Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Raimundo Lúlio e A Evangelização Dos Muçulmanos
Raimundo Lúlio e A Evangelização Dos Muçulmanos
São Paulo
2010
Livros Grátis
http://www.livrosgratis.com.br
Milhares de livros grátis para download.
2
São Paulo
2010
3
BANCA EXAMINADORA
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
_________________________________________________________________
DEDICATÓRIA
Esta pesquisa é dedicada aos membros da minha família, à minha esposa Veridiana,
e aos meus filhos, Ester, David, Arthur e Felipe Montenegro, os quais têm experimentado e
compartilhado comigo muitos dos mesmos sonhos que havia em Raimundo Lúlio e têm
sido bastante compreensivos com as minhas ausências, em virtude das exigências próprias
que a conclusão de um projeto de pesquisa de mestrado requerem.
7
AGRADECIMENTOS
RESUMO
As tensões entre cristãos e muçulmanos eram grandes nos dias de Lúlio e ainda
hoje as missões cristãs aos islâmicos continua sendo um grande desafio. A falta de um
diálogo franco e de um debate objetivo de idéias que tenham mútuos respeito, audição e
conhecimento ainda têm marcado a relação entre os seguidores de Cristo e os de Maomé.
A missiologia luliana buscou, no âmbito dos limites dos seus dias, vencer estas
resistências através do diálogo e da alteridade e é aqui apresentada como um paradigma
histórico relevante para a realização contemporânea de missões cristãs aos muçulmanos. O
reconhecimento daquele distante cenário medieval é necessário para o devido
entendimento das polêmicas e críticas à missiologia luliana, assim como para o
reconhecimento da sua natureza vanguardista, como se busca demonstrar nesta pesquisa.
PALAVRAS-CHAVE
ABSTRACT
KEY WORDS
SUMÁRIO
Sumário .............................................................................................................................. 10
Introdução ........................................................................................................................... 12
1. O contexto das missões cristãs aos muçulmanos ........................................................... 21
1.1. Cronologia geral da época de Raimundo Lúlio ........................................................... 21
1.2. Missões cristãs na Idade Média ................................................................................... 28
1.2.1 Missões medievais: a catolicização do mundo .......................................................... 28
1.2.2 O mau exemplo histórico da perda dos mongóis....................................................... 30
1.2.3 As condições religiosas do mundo medieval ............................................................ 31
1.2.4 A preocupação de Lúlio com a resposta da Igreja ..................................................... 32
1.3. A tensão entre cristãos e muçulmanos ........................................................................ 34
1.3.1 O surgimento do Islã e a sua relação com os cristãos ............................................... 34
1.3.2 A reação cristã à expansão islâmica .......................................................................... 36
1.3.3 A tensão entre cristãos e muçulmanos na Europa ..................................................... 38
1.3.4 A situação mais específica na Espanha de Lúlio ....................................................... 39
1.4 Missões que influenciaram Raimundo Lúlio ................................................................ 41
1.4.1 As primeiras missões cristãs aos muçulmanos .......................................................... 42
1.4.2 A influência das ordens missionárias ........................................................................ 43
1.4.3. A identificação com o cristianismo institucional ..................................................... 46
1.4.4 A influência de outros Raimundos em Lúlio ............................................................. 47
2. A missiologia luliana, teoria e prática de Raimundo Lúlio ............................................ 50
2.1. A biografia missionária de Raimundo Lúlio ............................................................... 50
2.1.1 Apresentação sucinta de Raimundo Lúlio ................................................................. 51
2.1.2 A vida inicial de Raimundo Lúlio ............................................................................. 51
2.1.3 A conversão e o chamado de Raimundo Lúlio .......................................................... 52
2.1.4 O preparo missionário de Raimundo Lúlio ............................................................... 53
2.1.5 A vida missionária de Raimundo Lúlio ..................................................................... 54
2.1.6 Raimundo Lúlio, missionário até a morte ................................................................. 54
2.1.7 Dialogando com a biografia missionária de Raimundo Lúlio ................................... 55
2.2. A visão missionária de Raimundo Lúlio ..................................................................... 56
2.2.1 O ideal de Raimundo Lúlio ....................................................................................... 57
2.2.2 O desconforto de Raimundo Lúlio ............................................................................ 58
2.2.3 A proposta missionária de Raimundo Lúlio .............................................................. 60
11
INTRODUÇÃO
A presente pesquisa tem como foco estimular e produzir uma reflexão teórica sobre
a atuação missionária cristã aos muçulmanos, tendo como paradigma histórico a
missiologia luliana, ou seja, o projeto teórico e a subseqüente prática missionária
decorrente desenvolvida pelo catalão Ramon Llull (forma original catalã do nome do
personagem histórico em estudo; contudo, na presente pesquisa dá-se a preferência pela
forma aportuguesada do seu nome, Raimundo Lúlio).
Lúlio viveu entre os séculos XIII e XIV, em pleno período medieval marcado por
diversos e intensos conflitos religiosos, especialmente entre cristãos e muçulmanos, que
disputavam terras não apenas no continente europeu, acentuadamente na península ibérica,
mas também na região do Oriente Médio conhecida como Terra Santa. Tais tensões
geográfico-religiosas foram vivenciadas intensamente no episódio das Cruzadas.
Desde o início da sua jornada espiritual de devoção cristã, Raimundo Lúlio passou
a perseguir o ideal de ver o mundo convertido a Cristo; e com tal propósito ele buscou e
desenvolveu um modelo missiológico-apologético que se concentrava no debate racional e
comparativo do conteúdo das crenças religiosas dos grupos em questão, dando um
destaque à mais tensa relação de então: a dos cristãos com os muçulmanos. Respeitando
princípios de alteridade, Lúlio desenvolveu a sua missiologia argumentativa e engajada,
que na presente pesquisa é nomeada como missiologia de Raimundo Lúlio, ou
simplesmente, missiologia luliana, a qual é descrita e proposta como potencialmente útil e
relevante tanto ao bom relacionamento inter-religioso, quanto à própria realização das
missões cristãs na contemporaneidade.
Idade Média – adota-se na presente pesquisa o termo Idade Média conforme usado
por Bosch, inclusive devido às semelhantes ênfases; sendo assim, tal expressão busca
indicar um período compreendido entre os anos 600 e 1500 d.C. – iniciado com o papado
de Gregório Magno e o começo da expansão islâmica; e finalizado com a conquista de
Constantinopla pelos muçulmanos (1453), a Reconquista de Granada pelos cristãos (1492)
13
e a Conquista do Novo Mundo, o continente americano (Bosch, 2002, p. 265). Este período
recebe na presente pesquisa o foco na tensão entre o cristianismo e o islamismo.
neste personagem, teoria e prática caminham lado-a-lado; sendo assim, considere-se o uso
aqui da seguinte expressão nesta pesquisa.
Sendo assim, o objetivo geral desta pesquisa é demonstrar que a missão apologética
de Raimundo Lúlio pode ser útil às missões cristãs contemporâneas nesta época de
diversidade e atividade inter-religiosa, enfatizando a atuação missionária cristã aos
muçulmanos, tendo como foco de pesquisa o modelo da missiologia luliana. Aqui se
pretende como objetivos específicos:
A questão norteadora desta pesquisa pode ser expressa na seguinte questão: qual foi
a relação entre Raimundo Lúlio e as missões cristãs aos muçulmanos? Esta questão
central desdobra-se nos seguintes problemas condutores da pretendida pesquisa:
• Qual a relevância contexto histórico e geográfico geral das missões cristãs aos
muçulmanos para a efetivação destas durante a Idade Média?
Este ponto da pesquisa caminha sobre hipótese e tônica bastante positivas a respeito
da missiologia luliana, não entrando nos mais intrincados debates e críticas. A segunda
hipótese se desenvolve sob os auspícios de uma reflexão inspirativa para a Igreja
protestante contemporânea, ao destacar os aspectos positivos da proposta luliana e
apresentar a sua missiologia como um paradigma histórico digno de ser considerado e até
mesmo seguido, com as devidas ressalvas necessárias.
Esta pesquisa termina por tentar demonstrar que pela natureza e conteúdo da
missiologia luliana a mesma se revela útil e relevante ao mundo contemporâneo como um
todo e não apenas à atuação missionária cristã aos muçulmanos, pois ensina a tolerância e
o respeitoso convívio de distintos credos na sociedade atual, sem, no entanto, relativizá-los,
rejeitá-los, impô-los ou no máximo tolerá-los, mas propõe o caminho da defesa do legítimo
direito de existência, manifestação e atuação democrática do diversos credos na sociedade
contemporânea, respeitando os direitos humanos básicos de liberdade de expressão, culto,
circulação; e, acima de tudo, direito à vida.
O meu interesse por Raimundo Lúlio se iniciou por curiosidade, pois tendo este
personagem histórico o mesmo nome que o autor deste projeto, o fato me chamou a
atenção desde quando ainda no curso teológico (por volta do ano de 1999) eu li pela
primeira vez a respeito de alguém homônimo na história das missões cristãs.
Embora com exigüidade de tempo, Lúlio foi o tema central do meu Trabalho Geral
Interdisciplinar – TGI (equivalente ao TCC de outras universidades) na validação do curso
de Teologia pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. O interesse na pesquisa sobre
Lúlio já estava selado e mesmo tendo começado a investigar outras áreas do conhecimento
enquanto cursava as disciplinas do mestrado em Ciências da Religião, agora se retornou
aqui, na dissertação de mestrado, a este tema que tem me atraído aos exercícios da
pesquisa acadêmica.
Proposta de diálogo inter-religioso. Ora, ainda neste século XXI a questão religiosa
é um tema de importante consideração não apenas por motivos religiosos, mas também
acadêmicos e até mesmo políticos e diplomáticos, pois persiste na contemporaneidade a
dificuldade de se estabelecer um diálogo respeitoso e uma livre atuação e vivência
religiosas entre adeptos de diversas religiões, como o Hinduísmo, o Budismo, inclusive as
três grandes religiões monoteístas mundiais, o Judaísmo, o Cristianismo e o Islamismo.
Tensões em escolas na França devido ao uso do véu por parte das meninas muçulmanas
ainda é um assunto presente na imprensa mesmo fora daquele país, como se pode verificar
no artigo de Reinaldo Azevedo, colunista na Revista Veja, conforme ele postou em 23 de
junho de 2009 (Azevedo, 2009, internet).
Embora Raimundo Lúlio tenha sido autor de vasta obra literária e destacado
filósofo e missionário, o mesmo ainda não goza do conhecimento devido na academia
brasileira, especialmente entre os protestantes; no entanto, Lúlio tem muito a contribuir
para o enriquecimento da vida acadêmica no Brasil, assim como o de vários espectros do
cristianismo, e por que não dizer o de toda a humanidade, pois a sua vida e obra têm muito
a contribuir a todos, em diversas áreas da nossa realidade e não apenas a academia, dentre
as quais, se pode aplicar a:
A Contemporaneidade, devido à atual realidade sócio-cultural que vivemos, de
tensão global entre o Ocidente e o Oriente, o Cristianismo e o Islamismo – mais claramente
percebida após os atentados de 11 de setembro de 2001 – isto porque Lúlio viveu em dias
de similar conflito e a sua atuação foi no meio da tensão, o que pode fazer dele uma lição
viva da história, pois ainda que inúmeras vezes a sua presença e argumentação causaram
alvoroço entre os seus oponentes, é inegável a superioridade de uma abordagem por
argumentação que busca o debate e o diálogo do que aquela que dispensa tal diplomacia,
como ocorre em ataques e guerras ainda hoje comuns;
A História, pois a pesquisa sobre este personagem da virada do séc. XIII para o séc.
XIV pode resgatar algumas contribuições que o cristianismo medieval vivido por Lúlio
deixou à posteridade, independente da matriz teológica específica (católica, ortodoxa,
protestante, etc.). A riqueza, a diversidade e complexidade do momento histórico vivido
por Lúlio justificam a História como ponto de relevância desta pesquisa;
A Educação e as Letras, pois dá a conhecer ao público contemporâneo a vasta
produção educacional, filosófica e literária deste personagem medieval. Embora ainda
sejam poucas as obras sobre Lúlio, assim como as de sua autoria traduzidas e editadas na
língua de Camões diante do universo que ele produziu, vai-se, contudo, dando a conhecer
ao público de escrita portuguesa a riqueza literária produzida por este mestre catalão, a
20
quem se atribui inclusive a destacada posição de poeta pioneiro que se tem conhecimento
na língua catalã.
