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Transcrição

ELÍDIA: É… Do homem com outra mulher, da mulher com outro homem, da mulher
com a mulher. Do homem contra o homem. Né isso? Que se torna nulo. Aí...

PADRE: Olá, Breno.

BRENO: Olá.

PADRE: Tudo bem?

ELÍDIA: E quando é um homem com outro homem?

PADRE: Não, Elídia. Nem tem isso não.

ELÍDIA: Senta aí, Breno.

PADRE: Não tem isso não.

ELÍDIA: Não tem isso não o quê?

PADRE: Não

ELÍDIA: Breno me contou que manteve relações sexuais com o senhor.

PADRE: Não, mas no seu casamento não. De jeito nenhum. Se ele que disse isso, ele
mentiu. No seu casamento não teve.

ELÍDIA: Não, durante o meu casamento não teve. Ele me disse isso. Mas antes do meu
casamento teve.

PADRE: Mas aí foi uma fraqueza. Nós nos confessamos e prometemos que não ia ter
mais, em respeito até a você. E foi essa a palavra que ele usou. Em respeito a
Elídia.

ELÍDIA: E mesmo assim o senhor celebrou nosso casamento. Tes-te-munhou.

PADRE: Ele já tinha confessado. Já tinha pedido perdão. E já tinha prometido que não
ia ter mais.

ELÍDIA: Mesmo se insinuando depois de casado.


PADRE: Não. Depois de casado não.

ELÍDIA: Então cê tá mentindo, Breno?

PADRE: Não, depois de casado não. Você mesmo me disse depois de casado que não
queria, por respeito a Elídia. Não foi?

BRENO: Tô falando dos abraços.

PADRE: Não, mas abraço eu dou em todo mundo. Abraço eu dou em todo mundo.
Não dou em você também?! Abraço eu dou em todo mundo. Mas não venha
com essa história não, que é mentira. É mentira. Cê sabe. (pausa) De jeito
nenhum.

ELÍDIA: E mesmo o senhor sabendo… Que namorava… Que ia casar… Dez dias antes
de casar…

PADRE: Foi dez dias, Breno? Foi não!

BRENO: Foi dia 2 de julho.

ELÍDIA: E a gente casou no dia 14.

PADRE: Foi não, Breno. Foi não. Foi não, Breno. Você tá confuso. Foi não.

BRENO: Depois de uma missa de dia dois.

PADRE: Foi não, Breno. Foi não. De jeito nenhum. Tenho certeza. (bate na mesa) Foi
bem antes. (estala os dedos) Vou lhe dizer quando foi! Foi quando ele foi
dormir lá em casa. No dia… (estala os dedos) Naquele tempo que vocês
dormiam lá em casa.

ELÍDIA: Uma vez só…

PADRE: Não, não foi uma vez só não.

ELÍDIA: Foi quantas vezes então?

PADRE: Acho que duas ou três.

ELÍDIA: Não tá batendo as histórias…

PADRE: Mas eu não posso dizer o que não foi… Tenho certeza.
ELÍDIA: Não tá batendo…

PADRE: Ele foi por respeito a você.

ELÍDIA: Não. Respeito não houve.

PADRE: Houve… Quando a fraqueza aconteceu, não houve. Mas depois, houve.

ELÍDIA: Então respeito não houve.

PADRE: A gente se confessou. Inclusive… Eu não sei com quem ele se confessou, mas
eu… Eu orientei que não podia se confessar comigo. Não foi assim, Breno?!
Foi assim ou não foi?

BRENO: Foi.

PADRE: Foi, né?! E dali em diante, houve um compromisso de não ter. E não teve.

ELÍDIA: Então me conte aí porque eu quero saber dessas disparidades de conversas.

BRENO: Aconteceu várias vezes, durante mais de um ano.

PADRE: Não, Breno. Não foi assim também não.

BRENO: Foi de março de 2010 a julho de 2012.

PADRE: Não, Breno. Foi não, Breno. Foi não. Foi não.

ELÍDIA: Não, porque… Eu entendo como relação sexual não só a questão da


penetração, né?! Não só a questão de vocês… Ficarem… Se masturbando, por
exemplo. Essas coisas assim… Né? De ficar um fazendo sexo anal no outro.

PADRE: Não, mas não teve… Eu acho que não teve isso não. Teve, Breno?

ELÍDIA: Teve, Breno?

BRENO: Duas vezes.

PADRE: Sexo anal, Breno?

BRENO: Duas vezes.


ELÍDIA: E sexo oral, teve?

BRENO: Sim.

PADRE: Teve. Teve. Não vou mentir pra você. Oral teve, mas anal não teve não.

ELÍDIA: Anal não teve ou teve?

BRENO: Eu me lembro de duas vezes.

PADRE: Eu não me recordo de nenhuma vez. E digo a você: foi uma grande fraqueza.
E depois a gente foi se confessar. E nos tornamos amigos, pra evitar.

ELÍDIA: Tá bem difícil. Tá bem difícil essa conversa.

PADRE: Por que, Elídia?

