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31/07/2019 O Brasil e o Universo: Com Quem Falam os Terroristas?

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O Brasil e o Universo
Crônicas sobre a surrealidade política e cultural brasileira.

s e xta-fe ira, 22 de agos to de 2014 Quem sou eu

Flávio Gordon
Com Quem Falam os Terroristas? Rio de Janeiro, RJ, Brazil
Doutor em Antropologia
Social (UFRJ), baixista
amador, carioca, rubro-
negro, 38 anos, casado.
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► 2015 (3)

▼ 2014 (9)

► Dezembro (1)

► Setembro (1)

Um vídeo chocante tem circulado nos portais de notícias e nas redes sociais esta ▼ Agosto (1)

semana. Ele mostra, em cores terrivelmente vivas, a decapitação do jornalista Com Quem Falam os Terroristas?
americano James Wright Foley, obra do grupo terrorista Estado Islâmico. Divulgado
pelos terroristas no dia 19 de agosto, o vídeo trazia um texto com dizeres ► Julho (1)

antiamericanos, e veiculava a seguinte mensagem, expressa na voz da própria
vítima: “Chamo meus amigos, família e entes queridos a erguer-se contra meus ► M aio (1)

verdadeiros matadores, o governo dos EUA. Porque o que vai acontecer ► Abril (3)

comigo é apenas o resultado de sua complacência e criminalidade”[1].
► Janeiro (1)

Segundo consta, Foley acreditava realmente no que dizia[2]. ► 2013 (8)


Quem estuda ou se interessa pelo terrorismo contemporâneo certamente está ► 2012 (5)

habituado com esse modus operandi, em que se repete uma modorrenta ladainha: ► 2011 (14)

a culpa por aqueles atos cruéis é dos EUA (ou de qualquer outro bode-expiatório a
gosto do freguês: Israel, o “Sistema”, eventualmente o Ocidente como um todo). ► 2010 (8)

A brutal espetacularização da morte de Foley é uma reedição fiel de casos


anteriores. Recorde-se, por exemplo, do empresário Nick Berg, americano de Marc adores
origem judia decapitado por militantes islâmicos no Iraque, em 2004. As imagens
rené girard
também foram divulgadas na internet pelos assassinos. Numa declaração com
equivalente teor de cinismo, o terrorista Abou Rachid, um dos autores da barbárie,
lançava sobre os EUA a culpa pelo que estava fazendo. Na época, a jornalista Sara
Daniel, do Nouvel Observateur, fez a reportagem: Denunciar abuso

“Enquanto Abou Rachid explica seu ‘dever de matar’, rememoram-se os urros


O Brasil e o Universo
bestiais de Nick Berg, o refém americano que agoniza enquanto os carrascos
investem laboriosamente contra seu corpo contorcido: ‘Vocês sabem, sentimos um Flavio Gordon
grande prazer quando decapitamos alguém’, empenha-se em nos comunicar, em
inglês, um dos homens sentados à direita do emir... ‘Nossa intenção ao seqüestrar
alguém não é amedrontar os reféns’, corrige ele, ‘mas sim exercer pressão sobre
Criar seu atalho
os países que ajudam ou se oferecem para ajudar os americanos. Em que pensam
quando visitam um país ocupado?... Decapitar não é uma coisa boa, mas um
método que funciona. No decorrer dos combates, os americanos tremem de medo. Total de visualizaç ões de página
Vejam a reação correta que tiveram as Filipinas. Graças à atitude deles, pudemos
liberar nosso refém e demonstrar ao mundo que também amamos a paz e a
clemência... Aliás, eu mesmo tentei negociar a troca de Nick Berg por alguns
prisioneiros. Foram os americanos que recusaram. São eles os verdadeiros
responsáveis por sua morte’”[3]. 2 1 0 8 0 7
Qual é a lógica de tal raciocínio? Seria apenas expressão irracional de mentes
“atrasadas”, como quer crer boa parte da opinião publicada? Ou, ao contrário, Minha lista de blogs
haveria um sofisticado know how de propaganda a embasar a prática e o discurso
dos terroristas, que revelariam, destarte, possuir um notável conhecimento da Amurtah
audiência ocidental para a qual se dirigem? Arte greco-budista XXI
Há 2 meses

