrevi-vos que é necessário fazer as distribuições segundo a determinação do
Senhor de Villarceux e ordenar que o façam da mesma forma. Julgo que tendes a ordem
assinada por ele e que a cumprireis com exatidão. Isto vos peço com muita humildade,
senhor Padre, tendo o cuidado de pedir a cada mosteiro recibo do que lhes dais 2. Quanto
às distribuições a fazer nas outras cidades onde há pessoas da Companhia, transmiti-lhes
.
Carta 455. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. XI, sec. I, 1ªed., p. 383.

.
Carta 456. – Original com os padres da Missão da casa Saint-Sylvestre, em Roma.
.

1,1
O presidente Trélon, sobrinho do Comendador de Sillery (Cf. 1, 452).
22
Os arquivos dos padres da Missão possuem ainda vários destes recibos, todos do ano de 1647.
essa instrução: devem seguir inteiramente a ordem que vos foi dada pelo referido
Senhor de Villarceux; e peçam recibo de tudo que derem, porque precisamos estar
seguros de que não se desvie, nem se aplique em outras partes um centavo sequer, seja
qual for o pretexto.
Enviar-me-eis, por favor, pelo ir. Mateus, uma cópia dos documentos, assinada
pelo Senhor de Villarceux e de seu oficialato, se o houver. Comunicai-me igualmente,
todos os meses, as somas que tiverdes distribuído ou dado ordem para distribuir em
outras partes. Jamais se viu ordem mais rigorosa, que se exige e se quer observada.
Não me dizeis nada sobre o número dos pobres dos campos, migrados para a
cidade e arredores, para os quais fazeis a distribuição. Todos os meses apresento às
generosas Damas o que se faz nos outros lugares. Só de Toul não pude fazê-lo, desde há
muito. Isso lhes dá grande satisfação. No sábado passado, empregamos duas ou três
horas examinando as outras cartas, com indizível consolação da parte delas.
Eis, senhor Padre, o que vos tenho a dizer no momento. Peço-vos cuidar de
vossa saúde. E isto vos peço com todo afeto que me é possível em Nosso Senhor. No
seu amor e de sua santa Mãe, sou, senhor Padre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre du Coudray, padre da Missão na casa de Saint-


Esprit de Toul, em Toul.

457. – A LEONARDO BOUCHER

Paris, 10 de julho de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Precisamos de vós aqui. Peço-vos que venhais na primeira oportunidade
apresentada, depois de receber a presente. Envio-vos para este fim seis escudos e o
Padre Dupuis, portador deles, para vos substituir. Mostrar-lhe-eis, por favor, o modo
como agis e rogareis ao R. P. reitor dos jesuítas 1dispensar-lhe a mesma caridosa
hospitalidade feita para convosco e que o assista com os seus bons e santos conselhos. O
Padre Dupuis é jovem ainda e sem experiência, mas é muito dócil e piedoso. Entregai-
lhe em mãos o dinheiro e as provisões que tiverdes. Recomendai a nosso caro Irmão
Davi2 ver nele Nosso Senhor e Nosso Senhor nele, e prestar-lhe a mesma obediência.

.
Carta 457. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
O R. P. Roussel.
22
Davi Levasseur, Irmão Coadjutor, nascido em Dancé (Orne) em 1608, recebido na Congregação de Missão a 2 de
janeiro de 1638. A carta 429 faz um belo elogio dele.
Antes de partir, pedi recibo de todo dinheiro que tiverdes dado às religiosas e
entregai-os ao Padre Dupuis. Despedi-vos do senhor governador3, dos senhores
presidente da câmara4 e de seus almotacéis, assim como de outros principais habitantes.
Apresentai-lhes e recomendai-lhes o senhor Padre Dupuis. Quanto ao senhor Padre
Batista5, conversaremos aqui, onde vos espero com o coração que Nosso Senhor
conhece, no amor do qual e no de sua santa Mãe, sou vosso servo,

Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Boucher, padre da Missão, em Bar.

458. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, 11 de julho de 1640.

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Aprovo o que me comunicais. Fazei o obséquio de o executar o mais depressa
possível, por favor, Senhora. Perdoai-me se não posso estar hoje convosco: tenho pressa
de ir à cidade. Enviar-vos-ei logo alguém para confessar vossas filhas e gostaria de
poder fazer o mesmo, no tocante aos assuntos que me pedis 1. Mas não me recordo de
nenhum, pois vos disse o que me veio ao espírito na ocasião. Se me lembrar de alguns a
caminho da cidade, tomarei nota deles e vo-los enviarei.
Desejo-vos um bom dia e sou, no amor de Nosso Senhor, Senhora, vosso muito
humilde servo,

Vicente de Paulo.

459. – A LAMBERT AUX COUTEAUX

Paris, 22 de julho de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi ontem vossa carta, de cuja data me esqueci, juntamente com as que me
enviais do Padre Cuissot e a ata da visita de La Rose. Ó senhor Padre, como lamento o
33
Charles de Mouchy, Marquês d’Hocquincourt, Governador e lugar-tenente geral em Lorena e em Barrois.
44
Gérard Jacob.
55
João Batista Delestoile, padre da Missão, natural de Bar-le-Duc.
.
Carta 458. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Assuntos para a conferência às Filhas da Caridade.

.
Carta 459. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
choque entre estas duas pessoas! Que faremos diante disso? Não viria a propósito
convencer aos dois de sua falta e especialmente ao Padre Benoit1, aproveitando a
ocasião para fazer uma conferência sobre a importância de jamais falar das pessoas com
os externos, nem das coisas que se passam na comunidade? Foi a causa do que
aconteceu em La Rose. O monsenhor Vigário-geral, ao que me disse o senhor Padre
Savinier, com seus pequenos artificios utilizados para se insinuar nos espíritos, neles
penetrar e tornar-se necessário a eles, fez com que ele 2 procedesse assim e que as coisas
chegassem a tal ponto. Oh! não, nunca se deve falar fora do que acontece dentro de
casa. Não será bom, no final da conferência, que obtenhais uma promessa pública de
toda a comunidade, no sentido de que ela se dê a Deus para proceder deste modo?
O Padre Savinier está aqui. Presto-lhe a melhor acolhida 3 que posso. Tem grande
vontade de voltar para o lugar donde veio e passar na casa dele 4. Manifestei-lhe os
inconvenientes de uma e outra coisa e me mantenho firme. Veremos.
Que faremos entretanto em favor desse lugar5? Vejo claro que é necessário outro
superior6 e um padre no lugar do Padre Gautier7. Temos um, na medida, para o caso.
Que vos parece se colocarmos o Padre Cuissot nesse lugar, para a direção e o
Padre Chiroye8 em Luçon9? Estou achando difícil fazer de outro modo. Uma palavra
sobre o vosso parecer, por obséquio.
Há duas coisas a considerar aqui: 1º, se o Padre Chiroye tem o dom de direção;
2º, se o Padre Thibault 1010 terá o espírito de submissão. No momento, ele o demonstra
em relação ao padre Cuissot. Está satisfeito e em bom estado de espírito. Rogo-vos
dizer-me vosso sentimento, o mais breve possível. Nesse caso, o Padre Benoit voltaria
para Richelieu, ou vos enviaria algum outro.
Escrevo ao Padre Cuissot que tome trezentas libras de empréstimo, para sua
mobília. Pagá-las-emos aqui, na entrega do documento. Segundo vosso desejo, o que
seria realmente necessário para os três? Pierre Rogue, o pastor que esteve aqui 1111, é o
11
Benoît Bécu.
22
Benoît Bécu.
33
São Vicente diz textualmente: “Je lui fais la meilleure Chère”. Pierre Coste coloca em nota chère, accueil
(acolhida).
44
Ele era de Clermont-Ferrand e vinha de La Rose.
55
La Rose.
66
Para substituir Benoît Bécu.
77
Denis Gautier, natural de Langres, recebido na Congregação da Missão com a idade de vinte e nove anos, superior
em Richelieu de 1642 a 1646 e de 1648 a 1649.
88
Jacques Chiroye, nascido em Auppegard (Seine-inferieure), a 14 de março de 1614. Ingressou na Congregação da
Missão a 25 de junho de 1638, adimitido aos votos a 9 de março de 1660, superior em Luçon (1640-1650, 1654-1660,
1662-1666) e em Crécy (1660-1662), falecido a 7 de janeiro de 1689.
99
Uma das cláusulas contidas no contrato de fundação do estabelecimento de Richelieu rezava que três padres desta
casa iriam à diocese de Luçon “quatro vezes no ano, nas estações mais propícias” e aí trabalhariam “seis semanas, a
cada vez” (Cf. carta 287). Pouco tempo depois São Vicente achou melhor estabelecer, em Lunçon mesmo, uma casa
distinta da de Richelieu, tendo Gilberto Cuissot como superior. Os missionários se contentaram no início com uma
casa alugada. A instalação não tinha terminado, quando São Vicente escreveu esta carta. Uma doação do Cardeal
Richelieu, seu fundador e benfeitor, permitiu-lhes a compra do edifício Pont-de-Vie, em dezembro de 1641 (ver na
Revue du Bas-Poitou, 1911, pp. 33-50, o artigo de F. Charpentier, Saint Vincent de Paul em Bas-Poitou).
1010
Jean Thibault, nascido em Paris, em 1615, recebido na Congregação da Missão a 29 de julho de 1638. Os temores
do Santo tinham fundamento. Jean Thibault não tinha espírito de submissão. Foi chamado de volta para Paris pouco
depois e deixou a Companhia em 1642. É preciso não confundi-lo com Luís Thibault, futuro superior de Saint-Méen,
que soube merecer por sua conduta os elogios do Santo.
1111
Provavelmente como doméstico.
mesmo que está em Richelieu? Estimaria muito que ele quisesse ficar por lá, e penso ser
isto necessário para ele, pois as pessoas que ele for procurar hão de mantê-lo na pequena
vaidade do seu espírito. Vê-lo-eis .
O senhor Bispo de Tours1212 se queixa comigo, porque fizeram pregação em
favor de pessoas que se dizem possessas em Chinon, e que ele afirma não o serem. E
não aprova sejam tratados como tais1313. Não soube o que dizer-lhe, a não ser que iria
examinar o caso. Peço-vos informar-me e dizer à Companhia que não diga nada e não
faça coisa alguma contra o parecer expresso por ele. Com efeito, o juízo sobre esses
casos pertence a ele, e ninguém pode fazer exorcismos numa diocese, sem a permissão
do bispo.
Quanto a esta jovem, todas as informações a seu respeito me levam a desconfiar
do seu espírito. Lamento esteja ela em Richelieu. Se ela não tem moradia em Chinon e
nem parente disposto a cuidar dela, in nomine Domini, penso que será preciso enviá-la
para aqui.
A Senhora Le Gras gostaria que désseis um giro por Angers, para visitar suas
filhas, sob forma de visita1414. Poderíeis alegar como motivo nossos negócios em Pont
de Cé1515 e a renda ou os auxílios que nos são devidos nesse lugar 1616. Poderíeis ir ver o
senhor Abade de Vaux, grande servo de Deus, e que tem igual caridade para com estas
filhas. É o Vigário-geral.
Podeis falar com cada uma em particular e depois fazer-lhes uma conferência,
sem que o pareça. Talvez bastasse desta vez a conversa particular.
Mandaram dizer-me que os Administradores do Hospital Geral fizeram para elas
vestidos de tecido mais bonito. Vede isto, e se não seria melhor colocar nossa irmã
Bárbara em Angers como superiora. E também se não convém mandar de volta para
Paris Madame Turgis, e a irmã Isabela, superiora das filhas, sempre doente, para
Richelieu, onde o clima melhor poderia restabelecê-la1717. É o pensamento da Senhora
Le Gras.
Quanto ao meu, é de vos querer mais que a mim mesmo, um milhão de vezes, e
de ser, em Nosso Senhor, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.
1212
Bertrand d’Eschaux (14 de outubro de 1618-21 de maio de 1641). A diocese era então governada pelo coadjutor
do arcebispo, Victor le Bouthillier.
1313
Pressionadas por Pierre Barré, pároco de Saint-Jacques de Chinon, cujo nome está implicado na história das
religiosas de Loudun, das quais fez o exorcismo, várias mulheres aceitaram fazer o papel de possessas, para dar mais
peso, formulando-as em nome do demônio, a odiosas acusações contra Sansterre, pároco de Saint-Louand, e contra o
Padre Gilloire. Pedro Barré não recuou diante de nada: mentiras, trapaças, sacrilégios, valia tudo, para ele. O
coadjutor de Tour não se deixou enganar. Preso e julgado em 1638, o impostor foi encerrado num mosteiro de Mans,
para o resto de seus dias. Suas cúmplices foram objeto de medidas severas, que colocaram um ponto final nos seus
escândalos (Cf. Dumoustier, Essai sur l’histoire de la ville de Chinon, Chinon, 1809, in-12, pp. 131-141).
1414
As palavras “visitar” e “visita” têm aqui dois sentidos diferentes. O que São Vicente pede a Lambert aux
Couteaux é que, fazendo de conta que se trata de uma simples visita, ele faça discretamente a visita canônica às irmãs
de Angers, como era uso nas comunidades.
1515
Pequena cidade pitoresca sobre o rio Loire, perto de Angers, formada por ilhotas ligadas por pontes e estendendo-
se sobre as duas margens. Sua grande importância estratégica lhe valeu a honra de vários eventos.
1616
Os impostos das “Pontes-de-Cé” estavam arrendados por 1800 libras, a 19 de junho de 1638, dia em que foram
deixados para a Congregação da Missão, em favor da casa de Troyes, pelo comendador de Sillery (Arch. Nat. S.
6712).
1717
A mudança da irmã Isabela só aconteceu entre os meses de agosto e outubro de 1641.
O Padre Dehorgny voltou ontem da visita à Companhia, em Lorena. Deus
abençoou muito sua viagem. Encontrou as coisas em bom estado, graças a Deus, a não
ser em Toul, onde o senhor Padre [Colée 1818] exerce sempre a paciência do bom Padre
du Coudray. Ó senhor Padre, como a Companhia deve se humilhar e louvar a Deus, por
este mistério, e pedir-lhe a graça de cumpri-lo bem! Vou providenciar a cópia das cartas
que o Padre Dehorgny me escreveu sobre o trabalho dos missionários e vos enviá-las.
Nosso Senhor protege nosso Irmão Mateus com uma proteção muito especial,
enquanto permite que a maior parte das pessoas seja roubada naquela região, às vezes
diante dos olhos dele, embora ele vá para lá todos os meses com 2500 libras. No último
mês, levava doze mil, sendo o excedente para o socorro a religiosos e religiosas que
morrem de fome por aquelas bandas.
Desde dois a três meses, Deus me dá a graça de reunir algumas pessoas de
condição desta cidade, para a assistência à nobreza daqueles lados. Sua providência nos
fornece seis mil libras por mês, ou um pouco mais, para este fim. Em nome de Deus,
senhor Padre, rezemos e nos humilhemos muito. Suplico-vos ajudar nisto a um pobre
Gascão1919.

Destinatário: Ao senhor Padre Lambert superior dos padres da Congregação da


Missão da casa de Richelieu, em Richelieu.

460. – A PIERRE ESCART1

São Lázaro, em Paris, 25 de julho de 1640.

1818
O nome no original foi tão bem rasurado que se tornou ilegível.
1919
Alguns pretenderam, no decorrer do século XIX, contrariando a tradição constante e unânime, que a Espanha é o
país natal de São Vicente. Todos os documentos são concordes com a tradição. Na carta 575, o próprio São Vicente
declara que é francês. Aqui, ele se diz gascão. Em uma de suas cartas, ele roga a Luísa de Marillac apresente suas
homenagens a Madame Ventadour, Marquesa de Pouy, “como a sua única dama, da qual a Providência o tornou
súbdito por nascimento”. Uma escritura, de 04 de setembro de 1626, com sua assinatura, começa com as seguintes
palavras: “Esteve presente Vicente de Paulo..., natural da paróquia de Poy, diocese d’Acqs (Dax), na Gasconha”. Em
sua conferência aos missionários de 02 de maio de 1659, ele fala de uma viagem a Poy, “o lugar de onde eu sou”. O
Bispo de Dax é seu bispo. È assim que ele o chama sempre. As cartas da tonsura o dizem nascido “na paróquia de
Pouy, diocese de Dax”. No século XVII, mostrava-se em Pouy e se honrava com religioso culto a casa onde nasceu.
Fizeram o impossível para conservá-la. A morada antiga caía em ruínas. Empregaram ao menos todos os esforços
para salvar o quarto onde o Santo veio ao mundo. Quando o tempo levou a cabo sua obra de destruição, construíram
uma capela sobre o quarto do nascimento. (Ver l’Histoire de la maison de Ranquine avant le XIX siècle no Bulletin
de la Société de Borda, ano 1906, p. 337 e seg.). Os Papas (breve da beatificação e bula da canonização), as
biografias do Santo, exceto alguns escritores espanhóis do século XIX, todos, a uma só voz, afirmam que São Vicente
nasceu na aldeia de Pouy, na diocese de Dax. Não há verdade histórica mais solidamente fundamentada.
.
Carta 460. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
Pedro Escart, nascido na Suíça, no Cantão de Valais, em 1612. Entrara na Congregação da Missão a 6 de março de
1637 e fora admitido ao sacerdócio no ano seguinte. Foi colocado em Annecy desde a fundação da Casa e transferido
mais tarde para Richelieu. No início de sua permanência em Annecy, causou boa impressão a Santa Joana de Chantal,
que dizia dele: “O Padre Escart é um santo”. Padre Escart era de fato virtuoso, zeloso e muito austero. Teria
continuado no agrado se Santa Chantal, se tivesse sabido guardar a moderação no seu zelo, suportar mais
pacientemente os defeitos dos outros e julgar com mais equidade seus coirmãos, sobretudo os seus superiores. Seu
temperamento o levou a extremos. Num acesso de loucura, matou um de seus amigos e morreu em Roma, onde fora
pedir a absolvição deste homicídio.
Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Peço-vos humildemente perdão por ter passado tanto tempo sem vos responder e
prometo corrigir-me, pela graça de Deus.
Vossa carta me trouxe uma inexprimível consolação, vendo o zelo que Nosso
Senhor vos dá pelo vosso progresso na perfeição e pelo da Companhia. Continuai,
senhor Padre, em nome de Nosso Senhor, a pedir esta graça a sua divina bondade e a
trabalhar para este fim com muita consciência: tempus enim breve est, et grandis nobis
restat via2 (o tempo é breve e nos resta um longo caminho). Ó senhor Padre Escart, que
eu estimo mais que a mim mesmo, faço de coração esta mesma prece a Deus por vós e
por mim. Mas como! Minha miséria é tão grande que estou sempre empoeirado com
minhas imperfeições. A minha idade de sessenta anos deveria ser um mais potente
aguilhão no sentido de trabalhar na correção de minha miserável vida, no entanto, não
sei como, progrido nisso menos do que nunca. Vossas orações, Padre Escart, meu caro
amigo, me ajudarão, assim como as dessas boas almas que vedes por aí. Peço-vos para
isso uma missa, no túmulo de nosso bem-aventurado Pai3.
Não sei se a consciência que tenho de minhas misérias me permitirá dizer-vos o
que vou escrever. Mas intento dizer-vos diante de Deus e no espírito de simplicidade
sobre o qual refleti esta manhã, diante de Deus.
Dir-vos-ei, portanto, senhor Padre, que o zelo, me parece, que tendes para o
progresso da Companhia é sempre acompanhado de certa aspereza e que chega mesmo
ao azedume. O que me dizeis e chamais de relaxamento e sensualidade em alguns me
leva a pensar assim, especialmente por causa do espírito com que mo dizeis. Ó meu
Deus, senhor Padre, é preciso precaver-se contra isso. É fácil, senhor Padre, passar da
falta ao excesso, nas virtudes, de justo, a rigoroso e de zelo imoderado.
Dizem que o bom vinho facilmente se torna vinagre e que a saúde em soberano
grau pode ser sinal de uma próxima doença. Não há dúvida de que o zelo é a alma das
virtudes. Certo, senhor Padre. Mas é preciso seja ele segundo a luz da sabedoria, diz São
Paulo4. Entende-se aqui: segundo a sabedoria da experiência. E como os jovens não têm,
de ordinário, a sabedoria da experiência, seu zelo descamba para o excesso,
especialmente nos que possuem aspereza natural. Ó Jesus, senhor Padre! É preciso
prestar atenção a isso e desconfiar da maioria dos movimentos e ímpetos de nosso
espírito, quando somos jovens, com este temperamento. Marta murmurava contra a
santa ociosidade e o santo comprazimento de sua querida irmã Madalena e julgava que
ela procedia mal em não se desdobrar, como estava ela própria fazendo, no serviço a
Nosso Senhor. Vós e eu teríamos experimentado talvez o mesmo sentimento, se
estivéssemos presentes. Entretanto, o altitudo divitiarum sapientiae et scientiae Dei!
Quam incomprehensibilia sunt judicia ejus5! (Ó profundidade das riquezas e da
sabedoria e ciência de Deus! Como são incompreensíveis os seus juízos!). Nosso

22
Primeira Carta aos Coríntios, 7, 29 e primeiro livro dos Reis, 19, 7.
33
São Francisco de Sales.
44
Rm 10, 2.
55
Rm 11,33.
Senhor declara que a ociosidade e o comprazimento de Madalena lhe são mais
agradáveis do que o zelo menos discreto de Santa Marta!
Dir-me-eis, talvez, que há diferença entre escutar Nosso Senhor, como
Madalena, e escutar nossas ternurazinhas, como fazemos. Meu Deus, senhor Padre,
como poderíamos saber se não foi o próprio Nosso Senhor que inspirou o pensamento
da viagem dos dois de que me falais e dos pequenos refrigérios que tomam? De uma
coisa estou bem seguro, senhor Padre: diligentibus Deum omnia cooperantur in bonum6
(Tudo redunda em bem, para os que amam a Deus), e não duvido que essas mesmas
pessoas amem muito a Deus. Como teriam eles deixado os parentes, os amigos, os seus
bens e todas as satisfações que tinham em tudo isso, para procurar a pobre ovelha
desgarrada nestas montanhas, se não amassem a Deus! E se o amor de Deus está neles,
como não julgar que Deus lhes inspira o que fazem ou deixam de fazer, e que tudo o
que fazem é para o bem, assim como o que deixam de fazer. Em nome de Deus, senhor
Padre, entremos nestes verdadeiros sentimentos e nestas práticas. Temamos que o
espírito maligno não pretenda, pelo excesso de nosso zelo, levar-nos à falta de respeito
com nossos superiores, e de caridade devida aos nossos iguais. É nisto que terminam, de
ordinário, nossos zelos menos discretos. É esta a vantagem que deles tira o espírito
maligno. Por esta razão vos suplico, senhor Padre, em nome de Nosso Senhor,
trabalhemos para nos libertar de nossos zelos, especialmente os que afrontam o respeito,
a estima e a caridade. E porque me parece que o espírito maligno tem essa pretensão
sobre vós e sobre mim, apliquemo-nos a humilhar nosso espírito, a interpretar bem o
modo de agir de nosso próximo e a suportá-lo nas suas pequenas enfermidades.
Sim, mas se o suporto, adeus nossos pequenos regulamentos, ninguém guardará
mais nenhum. E sabeis , me direis vós, que me encarregastes de velar para que sejam
observados.
Respondo à primeira dificuldade, o aniquilamento da observância dos
regulamentos: bastar-nos-á informar o superior, com o respeito e a devida reverência, as
faltas observadas e os consequentes inconvenientes e esperar que Nosso Senhor dê
provimento. Isto pode acontecer na próxima visita, na qual se devem relatar as faltas da
comunidade em geral e de cada pessoa em particular, até mesmo as do superior,
especialmente a falta de zelo pela observância dos regulamentos. Pode-se igualmente
notificar ao Superior Geral. Depois disso, ficar em paz, confiando na providência de
Nosso Senhor, quer pela mudança dos ofícios ou mesmo porque os próprios detentores
deles mudarão de atitude, seja depois de algum retiro ou então de alguma oração, na
qual Deus lhes comunicará luz e força para corrigir as faltas, em resumo, entregar tudo à
divina Providência e ficar em paz.
Quanto à segunda objeção: vossa responsabilidade em velar pelo regulamento.
Dir-vos-ei, senhor Padre, que é verdade. Mas isso se deve entender no sentido de velar
conforme a maneira explicada acima: avisar ao superior com espírito de humildade, de
mansidão, de respeito e de caridade, depois disso, se ele não der remédio, informar ao
Superior Geral.
Foi o que fizestes, mas com impetuosidade de espírito, com aspereza e até
azedume. Contra isto, devemos estar atentos, senhor Padre, em tudo que fizermos: non
66
Rm 8, 28.
enim in commotione Dominus, sed in spiritu lenitatis 7 (O Senhor não está no furacão,
mas na brisa leve). Se, depois de tudo isso as coisas continuarem como antes, fiquemos
em paz. É o que vos peço, senhor Padre.
Espero, no fim do outono, ir visitar-vos e falaremos disso mais particularmente,
como também da viagem que me propondes. Rogo, entretanto, a Nosso Senhor seja a
alegria e a paz de vosso coração.
Eia, pois, senhor Padre, preciso terminar dizendo-vos de novo que vos quero
mais que a mim mesmo. Tenho perfeita confiança em que, depois de terdes honrado de
modo particular, a humildade e a mansidão de Nosso Senhor, durante algum tempo, por
afetos, por atos adequados deste espírito de mansidão e de humildade, tornar-vos-eis,
com a graça de Deus, um homem totalmente apostólico. É o que lhe peço com todo
afeto possível, eu que sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso humilde e
muito obediente servo,

Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Escart, padre da Missão em Annecy.

461. – A BERNARDO CODOING

São Lázaro, 26 de julho de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Jamais tive consciência mais penetrante de minha indignidade para o ofício que
desempenho do que pensando neste exato momento na resposta que vos devo dar, por
causa da minha miséria que me impediu de vos escrever mais cedo.
Ó senhor Padre, até quando me suportareis? Ou quando me corrigirei? O cúmulo
de minha presente miséria é que perdi vossa última carta, em baixo da qual nossa digna
Madre me fez a caridade de escrever algumas linhas. Aqui vai a resposta às outras de 28
de abril e de 31 de maio.
Dou graças a Deus por todas as graças que concede a vossa pequena
comunidade. Elas me parecem, na verdade, acima de tudo que se pode esperar, e suplico
a ele vos continue a dispensá-las. Que ele vos devolva uma perfeita saúde, se é que não
decidiu santificar vossa alma pelas indisposições do corpo. Peço-vos, senhor Padre,
fazer todo vosso possível para isso. Oh! como me sinto feliz pelo que me dizeis de cada
um de vossa comunidade em particular!

77
1 Rs 19, 11.
.
Carta 461. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
Escrevo ao Padre Escart e se puder o farei ao Padre Duhamel 1. Falo ao primeiro,
com todos os detalhes, sobre o que me escrevestes, e o que ele próprio escreveu, logo
depois. É um homem cheio do espírito de Deus, mas áspero em seu zelo, como me
dizeis. Escrevo-lhe de tal modo que espero faça ele progresso na mansidão e na
humildade. Igualmente espero que Deus restitua as forças do corpo ao Padre Tholard,
continue concedendo as do espírito ao Padre Duhamel2, sirva-se utilmente do Padre
Bourdet e enfim que nosso Irmão Francisco3 trabalhe bem. São as preces que faço a
Deus, senhor Padre.
Que vos direi dos ordinandos, senhor Padre? Fico contente por vos terdes
oferecido para fazer a despesa da primeira ordenação. Mas penso que é preciso aceitar o
que o senhor Bispo de Genebra4 propõe: obrigá-los a dar um florim por dia, cada um, se
isto bastar, tudo contado e descontado.
Suporão que a despesa dos ordinandos de Paris fica por vinte soldos ao dia. Ela
abrange a necessária despesa de um maior número de irmãos, a linha, os pequenos
gastos, a troca das roupas. A grande dificuldade está na mobília. Seriam necessárias
para isso duas ou três mil libras.
O senhor Comendador5 me dizia dias atrás que não lhe agradaria nos déssemos a
liberdade de opor dificuldades aos senhores Prelados sobre o que pensam para o bem de
suas dioceses. Referia-se ao vosso intento de ir encontrar-vos com os ilustres senhores
do senado6, a respeito das dificuldades por eles levantadas, e vos dispor a não continuar
vossas missões, se não concordassem, embora o senhor Bispo fosse de parecer
contrário. Ele me diria sem dúvida a mesma coisa, se soubesse que teríeis feito
dificuldade ao senhor Bispo, por ele mandar os ordinandos pagarem a despesa de um
florim cada um ao dia, sem o consentimento do sínodo e do senado. Reconhece que isto
é um sinal de vossa prudência, mas que é preciso agir de modo mais simples. Com
efeito, os ordinandos não ficarão onerados por dar dez ou doze florins, pela alimentação,
durante a ordenação. Se os exercícios dos ordinandos forem segundo Deus, porque não
custearem eles sua alimentação, enquanto recebem este benefício do seu prelado?
Parece-me, senhor Padre, que faríeis bem submetendo-vos nisto ao pensamento
do referido senhor, como também em tudo mais que não altera nosso pequeno Instituto.
Temo que o alterariam as confissões na cidade. Isso é diretamente contrário ao nosso
pequeno Instituto. Nossa digna Madre7 levará8 o senhor Bispo, com suavidade, a
compreender tudo isso, se vos aprouver falar com ela a respeito, como jungo
conveniênte. E estou certo de que sua bondade concordará com isso.
Não acho que seja necessário excluir Annecy do benefício da missão. Se Nosso
Senhor inspirar ao senhor Bispo o desejo dela, julgo que é preciso fazê-la. Mas, antes,
11
Jean Duhamel era de Paris. Seu nome não figura nos registros de pessoal da Congregação da Missão, onde ele
permaneceu muito pouco tempo. Seu testamento, de 18 de abril de 1643 (Arch. Nat. M211, liasse 1), mostra que
lamentou vivamente sua saída e suas faltas.
22
Estava sendo tentado de deixar a Congregação da Missão, da qual veio realmente a se desligar, antes do fim do ano.
33
Vários irmãos coadjutores tinham esse nome. Não sabemos a quem aplicá-lo aqui.
44
Justo Guérin.
55
O comendador de Sillery.
66
O senado de Chambéry.
77
Santa Chantal.
88
Texto do manuscrito: “lui fera entendre” (lhe fará entender).
depois ou fora dela, estimo que não convém pregar e nem confessar na cidade. É deste
modo que se deve entender a regra de não trabalhar nas cidades, porque, de fato, isto
acabaria nos impedindo, com o tempo, de ir aos campos.
Meu Deus, senhor Padre, como estou aflito com vossa indisposição! E como
desejo que se encontre alguma casa ou um terreno para edificá-la, num lugar melhor da
cidade, como o arrabalde mais alto, onde estão os Capuchinhos9, ao que me parece!
Sendo assim, ó meu Jesus! É preciso deixar de pensar em se estabelecer noutra
cidade. Ficaríamos muito longe para prestar serviço à diocese. Pedirei entretanto ao
senhor Comendador que escreva ao senhor Comendador de Annecy 1010, que faz a
caridade de vos hospedar, para agradecer-lhe.
Não vejo segurança em tratar com Sua Excelência, o Senhor de Nemours 1111. É
um jovem príncipe. Uma e outra qualidade o impedem. Nosso Senhor vos mostrará, se
lhe aprouver, outra possibilidade. A extensão territorial do Estado do rei vai até perto de
Genebra. Talvez se encontre alguma vantagem dentro dos seus limites, com o tempo,
quando a Companhia trabalhar por aqueles lados.
Com muito prazer aprovo, senhor Padre, a aquisição dos leitos portáteis, como
me comunicais. Haverá algo a censurar, segundo o mundo. Mas onde é urgente a
necessidade, não há lei nem razão que o impeça. Como subsistir nessas montanhas, sem
leito, durante o inverno? Faltando isso, os missionários teriam de morrer ou abandonar a
missão, especialmente no inverno.
É preciso descobrir com criatividade como um mulo poderia bastar para isso e
nisso está a dificuldade.
No começo da Missão, procedíamos do mesmo modo. Mas abandonamos este
aparato, por ser supérfluo, e os embaraços, com ele, muito grandes: um cavalo não
bastava para uma pequena charrete ligeira de que dispúnhamos. Vem-me ao espírito que
poderíeis mandar transportar os móveis de um lugar para outro pelo carreto ou pelos
mulos que alugareis para isso. Mas para isso será bom trabalhar em lugares vizinhos e
escolher uma área da diocese, no começo do ano, para trabalhar sempre nela. Resultará
daí a comodidade do transporte fácil dos móveis de um lugar para outro, e ainda o fato
de encontrar assim o pessoal bem preparado, por causa da proximidade dos locais da
missão. Fizemos assim este ano no vale de Montmorency 1212. Não poderíeis imaginar,
senhor Padre, quanto o povo aproveita mais, nem quanto os missionários ficam mais
aliviados e progridem por este meio.

99
Desde a chegada a Annecy, os missionários encontraram hospitalidade junto a Jacques de Cordon, comendador de
Compesière. O Bispo de Genebra e Santa Joana de Chantal tinham contribuído pela metade com o mobiliário. O
comendador de Sillery lhes deu 3.000 libras, a 26 de janeiro de 1640, para a compra e o mobiliário de uma casa em
Annecy.
1010
Jacques Cordon, grande benfeitor dos missionários de Annecy. Fundou várias missões, a 24 de setembro de 1641,
em favor das paróquias que dependiam de suas comendadorias (Arch. Nat. S 6715-6716). Sua vida foi publicada em
Lyon em 1663 pelo Padre Calemard (Histoire de la vie d’illustre F. Jacques de Cordon d’Eviev, in-4º).
1111
Charles-Amédée de Savoie, Duque de Nemours, nascido em 1624, um dos principais adversários de Mazarino
durante a Fronda. Morreu em Paris a 30 de julho de 1652, ferido de morte num duelo com o Duque Beaufort, seu
cunhado.
1212
Vale outrora famoso por sua fertilidade em frutas de toda espécie. Na extremidade dele, sobre uma colina, se
ergue a pequena cidade de Montmorency (Seine-et-Oise).
É conveniente, para trabalhar deste modo, que o senhor Bispo escolha as áreas
da diocese onde quer o trabalho, e não mais mudar tanto de área, como tem feito.
Desejo fazer esta recomendação por toda parte.
Quanto às missas a mandar celebrar nessa região, é pena, senhor Padre, bem que
eu o desejaria. Mas na verdade não encontro meio para isso. Com efeito, além de não
ver ninguém disposto a isso, a miséria do século arrefeceu muito as esmolas e as
retribuições de missas. Suplico-vos garantir ao senhor Bispo que consideraria como
misericórdia de Deus a ocasião de prestar serviço nesse caso, se ela se apresentasse,
como também em todas as coisas em que lhe aprouver honrar-me com suas ordens. Não
há criatura no mundo sobre a qual tenha maior poder do que sobre mim.
Duas palavras sobre o negócio do vosso irmão. Fiz o possível junto ao senhor
Bullion1313 e ao senhor Tubeuf1414 em favor do caso. Foi em vão. Há apenas cerca de
um mês, um jovem advogado de Agen, presente ainda na cidade, recebeu a última
recusa. Há seis dias, ele esteve aqui e me disse que vosso irmão devia ficar satisfeito,
porque fizeram, no caso, tudo o que foi possível. O Senhor de Bullion disse que, se o
Rei quisesse dar atenção a esta espécie de prejuízos, sofridos por pessoas particulares a
seu serviço, a metade de sua renda não bastaria.
Que vos direi sobre nossas pequenas notícias? Há boa saúde na casa, graças a
Deus, e na Companhia por toda parte, exceto o Padre Jegat e o Padre Bastien 1515 em
Richelieu. O primeiro começa a melhorar.
O seminário1616 vai cada vez melhor, graças a Deus. O Padre Dufestel, superior
em Troyes, pediu-me que consinta seja nele admitido com o Padre Perceval, que veio
anteontem para isso. Entrarão amanhã, à tarde. O Padre Savinier nele também se
encontra.
As esmolas para Lorena continuam chegando sempre, pela misericórdia de
Deus. Estão sendo contempladas as cidades de Toul, Metz, Verdun, Nancy e Bar,
também Saint-Mihiel e Pont-à-Mousson, onde a miséria era tão grande que não se pode
imaginar. O Padre Dehorgny acaba de visitar os missionários presentes nesses lugares.
Ele me relata coisas incríveis, que causam tristeza: o povo comia até cobras.
Deus nos deu a graça de servir-se também desta Companhia para dar assistência
aos religiosos e religiosas. O rei concede 45.000 libras para isso, para serem distribuídas
por mim, segundo a ordem do senhor intendente da justiça.
Nesta cidade, Deus nos concedeu igualmente a misericórdia de organizar um
pequeno grupo de pessoas de condição para dar assistência à nobreza de Lorena e a
outras pessoas de condição nela presentes. Eia pois, senhor Padre, é tempo de terminar,
com o pedido humilde que vos faço de cuidar de vossa saúde e da saúde da comunidade.
1313
Claudio de Bullion, Marquês de Gallardon, com muito cartaz junto a Henrique IV e Luís XIII, foi encarregado no
tempo desses dois monarcas de missões diplomáticas muito delicadas. Depois de ter sido referendário (1605),
conselheiro ordinário de Estado, superintendente das finanças (1632), enfim ministro da justiça do rei, obteve do
Parlamento de Paris, em fevereiro de 1636, um ofício de presidente-magistrado, que Luís XIII criara expressamente
para ele. Morreu de apoplexia a 22 de dezembro de 1640.
1414
Jacques Tubeuf, presidente do Tribunal de Contas a 14 de novembro de 1643, superintendente e controlador geral
das finanças da rainha Ana d’Austria, falecido em Paris a 10 de agosto de 1670, com a idade de 64 anos.
1515
Sebastião Nodo.
1616
Trata-se do Seminário de Renovação, chamado também de Segundo Seminário, só para padres, depois de certo
tempo de trabalho. O documento 104 do tomo XIII, Ata de Assembleia de 1651, reunida em São Lázaro, faz alusão a
este seminário (XIII, 327).
Lembrai-vos de minhas misérias diante de Deus, para que se digne ter
misericórdia de mim!
Sou, no seu amor, vosso muito humilde e muito obediente servo,

Vicente de Paulo,
padre da Missão.

O Padre Dufestel, superior dos padres da Missão em Troyes, pediu para entrar
no seminário, onde se encontra atualmente com o Padre Perceval.
Envio-vos o recibo dos cem escudos do senhor Bispo de Alet.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão da


diocese de Genebra, em Annecy.

462. – A LAMBERT AUX COUTEAUX, SUPERIOR EM RICHELIEU.

Paris, 29 de julho de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Meu Deus, como agradeço de coração a Deus pelo restabelecimento da saúde do
Padre Jegat1. Peço-vos abraçá-lo em meu nome, com a maior cordialidade possível, e
rogo a sua bondade divina restitua a saúde a nosso bom Irmão Bastien 2, a quem saúdo
também muito humilde e afetuosamente. Se for preciso estação de águas ou se o médico
julgar que o clima não lhe é próprio, podeis no-lo enviar.
Mandei cem escudos ao Padre Cuissot3, para o seu mobiliário. Provereis, por
favor, a sua subsistência.
Agistes bem com esta jovem de Chinon4. É preciso afastá-la. Vistes, por minha
última carta5, o parecer do senhor bispo coadjutor de Tours6 sobre essas pessoas e a
queixa que nos fez por este motivo.
Oh! como fico consolado com o que me dizeis: ireis trabalhar para o vosso
progresso, digo, da comunidade. Na verdade, senhor Padre, me trazeis com isso um
consolo inexprimível. As conferências frequentes e a prática das virtudes que nos são

.
Carta 462. – Dossiê de Turim, original.
11
Bertrando Jegat, nascido em Vannes, em 1610, ordenado padre a 20 de setembro de 1636, recebido na
Congregação da Missão a 09 de outubro de 1638.
22
Sebastião Nodo.
33
Superior da casa de Luçon.
44
Esta moça chegou a derramar sangue de um frango na toalha do altar-mor da igreja Saint-Jacques, para tecer um
romance nada honroso para o Padre Gilloire. Desmascarada sua impostura, foi presa em Chinon.
55
Carta de 24 de julho.
66
Victor Le Bouthillier.
convenientes são os meios mais eficazes para isso. O Padre Savinier 7 ficou tão tocado
sexta-feira à noite, pela conferência feita aqui, que disse jamais ter ouvido algo que o
tenha tanto sensibilizado. Oh! como espero que a comunidade tire proveito disso. E
como espero encontrá-la em bom estado na próxima visita, lá pelo final, ou no começo
de outono, se Nosso Senhor me der essa graça!
Falei a Madame Duquesa8 deste sepultamento na igreja.
Bom dia, senhor Padre. Sou, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde
servo,

Vicente de Paulo.

463. – A SAMSON LE SOUDIER1

Paris, 29 de julho de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Agradeço-vos muito humildemente pela carta que vos aprouve ter a caridade de
me escrever. Ela me encheu de consolação, assim como a vosso irmão 2, a quem a
mostrei. Oh! que excelente jovem é ele. O senhor seu pai bem que o quis provar, mas se
manteve firme como um rochedo. Diz-me ele que, se por acaso tivesse a infelicidade de
querer ir embora, rogava a Deus o fizesse morrer na porta da casa. Terminou seus dois
anos de seminário e repassa a filosofia com o Padre Dehorgny para começar a teologia.
Conversou tão bem com quem veio encontrá-lo da parte do senhor seu pai, que o
referido senhor lhe prometeu enviar-lhe seu título e suas dimissórias. Falou também
com o senhor Barão Danti3, que está frequentemente por aqui.
Isso para o vosso irmão. Eia pois, senhor Padre, que direi de vós? Não posso
exprimir-vos a consolação que tenho ao saber de vossa fidelidade na observância do
pequeno regulamento e o amor que tendes ao recolhimento e afastamento do mundo e
de suas seduções. Oh! como isso fará de vós um bom missionário e um homem
apostólico! Continuai, senhor Padre, vos suplico, e exercitai-vos no catecismo e na
77
Ele acabava de ser chamado de La Rose para Paris.
88
A Duquesa de Aiguillon.
.
Carta 463. – Dossiê de Turim, original.
11
Samson Le Soudier, nascido em Courson (Calvados). Entrou na Congregação da Missão a 09 de outubro de 1638.
Fez os votos em Richelieu, a 14 de junho de 1642. Foi colocado em Luçon, depois em Saintes, onde morreu em
1646.
22
Jacques Le Soudier, nascido em Vire (Calvados), a 28 de outubro de 1619. Entrou na Congregação da Missão a 16
de maio de 1638 e foi ordenado padre em 1642. Fez os votos em Richelieu, a 14 de junho de 1642. São Vicente
pensou nele em 1646, para a fundação da Missão de Salé (Marrocos). O projeto, porém, foi abandonado, em razão de
circunstâncias que veremos mais adiante. Encontramos Jacques Le Soudier em 1653, em Saint-Ruentin, onde ficou
mais de dois anos. Foi superior em Crécy (1652-1654) e em Montmiraie (1655-1656). Uma longa enfermidade veio
interromper-lhe os trabalhos. Morreu em Montauban, a 17 de maio de 1663.
33
É possível que o Santo tinha tido em vista o barão de Renty, do qual, por distração, escreveu mal o nome. O barão
de Renty era da região de Samson Le Soudier e vinha com frequência a São Lázaro.
pregação. Os missionários devem aplicar-se a essas funções e embora não consigam
tanto êxito quanto outros, no juízo dos homens, é-lhes suficiente fazer a vontade de
Deus e com mais verdadeiros frutos talvez.
Falta-me tempo para falar-vos mais sobre isso e sou constrangido a terminar
dizendo-vos que sou, além do que posso exprimir, no amor de Nosso Senhor e sua santa
Mãe, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Le Soudier, padre da Missão da casa de Luçon,


em Luçon.

464. – A N***

São Lázaro, domingo, 29 de julho de 1640.

Senhor,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Anteontem, estive em Saint-Denis e pedi à Madre Superiora de Sainte-Marie1 o
seu empenho junto a sua irmã Madame de Hodicq2. Vereis, pela presente, o que me diz
especialmente nos trechos onde sublinhei algumas linhas. Peço-vos fazer-me a honra de
me retornar, dizendo-me se vamos continuar nossas pequenas recomendações, sem levar
em consideração o que ali está. Acrescento3 a isso, Senhor, a prece muito humilde que
vos faço de não revelar de quem tivestes conhecimento daquilo que o bom senhor deseja
não seja dito dele.
Dai-me a honra de crer que não há ninguém na terra sobre quem Nosso Senhor
vos tenha dado mais poder do que sobre mim que sou, no amor do mesmo Senhor,
vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

.
Carta 464. – Dossiê de Turim, cópia do século XVII ou XVIII.
11
A Madre Françoise-Elisabeth Phelippeaux de Pontchartrain, superiora do convento da Visitação de Saint-Denis.
22
Claude Phelippeaux, filha de Paulo, Senhor de Pontchartrain, secretário de Estado, e de Ana de Beauharnais,
esposa de Pierre de Hodicq, Senhor de Marly-la-Ville, admitido no Parlamento como Conselheiro a 26 de março de
1621, posteriormente presidente dos Inquéritos.
33
Texto original: “J’adresse” (Eu dirijo).
465. – A SANTA JOANA DE CHANTAL

Paris, 30 de julho de 1640.

Minha muito digna e querida Madre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Não posso exprimir-vos, minha muito digna Madre, minha confusão pelo tempo
que levei para vos responder, e o grande desejo que tenho de me corrigir.
Espero que Nosso Senhor desta vez me dará a graça de realmente me corrigir.
Com certeza, minha digna Madre, estarei certo do remédio, se pedirdes a Deus para
mim a virtude da diligência, que vos concedeu com tanta abundância. Eu o espero de
vossa caridade e de sua divina bondade.
Falemos do visitador.
Desta vez, minha querida Madre, vos manifestastes com toda clareza tanto na
carta que vossa caridade escreveu a nossa Madre da cidade 1, quanto nas linhas
acrescentadas em baixo da carta do Padre Codoing, no sentido de que não podeis
aprovar a autoridade de que vos falava ser necessária ao visitador 2. Bendito seja Deus
que assim o seja! Submeto-me de todo coração e penso que é a vontade de Deus, que se
dá a conhecer pela vossa.
Mas afora isso, confesso-vos, minha digna Madre, que o que vos escrevera era
minha opinião, com duas condições.
A primeira é que este visitador não usaria sua autoridade a não ser em casos
extremos e para isso se escolheria um visitador afável, sábio e cheio de respeito para
com os senhores bispos. Era assim o senhor Padre Coqueret, doutor da Sorbona, sobre o
qual o senhor Bispo de Sens3 lançara os olhos. Ele foi eleito, há pouco, para um dos três
superiores dos Carmelitas, e aceitou a eleição por causa do insistente pedido do senhor
Cardeal4. Ele possui em eminência essas três qualidades de que acabo de falar e teria
servido de exemplo para os outros.
A segunda condição é que ele não teria poder algum sobre casa alguma, a não
ser no ato da visita.
Nos dois casos, teria o poder necessário para remediar certas coisas, às quais
seria muito difícil fazê-lo de outra maneira. Mas fora disso, não poderia jamais arrogar-
se o direito de exercer algum ato próprio de um superior geral. Quanto à dificuldade que
seria a de desagradar aos senhores bispos, não duvideis, minha querida Madre, que, por
maiores que sejam vossas precauções a este respeito, não venha isto causar-lhes algum
estranho aborrecimento e não estimule alguma tempestade. É verdade que ela seria
menor.

.
Carta 465. – C. aut. – Original no convento da Visitação de Perigueux.
11
A Madre Helena Angélica Lhuillier.
22
Entre os conventos da Visitação, somente os dois mosteiros de Paris desejavam, como São Vicente, a instituição de
um Visitador.
33
Octave de Saint-Lary de Bellegarde (14 de novembro de 1626-26 de julho de 1646).
44
O Cardeal Richelieu.
Jesus! Minha querida Madre, o que estou a dizer?! Para onde foi o meu espírito,
dizendo-vos o que acabo de dizer-vos? Na verdade, parece que, se acato na vontade, não
o faço no juízo. Ó meu bom Deus! Certamente e inteiramente com a única intenção do
beneplácito de Deus, ao qual submeto minha vontade e o meu juízo, não duvidando que
isto é da vontade de Deus, uma vez que é da vontade de nossa digna Madre, que é de tal
modo nossa Madre que é a minha única, que eu honro e à qual quero tão bem e com
mais ternura do que jamais uma criança amou e honrou sua mãe, depois de Nosso
Senhor. E me parece que chega isso a tal ponto que tenho bastante estima e amor para
partilhá-los com todo mundo, sem exagero.
É portanto neste espírito de infância, minha querida madre, que vos falo e que
vos agradeço sempre todas as caridades que dispensais, como mãe extremosa, a vossos
caros filhos missionários e sou, no amor de Nosso Senhor e de sua Santa Mãe, vosso
muito humilde e obediente filho e servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: À minha Reverenda Madre de Chantal, superiora do primeiro


mosteiro de Annecy.

466. – AO COMENDADOR DE SILLERY

[1640].

Senhor

Na verdade, senhor Comendador, é preciso confessar que Deus opera maravilhas


em vós! Como! esta prontidão em vos entregar aos movimentos da graça, tão logo se
vos proponha o que poderia ser mais agradável a Deus, e em eliminar, em total
gratuidade, todas as razões de vossa elevada e sábia prudência, é, na verdade, render a
Deus um contínuo sacrifício de excelente odor e de admirável edificação para os que
conhecem estas belas ações.
Não tenho palavras para vos agradecer pelo favor que me fazeis de acatar
minhas pequenas propostas relativas ao nosso estabelecimento em Troyes. Sinto-me tão
reconhecido como se me tivésseis dado todos os bens do mundo, tanto porque aquilo me
parecia contrário à simplicidade na qual nossa pobre Companhia se deve firmar, como
pelo receio que tenho de que tudo que não esteja de acordo com ela possa cheirar um
pouco à esperteza dos filhos do século. Não é que eu não falte muito frequentemente a
.
Carta 466. – Vie de l’illustre serviteur de Dieu Noël Brulart de Sillery, p. 128. Os missionários, de início
estabelecidos na aldeia de Sancey, se fixaram em Troyes, a 25 de agosto de 1640, numa casa doada pelo comendador
de Sillery, na esquina da rua do quarteirão Croncels com a rua des Bas-Clos. Enquanto o comendador a estava
arrumando e ornamentando, São Vicente foi até o local. Julgou que a casa era muito luxuosa e suplicou a Brulart de
Sillery deixasse os missionários viverem na simplicidade e na pobreza de seu estado, conforme o espírito do
Evangelho, tirando os adornos da casa. Suas instâncias foram tão prementes que o comendador teve de ceder.

ela e que não seja mais claro que o dia que estais na prática desta virtude mais do que
jamais poderia eu estar. Suplico-vos acreditar que digo e acredito nisso mais firmemente
do que tenho como certo que vou morrer.
Ainda uma vez, senhor, agradeço-vos por terdes tido a bondade de condescender
com meus pequenos pontos de vista. Admiro nisso vossa humildade e isso me une a vós
com ternura tão grande que não posso exprimi-la.

467. – CHARLES DE MONTCHAL, ARCEBISPO DE TOLOSA, A SÃO VICENTE

Tolosa, 16401.

Não posso deixar que retornem para junto de vós estes dois missionários 2 que
nos enviastes, sem vos agradecer, como faço com todo meu coração, pelos grandes
serviços que prestaram a Deus, em minha diocese. Não saberia descrever-vos os
trabalhos que tiveram nem os frutos produzidos, pelos quais vos devo particular
reconhecimento, pois foi para aliviar-me que se deram tanto ao trabalho. Um deles
dominou de tal modo a língua desta região que suscitou a admiração dos que a falam e
se mostrou infatigável no trabalho. Quando estiverem mais descansados, suplico-vos
que os mandeis de volta, porque me disponho a mandar realizar os exercícios dos
ordinandos, e ainda preciso deles para isso. Tudo resultará na glória de Deus, se nos
ajudardes.

468. – A LUÍS LEBRETON

Paris, 09 de agosto de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Eis enfim a vida de São Venerando1 que me havíeis pedido.
Não vos envio ainda a carta do senhor Núncio 2. Não ousei ir vê-lo, pelas razões
que vos comuniquei3. Terei essa ventura quando do seu retorno da corte.

.
Carta 467. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, § 8, 1ª ed., p. 52.
11
A carta é anterior a 26 de agosto (Ver carta 475).
22
Roberto de Sergis e Nicolau Durot.
.
Carta 468. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
O martirológio romano assinala três santos com o nome Venerando: 25 de maio, São Venerando, diácono
martirizado na diocese de Evreux; 18 de junho, São Venerando, bispo e confessor; 14 de novembro, são Venerando,
mártir, em Troyes. La vie des bienheureux martyrs Saint Mauxe et Saint Vénérand, patrons du diocese d’Evreux,
tinha sido publicada em Ruão, em 1614.
22
Dom Scotti.
33
Não temos mais nenhuma das cartas que São Vicente escreveu a Luís Lebreton entre 01 de junho e 09 de agosto. É
numa dessas cartas perdidas, em várias talvez, que ele expõe as razões de que fala aqui.
Saldamos a letra de câmbio de trezentas libras, pagando cento e cinquenta a mais
pelo câmbio.
Volto ao pensamento que já vos tinha escrito, que é de fazer o bom propósito no
primeiro ano de seminário, os votos simples, no fim do segundo, e um voto solene de
terminar nossos dias na Companhia, longos anos depois de ter nela entrado4.
Fico contente por ter o R. P. assistente 5 dito que isso não nos torna religiosos.
Examinai-o com exatidão.
Espero cartas vossas com resposta em relação a uma quantidade de coisas sobre
que vos escrevi6: a união da casa Saint-Esprit de Toul, a dos dois priorados na diocese
de Langres, as questões concernentes a um mosteiro de Saint-François a ser colocado
sob a direção do senhor Arcebispo de Paris7. Peço-vos uma dispensa nos termos em que
vos escreveu o Padre Soufliers e o testemunho in forma pauperum8, e sou, no amor de
Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Espero a resposta relativa a Fernambouc das Índias9 . Escrevi ao senhor Padre Le


Bret em favor da Congregação de Santa Genoveva 1010. Assegurai-o de minha
obediência e dos meus serviços, nos encontros, às pessoas que ele conhece. Digo-lhe
que vós lhe falareis sobre a santidade da reforma de Santa Genoveva.

Destinatário: Ao senhor Padre Lebreton, padre da Missão, em Roma.

469. – A LUÍSA DE MARILLAC

Segunda-feira, 10 horas [16401].

Acabo de receber neste momento a carta que escreveis ao senhor Abade de Vaux
e concordo com ela. Apenas parece-me que teria sido a ocasião de lhe dizer que se esses

44
As palavras un solennel de e longues années après être entrés (um solene de e longos anos depois de ter nela
entrado), foram riscadas no texto original, mas, ao que parece, depois da redação da carta, porque a tinta é diferente.
55
O Padre Charlet, assistente francês dos jesuítas.
66
Não temos mais a carta ou as cartas que tratam do segundo e do terceiro ponto.
77
João Francisco de Gondi.
88
Quando as pessoas sem condição de pagar os direitos costumeiros pedem à Cúria em Roma uma dispensa de
parentesco para fins de matrimônio, esta dispensa é expedida in forma pauperum (na forma própria para os pobres).
Elas então só pagam uma parte dos gastos ordinários ou não pagam nada.
99
Pernambuco, no Brasil. As Américas eram outrora conhecidas pelo nome de Índias ocidentais.
1010
A Congregação de Santa Genoveva requeria em Roma a renovação dos poderes do Cardeal de La Rochefoucauld
e um indulto que permitisse ao Padre Faure continuar no cargo de Superior Geral.
.
Carta 469. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta parece que deva ser colocada antes da carta 473.
senhores desejam a cláusula relativa a mandar embora, é justo se coloque a de chamar
de volta as Irmãs, quando for julgado conveniente2.
É um caso sério que se queixem por toda parte de que peguem do que é
destinado aos doentes. É preciso fazer uma regra segundo a qual não poderão, sob
pretexto algum, alimentar-se do que é destinado aos pobres.
Consolar-me-íeis se expressásseis minhas recomendações e minhas escusas ao
Abade de Vaux por não lhe ter escrito, e lhe dissésseis que o farei na próxima mala
postal.
Bom dia, Senhora. Sou v. s.,

V. D.

Não recebestes uma carta que vos enviei de nossas irmãs de Richelieu que vos
comunicam, como faz o Padre Lambert a mim, que há duas jovens de lá se apresentando
para entrar nas Filhas da Caridade?

470. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[Entre 16401 e 16442].

Senhor Padre,

Madame de Verthamon não deixou de vir se encontrar com as damas e, depois


de lhes ter dado a conhecer com mais clareza que a intenção daqueles senhores era de
se tornarem donos absolutos da obra, disse que acreditava que eles gostariam se lhes
fosse dado o meio para se manifestarem. Contudo, ela fechou com as damas, no modo
como tinha sido resolvido. E os referidos senhores não deixaram de se manifestar e
disseram às damas que lhes concederiam tudo o que quisessem e mesmo que não teriam
que dar senão um recibo sem assinatura do dinheiro que recebessem. Eles tirariam
uma quitação de todos os comerciantes e, também, ao qe me parece, das amas de leite.
As damas lhe deram também a entender que não poderiam assumir ou continuar
esse cuidado a não ser que se mantivessem as primeiras disposições. Todas essas
negociações se deram na presença do senhor Chanceler 3. Este, ao final de tudo, disse
que redigiria por escrito a intenção dos senhores Altos Justiceiros e as entregaria às
damas. O Senhor Le Roy, quando as damas estiveram com ele e lhe expuseram todas
essas proposições, respondeu-lhes que, se isso acabasse com a questão, ele se afastaria
totalmente. Se houver algo mais, essas damas vo-lo dirão amanhã, na hora que vossa
caridade lhes marcou, pelas três horas após o almoço.
22
Ver, na correspondência autógrafa de Luísa de Marillac, as cartas 17 e 19.
.
Carta 470. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Em 1640 as damas da Caridade assumiram a obra das crianças expostas.
22
A cera usada para lacrar a carta traz a impressão do selo de que se servia Luísa de Marillac antes de 1644.
33
Pierre Séguier.
Sou, senhor Padre, vossa filha e serva,

L. de M.

Suplico-vos humildemente, senhor Padre, ter a bondade de me dizer se aprovais


que avisemos Madame de Verthamon que vós e as damas estareis aqui amanhã. Temo
que ela se aborreça, se não o fizermos, porque ela perguntou às damas quando isso
aconteceria.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

471. – A MARQUESA DE MAIGNELAY1 A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Há algum tempo, escrevi à Senhora Poulaillon para saber da Senhora Le Gras


se ela poderia fazer a caridade de arranjar uma boa professora para as moças deste
lugar2. Mas seria desejável que também pudesse ensinar-lhes algum ofício, porque os
habitantes deste lugar, afora esta condição, dificilmente as tiraria da casa do mestre-
escola onde não pagam quase nada e estudam junto com os rapazes. E é uma coisa
muito perigosa, como sabeis. Temos aqui um pároco muito bom que gostaria de ver
esta benfeitoria estabelecida aqui, enquanto estamos neste lugar. A Senhora Le Gras
comunicou à Senhora Poulaillon que poderia enviar duas, das quais uma para cuidar
dos doentes da Caridade, fazer as sangrias e preparar os remédios, e que poderiam ser
mudadas, como nos outros lugares. Aceitaremos todas as condições que vós e ela
julgardes oportunas. Mas gostaria de saber quanto antes o que desejariam ganhar,
para ver se minha filha gostaria de contribuir para isso. Há igualmente um Hospital
Geral que possui recursos e ao qual poderiam mandar que contribua com alguma
coisa. Fazei-me a caridade, senhor Padre, quanto antes, de enviar a resposta para a

.
Carta 471. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
São Vicente de Paulo conhecia, havia muito tempo, Claude-Marguerite de Gondi, irmã de Felipe Emanuel de
Gondi, antigo general das galeras, e viúva de Florimond d’Halluin, Marquês de Maignelay, que ela tinha desposado a
07 de janeiro de 1588. O marido foi assassinado três anos após o casamento. O filho morreu na flor da idade. A filha
levava uma vida infeliz junto a um marido que a brutalizava sem piedade, o Conde de Candale, filho mais velho do
Duque de Epernon. Contrariada por sua família, em seu atrativo pela vida religiosa, a Marquesa de Maignelay ficou
no mundo e se dedicou ao serviço dos pobres. Henrique IV a chamava de a sábia marquesa. A rainha Maria de
Médicis fazia dela por vezes a distribuidora de suas esmolas. Todos os dias, numerosos mendigos assediavam a porta
da casa onde morava, na Rua Saint-Honoré. Frequentava assiduamente os hospitais, as prisões, as igrejas, os
conventos. Colaborou na criação do Convento de la Madeleine, se encarregou da pensão de dezesseis religiosas e
deixou recursos para a continuação dessa obra de caridade depois de sua morte. Capuchinhas, Carmelitas, as Filhas
da Providência, os Oratorianos e a igreja da sua paróquia tiveram parte em sua generosidade. São Vicente não ficou
esquecido. Deu-lhe de seu tempo, de sua atividade, de seu dinheiro. Ajudou-o em todas as suas obras, em particular
na dos ordinandos. Certa manhã, ao acordar, percebendo que não enxergava mais, cantou o Te Deum em ação de
graças. Morreu a 26 de agosto de 1650 e foi sepultada na capela das Capuchinhas, revestida com o hábito delas. (La
Vie admirable de très Haute Dame Charlotte-Marguerite de Gondy, Marquise de Maignelais, pelo Padre Marc de
Bauduen, Paris, 1666, in-12).
22
Nanteuil-le-Haudouin (Oise).
minha casa, com este objetivo, e de comprar para mim seis livretos da fundação da
Caridade3. Eu vos devo muitos outros. É para enviá-los ao nosso pároco de Halluin 4,
donde chegamos, e a alguns outros da região que tentam reestabelecer essa devoção
nas nossas vilas, onde fora interrompida pela guerra. Todo mundo se lembra muito
bem, e com razão, de todas as caridades que vossos padres fizeram, com tanta
utilidade.
Suplico-vos ter parte em vossas santas orações, eu e minha filha.
Somos, senhor Padre, vossa muito humilde e muito obediente filha e serva,

Margarida de Gondy.

Nanteuil, 21 de agosto [16405].

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, superior dos padres da Missão.

472. – A MARQUESA DE MAIGNELAY A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Acabo de receber vossa carta. Peço-vos perdão se sou tão importuna. Mas a
necessidade de nossa Caridade1 é urgente, pois a nossa servente é tão caridosa que
embora seja paga até o dia 06 do próximo mês, quer deixar-nos no último dia deste, e
eu não queria segurá-la uma hora sequer, se ela não quiser. Desde a Páscoa tivemos,
graças a Deus, poucos pobres, no máximo doze. Creio que hoje são nove e, durante
tempos, muito menos. Pagamos cem libras de salário. Os remédios e a lavagem de
roupa se fazem aqui. É uma boa jovem que mantenho para fazer as caridades que não
posso fazer, não as tendo no coração, como deveria. Na realidade, não as faço, pois
minhas forças estão definhando. Se esta jovem que teremos, por vosso intermédio, é
boa moça, procuraremos hospedá-la sem custo algum e ficarei aliviada da falta da que
tenho. Se não souber fazer sangria, não tem importância, poderá aprendê-lo. A que
tínhamos aprendeu em pouco tempo. Ademais, nós temos um cirurgião.
Se vos aprouver que esse homem leve uma palavra vossa à Senhora Le Gras e
lhe envie a presente carta, ela poderia nos dar a resposta.
Termino como comecei, pedindo-vos perdão e suplicando que tenha parte em
vossas santas orações, sendo, senhor Padre, vossa muito humilde e obediente filha e
serva,

Margarida de Gondy.
33
Não resta exemplar algum conhecido deste opúsculo.
44
Comuna do cantão de Tourcoing (Norte).
55
Esta carta precedeu de poucos dias a carta 480.
.
Carta 472. – C. aut.– Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
A Caridade de Nanteuil-le-Haudouin.
Tarde de 26 de agosto [16402].

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, superior dos padres da Missão.

473. – A LAMBERT AUX COUTEAUX

São Lázaro, Paris, 26 de agosto de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Estou muito feliz com o que me dizeis do Padre Chiroye e vos rogo enviá-lo, o
mais cedo possível1, sem dizer para que fim. Podereis dizer-lhe que é talvez para cuidar
da comunidade, na ausência do Padre Cuissot, durante uma viagem que ele deve fazer, e
lhe dareis vossos bons conselhos sobre como proceder nesse caso. Enviar-vos-ei algum
outro para o seu lugar, se o Padre Benoît2 não voltar logo. Saúdo-o e o abraço em
espírito com uma ternura que não consigo exprimir.
Fareis bem em vos livrar desta jovem 3 e em aconselhá-la a não brincar com suas
fantasias e tratar de se ajustar ao modo de vida das outras. Nosso Senhor e sua Santa
Mãe não tinham estas ilusões e se ajustaram à vida comum.
Assegurai ao Padre Perdu que recebi e enviei sua informação a Roma, e ao Padre
Dehorgny, suas cartas, com o endereço adequado, e que lhe recomendei tudo com muito
empenho. Que ele me perdoe se não lhe estou escrevendo.
Esperamos essas caras moças da Caridade4 e vos devolverei o que vós lhes
destes. Quanto a Bárbara, vê-lo-eis5.
Não acham conveniente vossa viagem a Toul 6, por causa do pouco tempo que
teríeis para o trabalho.
Deus dispôs do bom Padre Fleury. Rogai a Deus por ele, por obséquio. Todos da
comunidade celebrem uma missa por ele. Peço ao Padre Colée comunicar-me por
quanto vendeu a ele sua parte nas duas pequenas casas anexas ao hospital e por quanto
estão alugadas.
Fazemos no momento, aqui, a visita de regra. Jamais pude discernir melhor
quanto importa empregar bem, para o nosso progresso espiritual, esse intervalo de
tempo que a Providência nos concede para isso. Em nome de Deus, senhor Padre, dizei-
22
Esta carta está no seu lugar perto de carta 471.
.
Carta 473. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
Jacques Chiroye estava sendo enviado como superior da casa de Luçon, no lugar de Gilbert Cuissot, chamado para
dirigir o estabelecimento de La Rose (Cf. carta 459).
22
Benoît Bécu.
33
Uma das “iluminadas” de Chinon (Cf. carta 459).
44
Provavelmente as duas postulantes de Richelieu, das quais se fala na carta 469.
55
Tratava-se de nomeá-la superiora no hospital de Angers.
66
Onde deveria ir fazer a visita.
o à comunidade. E ainda, que importa nos empreguemos todos e todo o tempo que
tivermos para esta finalidade e, portanto, faremos bem em adiar para outro tempo toda
espécie de ocupação, até mesmo as pregações e a visita aos lugares onde se realizaram
as missões. Precisamos primeiro trabalhar para o reinado soberano de Deus em nós e,
depois, nos outros. E o meu mal é que tenho mais empenho de fazê-lo reinar nos outros
do que em mim. Ó senhor Padre, que cegueira a minha e como peço a Deus não me
imitem nisso! Digo-vos isto com lágrimas nos olhos e que sou, no amor de Nosso
Senhor, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo,
padre da Missão.

Não vos preocupeis com o exagero de que me falais.

Destinatário: Ao senhor Padre Lambert, superior dos padres da Missão de


Richelieu, em Richelieu.

474. – A SANTA JOANA DE CHANTAL

Paris, 26 de agosto de 1640.

Minha muito digna e caríssima Madre,

Meu Deus, minha querida Madre, como se enternece meu coração ao ver a
bondade com que vossa incomparável caridade procede com vossos pobres filhos, os
missionários! Ó Jesus! Como são felizes e como espero que isso lhes há de valer! Em
nome de Nosso Senhor, minha digna Madre, continuai com esta mesma caridade para
com eles. Continuai, também, para com vosso insignificante filho e servo, com a parte
que a bondade do mesmo Senhor lhe deu, em vosso coração.
Escrevi longa carta ao Padre Escart, há mais ou menos um mês 1, sobre o que
vossa caridade me fez a honra de dizer que lhe devia escrever. Espero que tenha
recebido a carta e que ela tenha produzido efeito no seu espírito, se a tentação não tiver
deixado em sua imaginação impressões fortes demais. O motivo da visita a sua irmã é
considerável. Mas como isso vai contra uma máxima que temos de não visitar nossos
parentes, peço-lhe adiá-la até alguma ocasião em que possa ir até lá, quando estiver em
viagem, na ida ou na volta.
O que o Padre Tholard me escreve sobre sua tentação acontece de ordinário a
muitos, quando começam a se aplicar ao atendimento de confissões. Pouco a pouco, ela
vai passando, e temos por máxima não deixar de prosseguir, seja qual for o efeito
negativo da tentação, durante a confissão.
.
Carta 474. – C. aut. – Original no mosteiro da Visitação de Annecy.
11
A 25 de julho.
Quanto ao Padre Duhamel, escrevo-lhe que, se ele julgar que a residência em
Roma com um de nossos missionários 2 ou em Alet com os que ali estão 3 não lhe trará
descanso, in nomine Domini, volte para a casa dele, nesta cidade 4. Depois de passar
algum tempo em sua casa, veremos o que fazer. Tem o espírito naturalmente inquieto, e
jamais encontrará sossego, em qualquer condição em que estiver. Uma bondosa e santa
Senhora, [na qual5] tinha grande confiança6, me disse, antes de morrer, que ele se
perderia, se abandonasse a vocação. Não penso tenha ela querido dizer que fosse pelo
vício, mas por tropeços em que previa que acabaria caindo.
Que direi ao vosso caro coração, a respeito do senhor Comendador7, minha
querida Madre? Ó Jesus! Ele não tem o menor ressentimento do mundo, digo, o menor,
pelo que vossa caridade escreveu a respeito do visitador 8, e com toda a verdade, minha
digníssima Madre, asseguro-vos a mesma coisa quanto a mim, em particular. O motivo
disto é que nem ele e nem eu, que só buscávamos a vontade de Deus, acreditando que
ela nos seria manifestada, a nós dois, pela de nossa digna Madre, posso assegurar-vos,
minha amabilíssima e querida Madre, que não tivemos o menor pensamento do mundo
contrário ao vosso, digo-vos, o menor. E penso, minha querida Madre, que posso
garantir a mesma coisa da Madre da cidade9 e ficamos de tal modo em paz, como se o
próprio Nosso Senhor nos tivesse dito o que nos escreveis. E isso me fez ver que em
tudo não procuramos senão a mais pura glória de Deus. Desde que estou no mundo,
jamais vi ou senti em mim tão grande submissão do entendimento e da vontade do que
nessa ocasião. Ó minha querida e muito amável Madre, como sois soberanamente nossa
digna e muito amada Madre! Não, isso chega a tal ponto que não há palavra para vo-lo
exprimir. Só Nosso Senhor é capaz de vo-lo fazer sentir no vosso coração.
A reverenda Madre da Trindade escrevia, dias atrás, há apenas três dias, penso
eu, que ela julga a coisa necessária e que espera que ela aconteça. Direi apenas, ao
ouvido do coração de minha digna Madre, que ela diz que Nosso Senhor a fez ver algo
sobre isso1010.
Eis, minha digníssima e mais amável e amada Madre (não sou capaz de exprimi-
lo), o que direi no presente a vossa caridade. Ó Jesus! Estou me lembrando de que omito
a resposta ao que vossa caridade me diz, que aspiramos unir ao mesmo tempo a
perfeição eclesiástica e a religiosa. Oh! Não, minha querida Madre, somos pequenos
demais para isso. Mas é verdade que estamos nos desdobrando para encontrar um meio
de nos perpetuar em nossa vocação. Direi as razões, em outra ocasião, à minha querida

22
Luís Lebreton.
33
Antônio Lucas e Estêvão Blatiron. Este último tinha vindo para Alet em 1639, com Nicolau Pavillon.
44
Em Paris.
55
No texto original está escrito “ao qual”.
66
Madame Goussault.
77
O comendador de Sillery.
88
Estas palavras “a respeito do Visitador” (em francês “touchant le visiteur”) foram rabiscadas no original. É
profundamente lamentável que, para eliminar todo vestígio de desacordo entre Santa Chantal e São Vicente sobre esta
questão, se tenha querido colocar os editores das cartas do Santo na impossibilidade de ler o que ele escreveu sobre o
caso, nesta carta e alhures. Essa diferença não diminui contudo, em nada, a santidade de um e de outro, e não vemos
que sua divulgação possa causar prejuízo a quem quer que seja.
99
Irmã Maria Angélica Lhuillier.
1010
Omitimos aqui quatro linhas do original totalmente ilegíveis por causa dos rabiscos.
Madre, e os diversos pensamentos que nos sobrevêm quanto a isso, a fim de obter
vossos bons e santos conselhos.
Sou, entretanto, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde e muito
obediente servo,

Vicente de Paulo,
padre da Missão.

Em nome de Deus, minha digna Madre, que o último ponto de minha carta seja
dito unicamente ao coração de minha Madre e a nenhum outro.

475. – A BERNARDO CODOING

Paris, 26 de agosto de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi vossa carta do dia 04 deste mês. Como resposta vos digo que adoro a
conduta de Deus sobre vós, no novo trabalho que empreendeis, e rogo ao Senhor que
seja favorável a ele e nos faça conhecer sua divina vontade em semelhantes ocasiões.
Escrevo ao Padre Duhamel que, se ele julga que não vai encontrar tranquilidade
com a mudança de pessoas e lugares, indo ficar com o Padre Lebreton em Roma ou se
transferindo para Alet, in nomine Domini, volte para a casa dele em Paris. Dir-lhe-eis
que é bom que ele deixe passar algum tempo antes de voltar de lá para aqui. Disse a
nossa digna Madre que Madame Goussault me falava antes de morrer que ele se
perderia se não perseverasse na vocação, não por vício, mas por causa da qualidade do
seu espírito, inquieto em tudo e por toda parte. Temos porém motivo de esperar que
Nosso Senhor o terá sob sua particular proteção, por causa do temor que ele tem de lhe
desagradar. Peço-vos comunicar-me a decisão dele, para eu dar ordem, aos lugares que
lhe indiquei, de o receberem, e recomendá-lo aos coirmãos.
Escrevi, da última vez1, longa carta ao Padre Escart, conforme me pedistes.
Espero que, se a sua imaginação não estiver alterada, minha carta tenha produzido
algum efeito sobre ele. Se me for possível, aproveitarei o portador para lhe dizer ainda
umas duas palavras2.
Escrevo ao Padre Tholard sobre suas dificuldades no atendimento das
confissões3. Ele não deve deixar de confessar por causa disso.
Escrevi-vos uma longa carta, com o endereço, parece-me, do Senhor Courcilly,
livreiro de Lyon. Julgo que a esta altura a tenhais recebido.
.
Carta 475. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
25 de julho (Cf. carta 460).
22
Cf. carta 476.
33
Cf. carta 477.
Digo a nossa digna Madre4 que jamais o senhor Comendador5 e eu tivemos o
entendimento e a vontade tão submissos, quanto na ocasião da questão do visitador, em
relação ao pensamento que Nosso Senhor inspirou a nossa digna Madre. E isso é
verdade. Ó Jesus! senhor Padre, é preciso ater-se a isso.
Ei-vos agora no modo de vida próprio de seminário, em vossa nova moradia, e
pregando missão em Annecy. Muito bem, senhor Padre, adoro nisso a Providência.
Digo a Sua Excelência, o senhor Bispo 6, que o êxito da obra definirá a regra como
deveremos proceder doravante em semelhante caso.
Fazemos agora aqui a visita oficial. Estão presentes os Padres Savinier, de Sergis
e Durot. O Padre Dufestel, superior de Troyes, acaba de sair do seminário, onde me
pediu para passar algum tempo. Ó senhor Padre, que exemplo destes para a posteridade
a esse respeito7! O Padre Perceval, da comunidade de Troyes, fez companhia ao seu
superior.
Os Padres du Coudray e Guérin, o jovem, estão doentes em Lorena. Recomendo-
os às vossas orações e vos peço ajudar-nos a agradecer e a fazer que agradeçam a
bondade de Deus sobre esta pobre e humilde Companhia: ele inspirou a uma boa alma,
cujo nome ela não quer que se revele, a doação de vinte e cinco mil libras, parte em
dinheiro vivo, parte em rendas definidas. Que ele nos dê a graça de continuar a nos
afeiçoar cada vez mais ao espírito da Companhia. Ó senhor Padre, não vos toca o
coração ver os desígnios de Deus, no sentido de nos consolar temporal e
espiritualmente? Outrora, quis confirmar de viva voz a regra de São Francisco e, no
presente, com seus favores, o espírito desta pobre Companhia! Com efeito, é para este
fim que essa pessoa me diz ter-lhe Deus inspirado este gesto. Somente seu filho, que me
falou em seu nome, uma outra pessoa e eu sabemos de quem se trata. E não há outra
pessoa a quem eu possa dizê-lo. O altitudo divitiarum sapientiae et scientiae Dei! Quam
incomprehensibilia sunt judicia ejus!8 (Ó abismo das riquezas, da sabedoria e da ciência
de Deus! Como são insondáveis seus desígnios!). Ó senhor Padre! Quem nos ajudará a
nos humilhar até as profundezas dos infernos, e onde nos esconderemos à vista de tanta
bondade de Deus sobre nós? Esconder-nos-emos nas chagas de Nosso Senhor, em cujo
amor e no de sua Santa Mãe sou, senhor Padre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Suplico-vos, senhor Padre, dizer à comunidade que jamais fale a alguém sobre
isto. Comunicá-lo-eis, contudo, a nossa digna Madre e pedir-lhe-eis que nos ajude a
agradecer a Deus.

44
Santa Joana de Chantal.
55
O comendador de Sillery.
66
Justo Guérin, Bispo de Genebra.
77
Pareceria, conforme estas palavras, que Bernardo Codoing teria feito durante algum tempo o seminário de
renovação, isto é, teria deixado por algum tempo seus trabalhos, para se aplicar, em São Lázaro, sob a direção do
padre encarregado dos jovens seminaristas, a sua própria perfeição.
88
Rm 11, 33.
Entreguei as 300 libras de que me falastes a um estudante, conforme vossa
ordem. 500 libras se destinam ao filho de Madame de Menthon, que está na Academia.
Eu vos envio sua carta, para recebê-las de Madame sua mãe; entreguei igualmente
quinze pistolas ao ecônomo de Santa Maria da cidade9, de acordo com vossa carta.
Comunicai-me quando as receberdes, ou se já recebestes estas somas.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão de


Annecy, em Annecy.

476. – A PIERRE ESCART

Paris, 26 de agosto de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Embora vos tenha escrito bastante longamente, há cerca de um mês1, não
deixarei de vos dirigir estas linhas, nesta ocasião, para vos dizer que vos quero sempre
muito bem e penso com frequência na bondade de coração com que imagino acolhestes
o que vos escrevi, relativamente à submissão do juízo e ao bom uso que fizestes das
minhas palavras.
Parece-me, assim, que vos estou vendo em espírito de docilidade a todas as
coisas que vos são ordenadas, embora diretamente contrárias ao vosso sentimento. Ó
senhor Padre, como isso me trouxe grande consolação, e como penso que isso alegra o
coração de Deus! Jamais vi coisa que mais me tenha edificado do que as luzes que
Nosso Senhor vos concedeu no ano passado sobre esse assunto, no vosso retiro
espiritual.
Nossa digna Madre de Chantal me comunica que vos disseram que uma de
vossas irmãs apostatou da fé, o que me tocou profundamente. Tenho, porém, não sei por
quê, dificuldade em acreditar nisso e temo que o inimigo da paz de vossa alma tenha
sugerido esse pensamento aos que vos desejam ver em vossa terra, e vos persuadir a
viajar para lá. Mas como é possível tenha isso acontecido, suplico-vos, meu caríssimo
irmão, adiar os pensamentos sobre sua ida, até quando, por ocasião de alguma viagem,
pudedes certificar-vos do que aconteceu de fato, e se lhe poderíeis ser útil. O
testemunho que Nosso Senhor nos deu de quanto lhe agrada nos afastemos dos parentes,
ainda quando se tratasse da distribuição dos bens aos pobres e até mesmo do enterro do
próprio pai. Vemos, aliás, quanto evitou sua terra natal, desde o seu nascimento, e
mesmo na idade adulta. Tudo isso, aliado à experiência que tenho, em minha própria
pessoa, do fracasso de eclesiásticos nestas espécies de visitas, e levando em conta a

99
O primeiro mosteiro da Visitação.
.
Carta 476. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
25 de julho.
regra que temos e que se observa com fidelidade, pela graça de Deus, tudo pesado, digo,
não julgo conveniente que vades expressamente para isso. Pelo contrário, é melhor
esperar uma ocasião que a Providência vos disporá. Então, a caminho, podereis visitar
vossos parentes.
Sim, mas talvez, me diríeis vós, eu poderia reconduzir esta querida irmã ao seio
da Igreja. Tendes razão, senhor Padre, de dizer talvez, porque há motivo para dúvidas.
Pensando levar-lhe por vós mesmo algum proveito, quem sabe causeis prejuízo para vós
mesmo. Nosso Senhor via os parentes em Nazaré necessitados de um socorro para a
própria salvação, aos quais talvez pudesse ser de algum proveito. Preferiu contudo
deixá-los expostos ao perigo, de preferência a visitá-los, vendo que isso não agradaria a
seu Pai, e querendo dar este exemplo à posteridade e ensinar a sua Igreja o que é preciso
fazer em semelhante caso. Tenho admirado muito a prática desse exemplo de Nosso
Senhor em São Francisco Xavier, que passou muito perto dos seus, dirigindo-se para as
Índias, sem os visitar.
Eis, entretanto, o que podereis fazer: escrevei aos padres Capuchinhos de Sião e
rogai-lhes para irem ver vossa irmã e os outros parentes vossos, e fazerem o possível
para reconduzir à Igreja essa irmã e promoverem uma confissão geral para os outros
parentes. E poderíeis escrever a todos eles uma carta, e pedir-lhes que aproveitem a
graça que lhes será proporcionada por esses bons padres.
Eis, caro Padre Escart, o que vos direi para o presente. Desejo infinitamente nos
coloquemos inteiramente no estado de despojamento dos apegos de tudo que não é
Deus, e que só nos afeiçoemos às coisas, se for por Deus e segundo Deus. Procuremos,
primeiramente, estabelecer seu reino em nós, e depois nos outros. É o que vos peço
suplicar-lhe para mim, que sou, no seu amor, [senhor2], vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo,
padre indigno da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Escart, padre da Missão, em Annecy.

477. – A JACQUES THOLARD

Paris, 26 de agosto de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi vossa carta com a consolação que Nosso Senhor conhece. Como resposta
vos direi, senhor Padre, que não vos deveis afligir, nem com as tentações durante o
atendimento às confissões, nem com seus efeitos. Isso acontece naturalmente em
22
O Santo escreveu: Madame, por distração.
.
Carta 477. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
algumas pessoas, ao verem ou ao escutarem as menores insinuações. Em outras, por
sugestão do espírito maligno, para nos afastar do bem que fazemos nesta divina ação.
Num caso e noutro, jamais ofendemos a Deus, nem mortal nem venialmente, enquanto
tais acidentes nos desagradem no soberano ápice de nosso espírito.
A maior parte dos confessores, ou ao menos vários deles, são trabalhados por
essas fragilidades, no início deste ministério. Mas aos poucos essas fantasias deixam de
causar impressão à imaginação, quia in assuetis non fit passio1. Um santo bispo sofria
tais coisas, no começo da Igreja, batizando mulheres, por imersão. Tendo suplicado a
Deus muitas vezes o livrasse dessas tentações, e não sendo atendido, perdeu enfim a
paciência e se retirou para o deserto. Lá, Deus o fez ver três coroas, cada uma mais rica
que a outra, que tinha preparado para ele, se tivesse perseverado. Mas ficaria apenas
com a menor, porque não tivera confiança nele e que ele o preservaria de sucumbir à
tentação, uma vez que era por permissão dele que estava sendo tentado nos ministérios
de sua vocação.
Este exemplo, que me referia um dia um religioso cartucho, sob cuja orientação
fazia o meu retiro em Valprofonde2, fez desaparecer uma tentação quase semelhante de
que padecia nos trabalhos de minha vocação. Espero da bondade de Deus, senhor
Padre, que ela há de operar em vós efeito semelhante e que recebereis de Deus uma
coroa especial, se perseverardes. Basta que façais um ato de repúdio a todas essas
coisas, quando começardes a atender confissões. Não é necessário confessar-se disso.
Abstendei-vos de o fazer. Atendei as confissões em paz, e amai mais ainda a bondade
de Nosso Senhor, por não se ofender com tais coisas, e com nada que aconteça contra a
nossa vontade3.
Não importa se a violência da sensualidade vos impede de fazer ato algum de
repúdio, naquele momento, pois que isso não é necessário e quase não é possível, ao
menos de uma maneira sensível. O que Nosso Senhor pede de nós é que passemos logo
por cima desses devaneios, de tal sorte que não deixemos de dizer e fazer o que é
necessário para ajudar as almas a se purificarem de suas faltas.
Nosso Senhor será nisso vossa luz e vossa força. Tende nele inteira confiança e
lembrai-vos, senhor Padre, que sua bondade me concede uma afeição tão cordial por
vós que só ele vos pode fazer senti-la.
Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e muito
obediente servo,

Vicente de Paulo,
padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Tholard, padre da Missão. Em Annecy.

11
Adágio escolástico muito conhecido. O sentido é: O hábito embota a sensibilidade passiva.
22
Na comuna de Béon (Yonne).
33
Aqui o Santo rabiscou as palavras seguintes: mas se a tentação. Não importa tão pouco dizer que vós vos.
478. – A MARQUESA DE MAIGNELAY A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Deus nos enviou como servidora para a nossa Caridade uma viúva desse
arrabalde. Faremos a experiência, porque ela conhece a área. Julguei que seria bom
ver o que ela sabe fazer. Não precisais dar-vos ao trabalho de nos enviar aquela a
respeito da qual tanto vos importunei: sei que vossa caridade me perdoará e me fará a
de rezar por minhas necessidades, que, pela graça de Deus, não são pequenas. Mas em
qualquer estado que eu esteja, sou, senhor Padre, vossa muito humilde e muito
obediente filha e serva,

Margarida de Gondy.

29 de agosto de [16401].

479. – A LUÍSA DE MARILLAC

[29 ou 30 de agosto de 16401].

Senhora,

Recebi vossa carta2 esta manhã antes de escrever a minha e antes da Madame
Marquesa3 ver as vossas e as minhas, porque ao chegar nosso Irmão ela já partira.
Podereis, entretanto, mandar esta bondosa filha fazer o retiro e em Lorena.

480. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, manhã de quinta-feira [30 de agosto de 16401].

Senhora,

.
Carta 478. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta parece estar em seu lugar perto das cartas 471 e 480.
.
Carta 479. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Ver nota 2.
22
A carta 478.
33
A Marquesa de Maignelay.
.
Carta 480. – C. aut. – Original com as Filhas da Caridade do hospital com termas de Bourbon-e’Archambault.
11
A morte do Marquês de Fors, de que se trata nesta carta, aconteceu no mês de agosto de 1640. Por outro lado, a
carta 479, sendo de quarta-feira, 29 de agosto, ou de quinta, 30 de agosto, a presente, com data de quinta-feira, não
pode ser, se levarmos em conta o conteúdo, senão do dia 30.
A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!
Acabo de escrever a Madame Marquesa de Maignelay e de lhe enviar vossas
duas cartas de ontem e de hoje. Retenho aqui a filha até que obtenha resposta sobre se
ela poderá fazer cinco ou seis dias de retiro.
Perdi ontem nosso dia, porque fui visitar Madame Duquesa de Aiguillon e
Madame du Vigean2, pela morte do filho desta última 3. O pessoal da referida dama me
veio buscar para isso. Mas achei que Nosso Senhor fizera o ofício de consolador da mãe
de modo sobrenatural. Jamais vi imagem da força de Deus na aflição, como nesta
bondosa dama.
Isso e um negócio de importância que temos me tiram muito tempo de nossa
visita. Temo não esteja acabada de hoje, quinta-feira, até oito dias. Por conseguinte,
receio muito ser necessário chegar até a uma quinzena.
Esta filha vos levará a presente, depois de eu ter a resposta da Madame
Marquesa4, que ela também vos fará ver.
Quanto a mim, sou, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde e muito
obediente servo,

Vicente de Paulo.

Folgo muito que espereis alguma coisa desta boa lorenense e que a façais entrar
em retiro e fiqueis com ela. Temo seja ela um pouco preguiçosa.

481. – A LUÍSA DE MARILLAC

Manhã de terça-feira. [Agosto ou setembro de 16401].

Senhora,
22
Ana de Neubourg, esposa de Francisco Poussart de Fors, primeiro, barão, depois, Marquês du Vigean. A bela
baronesa- assim a denomina Voiture- era intimamente ligada à Duquesa de Aiguillon. Os inimigos de Richelieu
espalharam sobre as duas amigas os boatos mais infamantes (Cf. Les Historiettes de Tallemant des Réaux, Paris,
1833-1835, 6vol., in-8, t. II, p. 32; Recueil des chansons historiques, t. I, p. 149, ms da Biblioteca do Arsenal).
Voiture descreveu a magnífica casa de lazer que ela possuía em Barre, perto de Montmorency ( Oeuvres, Paris, 1858,
in-8º, p. 96).
33
Madame du Vigean tinha dois filhos e duas filhas, Ana e Marta. O mais velho, o Marquês de Fors, oficial corajoso
e até temerário, duas vezes preso pelos inimigos e duas vezes solto, acabava de sucumbir no cerco de Arras, com a
idade de apenas vinte anos. Sua morte comoveu o poeta Desmarets, que o chorou em longa elegia ( Oeuvres
poétiques, Paris, 1641, in-4, pp.18-21). O jovem irmão do marquês morreu assassinado em circunstâncias jamais
esclarecidas. Ana tornou-se Duquesa de Richelieu pelo seu casamento com um sobrinho-neto do Cardeal ministro.
Marta, depois de ter ocupado com brilho seu lugar no mundo, onde ela se divertia e divertia, tomou, apesar da
resistência da mãe, o véu das Carmelitas no convento da Rua Saint-Jacques, em Paris, e se tornou irmã Marta de
Jesus. São Vicente previra sua entrada para o claustro e lha tinha anunciado, num tempo em que ela não pensava
senão nos prazeres mundanos. Toda perturbada pela profecia de um homem, cujo poder junto a Deus ela conhecia,
suplicara-lhe, em vão, bem entendido, não rezasse nessa intenção. Ela mesma deu testemunho da autenticidade do
fato, numa declaração assinada de próprio punho (Cf. V. Cousin, Madame de Longueville, Paris, 1859, in-8, pp. 196-
203 e pp. 456-475; Collet op. cit., t. II, p. 516; deposição do Irmão Chollier no processo de beatificação).
44
A Marquesa de Maignelay.
.
Carta 481. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta se situa entre as cartas 469 e 482.
Eis duas jovens de Richelieu que a Providência vos envia. (Seria [bom] começar
a iniciá-las no retiro, já amanhã). Penso chamar Luísa e Bárbara2, se esta não for
necessária em Angers. Falaremos sobre isso. E se eu puder, irei encontrar-vos
imediatamente depois do almoço, para voltar para a assembleia.
Bom dia, Senhora. Sou, no amor de Nosso Senhor, vosso servo muito humilde,

V. D.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

482. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, sábado de manhã [Agosto ou setembro de 16401].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Não decidi a viagem de que me falais e não sei quem o disse ao senhor vosso
filho.
É importante que vossas filhas de Richelieu não estejam nem com o Padre
Durot, nem com o irmão. É bom dar-lhe a entender com suavidade que não é
conveniente tenhamos comunicações, a não ser em coisas necessárias.
Vi o bilhete da Madame Souscarrière e remeterei ao senhor Procurador Geral 2 o
que me enviastes.
Passei o encargo para a compra de uma casa3.
Estou muito atarefado hoje com nossa visita 4. Falarei contudo a Senhora Lamy,
se Deus quiser, em cujo amor sou vosso servo,
V. de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

22
Bárbara Angiboust, então em Richelieu.
.
Carta 482. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Ver nota 4.
22
Mateus Molé.
3
São Vicente andava à procura de outra Casa-Mãe para as Filhas da Caridade.
4
A visita de São Lázaro, iniciada desde 26 de agosto (Cf. carta 473).
3

4
483. – A LUÍSA DE MARILLAC

[16401].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Falarei esta noite com o Senhor de Vincy sobre a carroça para amanhã após o
almoço. Não pude servir-me da de hoje. Para esta noite, fica muito tarde. Além disso,
preciso ir amanhã de manhã, em Notre-Dame, à casa do senhor Bispo de Meaux 2, para
um negócio de grande importância.
Fico feliz com vosso parecer sobre vossas novas filhas, mas um pouco
preocupado porque Richelieu não as terá mais. E não sei o que pensará o Padre
Lambert.
Verei vossas filhas dentro de dois ou três dias e lhes recomendarei a obediência
a Ana .
3

Vejo muito bem que é necessário estar com vossas filhas, quinta-feira, nos
Meninos [Expostos]. Mas não sei se terei alguns momentos para tratar do regulamento.
Veremos. Podereis chamá-las para esse dia, por favor, ou para a sexta-feira, o que me
será menos incômodo.
Boa noite, Senhora. Sou v. s.

V. D.
Enviai-me amanhã de manhã uma de vossas filhas, por favor, para a resposta
sobre a carroça.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

484. – A LUÍSA DE MARILLAC

Quarta-feira, pela manhã [16401].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


.
Carta 483. – Original com as Filhas da Caridade de Gerona (Espanha).
11
Esta carta parece dever ser aproximada da carta 481.
2
Domingos Séguier, Bispo de Meaux (1637-1659).
3
Talvez Ana Hardemont.
2
3

.
Carta 484. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
1
Acabo de ler a ordem do dia que me entregastes e achei-a boa. O que me levava
a um parecer diferente era que não distinguia, em meu espírito, os ofícios das Irmãs. Eis
como penso que ficaria bem: as Irmãs de La Chapelle e do Hospital-Geral podem
observá-la tal qual; as das paróquias, dos Meninos 2 e dos forçados terão em vista
observá-la nos seus ofícios, com certa flexibilidade. A das irmãs das paróquias está
bastante bem especificada. No final, acrescentareis às linhas relativas aos ofícios na casa
dos Meninos Expostos, o que julgardes conveniente; e, na casa dos forçados, o que é
próprio das Irmãs dos forçados. Mas, neste último caso, é bom saber o que elas fazem,
antes de acrescentá-lo.
Fareis hoje o adendo ao que diz respeito aos Meninos, e mo enviareis. Examiná-
o-ei esta noite3.
Penso que a Providência quer que não vades hoje aos Meninos, o Senhor de
Vincy precisa de sua carroça, e temo voltar, amanhã, dos Meninos, muito tarde, e muito
febril depois das palestras. Poderíeis adiar para sexta-feira e chamar as Irmãs, amanhã,
para a vossa casa, em La Chapelle, para onde me dirigirei? Se isso contraria vossas
ordens já comunicadas, não tenhais dificuldade em tomar outra carroça emprestada e ir
hoje mesmo.
Irei amanhã aos Meninos, se Deus quiser.
Bom dia, Senhora. Devolvei-me esta tarde a referida ordem do dia.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

485. – PARA A MADRE DA TRINDADE

Paris, 01 de outubro de 1640.

Minha muito querida Madre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Rendo graças à bondade de Deus, minha querida Madre, porque vos devolveu
melhor saúde e lhe suplico vos conserve por longos anos, para o bem de vossa santa
Ordem e de vossos queridos filhos missionários, que gerastes em Nosso Senhor, na
diocese de Troyes.

21
Em sua conferência de 19 de julho de 1640, o Santo tinha anunciado às irmãs sua intenção de mandar redigir
regulamentos especiais para as irmãs da Casa-Mãe, do Hospital-Geral, das paróquias, dos Meninos Expostos e dos
Galés. Luísa de Marillac pôs-se à obra, em seguida. Talvez mesmo seu trabalho já tivesse sido começado. Esta carta
parece posterior de um dia, em relação à precedente.
2
Os Meninos Expostos.
3
Temos ainda diversas observações de Luísa de Marillac sobre as regras comuns e as regras particulares das irmãs
dos Meninos Expostos, do Hospital-Geral, dos Galés, dos hospitais e das paróquias, um regulamento para as irmãs
dos Meninos Expostos, um outro para as irmãs dos hospitais, um terceiro para os ofícios da Casa-Mãe (Cf. Pensées
de Louise de Marillac).
3

.
Carta 485. – Original na Visitação de Troyes.
Nossa Madre superiora de Santa Maria1 me disse, minha querida Madre, que ela
escreveu para vós a nova vida do falecido senhor Comendador de Sillery. Deus dispôs
dele no dia de São Cipriano, a 26 de setembro, entre meio dia e uma hora, de uma
maneira muito preciosa.
No começo de sua doença, tinha, durante os acessos, pequena perbutbação com
idéias fixas, que apareciam apenas em algumas ações infantis, em certas ocasiões.
Seis dias antes da morte, ficou tão lúcido, firme e suave como jamais o víramos,
e assim permaneceu até a hora bem-aventurada em que partiu para Deus, com uma
plenitude do espírito de Deus, uma contínua submissão a sua vontade, admirável a meus
olhos2.
Ele fez a confissão quase geral das maiores faltas de sua vida ao senhor Pároco
da paróquia3 e comungou publicamente de suas mãos, como viático, no mesmo sexto
dia antes da morte.
Seis horas antes de morrer, foi acometido de dificuldade de expectoração e
pequeno estertor. Aceitou a Unção dos Enfermos, que me dissera lhe fosse conferida
quando a julgasse a hora4. Recebeu este sacramento com profunda devoção, firme e ao
mesmo tempo terna. Começou e continuou a fazer atos de fé, de esperança, de caridade,
de contrição, de agradecimento ao seu bom anjo por toda assistência que lhe dera na
vida, pediu-lhe perdão do mau uso que dela fizera e lhe suplicou assisti-lo, na derradeira
ação que lhe restava fazer. Rendeu muitas vezes graças a Deus pela escolha que fizera
de sua Santa Mãe, pelas graças que lhe dera, e a ela mesma, por todas as graças que ela
lhe tinha obtido, em especial a de tê-lo recebido como seu escravo. Agradeceu a Deus
pela entrega de São João à Santa Virgem e da Santa Virgem a São João. Agradeceu-lhe,
além disso, várias vezes, pela Encarnação, pela vida e morte de Nosso Senhor e por nos
ter deixado seu corpo da terra, para nos unir a ele, e mais, pelo fato de que seu reino
jamais teria fim, pedindo-lhe perdão pelo mau uso que fizera de todos esses divinos
mistérios.
Agradeceu em seguida ao Espírito Santo por todas as inspirações que lhe tinha
concedido e lhe pediu perdão do mau uso que delas fizera. Agradeceu ao Pai Eterno
pela existência que lhe dera e à divina Trindade pela glória que possui. Suplicou-lhe que
a difundisse, assim como também a glória dada a Nosso Senhor, à Santa Virgem, aos
anjos e aos santos, em especial ao nosso bem-aventurado Pai5. Agradeceu além disso a
Deus por tê-lo tirado da massa corrompida do mundo, há oito ou dez anos, e por tê-lo
feito viver uma vida de maior recolhimento. Agradeceu-lhe também pela glória
concedida a São João, patrono de sua Ordem e a todos os bem-aventurados religiosos,
pedindo perdão por não ter vivido nela como verdadeiro religioso. Em meio a tudo isso,
que às vezes repetia, fazia frequentes atos de desejo de ver a Deus, com estas palavras

11
Maria Angélica Lhuillier.
22
São Vicente escrevera aqui as palavras: às seis horas ele comungou, que ele riscou depois.
33
Nicolau Masure, pároco de Saint-Paul.
44
No original francês, o sacramento da Unção dos Enfermos aparece na denominação antiga de Exrema-Unção que a
teologia posterior corrigiu para Unção dos Enfermos (N. do T.).
55
São Francisco de Sales.
de São Paulo: Cupio dissolvi et esse cum Christo 6; veni, Domine, veni et noli tardare
(Meu desejo é partir e estar com Cristo; vem, Senhor, vem e não tardes mais).
Uma hora antes de morrer, mandou chamar o Senhor de Cordes, um de seus três
executores testamentários7, e fê-lo distribuir aos seus servidores, em dinheiro, o que lhes
tinha legado em seu testamento, unindo-se à divisão das vestes de Nosso Senhor, antes
de sua agonia. Deu-lhes a todos sua bênção e rezou alguns Miserere (Salmo: “Senhor,
tende piedade”). Enfim, entregou a sua bem-aventurada alma a Deus, com grande
serenidade.
Eis, minha querida Madre, a ordem seguida pela bondade de Deus, na conduta
deste seu servo, que tinha em vós uma confiança única e que vós amáveis e
consideráveis tanto diante de Deus.
Pedi-lhe a bênção para vós, minha querida Madre, como fiz para Santa Maria e
para nós. Ó Deus! Minha cara Madre, como ele vo-la deu de bom coração e como falava
de vossa caridade com uma estima e confiança unicamente filial! A que testemunhou
para comigo é para mim de singular consolação e esperança de que me obterá
misericórdia diante de Deus.
Desejou, durante estas seis horas, que eu estivesse sempre a seu lado, de tal sorte
que não podia suportar passasse eu para um outro quarto, nem mesmo que recebesse
recados. Quis que almoçasse junto ao seu leito, cerca de meia hora antes de sua morte. E
aí está, minha cara Madre, em resumo, o que se passou por ocasião da partida desse
bem-aventurado servo de Deus.
Temia-se que, após sua morte, sua Ordem viesse a provocar tumulto 8. Mas não o
fizeram. Ao contrário, tudo aconteceu com igual paz e serenidade, como se fosse com
filhos seus. Seus executores testamentários apareceram todos ao mesmo tempo e
puseram tudo em ordem.
No dia seguinte, à tarde, o levaram para o cemitério, conforme o desejo dos
parentes, porque ele tinha deixado ordem, no seu testamento, no sentido de que seus
funerais se fizessem sem pompa e sem brasões. Durante o cortejo fúnebre, ouvia
pessoas dizendo: Ó meu Deus! O que perdem hoje os pobres! E outros: Oh! ele recebe
hoje no céu o bem que fez para os pobres9!
Os comentários hoje em Paris são sobre sua bela morte e o modo como dispôs
dos seus bens, que todos louvam, com exceção daqueles que ambicionavam alguma
coisa. Doou cem mil francos para sua Ordem1010, para nós, o que o Padre Dufestel vos
pode ter dito. Fez dos pobres do Hospital Geral seus herdeiros.
66
Fl 1, 23.
77
Os dois outros eram o presidente Trélon, seu sobrinho, e o senhor Desbordes, auditor de contas.
88
A Ordem de Malta teria desejado uma maior parte nas liberalidades testamentárias de Brulart de Sillery.
99
O cronista dos mosteiros da Visitação nos fornece outros detalhes sobre as exéquias de Noël Brulart de Sillery.
Lemos no seu manuscrito, citado pelo autor da vida do comendador, p. 225: “No dia seguinte a sua morte, em torno
das seis horas da tarde, todos os eclesiásticos de Saint-Paul, com uma vela na mão, foram buscar seu corpo e o
transportaram sem pompa para a paróquia, porque assim tinha ordenado. Terminadas as orações ordinárias, o mesmo
cortejo fúnebre trouxe o corpo para a nossa igreja (igreja da Visitação), onde devia ser enterrado. Estava descoberto e
com a casula. As lágrimas dos estudantes que sustentava e o grito dos pobres que alimentava se faziam ouvir de todos
os lados. Os senhores padres da Missão participaram do ofício religioso, celebrado pelo próprio São Vicente, que fez
em seguida o elogio do defunto, mas sem subir ao púlpito”. O senhor Padre Sillery foi sepultado debaixo da capela
dedicada a São Francisco de Sales. Um epitáfio gravado no mármore, em cima do jazigo, recordava suas virtudes,
seus títulos e seus serviços. Em 1835, o corpo foi transportado para o novo convento das Visitandinas, na Rua Neuve-
Saint-Etienne-du Mont, posteriormente rua d’ Enfer. A antiga capela da Visitação se tornara templo protestante.
Esquecia-me de dizer que deixou cinquenta mil libras para um pobre sobrinho
seu a fim de comprar um ofício no Parlamento ou no grande conselho, com a condição
de reversão em favor do Hospital Geral, caso ele não o fizesse, e para um outro, 1500
libras de renda, com a condição também de reversão para o referido Hospital 1111. Não
contemplou de modo algum os visitadores das duas Ordens que conheceis.
Quanto a mim, resta-me o reconhecimento dos infinitos favores que devemos a
vossa caridade, à qual renovo a oferta de minha obediência e sou, no amor de Nosso
Senhor, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

Não podendo escrever a nossas queridas Madres de Santa Maria 1212, suplico a
vossa caridade mostrar-lhes a presente.

Destinatária: A minha R. Madre da Santa Trindade, priora do mosteiro dos


Carmelitas da cidade de Troyes, em Troyes.

486. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[01 ou 02 de outubro de 16401].

Senhor Padre,

Os amigos da mãe de uma de nossas crianças2 pressionam muito para acordar3


as demandas judiciais iniciadas contra ela, embora esteja ausente, e pedem que se lhes
proponha o que deve ser feito para tirá-la dessa situação. Um beneficiado e o patrão
da dita Senhora se intrometem no caso. Prometi dar a resposta, a saber: ou o faremos
via justiça, para servir de exemplo às outras, o que lhe será motivo de total escândalo;
ou então, tomaremos o caminho mais suave: pedir-lhe que pague os gastos, retome seu
filho, apresentando uma pessoa como avalista de que ela não fará mais nenhum mal
para a criança, mas a educará como é de obrigação, e dê à casa alguma esmola. Por
favor, peço-vos estipular a quantia. Creio que os interessados no caso pagá-la-ão. Por

1010
Brulart de Sillery legara para o Conselho da Ordem 80.000 libras, além das 24.000 que ele lhe devia por ter
obtido a permissão de fazer testamento.
1111
Sobre as disposições testamentárias do comendador de Sillery, ver Contribuition à l’Histoire du monastère de la
Visitation Sainte-Marie du faubourg Saint-Antoine au XVIIe siècle, por Fosseyeux no Bulletin de la Société de
l’Histoire de Paris et de l’ile de France, 1910, p. 200.
1212
As irmãs da Visitação de Troyes.
.
Carta 486. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta e a seguinte, que lhe dá resposta, foram escritas entre a morte do Comendador de Sillery (26 de setembro
de 1640) e o retorno de Angers de Madame Turgis, que estava em Paris a 03 de outubro de 1640 ( Cartas de Luísa de
Marillac, carta 30). Ora, entre essas duas datas só há uma terça-feira, e essa terça-feira é o dia 02 de outubro, data da
resposta a esta carta.
22
Um menino exposto.
33
Acordar (accorder), acertar por acordo.
isto, creio ser preciso exigir uma boa soma, ou então, senhor Padre, antes desta
exigência, pedir-lhes que eles mesmos decidam a taxa a pagar.
Peço-vos, por favor, dar-vos ao trabalho de me comunicar tudo isso, sem
deferência por ninguém, pois o senhor Le Roy colocou tudo isso inteiramente aos meus
cuidados.
Entendo agir sempre nesta obra sob vossa obediência, vós que tendes o encargo
das damas, as quais gostaria de ver reunidas todas as semanas, em casa. Se estiverdes
de acordo, depois das decisões que me comunicardes, avisá-las-ei para virem aqui para
a resolução desta questão.
Doutra forma, poderíeis dar-vos ao trabalho de dizer a nossa irmã que as avise
para virem aqui, amanhã, quarta-feira, às onze horas, quando o senhor Bret deve vir
buscar a resposta que espero de vossa caridade.
Madame Turgis chegou. Pergunto-vos se concordais que a boa irmã que trouxe
com ela faça o retiro aqui, com aquela que falou convosco em Santa-Maria, ou na casa
do falecido senhor Padre Comendador4.
Falei à irmã de Saint-Germain que não podiamos manter em casa pessoas
descontentes ou que desedifiquem as outras irmãs. Se ela quisesse ficar, era preciso
mudar esse comportamento e não fizesse caso de ir servir os pobres, ao menos por
vários anos.
Nosso dinheiro esta todo em moeda da França, e muito pouco em peso de ouro.
Desejo muito que Deus queira dele servi-se, se for sua santa vontade.
Estive com Madame Villeneuve. Disse-me que lhe falaram de uma casa em La
Chapelle. Não sei se não é a nossa. Se vos apraz pensar nisso, creio seria necessário
vos digamos todos os incômodos e o que poderia ser remediado, antes de sair, para não
termos arrependimento.
Peço à bondade de Deus nada impeça seus desígnios e que eu seja
verdadeiramente, senhor Padre, vossa muito obediente filha e serva,

L. de M.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

487. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, terça-feira de manhã [02 de outubro de 16401].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!

44
O comendador de Sillery.
.
Carta 487. – C. aut. – Original com os padres da Missão de Lujan (República da Argentina).
11
Ver carta 486, nota 1.
Meu pensamento é o vosso no tocante à diligência a tomar em relação à mãe e
madrasta dessa criança. Fazei-lhe as propostas de que me falais, se as damas forem
desse parecer. Podeis solicitá-las que se reúnam para isso.
Estou indo a Rueil e não poderei estar presente.
Será bom, como dizeis, que as damas se reúnam todas as semanas.
Estou contente com a volta de Madame Turgis e lhe mando meu bom dia.
Fareis bem em mandar as duas filhas fazer o retiro e em sondar o dono de vosso
alojamento se ele colocar a casa à venda. Anteontem, informei-me se há alguma em La
Chapelle e solicitei a uma pessoa ficasse de sobreaviso.
Cuidai de vossa saúde, rogo-vos o quanto posso, e sou, no amor de Nosso
Senhor, Senhora, vosso servo,

Vicente de Paulo.

488. – A JACQUES CHIROYE, PADRE DA MISSÃO EM LUÇON

Outubro de 1640.

Nosso bom Deus quer servir-se de vós em Luçon, na qualidade de superior de


nossa pequena comunidade. Rogo-vos, senhor Padre, aceitar o ofício, na confiança de
que, procedendo com espírito de mansidão, humildade, paciência e zelo pela glória de
Deus na Companhia, e por ela nas almas de nossos bons senhores e mestres, o bom
povo dos campos, sua bondade, por si mesma, vos conduzirá, e por meio de vós, a vossa
família.
Como vejo que vosso coração há de gemer e me dirá ao ler esta carta: A, a, a,
Domine, nescio loqui1 (Ah! Senhor Javé, eis que eu não sei falar) e como me confiais
esse ofício? A isto, nada vos tenho a dizer senão sufficit tibi gratia Dei2 (basta-vos a
graça de Deus), que procureis agir como vistes os outros agirem e pergunteis sempre
que puderdes o parecer do senhor Padre Cuissot 3, que nós estamos enviando como
superior em La Rose.
Eia pois, senhor Padre, tende muita confiança em Deus. Entregai-vos a ele, a fim
de que ele vos dirija e seja ele mesmo o superior. Obedecei-lhe em tudo e ele fará
cumprir o que ordenardes. Tende especial devoção à direção exercida pela Santa
Virgem sobre a pessoa de Nosso Senhor e tudo irá bem.
Escrevei-me com frequência e saudai os Padres Soudier 4 e Thibault. Poderão
contar com a muito humilde oração que faremos aqui por eles, para se esmerarem no
bom exemplo que darão a toda Companhia, vivendo em união e submissão.
E Nosso Senhor lhes concederá mil bênçãos.

.
Carta 488. – Reg. 2, p. 261.
11
Jr. 1, 6.
22
2 Co 12, 9.
33
Seu predecessor à frente da casa de Luçon.
44
Samson Le Soudier.
489. – A LUÍS LEBRETON

Paris, 09 de outubro de 1640.

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Vossas cartas são sempre para mim motivo de singular consolação, embora não
tenhamos avançado em nada. Vejo claramente que não é por vossa culpa, mas porque
não é da vontade de Deus. Tenho perfeita confiança de que veremos enfim que não foi
conveniente. Seja bendito o seu santo nome!
Os negócios daqui não me permitiram ir estar com o senhor Núncio 1. Logo que
os daí forem acomodados, espero obter a permissão dele. Seja isso dito apenas ao
ouvido do vosso coração e a nenhum outro mais. Tenhamos, entretanto, paciência se
não conseguirmos nada antes da chegada do senhor Cardeal Bichi, faremos o que vós
me sugeris.
A meu ver, faríeis bem em vos ater ao aluguel de uma pequena casa ou de dois
quartos que, entretanto, tratareis de mobiliar. É melhor ter uma pequena casa, se nela for
possível ter uma capela.
Agistes bem com relação a esse eclesiástico de Béarn. Jamais pregaram missão
alguma, a não ser um deles com o nosso Padre Brunet, e um outro a metade de outra.
Penso que não há vinte mil pessoas ou trinta mil, em todo Béarn. Somos de opinião que
não aceiteis, quando vos pedirem alguma coisa no decorrer do mês, segundo vossa
prudência ordinária.
Gostaria muito que obtivésseis o parecer de várias pessoas daí a respeito do voto
de estabilidade, isto é, se ele estabelece uma companhia no estado religioso. Dissestes-
me que o R. P. assistente2 é de parecer contrário. Alegam que os Cartuchos e os
Beneditinos só fazem voto de estabilidade e todavia são religiosos. É verdade que ao
voto de estabilidade acrescentam o de se consagrarem à conversão dos Mouros, o qual
talvez seja um desdobramento do que constitui o voto de religião3.
Não me apresso a vos enviar companheiros, porque não estais ainda em moradia
estabelecida, mas principalmente porque soube, por vossa penúltima carta, que toda a
diocese de Roma se reduz à cidade de Roma. Desse modo, não vejo bem a utilidade de

.
Carta 489. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
Monsenhor Scotti.
22
O Padre Charlet, assistente francês dos jesuítas.
33
São Vicente não queria fazer de sua Congregação uma ordem religiosa. Roma, os bispos e a maior parte dos seus
padres se opunham a isso. Por outro lado, ele sentia necessidade de estimular à perfeição os membros que a
compunham e impedir as deserções, introduzindo os votos de pobreza, castidade, obediência e estabilidade. Mas estas
duas aspirações não seriam contraditórias? Compreendem-se as hesitações do Santo num tempo em que a atenção dos
teólogos não se voltava ainda para a questão de saber em que consiste formalmente a essência do estado religioso.
Para ser religioso, não bastava fazer os votos comumente chamados de votos de religião. Era necessário fazê-los
diante de uma pessoa que tivesse missão de aceitá-los em nome do Instituto e da Igreja. É por falta desta última
condição que os membros da Congregação da Missão, como declarou Alexandre VII (Breve Ex comissa Nobis nas
Acta apostolica, p. 16), permaneciam do clero secular. (Foi sobretudo a Congregação da Missão com seu caráter de
secularidade e votos não religiosos que provocou a reflexão de teólogos e canonistas que desembocou na categoria
jurídica das chamadas Sociedades de Vida Apostólica- Nota do Tradutor).
mais gente, a não ser em favor de bispados mais próximos, ou no caso de haver meio de
trabalhar com os ordinandos, ou nos retiros espirituais.
Enviei-vos o testemunho da pobreza das pessoas das quais vos escreveu o Padre
Sourfliers4. Elas são de Hay, diocese de Paris. Aqui está um outro, em favor das pessoas
da diocese de Poitiers, das quais vos escreveu o Padre Perdu, ou melhor, eu por ele. Não
me lembro do grau de impedimento.
Agradeço-vos muito humildemente a atenção muito fiel que tivestes no caso das
religiosas de Chanteloup5, do qual vos escreveu o senhor Padre Féret 6. Um padre
gascão, que foi a Roma buscar as bulas do senhor bispo nomeado de Comminges 7,
recebeu pedido neste sentido. Podeis dizer-lhe o estado em que está a negociação e a
recomendação que vos fiz de nela trabalhar. Se ele quiser juntar-se convosco ou fazer
algo por sua conta, agireis com ele conforme vossa caridade ordinária. Se esses
senhores tivessem sabido que tomaríeis o caso tão a peito e trabalharíeis nele tão
eficazmente, não teriam solicitado ninguém, a não ser vós.
Muito vos agradeço também pelo que fizestes em favor do senhor Comendador
Padre Harque. O mal que disseram dele convosco não é verdade. O falecido prior mor
da França8 o empregava na administração de seus bens e de sua casa. Ele sempre se
comportou em verdade com zelo, inteligência, e ele lhe aumentou a renda. A ordem é
muito correta neste ponto e, no entanto, nunca chegou ao conhecimento dele queixa
alguma. De resto é homem de piedade e não deixa dia algum de celebrar a santa missa.
Se algum religioso disse algo dele, é talvez porque estiveram envolvidos em algum
processo com ele, por causa da proximidade ou mescla de seus bens. Os processos
acarretam sempre alienação de algum bem e menos estima. O senhor Comendador de
Sillery tinha grande estima dele e de sua piedade. E sempre me pareceu partidário dos
interesses de Deus, em tudo.
Meu Deus, senhor Padre, não haveria meio de acertar a data com esses dois
priorados de Langres e, entretanto, dar-lhes garantia em caso de morte? É difícil obter o
consentimento dos abades, Sua Excelência o senhor príncipe9 e Sua Eminência o senhor
Cardeal. Embora eu tenha proposto o expediente que me sugeristes, a renúncia, no
intervalo, em favor de alguém da Companhia, o personagem não deu resposta a respeito.
Teme talvez a infidelidade do outro ou a morte. Muitos acidentes aconteceram em uma

44
Para reduzir as despesas no tribunal de Roma. Estas pessoas pediam dispensa para casamento.
55
Chanteloup está hoje em Seine-et-Marne, na comuna de Lagny. Havia lá um priorado conventual de religiosas
beneditinas.
66
Hipólito Féret, doutor em teologia, nascido em Pontoise. Ele se tornará vigário geral de Alet, de Paris, e pároco de
Saint-Nicolas-du-chardonet.
77
Hugues de Labatut, nomeado em 1637, falecido a 10 de fevereiro de 1644. A região de Comminges estende-se até
Haute-Garonne e Gers.
88
Guilherme de Meaux-Boisboudran.
99
Armando de Bourbon, príncipe de Conti, irmão do grande Condé, nascido em Paris a 11 de outubro de 1629, é o
cabeça do ramo dos Conti. Seu pai, que o destinava ao estado eclesiástico, conseguiu lhe dessem grande número de
abadias, entre outras as de Saint-Denis, de Cluny, de Lérins e de Molesme. As armas o atraíram mais do que a Igreja.
Sua paixão pela Duquesa de Longueville o arrastou para as intrigas da Fronda. Depois de o mandar prender na prisão
de Vincennes, o Cardeal Mazarino lhe deu em casamento sua sobrinha Ana Martinozzi. O príncipe tornou-se
Governador da Guiana (1654), general dos exércitos na Catalunha, onde conquistou várias cidades, grão-mestre da
casa do rei e Governador do Languedoc (1660). Morreu a 21 de fevereiro de 1666. Sua virtuosa esposa soube
reconduzi-lo a Deus e até mesmo inspirar-lhe grande piedade. Consagrava todos os dias duas horas à oração. Amigo
de São Vicente, ofereceu-lhe mais uma vez seus serviços e fez questão de assistir aos seus funerais.
comunidade, desse modo. A dignidade de teologal e a paróquia de Luçon foram
subtraídas daquela comunidade por essa maneira.
Nosso seminário está crescendo sempre, pela misericórdia de Deus, em número
e em virtude. O resto da Companhia está muito bem, graças a Deus. As diligências em
prol da Lorena ainda continuam e a assistência aos pobres, também. Temos aqui dez mil
libras para enviar para lá, tão logo o Irmão Mateus1010 tenha terminado o seu retiro.
Deus chamou a si o Comendador de Sillery. Morreu santamente, como viveu
depois que se retirou dos embaraços do mundo. Deixou para a Companhia, em favor do
seminário, oitenta mil libras, além das fundações de Genebra e Troyes.
A falecida Madame Duquesa de Ventadour1111 deixou quarenta mil libras para a
fundação de uma missão, e uma pessoa que não quer ser conhecida nos enviou, dias
atrás, vinte e cinco mil libras; a finalidade, dizia ela, é no sentido de que praza a Deus
que a Companhia continue no espírito que tem no presente. Ó senhor Padre, como Deus
é bom e como são admiráveis os filtros do seu amor! Rogo-vos orar a Deus por todas
essas pessoas e nos ajudar a obter a graça de pôr em prática a intenção dessa boa alma
que é de condição mediana.
Estou indo a Rueil para tentar cumprimentar a S. E. 1212 se o puder, e se dispuser
de espaço e tempo, dir-lhe-ei uma palavra sobre o negócio do Padre Le Bret, o qual
saúdo com todo respeito e afeto possível. E sou, dele e vosso, servo,

Vicente de Paulo.

Desculpai-me. Não sei como as anexas se desviaram em meio a nossos papéis.

Destinatário: Ao senhor Padre Lebreton, padre da Missão, em Roma.

490. – A ESTÊVÃO BLATIRON, PADRE DA MISSÃO EM ALET

09 de outubro de 1640.

Tudo que me escreveis sobre os vossos retiros me consola e me faz ver a


felicidade de ter uma boa conduta e um grande exemplo diante dos olhos1.

1010
Mateus Régnard.
1111
Catarina Suzana de Thémines de Monluc, filha de Antônio, Marquês de Thémines e Suzana de Monluc, esposa de
Charles de Lévis, Duque de Ventadour, era Marquesa de Pouy, Cauna, Thétieu, Buglose e outros lugares, hoje
situados nas Landes. Era uma das grandes benfeitoras do santuário de Notre-Dame de Buglose (Arc. Nat. S. 6703).
Testemunha dos grandes frutos obtidos por toda parte pelos filhos de São Vicente, desejava tê-los em suas terras.
Para este fim, legava ao Santo 40.000 libras, em seu testamento de 08 de setembro de 1634, para a fundação em
Cauna de uma casa de missão, composta de seis padres (Reg. dos estabelecimentos, Arquivos da Missão). O projeto
não aconteceu, provavelmente porque o Santo nunca pôde obter a soma legada.
1212
O Cardeal Richelieu.

.
Carta 490. – Reg. 2, p. 34.
11
Nicolau Pavillon, Bispo de Alet.
Desfrutai bem desta ventura, senhor Padre, in nomine Domini. Aspirai sempre e
sem descanso por vos formar à luz deste modelo e vos tornareis cada vez mais um bom
missionário. Lembrai-vos de que, na vida espiritual, os inícios contam pouco. O que tem
mais valor é a caminhada e o fim. Judas começara bem, mas terminou mal. São Paulo
terminou bem, embora tenha começado mal. A perfeição consiste na perseverança
invariável na aquisição das virtudes e no progresso nelas, porque nos caminhos de Deus
não avançar é recuar. O homem, com efeito, jamais permanece no mesmo estado e os
predestinados, como diz o Espirito Santo, ibunt de virtute in virtutem2 (caminham de
virtude em virtude).
Ora, o meio para isso, senhor Padre, é o contínuo reconhecimento das
misericórdias e bondades de Deus para conosco, acompanhado do temor contínuo de
nos tornarmos indignos de seus favores e de decair da fidelidade aos nossos pequenos
exercícios de piedade, em especial aos da oração, da presença de Deus, dos exames de
consciência, da leitura espiritual e de alguns atos diários de caridade, de mortificação,
de humildade e simplicidade.
Espero, senhor Padre, que o exato uso destas coisas nos tornará enfim bons
missionários, segundo o coração de Deus.

491. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, manhã de domingo [28 de outubro de 16401].


Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Ficai tranquila quanto a minha saúde. A febre de ontem diminuiu muito e vou
logo tomar um remédio que, com a graça de Nosso Senhor, aliviará meus pequenos
suores. Seja bendito seu santo nome!
Não disse que se avisem as damas. Bastam as que têm algum ofício. E se estais
bem onde estais, não penso que deveis vir a La Chapelle para esta cerimônia. Vereis.
Tenho receio da carroça para vós. Se fordes nela, procurai uma cadeira2, por favor.
Quanto ao vosso negócio, descarto o comerciante de madeira. Esse pessoal é
muito sujeito a cair em ruína e não conheço quase nenhum em Troyes que não acabe
dando com os burros n’água. Quanto ao outro, não saberia o que dizer a não ser que esta
quantidade de troca de empregados me leva a supor que é um empreiteiro. E essa gente,
de ordinário descamba para a confusão em seus negócios.

22
Sl 84, 8.
.
Carta 491. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
1 1
Esta carta, escrita num domingo, perto do inverno, entre a morte do Comendador de Sillery (26 de setembro de
1640) e a carta 494 (01 de novembro de 1640), só pode ser de 30 de setembro, 07, 14, 21 ou 28 de outubro. Se
compararmos o que diz aqui o Santo sobre o estado de sua saúde com que escreve a 01 de novembro, somos
inclinados a preferir o domingo mais próximo de dia de Todos os Santos.
22
Chaire, traz o texto. Em nota, Pierre Coste corrige o descuido do Santo: chaise, cadeira (chaire=púlpito!).
Acabo de fazer a proposta ao Padre Dehorgny, caso venhamos a precisar dele.
Ele prevê que sim. Dentro de dois ou três dias, dar-vos-ei a solução, se não encontrardes
outra melhor, embora, diante de Deus, não veja nada mais seguro.
Pela misericórdia de Deus, pagamos este ano uma dívida de dez mil libras, ou
antes, de quinze, aproximadamente3. Espero que aquilo que a Providência nos deu pelo
senhor Comendador4 nos impedirá de endividar-nos, a não ser no caso da casa que
precisamos comprar para as filhas5.
Eis uma carta que um bom eclesiástico me escreve de Sedan. Vede se nos é
possível enviar alguma excelente filha. Trata-se de uma nova comunidade cristã. O
senhor Duque e a madame Duquesa se tornaram católicos, há pouco. Há noventa anos, a
heresia ergueu seu trono sobre aquele principado 6. Oh! como desejaria estivésseis com
boa saúde! Mas qual! Está aí o inverno. Nem pensar nisso.
Ele escreve a Margarida de Saint-Paul. Não lhe entregarei a carta antes de vos
ver. Se Bárbara, de Richelieu, estivesse aqui, seria a solução. Pensai um pouco nisto e
em vossa saúde.
Sou no amor de Nosso Senhor, Senhora, vosso humilde servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

492. – OS ALMOTACÉIS DE METZ A SÃO VICENTE

Outubro de 1640.

Senhor Padre,

Vós nos ligastes tão estreitamente a uma dívida de gratidão, socorrendo, como
fizestes, a indigência e a necessidade extrema de nossos pobres, mendigos,
envergonhados e doentes e, de modo particular, os pobres mosteiros religiosos desta
cidade, que seríamos ingratos se demorássemos mais tempo sem vos testemunhar os
sentimentos que tudo isso despertou em nós.
Podemos garantir-vos que as esmolas que enviastes para aqui não podiam ser
mais bem distribuídas e empregadas do que em favor de nossos pobres, que aqui são

33
Era sem dúvida para pagar dívidas oriundas da aquisição de São Lázaro.
44
O Comendador de Sillery.
55
As Filhas da Caridade.
66
Em 1555, Sedam tinha passado para a Reforma com o seu senhor Henri-Robert de la Marck. A abjuração de
Frederico Maurício de la Tour d’Auvergne, Duque de Bouillon (1634), e seu casamento com Eleonora Catarina de
Bergh, filha de Frederico, Governador de Frise, e uma das primeiras damas da Caridade, foram as principais causas
do retorna à fé católica dessa antiga cidade.
.
Carta 492. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. XI, sec. I, 1ª ed., p. 376.
muito numerosos, e, sobretudo, em favor das religiosas. Estas ultimas estão destituídas
de qualquer socorro humano. Algumas não desfrutam de suas pequenas rendas desde
que a guerra começou e outras não recebem mais nada das pessoas de recurso da
cidade que antes lhes davam esmola, porque lhes tiraram os meios de o fazer.
Sentimo-nos assim obrigados a vos suplicar, como fazemos humildemente,
senhor Padre, que queirais continuar, tanto para com os referidos pobres como para os
mosteiros desta cidade, com as mesmas ajudas que até aqui nos destes. É motivo de
grande mérito para os que fazem tão boa obra, e para vós, senhor Padre, que a dirigis
e administrais com tanta prudência e inteligência. Conquistareis com isso grande
recompensa no céu.

493. – A LAMBERT AUX COUTEAUX, SUPERIOR EM RICHELIEU1

Paris, 29 de outubro de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Escrevi-vos ontem que entregásseis ao Senhor des Noyers2 um relatório3 do que
desejais seja do agrado do S. E. 4 conceder-vos. Pela presente, peço-vos não fazê-lo, se
ele não vo-lo pedir. É oportuno de nada se queixar, mas pelo contrário, testemunhar
muita gratidão pelos benefícios que se dignou fazer-nos, como é nosso dever.
Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso humilde servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

494. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, dia de Todos os Santos [16401].

Senhora,

.
Carta 493. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
O nome do destinatário desta carta não está no original. O conteúdo permite decifrá-lo.
22
Francisco Sublet des Noyers, Secretário de Estado.
33
O Santo repetiu por distração as palavras “um relatório” par mémoire antes e depois das palavras “ao Senhor des
Noyers”.
44
O Cardeal Richelieu.
.
Carta 494. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta se situa entre as cartas 491 (28 de outubro de 1640) e 509 (07 de fevereiro de 1641).
Minha febrezinha me obriga a ficar em casa.
Saí terça-feira passada pensando ir ver-vos, mas me senti pior. Entretanto, uma
quantidade de coisas exigiriam de mim ir estar convosco. Há uma pequena casa em La
Villete2, numa área de apenas uma eira, com o prédio e o jardim. Pertence à paróquia de
La Villete e depende daqui quanto à renda anual3 e à justiça. É a última da aldeia
daquele lado e do lado da igreja, da qual não está tão longe quanto a vossa casa. Falam
de quatro ou cinco mil francos. Há um corpo central de um edifício ou dois, com
ventilação pelo lado e atrás. Só há isso à venda em La Villete. Vede o que vos parece.
As damas dessa paróquia4 se queixam de Maria e dos seus modos de agir.
Desejam uma outra. Como despedi-la e quem enviar?
Quem destinais para Sedan? Urgem comigo para terem uma Irmã. Escrevi que
talvez ireis até lá. Mas como vos expor a tanto perigo nesta estação do ano?
Não sei o que vos dizer desta jovem de Angers, a não ser que há algo que não
vos convém, uma vez que não pratica uma coisa tão importante como a uniformidade no
traje5. Penso, contudo, ser necessário esperar um pouco.
O vosso filho poderá ser da missão de Mont-le-Héry6.
Madame Duquesa de Aiguillon deve ir ver-vos na primeira ocasião. Suplico-vos
manter as coisas no estado que lhe agrade aos olhos. Ela falará com o senhor procurador
geral7 para vos desobrigar das crianças desmamadas.
Sou, no amor de Nosso Senhor, v. s.

Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

495. – A JACQUES THOLARD

Paris, 13 de novembro de 1640.

Senhor Padre,

22
Então, pequena comuna, hoje, bairro de Paris.
33
Renda que certos bens deviam aos senhores dos quais dependiam.
44
Saint-Laurent.
55
A uniformidade do hábito não era o único obstáculo à perseverança das postulantes angevinas. O clima de Paris
não lhes era favorável. Luísa de Marillac o constata em uma carta ao Abade de Vaux que queria encaminhar para a
Companhia das Filhas da Caridade duas moças de Angers (angevinas): “Espero, escrevia ela, (carta 44), que elas
ficarão livres das debilidades a que estão sujeitas as jovens de Angers, que vêm para esta região. Nossa irmã Maria
que trouxe comigo será, creio eu, o começo das que terão ânimo e saúde. As duas últimas que vieram antes dela
ficaram doentes de enfermidades incuráveis desde que chegaram. Foram definhando sempre aqui e agora estão no
leito de morte. São as duas Perrine”.
66
Hoje Montlhéry, em Seine-et-Oise.
77
Mateus Molé.
.
Carta 495. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!
Recebi vossa carta. Li-a e reli-a com consolação, vendo a delicadeza de vossa
consciência. Por outro lado, com pesar, porque não vos submeteis ao conselho deste
santo prelado1 e ao que vos disse relativamente aos maus sentimentos que vos sobrevêm
durante as confissões.
Em nome de Nosso Senhor, senhor Padre, atende-vos com firmeza ao que vos
dissemos. Por quem poderíeis discernir melhor a vontade de Deus do que por este santo
prelado e, se a santa humildade me permitir, por aquele que é o intérprete da vontade de
Deus sobre vós?
Ó Jesus, senhor Padre, longe de vós! Não reflitais mais sobre isso, do mesmo
modo que sobre os impulsos de gula, como também sobre os pensamentos que vos
ocorrem (às vezes) sobre o casamento, nem sobre as tentações de desespero. Tudo isso
não é nada mais do que exercícios para vossa purificação, iluminação e perfeição, e para
que possais ter compaixão daqueles que virdes em semelhante situação. Meu Deus!
senhor Padre, é um desígnio de Deus que os que devem ajudar espiritualmente os outros
caiam em todas as tentações do espírito e do corpo que podem atormentar as outras
pessoas.
Submetei, portanto, vosso juízo ao que o senhor bispo e eu vos dissemos, por
favor, e não fiqueis refletindo, nem vos acuseis dessas coisas em confissão. Desprezai
estas sugestões malignas e a malignidade de seu autor, o diabo. Permanecei na alegria e
humilhai-vos quanto vos for possível. De ordinário, Deus permite estas coisas para vos
libertar de algum secreto orgulho e para suscitar em nós a santa humildade. Isso irá
diminuindo à medida que fordes humilhando vosso entendimento, e passará quando
tiverdes feito progresso notável nesta virtude. Trabalhai muito, portanto, na aquisição
desta virtude.
Nenhuma regra obriga sob pena de pecado, se a substância do ato de
transgressão não é por si mesma pecado, ou se não ocorre desprezo, mau exemplo ou
desobediência, quando a coisa for ordenada em virtude da santa obediência. Mas
procedemos bem tornando-nos exatos em tudo, na missão e em casa.
Quanto à genuflexão nos quartos, basta fazê-las nos grandes intervalos e não
todas as vezes que se entra ou se sai, e isto, no local onde se dorme.
Quanto às vossas cartas, ser-me-ão sempre muito queridas. Penso que podem ser
um pouco mais breves e escritas em pequenos períodos, para eu poder colocar a
resposta à margem.
Minhas pequenas enfermidades de febre quartã me impediram de escrever a
Madame vossa mãe. Fá-lo-ei e lhe enviarei os livros que me assinalastes.
Eia, senhor Padre, termino dizendo que sinto inexprimível consolação a vosso
respeito. Vê-lo-eis diante de Deus, em cujo amor e no de sua Santa Mãe sou, senhor
Padre, vosso muito humilde servo,
Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Tholard, padre da Missão, em Annecy.

11
Justo Guérin, Bispo de Genebra.
496. – A LUÍS LEBRETON

Paris, 14 de novembro de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Vossas cartas me confortam sempre, embora nossos negócios não avancem. Sei
que nada se pode acrescentar às vossas diligências e que isso não depende em absoluto
de vosso zelo e conduta. Nosso Senhor vos concede uma e outra coisa e conduz este
negócio segundo a ordem de sua eterna providência. Ficai certo, senhor Padre, que
vereis nisso nosso maior bem e me parece que já o vejo tão claramente como a luz do
dia que me ilumina. Ó senhor Padre, como é bom deixar-se conduzir pela providência!
A dificuldade do lado de cá é que quem pode tudo 1 não gostou quando lhe entreguei a
carta que me enviastes, no sentido de fornecer a Sua Santidade 2 informações sobre nós.
Ele próprio me disse, há apenas três dias, que deixemos vir um outro 3 e que ele mesmo
resolverá nosso negócio. Fiquemos então por aí, senhor Padre. Entretanto, se puderdes
obter a permissão de ter um pequeno alojamento em Roma, fazei-o.
Trabalhai bem suavemente junto aos vossos pastores4. O que me comunicastes a
respeito desse trabalho me encheu de conforto, porque podeis dizer com toda razão que
pauperes evangelizantur5 (os pobres são evangelizados).
E em meio a isso, trabalhareis nos nossos outros pequenos negócios, como
fazemos aqui sobre nossas pequenas regras, que ajustamos, quanto podemos, às de que
me falais. Penso que nos decidiremos por fazer o bom propósito de viver e morrer na
Missão, no primeiro ano do seminário, o voto simples de estabilidade, no segundo ano
do referido seminário, e o solene, depois de oito ou dez anos, a juízo do Superior Geral.
Isso equivalerá de certo modo à faculdade de expulsar os incorrigíveis.
Será necessário adotar certas precauções em relação aos votos de pobreza,
castidade e obediência, como a de fulminar todos os anos a excomunhão contra os
proprietários. Parece que a maior parte de nossos amigos estão chegando a esta
conclusão e que a discordância é comum no que se refere ao estado religioso, o qual
podemos evitar por esse meio, embora tenhamos motivo de esperar que todos lhe
assimilem o espírito.

.
Carta 496. – Dossiê de Turim, original.
11
O Cardeal Richelieu.
22
Urbano VIII.
33
Um outro Papa.
44
No entorno de Roma, terras incultas se estendiam ao longe, num raio de vinte quilômetros ou mais. Esta vasta
solidão, cheia de pastagens, era, durante o inverno o ponto de encontro de um grande número de pastores, que
retomavam, na volta da primavera, o caminho para suas regiões. Ocupando-se dessa pobre gente abandonada, privada
de missas e dos sacramentos, Luís Lebreton enfrentara uma obra muito penosa e muito meritória, inteiramente de
acordo com o fim de seu Instituto.
55
Lc 7,22.
Quanto aos nossos senhores bispos, submetemo-nos à obediência para com eles,
como os servos do Evangelho a seu senhor, quando se tratar de nossas funções externas,
assim como as punições por faltas exteriores, fora de casa. O senhor Bispo de Meaux 6
quis submissão a ele nas faltas internas em casa, em três casos: o de assassinato, de
mutilação de membros de alguém da Companhia e de libertinagem dentro de casa. No
que diz respeito à disciplina doméstica, ao governo da Congregação, à escolha e
demissão dos oficiais, à transferência de um lugar para outro e à visita canônica, tudo
isso dependerá do Superior Geral. Que vos parece de tudo isso?
Trabalhamos para obter do Superior Geral do Espírito Santo7 de aquém
montanhas o consentimento para a união. Envio-vos uma procuração daquele que dele
recebeu provisão, para poder resignar em favor do Padre Dehorgny8. Peço-vos
providenciar para que seja aceita o mais depressa possível e seja expedida a criação da
pensão de cem escudos que ele reservou para si. Estamos de acordo com a cidade de
Toul, embora a coisa ainda não tenha sido passada por escrito. Peço-vos, senhor Padre,
não perder tempo nisso e não dizer a quem quer que seja o que vos escrevi a respeito da
carta que me enviastes para informação de Sua Santidade, nem o que me prometeram.
Sou, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

Agradeço-vos a solicitude para com as filhas das quais o senhor Cônego de


Saint-Aignan9 vos escreveu e vos peço continuá-la.

Destinatário: Ao senhor Padre Lebreton, padre da Missão, em Roma.

497. – A PIERRE ESCART

Paris, 14 de novembro de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi vossa carta com uma consolação muito especial, vendo o modo como
acolhestes o que vos escrevi sobre a dificuldade que tendes com o Padre Codoing. Ó
senhor Padre, como rendo graças a Deus. Faço-o também pelo zelo que vos concede
pela observância dos pequenos regulamentos e pelo progresso na virtude da pessoa de
66
Domingos Séguier.
77
Olivier de la Trau, Senhor de Terrade, nomeado em 1619 e em 1621 Superior Geral da Ordem do Espírito Santo na
França. O geral da frança dependeu até 1625 do que residia em Roma. Olivier de la Terrade ficou detido durante
algum tempo nas prisões da Inquisição.
88
Trata-se do estabelecimento de Toul.
99
Paulo Chevalier, cônego de Saint-Aignan, na igreja Notre-Dame de paris, desde 1638, mais tarde Vigário Geral do
Cardeal de Retz, falecido em 1634.
.
Carta 497. – Dossiê de Turim, original.
quem me falais! Mas como o zelo, como as outras virtudes, se torna vício, no caso de
excesso, é preciso acautelar-vos para não vos deixar cair nesse labirinto. Com efeito, o
zelo que exorbita para fora do recinto da caridade para com o próximo não é mais zelo,
mas paixão de antipatia.
Confesso que, no início, pode ter sido zelo, mas o excesso o levou a degenerar
no que acabo de dizer-vos. A prova disso é que nem o que nossa reverenda e digna
Madre1 vos disse, nem o que vos escrevi, nem o que vos disseram, isto é, que não
queriam subscrever a última carta que me escreveste, não tirou de vosso espírito os
sentimentos (basta quanto aos sentimentos), mas nem mesmo tirou e nem diminuiu a
opinião que tínheis.
Sendo assim, senhor Padre, peço-vos muito humildemente refletir bastante nisso,
e seriamente, diante de Deus, e no que vou dizer-vos: 1º, Nosso Senhor atribui a si
mesmo o desprezo que tendes para com essa pessoa – qui vos spenit me spernit2 (quem
vos despreza, a mim despreza) – ; 2º, o que mais parece reprovado no Evangelho são os
juízos temerários; 3º, ele lança uma quantidade de maldições sobre as pessoas que
julgam temerariamente o próximo; 4º, era censurado como homem fútil, amante de si
mesmo, permitindo-lhe derramassem unguento na cabeça; os que dele se aproximavam
o denunciavam como comilão, beberrão, infrator das leis de Moisés, que não as
ensinava aos seus discípulos, permitindo-lhes colher espigas e comê-las, no dia de
sábado; não ensinava os discípulos a rezar, como São João o fazia.
Ora, quem eram aqueles que espalhavam esses rumores? Eram seus próprios
discípulos ou algum deles. Por quê? Porque não entenderam o espírito com que Nosso
Senhor fazia essas coisas. E porque isso não estava de acordo com o espírito deles, não
souberam no início questionar os próprios sentimentos, que lhes ofuscavam de tal modo
a razão corrompida que ela não foi mais capaz de discernir o verdadeiro do falso.
Acolhiam na imaginação um turbilhão de pensamentos conformes aos seus sentimentos
e razão deteriorados. Daí, pouco a pouco, se foram formando o desprezo, o ódio e tudo
que se seguiu. Ó Deus! senhor Padre, como tinha razão, ele que via tudo isso, de
levantar a voz contra os juízos temerários. E como tendes motivo de temer que o que me
dizeis dessa pessoa não tenha começado por alguma antipatia natural, ou por um forte
pendor para o zelo, o qual, em virtude de um espírito áspero demais, se tenha tornado
menos discreto! Em nome de Deus, senhor Padre, refleti nisso. E mesmo que não
acrediteis no que vos digo, aceitai pelo menos a dúvida de que seja assim, pois que sois
o único com essa opinião. O senhor Bispo3, a nossa digna Madre, os que dele se
aproximam, e o vêem e observam como vós, me dizem o contrário.
Diante desta dúvida, ó Jesus! senhor Padre, sois obrigado a fazer o possível para
vos desvencilhar dessas opiniões, vos humilhar muito a este respeito, não permitir
pensamento algum contrário à estima, à caridade e à submissão de espírito devida ao
referido senhor. Bendizei a Deus, entretanto, senhor Padre, porque não pecais por falta,
mas por excesso e virtude. Com razão, será menos penoso moderar vosso zelo do que

11
Santa Chantal.
22
Lc 10,16.
33
Justo Guérin, Bispo de Genebra.
adquiri-lo se não o tivésseis. Rogai a Deus por mim, por favor, que não o tenho de
modo algum para o meu progresso na virtude, a fim de que ele mo conceda.
Sou, em seu amor, e no de sua Santa Mãe, vosso muito humilde e obediente
servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.
Suplico-vos, senhor Padre, fazer algumas orações sobre o que vos digo e
comunicar-me as resoluções que Nosso Senhor vos conceder a respeito.

Destinatário: Ao senhor Padre Escart, padre da Missão, em Annecy.

