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Série Paradidática

Ecologia Aplicada

Ciclos e processos
da sucessão ecológica

Edir E. Arioli

2022

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Sumário
Cadeias e redes alimentares 2
Sucessão ecológica 8
Polinização e dispersão de sementes 14
Efeitos de borda e de clareira 21
Corredores ecológicos 26
Comunicação entre animais 31
Comunicação entre vegetais 38

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Cadeias e redes alimentares

A s relações de alimentação entre as espécies animais e vegetais formam


a cadeia alimentar de um ecossistema, com vários níveis tróficos, isto
é, de transferência de nutrientes. Quando várias espécies participam de
cadeias alimentares diferentes, interconectadas, as suas conexões formam
redes ou teias alimentares.

Fonte: planetabiologia.com

Cadeia alimentar simples de um ecossistema tropical.

O tamanho da cadeia alimentar é medido pelo número de níveis tróficos e


serve como indicador do volume da transferência de energia e do grau de
resiliência ecológica. O número de níveis tróficos é, por sua vez, um
indicador da biodiversidade de um ecossistema. Uma implicação direta
desta relação está no fato de que a extinção de espécies enfraquece as
cadeias alimentares, a biodiversidade e, consequentemente, o equilíbrio dos
ecossistemas.

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Fonte: sobiologia.com.br

Teia alimentar de um ecossistema idealizado.

As cadeias alimentares são usadas na modelagem ecológica, que geralmente


se baseia em cadeias alimentares de três espécies. Esta modelagem é útil,
por exemplo, no mapeamento da biodiversidade através dos biomas e no
estudo da migração de contaminantes ambientais nos ecossistemas.
Dentro de uma cadeia alimentar, os organismos são classificados em três
tipos, em função da capacidade de produzir e consumir nutrientes:
produtores, consumidores e decompositores.
Produtores são os organismos que produzem o próprio alimento,
utilizando energia solar ou química para sintetizar glicose, a substância
básica da sua estrutura e do seu metabolismo. Em ambiente subaéreo, onde
as plantas têm acesso à energia solar, isto é feito por meio da fotossíntese,
processo realizado pelos cloroplastos, componentes básicos da clorofila, o
pigmento verde dos vegetais. As folhas verdes absorvem gás carbônico,
utilizam-no para sintetizar a glicose a partir dos sais minerais absorvidos
pelas raízes e liberam oxigênio para a atmosfera. No assoalho dos corpos
d’água profundos (oceanos, mares, lagos), alguns tipos de bactérias
realizam a síntese da glicose utilizando a energia liberada pela oxidação de
enxofre, amônia e metano, no processo denominado quimiossíntese. Todas
as cadeias alimentares começam com um organismo produtor.

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Fonte: portaldoprofessor.mec.gov.br

Esquema simplificado do processo da fotossíntese.

Os organismos deste nível são as plantas verdes, cianofíceas (algas azuis e


verdes) e algumas bactérias que, devido à presença de clorofila, podem
realizar a fotossíntese. Estes organismos, por serem a base de toda a
biodiversidade da terra, são também conhecidos como produtores
primários.
A fotossíntese é o principal processo de transformação de energia na
biosfera e essencial para a manutenção da vida no nosso planeta. Ela
fornece oxigênio para a respiração dos organismos heterotróficos e as
substâncias orgânicas necessárias à constituição celular de todos os seres
vivos. Além disso, a fotossíntese (e, por extensão, a quimiossíntese) fornece
a energia necessária às funções vitais dos organismos, tais como a nutrição,
o crescimento e a reprodução.
Consumidores são espécies, geralmente animais, mas eventualmente
vegetais, que se alimentam de outros organismos. Todos os organismos em
uma cadeia alimentar, exceto os produtores, são consumidores. Eles são
denominados heterotróficos, porque não produzem o próprio alimento e
por isso têm de obter energia a partir de outros organismos. Todos os
animais e fungos são seres heterotróficos, juntamente com os herbívoros,
carnívoros e decompositores.
Os herbívoros são os organismos do segundo nível trófico, que se
alimentam diretamente dos produtores. Vaca, cavalo, ovelha, elefante,
girafa e capivara são exemplos de animais herbívoros, chamados de
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consumidores primários. Os carnívoros são predadores, porque se
alimentam de outros animais, tais como leão, onça, leopardo e os répteis
em geral. O carnívoro que come o herbívoro é chamado de consumidor
secundário e o que se alimenta de outro carnívoro é classificado como
consumidor terciário.
Decompositores são espécies animais e vegetais que extraem nutrientes
de organismos em decomposição e excrementos, de modo que exercem a
função ecológica de eliminar dejetos nocivos nos ecossistemas. Eles não
passam, portanto, de consumidores especializados, mais propriamente
classificados como necrófagos ou detritívoros.
Este grupo inclui algumas bactérias e fungos. O seu papel num ecossistema
é muito importante uma vez que transformam as substâncias orgânicas
ingeridas em substâncias minerais. Estas substâncias são novamente
utilizadas pelos organismos autotróficos, que sintetizam de novo matéria
orgânica, fechando assim o ciclo de utilização da matéria.
Pirâmide ecológica é a distribuição do número de organismos existentes
em cada nível trófico. Em alguns ecossistemas, como as pradarias, a forma
de pirâmide ecológica é igual tanto para a distribuição de energia quanto
para a biomassa. Em quase todas as florestas, entretanto, os produtores são
menos numerosos do que os consumidores. A árvore tem um grande
volume de energia e biomassa acumulado num único organismo, que
alimenta inúmeras espécies consumidoras, tais como vermes e insetos,
cujos organismos contêm energia e biomassa em volume muito menor.

Fonte: E.E. Arioli

Pirâmide ecológica

Pirâmide trófica. Embora nada limite a quantidade de níveis tróficos de


uma cadeia alimentar, o aproveitamento da energia transferida entre os
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níveis diminui à medida que eles aumentam. Isso ocorre porque os
organismos usam grande parte da energia que utilizam para realizar seus
processos vitais, como respiração, movimento e reprodução, e liberam o
restante para o meio ambiente na forma de calor. A isto se chama pirâmide
trófica ou de energia das cadeias alimentares.

Fonte: todamateria.com.br

Pirâmide trófica

Apenas 10% da energia disponível dentro de um nível trófico é transferido


para os organismos do nível seguinte. Por exemplo, um décimo da energia
solar captada pelas gramíneas acaba armazenado nos tecidos de vacas e
outros animais de pasto. E apenas um décimo do que a energia, ou seja,
10% de 10%, ou 1%, no total, é transferida para as pessoas que comem
carne. Portanto, quanto maior o número de níveis existentes entre o
produtor e o consumidor, no mais alto nível no ecossistema, menor a
energia restante.

