Você está na página 1de 728

Copyright © 2020 Jussara Leal

ÍNTIMA AÇÃO – SPIN-OFF DE SECRET

1ª Edição

Todos os direitos reservados. Nenhuma parte dessa obra poderá ser


reproduzida ou transmitida por qualquer forma, meios eletrônicos ou

mecânico sem consentimento e autorização por escrito do


autor/editor.

Capa: T Tenório Design Diagramação: Jussara Leal

Revisão: Bianca Bonoto.

Esta é uma obra de ficção. Nomes, personagens, lugares e


acontecimentos descritos são produtos da imaginação do autor(a).

Qualquer semelhança com nomes, datas e acontecimentos reais é


mera coincidência.

TEXTO REVISADO SEGUNDO O ACORDO ORTOGRÁFICO


DA LÍNGUA PORTUGUESA. CONTÉM LINGUAGEM INFORMAL.
À todas as leitoras que acompanharam a louca
jornada de Íntima Ação no Wattpad e foram
sensatas, compreensivas, com personagens e
comigo!
Muito obrigada!!!!!!
Dizem que o amor é um dos sentimentos
mais subestimados. Talvez seja. Eu sempre tive
contato direto com esse sentimento que transborda
em minha família. Porém, só vivi uma grande
experiência, a qual fracassou e eu esperava muito.
Apostei todas as minhas fichas em um
relacionamento onde entrei de cabeça, achando que
seria para sempre.
Claro, quem entra em uma relação já
esperando pelo fim? Mas, a questão é que eu e
Dandara tivemos duas chances e ela destruiu as
duas.
Victor é o irmão que abominava amar, que
fugiu desse sentimento o tanto quanto conseguiu. Já
eu, sou aquele que sempre esteve com a guarda
baixa, nunca fugi do amor, mas também nunca senti
algo tão forte capaz de abalar meu mundo.
Conheci dezenas de garotas, até namorei
com algumas e gostei delas, mas aquele tipo de
gostar mais superficial que qualquer outra coisa,
aquele gostar que deixava com a sensação de faltar
algo. Foi assim até eu encontrar Dandara em uma
audiência. Talvez esse lance de amor à primeira
vista exista realmente, porque quando bati os olhos
nela, simplesmente algo mudou em mim; uma
espécie de revolução interna. A parte triste foi
descobrir que ela era casada com um
desembargador famoso, um cara que você olha e
jamais acreditaria ser casado com uma mulher
daquele porte. Nada contra em relação à homens
mais velhos namorarem mulheres mais jovens, mas
os dois definitivamente são desproporcionais.
Eu e ela tornamos conhecidos ao longo do
tempo. Os encontros entre nós eram inevitáveis, já
que eu vivia nos tribunais. Mas, o grande encontro
de verdade foi em uma praia, onde pude conhecer
um pouco mais da juíza que vivia um casamento
fracassado. É surreal você descobrir que ama uma
mulher sem nem mesmo tê-la tocado. Cheguei a
imaginar que estava louco.
Dali então, muitas coisas mudaram. Tivemos
um encontro na Ilha, no casamento de Luma e foi lá
que descobri que a mulher que eu amava vivia um
relacionamento abusivo, regado de ameaças cruéis.
Peguei a batalha dela para mim e quis ser tudo para
ela, mas deve haver algo que não sei, porque
Dandara é apenas a mulher mais complicada que já
conheci.
No casamento de Victor tivemos nossa
primeira vez dentro do carro, no meio da estrada. Eu
disse que seria decisivo e ela concordou. Nossa
experiência foi fantástica. Com o passar dos dias,
descobrimos que éramos completamente
compatíveis nos mais diversos sentidos, e eu
descobri que a meritíssima, aquela mulher que era
extremamente séria e profissional, tinha seu lado
moleca de ser. Nos divertíamos muito quando
estávamos juntos. Eu trabalhava contando os
minutos para voltar para casa e ter minha dose de
Dandara. Acredite, não estou falando de sexo, estou
falando das conversas maduras e inteligentes, das
brincadeiras insanas, das gargalhadas, até das
músicas que ficávamos cantando e rindo. Eu aprendi
muito com ela e tive tempo de planejar uma vida
inteira ao lado daquela mulher, até mesmo um
casamento.
Parecia o relacionamento perfeito, até eu
chegar do trabalho e encontrá-la com as malas
prontas. Ela não disse muito, disse apenas que
precisava ir embora. Fui pego de surpresa de forma
que apenas fiquei observando todos meus sonhos
caírem por terra bem diante dos meus olhos. Tentei
procurá-la de todas as maneiras, até mesmo fui em
sua cidade natal, mas eu nunca a encontrei, e, com
os meses, eu desisti da busca e passei a aceitar a
perda. Porém, foi difícil o bastante para eu me sentir
asfixiado no Rio de Janeiro e decidir passar um
tempo na Califórnia.
Confesso, minha rotina em Los Angeles não
foi bonita ou do tipo que me orgulho. Não importa o
quanto eu tentava, Dandara estava e ainda está
fixada em meu coração e em minha mente, de forma
que só consigo esquecê-la quando estou bebendo
em algum lugar e me divertindo com diversas
mulheres.
Recebi um único e-mail dela dizendo que me
amava, mas, infelizmente, não consegui rastreá-la.
Foi difícil... até eu encontrar alguém que
trouxe uma leveza absurda para a minha vida. Ela
não é religiosa ou politicamente correta, é um tanto
quanto maluca e arranca de mim as mais diversas
gargalhadas, mas não é minha namorada. Eu achei
que poderia mesmo seguir em frente, estava no
caminho certo, até receber uma ligação que fez
minha vida girar significativamente.
Há batalhas sendo travadas, há meu coração
dividido em quatro partes, há ódio, raiva, tesão,
descobertas.
Eu costumava ser a melhor pessoa, porém,
certos acontecimentos têm o poder de extrair de nós
os piores sentimentos e a nossa pior versão.
Só eu posso salvar algo que eu nem sabia
existir.
Minha história talvez não seja tão bonita, mas
vou mostrar onde algumas coisas ganharam uma
proporção maior.
Las Vegas!
— Não, gente! Pelo amor de Deus! — grito de
costas para o altar, olhando todas as pessoas que
estão na igreja. — CARALHO! — Dessa vez é mais
alto, e isso faz com que todos se calem. Já perdi as
contas de quantas tentativas fiz.

— A deixem falar! — minha amiga Lili pede, e


eu sorrio amplamente para ela, em agradecimento.

— Gente, o negócio é o seguinte, aconteceu.


Ele não veio, nem vai vir, já foi dito no telefone —
informo, e o burburinho recomeça. Por que os
convidados parecem mais nervosos que eu? Eu
deveria estar surtando? Talvez sim, mas não estou.
Eu gosto de Pablo, e é muito decepcionante que ele
tenha feito que eu me sujeitasse a uma situação
como essa. Custava ele ter dito ontem que o nosso
casamento não iria mais acontecer? Teria me
privado de estar completamente vestida de noiva,
em uma igreja lotada, tendo que controlar
convidados descontrolados. Me sinto como
protagonista de uma adaptação cinematográfica,
mas, estar no meu lugar agora não é muito bom. Eu
chorei, mas agora apenas preciso me manter forte,
porque eu não serei a noiva arrasada após ser
deixada no altar. Definitivamente não sou dramática.
Prefiro a praticidade. Quer, bem. Não quer? Amém!
Vida que segue. — AOOO CARALHO!!! — grito
mais uma vez, e enfim, pela honra e pela glória, o
silêncio se faz! — O que quero dizer é que, porra, há
uma mega festa nos esperando. Mega mesmo. Sem
essa de mini porção de comida. É churrasco, cerveja
e tudo mais que temos direito. Então, seria um
desperdício não irmos, não é mesmo?

O caos dobra de proporção. Eu nem obtenho


respostas, os convidados simplesmente começam a
se retirar e sei que estão indo rumo ao local da
recepção. As únicas pessoas que ficam são meus
pais, meu irmão, meu filho e minha amiga Lili. Por
sorte, meu filho está dormindo em um carrinho e não
vai ter essa memória ruim para sua mente que já é
tão complicadinha. Vê-lo dormindo enquanto o pai
simplesmente me deixou no altar, me faz querer
chorar novamente. Henrico não merece o pai que
tem, e não estou dizendo isso apenas pelo
casamento. Inclusive, eu acho que esse casamento
era mais uma tentativa de juntar pai e filho, que
qualquer outra coisa.

Henrico tem 3 anos, fruto do meu


relacionamento com Pablo, o homem que seria meu
marido e que tive um relacionamento de 5 anos.
Meu filho é autista. Ele foi diagnosticado com 1 ano
e meio, quando comecei a notar algumas diferenças
como dificuldades em se locomover, a falta de
responder aos meus chamados, o gosto por manter-
se isolado... Por conta disso, o levei no médico e foi
solicitado uma avaliação neurológica onde foi
constatada a situação.

Ser mãe de um garotinho autista é bastante


complexo. Quando recebi o diagnóstico, foi como se
o mundo tivesse parado de girar por um tempo. Eu
olhei para meu filho e percebi que nossa vida nunca
mais seria a mesma e que teríamos que reconstruir
um novo mundinho mais acessível a ele. Sobre o
casamento, graças a Deus, ele é um garoto bastante
esperto para muitas coisas, e certamente,
compreenderia o acabou de acontecer.

Não sei se posso dizer que Pablo é um bom


pai. Jamais diria que é ótimo, pois estaria mentindo,
mas também não é dos piores. Henrico tem
dificuldade em lidar com ele, e Pablo tem dificuldade
em lidar com as limitações de Henrico, por conta
disso eu sou a "faz tudo" pelo meu filho. Sou eu
quem o acompanho em todas as atividades diárias
(que são muitas), sou eu quem o assessoro em tudo
que é necessário. Meu filho só fica bem comigo ou
com os meus pais, ele não dá abertura para
quaisquer outras pessoas da família. Felizmente, ele
também tem um bom relacionamento com todos os
profissionais que lidamos diariamente. Talvez, o fato
de ele ser mais afastado do pai se deve ao fato de
eu e Pablo não morarmos juntos, não sei bem
explicar, por isso acreditei que o casamento ajudaria
em uma aproximação dos dois. Eu moro sozinha e
Henrico oscila muito entre minha casa e a casa dos
meus pais. Há dias que ele quer dormir com eles, e
dias em que quer dormir comigo, e eu nunca nego
pelo simples fato de não querer magoá-lo ou deixá-
lo frustrado. De alguma forma, essa rotina faz bem a
ele e os médicos que acompanham aprovam. Eu e
meus pais moramos próximos, então tudo se
encaixa muito bem.

Eu sou advogada, uma mulher que não se


abate com as dificuldades. Eu prefiro usar os
obstáculos como motivação para continuar lutando.
Sou uma mulher muito alto astral, sem juízo sempre
que posso; gosto de festas, de baladas, de praia, de
viver. Não sou fresca para nada e não curto muito
dramas. Tento ser o mais prática possível.

Me tornei advogada pelo motivo mais idiota


que se pode existir. Quando estava em busca do
curso perfeito, lembrei da melhor sequência de
filmes que eu já vi: Legalmente Loira. Meu sonho era
ser exatamente como Elle Woods, e assim fui em
busca de realizá-lo. Sou a própria Ellen Woods da
atualidade. Felizmente, foi uma escolha certa, sou
extremamente bem-sucedida em minha profissão e
amo o que faço.

Agora, voltando à realidade dos fatos, pego


meus pais com os semblantes não muito bons. Eles
sempre foram contra meu relacionamento com o
Pablo, e eu sempre ignorei isso, tentando levar na
brincadeira algo que era visivelmente sério. Acho
que se Pablo surgisse aqui, meu pai e meu irmão
iriam matá-lo a sangue frio. Pensando nisso, sinto a
extrema necessidade de me abrir com eles, por isso
desço os degraus e me aproximo.

— Bom, o que posso dizer a vocês? Apenas


me desculpem — digo, agachando no chão sem me
importar com o vestido luxuoso que está em meu
corpo. — Não fiquem tristes por esse
acontecimento. Foi um livramento, provavelmente.
Vocês me ensinaram a ver alguns acontecimentos
dessa maneira.

— Aquele homem é um homem morto! —


meu pai decreta.

— Que nada, pai. Se ele morrer, nunca


saberá como é sofrer e pagar os pecados. Ele
merece ficar vivo — argumento. — Estou bem,
lógico que é um pouco constrangedor, mas quem
liga para isso? Estou indo para a festa beber e me
divertir, assim como vocês também estão indo
comigo.

— E a viagem de lua de mel? — meu irmão


pergunta, e mais uma vez, um filme surge em minha
mente insana e fértil. Me identifico com esse filme,
aliás.

Muita Calma Nessa Hora, o filme que eu


assisti ao menos cinco vezes, faz algo se agitar em
meu interior. Logo, fico de pé e recebo olhares
esquisitos quando meu sorriso se expande. De Elle
Woods à Tita, é assim que me sinto agora! A única
diferença é que terei que enfrentar a situação
sozinha, sem amigas, já que as passagens são
nominais e intransferíveis. Mas, quem disse que eu
nasci grudada com alguém? Eu sozinha já sou
demais para lidar comigo mesma. Entendeu? Nem
eu! Isso é o máximo! Eu vou descer o nível
internacionalmente, isso é bom demais!

— Já vem merda! — meu irmão diz em tom


de protesto porque me conhece muito bem.

— A lua de mel segue firme e forte, porém,


com um integrante a menos — anuncio minha
sentença, sendo a própria juíza da minha vida. Bato
palmas, mega animada por essa ideia brilhante ter
surgido. Las Vegas, meu amor! Quem em sã
consciência deixaria de ir para a cidade do pecado
sendo que tudo já foi devidamente pago? Ninguém!
Principalmente solteira... Aooo Las Vegas!

É com extrema felicidade que coloco todos


para ação. Seguimos para a festa e eu esqueço que
um dia fui noiva. A primeira coisa que faço é tirar a
sandálias, a segunda é cortar meu vestido,
transformando-o num quase tubinho perfeito, a
terceira é jogar o buquê e a quarta... Bom!

Eu subo na mesa do DJ e me acabo de


dançar, divertindo a galera e aproveitando meu
recém adquirido Habeas Corpus.
— Pedro... SAMPAIOOOO... — cantarolo. —
Pedro... SAMPAIO!!!

Ah minhas queridas amigas, se a vida me dá


limões eu faço uma caipirinha sinistra! Sofrer por
causa de macho escroto? Nem por um maldito
caralho! Levei um pé na bunda? Sim, levei! E, vou
usá-lo como impulso para curtir a vida! Ficar deitada
em uma cama chorando por conta de homem, nunca
fez parte de quem sou. É triste, amiguinhas, eu sei.
Ninguém quer ter o coração pisoteado, mas temos o
poder de escolher como lidarmos com isso. Eu
acabo de escolher a diversão, afinal, novas pessoas,
novos corpos, novas bocas, novas possibilidades
estão por vir e eu amo isso!

Meus pais vão embora cedo e eu me despeço


do meu pequeno que ainda está dormindo. Choro
por alguns minutos, mas logo me recupero.

Assim que a festa deixa de ser familiar, eu


passo a me sentir num baile funk e me liberto. Eu
me descabelo na pista, rasgo vestido, só não beijo
na boca de cachorro porque não tem um. Só vou
embora quando o sol surge no céu, alertando que
um novo dia acaba de começar e que meu voo está
prestes a sair.
É necessário Lili me dar banho frio e eu pego
meu voo tri bêbada, rindo até de um possível
desastre de avião.

Chego em Las Vegas me sentido um pouco


melhor. Quando o táxi me deixa em frente ao
famoso hotel Bellagio, grito sozinha e começo a
pular de felicidade! Porém, como desgraça pouca é
bobagem, meu telefone toca e o nome de Pablo
surge na tela.

— O que foi, desgraça? — Atendo.

— Bebê, eu sinto muito.

— Bebê é teu micro pau, idiota. Não me ligue


mais, inferno! Vá se foder, e a partir de agora, para
ver seu filho, terá que entrar na justiça, seu pedaço
de bosta! — O embuste começa a chorar e eu
começo a rir, puxando minha mala para dentro do
hotel. — Pobrezinho, tomara que tenha um infarto e
morra! Você foi a melhor saída, saiu da minha vida!
— cantarolo.
— Só estava confuso.

— Pega a confusão e enfie ela é algum lugar


melhor, cuzão! Não me ligue mais, Pablo, estou
falando sério. Se você começar a me perseguir, vou
entrar com medida protetiva, ordem de restrição e te
processar. Você morreu para mim ontem à noite.
Agora me deixe em paz, satanás! Filhote de
lombriga! Cara de cu com câimbra! Enfia um rojão
no cu e sai voando, infeliz! Pablo dos teclados! —
esbravejo, e trombo com um homem. O impacto faz
meu celular cair no chão e eu quase vou junto. —
Aooo Inferno! — grito revoltada, pronta para brigar.
Porém, ele começa a rir e eu foco em seu rosto,
sendo surpreendida positivamente. Sorrio para ele e
arrumo meus cabelos, na tentativa de mostrar que
sou sedutora, sexy sem ser vulgar. — From this
momenttt... — canto a música da Shania Twain para
ele, que arqueia as sobrancelhas sério e retoma a
risada.

— Uma brasileira — ele diz.

— Eita! Você é brasileiro. — Sorrio, mas


estou envergonhada agora.

— Prazer, Lucca. — Se apresenta


estendendo uma mão, e eu a pego para depositar
um beijo que o faz rir.

— Paula Jacinta, não ri — peço em vão. Ele


dá uma gargalhada e eu suspiro, encantada.
Encontrar um homem desses logo na chegada é
como chegar com o pé direito.

—Paula, Jacinta meu prazer em conhecê-la


— diz, piscando um olho.

— Prazer, Lucca. — Sorrio. — Embora eu


esteja num misto de alegria e tristeza por conhecer
um brasileiro logo na chegada.

— Por que tristeza?

— Eu saio do Brasil, mas o Brasil não sei de


mim — explico. — Como poderei perder a minha
dignidade sem ter minha reputação comprometida?
— Ele arregala os olhos e mais uma gargalhada
surge. Ele é o tipo que curte rir. E é um tipo bem
gato, com um sorriso lindo.

— Posso te contar um segredo? — pergunta,


e eu balanço a cabeça positivamente, ligeiramente
interessada.

— Claro.
— Estarei por aqui durante cinco dias para
perder a dignidade antes de retornar ao Brasil.
Podemos combinar algo.

— O quê? — pergunto.

— Certamente você já ouviu essa frase,


porém, vou dizer de qualquer jeito, apenas para
relembrá-la do primeiro mandamento de Las Vegas.

— Qual o primeiro mandamento de Las


Vegas?

— O que acontece em Vegas, fica em Vegas


— responde, piscando um olho e dando um sorriso.

— Oh! Já ouvi isso, mas não estava


lembrando desse pequeno grande detalhe. Você me
fez ganhar o dia, Lucca — brinco, fazendo uma
dancinha da alegria. — Se nos encontrarmos
novamente, faço questão de pagar um shot de
tequila em agradecimento. Quem sabe um porre
juntos? Podemos perder a dignidade e fingir que
nada aconteceu no dia seguinte.

— Será um prazer perder a dignidade com


você — ele brinca. — Paula, Jacinta minha
ansiedade para esbarrar com você novamente.

— Oh, você é piadista?

— Nas horas vagas — responde sorrindo, e


eu fico um pouco hipnotizada até meu celular tocar
no chão. O pego e atendo, esquecendo da presença
do tal Lucca.

— Bebê...

— Meu Deus! Caralho! Vá para o inferno! —


esbravejo. — Você nasceu pelo cu, só isso justifica!

— Estou arrependido.

— Você não vale o peido de uma vaca, Pablo.


Agora você sabe o que farei com meu celular? Não,
você não sabe! — grito, deixando minha mala no
saguão e saio para fora do hotel. Com todo ódio que
possuo dentro de mim, eu tento tacar meu celular na
fonte do Hotel, porém, um ser humano segura minha
mão, impedindo.

— Não faça isso. Existe algo muito mais


prático — Lucca diz.
— O quê?

— Atender apenas números conhecidos,


pessoas que realmente importam. — Suspiro
frustrada e ele ri. — Seu arsenal de xingamentos é
realmente pesado. Parabéns! Aliás, estou com dó do
tal Pablo que nasceu pelo cu.

— Obrigada. — Sorrio me derretendo. Por


que estou agradecendo-o? Enfim. Ele tem rosto de
criança, é encantador. Eu daria de mamar, com toda
certeza. — Ok! — digo, saindo do transe. — Preciso
fazer check-in. Obrigada por livrar meu celular da
morte, e novamente, prazer. Espero cruzar com
você.

— Torcerei por isso nos dois sentidos da


palavra. O prazer é todo meu, Paula. Espero perder
a dignidade com você. — Dois sentidos? Às vezes
meus neurônios são mais lentos que o normal.

— Tomara que sim. — Sorrio.

— Perder-se também é o caminho! — ele


divaga sorrindo, e se vai.

Perder-se também é o caminho! Gostei disso! Vou me perder,


juntamente com a minha dignidade! Aooo vida bandida, estou de
volta!
Assim que entro na suíte começo a rir quando encontro
flores, champanhe, tudo que foi solicitado para a chegada do casal
recém-casado. As flores eu chuto longe, o champanhe abro com
muita dificuldade e bebo na boca da própria garrafa.
Precisando de um banho relaxante, vou em busca do
banheiro e já encontro a banheira devidamente preparada,
mostrando que o hotel é extremamente pontual com a chegada dos
hóspedes. Me desfaço das minhas roupas e entro, suspirando de
prazer ao sentir o contato da água quente com a minha pele. Isso é
vida, o resto é resto. Melhor lua de mel, ever!
Passo ao menos meia hora hibernando na banheira, peço
algo para comer e durmo um pouco.
Quando anoitece, começo a me preparar para uma noitada
sozinha comigo mesma.
Existe algo que sempre cultivei: ser sozinha e ser feliz com
isso. Faço isso desde que me conheço por gente e tenho certeza de
que é uma das melhores coisas que faço por mim. Imagina se fosse
dependente emocional? Eu estaria muito mal agora.
Estive em um relacionamento por alguns anos, tenho um
filho, tenho a minha família, mas, sempre que possível, estou
curtindo a minha individualidade e a minha "solidão". Acho que
cresci vendo pessoas tão dependentes umas das outras, e aquilo
sempre me incomodou o bastante para não querer para a minha
vida. Não sei se um dia isso irá acontecer comigo, mas graças a
Deus estou ilesa por enquanto.
Não morava com Pablo, e muitas vezes durante a semana,
meu pequeno dorme com a minha mãe. Então, todos os momentos
sozinhos sempre foram bastante aproveitados e divertidos. Afinal,
se divertir sozinha te dá a liberdade de fazer o que bem quiser sem
receber olhares julgadores e ter que se importar com o pudor.
O que é se divertir sozinha? Vai desde sair sozinha para
tomar uma cerveja no boteco, a ficar em casa, fazendo desfile de
lingerie, dançando na frente do espelho, talvez assistindo um filme.
Ser feliz sozinha agrega muitas coisas que realmente valem a pena,
e melhora quando se é solteira. Divertir sozinha solteira é ir jantar,
curtir baladas, aumentar as idas no boteco, ficar com quem quiser,
quando quiser, onde quiser. É gozar de liberdade e do livre arbítrio.
E hoje é a minha primeira grande noite curtindo a minha liberdade
recém adquirida.
Por que eu cultivo tanto o hábito de ficar sozinha? Tem todo
sentido, acredite. Vou dizer todas as coisas que sempre coloquei em
uma balança e que me fazem ser seguidora fiel da prática:
E se meus pais morressem?
E se minhas amigas me abandonassem?
E se eu não tivesse filho?
E se não tivesse um relacionamento?
E se eu tivesse um relacionamento e ele terminasse?
E se eu tivesse uma grande desilusão amorosa?
E se...
Há tantos "e se" que devemos levar em consideração na
vida. E eu os levo. Acabo de ter uma grande desilusão amorosa e
acredite, está doendo sim. Mas, estaria muito mais se eu fosse
dependente emocionalmente de Pablo. Não devemos ter essa
dependência. Depender de alguém é o pior erro que você pode
cometer na vida, porque quando nos tornamos dependentes,
passamos a aceitar tudo, nos agarramos a qualquer coisa, seja boa
ou ruim, que a pessoa tem a nos oferecer, e isso causa dor,
frustrações, tristeza. Chorar na cama definitivamente não combina
comigo. As únicas pessoas no mundo que têm o poder de arrancar
minhas lágrimas são meus familiares, em especial o meu filho.
Pablo não era um namorado ruim. Ele pecava como pai em
alguns aspectos, mas nunca foi completamente ruim para mim
porque ele sabia a mulher que tinha em casa. Nem sempre fui tão
segura, lá na adolescência tive meus momentos de imbecilidade e
insegurança, dava muito ouvidos ao que pensavam de mim, ao que
diziam, então, um certo dia, me levantei da cama e gritei "FODA-SE
MUNDÃOOO". Aquele ato também foi importante pra caramba. Eu
não me sentia insegura em relação a Pablo, mas ele sabia
exatamente o nível do meu amor-próprio e era ele o inseguro da
relação. Porém, eu realmente não sei o que aconteceu para ele me
deixar plantada no altar. Só que ele sabe, ele pode estar me ligando
e tudo mais, mas no fundo ele sabe que NUNCA MAIS teremos
qualquer chance.
Sou o tipo de mulher que ponto final significa ponto final
mesmo, não existe segundas chances, a vida muito raramente
oferece segundas chances, por que eu ofereceria? Eu não sou a
vida, eu sou Paula. Apesar de ser amante da Marília Mendonça,
poucas músicas dela me representam.
Mas, calma! Ser feliz acompanhada também é legal. Porém,
sua companhia tem que ser bem escolhida, alguém que fale a
mesma língua que você, que não julgue suas ações e suas
escolhas, que seja desprovida de pudor e mais um montão de
coisas legais que não ficarei citando. O importante é ser alguém que
se encaixe em você e juntos formem a melodia perfeita da diversão.
Antes de sair, ligo para minha mãe para falar com meu
Henrico por chamada de vídeo. Ele está um pouco chateado e isso
me deixa um pouco triste.
— Ei, mi amor, fale com a mamãe, príncipe. — Pela vigésima
vez tento fazê-lo falar. Há dias que ele fica mais antissocial que os
outros e se fecha em sua própria bolha. É algo que requer um jogo
de cintura e tanto para lidar. — Henrico Davi da mamãe, vamos lá,
mamãe precisa saber o que você quer de presente da viagem. Que
tal um carrinho? — pergunto.
— Não, mamãe — ele responde finalmente.
— Então me peça outra coisa, qualquer coisa.
— Uma fantasia do Toy Story — diz.
— É? Uau! — Sorrio para ele. — Qual personagem? Deixe a
mamãe adivinhar, Hum... Buzz?
— Não.
— Hummm, o Senhor Cabeça de Batata? — Ele ri, e isso me
faz tão feliz, tão feliz. Recupero a felicidade instantaneamente. No
início da conversa pensei que ele nem falaria.
— Não, mamãe.
— Xiiii, a mamãe está perdida. Ei, Henrico, quer lembrar a
mamãe os nomes dos personagens? — pergunto esperançosa.
— Não, mamãe. Eu vou falar de uma vez — avisa.
— Sim, então me diga para que eu possa rodar todos os
lugares em busca da fantasia perfeita.
— Quero do Xerife Woody! — exclama empolgado.
— Então vou começar minha busca já, já. Só vou embora
quando encontrar essa fantasia — brinco com ele. — Filho, eu te
amo muito, viu?
— Viu.
— Já, já mamãe está de volta, seja um bom garoto com a
vovó.
— Tá. — Encerramos a ligação e uma lágrima escorre dos
meus olhos. Esse garoto é o meu oxigênio, é a minha única
dependência que vale a pena. Agora eu preciso encontrar a tal
fantasia, esse será meu propósito amanhã durante o dia.
Após dar o retoque final em minha maquiagem, decido ir
jantar e então ver o que a noite de Las Vegas me reserva. Mães
também precisam de um pouco de diversão noturna.
"Doente de amor, procurei remédio na vida noturnaaa" canto
pelo corredor!

"Doente de amor, procurei remédio na vida noturna". Não


está tocando essa música no pub onde estou, mas ela está em
minha mente de qualquer maneira. Acho que atingi o fundo do poço
de vez. Beber e frequentar casas noturnas é tudo que tenho feito
por um longo período, mas, nas últimas semanas, desde que decidi
voltar ao Brasil em consideração aos meus irmãos que estão se
matando de trabalhar sozinhos, tudo intensificou. Acho que é o
medo.
O medo de vê-la.
Mas, de que adianta nutrir esse medo se, nesse exato
momento, estou observando uma foto dela em meu celular?
Eu quero superar, mas nesse estilo de vida que estou
levando jamais encontrarei qualquer motivação.
Excluo a imagem do meu celular, juntamente com todas as
outras. Eu obtive todos os mais variados tipos de conselhos e os
ignorei, agora é um bom momento para colocar em prática.
Chegando no Brasil, seguirei com a minha vida como o homem que
sou. Agi por um longo período como um adolescente no auge da
vida louca. Bebidas, os mais variados tipos de mulheres, umas que
eu sequer sei o nome, outras que eu nem mesmo lembro. Nem
mesmo antes de Dandara entrar em minha vida eu agia dessa
maneira. Era solteiro, curtia sim minha liberdade, mas não era tão
insano quanto agora.
É mais de uma hora da manhã, cedo para ir para o hotel.
Peço mais uma dose de uísque e vou observar as pessoas se
divertindo. Há garotas em cima da mesa dançando, em cantos
casais numa espécie de pré-sexo, enquanto eu estou sentado em
uma banqueta, de frente para o bar. Olho para o lado e encontro a
loira do hotel sentada também em uma banqueta, porém, na outra
ponta, distante de mim. Sorrio ao vê-la bebendo tequila.
As loiras não são meu tipo preferido de mulher. Gosto de
morenas e negras, mas preciso dizer, a mulher é linda e tem um
sorriso chocante pra caralho. Não sei por que, mas as palavras que
meu irmão me disse tempos atrás surgem em minha mente. Algo
diferente... essa loira é bem diferente.
Ela bebe mais uma tequila e abre um sorriso perfeito para o
barman, provavelmente agradecendo-o. Noto que ela é alvo de
olhares de outros homens. Óbvio, ela chama demasiada atenção.
Mas, também noto seu desconforto quando alguns homens surgem
com um pouco mais de ousadia. Surpreendentemente, ela bota
todos para correr.
O que essa mulher veio fazer em Las Vegas sozinha? Estou
curioso para saber. Por isso, fico de pé e me aproximo, sentando-
me na banqueta ao lado.
— Olá, estou curioso para saber quão perto você está de
perder a dignidade para que eu possa acompanhá-la nessa missão
— digo, e ela sorri.
— Ei, você! Estou bem perto, mas estou achando esse lugar
sem graça. Queria um pouco mais de adrenalina. O que um homem
do seu porte faz sozinho aqui?
— Como seria esse lance de homem do meu porte? —
questiono rindo.
— Lindo, cara de bebê, tatuagens, cabelos desgrenhados,
lindo. — Arqueio as sobrancelhas.
— Te respondo se me disser o que uma mulher do seu porte
está fazendo sozinha em Las Vegas. — Ela sorri.
— Se eu contar você não vai acreditar — ela diz, e fico ainda
mais intrigado.
— Adoro histórias que desafiam a lógica. Prossiga.
— É a minha lua de mel. — Faço minha cara de surpresa. —
Porém, meu noivo me deixou no altar, ele não apareceu na igreja.
Então fui curtir a minha festa e vim curtir a minha lua de mel que
estava devidamente paga. — Fico a encarando porque me recuso a
acreditar. — Olha, lá! Eu disse que você não acreditaria.
— Quem deixaria uma mulher como você plantada num
altar? E, antes que pense que é uma cantada barata, não é.
— Pablo! Segundo ele, estava confuso.
— O Pablo que nasceu pelo cu? Isso explica o apelido
carinhoso — digo rindo. — Mas você está bem?
— Sim, estou. Sou bem-resolvida. Obviamente não estou
dando saltos de alegria, mas estou bem, realmente bem.
— Bom, se te faz sentir melhor, eu posso dizer que quase fui
deixado no altar. Não chegamos a um noivado com tudo o que tem
direito, mas conversamos sobre a possibilidade. Só estávamos
aguardando alguns detalhes para seguirmos com os planos. Somos
dois largados à traça — digo sorrindo.
— Isso merece um brinde. — Ela levanta o copo de uma
bebida que nem sei distinguir e bate em meu copo de uísque, num
brinde.
— Isso merece um casamento na capela do Elvis — sugiro.
— A dor do amor, é com outro amor que a gente cura.
— Aooo Boate Azul!!! — Eu fico chocado ao ouvir o AOOO.
Puta merda!
— Aooo Paula Jacinta, acho que é minha alma gêmea.
— Antes de me casar preciso saber mais sobre meu futuro
marido — ela brinca. — Lucca, não é isso?
— Exatamente. Lucca Albuquerque. — Ela cospe a bebida
longe, engasgando-se, e sou obrigado a bater em suas costas. Sua
tosse compulsiva, me faz ficar de pé para acudi-la e demora um
pouco até ela estar recuperada.
— Lucca Albuquerque... advogado?
— Sim. Devo temer seu pequeno ataque? — pergunto ainda
de pé, a segurando enquanto ela limpa a boca em um guardanapo.
— Eu sou praticamente uma fã do seu trabalho e dos demais
Albuquerque’s, é a minha meta na vida atingir esse patamar.
— Você é fã do meu trabalho e não me conhecia? —
pergunto.
— Só de nome e fama. Eu conheci um outro Albuquerque em
um tribunal onde eu estava apenas assistindo à situação toda, mas
não me lembro o nome dele. Ele era assustador e massacrou o
outro advogado que estava lá. Até a juíza ficou chocada. — Será
que a juíza é Dandara?
— Victor?
— Isso. Victor, ele é muito sério — ela diz. — Diferente de
você.
— Victor nos tribunais é realmente sério, mas, não conte a
ninguém, ele é tão louco quanto é possível, e se casou com uma
mulher mais louca que ele.
— Oh, surpreendente. Qual a sua idade?
— 32, quase 33. E a sua?
— 30 — responde sorrindo. — Não acredito que você é
Lucca Albuquerque.
— Me senti como uma celebridade agora — confesso rindo.
— Eu mal posso acreditar que vamos perder a dignidade
juntos essa noite.
— Para começar, acho que precisamos de um lugar mais
agitado que isso aqui, não? — sugiro.
— Super concordo. — Ela vira o restante da bebida, segura
minha mão e me arrasta do pub após pagarmos a conta. Não sei
onde ela está me levando, mas a acompanho.
— Você conhece Las Vegas?
— Não, nem um pouco — responde. — Mas, quando estava
chegando, vi que tinha um parque de diversões. O táxi deve saber
nos levar — argumenta, fazendo sinal para um táxi, que para
prontamente.
— De qual bairro você é? — pergunto. — Bom, se você me
conhece e viu Victor em um tribunal, no mínimo é carioca.
— Sim, moro no Recreio, e você? Puta merda! Só agora
compreendi que somos cariocas — ela diz, batendo a mão na testa.
— Na Barra. Bem perto, hein? Como nunca te vi? — Ela
sorri.
— Porque não era o momento ideal ainda. Moramos lado a
lado e só viemos nos conhecer em Las Vegas. Você acredita em
destino?
— Isso é uma cantada?
— Não necessariamente — responde rindo.
— Decepcionante então. E sim, eu acredito no destino, é por
isso que esse senhor nos levara ao casamento imediatamente. Em
seguida, curtiremos a lua de mel perdendo a dignidade no parque
de diversões e beijando a boca de cachorro na rua — aviso, e
informo ao motorista para mudar a rota.
— Você é louco!
— Louco é o Pablo que nasceu pelo cu. Estou indo aproveitar
a chance que ele me deu. Vamos corrigir o erro estúpido que ele
cometeu.
Lucca Albuquerque é a melhor pessoa, e mais louco que o
Batman três vezes. Me recuso a acreditar que ele é o famoso Lucca
advogado. Estamos nos casando na famosa capela do Elvis, porém,
quem está roubando o show é Lucca e não o tal "Elvis".
O defendo porque a trilha sonora estava extremamente chata
com as músicas do Elvis que eu nem mesma conheço. Aliás, acho
que só conheço duas músicas do famoso cantor, porém, não faz
meu estilo nem por um maldito caralho.
Meu marido fictício simplesmente pegou o microfone do
homem e está cantando Milu do Gusttavo Lima enquanto eu danço
com Elvis, que tem um gingado absurdo. A música escolhida não
tem nada a ver, mas tudo bem. Estamos além de bêbados, e estou
quase me sentando no chão para rir com categoria. Definitivamente,
meu casamento da vida real jamais teria sido tão engraçado e tão
louco.
— Aoooo Paula, Jacinta meu amor! — ele grita quando
termina, e o Elvis, mesmo sem entender, começa a rir e me solta.
Em inglês, ele nos informa que dará sequência à cerimônia. Lucca
me dá um gole da bebida que compramos e voltamos a ficar
comportados, como se fosse mesmo nosso casamento. Eu só sei
que o cara diz que podemos nos beijar e isso faz tanto o meu
sorriso, quanto de Lucca morrer.
Mesmo levemente embriagada, sinto um arrepio insano
quando ele se vira de frente para mim. Eu sou alta, mas esse
homem deve ter na faixa de 1,90m ou mais, porque me sinto
levemente "diminuída" perto dele. O choque surge quando
lentamente ele desliza seu indicador pelo meu pescoço e acabo
respondendo com um gemido inesperado. É surpreendente. Eu
nunca deixo o olhar dele e de forma simples ele vem se
aproximando mais e mais. Era para ser um beijo comum, tipo
"mandou, beijou", mas ele está criando um clima que só Jesus para
me defender. O cara é meio hipnótico, o simples toque da ponta do
seu dedo no vão do meu decote, me faz querer cair de joelhos. De
verdade, se eu já me senti dessa forma alguma vez na vida, não me
recordo mesmo, principalmente com tão pouco.
Quando minha boca está quase aberta devido ao choque, ele
cola o corpo ao meu e desliza uma mão pela minha nuca, fazendo
um carinho que me faz arfar e remexer as pernas para mantê-las
firme. Engulo a seco desviando meu olhar dos seus olhos para sua
boca. É surreal. Os lábios dele são grossos, bem definidos e
atrativos, inclusive, passo a língua pelos meus lábios com
pensamentos mais sujos na mente. Essa boca deve simplesmente
ficar fantástica pelo meu corpo, não que eu esteja pensando nisso.
Mas estou.
Ele também passa a língua pelos lábios e eu me pego
gemendo mais uma vez. A mesma mão que está em minha nuca
sobe um pouco mais. Seus dedos entrelaçam meus cabelos e ele os
puxa, misturando gentileza com ferocidade. Que homem é esse? Eu
não sei! Só sei que ele se abaixa e captura meus lábios, e eu
simplesmente me jogo nele, enrolando minhas pernas em torno da
sua cintura. Ele é obrigado a deixar meus cabelos para me segurar
pela bunda, porque eu simplesmente estou como uma selvagem
que parece não ver homem há pelo menos 10 anos. Mas, terei
meus pecados perdoados, porque é humanamente impossível não
ficar louca por essa boca e por esse beijo.
Nem sei por quanto tempo ele me beija, mas, quando acaba,
eu sinto um vazio me consumir.
— Deus! Eu quero te beijar para sempre! — digo, quando ele
afasta nossos lábios e o puxo novamente para continuarmos. Só
paramos quando Elvis surge com um extintor de incêndio e tenta
conter o fogo.
Lucca me coloca no chão e eu quase me desequilibro. Ele dá
uma gargalhada e me mantém presa ao seu lado enquanto Elvis
termina o caralho do nosso casamento. Eu queria muito uma lua de
mel com esse homem, mas isso seria errado pra caralho. Inclusive,
eu deveria parar de falar caralho, porque só penso em caralho
agora. Inclusive, que Deus me perdoe mais uma vez, mas,
furtivamente, resolvo manjar algo que não deveria. Eu me afasto de
Lucca e finjo ir arrumar minha sandália, até seguro na canela dele e
sorrio fingindo ser pura. Finjo estar indo olhar para seu rosto, mas
congelo no meio do caminho, abrindo minha boca em espanto e
caindo para trás no chão. Eu não sei manjar uma rola com
delicadeza, definitivamente.
— Como você fez isso? — ele pergunta, me ajudando a ficar
de pé e eu bato contra seu peitoral. Ignorando Elvis novamente, o
puxo para um beijo que decreta o estado de falência da minha
calcinha. Ele é bem dotado, caralho! E beija bem pra caralho!
Caralho! NÃO FALE MAIS “CARALHO”.
Eu quero a minha mãe!
Novamente o filho da puta do Elvis do inferno volta com o
extintor e eu avanço para bater nele.
— Eu vou matar você! — grito, e Lucca me pega por trás,
impedindo que eu bata na criatura assustada diante de mim. É o fim
do nosso casamento, definitivamente. Elvis diz as últimas palavras e
Lucca, deixa a bebida de lado, me pegando em seus braços. Até
deixo o stress de lado e começo a rir. Elvis pau no cu!
— Pronto! Pablo que nasceu pelo cu perdeu! — ele decreta.
— E agora? A vontade é te levar para o hotel, para o meu quarto.
Essa sua boca é perfeita e Pablo que nasceu pelo cu é um baita de
um imbecil. Me avise quando ele surgir, vou socá-lo até perder os
sentidos ou simplesmente agradecê-lo. Não me decidi.
— Agora vamos beber e dançar em algum lugar animado! —
decreto, abraçada ao pescoço dele.
— É isso! Boa ideia! Aooo Paula, Jacinta meu gingado na
balada!
— Aooo Lucca! Eu ia fazer uma rima tão ridícula agora —
digo rindo. — Deus me perdoe pela vigésima vez essa noite.
— Há uma balada brasileira aqui. Vamos! — avisa, indo em
busca de um táxi. Não sei o motivo, mas, ao invés de me sentar no
banco, eu me sento nas pernas de Lucca e nós vamos falando
merda até a boate.
Ele paga nossa entrada e vamos direto para o bar, onde
tomamos três doses de tequila. Está tocando funk na boate e eu
passo mal de rir quando ele tenta dançar. Ensino ele um passinho
da música Hit Contagiante e dançamos. Quando dou por mim, há
um monte de pessoas nos copiando. Quando começa Sentou e
Gostou eu grito e me jogo nos braços dele, que me roda no alto. Em
seguida, sou colocada de volta ao chão, ensino o passinho da
música para ele e nos acabamos de dançar. Eu juro que nunca tive
um namorado que fosse participativo em baladas, mas Lucca
(mesmo não sendo meu namorado) é simplesmente o mais
participativo e mais divertido.
Quando toca Rebola Pro Pai, eu fico na frente da dele
dançando e ele vai me dando tapas na bunda. Está tudo lindo até
uma música proibidona começar. Ela é mais lenta e Lucca sabe a
letra de cor. Ele traz sua mão em meu pescoço e cantarola em meu
ouvido:
"Quando a vontade bater, vou chamar pra foder daquele jeito
que tu gosta. Te boto de quatro, empina esse rabo, caralho,
gostosa, lá vai piroca."
Nada nunca foi tão quente! Ele me vira de frente e me beija.
Eu temo pelos meus líquidos vaginais! Felizmente, há um pouco de
bom senso e conseguimos nos afastar antes de fazermos sexo em
público. Até decido que preciso de mais uma bebida. Eu não deveria
ter encontrado esse homem não, é realmente sério. Nós dois juntos
somos muito loucos.
No balcão, peço uma água e mais duas tequilas. Estou na
última dose quando uma música que amo começa a tocar. Menina
Solta, da Giulia Be. Eu faço meu próprio show sob o olhar avaliativo
de Lucca, que observa com uma intensidade quase assustadora.
Ele parece o lobo mau e eu a chapeuzinho, só que não. Aqui somos
dois lobos e eu não sei dizer quem quer comer quem com mais
vontade. A sorte é que esse DJ não tem critérios e volta ao funk,
isso nos faz desviar dos olhares promissores.
Quando cansamos da balada, vamos para um cassino, onde
fingimos ser bilionários. Enquanto Lucca joga com alguns senhores,
eu fico sentada na mesa, ao lado dele, interpretando quase que o
papel de uma prostituta de luxo, dando uísque para ele na boca
como se fosse criada e paga para servi-lo. A parte interessante é
que ele joga sem retirar uma mão da minha coxa nua. O filho de
uma boa mãe ganha 5 mil dólares numa jogada e saímos gritando
do cassino para torrarmos a grana. Compramos todas as coisas
supérfluas que vamos encontrando pelo caminho, paramos para
comer cachorro-quente em uma praça, fazemos duelo de quem
bebe mais tequila, perdemos o restante da dignidade que
possuímos e do juízo também.
A minha última grande lembrança é dele lutando para abrir a
porta do meu quarto sem interromper nossos beijos.
"Aoooo Jacinta o Paulatejando" ...eu me lembro disso.
Há alguém me lambendo incansavelmente. Estou tentando
abrir os olhos, mas parece que fui atropelada por um trator. Há
também batidas fortes na porta e minha cabeça simplesmente
parece que está prestes a explodir. As lambidas continuam, e, sem
opção, me forço a abrir os olhos. Péssima ideia. Eu dou um grito tão
alto, que simplesmente devo ter acordado o hotel inteiro. Há um
gato enorme em cima de mim e eu me pergunto como ele veio parar
aqui. O pobrezinho sai correndo e eu estou aterrorizada. Porém,
descubro que o gato não é nada comparado à outra coisa que vejo.
Pior que ele, é encontrar um homem muito gostoso nu, visivelmente
assustado e completamente arranhado.
— Pelo amor de Deus! Você quer me matar de susto? — ele
pergunta, enquanto o pânico me invade. Lucca...
Lucca ALBUQUERQUE!
— OH PUTA QUE PARIU!!! — grito, observando seu pau e só
então ele parece se dar conta da mesma coisa que eu. Eu vejo o
olhar dele correr pelo meu corpo e então percebo que estou nua
também. Não sei. Eu simplesmente rolo da cama e nós dois
parecemos possuir a mesma linha de raciocínio, em busca de
qualquer preservativo que prove que fomos cuidadosos. Eu não
acredito que transei com esse homem e não vou me lembrar,
tampouco acredito que tenha sido imprudente. Isso é uma maldição!
Arrumamos uma confusão, correndo para todos os lados da
suíte, revirando as cobertas. Ele vai até o banheiro e eu me encaro
no espelho completamente assustada com a minha figura. Há
chupões por todo meu corpo, uma marca perfeita de mão em minha
bunda e marca de dedos em minhas coxas. Ser branquinha é uma
merda.
— No banheiro — ele grita, eu respiro aliviada e frustrada ao
mesmo tempo. Caio sentada no chão e permito olhar para o quarto,
completamente destruído. Isso vai nos custar uma fortuna,
certamente. Há até um quadro caído no chão e eu gostaria de
lembrar o tipo de sexo que fizemos. Estou quase calma quando o tal
gato sai correndo atrás de outro. Me levanto desesperada. Minha
cabeça está explodindo, mas eu quero rir porque isso parece
absurdo demais e eu me sinto naquele filme "SE BEBER NÃO
CASE". Meu corpo dói por completo, como se eu tivesse levado
uma verdadeira surra.
Quando Lucca volta, eu tento me enrolar em um lençol, com
vergonha. Felizmente ele está vestindo um roupão e parece ter
lavado o rosto. O homem é bonito até acordando.
— Diga que se lembra de algo! — peço. — Por que há gatos
na suíte?
— Não faço ideia — responde me encarando. — Você está
bem?
— Eu só queria lembrar. Estou sentindo o resultado em meu
corpo, mas seria mais interessante se eu lembrasse — argumento.
— Há dois preservativos usados no banheiro. Eu sinto muito,
nunca transaria com uma mulher bêbada por questão de respeito
mesmo, mas eu provavelmente estava mais bêbado que você, só
isso justifica, então... você pode me desculpar? Por favor!
Realmente gostei de você e gostaria que não tivesse uma imagem
ruim sobre mim. — Ele está mesmo preocupado e é tão bonitinho.
— Eu quem peço desculpas. Desde o primeiro beijo me tornei
uma coisa perturbadora sobre você. — Sorrio. — Mas gostaria de
lembrar, porque é um enorme desperdício transar com você e não
lembrar de nada. Se seu beijo causa um estrago, eu imagino o sexo.
— Minhas palavras parecem causar alívio nele, porque ele ri.
— Deve ter sido fantástico transar com você — diz de uma
maneira carinhosa, e o gato parece ter asas, porque voa sobre mim
como um maluco.
— AI MEU DEUSSS!!! SOCORROOO!!! — grito, e Lucca se
apressa em tirar o bicho de mim. Estou rindo muito, ao invés de
chorar. As lágrimas até estão escorrendo dos meus olhos, mas é de
tanto rir. Essa vai entrar para a lista das merdas que se eu contar
ninguém acredita. O gato precisa de exorcismo!
— Puta merda, são dois deles mesmo! — Lucca exclama, e
eu me jogo em seus braços quando o outro gato tenta me atacar. É
nesse momento perfeito, onde o lençol mal está cobrindo minha
intimidade, que a porta do quarto se abre, revelando ninguém
menos que Pablo, o homem que nasceu pelo cu.
Merda! Mil vezes merda!
— Que merda está acontecendo, Paula? — Pablo questiona,
colocando sua mala no chão e os dois gatos saem para fora do
quarto, para tudo ficar ainda mais perfeito. Assim que desço dos
braços de Lucca, arrumo o lençol em meu corpo e encaro meu ex.
— Eu quem deveria fazer essa pergunta. O que está
acontecendo, Pablo? O que você está fazendo aqui?
— É a nossa lua de mel — argumenta, e Lucca se torna
espectador do possível duelo do século.
— Seria a NOSSA lua de mel se você não fosse um escroto,
um babaca que sequer se preocupou com o filho autista. Agora é
apenas a MINHA lua de mel.
— Você tem um filho? — Lucca pergunta baixo.
— Sim, e infelizmente, esse imbecil é o pai — explico.
— Ele deve ser lindo como você. — Sorrio esquecendo-me
do meu ex. Esse Lucca é muito lindo mesmo. — Ele é autista?
— Sim, descobri quando ele completou 1 aninho e meio, mas
ele é um garoto muito esperto e doce. Tem seu próprio mundinho
encantado.
— Deve ser incrível. Minha família tem abrigos para crianças
e há alguns garotinhos e algumas garotinhas com autismo; há todo
um cuidado e uma preocupação especial sobre eles. Elaboram um
trabalho incrível, se quiser posso levá-la para conhecer. — Gente,
mal posso acreditar nisso. Esse homem deve ser fruto do meu
sonho.
— E eu fico aqui parado, ouvindo vocês conversarem sobre a
merda do autismo? Foda-se! Quem é esse cara? Você está nua e
ele de roupão.
— Não te devo satisfações. Merda de autismo é o seu
orifício! — informo.
— Você tinha um amante?
— Não, mas deveria ter tido. Certamente ele não me deixaria
frustrada como você deixa em curtos intervalos de tempo. — Lucca
começa a buscar as roupas dele com uma naturalidade que eu
jamais imaginei. Ele definitivamente não tem medo de Pablo e não
está intimidado. Simplesmente está agindo como se Pablo nem
mesmo estivesse aqui. Acho que Las Vegas atrai muita loucura.
Vinte e quatro horas nesse lugar e eu sinto que é de longe uma das
maiores loucuras da minha vida.
— Esse cara tem algum tipo de problema? — Pablo pergunta
a mim, e Lucca ri, com a cueca na mão.
— Eu? Problema algum. Já você, provavelmente tem muitos
— diz rindo, e volta olhar para mim. — Não consigo achar minha
camisa.
— Eu não faço ideia onde ela possa estar.
— Ok, cueca e calça terão que servir. — Ele vai para o
banheiro e eu esfrego meu rosto. Quero acordar do pesadelo. A
sorte é que Pablo é o ser humano mais calmo que já conheci.
Agora, sinceramente, estou na dúvida se ele é calmo ou se é idiota.
— Você transou com aquele cara?
— Ouça, Pablo, você perdeu o direito de me cobrar
explicações. Nós não estamos juntos mais, acabou e eu te disse
isso pelo telefone. Sinceramente, não sei o que você está fazendo
aqui. Você me conhece o bastante para saber que não há volta,
tampouco perdão. Eu não vou perdoá-lo, Pablo. Foi humilhante
estar dentro de uma igreja com mais de cento e cinquenta
convidados, sozinha. Eu só enfrentei aquilo até o fim, porque sou
forte e não vou ceder aos seus atos de estupidez. Sozinha, eu
encarei todos eles e tive que explicar que meu querido noivo estava
confuso e decidiu não ir. Portanto, pegue a sua confusão, enfie no
cu e vá embora.
— Precisamos conversar, Paula. Preciso explicar tudo e...
— Eu vim para cá para aproveitar a minha lua de mel. Não
vou conversar com você. Como eu disse, sua vinda até aqui é uma
perda de tempo. Não há explicação no mundo que vá me fazer
compreender. Você não pensou em nosso filho, Pablo. Você sabe
exatamente como as coisas podem ser difíceis e simplesmente não
pensou.
— Eu estava assustado. Acho que mais por Henrico do que
pelo casamento. Ele não gosta de mim.
— Ele gosta, Pablo. O problema é que você não se esforça
para lidar com o garoto e quer que ele morra de amores. Às vezes
acho que você se esquece das limitações dele, se esquece do duro
que dou diariamente. É como se você ignorasse o fato dele ter
autismo. Você nem mesmo é engajado em saber mais sobre o
assunto, em buscar conhecimento — argumento, enquanto as
lágrimas escorrem dos olhos dele. Eu até ficaria dó, mas não vou.
— Em minha mente sonhadora, eu pensei que após o casamento
seria diferente, porque você estaria convivendo com ele diariamente
e as coisas iriam progredir. Mas, não, você me deixou plantada em
um altar, deixou seu filho plantado lá também. Eu ainda te dei uma
chance de mudar de ideia pelo telefone e você simplesmente disse
que era maior que você, que não conseguiria ir. Então, eu te digo
agora que é maior que eu e eu não vou perdoá-lo de forma alguma.
— Quem é aquele cara?
— Um cara que conheci e não venha me julgar, sou solteira e
livre para fazer o que quiser. Ter passado a noite com ele não me
torna qualquer uma das merdas que você está imaginando.
— Então você assume que dormiu com ele? — pergunta.
— Não tenho que assumir nada, Pablo. Simples assim. Vai
ter que superar...
— Ele é brasileiro. Você já o conhecia?
— Ela não me conhecia, nos conhecemos ontem na chegada
— Lucca responde.
— Eu não vou embora — Pablo informa. — Ficarei e nós
iremos conversar com calma mais tarde.
— Você não impõe as coisas aqui — aviso. — Mas, se quer
mais uma conversa, tudo bem. Conversaremos. Porém,
conversaremos apenas para tentarmos discutir sobre nosso filho,
que é o mais importante nessa história, o que sobrou de nós.
— Te espero no restaurante. Vou pedir um quarto para mim
— avisa, pegando a mala e sai. Eu suspiro frustrada, porque estou
numa ressaca monstra e gostaria de ficar deitada tentando lembrar
de como é ter Lucca.
Por falar em Lucca, ele acaba de calçar o tênis e está diante
de mim agora.
— Ouça. Respire fundo, discutir a relação nem sempre é
agradável, mas você parece bem decidida. É melhor que enfrente
isso de uma vez e resolva a situação, para evitar problemas futuros
— Lucca aconselha. — Vou deixar o número do meu celular e pedir
alguém para vir arrumar essa bagunça.
— Eu faço questão de pagar.
— Minha prima é esposa de um dos sócios acionistas daqui,
sou meio que um cliente VIP que tem algumas mordomias, então
não se preocupe com isso — ele diz, fazendo um carinho em meu
rosto. — Eu estive fodido por mais de dois anos, mas te conhecer
me fez feliz, feliz de verdade. Nunca me diverti tanto quanto ontem,
mesmo que eu não me lembre da melhor parte, tenho certeza de
que foi incrível pra caralho. Espero que você resolva a situação com
Pablo que nasceu pelo cu, da maneira que julgar melhor para você
e seu filho. É uma mulher incrível e eu quero conhecer mais de você
caso decida não dar uma segunda chance a ele,
independentemente de ser em uma relação amorosa ou amigável.
Tudo bem?
— Tudo bem — respondo triste, porque ele simplesmente
parece triste o bastante agora, como se estivesse perdendo a
grande chance da vida. Eu não sei se estou louca de bebida ainda,
mas é como ele se parece agora. Acho que tudo foi mais intenso do
que imaginei, porque estou ligeiramente arrasada o vendo anotar o
número dele em um papel na mesa do quarto.
— Aqui está, não hesite em me ligar. Se ele a importunar ou
for grosseiro, basta me chamar e eu cuidarei da situação. Posso
confiar em você?
— Sim, pode. Agradeço. — Sorrio. — Também amei muito
conhecer você. Havia anos que não me divertia tanto e tenho
certeza de que a melhor parte da noite foi incrível. Tentarei lembrar
com todas as minhas forças. Agora só preciso de um banho,
remédios e ir em busca dos gatos. — Ele ri.
— Eu cuido do resgate dos gatos, não se preocupe. —
Novamente ele faz um carinho em meu rosto e deixa um beijo casto
em meus lábios. — Você é perfeita e Pablo é um imbecil, não se
esqueça disso. Daqui a pouco alguém virá arrumar tudo aqui.
— É recíproco. — O que é recíproco? Que merda eu estou
falando? Sei lá. Seja o que for, é recíproco. Aooo maldita cachaça!
Quando ele sai, parece que toda a intensidade vai junto e
atmosfera do quarto fica estranha.
Jesus coroado! Eu não sei se amo Las Vegas ou odeio.
Um trator passou em cima de mim.

É claro que eu tinha que fechar a minha estadia com chave


de ouro. Estou amaldiçoando tudo e todos que vejo pela minha
frente, sentindo uma frustração surreal. Eu devo ter algum carma
com mulheres comprometidas, só isso justifica a merda toda.
A primeira coisa que faço é solicitar que arrumem o quarto da
Paula; a segunda é pedir que cacem os gatos; e a terceira é tomar
um banho e me jogar na cama. Minha mente turbulenta não me
deixa dormir nem por um maldito caralho. Ela começa um duelo que
nem mesmo deveria existir, porque é absurdo, extremamente
absurdo. Conheci a mulher ontem e ela já está em minha mente,
acompanhada de Dandara. Isso é frustrante. Dandara deveria ir
para o inferno e sumir da minha mente.
A retiro com mais facilidade dos meus pensamentos quando
me lembro de Paula dançando. Ela é engraçada. Cinco minutos
pensando nela e então flashes de memórias surgem. Uma tatuagem
foda que some um pouco para dentro da calça, uma tatuagem nas
costas e outra no ombro. Mesa. Cama. Atrás das cortinas.
Eu pego meu telefone e ligo para meu irmão, porque
simplesmente estou fodido agora.
— SOPHIE! — ele está gritando. — Puta merda! Essa
menina vai me matar!
— Ela é uma princesinha da Disney do dindo dela — digo
rindo.
— Ok, Melinda já pegou a pequena meliante. Está tudo bem?
Vem quando?
— Fiz merda, ou talvez não seja merda — confesso.
— O que você fez?
— Conheci uma mulher ontem. Ela é brasileira, do Rio de
Janeiro, mora no Recreio, é advogada, tem 30 anos e é perfeita de
todas as maneiras possíveis e nem mesmo estou falando da beleza
física, que também é foda. — Ele ouve atentamente.
— E onde entra a merda?
— Ela é a minha versão feminina. Sério, a mulher é muito
doida, sabe? E ela diz até o AOOO, como nós dizemos. Nos
casamos na capela do Elvis, tivemos um sexo do qual não me
lembro bem, curtimos a noite pra caralho.
— E qual o problema nisso?
— É a lua de mel dela. — Victor se engasga.
— Porra! Você dormiu com uma mulher casada e agora o
marido dela quer matá-lo?
— Não! Ela foi deixada no altar e veio curtir a lua de mel, que
já estava paga. Só que hoje acordamos com a visita ilustre do
babaca que a deixou no altar e eles vão conversar.
— Puta merda! Melhor, então. — Não, definitivamente.
— Não há nada melhor, Victor. Ele é tão retardado que nem
brigou quando a viu seminua em meus braços. De qualquer forma,
foi um pouco fodido. Ela vai conversar com o idiota e talvez eles até
se resolvam — explico.
— Espera aí. Deixa-me ver se estou registrando direito. Por
um milagre de Natal você se interessou por ela? — Fico calado. Eu
me interessei por ela? Passaria o resto dos meus dias na
companhia dela de boa. Ela é dona de um astral e uma leveza que
poucas pessoas no mundo possuem. É carismática, divertida, sem
papas na língua, direta, sexy pra caralho, um mulherão. — Está!
Porra, estou quase pegando o primeiro voo para Las Vegas apenas
para conhecê-la. Essa mulher é o MacGyver.
— Ok, Victor. Não estou ligando para ouvir piadinhas.
— Não, calma, pô. Só estou surpreso — diz suspirando. —
SOPHIE, PEÇA DESCULPAS AO SEU IRMÃO! — ele esbraveja no
telefone, e volta a falar comigo. Sophie é terrível de todas as
maneiras. — Apenas tenha cuidado, ok? Vá com calma e não seja
impulsivo. Comece devagar, preserve seu coração e tenha certeza
do que quer. É preciso ter a completa certeza do que se quer,
principalmente porque você a conheceu ontem. Talvez só esteja
deslumbrado.
— Eu sei, mas precisava contar a alguém ou ficaria louco.
— Então ela é mesmo legal? Me conte mais — pede.
— Ela é inteligente, espirituosa, tem um sorriso
absurdamente perfeito, é maluca tipo eu. Gosta de uma sofrência e
de cachaça, não tem freio e consegue ser extremamente carinhosa.
Além disso, tem os atributos físicos que são chocantes. Ela é alta,
loira...
— Mas você não curte loiras.
— Ok, deixe eu terminar de dizer. Ela é alta, loira, gostosa
pra caralho, puta merda, Victor. A mulher é linda. — Ele ri, e eu
desligo o telefone na cara dele. Eu só não digo que ele é filho da
puta porque ele é filho da minha mãe. O imbecil me liga e eu
atendo, ouvindo sua gargalhada.
— Calma, você está estressadinho? — pergunta rindo.
— Estou falando algo sério e você está rindo como um idiota.
— É porque eu nunca te vi assim, e eu quero dizer nunca
mesmo. Você está falando de uma maneira leve e divertida, cheio
de empolgação. Só é engraçado, não estou debochando. — Estou
fodido.
— Ok, agora preciso dormir porque parece que um trator
passou por cima de mim. Mande um beijo para a creche do tio
Lucca e para a princesa safadinha parideira.
— Beleza. Juízo, tudo bem? Estou ansioso para você chegar.
Te amo, irmão.
— Também te amo. Sinto sua falta todos os dias. — Merda!
Eu sou um maricas? É meu irmão!
— Vai tomar no seu cu, Lucca.
— Ele está chorando. — Ouço Melinda rindo e debochando
no fundo. — Oh, Sugar Daddy, você está chorando? Vem aqui
chorar no meu colinho!
— Adeus! — Victor encerra a ligação.
Como um cachorro abandonado, fico até meia noite no bar do
hotel olhando para meu maldito celular. Ela provavelmente se
resolveu com o marido e eu estou aqui, iludido, aguardando algo
que não vai acontecer. Peço ao garçom uma saideira e estou quase
pedindo para ele colocar um "Toca aí um João mineiro e Marciano".
Cantarolo a música em minha mente e tamborilo os dedos no
balcão, rindo sozinho da minha própria falta de sorte. Legal é rir da
própria desgraça. Até os gatos sumiram nessa brincadeira.
Bebo a última dose, e quando estou prestes a levantar, uma
garrafa de tequila surge na minha frente.
— Você não sabe o quanto eu caminhei para chegar até aqui!
— Paula diz ofegante, e se acomoda na banqueta ao meu lado,
realmente cansada. Talvez não seja apenas uma música. — Percorri
milhas e milhas. Puta merda! Não preciso malhar pelo próximo mês.
— Você tinha meu número — digo.
— Tinha mesmo, até a faxineira jogá-lo fora. Fui em três
boates e venho te achar no lugar mais improvável. Logo no bar do
hotel! Estou revoltada agora.
— Está tudo bem? Deu tudo certo?
— Para mim sim, para ele não. Inclusive, Pablo que nasceu
pelo cu, neste momento deve estar bem longe. — Ela sorri. — Mas,
nada disso importa. Vim buscar meu parceiro do crime para mais
uma noitada de aventura. Se beber não dirija. — Estou um pouco
sem palavras. — E aí, você vem comigo ou terei que ir sozinha?
Tenho planos grandiosos, provavelmente serei presa.
— Se você for presa, certamente precisará de um advogado.
É melhor que eu a acompanhe para garantir sua liberdade. —
Sorrio, e recebo um sorriso lindo de volta. — Aooo Paula, Jacinta
essa noite problemática! — Fico de pé, pego a garrafa de tequila e a
ajudo a levantar. Seguro sua mão e saio decidido a ter mais uma
noite de loucura ao lado dessa mulher.
Desço para conversar com Pablo um tanto quanto decidida.
Há em meu rosto óculos gigantes, cobrindo o estrago de uma noite
mal dormida, até minha roupa teve que ser escolhida pensando nos
vestígios de uma loucura que eu nem sequer me lembro.
Coincidentemente, Pablo também está de óculos, cobrindo seus
olhos verdes.
Me sento diante dele e peço meu desjejum à uma
funcionária. Assim que ela se vai, ele começa:
— Você precisa me entender.
— Você é fraco. Não sabe lutar pelas coisas que deseja e
sente medo. Acho que ficamos todos esses anos juntos porque para
você era confortável. Eu me apaixonei por você antes, então uma
coisa levou a outra. Sempre foi eu em ação o tempo todo. Você até
tinha muita ação, mas se resumia na cama. Na cama você era
excelente pra caralho, nos dávamos bem, mas em todas as demais
situações era eu a dominar e você simplesmente se sentia
confortável. Minutos atrás eu estava nua com um homem. Acho que
qualquer “noivo” surtaria em grandes proporções, mas não você. Até
acho que está magoado, inclusive a mágoa está estampada em seu
rosto, mas não passa disso; mágoa.
— Eu amo você, Paula. Amo de verdade. Fiquei confuso,
sempre tive meu espaço, sempre foi cada um em seu canto, só
dormíamos juntos aos finais de semana, e tem Henrico.
— Não percebe quanto é vergonhoso isso que acabou de
dizer? Tem Henrico, Pablo? O Henrico existe há três anos, ele
sempre esteve entre nós porque ele é nosso filho, ele é parte de
nós. E você não sabe lidar com isso? Tantos anos de
relacionamento e você diz no dia do nosso casamento que está
confuso? Não há mais nada a ser feito, Pablo. Acho que não ter ido
foi a melhor coisa que você já fez por nós. Não daríamos certo,
principalmente pelo nosso filho.
— Eu sei que quer ser orgulhosa agora, e que sempre disse
que jamais perdoaria um erro de grande escala, mas, por favor, por
todos os anos que passamos juntos, Paula, me dê a última chance
de fazer certo. Eu prometo tentar ser próximo de Henrico.
— Você não tem que tentar ser próximo de Henrico. Isso é
sua obrigação como pai. Henrico não precisa de dinheiro, precisa de
carinho, compreensão, dedicação. E, não se trata de orgulho aqui.
Foi você quem tomou a decisão. Nesse exato momento, era para
estarmos curtindo a nossa lua de mel, passeando por Las Vegas. Eu
deveria estar ostentando a aliança que escolhemos juntos, tirando
fotos felizes. Foi você quem escolheu o nosso destino, quem
decretou o nosso futuro. Não há nada a ser feito agora, tampouco
há perdão. O máximo que conseguirá ter de mim é uma boa
relação, baseada no respeito, pelo nosso filho.
— Você dizia me amar até ontem de manhã — argumenta.
— As coisas mudam. Você não mudou de decisão? Eu tenho
direito de mudar também. Não apenas de decisão, mas de amor.
Acho que nós, seres humanos, temos uma capacidade absurda de
superação, de amar, deixar de amar, se apaixonar, se reinventar. Eu
nunca acreditei na teoria de que o amor só acontece uma vez na
vida. Não será agora que vou acreditar. Podemos sim amar outra
vez, porque vivemos em mutações, em mudanças, e todas elas
tocam diretamente na alma e em nossa essência. Há
acontecimentos que vem para nos alertar, Pablo; que nos mostra o
quanto merecemos mais do que estamos tendo. E, eu resolvi
encarar a situação dessa forma. Eu mereço mais do que você tem a
me dar, infinitamente mais. Por isso, apenas por isso, não ficarei me
lamentando. Já tenho minha decisão tomada, ficar aqui é nada mais
que perda de tempo. Você deve ir e seguir sua vida.
— Paula, por favor.
— Eu desejo do fundo do meu coração que seja feliz, Pablo.
Não insista mais, você me conhece.
— A última chance?
— Não. — É a minha palavra final, e se ele continuar com
isso, estou indo deixar meu café da manhã de lado.
Felizmente ele fica de pé e vai embora sem se despedir. Fico
um tempo olhando para o nada, pensando nos últimos
acontecimentos. Um suspiro triste escapa de mim. É tão louco como
a vida dá uns giros repentinos e muda tudo. Era para eu estar
casada, curtindo a lua de mel com meu marido, mas ao invés disso,
não me casei, tive sexo com um cara extremamente incrível e
sequer lembro. Como se não bastasse toda loucura, agora meu ex
acaba de ir embora, e isso simboliza o encerramento de um ciclo e o
início de outro, onde estou solteira.
Ok mundo, você pode parar de girar agora? Obrigada!
Talvez, o fato de eu ser capricorniana está ficando bastante
marcado agora. Na maioria das vezes não me identifico com muitas
das características que descrevem meu signo. Não sou materialista,
não sou muito fria, não sou calculista. Mas, há algo que me
descreve perfeitamente: a capacidade de apagar pessoas da minha
vida. Quando eu decido tirar alguém de dentro do meu coração, eu
simplesmente tiro e não há nada que me faça voltar atrás. Aí sim, eu
me torno a maior de todas as geleiras do mundo, como agora.
Termino meu café da manhã, vou para o quarto que agora
está devidamente arrumado, e durmo tanto, mais tanto, que pulo
todas as refeições. Só acordo a noite, desorientada por completo.
A primeira coisa que faço é tomar banho; a segunda é
solicitar um jantar. Escolho uma roupa que consiga cobrir alguns
hematomas leves do meu corpo, janto, escovo os dentes e faço uma
maquiagem para a noite. O problema é que quando vou em busca
do número de Lucca, não encontro o papel e isso me deixa mais
chateada do que deveria. Porém, um filho teu não foge à luta. Eu o
quero e estou indo atrás de encontrá-lo.
Estou ficando louca provavelmente, mas foda-se. Nem
mesmo conheço Las Vegas, mas sei que as melhores baladas são
mais ou menos próximas ao hotel. Andando, com um salto 15 em
meus pés, eu rodopio por todos os lados, tentando encontrá-lo.
Entro na boate que fomos ontem e não o encontro em qualquer
lugar. Saio dela e passo por mais duas boates e nada. Compro uma
garrafa de tequila e continuo andando pelas ruas cheias, até trombo
em pessoas por estar olhando para todos os lados. É então que me
encontro de frente ao hotel novamente e algo em mim me faz entrar,
como se tivesse uma força me puxando. Sigo para o restaurante e
não o encontro, o localizo no bar, cabisbaixo e perdido em
pensamentos. É a segunda vez que o vejo triste e vê-lo triste é
horrível de todas as maneiras. Ele parece tão desolado quanto é
possível estar. Eu gostaria de saber o que aconteceu com a ex dele,
porque tenho certeza de que foi ela quem o transformou em um
homem visivelmente abalado emocionalmente. Decido tentar mudar
isso.
— Você não sabe o quanto eu caminhei para chegar até aqui!
— canto ofegante, colocando a garrafa de tequila diante dele e
sorrindo. — Percorri milhas e milhas. Puta merda! Não preciso
malhar pelo próximo mês.
— Você tinha meu número — diz, visivelmente chateado.
— Tinha mesmo, até a faxineira jogá-lo fora. Fui em três
boates e venho te achar no lugar mais improvável. Logo no bar do
hotel! Estou revoltada agora — explico.
— Está tudo bem? Deu tudo certo? — pergunta tristonho.
— Para mim sim, para ele não. Inclusive, Pablo que nasceu
pelo cu, neste momento deve estar bem longe. — Sorrio. — Mas,
nada disso importa. Vim buscar meu parceiro do crime para mais
uma noitada de aventura. Se beber não dirija. — Ele fica mudo, me
observando minuciosamente. Acho que ele ainda não compreendeu
que estou aqui, ou sei lá o que está acontecendo. — E aí, você vem
comigo ou terei que ir sozinha? Tenho planos grandiosos,
provavelmente serei presa.
— Se você for presa, certamente precisará de um advogado.
É melhor que eu a acompanhe para garantir sua liberdade. —
Finalmente eu recebo um sorriso e retribuo. — Aooo Paula, Jacinta
essa noite problemática! — Fica de pé, pega a garrafa de tequila e
me oferece sua mão para que eu fique de pé. Penso que ele está
indo me soltar, mas não acontece. Ele entrelaça nossos dedos e me
arrasta do hotel para mais uma noitada.
Ao invés de irmos para uma balada, vamos para uma noite
de aventuras diferente. Estamos na Stratophere Tower, a torre de
observação independente mais alta dos Estados Unidos com vista
privilegiada para diversos pontos fantásticos de Las Vegas. É
assustador estar aqui, mesmo que eu não tenha medo de altura.
— Você curte brinquedos radicais? — ele pergunta com um
sorriso promissor, e eu mordo meu lábio.
— Na verdade, eu não vou em um parque desde a última vez
em que fui à Disney e ainda era adolescente.
— Mas tem alguma restrição?
— Acho que não. — Sorrio.