ELÍDIA: Porque ele diz uma coisa... Breno diz que foi pelo menos umas 20 vezes.

PADRE: Não, Breno.

ELÍDIA: De 2010 a 2012.

BRENO: De 2010 a 2012.

PADRE: Foi não.

ELÍDIA: Carícia… Prazer… Seja lá o nome que vocês quiserem dar.

BRENO: De fato, teve muito tempo que não aconteceu nada.

PADRE: Pois é. Mas não foi assim.

BRENO: Teve muito tempo que não aconteceu nada.

ELÍDIA: Carícia e beijo? Beijo… Rolou beijo?

BRENO: Sim.

PADRE: Eu acho que sim, Elídia.

ELÍDIA: Tá ótimo…
ELÍDIA: Não fale como se isso fosse uma coisa normal não, Padre Júlio.

PADRE: Eu não tô dizendo… Eu disse que foi normal, Elídia? Eu disse que foi uma
fraqueza grande. E que eu precisei me confessar pra poder continuar aqui
dentro…

ELÍDIA: E ainda assim o senhor aceitou testemunhar o nosso casamento.

PADRE: Mas Elídia, eu tenho maior carinho por você e por Breno.

ELÍDIA: Tem não, Padre Júlio.

PADRE: Tenho.

ELÍDIA: Pode ter carinho por Breno.

PADRE: Tenho.

ELÍDIA: Não, não, não, Padre Júlio.

PADRE: Minha amiga, se eu não tivesse carinho por você, eu não lhe respeitava como
eu lhe respeito.

ELÍDIA: Padre Júlio, o senhor transou com o meu noivo.

PADRE: Fale baixo.

ELÍDIA: Falar baixo?! Falar baixo, meu senhor?! Pelo amor de Deus. Não, olhe… Padre
Júlio, eu não sou de fazer escândalo não. Eu acho que o senhor me conhece.
Eu não sou de fazer escândalo não. Não sou de fazer escândalo. Deu vontade
de contar, assim?! Brah! Pra todo mundo?! Óbvio. Óbvio. Que eu sou
humana. Mas o senhor me vem dizer que transou com o então meu
namorado, depois o meu então noivo, e vem o senhor me dizer que me
respeita? Pelo amor de deus! Pelo amor de Deus!

PADRE: Eu lhe repito: foi uma grande fraqueza da qual eu me arrependi muito. Deus
é testemunha! Eu sei que não é normal. Eu sei que não deveria ter acontecido.
Fiz de tudo pra me converter. Tudo. Tudo. Tanto que se ele fosse sério, ele vai
dizer. Depois que vocês casaram, nenhuma vez.
ELÍDIA: Eu perguntei. Eu perguntei. É claro que eu perguntei. Claro que eu quis
saber tudo. De todos os detalhes sórdidos, inclusive. De todos os realizados.
De todas as vezes que eu liguei e perguntei. De todas as vezes que eu vi o
senhor chamando ele pra dormir lá.

PADRE: Sim, mas isso era uma coisa… Mas não era toda vida que ele ia dormir lá que
tinha não. Era, Breno?

ELÍDIA: Não, não era. Eu também sei disso. Também sei disso. Mas eu ainda não.. Eu
ainda não sei... Um me diz que foi diversas vezes. O outro me diz que foram
três vezes. E aí?! Em quem eu… Porque assim… Acreditar, acreditar em dois
mentirosos é difícil.

PADRE: Eu vou lhe dizer uma coisa: uma ouvinte é ruim do mesmo jeito. Agora eu
tenho certeza…

ELÍDIA: O senhor quer que eu chame mais pessoas pra ouvir?

PADRE: Não, meu amor. Eu só tô dizendo que eu tenho certeza que não foi essa
quantidade de vezes.

ELÍDIA: E aí, Breno?! Padre Júlio tá mentindo, ou é você que tá mentindo?

PADRE: Não, não é questão de mentira, Breno. Ou, Elídia. Não é questão de mentira
não.

ELÍDIA: Certo. Eu tô lhe perguntando… Eu já sei o que aconteceu. Eu já sei da orgia


que vocês fizeram.

PADRE: Não, orgia não, Elídia. Por favor. Vamos usar os termos mais tranquilos.

ELÍDIA: Padre Júlio… Padre Júlio… O senhor quer dizer, que o senhor como
sacerdote, mantendo relação sexual com um teoricamente fiel. Sabendo que
ele está namorando. Sabendo que ele está noivo. Sabendo que ele está prestes
a casar. O senhor como sacerdote. O senhor quer que eu ache uma palavra
mais amena do que orgia?!
PADRE: Não, Marília. Não é bem assim. Você sabe que orgia não é isso. Que foi
errado, foi. Que foi pecado grave, foi. Mas será que a gente não tem direito de
se converter? Eu busquei a conversão. Eu sou muito sincero, inclusive.

ELÍDIA: E nunca mais fez com ninguém.

PADRE: Não.

ELÍDIA: Então foi só com Breno?

PADRE: Não, não é que foi só com Breno.