Impactos das intervenções humanas


Extinção de espécies geralmente consideradas nocivas ou perigosas, tais
como insetos e répteis, prejudica a biodiversidade ao enfraquecer a cadeia
alimentar de uma área rural ou urbana. A eliminação de predadores
deflagra a superpopulação de presas, como já é comum nas regiões em que
as aves foram extintas ou expulsas, gerando pragas e doenças associadas.
Toda energia disponível para a manutenção de uma cadeia alimentar
começa a ser assimilada a partir da energia solar, através da fotossíntese e

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da quimiossíntese. A vida na Terra existe, portanto, porque existem
vegetais que transformam a energia solar em compostos orgânicos. Por
isto, o desmatamento é um crime ambiental grave porque elimina setores
inteiros dos ecossistemas, responsáveis pela origem da energia que sustenta
os biomas da Terra. Em última análise, se eliminarmos toda vegetação do
planeta, inviabilizaremos a sustentação da vida, inclusive a nossa.

Referências
Magalhães, L. Pirâmides ecológicas. Portal Toda Matéria, disponível em
https://www.todamateria.com.br/piramides-ecologicas, acessado em
13/04/2021.
MEC. Fotossíntese. Ficha técnica de aula. Ministério de Educação e
Cultura, Portal do Professor, disponível em
http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html, acessado
em 18/04/2021.
O que é cadeia alimentar? Redação Planeta Biologia, disponível em
https://planetabiologia.com/o-que-e-cadeia-alimentar, acessado em
18/04/2021.
Teia alimentar. Portal Só Biologia, disponível em
https://www.sobiologia.com.br/conteudos/Ecologia/Cadeiaalimentar4.
php.

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Sucessão ecológica

S ucessão ecológica é a sequência natural de crescimento de espécies


vegetais numa área, determinada pelas condições de fertilidade do
terreno, insolação, regime de chuvas, presença de vetores de semeadura e a
pré-existência de espécies vegetais. Embora a literatura mencione apenas
os vegetais dentro da sucessão ecológica, esse enfoque restritivo deve ser
considerado discriminante. As plantas dependem diretamente das espécies
animais para disseminação, crescimento e sustentabilidade, porque a
sucessão ecológica é o desenvolvimento da cadeia alimentar dentro de um
ecossistema.
Este conceito relativamente recente na história da Agronomia e da
Engenharia Florestal trouxe contribuições importantes para a eficiência e
eficácia dos projetos de recuperação de áreas degradadas. As características
ecofisiológicas das espécies típicas de cada estágio de sucessão são
relacionadas abaixo, de forma sucinta para facilitar a leitura.

Espécies colonizadoras
Desenvolvem-se sobre lajes, paredões rochosos e blocos rolados nos leitos
dos rios. Por isto, formam a vegetação chamada de rupestre, que significa
nas rochas. Estas espécies contribuem com ácidos húmicos para a
decomposição dos minerais primários em secundários, como as argilas e os
hidróxidos, que são constituintes fundamentais do solo.

Assim, por exemplo, os feldspatos e micas alteram-se a argilas e óxidos e


hidróxidos de alumínio; os minerais ferrosos transformam-se em óxidos e
hidróxidos de ferro; os grãos de quartzo permanecem praticamente
inalterados, formando a areia, mas sob condições especiais transformam-se
em sílica amorfa e biogênica por ação das raízes de espécies colonizadoras.

Esses processos são essenciais para a formação das primeiras camadas de


regolito, ou rocha alterada, matriz para o desenvolvimento do solo
propriamente dito, por influência da ação biológica.

As espécies colonizadoras mais comuns são os musgos e líquens, as


gramíneas e ervas rasteiras.

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Fonte: pt.dreamstime.com

Espécies colonizadoras: líquens e musgos recobrindo uma rocha.

Espécies pioneiras
Desenvolvem-se em áreas degradadas e sem sombreamento, formando
populações com poucas espécies e muitos indivíduos. Não toleram sombra,
gostam de sol.

As árvores são arbustivas, de pequeno porte, com até 10 m de altura.


Crescem rápido e vivem até 8 anos. Produzem sementes pequenas e
abundantes. As folhas e sementes são muito apreciadas pelos animais. As
raízes são abundantes, finas e longas.

As espécies pioneiras típicas são gramíneas, leguminosas, embaúba,


aroeira, canafístula, goiabeira, paineira, capororoca. Espécies epífitas
(trepadeiras, cipós) são ausentes ou em pequena quantidade.

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Fonte: pt.wikipedia.org

Espécies pioneiras: gramíneas, vassourinha, embaúba.

Espécies secundárias iniciais


Desenvolvem-se em clareiras, bordas de florestas e mata rala. Toleram
sombra e sol em proporções variadas. Convivem com pioneiras, mas em
número menor de indivíduos.

As árvores crescem rapidamente e atingem 10 a 20 m de altura,


desenvolvendo troncos de porte médio, que fornecem madeira macia e
clara, usada em artesanato. Formam sementes pequenas a médias.

Espécies típicas: mulungu, cinamomo, camboatá, aleluia, mamica-de-


porca, fedegoso, ipê-amarelo, cedro-rosa, araribá-amarelo, aroeira-
vermelha, grapia, jacarandá-vermelho, louro-pardo, tanheiro, corticeira,
guapuruvú, ingá.

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Fonte: apremavi.org.br

Espécies secundárias iniciais: aroeira, mulungu, grapia.

Espécies secundárias tardias


Desenvolvem-se em sub-bosques, com sombra permanente. As árvores são
de grande porte, atingindo 20-30 m de altura em até 50 anos de
crescimento. Podem viver centenas de anos.

Formam sementes médias a grandes. As raízes são superficiais e podem ser


aéreas. Os troncos fornecem madeira de lei.

As espécies mais conhecidas são jacarandá, ipê amarelo, araribá, figueira,


baguaçu, cedro, cupiúva. Espécies epífitas aparecem com frequência.

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Fonte: portalsuaescola.com.br

Espécies secundárias tardias e climácicas.

Espécies clímax ou climácicas


Desenvolvem-se somente à sombra, mas crescem acima do dossel das
florestas, atingindo mais de 30-50 m de altura. Vivem dezenas a centenas
de anos. Formam populações com poucos indivíduos de espécies raras.

A sua presença identifica florestas primárias. Formam sementes grandes e


fornecem madeira de lei. As raízes são superficiais, fortes e com pequeno
número de ramificações.

Espécies clímax comuns são pau-brasil, jequitibá, castanheira, cedro,


canela-preta, imbuia, pau-óleo, peroba. As espécies epífitas são
abundantes.

Bibliografia consultada
Ferronato, M. L. e colaboradores. Manual de recuperação florestal da Zona
da Mata Rondoniense. Ação Ecológica Guaporé, 2015.

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Santos, V. S. dos. Sucessão ecológica. Biologia Net, disponível em
https://www.biologianet.com/ecologia/sucessao-ecologica.htm,
acessado em 20/06/2021.

Sucessão ecológica. Portal Só Biologia. Disponível em


https://www.sobiologia.com.br/conteudos/bio_ecologia/ecologia23.ph
p, acessado em 19/06/2021.