— Vamos no Big Shot[1]?


— Aiiii!!! — dou um grito animado. — Acho que vou morrer,
mas vamos!!!
Lucca compra os ingressos e bebemos um pouco de tequila
para tomar coragem. Quando chega a nossa vez, encontramos um
lugar lado a lado e nos acomodamos. Estou no auge do nervosismo
agora e ele percebe. Acho bonitinho quando segura minha mão,
tentando passar segurança.
— Você é a uma companheira de aventuras e tanto — diz,
beijando minha mão.
— Você é louco. Eu gosto. — Sorrio.
Quando as demais pessoas terminam de se acomodar, a
trava de segurança nos prende e um friozinho surge em minha
barriga.
— Se eu morrer meu filho vai ficar com Pablo que nasceu
pelo cu! Maldição! Estou ligeiramente arrependida! — digo rindo.
— É uma grande merda, literalmente. Preparada?
— Sim, mas vai me dar tesão — digo sem pensar, ganhando
um olhar um pouco chocado. — Ué, é normal.
— Não é normal.
— Claro que é. Dá aquele friozinho que atinge até a alma.
— Você me fodeu agora. Eu vou pensar o tempo todo que há
uma linda mulher com tesão ao meu lado. — Começo a rir e grito
quando o brinquedo começa a se mover. Eu rezo todos as orações
que sei internamente. Pelo amor de Deus, eu tenho um filho e não
quero morrer tão jovem.
O bendito brinquedo vai subindo lentamente e estou quase
quebrando os dedos de Lucca. Deixo de focar no medo e passo a
focar na vista fabulosa. É de tirar o fôlego e eu gostaria de poder
tirar uma foto aqui de cima, mas não é possível. Essa é uma
daquelas imagens que devemos registrar em nossa mente e deixá-
la para memória de um momento incrível da vida.
Eu olho para Lucca e ele também está perdido na vista. Isso
me faz sorrir.
Quando o brinquedo chega no topo, é o momento de testar
meu coração. Eu fecho meus olhos, cagando de medo, e o
brinquedo simplesmente despenca. Eu grito tudo o que jamais gritei
na vida, e ouço a gargalhada de Lucca. Esse cara é louco, só isso
justifica.
Saio do brinquedo tontinha e ele vem me carregando,
morrendo de rir.
— Foi uma experiência fantástica que jamais repetirei —
aviso.
— Oh, eu até iria te chamar para saltarmos de bungee jump
amanhã.
— Que horas? — pergunto, fazendo-o gargalhar novamente.
Rindo, ele me pega em seus braços e me rodopia.
— Você é incrível, mas agora precisamos comer porque há
uma noitada para enfrentar e preciso estar fortinho. Estou com
fome.
Comemos, vamos para a balada e só saímos de lá às sete da
manhã, destruídos de tanto dançar. Não bebemos muito essa noite,
ficamos mais concentrados em dançar e conversar, mas, no fundo,
acho que não bebemos porque não queremos ter outra crise de
amnésia.
Eu ando com minhas sandálias na mão e Lucca tem a
excelente ideia de irmos comer. Escolhemos uma pizzaria e nos
acomodamos.

Essa mulher é uma excelente companheira, não resta


dúvidas. Ela topa tudo e não reclama de absolutamente nada.
Qualquer coisa pequena que seja, a deixa radiante pra caralho, tipo
uma pizza.
Ao invés de se sentar na cadeira, ela está no parapeito da
janela, devorando duas fatias de pizza de uma só vez e falando
pelos cotovelos.
— Que pizza, meus senhores! — elogia de boca cheia.
— É realmente gostosa, Diabinha. — É, diabinha é o melhor
apelido para essa mulher.
— A pizza?
— Também. — Sorrio, e ela retribui. — Vamos lá, me diga
algo que não sei sobre você.
— Acho que você sabe mais de mim do que eu sei de você
— diz. — Me conte sobre sua ex — pede. — Acho que teremos ao
menos uma amizade daqui para frente. Eu gostaria de saber mais
sobre isso, para compreender onde estou "pisando".
— Uma amizade colorida — afirmo.
— Por favor. — Ela ri, e eu fico sério.
— Entendi o que você quis dizer. Você quer um pouco de
transparência e acho que isso é muito importante em qualquer
relação, mesmo que seja uma amizade colorida ou não.
— É bem isso. Você já sabe que eu fui deixada no altar e que
não há ninguém no mundo que vá me fazer perdoar. Sabe também
que é tudo bem recente, então...
— Minha ex chama-se Dandara.
— Eu conheço uma juíza com esse nome. Ela é o diabo que
todos temem. — Eu fico calado, e ela compreende o meu silêncio. A
vejo abrir a boca em espanto. — Você está falando sério?
— É.
— Mentira! De coração, se você dissesse que seu irmão
esteve com a juíza Dandara eu até acreditaria, porque ele é maior
sério nos tribunais e temido, assim como ela. Agora... me desculpe,
mas não há como acreditar que você teve algo com ela.
— Pode acreditar, eu realmente tive — afirmo. — Ficamos
juntos poucos meses, morando juntos. Eu a amava demais, estava
muito apaixonado, mesmo ela sendo bastante oposta a mim.
Tivemos meses bons, e do nada, um dia ela simplesmente disse
que estava indo embora. Ela não permitiu que eu argumentasse,
tampouco demonstrou qualquer tipo de sentimento ou emoção.
Dandara teve um relacionamento complicado, abusivo, onde chegou
a ser agredida fisicamente e o cara foi preso. Fui atrás dela, fui atrás
do ex marido dela que havia sido solto poucos dias depois que foi
preso. Enfim, ele permanecia na mesma casa, mas ela não. Fui
atrás dela até mesmo na cidade dos pais e nada. Tentei rastrear o
número de telefone, tentei de tudo e simplesmente NADA. Então,
tempos depois ela me mandou um e-mail dizendo que me amava e
eu voltei a procurá-la. Dandara simplesmente sumiu, a família dela
continua normal, tudo normal. Não sei dizer.
— Você ainda a ama.
— Não vou mentir, ainda amo, mas não quero mais esse
sentimento. Nem mesmo a quero em minha vida. Compreende?
— Sim. — Ela sorri. — Eu acho que ainda amo Pablo, mas
não o quero em minha vida e tampouco quero esse sentimento. Isso
é saber se amar também, e é tão importante atingirmos esse nível
na vida, onde passamos a saber do nosso valor e deixamos de
permitir receber menos do que merecemos. Acho que temos muito
em comum, embora sua história seja bem diferente. Vocês tiveram
alguma discussão?
— De jeito algum. Sou o cara mais pacífico que tem, evito
brigas a todo custo, tendo sempre conduzir as situações com
paciência e humor.
— É, isso eu percebi.
— Não foi a primeira vez. Ela havia me deixado uma outra
vez e eu só voltei porque confiei nas palavras dela.
— Eu sinto muito por você — ela diz. — Sabe, eu imagino
que esse lance de não saber o motivo é o que mais dói. Espero de
coração que um dia vocês se encontrem e que você possa obter
essa explicação, mesmo que depois da conversa vá ficar com ela ou
não. Acho que isso ajudaria a compreender melhor e aceitar,
principalmente eliminar julgamentos, porque em situações como
essa acho que acabamos criando julgamentos mesmo sem querer e
sem saber a versão da pessoa. Não conseguimos controlar,
principalmente porque nos faz sofrer. Enfim, você entendeu o que
eu quis dizer?
— Consegui entender sim. — Sorrio, e ela sorri de volta.
Gostei do nível de maturidade dela. É uma Diabinha, mas é
inteligente e madura quando necessário. — Mas, eu espero não a
encontrar, não mais. Agora vamos escolher alguma sobremesa,
porque nem só de vinho e pizza vive um homem.
Pedimos uma sobremesa com morangos e voltamos a falar
coisas sem sentido.
— Isso aqui também é muito bom.
— É gostosa.
— A sobremesa?
— Também. — Ela ri. — Quais os planos para essa tarde?
— Eu quero ficar à toa o dia inteiro, e a noite também. Acho
que não quero sair hoje, talvez apenas para a piscina do hotel. O
que acha?
— Eu acho que conheço um lugar mais privativo que tem
piscina.
— Isso é um convite para um motel? — pergunta rindo.
— Não, mas se você quiser... — brinco. — Não é um motel.
Você é minha convidada se quiser passar um dia em uma piscina,
bebendo e comendo tudo o que temos direito — proponho.
— Parece uma boa ideia. Comer é realmente sempre bom.
— Então vamos embora dormir um pouco, Diabinha. Temos
um dia lindo pela frente.

Quando chegamos ao hotel, a levo até a porta do quarto e ela


faz uma carinha engraçada. Sorrio quando ela deixa a bolsa e as
sandálias caírem no chão e se joga em meus braços, me dando um
abraço apertado.
— Obrigada por ter feito minha noite feliz, bebê Lucca.
— Eu quem agradeço. Na verdade, eu tenho que agradecer
minha ex. — Ela franze a testa e eu deposito um beijo casto em
seus lábios. — Durma, logo mais venho acordá-la. — A coloco no
chão e sigo para a minha suíte.
Nem nos meus sonhos mais incríveis eu imaginei que minha
estadia em Las Vegas seria dessa maneira que está sendo. Eu
achei que ficaria bêbada em tempo integral e perderia a dignidade
de todas as maneiras mais alucinantes que podem existir. Mas, não.
Parece que Deus tinha outros planos e colocou em meu caminho
alguém que me faz perder a dignidade com moderação, o que é
muito mais bonito.
Após almoçarmos na cobertura do hotel, de uma maneira
muito sofisticada e até romântica, seguimos para um flat luxuoso,
que fica na cobertura de um prédio chamado VINCENZO.
Há toda uma energia crepitando entre nós dois quando ele
fecha a porta do apartamento.
— Aqui é lindo — elogio, tentando fugir da situação.
— É realmente bonito — diz, se aproximando de mim e
trazendo suas mãos em meu rosto. — Você está um pouco tensa.
Eu não a trouxe aqui para sexo, a trouxe para termos mais
privacidade e porque quero conhecê-la um pouco mais, então
simplesmente relaxe, tudo bem? Se fosse sexo não precisaríamos
sair do hotel.
— Eu sei. Só um pouquinho tensa à toa mesmo, embora já
tenhamos tido sexo, mesmo que as memórias tenham sido
apagadas. — Sorrio. — Eu acho que já conseguimos atingir um
nível de intimidade muito rápido. Estranho, não?
— Talvez sim, talvez não tão estranho. — Ele sorri.
— Acho que seria legal se fossemos mais devagar. Ambos
saímos de relacionamentos conturbados. Só estou um pouco
receosa porque as coisas estão evoluindo na velocidade de um
cometa e há muita química entre nós.
— A amizade é o que está no topo das coisas que quero com
você, tudo mais que acontecer será por livre e espontânea vontade
de ambos, sem forçar. Precisamos apenas deixar fluir, sem medo,
sem receios, tudo bem?
— Tudo bem. Deixar fluir, eu gosto de como isso soa — digo,
dando um beijo casto em seus lábios.
— Piscina? Cerveja?
— Uma combinação perfeita para uma tarde ensolarada.
— Pode ir indo, vou pegar as bebidas, tudo bem? — Gosto
de como ele é preocupado e demonstra respeitar uma mulher.
Aceno positivamente e sigo para área da piscina após ele me
mostrar onde é. Há uma vista incrível e isso me deixa animada.
Retiro minhas sandálias, meu vestido e ajeito o biquíni em meu
corpo. Sem perder tempo, mergulho, a água está um pouco fria,
porém, é bem-vinda em meio ao calor do sol e do meu corpo, que
está em combustão.
Lucca surge sem camisa, com um balde contendo algumas
cervejas em mãos. Ele o coloca na beira da piscina, retira os óculos
escuros e entra, num mergulho como eu fiz. Quando ele volta a ficar
de pé, eu ofego, observando-o arrumar os cabelos. Seus braços se
tensionam e os músculos ficam em evidência. É sexy.
Ele sorri para mim, coloca os óculos e pega duas long necks.
Eu bebo a minha tão rápido, sentindo uma sede insuportável.
— Uma mulher que gosta de cerveja é algo bom, hein? —
brinca.
— Eu amo uma cerveja bem geladinha — digo, nadando para
deixar o casco vazio e pegar mais uma. — Antes que pense, não
sou alcoólatra, só estava com sede. Uma mulher que bebe cerveja
não quer guerra com ninguém.
— Não pensei nada, aliás, pensei. Mas, são pensamentos
que devem ser mantidos em segredo — brinca, e noto seu olhar
correr pelos meus seios. Algo passa em sua mente e ele volta o
olhar para meu rosto, como se fosse um verdadeiro anjo celestial.
— Gostaria de saber ler pensamentos. — Sorrio, bebendo um
pouco da segunda cerveja.
— Você mudaria o conceito sobre mim se pudesse ler meus
pensamentos agora. — Hummm... gostaria mesmo de saber ler. —
Me conte mais sobre você, senhorita Paula Jacinta, esposa de
mentirinha. Quero saber mais sobre seu trabalho e sobre seu filho.
Será que é possível? — brinca, e sorrio em concordância.
Passamos cerca de uma hora conversando. Eu conto a ele
sobre meu trabalho, sobre meu bebê e toda a rotina que temos.
Comemos alguns morangos e seguimos bebendo, conversando. Os
assuntos simplesmente vão fluindo. Ele me conta sobre a família
dele, sobre os sobrinhos, afilhados. Fico encantada de ver o amor
que ele emana ao falar de cada um de seus familiares e como se
emociona quando diz sentir falta de todos eles. Inclusive, é
impossível não querer conhecer Victor e Melinda, que são as duas
pessoas de quem ele mais falou.
Esse homem é um gato, mega gostoso e super inteligente.
Ele é todo macho alfa e estou encantada com os pelinhos em seu
peitoral. Há uma tatuagem do lado direito em sua costela, a imagem
de Jesus de joelhos, com uma coroa de espinhos na cabeça.
Perfeito. Há também tatuagem em sua mão direita, uma flor que
cobre toda a mão e vai até um pouco acima do pulso.
Em seu rosto eu não sei dizer o que é mais lindo; o sorriso, a
boca carnuda, a barba ou os expressivos olhos. Lucca sorri com os
olhos, e isso é também é encantador.
Acho que a bebida fez efeito em mim de uma maneira
inapropriada, pois estou comendo-o com meus olhos e sentindo
uma necessidade sexual louca se apossar de mim. O clima
agradável também está contribuindo.
Ele se aproxima de mim e suas mãos fortes paralisam em
minha cintura. Sorrio, contente com a proximidade, e traço meu
dedo indicador do pescoço até seu umbigo.
Lucca delicadamente beija minha testa, mas, quando ele
desce até a minha boca e nossos lábios se encontram, eu permito
deixar que o tesão grite mais alto e liberto o que estava tentando
conter. O beijo com toda devassidão e desejo que existe em mim,
sentindo-o endurecer muito rapidamente contra meu corpo. Ele me
gruda contra a parede da piscina e eu enrolo minhas pernas em sua
cintura. Suas mãos deixam minha cintura e deslizam diretamente
para a minha bunda, onde ele aperta de um modo nada delicado.
Ofegante, sou obrigada afastar nos lábios por alguns
segundos.
— Diabinha, você está tornando as coisas difíceis para mim
— ele confessa em meu ouvido.
— Não me lembro de prometer deixar as coisas fáceis —
rebato, e passo a língua pelo seu pescoço antes de voltar a beijá-lo
e deixá-lo ainda mais louco. Me esfrego lentamente contra seu
corpo enquanto sua boca perfeita faz sexo com a minha. Passo
minhas mãos por parte do seu peitoral e subo, agarrando seus
cabelos. O nível de urgência aumenta. É tão incrível sentir a
alquimia, eu e ele, plena química. As mãos dele não conseguem
mais se manter no lugar e vê-lo perder o controle é tão revigorante,
faz com que eu me sinta tão poderosa, por ser capaz de causar
sensações e descontrole. Juntos, os quatro elementos fogo, ar,
terra, água. A água é onde estamos e ela é incapaz de apagar o
fogo que surge quando estamos tão grudados e perdidos em toques
e beijos. A terra simboliza nossa força, mas ela está falha neste
momento, quase rompendo-se. E o ar... o ar é quando falta o fôlego
e precisamos afastar nossos lábios mais uma vez.
— Não estou conseguindo mais segurar. — Ele é tão fofo de
avisar. — Você disse... — tenta argumentar, e eu coloco um dedo
sobre sua boca. Eu disse um monte de coisas, mas agora não sou
capaz de seguir qualquer uma delas. Acho que a muito tempo eu
não me sentia tão desejada como me sinto agora. Sabe, aquele tipo
de desejo que você consegue ver através dos olhos de uma
pessoa? É desse tipo que estou falando, e é tão raro que ignorar o
que ele causa é nada mais que burrice. Fazer sexo com alguém que
quer apenas foder é legal, mas fazer sexo com quem realmente te
deseja não apenas para sexo, é estar um nível acima do prazer.
Ofego com uma de suas mãos invade meus cabelos e ele me
puxa para mais um beijo. Acho que agora sim ele perdeu o controle
e deixou sua docilidade de lado, é uma pegada diferente, mais
decidida. Sorrio em seus lábios enquanto ele retira os óculos
escuros e joga longe.
Toco sua cintura e deslizo minhas mãos até o cós de sua
bermuda. Enfio um dedo pelo elástico e passeio com ele, sentindo
os pelinhos delicados de seu corpo. Eu gosto tanto disso, tanto.
Atualmente é tão raro encontrar um homem raiz e Lucca é bem raiz,
sem muita depilação e um pouco de pelos. Nada exagerado, mas
sob medida para me deixar com tesão. Eu admiro o bastante para
seguir com minha exploração, mas definitivamente a água não é um
bom lugar.
O afasto e ele sorri quando começo a andar.
— Você vai fugir, Diabinha?
— Vou — aviso, subindo os degraus da piscina sob o olhar
atento dele. Quando estou fora, desamarro os lacinhos que
prendem a calcinha do biquíni em meu corpo e deixo a peça cair. Eu
me viro de frente para Lucca, vejo seu olhar percorrer meu corpo e
focar em minha intimidade. Ele me olha com fome, desejo e
adoração. Isso me move a retirar a parte de cima e fico feliz ao vê-lo
passar a língua em seus próprios lábios e caminhar para sair da
piscina parecendo um predador. Ele tem o sangue quente, é
perceptível.
Quando ele está fora da piscina, me aproximo e abro sua
bermuda. A peça cai ao chão e eu o puxo pela cueca rumo à sala.
Ele mostra que eu não estou cem por cento no controle quando me
pega, me joga em seu ombro e caminha pelo apartamento a fora.
Vou rindo até ser colocada sobre uma cama e ele pairar sobre meu
corpo, com um semblante carregado de tensão sexual.
— Me come — peço.
— Pode ter certeza de que vou comer. — Um beijo e não há
mais tempo para preliminares. Eu abaixo a cueca dele, seu pau
salta livre e adeus racionalidade. É incrível como bêbados tivemos
prudência e agora não, porém, sinto que posso confiar nele e estou
devidamente protegida com meu implante anticoncepcional. — Você
faz uso de algum método contraceptivo?
— Sim, pode vir com tudo. — Lucca me invade de uma só
vez e arremete forte enquanto me beija como um maníaco. Eu
confio nele, como se nos conhecêssemos há anos, mesmo sabendo
que isso é errado.
Arranho suas costas, aperto sua bunda e movo meu corpo
abaixo do dele, desesperada. Somos canibais completos agora,
nada lento, nada moderado. Ele é perfeito, tê-lo dentro de mim é
perfeito, mas há algo diferente..., porém, foda-se.
Rolamos na cama e ele me coloca por cima. Eu apenas não
consigo montá-lo normal, porque é impossível deixar de beijá-lo. Eu
me movo deitada sobre ele, beijando sua boca, enquanto suas
mãos paralisam em meu quadril, ajudando meus movimentos a se
tornarem mais rápidos. É tão louco, que não há tempo nem para
gemer.
Ele volta a nos girar, ficando por cima novamente. Suas mãos
agora ficam sobre a cama e ele afasta nossos lábios. O vejo
observar a junção dos nossos corpos e subir o olhar para mim.
Mordo meu lábio e ganho um gemido de presente.
Deslizo minhas mãos pelo seu pescoço e o faço abaixar até
mim. Minha língua passeia rumo ao seu ouvido, mordo o lóbulo da
sua orelha e sussurro:
— Você me come tão gostoso. Vou gozar.
— Você sabe como matar um homem na cama — diz, vindo
me beijar. Ele arremete mais forte e então lento, é uma tortura
deliciosa senti-lo por completo, me alargando e então me deixando
vazia, repetindo os movimentos de forma tão gostosa, buscando
meu prazer. Sua mão esquerda desliza até meu seio direito, num
aperto dolorosamente delicioso. Sou obrigada a afastar nossos
lábios quando ele prende meu mamilo entre seus dedos. Quando
meu orgasmo se aproxima com mais força, abro mais minhas
pernas, cravo minhas unhas em sua bunda e permito deixar meu
corpo explodir, ouvindo a melodia máscula dos sons que saem de
Lucca, sentindo-o me acompanhar. Juntos, em plena conexão e
sincronia; parte do corpo dele pulsando dentro de mim e parte do
meu corpo se contraindo em torno dele. Uma fantástica viagem ao
céu, que melhora ainda mais quando recebo beijos em meu
pescoço e sinto seu corpo mais pressionado ao meu. — Meu Deus!
Que mulher! — ele diz baixinho, como se estivesse dizendo apenas
para si mesmo. Sorrio em pleno contentamento e bagunço mais
seus cabelos, então ele nos gira, deixando-nos de lado, um de
frente para o outro, um dentro de outro. O sorriso que dá é
fantástico.
— Isso foi incrível, surreal, avassalador — confesso sorrindo.
— Foi um pouco insano.
— Só um pouquinho. — Ele me beija delicadamente, tão
carinhoso e tão gostoso. É tão bom sair com um homem que sabe
como valorizar uma mulher e fazer com que ela não se sinta usada.
Ele não é meu segundo homem da vida. Antes de Pablo tive
experiências não tão boas, com homens que só pensam em buceta,
seios, bunda e conseguir orgasmos sem nem pensar nas mulheres.
Há uma diferença tão grande em sair com um homem que foca mais
no prazer da mulher do que no próprio. Só elogios para esse cara
aqui... ele merece muitos.
— Acho que precisamos de um banho — comento, traçando
meu indicador em seus lábios. — Sua boca é incrível. Eu gostaria
de senti-la mais... em outros lugares do meu corpo. — O sinto pulsar
dentro de mim e me remexo lentamente apenas para provocá-lo.
— Você é uma mulher decidida. Preciso dizer o quanto estou
admirado? Gostei muito disso. Acho que teremos que tomar um
banho para então que eu possa provar outras partes do seu corpo
com a minha boca. — Ele me deixa vazia, fica de pé e eu dou um
grito ao ver um piercing em seu pau.
— OH!!! Era isso que estava diferente! — exclamo
escandalizada, e ele ri.
— Gostou?
— É diferente — confesso. — Deus! Estou chocada, jamais
imaginaria.
— Há mais, fruto de uma noite de loucura com meu irmão —
comenta, virando-se de costas e eu quase engasgo com o vento ao
ver uma tatuagem em sua bunda com os dizeres "HAKUNA
MATATA". Não consigo parar de rir. — Você está fazendo bullying
comigo? — pergunta brincando.
— Oh Deus! Hakuna Matata é demais! — Meus olhos estão
brilhando em lágrimas, de tanto rir.
— Se eu contar o motivo você vai transformar o riso em choro
— ele diz ficando triste, e eu paro de rir.
— O que foi?
— Especialmente hoje estou bastante feliz, então não quero
falar sobre isso. Tudo bem? É algo que aconteceu com a esposa do
meu irmão e foi muito sofrido. Ele fez um Simba e eu quis
acompanhá-lo, escrevendo Hakuna Matata. Depois te conto direito.
Agora só consigo pensar em ter minha boca em seu corpo.
— Estou morrendo por isso — informo, ficando de pé e ele
me pega em seus braços. — Bebê, Lucca.
— Diabinha quente.
E assim passamos o restante da tarde e da noite. Entre sexo,
conversas engraçadas, comidas e bebidas.
Na manhã seguinte, assim que chegamos ao hotel, eu troco
de roupa e saio sozinha. Vou em busca de presentes para meu o
filho e até compro algumas coisas para mim. Passo a manhã e a
tarde inteira rodando pelas mais diversas lojas de Las Vegas e volto
chorando para o hotel, descompensada por não ter encontrado a
fantasia que Henrico pediu. Ligo para a minha mãe chorando e ela
tenta me acalmar, dizendo que ele vai compreender. Mas, sou mãe,
sei que é apenas uma fantasia, mas consigo pensar na felicidade
em que meu filho ficaria se eu chegasse com o que ele pediu. Ele
ama Toy Story, ama muito e isso o deixaria feliz. Os momentos em
que ele fica cem por cento feliz são tão raros, e eu gostaria tanto de
poder proporcionar isso ao meu pequeno, principalmente após
passar alguns dias distante. Queria colocar um lindo sorriso em seu
rosto e apenas não vou conseguir.
Eu rodei Las Vegas, fiz pessoas ligarem em busca da
fantasia e não encontrei nem mesmo de outro personagem do
desenho. Não conseguirei mandar confeccionar no Brasil a tempo.
Desanimada, tomo banho, visto um pijama, peço meu jantar no
quarto e durmo após comer.
Quando acordo no dia seguinte, ligo para Pablo.
— Mudou de ideia? — Ele atende já perguntando, mas eu
realmente estou chorando agora e sem paciência.
— Você pode me ajudar? É para Henrico. Ele me pediu uma
fantasia e eu apenas não consegui achar. Ele ficará arrasado. Você
já está no Brasil?
— Cheguei a pouco. Estou cansado, Paula. Não vou sair em
busca de fantasia. Já que você está de férias, deve ter tempo para
procurar melhor.
— Você é tão imbecil, desgraçado. É para seu filho — grito
de ódio.
— Eu não tenho jeito para essas coisas. Peça a sua mãe.
— A minha mãe está cuidando dele.
— Então volte antes e vá procurar, é bom que conversamos
mais uma vez. Não há motivos para estar aí.
— VOCÊ É UM IDIOTA! A MELHOR COISA QUE FEZ NA
VIDA FOI NÃO TER IDO NA DESGRAÇA DO CASAMENTO. EU
TENHO ÓDIO DE VOCÊ POR NÃO SE IMPORTAR COM NOSSO
FILHO, POR DEMONSTRAR NÃO TER CONSIDERAÇÃO. VOCÊ É
UM SER HUMANO DETESTÁVEL, PABLO. EU FUI IDIOTA POR
CINCO ANOS POR TER ME RELACIONADO COM VOCÊ.
HENRICO É A ÚNICA COISA BOA QUE VOCÊ FEZ NA VIDA. EU
ESPERO QUE TOME NO MEIO DO SEU CU E QUE TENHA A
DECÊNCIA DE NUNCA MAIS PROCURAR POR MIM OU POR
ELE. INFELIZ! — Encerro a ligação e volto a chorar, agora de
tristeza pelo meu filho ter um pai tão desgracento.
Há uma batida na porta e eu abro. O sorriso de Lucca morre
ao me ver e ele entra.
— Ei, o que houve?
— Eu tentei encontrar uma fantasia que meu filho pediu, rodei
Las Vegas inteira ontem e não achei. Fui ligar pedindo ao pai dele, e
ele simplesmente disse que não iria procurar fantasia nenhuma. E
eu prometi ao meu pequeno. — Choro, abraçada a ele. — Ele vai
ficar tão triste. Eu só queria fazê-lo feliz, fazê-lo sorrir. Pablo é ...
— Um filho da puta que nasceu pelo cu.
— É isso e mais.
— Qual fantasia é?
— Do Xerife Woody, do Toy Story — explico chorando.
— Ok. Ele tem três anos, não é isso?
— Sim.
— Vou encontrar — avisa, se afastando de mim. — Fique
tranquila. Vá lavar esse rosto e comer algo, mais tarde voltarei com
a fantasia.
— Como?
— Não importa, você ganhará o sorriso do seu filho. — Ele
pisca um olho e sai, eu caio de bunda na cama, chocada.
A primeira coisa que fiz ao sair do quarto de Paula foi solicitar
um voo rumo à Los Angeles. Dentro dele, minha primeira ligação foi
para Isis, que ficou ligeiramente assustada com o desespero pelo
qual eu estava clamando por uma fantasia infantil. Não preciso dizer
o quanto ela encheu meu saco, e, por isso, eu tive que falar com
Bruce.
Para garantir que desse certo, eu liguei logo em seguida para
Arthurzinho, para Heitor e para Maria Flor, e, neste momento, me
encontro dentro de um helicóptero voltando para Las Vegas.
Eu conheci a Paula há poucos dias e já percebi que a mulher
é uma mãe e tanto. O desespero que ela estava quando a encontrei
mais cedo foi de dilacerar um coração. Por um lado, poderia
facilmente parecer como um ato um tanto quanto exagerado, mas
por outro... é o filho dela, e se ela estava tão desesperada é porque
sabia que o garoto iria sentir. O mais surpreendente é o Pablo que
nasceu pelo cu mostrar que definitivamente é um grande pedaço de
merda, principalmente sabendo que o filho possui um certo tipo de
transtorno que pode ser bastante complexo. De qualquer forma, é o
dia de sorte de Paula, porque estou voltando com dois tamanhos
diferentes da fantasia, com um brinquedo contendo todos os
personagens e um presente para ela.
Passei o dia inteiro focado nessa causa de forma que estou
louco por um banho e uma refeição decente. Porém, é com sorriso
no rosto e plena satisfação que desembarco do helicóptero no
heliporto do hotel.
Vou diretamente para o quarto dela e ela abre a porta
cabisbaixa.
— AOOOO PAULA JACINTA! — digo. — Você é linda pra
caralho, até com carinha de quem chorou o dia inteiro. — Invado o
quarto atropelando-a.
— Ei... estou um lixo humano, desculpe.
— Você como um lixo humano é mais linda que 90% da
população feminina mundial — elogio. — Bom, quero saber se a
senhorita se comportou — aviso. — Comeu direitinho? — Ela
finalmente sorri.
— Comer a gente come. — Sorrio com sua resposta.
— Eu trouxe algumas coisas, mas só entregarei se eu ganhar
um beijo na bochecha e um sorriso muito lindo. Caso contrário... —
Ela corre, beija os dois lados da minha bochecha e me dá um
selinho na boca. Em seguida, ela dá o sorriso e eu acabo rindo.
Entrego as sacolas para ela e mesmo sem ver o conteúdo ela
começa a chorar. — Ei, sem chorar — repreendo, enquanto espalha
tudo pela cama. A vejo levar as mãos na boca e tentar reprimir o
choro.
— Eu mal posso acreditar — diz, vindo me abraçar. — Muito
obrigada, muito, muito, muito obrigada, Lucca. Você não faz ideia do
que acabou de fazer por mim e pelo meu filho. Parece bobagem,
mas é tão importante. É tão complexo ser mãe de um menininho
autista e eu sempre me apego a qualquer coisa que possa fazê-lo
feliz. Então, eu jamais serei capaz de expressar minha gratidão a
você, por esse gesto tão lindo, por ter se disponibilizado a me ajudar
mesmo sem eu ter pedido.
— Não precisa agradecer. Eu fiz de coração. — A aperto
contra meu corpo. — Trouxe duas fantasias de tamanhos diferentes
para garantir que dê certo. Não sei se ele já tem os bonecos, então
eu também os trouxe e há também uma camiseta para você, espero
que goste.
— Lucca, que Deus possa abençoar sua vida. — Isso sim me
toca. Isso me fode, inclusive. — Que Deus sempre o abençoe por
ter esse coração incrível e ajudar uma mãe desesperada. Não sei se
você tem o desejo de ser pai algum dia, mas, caso aconteça, o seu
filho ou sua filha será uma criança de sorte.
— Sim, eu quero muito ser pai um dia — respondo sorrindo.
— Que Deus abençoe a mãe maravilhosa que você é, e seu
pequeno filho. Conte comigo sempre que precisar, seja a hora que
for, para o que for. Não sou nenhum super-herói, mas moverei o que
for necessário para ajudá-la. Eu agradeço muito por tê-la conhecido,
você não faz ideia. Agradeço muito. Foi um longo período sem ter
momentos de felicidade absoluta e você me deu isso. Obrigado,
viu? — digo, beijando seu ombro. — Muito obrigado. Passar esses
dias com você tem sido incrível, revigorante e eu quero que não
fique em Vegas. Quero que seja presença constante em minha vida
daqui para frente. Além de todas as coisas, você se tornou uma
grande amiga.
— Você é o meu anjo da guarda, eu sinto isso. Tudo teria
sido diferente se eu não o tivesse conhecido logo na chegada. —
Sorrio. — Lucca, obrigada!
— Se me agradecer mais uma vez, teremos um grande
problema.
— Obrigada, Lucca. — Eu deslizo minhas mãos por dentro da
blusa dela e começo a fazer cócegas. As gargalhadas ecoam pelo
quarto e eu só paro quando ela está quase sem fôlego. — Oh
merda!
— Me agradeça novamente. — Meu tom de ameaça a faz rir.
— Bom, agora vou tomar banho e comer algo.
— Qual seu quarto?
— Cobertura, 1501 — informo.
— Posso ir até lá mais tarde? Talvez possamos assistir um
filme.
— Ouça, você pode sim ir até lá. Será um prazer recebê-la,
mas preciso alertá-la de algo — digo, puxando-a para meus braços
e afastando seus cabelos para eu poder falar em seu ouvido. Sorrio
ao vê-la se arrepiar, sensível pra caralho. — Eu não vi você ontem,
só pela manhã, quando a deixei aqui.
— Sim, e o que tem demais?
— Eu senti saudades — confesso. — Bastante. E, não sou
um bom garoto sempre — aviso. — Não se iluda com meu rosto de
bebê e minhas atitudes benevolentes. Nem sempre sou bonzinho.
— Não compreendo aonde quer chegar.
— Então serei bastante direto, Paula. Se você for ao meu
quarto, eu vou comê-la. Hoje estou com um apetite sexual insano.
Pense bem se quer ir.
— Eu quero ir... assistir filme.
— Se você for, eu vou comê-la assim que eu fechar a porta.
Metflix é o que você terá.
— Uau! Devo levar a pipoca?
— Não há necessidade. Só há uma coisa que você precisará
levar. — Sorrio mordendo sua orelha.
— Meu corpo?
— Não, disposição. Esse item é imprescindível. — Me afasto,
pisco um olho para ela e saio.

Paula vai até o meu quarto, transamos mais uma vez e eu me


pego completamente decepcionado quando chega o momento de
voltar ao Brasil.
Eu não consigo ficar uma única semana sem vê-la e nos
aproximamos consideravelmente.
E esse foi o início de uma história muito louca, que mistura
uma amizade extremamente forte, risadas descontroladas, tesão,
carinho...
E um amor paternal... Um grande amor paternal!
Meus dias voltaram a ser coloridos e a vida voltou a fazer sentido.

Ando completamente aérea desde que voltei de Las Vegas.


Sinto que os poucos dias vividos naquele lugar fizeram minha vida
mudar consideravelmente. Lucca é o motivo. Ele também é o motivo
de eu estar olhando para a parede, sorrindo, ao invés de verificar
um enorme processo.
Ele me mandou uma mensagem, e finalmente, combinamos
de sair no Rio de Janeiro. O dia passa como um borrão, e no final
do expediente, estou nervosa e ansiosa. Vou até o banheiro e
verifico minha maquiagem, em seguida me sinto confiante o
bastante para enfrentá-lo. É tão louco saber que terei que ponderar
minhas ações para não assustá-lo. Minha vontade certamente é de
me jogar nos braços dele, mas eu terei que manter minha postura
de mulher controlada. Acho que me sinto como uma adolescente,
indo sair com o "crush". A empolgação é quase a mesma.
Eu saio pela porta andando de maneira imponente e segura,
e lá está ele, encostado no carro. Um sorriso perfeito cresce em seu
rosto e eu solto um gemido baixo enquanto caminho até ele.
— Uma advogada como você ganha qualquer processo —
ele diz. — Porra, Paula! Com todo respeito, mas... uau!
— Lucca, é ótimo reencontrá-lo. — Sorrio indo cumprimentá-
lo. Vou abraçá-lo formalmente, mas as coisas não ficam muito
formais, a química não deixa. Suas mãos deslizam pela minha
cintura e eu fixo meu olhar nos olhos dele. Parece que ambos
fazemos uma contagem mental e ela não vai até três. Eu não sei
dizer quem toma a iniciativa, mas nos beijamos, e não um beijo
xoxo. Um beijão daqueles que dá vontade de tirar a roupa e
mergulhar de cabeça num sexo quente. — Que tal irmos para um
lugar mais... íntimo?
— Eu adoro como você tem tanta iniciativa — diz sorridente,
e se afasta para abrir a porta de seu carro. Me acomodo e segundos
depois ele está ao meu lado. — Ok, Paula, minha casa ou sua
casa?
— Um hotel ou motel seria mais rápido. — Ele balança a
cabeça em concordância e em quinze minutos estamos dentro de
uma suíte, fazendo sexo como canibais.

DIAS DEPOIS
— Paula, Jacinta minha saudade pelo telefone — Lucca diz,
e eu começo a rir como uma boba.
— Olá, bebê Lucca. Como foi seu dia de trabalho?
— Cansativo. Quando vai me deixar conhecer Henrico? —
pergunta.
— Não é tão simples, Henrico tem dificuldade em socializar.
— Eu garanto que ele vai socializar comigo. Vamos lá, me
deixe conhecer o garoto. Farei amizade com ele, podemos levá-lo
para passear, fazer programas especiais onde tenha inclusão, tenho
pesquisado muito depois que me disse sobre ele. Estou ansioso. —
Esse homem é muito surreal!
— Em breve, tudo bem? Prometo a você.
— Não gosto de ser enrolado, Paula. Jacinta minha fúria pelo
telefone, e espere só eu a pegar. — Isso me faz sorrir amplamente.

DIAS DEPOIS
— Realmente quero conhecer Henrico — Lucca diz,
enquanto andamos pelo shopping após termos ido em mais de 10
lojas até eu encontrar o vestido ideal.
— Você irá conhecê-lo, bebê Lucca. — Sorrio, parando na fila
do cinema. Ele simplesmente sai me puxando para outro lado e eu
descubro que ele tem um cartão fidelidade VIP no cinema. Somos
os primeiros a entrar para ver o filme e ainda somos servidos dentro
da sala do cinema.
— Isso é muito próspero — digo rindo.
— Viu? Sou o melhor amigo que você poderia ter. Jacinta
isso, Paula.
Não beijamos, não transamos, não trocamos carícias. Essa
noite decidimos ser apenas bons amigos apreciando a companhia
um do outro.
PS: Eu me apaixono um pouco mais a cada dia.
3 MESES DEPOIS
O meu dia foi tão exaustivo, mas estar recebendo um carinho
e um sorriso gostoso do meu filho é reconfortante.
Hoje mal tive tempo de trabalhar. O dia foi em função dele.
Henrico tem um pouco de dificuldade de locomoção, tanto nas
perninhas, quanto nos bracinhos e nas mãozinhas. Por conta disso,
fazemos vários tratamentos que ajudam na estimulação. Hoje ele
teve aula de música, natação e fisioterapia. Mas, há também
tratamentos que são domiciliar e são feitos por uma terapeuta
ocupacional. Felizmente, meu pequeno já está adaptado às
atividades. Entretanto, a parte que ele mais gosta é da terapia
ocupacional.
A tia Nanda (como ele mesmo diz), terapeuta, é um anjo da
guarda que trabalha com ele de uma maneira leve e divertida, o
acompanha quase diariamente. Todos os dias eu aprendo um pouco
com ela e sou grata por tanto carinho e dedicação. Fernanda
trabalha com as habilidades motoras que auxiliam meu pequeno a
desenhar, segurar objetos de maneira correta, diferenciar cores,
formas, tamanhos, a ser um pouco mais independente na hora de
escovar os dentinhos. Ajuda também em relação a ele se relacionar
com as demais pessoas, a usar o corpo como meio de
comunicação, resolver problemas, brincar, motricidade, integração
sensorial... a lista é gigantesca e até parece impossível uma criança
absorver todas essas coisas. Porém, meu bebê absorve muito bem
e todos os dias consigo ver avanços significativos. Não apenas pelo
acompanhamento que ele recebe da Nanda e dos demais
profissionais; eu não serei modesta, sou uma excelente mãe,
daquelas bem participativas e cem por cento envolvida em todas as
atividades do meu filho. Quando todas as atividades encerram, há
apenas nós dois e esses momentos a sós são considerados por
mim os mais importantes. É onde deixo de lado todo o stress diário,
me desligo do trabalho, das redes sociais e me dedico
exclusivamente a ele.
Além disso, recentemente um outro anjo da guarda entrou em
nossas vidas. Um anjo da guarda muito lindo e muito bebê também.
Lucca.
Eu e Lucca nos tornamos grandes amigos... gigantes...
íntimos... realmente íntimos... grandes amigos gigantes íntimos
realmente íntimos que transam sempre que possível e que não se
desgrudam muito. Há dias que saímos apenas para tomar um
sorvete, realmente como amigos, sem nem rolar um beijinho. Mas
há outros... há outros em que nos pegamos como canibais famintos
em qualquer lugar. É muito maravilhoso, mas eu estou
absurdamente apaixonada pelo meu melhor amigo e tento conciliar
o sentimento da melhor forma possível, levando sempre pelo lado
da amizade.
Não tem como não se apaixonar. Aliás, acho que é
humanamente impossível uma mulher conviver com Lucca e não se
apaixonar. O homem faz as coisas mais improváveis e consegue o
impossível. Ele se tornou o segundo grande melhor amigo de
Henrico. Eu me lembro o dia que ele simplesmente surgiu na porta
da minha casa sem nem mesmo avisar. Foi exatamente duas
semanas depois que voltamos de Las Vegas. Ele estava muito
insistente sobre conhecer Henrico, e eu muito relutante. Ele tentava
me passar confiança, dizendo que sabia o que estava fazendo e o
universo que estava habitando, mas... eu apenas tinha todos os
medos do mundo. Foi então que ele teve a excelente ideia de surgir
na minha porta, com uma sacola gigante. Eu quis matá-lo pela
primeira vez, mas ele é um bichinho audacioso e sagaz;
simplesmente invadiu minha residência e foi direto no alvo: Henrico,
que estava sentado no tapete da sala completamente cabisbaixo por
conta do pedaço de merda chamado Pablo.
Eu fiquei de pé observando e rezando para todos os santos.
Foi então que Lucca tirou de uma sacola um kit de pinturas bastante
legal e começou a desenhar toda turma do Toy Story. No início,
Henrico não cedeu às investidas delicadas de Lucca. Porém, após
alguns minutos, como num passe de mágica, meu filho
simplesmente começou a brincar com ele e minha boca foi ao chão.
Eles criaram suas próprias regras; Lucca ficava por conta dos
desenhos e Henrico por conta da pintura. Depois daquela noite, os
encontros entre os dois se tornaram mais frequentes e Henrico
simplesmente o tem em um patamar altíssimo.
O homem é apaixonado pelo meu filho, a ponto de mandar
mensagens ou ligar todos os dias de manhã e à noite. De manhã
perguntando se Henrico dormiu bem, a noite perguntando como foi
o dia de Henrico. Pelo amor de Deus! Lucca faz mais pelo meu filho
do que o próprio pai, isso é chocante.
Enfim. Estou apaixonada, mas não há stress sobre isso. Não
é algo que eu quero fugir, tampouco quero me jogar de cabeça. É
apenas um sentimento gostoso, que faz meu coração bater mais
forte sempre que possível, mas que não me causa surtos. Tudo
bastante saudável. Não acho que estamos no melhor momento para
entrarmos em um relacionamento, embora o que estamos tendo
seja quase isso. Mas, a maneira leve que estamos conduzindo tudo,
que conseguimos separar os momentos em que precisamos apenas
da amizade e os momentos em que precisamos de mais que isso,
está sendo benéfica aos dois. Não há cobranças entre nós, não há
discussões, só existe a parte boa e isso é tão gostoso de se viver.
Não precisamos rotular algo que começou a tão pouco tempo.
Lucca ainda tem os demônios dele, e eu ainda tenho os meus.
Então, o melhor que estamos fazendo por nós mesmos é conduzir
as coisas com essa calmaria gostosa onde a amizade está acima de
tudo.
O mais lindo de tudo isso é deitar todas as noites sabendo
que ele estará por mim sempre que eu precisar e eu estarei por ele.
— Bebê vida, hora de tomar banho para dormirmos bem
gostosinho — digo ao meu pequeno, e recebo um carinho em meu
rosto. — Tudo para mim.
— Mamãe.
— Amor da mamãe. — Sorrio. — Você é a minha vida toda,
pequeno gafanhoto. Agora deixa de preguiça e vamos tomar um
banho, fazer uma massagenzinha e dormir bem grudadinho.
Fazemos exatamente isso. Primeiro eu dou banho em meu
pequeno. Em seguida, me pego sorrindo quando ele se deita de
bruços, aguardando a massagem noturna que sempre faço em suas
costas e suas perninhas. Após eu contar uma historinha, ele
adormece e suspiro em pleno contentamento. Vencemos mais um
dia e fizemos grandes progressos.
Apago o abajur e minutos depois meu celular vibra. Sorrio ao
ver o nome de Lucca brilhar na tela.
— Hello! — Atendo baixinho e me levanto, indo para a sala.
— Hello! Como meu garoto está? Já dormiu?
— Sim, dormiu tem pouquinho tempo.
— Então abre a porta para eu te dar um beijo — ele ordena, e
eu fico boquiaberta até ouvir uma batida na porta.
A abro para encontrar um advogado muito destruído de
cansaço.
— Sua gravata está devidamente correta — brinco, puxando-
o e fecho a porta.
— Porra! Você me recebe vestida assim mesmo?
— Eu estava deitada com meu filho, já pronta para dormir —
justifico. — Minha calcinha é de avó e nem estou sexy.
— Você é sexy só de respirar. Poderia estar de fralda e ainda
seria sexy, agora vem aqui — diz, me oferecendo seus braços e eu
vou. É bonitinho quando ele deita a cabeça em meu ombro e cheira
meu pescoço. Eu até faço um cafuné em seus cabelos. — Estou
morto! Saí do escritório só agora. Já passou das onze?
— Quase onze. Você mora ao lado do escritório, doutor. O
que está fazendo em outro bairro?
— Vim buscar um beijo — explica. — Ei, eu não poderia ser
advogado de jeito nenhum — ele diz em um tom sério,
demonstrando cansaço real.
— Por quê?
— Porque não consigo processar o tanto que eu quero te
beijar agora! Aooo Paula, Jacinta meu desejo! — Sorri, me pegando
em seus braços e nos rodando. — Essa foi boa, hein?
— Foi excelente, bebê Lucca — concordo rindo. — Você
definitivamente tinha que ser militar.
— Militar?
— Sim, porque só você faz sentido na minha vida. Aooo bebê
Lucca, seu pau me cutuca!!! — eu praticamente grito, e então
lembro que meu filho está dormindo. Lucca simplesmente devora
minha boca antes mesmo que eu possa me arrepender de ter
gritado. Um senhor beijo que me faz chorar por todos os lados,
perder o sentido da vida e retomar apenas quando ele se afasta.
Pela madrugada...
— Pronto! Agora posso ir embora e dormir! Amém, Paula
Jacinta, sua gostosa.
— Eu devo ser gostosa mesmo, para você sair da Barra só
para vir me dar um beijo — brinco, beijando seu pescoço.
— Eu topava uma foda, mas há uma coisinha muito linda
roubando meu lugar na cama. Diga a ele que tio Lucca deixou um
beijo.
— Direi. — Sorrio.
— Como será seu dia amanhã?
— Tenho uma audiência as dez, Henrico ficará com minha
mãe porque tem terapia. Também tenho uma audiência às três da
tarde. Amanhã definitivamente será um dia caótico.
— Almoça comigo?
— Como amigo? — pergunto, arrumando sua gravata.
— Não, quero você de sobremesa.
— Meio dia?
— Perfeito. Te pego de meio dia às duas. Aooo potência
desenfreada — brinca, e beija minha testa. — Boa noite, Diabinha.
— Boa noite, bebê Lucca.
Às onze da manhã recebo uma vaga mensagem de Lucca
cancelando o nosso encontro.
Preocupada, tento ligar para ele e não obtenho sucesso em
nenhuma das tentativas.
— Apaixonadinho você me deixou. Apaixonadinho você me
deixou. Apaixonadinho você me deixou. Vem ficar perto aqui do seu
pretinho — cantarolo, dançando com a secretária do escritório, que
ri e não entende porra alguma. — Aoooo Cecília, bom dia!
— Bom dia, senhor Lucca — ela diz desnorteada.
— Alguém está muito animado essa manhã — Victor surge
dizendo. — Aposto que teve um sexo quente e suado.
— Não tive, my brother! — digo, abraçando-o. — Como estão
as crianças e a princesa safadinha?
— Estão bem, graças a Deus! — responde sorrindo. — E a
tal Paula?
— Ei, vamos ali na padaria tomar café da manhã? Aí
conversamos melhor — sugiro.
— Só se você me mostrar uma foto dela.
— Não! — exclamo com firmeza.
— Por que diabos você não deixa ninguém ver a mulher?
— Porque ela é minha!
— Vá tomar no cu, Lucca. Melinda também é minha e nunca
a escondi. Não... peraí... agora que registrei. Ela é SUA em que
sentido? Porque até ontem era sua “amiga” — ele diz fazendo aspas
no ar.
— Ela é minha amiga... MINHA. — Ele revira os olhos.
— Você se supera na possessividade. Sou casado, o que
acha que vou fazer se vê-la? Retardado!
— Ok. Eu mostro.
— Ah nem fodendo que você vai mostrá-la para Victor e não
vai mostrá-la para mim! Eu também estou indo nesse café da
manhã! — Ava surge descompensada, e segura eu e Victor pelas
mãos. — Vamos crianças!
— Era uma conversa apenas entre homens — explico
zoando.
— Sou mais macho que muito homem, então relaxa. Finge
que tenho uma piroca de 50 centímetros, grossa e veiuda.
— Que merda, Ava! — Victor a repreende, enquanto ela ri.
Entramos no elevador e em seguida caminhamos rumo à
padaria. Eu peço uma fatia de red velvet com recheio de ninho e um
frapuccino de caramelo. Victor e Ava me acompanham nessa
comilança e embalamos uma conversa sobre Paula. Pense em dois
irmãos chatos? São eles.
— Vamos lá, mostre logo a foto da mulher — Victor pede, e
sem chance de escapar dessa, pego meu celular e vou em busca de
uma foto que não seja proibidona. É... em alguns momentos capturo
uns cliques mais ousados, porque a mulher sabe ser quente,
principalmente ao acordar. Ela também tem fotos minhas bem
ousadas, tipo da minha bunda tatuada.
Quando encontro a foto ideal, entrego o celular aos dois.
— TOMAR NO MEU CU! — Ava grita para todos ouvirem.
— É... — Victor diz. — Porra!
— Aoooo Melinda! — Ele começa a rir das minhas palavras.
— Sério que você está com ciúmes de mim? Eu amo minha
esposa e ela é a coisa mais linda desse mundo, mas... que mulher
linda, cara. Puta merda! Linda pra caralho mesmo. Um sorrisão.
— Essa mulher é uma afronta! — Ava diz suspirando. —
Acho que a odeio por ser tão linda. Apesar de que, ela dá uma boa
disputa com Dandara... Dandara beira ao absurdo tamanha
perfeição. Seu gosto é indiscutível, irmãozinho — ela dispara a falar,
só então se dá conta. — Ok, falei merda, não é mesmo?
— Sim — Victor confirma.
— Tudo bem, desculpa. Não foi por mal.
— Quero pedi-la em namoro, mas estou com medo —
desabafo, precisando de um apoio moral neste momento.
— Medo? — Ava e Victor perguntam juntos.
— Estou sozinho há muito tempo, mas ela não. Tenho receio
de estar atropelando as coisas, mas eu quero mais do que o que
estamos tendo, embora esteja excelente. Estou um pouco louco por
ela e apaixonado pelo filho dela. Pensei muito, e quero ir além, bem
além. Paula não é apenas um rosto bonito, é uma mulher incrível
pra caralho, mega esforçada, dedicada, carinhosa, espirituosa,
engraçada. Ela é fantástica e tem sido difícil manter apenas a
amizade.
— Um pouco louco... sei — Ava debocha como se tivesse
cinco anos de idade.
— Você se lembra do que nosso pai sempre nos ensinou? —
Victor pergunta.
— Ele sempre nos ensinou tantas coisas — comento rindo.
— O NÃO todos nós já temos, agora é correr atrás do SIM.
Se é o que você quer, tem que seguir em frente e ir em busca do
SIM, sem medo — ele explica.
— Concordo com Victor — Ava diz. — Você deve saber o que
existe entre vocês. Pense em tudo que construíram durante os
meses que estão nessa amizade que não é amizade nem aqui, nem
na China. Pense em como ela te trata, no quanto ela demonstra
sentimentos, dá para captar a essência e ter mais ou menos a ideia
da resposta dela.
— Mas quero fazer algo diferente — confesso. — Quero
passar um final de semana com ela em algum lugar legal e então
fazer o pedido. Como ela tem Henrico, nossos encontros são um
pouco difíceis. Eu gostaria de uns dois dias a sós, para nos
curtirmos um pouco. Vocês têm alguma indicação?
— Bom, eu posso dar uma sugestão? — Victor pede.
— Sim.
— Eu a levaria para a Ilha, para começar logo com sorte —
ele diz sorrindo. — O que começa lá, sempre dá muito certo.
— Caso queira algo diferente, em Petrópolis tem várias
pousadas legais, inclusive uma onde nossos pais se hospedaram
quando se reencontraram. Eu já estive nela com Gabriel, num
momento caótico. Mas, lá é lindo.
— Também fui com Melinda em uma pousada em Petrópolis,
linda e aconchegante, com cachoeira e tudo mais. Bem romântica.
— Acho que gostei da ideia da Ilha — comento, imaginando
toda uma cena. Dá para preparar algo legal lá... — Na verdade, a
Ilha parece ideal.
— É isso! Estou tão feliz por vê-lo bem, seguindo em frente.
Nossos pais estão loucos para conhecer Paula. Estamos todos
felizes, Lucca. Você merece ser feliz, irmãozinho, e essa mulher
parece saber exatamente o que fazer para colocar sorrisos em seu
rosto. — Ava segura minha mão, com os olhos cheios de lágrimas.
— Eu a odeio por ser tão linda, mas eu a amo por ser especial.
— Pessoalmente é mais linda — digo, e ela faz uma careta.
— Bom, agora vamos ao trabalho! Irei almoçar com Paula e
ficarei ausente umas duas horinhas. Preciso adiantar algumas
coisas.
— Em qual restaurante vão? — a espertinha da minha irmã
pergunta e sorrio.
— Nenhum. Vou levá-la em um lugar.
— Ai... casal iniciante é um saco! — ela protesta, mas acaba
rindo.
Estou há cinco minutos olhando uma montagem com três
fotos que acabei de receber em um envelope sem remetente. Nesta
montagem há duas fotos de Dandara grávida e a foto de um
menino. Abaixo delas está escrito UMA LEMBRANÇA PARA
LUCCA ALBUQUERQUE.
Não compreendo o motivo para alguém me mandar algo
assim. Por que eu iria querer fotos de Dandara grávida? Foda-se ela
e o que ela fez da vida dela. Não me interessa mais, embora isso
aumente ainda mais minha mágoa em relação a ela. Dandara foi
embora sem deixar respostas, sem expressar sentimentos, e agora
eu descubro que ela é mãe. Fantástico!
Fico de pé e vou até a sala de Victor. Jogo a foto em cima da
mesa, diante dele, e ele franze a testa.
— O que é isso? — pergunta analisando.
— É o que eu gostaria de saber.
— Dandara grávida. Por que alguém te mandaria isso?
— Eu também gostaria de saber. — Me acomodo em uma
cadeira e Victor analisa a foto melhor. Ele olha para mim em alguns
momentos e balança a cabeça negativamente.
— Eu preciso te dizer algo, mas espero que não surte. É
apenas uma hipótese.
— Diga.
— Essa criança deve ter em torno de dois anos de idade,
talvez pouco mais. Faz quase três anos que Dandara foi embora.
Tipo, 2 anos e muitos meses.
— Sim, por volta disso — concordo.
— Concorda que é estranho você receber isso?
— Claro que é, não tem por que eu receber isso — afirmo.
— E se esse garoto for seu filho e isso for um aviso? — Meus
olhos se arregalam e eu pego a foto. Analiso apenas o garoto. Ele
é... uma mistura de Dandara com alguém.
— Dandara não estava grávida — digo, colocando a foto
sobre a mesa novamente.
— Ou ao menos você não sabia. Foi estranho a forma como
ela te deixou.
— Foi, mas eu duvido muito que ela me esconderia um filho.
Ela não seria capaz de algo dessa grandiosidade. — Seria? Esse
menino... não sei não. Se não me engano, lembro dela ter dito que o
desembargador não podia ter filhos. Será que ela tinha um outro
homem além de mim? Ou será que Victor está certo? Esse garoto
seria meu filho? Eu espero do fundo do meu coração que não seja,
porque eu juro por Deus, se ela teve coragem de me esconder um
filho, eu vou destrui-la impiedosamente e não terá argumento no
mundo que vá me impedir.
— Gosto muito de Dandara, Lucca, mas eu não duvido de
nada mais. Foi tudo realmente estranho.
— Vamos lá. Ela passou por um relacionamento abusivo, eu
ofereci minha mão e ela a soltou. Então, no seu casamento, nos
demos uma segunda chance. Chance que vale ressaltar que eu
disse que seria a última. Vivemos três meses juntos, eu dando todo
suporte do mundo a ela, e toda nossa família fazendo o mesmo. Ela
simplesmente foi embora mais uma vez, e, me desculpe Victor, não
há justificativa, seja lá qual tenha sido o motivo havia dezenas de
pessoas por ela, dezenas. Até mesmo vô Arthur. Vendo essa foto,
eu não posso seguir por esse caminho de ter um filho. Eu prefiro
acreditar que fui corno e que ela foi embora por ter outro. Esse
garoto não é meu filho.
— Ele se parece com você.
— Não se parece.
— O garoto se parece com você! — insiste. — Eu acho que
isso foi mais como um aviso. Você não receberia essa informação à
toa, após tanto tempo. Deveríamos investigar isso, posso pedir ao
Mário.
— Não faz sentido algum — digo. — Não sei se quero
investigar isso.
— Deveria querer pelo simples fato de tudo soar estranho
demais. Vamos fazer isso apenas por desencargo de consciência.
— Essa merda altera meu humor significativamente. Fico de pé,
pego a foto e sorrio.
— Fale com Mário, mas reze também. Se a sua suposição for
verdade, a porta do inferno vai se abrir e não será bonito.
Saio da sala de Victor e desmarco meu almoço com Paula.
Decido ir para casa dormir na tentativa de acalmar os ânimos. Não
quero encontrar Paula quando estou um pouco descompensado.
Em casa, corto a montagem e rasgo as duas partes que
contém Dandara. Fico apenas com a foto do garoto e me perco
tentando buscar respostas enquanto olho para ele.
Não é meu filho.

— Vocês formam uma linda família — o gerente do


restaurante diz sorrindo, assim que Lucca paga a conta. — Espero
que tenham gostado do nosso atendimento e que tenhamos suprido
a necessidade de vocês.
Não almoçamos juntos, mas viemos jantar e trouxemos
Henrico junto. Lucca disse que cancelou o almoço por não estar se
sentindo bem, mas minha intuição diz que não foi apenas esse o
motivo. Só preciso esperar o momento ideal para conversar com
ele. De qualquer forma, nossa noite está sendo incrível... muito
incrível.
— Não só gostamos, como voltaremos — Lucca informa
sorrindo. — Evitamos sair com ele à noite, porque ele não fica bem
em lugares com muito barulho, muita confusão. É bom saber que
investem em acessibilidade e inclusão. Fiquei muito satisfeito, foi
uma aposta que deu certo. Henrico se divertiu, desenhou, gostou
bastante da refeição especial.
— Muito obrigada por isso — agradeço, portando um sorriso.
— Como Lucca disse, é um pouco difícil sair com ele, porque
definitivamente não se sente bem com lugares barulhos e tudo mais.
Estou muito feliz por ter conhecido esse ambiente e certamente
viraremos presença constante aqui.
— Vocês são casados? — pergunta, e eu olho para Lucca
sorrindo. Todos que nos veem juntos fazem essa mesma pergunta.
— Ainda não. — Eu tento não filtrar essas palavras porque é
mais do que sou capaz de aguentar.
— Ele é um garoto muito lindo — elogia meu filho, que está
dormindo em meus braços. Isso me faz sorrir.
— Muito, não é mesmo? — O tom de Lucca é estranho e isso
atrai minha atenção. Ele parece querer matar o gerente por algum
motivo. — Vamos? — pergunta a mim, ficando de pé e afastando o
gerente. Ele me ajuda a levantar e pega Henrico dos meus braços.
— Obrigado, mais uma vez. Voltaremos em breve. — Nos
despedimos, e ele ainda consegue segurar minha mão enquanto
saímos do restaurante.
— O que foi aquilo? Você parecia querer matar o homem.
— Não foi nada — diz, beijando minha cabeça. — Você
dirige? Vou levando Henrico.
— Eu amo dirigir seu carro! — informo contente, e abro a
porta para que ele possa entrar com meu filho no banco de trás.
Não ligo o som para não acordar meu bebê e logo estamos
em casa.
Lucca o leva até o quartinho dele e o coloca na cama. Eu
retiro os tênis e as meias do meu pequeno e o cubro. Saímos do
quarto e Lucca me rouba um beijo ainda no corredor. Sorrio em seus
lábios e ele me pega em seus braços. Sou carregada até meu
quarto, onde ele tem o cuidado de fechar a porta com chave.
— Uau!
— Jacinta meu tesão por você — brinca, me colocando no
chão.
— Acho que há um bebê Lucca precisando de um pouco de
carinho hoje. Estou certa? — pergunto, abrindo a camisa dele e a
retirando do seu corpo.
— Estou precisando de você nua, embaixo de mim — diz,
chutando os sapatos e tirando a calça. Sorrio quando ele joga as
meias longe e me puxa, fazendo com que eu vire de costas. Sua
boca desliza pelo meu pescoço enquanto ele abre o fecho do meu
vestido. Delicadamente, retira a peça do meu corpo e envolve meus
seios em suas mãos. — Eu estava louco de saudade.
— Mas você veio me dar um beijo ontem.
— Um beijo para você é o suficiente? — pergunta, apertando
meus mamilos. — Que gostoso... Você gosta quando faço isso?
— Eu poderia gozar.
— Sua buceta está molhada? — pergunta baixinho em meu
ouvido.
— Sim.
— Posso te comer um pouquinho? — pede, me levando para
a cama. Quando estamos diante dela, ele me vira de frente e me
empurra, fazendo com que eu caia de costas.
— Deve — digo, puxando-o pela beirada da cueca. Ele abre
minhas pernas e se encaixa entre elas, então abaixa a cueca o
suficiente para liberar seu pau, afasta minha calcinha para o lado e
começa a me penetrar. Ofego de prazer sentindo-o me preencher.
Sem preliminares, sem mimimi. O delicioso sexo cru de necessidade
e desespero é o que ele me dá.
— Você sabe que é minha? — pergunta, enquanto arremete
em mim. — Responda.
— Sei. Sua.
— É isso. Você é o motivo... — Ele sorri e o empurro. Giro na
cama, ficando de quatro e o som roco que escapa de sua garganta
diz que fiz a coisa certa. Eu morro quando Lucca me pega por trás,
porque ele é tão rude e tão perfeito nessa posição.
Suas mãos pairam em minha cintura enquanto ele volta a me
penetrar. Ele fica completamente parado e eu jogo meu corpo ao
dele, remexendo meu quadril e me esfregando.
— Porra! Diabinha!
— E você... sabe que é meu? — pergunto, olhando-o por
cima do ombro. — Diga, bebê Lucca.
— Seu.
— Então me come.

