Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Toque de letras
Para celebrar os 80 anos de Aragão, o saguão do Cine Teatro Pe. José Zanelli recebe nesta
sexta-feira, às 21 horas, a exposição Uma releitura do tarô, com trabalhos do artista. Trata-se
de uma brincadeira com 22 esculturas dos arcanos maiores do tarô, na tentativa de aproximar
a população da arte. “É uma fantasia da minha cabeça. Quando você está tocando, entra em
contato direto com a arte”.
Para Aragão, que começou a desenhar em muros de Campina Grande aos 7 anos de idade, a
motivação da arte deve ser sempre o amor. Ele lamenta que a arte tenha virado mercadoria e
seja apreciada de acordo com seu valor de mercado. E qual o preço dos 80 anos de arte
produzidos por Henrique de Aragão? “Minha arte vale minha vida”, garante.
JL- A sua arte é sacra, mas ela tem muito de místico, como nessa exposição da releitura
do tarô. Como é isso?
Minha intenção com essa exposição é que sinto no mundo, mas, sobretudo, na comunidade de
Ibiporã, que nos desligamos da arte. A arte agora virou mercadoria, está nas galerias, está no
mundo. O pessoal dá um sentido à arte pelo preço que ela tem. Essa exposição é uma
brincadeira que vou fazer com os 22 arcanos maiores do tarô, que é fruto de uma cultura
popular de muita profundidade. Vamos por um capuz na pessoa e ela vai tatear, no escuro, no
meio dos 22 prismas. Quando você entra, faz uma pergunta, o que quer saber, mesmo
esquema do tarô. Vai ter uma taróloga, pelo menos uma vez por semana, que vai guiar esse
pessoal e ele vai tocar em sete cartas, sem ver. Depois, a taróloga vai se sentar à mesa com
essa pessoa, individualmente, e fazer a leitura para responder a pergunta dela.
Quando você está tocando, entra em contato direto com a arte. Hoje você entra no museu e
não pode chegar perto de uma obra de arte, pelo menos as mais famosas, no mundo todo. Isso
a título de proteção, eles falam. Quando você toca, a sua mão tem suor e tem ácidos, gordura,
aí fica no quadro ou na escultura. Até aí eu aceito, só que isso afastou o pessoal. Porque o
homem tem necessidade de tocar. Se o homem, para crescer enquanto ser humano, precisa
tocar, por que não? Tateando, no escuro, como cego que vai em direção à beleza, à harmonia,
à justiça, ao amor. E vai fazer isso pelo puro prazer, pelo mistério de descobrir aquilo que
perguntou. Mas ela vai se perder nessa busca, porque são sete cartas. É uma fantasia da
minha cabeça, para ver se a gente melhora, porque eu me preocupo muito com a comunidade
e com as crianças, sobretudo. Estou louco para ver uma criança de capuz fazer a pergunta
dela, não interessa qual seja. Vou pôr a taróloga no maior enguiço, porque, quando você pega
um adulto, tudo bem. Mas você pega uma criança de sete anos... Por exemplo, semana
passada, chegaram três crianças aqui, três irmãos – duas meninas e um molequinho. Aí
chegaram no portão: ‘Ô Henrique, a gente pode ver as obras?’. Eu digo: ‘Claro, não pode,
deve. É tua, eu só guardo’. Aí eles: ‘É verdade que você tem um pé de chocolate aí na sua
casa?’. Como é que eu vou explicar isso para as crianças lá no portão? ‘Amor, não é bem um
pé de chocolate, é um pé de cacau. Aí tem que tirar a semente...’. Comecei a explicar o
processo de chegar do cacau ao chocolate. Aí o menorzinho perguntou: ‘Tio, é sonho de
valsa?’ (risos) Aí acabei levando os três para ver o cacau. E eles saíram assim: ‘Ah!’ E
perguntaram: ‘Nóis pode voltar amanhã?’.
JL- O senhor falou um pouco do preço da arte. O senhor vive da sua arte? Qual o preço
dela?
Vivo, sim. O preço dela é minha vida. Mas o que me pagam, tem uma cotação do meu trabalho,
ao menos aqui no Brasil. Mas estou sobrevivendo. Estou reformando a casa e tenho que pedir
uma mão para os amigos. Eu procuro deixar a comunidade responsável por isso aqui. Para
mim, tem três palavras que integram minha relação com a arte e com a comunidade: beleza,
harmonia e justiça. Eu acho que deveria ser financiada pelos ricos e colocada na mão dos
pobres. Por isso a cidade é cheia de escultura por todos os lados, para a molecada chegar.
Senão, para que serve?
A escultura de quatro metros de altura e um sol ao redor da cabeça foi doada à UEL na década
de 1980 e permaneceu na rotatória do CCH durante anos. O artista plástico ressaltou que a
obra é a forma mais explícita da criação e se declarou um apaixonado pela beleza do corpo
humano. “O Cristo Libertador foi inspirado a partir da teologia da libertação, pois Deus está em
cada um de nós plenamente”, declarou. Henrique Aragão é conhecido internacionalmente. Ele
reside em Ibiporã há 43 anos e possui centenas de obras instaladas em igrejas e espaços
públicos do Norte do Paraná.
A reitora em exercício, Berenice Quinzani Jordão, destacou que a obra terá um valor
inestimável para o patrimônio cultural de Ibiporã. “Será uma obra mais apreciada e valorizada,
pois nesta nova condição a escultura terá o espaço que merece ter, ocupando lugar de
destaque na região”, disse.