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Polinização e dispersão de sementes

Polinização

P olinização é a transferência de células reprodutivas masculinas através


dos grãos de pólen de uma flor para o receptor feminino de outra flor
da mesma espécie (polinização cruzada) ou para o seu próprio estigma
(autopolinização). O resultado deste processo é a semente, geralmente em
grande quantidade e protegida por um invólucro carnoso e protetor, que
denominamos fruto.
O pólen é um conjunto de minúsculos grãos formados pelas angiospermas,
as plantas que dão flores. Os grãos são produzidos no estame, o órgão
sexual masculino das plantas, e são transportados pelos polinizadores. O
pólen existe em diversos tamanhos e formas. Composto por proteína, água,
vitaminas e aminoácidos, é o principal alimento das abelhas, borboletas e
colibris, mas outros insetos e pássaros o consomem. O pólen de abelha tem
sido consumido por humanos também, em forma de flocos, como
suplemento nutricional.

Fonte: iStock.com

Grãos de pólen ao microscópio.

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A transferência de pólen pode ser feita com auxílio de seres vivos, ou por
meio de fatores ambientais. No primeiro caso, os agentes de polinização
mais importantes são os insetos (abelhas, vespas, moscas, besouros,
mariposas), aves, mamíferos (morcegos, primatas), anfíbios (rãs,
pererecas) e répteis (lagartixas). Os agentes ambientais mais comuns são o
vento e a água.
As plantas que contêm sementes expostas, sem a proteção dos frutos, são
classificadas como gimnospermas (significa sementes nuas) e as que
produzem frutos são angiospermas (significa sementes encapsuladas). As
primeiras sofrem polinização pelo vento e as outras dependem dos agentes
biológicos de polinização. Em regiões de clima tropical, 94% das plantas
são polinizadas por animais, dos quais as abelhas são os mais importantes
porque fertilizam mais de 90% das plantações, no mundo inteiro.
Relacionamos a seguir os principais polinizadores e, para reforçar a sua
importância para os ecossistemas, as espécies mais cultivadas no Brasil,
que dependem das suas visitas para a reprodução.
Abelhas: soja, café, maçã, cebola, erva-mate, melão, tomate e feijão.
Vespas: aroeira-vermelha, juazeiro, mangueira, pereira e umbuzeiro.
Besouros: açaí, babaçu, abóbora, melancia, quiabo e buriti.
Moscas: manga, pera e pimentão.
Borboletas e mariposas: pequizeiro, laranjeira, mangabeira, pereira e
abacaxizeiro-do-cerrado.
Beija-flor, periquito, sanhaçu e outros pássaros: abacaxi-do-cerrado,
bacurizeiro e maracujá-poranga.
Morcego: pequizeiro, piquiazeiro e jatobá-do-cerrado.
Vento: babaçu, coqueiro, buriti, araucária, arroz, aveia, cana-de-açúcar,
cevada, milho e trigo.

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Fonte: madeinnatural.com.br Fonte: wikipedia.org

Apis mellifera Jataí

Fonte: commons.wikimedia.org Fonte: boaspraticasagronomicas.com.br

Besouro de mármore Mosca silvestre

Fonte: super.abril.com Fonte: mundoecologia.com.br

Vespa Borboleta

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Fonte: depositphotos.com Fonte: pinterest.com

Beija-flor Morcego

Dispersão de sementes
A semente tem a função de conservar e propagar as espécies vegetais,
germinando quando encontra condições adequadas para o crescimento
da plântula (broto) e o pleno desenvolvimento da planta. A dispersão de
sementes é o seu transporte para longe da planta de origem, dentro de um
processo de distribuição aleatória da germinação no espaço natural. O
caráter aleatório da dispersão é fundamental para a heterogeneidade das
populações vegetais, consequentemente da biodiversidade do nosso
planeta.
Sendo organismos fixos no solo, as plantas estão sujeitas às variações
ambientais e não podem evitar condições desfavoráveis por meio da
migração. Por isto, elas possuem maior tolerância às variações ambientais.
Entretanto, a polinização e a dispersão de sementes garantem o movimento
das plantas no espaço e a migração de genes entre populações.
Três hipóteses principais explicam a evolução da dispersão de sementes e
as suas vantagens para a biodiversidade: (a) evitar a mortalidade
desproporcional das sementes e plântulas próximas à planta matriz; (b)
aumentar as chances de a prole encontrar um ambiente livre
de competição; e (c) assegurar que a prole encontre um local favorável para
se estabelecer.
As diferentes maneiras como as sementes são dispersas e a frequência com
que atingem ambientes favoráveis para o estabelecimento da planta é que
determinam a riqueza e a distribuição espacial das populações de plântulas.
Os padrões de distribuição no espaço dependem de interações diretas e
indiretas com as forças seletivas bióticas e abióticas da comunidade. Assim,
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um dos processos que determinam a riqueza e distribuição das plantas é,
sem dúvida, a forma de dispersão de frutos e sementes.
Existem quatro grupos principais de formas de dispersão de sementes:
1) zoocoria, dispersão realizada por diferentes grupos de animais;
2) anemocoria, cujo principal agente dispersor é o vento;
3) autocoria, em que as sementes são dispersas pelas próprias plantas,
cujos frutos se abrem por deiscência explosiva e lançam as sementes;
4) barocoria, dispersão realizada apenas pelo peso do diásporo e por ação
da força gravitacional.
Antes de apresentar os dispersores de sementes, devemos lembrar a
importância desse processo para as espécies vegetais. As sementes são
órgãos de reprodução e, quando maduras, precisam ser liberadas da planta
matriz. Quando caem próximo à origem e germinam, a concentração local
de muitos indivíduos leva à competição por espaço e nutrientes. Por isso, as
sementes e os frutos precisam ser levados para áreas mais distantes, o que
depende dos agentes dispersantes.
Como foi mencionado acima, os animais são os principais responsáveis pelo
transporte das sementes. Diversas espécies de animais, como o mico-leão-
dourado e o lobo-guará, alimentam-se de frutos e eliminam as sementes
com as fezes em áreas distantes daquelas em que as encontraram. O mico-
leão-dourado, por exemplo, alimenta-se de aproximadamente 88 espécies
diferentes, sendo responsável por uma grande dispersão na Mata Atlântica.
Além de eliminar pelas fezes, alguns animais regurgitam as sementes dos
frutos que digeriram, o que é muito comum entre as aves.
Outros animais que realizam a dispersão de sementes são as formigas, os
répteis, os peixes, as aves, os mamíferos terrestres e voadores (morcegos).