Dormimos as três da manhã, e as quatro somos acordados


pelo telefone de Lucca. É sempre assustador receber ligações
durante a madrugada, simboliza que algo muito ruim acaba de
acontecer.
— Alô? — Ele atende sonolento, e eu fico atenta à conversa,
já que a mulher fala alto.
— Senhor Lucca Albuquerque?
— Sim.
— Senhor Lucca, aqui é do hospital Lourenço Jorge — a
mulher informa, e sinto que meu coração vai parar de bater. Algo
aconteceu com algum familiar de Lucca.
— Algo aconteceu?
— Esse é o número de contato que consta no registro do
paciente Samuel Farai Albuquerque.
— Não conheço qualquer pessoa com esse nome.
— Aqui consta que é seu filho e filho de Dandara Mendonça
Farai, que no momento não está apta a responder pelo garoto.
Nesse caso, foi necessário entrar em contato com o senhor. —
Minha boca vai ao chão e meu coração começa a falhar algumas
batidas.
— Como? — Lucca pergunta, se sentando, acordando de
uma vez por todas.
— Precisamos que venha até o hospital com o máximo de
urgência para autorizar os procedimentos. — Eu vejo o telefone cair
das mãos de Lucca ao mesmo tempo em que um grito de desespero
escapa de sua boca...
É humanamente impossível não ficar desesperada vendo o
desespero de Lucca. Ele está no telefone conversando com o irmão,
oscilando entre choro e raiva. Enquanto é isso, eu estou esperando
meus pais chegarem para ficar com Henrico, porque não existe uma
maneira que eu vá deixar Lucca sozinho agora. Ele está cego,
insano, desesperado. É tão assustador, porque eu nunca imaginei
que um dia o veria dessa forma. Victor provavelmente deve estar
tão desesperado quanto eu, porque Lucca não está falando coisa
com coisa, e sinto que se ele estivesse em sua própria casa, já teria
quebrado tudo.
Eu visto uma roupa tão rápido, que até assusto comigo
mesma. Caminho de volta para conferi-lo e ele encerra a ligação.
Meu coração se parte ao meio quando ele apoia um braço na
parede e começa a chorar a plenos pulmões. Sem saber o que
fazer, apenas me aproximo e o abraço por trás.
— Por favor, tente se acalmar — peço. — Não fique assim,
bebê Lucca. Você é maior que tudo, e vai passar por essa fase de
cabeça erguida.
— Ela foi capaz de me esconder um filho e eu simplesmente
descubro porquê o garoto está fodido em um hospital — desabafa.
— Eu sei que é difícil, quase incompreensível, mas você
precisa ficar calmo. É necessário um pouco de sangue frio para lidar
com determinadas situações. Não se desespere, não atropele o
mundo por conta da sua dor. Vamos até o hospital ver o garoto,
saber sobre ela e então vocês terão tempo para conversar.
Certamente ela deve ter uma explicação.
— E se o garoto estiver morrendo?
— Acho que se ele estivesse morrendo eles não iriam ligar
para você, iriam logo fazer o necessário para salvá-lo, mesmo que
sem autorização de um responsável. — Tento fazê-lo compreender
isso, porque sei que deve estar sendo difícil raciocinar, mas é a
verdade. Se o garoto estivesse morrendo, Lucca só saberia depois.
— Há tantas perguntas, tantas. Eu não consigo processar
nada, minha mente está um turbilhão — confessa desolado. — Por
quê?
— Você irá descobrir em breve. Primeiro foque em seu filho,
que precisa de alguém por ele já que a mãe não está apta a
responder pelo garoto, como a pessoa no telefone disse.
— Meu filho. Isso é tão absurdo, tão absurdo que parece que
estou vivendo um pesadelo. Não pela criança, mas pela maneira
como acabo de descobri-lo. Mais de dois anos de idade. Eu tenho
filho com mais de dois anos de idade.
— Enfrente, Lucca. — Ele finalmente me encara e meu lado
maternal surge com força. É como um bebê desolado que dá
vontade de pegar no colo, ninar e dizer que tudo vai ficar bem. O
abraço e faço cafuné em seus cabelos, isso vai o acalmando. Só
nos afastamos quando interfone toca avisando sobre a chegada dos
meus pais.
— Olá! — minha mãe cumprimenta Lucca. — Oh,
pobrezinho, o que está acontecendo? — pergunta.
— Um problema, mãe. Obrigada por vir — digo, abraçando-a
e vou abraçar meu pai em seguida. — Obrigada, pai.
— Me desculpem — Lucca diz. — Fomos pegos de surpresa
e Paula foi insistente em me acompanhar. Eu preciso dela agora,
porque... eu nem sei.
— Ela está mais do que certa, meu filho. Seja o que for, vou
orar para que tudo se resolva. — Minha mãe o abraça.
— Obrigado, dona Mariza.
— Se precisarem de qualquer coisa, basta ligar — meu pai
diz, batendo nas costas dele e eu pego minha bolsa para irmos.
Após nos despedirmos, eu dirijo até o hospital. Lucca está
sem condições alguma para dirigir. Ele simplesmente deitou a
cabeça no vidro e está o trajeto todo em pleno silêncio.
Eu fico calma quando vejo Victor na porta do hospital. Acho
que toda ajuda será bem-vinda neste momento. Não é a melhor
situação para conhecê-lo, mas é o que temos para hoje, nessa
madrugada onde coisas improváveis estão acontecendo.
Lucca está tão fodido que só desce do carro quando eu abro
a porta e ofereço minha mão. É como se ele estivesse perdido o
rumo da vida. É compreensível, não quero julgar Dandara, mas é
uma situação muito tênue, onde envolve direitos e deveres. Existe
uma criança que Lucca não sabia até agora; uma criança que foi
registrada com o sobrenome dele de forma ilegal certamente, já que
ele não sabia da existência. Eu não sei de nada, mas tudo parece
tão egoísta olhando de fora. Eu espero de coração que ela e Lucca
possam ter uma conversa esclarecedora e que ambos tenham uma
relação respeitosa, no mínimo. Não é a melhor forma dela voltar,
mas é importante, principalmente após ter tomado chá de sumiço.
Em momentos de caos eu consigo ser bastante racional, na
maior parte do tempo. Mas, neste caso, está um pouco difícil
assimilar tudo isso de forma racional. É meio que impossível não
pegar as dores de Lucca e acho que todas as pessoas que fazem
parte da vida dele reagirão da mesma maneira. Mesmo eu sendo
amiga dele, tendo uma certa intimidade, me sinto um pouco como
intrusa na situação, porém, preciso confessar o quanto eu me
encontro perplexa e desorientada agora.
— E aí, cara! — Victor o cumprimenta com um abraço que
mal é retribuído, em seguida vem até mim. — Olá! É uma pena estar
te conhecendo numa situação desse porte, mas, de qualquer forma,
é um prazer. Obrigado por estar com ele.
— Não precisa agradecer. — Dou um sorriso fraco.
— O que eu tenho que fazer? — Lucca pergunta.
— Vamos até a recepção pegar mais informações, saber se
há possibilidade do garoto ser transferido para outro hospital, há
uma série de fatores.
— Eu nem o conheço — diz com pesar. — Eu não conheço
meu próprio filho. Eu não tenho nada sobre ele, nem mesmo
documentos. Como ele tem meu sobrenome?
— Isso vamos saber depois, irmão. Agora o foco é saber o
que houve com o garoto e com Dandara. — O sinto tremer ao ouvir
o nome e só consigo pensar que... fodeu! Talvez seja o momento
ideal para eu começar uma novena para ela não receber todo a
carga que parece estar por vir. Há aqui um Lucca bem diferente do
Lucca que lido diariamente.
— Eu quero saber do garoto — ele avisa, e caminhamos até
a recepção.
É tão louco estar em meio a uma situação dessa. Me sinto
até perdida na forma como devo reagir, me portar, é tão insano. Só
sei que ele precisa de apoio, precisa de pessoas que consigam
controlá-lo o mínimo e colocar um pouco de razão em sua mente.
Ele está aéreo ainda, como se a ficha não tivesse caído. Ele sabe
que existe um filho, certamente fará o que for necessário, mas, por
enquanto, será meio robotizado; até a ficha cair de verdade.
Por ser algo tão íntimo e eu não me sentir cem por cento
íntima neste momento, me acomodo em uma cadeira e espero.
Daqui vejo que é Victor quem conduz tudo, Lucca não pronuncia
uma só palavra, apenas ouve e vai dando diversas assinaturas. É
então que um homem bonitão, com os cabelos revoltos que mistura
castanho com grisalho, surge e Lucca permite desabar abraçado a
ele. Eu me pego chorando vendo a cena.
— Pai... — O ouço, e decido que preciso ir ao banheiro, lavar
um pouco o rosto e respirar. É dilacerante ver o sofrimento
estampado no rosto de alguém que se tornou tudo para mim. Eu
detesto vê-lo sofrer tanto quanto detesto hospitais.
Nunca gostei de hospitais, são ambientes tão tristes e tão
carregados. Há pacientes em macas, aguardando atendimento; há
pessoas chorando, outras que parecem orar. Nada é bom aqui.
Quando eu era criança costumava dizer que seria médica porque
queria salvar todas as pessoas, mas não consigo me imaginar
trabalhando num ambiente como esse, carregando o peso de ter
pessoas dependentes de mim, do meu trabalho. Lidar com vidas é
para os fortes e eu admiro grandiosamente todos os profissionais da
área da saúde. Dez minutos nesse lugar e eu me sinto
claustrofóbica, absorvendo todas as dores ao ver pessoas
devastadas clamando pela vida de seus entes ou apenas
aguardando respostas que nem sempre são positivas.
Eu espero que Lucca obtenha uma resposta positiva e que
ele seja capaz de lidar com tudo.

— Vamos enfrentar tudo isso juntos — meu pai diz, na


tentativa de me passar o mínimo de conforto. Mas, não dá, eu não
consigo registrar tudo o que está acontecendo em minha mente.
Ele só se afasta quando eu estabilizo meu emocional. O
desespero maior é sobre o garoto, não sei como ele está, a
recepcionista simplesmente não diz nada.
— ...um acidente automobilístico. A mãe está inconsciente e
com feridas superficiais, por isso foi necessário ligar. Nos objetos
pessoais dela havia a certidão de nascimento do garoto e o contato
do pai — ela explica à Victor. — Samuel está bem, só bastante
assustado e com algumas feridas superficiais. Precisávamos de um
responsável, já que a mãe não está respondendo no momento por
não estar em condições.
— Mas na ligação foi informado que ele precisaria passar por
procedimentos — argumento, um pouco mais aliviado.
— Eu peço desculpas, senhor. Provavelmente a funcionária
não soube argumentar bem. Não são procedimentos médicos, são
procedimentos de acompanhamento ao menor. Sinto muito por toda
a situação. Espero que possam lidar com isso da melhor maneira,
pela criança. — Quão ridículo é eu chegar em um hospital e ter que
relatar que até minutos atrás eu não sabia da existência de um
filho? Isso é absurdo!
— Onde ele está? — pergunto.
Samuel. Puta que pariu, Dandara! É impossível não passar
um filme na mente agora. Um filme da época em que eu queria dar
a porra do mundo para ela e fui deixado sem explicação. Ela me
abandonou grávida do nosso filho, e eu simplesmente não consigo
ser racional agora. Qual será a maldita justificativa? Eu gostaria de
saber. Gostaria de ir até onde ela está e obrigá-la a me contar cada
maldito detalhe sobre o que foi feito e por que escondeu o meu filho
de mim.
— Iremos trazê-lo. — Isso faz meu coração parar de bater.
— Ela está trazendo o meu filho? É isso? — pergunto.
— É, calma, cara. Respire fundo — Victor diz.
— E o que eu vou fazer? Eu... eu posso levá-lo para casa?
Eu posso cuidar? Eu tenho que fazer o quê? Porra! Eu tenho
direitos agora? Eu... como estou na certidão dele? Se eu estou, isso
quer dizer que tenho plenos poderes sobre ele? Ou terei que tomar
alguma medida? Alguém pode me dar respostas? O que meu filho
come? Ele ainda mama? Como ele gosta de dormir? Caralho!
— Respire.
— Não tem como respirar! Estão trazendo o meu filho e eu
nunca o vi antes, não sei como lidar com ele. O garoto vai me odiar
por eu não saber lidar com ele? Eu sou a porra de um estranho para
o meu próprio filho, assim como ele é estranho para mim. Ele vai vir
em meus braços ou vai temer?
— Você saberá lidar com ele, Lucca. Você é mestre em lidar
com crianças, e é isso que seu filho é, uma criança. Como Soso,
como todas as crianças da nossa família — meu irmão diz.
— Pai, como você lidou com Isis?
— Eu simplesmente encarei a situação e lidei com ela como
se a conhecesse a vida toda. Não sei explicar, houve uma conexão
imediata. Eu me tornei pai no primeiro momento em que a vi, como
num passe de mágica. Talvez essa magia vá acontecer com você,
filho. Não há uma receita, não compare as situações. Vamos tentar
entender os motivos de Dandara, mas não compare sua situação
com a minha porque nenhuma situação é igual a outra, tudo bem?
— meu pai pede.
— Eu só não sei o que fazer. Não sei.
— Senhor Lucca? — a enfermeira me chama, e quando viro,
nos braços dela está o meu filho. Sinto minhas pernas fraquejarem
no mesmo momento, porque é o garotinho da foto, com um
machucadinho na testa e os olhos cheios de lágrimas. É hipnótico
olhar para ele.
Caramba! Eu sinto um medo tão grande dessa criança que
parece ser tão inofensiva. Acho que é o medo de ser rejeitado ou de
não ser bom o bastante. É um filho, caralho. Aquele que precisa de
um modelo de pai, um modelo de ser humano para seguir. Há tanta
responsabilidade sobre mim agora, porque eu terei que ser o melhor
homem que puder para que meu filho possa seguir meus passos. E
é tão fodido pensar que sou pai solteiro. O primeiro pai solteiro da
família, o homem que não tem qualquer relacionamento com a mãe
do filho. Isso foge de todos os planos paternais que já fiz na vida. É
algo que é bastante comum na sociedade, mas incomum em minha
família, e é com essa realidade que eu tenho que trabalhar.
Um instinto de proteção surge e eu me vejo o pegando dos
braços da enfermeira. Agora não existe raiva, ódio ou mágoa. É um
momento de reconhecimento entre nós dois e todo o restante deixa
de existir.
Ele para de chorar quando eu o pego e fica me observando,
como eu também o observo. Ele se parece com a mãe, mas os
cabelos dele são como os meus.
— Olá.
— Papai — ele diz de repente, me pegando de surpresa.
Como ele pode saber? Como essa criança pode saber que sou o
seu pai? Agora é o momento de deixar os questionamentos e focar
apenas nele, porque apenas ele é o que importa.
— Sim, seu papai. — Estou sem palavras. O som da sua voz
me chamando de papai está ecoando em minha mente. Não
esperava ser chamado de pai tão cedo, mas aqui estou eu, sentindo
um monte de sensações diferentes por conta dessa palavrinha. Meu
novo status na vida: PAI.
— A mamãe está dodói — ele diz, apontando para o corredor.
— Você é tão lindo. Tão lindo — digo, abraçando-o. — Você
é meu filho, para sempre. Meu filho!
— Olá, garotão. — Meu pai vem conhecê-lo, e está
visivelmente emocionado. — Sou seu avô preferido. Acredite,
ninguém me supera como avô — ele brinca, e Samuel sorri.
— Vovô.
— Sim, o melhor. Você está bem?
— Fominha — ele diz, levando as duas mãos na barriga, e é
bastante engraçado.
— Eu ouvi alguém dizer que está com fome! Oh! Eu estou
morrendo de fome agora! — Paula surge ao meu lado, e brinca com
o nariz do meu filho. — Ei, sou a tia Paula, amiga do seu papai. Me
deixa adivinhar o que você gosta de comer?
— Sim.
— Hummm... deixa eu pensar aqui... você gosta de
salgadinho! — Paula diz, fazendo-o sorrir.
— Sim — ele concorda.
— Viu? Tia Paula é mágica! — Tia Paula é linda, e eu sou
grato por ela estar aqui, me tirando de uma situação em que eu não
sei o que meu filho gosta de comer.
— Tio Victor também é mágico. Eu acho que você gosta de
comer... brigadeiro? — Victor pergunta.
— Brigadeiro sim! — meu filho responde.
— E iogurte, biscoito e Yakult? Papai ama Yakult, mas não
conta para ninguém porque é segredo. Vamos embora? — chamo.
— Lucca, há a mãe dele — meu pai diz cuidadosamente, e
eu chego a tremer de raiva. Foda-se a mãe dele!
— Ei, vamos ali na cantina ver se tem algo para gente
comer? Senão, teremos que achar um lugar que venda um montão
de coisas gostosas para enchermos o barrigão — Paula o convida,
e ele vai com ela de bom grado. Graças a Deus! — Seja humano. —
É o que ela aconselha antes de sair.
— Humano? Por que eu tenho que ser humano? — pergunto
ao meu pai e à Victor. — Houve qualquer resquício de humanidade
da parte de Dandara comigo?
— Olhe para essas pessoas aqui no hospital. Não há
qualquer uma que esteja aqui por Dandara. Sei que está com raiva,
tem todos os motivos do mundo para estar magoado, mas ela é a
mãe do seu filho, por isso devemos ficar e saber o que está
havendo ao certo com ela, antes de simplesmente pegarmos o
garoto e irmos para casa como se nada estivesse acontecendo. Ela
é mãe dele e tem os mesmos direitos que você — meu pai tenta
argumentar.
— Ah, ela tem os mesmos direitos que eu, pai? Então por
que diabos eu demorei dois anos para saber que tenho filho? Onde
os meus direitos ficaram guardados todos esses anos? Ela não
pensou nos meus direitos!
— Você não é essa pessoa que o ódio está te levando a ser.
Não permita que ele o cegue. Eu sei o que estou te falando, Lucca.
Palavra de quem viveu algo semelhante no passado e se arrepende
até hoje por todas as palavras ditas.
— O senhor disse que eu não deveria comparar os
acontecimentos, pai. Me perdoe pelo o que vou dizer, eu respeito
você acima de todas as coisas, mas te peço agora que não compare
a forma como você agiu e reagiu, com a forma como eu irei agir,
porque certamente são situações diferentes — peço educadamente.
— Vou procurar saber o estado de saúde de Dandara melhor, mas
após isso levarei meu filho. Dandara sempre foi topetuda, autoritária
e egocêntrica. Ela sempre toma todas as atitudes sozinha, sem se
importar com quem vai ferir. Então ela vai lidar com isso, porque é a
dona de si mesma, a inabalável, a mulher impulsiva que passa por
cima das pessoas, não é isso? Eu a amava, pai. Deus sabe o
quanto, mesmo autoritária, mesmo topetuda, eu a amava pra
caralho e aceitava por completo o jeito dela ser. Mas, a partir de
hoje lutarei por todos os meus direitos, com apoio de vocês ou não.
Dandara vai arcar com as consequências das próprias escolhas.
Vou entrar com o pedido de guarda do meu filho na justiça e vou
conseguir.
— Eu não vou permitir que faça isso — meu pai avisa, e eu
sorrio. Pela primeira vez estou indo ter um conflito com ele.
— Não é a sua história, pai. É a minha.
— Você vai lidar como um homem, e não como um monstro.
Não se tira um filho de uma mãe sem que os motivos sejam
extremamente pesados — argumenta.
— Quem me garante que os motivos não são pesados? E se
meu filho estiver correndo riscos? E a maldita alienação parental? E
o fato de meu filho ter meu nome em sua certidão de nascimento?
Só essas duas coisas já bastam, pai. Sem contar que, se meu filho
estiver correndo riscos, terei acréscimo em minha lista de
justificativas. É fácil falar "não se tira o filho de uma mãe", mas é
justo a mãe tirar o filho de um pai, que é um homem íntegro que
teria feito tudo pelo filho desde a descoberta da gravidez?
— Pai, Lucca só está nervoso. Está tudo muito recente,
espere a poeira abaixar — Victor intervém. Os deixo e vou atrás de
Paula, que está definitivamente salvando a situação. Estou tão puto
que não estou conseguindo controlar meus acessos de raiva e eu
poderia facilmente assustar meu filho agora. Por sorte, ela parece
ter percebido e está tentando privá-lo das minhas merdas.
Eles estão na lanchonete e ela está dando empadão para ele
de aviãozinho. Há um copo de suco natural, e ele está morrendo de
rir de alguma coisa que ela está falando. Paula faz um aviãozinho
fingindo que está indo dar para ele e então come. Isso o faz
gargalhar. Pelo menos ele parece uma criança fácil, receptiva,
mesmo após ter passado pela merda de um acidente.
— Ei — eu digo me juntando a eles.
— Xiiii, não conta para o papai que tia Paula estava comendo
seu lanchinho. É um segredo — ela diz, dando um pedaço para ele.
— Não tenho como te agradecer — confesso a ela.
— Não há nada aqui para agradecer, bebê Lucca. Apenas
fique calmo. Olha o presente lindo que acaba de ganhar!
— Um presentão — concordo com ela.
— Lucca, ela está acordada — Victor surge avisando. —
Você tem autorização para entrar. — Isso faz meu sangue ferver em
grandes proporções.
— Victor, se importa de dar o lanchinho para esse garotão?
— Paula pede, e ele sorri.
— Mas é claro que não. — Ele troca de lugar com Paula, e
beijo a cabeça do meu filho antes de me afastar com ela.
— Lucca, você concordou que Samuel é um presente.
— Sim, eu concordei.
— Foque nisso então, e não na raiva que está sentindo. Não
valorize os sentimentos ruins deixando de lado os bons. Fortaleça
os bons, ignore os ruins. Nenhum mal deve prevalecer dentro de si
— aconselha.
— Não me peça isso agora — digo a ela. — Além de todas
essas coisas que estão acontecendo, estou preocupado que você
vá mudar a visão que tem sobre mim. Mas, entenda, todos esses
acontecimentos caíram de uma só vez na minha cabeça e há muito
para eu lidar agora. Estou magoado, confuso, perdido, incrédulo,
nervoso, há uma quantia generosa de revolta. Talvez você, meu pai,
meu irmão, estejam pensando que estou agindo como se a minha
vida tivesse sido destruída com essa notícia, mas não é isso. Minha
vida não acabou, não foi destruída e estou feliz por ter um filho, mas
a forma como eu descobri, o fato de o garoto já ter dois anos... é
apenas difícil para mim lidar com isso. Estou magoado com
Dandara, independente da explicação que ela vá me dar, eu sinto
que nunca deixarei de ter mágoa. Eu sei o que vivemos, como
vivemos, a quantia de segurança que eu e toda a minha família
oferecemos a ela, as coisas que ela me dizia, eu sei tudo, então
para mim é muito pior do que todos vocês imaginam porque apenas
não faz sentido.
— Não vá como um trator para cima dela. Eu sei que ela
errou, acho que todos sabem, mas o que ela está prestes a
enfrentar agora vai ser pesado demais, Lucca, e acho que não
deveria ir com tanta agressividade para cima dela. Não estou
impondo, como sua amiga estou tentando aconselhá-lo a não ser
movido pelo ódio.
— Não sei como vou me sentir ao olhá-la — confesso.
— Pense no seu filho. Sei que você acaba de descobrir sobre
ele, mas essa descoberta também te leva a ter que se tornar um
exemplo que seu filho deve seguir. Dandara é mãe do garoto e
vocês precisarão de ter o mínimo de convivência que seja. Isso tem
que ser tratado na base do respeito e não com ódio, porque há um
ser humano inocente em meio a tudo isso e ele precisa dos dois.
— Não posso prometer nada. Como eu disse, não sei como
vou me sentir ao olhá-la. Nem tive tempo de absorver. E eu juro,
Paula, que teria simplesmente pego o garoto e ido embora. Não vou
mentir para você, não me julgue por isso, tenho meus motivos.
— Sim, tem seus motivos e estou muito longe de descobri-
los, porém, não é porque Dandara agiu errado que você tem que
agir também. O que ela fez é contra as leis, mas você pegar o
menino e sair sem satisfações também é. Não se iguale aos erros.
Aja com responsabilidade, com calma. Não deixe o ódio guiar suas
ações, porque você não é uma pessoa ruim. Aliás, você está no
topo das melhores pessoas que conheci na vida, Lucca. É um ser
humano querido por todos. Não mascare quem você é. — É
admirável. Essa mulher é admirável pra caralho mesmo. Por mais
ódio que eu esteja sentindo agora, eu acabo sorrindo e ela não
compreende isso.
— Eu iria levá-la para uma viagem curta no próximo final de
semana.
— Iria?
— É... mas os planos sofreram alterações e agora não sei
mais quando conseguirei levá-la.
— Ei, a paternidade não significa que nunca mais conseguirá
viajar — diz sorrindo. — Sabe, sou mãe e foi em uma das minhas
viagens sozinha que conheci um bonitão que se tornou um grande
amigo, além de ser meu próprio orgasmo.
— É, mas esse cara está cansado de ser seu amigo.
Inclusive, ele gostou de saber que é o seu próprio orgasmo. — Ela
fica corada, e faz uma cara de tristeza logo em seguida.
— Diga a esse cara que isso seria muito maravilhoso, mas
que não é o momento. — Ela suspira. — Lucca, se for o que estou
pensando, seria como um sonho, de verdade, e eu amaria cada
segundo, diria sim e todos os motivos. Mas, acho que é melhor
termos cautela porque as coisas mudaram e a situação vai exigir
isso. Acho que essa viagem vai precisar ser adiada, porque sua vida
agora vai mudar e talvez seus desejos mudem, talvez tudo mude. —
Seus olhos estão brilhando em lágrimas, mas ela é durona e não as
deixa cair. — Eu quero que resolva essa situação da melhor
maneira para você, para seu filho e para um bom relacionamento
com Dandara, tudo bem? E eu estarei com você em todos os
momentos, o apoiando...
— Você está renunciando a mim?
— De forma alguma, doutor. Você acha que sou idiota? Não
se renuncia a um homem como você. — Isso me faz rir. — Só estou
respeitando a situação. Mas, saiba de uma coisa — ela diz, batendo
seu indicado em meu peito. — Está tudo perfeito entre nós dois e eu
não sou tola de achar que somos apenas bons amigos. Isso deixou
de ser amizade a algum tempo, mesmo que não tenhamos dito
nada. Ainda conseguimos sair apenas como amigos, fazer
programas de amigos, mas nós estamos além disso faz um
tempinho. Tudo tem sido fantástico, não é?
— Extremamente.
— Então... três meses, Lucca. Abalou o meu mundo —
confessa. — Estou tranquila, confiante, e sendo sua amiga acima de
todas as coisas. Mas, eu também posso ser uma leoa se necessário
for. A partir do momento em que eu perceber que corro risco de
perder o que quero, as coisas vão mudar. Eu não sou àquela
pessoa que simplesmente renuncia às coisas sem lutar, e não estou
indo renunciar ao melhor amigo, dono do melhor beijo, do melhor
sexo da minha vida. Você é um em um milhão, uma raridade e eu
não sou idiota de simplesmente deixá-lo ir. O que eu quis dizer é
que neste momento não vou permitir que atropele as coisas comigo,
entende? Porque agora você precisa focar em outras prioridades e
precisa se dedicar à essa nova fase, que será de muitas
descobertas para você e para seu filho.
— Então você vai lutar por mim? É isso? — pergunto
divertido.
— Como uma verdadeira guerreira, Lucca Albuquerque —
afirma.
— Eu acho que me farei de difícil a partir de agora só para
vê-la lutando. Deve ser excitante. — Ela sorri, e eu a puxo para
meus braços, num abraço apertado. — Obrigado por estar aqui.
Você está certa em tudo, ok? Em tudo o que disse. A senhorita é a
minha melhor amiga, e eu jamais serei capaz de agradecer pelo
apoio, pela paciência, pela compreensão. Você é surreal, Diabinha e
eu acabo de descobrir que além de todas as qualidades que eu já
sabia que possuía, ainda tem o poder de me fazer ficar calmo
quando estou no olho do furacão. Estava indo como um trator.
— Sou uma fada — diz, e começamos a rir. — Isso foi
ridículo ao extremo!
— Aooo Paula, Jacinta minha gratidão. Agora eu preciso ir.
Você pode cuidar do meu filho, junto com meu irmão e meu pai?
— Com certeza. Mantenha a calma, bebê Lucca. Se você se
comportar, eu te darei um presente. — Sorrio mais uma vez.
— Tentarei me lembrar disso.

Eu não sei como fiquei relativamente calmo. Mas, é com


calma e tranquilidade que me dirijo até o quarto onde Dandara está,
após a enfermeira me guiar.
Respiro fundo antes de abrir a porta, e quando faço, Dandara
parece ter acabado de ver uma assombração. Eu não sei dizer
como me sinto agora. Ela está deitada, com alguns ferimentos e
recebendo medicação intravenosa.
— Meu filho! — ela diz se desesperando, deixando até
mesmo um copo cair de sua mão. Sorte que é de plástico. — Onde
meu filho está? — pergunta, tentando se levantar da cama, mas
parece sentir dores.
— O nosso filho está com a minha família — aviso. — Bom
vê-la, excelentíssima senhora juíza. É a famosa LEI DO RETORNO,
não é mesmo?
— Lucca, eu quero o meu filho.
— Você não está em condições de cuidar do nosso filho
agora — informo, sentando-me em uma cadeira. — Pelo seu
desespero, posso ver que não pretendia apresentar o meu filho ao
pai. Estou certo?
— Pretendia... não agora — responde. — Não assim.
— Sabe o que é mais engraçado nessa história? Você é uma
JUÍZA e simplesmente está agindo contra as leis. Como se sente
com isso? Alienação parental parece bom para você? E o fato do
meu nome estar em uma certidão de nascimento que eu nem
mesmo sabia existir? Como funciona tudo isso? Oh! Não precisa
explicar isso a mim agora. Guarde suas explicações para seu
advogado, para quando formos resolver essas questões
judicialmente com algum juiz ou juíza que tenha ética.
— Lucca... eu preciso ver meu filho.
— Por que foi embora grávida de um filho meu?
— Você não vai compreender. É inútil me fazer essa
pergunta.
— Pelo amor de Deus, Dandara. Eu dei o melhor de mim a
você, não me faça dar o pior. Não há mais como fugir ou esconder o
garoto porque eu não vou deixar. Você precisa apenas abaixar a
porra do seu topete e aceitar que não o fez sozinha. Ele tem um pai
que acaba de descobrir sobre a existência dele. Eu não vou permitir
que o tire de mim, porque ele não é sua propriedade. Ele também é
meu filho. Estou aqui porque infelizmente você é a mãe dele e nós
vamos precisar conversar. Não seja mais babaca do que você já foi.
Samuel está sendo bem cuidado, não aja como se eu ou meus
familiares fossemos monstros capazes de destruir com a sua vida e
a vida do garoto.
— Mas você vai tirá-lo de mim.
— Eu vou lutar pelo o que meu de direito e você não tem
culhões para me impedir disso. Você não é juíza quando está
lidando com o pai do filho que escondeu. Você é apenas uma
mulher fodida, que não tem poder ou qualquer outra merda agora.
Estou aqui te dando a chance de me dar sua versão dos fatos antes
de eu tomar as atitudes que pretendo — informo.
— Não o tire de mim, ele é a única coisa que tenho na vida.
— Porque você quis — digo ficando de pé, quase arrancando
meus próprios cabelos. É como se todas as barreiras da dor
tivessem acabado de se romper. É incontrolável o tanto de coisas
que quero dizer a ela. — Deus do céu, eu queria me casar com
você, te amava, te endeusava, eu só faltava me deitar no chão para
você passar por cima. O dia que você chegasse me dizendo que
estava grávida, seria provavelmente o dia mais feliz da minha vida.
Estávamos fazendo planos, fazendo tudo, íamos nos casar e você
simplesmente foi embora do nada, sem dar explicações, sem deixar
vestígios. Eu rodei tudo atrás de você, fui até a cidade da sua
família, rastreei seu telefone, eu fiz o diabo. Você não tem ideia do
inferno que passei, do estrago que fez no meu coração.
— Eu sinto muito, Lucca.
— Você sente muito, Dandara? É isso que você tem a me
dizer? Um simples "eu sinto muito"? Você nunca me amou,
Dandara. Nunca! E sabe o que é pior? Eu só estou conseguindo
enxergar isso agora, nesse exato minuto. Eu chorei sua partida por
quase três anos e você simplesmente nunca me amou. Quão
estúpido eu fui? Você me faz sentir raiva de mim mesmo.
— Você não sabe o que está dizendo. Eu amei, o amo e
sempre vou amar. — Quero rir dessas palavras estúpidas. — Nunca
foi por falta de amor.
— Você sempre foi egoísta, mas dessa vez se superou.
— Você nunca precisou passar por tudo que passei na vida,
então seu julgamento é estúpido e infundado, Lucca. Eu fui embora
porque a partir do momento em que descobri estar grávida, sabia
que perderia nosso filho com ou sem você. Meu filho é jurado de
morte antes mesmo dele existir e a culpa disso é exclusivamente
minha. Entre o bebê que eu carregava em meu ventre e você, eu
escolhi o meu bebê, o meu filho.
— Que merda você está falando? Pare de dizer que ele é
SEU, porra! Ele nunca foi apenas seu.
— Iríamos construir nossa família, permaneceríamos juntos,
as pessoas saberiam que eu estava grávida porque seria impossível
esconder isso.
— E o que há de errado nisso? Onde está o erro? —
pergunto.
— O erro está no erro que cometi no passado. Eu menti para
você sobre meu passado, Lucca. — Eu volto a me sentar após ouvir
essa merda. — Nada foi como eu disse, nem com a minha família,
tampouco com Diógenes. Mas, há uma coisa que sempre foi
verdadeiro, eu amo você, eu amei você, me entreguei a você, me
apaixonei. Foi verdadeiro, foi real. Nunca foi uma mentira todas às
vezes em que olhei nos seus olhos e declarei o meu amor. Eu amo
você.
— Foda-se o seu amor, Dandara. Ele não me interessa mais,
não acredito nele. Quem é você?
— Você está preparado para saber a verdade? — pergunta, e
me faço esse questionamento interno. Eu estou preparado?
— Quem é você?
— Compreendo sua ansiedade, mas não é o momento e nem
o local indicado para uma conversa desse porte — Dandara diz, e
eu suspiro repleto de frustração. Nesse momento, a raiva deu lugar
para uma enorme gama de decepção. Minutos atrás eu estava
consumido pelo ódio, agora estou consumido pela tristeza profunda,
daquela que parece doer até nos ossos.
Por que ela escondeu o passado de mim? Ela poderia ter me
dito, seja lá o que for. Teria sido tão mais bonito, tão mais nobre.
Estou dilacerado agora, com lágrimas em meus olhos e
envergonhado por chorar diante dela.
Victor costumava dizer que de tão bom eu me tornava
ingênuo, e agora eu consigo enxergar isso. A ingenuidade me
fodeu. E o pior de tudo, a coisa que eu mais abomino na vida é a
mentira e foi isso que ganhei da mulher que eu entreguei meu
coração. Não tenho mais o que dizer. Ela não vai falar agora e eu...
me sinto um pouco morto agora e vou terminar a conversa de
cabeça baixa, porque sou incapaz de olhar para ela.
— Eu nem sei se quero saber mais. Na verdade, estou com
tanto medo do que vou ouvir — confesso. — É tão triste descobrir
que tudo foi uma mentira, algo que me doei tanto, que acreditei
tanto. Acho que bem lá no fundo eu tinha esperanças de que você
voltaria e que retomaríamos, porque sou um idiota e iria perdoá-la.
Eu te esperei, Dandara. Te esperei até meses atrás. Todas as noites
quando eu fechava meus olhos era você quem vinha em minha
mente e eu rezava. Como um tolo, eu rezava para que um dia eu
pudesse reencontrá-la, porque você estava infiltrada em meus
ossos, em meu coração, em mim. Sempre soube dos seus defeitos,
assim como sempre soube dos meus, mas eles nunca fizeram
diferença para mim porque você era muito mais foda que todos eles.
Então... eu descubro que você é uma mentirosa. Descubro que
mentiu sobre quem é. Por que, Dandara? Você achou que eu não
seria capaz de compreendê-la? Era o seu passado, e não o seu
presente. Não mudaria o que sentia por você, talvez eu te admiraria
mais por ter tido coragem de se abrir comigo. Faria isso, porque
você era parte de mim, era o meu sonho se tornando realidade.
Agora tudo foi devidamente destruído por mentiras. Primeiro o
nosso filho, agora isso... e é tão frustrante ter que quebrar uma
imagem que construiu sobre uma pessoa. É tão ruim descobrir um
outro lado, um lado tão feio. Independentemente do que tenha sido,
é feio apenas pelo fato de você ter ocultado de mim, ter ocultado do
homem que moveria o mundo por você se preciso fosse. Eu nem
consigo ficar com ódio agora, porque eu acho que nunca estive tão
triste em toda a minha vida.
— Eu vou me explicar — diz. — Eu vou... eu te amo. Não foi
uma mentira isso. Você tem que confiar em mim, em meu amor. —
Eu quase sorrio. Como confiar quando a confiança foi devidamente
quebrada?
— Você ficará onde quando sair daqui?
— Em um hotel.
— Você está incapacitada, eu posso levar Samuel?
— Deus! O que eu fiz com você?! — ela questiona
começando a chorar.
— Posso levá-lo?
— Lucca, olhe para mim...
— Eu posso levar nosso filho? — pergunto mais uma vez.
— Sim.
— Ok. Você sabe meu número e onde me encontrar quando
sair daqui. Tudo bem?
— Lucca...
— Dandara, por favor — peço, ficando de pé. — Nos
falamos.
Caminho pelo corredor como se minhas pernas estivessem
se arrastando. Eu nem sei dizer como ficarei com uma criança
nesse estado em que me encontro.
— Filho? — Eu faço um sinal negativo porque se eu disser
algo, é capaz de eu cair de joelhos e chorar até perder as forças.
Apenas continuo andando.
— Lucca?
— Me dê a chave do seu carro? — peço à Victor, e ele a
pega, colocando-a em minha mão. — Cuide do meu filho?
— Cara...
— Eu só preciso de um tempo, por favor. Cuide dele?
Certifique-se que Paula chegará bem.
— Filho, você não quer conversar?
— Não sou capaz, pai. Me desculpe. Não sou capaz.
— Vá — é o que ele diz, e eu vou. Não me despeço de
Samuel, de Paula, eu simplesmente vou.
Quando chego em meu apartamento, eu sigo para o closet
onde Dandara deixou algumas roupas; um lugar que eu não remexia
a muitos e muitos meses.
Pego algumas fotos e observo. Tão perfeita, cada mínimo
detalhe, todos os traços. Perfeita pra caralho. No topo das mulheres
mais linda que já vi. Nenhum defeito, nada... apenas perfeita,
perfeita e perfeita. Tão perfeita que parecia como um sonho tocá-la,
que se tonava difícil manter as mãos longe, despertou em mim a
maior de todas as possessividades.
Apenas perfeita.
Mas é só a superfície, só a casca, todo o restante agora é
feio. Tão feia quanto é possível, porque eu aceitava todos os
pequenos defeitos dela, mas existe algo que eu sempre deixei claro
que jamais aceitaria: a mentira.
Tudo uma mentira. Tudo.
Eu as junto e junto todas as demais lembranças, enfio tudo
em uma mala e desço até o lixo do condomínio, onde coloco a mala.
Subo novamente, tomo banho e me acomodo em minha cama,
cobrindo até a cabeça. É então que todas as lembranças
indesejadas surgem... as lembranças da mentira.
"— Eu acho que seu divórcio deve sair em dois meses, então
podermos nos casar.
— Quero me casar na Ilha. — Seu sorriso é apenas o que
aquece meu coração.
— Hummm, de noiva?
— De noiva.
— Grávida de um filho meu?
— Não tão cedo — sua resposta me deixa quase frustrado,
mas é um direito dela de não querer filho agora. Só estou ansioso e
ela como sempre arruma uma maneira de fugir do assunto. —
Preciso de uma massagem em meus ombros.
— Sou massagista nas horas vagas.
— Eu amo você.
— Você é amor da minha vida, meritíssima.
— Promete que nunca vai me deixar? Haja o que houver?
— Prometo."
Excelentíssima, digníssima, meritíssima, você se foi e me
deixou na alameda dos sonhos despedaçados.
É o ponto final, a nossa próxima conversa será o grande
ponto final. Eu serei apresentado a uma mulher que não conheço, e
ela jogará sobre mim um monte de informações que provavelmente
serão difíceis de digerir. E, para completar, eu terei que lidar com ela
pelo resto dos meus dias, porque temos um filho. O tal filho que ela
não queria existe.
A minha vida estava tão perfeita, tão dentro dos trilhos. Bem
sucedido no trabalho, tendo uma espécie diferente de
relacionamento com uma mulher fantástica pra caralho, eu já havia
superado toda situação do passado e estava tão centrado em seguir
o presente e investir no meu futuro. Após quase três anos, eu enfim
havia conseguido esquecer os problemas e gozar livremente da
felicidade recém-adquirida. Mas, o furacão Dandara voltou para
fazer um estrago em grandes proporções. A única coisa boa que
trouxe consigo é o nosso filho, nada além.
Eu tento dormir, mas perambulo pelo apartamento pelo resto
da madrugada e vejo o sol nascer. Às oito da manhã, Zilda, minha
ajudante, chega alegre e radiante como sempre. Ela não recebe
minhas habituais brincadeiras essa manhã.
— Menino, o que te deu? — pergunta, ligeiramente
preocupada. — Você está doente?
— Zilda, doente de amor não procurei remédio na vida
noturna dessa vez — respondo. — Dandara voltou. — Ela abre a
boca em choque. — Eu tenho um filho de dois anos e só descobri
porque me ligaram do hospital. Eles sofreram um acidente, ela ficou
desacordada algum tempo e o garoto precisou de um responsável,
que no caso sou eu. Meu filho é registrado com meu nome mesmo
sem eu saber da existência dele.
— É alguma espécie de brincadeira?
— Eu daria vinte anos da minha vida para que fosse, Zilda,
mas é a realidade. — Ela acaba sentando-se, realmente chocada.
— Minha Nossa Senhora!
— Pois é, pois é. Você sabe fazer coisas que crianças
gostam, não sabe?
— Claro que sei — responde.
— Pode preparar algo para o almoço? Eu vou buscá-lo,
comprar algumas roupas para ele e então voltar para casa.
— Me parte o coração ver essa tristeza em seu rosto, meu
menino. — Ela fica de pé e vem me abraçar, eu a abraço também
porque é reconfortante. — Não fique assim.
— Você sabe o quanto eu amava aquela mulher, não sabe?
— Claro que sei.
— Você sabe como eu fiz e teria feito qualquer coisa para
fazê-la feliz e protegê-la, não sabe?
— Como sei!
— Vou buscar meu filho, Zildinha — digo, beijando sua testa
e me vou.
Eu sou tio, padrinho, mas nunca saí para fazer compras de
roupas com qualquer criança. Samuel é um garotinho muito fácil de
lidar, mas eu me encontro bem perdido. Acho que é porque minha
mente está bagunçada e eu não estou conseguindo me concentrar
direito. Para tudo ficar ainda melhor do que já está, minha mãe,
após longos anos bem, está em crise porque a maldição que me
aconteceu ativou alguns gatilhos nela. Só melhora!
Saio do shopping com Samuel carregado de sacolas.
Quando chegamos em casa Zilda fica louca com ele, e ele
parece gostar dela de cara. Enquanto eles confraternizam, eu ocupo
o espaço vazio do Closet com as roupas e calçados dele.
Nós passamos a tarde toda vendo desenhos e comendo, até
que algo acontece; ele simplesmente adormece agarrado a mim,
como um verdadeiro carrapatinho, e isso faz lágrimas caírem dos
meus olhos. Como pode surgir um amor tão forte do nada?
Realmente é como meu pai disse, a magia simplesmente acontece
e o amor surge forte antes mesmo de processarmos. Eu olho para
meu filho e ganho a percepção que não existe nada nessa vida que
eu não faria por ele.
Acho que adormeço também, porque acordo assustado
quando meu telefone toca. É um número diferente e eu atendo
prontamente.
— Oi.
— Oi. — Eu ouço a voz que me faz despertar mais que
depressa. — Meu filho está bem? — Isso me irrita um tanto...
porque ele não é dela. Ele é nosso.
— Sim.
— Eu já estou disponível para conversarmos.
— Me mande o endereço por mensagem de texto, estou indo
— aviso.
— Ok. — Ela encerra a ligação e eu suspiro. É a hora da
verdade!
Peço a Zilda para dormir aqui hoje e ela aceita prontamente.
— Qualquer coisa que acontecer basta me ligar.
— Não se preocupe. Nada vai acontecer, vamos nos divertir
juntos assim que ele acordar — diz me tranquilizando.
— Muito obrigado, Zilda. Estou te devendo uma.
— Vá com Deus, filho. Respire fundo e tenha paciência —
aconselha.
— Tentarei.

Quando Dandara abre a porta da suíte, eu engulo a seco ao


menos três vezes e fecho minhas mãos em punhos. Para quem
acabou de sofrer um acidente, ela está... muito bem.
— Ei.
— Vamos direto ao ponto — aviso, entrando e me
acomodando no primeiro sofá que encontro. Ela se acomoda em
outro sofá, de frente para mim e respira fundo.
— Espero que você tenha tempo para ouvir tudo.
— Estou aqui para isso.
— Onde meu filho está?
— O nosso filho está em minha casa com Zilda — informo. —
Comece a me dizer todas as mentiras.
— Deus! Você está de uma maneira que jamais imaginei ver
— diz.
— Vamos lá, Dandara. Diga-me tudo.
— Tudo começou na minha infância. — Essa primeira frase já
me faz ficar bastante atento. Eu quero ouvir e absorver cada maldito
detalhe. — Nasci em uma família pobre, nunca nos faltou comida,
mas nunca tivemos regalias. Minha mãe era empregada de uma
família muito rica e eles gostavam muito de mim, o casal tinha uma
filha da mesma idade que a minha e nós duas vivíamos brincando.
Enquanto eu mal tinha brinquedos, ela tinha tudo, em excesso.
Como o casal gostava muito da minha mãe, eles me colocaram para
estudar no mesmo colégio que a filha deles, e foi lá que tudo
começou. Eu não cabia naquele ambiente, o fato de eu ser negra já
era o suficiente para eu sofrer com piadas, mas o fato de eu ser filha
da empregada... era terrível. E a garota sempre que podia esfregava
na cara de todos que eu era a filha negra da empregada da casa
dela, que o pai dela pagava o colégio para mim. Meus pais não
ouviam minhas reclamações, diziam que era bobeira e que eu
deveria agradecê-los pela oportunidade de estudar no melhor
colégio. Acontece, que aquilo me fez cultivar um ódio gigante dentro
de mim e eu fui obrigada a aceitar até a minha adolescência. A
situação se tornou tão insustentável, que fixei em minha mente que
um dia eu seria tão poderosa ou mais poderosa que cada um deles.
Se tornou a minha missão na vida, eu só queria chegar no mais alto
patamar do poder para poder dizer a todos eles que a negrinha, a
filha da empregada, é muito mais poderosa do que qualquer um
deles. Era apenas esse o meu propósito. — Ela suspira. —
Acontece que meus pais não tinham mesmo condições. Eu fui
aprovada em uma universidade pública, mas eles não tinham como
me sustentar, como comprar os livros que eu iria precisar. Então eu
me tornei modelo e com o dinheiro que ganhava, investia nos
estudos.
"Agora entra a parte feia. Eu comecei a sair com os mais
diversos homens por interesse. Era muito bonita, sempre tive um
corpo perfeito e passei a usar isso para seduzir os caras que tinham
dinheiro. Tudo pela fome de poder e de me auto afirmar, foi quando
conheci Diógenes. Ele estava sempre na universidade dando
palestras e eu notava a maneira que ele me olhava, com desejo e
tudo mais. Me aproximei fingindo admirar a carreira dele e
passamos a ter encontros fora da universidade. Ele não me cantava,
mas eu sempre que podia fazia insinuações. Foi assim até ele ceder
ao desejo e eu dei o meu melhor para mantê-lo."
— Uow! — digo, esfregando meu rosto.
— Ele era muito mais velho, imagine uma mulher cheia de
vida e desejo? Ele apenas ficou louco, deslumbrado, apaixonado e
não demorou muito a me pedir em casamento. Nesse período, eu já
não morava mais com meus pais. Só que fiz questão de ir até eles,
de voltar ao bairro onde tantas pessoas falavam de mim. Cheguei
em um carro incrível, com um anel de diamante no dedo e esfreguei
na cara de todos que eu estava indo me casar com um
desembargador famoso. Meus pais não aceitaram de forma alguma,
porque Diógenes tinha idade para ser meu pai, mas eu disse a eles
que nada e nem ninguém iria me impedir. — Isso é característico
dela desde sempre. — Eu me casei com ele, nosso casamento saiu
em várias notinhas em diversos jornais e foi o primeiro passo para
eu me sentir no poder. Me formei, passei três meses estudando dia
e noite e me tornei juíza com uma das notas mais altas. Aí sim, foi
minha ascensão social. A negra filha da empregada se tornou juíza,
e essa mesma pessoa julgou pelo menos três casos de pessoas
que a humilharam no passado e os fez perder.
— Isso é errado.
— Eu sei, mas havia tanta mágoa dentro de mim, de um jeito
que me tornei cega, Lucca. Eu só pensava no poder, apenas no
poder e na vingança. Enfim, conheci um advogado da minha idade.
Nunca senti tesão por com Diógenes, sempre fingi, ele não me
satisfazia sexualmente e eu tinha fome de sexo. — Ela traiu
Diógenes! — Eu me envolvi com esse advogado num romance
tórrido. Eu queria transar com ele em todos os diversos lugares e foi
aí que engravidei.
— O quê?
— Eu engravidei e disse que o filho era de Diógenes, só não
sabia que ele era estéril. — Ela dá um sorriso nervoso. — E ele não
me contou, simplesmente contratou uma equipe de detetives para
descobrir quem era o meu amante e nos pegar em flagrante.
Diógenes os ordenou a fazer os mais diversos tipos de vídeos e
fotos enquanto eu transava com o advogado, há inúmeros registros
da minha traição. Não há nenhum vídeo meu transando com
Diógenes, como eu havia dito a você na Ilha, os vídeos dizem
respeito a mim e ao advogado que também era casado. Quando
Diógenes expôs isso, o advogado mudou de país com a família e eu
passei a viver sob ameaça.
— Puta merda, Dandara!
— Ele ameaçou a minha reputação durante anos e eu
deveria ter deixado ele espalhar tudo, Lucca, mas eu simplesmente
não conseguia porque isso iria queimar a imagem que custei a
construir e ia me tirar do papel da mulher poderosa, me levar direto
para o caminho da humilhação. Eu não suporto sofrer qualquer tipo
de humilhação, é como pânico, só de pensar nisso, eu me
desespero. Foi então que um dia fui devidamente dopada e passei
por um procedimento de aborto sem saber.
— Deus! Só melhora!
— Quando eu acordei, Diógenes estava ao meu lado com um
sorriso presunçoso. Foi a primeira vez que ele me deu um tapa na
cara e eu me lembro da sua frase todos os dias: "Sua negrinha
piranha e suja, eu não posso ser pai e você nunca será mãe. Ao
menos enquanto eu estiver vivo. Se você engravidar um dia, seja de
quem for, eu vou matar seu filho. Eu vou deixá-la viva para sentir a
dor e vou matar o seu filho". — Isso faz meu coração falhar. — E aí
as humilhações pioraram. Ele me fazia alisar o cabelo, me fazia
andar vestida da maneira que ele julgava correta, eu andava
cravejada de joias caras, foi um inferno. Ele me humilhava todos os
dias e eu aceitava apenas para não ter meu poder quebrado, para
não sofrer mais qualquer humilhação na vida. Então eu o conheci, e
o interesse foi mútuo. Criei coragem para colocar um ponto final na
história, mas não dava Lucca, não dava porque eu não aceitava ter
minha reputação queimada. Me afastei de você e tentei encontrar os
vídeos, as provas, tudo, e não encontrei de forma alguma. Então, no
casamento do seu irmão, eu estava decidida a jogar a reputação
para o inferno e ficar com você. Queria te contar tudo, mas não tinha
coragem porque isso iria mudar o que você pensava de mim, ia ser
humilhante. Ficamos juntos por alguns meses e eu engravidei de
Samuel.
— Se você tivesse me dito, nós teríamos mudado de país,
teríamos trabalhado em uma investigação. Dandara, a minha família
é poderosa o bastante para destruir com Diógenes e resgatar as
provas que iriam te absolver desse inferno. Não ia julgá-la por ter
agido como agiu, porque era o seu passado e só você sabe a sua
dor e tudo o que passou. É algo pesado, mas teria compreendido.
Não me apaixonei pelo seu passado, me apaixonei por quem você
era comigo. Moveria o mundo para proteger você e nosso filho,
usaria todo o poder que tenho, que minha família tem, íamos lutar
juntos. Faria tudo e qualquer coisa, Dandara. Eu faria tudo. Mal
posso respirar agora. Você não é quem eu achava ser, você... você
foi uma invenção da minha mente. Eu só precisava da verdade, só
isso — digo desesperado.
— Eu não pensei em você nem por um segundo — assume.
— Infiltrei em minha mente que tinha poder o bastante para salvar
meu filho sem precisar de qualquer pessoa e foi o que fiz. Não sou
uma juíza por amar a profissão, sou porque é uma profissão que
emana poder e que me coloca no topo, e usei isso. Cheguei em
casa, peguei as minhas coisas e fui embora. Pedi ajuda a alguns
conhecidos influentes da justiça e estive escondida por mais de dois
anos, com total proteção, com seguranças me rondando vinte e
quatro horas por dia. Fraudei a certidão de nascimento de Samuel
porque eu queria que ele soubesse... caso algo ruim acontecesse
comigo, eu queria que ele soubesse que tem um pai. Eu mostrava
fotos suas para que ele pudesse fixar sua imagem na mente, e
nunca saí de casa sem carregar comigo formas de contato com
você e sua família, sempre pensando que se algo acontecesse, as
pessoas chegariam até você. Meu plano foi perfeito até um dos
seguranças aceitar suborno de Diógenes, que parece nunca ter
deixado de me perseguir e me delatar.
— Pelo amor de Deus, Dandara! Isso tudo é tão absurdo!
— Ele descobriu onde eu e Samuel estávamos. Eu fugi e
então o acidente aconteceu. Enquanto fugia com meu filho, a
inteligência da polícia tentava resgatar Diógenes. Eu estava
dirigindo em alta velocidade, falando ao telefone, gritando, ditando
regras, fazendo mil e uma coisas, então eu perdi o controle. É sorte
estarmos vivos. Só ficou em mim alguns arranhões superficiais e
acho que em Samuel também. Fiquei apagada por um tempo
provavelmente por nervoso, não sei dizer. Enfim, Lucca, não é nada
bonito, ou que me orgulho. Sofri abuso de Diógenes porque eu
mesma mereci. Ele era um bom marido e eu... apenas nunca fui boa
com ele. — Nada justifica os abusos, a agressão.
— E onde Diógenes está agora?
— Eu não sei dizer — responde.
— Então nosso filho corre riscos? — pergunto, temendo pela
resposta.
— Sim, mas...
— Mas nada! Nosso filho corre riscos, você saiu feito louca,
se acidentou, os dois poderiam ter morrido e você vem com um
"mas"?
— Há muita segurança.
— Como havia no local onde você estava. Adiantou algo? O
desgraçado do Diógenes encontrou vocês — esbravejo, ficando de
pé. — Samuel a partir de agora está sob meus cuidados e isso é
indiscutível. Enquanto a vida do nosso filho estiver em jogo, ele
ficará protegido por mim, do meu jeito — aviso.
— Não! — Ela se desespera. — Eu não posso ficar sem meu
filho. Pelo amor de Deus, Lucca. Tudo, menos me deixar sem meu
filho. Pelo amor de Deus! — É aí que a mulher que luta para não ser
humilhada cai de joelhos ao chão, clamando por piedade. E, por
mais decepcionado que eu esteja com ela, eu tenho piedade e me
compadeço da sua dor. Aqui, diante de mim, de joelhos ao chão,
tem uma mãe. A mãe do meu filho, a mulher que escondeu meu
filho de mim por dois anos. Eu tenho todos os motivos do mundo
para deixá-la assim, de joelhos chorando, mas eu não faço. E as
palavras de Paula surgem frescas em minha memória:
"— Não vá como um trator para cima dela. Sei que ela
errou, acho que todos sabem, mas o que ela está prestes a
enfrentar agora vai ser pesado demais, Lucca e acho que não
deveria ir com tanta agressividade para cima dela."
Estendo a minha mão a ela e nos primeiros segundos parece
não acreditar no meu gesto. Seu choro diminui, mas não cessa por
completo. Então, segura minha mão e eu a faço ficar de pé. Olhos
nos olhos agora e eu mal consigo raciocinar, tantas informações,
tantos acontecimentos. Eu não consigo mais ver a conexão que
existia a cada vez que nos olhávamos.
O choro dela... eu não sei como me sinto sobre isso e só
consigo pensar que sou mais humano do que pensei.
— E agora, Dandara? — questiono. — Eu não sou nada
nesse mundo para poder dar lição de moral nas pessoas, mas,
mediante a tudo que me disse, e mediante à cena que acabou de
fazer, eu preciso te perguntar algo. Olhe para trás, para todas as
coisas que fez, pela sua sede de poder por vingança. Valeu à pena?
Valeu à pena perder sua própria identidade apenas para se vingar
de todos os constrangimentos que passou? Olhe como você se
encontrava há um minuto, de joelhos, implorando. A poderosa juíza
de joelhos, pedindo clemência. Valeu à pena, Dandara?
— Não.
— Se eu tivesse te conhecido nessa época eu diria tantas
coisas, mas, principalmente, eu te diria que tudo o que falavam dizia
muito mais sobre eles do que sobre você, porque não é vergonha
ser negra, não é vergonha ser filha de empregada. Vergonha é
julgar as pessoas pela classe, pela cor, pelo credo. Seus pais
erraram com você, muitas pessoas erraram, foram omissos, mas
você guardou isso com tanto ódio e deixou esse sentimento ser o
carro chefe da sua vida quando poderia ter escolhido uma maneira
mais nobre de lidar com a situação. Não posso julgá-la inteiramente,
nasci em berço de ouro, meus pais sempre foram maravilhosos,
nunca passei por preconceito de qualquer espécie. Imagino quão
doloroso deve ser, Dandara e sinto muito por ter tido que enfrentar
toda essa merda. Mas, o erro começou quando você permitiu que os
sentimentos ruins, que o ódio moldasse seu caráter e se perdeu. Eu
conheci uma Dandara incrível, talvez ela seja o seu verdadeiro "eu"
que ficou perdido num mar de erros tudo em prol de se auto afirmar
e vingar pessoas tão pequenas. Você se auto destruiu nessa busca,
mas pode haver um resgate, depende de si mesma. Da mesma
forma que foi capaz de se destruir, pode se reconstruir e fazer a
coisa certa. — Ela me abraça e eu fico sem ação. O seu abraço é
tão forte que parece capaz de me sufocar; é um abraço de
desespero, um abraço do qual eu me afasto.
— Eu amo você, sempre foi verdade.
— Não foi. Você disse no início da conversa que não pensou
em mim em momento algum. Você não me amou, eu amei sozinho.
— Lucca, não pensei em você porque em minha mente
estava fixado que meu filho seria morto. Não pensei em você, não
pensei em mim, não pensei em nada além do bebê em meu ventre.
Eu preferia a morte que perder meu filho. Naquele momento, eu não
me importei se sentiria sua falta, o quanto doeria a distância e nem
mesmo pensei que você iria me odiar pelo resto dos meus dias. Eu
estava cega e decidida a salvar meu filho mesmo que para isso eu
tivesse que ser infeliz pelo resto da vida. Desde aquele dia, manter
Samuel passou a ser o meu propósito na vida. Eu vivo por aquele
garoto desde o momento em que soube de sua existência. Tive
medo, Lucca, medo de ser dopada e ter outro aborto, medo de
seguir com a gravidez e ver meu filho morto, medo de tudo. Um
monte de cenas passou pela minha cabeça e nenhuma delas era
bonita. A ameaça de Diógenes foi verdadeira e ele tem poder,
status, dinheiro, conhecidos, ele é o próprio diabo e ele iria fazer mal
ao meu filho, de um jeito ou de outro. Não pensei mesmo em você,
não pensei em nada. Eu sei que é difícil compreender, Lucca, mas
você não esteve em minha pele e será incapaz de imaginar todas as
merdas que eu passei no passado. Se eu pudesse voltar atrás,
mudaria todas as minhas escolhas, todas as minhas ações, mas
isso é impossível, impossível.
— Eu teria me transformado na porra de um super-herói para
salvá-los. Teria feito tudo. No final, quem vai ajudá-los, Dandara?
Eu! — digo, me sentando. — Você ultrapassou o limite da auto
suficiência, se tornou egoísta, extremamente calculista. A sua
impulsividade e sua prepotência te levou por um caminho
completamente errado. Tudo teria sido diferente, tudo. E Deus é
minha testemunha do quanto eu queria que tudo tivesse sido
diferente. Um filho, eu seria o mais feliz dos homens em criar um
filho junto com a mulher que eu amava. E ele não é só o seu filho,
Dandara, é meu também.
— Eu sei, mas é o costume de dizer assim, não estou
fazendo por maldade — justifica.
— E agora? Você não quer ficar sem Samuel e eu quero
protegê-lo. O que faremos, Dandara? Eu quero estar perto do nosso
filho porque mereço isso. Quero conhecê-lo, quero ser pai. O que eu
vou fazer? Você fodeu com tudo e eu nem sei como agir. Seríamos
uma família, o protegeríamos juntos e não somos nada agora, nada
além de pais do Samuel.
— Eu aceito qualquer coisa, desde que não o tire de mim.
Aquele garoto é o meu oxigênio, é cada batida do meu coração, ele
é a minha vida, Lucca. Nunca estive tanto tempo afastada dele,
sempre fomos nós dois, sempre. Renunciei à minha vida por ele e
perdê-lo é tudo que sempre quis evitar. Foi por ele que larguei tudo,
Lucca, por ele. Se você o tirar de mim, terei perdido tudo.
— Por que não pensou nisso antes? Você foi errada até
mesmo com meus familiares. Quando aconteceu a situação na ilha,
todos eles se reuniram para te ajudar, Dandara. Todos estenderam a
mão para você, ofereceram ajuda, compraram o seu problema, e
você simplesmente tacou o foda-se. Sinceramente, a minha vontade
é de tirá-lo de você. Como juíza você deve saber que seria muito
fácil, que há uma série de fatores que fariam eu ganhar a causa. —
Isso a faz cair sentada no sofá. A vejo perder a cor do rosto e por
um momento acho que ela está indo desmaiar. Não existe mais a
mulher durona e prepotente, existe a mulher que não tem mais
argumentos de tão abalada emocionalmente. Sim, é visível em seu
rosto o abalo. Ela está sofrendo e eu queria não ter dó, queria muito.
Acho que ela merece sentir muitas dores para poder aprender um
pouco com os erros.
— Eu preferia ter morrido no acidente — confessa. — Sinto
muito, Lucca. Você pode tomar as atitudes que julgar necessário.
Está completamente certo, coberto de razão. Então, eu... não sei.
Não sei mais, apenas o salve, por favor. Não permita que nada de
ruim aconteça a ele. Por favor, por favor. — Isso me deixa mal de
forma que é quase sufocante. Não sei o que fazer, e é uma grande
merda estar tão perdido. — Samuel é igual a você; é alegre,
brincalhão, tranquilo. Tem alergia a camarão e amendoim, de resto,
é o ser humano mais fácil de lidar. Você não terá muitos problemas
com ele, todas as vacinas estão em dia e ele tem acompanhamento
com pediatra de três em três meses. Ele gosta que conte histórias
sobre você para dormir — explica de cabeça baixa, e eu vejo as
lágrimas caindo. — É um pouco difícil de comer verduras, mas se
argumentar muito ele come, basta dizer que se não comer vai ficar
dodói e terá que tomar injeção. — Ela dá um sorriso fraco. — Ele
tinha um ursinho amigo, que gostava de dormir abraçado, mas, no
desespero, tivemos que deixá-lo. Tem medo do mar, então talvez
você possa convencê-lo ao contrário.
Eu me levanto e vou para janela respirar ar puro. É muito
mais do que posso suportar, sou bom em suportar dores, mas sou
péssimo em causar dor a alguém. Prefiro sentir do que fazer sentir.
Minha mente começa a trabalhar em alguma maneira de
salvá-los, penso em mil e uma possibilidades de colocá-los em um
lugar mais seguro. É o momento de agir e retomar o controle, ficar
perdido não vai me ajudar. Penso em Nova York, em Los Angeles,
penso em tudo, mas é bem provável que ele consiga rastreá-la pelo
passaporte. A Ilha é impossível, porque o desgraçado sabe
exatamente o caminho, não vejo a possibilidade deles ficarem no
Rio porque é extremamente arriscado. Só vem um lugar em minha
mente e isso implica que eu terei que renunciar a algumas coisas
até ter essa situação devidamente controlada. Respiro fundo,
passando por cima da raiva, do ódio, do rancor e decido que não
posso fazer com essa mulher o que ela fez comigo, porque isso nos
tornaria iguais quando estamos longe de ser ao menos parecidos.
— Sou incapaz de tirá-lo de você, mesmo com todos os
motivos para fazer isso — confesso. — Eu quis muito, muito, mas
eu não sou um homem ruim, não sou um monstro que vai tirar uma
criança de uma mãe. Não quero que ele cresça sem você e que me
odeie por afastá-lo da mãe. Vou providenciar tudo; seguranças,
advogados, equipe de investigação, vou mover céus e terra para
mantê-los seguros, mas estamos indo embora até termos a situação
sob controle.
— Como?
— Não se anime, estou fazendo pelo meu filho — informo,
para que fique bem claro. — Não vou falar o local para onde iremos
porque não confio em você para mais nada nessa vida.
Simplesmente tenha em mente que estamos saindo da cidade por
um tempo e que as coisas agora vão andar ao meu modo, pelo
menos até eu conseguir dar um fim em Diógenes. É isso ou eu vou
passar por cima da minha generosidade e vou me transformar num
monstro pedindo a guarda do meu filho. Pegar ou largar, Dandara.
— Ok, eu... qualquer coisa.
— E quero que fique claro, eu tenho uma pessoa em minha
vida e a respeito. Não irei me afastar dela porque você surgiu das
profundezas. Ela vai conviver comigo e você vai respeitar isso. —
Ela suspira nada satisfeita, mas não ousa ir contra. Não estou
renunciando a Paula nem por um maldito caralho.
— Qualquer coisa, eu só preciso do meu filho. Não suportaria
perdê-lo, todo o resto pode vir a ser suportável.
— Que bom.
— Mas eu amo você. Amo você com todas as minhas forças,
apenas não mais do que amo meu filho. Me apegarei a qualquer
coisa para conseguir o seu perdão.
— Fico feliz que ame nosso filho — digo. — Estamos
conversados. Vou embora, mas entrarei em contato a qualquer
momento.
— Quando vou poder ver Samuel? — pergunta, voltando a
chorar. — Deus! Não dá para mim... por favor, eu preciso vê-lo ao
menos por alguns minutos.
— Eu odeio você, Dandara! — esbravejo. — Pegue a porra
da sua bolsa, maldição!

Além do fundo do poço, se é que é possível ir mais abaixo do


que já estou e de como me sinto. Eu sabia que mais cedo ou mais
tarde enfrentaria tudo que estou enfrentando, mas a grande verdade
é que sofro desde quando Lucca entrou em minha vida.
Sofro de arrependimento pelas minhas escolhas, por ter
buscados meios não bonitos ou honráveis para crescer, me
arrependo até mesmo de ter traído Diógenes, porque talvez, se eu
não tivesse o traído, uma separação teria sido mais fácil e eu estaria
completamente livre para viver meu grande amor. Me tornei vítima e
prisioneira do meu passado, e, desde quando consegui enxergar
isso, tem sido extremamente difícil lidar com as cobranças que eu
mesmo tenho me feito. O famoso "e se" é uma maldição que faz
parte do meu dia a dia. O tempo todo me questiono "e se eu não
tivesse feito tal coisa?" e isso me dói tanto, me dilacera tanto,
porque tudo na minha vida poderia ter sido diferente. Não tive
oportunidades, mas eu sempre fui tão inteligente, bastava eu ter me
dedicado para o bem e não por sede vingança.
Me perdi no caminho do ódio, e, por mais que eu tente
justificar, é meio que impossível a compreensão. Porém, ser
humilhada é a pior coisa que pode acontecer na vida de uma
pessoa. Andar num corredor repleto de pessoas que riem,
debocham, cochicham de você sem nem mesmo tentarem
esconder, é tão doloroso que eu não desejaria isso para qualquer
pessoa. E, para completar, meus pais eram omissos. Eles se
recusavam a me ouvir porque para eles era mais importante manter
o emprego do que lutar pela discriminação que a própria filha era
submetida. Tudo isso pesou tanto em cima de mim e eu guardei,
como um veneno infiltrado em minhas veias. Passei a usar aquilo de
motivação para crescer na vida, e poderia muito bem ter ido com
meus próprios méritos. Minhas notas eram excelentes, fui modelo
por um tempo, mas aquelas mesmas pessoas que riam de mim, eu
era obrigada a encontrar na universidade e aquilo apenas
alimentava mais e mais meu ódio. Queria ser maior que todos eles,
melhor. Eu era nas notas, mas não em minhas ações. Comecei a
me envolver com os caras mais badalados e ricos da universidade,
me tornei uma pessoa que andava de cabeça erguida quase
pisando nas demais, fiz uma série de coisas que são tão horríveis e
só depois de muitos anos eu consegui enxergar e ver que minhas
ações me transformaram em um ser tão deplorável quanto as
pessoas que me humilhavam.
Me arrependi de todas as maneiras possíveis, mas a fase em
que me tornei mais arrependida foi quando conheci Lucca
intimamente e descobri o ser humano fantástico que ele é. Eu não
conseguia lidar com a minha própria culpa e com o medo dele
descobrir quão feia eu poderia ser. Me afastei dele para tentar
buscar uma solução e apenas não encontrei... então retomamos e
eu engravidei.
Eu sempre quis ser mãe, principalmente após ter me
submetido à um aborto sem nem mesmo saber. Tive medo de que
nunca mais pudesse engravidar, mas Lucca me engravidou e o dia
em que descobri foi apenas um dos piores dias da minha vida. Não
pelo bebê, mas pelo que significava estar grávida. O positivo veio
como um soco em meu estômago, simplesmente me tornei
desesperada, vesti minha armadura, passei a ser calculista e parei
de pensar até mesmo em mim. Foi como se minha mente tivesse
sido desconectada do universo e focado apenas na parte onde meu
filho seria morto.
Com toda a sinceridade, eu não pensei em nada.
Absolutamente nada. Não me preocupei com riscos que eu
possivelmente correria, não me preocupei com Lucca, não me
preocupei com nada. Só em manter a gravidez de forma segura.
E agora, ao ver tudo que causei e tudo que perdi, eu apenas
não consigo lidar. Não consigo lidar com o próprio caos que causei.
Pior é ver o homem que perdi sendo grande em suas ações e
visivelmente tendo piedade de mim, não me sinto humilhada porque
a dor é tão profunda que não sobre espaço para isso. Só me sinto
devastada por ver exatamente o que perdi por culpa de um passado
que eu mesmo fodi.
Ele é tão generoso que está passando por cima da própria
mágoa para aliviar meu coração, e eu nunca, jamais, serei capaz de
agradecer. Espero que um dia ele possa me perdoar e que eu seja
capaz de lutar para tê-lo de volta, mas no momento não vejo
esperanças, principalmente quando chegamos diante do
condomínio dele e ele para o carro, abrindo um grande sorriso
enquanto olha para uma mulher que está na porta. É como se as
portas do céu acabassem de se abrir e ele estivesse vendo uma das
maravilhas do mundo.
Meu sangue inteiro ferve quando ele desliga o carro e desce,
como se estivesse hipnotizado. É ela. É ela a mulher que está com
ele, e é impossível não querer matá-la. Lucca seguiu com a vida,
mas o que eu poderia esperar? Nada. Fui embora sem deixar
rastros, detonei com o coração do homem, e, provavelmente, é ela
quem cuidou dos caquinhos. Isso não impede que eu sinta um
ciúme quase doentio, daqueles que fazem tremer interna e
externamente. Eu deveria dizer que mereço a dor que estou
sentindo ao vê-lo abraçá-la, mas não vou dizer.
Sem opção, desço também, porque certamente é onde ele
deixará o carro. Eu vejo a loira se afastar dele e arregalar os olhos
quando me vê. Me aproximo para que ela saiba que eu voltei e que,
por mais que no momento nada esteja favorável a mim, nós vamos
travar uma batalha dentro em breve. Eu amo Lucca e isso nunca foi
uma mentira. Nunca foi uma mentira!
— Desculpa, eu... não imaginei — ela diz a Lucca, e se vira
para mim. — Oi, prazer. — A analiso bem e percebo que a conheço.
— Eu conheço você?
— Provavelmente — ela responde sorridente. — Sou
advogada e já estive em alguns julgamentos com você.
— Você pode subir e ver nosso filho — Lucca diz ríspido, de
forma que ganha um olhar quase repreensivo da mulher. Não gostei
dela, nem um pouco para falar a verdade.
— É ela a mulher que você está? — pergunto.
— Dandara... — Eu compreendo, e pelo meu filho, eu me
calo e saio.
Assim como existe amor à primeira vista, existe o ódio também.
— Você sempre aparece nos momentos em que eu mais
preciso — digo a Diabinha linda que está diante de mim. Eu iria em
seu apartamento mais tarde, mas, por obra da nossa conexão forte,
ela veio até mim.
— Estou completamente mortificada por Dandara. Eu não
imaginei... sinto muito por ter vindo. É apenas costume e eu nem
mesmo pensei que pudesse ter esse encontro. Ela deve estar me
odiando ou sei lá...
— Você não tem que sentir muito. Não temos nada a
esconder, temos?
— Não, mas pela maneira como ela me olhou deu para
perceber que ainda tem sentimentos por você e não deve ter sido
nada legal ver uma mulher o aguardando — justifica.
— Paula, não vá por esse caminho. Eu e Dandara ficamos no
passado — digo, respirando fundo. — Há tanta merda para contar
que você provavelmente vai demorar uns três dias para conseguir
absorver.
— É tão complexo assim?
— Parece algo como um filme de ação, misturado com terror
e em alguns momentos parece uma grande comédia. Porém, não é.
Não há graça e beira ao absurdo. Meu cérebro está fritando, vamos
dar uma volta, tomar uma?
— Eu mataria por uma cerveja gelada. — Ela topa e eu
sorrio.
— Por isso que eu te amo! "Simbora", mulher!
— Você deveria ter mais controle sobre as coisas que fala —
ela repreende sorrindo.
— O que eu disse?
— Nada. — Eu não entendo o que ela quer dizer, mas...