Eu aposto toda a minha coleção de cachimbos na segunda hipótese. E explico. Augusto Nunes | VEJA.com
#SanatórioGeral: Neurônio abandonado
Para se compreender a lógica do terror, é preciso, antes de tudo, abandonar todo o Há uma hora
imaginário iluminista e o seu pendor para a exotização. Nada mais equivocado, por
exemplo, do que a opinião corrente, veiculada em matérias jornalísticas e textos de Bios Theoretikos
opinião, segundo a qual os terroristas seriam um bando de criaturas primitivas, "Impressão: nascer do sol", de Claude
egressas da Idade da Pedra, cegas e brutalizadas por concepções de mundo Monet
“medievais” (adjetivo usado pejorativamente por dez entre dez jornalistas Há 7 anos
contemporâneos).
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31/07/2019 O Brasil e o Universo: Com Quem Falam os Terroristas?
Blog do Angueth
De antemão, cabe lembrar que boa parte dos terroristas islâmicos é oriunda de São José, rogai por nós!
famílias de classe média alta, educada e intelectualizada. Muitos deles estudaram Há 4 meses
nas melhores universidades do Ocidente, como Harvard e Oxford. Muitos, além
Blog do Pim
disso, demonstram um completo desinteresse pela tradição corânica[4].
O Blog do Pim agora está na VEJA.
Historicamente, os terroristas não fazem parte de uma massa carente, ignorante, Acompanhe lá, todos os dias!
oprimida e miserável. Muito pelo contrário, os “guerreiros suicidas” empenhados na Há 5 anos
jihad foram educados profissional e intelectualmente no mundo globalizado.
Dominando os códigos intrínsecos ao ambiente cultural e universitário do Ocidente Cenas de Paris
moderno, é provável que muitos deles viessem a desfrutar de um futuro próspero Mais sobre a exposição Jacques Tati
caso não houvessem optado pelo terrorismo. Portanto, vislumbrar no Há 10 anos
fundamentalismo islâmico um fenômeno exótico, arcaico ou, em suma, pré-
Cesar Gordon
moderno, é um erro crasso, ainda que comum.
A floresta por quem vê o invisível
Há 11 anos
Conforme têm mostrado alguns estudiosos do terrorismo contemporâneo – como
André Glucksmann[5], John Gray[6], Paul Berman[7], Barry Cooper[8], entre outros Ciência Brasil
–, o movimento jihadista, antes que conseqüência direta de alguma espécie de Professores de matemática de
“mentalidade primitiva”, é precisamente o contrário: um subproduto da modernidade Ugandópolis (Brasil) fazem com que as
ocidental, do Iluminismo e do Romantismo[9]. crianças odeiem contas. Resultado: é um
desastre o que o povo sabe de
Organizações como a al-Qaeda e o Estado Islâmico são atores globais (e não matemática.
Há 3 anos
‘tribais’) que, à semelhança do anarquismo e niilismo russos do século XIX (tão
bem descritos por Dostoiévski em Os Demônios), ou dos totalitarismos europeus Construindo o pensamento
do século XX (notadamente, comunismo e nazismo), enxergam o terror como
método legítimo para instaurar uma nova ordem e um “novo homem”. O "Terceiro Contra Impugnantes
Reich" dos nazistas, a “sociedade sem classes” dos comunistas e o "califado Compra do livro "COSMOGONIA DA
universal" dos jihadistas fazem parte, mutatis mutandis, de uma mesma tradição DESORDEM"
revolucionária. O terrorismo islâmico, portanto, procede essencialmente daquele Há um ano
tipo de experiência existencial que gerou os movimentos revolucionários ocidentais,
Diogo Mainardi - VEJA.com
fenômeno moderno surgido na decadente Rússia czarista. Como diz John Gray:
“Se Osama Bin Laden tem um precursor, este é Sergei Nechaev, o terrorista russo Diplomatizzando
do século dezenove”[10]. Julho: mês de férias, mês de leituras:
PRAlmeida em Academia.edu
Ao atribuir a culpa de seus atos abomináveis aos EUA, os terroristas sabem, pois, Há 16 horas
com quem estão falando. Sabem que encontrarão ouvidos sensíveis a essa
mensagem que justifica a violência mediante a auto-vitimização. Grupos como o Escrevo, sim!
Estado Islâmico, a al-Qaeda ou o Hamas sempre souberam muito bem explorar a O Grande Buda!
“culpa coletiva” ocidental. Afinal de contas, a idéia de lançar o fardo de todos os Há 8 anos
males do mundo sobre as costas dos EUA não é algo novo. Ao contrário, essa Eu gosto de Agatha Christie
mesmíssima mensagem é constantemente vocalizada por um sem-número de Há 6 anos
bien-pensants no Ocidente.
Frases do Calvin
Basta lembrar dos atentados de 11 de setembro. À época, o conceituado lingüista Calvin & Haroldo & Star Wars - Uma
Noam Chomsky, um dos intelectuais públicos mais influentes do mundo, qualificou Homenagem Estrelar!
os EUA de “Estado terrorista”[11]. A tese de Chomsky era a seguinte: os ataques Há 3 anos
terroristas representavam uma resposta dos povos oprimidos do Terceiro Mundo
aos séculos de exploração e expansionismo norte-americano. Os EUA, antes que Fusca Brasil
Golpe no Recesso
vítimas, eram, em última instância, os verdadeiros responsáveis pelos Há 5 dias
atentados. Soa familiar, não?
Necromanteion
A posição de Chomsky foi corroborada por outros intelectuais, e amplificada dentro Marsilio Ficino e a natureza das virtudes
e fora do universo acadêmico. Segundo tal visão, os terroristas da al-Qaeda haviam Há uma semana
sido irremediavelmente atraídos para o campo magnético do WTC – símbolo do
poderio econômico norte-americano –, não tendo outra alternativa que não a de se O bico do tentilhão
explodir contra milhares de inocentes. Os terroristas estariam expressando um OliverTalk: Estudar Sócrates em 2019? Ele
nem tem diploma!
instinto de liberdade, instinto demasiado humano que, sob condições de opressão,
Há 5 dias
tende a se mostrar exasperado e, eventualmente, violento. Já os EUA, o país
agredido, sendo inexorável e aprioristicamente culpado no tribunal da História, O GLOBO » Blogs » Blog do Noblat
deveria absorver o golpe com humildade e resignação. Como notou o analista Quem diz que o amor é falso, por Luiz Vaz
político Frédéric Encel acerca desse estilo de interpretação, “é como se os de Camões
trabalhadores no World Trade Center e os passageiros dos aviões seqüestrados Há 4 anos
encarnassem o mal da América, tendo que expiar a culpa pelo culto do rei dólar, o
destino dos Apaches, o McDonald’s...”[12] O GLOBO » Blogs » Lucia Hippolito