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Fonte: oeco.org.br

Mico-leão-dourado

Fonte: pinterest.com

Picão preto

Não é somente por servirem de alimento que os frutos são dispersos por
espécies de animais. Algumas plantas, como o picão preto, apresentam
frutos e sementes com adaptações que permitem que eles prendam-se ao
pelo de alguns mamíferos. Entre as estruturas encontradas, podemos
destacar os ganchos, farpas, espinhos e cascas adesivas. Outra forma de
dispersão é através do vento. Muitos frutos e sementes são tão leves que
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conseguem ser levados pelas correntes de ar. Alguns menos leves possuem
estruturas, como alas, que permitem que eles sejam soprados de um local
para o outro.
A água é também um agente dispersor. Alguns frutos e sementes são
capazes de flutuar, podendo ser levados a longas distâncias. O principal
exemplo de planta que tem seu fruto levado pela água é o coqueiro, sendo
que muitas ilhas recém-formadas recebem o coco através das correntes
marítimas.
Existem, ainda, frutos que liberam suas sementes de forma explosiva.
Como exemplo desse tipo de dispersão, podemos citar o fruto da mamona,
que libera suas sementes a longas distâncias após a abertura de seu fruto.
Assim como ocorreu com flores e insetos, as sementes e frutos coevoluíram
com seus agentes dispersores. Esse evento foi, sem dúvida, fundamental
para o sucesso na reprodução das espécies vegetais.

Impactos das intervenções humanas


Eliminar aves, insetos e outras espécies animais de uma mata em área
urbana, por exemplo, contribui para o definhamento da vegetação. Além do
papel polinizador e dispersor de sementes, os animais que habitam as
manchas verdes da nossa paisagem formam a cadeia alimentar, responsável
pela biodiversidade regional.

Bibliografia consultada
Embrapa. O que é polinização. Empresa Brasileira de Pesquisa
Agropecuária, Unidade Meio-Norte, disponível em
https://www.embrapa.br/meio-norte/polinizacao, acesso em
12/03/2021.
Santos, V. S. dos. Dispersão de Sementes. Biologia Net, disponível
https://www.biologianet.com/botanica/dispersores-sementes.htm,
acesso em 12/04/2021.
Wolosky, M. e colaboradores. Relatório Temático Sobre Polinização,
Polinizadores e Produção de Alimentos no Brasil. BPBES, REBIPP,
2019.

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Efeitos de borda e de clareira

Efeito de borda

A substituição de grandes áreas florestadas por pastagens e campos


agrícolas leva à sua fragmentação em manchas verdes isoladas e
imersas em paisagens profundamente modificadas. Cada um desses
fragmentos contém uma borda de transição entre a área modificada e o
fragmento de vegetação natural. Esta transição pode ser observada nos
parâmetros físicos, químicos e biológicos do sistema, na disponibilidade de
energia e no fluxo de organismos entre os ambientes. O conjunto destas
alterações constitui o denominado efeito de borda.

Tipos de efeito de borda


Os efeitos de borda podem ser abióticos ou biológicos, e esses podem ser
diretos ou indiretos. Os efeitos abióticos envolvem mudanças nos fatores
climáticos locais, tais como maior exposição aos ventos e à radiação solar,
altas temperaturas e baixos teores de umidade no ar e no solo.
Os efeitos biológicos diretos abrangem alterações na abundância e na
distribuição de espécies provocadas pelos fatores abióticos nas
proximidades das bordas, como o aumento da densidade de indivíduos
devido à maior produtividade primária causada pelos altos níveis de
radiação solar. Os efeitos indiretos envolvem mudanças na interação entre
as espécies, como predação, competição, herbivoria, polinização e dispersão
de sementes.

Consequências do efeito de borda


Quando a mata é destruída e uma pequena área permanece isolada, as
árvores que ficavam no meio da floresta passam a ocupar as bordas da
mancha verde. Muitas espécies apresentam dificuldades de adaptação às
novas condições ambientais, como maiores luminosidade e temperatura, e
adoecem. Conforme as árvores da borda morrem, o efeito pode continuar

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afetando a vegetação remanescente, com a possibilidade de toda a área ser
extinta. No entanto, a dinâmica de um fragmento de floresta depende de
diversos fatores, tais como tipo de vizinhança, grau de isolamento e
formato da área.
A proximidade de outras manchas verdes minimiza os efeitos da
degradação, porque a polinização pode persistir, a migração de animais
pode continuar beneficiando a fertilização do solo e a semeadura natural, e
assim por diante. Quanto menor e mais isolado for um fragmento florestal,
mais sujeito ele estará ao efeito de borda. Como a degradação pode se
estender por até 500 metros dentro da mata, muitos fragmentos
comportam-se inteiramente como áreas de borda.
Além de ficarem muito mais vulneráveis às alterações, as florestas
fragmentadas acabam sendo invadidas por organismos invasores, tais como
plantas rasteiras, trepadeiras e capim, que adentram a mata e interferem no
crescimento e desenvolvimento de outras espécies. Muitas vezes, quando
atingem esse ponto, as áreas tornam-se irrecuperáveis.
As alterações que acontecem na mata que fica à borda de um fragmento
vegetal influenciam também na fauna local: com a entrada de algumas
espécies de plantas e a morte de outras, ocorrem mudanças na cadeia
alimentar. Muitos animais silvestres morrem por causa da modificação em
seu habitat, outros, afugentados, migram para áreas próximas. Entretanto,
o fragmento florestal nem sempre está destinado a sofrer os efeitos de
borda e a morte das espécies nativas. Procedimentos de manejo ambiental
podem reduzir os impactos do isolamento de uma área de vegetação nativa,
preservando parte dos seus recursos e da sua biodiversidade.

Efeito de clareira
As clareiras naturais, formadas por quedas de árvores, deslizamentos de
terra e outros acidentes ambientais, são responsáveis pela regeneração de
florestas tropicais e contribuem de forma significativa para a
biodiversidade. Estas perturbações têm um papel importante na dinâmica
ecológica, influenciando o crescimento das plantas, as estratégias de defesa
contra herbívoros e a diversidade de plantas lenhosas. Isso acontece devido
a uma grande diferença de microclima entre os ambientes de mata madura
e de clareira natural, que leva a diferenças substanciais na estrutura e
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composição da vegetação. As clareiras naturais influenciam a distribuição
espacial e temporal de plantas e, consequentemente, afetam os animais que
interagem com estes organismos.
As clareiras possuem quatro fontes de regeneração: sementes, plântulas
(brotos), rebrotamento e redistribuição de espécies.
A regeneração a partir de sementes envolve a criação de sítios favoráveis à
colonização por espécies pioneiras que compõem o banco de sementes no
solo, presentes antes da abertura da clareira. As espécies pioneiras
favorecem o estabelecimento de outras, secundárias e climácicas, pois
criam abrigo para dispersores, promovem melhoria na fertilidade do solo e
fornecem habitats adequados ao reflorestamento.
A regeneração a partir de plântulas ou jovens pré-estabelecidas ocorre
quando se desenvolvem as plântulas e plantas jovens tolerantes à sombra,
presentes no sub-bosque antes da formação da clareira. Com a exposição às
novas condições de luminosidade, umidade e temperatura, os rebentos
vegetais se desenvolvem de acordo com a sequência ecológica descrita
anteriormente.
A regeneração por rebrotamento acontece quando árvores ou arbustos no
interior da clareira, bem como lianas puxadas pelas árvores caídas,
produzem numerosos brotos clonais. Trata-se, portanto, de uma renovação
semelhante à que provocamos pela poda das árvores de jardim e pomar.
A regeneração a partir da vegetação adjacente é promovida quando lianas,
herbáceas e galhos do dossel circundantes preenchem lateralmente o
espaço aberto pela clareira. A abertura de espaço dentro da mata cerrada
pode facilitar a expansão lateral de dosséis, que normalmente se mantêm
restritos dentro do que se denomina efeito de dossel ou timidez das copas.