Uma cerveja vira 20, acompanhadas de pequenas doses de


cachaça mineira e tira gosto. Paula está levemente alterada e
extremamente engraçada. Nós dois estamos rindo da confusão em
minha vida e eu a admiro por curtir sofrer comigo, do meu modo.
Meu sofrimento passa por etapas. Em alguns momentos fico
isolado pensando e sentindo as dores, em outros eu vou beber e rir
da merda toda, porque simplesmente não adianta ficar chorando.
Paula é assim. Ela é muito doida. Muito!
— Deus meu do céu! Olha, sinceramente, você se superou.
Eu não vou te dar conselhos de jeito nenhum, bebê Lucca.
Definitivamente não vou entrar nisso, ok? Mas eu te amo. Eu só não
quero julgar a mulher e a situação, porque não cabe a mim. Estou
de fora disso, preciso estar. Só posso te ajudar fazendo-o rir, te
dando uns "catos" gostosos, ou sendo sua amiga. Sei que amigos
costumam interferir em assuntos assim, mas como nossa amizade é
um pouco evoluída, não posso entrar porque vou acabar levando
para o lado sentimental, misturando meus sentimentos com a razão.
Caralho, Deus do céu! Não sei quanto tempo vou demorar para
processar tudo isso. Você estava certo.
— Complexo, não é mesmo?
— Você ainda a ama? — pergunta, e olha para todos os
lados, menos para mim. É engraçado.
— Amo.
— Oh merda!!!
— Bem longe de mim — digo, e ela começa a rir.
— Puta merda, meu coração falhou algumas batidas. — O
ruim da bebida é que as verdades saem com muita facilidade. Ou
talvez seja bom. Já descobri algumas coisas com apenas um pouco
de conversa com essa senhorita muito alegrinha de cachaça.
— Por quê? — pergunto sério, e ela para de sorrir.
— Eu não saberia dizer.
— Saberia sim. — Sorrio. — Por que seu coração falhou
algumas batidas?
— Estou com medo — confessa. — Estou me cagando de
medo, na verdade. Aliás, estou mais que cagando de medo. Estou
completamente medrosa e nunca fui muito medrosa. É meio
estranho estar na posição onde estou, porque você já faz parte de
mim, dos meus dias, da minha vida. Então tudo está mudando agora
e não pense que estou arrasada por completo. Você acaba de
ganhar um filho e isso é tão incrível, Lucca. É muito incrível ter um
filho, é magico, transcende. Mas não é só um filho, com ele veio a
sua ex. Eu te conheci e você ainda a amava.
— Você ainda amava Pablo que nasceu pelo cu quando te
conheci. Esse sentimento mudou? — pergunto curioso.
— Aí que está. Talvez eu tenha amado, mas não com
tamanha intensidade, entende? Eu realmente o amava, mas não era
tão intenso e tão avassalador. Todos nós cometemos erros na vida.
Eu amei Pablo, de verdade, durante muito tempo. Mas, nos dois
últimos anos acho que meu foco maior era em relação a Henrico ter
uma família, nem era sobre eu me casar com o amor da minha vida.
Era sobre viver com o pai do meu filho e tentar melhorar o convívio
entre eles. Pablo me deixou plantada no altar e aquilo doeu, por
mais que eu tenha me mantido forte, me embriagado, ele foi capaz
de fazer aquilo e me magoou profundamente. Porém, dias depois eu
parei para pensar bem, até mesmo fiz comparações com um certo
cara que conheci — diz sorrindo. — Eu nunca senti pelo Pablo o
que senti desde o primeiro contato com aquele certo cara.
— Cara de sorte.
— Aquela coisa de pele, tato, paladar, frio na barriga,
ansiedade, saudade. Eu nunca senti isso antes, nunca fui tão
desesperada sobre alguém. Mas eu sinto saudade de você, sinto a
necessidade de vê-lo sempre, mesmo que nem sempre seja como
um "algo a mais", mas só a sua presença, sua amizade, já significa
tanto para mim e eu simplesmente estou com muito medo agora. —
Quando as lágrimas escorrem dos olhos dela, meu coração se agita
no peito. — Eu nem deveria estar falando sobre isso. — Ela sorri
limpando as lágrimas. — Só estou um pouco abalada, por mais forte
que eu seja. E ela está em seu apartamento, faz todo sentido eu
estar assim. Isso traz um pouco de insegurança para mim e não sou
capaz de controlar isso, não agora.
— Não fique insegura. Eu não a quero, quero você, toda.
— Mas isso pode mudar, porque vocês são uma família.
Precisamos lidar com a verdade e a realidade. Pode mudar.
— Você e Pablo são uma família. Mudaria algo entre nós? —
Ela nega com a cabeça. — Então, aí está a sua resposta, Paula.
— Me desculpe, é apenas porque não dormi direito e passei
o dia com a cabeça repleta de pensamentos. Eu tive um dia de cão
chupando manga, foi infernal. — Ela precisa saber o que está indo
acontecer.
— Eu não sei se é o momento ideal para eu dar uma notícia
que pode piorar seu estado, mas preciso te dizer.
— Oh merda! Me dê uma dose! — ela grita ao garçom, e eu
dispenso.
— Melhor não.
— É tão fodido assim? Você não quer mais o lance entre
nós? Apenas amizade? Nem isso? Puta que pariu! — Como segurar
o riso? Felizmente estou conseguindo.
— Nada acabou entre nós, não diga bobagens. Quero você e
nosso garoto também. — Ela sorri. — Nossos garotos. Agora tenho
Samuel. Você aceita uma bagagenzinha nessa nossa história?
— Sim. Samuel é uma bagagenzinha como Henrico, eles são
muitos lindos. Nossas bagagenzinhas. — Ela sorri e volta a ficar
séria. Eu respiro fundo e decido ir direto ao ponto, sem prorrogar o
que precisa ser dito.
— Samuel está correndo riscos, como falei anteriormente.
Diógenes quer matá-lo para se vingar de Dandara. — Ela ouve
atenta. — Eu preciso proteger o meu filho e não sou capaz de tirá-lo
da mãe, mesmo que tenha sentido uma enorme vontade de fazer
isso.
— Isso derrubaria tudo o que acho de você. — Ela me corta.
— Não se tira o filho de uma mãe, a não ser que ele sofra maus
tratos e... enfim.
— Eu poderia tirá-lo, Paula. Ele não sofre maus tratos, mas
por conta dos erros do passado dela, meu filho está jurado de
morte.
— Eu sei, mas isso é tão complexo — diz suspirando. —
Você tem razão, mas, acho que por ser mãe, isso pesa bastante em
minha opinião. Eu morreria sem o meu filho, a vida deixaria de fazer
sentido. Não sou capaz de imaginar viver sem o meu pequeno. Não
conheço Dandara, mas imagino a dor que ela sentiria por viver sem
o filho, mesmo que tenha errado pra caramba e tenha consciência
sobre isso.
— Ela se desesperou quando mencionei pedir a guarda do
nosso filho e naquele momento eu enxerguei que Samuel é a única
coisa que restou na vida dela. Ele é o mundo de Dandara e seria
crueldade tirá-lo dela — explico. — Aí entra um detalhe importante.
Acredite, é tudo o que eu não queria, Paula. Porém, diante das
circunstâncias é necessário. Vou precisar agir, contar com a ajuda
da minha família, contratar investigadores, lutar judicialmente. Não
será fácil e não poderei continuar no Rio de Janeiro.
— Oh! — ela exclama, apoiando a cabeça nas mãos. —
Como assim?
— Terei que sair da cidade temporariamente até ter toda
situação sob controle e os dois estarem devidamente seguros. Vou
levá-los para Belo Horizonte, para um lugar onde tenhamos toda a
segurança necessária. Não serei capaz de deixá-los lá, de deixar
Samuel longe dos meus olhos quando sei que ele está correndo
sérios riscos.
— Compreendo, de verdade. É o certo a ser feito. Você deve
sim proteger Samuel. — Ela dá um sorriso fraco. — Ele é um garoto
de sorte por tê-lo como pai. Porém, isso implica que você e Dandara
morarão sob o mesmo teto, não é isso? Eu compreendi bem?
— É, não tenho opção, Paula. No momento é o que deve ser
feito. Morar sob o mesmo teto não quer dizer que vamos ficar juntos,
que o nosso passado e todos os erros serão perdoados. A única
coisa que nos une é Samuel, e é por ele que estou fazendo isso.
Sou um homem muito bom, meu amor, mas não sou idiota ou burro.
Dandara mentiu, escondeu meu filho e se não fosse por esse
acidente eu nem mesmo saberia da existência dele. Certas coisas
são imperdoáveis e impossíveis de serem consertadas, Paula. Não
vou colocar o que existe entre nós à prova. Quando eu estava
completamente perdido, você surgiu do nada e me deu novas
perspectivas. Você é a minha versão feminina, somos compatíveis
em tudo e seu caráter é apenas incrível pra caralho. Eu não vou
renunciar a você por nada desse mundo. Compreende?
— Compreendo — diz com firmeza, e, de repente, cruza os
braços sobre a mesa deita sua cabeça neles e começa a chorar
com força total. Paula nem mesmo me vê pedir a conta e pagar. Ela
simplesmente chora sem se importar com nada na vida.
Após pagar a conta, pego seu celular, sua bolsa e luto para
pegá-la em meus braços. Minha Diabinha deita sua cabeça em meu
ombro, agarra meu pescoço e vai chorando até o carro. Quando a
coloco no banco, fecho a porta e me acomodo. Ela deita sua cabeça
na janela e eu estou completamente perdido. Nunca vi uma mulher
chorar por mim, nunca estive em uma situação como essa.
— Me desculpe. Eu sou forte na maior parte do tempo, mas
também tenho direito a possuir fraquezas. Vai passar, apenas me
desculpe — diz soluçando, enquanto dirijo rumo à nem sei onde. —
Eu... há... até meu filho ama você — gagueja.
— Eu também o amo, demais. Não estou indo abandoná-lo,
nem se você chutar a minha bunda. Eu e Henrico somos amigos,
esteja ciente disso, dona Diabinha. E, não estou indo renunciar à
mãe dele de jeito algum. Tem oportunidades na vida que só
acontecem uma vez, não devemos desperdiçá-las.
— Vou sentir tanto a sua falta. Tanto. Eu não chorei quando
fui deixada no altar, mas agora ... oh Meu Deus! Estou tão
devastada. Nunca imaginei que iríamos ter que sofrer um
afastamento.
— Eu também sentirei muito sua falta, mas pode ter certeza
de que estarei com você nem que seja uma vez na semana, e de
vez em quando, vou sair de BH de helicóptero só para roubar um
beijo e voltar. — Ela sorri entre lágrimas.
— Era mais fácil quando você saía da Barra, ia até o Recreio
só para me dar um beijo e ir embora. Eu vou sentir falta disso, meu
bebê Lucca.
— Pare de chorar. Prometo que darei o meu melhor para
cultivar o que existe entre nós. Não quero perder isso. Você é
extremamente importante e preciosa para mim. É como uma joia
rara, de valor inestimável, Diabinha. É importante pra caralho na
minha vida.
— Quando você vai? — pergunta.
— Amanhã, Diabinha. Não posso arriscar continuar aqui. —
Isso faz o choro voltar com força total. Juro que estou quase
chorando junto. Puta merda! Eu não queria ter que deixá-la, ter que
me afastar, mas as circunstâncias são incontroláveis agora e há um
outro pedaço de mim que precisa da minha dedicação total nesse
momento. — Dorme comigo essa noite?
— Nãooo! — Por que diabos eu quero rir disso? Ela se
parece com Théo quando faz pirraça.
— Poxa vida! Você não vai dormir de conchinha comigo? Eu
vou sentir sua falta.
— Não vou.
— Então vou ter que dormir sozinho, abraçando o
travesseiro. Aliás, vou levá-la embora e vou subir apenas para
roubar seu travesseiro para levá-lo comigo. É isso. — Ela soluça.
— Não me faça rir agora.
— Você é muito boba por estar chorando. Muito mesmo —
comento. — Você ainda não percebeu algumas coisas, mas eu
também nem vou falar porque sou um garoto malvado.
— Eu quero dormir de conchinha.
— Não quero mais, Paula. Jacinta minha revolta por ter sido
rejeitado! — brinco, e ela fica caladinha até chegarmos em seu
apartamento.
É engraçado como ele se parece vazio quando Henrico não
está, e mais engraçado ainda é a forma como eu me apeguei ao
garoto. Inclusive fico um pouco sentido ao perceber que sou mais
apegado a ele do que ao meu próprio filho. Mas, eu acabo de
conhecer meu filho e nem tive tempo para me apegar. Isso vai
acontecer e eu quero muito, muito mesmo.
— Há roupas minhas aqui, não há? — pergunto.
— No meu closet. Vou tomar banho, ok?
— De acordo, senhorita. — Ela se vai e eu vou até o closet.
Há umas quatro cuecas, bermuda, camisa, isso me faz pensar em
tudo que vivemos nos últimos meses. Tem sido intenso e de uma
naturalidade surreal. Simplesmente nos encontramos e estamos
seguido o fluxo da situação sem nunca forçarmos nada, construímos
uma relação bonita, baseada na amizade, na verdade e no respeito.
Sentirei saudade da rotina que estávamos adquirindo. Parece que
não fui o único a entrar de cabeça nessa história, tampouco o único
a permitir que os sentimentos surgissem. O choro dela, as palavras
de uma bêbada verdadeira... eu descobri tanto e isso é fodido. Não
quero fazê-la sofrer, mas sei que indiretamente vou. Ficaria inseguro
se fosse o contrário, sentiria pra caralho se por algum motivo ela
fosse morar com Pablo.
Após alguns minutos perdido em pensamentos, me desfaço
das minhas roupas e decido me juntar a ela no banho. Haja coração
para lidar com essa mulher chorando. Ainda assim, ela está tão
linda. Seus cabelos estão presos num coque, e seu corpo dispensa
comentários. Não há mais palavras para elogiá-la.
Quando entro, a Diabinha para de chorar e fica me
observando tomar banho. É legal quando fazemos coisas assim
sem pretensão sexual. Nesse momento, quando a puxo para meus
braços, é só carinho, o mais puro e verdadeiro de todos os carinhos.
— Bebê Lucca, você é a melhor coisa que me aconteceu
depois de Henrico. É só por isso que estou chorando, porque se
tornou essencial na minha vida e tenho o maior de todos os carinhos
por você. Dói bastante imaginar que não terei mais para onde fugir
no meu horário de almoço, não serei acordada no meio da noite
para ganhar um beijo, não terei meu companheiro de cinema
durante a semana, não terei seu abraço reconfortante quando as
coisas saírem do controle para mim. Eu sei que é temporário, mas...
— Machuca do mesmo jeito — concluo. — Sentirei falta de
tudo isso também, meu amor. — Acho que o grande X da questão é
que nunca tivemos momentos de declaração. Nos elogiamos
diariamente, mas nunca declaramos a importância de um para o
outro. Acho que isso faz com que a insegurança se intensifique. Ela
está insegura, eu também. Sei que meu caso é mais complexo, já
que estarei com uma ex sob o mesmo teto, mas deixá-la sozinha e
longe dos meus olhos também é complicado para mim. A mulher é
linda, gostosa, inteligente, espirituosa, extremamente simpática e
dona do sorriso mais lindo que já fui capaz de ver na vida.
— Mas você deve ir, ok? Proteja o seu garoto com unhas e
dentes, não permita que nada de ruim aconteça a ele e até mesmo
à mãe dele. Seja o super-herói que eu sei que é.
— Você não sabe ainda, mas eu vou ser o grande amor da
sua vida. — Ela sorri. — É sério.
— Lucca, você ainda a ama?
— Vou te responder isso de uma maneira diferente e
enigmática. Eu vou cantar uma música na minha própria versão.
Vou trocar o TE por ME. O SEU por MEU. — Ela fica prestando
atenção. — Quem me leva ao céu? Você. Sem me tirar do colchão?
Você. Quem é que tira o meu mel? Você. Me deixa molinho no
chão? Não tenha dúvida, quem? Você. Me traz o céu pro colchão?
Você. Acabou sua dúvida, Paula!
— Não vou renunciar a você, Lucca. Não vou. Não importa as
circunstâncias, eu não vou desistir de você, irei lutar, enfrentar o que
for necessário. Ela é o B e eu sou o A. Eu sou A de amor, o A que te
ama.
Merda! Eu não consigo parar de chorar, de forma que minha
cabeça está começando a doer consideravelmente. Também não
consigo deixar de ficar abraçada a Lucca. Acho que só agora estou
conseguindo enxergar a dimensão do meu sentimento por ele e é
algo realmente gigante. Só de pensar em perdê-lo dói bastante, e
isso coloca abaixo todo meu discurso de mulher autossuficiente.
Mas, que mal tem se apaixonar? Acontece e então temos que saber
a melhor forma de lidar com isso. Porém, agora toda minha
racionalidade foi dar um passeio e deu lugar ao sentimentalismo
total. Estou extremamente sentimental, mais do que jamais fiquei
algum dia na vida. Na verdade, eu só fico assim quando o assunto é
meu filho.
Temos uma conexão mental, sexual e emocional. Isso é tão
raro de existir, é como um prêmio incalculável. Não consigo pensar
em perder isso, porque é algo que nunca tive antes, e é a melhor
coisa que já me aconteceu.
Não gosto de estar dessa maneira, me sentindo em um
completo estado de vulnerabilidade e percebendo que estou
levemente inclinada para uma dependência emocional. Isso foge
das minhas convicções e crenças, mas tudo tem sido tão
arrebatador, então preciso perdoar a mim mesma por essa curva
fora da estrada.
Meu bebê Lucca é tão apaixonante e tem esse rosto de bebê.
Meu Deus! Quem sou eu? O que fizeram comigo? Eu nunca fui tão
fofa.
Não existem mais respostas para os meus questionamentos
internos. Só sei que agora estamos na cama, abraçados e eu
apenas não consigo desgrudar dele. Eu amo tudo sobre esse
homem, seu sorriso, seus olhos, seus traços, sua boca, até mesmo
sua pele. Isso é louco?
— Ouça, não vá ficar triste, ok? — ele pede, brincando com
meus cabelos. — Por favor. Eu preciso que se mantenha bem, firme
e forte. Promete para mim?
— Prometo.
— Você é minha e eu sou seu, mesmo sem o estado civil
definido. Estarei de olho na senhorita, mesmo que de longe. Sou
extremamente possessivo e ciumento, que fique claro.
— Se você não me dissesse jamais imaginaria isso —
debocho.
— Só estou pontuando para que fique bastante claro, Paula.
Não estou brincando agora. Tenho sido controlado, mas meu
autocontrole às vezes vacila. Sou ciumento — avisa sério, e eu
sorrio. Sorrio, mas quero chorar mais cem litros.
— Lucca, imagina a minha situação? Você morará com uma
potência de mulher. Dandara é apenas uma das mulheres mais
lindas que eu já vi, sem contar o corpo daquela mulher. Pelo amor
de Deus! Eu não a odeio, mas eu odeio, porque é tão injusto que o
meu bebê Lucca está indo morar com um mulherão da porra. Deus
do céu! Lucca, eu vou me embriagar amanhã e chorar por três dias
até que não tenha mais lágrimas e possa seguir a vida confiante,
como sempre fui. — Meu Deus! Ele está indo morar com Dandara!
Não tenho elogios suficientes para a beleza daquela mulher. Ela é
absurdamente maravilhosa, sensual, gostosona. Nenhuma mulher
iria ficar cem por cento confiante sabendo que o homem que ama
está indo morar com a ex temporariamente, principalmente que a ex
dele o ama. Por que eu sei disso? Porque ela me olhou de uma
maneira que me causou calafrios. Sabe quando você nem precisa
de palavras porque um olhar diz tudo? Foi assim. O olhar dela gritou
"eu o terei de volta custe o que custar". Mas... eu também o quero e
no momento ele é meu.
— Eu não sei quanto sexo de conscientização faremos essa
noite para provar que estou muito louco por você e que não há
qualquer outra que eu queira.
— Ah nem... — digo, abraçando-o mais forte. — Você é meu
travesseiro preferido.
— Por quê? Você tem outro travesseiro para fazer essa
comparação? — Reviro os olhos e começo a rir. — Aoooo Paula,
Jacinta meu cinto estalando nessa bunda como castigo.
— Você me daria uma surra de cinto?
— Você curte essas paradas diferenciadas? — pergunta
rindo.
— Não.
— Em minha família tem uns casos exóticos — comenta. —
Meu cunhado é dono de um clube de sexo em Las Vegas. — Eu me
afasto e o encaro chocada.
— Sério?
— Sim, extremamente luxuoso e seleto — diz rindo. — Meu
pai fica puto. Enfim, o sogro da minha irmã tem um clube de BDSM
aqui no Rio.
— Misericórdia! Me leva?
— Você disse que não curte essas paradas.
— Mas tenho curiosidade de ver — explico.
— Sou ciumento.
— E eu não posso ir conhecer o local? Não quero praticar,
quero conhecer.
— Não.
— Eu vou sozinha então. Vou procurar, você vai estar em
Belo Horizonte mesmo, nem vai ficar sabendo — brinco, e ele rola
na cama, pairando por cima de mim.
— Não brinque comigo.
— Você é um bebê, bebê Lucca. Não coloca medo em mim
— digo, empurrando-o e invertendo a posição, ficando por cima. —
Eu detenho o poder.
— Com esses seios você pode fazer o que quiser de mim,
Diabinha. Bebê Lucca está acordando.
— Quando bebê Lucca não acorda?
— Quando você está longe. — Oh, isso foi fofo. Me deito
sobre seu corpo, o beijo. Quando dou por mim, estou chorando
novamente e ele tentando me acalmar. — Não faz isso comigo, por
favor. Me sinto mal pra caralho vendo você desestruturada e
chorando. Vai ficar tudo bem, você precisa confiar em mim, se não
confiar em mim, confie ao menos em nós dois juntos.
— Está bem.
— Vamos dormir, meu amor. Vem aqui. — Ele me ajeita na
cama e me abraçada por trás, depositando um beijo em minha
cabeça. — Dorme bem grudada comigo.
— Ok.
Eu finjo dormir, mas...
...Em minha mente todos os pensamentos estão rondando,
juntamente com a certeza de que nada mais será como antes.
É a primeira vez que durmo com Paula e acordo triste. É um
tipo de sensação diferente, como se eu estivesse indo me despedir
da própria felicidade, por mais que pareça extremamente pesado
colocar a situação dessa maneira.
Há três meses eu tenho sido imensamente feliz porque tive
minha vida transformada por ela. Essa menina mulher linda pra
caralho, interna e externamente, que está com os lábios ainda
vermelhos de todos os beijos que demos durante a noite. Estou
extremamente sentido por ter que deixá-la.
É com dor no coração e um tremendo nó na garganta que a
acordo para me despedir.
Ela abre seus olhos e fica me olhando. Meus olhos se
enchem de lágrimas.
— Ei, mocinha. Preciso ir — digo, fazendo um carinho em
seus cabelos.
Ela se senta e me abraça forte, chorando mais uma vez.
Dessa vez eu a acompanho num choro silencioso.
— Não fique assim.
— Eu apenas sei tudo o que me espera. Confio em você,
mas sei o que me espera e todas as coisas que terei que enfrentar
— diz. — E eu enfrentarei, me manterei firme. — Essa mulher gosta
de mim de verdade. Estou conhecendo a sensação de ser
devidamente amado, de ter alguém que se doa por completo.
— Fique firme e cuide do nosso garoto. Ok?
— Sim.
— Você é a melhor coisa que me aconteceu. Minha melhor
amiga, minha amante, minha confidente, minha base de apoio.
Preciso que fique bem pelo bem da minha saúde mental. — Ela
balança a cabeça positivamente. — Eu volto na próxima semana
para vê-la ou talvez peça para você ir. De acordo?
— De acordo.
— Vou escovar os dentes, me vestir e volto para te dar um
beijo — informo, beijando sua testa. — Você é o motivo, Paula!
— Você é o motivo! — Sorrio e fico de pé.
No banheiro lavo meu rosto e tento retomar o controle
necessário para seguir em frente. Escovo os dentes, visto minhas
roupas e Paula já não está mais na cama. Pego minha carteira, a
chave do carro e vou em busca da Diabinha. A encontro na cozinha
bebendo um iogurte.
— Coisa mais linda do Lucca! Preciso ir meu amor, tenho que
passar na casa do meu pai. Vem aqui. — Ela vem, se jogando em
meus braços e eu a pego. — Comporte-se, ok?
— Talvez — provoca.
— Eu acho bom se comportar.
— Parece que não sou a única insegura aqui. — Ela sorri
com a recém descoberta.
— Isso é um pouco fodido, não? — comento sorrindo. —
Comporte-se, já volto para você.
— Bebê Lucca, eu vou sentir saudades.
— Eu também, princesa. Dê um beijo no meu garoto — peço,
colocando-a no chão e tentando não prolongar uma despedida que
não está sendo muito fácil.
Caminho até a porta e a puxo para um beijo. Beira a
engraçado a forma como nossos beijos são explosivos. Ela sorri em
meus lábios e sorrio de volta, beijo sua testa e sem conseguir dizer
qualquer coisa vou embora.
Ela fica da porta me olhando enquanto espero o elevador
chegar. Entro no elevador e saio no mesmo segundo, não dou nem
tempo dela processar meu retorno, simplesmente a pego em meus
braços, chuto a porta e a levo para a cama.
Chuto meus tênis, arranco minha camisa, retiro minha calça e
minha cueca como um verdadeiro velocista.
— Meu Deus! Lucca! — Ela ofega quando me encaixo entre
suas pernas e retiro sua camisola. Minha boca desliza pelos seus
seios, dando devida atenção a cada um deles. Gosto quando suas
mãos se perdem entre meus cabelos conforme vou descendo meus
lábios até um caminho delicioso.
Afasto sua calcinha para o lado e me delicio com o sabor
delicioso de sua buceta molhada, recebendo de brinde gemidos
nada delicados. Meu pau duro clama por alívio, e eu uso uma mão
para tocá-lo, louco de vontade de me enterrar nessa mulher. Sugo
seu delicado clitóris e passo minha língua por toda sua intimidade,
de cima a baixo, movendo minha língua em círculos e pressionando
seu botão delicado. Fico louco quando ela abre mais as pernas,
pedindo por mais. Por um momento acho que ficarei sem meus
cabelos.
— Quer que eu te coma?
— Eu quero me sentar em você. — Game over! Essa mulher
é a rainha da sentada e eu serei um soldado massacrado em alguns
segundos.
Me afasto, deito e a faço me montar. É a visão do paraíso.
Rasgo as laterais de sua calcinha e a deixo livro para mim. Suas
mãos se apoiam em meu peitoral e ela sorri enquanto se esfrega em
minha ereção, preparada para dar o bote. Minhas mãos descansam
em seu quadril e eu tento controlá-la na tortura. A levanto um pouco,
e como uma garota muito esperta, ela direciona minha ereção em
sua entrada. Observo como deslizo para dentro dela lentamente e
arrepio quando estou por completo. O sorriso cresce em seu rosto
perfeito e então some quando ela morde o lábio e geme um
"hummmm", como se estivesse tendo a melhor sensação da vida.
Seus movimentos começam e me torno um admirador, apenas
observando seu corpo, seu semblante, suas ações; sentindo na pele
quão quente, sexy e intensa Paula pode ser. Memorizo cada detalhe
enquanto ela busca o prazer em meu corpo, até mesmo coloco
minhas mãos atrás de minha cabeça. Suas bochechas coram
quando seu olhar encontra o meu, ganhando a percepção de que
nenhum movimento está passando batido aos meus olhos.
Desvio apenas para olhar seus seios levemente balançado
conforme ela se move. É tão erótico e tão belo, que leva tudo de
mim para não a prender sob meu corpo e enchê-la com meu prazer.
Conforme ela intensifica e ousa mais em seus movimentos,
minhas mãos deixam a cabeça e seguem para os seios, apertando-
os e brincando com os mamilos rijos. Levo meu polegar em sua
boca e ela o chupa, então o desço até seu clitóris e ganho um
gemido alto em aprovação. A seguro pelo quadril e me sento,
reivindico sua boca e nos giro na cama, fazendo com que ela fique
por baixo. Seu corpo todo se retesa quando está prestes a gozar e
eu arremeto implacável até sentir seu aperto intensificar. Minha
Diabinha goza arranhando minhas costas, e a simples visão do seu
rosto perfeito tomado de prazer me faz gozar junto.
Grudo a minha testa à dela enquanto tento recuperar, então
ela me abraça forte e eu sei que está chorando silenciosamente
dessa vez. Grudado nela, no giro até estarmos de lado e retribuo o
abraço.
— Vá. Tome banho e vá, ok? Eu apenas vou ficar aqui até
você ir — ela pede.
— Eu vou, mas eu volto — digo, beijando sua boca uma
última e saindo de dentro dela. — Minha Diabinha.
— Bebê Lucca.

— Caralho! — meu pai e Victor exclamam juntos após


ouvirem tudo o que acabei de contar.
— Isso não é brincadeira? — Ava pergunta.
— Não, eu só vou em casa pegar algumas roupas e estarei
levando-os para BH. De lá vou trabalhar para solucionar isso e
conto com todos vocês.
— Já vou acionar Mário, ele conhece pessoas que podem
nos ajudar.
— Se preocupe em proteger o garoto — meu pai aconselha.
— Vou verificar minha mãe — aviso. — Mas, não vou contar
a ela a gravidade dos fatos, ok? Espero que não comentem
também, ela já está abalada.
— Eu não sei ser impassível, estou puta com Dandara num
nível... — Ava esbraveja.
— Ava, não cabe a nós julgarmos — meu pai adverte, e eu
fico de pé, fugindo da conversa.
Bato na porta do quarto da minha mãe e ela manda entrar. A
encontro deitada, assistindo uma série na Netflix, visivelmente
abatida.
— Ei, dona Vic, linda pra caralho!
— Sadbebê. — Ela sorri. — Como você está?
— Eu estou bem. Quero saber como você está. Mãe, o que
aconteceu comigo não tem absolutamente nada a ver com o que
aconteceu com você. Por favor, não absorva isso. Irei resolver da
melhor forma.
— Eu passei por algo similar, filho. É impossível não ser um
pouco devastada pela sua situação. É como se eu estivesse vendo
o meu próprio passado. E é tão ruim, tão ruim ver meu próprio filho
passando por isso. Parece que é como um castigo, para eu sentir na
pele o que fiz com Matheus.
— Você protegeu Isis, meu pai, nossa família toda. Você era
apenas uma adolescente, mãe, uma pessoa que teve a vida
devastada por um homem terrível que quase matou meu pai e
quase destruiu nossa família. Era um segredo que teve que carregar
para proteger a todos. Dandara tem mais de trinta anos de idade, é
uma juíza, tem a lei do lado dela, dinheiro, conhecimento, tinha a
mim e toda a nossa família. Ela escolheu ser autossuficiente e foi
egoísta, porque ela estava amparada por todos os lados e decidiu
agir sozinha. Escolheu esconder o nosso filho e ainda teve a
capacidade de dizer que se não fosse o acidente, talvez eu não
ficaria sabendo da existência do garoto tão cedo. As histórias não se
comparam de forma alguma.
— Mas...
— Mãe, pelo amor de Deus, você está há anos tão bem, tão
forte, tão feliz. Não deixe isso te levar para um passado sombrio e
doloroso. Não quero que fique impactada por isso. Sou forte e vou
lidar com a situação, apenas preciso que fique firme e forte, que não
deixe isso te abalar. Foque no fato de que agora você tem mais um
neto e deixe todo o restante para eu resolver. Tudo bem?
— Você é a coisa mais perfeita, filho — ela diz me
abraçando. — Eu sinto muito que esteja passando por isso e confio
que irá resolver da melhor maneira, porque você é meu filho e filho
de Matheus, isso significa muito e sei a criação que teve.
— É isso, mãe. Não se preocupe com nada e deixe o seu
passado de fora, tudo bem? Não tem absolutamente nada a ver.
— E Paula? Eu não a conheci. Como ela está com tudo isso?
— Ela é muito parecida com você. — Sorrio. — É uma mulher
forte, determinada e está me apoiando. Quanto a conhecê-la, vou te
passar o número dela, talvez vocês possam marcar algo. Eu ficaria
muito feliz se vocês ficassem próximos a ela durante o período em
que eu estiver em BH.
— Você vai para BH? — pergunta chocada.
— Sim, por um tempo. Só até resolver algumas questões
sobre Samuel com Dandara. — Oculto dela a gravidade dos fatos
por enquanto. — Mas estarei aqui sempre, não se preocupe. É
uma transição temporária — brinco.
— Parece que todos meus filhos passam por essa transição
temporária.
— É porque somos muito iguais aos nossos pais. — Sorrio.
— Eu espero que sua transição temporária seja satisfatória, e
que no final o amor sobressaia a tudo.
— O amor é lindo, dona Vic. De tirar o fôlego. Quero que
você a conheça e se apaixone. Como eu disse, ela me lembra você
em muitas situações.
— E eu inocente, achando que o amor era Dandara.
— Era — digo, dando um beijo na testa de minha mãe. —
Preciso ir, mãe. Cuide-se. Não quero ficar sabendo que você está
em crise. Estou bem, está tudo certo, fique bem também. Promete?
— Prometo. Só de ver que você está realmente bem, já me
alivia tanto. Mantenha-se forte, filho. Eu amo você, meu pimpolho
sadbebê.
— Agora eu tenho um filho para roubar "kult" — brinco.
— Estou louca para vê-lo. Matheus me mostrou fotos e só fez
elogios. Iremos a BH.
— Esperarei por isso ansioso!
Me despeço dela, do meu pai, dos meus irmãos e sigo para a
casa mais decidido que ontem e com a certeza de que terei ajuda o
suficiente para proteger meu filho.
— Aoooo Zilda! — Cutuco minha ajudante assim que chego.
— Meu menino, estou apaixonada por Samuel.
— Ele é lindo, não é mesmo? — Ela sorri.
— Um amor de criança.
— Onde ele está?
— Dormindo com a mãe... só tem um detalhe.
— Qual? — pergunto já receoso.
— Eles estão dormindo no seu quarto, na sua cama — avisa,
e eu respiro fundo.
Caminho até o quarto, abro a porta e encontro Dandara
deitada de bruços, vestindo apenas sutiã e uma micro calcinha que
mal é possível visualizar.
E assim começa a amostra grátis do que o futuro reserva para mim.
Há barulhos de gargalhadas vindo do meu quarto. Estou
tentado a ir descobrir o que se trata, porém não vou. Segundos
depois a porta se abre e dois seres humanos saem correndo feito
loucos: mãe e filho. Eu não sei qual é a piada entre eles e o motivo
pelo qual estão tão felizes, mas eu sei que isso dói na minha alma.
Ver Dandara no modo mãe me causa uma sensação ruim, quase
sufocante, porque ela é mãe do meu filho e simplesmente não
somos ou tampouco seremos uma família.
Tudo bem. Há pessoas que vão dizer que somos uma família,
mas não somos. Tudo fugiu do que sempre sonhei e planejei. Tinha
o sonho de encontrar uma grande mulher, me casar, ter filhos e ter
uma família feliz como os exemplos que vejo no clã Albuquerque
Brandão. A culpa de eu ter meus sonhos destruídos é dessa mulher
que está me olhando e deixando seu riso desaparecer. Por mais que
eu lute contra, minha mente se pega viajando, me imagino vendo
meu filho nascer, imagino o criando junto com Dandara, imagino os
acompanhando nesse acesso de riso e nas brincadeiras matinais.
Imagino mil e uma coisas que jamais serei capaz de viver ou
recuperar.
— Ei, bom dia — ela diz sem graça, enquanto um pequeno
ser se joga em cima de mim.
— Olá, garoto! Você dormiu muito? — pergunto ao meu filho.
Caralho! Quando é que a ficha vai cair? Eu pareço imerso em um
sonho muito louco. Há uma criança em meus braços e ele está me
chamando de papai, isso me deixa tanto apaixonado, quanto
furioso. Na verdade, deixa todos meus sentimentos bastante
descontrolados. Eu não consigo conter ou controlar, ao mesmo
tempo em que estou repleto de amor, há uma quantia de ódio. A
revolta por não ter visto meu filho nascer, por ter perdido dois anos
da vida dele, por saber que se não fosse o maldito acidente talvez
eu nem saberia de sua existência.
Não gosto de me sentir assim, não gosto de cultivar
sentimentos ruins e depreciativos, mas puta merda... quando é que
vou parar de sofrer por culpa das escolhas erradas de Dandara? Eu
estava bem, feliz e agora estou fodido, querendo me encolher em
um canto e chorar. Sou tão bom, que acho inadmissível estar
passando por tantas provações. É aquele lance de achar que não
merecia, de ficar buscando coisas erradas que já fez na vida para
tentar justificar o fato de estar pagando tão caro.
Quando os braços de Samuel envolvem meu pescoço e ele
me abraça, eu respiro fundo. É completamente estúpido sentir ódio
enquanto meu filho está me dando parte do seu amor. Porém, nesse
momento, se eu estivesse sozinho com Dandara, iria colocar a porra
toda pra fora, sem me importar se as minhas palavras iriam ou não
a ferir.
— Ei, pinguim, vamos tomar café da manhã? — Dandara o
chama. — Tia Zilda fez muitas coisas gostosas. Você precisa...
— Encher a pança — ele diz, e eu acabo rindo do seu
palavreado.
— Encher a pança? — pergunto a ele.
— Sim, papai. Comer e ficar forte.
— Put... Você é incrível, garoto! — Estou apaixonado nesse
garoto. Ele é muito foda, muito divertido e esperto. O coloco no chão
e ele sai correndo até Zilda, então Dandara vem falar comigo.
— Oi.
— Oi.
— Bom, eu saí fugida do local onde estava, estou sem
roupas e Samuel também. Só peguei meus documentos, dinheiro,
cartões, abandonei todo restante — explica. — Vou precisar sair
para comprar.
— Não — falo de maneira ríspida, e ela me lança um olhar
desafiador.
— Não te pedi autorização. Eu disse que vou precisar sair
para comprar.
— Vá, Dandara. Coloque-se em risco se é isso que você
quer. Eu acho que você poderia esperar chegarmos ao nosso local
de destino e então comprar em um lugar seguro. Mas, se você quer
sair aqui no Rio de Janeiro, saiba que vai sair sozinha. Eu estou
levando Samuel para um lugar seguro, porque não vou permitir que
ele corra riscos por conta da teimosia da própria mãe.
— Como vamos morar juntos? Você me odeia de todas as
formas, Lucca. Olha como você fala comigo!
— Você queria que eu ajoelhasse aos seus pés e dissesse
que te amo? O que você esperava de mim, Dandara? Você fodeu
tudo! Você fodeu pra caralho a nossa situação. E se eu disse não, é
porque mesmo você não merecendo, eu ficarei satisfeito se
conseguir mantê-la segura. Enfim, estou puto de raiva hoje, portanto
tente não me irritar, por favor. Vá tomar café com Samuel, vou
arrumar minhas coisas para podermos ir.
— Ouça, Lucca. Errei com você pra caralho, tudo bem? Eu
sei disso, na verdade, errei praticamente a minha vida toda, com
tudo e com todos. Reconheço meus erros, reconheço que fui
egoísta, que preferi buscar caminhos ruins, eu reconheço a merda
toda. Mas, isso não me faz ter que aturar esse tipo de tratamento.
Não quero que se ajoelhe e diga que me ama, não quero que me
faça carinho ou qualquer coisa do tipo, mas nós temos um filho e
teremos que nos tratar com respeito porque ele não tem culpa de
nada e eu não o quero traumatizado por conta de um mal
relacionamento entre os pais. Ontem eu estava muito desesperada
e fragilizada, hoje não mais. Se você quiser brigar, nós estamos indo
brigar. Eu te contei tudo, abri minha vida errada todinha, te contei
toda a verdade e todas as coisas das quais eu não me orgulho. Pelo
amor de Deus, precisamos no mínimo de uma convivência pacífica.
— Eu ainda não estou conseguindo.
— Era para estar, principalmente após ter passado a noite
fodendo — ela rebate, e eu sorrio de nervoso.
— Você sabe que o que eu faço não lhe diz respeito, não
sabe? Não é da sua maldita conta. Minha vida pessoal não te diz
respeito, principalmente o que fiz a noite passada.
— Não deve ter sido satisfatório, levando em conta seu mal
humor — diz.
— Foi extremamente satisfatório se quer mesmo saber. Mas,
sabe o que não foi satisfatório? Chegar em casa após ter tido uma
noite incrível e encontrá-la praticamente nua na minha cama. Se
quer conviver comigo, tenha modos e o mínimo de respeito. Eu não
sou obrigado a ver sua bunda nua.
— Tudo bem, Sherlock Holmes! Eu sei que dormi em seu
quarto, sei que o quarto é seu. Mas, se eu estava dormindo nele e
se minha presença te incomoda tanto, por que diabos foi lá? Eu
dormi de calcinha e sutiã porque estava sem roupa de dormir e não
tive coragem de pegar uma roupa sua. Não tenho bola de cristal
para adivinhar que você, sabendo que eu estava lá, iria entrar no
quarto sem bater. Não foi para provocá-lo, não preciso da minha
bunda para reconquistá-lo, Lucca.
— Nem tente — aviso.
— Eu vou tentar, acredite. E quer saber? — pergunta se
aproximando, e eu fecho minhas mãos em punhos, meu sangue
ferve de raiva. — Eu vou conseguir, aquela Barbie não é páreo para
mim. — Eu começo a rir, com vontade.
— Ela realmente não é páreo. Sabe por quê? — pergunto, e ela faz
uma careta. — Porque ela não precisa competir com você. Eu não
faço parte de um jogo, de uma competição. Foi você quem me
deixou, agora lide com as consequências das suas escolhas. Eu
fiquei fodido por mais de dois anos, rezando para você voltar
porque, embora eu tenha dito naquela maldita chácara que seria a
última chance, eu ainda mandaria a racionalidade para o inferno e
ficaria com você, porque eu sempre fui tão idiota quando se trata de
você. — Os olhos dela brilham em lágrimas. — Porém, agora não
sou mais. Custei a retomar minha vida e Paula foi de extrema
importância para eu conseguir seguir em frente. Não vou permitir
que destrua minha vida uma segunda vez.

Lucca sai da sala como um rompante de fúria. Eu caio


sentada no sofá, sem forças, e tento recuperar o mínimo da minha
dignidade, se é que possuo. Eu desenvolvi uma depressão no
passado, no final do meu relacionamento com Diógenes, e luto
contra isso desde então. Era um pouco mais fácil quando todos
meus problemas estavam distantes e eu só tinha que me preocupar
em cuidar do meu filho. Agora, por mais que eu queira muito lutar,
eu também sinto uma enorme vontade de me deitar em uma cama e
permanecer nela por tempo indeterminado apenas dormindo.
Eu nunca quis voltar porque sabia o que enfrentaria e sou
covarde demais. Eu lutei contra meus sentimentos por dois anos, os
mantive guardados a sete chaves e coloquei minha mente para
focar apenas em Samuel. Consegui, foi muito satisfatório até
reencontrar Lucca. Tive o melhor desse homem, Lucca consegue
ser o melhor homem que já conheci na vida, de uma bondade e uma
generosidade ímpar. Ele é aquele cara que tem excesso de coisas
boas, dono de um caráter indiscutível e atitudes extremamente
generosas; um amante indescritível, um filho incrível, um amigão,
um irmãozão. Antes dele eu achava que não existiam homens
perfeitos, mas ele veio para mostrar que existe, porque só consigo
descrevê-lo como perfeito. Carinhoso, bem-humorado, um amante
voraz na cama, o cara que passa por cima de todas as coisas para
fazer o bem a quem ama... enfim, descrevê-lo requer uma
eternidade.
É tão triste conhecer esse outro lado dele. Eu não sei dizer o
que me dói mais; vê-lo em plena revolta me tratando como se eu
fosse a pior mulher do mundo ou saber que jamais obterei perdão. É
horrível lidar com o arrependimento e inútil lutar contra esse
sentimento. Não adianta tentar ocultar, essa sensação é angustiante
porque eu sinto vontade de poder corrigir todas as coisas e sei que
jamais poderei voltar atrás. Olho para esse apartamento e me
lembro de todos os momentos bons que vivemos aqui... Deus, é tão
desesperador! É como se sugasse toda a minha energia e vontade
de viver. Só queria proteger meu filho, não pensei em nada, nem
mesmo em mim. Diógenes vai matá-lo se nos encontrar e pensar
nisso piora tudo. Preciso enfrentar isso, preciso corrigir, talvez se eu
me livrar de Diógenes, eu possa lutar por todo restante. É focada
nisso que tomo uma decisão e vou até o quarto de Lucca.
— Posso entrar? — pergunto ao bater na porta.
— Sim. — Ele autoriza e eu entro. Há na cama duas malas
grandes e ele está colocando suas roupas.
— Eu ficarei — digo, e ele para de se mover, me encarando.
— Como?
— Proteja Samuel, promete para mim? — peço, tentando não
chorar, por medo dele pensar que minhas lágrimas são falsas e que
estou tentando comovê-lo.
— Não estou entendendo, Dandara.
— Leve Samuel, o proteja. Ficarei para lidar com Diógenes,
preciso resolver isso. Se algo ruim tiver que acontecer, eu prefiro
que aconteça comigo. Apenas o salve. — Ele engole a seco.
— Não.
— Não? — Agora sou eu quem não estou entendendo.
— Você não vai lidar com Diógenes sozinha, não vou permitir
que coloque sua vida em risco. Aquele homem é perigoso e você
sabe disso.
— Eu vou usar meu poder, pedirei auxílio e proteção. Confio
em você para lidar com nosso filho, sabendo que ele estará em
boas mãos, fica mais fácil para mim. Ele agora tem alguém que vai
olhar por ele, então isso me deixa um pouco mais segura para poder
entrar na guerra. Se tudo isso está acontecendo, é por minha culpa.
Você não precisa se envolver, apenas cuide de Samuel e da
segurança de vocês dois — aviso, indo pegar minha bolsa porque
sou incapaz de permanecer vendo o olhar que ele está dando a
mim. — Você pode fazer isso, Lucca? Eu falarei para Samuel que
estou indo em uma viagem rápida.
— E se essa viagem for eterna? — pergunta, enquanto
lágrimas escorrem de seus olhos. Isso faz que as minhas escorram
também. — Não quero que Samuel perca a mãe, estou nessa com
você. Já resolvi tudo e vamos conseguir capturá-lo.
— Tenho medo de ir com vocês, sou o alvo principal, é atrás
de mim que Diógenes vai vir para poder cumprir a promessa.
Estando sem Samuel, é mais fácil.
— Ele não mata nosso filho, mas mata você, Dandara. De
que adianta? Eu não quero! Você não está indo sair dos meus
olhos.
— Eu preciso tentar corrigir tudo, Lucca. Por favor. Estou me
sentindo um lixo e se eu puder lutar, me sentirei um pouco menos.
— Você não acha que já fez merda o bastante? — ele
pergunta. — Do seu modo nada deu certo, Dandara. Tudo que você
fez agindo por impulsividade deu merda, me deixa estar no controle
agora? Não destrua mais as coisas, não complique a situação mais
do que já está complicada.
Eu queria dizer muitas coisas, mas as palavras ficam presas
em minha garganta, rasgando tudo internamente. A cada lágrima
que cai de seus olhos, maior fica o nó em meu estômago, a náusea
contribui para que eu me sinta cada vez mais no fundo do poço e a
realidade acrescida de uma grande dose de desespero me cega,
tirando-me a capacidade de raciocinar.
Indecisão, medo, arrependimento, desespero. Eu queria
apenas conseguir dizer parte de tudo que sinto, mas me calo. Não
quero perder meu filho, tampouco me distanciar, mas tenho medo
que ficar seja ainda mais perigoso, assim como tenho medo de ir e
Lucca me odiar ainda mais. Sou vítima de mim mesma.
Vítima das minhas fraquezas.
Vítima do meu passado.
Vítima das minhas escolhas.
Vítima dos meus familiares.
Vítima de Diógenes.
Vítima da minha traição.
Vítima do meu orgulho.
Vítima da minha incapacidade de aceitar ser humilhada.
Vítima do meu egoísmo.
Vítima da minha prepotência.
Vítima da irracionalidade.
Vítima da impetuosidade.
Sempre agi com excesso para esconder todas as faltas que
tive na vida. Eu não esperava que todas as minhas ações um dia
custariam tão caras. Me sinto tão sozinha, sem carinho, apoio,
vazia, desde pequena. Meus pais eram pobres e precisavam
trabalhar, eram raros os momentos em que estávamos juntos, e
quando acontecia, eles eram frios porque estavam sempre
cansados. Algumas vezes eu fecho os olhos e consigo ver
exatamente como eu era aos oito anos de idade. Eu me vejo
sentada num cantinho do quarto conversando com uma boneca que
eu ganhei dos patrões dos meus pais. Ela se chamava Jully e era a
minha companhia, era a "pessoa" com quem eu conversava e
compartilhava os acontecimentos da minha vida. Meio que me
acostumei com toda frieza e só conheci o verdadeiro acolhimento
nos braços de Lucca. Neste momento, eu queria que alguém
pudesse me dar um abraço acompanhado de palavras de incentivo.
Queria que alguém pudesse me dizer que preciso se forte e que
tudo vai ficar bem. Eu tive esse alguém, mas agora ele está tão
distante quanto é possível e tudo isso é minha culpa.
O desespero e a dor nos olhos dele me fazem recuar. Eu me
sento no canto do quarto, abraço minhas duas pernas e choro.
Talvez a real intenção de Dandara neste momento seja me
deixar louco. Ela está encolhida no canto do quarto, sentada no
chão, chorando desesperadamente. E, eu só consigo pensar em
como a vida às vezes é cruel. Estava tudo indo tão bem até
Dandara aparecer.
Respiro fundo, sabendo que não há como fugir da situação
em que me encontro. Terei que resolver isso de forma madura, sem
deixar o ódio tomar conta de quem sou. Me acomodo ao seu lado e
isso faz com que o choro diminua.
— Olha, já foi feito — desabafo. — Não é possível voltar
atrás, sinto dizer, nem mesmo consigo acreditar que você faria isso,
que voltaria atrás e corrigiria. Se não fosse o acidente, eu jamais
saberia da existência de um filho. Eu sei disso, você sabe disso, e
não adianta mentir ou fingir, Dandara.
— Estou arrependida, Lucca.
— Arrependimento não conserta as coisas. Você só está
arrependida porque eu descobri sobre você e Samuel. Enquanto
esteve longe com ele, tenho certeza de que arrependimento nem
mesmo passou pela sua cabeça. Estou errado?
— Não. Mas... sempre foi para proteger meu filho.
— Sempre foi por se achar autossuficiente, por achar que
você se basta. Entendo que sua vida tenha sido difícil, sei que não
posso julgá-la, mas suas escolhas te trouxeram até esse momento
fodido que estamos vivendo e ficar chorando pelos cantos não vai
mudar nada. — Ela balança a cabeça em concordância. — Você
sempre teve um escudo invisível, sempre foi forte, determinada. É
dessa determinação que precisa agora, Dandara. Não por mim, não
pensando em travar uma batalha para me ter de volta. Mas, você
precisa disso por si mesma e pelo nosso filho. Samuel corre perigo,
você é uma mulher forte, e ele precisa da sua força agora. Seja a
mulher foda que conheci, aquela que mete medo, que peita
pessoas, que atropela como um trator. Seja assim para proteger
nosso garoto e nada além disso, porque se você cisma de canalizar
seus esforços para recuperar algo que fracassou ou para prejudicar
uma mulher que nunca fez mal algum a você, eu perco o pouco do
respeito que sobrou entre nós e eu gostaria de não perder isso.
"Estou magoado, Dandara. Não teria como ser diferente,
você sabe muito bem o que existiu entre nós dois e o quanto a
apoiei o tempo todo. Te ofereci proteção, cuidados, o mundo e nada
disso pareceu o suficiente, levando-a a buscar outros meios, outros
caminhos. Então estou magoado sim, puto, com uma mágoa
gigantesca no coração, revoltado por ter perdido dois anos da vida
do meu filho, mas isso vai passar um dia porque nada é eterno.
Tentarei ser maleável com você, em troca eu só peço que me
respeite, que respeite o meu espaço, respeite o meu momento,
respeite o relacionamento que estou construindo. Não é o momento
em canalizar forças para me seduzir, para resgatar o que você
abandonou. É o momento de unirmos forças, de tentarmos construir
um relacionamento saudável e amigável pelo nosso filho, resgatar a
admiração que eu sentia por você. De verdade? Eu acho que somos
capazes de conseguir isso, de termos um relacionamento bom,
saudável e amigável. Quero propor isso a você."
— Tentarei.
— É isso? — pergunto. — Apenas um tentarei?
— Tentarei ser amigável. Eu não voltaria, Lucca, se não fosse
o acidente você não saberia mesmo de todas as coisas, porque
desde que descobri a existência de Samuel, o foco da minha vida
passou a ser protegê-lo, de tudo e todas as coisas que pudessem
causar dano. Um relacionamento com você seria perigoso tanto
para Samuel, quanto para mim, para você e sua família. Mas, o que
eu sinto por você nunca foi uma mentira e nunca deixou de existir.
Há momentos na vida em que somos obrigados a renunciar
determinadas pessoas, determinados sentimentos, e eu renunciei
tudo para ser mãe e manter Samuel seguro. Agora tudo foi
"descoberto", inclusive o sentimento que eu havia encoberto durante
dois anos. Vê-lo por foto parecia fácil, mas vê-lo pessoalmente,
saber que agora seremos próximos, vê-lo sendo pai do meu filho...
isso mexe comigo, Lucca. Mexe muito. Causa arrependimento, dor,
raiva de mim mesma, mas, principalmente, me causa sonhos,
desejos. Agi errado, não pensei em nós três como uma família, mas
acabamos de nos tornar, mesmo não estando juntos. Não existe
uma maneira ou uma fórmula que vá fazer com que eu não sinta o
impacto que sinto quando o vejo com Samuel. Não existe fórmula
para apagar de dentro de mim as lembranças e a saudade que sinto
de você. Serei compreensiva sobre sua raiva, principalmente porque
a razão está com você. Mas, por favor, seja compreensivo com o
meu sentimento, com o meu arrependimento, com a minha dor.
Respeite isso, não me amaldiçoe por querer tentar. Vou defender
meu filho, se precisar matar alguém, eu irei matar, você vai
descobrir como sou uma mãe leoa e como eu sou capaz de fazer
qualquer coisa para proteger meu filho. Só que viver em função de
protegê-lo não apaga o que sinto pelo pai dele.
— Eu prometo respeitar você, Dandara, mas espero o
mesmo, espero que me respeite. Estou bem, seguindo em frente,
feliz e pretendo continuar assim. Sempre fomos muito opostos e eu
sempre acreditei que era isso que me atraía em você, agora, eu só
consigo ver que nem sempre os opostos podem se atrair. Nossas
diferenças são gigantescas e há um abismo gigante entre nós dois
neste momento. Agora, vamos deixar de conversa, preciso terminar
de arrumar minhas coisas para que possamos ir embora.

Três horas depois estou me divertindo vendo Samuel correr


por toda a enorme casa, onde passei toda a minha infância. A casa
é realmente gigante, ampla, espaçosa, o lugar ideal para crianças e
foi ideal para uma família com cinco filhos. Eu e meus irmãos
tivemos momentos incríveis aqui, assim como meu pai e tia Bia
também tiveram. É fantástico que vamos modernizando a casa com
o tempo e nunca somos capazes de abandoná-la. Eu agradeço por
isso.
— Samuel, vamos em busca de um quarto para você? — o
convido e ele vem correndo. O pego em meus braços e subimos
para o segundo andar da casa, onde os quartos ficam. — Papai vai
te mostrar onde era o meu quarto quando eu era do seu tamanho.
— Ele ri, e eu beijo sua bochecha. — Você é muito lindo, garoto.
Parece com o papai.
— Não parece não — Dandara diz. — Ok, um pouco, mas ele
se parece muito mais comigo. De você ele puxou os cabelos.
Ok, ele se parece com Dandara pra caralho mesmo. Os
traços do rosto são muito idênticos, mas não darei o braço a torcer.
— Ele se parece comigo também.
— Pouco. — Reviro os olhos e ela sorri.
Abro a porta do meu antigo quarto e eu sinto a nostalgia me
invadir com força. Coloco Samuel no chão e ele sai para explorar.
— Gostou do quarto do papai?
— Sim!
— Quer dormir nele? — Ele se joga em cima da cama e
começa a pular. Dandara ri e parece se controlar para não o
acompanhar. Estou curioso para ver essa mulher no modo mãe, de
verdade. Quem a olha jamais imagina que dentro dessa mulher há
também um pouco de molecagem.
— Quero!
— Então você fica com o quarto do papai. — Sorrio. — Você
quer escolher um quarto? — pergunto a ela.
— Ficarei aqui com ele. A cama é de casal e nos
acostumamos a dormir juntos. — Há uma dependência emocional
nisso aí. Não conheço bem desse universo, mas será que é
saudável ou será que isso pode interferir no "crescimento" do nosso
filho? Embora, preciso dizer, eu gostaria de dormir com ele, porque
eu perdi um longe período de convivência e quero recuperar, mas
vou deixar a poeira abaixar e analisar o comportamento de Dandara
com ele.
— Ok, ficarei no quarto que era dos meus pais, no final do
corredor — informo. — Do lado direito, na última porta, há um
escritório grande, caso seja necessário, fique à vontade.
— Obrigada, Lucca.
— Eu acho que precisamos conversar sobre a estada aqui —
digo a ela. — Ouça, isso aqui não é uma prisão domiciliar, o
condomínio é enorme, repleto de segurança, além de termos alguns
seguranças particulares que julguei necessário. Não vou mantê-la
presa, Dandara, você pode sair, pode ter sua vida, só peço que seja
cautelosa e que colabore com os seguranças. Pense que é apenas
temporário e que tão logo isso acabar nossa vida voltará ao normal.
Sei que precisa de roupas e tudo mais, vamos usar apenas dinheiro
em espécie, nada de cartões de crédito, nada de coisas que facilite
sermos encontrados. Pode colaborar com isso?
— Sim, como vou conseguir sacar meu dinheiro?
— Use o meu, não se preocupe com isso.
— Não vou usar o seu dinheiro, Lucca. Tenho meu próprio
dinheiro. — Que mulher difícil!
— Você me paga depois. Se você faz um saque aqui, talvez
possa estar sendo monitorada e vão descobrir que está em Belo
Horizonte. Deixe de orgulho agora, por favor. Estou tentando fazer
as coisas certas para nós três.
— Te pagarei. — Eu suspiro tentando buscar a calma e a
deixo.
Pego minhas malas no térreo e subo para o quarto dos meus
pais. Há roupas deles aqui, porque eles estão sempre em BH, então
arrumo um espaço no closet e arrumo minhas coisas nele. Há uma
pequena mala com as coisas que comprei para Samuel e logo terei
que ir até o quarto dele arrumá-las.
Faço o pedido de alguns alimentos pelo celular e no meio da
tarde chegam as duas ajudantes que irão auxiliar aqui; uma
cozinheira e uma faxineira. Dona Márcia é a cozinheira e Luciana a
faxineira. Fico contente por ver meu filho e Dandara socializando
com elas.
— Lucca, vou precisar sair para comprar roupas para mim e
mais coisas para Samuel — Dandara informa. — Há como
disponibilizar um segurança para me acompanhar?
— Claro, fico feliz que tenha abaixado a guarda. Há dois
seguranças lá fora, eles irão acompanhá-la. Vou pegar dinheiro o
suficiente para você.
— Só agora estou percebendo quanto sou refém de um
cartão de crédito. Odeio dinheiro em espécie, principalmente porque
andar com dinheiro em espécie hoje em dia é pedir para ser
assaltado. — É ruim mesmo.
— Estou com um cartão do meu pai, se preferir. Vou anotar a
senha, acho que é mais indicado já que não faço ideia da quantia
que vai precisar.
— Você é perfeito — ela diz sorridente. — Não vai pegar?
— Vou. — Subo para pegar o que ela precisa e desço. — Se
precisar falar comigo use o celular de um dos seguranças. Tente ser
cautelosa.
— Eu sou juíza, Lucca. É uma profissão extremamente
arriscada e que exige cautela. Há uma arma?
— Quê?
— Eu sempre andei armada, é como se fizesse parte de mim.
Infelizmente não consegui pegar minha arma na fuga. Preciso de
uma — explica.
— Vou providenciar, preciso apenas da autorização.
— Quando eu voltar pegarei — diz, caminhando rumo a saída
de casa.
Eu e Samuel ficamos jogando vídeo game e ele acaba
dormindo no sofá. O levo para meu quarto e o arrumo em minha
cama. Tomo banho e decido ligar para a minha advogada.
Yoga e eu não combinamos. Eu nem sei porquê me matriculei
nisso, para falar a verdade. Mas, já que paguei a mensalidade, não
vou desperdiçar as aulas. Especialmente hoje estou completamente
tensa, minha mente está um turbilhão e não estou conseguindo
relaxar o suficiente para fazer os exercícios. Nesse momento
estamos na meditação, enquanto todos estão com os dois olhos
fechados, eu estou com apenas um, observando a plenitude com a
qual as pessoas praticam Yoga. Não vou dizer que estou com
inveja, ou talvez até esteja um pouco, acho muito bonito pessoas
que conseguem se manter equilibradas, plenas e que sabem deixar
os problemas de lado quando necessário. Eu não sou essa pessoa,
mas as circunstâncias estão exigindo isso de mim, terei que passar
por uma transformação e me tornar uma mulher muito plena, muito
mais bem resolvida do que já fui algum dia.
Meu celular está escondido entre minhas pernas, e quando
ele toca e vejo o nome de Lucca, eu esqueço onde estou.
— Bebê Lucca! — eu praticamente grito quando atendo a
ligação. Dezenas de mulheres, incluindo a instrutora, me lançam
olhares reprovadores. Eu junto minha esteira rapidamente e fujo
para o vestiário mais que depressa.
Fé nas malucas!
— Paula, Jacinta a saudade que eu estou sentindo de você!
— Isso me arranca um sorriso muito largo.
— Nem parece que trepamos essa manhã.
— Pelo amor de Deus, Paula, não fale palavras como trepar,
foder, transar, ok? Não enquanto estivermos distantes. Nada disso,
mocinha. Comporte-se — ele diz tão engraçado que começo a rir.
— Ok, bebê Lucca. Como foi a viagem?
— Pacífica. Estou tentando pacificar a situação — explica. —
Tive uma conversa séria com Dandara, estou confiante que vá surtir
efeito. Acho que não adianta ficar revoltado agora.
— Não adianta mesmo. Vocês precisam ter um bom
relacionamento por Samuel, que é a coisa mais linda e a sua cara.
— Ele é a minha cara, não é mesmo?
— Parece bastante, em especial os cabelos e o sorriso —
digo sorridente.
— Me diga como o meu garoto está?
— Ele está bem, com meus pais, vim para Yoga. — Lucca
começa a rir.
— Paula, você é a minha princesa, mas, combina mais com
um Muay Tay, algo do tipo. Acredite, lutas também contribuem
positivamente para aprendermos a lidar com as situações, controlar
a mente, adquirir equilíbrio. Deveria tentar.
— Vou tentar, mas me sinto muito diferenciada por não
conseguir fazer Yoga. Tenho problemas de concentração,
principalmente quando há muitas coisas em minha mente.
— Acontece com todos, meu amor. Tente o Muay Tay, vou
pedir à Victor o contato da academia onde Melinda faz e te mando,
tudo bem?
— Você é muito apaixonante, sabia? — Até suspiro dizendo
isso. Estou apaixonada.
Uma segunda chamada surge em meu celular e é a minha
mãe, preciso atendê-la.
— Lucca, vou precisar desligar, já, já nos falamos, ok?
— Ficarei esperando, Diabinha. — Ele desliga e atendo
minha mãe.
Meu coração já começa a acelerar quando ouço Henrico
gritando.
— Mãe, o que está acontecendo?
— Venha logo, filha. Há fogos. Pablo é um desgraçado.
— O quê?
— Venha logo para casa. — Ela encerra a ligação e eu pego
apenas minha bolsa. Deixo tênis, esteira, pego a chave do carro e
corro descalça pela academia. Eu até mesmo pulo a roleta de
segurança. Entro em meu carro desesperada, tentando não chorar.
Eu dirijo como uma louca descontrolada, por sorte a
academia é perto do meu apartamento. Paro meu carro na porta do
condomínio e há um carro de tele mensagens estacionado. Uma
mulher está dizendo as mais diversas palavras de amor, enquanto
um idiota solta fogos de artifício e outro idiota, mais conhecido como
Pablo, está de pé com um buquê de flores em mãos. Acho que
nunca senti tanto ódio como estou sentindo agora.
Entro apressada pelo prédio e sei que Pablo está me
seguindo. Não subo pelo elevador, vou correndo pelas escadas e
abro a porta do meu apartamento para encontrar o caos instalado.
Meu pai está de joelhos no chão, tentando conter a fúria de Henrico,
que está se debatendo a gritando desesperadamente.
— Paula...
— SAIA DAQUI, PABLO! SAIA OU EU VOU CHAMAR A
POLÍCIA, DESGRAÇADO.
— Por que ele está assim?
— VOCÊ É IDIOTA??? NOSSO FILHO É AUTISTA, VOCÊ
SABE O QUE OS FOGOS CAUSAM NELE — esbravejo chorando,
e pego meu pequeno dos braços do meu pai. É preciso que eu use
toda a força que possuo para carregá-lo até o banheiro do meu
quarto.
Fecho a porta com chave, cubro seus ouvidos com as mãos e
recebo chutes, arranhões desesperados até o som cessar e Henrico
começar a se acalmar. Estou chorando em desespero e meu filho
me agarra forte, num abraço esmagador. Ele está tremendo,
suando, seu coração está acelerado, e sei que preciso me acalmar
e parar de chorar para não assustá-lo ainda mais. Aos poucos vou
conseguindo encontrar a calma que preciso.
— Mamãe está aqui, meu amor. Mamãe vai protegê-lo, ok?
Acalme-se, meu amor. Por favor, fique calmo — digo, balançando-o
para frente e para trás, como se estivéssemos dançando sentados.
Isso costuma acalmá-lo. — Vai passar, meu pacotinho de amor.
Mamãe te ama até o infinito e mais. Vai passar, minha estrelinha.
Quem é o meu príncipe? Quem é? O Henrico Davi! O garoto mais
lindo do universo todinho e mais especial também.
Eu percebo que ele se acalmou, mas não pelo meu abraço, e sim
porque desmaiou. Essa percepção me faz desesperar novamente e
eu grito meus pais.
Meu bebê está sendo examinado e recebendo medicação
intravenosa. Devido ao meu desespero, fui convidada a esperá-lo do
lado de fora, pois poderia gerar maior stress se meu filho me visse
dessa maneira.
Estou andando pelo corredor e há sete ligações de Lucca não
atendidas. Enquanto estou verificando, ele liga novamente e eu
atendo.
— Paula, que diabos aconteceu? Estou desesperado. Já
liguei até para seus pais — ele diz.
— Está tudo bem, bebê Lucca. Não quero que se preocupe.
— Me diga o que houve. Não quero que esconda nada de
mim, Paula. Algo está acontecendo e quero saber, por favor —
pede, e não há como fugir. Respiro fundo, tentando não chorar, e
decido contar:
— Pablo resolveu fazer uma declaração de amor para mim —
digo, e ouço o barulho de Lucca socando algo. — Mas não de uma
maneira tradicional, ele contratou um desses carros de mensagem
ao vivo, levaram fogos...
— E Henrico deu uma crise. — Soluço porque nem mesmo
precisei terminar de contar. Lucca simplesmente sabe mais sobre
meu filho que o próprio pai dele. — Merda, Paula!
— Foi muito horrível. Ele tremia, gritava, estava transpirando
muito, levei um monte de chutes e arranhões. Então ele... ele
desmaiou. Foi tão assustador. Acho que foi a pior crise que já
enfrentamos.
— Ele já acordou? Como ele está? Onde você está?
— Estou no hospital Barra Dor. Ele está sendo medicado, o
médico achou melhor eu não ficar na sala, porque estou nervosa e
apenas não consigo parar de chorar. Foi horrível, Lucca. Horrível.
Estou no hospital descalça, descabelada, desesperada. As pessoas
estão me olhando como se eu fosse maluca, não trouxe nem
documentos, minha mãe teve que voltar em casa e buscá-los.
— Você é mãe, princesa. Uma mãezona. Onde está Pablo?
Eu espero que ele tenha voltado para dentro do cu de onde ele saiu.
— Isso quase me faz rir.
— Não sei... eu saí desesperada junto com os meus pais. —
Assim que eu termino de dizer Pablo surge no corredor, com os
olhos vermelhos de choro. — Ele está aqui.
— Pablo?
— Sim, está vindo em minha direção. Acho que vamos
precisar conversar.
— Eu queria estar aí com você. Odeio estar longe agora,
princesa. Odeio que tenha que enfrentar tudo isso sozinha — Lucca
diz suspirando. — Converse com ele e me ligue quando acabar,
ok?
— Sim, farei isso. Caso eu não ligue é porque fiquei sem
bateria e não trouxe nada.
— Ok. Meu amor, fique bem, fique firme. Você é uma mulher
forte, determinada, incrível pra caralho, além de ser uma mãe
surpreendente. Tenho muito orgulho de você, muito. Nosso garoto
ficará bem porque ele tem a sua força e tem o amor de toda sua
família, e o meu também. Foi só um susto.
— Está bem.
— Nos falamos mais tarde. Diga a Pablo que nasceu pelo cu
que ele conhecerá minha fúria em breve, principalmente se fizer mal
ao meu garoto e ficar tentando reconquistar a minha garota. —
Sorrio porque esse homem tem o dom de preencher minha alma.
Me despeço dele e me acomodo em um banco. Pablo senta-
se ao meu lado.
— Eu juro por tudo que é mais sagrado nessa vida, não fiz
por mal e tampouco me lembrei sobre os fogos. Não queria que
Henrico estivesse na merda de um hospital por minha culpa. Nunca
quis — ele desabafa chorando. — Estou me sentindo um merda,
Paula. Um grande merda e nem sei o que fazer para consertar isso.
Henrico não gosta de mim, e eu ainda estrago tudo. Só peço que
acredite em mim e me desculpe. Não fiz por mal.
O conheço o suficiente para saber que suas palavras são
verdadeiras.
— Henrico gosta de você, Pablo, mas você não ajuda. Não
ajuda de forma alguma. Você nem esforça para lidar com ele — digo
chorando. — Você é pai, tinha que ser o super-herói dele. Muitas
crianças não têm uma figura paterna porque os pais morreram, ou
definitivamente não prestam mesmo. Você presta, Pablo, tinha tudo
para ser um pai incrível, mas, só porque nosso filho possui
limitações, você o ignora dizendo que não sabe lidar bem com ele. É
tudo questão de querer, de possuir boa vontade. Tem sido eu e
meus pais por Henrico desde sempre. Nem mesmo seus pais dão
atenção ao garoto, o tratam como se ele fosse um alienígena. Você
está mais preocupado em fazer declarações ridículas tentando me
reconquistar, do que se esforçando para ser um bom pai. — Ele
chora cobrindo o rosto com as mãos. — Sei que para você ele não é
o filho perfeito que tanto queria, que ele não é capaz de jogar
futebol, sair correndo por todos os lados, mas ele é perfeito para
mim, e ele é a criança mais fantástica do mundo. — Soluço. — Ele é
carinhoso, doce, amigável, ele é tudo de melhor que existe no
universo e você está perdendo tudo isso. Nosso filho está
crescendo, daqui um tempo ele deixará de lembrar de você, Pablo.
Ser pai não se resume em apenas ajudar financeiramente. Pegue o
seu dinheiro e enfie no teu cu, porque eu ganho muito bem e tenho
condições de criar o meu filho. Só queria que você se esforçasse,
que tentasse ser um bom pai para ele, que não sentisse vergonha...
— Não sinto vergonha.
— Não? Porque é tudo que parece, Pablo. Quando
estávamos juntos já deixamos de sair centenas de vezes porque
você tinha medo dele dar algum tipo de crise, tinha vergonha do que
as pessoas iam falar ao ver um garoto com dificuldade motora, tinha
vergonha de apresentá-lo aos amigos. E eu me esforcei, acreditei
que morando sob o mesmo teto isso mudaria, você se apegaria
mais a ele, compreenderia mais sobre tudo... quis que fossemos
uma família pelo nosso filho. A cada dia só piora e eu acho que meu
bebê não terá uma figura paterna como eu tive.
— Ele terá, Paula. Eu prometo a você que ele terá. Me
perdoe e me dê uma chance de tentar ser melhor. Nunca quis
causar isso a ele, nunca. Eu preferia ter levado um tiro ao ver nosso
filho no hospital. Me perdoe.
— Apenas mude, Pablo. Seja o pai que Henrico precisa, seja
a figura paterna, a referência de bom homem que ele tem que
seguir. Acredito que não tenha feito de propósito, mas o erro está
em você não ter se lembrado de algo que sempre bati na tecla. Você
já me viu fugindo com Henrico de lugares por conta de fogos.
Esquecer isso é imperdoável, Pablo.
— Você acha ele vai me perdoar? — Meu Deus!
— Ele é uma criança, só há pureza e amor no coraçãozinho
dele.
— Me ensina? Me dê dicas de como lidar com ele? Há
alguém que eu possa procurar para obter informações? Eu faço
qualquer coisa, estou muito, muito arrependido. Ver que uma atitude
fodida minha o trouxe aqui está me matando.
— Vou ajudá-lo. Quero muito que seja um paizão para
Henrico, muito.
— Volte para mim, pelo amor de Deus! Você é a mulher mais
foda que eu já conheci, eu amo você, Paula, amo você. Só estava
com medo, perdido. Confesso que não sei lidar com Henrico, não
sei, e tive medo disso, medo até da responsabilidade. Estou sendo
verdadeiro.
— Eu o quero como pai do meu filho, Pablo, apenas como pai
do meu filho. Não amo você, não há possibilidade de ficarmos
juntos. Não somos compatíveis há muito tempo, bem antes de toda
a história do casamento. Só estávamos nos esforçando. Peço por
favor que respeite minha decisão. Quero que tenhamos um bom
relacionamento, que possamos ser amigos e uma boa base apoio
para nosso filho, é apenas isso que tenho a te oferecer, nada mais.
— Ele fica de cabeça baixa, provavelmente frustrado. Não há nada
que possa ser feito, eu não costumo voltar atrás em minhas
decisões e sempre fui bem direta com ele sobre não dar segundas
chances.
— Sinto muito, Paulinha. Eu prometo fazer com que você
sinta orgulho de mim ao menos como pai. — Respiro fundo e seguro
sua mão.
— Vou acreditar em você, Pablo. Não faça por mim, faça pelo
nosso filho. Faça para que ele se orgulhe de ter você como pai. —
Ele beija minha mão e em seguida minha testa.
— Prometo.
A noite se arrasta. Após muita insistência, meus pais vão
embora, Pablo vai embora e eu fico. O médico insistiu sobre Henrico
ficar em observação por vinte e quatro horas, por medida de
segurança. Ao menos agora eu posso ficar com ele no quarto. Estou
mais calma e ele está dormindo.
Seguro sua mãozinha, deito minha cabeça na cama e fico
zelando seu sono tranquilo. Estou quase dormindo quando alguém
bate na porta. Eu vou abri-la e encontro Lucca carregando duas
sacolas.
— O quê? Como? — pergunto, começando a chorar. — Você
está aqui?
— Não, eu estou lá em BH, Paula. Jacinta minha ironia —
diz, me pegando em seus braços. — Está tudo bem agora, meu
amor. Conversei com o médico, subornei até uma enfermeira.
— Subornou?
— Sua mãe me deu roupas limpas, produtos de higiene. Você
vai tomar um banho gostoso, e vai comer o lanche que eu trouxe.
Ficarei cuidando do nosso garoto.
— Você torna as coisas difíceis, Lucca. Muito difíceis.
— Pensei que tornaria fácil — diz sorrindo. — A enfermeira
vai levá-la para tomar banho. — Ele me entrega uma sacola e vejo
que há mesmo uma enfermeira me esperando. Eu queria dizer
tantas coisas a ele, mas me controlo por saber que não é o
momento ideal para dizer. Aceno positivamente com a cabeça e vou
sabendo que Henrico está em boas mãos.

