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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2022.0000251778

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação Cível nº


1007175-21.2016.8.26.0405, da Comarca de Osasco, em que é apelante MUNICÍPIO
DE OSASCO, é apelado CONSÓRCIO PLANOVA RUAL ARC.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 18ª Câmara de Direito


Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Negaram
provimento ao apelo fazendário, todavia, com observação, esta consubstanciada
nos critérios balizadores do pleito repetitório, nos termos fixados pelo acórdão. ,
de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores BEATRIZ BRAGA


(Presidente), HENRIQUE HARRIS JÚNIOR E BURZA NETO.

São Paulo, 5 de abril de 2022.

BEATRIZ BRAGA
Relator(a)
Assinatura Eletrônica
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TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Voto nº 36865
Comarca: Osasco
Apelante: Município de Osasco (exequente)
Apelado: Consórcio Planova-Rual-Arc (executado)

Juiz sentenciante: Olavo Sá Pereira da Silva

Ementa: Apelação cível Ação declaratória cumulada com


pedido repetitório. Controvérsia relacionada à base de
cálculo tributária do ISSQN incidente sobre serviços de
construção civil. A sentença julgou a ação procedente e
deve ser mantida. Com efeito, o artigo 7º, §2º, I da LC
116/03 exclui da base de cálculo do ISS incidente sobre os
serviços de construção civil o valor dos materiais fornecidos
pelo prestador de serviços. O mencionado entendimento
adotado pelos Tribunais Superiores é também consolidado e
sedimentado pela jurisprudência desta Corte de Justiça.
Eficácia vinculativa da jurisprudência do STF sobre o tema,
especialmente quando reconhecida a repercussão geral do
julgamento RE 603.497.
De fato, os materiais utilizados na construção civil pelo
prestador do serviço, independente de haverem sido
produzidos pelo próprio contribuinte ou adquiridos junto a
terceiros, devem ser deduzidos da base de cálculo tributária
do ISS, uma vez empregados na obra. De rigor, portanto, a
procedência da ação, inclusive diante da efetiva
comprovação, via perícia oficial, da discriminação dos
valores dos materiais utilizados na execução da obra. Por
conseguinte, a descrição e enumeração dos materiais
empregados na prestação de serviços possibilita ao
exequente a dedução de seus respectivos valores da base de
cálculo do tributo, para fins de recolhimento do ISS, assim
como a repetição das somas recolhidas, a esse propósito, a
serem devidamente apuradas em liquidação de sentença,
ressalvada a prescrição quinquenal. A manutenção da
sentença, outrossim, enseja a majoração da verba honorária
advocatícia de 10 (dez) para 15% (quinze por cento) do
valor atualizado da causa, em atendimento ao preceito
disposto no artigo 85, §11 do CPC. Nega-se provimento ao
apelo fazendário, todavia, com observação, esta
consubstanciada nos critérios balizadores do pleito
repetitório, nos termos fixados pelo acórdão.

Trata-se de apelação interposta contra a sentença de


fls. 3321/3325, proferida nos autos da ação declaratória de
inexistência de relação jurídico-tributária cumulada com pedido
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repetitório ajuizada por Consórcio Planova-Rual-Arc em face do


Município de Osasco.

Referida sentença julgou a ação procedente para o


fim de autorizar a autora a deduzir da base de cálculo do ISSQN
incidente sobre a prestação dos serviços de construção civil,
descritos nos autos, o valor dos materiais utilizados na obra e o
custo das subempreitadas, além de determinar que o Município
se abstivesse de exigir que o cálculo do imposto se desse com
base no valor integral da nota fiscal correspondente à prestação
do serviço, sem as referidas deduções.

A decisão também declarou o direito da autora à


compensação/restituição dos valores recolhidos sobre os
materiais empregados e as subempreitadas, com eventuais
débitos de ISSQN, mediante a discriminação dos respectivos
valores, além da comprovação das aquisições ou produções e o
efetivo emprego na obra, a ser apurada no âmbito administrativo.

Consequentemente, o processo foi declarado extinto,


com resolução de mérito, nos termos do artigo 487, inciso I, do
CPC.