Obamatório
A mensagem era clara, ainda que odiosa quando dita com todas as letras: os EUA
E se eles não tivessem conseguido?
pediram aquilo. Enquanto a maior parte da intelligentsia ocidental evitou dizer o que Há uma semana
pensava de maneira assim tão direta, houve intelectuais que não se fizeram de
rogado. O filósofo Jean Baudrillard escreveu: Odilon de Oliveira

“Olhando de perto, pode-se dizer que eles o fizeram, mas nós o desejamos... Olavo de Carvalho - Sapientiam
Quando o poder global monopoliza a situação a este nível, quando há tamanha Autem Non Vincit Malitia
condensação de todas as funções na maquinaria tecnocrática, e quando nenhuma
forma alternativa de pensamento é permitida, que outro caminho há senão uma Professor Paulo Moura
guinada situacional terrorista? Foi o próprio sistema que criou as condições
Reinaldo Azevedo - Blog - VEJA.com
objetivas para essa brutal retaliação” (grifos meus)[13].
MEU ÚLTIMO POST NA VEJA
Há 2 anos
No Brasil – justamente o país cuja elite política e intelectual achou por bem dar
abrigo ao terrorista italiano Cesare Battisti –, não é de surpreender a presença de Revista Vila Nova
intelectuais defendendo abertamente a lógica do terror como meio político aceitável.
Recorde-se, por exemplo, de um artigo de Vladimir Safatle, intitulado The United States and the New
significativamente “Invenção do terror que emancipa”, no qual o professor da USP, World Order
resenhando uma coletânea organizada por Slavoj Zizek (outro notório entusiasta da INDEX/ÍNDICE
"violência revolucionária"), descreve terroristas de uma maneira assaz peculiar: Há 7 anos
“sujeitos não-substanciais que tendem a se manifestar como pura potência
Verde: a cor nova do comunismo
disruptiva e negativa”[14]. O cerne do argumento é que o rótulo “terrorismo” é, na
Ideólogo ‘verde’ condena homem como
verdade, um juízo moralista e reacionário sobre práticas revolucionárias inerentes à 'assassino serial' da Criação (sic!)
história política moderna. Há 3 dias