Após um banho demorado e estar devidamente vestida,


coloco minhas roupas sujas na sacola e volto ao quarto. É surreal
que Lucca esteja aqui, sentado, observando meu filho.
Esse homem é de uma generosidade sem tamanho, e eu
nem sei descrever a bondade que ele carrega no coração. Ele saiu
de BH, provavelmente em um voo fretado, para vir aqui conferir
Henrico. Não sei quem tem mais sorte na vida, eu ou meu filho. Sei
que independente do nosso futuro, Lucca sempre será um bom
amigo e estará perto do meu filho, e isso é o mais incrível. É tão
legal como somos capazes de separar as coisas, maduro também.
E, sinceramente, com toda a loucura que carrega, eu jamais
imaginei que ele pudesse ser tão maduro quando necessário.
Sim, ele é bem louco. Ele é capaz de matar uma pessoa de
rir com muita facilidade, gosta de fazer aventuras, comete várias
molecagens, e ainda assim é um homão com H bem maiúsculo e
gritante.
Ele é um grande amigo, mas, a cada atitude dele, eu percebo
o quanto se tornou o ponto fraco da minha vida. Contrariando minha
própria filosofia de dependência emocional, percebo que já sou
dependente do afeto dele. Talvez eu nunca tenha amado de verdade
na vida, porque nunca fui tão apegada a alguém, mas de alguma
forma, estou apegada a ele. É uma junção de diversos fatores;
amizade, companheirismo, diálogo, compreensão, sexo, diversão,
carinho, a atenção que ele dá até para as minhas futilidades.
Construímos algo nos últimos meses, uma amizade imensa e um
sentimento que consegue ser maior a cada dia.
Quando eu disse que ele torna as coisas difíceis, é porque
realmente torna. É difícil não se envolver, difícil não se apegar, difícil
não estar apaixonada, difícil não o amar, difícil não sentir saudades
mesmo tendo-o visto a tão pouco tempo e mesmo ele estando
diante dos meus olhos. É apenas difícil não deixar minhas
convicções e crenças de lado para mergulhar de cabeça no
sentimento que ele despertou em mim.
Eu costumava ser uma mulher controlada, pés no chão, mas
já faz um tempo que eu tenho estado nas nuvens e descontrolada.
Ele torna tudo difícil demais e o destino faz o mesmo. Mas,
há algo em que me apegar: nunca fui uma mulher que gosta das
coisas fáceis. Nunca conquistei nada de mão beijada. Tudo o que
tenho, tudo o que sou, é fruto de muitas batalhas, muitas lutas e
muita porrada. E é por isso que valorizo tanto conquistas e pessoas.
Por ser uma batalhadora, a cada vez que olho para esse homem eu
tenho a certeza de que por ele vale a pena lutar, por ele vale à pena
uma infinidade de coisas.
Obviamente que ele possui defeitos, assim como eu também
possuo, mas todas as qualidades sobressaem disparado. Esse
homem é um em um milhão, e eu agradeço a Deus todos os dias
por ele ter entrado em minha vida e na vida de Henrico.
— Paula, Jacinto você me encarando há alguns minutos.
— Você... é surpreendente demais. Sério. Quem é você,
bebê Lucca? — pergunto, deixando a sacola no sofá e me sentando
em suas pernas.
— Vou ter que cantar novamente?
— Sim.
— Quem te leva ao céu? Sem te tirar do colchão? Quem é
que tira o seu mel? Te deixa molinha no chão?
— Você. — Sorrio.
— Eu sou esse cara aí. Você sabe — diz, me abraçando
forte. — Ouça, eu irei embora de manhã bem cedo, só vim mesmo
porque precisava vê-los. É horrível ter coisas acontecendo e estar
longe — comenta. — Mas logo isso vai passar. Quero que coma e
descanse.
— Eu comi um pouco mais cedo, não estou com fome. Posso
te pedir algo?
— Você quer o mundo? Eu te dou! — brinca.
— Me faça dormir e esquecer o dia de hoje? Por favor, bebê
Lucca.
— Você torna as coisas difíceis, Paula — diz me imitando, e
fica de pé comigo em seus braços. Ele me acomoda no sofá, coloca
uma almofada debaixo da minha cabeça, me cobre com um lençol e
se senta no chão, ao meu lado.
Sorrio quando ele começa a cantar músicas de ninar e faz
carinho em meus cabelos.
— Sou o lobo mau, lobo mau, lobo mau, pego a Paulinha
para fazer um vrau — cantarola, me fazendo rir. — Não fique triste e
zangada, se eu fico de lado e te como no chão.
— O quê? — pergunto gargalhando.
— É a música do ursinho Pimpão versão proibidona. Durma,
Paula, não atrapalhe minhas canções. Shiuuuu!
Eu fico calada, rindo de algumas letras malucas, mas no fim
acabo cedendo ao cansaço e durmo.
Quando acordo pela manhã, Henrico está dando gargalhadas
numa conversa animada com Lucca e eu jogo a almofada sobre a
minha cabeça percebendo que estou fodida... porque já era... já era
de verdade. Eu não consigo mais enxergar um futuro em que não
tenha Lucca nele.
— Olha quem acordou! — digo a Henrico, após ter pegado
Paula em flagrante me analisando.
— Mamãe.
— Ela mesma. — Sorrio enquanto Paula tenta despertar de
uma vez. Ela está engraçada, me olhando de um jeito diferente e
simplesmente não consigo decifrar o olhar enigmático. — Olha
quem está bem e feliz, mamãe! Ele é o super-herói mais forte e o
pintor mais incrível.
— Lucca... deixa para lá — ela diz, ficando de pé e se
aproxima de Henrico. — Amor da mamãe, meu anjo protetor! Você
está bem realmente bem e para sempre bem? — Henrico balança a
cabeça positivamente, e noto que ela está com dificuldade de
locomover as mãozinhas hoje. Ele tem problemas de coordenação
motora, alguns dias parecem mais fáceis e outros mais
complicados. Paula nota e começa a brincar com os dedinhos dele
enquanto o distrai conversando. — Bom, tio Lucca tem que ir agora,
ok? Mas, logo estaremos juntos e eu irei levar um amiguinho para
você conhecer, pode ser?
— Não — Henrico diz.
— É um amiguinho muito especial, igual o tio Lucca, você vai
gostar dele, meu amor.
— Não quero. — Seguro a vontade de rir, porque é
engraçado vê-lo ciumento, mas ele vai gostar de Samuel, vou
trabalhar nesse propósito. Meu filho precisa de convivência com
crianças, assim como Henrico também precisa. Há meus sobrinhos
também, e sei que mesmo terríveis eles vão se dar bem.
— Desculpe por isso — Paula diz baixinho rindo.
— Está tudo certo. Vamos lidar com isso depois — respondo.
— Preciso ir, meu amor. Quero chegar antes de Samuel acordar —
explico, e alguém bate na porta, a abrindo logo em seguida. Pablo
que nasceu pelo cu entra e foca seu olhar diretamente em mim.
— O que esse cara está fazendo aqui? — pergunta.
— Lucca veio ver o nosso filho, Pablo. Bom dia para você
também — Paula diz, e Pablo se aproxima de Henrico. Sei que é
errado de todas as maneiras, mas eu não consigo não sentir
ciúmes. Porém, é algo que devo lidar com maturidade, ele é pai de
Henrico, ex noivo de Paula, e eles vão conviver.
— Ele está bem?
— Acordou bem.
— Vou nessa — informo, pegando meu casaco e dou um
beijo em Henrico. — Ei, rapaz, tio Lucca ama você. Logo iremos
pintar juntos.
— Está bom — Henrico responde, e sorrio antes de me
afastar. Paula me acompanha até a porta, deixando-o com Pablo
que nasceu pelo cu.
— Vocês conversaram ontem? — pergunto curioso.
— Sim. Pablo é completamente perdido, ele não fez
propositalmente, só não teve raciocínio. Conversei com ele, expus a
situação, minhas queixas em relação a ele como pai, parece ter
surtido efeito. Disse a ele também que nossa convivência será
apenas como pais, nada além, que insistir em algo é perda de
tempo. Nos entendemos e ele quer ser o pai que Henrico precisa.
Estou contando que dê certo, quero que meu filho tenha o pai
presente. Estou dando uma segunda chance.
— Você está certa. Henrico precisa do pai, é importante —
digo, mexendo em seus cabelos. — Paula, me ligue para o que
precisar, por favor. Não me esconda as coisas com medo de causar
problemas. Prefiro sempre ficar sabendo de tudo, ok? Confio em
você, confio que o que estamos construindo é na base da
transparência e da verdade; é por isso que eu a admiro. Não sou o
pai do Henrico, não quero ser e nem quero roubar o lugar do pai
dele, mas estabeleci uma relação de carinho com o garoto, já te
disse infinitas vezes o quanto Henrico é importante para mim. Me
preocupo e ficarei feliz se você continuar me dando notícias diárias
sobre ele, como sempre fez. As coisas mudaram um pouco, há
Dandara, há meu filho, mas não é porque eles chegaram em minha
vida que você e Henrico deixarão de ser importantes. Os dois
ocupam um lugar extremamente importante em minha vida e não
quero perder isso de forma alguma.
— Não vai perder, prometo — ela diz, passando as mãos em
meu rosto. — Você é...
— O motivo?
— O motivo — concorda sorrindo.
— Você é o meu motivo — afirmo. — Preciso ir, nos falamos
mais tarde, ok?
— Boa viagem, bebê Lucca. Obrigada por ter vindo, por me
fazer dormir e por amar meu filho.
— Talvez não seja só o seu filho que amo... — Beijo sua testa
e vou embora.

Quando chego em BH, a primeira cena que me deparo é de


Dandara pisando em um carrinho, caindo de costas no chão,
morrendo de rir com Samuel. Ele chega a perder o fôlego e eu
caminho para ajudá-la a se levantar, porém, ela está chorando de rir
e nem consegue ter forças para ser ajudada.
Para onde eu olho na sala há brinquedos e isso me faz
lembrar de Théo e todos meus outros sobrinhos. Ter criança em
casa é algo de outro mundo, é como se colorisse a vida. E agora eu
tenho meu filho, embora essa convivência sob o mesmo teto seja
temporária.
— Papai, a mamãe caiu de madura — Samuel diz de um jeito
engraçado, gargalhando.
— Me ajude a puxá-la, garoto. Papai está muito fraco. — Ele
vem até mim e segura no braço dela enquanto a puxo pela mão.
Dandara fica de pé e limpa as lágrimas, Samuel sai
correndo.
— Me desculpe pela bagunça — ela se desculpa sem graça.
— É que... talvez você não vá gostar ou aprovar, mas eu não ligo de
ter a casa infestada de brinquedos por todos os lados. Mas, não se
preocupe, ensinei que ele sempre deve guardar e ele realmente faz.
Se você quiser, se esse mundo de brinquedos incomodar, posso
falar para ele brincar apenas no quarto ou no jardim.
— Eu não importo com essa bagunça. A casa é de vocês,
são livres para fazerem o que quiser. Ele é só uma criança, tem
mais é que brincar e espalhar brinquedos. Estou feliz pela bagunça.
É meu filho e isso é incrível, meus sobrinhos fazem o mesmo
quando vão em meu apartamento, inclusive há muitos brinquedos
lá. Só não sabia que você era esse tipo de mãe... — comento.
— Que tipo de mãe?
— Divertida, moleca, que não liga muito para bagunças.
Sinceramente, estou muito surpreso.
— Surpreso ruim? — pergunta receosa.
— Surpreso bom. Acho que Samuel trouxe a leveza para sua
vida, algo que você não apenas merecia, como precisava para
quebrar um pouco do modo juíza casca grossa. Você tem esse jeito
séria, centrada, parece tão inalcançável, mas há um garotinho que
consegue extrair uma outra Dandara. É interessante e até mesmo
engraçado. Não leve a mal o que estou dizendo.
— Não, eu entendi e é exatamente isso mesmo — concorda.
— Samuel trouxe um resgate de mim mesma. Com ele eu consigo
ser a Dandara que eu costumava ser na adolescência, alegre, viva,
leve. Durante um tempo só tínhamos um ao outro, então somos
muito grudados e eu sempre fui a melhor mãe que poderia ser. Nos
divertimos juntos e crescemos juntos também. Como ele é filho
único e não havia crianças para brincar, sou eu quem brinco com ele
desde sempre.
— Ele é um garoto incrível. Nota-se que fez um trabalho
excelente com ele, meritíssima, excelentíssima, mamãe. — Ela dá
um sorriso fraco. — Mas, acho que ele precisa conviver com outras
crianças também.
— Eu sei, mas enquanto corrermos riscos, Lucca, as coisas
terão que continuar dessa maneira. Eu me desdobro para virar
criança e você é convidado a fazer o mesmo. — Balanço a cabeça
em concordância e olho para nosso filho, sentado no tapete
brincando com blocos.
— Acho que posso virar criança, Dandara.
— Tenho certeza que sim. Há um crianção escondido dentro
de você.
— Bom, vou tomar banho, vestir uma roupa confortável e
descer. Sabe se o almoço está sendo preparado? — pergunto.
— Está sim, eu não sabia que você havia saído. Achei que
estivesse dormindo. Eu e Samuel acordamos tem uma hora mais ou
menos.
— Precisei sair, mas vocês já estavam dormindo — explico.
— Não vá cair novamente, meritíssima. Embora tenhamos que nos
tornar um pouco crianças, já estamos velhinhos, tombos são
perigosos.
— Serei cuidadosa — diz. — Você parece cansado, não
dormiu?
— Apenas cochilei, e sim, estou bastante cansado.
— Não dormiu por quê? — pergunta. — Problemas ou
mulher?
— Problemas pessoais. — Espero que ela entenda que não
tenho que dar satisfações. Estou me esforçando para evitar
conflitos.

Essa situação é muito diferente de tudo que cresci vendo. É


estranho. Eu sempre achei que quando eu tivesse filhos, seria com
a minha namorada ou esposa, nunca com uma ex. É algo super
normal na realidade, mas para mim é estranho e terei que aprender
a lidar. Paula lida bem, mas eu não estou conseguindo, porém, as
histórias são completamente diferentes.
É diferente estar sob o mesmo teto que Dandara e meu filho.
Todos os meus irmãos são casados, pais e felizes com a família que
construíram. Comigo é diferente. No passado, eu poderia até
apostar que Victor seria o diferentão, aquele cara da família que ia
ter filho com uma mulher a qual não tivesse ligação
emocionalmente. E agora meu irmão se casou com uma mulher
fantástica, tem filhos, uma família linda. Ava se casou e tem uma
família linda, Luma fez o mesmo, não preciso falar sobre Isis, que é
a versão da minha mãe e tem uma linda família também. Dá um
certo desespero em alguns momentos, principalmente os vendo
confraternizar, vendo que ela é uma mãezona, e Samuel sendo a
ponte que a liga a mim, dividindo momentos. Meu filho se parece tão
feliz e ele está gostando de ter a mãe e o pai "juntos". Isso me dá
uma revolta gigantesca, porque ela o privou disso por dois anos, ela
privou meu filho de ter uma família feliz e completa, independente
dos motivos, eu nem consigo raciocinar sobre eles agora.
Agora mesmo estamos andando pelo jardim, para eu mostrar
a Samuel a casa de apoio e tentar resgatar alguns brinquedos que
eu tive na infância. Dandara está segurando uma mão dele e eu a
outra, mas confesso que está sendo difícil lidar com a situação e
que a mágoa está quase falando mais alto dentro de mim, porém,
pelo meu filho, estou esforçando para me manter sob controle,
quando minha vontade é gritar e dizer que era para sermos uma
família tradicional, que era para estarmos casados, criando nosso
filho juntos e que ela tirou isso de nós. Ela destruiu essa
possibilidade.
Chego à conclusão que terei que contar com ajuda
psicológica para conseguir ter equilíbrio. Esses momentos em
"família" me fazem pensar em como teria sido diferente se ela
simplesmente não tivesse desaparecido levando meu filho em seu
ventre e eu não consigo controlar esses pensamentos. Às vezes é
difícil se manter sob controle, mas em algum momento sinto que vou
desabar, só espero que não seja diante do meu filho.
Entramos na casa e ele solta nossas mãos, mega
empolgado.
— UAU! — ele diz, como se estivesse vendo a coisa mais
fantástica do mundo. É incrível como crianças conseguem ser tão
leves. Nesse momento eu invejo meu garoto.
— Bom, sua vovó deixou muitos brinquedos guardados aqui.
Será que eles ainda existem?
— Até essa casinha é linda. Parece de boneca — Dandara
comenta.
— Essa casa inteira é perfeita — comento. — Vamos à caça
de brinquedos, filho?
— Sim!!!
Encontro um pula-pula desmontado, várias bolas, bonecas
das minhas irmãs, tudo me traz uma quantidade generosa de
nostalgia. Em alguns momentos me pego com os olhos marejados,
lembrando-me de como minha infância foi fantástica. Eu e meus
irmãos destruíamos a casa, deixávamos nossos pais sempre loucos,
mas éramos educados. Educados, porém, bagunceiros. Ava e Isis
eram as piores, porque brigavam o tempo todo por questões de
ciúmes. Luma e eu éramos os mais pacíficos, e Victor... Victor era
engraçado. Era bravo, ciumento, possessivo, mas sempre
engraçado. Atualmente, Isis e Ava se dão muito bem, porém, não
perdem a mania de sempre brigar. Acontece em todas as festas de
família, em todos os encontros, mas logo fazem as pazes e viram
melhores amigas.
— Como é reviver um pouco da infância? — Dandara
pergunta, ao me ver parado com uma boneca em mãos.
— Dá vontade de voltar no passado só para viver todos os
momentos novamente. Acho que se pudéssemos voltar atrás,
aproveitaríamos mais cada momento, daríamos mais valor aos
pequenos momentos. Passa tão rápido, a gente cresce, vira adulto,
começam as responsabilidades, os problemas, não dá mais para
correr para os braços do pai ou da mãe — comento pensativo. —
Até dá, mas somos os únicos responsáveis pelo que acontece com
nós mesmos. Somente nós podemos tomar medidas, resolver
situações. Os braços dos pais se tornam apenas o conforto, porque
eles não podem mais resolver nossos problemas como resolviam
quando éramos crianças. Quando vejo uma criança dizendo que
quer ser adulto eu me sinto mal pra caralho. Se elas soubessem o
que ser adulto significa, talvez nunca diriam isso.
— Você teve uma infância feliz, acho que isso é o seu
conforto. Seus pais foram carinhosos, atenciosos, apoiaram você e
seus irmãos, certamente faziam o possível e impossível para
proteger todos vocês. Acho que é por isso que deve sentir essa
nostalgia. Já eu, torcia todos os dias para ser adulta e ser adulta é a
melhor coisa que me aconteceu, mesmo que eu seja uma adulta
que comete erros.
— Acho que cometemos erros o tempo todo. Mas, em
algumas situações, ganhamos a chance de corrigir ao menos alguns
deles. Se eu ganhasse a chance de escolher entre voltar a ser
criança ou continuar sendo adulto, escolheria voltar a ser criança
para não ter que lidar com os meus erros e com os erros dos
outros.
O que posso dizer? Nada!
Me calo e deixo que ele curta o momento com Samuel. Volto
para o jardim e me sento em uma espreguiçadeira, nela fico
observando a lagoa e minha mente turbulenta tira minha
concentração. Preciso arrumar uma maneira de conviver com o meu
próprio arrependimento. E, pior de tudo, não é apenas
arrependimento. É arrependimento e vergonha por todas as atitudes
erradas que tomei em minha vida desde o momento em que saí da
casa dos meus pais.
Fiz coisas tão horríveis das quais não me orgulho, o mais
engraçado é que, na época, parecia a coisa certa a ser feita, eu me
orgulhava, me vangloriava, vibrava a cada conquista patética que eu
conseguia usando meios não muito honráveis. Eu errei com todas
as pessoas que entraram em meu caminho desde a faculdade,
todas. E, ter a consciência de que o risco que meu filho está
correndo é culpa das escolhas erradas que fiz no passado é
horrível. Estou pagando caro e errando a cada dia, porque errar se
tornou grande parte do ciclo da minha vida. Errei com Diógenes,
errei com Lucca, errei com meu filho.
Samuel está tão feliz com a presença do pai, tão radiante.
Acho que todas as crianças sonham em ter sua família unida,
crescer sob as asas dos pais. O meu grande erro fez essa
possibilidade se tornar nula para meu filho.
Por mais que eu queira lutar para reconquistar Lucca, sinto
que não vou conseguir. Não há mais paixão em seus olhos, tudo o
que vejo é compaixão. Duas palavras tão parecidas e com
significados tão distantes. Compaixão, no meu caso, é quase pena.
E agora quero rir de mim mesma, porque esse mundo dá muitas
voltas. Eu recebo de Lucca o mesmo olhar que eu recebia dos
chefes dos meus pais e da filha deles. Aquele olhar de pena, muitas
vezes de compaixão; o tipo de olhar que me causava revolta e que
eu jamais soube lidar. Porém, dessa vez é diferente, não tenho
direito de me rebelar, porque agora minha única opção é assumir
meus erros e todos os riscos. Não tenho mais como jogar,
simplesmente tenho que calçar a humildade, abaixar a cabeça e
fazer o que deve ser feito pelo meu filho.
É tão desconcertante ver Lucca sendo pai, é desconcertante
conversar com ele com tanto distanciamento, porque nem mesmo
amigos poderemos ser. Ao menos não tão rápido. Há um abismo
nos separando, e eu quem o cavei. Tenho olhado para todos os
lados, para todas as possibilidades que possam vir a me ajudar a
reverter a situação e apenas não consigo enxergar nada agora, isso
me causa uma tristeza tão profunda, um tipo de dor na alma e
parece deixar um rombo no coração.
A força costumava ser o meu escudo e até isso eu perdi
desde o acidente. Nunca me preparei para reencontrar Lucca e lidar
de frente com a situação. Covarde, eu sei e assumo. Uma grande
covardia, o maior de todos os egoísmos, a minha maldita mania de
achar que tenho que estar no controle sobre todas as coisas.
Herança de uma época que eu não conseguia ter controle nem
mesmo das minhas emoções.
— Senhora Dandara, me desculpe interromper, a senhora
deseja um suco ou uma água? — a empregada pergunta, e eu
balanço a cabeça negativamente.
— Não, muito obrigada.
— A senhora está triste — diz. — Posso te dar uma oração?
Ela é famosa, do Divino Espírito Santo. — Acabo rindo, mas não
como deboche.
— Pode me dar sim, embora eu ache que não vá resolver.
— Vai sim, a senhora vai ver, é tiro e queda. — Ela retira um
papel do bolso e me entrega a oração. Eu balanço a cabeça
positivamente segurando o papel.
— Sabe quando você comete tantos erros e perde a fé em
tudo por não conseguir vislumbrar uma única possibilidade de
revertê-los? Eu não consigo vislumbrar nada, mas vou fazer sua
oração, talvez amenize um pouco, mesmo eu sendo uma mulher de
pouca fé.
— Por que a senhora tem pouca fé? Desculpe perguntar.
— Porque eu cresci vendo maldade nas pessoas, e eu
rezava, eu pedia, implorava, nunca obtive respostas. Perdi a fé não
apenas nas pessoas, perdi a fé em Deus, perdi a fé em tudo. Infiltrei
em minha mente que não tinha ninguém por mim e atropelei o
mundo achando que nunca pagaria meus pecados. Mas, adivinha?
Estou pagando. Talvez exista mesmo um Criador que tenha anotado
meus delitos e esteja me cobrando cada um deles.
— Nossa...
— Mas, não se assuste. Há um garotinho ali com o pai dele
que dificulta um pouco meu ceticismo, porque ele é tão perfeito, tão
incrível, que penso que ao mesmo tempo que estou sendo cobrada,
estou sendo abençoada pelo simples fato de ter sido designada a
ser mãe. Se existe mesmo um Deus, foi Ele quem me deu Samuel,
talvez para ser o motivo para eu continuar a viver. Quando estou
com ele, nada mais importa, nem mesmo eu, só ele. Não existe
nada no mundo que eu não faria para protegê-lo e para fazê-lo feliz.
— Filhos são tudo mesmo, senhora Dandara. Agora, se me
permite, vou voltar ao trabalho. Se precisar de qualquer coisa é só
pedir. Reze essa oração e acredite em Deus.
— Obrigada. — Sorrio, e ela se vai.

— Como nosso garoto está? — Ouço a voz de Lucca quando


estou prestes a abrir a porta do escritório. Mesmo sabendo que é
errado, eu não consigo apenas ir embora e respeitar seu momento
ligação. Sou movida pela curiosidade de ouvir a conversa. — Acho
que é uma boa possibilidade. Posso te ajudar a buscar escolas que
trabalhem voltadas à inclusão, pode ser bom para o
desenvolvimento dele conviver com demais crianças. Assim que
tudo acalmar, quero que Samuel entre na escola também. — Há
uma pausa. — Samuel é fantástico, ainda estou absorvendo o
impacto de ser chamado de papai — Lucca diz, e parece estar
sorrindo. — Mal o conheço e ele é parte de quem sou. É inteligente,
engraçado, carinhoso. Ele é... meu filho. E eu pensando que seria
pai daqui uns dois anos ou pouco menos, talvez mais. Que eu
acompanharia a gestação e viria meu filho nascer... então, do nada,
descubro que tenho um filho e isso me deixa tanto feliz quanto puto,
dá uma sensação de frustração por não o ter visto nascer, não ter
visto seu desenvolvimento desde o início, a primeira palavra, o
primeiro dentinho... — Silêncio novamente. — Eu sei, Paula, mas é
apenas difícil. Está muito recente, tenho certeza de que isso logo
passará. Tenho o direito de estar extremamente sentido, mas isso
vai passar.
Paula... A loira.
— Só queria ir aí te roubar um beijo — Lucca diz suspirando.
— Me sinto como um viciado. — Eu esqueço que preciso ser plena
e invado a sala. — Ok, Paula, Dandara chegou aqui, vou ver o que
ela quer e ligo mais tarde... Eu também. Beijos.
Puxo uma cadeira e me sento de frente para ele.
— Ela é tão segura que não está nem mesmo um pouco
incomodada ou receosa pela minha presença? — pergunto. — Você
acabou de dizer a ela que cheguei, simples assim?
— Talvez você não tenha dedicado tempo o suficiente para
me conhecer, Dandara. Mas, deixe eu me apresentar; meu nome é
Lucca Brandão Albuquerque Fidelidade. Paula me conhece. Não
consigo enxergar um único motivo para que ela se sinta insegura
com a sua presença. — Mais um tapa sem mãos. — Existe algo que
meu pai ensinou a mim e a todos os meus irmãos; ser fiel aos
sentimentos e ter responsabilidade emocional. Eu sigo à risca. Não
acho que vá acontecer, mas, suponhamos que um dia eu me
encontre balançado por qualquer outra mulher, eu terei a
responsabilidade e a humanidade de dizer a ela. Não descarto as
pessoas como se elas simplesmente tornassem descartáveis,
pessoas não são descartáveis. Você deveria aprender sobre
responsabilidade afetiva, inclusive para lidar com o nosso filho.
Responsabilidade afetiva é saber que suas vontades não devem ser
as únicas a serem levadas em consideração. É pensar em como
suas atitudes podem interferir diretamente na vida das pessoas,
positivamente e negativamente.
— Ok, isso é uma aula?
— Não. — Ele sorri. — Só devemos ensinar quem tem
humildade e vontade de aprender. Mas, já que entrou aqui como um
tornado e estava ouvindo minha conversa por trás da porta, me diga
o que quer.
— Samuel dormiu.
— Eu sei, fui eu quem o levei para a cama. — Merda, eu me
sinto patética.
— Devemos discutir sobre segurança, sobre os planos, não?
— Vou te colocar a par de tudo. Mário, amigo de Victor, está
investigando o paradeiro de Diógenes para podermos agir. No
momento a única coisa que podemos fazer é aguardar. Há pessoas
no Rio trabalhando para nos situar, enquanto eles trabalham lá, eu
aproveito para recuperar o tempo perdido com meu filho, até termos
que entrar em ação, meritíssima.
— Eu preciso de uma arma — solicito mais uma vez.
— Já solicitei a Victor, ele vai providenciar. Ele está vindo no
final de semana.
— Junto com a sua namorada? — pergunto, sustentando seu
olhar.
— Não. Não sou um sem noção, Dandara. Não exporia você
ou ela a uma situação tão desagradável quanto essa. Quando
minha namorada vier à BH ela ficará em outro local.
— Como a conheceu?
— Sério mesmo que você quer conversar sobre o meu
relacionamento? Está certa de que isso a fará feliz? — Lucca
questiona, e eu me sinto claustrofóbica.
— Posso sair? Pode pedir os seguranças para me
acompanharem?
— Aonde você vai?
— Não faço ideia, só preciso sair daqui por um tempo porque
está sendo terrivelmente difícil conviver com você, aguentar e
receber toda a sua mágoa. E, antes que jogue em minha cara como
tem feito, sei que está com a razão, sei que fui eu quem provoquei,
mas não deixa de ser difícil lidar, porque a cada dez palavras que
você diz, oito são destilando sua mágoa sobre mim e estou de saco
cheio. Cheguei no meu limite por hoje. É um inferno vê-lo
conversando com aquela mulher, cheio de amores. E parece que ela
tem um filho e você disse "nosso garoto", como se ele fosse seu
também. É um inferno que você olhe para mim como se eu fosse
um nada, é um inferno estar presa porque cometi erros no meu
passado fodido, é um inferno que todos estejam tendo suas vidas
mudadas radicalmente por conta de erros que cometi sozinha. Eu
odeio ter que pensar e dizer isso, mas... eu deveria ter perdido o
bebê, assim ele não estaria correndo riscos, você não estaria, e
talvez nós pudéssemos estar juntos... mesmo que eu nunca mais
engravidasse.
— Você acabou de falar uma merda grande, Dandara.
Apenas pare!
— É tudo o que faço, falar e fazer merdas grandes, então não
aja como se estivesse chocado com as minhas malditas palavras —
desabafo chorando. — Eu só estou de saco cheio, Lucca. Não tenho
pessoas para desabafar e estou cansada de carregar tudo sozinha.
Eu vou matar Diógenes, estou te avisando de uma vez. Errei com
ele, estou colhendo frutos dos meus erros e vou matá-lo antes que
ele mate nosso filho.
— Respire. Vamos agir com calma, ok? Você não está
sozinha, não mais. Trata-se da segurança do meu filho, da mãe do
meu filho. Por mais que não estejamos juntos, eu jamais iria querer
seu mal, jamais iria querer vê-la morta.
É assustador vê-la se quebrando diante dos meus olhos. E
estou relevando todas as suas palavras agora, porque tudo que
consigo ver é uma mulher desabafando toda a merda em cima de
mim.
— Não quero sua maldita piedade! Não quero que me lance
olhares de pena, de compaixão. Você olha para mim como aqueles
desgraçados me olhavam quando era apenas uma menina, e eu
odeio isso com todas as forças.
— Não sei como espera que eu te olhe. Não estou com pena,
estou magoado, não com pena — argumento.
— Eu vejo, Lucca. Eu vejo, e é horrível. Você só está
tentando me tratar bem por conta de Samuel.
— É uma verdade, não vou mentir. Precisamos ter um bom
relacionamento por ele, porque o garoto não tem culpa de nada que
está acontecendo e merece pais que se respeitem.
— Odeio tudo isso.
— Odeia porque te tira do topo — digo. — Você esteve
acostumada a ser o centro do meu mundo, eu te colocava no topo
de todas as coisas boas, sempre. Você errava comigo, eu perdoava
mesmo quando dizia que seria a última vez. Mas, você tem que
pensar que eram erros banais. Erros banais são fáceis de ser
perdoados, agora há uma criança, um filho meu e você não pode
exigir que eu te trate como tratava antes, porque tudo isso acabou
de acontecer, fui pego de surpresa e estou tendo que lidar com a
minha própria confusão mental agora. O que precisa entender,
Dandara, é que o mundo não gira conforme você quer. Que precisa
dar tempo ao tempo, precisa esperar a poeira abaixar, as coisas se
ajeitarem, porque é infinitamente melhor que agir precipitadamente
como sempre fez. O seu maior erro em relação a mim está em ser
precipitada, inclusive, se não tivesse se precipitado ao descobrir a
gravidez, tudo teria sido diferente. Então apenas pare de falar um
monte de merda, abaixe seu topete e respeite o meu momento, o
meu espaço. Estou respeitando o seu, estou sendo o máximo legal
que consigo ser agora. Há coisas mais importantes que tentar exigir
de mim um tratamento que não sou capaz de te dar agora. Você
acha que é simples lidar com a descoberta de um filho meu que eu
nem sabia existir, correndo risco de vida, e com a maldita traição
que cometeu? Não é simples. Não é só você que sofre nessa
história, as coisas não têm que acontecer quando você acha que é o
certo. Tire o foco de mim, porque eu não sou tão importante quanto
Samuel é. É ele quem necessita da nossa atenção, do nosso
sentimento. Esqueça o nosso passado e pare de gastar energias
com coisas que não podem ser recuperadas — aviso, ficando de pé.
— Gaste sua energia tentando ser uma pessoa melhor, Dandara.
Tentar corrigir os erros não significa tentar resgatar um
relacionamento. Eu a admiraria infinitamente se se esforçasse para
mudar. — A deixo no escritório e vou para meu quarto.
Tão logo fecho a porta do meu quarto, um soluço de dor
escapa de mim. Sou bom em sofrer, mas péssimo em fazer as
pessoas sofrerem. Não sei lidar comigo causando mágoa nas
pessoas, mesmo quando estou devastado. Para muitas pessoas,
ver a pessoa que te causou mal sofrer é libertador, para mim é
doloroso, ao extremo, porque eu nunca fui um homem ruim, jamais.
Minha vida toda eu venho tentando ser o melhor homem que
consigo, mas estou falhando agora.
Eu nunca, nem mesmo nas piores hipóteses, imaginei ver
Dandara tão quebrada como ela se encontra agora. Nunca imaginei
passar por uma situação tão fodida onde minha mente está
fervilhando tanto que eu mal consigo controlar. Há Paula no meio
disso tudo e eu me sinto tão fodido por estar tendo que lidar com
toda essa merda. Ela definitivamente não merecia, eu não merecia,
acho que nem Dandara merece toda essa carga de sofrimento.
Dandara sumiu, voltou sem querer e agora está comigo
fixado em sua mente. Talvez ela nem me ame como diz, seja
apenas um pouco dependente de tudo que eu fui capaz de dar a
ela, todo o suporte. Penso que o amor verdadeiro nunca me faria
sofrer. Amor e cumplicidade andam juntos. Acredito que ela esteja
arrependida pelas escolhas, mas o arrependimento não apaga o
peso das suas decisões e nem sei como conversar com ela sem
que a deixe magoada ou sem que acabe jogando minha mágoa.
Chega a ser involuntário, incontrolável também.
Retiro minhas roupas e vou tomar banho, apoio minhas mãos
na parede e deixo a água cair em rompantes sobre a minha cabeça.
Preciso buscar um acompanhamento psicológico para que Dandara
consiga lidar melhor com si mesma, talvez ela consiga enxergar a
situação e possa mudar um pouco seu foco para o que de fato
interessa.
Permito que minha mente me leve a uma outra perspectiva.
Não tem jeito, não há como fugir, eu preciso apenas pensar em tudo
e agora estou pensando num possível relacionamento com ela. Eu
quero rir e então chorar, porque nesse momento eu nem consigo
pensar em ter meus lábios grudados ao dela. Pensar nisso me dá
ânsia tamanha a mágoa que está em meu peito.
É tão louco quando os sentimentos mudam, invertem. Eu não
podia ver aquela mulher que meu coração disparava no peito, o
desejo surgia de uma maneira visceral, agora não há nada a não ser
uma quantia generosa de mágoa que eu espero passar. De
verdade, eu espero que esse sentimento ruim que me sufoca passe
logo porque não sei lidar com ele, não sei lidar com tanta dor. Talvez
precisemos de uma conversa definitiva, onde possamos colocar as
cartas na mesa e estabelecer o tipo de conexão que teremos a partir
de agora. Talvez, jogando abertamente, ela seja capaz de
compreender a situação e lutar por si mesma, com o propósito de
mudar por ela e pelo nosso filho, e não por mim.
Quando deixo o banho a primeira coisa que faço é ir em
busca dela. A encontro na sala, sentada no tapete olhando para a
escuridão. Eu agora começo a lidar com a situação mais complexa
que pode existir: dar a mão a quem a soltou, a quem cometeu uma
série de erros comigo. E eu faço isso porque essa mulher precisa
que eu seja ao menos seu ponto de apoio.
Me sento ao seu lado e ela se assusta.
— Podemos conversar? — peço.
— Me desculpe por todas as coisas que eu disse. Eu falei
mesmo um monte de asneiras. Samuel é tudo que eu mais amo na
vida, o maior presente que já ganhei, o meu único companheiro,
Lucca. Eu só... senti ciúmes, sei que não deveria, mas fico cega
quando sou obrigada a lidar com esse sentimento. Além disso,
estou abalada, com medo, tomada de arrependimento sobretudo.
Não quero ser essa pessoa, mas eu acabo atropelando o mundo.
— Para variar — digo. — Vim em missão de paz, acho que
precisamos de uma conversa séria sobre nós.
— Tudo bem.
— Eu preciso que entenda o meu lado, assim como faço o
compromisso agora de tentar entender o seu. — Ela balança a
cabeça positivamente. — Eu era louco por você, de verdade. Te
namorava quando você nem mesma era capaz de imaginar. Você
era como um fetiche, como um sonho. E eu a tive após muito tempo
de espera. Lutamos juntos contra seu ex, e você me abandonou; a
primeira vez dizendo que foi para a minha proteção. Não concordei,
mas aceitei isso quando você voltou no casamento do meu irmão.
Você se lembra as palavras que eu te disse lá? Lembra o que me
prometeu? Você prometeu que nunca mais faria estupidez e eu te
disse o quê? Que era a nossa última chance. Sinceramente, quando
você chegou em casa, arrumou as malas do nada e foi embora sem
me dar satisfações... você quebrou algo que existia entre nós. Algo
grande se rompeu e eu fiquei tão mal, tão mal, que nem suportar
ficar no Rio de Janeiro eu suportei mais. Passei uma temporada na
Califórnia; Los Angeles e Las Vegas. E você não saía da minha
mente, era como uma espécie de obsessão doentia. Mesmo assim
me esforcei. Nos primeiros meses foi muito difícil, mas depois eu
consegui seguir minha vida. Só que, mesmo seguindo, eu nutria
uma mágoa grandiosa de você só pelo fato de ter me deixado
daquela maneira tão fria e impessoal, como se eu não significasse
nada, como se nossa história não significasse nada. Dandara,
iríamos nos casar, estávamos planejando tudo e você saiu de
cabeça erguida, tacando o foda-se para tudo que havíamos
construído.
"Eu demorei muito, mas enfim superei. Então você surgiu
sem querer, com um filho. Um filho meu. Eu já tinha mágoa de você
por ter me deixado, imagina como me senti ao saber que me
escondeu um filho? No auge da revolta, Dandara. Eu tanto entendi
sua explicação, quanto não entendi merda alguma, porque em
alguns momentos eu oscilo entre a compreensão e a raiva, e acabo
despejando uma quantia generosa de mágoa sobre você. Acontece
que eu não quero mais isso, não quero ser o cara que vai ficar te
enchendo de lições de moral. Não mais, por isso estou aqui, para
tentarmos chegar em um acordo."
— Compreendo.
— Um acordo de paz. Acho que você sabe o que fez, o que
causou, e eu não preciso ficar jogando isso sobre você, porque já
tem coisa demais para lidar. Vou ser bastante claro e direto com
você. Estou em um relacionamento que ainda não foi consolidado.
Eu iria pedi-la em namoro, então você surgiu com nosso filho e os
dois se tornaram a minha prioridade. Mas, existe algo muito forte
entre Paula e eu. Algo bonito que fomos construindo aos poucos e
se tornou grandioso para ambos. Uma relação de amizade, amor,
cumplicidade, segurança, RECIPROCIDADE — digo reciprocidade
com mais ênfase para que ela compreenda. — Algo que eu sempre
quis viver e estou tendo a oportunidade de viver e sentir agora. Não
quero perder isso, porque é algo raro e me faz um bem que eu
jamais seria capaz de colocar em palavras. Não consigo imaginar
minha vida sem que a Paula seja parte dela, me desculpe o excesso
de sinceridade, mas estou lidando com verdades agora, colocando
as cartas na mesa. Queria oferecer a você a minha amizade,
Dandara, porque ela é a única coisa que posso te dar agora. Não
posso dizer que nunca teremos nada porque não comando o destino
e não sei o dia de amanhã, mas, neste momento, não há
perspectivas para nós como um casal. Portanto, acho que devemos
focar no respeito, em construir uma amizade sólida, para darmos o
melhor ao nosso filho.
— Não tenho opções, me resta aceitar — diz cabisbaixa. —
Estive sentada aqui desde que você saiu do escritório, consegui
enxergar alguns erros, como por exemplo focar em reestabelecer a
conexão que perdemos ao invés de tentar corrigir ou salvar a
situação que estamos vivendo. Compreendi que agora deve ser feita
uma coisa de cada vez, a passos de tartaruga. Minha prioridade é
salvar Samuel, acho que só quando esse inferno acabar conseguirei
lidar com as demais coisas. Aceito sua amizade, Lucca. Se isso é a
única coisa que posso ter de você, estou pegando. Talvez Paula
seja passageira, não sei dizer, talvez lá na frente nós dois possamos
reencontrar a conexão que possuíamos, juntamente com o perdão.
Vou pegar a amizade, ao menos até tudo se resolver e eu me sentir
devidamente pronta e segura para fazer mais uma tentativa. Foi
difícil para mim deixá-lo, muito difícil. A imagem do seu rosto tomado
de choque virou uma assombração, algo difícil de lidar, mas estava
desesperada, cega, insana, carregando a certeza de que em algum
momento algo ia dar muito ruim. Talvez um dia meu egoísmo possa
ser perdoado, porque tudo que fiz foi por amor, por querer proteger
algo valioso que você me deu. Tenho a consciência que busquei a
pior de todas as maneiras, mas tenho também um arrependimento
profundo, porque não é fácil para uma mulher decidir em questão de
minutos que está indo criar seu filho sozinha, escondida, sem ajuda
de qualquer familiar, qualquer pessoa próxima, sem nunca ter tido
uma única experiência materna.
"Espero mesmo que tudo isso acabe, que sua mágoa
diminua, que você possa enxergar que eu jamais teria feito algo
pensando em arruiná-lo como fiz. Eu me perdi dentro de mim
mesma, dentro do meu medo, dentro das ameaças de Diógenes, e
não consegui fugir da prisão, Lucca."
— Você é uma mulher maravilhosa, Dandara. Claro que
possui defeitos, porque eu possuo também. Não somos perfeitos,
aliás, estamos muito longe da perfeição. Você possui características
fortes, marcantes, um escudo invisível, e está tudo bem ser assim.
Sempre fui apaixonado pelo seu jeito que muitos julgam como
errado. O que nos destruiu foi a mentira, a falta de cumplicidade que
deve existir numa relação. Mas, o mundo não vai acabar por isso.
Vamos apenas lidar com a situação. Não fique chorando pelos
cantos, se lamentando, o erro já foi cometido e ponto, agora é o
momento de focar em mudar a situação, principalmente por Samuel.
Você diz que não há nada no mundo que não faria por ele, eu digo a
você o mesmo, porque eu mal o conheço e ele já é a pessoa mais
importante da minha vida. Não pense que sua vida acabou por não
estarmos juntos. Apenas tente mudar, tente ser um pouco mais
humilde, você não precisa mais desse escudo que levantou, é o
momento de abandoná-lo e tentar ser feliz. Dandara, você é a
mulher mais linda que eu já conheci na vida, sua beleza chega a ser
exótica. É linda, saudável, poderosa pra caralho. Encontre isso
dentro de você. A fraqueza não combina com quem você é, todas
essas falhas também não. Foque em resgatar sua verdadeira
essência e eu tenho certeza de que vamos nos entender. Temos
muito para construir uma amizade sólida, uma relação de respeito.
Por mais magoado que eu esteja, por mais que eu tenha explodido
inúmeras vezes desde que te encontrei naquele hospital, após ouvir
toda a sua história, eu quero que seja feliz, que volte a ser
digníssima, excelentíssima, meritíssima, lindíssima, juíza. — Ela ri
enquanto chora e me abraça. Eu sinto meu coração dilacerar com a
força dos seus braços em torno de mim e luto com todas as forças
para não chorar.
Falho.
Falho porque odeio vê-la assim, odeio sentir o que estou
sentindo agora, odeio que todas as coisas tenham dado tão errado.
Não há poder ou escudo agora, ela deixou tudo cair e está perdida
porque não sabe como conviver sem essas duas coisas. Deixou cair
porque certamente seu sofrimento consegue ser maior que todos os
motivos que a tornaram uma pessoa tão difícil.
— Eu queria voltar no passado, lá onde deixei a minha
humildade cair. Queria não ter vestido minha armadura de proteção
e arrogância, queria voltar apenas para escolher uma forma
diferente e bonita de lidar com todas as coisas que lidei e queria
que, naquela época, tivesse surgido um Lucca em minha vida para
poder me alertar, poder chegar até mim e dizer "não vá por esse
caminho, você está errada e isso vai foder o seu futuro". Não havia
ninguém e quem ousava se aproximar era devidamente afastado
porque deixei de ter fé nas pessoas depois que conheci a maldade
humana. Hoje eu me olho no espelho e tudo que vejo é o vazio. E
eu quero muito mudar, quero muito tentar resgatar minha essência,
mas às vezes é como se meus passos não me obedecessem mais.
— Eu entendo você.
— Não é por maldade, Lucca. Mas talvez eu não tenha me
esforçado o bastante e agora enxergo isso. Não quero mais
continuar caminhando rumo ao abismo, não quero mais fazê-lo
sofrer, não quero que Samuel pague por meus erros. Prometo que
lutarei com mais afinco e que tentarei ao máximo me livrar de quem
fui nos últimos anos.
— Você não foi só erros, Dandara. Eu conheci a Dandara
sem escudos e me apaixonei por ela. Apenas resgate sua essência
— incentivo, confiando que ela vá conseguir. Dandara é uma mulher
extremamente forte que possui fraquezas.
A retiro dos meus braços e fico de pé. Acho que já
estabelecemos uma nova relação e eu não quero mais chorar.
Limpo meus olhos e ela fica de pé também. É tão estranho...,
mas vamos aprender a lidar com essa convivência.
— Estamos conversados? — pergunto.
— Sim. Me desculpe, inclusive pelos erros que ainda não
cometi. O processo é doloroso e não sou capaz de mudar da noite
para o dia, Lucca — diz com toda a sinceridade.
— Vamos ficar bem, Dandara. — Ela me abraça novamente,
e eu engulo a seco quando ela começa a dizer:
— Talvez nunca mais fiquemos juntos, mas, quero que saiba,
independente do que aconteça, independente de quantas voltas ao
mundo dê, talvez eu case, talvez não, talvez eu encontre alguém
como você encontrou, eu sempre irei amá-lo. Sempre. Todas às
vezes que nos encontrarmos, quero que se lembre que eu ainda
estarei amando você, mesmo do meu jeito errado de amar. Eu ainda
estarei amando você, Lucca.
Estou sentada no sofá, trabalhando em meu notebook,
porém, não deixo de estar atenta à Henrico, a terapeuta e Pablo,
que estão em uma dinâmica bastante divertida. É interessante ver
que ele está mesmo se esforçando, tentando compreender e
participar do universo diferenciado do nosso filho. O estranho é que
Henrico não tem muita familiaridade com ele, mesmo sendo filho.
Pablo está tendo que se esforçar bastante e aos poucos está
conseguindo quebrar o gelo. Faz apenas três dias desde o episódio
dos fogos e Pablo tem sido presente como nunca. Estou realmente
feliz por isso. Meu pai sempre foi meu super herói e eu sempre tive
vontade que Pablo fosse o herói de Henrico, uma pessoa que no
futuro meu filho tenha orgulho de falar sobre.
Estou sorrindo quando meu celular vibra e um número
estranho surge na tela.
— Alô? — Atendo.
— Paula? — uma mulher pergunta.
— Sim, sou eu. Se for telemarketing você está falando com o
meu espírito. — A mulher ri.
— Não é telemarketing. É Victória, mãe de Lucca. — Eu
quase deixo meu notebook cair quando fico de pé abruptamente,
chocada o bastante para não conseguir respondê-la. — Paula?
— Oi... estou ouvindo, só estou tentando absorver o impacto
— explico, e ela volta a rir.
— Bem que Lucca disse que você é espirituosa.
— Ele disse? — pergunto, indo até meu quarto, para poder
conversar com privacidade.
— Disse não apenas isso — afirma. — Paula, pense numa
pessoa curiosa para conhecê-la? Estão todos falando de você e eu
me sinto em desvantagem. Quero convidá-la para jantar em minha
casa esta noite, ficarei extremamente feliz da vida se puder vir.
Quero muito conhecê-la.
— Uau!
— Uau é sim ou não? — pergunta divertida.
— Sim, claro. Apenas me envie o endereço por mensagem.
Será um prazer.
— Ah! Que incrível! Ficaremos muito felizes em recebê-la, à
propósito, o convite se estende à Henrico também. — Isso faz meus
olhos se encherem de lágrimas. — Queremos muito conhecê-lo.
— Acho que Lucca já falou com a senhora sobre ele. Tentarei
levá-lo se ele estiver disposto, há noites em que ele gosta de dormir
com os meus pais. Muito obrigada pelo convite e principalmente por
incluir o meu filho.
— Não se preocupe, saberemos muito bem lidar com
Henrico, amamos crianças. — Eu quero chorar de verdade.
— Obrigada mesmo, Victória.
— Às oito? — pergunta.
— Às oito — confirmo. — Apenas me mande o endereço.
— Tudo bem, meu amor. Beijos. Esperarei ansiosa.
Ela encerra a ligação e eu me jogo na cama, perplexa. A mãe
de Lucca me ligou e isso prova que as coisas estão mais sérias do
que eu imaginei. Quero chorar de emoção e rir de felicidade, mas,
ao invés disso, eu ligo para o meliante que atende no primeiro
toque.
— Puta merda, Paula!!! — Lucca diz. — Vamos fugir, para
outro lugar, baby?
— Para onde haja um tobogã? — pergunto, mordendo meu
lábio inferior.
— Faça o meu pau de trampolim.
— Isso não foi romântico — digo rindo.
— Você sabe meu nível de romantismo. Quando a saudade
bater vou chamar para foder...
— Oh, isso me lembra Las Vegas, você sabe. — Ele ri. —
Sua mãe me ligou, eu quase tive um infarto agora. Ela quer que eu
vá jantar na casa dela, e eu simplesmente não estava preparada
para um evento desse porte. Estou tremendo.
— Meus pais são completamente loucos e muito receptivos,
você vai gostar deles. Eles farão com que se sinta em casa,
princesa.
— Isso não alivia minha ansiedade, mas, tudo bem. Eu irei do
mesmo jeito porque não sou mulher de correr. — Ele dá uma
gargalhada, e eu rio também. — Ai meu Deus! Lucca Albuquerque!
Você é um louco completo!
— Eu já conheço seus pais, senhorita. Falta você conhecer
os meus.
— Isso é muito... outro patamar, né?
— Outro patamar — concorda divertido. — Estou tendo
alucinações de tanta saudade.
— Também estou morrendo de saudades, bebê Lucca. Muito
mesmo. Sinto sua falta, mas compreendo que há coisas maiores
para lidar agora. Em breve tudo estará no devido lugar. Por falar
nisso, como estão as coisas aí?
— Tive uma conversa bastante importante com Dandara.
Nossa relação melhorou consideravelmente depois disso, estamos
tentando ser amigáveis um com o outro — explica. — E por aí?
— Pablo está aqui, participando da terapia com Henrico.
Parece que o susto mexeu com ele positivamente e despertou a
paternidade de vez, felizmente. — Lucca fica calado e eu dou um
sorriso porque sei o motivo. — Lucca?
— Aham. Compreendo. Estou muito ciumento agora, porra...
não posso estar, mas estou. Vou lidar com isso.
— Ciumento por Henrico ou por mim?
— Por você. Claro que sinto um pouco de ciúmes por Henrico
também, mas é o pai dele e fico feliz que nosso garoto o tenha de
volta. A figura paternal é importante e Henrico merece isso. Mas,
Pablo gosta de você e eu me sinto louco. Estamos numa situação
complicada, Paula Jacinta. Estou numa espécie de "de férias com a
ex", você está com seu ex aí. Apenas precisamos aprender a lidar
com isso. Preciso compreender que Pablo será presença constante
em sua vida, assim como você sabe que Dandara será presença
constante em minha vida.
— Eu acredito no que construímos nos últimos meses.
Embora não tenhamos formalizado um relacionamento, acho que
sabemos exatamente a grandeza do sentimento que existe entre
nós dois — argumento. — Confio em você e sei que confia em mim.
— De olhos fechados — afirma. — Mas sou ciumento.
— Possessivo também.
— Louco.
— Muito louco, de verdade — digo sorrindo.
— Louco por você. Muito louco por você. — Mais um grande
impacto. — Quando tudo isso passar, iremos fazer uma viagem.
Nossos garotos terão que nos perdoar por ficarmos pelo menos
cinco dias viajando, Paula.
— Eles perdoarão. — Sorrio. — Como Samuel está?
— Ele está bem, se divertindo como se estivesse em uma
colônia de férias, alheio ao grande problema que eu e Dandara
temos nas mãos. Nesse momento eles estão na piscina, brincando.
— Eu imagino aquela mulher em um biquíni... meu Deus, ela é
muito destruidoramente linda e agora sou eu quem estou com
ciúmes. Sou segura, mas nem tanto. Caramba! — Paula?
— Ai meu Deus! Lucca! Eu morri de ciúmes agora. Sério. —
Ele dá uma gargalhada gostosa e eu acabo rindo de mim mesma. —
Ah, nem!!! Não tem graça. Dandara tinha que não ser a mulher mais
linda que eu já conheci.
— Não há motivos para ciúmes, ok?
— Estou morrendo — confesso.
— Não morra. Você é o motivo...
— O motivo de quê? — pergunto sorrindo, porque falamos
sempre isso e nunca damos uma explicação.
— Um dia te contarei. Meu amor, tenho que desligar, Samuel
está me chamando. Ligo para você antes de dormir.
— Ok, bebê Lucca.
— Bom jantar com os meus pais, relaxe. O máximo que vai
acontecer são minhas irmãs chegarem fingindo que não sabiam da
sua presença. Tome cuidado, Ava é sinistra.
— O quê? Como assim Ava é sinistra? — Ele dá mais
gargalhadas, e eu entro em um quase pânico. — Lucca, pare de
brincar.
— Ava é aquela irmã superprotetora, ela provavelmente vai
perguntar até o tamanho da calcinha que você usa. Nossa... eu
podia ter dito outra merda, porque agora estou te imaginando em
uma das suas calcinhas... Porra, Paula! Jacinta o pau latejando de
saudades! Gostosa! Quero você nua para mim. — Um calor surge
repentinamente e eu me abano com a mão. Misericórdia, Lucca... eu
amo esse homem na cama comigo. — Sentiu o impacto também,
né? Safadinha. Logo terei você assim, nua para mim.
— Queria agora, não vou negar, mas, tudo bem. Beijos, meu
amor. — Encerramos a ligação e... caramba. Nunca fui uma
chorona, mas me pego chorando, com um excesso de
sentimentalismo que nunca fez parte de quem sou. Porém, meu
choro dura pouco, não gosto de me sentir fora da zona de conforto
emocional, por isso, sempre que estou perto de fraquejar, tento
controlar meu emocional.
A única pessoa que desperta minhas fraquezas é Henrico.
Sempre tive a incrível habilidade de lidar com meus sentimentos
mesmo em situações altamente desestabilizadoras. Equilibrar razão
e emoção costumava ser o meu ponto forte... costumava.
Em meu banheiro lavo o rosto, respiro fundo e volto à sala.

As oito da noite pontualmente, estou diante do apartamento


de Victória, com Henrico em meus braços. Sou recebida por
Matheus, pai de Lucca.
— Olá, sejam bem-vindos — ele diz sorridente, e Henrico fica
encarando-o completamente sério. Matheus me lança um olhar
apaziguador, como se estivesse dizendo "relaxa, eu tenho um
plano".
— Henrico, diga olá para Matheus, filho. Ele é pai do tio
Lucca, sabia? — Henrico me encara e volta a olhar para Matheus.
— Ei, Henrico, tio Lucca mandou um presente para você,
quer ver? — Arregalo meus olhos, surpresa. — É um kit muito legal
de pinturas. Eu amo pintar, tio Lucca aprendeu comigo, sabia? Sei
desenhar super-heróis. Quer ver? — Henrico reluta, mas eu quase
caio para trás quando ele se esforça para estender os braços para
Matheus e vai com ele. Não é normal isso acontecer, na verdade é
bastante raro, mas acho que o ponto fraco do meu filho é a palavra
"pintura".
Uma mulher linda surge, radiante. Eu sei que é Victória, mas
não fazia ideia de que ela poderia ser tão maravilhosa e elegante.
— Meu Deus! Você é ainda mais linda pessoalmente! — ela
exclama, me puxando para um abraço e eu sorrio.
— Muito obrigada, estou procurando a mãe do Lucca e não a
irmã — brinco, fazendo-a rir.
— Ai meu Deus, Lucca! — Uma loira maravilhosa surge
falando ao telefone. — Você realmente tem o pau de ouro, só isso
justifica. Acabo de ver de Paula e já a odeio.
— Ava! A garota vai pensar que é realmente sério, filha —
Victória a repreende. Essa é a famosa Ava e pelo amor de Deus,
que mulher linda! É desconcertante.
— Me conte o segredo do Lucca, Paula? Por favor! Sempre
quis saber o porquê dele conseguir as mulheres mais lindas. Me
desculpe se isso pareceu grosseiro, mas... — Ela fica em silêncio e
depois xinga Lucca. — Adeus irmão, vá se foder!
— Ava!!!
— Desculpe, mãe. — Eu gosto de Ava. Ela é bem espirituosa
e engraçada, não tem papas na língua pelo pouco que vi. Parece
que autenticidade é seu forte. Ela me espreme em um abraço e
sorri. — Bem-vinda, Paula. Vou importunar Henrico com meu pai e
deixá-las a sós.
Ela se vai e eu percebo que já perdi meu filho essa noite. Isso
me faz sorrir, porque onde meu filho é bem-vindo, eu me sinto
completamente acolhida.
— Muito obrigada pelo carinho com Henrico, Victória — a
agradeço, e ela faz um sinal para que eu a acompanhe até um sofá.
É aí que ela decide mesmo me conhecer melhor. Entre
risadas e momentos emocionantes, ela descobre mais de mim e eu
descubro mais sobre Lucca.
— Você é tudo e muito mais do que Lucca me disse, Paula.
Acho tão lindo pessoas que conseguem conduzir a vida com
sensibilidade, otimismo. Você está sendo muito madura em lidar
bem com a situação de Lucca e Dandara. Imagino que seja algo
difícil.
— É — Confesso. — Conheci Lucca e ele ainda carregava
consigo uma mágoa enorme por Dandara. Acho que eles tiveram
um relacionamento muito intenso ao qual Lucca se doou
extremamente. Não posso dizer que não me sinto ameaçada, a
mulher é fantástica, linda, deslumbrante, poderosa, eles estão
vivendo sob o mesmo teto e poucas pessoas no mundo
conseguiriam lidar com isso. — Sorrio. — O que me conforta é que
Lucca é muito transparente, verdadeiro e responsável. Não posso te
dizer que confio que iremos ficar juntos custe o que custar ou
teremos nosso felizes para sempre, mas posso dizer que, caso a
situação dele com Dandara sofra "alterações", ele virá até mim
antes de dar qualquer passo com ela. Eu confio de olhos fechados
nele.
— Eu não me envolvo muito em assuntos sentimentais dos
meus filhos, aquele lance de não meter a colher, mas sei que os três
estão vivendo uma situação complexa. Gosto muito de Dandara,
embora eu tenha visto meu filho se doar e logo em seguida sofrer
muito. Sei separar as coisas e não levar para o pessoal. Estou
adorando conhecer você também. Apenas torço para que ninguém
se machuque nessa história. Lucca merece ser feliz, e vocês
também.
— Ele merece muito. Poucas pessoas no mundo possuem a
grandeza do seu filho. A educação, os valores que ensinaram a
ele... — Suspiro. — Ele é único. Eu tento não pensar em perdê-lo,
mas, se isso acontecer, eu espero ao menos poder ser amiga dele.
Lucca é aquele tipo de pessoa que vale a pena ter por perto e eu
quero tê-lo para sempre. Você acha que ele continuaria sendo meu
amigo?
— Eu acho que deveria continuar acreditando e não ponderar
perdê-lo. — Ela sorri. — Precisa acreditar no que construíram. Sabe
aquela frase "quem acredita sempre alcança"? Ela faz tanto
sentido.
— Continuarei acreditando — afirmo.
— Lucca é muito coração, Paula. Porém, se engana quem
pensa que ele é bobo. — Essa mensagem parece subliminar, por
isso fico atenta. — Ele não é tão passivo sempre, e nunca devemos
confundir sua bondade com "aceitar tudo", porque ele não aceita.
Lucca não deve ser subestimado, jamais. Ele é como o pai. Matheus
é um neném quase sempre, e um tornado sempre que precisa. Um
tornado capaz de fazer estragos.
— Entendo.
— Bom, agora vamos chamar o pessoal para jantar? Já
fofocamos bastante. — Ela sorri. — Você não sabe quanto estou
feliz em conhecê-la e ter uma visão ainda mais ampla do que Lucca
tanto dizia.
— É um enorme prazer também, Victória.
Henrico não sai do colo de Matheus durante o jantar inteiro.
Olhar para Matheus é como vislumbrar um Lucca mais velho. Eles
são muito parecidos fisicamente, exceto pelas covinhas. Os cabelos
revoltos, o tom de pele, o olhar... muito Matheus. Ava é maluca, mas
é extremamente acolhedora e possessiva. Ela parece ser o tipo de
irmã leoa e eu percebo isso a cada vez que falamos de Lucca.