Em razão da sucumbência o Município de Osasco foi


condenado a arcar com o pagamento das custas e honorários
advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) do valor atualizado
da causa (R$42.934,14 - quarenta e dois mil, novecentos e trinta

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e quatro reais e catorze centavos em 31 de março de 2016).

Insatisfeita com o resultado do julgado apela a


Municipalidade ré pugnando por sua integral reforma.

Em suas razões recursais acostadas a fls. 3348/3354


defende a legalidade e juridicidade de seu atuar fiscal, nos planos
adjetivo e material, especialmente no tocante à higidez da base
de cálculo infirmada.

A esse propósito, assinala que a base fiscal do ISS


consiste no custo integral do serviço, de modo que não deve ser
admitida a subtração dos valores correspondentes aos materiais
utilizados e às subempreitadas.

Requer, por conseguinte, seja reconhecida a validade


do critério que estabelece como base de cálculo fiscal o custo
integral dos serviços, com a inversão da condenação
sucumbencial.

O apelo não recebeu resposta.

É o relatório.

Preenchidos os requisitos legais o apelo deve ser


conhecido.

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No mérito, contudo, não comporta provimento, nos


termos que serão adiante delineados.

Com efeito, o objeto da incidência fiscal discutida nos


presentes autos consiste na contratação do consórcio-autor para
a elaboração dos projetos básicos e executivos das obras de
urbanização da Avenida Visconde de Nova Granada/Sport Club
Corinthians Paulista, situada em Osasco.

No curso do feito foi produzida prova pericial e o


respectivo laudo fora apresentado a fls. 3.210/3.248, com
esclarecimentos a fls. 3.266/3.270, e 3.286/3.289.

A expert nomeada pelo juízo concluiu o seguinte:

“Após as análises e verificações nos documentos


anexados aos autos: “Notas Fiscais de Serviço, Notas
Fiscais de Vendas, Livro Registro de Entrada e as
Guias Previdenciárias, como também pelas repostas
ofertadas aos quesitos, apura-se que o material que
se pretende abater no cálculo do ISSQN foi
empregado na obra relativa ao Contrato nº 111/2014”.

Quanto ao cerne da controvérsia, anote-se que o STF,


no julgamento do RE 603.497/MG, pacificou a questão
relacionada à interpretação do artigo 9º, §2º, alínea “a”, do DL

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406/68, reproduzido pela LC 116/03, em seu art. 7º, §2º, I1.

Reconhecida a existência de repercussão geral, foi


determinada a aplicação do regime legal previsto no art. 543-B do
CPC e, no mérito, consignou-se o seguinte no voto da Ministra
relatora do recurso:

“(...) Verifico que a matéria já se encontra pacificada


no âmbito desta Corte, no sentido da possibilidade da

1
Art. 9º, DL 406/68. A base de cálculo do imposto é o preço do serviço. (...)
§2º Na prestação de serviços a que se referem os itens 19 e 20 da lista anexa o imposto
será calculado sobre os serviços deduzido das parcelas correspondentes:
O valor dos materiais fornecidos pelo prestador de serviços.
32. Execução por administração, empreitada ou subempreitada, de construção civil, de
obras hidráulicas e outras obras semelhantes e respectiva engenharia consultiva, inclusive
serviços auxiliares ou complementares (exceto o fornecimento de mercadorias produzidas
pelo prestador de serviços, fora do local da prestação dos serviços, que fica sujeito ao ICM)
(item Complementar 56/87).

Art. 7º, LC 116/03. A base de cálculo é o preço do serviço.


§2º Não se incluem na base de cálculo do Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza:
I o valor dos materiais fornecidos pelo prestador de serviços previstos nos itens 7.02 e
7.05 da lista de serviços anexa a esta Lei Complementar.
7.02 Execução, por administração, empreitada ou subempreitada, de obras de construção
civil, hidráulica ou elétrica e de outras obras semelhantes, inclusive sondagem, perfuração
de poços, escavação, drenagem e irrigação, terraplanagem, pavimentação, concretagem e a
instalação e montagem de produtos, peças e equipamentos (exceto o fornecimento de
mercadorias produzidas pelo prestador de serviços fora do local da prestação dos serviços,
que fica sujeito ao ICMS).
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dedução da base de cálculo do ISS dos materiais