498. – A BERNARDO CODOING

Paris, 15 de novembro de 1640.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Escrevi-vos muito longamente, há cerca de um mês. Resta-me pouca coisa a
dizer-vos no momento.
Enviei as 400 libras aos dois jovens de Annecy que estudam em Orleans e
mandei entregá-las às filhas de Santa Maria da casa de Paris, para esta finalidade.
O Padre Duhamel me escreveu de Lyon que queria se encontrar comigo a duas
léguas de Paris, há 8 ou 10 dias. Não ouvi mais falar dele, desde então.
Comuniquei-vos, se não me engano, a morte do senhor Comendador de Sillery.
Sua morte correspondeu à sua bela vida. Foi para o céu como um monarca que vai
tomar posse de seu reino, com uma paz, uma confiança, uma serenidade e uma fortaleza
inexprimíveis. Ó senhor Padre, ele era realmente um grande servo de Deus! O que vos
acabo de dizer, eu o dizia, dias passados, a Sua Eminência, e mais, que nos oito ou dez
anos em que tive a honra de me aproximar dele, não vi nele um pensamento, uma
palavra ou uma ação que não tendesse para Deus, mediata ou imediatamente, nem
mesmo pensamento algum de impureza em todas as cordiais conversas mantidas em
Santa Maria. Afirmou-me isto muitas vezes1. Ó senhor Padre, como Deus é bom para os
que se desapegam das afeições do mundo para se unir a ele!
Saúdo muito humildemente a comunidade e sou, no amor de Nosso Senhor,
vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo,
.
Carta 498. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
Ele deixara sua magnífica residência no final do mês de julho de 1632, para morar numa casa vizinha do primeiro
mosteiro da Visitação, com a intenção de acompanhar nele os exercícios de piedade das religiosas. Reservara-se para
este fim, na igreja do mosteiro, a primeira capela à direita, logo na entrada.
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão de


Annecy, em Annecy.

499. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[28 de novembro de 16401].

Senhor Padre,

Madame de Liancourt me comunicou que mandaria buscar-me amanhã pelas


oito horas. Suplico muito humildemente a vossa caridade dizer-me se alguma coisa
pode impedir-me de ir encontrar-vos, e vos lembrar o que vos disse hoje, a respeito de
nossas Irmãs. Foi no dia de amanhã que as primeiras começaram a viver em
comunidade, embora de maneira muito pobre, há 5 ou 7 anos2.
Tive, esta noite, um pensamento que me alegra: como pela graça de Deus estão
melhor do que no início, depois dos poucos anos que espero permanecer na terra,
aquela que, pela graça de Deus virá depois de mim, atrairá sobre elas maiores
bênçãos, por seus bons exemplos.
É o que desejo de todo meu coração e peço ao nosso bom Deus. E que eu possa
ser, até a minha última hora,...

500. – A LUÍSA DE MARILLAC

[28 ou 29 de novembro de 16401].

Senhora,

Nada vos impede de ir estar com Madame Liancourt, que eu saúdo


humildemente.
Procurarei agendar a assembleia de nossas damas para segunda-feira próxima,
sendo impossível antes. Jamais estive mais sensibilizado com a conduta de Deus sobre
vossas filhas do que agora.

.
Carta 499. – Manuscrito São Paulo, p.22.
11
Ver nota 2.
22
Foi a 29 de novembro de 1633. Esta carta seria portanto, se Luísa de Marillac não comete um erro, de 28 de
novembro de 1638, 1639 ou 1640. A terceira data é a única possível, pois que São Vicente estava ausente de Paris a
28 de novembro de 1638 e a 28 de novembro de 1639.
.
Carta 500. – Manuscrito São Paulo, p. 22.
11
Esta carta responde à carta 499, depois da qual foi escrita.
501. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, manhã de segunda-feira [Em torno de 16401].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Não recebi a carta que escreveis ao senhor Abade de Vaux como resposta à que
recebestes dele e que vos devolvo.
Mas tenho a que escreveis em Richelieu, que acabo de enviar-lhe. Quando eu vir
a primeira, dir-vos-ei o que penso, e falaremos sobre o que o referido senhor Abade de
Vaux vos escreve, e sobre as crianças2. É preciso fazer, o mais cedo possível, uma
assembleia geral3.
Peço-vos, entretanto, cuidar de vossa saúde e sou, no amor de Nosso Senhor,
Senhora, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

Penso haver mais humildade se tratarmos as Filhas da Caridade com título de


irmãs do que de filhas4. É o uso em Santa Maria.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

502. – OS ALMOTACÉIS DE PONT-À-MOUSSON A SÃO VICENTE

Dezembro de 1640.

O receio de ver brevemente privados das caridades, que aprouve a vossa


bondade mandar distribuir aos nossos pobres, leva-nos a recorrer a vós, senhor Padre,
para que lhes continueis a dispensar os mesmos socorros, com tanto zelo quanto antes.
Efetivamente, a carência continua como jamais. Há dois anos, a colheita é insuficiente
e as tropas de soldados comem o trigo ainda verde. Contínuas guarnições militares
deixam-nos apenas objetos de compaixão. Os que tinham recurso estão reduzidos à
mendicidade. São motivos tão fortes quanto verdadeiros, para estimular-vos a ternura

.
Carta 501. – Dossiê da Missão, original.
11
Ver nota 4.
22
As Crianças Expostas.
33
Uma assembleia das damas da Caridade.
44
Nas cartas seguintes o próprio São Vicente procurará conformar-se ao conselho que dá aqui a Luísa de Marillac,
mas o antigo hábito às vezes acaba prevalecendo.
.
Carta 502. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. XI, sec. I, 1ª ed., p. 379.
do coração, já pleno de amor e de piedade, para prosseguir com vossa benignidade
para com quinhentos pobres que morreriam em poucas horas se, por infelicidade, esse
alívio lhes viesse a faltar. Suplicamos vossa bondade não permitir esse extremo, mas
nos dar as migalhas do que as outras cidades tiverem de supérfluo. Não fareis somente
caridade para com nossos pobres, mas os tirareis das garras da morte e nos tornareis
estreitamente devedores e agradecidos.

503. – A LUÍSA DE MARILLAC

Manhã de sábado [1640 ou 16411].

Senhora,

Parece-me, Senhora, que irmã Vicência, de Richelieu, seria preferível neste


início. Além disso, esta Irmã precisa de muito trabalho para satisfazer seu espírito ativo.
É muito boa filha, de boa reputação na sua região, e serviu sua patroa com perseverança
durante sete ou oito anos. É impossível dizer como esta pobre mulher sofre com sua
ausência. Há espíritos que logo de início não se ajustam a todas as pequenas
determinações. O tempo acaba levando tudo a bom termo. Constato isso todos os dias
entre nós.
Tenho toda estima e afeição por esta obra2, e hoje de manhã, estava pensando em
trazer o Padre Lambert, superior em Richelieu, para prestar serviço a esta obra e a todas
as nossas Caridades. Mas ainda não chegou a hora3.
Vou ver a casa4.
Bom dia, Senhora. Sou v. s.

V. D.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

504. – A LUÍSA DE MARILLAC

.
Carta 503. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Quando São Vicente escrevia esta carta, havia entre as Filhas da Caridade uma irmã enviada de Richelieu. Lambert
aux Couteaux era superior da casa fundada nessa cidade e São Vicente pensava na mudança da Casa-Mãe das irmãs.
Estes três detalhes nos levam a adotar a data aproximativa acima. É mais provável a data de 1641 que a de 1640.
22
Provavelmente as Confrarias da Caridade.
33
Lambert aux Couteaux ficou em Richelieu até 1642.
44
Muito provavelmente uma casa proposta a Luísa de Marillac, para ela e sua pequena comunidade.
.
Carta 504. – Carta assinalada num catálogo do senhor Charavay, comerciante de autógrafos em Paris. O original,
todo da mão do Santo, compreende duas páginas de textos in-12.
Vicente de Paulo deseja saber o número das crianças expostas e se é possível
conseguir amas-de-leite ao preço de que falou. Isso daria ânimo a todo mundo.

505. – A CHARLES OZENNE1

14 de janeiro de [16412].

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Meu Deus, senhor Padre, como estou preocupado com a doença do Padre
Dufestel3. Suplico-vos, em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo, senhor Padre,
providenciar-lhe assistência de todos os modos possíveis. Não duvido que o façais, vós
e toda a comunidade, com toda a caridade que é possível imaginar, mas vos peço
empregar todo o cuidado para que ele seja atendido pelo melhor médico e nada poupar
para o bem dele. Ó meu Deus, senhor Padre! Sinto muito não estar ao vosso lado para
vos auxiliar no vosso zelo e assistência!
Aprouve a Nosso Senhor dar a recompensa pelos seus trabalhos ao senhor Padre
Sergis. Relatar-vos-ei como isso aconteceu, dentro de dois ou três dias 4. Suplico-vos,
entretanto, rogar a Deus por ele.
Direis ao Padre Dufestel que avisaremos logo em seguida se é conveniente que
ele vá se encontrar com o sobrinho do senhor Bispo de Troyes5, para conseguir o
pagamento do Senhor Saint-Armand e que nós também, nesse meio termo, vamos
procurar o pagamento, como também o da renda do senhor Comendador6. Penso até
mesmo que é preciso envidar algum esforço, sob a cobertura de um amigo, para ter a
casa de que me fala e que importa não perder tempo. O senhor Gouault prosseguirá com
sua assistência neste sentido, como em tudo mais, como lho peço de sua bondade.
Quanto a mim, solicitarei o lugar de que me fala, agora que este bom coirmão está de
volta.

.
Carta 505. – Dossiê da Turim, cópia do século XVII ou XVIII.
11
Charles Ozenne, nascido em Nibas (Somme) a 15 de abril de 1613, foi ordenado padre em 1637 e recebido na
Congregação da Missão a 10 de junho de 1638. Colocado na casa de Troyes depois do Seminário Interno, nela fez os
votos a 29 de agosto de 1642 e foi nomeado superior em 1644. Foi de lá que São Vicente o retirou em 1653, para
confiar-lhe a direção da Missão da Polônia. “É, dizia ele, um homem de Deus, zeloso e desapegado, que tem o dom
para conduzir e conquistar os corações das pessoas de dentro e de fora”. Infelizmente, a carreira deste excelente
missionário foi curta. Morreu em Varsóvia, a 14 de agosto de 1658 (Notices, t. III, pp. 148-154).
22
O copista escreveu 14 de janeiro de 1740. O “7” é evidentemente consequência de distração e o “zero”, de má
leitura. A morte de Roberto de Sergis, que a carta 475, de 26 de agosto de 1640, supõe ainda em vida, se dera muito
recentemente, a 03 de fevereiro de 1641(Cf. 1. 507).
33
Superior da casa de Troyes.
44
Essa carta, enviada a todas as casas da Companhia, não nos foi conservada. Nada sabemos sobre os últimos
momentos do Padre Robert de Sergis.
55
René de Breslay, Bispo de Troyes.
66
Sobre a pensão anual devida a São Vicente quer pelo Bispo de Troyes, quer pelo comendador de Sillery, ver a carta
292, nota 1.
O senhor Padre du Coudray não está ainda de volta. Estou muito preocupado,
pois que deveria estar aqui há dez dias.
Temos aqui um de vossos parentes, chamado Heurtel 7, que quer doar-se a Nosso
Senhor em nossa pequena Companhia. Saúdo o Padre Dufestel e o abraço em espírito
com toda a humildade e afeição possível, como faço como os outros de vossa família.
Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e muito
obediente servo,
Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Ozenne, padre da Missão, em Troyes, aos


cuidados da R. Madre Superiora da Visitação de Santa Maria de Troyes.

506. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, manhã de quinta-feira [31 de janeiro de 16411].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Não consigo agradecer-vos suficientemente a assistência às nossas necessidades,
com a humildade e a afeição com que gostaria.
Rogo a Nosso Senhor seja ele a vossa recompensa e vos aumente o amor para
com ele.
Acabo de pedir que chamem amanhã o notário para fazer-vos um documento
desta soma e tratarei de vos dar o dinheiro que vos devemos, o quanto antes.
Pensava ir ver-vos hoje. Mas foram de parecer que me submeta à sangria pela
segunda vez. Se puder, irei estar convosco amanhã, se Deus quiser. Temos muitas
coisas a tratar. A mais urgente é a da Irmã para Sedan. Peço-vos mandar buscar Maria
de Saint-Germain, falar-lhe a respeito, e ver quem colocaríeis em seu lugar. Ela precisa
partir dentro de cinco ou seis dias para que eu mande dizer a última palavra ao senhor
Pároco de Saint-Germain2.
A assembleia transcorreu muito bem, a meu contento, graças a Deus, em cujo
amor sou v. s.

V. D.

77
Francisco Heurtel nasceu em Nibas (Somme) em 1621. Entrou na Congregação da Missão a 26 de novembro de
1640 e fez os votos a 01 de dezembro de 1642. Foi ordenado padre em 1645.
.
Carta 506. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta é muito provavelmente da quinta-feira precedente ao dia em que foi escrita a carta 509.
22
Pierre Colombert. Foi pároco de Saint-Germain-l’Auxerrois, de 16 de março de 1636 a 06 de julho de 1657.
507. – A LUÍS LEBRETON

Paris, 03 de fevereiro de 1641.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Há muito tempo não vos escrevo. Minha viagem a Richelieu, o grande embaraço
dos negócios que encontrei ao chegar lá e a indisposição que tive depois, tudo isto,
aliado a minha ordinária preguiça, foi a causa. De hora em diante, escrever-vos-ei com
mais frequência, com a ajuda de Deus, como espero.
O relato que me fazeis de vossa missão na diocese de Porto me encheu de
alegria, mais do que vos posso dizer. A este respeito, resta-me uma dificuldade, isto é, a
de saber por que razão permaneceis tão pouco tempo em cada lugar. A máxima da
missão é de ficar e de trabalhar nos locais até que todas as almas tenham oportunidade
de cumprir seu dever. Tivemos de fazer assim porque os que têm maior necessidade
estão sempre ad feces1.
Falei a Madame Duquesa de Aiguillon sobre vossa proposta, a fazer à Sua
Eminência2, relativa a nossa fundação em Roma. Ainda não recebi resposta.
Estou exultante de consolação pelo que me comunicais, a saber, que Sua
Eminência o Cardeal Bagni pensou em nós, com relação ao assunto dessa capela, e peço
muito a Deus santifique cada vez mais sua querida alma.
Não saberia o que vos dizer sobre as diversas propostas que me fazeis dessas
capelas e dos diversos lugares que sugeris. Remeto tudo à Providência de Deus e aos
bons conselhos que vos derem as pessoas daí que nos amam. Não posso exprimir-vos
quanto diminuíram as caridades do lado de cá e a dificuldade de encontrar dinheiro de
empréstimo. Todos sofrem as consequências da miséria do século. Aguardamos a
resolução de Sua Eminência, com paciência, assim como a hora da Providência, em
relação ao nosso estabelecimento.
Ninguém me reclama o dinheiro que me comunicais ter pedido emprestado aí.
Aguardo a ocasião para falar, ou mandar falar, a respeito dos abades de que
dependem os dois priorados3, a fim de lhes obter o consentimento para a união.
Entramos em entendimento com a pessoa que detinha o direito do senhor Padre Geral da
Terrade, da Ordem do Espírito Santo, relativo à casa de Toul e tivemos notícia de que
ele trabalha para lhe obter o consentimento, conforme me dissestes.
Eis algumas cartas e um relatório do senhor Bispo de Genebra 4 a respeito do seu
projeto de fundar um seminário cuja direção quer entregar aos missionários que temos
em sua diocese. Vede as cartas e o seu relatório, assim como o do Padre Codoing.
.
Carta 507. – Coleção do processo de beatificação.
11
A borra é a última a sair do tonel.
22
O Cardeal Richelieu.
33
O príncipe de Conti e o Cardeal Richelieu.
44
Justo Guérin.
Lacrai as cartas e entregai-as a quem são dirigidas; e fazei o possível para o êxito de seu
projeto. Vede como é importante, em tantas circunstâncias, ter um estabelecimento da
Companhia.
Os Reverendos Padres5 com os quais vos comunicais mais familiarmente por lá,
escrevem por aqui tudo que fazeis e também o que vos fazem. E divulgam tudo aqui.
Peço-vos ficar atento a isso. Não vos falo dos Reverendos Padres Jesuítas.
Esquecia-me de dizer-vos, com relação à intenção do senhor Bispo de Genebra,
que ela me parece boa em tudo, exceto no que se refere aos meninos que ele deseja
serem educados no seminário. Com efeito, até o presente, não ouvi falar que seminário
algum desse tipo tenha tido bom êxito para o bem da Igreja. E a experiência nos mostra
o contrário em Ruão, Bordéus, e Agen 6. Exporei minha humilde opinião ao santo
prelado ou, seja como for, ao Padre Codoing. Que a dificuldade, porém, não parta de
vós aí, por favor7.
Escrevereis aos dois em nosso nome, por obséquio, e nos prestareis conta do que
tiverdes feito.
Recebi e enviei para Richelieu as indulgências e dispensas que lhes obtivestes.
Escrevi-vos que não acham bom por aqui nos entendamos ou negociemos com a pessoa
da qual me enviastes a carta relativa aos nossos negócios. Aquele que tem poder me
disse que mandará resolver nosso negócio, dentro de algum tempo.
Só tive a honra de estar com Sua Eminência apenas uma vez e só lhe pude dizer
duas ou três palavras, desde a minha volta. Quando aparecer a ocasião, dir-lhe-ei uma
palavra em favor do senhor que nos protege aí e nos presta assistência com tanta
caridade. Suplico-vos renovar-lhe os préstimos de minha obediência, e ao senhor
Marchand também, neste início de ano.
Espero tenhais recebido a fundação de Santo Eutrópio 8 e que vossa caridade
continuará o empenho pelo êxito deste negócio.
Parece que todos os nossos senhores bispos desejam ter seminários para padres,
para pessoas jovens. O senhor Bispo de Meaux, que aceita uma fundação oferecida a
nós em sua diocese, o deseja 9. Isso me parece bom, mas só em se tratando de
eclesiásticos. O senhor Bispo de Saintes1010 nos oferece a mesma coisa.
O bom Deus vai se servindo assim desta Companhia: no caso do povo, com as
missões; para o clero iniciante, com o retiro dos ordinandos; para os que já são padres,
não admitindo ninguém aos benefícios, nem aos vicariatos sem que tenham feito o retiro

55
Os Padres do Oratório.
66
No seminário de Ruão só eram recebidos jovens, com a idade de ao menos quatorze anos. São Vicente retorna em
outra parte (carta 709) sobre o reduzido número de padres que saíam deste seminário (Ver excelente obra de M.
Degret, Histoire des seminaires français jusqu’ à la Révolution, Paris, 1912, 2 vol., in-12, t. I, p. 86). Os seminários
de Agen e de Bordéus estavam vazios.
77
São Vicente não era tão contrário à admissão de meninos nos seminários. Ele mesmo recebeu alguns durante sua
vida, quer nos Bons-Enfants, quer no seminário São Carlos. Instruído, porém, pela experiência de que este meio era
insuficiente para alcançar a reforma do clero e porque dava poucos resultados, e ainda, porque eram resultados
tardios, estimava com razão que a preparação remota não devia conduzir à negligência da preparação próxima dos
que estavam prestes a receber as ordens, ou as tinham já recebido. E quando os recursos não davam para levar tudo
em frente, era melhor empreender o mais urgente.
88
Em Morangis (Seine-et-Oise).
99
Domingos Séguier, Bispo de Meaux, tinha requisitado os padres da Missão para Crécy.
1010
Jacques Raoul, Senhor de la Guibourgère.
e tenham sido instruídos no seminário; para os beneficiários em atividade, os exercícios
espirituais. Praza à divina bondade nos conceda sua graça para isso!
A Companhia está crescendo em número e em virtude, pela misericórdia de
Deus, como cada um reconhece e me pareceu nas visitas. Só eu, miserável, vou-me
sobrecarregando de novas iniquidades e abominações. Ó senhor Padre, como Deus é
misericordioso em me suportar com tanta paciência e longanimidade e como sou
mesquinho e miserável por abusar tanto de sua misericórdia! Suplico-vos, senhor Padre,
me recomendeis frequentemente à sua divina Majestade.
As esmolas para Lorena continuam sempre, pela misericórdia de Deus. Nosso
Irmão Mateus leva para lá, todos os meses, duas mil e quinhentas libras para os pobres e
cerca de quarenta e cinco mil libras para os religiosos e religiosas. E temos hoje a
assembleia para a assistência à pobre nobreza refugiada, para a qual distribuímos, no
mês passado, mil e tantas libras e espero distribuir outro tanto hoje.
Deus dispôs de nosso bom Padre de Sergis. Sobre ele vos escrevo em carta à
parte.
Eis nossas pequenas notícias. Recebo sempre as vossas com consolação. Sou, no
amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Se depois que a pessoa, a quem o senhor Bispo de Genebra escreve, tiver visto o
que ele diz desta pequena Companhia, estiver aberta a prestar este serviço, quid (que tal)
se lhe pedis emprestada a carta, para apresentá-la a Sua Excelência, Dom Ingoli, e aos
que julgardes conveniente?

Destinatário: Ao senhor Padre Lebreton, padre da Congregação da Missão, em


Roma.

508 – A ADRIANO BOURDOISE

06 de fevereiro de 1641.

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


O jovem eclesiástico, senhor Clauset, que saiu daqui e solicita entrar na vossa
comunidade, é cheio de boa vontade e digno de que lhe façais a caridade que vos pede.
Há apenas quatro ou cinco dias, aconselhei a um outro eclesiástico, que saiu de Saint-
Gervais e veio fazer retiro conosco, a vos solicitar a mesma graça que o primeiro. Ele
me comunicou depois que vós lha concedestes. Todas as ocasiões que eu tiver de vos
encaminhar outros, fá-lo-ei. Suplico-vos igualmente levá-lo a bem, e mais ainda, não
fazer dificuldade alguma para receber todos daqui que quiserem sair e pedirem para

Carta 508. – Reg. I, fl. 34, vº. O copista nota que o original era de escrita autêntica de São Vicente.
entrar aí, sem necessidade de pedir meu consentimento. Do mesmo modo, peço-vos
muito humildemente, senhor Padre, levar a bem que, se se apresentar algum dos vossos
pensionistas para entrar em nossa pobre e humilde Companhia, o recebamos,
simplismente, sem mais. Digo, de vossos pensionistas, e de modo algum, com certeza,
dos que têm a felicidade de estar ligados a vossa santa comunidade, que eu considero
das mais santas da igreja de Deus. Eu mesmo me julgaria feliz de estar nela, se a
Providência não me tivesse ligado a esta em que estou. Mas como não tenho de fato esta
felicidade, eu a tenho na estima e afeição de ser, no amor de Nosso Senhor e de sua
Santa Mãe, senhor Padre, vosso...

509. – A LUÍSA DE MARILLAC

Manhã de quinta-feira [07 de fevereiro de 16411].

Senhora,

As damas de ofício de Saint-Germain-de-l’Auxerrois estiveram aqui ontem para


me fazer grandes lamentos a respeito de nossa irmã Maria2, não no sentido de retê-la,
mas de reclamar por Irmãs que saibam servir e fazer os pratos e os remédios. Queixam-
se de que a companheira de Maria não sabe nada. Não conhece nem mesmo a casa das
Damas para levar-lhes os avisos. Pedem de volta a que lhes tiraram e que se encontra
em Saint-Etienne3, como também Vicência. É responsabilidade vossa encontrar um
meio de retirar esta Irmã e ver qual outra colocar-lhe no lugar. Há a alternativa de lhes
dar alguma outra que saiba fazer os pratos e tenha experiência. Mostra-nos isso quanto é
necessária vossa vinda a essa paróquia e que vossas filhas sejam bem treinadas.
Vi ontem a casa da qual vos falei, no subúrbio Saint-Martin. Mas não há
cômodos suficientes. Seria bom, como dizeis, conseguir uma quanto antes, exclusiva
para vós. Mas não é fácil encontrá-la. Será necessário, entretanto, ficar com a primeira
que aparecer, de aluguel.
Providenciareis, por favor, o mais cedo possível, a escolha da Irmã a ser enviada,
para poderdes retirar Maria. Cuidai que ela faça o retiro e mandai-a partir segunda-feira
próxima.
Estou envergonhado pelo tempo em que estamos em dívida com essa Senhora
dama de Sedan.
Bom dia, Senhora. Sou, Senhora, vosso muito humilde servo,

.
Carta 509. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta é da quinta-feira que precede a carta 512, datada de 09 de fevereiro.
22
Maria Joly. Era apreciada pelas damas de Saint-Germain-l’Auxerrois, que viam com pesar sua partida, mas não
ousavam resistir à vontade de São Vicente. Tiravam-lhe Maria Joly e lhes deixavam uma irmã que lhes não satisfazia.
Compreendem-se as suas queixas.
33
Saint-Etienne-du-Mont, paróquia de Paris.
Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

510. – A LUÍSA DE MARILLAC

Quinta-feira, 14 horas [07 de fevereiro de 16411].

Senhora,

Penso, Senhora, que não me fiz entender bem, no tocante à Irmã a se enviar a
Saint-Germain. Escrevi-vos que estas damas pedem de volta a que lhes tirastes e
colocastes em Saint-Etienne. Compete a vós verificar se lhes podeis devolvê-las ou
mandar-lhes alguma outra que tenha experiência semelhante à dela. Com efeito,
enviando-lhes hoje a primeira, o senhor Pároco2 me disse ontem que vos mandaria
Maria de volta, hoje mesmo3.
Na verdade, a necessidade que temos das Irmãs mais dotadas me toca até o
fundo do coração.
Quanto à residência nessa paróquia, é preciso, a qualquer preço, ter uma de
aluguel, esperando a ocasião de comprar uma outra, o que não acontece todos os dias,
pelo menos quando se trata da que se precisa.
Vejo que vos deixais tomar por sentimentos humanos logo que me vedes doente,
pensando que está tudo perdido, por falta de uma casa. Ó mulher de fé apoucada e de
fraca acolhida à conduta e ao exemplo de J. C.! O Salvador do mundo, quanto ao bem
de toda a Igreja, se dirige ao seu Pai, quando estão em jogo regras e acomodamentos.
Ora, quando está em jogo um punhado de filhas que ele evidentemente suscitou e
congregou, pensais que nos vai faltar!
Vamos, Senhora, humilhai-vos muito diante de Deus, em cujo amor sou v. s.

V. D.

Fizeram-me uma sangria hoje, mas estou bem melhor, graças a Deus!

Destinatária: A Senhora Le Gras.

511. – A LUÍSA DE MARILLAC


.
Carta 510. – Original em Amiens, na casa das Filhas da caridade da Rua de Beauvais, nº 127.
11
A mesma reflexão da carta 509, nota 1.
22
Pedro Colombet.
33
Ver carta 509.
.
Carta 511. – C. aut. – Original no asilo Saint-Nicolas de Metz.
[08 de fevereiro de 16411].

Senhora,

Bendito seja Deus por ter a Irmã Maria2 tomado a decisão! Tudo para o maior
bem, pois que estimais que a de Beauvais 3 tem as qualidades que a capacitam para o
trabalho de Saint-Germain4. In nomine Domini, enviai-a, por favor.
O Irmão Jordano5, que eu pensava enviar a Montmorency amanhã, se encontra
indisposto.
Vossa ama-de-leite servirá, entretanto, a vossas criancinhas durante sete ou oito
dias, por favor.
Perdi o relatório que me enviastes para a assembleia 6. Rogo-vos dar-vos ao
trabalho de me enviar um outro.
Desejo-vos um bom dia e paz de espírito.
Sou, no amor de Nosso Senhor, vosso servo,

V. de Paulo.

512. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Enfim está aqui nossa boa Irmã Maria, plena de boa vontade. Julgo-a um pouco
cansada do trabalho que teve nos últimos oito dias. Receio muito por ela ir sozinha, e
por não se encontrar mais com suas irmãs. Mas está disposta, sem murmurar e sem que
a mudança lhe suscite pretexto para faltar à obediência. Deixa somente transparecer
grande temor.
Quanto a mim, porém, sou menos sábia. De fato, a resolução que me parecia
terdes tomado de jamais enviar uma Irmã sozinha, se me fixou tão fortemente no
espírito que me parece necessário enviar alguma outra com ela. Ela pode vir a adoecer
a caminho ou, estando lá, podem surgir pessoas más que pensem mal dela e lhe causem
desgosto.
E como ninguém é insensível, e não é pouca coisa ver essas Irmãs abandonarem
tudo, ela pode ficar muito triste e, sem como aliviar o espírito, há que se temer venha a

11
Carta escrita depois da carta 510 e antes da 512.
22
Maria Joly.
33
Provavelmente irmã Francisca Carcireux, originária de Beauvais.
44
Saint-Germain-l’Auxerrois.
55
Jean Jourdain, o primeiro Irmão Coadjutor da Missão.
66
A assembleia das damas da Caridade.
.
Carta 512. – Arq. da Missão, cópia do original autógrafo.
cair no desânimo. Temo igualmente seja isto nocivo para as outras. Diriam que não há
muita preocupação com as Irmãs, pois que as deixam partir sozinhas.
Tudo pesado, senhor Padre, tomo a liberdade de vos suplicar penseis nisso, e se
não há um meio de ela servir de exemplo às outras, para encorajá-las.
A viagem não nos custará muito. Além dos dez escudos que trouxe, há oito dias,
trouxe outro tanto, ontem.
Quanto às despesas, já que elas se alimentam com sobriedade, creio que o
pouco dado a uma ajudará a outra a viver, e além disso, elas trabalharão para ganhar
o resto. Com efeito, embora ela tivesse muito trabalhado e muitos doentes em Saint-
Germain, não deixava de lavar roupa para os outros, ganhando assim alguma coisa.
Pensava, senhor Padre, se o aprovardes, dar-lhe como companheira nossa irmã
Clara, cheia de vigor físico. É aquela que foi estar convosco em Santa Maria,
juntamente com sua mãe, para ser admitida. É de temperamento suave, e penso que se
darão bem, juntas.
Suplico-vos muito humildemente dar-vos ao trabalho de me comunicar se
aceitais que assim seja e o dia em que poderão partir, e se não seria preciso reservar-
lhes o lugar no coche.
Sinto-me aborrecida por vos incomodar em vossa enfermidade, cuja cura
suplico ao bom Deus, e sou, senhor Padre, vossa humilde filha e grata serva,

L. de M.

Fevereiro de 1641.

A irmã que vos proponho ir com a irmã Maria Joly sabe ler; ela poderia dar
aulas às mocinhas pobres. Se vossa caridade pensar em outra Irmã, seria possível dizer
o nome? Haveria meio de dar uma companheira a nossa boa irmã Maria?

513. – A LUÍSA DE MARILLAC

[09 ou 10 de fevereiro de 16411].

Senhora,

Aprovo vossa intenção de enviar as duas Irmãs, contanto que a segunda saiba
dar aulas. E é disto que duvido. Ser-vos-á bom instruí-la.
Outra dificuldade é o sustento delas. Se esta Irmã não é capaz de dar aulas, não
seria melhor enviar para lá uma outra menos necessária nessa cidade?

.
Carta 513. – Arq. da Missão, cópia do original autógrafo.
11
Esta carta responde à precedente, depois da qual foi escrita.
Bom dia, Senhora. Estou passando bem, graças a Deus, e sou vosso muito
humilde servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

514. – A LUÍSA DE MARILLAC

[Fevereiro de 16411].

Eis a cópia da carta que escrevo a Madame Duquesa de Bouillon 2, e ao R. P.


capuchinho, na ausência do senhor de Rozière.
Veja se há algo a acrescentar ou tirar.
Quanto ao dinheiro, esqueci-me de dizer-vos que, se lhes derdes os vinte
escudos que Maria3 trouxe, ficará bem. Mas seria necessário que a maior parte fosse em
ouro e que a escondam em alguma parte de seus trajes.
Devolvei-me estas cartas imediatamente, por obséquio.

515. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Antes de 16501.

Nosso bom Deus quis acrescentar à consolação que sua bondade me dispensou
com a vossa caridade, mostrando-me, num outro caso, que sua providência não
abandona os pecadores. Com efeito, enviou-me Madame de Marillac 2 para me dizer que
pensava estar eu adoentada e me suplicava dizer-lho com toda a liberdade, para me
prestar a ajuda que madame sua mãe 3 me havia oferecido, de enviar todos os anos uma
certa importância. Declarei-lhe com toda a simplicidade o meu incômodo e que não
teria necessidade de nada se meu filho tivesse algum emprego.

.
Carta 514. – Original no Hospital do Bon-Secours, em Metz.
11
Esta carta parece posterior, em alguns dias, à carta 512.
22
Eleonora Catarina Fébronie de Bergh, casada a 01 de fevereiro de 1634 com Frederico Maurício, Duque de
Bouillon, falecida a 14 de julho de 1657, aos 42 anos. Contribuiu com suas liberalidades para o estabelecimento das
Filhas da Caridade em Sedan.
33
Maria Joly.
.
Carta 515. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Data do casamento de Michel Le Gras.
22
Esposa de Michel de Marillac, Conselheiro do Parlamento.
33
Ou antes, sua sogra, viúva de Renê de Marillac, então no Carmelo.
Desejou estar convosco para tratar deste assunto, mas tínheis saído. Queria
saber de vós, senhor Padre, como o senhor Bispo de Beauvais 4 recebera a proposta que
ela lhe fizera e a opinião dele a esse respeito. Considerando que ela não sabe a
maneira como lhe falar disso e como ele deve partir amanhã ou depois, ela e eu vos
suplicamos muito humildemente dar-vos ao trabalho de lhe escrever uma palavra sobre
este assunto, digo, a Madame de Marillac, se julgardes conveniente. Fez questão disso,
temendo que tivésseis algo a me dizer que me pudesse contristar.
Não sei se é meu orgulho que me aflige pelo incômodo que causo aos outros.
Deveria estar bem melhor, pois que tenho a honra de ser, senhor Padre, vossa muito
humilde filha e muito grata serva,

L. de M.

516. – A LUÍSA DE MARILLAC

Manhã de sábado [entre 1639 e 16411].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


É bom continuar as orações ordinárias.
Sugeri vós uma oração especial a esta boa jovem, em preparação para o seu
casamento:
1º - Motivos, para uma mulher, de viver bem com seu marido. Sobre isso,
apresentar-lhe-eis três autoridades. A primeira, conforme São Paulo 2, é que o marido é a
cabeça da mulher e por conseguinte ela deve ter para com o marido a mesma
dependência dos membros para com a cabeça; 2º - O que diz o mesmo São Paulo às
mulheres, isto é, que sejam obedientes aos seus maridos; 3º - Deus disse à mulher que
precisa deixar pai e mãe para seguir os seus maridos.
O segundo ponto é saber em que consiste a boa convivência de uma mulher com
seu marido. Ora, ela consiste em amar o marido mais que todas as coisas, depois de
Deus e em agradar-lhe e obedecer-lhe em tudo que não for pecado.
O terceiro ponto são os meios de uma mulher obter a graça para viver bem com
seu marido: 1º - Pedir a Deus esta graça; 2º - Não admitir no coração pensamento algum
de menos estima para com ele; 3º - Não dizer, nem fazer jamais alguma coisa que lhe
possa desagradar; 4º - Fazer o propósito de imitar alguma mulher casada que vive bem
com seu marido; 5º - Cultivar a devoção de honrar o casamento de São José com a
Santa Virgem.

44
Agostinho Potier.
.
Carta 516. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
O lugar dado às palavras” manhã de sábado”, no cabeçalho da carta indica que não foi escrita antes de 1639. Por
outro lado, depois de 1641 as irmãs não estavam mais em La Chapelle.
22
Carta aos Efésios, capítulo 5.
Tendes o espírito muito pouco confiante. Tende confiança que Nosso Senhor
cumprirá seus desígnios sobre vosso filho.
É preciso manter para com Angers o que prometestes, embora, no momento, seja
contra vosso sentimento.
Se puder, irei amanhã a La Chapelle ou mandarei alguém.
Bom dia, Senhora. Sou v. s.

V. D.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

517. – A LUÍSA DE MARILLAC

Meio-dia de sábado [fevereiro ou março de 16411].

Madame de Chaumont acaba de sair daqui. Falou-me de uma comediante que


deseja abandonar seu modo de vida e retirar-se para a sua terra, onde quer comprar um
terreno com o bom dinheiro que ganhou para isso. Mas essa boa Senhora deseja para
ela, antes disso, um retiro de sete ou oito dias. Dei-lhe esperança desta caridade em
vossa casa. Estaríeis de acordo, Senhora?
Essa mesma Senhora retirou das Ursulinas 2 uma jovem que colocara lá e onde
ficara durante seis anos. Ela tem conhecimento de que estas religiosas ensinam, e muito
bem, trabalhar em tapeçaria. Veio-me ao espírito que talvez a moça possa durante dois
ou três meses prestar serviço útil às Irmãs de La Chapelle, especialmente ensinando-lhes
a dar aulas. Que vos parece, Senhora? Uma palavra de resposta a respeito de tudo isso.
A jovem não é filha da senhora dama e nem pretende entrar para a Caridade. Ela quer
ser religiosa.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

518. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, manhã de quarta-feira [fevereiro ou março de 16411].

Senhora,

.
Carta 517. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta precede de poucos dias a carta 518.
22
Convento fundado em 1612, na paróquia Saint-Jacques, pela Senhora Lhuillier, viúva de Cláudio Le Roux.
.
Carta 518. – Original no Berço de São Vicente de Paulo.
11
Esta carta foi escrita quatro dias antes da carta 519.
A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!
Penso que não deveis temer o que me dizeis desta jovem. Peço-vos, por isto,
salvo melhor juízo vosso, escrever a Madame Chaumont que vo-la envie, ou comunicá-
lo oralmente à sua funcionária da portaria. Foi, com efeito, o que lhe escrevi, isto é, caso
estivésseis de acordo, se ela fosse deixar a jovem na cidade, mandaríamos buscá-la. Do
contrário, parece-me que seria bom mandar dizer à porteira que lhe envie uma carta a
Saint-Germain. Quanto à pensão, poderíeis mandar dizer a Madame Marquesa2 que
recebereis o que lhe aprouver.
Aqui está uma carta de Madame Le Roux que espera ir fazer o retiro convosco,
segunda-feira, juntamente com Madame Lotin. Vossa saúde vos permitirá entregar-vos
a isso, Senhora? Meu resfriado parece ter melhorado, dando-me a esperança de poder
assistir à assembleia na próxima sexta-feira. Rogo-vos recomendá-la a Nosso Senhor,
em cujo amor sou vosso servo,

V. D.

519. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, domingo pela manhã [fevereiro ou março de 16411].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Muitas coisas tenho a dizer-vos. Não sei se me lembrarei de todas. A primeira é
que nossa irmã Maurícia, de São Sulpício, abandonou a Caridade. Sua mãe foi buscá-la
ontem. São as consequências da questão de nossa irmã Maria. Madame Duquesa 2, ao
sabê-lo, soltou um brado, em minha presença. Estive com ela ontem e disse que era o
mau trato que estas Irmãs estavam recebendo na paróquia. Ela própria queria abandonar
tudo3.
Ó meu Deus! É preciso tomar providência no caso. Em nome de Deus, Senhora,
vede, desde hoje, quem podeis mandar. Uma das que restam está doente e só há uma em
condição de trabalhar. Suplico-vos, Senhora, fazer o possível para encontrar uma
solução.
Ela comentou ainda ontem comigo sobre o estabelecimento destas Irmãs. Disse-
lhe que conversaremos sobre isto dentro de dois ou três dias.

22
Madame Chaumont.
.
Carta 519. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Uma frase da carta dá a entender que foi escrita durante a quaresma. O conjunto só se pode aplicar ao ano 1641.
22
A Duquesa de Aiguillon, presidente da Caridade estabelecida na paróquia São Sulpício.
33
A paróquia São Sulpício superava as outras paróquias da capital em extensão e em má reputação (Cf. Faillon, op.
cit., t. II, p. 12).
Penso que faríeis bem em enviar Joana4 para Saint-Germain5.
Madames Le Roux e Lotin pressionam no sentido de começar amanhã o seu
retiro convosco. Que vos parece, Senhora? A segunda costuma comer carne.
Ser-me-á difícil estar convosco, por causa do meu incômodo. Será preciso que
elas venham aqui.
Fareis o que vos for possível no caso de Saint-Jacques e dos condenados às
galés.
Vou insistir com o Padre Lambet, no caso das Irmãs.
Quanto ao negócio de Angers, esqueci-me ontem de dizer uma palavra ao
Senhor de Cordes. Vamos ver. Poderíeis excusar-me, no caso dos papéis, em razão da
minha pequena indisposição.
Importa continuar rezando para conseguir a casa. Por ela não me aflijo tanto; no
presente, importa estabelecer-vos aqui por meio de um aluguel. Ó Jesus! Senhora, vossa
causa não depende de uma casa, mas sim da continuação da bênção de Deus sobre a
obra.
Vou perguntar ao Padre du Coudray se ele conhece moças com qualidades em
Lorena e pedir-lhe escreva para todo lugar. É uma ideia que me vem, no momento.
Mandai-me quanto antes vossa opinião sobre essas damas e o seu retiro.
Bom dia, Senhora. Sou vosso s.

V. D.

Acabo de escrever a Madame Le Roux para adiar o retiro.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

520. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, terça-feira, às 02 horas [depois de 16391].

Senhora,

Pensei em mandar copiar e cotejar os papéis de Angers. Será feito dentro de dois
dias.
Gostaria de ver a carta que vos escreveu o senhor Abade de Vaux.
Estou passando bem, graças a Deus.
Sou, no amor de Nosso Senhor, minha Senhora, vosso muito humilde e
obediente servo,

44
Jeanne Lepeintre.
55
Saint-Germain-en-Laye.
.
Carta 520. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Data da entrada das Filhas da Caridade para o hospital de Angers.
Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

521. – A LUÍSA DE MARILLAC

[Depois de 16371].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Estou passando bem, graças a Deus, menos quanto à minha febrezinha. Tomei
ontem águas virtuosas e me proponho continuar a tomá-las, se ainda encontrá-las.
Parece-me que me farão bem, como sempre fizeram.
E vós, como estais? Se puder irei ver-vos bem cedo. Envio-vos, nesse ínterim,
duas cartas vindas de Richelieu. Conversaremos sobre elas.
Sou, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde servo,

V. D. P.

522. – UM PADRE DA MISSÃO A SÃO VICENTE

1641.

É inimaginável quanto agora nossos trabalhos passados são suavizados por


consolações que nosso bom Deus nos envia, para nos encorajar. Estas almas de Poitou,
que pareciam duras como pedras, pegaram o fogo sagrado da devoção, com tanta força
e ardor que não parecem poder apagar-se durante muito tempo.

523. – A SANSON LE SOUDIER

Paris, dia de Ramos1, 1641.

.
Carta 521. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
A casa de Richelieu foi fundada em 1638.
.
Carta 522. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, 1ª ed., p. 50.
.
Carta 523. – Original em Turim, na casa central das Filhas da Caridade.
11
24 de março.
Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Fico muito confundido por ter passado tanto tempo sem dar resposta a vossa
carta. Peço-vos perdão com toda humildade que é possível, esperando corrigir-me.
Vosso bom irmão2 está com o seu título e sua dimissória e receberá a primeira ordem
sacra na presente ordenação. Espero que Nosso Senhor lhe dará a graça de uma grande
participação no seu espírito, e lhe peço conceda-vos a graça de continuar vossas
pregações e catecismos. Em nome de Deus, senhor Padre, encorajai-vos e não
desanimeis. Embora não tenhais tantos talentos, Nosso Senhor vo-los aumentará, se lhe
aprouver, dentro do espírito de humildade e de caridade, no qual estou persuadido que
viveis, dentro e fora de casa. Ó senhor Padre, como suplico a Deus vos aperfeiçoe neste
espírito! Eu o espero de sua bondade e vou logo agora suplicar-lho no santo sacrifício.
Sou no seu amor, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Soudier, padre da Missão em Luçon.

524. – AO SENHOR PADRE PERRIQUET

Paris, dia de Páscoa1, 1641.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi vossa carta com consolação e soube com admiração da bênção que
Nosso Senhor vos concede. Rendo muito humildes graças à sua divina Majestade e
rogo-lhe continue a santificar vossa querida alma, cada vez mais. Há muito tempo,
tenho refletido no que me fizestes a honra de propor-me, isto é, se faríeis melhor
continuando o serviço que prestais a Deus onde estais, ou se regressando para onde
parece que a Providência vos solicita, isto é, para o vosso benefício. Ora, preciso dizer-
vos, na simplicidade do meu coração, que me parece faríeis melhor permanecendo em
Bayonne: 1º - porque a mesma Providência, que jamais se contradiz, chamou-vos antes
para Bayonne; 2º - porque ela vos abençoa aí supra modum2, 3º - porque duvido tenhais
feito tanto bem lá quanto em Bayonne; 4º - porque Nosso Senhor vos concedeu as
virtudes necessárias para servi-lo aí, sem esperar outra recompensa, além da do céu; 5º -

22
Jacques Soudier.
.
Carta 524. – Dossiê dos padres da Missão, cópia do século XVIII.
11
31 de março.
22
Sobremaneira, sobremodo.
porque vos considero não somente útil ao senhor Bispo de Bayonne 3, mas também
necessário, especialmente no estado em que se encontra. Que contas daríeis a Deus se,
por falta de vossa assistência, este bom prelado abandonasse sua cara esposa (a
diocese), que vos quer tanto bem?
Os humildes pensamentos que vos proponho e que submeto aos vossos, não os
ousaria dizer senão a poucos eclesiásticos, porque há poucos, parece-me, a quem Deus
preveniu com a graça de não valorizar os interesses materiais. E vós sois, assim o julgo,
um daqueles que jamais vi com tão grande desinteresse. E o que me leva a pensar que
não me engano é que reflito nisso há muito tempo e que o senhor Bispo de Bayonne vos
poderá testemunhar que, seja o que for me tenha ele dito a respeito, não ousava então
dizer-vos o que vos digo agora. E posso garantir-vos, como o faço diante de Deus, que
nenhum motivo humano me impele a dizer-vos isto, mas unicamente o interesse de
Deus e o bem de sua Igreja. Mas como sou um pobre roceiro e guardador de porcos e, o
que é pior, a mais abominável e detestável de todas as criaturas do mundo, peço-vos não
ter consideração alguma com o que vos digo, se não vos parecer conforme à vontade de
Deus, em cujo amor e no de Jesus Cristo sou, senhor Padre, vosso humilde e muito
obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Perriquet, Vigário Geral do senhor Bispo de


Bayonne, em Bayonne.

525. – A LUÍSA DE MARILLAC

Terça-feira, meio dia [entre 1641 e 16541].

Eis vossos papéis, Senhora. Conversaremos sobre o que me dizeis quanto ao


quarto para Madame Lhoste (?).
O Irmão Pierre Rogue foi embora sem se despedir. Não está mais aqui, há um
mês.
Fareis o que julgardes bom com respeito aos papéis de nossa irmã Maria 2, de
Sedan. Vou escrever a ela e darei resposta a Madame Forest.
Pedem-nos 500 libras pela casa. Quanto a mim, peço-vos orações, eu que sou v.
s.

V. D.

33
Francisco Fouquet.
.
Carta 525. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Duração da permanência da irmã Maria Joly em Sedan. A carta mais parece de 1641.
22
Maria Joly.
526. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[16411].

Senhor Padre,

Envio-vos uma carta da Irmã Aimée, de Troyes, que seus irmãos não quiseram
levar. Suplico-vos muito humildemente o favor de me dizer quando essa senhora de que
ela fala deve regressar e se lhe devo dar dinheiro e quanto para as despesas e para o
lugar na diligência.
Pensando que Deus me daria hoje a oportunidade de falar convosco, pus-me a
examinar as reiteradas faltas que cometo. Pareceu-me também, meu muito honrado
Pai, que (esta oportunidade) deve dar a conhecer à vossa caridade quanto preciso ser
ajudada, para cumprir a santíssima vontade de Deus, pois de mim nada há que esperar,
absolutamente nada, a não ser o que vós fizerdes a honra de ordenar, porque, disso,
parece-me, nosso bom Deus me concede a graça de lembrar-me.
Uma das coisas mais urgentes para mim é vos pedir conselho sobre como agir
com nossa boa irmã Bárbara e vos dizer que ela precisa muito falar convosco. Creio
que ela não ficará satisfeita enquanto não o conseguir. Se puderdes ir a La Chapelle
neste sábado, far-nos-íeis grande favor.
Temo muito que nossa Irmã Margarida, a senhorita2, acabe ficando
desequilibrada. Estimaria muito se não fosse incômodo, me permitísseis falar, a tempo,
convosco, sobre isso.
Vossa caridade poderia, por obséquio, lembrar-se das anotações que me
prometeu, para me ajudar a falar às nossas Irmãs, duas ou três vezes por semana,
procurando animá-las? Sinto que mereço grandes castigos pelas faltas que cometem.
Pedi a Deus uma outra pessoa que possa servi-las melhor, suplico-vos com lágrimas
nos olhos. Há tantos anos Deus me dá a graça de falar-me através de vós e ainda sou o
que sou! Invocai, por favor, sua misericórdia sobre minha pobre alma, que ele colocou
em vossas mãos, a fim de ser para sempre, senhor Padre, vossa muito humilde e grata
filha e serva,

L. de Marillac.

Quinta-feira.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

.
Carta 526. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta foi escrita quando a Casa-Mãe ainda estava em La Chapelle e depois do chamado da Irmã Bárbara da
casa de Richelieu, nos primeiros tempos da permanência de Margarida de Turenne na Casa-Mãe.
22
Provavelmente Margarida de Turenne, parente do pároco de Saché.
527. – A LUÍSA DE MARILLAC

[1641].

Penso, Senhora, que fareis bem em dar o que for preciso para a vossa Irmã 1
poder voltar. Encaminhai-a para Madame Gouault que se encontra na casa do seu filho
comerciante, na Rua Saint-Honoré.
Não me é possível estar disponível para as nossas Irmãs, antes do fim da
próxima semana. Temos assembléias, todos os dias, daqui até quarta-feira. Depois disso,
falarei com Bárbara. Estando as coisas no ponto em que estão, é preciso colocar esta
filha em algum outro lugar. Quanto a essa senhorita, o que estais pensando para ela?
Falarei com o senhor Guilloire sobre a Senhora Constância. Será bom,
entretanto, orientar Madame Bélot2. Não vos parece, porém, que Madame Turgis possa
substituir-vos? Seria bom dar-lhe crédito entre as Irmãs, se a julgardes apta.
Quanto a vós, Senhora, em nome de Deus, perdoai-me se não puder falar
convosco tão cedo. Fá-lo-ei logo que me for possível. Sou, no amor de Nosso Senhor, v.
s.

V. D.

528. – A LUÍSA DE MARILLAC

[16411].

Esta Irmã se decidiu, enfim, a ir para Saint-Côme2, embora diga, em seu humor
flutuante, que não ficará lá por muito tempo. Foi bom, seu tio era igual a ela.
O Padre Dehorgny me comunicou, há dois ou três dias, que não estão muito
contentes com nossa Irmã Jeanne, lá nos condenados às galés. Quem lhe falou sobre
isso foi o padre de Saint-Nicolas3. Sendo assim, é preciso retirá-la quanto antes possível.
Não sei se este ofício estará acima das forças de nossa irmã Bárbara Angiboust4.
.
Carta 527. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original. Esta carta responde à precedente, depois da qual São
Vicente a escreveu.
11
Irmã Aimée.
22
Talvez Maria Le Maistre, esposa de Martin Bélot, diarista que tinha seu domicílio na paróquia Saint-Nicolas-du-
Chardonnet, rua des Rats. Posteriormente Rua d’Arras.
.
Carta 528. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Ano em que Bárbara Angiboust foi servir aos galés.
22
Paróquia de Paris.
33
Jorge Froger, pároco de Saint-Nicolas-du-Chardonnet. Sabe-se que o clero de Saint-Nicolas-du-Chardonnet era
encarregado da Capelania dos galés.
44
Ela se fez notar nele, como em toda parte, por sua grande caridade e inalterável paciência. Acontecia de os galés,
descontentes com o que se lhes servia, jogarem por terra sua refeição. Bárbara se inclinava, recolhia o pão, a carne, e
Espero estar convosco, se Deus quiser, amanhã. Louvo a Deus, pois estais
passando bem.
Fiquei muito edificado com esta senhorita de Arras. Quando ela irá começar o
retiro? Tem muita vida interior. Não sei se será muito ativa. Se não, Nosso Senhor a
ajudará.

529. – A LUÍSA DE MARILLAC

[ Abril ou maio de 16411].

Parece-me, Senhora, que nossa cara irmã Margarida, de Saché, é um pouco


volúvel demais e pouco determinada. Conversai com ela, e se ficardes satisfeita,
podereis admiti-la. É de se temer que, se for recusada, não lhe seja isso um motivo de
tentação2. A de Liancourt3, que esteve em Nanteuil 4, deve esperar mais, assim me
parece.
Disse a Jeanne5 para se desapegar do lenço e usar a touca, quando for à igreja.
Acho que precisamos suportá-la com este apego. Com o tempo, ela poderá se livrar
dele. É pena, pois é boa Irmã.
Às oito horas, descerei para celebrar a santa missa. Deus sabe com que coração
espero celebrá-la por vós e vossas filhas e com quanta afeição me recomendo a vossas
orações e às delas.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

530. – A LUÍSA DE MARILLAC

Bendito seja Deus, Senhora, por tudo que lhe aprouve operar em vós, no vosso
retiro e por ter-me privado da consolação de estar aí convosco!
Estou passando bastante bem, graças a Deus, e em condição de vos oferecer
amanhã a Nosso Senhor, no novo estado exterior e interior no qual o amor divino vos
colocou1. Ele supre e realiza divinamente o que os homens não podem humanamente

depois de limpar os alimentos, os apresentava de novo aos forçados, com o rosto sempre sorridente.
.
Carta 529. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Ver nota 2.
22
Margarida de Turenne recebeu o hábito das Filhas da Caridade no dia de Pentecostes do ano 1641, ou em dia
próximo desta festa (carta de sua mãe conservada nos arquivos das Filhas da Caridade).
33
Talvez Francisca Noret, que estava em Liancourt.
44
Nanteuil-le-Haudoin (Oise). Esta localidade tinha por Senhor (Proprietário) Charles de Shomberg, duque de
Halwin e Marechal de França.
55
Jeanne Lepeintre.
.
Carta 530. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Bárbara Bailly diz em suas notas que Luísa de Marillac revestiu o hábito da Filha da Caridade num dia de
Pentecostes e adoeceu de tal forma que lhe foi preciso retomar sua touca. A irmã de Geoffre coloca o fato em 1639,
fazer. Talvez tenha ele permitido expressamente a minha ausência para eu não meter a
minha foice na sua seara. Suplico-lhe vos anime plenamente com seu espírito, assim
como vossas duas filhas e vossos doentes.
Fareis bem em despedir esta jovem de Angers depois das festas, o mais cedo
possível. Veremos depois a ação de Nosso Senhor em vós. E o céu há de olhar para vós,
amanhã, revestida com o hábito exterior de penitência, que ocupou o vosso espírito e o
dela, durante muito tempo, por sua misericórdia, em cujo amor sou vosso servo...

V. D.

531. – A JEAN DESLYONS1

20 de julho de 1641.

Senhor Padre,

Recebi a carta que vos aprouve dar-me a honra de escrever-me. Não vos dei
resposta logo ao recebê-la, por causa do embaraço em que estava. Vossa caridade me
perdoará, por favor, e haverá por bem que o Padre Duchesne vos leve a resposta de viva
voz. Ele vai encontrar-vos juntamente com o padre decano de Saint-Frambourg 2 para a
questão de que se trata. Suplico-vos muito humildemente, senhor Padre, assistir a ele
com vossos conselhos e vossa proteção.
Se julgardes diante de Deus que nossa pobre e humilde Companhia pode prestar
algum pequeno serviço a sua divina Majestade em vossa cidade, o referido senhor
decano e ele vos relatarão o estado em que se encontra o negócio.
Quanto a mim, suplico-vos aceitar a reiterada oferta de minha obediência e sou,
no amor de Nosso Senhor, senhor Padre,...

532. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

conforme “várias confrontações” (Cartas de São Vicente de Paulo a Luísa de Marillac, p. 218, nota). Não sabemos
que confrontações teve em vista. Mas duvidamos muito que antes da entrada das Filhas da Caridade para o hospital
de Angers, Luísa de Marillac tenha tido angevinas em sua comunidade. Em sua correspondência e na de São Vicente,
nunca se fala de irmãs angevinas antes do dia 01 de dezembro de 1640.
.
Carta 531. – Reg. I, fº 21 vº – o copista nota que o original traz a escrita de São Vicente.
11
Jean Deslyons, nascido em Pontoise, em 1615, tomara posse do decanato e da teologal de Senlis a 11 de setembro
de 1638, e recebera o capelo em Sorbona, a 05 de junho de 1640. Deixou-se levar pelas ideias jansenistas e nelas
perseverou, apesar dos esforços feitos por São Vicente para ele voltar atrás. O que é mais lamentável é que ele era um
homem virtuoso, de vasta erudição e conquistara a estima de todos que o conheciam. Era apaixonado pelos antigos
usos da Igreja, que ele desejava estabelecer. Devem-se a ele obras muito apreciadas. Morreu em Senlis a 26 de março
de 1700.
22
Hoje, Villers-Saint-Frambourg. Essa paróquia tinha por decano, desde 02 de abril de 1637, Felipe Robin,
Conselheiro no presidial de Senlis.
.
Carta 532. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
Senhor Padre,

Envio-vos uma carta de nossa boa irmã de Sedan1. Suplico-vos tenha a bondade
de lê-la e a caridade de lhe proporcionar algum consolo. Li para as nossas irmãs tudo
que poderia encorajá-las com o seu exemplo. Elas me pareciam como soldados –
segundo se diz - ao soar o alarme, principalmente a irmã Henriqueta. Embora esteja
em retiro, preferiria partir hoje em vez de amanhã. Se julgardes conveniente que eu
escreva a Madame de Bouillon, conforme o desejo dela, poderia vossa caridade, por
favor, avisar-me? Espero, também, tenhais a bondade de me receber, ao menos no
sábado ou domingo, ajudando-me a me preparar para os meus 51 anos que vou iniciar
segunda-feira, dia de Santa Clara2, se Deus me der a graça de viver até lá.
O senhor Pároco de Saint-Germain-l’Auxerrois mandou perguntar-me se uma
senhora poderia vir aqui fazer o seu retiro. Seu marido talvez deva fazê-lo convosco.
São pessoas, como disseram, que sofreram muito, mas não sei o nome delas. Respondi-
lhe que lhe darei a resposta amanhã, depois de vo-lo ter comunicado.
Tende a bondade, por favor, de me orientar sobre o que lhe dizer e de vos
lembrar que sou, senhor Padre, vossa muito humilde e grata filha e serva,

L. de M.

Quarta-feira, 07 de agosto de [16413].

Cinco irmãs estão em retiro: Henriqueta, Margarida, de Saint-Laurent 4, a


parente do senhor Pároco de la Gève, Cláudia Lauraine, que cuida das crianças 5, e a
de Angers. Elas poderão fazer, sexta-feira, pela manhã ou à tarde, sua confissão;
algumas a confissão geral, as outras, a dos últimos quatro ou cinco anos.
Determinareis, por obséquio, o tempo.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

533. – A LUÍSA DE MARILLAC

[07 de agosto de 16411].

11
Maria Joly.
22
12 de agosto.
33
Foi a 12 de agosto de 1641 que Luísa de Marillac iniciou seus 51 anos.
44
Margarida Lauraine.
55
Crianças expostas.
.
Carta 533. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta responde à precedente, sobre cujo original ela vem escrita logo depois.
Duas ou três palavras, apenas, porque estou com pressa. Estou satisfeito com o
que a irmã Maria vos escreve. É perigoso escrever-lhe (agora). Aguardemos um pouco
até que eu esteja com o capelão do senhor Conde.
Penso que não há inconveniente em receber esta senhora depois de ela vos ter
informado seu nome e seus predicados. Nada sei sobre o seu marido.
Será difícil para o Padre Soufliers atender vossas filhas amanhã. Pedirei ao Padre
Dehorgny que o faça, ou a algum outro.
Vou a Nanterre amanhã pela manhã, se Deus quiser, e espero estar de volta
domingo à noite. Depois desta viagem teremos a satisfação de estar convosco.
Comunicai-me o que a Madame Duquesa de Maignelay [diz 2] a respeito de uma
professora para aquele lugar.
Bom dia, Senhora. Sou vosso muito humilde servo.

534. – A LUÍSA DE MARILLAC

Manhã de terça-feira [16411].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Não sei o que vos dizer sobre a pequena Jeanne2, a não ser que é preciso falar
alguma coisa a respeito da tentação de usar esse lenço, e que vamos, finalmente, pensar
nisso quando ela estiver aqui nessa festa3.
Quanto a Ana4, penso que fareis bem em lhe escrever um pouco cordialmente a
respeito de sua tristeza. É bom escrever uma palavra a Perrette 5, penso eu, enquanto
esperais vê-la.

22
Palavra esquecida, no original.
.
Carta 534. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
1 1
Esta carta deve, ao que parece, ser colocada próxima da carta 537. Ela é do tempo em que as irmãs tinham a Casa-
Mãe ainda em La Chapelle.
22
Jeanne Lepeintre.
33
O traje das primeiras Filhas da Caridade, quase todas originárias das cercanias de Paris, era o que elas vestiam
quando se apresentavam a Luísa de Marillac para fazer parte da pequena comunidade. As que vinham de mais longe
se vestiam, por motivo de uniformidade, como as camponesas do entorno de Paris: um vestido cinza, muito
semelhante ao que as Irmãs usam ainda hoje (o Padre Pierre Coste escreve no século XX, na década de 20), uma gola
menos comprida que a atual, e se cobriam com uma touquinha. As Filhas da Caridade eram e deviam permanecer, no
pensar do Santo fundador, como filhas do campo (camponesas, aldeãs). Ele as queria seculares e não religiosas.
Consequentemente, entendia que se trajassem como “as mulheres comuns”, segundo sua própria expressão.
Entretanto, como a touquinha protegia mal da temperatura, o Santo permitiu em 1646 às mais franzinas, em particular
a Jeanne Lepeintre que padecia de um incômodo nos olhos, acrescentar à touca, como fazia bom número de
camponesas, a corneta branca, pedaço de tecido sem goma, levantado na frente e caído dos dois lados. O uso da
corneta se generalizou, e Edme Jolly, terceiro Superior Geral, o tornou obrigatório em 1685, para remediar ao que
poderia haver de chocante numa comunidade na disparidade de toucado. A corneta começou a aumentar na segunda
metade do século XVIII. No século XIX, permitiu-se a goma, para lhe dar mais consistência. Luísa de Marillac não se
trajava como suas filhas. Ela vestia, com permissão de São Vicente, o traje em uso entre as viúvas consagradas à
piedade.
44
Talvez Ana Hardemont.
55
Provavelmente Perrette, sobrinha da irmã Henriqueta Gesseaume.
Espero ir quinta-feira a La Chapelle. Se pedirdes a Madame Caregré, filha do
Senhor de La Bistrade, que vos pegue em sua carruagem, podeis dizer-lhe que irei até lá
entre duas e três horas do mesmo dia, pois a deixara em dúvida. Sou vosso muito
humilde servo,

V. D.

535. – A LUÍSA DE MARILLAC

Quinta-feira de manhã [entre julho e setembro de 16411].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Eis-me de volta2, graças a Deus; a ele agradeço por vossa saúde.
Isabel3 está perfeitamente bem de saúde corporal. Mas não está satisfeita numa
casa onde não há observância4. Sua companheira é uma pobre criatura 5; não sei se há
algum meio de ocupá-la com algum serviço; ela tem com ela apenas cinco meninas 6, e
não visita os doentes.
O que mortifica mais ainda nossa querida irmã Isabel é que ela não vai ver os
doentes, desde há algum tempo em que a ocuparam com o mobiliário de quarenta ou
cinquenta ordinandos. Avisei ao Padre Lambert para não agir assim com ela. Esta Irmã
parece desejar seu retorno para aqui ou para Angers 7. Fará contudo, por virtude, o que
lhe ordenarem.

.
Carta 535. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta tem seu lugar entre a chegada da irmã Elisabeth Martin a Richelieu (o mais cedo, em julho de 1641) e a
compra da nova Casa-Mãe das irmãs, em frente a São Lázaro (setembro de 1641).
22
São Vicente voltava de Richelieu.
33
Elisabeth Martin.
44
A casa de Richelieu.
55
Talvez Luísa, que tinha sido enviada para Richelieu com a irmã Bárbara Angiboust, quando da fundação. “Minha
filha, escrevia-lhe Luísa de Marillac em 1639 (carta 11), fazei-vos um pouco de violência. Que proveito podeis ter ao
fazerdes, sem permissão, visitas e peregrinações e ao quererdes em tudo viver segundo vossa vontade? ...Creio que a
causa da maior parte de vossas faltas... é que tendes dinheiro e sempre gostastes de tê-lo”.
66
Em sua classe escolar.
77
Ela era superiora em Angers, antes de ir para Richelieu.
Madame Duquesa de Aiguillon me falou ontem que a proposta que Madame de
Lamoignon8 lhe fez de pôr a juros as 45.000 libras, e alugar por enquanto uma casa, lhe
agrada9.
Encontrar-nos-emos com as damas de ofício, sábado à tarde. Obséquio avisá-las
e também adiar a assembleia das filhas até a próxima semana, por causa do embaraço
que esse meu retorno me traz.
Quanto a vós, terei a ventura de vos ver quanto antes possível e sou v.s.

V. D.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

536. – A LUÍSA DE MARILLAC

[Agosto ou setembro de 16411].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Penso que é bom responder à pessoa que vos escreveu, pedindo Irmãs para
Saint-Roch, que não se pode enviar apenas uma.
Devo receber hoje a resposta de Madame Maretz 2. Se ela quiser ceder-vos a casa
por doze mil libras, podemos dar-lhe seis mil em dinheiro e o resto em rendas.
Procurarei estar convosco um dia desses, para ouvir o que tendes a dizer-me.
Bom dia, Senhora. Sou, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde e muito
obediente servo,

Vicente de Paulo,
i. p.d.M.

88
Madame de Lamoignon tinha o nome de Maria de Landes como nome de nascimento. Casou-se a 10 de junho de
1597 com Chrétien de Lamoignon, presidente de capelo, no Parlamento de Paris. Desta união nasceram o célebre
Guilherme de Lomoignon, primeiro presidente no mesmo Parlamento, e Madalena de Lamoignon, muito conhecida
por sua piedade e dedicação para com os infelizes. A mãe, no dizer do próprio São Francisco de Sales, era uma das
mulheres mais santas do seu tempo. Entre as damas da Caridade, das quais se tornou presidente depois de Madame
Souscarrière, foi uma das que melhor ajudaram São Vicente. Seu nome merece figurar ao lado dos nomes de Madame
Goussault e da Duquesa de Aiguillon. “O pai dos pobres vai ver a mãe deles”, diziam ao ver o Santo entrar em sua
casa. Nunca deixava de participar do ofício divino do cabido dos cônegos. Certo dia veio a desfalecer e então se
deram conta de que ela usava um cilício e uma cinta com pontas de ferro agudas que a feriam cruelmente. Morreu a
21 de dezembro de 1651, com a idade de setenta e cinco anos. Os pobres de sua paróquia não permitiram que
transportassem seu corpo para a igreja dos franciscanos de Saint-Denis, onde estava enterrado seu marido (Bibl. Nac.,
ff 32. 785).
99
Para fazer dela a Casa-Mãe das Filhas da Caridade.
.
Carta 536. – C. aut. – Original no hospital geral de Evreux.
11
Esta carta precede, em muito poucos dias, a compra da nova Casa-Mãe das irmãs, perto de São Lázaro.
22
Esposa de Jean Maretz, proprietário da casa.
537. – A LUÍSA DE MARILLAC

[06 ou 07 de setembro de 16411].

Estou um pouco preocupado, Senhora, com a vossa indisposição. Suplico-vos


muito humildemente fazer o possível para a vossa recuperação.
Será preciso, portanto, dispor destas Irmãs do modo como me assinalastes.
Será preciso igualmente que vós ou eu [falemos2] claro com nossa irmã Jeanne
Lepeintre3.
Procurarei estar convosco e vossas filhas, amanhã.
O senhor Pároco de Saint-Germain-en-Laye me falou ontem muito bem a
respeito da Irmã Perrette; mas não sei que solução dar a isso.
Envio-vos enfim o contrato da compra [da casa] e o dinheiro doado 4. Dizei-me,
por favor, quantos quartos ela tem. Mandaremos publicar a compra na pregação do
domingo.
Bom dia, Senhora. Sou v. s.

V. D.

538. – A ESTÊVÃO BLATIRON, PADRE DA MISSÃO, EM ALET

09 de setembro de 1641.

Meu Deus! Como estou alegre por tudo que o Padre Dehorgny me disse e
escreveu sobre vós! Mas fiquei igualmente aflito por causa de vossa indisposição e das
dificuldades que tendes em algumas ocasiões com a pessoa que vós sabeis 1. Em nome

.
Carta 537. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Ver nota 4.
22
O original está danificado neste lugar e em vários outros.
33
Por causa de sua maneira de se cobrir com a touca.
44
A escritura da venda foi passada a 06 de setembro de 1641, diante de Guilherme Le Roux e Estêvão Paisant,
notários, entre Jean Maretz, burguês de Paris, e Maria Sadot, sua mulher, de uma parte, e, da outra parte, a
Congregação da Missão, representada por São Vicente de Paulo, Antônio Portail, Antônio Lucas, Jean Dehorgny,
Francisco Soufliers, Leonardo Boucher e Renato Almeras. Falava de “duas casas contiguas uma à outra, situadas no
bairro St-Denis, bem em frente da igreja de São Lázaro, na avenida (grande rue), constando uma delas de uma adega,
duas salas inferiores, quatro quartos, dos quais um ao lado do outro, no primeiro andar, e dois outros lambrisados, e
um “galtas”(?), um estábulo, um pátio murado e um poço de tamanho médio, no referido pátio; a outra casa
constando de uma sala inferior, cozinha ao lado, um quarto grande, dois quartos lambrisados e um celeiro em cima,
coberturas de telha, um portão largo servindo de entrada para as duas casas, na extremidade das referidas duas casas;
ao lado, depois do dito portão largo, está um pequeno alpendre, em forma de dossel, coberto de ardósia, dependente
dessas casas, com um jardim atrás, tudo cercado de muros”. O Santo pagou em dinheiro aos vendedores 6.600 libras,
e se comprometeu a pagar cada ano 300 libras, renda das 5.400 libras que lhe restava a pagar. A nova casa das irmãs
foi aumentada com o tempo. São Vicente tornou a vendê-la em 1653 a Luísa de Marillac (Arq. Nac. S 6.608).
.
Carta 538. – Reg. 2, p. 263.
11
Provavelmente Antônio Lucas.
de Deus, senhor Padre, poupai vossa pobre vida. Contentai-vos com consumi-la pouco a
pouco pelo seu divino amor. Ela não é vossa, é do autor da vida, por cujo amor deveis
conservá-la até que ele vo-la peça, se é que não se apresente a ocasião de entregar-lha,
como aconteceu com um bom padre de oitenta anos que acabam de martirizar na
Inglaterra, com suplício cruel2. Arrancaram-lhe o coração, estando ele já meio
estrangulado. Antes de executá-lo, disseram-lhe que, se aceitasse renunciar a sua
religião, poupar-lhe-iam a vida; ao que respondeu que se tivesse mil vidas, daria todas
de coração por amor a Jesus Cristo, pelo qual morria. Digo-vos isto com lágrimas nos
olhos, ao ver a felicidade deste santo sacerdote em contraste com o meu apego a minha
miserável carcaça.

539. – A SANTA JOANA DE CHANTAL

[16411].

Minha muito cara e digna Madre,

Recebi hoje a carta que vossa bondade me escreveu, com o endereço de nossa
Madre do subúrbio2. Como resposta, dir-vos-ei, minha cara Madre, que rendo graças a
Deus por todas as graças que ele concede a nossos pobres missionários, a partir das
informações que vossa caridade permite que eles lhe dêem. Rogo a Deus também os
torne dignos da continuação da mesma graça, pelo bom uso dela, que desejo
ardentemente que eles façam. Em nome de Nosso Senhor, minha digna Madre,
continuai a fazer-lhes a mesma caridade.
Tratarei de obedecer-vos quanto à visita do subúrbio, colocando as coisas em
ordem, da maneira como vossa caridade desejar, se pedirdes a Nosso Senhor me
conceda partilhar da firmeza e mansidão, com que vos agraciou! Oh! como vosso bom
anjo nos ajudaria sobremaneira nisso, se vós, minha cara Madre, lho pedirdes!
Nossa querida Madre da cidade 3 parece ter o espírito de Deus em sua conduta.
Nossa cara irmã Angélica4 vive, para com ela, em suas enfermidades, numa humildade e
cordialidade que me edificam. Oh! como desejo esta mesma bênção para todas as

22
Guilherme Webster, ou Ward, martirizado em Londres, a 26 de julho de 1641. Sobre a morte deste heroico mártir,
ler a Histoire de la persécution présente em Angleterre”, pelo Senhor de Marsys, 1646.
.
Carta 539. – Processo de beatificação de Santa Joana de Chantal, parte compulsiva, fº 138, cópia.
1 1
. Esta carta é posterior ao estabelecimento dos missionários em Annecy (1640) à disposição da Madre Lhuillier (16
de maio de 1641) e anterior à última viagem de Santa Chantal (fim de julho de 1641). Não está, portanto, em seu
lugar aqui. Infelizmente, é tarde demais para inseri-la em sua ordem cronológica.
22
Ana Margarida Guérin (24 de maio de 1640 – 21 de maio de 1643). Esta carta não chegou até nós.
33
A Madre Luísa Eugênia de Fontaines, eleita a 16 de maio de 1641. O primeiro mosteiro permaneceu sob sua
direção durante trinta e três anos. Ela o deixou em 1644, para ir estabelecer a reforma na Abadia de la Perrine, perto
de Mans. Voltou a Paris para trabalhar no diretório da Abadia de Port-Royal. Morreu a 29 de setembro de 1694, com
a idade de oitenta e seis anos. “Deus sempre abençoou sua conduta e empreendimentos”, diz o livro das profissões
(Arq. Nac. LL 1718).
44
Helena Angélica Lhuillier.
ordens! É uma admirável harmonia aos olhos de Deus, motivo de grande edificação para
todos que o vêem.
Boa noite, minha cara Madre. Sou, no amor de Nosso Senhor, muito humilde e
muito obediente servo,

Vicente de Paulo.

540. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

O desejo expresso pela Senhora Chamillac, a mim dirigido, no sentido de que


vossa caridade rogue a Deus por ela, leva-me a suplicar-vos muito humildemente a
assistais nessa necessidade extrema em que jamais esteve, a saber, o estado agonizante
em que acabam de me dizer que ela se encontra. Creio poder dizer, em verdade, que foi
o amor de Deus que a colocou tão cedo neste estado. Perderei muito com a falta desta
bondosa criatura, mas se isto for da vontade de Deus, a ela quero submeter-me
inteiramente. É para este fim que vos suplico muito humildemente fazer-nos a caridade
que vossa bondade nos permite esperar, nessa extrema necessidade. As ocasiões que
vo-lo impediram não deixarão de surgir ainda, mas quem sabe nos deis a honra de não
as esperar.
Perdoai-me esta liberdade. É o temor que frequentemente me sobrevém: parece-
me que a conduta da divina Providência está nos impedindo este bem.
Suplico com todo coração a Deus nos conserve o que nos deu por vosso
intermédio, e sou, senhor Padre, vossa muito obediente e muito grata serva,

L de M.

11 de setembro de [16411].
Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

541. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ANNECY

Paris, 15 de setembro de 1641.

Senhor Padre,

.
Carta 540. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.

11
Data marcada no dorso do original.
.
Carta 541. – Pérmartin, op. cit., t. I, p. 375, carta 333.
A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!
Rendo graças a Deus por todas as graças que ele vos concede e peço-lhe
abençoe, cada vez mais, vossa querida comunidade, vossa pessoa e vossos trabalhos.
Podeis garantir a nossa querida e honoratíssima Madre de Blonay 1 que eu acatei com
respeito e inteira submissão as razões que ela alega para o pronto retorno de nossa digna
Madre2, e que não será por mim que o senhor Bispo de Genebra 3 e ela não tenham a
satisfação que desejam nisto como em todas as coisas. Saúdo-a com o mais humilde
respeito possível e me recomendo a suas santas orações.
Entregamos trezentas libras correspondentes ao trimestre de outubro, cinquenta
escudos ao senhor Châtillon e outros cinquenta ao senhor Monnellet. Enviaremos as
outras na ocasião por vós marcada, uma vez que nos dizeis para fazer assim.
O Padre Dehorgny nos cumulou de consolação, relatando-nos o bom e amável
estado da comunidade e os grandes frutos que produz4. Ó senhor Padre, agradeço a Deus
com muita humildade por tudo isso e lhe peço continue a dispensar-vos a mesma graça!
Persisto sempre no pensamento de que não é conveniente receber senão padres e
pessoas com ordens sacras, não para ensinar-lhes as ciências sagradas, mas o uso delas,
do modo como se faz com os ordinandos.
O que desejastes da parte de Roma aconteceu, pela graça de Deus. Sua Santidade
nos permitiu alugar ou comprar uma casa, nela morar e exercer nossas funções em favor
do povo e dos eclesiásticos, segundo nosso Instituto, com a condição de dependermos
do Cardeal Vigário e do vice-gerente5, no que tange às funções relativas ao próximo, e
do Superior Geral da Companhia, no que diz respeito a sua disciplina interna. Esta
permissão concedida foi acompanhada do testemunho dos frutos operados pelo Padre
Lebreton, que Deus abençoa largamente6.
Dispomo-nos a enviar para lá duas ou três pessoas da Companhia, neste mês de
outubro. Rogo-vos, senhor Padre, ajudar-nos a agradecer a Deus por tudo isso.
Saúdo muito humildemente vossa querida comunidade e me recomendo com
toda humildade a vossas preces e às dela. Sou...

542. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, manhã de quarta-feira. [Entre 1639 e1641].


11
Maria Aimée de Blonay, então superiora do primeiro mosteiro de Annecy, uma das pioneiras filhas espirituais de
São Francisco de Sales, muito estimada por este grande santo e Santa Chantal. Morreu em odor de santidade, a 15 de
julho de 1649. Atribuiu-lhe milagres (Cf. Aimée sainte, t. VI, pp. 368-369). Carlos Augusto de Sales, Bispo de
Genebra e sobrinho de São Francisco de Sales, escreveu sua vida em 1655.
22
Santa Chantal.
33
Justo Guérin.
44
Ele acabava de fazer a visita da Casa de Annecy.
55
Substituto do Cardeal Vigário, o então João Batista Altieri.
66
Este documento é de 11 de julho. Foi publicado por Salvador Stella em La Congregazione della Missione in Italia,
Paris, 1884-1899, in- 8º, t. I, p. 5, conforme o manuscrito das fundações dos seminários, conservado na Casa-Mãe dos
padres da Missão (fº 100).
.
Carta 542. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Estão aqui algumas cartas para as filhas de Saché1. Se puder, irei esta tarde a La
Chapelle.
Vejo claramente, pela carta do senhor Pároco2, quanto estas boas filhas lhe
tocam o coração e que convém falar com elas algumas vezes. Hei de fazê-lo, eu que
sou, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde e obediente servo,

V. P.

543. – A LUÍSA DE MARILLAC

[16411].

É verdade que a bondosa Madame Caregré me afirmou desejar que eu vá estar


com ela algumas vezes. Isto, porém, não quer dizer que não devais tratar com ela como
com outra pessoa, digo, em tudo. Em resumo, deveis vós mesma orientá-la nos
exercícios espirituais, como se eu não devesse vê-la. Ela tem perfeita confiança em vós.
Mandei colocar um bilhete na sacristia, esta manhã, para rezarem a Deus por
essa criança. Peço-vos dizer-me como está passando esta manhã. Rogo a Nosso Senhor
a conserve em bom estado.
Estou saindo logo para começar a visita em Santa Maria da cidade, com a graça
de Deus.

544. – A LUÍSA DE MARILLAC

Envio-vos as resoluções de Madame N. Boas resoluções. Mas me parece seriam


melhores se ela descesse mais ao particular. Seria bom exercitar nisso as que fizerem os
exercícios espirituais convosco. Sem isto, teríamos apenas produções do espírito, o qual,
encontrando alguma facilidade e até mesmo certa suavidade na reflexão sobre uma
virtude, se encanta com o pensamento de ser bem virtuoso. Contudo, para se tornar

11
Pequena comuna de Indre-et-Loire, perto de Chinon. Trata-se aqui, não de Filhas da Caridade, colocadas em Saché,
mas de irmãs originárias desta localidade. Eram cinco em Paris, a 17 de setembro de 1641: Luísa Rideau, Margarida
de Turenne, Perrine, Andréia e Renata.
22
Restam-nos várias cartas do padre de Mondion, pároco de Saché (Arq. das Filhas da Caridade). Se a carta de que
fala São Vicente for deste número, só pode ser a de 17 de setembro de 1641, dirigida à irmã Luísa Rideau.
.
Carta 543. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Ao que tudo parece, esta carta foi escrita pouco tempo depois da carta 534.
.
Carta 544. – Abelly, op. cit., 1.I, cap. XXVI, fim, p. 122.
solidamente virtuoso, é preciso tomar boas resoluções práticas sobre atos particulares de
virtude e ser fiel depois em cumpri-las. Sem isto, nós o seremos com frequência apenas
na imaginação.

545. – A ANTONIO PORTAIL

05 de outubro de 1641.

São Vicente de Paulo dá a Antonio Portail notícias de São Lázaro e das outras
casas da Companhia.

546. – A LUÍSA DE MARILLAC

Domingo, 04 horas. [Outubro de 16411].

Senhora,

Fiquei muito satisfeito com o relatório que me enviastes ontem à noite, com
respeito à senhora dos forçados. Foi resolvido ontem que eu deveria estar com o senhor
Accar2, para saber mais particularmente dele quais as funções que pretende para essa
Senhora. Enviei o Padre Dehorgny com essa finalidade e aguardo a resposta dele. Não
fui pessoalmente, porque me propus fazer um pequeno retiro em preparação para o
jubileu, e o comecei hoje. Recomendo-o às vossas orações.
Recebi hoje a carta da Madame Marquesa de Maignelay. Ela aguarda as filhas.
Quando lhas enviareis? É preciso reservar lugar no coche de Soissons3.
Esqueci-me de falar com a jardineira a respeito de vossa porta 4. Mandarei
alguém falar com ela. Mandei também dizer-lhe que não ceda a ninguém o quarto vazio
de que dispõe. Neste caso, Madame Lhoste poderá ficar nele.
Um Senhor de Fontenay5 falou ontem maravilhas em louvor de vossas pobres
filhas. Conversaremos depois do retiro sobre a maneira como poderão ganhar o jubileu 6,
como também vós, de quem sou, no amor de Nosso Senhor, v. s.

.
Carta 545. – O original, composto de três páginas in-4º, escritas de próprio punho por São Vicente, pertenceu ao
Marquês de Gerbéviller.
.
Carta 546. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta foi escrita durante um ano jubilar, depois da compra da nova Casa-Mãe, entre as fundações de Fontenay
e de Nanteuil-le-Haudouin (Oise).
22
Administrador da casa dos forçados.
33
Para as irmãs destinadas a Nanteuil-le-Haudouin.
44
A porta da nova Casa-Mãe da Rua do Faubourg-Saint-Denis.
55
Fontenay-aux-Roses.
66
São Vicente fez para as irmãs, a 15 de outubro, a conferência que anuncia aqui.
V. D.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

547. – A IRMÃ JEANNE LEPEINTRE, EM SAINT-GERMAIN-EM-LAYE

09 de outubro de 1641.

Minha cara Irmã,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Peço-vos perdão, porque deixei de vos escrever. Não foi falta de estima e
afeição. Deus sabe que as tenho por vós até quanto me é possível. Meus embaraços são
parcialmente a causa. Além disso, não tinha em mãos vossa carta. A Senhora Le Gras
guardou-a por muito tempo.
Sinto-me, sem dúvida, muito consolado com o bem que ouço dizer de vós e com
a bênção que Deus concede a vossa conduta e lhe agradeço. Praza a sua divina bondade
vos dar a graça de conservar e aumentar a união de nossas Irmãs, de encorajá-las na
observância do pequeno regulamento, na prática das virtudes, no amor da vocação e
enfim no serviço generoso a Nosso Senhor nos pobres! Para isso, minha querida irmã,
tende grande confiança nele. Suplicai-o que ele próprio realize estas coisas, que habite
sempre em vosso coração, em vossas palavras e ações, e que todos saibam que sois sua
bem-amada filha. É a graça que lhe peço.
Sou, nele...

548. – NICOLAU PAVILLON, BISPO DE ALET, A SÃO VICENTE

Alet, 20 de outubro de [16411].

Senhor Padre,

Começarei a responder à carta que me fizestes a honra de escrever-me, datada


de 09 de setembro, suplicando-vos humildemente não useis para comigo de nenhuma
espécie de escusa por não me dar com mais frequência vossas desejadas notícias.
Com efeito, estou totalmente persuadido de que esta privação, que é muito
sentida por nós, jamais há de provir de alguma falta vossa de caridade a este respeito,
mas antes da falta de tempo de vossa parte e porque me tornei indigno no passado. Isto

.
Carta 547. – Manuscrito da Câmara dos Deputados, p. 137.
.
Carta 548. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
Ver nota 4.
me obriga a vos pedir humildemente perdão, como também de uma infinidade de outras
faltas que cometi para convosco, e a suplicar-vos assistir-me com vossas santas
orações para a minha correção no futuro.
Sinto muito reconhecimento para com a caridade dos que vos disseram algum
bem de mim e especialmente a Sua Excelência o senhor Bourlemont 2 e ao senhor Padre
Perrochel. Entretanto, posso garantir-vos que, por minhas misérias e indolência, estou
num estado mais digno de compaixão do que de admiração. Espero, entretanto, que, em
meio a tudo isso, a bondade divina, tendo em vista seu amor mais do que as minhas
ofensas, me fará misericórdia, se vos dignastes lembrar-vos algumas vezes de mim e
solicitá-la em meu favor.
Meu primo Bourdin ainda não me falou da intenção de fazer seu retiro, e eu
julguei não dever dar sobre isso a primeira palavra, mas aguardar que ele dê abertura
neste sentido, para que possa colocar-lhe o negócio a sua inteira disposição. Depois,
quem sou eu para encontrar algo a censurar nele e dizer-lhe que se liberte de tão longo
cativeiro e de tantas indolências que lhe dou ocasião de padecer comigo?
Tenho muitos agradecimentos a vos fazer pela lembrança que tivestes do
negócio do meu pai, e por falar dele com a Madame Duquesa 3. Espero que, se Deus
não fizer com que ela acolha o oferecimento desta recomendação, ele lhe dê a graça de
sofrer e fazer bom uso dessa perda. Isso, porém, não diminuirá minha confiança em
recorrer a esse mesmo crédito que tendes junto dela, em favor de um empreendimento
que diz respeito a esta pobre e miserável diocese. Tenho conhecimento de que o senhor
Marechal de Brezé4 virá até Catalunha, na qualidade de vice-rei. Como teremos a
honra de estar na sua vizinhança, desejaríamos também sentir-lhe as vantagens,
preservando os lugares pertencentes à diocese das tropas militares. É possível
consegui-lo mediante uma carta dirigida a ele, suplicando-lhe este favor, confiada a
Madame Duquesa, que no-la enviaria para lhe ser entregue. Com efeito, posso
asseverar-vos, senhor Padre, que corremos o perigo, se a proteção divina não nos
socorrer, de ficarmos reluzidos à mendicidade, o que me obriga a recorrer a vossa
intercessão.
Se não temesse ser por demais importuno convosco, lembrar-vos-ia a esperança
que vos aprouve dar-me, há algum tempo, de falar de nossa penúria a Sua Eminência 5,
quando se apresentasse a ocasião de estar com ele, com a finalidade de moderar a
nossa taxa, a mais alta, pelo que vejo, da província. Com efeito, elevaram-na a mil
escudos, enquanto o Senhor de Narbona6 com renda de sua diocese cinco ou seis vezes
maior, paga apenas a taxa de dois mil. Vede a proporção. E isto, num tempo em que a
diocese é a mais miserável e a mais atribulada, não só da província, mas de toda
França. Oh! Deus seja para sempre bendito, ele que nos dá e nos tira como e quando
lhe apraz.
22
Cláudio d’Anglure, Conde de Bourlemont.
33
A Duquesa de Aiguillon.
44
O Marechal Urbano de Maillé, Marquês de Brezé, cunhado de Richelieu, fizera a campanha do Piemonte, fora
comandante-em-chefe do exército da Alemanha, desempenhara as funções de embaixador na Suécia e na Holanda, e
governara Calais e Anjou. Tornou-se vice-rei da Catalunha em 1641, e morreu a 13 de fevereiro de 1650, com seus
cinquenta e quatro anos.
55
Cardeal Richelieu.
66
Cláudio de Rebé (1628-1659).
Oh! Por certo, estimo muito os Padres Blatiron e Lucas, cuja caridade eu
exerço pelo suporte de minhas enfermidades. Rogo a Nosso Senhor seja sua
recompensa. Não digo nada a respeito deles, pois eles mesmos se encarregam de vos
dar as informações. Apenas acrescento que eles se aplicam à perfeição do seu estado,
na medida da graça de Deus e dos diversos caminhos com que os conduz pela mão.
Não posso exprimir-vos o reconhecimento de que vos sou devedor, por querer
acrescentar ao presente número deles, alguns outros que vos apraz nos preparar, com a
capacidade e a virtude requerida no cultivo deste campo. Estou à procura de algum
lugar cômodo para eles ficarem, e quando tudo estiver pronto, avisar-vos-ei para
mandá-los partir.
A extrema ignorância dos que pretendem receber as sagradas ordens e a pouca
esperança de que adquiram mais capacidade para o futuro obrigou-me a chamá-los a
Alet e mantê-los aqui, por quanto tempo for necessário, para ensinar-lhes o pouco
requerido para admiti-los.
Estou empregando neste trabalho o Padre Blatiron e algum outro eclesiástico
que temos à mão, para contribuir para esse pequeno desígnio, que não é, por assim
dizer, mais do que um simples ensaio, que recomendo a vossos santos sacrifícios.
Prestar-vos-ei conta do acontecimento.
Penso vos ter comunicado que lancei os olhos sobre a paróquia de Alet com a
intenção de uni-la, segundo vosso beneplácito, à Missão, quando ela estiver em meu
poder. O meio para isso seria ter a inteira disposição do arquidiaconado. Ora, o
senhor Padre de Saint-Martin, tem pretensão sobre ele, em razão de um indulto. Mas
sempre me disse que disporia dele em nosso proveito. Entretanto, ele me escreveu, há
poucos dias, a carta que vos envio, pela qual ele parece pedir compensação. Uma
palavra vossa sobre a primeira observação o levará a se explicar a esse respeito. Ele já
tem a responsabilidade de uma pensão para o capelão do Senhor des Noyers e aquele
que... de intenção, não quereria abandonar seu pretendido direito a não ser a troco de
uma compensação. Vede, senhor Padre, se poderia eu satisfazer a tanta gente. Temo
que ele tenha sido incitado a esta reclamação, não a partir de iniciativa própria, mas
pelo senhor Camus, como me diz. Meu Deus, senhor Padre, perdoai-me tanta
importunação.
Bendigo a Deus, de todo meu coração, pelo progresso que vos dignastes
comunicar-me de vossa querida Companhia e lhe peço tornar-me partícipe dos
preciosos serviços que lhe prestais, para suprir minha negligência, permanecendo
sempre, em seu amor, senhor Padre, vosso muito humilde e muito afeiçoado servo,

Nicolau, bispo de Alet.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, Superior Geral da Congregação dos


padres da Missão, em São Lázaro.
549. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[outubro ou novembro de 16411].

Senhor Padre,

Esqueci-me de vos dizer que Madame Traversay me pediu para vos lembrar do
documento dos galés a ser levado ao senhor Procurador Geral 2 e que uma das Irmãs
que devem fazer hoje a confissão do jubileu é a da Normandia, da região de um pobre
homenzinho. Ele está hoje no seminário3 e com sua bondade e simplicidade levou-a
algumas vezes a tomar algumas resoluções. Anteontem de manhã ele lhe disse que vai
falar com ela. Não ousei permiti-lho sem vossa ordem. Ele lhe deu também algumas
estampas, mas penso que foi porque não tinha onde guardá-las. Guardei-as comigo,
esperando vossa ordem.
Peço-vos muito humildemente, senhor Padre, prestar atenção no que o senhor
Abade de Vaux me comunica sobre o estabelecimento das religiosas de Santa Genoveva
e se não será conveniente propor aos senhores Administradores que peçam ao senhor
Bispo de Angers4 aprove o serviço e a residência de nossas Irmãs no hospital. Podereis
escusar-vos de não lhe ter falado antes: tratava-se, primeiramente, de uma experiência,
e isto com o temor de que os reverendos padres pensassem em fazer delas religiosas.
Com efeito, receio, agora que nossa irmã Elisabeth 5 não está mais lá, não se
deixassem as outras facilmente levar por esta persuasão.
Atendamos também, por favor, a que só há seis filhas de serviço, estando a
sétima doente, e que nem os senhores Administradores, nem as filhas reclamam uma
outra, nem mesmo o senhor Abade de Vaux.
Poderia também vossa caridade me instruir sobre o que dizer-lhe a respeito da
Madame de Vertus6? O mensageiro parte hoje. Sou, senhor Padre, vossa muita grata
filha e serva,

L. de M.

Manhã de sábado.
.
Carta 549. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Ver nota 7.
22
Blaise Méliand (1641- 1650).
33
Juliano Guérin, natural de Lacelle (Orne), vivera algum tempo no exército antes de abraçar o estado eclesiástico. A
entrada do seu irmão na Congregação da Missão deixava livre a paróquia de Saint-Manvieu, que ele administrou
durante três meses. Deixou-a com a idade de trinta e cinco anos, para ir para São Lázaro, onde foi recebido a 30 de
janeiro de 1640. Em 1641, ele foi socorrer as desventuradas populações de Lorena. Sua saúde ficou afetada e foi
enviado para Richelieu, onde fez os votos a 14 de junho de 1642. As missões que pregou na diocese de Saintes em
1643 e 1644 tiveram grande êxito. Foi nele que São Vicente pensou, em 1645, para ir lançar os fundamentos da
Missão de Tunis. O valente missionário morreu nesta cidade a 13 de maio de 1648. Sua biografia foi publicada no t.
III das Notices, p. 57-82.
44
Cláudio de Rueil (1626-1649).
55
Elisabeth Martin.
66
Catarina Fouquet, viúva de Cláudio da Bretanha, Conde de Vertus e de Goëllo, primeiro barão de Bretanha,
Conselheiro de Estado, morto em Paris a 06 de agosto de 1637. Ela morreu nesta última cidade, a 10 de maio de
1670, com a idade de oitenta anos.
Apraz-vos, por caridade, nos comunicar a hora em que nossas irmãs irão a La
Chapelle? Tive ontem a felicidade de estar com Madame Chantal 7. Não sei o que vosso
bom Deus fará de mim, que sou tão infiel e cheia de pecados.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

550. – A LUÍSA DE MARILLAC

[Outubro ou novembro de 16411].

1. Entregarei o documento a Madame Traversay.


2. Esse padre daqui é novo e faz isso por simplicidade. Fizestes bem em guardar
as estampas.
3. Penso que não é necessário fazer nada pelo estabelecimento de Santa-
Genoveva. É contudo de se desejar que o senhor Bispo de Angers 2 receba essas
filhas, ao menos algumas, se possível.
4. Estes senhores3 Administradores estão contando, sem dúvida, com o retorno
de nossa irmã Elisabeth.
5. Eu não teria condição de servir a esta Senhora4, nem saberia quem
encaminhar-lhe. Faria bem em procurar um jesuíta. Espero estar, às duas horas,
em La Chapelle5.

551. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[Outubro ou novembro de 16411].

Senhor Padre,

5 ou 6 filhas iniciaram hoje seu pequeno retiro.

77
Santa Chantal chegara a Paris a 04 de outubro. Deixou a capital a 11 de novembro.
.
Carta 550. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta responde à carta 549. São Vicente escreveu-a no espaço branco deixado por Luísa de Marillac, no
cabeçalho de sua carta.
22
Cláudio de Rueil (A frase do original é difícil e obscura; a tradução é interpretação nossa - Nota do Tradutor).
33
Os Administradores do hospital de Angers.
44
Madame de Vertus.
55
As irmãs não tinham, portanto, deixado La Chapelle em outubro de 1641. Compreende-se, dados os trabalhos de
arrumação que se deviam fazer na nova casa.
.
Carta 551. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Entre 1636 e 1641, datas extremas da permanência das irmãs em La Chapelle, só houve dois jubileus, um em 1636;
o outro em 1641. A menção da Senhora du Mée nos faz preferir 1641 a 1636.
Quase todas dizem que estão dispostas a fazer sua confissão. A Irmã Bárbara
gostaria também de fazê-la, em função do jubileu, esta semana, pois ela não se
encontrava com muito bom humor na semana passada. Peço dizer-me se concordais
que todas se dirijam até La Chapelle: receberíeis as que julgarsseis conveniente; ou se
devo enviar as que se dizem bem dispostas, ficando as outras em casa. É necessário,
creio eu, possa falar convosco, antes de enviar alguma para a Senhora du Mée2.
Sou, senhor Padre, vossa muito humilde e muito grata filha e serva,

L. de M.

Todas gostariam muito mais de ir, temendo não poder estar convosco uma outra
vez.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

552. – JUSTO GUÉRIN, BISPO DE GENEBRA, A SÃO VICENTE

Outubro de 1641.

Confesso meu eterno reconhecimento para convosco e vossos caros filhos,


nossos bons padres da Missão. Eles vão trabalhando cada vez melhor e conquistando
mais e mais almas para o céu. Com certeza, senhor Padre, não cessarei de admirar a
conduta da divina Providência sobre esta pobre diocese, enviando-nos estes bons
operários por vosso intermédio. Não cessarei também jamais de agradecer-lhe, como
também a vós, pois seria ingrato demais se não o fizesse.
Meu Deus! Perdemos com grande pesar o senhor Comendador de Sillery, nosso
grande benfeitor...

553. – A N******

Temos por máxima trabalhar a serviço do povo, sob o beneplácito dos senhores
párocos, e de jamais ir contra os seus sentimentos. Na entrada e saída de cada missão,
lhes pedimos a bênção, em espírito de obediência.

22
Dama da Caridade (no original, o verbo da frase final “avant que d’envoyer”... parece sem objeto direto. O tradutor
interpretou o sentido da frase – Nota do Tradutor).
.
Carta 552. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, § 4, 1ª ed., p. 35.

.
Carta 553. – Abelly, op. cit., 1. III, cap. XIV, p. 232.
***
554. – A LUÍSA DE MARILLAC

Rendo graças a Deus por vossa melhor disposição, Senhora, e lhe peço vos
fortaleça cada vez mais. Se eu puder, terei hoje a honra de estar convosco, ou ao menos
amanhã.
Esta jovem de Lucé1, que veio anteontem, me parece apta, se tiver saúde
conveniente. Seu pai diz que ela não tem doença. Resolvei como vos aprouver.
Sou v. s.

V. D.

555. – PARA A MADRE SUPERIORA DO CONVENTO DA VISITAÇÃO DE


METZ

Paris, 02 de novembro. [Entre 1639 e 16451].

Minha muito cara Madre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi muito confuso vossa carta, porque vossa caridade me atribui louvores
que me tornam culpado diante de Deus. Mas fiquei muito consolado pela confiança com
que vossa bondade me fala de suas necessidades. Agradeço-vos muito humildemente e
rogo a Nosso Senhor seja ele mesmo vosso provedor e vossa provisão e que me faça
digno de prestar a algum pequeno serviço à vossa dileta bondade. Tentei iniciar por
escrito uma palavra a nossa cara Madre superiora do primeiro mosteiro de nossa cidade.
Ela me respondeu que vai fazer o que lhe for possível em favor de vossa querida casa.
Ela já tem a promessa de cem libras e logo que as receber mas enviará. Não me será
necessário enviá-las de imediato, como também o que vier a conseguir a mais. É um
coração pleno de caridade. Não fossem alguns incômodos que sua casa anda sofrendo,
podeis crer, minha cara Madre, que ela vos enviaria recursos do seu mosteiro.
Peço, entretanto, a Deus, minha cara Madre, proveja a todas as vossas
necessidades e me torne digno de ser, em seu amor e no de sua Santa Mãe 2, vosso muito
humilde servo,

Vicente de Paulo,

.
Carta 544. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
Muitas localidades trazem este nome. A menos afastada de Paris esta situada perto de Chartres.
.
Carta 555. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
Nada, no corpo da carta, permite precisar-lhe o ano. Há razão para crer que ela é do tempo em que São Vicente
andava ocupado em aliviar as ruínas acumuladas pelos exércitos na Lorena (1639-1650) e ele mesmo escrevia sua
correspondência sem ajuda de secretário (antes de 1645).
22
São Vicente acrescenta aqui “Monsieur” (Senhor) por distração.
padre da Missão.

Esquecia-me de dizer-vos, minha querida Madre, que, se eu pudesse, destinar-


vos-ia algo do que enviaram para os pobres de Metz, mas não nos é permitido dispor
destes recursos a não ser em favor daqueles pobres mendigos, para ajudá-los e impedir
que morram de fome.

Destinatária: A minha Reverenda Madre, Superiora das filhas da Visitação


Santa Maria de Metz, em Metz.

556. – PARA A MADRE DA TRINDADE

Paris, 05 de novembro de 1641.

Minha muito cara e digna Madre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi vossa carta com tanto respeito e ternura que não sou capaz de vo-lo
exprimir, e sempre no espírito de reconhecimento por todas as obrigações de que vos
somos devedores.
Para vos prestar conta do negócio de que me fizestes a honra de escrever-me,
minha cara Madre, dir-vos-ei que, no mesmo instante em que recebi vossa carta, escrevi
a nossa Madre do subúrbio1, onde estava nossa digna Madre2 e também, dois dias antes,
a superiora de Ruão3. Dizia-lhe que estava refletindo na questão e lhe pedia falasse a
nossa digna Madre sobre o negócio a respeito do qual eu lhe escrevia. Concluí minha
carta dizendo-lhe que no reino da caridade é preferível sofrer algum incômodo a
incomodar o próximo. Ela me respondeu a respeito que nossa digna Madre aconselhara
à reverenda Madre Superiora de Ruão a recorrer a seus amigos sobre essa desavença e
que a referida Madre de Ruão acolhera o conselho e encaminhara as coisas no sentido
dessa resolução. Afirmou-me que esta boa Madre lhe dissera que o RR. MM. Carmelitas
podiam ver seus quartos e seu jardim, como elas podiam ver os dos Carmelitas, e que
ela desejava dar todas as satisfações possíveis, que na verdade vós sois sua boa Madre e
que ela vos escreveria.
Eis, minha cara Madre, o que se passou. Queira Deus pudesse eu ser digno de
prestar algum pequeno serviço a vossa santa Ordem, maior do que esse. Sua bondade
sabe a afeição que lhe tenho e a reverência que me deu para com minha cara Madre, a

.
Carta 556. – C. aut. – Original na Visitação de Troyes.
11
Ana Margarida Guérin, religiosa do primeiro mosteiro, enviada ao segundo quando da sua fundação. Foi colocada,
mais tarde, à frente do estabelecimento de Ruão e do terceiro mosteiro de Paris, onde morreu a 24 de janeiro de 1669,
com a idade de 67 anos.
22
Santa Chantal.
33
Ana Teresa de Préchonnet.
que dedico uma incomparável estima e que desejaria ver de volta a sua morada 4, se não
temesse desejar algo contra a vontade de Deus, que vos governa com muito particular
providência.
O que me faz moderar a afeição por demais sensível que teria com vosso retorno
foi a nossa leitura do refeitório, esses dias passados. Narrava que um padre jesuíta
espanhol, que envelhecera em numerosos e assinalados serviços prestados a Deus nas
Índias, insistiu com seus superiores que lhe fosse permitido voltar, para morrer em seu
país, e ali não fazer nada mais a não ser preparar-se para bem morrer. Foi-lhe dada a
permissão e ele voltou ao país. Estando um dia em oração aos pés do crucifixo, ouviu
interiormente uma censura tão severa de que tinha feito mal em abandonar a nova
Igreja, cuja fundação ele viera ajudar, que não teve mais paz, enquanto seus superiores,
não o mandaram de volta. Lá chegando, recomeçou a trabalhar com todo ardor
permitido por sua avançada idade, e morreu enfim como vivera, em odor de santidade.
Este é o motivo, minha cara Madre, que me leva a oferecer a Deus a
disponibilidade de vossa pessoa para qualquer lugar, e em submissão ao modo como ele
julgar mais conveniente para a sua glória.
Disseram-nos que o senhor Bispo de Troyes5 está doente. Meu Deus, minha cara
Madre, como isto me sensibilizou. Peço a Nosso Senhor, de todo coração, conserve este
santo prelado e o santifique cada vez mais!
Faço-lhe a mesma prece por vós, minha cara Madre, a quem recomendo este
pobre miserável, o maior de todos os pecadores. Faço igualmente o mesmo por esta
pobre pequena Companhia. Sou, no amor de Nosso Senhor, e de sua Santa Mãe, minha
cara Madre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatária: A minha muito cara Madre da Trindade, superiora das Carmelitas


da cidade de Troyes, em Troyes.

557. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ANNECY

19 de novembro de 1641.

Eis algumas notícias que vos entristecerão. Nosso Senhor dispôs do seu servo, o
Padre Lebreton1, voltando da missão de Óstia, para onde fora no mês de outubro. É um
tempo de muito contágio para os que saem de Roma, vão até Ostia e voltam a Roma.
44
Provavelmente Paris, onde nascera e se tinham decorrido os primeiros anos de sua vida religiosa. Ela permaneceu
em Troyes até a morte em 1647.
55
René de Breslay. Ele morrera a 02 de novembro.

.
Carta 557. – Manuscrito de Lyon.
11
A 19 de outubro.
Várias pessoas me falam das maravilhas dos grandes trabalhos que realizou naquela
região e das bênçãos que Nosso Senhor lhe concedeu. O senhor Cônego Le Bret me
escreve que os senhores Cardeais Barberini2 e Lenti3 o choraram, como também
Monsenhor vice-gerente de Roma4.
Ele obtivera a permissão de se estabelecer naquela cidade, na esperança de
instaurar nela os exercícios espirituais dos ordinandos. É juízo comum que não se deve
deixar de enviar para lá alguém para levar a cabo o estabelecimento, e parece que a
Providência vos tem em vista para isso. Digo-o ao pé do ouvido do vosso coração, sem
dizê-lo a ninguém. Enviar-vos-ei as instruções cabíveis. Ah! senhor Padre, como há
grande motivo para esperar, com o favor de Deus, que nos confiem os ministérios de
que deram esperança ao Padre Lebreton, no qual, falando humanamente, perdemos
muito! Mas, com toda a certeza, parece-me que este santo homem fará mais no céu em
nosso favor do que faria na terra, e que será como uma vítima oferecida a Deus e
consumida pelo bem da Igreja. Intercederá por nós no céu e obterá as bênçãos
necessárias para este empreendimento. Se eu puder, anexarei ao pacote uma cópia da
permissão para o nosso estabelecimento.
Poderá haver dificuldade quanto à língua, que ele sabia como o francês. Mas
Deus vos dará a graça, sendo do seu agrado, de vos fazer entender pelos estrangeiros,
como o concedeu a São Vicente Ferrer, se os pecados do pior dos Vicentes e de todos os
homens do mundo não o impedirem.

558. – A LUÍSA DE MARILLAC

[Entre 1641 e 16541].

Envio-vos as cartas de nossa Irmã Maria, que julguei acertado dever abrir.
Depois de lê-las, dobrá-las-eis, por favor, num envelope e acrescentareis duas linhas de
vossa mão para essas senhoras, onde conste que eu as abri, porque é costume entre nós
ver as cartas que as filhas escrevem e as que lhes são escritas.
As damas de ofício virão segunda-feira.
Tratarei de estar com Madame de la Pompe, indo ao subúrbio Saint-Germain
esta tarde.
Farei o que puder para essa senhora e falarei sobre ela com Madame de la
Pompe. Mas não sei como proceder nisso.
Bom dia, Senhora. Cuide de vossa saúde. Sou, no amor de Nosso Senhor, v. s.

22
A família Barberini tinha então três de seus membros no Sacro Colégio: Antônio, capuchinho, irmão de Urbano
VIII, Antônio e Francisco, seus sobrinhos.
33
Marcel Lenti, Bispo de Palestrina (1629), de Tusculum (1629-1639), de Porto (1639-1641) e de Ostia (1641-1652),
falecido a 19 de abril de 1652.
44
João Batista Altieri.
.
Carta 558. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Datas extremas da permanência de Maria Joly em Sedan.
V. D.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

559 – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ANNECY

07 de dezembro de 1641.

Dizeis-me que ireis colocar o dinheiro a juros, nas mãos do senhor Conde de N.;
isto me dá motivo para dizer-vos, senhor Padre, que tenho dificuldade em aceitá-lo.
Parece-me que teria sido mais conveniente comprar ou mandar construir uma casa. Sei
muito bem que há algo a censurar até nisso. Mas se me tivésseis escrito vossa intenção e
vossas razões, tê-las-ia pensado diante de Deus, como procurei fazer com as do
contrato, mas tarde demais. Teria sido conveniente me tivésseis comunicado uma e
outra proposta e em seguida as razões pró e contra para eu firmar meu juízo. Tive
grande dificuldade em consentir em algumas cláusulas por demais rudes do contrato.
Por esta razão vos peço, senhor Padre, jamais fazer coisa semelhante sem me escrever.
Teria sido bom me tivésseis dito a maneira como desejáveis proceder quanto ao
seminário que começastes. Parece-me que vos tinham sugerido enviar-me o projeto
antes de concluir o negócio. É o que sempre praticaram todos da Companhia e o que se
pratica em toda companhia bem regrada.
Objetar-me-eis que demoro muito, que esperais algumas vezes seis meses por
uma resposta que se poderia dar em um mês e, que neste ínterim, ocasiões se perdem e
as coisas não andam. A isso respondo, senhor Padre, que é verdade que demoro muito a
responder e a fazer as coisas. Contudo, ainda não vi jamais algum negócio prejudicado
pela minha lentidão. Tudo se fez a seu tempo, com as intenções e precauções
necessárias. Contudo, proponho-me, para o futuro, responder-vos com mais prontidão,
depois de receber vossas cartas e ter considerado a coisa diante de Deus, que é muito
honrado quando se emprega tempo para se refletir maduramente nas questões que dizem
respeito ao seu serviço, como são todas as que tratamos. Portanto, corrigir-vos-eis, por
favor, de vossa precipitação em resolver e fazer as coisas, e eu trabalharei para me
corrigir de minha lentidão.
Suplico-vos de novo, em nome de Deus, me comunicar todas as coisas, com os
prós e os contras das que são mais importantes, tendo o cuidado de não acrescentar, não
subtrair ou mudar nada em nossa maneira de viver e de fazer alguma coisa de
importância, sem antes me escrever e ter minha resposta. Oh! como o bom Padre
Lebreton praticou perfeitamente isso e como Deus abençoou-lhe a conduta!
Ousaria dizer-vos sem corar de vergonha, senhor Padre? Não há remédio,
preciso fazê-lo: repassando todas as coisas principais acontecidas na Companhia,
parece-me, e é fácil demonstrá-lo, que, se tivessem sido feitas antes do seu tempo, não

Carta 559 – Reg. 2, p. 222.
teriam tido êxito. Digo-o de todas, sem excetuar uma sequer. Por causa disso, tenho uma
devoção particular em seguir passo a passo a adorável Providência de Deus. E a única
consolação que tenho é que me parece que foi unicamente Nosso Senhor que fez e faz
incessantemente as coisas desta pequena Companhia. Em nome de Deus, senhor Padre,
encerremo-nos neste espírito, na confiança de que Nosso Senhor fará o que quiser seja
feito entre nós. É o que espero de sua bondade e da atenção que prestareis à muito
humilde e afeiçoada prece que vos faço pelo amor de Nosso Senhor...

560. – A LAMBERT AUX COUTEAUX, SUPERIOR, EM RICHELIEU

14 de dezembro de 1641.

Parece-me que somos bastante exatos na observância dos ordenamentos de vossa


visita, até ao ponto de os lermos todos os meses desde vossa partida. Eu mesmo tratei de
guardá-los no que toca à linguagem de vossa região 1, embora tenha faltado duas ou três
vezes, como também a respeito de irmos visitar dois doentes que temos na enfermaria.
Não poderíeis crer como tenho devoção em recomendar com frequência a obrigação que
temos de nos tornar exatos no cumprimento destes ordenamentos.

561. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ANNECY

Paris, 16 de dezembro de 1641.

Senhor Padre,

Envio-vos minha terceira carta, dentro de aproximadamente um mês. Escrevo a


presente com a dor que podereis imaginar, pela estima e devoção que Nosso Senhor me
dera por nossa digna Madre e da qual vos falei.
Faremos o possível para que essa santa religiosa 1 seja devolvida a seu mosteiro.
Já dispus Sua Excelência, o Senhor de Chavigny, secretário de Estado 2, no sentido de
concordar com empenhar-se por isso. Ele deve vir hoje a esse mosteiro para este fim 3.

.
Carta 560. – Reg. 2, p. 98.
11
Lambert Aux Couteaux era picardo (da Picardia).
.
Carta 561. – C. aut. – Original comunicado pelo Padre Heudre, padre da Missão.
11
Santa Joana de Chantal, falecida santamente em Moulins, a 13 de dezembro, um mês depois de ter deixado Paris.
22
Leão Bouthillier, Conde de Chavigny e de Besançois, parente de Jean-Jacques Olier, nascera em Paris, a 28 de
março de 1608. Embora designado pelo próprio Luís XIII para fazer parte do Conselho da Regência, foi afastado por
Mazarino. Ele se colocou do lado dos príncipes durante as turbulências da Fronda. Sua piedade, aliás sincera, se
aliava ao amor dos prazeres. Morreu em Paris, a 11 de outubro de 1652. Sua mulher, Ana Phelippeaux, foi uma
ardorosa jansenista.
33
O corpo de Santa Joana de Chantal foi embalsamado e exposto durante dois dias na capela da Visitação de
Moulins. Depois, foi transportado secretamente para Annecy, para junto do corpo de São Francisco de Sales,
conforme o desejo expresso pela santa, durante sua vida.
Peço-vos, senhor Padre, transmitir a nossa cara Madre de Blonay a certeza disso, como
já o fiz para com o senhor Bispo de Genebra 4, pela carta que acompanha a presente.
Dizei também a todas as nossas caras Irmãs de um e de outro mosteiro 5 que nossas
queridas Irmãs daqui farão o possível para o mesmo fim.
Aprouve a sua digna bondade, digo, à nossa digna Madre, em suas duas últimas
viagens6, legar seu coração a esse mosteiro 7. Nossa Madre8 envia uma cópia do
documento de sua vontade ao senhor bispo, com plena confiança de que ele confirmará
a intenção de nossa digna Madre9. Suplico-vos, senhor Padre, falar disso com ele.
Minhas duas cartas anteriores vos tornaram ciente da necessidade que a
Providência tem de vós em Roma e como nos dispúnhamos a vos enviar para lá 1010,
enviando o Padre Dufestel e o Padre Grimal 1111 para o vosso lugar. Terei inúmeras
coisas a vos dizer sobre isso, além de tudo que vos disse. Fá-lo-ei na próxima ocasião.
Sou, entretanto, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão de


Annecy, em Annecy.

562. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ANNECY

[Dezembro de 16411].

Senhor Padre,

44
Justo Guérin.
55
Os dois mosteiros de Annecy.
66
Em 1636 e 1641.
77
Santa Joana, de início, recusara por humildade doar seu coração ao primeiro mosteiro de Paris. Este coração,
pensava ela, não vale a pena ser conservado. Mas quando lhe observaram que a presença do seu coração em Paris e
de seu corpo em Annecy contribuiria para a união dos dois mosteiros, consentiu em redigir o ato de doação (Cf.
Bougaud, Histoire de Sainte Chantal, 8ª ed., Paris, 1874, 2 vol., in-12, t. II, p. 461). O texto da doação foi publicado
por Henri de Maupas, op. cit., p. 240. O original pertencia, em 1874, ao senhor Conde de Hauterive, antigo chefe de
divisão no ministério dos negócios estrangeiros (Cf. Bougaud, ibid., p. 462, em nota).
88
Luísa Eugênia de Fonteines, superiora do primeiro mosteiro de Paris.
99
Os desejos da Santa não foram respeitados. A Duquesa de Montmorency não consentiu em doar o corpo ao
primeiro mosteiro de Annecy, a não ser com a condição de ficar com o coração em Moulins. A preciosa relíquia foi
colocada sobre um altar, no quarto da Santa, bem junto ao leito em que falecera (Cf. Bougaud, ibid, p. 584).
1010
Primeira redação: “vos enviar para lá, para nos representar em Roma”.
1111
Francisco Grimal, nascido em Paris, a 06 de março de 1605, começou seu seminário interno a 06 de junho de
1640 e fez os votos a 09 de outubro de 1646. Prestou grandes serviços à Congregação, quer como superior das casas
de Crécy (1645-1646), Sedan (1646-1648), Montmirail (1648-1649, 1654-1655), Agen (1650-1651), quer como
segundo assistente de São Vicente (1652), quer mesmo em postos mais modestos, em Fontenebleau e outros lugares.
A introdução dos votos na Companhia respondia aos seus desejos. Aceitou de boa vontade esta medida e se esforçou
por torná-la aceita em torno dele.
.
Carta 562. – Dossiê da Missão, cópia tirada no mosteiro da Visitação de Annecy, sobre o original autógrafo que foi
trocado, por volta de 1880, por um autógrafo de São Francisco de Sales.
11
O que se diz aqui da visão do coração de Santa Chantal não nos permite atribuir outra data a esta carta.
Recebi anteontem a carta que me responde ao que escrevi a respeito de Roma.
Dir-vos-ei, como resposta, que julgo bem consideráveis as razões que me apresentais
para adiar a viagem para depois da Páscoa. Mas há inconveniente em diferir para tanto
tempo. O Papa, o Cardeal Lenti, decano dos cardeais e um outro bom e virtuoso
eclesiástico, que pensam nos exercícios dos ordinandos, podem morrer durante esse
tempo. Se isso acontecesse, uma boa obra poderia perder-se ou correr grande risco.
Tratarei de vos enviar o mais cedo possível o Padre Dufestel ou o Padre Grimal, com
um outro a mais, a fim de os instruirdes durante doze ou quinze dias. Darei ordem
igualmente aos outros de partirem, o mais cedo possível, para esperarem em Marselha.
Dir-vos-ei, entretanto, senhor Padre, que duvido seja conveniente fornecer aos
vossos seminaristas textos escritos para eles estudarem. Há livros suficientes, mais
extensos ou mais breves para esse fim. O principal é que possam repetir bem o que foi
ensinado. O melhor método que experimentei para isso é adotar um casuísta, explicar-
lhes um ou dois capítulos ao mesmo tempo, de cor, e mandá-los, a cada um, recitar de
cor a outra lição. Fazendo isto várias vezes, o assunto se grava e permanece para sempre
na memória. Devem ser explicadas as dificuldades levantadas.
Procedemos assim com os casos de consciência e com as controvérsias. E
obtivemos êxitos maravilhosos. Depois, sabemos bem que os textos escritos não são
relidos. E o que é mal é que apelam para estes textos e não exercem suficientemente a
memória para guardar o assunto. De que servem, vos pergunto, para um doutor, seus
escritos, depois de terem feito seus estudos? Para nada, com certeza, a não ser para
recorrerem eventualmente a eles. Ora, há tantos autores atualmente, com índices tão
bem feitos, que é só escolher um bom casuísta para a ele recorrer em caso de
necessidade. Sendo assim, vos suplico, senhor Padre, atenção para entrar nesta prática
que acabo de vos expor.
Não duvidais tenha eu sentido uma dor muito sensível com a morte de nossa
digna Madre. Foi porém do agrado de Deus consolar-me com a visão de seu encontro
com nosso bem-aventurado Pai2 e dos dois com Deus, logo que soube da notícia e
depois de um ato de contrição que fiz, no instante após ter lido a carta pela qual me
comunicavam o estado extremo de sua doença.
A mesma coisa me foi mostrada, se não me engano, na primeira missa que
celebrei por ela, após a notícia de sua morte3. Seja isto dito somente ao bom senhor
Padre Codoing, por favor, e aos nossos padres, que abraço em espírito, a cada um, com
a maior afeição e humildade a mim possível.

563. – A MICHEL DUPUIS

Paris, 12 de janeiro de 1642.

Senhor Padre,
22
São Francisco de Sales.
33
São Vicente deixou, escrito do próprio punho, um testemunho da visão de que fala aqui.
.
Carta 563. – Original em Nîmes, com as Filhas da Caridade da Rua des Greffes, 12.
A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!
O homem que me entregou vossa carta de 30 de dezembro chegou apenas ontem
à noite. Fiquei muito contristado vendo vossos sofrimentos e consolado pela esperança
de vos ver, bem depressa. Com efeito, tendo considerado tudo que me comunicais, é
conveniente que volteis o mais depressa possível. Enviaremos alguém em vosso lugar,
ou dareis a ordem que me sugeris. Proporei quanto antes a questão a essas senhoras e
vos darei a resposta pelo vosso portador, o mais breve possível. Entretanto, mantende-
vos na alegria. Agradecei e apresentai minhas escusas ao Revmo. Padre Reitor pela
carta que teve a caridade de me escrever e por ser eu tão mesquinho que não lhe posso
escrever, no momento. O! se tivésseis algum alerta a me fazer a respeito da
possíbilidade de deixardes totalmente a cidade, sem que alguém fique em vosso lugar,
fá-lo-eis quanto antes. O que me dizeis, isto é, que vossa ausência poupará sessenta
libras por mês aos pobres, me sensibiliza. Mas Deus sabe quanto enternecido ficarei ao
vos abraçar em vossa chegada e quanto sou, em seu amor, senhor Padre, vosso muito
humilde servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Dupuis, padre da Missão, presente em Saint-


Mihiel, para assistência aos pobres.

564. – A LUÍSA DE MARILLAC

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Estais aborrecida comigo por não terdes notícias minhas desde vosso retorno? O
embaraço contínuo em que me encontro aqui me impediu de ir estar convosco. Tinha o
propósito de fazê-lo hoje, quando fui ver o senhor Villecot. Mas com a urgência de estar
em Santa Maria1, não o fiz. Portanto, espero muito que me escuseis e me deis notícia do
estado de vossa disposição.
Desejo-vos, entrementes, um bom dia e sou, no amor de Nosso Senhor, vosso
muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

.
Carta 564. – Gossin, op. cit., p. 494, conforme o original que lhe foi comunicado pelo Padre Le Vayer du Boulay,
pároco de Gangesle-Roi.
11
O convento da Visitação.
565. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ANNECY

Paris, 22 de janeiro de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Eis enfim convosco o Padre Dufestel. Suplico-vos, senhor Padre, instruí-lo bem
e informá-lo de tudo. Deus o abençoou muito em Troyes 1. Espero que lhe continue com
sua misericórdia em Annecy, se as abominações de minha vida passada, das quais acabo
de revelar uma parte na partilha de oração, neste dia de São Vicente, não o impedirem.
Cumprida vossa tarefa, partireis dentro de sete ou oito dias, no mais tardar, porque a
Providência vos enseja boa facilidade de viajar por mar, com a ida do secretário 2
enviado ao senhor embaixador de Roma3.
Dentro de sete ou oito dias, no máximo, farei partir os que vão convosco. Tereis
notícias deles em Sainte-Marie de Bellecourt.
Enviei, esta manhã, trezentas e cinquenta libras ao fiador do Senhor Lumague 4
em Lyon, que vos forneceu o dinheiro. É para o presente trimestre do pagamento em
Annecy. Tomareis providência para recebê-las. Quanto ao de Roma, seguirei a ordem
que me indicastes em vossa última carta.
Como estou com pressa de terminar, escrever-vos-ei mais longamente [mais
tarde] e sou, entretanto, saudando muito humildemente a pequena comunidade, vosso
5

muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

Escrevo igualmente ao senhor Bispo de Genebra, ao qual o Padre Dufestel


entregará 140 libras que mando para os seus participantes dos exercícios dos
ordinandos, eu que sou no amor de Nosso Senhor...

566. – A FRANCISCO DUFESTEL, EM ANNECY

22 de janeiro de 1642.

.
Carta 565. – Original na biblioteca pública e universitária de Genebra, ms. sup. 360.
11
Ele era superior lá.
22
Jean de Montereil ou Montreuil, cônego de Toul e secretário do príncipe de Conti, acabava de aceitar as funções de
secretário do Marquês de Fontenay-Mareuil, embaixador de Roma. De lá foi para a Inglaterra como secretário de
embaixada e pouco depois nomeado representante do governo na Escócia. Tornou-se membro da Academia Francesa.
Publicaram alguns de seus escritos. Morreu a 27 de abril de 1651, com a idade de apenas trinta e sete anos.
33
O Marquês de Fontenay-Mareuil.
44
Célebre banqueiro.
55
O original está estragado neste lugar.
.
Carta 566. – Trecho citado no depoimento do Irmão Pierre Chollier, testemunha 102 no processo de beatificação de
São Vicente.
... Abraço em espírito toda a casa com o coração pleno da consciência de minha
indignidade para servi-los como merecem e, no entanto, cheio de afeição...

567. – UM PADRE DA MISSAO A SÃO VICENTE

[Entre 1639 e 16431].

Ó senhor Padre, quantas almas vão para o paraíso pela pobreza! Desde que
cheguei a Lorena, assisti a mais de mil pobres em sua morte. Todos se mostravam
perfeitamente dispostos. São os numerosos intercessores no céu, em favor dos seus
benfeitores.

568. – A LUÍSA DE MARILLAC

Manhã de terça-feira, [16421].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Não podendo ir ver-vos esta manhã, como era a minha intenção, vai aqui a
minha resposta.
Encarreguei o Padre Portail de escrever a nossa irmã Maria Joly, em Sedan, em
meu nome. Vou ler sua carta esta noite e vo-la enviarei amanhã.
Madame chanceler falou do negócio da Senhora du Mée ao senhor chanceler.
Ele lhe prometeu falar com o Senhor de Chevreuse 2. Seria bom que ela mesma estivesse
com ela.

.
Carta 567. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. XI, sec. I, 1ª ed., p. 377.
11
Foi entre 1639 e 1643 que vários grupos de missionários percorreram a Lorena à procura das misérias, para
distribuir os socorros. Depois de 1643, São Vicente se serviu quase exclusivamente do Irmão Mateus Régnard, para
levar as esmolas (Cf. Abelly, op. cit., 1. II, cap. XI, sec. I, 1ª ed., p. 388).
.
Carta 568. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Ver nota 5.
22
Cláudio de Lorena, Duque de Chavreuse.
Disse ontem à Senhora de Lamoignon 3 que a assembleia4 se realizará hoje em
Santa Maria da cidade, onde necessariamente eu tenho o que fazer.
Tereis muitas outras querelas da parte das oficiais da Caridade, se continuardes
em vida, como espero. Falaram-nos na pregação ontem, na oração fúnebre da falecida
Madame Chantal, que uma de suas religiosas lhe atiçara injúrias vinte anos a fio 5. Ó
Senhora, como custa caro fazer o bem no espírito de Jesus Cristo!
Bom dia. Sou v. s.

V. D.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

569. – A BERNARDO CODOING

Paris, último dia de janeiro do ano 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Não vos tendo podido escrever mais longamente pelo Padre Dufestel, envio-vos
o complemento daquelas linhas por um portador especial que pedi ao Senhor Lumague
enviar-vos, pelo seu correspondente em Lyon.
O Padre Dufestel, em companhia do Padre Guérin1, irá, portanto, substituir-vos.
Os dois são bons servos de Deus. Peço-vos entregar ao primeiro as cartas de sua
qualidade de superior, que estou enviando a ele e garantir ao senhor Bispo2 que é um
missionário muito sábio, de boa conduta, muito abençoado, e que tem uma afeição e

33
Madalena de Lamoignon nasceu em Paris, a 14 de setembro de 1608, filha de Chrétien de Lamoignon, presidente
magistrado no Parlamento de Paris, e de Maria de Landes, que a iniciou desde a infância, na prática da caridade. A
mãe e a filha rivalizavam na dedicação aos miseráveis. Iam frequentemente visitá-los em casa, pensavam-lhes as
feridas, limpavam-lhes os quartos, arrumavam seus leitos, distribuíam-lhes vestes, roupas de cama, alimentos,
dinheiro. São Vicente de Paulo dizia da Senhora Lamoignom que ela era tão pressurosa nas obras de caridade que
ninguém conseguia acompanhá-la. Ela deixou seu nome em todas as caridades que o Santo fundou e tomou parte
ativa em todas. Morreu a 14 de abril de 1687, com seus 79 anos. Sua vida foi escrita pelo P. d’Orleans ( Vie de
Mademoiselle de Lamoignon, Bibl. Nac., ms. fr. 23895) e pela Senhora Luísa Masson (Madeleine de Lamoignon,
Lyon, 1846, in-12). O abade Carron reservou-lhe um lugar na Vie des dames françaises qui ont été les plus celèbres
dans le XVII siècle par leur piété et leur dévouement pour les pauvres, 2ª ed., Louvain, 1826, in-8º.
44
A assembleia das Damas da Caridade.
55
Foi Monsenhor de Maupas, então bispo nomeado de Puy, mais tarde Bispo de Evreux, que pregou em Paris em
1642 a oração fúnebre de Santa Chantal, cuja vida ele devia escrever.

.
Carta 569. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
Jean Guérin, nascido em Lacelle (Orne) em 1594. Entrou na Congregação da Missão a 07 de novembro de 1639.
Fez os votos em Annecy, a 04 de agosto de 1642. Foi nomeado superior no mês seguinte e continuou a dirigir a casa
até sua morte, em 06 de março de 1653. São Vicente escrevia alguns dias após seu falecimento: “Deus sempre
abençoou a conduta e os trabalhos desse seu servo, sempre estimado pelos de dentro e os de fora da família”. Sua
biografia foi publicada no t. III das Notices, pp. 23-28.
22
Justo Guérin, Bispo de Genebra.
obediência especiais para com nossos senhores prelados. O falecido senhor Bispo de
Troyes3 o honrava com sua benevolência a tal ponto que é impossível traduzi-la.
Certifique igualmente a comunidade que ele dirige com mansidão, caridade,
sabedoria e também com firmeza em relação ao fim a que tendemos e que governou tão
bem a família de Troyes4 que os internos e os externos exprimem seus aplausos, mais do
que posso dizer.
Quanto a ele, dir-lhe-eis, por favor, que lhe peço aceitar vossos ordenamentos
com respeito ao seminário, a instrução sobre os textos para o ensino 5, o procedimento
com o Padre Escart e de modo geral em relação a todas as coisas, até que receba outra
ordem nossa sobre as dificuldades que se apresentarem. Peço a ele me informar de tudo
e nada mudar sem antes me comunicar.
Tomei conhecimento das razões pelas quais fizestes determinadas coisas,
conforme dissestes ao Padre Dehorgny. Embora saiba muito bem que nada fizestes
inconsideradamente, penso contudo, senhor Padre, que é conveniente nos aviseis sobre
as coisas principais, antes de fazê-las, não somente quanto ao essencial, mas também
quanto às circunstâncias, ut simus unanimes in eodem spiritu6 (para que sejamos
unânimes num só espírito). Eu vo-lo suplico, em nome de Nosso Senhor. Tende
confiança que as coisas de Deus não se perdem de ordinário por tomarmos mais tempo
para examiná-las e recomendar-lhas em nossas orações. Muito pelo contrário, tudo sai
melhor7.
Só pude arranjar dois terços dos quarenta e seis escudos de intenções de missas,
que o senhor Bispo de Genebra deseja enviar-vos, em prol dos exercícios espirituais. Eu
os envio para o senhor Mascarini e o senhor Lumague, em Lyon, que lhos fornecerá
para remetê-los ao referido senhor Bispo. Disporá deles como lhe aprouver, enquanto
vamos ver se conseguimos algo mais de outra fonte, para lhe enviar.
Suplico-vos, senhor Padre, certificá-lo do meu respeito e que segui sua ordem,
conforme me comunicastes, e vou defendê-la junto a nossa mui cara Madre Superiora
da Visitação8, a respeito [do coração] de nossa digna Madre9. E ainda, que disse ontem à
Madre Superiora daqui que ela contribuiria mais para a glória desta bem-aventurada
alma, entrando nos sentimentos do seu coração todo amoroso e amável do que insistindo
na posse do mesmo coração. Sustentarei este discurso, porque o tenho assim no espírito
e no coração, certo de que o senhor Bispo de Genebra é o intérprete da vontade de Deus
nisso e é este o seu parecer.
Estas filhas têm um pouco de dificuldade em se render a isso e gostariam muito
fosse do agrado do dito senhor Bispo que se partilhasse com elas esse tesouro. Sua
providência muito santa e paternal saberá bem como prover a isso. Espero que,

33
Renê de Breslay.
44
De 1639 a 1642.
55
Texto das aulas.
66
Fl 1,27.
77
O original está arruinado numa distância de vários centímetros. A reconstituição do texto não comporta dificuldade
alguma.
88
Luísa Eugênia de Fonteines.
99
Santa Chantal.
enquanto as pessoas da atual direção estiverem no poder, elas se conterão. Mas temo
muito que, com o tempo, esta casa não se mantenha na mesma disposição1010.
Depois de escrita a presente carta, o senhor Lumague acaba de me dizer que
Nosso Senhor dispôs de nosso Santo Padre, o Papa1111. Esta notícia me deixou perplexo
durante seis horas: devemos mandar os da Companhia partir para Roma? Mas acabamos
nos decidindo: eles partirão depois de amanhã, 03 de fevereiro1212. Estarão em Lyon dez
ou doze dias depois e em Marselha lá pelo dia dezessete. Para ali deve dirigir-se o
secretário do senhor embaixador de Roma1313. Desejo muito que chegueis lá ao mesmo
tempo, para partir com ele, o que não será pequena vantagem. Em nome de Deus,
senhor Padre, fazei o que puder para isso.
Estamos enviando o Padre Germano e o Irmão Martin 1414. Um e outro são muito
afeiçoados e inteiramente apegados a sua vocação. O primeiro tem o espírito suave, é de
vida interior, obediente, regular, transparente, de bom relacionamento e muito simples.
O outro é cândido, simples, manso, obediente, regular, tem estudos de filosofia e de
teologia. Desta última, defendeu teses, há apenas três dias, e foi abençoado. É excelente
catequista, prega bem, tem dom para os exercícios dos ordinandos, embora tenha apenas
22 anos. Enviamo-vos, além dos dois, um irmão, boa pessoa, dócil, regular, embora
tenha entrado, há pouco tempo, na Companhia. Estou na dúvida se vos envio ainda um
padre a mais e um clérigo, os dois de notável virtude: o primeiro, de muita vida interior,
bom catequista e muito bom pregador; o segundo, de observância regular, de vida
interior, simples, e é filósofo. Veremos se nos será possível vo-los enviar.
Mandarei pagar aqui o trimestre de janeiro ao Senhor Delorme, se já não o
fizeram conforme ordem minha. Há alguma dificuldade na letra de câmbio. Mas será
superada pela quitação com este bom homem, enfermo e quase paralítico em seu leito.
Envio cento e cinco libras que recebereis do senhor Lumague em Lyon. Enviá-
las-eis ao Padre Dufestel, para ele entregá-las ao senhor Bispo de Genebra, em favor dos
seus exercitantes (trata-se dos retiros ou exercícios espirituais - N.T.). Parte delas me
foram dadas de esmola. Envio-vos também quarenta libras pelo referido senhor. Ser-
vos-ão entregues em Lyon para a vossa viagem para Marselha. Será preciso deduzir
desta soma o que deve ser pago ao portador expresso da presente carta. Em Marselha,

1010
Já deixamos assinalado em nota (carta 561, nota 9), que o coração não saiu de Moulins, onde a santa morreu.
1111
Era rebate falso. Urbano VIII morreu a 29 de julho de 1644.
1212
A carta está datada de 31 de janeiro. São Vicente a terminou a 01 de fevereiro.
1313
Jean de Montreuil, secretário do Marquês de Fonteney-Mareuil.
1414
Jean Martin, nascido em Paris a 10 de maio de 1620, não atingira ainda seus 22 anos. Pertencia à Congregação da
Missão desde 09 de outubro de 1638. Alguém escreveu que São Vicente o enviara à missão de Saint-Germain-en-
Laye, na qualidade de catequista e que tivera o delfim entre seus ouvintes. Não é isto possível, pois a missão de Saint-
Germain aconteceu alguns meses antes de sua entrada em São Lázaro. Ordenado padre em Roma, a 25 de abril de
1645, foi, no ano seguinte, enviado para Gênova, a fim de iniciar ali um novo estabelecimento. São Vicente não teve
talvez missionário mais dotado para arrastar as multidões e converter as almas. Em 1654, Jean Martin foi chamado de
volta para a França e colocado em Sedan, na qualidade de superior e pároco. Em 1655, São Vicente o enviou para
Turim, para dirigir um novo estabelecimento fundado pelo piedoso Marquês de Pianezze, primeiro ministro de
Estado. Lá, como em Gênova e Sedan, o zelo missionário venceu a resistência dos corações mais endurecidos.
Mereceu ser chamado de Apóstolo do Piemonte, e seus coirmãos receberam o nome de Padri santi (Padres santos).
Renê Almeras lhe ofereceu em 1665 a direção da casa de Roma. Foi para ele um bem penoso sacrifício. Jean Martin
se resignou. Foi enviado para Gênova em 1670, para Turim, em 1674, para Roma, em 1677, para Perúsia, em 1680,
para Roma, em 1681, sempre na qualidade de superior. Foi nesta última cidade que ele morreu, a 17 de fevereiro de
1694. Temos a notícia manuscrita sobre ele, escrita por um contemporâneo. Foi publicada, com alguns retoques, no t.
I das Notices, pp. 269-372.
dirigir-vos-eis ao juiz de Forbin, lugar tenente geral das galeras, que vos encaminhará
para onde a comunidade vai se hospedar. Se ela já tiver partido, aproveitando os ventos
favoráveis e a comodidade de que falei, ele vos ajudará a encontrar algum navio, e, se
for o caso, dar-vos-á dinheiro para a viagem, se precisardes.
Eis, senhor Padre, o que vos posso dizer no momento. Abraço-vos, como ao
Padre Dufestel e toda a comunidade, com a maior ternura e a humildade possíveis. Sou,
no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

Estou com tanta pressa que não posso escrever ao Padre Dufestel. Que ele me
perdoe, por favor.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão de


Annecy, em Annecy.

570. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ANNECY

São Lázaro, 09 de fevereiro de 1642.

Senhor Padre,

Envio-vos uma carta do senhor Cardeal Mazarino, com recomendações a nosso


respeito, dirigida ao Cardeal Antônio, sobrinho de Sua Santidade 1. Recebi ontem vossa
carta vinda do lugar da missão onde levastes vossos seminaristas. Oh! como minha alma
ficou consolada por tudo que me relatais, como também pela proposta da compra da
casa! Ela deve estar, porém, dentro da cidade de Annecy, ou tão próxima que possa
servir de residência, como se estivéssemos na cidade. Mas não nos é possível ajudar-vos
com essas 7000 libras. O Padre Dufestel procurará, portanto, se arranjar com mil
ducados que são parte da soma colocada para gerar rendas.
Fizestes bem em me advertir no sentido de não recorrer a Sua Eminência 2 para o
projeto do senhor Bispo de Genebra3. Não fosse isto, teria escrito amanhã ao senhor
Chavigny, em Lyon, para lhe falar sobre o assunto 4. Vossa presença em Roma terá
muita força junto ao senhor Embaixador5. Pedirei ao senhor de Liancourt, seu grande
amigo, lhe escreva sobre a questão, com o maior capricho que puder.

.
Carta 570. – Dossiê da Missão, cópia tirada do original do senhor Charavay.
11
Antônio Barberini.
22
O Cardeal Richelieu.
33
Justo Guérin.
44
O Cardeal Richelieu não era bem visto pela corte romana para que sua intervenção pudesse ser de alguma utilidade
para o Bispo de Genebra.
55
O Marquês de Fonteney-Mareuil.
O bom Padre Thévenin, pároco de Saint-Etienne, no Delfinado, me escreveu
várias cartas, todas no intuito de trabalhar para erigir um seminário de padres para as
paróquias e outros benefícios. Pressiona-me com uma quantidade de razões, apelando
até para os juízos de Deus. Ele esteve convosco no Delfinado 6 e em Annecy, e conosco
aqui. Gostaria muito que vos désseis ao trabalho de estar com ele, de passagem, e de lhe
entregar minhas cartas. Entre estas, há uma letra de câmbio, a fim de que ele pegue, em
Lyon, com os senhores Mascarini e Lumague, 250 libras, que ele me diz ter gasto para
vir estar conosco. Insiste comigo para abandonar nosso projeto das missões, a fim de
assumir o que propõe. Não teria eu dificuldade em fazê-lo, se isto fosse do agrado de
Nosso Senhor. Mas a Companhia foi aprovada pela Santa Sé, que tem infalibilidade
para a aprovação das Ordens que apraz a Deus instituir, segundo o que ouvi do Padre
Duval. Em segundo lugar, a máxima dos Santos é que quando uma coisa foi bem
decidida diante de Deus, depois de muitas orações e conselhos tomados, é preciso
rejeitar e considerar como tentação tudo o que se propuser contra. Em terceiro lugar,
enfim, tendo sido do agrado de Deus conceder uma aprovação universal às missões, de
tal modo que por toda parte todos começam a tomar gosto por elas e muitos a trabalhar
nelas com as bênçãos da misericórdia de Deus, parece-me que seria necessário quase
um anjo do céu para nos persuadir de que é vontade de Deus deixemos esta obra, para
assumirmos outra que já se tentou em diversos lugares, sem êxito.
Como entretanto o concílio de Trento recomenda os seminários, demo-nos a
Deus para prestar-lhe serviço também nisso, por toda parte onde pudermos. Começastes
em Annecy. O senhor Bispo de Alet 7, que tem nossos padres, faz o mesmo. O senhor
Bispo de Saintes8 tem a mesma intenção. Em Paris, vamos começar uma experiência
com doze e para ela o senhor Cardeal nos ajuda com mil escudos9.
O Padre Thévenin gostaria que a coisa fosse mais rápida. Mas parece que os
negócios de Deus se fazem pouco a pouco e quase imperceptivelmente e que seu
espírito não é impetuoso, nem intempestivo. Escrevi-vos acima, pedindo-vos para ir vê-
lo. Pensei porém, depois, que não há necessidade e bastar-vos-á enviar-lhe minhas
cartas.
Folgo em saber, senhor Padre, que vossa natureza venceu aqueles movimentos
de ardorosa urgência, sentidos no começo, em relação a Roma. Ao contrário,
experimentais agora sentimentos de temor. Será então o puro amor de Deus que vos
conduzirá até lá. Ele realizará sua obra por vós. Ide pois, senhor Padre, in nomine

66
Bernardo Codoing tinha outrora pregado missão por lá.
77
Nicolau Pavillon começara seu seminário pouco tempo após sua chegada em Alet. Nele recebia jovens e até padres
ordenados, sem saber uma palavra em latim (Cf. Degert, op. cit., t. I, p. 197).
88
Jacques Raoul, Bispo de Saintes, pensava, desde o ano de 1633, no estabelecimento de um seminário em sua
diocese. Só pôde realizar seu projeto em 1644 (C.f Luís Audiat, São Vincente de Paulo e sua congregação em Saintes
e Rochefort, Paris, 1885, in-8º).
99
Foi, segundo o testemunho de Abelly (op. cit., t. I, cap. XXXI, p. 146), pelo ano de 1636 que São Vicente erigiu,
no colégio dos Bons-Enfants, um seminário, onde adolescentes fizeram os estudos de humanidades. Tocado pelo que
lhe disse o Santo sobre a necessidade de os clérigos, já de ordem sacra ou prestes a recebê-las, se exercitarem durante
um ou dois anos nas virtudes e funções do seu estado, Richelieu lhe concedeu mil escudos em 1642, para o sustento
de doze eclesiásticos. A estes doze, vieram ajuntar-se outros que pagavam pensão. Os seminaristas bem cedo se
tornaram tão numerosos que são Vicente teve de retirar dos Bons-Enfants os que faziam humanidades e transferi-los
para um edifício situado no extremo do recinto de São Lázaro. Assim começou o seminário São Carlos. O seminário
dos Bons-Enfants passou, portanto, por três fases sucessivas: a primeira de 1636 a 1642, a segunda de 1642 a 1645, e
a terceira de 1645 a 1791.
Domini (em nome do Senhor), nesta confiança. Escrevei-me com frequência e sobre
todas as coisas. Escolhei um lugar bem sadio para a vossa habitação em Roma. A carta
do Cardeal Mazarino foi escrita com capricho!
Sou, senhor Padre, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

O Senhor de Montereil, secretário do Embaixador de Roma, tomará um barco


para viajar terra a terra. Peço-vos ir para Marselha pelo dia 26 ou 27.

571. – A PIERRE DU CHESNE, PADRE DA MISSÃO, EM CLAYE1

São Lázaro, 02 de março de 1642.