A presente pesquisa, que tem por título “A contribuição de Raimundo Lúlio para as
missões cristãs aos muçulmanos” está dividida nos seguintes capítulos e conteúdos:
No capítulo 1, intitulado O contexto das missões cristãs aos muçulmanos, procura-
se apresentar o cenário histórico e geográfico medieval e como nele se desenvolveram as
missões cristãs medievais até os dias de Lúlio. Para tanto, esta pesquisa assim se estrutura:
1) cronologia geral da época de Raimundo Lúlio; 2) missões cristãs na Idade Média; 3) a
tensão entre cristãos e muçulmanos; e 4) missões que influenciaram Raimundo Lúlio.
No capítulo 2, intitulado A Missiologia Luliana, teoria e prática de Raimundo
Lúlio, busca-se apresentar uma visão panorâmica da proposta missionária desenvolvida por
Lúlio, em sua teoria e prática, destacando os aspectos considerados positivos e sob uma
avaliação protestante otimista e inspirativa. Para tanto, esta pesquisa assim se estrutura:
1) a biografia missionária de Raimundo Lúlio; 2) a visão missiológica de Raimundo Lúlio;
3) as letras na missiologia de Raimundo Lúlio; e 4) o zelo missionário de Raimundo Lúlio.
No capítulo 3, intitulado Debatendo cruzada e missão em Raimundo Lúlio, procura-
se apresentar uma visão crítica sobre o episódio das cruzadas e a visão que Lúlio tinha das
mesmas – entendendo-as dentro do seu contexto histórico – e também se debruçar sobre as
principais propostas missiológicas de Lúlio, dando destaque à sua missiologia como fruto
de uma percepção sensível do princípio da alteridade. Para tanto, esta pesquisa assim se
estrutura: 1) as cruzadas cristãs e os muçulmanos; 2) as cruzadas para Raimundo Lúlio;
3) O Diálogo inter-religioso em Raimundo Lúlio, destacando a sua relação com o
Islamismo e o princípio de alteridade presente na sua proposta missiológica.
Desta maneira, dentre as tantas contribuições possíveis vindas do cristão catalão
Raimundo Lúlio, esta pesquisa busca apresentar o seu pensamento e a proposta de missão
cristã dirigida aos muçulmanos, avaliando criticamente as suas propostas e procurando
defender a sua relevância à contemporaneidade.
21
1257 Casamento de LÚLIO com Blanca Picany com a qual tem dois filhos:
Domingos e Madalena.
1262 Jaume de Aragão decide fundar o Reino de Maiorca, que inclui o Roussillon
e o Senhorio de Montpellier, para seu segundo filho.
1265-321 Dante.
1266-68 Rogério Bacon escreve o Opus majus, opus minus, opus tercium.
Maiorca.
1285 Jaume II perde Maiorca, que não recuperará até 1298. Durante este período,
traslada a Corte a Perpignan e a Montpellier. LÚLIO freqüentará essas
cidades.
1287 Primeira visita de LÚLIO à Corte Papal. Não consegue nada, porque o Papa
Honório IV morre no dia 3 de abril.
1289 LÚLIO reside em Montpellier e envia una coleção de escritos seus ao duque
de Veneza.
1289 A experiência docente mostra a LÚLIO que a versão atual da Arte é difícil
24
1291-2 LÚLIO traslada-se a Roma e dedica ao Papa Nicolau IV seu primeiro livro
sobre as cruzadas.
1292-3 Viagem a Gênova, onde, aos 60 anos, LÚLIO sofre uma forte crise
psicológica. Empreende sua primeira viagem a África, na Tunísia.
breve poema lírico que explica o drama e as esperanças de que então estava
com 65 anos.
1300-3 Duns Scot volta como professor a Paris. Seus contemporâneos: Guilherme
de Falgar, Pedro João Olivi, Ricardo de Middleton, Rogério Marston, Pedro
de Trabibus e Ghilhermo de Ware. Duns Scot deixa Paris o dia 28 de junho.
1302 LÚLIO em Chipre. Fracasso na sua tentativa de atrair o rei para seus
projetos. Encontra-se com o Grão Mestre dos Templários.
1304-7 Duns Scot volta a Paris onde fica até setembro de 1307.
1308-9 LÚLIO entre Pisa e Montpellier. Termina a Ars generalis ultima , a versão
definitiva de sua Arte, e a mArs brevis. Escreve o Liber clericorum, dirigido
à Universidade de Paris. Intenta promover uma cruzada desde Gênova. Em
maio dedica desde Montpellier a Ars Dei a Clemente V e a Felipe IV da
França. Provável encontro de com Arnau de Vilanova em Marsella.
1316 LÚLIO morre, aos 84 anos, perto de Maiorca voltando da Tunísia. Uma
lenda piedosa, não desmentida, supõe que foi lapidado.
Segundo Castagnola e Padovani, o rei Carlos Magno pretendia dar uma unidade
interior e espiritual ao seu vasto império e, para tanto, empenhou-se em educar intelectual,
moral e religiosamente os bárbaros que o constituíam. Para isto, precisaria se implantar
paralelamente civilização, religião, cultura clássica e catolicismo. Sendo assim, escolas
foram organizadas no Sacro-Império, e sendo o clero a classe mais apta para o magistério,
serviu de docente num projeto de amplos objetivos, que envolvia uma educação popular
simples e uma educação especial para a classe dirigente em geral, assim como os
funcionários do império. Nesta tarefa de implantar escolas no império carolíngio, estes
autores destacam a figura de Alcuíno, que vindo da Inglaterra – o viveiro da cultura
naquela época – ditou o programa educacional predominante no império, o qual perdurou
invariado praticamente por toda a Idade Média. (Castagnola e Padovani, 1962, pp.
171,172).
O Império Carolíngio do Séc. VIII ilustra o desafio da unidade no mundo medieval.
Assim, os povos recém-conquistados deveriam ser educados tanto para a coroa, quanto
para a fé católico-romana, dentro da cultura herdada dos povos clássicos e adaptada à nova
ordem. Tal tarefa recaiu basicamente sobre a igreja institucional.
Contudo, pensar em alcançar pessoas que professavam uma fé distinta do
cristianismo e que vivesse fora dos limites geográficos e das influências lingüísticas e
culturais das “terras cristãs” era desconsiderado pela igreja institucional como algo de alto
risco, portanto desnecessário, a ponto de alguns terem condenado o esforço de Lúlio de
buscar alcançar muçulmanos para Cristo, segundo Tucker (1996, p. 59).
Os islâmicos há muito já foram se mostrando uma ameaça numérica ao cristianismo
institucional, isso sem mencionar o desconforto e a tensão sentidos por muitos cristãos que
conviveram por séculos com a considerada inconveniente presença islâmica na península
Ibérica, inclusive nos dias e terra natal de Lúlio, pois a ocupação muçulmana destas deixou
a região em estado de tensão por muito tempo, como se verá mais adiante.
As mudanças sociais ocorrentes na baixa Idade Média, período compreendido entre
os séculos XI e XV, tais como o crescimento das cidades e o êxodo rural subseqüente
também foram sentidas na esfera teológica. A igreja seguiu o desenvolvimento da
sociedade, surgindo no início do Séc. XIII os dois principais centros de estudos teológicos:
as nascentes universidades de Paris e Oxford. Nestas duas cidades os dominicanos
fundaram casas e logo tiveram professores nas universidades, segundo Gonzalez (1986, p.
120), o que é importante porque mostra o cristianismo aprimorando-se intelectualmente,
algo providencial para um trabalho como o pretendido por Lúlio.
30
subjugavam um povo; desta forma, segundo ela, através da expansão do povo mongol já na
virada do século XIII para o XIV, “todos os quatro impérios mongóis tinham se convertido
ao Islã. Os mongóis tornaram-se, portanto, o principal poder muçulmano na importante
região islâmica central” (Armstrong, 2001, p. 147).
A conversão em massa dos mongóis ao islamismo tendo em face à inicial simpatia
para com o cristianismo mostra a grande insensibilidade missionária do cristianismo
naqueles dias, especialmente a inabilidade dos cruzados de olharem para o contato com
outros povos mais como oportunidades de evangelização do que como ocasiões de guerra a
serem travadas e vencidas, assim como revelam também à intolerância quanto às outras
segmentações cristãs, distintas da hegemonia católica.
Esta cegueira quanto à necessidade dos mongóis revelavam também uma falta de
interesse na evangelização dos outros povos e até mesmo de uma aproximação e debate da
fé cristã com aqueles que ainda não a professam. Tal indiferença se mostrava ainda mais
aguda quando se tratava da relação entre cristãos e muçulmanos, a ponto de se verificar
que entre eles não houve na Idade Média um verdadeiro e proveitoso diálogo inter-
religioso, sendo uma fantasia a busca de evidências neste sentido, conforme as seguintes
palavras de alerta de Brague:
combatidas por Lúlio, o filósofo árabe e muçulmano Averróis, era defensor de uma
vivência dupla da religião islâmica: aos mais cultos, caberia pensar a própria religião de
maneira mais filosófica e aos demais, restava-lhes uma crença crédula, até mesmo fanática.
Esta dicotomia foi assim expressa por Saranyana: “Seria uma religião que, nos sábios, cede
à filosofia, ou a ela se orienta, e no vulgo cede à boa cidadania, ao bom comportamento,
tanto individual como social. A religião do vulgo é uma espécie de ‘fideísmo’ – para não
dizer fanatismo – sem conteúdos inteligíveis” (Saranyana, 2006, p. 239).
De formas distintas, tanto o cristianismo, quanto o islamismo viviam dias de agudas
distinções na própria vivência de suas religiosidades, o que na verdade, acabava por
expressar os intensos contrastes morais vividos naqueles dias medievais, os quais não eram
percebidos apenas em lugares distintos do mesmo país, mas muito próximos, até em uma
mesma pessoa, a qual poderia demonstrar “uma fé sublime e uma superstição degradante,
uma pureza angelical e uma sensualidade grosseira” (Zwemer, 1977, p. 7).
Devido a sua preocupação com o declínio moral e religioso da cristandade, Lúlio
escreve ao rei Filipe da França uma dedicatória, na qual roga ao mesmo a que assumindo o
seu papel de magistrado cristão, venha a defender a fé cristã nos limites do seu reino,
velando pela condição espiritual de todos, removendo os vícios e promovendo as virtudes,
de tal maneira que o seu reino fosse “espelho e exemplo para todos os reis cristãos em
todas as virtudes próprias do ofício real” (Lúlio, 2001a, p. 115). Desta maneira, Lúlio
demonstra tanto a sua preocupação com o estado moral e religioso da cristandade, como
também revela e apela à visão vocacional religiosa para o magistrado civil, que teria
responsabilidades e competências cívicas de manter e assegurar a qualidade espiritual da
sociedade sobre a qual foi por Deus constituído governo. Esta é uma visão que reflete a
compreensão de cristandade, tão arraigada em Lúlio, que será mais adiante estudada.
1
Sobre o termo sarraceno, referência comum aos muçulmanos, Fletcher comenta: “Aqui, Isidoro de Sevilha,
o grande polímata e enciclopedista do fim da Antiguidade, e contemporâneo de Maomé, resume um consenso
cristão: Os sarracenos vivem no deserto [...]. Eles também, como já dissemos, insistem em se denominar
sarracenos, porque falsamente se vangloriam de descender de Sara” (Fletcher, 2004, p. 25).
35
ele orava. “Isso estava de acordo com os termos de rendição da cidade” (Runciman, 2003a,
p. 17). A citada descrição indica a vocação histórica de tensão entre estes que são
atualmente os mais numerosos grupos religiosos do mundo, os cristãos e os muçulmanos.
Agora, a presente pesquisa estuda este conflito, de essencial compreensão para o devido
entendimento do tema em estudo.