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31/07/2019 O Brasil e o Universo: Com Quem Falam os Terroristas?
Por ocasião do 11 de setembro, em artigo publicado no Correio Braziliense, Safatle Seguidores
já seguira mais ou menos a linha de Baudrillard: “Verdade seja dita: a terça-feira
negra mostrou como a ação política mais adequada para a nossa época é o Seguidores (35) Próxima
terrorismo. Ele é o que resta quando reduzimos a dimensão do conflito social à
lógica do espetáculo”[15].
A razão e o título deste blog
Nota-se que esses intelectuais são unânimes em tratar o terrorismo como reação, Este blog nasceu da constatação de
ou retaliação, a uma agressão anterior. Antes que ação motivada política e que o Brasil, alinhado com outros países da
ideologicamente, o terrorismo seria equivalente à agressividade reativa de uma fera América Latina, vem numa escalada vigorosa
acuada. Sendo os EUA ou o Ocidente os “verdadeiros” agentes do terrorismo, rumo ao totalitarismo. É possível perceber,
análises como as de Chomsky, Baudrillard e Safatle acabam por equiparar os nas mais diferentes esferas, indícios de que
terroristas e as vítimas, ambos passivamente sujeitos à atuação de um ator estamos próximos – se é que já não
histórico que, de fora e acima, os determina igualmente. Diante do algoz abstrato e chegamos lá – de viver em pleno 1984, de
categorial, as vítimas concretas (os mortos pelo terror) e os agressores concretos George Orwell. Orwell, aliás, foi um dos
(os terroristas do Estado Islâmico, por exemplo) são todos, de direito, igualados na primeiros a perceber que toda revolução
condição de pacientes históricos. Diante do “fato” primeiro da opressão, o totalitária é precedida por uma revolução
terrorismo torna-se praticamente um imperativo categórico, ou, nas palavras de semântica, e esse é um dos temas centrais
Safatle, “a ação política mais adequada para a nossa época”. do presente blog.