Senhor Padre,

Envio-vos a resposta para a Madame de Claye e uma palavra para o retorno do


Padre Boudet.
Meu Deus, senhor Padre, o que faremos e como se porta o senhor Renty 2? Como
vai vossa comunidade? Nosso Senhor abençoa vossa missão? Não pude estar com o
senhor Bispo de Meaux3. É bom informá-lo sobre o estado da missão e pedir-lhe vos
comunique se lhe apraz ir abençoar sua obra.
Traço-vos às pressas estas linhas e sou, do senhor Renty e vosso, no amor de
Nosso Senhor...
Se o Padre Boudet não estiver em Claye, encaminhareis o portador para
Fontaine4.

.
Carta 571. – C. aut. – O original desta carta foi posto à venda pelo senhor Charavay, que lhe publica o texto num
dos seus catálogos.
11
Em Seine-et-Marne.
22
Gastão de Renty, nascido em 1611 em Bény-Bocage (Calvados), era, diz Abelly (op. cit.,1. II, p. 365), “tão nobre
pela virtude quanto pelo nascimento”. Depois de ter guerreado na Lorena, à frente de uma companhia de cavaleiros,
fixou-se em Paris, colocou-se sob a direção do Padre Condren, entregou-se às práticas de piedade e às obras de
caridade. A recitação do ofício divino, a oração, os exames de consciência ocupavam uma parte do seu dia.
Levantava-se de noite para recitar as Matinas. Um dia por semana era consagrado à visita dos doentes da Casa da
Caridade, aos quais instruía e consolava. Um outro dia, à visita dos hospitais. Visitava os pobres nas suas casas com
as irmãs da paróquia Saint-Paul. Os ingleses refugiados na França por causa da sua fé, os lorenenses advindos a Paris,
à procura de segurança que não tinham em sua região, os cativos da Barbaria, os forçados de Marselha, os
missionários do Levante encontraram nele um generoso benfeitor. O doutor Burnet, Bispo de Salisbúria, disse “que
deviam colocá-lo com justiça entre os maiores modelos que a França produziu” no século XVII (Collet, op. cit., t. I,
p. 215, nota). Um tal homem não podia deixar de ter relacionamentos frequentes com São Vicente. Já dissemos que
ele foi o principal auxiliar do Santo na assistência aos nobres lorenenses refugiados em Paris. Encontrasse ele
pecadores desejosos de se converter, aconselhava-os a ir fazer retiro em São Lázaro. O piedoso e caridoso barão
morreu a 24 de abril de 1648, com a idade de trinta e oito anos. O Padre Saint-Jure escreveu sua vida ( La vie de
Monsieur de Renty, Paris, 1651, in-8º).
33
Domingos Séguier.
44
Fontaine-Essarts, lugarejo da comuna de Courbetaux (Marne), ao lado de Montmirail.
572. – A LUÍSA DE MARILLAC

[Entre 1639 e 16471].

Senhora,

Expressei meu pensamento a Madame Duquesa de Aiguillon, com respeito a


essa moça de Bordéus. Parece-me que ela se deita cedo demais, e dá mostras de que o
reconhece. A Senhora Poulaillon parece não fazer dificuldade de ficar com ela.
Faremos amanhã nossa assembleia em favor de Lorena.
Bom dia, Senhora. Sou...

573. – AO GOVERNADOR DE UMA GRANDE CIDADE1

Eu vos prestarei serviço, se puder. Mas, no que toca ao negócio dos Padres da
Missão, peço-vos deixá-lo nas mãos de Deus e da justiça. Prefiro vê-los fora de vossa
cidade a vê-los nela pelo favor e autoridade dos homens.

574. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, manhã de domingo. [Entre 1640 e 16481].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Na dúvida se poderei assistir hoje à assembleia das Damas da Caridade, que se
deve realizar em vossa casa, por causa de uma outra que temos aqui, em favor de
Lorena2, envio-vos a carta que me escreveu ontem Madame Duquesa de Aiguillon, pela
qual vereis que ela me comunica que as damas podem começar a fazer a coleta. Elas a
farão, portanto, se lhes aprouver. A obrigação de colocar o dinheiro arrecadado nas
mãos desses senhores não consta na carta.
.
Carta 572. – Pérmartin, op. cit., t. II, p. 314, carta 775.
11
Esta carta é datada de março de 1651. Parece isso uma adição, cremos, do editor. A palavra sobre a assembleia em
favor de Lorena mostra que importa situá-la entre 1639 e 1647.
.
Carta 573. – Collet, op. cit., t. II, p. 235.
11
Esse Governador, talvez de Toul, pedira ao Santo para usar sua influência junto à corte, no sentido de poder ele
obter um favor. Prometia em troca proteger os missionários do lugar contra os que faziam oposição ao seu
estabelecimento.
.
Carta 574. – C. aut. – Original com as Filhas da Caridade de Soissons.
11
Ver nota 2.
22
Provavelmente, a assembleia das pessoas caridosas que haviam assumido em 1640 a assistência dos nobres
lorenenses, refugiados em Paris, e a continuou até 1648.
Mostrareis às damas o relatório que desejaram que eu redigisse, para entregarem
às damas que farão a coleta, a fim de informarem as pessoas sobre a coisa. Elas e vós
acrescentareis, retirareis e ordenareis o que achardes oportuno. Feito isto, mo enviareis
ainda hoje, para que possa destacar alguns pontos e devolvê-lo amanhã, bem cedo, para
ser enviado a Madame Mestay.
Penso que é bom dizer às damas que é prudente não falar das dificuldades que
levantam esses senhores, e que convém agir e distribuir as tarefas, ainda esta semana.
Se eu puder, embora duvide disso, vou dar uma escapada pelas quatro horas,
pouco mais ou menos, para estar presente ao fim de vossa assembleia, ainda hoje.
Bom dia, Senhora. Sou das damas e vosso, no amor de Nosso Senhor, Senhora,
servo muito humilde e obediente,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

575. – A BERNARDO CODOING, PADRE DA MISSÃO, EM ROMA.

São Lázaro, Paris, 17 de março de 1642.

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi vossa carta de 23 de fevereiro, de Lyon, há apenas dois ou três dias, e
fiquei muito preocupado. Recebemos antes a que escrevestes de Avinhão ao senhor
Padre Soufliers. Dir-vos-ei, como resposta a vossa carta e à que mandastes para o Padre
Soufliers, que saldaremos todas as quantias que pagastes em Lyon. Por não ter recebido
vossa carta a tempo, pagamos apenas cerca de mil libras em duas partes, das quais nos
trouxeram vossas letras de câmbio, e não a do senhor Morand, escudeiro-mestre em
Lyon. Mas nós o faremos. Para o futuro, a fim de evitar confusão, peço-vos nada pegar
aí, a não ser o necessário para viver, caso não vo-lo mande, levando em conta vossa
precisão, ou aquilo que me tiverdes comunicado por escrito.
Rendo graças a Deus pela graça que vos concedeu em tudo que me escreveis, e
lhe peço vo-la continue no futuro e, de modo particular, vos conserve em boa saúde,
com a qual vos peço ter muito cuidado. Para este fim, peço-vos morar em local onde os
ares sejam bons e de ser um pouco supersticioso quanto a observar os tempos de sair e
voltar a Roma que o vulgo julga convenientes. Por faltar a isso, o bom Padre Lebreton
privou a Companhia de sua pessoa.
Consultamos, com seriedade, sete coirmãos da Companhia, seis conjuntamente,
e o outro à parte, porque partia para os campos, no tocante às exposições orais em classe
das quais falastes ao Padre Soufliers. Tudo pesado e considerado, cinco fomos de

.
Carta 575. – Conhecemos o rascunho e o texto definitivo desta carta, ambos escritos da mão de São Vicente e
datados, o primeiro, de 17 de março; o segundo, do dia seguinte. Este último documento pertence aos padres da
Missão e Turim. O outro se encontra na Catedral de Bogotá (Colômbia).
parecer contrário a essas exposições orais. Dos cinco, dois são estimados como os mais
sábios da Companhia. Eis as razões:
A primeira vem da própria ciência que desejamos transmitir, a qual será mais
segura se for a de um autor aprovado, do que a de escritos de um particular.
Em segundo lugar, da parte dos prelados e do público, que darão preferência a
um autor aprovado, mais que aos escritos de um jovem que não deu prova de sua
ciência nos bancos das escolas.
Em terceiro lugar vem o interesse da Companhia. Ela dispõe de mais pessoas
que poderão utilmente explicar um autor, do que de gente para ditar textos. E ainda, pela
razão de que não se exporia à censura de suas lições e não atrairia sobre si, inveja do
que poderia fazer.
Em quarto lugar vem o lado dos que ensinam. Ser-lhes-á mais útil explicar um
autor do que compor textos, se não os tirar, como fizestes, de Bonacina 1 ou de algum
outro autor. Neste caso, ao descobrirem o autor, zombarão do professor. Quanto a tirar
de sua cabeça, é preciso ser professor de teologia para isso, ou ter capacidade suficiente
e empregar muitíssimo tempo na consulta aos autores e fazer apenas isto. E então, adeus
à solicitude por fazer os seminaristas repetirem o conteúdo, no que consiste o fruto
principal. E adeus ainda ao cuidado da vida espiritual e a tudo mais. Se vosso espírito
foi capaz de tudo isto até o presente, resta saber se o será com o tempo. Em todo caso,
se o puderdes, nem todo mundo tem a força de espírito que Nosso Senhor vos possa ter
dado, para bastar a tudo isso.
Em quinto lugar, temos o lado dos seminaristas, que podem ser ou não teólogos.
Se o forem, não entrarão no seminário para aprender a moral, mas antes a piedade e as
outras coisas que lhes convêm, do mesmo modo que os licenciados em teologia pela
Sorbona não entraram nos exercícios dos ordinandos para aprender a doutrina neles
ensinada, mas para se tornarem melhores. Se não forem teólogos, contentar-se-ão alguns
com os textos ditados, como se faz de ordinário na Sorbona. E o mestre que os ensina
julgará ter feito o bastante, entregando-lhes textos, e ter trabalhado o suficiente,
compondo-os e lhos entregando. Queira Deus neles pensem depois! E se são ignorantes,
como acontece com a maior parte dessa condição, meu Deus! senhor Padre, de que lhes
servirá vos tenha entregue a tanto trabalho por eles? Não valeria mais a pena empregar o
tempo interpretando-lhes bem, levando-os a aprender de cor e, depois, a repetir um
autor, do que perder o tempo compondo-lhes textos por escrito, uma vez que todo
proveito para eles consiste em fazê-los aprender de cor e a dar conta do que
aprenderam?
Objetar-se-á que os discípulos serão tentados a ir embora se não lhes for
ministrado algo da própria lavra e que não conceberão boa opinião do mestre. Talvez
fosse verdade, se não houvesse outros atrativos no seminário. Mas nele tendes o da
piedade, se for do agrado de Deus saiam dele homens verdadeiramente piedosos. No

11
Martin Bonacina, nascido em Milão por volta de 1585, é um dos príncipes da teologia moral. Lecionou por três
anos direito canônico e civil no seminário de sua terra natal e foi depois reitor do Colégio Suíço. Seu mérito granjeou-
lhe a nomeação por Fernando II como Conde palatino e cavalheiro da Toison d’Or (do Velocíno de Ouro). Sagrado
Bispo de Útica, morreu enquanto se dirigia para a corte de Viena, aonde Urbano VIII o enviava como Núncio (1631).
Escreveu um compêndio de teologia moral (Lyon, 1624, 2 vol., in-fº), que já tinha dezoito edições em 1754, e
diversos tratados de direito, dogma e moral.
seminário, tereis ainda o canto, as conferências, as cerimônias, a instrução para a
catequese e a pregação e sobretudo o bom odor transpirado da vida edificante dos que
forem educados neste estilo, e a procura deles para os ministérios e trabalhos.
A Conferência dos externos, que vem fazer palestras em São Lázaro, faz
profissão de tratar os assuntos com muita simplicidade. Tão logo venha alguém a aduzir
mais teorização e ornar a linguagem, imediatamente me trazem queixas, no sentido de
remediar a isso. E o primeiro a fazê-lo é o senhor Padre Tristan, doutor em teologia 2,
pertencente à agremiação. E, no entanto, Nosso Senhor permite que todos desejem fazer
parte dela. O último admitido foi o senhor Abade de Saint-Floran, Conselheiro do
Parlamento.
Crede, senhor Padre, que o espírito de Nosso Senhor não é um espírito de porte a
realizar as coisas para angariar estima, e me parece que o da Missão deve buscar sua
grandeza na humildade, e sua reputação no amor da própria abjeção.
Já se disse que é mais fácil compor e ditar do que explicar um autor. Se o é para
vós, ainda bem. Mas a razão me parece ir contra este modo de ver. Há muito maior
dificuldade em pensar as matérias, estudar os autores, compor na mente a doutrina e
traduzi-las pessoalmente por escrito, para depois ditá-la e explicá-la, do que
simplesmente explicá-la.
Disseram também que as coisas se aprendem escrevendo. Seria de se desejar que
o fosse. Mas os que escrevem na Sorbona ensejam a oportunidade de se verificar o
contrário. É verdade que um pequeno número [de assuntos se assimilam melhor, mas
outros muitos nem são assimilados, nem se fixam na memória3].
Objetar-se-á que os mestres se tornarão, por este meio, mais sábios, porque
estudarão as matérias a fundo e lerão vários autores para esse fim. Certo, mas eles não
poderão portanto fazer outra coisa a não ser estudar e compor textos. Sendo assim,
quem ministrará aos seminaristas instruções sobre assuntos de vida interior? Quem os
exercitará nas sagradas cerimônias? Quem os ensinará a dar catecismo e a pregar e
quem os ajudará a observar a regularidade? Será necessário muita gente para cada
seminário. Quem os sustentará e o que será das missões?
Dir-me-eis que tudo isso não deixa de ser feito em Annecy, por apenas uma
pessoa. É verdade. Mas nem todos os lugares e nem todos os missionários são iguais, e
acresce que estamos apenas começando.
Alega-se, enfim, o exemplo dos RR. PP. Jesuítas e da Universidade de Paris.
Mas não é o mesmo caso. Eles fazem profissão pública de ensinar as ciências e
precisam de reputação. No seminário, porém, a maior necessidade é de piedade e de
ciência mediana, com a inteligência do canto, das cerimônias, da pregação e da
catequese, mais do que muita doutrinação.
Que diremos das universidades da Espanha, onde não se sabe o que é ditar nas
aulas e se contentam com as explanações? Contudo, todos estão de acordo em que eles
são teólogos mais profundos do que os de outras partes.
22
Claude Tristan, Senhor de Maisoncelles, cônego, arcediago-mor e Vigário Geral de Beauvais, durante quarenta
anos. Sua recusa de assinar o formulário lhe valeu em 1666 a exclusão do coro e a privação dos frutos de sua
prebenda. Morreu a 29 de junho de 1692.
33
Completamos esta frase acompanhando Jean Bonnet, Superior Geral da Missão, o qual, na circular de 10 de
dezembro de 1727, cita a maior parte desta carta.
Além de tudo, se fôssemos introduzir agora este método de tudo compor e ditar,
veríeis em breve dizer-se que para termos homens capazes para isso, seria necessário
termos colégios e nos entregar ao ensino. Ó Jesus, senhor Padre! Se isto acontece, o que
seria do povo pobre?
Todas essas considerações fazem com que continuemos a explicar Biensfeld 4,
como tínhamos começado a fazê-lo, com a bênção de Deus, e me levam a suplicar-vos,
senhor Padre, a permanecer nesta prática, como também a submeter vossos
pensamentos às determinações que se tomarem aqui. Digo-vos, não somente em relação
a este ponto, mas em todas as coisas, e de nada fazer de importante sem me escrever e
sem antes receber a resposta.
Vede, senhor Padre, vós e eu nos deixamos levar demais por nossas opiniões.
Estais entretanto num lugar onde se impõe uma maravilhosa discrição e circunspecção.
Sempre ouvi dizer que os italianos são o povo mais cauteloso do mundo e que mais
desconfiam das pessoas muito apressadas. A discrição, a paciência e a mansidão
conseguem tudo com eles, com o tempo. E como sabem que nós franceses vamos
depressa demais, deixam-nos muito tempo no meio da rua, sem nos dar atenção.
Em nome de Deus, senhor Padre, preste atenção nisso. Atenção também para
jamais passar por cima das ordens que receberdes de nós, como fizestes com relação ao
Padre Thévenin. Com que tranquilidade de consciência poderíeis, senhor Padre, ficar
com o que eu enviava para ele? Dizeis que é um maluco e que pediu esmola pelo
caminho e gastou pouco. Que o seja. Mas deveríeis ter refletido que eu tinha alguma
razão particular para agir assim e pensar que talvez esse dinheiro não era daqui; como
de fato não é. Em nome de Deus, senhor Padre, prestai atenção nisso e convençamo-nos
de que estaremos fazendo sempre a vontade de Deus, e de que Ele fará a nossa, quando
fizermos a de nossos superiores. Cairemos em milhares de inconvenientes e desordens,
se procedermos de outra forma.
Escrevei-me sobre todas as coisas e vos prometo dar a resposta por todos os
portadores ordinários, ou pelo menos de 15 em 15 dias. E o que tiverdes de me
informar, seja enviado a mim, pessoalmente, por favor.
Além das cartas que escrevererdes sobre assuntos particulares, escrever-me-eis
uma outra que eu possa mostrar aos coirmãos.
Além disto, é bom que envieis uma carta ao senhor Montmaur, referendário, que
nos deu assistência nessa ocasião. Se a coisa tiver êxito, temos motivo para esperar que
nos continuará sua caridade. Vossa carta se empenhe em agradecer-lhe e lhe peça leve a
bem que lhe presteis conta do estado de vossos negócios, de tempos a tempos.
Será conveniente também escrever de vez em quando à Madame Duquesa de
Aiguillon e à Madame Presidente de Herse, que nos fizeram também caridade, nessa
ocasião. Mas não faleis de umas ou outras pessoas a quem quer que seja, por favor, e
enviai-me vossas cartas abertas.
Veja, senhor Padre, escrevi-vos sobre muitas coisas. Mas a quem poderia eu
falar com toda simplicidade e com total confiança, a não ser a um outro eu mesmo, a
44
Pierre Biensfeld, nascido em Biensfeld (Luxemburgo) por volta de 1540, morreu de peste a 24 de novembro de
1598. Deixou várias obras de teologia e direito canônico. São Vicente tem em vista sem dúvida seu Enchiridion
Theologiae Pastoralis, editado em Treves em 1591 e em 1602 e depois em Douai em 1630 e 1636, com notas de
François Sylvius. Esta obra mereceu os elogios do sínodo reunido em Malines, em 1607.
quem quero bem, mais do que a mim mesmo? Oh! Com certeza, abrir-vos-ei sempre
meu coração e não reservarei coisa alguma ao vos falar, porque conheço o fundo do
vosso coração e a caridade que Nosso Senhor vos inspirou para comigo.
Sou, no amor do mesmo Senhor, vosso e de vossa comunidade, que abraço em
espírito, prostrado aos vossos pés, senhor Padre, muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

SEGUNDA REDAÇÃO

Paris, 18 de março de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Bendito seja Deus por me parecer que chegastes enfim a Roma e praza a sua
divina bondade que assim tenha sido, para sua maior glória e vos conserve em perfeita
saúde! Suplico-vos, senhor Padre, fazer o que puderdes para isso e, com esse fim,
procurar uma casa em lugar de clima sadio e até mesmo de ser um pouco supersticioso
na observância dos tempos em que o povo julga perigoso sair de Roma e voltar para a
dormida. Perdemos aí o Padre Lebreton por faltar a isso.
Saldei vossas letras de câmbio de Lyon, exceto a de mil libras do senhor
Morand, por ter tido conhecimento dela há apenas dois dias. É bom não tomar dinheiro
emprestado em Roma, sem me avisar e aguardar a minha resposta, a não ser para a
alimentação.
Consultamos com muita seriedade sete coirmãos da Companhia sobre a questão
de ditar textos nas aulas. Cinco são de parecer negativo. Continuaremos assim a explicar
um autor, sem ditar textos, como começamos a fazer, com a bênção de Deus. Eis as
razões:
A primeira é tirada da própria ciência que se deseja transmitir, que será mais
segura, se for de um autor aprovado, do que de escritos de um particular.
A segunda vem da parte dos prelados e do público que darão preferência a um
autor aprovado e escolhido, mais do que aos escritos de um jovem que não tenha dado
prova de sua capacidade nos bancos das escolas.
A terceira resulta do interesse da Companhia. Ela dispõe de mais pessoas que
poderão explicar utilmente um autor, do que de gente que possa compor textos e ditá-
los. Poderá, por conseguinte, servir a Igreja em mais lugares e estar menos sujeita à
inveja.
A quarta vem do lado dos que forem ensinar, para os quais será mais fácil,
digam o que disserem, explicar do que compor e ditar, a não ser que tirem suas lições de
um autor, como por exemplo de Bonacina. Mas então, quando os alunos o descobrirem,
zombarão do professor ou o desprezarão. Quanto a tirá-las da própria cabeça, é preciso
para isso, ter a capacidade de um mestre de teologia. Além disso, seria preciso empregar
longo tempo para consultar os autores, e só fazer isto. Sendo assim, que meios teria para
explicar bem os textos, exigir dos alunos que os repitam, velar pela vida espiritual e
todos os outros exercícios do seminário? Se acaso fizestes tudo isto, nem todos são
dotados dessa força, e talvez ela vos venha a faltar com o tempo. Além do mais, se os
professores ministrarem as mesmas lições para a segunda turma de seminaristas, dirão
que só aprendem a mesma canção. E então, que diferença haveria entre fazer isso e
utilizar sempre um mesmo autor? Mas se quiserem escrever sempre textos novos, seria
necessário nada mais fazer a não ser isso.
A quinta razão se deduz da parte dos seminaristas. Eles são sábios ou ignorantes.
Se forem sábios, não entrarão no seminário para aprender a moral, mas antes, para se
tornarem melhores e aprenderem as outras coisas que nele se ensinam, como fazem os
bacharéis em teologia entre os ordinandos e os doutores que participam da assembleia
dos eclesiásticos de São Lázaro, na qual fazem profissão de tanta humildade e
simplicidade, nas matérias que expõem. Se forem ignorantes, meu Deus! senhor Padre,
de que servirão os textos escritos?
Eis, senhor Padre, os motivos pelos quais tomamos a decisão que acabo de vos
comunicar, a de explicar um autor. Acrescento a resposta às objeções que levanta a carta
escrita ao Padre Soufliers.
Dizem que os seminaristas não terão um bom conceito do seu professor e serão
tentados a deixar o seminário, se não lhes derem textos por escrito. Ora, seria verdade,
responderíamos, se o seminário não oferecesse outras motivações a não ser a da ciência
e supondo-se que todos os seminaristas fossem sábios. Nele porém há o atrativo da
piedade, do canto, das cerimônias, da catequese, da pregação e enfim o da boa reputação
dos que por ele passaram, preferidos para os ofícios, nos currículos e nos benefícios. O
senhor penitenciário já lança os olhos sobre os nossos, para empregá-los nos mosteiros e
semelhantes ofícios.
A terceira objeção5 diz que é mais fácil compor e ditar textos do que interpretar
um autor e cobrar a repetição dele. Parece-me isto um paradoxo, pois, no primeiro caso
é necessário estudar, ler os autores, compor, ditar e explicar. No segundo, apenas
estudar, explicar e cobrar o aprendizado.
A quarta objeção é que se aprende escrevendo. Admito, quando se trata de
guardar na memória pouca coisa. Mas quando há muita matéria, a experiência mostra o
contrário, como na Sorbona, onde os que só têm textos escritos são tão ignorantes dos
assuntos como aqueles que não tiveram acesso a nenhum texto escrito.
Dizem mais que, por este meio, os professores se tornarão mais sábios, porque
estudarão a matéria a fundo e lerão vários autores. Concordo. Mas não poderão fazer
outra coisa a não ser estudar, compor e ditar. Sendo assim, quem ensinará a piedade, o
canto, as cerimônias? Quem ensinará como dar catequese, como pregar? Seriam quase
necessárias tantas pessoas quantos são os diversos ofícios em cada seminário. Onde
encontraremos tanta gente e os fundos para mantê-la? Se se responde que dão conta de
tudo isso em Annecy, direi, como acima, que isso é bom para aquele lugar e como um
início, mas o trabalho com os ordinandos nos faz experimentar aqui o contrário.

55
Esta objeção é na realidade a segunda.
Objeta-se, enfim, que é este o uso dos RR. PP. Jesuítas e das universidades.
Distingo entre as universidades. Não se dita em toda a Espanha, onde há tão grandes
teólogos. E depois, não é o mesmo caso. Essas instituições, na França, fazem profissão
de ensinar as letras.
Asseguro-vos, senhor Padre, que, se entrarmos neste espírito, vereis em breve
propostas, na Companhia, de que será preciso assumir colégios e ensino público, a fim
de ter homens mais sábios para ensinar esses seminaristas. Se fosse assim, meu Deus!
senhor Padre, que seria do pobre povo do [campo 6] e em que tipo de espírito
entraríamos, querendo nos emparelhar com estas grandes instituições? Onde estaria a
santa humildade, na qual foi do agrado de Deus conceber, gerar e educar esta pequena
Companhia, até o presente?
Posto tudo isto, senhor Padre, em nome de Deus, nunca mais façais esta
proposta. Sede firmemente fiel a todas as decisões tomadas aqui, sobre todos os
assuntos. Nada façais sem nos escrever, nem antes de receber nossa resposta. Digo,
nada que tenha alguma importância. Lembrai-vos, por favor, do que vos escrevi em
Annecy.
Tenho muito a vos dizer sobre o que fizestes a respeito desse bom padre do
Delfinado. Fica para outra vez, se Deus quiser.
Escrevei-nos, com frequência, e, de três em três meses, ao Senhor de Montmaur,
referendário, que nos ajuda em vosso sustento, e às Madames Duquesas de Aiguillon e
de Herse, também.
Escrever-nos-eis, a nós, pessoalmente, uma carta fazendo menção das coisas
reservadas e uma outra que se possa mostrar aos outros. Quanto às cartas ao Senhor de
Montmaur e às Madames, serão para agradecer-lhes sua assistência, certificá-los de
vossas preces, dizer-lhes, resumidamente o estado da comunidade, o que se pode
esperar a respeito dos ordinandos, rogando-lhes continuem com a boa vontade de que
dão mostras para com esse estabelecimento. Nenhum deles deseja que se propague a
caridade que nos têm feito.
Espero escrever-vos de 15 em 15 dias e, talvez, a cada portador ordinário.
Quando me escreverdes, e a coisa o exigir, escrevereis, por favor, tudo a mim, não a
outros, para mo dizerem.
Eis tudo que tenho a vos dizer no presente. Resta-me abraçar vossa querida
comunidade. Como faço, prostrado em espírito a seus pés e aos vossos. Sou, no amor de
Nosso Senhor e de sua Santa Mãe, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente
servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

576. – A JACQUES BOUDET

66
Texto original: Companhia. Evidentemente, trata-se de uma distração. No francês, “Compagnie” (Companhia) por
“Campagnie” (Campo).
.
Carta 576. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
São Lázaro, 25 de março de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Suplico-vos muito humildemente, senhor Padre, voltar para São Lázaro, logo
que receberdes a presente carta. Temos aqui outra missão para vós e vos aguardamos
com afeição.
Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Boudet, padre da Missão, em Fontaine1.

577. – BERNARDO PRÉVOST, SENHOR DE SAINT-CYR-LES-COLONS1, A SÃO


VICENTE

O zelo dos vossos padres, unido ao exemplo de sua piedade, operou tal mudança
de vida nos meus camponeses que os vizinhos quase não os reconhecem. Quanto a mim,
confesso que não os reconheço mais e não consigo tirar de mim a persuasão de que
Deus me enviou uma nova colônia de pessoal para povoar minha aldeia. Vossos padres
encontraram apenas espíritos rudes, cuja transformação só seria possível com a graça
que acompanha vossos obreiros, especialmente estes daqui, que tivestes a bondade de
enviar para a conversão deste povo e a minha. É fruto da misericórdia de Deus e da
conduta de vossa prudência enviar-nos homens conformes com as nossas necessidades.
Depois dos agradecimentos que vos faço, só nos resta oferecer a Deus ardentes
preces, para que cumule de bênçãos vossa Companhia, que estimo ser hoje na sua
Igreja uma das mais úteis à sua glória. Fico, contudo, no temor de que esse pobre povo,
se não tiver um bom pastor que o mantenha nas boas resoluções tomadas nas missões,
que lhe foram tão úteis, venha a cair facilmente no pecado da omissão, esquecendo ou
negligenciando a prática do que lhe foi tão judiciosamente ensinado. Já que não
quisestes dar-lhe um pároco, creio que, tendo-o engendrado de novo em Nosso Senhor,
sois obrigado ao menos a conseguir-lhe algum com vossas orações, o que vos suplico
de todo meu coração.

11
Fontaine- Essarts.
.
Carta 577. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, §VII, 1ª ed., p. 45.
11
Localidade de Yonne. Bernardo Prévost era Conselheiro do Grande Conselho.
578. – MADAME DE SAINT-CYR-LES-COLONS1 A SÃO VICENTE

1642.

Embora me reconheça incapaz de vos agradecer dignamente por tanta honra e


tantos benefícios recebidos de vós por nossa paróquia, julgo que não posso ocultar esta
verdade: depois de Deus, sois de algum modo nosso salvador, por meio desses bons
padres que nos enviastes e que fizeram maravilhas neste lugar. Conquistaram de tal
modo a afeição do Senhor de Saint-Cyr que temo não esteja ele doente por se ver tão
longe deles. Quanto a mim, não posso dizer-vos o sentimento que experimento por
causa disto. Sinto-me por demais triste para vos poder dizer outra coisa.

579. – PIERRE DE NIVELLE, BISPO DE LUÇON, A SÃO VICENTE

1642.

Se for do agrado de Deus que o Instituto dos padres de vossa Congregação


continue por muito tempo em sua Igreja, ela deve esperar dele numerosos e excelentes
frutos. A diocese de Luçon, em cujo território trabalham, há três ou quatro anos, sob
vossas ordens, já recebeu frutos notáveis, particularmente Luçon, onde sua missão foi
muito frutuosa. Sou infinitamente grato ao senhor Cardeal Richelieu por no-los ter
conseguido, e a vós, senhor Padre, por no-los ter enviado. O superior deles, sobretudo 1,
trabalha incansavelmente com admirável zelo. Ele tem talentos muito apropriados ao
seu ministério, e seu zelo o torna estimado por todos. Em tudo é digno de louvor, a não
ser no excesso de trabalhos, se é que pode haver excesso nos trabalhos empreendidos
para conquistar almas para Deus.

580. – A BERNARDO CODOING

São Lázaro, 01 de abril de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Escrevo-vos estas linhas com grande pressa. Recebi vossas duas cartas de
Marselha e saldei a letra de câmbio.
.
Carta 578. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, § VII, 1ª ed., p. 46.
11
Maria de Moncy, filha de Claude de Moncy, auditor de contas e esposa de Bernardo Prévost.
.
Carta 579. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, § VIII, 1ª ed., p. 50.
11
Jacques Chiroye.
.
Carta 580. – Original comunicado pelo senhor Guy de Canssagnac.
Tínhamos entrado em acordo, sobre a união e suas condições, com o Padre
Authier1, há quatro ou cinco anos. Voltando da Provença, comunicou-me que os seus
padres2 desaprovavam a coisa. Se voltaram atrás e vos propuseram as condições, podeis
estar certo de que estaremos prontos para fazer o que for possível razoavelmente.
Relatar-me-eis, por obséquio, as propostas que vos fizeram e quem foi o proponente.
Examinaremos com isso a questão diante de Deus e vos escreveremos.
Não deixeis, entretanto, de proceder no empenho pelo nosso estabelecimento, na
linha das diligências de nosso bom Padre Lebreton, sem vos comprometer com nada.
Suplico-vos, senhor Padre, em nome de Nosso Senhor J. C., desconfiar do ímpeto
ardoroso da natureza, na questão sobre a qual me escreveis. O espírito de Deus caminha
suave e humildemente. Lembrai-vos de que vós e eu somos sujeitos a milhares de
impulsos da natureza. No início do projeto da Missão, eu me encontrava numa contínua
aflição de espírito. Isto me fez desconfiar de que a coisa poderia vir da natureza ou do

11
Cristóvão d’Authier de Sisgau, nascido em Marselha, a 06 de abril de 1609, obteve, jovem ainda, um benefício na
Abadia de São Vítor. Foi ordenado padre, em junho de 1633, e recebeu, alguns dias depois, o capelo de doutor. Em
1634, o Arcebispo de Aix lhe confiou, a ele e aos que se uniram a ele para pregar missões, a capela de Notre-Dame
de Beauvesez. No ano seguinte, ele aprovava o novo Instituto com o título de Congregação dos Clérigos da Missão,
que mudou em 1638 pelo de Congregação dos Missionários do Clero. Os Missionários do Clero se estabeleceram em
Brignole e em Marselha e foram chamados em Valença (1639) para dirigir o seminário dos ordinandos. Em Senlis,
confiaram-lhes a paróquia Sainte-Geneviève (1640). Urbano VIII reconheceu esta sociedade pelo breve de 04 de
junho de 1644, e Inocêncio X mudou o seu nome, a 20 de novembro de 1647, para o de Congregação do Santo
Sacramento para a direção das Missões e dos Seminários. Seus membros, desde então, foram chamados de Padres
Missionários da Congregação do Santo Sacramento. Cristóvão d’Authier foi nomeado, em 1644, reitor dos dois
colégios apostólicos de Avinhão, e depois bispo titular de Belém. Foi sagrado em Roma, a 26 de março de 1651.
Ficou nessa cidade durante os anos de 1652, 1653 e parte do ano de 1654, e voltou para a França, onde continuou a
dirigir sua Congregação. Morreu em Valência, a 17 de setembro de 1667.
Sobre as tentativas de união de seu Instituto com o de São Vicente, eis o que lemos nos Anais dos Padres
do Santo Sacramento (Ms. conservado na biblioteca dos Padres Beneditinos de Marselha, antes de sua expulsão): “Na
volta da primeira viagem do Padre de Sisgau a Roma, quando tinha sua Congregação apenas na mente, algumas
pessoas de piedade lhe inspiraram ir a Paris para ver a possibilidade de se unir a Vicente de Paulo, que acabava de
erigir uma, quase semelhante, com o nome de Missão. Foi então, por este motivo, permanecer alguns meses, como
desconhecido, em sua casa de Paris chamada Bons-Enfants, para ver se poderiam juntos entrar em acordo e se os seus
fins eram semelhantes. Não tendo reconhecido naquela ocasião a vontade de Deus, começaram novas tentativas este
ano (1642), no tempo de uma jovem religiosa de extraordinária virtude e cuja santidade mereceu, depois de sua
morte, que o R. P. de la Rivière, da Ordem dos Meninos, lhe publicasse a vida. Esta piedosa religiosa era da cidade de
Valença e chamavam-na comumente de Irmã Maria. Mostrou ao Padre d’Authier que ele devia unir-se a São Vicente
de Paulo e a fazer destes dois corpos um só, para melhor realizar na Igreja as santas intenções que Deus lhes
inspirava. Falou-lhe com tanto vigor desta união e dos sinais de que Deus o queria, que o Padre d’Authier, que fazia
profissão de desapego, se rendeu a esta proposta. A Providência, para melhor provar seu desinteresse, permitiu que,
neste mesmo tempo, quatro ou cinco missionários do Padre Vicente passassem por Valência, voltando de uma missão
que acabavam de pregar, e o fossem saudar no seminário, para lhe falar sobre isso. O Padre d’Authier os recebeu com
toda amizade possível, e depois de conversar com o chefe do grupo, chamado Codoing, lhe deu a conhecer que não
seria por ele que esta união não fosse levada a cabo, pois que nela reconheceu a maior glória de Deus e a utilidade da
Igreja. Chegando a Paris, o Padre Codoing comunicou os entendimentos ao Padre Vicente, o qual escreveu ao Padre
de Sisgau uma carta, de 22 de abril de 1642, para certificá-lo de que não estava menos disposto do que ele a essa
união. O Padre d’Authier foi a Paris, algum tempo depois, para este assunto. O que deteve a conclusão deste negócio
foi que o Padre Vicente não queria embaraçar-se com a responsabilidade das paróquias e nem dos seminários de
nossa Congregação, nem permitir que os missionários usassem punhos e golas semelhantes aos dos eclesiásticos que
viviam no mundo”.
Esta narrativa parece exata, salvo em dois pontos: Bernardo Codoing não foi a Paris e os obstáculos ao
projeto provinham menos dos punhos e golas do que das exigências do Padre d’Authier a respeito da fusão das regras
e constituições, e de sua pretensão de se tornar coadjutor de São Vicente, com futura sucessão.
As duas Congregações trabalharam em conjunto, em 1643, nas galeras de Marselha. Houve depois entre
elas ligeiros desencontros. Os padres do senhor Padre d’Authier tentaram impedir o estabelecimento dos padres da
Missão em Roma. Por outro lado, a semelhança dos nomes tendo dado ocasião a desagradáveis equívocos, São
Vicente fez algumas tentativas no sentido de obter que os missionários do Santo Sacramento não usassem mais o
título de missionários.
A vida de Cristóvão d’Authier de Sisgau foi escrita por Nicolau Borelli, padre de sua Congregação.
22
Os padres de Cristóvão d’Authier.
espírito maligno. Fiz um retiro espiritual expressamente sobre isso, em Soissons, para
que Deus me livrasse do espírito de complacência e do afobamento que me ocupavam
neste negócio. E aprouve a Deus escutar-me; por sua misericórdia, libertou-me de um e
de outro, e concedeu-me a graça de passar para disposições de espírito contrárias. Penso
que, se Deus concede alguma bênção à Missão e que eu lhe seja menos motivo de
escândalo, devo atribuí-lo, depois de Deus, a isso. Desejo permanecer na prática de nada
concluir nem empreender, enquanto estiver nestes ardores de esperança, em vista de
grandes bens.
Termino, entretanto, saudando a pequena comunidade e sou vosso servo,

Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, padre da Missão, em Roma3.

581. – A JACQUES CHIROYE

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Estou enviando o Padre Dehorgny para vos visitar. Espero de vossa bondade o
recebais com toda a afeição e ternura que Nosso Senhor vos deu por todos da
Companhia. Nada vos direi de sua probidade, do zelo e da experiência que tem acerca
de tudo que diz respeito ao nosso Instituto, nem das outras virtudes que o recomendam,
pois vos são bastante conhecidas. Foi o que me impeliu a vo-lo enviar, não podendo eu
mesmo ir pessoalmente estar convosco. Confio na graça que Nosso Senhor lhe
concedeu, que sua visita vos será motivo de consolação e edificação. Estarei, portanto,
convosco, na pessoa dele, e vos abraçarei com ele, no amor de Nosso Senhor. Peço-lhe
com todo coração vos conceda as disposições de São Zacarias e Santa Isabel para
receber as graças que a visita da Santa Virgem lhes levou. E para o Padre Dehorgny,
peço a Nosso Senhor animá-lo do espírito com que encheu sua Santa Mãe, de tal sorte
que tudo que ele vos disser, vós o recebais como saindo de seus lábios, ou antes, do seu
coração santíssimo e todo divino, no qual sou, plenamente, senhor Padre, vosso muito
humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

33
Bernardo Codoing ainda não estava em Roma quando São Vicente escrevia esta carta. Chegou lá no dia 08 de abril.

.
Carta 581. – Dossiê de Turim, original.
19 de abril1.

Destinatário: Ao senhor Padre Chiroye, superior da Missão, em Luçon.

582. – A BERNARDO CODOING, PADRE DA MISSÃO, EM ROMA

Paris, 25 de abril de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Estas linhas têm apenas duas finalidades. Uma é a de enviar-vos duas cartas, das
quais uma é para vós e a outra para o Senhor de Montereil, secretário do senhor
Embaixador1. Trata-se do senhor Cônego de Saint-Aignan, a quem devemos muitos
favores por nos ter resignado um priorado de 2000 libras de renda e cuida da resignação
de um outro que vale mais de 400 libras, em favor dos ordinandos 2. Enviar-vos-ei, no
primeiro dia que puder, o consentimento dos abades de que eles dependem, dos quais
um é Sua Eminência3.
Esse Cônego de Saint-Aignan assumiu o encargo de um mosteiro de religiosas
desta diocese, no qual aconteceram grandes abominações 4. O rei o tomou dos
franciscanos e o colocou sob a jurisdição do senhor Arcebispo de Paris. O Padre
Lebreton trabalhou muito nisso. Encontrareis relatórios dele entre os seus papéis. Peço-
vos agir de acordo com eles. Não se pode imaginar quanto este negócio é importante.
Peço-vos escrever-me a respeito, como também para ele (o senhor Arcebispo de Paris) e
me enviar suas cartas abertas.
Além disso, peço-vos obter da Penitenciária uma dispensa de entrar em religião
para uma pessoa, segundo o relatório que vos envio. Chamam a isso de um discreto
viro5. Eu vo-lo recomendo com toda a afeição que me é possível. Trata-se de uma boa
serva de Deus6.
O Padre Authier chamou o mais íntimo e o mais concorde com seu espírito, pelo
que dizem, entre os eclesiásticos de Senlis7, para enviá-lo a Roma. O superior de Senlis

11
Uma certa mão, que não a do secretário, escreveu no dorso da carta: 19 de abril de 1640. E é a data seguida pelo
registro 2, p. 98. Não nos é possível adotá-la, pois Jacques Chiroye só foi nomeado superior do estabelecimento de
Luçon mais tarde, a 06 de outubro de 1640 (Cf. carta 488). Jean Dehorgny foi enviado em viagem de visitas para o
lado de Lorena, em 1640. Visitou talvez outras casas no correr do ano de 1641 ou 1642. Em abril de 1643, partira
para a Itália, de onde só voltou definitivamente em dezembro de 1653.
.
Carta 582. – C. aut. – Original em Paris, com as Filhas da Caridade da Rua Pierre-Nicole, 9.
11
Francisco Duval, Marquês de Fonteney-Mareuil.
22
Talvez os priorados da diocese de Langres, de que se trata em outras cartas.
33
O Cardeal Richelieu.
44
O mosteiro de Saint-Eutrope (Cf. carta 594).
55
Provável expressão da jurisprudência eclesiástica do tempo, hoje fora de uso, ao que nos consta, indicativa de
discrição e segredo.
66
Esta pessoa fizera voto de entrar no Carmelo.
77
Jean-Jacques Lafon. Morreu em Senlis, pároco de Sainte-Geneviève.
nos enviou um jovem eclesiástico de sua casa para os exercícios dos ordinandos e
mandou-me dizer que estaria comigo em breve, para falar de um negócio importante
que exigiria tempo de minha parte, e isto, antes de sua partida para uma longa viagem.
Respondi-lhe que seria bem-vindo e disporíamos do tempo que lhe aprouvesse.
Comunicou-me depois que não faria mais a viagem e não me disse uma palavra sobre o
negócio de que trataria comigo. Isto não me impediu de escrever ao Padre Authier que
eu recebera com alegria a disponibilidade para a união, acontecida em vossa entrevista,
da qual me escreveis, e que ele me achará sempre disposto para isso.
Escrevi a mesma coisa à Irmã Maria 8 e a sua companheira que tiveram a
bondade de me escrever sobre o caso. Não se sabe se esta mudança do Padre Le Bégue,
superior da casa deles em Senlis, não procede do fato de ele ter visto a possibilidade de
se estabelecer definitivamente em Senlis9, dada a dificuldade que fizemos, junto ao
senhor Bispo de Senlis, de aceitar a melhor paróquia de sua diocese 1010, que nos oferece
para nela nos estabelecer. Falou-me disso com tanto ardor, a ponto de afirmar que se
poria de joelhos para mo suplicar, se dependesse apenas disso.
Ora, nossa dificuldade no caso está exatamente na que sempre fizemos, como
sabeis, em assumir paróquias, exceto a de Richelieu 1111. Tudo isso vos faz ver que é
conveniente usar de discrição nesse negócio.
Escrevi ao Padre Germano para partir na primeira oportunidade.
Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

583. – A MADRE FRANCISCA ELISABETH PHELIPPEAUX

São Lázaro, 01 de maio de [16421].

Minha mui cara Madre sabe que sou todo de Santa Maria e dela. Mas não sou
seu pai espiritual, a não ser na medida em que é da casa de Paris. Além do mais, temo
muito não estar de volta de uma viagem que me proponho fazer, com a ajuda de Deus,
se um pequeno incômodo meu mo permitir.
Se estiver de volta, ou se não fizer a viagem, e minha cara Madre tiver permissão
para isso, tratarei de lhe prestar este pequeno serviço. E Deus sabe com que coração o
farei e quanto sou, no amor de Nosso Senhor, minha cara Madre, seu muito humilde e
obediente servo,

88
Maria de Valência.
99
Nicolau Sanguin.
1010
A paróquia Sainte-Geneviève de Senlis. Ela foi dada aos padres de Cristóvão d’Authier.
1111
Foi preciso toda a autoridade do Cardeal Richelieu para fazê-lo aceitá-la.
.
Carta 583. – Original comunicado pelo senhor Barão de Bich, de Aosta.
11
Esta carta deve ser aproximada, parece, da carta 585.
Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatária: A Senhora Madre Superiora de Santa Maria de Saint-Denis, em


Saint-Denis.

584. – UM ECLESIÁSTICO DA CONFERÊNCIA DE PONTOISE A SÃO VICENTE

Maio de 1642.

A pequena companhia da Conferência dos Eclesiásticos de Pontoise obrigou-me


a escrever-vos, para testemunhar a satisfação que todos sentimos com nossa pequena
assembleia. Preciso confessar-vos que de início não sabíamos ainda o que era. Mas
agora saboreamos todos os dias, cada vez mais, as graças e bênçãos que apraz Nosso
Senhor derramar sobre ela. Vemos todos quanto proveito traz para cada um em
particular e para todo corpo da Igreja. Depois de Deus, senhor Padre, devemos a vós
toda gratidão por nos ter recebido como associados à vossa bondosa e virtuosa
Conferência de Paris. Recebemos de vós as primeiras instruções para esta pequena
Conferência. Serviram-nos de sementes para produzir vários frutos que todos os dias
nela se apresentam para fazer, e aos quais Deus acrescenta crescimento e bênção.
Pedimo-vos a graça, já que ainda somos crianças na virtude, e ainda não temos
força para nos sustentar e nos conduzir, de ter a bondade de nos conceder, vez por
outra, a visita de algum dos eclesiásticos de vossa Conferência de Paris, a fim de nos
ensinar a caminhar com mais solidez nos exercícios que começamos, todos com grande
alento. Pomos assim a descoberto nossas fraquezas, para que nos concedais a graça de
quem nos prestar vossa assistência.

585. – A MADRE FRANCISCA ELISABETH PHELIPPEAUX

Paris, 08 de maio de 1642.

Querida Madre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi vossa carta com uma ternura tão sensível que não vo-la posso exprimir.
Vejo nela a perfeita efusão do coração de nosso bem-aventurado Pai e de nossa digna
Madre. Não fosse a dificuldade que encontro para o que me propondes 1, que chega a ser

.
Carta 584. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. III, sec. V, p. 266.
.
Carta 585. – C. aut. – Original na Bibl. Nac., n. a. f. 22.819.
11
Esta proposta é, ao que parece, aquela à qual o Santo responde, na carta 583.
impossibilidade, dedicar-me-ia a vós, à maneira como vós e vossa santa comunidade me
faz a caridade de desejar. O embaraço em que estou e que aumenta todos os dias, as
indisposições que me acometem, com minha idade, me levam a suplicar-vos, muito
humildemente, minha cara Madre, escusar-me por ser indigno da graça que vós e vossa
santa comunidade me ofereceis, garantindo-vos que, embora não vos sirva da maneira
como propondes, fá-lo-ei de outra forma que me ordenardes.
Sou vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A minha R. Madre Superiora da Visitação Santa Maria, em Saint-


Denis.

586. – AO SENHOR N******1

[Entre 1640 e 16482].

Excelentíssimo Senhor,

Nosso Senhor dirigiu-se a vós para a subsistência da pobre nobreza de Lorena e


sua divina bondade abençoou a caridade que vos concedeu em favor deles.
Dirigiu-se ainda a vós para dizer que não há um soldo para o próximo mês e que,
se vossa providência não lançar olhos de compaixão sobre eles, será necessário, com
toda certeza, que essa pobre gente...

587. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[Perto de maio de 16421].

Senhor Padre,

.
Carta 586. – Reg. I, fº 70 – O copista nota que o original era da mão de São Vicente.
***

11
Muito provavelmente o Duque de Liancourt, que fazia parte da sociedade formada para socorrer a pobre nobreza
lorenense, refugiada em Paris e que tinha o direito ao título monsenhor (traduzimos por Excelentíssimo Senhor – N.
T.)
22
A obra da nobreza de Lorena, fundada em 1640, durou cerca de oito anos (Abelly, op. cit., 1. I, cap. XXXV, p.
168).
.
Carta 587. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta precede de bem pouco tempo a carta que Luísa de Marillac dirigia, a 05 de julho de 1642, a Jeanne
Lepeintre (Cartas de Luísa de Marillac, l. 64).
Madame Belot prevê que a questão da irmã Ana será desgastante e teme que
haja processo, porque parece que o senhor du Ruisseau e os principais moradores 2
querem que ela fique lá. Ela acredita que o seu irmão, executor do testamento da
pessoa que fez a fundação, e seus herdeiros se colocarão contra. E que este ponto de
honra os levará a se desentenderem uns com os outros. Não vos seria possível, senhor
Padre, mandar alguém falar com o senhor pároco, ao qual ela disse que eu não achava
bom fosse ele a sua casa e que ela falasse com ele e com o senhor du Ruisseau? Não
creio queiram eles fazer algo contra o que lhes propuserdes. Tenho um grande desgosto
de não ter desconfiado suficientemente deste lastimável espírito.
Nossa Irmã Ana, da paróquia São Sulpício, também lorenense, veio estar
comigo anteontem para me pedir a retirasse de lá, pelas seguintes razões: ela tem lá
dificuldades e contradições demais. É verdade que esses senhores que se imiscuem
nessa Caridade as menosprezam muito. Suspeito que esta Irmã de Fontenay lhe tenha
falado ou mandado falar algo, pois está empenhada em retirar de lá alguma outra com
ela.
Madame d’Humières3 está resolvida a esperar vossa disponibilidade para fazer
sua confissão. Disse-lhe que não estáveis passando bem. Ela não desiste de esperar que
possa ser um dos dias da próxima semana. Gostaria de poder ter certeza disso amanhã.
Dizei-me, por favor, o que devo fazer com nossa irmã Ana de São Sulpício.
Parece-me que ela tem muita pressa.
Somos muito felizes por vos ter dado o bom Deus um coração de pai para nos
tolerar, a mim, em particular, que sou, senhor Padre, vossa humilde filha e serva
agradecida,

L. de M.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

588. – A LUÍSA DE MARILLAC

[Por volta de maio de 16421].

Penso um pouco em enviar amanhã o senhor Padre du Coudray à Fontenay, para


ir estar com esta filha2 e, se for preciso, com o senhor pároco e o senhor Du Ruisseau.
Comecei esta tarde a tomar a tisana purgativa.

22
De Fonteney-aux-Roses (Seine). Embora as Filhas da Caridade se tenham estabelecido nesta localidade em 1642, o
ato de fundação data de 11 de novembro de 1650 (Arq. Nac. S 6.187). Um legado importante feito pelo senhor
Béguin para a fundação de duas irmãs consolidou a obra começada.
33
Provavelmente Isabel Phelippeaux, casada em julho de 1627 com Luís de Crevant, Marquês d’Humières.
.
Carta 588. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta responde à precedente. Foi escrita no lado reservado ao endereço.
22
Irmã Ana, de Fontenay.
Preciso de alguns dias para me purgar. Depois disso, veremos o dia em que
poderemos prestar esse pequeno serviço a essa senhora3.
Boa noite, Senhora. Sou v. s.

V. D.

589. – A BERNARDO CODOING, PADRE DA MISSÃO, EM ROMA

25 de maio de 1642.

Não posso explicar-vos a consolação que vossas duas cartas de deram, a não ser
vos dizendo que, desde que estou na Companhia, não me lembro ter recebido uma só,
tão profunda quanto esta. Chego a temer tê-la deixado ocupar-me o espírito por duas ou
três horas, diversas vezes, durante um quarto de hora, a cada vez. Ó senhor Padre, como
as abominações de minha vida me afligem à vista dessa misericórdia de Deus sobre a
Companhia1!
Aprovo inteiramente o que dissestes a Dom Ingoli sobre os poucos operários que
somos e a obrigação que temos para com nossos senhores bispos circa missiones
faciendas (a respeito de missões a se realizarem) e que isso nos tira, no presente, o meio
de nos prevalecer da graça que sua bondade nos oferece de mediar junto à sagrada
Congregação de Propaganda Fide (da Propagação da Fé) sua proteção para a
Companhia.
Penso, senhor Padre, que faríeis bem em não ir mais longe e conduzir vosso
modo de proceder junto dele sobre essa base. Certificai-o, como lhe disse pelo Padre
Lebreton, de que eu creio, uma vez que somente Sua Santidade pode enviar ad gentes
(para missões além-fronteiras), que todos os eclesiásticos são obrigados a obedecer-lhe,
quando os mandar partir para esse fim. A pequena Companhia foi educada nesta
disposição de partir com toda boa vontade, deixando tudo, quando aprouver a Sua
Santidade enviá-la a capite ad calcem (do primeiro ao último) para aquelas regiões.
Praza Deus, senhor Padre, nos torne dignos de empregar nossas vidas, como Nosso
Senhor, na salvação dessas pobres criaturas isoladas de qualquer assistência.
Trabalhai esse assunto segundo vossa prudência ordinária.

590. – UM PÁROCO DOS ARREDORES DE PARIS A SÃO VICENTE

1642.

33
Madame d’Humières.
.
Carta 589. – Reg. 2, pp. 33 e 76.
11
Termina aqui o primeiro fragmento.
.
Carta 590. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. IV, sec. IV, 1ª ed., p. 285.
Os frutos produzidos pelos que fazem convosco os exercícios do retiro espiritual
espalham por toda parte um tal odor, que despertam no espírito de muitos o desejo de
irem eles próprios colhê-los na árvore. Vendo assim um dos meus parentes próximos
nesta boa vontade, julguei não poder fazer melhor por ele do que vos suplicar,
humildemente, tenhais a bondade de recebê-lo, para fazer em vossa casa os exercícios
do retiro espiritual, do qual espera luz e graça para a conduta do resto de sua vida.

591. – OS ALMOTACÉIS DE LUNÉVILLE A SÃO VICENTE

1642.

Senhor Padre,

Desde os vários anos em que esta pobre cidade tem sido afligida pela peste, pela
guerra e pela fome, o que a reduziu à extrema carência em que se encontra, em vez de
conforto, só recebemos os rigores da parte dos credores e as crueldades dos soldados,
que levaram à força o pouco de pão que tínhamos. Desta sorte, parecia que o céu não
usava senão de severidade para conosco, quando um de vossos filhos em Nosso Senhor,
chegando aqui carregado de esmolas, suavizou generosamente o excesso de nossos
males e levantou nossa esperança na misericórdia do bom Deus.
Já que nossos pecados provocaram sua cólera, beijamos, humildemente a mão
que os pune, mas acolhemos também os efeitos de sua divina suavidade, com
extraordinários sentimentos de gratidão. Bendizemos os instrumentos de sua infinita
clemência, tanto os que nos aliviam com tão oportuna caridade, quanto os que no-la
procuram e distribuem, especialmente a vós, senhor Padre, que sabemos ser, depois de
Deus, o principal autor de tão grande bem.
Dizer-vos que tudo foi bem aplicado em favor deste pobre lugar, onde os mais
afortunados estão reduzidos a nada, é o que fará o missionário que nos enviastes, com
menos estresse próprio do que nós. Ele viu nossa desolação, e vos verei diante de Deus
a gratidão eterna que temos para convosco, por nos terdes socorrido nessa situação.

592. – A LUÍSA DE MARILLAC

[08 de junho de 16421].

.
Carta 591. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. XI, sec. I,1ª ed., p. 385.

.
Carta 592. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
A queda do forro do teto de que se trata aqui aconteceu em 1642, na véspera de Pentecostes (Cf. Cartas de Luísa de
Marillac, 1.64 e 102; conferência de 20 de junho de 1642 para as irmãs).
Meu Deus, Senhora, como fiquei pasmo, esta manhã, quando o Padre Portail me
relatou o acidente ocorrido em vossa casa. Comuniquei-o à Companhia2 e lhe disse o
que falou Nosso Senhor aos que o interrogavam a respeito dos que foram soterrados
pelas ruínas da queda da torre de Jericó. Não acontecera isso por causa dos pecados
daquelas pessoas, nem pelos dos seus pais e mães, mas para manifestar a glória de Deus.
Digo-vos a mesma coisa, com toda a certeza, Senhora. O acidente sobreveio não
por causa de vossos pecados, nem pelos de nossas caras Irmãs, mas para nos lembrar, a
nós que assim o entendemos, de que devemos viver tão santamente, que não sejamos
surpreendidos pela morte. Tendes, nessa oportunidade, um novo motivo para amar a
Deus, mais do que nunca, pois vos preservou como a pupila do seus olhos, num
acidente no qual ficaríeis esmagadas sob as ruínas, se Deus não tivesse desviado o
golpe, por sua amável providência. Rendemos graças a Deus por tudo.
Em breve, com a ajuda de Deus, espero ter a felicidade de vos ver aqui, se
vierdes para as vésperas, ou em vossa casa.
Envio-vos, entretanto, estas linhas, para vos saudar e vos dar bom dia, de
antemão.
Sou v. s.

V. D.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

593. – RESPOSTAS DE SÃO VICENTE A QUESTÕES COLOCADAS POR


LUÍSA DE MARRILAC

[Por volta de junho de 16421].

P. – Irmã Henriqueta deverá ir para Sedan antes de vosso regresso e devemos


chamar a Irmã Gillette2? Neste caso, teríamos de mandar duas para lá?
R. – Penso que sim.
P. – Se a Irmã Bárbara3 deve permanecer nos Galés, será necessário enviar
uma terceira Irmã, visto que a Irmã Bárbara está fraca e adoentada?
R. – Penso que seria bom. Dentro de poucos dias, bastarão duas. Os forçados
irão logo embora4.

22
São Vicente fez mais tarde diante de suas filhas o relato deste acidente (conferência de 13 de fevereiro de 1646).
Luísa de Marillac consignou por escrito as reflexões que lhe sobrevieram nessa ocasião (Pensamentos, p. 186).
.
Carta 593. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta foi escrita pouco tempo após a carta 587 e talvez na véspera da viagem de São Vicente a Richelieu, por
volta de 10 de junho. Entre cada questão, Luísa de Marillac deixou um espaço em branco para as respostas. São
Vicente preferiu escrevê-las nas margens das duas primeiras páginas. As iniciais P(pergunta) e R(resposta) foram
acrescentadas para tornar a carta mais inteligível.
22
Gillette Joly, irmã de Maria Joly.
33
Irmã Bárbara Angiboust.
44
Depois de algum tempo de permanência em Paris, dirigiram-se para Marselha.
P. – Será necessário conversar com o senhor Procurador Geral 5 a respeito da
proibição de sair, feita por ele à nossa Irmã Henriqueta?
R. – Sim.
P. – Não se poderia dar uma ordem para que nossas Irmãs de São Sulpício não
fiquem tão sobrecarregadas com a distribuição dos remédios, tendo de levá-los a
indivíduos que não são atendidos pela Caridade, recebendo ordem de cinco ou seis
pessoas? Isso, e mais o pouco caso que delas fazem, as contínuas suspeitas de que
padecem, as desanimam. Não haveria também algum meio de fazê-las mudar de
quarto?
R. – Farei com que Madame Duquesa6 fique ciente disso, na minha volta, a não
ser que prefirais falar-lhe vós mesma.
P. – Como farei para tirar de lá a Irmã Ana?
R. – Vós o vereis.
P. – Quando Madame Chanceler for a Fontenay, seria conveniente dizer-lhe
alguma coisa? E como falarei com a Irmã Ana? No tempo em que eu estiver no
Crianças Expostas, não seria melhor que ela fosse para lá, em vez de ficar em casa,
com perigo de aprontar ali alguma confusão?
R. – Será preciso relembrar esta viagem à Madame Chanceler e levar essa filha
para o Crianças Expostas.
P. – Quem colocar no lugar dela, Jeanne Lepeintre?
R. – Enviar Jeanne Lepeintre, etc.
P. – Deveríamos então falar-lhe do toucado? Se ela aceitar, com a condição de
poder usar uma touca, por causa de uma doença na vista, poder-lhe-á ser concedido
que use uma de estamenha preta? Ou trazemos a Irmã Perrette de Saint-Germain 7, por
causa do atrito com o pároco, do qual é preciso falar?
R. – Propor-lhe este tipo de toucado. Entretanto, não mexer tão cedo com Saint-
Germain.
P. – Como proceder com irmãs que, ao menor descontentamento, falam em ir
embora?
R. – Na primeira conferência que lhes fizer, trataremos de remediar a esse
defeito, se Deus quiser.
P. – Deverei falar com Madame Lhoste da necessidade que vamos ter do seu
quarto, caso venham para cá todas as crianças com suas amas? Ela não o ocupa, há
quase um mês, porque não mandaram colocar persianas nas janelas.
R. – Seria bom.
P. – Poderão as amas comprar ou alugar uma casa para as crianças, durante
vossa ausência?
R. – Como quiserem.
P. – Deveríamos reunir todas as Irmãs para que, conversando juntas,
familiarmente, se encorajem umas às outras e reconheçam as faltas que cometem, tanto

55
Blaise Méliand (1641-1650).
66
A Duquesa de Aiguillon.
77
Saint-Germain-em-Laye.
no serviço aos pobres, quanto no comportamento com as Damas, e na cordialidade
entre elas?
R. – Experimentai fazê-lo, se vos parece oportuno.
P. – Devemos, e quando, admitir as duas jovens que se apresentam,
especialmente a de Madame Henriqueta?
R. – Quando julgardes oportuno.
P. – O Crianças Expostas tem pão demais, no momento. Poderíamos pegar
alguns para nós, ou seria preciso falar antes com as Damas ou pelo menos com
Madame Duquesa?
R. – Falar com Madame Duquesa.
P. – Se as amas e as crianças vierem para cá, farão suas despesas à parte, ou
agiremos como em La Chapelle, para evitar reclamações sobre o que poderia ser
tirado por uns e por outros?
R. – Sou de opinião que façam as próprias despesas.
P. – Se for preciso algum conserto na lareira que o Padre Portail já viu,
poderemos mandar fazê-lo?
R. – Sim, se vos apraz. Mandaremos pagá-lo.
P. – A quem me dirigir, se surgir alguma dificuldade? No caso, seja ele avisado
para não condescender com os meus sentimentos ou desejo de melhorias, mas para
ater-se inteiramente à conduta de Deus, pela pessoa de nosso muito honrado Superior.
R. – Ao Padre Portail. Falarei com ele.
P. – O senhor Conde de Lannoy8 quer ter a certeza de que lhe será enviada a
ajuda solicitada.
R. – Tende a bondade de propô-lo a Madame Herse, pois me esqueci de falar-
lhe sobre isso.
P. – Madame de Beaufort 9 pergunta como comportar-se com os tesoureiros da
paróquia Santo Estêvão. Eles querem assistir, como corporação, à prestação de contas
da tesoureira e à eleição dos novos membros da Diretoria, ou, pelo menos, que seja
nomeado por eles um procurador da Caridade para assistir aos referidos atos.
R. – Ela fará bem em protelar a reunião até que esse tesoureiro tenha terminado
o seu tempo.
P. – Suplico-vos humildemente, senhor Padre, se for possível, tenha eu a honra
de falar convosco aqui em casa, para que todas as nossas Irmãs da casa recebam o
estímulo para procederem bem, mediante a felicidade de vossa santa bênção. Ficai
certo de que temos grande necessidade dela. Gostaria muito de saber qual a hora
melhor para vós. E também de que soubésseis quanta apreensão me causa vossa
viagem, a fim de que, diante de Deus, consoleis o coração de vossa pobre filha e muito
grata serva.

L. de M.

88
Charles de Lannoy, Governador de Montreuil-sur-Mer (Pas-de-Calais), falecido em 1649. Deixaram-no esperar
muito tempo. As irmãs só se estabeleceram em Montreuil em 1647.
99
Presidente da Confraria de Saint-Etienne-du-Mont, paróquia de Paris.
Tarde de terça-feira.

R. – Ao cair da noite, tratarei de ir até vossa casa. Mas vos digo, contudo, que
sois uma mulher de fé muito fraca e que sou vosso servo,

V. D.

Subscrições: Ao senhor Padre Vicente. – A Senhora Le Gras.

594. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ROMA

São Lázaro, 20 de junho de 1642.

Senhor Padre,

Julgo não ser conveniente que penseis, para o presente, na proposta de Saint-
Yves . Dou-vos os motivos.
1

O espírito desse país daí é reservado, contemporizador e ponderado. Ama e


estima as pessoas que vão piano piano (em marcha lenta, de pouco a pouco) e se
previnem ao extremo contra os que vão com pressa. Essa união teria como consequência
a impossibilidade, durante quatro anos, de manter a fidelidade ao nosso espírito.
Aqueles que governam têm aversão a toda sorte de uniões. O datário 2 disse, há algum
tempo, a um padre jesuíta, que conversava com ele sobre a união de um benefício:
“Senhor Padre, disse ele, não é justo molhar meu pão na xícara do vizinho”. Quanto a
nós, recusaram-nos a união de dois priorados em favor dos ordinandos3. Do lado de cá, a
dificuldade é a mesma, digo, daqueles que governam. A Congregação de São Luís
desencadearia uma tempestade contra vós.
Procuremos a glória de Deus. Ele fará nossos negócios. Agradecei, portanto, a
esses senhores, por favor, com todo reconhecimento possível. Tenho para com eles uma
gratidão tão amorosa que me é impossível vo-la exprimir. Ó senhor Padre, como peço
de coração a Deus os cumule de suas graças!
Ponde o nome na carta daquele que me escreveu.

.
Carta 594. – Pérmartin, op. cit., t. I, p. 408, carta 355. Ele teve em mãos o original que o senhor Charavay colocou à
venda.
11
Os bretões tinham obtido de Roma, há dois séculos, uma igreja paroquial e um hospital, que dedicaram a Saint-
Yves. Por falta de recursos, a Confraria Saint-Yves, administradora desse patrimônio, uniu-se mais tarde à Confraria
de São Luís de França, da qual dependiam a igreja e o hospital desse nome. Desta fusão nasceu a Congregação de
São Luís e Saint-Yves. O hospital Saint-Yves não tardou a ser supresso. A paróquia continuou a existir até 1824, sob a
direção de um titular, nomeado pela Congregação de São Luís. A igreja Saint-Yves, situada no Campo de Marte, era
a antiga igreja de Santo André de Monterariis que remontava no mínimo ao século XI... Bernardo Codoing teria
desejado que a paróquia Saint-Yves fosse desligada de São Luis e atribuída à Congregação da Missão.
22
É na dataria de Roma que se emitem as expedições para os benefícios consistoriais, as dispensas e outros atos do
mesmo gênero. O datário é o primeiro oficial.
33
Os dois priorados de Langres.
O senhor Abade de Saint-Denis, capelão da rainha, pertencente a nossa
Conferência de São Lázaro, é um dos mais capazes e virtuosos eclesiásticos desse
reino4, foi nomeado Bispo de Puy, na Auvérnia, há sete ou oito meses. Suplico-vos,
senhor Padre, empenhar-vos no sentido de agilizar a expedição de suas bulas.
O senhor de Saint-Aignan, nosso benfeitor, vos relatará, um desses dias, como o
mal em Saint-Eutrope é maior do que diz o papel. Peço-vos continuar a agir secreta e
eficazmente, como também na expedição da dispensa. Tratando-se de voto simples e in
foro interno (no foro interno), não precisa haver atestações públicas5.
O Padre Germano não vos deu dinheiro suficiente para vossa subsistência e
acomodação. Aguardando até que vo-lo envie, tomai emprestado, nas melhores
condições possíveis, com o senhor Marchand. Ele me deu a honra de dizer-me que vos
fornecerá o que precisardes.
Abraço os Padres Germano e Ploesquellec6, a todos os Irmãos7 e a vós, senhor
Padre, com ternura inimaginável. Sou, de todos, no amor de Nosso Senhor...

595. – A UM BISPO1

São Lázaro, 22 de junho de 1642.

Recebi, em Richelieu, aonde fui fazer uma viagem da qual cheguei de volta
recentemente2, a carta com que teve a bondade de me honrar. Antes de partir, dei ordem
para retirarem uma carta que o Senhor de Liancourt me prometera, para vo-la enviar
juntamente com a que ele já tinha enviado ao senhor Embaixador 3. Entretanto, resolvi,
ao voltar, pedir a Madame Duquesa que ela mesma escrevesse, como de fato lhe pedi.
Visto, porém, que ela se escusou, escrevi ao senhor de Saingui, Secretário de Estado,
que ocupa o departamento de Roma e se acha na corte, usando da precaução que vós,
senhor Bispo, tínheis desejado, isto é, que ele evite falar disso. Aguardo sua resposta.
A confiança com que me honra me garante a de que ele honrará o silêncio de
Nosso Senhor e que, se for o caso de escrever, ele o fará. Logo que eu receber-lhe a
resposta, avisar-vos-ei, senhor Bispo. Fico pesaroso por não ter ainda a felicidade de vos
servir com prontidão e mais eficazmente. Meu Deus! senhor Bispo, como me sentiria

44
Henrique Cauchon de Maupas du Tour, membro da Conferência das Terças-Feiras, ocupou a sede episcopal de Puy
de 1641 a 1661, e a de Evreux, de 1661 a 12 de agosto de 1680, dia de sua morte. Orador de renome, pregou a oração
fúnebre de Santa Chantal e de São Vicente. Devemos-lhe uma vida de São Francisco de Sales e uma outra de Santa
Chantal. Foi um dos dois bispos que aprovaram a Vida de São Vicente, por Abelly.
55
Ver carta 582, nota 5; carta 633, nota geral.
66
Guilherme de Ploesquellec, nascido em Plourivo (Côtes –du-Nord), em 1614, foi recebido na Congregação da
Missão a 13 de julho de 1641 e admitido aos votos, em Paris, em 1647. Ficou muito pouco tempo em Roma. Talvez o
tivessem escolhido na esperança de que pudesse prestar serviço em Saint-Yves.
77
O Irmão Martin, clérigo, e o Irmão Francisco.
.
Carta 595. – Pérmartin, op. cit., p. 409, 1. 356.
11
Talvez o Bispo de Puy.
22
A viagem a Richelieu se situa entre 07 e 20 de junho. O Santo fora fazer lá a visita do estabelecimento de sua
Congregação.
33
O Marquês de Fonteney-Mareuil.
feliz, se fosse do agrado de Deus me dar a graça de vos poder prestar algum pequeno
serviço em minha vida, em reconhecimentos das dívidas infinitas que temos para com
vossa bondade, sem igual sobre a terra! Sou indigno desta graça de Deus. Não deixarei,
entretanto, de lha pedir, e durante toda a minha vida lhe pedirei vos conserve por longos
anos, para o bem de sua Igreja. Que ele me torne digno de ser, em seu amor e no de sua
Santa Mãe...

596. – UM PADRE DA MISSÃO A SÃO VICENTE

1642.

Deus abençoou a missão pregada em Essarts1: sete hereges se converteram, os nobres e os


oficiais de justiça tiraram dela grande proveito.

597. – JACQUES RAOUL DE LA GUIBOURGÈRE, BISPO DE SAINTES, A SÃO VICENTE

1642.

Os trabalhos dos missionários obtiveram tal sucesso que as próprias populações lhes foram
agradecer.

598. – SYLVESTRE DE CRUSY DE MARCILLAC, BISPO DE MENDE, A SÃO


VICENTE

1642.

Asseguro-vos que tenho, pelos trabalhos que vossos missionários fazem, no


presente, em minha diocese, mais estima do que o teria se me dessem cem reinos. Sinto
imensa satisfação ao ver que todos os meus diocesanos se voltam para a prática do bem
e que os meus párocos tiram grande proveito das palestras que vossos padres fazem,
com êxito e bênção.

599. – JACQUES-RAOUL DE LA GUIBOURGÈRE, BISPO DE SAINTES, A SÃO


VICENTE
.
Carta 596. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, § 8, 1ª ed., p. 50.
11
Em Marne.
.
Carta 597. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, § 2, 1ª ed., p. 30.
.
Carta 598. – Abelly, op. cit., 1.II, cap. I, sec. III, § 3, 1ª ed., p. 31.
.
Carta 599. – Abelly, op. cit., 1.II, cap. II, sec. II, § 2, 1ª ed., p. 30.
Saintes, 1642.

Chamei vossos missionários para esta cidade, para descansarem alguns dias.
Com efeito, eles trabalham, há cinco meses, com tal assiduidade que me admiro como
puderam aguentar. Estive pessoalmente in loco para buscá-los.

600. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Nossa Irmã Francisca1 me parece indiferente quanto a ir para Liancourt ou


permanecer aqui. Ela se esqueceu de vos dizer que está emancipada, podendo desfrutar
dos bens de sua falecida mãe e que, tendo alugado uma parte da casa, há três ou quatro
anos, nada recebe. Pensa, por isso, em vender o que possui em sua terra natal. Julga
que poderia pôr ordem nesses pequenos negócios, se fosse comigo até lá. Peço-vos
muito humildemente ter a bondade de me dizer o que devo fazer e se não haveria nada
a recear se a deixássemos ir, por causa da proposta que esse bom padre lhe fez,
embora se veja nela, ao que parece, grande firmeza na vocação.
Restou-me no espírito um certo temor de que nossas Irmãs pensem que eu não
quero que falem de suas dificuldades. Examinando-me sobre isso, pude encontrar
apenas dois motivos: um deles foi quando veio aqui o Padre Thibault 2 e pediu para ver
três ou quatro de suas conhecidas, das quais uma era a pequena Irmã Cláudia. Na
época, ela não se cansava de falar de um escrúpulo que tinha por um pecado já
confessado, e eu lhe avisei que não falasse mais em tal assunto. Uma outra vez foi com
nossa Irmã Luísa. Ela gosta muito de conversar com frequência sobre austeridades.
Disse-lhe para não falar mais disso e se contentar com a prática das que lhe foram
permitidas e que, quando as interrompesse, poderia retomá-las, sem nada falar a
respeito.
Fora disso, senhor Padre, não creio ter dado motivo a nenhuma para dizer, que
não gosto de que falem (de suas penas). E se elas se queixarem de outra coisa, creio
seria necessário que sua caridade tudo esclarecesse, para conhecer melhor as
disposições de espírito das Irmãs.
Parece-me, senhor Padre, que o pedido que vos fiz de que nossa Irmã Turgis
ocupasse meu lugar, para o maior bem de nossas Irmãs, me veio ao espírito a partir de
um certo indício desta necessidade, do qual não me lembro exatamente. E também do
fato de que o senhor Padre Portail costuma propor a várias Irmãs ao mesmo tempo,
para fazerem o retiro espiritual e a quase todas lhes fala dos votos. E as irmãs, pouco
esclarecidas e impacientes, não têm mais descanso enquanto a coisa não se realize, e

.
Carta 600. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
Francisca Noret.
22
Jean Thibault, padre da Missão.
deixam para depois a preocupação com o agir e proceder bem. A mim me parece que,
como preparação para um bom retiro, deveriam antes, depois de se terem deixado cair
em certo relaxamento, como acontece frequentemente, começar a proceder melhor. O
retiro lhes seria proposto depois, logo que fosse possível realizá-lo. E isto é mais difícil
para nós do que para as religiosas, porque temos de substituir por outras as que saem
para o retiro.
Penso, senhor Padre, que para remediar com prontidão à desordem das irmãs
da São Sulpício, seria melhor enviar logo a Irmã Henriqueta e chamar a Irmã Catarina
para fazer seu retiro e mantê-la aqui, adiando para depois o retiro da Irmã Henriqueta.
Receio com efeito que suas pequenas desordens continuem. Tenha vossa caridade a
bondade de me responder a tudo isso e me perdoar tudo que vos comunico, talvez fora
de propósito, e dar-me vossa santa bênção como sendo, senhor Padre, vossa muito
humilde e muito agradecida filha e serva,

L. de M.

Domingo, 06 de julho de [16423].

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

601. – A LUÍSA DE MARILLAC

[06 ou 07 de julho de 16421].

Penso como vós, Senhora, que não há nada a temer de nossa Irmã Francisca 2.
Faça como julgardes conveniente.
Não estou sabendo de queixas de suas filhas, por não as deixardes falar com
pessoas de espiritualidade.
Avisarei ao Padre Portail sobre o assunto de ontem e sobre o assunto dos retiros.
Na minha volta, com a ajuda de Deus, conversaremos sobre tudo e me indicareis tudo
de que for preciso avisá-lo.
Fareis bem em avisar quanto antes Henriqueta e mandar vir Catarina.
Ficai em paz a respeito das pequenas dificuldades de que me falastes ontem.
Tenho experiência, de cerca de 25 anos, a respeito do rumo que deve tomar a direção
interna e externa, e dos inconvenientes de ambas. Informar-vos-ei sobre tudo isso.
Cuidai de vossa saúde e de vos manter na alegria.
E rezai por mim, que sou...

33
As palavras “06 de julho”, “domingo” e o conteúdo indicam com certeza o ano 1642.
.
Carta 601. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
Esta carta responde à precedente, à qual sucede no original.
22
A Irmã Francisca Noret.
V. D.

602. – A BERNARDO CODOING

Beauvais, 11 de julho de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi, nesta cidade de Beauvais1, vossa carta de 15 de junho. Eu tinha deixado
ordem para ma enviarem logo que a recebessem, por portador expresso.
Escrevi-vos por todo correio ordinário, ao que me parece, desde minha volta de
Richelieu, e algum tempo antes. Penso não ter faltado a não ser duas vezes, desde vossa
chegada.
Fiquei muito contente em saber, pela carta que escreveis ao Padre Soufliers, a
maneira de proceder ao dar ordens.
A propósito do Padre Soufliers, escrever-me-eis, por obséquio, a mim
pessoalmente, todas as coisas, e a nenhum outro, sobre negócios a tratar. Dissestes a ele
alguma coisa a respeito dos Padres G[ermano] e P[loesquellec] que não convém que
ninguém o saiba, a não ser eu, como também qualquer falha de alguém da Companhia,
conforme a regra da verdadeira caridade. O que escreveis a um outro para mo dizer não
me fará apressar a resposta para mais cedo.
Escrevi-vos que esperava que Nosso Senhor me daria a graça de me corrigir 2, e
estou trabalhando para isso, por sua bondade. Quanto aos Padres G[ermano] e
P[loesquellec], atribuí-lhes responsabilidades. Vereis que se sairão bem, ao menos o
Padre G[ermano], que se desempenhava muito bem, com vigilância e habilidade, no que
fazia. Terá mais dificuldade na língua do que os mais jovens. Mas aos poucos se dará
bem. Quanto ao Padre P[loesquellec], ele tem talento para falar em público, e será
motivo de edificação e bênção, como espero, e como tem sido sempre e em toda parte.
Se acontecer o contrário, não hesiteis em me comunicar, por favor, e não fiqueis
constrangido por causa deles. Se for necessário, providenciaremos outros em seu lugar.
Vão aqui as respostas às questões que colocais:
Primo (em primeiro lugar), a respeito da casa de aluguel por 40 pistolas. Penso
terdes feito bem, tendo em vista o projeto dos ordinandos. Julgo que fareis bem dando
alimentação gratuita aos ordinandos e aos exercitantes. É o desejo da fundadora 3. Se
puderdes alimentá-los por trinta cêntimos por dia, dará isso cem francos para cada
ordenação e quatrocentos francos por ano, supondo que tenhais quatro ordenações por
ano e trinta ordinandos em cada ordenação. Podereis, além disso, empregar os duzentos

.
Carta 602. – C. aut. – A primeira folha do original se encontra na Casa-Mãe dos padres da Missão, a segunda no
British Museum, Foreing Private Letters 22.488, fº 14.
11
O Santo fazia pela terceira vez a visita do convento das Ursulinas dessa cidade (Cf. Collet, op. cit., t. I, p. 358).
22
Ver carta 559.
33
A Duquesa de Aiguillon.
francos para os exercitantes, na razão de dois por dia ao longo de todo o ano. Envio-vos
seiscentas libras para isso. Vossa renda daqui remonta a 2.500 libras, no presente. Não
sei o que valerão em Roma, no futuro, essas 1.500 ou 1.600 libras.
Enviei-vos a letra de câmbio da Madame Duquesa de Aiguillon, de seis mil
novecentas e tantas libras, que podereis aplicar em alguma instituição de crédito, como
vos disse, a não ser que se apresente alguma casa para comprar a crédito, e acomodá-la
ao nosso uso, ou que se realize com o tempo o negócio de Saint-Yves. Vê-lo-eis e me
comunicareis tudo, por favor. É preciso segredo a respeito desse dinheiro, temendo que
vo-lo...4. Penso igualmente não ser conveniente divulgar ainda a fundação, se julgardes
que, em virtude da aversão que antes poderiam ter contra a referida Madame5, fizessem
dificuldades para apresentar os ordinandos. Isto é de grande importância. O Padre du
Coudray [pensa] que isso não o impedirá. Podereis sondar em segredo a opinião de
nossos amigos íntimos e escrever à Madame uma carta de agradecimento e total
reconhecimento. Essa fundação vem de um voto por ela feito, pela saúde de S. E.,
quando estava doente6. Por esta razão, podeis pensar que não há de lhe faltar a
recomendação do senhor Núncio7, quando de sua volta, para a finalidade de que me
falastes e para o negócio de Saint-Yves. Fazei aí algum exercício de piedade para
agradecer a Deus pela graça por ele dispensada ao vosso estabelecimento.
Não deixeis de equilibrar as despesas e os projetos. É tudo com que podeis
contar. Ela fez outras fundações em várias partes, e não acrescenta nada mais, nem S.
E., ao que deram. E quanto a colocar seu brasão de armas, ficai certo de que essa
vaidade não o toca.
Podeis assumir o encargo de examinar os padres e pregar-lhes um pequeno
retiro. Se, com o tempo, se verificar que a pouca renda de que dispondes não o permite
mais, in nomine Domini (em nome do Senhor), rogareis Aquele que provê às
necessidades das pequenas moscas lance os olhos de sua providência sobre vós, e
tomareis então conselho do que devereis fazer. Podereis igualmente assumir o cuidado
da visita aos pobres. Esta Companhia tem, como Nosso Senhor, o cuidado espiritual e
temporal dos pobres doentes.
Eu vos escrevi muitas vezes que faríeis bem em tomar como colaborador um
padre italiano. O que trabalhou com o Padre Lebreton me parece mais adequado do que
qualquer outro. Escrevi-vos também que seria bom chamar esse bom bretão ao qual
escrevi. Oh! como me parece gente boa e de bom espírito! Abraço-o em espírito com
mui grande ternura, como as primícias da bênção de Deus sobre vosso estabelecimento.
Ficaria também muito consolado se esse outro do Padre Lebreton tivesse vocação para
isso. Seria bom, outrossim, conseguir um Irmão italiano e, se for preciso, enviar-vos-ei
um outro daqui, no lugar de Francisco8 ou com ele.

44
A frase está no fim da página. Está inacabada no original.
55
Por causa do seu tio, o Cardeal Richelieu.
66
O Cardeal padecia da doença que devia levá-lo à morte, a 04 de dezembro. Dois abscessos foram detectados no
ápice pulmonar, depois da cicatrização de uma úlcera no braço.
77
Jerônimo Grimaldi, Arcebispo de Selêucia, nascido em Gênova, em 1597, Vice-legado de Romanha, em 1625,
Governador de Roma, em 1628, Núncio na França, a 02 de março de 1641. Tornou-se Cardeal em 1643, Arcebispo
de Aix, em 1648. Morreu nessa última cidade a 04 de novembro de 1685.
88
Ignoramos de qual Irmão Coadjutor se trata. Muitos tinham esse nome.
Dai-me um pouco de tempo [para examinar9] se nos devemos vestir aí à italiana.
Há prós e contras, e em quantidade. Veremos.
Não vejo esperança alguma de união com os padres da Provença 1010, se não vier
de Sua Santidade, quando pedirem sua aprovação 1111. Ele ordenou aos Beneditinos
reformados da Bretanha1212 e aos de Lorena1313 que se unissem com a Congregação de
Saint-Maur, a da França1414. E deu certo. A Santa Sé sabe, por experiência, os estranhos
atritos que ocorrem entre duas [Ordens]1515 que trazem um mesmo nome e entre os que
dispõem dos mesmos1616 meios para chegar ao mesmo fim. No momento em que
vos falo, o Padre Portail, que representa o superior em Paris, me comunica que um
muito bom e excelente eclesiástico que se apresenta em nossa casa em Paris, lhe disse
que, se não o recebermos, por causa do senhor Bispo de Puy1717, ao qual nós o cedemos,
e com receio de lhe desagradar, ele irá para o seminário que os senhores Padres Olier,
de Fose1818, Brandon e alguns outros1919 estão iniciando, em Vaugirard2020, donde estão
vindo para São Sulpício, de cuja paróquia se têm ocupado 2121. Um outro daqui, ao se
apresentar, me disse muito simplesmente que, se não o aceitarmos, irá procurar esses
missionários da Provença, em Senlis. Podeis imaginar com que espírito vos digo isto,
afirmando-vos que rogo a Deus várias vezes, todos os dias, os abençoe e os faça crescer,
e nos aniquile se não o servirmos na fidelidade ao desígnio que tem sobre nós. Meu
Deus! senhor Padre, como nos importará pouco, quando estivermos no céu, se aprouver
a Deus dar-me a graça de chegar lá, por quem Nosso Senhor seja glorificado, conquanto
seja glorificado! Oh! com toda a certeza, lá não haverá nem meum, nem tuum (nem
meu, nem teu).
Não sei se o Padre Lucas fez o que lhe escrevestes. Ele está em missão. Na sua
volta e na minha, dentro de quatro ou cinco dias, falarei com ele, se Deus quiser.
99
A frase do original está incompleta.
1010
Os padres de Cristóvão d’Authier.
1111
Obtiveram-na a 04 de junho de 1644.
1212
A reforma fora implantada nos conventos beneditinos da Bretanha, no início do século XVII, sob o impulso de
alguns monges de Marmoutiers que se retiraram para o priorado de Lehon-sur-Rance, perto de Dinan. Os dez
mosteiros que a tinham adotado se uniram à Congregação de Saint-Maur, em 1628, por ordem de Urbano VIII.
1313
A Congregação de Saint-Vanne nascera da reforma introduzida em Lorena pelo Cardeal Charles de Lorena,
legado a latere, e fora solenemente aprovada pelo breve de 07 de abril de 1604.
1414
A Congregação de Saint-Maur, oriunda da Congregação de Saint-Vanne, sobretudo sob o impulso de Gregório
Tarrise, e aprovada pelo breve de 17 de maio de 1621, possuía em 1640 quase todas as grandes abadias da Ordem de
São Bento (Cf. Dom Paulo Denis, Le cardinal de Richelieu et la reforme des monastères bénédictins, Paris, 1913, in-
8º).
1515
Cremos ser esta a palavra do original, estragado nesse lugar.
1616
Aqui se interrompe a parte da carta conservada nos arquivos da Missão. A palavra “même” (mesma) está repetida
no início da segunda folha.
1717
Henrique de Maupas.
1818
O Abade de Saint-Volusien de Foix, Francisco Estêvão de Caulet, que se tornou Bispo de Pamiers.
1919
Du Ferrier, de Bassancourt, Amelotte e Houmain.
2020
Era então uma comuna do subúrbio de Paris. Jean-Jacques Olier se retirara para ali, em dezembro de 1641, com
seus dois primeiros companheiros, Caulet e du Ferrier, e ali começara seu seminário, primeiro, numa casa pobre,
situada perto da igreja, depois, num edifício mais confortável.
2121
A paróquia de São Sulpício era então muito extensa. Seus limites circundavam a atual sexta circunscrição
administrativa, exceto uma pequena parte, englobada pelas paróquias Saint-Cosme e Saint-André-des-Arts, toda a
sétima circunscrição e uma boa parte da décima quinta. Sua população era considerável e passava por uma das menos
religiosas da capital. A paróquia de São Sulpício foi oferecida a Jean-Jacques Olier por Juliano de Fiesque, seu
predecessor, e aceita a 25 de junho, às instâncias de São Vicente. O novo pastor só tomou posse depois de ter
recebido de Roma suas cartas de provisão.
Poderíeis tomar o empréstimo para vossa despesa na razão de 500 libras por
trimestre. Tenho dúvidas de que vos concedam durante muito tempo as 2.500 libras por
ano dos coches de Soissons, que vos são dadas 2222. Os arrendamentos destes tipos de
bens diminuem notavelmente de preço. As rendas que temos de Chartres valerão menos,
este ano, em torno da metade. As misérias públicas e a diminuição da população estão
causando esta baixa.
Eu vos tenho escrito muito longamente sobre o negócio de Saint-Yves2323.
Penso que será conveniente fazer missão nas cidades sede de diocese, pela razão
que vos escrevi há tempos em Genebra2424. Quando resolvemos em nossa primeira
fundação que não trabalharíamos nas cidades episcopais, tratava-se de pregações e
confissões ordinárias, como fazem as Ordens em suas casas e em outras Igrejas. Não
pensávamos, na ocasião, em excluir delas as missões2525. Acabamos de pregá-las em
Alet e em Luçon.
Será bom comprar um cálice de prata e honrar a pobreza de Nosso Senhor nos
paramentos, como fazemos em São Lázaro.
Continuaremos a saldar todas as letras de câmbio aqui. Para o futuro, vamos ver.
Aí está a resposta exata a todos os pontos por vós levantados e a muito humilde
prece que vos faço de zelar por vossa saúde e pela da comunidade. Abraço a todos em
espírito, prostrado aos pés de cada um, com uma ternura de coração que não sou capaz
de vos exprimir, maior ainda agora, quando me dizeis que nada fareis sem a devida
ordem e que vos propondes ir piano , piano. Ó senhor Padre, como meu coração ficou
alegre com isso. Lembrai-vos, senhor Padre, que a maneira de fazer com que uma
árvore cresça bem alto é cortar-lhe os ramos e que os animais que se alimentam demais,
quando jovens, se extenuam. Oh! como Nosso Senhor nos deu uma grande lição, em
não se apressar no pouco que quis realizar, em comparação com os apóstolos e com o
que poderia fazer, e quando buscava ocultar-se nas horas em que a multidão mais se
aglomerava para segui-lo! Em nome de Deus, senhor Padre, se a necessidade nos obriga
a apressar-nos, que o seja lentamente, como diz o sábio provérbio. Creio também que
devemos ter devoção de não nos mostrar tanto, por escritos, pelos impressos e
relacionamentos (digo-o com respeito ao público; já é bastante em relação à vida
interna), como o devemos fazer pelas boas obras. Mais cedo ou mais tarde, elas falarão
de modo muito mais eloquente do que tudo que fizermos para firmar nossa presença e
nos pôr em evidência.
Não pude deixar de vos dizer essas últimas palavras, em razão do que dissestes
sobre o vosso pensamento de mandar imprimir o relatório do senhor Bispo de
Bayone2626, a respeito da maneira de ser do seu seminário.
Termino recomendando-me a vossas preces, e sou, no amor de Nosso Senhor,
senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

2222
É provavelmente com as rendas dos coches de Soissons que a Duquesa de Aiguillon contava pagar uma parte da
soma prometida à casa de Roma, pelo contrato de 04 de julho de 1642.
2323
Ver carta 594.
2424
Ou, antes, em Annecy, cidade da diocese de Genebra.
2525
Ver, a respeito, a evolução do pensamento de São Vicente (Cf. todo o capítulo 2 de “Um Místico da Missão,
2001, Belo Horizonte, Padre Getúlio Mota Grossi” – N. do T.).
2626
Francisco Fouquet.
Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, Superior dos padres da Missão de


Roma, em Roma.

603. – A PIERRE DU CHESNE

São Lázaro, Paris, 24 de julho de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Envio-vos a resposta do senhor Bispo de Meaux1 que ele me enviou pelo seu
criado. Tornando a pensar na dificuldade de servir o café aos senhores ordinandos,
fiquei mais amarrado a um embaraço. É que, estando em missão, os irmãos deveriam
voltar para esse café. Temo que com o tempo haja sobrecarga. O remédio seria esses
senhores aceitarem o serviço alternativo, à mesa, como fazem os ordinandos daqui, e
fazerem também a leitura, durante o café, cada um por sua vez. A despesa me parece
pouca coisa, em comparação com essa vantagem. Reflita nisso. E se julgardes que essas
razões têm peso, penso que não haverá inconveniente em nos vermos, e que deis um
pulo até Paris, para dormir uma noite, e solicitarmos o parecer de alguns da Companhia.
Não pude estar com o dito senhor para lhe referir o procedimento desse ministro,
desaprovado pelos editos. Mas vou avisá-lo.
Não entendi bem o que me dissestes, isto é, que um desses dois jovens tem os
tornozelos dos pés voltados para dentro. Seria a ponta dos pés e os dedos? Porventura
ele manca? Os pés são muito disformes? Está impedido de caminhar longa distância?
Quanto ao segundo, o sapateiro, parece-me que não haveria inconveniente em
recebê-lo, a não ser a questão da sua pobre mãe. De que viverá ela?
Estou contente com o que me dizeis do senhor Obriot e o saúdo de novo com
muita humildade.
Aqui não mandam preparar carne para cozinhar, e talvez não se mande fazer
vela aí. Se o mandarem, direi que vos atendam quanto à cem libras, se não me esquecer.
A Senhora Poulaillon não poderia receber essas pobres mulheres 2. Ela acolhe as
que estão em perigo de se perderem e não as que já se perderam. Vejo-me embaraçado
com isso. Procurarei ver se é possível arranjar-lhe uma professora, o que não é fácil. A
propósito, estou vos mandando de volta o Irmão Pascal3. Sou vosso servo,
.
Carta 603. – Dossiê da Missão, cópia tirada, em 1854, do original em poder do senhor Laverdet.
11
Dominique Séguier.
22
Na casa dirigida pelas Filhas da Providêcia.
33
Jean Pascal Goret, nascido em Angers em 1613, recebido na Congregação da Missão, na qualidade de Irmão
Coadjutor, a 21 de novembro de 1641. São Vicente se serviu dele para os pobres da Picardia, como se tinha servido
Vicente de Paulo.

Penso ser melhor que escrevais ao senhor Bispo de Meaux e lhe agradeçais por
vos ter escrito com tanta bondade e estímulo, e lhe aviseis do caso desse ministro.
Mandai-me a carta, e eu lha enviarei.

Destinatário: Ao senhor Padre du Chesne, Superior dos padres da Missão de


Crécy, em Crécy4.

604. – A FRANCISCO DE SAINT-REMY1

Paris, 27 de julho de 1642.

A graça de N. S. esteja sempre convosco!


Acabo de receber, há uma hora, vossa carta de Nevers. Ela me trouxe o conforto
de ver que estais passando melhor e o pesar de não saber o que dizer-vos, com relação à
proposta que me destes a honra de apresentar-me, sobre a mudança de estabelecimento.
A razão é que não me lembro dos prós e contras em relação a um e a outro, o que me
leva a suplicar a Deus vos dê ele mesmo a conhecer o lugar para onde vos chamou,
desde toda a eternidade. Espero que sua bondade o fará, e lho peço com todo meu
coração. Proponho-me oferecer-lhe o adorável sacrifício para este fim, num dia desta
semana, que espero seja quinta-feira próxima, com a ajuda de Deus, em cujo amor sou,
senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

605. – A BERNARDO CODOING


do Irmão Mateus Régnard para os de Lorena.
44
Os padres da Missão foram chamados para Crécy, em 1641, pelo rei Luís XIII que lhes fez doação perpétua do
castelo e de 8.000 libras de renda, a serem deduzidas, a metade, dos rendimentos de cinco granjas, e a outra metade
dos ofícios dos retalhistas dos armazéns de sal de Lagny-sur-Marne. No caso em que esses ofícios fossem supressos,
a casa de Crécy teria o direito de receber, em compensação, a quantia de 31.600 libras, de outros fundos. Os padres
deveriam ser em número de oito, ter com eles dois irmãos coadjutores, pregar missões na diocese de Meaux,
distribuir anualmente 4.000 libras em esmolas, receber gratuitamente em sua casa, uma vez por ano, para os
exercícios do retiro preparatório às ordenações, os ordinandos da diocese, admitidos pelo Bispo de Meaux, celebrar
diariamente, para sempre, duas missas simples, na igreja do castelo, uma para o rei e a família real, a outra para os
senhores contratadores de Crécy, acrescentando outras cinco, todos os dias, durante os dez dias seguintes à morte dos
reis, das rainhas da França e dos seus filhos, e fazendo o mesmo após a morte dos senhores contratadores de Crécy,
durante cinco dias. O Bispo de Meaux aprovou o contrato a 12 de abril de 1641. Mas o rei, que prometera garantir
tudo e indenizar os senhores contratadores de Crécy, não manteve a palavra. Disso resultou que as rendas diminuíram
consideravelmente, os senhores foram reintegrados na posse do castelo e o número de padres reduzido a três.
.
Carta 604. – Dossiê da Missão, cópia tirada do original em poder do senhor Charavay.
11
Arcediago de Langres.
.
Carta 605. – Original na Biblioteca Comunal de Nancy.
Paris, 28 de julho de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Estou me adiantando, ao escrever-vos pela segunda vez, sem ter recebido cartas
vossas, as daqui da terra, enquanto, em vosso retiro, enviastes várias delas para o céu, a
fim de me obter misericórdia pelas abominações de minha vida.
A presente tem por objetivo dizer-vos que me vieram informar de que a
Companhia publicou em Roma que fostes enviados para lá em vista da reforma dos
eclesiásticos e que estais credenciados para a reforma e a formação de todo eclesiástico
e que isto está causando muito prejuízo. Uma pessoa que veio de lá disse isto aqui.
Diante disso, depois de nos humilharmos muito, precisamos de muita oração e
nos ocultar até que, pela bondade de Deus, nos tenhamos purificado da complacência
que experimentamos nesse empreendimento.
No momento, é o que o embaraço de minhas pequenas ocupações me permite
dizer-vos, senhor Padre.
Acrescento a isso que sou, com o coração que Deus sabe, e em seu amor, senhor
Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, Superior dos padres da Missão de


Roma, em Roma.

606. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ROMA

[05 de agosto e 16421].

O projeto que me propondes de ir começar vossas missões nas terras dos


senhores Cardeais me parece de estilo humano contrário à simplicidade cristã. Ó senhor
Padre, guarde-nos Deus de fazer alguma coisa com horizontes tão rasteiros! Sua divina
bondade nos pede jamais fazer algum bem, em lugar algum, para nos tornar
importantes, mas que a tenhamos em vista, única e diretamente, sem intermediações ou
rodeios, em todas as nossas ações.
Isto me enseja a ocasião de vos pedir duas coisas, prostrado em espírito aos
vossos pés e pelo amor de Nosso Senhor Jesus Cristo. A primeira é que fujais, quanto
possível, de aparecer; a segunda, que nada façais por respeito humano. Assim sendo, é
.
Carta 606. – Abelly, 2ª edição, 1. II, p. 16.
11
A data é dada por Collet, op. cit., t. I, p. 538.
justo que, de todos os modos, honreis por algum tempo a vida oculta de Nosso Senhor.
Há um tesouro escondido nela, pois que o Filho de Deus permaneceu trinta anos na terra
como um pobre artesão, antes de se manifestar. Ele abençoa, também, sempre e muito
mais, os humildes do que os retumbantes.
Dir-me-eis talvez: que apreciação fará de nós essa corte (a corte romana) e o que
se dirá de nós em Paris? Deixai, senhor Padre, que pensem ou digam de nós o que
quiserem. Ficai certo de que as máximas de Jesus Cristo e os exemplos de sua vida
nunca falham, mas produzem fruto a seu tempo, e o que não lhes é conforme é vão, e
tudo sai mal para aquele que age segundo as máximas contrárias. Tal é a minha
convicção e tal é a minha experiência.
Em nome de Deus, senhor Padre, tende isso por infalível e ocultai-vos com todo
empenho.

607. – UM CÔNEGO1 A SÃO VICENTE

1642.

Nesta diocese o Clero está sem disciplina, o povo sem temor de Deus e os
padres sem devoção e sem caridade, os púlpitos sem pregadores, a ciência sem honra,
o vício sem castigo. O interesse particular fala alto, de modo ordinário, no santuário.
Os mais escandalosos são os mais poderosos e a carne e o sangue como que
suplantaram o Evangelho e o espírito de Jesus Cristo. Estou certo de que sereis
solicitado, por vós mesmo, a prestar socorro a esta diocese, sabendo de sua
necessidade. Quis novit utrum ad regnum idcirco veneris, ut in tali tempore parareris 2?
(Quem sabe se não foste elevado à realeza em vista desta circunstância).
A circunstância é digna de vossa caridade, se for do vosso agrado a humilde
prece que vos faço de nela pensar seriamente diante de Nosso Senhor, como vinda de
um de vossos primeiros filhos3.

608. – A LUÍSA DE MARILLAC

Da casa de Madame de Souscarrière, quarta-feira, às 14 horas [entre 1639 e 16441].

Senhora,

.
Carta 607. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. II, sec. I, 1ª ed., p. 213.
11
“Um eclesiástico, nobre por nascimento, e célebre por sua piedade, cônego de uma igreja catedral”, diz Abelly.
22
Est 4,14. Alusão à influência que tinha São Vicente sobre a Rainha Ana d’Àustria.
33
Um dos primeiros membros da Conferência das Terças-Feiras.
.
Carta 608. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Tempo durante o qual Madame de Souscarrière foi presidente das Damas da Caridade.
Mandei dizer ontem à noite a Madame de Souscarrière que lhe pedia antecipasse
a assembleia de amanhã, quinta-feira, para hoje.
A pessoa com quem falei não lhe transmitiu o recado, de sorte que a assembleia
se realizará amanhã: trata-se da assembleia das quatorze, que não pode ser adiada,
porque o grupo anterior e o novo grupo eleito devem reunir-se e foram avisados para
este fim2. Sendo assim, vede bem, Senhora, que não podendo estar em dois lugares ao
mesmo tempo, sou obrigado a preferir a primeira assembleia indicada, a das quatorze.
Peço-vos humildemente por isto adiar a vossa para a sexta-feira próxima e contra-avisar
vossas filhas3.
Gostaria de saber também se a febre vos deixou. Oh! como ajuntais grandes
tesouros no céu, sofrendo e agindo!
Desejo-vos uma boa tarde e uma boa noite e sou, no amor de Nosso Senhor,
Senhora, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

609. – A BERNARDO CODOING

Paris, 19 de agosto de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Estou preocupado por não ter recebido cartas vossas pelo último correio. Temo
que estejais com alguma indisposição. Em nome de Deus, senhor Padre, tende cuidado
com vossa saúde, especialmente nesses dias caniculares. Não preciso recomendar-vos o
cuidado com a comunidade. Não faltais a isso, graças a Deus.
Fiquei muito feliz com tudo que cada um desses senhores me escreveu depois do
retiro e rogo a Deus lhes dê a todos a graça de serem fiéis às santas resoluções tomadas.
Sua bondade me perdoará por não lhes escrever ainda por este correio.
Mandei escrever-vos que é bom empregar mais tempo nos exercícios dos
ordinandos, para que vós e a comunidade tenham mais condição de ministrar as

22
Quatorze Damas eram mais particularmente encarregadas no Hospital Geral das obras de misericórdia espiritual.
Elas visitavam os doentes para confortá-los e instruí-los. Eram eleitas de três em três meses, por ocasião das quatro
têmporas, em Assembleia Geral. “O Padre Vicente, narra Abelly (op. cit., 1. II, cap. XXIX, p. 138), reunia tanto as
que deixavam o cargo como as que estavam entrando, juntamente com as oficiais da Confraria, na sala delas, perto do
Hospital Geral. As que saíam relatavam como tinham procedido e os frutos obtidos com a bênção de Deus... O Padre
Vicente apoiava com seu parecer, quando julgava necessário, o que era preciso continuar...”
33
Algumas Filhas da Caridade das outras casas de Paris e dos arredores vinham sempre às conferências de São
Vicente feitas na casa de Luísa de Marillac.
.
Carta 609. – Bulletin de la Societé de l’Histoire de Paris et de l’Ile-de-France, 07 de outubro de 1883, p. 141. O
original, todo da mão do Santo, pertencia então ao baronete senhor Thomas Philipps, de Chenttenham (Inglaterra).
palestras e presidir às partilhas, sem empregar nisso outras pessoas: conheço por
experiência as consequências disso.
Madame Duquesa de Aiguillon, além da fundação de Roma, fez uma outra de
mil libras de renda com os recursos dos coches de Orléans, para a manutenção de três
missionários em Notre-Dame de la Rose, para prestarem serviço à diocese de Condom,
da qual ela tem a propriedade, como da diocese de Angenois 1. Mandamos partir os três
missionários dessa fundação, sob a direção do Padre Soufliers, há dois dias.
O Cônego de Saint-Aignan está em dificuldade com o negócio de Saint-
Eutrope2. Ser-vos-ia possível obter um breve para se contratarem juízes in partibus
(regiões fora de Roma, sobretudo de infiéis), sem que isto se divulgue? Se o
conseguirdes, seria necessário providenciar a nomeação dos senhores Bispos de
Beauvais3, de Meaux4 e de Senlis5. Tome as medidas neste sentido, de tal sorte que não
apareça abertamente que vos ocupais disso.
Recomendo-vos novamente a dispensa do voto das Carmelitas 6 e a questão do
senhor Bispo de Puy7.
Começa a surgir aqui a inveja, por causa do ofício que vos dão motivo de
esperar aí8, e temo por isso, sem saber a que atribuir a razão da queixa que certas
pessoas religiosas fazem de nós. A caridade, a humildade e a paciência dissiparão essas
nuvens, como espero.
Endereçai para mim as cartas dos membros da casa que escreverem a alguém da
Companhia na França, por favor.
Obséquio, também, não comentar o assunto com pessoa alguma do mundo.
Abraço vossa comunidade com toda afeição e humildade possível e sou, no amor
de Nosso Senhor, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão de


Roma, em Roma.

11
O contrato de fundação foi assinado a 04 de julho de 1642. A Duquesa de Aiguillon, Condessa d’Agenois e
Condomois, doava 13.500 libras e pedia em contrapartida que: 1º, as missões, até ali limitadas ao ducado de
Aiguillon, se estendessem a todas as terras que dependiam dela em Agenois e Condomois; 2º, os ordinandos dos
mesmos lugares fossem acolhidos na casa dos padres da Missão, para nela receberem a instrução necessária. Os de
Condomois seriam custeados pelo Bispo de Condom, até que os missionários tivessem nessa diocese um fundo, uma
casa e móveis; 3º, todos os anos, em caráter perpétuo, fosse celebrado um serviço religioso completo ou uma missa
por ela e seu tio, o Cardeal Richelieu (Arq. Nac. MM 534). Esta fundação elevava para sete o número dos
missionários.
22
Ver carta 582.
33
Agostinho Potier.
44
Domingos Séguier.
55
Nicolau Sanguin.
66
Ver carta 594.
77
Henrique de Maupas.
88
O ministério junto aos ordinandos.
610. – A FRANCISCO DUFESTEL

Paris, 26 de agosto de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Há apenas sete ou oito dias que vos escrevi com o endereço de Santa Maria da
cidade e mandei minha carta para o senhor Bispo de Genebra 1. No momento, escrevo
com o endereço de Santa Maria do subúrbio. A carta deverá ser entregue à Reverenda
madre Superiora do primeiro mosteiro de Annecy2.
Enviei-vos a ratificação formal da doação do senhor Comendador de Genebra3 e
vos escrevi que eu penso que fareis bem em comprar enfim uma casa, empregando na
compra as duas mil libras que o referido senhor Comendador quer doar-vos. Disse-vos
também as razões que tive até o presente de duvidar se devíeis comprar uma casa antes
de serem aprovados neste Estado, pelo Parlamento de Chambéry.
Estou preocupado, porque já vieram dois correios sem me trazer cartas do Padre
Codoing. Temo que esteja doente.
Vão aqui nossas pequenas notícias.
Os Padres Louistre e Fourdim4 saíram da Companhia, como também o senhor
Lescuyer5 e outro clérigo, além de dois ou três que dispensamos. Penso que o Padre N. 6,
que estava em Luçon, poderá sair dentro em breve. Podeis imaginar a dor que senti, não
tanto pela saída de algum deles, quanto pelo fato de que a natureza os dominou de tal
modo que não houve meio de trazê-los de volta ao espírito de piedade. Depois da
partida do Padre Louistre, pus-me a rezar o ofício divino, em minha dor. Mas a bondade
de Deus me consolou, trazendo-me à memória que, ao som da trombeta, nos exércitos,
na ocasião do combate, fez chegar aos ouvidos dos que tinham medo, dos que tinham
desposado uma mulher, plantado uma vinha ou edificado uma casa naquele ano,
poderiam se retirar, julgando que aquela espécie de gente faria mais mal na batalha do
que serviços que nela poderiam prestar. Em seguida, veio-me ao espírito que alguns
dentre eles, que se deixaram levar ao transtorno da própria vocação, por apenas um que
padecia desse mal, não farão mal à Companhia como o poderiam, se nela
permanecessem toda a vida. Desta forma, senhor Padre, aprouve a Deus consolar-me de
modo extraordinário. Talvez o senhor tenha levado em conta que um deles me viu a
seus pés durante meia hora, para dissuadi-lo, o que não consegui. In nomine Domini (em
nome do Senhor), é preciso honrar a grande multidão e o pequeno número dos que
.
Carta 610. – Dossiê da Missão, cópia tirada do original. Este último, todo da mão do Santo, foi enviado outrora de
Annecy para o Arcebispo de Edimburgo.
11
Justo Guérin.
22
A Madre de Blonay.
33
Jacques Cordon, Comendador dos Genebreses e de Compaisières, doara aos missionários de Annecy, por contrato
de 06 de agosto de 1642, a soma de 4.200 florins, para a fundação de uma missa quotidiana, em caráter perpétuo.
44
Gabriel Fourdim, nascido em Fressenneville (Somme), entrou já subdiácono na Congregação da Missão, a 02 de
janeiro de 1639, com a idade de 24 anos.
55
Pierre Lescuyer, nascido em Paris, recebido na Congregação da Missão a 09 de outubro de 1638, com a idade de 20
anos.
66
Jean Thibault.
seguiram e que perseveraram com Nosso Senhor: honrar seu estado interior, nessas
circunstâncias.
Foi do agrado de Deus enviar para nós o senhor Procurador do rei em Amiens 7,
um bom moço, homem de muito estudo, mesmo em teologia, e um professor bastante
famoso de filosofia8, que deve chegar na festa de São Martinho. Usai dessa notícia,
juntamente com vossa pequena comunidade, de acordo com vossa prudência ordinária,
por favor. Cuidai de vossa saúde. O Padre Lambert ainda não voltou9.
Nosso seminário de Paris vai tão bem que penso jamais ter visto algo que me
tenha trazido mais consolação e edificação. O senhor Bispo de Sarlat 1010, há quatro ou
cinco dias, foi passar nele o dia. Viu todos os exercícios do seminário, feitos com tão
grande esmero que ele voltou de lá todo sensibilizado. Confesso-vos que, ainda no
momento em que vos falo, sinto como isso é gratificante. E desejo que praza a Deus me
dê a graça de ir ver o vosso seminário.
Abraço a comunidade com toda a afeição e humildade a mim possível, e sou, no
amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Dufestel, superior dos padres da Missão de


Annecy, em Annecy.

611. – A LUÍSA DE MARILLAC1

[01 de setembro2].

77
Guilherme Delattre, nascido em Amiens, recebido na Congregação da Missão a 10 de agosto de 1642, com a idade
de 32 anos, superior em Cahors (1644-1646), La Rose (1646-1648), Agen (1648-1650), falecido em Bordéus em
1650.
88
João Batista Gilles, da diocese de Avranches, reitor e professor de filosofia no Colégio de Lisieux, situado na Rua
Beauvais, em Paris, foi recebido na Congregação da Missão, a 28 de novembro de 1642, e fez os votos a 11 de
outubro de 1645. Depois de o ter colocado algum tempo no seminário de Cahors, São Vicente lhe confiou a cadeira
de moral, em São Lázaro. Quando o Núncio lhe pediu apresentasse um candidato para Coadjutoria de Babilônia, o
nome de Joaõ Batista Gilles lhe veio ao espírito. Na segunda Assembleia Geral, da qual fazia parte, o Padre João
Batista tomou parte no debate sobre os votos, cuja manutenção ele defendeu. Seu ímpeto ardoroso contra as doutrinas
jansenistas se manifestava sobretudo nas aulas e palestras aos ordinandos. Mas sua insistência em atacá-los corria o
risco de produzir um efeito contrário ao esperado. São Vicente o percebeu, e o afastou de São Lázaro em 1651. João
Batista Gilles dirigiu por pouco tempo a casa de Crécy, onde morreu a 22 de agosto de 1652. Deram-lhe um lugar
merecido na coleção das Notices, t. III, pp. 110-114. Seu testamento, de 30 de abril de 1643, revela a alta estima que
tinha para com São Vicente (Arq. Nac. M 211, maço I).
99
Ele estava numa turnê de visitas em Lorena.
1010
Jean de Lingendes (1642-1650).
.
Carta 611. – Abelly, op. cit., 1. III, cap. III, sec. III, 1ª ed., p. 23.
11
Abelly não dá o nome do destinatário. Contenta-se com dizer que as cartas 32, 53 e 611 foram dirigidas à mesma
pessoa.
22
Ver nota 3.
Agradeço-vos a participação na devoção ao meu santo patrono 3, e rogo a Deus
conceda a vossa fé o que minha miséria é indigna de obter para vós. Pedi-lhe, por favor,
por minha falta de devoção, causada por falta de preparação. Estive embaraçado em
negócios a manhã toda, sem poder fazer senão um pouco de oração e ainda assim com
muitas distrações. Julgai por aí o que deveis esperar de minhas preces neste santo dia.
Isto, porém, não me desalenta, porque ponho minha confiança em Deus, e não, com
certeza, em minha preparação, nem em todos os meus recursos. Desejo-vos o mesmo,
de todo meu coração, pois o trono da bondade e das misericórdias de Deus se ergue
sobre o fundamento de nossas misérias. Confiemos, portanto, inteiramente em sua
bondade e jamais seremos confundidos, como nos garante por sua Palavra.

612. – A FRANCISCO DUFESTEL

Paris, 01 de setembro de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Eu vos escrevi recentemente, há oito dias, e vos enviei a ratificação da doação
do senhor Comendador dos genebreses1, e algum tempo antes, enviei ao senhor Bispo
de Genebra2 as cartas que desejou. Resta-me agora dizer-vos que ainda não tenho
notícias do Padre Lambert, desde que me escreveu de Toul. Estou preocupado com isso,
pois que ele devia ir a Saint-Mihiel, cujos caminhos são perigosos. Por conseguinte, não
posso congratular-me ainda com a boa ordem que, estou certo, ele encontrou em vossa
comunidade. Entretanto, eu o faço, dentro do sentimento de perfeita confiança que
tenho de que todas as coisas estão de acordo com o desígnio que Deus tem sobre ela.
Estou igualmente preocupado com o Padre Codoing. Já vieram três correios sem
me trazer notícias dele. Possivelmente está doente e em perigo. Seja bendito o santo
nome de Deus! Recomendo-o todos os dias às orações da comunidade. Peço-vos fazer o
mesmo na vossa.
Escrevi-vos que, embora haja muitas razões contra, penso, contudo, que fareis
bem em comprar uma casa e providenciar, ao mesmo tempo, o meio de obter de sua
Alteza Real3 o poder de ter propriedade em seus Estados.
33
É muito provável que os pais de São Vicente de Paulo, dando-lhe no batismo o nome de Vicente, queriam colocá-
lo sob o patrocínio do primeiro bispo e primeiro patrono da diocese, São Vicente de Xaintes, mártir, que a Igreja
festeja a 01 de setembro e ao qual a diocese, e mais particularmente a cidade de Dax, situada e seis quilômetros de
Pouy, tinha grande devoção. Abelly conta (op. cit., t. III, cap. IX, p. 94), que Vicente de Paulo, curioso por saber as
particularidades da vida do seu santo patrono, mandou fazer pesquisas na Espanha. O biógrafo acreditou talvez,
baseado no martirológio romano, que São Vicente de Xaintes tinha morrido naquele país, contrariamente à tradição
de Dax, que fixa o lugar do seu martírio em Xaintes, pequena localidade incorporada hoje a esta última cidade.
Vicente de Paulo considerava São Vicente de Xaintes como seu segundo patrono.
.
Carta 612. – Dossiê da Missão, original.
11
Jacques Cordon.
22
Justo Guérin.
33
Carlos Emanuel II, Duque de Saboia.
Tiram-me a pena da mão. Peço-vos fazer chegar as cartas do pacote incluso às
pessoas destinatárias e abraçar por mim, que o faço com toda a humildade e afeição
possível, vossa pequena, mas muito amável, comunidade. Dirijo-vos esta prece,
prostrado em espírito aos vossos pés e aos de todos, até ao menor dos irmãos que serve
Nosso Senhor nos seus servidores, e sou, em seu amor, senhor Padre, vosso muito
humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Dufestel, superior dos padres da Congregação da


Missão de Annecy, em Annecy.

613. – A JACQUES CHIROYE, SUPERIOR, EM LUÇON

Paris, 06 de setembro de 1642.

Senhor Padre,

Recebi vossa carta e a que escreveis ao Padre Thibault, e vos agradeço muito
humildemente pelas advertências.
Rendo graças a Deus pela prática de visitar todas as semanas a cada um em seu
quarto, e pelo demais. Ó senhor Padre, como fico alegre com isso! Continuai-a, por
favor. Mas antes de introduzir algum costume de importância, peço-vos avisar-me,
conforme a ordem que acabo de dar à Companhia, que teve de mudar algo no hábito de
fazer visitas à igreja. Não posso deixar de vos tornar a dizer que estou muito contente
com a prática de que me falais.
Fico admirado ao extremo com o que me dizeis do Padre T[hibault]. Ontem de
manhã ele insistiu comigo para permitir-lhe uma viagem a Luçon 1. Não sei em que
ocupá-lo. Não tem espírito de obediência, nem o de comando, e tem uma paixão
inimaginável por comandar. Ontem, à noite, no tempo de silêncio, queixava-se comigo
de que não lhe confiava ofício algum. Disse-lhe que esta disposição de espírito me
atemorizava; só o espírito maligno poderia sugeri-la e era contrária aos demais da
Companhia. Nela, os que detêm cargos de comando pedem para serem depostos e tenho
dificuldade para encontrar entre os outros, em certas ocasiões, quem queira a
responsabilidade do superiorato. Posto isto, penso que ele acompanhará M. N., que
acabou saindo da Companhia, como outros também, que não conheceis, dos quais dois
estão instando para voltar. Mas isso não é conveniente, pois um só deles estragou três
ou quatro.

.
Carta 613. – Pérmartin, op. cit., t. I, p. 420, 1. 364.
11
O Padre Thibault estava nessa cidade antes de ser chamado para Paris.
Uma coisa me consola. É que dificilmente um espírito orgulhoso poderá
permanecer na Companhia. As faltas cometidas por aquele de que falamos, o s.
T[hibault], são notáveis.
Tratarei de enviar-vos brevemente a estampa que pedis. Dizei-me, eu vos
suplico, se não tendes confiança nas bênçãos de Deus sobre os trabalhos de vós três,
aguardando até vos enviarmos socorro. Peço-vos não vos comprometer com a alta
sociedade e abraçar, de minha parte, os Padres Le Boysne 2 e Bonaflos3, aos quais
abraço, prostrado em espírito a seus pés, e aos vossos, de quem sou...
Deus abençoa a missão de Roma. Recomeçam a preparar alguns ordinandos que
recebem as ordens extra tempora (fora do tempo).

614. – A LUÍSA DE MARILLAC

[16421].

A Senhora Le Gras terá a bondade de me avisar, por obséquio, quem ela vai
enviar para Saint-Germain2, se mandar nossa Irmã Perrette para Fontenay3.
Disse a Jeanne4, de Saint-Germain, que peça perdão à comunidade, por ter vindo
de lá sem permissão5. Ela pede para fazer o retiro. Perece-me que será bom lhe dar a
licença.
Pedem uma Irmã em São Sulpício para trabalhar no lugar de nossa Irmã de
Champigny6, doente, pois as outras duas não podem bastar para quarenta doentes muito
distantes. A doente começa a melhorar. A Irmã permanecerá lá por pouco tempo.
Propõem também que a chamemos para respirar o ar livre e acabar de se curar de uma
diarréia.
Madame Duquesa de Aiguillon irá até vós quinta-feira próxima. Será preciso
convocar para aí nossas três viúvas7. Devo falar antes com Madame Traversay.
Perdi vossa carta e não sei se vos devo responder alguma outra coisa.

22
Leonardo Le Boysne, nascido em La Chapelle-Janson (Ille-et-Vilaine), recebido em São Lázaro a 06 de maio de
1638. De Luçon, foi para Richelieu, e depois, em setembro de 1645, para Saint-Méen, onde morreu, a 25 de fevereiro
de 1670. Padre, dos mais edificantes, mereceu o elogio dele feito pelo Padre Alméras, Superior Geral, na circular de
13 de março de 1670: “Acabamos de perder um tesouro oculto de graça e santidade... Distinguia-se pela piedade, pela
mortificação, a mansidão, a regularidade, a obediência e pelo bom exemplo, mas particularmente pela humildade e a
caridade. Julgo-me feliz por ter feito meu Seminário com ele... Era um missionário muito virtuoso e dos mais
completos da Companhia”. Sua notícia nos foi conservada nos manuscritos de Lyon, pp. 234-237.
33
Jacques Bonaflos, nascido em Saint-Flour , em 1611, recebido na Congregação da Missão, a 22 de agosto de 1639.
É a primeira e última vez que encontramos seu nome.
.
Carta 614. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta parece preceder de poucos dias a carta 615.
22
Saint-Germain-em-Laye.
33
Fontenay-aux-Roses.
44
Jeanne Lepeintre.
55
Lemos em uma carta de Luísa de Marillac, de 05 de julho de 1642 (C. 64), que Jeanne Lepeintre tinha grande
desejo de ir a Paris.
66
Provavelmente Champigny-sur-Marne (Seine).
77
Talvez Madames de Herse, de Souscarrière e de Romily.
615. – A LUÍSA DE MARILLAC

[16421].

Já que tendes motivos para colocar Perrette em Fontenay, fá-lo-eis, por favor, e
enviareis a Irmã de Normandia para a Irmã Henriqueta, e a outra de que me falais, para
São Sulpício. Enviareis a de Mans para o lugar de Perrette. Não tendes outra, além da de
Saint-Etienne, para enviar a São Sulpício? Servir-vos-eis dela, contudo, como vos
aprouver.
Peço-vos escrever a Madame Traversay que lhe suplico tenha a bondade de vir
até aqui, amanhã ou depois, e veremos com ela o que é preciso fazer para a contra-
ordem da quinta-feira a Madame Souscarrière. Falaremos da visita das crianças2.
Boa noite, Senhora. Sou vosso servo,

V. D.

Destinatária: Para a Senhora Le Gras.

616. – A LUÍSA DE MARILLAC

Terça-feira, 13 horas [setembro de 16421].

Penso, Senhora, que não há probabilidade de perderdes a ocasião de tomar águas


virtuosas que chegarão depois de amanhã. Quanto a dizer que o fareis em Liancourt,
quais os sinais de que o fareis de modo útil, se fordes visitar as Caridades das aldeias,
como vos pede Madame2? Poderíeis fazer depois as visitas, a não ser que julgueis
oportuno usar lá das águas, com a condição de que não vos falem de negócios.
Não é bom deixar esta Irmã ir ter com o Padre Thibault 3 que planeja sua saída
(da Companhia). Quanto a nós, pensamos em dispensá-la, por uma razão que vos direi
um dia desses.

.
Carta 615. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta parece dever ser aproximada das cartas 614 e 617.
22
Entregues às amas de leite.
.
Carta 616. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta se situa poucos dias antes da carta 617.
22
Madame Liancourt.
33
Jean Thibault.
617. – A LUÍSA DE MARILLAC

[setembro de 16421].

Eis-vos, pois, a dois dias de vossa partida. Não pude ter a felicidade de estar
convosco ontem à noite. Voltei tarde demais, por culpa minha. Eia pois, Senhora, peço a
Nosso Senhor abençoe vossa viagem2 e que vos conceda seu espírito para agir em
sintonia com ele.
Com referência à Companhia das Damas, nada há que mereça vos seja dito, a
não ser que a Providência as leva a voltar os olhos para esse subúrbio, com interesse
numa casa3, pelo menos a algumas, e que a Senhora du Mée se propõe ir visitar as
crianças4 do lado da Normandia. Quem lhe dar neste caso (como acompanhante)?
Ninguém? Ela não tem preferência quanto a isto. Vede, contudo, do lado das Irmãs.
Parece-me que não há muito com que vos preocupar. A de lá vos bastará. Em nome de
Deus, Senhora, não vos apresseis. Se Madame 5 achar bom e vós puderdes ir visitar as
Caridades dessas aldeias, poupai lá vossa fala. É pelo muito falar que temo por vós, em
vossas visitas.
Em nome de Deus, Senhora, tende cuidado com vossa saúde e vivei com alegria.
Peço a Nosso Senhor vos dê ele próprio sua santa bênção, enquanto vo-la darei da parte
dele, na santa missa. Teria dificuldade em ir ter convosco, por causa do embaraço em
que estou, tendo de escrever para vários lugares.
Bom dia, Senhora. Rogai a Deus por mim que sou, no amor de Nosso Senhor, v.
s.,

V. D.

Destinatária: Para a Senhora Le Gras.

618. – A FRANCISCO DUFESTEL

20 de setembro de 1642.

Insistis comigo para introduzir na Companhia a deposição e mudança de


Superiores, com maior frequência do que fizemos até o presente, e me pedis começar
por vós, deixando-vos como súbdito na mesma casa que dirigis.
.
Carta 617. – Original comunicado pelo padre da Missão Jean Moore.
11
Esta carta parece preceder de poucos dias a carta 620.
22
A Liancourt.
33
A fim de alojar os meninos expostos.
44
Os meninos expostos entregues às amas de leite.
55
Madame de Liancourt.
.
Carta 618.. – Reg. 2, p. 258. O original é todo da mão do Santo. O senhor Charavay, que o pôs a venda, cita-lhe a
seguinte passagem, que o registro 2 não reproduz: “...de que rendo graças a Deus, e lhe rogo abençoe sua obra cada
vez mais, e que santifique vossa querida alma e todas as da pequena comunidade e todas as que decidiu salvar, por
vosso intermédio.”
Agradeço a Deus, senhor Padre, a inspiração que vos deu sobre isso, e me
entrego a sua divina Majestade para cumpri-lo, com a ajuda de sua graça. E como o
desejais, começaremos por vós. Dareis, portanto, vossa demissão, por favor, no primeiro
capítulo1 a que presidirdes e entregareis o vosso ofício à pessoa do Padre Guérin 2, a
quem peço aceitá-lo.
Rogo à comunidade considerá-lo em Deus e Deus nele, e obedecer-lhe da
mesma maneira. E como será novo no ofício, e será preciso seja assistido pelos vossos
bons conselhos, peço-vos lhe façais esta caridade, e a ele, pedir vosso parecer em todas
as coisas. Será bom, antes de lhe passar o cargo, lhe digais as pequenas máximas da
direção, em especial esta: é preciso ser firme e invariável quanto ao fim, suave e
humilde quanto aos meios, embora eu a pratique tão mal. E já que o espírito maligno
apronta das suas, nas mudanças de oficiais de uma companhia, indispondo alguns, por
causa da deposição do anterior, no qual têm confiança, e a outros porque não foram
escolhidos e ainda outros pela escolha de tal pessoa, rogo-vos, senhor Padre, fazer uma
conferência sobre o assunto.
O primeiro ponto da conferência pode ser sobre a indiferença que devem ter os
missionários para passar a direção de um oficial à de um outro; o segundo será sobre
como devem comportar-se os missionários entre si, quando da mudança de um oficial; o
terceiro será sobre como deve comportar-se o deposto com o que for eleito e o eleito
com o deposto.
Não posso deixar de dizer-vos que uma das melhores práticas do segundo ponto
é a de não fazer entre si comentário algum sobre o assunto. Ó Deus, senhor Padre! como
ficarei contente se me enviardes o que for dito sobre cada ponto! Peço-vos anotar tudo.
Esqueci-me de pedir ao Padre N. não se imiscuir na questão do visitador de
Santa Maria. Ó senhor Padre, como é bom não nos intrometer a não ser naquelas coisas
para as quais somos credenciados! Deus entra sempre nestes casos, jamais nos outros.

619. – A JEAN GUÉRIN

Paris, 24 de setembro de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Não sou capaz de expressar a consolação que sinto por tudo de bom que o Padre
Dufestel me disse e escreveu a vosso respeito e que o Padre Lambert me confirmou.
Dou graças a Deus e lhe peço santifique sempre mais vossa querida alma e, por meio
dela, aquelas que sua divina Providência quiser salvar e levar à perfeição por vosso
intermédio.

11
Cf. c. 125, n. 13.
22
Jean Guérin.
O Padre Dufestel tem insistido várias vezes comigo para depô-lo e colocar outro
em seu lugar. O testemunho que ele e o Padre Lambert deram de vós me leva a suplicar-
vos, em nome de Nosso Senhor Jesus Cristo, que sirvais à comunidade em seu lugar.
Deus lhe abençoou a conduta, lá onde foi superior. Peço-vos chamá-lo para o vosso
conselho e pedir-lhe o parecer em todas as coisas de importância. E peço a ele fazer esta
caridade para com a comunidade. Espero que ele o fará, com bom proveito. E já que é
conveniente formar duas pessoas para servirem de conselheiros junto aos superiores,
convidareis o Padre Escart, este ano, para isso.
Embora, segundo as regras da Companhia, o superior não seja obrigado a seguir
a pluralidade das opiniões e as coisas propostas se devam resolver entre Deus e ele –
com a condição de responder, na visita, pelo resultado do que tiver feito contra o
sentimento de seu conselho – tereis, contudo, um grande respeito pelos pareceres do
Padre Dufestel, como estou certo de que o tereis.
E como estou com pressa para terminar e não posso dar-vos por mim mesmo
instruções particulares referentes à conduta que deveis ter, peço ao Padre Dufestel que o
faça. Vai aqui apenas uma recomendação. O superior deve ser firme quanto ao fim, e
humilde e suave quanto aos meios; cheio de força na observância das regras e santos
costumes da Companhia, mas afável quanto aos meios de fazê-las observar. E como só
o espírito de Jesus Cristo é o verdadeiro diretor das almas, peço a sua divina Majestade
vos conceda o seu espírito, para a vossa direção e a da comunidade e sou, em seu amor e
no de sua Santa Mãe, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Guérin, padre da Missão, em Annecy.

620. – A LUÍSA DE MARILLAC, EM LIANCOURT

São Lázaro, 28 de setembro de 1642.

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Peço-vos suplicar a Deus me perdoe a falta de não dar com mais prontidão
resposta às cartas que me escrevem.
Nosso Senhor vos tira, estando longe, o cuidado com as ocupações daqui, a fim
de vos entregar melhor ao que se apresentar aí onde estais.
Fareis bem em trazer jovens que tenham vocação e que julgardes em condição,
se se apresentarem algumas por aí.

.
Carta 620. – Dossiê da Missão, cópia tirada do original em poder do abade Dufourny, pároco de Ponthoile
(Somme).
No momento, não teríamos condição de vos enviar ninguém para a visita às
Caridades. Nossa comunidade se encontra em retiro. Fica para uma outra vez, se for
necessário, depois que Madame1 vos tiver levado aos devidos locais e ali tiverdes feito o
que vossa saúde vos permitir fazer. Suplico-vos não falar além de vossas forças nesses
referidos lugares.
Madame Turgis não me falou do que me dizeis a respeito do envio da Irmã
Jeanne, de Saint-Germain, à Senhora du Mée, para a visita das crianças. Parece-me que
ela trabalhará bem. Em todo caso, mandarei dizer-lhe que não a envie logo, se é que já
não o fez.
Certificai a Senhora de Ligny que rezarei pela alma da falecida senhora sua mãe
e por ela.
Não vos apresseis tanto, quando vossa saúde estiver melhor por aí.
Direi ao senhor Vacherot (?) o que me pedis.
Saúdo muito humildemente ao Senhor e a Madame de Liancourt e sou, no amor
de Nosso Senhor, Senhora, vosso servo,

Vicente de Paulo.

621. – A LUÍSA DE MARILLAC

Segunda-feira [entre 1642 e 16441].

Senhora,

Está aqui uma jovem senhora que o Padre du Chesne me encaminhou de Crécy,
para lhe arranjar alguma condição de servir como arrumadeira de quarto ou em alguma
outra coisa. Não sei a quem dirigi-la. Peço-vos dar-lhe algum rumo neste sentido. É de
se desejar que ela fique com pessoas de bem.
Desejo-vos um bom dia e sou, no amor de Nosso Senhor, vosso servo,
Vicente de Paulo.

622. – A JEAN BRUNET E ESTÊVÃO BLATIRON, PADRES DA MISSÃO,


EM ALET

Paris, 08 de outubro de 1642.

11
Madame de Liancourt.
.
Carta 621. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Datas extremas da permanência de Pierre du Chesne em Crécy.
.
Carta 622. – Gossin, op. cit., p. 450, conforme com o original comunicado pelo abade de Labouderie.
Senhores Padres,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Já vos escrevi que a Providência de Deus vos chama a Roma, para um novo
estabelecimento que ali se inicia com uma casa da Companhia. Pedi-vos para vos
dirigirem para lá, partindo no dia seguinte ao recebimento da presente carta e torno a
fazê-lo agora. Supliquei humildemente ao senhor Bispo de Alet acolha a transferência e
vos empreste vinte escudos para a viagem.
Partireis diretamente para Marselha, onde encontrareis o Padre Rose 1 e nosso
Irmão Pascal2, da comunidade, que partirão depois de amanhã e estarão em Marselha
pelo dia 263. Eu os encaminharei ao senhor Comendador de Forbin, que comanda as
galeras, e lhe pedirei vos faça embarcar em uma ou duas galeras que conduz para Roma.
É uma ocasião muito vantajosa em todos os sentidos. Dirigir-vos-eis também ao
referido senhor Comendador. Parece me terem dito que as duas galeras estão no porto
de Toulon, dez léguas para lá de Marselha. Darei ordem ao Padre Rose para se dirigir
para lá, se não as encontrar em Marselha. Fareis o mesmo, por favor, depois de terdes
falado com o senhor Comendador. Ele vos fornecerá dinheiro, se por acaso tiverdes
necessidade. Ele poderá, em qualquer hipótese, vos dar cem libras, como lhe suplico
humildemente.
Escrever-vos-ei pelo Padre Rose, pois não posso fazê-lo no momento: urgem
comigo para ir fazer o sepultamento do bom Padre Pillé, que viveu santamente, e do
mesmo modo morreu4, com sentimentos de amor por nossa vocação, além de tudo que
se poderia dizer a respeito. Pedi-lhe muitas vezes a bênção para vós e para mim. Enviar-
vos-emos um mais amplo relato, depois da conferência que se fará sobre ele.
Recomendo-o a vossas orações e sou, no amor de Nosso Senhor, senhores Padres, vosso
muito humilde servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

623. – NICOLAU PAVILLON A SÃO VICENTE

[Outubro de 16421].

Senhor Padre,

11
Nicolau Rose, nascido em Transloy (Passo de Calais), em 1616, recebido como padre na Congregação da Missão, a
07 de dezembro de 1641, superior em Troyes, de 1653 a 1657.
22
Jean Pascal Goret.
33
Jean Skuddie substituiu Nicolau Rose.
44
A 07 de outubro.
.
Carta 623. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
Ver carta 622.
Recebi apenas uma carta, desde há seis ou sete dias, que faça menção de vossa
ordem, relativa à partida dos senhores Padres Brunet e Blatiron para Roma, e que eles
cumpriram ao mesmo tempo e pontualmente2.
Confesso-vos, senhor Padre, que fiquei um pouco penalizado, vendo-me privado
de tão excelentes operários, num tempo em que mais falta me faziam. Mas como a
Providência assim o dispôs para o bem da Igreja universal, aceito-o com todo meu
coração. No mais, senhor Padre, agradeço-vos humildemente por tê-los cedido para
mim, até o presente, e vos suplico perdoar-me as minhas faltas cometidas para com
eles, e minha pouca fidelidade à promessa que vos fiz de colocá-los logo em condição
de viver na observância mais exata das suas regras. Embora tenha havido alguns
motivos para isso, não foram assim consideráveis em face da ordem dada por vós.
Espero, depois de ter feito penitência por esta falta e por tantas outras, que tereis
compaixão de nossa necessidade, segundo a palavra que tivestes a bondade de nos dar.
Esperamos aqui, a cada dia, o senhor Bispo de Angers 3 para nos consolar desta
perda, com sua presença, como também me sinto consolado por vossa bondade me ter
sinalizado com nova esperança. São novos favores que acumulais para comigo, além de
tantos outros, e que me comprometem a permanecer, no amor de nosso caro Salvador e
de sua Santa Mãe...
É o senhor Bispo de Alet.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, Superior Geral dos padres da Missão da


Congregação da Missão.

624. – A LUÍSA DE MARILLAC

[Entre 1641 e 16431].

Bendito seja Deus, Senhora, pelo que encontrastes em vosso filho! Peço-lhe de
todo meu coração modele o coração dele segundo o do seu Filho, e o vosso, em relação
ao vosso filho, segundo o coração dele (Deus Pai) em relação ao seu Filho Nosso
Senhor.
Já que tendes bastante confiança no senhor Dandilly, não vejo inconveniente em
que lhe entregueis as duas mil libras. Se não conseguirdes colocar o restante, talvez
possamos anexá-lo a todos e cada um dos nossos bens e vos hipotecar o pagamento do

22
O autor da Vida de Dom Pavillon, editada em 1738, pretendeu (t. I, p. 40), que o próprio Bispo de Alet tenha
pedido a saída de Estêvão Blatiron e Jean Brunet, que julgava incapazes de ensinar a teologia aos clérigos de sua
diocese. Raymond Bonnal dá uma outra razão, a saber, a impossibilidade em que se achava São Vicente de satisfazer
às exigências de Nicolau Pavillon, que queria dois missionários a mais (Cf. Raymond Bonnal nas dioceses de
Pamiers e Alet , pelo Abade Benjamin Mayran, Foix, 1914, in-8º, p. 34). A carta do Bispo de Alet nos ajuda a
restabelecer a verdade.
33
Claude du Rueil (1626-1649).
.
Carta 624. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta foi escrita depois da transferência da casa das Irmãs para defronte de São Lázaro (1645), quando Jean
Dehorgny estava em Paris (1641-1643, 1653-1660). O que se diz de Michel Le Gras nos leva a preferir o período de
1641 a 1643.
preço de renda, sobre uma casa daqui, quase à frente da vossa, alugada por cem
escudos. Digo-o no caso em que não encontrardes onde colocá-lo e se estiverdes de
acordo. Seria para o reembolso de um homem que recebeu de nós esta casa.
Quanto aos exercícios de que me fazeis menção, conversaremos depois. O Padre
Dehorgny irá logo dar-vos notícias de vossas filhas de Saint-Cloud2.
Adeus, Senhora. Sou, no amor de Nosso Senhor, vosso humilde servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

625. – A BERNARDO CODOING

Paris, 24 de outubro de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


A presente carta é só para vos dizer que não recebi cartas vossas pelo último
correio e para responder a vossa última carta. Não vejo meio algum de aumentar vossa
renda acima de 2.500 libras, como também as duzentas e cinquenta libras de renda de
vosso dinheiro que empregamos aqui. Ajustareis vossas despesas a isso, aguardando que
apraza a Deus arranjar-vos algo mais, por favor.
A proposta do seminário na Bretanha é muito apreciada por uma pessoa de
autoridade no lugar. Mas não temos pessoas capazes para colocar lá e recursos para a
manutenção do seminário1.
O Padre Skuddie2 partiu com nosso Irmão Pascal3 para ir encontrar-vos.
Escrevera aos Padres Brunet e Blatiron para fazerem o mesmo 4. Dei-lhes contra-ordem,
porque não vos vejo com recursos suficientes e temos grande necessidade deles aqui.
Estamos em missão. Oh! como gostaria que pudésseis fazê-la entre os pobres
pastores! São os favoritos de Nosso Senhor, pois ele quis dar-lhes as primeiras notícias
do seu nascimento, com a exclusão de Jerusalém e da própria Belém, onde nascia.
Vereis.

22
Em nenhuma parte na correspondência de São Vicente e de Luísa de Marillac vemos que tenha havido um
estabelecimento das Filhas da Caridade em Saint-Cloud. Tratar-se-ia aqui de membros da Companhia da Caridade
estabelecida em Saint-Cloud ou de Irmãs oriundas do mesmo lugar?
.
Carta 625. – O original, roubado da casa de São Lázaro em 1789, quando do saque dessa casa, foi para a coleção do
convencional Boissy d’Anglas. Foi posto a venda em Paris, no hotel Drouot, a 13 de junho de 1914, pelos cuidados
do senhor Kra, perito, com quem pudemos tirar uma cópia.
11
Provavelmente o seminário de Vannes (Cf. 1. 660).
22
Jean Skuddie, nascido em Cork (Irlanda), recebido na Congregação da Missão a 09 de outubro de 1638, com a
idade de 29 anos, ordenado padre em dezembro de 1640, falecido antes de 1646.
33
Jean Pascal Goret.
44
Carta 622.
Envio-vos cartas do senhor Núncio5.
Acabamos de realizar uma assembleia de alguns superiores próximos daqui e
dos mais antigos da casa, os superiores de Richelieu 6, dos Bons-Enfants7, de Troyes8, de
Toul9 e de Crécy1010, com os Padres Portail, du Coudray, Lucas, Alméras e Boucher.
Durou dez dias. Examinamos as regras que redigimos, e concluímos as principais.
Deputamos os Padres Portail, du Coudray, Dehorgny e Lambert para examinar e
concluir as demais1111. Determinamos a forma a seguir nas assembleias gerais e
colocamos em prática o que restava fazer na Companhia1212. Enviar-vos-ei tudo isso, a
fim de dar-nos vosso parecer. Nada introduzimos de novo, ou muito pouca coisa, como
dar assistentes ao Superior Geral1313. Assim, poderei morrer, quando for do agrado de
Deus não mais suportar as abominações de minha vida. Não vos chamamos, nem o
Padre Guérin, superior de Annecy, nem o Padre Soufliers 1414, porque todos acabais
apenas de ser colocados nos ofícios que tendes, acrescendo que tomamos esta resolução
no curto período de três dias, por ocasião da presença desses Padres aqui. Sois o
primeiro e o único a quem dou esta notícia. Honrareis o silêncio de Nosso Senhor nisto,
por favor, com quem quer que seja, por um motivo especial que eu tenho comigo.
Abraço, prostrado em espírito, vossa pequena comunidade e vos peço abraçar
todos de minha parte e lhes pedir perdão por ser eu tão mesquinho que não lhes pude
escrever, e sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão de


Roma, em Roma.

626. – JEAN JACQUES OLIER A SÃO VICENTE

[Outubro de 16421].

Quem tem Jesus tem tudo!

Gostaria de suplicar-vos em Nosso Senhor permita ao Padre Lucas vir aqui


hoje, porque deverá estar aqui um herege que me pergunta coisas de que não estou bem
55
Jerônimo Grimaldi.
66
Lambert aux Couteaux.
77
Jean Dehorgny.
88
Jean Bourdet.
99
Jean Bécu.
1010
Pierre du Chesne.
1111
Renê Alméras devia substituir a quem dentre eles deixasse Paris.
1212
A assembleia tinha durado de 13 a 23 de outubro. A ata das sessões nos foi conservada.
1313
Antonio Portail e Jean Dehorgny.
1414
Superior em La Rose.
.
Carta 626. – Arquivo de São Sulpício, cópia da mão de Leschassier.
11
Antônio Lucas estava então em Paris, na assembleia dos superiores. Só voltou muito mais tarde.
informado. Espero de vós este favor, pelo amor de Nosso Senhor. Ele seria útil para
dois fins: para a edificação do povo huguenote e também para a minha instrução, pois
sou muito ignorante e incapaz do cargo que ocupo e do qual desejaria tornar-me menos
indigno em Nosso Senhor, por vosso intermédio. Já lhe tinha pedido ultimamente vos
comunicasse que, dado o pouco tempo que lhe resta, em que ficará nesta cidade, eu
teria grande necessidade de sua convivência por quinze dias, a fim de me instruir sobre
a natureza de doutrinas que poucas pessoas conhecem como ele, como relatava o
falecido Padre de Condren, que muito o estimava e lhe fizera propostas que me seriam
muito úteis, para o bem de Nosso Senhor, no qual sou todo vosso,

Olier.

627. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[1642 ou 16431].

Senhor Padre,

Nossa Irmã Jeanne Dalmagne2 chegou de Nanteuil. O transporte que a trouxe


volta amanhã, às 8 horas da manhã. Não sei se ela deve voltar também, ou então se
julgais conveniente que permaneça aqui por alguns dias. Ela foi ao sepultamento de
nossa Irmã. Em razão disso, não sei o que ela tem a nos dizer. Talvez o saibais pela
carta que vos trouxe e podereis me informar sobre sua permanência. Eu vo-lo peço
muito humildemente, como também de me considerar diante de Deus, amanhã, no santo
altar, vossa muito humilde e mui grata filha e serva,

L. de M.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

628. – A ANTÔNIO LUCAS

Paris, 20 de novembro de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!

.
Carta 627. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Ver nota 2.
22
Jeanne Dalmagne, primeiramente irmã rodeira do Carmelo, foi recebida nas Filhas da Caridade a 25 de março de
1638, colocada em Nanteuil-le-Haudouin (Oise) em junho de 1642, admitida aos votos a 25 de março de 1643. Foi
chamada para Paris no mesmo ano, por motivo de saúde, e morreu a 25 de março de 1644, aos trinta e três anos de
idade.
.
Carta 628. – Original com os padres da Missão de Oria (Itália).
Meu Deus, senhor Padre, como minha alma está consolada pela bênção que sua
divina Majestade se digna dispensar a vossa missão, pela fortaleza que vos comunica
para sustentar tão grande trabalho e pela vida angélica que levam o Senhor e a Madame
de Varize1! Por tudo isto, rendo graças a Deus e lhe peço vos fortifique cada vez mais, e
seja a santificação e a glória do Senhor e Madame Varize. Mas, meu Deus! senhor
Padre, como esta consolação vem mesclada de aflição, pela doença do Padre Roussel 2.
Ó Senhor! Bendito seja Deus, cui sic placuit! (a quem assim aprouve!) não parece ser
possível trazê-lo para aqui neste estado, dada a natureza de sua doença, a estação do
tempo e a distância. Enviar-vos-ei nosso Irmão Arnaldo 3, se lhe permitir sua
indisposição. Não posso enviar-vos o Alexandre4, porque temos conosco doentes os
Padres Bécu e Prevost5.
Não deveis também ir começar sozinho a missão em Marchenoir 6; isso vos
pesaria demais. Ó Jesus! senhor Padre, é melhor adiá-la para um tempo em que nos for
possível enviar-vos o socorro que não podemos mandar-vos no momento, pois todos os
que poderiam ajudar-vos estão em missão. Se o senhor Arcediago de Dunois pudesse
fazer esta boa obra, in nomine Domini, poderíeis acompanhá-lo. Fora disso, eu vos
peço, senhor Padre, diferir a coisa e nada poupar na doença do Padre Roussel, que eu
saúdo muito humildemente e lhe peço, em nome de Jesus Cristo, fazer o possível para
melhorar. Não agradeço ao Senhor e a Madame Varize pela incomparável caridade que
exercem para com o Padre Roussel: só Deus é digno deste agradecimento e de ser a
recompensa deles. Renovo-lhes agora a oferta de minha obediência.
Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Lucas, padre da Missão, presente em Varize,


Varize.

629. – A BERNARDO CODOING

São Lázaro, 21 de novembro de 1642.

Senhor Padre,

11
Varize, pequena comuna de Eure-et-Loire. Madame de Varize chamou para lá as Filhas da Caridade, em 1651 ou
1652.
22
Este nome não se encontra nos antigos catálogos do pessoal.
33
Guilherme Arnaldo, nascido em Embrun (Altos Alpes), recebido em São Lázaro a 27 de abril de 1642, com a idade
de vinte e sete anos.
44
Alexandre Veronne.
55
O Padre Prévost, diz mais a frente São Vicente (carta 631), era “sábio, homem habilidoso nos negócios”. Nos
antigos catálogos do pessoal, não encontramos outro Prévost a não ser Nicolau Prévost, ingressado na Congregação
da Missão em 1646 e falecido em Madagascar, em setembro de 1656.
66
Centro administrativo do Cantão da Circunscrição administrativa de Blois (Loir-et-Cher).
.
Carta 629. – C. aut. – Original na biblioteca pública e universitária de Genebra (ms. fr. 197 f.), que o adquiriu em
1824, em troca de um autógrafo de Calvino.
A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!
Não vos escrevo há 15 dias. Recebi, desde então, duas cartas vossas do lugar
onde pregastes a primeira missão. Deram-me motivo para agradecer a Deus, pela
bênção de sua bondade nesta ocasião. Não pude impedir-me de comunicá-lo à pequena
família, na partilha de oração, em especial na reconciliação acontecida, que me parece
um milagre, tendo em vista o temperamento da região. Tenho um pouco menos
facilidade para entender o italiano. Mas já que isto ajuda a facilitar-vos o estilo, in
nomine Domini! Não sei se Madame Duquesa1, vossa fundadora, o compreende. Eu a
consolo algumas vezes, mostrando-lhe vossas cartas. Quando houver algo de particular,
especialmente aquilo que diz respeito às pessoas da comunidade, poreis num bilhete à
parte.
Enviei-vos as cartas de recomendação do senhor Núncio2 ao senhor Cardeal de
Saint-Onuphrio3 e ao senhor vice-gerente. Peço-vos comunicar-me o efeito delas.
Vossa penúltima carta, como a que a precede e a última, me mostram alguma
mudança de vossa conduta, com relação aos ordinandos e exercitantes, sob o pretexto de
que esses senhores Prelados deixaram cada um com a liberdade de ir ou não ir (para as
instruções e retiros). Sobre isso vos direi que me parece teríeis feito bem em continuar
do modo como a Providência de Deus estava dispondo, que requeria talvez este ato de
paciência e de submissão, para atrair a abundância de sua graça sobre vós.
Teria sido melhor pregar missões em lugares mais humildes e a dos pastores
teria contribuído para isso. Tenho duas ou três razões para tanto: uma é que Nosso
Senhor humilha para exaltar, prova com sofrimentos interiores e exteriores para nos
trazer a paz. Ele deseja frequentemente as coisas mais do que nós. Mas quer levar-nos a
merecer a graça de as fazer, mediante várias práticas de virtude, e a suplicá-la com
muitas orações.
A segunda razão é que é conveniente que vossos principais planos, todos em
favor de Roma, se executem com paciência e longanimidade. Em Roma, os espíritos são
pacientes, observadores da conduta dos homens. E como são sólidos, têm dificuldade
para confiar coisas de importância a pessoas que seguem e se apegam a segundas
inspirações, algumas vezes com prejuízo das primeiras. Oh! como são pacientes e
longânimes e como amam a paciência, e a perseverança nos primeiros planos!
A terceira razão vem do lado de cá, onde a pessoa de que vos falei e um prelado
amigo nosso viram algo em que se deveria pensar, nesta mudança de procedimento.
Além disso, enquanto vamos passo a passo em nossos planos, Deus suscita outros que
vão realizando o que antes pedia de nós.
Aceitai, por obséquio, que eu vos diga, senhor Padre, que sempre notei este
defeito em nós dois, de seguir facilmente e de nos apegar às vezes muito fortemente a
nossas novas imaginações. Isto me fez impor-me o jugo de nada fazer de importante

11
A Duquesa de Aiguillon.
22
Jerônimo Grimaldi.
33
Francisco Antônio Barberini, irmão de Urbano VIII, da ordem dos Capuchinhos, nascido em Florença, em 1569,
criado Cardeal em 1624, religioso de piedade e caridade exemplares. Embora tivesse trocado, há tempos, seu título de
Saint- Onuphre pelo de Sainte-Marie-au-delà-du-Tibre, continuavam a chamá-lo de Cardeal de Saint-Onuphre.
Morreu em 1646.
sem conselho. E Deus me dá todos os dias novas luzes sobre a importância de agir
assim e maior empenho em nada fazer a não ser assim. Em nome de Deus, senhor
Padre, nada façais de importante, nem, sobretudo, nada de novo, sem antes me avisar,
para eu vos dar meu parecer. Vejo uma quantidade de razões que poderíeis alegar em
contrário. Mas crede, senhor Padre, que eu as vejo todas daqui e tenho razões para
responder a todas, e experiências que meus sessenta e dois anos e minhas próprias faltas
me deram4, e que não vos serão inúteis.
As duas principais razões que vos levaram a agir assim são as seguintes: a
primeira, a de que vos falei, isto é, que não podíeis fazer as duas coisas ao mesmo
tempo – pregar a missão e deixar pessoas capazes com os ordinandos. Quanto a isso, já
vos disse que teria sido melhor fazer missões em lugares mais humildes, como a dos
pastores. Acresce que Deus abençoa sempre melhor os inícios mais humildes do que os
que levantam muito barulho e publicam nosso committimus5.
A segunda razão é que, pregando as missões e atendendo os ordinandos de
Velletri6 com êxito, o senhor Cardeal Lenti tiraria daí motivo para valorizar a
Companhia e para mandar anular o decreto dos ordinandos. Dir-vos-ei que isso poderia
acontecer. Mas como me pareceu contrário à simplicidade cristã e ao que me parece que
Deus pede de nós, sempre fugi de realizar ações de piedade num lugar para me tornar
recomendável noutro, exceto uma vez em que fizemos a missão num lugar, para atrair
sobre nós a consideração do falecido senhor primeiro presidente de Paris 7, com quem
tínhamos que tratar.
Deus permitiu que tudo tivesse efeito contrário, pois a Companhia ali deixou
transparecer, mais do que em nenhum outro lugar, a pobreza e a miséria dos espíritos
dos seus membros. E foi preciso que eu lá voltasse depois da missão, para pedir perdão
a um padre, de joelhos, por uma ofensa que um da Companhia lhe fizera. Nosso Senhor
me deu a conhecer com evidência, nesta ocasião, por experiência, aquilo em que até
então acreditara na teoria: Deus pede de nós que jamais façamos algum bem num lugar
para nos tornar recomendáveis em outros, mas visemos somente a ele diretamente,
imediatamente e sem rodeios, em todas as ações, e nos deixemos conduzir por sua mão
paternal.
Escrevi-vos sobre os nossos votos e esqueci-me de vos dizer que é livre aos que
já estão na Companhia o fazê-los ou não. É decisão que diz respeito aos que vierem no
futuro. A maior parte dos que estão convosco já os fizeram e não há necessidade de lhes
falar disso. Penso que apenas o padre Ploesquellec não os fez8. Administrareis isso com
vossa prudência ordinária, em relação aos que se apresentarem no futuro.
Não sei se os seis clérigos, de que me falais que estão se apresentando, são
padres ou estão prestes a sê-lo. Neste último caso, in nomine Domini. Mas se são

44
São Vicente tinha escrito antes: que meus sessenta e dois anos me deram. Ele riscou me deram para acrescentar e
minhas próprias faltas.
55
Privilégio concedido a certas pessoas ou agremiações de não poderem ser citadas a não ser diante do Parlamento.
66
Cidade situada a algumas léguas de Roma.
77
Nicolau Le Jay, barão de Tilly, nomeado primeiro presidente do Parlamento de Paris, em 1630, falecido em 1640.
88
Ele os fez em 1647.
meninos, lembrai-vos, senhor Padre, de que não podemos contar aqui a não ser com o
que vos foi prometido pela fundação, e com isso, ajustai vossas contas.
Recebi as indulgências e o altar privilegiado para La Rose.
Estou preocupado com o acúmulo de trabalho que tendes, e temo não vos
sobrecarregueis o espírito e o corpo além de suas forças. Em nome de Deus, senhor
Padre, poupai-vos.
Sou, em seu amor, v. s.

Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão de


Roma, em Roma.

630. – A JACQUES CHIROYE

Paris, 22 de novembro de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi vossa carta que me informa sobre a continuação de vossa doença, mas
deixa, contudo, a esperança de que bem logo Nosso Senhor vos livrará dela, pelo que
lhe agradeço muito humildemente e lhe rogo haja por bem vos devolver uma perfeita
saúde, para a sua glória, o bem da Companhia e a salvação das almas.
Pedi ao Padre Lambert vos escrevesse que peço ao Padre Collé voltar para
Richelieu, como também ao Padre Durot, a quem escrevo.
Ele me prometeu enviar-me quinhentas libras, ou, seja como for, pedir ao Padre
Perdu vo-las envie. E eu vou procurar enviar-vos duzentas ou trezentas para reparos e
mobiliamento, dentro de dez ou doze dias.
Penso que será bom que o senhor Bispo de Luçon 1 aceite escrever ao senhor
Cardeal2, para obter sua assistência e ajuda para o mobiliamento e a alimentação dos
ordinandos.
Aí está, senhor Padre, o que vos direi no presente, acrescentando que saúdo
vossa pequena comunidade, prostrado em espírito a seus pés e aos vossos. Sou, no amor
de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

.
Carta 630. – O original, propriedade do príncipe de Ligne, se encontra no castelo de Beloeil, na Bélgica.
11
Pierre Nivelle (1637-1661).
22
O Cardeal Richelieu, anteriormente Bispo de Luçon.
Destinatário: Ao senhor Padre Chiroye, superior dos padres da Missão de
Luçon, em Luçon.

631. – A FRANCISCO DUFESTEL, PADRE DA MISSÃO, EM ANNECY1

28 de novembro de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Eis nossas pequenas notícias: o Padre Coudray viaja para a Barbária no intuito
da libertação de cerca de 80 escravos e com o projeto de pregar missão para os outros,
em torno de 10.000, na Argélia.
Nosso Senhor trouxe para a Companhia o Padre Gilles, diretor e professor de
filosofia em Lisieux2, e o Padre Prevost, também sábio, hábil nos negócios, e ainda
alguns outros, que ocuparam o lugar dos que saíram.
Não vos espanteis mais com essas saídas. Nosso Senhor foi seguido e
abandonado por vários milhares de pessoas e reduzido a 120 fiéis em sua morte. Santo
Inácio (Loyola), no começo da santa Companhia que Nosso Senhor instituiu por ele,
mandou embora doze de uma só vez3. E sabeis que não dispensamos nenhum dos
padres, nem algum outro a não ser M.N., ao qual escrevi dias passados e pedi-lhe se
retirasse, por várias razões importantes. Deus sabe e mostra aos homens quanto ele
abençoa bem mais um pequeno número escolhido do que um grande número entre os
quais há quem teme o trabalho e tem apegos às mulheres, às vinhas e às casas.
Penso que é bom não mudarmos o nome que o Santo Padre dá às nossas casas –
da Missão - para chamá-las de Seminários. Suplico-vos, senhor Padre, firmeza no
sentido de não inovar nos termos, nem em outras coisas que se praticam na Companhia,
para conservar a unidade do todo. É inimaginável o inconveniente para uma
Congregação não manter a uniformidade.
Termino a presente recomendando-me a vossos santos sacrifícios e aos dos
outros padres, aos quais abraço, prostrado em espírito a seus pés...

.
Carta 631. – O original, todo da mão do Santo, foi posto a venda em Londres, a 08 de março de 1858, e depois
ficou com o senhor Charavay. Tiramos de empréstimo do catálogo do Sr. Charavay o início desta carta, até as
palavras “e vós sabeis que” (et vous savez que), e a última frase. O resto, do registro 2, pp. 23 e 49.
11
O senhor Charavay garante que a carta foi endereçada a Francisco Dufestel, padre da Missão, em Brest. Ele leu
mal. Dufestel estava no seminário de Annecy.
22
No Colégio de Lisieux, em Paris.
33
Luís Gonzalez, provincial de Portugal, despachou do Instituto vários dos seus coirmãos que murmuravam porque
os empregavam na edificação do Colégio de Coimbra (História de Santo Inácio de Loyola e da Companhia de Jesus,
pelo R. P. Daniel Bartoli, Paris, 1844, 2 vol. in-8º, t. II, p. 85). Teria São Vicente feito alusão a este episódio?
632. – BERNARDO CODOING, SUPERIOR EM ROMA, A SÃO VICENTE

Roma, 1642.

Pregamos uma missão num lugar cujo nome omitiremos. Um povoado fechado,
composto de três mil almas, ou cerca disso, no caminho de Roma para Nápoles.
Durante o mês da missão, encontramos misérias e desordens espantosas. A maior parte
dos homens e das mulheres não sabiam nem o Pai-Nosso, nem o Creio-em-Deus-Pai e
muito menos as outras coisas necessárias à salvação. Havia lá inúmeras inimizades
inveteradas. As blasfêmias eram comuns, blasfêmias de causar horror. Várias pessoas
de toda sorte de condição viviam no concubinato. Várias mulheres da vida e devassas
corrompiam a juventude.
Com tudo isso, encontramos grandes oposições e resistências, e o espírito
maligno nos aprontou ataques violentos, do próprio lado daqueles que mais deviam
apoiar-nos. Enfim, essa missão foi um sofrimento quase contínuo para nós. Não havia
humildade capaz de ganhar o coração dessas pessoas, pois elas julgavam que lhes feria
a honra deixarem-se instruir e se converterem. Não havia meio de fazer as pazes com
elas, a não ser deixando de pregar e confessar. Contudo, depois de 15 dias de
paciência e perseverança, nos exercícios ordinários das missões, estes povos
começaram a abrir os olhos e a reconhecer suas desordens. E no final, a graça de Deus
produziu ali grandes frutos. Aconteceram grandes reconciliações. As inimizades se
apagaram, e as blasfêmias cessaram. Quatro moças devassas se converteram. Entre os
concubinos, um dos mais obstinados, que vivia, há doze anos, em adultério público e
causava muita desordem na sua família e escândalo no povoado, se converteu,
abandonou o pecado e suprimiu-lhe a ocasião. Um outro grande fruto, entre todos os
outros que ordinariamente se colhem nas missões, foi deixarem um pecado abominável,
cujo nome não se diz, ao qual estavam extraordinariamente sujeitos.
A comunhão geral se realizou com muito boas disposições, e todos ficaram
emocionados ao ouvir o choro e o gemido, e ao ver as lágrimas das almas convertidas.
Enfim, apesar de todos os esforços do espírito maligno, esta missão terminou
com grandes bênçãos.

633. – A BERNARNO CODOING

.
Carta 632. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. III, § I, 1ª ed., p. 58.

.
Carta 633. – O original era da mão do Santo. Foi posto a venda por Charavay. Não tendo podido encontrá-lo,
tiramos nosso texto de Pérmartin, op. cit., t. I, l 373, exceto a parte compreendida entre as palavras Fiz alguma
proposta e Fazem-nos a ameaça de que M. N., que foi extraída de um fac-símile do original, conservado na Casa-
Mãe dos padres da Missão. Estes últimos têm ainda em seus arquivos uma folha isolada que pertencia, cremos, a esta
carta e na qual se encontra:
1º Uma nota sobre o conteúdo da carta: “Importância de limpar a Companhia dos incorrigíveis. O Padre
Vicente prefere expor-se a vários perigos a conservar tais pessoas. Excelente em sua firmeza, sabedoria, desapego,
etc.”
2º O endereço, da mão do Santo: “Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Congregação da
Missão de Roma, em Roma.”
Paris, 25 de dezembro de 1642.

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi ontem vossa carta que dá notícia de vossa terceira missão, como também
o decreto do Monsenhor vice-gerente concernente aos ordinandos. Respondo no geral,
não podendo fazê-lo detalhadamente, porque a entreguei no mesmo dia a Madame
Duquesa de Aiguillon, como também a que lhe escrevestes.
Começo dizendo-vos que fiquei tocado de modo inexprimível pelo risco de vida
que correstes e pelo mal que esses bandidos vos fizeram. Ó senhor Padre, como
agradeci e mandei agradecer a Deus por vos ter conservado. Em nome de Deus, senhor
Padre, velai por vossa saúde. O que me dizeis sobre vossa indisposição me aflige
também sobremaneira.
Louvo a Deus por vos ver inteiramente entregue ao trabalho com os ordinandos.
Não há recurso algum em dinheiro a buscar, no momento. Farei o que me for possível.
A miséria da guerra arrefeceu muito o coração dos que poderiam contribuir. A
Providência permitiu que Richelieu ficasse sem fundos. Sua Excelência1, o falecido,
tinha vendido os cartórios de Loudun2, com a intenção de colocar o preço em
propriedades rurais, como o fez. Mas veio a falecer antes de nos fazer a cessão, cujo
projeto me enviou, sem a sua assinatura, dois ou três dias antes de sua morte. Veremos o
que aprouverá aos herdeiros fazer.
A fundação de Crécy, também, não está garantida 3, nada além do que é
indispensável para a manutenção das pessoas que deveríamos ter lá. É a razão da
impossibilidade em que nos encontramos. Falta recurso de lá e daqui, porque o rei
retira, neste ano e no trimestre do outro, nossas rendas de Angers4, as de Ponts-de-Cé
que pertencem à casa de Troyes5, mais de vinte mil libras ou por aí. E não sabemos quid
futurum sit (o que será no futuro) nos anos seguintes. Deus seja bendito!
Não recebemos ainda os pagamentos dos vossos coches de Soissons, embora os
peçamos todos os dias. O motivo são algumas dificuldades encontradas em vosso
negócio. Seguramos vosso dinheiro em razão de uma outra dificuldade que apareceu.
Entregamos cinco mil libras ao senhor Boice, pelo dinheiro de uma letra de câmbio
dessa soma, segundo a ordem do senhor Marchand e a própria carta vossa de junho.
Diga-me, por favor, com quanto dinheiro ficastes da soma que Madame Duquesa 6
enviara e que mandastes de volta, e quanto vos resta aqui.
Fiz alguma proposta de negociação a cerca da importância desta obra, a uma
pessoa, digo, da obra de Roma. Veremos o que resultará disso. Foi à própria Madame
Duquesa de Aiguillon. Esperamos o efeito produzido e vos darei notícia no próximo
3º Um complemento à carta, igualmente da mão do Santo: “A dispensa dos votos que me enviastes não está
correta: ela diz que a pessoa tem 50 anos, e ela tem apenas 36. Suplico-vos, senhor Padre, obter uma outra. Ela está
absolutamente resolvida a jamais se casar e se lhe quiserem dar a dispensa com esta condição, ela o aceitará de
coração. Peço-vos, senhor Padre, trabalhar para isto. A coisa é importante”.
11
O Cardeal Richelieu, morto a 04 de dezembro.
22
É com as rendas dos cartórios de Loudun, dos quais Richelieu lhes tinha feito doação irrevogável, pelo contrato de
fundação, que viviam os missionários de Richelieu.
33
Ver carta 603, nota 5.
44
Doadas a São Lázaro, a 20 de agosto de 1640, pelo Comendador de Sillery.
55
Em virtude de um contrato de 19 de junho de 1638.
66
A Duquesa de Aiguillon.
correio. Se for do agrado de Nosso Senhor que tudo chegue a bom êxito, ou que Ele
providencie os recursos por aí, nós vos enviaremos o Padre Brunet e o Padre Blatiron.
Destinara o último para Saintes7, mas o reterei aqui até que vejamos o que será
possível. Ele vai entrar no seminário 8 dentro de dois dias. Temos dois outros sábios
eclesiásticos9 que estão se dando perfeitamente bem com os exercícios interiores e
exteriores, até mesmo com o nosso modo de pregar, pelo que nos informa o Padre
Alméras, da missão que estão pregando em Clichy. Um era não medíocre professor de
filosofia no Colégio de Lisieux. Se estivessem um pouco mais preparados, vo-los
enviaria, ou um deles.
Temos doze ou quatorze seminaristas, parte de filosofia e parte de teologia, que
se preparam aqui. Não acreditaríeis, senhor Padre, na bênção que Nosso Senhor lhes dá,
no uso do método que ele inspirou à Companhia. Quando estiverem preparados,
teremos, com a graça de Deus, com que vos dar socorro. Todos fizeram bem o
seminário, graças a Deus. Vamos dispensar, contudo, um dentre eles, porque tem o
espírito muito mal adaptado às letras. Custa entender as coisas e só com muita
dificuldade.
Nosso seminário também está cheio, pela misericórdia de Deus. Temos 36 ou
38. Recebemos 7 no último mês1010. Todos são de esperança, pela misericórdia de Deus.
Penso que Nosso Senhor nos concede esta graça por alguma fidelidade que vê na
Companhia em expurgar os incorrigíveis. Alguém daqui me dizia, dias passados, a este
respeito, que seis dos melhores não fariam na Companhia tanto bem quanto um único
incorrigível nela faria de mal. Um dos que dispensamos, há quatro ou cinco dias, me
escreveu que se não o recebêssemos, ele me mataria e vários outros da Companhia, ou
botaria fogo aqui, para se enforcar à porta. Nosso Senhor me concedeu a disposição para
enfrentar esse risco, de preferência a receber na Companhia uma pessoa que nela viveu
como ele.
Fazem-nos a ameaça de que M. N., a quem escrevi duas vezes para se retirar da
Companhia, vai escrever contra nós. In nomine Domini, é melhor oferecer-se às
maledicências de um homem que de mantê-lo, dado o modo como vivia. Meu Deus,
senhor Padre, o que não fizemos para colocá-lo no modo de vida dos outros? Ele
próprio dizia a uma senhora de insigne piedade que me fizera um mal maior do que todo
o resto. O que fez contra mim não é nada. Mas é verdade que fez muito mal à
Companhia. Nosso Senhor tirará disso sua glória, se for do seu agrado. M. N. não sendo
pessoa própria para aqui, como o seria para aí? É preciso limpar a Companhia. Dez bons
valerão por cem. E cem que não são chamados ou não respondem aos desígnios de
77
Embora os padres da Missão não tivessem ainda estabelecimento algum na diocese de Saintes, não deixavam de
trabalhar lá, desde 1640, com grande proveito da religião (Cf. Abelly, op. cit., 1. II, p. 36)
88
O Seminário Interno era, para a Congregação da Missão, o que é o noviciado para as ordens religiosas. Nele eram
recebidos os recém-chegados para se formarem na prática das virtudes do seu estado, e instruí-los sobre o gênero de
vida e os deveres dos missionários. São Vicente readmitia nele, a pedido, os padres do Instituto que sentiam
necessidade de se afastar, por um ou vários meses, das ocupações exteriores, para recuperar o fervor inicial da sua
vocação.
99
João Batista Gilles e Francisco Prévost. Esta carta, a seguinte, e outras ainda, mostram que São Vicente ficava feliz
por receber na sua Congregação padres instruídos e não ficava com os que julgava incapazes. A lenda que no-lo pinta
como fazendo pouco caso da ciência é de origem jansenista.
1010
Os Padres Blondel, Gilles, Prévost, Cuissot, Mugnier e Dunots. O catálogo do pessoal não nos dá a conhecer o
sétimo.
Deus, não valem dez. Oh! Como Deus o mostrou muito bem quando ordenou que antes
da batalha se publicasse que os medrosos, os casados daquele ano, os que tinham
plantado uma vinha ou edificado alguma casa se retirassem, sabendo muito bem que
fariam mais mal do que bem no combate!
Dizeis-me que é de se desejar que a residência do Geral seja em Roma. É uma
grande questão. Se Nosso Senhor me desse força para ir visitar-vos aí (isto entre nós), in
nomine Domini, nós o veríamos. Recomendai-o a Deus. Não posso olhar só o meu lado.
O desejo que tenho de ir estar convosco e toda a vossa comunidade poderia vir da
natureza.
O senhor Marechal de la Meilleraye1111 é governador da Bretanha e dentro de
dez dias vai para lá, para reunir os Estados. Madame Duquesa 1212 lhe falará sobre Saint-
Yves e lhe entregará vosso relatório1313. Ela me disse que o senhor Cardeal14 14estava
fascinado por...Bendito seja Deus por ter a Providência disposto de outra forma!
Realizamos dois ofícios religiosos solenes e celebramos várias missas por ele. Celebrai
muitas aí, por favor. Recomendo igualmente a vossas orações o falecido senhor Cardeal
de Gondy1515. Oh! Quanto perdemos também com sua morte!
Receio esquecer de vos renovar um aviso e de vos recomendar nada escrever
sobre negócios de Estado daqui, porque posso assegurar-vos que, além de ser contrário
ao nosso espírito e, como penso, ao de Nosso Senhor, todas as cartas correm o risco de
ser lidas. Além do mais, devemos ser muito fiéis à nossa prática de não nos ocupar com
tais coisas, nem com notícias do mundo.
Eis, senhor Padre, aproximadamente, o que ora vos posso dizer. Abraço-vos, a
vós e vossa comunidade, prostrado em espírito a seus pés e aos vossos e sou, no amor
de Nosso Senhor...
Esqueci de dizer-vos que é conveniente, e é uso de toda comunidade bem
ordenada, que os superiores particulares dêem aos seus súbditos a liberdade de escrever
ao Superior Geral, sem ler as tais cartas, nem as respostas do Superior Geral. Peço-vos
dizê-lo à comunidade, como o faço ao Padre Germano, que me falou bem de vós, o que
eu não saberia de outro modo.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Congregação da


Missão de Roma, em Roma.

1111
Charles de la Porte, Duque de Meilleraye, nascido em 1602, deveu sua rápida fortuna, tanto à proteção do Cardeal
de Richelieu, seu primo, quanto ao seu valor pessoal. Foi nomeado grão-mestre da artilharia em 1634, Marechal de
França em 1637, superintendente das finanças em 1648, duque e par em 1663. Foi ele que sugeriu a São Vicente o
pensamento de enviar missionários a Madagascar. Morreu em Paris, a 08 de fevereiro de 1664.
1212
A Duquesa de Aiguillon.
1313
O Governador da Bretanha tinha o direito de dispor da igreja Saint-Yves.
14 14
O Cardeal Richelieu.
1515
Henrique de Gondi, Bispo de Paris (1598-1622), primeiro Cardeal de Retz e chefe do Conselho do Rei, tinha
morrido no acampamento do Rei, diante de Béziers, no mês de agosto de 1622, com a idade de 52 anos. Porque São
Vicente o recomenda, a 25 de dezembro de 1642, às orações do Padre Codoing? O fato é tão estranho que somos
levados a nos perguntar se esta frase reproduz fielmente o original.
634. – A PIERRE DU CHESNE
Senhor Padre,
A graça de nosso Senhor esteja sempre convosco!
Não duvido que o assunto da presente carta vos cause de início desgosto e tristeza,
uma vez que ela é destinada a vos dar notícia da perda de nosso bom Padre Pillé, perda
que eu senti tão vivamente como nenhuma outra, porque eu o considerava como a
felicidade e a benção da Missão. Temos, no entanto, motivo para nos consolar, pela
certeza que nos resta de que não o perdemos de vista. A vida santa que ele levou e sua
morte feliz dão testemunho de que ele agora está no céu e, portanto, de que ele está mais
presente a nós e é mais capaz de fazer à Companhia um bem maior do que nunca. As
duas conferências que fizemos sobre suas virtudes o atestam amplamente, como
podereis ver pelo resumo que vos estamos enviando.
Mas antes de iniciar-lhe o relato, peço-vos considerar que ainda que eu descrevesse
por extenso tudo que me foi referido, seja de viva voz seja por escrito, não poderíeis
com tudo isso conhecer toda a vida deste grande homem, porque não fomos ainda
informados de uma quantidade de coisas notáveis que se poderia dizer dele,
particularmente do que se passou antes de sua entrada na Companhia.
Todas as suas ações são como pedras preciosas que merecem ser
cuidadosamente recolhidas e conservadas. Esperamos fazê-lo com o tempo, se Deus
quiser, mediante a assistência divina. No presente, contentar-me-ei com a amostragem
de algumas, a fim de que com estas possais avaliar as demais.
Para proceder com a ordem e com a simplicidade ordinária da Missão, começo a
dizer que o Padre Pillé se chamava Jean e era natural de Ferrières, diocese de Sens 1. Seu
pai e sua mãe eram virtuosos e tementes a Deus. Isto ficou evidente no cuidado todo
especial de educá-lo na virtude e no temor de Deus. Desde a infância, deu provas da
escolha e dos desígnios da Providência divina sobre ele. Com efeito, sentindo, desde
então, o coração ardendo do desejo de se consagrar a seu serviço de um modo todo
particular, concebeu o desejo de buscar os meios para isso. Vendo que a ciência era uma
ajuda não pequena para a virtude, ele se propôs prover-se dela. Como seus pais não
queriam que ele estudasse, decidiu ir morar em Paris, para ter mais oportunidade de
fazer seus estudos. Vendo, um dia, que seu pai ia a esta cidade com a charrete carregada
de mercadorias, subiu disfarçadamente nela e se escondeu debaixo do feno, temendo
fosse descoberto e despachado de volta para casa. E se deu tão bem que chegou a Paris,
onde encontrou meio de se entregar aos estudos. Empregou fielmente nisso o tempo
possível, crescendo na ciência e na virtude. Frequentava os sacramentos, fugia das más
companhias e só encontrava prazer em estar com o bom Deus que o destinava a ser seu
ministro. O Senhor lhe concedeu profundo apreço ao estado eclesiástico, no qual entrou,
ardendo do desejo de trabalhar pela salvação do próximo. Foi ordenado padre como
pertencente a Saint-Nicolas-des-Champs2, onde foi motivo de grande edificação.

.
Carta 634. – C. as.– Dossiê da Missão, original. Esta carta foi enviada a todas as casas da Companhia.
11
Ferrières-Gâtinais, hoje sede do cantão de Loiret.
22
Paróquia de Paris.
O Pe. Gallemant, doutor da Sorbona e homem de vida santa, vendo o zelo com
que o bom servo de Deus agia na salvação das almas e que nada melhor pedia do que
trabalhar, o fez seu vigário em Notre-Dame de Vertus 3, onde não trabalhou menos do
que antes, exercendo as funções de pároco.
Com isso, o mesmo Pe. Gallemant que não podia, por motivos muito justos
residir na paróquia, passou com confiança toda responsabilidade para ele. Aprouve
porém a Deus dispor do senhor seu tio sacerdote, Pároco de Ferrières, ao qual ele
sucedeu. E foi ali que este bom servo de Deus aprofundou a consciência da obrigação
que tinha um pastor de procurar a salvação das almas a ele confiadas.
Quem seria capaz de dizer a devoção e o fervor com que ele desempenhava a
função de pároco? Em nada se poupava, seja no púlpito, seja no confessionário, seja em
outra ocupação. Em tudo Deus lhe concedia graças e bênçãos, especialmente na direção
das consciências.
Quando sua enfermidade, iniciada desde então, não lhe permitia pregar ou dar
catecismo, ele o fazia por meio dos padres franciscanos ou outros religiosos, aos quais
dava instrução a respeito de tudo o que havia a fazer, em favor dos seus paroquianos.
Todo seu cuidado paternal e seu raro exemplo não impediram que, nos primeiros
anos, ele fosse caluniado, provado e perseguido por suas próprias ovelhas,
particularmente por um certo justiceiro do lugar, e até pelos próprios religiosos.
Moveram-lhe um processo por ter estabelecido lá a Confraria do Rosário. É incrível
quanta dificuldade suportou e quanta constância demonstrou, ao mesmo tempo. Um
outro que não tivesse sua virtude teria abandonado tudo. Mas ele, como bom pastor, se
manteve sempre firme, e acabou vitorioso sobre os inimigos.
Mas, o que é mais ainda, conquistou-lhes depois tão bem o coração que não
havia ninguém mais tarde que não amasse e não o estimasse como um homem de Deus.
Contudo, vencendo os adversários, ele perdeu a saúde e adquiriu uma doença
corporal que o fez sofrer e definhar até a morte. Em compensação, tornou-se mais sadio
e mais forte na alma. E isto ficou evidente nas raras virtudes que o viram praticar
depois, com maior perfeição.
Entre outras coisas, era um grande amante do asseio na igreja. Não suportava nela
sujeira alguma. Viram-no muitas vezes passar momentos depois do almoço a arrumar a
igreja e os paramentos. Velava também com grande cuidado para que o serviço divino
se realizasse com a decência requerida. Ele próprio assumia a tarefa de ensinar o canto.
Não podia tolerar nenhuma imodéstia na igreja. Tão logo o viam chegar, todos se
colocavam no devido lugar. Enfim, podia dizer com toda razão: zelus domus Dei
comedit me4 (O zelo de tua casa me devorou).
A casa dele era um albergue para os pobres em trânsito, e nela ele os agasalhava.
Tinha todo prazer em receber os religiosos, particularmente os franciscanos, que ele
acolhia como anjos enviados por Deus. Era bonito vê-lo caminhar ao encontro deles,
recebê-los de braços abertos com tal efusão de coração que se poderia dizer que os
conduzia na palma das mãos. Enfim, cumpria para com eles todas as atribuições de um
hospedeiro muito atencioso e caridoso. Providenciava de ordinário uma pessoa que os
33
Em Aubervilliers (Seine).
44
Jo 2,7
conduzia às casas para pedirem esmolas. Ajudava-os a guardar as provisões em sua
casa, servindo-lhes como verdadeiro pai.
Nosso Senhor lhe dera a graça de uma maravilhosa compaixão para com os pobres.
Distribuía amplamente esmola duas vezes na semana. Mas jamais dava esmola corporal
sem acrescentar a espiritual, por alguma boa palavra de edificação. Tão logo soubesse
da notícia de algum doente, viam-no, a este caridoso pastor, deixar todos os trabalhos e
até mesmo o descanso para ir socorrê-lo. Como sua enfermidade o levasse a temer não
pudesse desempenhar bem o seu ofício de pároco, pois tinha apenas um vigário,
providenciou um outro, embora não fosse obrigado a isso de modo algum. Com efeito,
era suficiente apenas um porque ele não deixava de trabalhar, por si mesmo, em tudo
aquilo que lhe fosse possível. Enfim, se pela obra se conhece a excelência do obreiro,
basta apenas lembrar que a paróquia de Ferrières, no começo, era uma terra inculta.
Quando a deixou, encontraram-na tão bem cultivada que eu não sei se havia alguma que
o fosse melhor, numa palavra, podemos dizer que era um pastor bonus.
Eu iria muito longe, se quisesse descer aos pormenores de sua santa vida como
pároco. No entanto, ele se considerava sempre um servo inútil, julgando ter os ombros
muito frágeis para suportar um fardo tão pesado como o de um pároco. Assim, acabou
renunciando à paróquia, temendo o juízo de Deus. Mas antes de deixá-la, fez duas
coisas. A primeira foi que, embora pudesse dizer quid potui facere vineae meae et non
feci5 (o que poderia eu ter feito para a minha vinha e que não fiz?), contudo mandou
pregar missão na paróquia, e nela todos os paroquianos fizeram sua confissão geral. A
Confraria da Caridade foi instituída e todas as desavenças foram apaziguadas. Até uma
grande parte dos antigos religiosos fizeram a confissão geral. Em segundo lugar,
providenciou para a paróquia um excelente sucessor: um irmão seu que ele tinha
educado e mandara estudar para esse fim. Assim ele tinha motivo de viver com a
consciência tranquila, porque seu irmão foi e é ainda um dos melhores párocos que eu
conheço.
Tendo provido a sua paróquia, o Padre Pillé resolveu entrar em nossa
congregação. Já tinha idade e estava doente. Embora eu tivesse escrúpulo de receber na
Companhia párocos que trabalhavam bem em suas paróquias, sua virtude e santidade e
ao mesmo tempo sua grande instância e perseverança em no-lo pedir tiveram tanto
poder sobre mim que, depois de tê-lo feito postular durante tanto tempo, eu o admiti
enfim no número dos nossos missionários. Entrou em nossa Companhia no mês de
setembro no ano de 1630, com o desejo de consumir o resto de seus dias nos exercícios
da Missão. Aprouve, porém, a sabedoria divina, que queria nos pregasse ele pela
paciência, deter o curso e a impetuosidade de seu zelo, com sua enfermidade. Ela
continuou a afligi-lo e o impediu de realizar as funções da Missão da maneira como
teria desejado. Contudo, ele pregou algumas missões, como vamos dizer adiante,
falando das virtudes que o vimos praticar desde que tivemos a felicidade de tê-lo
conosco. Eram virtudes raras e eminentes. Entre outras, realçamos as seguintes.
A primeira é o amor que tinha a Deus. Um tal amor que o fazia palpitar e como
que perder o fôlego, aspirando por ele noite e dia. Falava constantemente de sua
grandeza e dos privilégios que acompanham aqueles que o servem. Lembrava como
55
Is 5,4
Deus é fiel aos que só lhe procuram agradar e quanto ama os que o amam e glorifica
aqueles que o glorificam. Quem quisesse alegrá-lo, era só falar-lhe de Deus. Este amor
o tornava muito afeiçoado às coisas concernentes ao serviço divino. Tinha um elevado
apreço a todos os ordenamentos da Igreja, com um singular prazer nas cerimônias, nas
rubricas, no canto gregoriano, na música, etc. Não deixava de lamentar muito a
ignorância e o escândalo dos padres e sua negligência em observar as rubricas, em
praticar as cerimônias e em manter limpas as igrejas. Dizia frequentemente: “penso que
não há mais fé no mundo. Os pregadores não pregam as verdades do evangelho. O
pobre povo tem fome da palavra de Deus e deixam-no morrer de fome por falta de
assistência. Parvuli petierunt panem, et non est qui frangat eis 6 (os pobres pediram pão,
e não há que lhos parta).
Era muito exato na recitação do breviário. Ao cair doente, ficava triste se não
pudesse rezá-lo. Embora sua enfermidade fosse tal que lhe permitisse dispensar-se dele,
contudo, ele o rezava frequentemente com prejuízo de sua saúde com tanta devoção que
chegava a chorar. Tinha sempre nos lábios algum versículo do profeta Davi,
principalmente aquele que o víamos repetir com frequência: Domine, dilexi decorem
domus tuae26 (Senhor, amei a beleza da tua casa). Mostrava assim quanto amor ele
tinha às coisas de nossa religião. Quando cumpria a principal, a Santa Missa, era com tal
devoção que transmitia o amor de Deus a todos que o viam. Viram-no frequentemente
chorar de devoção durante a celebração. Só deixava de celebrar quando a doença o
impedia. Chegaram a vê-lo tão fraco no altar e com tanta dor de estômago, que
pensavam fosse ele desfalecer. A tristeza que tinha ao tomar os remédios era porque o
impediam de celebrar. Um mês antes de sua morte viram-no ajudar a missa sem quase
poder se manter. Tinha uma grande devoção ao Santíssimo Sacramento do altar. Fazia
continuamente atos de fé sobre este mistério e experimentava fervorosas aspirações,
dizendo às vezes entre lágrimas: “Meu salvador, não vos conhecem, não têm fé, etc.”.
Desta grande caridade nascia um tão grande desejo da salvação das almas que
estava pronto a todo o sacrifício para a salvação de apenas uma. Com efeito, quando se
tratou de ir para a missão e sua enfermidade lho permitiu, sabe Deus que ele não se
poupou de modo algum. Embora precisasse mais de repouso do que de trabalho,
contudo, trabalhava além de suas forças. Pregou três ou quatro missões, nas quais os
que foram enviados com ele disseram que jamais tinham visto um missionário trabalhar
a tal ponto. Era o primeiro no confessionário. Ficaria contente de passar ali o dia inteiro
sem comer, se a obediência não moderasse o seu zelo. Na quarta missão, as forças do
corpo lhe faltaram totalmente, de tal sorte que foi preciso trazê-lo de volta. Foi nesse
tempo que começou suas queixas, dizendo que era inútil para a casa, para a qual
trouxera apenas incômodo. Era essa a sua fala mais comum. “Meu Deus, dizia um dia
chorando a um de nossos irmãos, lá estão as almas de irmãos nossos que caem no
inferno, por falta de instrução, enquanto eu estou aqui sem fazer nada!”.
No que diz respeito à devoção e firmeza na sua vocação, era algo inexprimível, e
só ele mesmo poderia revelar seus sentimentos. Ficava como que fora de si mesmo
sempre que lhe tocavam no assunto. Pode-se constatar isso numa resposta que ele deu a
66
Lm 4,4
26
Sl 26,8
um de nossos irmãos clérigos que lhe perguntava como estava passando. O senhor
Padre. Pillé lhe respondeu que ele era inútil, que ele estava sendo pesado para a casa. O
clérigo, por fora do que ele pensava, lhe diz: “ Mas como senhor Padre, estaríeis
querendo ir embora?” Foi-lhe como um golpe de punhal. Jamais lhe teriam podido tocar
num ponto tão doloroso. “Ó meu irmão, lhe disse ele com lágrimas nos olhos, livre-me
Deus de ter esse pensamento! Se me colocarem para fora da casa por uma porta, entrarei
pela outra, ou antes, morrerei na soleira”. Apreciava e amava tudo que pertencia à
Missão, fosse coisa pequena ou de maior importância. Tinha uma devoção muito
sensível para com o Seminário. Alegrava-se quando podia prestar-lhe algum serviço,
como escrever em grandes letras os nomes de nossos irmãos, transcrever escritos, colar
estampas sobre cartões, etc. Quando o falecido padre de la Salle, então diretor do
seminário, o chamava para atender as confissões dos seminaristas, fazia-o com indizível
alegria. Ouviram-no dizer frequentemente: “Se tivesse um pouco de saúde, insistiria
para ser admitido no número dos seminaristas para servir e obedecer como o menor de
todos. Não o podendo, com grande pesar meu, trato de suprir esta falta com estes
pequenos serviços”. Dizia frequentemente aos nossos irmãos do seminário: “Ó como
sois felizes por ter tão bela ocasião de trabalhar na própria perfeição! Nós não a
tivemos, em nosso tempo! Coragem, portanto, meus irmãos! Tudo depende de vós”. Um
dia, um de nossos irmãos se recomendou às suas orações. Ele lhe disse que fazia a ronda
todos os dias, querendo dizer com isso, que rezava por cada um em particular,
começando do mais antigo da Companhia até o mais novo.
Quem quisesse alegrar o Padre Pillé era só falar-lhe sobre os frutos das missões
e dos bons operários da Companhia. Mas se quisesse entristecê-lo, era só lembrar-lhe a
saída de algum. “Meu Deus, disse um dia a esse respeito, em que estão pensando esses
infelizes? Quanto a mim penso que estão cegos. Enganam-se ao pensar que terão êxito
fora da Missão. Não sabem eles que, saindo, são como peixes fora d’água e como
membros separados do corpo, que não podem mais participar dos influxos da cabeça?
Oh! como são dignos de compaixão!”. Mas quando lhe diziam que alguém acabava de
ser recebido na Companhia, seu coração ficava arrebatado e transportado de alegria. E
por mais doente que estivesse, não conseguia impedir que esses sentimentos
transparecessem fora: no seu corpo que vibrava, no semblante que repentinamente se
iluminava, nas mãos que ele erguia e juntava em forma de prece, nos braços com que
abraçava cordialmente seu novo irmão, nos olhos, que derramavam lágrimas de júbilo, e
sobre tudo na língua, que não podendo moderar o impulso do coração, proferia palavras
tão fervorosas, tão cheias de poder, de veemência e de vivacidade, que o Espírito Santo
parecia estar em sua boca em forma de línguas de fogo. “A Missão, dizia ele, é o
espírito dos primeiros cristãos. É uma vida toda apostólica. É o soberano e último meio
que Deus encontrou para reformar a sua Igreja. Parece-me que sua bondade, sua
sabedoria e sua onipotência se esgotaram nessa obra-prima de suas mãos. Oh! como sua
Providência tem grandes desígnios sobre a Missão! Oh! veremos grandes coisas! Oh!
que felicidade ser missionário! Como sou feliz por pertencer ao número deles e ao
mesmo tempo infeliz por ser tão inútil e tão pesado à Missão! Etc.” Dizia a mesma coisa
e mais ainda, sempre que lhe falavam do assunto da Missão, particularmente no leito de
morte. Não conseguia impedir-se de falar sobre ela a todos que o vinham ver e com
ardor e veemência jamais vistos, de tal maneira que não tinha forças e palavras a não ser
para expressá-lo. E o melhor, penso eu, é que dizia tudo isso como sentia no coração,
pois teria escrúpulo de consciência de dizer a menor coisa contra a simplicidade e com
exagero. Sabeis que não costumo exagerar as coisas, mas posso garantir-vos que me
seria impossível poder exprimir-vos os elevados sentimentos que ele tinha da Missão e
que tudo que eu disse não é nada em relação ao que falta dizer. Deste modo, é melhor,
no presente, contentar-me com admirá-lo e vos deixar imaginá-lo. Dir-vos-ei somente
que quanto mais ele ia realçando a grandeza de nosso Instituto e exagerando os baixos
sentimentos sobre si mesmo, tanto mais me parecia grande em santidade e útil a toda
nossa comunidade, de tal modo que não podia impedir-me de dizer frequentemente e em
alta voz: “ O senhor Padre Pillé, só com o seu não - fazer e o seu padecer, fazia mais
para Deus e para a casa do que eu e toda a nossa Companhia agindo e trabalhando sem
cessar”.
Sua humildade era muito grande e muito profunda. O que acabamos de dizer
sobre a baixa estima que tinha de sua pessoa é uma prova bastante evidente. Era tal sua
humildade que embora lhe tenha dito várias vezes estimar como uma grande bênção tê-
lo em nossa companhia, não se deixava, contudo, convencer. Assim, viveu sempre
nestes baixos sentimentos sobre si mesmo, dizendo, em todas as ocasiões que ele era
inútil para a casa, que se julgava indigno de estar nela, que era um peso para a casa e
que não merecia o menor dos bons serviços que lhe prestavam, mesmo em suas
enfermidades.
Não se contentava de ter esta humildade no coração e nos lábios. Cuidava, por
todos os meios, de colocá-la em prática nas ações, oferecendo-se com este intuito, para
prestar serviços nas coisas menores e mais simples da casa. Entre outras coisas, é de
notar-se que foi, um dia, enviado para ajudar nosso Irmão Alexandre, então despenseiro.
Ele o fez de tão bom coração que o próprio Irmão nos disse que jamais vira igual
submissão de vontade e de juízo, pois ele lhe obedecia como se fosse apenas um jovem,
ele que era padre há muito tempo e de idade avançada.
Suplicou, um dia, com insistência a um de nossos irmãos da cozinha adverti-lo
de suas faltas. Ajudava com frequência ao cozinheiro em tudo que podia e nos serviços
mais baixos e desprezíveis. Assumia o trabalho de ensinar o canto aos seminaristas
menores, embora fosse por eles não pouco atormentado. Sua humildade apareceu ainda
no fato de não ousar dar seu parecer sobre assunto algum, qualquer que fosse
principalmente se se tratasse de ciência, pois se julgava ignorante. Dizia, um dia, a um
de nossos irmãos que era inapto para qualquer ministério da Missão, por causa de sua
incapacidade. Dizia, ainda, que era incapaz de conduzir um grupo de ordinandos, o que,
no entanto, faziam,na ocasião, irmãos nossos, simples clérigos. Contentava-se com
organizar as cadeiras dos senhores ordinandos, dizendo que era este o serviço que lhes
podia prestar, embora na verdade fosse bastante capaz e experimentado nos assuntos
tratados. E o que é mais notável, é que essas palavras eram na verdade o reflexo dos
sentimentos do seu coração. Nisto consiste a verdadeira humildade.
Sua obediência não era menor do que a sua humildade. Nada fazia sem
permissão, embora já fosse antigo na casa. Fazia questão de pedir licença aos superiores
para as menores coisas. Aceitava com total indiferença tudo que lhe dessem, fosse bem
ou mal preparado, mesmo quando lhe causasse repugnância e aversão. Quando os
seminaristas menores lhe pediam alguma coisa, ficava preocupado por não saber se
tinham permissão. Esta grande obediência o levava a ter uma maravilhosa
condescendência para com seus iguais e mesmo para com seus inferiores. Jamais
contradizia alguém. Aceitava participar de qualquer assunto, com quanto fosse de
edificação, e deixava fácil e prontamente o que estava fazendo para se aplicar a outra
coisa que lhe pedissem. E o que é mais perfeito é que obedecia em tudo com submissão
de juízo. Disso davam testemunho os atos heroicos de que vamos logo tratar, de tal
forma que podemos dizer: Factus est obediens usque ad mortem 27(Fez-se obediente até
a morte).
Sua paciência foi heroica. Jamais demonstrou o menor sinal de impaciência.
Bendizia a Deus nos sofrimentos frequentemente tão atrozes que inspirava piedade a
todo mundo. Dir-se-ia a cada momento que ia entregar o seu espírito. Apesar de tudo
isso, não deixava de permanecer alegre e sempre igual a si mesmo. Este pobre homem
não podia levantar-se de manhã sem aumentar sua indisposição nem se vestir sozinho, a
não ser com muita dificuldade. No entanto não deixava de participar da oração com a
maior frequência possível, embora tivesse grande necessidade de repouso, pois quase
não dormia durante a noite, por causa da tosse. Enfim, seu zelo o levava a fazer mais do
que podia. Por causa disso, viram-no frequentemente cair sobre a escada sem poder se
sustentar nem se levantar. Não se contentava com as cruzes que Deus lhe enviava. Ele
próprio se infligia alguns sofrimentos, macerando sua carne, não obstante suas grandes
enfermidades, ora com jejuns, ora com outras austeridades, como se pode presumir a
partir de uma disciplina ensanguentada, encontrada em sua cama, após sua morte. Era
enfim, um homem de dor e ao mesmo tempo um exemplo de paciência. Embora tenha
sempre parecido tal para todos, é preciso reconhecer que no leito de morte o era de um
modo particular. Parecia que a paciência estava como que em seu trono triunfando dos
sofrimentos e das dores. Seus males eram maiores do que nunca e suas forças muito
frágeis. Mas sua paciência aumentava cada vez mais. Não somente suportava de coração
e com submissão à vontade de Deus os próprios sofrimentos, mas se alegrava com eles e
desejava sofrer mais ainda por Nosso Senhor e pelo próximo. É o que o fazia dizer
repetidamente com tanta feição: Domine, bonum mihi quia humiliasti me (Senhor, foi
bom pra mim o ter-me humilhado). Bendito sejais, oh meu Deus! Como sois bom! Absit
mihi gloriare nisi in cruce Domini Nostri Jesu Christi 28! Etc. (longe de mim gloriar-me
a não ser na cruz de Nosso Senhor Jesus Cristo!).
Possuía a virtude da pobreza no mais alto grau. Não tinha apego algum às coisas
da terra. Comprazia-se com ser tratado como pobre e em servir-se das coisas mais
pobres. Chegava a ponto de recolher o que encontrava, se pudesse servir para alguma
coisa, como um pedaço de papelão, de madeira, uma pequena agulha. No que diz
respeito às coisas que estavam a seu uso, era muito cuidadoso em conservá-las. Ele
mesmo remendava suas roupas, reparava o breviário que tinha sempre algo a consertar.
Usava luneta com uma lente quebrada; jamais o convenceram de trocar por uma outra.
De tal modo tinha renunciado a propriedade das que usava, que tinha escrúpulo de as
27
Fl 2,8
28
Gl 6,14
dar aos outros ,a não ser com licença,por menor que fossem, embora fosse muito liberal.
Soube que agiu assim até no leito de morte. Um sobrinho seu, nosso Irmão Bonichon 29,
tendo lhe pedido apenas alguns pequenos manuscritos de devoção para aprender a
adquirir a perfeição, este pobre homem lhos recusou, dizendo-lhe que fosse apresentá-
los ao superior e ele próprio lhos pedisse. Não era menos consciencioso quando se
tratava de receber o que lhe queriam dar. Fazia questão de obter a permissão para aceitar
um pequeno livro, uma imagem de papel ou coisa semelhante. Embora essas coisas
pareçam pequenas no juízo dos homens, o espírito com que ele as fazia as tornava
grandes aos olhos de Deus e dos anjos.
Era de uma grande simplicidade, não a rústica ou simplória, mas a santa
simplicidade da pomba, que lhe aperfeiçoava as outras virtudes. Sua caridade era
simples, sua humildade, simples, sua obediência, simples, sua paciência, simples e
assim as outras virtudes. Nele não havia nenhuma mescla de respeito humano, de
simulação, artifício ou astúcia. Isso fazia com que, embora fosse muito judicioso, se
deixasse conduzir como uma criança. Acreditava em quase tudo que lhe diziam, mesmo
como brincadeira, e se dispunha a fazer tudo que quisessem dele. Passava com
frequência o recreio com os seminaristas menores e conversava com eles com
simplicidade, como se fosse criança como eles. Esta simplicidade o tornava amável e
amado por todos, mas principalmente por Deus, que sem dúvida se comunicava
ordinariamente com ele, de um modo todo particular, pois que cum simplicibus est
sermocinatio ejus30 (com os simples é a sua conversação). Não é de admirar, pois, se ele
parecia sempre um homem interior, fervoroso e só aspirando a Deus.
Sua aplicação ao trabalho era maravilhosa. Ainda que sua indisposição o
tornasse muito fraco e débil e que o trabalho incomodasse, jamais o viam ocioso. Estava
sempre em atividade, tendo como uma de suas máximas que a ociosidade é mãe de
todos os vícios, como disse um dia a um de nossos irmãos que lhe perguntou porque
trabalhava tanto. A maior parte das vezes reparava os missais e os breviários, escrevia
as cerimônias e outras coisas da casa. Ia até mesmo ao jardim para trabalhar, e agachado
no chão arrancava as ervas más, carregava lenha e água para a cozinha, lavava louça,
isto tão espontaneamente, que edificava os que o viam.
Quando a enfermidade o obrigava a ficar de cama, encontrava ainda meio de
trabalhar, seja lendo, seja escrevendo ou costurando, e sobre tudo rezando. Fazia então
particularmente orações jaculatórias com tanta assiduidade e ardor que tocava e
inflamava os que o percebiam.
Quanto à castidade, ele a possuía em grau muito eminente e creio que usou todas
as precauções imagináveis para conservá-la integralmente. Os pequenos escritos sobre
este assunto, que foram encontrados depois de sua morte em sua bolsa, dão suficiente
testemunho disso. Tudo indica que ele os praticava pontualmente, embora fossem muito
difíceis de colocar em prática. Eram certos meios soberanos para conservar a castidade.
Isso mostra claramente que nosso Irmão Alexandre, enfermeiro, não deixava de ter
29
Nicolau Bonichon, clérigo, nascido em Ferrières-Gâtinais a 30 de julho de 1619. Entrou em São Lázaro a 24 de
setembro de 1641. Fez os votos a 9 de junho de 1644 e foi ordenado padre a 21 de setembro de 1647. Foi colocado
mais tarde na casa de Cahors. Um outro sobrinho do Padre Pillé, Cristóvão Bonichon , entrou na Congregação da
Missão em 1645, na qualidade de Irmão Coadjutor.
30
Pr 3,32
razão ao dizer abertamente na conferência que ele tinha notado em seu corpo sinais de
uma castidade virginal. No entanto seu temperamento natural parecia ser inteiramente
contrário a isso; donde se conclui que ele teve de suportar grandes combates e
conquistar grandes vitórias, para impedir que esse tesouro lhe fosse roubado.
Sua mortificação não apareceu apenas no combate aos movimentos carnais, que
ele reprimia tão bem, mas ainda em relação a outras dificuldades, tanto interiores quanto
exteriores. Já se viu por acaso um homem deste porte, mais mortificado do que ele na
vista, no ouvido, no gosto e nos outros sentidos, e sobre tudo na língua, no juízo e na
vontade? Deixo-vos imaginar. Mas para melhor conhecer a excelência desta virtude
nele, é preciso lembrar que era naturalmente impetuoso, arrebatado, colérico e ávido de
ouvir e saber, etc. Contudo dominava tão bem as inclinações e as paixões que sempre
pareceu ser naturalmente tranquilo, suave, indiferente e bonachão. Mas tudo isso era
graça divina, e virtude que ele adquiriu à custa de se mortificar. Numa palavra, pode-se
dizer com verdade que sua vida foi uma contínua mortificação como se a Deus
aprouvesse vê-lo assim, no uso das mortificações, como um outro Jó. O Senhor não se
contentou somente com suas mortificações ordinárias, mas lhe permitiu a ocasião de
algumas extraordinárias. Pode-se perceber isso particularmente quando vemos que
depois de lhe ter dado, de um lado, um grande conhecimento do valor e da beleza das
almas e a grande necessidade que tem do auxílio da Missão, e por um outro lado, um
desejo insaciável e incrível de trabalhar nelas sem cessar para sua salvação, tirou-lhe
quase ao mesmo tempo os meios de realizar estes santos desígnios, permitindo-lhe uma
enfermidade no corpo que o atormentou quase continuamente, e uma outra maior, no
espírito: a persuasão de ser inútil e pesado à casa, fruto de sua grande humildade, como
já dissemos. Para vos fazer uma ideia de algum modo desta mortificação heroica, basta
representar-vos um homem faminto continuamente diante de uma mesa coberta de toda
a espécie de carnes apetitosas, nas quais não pudesse tocar por estar acorrentado. Sua
mortificação era mais ou menos isso e até maior, ao menos porque era de maior
duração. Entretanto, embora sua humildade o tenha levado a algumas pequenas e
amorosas queixas de suas dores, podemos dizer dele o que o Espírito Santo diz de Jó: In
his omnibus non peccavit31 (Em tudo isso não pecou). Antes, em tudo ele se purificou
como ouro na fornalha porque em tudo isso permanecia inteiramente resignado à
vontade de Deus, o que não podia ocultar por causa dos frequentes atos dessa virtude
que o viam fazer com tanto fervor.
Embora já tenha feito menção de sua grande devoção, não posso, entretanto,
impedir-me de dizer mais uma palavra. É inacreditável quanto era devoto de todas as
coisas santas que a igreja aconselha ou aprova, como a água benta, o agnus Dei, o
rosário, as relíquias, as indulgências e outras semelhantes. Era também muito devoto
dos Santos e dos Anjos. Tinha particularmente três devoções. A primeira, ao seu anjo da
guarda, que honrava todos os dias de modo especial. Tinha grande confiança nele,
suplicando por seu intermédio os frutos das orações que de ordinário lhe fazia. É
provável que o contemplava frequentemente com os olhos do espírito, como fazia Santa
Francisca com seu anjo, com os olhos do corpo, e lhe falava familiarmente e com
grande reverência. A segunda, e maior, era à Santa Virgem. Mas ser-me-ia impossível
31
Jó 1,22
exprimi-lo, seria preciso escutá-lo a ele próprio, falando dessa devoção. O que dizia dela
era capaz de despertá-la nos outros, particularmente quando se tratava de sua Imaculada
Conceição, do poder que tinha junto ao seu filho, e dos grandes milagres que fazia em
favor de tantas pessoas. Mas o principal é que lhe imitava as virtudes e exortava aos
outros a fazer o mesmo. Creio que esta devoção foi uma das principais causas de sua
castidade, da qual falamos, e da Virgem lhe conceder tudo que pedia. Por isso, tinha
uma grande confiança nela, particularmente no leito de morte, como eu mesmo notei
várias vezes, entre outras, quando pronunciava estas palavras: In te, Domina, speravi;
non confundar in aeternum, quia non solum sperantem, sed etiam desperantem adjuvas
(Esperei em ti, Senhora, jamais serei confundido, porque proteges não somente ao que
tem esperança, mas também o que está em desespero).
Mas sua principal devoção era à paixão de Nosso Senhor. Nela pensava todos os
dias e quase todas as horas, sempre com o sentimento de compaixão, de admiração e
agradecimento. Frequentes vezes, não conseguia impedir a manifestação interior desses
sentimentos, como em aspirações, suspiros e lágrimas. Isso o levava a dizer com
frequência que aquele que não agradece, todos os dias, a Nosso Senhor Jesus Cristo por
sua paixão, perde o seu dia. É também por isso que em sua última enfermidade beijava
repetidas vezes, com muita devoção, e até com lágrimas o crucifixo que tinha sempre
perto dele no leito. Quem poderia relatar os belos colóquios desses momentos no
coração e nos lábios? Quem poderia exprimir o sentimento com que dizia: O bone Jesu,
qui mortuus es pro me, quis mihi tribuat ut moriar pro te! Salve, crux pretiosa, suscipe
discipulum Chirsti ac per te me recipiat qui per te moriens me redemit! (Ó bom Jesus,
que morreste por mim, quem me daria a graça de morrer por ti! Salve, ó cruz preciosa,
recebe o discípulo de Cristo, e por ti me receba quem morrendo em ti me redimiu!).

Eu não daria conta , se o quisesse, de descrever todas as suas virtudes. Basta


dizer que não somente não me lembro de jamais ter notado nele algum vício nem de ter
ouvido dizer que ele tinha algum, mas ainda que sempre observei nele apenas virtude, e
todos o viam como também eu, como um espelho de devoção, de paciência, de
humildade, de obediência, de caridade e de toda a espécie de virtudes. A esse respeito,
não posso omitir a estima que dele tinha o senhor Padre Parmentier, pároco de La
Queue32, homem de rara virtude, que o conheceu muito particularmente. Jamais falava
dele a não ser com admiração, dizendo ordinariamente com ardor: “O padre Pillé é um
homem de Deus, é um tesouro oculto, é um santo”.
Parece-me que aí está o bastante para levantar o edifício das virtudes desse
grande homem de Deus, mas deixamos de lhe colocar os fundamentos. Falta ainda uma
virtude eminente que nele era tão viva e tão deslumbrante acima de todas as outras, que
as vivificava e as fazia brilhar maravilhosamente. Era a fé viva e intensa que tinha em
soberano grau de tal maneira que parecia, ao escutá-lo e ao vê-lo agir, que ele tocava e
experimentava os mistérios da fé. Não tinha dificuldade alguma em crer mesmo em
coisas que não eram de obrigação, como a história dos santos, seus milagres e tudo que
os livros de devoção contêm. Era a fé viva e profunda que tinha na grandeza e bondade
de Deus que o levava a sofrer com tanta alegria e agir com tanto fervor. A grande fé na
32
La Queue- en-Brie (Seine-et-Oise)
justiça divina lhe inspirava um grande temor dos juízos e dos castigos de Deus. Levava-
o também a um grande horror do pecado e a um grande zelo pela salvação das almas.
Inspirava-lhe um forte temor de prestar contas a Deus, especialmente pelas almas que
lhe haviam sido confiadas. Levava- o a dizer frequentemente, e com lágrimas e
suspiros: “Oh! como são terríveis os juízos de Deus. Oh! como seria feliz se jamais
tivesse sido pároco!”. Enfim, era esta a fé que o fazia praticar em alto grau todas as
virtudes que observamos nele. E o que me parecia mais admirável é que esta fé produzia
graça mesmo na alma dos outros, como o experimentaram alguns dos nossos irmãos,
por terem recorrido a ele em suas tentações. Ele lhes dizia: “Fazei ou dizei isto ou
aquilo, e ficareis livres”. E acontecia como tinha falado. Eu mesmo o experimentei em
várias ocasiões, particularmente quando estava, um dia, em grande dificuldade quanto
ao processo que os senhores Cônegos de São Victor nos tinham movido por causa de
nosso estabelecimento em São Lázaro. Eu estava a ponto de abandonar totalmente esta
casa para não entrar no processo. Consultei sobre o assunto vários personagens que não
foram capazes com as suas razões de persuadir, de resistir e defender nossa causa.
Quando perguntei ao Padre Pillé o seu parecer, ele apenas me disse singela e friamente:
“Senhor Padre, isso não é nada, fazei-o. Não vos preocupeis. É a vontade de Deus”.
Tão logo ouvi o que me disse, não poderíeis imaginar o quanto fiquei consolado e
imediatamente resolvi a enfrentar questão, de tal modo que não senti depois nenhum
incômodo nem dificuldade, como se o próprio Deus mo tivesse revelado e ordenado. De
tal modo era viva e eficaz a fé do Padre Pillé.
Esta fé extraordinária não o impediu na hora da morte de ser um pouco tentado
de infidelidade. Mas esta tentação lhe foi permitida por Deus para firmá-lo mais em sua
fé, como um pouco d’água lançada sobre uma fogueira serve apenas para lhe estimular
mais as chamas. O ato que ele fez depois foi disso uma prova muito forte e autêntica.
Com efeito, um pouco antes de perder a fala, fui vê-lo e tendo me relatado sua tentação,
perguntei-lhe se não acreditava em tudo que Deus tinha revelado a sua Igreja. Ele me
respondeu imediatamente com extremo vigor de espírito: “ Renuncio a todas as
sugestões do espírito maligno, quero morrer como verdadeiro cristão”. Em alta voz fez
este ato de fé: “Oh meu Deus! creio todas as verdades que revelastes a vossa Igreja.
Renovo todos os atos de fé feitos em minha vida, e porque talvez não tiveram todas as
condições requeridas, renovo todos os atos de fé dos apóstolos, dos confessores e dos
mártires, etc”.
Quando eu disse que esta grande fé lhe causava um grande temor da justiça
divina, não deveis imaginar que ele tenha faltado à esperança. Ela era também muito
grande nele. Disto não nos devemos admirar, pois que a mesma fé da qual fazia tantos
atos, lhe servia sempre de escudo para resistir aos assaltos da tentação e ao mesmo
tempo de chama para ver claramente a imensidade da misericórdia, o valor infinito da
morte e paixão de Nosso Senhor e a verdade infalível das promessas que ele fez aos
pecadores penitentes. Além disso, sua grande caridade, unida a uma fé profunda, era
uma marca infalível de que sua esperança era igualmente grande, do mesmo modo que,
ao vermos de noite uma grande claridade e sentirmos um grande calor, é um sinal
evidente de que a chama é também muito grande. Assim, tendo vos mostrado a grande
luz de sua fé e o grande ardor de sua caridade, segue-se infalivelmente que a chama de
sua esperança era proporcionalmente grande. E quando não houvesse outra prova além
da experiência que temos das contínuas vitórias que ele obteve, combatendo contra o
temor até a morte, isso seria bastante para nos fazer ver a grandeza de sua esperança,
pois, de outro modo, não teria podido subsistir, como aconteceu. E não somente
subsistia, mas aumentava sem dúvida à medida que era provada, assim como a chama
de um grande fogo bem aceso, cresce, ao ser agitada pelos ventos. E foi sem dúvida por
esse motivo que Deus o quis prová-lo desse modo, para fazê-lo conquistar mais bela
coroa. Embora esta grande esperança o tenha acompanhado durante toda a vida, contudo
apareceu e brilhou mais no final de sua existência pelos vários atos assinalados dessa
virtude, de modo especial quando lhe falávamos do paraíso, para onde deveria logo
partir, e quando nos recomendávamos as suas orações, quando estivesse no céu. Ele
sempre nos respondia com decisão e singelamente que não deixaria de rogar a Deus por
nós e por toda a Missão, e no-lo prometia como se lhe tivesse sido revelado que entraria
no céu logo após a morte. Oh! quão belas súplicas prometia apresentar à divina
Majestade por toda a Companhia! Enfim, mostrou-nos que sua esperança ia crescendo à
medida que previa o aproximar da recompensa , como o movimento da pedra aumenta
de velocidade quanto mais se aproxima de seu centro de atração.
Eis, Senhor Padre, o resumo da vida do Padre Pillé, que parece sem dúvida
muito grande. Contudo, eu o considero pequeno, tanto porque não vos fiz ver todas as
suas virtudes, pois seria impossível, quanto porque o que havia de maior e de mais
excelente, sua profunda humildade o ocultou, e só Deus o pode conhecer. Nós a
conheceremos somente no céu, particularmente esta plenitude de graça e de espírito
com que praticava todos os atos de virtude. Seja como for, eis aí uma parte do que
pudemos observar em sua vida.
Possivelmente, esperais que vos faça também um relato de sua morte. Digo-vos,
porém, apenas, que já o tendes no espelho de sua vida, uma vez que sua morte foi tal
qual sua vida. Se alguma diferença há, ela está no fato de que sua vida foi como grande
quadro e sua morte como uma miniatura. Posso, com efeito, dizer que nos dez ou doze
últimos dias de sua vida, ele fez e refez atos interiores e exteriores de todas as virtudes
que apontamos, em especial, de fé, de temor, de esperança, de caridade, de contrição, de
humildade, de obediência, de paciência, de resignação e de conformidade com a
vontade de Deus. Ele fez de modo intensivo em sua morte o que fez
extensivamente em sua vida. Quero dizer, se fez na vida vários atos de uma virtude, por
exemplo, até três graus, o pouco que o fez em sua morte era até seis graus. Entretanto,
para vos dizer algo de mais particular, relativo ao fim deste homem de Deus, acrescento
o que se segue. Mais ou menos três semanas antes de sua morte, trouxeram-no, senhor
Padre, dos Bons-Enfants para São Lázaro, por causa de um grande e contínuo
adormecimento observado nele, além da doença ordinária do peito e dos pulmões. Três
a quatro dias depois de sua chegada, começou a ficar de cama, e foi depois sempre
definhando em suas forças e crescendo em suas dores, por causa da enfermidade do
peito que o oprimia mais do que nunca, de tal modo que em poucos dias não pôde mais
se manter de pé, nem se utilizar de seus membros. E o que é mais, começou logo depois
a jorrar dos pulmões intensas expectorações. Mantinha, porém, ainda, a lucidez de
espírito, grande coragem e liberdade de palavra. O que é mais admirável, falava e orava
frequentemente com mais vivacidade e vigor do que antes, em especial, quando se lhe
anunciava que desta vez Deus queria pôr um termo aos seus sofrimentos temporais, para
ir gozar das alegrias eternas. Foi então que começou, como um cisne, a cantar mais
suavemente do que antes. Oh! quem poderia exprimir os sentimentos que tinha no
coração quando pronunciava nos lábios este versículo de Davi:Laetatus sum in his quae
dicta sunt mihi: in domum Domini ibimus! 33(Alegrei-me quando me disseram: vamos
para a casa do Senhor!). Oh! quem poderia exprimir com que espírito praticou todos
esses atos de virtude, tanto interiores quanto exteriores, nestes últimos momentos,
principalmente quando lhe dei o sagrado Viático e Unção dos Enfermos! Com efeito, os
atos de fé, de esperança, de caridade, de contrição, de humildade, de simplicidade, de
obediência e de conformidade com a vontade de Deus, que fazia nesses instantes, eram
outros dardos inflamados que penetravam os corações dos presentes e os faziam
derramar lágrimas. Era um segundo Santo André: este grande apóstolo foi pregado na
cruz e nela permaneceu dois dias antes de morrer, durante os quais pregava para os
povos e rogava a Deus pela conversão das almas. Assim também morreu o Padre Pillé
na cruz: em meio às dores agudas de sua enfermidade e durante os seus sofrimentos,
edificou a todos os missionários pelos bons discursos e pelos raros exemplos que lhes
deu de paciência e de outras virtudes.
Duas vezes ao dia eu ia visitá-lo, particularmente na última semana de sua vida.
Importa, porém, dizer que não era tanto para consolá-lo, encorajá-lo e dispô-lo a bem
morrer quanto para me consolar a mim mesmo, me encorajar e me dispor a bem viver.
De fato, jamais voltava sem ter o coração comovido e perfumado de devoção. Ficava
arrebatado de admiração ao ver nele coisas tão contrárias e distanciadas numa mesma
pessoa e ao mesmo tempo: tão grande paciência ao lado de tão grande sofrimento, tanta
força de espírito e tanta fraqueza de corpo, voz tão forte (sobretudo quando falava de
Deus) e tão grande incômodo do pulmão, tanta vigilância e atenção ao que lhe diziam e
tão grande torpor. À menor palavra proferida para dispô-lo à morte, abria de repente os
olhos e os lábios para testemunhar que seu coração não dormia, embora o corpo
estivesse mergulhado em profunda sonolência e que permanecia sempre vigilante com a
lâmpada acesa, prestes a receber o Esposo que aguardava com tanto desejo. Ficava mais
admirado ainda ao ver nele tão profunda humildade com tão elevada caridade, um temor
tão grande com tão perfeita esperança, uma fé tão firme em meio a tão forte tentação,
tanta contrição e tanta inocência, tanta devoção ao lado de tanta desolação, tanta
paciência em meio a tantas dores, e enfim, tanta resignação à vontade de Deus
juntamente a tanta mortificação interior e exterior.
Mas o que mais me enternecia de devoção o coração era vê-lo e ouvi-lo quando
se recomendavam às suas orações e quando lhe pediam a bênção, particularmente
quando era eu que lho pedia. De início, ele se escusava, dizendo que era ele que devia
fazer-me este pedido. Mas depois obedecia com simplicidade, dizendo: “Para minha
confusão é que vou fazê-lo por obediência”. Começava então a fazer orações tão
admiráveis, nos desejava tantas bênçãos, nos dava tão bons conselhos, nos falava tanto
bem da Missão e nos predizia tantas graças, e isso com tanto fervor, simplicidade e
humildade, que nos parecia ouvir um santo do paraíso. Não podíamos conter as
33
Sl 121,1
lágrimas, em especial quando, na conclusão, erguia a mão e fazia o sinal da cruz para
me dar a bênção que eu recebia dele como se o próprio Nosso Senhor em pessoa me
tivesse abençoado. Parecia-me que eu recebia no próprio momento os efeitos da bênção
em minha alma.
Eis o que vos posso dizer sobre sua enfermidade que durou cerca de quinze dias.
Ao final deles, depois de ter cumprido todos os deveres de um perfeito cristão e
prestado homenagem ao soberano Senhor, de coração, de boca e nas ações, começou a
perder a fala e enfim entrou em agonia. Foi com uma agonia bastante tranquila e serena
que ele terminou a sua vida e exalou o último suspiro de maneira mais suave ainda.
Quase não o perceberam, a não ser por uma devota aspiração que ele fez dizendo: “Oh
meu Deus!”, frase curta, mas enfática e enérgica. Oh! quantas coisas belas estão
compreendidas nestas poucas palavras! Oh! quem as poderia enunciar! Estas últimas
palavras pareceram tão admiráveis a um dos nossos, que chegou a dizer que havia
motivo para crer que neste último instante este homem apostólico já estava vendo Nosso
Senhor, e até mesmo o tocava. Ficou tão extasiado com isso que foi impelido a
exclamar, como um outro São Tomé: Dominus meus et Deus meus!34 (Meu Senhor e
meu Deus!).
Assim entregou a ele a sua alma que sem dúvida voou para o céu, não
precisando de purgatório depois da morte, pois fora tão purificada durante a vida.
Morreu no mês de outubro, na antevéspera de São Dionísio, numa terça-feira, dia
dedicado aos anjos aos quais tributara uma grande devoção. Foi sepultado no coração de
São Lázaro, com missa cantada e solene, que eu tive a felicidade de celebrar. Não
deixamos, além disso, de celebrar cada um três missas para o repouso de sua alma. Cada
Irmão Coadjutor fez a comunhão e rezou três terços para o mesmo fim. Peço-vos fazer e
mandar a comunidade fazer a mesma coisa.
Eis, senhor Padre, a vida e a morte deste bom e verdadeiro missionário, ou antes,
deste santo que agora intercede por nós, como podemos piedosamente crer. Há muito
que aprender e de que tirar proveito por parte de todas as pessoas que compõem a nossa
Congregação. Os idosos aprenderão a não se dispensarem da regra, os jovens, a
submissão, os doentes, a se encorajarem e terem paciência, os que têm saúde, a não
simular trabalho, os espirituais, a progredir na perfeição, e os delicados, a se
confundirem, vendo um ancião enfermo fazendo mortificação. Os que não estão firmes
na vocação, ou que, à primeira tentação ou descontentamento, projetam sua saída,
aprenderão a importância que é preciso dar à graça que Deus lhes deu de serem
missionários. Os que murmuram por serem inaptos para a pregação, para a confissão, e
outras funções da Missão, por motivo de enfermidade ou de incômodo corporal ou
espiritual, ou porque os deixam em casa para outros trabalhos que não lhes agradam,
aprenderão que é grande presunção imaginar que Deus tenha necessidade de seu talento,
como se não pudesse converter as almas por outros meios. Aprenderão que a
obediência, a mortificação, a oração, a paciência e virtudes semelhantes, conquistam
melhor as almas do que toda a sapiência e indústria humanas. Vimos claramente tudo
isso no Pe.Pillé. Como já disse, ele fez mais padecendo, do que todos nós, agindo. O
que temos de fazer é imitá-lo nessas virtudes e orar por ele, ou antes, invocá-lo, ao
34
Jo 20,28
menos em particular, uma vez que a Igreja ainda não nos permite fazer de outro modo.
Fazendo isto, devemos esperar, por sua intercessão, grandes favores do céu nesta vida e
depois ir gozar com ele da glória, na outra. Conceda-nos Deus esta graça, pelos méritos
de Nosso Senhor e de sua Santa Mãe, em cujo amor sou, senhor Padre, vosso muito
humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.
Indigno padre da Missão.

São Lázaro, Paris, 01 de janeiro de 1643.

Destinatário: Ao senhor Padre Du Chesne, superior dos Padres da Missão de Crécy,


em Crécy.

635. – A JEAN GUERIN

Paris, 12 de janeiro de 1643

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Meu Deus, senhor Padre, como minha alma ficou consolada pelo modo como a
comunidade recebeu vosso novo ofício! Isso me leva a esperar graças especiais de Deus
sobre vós. Ó senhor Padre, como é necessária a graça de Deus para conduzir uma
família como a vossa, para evitar que nada contrário ao seu espírito nela se infiltre e
para fazê-la progredir no caminho da perfeição! As orações frequentes vos ajudarão,
como também tomar algum tempo, diariamente ou semanalmente, para meditar na
importância de um superior trabalhar para o progresso de sua comunidade na perfeição
que Deus pede dela; em segundo lugar, refletir em que consiste esta perfeição; em
terceiro, de que maneira a Companhia em geral e cada um em particular pode trabalhar
neste sentido; em quarto lugar, refletir nos meios para fazê-la progredir colocando-os
em prática. O primeiro meio é ser sempre dos primeiros nas ações da comunidade, na
medida em que os negócios o permitirem; o segundo, ser invariável quanto ao fim e
suave quanto aos meios para alcançá-lo; e o terceiro, pedir o parecer daqueles que
escolherdes como o vosso conselho, os senhores Padres Escart e Tholard, e sempre, nas
coisas principais, o do padre Dufestel. Não ficareis, contudo, constrangido pela
pluralidade dos votos.
Escolhereis a opção que vos parecer melhor, ou ficareis com vosso parecer, disposto a
prestar conta dele na visita, como diz a regra. Oh! como procedereis bem dando atenção
ao parecer do padre Dufestel! Em se tratando de coisas temporais, podereis recorrer a

.

Carta 635. – Coleção de processos de beatificação.
advogados; fora disso, não. Somente os membros do corpo da comunidade são
animados pela influência do espírito do mesmo corpo.
Quando digo que é preciso ser invariável quanto ao fim e suave quanto aos meios,
estou vos indicando a alma da boa conduta. Uma coisa sem a oura estraga tudo. Ó,
senhor Padre, como a participação na mansidão e na humildade do coração de Nosso
Senhor exprime vivamente a figura de Nosso Senhor e a de sua boa conduta, sobretudo
se a firmeza estiver presente, sem a qual vejo que a maior parte das comunidades que
caem no relaxamento chegam a isso pela excessiva indulgência dos superiores! Sede,
pois, firme, senhor Padre; de início, admito que contristareis os espíritos, mas depois
terão mais confiança em vós. Fora disso um dia estareis exposto ao desprezo deles. Sede
exato em acolher a comunicação do seu interior todos os meses. Rogo à Companhia
afeiçoar-se a esta santa prática e a todas as outras. O que digo à Companhia e a vós,
senhor Padre, sobre este ponto, quero dizer da observância de todas as nossas pequenas
regras, sobretudo a da caridade mútua. Como somente o espírito
de Nosso Senhor Jesus Cristo é o verdadeiro diretor das almas, peço a sua divina
Majestade vos comunique o seu espírito para vossa direção particular e para direção da
comunidade. Meu Deus! senhor Padre, como sou tão miserável para me atrever à
ousadia de vos dizer estas coisas que eu mesmo não pratico? Vossa caridade me
perdoará, por favor, e suplicará a Deus por mim, que sou o mais miserável dos homens,
mas que ouso esperar corrigir-me, se for ajudado pelas vossas orações e pelas de vossa
pequena comunidade, à qual me recomendo, e sou, no amor de Nosso Senhor, vosso
muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Guérin, superior dos Padres da Missão de


Annecy, em Annecy.

636. – A UM PADRE DA MISSÃO

Abraço-vos com toda a ternura de minha alma, considerando a vossa como uma
vítima oferecida continuamente à glória de seu soberano Senhor, e que trabalha em sua
própria perfeição e para a salvação do próximo. Meu Deus, senhor Padre, como são
felizes aqueles que se entregam a Deus sem reserva para fazer as obras que Jesus Cristo
fez e para praticar as virtudes que praticou, como a pobreza, a obediência, a humildade,
a paciência, o zelo e todas as outras! É desta maneira que se tornam verdadeiros
discípulos de um tal mestre. Vivem puramente do seu espírito e espalham, com o odor
.
Carta 636. – Cartas escolhidas de São Vicente de Paulo ( arquivo da Missão), carta 36.
de sua vida divina, o mérito de suas santas ações, em favor da edificação das almas
pelas quais morreu e ressuscitou. Se ,portanto, vos considero como um de seus bons
servidores, não tenho motivo para vos querer bem e vos estimar nele, e para implorar
com frequência, como faço, que continue concedendo-vos as graças para lhe serdes fiel
até a consumação dos séculos e para serdes enfim, coroado de glória na eternidade? São
estes os anseios do meu coração para a felicidade do vosso.

637. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[17 de janeiro de 16431]

Senhor Padre,

Eis uma carta de nossa Irmã Jeanne, de Issy 2. Vereis o que ela fez a respeito da
cópia da quitação que lhe pedem. Penso, senhor Padre, que seria bom regularizar este
negócio quanto antes.
O senhor Pároco de Baron3 espera obter uma Filha da Caridade depois da festa
da Candelária, e esperamos que a Providência divina inspire a vossa caridade mandar-
nos avisar. Nossas Irmãs acreditam, tanto quanto eu, que este benefício, que nos tem
sido adiado por tanto tempo, é uma punição pelo mau uso que fizemos do passado, do
qual nos arrependemos, reconhecendo não podermos no futuro fazer melhor, sem uma
grande ajuda de vosso caridade, da qual sou, senhor Padre, uma pobre e humilde filha,
e muito agradecida serva,

L. de M.
Dia de Santo Antão.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

638. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

.
Carta 637. – C. aut.– Dossiês das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta parece deva aproximar-se da carta 641.
22
No entorno de Paris.
33
Localidade da circunscrição de Senlis (Oise).
.
Carta 638. – C. aut.– Dossiê das Filhas da Caridade, original.
[25 de janeiro de 16431]

Senhor Padre,

Suplico-vos humildemente fazer-me a caridade de dizer a hora de vossa Santa


Missa amanhã, e para o meu filho a caridade de, na celebração, rezar por ele e se
lembrar de minha muito humilde súplica. Não poderíamos mandar nossa Irmã
Henriette para Issy2 porque ela será necessária em Fontenay 3 para dirigir a escola,
pois a Irmã que mora lá não sabe ler. Esta bondosa e simples Irmã que eu vos disse ter
ideia de mandar de volta, não fez retiro porque não a julguei capaz. Suplico-vos muito
humildemente, senhor Padre, dar-se ao trabalho de me dizer se devo colocá-la entre as
outras.
Espero que nossas Irmãs façam bom uso da instrução que vossa caridade nos
ministrou hoje4. O coração delas está repleto desse desejo e querem se lembrar dela
sempre. Suplico-vos, por isso, muito humildemente enviar-nos o pequeno resumo dos
pontos que estava convosco. Parece-me que com ele poderei lembrar-me de boa parte
do que Nosso bom Deus nos disse pela vossa boca.
Estarei eu, antes de morrer, no estado de amor a Deus que ele me pede? Fazei-
me a caridade de pensar um pouco nisso e de tomar conhecimento de minhas
desordens, e que eu não tenha na hora da morte toda a confusão que mereço por
minhas infidelidades ao desígnio de Deus, particularmente quando ele me pedir conta a
partir do tempo em que sua bondade me deu a graça, meu muito honrado Pai, de ser a
vossa menor filha e a mais grata serva.

Esqueci-me de vos perguntar se devo escrever a ata de reconhecimento que vos


enviei, no dorso da folha onde está a resolução do pagamento, ou então se deve ficar
na beirada da mesma folha, para que fique compreendida dentro da resolução.

Dia da conversão de São Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

639. – A BERNARDO CODOING

Paris, 30 de janeiro de 1643.

Senhor Padre,

11
Data acrescentada no dorso do original.
22
Comuna do entorno de Paris.
33
Fontenay-Roses (Seine).
44
Esta conferência nos foi conservada.
.
Carta 639. – C. aut. Dossiê da Missão, original.
A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!
Recebi duas cartas vossas ao mesmo tempo, uma de oito e outra de quatorze do
mês passado. Não darei resposta à primeira, a não ser vos dizendo, em poucas palavras,
que respeito o primeiro artigo concernente ao meio de consolidar a Companhia com a
promessa de pagar a despesa feita, em caso de sairmos, sendo a isto obrigado ... .
Entretanto a experiência do seminário instituído em Ruão pelo falecido senhor Cardeal
de Joyeuse, onde se estabelece a obrigação e se dá uma garantia de pagar a pensão, em
caso de não permanência na vocação, nos faz ver que este meio é inútil e que não
remediou a todas as desordens precedentes.
Quanto à segunda questão, o caso das paróquias, estamos rezando a Deus
incessantemente para isso, depois de quatro ou cinco conferências feitas sobre isso, sem
chegarmos a uma solução nem para afirmativa, nem para negativa. Não deixaremos de
fornecer menos bons párocos à Igreja, pelos nossos seminários, do que pela própria
Companhia, como espero, no caso de nos decidirmos pela exclusão, depois de muitas
orações e conferências. Ficai certo, senhor Padre, de que não poderíeis alegar nenhuma
razão, nem a favor nem contra, que já não tenha sido examinada e considerada pela
Companhia, desde o longo tempo em que ela pensa nisso e nas outras coisas que vossa
primeira carta contém. Por isso vos suplico fiqueis tranquilo quanto a isso, como
também no que diz respeito ao negócio da Barbaria. Quanto a esta, não vos direi outra
coisa, a não ser que nosso pensamento não exclui, nem faz coisa alguma contra as
Ordens da Redenção e dos Maturinos. Estamos apenas vendo se existe algum meio de
a pequena Companhia fazer uma espécie de missão de tempos em tempos entre esses
pobres escravos.
Para isso, tomaríamos como pretexto, a fim de viabilizar a primeira tentativa, o
resgate que tentaríamos fazer de um pequeno número de escravos. A
Providência parece chamar-nos para isso e para nos sentir em dívida com dezoito que
perderam a fé. Sobre esses dezoito, prometi mandar partir o Padre du Coudray dentro de
cinco ou seis dias, para Marselha, onde, trabalhando com os forçados, redigirá a minuta
do contrato.
Adoro a Providência Divina sobre o que vós me dizeis, senhor Padre, na segunda
carta, e louvo a Deus por ter o senhor Cardeal de Lenti pensado em um seminário. Ó

O mal estado do original não nos permite ler a palavra que se encontrava neste lugar.

Francisco, Duque de Joyeuse, nascido a 24 de 1562, ocupou sucessivamente as sedes de Narbona (1582-1598), de
Tolosa ( 1598-1605) e de Ruão ( 1605-1615). Foi feito Cardeal a 12 de dezembro de 1583 e tomou posse de seu título
a 7 de janeiro de 1590.

A Ordem da Redenção ou das Mercês foi fundada no século XIII por São Pedro Nolasco para o resgate dos
escravos. O padre João Batista Gonzalez introduziu nela a reforma no fim do século XVI.

A Ordem dos Maturinos remontava ao século XII e tinha por fundadores São João da Mata e São Félix de Valois.
Tirava o seu nome do convento de Paris, construído sobre o terreno de uma antiga capela dedicada a São Maturino.
Chamavam-na de Ordem dos Trinitários. A reforma , começada em 1573, estendeu-se a toda a Ordem por Urbano
VIII em 1635.

Leonor d’Estampes de Valençay.

Félix Vialart, bispo de Châlons, era filho de Madame de Herse, uma das colaboradoras mais generosas e mais
devotadas a São Vicente. Nasceu em Paris a 5 de setembro de 1613. Desde 1640, quando ainda estava nos seus 28
anos, foi escolhido como sucessor de Henrique Clausse para a sede de Châlon. Fundou um seminário, reformou o
clero, organizou as Missões, socorreu aos necessitados. Mas, como Nicolau Pavillon, deixou-se contaminar pelas
ideias jansenistas. Foi isto uma mancha incômoda num episcopado tão pleno e tão fecundo. Félix Vialart morreu a 10
de junho de 1680 (Cf. La vie de Messire Félix Vialart de Herse, Utrecht, 1738, in-16).

senhor Padre, quanto bem a fazer, se aprouver a Deus abençoar esta boa obra!
Acabamos de enviar esta manhã dois seminaristas em missão, na Champanha, e amanhã
ou depois enviaremos sete ou oito, em dois grupos. Os que voltaram, há pouco, de lá,
trabalharam muito bem e os que enviamos aos senhores Bispos de Reims  e de Chalons
para serem seus auxiliares se portam igualmente muito bem. Meu Deus, senhor Padre,
como estou contente com vos ver trabalhando no meio dos pastores e dos incuráveis!
Penso que fazeis bem em dar assistência aos ordinandos. Todos reconhecem aqui que o
bem que se faz hoje em Paris provém principalmente disso.
Estava a ponto de vos enviar os senhores Padres Blatiron e Brunet. Mas como
me dizeis que não vos envie ninguém, si anona non sit duplicata (se os recursos não
forem duplicados), destinei o primeiro para Saintes e o segundo para outro lugar. Ainda
não temos o contrato de vossa fundação. Dão-nos esperança de recebê-lo dentro de três
dias e posso vos garantir que não perco tempo em solicitá-lo. Logo que o obtivermos,
trataremos de deduzir o que vos é devido. Pago, entretanto, as trinta e sete pistolas que
me dizeis ter tomado de empréstimo, além das cem que pagamos e as que vos disse que
podeis obter com o senhor Marchand, que são outras cem.
Meu Deus, senhor Padre, como me sinto consolado por vos ter dado Nosso
Senhor esses dois bons eclesiásticos italianos! Suplico-vos, senhor Padre, dizer ao Padre
Boulier e a eles que os abraço prostrado em espírito a seus pés, e que vou agora celebrar
a Santa Missa a fim de que praza a Deus torná-los segundo seu coração. Será bom,
como me dizeis, formá-los na vida interior. Sem isto uma pessoa bem cedo acaba vendo
logo chegar ao fim o seu fervor.
Saúdo também o resto da comunidade prostrado igualmente em espírito a seus
pés, e lhes suplico muito humildemente perdoar-me por não poder escrever a todos. Oh!
como tenho necessidade de vossa tolerância e da tolerância deles! Eu vo-las peço,
senhor Padre, com toda a humildade e afeto que me é possível, e recomendo a vossas
orações um retiro que espero começar pelo final da próxima semana, assim como a
revisão de nossas pequenas regras comuns que vos enviarei depois.
Não posso agradecer-vos tão humilde e afetuosamente como gostaria, pelo fato
de me dizerdes que estais pronto a abandonar vossos pensamentos sobre as coisas que
me comunicais. Podeis estar seguro, senhor Padre, que não decidimos nem executamos
nada senão depois de muitas comunicações e trocas de ideias com pessoas de insigne
piedade. Permaneceremos sempre do clero secular, com a ajuda de Deus, e na
disposição de servidores devotados em relação aos nossos senhores Prelados.
O que vos disse outrora das... 
Sou, no seu amor, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.


Do resto da frase é possível discernir apenas certas palavras isoladas, como convenientes, espero, Deus, que será o
elo de.
Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos Padres da Missão de
Roma, em Roma.

640. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR EM ROMA

Paris, 05 de fevereiro de 1643.

Vicente de Paulo dá notícias de sua comunidade, fala da fundação de vários


seminários, etc.

641. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Madame de Lamoignon e Madame de Nesmond vieram aqui de volta da visita


ao hospital de Saint-Denis, para o qual elas devem solicitar irmãs da Caridade, no
caso das religiosas hospitaleiras não aceitarem as condições que lhes querem propor .
Estas damas, senhor Padre, tinham um grande desejo de falar-vos, para vos dizer que
não crêem que o Sr. Bispo de Beauvais vá a St-Germain e que Madame sua irmã
poderá conduzi-las até lá, em vez dele, se concordardes. Mas a maior dificuldade para
irem até lá é que lhes disseram que o Senhor de Noyers está em Versalhes com o rei.
Parece-lhes que se ele não estivesse em St-Germain, sua viagem não seria tão útil. Elas
não sabem também se devem agradecer somente à rainha, recomendando a Sua
Majestade esta obra, ou então suplicar-lhe se torne protetora dela. Esperarão vosso
parecer sobre tudo isso antes de resolver a viagem e devem procurar-vos em vossa
casa, amanhã de manhã, ou melhor, senhor Padre, se o julgardes necessário, vossa
caridade lhes daria a decisão mais cedo.
O senhor Pároco de Issy veio aqui e depois de me ter falado de uma caridade
em favor de uma pequena jovem, perguntou-me se enviaríamos logo de volta nossa
irmã Jeanne. Eu o fiz compreender que eu esperava esclarecer-me sobre a dúvida que
tinha a respeito do desígnio de continuar essa caridade. Disse-lhe com simplicidade o
motivo disso. (Não estraguei nada, parece-me). Ele deve falar com a Senhora de
.
Carta 640. – O senhor Charavay, que pôs à venda o original desta carta, diz em seu catálogo que São Vicente a
escreveu com sua própria mão e que ela continha três páginas in-4º.
.
Carta 641. – C. aut.– Dossiê das Filhas da Caridade, original.

Ana de Lamoignon, esposa de Teodoro de Nesmond, presidente do Parlamento de Paris e filha de Madame de
Lamoignon. Os membros de sua dupla família eram todos ligados a São Vicente de Paulo, cujas virtudes apreciavam
e cujas obras favoreciam.

O estabelecimento de Saint-Denis (Seine) só começou a 2 de agosto de 1645.

Agostinho Potier.

Saint-Germains-em-Laye (Seine-et-Oise), onde a corte residia durante uma parte do ano.

O Bispo de Beauvais tinha duas irmãs: Renata, casada com Oudard Hennequin, Senhor de Boinville, referendário
do hotel do rei; Madalena, casada com Teodoro Choart, Senhor de Buzanval.
Montdesir e vos dizer o que ele deseja fazer. Ele gostaria de lançar sobre nós a falta a
respeito do pouco que foi dado a nossas irmãs desde que estão em Issy. Poderia vossa
caridade dar-se ao trabalho de me comunicar se devo adiar ainda o chamado de volta
de nossa Irmã Jeanne? Sou, senhor Padre, vossa muito humilde serva,

L. de M.
Fevereiro de 1643.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

642. – A PEDRO ESCART, PADRE DA MISSÃO, EM ANNECY

Paris, 11 de fevereiro de 1643

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Se soubésseis a alegria do meu coração ao ler vossa carta, o vosso vibraria com a
mesma emoção. Ó senhor Padre, com que ternura vos abraço, mas com que humildade
me prostro em espírito a vossos pés. Amanhã, se Deus quiser, celebrarei a Santa Missa
em parte para render graças a Deus pelas que Deus vos concede. Oh! como este
argumento: tudo que leva a arruinar a caridade vem do espírito maligno, me parece vir
do céu, e como a ele me refiro e me referirei muitas vezes! Oh! bendita seja a sabedoria
eterna de Jesus Cristo, que vos inspirou a menor  e a conclusão com tanto vigor e
bênção! Continuai, senhor Padre, a ver as coisas e as ações do próximo com espírito de
caridade. Quando suas ações apresentarem cem faces, pratiquemos o conselho de nosso
bem-aventurado Pai , olhar para a melhor. Meu Deus, a participação que Nosso Senhor
vos concedeu em sua humildade, quando foi feita a mudança do superior , me consola,
como igualmente vossa indiferença a vos submeter a quem quer que seja! Com toda a
certeza, é uma marca da posse soberana que Nosso Senhor exerce sobre o vosso
coração, que eu amo mais do que o meu próprio, no de Nosso Senhor, no amor do qual
sou vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

.
Carta 642. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.

Um rasgão subtraiu o destinatário da carta. O conteúdo indica que ela foi dirigida a um padre da casa de Annecy,
muito provavelmente a Pedro Escart, que recebe em outras cartas conselhos semelhantes aos que o Santo dá aqui.

Linguagem do silogismo da lógica aristotélica, o qual consta de uma proposição chamada maior (ex.: Todo homem
é mortal), de outra chamada menor (ex.: Pedro é homem) e de uma conclusão (ex.: Logo, Pedro é mortal). N. do T..

São Francisco de Sales.

Jean Guérin acabava de substituir Francisco Dufestel.
643. – PADRE PIERRE FOURNIER1 A SÃO VICENTE

Nancy, 1643.

Vossa caridade é tão grande que todo mundo a ela recorre. Todos vos
consideram aqui como o asilo dos pobres aflitos. Por isso vários se apresentam a mim
para encaminhá-los a vós, e assim possam sentir os efeitos de vossa bondade. Aqui
estão dois cuja virtude e qualidade excitarão com razão vosso coração caridoso a
assisti-los.

644. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR EM ROMA

Paris, 20 de fevereiro de 1643.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja sempre convosco!


Recebi, há três dias, vossa carta do dia oito do mês passado. Queixai-vos de que
não vos escrevo bastante. Penso que não passou nenhum correio ordinário, desde esse
tempo, sem que eu vos tenha escrito, e, no entanto, se passaram três ou quatro semanas
sem que eu tenha recebido carta vossa. Cremos que se extraviaram. É verdade,
entretanto, que a contar do tempo em que me escrevíeis, deixei passar dois correios sem
vos escrever por...1
Louvo a Deus por ter abençoado vossos trabalhos em Óstia, junto aos pastores, e
por continuar suas bênçãos sobre as pessoas idosas desse hospital. Nunca vi missões
mais belas do que aquelas que se fizeram no hospital Petites-Maisons dessa cidade 2. São
pessoas cuja maior parte viveu vida desordenada, que jamais fizeram uma confissão
como convém e que estão prestes a comparecer diante do juízo de Deus. Oh! sei, senhor
Padre, que há grandes mostras de que o espírito de Deus anima o do senhor Cardeal
.
Carta 643. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. XI, sec. I, 1ª ed., p. 387.
11
Nascido em Château- Thierry em 1600, recebido em 1616 na Sociedade de Jesus, sucessivamente reitor dos
colégios de Metz, Nancy, Reims, Pont-à-Mousson, Verdun e Châlons, morto em Châlons, a 17 de setembro de 1671.
.
Carta 644. – Dossiê da Missão, cópia tirada do original do senhor Charavay. O original pertencia em 1881 ao
Marquês de Gerbéviller (em Gerbéviller, Meurthe-et-Moselle).
1
¹ O copista não soube ler a sequencia.
2
O hospital Petites-Maisons, chamado também asilo des Ménages e des Teigneux, estava situado muito perto do
local onde se cruzam hoje a rua de Sévres e a avenida Raspail, sobre a área da praça des Ménages ou do Bon-Marché.
Abrigava quatrocentas pessoas idosas e enfermas, dos dois sexos atacados de loucura, de doenças discriminadas e
sarna. O próprio São Vicente tinha pregado ali uma missão antes da fundação de sua Congregação (Abelly op. cit. , 1.
II, cap. I, sec. I, § 5, p. 20). Enviou-lhe mais tarde os membros das Conferências das Terças- feiras, que nele fizeram
um bem considerável (Abelly, op. cit. , 1. II, cap. III, sec. III, p. 257).
3
O copista leu: “e vos direi que em Annecy e o padre Chiroye em Luçon, nós contradizemos meu parecer, que é de
fazer disso uma regra”. Assim formulada, a frase não tem sentido. São Vicente certamente escreveu outra coisa.
4
O uso foi mantido. Para passar por cima desta regra da qual o Santo fazia muita questão era preciso nada menos do
que uma ordem formal dos bispos.
5
As Empresas Transportadoras são as Messageries reais, organizadas por Richelieu.
6
O copista não soube ler o fim da frase.
27
O Cardeal Richelieu.
Lenti, que teve o pensamento de assistir a essas pobres pessoas idosas. Rogo a Nosso
Senhor o conserve sempre para o bem de sua Igreja. Que idade tem ele?
Esqueci-me de responder à pergunta que me fizestes, se trabalharemos nas
cidades onde houver acerbispado ou bispado. Dir-vos-ei que em Annecy, e que o senhor
Padre Chiroye em Luçon... Meu parecer é que façamos uma regra3 sobre isso. Há
alguém entre nós que é de parecer contrário. Retornareis ao nosso uso, por favor, até
que o tenhamos regulamentado4 de outro modo.
Perguntais-me o que podemos adiantar no sentido de agir desse modo. Eis o que
vos posso dizer. Já me havíeis escrito sobre isso, e vos respondi que só tínheis 2500
libras de renda. Não sei se a renda não será diminuída, em virtude de um processo que
os arrendatários dos coches movem contra as empresas 5 transportadoras, sobre o
transporte das pessoas, e que foi enviado ao Parlamento pelo Conselho. Madame
Duquesa de Aiguillon, com sua autoridade, teria obtido sentenças vantajosas aos
arrendatários dos coches. As empresas nos davam 3000 libras dos coches, por ano. Mas
o arrendatário que detém ainda o direito sobre eles por 5 a 6 anos, requisitaram-nas para
ele. Dizia que ficamos com seu arrendamento, e com efeito, ele nos fora transferido.
Comuniquei a carta a Madame Duquesa conforme seu pedido, para saber a
opinião dela sobre se deveis empreender os exercícios dos ordinandos. Disse-me que era
de parecer que os assumísseis e que ela vos ajudaria de algum modo, no presente e vos
relacionaria em seu testamento. Eis o que me disse. Não temos ainda o contrato de
vossa fundação para quantidade...6.
Sua Eminência7, o falecido Cardeal, doou para a missão de Richelieu sessenta
mil libras como fundação, em seu testamento, no qual pede se reze por ele. O Senhor de
Liancourt teve de vir há três dias ao grupo, reunido em favor da nobreza lorenense. Na
reunião se disse que, há um ano atrás, ele tinha salvo alguns nobres com as missões que
ele mandou pregar8. Não comentareis sobre isso, por favor. Os senhores Padres du
Coudray e Boucher partirão dentro de dois dias para a Barbária, e os padres Brunet e
Candelou9 irão com eles juntamente com um Irmão cirurgião para pregar missões nas
galeras de França1010. O cirurgião irá dirigir uma espécie de hospital na Argélia para os
38
Em La Chapelle.
4

99
Jean Candelou, nascido em Fabrezan (Aude), recebido em São Lázaro a seis de abril de 1640, com a idade de 23
anos.
1010
Os Padres Du Coudray, Candelou, Boucher e Brunet se entregaram ao trabalho logo ao chegar a Marselha, em
colaboração com oito padres da congregação do padre d’Authier. A seis de março, o senhor bispo Dom Gault já
podia escrever à Duquesa de Aiguillon: “foi a vinda desses senhores padres que me determinou totalmente a decidir
esta missão, que talvez eu tivesse adiado para outro tempo. Não vos posso dizer, Madame, quantas bênçãos estes
pobres forçados invocam sobre aqueles que lhes proporcionaram um socorro tão salutar...”. Como as galeras
deveriam logo partir de Marselha, o bispo acrescentava aos missionários alguns Jesuítas e Oratorianos. A missão
durou vinte dias. Havia três padres em cada navio. Dom Gault se distinguia entre todos pelo seu zelo. Ele ia de galera
em galera pregando, catequizando, confessando, tendo para todos uma palavra de consolação. Todos os forçados
católicos cumpriram seus deveres, exceto cinco ou seis. Houve batismos de turcos, abjurações de hereges, inúmeras
conversões. “As galeras mudaram tanto, escreve Belsunce (L’antiquité de l’Église de Marseille et la succesion de ses
évêques, Marselha, 1747-1751, 3 vol. In-4º, t. III, p. 411), que as compararam a claustros”. ( Ver Saint Vincent de
Paul et ses oeuvres à Marseille por H. Simard, Lião, 1894, in-8º, p. 60-67; Abelly op. cit., 1. II, cap. I. sec. II, §4, PP.
35-38)
pobres galés, e deste modo conquistar o direito de ficar por lá e comportando-se à
maneira dos que vieram do Canadá 1111. Não podemos encontrar meio mais eficaz para
mostrar a beleza e a santidade da Igreja católica do que o da hospitalidade exercida para
com os doentes. Rogo-vos recomendar isso a Deus sem fazer comentários a respeito.
Saúdo a comunidade, prostrado em espírito aos seus pés, e sou, senhor Padre,
vosso muito humilde servo.
Vicente de Paulo
i.p. da Missão

O pensamento que Nosso Senhor nos deu de não trabalhar nas cidades não foi
nunca para excluir delas as missões, se bem me lembro, mas somente de nelas não
pregar, nem catequizar ou confessar, de modo ordinário em nossas missões ou em
outras ocasiões, a fim de ficarmos livres e prontos para o povo pobre. Vós o fizestes
assim.

645. – AS AUTORIDADES DE SAINT-MIHIEL A SÃO VICENTE

1643.

Todo o corpo da cidade de Saint-Mihiel e todos os membros em particular vos


rendem um milhão de graças pelos trabalhos e cuidados que vos dignastes assumir em
favor do seu alívio, tanto pela distribuição de esmolas e assistência aos pobres doentes
e necessitados, quanto pela diminuição de uma parte do fardo de nossa guarnição
militar. Suplicamo-vos muito humildemente continuar-nos vossa proteção e vossas
esmolas, das quais esta pobre e desolada cidade tem tanta necessidade como nunca. É
totalmente verdade que por este meio uma infinidade de pessoas continuam hoje em
vida e nela não estariam sem isso. Se lhes subtraírem ou lhes tirarem inteiramente essa
assistência, necessariamente uma grande parte dos habitantes morrerão de fome, ou
terão de ir procurar vida em outras partes. Não falamos das distribuições que
mandastes fazer aos conventos por meio das quais conseguiram em parte subsistir, e da
assistência que tantas pessoas envergonhadas, até mesmo da nobreza, receberam de
vossos padres em suas doenças e necessidades. Não somos capazes de louvar como
merecem os grandes cuidados e o trabalho que eles tiveram, nem vos pedir com a
devida instância a continuação dos mesmos socorros em favor de tantos doentes e
necessitados, além da glória e do mérito que por tudo isso tereis diante de Deus.

1111
Foi ainda graças à iniciativa inteligente e à caridade generosa da Duquesa de Aiguillon que o Hospital Geral de
Québec foi fundado. As Ursulinas e as hospitaleiras francesas serviam nele. Elas tinham conquistado as simpatias dos
indígenas por, sua dedicação para com os doentes e seu heroísmo por ocasião de uma epidemia ( Histoire de l’Hôtel-
Dieu de Québec [por irmã Francisca Suchereau de Saint-Ignace], Montauban, 1751, in-12).
.
Carta 645. – Abelly, op. cit., 1. II. Cap. XI. Sec.I, 1ª Ed., p. 382.
646. – A JEAN MARTIN1

Paris, 23 de fevereiro de 1643.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Não posso exprimir-vos, senhor Padre, a consolação que minha alma recebeu
todas as vezes que o padre Guérin2 me comunicou a felicidade que tinha de trabalhar
junto convosco, nem quanto ela duplicou pela leitura de vossas cartas e pelos
sentimentos que Deus vos inspira de vos entregar a ele nesta pequena Companhia.
Rendo graças a sua divina Majestade por uma e outra coisa e rogo-lhe vos faça conhecer
sua vontade sobre isso. Com efeito, se for isso do agrado de Deus, ó Jesus, senhor
Padre, a ele nos entregaremos com todo o coração, tendo, porém, em vista que somos
muito indignos desta felicidade. Ora, a fim de conhecer melhor os eternos desígnios de
Deus sobre vós neste assunto, será bom, senhor Padre, que, uma vez que contais com a
boa vontade do senhor Bispo de Saintes3, vos deis ao trabalho de vir até aqui quando
[lhe aprouver] 4 e a vós também, e conhecereis de modo mais particular nosso modo de
vida, e fareis o retiro espiritual para esse fim, e me direis o vosso parecer. Ó Jesus!
senhor Padre, como ficarei contente ao vos abraçar, se isto acontecer! Eu o faço desde já
em espírito, prostrado aos vossos pés com toda humildade e afeto que me é possível, a
mim, que sou, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

647 – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Creio ter havido algum impedimento, pois que Madame de Lamoignon não me
enviou sua carroça. Isto me faz suplicar-vos humildemente, senhor Padre, não falar da
dúvida sobre aquilo que dei às Irmãs quando de sua partida, porque me permaneceu
.
Carta 646. – O texto desta carta foi tirado de um fac-símile, publicado em The autograph Souvenir de Netherclift,
Londres, 1865. O original foi posto à venda pela casa Charavay, a 3 de fevereiro de 1845. Pertencia em 1865 ao
senhor O’Callaghan.
11
Jovem padre de 25 anos, nascido (Charente-Inférieure), recebido na Congregação da Missão a 20 de maio de 1643.
Não confundi-lo com um outro Jean Martin, que foi muito tempo superior da casa de Turim.
22
Juliano Guérin.
33
Jacques Raoul.
44
Palavras apagadas no original.


Carta 647. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
sempre no espírito ter- lhes dado cinquenta escudos, e porque não me veio ao
pensamento outra coisa se não a incerteza do que elas tinham. Suplico-vos
humildemente que só isso seja levado em conta. Era minha intenção dizer-vos diante
das damas, como sou obrigada, e de me declarar, senhor Padre, vossa muito humilde e
muito indigna filha e serva,

L. de M.
Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

648. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Tive conhecimento daquilo de que o senhor Padre Compaing me prometera


informar-se, e estou por esse motivo tão aflita como nunca. Por isso vos suplico, pelo
amor de Deus, possa falar convosco hoje, aqui, se for possível, ou então ir estar
convosco. É tempo, creio eu, de providenciar algum remédio para o mal, que é extremo
e pior do que poderíeis pensar. Tenho grande motivo para temer e para desejar que
Deus me guarde e inspire vossa caridade, para tirar sua glória de tão grande mal.
Parece-me que consinto em me submeter a tudo, mas tenho temor da eternidade. Em
nome de Deus, considerai este negócio como de uma grande importância, e dai-me a
honra de crer-me, senhor Padre, vossa muito obediente filha e muito grata serva,

L. de M.
Destinatário: Para entregar ao próprio Padre Vicente.

649. – UM BISPO A SÃO VICENTE

1643.

A desolação extrema que encontro no clero de minha diocese e a impotência em


que estou de lhe dar remédio, me obrigaram a recorrer ao vosso zelo cujos sentimentos
e forte inclinação para restaurar a disciplina eclesiástica nos lugares onde se encontra
águas abaixo ou totalmente enfraquecida, são bem conhecidos.

.
Carta 648. – C. aut.– Dossiê das Filhas da Caridade, original.
.
Carta 649. – Abelly, op. cit. 1. II, cap. II, sec. I, 1ª ed., p. 214.

650. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR EM ROMA

27 de fevereiro de 1643.

Em nome de Deus, senhor Padre, não coloqueis moderação na liberdade de


escrever ao Superior Geral. Este uso é fundamentado em muitas boas razões. É uma das
principais consolações dos inferiores terem esta inteira liberdade. E isto, com toda a
certeza, é justo. Não penseis, senhor Padre, que julguemos estarem os inferiores contra
o superior, sem antes o ouvirmos, nem que vamos agir segundo o que se poderia
conjecturar a partir de seus relatos. Ó Jesus! Não! Posso assegurar-vos que não digo
nada a partir disso, mas sempre a partir da conduta que percebemos nas cartas dos
superiores particulares. É muito de se desejar, senhor Padre, que todos os superiores da
Companhia façam como faz um deles, que diz em público, de tempos em tempos, que se
alguém encontrar alguma coisa a censurar em seu procedimento ou em seus costumes,
avise ao Superior Geral, e ele procurará corrigir-se com a ajuda de Deus.
Estive ontem com o R. P. Bagot1, que muito me consolou por tudo que me disse
sobre a virtude e a regularidade de vossa família. Dou graças a Deus de coração, porque
é nisto que consiste ou de onde depende o motivo de esperar a misericórdia de Deus
sobre a Companhia e os serviços que presta a sua Igreja.
Continuai, senhor Padre, a vos esforçar para colocar vossa comunidade no bom
caminho e na exatidão à pequena regularidade, e não vos preocupeis com outra coisa.
Nosso Senhor fará o resto.

651. – A JEAN GUÉRIN, SUPERIOR, EM ANNECY

10 de março de 1643.

Ó senhor Padre, como peço a Deus de coração por vós e por todos os vossos, a
fim de que praza a sua divina bondade fazer que não tenhais senão um só coração e uma
só alma! A caridade é o cimento que liga as comunidades a Deus e as pessoas entre si,
de tal maneira que, quem contribui para a união dos corações de uma companhia, a liga
indissoluvelmente a Deus. Praza a sua infinita bondade animar-vos com o amor que ele
tem para com isso!

.
Carta 650. – Reg. 2, pp. 29 e 267.
11
Jean Bagot, da Companhia de Jesus, nasceu em Rennes a 2 de julho de 1591 e morreu aos 23 de agosto de 1664.
Dirigiu o colégio de Clermont e foi por pouco tempo confessor de Luís XIV. O piedoso e célebre Boudon o
considerava como um dos homens mais santos e sábios do seu século. Devemos a Jean Bagot várias obras de
teologia. A mais famosa é a Défense du droit episcopal et de la liberté des fidèles touchant les messes et les
confessions d’obligation, Paris, 1655, in-8º, que foi censurado a 7 de abril de 1657 pela Assembleia do clero da
França (ver La vie des Saints de Bretagne por dom Lobinau, ed. Tresvaux, Paris, 1836-1839, 6 vol. In-8º, t. II, pp.
344-350).

.
Carta 651. – Reg. 2, p. 34.
652. – A FRANCISCO DUFESTEL

10 de março de 1643.

Vicente de Paulo fala de cinco religiosos prontos para embarcar nas galeras para
o resgate dos cativos.

653. – A UMA RELIGIOSA DE PARIS

[entre 1639 e 16471]

Minha muito querida Madre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Não ouvi falar desde ontem pela manhã desta jovem. Estou preocupado com
vossas irmãzinhas e peço a Nosso Senhor seja vosso alívio. Sábado devo celebrar a
missa em Notre-Dame de Paris e nela dar a comunhão às Damas da Caridade de Lorena.
Se antes ou depois disso vós vos propondes fazer a viagem, irei até lá, se Deus quiser.
Envio-vos a carta de Madame de Villeneuve e sou, no amor de Nosso Senhor,
minha muito querida madre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

654. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ROMA

Paris, 20 de março de 1643.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi duas de vossas cartas ao mesmo tempo, uma do dia primeiro e a outra do
dia doze de fevereiro. Eis a resposta à primeira. Dou graças a Deus por tudo que me

.
Carta 652. – O senhor Charavay registra esta carta em um de seus catálogos. Diz-nos que São Vicente escreveu de
próprio punho as três páginas in-4º que a compõem.
.
Carta 653. – Dossiê da Missão, cópia tirada do original na casa do abade Eglée, cônego titular de Notre-Dame de
Paris. O original era da mão de São Vicente.
11
Tempo durante o qual funcionou a obra das Damas da Caridade de Lorena.
.
Carta 654. – Tivemos sob nossos olhos apenas uma cópia muito imperfeita, tirada do original do senhor Charavay.
dizeis nas duas e em especial por terdes tido a felicidade de prestar reverência ao senhor
Cardeal Lenti e por tudo que S. E. vos disse, como também por terdes começado o
seminário para os diáconos e os subdiáconos que o senhor Cardeal Lenti vos enviou.
Dir-vos-ei que entrevejo os frutos que me dizeis poderão dele provir, se aprouver a
Deus abençoá-lo, como lhe peço com todo o meu coração, e lhe ofereço todas as
palpitações deste meu coração como outras tantas orações jaculatórias a lhe pedirem
sem cessar esta graça.
Quanto ao negócio de Saint-Yves, não vejo muita coisa a se esperar no presente,
por causa da oposição que fazem os Padres do Oratório a respeito de Saint-Louis 1, pelo
seu padre Geral2, confessor do senhor irmão do rei3, ao qual a pessoa a quem falei disso4
não quer desagradar. Não direis isto a ninguém no mundo. Veremos com o tempo.
Mostrei vossas cartas, como faço de ordinário, à Madame vossa fundadora 5.
Quando houver alguma coisa de particular, dir-me-eis por meio de um bilhete à parte.
Eis a resposta à segunda carta. Ela me fala longamente de Saint-Yves e de
alguma missão na Bretanha. Só posso dizer-vos o que vos disse sobre este assunto, a
saber, que a pessoa a quem falei disso se afasta de mim por esse motivo, e que temos
alguns bretões em nosso seminário, se a coisa fosse urgente. Fora disso, omnia tempus
habent ( cada coisa tem o seu tempo).
Sou inteiramente a favor de vosso parecer, senhor Padre, que é preciso
consagrar-nos decididamente aos seminários. Com isto as missões terão mais êxito.
Somos obrigados a ir começar o de Cahors6 depois da Páscoa, e os senhores Bispos de
Mende7 e o de Angoulême8 nos pressionam no sentido de pregar missão em suas
dioceses ao mesmo tempo, o que nos é impossível se Deus não nos ajudar. Estamos
mandando a todos que dispõem de meios para isso que paguem a pensão. Estão dando
duzentas libras, ou ao menos oitenta escudos. Penso como vós que é preciso agir desse
modo em toda parte.
No primeiro dia disponível escreverei ao Padre Soufliers o que me dizeis em
relação a Agen9. Esperarei o que a Madame Duquesa1010 me disser sobre o seminário de
Richelieu e os ordinandos de Poitiers.

11
A confraria de São Luís dos Franceses, em Roma.
22
Francisco Bourgoing, predecessor de São Vicente na paróquia de Clichy.
33
Gastão, Duque de Orleans.
44
Provavelmente o Conde de Brienne.
55
A Duquesas de Aiguillon.
66
O contrato de fundação fora assinado no dia 4 de janeiro precedente. O pessoal da casa de Cahors deveria
compreender logo de início três padres e dois irmãos com o encargo de pregar missões, instruir os clérigos da diocese
que se apresentassem, manter gratuitamente três seminaristas escolhidos pelo Bispo e receber durante dez dias para os
exercícios espirituais, na época das ordenações, os clérigos chamados às ordens sacras. O Bispo de Cahors dava-lhes
por pensão as rendas dos priorados de la Vaurette e Balaguier e prometia acrescentar logo oitocentas libras, com a
condição de que, na ocasião do aumento, viesse um quarto padre ajuntar-se aos outros três e que o número dos
clérigos admitidos nos seminários, a título gratuito, passasse de três para seis. Os três padres da Missão prometidos
chegaram a Cahors a 12 de junho de 1643. O senhor Padre Adriano Foissac escreveu a história deste estabelecimento
(Le premier grand séminaire de Cahors et les prêtres de la Mission, Cahors, 1911, in-8º). Nós nos inspiraremos
frequentemente em seu trabalho, que está bem documentado.
77
Sylvestre de Crusy (1628-1659).
88
Jacques du Perron (1637-1646).
99
Ou antes para La Rose, na diocese de Agen. O Padre Soufliers era superior da casa erigida nesta localidade.
1010
A Duquesa de Aiguillon.
Folgo com o que me dizeis, a saber, que o Papa 1111 [admite] 1212 a união das
paróquias ao seminário, pagando a componenda 1313. O senhor Bispo de Saintes 1414 me
pede isso pela carta que dele recebi ontem. Explicai-me, entretanto, por favor, a
condição de que me falais– o pagamento da componenda– a quanto monta e também
se estas paróquias são dirigidas pelos padres do seminário.
Não tenho a honra de conhecer o Senhor de Vanury. Levarei em consideração,
entretanto, a proposta que me apresentais a respeito dele. Quanto à paróquia do senhor
Cardeal Lenti, se tivermos coirmãos disponíveis e suposto que ela esteja em alguma
cidade pequena, in nomine Domini, seria preciso pensar nisso. Mas se puderdes
suspender a negociação, tereis a oportunidade, entretanto, de ver e me comunicar o
estado do local, o número dos comungantes e quantas pessoas poderia isso inquietar,
depois de pregardes missão no referido lugar.
Quanto à dispensa do voto eu vos devolvi a que me enviaste, e comuniquei que
esta boa alma tem apenas cerca de trinta e seis anos1515. Quanto à doença que a
constrange a comer carne, trata-se de um enfraquecimento da natureza em virtude de
uma contínua agitação do seu espírito e das preocupações que os negócios lhe causaram.
Suplico-vos, senhor Padre, empenhar-vos nisso.
A absolvição ou a dispensa que se vos pedia em favor do herege convertido, que
foi um cátaro1616, será solicitada em Roma por ele mesmo; e já partiu para lá.
Mandarei refazer e assinar pelo padre Callon a carta que deve escrever ao senhor
Abade de Aumale1717. Se o negócio de Saint-Yves avançasse, nós lhe mandaríamos
escrever por intermédio de pessoas de importância. Se este negócio se concluir,
suprimiríeis a alma da coisa, omitindo o assunto do seminário. O que se dirá em razão
da mudança deste rumo?
Já que o irmão do Irmão Martinho vos é útil e pensais fazer dele um bom rapaz,
in nomine Domini, ficai com ele.
Trataremos de obter a carta do Cardeal Mazarino na maneira como pedis, e vos
enviarei o livro latino dos ordinandos por meio do Padre Dehorgny, que espero mandar
partir na Páscoa para ir visitar as pobres e pequenas famílias de Nosso Senhor.
Pensaremos no que me dizeis, isto é, ser conveniente que o Geral tenha a
faculdade de aplicar os bens de uma casa em outra. Procurai o parecer dele, se isto é de
desejar-se e se há algum precedente.
Mandarei redigir de ora em diante os memoriais em latim, antes de vos solicitar
que obtenhais o que eles deverão conter.
Eis as palavras da senhora do voto, relativas à sua indisposição: esta
enfermidade é antes uma fraqueza e delicadeza de temperamento, que impede esta

1111
Urbano VIII.
1212
O texto da cópia em francês traz o verbo “admire”– admira – em vez de [admet]– admite.
1313
Pagamento ao Papa por favores obtidos dele.
1414
Jacques Raoul de la Guibourgère.
1515
Ver carta 633, nota geral.
1616
Nome trazido, desde os primeiros séculos da Igreja, por várias espécies de hereges e ultimamente pelos puritanos,
seita protestante da Inglaterra.
1717
Edmundo ou Amado du Broc du Nozet.
mulher de poder fazer seis dias seguidos de jejum, sem ficar doente de uma enfermidade
particular.
Comunicar-me-eis, por favor, o nome da paróquia de Vannes da qual me falais,
para que eu possa cuidar de estabelecer lá um seminário.
Resta-me agora responder ao que me falais a respeito de M... 1818 e, a seu
respeito, da tolerância com os díscolos1919. Que faríeis, senhor Padre, de uma pessoa
que tivesse feito o possível, desde alguns anos, para afastar da casa todos aqueles que
conheceu, e que efetivamente desencaminhou quatro ou cinco dos mais capazes de
servir e triunfou em um ano sobre os melhores da Companhia; uma pessoa, cujo
espírito, se não está inteiramente corrompido, está muito transtornado; faz o que pode
para conseguir seus intentos, não somente com palavras mas também por escrito, em se
tratando de ausentes? Eis o que ele diz a um senhor... 2020: “Ainda está no cueiro2121?
Não pensa mais no que lhe disse, isto é, que se ele levantar o estandarte, eu baterei o
tambor por toda parte? E tais e tais não tomarão partido? E vós, [senhor Padre], quereis
que vos envie tecido dessa região para fazer um capuz para os vossos votos (que ele fez
a seis ou sete anos)?”. E em seguida lhe comunica os defeitos corporais das mulheres da
região, que a maior parte dos homens entram na igreja pelo claustro e que as mulheres
são tão feias que ele não teve dificuldade para fazer um sinal da cruz e espantar a
tentação. Escreve isso, do lugar onde pregou missão, a um outro que está a 150 léguas
longe dele.
Que faríeis vós... pois ele tem ainda... desde que saiu, e causou tal divisão na
família de... que foi preciso contratar novos servidores2222 e tudo isso no momento em
que ele me dava as maiores esperanças. Ó senhor Padre, Deus nos guarde de vo-lo
enviar e a vós de o receber! Ele arrasaria logo vosso estabelecimento ou o transtornaria
muito.
Vós me dizeis que é preciso suportar essas pessoas, neste começo em que a
Companhia precisa tanto de pessoal e que depois de algum tempo poder-se-ia limpá-la.
É verdade, senhor Padre, que a Companhia precisa de pessoal. Mas é melhor ter menos
gente do que ter muitos desordeiros e difíceis, com tal procedimento. Dez bons farão
mais para Deus do que cem deste teor. Limpemos, senhor Padre, limpemos a
Companhia dessas pessoas profanas que não são agradáveis aos olhos de Deus, e ele a
aumentará e abençoará. Querendo Deus fazer perecer cerca de três mil homens que
tinham adorado o bezerro de ouro e querendo Moisés impedi-lo com suas preces, Deus
lhe respondeu: Dimite me ut irascatur furor meus contra eos faciamque te in gentem
magnam2323 (Deixai-me acender meu furor contra eles e eu farei de ti um grande povo).
Assim, senhor Padre, diminuir o número dos que ofendem a Deus numa Companhia é
aumentar a mesma Companhia, em virtude e em número, uma vez que as pessoas
procuram as Companhias virtuosas e com boa ordem. Oh! Nosso Senhor sabia bem o
1818
O copista não soube ler o nome.
1919
Díscolo, pessoa com quem é difícil conviver (desordeiro, insubordinado, brigão, dissidente etc).
2020
O nome estava provavelmente rabiscado no original.
2121
A expressão francesa “avoir encore le béguin” que traduzimos por “ainda está no cueiro”, se diz de uma pessoa
inexperiente ou ignorante como uma criança.
2222
O copista ficou embaraçado para ler esta frase.
2323
Ex 32,10.
que dizia quando falava que malum pecus inficit omne pecus2424!(uma ovelha
contaminada corrompe todo o rebanho). Basta um homem como esse, senhor Padre,
para perturbar uma Companhia. A dos Mathurinos reformados está numa desolação
extrema e ameaçada de extinção, ou total ou parcial, por causa de um espírito profano,
desordeiro e incorrigível, cheio de artifícios2525!
Rogo a Deus, senhor Padre, esclareça e ilumine vosso entendimento para
compreender a importância que há para a glória de Deus, para a santificação da
Companhia e para o bem da Igreja, não toleremos nela pessoas que não agem bem, pois
chegaria um tempo em que não o poderíamos fazer, quando o quiséssemos.
Sim, mas ele se mandará e se porá a escrever e causar estragos à Companhia. –
Ele não nos fará maior mal do que o que Deus permitir que nos faça, e o mal que nos
fizer se transformará em bem para nós. Depois, não seríamos indignos de servir a Deus
em nossa condição, se, para impedir que uma pessoa nos faça mal, aceitemos que ela
transtorne o serviço e a glória de Deus entre nós? Lembrai-vos, senhor Padre, que a
decadência da maior parte das comunidades é devida à apatia dos superiores em manter
a devida firmeza, e por não limpá-las dos desordeiros e incorrigíveis.
Termino recomendando-me a vossas fervorosas preces e às da comunidade e
sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
Indigno padre da Missão..

655. – A PIERRE DU CHESNE, SUPERIOR EM CRECY

Paris, 25 de março de 1643.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Acabo de ver neste momento a carta que escrevestes ao Padre Portail, a qual me
traz não pequena preocupação por causa da indisposição que tendes e a dificuldade de
vos enviar alguém para vos substituir no vosso ministério. Farei, contudo, o que puder,
e vos peço, em nome de Nosso Senhor, fazer o mesmo em prol de vossa saúde e de nos
mandar de volta Padre Boudet, se ele não está atendendo confissões.
Saúdo muito humildemente o Padre Vincy e toda vossa pequena comunidade,
prostrado em espírito a seus pés e aos vossos. Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor
Padre, vosso muito humilde servo,

2424
São Vicente se equivoca. Esta sentença não é de Nosso Senhor, nem mesmo está na Sagrada Escritura.
2525
O Santo tem provavelmente em vista Alexis Berger, um dos principais cabeças da oposição ao Geral dos
Maturinos, Luís Petit. Sobre as desordens escandalosas de que esta Congregação dava então um triste espetáculo,
encontram-se detalhes instrutivos em Paul Deslandres, L’Ordre des Trinitaires pour le rachat des captifs, Tolosa,
1903, 2 vol. In-8º, t. I, p. 244 e seg.
.
Carta 655. – C. aut. – O texto foi tirado diretamente do original em poder do senhor Charavay.
Vicente de Paulo
indigno padre da Missão.

Se eu puder, farei partir alguém desde hoje. O mensageiro me tira a pena da


mão.

656. – A LUÍSA DE MARILLAC

Tarde de quinta-feira [1643, perto de maio1 ]

Bendito seja Deus, Senhora, por todas as coisas que me dizeis: o estado de nossa
cara Irmã de Nanteuil2, o que o bom senhor Pároco de Saché 3 vos comunica, a jovem
que a providência vos trouxe e, enfim, o baixo sentimento que Nosso Senhor vos dá de
vós mesma!
Não é conveniente que enviemos alguém daqui para Nanteuil. Basta que nossa
cara Irmã Elisabeth vá até lá, se lhe for cômodo.
Vede o uso que fez nossa digna Madre de Chantal dos impropérios 4 que lhe
assacou uma jovem egressa. Oh! como sois feliz de ter a ocasião de mostrar ao céu e à
terra o uso que fazeis dessa injúria! Não é justo que reconheçais o bom Deus na pessoa
desta jovem que ele vos enviou, por algum ato notável de aceitação do seu beneplácito
tal como neste caso?
Agradecei a Deus também pelo sentimento que vos dá de vós mesma e tende
confiança que sua bondade suprirá a minha ausência. Entregai-vos a ele para isso.
Falaremos disso no primeiro encontro e trataremos desta jovem que eu saúdo como
saúdo também a Luísa.
Se não estou enganado, estais certa em vossa conduta para com o vosso filho.
Não tenho mais nenhuma febre. Tenho motivo para temer que eu não banque um
pouco demais o delicado neste resfriado.
Sou obrigado a sair amanhã para estar com a rainha em Val-de-Grâce5, depois do
almoço. Feito isto, retiro-me para minha toca e me reservarei para estar convosco
quando estiver totalmente pronto para sair. Estive convosco e com vossas filhas hoje,

.
Carta 656. – Dossiê da Missão, original.
11
Ver nota 2.
22
Jeanne Dalmagne, então em Nanteuil-le-Haudouin, onde acabava de cair doente. Ao receber a carta de São
Vicente, Luísa de Marillac comunicou à doente que lhe enviaria a Irmã Elisabeth Martin: “nossa Irmã Elisabeth irá
vos assegurar da afeição de todas as nossas Irmãs e do desejo que vos lembreis delas no céu, quando Deus vos tiver
feito misericórdia” (Carta 97). Jeanne Dalmagne não chegara a esse ponto. “Irei embora daqui convosco”, disse ela
ao ver a Irmã Elisabeth. De fato, recobrou as forças e ficou logo em condição de ser transportada numa liteira até
Paris. Ela foi definhando ainda até cerca de um ano e morreu a 25 de março de 1644.
33
O Padre Mondion.
44
Impropérios– em francês impropères– censuras injuriosas.
55
Antiga residência de Petit-Bourbon. Ana d’Áustria tinha levado para lá as Beneditinas de Bièvre, que ela ia visitar
frequentemente e cumulava de generosas doações. A seu desejo, o próprio Luís XIV lançou , a 01 de abril de 1645, a
primeira pedra fundamental da igreja. Legou-lhes o seu coração e as relíquias do seu oratório.
em espírito, na Santa Missa, com a consolação que Nosso Senhor sabe, em cujo amor
sou v. s.

V. D.

Mostrai-me, por favor, esses papéis da Madame Duquesa de Aiguillon.

657. – A LUÍSA DE MARILLAC

[Entre 1638 e 16491]

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Estou muito contente por não terdes encontrado cadeira para ensinar. É preciso
honrar os sentimentos de Nosso Senhor quando dizia aos apóstolos que se queixavam de
estarem outros pregando e expulsando demônios como eles: “Os que não estão contra
vós (dizia o bendito Salvador) estão a vosso favor2”. Ficai certa, Senhora, que todas
estas pequenas tramas das descontentes se transformarão em bem para a Companhia das
Filhas.
É preciso refletir sobre o que fazer com Maria Denyse e dar ao senhor pároco 3
mais do que se tem feito, em consideração ao longo tempo em que nada recebeu.
Quanto ao vosso filho, servir-nos-emos dele em Linas4 e na Normandia.
Cuidai de vossa saúde, eu vos rogo. Sou, no amor de Nosso Senhor, vosso muito
humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.
Destinatária: A Senhora Le Gras.

658. – A BERNARDO CODOING

Paris, 17 de abril de 1643.

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!

.
Carta 657. – C. aut. – Original na casa central das Filhas da Caridade do Rio de Janeiro.
11
Pensamos que a frase relativa a Michel Le Gras não pode ter sido escrita antes de 1638 ou depois de 1649.
22
Lc 9,50
33
Provavelmente o pároco de Saint- Laurent, Padre Lestocq.
44
Perto de Corbeil (Seine-et-Oise).
.
Carta 658. – C. aut. – Dossiê da Missão, original. Esta carta foi reproduzida em numerosos exemplares pela
iniciativa de uma loja maçônica, com este cabeçalho: “Cartas e peças autógrafas de São Vicente de Paulo, da qual a
R de seus discípulos ordenou a litografia em dupla expedição, uma em fac-símile, a outra em escrita cursiva, depois
da doação que lhe foi feita dela pelo f Le Bouillé de São Gervásio. Paris, 19 de julho de 1823”. Este trabalho
contém um formigueiro de pecados de leitura.
Recebi vossa carta do dia 10 do mês passado com as do senhor Vigário Geral de
Óstia, do senhor Marchand e do Senhor de Luzarches. Como resposta, vos direi que vos
enviei uma procuração para comprar uma casa e nos comprometer com o pagamento da
renda de seis mil escudos. Pensar em ter uma de sessenta mil libras, como vos
aconselham, ó Jesus, não estamos em condição disso, senhor Padre. As sessenta mil
libras de que me falais são destinadas, pelo falecido S. E. 1, para Richelieu, e nem os
executores testamentários, nem os herdeiros consentirão jamais seja esta soma desviada
para outro lugar ou para outro fim.
Embora o Padre Blatiron estivesse em Richelieu, não deixei de lhe comunicar
que parta para Lyon, a 3 de maio, onde o Padre Dehorgny, que irá vos visitar, o tomará
consigo, assim como ao Padre Brunet, em Marselha 2. Ele vos levará os dois e trará de
volta o Padre Germano.
Entreguei a Madame Duquesa de Aiguillon as cartas que lhe escrevestes, assim
como as que me escrevestes. Estive com ela ontem e não... 3 sobre isso. Temo muito que
o estado dos negócios não leve o rei a se apoderar daquela soma. Fique isso entre nós!
Quando digo daquela soma, estou falando do dinheiro que S. E. deixou. Dominus
providebit (O Senhor Deus cuidará).
O extraordinário embaraço em que me encontro me impede de dar resposta a
todos esses senhores. Espero fazê-lo ao Vigário Geral de Dom Lenti e a esses outros
senhores.
Já vos disse muitas vezes que o negócio da Barbária 4 não se faz às nossas custas,
nem o de Cahors.
Desejo que vosso estabelecimento não seja luxuoso, nem ostensivo. As obras de
Deus não se fazem desta maneira, ao contrário das do mundo.
Se puderdes desfazer-vos, sem que se note, da proposta de receber este bom
senhor em vossa casa, fareis bem. Pensava ter-vos dito que é preciso ter por máxima
não se imiscuir em tais compromissos com outras pessoas, seja qual for o pretexto,
porque raramente é possível manter a caridade nesses casos, não tanto por causa dos
patrões, quanto por causa dos empregados.
Se o projeto dos Vescovandi5 tiver êxito, será um grande negócio. Os que foram
elevados aqui a esta dignidade chamam a atenção entre os outros prelados, de tal sorte
que todo mundo, até o rei, notam que são diferentes. É o que levou Sua Majestade a me
comunicar por seu confessor6 que eu lhe envie a lista dos que me parecem capazes deste
ministério7.
11
O Cardeal de Richelieu.
22
Ele trabalhava nas galeras com o padre Francisco du Coudray.
33
Segue uma palavra ilegível no original.
44
Ver carta 639.
55
Os que devem ser elevados ao episcopado.
66
Jacques Dinet, jesuíta. Ele tinha substituído, junto ao rei, no mês de março, seu coirmão o Padre Sirmond, cuja
surdez o colocara na necessidade de renunciar às suas funções. Nascido em Moulins em 1580, recebido na
Companhia de Jesus em 1604, o Padre Dinet desempenhou sucessivamente as funções de reitor em Orleans, Tours,
Reims, Paris e se tornou provincial da França e da Champanha. Morreu de hidropisia a 22 de dezembro de 1653,
alguns meses depois de ter sido nomeado confessor de Luís XIV.
77
Eis em que termos o Padre Dinet fala deste fato em Idée d’une belle mort ou d’une mort chrétienne dans le récit de
la fin heureuse de Louis XIII, Paris, 1656, in-fº, p. 14: “Como algumas dioceses estavam vacantes e ele tinha intenção
de provê-las com homens dignos, encarregou-me de pensar nisso e de me comunicar a respeito com pessoas
Eis, senhor Padre, o que vos tenho a dizer no presente. Sou, no amor de Nosso
Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos Padres da Missão de


Roma, em Roma.

659. – ALAIN DE SOLMINIHAC, BISPO DE CAHORS, A SÃO VICENTE

Cahors, 03 de maio de 1643.

Senhor Padre,

Os negócios públicos que me têm ocupado desde alguns dias, durante os quais
me encontro afastado da visita de minha diocese, me tiraram a ocasião de me
comunicar com vossos missionários até na sexta-feira em que eles se deram ao trabalho
de vir a Mercuès1. E isso me impede de falar convosco sobre eles. Dir-vos-ei somente
que eles promoveram o retiro dos ordinandos que eu admiti às ordens no sábado, na
hora de costume, com grande fruto e edificação de toda a cidade. O Padre Dufestel,
com o qual me entretive, me parece um homem reto, com grandes qualidades. Ele me
declarou, o que já vos disse várias vezes, que este estabelecimento era um dos mais
importantes que tendes e que possivelmente tereis no reino da França2.
Meu encarregado de negócios me comunica que os de Santa Genoveva, por
intermédio da Madame, esposa do Chanceler, conseguiram passar para o Senhor de
Fouquet a relatoria da questão, contrariando dois decretos pelos quais o Senhor de La
Ferté continuaria como relator deste negócio que me é muito caro, como sabeis. Por
essa razão, vos suplico, em nome de Deus, continuar para conosco vossa assistência
assim como em favor de nossos bons religiosos, etc.
Soube que o senhor Bispo de Sarlat3 continua sendo preceptor do rei, o que sem
dúvida é um ofício bastante aquém de sua dignidade. Enquanto isso, sua diocese, uma
das mais perdidas da cristandade, fica abandonada. Prestaríeis um grande serviço a

inteligentes e zelosas pelos interesses de Deus, jesuítas ou não, e particularmente com o reverendo Padre Vicente de
Paulo, Superior Geral da Missão, e de lhe oferecer uma lista, na qual seriam relacionados de acordo com a capacidade
e o mérito”. Ver ainda Abelly, op. cit. 1. I, cap. XXVII, p.125. O fato era muito recente, quando São Vicente escrevia
esta carta.
.
Carta 659. – Arquivo da diocese de Cahors, caderno, cópia. Este caderno contém quarenta e quatro cartas de Alain
de Solminihac a São Vicente, copiadas no século XVIII, antes do envio dos originais para Roma, por ocasião do
processo dos escritos do santo Bispo de Cahors. Agradecemos aqui ao senhor Cônego Albe, que consentiu
generosamente em no-lo informar.
11
Hoje centro adminitrativo de um cantão nos arredores de Cahors.
22
Os primeiros seminaristas chegaram dia 15 de junho de 1643, três dias depois dos padres da Missão. Eles se
estabeleceram em la Chantrerie, casa do cabido da catedral, que servia de morada para o bispo em 1791 e foi
demolida no século XIX.
33
Jean de Lingendes. Ocupou a sede de Sarlat de 1642 a 1650.
Deus, se aceitásseis dizer uma palavra sobre isso ao senhor Bispo de Beauvais 4, para
mandar dar-lhe ordem de vir cumprir sua obrigação. Do contrário, que se faça outra
provisão deste bispado. A diocese de Périgueux está também numa grande desolação e
parece que não vai demorar muito a ficar vacante 5. Rogo-vos também, se julgardes
conveniente, dar a entender a Sua Eminência que é muito importante se providencie
uma pessoa que tenha todas as qualidades requeridas, para colocá-la à frente de uma
diocese de tal importância, muito arruinada. Há muito tempo tinha falado ao senhor
Cardeal6 para colocar lá o Padre Brandon7, que me parecia apto para reformá-la. E o
Senhor des Noyers me dera esperança, em minha última viagem à corte, de que isso se
realizaria.
Sou, etc.