Além da diferença quanto à compreensão sobre Deus, o Islã não difere tanto do
cristianismo medieval pela sua proposta teocrática, pois assim como segundo a instrução
corânica, a ordem divina se estende também à sociedade civil, o modelo medieval de
cristandade era uma encarnação da realidade civil como expressão da influência e do
domínio eclesiástico da fé cristã no mundo. Contudo, para o Islã, até a própria guerra
(Jihad) é um serviço religioso e a principal delas é a luta para submeter todas as paixões da
alma do fiel a Deus, pois o muçulmano deve se empenhar a defender e estender a fé
islâmica, combatendo por Alá, visto que o Corão lhes ordena até a matarem ou serem
mortos, conforme registra Mata (2006, p. 21). De fato, é inegável a afirmação do Corão
Sagrado no verso 111 da sua 9ª Surata do julgamento e promessa feitos por Alá aos fiéis
quanto à disposição destes a matarem e a morrerem pela sua fé, como se lê:
impingida aos cristãos, eram muito menores que nos tempos dos bizantinos –, mostravam-
se pouco inclinados a questionar seu destino”, segundo Runciman (2003a, p. 31).
No entanto, as tensões entre cristãos e muçulmanos que no Oriente Médio não
pareciam ser grandes no início da expansão do Islã, foram se intensificando especialmente
na Europa Ocidental. Lúlio afirma que um certo sarraceno, nomenclatura comum para os
muçulmanos na referência européia, havia escrito a reis cristãos questionando a luta
armada dos cristãos tentando reconquistar as terras que antes haviam sido alcançadas pela
pregação apostólica, pois ao apelarem às armas, eles estavam usando o caminho descrito
pelo profeta Maomé e não aquele ensinado por Cristo (Lúlio, 2009a, p. 100). Desta forma,
vê-se não apenas que os conflitos se tornaram bélicos, aguçados pelas cruzadas, como se
verá em seguida, mas também destacava a tensão religiosa em si.
O período compreendido entre os anos 1050 e 1300 d.C. foi marcado por tensões
constantes entre cristãos e muçulmanos; o domínio cristão que havia sido estabelecido na
Síria, Palestina, Sicília e península Ibérica estava sendo passo a passo substituído pela
expansão islâmica, o que resultou numa guerra permanente entre os dois grupos religiosos
no mundo mediterrâneo, segundo Fletcher (2004, p. 94). Esta grande expansão do
islamismo, dominando todo o Oriente Médio, o norte da África, a Europa Oriental,
estendendo-se pela Ásia adentro, mas especialmente indo ao Ocidente alcançando as ilhas
mediterrâneas e encravando-se na península Ibérica através do Estreito de Gibraltar geraria
reações adversas nos cristãos europeus ocidentais, como se pode verificar.
A visão que a maioria dos cruzados, que eram cristãos ocidentais com um senso de
vocação diante dos não católicos, tinha para com os infiéis era a do seu extermínio, posto
que inimigos da verdade divina; ou aos que fosse permitido viver, restava a escravidão, já
que estavam destinados ao inferno; poucas vozes se opuseram a esta visão restrita de
tratamento de juízo, dado especialmente aos muçulmanos, segundo Neill (1997, p. 118).
Zwemer denuncia que na época, quase todas as descrições dos islâmicos eram
recheadas de ignorância e ódio. No entanto, ele destaca o trabalho pioneiro e sensível de
Pedro Venerabilis, visto que teria sido o primeiro a traduzir o Corão e estudado o
Islamismo com entendimento e erudição, procurando traduzir ao árabe versículos bíblicos
fundamentais à exposição da fé cristã àqueles, assim como afirmou que o próprio Corão
continha as armas necessárias a se atacar a fortaleza islâmica, contudo, continua Zwemer,
ele se negou à tarefa missionária, alegando não ter tempo para isto visto que vivia ocupado
com os seus livros. O sinal de um novo caminho a ser abordar os muçulmanos foi indicado
pelo venerável Pedro, que claramente defendia a idéias do não uso das armas, força ou
ódio, mas sim das palavras, da razão e do amor, ainda segundo Zwemer (1977, pp. 38,39).
Apesar da relação hostil entre cristãos e muçulmanos, especialmente na Europa, do
contato resultou contribuições ao mundo cristão ocidental, assim como no início da
expansão islâmica o contrário havia se dado, por exemplo, através do funcionalismo
público ocupado pelo povo do livro (cristãos), mais acostumado à vida burocrática e
urbana, em contraste com a origem tribal e semi-nômade dos árabes (etnia majoritária e
classe exclusiva na formação inicial do povo muçulmano), e pouco a pouco muitos destes
cristãos foram se aculturando ao Islã, absorvendo costumes, padrões de vestimentas e
culinária, assim como se acomodando aos benefícios garantidos aos seguidores do Islã e
acabaram migrando de religião, tendo trazido aos maometanos a cultura oriental helenística
e persa, traduzindo especialmente para o sírio muitos destes escritos, entre eles os trabalhos
de Aristóteles, posteriormente revertidos ao árabe, segundo Fletcher, (2004, p. 50).
Curiosamente, o contrário se deu com o contato posterior da cristandade ocidental com os
árabes, posto que muito da antiga erudição cristã havia se perdido com a queda de Roma, e
veio a ser reintroduzida ao meio cristão através do caminho de retorno, de tal maneira que
muitos destes clássicos foram re-introduzidos no cenário da academia cristã através da
pena árabe, quando do tenso contato com os cruzados.
Apesar das irônicas contribuições mútuas e das incipientes e veneráveis propostas
de Pedro, o que predominava era a tensão entre os dois grupos; aliás ela apenas se
acentuava, especialmente na Europa.
38
mútuas ainda perduram entre os seguidores de Cristo e os de Maomé e elas não estão
relacionadas apenas aos textos considerados sagrados pelos dois grupos.
Decorrentes de tantas tensões, que têm por fundo questões não somente de fé e de
autoridade escriturística religiosa, mas também conflitos culturais, tensões sociais e fatores
econômicos, como as devidas posses de terra, um grande choque de culturas se estabelecia
e ainda se estabelece nesta relação entre cristãos e muçulmanos; e como resultado deste
choque, está a dificuldade da conversão dos muçulmanos à fé cristã nos dias e nas terras
pátrias de Lúlio, como expressa Jaulent:
A conversão dos muçulmanos, porém, não era bem vista pelos senhores
de Maiorca em virtude de certos prejuízos econômicos. O batismo
devolvia ao escravo a condição de livre e melhorava sua condição de
alforria. Por estes motivos, a conversão dos cativos muçulmanos não era
muito favorecida e, sem qualquer dúvida, pode-se afirmar que os
esforços de Lúlio para promover a cristianização dos muçulmanos
contrariaram os interesses de boa parte da sociedade cristã e também das
poderosas ordens militares do Templo e do Hospital. [...]
Tenha-se em conta também a natural dificuldade que Lúlio encontraria
na conversão dos muçulmanos, por possuírem estes uma tradição
filosófica e científica que, ainda no século XIII, inexistia no Ocidente.
Lúlio, visto por alguns historiadores como antimuçulmano, era, antes de
mais nada, um homem de seu tempo, e tinha viva consciência da
importância do Islã na vida cultual dos cristãos. (Jaulent, 2001b, pp.
11,12).
Nenhum outro país na Europa tinha um contato tão estreito com o Islã,
para o bem e para o mal, como os reinos de Castela, Navarra e Aragão.
Ali, a disputa era tanto pela mente quanto pela espada. Por três séculos se
pelejou uma cruzada tanto sobre a verdade quanto sobre o campo de
batalha entre cristãos e muçulmanos. Neste conflito, os antepassados de
Raimundo Lúlio fizeram a sua parte. Durante todos os anos da vida de
Lúlio, o domínio muçulmano se manteve em Granada contra os reinos
espanhóis unidos. Até o ano de 1492 os sarracenos não haviam ainda
sido expulsos das terras da Europa meridional (Zwemer, 1977, p. 13).
40
Esta longa ocupação resultou em muitas revoltas por parte dos cristãos que estavam
sob o governo de muçulmanos que dominaram a Espanha. Escritos ofensivos ao profeta
Maomé e ao islamismo foram produzidos e, embora os cristãos tivessem sido capazes de
viver sob o novo regime e domínio islâmico, “secretamente insultavam aqueles que
estavam no comando”, comenta Fletcher (2004, p. 41).
A série de favorecimentos aos convertidos ao Islã, assim como a constante pressão
que o governo muçulmano caracteristicamente exerce sobre os não islâmicos têm sido
instrumentos poderosos tanto de conversão quanto especialmente de manutenção na fé
maometana entre os seus seguidores. Houve inúmeras conversões de cristãos ao islamismo
especialmente no contexto espanhol e catalão em virtude destes favorecimentos, muitas
vezes casos de apostasia consciente por parte de cristãos mais preocupados com as
condições de sua vida, do que em suportar o preço de permanecer firme em sua confissão
de fé cristã, ainda que a julgasse superior, afirma Fletcher, que em seguida corrobora o
destaque que se costuma dar à nobreza do líder muçulmano Saladino frente a tensão com
os cristãos cruzados: “Os cruzados eram capazes de respeitar tanto o valor moral quanto o
marcial dos seus oponentes. Saladino é o principal, mas não o único exemplo, um homem
de palavra, pio e sábio, clemente e justo, terrível apenas com aqueles como Renaud de
Chântillon, que desprezou as leis da guerra” (Fletcher, 2004, p. 98).
Neste ínterim, a Maiorca natal de Lúlio, estava à sombra das tensões vivenciadas
pelo rei Jaime I, de Aragão, as quais não sendo apenas de ordem cívico-militar com os
islâmicos, mas também de ordem político-pessoais relativas a questões matrimoniais
intrincadas. Tendo recebido auxílio do príncipe português Pedro nestas últimas questões, o
referido rei aragonês acabou por recompensar a este em 1231 d.C. com o comando da ilha
de Maiorca, reconquistada recentemente dos muçulmanos, segundo Fletcher (2004, p. 97);
sendo este o contexto histórico no qual surge Lúlio.
Percebe-se que a relação entre os cristãos e os muçulmanos nunca foram
completamente pacíficas, ainda que em alguns momentos um tivesse oferecido e recebido
uma certa tolerância para com o outro grupo, a tendência histórica era, na melhor das
hipóteses, de ignorância ou indiferença e nos mais tensos momentos de franca batalha
sangrenta. A começar nas questões religiosas, tal conflito envolvia duas concepções muito
distintas sobre a vida e sobre o mundo e a inter-relação disto com a fé, apresentada aqui a
partir da obra em referência de Fletcher (2004, pp. 17-22).
41
Contudo, a tensão se acentuou com a disputa pela terra, desde a questão do direito
de posse dos lugares considerado sagrados por ambos os credos até o próprio direito de
defesa das suas respectivas terras, considerado legítimo por ambos.
As questões das ocupações territoriais tanto na chamada Terra Santa, quanto na
península Ibérica estavam no centro das principais tensões e dos mais sangrentos
confrontos entre os adeptos destas duas grandes religiões monoteístas, tendo encontrado o
seu ponto de maior tensão no episódio histórico conhecido como cruzadas, que por ter
importância vital nesta pesquisa, não apenas em sua contextualização histórica, mas
principalmente por ser um dos pontos polêmicos essenciais em Lúlio e por trazer consigo
uma das principais controvérsias sobre o seu significado para a compreensão do seu
pensamento e propostas, recebe um destaque especial nas considerações críticas do terceiro
e último capítulo desta pesquisa.
De uma forma bem peculiar, como se verá melhor em seguida, esta citação já
demonstra como Raimundo Lúlio absorveu o que havia de melhor destas duas ordens
missionárias dos seus dias, e assim, utilizando-se das suas contribuições, acabou por
desenvolver o seu empreendimento missionário, aqui chamado de missiologia luliana, a
qual será o tema de estudo do próximo capítulo. Por hora, a presente pesquisa apresenta as
influências deixadas em Lúlio das primeiras missões cristãs aos muçulmanos, assim como
destaca os principais personagens que colaboraram com o desenvolvimento da Missiologia
de Lúlio, tendo sido simultaneamente os seus precursores.
Félix teve uma grande maravilha com aquela grande pena que o corpo
sofrerá no Inferno, e disse que grande pena será aquela que terá Maomé,
que proporcionou a tantos homens estarem no Inferno, pois na pena de
cada um será multiplicada a pena de Maomé.
Quando Félix se maravilhou por muito tempo com a grande pena de
Maomé, se maravilhou muito fortemente de os cristãos terem tão pouco
cuidado de converter os infiéis, e teve a opinião de que, como se
preocupavam tão pouco, teriam a mesma pena que os infiéis suportam
nos Infernos.