23
Fonte: divertudo.blog

Efeito de dossel ou timidez das copas.

Vários estudos têm comprovado influências significativas das clareiras


naturais sobre comunidades vegetais, mas poucos se dedicam às espécies
animais. Dentre esses, podemos citar estudos com árvores, plantas
pioneiras, bambus, crescimento de plântulas, interação da área da clareira e
concentração de herbívoros e a sobrevivência de espécies pioneiras.
Os estudos com animais enfocam essencialmente aves, formigas e aranhas.
Nestes estudos, foram encontradas diferenças significativas na estrutura e
composição das comunidades de aves e aranhas tecedeiras entre clareiras
naturais e florestas maduras. Recentemente foi verificado que não existe
uma tendência da assembleia de formigas das clareiras se assemelharem às
das matas adjacentes à medida que as clareiras envelhecem.
As aranhas estão entre os animais mais abundantes e diversos do planeta,
constituindo a sétima maior ordem animal em riqueza, com 42.751 espécies
descritas. Na estrutura trófica das comunidades, agem como predadores
secundários, regulando direta ou indiretamente a abundância de táxons
que atuam em importantes processos ecossistêmicos, como herbivoria,
polinização, decomposição e dispersão. As aranhas são consideradas
predadores generalistas, porém, muitas espécies podem selecionar suas
presas. A distribuição e a densidade populacional das aranhas estão
associadas a fatores ambientais, como temperatura, umidade relativa do ar
e luminosidade, fisionomia, riqueza e composição vegetal e também à
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disponibilidade de presas, inimigos e predadores. Tudo isso contribui para
o aumento da concentração de aranhas em clareiras naturais, que passam a
funcionar como criadouros e centros de difusão de aracnídeos para o
interior das florestas.

Referências
Azevedo, J. Efeito de borda: o que é e consequências. eCycle, disponível em
https://www.ecycle.com.br/efeito-de-borda/, acessado em
15/03/2020.

Lima-Ribeiro, M. de S. Efeitos de borda sobre a vegetação e estruturação


populacional em fragmentos do Cerradão no Sudoeste Goiano, Brasil.
Acta bot. bras. 22(2): 535-545. 2008

Entenda o que é efeito de borda. Portal Pensamento Verde, 2014.


Disponível na Internet em
https://www.pensamentoverde.com.br/meio-ambiente/, acessado em
15/03/2020.

Silva, F. C. da; Serrão, D. R.; Nemer, T. C. Efeito de diferentes tamanhos de


clareiras, sobre o crescimento e a mortalidade de espécies arbóreas, em
Moju-PA. Acta Amazônica, 37(1), 2007.

25
Corredores ecológicos

C orredores ecológicos ou de biodiversidade são áreas que unem


fragmentos florestais separados por intervenção humana, tais como
abertura de estradas, áreas agrícolas, extração de madeira, mineração e
instalação de núcleos residenciais. É comum que eles coincidam com
fundos de vale, aproveitando matas ciliares de cursos d’água, e com divisas
de propriedades rurais.
Os corredores podem ser naturais, geralmente na forma de veredas, ou
criados dentro de projetos de recuperação ambiental em várias escalas. Eles
podem atingir grandes dimensões regionais ou limitar-se à conexão de
manchas verdes dentro de uma zona rural com poucos quilômetros de
extensão. Independente das dimensões, eles têm importância ecológica
inestimável, porque estendem o alcance das manchas verdes muito além
dos seus limites individuais e promovem efetivamente a biodiversidade.
O corredor ecológico permite o livre deslocamento de animais entre
manchas verdes, as trocas genéticas entre espécies vegetais, a dispersão de
sementes e o aumento da cobertura vegetal. Ele reduz os efeitos da
fragmentação dos ecossistemas ao promover a ligação entre diferentes
áreas e permitir o fluxo gênico entre as espécies animais e vegetais. Esse
trânsito permite a recuperação de áreas degradadas, promovendo a
conservação da biodiversidade e o desenvolvimento ambiental de uma
região.
Dependendo do tipo de estrutura e função, os corredores ecológicos podem
ser classificados em lineares, faixas e corredores de riacho. No Brasil, a
instalação de corredores ecológicos como estratégia de mitigação dos
efeitos da fragmentação de habitats teve início em 2000.

26
Fonte: biologianet.com

Corredor ecológico preservado entre áreas agrícolas.

Os corredores ecológicos são utilizados como estratégia para compensar os


impactos negativos do homem no meio ambiente, garantindo a conexão
entre áreas fragmentadas. Plantas e animais são diretamente impactados
pela fragmentação de ambientes naturais. Os animais são impedidos de
circular livremente por grandes áreas, sendo necessário cruzar ambientes
sem seu habitat natural, onde são frequentemente predados, capturados,
caçados ou atropelados. As plantas têm a propagação comprometida pela
fragmentação da cobertura vegetal, uma vez que ela dificulta ou inviabiliza
a polinização e a dispersão de sementes.
Por isso, os corredores ecológicos têm sido implantados como alternativa
de mitigação aos impactos da fragmentação, pois eles contribuem para a
conservação da biodiversidade, filtragem de contaminação, prevenção da
erosão e controle de enchentes. Mas a implantação de um corredor
ecológico precisa levar em conta aspectos como largura, comprimento,
conectividade, espécies-alvo, vegetação e usos do solo circundante.
O conceito surgiu durante os anos 1990, em meio a debates na comunidade
científica. Ele foi considerado como uma das principais estratégias a utilizar
na conservação da biodiversidade. No Brasil, o conceito foi incorporado à
legislação em 1993, pelo Decreto Federal nº 750, que dispunha sobre “o
corte, a exploração e a supressão de vegetação primária ou nos estágios
avançado e médio de regeneração da Mata Atlântica”. Este dispositivo legal
proibia a “exploração de vegetação que tenha a função de (…) formar

27
corredores entre remanescentes de vegetação primária ou em estágio
avançado e médio de regeneração”.
Este decreto foi revogado pela Lei do SNUC, cujo artigo 25 determina que
“as unidades de conservação, exceto Área de Proteção Ambiental e Reserva
Particular do Patrimônio Natural, devem possuir uma zona de
amortecimento e, quando conveniente, corredores ecológicos”.