Após o jantar sigo para casa com Henrico, porém, durante o


trajeto, meu coração dispara quando percebo que meu carro está
sendo seguido.
É desesperador ser seguida quando meu filho está dentro do
carro comigo. Se eu estivesse sozinha o terror seria menor e talvez
eu conseguiria pensar com mais clareza.
Acelero o carro consideravelmente, porém, o carro que está
me seguindo acelera também, confirmando que isso é mesmo uma
espécie de perseguição. Henrico está falando comigo, mas não
consigo responder agora. Vou desviando de todos os carros que
surgem na minha frente, pego até mesmo um atalho que me faça
chegar mais que depressa em casa. Pondero ir para a casa de
Pablo ou para a casa dos meus pais, mas isso os deixaria em
evidência. Deus sabe lá quem está me perseguindo, e, se estou em
risco, não quero que mais ninguém fique.
Quando avisto meu prédio respiro aliviada e entro na
garagem depressa, só ouço o som de um carro derrapando quando
a porta se fecha. Demoro um tempo para conseguir me mover,
estou trêmula, meu coração está disparado e minha cabeça agora
parece prestes a explodir. É preciso um exercício mental para
encontrar o equilíbrio e conseguir sair do carro com meu filho.
Só tenho paz quando entro dentro do apartamento e tranco a
porta.
— Filho, vamos tomar um banhozinho e escovar os dentinhos
para dormir, ok?
— Vovó — ele diz, mas infelizmente hoje terá que ser
contrariado.
— Vovó e vovô foram passear hoje, tudo bem? Amanhã você
poderá dormir com eles — explico, e ele aceita sem protestar.
Dou um banho nele, escovo seus dentes e visto seu pijama.
O coloco em minha cama porque sei que serei incapaz de dormir
essa noite se ele não estiver ao alcance dos meus olhos. É
assustador ser perseguida, principalmente por não saber do que se
trata e se isso irá se repetir. Poderia ser assaltante, assim como
poderia não ser. Pela minha mente passa a possibilidade dessa
perseguição estar ligada com a atual situação de Lucca e Dandara.
Não demora muito para Henrico estar dormindo. É a minha
vez de tomar banho, e quando estou me secando, Lucca liga. Visto
meu roupão e atendo:
— Lucca Albuquerque.
— Diabinha, como foi o jantar?
— Foi incrível, amei conhecer sua mãe, sua irmã, um pouco
mais de seu pai — digo. — Henrico amou seu pai, não saiu dos
braços dele nem por um segundo.
— Fico muito feliz por isso, mas sua voz está estranha. Eles
disseram algo que te chateou?
— De forma alguma, muito pelo contrário. Só estou com dor
de cabeça, um pouco indisposta. — Não vou contar a ele. Lucca
não precisa de mais um problema, o foco dele deve estar cem por
cento em proteger Samuel e Dandara.
— Paula, não minta para mim. — Eu prometi que nunca
mentiria para ele, então eu apenas fico calada, porque não posso
mesmo mentir. Isso quebraria um pouco da confiança que
construímos. — O que houve? Algum problema com Pablo?
— Lucca, você não tem que se preocupar, ok?
— Paula, não esconda nada de mim. Eu ficarei decepcionado
se fizer isso — insiste.
— Na volta da casa dos seus pais eu fui seguida, fiquei
assustada e estou mesmo explodindo de dor de cabeça. Se eu
estivesse sozinha, teria sido menos estressante, mas eu estava com
Henrico, foi desesperador o bastante. Mas, não é nada que tenha
que se preocupar, já estamos em casa, seguros.
— Puta merda! — ele grita, e o ouço socar algo.
— Calma. Devia ser assalto, mas fui esperta. Rio de Janeiro,
você sabe como é. — Lucca transborda no telefone, e eu tento não
ficar desesperada com o choro forte dele. Parece que toda a dor
que ele estava guardando finalmente está sendo expulsa através do
choro. — Lucca, pelo amor de Deus! Você está me deixando
desesperada dessa maneira, e eu nem tenho como estar com você
agora, estamos distantes. — Ele não para, e isso me destrói um
pouco a cada segundo enquanto luto contra as minhas próprias
lágrimas tentando passar qualquer tipo de força para ele. — Lucca,
meu amor, não há motivo para desespero. Ficarei mais atenta a
partir de agora, prometo a você. Evitarei sair à noite com Henrico,
serei mais cuidadosa. Não faça isso, por favor, eu nem posso
abraçá-lo agora, como ficarei sabendo que você está chorando?
— É demais para mim... — ele diz soluçando. — É mais do
que posso suportar. Meu filho, Dandara, você, Henrico... eu não
suportaria.
— Não vai acontecer nada, meu amor. Tudo vai dar certo e
logo essa fase difícil terá passado. Samuel, Dandara, todos estarão
bem.
— Preciso de você. — Isso me leva as lágrimas porque
preciso dele também.
— Logo estaremos juntos, Lucca. Logo.
— Preciso pensar... eu vou pensar em algo e te ligo. Se
mantenha segura, Paula, por favor — pede.
— Mantenha-se calmo, tudo bem?
— Paula... você é... o motivo. Eu não suportaria...
— Vai ficar tudo bem — reafirmo, e ele encerra a ligação.
Eu passo parte da noite na janela, vigiando, rezando,
chorando. Tão afetada quanto é possível e ganhando a percepção
de que estou sofrendo transformações significativas por conta do
sentimento enorme que se apossa de mim um pouco mais a cada
dia.
Sempre achei que relacionamentos amorosos se encaixavam
na superfície da pirâmide da vida; que a vida era muito mais
profunda que todos os assuntos do coração e que lutar por amor,
por relacionamentos, era quase como um desperdício. Não que eu
fosse fria, mas eu tentava conduzir a vida com a praticidade de não
mergulhar cem por cento em pessoas e me tornar emocionalmente
dependente. E é tão louco como somos capazes de sofrer
mudanças, até mesmo de pensamentos. É louco como somos
capazes de nos reinventar, obter novas perspectivas, mudar
opiniões.
Nunca rezei pedindo a Deus um alguém, pedindo a Deus o
amor, mas nesse momento eu me pego rezando para nunca perder
Lucca, para Ele dá-lo a mim, se é que Ele designa pessoas umas
para outras. Eu acredito que sim, acredito em destino, nos desígnios
da vida. O que tem me transformado a cada dia é a maneira como
Lucca me faz sentir... é tudo o que ele é, todas as suas ações, sua
proteção, seu sorriso genuíno como o de uma criança. É a maneira
como sem querer ele me tira da zona de conforto, como tudo que o
envolve me leva à beira de um precipício e me faz sentir viva. É a
intensidade, força, resignação, paixão, humildade... o caráter
surrealista.
É ele.
Em pouco tempo... tão pouco tempo, ele conseguiu o que
nenhum outro jamais chegou perto de conseguir, e isso tanto me
assusta quanto me fortalece.
Eu rezo mais uma vez pedindo a mesma coisa, e eu rezo em
seguida uma prece silenciosa pedindo que Deus ouça todas as
minhas preces anteriores.
Estou saindo do mercado do condomínio, quando chego no
carro, pego Lucca dormindo.
Ele não está bem desde que acordou. Está mais grudado
com Samuel, e eu nem ousei me intrometer nesse grude durante
toda a manhã. Samuel não saiu dos braços dele nem por um
segundo, exceto nos momentos de irem ao banheiro. Lucca também
está silencioso, pensativo, aéreo e eu sinto que algo está
atormentando-o. Talvez seja muita coisa para ele lidar em tão pouco
tempo, ou o medo. O que me conforta é que hoje parte da família
dele chega e talvez ele melhore um pouco.
Abro a porta cuidadosamente e me acomodo ao seu lado. Ele
desperta, assustado.
— Comprou o que precisava? — pergunta, esfregando o
rosto.
— Sim. Está tudo bem? Hoje você está estranho.
— Tudo ficará bem, é o que quero acreditar — diz, dando um
sorriso fraco. — Talvez deveríamos sair do país. Podemos tentar
fazer isso de forma sigilosa, o que acha? É mais seguro, protegeria
a todos.
— Fui pega de surpresa agora.
— Não quero que Samuel permaneça correndo riscos, não
quero que mais pessoas saiam feridas dessa história — argumenta.
— Acho que é o melhor a ser feito.
— Acho que você está nervoso por algum motivo. Não
descarto a possibilidade, mas devemos resolver isso com a cabeça
centrada e planejar de uma forma segura. Você deixaria tudo para
trás?
— Não — afirma. — Eu entendi sua pergunta e não se trata
disso agora, Dandara. Estamos nos dando bem, por favor, vamos
continuar.
— Só perguntei porque acho que você deixou de ponderar
todas as coisas que envolvem ir embora do país.
— Não existe nada que eu não faria para tentar salvar nosso
filho — afirma. — Entende isso?
— Temos algo em comum. Agora talvez você seja capaz de
compreender minhas ações.
— Não vá por esse caminho agora, por favor — ele pede. —
Existe uma diferença grande entre nossas ações, Dandara. Por
exemplo, minha namorada foi perseguida ontem provavelmente por
consequência do que está acontecendo entre você e eu. Eu deveria
deixá-la, deveria me afastar em prol da segurança dela, e eu jamais
faria isso. Talvez você seja capaz de compreender o que quero dizer
com isso. — Balanço a cabeça em plena compreensão.
— Nem todas as pessoas são iguais ou adotam posturas
idênticas. Cada um lida com o medo de uma forma.
— Graças a Deus por isso. Não quero discutir com você, não
quero que fique me pressionando indiretamente a magoá-la.
Compreender não quer dizer aceitar. Há um abismo entre essas
duas coisas. Quero focar no nosso presente, nas ações do presente
e esquecer as ações do passado, Dandara. Isso é para o nosso
próprio bem e para o bem do nosso filho. Não devemos gastar
energias debatendo sobre o passado.
— Eu sinto muito pela sua namorada. Tentarei resolver isso
da melhor forma e vocês estarão livres, seguros, para poder viver a
linda história de amor que construíram. Não vou embora do país. Te
autorizo a levar Samuel porque a segurança dele para mim é o que
mais importa nessa vida. Eu vou resolver o que tiver que resolver,
custe o que custar. O erro foi meu, não foi? Eu vou arcar com isso e
não adianta dizer que não dessa vez. Você, Samuel, sua namorada,
toda a sua família... vocês não têm absolutamente nada a ver com o
meu erro. Não têm que sair prejudicados dessa história. A juíza
Dandara está de volta, serei implacável até destruir Diógenes e
deixá-los todos em segurança — aviso, descendo do carro.
Lucca veio me seguindo de carro, mas agora apenas estou
cansada de tudo.
Quando chego em casa, Victor, Humberto, Davi, Melinda,
Matheus e Victória estão nos esperando.
— Dandara! — Victória exclama vindo me abraçar. — Está
tudo bem?
— Sim — minto sorrindo, e vou cumprimentar a todos. —
Victor, trouxe o que solicitei através de Lucca?
— Sim, só espero que utilize com sabedoria, ok?
— É apenas para proteção, caso de extrema necessidade —
explico, abraçando-o. — Muito obrigada.
— Meritíssima! — Humberto diz sorridente e vem me abraçar.
— Bom revê-la.
— Bom revê-lo também — digo, indo abraçar Melinda. — Ei,
como os pequenos estão?
— Terríveis — ela diz sorridente. Ficaram com Ava e a babá.
E Samuel? Estou apaixonada por ele. — Ela diz apontando para a
sala onde Samuel está brincando com Davi.
— Ele é encantador, não é? — digo sorrindo.
— Teremos tempo para conversar, quero saber como você
está em meio a tudo isso — diz, me dando mais um abraço e se
vai.
Lucca chega e todos vão cumprimentá-lo. Eu me sinto
perdida, deslocada, sem lugar. Consigo enxergar todas as pessoas
maravilhosas que meu filho deixou de conviver por dois anos,
consigo sentir a dor de pensar nas possibilidades se eu não tivesse
decidido cuidar de tudo sozinha. É impossível não sentir uma
imensa tristeza por ter perdido um vínculo maior com todas essas
pessoas e com Lucca em especial.
Enquanto todos conversam, eu levo as compras para a
cozinha e guardo tudo na geladeira e nos respectivos armários.
Ouço gargalhadas de Samuel, uma conversa séria entre Victor,
Matheus e Lucca, vejo Victória sendo a melhor sogra de sempre
com Melinda, vejo Humberto carregando meu filho nos ombros...
Vejo uma grande família, onde um está por todos e todos estão por
um.
Subo para meu quarto, felizmente despercebida. Tranco a
porta e vou direto tomar um banho, apenas para deixar a água cair
sobre minha cabeça por um tempo. No fundo eu quero resgatar a
mulher inatingível que eu fui por muitos anos. A frieza me impedia
de sentir dores profundas, era tão mais fácil lidar com tudo.
Sinto falta de ser a juíza Dandara, sinto falta da minha força,
sinto falta de como era bom estar no controle sendo maestra da
minha própria vida. Não quero deixar que a dor me torne fraca como
quero ser agora. Não quero permitir que as lágrimas escorram dos
meus olhos e que eu fique de joelhos para implorar um perdão.
Assumi, pedi o perdão, e agora preciso apenas ignorar o meu
coração e ser razão de todas as maneiras que a situação exige.
É o que disse a Lucca, afinal. A juíza Dandara precisa voltar
e entrar no controle da situação antes que pessoas inocentes
paguem pela pecadora.
BH tem os melhores bares com moda sertaneja. Eu, Davi,
Victor e Humberto estamos em um há pelo menos umas duas horas,
conversando, bebendo, e eu nem tenho palavras para agradecê-los
por estar aqui.
Dandara e Samuel estão com meus pais, com Melinda e
Luma, que chegou algumas horas mais tarde. Saber que eles estão
seguros e que Dandara terá pessoas diferentes para poder
desabafar me deixa extremamente satisfeito. Acho que ela precisa
disso, conversar com pessoas que estão livres de mágoas.
— Faltou o Piroca Baby nessa hein? — Victor comenta rindo.
— Sinto que estamos incompletos.
— Ava viria buscá-lo dando tapas na cara dele, coitado —
Humberto diz.
— Só eu que dei sorte nessa merda. — Sorrio. — Paula se
senta nos botecos e bebe comigo, ainda canta sofrência.
— Sorte quem deu fui eu, solteiro, convicto, independente
emocionalmente — Humberto argumenta.
— Tomar no seu rabo desvirginado, Humberto. — Davi já
está bêbado, nota-se pela risada.
— Desvirginado é você. Luma bota tanto no seu cu que nem
sei como que consegue se sentar.
— Aooooo Luma vibroquete — Zombo rindo. — É um
boquete e uma enfiada no teu ânus.
— Aoooo nível baixando! — Victor repreende. — Luma é
nossa irmã, Lucca.
— E você acha que ela não faz essas coisas não? —
pergunto. — Até a princesinha da Disney faz, imagina Luma?
— Aooooo Melinda, ficaria linda sendo chicoteada no meu
clube — Humberto diz rindo, e Victor dá um soco no braço dele. Eu
entro na onda porque meu irmão fica extremamente puto.
— Aoooo Melinda, linda demais! Ainda tenho esperanças de
que ela enxergue que sou o melhor dos irmãos, mais jovem, mais
disposto, mais viril, mais bonito com cara de neném.
— Sem os dentes você ficaria mesmo com cara de neném —
meu irmão esbraveja, e bebe um copinho de pinga. — Aoooo
caralho, essa pinga é da braba! Puta merda! Triste é não poder te
zoar mais com a Dandara. Aoooooo...
— Não mesmo — afirmo rindo.
— Nem uma balançada? — Humberto pergunta.
— Nem umazinha. Foram dois anos sem vê-la, cara. Além
das muitas mentiras, independente de Samuel. A grande verdade é
que Dandara nunca quis uma relação de cumplicidade, ela sempre
quis estar no controle, tomar as rédeas, sempre foi altamente
impulsiva. Ela nunca foi boa em compartilhar problemas,
compartilhar até mesmo coisas banais, nunca meus desejos foram
levados em consideração. Se ela quer algo, não se importa nem
mesmo com os sentimentos das pessoas, ela simplesmente
atropela tudo e todos e executa a qualquer preço; custe o que
custar. É o jeito dela ser, estou falando sobre verdades aqui. Alguns
podem lidar com isso, outros não. Lidei por muito tempo e nunca foi
um empecilho, mas o jeito dela decretou o nosso fim, cara. Não fui
eu quem a larguei.
"Há uma diferença muito grande entre nós; diferença de
personalidade mesmo, sabe? Eu sou um cara muito leve, não ligo
para porra nenhuma nessa vida. Dandara já é extremamente
calculista. Eu gostei muito dela, muito, fui completamente
apaixonado e deslumbrado. Achava incrível ela parecer tão
inalcançável para todos, e muitas das vezes ser completamente
alcançável para mim, quando ela se permitia. Dandara é linda,
inteligente, desafiadora, arisca, tem um gênio muito complicado, e
isso tudo me atraía. As diferenças não eram problemas quando
estávamos juntos, mas ela é instável e eu não gosto de
instabilidade. Ela sabe disso porque fui bastante claro na última vez
que voltamos."
"Dandara não oferece segurança emocional a ninguém, nem
a si mesma, e isso é um grande problema para ela mesma. Eu disse
a ela que seria a nossa última chance e foi. Estou muito magoado
com ela, mas sei que vai passar em algum momento. Nem acho que
seria saudável um relacionamento entre nós, nem mesmo se meus
sentimentos por ela ainda existissem, porque querendo ou não as
mentiras marcaram e isso sempre seria uma sombra entre nós. Eu
torço para que ela seja capaz de mudar por si mesma, porque não
acho saudável conduzir a vida da maneira como conduz. Acredito
que ela se boicota em cada ação. Quero muito que ela mude, cara,
mas apenas por si mesma. No momento ela ainda acha que precisa
mudar por mim, isso já demonstrada a instabilidade. Eu gostaria que
ela tivesse um acompanhamento psicológico, alguém que a
ajudasse a enxergar de uma forma mais bonita os erros e como
corrigi-los."
— Dandara te deixou muito abalado emocionalmente no
passado — Davi comenta.
— Quando estamos mergulhados de cabeça na relação, a
racionalidade falha muito. Se parar para pensar meu relacionamento
com ela nunca foi muito saudável, era como viver na corda bamba o
tempo inteiro, quase um pouco tóxico pela forma insana como eu
me doava e pela maneira como minha doação era retribuída. Houve
uma desigualdade, poucas vezes houve reciprocidade. Quando ela
me procurou no casamento do Victor eu queria tanto acreditar que
suas promessas seriam cumpridas que fui cem por cento passional,
mas ali mesmo já estava tudo muito errado, acho que começamos
bem errado e o que começa errado dá errado sempre.
"Eu achava que as diferenças entre nós iriam nos completar
em algum momento, bem típico daquela frase que diz que os
opostos se atraem, mas essa frase não cabe para todos os opostos.
Estendi a minha mão para ela, todos vocês estenderam também, ela
soltou e tem os motivos, mas tudo bem ela ter os motivos dela,
porém, esses motivos impactaram diretamente na minha vida. Ela
quis escolher por mim mais uma vez, e isso é de um egoísmo
extremo. Ela nunca teria voltado se não fosse pelo acidente, tem
ideia disso? Se não houvesse um acidente, talvez eu passaria mais
anos sem saber da existência de um filho, até mesmo a vida toda,
mesmo achando que mentiras não conseguem ficar guardadas para
sempre."
"Eu vou além, Dandara não me ama como diz. Amor não é
egoísta dessa maneira. Talvez eu tenha sido o único homem que
estendeu as mãos para ela e se doou por completo, acho que isso
pode tê-la confundido. Isso não a torna uma pessoa ruim, isso a
torna uma pessoa como eu, como vocês, passíveis de erros, porém,
erros machucam pessoas, e por mais que tenhamos a grande
capacidade de perdoar, no meu caso com Dandara perdoar não
significa ter que reestabelecer uma relação de amor. Ela foi meu
ponto fraco por muito tempo, mas não vou romantizar o passado.
Romantizar o passado me aprisionaria a ele, eu prefiro tirá-lo como
aprendizado, porque certamente tudo que vivi com ela me modificou
de alguma forma."
— É bem complexo, só quem viu de perto sua dor é capaz de
compreender o significado das suas palavras agora — Victor diz. —
Gosto muito de Dandara, mas você não merece menos do que dá
aos outros, Lucca. Ela faz parte da nossa família agora, está ligada
a nós pelo Samuel, mas eu olho para vocês e não consigo
vislumbrar os dois juntos, principalmente pela inconstância. Não
acho saudável ficar com uma pessoa que não oferece estabilidade
emocional. É o que acho, me desculpe.
— Eu concordo, e acho que todos pensam assim também —
Davi ressalta. — Não que a nossa opinião tenha que interferir nas
suas escolhas...
— O que vocês precisam entender é que não é uma escolha,
principalmente por estarmos falando de pessoas e não de objetos.
Pessoas não são como roupas que escolhemos uma que se encaixa
melhor com o determinado evento que estamos indo — afirmo. —
Não estou escolhendo entre uma mulher e outra, porque estou
vivendo o relacionamento que mereço há alguns meses, estou
construindo uma nova história e estou imensamente feliz como
nunca estive antes. A volta da Dandara não me fez ter que escolher
com quem ficar, de forma alguma. A volta dela só significou um
adiamento nos meus planos e nada além disso. Eu e Dandara
deixamos de ser um "nós" desde a última vez que ela me deixou da
forma mais cruel possível. Foi quando ela surgiu na minha frente
segurando uma mala, sem qualquer vestígio de humanidade e
sentimento em seu rosto; foi quando ela só disse que não dava mais
e que estava indo embora; foi quando nem mesmo teve a
capacidade de se sentar comigo e contar uma história qualquer,
mas que pelo menos fizesse sentido. Foi lá, há pouco mais de 2
anos atrás, que nosso fim foi decretado. Desde então não se trata
de uma escolha da minha parte. Se existe esse lance de escolha,
devo dizer que foi ela quem escolheu viver sem mim e agora é ela
quem tem que sustentar as próprias escolhas.
"Sabe o que torço muito? Para que ela consiga melhorar por
si mesma, pelo nosso filho. Torço para que no futuro consigamos ter
uma amizade, porque ela é fantástica, sabe? Ela é fantástica como
amiga e eu aprendi muito com ela. Por trás daquela mulher
inalcançável existe outra que gosta de ensinar, de ajudar, que
quando permite abaixar suas barreiras se torna uma grande amiga.
Aliás, Dandara nem mesmo possui amigas porque não deixa
ninguém se aproximar. Ela precisa modificar isso para ser feliz,
precisa para de bloquear pessoas, sentimentos. Quero que ela se
reestabeleça, arrume um cara legal nem que seja para ter a espécie
de uma amizade colorida, sei lá. Quero que ela seja feliz acima de
todas as coisas, mas a felicidade dela não está comigo e nem deve
depender de mim. Ela deve ser feliz por si própria. "
— E Paula?
— Paula é o motivo. — Sorrio. — Quando sofremos uma
grande desilusão amorosa deixamos de acreditar nas pessoas, no
próprio amor, muitas vezes até mesmo na nossa capacidade. Sabe
quantas vezes ponderei que o erro estava em mim? Sabe quão
doloroso é se sentir descartável, sentir que quanto mais você faz
algo pela pessoa, menos ela parece gostar de você? Sabe o que é
chorar por se sentir incapaz de manter a mulher que ama? E eu fui
forte, cara. Na maior parte do tempo eu sofri calado, sem ninguém
saber o quanto as ações de Dandara fizeram com que eu duvidasse
de mim mesmo. Me sentia incapaz, inferior, fodido. Passei um longo
período acreditando que o erro estava em mim, que eu deveria
deixar de ser bom, deixar de ser quem eu sempre fui. Então Paula
surgiu, do nada, em Las Vegas. Minha versão feminina da vida. Eu
achei que tudo ficaria na viagem, mas porra... voltamos da viagem e
começamos a sair frequentemente, ela me deixou entrar, me deixou
fazer parte da sua vida, começou a dividir sua história comigo, quis
que eu dividisse a minha com ela. Nos tornamos amigos, amantes e
ela é o motivo...
— Que diabos de motivo? — Humberto pergunta.
— O motivo para eu enxergar que o erro nunca esteve em
mim. O motivo para eu descobrir que temos a capacidade de voltar
a amar mesmo quando sofremos um baque gigante. O motivo para
eu conseguir compreender que o mundo é infinito e que há outros
corações esperando por nós. O motivo que me fez voltar a acreditar
que o amor é amor e ponto. O motivo de eu querer ir além. O motivo
de eu me sentir amado. O motivo de eu sentir que existe alguém
que se importa comigo, que precisa de mim. O motivo de eu deixar
todo o meu passado para trás e querer construir um futuro onde a
reciprocidade sempre vai existir. O motivo de... sorrir. Paula é todos
os motivos que eu nem tenho como dissertar devido à quantidade e
a profundidade... ela só me faz feliz e ponto, ela não pede nada em
troca, é generosa, forte, leve, é minha cúmplice, minha amiga e se
tornou o meu amor. Paula é o motivo desde que surgiu em minha
vida, e eu sinto muito por não ter dito tudo isso a ela, por não a ter
pedido em namoro antes das coisas se tornarem complicadas.
Porém, eu sei que quando tudo isso passar ela estará esperando
por mim e poderemos dar continuidade à nossa história, porque o
amor é nós, o amor é aquilo que estamos construindo. Amor é
doação, cumplicidade, confiança, reciprocidade, paciência, espera.
— Êeeeee chão moiado.
— Quero que Samuel conheça Henrico, que eles possam ser
amigos, que todos nós, Dandara, eu, Pablo, Paula, possamos ter
um relacionamento saudável pelas crianças e por nós mesmos. O
que mais me magoa é apenas saber que Samuel não terá os pais
criando-o juntos, sob o mesmo teto. Mas, tenho certeza de que será
mais saudável e ele será mais feliz assim. Vou dar o meu melhor e
sei que Dandara também dará. Ela é uma mãezona, uma leoa, e
sempre vai querer o melhor para Samuel, mesmo que tenha tomado
atitudes precipitadas. Vamos cria-lo juntos, porém separados.
— Dandara sabe tudo sobre você e Paula?
— Ela sabe que eu e Paula estamos juntos, e por mais que
queira bater o pé, sabe que não há volta. Mesmo que seja no fundo,
ela sabe. Estamos unidos agora por Samuel, e isso é tudo que
importa e tudo o que tem que importar de verdade.
— Todos nós estaremos por Dandara, por você, por Paula.
Somos uma família! — Humberto diz. — Um por todos, todos por
um, independente do que aconteça. Dandara ficaria linda amarrada
na minha cama, Paula também ficaria perfeita numa cruz de Santo
André, então é isso. Só coisas lindas. Princesinha da Disney eu não
digo porque a quebraria no meio tamanha a delicadeza.
— Teu cu! — Victor esbraveja, e começa a cantar: — Foi ela
quem me ajudou a levantar quando eu caí. Foi ela quem enxugou as
minhas lágrimas, me fez sorrir. Ela me aceitou do jeito que eu sou. E
é com ela que eu estou. Aoooooooo Chão moiadoooooo!
— Como conhece Paula? — pergunto a Humberto, e todos
param de rir.
— Você ligou para cinquenta pessoas pedindo segurança
para a garota. Eu estava com Victor quando ele foi até a casa dela
— explica. — Calma aí, camarada! — diz, levantando as mãos.
— Aoooo ciúme danado! — Davi grita.
— É uma ciumeira atrás da outra... — Victor canta, e eu
reviro os olhos.
Ficamos mais algumas horas no bar e quando chegamos eu
tenho uma surpresa.
Dandara está arrumando uma bolsa sobre a mesa. Ela está
vestida como se estivesse indo para algum lugar.
— O que está havendo? — pergunto.
— Você vai proteger o nosso filho com toda a sua alma, eu
confio em você e em toda a sua família. Sei que não deixarão que
nada de ruim aconteça a ele.
— Tá, mas o que você vai fazer, Dandara? — pergunto
aturdido.
— Diógenes — diz. — Não vou ficar sentada esperando que
ele venha até mim e capture meu filho, não ficarei esperando-o nos
encontrar e causar a destruição. Eu irei encontrá-lo, não o contrário.
Todos os documentos de Samuel estão sobre a sua cama.
Passaporte, cartão da vacina, tudo.
— Como? — Estou boquiaberto agora.
— Talvez eu tenha que fazer uso ilegal do meu poder, não
sei. Custe o que custar, meu filho sai ileso dessa ou eu não me
chamo Dandara. Cuide de Samuel, que de Diógenes cuido eu —
avisa, pegando a bolsa, a arma e começa a andar rumo a saída.
— Dandara... você não está indo sozinha.
— Nem o diabo é capaz de me impedir, Lucca — avisa
decidida.
Não consigo dormir. Minha noite oscila entre ficar na janela e rodar
pela casa comendo tudo o que encontro pela frente. Eu quase tenho um
ataque cardíaco quando às 7h da manhã o interfone toca.
— Pois não — digo ao porteiro.
— Senhorita Paula, há um senhor chamado Victor Albuquerque
aqui embaixo... — Isso é obra de Lucca, tenho certeza. Não queria causar
um desconforto, ele já está lidando com tantas coisas, vivendo sob tensão
e medo por Samuel, mas eu também não poderia ocultar, ele não me
perdoaria.
— Pode mandá-lo subir. — Ele desliga, e eu vou vestir um roupão
decente para receber Victor.
Em três minutos a campainha toca e eu descubro que Victor não
está sozinho.
— Paula, bom dia! — Victor diz me abraçando. — Esse é
Humberto, irmão do marido de Ava e um grande amigo meu e do Lucca —
apresenta.
O cara é enorme e extremamente forte. O aperto de mão dele
quase quebra a minha.
— Humberto, é um prazer conhecê-lo.
— Você é gata pra caralho! — Humberto diz, e Victor dá uma
cotovelada nele. — É a verdade. Melinda também é. Por que diabos tenho
que mentir? — Acabo rindo.

— Eu ainda quebrarei cada um de seus dentes, Humberto. Tenho


certeza de que Lucca irá me ajudar — Victor diz rindo. — Ok, vamos ao
que interessa. Lá embaixo há dois seguranças.

— Han? Primeiro entrem... vamos nos sentar. — Os convido e eles


entram. — Nem fiz café. Acabei de "não" acordar.
— O que seria isso? — Humberto pergunta.
— Não dormi bem — explico sorrindo. — Vou fazer um café —
aviso.
— Não precisa, estamos bem — Victor responde. — Soubemos
que foi seguida ontem. Lucca está um tanto quanto desesperado, Paula,
com razão. Dandara foi casada com um desembargador poderoso,
cometeu alguns erros e por conta disso sofre várias ameaças. Ele está em
busca de Samuel para efetuar uma vingança doentia contra o garoto e
contra Dandara. Os dois estão ameaçados de morte e o cara está
cavando tudo em busca de encontrá-los. Toda família está em estado de
alerta, investigações estão acontecendo, e tememos que a perseguição
que sofreu ontem seja obra de Diógenes.

— Ponderei isso, mas não quis acreditar. Não tenho ligação com o
ocorrido, mas acho que sou uma boa isca para chegarem até Lucca e
consequentemente à Samuel e Dandara — digo ressentida.
— É exatamente isso e você ter a consciência é algo muito
importante, Paula. Estamos lidando com uma pessoa influente, poderosa
e sem escrúpulos. Precisamos ser cuidadosos agora, e é por isso que
Lucca foi insistente em contratarmos seguranças para você. Sei que
trabalha, que precisa sair de casa, um deles sempre estará te
acompanhando e o outro ficará aqui fora do prédio, para garantir a
segurança de Henrico. Sei que é ruim, que é uma situação chata,
principalmente por você não estar ligada ao ocorrido, mas ficaria feliz se
aceitasse isso pelo menos até a poeira abaixar. Lucca precisa estar em
BH com o filho, e sabemos que ele está desesperado pelo que pode vir a
afetar você.

— Eu farei qualquer coisa para tornar os dias dele menos


preocupantes. Aceito os seguranças e afirmo meu compromisso de ser
cuidadosa — digo, tranquilizando-os. — De qualquer forma, eu tenho uma
arma, um curso de tiro e um certificado. — Eles riem. — Não costumo
andar armada, mas acho que agora é necessário.
— Apenas seja cuidadosa, Paula, e nos mantenha informados
sobre tudo. Lucca prefere estar por dentro de tudo do que ser pego de
surpresa — Humberto aconselha. — Estamos indo para BH dar apoio a
ele, mas também estaremos ligados em você. — Sorrio.
— Super protetores, isso é de família? — pergunto.
— Deve ser — Victor responde divertido. — Onde Henrico está?
Estou ansioso para conhecê-lo.
— Ele ainda está dormindo. Digamos que ele é muito dorminhoco e
acorda só depois das oito.
— Ok. Bom, então estamos conversados, vou deixar meu cartão.
Não hesite em ligar, Paula. — Balanço a cabeça positivamente e eles
ficam de pé.
— Foi um prazer conhecê-la, agora terei armamento para poder
irritar Lucca — Humberto diz, me abraçando.
— Prazer é todo meu. Lucca sempre fala de você com muito
carinho. — Sorrio, e eles se vão. Eu fecho a porta e fico encostada nela
por um tempo processando tudo. Primeiro estou sendo perseguida,
segundo... é como se eu tivesse sido encaixada na família de Lucca sem
nem perceber. É assim que todos estão me tratando, e eu, por mais pés
no chão que seja, me encontro praticamente iludida com um futuro muito
louco.
Meu celular toca e é uma mensagem dele:
"Sonhar com você é a maldição do Faraó, Paula. Jacinta minha
paudurecência matinal! Você é o motivo até disso... você é todos os
motivos. Cuide-se, por favor, ok? Ps: você sabia que é minha namorada?"
Obviamente que me pego sorrindo, distraindo de todos os
acontecimentos. Me jogo no sofá e solto um gemido de frustração,
sentindo a saudade aumentar e o desejo sexual me atingir com força.
Sexo é a última coisa que eu deveria pensar agora, mas, nem tento
repreender a mim mesma por tantos pensamentos sujos que atravessam
minha mente. Aliás, meu apetite sexual anda a mil! É engraçado como nos
transformamos quando encontramos alguém que parece ter sido criado
para nos dar prazer; tudo muda, até o apetite. Eu consigo ver aquele
homem completamente nu e duro, com todas aquelas tatuagens, aqueles
cabelos desgrenhados e aquela barba que fica deliciosa roçando entre
minhas pernas. Quase consigo sentir seu toque. Isso é o suficiente para o
meu corpo esquentar consideravelmente, imaginando sua tal
"paudurecência" matinal. Dormir com Lucca é sempre incrível, mas
acordar com Lucca é... uma fonte de prazer e fogo. Eu ligo para ele...
— Diabinha. — É assim que ele me atende, com a voz ainda mais
rouca devido ao sono.

— Não me mande mensagens com insinuações sexuais, por favor.


— Por quê? Costumávamos trocar mensagens sexuais — diz.
— Era mais fácil. Trocávamos mensagens e poucas horas depois
conseguíamos resolver a situação. Agora não é tão fácil, muito pelo
contrário.

— Te deixei com uma situação complicada, Diabinha? Por que não


vem para BH com a minha família? Você pode ficar na chácara e
podemos matar um pouco da saudade. — Quase choro de frustração e
vontade.
— Eu amaria ir, mas não posso. Ainda estou assustada com o
ocorrido, não sou capaz de desgrudar do meu filho. Só de ter que sair
para trabalhar já será bastante complicado hoje — explico. — Quero muito
vê-lo, eu daria muitas coisas apenas para poder te dar um abraço e um
beijo, nem precisava de sexo, bebê Lucca. Sei que em breve estaremos
juntos. Como Samuel está?
— Ele está bem, meu amor. E meu garoto? Estou morrendo de
saudades dele.
— Tudo certo, ainda dormindo.
— Paula, eu prometi que te veria toda semana, ao menos um dia.
Não foi isso? — pergunta, e sorrio.

— Sim, você prometeu, mas não é que eu não tenha acreditado em


sua promessa. Sei que é a sua vontade, porém, eu sempre soube que
seria difícil isso acontecer, bebê Lucca.
— Minha família chega hoje. Amanhã tentarei ir aí, mesmo que seja
só para te roubar um beijo e ver meu garoto. — Meus olhos se enchem de
lágrimas. — Ok?
— Eu amaria, mas... posso esperar por você. Estarei esperando,
mesmo que demore, ok?

— Você é o motivo.
— De?
— Te conto na viagem que faremos quando a poeira abaixar. —
Uma viagem...
— De preferência em uma praia isolada da civilização.

— Cuidarei disso.
— Ok, bebê Lucca. Nos falamos depois. Espero que sua
paudurecência matinal tenha sido controlada — brinco.
— Vou controlá-la agora, me mande uma foto dos seus seios. —
Dou uma gargalhada, e ele ri também. — Brincadeira, não precisa. Há
muitas fotos suas aqui em meu celular. Basta olhar para uma delas.
Aoooo Paula, Jacinta a imaginação fluir. Se cuide, princesa. Eu... Ei, você
não respondeu minha mensagem sobre saber que é a minha namorada.
— Não sei nada sobre isso, mas ficarei feliz o dia que debatermos
sobre.
— Aooo chão moiado, Paula. Você pisa no meu coração assim.
Vou te processar por abandono de incapaz.
— Lucca Albuquerque, chega de distrações matinais. Preciso
arrumar o café do meu bebê e me arrumar para trabalhar. Há uma
audiência complicada essa tarde.
— Ok. Por favor, cuide-se, por favor, por favor mesmo — pede.
— Prometo.

Está um calor infernal e estou com um mal estar absurdo. Já perdi as


contas de quantos copos de água bebi e não estou mais suportando ficar
trancada numa sala de audiência, principalmente porque já praticamente
anoiteceu. Acho que estou sob tensão e isso está me afetando
grandiosamente. Quando o juiz pede uma pausa de quinze minutos, leva
tudo de mim para não debruçar na mesa dele e dar um beijo em sua
bochecha em agradecimento.

Pego minha bolsa e saio um pouco da sala, deixando minha cliente


que não quer nem mesmo respirar um pouco. Sigo para o banheiro, faço
xixi e em seguida lavo meu rosto, aproveitando para molhar um pouco
minha nuca. Aproveito a pausa e ligo para minha mãe:
— Oi filha.
— Olá, mãe. Como as coisas estão? Henrico está bem?
— Está sim, filha. Pablo está aqui, aquele embuste até está sendo
um bom pai. Acho que o susto foi bom por esse lado. — Pior que é
verdade.
— Então está tudo certo, mãe. Vou voltar para audiência. Amo
vocês.
— Amo você, filha. Que Deus te proteja. — Eu fico alguns
segundos com isso na cabeça, e por algum motivo, tiro a arma que está
em minha bolsa e escondo em minhas costas, travando-a em minha calça
jeans.
Quando estou saindo do banheiro, um homem que deve ter na
faixa dos 60 anos de idade entra e bloqueia minha saída.
— Senhor, esse banheiro é feminino.

— Senhorita Paula, é um imenso prazer conhecê-la. Acho que não


se recorda de mim, mudei um pouco visual. — Não o reconheço, posso
apostar que nunca o vi. — Sou Diógenes — ele diz com um sorriso
estranho, e eu nem preciso de mais nada para saber que algo deu errado.
— A questão é o seguinte, a senhorita vai me acompanhar sem fazer
qualquer alarde ou sem qualquer relutância. Se você não colaborar
comigo, seu filho sofrerá consequências. Henrico é o nome dele, não é
isso? É um nome muito bonito.
— Henrico não. Seja lá o que for, deixe meu filho de fora disso —
aviso tremendo.
— O futuro dele depende do seu comportamento. Agora deixemos
de conversa. Me acompanhe com boa vontade. No primeiro deslize seu
filho será morto. — Eu pego minha arma e aponto pare ele.
— Não tão fácil, desembargador. — Ele dá uma gargalhada sinistra
e um homem surge atrás de mim, me desarmando abruptamente. A força
dele, faz minha arma cair no chão ao mesmo tempo em que uma dor
horrível surge em meu braço. Que Deus me ajude!
— Menos dez pontos a favor de Henrico...

— Você quer me deixar louco? — Lucca grita, e tenho certeza de


que seu grito certamente pode ter acordado algumas pessoas.
— Você não tem que se preocupar comigo — argumento. — Você
só precisa aceitar minha decisão e cuidar de Samuel, é o que quero e o
que preciso.
— Não tem que querer, me desculpe. Todas às vezes que tentou
sozinha tudo deu errado. Se você ama seu filho, quer se manter viva e
segura para cuidar dele. Isso que está indo fazer é arriscado, não temos
garantias de que você vai conseguir resolver o problema. Pode ser que
isso não aconteça e que tudo piore, inclusive que Samuel perca a mãe. —
Ele está puto, mas eu preciso resolver. Sei que vou conseguir.
— Eu estou indo, não quero ser grosseira, mas não preciso de
autorização, Lucca. Assim como pode dar errado, pode dar certo. Não
posso ficar esperando, daqui a pouco mais pessoas vão pagar pelo meu
erro. Se algo tem que acontecer, prefiro que aconteça comigo, mas, de
qualquer forma, eu tomarei cuidado. Quero voltar para o meu filho.
— NOSSO FILHO!
— EU SEI QUE ELE É NOSSO, LUCCA! MAS EU TENHO MANIA,
NÃO FAÇO POR MAL.
— Parem de brigar! — Victor tenta intermediar.

— Você faz tudo errado, merda. Você havia prometido que me


deixaria estar no controle. Estamos buscando a melhor e mais segura
forma de chegarmos até ele e resolvermos a situação, mas você apenas
não consegue, quer atropelar o mundo novamente.
— Ele está atrás de nós, Lucca. Prova disso é a perseguição da
sua namoradinha. Quer que ela pague por mim também? Se acontece
algo com ela, você jogará a responsabilidade em cima de mim, até porque
indiretamente terá sido minha mesmo. Não estou disposta a ouvi-lo jogar
todas as coisas erradas em minha cara. Sei dos meus erros e preciso
corrigi-los agora, antes que algo dê errado. Lucca, se ele está
perseguindo sua namorada, falta pouco para ele chegar até nós.
— Você não pode ir sozinha, Dandara... não é seguro.
— Você precisa ficar com Samuel. Ele precisa de ao menos um de
nós dois na vida.
— Eu vou com ela — Humberto diz.

— Não lembro de ter dito que qualquer pessoa poderia vir comigo
— rebato.
— Não tenho nada a perder. Não tenho filhos, não tenho mulher,
estou de férias, e sou médico. Você pode precisar de um médico. Quero
ver sair daqui sozinha, meritíssima. A não ser que atire em um de nós ou
em todos, você não está indo sozinha. — Humberto desgraçado!
— Eu não acho legal que qualquer um dos dois vá — Victor diz. —
Parece que todos estão ficando loucos. Dandara, você está sendo
impulsiva. Está colocando tudo em risco.
— É isso que estou dizendo, mas, quando sou eu a falar, Dandara
pensa que estou destilando ódio ou qualquer merda — Lucca comenta se
aproximando. — Pode por favor abaixar a porra do seu topete,
meritíssima?
— Sou juíza, já lidei com casos horríveis, não quero entrar para as
estatísticas, tampouco quero que qualquer um de vocês entre. — O
celular dele toca e ele recusa a ligação. Em seguida é o celular de Victor.
— Lucca, Paula está me ligando em chamada de vídeo. — Isso
deixa todos em estado de alerta. Eu quero fechar meus olhos e gritar, algo
de errado está acontecendo com aquela mulher e eu serei massacrada
por Lucca...
Quando Victor atende, Lucca parece querer morrer, porque no
vídeo a tal Paula está amordaçada e com as mãos presas atrás de uma
cadeira. Eu reconheço o local e sei que é o porão da casa onde eu e
Diógenes morávamos. Não espero mais um segundo, roubo a chave de
um carro qualquer em cima da mesa e saio.
Estou em um porão, bastante luxuoso por sinal, tentando me
manter equilibrada, lutando contra o enorme desespero que quer
tomar conta de mim. Eu sou boa em ser racional quando precisa e
estou tentando usar apenas a racionalidade agora. É preciso frieza
em situações como essa, não que eu tenha passado por algo assim
antes, mas, definitivamente, não posso ficar gritando, dificultando o
que já está difícil. Acho que se eu não relutar será melhor para mim
e para a situação como um todo.
Não vou dizer que não estou morrendo de medo. Há tantos
medos em mim agora. Medo por Henrico, pelos meus pais, por
Lucca, por Samuel, até mesmo por Dandara. Estou com dó dela,
para falar a verdade. A mulher deve estar arrependida de todas as
maneiras possíveis e mal deve estar conseguindo lidar com a culpa
nesse momento. Espero que Lucca não esteja despejando sua fúria
sobre ela, porque acho que a mulher já está com uma carga muito
pesada de culpa sobre si mesma.
Erros do passado interferem diretamente no presente, é isso
que estou aprendendo, e acho que todos estão aprendendo
também. Eu espero de coração sair ilesa dessa história, e torço para
que Lucca e todas as demais pessoas saiam também.
Diógenes é um monstro. Ele queria que eu o levasse até
Lucca, mas tudo que sei é que Lucca está em Belo Horizonte, isso
me custou um tapa forte no rosto e um puxão de cabelos que está
doendo até agora. Estou me apegando ao fato de que poderia ser
pior, mas talvez, conforme as horas forem passando, se torne um
pesadelo maior.
Há algumas horas o monstro ligou para Lucca pelo meu
celular e eu imagino o terror que tudo virou. Não sei do paradeiro
dos meus seguranças, nem sei como tudo isso aconteceu. Tive que
andar pelo fórum com a naturalidade de uma mulher coberta de
plenitude, quando realmente estava indo para algo terrível.
Estou com fome, com sede, meu estômago está uma
bagunça e meu corpo está dolorido por inteiro. Estar na mesma
posição por horas seguidas é horrível o bastante, uma cadeira de
ferro horrível, dura... Diógenes está pessoalmente cuidando de mim,
sentado em uma outra cadeira, com os abraços apoiados em uma
mesa e me encarando o tempo todo. Estamos sustentando o olhar
um do outro, e eu não recuo nessa guerra silenciosa. Eu sou capaz
de escutar o som dos meus batimentos cardíacos, não há um único
ruído e isso é um tanto quanto aterrorizante.
Sou prisioneira desse monstro e não faço ideia de quanto
tempo isso durará. Nas poucas vezes que ele desvia o olhar, eu
aproveito para tentar retirar a corda que está mantendo meus pulsos
presos atrás da cadeira. O aperto não está forte e sinto que com
muita concentração serei capaz de soltar. Em minha mente começo
a travar um plano, caso eu consiga me livrar, mas o plano não é
bom de qualquer forma. Eu nunca me imaginei agredindo alguém ou
até mesmo matando. Não faz meu perfil. Talvez nem mesmo
naquele banheiro eu teria conseguido atirar em Diógenes; ao menos
não para matar.
O infeliz fica de pé e começa a caminhar em minha direção.
Isso deveria me dar medo, mas, ao invés disso, sinto repulsa, um
nojo capaz de me fazer vomitar.
Ele retira o pano horrível que está me mantendo amordaçada
e eu percebo ainda mais a secura em minha boca.
— Você é tão sem graça — ele diz. — Está com sede?
— Sim.
— Fome?
— Sim.
— Talvez eu possa pedir algo.
— Tipo uma prisão de luxo — debocho. — Tratamento
diferenciado.
— Pode não parecer, mas eu não me sinto confortável tendo
que tomar atitudes extremas — argumenta. — Infelizmente na vida
muitas vezes os justos pagam pelos pecadores.
— Eu sei o que Dandara fez com você, Lucca me contou. Sei
que deve ter sido doloroso, mas... matar uma criança por conta
disso não é justo. Acho que você deveria superar o ocorrido e seguir
sua vida. Há tantas mulheres no mundo, por que vai destruir sua
vida por conta de um erro do passado?
— Você sabe o que é dar tudo de si para uma mulher e ser
cruelmente enganado? Sabe o que é a mulher chegar diante de ti e
dizer na maior cara de pau que está grávida de um filho seu e você
saber que essa possibilidade é impossível? Eu provavelmente teria
a perdoado se ela me contasse a verdade, eu poderia até mesmo
ter assumido a criança... porque eu era um tolo apaixonado por
aquela mulher — ele fala com muito ressentimento, e eu
compreendo que deve ter sido difícil, mesmo assim não justifica ele
querer matar Samuel ou Dandara. — Ela me usou para crescer por
conta de uma obsessão insana, uma fome doentia pelo poder. Ela
mentiu para mim desde o início.
— Eu realmente compreendo você, Diógenes. Mas é algo a
ser superado, uma vingança vai destruir sua própria vida, todas as
possibilidades que ainda existem. O garoto não tem culpa pelos
erros do passado da mãe. Ninguém tem culpa. E Dandara... sei que
as atitudes dela não foram honráveis, mas acredito que só ela saiba
o que sentiu lidando com o preconceito descabível, só ela sabe a
dor que sentiu e em que a dor foi capaz de transformá-la. Cada um
lida com os acontecimentos de uma maneira diferente. A maneira
que ela escolheu foi sim errada, mas... — Ele me dá outro tapa na
cara que faz meu pescoço virar rapidamente para a esquerda.
Lágrimas queimam meus olhos, e eu luto para segurá-las.
— Você está defendendo a mulher que é a responsável por
você estar nessa situação e a responsável por um monte de
pessoas estarem correndo riscos nesse minuto — esbraveja. —
Você é estúpida.
— Só estou tentando te mostrar que não vale a pena. Que
essa situação não tem nem mesmo a perspectiva de ter um final
feliz. Acho que a vida já castigou Dandara o bastante. Você deveria
apenas deixá-la em paz, deixar Samuel em paz. O que uma criança
de dois anos fez de mal a você? Nada. Ele é só um bebê.
— Pare de falar ou vou me arrepender de ser bonzinho! —
ameaça, e se vira pegando seu celular e digitando incansavelmente.
Suspiro frustrada, cansada, com dores até os ossos. Fecho meus
olhos e faço uma oração silenciosa enquanto tento me desvencilhar
das cordas. Quando termino, passo a observar melhor o local e
todas as possibilidades que ele oferece. Há uma arma sobre a mesa
onde Diógenes estava, e outra arma em sua cintura. Não há objetos
cortantes. Nesse porão há apenas uma janela de vidro, pequena.
Talvez eu consiga passar por ela, ou talvez minha bunda fique
agarrada.
Isso parece algum tipo de cena de filme, na verdade de livro,
com menos ação do que teria em um filme. Ser refém em um
porão... isso é algo que nunca imaginei viver. Meus pais devem
estar desesperados e eu espero que Lucca tenha entrado em
contato com eles para poder avisá-los de que as coisas deram
errado.
A única coisa que me faz chorar é lembrar de Henrico. Eu só
queria meu filho, queria dormir grudada nele e não soltá-lo nunca
mais. Tenho tanto medo de que coisas ruins aconteçam a ele. Meu
garotinho não tem culpa alguma de nada, ele é apenas um anjo,
perfeito de todas as maneiras possíveis, é metade de mim e dono
de todo o meu coração. Eu suportaria perder muitas coisas, mas
jamais suportaria se qualquer coisa ruim o afetasse.
Eu sinto um aperto tão forte no meu coração, ao mesmo
tempo em que me sinto fraca, incapaz. A onda de tristeza nubla
minha força, mas eu luto para conseguir me manter firme. Odeio me
sentir indefesa. Vou remexendo a corda em meus pulsos, agora com
mais força já que o monstro está distraído. Calculo em minha mente
a maneira como terei que ser exatamente precisa se quiser sair
dessa sem danos.
Quando ele volta a olhar para mim, detenho meus
movimentos.
— Você é durona, não mesmo? Estou extremamente
decepcionado. Amaria te ver chorando, relutando em desespero —
diz rindo. — É, parece que ninguém virá em defesa da linda
donzela. Acho que você não é tão importante para o seu namorado.
Dandara deve ter jogado sua magia sobre ele, aquela mulher é
poderosa, capaz de dobrar todos os homens e colocá-los sob seus
pés. Ela arquiteta e engana pessoas muito bem. — Ele solta uma
risada aguda que faz meu sangue ferver de ódio, é então que
consigo me desfazer da corda e sorrio internamente, mesmo
temendo pelo que estou indo fazer.
Diógenes se vira para voltar à mesa e eu sou rápida ao ficar
de pé, pegar a cadeira e dar um forte golpe que o faz cair
desacordado. Levo minhas mãos à boca, chocada com meu feito.
Eu espero de verdade não o ter matado, na verdade, estou rezando
para isso não ter acontecido. Não quero viver carregando o peso de
uma morte em minhas costas.
Preciso agir rápido, por isso caminho até ele, pego a arma
em sua cintura, os celulares meu e dele, e a arma que está sobre a
mesa. Uma das armas escondo em minhas costas, presa pela calça
jeans e a outra coloco no meu bolso da frente.
Sei que o filho da mãe pediu algo pelo telefone e que alguém
está vindo trazer. Tento puxá-lo, escondê-lo, porém o peso dele é
muito mais do que sou capaz de aguentar. Pego a cadeira, me
escondo próximo à porta e me preparo para golpear quem quer que
esteja vindo até nós. Demora um pouco até que um homem surja, e
ele não dura dez segundos antes que eu dê uma cadeirada nele,
fazendo-o cair também.
Me sinto em uma cena de Control Strike, caminhando
cuidadosamente, olhando para todos os lados em busca da próxima
vítima, porém, agora estou com uma arma de fogo em mãos e não
mais uma cadeira. Estou ignorando todas as dores e seguindo como
um assassino em série.
Dentro da casa parece não ter ninguém, mas, pela janela,
vejo pelo menos cinco homens armados do lado de fora, no jardim.
É preciso agir com inteligência, por isso começo a vasculhar os
cômodos, para encontrar um lugar onde eu possa ficar segura e
talvez conseguir fugir. Encontro um escritório no primeiro andar e
me tranco dentro dele, quase morro de susto quando alguém coloca
uma arma em minha cabeça. Tento fazer um golpe, mas paro
quando ouço a voz:
— Merda! Barbie!
— Como você está aqui? — pergunto, virando-me para
Dandara.
— Eu quem deveria perguntar isso.
— Eu desmaiei Diógenes e um capanga, mas eles podem
acordar a qualquer momento — digo. — Precisamos sair daqui.
— Você não o matou? — pergunta em tom discriminatório.
— Não sou uma assassina. Eu tenho certeza de que estaria
desmaiada se tivesse matado alguém.
— Eu odeio você ainda mais — ela diz.
— Enfie seu ódio no cu, meritíssima. Eu quero sair desse
inferno, meu filho está correndo riscos e o meu primeiro assassinato
será se algo tiver acontecido com ele.
— Seu filho está bem, seguro, em BH com toda sua família.
— Isso tanto me tranquiliza quanto me deixa em choque.
— Como?
— Cale a boca, Barbie moda e magia, não é o momento para
questionamentos. Anda, precisamos matá-lo! — Essa mulher é
doida!
— Eu não vou matar ninguém, querida Dandara. Não mato
nem mesmo uma barata. Não sou fresca, porém, não sou
assassina. Se você quer matar alguém, vá em frente, não sou
obrigada a acompanhá-la, principalmente porque você não gosta de
mim. Isso aqui, meritíssima, não é uma cena de As Panteras
Detonando. Não sou a Dylan, você não é a Madison.
— Deus! Cale a boca! — Eu me calo e vou dar um jeito de
sair daqui. A deixo próxima à porta e vou até as janelas, buscar uma
maneira de escapar. Não vou esperar que Diógenes acorde ou que
qualquer um dos capangas deem conta de algo saiu dos trilhos.
Um dos celulares vibra em meu bolso. É o do Diógenes e há
uma mensagem de um dos seguranças perguntando pelo
segurança que foi levar comida até nós. Me acomodo na cama e
respondo:
— Solicitei que ele ficasse aqui para eu poder dormir um
pouco. Podem se dispersar. Parece que o plano falhou. — Digito
e Dandara se aproxima.
— Que merda você está fazendo?
— Resolvendo a merda que você me colocou. O segurança
mandou mensagem para o celular de Diógenes, estou respondendo
como se fosse ele.
— Você não é tão burra, Barbie.
— É engraçado, não é mesmo? Você se sentia inferior
quando sofria preconceitos, quando ouvia pessoas falando de você.
Por que diabos você faz o mesmo? Eu entendo o motivo de me
chamar de Barbie, isso também é uma espécie de preconceito,
meritíssima.
— Parece que Lucca te contou muito sobre mim.
— Eu e Lucca somos amigos, acima de todas as coisas —
informo. — Sinto muito pelo que passou em sua juventude, mas não
faça com os outros o que você odiava que faziam com você. —
Pisco um olho para ela e fico de pé. — A Barbie aqui está tentando
achar a melhor solução para nos livrar desse pesadelo. — Um som
de tiro me faz arregalar os olhos.
— Lucca! — Dandara diz desesperada, e outros sons
surgem.
— O que devemos fazer? — pergunto desesperada, e ela vai
até a janela.
— Vem — me chama, abrindo a janela e nós duas pulamos
para a parte de trás da casa. Parecemos duas criminosas, é
horrível. — Seja esperta, Paula. Se algo acontecer com você eu sou
uma mulher morta — diz baixinho.
— Se eu morrer ...
— Se você não morrer por eles, eu mesma te mato. Será que
incapaz de calar a boca?
— Estou nervosa — confesso, e outro disparo acontece. Não
sei como, mas Diógenes surge armado diante de nós.
— Olha quem chegou! — ele diz sorridente. — Eu não sei
qual das duas deve morrer primeiro. A puta chefe ou a putinha loira
que me deu uma cadeirada.
— Você deve morrer primeiro, certamente — Dandara diz
sorrindo, e eu estou gelada, com a arma apontada para ele. Eu sinto
que ele vai matá-la, porque ele está mirando a arma na direção
dela. Não sei se sou capaz de permitir... não sei o que fazer Deus!
Não sou uma assassina!
— Por tudo que me fez passar, Dandara. Eu vou matar você
e vou matar seu filho em seguida — ameaça, e assim que ele
destrava a arma eu atiro em seu braço. Diógenes cai de joelhos no
chão e grita de dor. Eu sinto minhas pernas ficando bambas.
— Fuja, Paula... — ela grita quando um outro homem surge.
Não posso deixá-la merda... não posso. Quando dou por mim, estou
dando o segundo tiro e o terceiro... Ela me puxa e saímos correndo.
— Odeio você... heroína desgraçada.
— É recíproco — grito de volta para ela. — Você é incapaz
de agradecer?
— Você roubou Lucca de mim.
— Você o deixou. Não roubei ninguém de você, idiota! — Eu
vou matar... Deus me dê forças.
— Era para sermos uma família.
— Então por que foi embora? — questiono, enquanto
corremos.
— Você não sabe de nada.
— Então pare de falar merda e me acusar de coisas que não
fiz. Eu não tenho culpa se você o deixou, não tenho culpa se não
são uma família.
— Você não faria qualquer coisa para proteger seu filho? —
pergunta.
— Faria, principalmente contar com a ajuda do homem que
amo. Dois lutando é melhor que apenas um, prova disso é o que
acabou de acontecer conosco. Se você estivesse sozinha estaria
morta. — Ela para de correr e se vira de frente para mim. Nós
vamos nos matar, isso é certeza.
— Fácil falar, não é mesmo? Mulher maravilha!
— Fácil fugir, não é mesmo? Mulher de aço! Fugir é para os
fracos, meritíssima. Os fortes encaram os problemas de frente.
— Vocês estão indo brigar? — Ouço a voz de Victor.
— Não fale o que você não sabe! — Dandara me ameaça.
— Então encare as consequências dos seus atos sem se
revoltar com quem nunca fez nada contra você. Eu entendo que
goste de Lucca, mas foi você quem colocou o ponto final quando o
deixou. Não vou me sentir mal porque vocês não estão juntos,
porque não vão criar o filho sob o mesmo teto. Tampouco vou abrir
mão dele, não sou burra! Não destruí família alguma, porque eu
jamais seria capaz. Eu o amo e se tiver que lutar com você eu vou,
meritíssima! — Ela avança sobre mim, e eu deixo a arma cair para
avançar sobre ela. Ela agarra meus cabelos, eu agarro os dela. O
único problema é que estou fraca e não estou podendo dar o meu
melhor, por isso estou saindo perdendo nessa luta. Por sorte
Humberto a tira de cima de mim.
— Eu odeio você!
— É recíproco! — grito, enquanto Victor me ajuda a ficar de
pé. Há um festival de policiais espalhados pela casa e um Lucca
desesperado surge. Um soluço escapa de mim assim que o vejo e
assim que seus braços sustentam meu corpo.
— Diabinha... — Ele chora. — Me deixe ver você, meu amor.
Está tudo bem? Aquele desgraçado tocou em você?
— Bebê Lucca, estou viva — digo, agarrada a ele. — Eu tive
medo de algo acontecer e não ter dito que eu...
— Ela salvou a minha vida, Lucca. Satisfeito? Ela atirou em
dois homens para me salvar — Dandara diz chorando, cortando as
minhas palavras. — Ela é a super heroína da história. A super
heroína que salvou a vilã!
— Pare com isso — peço, me afastando de Lucca. — Por
favor. Estamos esgotadas. Não existem heroínas, nós duas nos
salvamos. Está tudo bem agora, isso é tudo que importa.
— Não fui eu quem a salvei, Lucca — Dandara diz a ele, e
cai de joelhos ao chão, chorando. — Ela é melhor que eu... e eu o
perdi. — Minhas lágrimas disparam ainda mais, sentindo a dor
dessa mulher.
— Ela precisa de você — digo a Lucca.
— O quê?
— Ela apenas precisa de você.
Eu também preciso....
— Não — digo a Paula. — Não vou deixá-la. Você precisa de
mim também e eu preciso de você, há mais pessoas ali por ela,
Paula. — Minha Diabinha está abatida, destruída, e eu não vou
deixá-la. Passei por horas de terror, desesperado por medo de
qualquer coisa ruim acontecer com ela. Não sou nem capaz de
soltá-la agora, quem dirá me afastar. Por sorte, Humberto e Victor
pegam Dandara no chão e a levam para fora.
Desde que descobrimos sobre Paula, fiquei com Dandara o
tempo todo, principalmente porque ela saiu de casa como uma
louca. Foi como uma cena de filme ter que perseguir minha ex e
fazê-la parar ainda no condomínio. Depois disso fretamos um voo e
quando chegamos no Rio já havia policiais preparados para nos
ajudar. Dandara é mesmo influente, com uma ligação ela conseguiu
organizar uma operação, mas há coisas mal explicadas nessa
história. Ela poderia ter usado a influência no passado e eu quero
entender sobre isso em algum momento. Além disso, ela conseguiu
fugir e chegou aqui antes.
— Eu nunca vi alguém tão desestruturada na vida antes —
Paula diz chorando. — Ela precisa de ajuda. Só está perdida, sem
conseguir lidar com todas as coisas, todos os riscos, lidar com o fato
de que o perdeu. Ela precisa de ajuda psicológica, Lucca e precisa
de pessoas a apoiando. Ela é mãe do seu filho e precisa do seu
apoio.
— Eu compreendo isso, e vou ajudá-la. Mas, Paula, deixe de
pensar nos outros agora e pense em si mesma. Você acabou de
passar por algo pesado, precisa de cuidados.
— Eu quero meu filho. — Ela chora me abraçando
novamente. — Achei... achei que ele sofreria consequências...
— Seus pais, ele e até mesmo o Pablo que nasceu pelo cu
estão em BH, na chácara da minha família. Estão bem, em
segurança. Não vamos poder ir para lá agora, você precisa de
cuidados e precisará depor.
— O que vai acontecer com Diógenes? Eu dei um tiro nele.
Foi horrível. Dandara estava tão fragilizada, Lucca. Ela tinha uma
arma apontada para ele e não conseguiu atirar. Ele iria matá-la e ela
não reagia, eu precisei reagir por ela, ou nós duas... — Estou
preocupado com Dandara. Ela tinha a ideia fixa de matar Diógenes
e não conseguiu reagir.
— Vamos deixar isso para depois? Você precisa ser
examinada, comer, tirar essas roupas, tomar um banho relaxante. —
Ela balança a cabeça positivamente, e eu a levo até uma das
ambulâncias que estão paradas na frente da casa. Dandara está em
uma delas, por isso, enquanto Paula é examinada, eu vou até ela.
— Eles deram um calmante a ela — Humberto explica. — Ela
está muito abalada, parece inacreditável vê-la assim. Paula te disse
algo?
— Apenas que Dandara estava com uma arma apontada
para Diógenes e não conseguiu atirar, não conseguiu reagir. Vou
deixar as duas descansarem disso, e depois terei uma conversa
com cada uma. Elas terão que depor, mas isso é impossível agora.
— Victor já disse ao delegado. Vá descansar com Paula,
cara. Eu e Victor cuidaremos da Dandara — o agradeço e volto para
Paula. Com a claridade dentro da ambulância consigo ver uma
marca vermelha do lado direito de seu rosto, que agora está uma
mistura de palidez com vermelho. A vejo conversando com uma
médica, insistindo para ir embora. Depois de muita insistência ela é
liberada e eu peço o motorista que me trouxe até aqui para nos
levar ao meu apartamento.
— Eu deixei minha bolsa... pode pedir a Victor para pegá-la?
— pede, e envio uma mensagem para Victor solicitando.
Quando chegamos em meu apartamento, a primeira coisa
que Paula pede é algo de comer. Ela bebe tanta água, sinônimo da
sede que passou por horas.
— Só há congelados. Lasanha, meu amor, pode ser? Se
quiser eu posso tentar conseguir algo, o problema é que ainda são
seis da manhã — argumento.
— Eu amaria uma lasanha congelada — responde, dando um
sorriso fraco e eu odeio essa tristeza em seu rosto.
Coloco a lasanha no micro-ondas e me sento de frente para
ela na mesa de jantar.
— Quer me contar como foi?
— Sim — ela diz, segurando minha mão por cima da mesa.
— Fiquei horas perdidas amordaçada e presa num porão. — Olho
para os pulsos dela e há enormes vergões causados pela corda. —
Diógenes ficou sentado de frente para mim, a uma certa distância.
Ficamos apenas nós dois lá e foi ele quem me amarrou, por sorte.
Desde que ele me prendeu eu percebi que com um esforço maior
talvez eu conseguiria me livrar da corda e assim foi. Fiquei
esperando que ele se distraísse e a todo momento eu tentava um
pouco — explica. — Eu tive que ser de uma frieza extrema, Lucca e
fui. Houve um momento em que ele quis me oferecer água e
comida, e ele disse algumas coisas sobre Dandara, cheio de
amargura. Disse que teria criado o filho dela se ela não tivesse
mentido para ele, disse uma série de fatores. Tentei argumentar com
ele, dizendo que Samuel não deveria pagar por isso, que a própria
vida ia cobrar os feitos da Dandara, tentei usar uma psicologia que
nem mesmo conheço. — Ela sorri um pouco. — Ele me deu alguns
golpes no rosto, revoltado pelo fato de eu estar tentando defender
Dandara. E, quando se virou de costas eu conseguir soltas minhas
mãos. Fui rápida pegando a cadeira e o golpeando, ele caiu
desmaiado no chão, foi horrível, mas precisei fazer isso com um dos
capangas dele também.
"Desarmei Diógenes, mas não lembrei de desarmar o
capanga maldito. Fugi por dentro da casa, me tranquei em um
quarto e Dandara estava lá. Discutimos, eu enviei mensagem para
os capangas como se fosse Diógenes, foi tipo As Panteras, mas não
éramos as panteras. — Franzo a testa.
— Panteras?
— É, As Panteras Detonando, do filme. — Sorrio. — Quando
pulamos pela janela, corremos um pouco e logo encontramos
Diógenes. Ele disse que mataria nós duas, tanto eu, quanto
Dandara estávamos com armas apontadas para ele, mas ele ia
matá-la primeiro, antes de vir até mim. Havia muita certeza e muito
ódio no olhar dele, e Dandara parece ter sofrido um apagão por
alguns segundos ou talvez ela quisesse morrer, Lucca. Há essas
duas opções conflitando em minha mente. Quando ele destravou a
arma, eu precisei atirar... — Caralho! — Eu dei um tiro no braço
dele, e outros dois capangas surgiram. Eu dei um tiro em cada um
deles, e aí Dandara reagiu, me puxando para corrermos. E aí...
— E aí?
— Nós brigamos — diz envergonhada.
— Brigaram?
— Rolamos no chão... eu me sinto envergonhada por isso,
mas porra... que mulher difícil! Passamos por um monte de merda e
ela gritando que eu tirei você dela. Eu joguei algumas coisas na cara
dela no calor do momento. Não me orgulho, Lucca. Não sou mulher
de rolar no chão com outra, principalmente por conta de um homem,
mesmo que eu o ame. Mas a adrenalina estava demais. Antes de eu
conseguir me soltar da cadeira, sentia que estava prestes a
desmaiar. Depois, quando me soltei, parece que uma fera tomou
conta de mim. A adrenalina foi no alto e... dei tiros em três homens,
briguei com Dandara. Surtei, eu acho.
— Você apenas se defendeu e defendeu Dandara. Se uma
das duas não tivesse tomado partido, as duas estariam mortas
provavelmente. Então, você não surtou, você se defendeu, salvou a
pele de vocês.
— Lucca, a possibilidade de Dandara querer morrer está me
assombrando. Não acho que ela teria coragem de se matar, mas ela
teria coragem de ficar na mira de uma arma e pedir para apertarem
o gatilho. Ela está sofrendo muito com tudo isso. Você consegue
enxergar? — Suspiro.
— Consigo, Paula. Mas, o que posso fazer? Estou tentando
ter um bom relacionamento com ela e já solicitei um
acompanhamento psicológico, porque sei que ela precisa muito, até
eu estou precisando. Porém, a única coisa que posso oferecer a ela
é a minha amizade, a minha dedicação para ajudá-la. Eu não sinto
nada por Dandara mais, foram dois anos sem nem mesmo vê-la.
Sentia mágoa, mas estou tentando reverter isso. Estou tentando
voltar a sentir carinho, retomar a admiração, porque ela é uma
mulher incrível. Eu sei que ela é incrível, mas não a amo — explico.
— Eu não sou louca de estar falando num sentido de um
envolvimento emocional, senhor Lucca. — Sorrio agora, porque ela
até mesmo levantou o tom de voz. — Eu disse no sentido de
precisar de ajuda apenas.
— Oh, bom! Pensei que estivesse me empurrando, me
convencendo a dar uma terceira ou quarta chance para Dandara.
— Nem fodendo! — exclama, e eu vou buscar a lasanha,
juntamente com uma latinha de refrigerante. Fico observando-a
comer e sinto um enorme alívio por todos terem saído ilesos desse
inferno. Acho que nunca tive tanto medo. Medo por acontecer algo
com Dandara e nosso filho ficar sem a mãe, medo de acontecer
algo com Paula e eu perdê-la, medo de Henrico perder a mãe, medo
de tudo. Não desejo para ninguém viver isso.
Sei que Victor já entrou em contato com nossa família toda e
com a família de Paula, mas, mesmo assim, me pego enviando
mensagens para eles, dizendo que estamos bem.
Quando Paula termina de comer, colocamos a louça na pia e
vamos tomar banho. Primeiro escovamos os dentes, em seguida
começo a preparar um banho relaxante para nós dois. Enquanto
coloco a banheira para encher, ela se despe e prende os cabelos
em coque engraçado. Acho que enquanto a marca vermelha não
sair do seu rosto, vou sentir dor todas às vezes que olhar.
A observo nua e quase perco a capacidade de respirar. Ela
sorri e se acomoda na banheira, faz um sinal para eu me juntar a ela
e retiro minhas roupas. Me acomodo na banheira e minha diabinha
me abraça forte, deitando sua cabeça em meu ombro; parece
exausta física e psicologicamente.
— Você é tão bonito, bebê Lucca — sussurra.
— Você é tão linda, Paula. Por dentro e por fora. Sua beleza
interior é tão grande, que deixa a exterior ainda mais reluzente. —
Ela sorri.
— Tive medo de que algo ruim acontecesse. Medo por não
ter te falado antes.
— Falado o quê? — pergunto.
— Que eu te amo — diz, levantando a cabeça e olhando em
meus olhos. — Eu te amo. — A beijo de surpresa e ela ri com os
lábios grudados aos meus.
— Você é motivo — digo sorrindo. — Não sei a quanto tempo
te digo isso, mas, desde a primeira vez sempre foi um "eu te amo"
disfarçado.
— Você é o motivo então... — ela diz sorrindo.
— Somos o motivo um do outro — concordo, passando as
mãos em seu rosto. — Quero me casar com você. Dessa vez para
valer. — Ela abre a boca em choque e eu acho que também estou
em choque agora. Quero me casar com essa mulher. Ela é o
motivo!