Enquanto pensava isso, Félix se lembrou de São Bento, de Santo
Agostinho, de São Francisco, de São Domingo, e de muitos outros santos
que estão na graça de Deus, por terem proporcionado a muitos homens
serem salvos e fugirem dos Infernos. Por isso, se maravilhou de como
não existem muitos homens que iniciam coisas novas que sejam úteis por
todos os tempos, pelas quais multiplicariam sua glória (Lúlio, 2009b, p.
341).
Apesar desta constatação de apatia quase universal dos cristãos para com a
evangelização dos outros povos, houve gloriosas exceções naqueles dias próximos, que na
maioria das vezes eram missionários enviados pelas ordens missionárias de São Francisco
e de São Domingos, como foi o caso dos franciscanos enviados à evangelização da China
seguindo a antiga rota da seda, conforme registra Cropani (2003, p. 12).
Desta maneira, vê-se que não foi Lúlio quem começou a evangelização dos
muçulmanos, em certo sentido, a sua proposta missionária, tanto na teoria quanto na
prática, foi uma continuidade nas missões cristãs a outro povos, ainda que se reconheça a
deficiência do que estava sendo feito neste sentido. Por isso, não se pode deixar de
reconhecer que houve novidade na proposta missionária luliana. Para que se entenda
43
Apesar da influência das citadas ordens, Hillgarth defende a idéia de que Lúlio
acabou exercendo um trabalho bastante independente, não apenas não se ligando aos
franciscanos ou dominicanos, mas também independente da própria estrutura, modelo e
visão eclesiástica dominante nos seus dias, devidos aos seus ideais estarem além do que era
perseguido.
Portanto, como compreender a relação de Lúlio com a Ordem dos Frades Menores,
ou mesmo com a igreja institucionalizada, é o que se segue nesta pesquisa.
46
Deste relato, percebe-se não apenas a tensa relação entre Lúlio e o catolicismo
institucional, mas também a associação popular da sua imagem ao franciscanismo. Alguns
historiadores se dividem a respeito desta associação ter sido ou não real na vida de Lúlio.
Iáñez, na sua obra sobre a literatura medieval, associa o período de estudos teológicos e
meditação de Lúlio como um eremita no monte Randa, logo após a sua conversão, com um
suposto ingresso seu na “Ordem Terceira de São Francisco” (Iáñez, 1992, p. 199).
Embora Bustinza também identifique Lúlio como um franciscano (Bustinza, 2007,
p. 805), é preferível seguir a interpretação do lulista brasileiro Costa que assim explica a
relação entre Lúlio e o franciscanismo:
Enfim, fato é que a história posterior associou Raimundo Lúlio com a imagem de
São Francisco de Assis, tendo o tempo, inclusive, deixado os restos mortais de ambos
repousarem em tumbas vizinhas, na Igreja de São Francisco, localizada em Palma de
Maiorca, terra natal de Lúlio, conforme indica Zwemer (1977, p. 109).
Concluindo esta investigação sobre as influências exercidas sobre Raimundo Lúlio,
a presente pesquisa passa a discorrer agora sobre alguns dos personagens históricos que
possivelmente teriam dado uma maior contribuição à formação missionária de Raimundo
Lúlio, ou no mínimo, tiveram grandes similaridades de pensamento, possivelmente
corroborando influências sobre este.
missionários deveriam ainda ser versados em bom conhecimento teológico não apenas do
Cristianismo, mas também nas doutrinas das respectivas religiões daqueles a quem eles
deveriam comunicar a fé cristã; eles também deveriam ser aptos para demonstrar a
superioridade da fé cristã sobre as demais através de convincentes escritos apologéticos,
assim como de uma vida cristã autêntica, seguindo o modelo dos apóstolos, como se
percebe na seguinte exclamação de Lúlio: “Nós temos esperança que Deus envie a este
mundo homens de vida santa, que também sejam da Ordem dos Apóstolos e que tenham a
ciência e a linguagem para saber pregar e converter os infiéis, com a ajuda de Deus, e que
dêem aos cristãos um bom exemplo com sua vida e suas palavras santas” (Lúlio, 2006, 32).
Neste ponto encerra-se o presente capítulo como uma exposição contextual
histórica e geográfica das missões cristãs que foram exercidas até os dias de Lúlio,
destacando a relação entre cristãos e muçulmanos; e encerrando com a identificação do que
foi feito na época e um pouco antes de Lúlio quanto à evangelização dos muçulmanos,
destacando as ordens mendicantes e aqueles outros Raimundos que foram precursores de
Raimundo Lúlio na missão cristã aos muçulmanos.
A presente pesquisa passa ao próximo capítulo fazendo uma exposição panorâmica
da teoria e prática missionária de Raimundo Lúlio, aqui identificadas juntas como
Missiologia Luliana, pois como se há de perceber, teoria e prática estavam profundamente
associadas na vida e na pessoa de Lúlio. A exposição de tal missiologia visa demonstrar de
que maneira a mesma não foi uma simples compilação das idéias de outros, especialmente
dos outros Raimundos há pouco apresentados, mas em que ela de fato veio a oferecer uma
contribuição original às missões cristãs aos muçulmanos.
50
Ramon Llull estava com uns sessenta anos de idade na primeira vez que
viajou para Tunis e mais de oitenta na sua última viagem. (...)
[Diferentemente de] Marco Pólo [que] era um mercador. Llull pretendia
dialogar com pessoas de religiões diferentes do cristianismo, para
encontrar um caminho comum. (...) Llull não escrevia livros de viagens,
nem descrevia paisagens. Viajava para falar com as pessoas, para saber o
que pensavam e dizer-lhes o que ele pensava... sobre Deus. (...) Llull não
se importava que o tivessem por louco, ou que considerassem impossíveis
os seus propósitos... com o propósito de mover aos seus interlocutores a
usar a razão (Mata, 2006, p.16).
Embora Lúlio tenha sido apresentado como pregador, místico e até mesmo como
político pragmático, conforme os destaques de Runciman (2003b, p. 374), a sua
contribuição maior se deu em duas áreas: na produção literária, pelo que se destaca a
variedade de temas abordados, assim como a diversidade de línguas nas quais escreveu,
dentre elas o catalão, dando a este idioma a unidade e divulgando-o, pelo que é
51
considerado o primeiro escritor catalão de notoriedade universal, segundo Iáñez (1992, pp.
199-202); e o outro destaque está na sua proposta missionária, pois a missiologia luliana
revela como Lúlio utilizou e subordinou o seu vasto e rico conhecimento filosófico ao uso
teológico missionário, um contraste com o oponente árabe-muçulmano Averróis, que fazia
o contrário, segundo Saranyana (2006, pp. 240,379).
“propriedades na ilha – já por volta de 1232 sua família possuía cerca de 159 hectares”
(Costa, 2000, p. XV).
Lúlio foi educado no refinado ambiente da corte real maiorquina, segundo Iáñez
(1992, p. 200), tendo sido preparado para a carreira das armas, como indica Costa (2000, p.
XVI); porém, ele não permaneceu muito tempo na então provincial Maiorca, onde teria
uma pacata vida típica do interior, pois quando ainda jovem, foi para a Espanha e serviu na
corte do rei de Aragão, época na qual viveu em devassidão, embora casado e com filhos,
pois como informa Tucker, tinha amantes e “pelo seu próprio testemunho, sua vida era
completamente imoral”. (Tucker, 1996, p. 53). Costa indica que o nome da esposa de Lúlio
era Blanca Picany, com quem teve dois filhos, Domingos e Madalena; e completa: “Mais
ou menos nesta mesma época, foi nomeado administrador da casa real do futuro rei Jaime
II de Maiorca” (Costa, 2000, p. XVI).
a conversão de Lúlio foi mística, marcada por visões. Ele haveria tido três
visões de Cristo. Na primeira, ele estava compondo uma música erótica, à
noite, quando foi surpreendido pela imagem de Cristo pendurado na cruz,
com as suas mãos e pés escorrendo sangue, olhando-o com censura;
impressionado pela visão, parou a sua composição até tentou retomar tal
obra na semana seguinte, quando se dá, novamente, a visão. Então ele se
entrega a Cristo, mas é assaltado pela terrível dúvida se podia ele, tão
pecador, ser aceito pelo Santo Jesus. Lúlio passa então a viver uma vida
ascética, típica da mística monástica de então, até que tem uma terceira
visão, através da qual, torna-se consciente da sua responsabilidade para
com os que o rodeavam. Nesta visão, ele se encontrara com um peregrino,
que ao saber da vocação ascética do mesmo, o repreende pelo seu
egoísmo e o desafia a seguir o mundo e levar a outros a mensagem de
Cristo. Lúlio procura dedicar-se especialmente aos sarracenos, que eram
considerados os mais odiados e temidos inimigos da cristandade. (Tucker,
1996, p. 53).
Esse episódio aconteceu por volta de 1265, aproximadamente aos trinta anos de
idade de Lúlio, informa Costa (2000, p. XVI) e tal experiência mística marcou tanto a sua
conversão como a sua vocação missionária, pois ao mesmo tempo em que ele foi
repreendido pela sua promiscuidade, também recebeu a sua chamada missionária, o que
honrou até a sua morte.
53
ser ao serviço a Deus, afirma Franch (1954, p. 48), em obediência à visão do seu chamado
e vocação missionária.
Sobre Lúlio, Iáñez complementa Neill: “passou indubitavelmente por Tunes, onde
foi martirizado, e pelo menos duas vezes por Bugia, onde também recebeu maus tratos que
– talvez (pois se perde o seu rasto) – o tenham levado à morte em 1315. Beatificado pela
Igreja, é conhecido pelo título de ‘Doutor Iluminado’”. (Iáñez, 1992, pp. 199,200).
Sobre os eventos que marcaram o final da vida Lúlio, cuja tradição associa ao
martírio, importa a leitura da seguinte descrição de Tucker, que comenta a questão, assim
como se percebe além da preocupação com a evangelização, o coração pastoral do ancião
cristão, ao dirigir-se à sua pequena congregação de convertidos do Islã à fé cristã na
Tunísia:
Após a sua morte, Lúlio foi reconhecido como um cristão de destacada contribuição
às missões cristãs e à medida que os seus escritos vão sendo estudados e a sua obra vai
sendo conhecida, maior valor vai-se atribuindo ao missionário cristão natural de Maiorca.
O desejo de Lúlio é ver um mundo mais piedoso, habitado por pessoas que
conheçam a Deus, o adorem e o sirvam como fruto deste amor. O seu sonho era ser parte
do processo de conversão de gentios à fé cristã, mas o seu ideal era bem mais abrangente,
não se restringia a converter muitas pessoas; não que isso por si só fosse uma tarefa menor,
58
muçulmanos; dessas passagens destaca-se aqui apenas duas: “Combatam por Alá: matem
ou [eles] lhes matam”, ainda que se recomende a moderação neste combate, pois Alá não
teria prazer em quem se excede nisto; “Combatei contra eles até que deixem de induzi-los
a apostatar e se rendam ao culto a Alá. Se cessam, [que] não haja mais hostilidades contra
os ímpios” (Mata, 2006, p. 21,22).
Dá para se perceber a dimensão da dificuldade de se fazer missões cristãs entre os
muçulmanos. A triste constatação das cruzadas é que as práticas de cada respectivo grupo
envolvido foi essencialmente contrária à fé professada por eles, pois na ocasião, a
tolerância gentil pregada no evangelho cristão foi vivida em grande medida pelos islâmicos
e o combate letal contra os infiéis ensinado no Corão foi praticado em grande medida pelos
cristãos. Lúlio não se rendeu à relação “cruzada” entre os cristãos e os muçulmanos tal
como se tornou, abusiva, nem muito menos a apoio como recurso de “conversão” religiosa,
pois ele entendia que os cristãos tinham uma responsabilidade maior, mais precisa e
essencialmente evangélica de se aproximar e em se relacionando com os não cristãos,
tentar apresentar-lhes racionalmente a fé cristã; esta percepção desdobrou-se na sua
proposta missionário, próximo tópico de estudo neste trabalho.
Embora, segundo Costa, Lúlio visse que uma das duas principais obrigações do
cavaleiro do Séc. XIII fosse lutar na cruzada (Costa, 2001, p. 37), essa luta não poderia ter
propósito de conversão, mas militar, ainda que imbuída de valores religiosos.