“Em uma paisagem com alto grau de conectividade, os organismos conseguem se


deslocar entre os elementos da paisagem, promovendo grande fluxo biológico entre os
remanescentes de vegetação natural, permitindo a manutenção da alta diversidade e a
redução dos riscos de extinções. Tendo em vista a importância da conectividade para a
manutenção da biodiversidade em paisagens fragmentadas, a adoção de critérios de
priorização de áreas, definição das melhores práticas e espécies para o plantio e o
manejo integrado da propriedade surge como uma importante estratégia de
planejamento da paisagem.” (Apresentação do Corredor Ecológico Vale do Paraíba em
www.corredorecologico.com.br).

Os corredores são criados com base em estudos sobre o deslocamento de


espécies, sua área de vida e a distribuição de suas populações. A partir das
informações obtidas são estabelecidas as regras de utilização destas áreas, a
fim de amenizar e ordenar os impactos ambientais das atividades humanas.
Estas regras farão parte do plano de manejo da Unidade de Conservação à
qual o corredor estiver associado.

28
Fonte: biologianet.com

Passarela de corredor ecológico sobre rodovia.

Após os estudos previstos em lei, os corredores ecológicos só se tornam


oficiais quando ganham reconhecimento do Ministério do Meio Ambiente.
Até o ano de 2014 foram reconhecidos apenas dois corredores: o Capivara-
Confusões, que conecta o Parque Nacional da Serra da Capivara ao Parque
Nacional da Serra das Confusões, e o Caatinga, que engloba oito unidades
de conservação entre os estados de Pernambuco, Bahia e Sergipe.
Além destes, hoje, existem outros sete corredores ecológicos em fase de
implementação ou estudo pelo Ibama. Cinco deles estão na Amazônia:
Corredores Central, Norte, Oeste e Sul da Amazônia e Corredor dos
Ecótonos Sul-amazônicos. Outros dois contribuem para a recuperação
ambiental da Mata Atlântica: Corredor Central da Mata Atlântica e
Corredor da Serra do Mar.
Diversos estudos apontam a viabilidade do uso de corredores ecológicos
como ferramenta de desfragmentação florestal, principalmente para
espécies de menor porte e de tempo de vida curto. Entretanto, algumas
pesquisas também mostraram que a implementação de corredores
ecológicos também pode ser ineficaz para a contenção da perda de
biodiversidade, principalmente para espécies de maior porte. Análises
apontam maior vulnerabilidade para populações de baixa densidade em
comparação com as de alta densidade.

29
Referências
O que são corredores ecológicos. OEco, Dicionário Ambiental, disponível
em https://www.oeco.org.br/dicionario-ambiental, acessado em
11/05/2021.

Santos, H. S. dos. Corredores ecológicos. Biologia Net, disponível em


https://www.biologianet.com/ecologia/corredores-ecologicos.htm,
acessado em 23/06/2021.

Santos, V. S. dos. Corredores ecológicos. Brasil Escola, disponível em


https://brasilescola.uol.com.br/biologia/corredores-ecologicos.htm,
acessado em 29/08/2021.

30
Comunicação entre animais

P or que incluir nesta coleção de fascículos informações sobre


comunicação entre animais e entre plantas? Porque estamos falando
de ecossistemas e de equilíbrio ecológico, os quais dependem mais da
existência de comunidades interconectadas do que de indivíduos isolados.
Indivíduos isolados não constroem sistemas, mas apenas bandos dispersos
e sem objetivos coletivos. A comunicação é o processo que cria
interconexões sociais, típicas das comunidades vivas. Por isto ela é
indispensável para entendermos como funciona a natureza.
A comunicação entre animais é a transferência de informação, na forma de
sinais físicos ou químicos, de um ou mais indivíduos, denominados
emissores, para outros animais, ditos receptores. As informações podem
ser enviadas intencionalmente, como em um ritual de acasalamento, ou
involuntariamente, quando um predador permite que a presa sinta o seu
odor, durante a tocaia.
Os sinais físicos mais óbvios são percebidos pela visão, pela audição ou pelo
tato, os químicos são sentidos pelo olfato e pelo paladar. É comum para
algumas espécies animais combinar formas diferentes de sinais para
transmitir uma mesma mensagem.
A comunicação visual envolve posturas e gestos de ameaça ou de
acolhimento, expressões faciais, mudanças de cor e emissão de
bioluminescência. Os cães expressam raiva por meio de rosnados e
mostrando os dentes, abanam o rabo em sinal de alegria ou amizade,
mostram-se deprimidos deitando o focinho entre as patas dianteiras, e
assim por diante. Os símios, assim como os seres humanos, parecem ser os
únicos animais que fazem gestos específicos e repetitivos para se
comunicar.
Outros gêneros de animais, tais como os répteis e insetos, podem ter
capacidades semelhantes, mas inacessíveis à nossa compreensão devido a
padrões bizarros de gestual. Como poderemos interpretar, por exemplo,
determinados movimentos das antenas ou das asas de um inseto? Os
especialistas em etologia, que estudam o comportamento dos animais,
podem ter respostas a estas questões, mas não estamos tratando aqui de

31
conhecimento científico, apenas de observação da natureza pelo ser
humano comum. De qualquer maneira, as habilidades de comunicação
visual variam muito entre as diferentes espécies animais.
As mudanças de cor podem ser desencadeadas pelo humor, contexto social
ou por fatores ambientais, tais como a temperatura e a luminosidade. O
polvo e a sépia possuem na pele células especializadas (cromatóforos) que
podem alterar a cor, a opacidade e a reflexão da luz. Além do uso deles para
camuflagem, mudanças rápidas na cor da pele são usadas durante a caça e
nos rituais de acasalamento. A sépia pode exibir simultaneamente dois
sinais completamente diferentes dos lados opostos do corpo, como quando
mostra um padrão masculino para uma fêmea e um padrão feminino para
os machos competidores. Alguns sinais de cor ocorrem em ciclos, como por
exemplo, quando uma babuína começa a ovular, sua área genital incha e
fica vermelho-brilhante, indicando aos machos que está pronta para
acasalar.

Fonte: ethosanimal.com.br

Comunicação entre espécies diferentes.

A bioluminescência é mais comum do que parece, principalmente nos


ambientes distantes da luz do sol. Peixes, vermes e crustáceos que habitam
os assoalhos dos oceanos precisam recorrer a esta habilidade para atrair

32
suas presas. Nos ambientes de terra firme, conhecemos vagalumes, vermes,
aracnídeos, larvas de insetos, fungos e bactérias luminescentes.

Fonte: oficinadeemocoes.org.br

Contato de acolhimento.