Alain, bispo de Cahors.

660. – A BERNARDO CODOING

Paris, 15 de maio de 1643.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi duas de vossas cartas ao mesmo tempo, uma do dia 05 e a outra do dia 15
de abril. A do dia 05 me estimula a envidar esforços para o nosso estabelecimento de
Roma. Garanto-vos que não perco tempo em favor disso. Enviei-vos uma procuração
para a compra da casa e a minha opinião quanto à última que me propusestes, assim
como em relação à nova fundação de cinco mil libras de rendas sobre os coches de
Ruão, que a Madame Duquesa instituiu1. Mandei saber do notário2 se ela assinou o
contrato que ela nos enviou para o assinarmos em primeiro lugar. Se eu souber a
resposta, antes de mandar a presente para o correio, informar-vos-ei por um pequeno
bilhete.
Ela me fala, em segundo lugar, de alguns da Companhia, diferentes dos
primeiros que me solicitáveis. A esse respeito, vos direi que desejo que tenhais a
44
Augustinho Poitier.
55
Francisco de la Béraudière era Bispo de Périgueux desde 1614. Morreu a 14 de maio de 1646.
66
O Cardeal de Richelieu.
77
Filiberto de Brandon.
.
Carta 660. – C. aut. – Original colocado à venda pelo senhor Charavay.
11
O contrato é de 02 de maio. A Duquesa de Aiguillon se compromete em dar 50.000 libras à casa de Roma, que
ficava assim coberta por uma renda de 5.000 libras. Ela pede, em troca, que nela se celebre diariamente uma missa
simples para o repouso da alma de Richelieu, que cada ano, a 04 de dezembro, dia aniversário da morte do Cardeal,
todas as missas sejam celebradas e uma encomendação feita na mesma intenção, que iguais favores lhe sejam
prestados a ela mesma depois de sua morte, que os missionários deem hospitalidade na casa aos ordinandos, em todo
o tempo do ano, para dispô-los, por um retiro preparatório, para bem receber as sagradas ordens, enfim, que um
epitáfio seja colocado na igreja no lugar mais evidente e mais cômodo, para memória desta fundação.
22
Mestre Charles, notário da Madame Duquesa de Aiguillon, cuja sucessão o mestre Julio Basílio Jean Ader
(Boulevard Saint-Germain, 226) ocupa hoje.
bondade de pesar bem as coisas antes de as comunicar, porque, quando se muda
facilmente de parecer, acontece que as coisas não se realizam conforme as últimas
opções.
Os senhores Padres Blatiron e Brunet, que nos eram mais úteis aqui do que
nenhum daqueles que pedis, estão a caminho para irem encontrar-vos, depois de muitas
e diferentes viagens que fizeram. Basta, daqui para frente, que me informeis sobre a
qualidade das pessoas e deixeis a escolha para mim. Um superior de uma congregação
conhece melhor todas as pessoas que a compõem do que qualquer outro. Dizeis-me que
escolhi mal no começo. Não o creio.
Vede, senhor Padre, tenho grande confiança nas pessoas que possuem dons. Mas
a experiência me faz ver todos os dias quão pouco se deve confiar em talentos e meios
humanos em qualquer parte do mundo. Dizia, nesses dias passados, a uma pessoa de
condição, que eu sinto no fundo do meu coração que eu não creio mais nos meios
humanos para as coisas divinas do que no diabo. Mesmo que as coisas não tivessem
avançado até o ponto em que chegaram, não tenho dúvidas de que Nosso Senhor não as
tivesse feito a seu modo, isto é, fazer melhor pelos menores do que pelos mais
excelentes instrumentos, segundo a regra: Infirma elegit Deus ut fortia quaeque
confundat3 (O que é fraqueza no mundo, Deus o escolheu para confundir o que é forte).
É neste sentido que digo que não escolhemos mal, pela misericórdia de Deus, e que
espero que Nosso Senhor fique satisfeito em se servir daqueles que ele mesmo traz para
nós, e não nos pede outros no momento. Oh! para o futuro espero que dê a graça à
Companhia ou de lhe mandar candidatos melhores, ou de formá-los melhor do que ela
tem feito, ou de se conformar com essa pobreza.
Temos aqui dezesseis ou dezoito estudantes de teologia e filosofia que vão muito
bem no dizer de quem o entende melhor do que eu. O Padre Messier, doutor da
Sorbona4, que assistiu, há três dias, aos seus debates, admirava como tinham feito tanto
progresso em tão pouco tempo. O mesmo aconteceu com nosso Padre Gilles.
O negócio de Saint-Yves não pode avançar por aqui no momento. O Senhor de
Chavigny me disse a razão, que eu já vos comuniquei. Se por lá puderdes, por meio do
senhor Marchand, disponibilizar aqueles a quem isso interessa, o que não é provável,
darei meu aval. As coisas mudaram depois aquele tempo.
Deixaremos lá também o seminário de Vannes. Falam-nos de um outro para
Tréguier, na Bretanha Inferior. Mas ainda há apenas cerca de 500 libras de renda. Folgo
em saber da facilidade que me dizeis que há para a união das paróquias. Mas como
aquilo que me dizeis referente a deixar à disposição do Superior Geral tirar de uma casa
para dar a uma outra acarreta muitos inconvenientes, e é algo inédito em qualquer
companhia, devo pensar nisso melhor por mais tempo diante de Deus.
Já vos escrevi, a respeito da residência do Geral, que estou pensando , há cerca
de um ano, como na maior parte dos assuntos que me sugeris, especialmente no que
dizeis a respeito dos que saem. Louvo a Deus pelo que me dizeis dos ordinandos, do

33
1 Co 1,27
44
Luís Messier, nascido em Paris em 1573. Foi pároco da paróquia Saint-Landry de setembro de 1598 até o mês de
abril de 1664, decano da faculdade de teologia, sênior da casa e sociedade da Sorbona. Morreu a 15 de novembro de
1666. Deixou-se levar pelas ideias jansenistas. Luís Messier, seu irmão, era arcediago de Beauvais.
senhor Cardeal Barbarin5 e da resolução que tomastes a respeito da paróquia da diocese
do senhor Cardeal Lenti. Meu Deus! senhor Padre, como estou com vergonha por não
lhe ter escrito e nem ter respondido a seu Vigário Geral! O embaraço em que me
encontro, desde há algum tempo, e minha indesculpável miséria mo impediram.
Aprouve a Deus dispor de nosso bondoso rei no dia em que ele nascera, há trinta
e três anos. Sua Majestade (Luís XIII) desejou que eu o assistisse em sua morte
juntamente com os senhores Bispos de Lisieux 6 e de Meaux, seu primeiro capelão 7,
assim como o R. P. Dinet, seu confessor8. Desde que estou neste mundo, jamais vi uma
pessoa morrendo mais cristãmente. Há cerca de quinze dias, mandou recomendar-me
fosse estar com ele. Como tivesse melhorado no dia seguinte, voltei para casa. Tornou a
me chamar, há três dias, durante os quais Nosso Senhor me deu a graça de permanecer
junto dele. Nunca vi maior elevação de espírito a Deus, mais tranquilidade, maior temor
das menores sombras de pecado, mais bondade, mais clarividência de juízo em uma
pessoa desta condição. Anteontem, os médicos, vendo-o em sono torporoso e de olhos
virados, temeram que fosse morrer e o disseram ao padre confessor. Este o acordou logo
e lhe disse que os médicos julgavam ter chegado a hora de fazer a recomendação de sua
alma a Deus. Imediatamente, este espírito, cheio do de Deus, abraçou terna e
longamente este bom padre e lhe agradeceu a boa notícia que lhe dera. Logo depois,
elevando os olhos e os braços para o céu, rezou o Te Deum laudamus (Nós te louvamos,
Senhor) e o terminou com tanto fervor que só a lembrança disso me enternece
profundamente, na hora mesmo em que vos falo9.
Como o sino me chama e me impede de falar mais sobre ele, termino
recomendando-o às vossas orações e às da comunidade.
Podeis dizer ao R. P. assistente dos jesuítas1010 que o R. P. Dinet fez tanto bem
ao lado deste príncipe, que Sua Majestade e toda a corte ficaram muito edificados. Ó
senhor Padre, como esse Reverendo Padre é um grande servo de Deus!
Sua Majestade doou seu coração a esta santa Companhia para ser sepultado em
São Luís1111 com o da rainha-mãe. Quanto a mim, eu vos dou o meu, eu que sou, no

55
Já dissemos que o Sacro Colégio contava três cardeais com este nome, um irmão e dois sobrinhos de Urbano VIII,
a saber: Francisco Antônio, Cardeal de Saint-Onuphre; Antônio, comumente conhecido pelo nome de Cardeal
Antônio, e Francisco. Trata-se provavelmente deste último, Francisco Barberini, nascido em Florença em 1597, feito
Cardeal pouco depois da elevação do seu tio, legado a latere na França, depois, no começo de 1626, na Espanha.
Refugiou-se na França com seus irmãos, quando Inocêncio X quis exigir deles a prestação de contas das dilapidações
de que se tornaram culpados sob Papado de Urbano VIII, e recebeu a mais cordial hospitalidade, embora se tenha
mostrado, durante a vida de seu tio, mais favorável aos interesses da Espanha do que aos da França.
66
Felipe Cospéan.
77
Domingos Séguier.
88
Eis o que diz o Reverendo Padre Dinet a respeito da presença do Santo junto do príncipe moribundo (Op. cit. P.44):
“O Padre Vicente veio também por duas vezes, conforme o desejo da rainha, manifestado ao rei. Mas este grande
príncipe não consentiu, a não ser com a condição de que seu confessor não fizesse objeção, de tal modo mantinha ele
o seu espírito presente a tudo que se passava em torno. Essa excelente princesa foi tão bondosa que quis dar-se ao
trabalho de me comunicar isso todas as vezes. Eu ficava cheio de admiração e me sentia obrigado a não somente
render-lhe meus agradecimentos, como também muito humildemente pedir-lhe as suas graças.”
99
O piedoso monarca deixou em testamento para o Santo 24.000 libras em favor de uma fundação de duas missões
que seis missionários deveriam pregar cada ano, durante dez anos, na cidade de Sedan. Colocou, além disso, a sua
disposição e à do R. P. Dinet a soma de 46.000 libras, 40.000 para serem empregadas em favor dos pobres do campo,
parte em missões, parte em esmolas, e 6.000 para o regaste dos escravos franceses cativos na Argélia.
1010
O Padre Estêvão Charlet, assistente da França (1627-1646).
1111
Casa professa dos padres jesuítas. O estado de deterioração da igreja Saint-Paul fez com que o serviço paroquial
fosse transferido em 1802 para as igrejas dos jesuítas, que tomou então o nome de igreja Saint-Paul - Saint-Louis.
amor de Nosso Senhor e de sua Santa Mãe, senhor Padre, vosso muito humilde e
obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão..

Vieram dizer-me que a Madame Duquesa não assinou o contrato e que não está
em condição de assiná-lo, por alguns dias.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos Padres da Missão de


Roma, em Roma.

661. – FRANCISCO DU COUDRAY,PADRE DA MISSÃO, A SÃO VICENTE

[Marselha, 23 ou 24 de maio de 16431.]

João Batista Gault, bispo de Marselha2, acaba de entregar sua bela alma a Deus.
“Falta-nos ainda uma missão a pregar em uma galera, não mais para este ano. O
trabalho é grande. Mas o que nos ajuda muito a suportá-lo é a transformação notável
observada nesses pobres forçados, o que nos dá a maior satisfação possível. Ontem eu
dava catecismo para sete turcos de diversas galeras, que mandei vir para aqui. Deus,
por sua misericórdia, queira abençoar este trabalho, que eu recomendo a vossos santos
sacrifícios. Um outro turco doente foi batizado na galera. Além desses turcos,
converteram-se cerca de trinta hereges que fizeram abjuração.”

662. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ROMA

Paris, 29 de maio de 1643.

Senhor Padre,

.
Carta 661. – Abelly, op. cit., 1.II, cap. I, sec. II, § 4, 1º ed.
11
Ver nota 2.
22
Nasceu em Tours, a 26 de dezembro de 1593. Foi recebido no Oratório a 10 de junho de 1618. Foi sucessivamente
professor, missionário, pároco e foi sagrado Bispo de Marselha a 05 de outubro de 1642. Chegou a esta cidade em
janeiro de 1643 e nela morreu a 23 de maio, depois de ter dado, neste curto lapso de tempo, mil provas de santidade e
zelo apostólico. Os milagres se multiplicaram a tal ponto em seu túmulo que a Assembleia do Clero da França pediu
para ele, em 1646, as honras da Beatificação. O processo canônico, interrompido com as turbulências da revolução,
foi retomado no século XIX (La Vie de Messire J. B. Gault, pelo Padre Francisco Marchetty, Paris, 1650, in-4º).
.
Carta 662. – Pémartin, op. cit., t. I, p. 454, 1. 391. Pémartin tirou o seu texto do original, posto à venda por
Charavay a 27 de abril de 1864.
Recebi ontem a dispensa dos votos1 e vossa carta que a acompanhava. Agradeço-
vos muito humildemente.
Admiro-me por não me comunicardes que recebestes a procuração que vos
enviei para comprar parceladamente a casa em que morais 2, nem a que vos escrevi
depois para comprar também por meio de renda anual e perpétua, na razão de duzentas
libras, o edifício de que me falais. A Duquesa de Aiguillon é de parecer favorável a este
último. Tendes razão em adiar os exercícios das Têmporas 3 para os ordinandos até que
possais comprá-lo, pois que não tendes capela, nem outros espaços necessários. Tome,
portanto, providência, senhor Padre. Eu ratificarei o que fizerdes.
O senhor Cardeal Mazarino me prometeu escrever ao senhor Cardeal Ginetti 4, e
hoje espero estar com o senhor Chavigny em função da carta do rei para Roma. Amanhã
estarei com o senhor Núncio5. A Madame Duquesa escrever-lhe-á também.
Nosso negócio das cinco mil libras não foi ainda assinado6. Será assinado, espero
eu, proximamente.
Aí está o padre Dehorgny convosco. Dir-lhe-eis, por favor, que o Padre Le
Bègue me falou que os superiores de sua Companhia 7 lhe escreveram que desejariam
fosse o Padre Authier coadjutor do Superior Geral e que entrassem em acordo ou
mesmo lhe dessem a direção de suas casas. Excluo a primeira proposta, por varias
razões, e também a segunda, a não ser com a condição de que o Superior Geral mande
visitar todos os anos essas casas, constitua nelas superiores e transfira as pessoas, se não
acharem melhor que ele seja um dos assistentes do Geral. Uma palavra sobre o parecer
dele e sobre o vosso, por favor, a respeito disso.
Termino saudando-vos aos dois com toda humildade e afeição que me é
possível, prostrado em espírito aos vossos pés. Sou no amor de Nosso Senhor...

663. – JACQUES-RAOUL DE LA GUIBOURGÈRE, BISPO DE SAINTES, A SÃO


VICENTE

Maio ou junho de 1643.

Passei a festa de Pentecostes com os senhores padres vossos missionários, que


trabalham com maravilhoso zelo, mas com grande consolação, dada a bênção que

11
Para a pessoa de que se trata na carta 594.
22
No começo de sua permanência em Roma, Bernardo Codoing morava numa pequena casa em Pont-Sixte, onde
talvez ainda estivesse em 1643.
33
Trata-se dos três dias de orações e abstinência prescritos pela Igreja nas quartas, sextas e sábados da primeira
semana de cada estação.
44
Martio Ginetti, nomeado Cardeal a 19 de janeiro de 1626, posteriormente legado em Ferrara, legado a latere na
Alemanha, Bispo de Albano, de Sabine, de Porto, Cardeal-vigário, falecido como subdecano do Sacro Colégio, a 01
de março de 1671, com a idade de 86 anos.
55
Jerônimo Grimaldi, Arcebispo de Selêucia.
66
Ver carta 660.
77
A Congregação de Cristóvão d’Authier de Sisgau.

.
Carta 663. – Abelly, op. cit., 1.II, cap. I, sec. II, § 4, 1ºed., p.30.
Deus lhes concede aos trabalhos. Não posso dar-vos graças proporcionais às dívidas
de gratidão.

664 – FRANCISCO DU COUDRAY, PADRE DA MISSÃO, A SÃO VICENTE

Marselha, 01 de junho de 1643

Ontem, dia da Santíssima Trindade, foram batizados na igreja catedral nove


turcos, diante de toda a cidade de Marselha. As ruas estavam lotadas de gente
bendizendo a Deus. Não tínhamos também intenção de ocultar esta ação, para tocar o
coração de outros turcos que parecem hesitar. Hoje dois outros vieram encontrar-me
para me dizer que querem ser cristãos. Estavam acompanhados de um terceiro, que foi
batizado há cerca de dez dias. Continuamos a ministrar-lhes catecismo em italiano,
duas vezes ao dia para consolidá-los e firmá-los quanto for possível. Do contrário,
ficariam expostos a voltar ao maometismo.

665. – LÉONOR DESTAMPES DE VALENÇAY, ARCEBISPO DE REIMS, A SÃO


VICENTE
1643.

Não saberia agradecer-vos devidamente o favor que me fizestes, enviando-me


vossos missionários para orientar os exercícios espirituais dos meus ordinandos. Ficai
certo de que eu tinha uma grande necessidade deles, e que não poderiam ir a lugar
algum onde fossem mais necessários. Eles mesmos vos farão o relatório dos grandes
frutos produzidos.

666. – OS ECLESIÁSTICOS DA CONFERÊNCIA DE NOYON A SÃO VICENTE

1643.

Se as ações de graça devem corresponder à grandeza dos benefícios recebidos,


nossa Conferência ficará necessariamente em dívida quanto ao dever de gratidão que
ela é obrigada a vos prestar, pela edificação singular recebida de vossos padres na
direção e instrução dos ordinandos. Há muito tempo desejávamos esta bênção de vossa

Carta 664. – Abelly, op. cit., 1.II, cap. I, sec. II, § 4, 1ºed., p. 37.

.

Carta 665. – Abelly, op. cit., 1.II, cap. II, sec. V, 1ºed., p. 235.

.
Carta 666. – Abelly, op. cit., 1.II, cap. II, sec. V, 1ºed., p. 235.
parte. Mas agora que a Conferência sentiu-lhe os vantajosos efeitos, ela os estima e os
encarece a tal ponto que ela não encontra palavras para vos exprimir os próprios
sentimentos.

667. – UM ECLESIÁSTICO DA CONFERÊNCIA DE NOYON A SÃO VICENTE

1643.

Gostaria de encontrar termos capazes de exprimir a consolação e a edificação


que receberam não somente os ordinandos, mas também os senhores padres da
Conferência, pelos colóquios que nos fez M. N., de vossa Companhia. Tocou de tal
modo os corações, que esses senhores padres não se cansavam de falar dele. Entre os
ordinandos, havia muitos aborrecidos por que os obrigavam a fazer esses exercícios, e
se tinham feito o propósito, antes de iniciá-los, de não fazer de modo algum sua
confissão geral, e além disso, de não fazê-la a vossos padres. Depois, porém, de ter
participado dos colóquios, ficaram tão fortemente tocados que confessaram e
declararam alto e bom som, na presença dos outros, suas más intenções e
posteriormente a resolução contrária tomada, de fazer a confissão geral e de fazê-la
aos padres missionários. Eles o diziam derramando lágrimas, de tal modo estavam
tocados.
Rendo-vos, portanto, infinitas ações de graça por vossa grande caridade para
conosco, tanto de minha parte, quanto da parte desses senhores ordinandos, que me
encarregaram de vos escrever para vos testemunhar o contentamento que sentiram.

668. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

.
Carta 667. – Abelly, op. cit., 1.II, cap. II, sec. V, 1ºed., p. 235.
.
Carta 668. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
Madame Pelletier acaba de sair daqui. Veio dizer-me que o senhor Abade
Buzay era coadjutor do senhor Arcebispo e que logo pensou em meu filho. Sem nada
1

dizer-me, falou dele ao R. Padre Emanuel 2. Ele disse a ela para saber de mim se eu
gostaria que o apresentasse para servir ao referido senhor Buzay, não sei se como
esmoler, ou numa outra função mais apropriada a ele. Ora, como isso não veio de mim,
de modo algum, pensei, senhor Padre, que eu não deveria deixar de tomar a liberdade
de vos perguntar como me conduzir nesse caso. Se o julgardes viável, suplico-vos muito
humildemente fazer-nos a caridade de nos ajudar nisso. Creio que, se meu filho, tivesse
alguma tendência para a melancolia, que seria, a meu ver, a causa de suas aflições,
estas últimas desapareceriam. Ele sempre me pareceu ter temor de Deus e vontade de
cumprir fielmente o que lhe for confiado. Se quiserdes que tenha a honra de vos falar
sobre este assunto, praza a vossa caridade dar-se ao trabalho de me comunicar, e crer-
me senhor Padre, vossa muito grata filha e serva,

L. de M.
08 de junho de [1643 ]. 3

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

669. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

As Madames Souscarrière, de Romilly1 e Traversay estiveram convosco para vos


dizer que o senhor Chanceler2 as recebeu muito bem e alertou-as que para entrar de
posse do castelo de Bicêtre3 é preciso falar com a rainha e providenciar um alvará.
Suplicam-vos, muito humildemente, seja vossa caridade que fale com ela, se já não o
1

1
Francisco Paulo de Gondi, abade de Buzay, filho de Felipe Emanuel de Gondi, general das Galeras, e de Francisca
Margarida de Silly, foi nomeado, a 13 de junho de 1643, coadjutor de seu tio, João Francisco de Gondi, Arcebispo de
Paris, e sagrado a 31 de janeiro de 1644. Embora tivesse tomado parte ativa nas turbulências da Fronda, a rainha, sem
dúvida, para conquistá-lo, obteve-lhe a 19 de fevereiro de 1652, o chapéu cardinalício. Mazarino, descontente com
sua influência e suas manobras, mandou prendê-lo na prisão de Vincennes. Feito Arcebispo de Paris com a morte de
seu tio e consequentemente tornando-se mais perigoso para o primeiro ministro, o Cardeal de Retz foi transferido
para o castelo de Nantes, donde ele fugiu e foi para a Espanha e depois para a Itália. Em Roma, os Padres da Missão,
sob a ordem do soberano Pontífice, lhe deram hospitalidade em sua casa. Faltou pouco para Mazarino fazer cair sobre
São Vicente e a sua Congregação todo o peso de sua cólera. Com o advento de Alexandre VII, que lhe era menos
favorável do que Inocêncio X, o Cardeal de Retz deixou Roma e empreendeu uma longa viagem pelo Condado
Francês, pela Alemanha, pela Bélgica e pela Holanda. A morte de Mazarino abriu-lhe as portas de sua pátria. Voltou
para a França em 1662, renunciou ao arcebispado de Paris e recebeu em troca a Abadia de Saint-Denis. A idade e
aprovação o tornaram mais ajuizado. Ninguém reconheceria o prelado ambicioso, leviano e irrequieto que tinha
sublevado Paris e feito tremer o poderoso Mazarino, no homem tranquilo, aplicado, caridoso de costume simples,
solícito por fazer economia a fim de poder pagar seus numerosos credores, até mesmo piedoso durante os quatro
últimos anos de sua vida. Morreu a 24 de agosto de 1679. Como escritor, o Cardeal de Retz é conhecido sobretudo
por suas Mémoires.
22
O R. P. Felipe Emanuel de Gondi, do Oratório, pai do abade de Buzay.
33
Data acrescentada no dorso do original.
.
Carta 669. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Luísa Goulas, esposa de Pierre Sublet, Senhor de Romilly, Conselheiro do rei e tesoureiro geral das guerras.
22
Pierre Séguier.
fez, e de avisá-las por quem farão redigir o alvará e quem deve apresentá-lo, o senhor
Chanceler ou Madame de Brienne4.
O senhor Chanceler ofereceu também às referidas damas expedir um decreto,
para que se sirvam de uma parte da soma das crianças pobres em favor de suas
necessidades presentes. Poderíeis dizer-lhes, por obséquio, qual soma pedir?
As mesmas damas temem que Madame de Lamoignon tenha estragado tudo,
falando ao Senhor de Nesmond5, e vos suplicam falar prontamente disso à rainha, com
temor de que Sua Majestade seja prevenida por algum outro, e vos lembrar de mostrar-
lhe que o povo terá como grande gratificação a diminuição que o rei fará sobre o porte
de grãos, conforme Madame Romilly já vos disse.
Disse ao Padre Portail que vossa caridade pediu-nos deixássemos a assembleia
para o domingo. Ele houve por bem vos propor o assunto: a importância de observar o
que está no diretório da maneira de viver das Filhas da Caridade, fazendo a leitura
dele6. Parece-me muito importante preveni-las de que um bom meio de se habituar à
prática do diretório é que cada irmã das paróquias, e uma de cada casa, façam um
relatório sobre isso em todas as assembleias, todas ou uma parte delas cada vez.
Também, senhor Padre, se julgardes conveniente, nos fareis a caridade em cada
conferência de nos ministrar instrução sobre um ou dois pontos de nosso modo de vida.
Se quiserdes que todas nós façamos oração pela assembleia, poderia vossa caridade
determinar-lhe os pontos, para que os enviemos às nossas irmãs, alertando-as para
isso? Irei amanhã, bem cedo, saber o que for de vosso agrado dizer-me sobre todos
esses assuntos.
Permiti-me suplicar-vos vos lembreis no santo altar das minhas necessidades,
especialmente do que me torna tão criminosa diante de Deus, que me impede de ter
total confiança na sua santíssima providência e me torna indigna de me declarar,
senhor Padre, vossa filha, embora por sua bondade eu seja vossa gratíssima serva.

L. de M.
12 de junho [1643 ]. 7

670. – JEAN-JACQUES OLIER A SÃO VICENTE

33
O que Luísa de Marillac chama de castelo de Bicêtre era um vasto edifício construído por Luís XIII no local do
antigo castelo real, para dar asilo aos oficiais e aos soldados inválidos. Depois da morte do monarca, o projeto foi
abandonado e o edifício ficou vazio.
44
Luísa de Béon, filha de Bernardo de Béon, intendente de Saintonge, de Angoulême e da região de Aunis, e de
Luísa de Luxembourg-Brienne, esposa de Henrique Augusto de Loménie, Conde de Brienne, secretário de estado.
Era uma dama da Caridade muito devotada a São Vicente e a suas obras. Morreu a 2 de setembro de 1665.
55
Francisco Teodoro de Nesmond, Senhor de Saint-Dyzan, presidente, com barrete de magistrado, no Parlamento de
Paris, desde 20 de dezembro de 1636. Tornou-se depois superintendente da casa do príncipe de Condé, primeiro
presidente do Parlamento e morreu a 25 de novembro de 1664 com a idade de sessenta e seis anos. Do seu casamento
com Ana de Lamoignon, irmã do célebre magistrado, teve quatro filhos e uma filha. Um de seus filhos ocupou a sede
episcopal de Bayeux.
66
São Vicente fez sua conferência a 14 de junho, sobre o assunto proposto por Antônio Portail.
77
Data acrescentada no dorso do original.
.
Carta 670. – C. aut. – Arquivo do seminário de São Sulpício, original.
[Paris, junho de 16431]

Quem tem Jesus tem tudo!

Senhor Padre,

Rogo a Nosso Senhor que viva em vós para o triunfo da Igreja sobre o cinismo
do século.
Esqueci-me ontem de vos falar sobre o principal assunto que me levou até vós:
fazer-vos algumas queixas sobre o maior escândalo acontecido na Igreja de Deus desde
há muito tempo. Trata-se de um pároco2 que, perto de Paris, foi açoitado e ferido a
pauladas pelo senhor de sua aldeia3, na presença de seus paroquianos e na porta da
igreja com a maior infâmia e humilhação possível para o estado eclesiástico 4. O
pároco é uma pessoa de grande integridade e igual capacidade, que tem testemunhos
muito autênticos de uma e outra coisa, e que merece ser apoiado por sua pessoa como
pelo seu caráter.
Penso, senhor Padre, que nesta abordagem da regência da rainha, se ela quiser
obrigar este cavalheiro a uma satisfação pública ou infligir-lhe uma punição temporal,
ela repararia muito a autoridade da Igreja e reprimiria muita ousadia e insolência que
a nobreza costuma exercer contra a Igreja, desprezando e violando impunemente todos
os seus direitos como num tempo de libertinagem e de reinado da impiedade. Pedi
ontem ao senhor Bispo de Puy5, que teve a bondade de vir estar comigo, falasse disso
ao senhor Bispo de Beauvais6, para providenciar remédio para este mal que se tornou
público e de que a corte já está ciente. Ela espera somente as ordens de Sua Majestade
para dar a conhecer o empenho que ela tem em punir esta espécie de crime.
Este bom padre não pode facilmente coligir as provas para acionar a justiça,
porque o senhor está presente no lugar, e isto intimida os espectadores do ultraje.
Alguns vieram estar comigo em segredo para me perguntar se deveriam depor em
justiça o que sabiam sobre tal atentado que lhes causara tanta comiseração. Animei-os
a cumprir com seu dever, como também ao senhor pároco. Ele ainda estava lívido e
fora solicitado, por sua vez, a não levar o caso para frente. Teme uma previsível
punição que ele não poderia evitar neste santo reino de piedade. Pessoas de grande
peso e de altíssimo mérito, que ouviram falar do que aconteceu, se manifestaram no
sentido de que este bom padre não deveria intimidar-se nem calar-se. Está em jogo o
interesse universal da Igreja. Viria muito a propósito que, no advento da regência da
rainha, pudessem todos presenciar um castigo público e uma punição exemplar de um
sacrilégio tão odiento, a fim de devolver a paz e a tranquilidade para a Igreja, neste

11
Ver nota 4.
22
Gervásio Bigeon, pároco de Arcueil, doutor em teologia.
33
Teodoro de Berziau.
44
Por ter impedido o juiz senhorial de presidir a prestação de contas de seus tesoureiros, Gervásio Bigeon recebeu de
Teodoro de Berziau, a 30 de maio de 1643, dez ou doze cacetadas, que o feriram na cabeça, e esporadas que lhe
rasgaram as vestes. A questão foi levada ao Parlamento e atraiu a atenção da Assembleia do Clero que dirigiu à
rainha, em 1645, severas advertências.
55
Henrique de Maupas, Bispo de Puy e primeiro capelão da rainha.
66
Agostinho Potier, Bispo de Beauvais, capelão-mor de Ana d’Áustria.
assunto, por todo o resto de sua regência e redimir a Igreja do vexame e da opressão
em que vivem os párocos, nas regiões afastadas da corte, onde os padres não têm boca
para se queixarem e só parecem ter ombros para sofrer.
Todos os senhores bispos têm grande interesse nisso e sentem, pelos seus
párocos, um frêmito de indignação diante desta opressão, sem lhe poder dar remédio.
Sabeis disso melhor do que todos, vós que fostes testemunha ocular de todos esses
males, no ministério das missões no campo. Frequentemente Deus despertou em vosso
coração gemidos de compaixão diante desses males, assim como o desejo de lhes dar
remédio, se vos fosse possível. Ele agora coloca em vossas mãos a autoridade para
fazê-lo7. Senhor Padre, o que não teríeis feito naquele tempo quando esses males vos
eram tão sensíveis? O que não gostaríeis de fazer, tendo agora o poder que Deus vos
dá, do qual podeis tão eficazmente utilizar para a glória de Deus e para o bem da
Igreja? O grande mestre e sapientíssimo senhor dos conselhos quis fazê-lo passar por
tudo isso, para vos tornar mais sensível aos males do seu clero e aos seus gemidos, sob
a opressão em que se encontra. Onde está o homem, dizíeis vós, capaz de nos libertar?
Onde está aquele a quem Deus dará este zelo e esta autoridade? Debuit per omnia
nobis assimilari ut misericors fieret8 (Convinha em tudo tornar-se semelhante a nós
para se tornar misericordioso). Nosso Senhor passou por isso. Padeceu na
enfermidade, para ter compaixão de nós. Em sua glória e em seu reino, assentado à
direita de Deus, lembra-se de nossas misérias e nos assiste com sua proteção, sua força
e sua graça.
É o que vos pede, senhor Padre, a Igreja, a porção mais humilde do clero, a
saber, os párocos, e sobre tudo, eu, de mãos postas em favor deles, eu que tenho a
honra de ser um de seus coirmãos. Sofro com eles e, por vossa graça, estive em muitas
regiões, de tal sorte que pude tomar conhecimento dos sofrimentos e dos males que
padecem, longe de Paris. Lanço-me a vossos pés, com esse bom pároco, e vos peço a
graça, agora que estais livre das cadeias em que estamos cativos: lembrai-vos de nós,
quando estiverdes em vosso reino. Utilizo-me dos termos da Escritura e daqueles desses
pobres cativos diante de José, o qual, por sua fidelidade, mereceu com justiça chegar
onde estais, para a redenção do povo, para o sustento de seus irmãos, e para a grande
alegria e glória de seu pai Jacó.
Espero tudo isso de vossa pessoa, a saber: o alívio da Igreja, a liberdade dos
padres e a maior glória de Deus Pai, no qual sou, por Jesus Cristo Nosso Senhor, vosso
muito humilde e muito obediente servo9,

Olier.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, superior dos Padres da Missão, em São


Lázaro.

77
São Vicente acabava de ser nomeado pela rainha membro do Conselho de Consciência.
88
Hb 2,17.
99
Apesar das prementes diligências de São Vicente, nenhuma sansão foi aplicada até 1646. A pedido da Assembleia
do Clero de França, o Arcebispo de Paris infligiu a Teodoro de Berziau as penas canônicas ( Processos verbais da
assembleia de 1645, 29 de dezembro de 1645, 09 de fevereiro, 03 de março, 14, 18,19 e 20 de abril e 1646).
671. – SYLVESTRE DE CRUSY DE MARCILLAC, BISPO DE MENDE, A SÃO
VICENTE

1643.

Vossos missionários irão prestar-vos conta do que fizemos nas Cevenas, em


minha diocese, onde fiz visita pastoral e recebi trinta ou quarenta huguenotes para a
abjuração de seus erros e deixei outros tantos em condição de fazer o mesmo dentro de
poucos dias. Fizemos solenemente ali a missão com incrível 1 proveito. E como esses
bens procedem de Deus e de vossa boa assistência, não posso escolher alguém para vos
fazer dessa missão um relatório mais fiel e com melhor desempenho do que estes bons
padres.

672. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ROMA

Paris, 18 de junho de 1643.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Nada de novo tenho a vos dizer, a não ser o que vos disse em minha última carta,
há oito dias, a saber, que enfim a Madame Duquesa de Aiguillon assinou o contrato de
doação de cinco mil libras de renda a serem percebidas do preço dos coches de Ruão e
que ela ficaria muito aborrecida se não fizésseis os exercícios dos ordinandos das
quatro-têmporas. Ela instituiu esta fundação para esta finalidade por que dissestes que
valeria a pena fazê-los. Sua opinião é que compreis o edifício de que falais, por meio de
renda anual e perpétua. Mandar-vos-ei a ratificação disso quando o tiverdes feito.

.
Carta 671. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, § 3, 1ºed., p. 31.
11
A missão foi realizada depois da Páscoa (Cf. carta 654).

.
Carta 672. – C. aut. – Original na biblioteca minicipal de Lille, ms 986, fº 750.
Jamais fui tão digno de compaixão e tive mais necessidade de orações do que
agora, no meu novo ministério1. Espero não o seja por longo tempo. Rogai a Deus por
mim.
Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde servo.

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

673. – ALAIN DE SOLMINIHAC, BISPO DE CAHORS, A SÃO VICENTE

De Mercuès, 08 de Julho de 1643.

Senhor Padre,

Vistes, por uma de minhas cartas, que vos escreveram sobre o negócio de la
Vaurette sem que eu o soubesse e sem necessidade1. Fiquei muito aborrecido, pois não
quero recorrer a vós a não ser quando se tratar de algo que não poderíamos resolver
sem vós. Pelo contrário, gostaria de aliviar-vos com todo o meu possível. O Padre
Dufestel acertou com o senhor intendente no sentido de obter-lhe assistência. Disto é
que precisamos. Com efeito, em se tratando de direito, Delom não tem nenhum.
Suplico-vos não me queirais jamais em Paris, pois ela é para mim pior que um
purgatório. Se soubésseis da necessidade de minha presença em minha diocese, não me
aconselharíeis jamais ausentar-me dela. Ousaria dizer-vos que essa presença é de
algum modo útil para o serviço do Rei; pelo menos o tem sido até o momento, por
causa da desordem de Villefranche2, na qual sem mim esta região teria caído.
De resto, permiti-me dizer-vos que fiquei extremamente surpreso por ter visto
em vossa carta que tínheis apresentado uma petição à Rainha, escrita e assinada de
vosso próprio punho, no interesse do primeiro canonicato vacante, quando do feliz
advento do Rei à coroa, em favor de um oficial meu. Foi por acaso possível fazer isso
11
Depois da morte do rei Luís XIII, a rainha Ana d’Áustria tinha instituído, como um ministério dos negócios
eclesiásticos, um Conselho de Consciência cuja presidência ela se reservara e para o qual chamara o Cardeal
Mazarino, o Chanceler Séguier, os bispos de Beauvais e de Lisieux, Jacques Charton, penitenciário-mor de Paris, e
Vicente de Paulo. Este último teria sido colocado como coordenador do conselho, no dizer de Madame de Motteville
(Memórias de Madame de Motteville, ed. Riaux, Paris, 1855, 4 vol. In-8º, t. I, p. 167) e de um outro escritor
assinalado por Collet (op. cit., t. I, p. 365, nota), que duvida não sem motivo, da exatidão do fato. Os biógrafos do
Santo nos disseram com que desinteresse ele cumpriu suas honrosas funções, quão grande foi o bem que daí resultou
para o clero da França e que força de caráter lhe foi preciso para opor os direitos da justiça e o interesse da religião
aos caprichos de Mazarino, que atendia com muita frequência apenas ao seu interesse político. Cansado das
resistências que encontrava no seio do conselho, o poderoso ministro acabou por não mais reuni-lo a não ser em raras
ocasiões e com intenção de excluir o Santo que não fazia mais parte dele no fim de 1652. O pouco que nos resta da
correspondência do Santo com o Cardeal nos mostra que, durante os dez anos que durou sua função, Vicente de Paulo
não negligenciou ocasião alguma de afastar os indignos do episcopado e dos benefícios, e de trabalhar para a
manutenção da fé e da disciplina.

.
Carta 673. – Arquivo da diocese de Cahors, caderno, cópia.
11
A união ao seminário do priorado secular de Notre-Dame de Lugan ou de la Vaurette, em Bas-Quercy, remontava a
6 de outubro de 1638. Levantaram oposição contra essa medida.
22
Alusão à revolta de camponeses, provocada em 1637 por impostos excessivos.
sem violentar ou até mesmo sem forçar vosso natural, permiti-me vos diga mais:
deveríeis vós ter feito isso? Pela honra de Deus, administrai melhor a afeição da
Rainha por vossa Congregação e por vossos bons amigos. Deixai isso para quando se
tratar de negócios importantes e para os quais os favores e a proteção de Sua
Majestade forem necessários. Temo muito que a consideração para comigo serviu de
motivo para isso. Ficaria muito aborrecido se de fato o fosse. Garanto-vos que, se eu
soubesse que o meu oficial se tivesse servido de meu nome para vos obrigar a isso,
seria um motivo suficiente para dispensá-lo. Por isso vos rogo em nome de Deus que de
ora em diante nada façais, em favor de quem quer que seja, por consideração a minha
pessoa, se não receberdes de minha parte uma carta expressamente para isso.
Espero não sejais importunado por mim, exceto no caso de nossos bons
religiosos, os quais vos recomendo com todo o meu coração. É em favor deles que eu
gostaria de angariar o apoio da Rainha se fosse necessário, e pedir o vosso auxílio, não
para pedir um canonicato. Esta diligência é digna de vós e da piedade da Rainha.
Conjuro-vos, pois, conceder-lhes vossa assistência e ao padre de Recules, deputado
deles, que irá a Paris para esses negócios.
Folgo muito que o Padre Authier chegue até aí para tentar esta união que me
parece desejada por Deus. Asseguro-vos que, se eu pudesse deixar minha diocese, não
haveria motivo mais forte para me levar até aí do que para promovê-la. Entretanto não
sou digno disso. Peço-vos faleis com o senhor Arcebispo de Arles 3 a fim de que, caso
ele tenha alguma dificuldade, ela venha a dissipar-se com o parecer do referido padre.
Vou comunicar ao Padre Authier meus sentimentos a respeito.
Devo dizer-vos que vossos pobres missionários e seminaristas pensaram que
seriam todos imolados em holocausto a Nosso Senhor, no sábado passado: às oito da
noite, pegou fogo num forno de um burguês, contíguo à porta do seminário onde havia
um depósito de treze pilhas de lenha. Ele foi atingido pelas chamas e causou um
fogaréu tão grande durante toda a noite que foi um milagre não ter sido o seminário
reduzido a cinzas. Teria isto acontecido sem os imensos socorros e esforços para deter
o fogo. O senhor Padre Dufestel teve êxito com as medidas tomadas. Mas não foi sem
grande temor pelo qual o pessoal foi recompensado, e sem algum tonel de vinho dado a
beber aos que apagavam as chamas.
Há em nosso seminário quatorze jovens eclesiásticos que se portam bem.
Lamento apenas não estejam eles alojados em lugar mais amplo e próximo de uma
igreja onde exerceriam suas funções. Não podemos remediá-lo no presente e, por isso,
é preciso ter paciência. Peço-vos não me deis resposta quando vos escrevo, a não ser
que haja grande necessidade e que tenhais tempo para isso. Sei muito bem quão pouco
tempo tendes e por esse motivo me compadeço convosco. Reservai-o, portanto, para os
negócios de grande importância, e crede-me, senhor Padre, vosso muito humilde e
muito afeiçoado servo,

Alain,
Bispo de Cahors.

33
Jean Jaubert de Barrault.
674 – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ROMA

10 de julho de 1463.

Senhor Padre,

Já vos falei que o que me escreveis sobre a sede do Superior Geral em Roma
apresenta dificuldades muito grandes. Vedes as dificuldades do lado de lá. Eu as vejo
como vós e mais as de toda a Companhia. Há diferença entre os pontos de vista de um
particular e os de um Superior Geral. O primeiro vê apenas e só considera as coisas que
lhe foram confiadas e tem a graça própria para isso. A bondade de Deus a concede ao
Geral em vista de toda a Companhia. Não é que o particular não veja as mesmas coisas
que o Geral e talvez até mais. Mas a humildade deve levá-lo a desconfiar disso, e o
Geral deve ter a confiança de que, como Deus lhe proporcionou a graça desta vocação,
ele lhe dará a graça de escolher o que for melhor para a Companhia, de modo especial
nas coisas de grande peso em que pensa há muito tempo e pelas quais está rezando. Não
é que ele não possa enganar-se, e que o inferior não possa talvez discernir melhor. Mas
este não deve ter a presunção disso, nem resistir contra o que o Superior Geral pensa ser
melhor diante de Deus. Portanto, não falemos mais sobre isso, senhor Padre, eu vos
peço, mas oremos muito a Deus por isso e nos humilhemos muito. Deus não permitirá
que a coisa deixe de se realizar em seu devido tempo, se o tiver por agradável, como
espero.

675. – A MADRE MARIA EUFROSINA TURPIN

Paris, 23 de julho de 1643.

Minha cara Madre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi vossa carta com a alegria que Nosso Senhor sabe e que aumentou com
tudo aquilo que o bom senhor Bispo de Amiens 1 me relatou e que já me tinham dito a
respeito das bênçãos que Nosso Senhor concede a vossa santa família, que eu saúdo
com todo respeito e afeição possível. Peço a sua divina bondade santificá-la cada vez
mais.


Carta 674. – Dossiê dos padres da Missão, cópia tirada do original em poder do senhor Charavay.

.
Carta 675. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
Francisco Lefèvre de Caumartin (1618-1652).
A providência de Deus me fez encontrar em Santa Maria do subúrbio como
também aqui no mosteiro da cidade, o primeiro para vós, nossa cara Irmã Maria Cecília 2
e nossa e vossa cara Irmã rodeira3, que diz não haver no mundo superiora comparável a
sua. Meu Deus, minha cara Madre, como isto aumentou a estima e a afeição que, como
sabeis, o bom Deus me deu para convosco! E como esta filha está a ponto de partir e eu
não posso dizer-vos mais alguma coisa sobre isso, termino recomendando-vos orar pelo
número infinito das abominações de minha vida, a fim de que seja do agrado da
misericórdia de Deus ter piedade de mim, que ele fez, por sua graça e no seu amor e no
de toda a vossa santa comunidade, vosso muito humilde e muito obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Não posso deixar de dizer-vos o que vossa Irmã rodeira acaba de me responder.
Eu lhe disse: “Minha Irmã, se eu escrever a nossa Madre que me falastes muito mal
dela, diríeis que eu menti?”– “Sim”, respondeu-me.

Destinatária: A minha cara Madre Superiora da Visitação Santa Maria de


Amiens4, em Amiens.

676. – A CHARLES DE MONTCHAL, ARCEBISPO DE TOLOSA1

São Lázaro, manhã de segunda-feira [Entre 1643 a 16472].

Senhor Arcebispo,

Quem vai levar-vos a presente carta tem a honra de falar com a rainha, e quem
vai acompanhá-lo vos dirá algo de particular que vos importa saber, com respeito à
questão de Louviers3. Suplico-vos muito humildemente, senhor Arcebispo, escutá-lo
22
Maria Cecília Baillon.
33
Talvez Maria Catarina Bassecole, a qual, quando da fundação do mosteiro de Amiens, se dispunha a ser a irmã
rodeira.
44
Mosteiro fundado em setembro de 1640. Ana Maria Alméras, irmã de Renato Alméras, era do número das irmãs
fundadoras. Foi colocada, em 1652, à frente da pequena comunidade.
.
Carta 676. – C. aut. – O original pertence às Filhas da Caridade da Rua Caulaincourt, 33, Paris.
11
O nome do destinatário é dado por Gossin (Saint Vincent de Paul peint par ses écrits, p. 480), que teve em mãos o
original quando a folha sobre a qual se encontrava o destinatário ainda não se tinha perdido.
22
Ver nota 3.
33
São Vicente entende falar muito provavelmente das religiosas que renovaram no mosteiro Saint-Louis de Louviers
as desordens de Loudun. O negócio se arrastou de 1643 até 1647. Depois do inquérito canônico feito pela autoridade
diocesana (março de 1643) teve lugar o inquérito dos comissários da corte, confiado a Charles de Montchal, assistido
por Jacques Charton, penitenciário de Paris, Samuel Martineau, doutor em teologia, e o Senhor de Morangis,
Conselheiro do rei, e médicos de Ruão (agosto e setembro de 1643). Depois do relatório dos inquisidores, que era
pesado para os acusados, o Parlamento de Ruão avocou para si o negócio. A principal acusada, Madalena Bavent,
irmã rodeira, fez revelações horríveis sobre as infâmias, os sacrilégios e os atos de magia e de feitiçaria nos quais se
tinham imiscuído várias pessoas com ela, das quais três padres: David, antigo diretor das religiosas, Mathurin Picard,
pároco de Mesnil-Jourdain, e Boullé, vigário deste último. A 21 de agosto de 1647, Boullé foi condenado a ser
sobre isso e permitir seja eu sempre o que Nosso Senhor me deu a graça de ser, a saber,
senhor Arcebispo, vosso muito humilde e obediente servo.

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

677. – A BERNARDO CODOING

Paris, 24 de agosto de 1643.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Queixastes-vos por não terdes recebido cartas nossas por dois correios
consecutivos. Não deixamos de vos escrever por ocasião de cada um deles. Uma vez, a
carta não chegou a tempo ao senhor Parisot, que já tinha postado o seu pacote.
Mandamos liquidar a letra de câmbio de três mil libras no dia prefixado.
Esperando vossa resolução sobre o assunto dos oito mil escudos que solicitais,
trataremos de vender os coches de Soissons, que vos valerão 2.500 libras, mas que vão
diminuir, pois o arrendatário nos pede desconto por causa da instância levantada contra
ele pelos mensageiros. Além disso, a morte do senhor Cardeal 1 fez com que a instância
fosse remetida do conselho para o Parlamento. Neste caso só vos restarão cinco mil
libras da renda dos coches de Ruão.
O Senhor de Montheron, meu antigo amigo, que vos falou da Missão de
Babilônia, escreveu ao senhor bispo2 que falou sobre isso com Dom Ingoli. Este último
afirmou que a Congregação da Propagação da Fé aprovou nosso emprego nessas regiões
longínquas e a demissão de seu bispo em favor de um da Companhia, que poderá eleger
três membros e apresentá-los a Sua Santidade para escolher um que suceda ao falecido
como fazem os franciscanos em uma cidade da Hungria, limítrofe da Turquia. Ele vai
escrever sobre isso ao senhor Núncio, agora Cardeal Grimaldi, para dois fins: que Sua
Eminência fale com a rainha para dar ao Bispo de Babilônia alguma outra diocese ou
uma abadia aqui e mandar-me dar início a esta proposta3. A esse respeito, tendo julgado
queimado vivo como feiticeiro e fautor de malefícios. Davi e Picard foram mortos. Exumaram os restos deste último
para jogá-los nas chamas. O suplício de Boullé pôs fim às perturbações (Cf. Essai historique sur Louviers por Paulo
Dibon, Ruão, 1836, in-8º, pp. 126-144; Affaire curieuse des possédées de Louviers por Z. Piérart, Paris, 1858, in-8º).
.
Carta 677. – Coleção do senhor Henri de Rothschild, original.
11
O Cardeal Richelieu.
22
Jean Duval, carmelita descalço, como religioso Bernardo de Santa Teresa, Bispo de Babilônia.
33
Uma caridosa viúva, Madame Ricouard, nascida du Gué de Bagnols, deixara para a Missão da Pérsia, em 1638, a
soma de 66.000 libras e sua casa da rua du Bac, com a condição de que a diocese de Babilônia fosse restabelecida,
ocupada primeiramente por um carmelita descalço, e em seguida por franceses. Ela mesma indicou Jean Duval,
pregador muito apreciado. O novo bispo acumulou, com o título de Bispo de Babilônia, os títulos de vigário
apostólico de Ispahan e de Visitador de Ctésiphon. Chegou a Ispahan a 07 de julho de 1640 e operou, como disseram,
numerosas e extraordinárias conversões. Depois de algumas afrontas e de maus negócios, voltou à França para expor
a Richelieu o estado de sua Missão. Richelieu estava morto quando ele chegou. O Bispo de Babilônia aumentou sua
casa da rua du Bac com a compra de alguns prédios, com a intenção de estabelecer nela um seminário destinado a
que havia talvez alguma aparência de que Nosso Senhor queria algo de nós neste caso,
respondi a uma religiosa, que se dirigiu a mim em nome do referido senhor que
pensaríamos nisso, esperando que apraza a sua divina bondade manifestar de maneira
mais evidente sua vontade, pelo modo como vos prepuserem a coisa da parte da referida
Congregação, e pelo modo como a proposta for recebida aqui, positis aliis
circumstantiis ponendis (Levando em consideração as outras circunstâncias necessárias
no caso).
Há nisso muitos prós e muitos contras. Alguém escreveu há pouco tempo, pelo
que me disseram, que os religiosos e os missionários que não se dispõem a ir em
socorro das almas infiéis que estão em perigo de se perderem, estão no caminho da
condenação. Argumento contra: 1º, há falta de pessoal em nossa Companhia; 2º, há
fortes razões para pôr em dúvida que Nosso Senhor queira se tirem bispos do corpo dos
missionários, como também do meio dos jesuítas; 3º, não há nada a fazer presentemente
na Babilônia, onde não é permitido falar contra a religião de Maomé, sob pena de perder
a vida. Se há algum bem a fazer, é na cidade onde mora o rei da Pérsia 4, trezentas léguas
além, onde há duas ou três espécies de religiosos, carmelitas, capuchinhos e jacobinos.
Não há católicos, a não ser alguns pobres rapazes que se procurou educar em nossa
santa religião. Há cerca de sessenta mil cristãos gregos, armênios, que foram
transportados como escravos para uma cidade que o rei mandou edificar para nela eles
habitarem, junto a sua cidade real.
Eis o estado da coisa. Pensei que vos deveria dizê-lo, para recomendardes este
negócio a Deus e me dizerdes vosso pensamento sobre isso.
Como vos escrevi, adiamos para o próximo ano falar sobre a união com o senhor
Padre Authier. Ele quer que recebamos suas constituições impressas e os seus
ordenamentos entre os nossos, salvo o ajuste das dificuldades que se encontrarem. Há
aparência de que acontecerá com ele talvez como com o Padre Romillion 5, que se tinha
separado do bem-aventurado César de Bus6 por causa dos votos7, e já tinha fundado uma
alimentar a Missão da Pérsia. O empreendimento estava acima de suas forças. Fracassou completamente e vendeu a
casa, a 16 de março de 1663, para a Sociedade das Missões Estrangeiras, que ainda a possui. Continuou a morar nela
até 10 de maio de 1669, dia de sua morte. A rua da Petite-Grenelle ou rua da Fresnaye, que encontrava a rua du Bac
no ponto onde se encontrava a sua propriedade, tornou-se, em recordação deste prelado, rua de Babilônia. Jean Duval
ficara apenas dois ou três anos na Pérsia. Provavelmente, quando entrou na França em 1643, estava com a intenção,
talvez mesmo com a ordem de não voltar mais para lá. Era daqueles homens que não sabem resistir à tentação de se
ocupar de negócios comerciais e financeiros, mesmo quando revezes lamentáveis vêm adverti-los de que eles não têm
competência alguma nesses assuntos. O coadjutor que buscavam para ele deveria não propriamente ajudá-lo, mas
substituí-lo. A situação pecuniária da Missão da Pérsia explica as repugnâncias e a recusa daqueles aos quais esse
título era proposto. Os arquivos das Missões Estrangeiras mostram que a notícia dedicada a Jean Duval pela Gallia
Christiana, t. VII, col. 1034, aproxima-se mais de panegírico do que de história.
44
Ispahan.
55
João Batista Romillion, nascido em 1553, em Isle (Vaucluse) de pais huguenotes, convertido em 1579, ordenado
padre em 1588, morto a 14 de julho de 1622. César de Bus e ele fundaram em Isle, em 1592, para prover à instrução
dos pobres, dos ignorantes e do povo do campo, o Instituto dos Padres da Doutrina Cristã, que Clemente VIII
aprovou em 1597 (Cf. La vie du P. Romillion, prêtre de l’Oratoire de Jésus et Fondateur de la Congrégation des
Ursulines en France, pelo abade Claudio Bourguignon, Marselha, 1649, in-4).
66
César de Bus, nascido em Cavaillon (Vaucluse) a 03 de fevereiro de 1544, feito padre, depois de ter perdido e
reencontrado a fé, cego com a idade de 49 anos, morto a 15 de abril de 1607 (Cf. La vie du B. Père Cérsar de Bus
pelo R. P. Jacques de Beauvais, Paris, 1645, in-4).
77
César de Bus queria unir mais estreitamente estes coirmãos por meio de um voto. Nem todos o aceitavam, entre
outros, o Padre Romillion. Daí surgiram dois partidos e a cisão. César de Bus ficou com a casa Saint-Jean de
Avignon. A casa de Aix foi deixada para os partidários do Padre Romillion. Os Padres da Doutrina Cristã se
refizeram penosamente desta provação. Restavam apenas três estabelecimentos em 1610. Sua congregação se uniu
aos Somascos da Itália em 1616, depois se separou deles em 1646 para voltar aos votos simples e ao estado secular.
quantidade de casas. Quando instituído o Oratório, ele veio procurar o Padre de Bérulle 8,
solicitando a união. Mas não o conseguiu jamais, até que, após vários anos, sua
congregação, que julgava conveniente essa união, o pressionou de maneira tão forte e o
coagiu enfim, contra sua intenção, a fazer a união9. Há algo semelhante ao que parece a
respeito dos seus, pelo que me dizem. Mas disto não falareis a ninguém deste mundo,
por favor, a não ser ao Padre Dehorgny, se ele ainda estiver em Roma.
É tudo que vos posso dizer no presente. Quanto ao mais, depois de me prostrar
em espírito aos pés de vossa comunidade e aos vossos pés, me recomendo as orações de
todos, nestas circunstâncias, sou, no amor de Nosso Senhor e por sua pura misericórdia
e vosso caridoso suporte, senhor Padre, vosso e de todos muito humilde e obediente
servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão de


Roma, em Roma.

678. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR EM ROMA

Paris, 11 de setembro de 1643.

Senhor Padre,
No momento da Revolução, contava quinze casas e vinte e seis colégios distribuídos em três províncias, com Casa-
Mãe em Paris.
8,8
Pierre de Bérulle nasceu no castelo de Sérilly, perto de Troyes a 14 de fevereiro de 1575. Pouco depois de sua
ordenação sacerdotal em 1599, foi nomeado capelão do rei. Seu talento nas controvérsias lhe pemitiu reconduzir ao
seio da Igreja vários grandes personagens, entre outros o Conde de Laval, o barão de Salignac e um presidente no
Parlamento de Pau. Foi encarregado pelo rei da honrosa missão de conduzir até a Inglaterra Henriqueta de França,
filha de Henrique IV que ia desposar o príncipe de Galles. Ele estabeleceu os Carmelitas na França em 1603, com a
ajuda de Michel de Marillac, ministro da justiça, e de Madame Acarie, e fundou em 1611 a Congregação do Oratório,
da qual foi o primeiro superior. Sua influência sobre o clero foi considerável. Soube agrupar em torno dele os padres
mais virtuosos e eminentes de Paris. Foi junto dele que São Vicente, desde a sua chegada nessa cidade, foi buscar
ajuda e conselho. Abelly pretende mesmo que ele morou cerca de dois anos em sua casa. Temos, porém, razões para
reduzir estes dois anos a quatro ou cinco meses no máximo. Que São Vicente aceite a paróquia de Clichy, ou entre
como preceptor na família dos Gondi; que ele se retire para longe em Châtillon-les-Dombes, ou que retome o seu
lugar junto do General das galeras, reconhecemos sempre a intervenção de Pierre de Bérulle. Gostaríamos de poder
dizer que suas relações permaneceram sempre as mesmas. Pierre de Bérulle não viu com bons olhos o nascimento da
Congregação da Missão. Esforçou-se mesmo por lhe impedir a aprovação em Roma, como sabemos por uma de suas
cartas ao Padre Bertin. Escreveu-lhe em 1628, falando do novo instituto: “O desígnio que me dizeis ser o daqueles
que solicitam o negócio das missões por diversos caminhos e, a meu ver oblíquos, o devem tornar suspeito e nos
obrigar a sair fora da discrição e da simplicidade na qual estimo a propósito permanecer na conduta dos negócios de
Deus” ( Arquivo da Missão, conforme Arquivo Nacional, M 216, segundo pacote, caderno do P. Bertin, p. 26, onde
não se encontra mais este documento). Pierre de Bérulle era então Cardeal há um ano. Morreu a 02 de outubro de
1629. Sua vida foi escrita pelo P. Cloyseault, da qual o P. Ingold publicou o manuscrito em 1880 na Bibliothèque
Oratorienne, por Tabaraud (Paris, 1817, 2 vol. in-8º), Marquês de Caraccioli (Paris, 1764, in-12) e o abade Houssaye
(Paris, 1874-1875, 3 vol. in-8º).
99
A conselho do Cardeal Tarugy, Arcebispo de Avinhão, o P. Romillion adotou as regras do Oratório de Roma,
depois de sua separação de César de Bus. Seus padres eram então apenas doze. Multiplicaram-se logo a ponto de
chegarem a dirigir nove estabelecimentos. A fusão de sua congregação com o Oratório da França lhe foi pedida pelo
P. de Bérulle. Ele aceitou sob pressão dos seus e os artigos da união foram assinados em Tours a 21 de setembro de
1619.
.
Carta 678. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!
Respondo a duas de vossas cartas, uma para mim, de quatro de agosto, a outra
para o Padre Lambert, de dez do mesmo mês.
Liquidamos a letra de câmbio de 3.000 libras que sacastes contra nós.
Disse-vos1 e torno a dizer-vos que é preciso suspender a resolução, assim como a
execução da sede do Geral, e isso por razões muito importantes. Peço-vos, senhor
Padre, ficar por aí.
O que me divide ao meio o espírito, no presente, é o ciúme de sua própria
autoridade e a dependência em relação a eles que têm os nossos senhores Prelados, que
dirão e farão a mesma coisa do lado de cá que vós apreendeis do lado de lá. A próxima
congregação resolverá isso. Neste ínterim, oremos a Deus. Se aprouver à justiça de
Deus suportar-me na terra até lá, direi os meus pensamentos sobre isso, se me conceder
o tempo para isso, e os mandarei colocar por escrito.
Entreguemos, entretanto, isso à conduta da sábia Providência de Deus. Tenho
uma devoção especial em segui-la, e a experiência me faz ver que ela faz tudo na
Companhia e que nossas providências o impedem. É neste espírito que jamais fiz ou
disse alguma coisa para nos recomendar, pelo que me consta, e que não me apressarei
no sentido de obter do senhor Arcebispo de Reims 2 a carta para Dom Ingoli, relativa à
bênção que Nosso Senhor concedeu à missão de Sedan3.
Falei ao Senhor de Brienne sobre o negócio de Saint-Yves. Disse-me que fará o
que puder para isso e que procure saber convosco como proceder para trabalhar neste
negócio. Isto não impedirá que penseis nessa pequena igreja paroquial, se tiverdes
algum alojamento anexo. De outra forma, não vejo nisso grande vantagem. A
multiplicidade das casas torna-se um embaraço e ocasião de murmuração. Se a coisa for
necessária, é preciso ir em frente e deixar que falem o que quiserem.
Falei ao senhor Cônego de Saint-Aignan para resignar nas mãos de um particular
da Companhia. Não respondeu nada.
O negócio de Richelieu está parado. Foi-nos necessário fazer muitas concessões,
por causa das grandes dívidas desta sucessão e do humor daqueles com quem tínhamos
que nos entender.
Estarei atento ao que me escreveis sobre o seminário de Agen4. Existe algum
espírito de divisão naquela casa que sempre a perturbou e a perturba no momento, mais
do que nunca. Escrevi ontem ao senhor Padre Soufliers para ir substituir o Padre
Dufestel em Cahors, e ao Padre Dufestel para ficar no lugar dele. As outras casas não
nos deram tanto trabalho.
Rogo-vos, senhor Padre, pedir a Deus por aquela casa e por este miserável
pecador, que abusa tanto de sua misericórdia e que é, no amor de Nosso Senhor, senhor
Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

11
Ver carta 674.
22
Léonor d’Estampes de Valençay.
33
Missão fundada por Luís XIII (Cf. carta 660, nota 10).
44
Ou antes de La Rose, na diocese de Agen.
Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

679. – PARA A IRMÃ HELENA ANGÉLICA LHUILLIER

São Lázaro, manhã de sábado [Entre 1641 e 16441].

Minha cara Irmã,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


O serviço que tentei prestar a nossas caras irmãs de Saint-Denis 2 não vale o
agradecimento que me fazeis. Vosso bom anjo talvez vos tenha dito que estando em
Pontoise com o senhor Bispo de Beauvais 3 que se dirigia a Saint-Germain4, e tendo
insistido fortemente comigo para ir até lá, não tive razão mais forte para me escusar a
não ser a da palavra que tinha dado de fazer essa visita. Compete a mim agradecer a
Deus, como o faço de todo o meu coração, pela graça que me concedeu de ver, nessa
visita, a união dos corações, a simplicidade, a humildade, a obediência e a exatidão na
observância das regras num estado de notável perfeição. Ó minha querida Irmã, há
grande motivo de louvar a Deus por isso!
Comecei a visita quinta-feira, às duas horas, e terminei-a ontem à noite, às sete
horas. Na primeira ocasião, o mais cedo que eu puder, relatar-vos-ei de viva voz o que a
pena não pode exprimir sobre o motivo que tendes de bendizer a Deus por estas amáveis
esposas que gerastes e educastes para ele.
Agradeço-lhe entretanto porque passaram vossas fadigas e saúdo nossa cara
Madre e, se for conveniente, também nossa pobre enferma. Sou, no amor de Nosso
5

Senhor, minha cara Irmã, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A minha cara Irmã Helena Angélica Lhuillier, em Santa Maria da


cidade.

.
Carta 679. – C. aut. – Original com a Senhora d’Alaincourt, em Cambrai.
11
A carta é posterior à fundação do mosteiro de Saint-Denis (29 de junho de 1639), anterior à morte do Bispo de
Beauvais, Agostinho Potier (20 de junho de 1650), e do tempo em que Helena Angélica Lhuillier era simples irmã do
primeiro mosteiro de Paris (1641-1644).
22
As irmãs da Visitação.
33
Agostinho Potier, membro do Conselho de Consciência.
44
Saint-Germain-en-Laye.
55
Luísa Eugênia de Fonteines.
680. – A BERNARDO CODOING

Paris, 09 de outubro de 1643.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Apraz a Deus tenha dado motivo para vos pedir humildemente perdão de não
vos ter escrito pelos dois últimos correios, por puro esquecimento. Vossa caridade me
perdoará, por favor.
Vossas últimas cartas me falam da necessidade de ficar com esse edifício de
seiscentos escudos de aluguel. Ora, pesadas todas as coisas que me dizeis, não
apresentareis dificuldade para alugá-lo, se já não o fizestes. Nisto estareis muito à
vontade, pois a piedade de vossa digna fundadora1 nos dá esperança de obtermos os
fundos para isso. Ela ainda não o cumpriu. Espero que o faça. Mas o restante que ela
vos concedeu foi tirado da mesma espécie de recursos antes disponibilizados. Sobre
eles, o rei publicou um edito pelo qual atribui a si três oitavos do preço do arrendamento
deste ano e a mesma coisa para o ano seguinte. Nestes tempos, esta cobrança se estende
a todas as coisas e não há oficial da corte soberana que não esteja sujeito à mesma
cobrança. Farei tudo que puder para dela nos isentar. Não sei se nosso bom Deus nos
dará esta graça2.
A pessoa que nos falou diversas vezes do negócio da Babilônia 3, dele nos falou
de novo ainda ontem. Perguntei-lhe se o senhor Bispo não tratou com aquele de que vos
falei que demonstrou com insistência interesse pelo negócio, o Padre Authier. Ela me
garantiu que não. Disse-nos, porém, que, se pudéssemos conseguir com o senhor de
Saint-Aignan lhe fosse dado o priorado de 2.500 libras, ele cuidaria da questão.
Disse-nos mais que esse padre não pedia o bispado, mas que lhe aprouve recebê-
las para a sua associação, a fim de servi-lo em todas as suas funções e projetos que
mantém nesses longínquos países.
Isso me deu motivo para pensar que talvez pudesse isso facilitar a união,
conseguindo para ele o bispado, digo, para o senhor Padre Authier. Pois a maior
dificuldade neste negócio vem de sua pessoa. Os seus o desejam muito e o confirmaram
com o Padre du Coudray. Soube que a união efetivada da Doutrina Cristã da Provença
com o Oratório foi sempre contraditada pelo R. P. Romillion, seu fundador, e que foi
sua Companhia que o pressionou, de tal maneira que ele acabou sendo coagido. Uma
das dificuldades que nos fez no negócio um dos principais entre os seus é a da utilização
que em seguida ele faria da união: pedia que fosse nosso coadjutor cum futura
successione (com direito a sucessão). Disse-lhe claro que isso não seria possível. Ora,
parece que isso seria um motivo notável manifestado pela Providência. Nisso temos
duas coisas a fazer, uma do lado de cá, outra do lado de lá: do lado de cá, examinar se
.
Carta 680. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
A Duquesa de Aiguillon.
22
Este período é extremamente obscuro no texto original francês. A tradução foi o resultado de um penoso exercício
de interpretação! Compare, se quiser, com o mesmo original: II, 421-422 (Nota do tradutor).
33
A questão do coadjutor ou do sucessor de Jean Duval, Bispo de Babilônia.
poderíamos garantir a coisa para a Companhia, por meio do priorado do senhor Cônego
de Saint-Aignan. Do lado de lá, estaríeis com Dom Ingoli e trataríeis com ele, com
vossa prudência ordinária, da união da Companhia e do referido cargo para o dito Padre
Authier.
O Padre du Coudray, voltando de lá, recuperou a saúde e está pronto para
retornar para a Provença, por causa da insistência que fazem em Marselha 4. Ele entrará
em entendimento quanto aos lugares com o referido senhor Padre Authier. Disse-vos
que adiamos a resolução para o próximo ano. Esta oportunidade poderia talvez acelerar
e facilitar a coisa, que requer da parte de lá uma grande precaução e discrição. Não
temos dificuldade, pela graça de Deus, com a uniformidade das funções, pelo contrário:
Utinam omnes prophetent! (Oxalá todos profetizem!). Mas todos os nossos amigos nos
dizem que o nome nos poderia causar algum prejuízo e que com o tempo poderia isso
ocasionar milhares de choques incômodos. Julgam ser necessário que eles ou nós o
mudemos. Que eles assumam o nome de Padres do Clero5, nada a censurar. Eles vão
além e estimam que é necessário que nós nos oponhamos às suas bulas em Roma, e
aqui, à verificação das cartas patentes que poderiam obter. Mas seria isto em último
caso. Dizem eles que o Papa recusa a aprovação e os remete à união do lado de cá. Se
jamais tivestes alguma questão delicada em mãos, aqui está uma. Importa ao extremo
mantenhais o maior segredo e me aviseis exatamente de tudo. A alma disto, digo de
novo, é o segredo a respeito do que quer que seja.
Comuniquei vosso relatório de Saint-Yves ao Senhor de Brienne. Ele me
remeteu ao Senhor de Saint-Chamont6, que vai para lá como embaixador, para que ele
trate do negócio ao chegar lá. Esta questão nos trará alguma tempestade deplorável com
os Padres do Oratório. Minha intenção é protelar.
Recebemos a provisão de Champvant7 e a enviamos para tomar posse dela,
aguardando a união.
Escrevi ao senhor Cônego Le Bret sobre a dificuldade que comporta o negócio
de que ele me fala8. Certificai-o do meu empenho em servi-lo.
Nosso negócio de La Rose vai mal. Precisamos ter paciência. O Padre Lambert
está a caminho para fazer lá a visita. Quanto a mim, sou, no amor de Nosso Senhor,
senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo.

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Apresentai minhas excusas, por favor, aos senhores Padres Brunet e Blatiron,
pois as dificuldades em que me encontro me impedem de lhes dar resposta. Abraço os
44
O Santo não executara seu projeto de enviá-lo para a Barbaria. Depois de vários meses de trabalhos frutuosos nas
galeras de Marselha, Francisco du Coudray voltara a Paris, onde assinou, a 25 de julho, o contrato de fundação da
casa de Marselha.
55
Eles se faziam denominar por Missionários do Clero.
66
Melchior Mitte de Miolans, Marquês de Saint-Chamont, Senhor de Chevrières. Foi enviado a Roma na qualidade
de embaixador extraordinário e morreu em Paris, a 10 de setembro de 1649.
77
O priorado Saint-Nicolas e Champvant, na diocese de Poitiers, permaneceu unido à Congregação da Missão até a
grande Revolução. Estêvão Blatiron foi o primeiro titular dele. Champvant faz hoje parte da comuna de Chaveignes
(Indre-et-Loire).
88
O Bispo de Toul acabava de morrer e pensavam em dar a sede vacante ao senhor Padre Le Bret.
dois, prostrado em espírito aos seus pés e aos vossos, assim como aos de todos os outros
da comunidade, a cujas preces me recomendo.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão de


Roma, em Roma.

681. – GUILHERME GALLAIS, SUPERIOR EM SEDAN1, A SÃO VICENTE

Sedan, 1643.

Dir-vos-ei, senhor Padre, que, desde que foi do agrado de Deus constituir a
pequena Companhia da Missão, ela não trabalhou de maneira mais útil e mais
necessária do que o faz aqui2. Os hereges continuam a se edificarem e assistirem às
pregações, das quais se gabam muito. Quanto aos católicos, é preciso trabalhar com
eles como com pessoas totalmente novas. Com efeito, desde há quatro ou cinco anos em
que a pregação é livre nesta cidade, não se falou nela a não ser de controvérsias e
muito pouco de práticas e exercícios de religião e de piedade. Muitos declararam
francamente que não acreditavam fosse necessário confessar todos os pecados. Os
mesmos abusos se cometiam no uso da sagrada comunhão, etc. Desta maneira, foi-nos
preciso começar a instruí-los sobre os princípios elementares da religião. É verdade
que isto não aconteceu sem muita consolação, na medida em que escutavam com prazer
o que se lhes dizia, e o praticavam com fidelidade. Não seriam capazes de admirar
suficientemente a graça que Deus lhes deu, nem como fazer para se tornarem
agradecidos por ela ao ponto que desejavam.

682. – A BERNARDO CODOING

Paris, 06 de Novembro de 1643.

Senhor Padre,

.
Carta 681. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, § 5, 1ªed., p. 38.
11
Guilherme Gallais, nascido em Plouguenast (Côtes-du-Nord), recebido na Congregação da Missão a 07 de abril de
1639, com a idade de 24 anos, ordenado padre em 1641, admitido aos votos em 1645, superior em Sedan (1643-
1644), em Crécy (1644-1645), em Mans (1645-1647). Era um missionário de grande talento.
22
A 07 de maio de 1643, chegaram a Sedan, conduzidos por Guilherme Gallais, seu superior, quatro padres da
Missão, Jacques Lesage, Evrard Gobert, Jean Alain e F. Firmin. A 08 de setembro, Guilherme Gallais tomava posse
da paróquia. Cedendo-a à Congregação da Missão, Renato Luís de Fiquelmont, abade de Mouzon, que era o
colatário, impusera duas condições: a primeira, que os abades de Mouzon permaneceriam como párocos primitivos de
Sedan e teriam o direito de cantar a missa solene na igreja, duas vezes ao ano, nos dias do seu agrado, com todos os
atributos de honra devidos ao pároco. A segunda, que, se os padres da Missão viessem a se retirar, os abades de
Mouzon recuperariam os direitos de colatários. O contrato de estabelecimento elevava a sete o número de padres e a
dois o de irmãos. Quatro padres deviam atuar nas Soberanias de Sedan, Raucourt e Saint-Manges, para nelas pregar
missões. Aos outros três era confiado o cuidado da paróquia de Sedan.
.
Carta 682. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!
Recebi e perdi vossa última carta. Eu a recebi há três dias e ela me dá motivo
para render graças a Deus pela bênção que ele concede a vosso retiro e para suplicá-lo
conceda a todos a graça de serem bem fiéis às resoluções tomadas.
Não me lembro do que me dizeis em vossa carta, a não ser que julgais que a
paróquia a vós oferecida não vos convém. Disse-vos várias vezes que fiqueis com a casa
de duas mil libras.
Assinamos ontem a fundação de soma igual feita pela Madame Duquesa de
Aguillon, e hoje julgarão se nos tirarão isso e o resto destas fundações, diante da
instância feita pelo senhor Duque de Bellegarde 1, no sentido de que o rei lhe dê os
coches da França, que ele sustenta pertencer-lhe. Escrevi a respeito ontem à rainha.
Veremos.
O Senhor de Saint-Chamont, que viaja como embaixador para Roma, nos fez a
honra de nos visitar e de nos oferecer sua benevolência e sua proteção. Vós o visitareis
cuidadosamente logo que chegar, o que não acontecerá logo.
O senhor Cardeal Grimaldi voltará bem cedo para Roma. Será bom fazer-lhe a
mesma coisa. Quanto à sede do Geral, há muitas coisas a dizer a respeito do lugar em
que me escreveis seria conveniente que ela se estabelecesse. Nós o veremos.
Espero que me liberem bem cedo para ir ver-vos, se for do agrado de Deus
suportar-me na terra. Falaremos então sobre isso mais profundamente. Importa não dar
mais atenção à união de Saint-Yves. Tememos despertar emulação entre a santa
Congregação do Oratório e a nossa humilde Companhia.
Nada vos direi sobre o bispado de Babilônia. O senhor que me levava a falar
disso, frequentemente, não me diz mais palavra alguma sobre isso.
É preciso não se desligar da espera de solicitação, nem da espera da união do
priorado de Dyé2 que nos oferece o senhor Cônego de Saint-Aignan. Todas as coisas
acontecem no tempo certo e oportuno, não antes e nem depois. Os padres jesuítas, seja
qual for a dificuldade que encontrem lá, para as uniões, não deixam de procurar obter as
resignações aqui.
Pensais vós ter grande dificuldade para a aprovação de nossas regras aí, se nós
vo-las enviarmos?
Não sei donde me vem o impulso que experimento de vos aconselhar a fazer
profissão, como procuro fazer, de não entrar em nenhuma intriga, nem no embaraço de
coisas temporais exteriores. Oh! que exemplo nos deixou Nosso Senhor de uma e outra
coisa! Estou renunciando a toda e qualquer ocupação a não ser o cuidado da Companhia
e das coisas eclesiásticas e religiosas. Ajudai-me, senhor Padre, com vossas orações
para este fim, e alcançar de Deus não me permita fazer coisa alguma a não ser em sua
presença e tendo em vista sua santa vontade. Ó Deus! senhor Padre, peço com empenho
a cada um de vossa pequena comunidade a visita das sete igrejas, por uma vez, a fim de
11
Roger de Saint-Lary, Duque de Bellegarde, antigo favorito de Henrique III e antigo superintendente da casa Gaston,
Duque de Orleans. Comprometido com a revolta de seu senhor, ele o acompanhou ao exílio e voltou com ele para a
França no decorrer do ano de 1634. Resignou em 1639 em favor de Cinq-Mars o seu cargo de escudeiro-mor e
morreu sete anos depois.
22
Localidade do entorno de Tonnerre (Yonne).
que apraza à misericórdia de Deus perdoar-me as abominações da minha vida passada e
da presente e me dê a graça que acabo de pedir-vos lhe solicite em meu favor. Sou, no
amor de Nosso Senhor, e de toda a vossa pequena comunidade, que saúdo prostrado em
espírito a seus pés e aos vossos, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão de


Roma, em Roma.

683. – UM BISPO A SÃO VICENTE

Ajudado por seus Vigários Gerais, trabalha do melhor modo possível para o bem
de sua diocese, “mas com pouco sucesso, por causa do grande e inexplicável número de
padres ignorantes e viciados que compõem o meu clero, e que não podem corrigir-se,
nem por palavras, nem pelos exemplos. Sinto horror quando penso que em minha
diocese há quase sete mil padres beberrões ou impudicos que sobem todos os dias ao
altar e que não têm vocação alguma”.

684. – ANNE DE MURVIEL, BISPO DE MONTAUBAN, A SÃO VICENTE

[Entre 1635 e 16521].

Os padres da Missão são muito necessários nessa diocese. Com efeito, nos
lugares onde antes trabalharam, não se encontra mais feiticeiro algum, nem feiticeira.
É o fruto dos catecismos e das confissões gerais por toda parte. Colocam o povo em tão
bom estado que o diabo não os pode iludir com sortilégios, como faz com aqueles que
se aviltam na ignorância e no pecado.

685. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[19 de novembro de 16431].

.
Carta 683. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. II, sec. I, 1ª ed., p. 214.
.
Carta 684. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, § 8, 1ª ed., p. 49.
11
Abelly declara que esta carta de Anne de Murviel, morto em 1652, foi escrita alguns anos depois de 1632.
.
Carta 685. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Data acrescentada no dorso do original.
Senhor Padre,

Dei esperança a Senhora Viole de que ela poderia falar convosco aqui amanhã,
na hora melhor para vós, e que para isso ela venha já de manhã para voltar só a noite.
Envio-vos uma carta que o senhor Padre Compaing me entregou para que a
vísseis, dizendo-me que conheceis bem esse negócio.
Suplico ao nosso bom Deus dar-vos novas forças e saúde, para a sua glória, e
sou, senhor Padre, vossa muito humilde e grata filha e serva,

L. de M.

Hospital dos Meninos Expostos, quinta-feira, 19 de novembro.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

686 – JEAN JACQUES OLIER A SÃO VICENTE

Quem tem Jesus tem tudo.

Senhor Padre,

Ouso tomar a liberdade, pela glória de Jesus Cristo e pelo serviço de seus
membros, de vos suplicar, se vossa comodidade o permitir, tenha a bondade de vir
estimular nossas damas da Caridade, que se reúnem hoje de modo extraordinário para
refletirem na conveniência de irem elas próprias servir aos pobres e de cumprir o
regulamento da confraria, ao qual até o presente não se tinham submetido. Eu vos
conjuro que não me recuseis esta graça, em nome de Nosso Senhor e de sua Santa Mãe,
em cujo amor sou, senhor Padre, vosso muito humilde e muito obediente servo,

Olier.

Noite de quarta para quinta-feira, 11 horas.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, superior da Missão, em São Lázaro.

687. – JACQUES DU PERRON, BISPO DE ANGOULÊME, A SÃO VICENTE


Carta 686. – C. aut. – Arq. do seminário de São Sulpício, original.

.
Carta 687. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. II, sec. V, 1ª ed., p. 234.
Dezembro de 1643.

Seria de se desejar que os padres da Missão tivessem um estabelecimento na


diocese de Angoulême. Os exercícios dos ordinandos, começados no corrente mês,
produzem tantos frutos que toda a cidade de Angoulême louva a Deus por isso e deseja
a continuação desta obra.

688. – A UM MAGISTRADO DE TOUL

Paris, 13 de dezembro de 1643.

Senhor,

A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja sempre convosco!


Recebi, por um dos padres da nossa pequena Congregação da Missão de Toul 1, a
notícia de que fostes pressionado, por algumas pessoas das quais não foi do agrado de
Deus merecêssemos a benevolência, para nos perturbar em nosso pequeno
estabelecimento, na casa Saint-Esprit, e que vossa bondade não quis agir contra nós,
sem que eu fosse informado disso. Permito-me a confiança de vos escrever a presente
carta para vos agradecer e vos suplicar muito humildemente, prezado senhor, proteger-
nos em nosso estabelecimento. Apresento-vos aqui, meu prezado senhor, as razões para
justificar meu pedido.
A primeira é que não somos intrusos nessa casa. A ela fomos chamados pelo
falecido senhor Bispo, que era um personagem de insigne piedade2 , e isso, por três anos
antes de lhe aceitar o convite.
2ª, ele agiu assim sob a insistência que lhe fora feita, antes de morrer, pelo
último comendador dessa casa3, alegando como motivo que deixava apenas dois
religiosos, nenhum dos quais tinha as qualidades requeridas para dirigi-la, ou, melhor
dizendo, para restabelecer a disciplina, e que quase não havia mais religiosos desta
ordem na França, muito menos por esses lados.
3ª, aquele prelado, depois do pedido apresentado por esse senhor, pelo qual lhe
suplicava providenciar pessoas que pudessem suprir a deficiência dos religiosos,
apresentou ao rei um requerimento, no qual expôs a Sua Majestade o que o senhor
Comendador lhe havia recomendado, e suplicou-lhe aprovasse a introdução de um
seminário de padres nesta casa, para trabalhar na instrução do pobre povo do campo e
dos ordinandos de sua diocese. Sua Majestade lhe acolheu a súplica depois do parecer
que solicitou sobre isso ao seu intendente de justiça de Lorena4 e que este último lhe deu

.
Carta 688. – C. aut. – Dossiê da Missão, minuta.
11
Jean Bécu, superior da casa de Toul.
22
Charles Chrétien de Gournay, morto a 14 de setembro de 1637.
33
Mestre Domingos Thouvignon.
44
Vignier, barão de Ricey.
depois de ter ouvido os magistrados e os almotacéis da cidade de Toul. O Conselho
dispôs que o rei seria solicitado no sentido de escrever a Sua Santidade para a união
dessa casa ao referido seminário de padres.
4ª, em consequência dessa determinação do Conselho, encaminharam o
requerimento a Roma, onde se trabalha ainda pela referida união, contraditada pelo
Comendador da Ordem do Espírito Santo de Roma5, que pretende ter jurisdição sobre
essa casa.
5ª, neste ínterim, o Conselho achou por bem entregar para um membro da
Missão a provisão da referida comendadoria, tanto pelo rei, quanto pelo dito
6

Comendador de Roma.
6ª, aquele que recebeu a provisão da comendadoria transigiu com os dois
religiosos que restavam na referida casa, a respeito de suas pensões. Desta maneira, eles
consentiram com a união da comendadoria à Congregação da Missão, e esta transação
está registrada no Parlamento de Metz.
7ª, além do direito dos citados religiosos, temos ainda o direito de um que foi
contemplado por aquele que se diz Geral do Espírito Santo na França7.
Eis, prezado senhor, o estado da questão, e o motivo pelo qual nós estamos na
casa Espírito Santo em Toul, e do qual podeis ter conhecimento por outros.
É a resposta às objeções que fizeram contra nós.
Disseram que o Bispo não nos poderia ter introduzido nela, em virtude da regra:
Regularia regularibus et saecularia saecularibus (As coisas religiosas, com os
religiosos, e as coisas seculares, com os seculares).– Respondemos que os cânones
permitem aos bispos colocar padres seculares onde não existem religiosos da Ordem.
Disseram-vos, prezado senhor, que os bens da casa Espírito Santo pertencem aos
pobres e que foi fundada para a assistência aos pobres ...8.

689. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Madame Traversay e a Senhora Viole acabam de partir daqui e vos saúdam


muito humildemente. Esta última encarregou-me de dizer-vos que seu irmão 1 a avisou
de que o senhor advogado geral2 lhe havia comunicado saber, de fonte segura, que uma
pessoa que tinha servido (nos exércitos do rei), queria pedir à rainha a doação das

55
O grão-mestre da Ordem do Espírito Santo era então Estêvão Vaius, bispo in partibus de Cirene.
66
Jean Dehorgny.
77
Olivier de la Trau, Senhor de la Terrade.
88
O texto termina aí.
.
Carta 689. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Deffita, advogado do Parlamento de Paris.
22
Omer Talon, nascido em Saint-Quentin, admitido como advogado geral do Parlamento a 15 de novembro de 1631,
falecido a 29 de dezembro de 1652, com a idade de 57 anos. Publicaram suas Mémoires em 1732. Sua vida foi escrita
pelo Abade Hubert Mailfait (Un Magistrat de l’ancien regime: Omer Talon, sa vie et ses oeuvres, Paris, 1902, in-8).
ofertas feitas aos portadores de trigo e que, se aumentar o número dos que deverão
pedi-lo, as crianças perderão esse auxílio.
Madame de Liacourt também me disse, senhor Padre, que vos falasse das
pensões dos monges leigos que percebe cada abadia3, porque desejava propor à rainha
que (essas pensões) passem para os inválidos. Se julgardes que ela não o deve fazer,
procurai, por favor, torná-la ciente disso. E procurai pensar diante de Deus como
poderia eu ser-lhe fiel, como me sinto obrigada a sê-lo, deixando de ter como única
diretiva a minha vontade própria, pois me parece vivê-la em tudo, o que é para mim um
grande obstáculo à realização da vontade de Deus, pela qual sou, senhor Padre, vossa
muito agradecida e indigna filha,

L. de Marillac.

16 de dezembro de [16434].

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

690. – A UM BISPO

[Entre 1643 e 16521].

Em nome de Deus, senhor Bispo, perdoai-me se me intrometo aqui nesses


negócios, sem saber se as iniciativas que tomo vos agradarão. Poderá acontecer talvez
que fiqueis mal satisfeito. Mas não há outro modo, pois o que eu faço é apenas em
virtude de um excesso de afetuoso zelo por vos ver aliviado dos cuidados e
preocupações que estes incômodos negócios vos poderiam causar, e assim possais vos
entregar com mais tranquilidade de espírito à conduta e santificação de vossa diocese.
Para esse fim, ofereço frequentemente minhas pobres preces...
Mas há uma coisa, senhor Bispo, que muito me aflige. No Conselho 2, vos
descreveram como um prelado que tem grande facilidade para entrar em processos, de
tal maneira que esta impressão ficou muito gravada nos espíritos. Quanto a mim, admiro
Nosso Senhor Jesus Cristo que desaprovou os processos e que, entretanto, aceitou entrar
em um e perdê-lo. Não duvido, senhor Bispo, que, se tendes alguns, o seja para
sustentar e defender a causa dele. Por isso, conservais uma grande paz interior em meio
a todas as contradições externas, porque tendes em vista apenas Deus e não o mundo.
Procurais unicamente agradar a sua divina Majestade sem vos preocupar com o que
dirão os homens. Agradeço, por esta razão, a sua divina bondade, porque isto é uma
graça que não se encontra senão nas almas que lhe são intimamente unidas. Mas devo
33
Nome dado aos soldados inválidos que os reis colocavam outrora nas abadias, onde exerciam algumas funções.
44
Data acrescentada no dorso do original.
.
Carta 690. – Abelly, op. cit., 1. III, cap. XI, sec. IV, p. 141.
11
Tempo durante o qual São Vicente pertenceu ao Conselho de Consciência.
22
No Conselho de Consciência.
dizer-vos também, senhor Bispo, que esta incômoda opinião do Conselho vos poderá
prejudicar na presente solicitação e impedir vos concedam o que pedis.

691. – AO MESMO BISPO

[Entre 1643 e 16521].

Suplico-vos muito humildemente, senhor Bispo, suportar-me ainda esta vez, se


vos faço a proposta de um acordo. Sei muito bem que não duvidais seja a afeição do
meu pobre coração em vos servir que me leva a desejá-lo. Poderíeis, todavia, não gostar
porque, sendo eu tão pouco inteligente e sabendo que não acolhestes a primeira proposta
que vos fiz, venha fazer-vos uma outra. Não o faço, entretanto, por minha própria
iniciativa, mas por ordem do vosso relator, com o qual fui ter, há dois dias, para lhe
recomendar vossa causa e lhe manifestar as condutas admiráveis que Nosso Senhor
exerce sobre vós, senhor Bispo, e por vosso intermédio, sobre vossa diocese. Ele
respondeu que era vosso humilde servidor e uma das pessoas do mundo que mais vos
estima e venera e que, dentro deste espírito, rogava-me comunicar-vos que, se acreditais
nele, saireis amigavelmente de todas essas contendas. Apresentou-me várias razões para
isso, entre outras esta, a saber, a conveniência para um tão grande prelado como vós, de
pôr um fim a estas questões por esta via, sobretudo porque dizem respeito ao vosso
clero, cujos espíritos estão dispostos à revolta e na intenção de vos atormentar a vida
toda. Sabendo do ambiente do Conselho2, teme o advento de perseguições, porque
vários daqueles que o compõem, não conhecendo a vida santa que levais, nem as retas
intenções que vos levam a agir deste modo, poderão pensar que há nisso algo contrário à
tolerância e a mansidão convenientes a vossa dignidade.
Suplico-vos muito humildemente, senhor Bispo, perdoar minha ousadia e de não
considerar o que vos apresento como vindo de mim, mas do vosso relator, que é um dos
mais sábios do século e um dos melhores juízes do mundo. Há mais pessoas com ele do
que com os primeiros dirigentes da justiça, porque todos se julgam felizes por tê-lo
como relator. Rogo a Deus aja por bem devolver a paz a vossa Igreja e a tranquilidade
ao vosso espírito. Conheceis o poder que tendes sobre mim e a afeição singular que
Deus me concedeu pelo vosso serviço. Se, portanto, me julgais digno de contribuir com
alguma coisa, a bondade divina sabe que nisso me empregarei com todo o meu coração.

692. – O SUPERIOR DE UM MOSTEIRO REFORMADO DE PARIS A SÃO VICENTE

.
Carta 691. – Abelly, op. cit., t. III, cap. XI, sec. IV, p. 142.
11
Resulta do que diz Abelly que esta carta acompanhou de bem perto a carta 690.
22
O Conselho de Consciência.
.
Carta 692. – Abely, op. cit., 1. II, cap. IV, sec. IV, 1ª ed., p. 285.
Este bom religioso1 tem grande necessidade, por diversos motivos que ele vos
poderá dizer, de corrigir sua vida, até aqui bastante desregrada, com prejuízo das
almas que ele tem sob sua conduta. Aconselharam-no a retirar-se para vossa casa,
como a um lugar de segurança para as almas, e de orientação para recolocá-las no
caminho do dever. Peço-vos com muita insistência fazer-lhe a caridade de o receber e
de nada esquecer a respeito de tudo que julgardes próprio para reconquistá-lo para
Deus.

693. – A LUÍSA DE MARILLAC1

Parece-me que fareis melhor se disserdes a coisa a Madame Chanceler 2 e que,


para dar exemplo às outras, seria conveniente ir pegá-la na carruagem para trazê-la para
vossa casa. A aldeia não terá motivo para se queixar, uma vez que lhe enviarão uma
outra. Além disso, penso que eles foram informados de que seriam mudadas (as Irmãs)
quando se julgasse conveniente. Nem ela também (teria razão de se queixar), uma vez
que se submeteu a esta última condição. O que vos fez pensar nela é que soubestes que
ela admite consigo, algumas vezes, pessoas que estão na desordem. De resto, parece-me
que fazeis disto um problema, que na realidade não existe. Enfim, importa estar
preparada para essas dificuldades que acontecem muito frequentemente.

694. – AO PADRE FAURE

[Entre 1634 e 16441].

Vicente de Paulo recomenda ao superior da Congregação de Santa Genoveva um


jovem de boa conduta que ele gostaria entrasse no seminário.

695. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Quinta-feira, 14 de janeiro de [16441].

11
Pároco de uma paróquia, membro da Ordem à qual pertencia que escreve a carta.
.
Carta 693. – C. aut. – Dossiê das Filhas da caridade, original.
11
O texto, bastante obscuro, trata, a nosso ver, da mudança de irmãs (filhas), de um lugar para outro, uma questão
administrativa interna que provocava às vezes protesto ou causava descontentamento (Nota do Tradutor).
22
Madame Séguier.
.
Carta 694. – O senhor Charavay faz alusão a esta carta em um de seus catálogos. Diz-nos que está assinada e consta
de uma página in-4º.
11
Esta carta data do tempo em que o Padre Faure era superior da Congregação de Santa Genoveva (1634-1640 e
1643-1644).
.
Carta 695. – Gossin, op. cit., p. 483 e seg., conforme original comunicado pelo Senhor de Monmerqué. O texto foi,
em algumas partes, muito mal lido e sua reconstituição é por vezes bastante difícil.
Senhor Padre,

Bendito seja o nosso bom Deus, por cuja vontade estais doente! Entretanto, ele
quer também que, por seu amor, tenhais com vosso corpo a mesma caridade que teríeis
com o de um pobre. Ouso mesmo afirmar, meu muito honrado Pai, que Deus assim o
quer absolutamente. Aproveitai, pois, esta ocasião, vo-lo peço, e perdoai a excessiva
liberdade que tomo, como interessada pela glória de Deus.
Madames Traversay, Romilly, Fortia e Viole estão muito aflitas com o caso da
senhorita Serquemann e tinham vindo dizer-vos, senhor Padre, que o senhor Lavocat as
havia intimado a comparecer perante a Câmara, aonde também fizera ir a referida
senhorita. Mostrou-se muito contrariado porque seu parecer não fora seguido. Estava
persuadido de que a senhorita tinha razão para se queixar e queria que ela falasse às
aludidas senhoras tudo o que tinha dito somente a ele, em particular.
Em primeiro lugar, disse ela que fora realizado numa carruagem um conselho
de três pessoas, das quais uma éreis vós, senhor Padre, e as outras, as Madames
Traversay e Romilly. Neste conselho, decidistes levar as crianças para o campo e
impedir o senhor Pelletier2 de continuar suas esmolas.
O que as referidas senhoras escutavam, o dito senhor Pelletier escrevia na
presença da senhorita e esperava a resposta, a qual, disse ela, foi também redigida por
escrito. Ela pedia a seu sobrinho para adiar por oito dias a entrega do dinheiro. Isso
não está no que foi escrito.
Ao ser interrogada sobre quem lhe confiara este segredo, a senhorita disse que
fora um anjo, e que o diria ainda, por que éreis apenas três.
O senhor Lavocat disse também às senhoras que, depois de estar convosco,
esteve com o senhor primeiro presidente3 e este lhe disse que não tinha dado crédito a
tudo que lhe tínheis dito e que esta senhorita lhe falara que sabíeis muito bem do
projeto dessas senhoras, embora lhe dissésseis o contrário. E é isto que aborrece o
senhor Lavocat. Ele diz que é preciso não mais falar em levar as crianças e não recusar
as esmolas de que ela dispunha para esse fim.
A senhorita armou um escândalo junto ao senhor Pelletier, dizendo que o
mandará levar as crianças até a porta de sua casa. Dá a entender que lhe prometeram
a fundação, e o senhor presidente, uma hospedaria, mas que as madames impedem esta
boa obra. Queixa-se muito por não terdes querido falar com ela, embora se tenha
encontrado convosco com muita dificuldade, dia de Reis. Queixa-se igualmente de que
o senhor Pelletier recusou-se formalmente a recebê-la e lhe mandou dizer que tinha
destinado cem libras para pagar as mensalidades das crianças que ele mantinha, mas
não pretendia continuar mais. Queixou-se amargamente, dizendo-se muito endividada.

11
Francisco Lavocat, tendo morrido em 1646, as palavras “quinta-feira, 14 de janeiro” limitam nossa escolha aos
anos 1638 e 1644. Os fatos assinalados na carta não se explicariam em 1638, uma vez que as Damas da Caridade só
em 1640 deixaram a direção da creche para a obra dos Meninos Abandonados.
22
Nicolau le Pelletier, sobrinho de Madame Goussault, Senhor de Château-Poissy e de la Houssaye, contador.
Recebeu o hábito eclesiástico depois da morte de sua mulher, Catarina Vialart, e foi ordenado padre a 27 de fevereiro
de 1652. Estava ainda vivo a 26 de julho de 1675.
33
Mateus Molé.
O senhor presidente lhe disse para apresentar um requerimento e que ele o
deferiria. As crianças não sairiam de sua guarda, ainda que isso lhe custasse o mínimo
de três mil libras, como fiança. Essas senhoras creem perdida a reputação da sua
companhia. Afligem-se por vos ver envolvido nessa questão e pedem algum remédio
para este mal.
Esqueci-me de dizer-vos, senhor Padre, que ontem Madame Traversay, vendo-se
forçada a dar alguma satisfação ao senhor Lavocat e para acalmar um pouco a
senhorita, mandou um recado à Senhora Romilly no sentido de dizer ao senhor seu
sobrinho o que o seu anjo da guarda lhe inspirasse. Esta manhã, estando ele à mesa,
ela lhe disse: “Venho dizer-vos que façais pelo negócio da Casa de Caridade tudo que
Deus vos inspirar”. Encarregaram-me também de dizer-vos, senhor Padre, que julgam
necessário um encontro do senhor Lavocat com o senhor Pelletier, na presença de
algumas senhoras da Companhia e da Senhorita Sequermann, a fim de que ele seja
testemunha da vontade do referido benfeitor, o qual há de sustentar-lhe não ter tido
jamais intenção de fazer uma fundação, nem de continuar para sempre com sua
contribuição.
Com isso o senhor Lavocat ficará ciente de que as outras coisas que a senhorita
adiantou são antes fruto do seu desejo do que de um sólido motivo para esperar uma
fundação. Mas é inimaginável o crédito que este bom primeiro presidente dá a esta
mulher. Ele é tal que o senhor Lavocat e as mães da Casa de Caridade são
constrangidos a dizer que precisam dela.
A intenção dessas senhoras, com essas negociações, é fazer com que o senhor
Lavocat possa informar o senhor juiz sobre a verdade nessa questão. Suplicam-vos,
senhor Padre, se puderdes, lhes deis amanhã alguma orientação. Se o senhor Pelletier
não estivesse doente, elas vos proporiam fosse ele mesmo estar com o senhor primeiro
presidente.
Espero que nosso bom Deus possa tirar sua glória desta desagradável situação.
Assim lhe peço com todo o meu coração e também vos conceda saúde para enfrentar
este problema.
Espero outrossim de vossa bondade ser ajudada, fazendo-me participar dos
vossos sofrimentos e santos sacrifícios, visto não ignorardes minhas necessidades.
Sou, senhor Padre, vossa mui grata filha e humilde serva,

Luísa de Marillac.

696. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[Janeiro de 15441].

Senhor Padre,

.
Carta 696. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta tem o seu lugar ao lado da carta 695.
Caso aproveis que o senhor Lavocat vá procurar o senhor Pelletier, conforme
vos disse, suplico-vos humildemente indiqueis as senhoras da Companhia que deveriam
estar presentes. Madames Traversay e Romilly são as que estão mais envolvidas na
questão. Não seria bom fossem algumas outras com elas?
Penso que vosso resfriado se curaria mais depressa se fôsseis deitar um pouco
mais cedo à noite. O excesso de trabalho e o ficar acordado até mais tarde aquecem o
sangue. Peço a Deus que vos manifeste a sua vontade neste particular e nela sou,
senhor Padre, vossa muito humilde filha e grata serva.
A sangria de ontem quase me curou por completo, graças a Deus.

L. de Marillac.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

697. – JACQUES DU PERRON, BISPO DE ANGOULÊME, A SÃO VICENTE

Janeiro de 1644.

Embora eu já vos tenha agradecido pelo envio dos padres, vossos missionários,
para esta diocese, julguei que não deveria deixar ir a carta de nossa pequena
Conferência, sem acompanhá-la com estas demonstrações, apesar de muito fracas, dos
vivos sentimentos de gratidão que tenho pelo grande fruto que esta diocese recebe da
caridade que nos fizestes, dando-nos vossos operários. Minha consolação seria,
contudo, muito imperfeita, senhor Padre, se não completásseis esta felicidade, aliás
passageira, com uma Missão estável e permanente nesta diocese, que dela precisa
muito mais do que outras. Quando souber que estiverdes em condição de nos conceder
este favor, trabalharei aqui a fim de encontrar os meios para fundar este
estabelecimento, do qual espero Deus receberá muita glória, e a Igreja, grandes
benefícios na salvação das almas, que é a única coisa que vos propusestes como fim de
todas as vossas ações. 

698. – ALAIN DE SOLMINIHAC, BISPO DE CAHORS, A SÃO VICENTE

Mercuès, 27 de janeiro 1644.

Senhor Padre,

.
Carta 697. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, § 8, 1ª ed., p. 51.

.
Carta 698. – Arq. Da diocese de Cahors, caderno, cópia.
Logo que recebi vossa carta, mandei o Padre Dufestel 1 partir. Ele foi se
encontrar com o prior da Abadia de Chancelade, e ambos foram juntos até a Abadia de
Saint-Pardoux2, onde transmitiram as informações, conforme a intenção de Sua
Majestade, e as quais vos envio. Vereis por elas que o que vos dissera é inevitável. A
Rainha fará bem em prover esta casa de uma priora vinda de uma comunidade
devidamente reformada. De outro modo, não se estabelecerá nela jamais, por outro
meio, a regularidade. Vereis como esta jovem religiosa que pedem como coadjutora
não quis nem mesmo dizer sua idade3.
Nosso seminário vai bem, graças a Deus, com grande proveito e edificação de
toda a minha diocese. O Padre Gilles o dirigia bem. Todavia, como é vontade vossa
retirá-lo, todos aqueles que enviardes serão bem vindos. O que tenho a dizer-vos a
respeito é que este seminário é de grande importância, como vos disse várias vezes, a
fim de que coloqueis sempre nele pessoas com as qualidades requeridas para bem
governá-lo.
Eu já tinha sabido, por meio de um dos vossos, da morte de Saint-Cyran e
admirei a providência de Deus por tê-lo levado em meio à borrasca levantada a
respeito dele. Espero que Deus a acalme, embora se encontrem pessoas que fazem
profissão de manter sua doutrina...
Não deixarei de ir ao Pouget 4, de acordo com a ordem da rainha, logo que
estiver em condições de ir a cavalo, pois não estou podendo ir de carruagem.
Entretanto folgaria muito vos aprouvesse levar ao conhecimento de Sua Majestade que
não posso fazer a visita sem as suas ordens a não ser no que diz respeito à clausura,
pois a visita não seria de minha jurisdição. Assim, se Sua Majestade quiser que eu
informe sobre o estado do mosteiro, tenha a bondade de me enviar suas ordens para
isso. Dir-vos-ei de antemão que esta casa se encontra, há muitos anos, em muito má
reputação em toda a diocese e regiões vizinhas e que de tempos em tempos
aconteceram nela grandes escândalos...
Pela primeira vez, é verdade, é necessário trazer uma priora de uma outra casa
reformada. Sua Majestade poderia mandar trazê-la do mosteiro de Cahors, onde a
reforma está bem implantada, motivo de grande satisfação de minha parte.
Eis o que vos posso dizer, de modo geral, dessa casa. Louvo a Deus pelo
desígnio da rainha de prover com bons superiores os mosteiros cuja nomeação depende
de Sua Majestade. Deus a abençoará na medida de seu zelo pelas coisas que se referem
a sua glória e ao seu serviço.
Sou sempre, senhor Padre, etc.

Alain,
11
Superior do seminário de Cahors.
22
Saint-Pardoux-la-Chapelle, hoje sede administrativa de cantão na Dordogne.
33
Catarina Pot de Rhodes, priora do mosteiro das Dominicanas estabelecido em Saint-Pardoux, com a idade de 87
anos, tinha perdido, a 05 de julho de 1643, sua irmã Catarina de Rhodes, que era também sua subpriora. Para garantir
o lugar que esta última ocupava para um membro de sua família, pedira como coadjutora sua sobrinha Gasparde de
Rhodes, religiosa professa do mesmo convento, então com seus 24 anos.
44
Mosteiro das Clarissas, fundado perto de Casteulnau-de-Montratier (Lot) no século XIV pelo legado Bertrand du
Pouget, Cardeal-bispo de Óstia.
Bispo de Cahors.

699. – UM ECLESIÁSTICO DE ANGOULÊME A SÃO VICENTE

[Janeiro ou fevereiro de 16441].

Estou montando a cavalo para levar aos vossos missionários que trabalham em
Blanzac2 o dinheiro que me mandastes para as necessidades deles. Permiti-me, por
favor, seja de novo importuno convosco, reiterando-vos minhas muito humildes preces
em favor desta pobre e desolada diocese, que vos suplica obreiros estáveis para
socorrê-la em suas necessidades espirituais. Elas são extremas. Contudo, a situação
não é irremediável, se houver pessoas que tenham o zelo e a caridade desinteressada
como os da casa de São Lázaro, para trabalhar com zelo em favor dela. Sei muito bem,
senhor Padre, que a Providência poderá se servir de mil outros meios para isso,
quando for do seu agrado. Mas parece claramente que ela lançou os olhos sobre vós e
que vos escolheu entre vários milhares para socorrer não somente todas as dioceses
pobres do reino, mas principalmente aquelas que parecem estar abandonadas por
todos.

700. – A JEAN DEHORGNY

Paris, 03 de fevereiro de 1644.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Não tenho muita coisa a vos dizer hoje. Escrevi longamente, há oito dias, ao
senhor Padre Codoing sobre todos os assuntos. Disse-lhe que vos mostre sua carta.
A que eu recebi essa semana, do dia nove do mês passado, me fala da
necessidade que tendes para saldar este trimestre, e vos garanto, senhor Padre, que
jamais teremos talvez necessidade tão grande. Faremos o que pudermos para quitá-lo.
Em nome de Deus, procure aliviar-nos no próximo trimestre.
O rei impôs há pouco uma nova taxa sobre vossos coches. Trabalhamos para nos
isentar dela. O arrendatário desse serviço em Soissons entrou em falência. Fomos
coagidos a quitar seiscentos e vinte e cinco libras como garantia em favor dele, até
pagar tudo que devia. Quem arcará com isso? A casa daqui vo-lo adiantou.
.
Carta 699. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, § 8, 1ª ed., p. 52.
11
Esta carta, declara Abelly, foi escrita quinze dias depois da carta 697.
22
Sede administrativa de cantão, na Charente.

.
Carta 700. – C. aut. – Original na Biblioteca da Sociedade Histórica da Pensilvânia, em Filadélfia, coleção Dreer.
Dizem por aqui que a Companhia não faz nada em Roma. Comunicai-me os seus
trabalhos com os ordinandos e com os retiros espirituais, e qual o número com que
trabalha de ordinário.
O senhor Cônego Le Bret parte dentro de quatro dias. Ele nos prometeu maior
afeição e proteção do que nunca, em especial com relação ao Saint-Esprit de Toul.
Peço-vos ir vê-lo frequentemente e confidencialmente. Há algum projeto envolvendo o
seu nome para aquela diocese1. Mas não digais isto a ninguém, por favor.
Jamais se viu aqui tanta regularidade, tanta união e cordialidade, como no
presente. Parece um pequeno paraíso. Mas a calmaria extraordinária, de ordinário, é
véspera de alguma tempestade.
O senhor Padre de Bolonha2 recusa seu bispado, pela impossibilidade de pagar
vinte e três mil libras que lhe pedem em Roma. Si quid potes, adjuva illum (Se puderdes
algo, ajudai-o).
Não foi do agrado de Deus tenhamos as boas graças do senhor embaixador de
Veneza, que vai residir por algum tempo em Roma. Visitai-o, contudo, com todo o
cuidado.
O senhor Bispo de Beauvais3 nos recusou as dimissórias de Carcireux4 com
dívida para a Companhia. Estou pedindo a Dom Chauvel conceder-lha. Tornar-nos-
emos devedores para com ele.
Abraço com ternura toda a vossa família, desde o último dos irmãos até vós,
prostrado em espíritos aos vossos pés e aos deles e sou vosso muito humilde e muito
obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Não é conveniente dar ao Senhor de Montheron o trabalho de vir a Paris


expressamente para o negócio da Pérsia. Certifique-o de minha obediência e da saúde de
sua querida irmã.

Destinatário: Ao senhor Padre Dehorgny, superior 5 dos Padres da Missão de


Roma, em Roma.

701. – A GUILHERME GALLAIS, SUPERIOR, EM SEDAN

11
Ver carta 680, nota 7.
22
Francisco Perrochel.
33
Agostinho Potier.
44
Paulo Carcireux, nascido em Beauvais, entrou na Congregação da Missão a 27 de julho de 1640, com a idade de 20
anos, e fez os votos a 20 de março de 1644. Foi ordenado padre em 1645.
55
Esta palavra resulta, muito provavelmente, de uma distração, pois, nas cartas seguintes, o Santo continua dando a
Bernardo Codoing o título de superior da casa de Roma.

.
Carta 701. – Reg. 2, p. 194.
13 de fevereiro de 1644.

Vossas duas últimas cartas me falam da dificuldade em que estais. Como


resposta, dir-vos-ei que é raro estar em qualquer condição que seja, especialmente na
que estais, sem cair na língua dos maledicentes ou nas queixas dos descontentes. É
preciso entregar-se a Jesus Cristo Nosso Senhor para fazer bom uso disso, unindo-se ao
uso que ele fez de todas as contradições e calúnias que sofreu, para nos ensinar a
proceder como ele em circunstâncias semelhantes. Como não pude exprimir-vos meus
sentimentos, de viva voz, relativos à maneira como vos comportar em tais ocasiões,
passo a vo-los escrever com toda simplicidade.
É conveniente, senhor Padre, não nos imiscuir nos negócios seculares, por mais
que tenham alguma relação com as coisas espirituais:
1º Porque São Paulo aconselha os eclesiásticos a não se meterem nas coisas
temporais e seculares1.
2º Porque ninguém pode servir a dois senhores, a Deus e ao mundo, ao espiritual
e ao temporal, conforme diz Nosso Senhor2.
3º Porque quando nos metemos nessas questões, ou se trata somente de
católicos, ou somente de pessoas da outra religião 3, ou de uma questão de um católico
contra um huguenote. Ora, entrar em um caso de um católico contra outro católico,
como seria fazer solicitações ao senhor Governador 4 ou aos oficiais de justiça, parece
que um coração de pai não pode agir assim com seus filhos. Se se tratar de duas pessoas
da pretensa religião, quid tibi et filiis Belial? (O que tens a ver com os filhos de Belial?).
E se a questão for a favor de um católico contra um protestante, como saber se o
católico tem fundamento sólido para demandar na justiça o que pretende? Há muita
diferença entre ser católico e ser justo.
4º Ainda quando tivésseis a certeza de que o católico estaria bem fundamentado
na justiça, por que não pensar que o senhor Governador e os magistrados julgariam a
coisa conforme a consciência deles, especialmente quando não diz puramente respeito à
religião?
5º E depois, de que se trata? Geralmente de bens ou da honra. Ora, pertence a
vós, senhor Padre, exortar, tanto em particular como em geral, as almas que Deus vos
confiou, a menosprezar a honra e a suportar a perda de bens, como fazia São Paulo, e
não tornar-vos reclamante deles no sentido de ter ou conservar a honra ou os bens. Ó
Padre [Gallais], meu caro irmão, como vós e eu seríamos grandes missionários se
soubéssemos animar as almas com o espírito do Evangelho, que as deveria tornar
conformes a Jesus Cristo! Garanto-vos que nisto está o meio mais eficaz de que
11
Tm 2,4.
22
Mt 6,24.
33
Os huguenotes.
44
Abraão de Fabert, um dos mais ilustres generais do século XVII, nascido em Metz, em 1599. Não se poderia
elogiar demais suas virtudes cívicas, seus talentos militares e suas qualidades administrativas. Conquistou todos os
seus graus na ponta da espada. A famosa retirada de Mogúncia e o cerco de várias praças fortes lhe deram ocasião de
mostrar o próprio valor. Amava a disciplina e era o terror dos ladrões. Sua fidelidade ao rei e ao seu ministro foi
recompensada com as mais eminentes dignidades: tornou-se Governador de Sedan em 1642, lugar-tenente geral em
1651 e Marechal de França, em 1658. Morreu em Sedan, a 17 de maio de 1662. Publicaram sua correspondência do
período entre 1634 e 1652. Sua vida foi escrita pelo P. Barre (Vie de Fabert, Paris, 1752, 2 vol. in-12) e pelo general
Júlio Bourelly (Le Maréchal de Fabert, Paris, 1879-1881, 2 vol. in-8).
dispomos para santificar os católicos e converter os hereges, e que nada os poderá
obstinar tanto no erro e no vício como o procedimento contrário. Lembrai-vos, senhor
Padre, do que disse Nosso Senhor a quem se queixava com ele de seu irmão: Quis me
constituit judicem inter te et fratrem tuum?5 (Quem me constituiu juiz entre ti e o teu
irmão?). Dizei a quem quiser vos empregar na reclamação dos seus negócios: Quis me
constituit advocatum vel negotiatorem vestrum? (Quem me constituiu advogado e
negociador vosso?).
6º São estas considerações e outras semelhantes que me levam a não entrar, no
ofício que aprouve à rainha dar-me no conselho das coisas eclesiásticas, a não ser nas
questões desta natureza e que dizem respeito também ao estado religioso e aos pobres,
seja qual for a aparência de piedade e de caridade que possam ter os outros negócios que
me são propostos.
Mas, me diríeis vós, de que vou me ocupar?
Eis, senhor Padre, o que é próprio de vossa vocação e em que vos deveis aplicar com
exclusividade: 1º, em vossa própria perfeição; 2º, na de vossa comunidade; 3º, em
anunciar a palavra de Deus ao povo católico de Sedan, e, estando em missão, ao pobre
povo do campo; 4º, em administrar os santos sacramentos; 5º, nos ofícios dos religiosos;
6º, em procurar o bem dos pobres, em visitar os doentes, os prisioneiros civis e também
os criminosos, depois do confronto com os testemunhos, ou, ao menos depois de corrido
o processo, e não antes para que não se queixem de vós se forem convencidos de
alguma coisa que vos tiverem confiado ou confessado, ou então se queixem os juízes, se
não confessarem a verdade. Um criminoso, cuja confissão eu atendi outrora, e que me
confiou seu crime, por várias vezes achou que devia enforcar-se, por causa do medo que
o diabo lhe sugeriu de que eu o revelaria aos juízes. A todas essas ocupações podeis
acrescentar a de ensinar as coisas necessárias à salvação aos pobres que vos pedirem
esmola na cidade ou em casa, e a de reconciliar as pessoas com desavenças e as próprias
famílias. É ainda vosso ofício dar conselhos espirituais às pessoas que vo-los pedirem e
admoestar os que estiverem agindo mal.
Mas como, dir-me-eis, poderia eu ver um católico pressionado por um
protestante sem lhe assumir a defesa? Respondo que esta opressão não aconteceria sem
algum motivo. Ela ocorre em virtude de algo que o católico deve ao huguenote, ou por
alguma injúria ou dano que ele lhe teria feito. Ora, posto isto, não é justo que o
huguenote reclame na justiça? Ou seria o católico mais merecedor de justiça por ser
católico? Teríeis mais motivo para vos imiscuir em seus negócios do que Nosso Senhor
para entrar nos daquele homem que se queixava do seu irmão?
Sim, mas os juízes são protestantes. – É verdade, mas eles são também
jurisconsultos e julgam de acordo com as leis, com os costumes e decretos. Além de sua
consciência, fazem profissão de honra. Além disso, se vos intrometeis nas questões dos
católicos, os ministros farão o mesmo nas do seu partido, e deveis estimar que serão
melhor ouvidos do que vós e assim prejudicaríeis ao católico, pois, ao reclamar por ele,
provocaríeis um mais poderoso contra ele.
Não será junto aos juízes, direis vós, que eu irei reclamar. Dirigir-me-ei ao
senhor Governador para que interponha a sua autoridade em relação aos juízes. – A isto
55
Lc 12,14.
respondo com duas observações: A primeira, é que o senhor Governador, sendo bom
como é, escutará o pobre homem que se dirigir diretamente a ele e o apoiará, se notar
que tem razão. A segunda é que, fazendo disto uma intriga de religião junto ao senhor
Governador, tereis os ministros de frente, e acabaríeis vos expondo, e, em lugar de ser
útil ao católico, o poríeis em perigo de ser ainda mais maltratado.
Dir-me-eis talvez também que não pretendeis amparar ninguém que tenha
processos, mas somente algum católico, por possível mau tratamento por parte do
senhor Governador, por ter sido mal informado. – Exatamente a esse respeito quero
dizer-vos, senhor Padre, que o senhor Governador é mais clarividente em seu cargo do
que vós e eu, e que não sou de opinião, de modo algum, que entreis nisso6.

702. – MONSENHOR LE BOUCHER1 A SÃO VICENTE

1644.

Estais fazendo o bem por toda a parte e prestais grandes serviços a Deus, à
Igreja e à santa religião. Venho de Tonnerre, onde estive com vossos caros filhos, os
Padres da Missão, dirigidos por um homem de Deus. Importa-me confessar, senhor
Padre, que todos esses bons eclesiásticos operam maravilhas por sua doutrina e por
seus bons exemplos. Reconciliam muitas almas com Deus e com o próximo.

703. – UM RELIGOSO A SÃO VICENTE

1644.

Peço a Deus vos prolongue os dias e os anos para sua glória e para o bem do
próximo, pelo qual trabalhais incessantemente. Está aqui uma pessoa digna de vossa
caridade que encaminho para vós. Trata-se de um pajem do príncipe de Talmond 1 que
até o momento foi educado no calvinismo e se dirigiu a mim, querendo se converter.
Não me julgando com capacidade suficiente para tão boa obra, tenho a ousadia de
encaminhá-lo para vós como àquele a quem Deus concede graças muito particulares e
muito preciosas para a sua glória e para a salvação dos pecadores e desviados. Tende
a caridade, portanto, meu muito honrado pai, em Nosso Senhor, de acolhê-lo e abraçá-

66
O registro 2 acrescenta: “Esta carta foi escrita de próprio punho (a mão do Santo) e não tem outra conclusão”.
.
Carta 702. – Abbely, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, § 7, 1ª ed., p. 46.
11
Vigário Geral da Abadia de Moutiers-Saint-Jean.
.
Carta 703. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. 4, sec. 4, 1ª ed., p. 285.
11
Henrique, Senhor de la Trémoille, Duque de Thouars, par de França, príncipe de Tarente e de Talmond, Conde de
Laval, nascido em 1599, falecido a 21 de janeiro de 1674, com 75 anos.
lo como a uma pobre ovelha desgarrada que busca para onde fugir e salvar-se das
garras do lobo.

704. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR EM ROMA

Paris, 16 de março de 1644.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi cartas vossas todas as semanas, se não me engano. Todas são atinentes ao
negócio da Catalunha1. Já vos disse meu pensamento sobre isso. Contudo, por
condescendência com vossa insistência, in nomine Domini, podeis enviar até lá, por
favor, o bom Padre Boulier e nosso caro Irmão Martin, se vos for possível passar sem
este último.
Disse-vos que Sua Majestade ficou satisfeita com o testemunho que o senhor
embaixador2 lhe deu a vosso respeito, e que ela destinou mil escudos para o vosso
seminário, mas que não ouvi falar mais disso depois. Disse-vos ainda que julguei não
ser conveniente falar-lhe do seminário de Barcelona no sentido de conseguir dela algum
auxílio, pois se encontra sobrecarregada de pedidos de todas as partes do reino. Ela não
pode atender a todos com suas rendas e julga ser contra sua consciência usar dos
recursos do rei ou do público em razão das necessidades em que se encontram.
Trataremos de socorrê-los daqui quanto a sua subsistência. Mas o que farão lá,
se não tiverem algum fundo? Em nome de Deus, senhor Padre, pense nisso.
Mandaremos partir em breve dois ou três irmãos e um ou dois clérigos. Um
destes dois últimos se destina aos Incuráveis, é pessoa de ótimos costumes, muito bom
teólogo, trabalha no seminário dos eclesiásticos 3 e sabe cantar bem. Quanto ao outro,
veremos depois.
Ser-vos-á difícil contentar vossos italianos, se não erigirdes um seminário da
Companhia para a formação dos que receberdes. Nela tendes trabalhado como vos foi
possível neste momento. Importa trabalhar para este fim, no futuro, e sobretudo na
observância da regularidade da casa.
Em nome de Deus, senhor Padre, retirai de vossa preocupação assuntos de outras
casas e lugares distantes que não vos dizem respeito, e aplicai todo o vosso zelo na
disciplina doméstica. O resto virá, a seu tempo. A graça tem sua hora. Abandonemo-nos
à providência de Deus e nos guardemos de ultrapassá-la. Se for do agrado de Nosso
Senhor dar-me alguma consolação em nossa vocação, será por isto: penso, ao que me
parece, que nos temos empenhado em seguir, em todas as coisas, a santa Providência e
.
Carta 704. – Dossiê da Missão, cópia tirada do original, em poder do senhor Laverdet, em 1854.
11
Tratava-se da abertura de um estabelecimento em Barcelona.
22
O Senhor de Saint-Chamont era então embaixador da França junto à Santa-Sé. Talvez, porém, queira o Santo se
referir aqui ao antigo embaixador, o Marquês de Fontenay-Mareuil, que acabava de ser chamado para a França.
33
O seminário dos Bons-Enfants.
temos procurado não colocar o pé a não ser onde ela nos indicou. Sede também bastante
cordial com cada um e nada poupeis para a assistência aos doentes da Companhia.
Esqueci-me de vos dizer, desde o início, que o costume da Companhia e de toda
comunidade bem regrada é que os superiores não abram as cartas dos membros da casa,
quando escrevem ao Superior Geral, como também as que ele escreve aos coirmãos da
casa. Em nome de Deus, senhor Padre, procedei assim, ainda quando, por respeito, eles
vos pedissem para abri-las.
Nada vos direi acerca daquilo de que nos acusam aí, a não ser que, pela
misericórdia de Deus, nossa Companhia resiste a todas as novas opiniões e que faço o
que posso contra elas, de modo especial quando se trata de todas aquelas que atentam
contra a autoridade do Pai comum de todos os cristãos. Sobre essa questão, apelo para o
testemunho de Sua Eminência o Cardeal Grimaldi e do parecer do público, e, sendo
assim, não precisamos ficar nos justificando a respeito do que me dizeis.
Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e muito
obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão de


Roma, em Roma.

705. – AO SUPERIOR DA CASA DE MARSELHA

[16431 ou depois].

A respeito do que me perguntais, se poderíeis usar uma sotaina curta para visitar
as galeras, dir-vos-ei que um autor moderno, tendo composto um livro no qual, entre
outras coisas, permite o uso das sotainas curtas, especialmente para ir ao campo, uma
comunidade daqui de Paris vai escrever contra isso, não podendo suportar que os padres
se permitam esse uso. Se me disserdes que alguns prelados e alguns outros padres
adotam esse uso, dir-vos-ei, quanto a isso, senhor Padre, que eles têm o poder de fazer
como lhes apraz, pois reside neles o poder de fazer as leis, digo isso dos bispos. Mas
quanto a nós, que Deus, por sua bondade, escolheu para prestar algum pequeno serviço
à Igreja na pessoa dos senhores eclesiásticos como procuramos fazer, pela misericórdia
de Deus, penso que devemos nos abster desse uso. Convém, senhor Padre, que nos
empenhemos em honrar, de todos os modos possíveis, o estado e a ordem da Igreja. Por
esta razão, peço-vos, em nome de Nosso Senhor, não pensar nisso.

.
Carta 705. – Reg. 2, p. 143.
11
Data da fundação do estabelecimento.
706. – UM MEMBRO DA CONFERÊNCIA DE ANGOULÊME A SÃO
VICENTE

1644.

Nossa Conferência julgou que não devia diferir por mais tempo prestar-vos seus
deveres de gratidão e testemunhar-vos que ela não se reconhece digna da honra que lhe
fazeis, tomando parte no que interessa ao seu progresso e perfeição. Suplico-vos
humildemente, senhor Padre, permitir-lhe vos reconheça por seu avô, pois Deus se
serviu de um de vossos filhos para fazê-la vir à luz e que acrescenteis ao primeiro favor
o de considerá-la não como uma estranha, mas como vossa neta, e de fazer com que
essa bela e ilustre Conferência de Paris, vossa filha mais velha, não desdenhe o tê-la
como sua irmã, embora inferior em tudo.

707. – A BERNARDO CODOING

14 de abril de 1644.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Dentro de três dias, espero fazer partir os três ou quatro Irmãos que pedis com
quatro clérigos, um padre de Annecy, três padres para Marselha e o Padre Dehorgny,
que volta de lá para fazer a visita e os conduzirá a todos, cada um ao seu lugar.
Não recebi as três mil libras que a rainha, segundo vos escrevi, nos fez esperar
em favor da Catalunha, e não sei se no-las entregarão. Adiai, por favor, a partida para
Barcelona daqueles que é preciso enviar para lá até que cheguem os que estou enviando.
Com esse reforço, é possível inaugurar um bom seminário doméstico 1 e um
outro de externos. Nossos Irmãos são muito bons, pela graça de Deus, e dão bom
exemplo! Oh! como desejo que a disciplina resplandeça em vossa casa, que a mansidão,
que a humildade e a mortificação nela brilhem, de modo particular! Em nome de Deus,
senhor Padre, seja esse o vosso principal cuidado e o de toda a comunidade! E não
tenhamos pressa com a expansão da Companhia, nem com as aparências exteriores. A
consolação que Nosso Senhor me concede está em pensar que, pela graça de Deus,
procuramos sempre seguir e não antecipar a Providência que, com muita sabedoria,
conduz todas as coisas ao fim para o qual Nosso Senhor as destina. Na verdade, senhor

.
Carta 706. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. III, sec. V, 1ª ed., p. 267.

.
Carta 707. – C. aut. – Original comunicado pelo Senhor d’Aussonville, membro da Academia Francesa.
11
Seminário de formação para missionários.
Padre, jamais percebi melhor a vaidade de um agir em contrário, nem compreendi
melhor o sentido dessas palavras: Deus arranca a vinha que ele não plantou2.
Abraço a comunidade prostrado em espírito a seus pés e aos vossos, e sou vosso
muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão, em


Roma.

708. – ALAIN DE SOLMINIHAC, BISPO DE CAHORS, A SÃO VICENTE

Saint-Céré1, 01 de maio de 1644.

Senhor Padre,

Tendo tomado conhecimento das poderosas solicitações que os religionários


deste lugar insistem em fazer, para nele restabelecer a prédica, supressa por
determinação do Parlamento de Tolosa, escrevi à rainha, suplicando a Sua Majestade
que dê ordem ao senhor Chanceler para ele confirmar a determinação, como
inteiramente justa. Desde que cheguei a esta cidade, para fazer a visita pastoral, soube
por um dos principais habitantes chegado de Paris, o qual me disse ter conversado
convosco sobre esse negócio, que a Senhora de Bouillon solicita e promove solicitações
com grande paixão. Visto que ela não tem direito de pedir o restabelecimento da
prédica, alega como razões que se trata de um lugar que ela escolheu por morada e que
é muito razoável que ela disponha de um no qual possa mandar fazê-la. Isso é pura
invenção para obrigar o senhor Chanceler a conceder-lho, o que seria de perniciosa
consequência e muito prejudicial para a religião. Por isso vos suplico, em nome de
Deus, dizer-lhe e fazê-lo compreender bem o grande prejuízo que isso causaria não
somente a todos os católicos dessa cidade e da minha diocese, mas também de todo o
reino. Se ele não confirmar esse decreto tão célebre do Parlamento de Tolosa, que
vergonha seria agora: ele foi emitido com tanto conhecimento de causa, advogados
famosos do Parlamento pleitearam esse negócio com grande aparato, o dito decreto foi
formalmente louvado e distribuído pelo reino. Que prejuízo seria para a religião! Que
proveito não tirariam disso os adversários! Na verdade, se ele o fizer, o que não creio
da parte dele, eu o censuraria no dia do juízo, pela perda das almas da qual seria a
causa. Com efeito, a heresia vai despencar nestas regiões, se subsistir a determinação,
como é justo. Depois que foi editada, seis famílias das principais da cidade se
22
Mt 15,13.

.
Carta 708. – Arquivo da diocese de Cahors, caderno, cópia.
11
Centro administrativo de cantão, na circunscrição de Figeac (Lot).
converteram, e outras estão de tal modo abaladas, que estão dependendo apenas de
uma certa esperança do restabelecimento da prédica. Desde há pouco, recebi cinco
convertidos nessa cidade e na vizinhança. Os meus missionários receberam dois, e um
dos meus vigários forâneos, um outro. Alguns deram a palavra de que vão abjurar a
heresia em minhas mãos, dentro de dois ou três dias. Enfim, espero que bem cedo ela
cairá por terra, com a assistência do senhor Chanceler, a qual peço-vos dizer-lhe que
lhe suplico, em nome de Deus, pois se trata da salvação de uma quantidade de almas,
pelas quais ele responderia no dia do juízo. Não se prenda ele ao espírito da Senhora
de Bouillon, transtornado por essa heresia. Não se trata, no caso, de uma questão de
Estado, mas de satisfazer o espírito de uma senhorita que parece não ter outra paixão a
não ser a do retorno da prédica. Far-me-eis o obséquio, quando estiverdes com a
rainha, de lhe dizer que suplico ainda, de novo, a Sua Majestade, para dar ordem ao
senhor Chanceler de confirmar o decreto. Eu vos dirijo este pedido tanto mais à
vontade, quanto mais se trata de uma questão importante para a glória de Deus e muito
especialmente para o bem de minha diocese.
No momento em que termino a presente, um de nossos pobres transviados veio
lançar-se entre nossos braços, e eu acabo de recebê-lo solenemente na Igreja.

Alain,
Bispo de Cahors.

709. – A BERNARDO CODOING

Paris, 13 de maio de 1644.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja sempre convosco!


Li as cartas que escrevestes aos Padres Portail e Dehorgny, de 16 do mês
passado. Pensei e repensei na proposta que me fazeis do seminário de Velletri 1 e [de
Óstria(?)], e na de fazer o mesmo a respeito de estabelecimentos semelhantes. Dir-vos-
ei que me parece que não há perigo em acolher a intenção do senhor Cardeal 2 para
Velletri, no sentido de fazer uma experiência desse projeto. As coisas, no decorrer de
sua execução, não correspondem de ordinário às ideias anteriormente concebidas.
O ordenamento do Concílio 3 deve ser respeitado como vindo do Espírito Santo.
A experiência mostra, contudo, que a maneira de executá-lo, no que toca a idade dos
.
Carta 709. – Gossin, op. cit., p. 446, conforme o original, comunicado pelo senhor Alexandre Martin. A carta foi
toda escrita pela mão do Santo.
11
A diocese de Velletri, unida desde o século XII à de Óstia, tem por direito o decano do sacro-colégio como titular.
22
O Cardeal Lenti, Bispo de Velletri.
33
O Concílio de Trento. O decreto Cum adolescentium aetas, relativo aos seminários (Sessão XXIII, cap. XVIII),
ordena que ninguém seja recebido no seminário antes da idade de doze anos e assinala a necessidade de educar os
futuros padres, na piedade e na religião, desde os primeiros anos. Sobre a história desse decreto, pode-se consultar
com proveito a obra já citada do senhor Abade Degert t. I, livro 1º, cap. 1º.
seminaristas, não dá resultado, nem na Itália, nem na França. Uns vão embora antes do
tempo, outros não têm inclinação para o estado eclesiástico, outros se retiram para
diferentes comunidades e outros fogem dos lugares aos quais estão ligados por
obrigação, em virtude de sua educação, preferindo tentar repentinamente a sorte em
outras partes. Existem quatro seminários desse tipo no reino, em Bordéus, em Reims,
em Ruão, e anteriormente um em Agen. Nem uma, nem outra dessas dioceses tiram dele
algum bom proveito4. Receio que, fora de Milão e de Roma, as coisas não aconteçam do
mesmo modo, na Itália. É outra coisa recebê-los com a idade de vinte até vinte e cinco
ou trinta anos. Temos vinte e dois meninos em nosso seminário dos Bons-Enfants. Entre
eles apenas três ou quatro dão esperança. Os outros não parecem dar motivo para se
contar com sua perseverança, por mais cuidado que se tenha. Deduzo daí a razão para
duvidar, melhor dizendo, a provável consequência de que a coisa não terá êxito, como
se propõe. O Padre Authier e o Padre Le Bègue 5 afirmam que obtêm bom resultado.
Ora, não duvido que seja verdade, no caso deles, nos inícios. Mas na verdade, senhor
Padre, é de se temer que antes de os frutos chegarem a amadurecer, os diversos
acidentes de que vos falei não os estraguem. Depois, mesmo quando fosse da vontade
de Deus conceder alguma bênção à Companhia, em nosso caso, não seria conveniente
para nós assumir estabelecimento algum dessa natureza sem que haja ao menos a
manutenção de dois padres para trabalharem nas missões. De outro modo, se anularia o
projeto da assistência ao povo pobre, quod absit (do que Deus nos livre). Se a coisa
tiver aparência de bom êxito, pensaremos no caráter gradativo que propondes para a
Companhia, e nas outras circunstâncias que colocais.
Envio-vos o tratado que fizemos com o senhor Bispo de Cahors 6, ou seja como
for, suas determinações. Ele poderá conceder o visto à bula que me propondes, no caso
em que o senhor Cardeal7 queira firmar logo esse negócio.
Há uma outra coisa de consequências desagradáveis. Trata-se da obrigação de
prestar contas ao senhor bispo e a todos os cabidos, embora a coisa pareça razoável. Nós
não aceitamos o tratado de São Lázaro a não ser com a condição de sermos dispensados
da prestação de contas ao senhor Arcebispo8 conforme era de costume. Oh! como isso
tem consequências desagradáveis, embora não haja remédio, uma vez que o Concílio o
ordena9. A sujeição aos senhores deputados do cabido para este fim é outro ponto em
que se deve refletir muito.
Nós refletiremos nisso e, de vossa parte, deveis examiná-lo aí, juntamente com o
senhor Padre Dehorgny, no tocante ao caso da Catalunha. Não recebemos os mil
escudos, nem temos esperança de recebê-los.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior da Missão de Roma, em


Roma.
44
Ver carta 507, nota 7.
55
Padre da Congregação do Padre d’Authier e superior do seminário de Senlis.
66
Alain de Solminihac.
77
O Cardeal Lenti.
88
João Francisco de Gondi, Arcebispo de Paris.
99
Sessão XXIII, cap. XVIII: O bispo receba cada ano a prestação de contas deste seminário, na presença de dois
membros do cabido e outros dois, deputados pelo clero da cidade.
710. – JACQUES LESCOT, BISPO DE CHARTRES1, A SÃO VICENTE

[Maio ou junho de 16442].

Os dois missionários que me fizestes a honra de me enviar, para as ordenações


de Pentecostes, são eclesiásticos muito honrados, sábios, capazes, diligentes e zelosos.
Por esse motivo, estão produzindo, pela graça de Deus, grandes frutos, pelos quais vos
sou infinitamente grato, juntamente com toda esta diocese, que julgo muito inclinada
para o bem. Mas precisamos da assistência de vossa caridade, com a qual eu conto,
senhor Padre, e que é tão abrangente e tão grande que não a recusais a ninguém.

711. – A UM RELIGIOSO

23 de junho de 1644.

Meu Reverendo Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


A rainha me deu a honra de me mandar escrever-vos que Sua Majestade ficou
satisfeita com a visita que, por sua ordem, fizestes ao priorado de Saint-Pardoux 1.
Suplico-vos de sua parte voltar lá e dizer à senhora prioresa 2 e a sua sobrinha3 que ela
quer nomear sua coadjutora. Sua Majestade deseja que as coisas contidas no relatório
incluso sejam estabelecidas antes de conceder a patente de coadjutoria. Se elas e sua
comunidade consentirem e executarem o conteúdo do referido relatório e as outras
coisas que lhes direis serem necessárias para a boa ordem do referido mosteiro e a
segurança de suas consciências, Sua Majestade mandará entregar ao senhor Rhodes a
expedição da dita coadjutoria. Fazei, portanto, por favor, meu reverendo Padre, esta boa
obra, em nome de Nosso Senhor, escrevendo-me que o aludido relatório foi executado,
para que Sua Majestade entregue a patente ao Senhor de Rhodes. Quanto a mim, renovo
aqui a oferta de meus muito humildes serviços e sou, no amor de Nosso Senhor, senhor
Padre, vosso servo,
.
Carta 710. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. II, sec. V, 1ª ed., p. 236.
11
Jacques Lescot, nascido em Saint-Quentin em 1593, era professor na Sorbona, cônego de Notre-Dame e confessor
de Richelieu antes de ser elevado à sé episcopal de Chartres, que ocupou de 13 de novembro de 1643 até 22 de agosto
de 1656, dia de sua morte.
22
Conforme Abelly e o conteúdo da carta.
.
Carta 711. – Reg. I, fº 2. A cópia foi tirada, diz o registro, do “original autógrafo ou minuta”.
11
Saint-Pardoux-la-Chapelle.
22
Catarina Pot de Rhodes.
33
Gasparina Pot de Rhodes. Na reunião de 11 de maio de 1644, o Conselho de Consciência dera o parecer de que a
rainha poderia nomeá-la coadjutora. Doze dias antes da morte de sua tia, a 12 de agosto de 1645, ela foi colocada à
frente do convento, que governou até 10 de fevereiro de 1684, dia de sua morte.
Vicente de Paulo.

712. – AO PADRE CHARLES FAURE1

São Lázaro, 26 de junho de 1644.

Meu Reverendo Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Conforme o desejo do senhor Cardeal de la Rochefoucault e o vosso, fui ontem a
Rueil e tive a honra de falar com a rainha sobre a demissão de Sua Eminência a partir do
presente do título e do usufruto da Abadia Santa Genoveva, em favor de vossa
Congregação. Sua Majestade concordou e o senhor Cardeal Mazarino, a quem falei por
ordem dela, também. Sua Eminência deu-me a ordem de falar sobre isso ao senhor
Chanceler2, como fiz. Ele está de acordo com a expedição do diploma. Sendo assim,
levá-lo-eis, por favor, ao secretário de estado em exercício neste mês, ao qual Sua
Majestade e o senhor Cardeal Mazarino confirmarão o que vos digo 3. Recomendo-me a
vossas santas orações e sou, no amor de Nosso Senhor, meu reverendo Padre, vosso
muito humilde e muito obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Se desejais as cartas patentes, o senhor Chanceler me disse que é preciso anexar-


lhe a concordata feita com o senhor Cardeal de la Rochefoucault sobre esta questão4.

713. – ALAIN DE SOLMINIHAC, BISPO DE CAHORS, A SÃO VICENTE

Mercuès, 29 de junho de 1644.

Senhor Padre,

.
Carta 712. – C. aut. – Arquivo do ministério da guerra, t. LXXXV, fº 140, original.
11
Superior geral da Congregação dos Agostinianos, na França. Embora o nome do destinatário não esteja indicado no
original, o conteúdo da carta permite-nos adivinhá-lo.
22
Pierre Séguier.
33
O Cardeal de la Rochefoulcault tinha dado sua demissão, a 03 de fevereiro. Ela foi aceita pelo rei a 30 de junho.
44
A intervenção de São Vicente na demissão do Cardeal de la Rochefoucault consta na Gallia christiana, t. VII, col.
779: O rei admitiu a resignação nas condições desejadas pelo Cardeal, por meio de um rescrito de 30 de junho de
1644, com o máximo empenho de São Vicente de Paulo, o qual, tendo eliminado as dificuldades, o apressou.

.
Carta 713. – Arquivo da diocese de Cahors, caderno, cópia.
Não sei como puderam espalhar em Paris o boato de que eu tinha morrido, pois
fiz a minha visita pastoral durante toda esta primavera, em perfeita saúde, exceto
quatro ou cinco dias em que fiquei indisposto por causa dos maus ares da casa onde
ficamos hospedados.
Temo estar fazendo demais o que me aconselhais e desejaria muito tomásseis
para vós as advertências que me dirigis sobre esse assunto1.
A determinação que nos destes no sentido do estabelecimento da reforma de
Chancelade na Abadia de Foix é o fruto de vossa afeição para conosco, pela qual vos
rendo mil graças, rogando-vos no-la continue, assim como vossa assistência nessa
questão. Os antigos religiosos se opuseram ao restabelecimento dos nossos, ali
estabelecidos pelo senhor Arcebispo de Tolosa2 apesar da oposição deles... Meu
Vigário Geral, presente em Foix na ocasião do restabelecimento e que ainda está em
Tolosa, me escreveu que mandará vir para Paris a ata do senhor Arcebispo, para ser
confirmada por decreto do conselho, etc.
Sou, senhor Padre,...

Alain, bispo de Cahors.

714. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Peço-vos muito humildemente perdão por vos importunar. Mas o temor que
tenho de ofender a Deus, por estar durante mais tempo sem comungar, não podendo
fazê-lo sem anter ter a honra de falar convosco, faz com que eu tome a liberdade de vos
comunicar esta situação, suplicando-vos, pelo amor de Deus, acreditar que fiz o
possível para vencer o temor, que ontem me conteve, de receber a comunhão. Sabeis
que isso não me ocorre, de modo ordinário, e que sou, senhor Padre, vossa muito grata
e muito indigna filha e serva,

L. de M.

Quinta-feira, 30 de junho de [16441].

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

11
Vicente de Paulo provavelmente tinha aconselhado ao Bispo de Cahors de se poupar, para não comprometer sua
saúde.
22
Charles de Montchal.
1
Carta 714. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
1
As palavras “quinta-feira, 30 de junho”, a impressão do selo, em cera, representando um coração sobre o qual
aparece Nosso Senhor crucificado, a expressão do início “senhor Padre”, sugerem essa data. Não encontramos este
selo em nenhuma das cartas anteriores ao ano 1644. Por outro lado, a partir de 1650, Luísa de Marillac chama sempre
são Vicente de “Meu muito honrado Pai” na introdução das cartas.
715. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR EM ROMA

09 de julho de 1644.

Os que conhecem bem a questão dos irmãos em uma companhia estimam que
fizemos muito ao introduzi-los e conservá-los no uso de seu hábito curto, de maneira a
não pensarem no comprido, por várias e importantes razões. Confesso que há alguma
razão particular para se usar de outra forma na Itália, embora eu não considere o hábito
comprido muito mais eficaz para os impedir do mal. Meus Deus! senhor Padre, em que
espécie de desordem vemos cair os irmãos religiosos que pedem esmolas sozinhos na
cidade! Em nome de Deus, senhor Padre, tentemos todos os meios imagináveis antes de
introduzir uma prática geral para uma casa e para um lugar particular. Examinaremos
isso com o tempo1.
Dizeis que se vossa renda vier a faltar ou diminuir, em razão da revenda dos
coches pelo rei, a casa de São Lázaro deve fazer empréstimo e hipoteca, para vos dar
condição de subsistência, tanto porque não lhe faltará assistência em Paris, como
também porque não é conveniente que ela seja tão rica. Com efeito, se o fosse, aqueles
que outrora pretenderam reivindicá-la para si, ressuscitariam seus desejos.
Respondo, primeiramente, que ninguém nos dá assistência. Imaginam que
estamos na opulência por mais que digamos o contrário. Em segundo lugar, se nos
sobrecarregarmos com empréstimos, os mal intencionados tirariam daí motivos para nos
denunciar aos poderes. Em terceiro lugar, não é justo empenhar os bens que pertencem
originariamente a esta casa, para favorecer o estabelecimento da casa de Roma. Oh!
não, senhor Padre, importa não pensar nisso, nem ir depressa demais. As obras de Deus
não caminham deste modo. Elas se fazem por si mesmas, e aquelas em que ele não toma
parte, perecem logo. Digo-vos isto com frequência, e vossa piedade o suportará, por
favor. Ficai certo de que não experimento maior consolação na obra de nossa vocação
do que ao pensar que temos seguido a ordem da santa Providência, que quer tempo para
a produção de suas obras. Vamos com calma em nossas pretensões.

716. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR EM ROMA

15 de julho de 1644.

Quero crer que as condições exigidas para o seminário do senhor Cardeal


Barberini1 não são tão opostas ao nosso modo de vida, que lhe alterem o essencial. Se
.
Carta 715. – Reg. 2, pp. 26 e 226.
11
Aqui termina o primeiro fragmento.

.
Carta 716. – Reg. 2, p. 21.
11
Francisco Antônio Barberini.
assim o fosse, ó Deus, senhor Padre, seria melhor nos encerrar em nossa pequena
concha. Não permita Deus que motivo algum humano nos faça afrouxar em qualquer
negócio que seja, e que se julgue de Deus! A máxima deixada por aqueles que Deus
chamou a alguma nova obra é de não mudar nada sob pretexto de qualquer vantagem
que seja. O bem-aventurado Bispo de Genebra insiste nisso com suas queridas filhas. A
natureza tem seus modos de agir, a arte tem suas regras e a Santa Sé, suas precauções.
Quando os Papas aprovam as ordens e lhes conferem o poder de fazer estatutos,
colocam, entre outras condições, a seguinte: aprovam as regras que essas ordens
fizerem, conquanto não sejam contrárias aos fins do Instituto. Sendo assim, importa
guardar-nos de tratar com quem quer que seja, nem com qualquer vantagem possível, se
as condições não forem conformes com nosso modo de vida.

717. – FÉLIX VIALARTE, BISPO DE CHÂLONS, A SÃO VICENTE

Châlons, 26 de julho de 1644.

Senhor Padre,

Conforme vosso desejo, busquei informações, as mais exatas possíveis, sobre


essa religiosa. E não tendo conseguido dados suficientes aqui, enviei o senhor
Basseline ao próprio local. Eis o que pude obter.
Julgam-na muito exata e regular em seus deveres, de bom discernimento e muito
inteligente na conduta das coisas temporais, nas quais foi e ainda está ocupada. Mas
ainda não foi aplicada na conduta do espiritual, em sua casa. Não foi nem priora nem
mestra de noviças. O seu humor é reservado e discreto e geralmente estimado por todas
as filhas da referida casa que, como sabeis, enviaram a atestação sobre sua vida e
costumes. Dizem que um tal de Senhor de Pernes, outrora governador da cidadela de
Saintes1, deu três mil escudos à atual abadessa para obter seu consentimento em favor
desta religiosa daqui, que dizem também não saber nada sobre isso. Mas o referido
Senhor de Pernes espera que um dia ela terá em vista a sua filha, que é jovem ainda,
para o mesmo lugar. Julgam-na indiferente ao êxito deste negócio.
Eis o que pude saber de tudo isso, sem descobrir totalmente a coisa. O correio
está com pressa.
Sou com todo o meu coração, senhor Padre, vosso muito humilde e muito
afeiçoado servo,

Félix, Bispo de Châlon.

.
Carta 717. – C. aut. – Biblioteca do Instituto, fundos Godefroy 273, fº 234.
11
Luís, Senhor de Pernes, barão de Rochefort.
Sou-vos muito grato pelas ofertas que fizestes a minha mãe2, há algum tempo, no
sentido de me conseguir um decreto do conselho sobre a união das paróquias. Aceito,
se vos apraz, estas ofertas, e as terei como graça. Limito-me agora a menos do que traz
o decreto obtido para o Delfinado, como vos dirá minha mãe, e julguei dever fazê-lo
assim, no momento, esperando, com o tempo, fazer o resto.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, Superior Geral dos Padres da Missão.

718. – A BERNARDO CODOING

Paris, 29 de julho de 1644.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Importa não pensar, no momento, em subtrair um único soldo da venda de
vossos coches, mas em voltar todas as vossas forças para lhe conservar a renda, por
causa das contínuas vendas e revendas que se fazem desta espécie de bens, em favor dos
negócios do rei. É necessário que eu esteja sempre a solicitar nossa isenção da taxa
comum e que tomemos emprestado duas mil libras para comprar-vos a recovagem 1 de
Soissons, que está em revenda para mitigar os processos que tendes com as recovagens,
por causa dos coches, sobre cujos direitos, eles diminuem de um terço ou da metade. E
o que é mais, é preciso não mais contar com as três mil libras que tomastes emprestado,
cedo demais, na esperança que vos tinham dado de que elas vos seriam doadas.
Mas que faremos nós, di-lo-eis. Faremos o que Nosso Senhor quer, isto é, que
nos mantenhamos sempre na dependência de sua Providência, pois assim é do seu
agrado, ele que vê o que é melhor para nós. O prior dos jacobinos reformados desta
cidade me disse, dias passados, que a desolação da sua casa aconteceu depois que
ficaram num estado de independência da Providência, e de se terem bem instalado, com
boa garantia do que viver. Em nome de Deus, senhor Padre, abandonemo-nos à conduta
da amável Providência de Deus e estaremos a coberto de toda a sorte de inconvenientes
que nossa precipitação pode atrair-nos. Não somos bastante virtuosos para suportar o
peso da abundância e o da virtude apostólica e temo que jamais o seremos e que o
primeiro sufoque o último.
Quanto ao voto para os principais (da Companhia), a razão por vós alegada de
que sem isto a Companhia se dividiria em diversas congregações ou generalatos, não sei

22
Madame de Herse.
.
Carta 718. – C. aut. – Original comunicado pelo senhor Pároco de São Vicente de Paulo, em Lyon.
11
Transporte feito pelos recoveiros, o preço ou o contrato desse transporte.
o que dizer-vos a não ser que os votos dos carmelitas descalços 2 e os dos bernardinos3
não impediram a divisão dos generalatos da Espanha e da Itália e que há muita coisa a
pensar sobre isso e eu o farei. E vos peço, entretanto, ficar tranquilo a esse respeito.
Ficai, porém, certo de que pensarei nisso e analisarei as vantagens e os inconvenientes,
por muitas vezes, em meu espírito. Mas se o Padre Dehorgny e vós quiserdes fazer o
mesmo, nós o examinaremos diante de Deus, no amor do qual sou, de um e de outro,
senhor Padre, muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
i.p.da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão de


Roma, em Roma.

719. – A LUÍS THIBAULT, SUPERIOR EM SAINTES1

Paris, 03 de agosto de 1644.

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Eu vos escrevi, parece-me, há pouco tempo. Eis o que acrescento à minha carta
precedente.
A respeito do Padre Guérin, penso que faríeis bem e é necessário ceder-lhe
nosso Irmão Jean Bisson2 ou algum outro para acompanhá-lo.
Pagaremos aqui ao senhor Bispo de Saintes 3 as cinquenta libras que ele me disse
ter dado ao Padre Guérin para ir à estação de águas.
Meus Deus, senhor Padre! Como estou preocupado com a pobreza em que estais
e por não podermos socorrer-vos daqui! Estais honrando a carência de Nosso Senhor, e
ele vos cumulará com tesouros eternos, e vosso sofrimento presente vos merecerá a
abundância, que temos mais motivo de temer do que a penúria. Um reverendo Padre
22
Clemente VIII separou da congregação espanhola os carmelitas descalços da Itália e os agrupou em congregação
particular. O novo Instituto tomou o nome de Santo Elias e recebeu a permissão de se espalhar pelo mundo inteiro,
exceto na Espanha.
33
Religiosos reformados da ordem dos Cisterciences. Em 1630, Urbano VIII dividiu a congregação em duas: a
congregação italiana, cujos membros tomaram o nome de bernardinos reformados, e congregação francesa que se
tornou a Congregação de Nossa Senhora dos Bernardinos. Cada uma tinha seu superior geral.
.
Carta 719. – C. aut. – Dossiê de Turim, original.
11
Luís Thibault nascera em Ferrières-Gâtinais a 29 de março de 1618, de pais piedosos, que mais tarde, depois da
morte da filha, conceberam o projeto de abandonar o mundo para servir a Deus, o pai, nos Padres da Missão, a Mãe,
nas Filhas da Caridade. Foi recebido em São Lázaro, a 21 de agosto de 1637 e ordenado padre em abril de 1642. Na
ocasião em que São Vicente escrevia esta carta, ele dirigia o estabelecimento de Saintes. Chamado para Paris em
1646, aí fez os votos e se entregou com zelo e sucesso aos trabalhos missionários. De 1648 até a sua morte (fevereiro
de 1655), foi superior da casa de Sainte-Méen. Tinha o hábito, durante as missões, de procurar pessoas piedosas que
desejassem desapegar-se do mundo, e ajudá-las na escolha de uma comunidade. A Companhia da Filhas da Caridade
foi particularmente beneficiada pelo seu zelo (Notices, t. III, p. 124-128).
22
Jean Bisson, Irmão Coadjutor, o mesmo, sem dúvida, que figura no catálogo do pessoal com o nome de René
Bisson, nascera na diocese de Séez, no fim de 1600. Foi recebido na Congregação a 05 de novembro de 1636. Fez os
votos a 18 de outubro de 1646.
33
Jacques Raoul de la Guibourgère.
reformado4, cuja casa está todavia em grande divisão, comentava comigo, dias atrás,
falando-me de sua aflição: “ Meu Deus, senhor Padre, enquanto estávamos em
dificuldades, servíamos a Deus em grande paz e devoção, agora que nada nos falta, eis-
nos em meio a divisões e desolação”.
Vou dizer ao Padre Portail para vos enviar o relógio que pedis, e sou do Padre
Guérin, que eu abraço, e vosso, senhor Padre, muito humilde e muito obediente servo,

Vicente de Paulo,
i.p. da Missão.

720. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR EM ROMA

06 de agosto de 1644.

Vejo, por vossa carta do dia 10, ainda um novo projeto de educar, em
humanidades, jovens até a idade de 18 anos, e que abandonais o projeto do seminário
dos eclesiásticos, como também as propostas que visam beneficiar a juventude da
Catalunha. Dir-vos-ei, senhor Padre, sobre isto o que vos disse em outras vezes. Temo
que andeis depressa demais em todas as coisas. É também o pensamento dos externos,
que conhecem vossos procedimentos aí. Não vos ocultarei o que um senhor de condição
me disse pessoalmente. Isto acontece porque estais continuamente a ocupar vosso
espírito com pensamentos e meios de progredir, e vos apressais na execução. E quando
empreendeis algo que não dá o resultado por vós desejado, falais em mudar, às
primeiras dificuldades que se apresentam. Em nome de Deus, senhor Padre, pensai nisso
e no que vos disse em outras ocasiões, e não vos deixeis levar pela impetuosidade dos
movimentos do espírito. O que de ordinário nos engana é a aparência de bem, segundo a
razão humana, que jamais atinge, ou raramente, a divina. Já vos disse outras vezes,
senhor Padre, que as coisas de Deus se fazem por si mesmas e que a verdadeira
sabedoria consiste em seguir a Providência, passo a passo. E ficai certo da verdade de
uma máxima que parece um paradoxo: Quem se apressa recua, nas coisas de Deus.

721. – JUSTO GUÉRIN, BISPO DE GENEBRA, A SÃO VICENTE

Agosto de 1644.

44
O prior dos dominicanos ou dos jacobinos reformados de Paris (Cf. carta 553).

.
Carta 720. – Reg. 2, p. 227.

.
Carta 721. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. II, § 4, 1ª ed., p. 35.
Vossos missionários continuam a enriquecer cada vez mais o paraíso com almas
que colocam em estado de salvação, ensinando-lhes o caminho e fornecendo-lhes os
meios para lá chegar, com suas instruções, catecismos, exortações, pregações e
administração dos sacramentos, com a vida edificante que levam e os bons exemplos
que dão em todos os lugares onde pregam missões. Uma única coisa eu lamento, é que
o número deles é muito pequeno em face da vasta extensão de nossa diocese, que
contém quinhentas e oitenta e cinco paróquias. Meu Deus! se Deus me der a graça,
antes de morrer, de vê-los percorrer todos os lugares desta diocese, direi com toda a
verdade e de todo o meu coração, com uma consolação toda especial de minha alma:
Nunc dimittis servum tuum, Domine, secundum verbum tuum in pace 1 (Agora, Senhor,
podes despedir em paz o teu servo segundo a tua palavra).

722. – A BERNARDO CODOING, SUPERIOR, EM ROMA

Paris, 12 de agosto de 1644.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Vossa última carta me fala do negócio de Babilônia e das Índias Orientais 1.
Dizeis-me que há clara aparência do chamado de Deus à Companhia para aqueles
lugares. Quanto ao primeiro, o que nos tem retido é o que dissestes em uma de vossas
últimas cartas, isto é, que é preciso levar de início seis mil escudos para aquele país por
causa da dificuldade de enviar dinheiro para lá todos os anos. Outra dificuldade é o que
me dizeis em vossa última carta, a saber, que para ir a Goa é preciso partir todos os anos
de Lisboa para Goa e de lá para Ispahan. Há uma outra dificuldade, a de enviar daqui ao
Monsenhor de Babilônia2 a renda que ele percebe e que é destinada a sua diocese.
Poderíeis mandar fazer o negócio sem isso?
Obtive do rei um decreto pelo qual vossos coches não vos poderão ser subtraídos
a não ser com um reembolso efetivo, nem sobrecarregados com finanças antes de ter
recebido as recomendações que nos enviastes. Uma pequena indisposição minha tira-
me o meio de escrever a eles.
Soubemos da morte de nosso Santo Padre3 e celebramos por ele uma missa
muito solene. Em nome de Deus, senhor Padre, apressai com esta mudança a união do
priorado do senhor Cônego de Saint-Aignan 4 e, se for possível, a confirmação de nossas
11
Lc 2. 29.
.
Carta 722. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
A questão da evangelização as Índias Orientais fora levantada há vários anos. A Congregação para a propagação da
fé tinha concebido o projeto de organizar as Missões do Extremo Oriente e procurava pessoas e dinheiro necessários
para este empreendimento. O projeto era atravancado de dificuldades. Ele atingiria a meta somente em 1658, graças à
Sociedade das Missões Estrangeiras. Vemos por esta carta e por outras que São Vicente foi solicitado a prestar a sua
colaboração.
22
O Padre Bernardo de Santa Teresa.
33
Urbano VIII, falecido a 29 de julho de 1644.
44
Ver carta 582.
regras, com a revogação da atribuição que foi dada para isso ao senhor Bispo de Paris 5.
Enviar-vos-ei uma cópia dos ofícios, em especial o do Superior Geral. Será necessário
resumir tudo isso e ficar apenas com o sentido essencial. O que me dizeis sobre a nossa
vocação para os lugares de que vos falei acima me questiona com urgência, em especial
o das Índias. Pensei em um padre e um clérigo para Portugal6. Talvez os enviemos
quando da ida do embaixador para lá7.
Mandai-me dizer o nome do bispo nomeado para as Índias e quando ele tem
intenção de partir, se Goa é a sua diocese e de quanto ele ficará distante dela8.
Saúdo o Padre Derhorgny e vossa pequena comunidade, que eu abraço,
prostrado em espírito aos vossos pés e a seus pés, e sou, no amor de Nosso Senhor,
senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

723. – A LEONOR D’ESTAMPES DE VALENÇAY, ARCEBISPO DE REIMS

Paris, 21 de setembro de 1644.

Senhor Arcebispo,

Agradeço-vos muito humildemente a graça que vos dignastes fazer-nos de levar


em consideração as humildes ponderações que vos apresentamos sobre o assunto de
Sedan1 e vos peço perdão, com toda humildade e respeito a mim possível, por ter havido
55
João Francisco de Gondi.
66
Para passar de lá para as Índias.
77
Luís de Goth, Marquês de Rouillac.
88
Teria São Vicente em vista Antônio de Jesus Maria, da ordem de São Bento, nomeado Bispo de Miliapour a 20 de
agosto de 1643? Goa tinha então um bispo. Era o franciscano Francisco dos Mártires, nomeado a 19 de março de
1636. Depois de sua morte (25 de novembro de 1652) a sede episcopal ficou vacante durante vinte e três anos.
.
Carta 723. – C. aut. – Arch. Dép. des Ardennes, série A, art. 21. Esta carta foi publicada pela primeira vez na
Coletânea dos Editos, Declarações, Cartas Patentes e Decretos do Conselho, registrados no Parlamento de Metz,
conjunto dos Decretos de Regulamentos emitidos por esta corte, Metz, 1776, in-8, t. II, p. 53.
11
Um escrito do Arcebispo de Reims (Ata contendo o regulamento para as pensões dos párocos das cidades e
comendadorias de Sedan, assim como para o restabelecimento da religião católica nos referidos lugares na
Coletânea dos Editos, p. 43), datado de 23 de agosto de 1644, nos coloca a par das circunstâncias que provocaram
esta carta e uma nota adicional, de 24 de setembro, nos informa o que se seguiu. “Julgamos, diz o Prelado, que era
conveniente estabelecer nesta cidade de Sedan um pároco e seis padres, dos quais um será encarregado de dar o
catecismo para a juventude, de instruí-la sobre sua fé, de lhe ensinar a piedade. Deverá também manter, hospedar e
remunerar um pregador durante o Advento e a Quaresma. E visto que anteriormente o Padre Vicente de Paulo,
Superior dos Padres da Missão, enviou alguns para se aplicarem às funções da referida paróquia, conforme o
consentimento do senhor Abade de Mouzon, apresentante da referida paróquia, e nossa permissão, além do fundo
notável que o falecido Luís, o Justo, de felicíssima memória, tinha doado, por sua piedade, tanto para administrar a
dita paróquia, quanto para fazer as missões, sob nossa autoridade, onde houver necessidade, nas chamadas
soberanias, o qual fundo foi deixado nas mãos do dito Padre Vicente de Paulo, julgamos, segundo o que ele nos
relatou, por alguns dos referidos padres da Missão, poder retomar ao menos duas mil e quinhentas libras de renda,
deixando-lhes a porção dos dízimos de Sedan e Balan... Mas, visto como os referidos padres da Missão nos disseram
que não podiam resolver nada, porque não sabiam qual era a doação do rei, nem a intenção do Padre Vicente de
Paulo, e nos pediam tempo para avisá-lo, nós lho concedemos...”.
O Arcebispo acrescenta na data de 24 de setembro: “E depois, tendo o dito Padre Vicente de Paulo recebido
a comunicação de nossa ata e o aviso dos referidos padres da Missão, teria enviado o Padre Lambert aux Couteaux, o
qual, depois de ter ele próprio estado em Sedan e ter considerado e examinado todas as coisas, e em seguida tendo
em meu procedimento algo que vos desagradou. Ficai certo, senhor Arcebispo, de que
foi contra a minha intenção. Jamais tive maior desejo do que o de vos obedecer em
todas as coisas. Contentei-me em informar a rainha para saber se ela entendia que a
doação para a Missão de Sedan, feita pelo rei, fosse empregada para o mesmo fim. Não
disse, nem fiz coisa alguma para impedir a expedição das cartas patentes, certo de que,
resolvido aquele ponto por Sua Majestade, poderíamos recorrer a vós, senhor
Arcebispo, com toda a confiança de que faríeis tudo o que fosse razoável. É o que
fizestes conforme me disse o Padre Lambert 2, que eu vos envio para pôr fim à questão
da forma como julgardes conveniente, que eu ratificarei aqui. Daí, portanto, as ordens,
senhor Arcebispo, e nós vos obedeceremos com inteira submissão e afeto.
Vosso muito humilde e muito obediente servo,

Vicente de Paulo,
Padre da Missão.

724. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[Entre 21 de setembro e 13 de outubro de 16441].

Senhor Padre,

A confiança que nosso bom Deus pôs em meu coração para com vossa caridade
supera o temor que, com justiça, deveria ter de tornar-me importuna, por suplicar-vos
muito humildemente que vos lembreis de que se aproxima o tempo do cumprimento de
um artigo, contido no relatório que vos entreguei, antes de vossa partida. Quero
lembrar-vos também, senhor Padre, o desejo do senhor Guillou, a respeito do hospital
onde se encontra a Madame sua irmã. Temo que ele se sinta ofendido, se não lhe

retornado para encontrar o dito Padre Vicente de Paulo em Paris, para lhe prestar conta, o qual em seguida no-lo teria
reenviado, com poder de tratar conosco, como consta da carta a nós dirigida de Paris, de 21 deste mês, cujo teor se
segue.”
22
Depois de ter reproduzido toda a carta, o Prelado continua: “Depois da tal carta, o Padre Lambert aux Couteaux,
nos tendo dito que fora encarregado pelo referido Padre Vicente e por toda a Congregação para resolver tudo conosco
e tendo prometido mandar ratificar o que tratarmos com ele, foi resolvido o que se segue: manter na cidade de Sedan
um pároco, sete outros padres da Missão e dois irmãos, junto com um vigário ou outro padre da confiança deles e
aprovado por nós ou por nossos Vigários Gerais para prestar serviço em Balan, dos quais oito padres, quatro ao
menos ficarão em Sedan, para ali desempenhar as funções curiais, pregar, catequizar e fazer missão. Os outros quatro,
que serão aplicados na pregação de missões nas soberanias de Sedan, Raucourt e Saint-Manges e outros lugares de
nossa diocese, sob nossa autoridade e nossa permissão, serão obrigados a se deslocarem, todos ou a maior parte deles,
para Sedan, quando das festas de Páscoa, do Santíssimo Sacramento, de São Lourenço, de Nossa Senhora de 15 de
agosto e do Natal, a fim de tornar, nesses dias, mais solene, o serviço religioso. E quanto à censura que nos foi feita
no tocante ao pregador, não julgamos conveniente encarregá-los da hospedagem, da manutenção e da remuneração do
referido pregador. Para este fim ordenamos que, para a referida manutenção e remuneração, seja tirada a soma de 160
libras de renda devida pela receita do Domínio, sobre a terra de Bazeilles, mais...”.
Encontram-se vários documentos concernentes a este negócio na Biblioteca Nacional n. a. f. 22. 326, reg.,
fº 56 e seg.
.
Carta 724. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
O ano está assinalado no dorso do original. O conteúdo da carta permite precisá-lo mais (Cf. notas 2 e 3).
dermos resposta alguma, dentro do tempo em que ele pretendia ter algumas filhas, isto
é, antes da festa de Todos os Santos.
Permiti-me, muito honrado Pai, vos pergunte o que devemos esperar de vosso
retorno2. Quão aliviada me sentiria se pudesse dar-vos a conhecer minhas apreensões!
Todas elas convergem para o temor de que Deus me abandone, como creio havê-lo
merecido tantas vezes.
Suplico-vos humildemente permitir-me ir a Chartres, durante vossa ausência,
para recomendar à Santíssima Virgem todas as nossas necessidades e as propostas que
vos fiz3. Já é tempo de pensar em mim e, diante de Deus, creio que nisso está
igualmente o bem de nossa pequena Companhia.
Na semana passada, esteve aqui uma senhora, viúva de um nobre cavalheiro
chamado senhor Sigongne. Disse-me que vinha ver se poderia servir a Deus conosco.
Ela se encontra ainda num grande sofrimento pela morte do marido, o que a desapega
totalmente de tudo mais. Não tem filhos. Não sei se é Deus que a envia. Despertou em
mim grande compaixão, vendo-a tão ferida em seus sentimentos. Se ela voltar, senhor
Padre, julgais conveniente que a acolhamos por algum tempo para, de certo modo,
fazer um retiro espiritual que, devido a seu estado, seria mais um alívio? Julguei não
dever tomar nenhuma determinação antes de vos comunicar o fato.
Enfim, nosso bom Deus permitiu essa longa viagem, sem me conceder o que lhe
havia pedido. Suplico a sua bondade trazer-vos de volta, em breve, e com a saúde
completamente revigorada. Fazei-me a caridade e o favor de tranquilizar-me um
pouco, dando-me notícia de vosso estado e de continuar acreditando que nosso bom
Deus quer que eu seja, verdadeiramente, vossa humilde e muito agradecida filha e
serva,

L. de Marillac.

(P.S.) – Permiti, senhor Padre, que vos apresente as mui humildes saudações de
vossas filhas, nossas queridas Irmãs, que, como eu, estranhamos vosso afastamento.
Nossa Irmã Ana, de Saint-Paul, está muito doente.
Todas começamos a perceber, com pesar, que há muito tempo não temos a
felicidade de nos reunirmos, diante de vossa caridade, para a Conferência. Nós a
aguardamos com todo afeto e pedimos, humildemente, vossa santa bênção, como
preparação para ela.
Faz nove meses que a senhora (de que vos falei) ficou viúva. É boa pessoa e de
alta condição.
Podeis supor que, se Beauce entrasse no vosso itinerário, aproveitaria o
momento de vosso regresso para fazer a viagem que vos peço. Perdoai minha
insistência importuna sobre esse assunto.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, Superior Geral dos padres da Missão.


22
São Vicente, tendo partido para Richelieu pouco depois do dia 21 de setembro de 1644 (Cf. carta 723), estava de
volta a 13 de outubro, em Fréneville (Cf. carta 725), onde permaneceu alguns dias antes de ir para Paris.
33
Luísa de Marillac nos deixou um breve relato do que fez em Chartres, onde ficou do dia 14 a 17 de outubro ( Cartas
de Luísa de Marillac, p. 177).
725. – A ANTÔNIO PORTAIL

Richelieu, 05 de outubro de 16441.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Podeis imaginar até que ponto me afligi com a morte do Padre Perdu e
igualmente como fiquei consolado, vendo o modo como Nosso Senhor dispôs dele.
Fizemos aqui, em sufrágio dele, um ofício religioso impregnado de muita devoção,
acompanhado de lágrimas, e uma conferência com muita consolação.
Envio-vos o arrendamento que vos devolvo assinado. Se o senhor Trobois desse
seiscentas libras, eu acharia melhor, uma vez que estejam naqueles lugares. Não mando
fazer nada sem o consentimento do senhor Sorus.
Fareis bem em enviar as quatrocentas libras a Fréneville, se ainda não o fizestes.
Nós as devemos ao granjeiro, por causa de sua colheita de trigo.
Abraçai ao Padre Gallais de minha parte. Estou ansioso por abraçá-lo.
Se há alguma coisa urgente a me informar por carta, podeis dirigi-la ao senhor
Pároco de Tours para que ma envie ou por um portador expresso, para Fréneville, onde
só poderei estar na quinta-feira [13]2 deste mês. Sou, no amor de Nosso Senhor, vosso
muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Portail, padre da Missão, em São Lázaro, Paris.

726. – A JEAN DEHORGNY, PADRE DA MISSÃO, EM ROMA

Fréneville, 14 de outubro de 1644.

Senhor Padre,
.
Carta 725. – Bibl. Nac. n. a. f. 1473, reg., fº 1695, fac-símile. O original, todo da mão do Santo, pertenceu ao
colecionador Berthevin.
11
A última cifra está mal reproduzida no fac-símile: Seríamos levados a ler 1640 ou 1642. Mas sabemos que o Padre
Perdu estava vivo a 22 de novembro de 1642 (Cf. carta 630). A comparação da carta acima com a seguinte e a
presença de Guilherme Gallais em Paris nos fazem escolher a data que aqui colocamos.
22
O fac-símile traz: 15. É, com toda a certeza, um erro.

.
Carta 726. – Em sua Isographie des hommes célèbres, Paris, 1828-1830, 2 vol., in-4º, t. II, p. 156, Delarue traz o
fac-símile da passagem desta carta compreendida entre as palavras Senhor Padre Codoing e por sua graça. O texto
do fac-símile difere muito pouco do encontrado na obra do Padre Pérmartin, t. I, p. 482, 1. 418. Este último teve sob
os olhos, assim o cremos, o original, que pertenceu ao Senhor de Châteaugiron. Por essa razão seguimos o seu texto
com confiança quanto à parte que o fac-símile não nos dá a conhecer.
Recebi aqui duas de vossas cartas, que escrevestes da missão próxima de Saint-
Sauveur1, quando da minha volta de Richelieu, onde acabo de fazer a visita com muito
boa disposição. Essas duas cartas não são para mim. Uma delas escreveis ao falecido
Padre Dufour2.
O Padre Codoing me pede com muita humildade ser desonerado do cargo de
superior, de tal maneira que não pude deixar de atender ao que ele pediu no mesmo
espírito com que ele pediu. Suplico-vos, senhor Padre, assumir o lugar dele por algum
tempo, embora vos tenha pedido para voltar daí. Não é que não precisemos de vós.
Nosso Senhor há de dar providência à vossa falta, por sua graça.
Talvez tenhais podido saber que colocamos no lugar do Padre Dufour, em
Sedan, o qual não estava satisfazendo, o nosso Irmão Damiens 3, que tem graça de Deus
para isso. Colocamos também o Padre Cuissot na direção do colégio 4. Resta-me dizer-
vos que penso ser bom conservar o Padre Codoing junto de vós durante algum tempo,
para vos inteirar um pouco dos deveres da casa. Nossos negócios consistem na
aprovação de nossas regras, na maneira como todos nós tivemos de nos aplicar a isso e
numa quantidade de outras pequenas diligências sobre as quais escrevemos ao Padre
Codoing. E quando estiverdes a par dos negócios e vós e ele tiverdes feito o que vos for
possível, será bom que ele venha visitar nossas pequenas casas de Marselha e de
Annecy.
O Padre Dufestel me comunica que ele vos envia o Padre Nouelly 5, com grande
pesar seu, pois recebia dele uma grande assistência.
Eis, senhor Padre, o que vos posso dizer no presente, acrescentando que abraço
toda a comunidade daí, prostrado em espírito a seus pés e aos vossos. Sou vosso muito
humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
i.p. da Missão.

11
Jean Dehorgny pregava uma missão de três semanas em Longone, pequeno povoado dependente da Abadia de
Saint-Sauveur na Sabina (Cf. Notices, t. I, p. 158).
22
Antônio Dufour, nascido em Montdidier, era subdiácono quando foi recebido na Congregação da Missão, a 31 de
dezembro de 1639. Fez os votos a 29 de setembro de 1642, foi colocado em Sedan e depois colocado à frente do
Colégio dos Bons-Enfants, que ele dirigiu de 1643 a 1644. Por ocasião de uma doença que parecia não ter gravidade
alguma, ofereceu sua vida a Deus para conservar a do Santo Fundador, cujo estado inspirava as mais vivas
inquietações. Deus o atendeu. Sua doença se agravou enquanto o Santo recuperava pouco a pouco a saúde. Uma
noite, relata Abelly (op. cit., 1. I, cap. IV, p. 245), três toques se fizeram ouvir na porta do quarto onde repousava o
Santo. Aqueles que o velavam foram abrir a porta. Não havia ninguém. São Vicente compreendeu. Mandou chamar
um clérigo e lhe disse para recitar uma parte do ofício dos mortos. Antônio Dufour acabava de expirar. Abelly situa
erroneamente este fato em 1645. Ele aconteceu em 1644, como constata Collet, op. cit., t. I, p. 406.
33
Gabriel Damiens, nascido em Bourseville (Some), ingressou na Congregação da Missão a 30 de março de 1640,
com a idade de 19 anos. Foi admitido aos votos a 16 de outubro de 1642 e ordenado padre em 1646. Posteriormente
foi colocado nos Bons-Enfants como professor de filosofia. Sua insistência em combater o jansenismo foi motivo
pelo qual São Vicente o retirou do ensino. O Santo tinha conhecimento da juventude e de sua tendência em tomar a
defesa das doutrinas atacadas sem as devidas medidas.
44
O seminário dos Bons-Enfants.
55
Bonifácio Nouelly, nascido em Collonges (Ain), ingressou, já como padre, na Congregação da Missão, a 22 de
novembro de 1643, com a idade de 25 anos. Foi colocado em Marselha, em 1644, e enviado a Argel, em 1646, para
dirigir ali a nova Missão. Depois de um ano de duros trabalhos e de dedicação, contraiu, à cabeceira de um pestilento,
os germes da doença que o levou à morte, a 22 de julho de 1647 (Notices, t. III, p. 28-34).
Destinatário: Ao senhor Padre Dehorgny, padre da Missão.

727. – A ANTÔNIO PORTAIL

Fréneville, 14 de outubro de 1644.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Já cheguei aqui desde ontem à noite, com muito boa disposição. Apenas o meu
resfriado não me deixa e me limita, pela graça de Deus.
Escrevi-vos de Saint-Dyé1 que a rainha entregou em nossas mãos duas mil libras
em favor da nobreza de Lorena. É lamentável não o tenhais sabido. Penso tê-lo dito ao
Padre Gentil2. Não há dúvida de que o disseram à rainha, e assim damos algum motivo
para censura. Como eu tinha escrito dessa Assembleia 3, poderíeis pensar que, ou
tínhamos recebido dinheiro, ou que era necessário adiantá-lo. Peço-vos, senhor Padre,
enviar recados por toda parte, pedir desculpas à comunidade, quando estiver em São
Lázaro, por intermédio do Padre Lambert, e de pegar mil francos do cofre ou até mesmo
mil e duzentos, se for preciso.
Respondestes bem ao senhor Brisacier4.
Encontro-me em certa perplexidade sobre se devo ir daqui a Fontainebleau 5. A
doença do senhor Cardeal6, o negócio da Caridade7 e o da nobreza de Lorena, parecem
exigi-lo, além de outros motivos, como também a missão que a rainha pensara em

.
Carta 727. – C. aut. – O original pertencia, em 1913, ao senhor La Caille, Avenida Malesherbes, 50, Paris.
11
Saint-Dyé-sur-Loire, localidade do Loir-et-Cher.
22
Mathurin Gentil, nascido em Brou (Eure-et-Loir) em maio de 1604, ingressou na Congregação da Missão a 11 de
novembro de 1639. Fez os votos a 17 de outubro de 1642. Era o ecônomo da casa de São Lázaro em 1644, e foi
exercer as mesmas funções, em 1647, no seminário de Mans. Morreu nesta cidade a 13 de abril de 1673, muito
lamentado por todos e, em particular, por seu Superior Geral, que anunciou sua morte a toda a Companhia por uma
circular muito elogiosa.
33
A Assembleia para a nobreza lorenense.
44
Laurent de Brisacier, nascido em Blois a 02 de agosto de 1609, era o irmão do jesuíta Jean, que adquiriu fama pelas
controvérsias contra os jansenistas, e era o tio de Jacques Charles, futuro superior das Missões Estrangeiras. Tornou-
se decano de Saint-Sauveur em Blois, em 1632. Foi preceptor de Luís XIV, por volta de 1649, durante uma ausência
de Dom Péréfixe. Recebeu da corte a missão de ir a Roma para lá negociar diversas questões e foi encarregado pela
rainha de cumprir o voto que ela tinha feito, durante uma doença do seu filho, se conseguisse sua cura, de fazer a
fundação de um ofício solene todos os anos, no dia de São Luís, na igreja de Notre-Dame-de-Lorette. Laurent de
Brisacier foi ainda Conselheiro de Estado. Suas rixas com o cabido de Blois lhe valeram mais de um processo.
Tomou parte ativa na fundação do seminário das Missões Estrangeiras e morreu em Blois, a 15 de fevereiro de 1690
(Cf. Une famille Blésiose, Les de Brisacier, por André Rebsomen, nas Mémoires de la Société des sciences et lettres
de Loir-et-Cher, 30 de junho de 1902).
55
A corte se encontrava lá.
66
O Cardeal Mazarino.
77
Provavelmente o estabelecimento de uma Confraria da Caridade.
mandar pregar naquele lugar8. Escrevi ao Bispo de Bolonha9. O Padre Alméras
apresentará à Assembleia1010 o pensamento da rainha e verá, entre esses senhores
padres, quais poderão dar assistência a essa missão, se ela acontecer, anotar-lhes-á o
nome e lhes pedirá estejam à disposição, caso a rainha se decida a fazê-la.
Saúdo muito humildemente ao senhor Padre Prior1111 e ao senhor Padre
Cousin1212, como também a pequena comunidade. Sou no amor de Nosso Senhor,
senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Portail, padre da Missão, em Paris.

728. – A ANTÔNIO PORTAIL, PADRE DA MISSÃO, EM SÃO LÁZARO

Fréneville, 21 de outubro de 1644.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Aí vai o senhor Pároco de Mespuits1. Peço-vos oferecer-lhe hospedagem e
acolhê-lo efetivamente em nossa casa.
Pela graça de Deus, entramos, enfim, em acordo com o rendeiro de Mespuits.
Devemos-lhe 368 libras. Precisamos de 400. Peço no-las enviar pelo senhor Rivet 2, ou
algum outro, ou pelo mensageiro de Etampes, se ele quiser se encarregar disso, com
uma carta dirigida ao senhor du Pred, nosso Procurador, para recebê-las e no-las
entregar.
Espero partir amanhã, sábado, ou segunda-feira, no mais tardar, para Chartres e
voltar quinta ou sexta-feira, no máximo, com a graça de Deus, para Paris. Faço questão
de passar na casa do senhor Norais3, em Saclay4, para ver a granja que ele nos oferece e

88
Deveríamos relacionar com essa missão o incidente do qual Abelly nos faz o relato em sua obra, 1. III, cap. XIV, p.
235? Pressionado pela rainha a pregar uma missão em Fontainebleau, o Santo enviou os padres de sua congregação.
Acontece que um religioso começara lá uma série de pregações. Para não importuná-lo, os missionários fixaram seus
exercícios em horas diferentes. Apesar desta precaução, aconteceu um vazio em torno do púlpito dele. Ele ficou com
ciúme e se queixou amargamente. Sabendo disso, o Santo suplicou à rainha lhe permitisse chamar de volta os seus
padres, o que lhe foi concedido.
99
Francisco Perrochel. Ainda não tinha sido sagrado.
1010
A Assembleia das terças-feiras.
1111
Adriano Le Bom, prior de São Lázaro.
1212
Cláudio Cousin, antigo religioso de São Lázaro.
.
Carta 728. – Dossiê da Missão, cópia tirada do original do senhor Charavay.
11
Pequena comuna de Seine-et-Oise.
22
Provavelmente Jacques Rivet, Irmão Coadjutor, nascido em Houdan (Seine-et-Oise), a 11 de setembro de 1620.
Entrou na Congregação da Missão a 16 de dezembro de 1641 e fez os votos a 22 de abril de 1646.
33
Grande amigo da Congregação da Missão. Encontraremos mais à frente uma bela carta de São Vicente ao senhor
Norais para consolá-lo em suas provações.
44
Perto de Palaiseau, em Seine-et-Oise.
que o senhor Prior5 nos aconselha, com tanto empenho, a receber 6. Não lhe direis
contudo o que vos digo, (isto é), que devo passar por lá. Ele se preocuparia com me
fazer encontrar lá o referido senhor Norais.
Espero devolver-vos amanhã nosso Irmão Jean Lequeux7.
Enviai-nos o senhor Padre Gallais para anunciar a missão em Fontainebleau,
para o dia da festa de Todos os Santos. Será conveniente que ele peça a bênção do
senhor Arcebispo de Sens8, se ele estiver em Paris ou em Lys9, perto de Melun, ou a um
quarto de légua dali. Será bom que lhe escrevais em minha ausência, se ele partir sexta-
feira, como também ao Padre Prior, Pároco de Fontainebleau, comunicando-lhes a
ordem que recebi da rainha neste sentido, e rogar-lhes, em minha ausência, para acatá-
la. Vereis quem poderíeis enviar e se seria conveniente enviar os senhores Padres
Boucher e Mollin1010.
Estou passando bem, graças a Deus, e sou vosso servo,

Vicente de Paulo.

Prometemos uma capa de asperges nova, de chamalote floreado, para a igreja de


Mespuits. Entregá-la-eis, por favor, ao senhor pároco.

729. – A LUÍSA DE MARILLAC

Manhã de quinta-feira [depois de 16381].

Solicita-se, muito humildemente, que a Senhora Le Gras não avise às filhas


sobre a assembleia de amanhã, porque a rainha acaba de me mandar chamar, e porque é
necessário fazer amanhã a assembleia das oficiais do Hospital Geral.

Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

55
Adriano Le Bon.
66
A granja oferecida a São Vicente estava situada no lugarejo hameau de Orsigny. O Santo a aceitou pelo contrato de
22 de dezembro de 1644 (Cf. Arq. Nac. S 6687). Ficou de posse dela, com toda tranquilidade, durante a vida do
Senhor e da Senhora Norais. Mas depois da morte dos doadores, os herdeiros reclamaram, moveram processo e
obtiveram um ganho de causa. A granja voltou, em 1684, a ser propriedade dos Padres da Missão.
77
Nascido em Châlons-sur-Marne, entrou na Congregação da Missão como Irmão Coadjutor a 22 de junho de 1639,
com a idade de 19 anos. Fez os votos a 13 de novembro de 1653.
88
Otávio de Saint-Lary de Bellegarde (1621-1646).
99
Hoje Dammarie-les-Lys. Ali se veem as ruínas de uma antiga Abadia de religiosas cistercienses, às quais a rainha
Blanche, mãe de São Luís, legara o seu coração.
1010
Jean Mollin, nascido em Beauvais, entrou na Congregação da Missão a 20 de junho de 1640, com a idade de 20
anos. Fez os votos a primeiro de novembro de 1643 e foi ordenado padre em 1644.
.
Carta 729. – C. aut. – Original com as Filhas da Caridade de Sedan.
11
Antes de 1639, as palavras “manhã de quinta-feira” viriam no fim da carta, não no começo.
730. – AO SENHOR PADRE CAMPION1

[10 de novembro de 16442].

De muito bom grado, senhor Padre, dirigir-me-ei, sábado próximo para o lugar 3
e na hora que me indicais.
Sou vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

731. – A JEAN DEHORGNY

Paris, 11 de novembro de 1644.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Escrevi-vos há oito dias e nada vos direi além do que vos disse então, pois que
não recebi cartas vossas desde esse tempo.
Trataremos aqui da aprovação de nossas regras comuns, das do Superior Geral,
das da eleição e das do Visitador. Se chegarmos a bom termo, in nomine Domini, não
deixareis de ver aí o que se poderá fazer a respeito.
Já vos disseram que substituímos o Padre Dufour pelo nosso Irmão Damiens,
para ministrar as aulas. Não poderíeis crer como Deus o abençoa nesta função e quanto
agrada aos seminaristas1, atualmente em número de vinte e dois. O Padre Cuissot
despediu ontem dois deles, por terem saído sem permissão. Os Padres Soufliers, Buissot
e Bastin2 estão fora. Os Padres Colée e Durot estão doentes.
Pedi ao Padre Lambert para mandar embora os senhores Padres Perceval, Le
Noir , du Chastel4 e Le Roy5. Limpamos e relimpamos, de nove, o nosso seminário.
3

Restam trinta que vão muito bem, pela graça de Deus.


.
Carta 730. – Dossiê da Missão, cópia tirada do original do senhor Charavay. Estas linhas estavam escritas com a
mão do Santo embaixo da carta do Padre Campion.
11
Padre do Colégio de Fortet.
22
É a data da carta do Padre Campion. São Vicente respondeu a ele no mesmo dia.
33
Na casa do senhor Quarré, notário, na Rua Saint-Jacques. Tratava-se de uma questão de dinheiro.
.
Carta 731. – C. aut. – O original desta carta pertence aos padres jesuítas, que o conservam no quarto de Santo
Inácio, em Roma.
11
Os seminaristas dos Bons-Enfants.
22
Este nome não existe no catálogo do pessoal.
33
Jacques Le Noir nasceu em Arras, foi recebido como padre na Congregação da Missão, a 12 de maio de 1641, com
a idade de 26 anos.
44
Pierre du Chastel nasceu em Courcelles-le-Comte (Passo de Calais), foi recebido como padre na Congregação da
Missão, a 09 de outubro de 1641, com a idade de 25 anos. Morreu em Paris, em 1648.
55
Jean Le Roy nasceu em Saint-Malo, recebido em São Lázaro em 15 de dezembro de 1640.
Chamamos de volta o Padre Gallais, de Sedan, e enviamos para lá o Padre
Grimal, como superior, com pessoas que não conheceis e que estão trabalhando muito
bem. Os Padres Alain6 e Philmain7 já estavam lá.
O Padre Ozenne está encarregado da casa de Troyes. O Padre Bourdet 8 está aqui,
esperando colocação. Entrementes, o encarregamos de zelar pela sacristia e pelos
porteiros. Nós o destinamos à supervisão da saúde. O Padre du Coudray está em La
Rose. São estas as pequenas mudanças, além da do retorno do Padre Gilles, que faz
maravilhas na orientação da piedade e da doutrina em favor de nossos seminaristas.
Se não virdes por aí alguma luz sobre a união da casa de Toul, penso ser melhor
abandoná-la, antes cedo do que tarde9.
É-nos impossível retirar as três mil libras que adiantamos para vossa casa, na
esperança de semelhante soma que a rainha ordenara em favor desta daqui. Nosso
aperto, que é muito grande, nos constrange a retê-las sobre o que vos devem enviar.
Estou sempre em embaraço. Espero não permanecer assim por longo tempo. Celebro
frequentemente a santa missa nessa intenção e rogo que a Providência nos dê
oportunidade para isso.
Pedi ao Padre Portail escrevesse para todas as casas dizendo que os superiores
não devem ler as cartas dos inferiores quando escrevem ao Superior Geral ou as do
Superior Geral para eles. Peço-vos fazer com que atentem a isso e começai vós mesmo a
praticá-lo.
Estou preocupado, porque não estais trabalhando com os ordinandos, conforme a
intenção da fundadora1010. Não é falta nossa. Importa, porém, visá-lo incessantemente,
embora com prudência. As dificuldades, por outro lado, me parecem muito grandes.
Abraço o Padre Codoing e o Padre Blatiron e peço aos dois para serem vossos
conselheiros, e a vós, senhor Padre, fazer-lhes o mesmo pedido. Pertence ao Superior
Geral nomeá-los, pessoalmente ou pelo Visitador.
Abraço a todos, prostrado em espírito aos vossos pés, e sou, senhor Padre, vosso
muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Dehorgny, superior dos padres da Missão de


Roma, em Roma.

732. – NICOLAU PAVILLON, BISPO DE ALET, A SÃO VICENTE

66
Jean Allain nasceu em Dreux, entrou como padre em São Lázaro, a 20 de maio de 1643, com a idade de 31 anos.
Fez os votos a 20 de abril de 1646. Morreu cerca de 06 de abril de 1649.
77
Francisco de Philmain nasceu em Normandel (Orne), entrou como diácono em São Lázaro, a 14 de abril de 1642,
com a idade de 25 anos.
88
Anteriormente superior em Troyes.
99
Já vimos que esta casa era disputada contra a Congregação da Missão, pela Ordem do Espírito Santo.
1010
Consignada no contrato de 02 de maio de 1643 (Cf. 1. 660, nota 1).
.
Carta 732. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
Senhor Padre,

Perdoai-me se tomo a confiança de unir minhas muito humildes preces às do


senhor Bispo de Angers1, no tocante ao acidente acontecido com sua família. Com
efeito, além dos deveres da caridade, comum em tais ocasiões, devo tantos favores a
pessoa dele, pela edificação e pelo serviço que ele presta a esta diocese, que não
poderia, sem grande ingratidão, deixar de lhe dar este testemunho de meu
reconhecimento. Não que eu creia poder acrescentar algo, pela recomendação que eu
vos faço, senhor Padre, à vossa caridade, nessa ocasião, mas é para nada omitir no que
penso ser meu dever.
Estou preocupado por saber se recebestes minha resposta à proposta da carta
que me destes a honra de escrever-me, no mês de julho último, que era portadora da
inteira submissão da minha pessoa e dos meus pequenos ofícios ao que julgásseis ser
da vontade de Deus nesta ocasião e em todas as outras.
Para vos pôr a par, entre vossas grandes e importantes ocupações, de nossas
pequenas notícias, dir-vos-ei que damos continuidade a nossas assembleias de
eclesiásticos da diocese e das dioceses circunvizinhas que o solicitam. Estamos
reunindo uma no presente com cerca de trinta padres, que fazem os exercícios
espirituais no bispado durante quinze dias com muito fruto e edificação. Ao mesmo
tempo, alguns dos eclesiásticos da família percorrem as paróquias da diocese para
verificar em que estado se encontram depois de nossa visita terminada no ano passado
e se nossas determinações estão sendo executadas. Imploro, sobre este pequeno
trabalho e sobre outros projetos menores, a assistência de vossas santas orações, não
podendo contar, sem vos importunar com a de vossos conselhos. Vossa caridade não
recusará esta graça a quem, apesar de tudo, persevera sempre, senhor Padre, no amor
do Salvador e de sua santa Mãe, vosso muito humilde e muito obediente servo,

Nicolau, Bispo de Alet.

De Alet, 18 de novembro de 1644.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, Superior Geral da Congregação dos


padres da Missão, em São Lázaro, Paris.

733. – A GUILHERME DELVILLE1

11
Cláudio de Rueil, Bispo de Bayonne (1622-1626), depois, Bispo de Angers (1626 até 20 de janeiro de 1649).
.
Carta 733. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
Guilherme Delville nasceu em Tilloy-lez-Bapaume, hoje Ligny-Tilloy (Passo de Calais), entrou como padre na
Congregação da Missão a 19 de janeiro de 1641, com a idade de 33 anos. Foi superior em Crécy (1644), em
Montmirail (1644-1646, 1650-1651). Retirou-se depois para Arras, onde continuou a cumprir durante vários anos,
com a permissão de São Vicente, seus deveres de missionário. Morreu nesta última cidade em 1658.
Paris, 20 de novembro de 1644.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Não é conveniente que doeis as granjas da Chaussée2 antes de ter tomado posse
delas, nem que delas tomeis posse, antes de resolvermos a maneira, (como fazer isso),
com um bom conselho nessa cidade, o que faremos com o senhor du Fresne, dentro de
três ou quatro dias. Além disso, deveis avisar-me sobre o que vos oferecem, antes de
fazer qualquer coisa. Será conveniente torná-lo público antes de doá-las. Se as tivésseis
doado antes da tomada de posse, teríeis feito um ato de intrusão no benefício, o que é
uma falha que poderia levar à sua perda. Em nome de Deus, senhor Padre, não tenhais
pressa nos negócios e nada façais de importante sem nosso parecer. Serei exato em vos
dar em seguida a resposta.
Não peçais mais, no futuro, dinheiro ao senhor Geger. Tomai-o dos cobradores
da terra de Montmirail, ou de algum outro. Nós pagaremos aqui no tempo marcado.
Tendes razão no que me dizeis, que importa proceder com suavidade no que diz
respeito à Madame Gomer.
Suplico-vos saudar e agradecer em meu nome ao senhor Prior3, pelas boas
acolhidas que vos dispensa. Ficarei infinitamente contente por vê-lo, se vier a esta
cidade, e por honrá-lo e servi-lo.
É necessário, portanto, deixar a granja de Chamblon4 como está.
Nada conseguirei falando com a rainha a respeito do que dizeis sobre os
excessos cometidos em relação às fábricas5. O negócio foi feito pelo falecido rei e os
que administram esses negócios subverteriam o que eu poderia dizer deles. Contudo,
direi alguma palavra sobre isso. Oh! como a guerra é um grande mal!
É preciso dar continuidade às esmolas que eram feitas ao Hospital Geral, em
favor desses meninos de coro e em favor dessas bondosas mulheres. Veremos isso.
Falarei a respeito ao Reverendo Padre de Gondi.
Não deixaremos de rezar pelo bom......6. Se puder prestar serviço à sua família,
eu o farei.
Louvo a Deus por tudo que me dizeis sobre a falecida Senhora de Thiercelin.
Bendito seja Deus pelo fato de que também a nobreza vos reclama em sua
doença! É uma boa obra e o meio mais eficaz de cooperar com sua salvação. Se eles se
curarem, fareis com que tomem a resolução de melhor servir a Deus e de mudar para
melhor seu estilo de vida. Se morrerem, os entregareis nas mãos da misericórdia de
Nosso Senhor. Desejo muito que se faça o mesmo para com os pobres, na medida do
possível.
É preciso ter ao menos um Irmão convosco.

22
No subúrbio de Montmirail.
33
Jean François Delabarre, prior de Montmirail (1636-1646).
44
Hoje Champlong, na comuna de Courgivaux (Marne).
55
Nome relativo à administração dos bens da Igreja.
66
O nome foi esquecido no original, passando de uma página para outra.
Bendito seja Deus, senhor Padre, pelo que me dizeis desses senhores párocos
que querem fazer o retiro em vossa casa! Ó Jesus! senhor Padre, recebei-os e enviai
alguém em seu lugar durante esse tempo, para pregar lá a missão, ou rever o povo que
quiser se reconciliar, se a missão já foi pregada em sua paróquia. Em qualquer hipótese,
enviareis para lá, nos domingos e nas festas, algumas pessoas, e elas poderão pedir aos
párocos mais próximos para dar assistência aos paroquianos deles, em caso de
necessidade extrema, durante sua ausência.
Quanto ao nobre cavalheiro que tem a mesma intenção, procedereis com ele, por
favor, como fazemos aqui.
Vou dizer a Alexandre7 que vos envie o que está contido em seu bilhete (?).
Que vos direi da missão de Beuvardes 8? Será bom pregá-la enquanto o Senhor e
Madame de Melun estiverem lá. Certificai-os de que é informação falsa a que lhe deram
de que eu disse que falaria com a rainha 9 da inexecução do testamento da Madame de la
Bécherelle. Jamais este pensamento entrou em meu espírito, nem o de impaciência
alguma, e que sou seu muito humilde servo e trataremos de lhes enviar um eclesiástico
no lugar daquele que está lá.
Porventura vos entregaram os cinquenta escudos que a falecida Madame de la
Bécherelle vos legou?
Tiram-me a pena da mão e me constrangem a terminar a presente carta,
recomendando-me as vossas santas orações, prostrado em espírito aos vossos pés e aos
de vossa comunidade que eu saúdo. Envio-vos este portador expressamente para que
não entregueis as granjas da Chaussée e da Maladrerie, a não ser depois da tomada de
posse delas1010.
Sou, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Delville, superior dos padres da Missão de


Montmirail, em Montmirail.

734. – A GUILHERME DELVILLE

São Lázaro, 20 de novembro de 1644.

77
Alexandre Véronne, enfermeiro de São Lázaro.
88
Em Aisne.
99
A missão de Beuvardes, fundada por Madame de la Bécherelle a 03 de julho de 1643, devia ser pregada a cada
cinco anos.
1010
Diante da apresentação de Pierre de Gondi, Duque de Retz e Barão de Montmirail (29 de setembro de 1643), o
Bispo de Troyes tinha unido em caráter perpétuo à Congregação da Missão, a 20 de junho de 1644, o priorado ou
Hospital Geral de Chaussée, no subúrbio de Montmirail, na diocese de Troyes, com o compromisso de ela manter ali
dois padres e um irmão, que pregariam missões por toda parte onde o bispo os enviasse, conservariam os prédios em
bom estado, atenderiam a todas as obrigações espirituais e temporais do priorado e reconheceriam os direitos de visita
do bispo e “a vantagem de duas libras e cinco coletas por ano”. (Arq. Nac. S 6708).
.
Carta 734. – C. aut. – O original foi posto à venda pelo senhor Charavay em 1913. É dele que nós tiramos a cópia.
Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Depois que escrevi a minha última carta, que recebereis por esse mesmo
portador, pensei em pedir-vos para ir receber as determinações e a bênção do senhor
Bispo de Soissons1 e de informá-lo sobre a vontade do senhor Duque de Retz 2, de unir o
hospital de Chaussée à Missão; dizer-lhe ainda que o senhor Bispo de Troyes 3, do qual
depende o hospital, concordou com a união, com a condição de nos estabelecer em sua
diocese; e ainda, que os habitantes de Montmirail enviaram uma delegação ao
Reverendo Padre de Gondi para pedir-lhe que não consinta que venhamos a permanecer
na referida diocese de Troyes, retendo-nos em Montmirail; que o referido R. P. deu o
seu consentimento, como também eu, no caso em que o senhor Bispo de Soissons o leve
a bem e nos dê efetivamente seu consentimento. Neste caso, suplicaremos muito
humildemente ao senhor Bispo de Troyes consinta em nossa permanência em
Montmirail. Não escrevi ao dito senhor Bispo de Soissons. Julguei que ele não levará a
mal que sejais encarregado disso, vós ou também o Padre Dufour4.
Apareceu um quisto no joelho do senhor Bispo nomeado de Bolonha 5, que o
teria impedido de fazer a missão em Soissons. Trataremos de dispor as coisas para que
seja realizada na Quaresma, se o referido senhor bispo o houver por bem. Ofereço a ele
minha humilde e respeitosa submissão e obediência 6, com toda a humildade e respeito
que me é possível. Saúdo também muito humildemente o Padre Dufour, assim como
vossa pequena comunidade e sou, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Tende a bondade de me escrever, por favor, via Soissons.

Destinatário: Ao senhor Padre Delville, superior dos padres da Missão de


Montmirail, em Montmirail.

11
Simão Le Gras.
22
Pierre de Gondi, Duque de Retz e barão de Montmirail, filho mais velho do Padre de Gondi e antigo aluno de São
Vicente.
33
Francisco Malier du Houssaye (1641-1678).
44
Cláudio Dufour nasceu em Allanche (Cantal), entrou na Congregação pouco depois de sua ordenação sacerdotal, a
04 de maio de 1644, com a idade de 26 anos. De início foi enviado a Montmirail (1644), depois foi colocado à frente
do seminário de Saintes (1646-1648). Era muito virtuoso, mas de uma virtude austera e pouco amável. A vida de
missionário era suave demais a seus olhos, persuadiu-se de que a de cartuxo conviria melhor ao seu amor pela oração
e pela mortificação. São Vicente foi de parecer completamente contrário, e Cláudio Dufour, sempre dócil, abandonou
seu projeto. Para afastá-lo de tentações desta natureza, o Santo colocou seu nome na lista dos missionários destinados
a Madagascar. Enquanto aguardava o dia do embarque, ele o ocupou primeiramente em Sedan, depois em Paris, onde
lhe confiou a direção do seminário interno, durante uma ausência do Padre Alméras, e enfim, em La Rose, como
superior (1654-1655). As viagens eram longas naquela época. O Padre Dufour partiu de Nantes em 1655 e chegou a
Madagascar no mês de agosto do ano seguinte. Alguns dias depois do seu desembarque, a 18 de agosto, foi tragado
pela doença (Notices, t. III, p. 14-23).
55
Francisco Perrochel.
66
O Santo acrescentara aqui as palavras “e a desta pequena Companhia”, que ele depois riscou.
735. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Estou preocupadíssima por causa do meu filho que chegou, sábado, com a
Condessa de Maure. Ela me disse que, no domingo, confiou-lhe um bilhete e que ele
ficou de vir ver-me, porém não tem ideia de onde possa estar. Que devo fazer? Não sei
se terá ido aos Bons-Enfants. Mando procurá-lo? Ou vós, senhor Padre, vos daríeis
esse trabalho, isto é, o de mandar alguém informar-se se esteve lá e o que fez? Eu vo-lo
suplico, muito humildemente, pelo amor de Deus! Bem sabeis quão grande são o meu
sofrimento e temores e que sou, senhor Padre, vossa muita obediente e agradecida filha
e serva,

L. de M.

02 de dezembro de [16441].

Não posso contar com a ajuda de ninguém neste mundo, nem quase nunca a
tenho tido senão de vossa caridade.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

736. – CHARLES FRANCISCO D’ABRA DE RACONIS, BISPO DE LAVAUR 1, A SÃO


VICENTE

[Entre 1643 e 16462].

Depois que tive a honra, ontem, de conversar convosco, fui encontrar-me com o
senhor Príncipe de Condé3 para tratar da questão de Jansênio4. Encontrei-o todo cheio
.
Carta 735. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Data acrescentada no dorso do original.
.
Carta 736. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. XII, 1ª ed., p. 416.
11
Huguenote convertido tornou-se pregador e capelão do rei e depois professor de teologia no Colégio de Navarra,
foi sagrado Bispo de Lavaur a 22 de maio de 1639. Morreu em sua terra natal, em Raconis, na diocese de Chartres, a
16 de julho de 1646, depois de ter lutado vigorosamente contra o jansenismo.
22
Esta carta parece dever ser colocada no tempo em que o Príncipe de Condé era membro do Conselho da Regência.
33
Henrique II, Príncipe de Condé, pai do grande Condé. “O príncipe de Condé, diz o P. Rapin em suas Memórias (t.
I, p. 40), tinha encontros secretos e frequentes com o Núncio do Papa e o Chanceler, com a intermediação do Padre
Vicente, para procurar em conjunto meios para destruir essas novidades, das quais tinha aversão”.
44
Cornélio Jansen, mais conhecido com o nome de Jansênio, nasceu na aldeia de Acquoy (Holanda) em 1585, e foi
estudar em Paris em 1604. Ali conheceu o Abade de Saint-Cyran, que lhe arranjou um posto de preceptor junto a um
Conselheiro, depois o levou para Bayonne, onde leram juntos os escritos de Santo Agostinho. Jansênio voltou para
Louvain em 1617 e lá conquistou o doutorado. Foi colocado à frente do colégio Santa Pulquéria e assumiu, em 1630,
a cátedra de Escritura Sagrada na universidade desta cidade. Elevado ao bispado de Ypres, pelo favor de Felipe IV,
foi sagrado em 1636. Dois anos depois, morria de peste com sentimentos de submissão à Santa Sé. Temos dele um
livro contra a França, Mars Gallicus, diversos comentários sobre a Sagrada Escritura e cartas ao seu amigo, o abade
de Saint-Cyran. A mais importante e a mais conhecida de suas obras é o Augustinus, que suscitou uma violenta
de ardor e de luzes contra os erros desse autor. Encorajou-me ao extremo a continuar o
meu trabalho e a colaborar com vosso zelo pela defesa da Igreja, do qual lhe falei
durante muito tempo e com o qual ele ficou radiante. Ele me deu ordem de duas coisas:
a primeira, a de estar com o senhor Núncio 5 para lhe comunicar, de sua parte, que ele
ficaria muito satisfeito em poder encontrar-se com ele, em alguma igreja, para lhe falar
deste negócio e lhe mostrar a necessidade absoluta que ele (o senhor Núncio) tem, para
o bem da Igreja e do Estado, de dar resposta a este autor. Cumpri logo sua solicitação
e fui estar com o senhor Núncio. Ele concordou, depois de uma longa conversa, que eu
lhe enviasse um catálogo dos erros de Jansênio, que foram outrora condenados ou
pelos Concílios, ou pelos Papas. Prometi fazê-lo. Voltei a estar com o senhor Príncipe,
que ficou extremamente satisfeito com esta resolução e me garantiu que ele
apresentaria à rainha e ao senhor Cardeal Mazarino a grande importância disso e
renovou-me a segunda ordem que me dera, a de vos certificar de seu zelo neste
negócio, a fim de levá-lo em frente juntamente convosco.

737. – A BERNARDO CODOING

São Lázaro, Paris, 04 de janeiro de 1645.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Acabo de receber, há cerca de uma hora, a carta que me escrevestes no dia onze
do mês passado e que me trouxe um contentamento inexprimível, porque vós e vossas
cartas causam sempre o mesmo efeito em mim. Bendito seja Deus por tudo que me
dizeis! É verdade que havia certa suspeita de que não me suportariam mais no cargo 1.
Mas meus pecados são a causa de que isto não tenha acontecido e de que não tenha sido
do agrado de Deus aceitar o sacrifício que lhe ofereci para este fim. In nomine Domini
espero que acabarão se cansando. Quanto a visitar por mim mesmo as casas que me
indicais, dir-vos-ei que o senhor Cardeal de La Rochefoucauld me fez a honra de dizer-

tempestade na Igreja. Este escrito, publicado em Louvain, em 1640, e em Ruão, em 1652, exigira dele vinte anos de
trabalho. O Augustinus foi censurado por Urbano VIII, e por muitas vezes, nos anos seguintes.
55
Nicolau Bagni, Arcebispo de Atenas, Núncio na França, de 25 de junho de 1643 até o ano de 1657. Foi criado
Cardeal com o título de Santo Eusébio e feito Bispo de Sinigaglia a 09 de abril de 1657. Morreu em Roma a 23 de
agosto de 1663 com a idade de 79 anos. São Vicente, com quem ele teve estreitos relacionamentos, só pôde louvar
sua benevolência.
.
Carta 737. – Coleção do processo de beatificação.

11
Conta Abelly (op. cit., 1. I, cap. XXXII, p. 173) que depois de uma viagem de alguns dias fora de Paris, espalhou-
se o boato de que o Santo, tendo caído em desgraça, recebera ordem de abandonar a corte. Ele acabou voltando. A um
eclesiástico que lhe falava de sua alegria ao saber que o boato era falso, ele respondeu: “Ah! Como sou miserável!
Não sou digno dessa graça”. A viagem de que fala Abelly não seria a que o Santo fez a Richelieu, em outubro de
1644? E não seria necessário aproximar o que diz aqui o Santo do relato de seu biógrafo? A verdade é que o boato de
sua desgraça andou correndo mais de uma vez, em particular em fevereiro de 1644, quando ele conseguiu fosse
entregue a Jean-Jacques Olier um benefício solicitado por Mazarino para o filho do Duque de la Rochefoucauld (Cf.
Arq. do Ministério dos Negócios Estrangeiros, relatórios e documentos, França, vol. 849, fº 68 e 75).
me muitas vezes pessoalmente que isso não é conveniente, pela razão de que, estando eu
em viagem ou em alguma casa particular, os outros virão a sofrer, porque não receberei
suas cartas, nem os outros as minhas respostas, por longo tempo. Haverão de alegar-me
sempre o exemplo da Ordem dos cartuxos e dos jesuítas, que procedem assim. Sendo
assim, é bom que me comuniqueis o que me diríeis, em minha presença. Procurarei ficar
atento a isso.
Ficai certo de que não tenho repugnância em absoluto para com a proposta das
Índias, nem quanto ao seminário menor que me sugeris, desde que as coisas estejam de
acordo com o que me dizeis a respeito dos ordinandos. Mas o que faremos com o
seminário? A maior parte da renda vos é doada para esse fim. E começo a perceber que
nossa bondosa fundadora tem dificuldade em relação a ele. Não me dizeis quanto tendes
por mês nem por semana. Talvez isso satisfaria. Se o Padre Dehorgny, vós e o Padre
Blatiron forem do mesmo parecer, poderíeis tentar também o de Santo...2.
Vou encarregar alguém, já nesta noite, para redigir uma procuração que vos
enviarei dentro de dois dias, dando ao Padre Dehorgny, se ele concordar, e também ao
Padre Blatiron, o poder de comprar essa casa e de empenhar e hipotecar vossos coches
de Soissons, arrendados por cerca de duas mil libras, e a porção que tendes sobre os
coches de Ruão da qual retirareis cerca de seis mil libras do arrendamento, pois que nos
é impossível enviar-vos as seis mil libras que pedis. Fá-lo-íamos de bom coração, se
pudéssemos. Mas tenha cuidado para que esta casa esteja situada num lugar bem sadio.
Paro por aqui, recomendando-me a vossos santos sacrifícios com toda a
humildade que me é possível e às orações do Padre Dehorgny e da comunidade,
prostrado em espírito aos vossos pés e aos de todos.
Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente
servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, padre da Missão, em Roma.

738. – A GUILHERME DELVILLE

Pais, 07 de fevereiro de 1645.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


O portador desta me dá oportunidade de me recomendar a vossas santas orações
e às da vossa comunidade daí, que eu abraço, prostrado em espírito a vossos pés e aos
dos vossos coirmãos. Ainda não temos o nosso despacho da parte do senhor Bispo de

22
Palavra ilegível na cópia.
.
Carta 738. – C. aut. – Original com os padres da Missão de Gênova.
Soissons1. Ele me fez a honra de escrever-me que aceita nosso estabelecimento e que
combinaria todas as coisas com os que nós enviarmos para a missão de Soissons, que foi
adiada. Por esta razão, penso que fareis bem em ir encontrá-lo em Compiègne, onde ele
se encontra, para receber suas determinações sobre isso e tomar conhecimento das
dificuldades, se ele as fizer, sobre nossa maneira de agir e o que ele deseja de nós.
Enviei-lhe as condições com as quais o senhor Bispo de Meaux 2 nos recebeu em sua
diocese3 assim como todos os outros nossos senhores Prelados em cujas dioceses
estamos estabelecidos. Vê-lo-eis.
Informai-me todos os detalhes do que fizestes a respeito do negócio da granja de
Chaussée, se toda a renda está compreendida e o que resta, assim como o estado de
vossa granja de Fontaine-Essarts4. É preciso escrever-me com frequência sobre todas as
coisas.
Bom dia, senhor Padre. Sou vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Delville, superior dos padres da Missão de


Montmirail, em Montmirail.

739. – A CHARLES DE MONTCHAL, ARCEBISPO DE TOLOSA

Paris, 24 de fevereiro de 1645.

Senhor Arcebispo,

Reitero aqui a oferta de minha obediência com toda a humildade e submissão


que me é possível, e Deus sabe com que coração eu o faço.
Esse eclesiástico do Colégio de Mage persevera ainda, pelo que me disse há
pouco, na proposta que fez ao senhor Flous, mediante algo que ele espera se faça por ele
aqui. Ele se oferece para ir até lá, quando quiserem, e obter a aquiescência de cinco ou
seis colegiados que lhe empenharam sua palavra no sentido de dar consentimento à
coisa, julgando que os outros vão anuindo pouco a pouco. Suplico-vos muito
humildemente, senhor Arcebispo, dizer-me se a coisa é exequível dessa maneira, se é
necessário que o reconhecimento preceda o benefício, ou o contrário, e como é preciso
proceder para que a coisa tenha probabilidade de êxito. Ele parece homem honrado e
consciencioso, e está disposto a se adaptar a esta cidade.

11
Simão Le Gras.
22
Domingos Séguier.
33
Em Crecy.
44
Luís Toutblanc, secretário do Duque de Retz, legara aos padres da Missão as granjas de Fontaine-Essarts e de
Vieux-Moulin pelo seu testamento de 12 de maio de 1644 (Arq. Nac. S 6708).
.
Carta 739. – C. aut. – Original nos arquivos do Cabido de Recanati (Italia).
Temos aqui o senhor Abade de Beaulieu1, irmão do falecido senhor Bispo de
Vabres2 que insiste muito em obter o bispado. Há discordância no que me falam a
respeito dele. Em nome de Deus, senhor Arcebispo, tenha a bondade de me escrever
quem ele é, se ele é capaz e piedoso, e se ,enfim, ele tem as qualidades adequadas a esta
dignidade, em especial, se ele é Padre3. Ele diz que é, mas alguns, que me informaram
sobre ele e que o conhecem, nada sabem a respeito. Aguardo, para tomar decisão, o que
fizerdes a caridade de me escrever sobre ele. Vou ter a coragem e a ousadia de vos
suplicar, muito humildemente, senhor Arcebispo, que me envieis quanto antes o que
souberdes a respeito dele, e de vos garantir que jamais alguém o saberá de minha parte.
Está conosco também o Senhor de Campels, desde há muito a favor do senhor
Bispo de Montauban4, contra o senhor Bispo de Útica 5. Que faremos com isso, senhor
Arcebispo? O negócio aqui está todo confuso. Oh! como desejo que vós sejais
deputado, senhor Arcebispo, por muitas razões, de modo especial para esta explícita
questão. Propor-lhes-ei, como já fiz a ambas as partes, recorrer a vós, senhor Arcebispo,
quanto ao que o primeiro dos referidos senhores daria ao segundo, e quanto às
condições em que ele consentiria que este último pudesse trabalhar em sua diocese.
Meus Deus, senhor Arcebispo, como fiquei aflito com a doença do senhor vosso
irmão, e ainda o estou! Ele é aguardado aqui por muitas pessoas de bem, das quais ele é
protetor. E eu, senhor Arcebispo, peço a Deus no-lo devolva, quanto antes e em boa
saúde, e que me torne digno da graça que me concedeis de me permitir a de ser, senhor
Arcebispo, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre de Missão.

740. – O CARDEAL FRANCISCO BARBERINI, PREFEITO DA PROPAGANDA, A


SÃO VICENTE1

Sabendo com que dedicação Vossa Reverendíssima se aplica ao socorro


espiritual do próximo, em especial à formação dos que desejam abraçar o estado
11
Jean de la Vallete Cornusson, Abade comendatário da Abadia de Beaulieu, em Rouergue, decano de Varenne, prior
de Parisot. Certos biógrafos do Santo pretenderam que ele fora educado por São Vicente de Paulo em Buset, cerca do
ano de 1600. A carta a Charles de Montchal torna esta suposição bastante inverossímil.
22
Francisco de la Valette, falecido a 20 de novembro de 1644. Teve por sucessor Isaac Habert. À exceção de um
período de uma dezena de anos, a sede de Vabres ficara com a família dos la Valette desde o ano de 1563.
33
Naquela época, o bispado era considerado um benefício e era atribuído muitas vezes a pessoas que nem sacerdote
eram, às vezes, até a crianças, sem se aterem ao caráter sacramental do eleito ou nomeado (Nota do Tradutor).
44
Anne de Murviel (1600-1652).
55
Pierre de Bertier, doutor da Sorbona, antigo Cônego e Arcediago de Tolosa, Coadjutor de Anne de Murviel e mais
tarde seu sucessor, sagrado em 1636, Bispo in partibus de Útica. Ele teve de suportar muita coisa do velho Bispo de
Montauban e pensou mais de uma vez em apresentar sua demissão. Algum tempo antes da morte do Prelado,
escreveu a Mazarino: “Sua saúde é tão boa e seu humor é tão mau que não tenho razão para esperar nem a sua
sucessão, nem mesmo suas boas graças. Dessa maneira, Eminência, não estou apenas sem trabalho em meu
ministério e sem renda suficiente em minha condição, mas também estou sendo perseguido sem cessar e julgado
culpado sem razão”. (Arq. Nac. KK 1217, p. 207).
.
Carta 740. – Dossiê da Missão, cópia.
11
A carta foi dirigida a São Vicente em italiano. Optamos pela tradução do texto francês em Pierre Coste (Nota do
Tradutor).
eclesiástico, os cardeais que fazem parte desta Congregação da Propaganda houveram
por bem encarregar-me de vos suplicar, em seu nome e no meu próprio nome, como
faço pela presente carta, que envieis alguns de vossos operários para a Irlanda a fim de
ensinar ao clero de lá a prática das cerimônias e dos ritos sagrados. O clero local se
encontra na mais profunda ignorância das rubricas, em razão dos obstáculos
levantados, desde há muito tempo, ao exercício do culto público pelos hereges que
dominam o país. Esta é uma obra particularmente digna de vosso zelo, dados os frutos
que dela podem esperar nesse reino.
Que o Senhor vos seja propício!
À disposição de Vossa Reverendíssima,

Cardeal de Santo Onofre.

Roma, 25 de fevereiro de 1645.

741. – JACQUES RAOUL DE LA GUIBOURGÈRE, BISPO DE SAINTES, A SÃO


VICENTE

Março de 1645.

Nossos ordinandos experimentam bênçãos maravilhosas e agora há tanto


empenho para serem recebidos nesses exercícios  (retiros), quanto havia anteriormente
de dificuldade nos indivíduos, para fazê-los participar deles.

742. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[Cerca do ano de 16451].

Senhor Padre,

Temos um número bastante bom de jovens, porém, no momento, não vejo


nenhuma suficientemente preparada para poder iniciar o serviço dos pobres em São
Gervásio2, quero dizer, começar por meio delas, porque já sei que outras os estão
servindo. Entretanto, se a Madame de la Porte quiser emprestar-nos a Irmã Henriqueta
durante quinze dias, creio que neste meio tempo poderíamos arranjar alguma. Porém,

.
Carta 741. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. II, sec. V, 1ª ed., p. 236.

.
Carta 742. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Nao se faz menção do estabelecimento das irmãs em São Gervásio antes de 24 de março de 1646.
22
Paróquia de Paris.
em tal caso, parece-me que tanto o senhor Pároco 3 como as Damas de São Gervásio
teriam de saber que a tomastes de empréstimo, para que esta mudança súbita não os
ofenda. Se me lembrar de alguma outra, vo-lo direi.
Tenho grande apreensão a respeito do assunto sobre o qual tratei no papel
entregue a vossa caridade, esta manhã. Temo pelo meu espírito e receio pelo meu
estado de alma, custando-me bastante submeter-me, neste ponto, à justiça eterna.
Suplico, por amor de Deus, a vossa caridade, presteis atenção nisso. Crede-me, senhor
Padre, vossa muito obediente e grata serva,

L. de M.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

743. – NICOLAU PAVILLON, BISPODE ALET, A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Conversando com o senhor Arcebispo de Narbona1, durante a reunião dos


Estados2, ele me fez a honra de falar-me de alguns negócios importantes que ele tem
com a Madame Duquesa de Guise3. A propósito, sabendo que poderíeis ser-lhe útil e
tivestes a bondade de me querer bem, pensei ser de meu dever oferecer-lhe toda a
confiança que vossa bondade inspira em mim para convosco. Estou certo de que este
muito digno prelado já goza de tal consideração convosco que não é necessário que eu
me interponha no sentido de vos recomendar-lhe os interesses e que acrescente as
minhas preces às suas. Eu o faço entretanto e vos suplico com todo meu coração
empenhar-se em favor dele em tudo que vos for possível. Tenho tantos testemunhos de
sua bondade e da afeição com que lhe apraz honrar-me, além do que lhe devo na
qualidade de seu sufragâneo, que não posso deixar de tomar parte significativa em tudo
que lhe diz respeito e de considerar os seus negócios como meus mais importantes
negócios, os quais eu tomaria mais a peito. Por isso, senhor Padre, suplico-vos de novo
dar-lhes afetuosa atenção e vos direi ainda que interessa muito à glória de Deus que os
seus negócios tenham pleno êxito e será de grande proveito facilitar-lhe o caminho
para que progrida cada vez mais em sua diocese e em toda a Província. Espero de
vossa bondade, como também de vosso zelo, lhe propicieis de bom coração vossos
cuidados garantindo-vos que, além do serviço que prestareis a Deus, acrescentareis
muito aos favores que vos devo, na qualidade, senhor Padre, de vosso muito humilde e
obediente servo,

33
Charles Francisco Talon (27 de agosto de 1620-25 e setembro de 1651).
.
Carta 743. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
Cláudio de Rebé (1628-1659).
22
Os Estados da Provença.
33
Henriqueta Catarina, Duquesa de Joyeuse, viúva de Henrique de Bourbon, Duque de Montpencier, e de Charles de
Lorraine, Duque de Guise, falecido em Paris, a 23 de fevereiro de 1656, com setenta e dois anos.
Nicolau, bispo de Alet.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, Superior Geral da Congregação dos


padres da Missão, em São Lázaro.

744. – JEAN JACQUES OLIER A SÃO VICENTE

[1644 ou16461].

Quem tem Deus tem tudo.

Senhor Padre,

Estou sendo solicitado de dois lados para vos escrever: um da parte do senhor
Landas, que deseja vos dê testemunho da religião do senhor seu pai e da senhora sua
mãe, o que faço com todo coração, pois lhes conheci a notável piedade; de outra parte
sou solicitado por uma donzela da Madame Princesa2 para vos pedir uma religiosa
para a reforma de uma abadia sobre a qual o senhor Bispo de Clermont 3 vos escreve,
como também a mim, para vo-lo suplicar 4. Eu o faço com a intenção de procurar o bem
da glória de Deus por toda parte onde ele está em jogo e particularmente em nossos
cantões da Auvérnia, tão abandonados.
Sou de todo coração, em Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e
muito obediente servo,

Olier, pároco de São Sulpício.

Senhor Padre, tenho a satisfação de vos enviar este livro que vos aprouve pedir-
me ultimamente.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, superior da Missão.

.
Carta 744. – C. aut. – Arq. do Seminário de São Sulpício, original.
11
Ver nota 4.
22
Carlota Margarida de Montmorency, Princesa de Condé.
33
Joaquim de Estaing (1614-1650).
44
Durante os dez anos em que São Vicente foi membro do Conselho de Consciência, houve apenas três mudanças de
abadessas na diocese de Clermont: duas na cidade episcopal, em Santa Clara (1644) e em Eclache (1646); a terceira
em Santa Clara de Aigueperse (1646).
745. – TOMÁS TURCHI, SUPERIOR GERAL DOS DOMINICANOS, A SÃO
VICENTE1

Reverendíssimo Padre,

A chegada tardia do correio que me trazia as cartas de vossa Reverendíssima


Paternidade me servirá de escusa junto a vós, e por vosso meio, junto de Sua
Majestade, a rainha cristianíssima. Aguardarei a próxima semana para tomar, a
respeito da perigosa divisão projetada por algum de nossos irmãos da Congregação de
São Luís, a decisão deixada à minha escolha pela suave piedade da rainha, com o
parecer esclarecido do Conselho dos Negócios Eclesiásticos, ao qual me conformarei
em todos os pontos. Mas como Vossa Reverendíssima Paternidade, levado pelo ardor
da caridade de que arde em todos os lugares, se dignou conceder-me favores que a
grandeza de suas virtudes e seus méritos me torna tanto mais preciosos, ouso implorá-
la com confiança a respeito de um livro escrito, dizem, pelo Padre Jean de Santa
Maria, superior do convento da Santíssima Anunciada em Paris, subúrbio Saint-
Honoré, que se permitiu insultar os Superiores Gerais de algumas Ordens que residem
em Roma, e de desviar os inferiores da obediência a seus superiores legítimos, para
submetê-los à jurisdição dos Ilustríssimos e Reverendíssimos Bispos. Assim, suplico
instantemente Vossa Reverendíssima Paternidade fazer com que, pela autoridade da
cristianíssima rainha, este Padre seja obrigado, tirando-lhe toda a possibilidade de
recurso, a se submeter à obediência pela qual o envio do convento de Paris ao de
Avinhão.
Diversas razões me sugerem esta medida: a proximidade do dia em que se deve
reunir a Assembleia do Clero de França, na qual ele poderia encontrar um bom
número de protetores; sua natureza impetuosa; sua tendência para novidades; seu
caráter inclinado à insolência e à insubordinação; sua habilidade, só detectada por
quem o conhece, em insinuar no espírito dos outros seus obstinados projetos de
separação. Ele zombaria de minha autoridade se a cristianíssima rainha, em sua
bondade e piedade, não se dignasse, sob a influência de vossa Reverendíssima
Paternidade, usar de seu poder para a execução das medidas a tomar.
Esperando esta graça de vossa recomendação, à qual vossas virtudes e vossos
méritos eminentes conferem uma eficácia toda particular junto de todos os Príncipes,
sobretudo junto a Sua Majestade cristianíssima, terei para convosco, em
reconhecimento deste benefício, um afetuoso respeito, e rezarei sem cessar por vós,
como desejo de coração e como vos peço por escrito que rezeis por mim, que sou...

Roma, 05 de abril de 1645.

.
Carta 745. – Arq. da Missão, cópia tirada da Casa Generalícia dos Padres Dominicanos, na coleção manuscrita
intitulada: Praedicaturium Franciae. – Conventus Parisiensis series B, p. 105.
11
Tradução do francês, por sua vez, traduzido do original latino (N. T.)
746. – TOMÁS TURCHI, SUPERIOR GERAL DOS DOMINICANOS, A SÃO VICENTE

Reverendíssimo Padre,

Conforme o desejo expresso por Sua Majestade, a Rainha Cristianíssima, e o


Conselho dos Negócios Eclesiásticos, tomei uma determinação a respeito da divisão
projetada por algum dos nossos irmãos da Congregação de São Luís 1. Venho
comunicar-vos esta determinação. Se o que decidi em obediência à piedosíssima
vontade de Sua Majestade, a Rainha Cristianíssima, receber sua aprovação, suplico a
Vossa Reverendíssima Paternidade predispô-la a apoiar o R. P. Vicente Bosside,
Vigário Geral, e a se servir de seu poder no sentido de que os irmãos enviados para
fora de Paris se retirem para os conventos designados para eles e não sejam tolerados
em outros lugares. Do contrário, estes últimos encontrariam meio de burlar a minha
autoridade, pois, pelo que estou sabendo, aqui mesmo, no seio da Cúria, eles têm seus
protetores, iludidos por dissimulações e falsos pretextos. Quanto a mim, não tenho
outra meta, obedecendo à voz de minha consciência e aos deveres do meu cargo, a não
ser a de restabelecer em seu esplendor uma Congregação que vai definhando há muito
tempo, e de afastar os obstáculos que a ameaçam com os piores males. Amo ternamente
os irmãos que me são confiados, mas acima deles amo a Deus, o bem da Ordem e a
vida regular.
Que Vossa Reverendíssima Paternidade haja por bem escusar-me. Falo com
toda sinceridade. Sou talvez importuno, mas vossa piedade será plena de indulgência
para com o zelo que me pressiona a vos expor minhas necessidades. Imploro vossa
proteção em que confio plenamente. Porém a bondade de Vossa Reverendíssima
Paternidade já me atendeu. Expresso-lhe toda minha gratidão e lhe apresento minhas
homenagens. Que Deus vos conserve a vida!

Roma, 17 de abril de 16452.

747. – A LAMBERT AUX COUTEAUX

Paris, 18 de abril de 1645.

Senhor Padre,
.
Carta 746. – Arq. da Missão, cópia tirada na Casa Generalícia dos Padres Dominicanos, na coleção manuscrita
intitulada: Praedicatorium Franciae. – Conventus Parisiensis series B, p. 111.
11
Ramo da grande Ordem dominicana. A Congregação languedócia (Occitana), chamada, em 1629, Congregação de
São Luís, nascera da reforma do Padre Sebastião Michaëlis. Tinha nessa ocasião dezessete casas das quais as
principais eram as de Paris, Tolosa, Bordéus e Avinhão. Todos os conventos situados abaixo do Loire foram
anexados, em 1646, à Província de Tolosa. Antes de 1668, a Congregação de São Luís não tinha o nome de
Província, nem os privilégios. Não eram representadas nos Capítulos Gerais.
22
O Padre Turchi veio para a França no decorrer do ano. De Paris, onde estava a 26 de novembro, foi para o norte,
passou pela Bélgica, em março de 1646, voltou a Paris para a Festa de Pentecostes, visitou os conventos da França,
chegou a Tolosa em novembro e desceu para a Espanha. Sua viagem só terminou em 1648.
.
Carta 747. – C. as. – Dossiê de Turim, original. Esta carta foi enviada às diversas casas da Congregação da Missão.
A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!
Estas linhas são apenas para vos informar que o número dos missionários de
nossa casa celeste aumentou, há pouco, com a morte serena de um de nossos estudantes,
nosso Irmão Jamain1, natural de Verdun, a quem Deus tirou da teologia escolástica para
levá-lo a aprender num instante a teologia celeste. Sua vida exemplar e sua santa morte
nos fazem crer piedosamente que ele já goza da imortalidade feliz com os santos. Minha
intenção não é de expor-vos aqui detalhadamente as suas santas ações, tanto porque não
tenho tempo, quanto porque ainda não fizemos a conferência sobre sua vida e sua morte.
Bastar-me-á, por hora, dizer-vos que não me lembro jamais de ter observado nele vício
algum e que possuía em alto grau as virtudes que compõem o espírito de um verdadeiro
missionário, particularmente a simplicidade, a humildade, a mansidão, a submissão e
exatidão, não somente no seminário, mas também nos estudos, quando os mais
fervorosos de ordinário se relaxam. Esteve doente várias vezes, e neste estado
demonstrou sempre uma grande paciência e resignação à vontade de Deus, embora a
interrupção de seus estudos fosse para ele um grande motivo de mortificação. A última
doença que teve durou apenas oito dias; mas ele fez mais e sofreu mais, por Jesus
Cristo, nessa única semana, do que em vários anos de sua vida, porque a dor que
suportava era muito grande e a virtude que praticava era mais difícil, a tal ponto que
todos se admiravam de como ele podia ainda assim pensar em Deus. A doença o
surpreendeu de repente no quarto domingo da quaresma. Era uma cólica muito violenta
que, ao final de alguns dias, se transformou numa inflamação do pulmão que bem cedo
apodreceu. É incrível quanto o sufocamento que tinha era grande e quanto a dor era
pungente. Com tudo isso, dava testemunho de uma extraordinária paciência e uma
notável serenidade de espírito. Quando lhe anunciaram a notícia de sua próxima morte,
mostrou que já estava inteiramente preparado, dizendo sem se perturbar: “Pois bem,
senhor Padre, que devo, portanto, fazer?”. Recebeu todos os sacramentos com uma
devoção e uma tranquilidade incomuns e teve a felicidade de lucrar o jubileu. Até quase
o último suspiro, permaneceu sempre na prática das virtudes que merecem o paraíso,
pois, vez por outra, lhes praticava os atos, no coração ou com os lábios, particularmente
quando alguém lhe falava sobre elas. Permaneceu em agonia muito pouco tempo. Deus
quis recompensá-lo dessa forma, em consideração aos combates que enfrentava pela
virtude da mortificação, enquanto estava com saúde.
Não poderia calar as pequenas circunstâncias observadas, antes e depois de sua
morte, que me parecem de bom auspício para este Irmão. Teve a felicidade: 1º, de beijar
devotamente a cruz imediatamente antes de entregar o seu espírito; 2º, de exalar o
último suspiro no exato momento em que concluíam a recomendação da alma, com
estas palavras: pervenire mereatur ad gloriam regni caelestis (mereça chegar à glória do
reino celeste); 3º, o último dia de sua vida foi o domingo da Paixão de N. S. e também
dia de São Francisco de Paula, cuja simplicidade e humildade ele imitara tão bem; 4º,
foi também o dia da abertura do jubileu; 5º, foi enterrado em frente ao crucifixo de

11
Martin Jamain entrara em São Lázaro no dia 08 de outubro de 1640, com a idade de 21 anos, fizera os votos a 10 de
outubro de 1642.
nossa igreja de São Lázaro; 6º, alguns dias antes de sua morte, predisse, contra o parecer
do médico, que ele não passaria do domingo.
Há grande motivo para se pensar que tudo isso não aconteceu por acaso, mas que
Deus assim o permitiu para melhor nos dar a conhecer o feliz estado desta bela alma.
Isso não impedirá, por favor, que lhe presteis os deveres de praxe, como fizestes para os
outros de nossa Companhia, e como já fizemos aqui. Acrescentamos a mais o canto de
um serviço religioso solene, no dia de seu enterro, na segunda-feira, três de abril. Deus
nos dê a graça de imitá-lo em suas virtudes, para acompanhá-lo um dia na glória que
desfruta!
Sou, no amor de Nosso Senhor e de sua Santa Mãe, senhor Padre, vosso muito
humilde e muito obediente servo,

Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Lambert, superior dos padres da Missão de


Richelieu, em Richelieu.

748. – AOS SENHORES...

São Lázaro, Paris, 20 de abril de 1645.

Senhores,

Não respondi às vossas últimas cartas com as quais tivestes a bondade de me


honrar, por causa da incerteza do desfecho de vossos negócios. Mas agora que
chegaram ao fim aqui, com vossa satisfação, e que a rainha mandou deduzir das rendas
do comboio de Bordéus a dos gabinetes de vossa eleição 1, pela sábia, inteligente e
vigilante conduta do senhor Bispo de Dax 2, resta-me apenas agradecer-vos pela honra
que tivestes a bondade de me fazer nessa ocasião. Além disso, quero dizer-vos que,
embora eu tenha procurado servir-vos nisto conforme vossa ordem, eu o fiz de modo
muito pouco inteligente e não tinha o crédito necessário para levar a bom termo o
negócio. O mérito e o reconhecimento se devem a Deus, à bondade da rainha e à do
referido senhor Bispo, que fizeram tudo.
Se se apresentar alguma outra ocasião de vos prestar algum outro serviço,
tratarei de fazê-lo com todo o afeto e diligência que me for possível. Sou, no amor de

.
Carta 748. – C. aut. – Original no Hospital Geral de Clermont-Ferrand.
11
Provavelmente a eleição de Lannes. O Cabido de Dax estava então preocupado por encontrar os recursos para
reparar a igreja catedral. A ruína deste edifício era tal que fora preciso interromper o serviço paroquial. Com a
intervenção de São Vicente, a rainha Ana d’Áustria tinha, pelo decreto de 07 de julho de 1644, mandado deduzir cada
ano, de 1645 a 1655, em toda extensão de Lannes, um imposto suplementar de 40.000 libras, para os reparos a fazer
no monumento. A partilha e o pagamento deste imposto numa região muito pobre, que as guerras da Fronda bem
cedo empobrecerão mais, passaram por muitas dificuldades, que o Santo não conseguiu desfazer completamente (Cf.
nossa História das catedrais de Dax no Boletim da sociedade de Borda, 1908, p. 88 e ss.).
22
Jacques Desclaux (1639-1658).
Nosso Senhor e de sua Santa Mãe, senhores, vosso muito humilde e muito obediente
servo,

Vicente Paulo, indigno padre da Missão.

749. – A JACQUES CHIROYE

Paris, 03 de maio de 1645.

Senhor Padre,

A graça de N. S. esteja sempre convosco!


Já vos escreveram de modo geral sobre as notícias da morte de nosso caro Padre
Robiche1, padre de nossa Congregação da casa de Marselha2. Mas não tivestes ainda
conhecimento talvez sobre particularidades de sua doença, de sua morte e de suas
virtudes, e gostaríeis sem dúvida em tomar conhecimento de alguma coisa a respeito,
para vossa consolação e para a edificação de vossa pequena comunidade. É o que me
obrigou a vos traçar ainda estas linhas, embora um pouco atrasado, porque não tive o
tempo de fazê-lo mais cedo.
Eis, portanto, uma parte do que soube de nossos missionários que trabalharam
com ele durante o último ano de sua vida e que o assistiram até o último suspiro e até o
túmulo.
Durante o tempo em que o bom operário de Jesus Cristo se aplicava com seus
coirmãos a catequizar, pregar, confessar e consolar nas galeras dos pobres forçados, em
especial aos que estavam muito doentes, Deus, querendo fazê-lo merecer mais para
recompensá-lo mais abundantemente, mandou-lhe uma febre com púrpuras, que se
apoderou dele na última Festa dos Reis e durou vinte e um dias, dos quais esteve livre
apenas quatro, durante os quais houve tempo para administrar-lhe os sacramentos,
estando ele com toda consciência possível. Ele edificava sobremodo a comunidade
porque, estando quase sempre em delírio ou em letargia, logo que lhe sugeriam fazer
atos de fé, de amor, de contrição e outros, voltava a si por pouco tempo e os fazia com
grande devoção. A resignação que ele tinha à vontade de Deus era admirável: dizia que
era bom estar neste estado e que era o melhor para ele, porque Deus o queria. Faziam
dele tudo que desejavam: colocava-se na posição que pediam, sem se queixar, nem
.
Carta 749. – C. as. – Dossiê de Turim, original. Esta carta foi enviada para todas as casas da Congregação da
Missão.
11
Luís Robiche, nascido em Reuil-la-Ferté (Seine-et-Marne), entrou como padre em São Lázaro a 31 de outubro de
1643, com a idade de 33 anos.
22
A Duquesa de Aiguillon tinha fundado a casa de Marselha, a 25 de julho de 1643, por uma generosa doação de
14.000 libras. O contrato passado nesse dia enumera as responsabilidades impostas aos quatro padres que o Santo
prometia enviar para esta cidade: direito de superioridade sobre os capelães, que podiam mudar livremente quando
julgassem oportuno; missão de cinco em cinco anos em cada uma das galeras de Marselha e nos outros portos do
reino; funções de capelão do hospital dos pobres galés da cidade; “além disso, quando o julgassem conveniente,
enviariam missionários para a Barbária a fim de consolar os pobres cristãos cativos e de os instruir na fé, no amor e
no temor de Deus” (Arq. Nac. S 6707). Ana d’Áustria, partilhando das intenções da Duquesa de Aiguillon, conferiu,
em caráter perpétuo, ao Superior Geral da Missão, por ato de 16 de janeiro de 1644, o título de Capelão Real das
galeras e lhe concedeu a faculdade de delegar seu poder e seus direitos.
recusar nada do que lhe apresentavam. Quase não cessava de falar, embora
confusamente entre os dentes, mas o seu discurso era sempre sobre as coisas de Deus ou
pelo menos tendentes a Deus. Dava testemunho de uma maravilhosa gratidão para com
sua divina bondade pelo fato de morrer na Companhia à qual frequentemente protestava
guardar fidelidade. Enfim, entregou sua bela alma ao criador, no instante em que
começavam o Subvenite Sancti (Vinde Santos), às palavras Occurrite Angeli (Acorrei
Anjos), porque acreditavam que ele já tinha expirado. Isto aconteceu no dia 27 de
janeiro último.
A caridade que exercera para com os pobres galés doentes conquistara de tal
modo os corações dos marselheses que, embora não houvesse intenção de realizar
grandes cerimônias em seu enterro e tivessem convidado apenas os amigos da casa,
acorreram, contudo, com tão grande afluência que houve temor de que os assoalhos
cedessem sob seus pés, de tal maneira que foram constrangidos a descer o corpo do
quarto onde estava para colocá-lo na capela da grande sala inferior, a fim de que todos
tivessem a satisfação de vê-lo. Ao vê-lo, levantavam os olhos e as mãos para o céu,
dizendo: “Oh! que bela alma! Oh! que bem-aventurado!”. E embora a sala fosse
bastante espaçosa e mais de cem pessoas pudessem vê-lo ao mesmo tempo, contudo
alguns se apinhavam nas janelas, outros subiam por escadas ou pedaços de pau que
encontrassem. Aconteceu, nessa ocasião, entre outras coisas, uma notável: um homem
de condição pegou uma almofada e a rasgou com os dentes para obter o sangue do
falecido com que estava manchada. Outros raspavam a cadeira na qual se assentara,
outros colhiam a cera que caía das velas; desse modo, se lhos tivessem permitido, teriam
levado e rasgado tudo aquilo que lhe servira, até mesmo quebrado as imagens que lá
estavam. Enfim, todos procuravam obter alguma coisa dele, para guardar como relíquia.
Ao descê-lo do quarto, todos se colocavam de joelhos e se apressavam em beijar-lhe os
pés. O rumor comum na cidade é que ele é um bem-aventurado; e vão procurar saber
com muita devoção do lugar onde foi enterrado, para lhe dirigirem preces.
Eis, senhor Padre, belos testemunhos de santidade. Entretanto dou mais
importância às virtudes por ele praticadas, particularmente depois de ter entrado na
Companhia, do que a tudo isso. Não me lembro de ter observado nele nenhum vício,
nem ouvido dizer que o tivesse. Ao contrário, enquanto viveu em nosso seminário de
São Lázaro, deu-nos sempre bons exemplos por sua humildade, bondade, caridade,
obediência e piedade. Conceda-nos Deus a graça de aproveitarmos deles! Estava com a
idade de trinta e cinco anos, tinha uma compleição extremamente forte de modo algum
sujeita a doenças, o que nos leva a pensar em nos manter atentos para comparecer diante
de Deus, uma vez que a vida é tão precária. É o fruto que desejo: possamos colher dessa
morte, feliz, sem dúvida, para ele e também para nós, que experimentaremos mais
eficazmente o efeito de suas orações. Como não podemos saber com toda certeza se ele
tem ou não necessidade das nossas (segredo reservado somente a Deus), peço-vos,
senhor Padre, cuidar para que cada um de nossos padres (se já não o fizestes), celebre
três missas para o repouso de sua alma e que nossos irmãos coadjutores recebam a
comunhão e recitem o rosário na mesma intenção. Cumprimos aqui para com ele os
mesmos deveres, embora tenhamos motivo de crer piedosamente que deles não tinha
necessidade alguma, pois que a voz do povo (que é a voz de Deus) o beatifica e que
morreu de certa maneira como mártir, expondo sua vida e perdendo-a no trabalho, por
amor de Jesus Cristo, na salvação corporal e espiritual dos pobres doentes, cuja doença
leva ordinariamente à morte e que sabia ser contagiosa.
Se eu tivesse tempo para vos expor detalhadamente as mortificações e os outros
atos heroicos de virtude praticados por dele, cujo relato ouvi dos nossos, em uma
conferência que fizemos sobre o assunto, poderíeis conhecer, ainda mais claramente do
que por tudo o que vos acabo de dizer, o feliz estado de sua alma. Não há dúvida, com
efeito, de que a marca mais autêntica de uma boa e santa morte é uma boa e santa vida,
tal como foi a deste homem apostólico, ao menos nos dois anos que tivemos a felicidade
de tê-lo em nossa Companhia.
Ó senhor Padre, como temos grande motivo de amar nossa vocação e de nos
tornar dignos dela, pois que em tão pouco tempo nela podemos viver e morrer
santamente! Deus nos dê esta graça!
Sou, no amor de Nosso Senhor e de sua Santa Mãe, vosso muito humilde e
muito obediente servo,

Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Chiroye, superior da Missão, em Luçon.

750 – A LUÍSA DE MARILLAC

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Diz o regulamento que a tesoureira prestará contas na igreja, na presença do
senhor Pároco e dos habitantes. Até o momento, não soubemos que a justiça tenha
querido tomar conhecimento delas. Parece-me que o senhor Tranchot dirá e fará melhor
do que ninguém o que for preciso fazer a respeito. Gostaria muito que tivésseis uma
carruagem para ir vê-lo e falar-lhe sobre isso, ou que vos désseis ao trabalho de escrever
à sua senhora.
O personagem veio aqui hoje e me disse que mandastes buscar o senhor Roche
ao qual dissestes que ele não ousaria sustentar o que afirma como fato. Ora, ele diz que
é verdade, mas que vós lhe dissestes ou fizestes coisas equivalentes. Disse-lhe que é
preciso pesar as mesmas coisas para emitir um sólido parecer e que não me falaria
jamais dessas coisas, porque eu não queria mais ouvir falar delas de modo algum.
Escrevi ao senhor seu irmão que ele volte atrás, porque, graças a Deus, nosso negócio
está concluido. E eu sou, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde e obediente
servo,


Carta 750. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
Vicente de Paulo.

751. – A UM PADRE DA MISSÃO

Importa por todos os modos evitar usar esta prática1 da qual o espírito maligno
poderia se servir para tentar ao que está vivo e até mesmo ao que está para morrer. O
diabo usa de todo recurso para atacar uma alma neste estado e o vigor do espírito pode
permanecer, embora o do corpo esteja debilitado. Lembrai-vos do exemplo daquele
santo que, estando doente, não quis que sua mulher o tocasse, depois de se terem
separado por mútuo consentimento, dizendo que ainda havia fogo sob as cinzas. De
resto, se quereis conhecer os sintomas de uma próxima separação da alma em relação ao
corpo, peça a algum cirurgião ou a alguma outra pessoa presente para vos prestar este
favor, havendo nisso menos perigo do que fazê-lo por vós mesmo. Podeis também pedir
ao médico informação sobre o que ele pensa. Mas, aconteça o que acontecer, importa
jamais tocar moça ou mulher, qualquer que seja o pretexto.

752. – NICOLAU PAVILLON, BISPO DE ALET, A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Temos lá agora o Padre de Bauregard, decano de nossa igreja catedral, que é


também Conselheiro do Parlamento de Tolosa e foi nomeado, pela Província de
Narbona, Agente
Geral do Clero. Escreveu-me que já teve a honra de estar convosco, mas acredita,
entretanto, que uma de minhas cartas lhe dará mais confiança e liberdade para se
aproximar de vós, quando os negócios de seu cargo de agente ou alguma outra ocasião
o obrigar a fazê-lo. Embora eu saiba que não lhe falte apoio mais poderoso do que
minha recomendação, não pude, entretanto, recusar-lho e o faço até mesmo com toda
afeição que me é possível. Ficar-vos-ei grato, senhor Padre, se lhe derdes a conhecer
que levastes em conta estas poucas linhas que vos dirijo em favor dele, como também
por crer que sou para sempre, senhor Padre, vosso muito humilde e muito obediente
servo,

Nicolau, Bispo de Alet.

De Alet, 24 de maio de 1645.


.
Carta 751. – Abelly, op. cit., 2ª ed., 2ª parte, p. 267.
11
O padre ao qual o Santo se dirige lhe perguntara se era permitido tomar o pulso de uma mulher doente para ver se
era tempo de lhe dar os últimos sacramentos ou de rezar as orações da recomendação da alma.

.
Carta 752. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, Superior Geral da Congregação dos
padres da Missão, em São Lázaro, Paris.

753. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Quinta-feira, [25 de maio de 16451].

Senhor Padre,

Suplico ao bom Deus fazer-me a graça de que minhas importunações não sejam
sobrecarga demasiada para vossa caridade, e vos peço perdão por todos os
aborrecimentos que vos ocasiono devido às minhas necessidades. Rogo-vos, pelo amor
de Deus, que me indiqueis uma ou várias intenções que me deva propor no retiro
mensal e concedei-me a graça de poder amanhã ouvir a santa missa que celebrareis,
para nela receber vossa bênção paternal. Tenho muito apreço a esta próxima grande
festa por causa de todas as insignes graças que nela Deus concedeu a sua Igreja e,
quanto a mim, pela graça que sua bondade me fez há vinte e dois anos, trazendo-me a
felicidade de ser dele, da forma como vossa caridade o sabe2. Sinto em meu interior não
sei que inclinação para unir-me, mais fortemente, a Deus; porém não sei como. Dizei,
por favor, meu muito honrado Pai, a vossa pobre filha e serva o que pensais, em nome
de Jesus, pelo qual somos o que somos diante de Deus. Espero muita ajuda de vossa
santas orações e rogo a vosso venerando Anjo da Guarda não vos deixeis esquecer
disso.

.
Carta 753. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Ver nota 2.
22
Em uma nota que acompanhava sua carta (Cartas de Luísa de Marillac, p. 186), a fundadora fala de uma “lei” que
Deus colocou em seu coração no dia de Pentecostes e “que jamais saiu dele”. Eis, conforme seus próprios escritos
(Arq. da Missão), o fato ao qual faz alusão: “No ano de 1623, dia de Santa Mônica, Deus me deu a graça de fazer
voto de viuvez, se Deus chamasse a si o meu marido. No dia da Ascensão, logo em seguida, tive um grande
abatimento de espírito, por causa da dúvida que eu tinha se devia deixar meu marido, como o desejava fortemente,
para recobrar meu primeiro voto e ter mais liberdade para servir a Deus e ao próximo. Duvidava ainda se o apego que
eu tinha ao meu diretor me impedia de procurar um outro, estando ele ausente por longo tempo, e temia ser a isso
obrigada. Experimentava ainda grande sofrimento com a dúvida sobre a imortalidade da alma. Isto me fez
permanecer, desde a Ascensão até Pentecostes, num sofrimento incrível. No dia de Pentecostes, assistindo à santa
missa ou fazendo a oração na igreja, de repente, meu espírito foi iluminado em suas dúvidas, e fui avisada de que eu
deveria ficar com meu marido e viria um dia em que eu estaria em condição de fazer voto de pobreza, castidade e
obediência, e que isso aconteceria numa pequena comunidade em que algumas outras pessoas fariam o mesmo.
Entendia então que estaria num lugar para servir o próximo, mas não podia compreender como isso se faria, pois que
isso deveria acarretar o ir e vir. Fiquei então certa de que devia permanecer em paz quanto ao meu diretor e que Deus
me enviaria um, que ele me fez ver nessa ocasião, parece-me. Senti repugnância em aceitá-lo. Contudo eu o aceitei.
Parecia-me que ainda não era para realizar essa mudança. Fiquei livre do meu terceiro sofrimento com a certeza que
senti em meu espírito de que era Deus que me inspirava o que disse anteriormente e que, por Deus, não deveria
duvidar do resto. Sempre acreditei ter recebido esta graça do bem-aventurado Bispo de Genebra, por ter, antes de sua
morte, desejado muitíssimo comunicar-lhe esses sofrimentos, e ao depois ter sentido com isso um grande fervor
interior e recebido por este meio muitas graças; e nesse tempo tive algum motivo para acreditar nisso, do qual agora
não me lembro”.
L. de M.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

754. – GASPAR DE SIMIANE DE LA COSTE A SÃO VICENTE

Marselha, 1645.

Eu vos escrevo para vos informar sobre o progresso do hospital, com cujo
estabelecimento tanto contribuistes1. Soubestes por minha última carta como, depois de
muita resistência, com a ajuda de Nosso Senhor, nos confiaram os doentes das galeras.
Sem dúvida, não vos poderia exprimir a alegria que sentem esses pobres forçados ao se
verem transportados desse inferno para o hospital, a que chamam de um paraíso.
Somente com a entrada ficam curados da metade dos seus males, pois que os aliviam
dos vermes de que chegam cobertos, lavam-lhes os pés, e em seguida, os levam para um
leito um pouco mais macio do que a madeira sobre a qual estavam acostumados a se
deitar. Ficam todos admirados de se verem colocados em um leito, servidos e tratados
com um pouco mais de caridade do que nas galeras, para onde reenviamos grande
número de convalescentes que lá teriam morrido. Com toda certeza, senhor Padre,
podemos dizer que Deus abençoou esta obra, o que transparece não somente na
conversão de maus cristãos, mas também na de turcos que solicitam o santo batismo.

.
Carta 754. – Abelly, op. cit., 1. I, cap. XXVIII, 1ª ed., p. 130.
Este fragmento de carta se encontra todo inteiro em uma carta dirigida a 30 de maio de 1645 pelo cavaleiro
de la Coste ao senhor de Montmaur, Conselheiro do rei (Cf. A Companhia do Santíssimo Sacramento do Altar em
Marselha. Documentos publicados por Raoul Allier, Paris, 1909, in-8, p. 198). Ter-se-ia Abelly enganado sobre o
destinatário ou o cavaleiro de la Coste teria escrito nos mesmos termos ao Senhor de Montmaur e a São Vicente?
Raoul Allier prefere a primeira hipótese (ibidem, p. 199, nota 2); a segunda parece mais verossímil, pois o que diz
aqui o cavaleiro se aplica muito bem a São Vicente.
Gaspar de Simiane de la Coste, nascido em Aix em 1607, fora reconduzido a Deus em consequência da
morte prematura de uma pessoa que ele amava. Veio a Paris, estudou a arte da controvérsia com o Padre Véron e
tornou-se amigo de São Vicente de Paulo que despertou em seu coração o amor aos pobres infelizes, de modo
particular para com os pobres galés. Deve-se sobretudo a ele, a São Vicente de Paulo e a Dom Gault, Bispo de
Marselha, a fundação do hospital dos forçados, nessa cidade. Criou também a Obra das Mulheres Boêmias, em favor
das mulheres que acompanhavam as Galeras, seja para não abandonarem seus maridos, seja por outras razões menos
dignas. O piedoso cavaleiro se imbuiu plenamente das máximas de São Vicente. Conformava sua vida, o quanto lhe
era possível, à regra dos missionários: levantar-se às 4h da manhã, uma hora de oração, leitura de um capítulo do
Novo Testamento, de joelhos, de cabeça descoberta, meia hora de leitura espiritual, visita ao Santíssimo Sacramento,
antes de depois das saídas, retiro mensal, retiro anual de oito dias. Seu tempo em grande parte era tomado pelos galés
do hospital, aos quais se comprazia em ministrar algum consolo e seus desvelos. Os missionários não tinham auxiliar
melhor. Morreu de peste a 24 de julho de 1649, vítima de seu devotamento, em circunstâncias que relataremos
depois. O Senhor de Ruffi publicou sua vida em 1659 (Vida do Senhor Cavaleiro de la Coste, Aix, in-8º).
11
Os biógrafos de João Batista Gault, Bispo de Marselha (Marchetty, op. cit., p. 206), e do cavaleiro de la Coste
(Ruffi, op. cit., p. 123) remontam o hospital dos forçados ao ano de 1618, numa época em que Felipe Emanuel de
Gondi era General das Galeras, e São Vicente seu conselheiro muito ouvido. Por falta de meios, sem dúvida, o
estabelecimento permaneceu inacabado. João Batista Gault retomou o projeto, interessou nele o cavaleiro de la Coste,
São Vicente, a Duquesa de Aiguillon e outros personagens influentes e morreu sem ter nada começado. O cavaleiro
de la Coste se consagrou a essa obra e teve a alegria de vê-la terminada, graças aos mesmos interessados.
755. – AO CONDE DE BRIENNE

São Lázaro, 02 de junho de 1645.

O Conselho dos assuntos religiosos roga ao senhor de Brienne por seu servo
Vicente escrever ao senhor Conde de Alais 1, ao Parlamento e aos Cônsules da cidade de
Aix, na Provença, que mandem cessar as ações escandalosas e ofensivas a Deus e às
pessoas de bem, que se praticam, desde algum tempo, na procissão da Festa do Corpo
de Deus, em Aix, cuja prática infeliz havia sido supressa, há alguns anos, por ordem do
falecido rei, e recomeçou ano passado2.

Vicente de Paulo, indigno Superior dos padres da Missão.

Destinatário: Ao senhor Conde de Brienne.

756. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Sábado, véspera de Pentecostes [03 de junho de 16451].

Senhor Padre,

Rogo ao bom Deus que o remédio vos tenha encontrado em estado de poder
fazer efeito sobre vossa saúde, mas receio tenha sido por demais prematuro. Desde
alguns dias, venho pensando em vos propor que tomeis os caldos. Creio que vos farão
muito bem. Se o permitirdes, poderíamos levá-lo a partir de amanhã. Tomei-os esta
semana e senti notável melhora.
Não posso esperar mais tempo, meu muito honrado Pai, para dizer-vos como
passei esses dias de retiro. Penso que Deus não quer que eu desfrute plenamente dessa
suavidade. Desde ontem tenho andado bem distraída por causa de uma de nossas
doentes que recebeu a Unção dos Enfermos. É uma Irmã que estava em São
Bartolomeu, filha de um comerciante de Tours, chamada Catarina de Gesse. Outra
doente, e essa de espírito, não cessa de reclamar que pediu para vos ver e nós não vos
avisamos. Tentaremos resolver este embaraço depois destas festas, se Deus quiser.

.
Carta 755. – C. aut. – Bibl. Nac., coleção Clairembault, vol. 399, p. 9443, original.
11
Luís Emanuel de Valois, falecido sem deixar posteridade a 13 de novembro de 1653.
22
A procissão do corpo de Deus era acompanhada em Aix por representações alegóricas que nada tinham de piedoso
ou mesmo decente. Nela se viam jovens rapazes, disfarçados de Cupido e de demônios, se permitirem liberdades
realmente excessivas, para melhor cumprir seu papel, que consistia em simbolizar os pecados capitais. Encontram-se
informações interessantes sobre essa questão em Joseph de Haitze, Espírito do Ceremonial de Aix na celebração da
Festa do Corpo de Deus, 1708, e em Gregório Gaspard, Explicação das Ceremônias da Festa do Corpo de Deus de
Aix, na Provença, Aix, 1777, in-12. A Companhia do Santíssimo Sacramento de Marselha teve de lutar contra tais
abusos (Raoul Allier, A Companhia do Santíssimo Sacramento do Altar, em Marselha, Paris, 1909, in-8º).
.
Carta 756. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Data acrescentada no dorso do original.
E, quanto a mim, meu caríssimo Pai, que farei amanhã? Comungarei sem vos
declarar todas as maldades que descobri no meu exame? Ah! Meu Deus! Como tenho
motivos para reconhecer e confessar que nada faço que valha a pena! Entretanto, meu
coração não se enche de amargura, embora tenha motivos para temer que a
misericórdia de Deus se canse de exercer numa pessoa que lhe desagrada sempre.
Hoje é aniversário do desabamento do assoalho de nossa casa e, amanhã, o do
dia em que nosso bom Deus fez-me conhecer sua vontade e em muito desejaria que seu
santo amor fosse, para meu coração, sua lei eterna. Vede, meu muito honrado Pai, de
que necessito para isso e se vossa caridade pode dizer-me alguma palavra que me
ajude. Tende também a bondade de informar-me se amanhã, em algumas de minhas
meditações, tomarei como assunto o evangelho do dia, ou a descida do Espírito Santo,
ou se dedico a esse tema todas as meditações do dia.
Peço-vos perdão por vos ser tão importuna, ainda que me pareça que nisso faço
a vontade de Deus, na qual sou, senhor Padre, vossa muito grata filha e muito
obediente serva,

L. de Marillac.

Sábado.

Recomendo às vossas orações o meu filho, por amor de Deus. Ocorreu-me


perguntar se ele tem em seu quarto um crucifixo grande.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

757. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Hoje, quinta-feira, [antes de 16501].

Senhor Padre,

Humildemente vos rogo, pelo amor de Deus, me concedais a honra de vos falar
nesta manhã, pois preciso dar uma resposta urgente a meu filho que virá procurar-me
hoje, por que ontem não lha quis dar.
Se vossos afazeres vos obrigarem a sair de casa antes que eu chegue, tende a
bondade de passar por aqui. Se tomo a liberdade de fazer-vos semelhante pedido é por
causa da urgente necessidade que tenho. Sou no amor de Jesus crucificado, senhor
Padre, vossa muito humilde e mui grata filha e serva,

L. de M.

.
1
Carta 757. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
1
Depois de 1649, Luísa de Marillac teria escrito “Meu muito honrado Pai” e não “ Senhor Padre”.
Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

758. – A MADRE MARIA INÊS CHEVALLIER1

Paris, 25 de junho de 1650.

Minha Reverenda e mui cara Madre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Não vos posso agradecer com a ternura que desejaria por tanta bondade e
cordialidade que nos demonstrais na pessoa do Padre Gallais 2. Ó minha Madre, como
vos agradeço com toda ternura e vos suplico igualmente continuar para conosco a
mesma bondade e aceitar o reconhecimento que vos manifesto!
Envio ao Padre Gallais as cartas patentes exigidas para os nossos negócios, e a
vós, minha cara Madre, o meu coração, no de Nosso Senhor, como também a vossa
santa comunidade, que peço a Deus santifique cada vez mais. Sou, no amor do mesmo
Senhor e no de sua Santa Mãe, minha Reverenda Madre, vosso muito humilde e muito
obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatária: A minha Reverenda Madre Superiora da Visitação de Santa Maria


de Mans, em Mans.

759. – A JEAN DEHORGNY, SUPERIOR, EM ROMA

30 de junho de 1645.

.
Carta 758. – Dossiê da Missão, cópia tirada do original em poder do senhor Padre de Saint-Rémy, diretor do asilo
dos alienados, em Mans.
11
Superiora da Visitação de Mans (21 de maio de 1643 a 27 de maio de 1646), anteriormente professa do primeiro
mosteiro de Paris.
22
O Padre Gallais fora a Mans tomar posse do cargo de prepósito e da direção da igreja colegial e real de Notre-
Dame de Coëffort, cedida à Congregação da Missão a 26 de janeiro de 1645, pelo prepósito Martin Lucas, principal
administrador do Hospital Geral da cidade de Mans, tanto em seu nome quanto em nome de seus coirmãos. Este
último colocava como condição que ele gozaria, durante a sua vida, dos frutos e da renda do Priorado, que remontava
à soma de 2.400 libras, que seus coirmãos receberiam suas pensões ordinárias, que padres da Missão seriam enviados
para lá em número suficiente, celebrariam nela o ofício divino, assumiriam as missas e os óbitos da fundação e se
dedicariam ao trabalho das missões. O rei, a quem pertencia a nomeação para o cargo prepósito, tinha, pelas cartas
patentes de fevereiro de 1645, renunciado ao seu direito de lhe dar provisão e aprovado a concordata. Emmeric-Marc
de la Ferté, Bispo de Mans, emitiu o decreto de união a 18 de novembro de 1645 e nele acrescentou o direito de
apresentar e de nomear, para as paróquias de Montbizot e da Maison-Dieu, com o compromisso, para os padres da
Missão, de arcar com todas as fundações e outras obrigações do priorado, de cumprir as funções de capelães do
grande Hospital Geral de Mans e de receber os ordinandos e os seminaristas que lhe fossem enviados.

.
Carta 759. – Reg. 2, p. 227.
Esta semana veio-me ao espírito alguma luz sobre os meios possíveis para
introduzir a piedade nos espíritos daqueles que devem um dia compor aquela corte.
Confesso-vos que a proposta que me fizeram da instrução dos meninos me passou pela
mente como o único meio. Mas há tantas coisas a dizer a respeito disso que é preciso
nada fazer, se a Providência a isso não nos coagir.

760. – A JEAN DEHORNY

Paris, 06 de julho de 1645.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Envio-vos um relato da irregularidade de dois padres que foram surpreendidos
neste estado durante o retiro, e vos suplico, senhor Padre, obter-lhes a dispensa e no-las
enviar quanto antes. Permanecem, entretanto, conosco no seminário do Colégio dos
Bons-Enfants.
Vossa carta de 12 do mês passado me fala de uma procuração geral para
comprar uma casa. Esqueci-me de redigi-la. Além disso, não temos condição para isso.
Comunicai-me se tiverdes no presente alguma ocasião propícia.
Estou pensando no que dizeis a respeito do Reverendo Padre da Babilônia 1.
Veremos.
O Padre Dufestel está passando mal do pulmão e é obrigado a sair de Marselha.
Encontro-me na dificuldade de mandar alguém para substituí-lo. Não temos ninguém
nem mais preparado, nem mais à disposição do que o Padre Guérin 2. Em seu lugar estou
pedindo ao Padre Dufestel para ir para Annecy.
Não estou com bastante clareza a respeito do projeto do Padre Codoing. É
preciso esperar com paciência.
O Padre Coglée3 parece necessário em Marselha, onde se recuperou de sua
indisposição.

.
Carta 760. – Coleção do processo de beatificação.
11
O Padre Bernardo de Santa Teresa.
22
Superior do seminário de Annecy.
33
Marcos Coglée, nascido em Carrick (Irlanda) a 25 de abril de 1614, ordenado padre a 30 de maio de 1643, foi
recebido na Congregação da Missão a 24 de julho do mesmo ano. Acabava de ser enviado para Marselha, onde
permaneceu até 1646. Num momento de perturbação e desânimo, teve a felicidade de encontrar Geraldo Brin, seu
compatriota, que o reteve na Companhia. Depois de lhe ter dado um tempo para se firmar um pouco com alguns dias
passados no Seminário Interno, o Santo o colocou em Sedan (1646). Marcos Coglée fez os votos nessa cidade a 13 de
dezembro de 1649 e foi nomeado, no ano seguinte, pároco da paróquia e superior do estabelecimento. Substituído em
1654 por Jean Martin, retomou as mesmas funções em 1655, permanecendo nelas por um ano. Ocupou, durante
alguns meses, em 1659, a direção do seminário de Annecy, que ele deixou para retornar a São Lázaro.
Disse-vos o meu pensamento sobre o Irmão Berthe 4, com relação ao referido
senhor.
Fiquei satisfeito com o que me dissestes, parece-me, que o R. P. Léon 5 deve ir
passar alguns dias convosco. Se ele estiver ainda em Roma eu o abraço com todo afeto
do meu coração, como faço também em relação ao bom Padre de Montheron, prostrado
em espírito aos pés de um e de outro.
Quanto ao que me dizeis sobre a dificuldade de atribuir benefícios a crianças,
trata-se de uma determinação feita, estando no Conselho dos assuntos eclesiásticos os
senhores Bispos de Lisieux6 e de Beauvais7, por razões que podeis imaginar e pelo
aludido motivo de que se trata de descartar, entre dois males, o pior, ou seja, a
confidência e a inutilidade da infância8. Seria isso bom se houvesse apenas homens
casados e com filhos a solicitar benefícios. Mas o número desses não chega talvez a um
terço, pois todos os que pedem benefícios não são casados, e todos os que são casados
não têm filhos, e os que os têm não estão determinados a engajá-los no estado
eclesiástico, assumindo entrementes o benefício. Houve dificuldades para a observância
desta determinação. Para muitos, é violência romper com ela. Mas eis que, com a graça
de Deus, começam a se habituar com isso. O senhor de Chavigny 9 perdeu seu segundo
filho, encarregado de duas boas abadias. Os familiares as pediram para o seu terceiro
filho, que tem apenas cinco ou seis anos. Tendo Deus me dado força para me manter
firme, ele veio encontrar-me para me dizer que longe de levar a mal que eu tenha
insistido em me opor, ao contrário, se eu tivesse atendido ao desejo da madame sua
mãe, que eu o teria escandalizado, que ele conceberia desprezo a meu respeito e não o
teria aceitado. É do próprio senhor de Chavigny que vos falo. Seja isto dito ao pé do
ouvido do vosso coração. Não sei por que me deixei levar a vos dizer tanta coisa sobre
isso.
Vede nossas pequenas notícias. Deus dispôs do Padre de Vincy. Partiu deste
mundo não somente em paz, mas também com alegria. Quis que o recebêssemos na
Companhia quatro horas antes de morrer, conforme a inspiração que tivera, segundo me
disse. Do mesmo modo o sepultamos. Eu o recomendo a vossas orações.
44
Tomás Berthe, de Donchéry (Ardennes), foi recebido na Congregação da Missão a 26 de novembro de 1640, com a
idade de 18 anos, e pronunciou os santos votos a 08 de dezembro de 1645. Ordenado padre em 1646, foi enviado para
Sedan. Persuadido de que ia para esta cidade na qualidade de superior, sentiu-se humilhado por ver que lhe
confiavam um ofício inferior e se retirou para sua família. Retornou bem cedo a melhores sentimentos, e São Vicente,
que lhe conhecia as virtudes e lhe apreciava os talentos, o recebeu com alegria. Tomás Berthe prestou grandes
serviços à Companhia nos ofícios importantes que lhe foram confiados. De 1649 a 1650, foi superior do Seminário
dos Bons-Enfants, de 1653 a 1655, superior da casa de Roma; em 1660, foi secretário da Congregação, de 1661 a
1667, assistente do Superior Geral, de 1668 a 1671, superior da nova casa de Lyon, de 1673 a 1682 e de 1687 a 1689,
superior do Seminário São Carlos, de 1682 a 1685, superior em Richelieu. Em outubro de 1659, São Vicente julgava
que, entre os seus missionários, ninguém era mais apto para substituí-lo à frente da Congregação do que Renê
Alméras ou Tomás Berthe. Foram os dois nomes que ele propôs antecipadamente por escrito à Assembleia Geral que
devia escolher seu sucessor. Tomás Berthe morreu em 1697. Houve entre ele e Edme Jolly, então Superior Geral,
alguns atritos que lançaram sombra sobre seus últimos anos (Cf. Notices, t. II, pp. 247-313).
55
Da Ordem dos Carmelitas mitigados.
66
Felipe Cospéan.
77
Agostinho Potier.
88
“Inutilidade da infância”: está assim no original francês, obscuro para o tradutor.(N. do T.).
99
Léon Le Bouthillier, Conde de Chavigny, Secretário de Estado. Ana Phelippeaux, dama de Busançois, sua esposa,
lhe deu seis filhos e oito filhas, entre os quais muitos morreram jovens ou se fizeram religiosos. Um deles, Francisco,
tornou-se Bispo de Rennes e de Troyes. Os dois filhos de que se trata aqui eram Nicolau, nascido a 06 de setembro de
1633, e Urbano, nascido a 27 de novembro de 1639.
O Padre Lambert entrou no seminário1010, no qual é um notável exemplo (de
edificação).
Enviamos o Padre Gallais a Mans para tomar posse de nosso
estabelecimento1111.
O Padre Portail vai fazer um retiro de sete ou oito dias e, depois disso, o
mandaremos partir para fazer a visita que fazia o Padre Lambert. Ele precisa de um
retiro espiritual. Talvez irá ter convosco. Mandaremos o Padre Lambert ocupar-lhe o
cargo de assistente, se vós e os outros a quem escreverei sobre isso, conforme nossa
regra, não fordes de parecer contrário.
Começamos o seminário dos eclesiásticos, que celebram a santa missa em
Notre-Dame1212. Já há cerca de vinte nos Bons-Enfants, desde há sete ou oito dias.
Enviamos para lá o Padre Gilles e o Padre Beaumont 1313 para assistirem às aulas e
chamamos de volta para aqui o Irmão Damiens, que encanta os seminaristas. Quanto
aos ordinandos, será necessário transferi-los para aqui, onde vamos começar um edifício
no lugar da pequena enfermaria1414. Madame Duquesa de Aiguillon foi quem doou as
10.000 libras para isso. Estamos cercando nossas terras com muros.
Embora sempre com incômodo, minha carta é mais longa, porque estou de cama,
hoje, por causa de uma enfermidade no pé. Eis o que vos posso dizer no presente.
Abraço vossa pequena comunidade, prostrado em espírito aos seus e aos vossos pés e
sou, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Suplico-vos, em nome de Nosso Senhor, fazer todo o possível pela dispensa do


Senhor Le Gras. Sua bondosa mãe está totalmente decidida a isso e parece que não vai
mudar a sua determinação1515.

1010
No Seminário Interno de São Lázaro
1111
Tomara posse a 30 de junho.
1212
Depois de uma fundação feita por Richelieu, doze clérigos se juntaram, em 1642, aos jovens seminaristas que
faziam humanidades. Em 1645, desolado por ver numerosos padres vivendo em Paris, em locais onde sua virtude
ficava gravemente exposta, celebrando sem devoção e sem atenção às rubricas, passando de igreja em igreja,
mendigando honorários de missas e pedindo, publicamente, esmola, São Vicente arrumou um local na extremidade
do recinto de São Lázaro, num edifício que tomou nome de Seminário São Carlos, e alojou nele os seminaristas que
faziam as humanidades e recebeu em seu lugar, no Colégio dos Bons-Enfants, uns quarenta eclesiásticos. Seus
honorários de missas deviam servir para cobrir os gastos de alimentação. Combinou-se com o Cabido que todos eles
iriam, em hora marcada, celebrar a missa em Notre-Dame. O Santo só teve que se felicitar com esta nova obra, que
deu bons padres à Igreja (Collet, op. cit., t. I, p. 411 e seguintes).
1313
Pierre de Beaumont, nascido em Puiseaux (Loiret) a 24 de fevereiro de 1617, entrou na Congregação a 23 de
fevereiro de 1641, fez os votos a 04 de outubro de 1643 e foi ordenado padre em março de 1644. Foi preso na ocasião
do processo relativo ao estabelecimento de Saint-Méen. Tornou-se diretor do Seminário Interno de Richelieu e
depois, por duas vezes, superior da casa (1656-1660, 1661-1662).
1414
O novo edifício tinha aproximadamente vinte e três metros de comprimento e nove metros de largura. Com seus
quatro andares, oferecia lugar suficiente para os ordinandos (Arq. Nac. M 212, março nº 7).
1515
Ignoramos de que dispensa precisava Michel Le Gras. Tudo que sabemos é que essa dispensa foi muito difícil de
se obter e que as diligências continuaram durante vários anos. Pediu-se a intervenção do rei, que enviou ordens a seu
embaixador. Este último, depois de ter falado da questão com o próprio Soberano Pontífice, sem êxito, procurou
apoio dos cardeais mais influentes. Em 1648 nada ainda se tinha feito. Sobre este assunto existe, no Berço de São
Vicente de Paulo, duas interessantes cartas de Renê Alméras a Santa Luísa de Marillac, uma de 23 de março de 1648,
a outra de 21 de junho de 1649. Pensamos que se trata de uma dispensa em vista de um casamento. Mas qual era
então a natureza do impedimento para encontrar tantos obstáculos, apesar de tão altas intervenções?
Destinatário: Ao senhor Padre Dehorgny, Superior dos padres da Missão, em
Roma.

761. – NICOLAU PAVILLON, BISPO DE ALET, A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Tendo-vos a divina Providência chamado, para a sua maior glória, para o


cuidado dos negócios eclesiásticos mais importantes desse reino e vos tendo inspirado,
desde longo tempo, um tão grande zelo no sentido de procurar, nas devidas ocasiões, a
reforma da organização e da disciplina da Igreja, tomei a confiança de vos dirigir um
pequeno relatório das principais e mais frequentes desordens que a perturbam e lhe
causam relaxamento, notavelmente por essas bandas. Tive o pensamento, desde que
tomei conhecimento delas, há alguns anos, de vos comunicá-las. O que me fez,
entretanto, adiá-lo até o presente foi por ter julgado que o tempo mais adequado para
remediá-las seria o da reunião da Assembleia do Clero, cujos principais e mais dignos
ofícios são os de redigir esses tipos de regulamentações e de empreender os meios mais
eficazes para a sua execução. Examiná-lo-eis portanto, por obséquio, e vereis o que
será possível, pois sei que tudo que é de se desejar, nem sempre se pode esperar. Não
expus muitas outras necessidades, embora urgentes, tanto porque são bastante
conhecidas, quanto porque duvidei se o tempo e o estado dos negócios admitiria tal
proposta. E mesmo deste pouco que eu soube, julgareis talvez não se deva falar no
momento, o que submeto inteiramente a vossa prudência. No caso de se dever propor
algum artigo, penso não ser conveniente se saiba que nele tive alguma parte, por várias
razões que podereis imaginar, pois não me manifestei, a esse respeito, a pessoa
alguma, a não ser a vós.
Suplico-vos, senhor Padre, escusar-me pela liberdade que ouso continuar a ter
convosco, sem violar o respeito que vos devo e que terei sempre, senhor Padre, como
vosso muito humilde, muito obediente e muito grato servo,

Nicolau, Bispo de Alet.

Alet, 12 de julho de 1645.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, Superior Geral da Congregação dos


padres da Missão, em São Lázaro.

762. – A UM PADRE DA MISSÃO


.
Carta 761. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
.
Carta 762. – Manuscrito de Lyon.
[Julho de 16451].

Peço-vos recomendar a alma do falecido Padre de Vincy, que morreu


piedosamente depois de ter sido recebido na Companhia, conforme a inspiração que me
disse, duas ou três horas antes de morrer, ter-lhe dado Nosso Senhor.

763. – A GUILHERME GALLAIS, PADRE DA MISSÃO, EM MANS

14 de julho de 1645.

O senhor Padre... está com boa vontade. Penso ser bom lhe deis ocupação,
temendo que, ao procurá-la por si mesmo, não venha a alterar suas boas disposições.
Alguns espíritos são como mós girantes sem trigo, que se inflamam e queimam o
moinho.
Peço-vos de novo escrever-me, a mim somente, sobre vossas pequenas
dificuldades, e jamais a pessoa alguma de fora, que venha alterar e estragar totalmente a
vida interna, quando se lhe revelam as próprias dificuldades. Não quero dizer com isto
que eu o tema da parte daquele a quem fizestes vossas pequenas reclamações, até o
presente. Mas não posso ocultar-vos nem o fato de que aquele que manifesta de tal
maneira suas fraquezas fora da comunidade expõe ao desprezo a própria pessoa que o
faz e toda a Companhia em geral, nem a fuxicaria que isso poderia render. Em nome de
Deus, senhor Padre, prestai atenção nisso e não tenhais medo de vos queixar comigo de
mim mesmo. Vereis que, com a graça de Deus, farei bom uso disso.

764. – AO PARLAMENTO

[16 de julho de 16451].

Os padres da Congregação da Missão, estabelecidos em São Lázaro, Paris,


afirmando ter a permissão do rei, por cartas patentes de 23 de junho de 1645, dirigidas a
vós, Excelências, pedem licença de vender ou mandar cortar quarenta hectares de mata
de 120 a 200 anos, muito velha, fazendo parte da quinta de Rougemont 2, situada na

11
Data da morte do Padre de Vincy.
.
Carta 763. – Reg. 2, p. 261.
.
Carta 764. – C. aut. – O original pertence ao senhor Cônego Loevenbruck, pároco da paróquia Saint-Vincent-de-
Paul em Nancy.
11
Data colocada no dorso da requisição.
22
Quinta dependente do priorado de São Lázaro.
paróquia de Sevran3, ligada à mata de Livry4, pela razão de que a maior parte da citada
mata é velha e mirrada, não serve mais e impede a boa mata de corte de crescer.
Pretendem, com a devida licença, empregar uma parte do dinheiro obtido da venda nas
cercas e tapumes que mandam fazer em torno das terras que possuem atrás de São
Lázaro5, por causa do grande estrago que o público faz nelas, indo e vindo, como
também roubando o trigo amadurecido 6. Usarão a outra parte para cercar uma casa no
bairro chamado Saint-Martin, alienada por seus proprietários anteriores, ou para
comprar uma granja que lhes interessa, na paróquia de Saclay 7. Tudo isso será vantajoso
para a referida casa de São Lázaro.
Posto isto, Excelências, apraza-vos mandar registrar as citadas cartas no cartório
de vossa referida corte, para que os referidos suplicantes possam usufruir dos seus
efeitos.

Vicente de Paulo, Superior da Congregação da Missão.

765. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Ontem, esqueci-me de dizer-vos que Madame Chavenas quer que as nossas


Irmãs de Saint-Gervais percebam os cinco soldos que as Damas, que se encarregam de
preparar a comida para os pobres, davam como salário à mulher que a levava, antes
da chegada das Irmãs. Ela acha que o pedaço de carne de vaca que colocam na panela
para a mesma mulher seja também para as Irmãs, assim como os dois pães. Entretanto,
tudo acaba revertendo em proveito dos pobres, porque todos os dias a citada Dama
toma das Irmãs os cinco soldos e o resto dá aos pobres. Isto magoa as Irmãs, pois as
Damas lhes perguntam se são remuneradas e Madame Chavenas não quer que elas
digam que entregam a ela, de volta, esse dinheiro. Peço-vos muito humildemente,
senhor Padre, me aconselheis como devo orientá-las, porque a Madame Chavenas me
havia dado esperança de que as coisas não continuariam assim.
33
Hoje pequena comuna de Seine-et-Oise.
44
Em Seine-et-Oise.
55
Estas cercas e tapumes existiam outrora. Foram derrubadas durante as guerras civis. Embora o Santo tivesse
começado a reconstruí-las depois de uma autorização régia, concedida a 20 de fevereiro de 1644, teve de despachar
os operários diante da oposição de Cadet, guarda das reservas de caça do Rei. Uma nova requisição, apresentada a 16
de junho de 1645, para obter o registro das cartas patentes, recebeu resposta favorável de Gabriel de Rochechouart,
juiz de la Varenne do Louvre, a 06 de julho, graças ao apoio da Rainha regente. Houve a permissão de retomar os
trabalhos interrompidos, com a condição de não deixar “buraco algum embaixo dos muros e dos tapumes, pelos quais
as lebres da planície pudessem entrar, nem permitir que no interior do referido recinto seja colocada nenhuma
armadilha nem outros instrumentos de caça, para capturar perdizes e perdigotos que pudessem nele se infiltrar”. (Arq.
Nac. S 6698, reg. fº 49).
66
Já antes de 20 de fevereiro de 1644, São Vicente se tinha queixado dos gatunos que se introduziam durante a noite
na propriedade de São Lázaro, munidos de sacos, no tempo da colheita, cortavam e levavam a terça parte das espigas
(Arq. Nac. S 6698, reg. fº 49). É provável que tinham recomeçado suas rapinas.
77
A quinta de Orsigny. Tinha sido comprada, mas não inteiramente paga.

.
Carta 765. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
Estou também sem saber se devemos deixar a Irmã Jaqueline em Saint-Jacques
ou chamá-la para aqui. É aquela que estava em Saint-Leu. Precisava falar-vos de todas
essas dificuldades, porém não me atrevo a pedir para conversar pessoalmente
convosco, pois não sei se estais de acordo. Ambos os assuntos são urgentes. Quanta
necessidade tenho de que vossa caridade se exerça sobre minha miséria, não podendo
eu ter outra ajuda senão a da direção que me deu a vontade de Deus, na qual sou,
senhor Padre, vossa muito indigna filha e mui grata serva,

L. de M.
Suplico-vos muito humildemente ter a bondade de me avisar se vossa caridade
entregou dinheiro a meu filho e se devo ir ao Filles-Dieu1 esta manhã para um serviço
ao qual Madame de Verthamon2 me lembrou que eu fosse, em favor de uma de suas tias,
caso possa servir-me de sua carruagem.

19 de julho de [16453].

766. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Julguei que deveria enviar-vos esta carta para que tenhais a bondade de lê-la.
Muito me admira que seja a mãe quem a tenha mandado escrever, pois já lhe havia
falado dos poucos meios que tenho para manter a casa e da incerteza de que isso
servisse para alguma coisa. Não que ela morando lá, eu não queira contribuir e
procurar o seu maior bem, por todos os meios que me fossem possíveis.
Sei que a maior parte das jovens que lá estão nada pagam. Se é verdade o que
ela disse, poderia ter um dote bastante bom para uma moça de sua classe, mesmo se
reduzido à metade do que afirmou possuir em sua terra natal. Penso que essas boas
Religiosas deram crédito exagerado às razões que ela lhes disse ter para conseguir, em
justiça, o que pretende.
Peço-vos humildemente perdão, senhor Padre, por importunar-vos com isso.
Minha intenção é dar-vos a conhecer a situação deste assunto tão aborrecido, para
quando vossa caridade tiver a bondade de estar com essas boas religiosas, pois dizem
ter grande necessidade de vos falar.
Queira a divina bondade aumentar-vos as forças, na proporção dos trabalhos
com que todo mundo vos sobrecarrega. Em meio a tudo isso, fazei-me a caridade de
considerar, diante de Deus, as minhas necessidades e de lhe recomendá-las, pois é a

11
Convento de moças penitentes.
22
Maria Boucher de Orsay, esposa de Francisco de Verthamon, Senhor de Breau, Barão de Manoeuvre, Referendário.
33
Esta carta parece ser dos primeiros tempos do estabelecimento de São Gervásio, e portanto deve ser colocada
pouco depois da carta 742.
.
Carta 766. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
única ajuda que tenho para cumprir sua santíssima vontade, na qual sou, senhor Padre,
vossa muito obediente filha e mui grata serva,

L. de M.

21 de julho de [16451].

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

767. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[26 de julho de 16451].

Senhor Padre,

Permito-me crer que, há muito tempo, não tomo a liberdade de falar convosco e
isso me desculpará ante vossa caridade, se me atrevo a dizer-vos que estou preocupada
com vossa enfermidade. Receio ser mais grave do que nos fazem crer. Se fôsseis um de
nossos pobres, talvez “a água forte” do senhor Deure vos curasse logo, porque os
unguentos, quaisquer que sejam, irritam a ferida e a mantêm em supuração. Não sei,
meu muito honrado Pai, se o bondoso padre das Filhas da Madalena esteve convosco.
Ele apressa a decisão da saída dessa jovem e parece convicto de sua conversão, pois
diz que ela lhe garante não querer pensar jamais na pessoa a quem se sentir ligada 2 e,
o que deseja é voltar para sua casa. Aliás, eu me lembrei ser essa a resolução que
juntos tomaram, antes de serem capturados. A carta que mostrei a vossa caridade deixa
antever que o propósito dele é de associar-se, depois do casamento, aos pais da moça,
negociantes de vinho, ou retirar-se para aquela região, para viver nela em paz, mas
sem fazer nada. Portanto, com toda probabilidade, o pensamento dela é que, tão logo
saia, ele irá buscá-la.
Peço, muito humildemente, senhor Padre, me perdoeis ter-vos falado desse
assunto: para mim é tão novo como no início e, em alguns momentos, se me torna tão
doloroso que nem posso expressá-lo.
Continuo tendo o pensamento de que estou bem perto de morrer, e, ainda que o
aceite, se tal for a vontade de Deus, causa-me sofrimento deixar, se Deus o quiser,
todos os meus negócios atrapalhados e em má situação.
Nossa pequena Companhia jamais esteve também tão frágil. Numa palavra, meu
muito honrado Pai, não sei se é porque, há muito, nos falta a vossa presença, o certo é
que estamos mal. Suplico muito humildemente vossa caridade lembrar-se da proposta

11
Data acrescentada no dorso do original.
.
Carta 767. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Data acrescentada no dorso do original.
22
É fácil adivinhar o nome daquele que Luísa de Marillac tinha em mente, ao escrever estas linhas.
que lhe fiz de uma conferência todas as semanas, com a presença de um de vossos
padres. Quando vo-la fiz, não me pareceu que vós vos afastásseis e até me destes a
honra de indicar um deles para nós. A essa conferência viria, por vez, uma irmã de
cada paróquia, para evitar que os pobres ficassem sem atendimento. Por favor, dai-nos
vossa santa bênção e concedei-me a alegria de ver-me diante de Deus, como o sou,
senhor Padre, vossa mui obediente filha e mui grata serva,

L. de M.

Dia de Santana.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

768. – NICOLAU PAVILLON, BISPO DE ALET, A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Tendo a honra de ser vizinho próximo e amigo particular do senhor Bispo de


Mirepoix1, compreendereis que una minhas preces às suas para solicitar vossa
intermediação, se for preciso, no negócio que o obriga a ir a Paris, por uma segunda
vez. Estou certo de que, ao estar com ele, ficareis consolado por reconhecer em sua
pessoa tantas boas qualidades que Deus lhe concedeu, para torná-lo útil à sua Igreja, e
lamentareis muito, como faço, o fato de que, em consequência desse processo, que se
prolonga por vários anos, ele se sinta impedido de agir em sua diocese e de nela pôr
em prática os seus talentos com toda a liberdade que desejaria, para bem conduzi-la.
Isto me leva, senhor Padre, a vos suplicar humildemente queira encontrar para
ele uma boa e rápida solução, em sua causa, e de considerá-la comum a toda à Igreja,
em suas principais circunstâncias. Com certa ousadia, acrescentaria ainda, como é
verdade, que estimaria feita a minha própria pessoa e a minha diocese todo
contentamento que este bom prelado receberá de vós, nessa ocasião, e que isso será
para mim um novo motivo para reconhecer os grandes favores que vos devo, desde
longos tempos, e de me declarar, como sou, em virtude de uma afeição toda sincera e
cordial, no amor do Salvador e de sua Santa Mãe, senhor Padre, vosso muito humilde e
muito obediente e grato servo,

Nicolau, bispo de Alet.