Para Lúlio, a devida instrução do missionário cristão era uma ferramenta
fundamental para o seu trabalho missionário, por isso ele mesmo se dedicou de 1262 a
1264 a aprender a língua árabe, passando também a estudar latim, teologia e o pensamento
filosófico distinto de cristãos, muçulmanos e judeus. Costa indica ainda a tendência de
Lúlio de buscar a síntese desse conhecimento adquirido com a prática escolástica que era
dominante na academia cristã do Séc. XIII (Costa, 2000, p. XVIII).
Aquilo que Lúlio buscou, se ampliou dentro de si desembocando na convicção de
que o devido conhecimento de teologia cristã, de literatura, das culturas e filosofias gerais
e das línguas nativas dos povos aos quais se pretendia alcançar era parte necessária da
bagagem cultural que o missionário cristão deveria ter.
Sendo assim, Lúlio tentou persuadir tanto o rei da França quanto os intelectuais da
Universidade de Paris da razoabilidade da sua argumentação apologética, tentando sem
sucesso convencê-los, especialmente ao monarca, da necessidade da construção de escolas
missionárias monásticas, onde se oferecesse treinamento missionário aos monges, o que
incluía o estudo da língua dos povos pagãos a serem alcançados e o da capacidade de
argumentação racional sobre a fé cristã, segundo Costa (2006, p. 20).
Essa missiologia luliana era uma realidade em construção, pois a “ação missionária
sofre necessariamente o influxo de quem a realiza. À medida que a pessoa ganha
experiência e amadurece, muda e aperfeiçoa seus métodos e técnicas de conversão”,
expressa Jaulent (2001b, p. 13). A grandiosidade de Lúlio se manifesta no fato de que o
seu aprendizado missionário não era só dele, nem só para ele ou para o seu ministério
pessoal, mas imediatamente se transformava em um projeto da igreja cristã para alcançar
os não-cristãos; e assim Lúlio ia desenvolvendo a sua rica missiologia, que envolvia
aspectos teóricos e práticos, como se pode ver.
No coração da missiologia luliana havia três condições essenciais que formavam a
tríade missiológica de Raimundo Lúlio, segundo Neill, a qual deveria ser aplicada para o
alcance dos seus contemporâneos sarracenos.
A primeira condição seria a necessária compreensão rigorosa da linguagem do
povo a ser alcançado, por esta preocupação Lúlio planejou a fundação de escolas de
línguas orientais e perseguiu tal objetivo até obter o apoio do Conselho de Viena em 1311,
em parceria com as maiores e melhores universidades do mundo, para a fundação de cinco
62
colégios. O seu propósito com o estudo das línguas era penetrar profundamente na cultura
dos sarracenos e assim, poder entendê-los e fazê-los receber com profundidade o
Evangelho.
A segunda condição era a composição de um livro que comprovasse racionalmente
o cristianismo ao povo a ser alcançado, pois teve contato com muçulmanos cultos e
compreendeu o seu ponto de vista, estes haviam desenvolvido uma escolástica própria,
através da qual, defendiam suas doutrinas com muita razoabilidade, sendo útil e necessário,
portanto, a produção de material didático com conteúdo e qualidade capazes de demonstrar
a fé cristã aos leitores islâmicos.
E a terceira condição era a disposição ao martírio como um testemunho fiel e
corajoso perante o povo a ser alcançado, o que de fato ocorreu, pois testemunhar em países
muçulmanos era uma decisão perigosa, visto que sob a lei islâmica, tal ofensa já devia ser
punida com morte. Neill registra que o próprio Lúlio escreveu: “Os missionários
converterão o mundo por meio da pregação, mas também vertendo lágrimas e sangue, e
através de grandes trabalhos e no meio de uma morte amarga” (Neill, 1997, p. 138-140).
Observa-se que esta teoria missiológica não se restringe aos sarracenos, mas pode
muito bem ser estendida ao trabalho missionário transcultural. Nisto, Lúlio também estava
bem à frente do seu tempo, por isso também, ele foi tão mal compreendido.
Destaca-se das suas três condições, um perfil integral, pois envolve todo o ser do
missionário: a sua inteligência, a sua emoção e a sua vontade, dirigindo-o para uma tarefa
evangelística bem pensada, estruturada e desenvolvida. Em Lúlio, a dependência e a crença
numa obra sobrenatural de Deus na redenção espiritual dos não-cristãos não excluíam o
devido preparo para uma melhor atuação missionária dos cristãos.
A visão missionária de Raimundo Lúlio era decorrente do seu ideal de ver a igreja
cristã alcançando os não cristãos, especialmente os muçulmanos, cuja única aproximação
significativa de cristãos conhecida estava sendo as cruzadas; para Lúlio, esta não era a
visão principal que os muçulmanos deveriam ter dos cristãos, mas sim o evangelho.
A missiologia luliana ensinava que aos não cristãos deveria se anunciar a fé
salvadora, através de missionários devidamente educados e engajados nessa tarefa, o que
indicava a necessidade da Igreja de se empenhar em edificar escolas missionárias,
financiadas também pelos magistrados cristãos, com o propósito de bem preparar monges
missionários, os quais deveriam ser educados na teologia cristã, na vasta literatura, nas
filosofias universais, nas línguas dos povos a serem evangelizados e também na devida
63
Ainda segundo Lidório, metade da população mundial deve ser considerada como
povo não alcançado, no entanto eles contam com apenas cerca de 3% do quadro total de
obreiros protestantes mundiais (Lidório, 1996, p. 97).
Os muçulmanos merecem ainda hoje uma atenção específica, pois além de serem o
segmento religioso de maior velocidade de crescimento atualmente, são o seu segundo
maior grupo religioso do mundo, com mais de um bilhão de seguidores no planeta.
Esta parte do trabalho se encerra com um apelo de um palestrante, descrito apenas
como VNN, um convertido a Cristo oriundo do mundo muçulmano. Ele exclama:
Como foi visto, Lúlio foi extremamente ousado no seu sonho missionário, pois
embora seja razoável se imaginar que ele não tivesse a real pretensão de conseguir alcançar
toda a humanidade para Cristo, em muitos dos seus escritos é isto que ele parece transmitir.
Se por um lado, transparece que ele anuncia um alvo por demais elevado para ser
alcançado, por outro lado fica absolutamente claro o seu desejo de ver convertido o maior
número possível de pessoas para a fé cristã.
Em O livro dos gentios e dos três sábios, Lúlio descreve o anseio de um dos sábios
como sendo o da bem-aventurança de ver todos os homens professando uma única e a
mesma fé, formando um só povo no caminho da salvação, pelo que o sábio pede que se
considere os benefícios de tal realidade (Lúlio, 2001b, pp. 47,48). Certamente o desejo
daquele sábio era uma ilustração do incansável anseio de Lúlio de ver mais e mais pessoas
convertidas a Cristo.
O legado literário de Raimundo Lúlio é impressionante. Costa identificou 244 obras
que sobrevivem até os dias de hoje (Costa, 2001, p. 23), o que faz de Lúlio um escritor de
altíssima capacidade de produção literária, especialmente ao se considerar o fato de que ele
viveu no Séc. XIII. No entanto, a relação de Lúlio com a literatura é singular, parecendo
conviver bem, embora aparentemente em contradição com a sua inclinação à contemplação
e à prática missionária, um verdadeiro paradoxo pessoal.
Sobre a importância dos escritos lulianos, Jaulent não poupa louvores na sua
reivindicação por um lugar mais honroso para Lúlio e os seus escritos na lista dos
destacados autores da literatura cristã e até mesmo da universal. Assim ele comenta sobre o
Livro do amigo e do amado de Raimundo Lúlio:
65
Lúlio pretende, pois, que o homem se eleve até Deus a partir da realidade
criada e, depois, bem firmado em Deus, contemple nEle essa realidade.
Parece-nos, assim, que Lúlio foi um precursor, por isso não estranha
Menédez y Pelayo ter dito, referindo-se ao conjunto dos místicos
espanhóis, que ‘Lúlio abre a série dos grandes’. Seu mérito, contudo, não
se reduziu a adiantar-se aos tempos, mas consistiu em fazê-lo com um
lirismo não igualado em toda a literatura da Idade Média (Jaulent, 1989,
pp. 38, 39).
Percebe-se dessas palavras lulianas a sua firme esperança de que Deus se utilize dos
seus escritos literários, ainda que parcos, para trazer à salvação mediante a demonstração
racional da fé cristã, aqueles que estavam antes ignorantes quanto ao teor da sua
mensagem. Esta literatura, entende Lúlio, não está acabada, mas deve ser buscada de
diversas e novas maneiras, o que significa a escrita de diversas e novas obras literárias, as
quais certamente deveriam responder melhor e mais adequadamente à demanda racional de
cada contexto missionário.
Isso é um sério alerta contra a acomodação à simples repetição das mesmas
doutrinas, nos mesmos moldes; e a simples reedição dos mesmos livros. A tarefa
missionária da literatura requer tanto a firmeza teológica bíblica, quanto à capacidade de
discernimento e criatividade para se apresentar racionalmente as respostas cristãs às
indagações feitas pelos não cristãos dos nossos dias também.
Lúlio continua, demonstrando que na tarefa missionária ocorre um verdadeiro
embate racional de confrontação de idéias e argumentos, e não deveríamos fugir desta
conclusão, presumindo que em nossos dias podemos evangelizar sem comparação ou
mesmo confrontação de idéias, como se pode verificar a seguir:
Este livro é dividido em quatro. O primeiro prova que Deus existe, que
existem nele as flores da primeira árvore, e que existe a ressurreição. O
segundo livro é do judeu pretendendo provar ser sua crença melhor que a
do cristão e do sarraceno. O terceiro é do cristão, pretendendo provar que
sua crença vale mais do que a do judeu e do sarraceno. O quarto livro é do
sarraceno pretendendo provar sua crença valer mais do que a do judeu e a
do cristão. (Lúlio, 2001b, p. 42)
A intenção de Lúlio com a sua vasta produção literária não deve ser entendida
como simplesmente levar as pessoas a “aceitar Jesus como seu salvador pessoal”; ele não
usava algo semelhante a reducionistas “quatro leis espirituais”; a sua intenção evangelística
literária era mais profunda, o conteúdo apresentado e a demonstração do mesmo eram mais
amplos, pois o propósito de Lúlio era levar os seus ouvintes e leitores a uma conversão
espiritual consciente, fruto de uma confrontação densa de valores e sistemas de crença,
para então colocar no coração e mente do seu leitor um quadro de referências e de valores
cristãos, que serviriam de norte também para vida deles, como princípios a conduzi-los na
fé que racionalmente lhes fora demonstrada no processo de evangelização calcado na
demonstração da sublimidade da fé cristã.
67
Quais são esses dados que a moral luliana recebe da teologia cristã? Em
primeiro lugar, a noção do verdadeiro fim do homem, que é um fim
sobrenatural. Isto porque nas ciências práticas – e a moral é uma delas –
os fins fazem o papel de princípios ordenadores do agir humano.
Em segundo lugar, a noção das condições existenciais em que se encontra
a criatura humana: possuir uma natureza ferida pelo pecado original.
Por último, todas as conclusões teológicas que interessam à ordem
prática: a graça, o organismo sobrenatural das virtudes e dos dons etc.,
serão também utilizados por Lúlio na construção da ciência moral.
(Jaulent, 1989, p. 162)
Como já deve ter ficado evidente, para Lúlio seria uma tremenda aberração alguém
se limitar a ser um teórico das missões; o devido entendimento da dimensão da tarefa
reclama uma necessária e urgente resposta. Para o catalão em foco, a sua resposta não se
limitou a traçar esboços de planos, currículos, construções, etc.; enfim, à elaboração teórica
de um projeto missionário, a qual foi feita com qualidade, o que por si só já seria uma
expressão prática do devido entendimento da questão missionária. Contudo, Lúlio
envolveu-se e comprometeu-se pessoalmente Lúlio na atividade missionária, tendo se
preparado para a demanda. Mata comenta que toda a vida de Lúlio fora marcada pela
perseguição de uma jornada missionária de pregações, escritos e viagens que tinham o
propósito de levar à fé cristã os adeptos de outras religiões, estando ciente e até disposto a
morrer nesta tarefa, caso fosse necessário (Mata, 2006, p. 16).
Essas palavras parecem contrastar com a maneira festiva, turística e glamorosa de
algumas atividades chamadas viagens missionárias que ocorrem no meio cristão nacional.