A comunicação auditiva é feita por meio da voz, de pancadas no próprio


corpo, estalidos, rangidos, ultrassons e infrassons, entre outros. Muitos
animais se comunicam através da vocalização. A comunicação vocalizada
serve para muitos propósitos: ameaça contra invasores de território,
atração do sexo oposto em rituais de acasalamento, chamados de alerta,
indicação de fontes de alimentos e aprendizagem por imitação. Morcegos,
veados, baleias, elefantes e aves canoras usam esta forma de comunicação
para atrair pares para acasalamento e espantar competidores. Os gorilas
são exímios comunicadores em suas demonstrações de força e poder,
quando batem com força o próprio peito ao mesmo tempo que correm ou
batem o solo com os pés.
Afora as funções mais óbvias de agressão e acolhimento, o toque físico
entre animais é usado também para o exercício de atos de higiene social.
Exemplo mais conhecido desta forma de comunicação é a catação de
parasitas praticada por todos os tipos de símios, para os quais esta
comunicação tem ainda a função de transmitir sinais de respeito à
hierarquia dentro do bando. As formigas recrutam colegas de trabalho para

33
busca de alimentos tocando-as com suas antenas e pernas dianteiras,
levando-as às fontes enquanto mantêm contato físico. Outro exemplo disto
é a dança das abelhas melíferas.
A aglomeração física promove a troca de calor, juntamente com a
transferência de informações olfativas ou táteis. Alguns organismos vivem
em contato constante dentro das suas colônias, como os corais. Quando os
indivíduos estão bem ligados desta forma, uma colônia inteira pode reagir
aos movimentos de reação ou alarme feitos por apenas alguns indivíduos.
Em várias ninfas e larvas de insetos herbívoros, agregações onde há contato
prolongado desempenham um papel importante na coordenação grupal.
Essas agregações podem assumir a forma de uma procissão ou uma roseta.
Algumas espécies de macacos emitem alarmes distintos para predadores
diferentes e as reações dos demais membros do bando variam de acordo
com a chamada. Por exemplo, se um alarme sinaliza a presença de um
píton, os macacos escalam as árvores, ao passo que o alarme para águia faz
com que os macacos busquem esconderijos no chão. Os cães de pradaria
conseguem sinalizar o tipo, tamanho e velocidade de um predador que se
aproxima. As vocalizações das baleias contêm verdadeiros dialetos típicos
de cada região de origem.

Fonte: Khan Academy

Catar piolho é um ato social importante.

34
Nem todos os animais utilizam a vocalização como meio de comunicação
auditiva. Muitos artrópodes esfregam partes do corpo para produzir som, o
que se conhece como estridulação. Gafanhotos, crustáceos, aranhas,
escorpiões, vespas, formigas, besouros, borboletas, mariposas e centopeias
são bem conhecidos por esta forma de comunicação. As partes do corpo
percutidas em conjunto também podem produzir sinais auditivos. O
exemplo mais óbvio é a vibração da ponta da cauda de cascavéis como um
sinal de aviso.
Os sinais químicos mais comuns são os odores corporais e de secreções,
bem como os sabores indicativos de toxidez que algumas presas
transmitem aos predadores.
A urina é uma mistura complexa e nos mamíferos é produzida pelos rins,
por efeito da filtragem do sangue, que elimina dele os produtos resultantes
do metabolismo celular. O principal produto deste conjunto de reações
químicas é a ureia, que é eliminada das células para o sangue e deste para
os rins, onde é o corpo descarta na forma de urina. O odor da urina varia
entre as diferentes espécies de mamíferos e entre os diferentes indivíduos
de uma mesma espécie, devido às concentrações variáveis das substâncias
que os rins eliminam: açúcares, proteínas, aminoácidos, triglicerídeos,
ácidos graxos, colesterol, hormônios e muitos outros metabólitos. Mais de
1.000 compostos podem ser identificados na urina, cujas combinações
dependem da alimentação, hidratação, medicamentos, processos
infecciosos, idade, sexo, dentre outros.

Outras formas de comunicação entre animais, menos comuns e mais


especializadas, utilizam correntes elétricas, vibrações no solo, toque físico e
mudanças de temperatura corporal.
A eletrocomunicação é observada principalmente em animais aquáticos,
embora alguns mamíferos terrestres, notadamente o ornitorrinco e os
equidnas, detectem campos elétricos que possam ser usados para a
comunicação. Algumas espécies de peixes usam um órgão para gerar um
campo elétrico, que é detectado por eletrorreceptores. Diferenças na forma
de onda e frequência das mudanças no campo transmitem informações
sobre espécies, sexo e identidade. Esses sinais elétricos podem ser gerados
em resposta a hormônios, ritmos circadianos e interações com outros
peixes. Alguns predadores, como tubarão e raias, conseguem encontrar
esses peixes geradores de sinais elétricos através da eletrorrecepção.

35
A comunicação sísmica é a troca de informações usando sinais de vibração
transmitidos através de um substrato, como o solo, a água, teias de aranha,
hastes de plantas ou lâminas de grama. Esta forma de comunicação tem
várias vantagens. Ela pode ser enviada independentemente dos níveis de
luz e ruído, geralmente tem um curto alcance e uma curta persistência, o
que pode reduzir o perigo de detecção por predadores. O uso da
comunicação sísmica é encontrado em muitas espécies, incluindo sapos,
ratos, toupeiras, abelhas, nematoides e outros.
Muitas cobras têm a capacidade de detectar a radiação infravermelha, o que
lhes permite obter imagens térmicas do calor emitido por predadores ou
presas. A sensibilidade deste sentido é tal que uma serpente pode
direcionar seu ataque para as partes do corpo mais vulneráveis de uma
presa.
Enquanto os fotorreceptores detectam a luz através de reações
fotoquímicas, a proteína nas fossas térmicas das cobras funciona como um
sensor iônico de temperatura. Ele detecta os sinais infravermelhos através
de um mecanismo que envolve o aquecimento do órgão da fossa, ao invés
da reação química à luz.
Os vampiros comuns, únicos mamíferos que se alimentam exclusivamente
de sangue, têm sensores de calor especializados em sua folha de nariz. Este
sentido permite que os morcegos localizem animais de sangue quente,
como bovinos e cavalos, e pode ser usada na detecção de regiões de maior
fluxo sanguíneo em presas específicas.
Por fim, também existe a autocomunicação, em que o emissor e o receptor
são o mesmo indivíduo. O emissor gera um sinal que é alterado pelo
ambiente e é recebido de volta pelo mesmo indivíduo. Existem dois tipos de
autocomunicação. A primeira é a eletrolocação ativa encontrada nos peixes
elétricos, elefante e no ornitorrinco. O segundo tipo de autocomunicação é
a ecolocalização, encontrada em morcegos. O sinal alterado fornece
informações que podem indicar alimentos, predadores, obstáculos ou
condições especiais do ambiente. Como o emissor e o receptor são o mesmo
animal, a pressão de seleção maximiza a eficácia do sinal, isto é, o grau em
que um sinal emitido é identificado corretamente por um receptor, apesar
da distorção de propagação e do ruído.