empregados na construção civil. Cito os seguintes
julgados: RE 262.598, red. para o acórdão Min.
Cármen Lúcia, 1ª Turma, DJe 27.09.2007; RE
362.666- AgR, rel. Min. Gilmar Mendes, 2ª Turma,
DJe 27.03.2008; RE 239.360-AgR, rel. Min. Eros
Grau, 2ª Turma, DJe 31.07.2008; RE 438.166-AgR,
rel. Min. Carlos Britto, 1ª Turma, D 28.04.2006; AI
619.095-AgR, rel. Min. Sepúlveda Pertence, 1ª Turma,
DJ 17.08.2007; RE 214.414-AgR, rel. Min. Carlos
Velloso, 2ª Turma, DJ 29.11.2002; AI 675.163, rel.
Min. Ricardo Lewandowski, DJe 06.09.2007; RE
575.684, rel. Min. Cezar Peluso, DJe 15.09.2009; AI
720.338, rel. Min. Joaquim Barbosa, DJe 25.02.2009;
RE 602.618, rel. Min. Celso de Mello, DJe 15.09.2009.
Desse modo, entendo que, com o reconhecimento da
existência de repercussão geral e havendo
entendimento consolidado da matéria, os Tribunais de
origem e as Turmas Recursais podem, desde logo,
com fundamento no § 3º do citado art. 543-B, aplicar a
orientação firmada por este Supremo Tribunal
Federal.
Assim, nos termos do art. 325, caput, do RISTF, o
relator poderá julgar o recurso extraordinário
monocraticamente”.

O acórdão foi assim ementado:

TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE SERVIÇOS ISS.


DEFINIÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. DEDUÇÃO DOS
GASTOS COM MATERIAIS EMPREGADOS NA
CONSTRUÇÃO CIVIL. RECEPÇÃO DO ART. 9º, §2º, b, do
DECRETO-LEI 406/1968 PELA CONSTITUIÇÃO DE 1988.
RATIFICAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA FIRMADA POR ESTA
CORTE. EXISTÊNCIA DE REPERCUSSÃO GERAL.

A matéria controvertida também foi pacificada no


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âmbito do STJ, nos termos dos julgados abaixo mencionados:

TRIBUTÁRIO - ISS - CONSTRUÇÃO CIVIL - BASE DE


CÁLCULO MATERIAIS EMPREGADOS - DEDUÇÃO -
POSSIBILIDADE.
1. Alinhada à orientação firmada pelo Supremo Tribunal
Federal, a jurisprudência desta Corte reconhece a
legalidade da dedução do custo dos materiais
empregados na construção civil da base de cálculo do
imposto sobre serviços (ISS).
2. Nos termos da Súmula 168 do STJ, não cabem
embargos de divergência quando a jurisprudência do
Tribunal se firmou no mesmo sentido do acórdão
embargado.
3. Agravo regimental não provido.
(AgRg no AEREsp 113482/SC, Rel. Min. Diva Malerbi, j.
27.02.2013).

AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO


ESPECIAL. TRIBUTÁRIO. ISS. CONSTRUÇÃO CIVIL.
CONCRETAGEM. MATERIAIS EMPREGADOS.
DEDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. POSSIBILIDADE.
RE 603.497/MG, REL. MIN. ELLEN GRACIE (DJE
16.09.2010). AGRAVO REGIMENTAL DO MUNICÍPIO
DESPROVIDO.
1. O STF, em Recurso Extraordinário em que
reconhecida a repercussão geral (RE 603.497/MG, Rel.
Min. ELLEN GRACIE), firmou o entendimento no sentido
da possibilidade da dedução da base de cálculo do ISS
dos materiais empregados na construção civil.
2. Considerando a eficácia vinculativa da jurisprudência
do STF sobre o tema, especialmente quando reconhecida
a repercussão geral, este STJ passou a adotar o mesmo
entendimento.
3. Agravo regimental do Município de Serra desprovido.
(AgRg no AREsp 155292/ES, Rel. Min. Napoleão Nunes
Maia Filho, j. 16.10.2012)

No mais, não há que se cogitar de incompatibilidade

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do disposto na Súmula 1672 do STJ, como, inclusive, já fora


decidido por aquele Tribunal no julgamento do REsp 976486.