A intenção de Lúlio, o meio utilizado, o risco envolvido, o tipo de oposição encontrada e a
dedicada argumentação evangelística que dominava a pauta das suas viagens revelam o
perfil de uma incursão missionária, que é algo bastante distinto de uma excursão turística
feita por cristãos.
Ainda que um certo turismo religioso tenha o seu lugar no mundo mercantilizado
contemporâneo, fica o questionamento se seria justo elevar tais passeios à condição de
incursões missionárias, pois estas são de natureza e propósito distintos, embora
semelhantes fisicamente e às vezes também próximos na forma como são apresentados. A
propriedade destas qualificações deveria observar o conjunto da obra de cada uma dessas
atividades, posto que revela a coerência com a devida dignidade do discurso missionário.
O preço e o risco envolvidos nas incursões missionárias lulianas revelam a
dignidade da sua natureza, pois como indica Costa, em virtude do desejo de ver crescer a fé
cristã através da conversão dos povos não cristãos, bárbaros, muçulmanos sarracenos e
outros gentios, Lúlio estava absolutamente consciente do risco envolvido e entendia ser
necessário estar preparado para o martírio, pois este, inclusive e juntamente com a
grandeza da demonstração pessoal de caridade, poderia ser o instrumento usado por Deus
para atrair a Cristo e à composição da cristandade, todo o mundo (Costa, 2006, p. 20).
Um solene alerta é dado aqui no foco essencial destas incursões missionárias, pois o
alvo é efetivamente a conversão do outro, estando o missionário disposto a pagar com a
própria vida nesta tarefa, o que de fato, deve ter ocorrido com Lúlio, pois ele enxergava no
martírio cristão – o que não é nunca a retirada deliberada da própria vida, mas a disposição
73
para permanecer fiel no cumprimento do anúncio do Evangelho, mesmo que isto lhe custe
a própria vida – um recurso da graça divina para impactar os gentios com a dimensão do
valor que o evangelho tem para os que nele crêem, na expectativa de que tal testemunho
reflita a glória do seu conteúdo e atraia a séria atenção da pretendida audiência.
No início do Livro das Bestas, de Raimundo Lúlio, já apresenta um quadro de
monges andarilhos missionários que refletem o entendimento luliano do relacionamento
estreito entre a fé cristã e a sua essencial vocação proclamadora, em simplicidade e árdua
dedicação neste exercício, como se percebe a partir deste breve diálogo entre Felix e o
grupo peregrino, personagens da fábula literária citada:
realizada; o que ele afirma em sua obra acerca dos exemplos considerados, também são
válidos à avaliação e à aproximação da atuação missionária de Lúlio. Destaca-se da
referida advertência a seguinte observação:
A tarefa que se tem a realizar é grandiosa. Parece que olhando ao redor não se
encontra modelos de inspiração pessoal aos interessados em realizar atualmente a obra
missionária, embora existam alguns. Lúlio, apesar de estar há quase mil anos de distância
da cristandade atual, pode ser um modelo de zelo e entendimento combinados no serviço
missionário.
Ao se considerar os contextos histórico, cultural, religioso e social nos quais o
referido missionário atuou buscando alcançar os islâmicos para a fé cristã, percebe-se que
o seu trabalho ultrapassou os limites circunstanciais da sua época e pode ser visto como um
verdadeiro paradigma histórico compatível com a prática missionária cristã em geral.
Esta pesquisa procura apresentar a missiologia luliana a partir da sua visão
essencialmente evangélica, pois segundo Tucker, quando Lúlio teve oportunidade de
defender o cristianismo, ele estabeleceu uma posição doutrinária “ortodoxa e evangélica
por completo” com “pouca teologia medieval e ... um mínimo de idéias romanas”, de tal
maneira que os princípios básicos de seu argumento continuam plenamente válidos hoje
num debate com muçulmanos, afirma Tucker (1996, p. 55).
A relevância da missiologia de Raimundo Lúlio para a missiologia cristã
contemporânea é percebida através da proposta de envolvimento pessoal intenso de Lúlio
nesta causa, fruto da sua visão de que é imperativa à Igreja a ordem de Cristo de que se
faça discípulos seus de entre todas as nações; e para isto, Lúlio compreendeu que a Igreja
deveria se empenhar devidamente no preciso e vasto preparo dos seus missionários,
capacitando-os para bem compreender a sua própria fé cristã, o pensamento humano
universal, a cultura do povo a quem se pretende alcançar, assim como a capacidade de se
expressar devidamente na língua nativa dos não cristãos, visando alcançá-los para a fé
cristã através da persuasão argumentativa capaz, adornada pela própria vida piedosa e
engajada nesta tarefa.
76
Esta citação já posiciona o leitor diante da dimensão do conflito que está por trás
das cruzadas, particularmente quanto à relação entre os cristãos e os muçulmanos e como
isto afetou, assim como foi interpretado por Lúlio em seus dias. O envolvimento que este
teve no projeto cruzadista da realeza dos seus dias e a relação entre o seu apoio às cruzadas
e a sua proposta missionária e/ou de diálogo inter-religioso são temas dos mais profundos
debates e polêmicas relacionadas ao personagem aqui em estudo, por isso esta pesquisa
dedica-se agora a explorar um pouco melhor o tema das cruzadas, encerrando este capítulo
final discutindo a percepção de Lúlio a respeito da mesma.
Antes de ser elemento essencial para a compreensão da proposta missionária de
Raimundo Lúlio, as cruzadas foram acima de tudo algo determinante para a formatação
não apenas das relações entre cristãos e muçulmanos, mas além disso para a construção do
mundo como se conhece hoje, conforme atesta Runciman nas seguintes palavras sobre a
relevância das cruzadas para a civilização: “as Cruzadas constituem um fato histórico
crucial da história da Idade Média. Antes de terem início, o centro da nossa civilização
situava-se em Bizâncio e nas terras do califado árabe. Antes de chegarem ao fim, a
hegemonia da civilização passara às mãos da Europa Ocidental. Foi dessa transferência
que nasceu a história moderna” (Runciman, 2003a, p. 11).
Percebe-se, portanto, que independente dos erros cometidos pelos cruzados, entre as
quais não se pode esquecer das atrocidades destes já citadas na referência que abre este
capítulo da pesquisa, as cruzadas foram um evento histórico de alcance muito maior do que
as questões religiosas envolvidas. No entanto, no que tange as relações entre cristãos e
muçulmanos, qual a importância e impacto que se deve considerar delas conseqüentes?
79
Embora muitos queiram isentar Lúlio de quaisquer visões cruzadistas, não há como
negar que havia nele sim muito desta visão tipicamente medieval sobre as cruzadas, mas
com consideráveis distinções do pensamento predominante nos seus dias, como se verá
adiante nesta pesquisa.
segundo Alem (1961, pp. 37,38). Desta forma, delineiam-se as Cruzadas como um
empreendimento que, embora exercido como uma atividade de conotação e vocação
religiosa, era essencialmente bélica e política, um poderio militar para inicialmente a
resolução de conflitos de posses de terra e reconquista de territórios outrora sob o domínio
cristão, embora posteriormente as Cruzadas tivessem sido usadas também para pressionar,
perseguir, sufocar e até mesmo executar grupos tidos como heréticos, como ocorreu com a
Cruzada contra os albingenses, ordenada pelo não inocente papa Inocêncio III, a qual em
1209 executou cristãos tanto albingenses, quanto ortodoxos no sul da França, segundo
narra Gonzalez (1986, p. 83).
Ainda que muitos cristãos comuns tenham visto e outros continuem vendo as
Cruzadas como “guerras missionárias”, elas deveriam mesmo ser vistas simplesmente
como uma ação militar, pois o papa Urbano II não pretendia a conversão dos muçulmanos,
pois “o islamismo constituía, antes, uma ameaça que precisava ser aniquilada antes que
suplantasse a igreja”, explica Bosch (2002, p. 277).
As Cruzadas foram uma campanha de pessoas de vindas de várias nações européias
em direção ao estrangeiro numa trágica loucura em nome de Deus; e delas, deve-se ficar
com a grande lição de que boa vontade e disposição sacrificial não podem “substituir uma
clara compreensão da” vontade de Deus, segundo Winter e Howthorne (1987a, p. 179).
O que as Cruzadas foram é um empreendimento cívico-religioso-militar violento
essencialmente de retomada de terras por parte dos cristãos, sob a convicção de se estar no
direito sagrado e com a bênção divina neste empreendimento de reconquista. Esta visão
revela uma nítida imagem predominante na Idade Média de uma sociedade modelar
teocrática, a Cristandade, a qual dominava o ideário de Lúlio para o mundo, como se
verificará mais adiante nesta pesquisa.
sucesso da ocupação cruzada. Tal denúncia do suposto tão somente nobre sultão, que teria
sido registrada pelo seu próprio secretário, assim se inicia, segundo Silveira:
Além de se verificar a opinião dos historiadores sobre a percepção das Cruzadas por
parte dos muçulmanos, é importante ir em busca do registro de compreensões que os
próprios islâmicos fazem sobre este assunto. Sendo assim, dá-se para perceber a partir da
leitura do registro de um muçulmano que eles se vêem tanto como vítimas da Cruzada da
Reconquista, como interpretam tal episódio como uma tentativa violenta de convertê-los ao
Cristianismo, numa empreitada que também demonstrava a insensibilidade cultural
daqueles cristãos, conforme assim se pode verificar do seguinte registro de Hammidulah:
De fato, tais palavras indicam precisamente que a leitura feita pelos muçulmanos do
episódio das Cruzadas é a pior possível, na contramão daquilo que aqui se está tentando
demonstrar como verdadeiro. Mas, não esconderia esta narrativa outros fatores além dos
histórico-culturais que temos considerado?
Apresentando uma avaliação peculiar sobre um aparente interesse mais recente dos
muçulmanos sobre as Cruzadas, destaca-se as seguintes palavras de Armstrong:
Com estas palavras, Armstrong ressalta não apenas o poder aqui já comentado da
memória coletiva dos povos do Oriente, mas acima de tudo, a tensão que se vive entre a
hegemonia do Ocidente nos âmbitos da produção de riquezas, de tecnologia e do poder de
fogo mundial, o que alimenta uma tensão atual entre as duas civilizações.
As Cruzadas afetaram especialmente as relações entre os cristãos e os muçulmanos,
pois embora estes tivessem no passado ocupado as terras que nas Cruzadas os cristãos
estavam reclamando de volta, houve muita resistência da parte dos islâmicos e também
85
crueldade da parte dos cristãos. Os muçulmanos viram-se, de fato, como vítimas desta
empreitada e tendem a cultivar esta memória especialmente nestes dias, diante da
hegemonia de uma nação ocidental, tida como cristã, e historicamente associada a um
sacro destino manifesto cristão. Independente dos méritos ou deméritos de cristãos ou
muçulmanos nas Cruzadas, é necessária a sensibilidade para com a percepção islâmica
deste importante episódio histórico e sua valorização da parte dos adeptos do Islã.
De fato, é muito difícil ao cidadão moderno ter uma interpretação das cruzadas
distinta daquela que apresenta os cruzados como um grupo de ignorantes, muitos dos quais
nobres, que em nome de uma fé cega em Deus e no poder da espada, se lançaram contra
muçulmanos numa busca desenfreada de retomar à força da espada as chamadas Terras
Santas; depois estendidas para a reconquista das demais terras ocupadas pelos muçulmanos
e até mesmo contra grupos julgados como heréticos, o movimento das cruzadas acabou por
ter a sua imagem associada à imposição da fé pela força, mas como, então se deve entender
o apoio, estímulo e até dicas de guerra cruzada que o personagem em estudo, conhecido
pela sua proposta de diálogo inter-religioso, fez? Esta parte da pesquisa, depois de ter
ambientado o leitor no universo das cruzadas, procura mostrar qual a visão que Raimundo
Lúlio tinha das cruzadas, e assim, elucidar a razão do seu apoio às mesmas.
entanto, ao se estudar as suas propostas dentro dos seu contexto histórico, conforme foi
apresentado objetivamente no primeiro tópico deste capítulo, fica-se mais fácil perceber
como ao mesmo tempo Lúlio pode ser apresentado como um missionário de vanguarda,
um verdadeiro modelo a ser seguido, mas também um defensor das cruzadas. Inicie-se
pelas suas próprias proposições.