Humberto está me levando para um hotel. Estou no fundo do


poço de uma maneira que nem consigo enxergar um fio de luz.
Nunca fui amiga da fraqueza, na verdade, sempre fui a maior
inimiga dela. Mas, cheguei no auge da minha fragilidade de forma
que não estou conseguindo mais me manter de pé.
A Dandara que criei está sendo desconstruída um pouco a
cada dia, é assustador, irritantemente assustador. Há mais ou
menos uma hora atrás eu fui capaz de enxergar que perdi tudo. Só
não perdi meu filho porque Deus teve piedade de mim, ou Samuel
teria ido também.
Não consigo expressar a grandiosidade da dor que senti
quando Lucca esmagou Paula em seus braços. Não adianta, sou
humana, e aquilo doeu como se um punhal estivesse perfurando
meu peito, por mais que eu já soubesse do relacionamento dos dois.
A forma como ele olhou para ela, o desespero dele dentro do
avião quando estávamos vindo para o Rio de Janeiro... o que eu
poderia querer? Sumi por dois anos, escondi um filho dele, e
gostaria de encontrá-lo disponível me esperando? Sou tão estúpida.
E, o pior de tudo, aquela mulher parece alma gêmea de Lucca, e eu
só convivi com ela por poucos minutos. Ela é durona, protetora,
parece colocar o bem das pessoas acima do próprio bem, não há o
mínimo de egoísmo nas atitudes dela e... ela me salvou da morte.
Por alguns segundos eu quis que Diógenes apertasse o gatilho só
para eu parar de sentir todas as dores e todo o grau de inferioridade
ao qual me encontro, enquanto aquele homem esteve com a arma
apontada para mim, eu nem mesmo pensei em Samuel. Só queria
que ele apertasse e acabasse logo com isso. E o que acontece? Ela
atira nele, mesmo se cagando. Atira nos capangas e sai plena,
como se estivesse acostumada a fazer isso todos os dias. E ela é
tão ridiculamente bonita, e forte...
Mesmo após a última conversa com Lucca, eu alimentava a
esperança, em minha mente eu dizia a mim mesma que tudo isso
iria passar e que eu iria reconquistá-lo. Hoje eu vi que isso não vai
acontecer, que é até mesmo inútil tentar, porque vi duas pessoas
que se completam bem diante dos meus olhos. O passado lindo que
perdi... é isso. Lucca agora ficou no passado, e eu preciso apenas
compreender isso, fixar a verdade em minha mente.
Fiz tantas coisas erradas durante tantos anos, tudo na
tentativa de não me sentir inferior como eu me sentia. E o que
adiantou cometer tantos erros se no final eu acabei me sentindo da
maneira que mais temia? Certos erros não valem a pena ser
cometidos. Busquei conquistar o meu espaço, o meu respeito, mas
foi da pior maneira possível. A sensação é angustiante, porque dá
uma vontade louca de voltar no passado e escolher caminhos
diferentes de lidar com os julgamentos, com o preconceito. Seria tão
mais bonito, teria me livrado de todas as coisas ruins que passei.
Sinto tanto por ter magoado Lucca, tê-lo abandonado. Acho
que pela primeira vez odeio a mim mesma por todos os rompantes
de fúria e por toda a impulsividade. Me odeio por não ter tido a
capacidade de agradecer aquela mulher, me odeio por ser egoísta e
por estar sentindo inveja por ela ter o homem mais incrível que já
conheci.
Lucca foi o primeiro homem que me envolvi sem qualquer
interesse. O primeiro que foi real, verdadeiro, e que eu pude ser
verdadeira também. E eu não consigo conter a dor agora... eu
queria implorar a ele, mas não posso porque no fundo, bem no
fundo, eu sei que ele merece alguém que seja tão boa e tão pura
como ele consegue ser. E ele já encontrou essa pessoa.
— Chegamos — Humberto avisa, e eu nem sei onde estou.
Tudo que sei é que estamos em um estacionamento. — A trouxe
para a minha casa porque você precisa se alimentar e está abalada
o bastante. Estou preocupado, Dandara.
— Não sinta pena de mim, por favor — peço chorando. —
Sinta tudo, menos pena.
— Vamos lá. Você precisa comer e descansar um pouco. —
Ele sai do carro, dá a volta e me ajuda a caminhar rumo ao
elevador. Humberto é um grande amigo de Lucca e
consequentemente se tornou um grande amigo meu quando morei
com Lucca. É bom ter alguém para me ajudar hoje, isso me mostra
que sozinha não me basto, como sempre achei.
Quando chegamos no apartamento dele, eu me sento no sofá
e apoio minha cabeça nas mãos.
— Quer conversar? — ele pergunta.
— Não sei como corrigir meus erros. Não sei por onde
começar a mudar. O que devo fazer? Tudo que faço por conta
própria dá merda e não consigo corrigir. Faço estragos irreparáveis
na vida das pessoas.
— Primeiro passo é reconhecer que errou, Dandara. O
segundo é parar de se culpar por tudo e parar de pensar tão pouco
sobre você. É triste vê-la se auto transformando em uma vilã. Você
cometeu erros sim, mas não é uma vilã, é apenas uma pessoa que
erra, como todas as outras.
— Aquela Paula não erra.
— Pare de se comparar. É claro que ela erra, mas cada
pessoa comete erros diferentes na vida. Não há como comparar
erros. Você tem que focar em si mesma, parar com esse negócio de
comparar a grama do vizinho e cuidar da própria grama. Há uma
mulher extremamente forte dentro de você, todos sabemos disso.
Não aceito vê-la de joelhos, chorando pelos cantos, não combina
com quem você é. Precisa aceitar que Lucca seguiu em frente, e
que você tem que seguir também. Diógenes deixará de ser a
sombra em sua vida e poderá recomeçar, retomar sua carreira,
arrumar um namorado ou sexo casual porque é importante foder. —
Eu consigo rir. — Eu sou muito sincero.
— Eu sei.
— Mas é a verdade. Siga sua vida, sozinha ou
acompanhada, mas se reconstrua, seja a juíza fodona que passa
pelos corredores ganhando olhares de respeito, admiração e até
mesmo de temor. A Dandara juíza é incrível. Pegue de volta o
controle da sua vida, mas de uma maneira saudável, sem atropelar
o mundo, sem a impulsividade que é a grande responsável pelos
seus erros. Lucca e você não estão juntos mais como um casal,
mas estarão juntos como pais e amigos. Você pode achar que não
tem ninguém no mundo, mas há várias pessoas que te admiram,
que torcem por você, que te têm como inspiração. Você me tem
como amigo e se quiser posso te dar algumas chicotadas, você
ficaria perfeita.
— Humberto... — Sorrio novamente, entre lágrimas.
— Você é incrível, enxergue isso e pense que agora deve dar
um passo de cada vez, sem atropelar o mundo. A mudança que
quer e precisa não acontece do dia para a noite, meritíssima. Há
muito mais pessoas torcendo por você do que se pode imaginar.
— Cometi muitos erros, Humberto. Tenho vergonha de mim
mesma agora.
— Não tenha. Use seus erros como lição para não cometer
novos erros, ok? — Balanço a cabeça em concordância. — Pegarei
uma roupa minha para você, toalha de banho, o único problema é
que não há um único produto de mulher nesse apartamento.
— Está tudo bem, obrigada mesmo. Muito obrigada pelo
apoio e me desculpe por ser difícil de lidar em situações de
desespero.
— É realmente difícil, mas nada que eu não consiga lidar ou
domar. Sou dominador de BDSM, posso usar isso em situações fora
do quarto também — diz sorrindo, e me abraça. — Você é incrível,
enxergue isso, meritíssima.
— Está bem. — Ele se afasta por alguns minutos e volta
trazendo tudo que preciso.
Entro no banheiro social e me dispo, encaro a minha imagem
no espelho e engulo a seco quando sinto dor por olhar para a
mulher diante dos meus olhos. Eu não quero ser ela mais, quero ser
diferente, quero ser uma pessoa melhor, quero que meu filho se
orgulhe de mim e que eu mesma possa me orgulhar de quem sou.
Tão bonita por fora, tão feia por dentro...
Lucca está dormindo. Dormi também, porém, meu sono foi
um pouco tumultuado, de forma que acordei e não consigo voltar a
dormir.
A coberta saiu de seu corpo, revelando um lindo homem de
cueca boxer, extremamente gostoso. Eu acho que amo esses
pelinhos em seu peitoral. Na verdade, eu tenho certeza sobre isso.
Sinto vontade de lamber cada pedacinho dele e... Nossa, o que
estou pensando? Acabei de passar por momentos de terror e estou
pensando em sexo.
Suspiro voltando a deitar minha cabeça no travesseiro, mas o
sossego dura muito pouco e eu me pego virando de lado, apenas
para observar Lucca, seu rosto é perfeito que beira ao inacreditável,
até o nariz do ser humano parece ter sido desenhado. Porém, o
mais chamativo é a boca, seus lábios são perfeitos... e eu me pego
louca de vontade de beijá-lo e de senti-lo tocar meu corpo. Percebo
que estou louca quando me pego pressionando as pernas
fortemente, nem mesmo o ar-condicionado está sendo útil agora.
Uma vez ele me disse que feliz é o homem que tem uma
mulher que o acorda para o sexo. Pondero sua frase agora e me
aproximo mais, disposta a fazê-lo imensamente feliz. Mentira, neste
momento estou pensando apenas na minha necessidade, mas ele
vai gostar também.
Deslizo minha mão pelo seu peitoral, descendo com ela até
próximo ao elástico da cueca. Passo minhas unhas levemente em
sua coxa direita e subo arranhando-o. Um som rouco escapa dele, e
eu deixo minha mão descer até seu pau. Sorrio quando ele começa
a despertar e começo a manipulá-lo por cima da cueca.
— Estou sonhando, não é? — Lucca pergunta, ainda com os
olhos fechados.
— Quero transar — sussurro em seu ouvido, e ele abaixa sua
cueca, como um desesperado eu diria. Ele a chuta para longe e eu
levo minha mão ao seu membro enquanto ele captura meus lábios
para um beijo. Me afasto dele apenas para ficar nua e meu corpo
queima com o olhar que recebo.
— Olhe para esses seios! Eu amo esse coraçãozinho entre
eles.
— Me come? — Um simples pedido, e ele está sobre meu
corpo, pedindo passagem entre minhas pernas. Há uma tortura
inicial, onde ele apenas me beija, prendendo minhas mãos acima da
cabeça. Eu me remexo sob seu corpo, implorando apenas com
meus movimentos. Sinto que ele está indo me dar o que quero
quando o maldito celular toca, levando-o a afastar nossos lábios.
— Se fosse em qualquer outra situação eu ignoraria a
ligação, mas, diante dos últimos acontecimentos, preciso atender,
Paula. É só um intervalo comercial, já voltamos com a programação
— brinca, se afastando e descendo da cama. Ofego vendo a
maneira confiante com a qual ele anda nu, indo em busca do
telefone. Também, do que ele teria vergonha? É tudo tão
incrivelmente perfeito e generoso, que é claro que o homem vai
possuir confiança total em si mesmo. Sem contar, que não é apenas
a beleza do corpo e a generosidade do seu incrível pau. Ele é
seguro porque sabe fazer uso de cada atributo que possui. E como
sabe... meu bebê Lucca me dá os melhores orgasmos da vida e
estou ansiando por alguns agora.
Porém, sinto minha libido desaba quando ele volta ao quarto
com uma cara nada boa.
— Ok, me diga o que houve dessa vez — peço, sentindo meu
coração acelerar.
— Diógenes está morto. — Ouvir isso faz todo meu sangue
desaparecer. Eu atirei no homem e ele está morto. Eu o matei? Sou
uma assassina? — Calma.
— Eu o matei? — pergunto, começando a chorar.
— Não. Apenas fique calma e me deixe explicar — ele diz, se
sentando na beirada da cama. — Alguém entrou no hospital e o
estrangulou. Não foi o tiro. Todos nós temos que ir para a delegacia.
Nos tornamos suspeitos, vamos ter que depor, um rolo doido, mas
não foi você quem o matou. Você perdeu toda a cor do rosto, Paula.
Vou pegar um pouco de água. Talvez eu tenha dado a notícia de
uma maneira não muito legal. Estou nervoso — diz, passando as
mãos pelos cabelos. — Me sinto um merda agora por estar aliviado
com essa notícia. Dandara e meu filho estão livres daquele
desgraçado. — Ele pega a cueca e a veste. — Me desculpe,
Diabinha, por ter dado a notícia assim.
— Se eu tivesse o matado acho que nunca mais teria
sossego mental na vida, Lucca.
— Eu sei. Mas, teria sido em legítima defesa.
— Sei que sim, mas... acho que deve ser pesado demais
carregar uma morte nas costas, principalmente quando você é uma
pessoa boa — argumento. — Quero que isso acabe logo, quero que
passe um mês desse episódio.
— Está acabando, agora realmente está. Eu gostaria de ficar
na cama com você, mas não podemos nos dar a esse luxo agora.
Tudo bem?
— Tudo bem. Preciso de um banho, estou sem roupas
limpas.
— Pegaremos sua bolsa com Victor, e iremos até seu apartamento
para pegar roupas limpas — diz.
Todos depomos, e agora estou em uma sala com Dandara e
com o delegado que está responsável pelo caso. Dandara solicitou
todas as imagens do circuito interno das câmeras de segurança do
hospital e estamos sentados, analisando.
Por algum motivo eu sei que ela suspeita de quem pode ter
matado Diógenes. Há mais coisas escondidas nessa história, coisas
que não me foram repassadas em nenhuma conversa. Ela até
mesmo tem um tipo de perfil que está procurando pelas imagens.
— Vou deixá-los por alguns minutos e voltarei — o delegado
avisa, ficando de pé e sai, deixando-nos a sós.
— O que você ainda não me contou, Dandara? — pergunto a
ela. — Há mais alguma coisa que eu precise saber? — Ela suspira
frustrada. — Por que parece que você desconfia saber quem matou
Diógenes?
— Porque desconfio. Não foi apenas eu quem fui ameaçada
todos esses anos. O advogado que me envolvi também foi, sei disso
mesmo não tendo qualquer contato com ele desde que a situação
foi descoberta. Diógenes me disse que ele nunca mais teria sossego
na vida, e acredito que tenha cumprido a promessa. Eu deveria ter
matado Diógenes na primeira oportunidade.
— É esse advogado que está procurando nas imagens? —
pergunto.
— Sim. Ele se chama Robert Peleteiro. Diógenes não era o
tipo que costumava colecionar inimigos, Lucca. Então Robert é o
único suspeito em quem consigo pensar. Quem além de nós dois
iria querer matá-lo?
— Essa situação é tão insana, Dandara — comento. — Mas,
se foi esse Robert, acho que eu deveria agradecê-lo, porque ele
acaba de tirar um enorme peso das minhas costas e da sua
também. Agora vocês estão devidamente livres, você poderá
retomar sua vida, nosso filho estará mais seguro.
— Sim — diz cabisbaixa. — Retomarei a minha vida.
— Estou torcendo por você, Dandara. Serei o primeiro a te
aplaudir.
— Vamos ao que de fato interessa. — Ela limpa algumas
lágrimas e passa a fixar o olhar na tela do computador. Me sinto mal
por vê-la sofrer, me sinto muito mal mesmo, mas não tenho como
mudar isso.
Ficamos pelo menos meia hora olhando, até que ela acha
algo. Voltamos a imagem da câmera umas doze vezes e ela dá um
tapa na mesa.
— Eu disse! — Ela fica de pé. — Robert! Foi ele! Isso me
deixa infinitamente mais tranquila, porque tira todos vocês da lista
de suspeitos. Graças a Deus! Agora só ficarei depondo por mais
umas duas horas, por conta de Robert. Isso é um inferno, Lucca,
mas está acabando.
— Vou providenciar um voo para o pessoal voltar a BH e
iremos mais tarde, ok?
— Você pode ir. A Barbie moda e magia deve precisar de
você — diz, rodando pela sala, eufórica pela descoberta.
— Você vai chamá-la de Barbie mesmo?
— Ela se parece com uma Barbie, não é ofensa ou bullying, o
que posso fazer? — argumenta.
— Precisamos conversar. Não posso simplesmente entrar em
um avião e deixá-la, temos muito o que conversar, sobre moradia,
sobre Samuel, sobre todas as coisas. — Ela pega uma pasta sobre
a mesa e me entrega. Nela há um testamento de Diógenes, onde
ele deixa todos os bens para ela.
— Desde que me casei com Diógenes me tornei herdeira
dele. Não vou fazer uso de todas as coisas, vou doar, sei lá, não tive
tempo de pensar, Lucca. Mas, a casa dele, outros imóveis que ele
possuía aqui no RJ e até fora do país, estão também em meu nome.
Eu só preciso decidir o local ideal onde Samuel tenha espaço,
segurança e que seja perto de você. Não quero que ele fique
afastado do pai e da convivência familiar, acho que podemos adotar
uma guarda compartilhada, se você estiver de acordo é claro.
— É tudo o que mais quero na vida, e agradeço por isso.
Podemos cria-lo de uma maneira feliz e saudável, Dandara. — Ela
para de andar, puxa uma cadeira e se senta de frente para mim.
— Me perdoe por tudo o que fiz, de coração. No momento eu
achei que estava fazendo o certo. Vivi sob pressão durante muitos
anos. Óbvio que foi por minha própria culpa, que eu fiz escolhas
erradas no passado que desencadearam tudo o que passei, mas
com você eu consegui ser tudo o que sempre quis. Eu amei você,
de verdade, mas errei por medo. Como eu já te disse, não existe
nada que eu não faria para proteger Samuel. Teria sido tão fácil se
eu simplesmente tivesse optado por um aborto, Lucca. Talvez você
jamais saberia, estaríamos juntos até hoje, e ninguém teria corrido
riscos, mas eu não optei porque o fizemos com amor, ele é fruto dos
dias mais felizes que eu já vivi, fruto do nosso amor. Preferi sumir e
tê-lo em segurança, do que destruir a coisa mais fantástica que
construímos. Foi errado do mesmo jeito, porque o escondi de
você..., mas... o que posso fazer agora? Preciso conviver com as
consequências, e por mais dor que estou sentindo e sei que vou
sentir tendo que conviver com sua nova realidade, eu irei enfrentar
pela felicidade do meu filho. Eu faço tudo por Samuel, inclusive ver
o pai dele sendo feliz com outra mulher. Mas, como eu disse, todas
às vezes que olhar para mim, saiba que eu ainda estarei amando
você.
— Meritíssima! — O delegado surge, e eu engulo a seco o nó
em minha garganta, ficando de pé.
— Vou deixá-los — agora sou eu quem digo, e deixo a sala.
— E aí? — Victor diz, e eu balanço a cabeça, incapaz de
dizer nada. — Está tudo bem?
— Onde Paula está?
— Na lanchonete aqui em frente, com Humberto — explica.
— Descobriram algo?
— Foi o ex amante de Dandara. Robert Peleteiro. Ele
também foi ameaçado por Diógenes.
— Por que saiu estranho dali?
— Porque não sei lidar com a dor de Dandara, não sei lidar
com algumas coisas que ela fala, porque há dor em tudo, em todas
as palavras. Nunca gostei de fazer pessoas sofrerem e sinto que
estou fazendo isso agora.
— Você não tem que se sentir mal, nesse caso. Não tem que
anular sua vida porque vivê-la intensamente causa dor à outra
pessoa. Ações e reações. Você seguiu em frente, está feliz com
Paula e não tem culpa por Dandara sentir dor com isso. Você foi o
melhor que pôde ser para Dandara enquanto estiveram juntos, fez a
sua parte, Lucca. Não se sinta culpado por seguir em frente, irmão.
Ela vai superar em algum momento, ainda está recente.
— Obrigado por compreender sem eu precisar dizer tudo —
digo, abraçando-o. — Meio que estou me sentindo culpado por estar
feliz com Paula. Não havia me sentido assim até minutos atrás, mas
quero que isso passe logo.
— Vai passar.
— Eu sei que vai — falo, batendo em seu ombro. — Só
vamos conseguir ir para BH a noite, não é isso? Iria providenciar um
voo para agora, mas acho inviável.
— Já providenciei para a noite.
— Preciso da minha garota — digo a ele.
— Em qual sentido?
— Todos. — Ele sorri, e eu estalo minhas mãos. — Me
mande uma mensagem avisando o horário do voo.
— Ok, vá.
Saio da delegacia e encontro Paula com Humberto na
lanchonete em frente. Eles estão bebendo cerveja e eu me junto a
eles.
— Cerveja?
— Estivemos muito tempo sob tensão — Paula explica.
— Nada que uma loira gelada não resolva — Humberto diz, e
leva um soco no braço por isso. — Conseguiram descobrir algo?
— Sim, mas não vou explicar agora, estou de saco cheio por
hoje — falo, bebendo cerveja do copo de Paula. — O que acha de
irmos para algum lugar? — proponho, e ela arregala os olhos, ao
mesmo tempo em que suas bochechas ruborizam.
— Ninguém entendeu esse convite — Humberto diz rindo.
— Seria deselegante deixar Humberto sozinho — responde a
mulher que acordou delirando de tesão. Apenas um jogo, eu capto
no ar. Ela gosta.
— Tenho certeza de que Humberto não se importaria.
— Talvez eu me importaria sim — o desgraçado diz, e eu
sorrio ficando de pé. Não perco tempo ao puxar Paula pelos braços
e jogá-la em meu ombro. Ela ri e eu pego sua bolsa.
Caminho até o estacionamento e só diante do carro a coloco
no chão, suas mãos se espalmam em meu peitoral e eu a grudo
contra o carro, cobrindo seu corpo com o meu. Toco seu rosto com
uma mão e a levo em seu pescoço em seguida.
— Sua mão está quente — comenta ofegante, e eu a desço
até seu seio esquerdo, apertando-o. Ela tenta me beijar e eu desço
mais, tocando sua cintura por cima da camisa e descendo mais.
Minha Diabinha retira minha mão e me empurra, sorrio quando ela
pega a chave do carro em meu bolso e entra, acomodando-se no
banco do motorista. Me acomodo ao lado dela e ela dá partida
rapidamente enquanto apenas a observo, no mais completo silêncio.
Paula quando quer me dar é uma mulher bastante decidida e veloz.
Seu destino é meu apartamento, e assim que descemos do
carro no estacionamento ela se joga em meus braços e me beija. É
assim que a conduzo até o elevador e nem mesmo me importo com
as malditas câmeras de segurança. Grudo minha namorada contra o
espelho e a beijo de uma maneira nada delicada. Só a solto quando
o elevador para. Duas senhorinhas entram e nos olham de maneira
estranha, devido ao fato de eu estar a mantendo presa.
Me afasto e nem sei dizer a cor que o rosto de Paula está
agora. As senhorinhas descem no quarto andar e eu a pego
novamente.
— Isso foi constrangedor — diz rindo.
— Constrangedor será receber um telefonema da portaria
assim que eu começar a te comer como pretendo. — Ela geme.
— Sua boca é tão suja quanto é possível.
Quando o elevador chega à cobertura, a arrasto pelo corredor
a fora. Ela vem rindo, mas seu riso morre assim que estamos dentro
do apartamento, porque eu jogo tudo que está sobre a mesa no
chão de uma só vez e a pego pela cintura, fazendo-a se sentar.
Retiro minha camisa, chuto meu tênis, minhas meias, retiro
minha calça, minha cueca e vejo minha Diabinha lamber os lábios.
Ela salta da mesa, me empurra até a parede decidida. Gosto dessa
atitude. Sorrio quando ela lambe meu peitoral e vem descendo até
meu pau. Fecho minhas mãos quando a provocação começa. Ela
envolve uma mão em torno dele e lambe a glande de leve,
provocando, me fodendo em não o chupar.
— Meu pirulito preferido. Lollipop! — diz num sussurro.
— Então me chupe como um pirulito, enfie tudo em sua
boca.
Agarro seus cabelos e a forço, ela obedece ao meu
comando, levando em sua boca e me deixando louco. A boca dessa
mulher é a coisa mais perfeita e vê-la em torno do meu pau me
excita o bastante. Gosto de observá-la levá-lo lento, mas não hoje.
Eu impulsiono sua cabeça para frente e para trás, a vejo quase
fazer vômito, sem clemência. Ela acompanha os movimentos e usa
sua mão para ir me masturbando. Quando estou prestes a gozar, a
retiro abruptamente, fazendo-a fica de pé.
Sua respiração está uma bagunça, como se estivesse sem
fôlego. Retiro suas roupas, e a deixo nua para mim. Senti
saudades.
Levo uma mão em seu rosto e a puxo para mim, beijando sua
boca, mordendo seu lábio inferior, lambendo cada pedacinho de
seus lábios deliciosos. Sem afastar nosso beijo, a coloco sentada
sobre a mesa e a faço abrir bem as pernas. Deixo sua boca e chupo
cada um de seus mamilos, em seguida enterro minha cabeça em
suas pernas, de uma só vez.
Sua buceta molhada é um convite tentador para o meu pau,
mas sou um amante generoso e gosto de chupá-la. Meus lábios se
molham com a excitação, a resposta de que ela quer isso, tanto
quanto eu quero. Deslizo dois dedos em sua entrada, os sons dos
gemidos ficam mais altos e eu quero fazê-la gritar. Quando uso os
dedos e a boca, Paula perde a compostura e agarra meus cabelos.
Seu clitóris inchadinho parece tremer, eu sinto sua buceta
contraindo em volta dos meus dedos e o sugo mais forte até ter
minha Diabinha se desmanchando sobre a mesa. Me afasto e a
imagem dela deitada sobre a mesa, com o rosto tomado de tesão, é
a mais bonita que já vi. Ela sorri, mas há lágrimas escorrendo de
seus olhos também. Ela ri e chora, uma bagunça louca que me faz
querer exterminar o choro de uma só vez.
Beijo sua boca.
— Eu sinto meu gosto em você.
— Seu gosto é uma delícia, Diabinha. Eu gostaria de sentir
seu cheiro e seu sabor o tempo todo — digo. — Esse cheiro de
buceta me deixa louco.
— Me leve para a cama? — pede choramingando.
— Por que está chorando?
— Porque eu passaria por tudo novamente. Por você. — A
pego em meus braços e logo estamos em minha cama.
Me encaixo entre suas pernas e estou dentro dela de uma só
vez.
— Oh... Puta merda... Lucca Desgraçado Albuquerque...
— Era assim que você queria hoje de manhã? — pergunto.
— Sim... agora vá mais forte... — exige, trazendo suas mãos
em minha bunda, impulsionando que eu vá mais fundo e eu apenas
vou, mais fundo, mais forte, até que ela perde as forças e deixa
seus braços caírem para eu comê-la como quero.
Eu amo a tatuagem dela. Amo ver como meu pau fica bem
entrando e saindo de sua buceta, amo ver seu corpo tomado por
arrepios de tesão, amo o quanto tenho que segurar meu orgasmo
para buscar o prazer dela. É uma luta interna, onde meu corpo quer
explodir e enchê-la, enquanto minha mente quer que eu continue
fodendo minha garota em busca de todos os orgasmos dela.
Nos observar assim me leva ao limite, por isso desvio o olhar
da junção deliciosa e olho para os lindos seios balançando.
Apoio minhas mãos acima de seus ombros e fico observando
seu rosto, seus lábios levemente abertos, seus olhos brilhantes. Por
mais que eu esteja a comendo como um selvagem, ela traz suas
delicadas mãos em meu rosto e eu diminuo o ritmo. Sua boca vem
até a minha, em um beijo delicado que derruba todas as minhas
barreiras. O lento parece ser ainda mais intenso, suas mãos
deslizam pelas minhas costas e eu desço com uma de minhas mãos
para adorar seus seios.
Meu quadril tem vida própria, e nossos corpos parecem
projetados para encontrar prazer um no outro. Eu a sinto vindo
gozar e me libero dentro dela, no timing perfeito. Jatos e jatos, eu
segurei dias para poder enchê-la dessa maneira. Não me toquei, fui
forte, apenas esperando esse momento.
Decepcionante o quanto eu preciso de mais doses de Paula
para voltar a agir como um homem satisfeito sexualmente. Quero
mais, quero que ela queira mais, quero que ela peça por mim.
— Eu te amo — dizemos juntos, e começamos a rir.
— Ok, Paula, Jacinta nossa conexão perfeita pra caralho!
— Ainda posso senti-lo pulsando dentro de mim.
— E eu posso senti-la contraindo, Diabinha linda — digo,
passando as mãos em seus cabelos.
— Eu amo seu corpo esmagando o meu. Quero mais — diz,
com uma carinha travessa. Ela pede e isso me dá uma injeção de
adrenalina.
— Quero você de quatro, empinando essa bunda bem grande
para mim. Me daria assim? — Um gemido escapa de si, e eu
percebo que minha boca suja causa um efeito.

Passamos o restante do dia e parte da noite namorando.


Chegamos no aeroporto trinta e cinco minutos atrasados, correndo
como loucos pela pista. Entramos no jatinho rindo, ofegantes, e
todos já estão a bordo.
— Nos desculpe pelo atraso — digo a todos.
— O mundo acabando e o casal Barbie e Ken fodendo! Que
lindo chupão, Lucca! Seu atraso é muito justificável! — Dandara diz.
— Se não se importa, eu quero ir embora ver o meu filho. Ficaria
feliz se não atrasasse mais.
Eu penso em discutir, mas me calo. Ela está com um pouco
de razão dessa vez, eu atrasei porque estava perdido em sexo com
a minha namorada, mas também não é para tanto, foram apenas 35
minutos.
Foda-se!
Por tudo que Paula passou nas últimas horas, nosso tempo
juntos foi mais que merecido.
— Nosso filho! — é a única coisa que digo.
Olha, sinceramente, seria desumano exigir de mim uma
postura de plenitude tendo que conviver dentro de um jatinho com
meu ex visivelmente apaixonado e a namorada dele. Ok, eu entendo
todas as merdas que fiz, mas estar ocupando o mesmo espaço que
eles está me deixando louca. Eu tento desviar meu olhar, mas não
consigo. É como se eu quisesse me auto infringir dor observando a
cena, vendo o meu passado dando o mesmo tratamento que me
dava à mulher do presente dele.
Tudo bem. Já compreendi o meu lugar, e agora é seguir em
frente e eu vou! Eu vou seguir em frente, vou voltar aos tribunais,
vou viver a minha vida finalmente livre de todos os segredos que
carrego comigo. Tenho potencial, inteligência e sou forte o bastante
para superar um coração partido.
— Meritíssima, estou com medo do seu olhar — Humberto
diz baixo, próximo ao meu ouvido.
— Meu olhar é altamente inofensivo, Humberto. — Sorrio. —
Sabe? Ao menos tudo acabou. Não serei obrigada a viver sob o
mesmo teto que Lucca, tampouco serei obrigada a conviver com o
romance dele. Só de sair dessa situação sinto que será como dar
dez passos à frente. Ter ficado convivendo tão proximamente com
ele não fez me bem, ainda não está fazendo, na verdade. Quero
apenas que isso acabe e que passemos a lidar apenas com
assuntos relacionados ao nosso filho. Sei que errei com Lucca, ele
merece ser feliz, mesmo que não seja comigo. Mas, aposto que ele
e a namorada devem estar me criticando mesmo que internamente.
Porém, eu tenho direito de sentir ciúmes, Humberto.
— É claro que tem.
— Sou humana, da mesma maneira que cometi erros, eu
também possuo infinitos sentimentos e sou intensa para tudo. Tanto
para errar, quanto para sentir. — Ele sorri.
— E será intensa para seguir com a sua vida de cabeça em
pé. Nesse momento pode ser que seja difícil de enxergar, mas você
foi extremamente corajosa. Assumiu todos seus erros, tentou corrigi-
los da melhor forma. Não ter recuperado Lucca não significa que
seus erros não foram ou não podem ser corrigidos, significa apenas
que o caminho de vocês agora é diferente. É uma consequência por
dois anos de sumiço e bola para frente, Dandara. Haja com
praticidade agora, não é seu perfil ficar chorando pelos cantos. É
claro que dói, vai doer, você vai sentir, mas passa. Tudo passa.
— É. Juro que tentarei a partir de agora — digo, voltando a
olhar para Lucca e suspiro.
Quando chegamos em BH, há dois carros nos aguardando.
Um é especial para a namorada de Lucca, e outro para os demais.
Parece que Lucca não está indo com ela para onde quer que ela
esteja indo, ele apenas a leva até o carro, dá um beijo, se despede
e volta para o nosso carro. Eu entro no banco da frente para não ter
que ir atrás com eles, e o motorista nos leva até a casa.
Infelizmente Samuel está dormindo quando chegamos, mas,
mesmo assim, eu e Lucca vamos até o quarto vê-lo. É algo que
tenho que me acostumar, mas o nó na garganta surge sem que eu
consiga controlar.
Deixamos o quarto de Samuel sem trocarmos uma única
palavra. Eu vou até o meu quarto apenas para tomar banho e vestir
roupas limpas. Pego um travesseiro, coberta e vou dormir com meu
filho. Abraço seu pequeno corpo, sinto seu cheirinho gostoso e é o
suficiente para eu me render ao sono e dormir em paz.
Acordo no meio da madrugada assustada. Fico pelo menos
vinte minutos girando na cama até desistir e ficar de pé.
Desço para a cozinha e encontro uma visita inusitada
sentado próximo ao balcão, bebendo uísque.
— Ora, se não é a mulher mais linda que eu já tive o prazer
de conhecer na vida — Enzo diz sorridente. — Vibrando de
felicidade pelo seu atual estado civil, meritíssima. Ainda sonho
acordado com uma certa revista sua que tive a honra de ver. — Ele
se levanta e vem me dar um abraço. Por um segundo penso que ele
está vindo me beijar, mas apenas sorri e se afasta.
— Enzo, é um enorme prazer revê-lo após tanto tempo. —
Sorrio. — Acho que te acompanharei no uísque.
— Estava bebendo com Humberto, mas ele acabou de subir.
Estava indo dormir quando você desceu. Esse seu pijama é capaz
de desestruturar um homem, meritíssima, com todo respeito — fala,
olhando para meu corpo, e, de repente, me sinto nua diante da
intensidade a qual ele está me olhando.
— Oh, não precisa ficar bebendo comigo. Apenas perdi o
sono e resolvi descer para respirar um pouco. De qualquer forma
pegarei uma bebida — informo, indo pegar um copo. Sirvo um
pouco de uísque e Enzo pega a garrafa e uma arma que estava
sobre a mesa. Ele me oferece seu braço e eu o pego, vou seguindo-
o até o jardim e nos acomodamos em duas espreguiçadeiras de
frente para a lagoa.
— Soube do ocorrido. Infelizmente eu estava de férias na
Califórnia, não pude ser útil, mas fico feliz que tudo tenha se
resolvido. Cheguei de viagem essa manhã e vim direto para cá,
estou encantado com Samuel, e ele parece ter gostado de mim —
diz sorridente.
— Obrigada. Samuel é mesmo encantador. Sou uma mãe
muito babona. — Sorrio.
— E o desembargador?
— Ele está morto. Há toda uma investigação por trás, para
completar, ele deixou toda a herança para mim, não faz o menor
sentindo e isso acabou me colocando como suspeita, devido a todos
os problemas que já vínhamos enfrentando. Sorte que encontrei
imagens na câmera de segurança do hospital ou teria que contratar
um investigador — brinco.
— Eu faria esse trabalho com um imenso prazer — diz,
piscando um olho. — Não cobraria dinheiro, cobraria algo que
dinheiro não é capaz de pagar.
— Não? Cobraria o quê? — Um sorriso cafajeste nasce em
seu rosto e eu percebo que estou em meio a um flerte. Será que
todos os Albuquerque’s são assim? É pré-requisito possuir
intensidade para ser membro da família?
— Eu posso pensar em muitas coisas sujas agora, como
moeda de troca. — Uau! Esse é direto mesmo. — Me diga,
meritíssima, que dia me dará a honra de sair comigo?
— Assim? Do nada? — pergunto, me divertindo. — Quão
bêbado você está?
— Não estou bêbado, sou simples e direto. Você está
solteira, por que eu deveria pisar em ovos? Não sou o tipo de cara
que gosta de enrolação, se quero algo eu vou lá e tento a sorte. —
Ele pisca um olho e sorri.
Enzo é bem bonito. Tem um sorriso lindo e faz o tipo bruto.
Ele é bem diferente de Victor, de Lucca, de Humberto; tem um jeito
desprovido de vaidade e um modo rude de falar e agir, talvez seja
pelo fato de ser investigador da polícia federal, sei lá. É bruto desde
o modo de se vestir até o modo de se portar, nada gentleman, sem
frescuras. Quando eu morava com Lucca ele passou um dia inteiro
conosco, fora que já nos encontramos umas duas vezes na Ilha.
Tempo o suficiente para eu traçar seu perfil.
— Por que não tem uma namorada? — pergunto, e ele me
serve um pouco mais de uísque.
— Falta de compatibilidade. Lembra da garota que Lucca
estava no casamento do Victor? Então, fiquei com ela alguns
meses, mas existe algo que eu odeio em algumas mulheres,
Dandara.
— O que seria?
— Frescura, não me toque, problematizar todas as situações.
Odeio essas paradas. Gosto de mulher decidida, madura, segura,
que goste das coisas numa pegada bruta.
— Você está bêbado sim — pontuo rindo.
— Não estou — fala rindo. — Estamos apenas conversando.
Você me fez uma pergunta, estou te dando a resposta. Minha
profissão é de um nível alto de complexidade, para a pessoa ficar
comigo tem que ser descomplicada e compreender que não é
simples ser um policial investigador. Não tem horário para algumas
operações acontecerem. Às vezes estou em casa as duas da tarde
de uma segunda-feira, outras estou domingo às quatro da manhã
em alguma investigação. Mulheres complicadas começam a
inventar traição e tudo mais, é um inferno — comenta, me fazendo
rir. — E você? Por que não tem um namorado?
— Oh! Meus dois últimos anos foram muito difíceis, giraram
em torno da proteção de Samuel. Não havia tempo para me
relacionar com ninguém. Desde que voltei tenho tentado reatar com
Lucca — digo, desviando meu olhar do dele. — Não deu, alguns
erros não podem ser desfeitos e houve consequência. Ele está com
outra mulher e eu fiquei no passado, com razão, mesmo que eu
queira insistir, ele está certo. Digamos que vou retomar minha vida
assim que voltar para o Rio.
— Então? Quando vamos sair? — pergunta. Tudo que
consigo pensar é que estou enferrujada nesse lance de paquera. —
Que tal amanhã eu levá-la para conhecer um pouco de BH?
— Não sei — falo com sinceridade. — Enzo, você é primo de
Lucca. Fica uma situação meio complicada, não acha? São da
mesma família e tudo mais...
— Não acho. Eu sou o cara que gosta de descomplicar. —
Sorri. — Você está solteira, Lucca namorando, o que nos impede de
ter uma noite divertida amanhã? Ele não tem direito de se
intrometer. Uma coisa seria eu te convidar para sair sabendo que
está em um relacionamento com ele, outra é eu te convidar para sair
estando solteira. Não vai ficar sofrendo pelos cantos por perdê-lo,
não é mesmo? Se está a dois anos sozinha, podemos inaugurar
essa sua nova fase recuperando o tempo perdido. — Ele tem seu
charme e um poder de argumentação excelente. Estou
ponderando... fácil demais.
— Preciso respirar um pouco antes de ter uma noite divertida
com você — digo, bebendo o resto do líquido em meu copo. Pego a
garrafa e sirvo um pouco mais.
— Gosta de uísque, meritíssima?
— Gosto de bebidas fortes — explico, ganhando uma
encarada que quase me deixa sem graça. — Bom, essa é saideira
— informo, virando tudo de uma só vez e fico de pé. — Foi bom
revê-lo, Enzo. — Ele tem um sorriso cafajeste, e é sorrindo que fica
de pé e se aproxima.
— Gosto desse seu tipo poderosa, controladora e fujona.
Saia comigo — pede, brincando com meus cabelos. — O que você
tem a perder?
— Nada. — Sou sincera, não há nada a perder, mas... — O
que tenho a ganhar saindo com você?
— Eu posso te levar à lugares onde você nunca esteve,
meritíssima. — Arqueio uma sobrancelha em desafio, e ele dá uma
gargalhada. — Você é uma juíza poderosa. Estou curioso para
saber até onde seu poder vai, Dandara. Será que entre quatro
paredes você faz o tipo dominadora como costuma ser dentro dos
tribunais? Meu primo que me perdoe por isso, mas é algo que penso
desde a primeira vez em que a vi.
— Muito pretensioso. Esse lance de que pode me levar à
lugares onde eu nunca estive eleva o nível de exigência, policial
Enzo. Deveria saber disso, eu sou bastante exigente, talvez seja
fruto do meu poder e da minha experiência. Isso pode não ser bom
caso me decepcione. Digamos que não gosto de criar expectativas.
— Sorrio piscando um olho.
— Eu posso levá-la. — Há segurança em suas palavras e eu
começo a imaginar...
— Excesso de confiança faz mal. — Sorrio, me virando para
ir para a cozinha, e ele me puxa pelo braço. Esse homem é mesmo
ligeiro e decidido.
— Saia comigo.
— Convença-me se for capaz. — Pisco um olho e o deixo.
Na cozinha lavo meu copo.
— Meritíssima, não sou homem de dormir com um talvez, ou
é sim ou é não, descomplique a nossa situação.
— Não estamos em uma situação — digo, me aproximando
dele. Acho que estou com falta de sexo, porque estou ponderando
sair com o primo de Lucca. Isso é loucura? — Estamos?
— Você é um absurdo de bonita — sussurra em meu ouvido.
— Esse seu corpo foi criado para matar e causar a destruição. Essa
sua boca é um convite tentador o bastante, meritíssima. Nem
mesmo precisa se esforçar.
— O que está havendo aqui? — Lucca surge dizendo, e eu
me afasto de Enzo.
— Eu estava aqui dizendo para Dandara o quão linda ela é —
Enzo responde, enquanto me sinto deslocada. — Ela é sem dúvidas
uma das mulheres mais lindas que já vi. Concorda, Lucca? —
Merda. Enzo é... sem limites.
— Vou dormir. Tenham uma boa madrugada. À propósito,
Lucca, estou dormindo com Samuel. Avisando apenas para você
não achar que é um jogo de sedução caso resolva ir até o quarto
onde ele está dormindo — informo, indo até a geladeira. Pego uma
garrafa de água e quando estou andando Enzo me chama.
— Sim ou não, Dandara?
— Talvez, já disse — respondo sem olhar para trás.
— Deixa eu ver se entendi, você está dando em cima de
Dandara? — Lucca pergunta a ele, e eu não fico para ouvir a
conversa.
No segundo andar trombo numa parede de músculos e
começo a rir ao sentir o perfume.
— Trombar numa mulher desse porte durante a madrugada
faz minha imaginação fluir — Humberto diz, segurando minha
cintura. — Meritíssima, que tal conhecer meu clube de BDSM? Você
ficaria perfeita de joelhos no chão. — Sorrio.
— Acho que não faço o tipo submissa, Humberto. Nada em
mim é submissa.
— Acho que entre quatro paredes, sexualmente falando, você
tem tudo para ser uma submissa perfeita. Às vezes é bom renunciar
ao controle, isso pode ser prazeroso. Que tal uma tentativa? Irei
conduzir com um enorme prazer. Um teste, Dandara?
Qual é desses homens essa madrugada?
— Vocês combinaram isso? — pergunto.
— Quem? Combinou o quê?
— Deixe. — Sorrio. — Tenho curiosidade de conhecer seu
clube, inclusive já chamei...
— Não fale isso, esqueça-o.
— Quem sabe quando voltarmos ao Rio você não me leva
para um tour? — Sorrio.
Humberto é quente como um vulcão. Mega alto, mega forte,
extremamente bonito, completamente dominador em todas as
situações. Ele me intimida e isso é algo raro.
— Não consigo dormir, meritíssima. Que tal me acompanhar
até lá embaixo? Podemos conversar um pouco.
— Oh, não. Há Lucca e Enzo lá. Estou tentando me manter
distante de Lucca desde o voo. Não me sinto pronta para ser amiga
dele ainda.
— Em algum momento precisará estar pronta.
— Em algum momento, não agora. — Ele passa o polegar
em meus lábios e eu sinto que é o momento de me afastar. Dois
homens lindos me fazendo convites para o sexo... estou
despertando do coma induzido... — Você é tipo o melhor amigo de
Lucca.
— O respeito, mas ele está em outro relacionamento, e há
uma das mulheres mais lindas que já vi disponível. — Sorri. — Você
é maravilhosa, Dandara. Somente um tolo é capaz de desperdiçar
uma oportunidade desse porte.
Pronto! Agora me sinto fodida sem nem ao menos ter feito
sexo!
— Você também está convidando Dandara para sair? —
Lucca questiona.
— Não leve para o lado pessoal. Dandara está solteira,
continuo sendo seu melhor amigo. Amigos amigos, mulheres à parte
— Humberto diz dando dois tapas nas costas de Lucca e desce, nos
deixando a sós.
— Sou solteira, há mais de dois anos não tenho um pouco de
diversão.
— E decidiu ter com o meu primo e meu melhor amigo? —
pergunta.
— Não decidi nada. Eles me convidaram para sair e você não
tem que ficar incomodado. Cuide da sua namorada, talvez em
alguns meses estejamos num barzinho, saindo em casal. Eu,
Humberto, você e sua namorada. Ou quem sabe eu saia com Enzo
e acabe entrando para a família? De noivos à primos, Lucca, esse
mundo é surpreendente, não é mesmo? — Pisco um olho para ele e
entro no quarto.
— Deixa eu ver se entendi, você está dando em cima de
Dandara? — pergunto a Enzo, me juntando a ele.
— Isso é um problema para você?
— De forma algumas, é só uma pergunta — falo rindo, e vou
pegar um copo de água. — Desde que viu as fotos dela você ficou
ligeiramente interessado, eu vi — comento.
— Ela é uma gata, mas nunca fiz qualquer insinuação
quando estavam juntos.
— Eu sei, apenas relaxe. Só fiquei curioso mesmo. Vai ficar
de vez no Brasil ou vai continuar suas viagens loucas?
— De vez — afirma. — E como você está com toda essa
confusão?
— Antes estava sob tensão, agora estou ligeiramente
tranquilo. Me sinto mal por comemorar uma morte, mas esse
acontecimento trouxe um enorme alívio. Agora Samuel poderá ter
sua vidinha normalizada, poderei recuperar os dois anos perdidos.
Quero que ele tenha amiguinhos, estude, todas essas coisas de
criança — explico sorrindo.
— Sua nova namorada é uma selvagem, não é mesmo? —
diz, apontando para meu pescoço.
— Acho que nos excedemos um pouco. Foram dias de
tensão, adrenalina.
— Tio Theus me contou que ela foi feita de refém.
— Não gosto de lembrar, acho que nunca serei capaz de tirar
da cabeça a imagem dela amordaçada e presa. Foi desesperador.
— Quero conhecê-la — diz, tamborilando os dedos na
bancada.
— Irá conhecê-la em breve. Quero me casar com ela e não
quero esperar muito tempo — digo sorridente. — Você vai gostar
dela. Ela me lembra muito nossa avó, lembra minha mãe também.
— Tio Theus me disse e eu não quis acreditar. Agora estou
vendo com os meus próprios olhos. Achei que estivesse consumido
pela mágoa, em relação à Dandara.
— Fiz tudo o que pude para mantê-la comigo.
— Eu sei — ele diz.
— Agora torço para que ela seja feliz. Quem sabe sejamos
primos? — brinco. — Dandara é uma mulher surpreendente, Enzo,
só é um pouco complexa. Os erros que ela cometeu comigo não
anulam o fato de que ela é uma mulher incrível. Ela merece ser feliz
e eu torço por isso demais. É a mãe do meu filho. Ela não teria
voltado se não fosse por um acidente, coisas importantes foram
quebradas entre nós dois, mas agora está de volta, livre do maior
problema da vida dela. Acho que agora as coisas darão certas e o
homem que ficar com ela terá a chance de conhecer um outro lado
que eu não pude conhecer devido às interferências do passado.
— Então tudo bem eu sair com ela? De verdade?
— Para começar, eu não tenho que autorizar, Dandara é livre,
solteira. Mas, sendo mãe do meu filho, eu desejo que ela seja feliz.
Então, desde que a faça feliz, tudo bem. — Sorrio e bagunço seus
cabelos. — Vou nessa. Quando acordar nos falamos mais.
Eu subo e encontro quem? Dandara e Humberto. Por um
momento quero rir, porque é engraçado ter uma ex sendo disputada
pelo meu melhor amigo e pelo meu primo. Enzo lá embaixo, agora
Humberto. A disputa será difícil.
— Você também está convidando Dandara para sair? —
pergunto, já que tenho que passar por eles para ir até meu quarto.
— Não leve para o lado pessoal, Dandara está solteira.
Continuo sendo seu melhor amigo. Amigos amigos, mulheres à
parte — Humberto diz, me dando dois tapas nas costas e desce.
Que diabos?
— Sou solteira. Há mais de dois anos não tenho um pouco de
diversão. — Eu não me lembro de ter perguntado, mas, vamos lá.
Isso é um pouco bizarro.
— E decidiu ter com o meu primo e meu melhor amigo? —
pergunto, sondando a parada.
— Não decidi nada. Eles me convidaram para sair e você não
tem que ficar incomodado. Cuide da sua namorada, talvez em
alguns meses estejamos num barzinho, saindo em casal. Eu,
Humberto, você e sua namorada, ou quem sabe eu saia com Enzo e
acabe entrando para a família? De noivos à primos, Lucca, esse
mundo é surpreendente, não é mesmo? — Sorrio, acreditando que
agora ela voltará a viver, merecidamente. Só espero que essa
piscada de olho não signifique que ela esteja pensando que estou
com ciúmes, porque se for por isso, envolver com os dois será um
retrocesso do caralho.

— Papai!!! — um ser humano pequeno me grita, e eu o pego


em meus braços.
— Bom dia, campeão do papai. Já fez seu lanchinho? —
pergunto, e ele esfrega a barriga. Isso simboliza que sim. Aos
poucos estou pegando a linguagem de sinais que ele curte fazer. —
Vamos passear com o papai hoje? Ter um dia de garotos?
— SIMMM! — Isso quase me ensurdece e pego minha mãe
rindo.
— Dona Vic, linda demais! — digo, beijando sua testa. —
Onde estão todos?
— Na piscina.
— Quero levar Samuel para passear, vou pedir à Dandara —
informo.
— Isso! Lá na Pampulha tem um parque muito legal.
— Vou levá-lo lá e depois no shopping para comprar
brinquedos. — Sorrio, beijando meu filho e caminho até a área
externa. Quero rir quando vejo Dandara conversando com Humberto
e Enzo dentro da piscina. Me aproximo deles. — Olá, bom dia!
— Bom dia!
— Não quer entrar na piscina, filho? — pergunto a Samuel.
— Não, papai.
— Ok. — Sorrio. — Ei, Dandara, eu quero levá-lo para
passear.
— Com a sua namorada? — Será difícil essa merda.
— Não. Hoje seremos apenas eu e ele. Mas, acostume-se
com a ideia de que ele vai conviver com a minha namorada, assim
como ele vai conviver com o seu futuro namorado ou o que quer que
seja. Talvez ele já esteja até convivendo. — Sorrio.
— Vem no padrasto, vem! — Enzo brinca chamando Samuel.
— Estou na disputa — Humberto avisa.
— Posso levá-lo, Dandara? — peço.
— Sim.
— Obrigado. — Os deixo e vou até a cozinha com Samuel.
Estou com fome.
Ele fica sentado no balcão enquanto eu pego um pedaço de
bolo e um copo de Nescau. Me acomodo a sua frente e ele come
metade do bolo. Isso me faz rir.
— Você gostou desse bolinho?
— Sim, é bão — responde, arrancando de mim uma
gargalhada.
— Bão dimais, trenzinho, do papai. — Sorrio. — Papai quer
que você conheça seus priminhos. Tem o Théo, o Miguelito, a Soso,
o Tiago. Você vai amar brincar com eles, sabia?
— Soso é menina?
— É. Sophie, é a princesinha terrível da família e afilhada do
papai. Filha do tio Victor e da tia Mel linda — explico, dando a ele
um pouco mais de bolo. É bonitinho que ele não fale de boca cheia,
extremamente educado. Obra da mamãe.
— Ei, carinha, sua mamãe está te chamando lá na piscina —
Humberto surge dizendo, e Samuel pede para que eu o coloque no
chão. Ele sai correndo como uma maquininha e eu fico rindo. — Ele
é ótimo.
— Demais!
— Me desculpe por Dandara — pede, e eu arqueio as
sobrancelhas.
— Te desculpar? Por que eu teria que desculpá-lo?
— Essa madrugada você nos pegou em uma situação, e, sei
lá, fiquei com medo de magoá-lo — explica.
— Me magoou apenas a parte onde você disse que não era
para eu levar pelo lado pessoal. De resto, está tudo bem, cara —
digo. — Nunca estive em um triângulo amoroso. Se eu tivesse ao
menos ficado balançado por Dandara teria terminado com Paula.
Não levarei nada disso para o lado pessoal. Estou seguro.
— No calor do momento imaginei que tivesse ficado
magoado, por isso disse aquilo.
— Imaginou errado. Fiz uma pergunta apenas, e é muito
horrível que, o fato de eu ter tido um relacionamento com ela, me
impeça de fazer determinadas perguntas e até mesmo brincadeiras
com o meu melhor amigo. Acho que agora tudo que eu disser será
mal interpretado, não poderei brincar em relação ao envolvimento
de vocês. Isso sim é chato. — Sorrio.
— Você pode brincar comigo, vou compreender. Mas, talvez
se você brincar na presença de Dandara...
— Ela vá achar que estou com ciúmes — completo. — Prefiro
não brincar. Ela disse coisas do tipo "vai cuidar da sua namorada",
como se eu estivesse com ciúmes ou cuidando da vida dela.
— Então está tudo bem caso ela aceite sair comigo?
— É a segunda vez que ouço essa pergunta hoje — digo
rindo. — Está tudo bem, de verdade. Só cuidado para ninguém sair
machucado dessa história. Desejo nada menos que a felicidade.
Pessoas felizes são mais leves.
— Perfeito, então.
— É isso! — falo, dando um aperto de mão a ele. — Amo
você, irmão.
— Também amo você, me desculpe pelas palavras. Estava
sonolento e empolgado, as duas coisas ao mesmo tempo.
— Fica tranquilo. — Ele volta para a piscina, termino de
comer e vou buscar Samuel para se arrumar.
Tomamos banho juntos pela primeira vez, ele em meu braço,
rindo a cada vez que o enfio embaixo da ducha.
Me visto primeiro e em seguida o arrumo. É como se eu
tivesse feito isso centenas de vezes, mas, tive treino com meus
sobrinhos, por isso estou me saindo bem.
No carro, o arrumo na cadeirinha e me acomodo em
seguida.
Nossa primeira parada é na Pampulha. Eu me torno uma
criança no parque de diversões, acho que mais criança que meu
próprio filho. Ele se diverte e ri o tempo inteiro. Como eu, ele odeia
maçã do amor e algodão doce, mas ama churros de doce de leite.
Após sairmos do parque, o levo para conhecer a igreja. Ele
fica deslumbrado.
— É papai do céu?
— É, a mamãe te ensinou a rezar? — pergunto a ele.
— Sim.
— Então vamos rezar juntos — digo a ele, e nos
acomodamos em uma cadeira. — Como você reza? — Ele junta as
mãozinhas em oração e meus olhos se enchem de lágrimas. É a
experiência mais foda de toda a minha existência!
— Anjinho do guarda, meu bom amiguinho, me leve sempre
para o bom caminho. Em nome do Pai, do Filho, amém. — Sorrio.
— Em nome do Pai, do Filho, do Espírito Santo, amém. — O
ensino e ele ri. — Tem mais um monte de possibilidades, sabia?
Você pode agradecer a papai do céu por ter uma mamãe, por ter um
papai, por ter uma família, por ter saúde.
— Bigado, papai do céu — ele diz de um jeito que me faz rir.
É muito fofo.
— É isso. Obrigado papai do céu, por eu ter um filho lindo,
saudável e muito especial — digo, e ele me abraça. — Eu amo
você, pequeno. Chegou do nada e é a pessoa mais importante da
minha vida, parte de quem sou. E talvez você não esteja
entendendo nada do que estou falando. — Sorrio. — Mas eu amo
você, filho, muito.
— Te amo, papai Lucca.
— Agora vamos ao shopping almoçar e brincar mais? — Ele
topa.
Passamos o resto do dia no shopping, ele se acaba de
brincar, compramos brinquedos, até um pouco mais de roupas, e já
é noite quando saímos do shopping. Ele está dormindo quando
chegamos em casa, por isso, deixo as compras no carro, o pego no
colo e sigo com ele diretamente para o quarto.
Dandara arruma a cama para que eu possa colocá-lo e retira
os tênis. Sorrio pelo fato dele nem mesmo se mover.
— Uau, o que fez com ele? — ela pergunta rindo quando
saímos do quarto.
— Foi um dia doido. Ele brincou pra caralho, se divertiu,
comeu que cheguei a ficar preocupado. Foi um bom dia.
— Eu gostaria de te mostrar algo no escritório. Está muito
cansado?
— Não. Vou apenas pegar algumas coisas que comprei e
deixei no carro, te encontro no escritório.