Outrossim, é inconteste que o artigo 7º, §2º, I da Lei


Complementar 116/03 exclui da base de cálculo do ISS incidente
sobre os serviços de construção civil o valor dos materiais
fornecidos pelo prestador de serviços.

Acrescente-se que o mencionado entendimento


adotado pelos Tribunais Superiores é consolidado e sedimentado
na jurisprudência desta Corte de Justiça:

Apelação Ação declaratória de inexigibilidade combinada


com repetição do indébito - ISS Serviços de
concretagem (pavimentação asfáltica) Sentença que
julgou procedente a ação por entender serem devidas as
deduções dos valores dos materiais empregados na
prestação do serviço da base de cálculo do imposto -
Entendimento firmado no RE 603.497 do STF, com
repercussão geral reconhecida, de que os materiais
utilizados na construção civil, pelo prestador do serviço
não importa se foram produzidos pelo próprio contribuinte
ou adquiridos de outrem, importa que tenham sido
"empregados" na obra, devam ser deduzidos da base de
cálculo do ISS Possibilidade que se condiciona à
apresentação de notas fiscais que elenquem e
especifiquem os materiais e seus respectivos valores
Provas robustas - Sentença mantida - Recurso
desprovido.
(TJSP; Apelação Cível 1003942-31.2018.8.26.0248;
Relator (a): Roberto Martins de Souza; Órgão Julgador:
18ª Câmara de Direito Público; Foro de Indaiatuba - 2ª

2
Súmula 167: “O fornecimento de concreto, por empreitada, para construção civil, preparado
no trajeto até a obra em betoneiras acopladas a caminhões, é prestação de serviço,
sujeitando-se apenas à incidência do ISS”.
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Vara Cível; Data do Julgamento: 31/10/2019; Data de


Registro: 27/11/2019)

Era imperiosa, portanto, a procedência da presente


demanda, inclusive pela comprovação, via perícia oficial, da
efetiva discriminação de valores dos materiais utilizados na
execução da obra.

Dessarte, a discriminação dos materiais empregados


na prestação de serviços possibilita ao exequente deduzir seus
respectivos valores da base de cálculo do tributo para fins de
recolhimento do ISS.

É inegável, portanto, a falta de juridicidade do critério


adotado pelo Fisco Municipal para a apuração da base de cálculo
tributária incidente sobre o serviço de construção civil objeto dos
autos, sendo de rigor a repetição dos valores recolhidos, a esse
propósito, a serem devidamente apurados em liquidação de
sentença, ressalvada a prescrição quinquenal, nos termos a
seguir expostos.

Com relação aos índices relativos aos juros e


correção monetária, o Supremo Tribunal Federal, ao concluir o
julgamento do incidente de Repercussão Geral Tema 810,
atrelado ao RE 870.947/SE, em 20.09.2017, definiu duas teses
sobre índices de correção e juros em condenações contra
Fazenda Pública.

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A primeira tese é relativa aos juros moratórios e tem


a seguinte redação:

“O artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela


Lei 11.960/2009, na parte em que disciplina os juros
moratórios aplicáveis a condenações da Fazenda Pública,
é inconstitucional ao incidir sobre débitos oriundos de
relação jurídico tributária, aos quais devem ser aplicados
os mesmos juros de mora pelos quais a Fazenda Pública
remunera seu crédito tributário, em respeito ao princípio
constitucional da isonomia (CRFB, art. 5º, caput); quanto às
condenações oriundas de relação jurídica não-tributária, a
fixação dos juros moratórios segundo o índice de remuneração
da caderneta de poupança é constitucional, permanecendo
hígido, nesta extensão, o disposto no artigo 1º-F da Lei
9.494/1997 com a redação dada pela Lei 11.960/2009.”

A segunda tese, relacionada à atualização monetária,


diz:

“O artigo 1º-F da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela


Lei 11.960/2009, na parte em que disciplina a atualização
monetária das condenações impostas à Fazenda Pública
segundo a remuneração oficial da caderneta de poupança,
revela-se inconstitucional ao impor restrição
desproporcional ao direito de propriedade (CRFB, art. 5º,
XXII), uma vez que não se qualifica como medida adequada a
capturar a variação de preços da economia, sendo inidônea a
promover os fins a que se destina”.