Lúlio defendia a idéia da unificação de todas as ordens cruzadas em uma única
ordem e sob um único chefe, um rei cruzado; tais propostas deveriam promover um maior
controle dos abusos dos cruzados, promovendo também nestes um maior senso de
responsabilidade, ao apelar-se à vocação cavaleiresca. Assim propõe Lúlio:
Na defesa do seu modelo de cavalaria, Lúlio indica assim o papel dos cavaleiros
cruzados, elevando à condição de martírio a morte nos campos de batalha cruzadas:
Não apenas sobre os cavaleiros, mas todas as ações de todos os que são citados
acima estão avaliadas à luz da fé, o que demonstra que para Lúlio, embora a cruzada fosse
uma prática militar, deveria ser exercida como expressão de convicção religiosa, e as
batalhas que ela envolvia, deveriam ser vistas como verdadeiras batalhas pela fé cristã
católica hegemônica. Percebe-se nesta postura, ainda, entre os fiéis do católico-romano a
pretensão à exclusividade ou no máximo a primazia dentre os demais grupos cristãos, pois
tendem a sobrepor a realidade do cristianismo à da instituição católico-romana,
demonstrando assim um espírito de intolerância estranho ao evangelho de Cristo, mas
comum às manifestações religiosas fundamentalistas.
A posição de Lúlio quanto às cruzadas, no entanto, não foi a mesma durante toda a
sua vida, antes ele foi se aliando à política expansionista da corte francesa à medida que ia
sendo convencido da utilidade e necessidade das cruzadas como força de combate da
cristandade católica, tanto na reconquista da península Ibérica e da Terra Santa – terras
indevidamente ocupadas pelos islâmicos –, quanto na reunificação da cristandade sob a
égide romana – na conquista de Constantinopla, atraindo os ortodoxos à autoridade do
pontífice romano, conforme indica Jaulent nas seguintes palavras:
Esta visão revela uma percepção histórico-cultural própria, mas não se pode fazer
vista grossa à mesma, pois na prática acabava por revelar intolerância e incapacidade de
convívio com o diferente. No mundo em que se vive hoje, tão plural e globalizado, não é
necessária à negação da fé para o convívio harmonioso, nem mesmo a diminuição da sua
importância, pois o problema não está no direito ao culto e à liberdade religiosa, o que
inclui o direito de anúncio assim como o de convívio com os que a rejeitam, os quais
continuam sendo cidadãos com plenos direitos civis e devem ser ainda objetos do amor
pelos cristãos; o problema está na indisposição à tolerância e à convivência com o outro.
Enfim, para Lúlio as cruzadas não eram argumento missionário, quando muito,
poderia impor uma certa submissão de todos os cristãos à Roma, mas quanto aos infiéis o
89
seu papel era militar, ainda que sob um projeto teocrático, de busca de restauração de
posses de terras a quem se julgava de direito. Este tipo de pensamento é bem complicado
de ser defendido nos dias atuais, pois se não se está negando a nenhum povo ou nação o
direito de lutar pelo seu chão, há de se reconhecer que tomar Deus como partidário de
disputas por espaços geográficos só tende e piorar situações de conflito, como o que ocorre
entre judeus e palestinos no Oriente Médio.
Duas importantes críticas devem ser feitas ao modelo cruzadista de Lúlio quanto à
atuação missionária da Igreja cristã contemporânea: a primeira delas diz respeito à comum,
mas ainda relevante denúncia de que historicamente as missões incorreram no erro de levar
juntamente com o evangelho, os valores culturais e os padrões sociais da cultura dos
missionários. Isto é claramente percebido em Lúlio, que sendo incapaz de separar os
conceitos de Cristandade e Cristianismo, propõe uma única ordem militar que luta pela
manutenção e defesa de um Estado cristão, uma verdadeira teocracia, a se estender e
guerrear com outros que se oponham à sua concepção de direito de posse à Terra Santa.
Sobre o grande equívoco, a respeito da relação entre o ser cristão e o lutar por uma
terra cristã, em oposição aos outros, enxergando-os como tendo menos direito, mentalidade
própria ao conceito de cristandade, Comblin comenta:
[...] com os sarracenos presos entre os cristãos, ordene-se que alguns dos
próprios idôneos sejam recebidos, aos quais seja mostrada a nossa fé, e
que outras razões nossas destruam a seita deles. Caso não queiram vir
para a fé, que se discuta com eles por algum tempo e, depois disso, que
possam ir livremente para sua terra com nossos empréstimos e presentes
da corte, e eles mesmos contarão aos outros sarracenos nossa fé, as
razões que temos e o modo de crer que mantemos. Assim as coisas
preditas deveriam ser feitas; que todas essas coisas seriam semeadas
entre eles e que eles fiquem em dúvida e preparem o caminho para sua
conversão (Lúlio, 2009c, p. 19).
“Conhecer e amar a Deus (amar a Deus era um preceito cristão [Mc 12,30 e Lc
10,27]. Porém, amar e conhecer a Deus era uma característica da teologia muçulmana, o
que indica uma influência islâmica no pensamento de Ramon” (Costa, 2000, pp.
XXIV,XXV).
A busca de um diálogo que se mostre real, no qual haja verdadeira abertura um para
a idéia do outro, a disposição a uma audição honesta, que possibilite a reflexão
comparativa das propostas religiosas é a idéia fartamente defendida por Lúlio e a base
sobre a qual muitas das suas obras foram escritas, dente elas o Livro dos gentios e dos três
sábios, que se desenvolve a partir desta proposta e premissa básica aqui discorrida,
conforme identifica o próprio Lúlio no epílogo desta obra com as seguintes palavras:
Quando o gentio ouviu todas as razões dos três sábios, começou a repetir
tudo aquilo que havia dito o judeu, e pôde repetir tudo aquilo que havia
dito o cristão, e isso mesmo fez de tudo aquilo que lhe havia dito o
sarraceno. Deste modo os três sábios tiveram um prazer muito grande,
94
cristão, por sua vez, sujeitou toda a sua capacidade filosófica às suas convicções cristãs,
conforme indica novamente Saranyana (2006, pp. 240,379).
O movimento sufi encontrou uma grande expressão dentro do Islã durante o século
XIII, conforme indica Küng (2004, p. 273); e o contato de Lúlio com os mesmos teria se
dado a tal ponto que Ribera chegou a propor “pela primeira vez na história que Ibnc Arabi
fora a fonte concreta e imediata da influência sufi exercida sobre o pensamento de Lúlio”,
comenta Bustinza (2007, p. 795).
Discorrendo mais a respeito desta influência, Bustinza afirma que alguns textos
lulianos são quase cópias de textos árabes, embora conclua reconhecendo que diante de
hipótese de “plágio” de obras sufi em Lúlio, “nos encontramos, com toda certeza, diante de
‘evidências indiscutíveis’ muito frágeis” (Bustinza, 2007, p. 822).
Lúlio esteve profundamente comprometido com a sua missão aos muçulmanos, e
não poupou esforços para conhecê-los melhor; aprendeu a língua deles, estudou a sua
religião, os seus principais escritos e conheceu a sua filosofia, enfim, teve todo um cuidado
em perceber e reconhecer o outro a quem ele pretendia e efetivamente se empenhou por
levar à fé cristã, conseguindo alguns discípulos, conforme registra Tucker, tendo gasto o
tempo que antecedeu o seu apedrejamento no norte da África confirmando na fé cristã
aqueles convertidos pelo seu difícil trabalho missionário na região2 (Tucker, 1996, p. 59).
Sobre a atual resistência de muitos cristãos em se empenharem na evangelização
dos muçulmanos nos dias atuais, Engqvist denuncia que o que falta é amor para se
completar a missão cristão ao Islã (Engqvist, 2001, p. 610). No entanto, é necessário se
lembrar que o atual trabalho continua árduo e estatisticamente desafiador.
Ainda a respeito à natureza deste diálogo, pode-se afirmar que para Lúlio, ele se
revestia de uma verdadeira confrontação de idéias, como já foi demonstrado, podendo para
muitos, portanto, ser melhor qualificado como um debate inter-religioso, ao invés de um
diálogo, no entanto, considerando o compromisso com a audição do outro e a real
disposição à mudança como elementos necessários, conclui-se que Lúlio era proponente de
um diálogo inter-religioso que partisse das convicções seguras dos debatedores, tendo ele
mesmo proposto certa vez aos intelectuais do Islã um franco debate religioso, a ser
acompanhado por uma predisposição sincera à conversão caso alguém fosse convencido da
melhor razoabilidade da fé do outro debatedor, segundo registra Zwemer (1977, p. 66).
2
Para a leitura da citação direta e completa, busque-se a citação presente na página 46 desta dissertação.
96
Quanto à utilidade dos debates, vale lembrar que nem todos se mostram úteis, como
bem observou o antropólogo Malinowski (1997, p. 147), no entanto, no contexto das
missões cristãs aos muçulmanos e aos judeus é preciso que se esteja ciente de que tais
debates religiosos costumam ser intensos e difíceis com judeus e muçulmanos, como bem
lembra Hesselgrave (1995, p. 299).
A cristandade acostumada a pregações unilaterais precisa ser sensível à necessidade
e preferência da presente geração, a qual requer maior debate e troca de idéias,
especialmente no contexto do mundo secularizado europeu, como indica Fornet-Betancourt
(2007, p. 120), mas também nas missões aos muçulmanos, como aqui se demonstra.
3
Admite-se aqui como satisfatória a seguinte definição simplificada de cosmovisão: “Uma cosmovisão é
exatamente o que a palavra diz. É a visão que uma pessoa tem do seu mundo, seu cosmos. É a maneira como
97
ela compreende e interpreta as coisas que acontecem com ela e com outras pessoas. É a maneira de a pessoa
compreende a vida e o mundo em que vive. É a convicção da pessoa quanto ao que é real e ao que não é
(O’Donovan Jr., 1999, p. 13).
98
ocorrer universalmente, segundo Pujals (2008, pp. 46,78), então comprova-se teoricamente
o que já se tem observado na prática, que o caminho trilhado para a conversão de um
muçulmano a outra religião é longo e árduo, como identifica Dennett (1993, p. 9), devendo
o muçulmano convertido a Cristo ser objeto de apoio, compreensão, empatia e acolhida
dos cristãos para consigo, conforme identifica Marsh a seguir:
Este relato revela quão grandes são os obstáculos a serem enfrentados por um
muçulmano que considere a possibilidade da conversão ao Cristianismo, pois a integração
no Islã pesa-lhe contrariamente à conversão, visto que “É com razão que os muçulmanos
não consideram o Islam apenas como um ideal abstrato destinado à adoração imaterial. O
Islam é um código de vida, uma força ativa que se manifesta em todos os campos da vida
humana”, como indica Abdalati (2008, p. 137).
Embora o Corão expresse alguma consideração para com judeus e os cristãos,
revela também uma crítica aguda a ambos, ao afirmar que os mesmos rejeitaram os livros
sagrados anteriores enviados por Deus a eles, a saber, a Bíblia Hebraica e os Evangelhos,
respectivamente, pelo que se tornaram ímpios, segundo o registro da 2ª Surata, nos versos
87-89 (Alcorão Sagrado, 1975, p. 11). Especificamente aos cristãos, o livro sagrado
islâmico afirma na 57ª Surata, no verso 27, que são um grupo de apóstatas, alguns por
sincera e enganosa tradição e outros por verdadeira corrupção (Alcorão Sagrado, 1975, p.
407); e, por fim, destaca-se aqui a afirmação corânica de que a divisão da cristandade é
uma evidência do juízo de Deus sobre a apostasia cristã, conforme a 5ª Surata, verso 14
99
(Alcorão Sagrado, 1975, p. 76). Ainda que estas duas últimas afirmações, mas
especificamente dirigidas aos cristãos, tenha verossimilhança, não deixa de ser uma crítica
aguda, que leva os muçulmanos a considerarem uma conversão à fé cristã como uma
verdadeira queda espiritual, além de apostasia e de todas as sanções sócio-políticas há
pouco apresentadas.
Fato é que assim como hoje, a atuação missionária cristã entre os muçulmanos
também era difícil nos dias de Lúlio, e exige preparação e sensibilidades grandes por parte
dos missionários que abracem tal vocação.