Ocorre que o terrorismo não precisa de razões, senão apenas de pretextos. Como Creio que o Brasil está passando por
escreveu o filósofo político André Glucksmann, “o ódio precede e predetermina o um processo de deturpação da linguagem
objeto que fabrica para si mesmo”[16]. É o que explica o também filósofo político pública, especialmente política. Tal
Barry Cooper: “O terror, em especial, não é um meio de enfrentar uma oposição, deturpação cria uma camada semântica
mas de criá-la (…) Tem de haver um cálculo, uma justificação, para toda a protetora, bloqueando o acesso à realidade,
matança, uma narrativa que crie inimigos ‘objetivos’ cuja existência e subseqüente e impossibilitando sua correta expressão. É
extinção mantenha o aparato homicida em movimento. Esse cálculo e essa como se tivéssemos passado ao largo das
justificação é o que [Hannah]Arendt chama de ‘ideologia'" (grifos meus)[17]. bases fundamentais do pensamento
ocidental, ignorando a criação da filosofia e
Pode-se dizer que, em se tratando de compreender o terrorismo, a razão da ciência política por Sócrates, Platão e
intelligentsia tem certa desvantagem em face da razão do senso comum, pois, Aristóteles. Como se estes pensadores
diferente desta, aquela se vê impedida – graças ao paradigma positivista que esteve nunca tivessem existido para além de
na origem da constituição das ciências humanas em disciplinas acadêmicas – de pequenos círculos de estudiosos, o Brasil
fazer uso de uma distinção moral absoluta entre bem e mal. Cito Cooper mais uma parece ter adotado o paradigma sofista,
vez: “Para a maioria dos americanos comuns, e, de fato, para a maioria dos seres onde a retórica e o consenso público -
humanos, os atentados de 11 de setembro foram uma lembrança da diferença reforçado hoje pela "rebelião das massas",
entre o bem e o mal. Com efeito, no contexto do progressismo pós-moderno, eles no sentido de Ortega y Gasset - eram mais
foram uma forçosa lembrança de que tal diferença existe. Os eventos daquele importantes do que a verdade. Como dizia
dia não estavam e não estão completamente abertos a interpretações e outro autor que admiro muito, o filósofo
julgamentos, não foram e não são completamente relativos ou simples matéria de político Eric Voegelin, o totalitarismo é
opinião. Quando o presidente Bush referiu-se aos terroristas como ‘praticantes do menos um fenômeno político e mais um
mal’ [evil-doers], isso não era apenas uma cartada retórica, mas uma descrição fenômeno pneumopatológico, ou seja, uma
correta do que, em árabe, poder-se-ia traduzir diretamente como mufsidoon. Ao doença do espírito. Ele começa na mente
mesmo tempo, entretanto, é insuficiente para a ciência política expressar apenas doentia de alguns guias espirituais e líderes
choque e raiva. A indignação de um cidadão e a demanda por justiça ou retaliação é políticos e, daí, quando não encontra uma
perfeitamente inteligível: a maioria das pessoas sabe quem são os caras maus, e reação firme e pronta, se espalha para toda
por que eles são maus. É tão auto-evidente quanto poderia ser que os terroristas a sociedade. Como mostrou Voegelin no
eram e permanecem sendo fanáticos religiosos e assassinos. É daí que todos, magistral “Hitler e os Alemães”, isso foi o
cidadãos e cientistas políticos, devem partir” (grifos meus)[18]. que aconteceu na Alemanha, por exemplo,
permitindo a ascensão do nazismo. A
A posição de Cooper pode parecer estranha à primeira vista. Isso se dá porque ela sociedade alemã, na época, não teve a
está longe de ser dominante entre intelectuais e formadores de opinião. Estes, coragem de perceber a extensão do
normalmente, quando convidados por veículos de imprensa a falar sobre problema, nem tampouco possuía meios de
terrorismo, procuram contrariar – alguns até corrigir – a percepção espontânea do descrevê-lo corretamente. Mutatis
senso comum sobre o fenômeno. Dessa decisão resultam os muitos Mutandis, creio que algo semelhante ocorre
malabarismos retóricos e analíticos como os de Chomsky, Baudrillard e Safatle. no Brasil. Os grandes responsáveis por isso
Para esses autores, a hipótese de que terroristas sejam pura e simplesmente são, a meu ver, os formadores de opinião:
maus é considerada simplista, por suposto. No entanto, desprezando, por assim imprensa, comentaristas políticos, artistas,
dizer, esta moralidade maniqueísta do senso comum, os intelectuais acabam intelectuais.
reforçando a ideologia subjacente ao terror, ao procurar uma causa supostamente
mais “objetiva” que a simples maldade e o desejo de destruição. Para Chomsky, O fato é que a sociedade brasileira
Baudrillard, Safatle e muitos outros intelectuais no Ocidente, os terroristas está cada vez mais suscetível a todo tipo de
possuem, de fato e de direito, um inimigo objetivo: a sociedade capitalista ocidental. totalitarismo, e o domínio que o atual
Nisso, parecem estar de pleno acordo com os fundamentalistas islâmicos. Contra governo exerce sobre diversos domínios
uma lógica “simplista” e “preto-no-branco” (“Fla-Flu” é, hoje, um termo em voga nas sociais - chegando mesmo a impor um
redes sociais), propõem-se análises que, sem dúvida mais complexas e quadro de referências e linguagem permitido
sofisticadas, acabam sendo, todavia, menos realistas. Eis um bom exemplo de - é um claro sinal. Este blog pretende reunir
quando a complexidade funciona como abrigo da ideologia. “A ideologia busca amostras que nos ajudem a compreender
explicar o sentido oculto dos eventos, um sentido nunca acessível ao senso comum como o Brasil e o Universo puderam se
(...) Para o ideólogo, as coisas nunca são o que parecem”[19]. distanciar tanto...