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Portanto, conclui-se que nas condenações contra a


Fazenda Pública oriundas de relação jurídica tributária é
inaplicável o artigo 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela
Lei 11.960/2009) tanto para a correção monetária quanto para os
juros de mora, de modo que deve ser obedecido o princípio da
isonomia para atualização do débito fazendário.

Em março de 2018 sobreveio o julgamento de


mérito do REsp nº 1.495.146/MG e, desse modo, o STJ, seguindo
a linha de entendimento do STF, manifestou-se sobre o assunto
em matérias mais específicas ao firmar as teses abaixo
transcritas (Tema 905):

“1. Correção monetária: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com


redação dada pela Lei 11.960/2009), para fins de correção
monetária, não é aplicável nas condenações judiciais impostas
à Fazenda Pública, independentemente de sua natureza.

Impossibilidade de fixação apriorística da taxa de correção


monetária. No presente julgamento, o estabelecimento de
índices que devem ser aplicados a título de correção monetária
não implica pré-fixação (ou fixação apriorística) de taxa de
atualização monetária. Do contrário, a decisão baseia-se em
índices que, atualmente, refletem a correção monetária
ocorrida no período correspondente. Nesse contexto, em
relação às situações futuras, a aplicação dos índices em
comento, sobretudo o INPC e o IPCA-E, é legítima enquanto
tais índices sejam capazes de captar o fenômeno inflacionário.
1.2. Não cabimento de modulação dos efeitos da decisão. A
modulação dos efeitos da decisão que declarou
inconstitucional a atualização monetária dos débitos da
Fazenda Pública com base no índice oficial de remuneração da
caderneta de poupança, no âmbito do Supremo Tribunal
Federal, objetivou reconhecer a validade dos precatórios
expedidos ou pagos até 25 de março de 2015, impedindo,
desse modo, a rediscussão do débito baseada na aplicação de
índices diversos. Assim, mostra-se descabida a modulação em
relação aos casos em que não ocorreu expedição ou

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pagamento de precatório.
2. Juros de mora: o art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação
dada pela Lei 11.960/2009), na parte em que estabelece a
incidência de juros de mora nos débitos da Fazenda Pública
com base no índice oficial de remuneração da caderneta de
poupança, aplica-se às condenações impostas à Fazenda
Pública, excepcionadas as condenações oriundas de relação
jurídico-tributária.

3. Índices aplicáveis a depender da natureza da condenação.

3.1 Condenações judiciais de natureza administrativa em geral.


As condenações judiciais de natureza administrativa em geral,
sujeitam-se aos seguintes encargos: (a) até dezembro/2002:
juros de mora de 0,5% ao mês; correção monetária de acordo
com os índices previstos no Manual de Cálculos da Justiça
Federal, com destaque para a incidência do IPCA-E a partir de
janeiro/2001; (b) no período posterior à vigência do CC/2002 e
anterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora de 0,5%
ao mês; correção monetária de acordo com os índices
previstos no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com
destaque para a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001;
(b) no período posterior à vigência do CC/2002 e anterior à
vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora correspondentes à
taxa Selic, vedada a cumulação com qualquer outro índice; (c)
período posterior à vigência da Lei 11.960/2009: juros de mora
segundo o índice de remuneração da caderneta de poupança;
correção monetária com base no IPCA-E.
3.1.1 Condenações judiciais referentes a servidores e
empregados públicos. As condenações judiciais referentes a
servidores e empregados públicos, sujeitam-se aos seguintes
encargos: (a) até julho/2001: juros de mora: 1% ao mês
(capitalização simples); correção monetária: índices previstos
no Manual de Cálculos da Justiça Federal, com destaque para
a incidência do IPCA-E a partir de janeiro/2001; (b)
agosto/2001 a junho/2009: juros de mora: 0,5% ao mês;
correção monetária: IPCA-E; (c) a partir de julho/2009: juros de
mora: remuneração oficial da caderneta de poupança; correção
monetária: IPCA-E.
3.1.2 Condenações judiciais referentes a desapropriações
diretas e indiretas. No âmbito das condenações judiciais
referentes a desapropriações diretas e indiretas existem regras
específicas, no que concerne aos juros moratórios e
compensatórios, razão pela qual não se justifica a incidência
do art. 1º-F da Lei 9.494/97 (com redação dada pela Lei
11.960/2009), nem para compensação da mora nem para
remuneração do capital.
3.2 Condenações judiciais de natureza previdenciária. As