Alguns podem estranhar e questionar a validade e a sinceridade de Raimundo Lúlio
nas suas propostas de diálogo inter-religioso, afirmando que não seria um verdadeiro
diálogo visto que o desejo do maiorquino era convencer os outros dos seus erros e
demonstrar os seus próprios acertos, desta maneira, seria mais apropriado falar-se em
debate inter-religioso, e não em diálogo. Contudo, tais propostas se baseavam num
conhecimento adequado tanto da fé islâmica, quanto da fé cristã, o que o levava a acreditar
na necessidade de uma demonstração clara, precisa, contrastante e confrontadora dos seus
ouvintes com as proposições do evangelho em oposição ao Corão.
Portanto, a visão que o muçulmano tem do árabe é bem mais elevada do que os
mais dedicados fundamentalistas protestantes nutrem pela versão King James do seu
próprio livro sagrado. Os passos de Lúlio e as suas recomendações ao envio de
missionários letrados e devidamente aculturados no universo do Islã (Lúlio, 2009c, p. 15)
também devem ser seguidos pelos missionários cristãos contemporâneos no mesmo ideal
de eficiente comunicação da mensagem cristã aos islâmicos.
Apesar da ênfase, o trabalho missionário proposto por Lúlio aos muçulmanos, não
se restringia à argumentação, o seu ideário de simplicidade e o seu engajamento pessoal
demonstram que para o missionário maiorquino, mais do que a razão, eram necessários
também o amor, a inteligência, a liberdade e o diálogo, obrigatoriamente, atesta Jaulent
(1989, pp. 27-30).
O diálogo religioso como estratégia de comunicação de fé na contemporaneidade
precisa ser usado não como fruto de uma flacidez nas convicções próprias do relativismo
enganoso da nossa época, mas como a busca consciente de uma aproximação irênica do
outro a quem se comunica a fé, pois o diálogo como meio de comunicação, num consciente
abandono de outras forças coercitivas, pressupõe fé na providência divina e humildade,
afirma Bosch (2002, pp. 577, 580,581); e estas são marcas essenciais da fé cristã.
Mais adiante, ao pensar que, malgrado fizesse isto, não sabia a língua
mourisca ou arábica, e nada aproveitaria. Mais adiante, considerando
estar só neste exercício tão grande, pensou em partir ao santo papa e aos
príncipes dos cristãos para impetrar que fizessem diversos monastérios,
onde homens sábios e literatos estudassem e aprendessem a língua árabe
e de todos os outros infiéis para poderem pregar e manifestar entre eles a
verdade da santa fé católica (Lúlio, 2010, internet).
Apesar de todo este projeto, que lhe custou muita insistência até a aprovação papal
para a construção dos tais três mosteiros solicitados, “[...] Ramon Llull não teve sucesso
em converter os muçulmanos para o cristianismo. Os diálogo inter-religiosos que
aconteceram na África aparentemente resultaram em fracasso, Não temos notícia
comprovada de nenhuma conversão de um muçulmano para o cristianismo baseada na Arte
luliana ou em suas pregações públicas” (Costa, 2010, internet).
Contudo, não se deve medir o valor e a importância das missões cristãs aos
muçulmanos determinados pela produtividade estatística própria da sociedade ocidental
secularizada, pois assim como foi nos dias de Lúlio, permanece hoje a necessidade de tal
tarefa missionária não pautada pela produtividade, pois a busca por resultados estatísticos
acaba historicamente esbarrando com a urgência da necessidade das missões aos
muçulmanos, conforme indica Chastain (1987c, p. 807).
Antes de números, as missões aos muçulmanos precisam dos mesmos princípios
dialógicos e de alteridade exercidos por Lúlio e atualmente reafirmados por missionários
como Dennett, que baseado em sua experiência e observação diz: “Os muçulmanos vão
falar livremente da sua religião e você deve encorajá-los, ouvindo calma e atentamente.
Eles estão muito mais conscientes do mundo espiritual que os ocidentais comuns e,
normalmente, estão prontos para discutir tais assuntos” (Dennett, 1993, p. 36).
A evangelização dos muçulmanos deve ser exercida com alteridade, segundo
Escobar (1996, p. 49), fugindo dos esteriótipos e reconhecendo valores, como sugere
Dennett (1993, p. 47), da mesma forma como fez Lúlio ao reconhecer e se apropriar de
vários valores dos muçulmanos, como destaca Costa das seguintes palavras:
CONSIDERAÇÕES FINAIS
tardios do testemunho de Lúlio na região, segundo VNN (1993, p.48), não se deve concluir
que não houve nenhuma contribuição às missões cristãs aos muçulmanos como
conseqüência da atuação missionária de Lúlio, pois este catalão alertou à Igreja Cristã dos
seus dias sobre a necessidade da percepção dos muçulmanos como um grupo de pessoas a
ser evangelizado, assim como demonstrou a necessidade de fazê-lo com sensibilidade e
conhecimento lingüístico, cultural, filosófico e religioso, demonstrando claramente uma
gênese do que hoje se costuma chamar de princípio de alteridade.
É conhecida a crítica histórica que se faz à exportação dos modelos culturais das
nações que os levaram fundidos ao conteúdo do evangelho na mensagem cristã que
entregaram aos povos colonizados, como indica Hiebert (1999, p. 54); e isso associado a
uma prática histórica muitas vezes condenável pelo próprio evangelho, gerando não apenas
distorções destes, mas potencialmente podendo trazer grandes danos às culturas quando
uma cosmovisão é substituída por outra, que tendo sido mal compreendida, mal
apresentada no processo da evangelização intercultural, ou simplesmente apresentada sem
a devida reflexão sobre as implicações que tal mudança poderia trazer graves e variados
males aos habitantes locais, como foi o caso de Madagascar, onde ocorreu uma grande
crise cultural, conforme relata o antropólogo Linton:
Portanto, quanto ao modelo proposto por Raimundo Lúlio, não se deve ficar com a
sua visão tipicamente medieval de cristandade, deve-se buscar a comunicação e a vivência
de um evangelho que consiga se contextualizar sem mudar a essência da sua mensagem,
ainda que se reconheça a dificuldade da execução objetiva desta proposição. As
manifestações do evangelho devem respeitar cada cultura, pois tendo sensibilidade e
alteridade, o missionário cristão haverá de reconhecer que em alguns aspectos, o povo ao
qual se destina vivência melhor do que o próprio missionário e a sua cultura de origem
algumas das propostas evangélicas.
Quanto ao diálogo inter-religioso, deve-se implementá-lo numa sincera busca de
efetiva comunicação, especialmente neste mundo contemporâneo, onde as informações
104
Porém em nada considero a vida preciosa para mim mesmo, contanto que
complete a minha carreira e o ministério que recebi do Senhor Jesus para
testemunhar o evangelho da graça de Deus. [...] esforçando-me, deste
modo, por pregar o evangelho, não onde Cristo já fora anunciado, para
não edificar sobre fundamento alheio; antes como está escrito: Hão de
vê-lo aqueles que não tiveram notícia dele, e compreendê-lo os que nada
tinham ouvido a seu respeito. (Bíblia Sagrada, 1993, p. 116).
Além do que já foi aqui demonstrado, fica como proposta para futuras pesquisas
também, a demonstração de como a missiologia luliana antecipou muitos princípios
considerados modernos pela missiologia e de que maneira ela pode ser útil e deve ser
avaliada pela Igreja cristã contemporânea. Encerram-se aqui estas considerações finais
com uma consciência de que embora tenha sido almejada a excelência na presente
pesquisa, a sua redação ficou distante do pretendido, ainda que também se tenha buscado
expressar uma outra consciência, reflexo da que havia no próprio Raimundo Lúlio, que era
a da responsabilidade missionária cristã frente aos povos não cristãos, tal visão pode ser
bem expressa nessa última citação, através das seguintes palavras do teólogo reformado
holandês Johannes Blauw: “De acôrdo com esta idéia cristã dos primeiros tempos, a Igreja
deve proclamar o Evangelho ao ‘mundo todo em cada geração’” (Blauw, 1966, p. 107).
108
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA4
4
As referências bibliográficas estão em três partes: a primeira com as obras impressas citadas nesta
pesquisa; a segunda com as obras obtidas em meios eletrônicos: normalmente artigos de sites temáticos da
internet; e a terceira com os outros que não foram autores ou editores das obras citadas na primeira parte,
mas sim colaboradores em prefácios, apresentações, capítulos editados e outras porções usadas nas citações
desta pesquisa.
109
ZWEMER, S. Raimundo Lulio: primer misionero cristiano entre los musulmanes. Grand
Rapids: Subcomision Literatura Cristiana, 1977.
LÚLIO, R. Vida Coetânea (1311). Site do prof. Dr. Ricardo da Costa (tradutor deste
artigo). Internet. Disponível em: http://www.ricardocosta.com/univ/vita.htm.
Acessado às 14:30h do dia 09 de junho de 2010.
SPORTV. Reportagem em áudio-visual. Internet: postado no 2º semestre de 2009.
Disponível em: http://vídeo.globo.com/Videos/Player/Esportes/0,,GIM1054319-
7824-FLAMENGO+E+CORINTHIANS+FARAO+AMISTOSO+NA+
PALESTINA,00. Acessado às 10:15h do dia 01 de dezembro de 2009.
_______. In: Willian Taylor (org.). Missiologia global para o século XXI: a consulta de
Foz do Iguaçu. Londrina: Descoberta, 2001.
FERNANDO, A. In: Willian Taylor (org.). Missiologia global para o século XXI: a
consulta de Foz do Iguaçu. Londrina: Descoberta, 2001.
GASCA, C. In: Federico Bertuzzi (ed.). Rios no deserto. São Paulo: Sepal, 1993.
HESSELGRAVE, D. In: Ralph Winter e Steven Hawthorne. (orgs.). Missões
transculturais, volume 3: uma perspectiva cultural. Mundo Cristão, 1987b.
HIEBERT, P. In: Willian Taylor (org.). Missiologia global para o século XXI: a consulta
de Foz do Iguaçu. Londrina: Descoberta, 2001.
JAULENT, E. In: Raimundo Lúlio. Escritos antiaverroístas (1309-1311). Porto Alegre:
EDIPUCRS, 2001a.
_______. In: Raimundo Lúlio. Félix, o livro das maravilhas, parte 1. São Paulo: Escala,
2009.
_______. In: Raimundo Lúlio. Livro das bestas. São Paulo: Escala, 2006.
_______. In: Raimundo Lúlio. Livro do amigo e do amado. São Paulo: Loyola, 1989.
_______. In: Raimundo Lúlio. O livro do gentio e dos três sábios. Petrópolis: Vozes,
2001b.
MMM. In: Federico Bertuzzi (ed.). Rios no deserto. São Paulo: Sepal, 1993.
NUNES, R. In: Raimundo Lúlio. Livro do amigo e do amado. São Paulo: Loyola, 1989.
REBOIRAS, F. In: Raimundo Lúlio. Raimundo Lúlio e as cruzadas. Rio de Janeiro:
Sétimo Selo, 2009.
RUBIÓ, J. In: Alexander Fidora e José Higuera. Ramon Llull: caballero de la fe.
Pamplona: Anuario Filosófico, 2001.
SILVEIRA, S. In: Raimundo Lúlio. Raimundo Lúlio e as cruzadas. Rio de Janeiro: Sétimo
Selo, 2009.
SPEER, R. In: Samuel Zwemer. Raimundo Lulio: primer misionero cristiano entre los
musulmanes. Grand Rapids: Subcomision Literatura Cristiana, 1977.
URBINA, P. In: Santiago Mata. El hombre que demostró el cristianismo. Madrid: RIALP,
2006.
VNN. In: Federico Bertuzzi (ed.). Rios no deserto. São Paulo: Sepal, 1993.
WRIGHT, C. In: Willian Taylor (org.). Missiologia global para o século XXI: a consulta
de Foz do Iguaçu. Londrina: Descoberta, 2001.
YOUSSEF, M. In: Ralph Winter e Steven Hawthorne (orgs.). Missões transculturais,
volume 4: uma perspectiva estratégica. Mundo Cristão, 1987c.
114
ZALUAR, A. In: Ruth Cardoso (org.). A aventura antropológica. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1986.
ZWEMER, S. In: Ralph Winter e Steven Hawthorne. (orgs.). Missões transculturais,
volume 2: uma perspectiva histórica. Mundo Cristão, 1987.
Livros Grátis
( http://www.livrosgratis.com.br )