36
Bibliografia consultada
Lillmans, G. Como os animais se comunicam. Perito Animal, disponível em
https://www.peritoanimal.com.br/como-os-animais-se-comunicam-
23180.html, acessado em 28/09/2020.
Nishida, S. M.; Giaquinto, P. C. Comunicação animal. Unesp, Plano de
Ensino, disponível na Internet em
https://www1.ibb.unesp.br/Home/Departamentos/Fisiologia/,
acessado em 30/09/2020.
Queiroz, J. Comunicação animal: problemas e métodos. ComCiência, Ver.
Eletr. Jornal. Científico, disponível em
https://www.comciencia.br/comciencia/handler.php, acessado em
30/09/2020.

37
Comunicação entre vegetais

E mbora pareça que o comportamento de plantas seja mais simples que


o dos animais, recentes descobertas revelam que elas antecipam
condições ambientais futuras ao perceberem sinais bioquímicos do
ambiente, exibem memória alterando comportamento em função de suas
experiências individuais ou de seus ancestrais. Esse comportamento
inteligente é observado na versatilidade das plantas para lidar com
estresses abióticos (mudanças de temperatura, luminosidade, umidade,
fertilidade do solo) e bióticos (ataque microbiano e de insetos), adotando
reações defensivas adequadas. Uma das razões para tanto é que os vegetais
estão em constante comunicação com uma grande variedade de
organismos.

Fonte: scielo.br

Comunicação química entre as plantas e o meio ambiente.

As plantas produzem muitos compostos que não costumamos associar aos


organismos vegetais: etileno, metanol, terpenoides complexos e alcaloides
contendo nitrogênio. Mais de 100.000 produtos químicos são produzidos

38
por plantas e, pelo menos, 1.700 desses são voláteis. O estudo de voláteis de
plantas tem sido restrito a produtos florais, mas a lista dos que são emitidos
a partir dos tecidos vegetativos está aumentando rapidamente. O
conhecimento aprofundado desses mecanismos de defesa das plantas cria a
possibilidade de desenvolvermos tecnologias ecologicamente sustentáveis
para controle de pragas e doenças.

Fonte: hopoloja.com.br

Comunicação química entre as plantas.

As plantas utilizam uma variedade de mecanismos de defesa contra as


agressões ambientais, tais como o ataque de organismos nocivos e
predadores, principalmente insetos herbívoros. Os mais comuns são a
produção de substâncias tóxicas, como a nicotina e a furanomucarina, que
chegam a matar herbívoros não adaptados, e algumas proteínas que
dificultam a digestão e a disponibilidade de nutrientes, prejudicando o
crescimento dos predadores. Esta capacidade inclui a de produzir
compostos voláteis que podem ser dispersos pelo ar como sinais de alerta
químico a outras plantas contra ameaças externas.
Além disso, algumas plantas desenvolvem barreiras físicas à entrada de
patógenos e à ação de herbívoros, na forma de tecidos lenhosos, espinhos,

39
cascas calosas e cutículas endurecidas. Elas podem também atrair
quimicamente parasitas e predadores dos herbívoros, como as formigas,
aumentando a concentração de açúcares, aminoácidos e compostos voláteis
no néctar extrafloral. A presença de ovos de insetos nas folhas e raízes das
plantas pode deflagrar a geração de voláteis capazes de atrair parasitas
desses ovos.
Pesquisadores da Universidade de Ciências Agronômicas da Suécia
descobriram que pés de milho, por meio da secreção de substâncias
químicas pelas raízes, mantém um sistema de comunicação por baixo da
terra. Captando esses recados químicos deixados no solo, as plantas
detectam se suas vizinhas de plantação estão invadindo seu espaço – e
começam a crescer mais rápido para disputar um lugar ao Sol.
Quando as plantas estão sob ataque, seus perfumes são transportados por
compostos orgânicos voláteis e tornam-se mais semelhantes entre si,
independente do tipo de relação existente entre plantas vizinhas. Trata-se
de uma reação semelhante à ativação do nosso sistema imunológico quando
o nosso organismo é invadido por agentes nocivos.
Os voláteis induzidos após o ataque dos herbívoros parecem preparar as
plantas vizinhas para um possível ataque futuro. A produção de néctar
extrafloral, outra defesa indireta das plantas, também é induzida em
plantas vizinhas após a exposição a compostos voláteis, o qual pode
aumentar a sobrevivência de artrópodes predadores. Estes exemplos
ilustram a enorme capacidade de defesa das plantas contra agressões
ambientais.
Os voláteis são utilizados pelas plantas como mensageiros químicos para
comunicação entre indivíduos da mesma comunidade. Cada espécie vegetal
consegue produzir vários tipos de sinalizadores, os quais variam também
em função do tipo de mensagem a ser transmitida: a origem do estresse
ambiental, a variedade de inseto herbívoro e sua fase de desenvolvimento
(ovo, larva, adulto), o período do dia (para identificar predadores diurnos e
noturnos), umidade do ar e do solo, estado fisiológico da planta emissora, e
assim por diante.
Quando uma planta é atacada por um herbívoro, todos os organismos
presentes no meio ambiente podem responder aos voláteis induzidos.
Alguns herbívoros podem ser atraídos e outros repelidos pelos voláteis
induzidos quando agridem espécies vegetais. Os estudos sugerem que tanto
40
as larvas dos lepidópteros (borboletas, mariposas) como os coleópteros
(besouros) e afídios (piolhos, pulgões) são, em geral, repelidos por plantas
infestadas.
A variedade de voláteis emitidos pelas plantas atinge a ordem de centenas
de compostos. Como diferentes espécies podem emitir os mesmos voláteis,
os especialistas supõem que a identificação precisa de cada mensagem é
feita em função da combinação de um número limitado de substâncias. O
conhecimento sobre estes processos está sendo enriquecido continuamente
desde 1983, quando eles foram detectados em testes de campo e
laboratório.

Bibliografia consultada
Pinto-Zevallos, D. M.; Martins, C. B. C.; Pellegrino, A. C.; Zarbin, P. H. G.
Compostos orgânicos voláteis na defesa induzida das plantas contra
insetos herbívoros. Química Nova, 36(9), São Paulo, 2013.
Ritter, C. Y. S. e colaboradores. Sistemas envolvidos na comunicação
vegetal. UCEFF, Agrotec: 4o Simpósio de Agronomia e Tecnologia em
Alimentos, 2017.
Taiz, L. et al. Fisiologia e desenvolvimento vegetal. 6. ed. Porto Alegre:
Artmed, 2017.

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Sobre o Autor
Edir E. Arioli é geólogo pela UFRGS (1969), doutor em Geologia pela UFPR (2008),
especialista em Gestão Tecnológica (1990) e Engenharia da Qualidade (1991). Produz
materiais paradidáticos para uso de professores e estudantes de Ciências da
Natureza. Email: earioli@yahoo.com.br

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