Alet, 31 de julho de 1645.

.
Carta 768. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
Luís de Nogaret de la Vallette d’Epernon, Bispo de Mirepoix (22 de dezembro de 1629 a 1655), depois Bispo de
Carcassonne (1655 a 10 de setembro de 1679).
769. – O CARDEAL DURAZZO1 A SÃO VICENTE

Gênova, agosto de 1645.

Soube, nesses últimos meses, quando da passagem do Padre Codoing por essas
bandas, que ele pertencia à Congregação da Missão, e me servi de seu ministério em
diversas partes de minha diocese, onde trabalhou com grande fruto e bênção no serviço
de Deus e na salvação das almas, com minha particular satisfação.
Contudo, ao dizer-me que, para obedecer aos seus superiores, devia partir para
Paris, dei o meu consentimento, já que enviastes outros padres para continuar o que ele
começou, com tanta felicidade2. Há esperança de se estabelecer aqui um tão piedoso
Instituto para a maior glória da Divina Majestade. Fiz questão de vos comunicar nossa
consolação espiritual a este respeito.

770. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Envio-vos as dificuldades surgidas em meu espírito, que me mandastes colocar


por escrito. Teria dificuldade em vo-las enviar, se não acreditasse que elas não
prejudicarão o cumprimento dos desígnios de Deus sobre o assunto. Suplico-vos muito
humildemente me concedais a honra de falar convosco, quanto antes vos for possível, a
respeito do meu filho. Julgo-o necessário, como também que vossa caridade se ocupe
diante de Deus em favor de suas necessidades e do modo como sabeis. É a Providência
que vos manda este acréscimo de trabalho a todos os favores que tendes feito e
continuais fazendo àquela que é, em seu amor, senhor Padre, vossa muito humilde
serva,

L. de Marillac.

18 de agosto [1643, 1644 ou 16451].

As dificuldades de permanecer em Bicêtre são:


.
Carta 769. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. IV, 1ª ed., p. 68.
11
Estêvão Durazzo, legado em Ferrara, depois em Bolonha, Cardeal em 1633, Arcebispo de Gênova de 1635 a 1664,
falecido em Roma a 22 de julho de 1667. Este piedoso prelado foi sempre para São Vicente e seus padres de uma
benevolência e dedicação admiráveis.
22
Em Gênova acabavam de chegar, com efeito, a fim de fundar um novo estabelecimento, quatro padres e um Irmão
Coadjutor. Estêvão Blatiron era o superior.

.
Carta 770. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta foi escrita quando a transferência das crianças expostas para Bicêtre estava apenas em projeto. Ela se
situa, portanto, entre junho de 1643 (Cf. carta 669) e julho de 1647. A data de 19 de agosto de 1646 deve ser
descartada, pois Luísa de Marillac não estava em Paris.
Primeiramente, o tamanho do prédio e a extensão do local. Nem pela metade
seriam ocupados, dentro de mais de dois anos.
Os grandes inconvenientes que existem, inclusive em Paris, quando as casas
foram, anteriormente, habitadas por pessoas de má vida. Com maior razão, são de
temer num lugar que, por muitos anos, foi o reduto, dia e noite, de toda espécie de
gente pouco recomendável, não só dentro do castelo, mas também fora.
O perigo que há nas estradas, para as Irmãs que, muitas vezes, são obrigadas a
ir e vir da cidade.
A impossibilidade de carregar as crianças nos braços, e a grande dificuldade de
levá-las a cavalo, por causa tanto dos terrenos argilosos e dos péssimos caminhos,
como por causa das chuvas, granizo e neve.
Seria preciso muitas Irmãs, devidos às viagens que estariam obrigadas a fazer,
tanto por causa das crianças, como pelas necessidades da casa, e não dispomos de
tantas, apropriadas a este tipo de trabalho.
Os perigos das muitas viagens a serem feitas pelas Irmãs poderiam causar-lhes
desequilíbrios, tanto agora como no futuro.
As grandes despesas para preparar o local a fim de torná-lo habitável, para
abastecê-lo, pois as provisões terão de ser ali mais abundantes do que em outro lugar.
Isso parece evidente.
Dificuldade de as Irmãs irem às Assembleias, de conseguirem vir todos os meses
à Casa (Mãe) e também de as crianças serem visitadas.
E se se tratasse de levar para lá todas as Irmãs de Caridade, parece-me, seria
grande prejuízo para toda a Companhia, por causa das visitas necessárias das Irmãs
que servem os pobres em Paris, dos exercícios que se fazem na Casa, tanto em favor do
atendimento aos pobres doentes, dos curativos de feridas, da instrução das meninas,
como, sobretudo, por causa da indispensável comunicação com os superiores e, às
vezes, com as Damas das paróquias.
Se, apesar de todas essas dificuldades, se devesse ir para lá, seria necessário,
pelo menos durante este inverno, que dois homens permanecessem na casa, e que todos
os dias houvesse missa na capela, na qual se poderia instalar uma pia batismal para as
crianças poderem ser batizadas, e seriam gastas as cinquenta libras doadas para isso.
Seria ainda necessário contar com uma carroça coberta e um cavalo para
transportar as crianças. Isso facilitaria bastante, e um dos homens poderia dirigi-la.
Se for assim, ter-se-ia de escolher com muito cuidado esses dois homens, devido
à comunicação com as amas e com as Irmãs.

771. – A LUÍSA DE MARILLAC

[Agosto ou setembro de 16451].

.
Carta 771. – Manuscrito São Paulo, p. 76.
11
A carta 772 responde a esta.
Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Eis o relatório do estabelecimento das filhas2. Contém três coisas: 1º, a maneira
de que se serviu a Providência para instituí-las; 2º, o modo de vida até o momento; 3º,
as regras de sua confraria ou associação. Coloco os dois primeiros itens, para que o
senhor Arcebispo e os senhores do Conselho sejam informados de tudo por eles.
Escrevi à Madame Traversay que, se puder ir até vossa casa, às duas horas de
hoje, com a Senhora Viole, tratarei de ir até lá.
Procurareis, entretanto, ler e fazer anotações sobre o referido relatório. Suprimi
uma quantidade de coisas que poderia ter dito a vosso respeito. Reservemos a Nosso
Senhor dizê-lo a todo mundo e, entretanto, permaneçamos no escondimento.
Sou, em seu amor...

772. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[Agosto ou setembro de 16451].

O número de Irmãs empregadas no serviço das crianças abandonadas é maior e


deve aumentar na festa de Todos os Santos, quando muitas outras serão trazidas.
Não sei se é necessário estender-se tanto nos elogios a essas Irmãs, os quais
começam assim: “É o que é mais digno de consideração...”. Não bastaria dizer-se:
“Além do serviço corporal que prestam aos ditos pobres doentes, Deus concede suas
bênçãos aos conselhos que lhes dão, para a sua salvação, tanto àqueles que vão morrer,
como aos que podem curar-se, para ajudá-los a viver bem. Isso produz muito fruto e
mostra com evidência...”?
Gostaria de indicar os outros lugares onde estão desde o princípio e
acrescentar: “Estão no Hospital Saint-Denis, há poucos dias ou tempo”. Nomearia
também Sedan e mencionaria que as que ficam nas aldeias se dedicam tanto à
instrução das crianças, como também atendem aos doentes e fazem-lhes curativos.
Não se fale do bem que a referida jovem faz no presente ou que fará no futuro.
Não há viúvas que colaboram, de modo ordinário, senão pouco e raramente.
Quanto aos trabalhos das Irmãs da Casa Mãe, após as palavras: “Fazer as
sangrias e curativos nos pobres que vêm de fora procurá-las para isso”, acrescentar o
seguinte: “Preparar e ministrar os remédios”.
Não estão especificados a leitura e o silêncio das duas horas, nem o silêncio de
outro tempo. Talvez não o seja necessário.

22
Este relatório era o primeiro esboço de uma súplica ao Arcebispo de Paris do qual daremos o texto (Carta 773).
.
Carta 772. – Dossiê das Filhas da Caridade, minuta autógrafa incompleta.
1 1
As Filhas da Caridade entraram em serviço no Hospital Saint-Denis a 02 de agosto de 1645, e se diz que esta nota
foi escrita poucos dias depois.
Não conviria mencionar que o dinheiro que se entrega à bolsa comum serve
para comprar as provisões necessárias à Casa e para a roupa das Irmãs, mesmo das
que estão nas paróquias, uma vez que é confeccionada em casa para, por este meio,
ficarem todas uniformemente vestidas?
Neste artigo: “Respeitarão e obedecerão em tudo que se refere à direção e à
assistência dos pobres doentes...”.

773. – A JOÃO FRANCISCO DE GONDI, ARCEBISPO DE PARIS

[Agosto ou setembro de 16451].

Vicente de Paulo, Superior Geral da Congregação dos padres da Missão, vos


dirige muito humildemente essa súplica, dizendo que, tendo sido do agrado de vossa
caridade pastoral conceder o poder, aos ditos padres da Missão, de estabelecer a
confraria da caridade para a assistência dos pobres doentes em todas as paróquias de
vossa diocese, onde ela poderia convenientemente estabelecer-se, e que depois de ter
feito, com bênção, o estabelecimento em várias aldeias, algumas Damas caridosas de
Paris se sentiram tão sensibilizadas que elas promoveram mediante os senhores Vigários
o estabelecimento da dita confraria em suas paróquias, como em Saint-Germain-
l’Auxerrois, Saint-Nicolas-du-Chardonnet, Saint-Leu, Saint-Sauveur, Saint-Merry,
Saint-Etienne, Saint-Sulpice, Saint-Gervais, Saint-Paul e outras onde a dita confraria
está estabelecida e trabalha com bênção. Como, porém, as Damas que compõem esta
confraria são, em sua maior parte, de uma condição que não lhes permite desempenhar
as mais inferiores e humildes funções que convém fazer nos trabalhos da referida
confraria, como o de levar o caldeirão pela cidade, fazer as sangrias, dar os banhos,
pensar as feridas, arrumar as camas e velar os doentes que estão sozinhos e prestes a
morrer, elas chamaram algumas moças da roça a quem Deus tinha dado o desejo de
assistir os pobres doentes, as quais se ocupam de todos esses pequenos serviços, depois
de terem sido preparadas para isto por uma virtuosa viúva chamada Senhora Le Gras, e
são sustentadas, enquanto permanecem na casa da referida senhora, pelo socorro de
algumas virtuosas viúvas e outras pessoas caridosas, que contribuíram com suas
esmolas, de tal sorte que, desde há treze ou quatorze anos do início desta obra, Deus lhe
tem dado tão grande bênção que, no presente, duas ou três dessas jovens se encontram
em cada uma das referidas paróquias, as quais trabalham todos os dias na assistência
dos referidos pobres doentes e até mesmo, algumas vezes, na instrução das moças
pobres, quando lhes é possível, e vivem por conta da dita confraria das paróquias, onde
estão empregadas, mas de modo tão frugal que elas não gastam senão cem libras por
ano, no máximo, com a alimentação e o vestuário, e, em algumas paróquias, somente
vinte e cinco escudos.
.
Carta 773. – Coletânea dos documentos concernentes à comunidade das Filhas da Caridade, p. 1 e seg. Este
manuscrito, conservado nos arquivos da Missão, contém principalmente os documentos emanados do Padre Jean
Bonnet, Superior Geral. Por isso, é mais conhecido pelo nome de Coletânea Padre Bonnet.
11
Esta súplica se situa, aproximadamente, depois da carta 772.
Além do trabalho das referidas jovens nas paróquias, três delas são empregadas
pelas Damas da Caridade do Hospital Geral, para nele servir os pobres doentes e lhes
prestar diariamente pequenos socorros. Além disso, dez ou doze delas, pelo menos, de
ordinário, se ocupam da educação das pequenas crianças abandonadas desta cidade, e
duas ou três na assistência aos pobres forçados. Além daquelas que estão empregadas
nesta cidade, nos trabalhos acima referidos, há ainda algumas que estão no Hospital de
Angers, em Richelieu, em Saint-Germain-en-Laye, em Sedan e, ultimamente, no
Hospital Geral de Saint-Denis, na França, e em outros lugares do campo, onde executam
aproximadamente os mesmos trabalhos, no que se refere ao tratamento dos doentes, ao
curativo das feridas e à instrução das moças pobres, tudo isso com muita bênção, pela
misericórdia de Deus.
A Senhora Le Gras as mantém, em parte, com o dinheiro que as ditas filhas
ganham com seu trabalho manual, quando têm tempo de sobra depois dos trabalhos
ordinários, em parte, com o auxílio das referidas viúvas, que para isso contribuem ainda,
algumas vezes, cada uma de acordo com suas possibilidades, em parte, com as esmolas
ordinárias, mas particularmente com a renda notável que o rei e a rainha, como também
a Madame Duquesa de Aiguillon, caridosamente lhes concederam, em caráter perpétuo,
cujo montante chega a mais de duas mil libras por ano.
O que é ainda muito notável nos trabalhos dessas pobres filhas é que, além do
serviço corporal que prestam aos pobres doentes, procuram contribuir para o espiritual,
da maneira como podem, particularmente, dizendo-lhes, vez por outra, uma boa palavra,
dando-lhes alguns pequenos conselhos relativos a sua salvação, tanto para aqueles que
estão para morrer, a fim de que partam deste mundo em bom estado, quanto aos que
poderiam recuperar a saúde, para ajudá-los a viver bem.
Nosso Senhor abençoa de tal modo o pequeno serviço que prestam em sua
simplicidade, que há motivo para bendizê-lo, por causa dos bons resultados que dele
procedem, de tal maneira que se pode ver, com evidência, realizado nelas, o que diz a
Escritura, segundo a qual Deus se compraz em se comunicar aos simples e pequenos, e
em se servir das pessoas mais insignificantes e humildes, para fazer delas grandes e
relevantes pessoas. Enfim, foi Ele mesmo que as chamou e aprovou e até mesmo
inspirou sua maneira simples de viver. Torna-se isso mais fácil de se crer, se
acrescentarmos que a voz do povo, que é a voz de Deus, lhes dá aprovação, não
somente por causa da utilidade que dos seus trabalhos resulta para o público, mas
também por causa do bom odor que espalham, pela vida edificante que levam. O que
mais autoriza o que se disse acima é que tudo foi feito em virtude do consentimento e da
permissão que Vossa Excelência concedeu ao referido suplicante, uma vez que a
aprovação do Prelado é a marca mais autêntica de uma verdadeira vocação e de uma
boa obra.
Como, porém, as obras que concernem ao serviço de Deus vêm a findar, de
ordinário, com aqueles que as iniciam, se não houver um laço espiritual entre as pessoas
que a elas se consagram, e é o que teme o suplicante, sob cuja direção sempre estiveram
até o momento, conforme o poder que Vossa Ilustríssima Excelência graciosamente lhe
concedeu, parece-me, senhor Arcebispo, que é de se desejar, em razão disso, seja do
agrado de vossa caridade erigir em confraria essa Companhia de filhas e viúvas e de
lhes dar como regulamento os artigos seguintes, segundo os quais viveram até o
presente e se propõem a viver para o futuro, sob o nome de Filhas e Viúvas Servas dos
Pobres da Caridade.....2.
Eis, senhor Arcebispo, em substância, o pequeno regulamento que o dito
suplicante redigira para ser observado pelas referidas filhas servas dos pobres, sob o
beneplácito de vossa caridade pastoral, a quem suplicamos humildemente aprová-lo e,
ao mesmo tempo, erigir em confraria sua pequena Companhia. Parece evidente que, por
seus ofícios caridosos e vida exemplar, são úteis para o povo, não prejudicam a ninguém
e tantos pobres, doentes, forçados, tantas crianças abandonadas são assistidas corporal e
espiritualmente e tantas moças pobres são instruídas, de tal modo que as confrarias das
Damas da Caridade não poderiam ter bom êxito sem o auxílio dessas pobres filhas, e,
enfim, elas próprias não poderiam dar continuidade ao bem que fazem, nem subsistir,
em comunidade, por longo tempo, na verdadeira caridade, se não forem ligadas e unidas
à maneira de confraria.
Por esses motivos e por outras boas considerações, apraza-vos por bondade,
senhor Arcebispo, deferir o muito humilde requerimento do dito suplicante. Fareis uma
obra agradável a Deus, útil a sua Igreja e que atrairá as bênçãos do céu sobre vossa
sagrada pessoa e sobre toda vossa diocese, para cujo fim estas bondosas filhas, os
pobres aflitos que elas assistem, e o referido suplicante, oferecerão suas preces à Divina
Majestade3.

Vicente de Paulo, indigno Superior da Congregação da Missão.

Destinatário: A Sua Ilustríssima e Reverendíssima Excelência, o senhor


Arcebispo de Paris.

774. – A GUILHERME DELVILLE, SUPERIOR, EM MONTMIRAIL

22 de setembro de 1645.

Vicente de Paulo roga a Guilherme Delville hospedar e dar alimentação gratuita


em sua casa a Adriano Le Bon, antigo Prior de São Lázaro, que deve ir a Montmirail, e
até mesmo a tratá-lo como se fosse dono dos bens e das pessoas.

775. – A DENIS GAUTIER1, SUPERIOR, EM RICHELIEU


22
Publicaremos o regulamento no volume dos documentos.
33
São Vicente teve de fazer no ano seguinte uma segunda súplica, que foi acolhida favoravelmente.
.
Carta 774. – Collet, op. cit., t. I, p. 514.

.
Carta 775. – Reg. 2, p. 176.
11
O manuscrito de Avinhão dá como destinatário Francisco Grimal, Superior em Sedan. Preferimos o destinatário do
registro 2.
2
Traduzimos por “eremitas” a palavra “solitaires”, cujo sentido Coste não decifra. (N. do T.).
15 de outubro de 1645.

Senhor Padre,

Estou muito contente com a bênção que Deus concedeu aos exercícios
espirituais de vossos “eremitas” 2, mas sobretudo, com vossa sábia conduta, que há de
ser sempre assim, como espero, procedendo com aconselhamento e paciência, que são
os meios, segundo os quais, o ensino de hoje nos mostra como os romanos conduziam
com êxito sua república, e são os mais eficazes que Deus nos deixou para uma boa
direção. Não duvido de que o cuidado da casa, o da paróquia e de tantos outros negócios
vos sobrecarregam. Lembrai-vos porém, senhor Padre, que Nosso Senhor é a força e a
sabedoria daqueles que Ele aplica a semelhantes obras, e tende confiança que Ele agirá
assim convosco.

776. – A DENIS GAUTIER, SUPERIOR, EM RICHELIEU

1645.

Vicente de Paulo roga a Denis Gautier receber como convém, em sua casa,
Adriano Le Bon, antigo Prior de São Lázaro, e oferecer-lhe hospedagem e alimentação,
e até mesmo tratá-lo como se fosse dono dos bens e das pessoas.

777. – NICOLAU PAVILLON, BISPO DE ALET, A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

O senhor Bispo de Lodève 1 me fez a honra, durante nossa atual permanência


nos Estados2, de me comunicar a resolução que tomara de pedir demissão de sua
diocese, em razão de sua idade e frequentes enfermidades, depondo-a nas mãos de Sua
Majestade, em favor do Padre du Bosquet, Conselheiro de Estado e Intendente de
Justiça nesta província, com a única reserva de uma pensão razoável. Desejou também
que eu fosse testemunha de sua demissão. Pensei, então, ser meu dever avisar-vos disto,

.

Carta 776. – Collet, op. cit., t. I, p. 514.

.
Carta 777. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
11
Jean de Plantavit de la Pause, prelado muito erudito (1625-1648).
22
Os Estados de Languedoc.
crendo que vos será muito agradável e que ficareis contente com o fato de ele depositar
sua afeição sobre uma pessoa de tal mérito e capacidade, como bem sabeis. A
esperança que tenho de que ele se tornará muito útil à glória de Deus nessa diocese e à
salvação das almas que lhe serão confiadas leva-me a suplicar-vos, senhor Padre, com
todo meu coração, a tê-lo como especialmente recomendado, e prestar-lhe, nessa
ocasião, todos os bons ofícios que dependerem de vós, podendo garantir-vos que, além
do serviço que prestareis a Deus e do bem que fareis a essa diocese, ficarei vos
devendo um reconhecimento muito especial, pois que o estimo ternamente e lhe dedico
muito respeito, devido às marcas que ele dá de sua virtude e de uma piedade
verdadeiramente cristã. Espero esta graça de vosso zelo para com tudo que diz respeito
ao bem da Igreja de Deus, e que me fareis a honra de me crer sempre, no amor de
nosso caro Salvador e no de Sua Santa Mãe, senhor Padre, vosso muito humilde e
muito obediente servo,

Nicolau, Bispo de Alet.

Pézenas3 28 de dezembro de 1645.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, Superior Geral da Companhia dos


padres da Missão, em São Lázaro.

778. – A JEAN SCARRON, PREPÓSITO DOS COMERCIANTES1

[janeiro de 16462].

Os padres da Congregação da Missão, estabelecidos no Priorado de São Lázaro,


expõem humildemente a presente súplica, dizendo que, tendo necessidade de fazer um
murado nas terras dependentes do dito Priorado, contíguas e confinantes com a casa e o
bairro do referido São Lázaro, para deter o prosseguimento dos grandes danos de que
são vítimas, aprouve ao rei outorgar-lhes o poder de mandar fechar e cercar de muros as
referidas terras, assim como existiam outrora com seus velhos marcos e prolongar esses
marcos para onde não existem; construir também e edificar nessas terras pequenas
casas, ao longo da calçada Saint-Denis, no fim do referido bairro 3, como consta em suas
cartas patentes de 20 de fevereiro de 1644, assinadas por Guénegaud4. Tendo essas

33
Cantão do Hérault.
.
1
Carta 778. – C. as. – Original no Seminário de São Sulpício, em Paris.
1
Jean Scarron, Senhor de Mendiné, Conselheiro da Alta Câmara do Parlamento.
22
Ver nota 6.
33
Lá se encontrava o Seminário São Carlos ou o Pequeno São Lázaro.
44
Henri de Guénegaud du Plessis, Marquês de Plancy, Comendador de Montbrison, Tesoureiro da Espanha, em 1639,
Secretário de Estado, de 1643 a 1669, Ministro da Justiça para as ordens do Rei, em 1656, falecido em Paris a 16 de
março de 1676, com a idade de 67 anos. Desposara, a 23 de fevereiro de 1642, Elisabeth de Choiseul, filha do
Marechal de Praslin.
cartas sido apresentadas aos senhores Tesoureiros de França, na Generalidade 5 de Paris,
esses últimos mandaram visitar os lugares e demarcar os alinhamentos necessários.
Considerando isso, senhor Prepósito, apraza-vos, por favor, mandar que as ditas
patentes anexas sejam registradas em vosso cartório, para que os suplicantes possam
usufruir de seus efeitos e para que as referidas cartas patentes estejam a sua disposição,
no que for de razão. E assim tudo ficará bem.

Vicente de Paulo, Superior indigno dos padres da Missão.

779. – A RENÊ SAUVAGE1

Paris, 19 janeiro de 1646.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Há muito tempo ando pensando como fazer para que sejamos todos para todos, e
para todos os ministérios da Companhia. Como vos falta o exercício das pregações, das
confissões e outros exercícios da Missão, envio o Padre Charles2 em vosso lugar, para
vos proporcionar a ocasião de ir pregar missão e a ela vos adaptar e nela vos
aperfeiçoar. Suplico-vos, senhor Padre, passar para ele as informações e os endereços
que tendes em vosso seminário. Disse-lhe, como a vós, que ele se contente em explicar-
lhes familiarmente um autor, como Binsfeld ou o francês Tolet3.
Ó Padre Sauvage, meu caro irmão, como suplico a Deus vos conceda o espírito
de seu Filho Nosso Senhor, para difundi-lo em tantas almas que a sua divina
Providência determinou salvar por vosso ministério!
Tinha-me proposto escrever pessoalmente aos senhores Padre Guérin e Tholard,
mas tiram-me a pena da mão e obrigam-me a recorrer a um outro.
Abraço-vos entretanto, prostrado em espírito aos vossos pés e aos de todos da
comunidade. Sou, senhor Padre, vosso muito humilde servo,

55
Circunscrição financeira da França, antes de 1789, a cuja frente estava um Intendente (Nota do Tradutor).
.
Carta 779. – Publicada por Et. Charavay no Amateur d’autographes, outubro de 1871, p. 171, conforme o original,
que fazia parte da coleção Merlin.
11
Renê Sauvage, nascido em Arrest (Some), entrou na Congregação da Missão a 02 de julho de 1638, com a idade de
25 anos, e fez os votos a 17 de outubro de 1642.
22
Francisco Charles, nascido em Plessala (Côtes- du-Nord) a 10 de dezembro de 1611, foi recebido na Congregação
da Missão a 12 de março de 1640. Foi ordenado padre na Quaresma do ano de 1641 e morreu a 26 de janeiro de
1673, depois de ter exercido em São Lázaro as funções de diretor dos retirantes e dos Irmãos Coadjutores. Na circular
dirigida a toda a Companhia para anunciar sua morte, Edme Jolly, Superior Geral, faz um grande elogio de sua
virtude (Ver Notices, t. II, p. 245-246).
33
O Cardeal Francisco Tolet, jesuíta, nasceu em Córdova a 04 de outubro de 1532, e faleceu em Roma a 14 de
setembro de 1596. Ensinou brilhantemente a filosofia no Colégio Romano e realizou com êxito várias missões
diplomáticas. Devemos-lhe vários tratados de filosofia e de teologia. É conhecido, sobretudo, por sua obra de
casuística, frequentemente reeditada, Instructio sacerdotum ac de septem peccatis (Roma, 1601) que reapareceu em
1604, 1608, 1633 com o título de Summa casuum conscientiae absolutíssima, e, posteriormente, muitas vezes.
Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Sauvage, padre da Missão, em Annecy.

780. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[Antes de 16501].

Senhor Padre,

Suplico-vos muito humildemente, pelo amor de Deus, possa hoje ter a honra de
falar convosco, por pouco tempo que seja, conforme vos aprouver. Se ainda não
assinastes nossas contas, tende a bondade de diferi-lo até que eu inclua os gastos das
Irmãs do Hospital Geral, pois esqueci-me de anotá-los.
Cometo muitas faltas por minha pressa excessiva, sem falar das faltas por
malícia.
Todas as vossas pobres filhas vos saúdam muito humildemente, pedindo-vos que
vos lembreis delas. Quanto a mim, a menor de todas, sou, senhor Padre, vossa muito
humilde e mui grata filha e serva,

L. de M.

Dia de São Vicente.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

781. – A UM PADRE DA MISSÃO

[1646 ou 16491].

Soube do sofrimento que vos causou certa carta que o senhor vosso pai vos
escreveu, para vos obrigar a ir socorrê-lo. Sobre isso, creio dever dizer-vos o que
pensei:
1º Não é pequeno mal romper o vínculo com que vos ligastes a Deus na
Companhia.

.
Carta 780. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Depois de 1649, Luísa de Marillac teria escrito “Meu muito honrado Pai” e não “Senhor Padre”.
.
Carta 781. – Reg. 2, p. 347. O destinatário desta carta parece ser Paulo Carcireux que tinha uma irmã entre as Filhas
da Caridade e deixou a Congregação da Missão para ajudar seu pai.
11
Ver nota 4.
2º Perdendo vossa vocação, privareis a Deus dos bons serviços que espera de
vós.
3º Sereis responsável, diante do trono de sua justiça, pelo bem que deixareis de
fazer e que faríeis, permanecendo no estado em que estais.
4º Poreis em risco vossa salvação, indo para junto dos vossos pais, e talvez não
os alivieis, como aconteceu a outros que saíram sob esse pretexto. Deus não o permitiu
porque, se ele quisesse que eles passassem a uma melhor condição, disporia de outros
caminhos para esse fim.
5º Nosso Senhor, conhecendo a malignidade inerente à obsessão com os
parentes, naqueles que já os deixaram para segui-lo, não quis, como diz o Evangelho,
que um de seus discípulos fosse nem mesmo sepultar seu pai, nem que um outro fosse
vender seus bens para dá-los aos pobres2.
6º Daríeis mau exemplo a vossos coirmãos e motivo de tristeza para a
Companhia, pela perda de um de seus filhos que ela ama e que educou com tanto
desvelo.
Eis, senhor Padre, o que vos suplico considerar diante de Deus.
O motivo que podeis ter de vos retirar está na necessidade do senhor vosso pai.
Mas é preciso ver em que casos os moralistas obrigam os filhos a sair de uma
comunidade. Quanto a mim, creio que é apenas quando os pais ou as mães estão
padecendo em sua própria saúde natural, não em sua condição de vida. Tal seria se
fossem muito velhos, ou quando, por algum incômodo natural, não pudessem ganhar a
própria vida. Ora, isto não acontece com o senhor vosso pai, que tem apenas 40 ou 45
anos, no máximo, e que está com boa saúde e pode trabalhar, e está de fato trabalhando.
Sem isto, não se teria casado de novo, como o fez há pouco, com uma jovem senhora de
18 anos, das mais belas da cidade. Ele próprio mo comunica, para que eu a apresente a
Madame Princesa de Logueville3, para ser ama-de-leite do filho dela4. Certo que ele não
se acha, penso eu, na abundância de recursos. Meu Deus! quem não se ressente hoje da
miséria desses tempos! Depois, não é seu incômodo presente que o obriga a vos chamar
de volta, porque ele não é grande. É apenas o incômodo que ele teme, por lhe faltar um
pouco de confiança em Deus, embora nada lhe tenha faltado, até o momento, e ele tenha
motivo para esperar que sua bondade não o abandonará no futuro.
Poderíeis talvez vos persuadir de que é por vosso meio que Deus quer de fato
acudir às suas necessidades, e que é por isto que sua Providência vos apresenta uma
paróquia de 600 libras, pelo próprio intermédio desse bom homem.
Mas vereis que não pode ser assim, se refletirdes em duas coisas: em primeiro
lugar, se Deus vos chamou a um estado de vida que honra o do seu Filho sobre a terra e
22
Lc 9, 59-62.
33
Ana Genoveva de Bourbon, esposa de Henrique II, Duque de Longueville, mulher de vida espiritual, instruída e
intrigante. Tomou parte ativa nas turbulências da Fronda. Tinha por São Vicente de Paulo uma profunda veneração.
Depois da morte do marido (1663), foi morar perto das Carmelitas da Rua Saint-Jacques. Passou o resto dos seus dias
na penitência e nas austeridades de Port-Royal e morreu jansenista, a 15 de abril de 1679. Sua vida foi escrita por
Bourgoin de Villefore (La véritable vie d’Anne-Geneviève de Bourbon, duchesse de Longueville, Amsterdam, 1739, 2
vol. in-12) e por Cousin (Madame de Longueville,Paris, 1859, in-8º).
44
A Duquesa de Longueville teve dois filhos: Jean-Louis-Charles, Conde de Dunois, mais conhecido como o Abade
de Orléans, nascido a 12 de janeiro de 1646, falecido a 04 de fevereiro de 1694, e Charles-Paris, nascido a 21 de
janeiro de 1649, na câmara municipal, morto afogado, a 12 de junho de 1672, atravessando o Rio Reno. Pensamos
que São Vicente fala aqui do Conde de Dunois.
tão útil ao próximo, não haveria de querer tirar-vos, no presente, deste estado, para vos
limitar ao cuidado de uma família do mundo que só busca suas comodidades e estará
continuamente a vossa procura para vos pedir o que tiverdes e o que não tiverdes e vos
sobrecarregará de desgosto e aflição, se não puderdes aliviá-la ao seu e ao vosso gosto.
Em segundo lugar, não é confiável que tenham prometido ao senhor vosso pai, em
vosso favor, uma paróquia de 600 libras de renda. As da diocese de Bourges são as
menores do reino. Mas se assim fosse, descontando vosso sustento, que vos restaria?
Não vos digo isso temendo que a tentação venha a vencer-vos. Não. Conheço
vossa fidelidade a Deus. Minha intenção é que escrevais, uma vez por todas, ao senhor
vosso pai, as razões que tendes de seguir antes a vontade de Deus do que a dele. Crede-
me, senhor Padre, o temperamento dele é de molde a não vos dar descanso, estando
perto dele, como não vo-lo dá, estando longe. A perturbação que ele causa a vossa pobre
irmã, que está com a Senhora Le Gras, é inimaginável. Quer obrigá-la a abandonar o
serviço de Deus e dos pobres, como se ele fosse receber dela grande amparo. Sabeis que
ele é naturalmente inquieto: o que ele tem lhe desagrada e o que não tem lhe suscita
violentos desejos.
Enfim, julgo que o maior bem que podereis fazer-lhe é rezar a Deus por ele,
conservando para vós a única coisa necessária, que um dia será vossa recompensa, e
que, por vossa causa, estenderá até mesmo para os vossos, as bênçãos de Deus. É o que
lhe peço de todo meu coração.

782. – NICOLAU PAVILLON, BISPO DE ALET, A SÃO VICENTE

Pézenas, 05 de fevereiro de 1646.

Senhor Padre,

Quanto à informação que vos apraz enviar-me, a respeito dos artigos que
pretendem terem sido aceitos, no negócio do Padre du Bosquet, e que o tornam vicioso,
fui vê-lo esta manhã, quando ele voltava da missa que acabava de celebrar. Ele me
garantiu de novo que renunciaria, de muito bom grado, a qualquer espécie de bispado,
antes que cometer uma vileza de tal sorte. Tereis ocasião de vê-lo, como penso, em
Paris, bem cedo. Nessa ocasião, ele conversará mais longamente convosco, sobre esse
negócio.
Não conheço nenhuma dessas pessoas que fazem profissão de notável piedade, a
respeito das quais vós dizeis, senhor Padre, haver queixas de que alteram os negócios
daqui. Com efeito, como me retirei para junto dos padres do Oratório, para ficar mais
em repouso e desligado das grandes e frequentes comunicações, e por não ter por
natureza o espírito de intriga, fico menos informado do que se passa no mundo.

.
Carta 782. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
Se desejais saber, senhor Padre, o meu procedimento nos negócios da
Assembleia1, dir-vos-ei que, quando prevejo que nela vão tratar algum deles de
importância, reflito maduramente diante de Deus, na oração da manhã, e lha
recomendo. Vou, então, celebrar a missa e em seguida me dirijo para a Assembleia. Na
base do conhecimento que Deus me concede, formo o meu parecer e o proponho, na
minha vez, tal e qual, e no mesmo espírito com que gostaria tê-lo feito na hora da
morte.
Enviarei quanto antes ao Padre Féret2 a carta que lhe é dirigida, no vosso
pacote. Aceitai por bem, senhor Padre, por favor, que tome a confiança de vos dizer
que, antes de tirá-lo da província e retirá-lo de nós, deveis pensar muito, pois ele é tão
útil aqui para o serviço da Igreja, quanto poderia sê-lo em vários outros lugares. Além
de um seminário de 25 eclesiásticos que começamos em Alet, há 3 meses, tanto de
dentro quanto de fora da diocese, no qual precisamos de seus serviços, os senhores
Prelados da Assembleia resolveram estabelecer as conferências de eclesiásticos em
suas respectivas dioceses e se dignam adotar o mesmo método nosso. Ora, se ele não
ficar conosco, não vejo como poderíamos ajudá-los nisso. Não falo das assembleias dos
eclesiásticos já ordenados, das dos ordinandos, das missões, visitas e outras propostas
semelhantes que se fazem todos os dias e às quais os senhores Prelados desta província
se acham dispostos, conquanto lhes seja dada alguma assistência.
É isto o que eu acreditei, senhor Padre, ser obrigado a vos representar, mais
para vos informar sobre o estado desta região, no que tange ao progresso do reino de
Deus, do que para vos levar a mudar vosso desígnio sobre a pessoa dele, caso ele vos
pareça mais vantajoso para o bem da Igreja. Considero e tenho em conta tudo que vem
de vossa parte com inteira submissão e reverência, sendo, de todo meu coração, senhor
Padre, vosso muito humilde e muito obediente servo,

Nicolas, Bispo de Alet.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, Superior Geral da Missão, em São


Lázaro, Paris.

783. – O CARDEAL MAZARINO A SÃO VICENTE

Fevereiro de 1646.

Senhor Padre,

11
A Assembleia dos Estados de Languedoc.
22
Vigário Geral de Nicolau Pavillon.
.
Carta 783. – Minuta não assinada. Arquivo dos Negócios Estrangeiros. Relatórios e Documentos, França, nº 855, fº
46.
Estas linhas são para vos dizer que, tendo o senhor Primeiro Presidente 1
despachado aqui no sentido de pedir à rainha o bispado de Bayeux, vacante desde há
alguns dias, para o senhor seu filho 2, ela lho concedeu. E isto ela o fez de bom grado,
tanto mais quanto ele tem as qualidades requeridas para dele ser provido, e porque Sua
Majestade se sentiu muito à vontade por encontrar uma ocasião tão favorável de
reconhecer, na pessoa do seu filho, os serviços do pai e o zelo que ele tem para com o
bem do Estado. A rainha prometeu-me escrever-vos sobre isso, e eu quis fazê-lo de
antemão, a fim de que tenhais a bondade de ir estar com ele, para lhe dar as instruções
que julgardes lhe sejam necessárias para bem desempenhar esta função.
Nada mais vos direi sobre isso, e termino garantindo-vos que sou, com muita
afeição...

784. – ALAIN DE SOLMINIHAC, BISPO DE CAHORS, A SÃO VICENTE

01 de março de 1646.

Senhor Padre,

Peço-vos tenha a bondade de mandar algum dos vossos ir ver o senhor


Laumonion e rogar-lhe de vossa parte que julgue o negócio da Vaurette.
Esta manhã, o padre Vigário Geral dos Dominicanos reformados veio estar
comigo. Ele me disse que era absolutamente necessário que a incorporação que o
Geral me prometeu do convento de Cahors a sua província se realizasse aqui e quanto
antes.
Ele deve ir ver-vos hoje ou amanhã, para implorar vossa assistência junto à
rainha para esse fim. Suplico-vos no-la conceda nesse negócio muito digno de vossa
atenção.
O senhor Núncio, que me deu a honra de vir estar comigo ontem, me impede de
ir aos Bons-Enfants, como tinha resolvido, para assistir à vossa Conferência e vos falar
do grande alarido nesta cidade por andarem dizendo que vão entregar o arcebispado
de Bordéus a um bispo que julgam indigno 1. Não imaginais o tumulto causado por isso.
Deus inspire aos que dispõem dessas eminentes dignidades a fazer escolha de pessoas
que delas sejam dignas!
Entrementes, sou, senhor Padre...

Alain, Bispo de Cahors.

11
Mateus Molé.
22
Eduardo Molé (22 de junho de 1647-06 de abril de 1652).

.
Carta 784. – Arquivo da diocese de Cahors, caderno, cópia.
11
A sede de Bordéus tinha ficado vacante, a 18 de junho de 1645, com a morte de Henrique d’Escoubleau de Sourdis,
a quem foi dado como sucessor, a 20 de novembro de 1646, Henrique de Béthume, Bispo de Maillezais.
785. – NICOLAU PAVILLON, BISPO DE ALET, A SÃO VICENTE

Pézenas, 01 de março de 1646.

Senhor Padre,

Ultimamente, me escrevestes que muitos suspeitavam que, na demissão feita


pelo senhor Bispo de Lodève de seu bispado, em favor do senhor Padre du Bosquet,
tivesse havido algum tratado tácito entre eles, o que tornaria a demissão viciosa e
contrária aos santos cânones. Sinto-me, então, obrigado a vos dizer com confiança o
que pude apurar a respeito da própria pessoa do referido senhor Padre du Bosquet.
Ele me fez a honra, no início da Assembleia dos Estados, de me comunicar a
escolha que o senhor Bispo de Lodeve fizera de sua pessoa, no sentido de lhe passar a
diocese, não se sentindo mais, em razão de sua idade e indisposição, no vigor e na
capacidade de cumprir suas funções. Ao mesmo tempo, teria desejado dele que
aceitasse ficar com sua biblioteca e com o jardim de sua propriedade, perto de Lodève.
Essas coisas lhe seriam inúteis no futuro, e poderiam, entretanto, ficar bem para o
referido Padre du Bosquet. Todavia, ele não queria fazer nada contra sua consciência e
o parecer de bons e sábios casuístas.
Tomei a liberdade de expressar meus sentimentos ao Padre du Bosquet, a saber,
que não se comprometesse com esse tratado sob esta condição, nem de palavra, nem
por escrito, nem de qualquer outro modo, ainda que os casuístas fossem de parecer
favorável, porque isto cheirava a simonia, ou, no mínimo, se aproximava disso.
Contudo, se ficasse com o bispado, não estaria impedido, sem se obrigar com certa
condição, de comprar uma casa e outra, por um justo e razoável preço, se julgassem
lhe fossem convenientes.
Deste modo, aconteceu o ato de demissão pura e simples, com a reserva da
pensão de uma parte da renda em proveito do referido senhor Bispo, em presença do
Bispo de Narbona e na minha presença, a pedido das partes. Ora, o que poderia trazer
dificuldade para este negócio é que, embora não haja nenhuma convenção verbal ou
outra qualquer que obrigue a esta compra, o dito Padre Bosquet, depois mesmo de se
tornar possuidor do bispado, conforme sempre me protestou, confessou-me entretanto,
de boa fé, que disse ou mandou dizer ao senhor Bispo de Lodève, a necessidade que
teria de sua biblioteca e do seu jardim, quando estivesse no cargo, e a inclinação e até
mesmo a decisão de tratar disso com ele, na base de uma justa avaliação a se fazer,
sem contudo querer se empenhar por compromisso algum.
É possível que, a coisa tendo chegado ao conhecimento de alguns, poderiam
esses levantar a suspeita de um tratado simoníaco ou de má edificação, caso a compra
se efetivasse, uma vez que os homens formam o próprio juízo pelo que parece
externamente e não penetram nas intenções e disposições interiores de transparência,
que se poderia trazer aos negócios.
.
Carta 785. – C. aut. – Dossiê da Missão, original.
Julguei, senhor Padre, dever informar-vos de tudo acima dito, para vos fornecer
mais amplo conhecimento de tudo que sei deste negócio, uma vez que deveis emitir
opinião sobre ele. Procurei também levar o próprio Padre du Bosquet, na presença do
senhor Bispo de Puy1, a se manifestar e relatar tudo singelamente a vós, quando estiver
em Paris, para evitar a censura e o mau juízo que se poderiam levantar.
Espero que não estimeis conveniente venha ele saber que vos escrevi sobre o
caso, pois isso poderia contristá-lo e causar-lhe esfriamento a meu respeito e deste
modo impedir a continuação da confiança que tem em mim, e de que faço questão
unicamente por causa da glória de Deus e o serviço da Igreja2.
Aceite, por obséquio, que eu seja sempre, no amor de nosso caro Salvador,
senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Nicolas, Bispo de Alet.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, Superior Geral da Congregação dos


padres da Missão, em São Lázaro, Paris.

786. – A JEAN DEHORGNY, SUPERIOR, EM ROMA

02 de março de 1646.

Por vossa última carta, pude ver como afinal enviastes o Padre Martin para
Gênova. Ousaria dizer-vos, senhor Padre, nessa ocasião, que é muito importante, mais
do que vos posso exprimir, vos entregueis a Deus para vos tornar exato a todas as
ordens do Superior Geral, sejam quais forem, ainda que choquem vosso sentimento e
qualquer pretexto que possais ter sobre o que seja melhor ou dos inconvenientes que
possam sobrevir. Com efeito, maior inconveniente não poderia acontecer do que o da
desobediência.
Um capitão me dizia, dias anteriores, que, ainda quando visse que seu general
desse uma ordem incorreta e que ele perderia sem dúvida a vida ao executá-la, e ainda
que pudesse fazer o general mudar de parecer, dizendo-lhe uma palavra, sentir-se-ia
desonrado se o fizesse e preferiria morrer a fazê-lo.
Veja, senhor Padre, que humilhação para nós no céu, ao ver tal perfeição na
obediência militar e a nossa, comparativamente, tão imperfeita. Garanto-vos, senhor
Padre, que dois ou três superiores que agissem dessa forma seriam capazes de pôr a
Companhia a perder-se e que, se não conhecesse bem vosso coração, seria obrigado a
tomar decisão mais radical. A certeza que tenho de que sois melhor do que jamais serei

11
Henrique de Maupas du Tour.
22
Francisco Bosquet foi sagrado Bispo de Lodève a 20 de dezembro de 1648. Passou desta sede para a de
Montpellier, a 24 de junho de 1657 e morreu a 24 de junho de 1676 (François Bosquet, pelo abade Henrique, 1889,
in-8).

.
Carta 786. – Reg. 2, p. 227.
e de que amais o Instituto melhor do que eu, me levará a não falar e nem pensar mais
nisso.
Enfim, depois de ter tentado, inutilmente, dissuadir M... de suas opiniões, fomos
aconselhados por quatro doutores da Sorbona, pelo senhor Bispo Coadjutor de Paris 1,
pelo senhor Cardeal2, pelo senhor Chanceler3 e pelo senhor primeiro Presidente4 a agir
como fizéramos com o senhor P.5 E assim o fizemos, ontem à noite.
Suplico-vos, senhor Padre, oferecer sua alma a Deus, e a minha, que está mil
vezes em pior estado, pelas minhas infidelidades aos movimentos que Nosso Senhor me
inspira no sentido de fazer-lhe a santa vontade em todas as coisas.

787. – A JEAN MARTIN, PADRE DA MISSÃO, EM GÊNOVA

Paris, 10 de março de 1646.

Senhor Padre,

Não vos posso dizer a consolação que recebeu minha alma pela vossa carta, nem
quanto peço a Deus de todo coração vos conceda cada vez mais o espírito do seu Filho e
um santo trabalho neste lugar1, onde tereis tanta necessidade dele. Ó senhor Padre, como
é necessária a humildade e o espírito de um perfeito missionário para esse lugar e para o
ofício que ocupais. Rogo a Nosso Senhor de novo vos conceda boa parte do seu espírito
e o vigor corporal tão necessário entre tantos e tão grandes trabalhos. Sinto inexprimível
satisfação por vos ver com o bom Padre Blatiron. Oh! que felicidade para um e outro
por estarem juntos e destinados por Deus, desde toda a eternidade, para servi-lo nos
ministérios aos quais a divina Providência vos aplica a ambos. Ó senhor Padre, quem o
teria dito, há quatro ou cinco anos? Sua divina bondade não se esgotará nisso, se fordes
bem fiéis na presente ocasião.
Aqui, a pequena Companhia está bem, graças a Deus. Ela ora a Deus
frequentemente por vós dois. Quem tem mais necessidade dessas orações é o mais
miserável de todos os pecadores do mundo que permanece, em Nosso Senhor...
Pensava poder escrever ao Padre Blatiron, mas me apressam por causa da missa.
Tenho apenas o tempo de vos abraçar, aos dois, de novo, prostrado em espírito aos dele
e aos vossos pés.

11
João Francisco de Gondi.
22
O Cardeal Mazarino.
33
Pierre Séguier.
44
Mateus Molé.
55
Provavelmente Guilherme Perceval, despachado da Companhia em 1644.
.
Carta 787. – Pérmartin, op. cit., t. I, p. 511, carta 444.
11
Em Gênova.
788. – A UM PADRE DA MISSÃO DA CASA DE SAINT-MÉEN

16 de março de 1646.

São Vicente responde a esse missionário a respeito da oposição feita pelos


religiosos beneditinos, que reivindicavam a posse da Abadia de Saint-Méen 1. Perdê-la,
diz ele, é melhor do que entrar em processo.

789. – A ANTÔNIO PORTAIL, PADRE DA MISSÃO, EM MANS

20 de março de 1646.

Esqueci-me de avisar-vos, antes de vossa partida, de algumas falhas encontradas


por vezes nas casas visitadas:
1º - Atendem confissões dos que vêm da cidade, dos subúrbios e das vilas. Peço-
vos proibi-lo a todos os nossos padres e dizer-lhes que, se depois de uma missão que
tiverem pregado, alguns penitentes que tiverem atendido em confissão voltarem a eles
por alguma necessidade, neste caso, poderão ouvi-los em alguma paróquia vizinha que
não seja nem da cidade nem dos subúrbios.
2º - Há quem vá pregar nos mosteiros de religiosas. Se os encontrardes, dai
ordem, por favor, no sentido de que isto não aconteça mais.
3º - Nem sempre mantêm a primeira porta fechada. Se a casa de Mans estiver
nesta falha, peço-vos remediar a isso, para que ninguém entre sem antes bater, e fazer
com que os senhores Cônegos não permitam que, por outras vias, homens, e muito
menos mulheres, entrem em nossa casa. Tratai, senhor Padre, de torná-los capazes desta
precaução tão necessária às comunidades e que peçam o parecer de pessoas que
conheçam a importância dela.
4º - Alguns se dispensam dos usos comuns. Importa então sobremaneira insistir
em que se guarde invariavelmente a ordem do dia e se pratiquem os santos costumes e
máximas da Companhia. Os superiores tenham bem em mente sua obrigação de velar
por isso, como também a de entregar lacradas as cartas do Superior Geral. Não é
permitido aos superiores das casas ler as cartas do Geral. E ainda, os mesmos superiores
das casas devem conscienciosamente mandar para o Geral as cartas dos coirmãos, sem
as ler, ainda que os que as escrevem lhes quisessem mostrá-las, por respeito.
.
Carta 788. – Collet, op. cit., t. I, p. 414.
11
Entregando aos padres da Missão, a 14 de julho de 1645, a direção perpétua do seminário que acabava de erigir na
Abadia de Saint-Méen (perto de Bourseul, Côtes-du-Nord), Aquiles de Harlay de Sancy, Bispo de Saint-Malo, lhes
tinha garantido uma renda anual de 500 libras sobre as dízimas e anexara ao estabelecimento a mesa conventual, com
a condição de que fossem em número de cinco, três para o seminário e dois para as missões, que eles mantivessem
gratuitamente, durante dois ou três anos, doze jovens eclesiásticos, dos quais quatro padres, na medida do possível,
para fazer o serviço religioso, dessem uma pensão aos religiosos da abadia, elevassem a vinte, depois da morte destes
últimos, o número dos jovens eclesiásticos recebidos gratuitamente, servissem, reparassem e provessem de todo o
necessário a igreja abacial, nela recitassem as horas canônicas, servissem as fundações, enfim, confessassem os
peregrinos e viajantes (Arq. Nac. S 6.711).
.
Carta 789. – Reg. 2, p. 99.
5º - Acontecem por vezes pequenas divisões nas famílias e discórdias entre os
espíritos. Dai-vos a Deus, senhor Padre, para reuni-los e cimentá-los na caridade. Deve
ser este um dos principais efeitos da visita.
6º - Além disso, velai pelas igrejas, pelas fontes batismais, pelos altares, pelas
cruzes dos altares e as das procissões, pelos cemitérios, etc., a fim de que tudo esteja
dentro da decência conveniente e de acordo com a máxima honra que nossa pobreza o
permitir.
7º - Como a parcimônia mesquinha é censurável, também o é a facilidade de dar
coisas mais do que é necessário. Tenho observado que zombam igualmente de um e
outro defeito, em algumas casas em que não se dá a devida atenção a isso, nas quais se
diz que encarecemos as coisas e que estamos cheios do dinheiro. É necessário
recomendar o meio termo entre esses dois extremos e que se observe o que aqui se
pratica quanto à alimentação.

790. – A UM PADRE DA MISSÃO

É verdade que a doença nos faz ver o que somos, muito melhor que a saúde, e
que é nos sofrimentos que a impaciência e a melancolia atacam os mais decididos. Mas
como eles só danificam os mais fracos, tirastes deles mais proveito do que vos poderiam
ter trazido de prejuízo, porque Nosso Senhor vos deu força para a prática de sua santa
vontade. E esta força aparece na resolução que tomastes de as combater com coragem.
Espero que ela apareça ainda melhor nas vitórias que obtereis sofrendo, daqui por
diante, por amor de Deus, não só com paciência, mas também com alegria e
contentamento.

791. – A ANTÔNIO PORTAIL

Paris, 23 de março de 1646.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Envio-vos minha terceira resposta, embora me comuniqueis que não recebestes
minhas cartas anteriores. Se a saúde da Senhora Le Gras o permitisse, se o tempo
melhorasse e fosse depois da Páscoa, ela poderia viajar para Mans. Antes disso, não
parece ser possível. O que dizer se ela enviasse para lá, já agora, duas Irmãs, sem tratar

.
Carta 790. – Abelly, op. cit., 1. III, cap. XXIII, p. 329.
.
Carta 791. – C. aut. – O original foi posto a venda pelo senhor Charavay, com quem tiramos a cópia. Um dos
catálogos da casa Charavay coloca, sem razão, como endereço desta carta “Ao senhor Pierre Goulart, em Sainte-
Geneviève”.
das condições até que ela esteja lá, ou que tenhamos sua aprovação, que estou
solicitando e mandarei solicitar, sem cessar1? Que vos parece?
Tendes razão e estou satisfeito com vossa proposta de deixar passar as festas,
para fazer aí o que me dizeis. Contudo, depois da visita, há um clamor de todas as
partes, solicitando-a, e não sei como poderíeis fazer a de Roma. Isso me leva a pensar
em mandar o Padre Alméras para lá, carregando sua indisposição.
Como a parcimônia mesquinha é censurável, também o é a facilidade de dar as
coisas mais do que é necessário. Tenho observado que zombam igualmente de um e de
outro defeito em algumas de nossas casas em que não se dá a devida atenção a isso, nas
quais se diz que encarecemos as coisas e que estamos cheios do dinheiro. É necessário
recomendar o meio termo entre esses dois extremos e que se observe o que aqui se
pratica quanto à alimentação.2
Pedi ao Padre Lambert vos dê a resposta sobre o restante, conforme
combinamos, sobre as decisões a vos transmitir. Dei ordem também para vos enviarem
o que pedis.
Saúdo-vos entretanto muito humildemente, assim como a pequena família,
prostrado em espírito a seus pés e aos vossos, e sou, no amor de Nosso Senhor, senhor
Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Portail, padre da Missão, em Mans.

792. – A ESTÊVÃO BLATIRON, SUPERIOR, EM GÊNOVA

23 de março de 1646.

Ó senhor Padre, como o bom Deus parece estar presente em vossa pequena
comunidade e em vossos trabalhos! E como poderíeis, sem isso, sustentar tão grande
trabalho? Não posso agradecer suficientemente a Deus pela força que vos comunica e
ao Padre Martinho, em meio a tão grandes trabalhos. E não consigo me livrar da
contínua apreensão que tenho de que os dois estejam fazendo demais. Em nome de
Deus, senhor Padre, cuidai em fazer de tal sorte que se moderem vossos trabalhos, da
maneira como vos escrevi. Não vos parece seja necessário vos revezar por algum outro,
que vos enviaríamos para vos aliviar? Podeis crer, senhor Padre, que meu coração
estremece ao vos dizer isto, por causa da perfeita confiança que tenho em vós, e com

11
A boa ordem implantada pelas irmãs no hospital de Angers fizera lançar os olhos sobre elas, para o Hospital Geral
de Mans. Neste mesmo mês de março, o Padre Portail escrevia a Luísa de Marillac: “Esperamos vossas filhas aqui
com grande impaciência... os Administradores nos pressionam” (Arq. da Missão). As Irmãs só partiram a 04 de maio.
22
São Vicente repete aqui o que já dissera na carta de 20 de março, temendo, sem dúvida, que aquela carta não tenha
chegado ao seu destino.

.
Carta 792. – Reg. 2, p. 197. O copista nota que São Vicente escreveu esta carta de próprio punho.
muitíssima razão. Mas qual! estou sempre temendo não estejais passando mal. Em nome
de Deus, senhor Padre, poupai-vos o mais possível.
Abraço-vos, e ao Padre Martinho, prostrado em espírito aos vossos pés e aos
daqueles que trabalham convosco, que eu saúdo e a cujas orações me recomendo.

793. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[24 de março de 16461].

Tenho grande motivo de me humilhar, vendo a conduta de Deus sobre mim que
sou indigna da graça que desejava receber antes de vossa querida festa da Encarnação,
a fim de que ela me servisse de preparação. Suplico a bondade de Deus poder obtê-la
antes de terminarem as festas de Páscoa e que vós, restabelecido de vossa indisposição,
possais estar em perfeita saúde para isso e para tudo o que nosso bom Deus quiser de
vossa caridade. Peço-vos, pelo santíssimo amor de Jesus, que de novo nos entregueis a
Ele e ofereçais, amanhã, à sua Santa Mãe, este quadro que se destina a ornamentar um
altar que tenha como belo título o seu nome, pedindo-lhe nova proteção para meu filho,
de que não tenho notícias desde o dia 07 deste mês. Isso me preocupa sobremodo. Não
tenho também notícia alguma da Madre Superiora da Visitação de Tours 2, nem do
senhor Padre Deure. Tudo isso enche de temores meu espírito.
Suplico-vos também humildemente, meu muito honrado Pai, que me façais a
caridade, amanhã3, de colocar no santo altar toda a pequena Companhia, cheia de
faltas e dura de coração, para que se cumpra em nós a santíssima vontade de Deus. Ó
meu caríssimo Pai, se nosso bom Deus vos permitisse ver o motivo disso, quão
horrenda eu vos pareceria! Não vejo em mim senão crime e uma bem fraca vontade de
corrigir-me. Ajudai vossa indigna filha, com vossas orações e caridosas advertências, a
ser toda de Deus e a obter de sua bondade olhe com compaixão para seu pobre filho.
Remeto-vos o livro que o senhor Padre Guérin, confessor de nossas irmãs de
Saint-Gervais, vos envia por intermédio delas. Mandou-nos também um exemplar.
Queira Deus tiremos proveito dele para sua glória!
Peço-vos, com toda a humildade a mim possível, prostrada de coração e afeto a
vossos pés, vossa santíssima bênção, para atrair sobre minha pobre alma as graças de
que tanto necessita, a fim de ser, verdadeiramente, meu muito honrado Pai, vossa muito
obediente filha e mui humilde serva,

L. de Marillac.

Véspera da Encarnação do Filho de Deus.

.
Carta 793. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Data acrescentada no dorso do original.
22
Clara Madalena de Pierre.
33
Dia da renovação dos votos.
Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

794. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[Março de 16461].

Sou indigna dos procedimentos da divina Providência, dos quais vossa


caridade me faz a honra de me advertir, a fim de me arrancar das minhas infidelidades.
Renuncio, portanto, a estas apreensões quanto ao futuro, para querer somente o que
Deus quiser ordenar, a cada dia. Entretanto, não creio ser capaz de impedir os justos
receios que terei por causa de minhas infidelidades, sem contudo faltar à submissão (do
coração).
Minha intenção não foi em absoluto que o quadro da Santíssima Virgem fosse
nem para o nosso oratório nem para o Crianças Expostas, mas para servir de ornato a
um altar dedicado à Virgem Santíssima, para, de certo modo, reparar as faltas do meu
filho. Empreguei, para mandar fazê-lo, alguns anéis que me restavam. Por isso, peço-
vos humildemente, senhor Padre, que aceiteis seja em vossa igreja que se faça a
satisfação, pois fiquei tão infeliz por o delito de meu filho ter sido praticado numa de
vossas casas.
O terço é a devoção que pedi a vossa caridade poder praticar, há três anos, e
que rezo em particular. Conservo guardados, num pequeno cofre, muitos desses terços,
com um papel no qual estão escritos muitos pensamentos sobre o assunto, para deixá-
los a nossas Irmãs após minha morte, se vossa caridade o permitir. Nenhuma delas
sabe disso. É para honrar a vida oculta de Nosso Senhor em seu estado de prisioneiro
nas entranhas da Santíssima Virgem e para saudá-la por sua felicidade durante aqueles
nove meses. As três contas pequenas são para cumprimentá-la pelos seus belos títulos
de filha de Deus Pai, mãe de Deus Filho e esposa de Deus Espírito Santo.
É isso o essencial desta pequena devoção. Pela graça de Deus, indigna como
sou, não a interrompi desde o tempo indicado e estou disposta, ajudada pela mesma
graça, a deixá-la, se vossa caridade me ordenar. Minha intenção, com este pequeno
exercício, é pedir a Deus, por meio da Encanação do seu Filho e as súplicas da
Santíssima Virgem, a pureza necessária à Companhia das Irmãs da Caridade, e o vigor
da mesma Companhia, segundo seu divino beneplácito.
Amanhã, se Deus quiser, enviar-vos-ei uma carta para o senhor Padre Portail 2
que me fareis o obséquio de ler e ver se será conveniente que lhe seja enviada.
Procurarei estar presente, também, amanhã, ao santo sacrifício da missa. E
embora creia que vossa caridade não a celebre embaixo, se pudesse saber a hora, teria
a felicidade de assistir a ela.

.
Carta 794. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta tem elos estreitos com a carta 793.
22
Então em Mans.
Favor não esquecer a resposta daquilo que a Madame Presidente de Lamoignon
solicita para saber se continuará com as coletas, e de que sou, senhor Padre, vossa
muito grata filha e obediente serva,

L. de M.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

795. – A ANTÔNIO PORTAIL, PADRE DA MISSÃO, EM MANS

03 de abril de 1646.

Fazeis muito bem, em vossa visita, ao aprofundar todas as coisas para torná-las
mais concordes com o espírito da Companhia e mais firmes. Isso me agrada. E já que
procedendo assim não poderíeis chegar a Roma, a não ser por volta do outono,
resolvemos enviar o Padre Alméras para fazer as visitas da Itália e, de passagem, as de
Marselha e Annecy. Quanto às outras casas, elas vão esperar esse benefício de vossa
caridade, e eu, a satisfação de ver-vos restabelecer nelas a ordem e a perfeição da
disciplina. Para melhor fazer isso, não precisais de apressar-vos. Não duvido de maneira
alguma de que não encontreis sempre novos assuntos a polir, a regrar e corrigir, coisas a
fazer e desfazer, particularmente na casa onde estais. Não é possível proceder de outro
modo, por esta primeira vez. Por esta razão, empregai nisso todo tempo necessário.
Deus fez o mundo em vários dias e só o conserva com a ordenação das mudanças e
mutações.
Praza a sua bondade tornar-nos constantes em seu amor!

796. – A GUILHERME DELATTRE

Paris, 07 de abril de 1646.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Acabo de receber vossa carta de 20 de março, com a cópia do contrato passado
pelas senhoras religiosas de Santa Clara convosco, a respeito do pagamento de três mil
libras pela aquisição de Fajemot, e mais o compromisso de 3.400 libras, pagáveis em
letra à vista. Enviei-vos a ratificação da referida compra. O senhor Bispo me garantiu
que ele mandará saldar o preço. Não me dissestes, pela vossa última carta, como
.
Carta 795. – Reg. 2, p. 100.

.
Carta 796. – C. aut. – Original no seminário de Colle, na Toscana.
esperais saldar a metade. E se não fosse o senhor Bispo a dizer-me que saldaria e
mandaria saldar tudo, teria eu ficado muito preocupado1.
Nessa oportunidade, passo então a dizer-vos, senhor Padre, que será
conveniente, numa outra vez, me relateis de modo resumido, porém mais
circunstanciadamente, as coisas. Neste negócio, por exemplo, me dizíeis que fostes
tratar com o Vigário Geral2 o pagamento desta soma e que ele vos tinha causado má
impressão e dissera que não tinha ordem de vos dar coisa alguma. No entanto, dois dias
depois, a soma foi entregue. Não me dissestes quem as deu, e era necessário dizê-lo, a
meu ver, como também a área do local de Fajemot, o prédio, a área da granja. Não me
dissestes também que tínheis abandonado Saint-Barthélemy durante a quaresma e a
doença do senhor Pároco3.
Penso, senhor Padre, que é conveniente me informeis mais detalhadamente sobre
as coisas e que procedais com plena confiança e submissão às vontades do senhor
Bispo. Tanto maior é vossa obrigação quanto mais ele vos estima e vos quer muito bem,
embora não o demonstre. Deseja que o deixem agir, que acolham o que ordena e o que
faz ou deixa de fazer. E é justo. Ele tem suas razões que ignoramos e que devemos
respeitar, já que, assim fazendo, cumprimos de Deus. Penso, além do mais, que não é
bom passar, para um terceiro ou um quarto, pequenos sentimentos que nos chocam. Um
bom estômago tudo digere, e um estômago delicado converte em mau humor o que
engoliu e algumas vezes o vomita. Oh! como é bom, senhor Padre, digerir os negócios
entre Deus e nós!
O senhor Arcebispo me falou do fosso. Disse-lhe que ele tem razão em não se
expor, diante da cidade, exigindo dela uma porta particular para vós. Isso acarretaria
muitas consequências em tempos de guerra. É melhor, no presente, fazer a volta pela
porta da cidade4.
Enviar-vos-emos um leitor do seminário no lugar do Padre Water 5 que virá aqui,
se lhe aprouver. Temos ordem de Roma de enviar missionários para o seu país e
estamos sendo pressionados pelo senhor bispo da região. Se ele tiver feito voto de ir a
Roma, nós lhe concederemos a dispensa dele. Abraço-o, a ele e ao Padre Treffort 6, com
11
A casa com dois corpos centrais de edifícios que o Padre Delattre acabava de adquirir do senhor Brengue, na praça
Gaillard, pertencera a uma ilustre família, muito enfronhada na vida pública de Cahors, no fim do século VI, a família
dos Pons-Fajemot, burgueses e cônsules dessa cidade. Ela estava onerada com uma hipoteca em favor das Clarissas,
que tinham direito a 5744 libras sobre as 6400 que ela custava. Guilherme Delattre pagou de imediato 3000 libras e
assumiu o compromisso de pagar o restante quando fosse exigido (Adrien Foissac, op. cit., p. 10).
22
O Reverendo Padre Garat, cuja vida foi escrita por Leonardo Roche (O retrato fiel dos abades ou outros superiores
regulares e de seus religiosos, na vida do Padre Jean Garat, Paris, 1691, in-8º).
33
O contrato de união da igreja paroquial de Saint-Etienne ou Saint-Barthélemy de Soubiroux ao seminário datava de
27 de dezembro de 1644. Os diretores do seminário não podiam tomar posse da paróquia a não ser depois da morte
ou demissão do pároco, Antônio Guittard (Foissac, op. cit., p. 9).
44
Sabemos pelo livro de registro de benefícios eclesiásticos de Dumas que, em 1646, Alain de Solminihac fez ao
seminário, então estabelecido na cidade, na Chanterie, uma primeira doação de 2000 libras, para comprar uma casa
chamada de Fajemot, situada no subúrbio de Barre, perto da igreja Saint-Barthélemy, da qual estava separada apenas
por um fosso e pelas muralhas do recinto. Ali será construído o novo seminário maior, alguns anos depois.
55
James Water, nascido em Cork (Irlanda), entrou em São Lázaro a 07 de outubro de 1638, com a idade de 22 anos.
Foi ordenado padre em 1642 e fez os votos em 1644. Foi enviado para o seminário de Cahors, depois, provavelmente,
para o seu país.
66
Simão Treffort, nascido em Villiers-Herbisse (Sube), a 02 de outubro de 1611, entrou na Congregação da Missão a
05 de outubro de 1642. Fez os votos a 07 de outubro de 1645. Foi superior em La Rose, de 1668 a 1677. Faleceu em
Cahors a 16 de junho de 1682. Em carta escrita alguns dias depois de sua morte, Edme Jolly, Superior Geral, tece um
grande elogio de suas virtudes.
toda a humildade e afeto possíveis a mim que estou pesaroso de não poder escrever aos
dois. Peço a Deus devolver a saúde ao nosso caro Irmão Dupuis 7. Se pudermos, enviar-
vos-emos um outro padre e o Irmão que pedis.
Ficai, entretanto, contente e em paz, senhor Padre, na confiança de que Nosso
Senhor abençoará cada vez mais vossos trabalhos e vos animará sempre mais com o seu
espírito. É o que lhe peço, com toda a afeição possível, e sou, no amor de Nosso Senhor,
senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Delattre, superior dos padres da Missão, no


Seminário de Cahors, em Cahors.

797. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, noite de quarta-feira [cerca de 16461].

Falarei com o senhor Vacherot 2 amanhã, se ele vier aqui, não sendo razoável que
eu o mande buscar para lhe dizer isso.
Quanto à Irmã, porém, ó Jesus, Senhora, não é conveniente. Poderei muito bem
dizer-lhe, gracejando, alguma coisa sobre a afeição dela pela tal pessoa, se houver
oportunidade. Mas me encontro muito impedido para poder dizer quando lhes poderei
falar. Jamais estive tão sobrecarregado de negócios como agora. Amanhã, durante o dia
inteiro, teremos aqui alguns doutores para tratarmos de algumas questões, e sexta-feira
preciso escrever quase o dia inteiro. Veremos.
Quanto ao documento da Senhora Viole, será necessário fazer, amanhã bem
cedo, a procuração de que fala. Sera em vosso nome, e deveis assiná-la como uma das
oficiais da Caridade do Crianças Expostas. Na verdade vós o sois, e das mais
importantes. Vou mandar redigi-la esta noite e vo-la enviarei amanhã para a assinardes.
Será necessário que o tabelião vizinho esteja presente à assinatura e que despache
alguém para trazê-la. Tratarei de enviar até aí um de nossos Irmãos, numa diligência.
Boa noite, Senhora. Sou, v. s.

V. D.

77
Clérigo da Missão.
.
Carta 797. – Dossiê da Missão, original.
11
É em torno desta data que encontramos o nome do senhor Vacherot na pena de São Vicente ou de Santa Luísa de
Marillac.
22
Sábio médico, conhecido, sobretudo, pelo seu apego ao Cardeal de Retz que ele ajudou a sair da prisão e
acompanhou até Roma. Em 1646, 1647 e 1648 era médico das Casas-Mães dos padres da Missão e das Filhas da
Caridade. Morreu em Commercy no mês de maio de 1664, com a idade de 62 anos.
798. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[Entre 1645 e 16501].

Senhor Padre,

O receio de que tenham esquecido de vos dizer que não deixarei de avisar todas
as Irmãs para virem amanhã, segunda-feira, para a conferência que vossa caridade nos
fez a honra de prometer, leva-me a importunar-vos com estas linhas. Tenho medo de
que algum outro compromisso nos impeça de ter essa felicidade. A Providência nos
trouxe Irmãs de Maule2, de Saint-Denis e Issy que, como as demais, muito se alegram
com a notícia. Queira Deus que tantas graças concedidas a nós, por sua bondade, não
sejam um dia motivo de confusão para nós, e para mim, em particular, pela graça de
ser, senhor Padre, vossa mui grata filha e humilde serva,
Luísa de Marillac.

799. – A GUILHERME DELATTRE, SUPERIOR, EM CAHORS

Paris, 19 de abril de 1646.

Senhor Padre,

Bendito seja Deus pelo que me dizeis: as coisas espirituais da casa vão bem e
estais fazendo bom uso das advertências de vosso admonitor! Rogo-lhe abençoe cada
vez mais vossa conduta.
Tivestes a oportunidade de saber da determinação do senhor Bispo de Cahors,
com relação aos eclesiásticos de sua diocese, no sentido de irem passar algum tempo em
vosso seminário, conforme julgardes conveniente1. O senhor Bispo agiliza seus
negócios quanto pode, com a intenção de voltar o mais cedo possível 2. Quando ele
estiver aí, providenciará a compra da casa3.
É bom, senhor Padre, que me digais noutra ocasião a substância ou, para dizer
melhor, a história resumida das principais coisas sobre o que me escreveis. Por
exemplo, vós me fazeis uma pequena apologia a respeito dos habitantes de Saint-
Barthélemy. Teria sido conveniente me tivésseis narrado a coisa como se passou e em
.
Carta 798. – “Suplemento às Cartas de Luísa de Marillac”, 1.129 bis.
11
Depois de 1649, Santa Luísa de Marillac não teria dito “Senhor Padre”, mas “Meu muito honrado Pai”; por outro
lado, o estabelecimento de Saint-Denis foi fundado em 1645.
22
Comuna do entorno de Versalhes.

.
Carta 799. – Pérmartin, op. cit., t. I, p. 521, carta 454.
11
Encontra-se o texto desta determinação em Foissac, op. cit., p. 20.
22
Alain de Solminihac estava em Paris.
33
A casa de Fajemot.
seguida os fatos que podem justificar-vos. Como não relatastes adequadamente como
tudo aconteceu, fico sem poder emitir algum juízo de algum erro de vossa parte. Dir-
vos-ei apenas, senhor Padre, que vossos procedimentos devem ser suaves quanto aos
meios, embora firmes em direção aos fins bons e justos, que serão tais quando de acordo
com os regulamentos ou a ordem dos superiores.
Quanto ao mais, é bom consultar os conselheiros domésticos e, em casos de
maior importância, o Superior Geral. No que diz respeito aos externos, pedir conselho
ao Bispo ou aos seus oficiais.
É assim que procedo. Raramente faço alguma coisa de minha pobre cabeça.
Maior motivo temos para nos aconselhar com os de fora quando se trata de uma ação
que diz respeito à diocese ou a algumas pessoas particulares. Neste caso, não devemos
apenas seguir a ordem dos senhores bispos e dos párocos em suas paróquias, mas
também pedir pessoalmente a permissão dos senhores bispos nas desavenças que
tivermos com seu povo e quando de escândalos que tivermos observado.
No que se refere à disciplina e desavenças que acontecem com os da Companhia,
o assunto é outro. Neste caso, pertence ao Superior Geral resolver a questão, e é a ele
que se deve recorrer.
Maior razão temos de nos cuidar em conduzir o povo com doçura e paciência,
evitando qualquer meiguice em nossas opiniões, pois que Nosso Senhor no-lo ensina em
relação ao povo, e compete a nós instruir os eclesiásticos, não só com palavras, mas
também com exemplos de como conduzir seu povo.
Sendo assim, senhor Padre, será bom acatar as ordens do senhor Vigário Geral 4
ou daquele a quem o senhor Bispo encarregou de solucionar esse atrito. Se ele nada vos
disse a respeito, é talvez porque não sabe como tendes o espírito humilde e dócil.
Suplico-vos, senhor Padre, não desanimar com o que vos digo, nem concluir que
não sois apto para a direção. A natureza e o espírito maligno vo-lo sugerem. Mas a santa
humildade e a confiança em Deus nos fazem esperar que tudo podereis com sua graça. É
este o sentimento do senhor Bispo de Cahors e o meu. E é por isto que desejo tomar
cuidado especial em vos advertir, aconselhar e confortar, porque, tendo bom espírito,
como tendes, pela graça de Deus, e boa intenção, espero da bondade de Nosso Senhor
que ele abençoará vossa conduta.
Vem-me ao espírito acrescentar-vos outro aviso, depois daquele, mas em duas
palavras: que vos habitueis a julgar as coisas e as pessoas, sempre e em todos os casos,
de maneira positiva. Se uma ação apresenta cem facetas, diz o Bem-aventurado Bispo
de Genebra5, olhai-a sempre pela melhor. Em nome de Deus, senhor Padre, procedamos
assim, embora o espírito e a prudência humana nos insinuem o contrário. Tenho em
mim mesmo esta aborrecida tendência de julgar todas as coisas e todas as pessoas
conforme meu cérebro mesquinho. Mas a experiência me mostra a felicidade de agir de
outro modo e como Deus abençoa este modo de proceder. Se o tempo me permitisse,
dir-vos-ia muitas coisas sobre isso. Mas eis que me retiram a pena da mão e me obrigar
a terminar, dizendo-vos que meu coração quer um bem especial ao vosso, no de Nosso
Senhor. E vos peço o mesmo, em correspondência, pelo amor do mesmo Senhor,
44
O R. P. Garat.
55
São Francisco de Sales.
embora o não mereça, a não ser porque vos amo mais do que vos posso exprimir, eu que
sou...

800. – JULIANO GUÉRIN, PADRE DA MISSÃO, A SÃO VICENTE

Tunis, 1646.

Retiramos das mãos de um renegado francês uma das pobres mulheres


francesas. Todos os comerciantes deram sua contribuição. A minha parte foi de 70
escudos. As duas outras mulheres estão em grande abandono. Trabalho para salvar a
que está em maior perigo. Há outras, jovens e belas, em grande perigo, se não forem
socorridas. Uma delas já estaria perdida se eu não tivesse, com muito custo, obtido um
entendimento no sentido de resgatá-la dentro de três meses e se não a tivesse colocado
num lugar em que seu patrão não pode violentá-la.
Não há muito que, para constranger uma outra a renegar Jesus Cristo, esses
homens cruéis lhe deram mais de quinhentas bordoadas. Não contentes com isso,
estando ela meio morta por terra, dois deles colocaram-lhe os pés sobre os ombros,
com tanta violência que lhe romperam as mamas. Desta maneira, terminou
gloriosamente a vida, confessando Jesus Cristo.

801. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[02 de maio de 16461].

Suplico muito humildemente a vossa caridade lembrar-se de que os lugares para


Le Mans estão reservados para sexta-feira próxima e da necessidade que temos para
isso da conferência que tivestes a bondade de prometer-nos para amanhã, quinta-feira2.
Peço-vos, muito humildemente, dar-vos ao trabalho de dizer-me o tema, para
avisarmos a todas as irmãs.

.
Carta 800. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. VII, § 12, 1ª ed., p. 139. O contrato passado a 25 de julho de 1643,
com a Duquesa de Aiguillon, para a fundação da casa de Marselha, dizia que São Vicente enviaria a Barbária, quando
julgasse a propósito, padres de sua congregação “para consolar e instruir os pobres cristãos cativos... na fé, no amor e
temor de Deus, e lá pregar missões, ministrar catecismos, instruções e exortações a que estão habituados”. O Santo
ainda não dispunha dos fundos suficientes. Por outro lado, era preciso entender-se com Roma. Quando tudo ficou
resolvido, Vicente de Paulo enviou Juliano Guérin e o Irmão Francisco Francillon, Irmão Coadjutor, para Tunis, onde
chegaram a 22 de novembro de 1645. Lange Martin, cônsul da França, os recebeu em sua casa. Juliano Guérin pôs-se
à obra, sem demora. De início, exerceu seu trabalho em segredo. Quando percebeu que não havia nada a temer, não
ocultou mais sua condição de padre e celebrou publicamente as cerimônias religiosas nas prisões. Mas se por um lado
poderia agir abertamente junto aos cristãos, não era a mesma coisa junto aos turcos. Nesse caso, a menor imprudência
poderia custar-lhe a vida.
.
Carta 801. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta foi escrita na quarta-feira que precedia o dia 04 de maio, dia da partida das Irmãs destinadas ao hospital
de Mans.
22
Esta conferência, se foi feita, não foi conservada.
Calculei quanto nossas Irmãs das paróquias trouxeram para a Casa Mãe no
ano de 1645. Atinge um total de 1129 libras e 12 soldos. Com isso, pudemos fornecer
hábitos e roupa branca a 43 Irmãs. Parece-me haver saldo de 400 libras para a Casa,
descontados os gastos, nos quais não estão os feitios dos hábitos e roupas brancas que
foram confeccionados por Irmãs daqui mesmo. Creio, senhor Padre, que, se vossa
caridade pretende falar algo sobre esse assunto, seria bom que as Irmãs percebessem
que, o que trazem, quase equivale às despesas. Como algumas trazem mais do que
gastam, elas suprem o que outras trazem de menos. Também não sei se toda a
Companhia seria capaz de entender o quanto suas economias favorecem a Casa, por
causa da pouca discrição de algumas e da maior parte, que falam com demasiada
liberdade tudo o que sabem.
Peço à bondade de Deus vos faça conhecer nossas necessidades e nossas
fraquezas, especialmente as minhas. Sou, por disposição da Santa Providência, senhor
Padre, vossa muito obediente filha e mui grata serva,

Luísa de Marillac.

Quarta-feira.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

802. – A LUÍSA DE MARILLAC

[02 de maio de 16461].

Por certo, Senhora, estou bem lembrado da assembleia de amanhã em vossa


casa, em vista das filhas que vão para Le Mans. É por isso que mandei solicitar ao
senhor Pároco de Saint-Jacques-du-Haut-Pas2, ao qual, como também às senhoras
oficiais, tinha dado a esperança de que iríeis vê-los amanhã, para pôr em ordem o
detalhe de sua Caridade. Mandei, porém, dizer esta noite, ao senhor Pároco, que não
podereis ir até lá amanhã, mas antes, talvez, na sexta-feira.
Estou atento igualmente ao que me dizeis sobre o que falam as Irmãs e o
inconveniente de que me informastes.
Boa noite, Senhora. Sou v.s.,

V.D.

.
Carta 802. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Esta carta responde à precedente. Foi escrita na página em branco da carta de Luísa de Marillac.
22
Pierre de Pons de la Grange, de Saint-Flour, doutor em direito. Foi Pároco de Saint-Jacques- du-Haut-Pas, em
Paris, de 24 de dezembro de 1645 a 1649. Tornou-se depois diretor das Missões Estrangeiras e morreu a 31 de março
de 1680.
803. – A ANTÔNIO PORTAIL

Paris, quinta-feira, 10 horas da noite, 03 de maio de [16461].

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


As Irmãs da Caridade, em nome das quais vos escrevo, partem amanhã de
manhã para Le Mans. E como não li, nem recebi vossa carta do dia 29 a não ser
exatamente agora, às nove em ponto, não posso responder-vos mais longamente
esperando até depois de amanhã pelo mensageiro que, do mesmo modo, chegará ou
mais cedo ou quase ao mesmo tempo que o coche.
Esperais só três Irmãs, mas estão indo quatro. A Senhora Le Gras vo-las envia 2.
Todas elas me deixaram tão contente como nem vos posso exprimir, por causa da boa
disposição com que vão viajar. Espero que Deus abençoará seu estabelecimento e lhes
dará a graça de levar em frente a disponibilidade atual para o trabalho. Nada vos direi
sobre o procedimento particular para com elas, a não ser que lhes providencieis um bom
confessor, de vida espiritual comprovada, de idade e prudente, que aceite seguir o modo
de dirigi-las próprio delas, que lhe comunicareis com clareza, por favor. Ninguém mais,
além dele, falará com elas, a não ser de passagem, e ele próprio, aliás, só na igreja.
Estou muito contente com a melhora do Irmão Testacy3. Meu Deus, como me
sinto preocupado com sua viagem. Ele vai fazê-la sem grande necessidade e contra o
uso da Companhia! Mas enfim, ele resolveu fazê-la. In nomine Domini, levai-o até La
Rose e dai-lhe lá um companheiro para ir até sua terra, onde ele não deve permanecer
mais do que quinze dias. O Irmão Rivanaigre 4 poderá, portanto, ficar em casa, e o Padre
Brin5 continuar o cuidado dos seminaristas, se o puder fazer, como começou.
Disse-vos na minha última carta que não era de parecer favorável a tomar de
empréstimo tão cedo dinheiro da renda, para não dar motivo ao povo de especular.
Como porém andam urgindo tanto pelos resgates, então, podereis tomar emprestado de
.
Carta 803. – C. as. – Dossiê de Turim, original. O post-scriptum é da mão do Santo.
11
A presença de Antônio Portail em Mans, o envio das Irmãs para esta cidade e outros detalhes impõem esta data.
22
Eram Jeanne Lepeintre, Cláudia Brigitte, Andrea e talvez Genoveva. Temos ainda (Cartas de Luísa de Marillac, p.
214) o regulamento que a fundadora lhes deu antes da partida.
33
Charles Testacy nasceu em Condom e entrou na Congregação da Missão a 27 de março de 1643, com a idade de
trinta anos. Fez os votos a 09 de janeiro de 1646 e foi ordenado padre no mesmo ano. Foi superior em Cahors (1646-
1647) e depois colocado na casa de Saintes. “Ele parece homem de bom senso, escreve dele São Vicente (Carta 870),
fiel a suas práticas, formado e entendido em negócios”.
44
Pierre Rivanaigre, clérigo, nascido na antiga diocese de Tournay, foi recebido na Congregação da Missão a 06 de
julho de 1644, com a idade de 23 anos.
55
Gérard Brin, nascido perto de Cashel (Irlanda), recebido na Congregação da Missão a 24 de outubro de 1639, com
a idade de 21 anos, admitido aos votos a 02 de novembro de 1642, ordenado padre em 1644. Este missionário foi
talvez o mais completo de todos os irlandeses que São Vicente recebeu na Congregação da Missão. Ele foi chamado
de Mans, no decorrer do ano 1646, para ser enviado para a Irlanda, onde fez, com vários de seus coirmãos e
compatriotas, um bem imenso. Recambiado para a França pela perseguição, Gérard Brin foi missionar na terra natal
do Santo. Algum tempo depois, foi nomeado superior em La Rose (1652-1654). Ocupou o mesmo cargo em Troyes,
de 1657 a 1658, em Meaux, de 1658 a 1660, em Toul, de 1660 a 1662. Voltou para a Irlanda em 1663 e retomou seus
trabalhos apostólicos com um zelo que a idade não arrefecera. Nem a prisão, onde permaneceu um mês, nem a
doença, que o conduziu por duas vezes às portas do túmulo, não detiveram este heroico missionário, um dos mais
dignos filhos de São Vicente.
alguém o quanto for necessário para satisfazer as necessidades mais prementes. Mas
com a maior discrição possível.
Não é aconselhável que o Padre Gallais6 vá pregar nas paróquias para nelas
fundar a Caridade. Sabeis como procedo em Paris. Procuro convencer e orientar as
damas em particular. Se ele puder fazer o mesmo, tudo bem.
Agradeço-vos os relatórios que me enviastes, pois me trouxeram grande
contentamento. Vou lê-los, se Deus quiser, amanhã, para maior alegria minha. Esta
noite, experimentei grande consolação ao ver por vossa carta os frutos que Nosso
Senhor tira de vossos trabalhos e os que se pode esperar no futuro, maiores ainda, se
houver bastante fidelidade. Peço a sua divina bondade lhes conceda plenamente esta
graça, para maior glória de Deus, e para vós, senhor Padre, a graça de partilhar cada vez
mais da sua força e do seu espírito. Eu vos recomendo a Ele com muita frequência e
com toda a capacidade de minha alma, porque a vossa me é muito cara e me está sempre
presente.
Ia terminar aqui a carta, quando vi que devia prosseguir, lembrando-me das
pobres Irmãs de Angers. Peço-vos ir visitá-las, estando a caminho. Terão grande
satisfação em vos ver e talvez grande necessidade dessa visita. A Senhora Le Gras conta
com ela, como também espera receber de muito bom coração as duas Irmãs que nos
enviais. Praza a Deus conduzir umas e outras e me dar a graça de ser, tanto quanto o
desejo, em seu amor, senhor Padre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

O Padre Gallais poderá mandar fazer por um outro a pregação da Caridade, na


cidade, e preparar as damas e instruí-las nas residências dos senhores Párocos. Em Paris,
não fazemos pregação para isso. Estabeleci anteontem Caridade de Saint-Jacques-du-
Haut-Pas, desta maneira, no subúrbio Saint-Jacques.

Destinatário: Ao senhor Padre Portail, padre da Missão, em Notre-Dame-de-


Coëffort7, em Mans.

804. – OS ADMINISTRADORES DO HOSPITAL DE NANTES A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

A grandeza de vossa caridade se espalhou por todas as regiões da terra,


principalmente nesta cidade. O Padre d’Annemont, capelão do senhor Marechal de la
Meilleraye nos garantiu que vosso zelo inclinara-se a nos socorrer, para remediar às
desordens que se cometem em nosso hospital, com prejuízo do alívio dos pobres, pela
66
Superior da casa de Mans.
77
Igreja colegial unida à Congregação da Missão.
.
Carta 804. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
negligência e desatenção dos servidores. Em favor deles, em nosso ofício de pais dos
pobres, julgamos ser dever nosso implorar, nesta urgente necessidade, vossa bondade,
no sentido de nos trazer a garantia de seis de vossas Filhas da Caridade, para a
supervisão e assistência aos pobres de nosso hospital.
Suas chagas e seus males são como lábios abertos a exigir de vossa piedade a
providencial assistência de suas filhas. Nós as recebemos com todo respeito às suas
regras e às do estabelecimento de Angers. Nada encontramos a acrescentar a respeito
da regra e do modo de viver. Com relação, porém, ao bem do referido hospital e à
direção de seus negócios, elas dependerão inteiramente de nós e dos outros nossos
sucessores no ofício de pais dos pobres. Terão acesso às provisões quotidianas,
salvaguardando a economia dos bens do referido hospital, com o parecer dos
mencionados pais dos pobres.
Quanto aos seus recebimentos, se desejardes algum tratado particular, enviar-
vos-emos o formulário e a procuração e alguém que tratará convosco. Empenhar-nos-
emos em efetivar o que vierdes a determinar nessa oportunidade, senhor Padre. Vossos
muito humildes e obedientes servos1,

J. Fourché, J. Fournier, Léonard, pais dos pobres2.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, Superior Geral da Missão, em São


Lázaro, Paris.

805. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[Antes de 16501].

Senhor Padre,

Minha fraca memória impediu-me ontem de dizer-vos que a pequena du Pont


desejava confessar-se convosco, quando do seu retiro espiritual. Acredito que era
também para vos falar sobre o desejo dos seus pais. Penso, senhor Padre, que se vossa
caridade pudesse atendê-la, ela poderia expor-lhe com mais liberdade seus
pensamentos, como também teríeis mais poder sobre seu espírito do que seu irmão,
como vos tinha posto, e que mora a quatro ou cinco léguas daqui.
Suplico muito humildemente a vossa caridade ofereça ao nosso bom Deus nossa
pequena novena que começa hoje. O bom Deus sabe que nada quero, por sua
misericórdia, a não ser sua santíssima vontade. Mas desejo que seu poder elimine todos

11
São Vicente acolheu favoravelmente a demanda dos Administradores.
22
Ver carta 813, nota 3.
.
Carta 805. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Depois de 1649, a carta começaria pelas palavras: “Meu muito honrado Pai”.
os empecilhos à perfeita execução desta santíssima vontade, na qual sou, senhor Padre,
vossa mui grata e humilde filha,

L. de Marillac.

Tende a bondade, por favor, de dizer a que horas a pequena du Pont poderá ir
encontrar-vos.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

806. – AO CARDEAL MAZARINO

Paris, 24 de maio de 1646.

Senhor Cardeal,

O senhor Grão-Mestre do Colégio de Navarra1 me disse que Vossa Eminência


ordenara ao senhor Le Tellier2 que eu lhe escrevesse informando se o senhor Douay,
licenciado em teologia, tem as qualidades necessárias para ser o diretor dos filósofos do
mesmo colégio. Eis o que pude saber, senhor Cardeal, tanto do falecido diretor quanto
de vários doutores dignos de fé. Dizem todos que é um homem de bem, muito
competente, com experiência no exercício desse cargo, no qual o falecido o tinha
empregado, já há alguns anos; acata as opiniões comuns e ortodoxas da Igreja e, enfim,
a voz pública do referido colégio é que este jovem senhor é, incontestavelmente, o mais
capaz de todos cogitados para o cargo. O que mais o confirma é que o falecido diretor,
homem santo que fez maravilhas na função, veio estar comigo, alguns dias antes da sua
morte, e me rogou empenhar-me junto a Vossa Eminência, no sentido de ter a bondade
de lhe dar este jovem senhor como coadjutor, que julgava, diante de Deus, o mais capaz
de continuar a boa ordem que instaurara em seu cargo.
Quanto a mim, senhor Cardeal, peço a Nosso Senhor santifique Vossa
Eminência, para o bem deste país. Sou, senhor Cardeal, vosso muito humilde e muito
obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.


.
Carta 806. – C. aut. – Original nos Arquivos do Ministério dos Negócios Estrangeiros, correspondência de Roma, t.
XCIV, fº II.
11
No local do Colégio de Navarra se ergue hoje a Escola Politécnica, que foi transferida para lá pelo decreto de 16 de
junho de 1804.
22
Michel Le Tellier, nascido a 19 de abril de 1603, Secretário de Estado, de 1643 a 1666, Chanceler e Ministro da
Justiça de França de 1677 a 1685, falecido a 28 de outubro de 1685. Durante as turbulências da Fronda, apoiou
Mazarino e sua política. “Na qualidade de Conselheiro de Estado, dizia ele um dia, tive oportunidade de manter
grande relacionamento com o Padre Vicente. Ele fez na França mais boas obras em favor da religião e da Igreja do
que ninguém mais do meu conhecimento. Mas observei, de modo particular, que no Conselho de Consciência, no
qual era o principal agente, jamais tratou dos seus interesses, nem dos interesses das casas eclesiásticas que
estabelecera” (Testemunho de Claude Le Pelletier, 121 e testemunha no processo de beatificação).
807. – A JEAN MARTIN, PADRE DA MISSÃO, EM GÊNOVA

Paris, 25 de maio de 1646.

Vicente de Paulo comunica a Jean Martin trabalhos dos missionários. Ele acaba
de receber na Companhia um novo recruta, sobre o qual deposita as maiores esperanças.

808. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Parece-me que o direito que tem o senhor Diretor do Hospital de Le Mans de


nomear duas Irmãs e o dos Administradores de nomear as outras, é causa da
desorganização que ocorre no serviço dos pobres. Não seria melhor que o senhor
Diretor declinasse desse direito, sem deixar de contribuir com a quantia estipulada, e
os senhores Administradores, sem contar com outro poder a não ser o que lhe outorga
a própria administração, aceitassem, para cumprir seu dever, chamar por si mesmos
Irmãs de alguma Comunidade, para cuidar dos pobres doentes? Talvez não vejais a
utilidade que possa haver em que duas de nossas Irmãs permaneçam em meio a essas
desordens.
Peço a Deus manifeste à vossa caridade sua santa vontade. Foi do agrado dele
levar para si nossa Irmã Maria Despinal, de Angers. Morreu cristã e santamente,
segundo me disse seu confessor.
Suplico-vos, mui humildemente, senhor Padre, recomendá-la às orações de
vossa santa Companhia e lembrar-vos de dar, sem demora, uma resposta aos bons
senhores de Nantes. Sou vossa muito obediente e muito humilde serva,

L. de Marillac.
28 de maio de [1646 ]. 1

809. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

.
Carta 807. – O senhor Charavay, que colocou à venda esta carta, diz no seu catálogo que o original era assinado pela
mão do Santo e compreendia uma página in-4º de texto.

.
Carta 808. – Dossiê da Missão, cópia do século XVII.
11
Ano da morte da Irmã Maria Despinal.
.
Carta 809. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
[Cerca de 16461].

Senhor Padre,

Acaba de sair daqui a Marquesa de Mortemart2. Ela me pediu suplicar-vos,


muito humildemente, vos lembreis do preceptor para seu filho 3. Continua com um padre
de Roule4 que começou a ministrar-lhe os primeiros rudimentos. Como porém duvida
de sua capacidade, diz-lhe claramente que o mantém em caráter provisório. Ele se
chama Padre Lafons. A senhora Marquesa solicita, muito humildemente, informar-vos
sobre ele, se possível, para que, se estiver em igualdade de condições com outros, possa
ser levado em conta com eles, na hora da deliberação.
Agradeço muito humildemente a vossa caridade pelo muito bem que me fez.
Parece-me que, quando me deixo levar por minhas apreensões, que me põem em estado
de verdadeira aflição, necessito ser tratada com um pouco de dureza. Vereis, pela carta
de meu filho que vos envio, minha fraqueza, por um lado, e por outro, o motivo do meu
sofrimento que faz ter tanta necessidade de vossa caridosa ajuda e de ser sempre,
senhor Padre, vossa mui grata filha e muito humilde serva,

L. de M.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

810. – A JEAN MARTIN

Paris, 08 de junho de 1646.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi vossa última carta com grande consolação, como todas as outras, o que
alivia um pouco a minha apreensão de que os trabalhos que suportais por tanto tempo
não venham a vos prostrar. Escrevi, a respeito, meus miúdos pensamentos ao Padre
Blatiron, para que procurasse moderá-los. Espero que ele lhes tenha dado atenção e que
em breve tenha boas notícias sobre isso.

11
Ver nota 3.
22
Diana de Grand-Seigne, filha do Senhor de Marsillac, falecida em Poitiers a 11 de fevereiro de 1666. Desposara
Gabriel de Rochechouart, Marquês de Mortemart, que se tornou par da França em 1650, pela elevação do seu
marquesado a ducado, e em 1669, Governador da cidade de Paris e da Ilha de França.
33
Luís Victor de Rochechouart, filho único de Madame de Mortemart, nascido a 25 de agosto de 1636, falecido a 15
de setembro de 1688, depois de ter prestado à sua pátria eminentes serviços, que lhe valeram os títulos de Marechal e
General das Galeras de França e de vice-rei da Sicília.
44
Comuna dos arredores de Paris, hoje englobada nessa cidade.
.
Carta 810. – C. as. – Dossiê de Turim, original.
Na dúvida em que me encontrava de poder escrever-vos, falei ao Padre Blatiron
acerca da saúde da senhora vossa mãe 1, que continua bem, e lhe disse que o vosso irmão
vai para Tolosa com o senhor Arcebispo, para ensinar grego ao seu sobrinho.
A propósito do assunto sobre os pais, não imagineis quanto me consola o
pensamento de que tendes os mesmos sentimentos de Nosso Senhor, e que dizeis como
ele que vossa mãe e irmãos são aqueles que fazem a vontade de Deus. Glorificado seja
seu Santo Nome para sempre!
Escrevi para Roma a fim de que o Padre Dehorgny vos enviasse esse estudante
alemão de que sabeis. Ainda não obtive resposta, mas a aguardo para bem cedo.
Crede-me, senhor Padre, que tenho grande compaixão de vossas fadigas, e praza
a Deus estejais aliviado como desejo! Até o momento, não cessarei de pedir a Nosso
Senhor que seja vossa força, vosso refrigério, vossa consolação e vosso tudo. Quanto a
mim, que eu seja sempre, senhor Padre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo, i. p. da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Martin, padre da Missão, em Gênova.

811. – JULIANO GUÉRIN, PADRE DA MISSÃO, A SÃO VICENTE

Túnis, junho de 1646.

Dois ingleses se converteram a nossa santa fé e servem de exemplo a todos os


outros católicos. Há um terceiro com apenas 11 anos, uma das mais belas crianças que
se possa ver e um dos mais fervorosos garotos que se possa desejar, muito devoto da
Santíssima Virgem que invoca continuamente para que lhe obtenha a graça de morrer,
antes que renegar ou ofender a Jesus Cristo.
Com efeito, é intenção de seu patrão levá-lo a renegar a fé cristã. Ele o
conserva consigo e emprega todos os meios com essa finalidade. Se fosse possível
enviar-nos duzentas piastras, nós o afastaríamos desse perigo. Há motivo para se
esperar que mediante a graça de Deus, seja ele um dia um segundo Beda, com tanto
espírito e virtude, pois nada se nota nele que seja próprio de criança. Fez profissão de
fé católica quinta-feira da semana santa da última quaresma e comungou no mesmo
dia, o que faz com frequência. Já foi por duas vezes açoitado com pauladas, para ser
forçado a renegar Jesus Cristo. Na última vez, disse ao patrão, enquanto este lhe batia:
“Corta-me o pescoço, se quiseres, pois sou cristão e jamais deixarei de sê-lo”.
Afirmou-me várias vezes que estava decidido a se deixar espancar de golpes e a morrer
antes que renunciar a Jesus Cristo. Vida admirável em tão jovem e tenra idade! Posso
dizer com verdade que é um pequeno templo onde repousa o Espírito Santo.

11
Gillette du Noyé, filha de Guilherme du Noyé e de Maria Nubert, livreiros em Paris.
.
Carta 811. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. VII, §10, 1ª ed., p. 133.
812. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[Cerca de 16461].

Senhor Padre,

Madame de Mortemart, não vos tendo encontrado, me encarregou de vos dizer


que aquele que está ocupando o cargo de preceptor do senhor seu filho, em caráter
provisório, deve ir procurar-vos, para que tenhais a bondade de examinar se ele é apto
para esse trabalho. Ela receia, porém, que ele vos diga apenas que está indo para
aprender de vós como se conduzir nessa função, e esta não é a intenção dela.
Nossa pobre irmã Genoveva ainda está muito doente. Quanto a mim, sou,
senhor Padre, vossa muito obediente e mui grata filha e serva,

L. de M.

Sábado.

813. – A LUÍSA DE MARILLAC

[Junho de 16461].

Esqueci-me de mandar a Senhora Le Gras ler estas cartas 2. Ela me fará o


obséquio de comunicar-me se esteve em Angers com os pais dos pobres 3, por ocasião da
introdução das Irmãs no hospital4. Verá igualmente, pelas cartas do Padre Portail, como
voltam nossas Irmãs, motivo pelo qual me sinto sensivelmente consolado5.

.
Carta 812. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Carta a se aproximar da carta 809.
.
Carta 813. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Ver nota 5.
22
O Santo anexara à sua carta a súplica que lhe dirigiam os Administradores do hospital de Nantes, no sentido de
conseguir para lá as Filhas da Caridade.
33
Nome dado aos Administradores do hospital.
44
A instalação das Irmãs no hospital de Angers ocorrera a 01 de fevereiro de 1640, na presença de Luísa de Marillac.
55
O Padre Portail, reconheçamo-lo, agira com demasiada precipitação, chamando as Irmãs para Le Mans, antes de
serem aplainadas todas as dificuldades e, sobretudo, antes de obter que, no serviço do hospital, as irmãs hospitaleiras
não se misturariam com as Filhas da Caridade. A Irmã Lepeintre e suas companheiras aguardaram a solução em Le
Mans, durante uma quinzena, numa inação que lhes deve ter sido penosa. Ao final, tudo fracassado, a 01 de junho o
Padre Portail anunciava a Luísa de Marillac que mandava duas Irmãs de volta para Paris e dava ordem às duas outras
de partirem para Angers. “Enfim, Senhora, vossas caras filhas estão de volta para vós, conforme ordem vossa. Creio
que não tiveram menos méritos em sua inatividade do que se tivessem produzido ações heroicas. Ainda quando não
tivessem feito outro bem a não ser com o testemunho de sua modéstia e serenidade de espírito nas tempestades, não
foi mal ter empregado o tempo e o dinheiro em sua viagem”.
O Padre Lambert acaba de dizer-me que é urgente o remédio a se dar à casa de
Richelieu6.
A Senhora Lamoignon se encarregou ontem de vos comunicar as decisões das
damas sobre o que propondes. Entre outras coisas, foi resolvido que envieis quanto
7

antes vossas filhas para a visita às crianças8.

814. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[Fim de junho ou julho de 16461].

Senhor Padre,

Temos pressa de enviar a Irmã Guilhermina2 para (a paróquia) São Paulo, a fim
de tirar de lá a Irmã Ana e trazê-la para aqui. Se tivésseis tempo para lhe dizer uma
palavra, vo-la enviaríamos hoje mesmo.
Pedi ao senhor Padre Lambert nos mandasse o vosso pedreiro, para ver o lugar
em que se há de construir um parlatório. Esqueci-me de dizer-vos que se poderia fazer,
em cima, um quarto, coisa também necessária, sobretudo porque o referido parlatório
deve ser coberto3. Quando Madame de Liancourt vier aqui, falar-lhe-ei disso, pois ela
entende de construção. Creio que vai contribuir com as despesas. Ela vai ocupar esse
quarto, quando dos seus pequenos retiros espirituais.
Peço-vos perdão por minhas importunações e sou, senhor Padre, vossa muito
obediente filha e mui grata serva,

L. de M.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

815. – A JEAN BOURDET, SUPERIOR, EM SAINT-MÉEN

29 de junho de 1646.

66
A Irmã Turgis foi enviada para lá algum tempo depois, na qualidade de superiora.
77
As damas da Caridade.
88
A visita às crianças expostas entregues a amas de leite.
.
Carta 814. – C. aut. – Dossiê das Filhas da Caridade, original.
11
Ver nota 3.
22
Guilhermina Chesneau.
33
O projeto de construir um parlatório foi adotado no Conselho de 28 de junho de 1646. São Vicente pediu com
insistência que o parlatório não tivesse grade, temendo que as Irmãs, com o tempo, não tivessem o pensamento de se
tornarem religiosas.

.
Carta 815. – Reg. 2, pp. 97 e 127.
Se o que me dizeis com relação às pequenas notícias da Companhia se refere
apenas às mesmas notícias, foi por distração que não as partilhei convosco e vos peço
perdão por isso, muito humildemente; mas se se trata da conduta da própria Companhia
ou de algumas pessoas particulares, não convém que vos escreva sobre isso, por muitas
razões. Penso também que o entendais assim. Ficai certo, senhor Padre, que nada faço
sem o parecer dos conselheiros que a Companhia me deu, nem sem recomendá-lo a
Nosso Senhor.
Vi por vossas cartas que, sem esperar nossa ordem, aceitastes a capela de
Plancoët1, mesmo apesar dos motivos que vos comunicara em contrário. São motivos de
peso, em especial o de que, ao nos ocuparmos em satisfazer às devoções dessa santa
capela, abandonaremos o desígnio de Nosso Senhor sobre nós, que é o de ir aos campos
à procura das pobres almas que receberiam a graça (de Deus) na própria terra e que não
iriam procurá-la em outras partes. Sei muito bem que tendes boas razões para a
afirmativa, particularmente a da mudança de ares; mas teria sido melhor comprar uma
casa de ares sadios para passeio, uma vez por semana, do que se comprometer com um
novo estabelecimento, no qual, em caso de bom êxito, tereis inimagináveis trabalhos; e
se não forem atendidos, será isso motivo de murmurações contra nós; ou então ser-vos-á
necessário empregar neles todos os obreiros que tendes e mais ainda.
Em nome de Deus, senhor Padre, não nos apressemos nas coisas. Vamos
devagarinho. Lembro-me que vos escrevi a mesma coisa em Troyes2 e me destes motivo
de esperá-lo. Podeis estar certo de que não poderíeis alegar razão alguma que eu não
tenha considerado, e com a resposta, antes de resolver qualquer coisa...3
Quanto à visita das casas da Companhia, trata-se de um uso de toda santa
comunidade e da própria Igreja. Se nela se estabelecem regras e determinações, é para
remediar falhas. E como é importante dar remédio a todas as falhas, tornam-se
necessárias tantas regras quantas são as espécies de falhas. O meio de não dar motivo a
um visitador de prescrever muitas regras é proceder de tal sorte que ele encontre poucas
falhas. E é neste sentido que tendes razão de desejar que ele deixe poucas determinações
e sou do mesmo parecer. Como também desejo que o visitador seja discreto ao emitir
ordens concernentes à igreja e à área externa, positis ponendis (observado o que se deve
observar). Quem é destinado para esse serviço terá a prudência necessária, como estou
certo de que cumprireis suas ordens com exatidão.

816. – A LUÍS THIBAULT, PADRE DA MISSÃO

Paris, 04 de julho de 1646.

Senhor Padre,

11
Hoje centro administrativo do Cantão na Cotes-du-Nord.
22
O Padre Bourdet dirigira a casa de Troyes de 1642 a 1644.
33
O registro 2 nos dá dois extratos da carta do Santo. Aqui termina o primeiro e começa o segundo.
.
Carta 816. – C. as. – Dossiê da Missão, original.
A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!
Contava antes com a felicidade de estar convosco do que a de vos escrever de
novo. Mas já que os negócios da Caridade ainda vos detiveram, tudo bem. A alegria de
vos abraçar será tanto maior quanto mais a desejei e esperei. Rogo a Nosso Senhor
reconduzir-vos com boa saúde, e ao Irmão Gondrée1 igualmente, que saúdo com afeto.
Os que dizeis que ireis trazer-nos serão bem-vindos; mas se não vos
comprometestes oralmente com aquele que quer vir para o seminário dos eclesiásticos
externos2 por 200 libras por ano, não o tragais, por favor, por tão pouco; pois não
recebemos seminaristas por menos de 250 libras. Se lhe prometestes, in nomine Domini.
Em Paris, não há pensão menor do que as nossas, nem onde os pensionistas sejam
melhor tratados; por isso mesmo, temos grande dificuldade em sua manutenção. Deus o
sabe.
Reservo-me dar testemunho da ternura do meu coração pelo vosso caro coração,
quando aqui chegardes, porque as palavras não são capazes de exprimir como gostaria a
consolação que sinto por ser totalmente para vós, no amor de Nosso Senhor, e sempre,
senhor Padre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Para ser entregue ao Padre Thibault, se estiver ainda em Saintes.

817. – A CLÁUDIO DUFOUR

Paris, 04 de julho de 1646.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Dou graças a sua divina bondade por vos ter conservado em vossa viagem assim
como o Padre des Noyelles1 e lhe suplico de coração conservar-vos em toda parte, para
a sua glória2.
Eis a resposta às perguntas de vossa carta:
11
Nicolau Gondrée, nascido em Assigny (Seine-Inférieure), entrou na Congregação da Missão, subdiácono, a 11 de
abril de 1644, com a idade de 24 anos. Foi ordenado diácono durante o Seminário Interno e depois enviado para
Saintes. De volta a Paris em 1646, recebeu o sacerdócio e se ofereceu em 1648 para ir pregar o Evangelho aos
insulares de Madagascar, onde chegou a 04 de dezembro de 1648. Deus se contentou com sua boa vontade. Chamou-
o para si a 26 de maio de 1649. São Vicente tinha elevado conceito da virtude do Padre Gondrée, que considerava
como “uma das melhores pessoas da Companhia”.
22
Nos Bons-Enfants.
.
Carta 817. – C. as. – Dossiê da Missão, original.
11
Felipe des Noyelles, nascido em Arras, entrou na Congregação da Missão a 18 de janeiro de 1642, com a idade de
trinta e três anos. Fez os votos a 02 de junho de 1646. Veremos mais à frente que ele não se adaptou ao caráter de
Cláudio Dufour.
22
São Vicente acrescentara primeiramente: “e o bem de sua Igreja”. Depois de refletir, rasurou estas palavras.
1º Não receber seminarista algum antes do retorno do senhor Bispo de Saintes 3, a
não ser que vos dê a conhecer sua intenção por carta ou por outros meios, como fez para
esse que está se apresentando e que podeis receber, se de fato o Padre Thibault trouxe
ordem dele, como vos disse. Esse procedimento não diz respeito apenas a seminaristas,
mas também a todos os outros exercícios e funções externas. Deveis lembrar-vos, por
favor, de nada empreender sem o parecer do referido senhor bispo, nem sem antes me
ter escrito.
2º Não é conveniente fazer ação pública alguma na igreja 4 paroquial, como
pregar, catequizar ou ouvir confissões5.
3º Aprovo plenamente o estabelecimento da Conferência dos Eclesiásticos
externos, já que prevedes facilidade para tal. Mas é bom escrever ao senhor bispo para
lhe obter o consentimento, pois talvez queira ele estar presente e dar-lhe início
pessoalmente.
4º É melhor, de agora em diante, usar em casa a touca, de preferência ao chapéu,
para guardar a uniformidade, já que estais agora alojados.
5º Se julgais não ser demais dar 5 soldos por semana aos pobres, podeis dar-lhes,
até 2 por dia. Mais do que isso, ou dar tanto quanto em Sedan, não vos seria possível.
6º Quanto à lâmpada do Santíssimo, Jesus, meu Deus! É preciso com certeza
mantê-la acesa. Isso é necessário; tanto mais que o óleo está barato.
O senhor bispo, dias passados, falou-me de vós, demonstrando grande satisfação
por saber que fostes colocado em Saintes, por causa dos bons comentários a respeito 6.
Estou certo de que encontrareis sempre nele muita bondade, grande tolerância e muita
abertura para tratar de negócios.
Saúdo muito humildemente toda a comunidade, a cujos pés, como aos vossos,
senhor Padre, me prostro em espírito para beijá-los e implorar o socorro de vossas
orações para mim e toda Companhia em geral, que caminha cada vez melhor, pela graça
de Nosso Senhor. É nele que vos ofereço meu pobre coração, que ama o vosso de um
modo como não posso exprimir e que me faz, para sempre, no seu amor, senhor Padre,
vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Dufour, padre da Missão, em Saintes.

818. – AOS SENHORES DEHÈRES E BAUTRU1


33
Jacques Raoul de la Guibourgère.
44
Primeira redação: em vossa igreja.
55
As palavras: se o senhor Pároco não o quiser, que se seguiram no original, foram riscadas pelo Santo.
66
Primeira redação: “do bem que lhe disseram de vós”.
.
Carta 818. – C.as. – Dossiê da Missão, minuta. O documento está em mau estado.
11
Guilherme Bautru, Conde de Serrant, Conselheiro do rei em seus conselhos, Intendente de Justiça, Polícia e
Finanças da circunscrição financeira de Touraine, membro da Academia Francesa, um dos homens mais espirituais
do seu tempo, autor de várias composições em verso, que tiveram voga, e de uma obra satírica, L’Ambigu. Iniciara-se
na diplomacia e ocupara diversos postos de embaixador. Morreu em Paris a 07 de março de 1665, aos seus 79 anos.
Paris, 08 de julho de 1646.

Senhor2,

Embora não tenha a honra de vos [conhecer], tomo entretanto a liberdade de vos
escrever [no interesse] da Congregação da Missão e de vos oferecer os serviços em
geral desta pequena Companhia, e os meus em particular, suplicando-vos o haja por
bem.
A autoridade que o rei vos conferiu, por o[ráculo] da divina Providência, no
sentido de manter sua autoridade entre seus [súbditos], conservar os direitos públicos e
garantir os direitos particulares [de cada um], leva-nos a recorrer a vós, Senhor, na
presente [ocasião], com grande confiança na caridade incomum com que exerceis tão
dignamente vosso cargo.
Somos proprietários por contrato de arrendamento, dos impostos de Angers, em
conjunto com o Hospital Geral de Paris, por doação feita a nós pelo falecido senhor
Comendador de Sillery. Presentemente, nos alertaram que os senhores prefeito 3 e
almotacéis da referida cidade mandaram publicar um arrendamento de herdade de
vários direitos sobre uma quantidade de mercadorias que entram na dita cidade, em
especial de um novo [direito] sobre o vinho, com prejuízo de vários artigos do conselho
e do arrendamento geral dos referidos impostos, que o proíbem expressamente 4. Leva-
nos isto, senhor, a vos suplicar, com insistência, mandeis cancelar do edital que
afixaram o artigo que fala do referido novo direito sobre o vinho. Com efeito, se
acontecer a taxação de novos impostos sobre este último, que meios teríamos de
conservar este arrendamento, já que o próprio arrendatário é constrangido a relaxar seus
direitos antigos, para facilitar a venda desta mercadoria5? Nisto, senhor, fareis um
benefício6 notável, não somente a nossa pequena Companhia, mas também aos pobres
do citado Hospital Geral, conservando-nos o que possuímos de mais líquido e garantido
e nos livrando de um processo que seríamos obrigados a mover junto ao Conselho,
opondo-nos a este empreendimento, o que para nós significaria um grande
aborrecimento.
Vede pois, senhor, quanto nos é necessária vossa proteção e quanto seremos
obrigados a implorar sobre vós, cada vez mais, a proteção de Nosso Senhor, ao qual
suplico, de todo o meu coração, propiciar-me as ocasiões de vos expressar as provas de
uma perfeita obediência e os testemunhos do meu desejo de ser, inviolavelmente, no seu
amor, senhores, vosso muito humilde e muito obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno superior da Congregação da Missão.

22
No início e no corpo da carta, o secretário escrevera primeiro Senhores. Substituiu em quase todo o resto o plural
pelo singular, exceto, por esquecimento, sem dúvida, na fórmula final.
33
Laurent Lamier (1645-1647).
44
Primeira redação: que proíbem expressamente de sobretaxar algo sobre o dito vinho, qualquer que seja a razão ou a
ocasião.
55
Primeira redação: do vinho.
66
Primeira redação: um serviço.
Destinatário: Aos Senhores Dehères e de Bautru, intendentes gerais da justiça,
em Touraine.

819. – A ANTÔNIO PORTAIL

Paris, 11 de julho de 1646.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi uma de vossas cartas de Saint-Méen, escrita na hora de vossa partida e
que no momento não tenho em mãos. Bem que eu suspeitava do que me escreveis sobre
o estado dessa casa, do qual vos peço enviar-me um relato mais longo.
Quanto à capela de que se encarregou 1 o Padre Bourdet, sinto-me em
dificuldades, sem saber o que resolver sobre uma coisa que nos será mais onerosa do
que útil, ao que parece. Peço-vos dizer-me vossa opinião. O Padre Brin se encontra
aqui, há quinze ou vinte dias. A santa Providência se manifestou em sua volta, servindo-
se dele para nos devolver o Padre Coglée, o qual, depois de passar alguns dias no
Seminário Interno, foi enviado a Sedan. O Padre Codoing chegou também do lugar
onde estava e está bem, no momento.
A comunidade agora está muito numerosa, com a volta dos que estavam
espalhados aqui e acolá, em missão, e com a presença de alguns outros, vindos de
Crécy, de Sedan, de Montmirail, etc. Alguns se exercitam no estudo da controvérsia, e
outros, nos casos de consciência.
Envio-vos alguns recibos a assinar, referentes às rendas do sal. Peço-vos
devolver-mos pelo presente correio.
Solicitastes, há algum tempo, os relatórios sobre a maneira de viver das Irmãs de
Caridade, que não vos puderam ser enviados, mais a tempo, para Saint-Méen. Estou vos
enviando tudo agora, depois de mandar colocar uma cópia em seu lugar.
Aguardo notícias de vossa chegada a Richelieu. Deus vos acompanhe e vos
conceda uma abundante comunicação de suas graças para operar lá, como em outras
partes, frutos de perenes bênçãos! Amém.
Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo, i. p. da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Portail, padre da Missão, em Richelieu.

.
Carta 819. – C. as. – Dossiê da Missão, original.
11
A capela de Plancoët.
820. – ESTÊVÃO BLATIRON, SUPERIOR EM GÊNOVA, A SÃO VICENTE

Julho de 1646.

Chegamos a 18 confessores. Houve mais de três mil confissões gerais e um


grande número de reconciliações de grande importância, com as quais chegaram ao
fim brigas que tinham causado vinte e três ou vinte e quatro assassinatos. A maior
parte dos que neles tinham tomado parte obtiveram o perdão e a paz, por escrito, das
partes ofendidas, e poderão conseguir a graça do príncipe e serem reconduzidos ao seu
primeiro estado.

821. – ESTÊVÃO BLATIRON, SUPERIOR EM GÊNOVA, A SÃO VICENTE

[Em torno de julho de 16461].

Quando vos escrevi sobre a ordem de nossas missões, esqueci-me de dizer-vos o


que fazíamos para a instrução do povo e alívio dos confessores. Temos dois jovens
eclesiásticos que, fora do tempo do catecismo, ensinam os mistérios (da fé) a todos os
que desejam confessar-se. Logo que estão suficientemente instruídos, recebem um
pequeno bilhete impresso para esse fim. Os penitentes o apresentam ao confessor que,
por esse meio, ficam seguros de que os que vêm confessar-se estão suficientemente
instruídos sobre as verdades cristãs. Deste modo, não ficam preocupados com
interrogá-los sobre elas. Isto ajuda o confessor a agilizar mais e evitar grande espera
em torno dos confessionários.

822. – A ANTÔNIO PORTAIL

Paris, 15 de julho de 1646.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Já vos escrevi para Richelieu, onde creio que chegastes hoje. Informei-vos de
que recebi vossas duas últimas cartas, uma de Rennes e a outra de Saint-Méen, que não
me surpreenderam muito, porque já suspeitava de tudo que me escrevestes.
.
Carta 820. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. IV, 1ª ed., p. 69.

.
Carta 821. – Abelly, op. cit., 1. II, cap. I, sec. IV, 1ª ed., p. 69.
11
Data dada por Abelly.
.
Carta 822. – C. as. – Dossiê da Missão, original.
Espero que encontreis, nessa nova visita, de que vos consolar, pelo empenho de
todos em agir bem. Espero por isso um feliz sucesso de tudo que aí determinardes e
mais firme exatidão na prática dos regulamentos. Para esse fim, rogo a Nosso Senhor
vos comunique cada vez mais o seu espírito.
O Padre Alméras partiu hoje daqui para encontrar-se convosco em Richelieu.
Mas não chegará aí tão cedo, porque se dirigiu antes até Roma, para tratar da questão de
um seminário que querem estabelecer naquela diocese. Madame Duquesa 1 doou para
este projeto uma paróquia que veio a ficar vaga e que depende de Marmoutiers2.
O Padre Alméras partiu sem levar suas cartas. Eu vo-las envio para entregar-lhas
aí, por favor, quando ele chegar.
Saúdo o Padre Gautier3 e toda a família em geral, com todo afeto e ternura a
mim possíveis. E meu coração abraça o vosso muito querido coração, com o desejo de
sermos junta e inseparavelmente unidos ao de Nosso Senhor, em cujo amor sou, em
verdade, senhor Padre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Portail, padre da Missão, em Richelieu.

823. – LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

Sexta-feira [20 de julho De 16461].

Senhor Padre,

Pareceu-me de toda conveniência enviar nossa Irmã Elisabeth 2 a Saint-


Germain-en-Laye, para se informar do modo de agir da Irmã que lá se encontra e, com
a mesma finalidade, poderá ir a Maule3 e Crespières4, localidades próximas. Assim
poderá se informar mais detalhadamente da necessidade da transferência da Irmã
Maria, que a Senhora de Bouillon pede seja retirada, e fazê-lo sem que suspeite de
outro motivo a não ser o da oportunidade de uma mudança de clima. Com efeito,
acostumada a muito trabalho, temo que adoeça quando tiver de sair. Ontem, não me
ocorreu a ideia de fazer essa proposta às nossas Irmãs. Suplico-vos muito
humildemente, senhor Padre, ter a bondade de me dizer se estais de acordo. Ela
1

1
A Duquesa de Aiguillon.
22
A célebre Abadia de Marmoutiers (Indre-et-Loire) dependia da Congregação de Saint-Maur.
33
Superior da casa de Richelieu.
.
Carta 823. – C. aut. – O fac-símile desta carta foi publicado na Revista dos Documentos Históricos, julho de 1873,
p. 50.
11
Data acrescentada no dorso do original.
22
Elisabeth Martin.
33
Localidade do Cantão de Meulan (Seine-et-Oise). As Filhas da Caridade possuíam lá um estabelecimento.
44
Localidade do Cantão de Poissy (Seine-et-Oise). As Filhas da Caridade tinham lá um estabelecimento.
poderia assim dormir hoje mesmo em Saint-Germain-en-Laye e levar à Senhora
Bouillon a resposta, se vos apraz, sobre o pedido que vos fez no sentido de enviardes
para lá um de vossos padres, para a prestação de contas das tesoureiras.
Peço a vossa caridade sua santa bênção a fim de me preparar para a sagrada
comunhão, e sou, senhor Padre, vossa mui grata serva e obediente filha,

L. de M.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente.

824. – A ANTÔNIO PORTAIL

Paris, 22 de julho de 1646.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi vossa carta, escrita de Angers, com os relatórios da visita a Saint-Méen e
do presente estado da casa. Trouxeram-me muito especial consolação, por ver que
vossas diligências são cada vez mais abençoadas pela mão paternal de Deus. Rendo-lhe,
de todo meu coração, meus muito humildes agradecimentos. Conforme vosso parecer,
senti-me no dever de escrever ao Padre Bourdet. Não terminei ainda a carta para ele 1,
mas espero concluí-la na primeira hora de folga.
O que me escreveis também das nossas Irmãs de Angers aumentou de muito
nossa alegria. Louvo a mesma bondade de Deus de vos ter feito chegar lá na hora
propícia.
Aprovo sem restrições as três palavrinhas que me sugeristes, com relação à
faculdade dos superiores particulares. Quando estiverdes de volta, vamos regulamentar
isso.
Suplico a Nosso Senhor infundir-vos cada vez mais o seu espírito para que
possais difundi-lo nos lugares por onde deveis passar, a começar em Richelieu, onde
espero que encontreis total disponibilidade para receber as graças que Deus lhes
prepara. Tende a bondade de me dar as notícias, por favor.
O Padre Alméras deve encontrar-se aí convosco, e talvez mais cedo do que eu
pensava. Partiu daqui para ir a Rennes, depois de passar por Angers. Mas como soube
que a questão se resolveria sem sua presença, escrevi-lhe que, neste caso, tomasse o
rumo de Richelieu. Não sei ainda como ele fez.
O que vos escreveram do Padre Brin não é verdade. Veio de Mans diretamente
para aqui. A experiência nos fez ver nessa ocasião que a Providência de Deus,
unicamente, o retirou daquele lugar para nos reconduzir à Companhia o Padre Coglée
.
Carta 824. – C. as. – Dossiê da Missão, original. A última frase do post-scriptum é da mão do Santo.
11
Carta 825.
que dela saíra, voltando de Marselha, e que foi depois enviado para Sedan. O referido
Padre Brin está conosco, e com grande edificação.
O Padre Codoing se comporta igualmente muito bem e vai todos os dias às
Conferências sobre casos de consciência e controvérsias.
De modo geral, toda a Companhia, pela misericórdia de Deus, vai cada vez
melhor, aqui e em outras partes, pois não recebo queixas de ninguém. A única novidade
é que o Padre Dufestel não é mais dos nossos, mas sua separação aconteceu com toda
suavidade. Atualmente é decano de Saint-Omer de Lilliers2. O Padre Coglée se retirou
também para Amiens.
Saúdo com humildade e afeto o Padre Gautier e os outros todos da casa. Abraço-
os a todos em espírito, o mais cordialmente que posso, invocando o socorro de suas
orações em meu favor e no de toda a Companhia, em particular o das vossas orações,
senhor Padre, nas quais tenho muita confiança. Peço a Nosso Senhor vos conserve e
torne participante de suas mais doces consolações, para poderdes sustentar com mais
força a magnitude de vossos trabalhos.
Sou, em seu amor e no de sua gloriosa Mãe, senhor Padre, vosso muito humilde
e obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Depois de assinada esta carta, recebi a vossa do dia 17, à qual não posso agora
responder. Dir-vos-ei unicamente que julgo excelente o que desejais colocar nas regras
do superior local.
Penso ser necessária vossa presença aqui, em razão das mudanças a fazer nas
regras.

Destinatário: Ao senhor Padre Portail, padre da Missão, em Richelieu.

825. – A JEAN BOURDET, SUPERIOR EM SAINT-MÉEN

[22 de julho de 16461].

Dizeis-me, senhor Padre, que sempre encontrais motivo de censura nas visitas
que se fazem na Companhia, e na maneira como são feitas. Suplico-vos, humildemente,
senhor Padre, levar a bem vos exponha as razões que a Companhia tem tido para
proceder assim.
A primeira é que as visitas que se fazem ou mandam fazer os que estão a serviço
do Superior Geral de uma Companhia, acontecem a exemplo da Igreja que ordena a

22
Lilliers é hoje centro administrativo de Cantão, no Passo de Calais.
.
Carta 825. – Reg. 2, p. 95.
11
Ver carta 824.
todos os Bispos visitem todas as suas igrejas de tempos a tempos e as mandem visitar
todos os anos pelos seus arcediagos e mais frequentemente pelos decanos rurais.
2º Todas as Ordens e Comunidades bem disciplinadas adotam essa prática.
3º A maior parte delas, como os Cartuchos, reconhecem que uma das principais
razões por que não precisaram de reforma foi que esta Ordem é visitada todos os anos.
4º A experiência nos mostrou que em uma de nossas casas quase desmantelada
em sua disciplina, assim como vários membros quanto aos bons costumes, por uma
visita, e só por ela, foi possível remediar a essa desgraça, de tal sorte que não há na
Companhia nenhuma outra casa que vá melhor do que essa.
5º A mesma experiência nos faz ver que todas as casas dela tiram proveito, pela
graça de Deus, algumas mais outras menos, na medida em que os superiores são mais
ou menos fiéis em observarem eles próprios ou em fazer com que os outros observem as
determinações feitas pelo Visitador.
6º A maior parte das casas insistem para serem visitadas, depois de passado o
tempo em que a visita deveria ser feita.
7º Os superiores locais solicitam as visitas, porque a comunidade em geral e
cada um em particular entram em maior união com ele e lhe acatam as ordens, depois da
visita, melhor do que antes.
8º As comunidades respiram melhor depois, porque a visita desaquece a
temperatura e fortalece os superiores que não têm força suficiente para reprimir a
ousadia de alguns. Acresce que, se há alguém na comunidade incomodando a maioria,
remedia-se parte de seu mau humor ou se alivia a comunidade com sua transferência,
ou, talvez, ele venha a melhorar.
9º Com a visita, todas as regras, ou quase, voltam a vigorar, se estavam deixadas
de lado.
10º Quando há inimizades, a caridade entre os coirmãos se restabelece.
11º Resumindo, pode-se dizer que as visitas, feitas com propriedade e exatidão,
fazem o que faz o sol: iluminam. As visitas expõem todas as faltas da comunidade a
quem lá está para remediá-las. O sol aquece, e a visita inflama as pessoas visitadas,
excitando-as a um mais intenso amor a Deus e ao próximo, a maior estima da vocação e
a maior observância das regras. E como o sol esparge sua influência sobre todas as
criaturas, pode-se também dizer que a visita traz proveito a toda a família visitada.
Sim, dir-me-eis, parece-me, porém, que esses efeitos não se notam em toda
parte. É verdade, respondo-vos, nas casas onde os superiores e os súbditos não andam
bem dispostos para merecer a graça dessa santa ação. Mas onde os superiores
demonstram bastante humildade e zelo, a visita faz maravilhas, como o mostra a
experiência, por toda a parte.
Não censuro as visitas, dir-me-eis, mas o modo como alguns da Companhia as
fazem. Bendito seja Deus, senhor Padre, por não culpardes as visitas, mas apenas a
maneira como são feitas! Vejamos como nela procedemos.
Começamos esta santa atividade por uma pregação que estimule a se fazer bem a
visita.
2º Cada qual confidencia ao Visitador suas próprias faltas, as da comunidade em
geral e as de cada particular, se tiver observado alguma.
3º Depois de ouvir cada um, o Visitador adverte a comunidade, no capítulo 2, das
faltas que lhe dizem respeito, e aos particulares, em particular.
4º Faz em seguida as determinações necessárias para que não se venha mais
recair nas mesmas faltas e introduzir o que for necessário para a boa ordem.
O que há de mal em tudo isto? Se nada há a recriminar nesta maneira de fazer as
visitas, talvez encontreis algo na execução e nas determinações do Visitador, pois estou
certo de que não o encontrareis na exortação e nas advertências.
Quanto à execução ou à informação secreta, não há comunidade em que isso não
se pratique desta maneira. Nossos senhores bispos interrogam publicamente os párocos
e o povo reciprocamente quanto às suas faltas. No que respeita às determinações, uns e
outros, os senhores bispos e os Visitadores das comunidades, as fazem. De que
serviriam as visitas sem isso? Os médicos, depois de curar um doente, prescrevem-lhe
um regime de vida, para se preservarem da recaída na mesma doença.
Sim, mas às vezes, os Visitadores fazem determinações que diminuem a
autoridade do superior e realçam a da comunidade, como a de dar um admonitor e
conselheiros a um superior, oficiais que os próprios superiores não escolhem com o
Superior Geral ou com o Visitador, se o próprio Geral não o puder fazer. Respondo que
se os superiores fossem impecáveis e infalíveis em seus conselhos, não haveria
necessidade disso. Mas como estão sujeitos a pecar e a errar e nem sempre têm o
discernimento necessário para agir sem conselho, não é justo fique ele próprio sem
admonitor e sem pessoas com quem possam se aconselhar. O próprio Geral tem seu
admonitor, seu confessor e conselheiros que a Companhia lhe deu. Não os escolheu por
si mesmo.
De resto, senhor Padre, eu vi as determinações que o Padre Portail fez na vossa
casa. E me parecem excelentes, tendo em vista o estado de vossa casa e das pessoas que
a compõem. Por isso vos suplico, pelas entranhas de N. S. Jesus Cristo, entrar, não
apenas no sentimento da importância das visitas, da maneira como se fazem, mas
também vos peço observar-lhes as determinações e fazê-las observar com exatidão.
Esteja certo, senhor Padre, que se o fizerdes, Deus abençoará e santificará cada
vez mais vossa conduta.

826. – A GUILHERME DELVILLE

Paris, dia de São Tiago1, 1646.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!

22
Cf. c. 125, n. 13.
.
Carta 826. – C. aut. – Original no Seminário Maior de Bernay.
11
25 de julho.
Soube por vossa carta e pela do Padre Rose, e pelo senhor Janus, do sofrimento
vosso e de vossa família, na circunstância de que me escreveis. Não seria capaz de vos
exprimir a dor do meu coração e como desejaria ter sofrido eu mesmo, e sozinho, em
vosso lugar, o que vós e os vossos suportaram.
O Padre Codoing, portador da presente, vos poderá testemunhar quanto isso me
tocou. Eu o envio principalmente para vos certificar de que vossos sofrimentos são
meus, e vos dizer, mais em particular, como penso diante de Deus que este negócio vai
terminar. Suplico-vos, senhor Padre, recebê-lo e acolher o que vos disser como vindo da
parte de quem é, mais do que vos pode expressar, no amor de Nosso Senhor, senhor
Padre, vosso muito humilde e muito obediente servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Delville, superior dos padres da Missão de


Fontaine-Essarts, em Fontaine-Essarts2.

827. – A ANTÔNIO PORTAIL

Paris, 25 de julho de 1646.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Eis-me a ponto de partir para Fontainebleau1 para ficar lá 3 ou 4 dias. Julgai por
aí se tenho muita folga para vos escrever. Fá-lo-ei contudo, a fim de responder ao que
me comunicais pela vossa carta do dia 17.
Começo pela notícia da viagem da Senhora Le Gras a Nantes para lá estabelecer
seis Irmãs que os Administradores do hospital pediram. Seguirá com ela a professora
que ensina aqui2 para ocupar em Richelieu o lugar da Irmã Margarida.
Não aprovo também, como vós, seus pequenos empenhos de se arranjarem, e
fareis bem em recomendar moderação, sobretudo no que diz respeito ao véu, a não ser
que o usem como as mulheres simples do povo. Falarei disso com a Senhora Le Gras3.

22
Os padres da Missão, anteriormente em Montmirail, se tinham estabelecido em 1644 em Fontaine-Essarts, numa
casa legada por Luís Toutblanc, secretário do Duque de Retz.
.
Carta 827. – C. as. – Dossiê de Turim, original.
11
A corte estava em Fontenebleau. O Santo era chamado provavelmente em razão de suas funções no Conselho de
Consciência.
22
A Irmã Turgis é quem foi colocada em Richelieu.
33
O resultado da conversa do Santo com Luísa de Marillac nos é conhecido. Esta última escrevia ao Padre Antônio
Portail a 13 de agosto (C. 148): “Não ousaria dizer-vos nada sobre a proposta do pequeno véu, a não ser que o Pe.
Vicente manifesta muito receio e com razão, embora por diversas vezes eu lhe tenha feito a proposta, não
propriamente de um véu (isso é totalmente de se temer), mas de algo que possa cobrir um pouco o rosto do frio
intenso ou do calor mais forte. Em vista disso, ele nos permitiu as Irmãs, com uso recente da touca, usassem uma
corneta de tela branca sobre a cabeça, caso necessário. Mas o véu negro, ó senhor Padre! Não me parece viável”.
Sou de opinião que adieis ainda a admissão aos votos dos Padres Gobert 4 e
Lucas5.
Quanto ao modo de agir com o Padre Coudray, sobre o qual me interrogais, não
posso sugerir-vos um melhor do que o da mansidão e da humildade. Agindo com essas
virtudes, peço-vos nada temer. Nosso Senhor abençoará o que fizerdes, e espero que
encontrareis a mesma facilidade que em outras casas, para introduzir as práticas da
Companhia e banir as que não lhe são próprias. Podereis moderar-lhe o poder em
relação à mudança de ofícios, como para os outros superiores. Enfim, é necessária a
maior uniformidade possível.
Ainda não tenho notícias da volta do Irmão Testacy6.
O Irmão Pedro Vas7 não se deteve aqui, depois de me entregar vossa carta.
Falei-vos do Padre Brin em minhas cartas anteriores. O Padre Le Blanc 8 foi
agora substituí-lo na direção do seminário de Mans. O padre Cuissot foi também
enviado para lá, no lugar do Padre Alain que chamamos de volta para aqui. O Irmão
Nicolau, que estava em Crécy, foi para Mans para cuidar dos negócios e o Irmão
Francisco Le Rogueux9 para trabalhar no jardim.
Logo que tivermos dinheiro, enviaremos o livro das cerimônias.
Nada vos direi de particular sobre a desordem da igreja, que me assinalais, mas
vos suplico aplicar o remédio que vos for possível e disciplinar tudo conforme Deus vos
inspirar.
O Padre Guérin, de Túnis, continua trabalhando com grande bênção. Escapou de
um grande perigo, depois da conversão do filho do rei, o qual, fugindo com cinco ou
seis de sua comitiva, foram batizar-se na Sicília. O pobre Padre Guérin foi obrigado a
permanecer na prisão durante um mês, sob a suspeita de ter contribuído para a fuga.
Esperava a todo momento o viessem buscar para lançá-lo às chamas, para o que estava
inteiramente disposto. Nosso Senhor, porém, quis conservá-lo e até mesmo o introduziu
mais do que nunca nas boas graças do rei, que lhe deu uma carta para o nosso rei. Eu a
tenho em mãos, mas não encontramos ninguém que saiba interpretá-la1010.
44
Evrard Gobert nasceu em Vandresse (Ardennes), entrou como padre na Congregação da Missão a 01 de julho de
1641, com a idade de 34 anos.
55
Jacques Lucas, natural de La Pernelle (Manche), nasceu a 10 de abril de 1611, foi ordenado padre em 1635 e
recebido na Congregação da Missão a 10 de março de 1638. Foi superior em Luçon (1650-1656) e em La Rose
(1662-1668).
66
Ver carta 803.
77
Irmão Coadjutor, recebido em São Lázaro a 03 de fevereiro de 1642, com a idade de 17 anos.
88
Georges Le Blanc ou Georges White, nascido na diocese de Limerick (Irlanda). Era padre, com a idade de 37 anos,
quando entrou na Congregação da Missão, a 07 de novembro de 1645. São Vicente o enviou para a Irlanda, no fim do
ano de 1646 e o chamou de volta para a França em 1648, para colocá-lo em Mans, donde o chamou para Paris em
1649. Depois disso, não encontramos mais em parte alguma o nome de Georges Le Blanc na correspondência do
Santo, ao menos em termos de certeza, porque ele tinha um homônimo. Um tal de Georges Le Blanc, bacharel em
teologia, estava metido, em 1651, entre os estudantes irlandeses da Sorbona que assinaram uma declaração contra o
jansenismo (Cf. As relações de São Vicente de Paulo com a Irlanda, por Patrício Boyle, nos Anais da Congregação
da Missão, t. LXXII, ano 1907, nº 2, p. 190). Seria ele?
99
Francisco Le Rogueux, nascido em Hiesville (Manche), entrou na Congregação da Missão a 07 de agosto de 1644,
com a idade de 16 anos.
1010
É de fato Juliano Guérin quem preparara a conversão de Chéruby, filho de d’Hadji-Mohamet, bei de Túnis. Ele o
recebia em casa durante a noite para lhe ensinar os mistérios da religião. O príncipe fugiu secretamente com três
escravos, passou pela Sicília e foi batizado em Palermo. Felipe IV, rei da Espanha, de quem dependia essa ilha,
aceitou ser seu padrinho e lhe deu uma propriedade em seus Estados. O bei, furioso, mandou matar uma escrava
cristã que, diziam, Chéruby tinha desposado. O autor da notícia sobre o Padre Guérin declara (p. 74) que o bei
mandou chamá-lo, o interrogou, e o acusado soube, não somente, pela habilidade das respostas, dissipar as suspeitas
O Padre Nouelly e o Irmão Barreau1111 chegaram a Argel, há pouco. Este último
vai ficar com o ofício de cônsul, para agir com mais liberdade nas outras coisas1212.
Estão no solicitando ainda para Salé, outra cidade da África 1313, onde é
permitido pregar Jesus Cristo. Não sabemos ainda quem escolher para lá. Peço-vos
pensar, diante de Deus, quem teria capacidade e zelo para isso e mandar-me vosso
parecer.
Tudo o mais, aqui e em outros lugares, vai cada vez melhor, pela graça de Deus,
em cujo amor sou, de todo o meu coração, senhor Padre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo, indigno padre da Missão.

Abraço com toda a ternura do meu coração a família.

Destinatário: Ao senhor Padre Portail, padre da Missão, em Richelieu.

828. – ALAIN DE SOLMINIHAC, BISPO DE CAHORS, A SÃO VICENTE

sobre ele, mas ainda conquistou as boas graças do bei, que lhe deu a permissão de mandar vir outros missionários.
Depois de algum tempo na Espanha, Chéruby foi para a Itália. Surpreendido em um porto da Itália por um corsário
enviado por sua mãe, foi reconduzido para Túnis. Demonstrou sempre a mais viva afeição pela religião católica e
pela França.
1111
Jean Barreau, nascido em Paris, na paróquia Saint-Jean-en-Grève, a 26 de setembro de 1612, abandonou o ofício
de advogado no Parlamento, para entrar, jovem ainda, na Ordem dos Cistercienses. Algum tempo depois, veio pedir a
São Vicente para recebê-lo entre os seus. Começou o Seminário Interno a 14 de maio de 1645. Em Argel, foi de uma
dedicação sem limites para com os escravos. A bondade do seu coração o levou, mais de uma vez, a se comprometer
com somas de que não dispunha, ou não lhe pertenciam, o que lhe valeu maus tratos das autoridades locais e censuras
de São Vicente. Já a ponto de perder o Padre Jacques Lesage, que uma enfermidade mortal levou a 12 de maio de
1648, ele fez os votos diante dele, embora não estivesse ainda desligado do voto simples de religião pronunciado
entre os Cistercienses. Esta dispensa só foi solicitada em 1652 e ele pôde enfim, a 01 de novembro de 1661,
validamente agora, dar-se a Deus na Congregação da Missão. Estava então em Paris, para onde o chamara o Padre
Renê Alméras, segundo Superior Geral, e tinha apenas as ordens menores. Foi ordenado padre, em 1662 ou 1663, e
passou o resto da vida na casa de São Lázaro, onde desempenhou o ofício de ecônomo. Foi, até mesmo, associado em
1672 ao ecônomo geral Padre Nicolau Talec. A 24 de maio de 1675, durante uma enfermidade grave, fez seu
testamento, ao qual ajuntou um codicilo a 07 de abril de 1679 (Arq. Nac. M 213, nº8). Deve ter morrido pouco
depois, pois não encontramos mais o seu nome em parte alguma.
1212
São Vicente comprara o consulado de Argel de Baltazar de Vias, com a ajuda pecuniária da Duquesa de Aiguillon
por conta de Lambert aux Couteaux. O Rei se apressou em ratificar o contrato. Esta medida tinha a grande vantagem
de afastar todo temor de conflito ou de simples desacordo entre o representante da França e os missionários, e dava a
estes um crédito de que a religião só poderia aproveitar-se. Contudo, o Santo preferiu confiar o ofício de cônsul a um
simples clérigo, para deixar os padres mais livres para a pregação do Evangelho. Talvez tenha sido esse o motivo pelo
qual Jean Barreau só foi chamado ao sacerdócio muito tarde, após seu retorno de Argel.
O cônsul da França era o protetor oficial dos franceses, dos judeus estrangeiros, dos gregos, dos armênios e
dos originários de país que não tivesse representante em Argel. Defendia-lhes os direitos, assumia-lhes os interesses,
facilitava-lhes o comércio e velava pela observância estrita dos contratos. Alguns direitos lhe eram atribuídos sobre
todas as mercadorias que os navios deles traziam para o porto de Argel, onde não podiam entrar e de onde não
podiam sair sem o seu passaporte. Era o juiz das desavenças entre os escravos ou entre os comerciantes das diversas
nações. Seu ofício, pelo que se vê, estava longe de ser uma sinecura.
1313
Cidade do Marrocos, na costa do Oceano Atlântico, então célebre ninho de piratas, hoje muito abaixo do seu
antigo esplendor. A França mantinha lá um cônsul. O projeto do Santo não chegou a termo; diremos mais tarde o
porquê. Desde 1643, a Companhia do Santíssimo Sacramento de Marselha pedira a São Vicente o envio de
missionários para esta localidade (Raoul Allier, A Companhia do Santíssimo Sacramento do altar em Marselha,
Paris, 1909, in-8º, p. 55).
.
Carta 828. – Arq. da diocese da Cahors, caderno, cópia.
Abadia de Chancelade, 31 de julho de 1646.