Ideólogos extremistas como os assassinos de Nick Berg e James Wright Foley são
a prova viva disso. Nos vídeos, vemo-los tentando convencer a opinião pública de V ídeos interessantes
que aquilo que se passa à vista de todos é, na verdade, uma espécie de ilusão de
ótica. Mesmo estando com a faca e o pescoço das vítimas nas mãos, os Como a URSS contribuiu para a ascensão
assassinos não são eles – como todos poderiam estar imaginando –, mas os EUA. do Nazismo
Esses terroristas dizem a sério aquilo que Groucho Marx dissera brincando: “Afinal, Vídeo-propaganda do 3º Congresso
vocês vão acreditar em mim ou nos seus próprios olhos?”. Nacional do PT: "Socialismo Petista"

É lamentável constatar que, com a contribuição de intelectuais-ideólogos tais como


Chomsky, Baudrillard e Safatle, uma parcela considerável do Ocidente tenha optado Página inicial Pesquisar este blog
por acreditar nos terroristas, em detrimento do que vêem os próprios olhos.
Pesquisar

[1] Link: http://www.gazetadopovo.com.br/mundo/conteudo.phtml?id=1492488.

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[2] Link: http://www.frontpagemag.com/2014/dgreenfield/james-foley-went-looking-to-support-
terrorists-in-syria-instead-they-cut-off-his-head/#.U_QH-MkUYLs.facebook
[3] Ver: “Yo lo decapité”. Nouvel Observateur, 5-11 de agosto de 2004. Disponível em:
http://www.sara-daniel.com/reportage.php?page=96
[4] Ver: COOPER, Barry. 2004. New political religions, or, An analysis of modern terrorism
(Eric Voegelin Institute Series in Political Philosophy). Columbia & London: University of
Missouri Press. p. 20.
[5] Ver GLUCKSMANN, André. 2002. Dostoïevsk i à Manhattan. Paris: Robert Laffont. E
também GLUCKSMANN, André. 2004[2007]. O Discurso do Ódio. Rio de Janeiro: Difel.
[6] Ver: GRAY, John. 2003. Al Qaeda and What it Means to Be Modern. New York & London:
The New Press.
[7] Ver: BERMAN, Paul. 2004. Terror and Liberalism. New York & London: W. W. Norton &
Company.
[8] Op. Cit.
[9] Diz Cooper: “As semelhanças estruturais entre movimentos que, de resto, pouco têm em
comum, sugerem que o terrorismo contemporâneo nada mais é que uma espécie de
sectarismo revolucionário, ideológico e moderno (...) [Tais movimentos] são associados a
expressões de um tipo específico de experiência espiritual que, em seu aspecto mais
significativo, independe das tradições e símbolos religiosos através dos quais se
expressa (Cooper Op.Cit. p.14 – grifos meus).
[10] Ver: GRAY. Op. Cit. p. 21.
[11] Ver: CHOMSKY, Noam. 2001. 9/11. New York: Open Media/Seven Stories Press.
[12] Citado por BERMAN. Op. Cit. p. 203.
[13] Ver: BAUDRILLARD, Jean. 2002. The Spirit of Terrorism. London: Verso. pp. 5-6.
[14] Link: http://cultura.estadao.com.br/noticias/artes,invencao-do-terror-que-
emancipa,305355.
[15] Link: www.geocities.ws/vladimirsafatle/vladi031.htm
[16] Ver: GLUCKSMANN (2004[2007]). p. 140.
[17] Ver: COOPER. Op. Cit. p. 12.
[18] Ver: COOPER. Op. Cit. p. 3.
[19] Ver: COOPER. Op. Cit. p. 13.

às agosto 22, 2014

Um comentário:

Anônimo 24 de agosto de 2014 18:50


Flávio muito boa sua análise, inclusive nestes últimos dias eu havia me interessado pelo
tema no tocante às origens históricas dessa nova "modalidade" de guerra cultural. Neste
sentido seu texto foi bastante esclarecedor! Parabéns!
Responder

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