ELÍDIA: Foram com outros também?

PADRE: Antes de Breno, pode ter tido outros… Mas depois de Breno, eu aprendi. Eu
aprendi.

ELÍDIA: Então pra eu dar…

PADRE: Com muito sofrimento, com muita dor…

ELÍDIA: Como com o senhor eu não posso, né?! Pra dar entrar na nulidade, eu vou
direto pro bispo.

PADRE: Não, cê pode dar entrada lá e pedir minha suspensão, não tem problema
nenhum. Agora eu não vejo motivo pra você fazer isso. Porque eu tenho
certeza que Breno não fez mais.

ELÍDIA: Hahahahahahay… Ai… Conte, Breno. Conte a novidade pra Padre Júlio.

BRENO: Fiz. Várias vezes. Eu não me confessava… (inaudível)

ELÍDIA: O senhor só não foi o escolhido. Um dos escolhidos. Conte.

PADRE: Faça isso não, Emília. Deixa ele tranquilo.

BRENO: Eu não me confessava com o senhor.

ELÍDIA: Padre Júlio, tranquilo?! Pra deixar ele tranquilo?! Dez anos me enganando?
Dez anos transando a torto e a direito… Permitindo que o senhor celebrasse o
meu casa– O meu pseudo casamento?
PADRE: Elídia…

ELÍDIA: Eu pensei que eu vim pra conversar, e nào pra rir.

PADRE: Não, Elídia, deixe eu lhe dizer.

ELÍDIA: Fale pra Padre Júlio.

BRENO: Eu já falei.

PADRE: Deixe eu lhe dizer. Antes do seu casamento, eu já tinha me confessado, e no


dia do seu casamento eu fiz questão de me confessar de novo. Justamente
porque eu queria que seu casamento fosse uma graça de Deus.

ELÍDIA: Não. Meu casamento não é válido.

PADRE: Não diga isso.

ELÍDIA: Não, não é.

PADRE: Não diga isso, Elídia.

ELÍDIA: Não é.

PADRE: Você tem o melhor marido do outro.

ELÍDIA: Haha! Conte, Breno. Por favor, conte. Pra que você não permita que outras
pessoas mintam mais. Porque eu também dizia isso. Eu também dizia isso.
Conte pra Padre Júlio o que é que você fez.

BRENO: Já contei.

ELÍDIA: Não, não contou não. Você não contou que ia pra banheiro, que transava
com qualquer um. Você não contou que ia pra cinema pornográfico. Você
não contou que ia procurar em sauna. Você não contou que não me
procurava, mas procurava homens. Conte. Agora tenha… Tenha decência de
olhar pras pessoas. Já que você não olha pra mim.

PADRE: Mas Elídia, será que não foi por causa da enfermidade?

ELÍDIA: Padre Júlio… A enfermidade foi consequência… Foi consequência… (respira


fundo, pausa longa) Eu até esqueci a palavra… Dessa perversão dele.
PADRE: Fale assim não…

ELÍDIA: Ai, ai… Você devia conversar mais com Padre Júlio, Breno. Aquela raiva toda
de Padre Júlio. De Padre Júlio não saber pedir desculpa. De sair gritando
disparate. De nunca pedir desculpas. De ser vaidoso ao extremo. Não sei nem
se ele sabe pronunciar essa palavra desculpa. Fica arrudiando quando quer
pedir desculpa quando sabe que fez merda. Fica arrudiando. (pausa longa)
Conte.

BRENO: Você já contou.

ELÍDIA: Por que? Você não tem coragem? Continua sendo covarde?

BRENO: Não. Aconteceram diversas vezes, como Elídia disse. Com vários homens. Eu
também me confessei várias vezes, mas aconteceu várias vezes.

ELÍDIA: Era tudo premeditado, que fazia ali já perto da catedral, pra se confessar. O
senhor também, Padre Júlio, era assim? Fazia e ia se confessar?

PADRE: Não. Eu lhe garanto com todas as letras que com Breno eu aprendi.

ELÍDIA: Hmpf…

PADRE: Cê pode até não acreditar, mas eu tenho Deus de testemunha…

ELÍDIA: É claro que eu não acredito, Padre Júlio.

PADRE: Eu só me coloco diante de Deus, porque Deus sabe. Deus sabe o quanto eu…
(inaudível)

ELÍDIA: Deus sabe. Deus sabe o quanto é subir num altar. Falar o que o senhor fala.
Fariseus hipócritas! Foi o evangelho de hoje.

PADRE: Mas Deus sabe. Deus sabe das renúncias que eu faço todo dia. Dos
sofrimentos, dos choros, das dores.

ELÍDIA: Consequências das suas escolhas.

PADRE: Sim, tudo bem. Eu não nego isso. Consequências das minhas escolhas. Mas
dizer que eu faço isso… Porque eu aprendi. Na dor. (bate na mesa) Mas eu
aprendi.

ELÍDIA: Tá bom. Eu vou me embora…

PADRE: Não… Faça isso não, Elídia…

(Áudio encerrado.)

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