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condenações impostas à Fazenda Pública de natureza


previdenciária sujeitam-se à incidência do INPC, para fins de
correção monetária, no que se refere ao período posterior à
vigência da Lei 11.430/2006, que incluiu o art. 41-A na Lei
8.213/91. Quanto aos juros de mora, incidem segundo a
remuneração oficial da caderneta de poupança (art. 1º-F da Lei
9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009).
3.3 Condenações judiciais de natureza tributária. A
correção monetária e a taxa de juros de mora incidentes
na repetição de indébitos tributários devem corresponder
às utilizadas na cobrança de tributo pago em atraso. Não
havendo disposição legal específica, os juros de mora são
calculados à taxa de 1% ao mês (art. 161, § 1º, do CTN).
Observada a regra isonômica e havendo previsão na
legislação da entidade tributante, é legítima a utilização da
taxa Selic, sendo vedada sua cumulação com quaisquer
outros índices.
4. Preservação da coisa julgada. Não obstante os índices
estabelecidos para atualização monetária e compensação da
mora, de acordo com a natureza da condenação imposta à
Fazenda Pública, cumpre ressalvar eventual coisa julgada que
tenha determinado a aplicação de índices diversos, cuja
constitucionalidade/legalidade há de ser aferida no caso
concreto.” (grifei).

Ressalte-se que a decisão paradigma do STF se


pautou em débito federal, tendo utilizado a taxa SELIC para
atualizar o débito. A referida taxa remunera tanto os juros
moratórios quanto a correção monetária.

No entanto, como esse processo tem como parte ente


municipal, o parâmetro há de ser outro.

Assim, partindo da interpretação do julgamento do


STF supracitado, deverão ser aplicados os índices de juros e
correção incidentes quando o Poder Público Municipal cobra
seus créditos tributários (em atendimento ao princípio da
isonomia).
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Ressalte-se que os cálculos em comento deverão ser


realizados em sede de liquidação de sentença, respeitado o
decidido em definitivo no Tema 810 (RE 870.947/SE), tendo em
vista que fora atribuído, em 24/09/2018, efeito suspensivo à
aplicação do citado julgado no tocante à correção monetária.

No mais, não correrão juros de mora no período


compreendido entre a expedição do precatório (se for o caso,
tendo em vista o valor a ser apurado em liquidação de sentença)
até o decurso do prazo legal para o respectivo pagamento
(Súmula Vinculante nº 17).

Incidirão, contudo, juros da mora no interregno entre a


data da realização dos cálculos e a da requisição de pequeno
valor (RPV) ou precatório. (STF. Plenário. RE 579431/RS,
Repercussão Geral - Info 861).

Necessário, ademais, diante do insucesso recursal


majorar a verba honorária advocatícia, nos termos do artigo 85,
§11 do CPC de 10 (dez) para 15% (quinze por cento) do valor
atualizado da causa.

E para que não se alegue cerceamento do direito de


recorrer, considera-se prequestionada toda matéria constitucional
e infraconstitucional discutida, bastando que as questões tenham
sido enfrentadas e solucionadas no acórdão, como de fato

Apelação Cível nº 1007175-21.2016.8.26.0405 -Voto nº 36865 15


PODER JUDICIÁRIO
TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

ocorreu, sendo “desnecessária a citação numérica dos


dispositivos legais”.

Por derradeiro, atentem-se as partes para o


cabimento de embargos declaratórios nas estreitas hipóteses
delineadas no artigo 1.022, sob pena de eventual aplicação das
multas processuais previstas nos §§ 2º e 3º do artigo 1.026,
ambos dispositivos do Código de Processo Civil. Assinale-se que
esta medida está em consonância com a atual jurisprudência dos
Tribunais Superiores sobre o tema.

Ante o exposto, nega-se provimento ao apelo


fazendário, todavia, com observação, esta consubstanciada
nos critérios relativos aos consectários legais relacionados
ao pleito repetitório, nos termos delineados pelo acórdão.

BEATRIZ BRAGA
Relatora

Apelação Cível nº 1007175-21.2016.8.26.0405 -Voto nº 36865 16

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