Senhor Padre,

Logo que cheguei aqui, escrevi ao senhor Bispo de Perigueux1 para lhe oferecer
meus serviços. Tendo sabido, por um de seus parentes próximos, que ele estava
aguardando obter as bulas de graça, mediante o favor do senhor Cardeal, eu o conjurei
a partir quanto antes para Paris, para tomar as providências requeridas para a
expedição delas e nada omitir, no que dependesse dele, para acelerar o processo, como
algo necessário para a glória de Deus, a salvação dos seus diocesanos e seu próprio
bem. Garanti-lhe que, se ele soubesse quanto a coisa é urgente e necessária, estaria eu
certo de que ele não deixaria passar um único momento, no sentido de trabalhar pela
aceleração da expedição. Respondeu-me que desejaria ardentemente consegui-las,
quanto antes, mas que só poderia empregar nisso a diligência que seu irmão deseja.
Ele viajou para a Holanda, a serviço do rei, e trancou o seu diploma com as cartas de
recomendação. Deste modo, ficaria paralisado até a sua volta.
Acrescentou que Sua Eminência tendo-lhe sugerido esperar essa gratuidade até
o acordo a ser feito entre o Papa e o rei, ele não poderia adiantar as providências
senão na medida em que Sua Eminência o aprovasse.
Esta resposta me chocou sobremaneira e me obrigou, vendo a confiança que ele
deposita em mim e o testemunho que me deu de acatar meus pareceres, a escrever-lhe
com mais vigor outra carta sobre o mesmo assunto. Nela lhe comunico que, tendo
refletido diante de Deus no meu retiro (que ele sabia que eu estava fazendo) sobre a sua
resposta, sentia-me impelido a lhe dizer que, se ele diferisse a obtenção das bulas até o
acordo do Papa e do rei, esse retardamento seria a causa de uma multidão de pecados
que se poderiam cometer em sua diocese e da perda de muitas almas; disso não deverá
ele duvidar, nem também de que Deus lhe pedirá contas de tudo; ficará prejudicada a
necessária estima que seus diocesanos devem ter por ele, vendo que ele prefere um
pouco de dinheiro à salvação de suas almas. Além do mais, impediria que Deus lhe
desse grandes graças, que infalivelmente lhe concederia, necessárias para a conduta de
sua diocese, e eu temeria até mesmo que não lhe subtraísse as que lhe tem concedido
até o presente, se adiasse assumir quanto antes seu ministério.
Julguei dever avisar-vos disto, a fim de agirdes com ele da maneira como Deus
vos inspirar, sem lhe revelar que vos escrevi algo a respeito, para urgir com ele no
sentido de se apresentar, sem perda de um instante, à sua diocese, que se encontra num
inimaginável estado de desolação, tanto espiritual quanto temporal. Fiz-lhe algumas
advertências prementes e lhe disse que farei outras, e que vo-las enviaria, como faço,
pedindo-vos lhas entregueis.
Estão querendo obrigá-lo a constituir como Vigário Geral o senhor Padre
Alexandre de Fontpidoux, Conselheiro no presidial, com quem estivestes no inverno
passado, em Paris, que não tem experiência alguma para conduzir uma diocese, nem

11
Jean d’Estrades, nomeado Bispo de Perigueux no decorrer do mês de julho, não tomou posse de sua diocese. Foi
transferido para Condom e substituído em Perigueux, em 1648, por Philibert de Brandon, candidato do Bispo de
Cahors.
mesmo a ciência requerida para o cargo, embora seja homem de bem e honrado. Vede
bem, vos suplico, de que modo essa diocese seria governada: por um jovem Bispo que
não sabe o que é isso, tendo como Vigário Geral quem também não o saberá. Ela seria
mais apropriada ao nosso oficial, embora este cargo exija um homem com mais
experiência, se fosse possível.
Estão falando que ele deve levar a mãe para a sua diocese. Isso não lhe fará
bem, se for verdade. Já ouvi falar disso.
Corre o boato de que o Padre de Vertueil, nomeado Bispo de Lectoure 2, deseja
trocar sua diocese com ele. Mas percebo no espírito do pessoal que não desejariam
fosse assim. Peço-vos agir com a maior energia possível, quer junto à rainha, se
julgardes conveniente, quer junto ao senhor Cardeal ou ao senhor Bispo de Perigueux,
no sentido de acelerar sua vinda para sua diocese, que se encontra em extrema
desolação, e de mostrar que as almas se perdem por falta de um bispo. Se quiserdes
fazer alusão a mim e dizer que vo-lo informei da situação, estarei totalmente de acordo,
pois é inteiramente verdade. Os fiéis não se consolam com a perda de Dom Brandão e
não deixam de publicá-lo alto e bom som, até mesmo aos amigos do senhor Bispo de
Perigueux, que mo comunicaram e disseram que isso lhe causa grande prejuízo.
Parto daqui amanhã, de volta para a minha diocese, depois de ter feito um
retiro de vinte dias que me impediu de retornar até o momento.
Suplico-vos lembrar-vos da reforma do convento dos jacobinos de Cahors e de
trabalhar sempre com vigor, como tendes feito, para proporcionar bons bispos à Igreja,
o que é o maior serviço que poderíeis prestar a Nosso Senhor.
Cuide de vossa saúde, suplico-vos, e crede-me sempre, senhor Padre, etc.

Alain, Bispo de Cahors.

APÊNDICES

1. – DECLARAÇÃO PELA QUAL SANTA CHANTAL AUTORIZA A DOAÇÃO


DO SEU CORAÇÃO AO PRIMEIRO MOSTEIRO DE PARIS

Viva Jesus!

Permito e consinto que nossas caras Irmãs de Aneccy doem meu coração, após
minha morte, a nossas caras Irmãs de Paris, do mosteiro da rua Santo Antônio, que me

22
Luís de la Rochefoucauld. Morreu como Bispo de Lectoure, em dezembro de 1654.
.
Apêndice 1. – A Vida da Venerável Madre Joana Francisca Frémiot, por Monsenhor Henrique de Maupas du Tour,
p. 323. Trata-se desta doação nas cartas 561 e 569.

testemunharam desejá-lo ardentemente, esperando, por este meio, que esses dois
mosteiros permaneçam não somente na perfeita união requerida pela caridade, mas
ainda em íntima ligação de coração e espírito, tal como sempre lhes desejei; com a
condição porém de que seja possível retirá-lo sem me abrir como se faz de ordinário,
mas somente de lado, e que seja uma de nossas Irmãs a me prestar, se possível, este
favor.
Dado a treze de abril de mil seiscentos e trinta e seis.

Irmã Joana Francisca Frémiot,


d. l. V. S. M.

Deus seja Bendito!

Irmã Joana Francisca Frémiot

Onze de novembro de mil seiscentos e quarenta e um.

2. – SÚPLICA DE SÃO VICENTE AO PARLAMENTO

(NOTA DO TRADUTOR: A “Súplica de São Vicente ao Parlamento”,contida


neste apêndice sob o número 2, assim como a “Súplica” sob o número 4, que vem
depois da carta endereçada a Antônio Portail, neste mesmo apêndice, serão
transportadas para o Tomo XIII (dos documentos) desta mesma edição de Pierre
Coste.).

3. – ANTÔNIO PORTAIL, PADRE DA MISSÃO, A UM OUTRO PADRE DA


MISSÃO

23 de maio de 1645.

O Padre Vicente recebeu vossa carta e contava responder-vos pessoalmente.


Entretanto, seus embaraços o impediram e me deu ordem para vos dizer:
1º Que ele se compadece sobremaneira com a aflição de vossos pais e com a que
o amor natural vos faz sentir pelo mesmo motivo. Suplica a Nosso Senhor lhes conceda,
a eles e a vós, o conforto necessário, e a graça de tirar disso bom proveito para a sua
glória.
2º Que não mereceis censura por lhe propor se deveis ir à terra natal, para uma
finalidade tão justa, a de procurar estabelecer a paz e providenciar para que vossa mãe
seja socorrida. Pelo contrário, sois, de algum modo, digno de louvor, diante de Deus e
do mundo, particularmente pelo fato de que vos submeteis ao que vosso superior vos
aconselhar.
Entretanto, ele vos suplica considereis diante de Deus o seguinte:
1º Embora seja verdade que a lei da natureza nos obriga a todos a dar assistência
aos pais, num caso de necessidade, o autor da mesma lei, o Filho de Deus, diz, como
sabeis, que quem não deixar pai, mãe, irmão e irmã, etc., não pode ser seu discípulo 1,
isto é, verdadeiro cristão e, com maior razão, verdadeiro missionário;
2º O mesmo Filho de Deus exigiu a prática desta máxima daqueles que
aspiravam esta qualidade de discípulos, dizendo uma vez a quem queria enterrar seu pai:
Sinite mortuos sepelire mortuos2 (deixai que os mortos sepultem os mortos), e outra vez,
a respeito daquele que queria ir fazer a partilha dos bens e dar sua parte para os pobres:
Nemo, lhe diz, mittens manum ad aratrum et respiciens retro aptus est regno Dei3
(Ninguém que põe a mão no arado e olha para trás é apto para o reino de Deus).
Dizer que há no caso uma necessidade que vos obriga, é o que não parece.
Podeis, por cartas e alguns amigos, suprir vossa ausência. Se fosse por preguiça, por
desprezo, ou por algum mau motivo que quisésseis omitir esse dever, teríeis motivo
para duvidar se faríeis mal ou não; mas como não desejais a coisa a não ser por amor a
Deus e por desencargo de consciência, e como não pretendeis omiti-la, a não ser com a
ordem de vosso superior, que ocupa o lugar de Deus, deveis ficar em paz, pois não
respondereis por isso diante de Sua Majestade, uma vez que o Padre Vicente vos
aconselha, como faz, a permanecer onde estais, tendo experiência dos grandes
inconvenientes de agir de outro modo. E quanto mais o pretexto invocado parece
fundado na caridade e na justiça, tanto mais ele se torna perigoso, porque estando
disfarçado, não se percebe o mal senão depois de provado. Mas, de ordinário, é tarde
demais para ser remediado.
Entre outros males decorrentes está o apego aos pais, aos seus interesses e às
coisas da terra, o desequilíbrio do espírito, o desprezo da regularidade e enfim a perda
da vocação. O contrário se nota naqueles que observaram as máximas do Evangelho a
esse respeito; Deus abençoou os pais e os negócios, como aconteceu com aquele que
conheceis, que ficou 20 anos sem ver sua mãe 4. Não aconteceu o mesmo com um outro
dos nossos que saíra expressamente para ajudar a mãe. Foi o que em menos pensou
estando fora; só buscava suas próprias satisfações e chafurdar no vício; sobreveio-lhe
então tão grande medo que, antes de terminar o ano de sua saída, suplicou para voltar e
foi recebido, e os negócios dos pais vão melhor do que antes.
Não sei porque inseri este último exemplo, pois não vem muito ao caso, uma vez
que não se trata de vos dissuadir da saída da Companhia, mas somente da viagem a
vossa terra. Foi sem dúvida pela experiência que temos de que os que pedem e obtêm,

1
Apêndice 3. – Reg. 2, p. 285. Esta carta, escrita em nome de São Vicente, faz, de certa forma, parte de sua
correspondência.
1
Mt 19, 29.
22
Lc 9, 60.
33
Lc 9, 62.
44
Antônio Portail fala de si mesmo.
pela insistência importuna, a permissão de ir rever os pais, perdem de ordinário a
vocação.
E ainda que essa infelicidade não vos acontecesse jamais, por causa de vossa
virtude, somente a consideração, entretanto, do mau exemplo que dareis aos outros com
essa viagem, deveria dissuadir-vos de pensar nela, senhor Padre. Com efeito, os que não
são tão virtuosos como vós poderiam dizer: porque não teria eu licença de ir, como tal
outro? E assim seria necessário dar-lhes a mesma autorização ou então contrariá-los,
com notável perigo; e uma e outra coisa seriam nocivas, tanto para um particular como
para a comunidade. Foi a principal razão que reteve o que ficou 20 anos na Companhia
sem ver a sua mãe.
O Padre Vicente vos roga, portanto, oferecer a Deus vossa vontade em sacrifício,
pela prática dessas máximas evangélicas e esperar que o próprio Jesus Cristo, pelo qual
renunciareis a vós mesmo e a vossos pais, será ele mesmo vosso procurador, vosso pai,
vosso amigo, vosso protetor e vosso tudo, ele que disse: Quaerite primum regnum Dei
et justitiam ejus, et omnia haec adjicientur vobis5 (Procurai antes de tudo o reino de
Deus e sua justiça e tudo mais vos será dado por acréscimo).
Eis, aproximadamente, o que o Padre Vicente me ordenou que vos escrevesse,
muito contrariado por não mo ter ditado palavra por palavra. Este discurso não vos
causaria aborrecimento, como acontecerá, a meu ver, por tê-lo mal composto. Rogo a
Nosso Senhor infunda nele o seu espírito, em cujo amor, sou...

4. – SÚPLICA DE SÃO VICENTE AO PARLAMENTO

(Ver atráz a observação feita no número 2 deste Apêndice.).

55
Mt 6, 33.
ANEXO II
432 BIS1 – SANTA JOANA DE CHANTAL A SÃO VICENTE

[Annecy, 22-29 de fevereiro de 1640]2

Quanto ao Visitador, é constante entre os nossos superiores e nós que ele será de
grande utilidade para conservação de nosso Instituto. Por outro lado, encontramos todos
grandes dificuldades quanto aos meios propostos para estabelecê-lo, por causa da
repulsa que sabemos estar existindo no espírito de nossa Irmã Superiora N., e é tudo o
que tememos.
Vejo claramente que não conseguiremos êxito pelo caminho proposto. É preciso,
se for conveniente, tratar de conquistar os prelados e os mosteiros, com suavidade,
levando-os com muito habilidade a entender o assunto, e ver que não haverá atrito com
a autoridade dos prelados. Com efeito, meu caríssimo Padre, seria necessário, com a
destreza da santa humildade e caridade, que o visitador não alardeie a autoridade que
tiver da Santa Sé; de outra forma, nada fará. Gostaria que já nos déssemos ao trabalho
de lhe dar esses conselhos.
Se Deus concretizar este desígnio dentro da serenidade, espero que ele
contribuirá muito para a sua glória. É preciso, porém, meu caríssimo Padre, que vossa
bondade trace as regras para o visitador. Já destes tanto de vosso tempo, tão caro e
precioso, para esse bendito assunto, que chego a me admirar de como o encontrastes em
meio à urgência e atropelo dos vossos outros negócios. É a santa dileção que Deus vos
concedeu por nós que vos leva a fazer o impossível. Nesta questão, não mexeremos em
nada, antes de obtermos vossas considerações. Deus conduza tudo ao fim determinado
por sua Providência!

448 bis1. – AO REVMO. PADRE ROBERRT LACHAU, S. J.2

04 de junho de 1640.

Cópia do Relatório do Padre Vicente, sobre a instrução dos Ordinandos, enviado, como reposta,
ao R. P. Lachau, reitor do Colégio de Montferrand, no dia 04 de junho de 1640.

[Questões colocadas pelo R. P. Lachau ao Padre Vicente].

11
Carta 432 bis. – Visitação de Annecy, cópia. Carta publicada em Santa Joana de Chantal, correspondência, Paris,
Cerf., t. V, 1993, p. 856-857.
22
1650 era ano bissexto.
11
Carta 448 bis. – Biblioteca Santa Genoveva, cópia, MS 3238, f. 283-284. Publicada na Vincentiana 1968, p. 57-
59. Fotocópia nos Arquivos da Missão.
22
Robert Lachau, reitor do Colégio Jesuíta de Montferrand, que dava suporte aos projetos e esforços do bispo
diocesano em favor dos Ordinandos.
Roga-se ao Padre Vicente enviar por escrito qual a ordem observada em sua
casa, para a instrução dos clérigos que deverão ser promovidos às Ordens sacras.

1. Por qual autoridade são enviados à referida casa.


2. É antes ou depois do exame a que são submetidos pelos Oficiais do
arcebispado, no intuito de saber a capacidade de cada um dos que se
apresentam para as citadas Ordens.
3. Se a instrução acima se faz antes ou depois da promoção às referidas Ordens
sacras, dos que foram admitidos.
4. Quantos dias permanecem na casa, para receber a instrução.
5. Sobre quais pontos incide principalmente a instrução e em que ordem.
6. Se, depois dela, se entrega a cada um deles um documento por escrito da
instrução recebida durante a permanência na referida casa.

Resposta [do Padre Vicente] aos itens acima.

1. Quanto ao primeiro, é o senhor Arcebispo de Paris que envia os Ordinandos


à Missão.
2. Os Ordinandos são examinados pelos Oficiais do senhor Arcebispo, antes de
serem enviados à Missão.
3. A vinda dos Ordinandos à Missão e a instrução se fazem antes da recepção
das santas Ordens.
4. Os Ordinandos permanecem onze dias na Missão.
5. Ensinamos-lhes pela manhã a teologia prática, que devem repetir em
seguida, como se faz com as crianças do catecismo. À tarde, há o colóquio
sobre o Pontifical. Ao longo do dia, além da referida repetição, ensinamos-
lhes as cerimônias. Logo após o levantar, fazemos juntos a oração mental, e
então se partilham os pensamentos nela obtidos.
6. Não damos aos Ordinandos, por escrito, certificado de que fizeram os
exercícios.

449 bis.1 – SANTA JOANA DE CHANTAL A SÃO VICENTE

[Annecy, em torno de 13 de junho de 1640].

Quanto ao Visitador, as razões que lhe mostram a utilidade são tão sólidas que
delas não se pode duvidar. Contudo, como Deus permitiu, sem que eu o soubesse, que
tantos mosteiros tenham sido avisados deste desígnio, e sentiram, a respeito, tão grande
discordância, e mo testemunharam, poderia eu aderir a ele, sem me dissociar deles?
Que êxito haveria com isso? Deixo-o à vossa consideração, meu caríssimo Padre, pois
11
Carta 449 bis. – Visitação de Annecy, cópia. Publicada em Santa Joana de Chantal, correspondência, Paris, Cerf.,
t. VI, 1996, p. 78-79.
eles se movimentarão em uníssono e, como dizeis, avisarão, depois, aos senhores
prelados que lhes cortarão a comunicação conosco. Haverá, então, ao que parece, uma
grande perturbação no Instituto, que goza de completa paz e união, pelo que dele
conheço, pela graça de Deus. Não sei de desordem alguma, a não ser a que aconteceu
com a dispensa dessas irmãs de N. 2, o que foi muito deplorável e exigiria pedir ao
senhor Bispo de N. uma boa mortificação para aquela superiora. São abalos
inevitáveis, quando há infidelidade ao regulamento.
Oh! meu caríssimo Padre, não posso deixar de vos confessar que me sinto
perplexa quando considero a utilidade desse visitador, e receio, ao mesmo tempo, que
não seja possível estabelecê-lo, sem um grande transtorno no Instituto, caso este não o
aprove. E fico com o pressentimento de que, nesse caso, não fizesse mais mal do que
bem e, portanto, não sendo possível ganhar as casas com doçura, se não seria melhor
deixar as coisas como estão, nos braços da Providência divina, em vez de ir em frente.
Eis minha opinião e a de alguns senhores Prelados.

498 bis.1 – SANTA JOANA DE CHANTAL A SÃO VICENTE

[Annecy], 24 de novembro de 1640.

Não posso duvidar da necessidade de um visitador apostólico para conservar a


uniformidade no Instituto e impedir as mudanças. Se isso não se fizer durante minha
vida, deixarei sobre a questão relatórios bem claros e preciosos que será necessário
examinar bem e consultar. A assistência de vossa bondade e de pessoas competentes
será imprescindível, pois, embora saiba muito bem do desejo de que eu diga sempre
meus pensamentos, eu o farei com toda singeleza, não, porém, para me prender a eles.
Creio, meu caríssimo Padre, que é preciso tempo para rezar muito e ponderar a
questão, como e quando deveria surgir a solução, pois ainda penso que o motivo que
levou esses senhores a suspender-lhe o andamento persiste sempre. A Irmã Superiora
me escreveu que se tratava de um segredo que não ousava colocar no papel. Penso que
se referia àquele que nosso Bem-aventurado Pai não quis; ora, Deus nos livre dele.
Não pensaríeis que estou adivinhando, meu caríssimo Padre? Folgaria muito em saber
se , por consideração para com esse personagem, não seria conveniente, ou até
necessário, deixar dormir o assunto até que ele se apague em seu espírito. Creio que
me compreendeis, tanto mais quanto não há urgência, pois os mosteiros estão no fervor
de suas observâncias, graças a Nosso Senhor.
Penso, às vezes, que, se Nosso Senhor me desse ainda um pouco de vida, eu
deveria enviar nosso confessor aos nossos mosteiros para examinar o estado de suas
observâncias e dizer-lhes meu último adeus, a fim de levar-lhes as notícias ao nosso
Bem-aventurado Pai. Esse pretexto não levantará suspeita. Como é conhecido e

22
Ruão.
11
Carta 498 bis. – Visitação de Annecy, cópia. Carta publicada em Santa Joana de Chantal, correspondência, Paris,
Cerf., t. VI, 1996, p. 151-152.
estimado por grande parte de nossas casas, pelo menos das principais, poderia lançar
suavemente a opinião da necessidade de algumas visitas para a continuação da
uniformidade. Se fosse conveniente, poderia mostrar a carta que lhes havia escrito
sobre esse assunto, e que foi aprovada por todos vós. Tenho confiança de que elas se
poriam de acordo com isso, em sua maioria; guardariam ao menos o segredo,
aguardando que se conquistassem os senhores nossos prelados. Não posso persuadir-
me de que não chegassem ao acordo, se o assunto lhes fosse bem apresentado, como
poderiam fazer os senhores Bispos de Sens, de Bourges e de Chalon, e vós, meu
caríssimo Padre. Com efeito, uma vez por ano, vários dentre eles vão a Paris.
Conquistando alguns deles, fariam um decreto de aprovação que poderia ser
comunicado a outros, acompanhado de cartas favoráveis, conforme se julgasse
conveniente.
Se não se introduzisse essa instituição de comum acordo, ao menos o dos
principais, ela traria perturbação ao Instituto. Nesse caso, seria preferível aguardar o
surgimento de alguma necessidade que não fosse possível sanar pelos meios ordenados
pelo Costumário.
Lanço aqui, diante do coração de meu caríssimo Padre, tudo que me vem ao
pensamento, porque sei que me suporta cordialmente. Com efeito, Deus meu! Sei lá o
que estou dizendo. Essas grandes questões não são para espíritos miúdos como o meu.
Com certeza estou abusando de vosso tempo, mas é a bondade do vosso coração
paternal que me inspira toda a confiança. Meu boníssimo e caríssimo Padre, suplique à
infinita Bondade que me receba, ao partir desta vida, entre os braços de sua doce
misericórdia. Sou...

26. – A LUÍSA DE MARILLAC

São Lázaro, meio dia de segunda-feira [11 de fevereiro de 16411].

Senhora,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Agradeço-vos muito humildemente o cuidado que tendes comigo. Estou
passando bem, graças a Deus. O senhor Delorme esteve comigo ontem e me mandou
tomar um remédio; tomei-o hoje. Não tenho mais febre e quase nenhuma inchação no
rosto. Desse modo, pela graça de Deus, só depende de mim fazer penitência por meus
pecados. Parece que Nosso Senhor quer dar-me tempo para isso.

.
Carta 26. – Carta autógrafa.
Original com as Filhas da Caridade da Paróquia Saint-Projet, em Bordéus. Publicado nos Anais C. M., 1928, p. 256-
257.
11
Data exigida pela do estabelecimento das Filhas da Caridade em Sedan (fevereiro de 1641) e pela comparação do
conteúdo da carta com o das cartas 512, 513, 514, 517, 518, 519 da edição Coste (t. II, p. 159-161; 163-167).
Mandei reservar e pagar dois lugares no coche de Sedan que partirá amanhã às
dez horas. Mantende nossas Irmãs prontas para partir às nove, por favor. Sinto muito
não poder estar com elas. Se Deus quiser, espero celebrar a missa na intenção delas.
Escrevi à Madame Duquesa2 e ao padre capuchinho que está lá, conforme me
dissestes. Resta uma dificuldade: dizem-me que há o temor de que haja alguma
proibição em relação ao comércio com essa cidade, o que me levou a escrever à
Madame Duquesa de Aiguillon e rogar-lhe me avise se há perigo em mandar para lá
essas filhas. Aguardo a resposta. Como é possível que ela não tenha tido tempo de ver
minha carta, solicitei a um funcionário do senhor Chanceler 3 que o indague a respeito e
me transmita as informações.
Não deixareis de mantê-las em estado de partir na hora combinada, por favor.
Estou mandando um padre daqui atender a essa filha, e sou, no amor de Nosso
Senhor, Senhora, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: A Senhora Le Gras.

27. – A SANTA JOANA DE CHANTAL1

Paris, 09 de junho de 1641.

Minha muito cara e muito digna Madre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi hoje a carta que vossa bondade me escreveu com o endereço de nossa
Madre do subúrbio2. Como resposta, vos direi, minha cara Madre, que rendo graças a
Deus por todas as que ele concede a vossos pobres missionários, segundo a

22
A Duquesa de Bouillon (1615-1657), recentemente convertida ao catolicismo, contribuiu financeiramente para o
estabelecimento das Filhas da Caridade em Sedan.
33
Pierre Séguier (1588-1672), servidor dócil da política interior de Richelieu e, depois, da de Mazarino. Caridoso,
favoreceu as obras de São Vicente.
.
Carta 27. – Carta autógrafa.
Original com as Visitandinas de Orthez (Basses-Pyrénées).
Carta publicada em parte na edição de Coste nº 539 (t. II, p. 185-186), segundo uma cópia incompleta inserida no
Processo de Beatificação de Joana de Chantal. Fotografia no Arquivo da Missão, Paris.
Texto original, com uma introdução histórica, publicado (com a forma e a ortografia do original) nos Anais da
CM 1954-1955, p. 621-628.
11
Santa Joana Francisca Frémiot de Chantal (1572-1641). Depois da morte do marido, colocou-se sob a direção de
São Francisco de Sales, que a orientou para a vida religiosa. Juntos, instituíram a Ordem da Visitação. Depois da
morte de São Francisco de Sales, consultou São Vicente em assuntos de sua direção espiritual e sobre os negócios de
sua Ordem. Nas cartas que ele lhe dirige, São Vicente se esforça por adotar o estilo e a maneira de São Francisco de
Sales. Desde 1622, São Vicente foi o superior eclesiástico da Visitação na diocese de Paris: Primeiro mosteiro (1619)
instalado no subúrbio Santo Antão em 1621; segundo mosteiro instalado em 1626 (subúrbio Saint-Jacques); terceiro
mosteiro instalado em 1639, em Saint-Denis.
22
Trata-se de Ana Margarida Guérin, superiora do segundo mosteiro da Visitação, no subúrbio Saint-Jacques.
comunicação3 que vossa Caridade permite que lhe façam, e rogo a ele que os torne
dignos do proseguimento da mesma graça, pelo bom uso que desejo muito que façam
dela. Em nome de Nosso Senhor, minha digna [Madre], continuai a fazer-lhes a mesma
caridade.
Procurarei obedecer-vos quanto à visita do subúrbio e seguirei a ordem que
vossa bondade me determina, se impetrardes a Nosso Senhor me faça participar da
firmeza suave que ele vos concedeu. Oh! que vosso bom anjo nos ajudaria muito nisso,
se vós, minha cara [Madre], o suplicardes com diligência.
Eis como está a questão da qual um Prelado se queixou àquela que vos escreveu,
conforme vossa caridade me informa. Não preciso falar-vos aqui sobre o trabalho de
vossas caras Filhas que estão em Madeleine4. Algumas dentre as Professas, temendo que
nossas Irmãs se retirassem e que prevalecessem as desordeiras, encontraram um meio de
escrever a Madame Duquesa de Aiguillon por conta própria, e suplicaram-na, à revelia
da Superiora, para ir vê-las. Ela o fez, porque tem amor e é benfeitora da Casa. Elas lhe
fizeram suas queixas e Madame falou disso com esse senhor, pedindo-lhe que pusesse
fim a essa questão. Como notasse que o caso se arrastava e o incêndio continuava e se
difundia cada vez mais, tudo fomentado pela ousadia a que se davam, por serem
sustentados pelo dito Senhor, a senhora Madame lhe mandou dizer que lhe pedia que
acabasse com o negócio ou ela daria queixa dele. Isso o aborreceu ao extremo e o
indispôs muito contra vossas caras Filhas, dizendo que tudo veio delas: o que não é
verdade. Disso eu asseguro vossa caridade; digo-vos que não têm parte alguma em...
(rasgão)... que eu fosse até o local para vos relatar as circunstâncias da questão, minha
digna Madre. Veríeis que são inocentes; ele mesmo me declarou, há algum tempo, que
não o cria, mas que elas eram, pelo menos, o motivo pelo qual fora maltratado.
A Casa, no presente, vai bem. Foi uma pequena tempestade que passou e que
deixou uma tranquilidade maior do que nunca nesses espíritos. Deste modo, há razão
para louvar a Deus, e quanto a vós, minha cara Madre, para vos certificar de que a
conduta nesse negócio foi ditada pelo conselho do irmão e da irmã desse senhor, e em
espírito de respeito e de submissão, e nada em contrário.
Aconteceu recentemente outra pequena refrega sobre o mesmo assunto que foi
ocasião de novas queixas, mas posso assegurar-vos, minha cara Madre, que não há falta
da parte delas. Vede, pois, que é Nosso Senhor quem permite que vossas Filhas sejam
provadas desta maneira. Bendito seja Deus porque o são sem motivo! A caridade é
paciente, diz São Paulo5. A grande obra de caridade que praticam não merece que por
ela venham a sofrer, a fim de se exercerem na paciência? Jamais se viu obra de Deus, no
interesse de Deus, onde não aconteça a paga com tal moeda.

33
São Vicente aconselhava aos seus coirmãos de Annecy a fazer a sua comunicação interior a Santa Joana de
Chantal; estes recorriam à superiora da Visitação em suas atribulações espirituais e lhe confiavam praticamente a
direção da própria alma.
44
O mosteiro de Santa Madalena (casas de moças arrependidas) era dirigido desde 1629 por religiosas da Visitação.
A superiora era então a Madre Ana Maria Bollain.
55
1 Co 13, 4.
Nossa cara Madre da Cidade6 parece ter o espírito de Deus em sua conduta.
Nossa querida Irmã Angélica7 vive em suas enfermidades com tal humildade e
cordialidade com as Irmãs que me causa edificação. Oh! como desejo a mesma bênção
para todas as Ordens: uma harmonia admirável aos olhos de Deus, motivo de edificação
para quem as vê.
Boa noite, minha cara Madre!
Sou, no amor de Nosso Senhor, vosso humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

Se não puder escrever, por agora, ao Padre Codoing8, será na próxima ocasião.
Espero que esta carta encontrará o Padre De Horgny 9, de nossa Companhia, em
Annecy1010, onde foi estar com vossos Missionários. Vossa bondade dirá, entretanto, ao
Padre Codoing, por favor, minha digna Madre, que estou entregando quatrocentas libras
ao Senhor de Menthon1111, pelo trimestre de julho.

Destinatária: A minha digníssima Madre Chantal, Superiora do Primeiro


Mosteiro da Visitação de Annecy, em Annecy.

28. – A SYLVESTRE DE CRUSY DE MARCILLAC1

Bispo de Mende

Paris, 06 de dezembro de 1641.

Senhor Bispo,

Agradeço-vos muito humildemente pela graça que concedestes aos vossos


missionários ao recebê-los com tanta bondade. Rogo a Nosso Senhor faça ele mesmo
por nós o devido agradecimento e que seja ele próprio vossa recompensa. Que ele nos
torne dignos, a eles e a mim, de vos servir na medida do vosso desejo.

66
Luísa Eugênia de Fonteines, que acabava de ser eleita, a 16 de maio de 1641, superiora da Visitação da rua Santo
Antão.
77
Maria Angélica Le Masson ou Helena Angélica Lhuillier ou ainda alguma outra religiosa da Visitação.
88
Bernardo Codoing, padre da Missão, nascido e falecido em Agen. Entrou na Congregação da Missão em 1636, era
superior da casa de Annecy desde 1640. Abandonou a Companhia depois de 1650.
99
Jean De Horgny, padre da Missão. Ingressou na Congregação da Missão em 1627. Nesta época, era superior do
Colégio dos Bons-Enfants. Em junho de 1641, se encontrava em Annecy, para a visita canônica.
1010
Os padres da Missão foram estabelecidos em Annecy em 1640, para missionar na diocese e receber os
ordinandos. O primeiro superior abriu pouco depois um seminário em sua casa.
1111
Membro da nobreza saboiana que morava em Annecy.
.
Carta 28. – Carta autógrafa.
Original comunicado pelo senhor Saffroy, livreiro em Paris (1927). Texto publicado nos Anais da CM, 1927, p. 235-
236.
11
Nascido em 1571, Bispo de Mende de 1628 a 1659, data do seu falecimento.
Vosso Vigário Geral talvez vos tenha escrito, como o senhor Chanceler 2 me
testemunhou, que ele estava muito contente por trabalhardes com tanto ardor em vossa
diocese; que não haverá necessidade de voltardes aqui, senhor Bispo; que não concederá
nada aos que vos exercem a paciência e que vos dão motivo para vir impedi-lo; que, na
verdade, a oferta que fazem de reembolsar o direito de que se trata e de liquidá-lo em
favor da província, dentro de dez anos, lhe parece razoável, já que é tão vantajoso para a
região. Não tendo previsto a resposta à questão, reservei-me dar-lha, e o farei, quando
estiver melhor informado. Falarei do caso àquele que me fizestes a honra de me
comunicar que o diga, no sentido de prestar o serviço no tempo e lugar devidos.
Estive também com o Senhor de Vertamont3, com a finalidade expressa de tratar
do negócio do vosso Vigário Geral, com o qual não me encontrei depois, a fim de lhe
dizer como o referido Senhor de Vertamont me prometeu de bom grado que faria a
devida justiça ao vosso referido Vigário Geral e que ele queria conversar sobre ele com
o Senhor de Morangis4, que concedeu o indulto em seu favor.
Acrescento a isso, senhor Bispo, a muito humilde prece que vos dirijo de mandar
entregar cinco escudos aí ao Padre Savinier 5, para comprarem roupa , ele e o Padre Le
Sage6. Eu os pagarei aqui ao vosso Vigário Geral. Não pude dar-lhos aqui, porque há
muito tempo que não o vejo, e não sei por qual outro endereço vo-los enviar.
Sou, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Bispo e Conde de Mende e de Gévaudan, em Mende.

562 bis.1 – PARA A MADRE LUÍSA EUGÊNIA DE FONTEINE, SUPERIORA DA


VISITAÇÃO DE PARIS

São Lázaro, domingo ao meio-dia [início de 1642].

Minha mui cara Madre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convoco!

22
Pierre Séguier.
33
Provavelmente Francisco de Verthamont, Conselheiro de Estado.
44
Provavelmente Antônio Barileon, Senhor de Morangis, referendário.
55
Annet Savinier, padre da Missão, nascido perto de Clermond-Ferrand. Ingerssou na Congregação da Missão em
1635.
66
Jacques Le Sage, padre da Missão, nascido em Suffray (diocese de Ruão) cerca de 1614. Ingressou na
Congregação da Missão em 1639. Morreu em Argel, em 1648.
1
Carta 562 bis. – Original perdido. Uma cópia manuscrita se encontra nos arquivos da Visitação, Avenida Denfert-
Rochereau 68, Paris. Fotocópia desta cópia nos Arquivos da Missão, Paris.
12
Octave de Bellegarde.
Escrevi ontem a nossa Madre do subúrbio que o meu pensamento era de que,
embora respeite o do senhor Bispo de Sens2 e não tenha eu mudado de opinião, convirá
mandar celebrar uma oração fúnebre, em favor de nossa digna Madre3, e ficaria sentido
se não fosse realizada.
Entretanto, para se proteger, de algum modo, contra os que encontrem
dificuldade nisso, seria bom reunir o conselho para esse fim. Supondo, porém, o parecer
do senhor Bispo de Châlons4, importa falar com o senhor Arcebispo 5, como é justo, e
ele, a não ser que sua sobrinha do subúrbio insista com ele, enviará o caso a seu
conselho, até mesmo, talvez, se ela vier a escrever-lhe. Vede, minha cara Madre, se há
inconveniente em mandar que esta filha lhe escreva, ou, então, se é oportuno que vós e
nossa cara Madre do subúrbio rogueis conjuntamente ao Monsenhor Le Blancq 6 que
fale com ele e vos comunique o que fazer, no caso. Não vos esqueçais de lembrar que se
faça a mesma coisa em Bourges e em Nevers. Submeto, porém, meu pobre pensamento
ao vosso juízo e ao de nossa cara Irmã H.A. 7, que saúdo de coração, como só Deus sabe,
no amor do qual e de sua Santa Mãe, sou, minha cara Madre, vosso humilde e obediente
servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

29. – A BERNARDO CODOING1

São Lázaro, 09 de fevereiro de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Está aqui uma carta do senhor Cardeal Mazarini 2, em nossa recomendação,
dirigida ao Cardeal Antônio3, sobrinho de Sua Santidade. Recebi ontem a vossa carta do
lugar da missão onde levastes vossos seminaristas. Oh! como minha alma ficou
consolada por tudo que contastes da missão, como também pela proposta de compra

23
Joana Francisca Frémiot de Chantal.
3

44
Felix Vialart de Herse, Bispo de Châlons-sur-Marne.
55
João Francisco de Gondi, Arcebispo de Paris.
66
Denis Le Blancq, Viário Geral de Paris.
77
Provavelmente Irmã Helena Angélica Lhuillier, Visitandina.
.
Carta 29. – Carta autógrafa.
Original na Biblioteca da Universidade de Amsterdam (Schenkings Diederichs 59 Ap.).
Carta publicada na edição Coste (Nº 570 t.II, p. 223-226) a partir de uma cópia com falhas; editada com a disposição
e a ortografia do original nos Anais da C.M. (1953, p.253-254).
11
Superior da casa de Annecy, B. Codoing acabava de ser nomeado superior da casa de Roma.
22
O Cardeal Mazarino (1602-1661), presente então na corte da França sem função definida; conselheiro de
Richelieu , será seu sucessor a partir de 17 de dezembro de 1642.
33
Antônio Barberini (1608-1671), subrinho do Papa Urbano VIII. Era então muito influente, por causa dos
numerosos cargos que exercera sucessivamente na Cúria.
dessa casa, se estiver na cidade de Annecy, ou tão próxima que vos possa servir de
residência, da mesma maneira como se estivessem na cidade. Mas nos é impossível
ajudar-vos com esses 7.000 florins. O Padre Du Festel4 tratará, portanto, de se arranjar
com os mil ducados, parte da soma empregada para rendas.
Fizestes bem em me advertir no sentido de não empenhar Sua Eminência 5 no
projeto do senhor Bispo de Genebra 6. Não fosse isso, eu iria escrever amanhã, a
respeito, ao Senhor de Chavigny7, em Lyon, para lhe falar do assunto. Vossa presença
em Roma será muito importante junto ao senhor Embaixador 8 para esse fim. Pedirei ao
Senhor de Liancourt9, muito amigo dele, lhe escreva sobre isso, em seu melhor estilo
possível.
O Padre Thévenin, Pároco de Saint-Etienne, no Delfinado1010, me escreveu
várias cartas, todas elas no sentido de trabalharmos para fundar um seminário de padres,
a fim de prepará-los para as paróquias e outros benefícios. Ele me pressiona com
numerosas razões, apelando até para os juízos de Deus. Esteve convosco no Delfinado e
em Annecy, e conosco aqui. Gostaria muito que vos désseis ao trabalho de estar com
ele, de passagem, e entregar-lhe minhas cartas. Entre essas, há uma letra de câmbio a ser
sacada em Lyon dos senhores Mascarini e Lumague1111, no valor de 250 libras, que ele
me comunica ter gasto para vir estar conosco. Ele me pressiona para abandonar nosso
projeto (das missões) para seguir o que ele propõe, o que eu não teria dificuldade em
fazer, se fosse do agrado de Nosso Senhor. Mas, 1º a Companhia, tendo sido aprovada
pela Santa Sé, que goza de infalibilidade na aprovação das Ordens que Nosso Senhor
institui, pelo que ouvi do falecido Padre Du Val 1212; 2º e sendo a máxima dos santos
rejeitar, como tentação, o que é contrário ao que foi decidido, diante de Deus, depois de
muitas orações e conselhos tomados; 3º e, enfim, tendo sido do agrado de Deus
propiciar uma aprovação universal, por parte de todos, a essa boa abra (das missões), de
tal sorte que, em todo lugar, todas começam a apreciá-la e nela trabalhar, e a
misericórdia de Deus tendo acompanhado com suas bênçãos esta obra: parece-me que
seria necessário um anjo do céu para nos persuadir que é vontade de Deus que
abandonemos essa obra, a fim de assumir uma outra que já foi iniciada sem êxito em
diversas partes.
Como, entretanto, o Santo Concílio de Trento 1313 recomenda essa obra, nós nos
demos a Deus para servi-lo nisso em toda parte, quando nos for possível. Vós
começastes1414, o senhor Bispo de Alet1515 faz a mesma coisa, o senhor Bispo de
44
Francisco du Festel acabava de ser nomeado superior da casa de Annecy, em substituição ao Padre B. Codoing.
55
Sua Eminência o Cardeal de Richelieu.
66
Justo Guérin, Bispo de Genebra desde 1639. Morreu em 1645.
77
Léon Bouthillier, Conde de Chavigny (1608-1652), excerceu diversos cargos administrativos e diplomáticos
importantes.
88
François Du Val, Marquês Fontenay-Mareuil, embaixador em Roma, de 1640 a 1650. Morreu em 1665.
99
Roger Du Plessis, Duque de Liancourt (1598-1674), homem piedoso, praticante de boas obras, ligado ao grupo
jansenista.
1010
Com certeza Saint-Etienne de Saint-Geoirs (Isère).
1111
Banqueiros de Lyon.
1212
André Du Val (1564-1638), professor da Sorbona, um dos conselheiros mais ouvidos por São Vicente.
1313
Decreto “Cum adolescentium aetas”, publicado na XXIIIª sessão (13 de julho de 1563).
1414
Foi em Annecy, no ano precedente, que B. Codoing começara os exercícios de um seminário de cléricos.
1515
Nicolau Pavillon, Bispo de Alet desde 1638. Morreu em 1677.
Saintes1616 tem a mesma intenção. Nós mesmos vamos dar início nesta cidade a uma
experiência com doze candidatos, para a qual Sua Eminência nos ajuda com mil
escudos1818. Esse bom servo de Deus gostaria que a coisa andasse um pouco mais
depressa, mas me parece que as coisas de Deus se fazem pouco a pouco, quase sem que
as percebam, e que seu espírito não é precipitado, nem intempestivo.
Disse-vos acima que vos rogava para ir ter com ele, mas pensei depois que não é
necessário e que basta enviar-lhe minhas cartas.
Sinto-me contente, senhor Padre, por vossa natureza se ter refeito desses
movimentos impulsivos que sentíeis para Roma, no início, e que no presente os temeis,
pois será o puro amor de Deus que vos conduzirá até lá, e, por conseguinte, tendes
motivo de esperar que o próprio espírito de Deus vos animará e fará sua obra por vosso
intermédio.
Ide, pois, senhor Padre, in nomine Domini, com esta confiança. Escrevei-me
com frequência e sobre todas as questões. Escolhei um lugar sadio para vossa
residência. A carta do senhor Cardeal Mazarino é escrita em bom estilo, e eu sou, no
amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

O senhor Montreuil, secretário do embaixador de Roma, tomará uma barca para


viajar em águas rasantes costeiras. Peço-vos dirigir-vos para Marselha lá pelo dia 25 ou
27.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, padre da Missão, em Lyon.

30. – A JACQUES CHIROYE

A carta 613 da edição Coste (II, 292-293), dirigida a Jacques Chiroye, padre da Missão, superior
da casa de Luçon, a 06 de setembro de 1642, foi publicada por Coste conforme a edição Pémartin de 1880
(nº 364, t. I, p. 420-421). O original dessa carta foi encontrado depois; em 1935, ele estava de posse de
dom Garnier, Bispo de Luçon, que deu notícia dele a arquivista da Congregação da Missão; este último
publicou essa carta nos Anais da C. M. (1938, p. 606-607), com a ortografia de São Vicente, pois a carta é
toda autógrafa.
As diferenças entre o original e o texto Pémartin-Coste são mínimas, sem importância; é a razão
pela qual não julgamos ser de utilidade reproduzir aqui essa carta.

31. – A FRANCISCO DU FESTEL


1616
Jacques Raoul de La Guibourgère, Bispo de Saintes desde 1642. Será transferido para Maillezais-La Rochelle em
1646.
1818
O escudo valia três libras.
.
Carta 31. – Carta autógrafa.
Paris, 20 de setembro de 1642.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Só Deus vos poderia exprimir como fiquei tão feliz pelo bom estado no qual o
Padre Lambert1 encontrou vossa comunidade em geral e cada um em particular, assim
como pelas bênçãos que apraz a Nosso Senhor conceder a vossas missões e ao vosso
seminário. Rendo graças a Deus e lhe rogo abençoe cada vez mais sua obra e santifique
vossa querida alma e todas as da pequena Companhia e, todas as que ele decidiu salvar
por vosso intermédio.
Vós me solicitais com insistência para introduzir na Companhia a
disponibilidade e a mudança de superiores com mais frequência do que fizemos até
agora e me pedis para começar por vós e de passar para a condição de súbdito na mesma
casa que dirigistes. Agradeço a Deus, senhor Padre, pelas luzes que vos concedeu a
respeito, e me entrego à sua divina Majestade para proceder assim, com a ajuda de sua
graça. E, como desejais, começaremos por vós. Dareis, portanto, vossa demissão, por
obséquio, senhor Padre, no primeiro capítulo 2 que fizerdes e entregareis vosso ofício à
pessoa do Padre Guérin3, a quem rogo aceitá-lo, como peço a Companhia que o
considere em Deus, e veja Deus nele, e lhe preste obediência do mesmo modo.
Como será novo no ofício e precisará ser assistido com vossos bons conselhos,
peço-vos fazer-lhe esta caridade e a ele que vos solicite o parecer em todas as coisas.
Será bom, antes de tudo, que lhe digais as pequenas máximas da Companhia, o espírito
e o modo de dirigir que ela adota. Dir-lhe-eis de modo especial esta máxima: é preciso
ser firme e invariável quanto ao fim, mas suave e humilde quanto aos meios, embora eu
a pratique tão mal.
O espírito maligno costuma algumas vezes fazer das suas, quando da mudança
dos oficiais de uma Companhia. A uns ele indispõe, por causa da deposição do antigo,
no qual depositavam confiança; a outros, porque não foram eles os escolhidos; a outros,
enfim, pela escolha de tal pessoa. Sendo assim, suplico-vos, senhor Padre, fazer uma
conferência4 sobre este assunto. O primeiro ponto constará da indiferença que os
missionários devem ter, no tocante a passar da direção de um oficial para a de um outro;
o segundo, de como se devem comportar os missionários entre si, quando se muda um
oficial; o terceiro, de como se deve comportar o deposto em relação ao que for eleito e o
eleito em relação ao deposto. Não posso deixar de dizer-vos que um dos melhores
Original na coleção privada da rainha da Holanda (em 1931). Uma parte desta carta foi editada conforme uma cópia
defeituosa do Registro 2 (Arquivos da Missão) por Coste (nº 618, t. II, p. 297-299). Os Anais da C.M. publicaram o
texto integral, conforme o original (1931, p. 693-696).
11
Lambert aux Couteaux, padre da Missão (1606-1653), ingressado na Congregação em 1629. Era então superior da
casa de Richelieu. Deve ter sido enviado em visita extraordinária a Annecy, para esclarecer São Vicente sobre a
situação da casa.
22
Cf. c. 125, n. 13.
33
Guérin (Jean), padre da Missão (1594-1653), ingressado na Congregação em 1639. Nomeado superior da casa de
Annecy, em substituição a Francisco du Festel (setembro de 1642), permaneceu no cargo até sua morte.
44
A conferência era uma exercício de comunidade, durante o qual cada participante expunha seus pensamentos e
sentimentos sobre o assunto proposto.
meios, no que diz respeito ao segundo ponto, é, segundo penso, de não fazerem
absolutamente nenhum comentário entre eles. Meu Deus, senhor Padre! Como ficarei
contente se me comunicardes o que for dito sobre cada ponto! Suplico-vos anotá-lo.
Espero que quem vos sugeriu o pensamento da mudança, vos há de sugerir
outros muitos e úteis à Companhia, quanto ao modo de se comportar na mudança.
Peço-vos dizer-me se o que me comunicastes pela vossa carta de 19 de agosto, a
saber, que no dia primeiro de outubro vos serão devidas doze pistolas 5, se deve entender
como a mais do que já pagamos e além de vossa paga a essa digna senhora, à qual nos
escrevestes que pagássemos o que tomastes dela.
O boato que corre por aqui é de que o senhor Bispo toma como seu sucessor o
senhor Arcebispo de Maurienne6.
Esquecia-me ontem de pedir ao Padre Codoing que não se envolva na questão do
Visitador de Santa Maria7. Não sabia nada de nada a respeito. Ó meu Deus, senhor
Padre! Como é bom não nos envolver a não ser em questões para as quais temos as
devidas credenciais. Deus então estará presente e jamais, ou raramente, em outros casos.
Não compreendo bem as medidas da casa que as Filhas da Visitação vos
oferecem. Dizeis que ela tem 53 pés8 de comprimento, 43 de largura e cento e cinqüenta
passos9 de frente sobre a calçada. A frente do edifício não é sua largura ou
comprimento? Uma palavra sobre isto, por favor.
Não é fácil comprar uma propriedade num Estado onde não se tem do príncipe a
permissão de se estabelecer. Se, por acaso, sem levar isto em consideração, o conselho
que poderíeis tomar de gente competente em Chambéry 9 for deste parecer, fareis bem
em comprar essa casa, conquanto seja de clima sadio. Suplico-vos, senhor Padre, em
nome de Deus, ter atenção, acima de tudo, aos ares saudáveis na compra que fareis.
Eis, senhor Padre, o que vos direi no presente. No mais, saúdo vossa
comunidade com todo respeito a mim possível, prostrado em espírito a seus pés. Sou,
dela e vosso, no amor de Nosso Senhor, muito humilde servo,

Vicente de Paulo
i. p. da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Du Festel, superior dos padres da Missão de


Annecy, em Annecy.

32. – IRMÃO MATEUS REGNARD AO PADRE VICENTE

55
A pistola valia 10 libras.
66
Paulo Millet de Châles (1599-1656), Bispo de Maurienne. Tomara posse de sua diocese a 17 de setembro de 1642.
Por engano, São Vicente lhe dá o título de arcebispo.
77
O Visitador canônico dos conventos da Ordem da Visitação.
88
O pé valia cerca de 33 centímetros.
99
O passo valia 2 pés e meio.
99
Chambéry, antiga capital da Saboia. Após a transferência da corte e do governo para Turim, Chambéry ficou como
centro administrativo das regiões além-montanhas.
Janeiro de 1643.

Há alguns dias, nosso Irmão Mateus me escrevia de Lorena. Sua carta, toda
banhada de lágrimas, me comunicava as misérias daquela região e em especial de mais
de seiscentas religiosas:
“Senhor Padre, a dor do meu coração é tão grande que não sou capaz de vo-la
exprimir, sem chorar, dada a enorme pobreza dessas religiosas que vossa caridade
manda socorrer e da qual eu não saberia descrever a menor parte. Os hábitos delas
são quase irreconhecíveis. Andam remendadas de todos os lados, de verde, de cinza, de
vermelho, enfim, de tudo que conseguem obter. Tiveram de passar a usar tamancos”.

33. – A BERNARDO CODOING

Paris, 05 de fevereiro de 1643.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Eu vos escrevi na semana passada e nada de novo, penso eu, tenho a vos dizer, a
não ser que uma pequena alteração acontecida nos negócios torna a questão de Saint-
Yves1 mais difícil e que não devemos apressá-la.
Uma outra coisa2 é relativa à pergunta que me fizestes se pregáriamos missão
nas cidades episcopais. Sobre isso, dir-vos-ei que jamais pensei em excluí-las, mas só
em não trabalhar nelas fora da missão. Com efeito, fizestes missão em Annecy 3 e o
Padre Chiroye4, em Luçon. O que não me pareceu conveniente foi pregar, catequizar e
confessar nesses lugares, fora do tempo da missão. Vou mandar a Companhia rezar para
resolvermos a questão, possivelmente, conforme o desígnio de Deus, e colocarmos a
decisão nas regras, se Deus quiser.
Peço-vos lembrar-vos da dispensa do voto de vida religiosa que vos pedi em
favor de uma viúva, e a de um padre capuchinho que se tornou herege, sobre o qual vos
escreveu o Padre Portail5.

.
Carta 32. – Conferência de 25 de janeiro de 1643 às Filhas da Caridade. Arquivos das Filhas da Caridade. Original
com a letra de Luísa de Marillac. S.V. IX, 84-85.

.
Carta 33. – Carta autógrafa.
Original nos Arquivos ducais de Sagan (Silésia), em 1936. Coste em sua edição pudera apenas dar notícia da carta
(Nº 640, t. II, p. 363), cuja existência então só era conhecida por um catálogo de Charavay.
Texto publicado nos Anais da C. M. (1936, p. 405-408) com a ortografia do original.
11
Tratava-se de unir a paróquia Saint-Yves (em Roma) à Congregação da Missão e nela instalar os padres da Missão.
O projeto não vingou.
22
Em margem, São Vicente escreveu: Esqueci-me de vos enviar a carta do Padre Codoing (sic.), há muito tempo.
33
Bernardo Codoing tinha morado em Annecy como superior da casa da Congregação da Missão de 1640 a 1642.
44
Jacques Chiroye, padre da Missão (1614-1689), ingressado na Congregação da Missão em 1638, superior desde
1640.
Ainda outra coisa: um pároco obteve sua paróquia às custas de uma bem leve
simonia. Chama-se Taufin6 e é da diocese de Troyes. Solicita a dispensa, para conservar
o benefício e receber os emolumentos que não passam de 100 escudos por ano. Ele é
muito pessoa de bem. A simonia é de apenas seis almudes 7 de vinho que o resignatário
do benefício fez absoluta questão que ele lhe desse, depois de terem entrado em acordo
sobre a pensão que era de doze escudos. Em nome de Deus, senhor Padre, providenciai
para que ela seja expedida quanto antes. Se for necessário declarar o benefício, ele se
denomina Nogetum8.
Aguardo a letra de câmbio de mil libras que vos propus receber. Apesar de todas
as diligências por mim realizadas, não temos ainda os contratos de vossa fundação, em
razão de uma quantidade de circunstâncias que se encontram no negócio.
O Padre Du Coudray9 e o Padre Boucher1010 partirão dentro de dois dias para a
Barbária1111, pelas razões que vos escrevi e, enquanto aguardam, pregarão missão nas
galeras de Marselha. Se se tratasse apenas do resgate dos cativos, eles não iriam para lá.
Mas, em se tratando de examinar as razões que haverá de dar assistência espiritual aos
pobres escravos no futuro, os dois nos estimulam a isto. Dizei, por favor, uma palavra
sobre o assunto a Dom Ingoli1212.
Aguardo com impaciência o êxito de vosso seminário. O nosso aqui está sendo
abençoado por Deus. Estamos com 22, dos quais sete ou oito se encontram em missão.
Saúdo e abraço vossa querida comunidade, prostrado em espírito a seus pés e
aos vossos. Sou, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo,
Indigno padre da Missão.

O senhor Cônego de Saint-Aignam1313 resignou em vosso favor ao priorado de


Dyé1414, diocese de Langres. O Padre Gallot 1515 deve enviar a procuração a um seu
fiador [...] banqueiro em Roma. Enviará, além disso, o consentimento do senhor Abade

55
Antônio Portail, padre da Missão (1590-1660), primeiro companheiro de São Vicente, escolhido pela Assembleia
Geral da Congregação da Missão, reunida em 1642, como primeiro assistente do Superior Geral (São Vicente).
66
Este nome dificilmente lisível foi posteriormente riscado, sem dúvida para velar com o anonimato essa história de
simonia.
77
Antiga unidade de medida para líquidos, equivalente a cerca de 40 litros. (N. do T.).
88
Esta palavra foi também riscada, certamente pela razão assinalada na nota 6. Nogentum (ou Nogetus) corresponde
a Nogent. Ora, há três Nogent na diocese de Troyes.
99
Francisco Du Coudray, padre da Missão (15861649). Entrou na Congregação em 1626. Não foi para a Barbaria.
Ficou algum tempo em Marselha para evangelizar os galés, em companhia de vários outros coirmãos.
1010
Leonardo Boucher, padre da Missão. Ingressou na Congregação em 1632. Também ele, como Francisco Du
Coudray, não irá para a Barbária.
1111
Com esse termo de Barbária designavam então a África do Norte. Os missionários de São Vicente começaram a
trabalhar para o bem espiritual dos escravos cristãos em Túnis, em 1645, em Argel, 1646.
1212
Secretário da Congregação da Propaganda em Roma, de 1622 a 1649.
1313
Cônego do Cabido da Catedral de Notre-Dame de Paris, desde 1638, mais tarde Vigário Geral do Cardeal de
Retz, Arcebispo de Paris. Seu nome de família era Paulo Chevalier. Morrerá em 1674.
1414
Priorado beneditino, hoje na diocese de Sens e no departamento de Yonne. O projeto em questão não vingou.
1515
Notário eclesiástico da diocese de Paris.
e dos religiosos. Estareis com ele, por favor, para lhe recomendar e velar aí pela
componenda1616.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão de


Roma, em Roma.

34. – A FRANCISCO DU FESTEL

10 de março de 1643.

Pormenores interessantes sobre questões gerais da Congregação em diferentes cidades,


sobre as galeras e sobre os êxitos dos estudos nos seminários. Envia-lhe a ratificação da
fundação do Comendador de Genebra com todas as recomendações possíveis:
“Ó senhor Padre, sinto grande consolação por ter Nosso Senhor escolhido dois
Comendadores de Malta para o bem da diocese de Genebra. Rogo a Nosso Senhor que
santifique cada vez mais essa Ordem e a alma do referido senhor, e que glorifique
sempre mais a alma do senhor Comendador de Sillery 1. Rogo-vos, senhor Padre, que
peçais permissão ao dito senhor para lhe beijar a mão, da parte de nossa Companhia e
particularmente da minha”.

35. – A BERNARDO CODOING, PADRE DA MISSÃO


SUPERIOR EM ROMA

Paris, 20 de março de 1643.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Recebi duas cartas vossas ao mesmo tempo, uma de 01 e a outra de 12 de
fevereiro. Eis a resposta à primeira.

1616
A componenda era uma oferta entregue à Santa Sé por ocasião da obtenção de um benefício, de uma graça ou
favor.
.
Carta 34. – O resumo dado aqui foi tirado de um catálogo de Charavay, que a assinala como autógrafa. Coste diz o
mesmo, por sua vez, em sua edição (nº 652, t. II, p. 374). A parte reproduzida acima, após o resumo de Charavay, foi
reencontrada na Biblioteca Nacional de Paris (Departamento dos Manuscritos: Nouv. Acq. fr. 3099).
11
Ver nota 3 da carta nº 16 da presente edição.
.
Carta 35. – Carta autógrafa.
Original no Museu de Mariemont (Bélgica) em 1960; estava ali desde 1910.
Carta publicada na edição Coste (c. 654, II, 375-382) conforme uma cópia cheia de erros de leitura e de
interpretações errôneas. O original, reencontrado recentemente, não está em muito bom estado: em vários lugares a
tinta comeu o papel; encontram-se muitas rasuras; alguns nomes próprios e até linhas inteiras se tornaram ilegíveis
por mão posterior. Algumas leituras atuais permanecem conjecturais.
Fotografia do original nos Arquivos da Missão (Paris).
Rendo graças a Deus por tudo que me dizeis nas duas, em especial, por terdes
tido a felicidade de prestar reverência ao senhor Cardeal Lante 1 e por tudo que Sua
Eminência vos disse. Igualmente pelo fato de terdes começado o seminário pelos
diáconos e subdiáconos que o senhor Cardeal Lante vos mandou. Dir-vos-ei que
entrevejo os frutos que me dizeis poderão dele provir, se aprouver a Deus conceder-lhe
sua bênção, como lhe peço com todo o coração. Ofereço-lhe todas as palpitações do
meu coração, como outras tantas orações jaculatórias a lhe pedir incessantemente esta
graça.
Quanto à questão de Saint-Yves2, não vejo muita coisa a se esperar no presente,
por causa da insistência que fazem os Padres do Oratório a respeito de Saint-Louis 3, por
intermédio do seu Padre Geral4, confessor do senhor irmão do rei 5, ao qual a pessoa com
quem falei6 do caso não quer desagradar. Não direis isto a pessoa alguma no mundo.
Veremos com o tempo.
Mostrei vossas cartas, como faço de ordinário, à Madame vossa fundadora 7.
Quando houver alguma coisa mais particular, é só me comunicar por um bilhete à parte.
Agora, a resposta à segunda carta.
Fala-me amplamente de Saint-Yves e de algumas missões na Bretanha. Nada
mais vos posso dizer a não ser o que já vos disse sobre esse assunto. Acrescento apenas
que a pessoa, a quem falei a respeito dele, se afasta de mim por causa disso, e que temos
alguns bretões em nosso seminário, caso haja urgência. Salvo isto, “omnia tempus
habent”8.
Sou totalmente do vosso parecer, senhor Padre, de que precisamos nos dedicar
aos seminários, e com isto as missões terão mais frutos. Somos obrigados a ir começar o
de Cahors depois da Páscoa e os senhores Bispos de Mende 9 e de Angoulême1010 nos
pressionam para fazer o mesmo em suas dioceses, e ao mesmo tempo, o que nos é
impossível, se Deus não vier em nosso socorro. Estabelecemos uma pensão para todos
que tiverem condições de pagar. Alguns colaboraram com 200 libras, outros com 80
escudos1111. Penso como vós que é preciso proceder assim em todo lugar.

11
Bispo suburbicário de Óstia.
22
Cf. nota 1 da carta nº 33 da presente série.
33
Confraria e Paróquia Saint-Louis-des-Français em Roma (à qual estavam ligadas a Confraria e a Paróquia de Saint-
Yves). Dependia dos Oratorianos franceses.
44
Francisco Bourgoing (1585-1662). Superior Geral desde 1641.
55
Gastão, Duque de Orléans.
66
O Conde de Brienne.
77
A Duquesa de Aiguillon.
88
Livro do Eclesiastes, 3, 1: “Há um tempo fixado para tudo”.
99
Silvrestre de Crusy de Marcillac, Bispo de Mende de 1628 a 1659, data de sua morte.
1010
Jacques Du Perron, Bispo de Angoulême de 1637 a 1646.
1111
Isto é, 240 libras.
Da próxima vez, escreverei ao Padre Souffliers 1212 o que me sugeris para
Agen1313. Vou aguardar o que a Madame Duquesa1414 me dirá com respeito ao de
Richelieu1515 e ao dos ordinandos em Poitiers1616.
Fico contente com o que dizeis, que o Papa 1717 vai admitir a união das paróquias
ao seminário, mediante o pagamento da componenda1818. O senhor Bispo de Saintes 1919
me pergunta sobre isto na carta que ontem recebi dele. Explicai-me, entretanto, por
favor, a condição de que me falais: a do pagamento da componenda, a quanto chega
isso, e que essas paróquias são servidas pelos padres do seminário.
Não tenho a honra de conhecer o Senhor de Vanci. Darei, contudo, atenção à
proposta que me fazeis a seu respeito.
Quanto à paróquia da diocese2020 do senhor Cardeal de Lante, se tivermos
pessoal disponível, e supondo que ela se situe numa cidade pequena, in nomine Domini,
seria preciso pensar a respeito. Mas se vos for possível suspender a coisa, poderíeis,
entretanto, ver e me comunicar o estado do local, o número de pessoas que recebem a
comunhão e quantas pessoas a paróquia poderia sustentar [?], depois de terdes pregado
missão nela.
Quanto à dispensa do voto, eu vos devolvi a que me enviastes e mandei dizer
que essa boa alma tem apenas cerca de trinta e seis anos. E no que diz respeito à doença
que a constrange a comer carne, trata-se de um enfraquecimento da natureza, em virtude
de uma contínua agitação do seu espírito e das preocupações que alguns negócios lhe
causaram. Suplico-vos, senhor Padre, empenhar-vos nisso.
A absolvição ou a dispensa que se pedia em favor do herege convertido, que foi
capuchinho, será solicitada por ele próprio, em Roma, para onde partiu.
Mandarei refazer e assinar pelo Padre Callon2121 a carta que já escreveu ao Padre
Aumale2222; se a questão de Saint-Yves fosse adiante, providenciaríamos que pessoas
importantes lhe escrevessem. Se o negócio se fechasse, suprimiríeis a alma da coisa,
omitindo a consideração do seminário. O que se diria em razão da mudança deste rumo?
Já que o irmão do Irmão Martinho 2323 vos é útil e pensais fazer dele um bom
rapaz, in nomine Domini, ficai com ele.
Trataremos de obter a carta do senhor Cardeal Mazarino, nos termos que
solicitais, e vos enviarei o livro latino dos ordinandos, pelo Padre de Horgny, que espero

1212
Francisco Soufliers, nascido em Montmirail, diocese de Soissons, em 1606, recebido na Congregação da Missão
em 1629, ordenado padre em 1631.
1313
Mais exatamente La Rose, diocese de Agen, onde o Padre Soufliers era superior desde o ano precedente.
1414
A Duquesa de Aiguillon.
1515
O Seminário de Richelieu começou em 1646 e teve existência afêmera.
1616
Trata-se quer de um projetado seminário de ordinandos (projeto abandonado), quer de um retiro de ordinandos
pregado em Poitiers.
1717
Urbano VIII, papa de 1623 a 1644.
1818
Cf. a nota 15 da carta nº 33 da presente série.
1919
Jacques Raoul de La Guibourgère, Bispo de Saintes de 1642 a 1646.
2020
Cf. nota 1.
2121
Luís Callon, nascido em Aumale, diocese de Ruão, entrou na Congregação da Missão em 1626; pouco depois,
retornou à sua paróquia de Aumale, sem deixar de fazer parte da Congregação. Faleceu em Vernon, em 1647..
2222
Edmundo ou Aimé de Broc de Nozet.
2323
Sem identificação certa, talvez Jean Martin, nascido em Paris em 1620. Entrou na Congregação da Missão em
1638. Ordenado padre em Roma, em 1645; faleceu em Roma em 1694.
mandar partir na Páscoa, para a visita das pobres pequenas famílias de Nosso
Senhor2424.
Pensaremos no que me dizeis, que é conveniente tenha o Geral a faculdade de
aplicar os bens de uma casa em favor de uma outra. Consulte, a respeito, se é algo
desejável e se há casas semelhantes como exemplo.
Doravante, mandarei redigir os memoriais em latim, antes de vos pedir para
obterdes o que eles contiverem.
Eis as palavras da senhora do voto, relativas à sua indisposição: essa
enfermidade é antes fragilidade e delicadeza de temperamento que impede essa mulher
de poder jejuar seis dias seguidos sem padecer de uma doença particular.
Comunicai-me, por favor, o nome da paróquia de Vanes2525, de que me falais, a
fim de me empenhar em estabelecer nela um seminário.
Resta-me agora responder-vos ao que me dizeis do Padre... [?] e, a seu respeito,
do suporte aos díscolos2626.
Que faríeis, senhor Padre, de uma pessoa que tivesse feito o possível desde há
alguns anos, para tirar da casa todos os que pôde e que, efetivamente, corrompeu quatro
ou cinco deles, dos mais capazes de servir; que fez ainda um maravilhoso estrago numa
alma, e das melhores da Companhia, cujo espírito, se não está totalmente pervertido,
acha-se muito alternado; que anda fazendo o que pode neste sentido, não somente por
palavras, mas também por escrito aos que estão ausentes? Eis o que ele disse a um
padre... [?] “Ainda está no cueiro? 2727 Não pensa mais no que lhe disse, que se ele
empinar a bandeira eu bato o tambor para todos os lados? E então, tais e tais outros não
tomarão partido? E vós, não quereis que vos mande pano desta região, para meter um
capuz em cima dos vossos votos (que ele fizera há seis ou sete anos)?” E, continuando
ainda, lhe relata os defeitos corporais do pessoal da região; que a maior parte dos
homens entra na Igreja pelo claustro e que as mulheres são tão feias que não teve
dificuldade em fazer um sinal da cruz para espantar a tentação. E escreve isso do lugar
onde pregou missão, a um outro a 150 léguas dele.
Que faríeis... [?] porque ele o tem sempre... [?] desde que saiu, e introduziu tal
divisão na comunidade de... [?] que foi preciso contratar novos operários ? E tudo isso
no auge do momento em que me dava as mais fortes esperanças. Ó senhor Padre, Deus
nos guarde de vo-lo enviar e a vós de recebê-lo. Ele arrasaria, bem logo, vosso
estabelecimento ou o prejudicaria de modo lamentável.
Dizeis-me que é preciso suportar esta gente, nestes inícios da Companhia,
quando precisa tanto de pessoal, e que, com o tempo, poderíamos limpá-la. É verdade,
senhor Padre, que a Companhia precisa de gente; mas é melhor ter menor número do
que contar com desordeiros desta natureza. Dez bons farão mais para Deus do que cem
dessa espécie. Limpemos, senhor Padre, limpemos a Companhia das pessoas profanas e
que não são agradáveis aos olhos de Deus. Ele a fará crescer e a abençoará. Querendo
Deus ferir de morte cerca de três mil homens que tinham adorado o bezerro de ouro, e

2424
Dito de outro modo: para ir fazer a visita canônica de várias casas da Companhia.
2525
Este projeto de seminário em Vannes não teve prosseguimento.
2626
Pessoas com as quais é difícil viver.
2727
“Está no cueiro” traduz a expressão francesa “etre dans son béguin”, isto é: ser inexperiente como uma criança.
Moisés querendo impedi-lo de o fazer com suas preces, ele lhe respondeu: “Deixa que
minha cólera se abrase contra eles e farei de ti uma grande nação”2828.
Assim sendo, senhor Padre, diminuir o número dos que ofendem a Deus numa
companhia é aumentar a mesma companhia em virtudes e em número, porque as
pessoas procuram as companhias bem regradas e virtuosas. Oh! como Nosso Senhor
sabia bem o que dizia, quando falava que uma ovelha má contamina todo seu
rebanho2929. Basta um homem como aquele, senhor Padre, para perturbar uma
companhia. A dos Maturinos reformados3030 está numa extrema desolação e ameaçada
de ser aniquilada total ou parcialmente por um espírito profano, desordeiro e
incorrigível, cheio de artimanhas.
Peço a Deus, senhor Padre, que levante e ilumine vosso entendimento para
penetrar a importância para a glória de Deus, para a santificação da Companhia e para o
bem da Igreja que não admitamos nela pessoas que não procedem bem. Chegaria um
tempo em que não poderíamos agir contra elas, quando quiséssemos fazê-lo.
Sim, mas ele irá escrever e açular os outros contra a Companhia. Certo; porém
ele não nos fará maior mal além do que Deus permitir, e o mal que nos fizer se
converterá em bem. E depois, não seríamos indignos de servir a Deus em nossa
condição se, para impedir que alguém nos faça mal, deixarmos que ele adultere o
serviço e a glória de Deus em nosso meio? Lembrai-vos, senhor Padre, que a decadência
da maior parte das comunidades vem da negligência dos superiores por não se
manterem firmes e não limpá-las dos desordeiros e incorrigíveis.
Termino recomendando-me a vossas sanas orações e às da comunidade.
Sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente
servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

36. – CARTA DE SÃO VICENTE AOS PADRES DA MISSÃO DE


MARSELHA

Com data de 18 de abril de 1643, conforme alusão de Allier (Raoul): A Companhia do


Santíssimo Sacramento do Altar em Marselha, Paris, 1909. O autor publica (PP. 153-155) a carta à
Companhia do Santíssimo Sacramento de Paris à Comunidade de Marselha, datada de 18 de abril de
1643. Nela se lê a seguinte passagem (p. 153):
“Mandaremos pedir ao Padre Vicente, Superior dos Padres da Missão, que enviou missionários
à Barbária, os quais estão ainda em vossa cidade, lhes escrevesse imediatamente em favor do referido
Vatel [escravo francês preso em Argel], no sentido de que seja ele incluído no número dos que devem ser

2828
Ex 32, 10.
2929
Provérbio que não se encontra na Bíblia.
3030
Trata-se da Ordem dos Trinitários (chamados de Maturinos, na França) reformados na França, no fim do século
XVI. A Ordem está então em plena crise, em consequência da oposição à autoridade do Superior Geral, por parte de
alguns dos seus membros, a cuja frente estava um tal de Alexis Berger.
libertados. Prometeu fazê-lo, se os fundos de que dispõem bastarem para a libertação daqueles a que
foram enviados e à dele. Escreveu-lhes hoje para esse fim...”

37 – A BERNARDO CODOING, PADRE DA MISSÃO, SUPERIOR EM


ROMA

Paris, 07 de maio de 1643.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco.


Madame Duquesa de Aiguillon1 está finalmente decidida a doar cinco mil libras,
todos ao anos, tirados do preço de arrendamento dos coches de Ruão, além das de
Soisson que já doou. A intenção é completar sete mil e quinhentas libras por ano, em
favor da casa de Roma, exatamente o que pedistes.
Esse tipo de renda, recaindo sobre o domínio do “rei alienado” 2 corre o risco de
reembolso, e coisa pior, às vezes. Temos, contudo, motivo para esperar que a coisa,
sendo empregada em tão excelente uso, a glória de Deus e o bem da Igreja, e sendo
apoiada aqui pelos senhores Núncios, ficará ao abrigo das alienações que incidem sobre
esse bens e protegida nos casos em que o rei, numa necessidade extrema dos seus
negócios, se utiliza dessas rendas.
O contrato ainda não foi passado, embora a minuta esteja pronta. Vou estar com
Madame Duquesa.
É o que vos posso dizer hoje, por estar sendo pressionado a ir começar uma
novena na intenção do rei3, que recomendo a vossas orações, como vos recomendo a
missão de Sedan, iniciada por ordem de sua Majestade.
Peço-vos enviar-nos a dispensa do voto de entrar nas carmelitas.
Sou, senhor Padre, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos padres da Missão em


Roma.

Em baixo: Senhor Marchand, de Roma.


Carta 37. – Carta autógrafa.
Original de posse (1965) de M. R. Schuermans, advogado, em Turnhout (Bélgica).

11
Sobrinha do Cardeal de Richelieu, benfeitora das obras de São Vicente, em particular das casas de Roma, de La
Rose, de Argel e de Turim.
22
No original Frances consta “sur Le domaine du roi aliéné”: de que se trata?... (N. do T.).
33
O rei Luís XIII devia morrer no dia 14 de maio seguinte.
38. – CARTA DO PADRE FÉLICIEN A SÃO VICENTE

Noticiada por Collet (Pierre), A Vida de São Vicente de Paulo. Nancy, 1748, 2 tomos, t. I, p.
306:
“... temos ainda uma carta do Padre Félicien, vigário provincial dos capuchinhos de Lorena,
na qual agradece a São Vicente, em nome dos seus irmãos, de modo semelhante como São Paulo
agradecia a Filemão, por ter ele dado alívio aos servos de Deus em sua extrema necessidade: Quia
viscera Sanctorum requieverunt per te... 1”(“Pois, graças a tí, foram reconfortados os corações dos
Santos”).
Collet acrescenta em nota: Esta carta, datada de Saint-Mihiel, em 20 de maio de 1643, se
conserva no seminário de Toul”.

39. –CARTA DIRIGIDA A SÃO VICENTE

Noticiada por Allier (Raoul), A Companhia do Santíssimo Sacramento do Altar, em Marselha...


Paris, 1909. (Extratos das deliberações, p. 55) [1643]:
“Data de 01 de agosto. Foi escrito a São Vicente, em Paris, Superior Geral dos padres
missionários da França, para que enviasse alguns dos seus padres a Salé1, na Barbária, para consolar os
escravos cristãos”2.

679 bis.1 – PARA A IRMÃ HELENA ANGÉLICA LHUILLIER, NA VISITAÇÃO


DE RUÃO

São Lázaro, 07 de outubro de 1643.

Minha caríssima Irmã,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!

11
Carta de São Paulo a Filemão, versículo 7: “O coração dos Santos está em repouso, graças a ti”.
.
Carta 39. – Esta carta, escrita em fins de julho de 1643, se perdeu.
11
Porto na costa atlântica de Marrocos.
22
O projeto não teve prosseguimento. Entretanto, falou-se dele por muito tempo. A 23 de julho de 1646, São Vicente
escrevia a Antônio Portail: “Pedem ainda por nós em Salé, uma outra cidade da África, onde há permissão de pregar
Jesus Cristo. Não sabemos ainda quem escolher para lá”. (São Vicente, Obras, edição Coste, t. II, p. 623). São
Vicente designou um dos seus coirmãos, Jacques Le Soudier, e o enviou a Marselha, para o embarque. Sabendo,
porém, que um religioso franciscano “se tinha antecipado” no caso, suspendeu o negócio, para não entrar em
concorrência com outros religiosos missionários.
11
Carta 679 bis. – “C. aut. – Uma nota do Padre Jean Couty, Superior Geral dos Lazaristas, inserida nos arquivos da
Visitação, avenida Denfert-Rochereau, 68, Paris, assinala que o original desta carta, escrita e assinada por São
Vicente, está guardada nos arquivos do primeiro mosteiro da Visitação de Paris. Essa nota data de 31 de outubro de
1738”. Uma cópia manuscrita se encontra nos arquivos da Visitação, Avenida Denfert-Rocherau, 68, Paris. Fotocópia
dessa cópia nos arquivos da Missão, Paris.
Estive presente ontem na abertura de vossa correspondência, em Santa Maria.
Dou graças a Deus pela saúde que vos concede e peço-lhe que a prolongue por muitos
anos. Oh! como é bom se expor em favor do serviço de um mestre que sabe reconhecer
os serviços que lhe prestam.
Vereis pelas cartas inclusas o que o senhor Destampes me comunicou.
Respondi-lhe que julgava não ser necessário que fosse a Ruão, nem que se começasse a
recorrer aos poderes temporais, a não ser depois que os recursos espirituais de vossas
orações, de vossas práticas de virtude e, especialmente, dos atos de paciência, não
tivessem merecido de Deus a graça de que precisais, para realizar a sua obra. Louvo a
Deus agora, minha cara Irmã, porque vossa carta nos faz entrever a aurora dessa amável
espera. Oh! como servirá de exemplo para a posteridade e como será maravilhosamente
honroso para Deus, se puderdes, por Jesus Cristo, introduzir o espírito de Jesus Cristo
nesse lugar, e como nosso bem-aventurado Pai2 e nossa digna Madre3 vos ficarão
reconhecidos por isso! Com efeito, só deixareis de ver as astúcias do diabo e o veneno
que esconde sob o recurso aos meios humanos e aos poderes da terra, se os parentes
dessas filhas forem os primeiros a recorrer a eles. In nomine Domini, a vontade de Deus
vos será então conhecida, no que tange a servir-vos dos mesmos meios. Sabeis, minha
cara Irmã, quantas vezes dialogamos sobre quanto esses meios falham nas coisas
divinas, e as resoluções que tomamos, com frequência, de nos ater ao que Nosso Senhor
nos ensina. Demo-nos de novo a Deus, de modo mais particular, para esse fim, minha
cara Irmã. Vou fazê-lo imediatamente na santa Missa, na qual não deixarei de vos
oferecer a Deus, como por sua graça o faço sempre, eu que sou, em seu amor, minha
cara Irmã, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo
i.p. da Missão.

40. – A BERNARDO CODOING, PADRE DA MISSÃO, SUPERIOR EM ROMA

Paris, 13 de novembro de 1643.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Estaria mais preocupado com vossa enfermidade, se não me tivessem dito, ao
mesmo tempo, que estais melhor. Peço a Nosso Senhor e mandarei que lhe peçam para
devolver-vos uma perfeita saúde. Suplico-vos, senhor Padre, poupá-la, quando sua

22
Francisco de Sales.
33
Joana Francisca Frémiot de Chantal.
.
Carta 40. – Carta autógrafa.
Original posto à venda em 1925 ou 1926 pelo senhor Lemasle, comerciante de autógrafos. Esta carta foi publicada
nos Anais da CM, 1926, pp. 231-232.
bondade vo-la recuperar. Moderai, para este fim, a austeridade de vida, no comer e no
dormir, que aumentastes após vosso retiro e segui o conselho do Padre Blatiron 1.
Rationabile enim debet esse absequium vestrum2. O excesso na prática da virtude não é
menos vicioso do que a falta.
Penso que já decidistes a negociação da casa de 2000 libras. Quanto à questão
dos coches que vos queriam subtrair, foi decidida em vosso favor, no Conselho do rei.
A fundação das 2000 libras está concluída, pela graça de Deus. Não falta mais nada para
iniciardes o trabalho dos ordinandos e do seminário para padres.
Os Padres do Oratório insistem aqui para terem Saint-Louis 3, por inteiro. Em
vista disto foi determinado no Conselho que falassem, a respeito, com o senhor
Embaixador de Roma4. Peço-vos nada falar sobre o caso a quem quer que seja.
O Senhor de Brienne me deu a mesma resposta com relação a Saint-Yves5.
O Senhor de Saint-Chamond parte dentro de dois dias para a embaixada de
Roma. Deu-me a honra de vir estar comigo e dar-me esperança de sua proteção.
O senhor Cardeal Grimaldi partirá no próximo mês 6. É um prelado de notável
virtude, conduta e firmeza. Recebi, ontem, sua bênção. Também ele me deu esperança
de sua proteção a vosso respeito, embora eu o tenha chocado um pouco, sem querer,
com relação ao Vigário Geral de Pignerol7, por causa de certa dificuldade que lhe fiz, no
tocante a algo que pedia. Mas isso não é nada. Ele me falava ontem, com evidente
entusiasmo, de nossa felicidade por nos entregar à assistência do povo pobre dos
campos.
Eis tudo o que o embaraço em que encontro me permite dizer-vos no momento.
No mais, abraço vossa pequena comunidade, prostrado de joelhos a seus pés e aos
vossos, e sou, no amor de Nosso Senhor, senhor Padre, vosso muito humilde e
obediente servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: Ao senhor Padre Codoing, superior dos Padres da Missão de


Roma, em Roma.

11
Estêvão Blatiron, nascido em Saint-Julien-Chapteuil, diocese de Clermont, em 1614. Recebido na Congregação da
Missão em 1638, foi ordenado padre em 1639. Chegara a Roma, há alguns meses. Era um coirmão prudente, sensato,
muito estimado por São Vicente. Morreu em Gênova em 1657, vítima do seu devotamento junto aos pestilentos.
22
Carta de São Paulo aos Romanos, 12, 1. A citação é aproximativa. Pode ser traduzida assim: “que vossa obediência
seja racional”; no contexto da carta, o sentido é ligeiramente diferente.
33
Cf. nota 3 da carta nº 33 da presente série.
44
O Senhor de Saint-Chamond. Cf. infra.
55
Cf. nota 1 da carta nº 33 da presente série.
66
Girolamo Grimaldi, Núncio em Paris desde 1641. Acabava de ser nomeado Cardeal (13 de julho de 1643) e ia
deixar seu posto para se juntar à Cúria romana. Em 1655, tornar-se-á Arcebispo de Aix-en-Provence, onde morreu em
1685.
77
Pignerol, cidade do Piemonte, dependia então da França.
41. – CARTA DO MARQUÊS DE FABERT1

Escrita de Sedan a São Vicente. Noticiada em Barre (Joseph), Vida do senhor Marquês de
Fabert, Paris, 1752, 2 tomos. Tomo I, p. 459.
O autor faz o elogio de Guilherme Gallais2, superior dos missionários de Sedan3, nestes termos:
“O cabeça da Missão era o senhor Padre Gallais, sábio lazarista, homem de reconhecida
probidade, desinteressado, religioso sem superstição, extremamente atento em nada fazer que lhe
pudesse atrair alguma distinção exterior; sempre modelo, jamais espetáculo, nas missões. Fazia uso de
seus talentos para a utilidade dos outros e não para a própria exaltação. Iniciou a grande obra da
conversão dos sedaneses estudando-lhes o caráter, a fim de se ajustar a seu alcance e de captar, de certo
modo, o foco e o grau de seu gênio.”
À margem, o Padre Basse assinala como fonte: “Carta do senhor Fabert a São Vicente 4”.

710 BIS.1 – DO PADRE CHARLES FAURE PARA SÃO VICENTE

J[esus] h[ominum] S[alvator]2


Reverendíssimo senhor Padre,
J[esus] h[ominum] S[alvator] seja vossa vida!

Sou testemunha do vosso zelo extraordinário para levar ao êxito o negócio da


Abadia de Santa Genoveva. É este mesmo zelo, que demonstrais em tudo que diz
respeito à honra de Deus, que me enseja motivo de vos pedir, por Nosso Senhor, para
vos tornar nosso protetor diante de Sua Majestade e para lhe dar a conhecer quanto
esse direito que vos impõem seria perigoso para a nossa Congregação e poderia
levantar-nos obstáculos e dificuldades. Dirijo-vos esta súplica, porque acredito que
Deus vos alçou, apesar de vossa humildade, ao poder que tendes junto a Sua
Majestade, para assistir com vosso apoio os pedidos que, por Deus, lhe são feitos.
Conhecemos demais a permanência desse zelo em vossa pessoa. Ele me leva a
esperar que, se a bondade da Rainha fosse informada da justiça do que nossa
Congregação deseja, depois da renúncia do senhor Cardeal de La Rochefoucauld 3, sua
Majestade o concederia, a não ser que tivésseis conhecimento de alguma possível razão
secreta que tornasse inútil toda prece e solicitação. Perdoai-me a importunidade; ela

1
Carta 41
1
Abraão de Fabert, nascido em Metz, em 1599, valoroso militar, goverdador de Sedan, em 1642, Marechal da França,
em 1658. Morreu em Sedan, em 1662.
22
Guilherme Gallais, nascido em Plouguenast, diocese de Saint-Brieuc, foi recebido na Congregação da Missão em
1639 e ordenado padre em 1641. Superior em Sedan de 1643 a 1644.
33
Os padres da Missão começaram seu ministério, em Sedan, em meio de 1643 (fundação real).
44
Carta a ser datada de 1643-1644 (durante a permanência em Sedan de Guilherme Gallais, de maio de 1643 a
setembro de 1644, ou pouco após sua saída).
11
Carta 710 bis. – C. aut. – Biblioteca Santa Genoveva, MS 3275, fol. 550, original. Fotocópia nos Arquivos da
Missão, Paris.
22
Jesus Salvador dos homens.
33
O Cardeal de la Rochefoucauld se demitira do título e do usufruto da Abadia de Santa Genoveva.
vos solicita auxílio em uma questão que Deus nos obriga a levar em frente, e me imporá
nova obrigação, como a toda a Congregação, da qual sou apenas frágil instrumento, de
rogar a Deus que abençoe a todos os vossos santos projetos, e de ser, em seu santo
amor, reverendíssimo senhor Padre, vosso muito humilde e muito obediente servo,

Ch. Faure

Nanterre, 21 de junho de 1644.

Destinatário: Ao Reverendíssimo Padre Vicente, Superior Geral da Missão, em


Paris.

42. – CARTA DO CAVALEIRO SIMIANE DE LA COSTE1 A SÃO


VICENTE

27 de junho de 1644.

Senhor Padre,

Julguei que era meu dever certificar-vos do meu muito humilde serviço e
obediência, e de vos testemunhar a alegria que senti com a entrada dos vossos padres
no hospital dos pobres forçados2. Nosso Senhor seja vossa recompensa, senhor Padre,
pela caridade que dispensastes a essa casa, e pelos bons serviços que lhe prestastes
junto a Madame Duquesa de Aiguillon. Nada vos escrevo sobre seu estado e carências,
pois não duvido de que o senhor Montmort3, ao qual rogamos, antes de sua partida da
região, vos informasse plenamente de tudo, o tenha feito, conforme deu-me a honra de
escrever-me. Assegurou-me da continuidade de vossa boa vontade, no sentido de
buscar a realização da obra de Nosso Senhor.
Sei, aliás, que o Padre Du Festel vos manda com frequência notícias dela.
Contentar-me-ei, então, somente, de vos suplicar, com toda humildade, que acrediteis
que não vos sou menos dedicado que os menores súbditos de vossa Companhia, à qual
dediquei todos os meus serviços; mas, sendo incapaz de fazê-la experimentar-lhe todos

.
Carta 42. – Tirada de: Allier (Raoue), A Companhia do Santíssimo Sacramento do Altar, Paris, 1909, pp. 181-182,
conforme a Vie de M. Le chevalier de La Coste, por Antoine de Ruffi, Aix, 1659.
11
Gaspard Simiane de La Coste, nascido em Aix, em 1607. Vindo a Paris, ligou-se de amizade com o senhor Padre
Vicente. De volta a Marselha, dedicou-se a toda espécie de boas obras. Foi o grande auxiliar das obras de São Vicente
em Marselha, empregando particularmente seu tempo e cuidados em favor do Hospital dos Galés. Morreu de peste,
vítima da sua abnegação junto aos galés pestilentos, em 24 de julho de 1649.
22
Em virtude de um contrato assinado a 25 de julho de 1643, a Duquesa de Aiguillon havia fundado a Casa da
Missão de Marselha: doava 14000 libras. Entre as cláusulas do contrato, encontramos esta: os missionários
garantiriam o serviço espiritual do Hospital dos Galés. Esse hospital, cuja instituição, em tono de 1618, parece devida
a São Vicente e a seu protetor, Filipe Emanuel de Gondi, general das galeras, tinha sido reorganizado, recentemente,
graças a Dom Gault, Bispo de Marselha, e ao cavaleiro de la Coste.
33
Henri-Louis Habert, Senhor de Montmort (ou de Montmaur), referendário e Conselheiro do rei.
os efeitos, pedirei, ao menos, a Deus, em minhas pobres orações, comunicar-vos, a vós
e a ela, a abundância de suas graças, e inundá-la com seu Santo Espírito, com a mesma
sabedoria que derramou sobre seus apóstolos, cujos passos ela trilha e dos quais vos
almejo a coroa, senhor Padre.
Vosso muito humilde e obediente servo,

O cavaleiro DE LA COSTE.

Marselha, 27 de junho de 1644.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, fundador dos Missionários.

43. – CARTA A ANTÔNIO PORTAIL1,


Padre da Missão em São Lázaro

Richelieu, 05 de outubro de 1644.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Fiquei triste, podeis imaginar a que ponto, com a morte do Padre Perdu 2, mas
igualmente consolado, vendo o modo como dele dispôs Nosso Senhor. Celebramos
aqui, com muita devoção, com lágrimas nos olhos, um ofício religioso na intenção dele
como fizemos a conferência, com grande consolação.
Aqui está o contrato de arrendamento, que vos estou enviando, já assinado. Se o
senhor Trubois desse seiscentas libras, seria a minha preferência, supondo que estejam
nos termos do contrato. Nada mais farei, a não ser buscar a concordância do senhor
Sorus.
Será bom enviar as 400 libras a Fréneville3, se ainda não o fizestes. Devemo-las
ao granjeiro, em razão de sua granja de trigo.
Um abraço no Padre Gallais, de minha parte. Estou aflito por abraçá-lo.
Vamos refletir a respeito da missão de Villevaudé4; quanto à outra, nem pensar.

.
Carta 43. – Carta autógrafa.
1
Original posto à venda pelo senhor Charavay, comerciante de autógrafos em Paris, em 1927 ou 1928. Carta já
publicada na edição Coste (C. 725, II, 480), conforme um fac-símile incompleto e incorreto, publicada de novo, de
acordo com o original, nos Anais da CM, 1928, pp. 8-10.
1
Antônio Portail (Cf. nota 5 da carta 33 da presente série) era o primeiro assistente de São Vicente, desde 1642. Era
ele que ocupava o lugar do Superior Geral, quando este último estava ausente de São Lázaro. São Vicente se
encontrava, então, em Richelieu, onde fazia a visita canônica.
22
Jacques Perdu, nascido em Grandvillers, diocese de Amiens, em 1607. Ingressou na Congregação da Missão em
1630, e foi ordenado padre em 1632.
33
Cf. nota 8 da carta nº 16 da presente série.
44
Pequena localidade da diocese de Meaux.
Estou muito satisfeito com o que me dizeis do Padre Bourdet5; um abraço nele
também.
Só poderei partir daqui dentro de três ou quatro dias. Oh! quantas questões
encontrei por aqui!
Tereis como novos hóspedes os Padre Collée6, Buissot7, Durot8, enfermo; Le
Noir9, Chastel1010 e talvez Lefebvre e nosso Irmão Bastien. Suplico-vos, senhor Padre,
providenciar-lhes a hospedagem.
Ó meu bom Deus, senhor Padre, como encontrei coisas distantes de nossa
expectativa!
Não mandareis partir aqueles de que vos falei, antes de vo-lo autorizar; mantê-
los-eis prontos para tal e direis ao Padre Alméras1111 que concordo com o que me
propõe, a respeito de Cantelin e dos dois outros dos quais me fala. À Senhora Le Gras
direis que acho bom tudo que me escreve1212, e tratarei de cumprir tudo que prometeu
por mim, mas que é difícil encontrar-me com ela por lá, e que, pela graça de Deus, estou
passando bem, embora trabalhe da manhã até à tarde.
Se há algo urgente que eu deva saber, endereçai-o ao senhor Pároco de Tours,
para mo entregar, ou, por um mensageiro expresso, em Fréneville, para onde não
poderei dirigir-me, a não ser quinta-feira 151313 deste mês.
Sou, no amor de Nosso Senhor, vosso muito humilde e obediente servo,

Vicente de Paulo.

55
Nesta época, dois padres da Missão traziam este nome. Não é possível determinar com certeza qual dos dois visa
São Vicente nesta passagem. Trata-se provavelmente de Jean Bourdet, nascido em Saint-Babel, diocese de Clermont,
em 1614, que entrou na Congregação da Missão em 1636, e foi ordenado padre em 1640. Foi colocado, durante
alguns meses, em São Lázaro, entre seu superiorato em Troyes (1642-1644) e sua colocação em Saint-Méen (1645).
66
Antônio Colée, nascido em Amiens, em 1610. Entrou na Congregação da Missão em 1630, e foi ordenado padre
em 1635. Saiu da Congregação em 1645.
77
Nicolau Buissot entrou na Congregação da Missão em 1630 e foi ordenado padre em 1632.
88
Nicolau Durot, nascido em Oisemont, diocese de Amiens. Entrou na Congregação da Missão em 1633 e foi
ordenado padre em 1636. Saiu da Congregação em 1645.
99
Jacques Le Noir, nascido em Arras, em 1615. Entrou na Congregação da Missão em 1641. Foi provavelmente
convidado a sair da Congregação pouco depois.
1010
Pierre Du Chastel, nascido em Courcelles-le-Comte, diocese de Arras, em 1606. Entrou na Congregação da
Missão em 1641, já padre. Faleceu em 1648, em São Lázaro.
1111
René Alméras, nascido em Paris, em 1613. Entrou na Congregação da Missão em 1637. São Vicente, que o
estimava, confiou-lhe cargos importantes e delicados (direção do noviciado, superiorato da casa de Roma, visita
canônica das casas da Congregação). Em 1661, sucedeu a São Vicente como Superior Geral da Congregação da
Missão. Morreu em 1672.
1212
Alusão à peregrinação que santa Luísa de Marillac projetava fazer a Chartres, onde esperava poder encontrar São
Vicente.
1313
Foi por distração que São Vicente anunciou sua chegada a Fréneville para o dia 15, quinta-feira (15 era sábado).
Lá chegou, efetivamente, na quinta-feira, dia 13.
Se eu não puder escrever ao Padre Lambert1414, dir-lhe-eis que estamos no auge
desse tumulto, que precisamos rezar. Peço-lhe que comunique minha ausência ao senhor
Arcebispo de Reims1515, e que, na volta, vamos trabalhar no seu negócio.

Destinatário: Ao senhor Padre Portail, padre da Missão, em São Lázaro, Paris.

44. – A ANTÔNIO PORTAIL, PADRE DA MISSÃO, EM SÃO LÁZARO

Fréneville, 15 de outubro de 1644.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


1. Eis a resposta à Madre do subúrbio1. Peço-vos enviar-lha quanto antes, e a
Madame Duquesa de Aiguillon, a carta a ela dirigida, logo que a tiverdes recebido.
2. É necessário que eu fale pessoalmente com o Abade de Vaux 2, ao voltar, se
Deus quiser.
3. Oh! como sofro pela perda da Igreja na pessoa do Padre Caignet. Não vos
recomendo nossos Irmãos Get3 e Jamain4; espero que nosso Irmão Alexandre5 há de se
esmerar nos cuidados para com eles. Saúdo aos dois.
Bendito seja Deus porque enfim o senhor Trubois se rendeu às 700 libras. É
justo preferi-lo, já que as coisas estão colocadas nesses termos: fizestes bem em recorrer
ao senhor Sorus para o caso. Tinha sempre as minhas dúvidas: Deus vê que, como
estava, não havia firmeza.
Sabereis, pela carta que vos escrevi de Saint-Dyé6, que os que devem chegar de
Richelieu só partirão na véspera de São Simão7, por falta de lugar na carruagem.

1414
Lambert Aux Couteaux, nascido em Fossemanant, diocese de Amiens, em 1606. Entrou na Congregação da
Missão em 1629. Era um dos homens de confiança de São Vicente. Morreu na Polônia, em 1653, da peste contraída à
cabeceira dos pestilentos. Estava, então (outubro de 1644), encarregado de negociar com o Arcebispo de Reims, a
propósito da situação jurídica e financeira do estabelecimento dos missionários de Sedan (em fundação desde maio de
1643).
1515
Leonor d’Estampes de Valençay, Arcebispo de Reims de 1642 a 1651, data de sua morte. Sedan pertencia a sua
diocese.
.
Carta 44. – Carta autógrafa.
O original pertencia, em 1942, à Paróquia Saint-Nicolas-du-Chardonnet, em Paris. Carta publicada, com o original
autógrafo e um comentário sucinto, nos Anais da CM, 1941-1942, pp. 272-273, Fotografia nos Arquivos da Missão,
Paris.
11
A Madre Ana Margarida Guérin, superiora do segundo mosteiro da Visitação de Paris (no subúrbio Saint-Jacques),
de 1640 a 1646.
22
Guy Lasnier, Abade de Vaux (1602-1681). Cf. ed. Coste, I, p. 601.
33
Firmino Get, nascido em Chepy, diocese de Amiens, em 1621; entrou na Congregação da Missão em 1641. Será
ordenado padre apenas em 1647; estava, então, fazendo seus estudos eclesiásticos em São Lázaro. Sua Saúde
permanecerá frágil. Morrerá em 1682.
44
Martin Jamain, nascido em 1619. Entrou na Congregação da Missão em 1640. Morreu em são Lázaro, em 1645.
55
Alexandre Véronne, nascido em Avinhão, em 1610. Entrou na Congregação da Missão em 1630, como Irmão
Coadjutor. Em São Lázaro, exerceu, durante longos anos, com inteligência e dedicação, as funções de enfermeiro.
Morreu em 1686.
66
Saint-Dyé-sur-Loire (atual departamento do Loir-et-Cher).
77
27 de outubro.
Estou penalizado com a indisposição da Irmã Genoveva. Suplico-vos, senhor
Padre, saudá-la de minha parte, assim como a sua companheira doente.
Bendito seja Deus que tudo vai bem em São Lázaro. Espero partir segunda-feira
para Fontainebleau, se minha enfermidadezinha me permitir.
Remeto-vos a carta do Padre Grimal 8 e vos peço tomar as providências, se
puderdes.
Peço a Alexandre atender ao que pede o Padre Grimal a respeito das cobertas.
Vosso humilde servo, senhor Padre,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Destinatário: [de outra mão]: Ao senhor Padre Portail, padre da Missão, em São
Lázaro.

45. – A ANTÔNIO PORTAIL, PADRE DA MISSÃO, EM SÃO LÁZARO

Fontainebleau1, 19 de outubro de 1644.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Cheguei aqui somente ontem, terça-feira, e espero partir hoje de volta a
Fréneville, para tratar do término do negócio com o granjeiro de Mespuits2, que está em
total confusão, determinado a acabar com a granja. Não sei o que teria feito esta noite,
embora não seja justo o que exige. De Fréneville, espero ir a Chartres, um ou dois dias
depois, cumprir o voto que ali fizeram por mim.
Entregareis ao senhor Chaumel essas duas missivas, por favor.
A rainha me fez a honra de me dar ordem no sentido de enviar, quanto antes,
para aqui, missionários para a missão. Vede quem vós poderíeis destinar para esse fim
com o Padre Gallais3. Nada faríamos, enquanto lá estivesse a corte.
Louvo a Deus pela melhora do Irmão Get 4, e peço a Deus lhe devolva saúde
perfeita para sempre.

88
Francisco Grimal, nascido em Paris em 1605, ordenado padre em 1629. Entrou na Congregação da Missão em
1640. Só fará os votos em 1646. Será daqueles que não hesitarão em renová-los em 1656.
.
Carta 45. – Carta autógrafa.
Original com as Irmãs de Mount-Saint-Vincent, em Halifax (Canadá). Carta publicada nos Anais da CM, 1937, pp.
14-15.
11
Voltando de Richelieu, São Vicente se deteve em Fontainebleau, onde estava a corte.
22
Vila ao Sul de Paris (atual departamento de Seine-et-Oise). A presidente Herse, proprietária de uma quinta situada
nesta vila, a tinha doado à Congregação da Missão.
33
Guillaume Gallais acabava de deixar Sedan. Estava “disponível” em São Lázaro.
44
Cf. a carta precedente, nota 3.
Enviei-vos duas cartas com endereço para Roma. Não vistes as que vos mandei
para serem encaminhadas. O Padre Codoing pede para ser deposto. Escrevo ao Padre
De Horgny5 que assuma o lugar dele. Não diga nada a respeito, por enquanto, por favor.
Recomendo-me às orações do Padre Lambert e a seus “consolitários” 6.
Tudo bem pesado, penso que Jourdain7 tem razão quanto à provisão do vinho.
Madame Duquesa8, com respeito ao expediente do Padre Lambert, me fala...9
Não vejo nada que exija a presença do Padre Du Chesne1010 em Paris.
Eu o saúdo, como a todos da casa, principalmente o senhor Prior 1111, e sou vosso
muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

Destinatário: Ao Padre Portail, padre da Missão, em São Lázaro.

758 BIS.1 – DO PADRE SIMON MARTIN2 A SÃO VICENTE

Senhor Padre,

Não é a primeira vez, e não será a última, se aprouver a Deus, que este
excelente livro do falecido reverendo Padre Luis de Granada, de feliz memória, que
operou conversões milagrosas no mundo, vos escolheu para introduzi-lo 3. Com efeito,
era muito conveniente que este instrumento tão útil de salvação fosse colocado nas
mãos de um padre cujas orações, operadas na caridade, conciliam os corações, não
somente do povo, mas até dos reis, e que, na função de apóstolo, que exerce
continuamente, em pessoa ou por seus coirmãos, estende o reino de nosso soberano
Mestre até aos lugares em que sua glória estava como enterrada; para dizer em uma

55
Jean De Horgny, com efeito, se encontrava já em Roma, para a visita canônica da casa. Substituiu pouco depois a
Bernardo Codoing, no cargo (até 1647).
66
Com esta expressão, São Vicente quer designar os que fazem os exercícios do retiro espiritual ao mesmo tempo que
Lambert Aux Couteaux.
77
Jean Jourdain, Nascido em Galluis, diocese de Chartres, em 1587. Entrou na Congregação da Missão, na qualidade
de Irmão Coadjutor, em 1627. Tinha sido mordomo na casa da Marquesa de Maignelay, onde travara conhecimento
com São Vicente. Foi o primeiro Irmão da Congregação e prestou preciosos serviços em São Lázaro. Era, então,
encarregado da dispensa.
88
A Duquesa de Aiguillon.
99
São Vicente se esqueceu de terminar a frase.
1010
Pierre du Chesne entrou na Congregação da Missão em 1637. Foi uns dos missionários mais estimados por São
Vicente. Era, então, superior da casa de missões de Crécy, que iria deixar, dentro em pouco, para assumir a direção da
casa dos Bons-Enfants, em Paris. Morreu em Agde, em 1654.
1111
Adriano Le Bon, cônego regular de Santo Agostinho, prior de São Lázaro. Resignou seu priorado, em favor da
Congregação da Missão, em 1632. Permanecendo em São Lázaro, que se tornou Casa-Mãe da Congregação da
Missão, veio a falecer em 1651, com seus setenta e quatro anos.
11
Carta 758 bis. – Publicada em nota no tomo XIV, pp. 347-348, por Pierre Coste. Quando da publicação do tomo
XIII, ele ignorava a existência desta carta. Ela lhe foi notificada pelo Padre Dubarat, arcipreste de Pau.
22
Religioso mínimo.
33
Por esta carta, o Padre Simon Martin dedica a São Vicente sua tradução francesa do Guia dos Pecadores do Padre
Luís de Granada.
palavra, onde a vinha do Senhor estava inculta e sem frutos, por falta de bons
operários que sustentassem, como convém, a honra do Mestre. Graças a Deus, a
França está agora mais cristã do que nunca; as trevas da ignorância dão lugar ao belo
dia da salvação e da graça; as ovelhas, que caminhavam ao sabor do desejo de seus
corações, escutam a voz dos seus pastores e são reconduzidas ao redil; e o Evangelho
do Crucificado é igualmente anunciado aos mais simples e miseráveis do campo e aos
mais capazes e maiorais das melhores cidades. Esta ventura provém do fato de que não
há canto do reino, por menor que seja, onde esses novos operários estimulados por
vosso zelo e piedade na messe do Senhor, não vão distribuir o pão da doutrina celeste e
o vinho sagrado que gera as virgens; e isso, com tanto fruto que se mostram,
verdadeiramente, muito dignos da qualidade de discípulos do grande mestre Jesus, no
ofício de evangelizador dos pobres.
É a vós, portanto, senhor Padre, com toda a justiça, mais do que a nenhum
outro, que esse livro, que realiza todos os dias tantas conquistas sobre os três grandes
inimigos de nossa salvação, devia ser dedicado. Com efeito, os pecadores, dos quais é o
guia, não recebem menos ensinamentos dos exemplos de vossa vida do que da verdade
dos seus preceitos. Permiti, pois, senhor Padre, pelo amor daquele por cuja glória
zelais com tanto ardor, que esta obra, com o nome do seu autor, já coroada pelos seus
frutos, receba ainda uma nova coroa, pelo vosso nome, marca de força e vitória, para
ser, enfim, acompanhada do triunfo que vos deseja, senhor Padre, vosso muito humilde
e muito obediente servo, em Jesus Cristo,

Irmão Simon Martin, religioso mínimo.

Convento de Nossa Senhora de Todas as Graças, chamado Nigeon-lez-Paris,


dia de São Paulo, 16454.

Destinatário: Ao senhor Padre Vicente, superior dos Padres da Missão de São


Lázaro.

46. – A LUÍSA DE MARILLAC

1646, dia de Ramos1

Agradeço-vos muito humildemente por todas as caridades que me fizestes


durante minhas pequenas indisposições. Vós o fazeis, há mais de vinte anos, Senhora, e
rogo a Nosso Senhor seja ele vosso agradecimento, como será vossa recompensa.

44
29 de junho de 1645.
.
Carta 46. – Carta autógrafa.
O original está com as Filhas da Caridade da Paróquia Saint-Projet, em Bordéus. Texto publicado nos Anais da CM ,
1928, p. 257-259.
11
25 de março.
Estou melhor, graças a Deus, mas não saio para fora ainda, porque ainda não fui
purgado, uma vez que me resta um pouco de resfriado. Vosso coração ficou um pouco
consternado, à vista dos meus pequenos incômodos e porque encarais, algumas vezes,
as coisas com um olhar que se fixa nos acontecimentos e nas consequências.
Acontece-vos o mesmo a respeito do senhor vosso filho, e isto vos perturba. É
bom, Senhora, não dar essas liberdades à nossa imaginação e detê-la com a
consideração de que se trata de um efeito de nossos sentimentos melancólicos, e de que,
de ordinário, a maior parte das coisas não acontece e de que só acontecerá o que a
Providência ordenar.
Muito Bem! Desejaríeis fazer vossa revisão e uma comunicação mais íntima 2
com aquele no qual Nosso Senhor vos inspirou alguma confiança. Não foi do agrado de
Deus que assim acontecesse, a fim de que as fizésseis, interiormente e em vosso íntimo,
com ele mesmo. Honrando-vos com seu amor até o extremo, como diz o Apóstolo, ele
quer, com ciúme divino, que seja com ele que façais esta cara revisão e íntima
comunicação. Teríeis motivo de vos queixar, sendo assim?
E como podeis saber se não é de propósito que Deus vos priva de notícias do
vosso filho, a fim de que honreis, de modo particular, a privação que ele mesmo quis
sofrer do seu, e a da Santíssima Virgem também? Oferecei-lhe vossas ternuras, Senhora,
bendizei-o, entregai-lhe a direção do vosso filho e ele o conduzirá tão bem que, do
próprio mal, se o houver, o que não creio, há de tirar o bem e a salvação dele. Aquele
que retira água da rocha e o óleo das pedras duras não produzirá o efeito de que vos
falo?
Vi o belo quadro3. A Igreja celebra amanhã a festa da Encarnação 4. Espero
celebrar a santa missa diante dele amanhã, pois me parece mais conveniente do que
hoje. É para o vosso oratório ou para o das crianças?
Não escrevereis na terça-feira ao Padre Portail sobre as vossas filhas que ele está
pedindo5? Não poderia ele acomodar as coisas ao vosso sentir, cuja compreensão lhe
passaríeis? Seria muito de se desejar que fôsseis lá. Mas como a coisa não é tão urgente
e não podeis estar em todos os estabelecimentos, redigi alguma notas que sirvam para o
presente e para o futuro, em tais casos.
É necessário que elas assumam a direção, ou que se submetam às outras Irmãs6.
A última alternativa não é conveniente e a primeira talvez seja difícil. Contudo, importa
tender para a primeira, ou então, que se lhes confie uma parte dos doentes para deles
cuidarem a seu modo. Dizei-me vosso parecer a respeito. Podeis escrever na terça e no
sábado, e depois nos encontraremos.
Vou, entretanto, oferecer-vos, como também as vossas filhas, a Nosso Senhor,
no adorável sacrifício da santa missa que estou indo celebrar. Peço-vos a mesma graça
em vossa santa comunhão.
22
“Rivisão”, “comunicação”, estas palavras fazem alusão à direção de consciência, para o qual Santa Luísa de
Marillac se dirigia ao Padre Vicente.
33
Quanto ao assunto desse quadro assim como para a maior dos pontos tratados nesta carta, ver, na edição Coste (II,
p. 574-576), as cartas 793 (de 24 de março de 1646) e 794 (de 25 de março); esta última é uma resposta à presente.
44
A festa da Anunciação fora transferida para o dia seguinte (26 de março) por causa da solenidade do dia de Ramos.
55
O Padre Portail se encontrava então em Mans onde fazia a visita canônica do estabelecimento dos Missionários. O
Padre Portail solicitava o envio de Filhas da Caridade para o serviço do hospital.
66
Trata-se das Irmãs de uma outra comunidade que serviam no presente ao hospital de Mans.
Ficarei muito contente de saber o que é este pequeno terço de doze contas preso
à imagem da Santíssima Virgem.
Bom dia, Senhora.
Sou vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo.

Destinatária: Para a Senhora Le Gras.

47. – A GUILHERME DELATTRE1, PADRE DA MISSÃO, SUPERIOR EM


CAHORS

Paris, 19 de maio de 1646.

Senhor Padre,

A graça de Nosso Senhor esteja sempre convosco!


Acabo agora de receber vossa carta. Como resposta a esta e à precedente, dir-
vos-ei, senhor Padre, que fiquei muito sensivelmente contristado, quando tive
conhecimento por vossa carta, que estivestes doente. Em nome de Deus, senhor Padre,
poupai-vos.
Não, senhor Padre, não foi aquele de quem suspeitais que me disse o que me
motivou a vos escrever da última vez2. Pelo contrário, foi ele que me trouxe de vós... as
palavras de gratificação3... e disso vos asseguro diante de Deus, que é a própria verdade.
Foi outro que falou do assunto. Dir-vos-ei com toda simplicidade, senhor Padre, que, o
que julguei de se desejar, foram duas coisas: a primeira é que poderíeis não vos
endurecer contra o jeito caloroso desse povo, tanto mais quanto não éreis ainda o
pároco4 e que o senhor Pároco era de opinião contrária à vossa; a segunda é que teria
sido conveniente, estando na cidade, encaminhar o povo para o Vigário Geral, desde o
instante em que começou a enrijecer, ou remetê-los a ele. Vejo perfeitamente que foi
por puro zelo em fazer observar as determinações do senhor Bispo de Cahors 5. Mas

1
Carta 47. – Carta autógrafa.
Original com os padres da Missão de Florença (Itália).
Texto publicado com a ortografia e a disposição do original nos anais da CM, 1947-1948, p.309-310. Fotografia nos
Arquivos da CM, em Paris.
1
Guilherme Delattre, padre da Missão, nascido em Amiens, em 1610. Entrou na Congregação da Missão em 1642 e
faleceu em Bordéus, em 1650.
22
Sem dúvida, a carta 799 da edição Coste (II, 582-585).
33
As palavras que seguem, como algumas da linha precedente, são ilegíveis em consequência de uma molhadura do
papel.
44
A união da Paróquia São Bartolomeu de Cahors ao Seminário, da qual o superior seria o pároco, decretada pelo
bispo desde 1644, será efetivada apenas algumas semanas depois desta carta.
55
Alain de Solminihac, nascido em 1593, ordenado padre em 1618, reformador da Abadia de Chancelade, em
Périgord, de que era titular desde 1614. Nomeado Bispo de Cahors em 1637, governou sua diocese com zelo,
dotando-a com instituições eficazes e duráveis. Amigo de São Vicente de Paulo, foi um modelo de bispo reformador.
Morreu em 1659. Sua causa de beatificação foi introduzida.
qual, honor regis judicium diligit6, e, além disso, nem sempre é possível advertir a tudo,
de imediato.
É por esta firmeza que tendes que o senhor Bispo vos estima e ama e até
testemunha que vos deseja, mais do que qualquer outro que conhece, no ofício que
tendes. Obsequium tuum ejus judicium diligit7. Esses embates, senhor Padre, e os atos
de paciência que neles praticais vos merecerão novas graças para confrontos
semelhantes.
De resto, fico admirado ao ver as oblações tão frequentemente reiteradas que
fizestes e, com a mesma frequência, fazeis a Deus. Ó Deus, senhor Padre, como lhe
peço de todo coração que ele se honre a si mesmo, pela glória que disso ele retira e que
ele seja o seu próprio agradecimento e uma ajuda para vossa querida alma.
Não vos posso exprimir a ternura que Nosso Senhor me inspira para convosco e
para com vossa pequena mas tão boa família. Eu a abraço com toda a efusão do meu
coração, que ama o vosso mil vezes mais do que a si mesmo, no de Nosso Senhor, em
cujo amor sou, senhor Padre, vosso muito humilde servo,

Vicente de Paulo,
indigno padre da Missão.

Abraço vossa família, prostrado em espírito a seus pés.

Destinatário: Ao senhor Padre Delattre, superior dos padres da Missão de


Cahors, em Cahors.

778 BIS.1 – SANTA LUÍSA DE MARILLAC A SÃO VICENTE

[1646]2.

Dar-nos a conhecer qual é a condição das Filhas da Caridade, e com quais


disposições devem entrar nesse lugar. Para esse fim, que estima devem ter de sua
condição e dos pobres, sendo alimentadas e pagas com as esmolas deles.
O que podem fazer para impedir que recebam neste mundo a recompensa do
serviço que prestam aos pobres, pelo pouco trabalho que têm junto àquele que
deixaram, e a honra que recebem.
66
Versículo 4 do salmo 98. Conforme a versão da Vulgação o sentido é este: “A força do rei está na fidelidade à
justiça”.
77
Esta citação, sugerida pela anterior, não é tirada da Sagrada Escritura. O sentido parece ser o seguinte: “Tua
obediência se liga a suas justas decisões”.
11
Carta 778 bis. – Nota autógrafa não assinada. – O Original está nos arquivos das Filhas da Caridade, Paris.
Fotocópia nos Arquivos da Missão, Paris. Texto publicado em Santa Luísa de Marillac, Escritos espirituais, Tours,
1983, p. 759.
22
Foi em 1646, a partir de 13 de fevereiro, que São Vicente tratou nas conferências dos assuntos propostos aqui por
Santa Luísa.
Se as Filhas não se poderiam iludir com o desejo apressado de servir os pobres,
tanto das paróquias quanto do Hospital Geral, o que as fariam, algumas vezes, amar
menos a permanência na casa.
Se aquelas que ficam em casa não têm igual mérito ao daquelas que servem os
pobres atualmente3.
Que cuidados e apreço devem ter as Filhas em relação ao regulamento da casa
e à sua prática.
De que maneira devem as Filhas expressar a mútua estima e amor e acolher
bem que as faltas de cada uma cheguem ao conhecimento da que lhes ocupa o lugar de
superiora e se elas não deveriam caridosamente advertir a própria superiora das faltas
que a veem cometer, cada uma por sua vez.
Sobre a necessidade de que cada uma advirta imediatamente sua irmã de suas
faltas, e de que maneira importa que essa última acolha a advertência.
Qual o perigo de as Filhas comentarem entre si o desagrado que recebem umas
das outras, quer à maneira de murmuração em particular, quer mesmo como alívio das
repreensões que porventura lhes tiverem sido feitas.

33
Atualmente: efetivamente. Cf. Dicionário do francês clássico, XVII século, Paris, 1989.
ÍNDICE DAS MATÉRIAS
––––––

417. A Luísa de Marillac, 11 de janeiro de 1640


418. A Luís Abelly, 14 de janeiro de 1640
419. A Luísa de Marillac, 17 de janeiro de 1640
420. A Luísa de Marillac, 22 de janeiro de 1640
421. A Luísa de Marillac, 28 de janeiro de 1640
422. A Luísa de Marillac, 31 de janeiro de 1640
423. A Luís Lebreton, 1º de fevereiro de 1640
424. A Jacques Tholard, 1º de fevereiro de 1640
425. A Luísa de Marillac, 04 de fevereiro de 1640
426. A Luísa de Marillac,, 10 de fevereiro de 1640
427. Um padre da Missão a São Vicente, fevereiro de 1640
428. A Antônio Lucas, 21 de fevereiro de 1640
429. O Padre Roussel a São Vicente, [fevereiro de 1640]
430. Um missionário a São Vicente [início de 1640]
431. Santa Chantal a São Vicente [fevereiro de 1640]
432. A Luísa de Marillac, [fevereiro de 1640]
433. A Luís Lebreton, 28 de fevereiro de 1640
434. A Luís Lebreton, 1º de março de 1640
435. Um padre da Missão a São Vicente [março de 1640]
436. A um padre da Missão [antes de 1642]
437. A Luísa de Marillac, [entre 1638 e 1650]
438. Um eclesiástico a São Vicente [entre 1639 e 1643]
439. A Luísa de Marillac [entre 1639 e 1642]
440. A Luísa de Marillac [entre 1639 e 1651]
441. A Luísa de Marillac [entre 1639 e 1641]
442. Um eclesiástico a São Vicente [cerca de 1640]
443. A Luís Abelly, 26 de abril de 1640
444. A Duquesa de Aiguillon [abril ou maio de 1640]
445. A Jean de Fonteneil, 1º de maio de 1640
446. A Santa Chantal, 14 de maio de 1640
447. Santa Chantal a São Vicente [maio de 1640]
448. A Luís Lebreton, 1º junho de 1640
449. Justo Guérin a São Vicente, junho de 1640
450. A Luísa de Marillac [entre 1636 e 1641]
451. Santa Chantal a São Vicente [entre 1626 e 1641]
452. A Francisco du Coudray, 17 de junho de 1640
453. A Madre Francisca F. E. Phelippeaux, 30 de junho de 1640
454. Jean Dehorgny a São Vicente [junho ou julho de 1640]
455. Jean Dehorgny a São Vicente, julho de 1640
456. A Francisco du Coudray, 10 de julho de 1640
457. A Leonardo Boucher, 10 de julho de 1640
458. A Luísa de Marillac, 11 de julho de 1640
459. A Lambert aux Couteaux, 22 de julho de 1640
460. A Pedro Escart, 25 de julho de 1640
461. A Bernardo Codoing, 26 de julho de 1640
462. A Lambert aux Couteaux, 29 de julho de 1640
463. A Samson Le Soudier, 29 de julho de 1640
464. A N***, 29 de julho de 1640
465. A Santa Chantal 30 de julho de 1640
466. Ao Comendador de Sillery [1640]
467. Charles de Montchal a São Vicente [1640]
468. A Luís Lebreton, 09 de agosto de 1640
469. A Luísa de Marillac [1640]
470. Luísa de Marillac a São Vicente [entre 1640 e 1644]
471. A Marquesa de Maignelay a São Vicente, 26 de agosto de 1640
472. A Marquesa de Maignelay a São Vicente, 26 de agosto de 1640
473. A Lambert aux Couteaux, 26 de agosto de 1640
474. A Santa Chantal, 26 de agosto de 1640
475. A Bernardo Codoing, 26 de agosto de 1640
476. A Pierre Escart, 26 de agosto de 1640
477. A Jacques Tholard, 26 de agosto de 1640
478. A Marquesa de Maignelay a São Vicente, 29 de agosto de [1640]
479. A Luísa de Marillac [29 ou 30 de agosto de 1640]
480. A Luísa de Marillac [30 de agosto de 1640]
481. A Luísa de Marillac [agosto ou setembro de 1640]
482. A Luísa de Marillac [agosto ou setembro de 1640]
483. A Luísa de Marillac [1640]
484. A Luísa de Marillac [1640]
485. Para a madre da Trindade, 1º de outubro de 1640
486. Luísa de Marillac a São Vicente [1º ou 02 de outubro de 1640]
487. A Luísa de Marillac [02 de outubro de 1640]
488. A Jacques Chiroye, 06 de outubro de 1640
489. A Luís Lebreton, 09 de outubro de 1640
490. A Estêvão Blatiron, 09 de outubro de 1640
491. A Luísa de Marillac [28 de outubro de 1640]
492. Os Almotacéis de Metz a São Vicente, outubro de 1640
493. A Lambert aux Couteaux, 29 de outubro de 1640
494. A Luísa de Marillac, 1º de novembro de [1640]
495. A Jacques Tholard, 13 de novembro de 1640
496. A Luís Lebreton, 14 de novembro de 1640
497. A Pierre Escart, 14 de novembro de 1640
498. A Bernardo Codoing, 15 de novembro de 1640
499. Luísa de Marillac a São Vicente [28 de novembro de 1640]
500. A Luísa de Marillac [28 ou 29 de novembro de 1640]
501. A Luísa de Marillac [em torno de 1640]
502. Os Almotacéis de Pont-à-Mousson a São Vicente, dezembro de 1640
503. A Luísa de Marillac [1640 ou 1641]
504. A Luísa de Marillac
505. A Charles Ozenne, 14 de janeiro de [1641]
506. A Luísa de Marillac [31 de janeiro de 1641]
507. A Luís Lebreton, 03 de fevereiro de 1641
508. A Adriano Bourdoise, 06 de fevereiro de 1641
509. A Luísa de Marillac [07 de fevereiro de 1641]
510. A Luísa de Marillac [07 de fevereiro de 1641]
511. A Luísa de Marillac [08 de fevereiro de 1641]
512. Luísa de Marillac a São Vicente, 09 de fevereiro de 1641
513. A Luísa de Marillac [09 ou 10 de fevereiro de 1641]
514. A Luísa de Marillac [fevereiro de 1641]
515. Luísa de Marillac a São Vicente [antes de 1650]
516. A Luísa de Marillac [entre 1639 e 1641]
517. A Luísa de Marillac [fevereiro ou março de 1641]
518. A Luísa de Marillac [fevereiro ou março de 1641]
519. A Luísa de Marillac [fevereiro ou março de 1641]
520. A Luísa de Marillac [depois de 1639]
521. A Luísa de Marillac [depois de 1637]
522. Um padre da Missão a São Vicente, 1641
523. A Samson Le Soudier, 24 de março de 1641
524. Ao senhor Padre Perriquet, 31 de março de 1641
525. A Luísa de Marillac [entre 1641 e 1654]
526. Luísa de Marillac a São Vicente [1641]
527. A Luísa de Marillac [1641]
528. A Luísa de Marillac [1641]
529. A Luísa de Marillac [abril ou maio de 1641]
530. A Luísa de Marillac
531. A Jean Deslyons, 20 de julho de 1641
532. Luísa de Marillac a São Vicente, 07 de agosto de [1641]
533. A Luísa de Marillac [07 de agosto de 1641]
534. A Luísa de Marillac [1641]
535. A Luísa de Marillac [entre julho e setembro de 1641]
536. A Luísa de Marillac [agosto ou setembro de 1641]
537. A Luísa de Marillac [06 ou 07 de setembro de 1641]
538. A Estêvão Blatiron, 09 de setembro de 1641
539. A Santa Chantal [1641]
540. Luísa de Marillac a São Vicente, 11 de setembro de [1641]
541. A Bernardo Codoing, 15 de setembro de 1641
542. A Luísa de Marillac [entre 1639 e 1641]
543. A Luísa de Marillac [1641]
544. A Luísa de Marillac
545. A Antônio Portail, 05 de outubro de 1641
546. A Luísa de Marillac [outubro de 1641]
547. A Jeanne Lepeintre, 09 de outubro de 1641
548. Nicolau Pavillon a São Vicente, 22 de outubro de [1641]
549. Luísa de Marillac a São Vicente [outubro ou novembro de 1641]
550. A Luísa de Marillac [outubro ou novembro de 1641]
551. Luísa de Marillac a São Vicente [outubro ou novembro de 1641]
552. Justo Guérin a São Vicente, outubro de 1641
553. A N***
554. A Luísa de Marillac
555. Para a Superiora do Convento da Visitação de Metz, 02 de novembro [entre 1639 e
1645]
556. Para a Madre da Trindade, 05 de novembro de 1641
557. A Bernardo Codoing, 19 de novembro de 1641
558. A Luísa de Marillac [ente 1641 e 1654]
559. A Bernardo Codoing, 07 de dezembro de 1641
560. A Lambert aux Couteaux, 14 de dezembro de 1641
561. A Bernardo Codoing, 16 de dezembro de 1641
562. A Bernardo Codoing
563. A Michel Dupuis, 12 de janeiro de 1642
564. A Luísa de Marillac
565. A Bernardo Codoing, 22 de janeiro de 1642
566. A Francisco Dufestel, 22 de janeiro de 1642
567. Um missionário a São Vicente [entre 1639 e 1643]
568. A Luísa de Marillac [1642]
569. A Bernardo Codoing, 31 de janeiro de1642
570. A Bernardo Codoing, 09 de fevereiro de 1642
571. A Pierre du Chesne, 02 de março de 1642
572. A Luísa de Marillac [entre 1639 e 1647]
573. Ao Governador de uma grande cidade
574. A Luísa de Marillac [entre 1640 e 148]
575. A Bernardo Codoing, 17 de março de 1642
576. A Jacques Boudet, 25 de março de 1642
577. Bernardo Prévost a São Vicente, 1642
578. Madame de Saint-Cyr a São Vicente, 1642
579. Pierre de Nivelle a São Vicente, 1642
580. A Bernardo Codoing, 1º de abril de 1642
581. A Jacques Chiroye, 19 de abril
582. A Bernardo Codoing, 25 de abril de 1642
583. A Madre F. E. Phelippeaux, 1º de maio de [1642]
584. Um eclesiástico da Conferência de Pontoise a São Vicente, maio de 1642
585. A Madre F. E. Phelippeaux, 08 de maio de 1642
586. A o Senhor N*** [entre 1640 e 1648]
587. Luísa de Marillac a São Vicente [perto de maio de 1642]
588. A Luísa de Marillac [por volta de maio de 1642]
589. A Bernardo Codoing, 25 de maio de 1642
590. Um Pároco dos arredores de Paris a São Vicente, 1642
591. Os Almotacéis de Lunéville a São Vicente, 1642
592. A Luísa de Marillac [08 de junho de 1642]
593. Respostas de São Vicente a questões colocadas por Luísa de Marillac [por volta de
junho de 1642]
594. A Bernardo Codoing, 20 de junho de 1642
595. A um Bispo, 22 de junho de 1642
596. Um padre da Missão a São Vicente, 1642
597. Jacques Raoul de la Guibourgère a São Vicente, 1642
598. Sylvestre de Crusy de Marcillac a São Vicente, 1642
599. Jacques Raoul de la Guibourgère a São Vicente, 1642
600. Luísa de Marillac a São Vicente, 06 de julho de [1642]
601. A Luísa de Marillac [06 ou 07 de julho de 1642]
602. A Bernardo Codoing, 11 de julho de 1642
603. A Pierre du Chesne, 24 de julho de 1642
604. A Francisco de Saint-Remy, 27 de julho de 1642
605. A Bernardo Codoing, 28 de julho de 1642
606. A Bernardo Codoing [05 de agosto de 1642]
607. Um Cônego a São Vicente, 1642
608. A Luísa de Marillac [entre 1639 e 1644]
609. A Bernardo Codoing, 19 de agosto de 1642
610. A Francisco Dufestel, 26 de agosto de 1642
611. A Luísa de Marillac, 1º de setembro
612. A Francisco Dufestel, 1º de setembro de 1642
613. A Jacques Chiroye, 06 de setembro de 1642
614. A Luísa de Marillac [1642]
615. A Luísa de Marillac [1642]
616. A Luísa de Marillac [setembro de 1642]
617. A Luísa de Marillac [setembro de 1642]
618. A Francisco Dufestel, 20 de setembro de 1642
619. A Jean Guérin, 24 de setembro de 1642
620. A Luísa de Marillac, 28 de setembro de 1642
621. A Luísa de Marillac [entre 1642 e 1644]
622. A Jean Brunet e Estêvão Blatiron, 08 de outubro de 1642
623. Nicolau Pavillon a São Vicente [outubro de 1642]
624. A Luísa de Marillac [entre 1641 e 1643]
625. A Bernardo Codoing, 24 de outubro de 1642
626. Jean-Jacques Olier a São Vicente [outubro de 1642]
627. Luísa de Marillac a São Vicente [1642 ou 1643]
628. A Antônio Lucas, 20 de novembro de 1642
629. A Bernardo Codoing, 21 de novembro de 1642
630. A Jacques Chiroye, 22 de novembro de 1642
631. A Francisco Dufestel, 28 de novembro de 1642
632. Bernardo Codoing a São Vicente, 1642
633. A Bernardo Codoing, 25 de dezembro de 1642
634. A Pierre du Chesne, 1º de janeiro de 1643
635. A Jean Guérin, 12 de janeiro de 1643
636. A um padre da Missão
637. Luísa de Marillac a São Vicente [17 de janeiro de 1643]
638. Luísa de Marillac a São Vicente [25 de janeiro de 1643]
639. A Bernardo Codoing, 30 de janeiro de 1643
640. A Bernardo Codoing, 05 de fevereiro de 1643
641. Luísa de Marillac a São Vicente, 09 de fevereiro de 1643
642. A Pedro Escart, 11 de fevereiro de 1643
643. Pierre Fournier a São Vicente, 1643
644. A Bernardo Codoing, 20 de fevereiro de 1643
645. As Autoridades de Saint-Mihiel a São Vicente, 1643
646. A Jean Martin, 23 de fevereiro de 1643
647. Luísa de Marillac a São Vicente
648. Luísa de Marillac a São Vicente
649. Um Bispo a São Vicente, 1643
650. A Bernardo Codoing, 27 de fevereiro de 1643
651. A Jean Guérin, 10 de março de 1643
652. A Francisco Dufestel, 10 de março de 1643
653. A uma religiosa de Paris [entre 1639 e 1647]
654. A Bernardo Codoing, 29 de março de 1643
655. A Pierre du Chesne, 25 de março de 1643
656. A Luísa de Marillac [1643, perto de maio]
657. A Luísa de Marillac [entre1638 e 1649]
658. A Bernardo Codoing, 17 de abril de 1643
659. Alain de Solminihac a São Vicente, 03 de maio de 1643
660. A Bernardo Codoing, 15 de maio de 1640
661. Francisco du Coudray a São Vicente [23 ou 24 de maio de 1643]
662. A Bernardo Codoing, 29 de maio de 1643
663. Jacques Raoul de la Guibourgère a São Vicente [maio ou junho] de 1643
664. Francisco du Coudray a São Vicente [1º de junho] de 1643
665. Leonor d’Estampes de Valençay a São Vicente, 1643
666. Os Eclesiásticos da Conferência de Noyon a São Vicente, 1643
667. Um Eclesiástico da Conferência de Noyon a São Vicente, 1643
668. Luísa de Marillac a São Vicente [08 de junho de 1643]
669. Luísa de Marillac a São Vicente, 12 de junho de [1643]
670. Jean-Jacques Olier a São Vicente [junho de 1643]
671. Sylvestre de Crusy de Marillac a São Vicente, 1643
672. A Bernardo Codoing, 16 de junho de 1643
673. Alain de Solminihac a São Vicente, 08 de julho de 1643
674. A Bernardo Codoing, 10 de julho de 1643
675. A Madre Maria Eufrosina Turpin, 23 de julho de 1643
676. A Charles de Montchal [entre 1643 e 1647]
677. A Bernardo Codoing, 24 de agosto de 1643
678. A Bernardo Codoing, 11 de setembro de 1643
679. A Helena Angélica Lhuillier [entre 1641 e 1644]
680. A Bernardo Codoing, 09 de outubro de 1643
681. Guilherme Gallais a São Vicente, 1643
682. A Bernardo Codoing, 06 de novembro de 1643
683. Um Bispo a São Vicente
684. Ana de Murviel a São Vicente [entre 1635 e 1652]
685. Luísa de Marillac a São Vicente, 19 de novembro de 1643
686. Jean Jacques Olier a São Vicente
687. Jacques du Perron a São Vicente, dezembro de 1643
688. A um Magistrado de Toul, 13 de dezembro de 1643
689. Luísa de Marillac a São Vicente, 16 de dezembro de [1643]
690. A um Bispo [entre 1643 e 1652]
691. Ao mesmo Bispo [entre 1643 e 1652]
692. O Superior de um mosteiro reformado de Paris a São Vicente
693. A Luísa de Marillac
694. Ao Padre Charles Faure [1643 ou 1644]
695. Luísa de Marillac a São Vicente [14 de janeiro de 1644]
696. Luísa de Marillac a São Vicente [janeiro de 1644]
697. Jacques du Perron a São Vicente, janeiro de 1644
698. Alain de Solminihac a São Vicente, 27 de janeiro de 1644
699. Um eclesiástico de Angoulême a São Vicente [janeiro ou fevereiro de 1644]
700. A Jean Dehorgny, 03 de fevereiro de 1644
701. A Guilherme Gallais, 13 de fevereiro de 1644
702. Monsenhor Le Boucher a São Vicente, 1644
703. Um religioso a São Vicente, 1644
704. A Bernardo Codoing, 16 de março de 1644
705. Ao superior da casa de Marselha [1643 ou depois]
706. Um membro da Conferência de Angoulême a São Vicente, 1644
707. A Bernardo Codoing, 14 de abril de 1644
708. Alain de Solminihac a São Vicente, 1º de maio de 1644
709. A Bernardo Codoing, 13 de maio de 1644
710. Jacques Lescot a São Vicente [maio ou junho de 1644]
711. A um religioso, 23 de junho de 1644
712. Ao Padre Charles Faure, 26 de junho de 1644
713. Alain de Solminihac a São Vicente, 29 de junho de 1644
714. Luísa de Marillac a São Vicente, 30 de junho de [1644]
715. A Bernardo Codoing, 09 de julho de 1644
716. A Bernardo Codoing, 15 de julho de 1644
717. Félix Vialart a São Vicente, 26 de julho de 1644
718. A Bernardo Codoing, 29 de julho de 1644
719. A Luís Thibault, 03 de agosto de 1644
720. A Bernardo Codoing, 06 de agosto de 1644
721. Justo Guérin a São Vicente, agosto de 1644
722. A Bernardo Codoing, 12 de agosto de 1644
723. A Leonor d’Estampes de Valençay, 21 de setembro de 1644
724. Luísa de Marillac a São Vicente [entre 21 de setembro e 13 de outubro de 1644]
725. A Antônio Portail, 05 de outubro de 1644
726. A Jean Dehorgny, 14 de outubro de 1644.
727. A Antônio Portail, 14 de outubro de 1644
728. A Antônio Portail, 21 de outubro de 1644
729. A Luísa de Marillac [depois de 1638]
730. Ao senhor Padre Campion [10 de novembro de 1644]
731. A Jean Dehorgny, 11 de novembro de 1644
732. Nicolau Pavillon a São Vicente, 18 de novembro de 1644
733. A Guilherme Delville, 20 de novembro de 1644
734. A Guilherme Delville, 20 de novembro de 1644
735. Luísa de Marillac a São Vicente, 02 de dezembro de [1644]
736. Charles Francisco d’Abra de Raconis a São Vicente [entre 1643 e 1646]
737. A Bernardo Codoing, 04 de janeiro de 1645
738. A Guilherme Delville, 07 de fevereiro de 1645
739. A Charles de Montchal, 24 de fevereiro de 1645
740. O Cardeal Francisco Barberini a São Vicente, 25 de fevereiro de 1645
741. Jacques Raoul de la Guibourgère a São Vicente, março de 1645
742. Luísa de Marillac a São Vicente [cerca do ano de 1645]
743. Nicolau Pavillon a São Vicente
744. Jean Jacques Olier a São Vicente [1644 ou 1646]
745. Tomás Turchi a São Vicente, 09 de abril de 1645
746. Tomás Turchi a São Vicente, 17 de abril de 1645
747. A Lambert aux Couteaux, 18 de abril de 1645
748. Aos Senhores..., 20 de abril de 1645
749. A Jacques Chiroye, 03 de maio de 1645
750. A Luísa de Marillac
751. A um padre da Missão
752. Nicolau Pavillon a São Vicente, 24 de maio de 1645
753. Luísa de Marillac a São Vicente [25 de maio de 1645]
754. Simiane de la Coste a São Vicente, 1645
755. Ao Conde de Brienne, 02 de junho de 1645
756. Luísa de Marillac a São Vicente [03 de junho de 1645]
757. Luísa de Marillac a São Vicente [antes de 1650]
758. A Madre Maria Inês Chevallier, 25 de junho de 1645
759. A Jean Dehorgny, 30 de junho de 1645
760. A Jean Dehorgny, 06 de julho de 1645
761. Nicolau Pavillon a São Vicente, 12 de julho de 1645
762. A um padre da Missão [julho de 1645]
763. A Guilherme Gallais, 14 de julho de 1645
764. Ao Parlamento [16 de julho de 1645]
765. Luísa de Marillac a São Vicente, 19 de julho de [1645]
766. Luísa de Marillac a São Vicente, 21 de julho de 1645
767. Luísa de Marillac a São Vicente, 26 de julho de 1645
768. Nicolau Pavillon a São Vicente, 31 de julho de 1645
769. O Cardeal Durazzo a São Vicente, agosto de 1645
770. Luísa de Marillac a São Vicente, 19 de agosto de [1643, 1644 ou 1645]
771. A Luísa de Marillac [agosto ou setembro de 1645]
772. Luísa de Marillac a São Vicente [agosto ou setembro de 1645]
773. A Jean Francisco de Gondi [agosto ou setembro de 1645]
774. A Guilerme Delville, 22 de setembro de 1645
775. A Denis Gautier, 15 de outubro de 1645
776. A Denis Gautier, 1645
777. Nicolau Pavillon a São Vicente, 28 de dezembro de 1645
778. A Jean Scarron, janeiro de 1646
779. A Renê Sauvage, 19 de janeiro de 1646
780. Luísa de Marillac a São Vicente [antes de 1650]
781. A um padre da Missão [1646 ou 1649]
782. Nicolau Pavillon a São Vicente, 05 de fevereiro de 1646
783. O Cardeal Mazarino a São Vicente, fevereiro de 1646
784. Alain de Solminihac a São Vicente, 1º de março de 1646
785. Nicolau Pavillon a São Vicente, 1º de março de 1646
786. A Jean Dehorgny, 02 de março de 1646
787. A Jean Martin, 10 de março de 1646
788. A um padre da missão da casa de Saint-Méen, 16 de março de 1646
789. A Antônio Portail, 20 de março de 1646
790. A um padre da Missão
791. A Antônio Portail, 23 de março de 1646
792. A Estêvão Blatiron, 23 de março de 1646
793. Luísa de Marillac a São Vicente [24 de março de 1646]
794. Luísa de Marillac a São Vicente [março de 1646]
795. A Antônio Portail, 03 de abril de 1646
796. A Guilherme Delattre, 07 de abril de 1646
797. A Luísa de Marillac [cerca de 1646]
798. Luísa de Marillac a São Vicente [entre 1645 e 1650]
799. A Guilherme Delattre, 19 de abril de 1646
800. Juliano Guérin a São Vicente, 1646
801. Luísa de Marillac a São Vicente [02 de maio de 1646]
802. A Luísa de Marillac [02 de maio de 1646]
803. A Antônio Portail, 03 de maio de 1646
804. Os Administradores do Hospital de Nantes a São Vicente, 18 de maio de 1646
805. Luísa de Marillac a São Vicente [antes de 1650]
806. Ao Cardeal Mazarino, 24 de maio de 1646
807. A Jean Martin, 25 de maio de 1646
808. Luísa de Marillac a São Vicente [28 de maio de 1646]
809. Luísa de Marillac a São Vicente [cerca de 1646]
810. A Jean Martin, 08 de junho de 1646
811. Juliano Guérin a São Vicente, junho de 1646
812. Luísa de Marillac a São Vicente [cerca de 1646]
813. A Luísa de Marillac [junho de 1646]
814. Luísa de Marillac a São Vicente [fim de junho ou de julho de 1646]
815. A Jean Bourdet, 29 de junho de 1646
816. A Luís Thibault, 04 de julho de 1646
817. A Cláudio Dufour, 04 de julho de 1646
818. Aos Senhores Dehères e Bautru, 08 de julho de 1646
819. A Antônio Portail, 11 de julho de 1646
820. Estêvão Blatiron a São Vicente, julho de 1646
821. Estêvão Blatiron a São Vicente [em torno de julho de 1646]
822. A Antônio Portail, 15 de julho de 1640
823. Luísa de Marillac a São Vicente, 20 de julho de 1646
824. A Antônio Portail, 22 de julho de 1646
825. A Jean Bourdet, 22 de julho de 1646
826. A Guilherme Delville, 25 de julho de 1646
827. A Antônio Portail, 25 de julho de 1646
828. Alain de Solminihac a São Vicente, 31 de julho de 1646

APÊNDICES

1. Declaração pela qual Santa Chantal autoriza a doação do seu coração ao


primeiro mosteiro de Paris
2. Súplica de São Vicente ao Parlamento
3. Carta de Antônio Portail a um padre da Missão, 23 de maio de 1645
4. Súplica de São Vicente ao Parlamento
ÍNDICE DO ANEXO DO TOMO II

432 Bis. Santa Joana de Chantal a São Vicente ( 22-29 de fevereiro de 1640)
448 Bis. Ao Revmo. Padre Robert Lachau, S.J (04 de junho de 1640)
449 Bis. Santa Joana de Chantal a São Vicente (cerca de 13 de junho de 1640)
498 Bis. Santa Joana de Chantal a São Vicente (24 de novembro de 1640)
26. A Santa Luísa de Marillac (11 de fevereiro de 1641)
27. A Santa Joana de Chantal (09 de junho de 1641)
28. A Sylvestre de Crusy de Marcillac, Bispo de Mende (06 de desembro de 1641)
562 Bis. Para a Madre Luísa Eugênia de Fonteine ( ínicio de 1642)
29. A Bernardo Codoing (09 de fevereiro de 1642)
30. A Jacques Chiroye (06 de setembro de 1642)
31. A Francisco Du Festel (20 de setembro de 1642)
32. Irmão Mateus Regnard ao Padre Vicente (janeiro de 1643)
33. A Bernardo Codoing (05 de fevereiro de 1643)
34. A Francisco Du Festel (10 de março de 1643)
35. A Bernardo Codoing (20 de março de 1643)
36. Carta de São Vicente aos Padres da Missão em Marselha (18 de abril de 1643)
37. A Bernardo Codoing (07 de maio de 1643)
38. Carta do Padre Félicien a São Vicente (20 de maio de 1643)
39. Carta dirigida a São Vicente (01 de agosto de 1643)
679 Bis. Para a Irmã Helena Angélica Lhuillier (07 de outubro de 1643)
40. A Bernardo Codoing (13 de novembro de 1643)
41. Carta do Marquês de Fabert (1643-1644)
710 Bis. Padre Charles Faure a São Vicente (21 de junho de 1644)
42. Carta do Cavaleiro Simiane de La Coste a São Vicente (27 de junho de 1644)
43. Carta a Antônio Portail (05 de outubro de 1644)
44. A Antônio Portail (15 de outubro de 1644)
45. A Antônio Portail (19 de outubro de 1644)
758 Bis. Do Padre Simon Martin a São Vicente (29 de junho de 1645)
46. A Luísa de Marillac (25 de março de 1646)
47. A Guilherme Delattre (19 de maio de 1646)
778 Bis. Santa Luísa de Marillac a São Vicente (1646)

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