Dez minutos depois estou no escritório com Dandara,


sentado ao lado dela, a vendo digitar incansavelmente no notebook.
Imagens dela grávida surgem e eu a encaro em busca de
respostas.
— Fui uma merda com você, Lucca, uma grande merda. Te
abandonei, fui cruel, uma boa filha da puta mesmo antes de
engravidar. Está tudo certo, já pontuamos essa parte, mas sempre
soube que devido às minhas escolhas você não teria uma
convivência com Samuel, ao menos no início. Eu gravei todas as
primeiras vezes dele, todas as pequenas conquistas. A primeira vez
que ele ficou sentado, a primeira vez que engatinhou, o primeiro
dentinho, as primeiras palavras, os primeiros passos, o desfralde...
Não alivia e tampouco substitui, mas... se você quiser ver, está tudo
aqui. — Engulo a seco, sem coragem para assistir.
— Agradeço por ter feito isso, mas não me sinto
emocionalmente preparado para ver isso. Tenho medo do que vou
sentir assistindo tudo, tenho medo de sentir mais raiva, mais mágoa.
Eu quero me mande isso, para quando eu me sentir devidamente
preparado para ver. Pode fazer isso? — Ela balança a cabeça
positivamente e limpa algumas lágrimas dos olhos. — Não se sinta
mal.
— Me desculpa por toda dor. Não tem nada a ver com nosso
relacionamento agora, mas me sinto mal por ver mágoa em relação
à Samuel.
— Eu o amo, ele é a melhor coisa que já aconteceu na minha
vida — digo.
— Mas eu errei o privando de acompanhar tudo e isso eu
nunca serei capaz de me perdoar.
— Se perdoe, porque eu estou caminhando para perdoá-la.
Não temos como voltar atrás, mas ao menos você acaba de me dar
mais um presente. Em breve irei me sentar em um local, sozinho, e
irei assistir tudo, cada detalhe. Acho que será importante ver
sozinho. Vamos superar essa fase, ok?
— Ok. Obrigada por ser o homem mais incrível que eu já
conheci. E, novamente, perdão.
— Está tudo bem. — Sorrio. — Deixei as compras no quarto
do Samuel. Se quiser dar uma olhada...
— Pode deixar. Bom, era só isso. — A abraço.
— Obrigado por ter gravado os momentos do nosso filho.
É ruim estar longe de casa, hospedada na chácara da família
de Lucca com toda a minha família e Pablo.
Passar uma noite aqui foi tranquilo, mas nessa segunda noite
eu já me sinto inquieta o bastante e não consigo dormir. Foi um
pedido de Victor até obterem a confirmação de que todos estaremos
cem por cento seguros.
É meia noite quando Lucca me liga e atendo no primeiro
toque.
— Olá, Diabinha. Ainda acordada?
— Estou inquieta, não consigo dormir. Falta muito para
voltarmos para o Rio? — pergunto.
— Não, acredito que em dois dias estaremos de volta à
rotina. Você sabe, aquela rotina onde saio do trabalho desesperado
apenas para roubar um beijo e ir embora. — Sorrio.
— Queria um beijo roubado, estou com saudades ainda.
Quero dormir abraçada com você, daquele jeito esmagador.
— Acho que vou aí roubar esse beijo e esmagá-la — diz. —
Vou roubar mais que um beijo... consigo pensar em outras coisas.
— Você está tão safado, Lucca — falo, me acomodando na
cama. — Isso me deixa safada também. Sua safadeza tem conexão
direta com a minha.
— Vamos trepar gostoso?
— Como Samuel está? — Ele dá uma gargalhada com a
mudança abrupta de assunto. Ele já sabe o motivo de eu fazer isso,
é sempre quando não há a possibilidade de irmos em frente com o
plano. Não sou a garota sexo virtual, embora já tenhamos trocado
algumas fotos bem íntimas.
— Ele está bem. Passamos o dia todo brincando, ele chegou
em casa desmaiado, acordou alguns minutos para comer e voltou a
dormir. E Henrico?
— Está bem. Está se aproximando um pouco mais do pai,
tem sido satisfatório. Ele está dormindo com minha mãe essa noite.
Acho que ontem o agarrei muito — comento rindo.
— Inveja boa desse garoto sortudo. Pablo que nasceu pelo
cu já fez mais alguma declaração?
— Algumas. Todas ignoradas com sucesso, bebê Lucca.
— Acho bom, senhorita Paula. Jacinta como fico nervoso
com essa situação — diz em tom de brincadeira, mas sei que está
falando sério. Conheço esse bebê que de bebê não tem nada.
— Não consegue dormir?
— Não, todas às vezes que fecho meus olhos eu te imagino
nua. Aooooo Luan Santana!!! Segura essa moda! — Esse homem
tem o dom de me fazer rir. — De galinha eu tiro pena, de peixe eu
tiro escama, de você eu tiro a roupa e te levo para a minha cama ao
som de Luan Santana! Aooo Paula... te quero demais o tempo todo.
— Lucca, você acredita em salvação? — pergunto séria.
— Acredito. O que está havendo? Mais uma mudança louca
de assunto, menina Paula?
— Então me salva dessa solidão, seu gostoso.
— Aoooo Paula, essa você me pegou — diz rindo. — Não
sou medida provisória, mas te resolvo na hora.
— Finge que é recurso adesivo e gruda em mim essa noite,
doutor Lucca.
— Me chama de cláusula contratual que te mostro meu
encargo. — Minha gargalhada ecoa pelo quarto.
— Queria seu encargo...
— Quanto você queria? — pergunta, me fazendo sorrir.
— Muito.
— Aguarde que eu tô chegando... — O louco encerra a
ligação e eu me pergunto se ele está vindo mesmo. Lucca deveria
ser estudado. Se ele cisma com algo simplesmente faz, assim, do
nada.
Fico no quarto uns vinte minutos e desço para a área externa
da casa. Está frio, bem no estilo Minas Gerais de ser. Subo para
pegar um casaco, desço novamente.
Aqui é tão diferente de estar em uma cidade grande. Não há
um único barulho, exceto o som gostoso dos grilos. Chega a dar um
pouco de medo por estar no meio do nada, por mais lindo que seja.
O céu está estrelado, mas a visão daqui é ainda mais fantástica
devido a escuridão, é como se pudéssemos tocar as estrelas.
Ouço um som de um carro distante e dou um tapa em minha
testa quando percebo que estou agindo como uma adolescente. É
surreal sentir o coração disparar e até mesmo tremer de ansiedade.
Coisas que somente Lucca é capaz de despertar em mim.
Conforme o som vai se aproximando, começo a morder meu
lábio inferior e estalo meus dedos. Por um momento penso em sair
correndo para ver se estou devidamente apresentável, mas acabo
deixando de lado.
É então que o carro surge, Lucca estaciona e desce. Alto,
imponente, lindo demais. O sorriso que ele dá me faz suspirar como
uma boba apaixonada, e antes que possa controlar me jogo em
seus braços, sentindo a deliciosa sensação de proteção e lar.
Me pego cheirando seu pescoço, beijando sua bochecha e
sorrindo.
— Eu acho que estou muito apaixonada por você — digo,
apertando-o. — Como posso sentir tanta a falta de alguém como
sinto de você? Eu gostaria de ficar nos seus braços para sempre e
nunca mais sair deles.
— Para sempre assim? — pergunta.
— Não existe sensação melhor, nem mesmo um orgasmo —
digo sorrindo.
— Posso te provar que um orgasmo pode ser tão bom
quanto. Vamos passar a madrugada em algum lugar? Te trago de
manhã cedinho. — Um sorriso cresce em meu rosto.
— Que lugar? — pergunto, brincando com seu cordão.
— Um bom lugar.
— Quero! — Ele me carrega até o carro. Me acomodo no
banco e logo Lucca está do meu lado, dando partida.
Ele acelera com força na estrada de terra, levantando poeira,
todo trajeto é silencioso e ele parece perdido em pensamentos.
Levo um susto quando de repente ele faz uma derrapagem e freia o
carro.
— O que houve? — pergunto, e ele aperta o volante com
força.
— Acho que não sou romântico. — Arregalo meus olhos não
compreendendo.
— Você é completamente romântico.
— Não tenho paciência, sou impulsivo e não consigo esperar
o famoso "momento certo" — argumenta, sem olhar para mim.
— Você acredita nesse momento certo? Acredita que as
coisas só devem ser executadas em um momento certo? —
questiono curiosa e apreensiva.
Ela é psicóloga, ela!
— Acreditei nisso até conhecer você e querer atropelar o
mundo. Olha onde estamos... em uma estrada de terra do local
onde grandes casamentos aconteceram na família. Victor se casou
aqui, meus pais, meus avós.
— Uau! Há uma capela aqui?
— Sim, linda por sinal. — Ele não solta o volante. — O
momento certo somos nós quem fazemos, não é isso?
— Eu acredito que sim, mas posso estar sendo lerda agora,
porque simplesmente não estou entendendo o porquê de estarmos
parados em uma estrada de terra tendo essa conversa.
— Você é o motivo — diz, olhando para a estrada. — E talvez
eu não tenha dito seu real significado para a minha vida.
— E você quer dizer agora? — pergunto sorrindo.
— Quero. Não é romântico, não é mesmo? Não há
champanhe, não há glamour, não há um ambiente bonito, um jantar,
ou qualquer coisa do tipo. Mas, há verdade, há eu, você, o céu, as
estrelas, uma estrada de terra e mato.
— Há tudo de mais perfeito então. — Sorrio. — O que mais
eu poderia querer?
— Você já ouviu sobre aquele lance de amor da vida e amor
para a vida?
— Sim — respondo pensativa.
— É e não é sobre isso o que tenho a te dizer, porém, uma
coisa leva à outra — fala. — Acho que nós seres humanos
confundimos muito esse lance de amor, até mesmo nos iludimos
sobre isso. Nos apegamos à ilusão e acabamos sofrendo. Daí,
quando o sofrimento vem, acabamos culpando as pessoas sendo
que os únicos culpados somos nós mesmos. Somos culpados pela
ilusão que criamos, culpados por insistirmos em algo que desde o
começo se mostra completamente errado, culpados por alimentar as
dores, por insistir em enxergar o amor onde ele nem mesmo existe;
culpados por exigirmos que as pessoas sejam o que esperamos que
elas sejam, culpados por forçar encaixes que não existem. — Ele
está falando sobre Dandara e eu estou quase chorando. Lucca está
indo terminar comigo... é o que tudo indica e eu não estava mesmo
preparada para isso. — Porém , somos covardes muitas das vezes;
é mais fácil responsabilizar pessoas pela nossa dor do que assumir
que fomos nós que criamos expectativas demais, nós quem
exigimos algo que a pessoa não estava preparada para dar, nós
quem inventamos um amor que não existiu. É tão fácil dizer eu te
amo, tão malditamente fácil, e, quando escutamos isso, passamos
por uma mudança interna surreal, nos apegamos a essas três
palavras de forma quase doentia. Do mesmo modo que é fácil dizer
eu te amo, é fácil acreditar que somos amados ao ouvir isso.
— Entendo, Lucca. — Meu Deus, não quero me desesperar
diante dele. Sempre fui tão forte sobre relacionamentos, mas, por
que a perspectiva de o perder me desestrutura tanto? Esfrego meu
rosto e luto forte contra a vontade de agarrá-lo e implorar para que
pare de falar coisas que podem a vir me ferir... ele vai... ele vai
terminar. Foram muitas mudanças em pouco tempo, isso tudo o
deixou confuso... pelo amor de Deus! Estou ficando fria.
— Não, você provavelmente não está entendendo, apenas
me deixe falar.
— Estou te ouvindo.
— A maioria das pessoas não têm responsabilidade
emocional e saem dizendo eu te amo como se essas palavras não
tivessem um significado tão grande e não tivesse o poder de
transformar vidas e momentos. E elas transformam. Essas palavras
iludem, salvam, estragam, consertam... Alguns dizem isso de forma
sincera e verdadeira, outros dizem por mero engano, por
confundirem um gostar com o amor; e há aqueles que dizem essas
palavras com a vontade real de iludir e se aproveitar da
vulnerabilidade das pessoas. E aí entra o que quero dizer; sempre
fui muito carente, muito emocional. Minha mãe diz que sou uma
versão mais intensa do meu pai, eu sempre fui o emocional da
família, aquele cara que se doa e que muitas das vezes é feito de
idiota pelas pessoas. Eu me apego ao carinho tão fácil, inclusive, já
fui até vítima de tentativa de golpe de uma mulher. — Ele sorri. —
Ela era linda, tinha uma filhinha e pegou que eu era cem por cento
passional. Me apeguei até à filha dela, até Victor me provar que a
garota não valia absolutamente nada.
— Nossa...
— É. Eu achei que gostava muito dela, mas com o tempo vi
que não, e surgiu Dandara. Aquela mulher era um grande desafio.
Parecia tão inalcançável, e aquilo mexeu comigo. — Merda...
— Não sei se quero ouvir mais — digo, permitindo que as
lágrimas caiam.
— Me deixe falar, por favor, é difícil pra mim. Somos amigos
acima de todas as coisas.
— Mas eu... — Ele coloca um dedo sobre a minha boca e
volta a apertar o volante.
— Sou muito iludido, Paula. — Ele sorri. — Aquele desafio
mexeu comigo e quando ela cedeu, eu agarrei com unhas dentes.
Eu era um idiota completo para aquela mulher, sabia? Não me
arrependo, Paula. Acho que não devemos nos arrepender, porque
tudo que passamos na vida contribui diretamente para o nosso
amadurecimento. Dandara parece toda errada, mas tivemos
momentos incríveis, de verdade. Quando ela se permitia abrir as
barreiras, ela era sensacional, só que sempre fomos completamente
diferentes. Eu era quente emocionalmente, ela fria e impessoal.
Houveram alguns momentos onde ela foi contaminada com a minha
quentura, mas, depois que nos separamos, bem antes de eu
conhecer você, eu passei a ver nossa relação com mais clareza e
consegui enxergar que ela se esforçava para caber em mim, mas
simplesmente não conseguia. Sou carinhoso, sou fofo — diz rindo.
— Gosto de um cafuné, de dormir abraçado, de brincar, tomar umas
biritas e cantar moda de viola, gosto de pés no chão, de
simplicidade. Já ela gosta de imponência, de salto alto, de
sofisticação. E é um direito dela gostar disso, é um direito dela ser
fria muitas das vezes. E eu acho que o que mais me levou a sofrer
foi enxergar isso, enxergar que foi uma luta que eu travei sozinho
noventa por cento do tempo, enxergar que eu me auto iludi. Fiquei
dois anos sozinho, desiludido real e sem acreditar em qualquer
mulher. E, acredite, eu nunca havia me desiludido antes, nunca
havia perdido a fé em relacionamentos. Sempre fui o cara de
arriscar e de me levantar após todas as quedas, mas aquela mulher
me derrubou forte, porque eu nunca havia me doado tanto a alguém
como me doei a ela, nunca havia criado tantas ilusões. — Não estou
entendendo mais nada.
— Aham...
— Aham, Paula? — Ele sorri. — Las Vegas, baby. O que uma
pessoa que mora no bairro ao lado do meu foi fazer em Las Vegas?
Por que essa pessoa foi deixada no altar e foi curtir a lua de mel
sozinha em Las Vegas? Por que diabos eu não te encontrei em
algum tribunal da vida ou até mesmo na praia? Moramos tão perto e
fui te encontrar em Las Vegas.
— Eu...
— Você é o motivo. Estava magoado com relacionamentos
quando te conheci. Não acreditava em qualquer mulher nessa vida.
Iria seguir solteiro, de verdade. A ideia de voltar para o Rio e
retomar a minha vida parecia aterrorizante. Eu estava sendo
pressionado pelos meus familiares a voltar e não tive escolha, então
fui me despedir da minha temporada de férias na Califórnia
passando os últimos dias em Las Vegas. Aí surgiu uma loira muito
louca no saguão do hotel gritando ao telefone. — Ele sorri. — Você
foi enviada para mim, eu tenho certeza disso e ninguém nunca será
capaz de quebrar essa minha convicção. — Limpo minhas lágrimas
e tento respirar fundo. — Então, senhorita Paula, quando eu mais
estava desesperado com a possibilidade de voltar ao meu país de
origem, você se tornou o maior de todos os motivos para eu fazer
isso. Você fez a perspectiva de voltar ser algo bonito.
— O motivo...
— É, e aí começamos a sair, eu percebi que o cara passional
estava bastante vivo em mim, porque a cada vez que eu te via, você
tornava um pouco mais o motivo de eu querer seguir em frente e me
entregar a um novo relacionamento. Você é o motivo de eu querer
correr todos os riscos.
— O motivo... — repito sorrindo.
— Você é tudo e todas as coisas que busquei, mesmo
quando não estava buscando nada. Complexo, eu sei, mas é
exatamente isso. Eu nunca soube o que estava buscando uma vida
inteira até encontrar você. Você é o motivo de todas as minhas
buscas valerem realmente à pena, porque você é o meu encaixe. E
é pés no chão, bebedeira, cantoria, chão moiado, brincalhona e tem
as piores cantadas do mundo — diz sorrindo. — Aoooo Paula, você
é a mulher mais foda que eu já conheci em toda a minha vida e é
como a mulher maravilha. — Agora eu choro forte. — Sabe aquele
amor que se multiplica?
— Não faça isso...
— Quem nunca sonhou em ter isso na vida? — ele diz, e
segura meu rosto. Lágrimas escorrem em seus olhos também e eu
tento limpá-las. — Sonhei com isso a vida toda. Além de ser o super
herói do meu filho, eu quero ser o herói de um alguém nosso, quero
ter a mulher maravilha ao meu lado todos os dias. Você é o amor da
minha vida, e o amor para a minha vida. Já me peguei questionando
o motivo de ter demorado tanto tempo para eu poder encontrá-la,
mas é sobre momentos. O nosso momento é agora.
— Você não vai terminar comigo? — Ele franze a testa.
— Quê?
— Você disse sobre enganos... e tal... e...
— Eu tive muitos enganos na vida, mas você é a minha maior
certeza. Nois é foda demais.
— Quê? — pergunto rindo.
— O mundo conspirou para destruir o nosso romance
mutante nas últimas semanas. — Eu sou louca por toda essa
loucura. Num momento ele está todo sério falando coisas
importantes e eu estou quase tendo um infarto, no outro ele está
bagunçando a porra toda e me fazendo rir com letras de músicas
sertanejas. — Nós pode até brigar por nada, mas depois que a raiva
passa não tem espaço pra mágoa. Eu estou voltando para essa
chácara pra buscar essa menina que roubou a minha paz. A
parceria é daquela, se não mata, aleija. Nós é foda demais. Nós
curte, cê pira, se envolve. Nós vira, não dorme, nós é foda demais.
Reprise, repete, nós pode. Nós bebe, nós é foda demais. Você é
maluca e eu sou o rei do virote. Meu Deus, ai que sorte, nós é foda
demais. E se nós junta no início da noite, e vinte quatro por doze.
Você é melhor amiga pra beber. Você é minha conselheira no amor.
Você é o melhor motivo pra dizer que a diversão apenas começou.
Você é o meu tempero no rolê, é quem faz acontecer... O resto você
nem vai entender... Aooooo Paula, por onde for quero ser seu par.
Case-se comigo. — Ele pega uma caixinha no bolso, e eu levo
minhas duas mãos à boca quando revela um anel de noivado.
Meu Deus! Estou muito além de chocada, muito. Inclusive
estou apertando meus olhos firmemente agora só para abri-los e
fazer uma verificação sobre ser real ou fruto de um sonho.
Felizmente, quando os abro, percebo que é real. A parte ruim é que
estou quase desmaiando e não consigo tirar as mãos da boca.
Se essas não foram as palavras mais lindas que já ouvi em
minha vida... Oh meu Deus!!! Isso é tudo tão real!!! Quão boa eu fui
para poder receber um presente desse porte? O homem mais
fantástico que já conheci quer se casar comigo!!!
— Você está me matando com seu silêncio — ele protesta,
dando um lindo sorriso e eu perco a força dos meus braços
deixando-os cair.
— Eu vou desmaiar.
— Não vai não. — Sua mão toca meu rosto num carinho
gostoso. — Não desmaie. Diga sim. — A docilidade do seu pedido
quase me faz suspirar.
— Mas é óbvio que sim! Você acha que eu sou tola de dizer
um não? — Ele sorri, e eu crio forças para abraçá-lo. — Você é
como o melhor sonho da minha vida. Eu mal consigo falar agora...
não esperava por isso tão cedo.
— O momento certo...
— O momento mais que certo — afirmo entre lágrimas. — É
real?
— Me deixe colocar o anel em seu dedo para tornar mais real
do que realmente é. — Ele segura minha mão e estou tremendo
enquanto o vejo deslizar o anel em meu dedo. Acho que ficarei
chocada por pelo menos um mês com esse pedido e essa
declaração. Eu nunca havia sentido tanta verdade e tantos
sentimentos através de palavras.
Assim que o anel está por completo em meu dedo, Lucca
pega minha mão e a leva até sua boca, deixando um beijo casto.
Sorrio e chega o momento dele capturar meus lábios.
— Vamos voltar ao propósito inicial desse passeio? —
sugere, quando se afasta.
— Eu já nem me lembro qual era o propósito — confesso
sorrindo. — Estou inebriada, Lucca Albuquerque.
— Não precisa se lembrar. Irei conduzi-la, confie em mim. —
Ele pisca um olho, liga o carro e seguimos rumo onde quer que ele
queira ir. Vou o trajeto inteiro olhando para o anel em meu dedo...
Só saio do sonho quando Lucca abre a porta do carro para
eu descer, então percebo que estamos na porta de um famoso hotel
de BH. Ele entrega a chave do carro ao manobrista e seguimos até
a recepção, onde ele pede uma suíte. Nem estava vestida para esse
evento, mas, foda-se.
Minutos depois estamos em uma suíte incrível e eu encaro
meu agora noivo. Nem tive o prazer de tê-lo como namorado... Isso
me faz sorrir.
— Por que parece tímida? — ele pergunta sorrindo, se
sentando na cama e retirando os tênis. — Aoooo Paula, vamos
acordar?
— Sim, vamos. Você não vai me deixar no altar, não é
mesmo? — brinco, mas ele parece levar a sério. Do nada ele está
de pé, diante de mim, tocando meu rosto.
— Não sou maluco, nem mesmo idiota — diz sorrindo. —
Estou certo do que quero, Paula. Completamente certo. Agora retire
essas roupas, vou encher a banheira para namorarmos.
Um gemido escapa de mim, mas não de tesão dessa vez.
Lucca sorri, compreendendo como se conhecesse cada parte de
mim e todas as minhas reações. É um gemido de satisfação pela
minha atual situação; algo que me faz pensar em como era chata a
minha vida antes de Lucca, e sem querer me faz fazer comparações
de um relacionamento para o outro. Eu nunca tive tudo isso que
estou tendo com Lucca, desde que ele entrou em minha vida tenho
passado por mudanças constantes. Deixei de ser a mulher da
praticidade emocional, para me envolver até o pescoço com esse
homem. E, agora, estou pensando na perspectiva de dividir um teto
com ele, com meu filho. Como será morar com esse homem? Como
será lidar com o nosso passado e nossos filhos, juntos?
Sinceramente, existem muitos casos como o nosso, mas isso é algo
que nunca passou pela minha cabeça viver.
Estou empolgada, mas receosa, porém, feliz. Será que
alguém consegue entender essa frase que acabei de pensar? Ela é
simples, porém, complexa.
Só sei que Lucca enche a banheira, volta nu e eu ainda me
encontro parada no mesmo lugar.
— AOOOOO PAULA!!! — seu grito me faz saltar, e ele me
pega em seus braços, me girando pelo quarto. — Vamos acordar,
bebê? Temos uma porrada de coisas para resolver e você ainda
está vestida.
— Aooo... — digo, e então começo a rir, escondendo minha
cabeça em seu pescoço. — Somos mesmo noivos? — Ele me
coloca no chão e caminha confiante até um frigobar; pega duas
latinhas de cerveja, as abre e volta até mim. Fico rindo quando ele
me entrega uma e nos faz cruzar os braços para bebermos juntos.
Isso deveria ser com champanhe, mas se fosse não seria nós.
— Pela força do ódio, amém, Paula! Nosso noivado foi
firmado nesse momento. Agora tira essa roupa, mulher, antes que
eu fique com ressentimento...
Deixo a cerveja sobre uma mesa e me desfaço das minhas
roupas. Lucca fica de pé, observando cada um dos meus
movimentos e bebendo sua cerveja. O olhar dele queima meu
corpo, e é quase hipnótico. Meus mamilos estão rijos e eu observo o
corpo dele reagindo ao meu. Eu chego a franzir a testa observando
seu membro crescendo, ganhando vida. Quando movo meu olhar,
encontro Lucca sorrindo.
— Isso foi engraçado — justifica.
— Isso é meio mágico, não? — questiono, prendendo meus
cabelos em um coque frouxo.
— A magia está em sua nudez, um belo estímulo, Paula. E a
varinha está comigo — ele diz, me puxando pela cintura.
— Varinha? Não acho que seja uma varinha — digo sorrindo,
e beijando seu queixo. — Vamos namorar.
— Estou tentado a deixar o namoro para depois e ir direto
para o sexo — comenta sorrindo. — Mas, serei um bom noivo. —
Me desvencilho do seu aperto e vou pegar a cerveja, em seguida
nos acomodamos na banheira.
É engraçado dividir uma banheira com Lucca, ele é muito alto
e suas pernas ficam dobradas.
— Por hotéis que façam banheiras maiores e acessíveis —
digo rindo.
— Em nosso quarto mandarei fazer uma sob medida. —
Deus! É muito real mesmo! Nosso quarto... nossa senhora! Eu me
viro de frente para ele e jogo minhas pernas sobre suas pernas. Ele
me puxa para frente de uma só vez e eu bato em seu peito. — Aooo
pegada violenta! Quando vamos nos casar?
— Vamos ser sensatos neste momento. — Ele sorri.
— Por que eu sabia que você diria isso?
— Porque você me conhece — respondo sorrindo. —
Primeiro você precisa estabilizar uma rotina com Samuel.
— É meu foco, mas isso não anula os meus outros propósitos
— explica. — Meu foco principal é Samuel, mas quero me casar
com você. Não quero esperar muito tempo.
— Quais seus planos, bebê Lucca?
— Buscar uma casa em um local seguro, que seja adaptável
à Henrico e Samuel, que tenha espaço para fazermos mais crianças
e termos conforto. Se possível, se estiver de acordo, eu quero me
casar com você no Cristo Redentor, quando o sol estiver se
despedindo. Uma recepção simples, apenas para os familiares.
— Eu acho perfeito! — exclamo em concordância, sendo
tomada por uma empolgação repentina. — Bom, eu quase me casei
uma vez. Conheço serviços de buffet, fotografia, acho que isso
facilita um pouco as coisas. Não quero um casamento cheio de
pessoas, prefiro que seja mais intimista mesmo, para nossos
familiares. É muito desgastante organizar um casamento gigante. É
real?
— Se você me perguntar isso mais uma vez... — ameaça,
apertando minha cintura e dou uma gargalhada sentindo cócegas.
— Oh merda!
— Não desvie meu foco, Paula Jacinta. — Sorrio. — Lua de
mel? Eu gostaria de conhecer a Finlândia.
Nós passamos o resto da noite planejando o casamento,
rindo e bebendo. Não transamos e voltamos para casa de táxi.
Começamos bem!
DIAS DEPOIS
Voltei para a antiga casa onde eu morei com Diógenes. Ela
agora está passando por algumas modificações, nada exorbitante,
mas apenas para mudar um pouco. Estou transformando um quarto
em brinquedoteca para Samuel, há também um quarto sendo
devidamente reformado para meu pequeno e estou modificando
meu antigo quarto por completo. É uma obra rápida, há uma equipe
boa trabalhando para fazer os ajustes mais rapidamente. Enquanto
isso, Samuel está passando uma semana com o pai. Porém, o vejo
todos os dias. Graças a Deus Lucca é um ser humano maleável.
Por falar nele... me surpreendo quando, no início da noite, o
interfone toca e o vejo pela câmera de segurança. Ele está sozinho,
não está com nosso filho e isso me deixa ligeiramente curiosa.
Libero sua entrada e logo ele surge na sala.
— Olá! — Me cumprimenta.
— Ei, está tudo bem com Samuel? — pergunto, e ele sorri.
— Sim, ele está no meu apartamento com Melinda e as
crianças, brincando. Quis aproveitar para vir conversar com você.
Tem um tempinho?
— Tudo que mais tenho tido é tempo. — Sorrio. — Não
retornei ao trabalho, a casa está um caos devido as obras. Estou
entediada — explico, guiando-o até o sofá. — Sente-se. Quer algo?
Uma água? Um suco? Um banho?
— Oh! — exclama rindo. — Bem-humorada, meritíssima?
— Aprendi com o melhor. — Sorrio me acomodando no sofá
diante dele. — Bom, o que te traz aqui, Lucca Albuquerque?
— Samuel — informa. — É aniversário dele em breve. Ele já
teve alguma festa? Acredito que não.
— Não teve, apenas um bolinho meu e dele — respondo.
— Então, estive pensando que seria interessante fazermos
uma festa. Quero muito comemorar o aniversário dele. Será o
primeiro que passo com ele, estou empolgado por isso. — Balanço
a cabeça em concordância. — Você está de acordo?
— Estou. Quero que ele saiba como é bom ter um
aniversário, quero tudo que o faça feliz. — Suspiro. — Pensei sobre
o que você falou em relação a escolinha. Também estou de acordo,
acho que podemos começar as buscas. Será importante para o
crescimento dele. Podemos procurar juntos?
— É claro! Eu faço questão de estar com você na busca pelo
melhor para o nosso filho.
— Perfeito.
— Bom, sobre a festa, estava pensando em fazer na Ilha. Lá
tem espaço para brinquedos infláveis, e tudo mais que uma criança
possa querer em uma festa. Acho mais legal do que alugar um salão
de festas e ficarmos trancados em um cômodo por quatro horas.
— Samuel vai se apaixonar pela Ilha. Gosto da ideia, Lucca.
Podemos olhar decoração e tudo mais.
— Você poderia ficar com essa missão? Eu olho o restante,
Victor já é experiente nisso e vai me ajudar. Se quiser, Melinda
ficaria muito feliz em ajudá-la em busca da decoração perfeita. —
Balanço a cabeça em concordância.
— Perfeito, vamos fazer acontecer.
— Obrigado por isso. Estou feliz por estarmos unidos por
nosso filho, Dandara. Feliz por estarmos tentando uma amizade.
— Eu continuo amando você, mas entendi que acabou. Já
disse. Todas às vezes que olhar para mim... não se esqueça. — Ele
sempre fica mudo quando eu digo isso. — Bom, quer ver como o
quarto de Samuel está ficando?
— Adoraria. — Ele fica de pé e o levo pela casa. Ele vai
olhando todas as modificações até chegarmos ao quarto do nosso
filho. — Uau!
— Essa parede será uma parede de escalada — explico.
— Isso é fantástico pra caralho! Quando fica pronto?
— Acho que em três dias. Estou com saudades do meu bebê.
— Ele me encara e dá um sorriso.
— Por falar nisso, não quero que ser intrometido nem nada,
entendo que vocês só tinham um ao outro, mas é importante ensiná-
lo a dormir no próprio quarto. Sabe disso, não sabe? Para o
crescimento dele.
— Sei, ele irá dormir no quarto dele. É algo que tenho que
trabalhar em mim mesma. Ele está super bem com você, ou seja,
não é um apego tão grande dele em dormir comigo. A apegada no
caso sou eu, e entendo que não é saudável.
— E a terapia?
— Sabe que tem sido até interessante? Apenas estou com
um pouco de dó da terapeuta por ter que ficar ouvindo minhas
tragédias — digo rindo. — Eu encho a cabeça da mulher. Temo ser
expulsa a qualquer momento.
— Mas é bom poder desabafar, não é?
— É, principalmente com uma pessoa que não tem qualquer
tipo de vínculo comigo, não me conhece e não vai me julgar. Acho
que é por isso que sempre saio do consultório me sentindo
infinitamente mais leve.
— Também me sinto assim. — Lucca também está fazendo
terapia. — A propósito... — Não o deixo terminar.
— Já encontrei a terapeuta para Samuel. Ele vai começar em
breve, estou esperando apenas a rotina se ajustar.
— Precisamos conversar sobre todos os demais ajustes,
guarda e tudo mais.
— Eu acho que podemos discutir isso entre nós mesmos.
Acho que não precisamos estabelecer parâmetros. Confio em você,
acho que confia em mim como mãe. Nós dois temos uma boa
condição financeira, estamos tentando ter um bom relacionamento.
Acho que é bom para Samuel o arranjo que estamos tendo. Não vou
impedir de buscá-lo ou vê-lo, acredito que também não vá fazer
isso. Enxergo que o mais saudável para Samuel é uma criação
compartilhada. Se quiser, podemos até registrar esse acordo, mas
aí vai da sua vontade.
— Bom, você já paga um plano de saúde. Quero arcar com
os custos do colégio, todo o restante vamos ajustando então. Confio
em você como mãe do meu filho. Sei que se arrependeu por tê-lo
escondido, assim como sei que quer o melhor para ele. Podemos
manter esse arranjo, Dandara. Vamos compartilhar a criação do
nosso filho. — Ele sorri e eu retribuo, mesmo arrasada por dentro.
— Perfeito.
— Bom, vou nessa então. Vamos nos falando, ok? Obrigado
por tudo. — Ele me abraça e eu o levo de volta a sala, o seguindo
até a saída.
Como juíza eu deveria adotar uma postura diferente sobre a
questão da guarda, mas, não quero complicar nada. Não mais.
Samuel merece apenas o melhor e sei que o melhor para ele é ter
os pais o criando com harmonia e felicidade. É o mínimo.
Quando Lucca se vai, me pego chorando mais uma vez,
como sempre. Encho uma taça com vinho e me jogo no sofá,
consumida pela culpa e pela dor. A pior sensação é saber que só o
perdi por minha culpa, e saber que ele seguiu em frente de uma
maneira bastante decidida.
Estou na metade da garrafa quando meu celular toca e o
nome de Enzo surge na tela. Respiro fundo e atendo.
— Alô...
— Meritíssima, já decidiu parar de me enrolar? — pergunta
direto e reto, como sempre.
— Enzo...
— Não estou no clima — diz imitando minha voz, e até me
faz rir. — Abra a porta. Como eu sabia que diria isso, resolvi me
adiantar. Abra ou vou pular o muro. Tenho um preparo físico
invejável, sabia? Vamos lá, Dandara, vou contar até cinco para
abrir.
Eu não me movo do sofá. Não gosto de facilitar as coisas
para ninguém e gosto de desafios. Encerro a ligação e espero. Eu
conto de um a cinco e ouço o barulho de um salto, em poucos
segundos Enzo está em minha sala, dando um sorriso cafajeste.
— Gosta de desafios, Dandara? — pergunta. — Desafios me
deixam excitado.
Estou reunida com Vic, Ava e uma cerimonialista. Nosso
encontro está sendo em uma cafeteria no shopping e eu me
encontro perdida, descobrindo coisas que não existiram na minha
primeira tentativa de casamento.
Estava tudo indo bem demais até que Dandara surgiu. A
presença dela não me incomoda, mas a dor estampada em seu
rosto me faz um mal imenso. Estou numa situação que nunca
imaginei estar, sabendo que a minha felicidade contribui para o
sofrimento de uma outra mulher. Isso é algo que terei que aprender
a lidar, porque eu me sinto extremamente mal todas às vezes que a
encontro.
Assim que ela se vai, eu não consigo mais me concentrar na
cerimonialista que está me mostrando uma série de coisas.
— Eu não consigo mais fazer isso hoje — confesso. —
Podemos continuar um outro dia? — Ela concorda.
— Claro, querida. Bom, vou deixá-las então. Ficarei
aguardando sua ligação para continuarmos o projeto — diz
simpática, enquanto Vic e Ava apenas ficam me observando.
A cerimonialista se vai e eu solto um suspiro.
— Não sei lidar — explico a elas. — Todas às vezes em que
me encontro com Dandara me sinto extremamente mal. Até me
sinto culpada pela dor dela.
— Não é uma situação agradável, Paula — Ava diz,
segurando minha mão por cima da mesa. — Não é mesmo e eu
compreendo que fique mal, mas é o que é. Lucca está com você,
quer se casar com você, não ama Dandara, ama você. Infelizmente
vai haver outros encontros e você precisa estar mais bem preparada
para isso. Não passo pano para ninguém, mas fico triste pela
situação da Dandara. Ela acha que eu a odeio, mas não. Não odeio
Dandara, odeio a forma como ela fez meu irmão sofrer desde o
início. A considero uma mulher incrível, mas completamente fria. Os
sentimentos e as vontades dela estão sempre acima de todos, e eu
nunca gostei disso — minha cunhada desabafa. — Lucca é a
felicidade da família, e eu o vi tão mal, mais tão mal... e não foi
apenas dá última vez que ela o deixou, foi desde o início. Ela largou
Lucca outras duas vezes antes do grande final, quando fugiu para
esconder a gravidez. Quando eles estavam juntos, Lucca até
mesmo se afastou um pouco da família porque a família é muito
louca para os padrões da Dandara. Ela não curte nossos programas
de maluco, nossas cachaças, nossas brincadeiras. Eles nunca
foram compatíveis, mesmo que Lucca tenha se esforçado
imensamente para isso. E, posso ser sincera com você?
— Pode.
— Se fosse você no lugar dela, ela não se sentiria mal. Eu
aposto a vida do meu filho nisso — Ava diz.
— Eu preciso concordar com a minha filha. — Vic suspira. —
O relacionamento deles foi muito conturbado, muito. Dandara tem
um jeito único de ser, é muito complexa, exigente, difícil. É
incompatível com Lucca. Me dói vê-la sofrer, mas me doeu ver meu
filho sofrer por ela. Doeu muito ficar dois anos afastada do meu filho
porque ele era incapaz de voltar para o Brasil e ter que lidar com
ela, e até mesmo com a ausência dela. Por isso, Paula, não quero
que você sofra, quero que fique feliz e que não deixe o passado
atrapalhar a fase linda que você e meu filho estão vivendo. Dandara
irá superar, irá encontrar alguém que seja compatível e que a faça
feliz. Nenhuma dor é eterna, Paula.
— Tiaaaa... — Samuel surge, e eu o pego para se sentar em
minhas pernas. Pela cara de Lucca houve um encontro
desagradável.
— Olá, pequeno, você passeou com seu pai? — pergunto a
Samuel, e ele sorri.
— Eu vi a minha mamãe. — Confirma o que eu já
desconfiava.
— Podemos ir embora? — Lucca pede. — É uma situação
extremamente fodida — ele desabafa. — Não sei lidar com o
sofrimento dos outros, é sufocante. Eu sinto muito pelo sofrimento
dela, muito, mas eu não posso fazer nada em relação a isso e não
sei lidar.
— Estávamos falando sobre isso agora — Ava comenta. —
Mas, não é o momento para debatermos mais. Há um lindo
garotinho que precisa ir brincar com o meu Théo. Que tal irmos
todos para minha casa? — Samuel desce das minhas pernas e vai
direto para Ava.
— Não poderei ir. Pablo está com Henrico, e eu preciso ir
buscá-lo — falo a eles, e ficamos de pé para nos despedir.
Lucca me leva até o meu carro e eu toco seu rosto.
— Tudo isso vai passar, ok? — digo.
— Sei que vai — diz, me puxando para um beijo. — Eu te
amo e você é o meu motivo.
— Você é o meu motivo. — Sorrio e o beijo. — Nos falamos
depois.

Quando chego na casa de Pablo, a empregada me permite


entrar apenas para encontrar ele e Henrico dormindo juntos no sofá.
É impossível não se emocionar com a cena. É tudo que eu sempre
quis para o nosso filho e estou imensamente feliz por Pablo estar
mesmo se esforçando e conquistando nosso filho a cada dia.
Pablo parece sentir a minha presença, porque, de repente,
ele abre seus olhos e os fixa em mim.
— Ei... — diz, levantando-se cuidadosamente para não
acordar Henrico. — Você está linda.
— Obrigada. Vim pegar nosso pequeno, mas... encontrei algo
inesperado — comento sorrindo.
— Deixe-o ficar essa noite? Por favor? Estamos nos dando
bem e eu o amo.
— Claro que eu deixo, ele é seu filho, Pablo. Estou feliz por
estarem assim, tão próximos. Obrigada por isso.
— Eu deveria ter sido sempre assim, você não tem que me
agradecer por algo que é minha obrigação. — Há pesar em suas
palavras. — Eu perdi você por isso, mas não quero perder nosso
menino. Quero que ele me ame e que eu seja o super-herói dele.
— Você será. — Sorrio. — Bom, então irei deixá-los, mas
preciso dar um beijo em nosso bebê antes.
Eu faço. Dou um beijo e um cheirinho em meu amor. Pablo
me leva até a porta e segura minha mão quando estou prestes a
entrar no elevador.
— Por favor, me dê apenas uma chance. Somos uma família,
eu quero muito viver isso — pede com lágrimas nos olhos. Mais
uma dor para eu lidar no dia de hoje.
— Você é um homem lindo, incrível, torço muito para que
seja feliz, mas, sua felicidade não será ao meu lado, Pablo. Está na
hora de você seguir em frente. Siga em frente, por favor — peço,
depositando um beijo em sua mão e vou embora.
Horas mais tarde resolvo sair com as minhas amigas.
— Paula, as pessoas estão começando a achar que somos
namoradas ou coisa do tipo — minha amiga Lili diz, enquanto
dançamos grudadas algumas músicas em um pub.
Faz sentido. Estamos abraçadas, parecendo num clima de
romance, mas, na verdade, estamos assim porque aproveitei para
contar a ela a loucura que vivi nas últimas semanas; chegada de
Dandara, um filho que Lucca não sabia possuir, uma breve mudança
dele de estado, o meu sequestro, e por fim, falta apenas contar
sobre o meu noivado inesperado.
— É verdade, estamos parecendo completamente
apaixonadas — digo rindo, e aperto sua bunda antes de me afastar
e voltar para a nossa mesa, onde Larissa, também minha amiga,
está nos aguardando rindo.
— Você deveria ter visto a cara daqueles homens ali quando
você apertou a bunda de Lili — Larissa comenta comigo. — Eles
agora estão tendo mil e uma imaginações.
— Foi proposital. Lili disse que as pessoas estavam
começando a achar que somos lésbicas — explico sorrindo, e vejo
meu celular acender na mesa. É uma mensagem de Lucca.
"Só para te lembrar que sou possessivo e ciumento pra
caralho; estou arrependido do vale night, Paula. Jacinta minha ira."
— Aposto que é o gostoso do Lucca — Lili diz rindo. — Você
está muito patética com essa cara de apaixonada.
— Patética é o teu cu! — rebato, digitando uma resposta.
"Não há o que se preocupar... ou talvez haja. Acho que tem
alguns caras fantasiando sobre uma cena em que eu e Lili estamos
trocando suores e fluídos. Estou com tesão."
— Bom, agora eu preciso comunicar o mais surreal de todos
os acontecimentos — informo sorrindo.
— Algo mais surreal do que ser sequestrada? — Larissa
questiona.
— É — respondo, e mostro meu anel de noivado, vendo as
duas abrirem a boca.
— Porra, eu achei que era um anel normal! — Lili diz
embasbacada. — Você está noiva???
— Sim, noiva. Eu esperava um pedido de namoro, mas meu
Lucca é o tipo que não curte enrolação e é impaciente. — Sorrio em
plena satisfação. — Vamos nos casar muito em breve.
— OH MEU DEUSSS!!! — as duas gritam juntas, atraindo
demasiada atenção e então enchemos nossos copos de chopp e
fazemos um brinde.
— Pelo menos você não será deixada no altar! Pablo é um
gato, gostoso, mas ele foi um babaca em fazer isso. Está com
medo? — Larissa pergunta.
— Não estou com medo, confio em Lucca. Há apenas uma
situação me chateando: a ex dele — confesso suspirando. — Ela
voltou trazendo um filho que ele não sabia existir, como eu já disse.
Até aí tudo bem, a questão é que ela o ama e que é impossível não
ser empática à dor dela. Hoje por exemplo, eu estava em uma
reunião no shopping com a minha sogra, minha cunhada e uma
cerimonialista que minha cunhada indicou, apenas para eu conhecer
o trabalho dela, então Dandara surgiu e ela viu do que se tratava a
reunião. Eu me senti tão extremamente mal por aquilo, eu vi a
desolação no rosto daquela mulher e me doeu, sabe? Eu me
coloquei no lugar dela, e sinceramente, eu não desejo essa dor para
ninguém.
— Nossa...
— E depois Lucca surgiu desolado pelo mesmo motivo —
comento. — Até encerramos a reunião. Lucca pega as dores de
todas as pessoas para si, e, por mais que ele não a ame, ele sente
muito quando a vê sofrendo. Ele é bom em sofrer, mas péssimo em
ver as pessoas sofrendo. E eu me sinto como ele. Ver a dor daquela
mulher me abala bastante. Imagino a quantidade de coisas que ela
está tendo que lidar, até mesmo lidar com a culpa, porque se as
escolhas dela tivessem sido diferentes, ela e Lucca estariam
casados hoje.
— Entendo você, amiga, mas é algo que você precisa
superar também. Sua atitude de sentir compaixão é muito bonita,
mas não deixe isso guiar sua vida, principalmente agora. Se você e
Lucca ficarem assim, o relacionamento de vocês vai começar a
desandar.
— Eu compreendo isso. Não sou louca de permitir que isso
interfira no que eu e ele estamos construindo, mas todas às vezes
que a vejo eu me sinto extremamente mal. Queria muito que ela
superasse, que encontrasse um alguém que possa amá-la com
todas as forças, ou que apenas ficasse bem de verdade. E, talvez
eu soe patética agora, mas eu adoraria se um dia pudéssemos ter
uma relação legal, sabe? Há uma criança que será meu enteado,
seria muito altruísta imaginar uma relação amigável com Dandara?
Será que um dia conseguiremos atingir esse nível?
— Acho que sim. Só precisam de um tempo, é tudo bem
recente, não é? — Lili diz. — Apenas siga sendo a mulher incrível
que é, fazendo tudo o que faz, Paulinha. O universo trabalha para
colocar tudo em ordem. — Meu celular vibra novamente.
"Você está com tesão por imaginar uma troca de suores e
fluídos com Lili? Oh maldição, Paula! Vou esbofetear essa sua
bunda, assim que eu for buscá-la, para aprender a ser uma boa
menina. Sou ciumento até mesmo em relação a mulheres, fique
ciente disso. Você é minha!"
Respondo:
"Tesão por imaginar você dentro de mim... faz alguns dias já,
bebê Lucca. Sou uma noiva necessitada e amaria ter minha bunda
esbofeteada por você. Quero trepar com você. Me come?"
— Tudo muito recente — respondo sorrindo. — Que tal
tequila?
— ARRIBAAA!!! — Larissa grita! — Aooooo gota serena da
peste!!! — Dou uma gargalhada e solicitamos ao garçom uma
garrafa de tequila, por que sim!
Estava com saudade das minhas amigas, de fazer esses
programas de meninas.
Estou na terceira dose quando uma turma chega. Arregalo
meus olhos, em choque, assim que os olhos de Lucca encontram os
meus. Desço meu olhar para um lugar específico e me levanto para
encontrá-lo sorrindo. Há com ele Enzo, Humberto, Ava, Gabriel,
Davi e Luma.
— Olá! — Lucca diz sorrindo, e pede o garçom mais mesas.
— Meninas, espero que não se importem de nos juntarmos a
vocês.
— Sem problemas — Larissa responde rindo, babando em
meu noivo. Eu a chuto por baixo da mesa e ela faz uma careta. —
Psicopata! — Me levanto e vou cumprimentar a todos. Em seguida,
sou pega pela cintura e espalmo minhas mãos no peitoral de meu
noivo.
— Me conte mais sobre sua mensagem safadinha? —
sussurra em meu ouvido. — Estou duro com uma pedra, Paula.
Você vai pagar por isso mais tarde. — Sorrio angelicalmente e o
puxo para se sentar ao meu lado.
Sou surpreendida com Ava bebendo tequila em um copo
grande. De repente, todos estão olhando para ela assustados.
— O quê? Vocês não bebem? — ela questiona.
— Não é água não, princesa — o marido dela diz.
— Princesa é Luma. Me chame de outra coisa — exige
rindo.
— Essas são Larissa e Lili, minhas amigas — as apresento.
— Essa Lili combina com meu clube — Humberto diz,
fazendo todos rindo. — Larissa, você combina também, mas...
— Mas a Larissa ficaria perfeita com os pulsos algemados —
Enzo é quem diz agora. — Gosta de ser presa, Larissa?
— Adoraria, por favor — minha amiga sem filtro responde. —
Quer dizer, não é isso. Nunca fui presa.
— Lari, Lili, esses são Enzo, Humberto, Luma, Ava, Davi e
Gabriel — Lucca apresenta.
— Nunca em minha vida estive em uma mesa com tantas
pessoas bonitas. Só ficando bêbada para superar essa surra de
beleza — Larissa diz rindo. — Com todo respeito.
— Meu Piroca Baby é o mais lindo de todos aqui — Ava diz,
beijando Gabriel no pescoço.
— Davi é disparado o mais bonito, não há nem como explicar
essa maravilhosidade — Luma rebate bebendo um copinho de
tequila. Realmente, Davi é lindo em grandes dimensões, mas eu
prefiro meu bebê Lucca infinitamente, e por conta disso, beijo sua
bochecha.
— Eu te amo — digo, e ele me pega, sentando-me em suas
pernas. Ele enlaça minha cintura, beija meu ombro e assim ficamos
sob o olhar de todos.
Os meninos pedem tira gostos, ficamos bebendo, comendo e
conversando. Em algum momento Enzo se acomoda ao lado de
Larissa e Humberto de Lili. Eu me sinto tão feliz agora que nem sou
capaz de explicar. É como se tudo fizesse sentido, até mesmo uma
mão que está adentrando por baixo do meu vestido... ela super faz
sentido agora.
— Aqui está meio desanimado. Que tal irmos para uma
balada? — Ava propõe. Todos topam... todos menos eu e Lucca,
que sorrimos um para o outro.
— Quer ir curtir a noite numa balada, bebê Lucca?
— Consigo pensar em algo que seja mais divertido que uma
balada, bebê Paula — responde, afastando meus cabelos e
beijando meu ombro. — Estou muito interessado em um momento a
sós com a minha noiva.
— Ahhhh, vocês vão sim! — Luma grita, batendo na mesa. —
Vocês vão porque eu custo a animar para esses programas de
louco. Estamos indo, Lucca e Paula!

Meia hora depois estamos em uma boate que eu nunca tinha


vindo. Parece que é voltada ao sertanejo e músicas nacionais. Foi
Lucca quem propôs, e pelas risadas, a família dele já conhecia o
local.
É muito engraçado quando fazemos uma fila para tomar
doses de tequila, todos juntos. Pegamos outras bebidas e seguimos
para a pista de dança. Há mesas na pista exclusivas para colocar
baldes com bebida, em poucos minutos, há um balde em nossa
mesa.
Deixo de lado a tensão sexual e decido aproveitar a noite. É a
primeira vez que saio com as minhas cunhadas. Deixamos os
homens conversando e nos unimos para dançar. Larissa e Lili estão
conosco, e estamos cantando a plenos pulmões. Algumas músicas
apenas eu e Larissa sabemos cantar.
Hit Contagiante começa a tocar e eu ensino Ava e Luma os
passinhos. Sentada Braba do MC WM é a próxima e eu descubro
que minha bunda tem vida própria. Luma é mais contida, mas Ava
fica ao meu lado e dançamos juntas. Estamos distraídas quando
Melinda surge empolgada.
Ela é absurdamente linda e absurdamente jovem, você a olha
e diz que ela tem vinte anos de idade. É linda, linda e linda. Tem
cara de menina atentada, e fica visível que é todas às vezes em que
olha para Victor. Ela o olha como se ele fosse o responsável por ela
respirar e viver. É algo bonito e o relacionamento deles deve ser tão
lindo e tão quente quanto esses olhares.
— Txarammmm!!! Cheguei!!! — ela diz vindo nos abraçar. —
Sugar Daddy vai surtar essa noite — anuncia, e eu olho para trás
para cumprimentar Victor.
— AOOO MELINDAAA!!! — Lucca grita. — COISA LINDA
DEMAIS.
— AOOO PAULA, MARAVILHOSA — Victor entra na zoação,
e leva um soco no braço do meu noivo. Enquanto é isso, encontro
Larissa beijando Enzo e Lili conversando intimamente com
Humberto. Eu nunca imaginei que a noite seria assim, mas está no
mínimo engraçado.
— Essa é uma boa noite para dar o golpe da barriga em meu
marido — Melinda anuncia. — Me ajudem a deixá-lo mais desligado
da vida? — nos pede.
— Eu escutei — Victor diz. — Aooo Melinda, chega de filhos.
Sophie me traumatizou. — Seguro o riso quando Melinda se
aproxima dele, brincando com sua camisa e com um cordão de
prata que descansa em seu pescoço. Tenho certeza de que esse
homem é capaz de fazer qualquer coisa que ela pedir. — Aooo
ereção constante! — Ele exclama fazendo todos rirem.
— Sugar Daddy, me dá mais bebês? — pede de um jeito
extremamente engraçado.
— Pelo amor de Deus, Melinda, quantos filhos você quer?
Vamos ali resolver essa situação!
Lucca me puxa para ele, só então percebo que a nossa
música começou. Bem, não é uma música bonita para ser a "nossa
música", mas marcou, e eu me pego rindo quando ele canta em
meu ouvido, movendo lentamente nossos corpos na parte lenta da
música.
— Te pego de jeito, mas não fica apaixonada, Paula, eu sou
romântico, safado e amanhã não venho.
— Amanhã você não vem porque irei destruí-lo hoje. —
Sorrio.
— Para falar a verdade eu acho que na outra vida eu também
te queria — cantarola uma música aleatória do nada. — Aooo Paula,
Jacinta você acordando todos os dias ao meu lado. Serei o homem
mais feliz do mundo. — Ele é tão fofo.
— E eu serei a mulher mais feliz. — Sorrio. — Por que está
bebendo pouco?
— Vim de carro, como a senhorita bem viu, além disso tenho
planos que uma embriaguez não permite executar. — Ele pisca um
olho e aperta minha cintura. — Meus pais estão com todas as
crianças e nos expulsaram de casa. Uma coisa leva a outra... não
é? Quero ser destruído.
— Quer? Quais seus planos então?
— Eles começam daqui a pouco, ali no estacionamento —
sussurra em meu ouvido.
— Ou eles podem começar agora no banheiro... — Sorrio, e
saio arrastando meu noivo pela boate.
Nada como ser alto em uma balada. Minha altura e meu porte
físico ajudam a dispersar projetos de homens que não podem ver
uma mulher; ajudam também a proteger minha garota que está há
alguns bons centímetros abaixo de mim. Aliás, me sinto no auge da
juventude, quando manter meu pau dentro da calça era algo
extremamente difícil. Eu costumava ser controlado antes dessa
diabinha loira aparecer. Ela ativa em mim ações muito imorais. Não
tenho mais idade para ir foder dentro de um banheiro de boate, mas
é isso que me encontro indo fazer.
O que detém Paula é uma música. Ela para de repente,
levanta um dedo e se vira de frente para mim. Essa mulher é louca
e surtada, é por isso que vou me casar com ela. Meu par na vida.
— Nossa música!!! — ela diz me abraçando, e só então vou
perceber a música. Começo a rir e a puxo mais perto, para
dançarmos.
— Olha o mundo conspirando, Paula — cantarolo em seu
ouvido.
— Nunca serei capaz de esquecer essa música, foi o pedido
de casamento mais lindo do universo inteiro. — Sorrio.
— Eu tenho todo um poder de argumentação e persuasão.
Vamos seguir essa música hoje à noite?
— Meu Deus, ai que sorte! — diz, me fazendo rir. — 24 por
12?
— É, isso aí. Diabinha.
— Ok, chega de romance, Lucca — fala, voltando a me
puxar.
Ofego, sabendo que a partir de agora o plano dela pode dar
muito certo, assim como pode dar muito errado. Mesmo assim me
encontro excitado e extasiado. É delicioso sentir que ela me deseja
da mesma maneira que eu a desejo. Estamos em completa
sintonia.
A questão é que, quando chegamos no banheiro,
descobrimos que é um daqueles que possuem várias cabines e ele
está ligeiramente cheio. Minha garota dirige um olhar a mim que
quase me faz rir, ela parece ter acabado de perder seu ursinho de
pelúcia favorito em uma mudança.
— Acho que seria deselegante transarmos no banheiro de
uma boate, de qualquer forma — digo, tentando distrai-la. —
Merecemos mais que isso.
— Mas é quente... eu sempre quis fazer isso.
— Então vamos correr algumas boates em busca do banheiro
perfeito. — Ela dá uma gargalhada e eu me perco em seus lábios, a
puxando para um beijo. — Consegue segurar seus desejos por mais
um tempo? — pergunto em seu ouvido, e sinto sua mão descer pela
minha calça, fechando-se em minha ereção. — Assim fica difícil pra
caralho.
— Consigo segurar — fala, batendo seus cílios.
Voltamos para o pessoal e estão todos nos olhando com uma
cara engraçada.
— O quê? Só se eu fosse um velocista e tivesse ejaculação
precoce — justifico, e risos ecoam. — Onde Davi e Luma estão?
— Atracados em algum canto — Victor diz rindo.
— Fazendo o que uns e outros não fazem — Melinda
completa a explicação, e eu seguro o riso. — Só acho.
— Continue, princesinha da Disney. Você hoje está batendo
todos os recordes. Estou anotando no meu caderninho mental.
— Isso é muito ruim — ela diz. — Você pode apagar as
anotações? Não quero ser castigada.
— Que espécie de relacionamento vocês têm? — Paula
questiona rindo. — Castigo?
— São castigos que você vai gostar de receber — Melinda,
desavergonhada, diz. — Mas, preciso fingir que são castigos ruins,
para manter as coisas quentes. A relutância é afrodisíaca quando se
trata do meu marido Sugar Daddy.
— Então eu vou começar a castigar de verdade e será
privando você de sexo, só para tornar as coisas mais interessantes
no relacionamento, manter as coisas quentes — Victor diz,
arqueando as sobrancelhas em desafio.
— Você pode tentar. Duvido, Victor, eu DUVIDO que você
fique sem transar comigo! — ela praticamente grita. — Você é um
pervertido, safado... — É, Melinda não pode beber nada alcoólico
mesmo.
— Quer apostar? Aooo Melinda, você não me desafie,
mulher!
— Eles são loucos — Paula diz em meu ouvido.
— Eles caíram da cama quando ainda eram bebês, por isso
são almas gêmeas. — Paula sorri.
— Aposto o que você quiser, Victor! — Melinda diz segura de
si.
— Se eu ganhar a aposta você vai me dar o...
— AOOO! — Entro na briga. — Vocês estão em uma boate,
só para constar.
— Ele ia dizer o... — Paula diz gargalhando. — Aooo
ressentimento!!!
— Aliás, podemos negociar essa situação? Estou ficando
com ressentimento de não ter adentrado em outra estrada. — Ela
para de rir e me encara. — Vamos nos casar, mereço gozar dos
meus direitos de ir e vir.
— Quê?
— É, não se finja de boba — digo sorrindo, e ela se afasta de
uma só vez, indo dançar com Ava. Fico rindo e pego uma cerveja no
balde.
Estou distraído quando alguém me cutuca. Olho para o lado e
encontro... Letícia. A garota que tentou me dar um golpe no
passado. A mãe da garotinha mais fofa que conheci antes da minha
afilhada Sophie.
— Lucca, faz muito tempo que não o vejo — ela diz
sorridente. Letícia é muito bonita, mas muito ordinária. As duas
coisas na mesma proporção.
— Muito tempo, talvez uns quatro ou cinco anos. Não me
recordo. — Sorrio. — Bom, morei dois anos na Califórnia, não tenho
frequentado muitas baladas.
— Me passe seu número... — pede pegando o celular. E é aí
que o furacão Paula surge.
— Olá! — minha noiva diz, estendendo a mão para Letícia.
— Oh! Olá! — Letícia responde sem graça.
— Bom, não posso chegar fazendo um caos, porque talvez
você não saiba, mas vim informá-la. Lucca está noivo e não será
possível você obter o número dele — explica educadamente, sem
fazer barraco, com uma postura impecável que eu não teria se fosse
o contrário.
— Me desculpem, eu não sabia.
— Não precisa se desculpar, tampouco se sentir mal. Você
não teria como adivinhar, por isso vim explicar. Espero que se
divirta. — Letícia sai prontamente, completamente sem graça. Paula
me dá um beijo e volta a dançar com Ava.
Estou boquiaberto agora.
— Essa é sinistra, hein? Se fosse Ava teria entortado o rosto
da garota, furado os dois olhos e quebrado o celular — Gabriel diz
rindo. — Essa Paula mete medo, viu! Essa é daquelas que faz as
paradas no talento.
— Melinda daria uma voadora, ela é dessas. — Victor ri. — A
Paula tem uma classe absurda, e é muito compreensiva, porém,
sinto que ela é capaz de esmagar alguém que ultrapassar seus
limites. Essa garota não é aquela da lancha?
— Aquela que você enfiou a língua na garganta? É ela sim —
brinco.
— Foi por uma boa causa, te salvei. Você estava todo bobo
com a filhinha dela, e a garota estava te enganando — meu irmão
justifica, e eu deixo um beijo em sua cabeça.
— Te amo.
— Aí eu vou chorar, porra! — Gabriel ri da cara dele, e leva
um peteleco na cabeça.
— Espera aí... Há um homem chegando em minha esposa
mesmo? — Gabriel pergunta, deixando a cerveja de lado.
— Iiiiii, estava demorando demais! — comento rindo, e ele vai
pegar Ava, livrá-la do assédio.
— Foda de se casar com mulheres lindas é isso. Pense num
homem que sofre? Sou eu — Victor desabafa com seriedade. — Eu
sofro todos os dias casado com Melinda. Às vezes sinto vontade de
me sentar no chão e chorar desespero, mas aí ela surge, me agarra
pela camisa e me arranca do propósito. Não tem coração que
suporte a pressão. Se eu morrer, cuide dos meus filhos, por favor.
— Cuidarei, Matheus Albuquerque versão intensificado. O rei
do drama! Isso é porque todos dizem que sou o que mais me pareço
com papai. — Sorrio e vou dar uma sarrada nervosa em Paula. Toco
sua cintura e a grudo contra meu corpo. É preciso respirar fundo
com a bunda dela se choca contra algo necessitado. Essa mulher é
a minha perdição. — Aoooo Paula, você saber por que as hienas
vivem rindo? — pergunto em seu ouvido, e ela se vira de frente para
mim.
— Não sei, mas adoraria saber.
— Porque elas fodem seis vezes por dia. — Ela ri com força,
e sou obrigado a segurar seu corpo com mais firmeza. — Quer
morrer de rir?
— A palavra dessa noite é "pernas" — diz ainda rindo.
— Pernas?
— Sim, que tal irmos num lugar privado espalhar essas
palavras? — Aperto sua cintura. Paula está jogando sujo essa noite
nas cantadas. Espalhar as pernas dela é tudo que posso querer. —
Há uma carteira em seu bolso ou é apenas sua felicidade por me ter
tão grudada ao seu corpo?
— Vou te mostrar em breve.
— Parece que você trabalha duro. Acho que tenho uma vaga
para você preencher. — Sorrio, quando ela morde o lóbulo da minha
orelha.
— Vou preencher sua vaga todinha. — Minha garota geme, e
meu pau parece prestes a criar vida e pular fora da minha calça.
— Se eu disser que trabalho nos Correios, você me deixa
pegar no seu pacote?
— Deus do céu, Paula! — digo rindo, e apertando sua bunda
sorrateiramente.
— Essa sua calça é muito bonita, posso testar o zíper dela?
— pergunta, e eu a beijo para silenciar sua boca esperta. Quando
me afasto, ela está ligeiramente ruborizada. — Bebê Lucca está
sofrendo.
— Pobrezinho. Você tem sido uma menina má. Ele precisa de
atenção, que tal sua boca encher ele todinho de beijos? — Ela
sorri.
— Se eu soubesse que ficaria tão molhada essa noite teria
vestido uma calcinha.
— Porra! — exclamo. — Você está falando sério? Está sem
calcinha, Paula Jacinta? — Não há brincadeira agora. Estou
realmente sério. Mas ela, por outro lado, está rindo.
— Meu sorriso é igualzinho o da Monalisa, é a combinação
perfeita para o seu Picasso.
— Não estou brincando agora, Paula.
— Eu deixo você me roubar, porque não é pecado roubar
para comer! Me come, bebê Lucca? — Eu nem me despeço das
pessoas. Paula me tirou do sério e eu só terei paz na minha vida
quando descobrir se ela está vestindo uma maldita calcinha.
Sigo com ela diretamente para o caixa. Arranco a pulseira de
consumação do braço dela, arranco a minha e entrego para a
funcionária.
— Isso tudo é por conta da calcinha? — a Diabinha
pergunta.
— É, e eu ficarei feliz se você estiver mentindo sobre estar
sem. — Ela sorri.
— Era apenas uma cantada. Por que eu sairia sem calcinha?
— Ok, Paula, mas agora que tal a gente fazer um filme
pornô? — pergunto.
— Senhor, sua conta. — Maldição, a funcionária escutou o
que eu acabei de dizer e está vermelha como um pimentão. Nem
confiro a conta, apenas entrego meu cartão, digito a senha e pago.
Em poucos minutos estamos fora da boate e Paula está
gargalhando incansavelmente.
— É culpa sua — digo a ela. — Essa guerra de cantadas.
— Apenas termine a do filme pornô, por favor — diz,
limpando lágrimas dos seus olhos. — A cara da mulher foi
impagável.
— Que tal a gente fazer um filme pornô, Paula? A gente nem
precisa gravar nada.
— Vamos gravar?
— Sério? — pergunto rindo.
— Sério. A gente grava, vê o desempenho e apaga.
— Minha casa ou sua casa?
— Qualquer lugar desde que você fique dentro de mim pelo
resto da noite — responde decidida. — Você é muito bonito, mas
sabe o que deixaria seu rosto ainda mais bonito? Se eu me
sentasse nele. Vou gritar seu nome em todos os meus orgasmos
múltiplos. — A pego decidido assim que encontro meu carro. Ela se
senta no capô e eu me encaixo entre suas pernas. Minhas mãos
sobem pelas suas coxas e vão direto em busca da calcinha.
Felizmente era mesmo uma cantada. Uma cantada capaz de deixar
um homem ciumento completamente louco.
— Tiro certo, bem na mosca, eu nem mirei quando acertei
sua boca. Gostosa. — Ela ri, enfiando suas mãos por dentro da
minha camisa.
— Eu amo esses pelinhos — diz, arranhando meu peitoral. —
Meu homem... quero você tanto, Lucca. Quero você o tempo todo.
— Mexo em seus cabelos e recebo um sorriso de satisfação. Volto a
beijá-la e as coisas esquentam ainda mais.
Minha garota se esfrega em minha ereção e eu quase perco
a noção do local onde estamos. O estacionamento é escuro, mas,
mesmo assim é arriscado.
— Vamos?
— Sim, por favor. — A desço do capô e abro a porta para ela
se acomodar no carro.
Eu não sei descrever o que sinto por essa mulher, mas há um
desejo que extrapola a razão e a emoção.
Quando chegamos em meu apartamento, ainda na sala a
puxo para mim. Ela chuta as sandálias longe e eu deslizo uma das
alças de seu vestido beijando seu ombro carinhosamente. Ela ofega
e eu vejo sua pele tomada por arrepios. Me afasto apenas para
retirar minha camisa e suas mãos vêm diretamente para meus
braços, num toque suave. Sorrio em seus lábios quando percebo
que agora sou eu quem está arrepiado.
Desço a outra alça do vestido e a peça cai, deslizando pelo
corpo da minha menina até o chão. Sinto seus mamilos roçando em
meu peitoral e a pego em meus braços, levando-a para minha
cama. A deixo deitada, retiro meus tênis, minha calça e minha
cueca, sob o olhar safadinho dela
— Você é tão incrível — fala, quando subo na cama. — Tão
incrível.
— O par perfeito para a mulher mais incrível que já conheci.
— Ela sorri, e eu beijo suas pernas. — Eu amo você, Diabinha. Faz
amor doce comigo?
— Faço. — Eu abocanho seu clitóris devagar, sentindo o
sabor da excitação dela. Molhada ao extremo, do jeito que me deixa
louco. Massageio o pequeno pontinho delicado com a minha língua
e minha garota se contorce de prazer. Ela começa empurrar seu
corpo para cima, pedindo por mais. Isso me faz sorrir e aumentar a
lambidas ritmadas. Quando suas pernas começam a tremer, me
afasto e beijo sua boca. Me encaixo entre suas pernas e pressiono
minha ereção em sua entrada, empurrando lentamente até estar
dentro dela por completo. O paraíso sob meu corpo.
Toco seu rosto retirando os cabelos para o lado e capturo a
imagem perfeita: rubor em suas bochechas, brilho nos olhos, boca
levemente aberta, ofegante. Engulo a seco, hipnotizado.
— É a coisa mais linda do meu mundo. Não sou o anjo da
guarda, mas vou te proteger. Esse seu sorriso é o combustível para
eu viver. Quer se casar comigo? — Ela sorri amplamente, e eu a
beijo delicadamente.
— Para sempre — responde. — Quero me casar com você
para sempre. Eu simplesmente vou... eu largo tudo e vou... ficar
para sempre com você. — Sorrio, me movendo contra seu corpo e
ganhando um gemido.
Faço amor lento com a minha noiva, capturando cada
gemido, absorvendo cada toque, fazendo-a sussurrar meu nome e
sentir o mais puro prazer.
Não consigo ficar mais um dia sem ter essa mulher na minha
cama para sempre.
Não preciso abrir meus olhos para saber que Lucca já não
está na cama. Me espreguiço rolando pela cama e sorrindo, até cair
dela. Uma risada surge enquanto eu choramingo por ter batido a
cabeça em um móvel. Ele apenas segue rindo e posso apostar que
seus olhos estão marejados agora.
— Que diabos você fez, Diabinha?
— Você vai ficar rindo? — pergunto rindo, ignorando a dor.
Apoio minhas mãos no chão e fico de pé. Finalmente ele se
aproxima e me abraça. — Ai minha cabeça! — protesto, e ele faz
carinho no local da batida.
— Isso que é acordar em grande estilo — diz rindo. — Me
desculpe, apenas foi engraçado. Ainda está alcoolizada?
— Não mesmo. — Sorrio beijando suas bochechas. — Coisa
mais linda que você é.
— Trouxe café da manhã na cama para você.
— Ok, vou apenas fazer xixi — informo, soltando-o e
correndo para o banheiro.
Faço xixi, lavo meu rosto, escovo os dentes e volto correndo
para a cama. Lucca sorri quando me acomodo ao lado dele.
— Você parece feliz e animada, Diabinha.
— Eu tenho todos os motivos do mundo para estar assim.
Aliás, hoje é um bom dia para Samuel e Henrico se conhecerem.
Isso terá que acontecer mais cedo ou mais tarde, é melhor que seja
mais cedo, assim, no casamento, eles já estarão familiarizados —
explico, e ganho mais um sorriso incrível.
— Gosto muito dessa ideia, na verdade, eu estava ansioso
por isso.
— Vou pegá-lo com Pablo, você pega Samuel com seus pais
e o leva para a minha casa. Acho que é melhor que Henrico esteja
em seu habitat natural — digo empolgada.
— Perfeito. Quero morar com você. — Encaro Lucca um
pouco impactada e ele levanta os ombros. — Estou atropelando
todas as etapas?
— Está — confirmo sorrindo. — Pulamos de um pedido de
namoro para um pedido de casamento, e agora do pedido de
casamento a morar junto. Não que seja uma reclamação, estou
ansiosa para dividir o mesmo teto com você, Lucca.
— Mas... precisamos de um lugar adequado. Precisamos da
nossa casa logo — ele diz.
— Acho que principalmente por Samuel. Tenho uma grande
preocupação em relação a ele, pelo fato de ver o pai morando com
outra mulher e outra criança. Acho que precisamos de um lugar
onde ele sinta que se encaixa e que faz parte de tudo. No meu
apartamento só há dois quartos, assim como no seu. Henrico tem
um quarto mais especial devido as limitações, se não fosse isso
poderíamos dividir o quarto para os dois, mas falta espaço.
— Eu pensei nisso, mesmo querendo atropelar o mundo. Vou
cuidar disso.
— Quero cuidar junto com você. Quero construir tudo com
você, Lucca. Sei que possui muito mais dinheiro que eu, mas
também possuo economias, quero sentir que participei da
construção do nosso futuro. — Ele balança a cabeça positivamente.
— Tenho uma proposta.
— Qual?
— Eu cuido da casa, você cuida da decoração, cuida em
torná-la acessível para Henrico, aconchegante para Samuel e para
nós. — Só por essa proposta sei que ele está falando de uma casa
milionária.
— Não precisamos de muito, sabe disso, não sabe?
— Sei, mas Paula, sinceramente, trabalho desde muito novo,
sempre esteve nos meus planos ter uma casa bacana, num bom
lugar, com a segurança para manter minha família protegida. Muitos
garotos sonham com carros que são verdadeiros brinquedinhos de
luxo, já eu... eu sempre sonhei em ter uma casa foda, como a casa
que cresci em Belo Horizonte. Não é questão de ser esnobe ou
qualquer coisa do tipo, é questão de realizar um grande sonho, em
dar o melhor para a minha família. Eu penso a longo a prazo. Temos
dois filhos, mas eu quero mais. Quero pelo menos mais dois. — Isso
me faz sorrir, porque eu também quero mais dois filhos. — Prometo
a você que não serei o cara que vai impedi-la de contribuir com
todas as coisas, mas, poderia deixar apenas a casa comigo? Por
favor? É um sonho desde a adolescência.
— Eu participarei da divisão das contas mensais.
— De acordo — concorda sorrindo. — Você é uma mulher
independente, empoderada, jamais ousarei diminuí-la, Diabinha. Eu
me apaixonei pela mulher independente, dona de si. Não vou deixar
essa mulher escapar. — Isso me deixa mais tranquila.
— Ok. É tão louco. — Sorrio. — Quando eu ia me casar com
Pablo, não houve nada disso. Nós nunca nos sentamos para
debater sobre o casamento, sabia? Eu cuidei de tudo sozinha, ele
não fazia questão de nada relacionado ao casamento. Com você é
tudo tão diferente, em todos os sentidos.
— Você terá o casamento mais lindo da história do Rio de
Janeiro — afirma, segurando meu queixo. — Você merece ter o
melhor e eu farei isso, em todos os sentidos — diz, piscando um
olho. — Eu vou tratá-la como uma verdadeira rainha. A minha
rainha, a minha esposa, a mãe dos meus filhos e a boadrasta do
meu Samuca.
— Por que me faz chorar todos os dias? — pergunto,
limpando minhas lágrimas.
— Por todos os lados, não é mesmo? — Dou uma risada.
— Exatamente. — O beijo e terminamos de tomar o café da
manhã.
Tomamos um banho juntos, nos arrumamos e ele me deixa
em casa. É engraçado como tudo fica vazio quando Henrico não
está.
Troco de roupa, pego a chave do meu carro e vou buscá-lo
na casa de Pablo. Quando chego, vou correndo abraçar meu filho e
sorrio ao senti-lo retribuindo.
— Meu pequeno príncipe. Mamãe está louca de saudades.
— Mamãe... — ele diz.
— Paula, será que poderíamos conversar num local privado?
Pedirei a Elma para olhar Henrico — Pablo diz com a voz séria, e eu
o encaro.
— Ok — digo, ficando de pé. — Mamãe já volta, filhotinho.
Sigo Pablo até a varanda e ele puxa uma cadeira para eu me
sentar, sentando-se logo em seguida diante de mim.
— Você está noiva? — pergunta, apontando para o anel em
meu dedo.
— Sim, estou — confirmo.
— Eu te amo, você não vai se casar com ele. Não vou
aceitar. Eu amo você, eu só enxergo você, eu respiro você — afirma
nervoso. — Você é minha. Estive tranquilo porque eu achei que isso
era fruto de uma vingança sua, que era uma aventura e que depois
você iria voltar, porque nós somos para sempre, até a morte. — Isso
é assustador. — Você é o amor da minha vida e não vai se casar
com ele.
— Me desculpe, Pablo, mas você está parecendo meio
doentio agora. Achei que tínhamos resolvido essas questões,
superado — argumento receosa.
— Meu filho não terá outro pai — avisa num tom grosseiro. —
Eu não aceito.
— Eu nunca quis que ele tivesse outro pai. Na verdade, me
lembro de ter sido muito insistente para você dar atenção a ele e
agir como pai. Nunca tiraria isso de você.
— Você vai para Las Vegas, conhece um babaca, transa com
ele e transforma isso em uma linda história de amor. Há apenas
poucos meses que o conhece e você já está noiva. Está agindo
como uma piranha. — Minha mão ganha vida própria quando estala
no rosto dele. Fico de pé.
— Nunca mais fale isso — ameaço. — Não te dou o direito
de falar assim comigo, babaca! O meu noivado não lhe diz respeito.
— Diz sim. Porque uma vez casada, meu filho morará com
outro homem e eu não aceito.
— Você não tem que aceitar. Seu histórico nem mesmo
permite que tenha que decidir as coisas por mim. Até poucos dias
atrás você ignorava o nosso filho, você me deixou plantada num
altar em meio a centenas de convidados, Pablo. Quem é você para
dizer qualquer coisa sobre a minha vida? Eu vou me casar e isso
não é da sua maldita conta. — Ele fica de pé e caminha
ameaçadoramente até mim.
— Se continuar com essa ideia estúpida, eu vou tirar Henrico
de você — diz, e eu começo a rir de nervoso.
É então que ele me puxa pela cintura e começamos uma luta.
Ele tenta me agarrar, puxa minha blusa, beija meu pescoço,
enquanto tento me debater. Ele é mais forte que eu.
— Me solte, desgraçado!!! — grito, socando-o, e ele agarra
meus cabelos com uma força que faz lágrimas brotarem em meus
olhos. — Que merda você está fazendo, Pablo? — questiono,
usando toda a força que tenho.
— Vou foder você, como eu fodia antes.
— Pare com isso! Me solte! — Ele tenta beijar minha boca, e
antes que ele consiga o que quer, consigo mover minhas pernas e
dou uma forte joelhada entre suas pernas.
— Vadia! — grita, visivelmente com dor e eu dou outro tapa
em sua cara.
— Nunca mais encoste em mim... nunca mais!
— Veremos. Eu vou tirar Henrico de você, custe o que custar.
Meu filho não terá outro pai.
— Tente a sua sorte, Pablo. Você nem sabe o tipo de autismo
que nosso filho tem, nunca tocou uma fralda sequer, nem sabe
todos os tratamentos aos quais ele é submetido. Você é um pedaço
de merda e terá que nascer novamente para tirar meu filho de mim.
Eu pensei que você estava mudando, mas não. Pau que nasce torto
nunca se endireita, não é mesmo? Eu sou uma idiota que ainda
acredita nas pessoas, mas eu não vou mais acreditar em você. Me
ameace novamente, e a briga será de cachorro grande — aviso,
deixando-o. Pego meu filho, as coisas dele e nem me despeço da
empregada.
O coloco na cadeirinha, e seguimos para casa após eu vestir
uma blusa larga que está em meu carro, temo que tenha ficado
vermelha. Estou tremendo, mas sei que preciso me acalmar ou as
coisas sairão piores do que já estão. Não quero trazer Lucca para
isso, mas... eu preciso apenas me acalmar antes de contar a ele. Eu
prometi a ele que sempre seria verdadeira, mas agora eu temo
contar por que ele vai perder a cabeça.
Quando chego em frente ao prédio, Lucca chega junto
comigo e eu nem preciso dizer nada para ele se dar conta de que
algo aconteceu.
— Me diga o que houve?
— Vou dizer. Apenas deixe eu processar, absorver, e te
contarei. Não na frente das crianças. — Ele balança a cabeça em
concordância e pega Henrico da cadeirinha. Minha cabeça está
levemente dolorida na parte onde Pablo puxou meus cabelos.
— Olá, Samuel! — digo sorrindo, e vou abraçá-lo. — Você
está muito estiloso hoje.
— Tia Paula, papai me arrumou.
— Seu papai é incrível, não é mesmo? Agora você vai
conhecer um amiguinho. — Samuel olha para Henrico nos braços
de Lucca e parece não gostar. Antes que dê qualquer problema,
pego meu filho e Samuel vai para os braços do pai.
Subimos até meu apartamento silenciosamente. Estou irada
e preciso dissipar isso
Quando entramos, Lucca se senta no sofá com Samuel e eu
me sento na mesa de centro com Henrico.
— Ei Henrico, esse é Samuel, filho do tio Lucca — apresento
o pequeno ao meu filho. — Samuel, esse Henrico, filho da tia Paula.
Vocês poderão ser amigos e brincar.
Henrico não curte. Definitivamente. Meu filho se contorce em
meu braço e estica os braços para Lucca, eu fico um pouco
impressionada com a situação. Samuel está apenas desconfiado,
mas Henrico parece revoltado o bastante. Eu tento mantê-lo em
meus braços e ele simplesmente começa a ficar vermelho. Lucca
ajeita Samuel em uma perna e pega Henrico, que abraça o pescoço
dele. Olho para meu noivo pedindo socorro.
— Henrico, deixa tio Lucca falar com você? — Lucca pede.
— Samuel é seu amiguinho, para brincar de pintar e colorir. Ele é
muito legal, igual o tio Lucca e igual a você. — Samuel deixa Lucca
e vem até mim. Ele fica com um dedo na boca enquanto observa o
pai com Henrico.
— Tia Paula, ele está chorando? — Samuel pergunta
curioso.
— Não, ele só está um pouco ciumento — explico sorrindo, e
o levo até a cozinha para termos uma conversa. — Deixa tia Paula
te explicar. Henrico tem um probleminha que se chama autismo, e
algumas limitações físicas. Tipo uma preguicinha, sabe? Ele não
corre, está começando a andar, porém, muito devagar, ele tem um
pouco de dificuldade em segurar as coisas e se manter firme, e tem
um monte de tias que o ajudam com vários tratamentos. Mas, ele
sabe brincar de um monte de coisas, sentadinho. Sabe brincar de
blocos de montar, de pintar, colorir. Você só precisa ter um
pouquinho de paciência com ele e ajudá-lo a brincar. Ele está um
pouco ciumento porque não está acostumado com outras crianças,
mas ele é muito legal e carinhoso, você vai gostar dele, tia Paula
garante.
— Posso brincar com ele sentado? — pede, e eu acho tão
fofo que ele tenha compreendido.
— Pode. Ele já pode andar, só que anda mais calminho que
você e tem dificuldades. Logo ele correrá. Não é o máximo?
— Tia Paula, posso chamar ele para brincar? Ele tem
brinquedos?
— Tem um monte de brinquedos no quarto dele. Vamos
chamá-lo para ver? — Samuel concorda com a cabeça e parece
animado. Eu achei que ele ficaria com ciúmes, mas, felizmente, ele
está bem.
Me aproximo do meu filho e ele está com as duas mãos no
rosto de Lucca, que conversa com ele de uma maneira fofa. Por um
momento esqueço o que vim fazer. Essas cenas mexem comigo
mais do que eu gostaria. Meu filho tem uma afeição gigantesca por
esse homem, muito mais do que tem pelo pai, e eu não sei como
lidar com isso. Lucca o conquistou de primeira.
— Ei, Henrico, vamos mostrar seus brinquedos para Samuel?
— proponho ao meu filho, e ele parece aceitar.
Nos próximos minutos a cena que se desembola diante dos
meus olhos é a imagem da perfeição. Todos nos sentamos no
tatame do quarto do meu filho e ficamos desenhando; meus olhos
se enchem de lágrimas quando finalmente Henrico resolve socializar
com Samuel. Isso parece emocionar Lucca também, porque ele me
puxa e beija o topo da minha cabeça.
— Eu disse que daria certo — sussurra em meu ouvido.
— É a cena mais linda, nossos garotos juntos, brincando.
Graças a Deus!
— Graças a Deus! — meu noivo concorda sorrindo. — Você
é o motivo.
— Lucca... eu...
— Você?
— Mais tarde tenho algo para te contar, mas você tem que
me prometer que não vai perder a cabeça.
— O que Pablo fez? Não vou prometer. Se ele tiver feito algo
com Henrico ou com você, eu vou fazê-lo pagar. — Engulo a seco.
— Me conte agora.
— Não. Há as crianças e eles precisam de atenção.
O clima muda de alegria para tensão. Eu peço almoço,
comemos, e Lucca vai para casa, descansar um pouco com
Samuel.
No início da noite, Henrico está tirando um cochilo quando
minha mãe surge e eu vou correndo abraçá-la, descarregando tudo
sobre ela.
— Minha princesa, o que aconteceu?
— Pablo disse que vai tirar Henrico de mim se eu me casar
com Lucca — digo chorando.
— Nenhum juiz daria a guarda de Henrico a ele, filha. Você
deve saber disso. É uma mãe excepcional, quando ele nunca jamais
chegou perto de ser um pai para o filho.
— Sei disso, mas a maneira como ele disse foi assustadora.
Ele parecia capaz de tudo. E, não foi apenas isso...
— O que aquele desgraçado fez? — minha mãe pergunta se
afastando, tomada pela ira.
— Ele tentou me agarrar. Ele disse que queria fazer sexo
comigo, quase rasgou minha blusa, ficou beijando meu pescoço,
tentou beijar minha boca... foi horrível.
— Ele fez o quê? — Lucca surge perguntando, e eu engulo a
seco.
Lucca não me dá tempo de contar a história. Da mesma
forma que ele entrou, ele sai do meu apartamento e eu me pego
encarando minha mãe, em choque.
— Meu Deus! Ele vai matar Pablo! — exclamo, começando a
temer.
— E eu ocultarei o cadáver. Tenho certeza de que podemos
forjar um álibi — minha mãe esbraveja, enquanto pego minha bolsa
e a chave do carro.
— Fique com Henrico, pelo amor de Deus! — peço, saindo
correndo atrás do meu noivo.
Desço pelas escadas e consigo encontrá-lo saindo do
prédio.
— Lucca!!! — grito seu nome e ele para, quase arrancando
os cabelos da cabeça. — Você precisa se acalmar.
— Por que não me ligou? Por que não foi para uma maldita
delegacia? — pergunta nervoso, de uma maneira que nunca vi.
— Eu estava com Henrico, apenas vim para casa com meu
filho. Você estava com Samuel, tínhamos combinado um encontro
entre as crianças.
— Que poderia ter sido adiado, Paula. Tem ideia da
gravidade do que ele fez?
— É claro que tenho. Não vou deixar ficar impune, Lucca.
Mas, quando tudo aconteceu Henrico era a minha prioridade. Não
podia assustá-lo. Me defendi de Pablo.
— Mas poderia ter dado errado, Paula. Pelo que a ouvi
contando foi uma tentativa de estupro, ele tentou abusar de você.
— Sim, foi exatamente isso — não minto. — E eu vou tomar
providencias.
— Você vai para uma delegacia e eu irei encontrá-lo —
avisa.
— Não é o momento para agressão, Lucca. É o momento de
agir categoricamente.
— Sei o meu lugar, sei que não posso intrometer em
determinadas questões, mas ele se tornou perigoso e pode usar
Henrico para uma espécie de vingança. Sei que Henrico não é meu
filho, mas eu não vou permitir que esse homem o leve mais, e eu
não quero você lidando com ele sozinha, não mais. Há eu, seus
pais, seu irmão, não lide com aquele cara sozinha mais.
— Não é tão simples, Lucca, mas eu vou tomar todas as
medidas cabíveis — afirmo, segurando-o.
— É sim. Estamos amparados pela lei, nem que eu tenha que
pedir ajuda à Dandara, precisamos impedir visitas onde ele fique
sozinho com Henrico. As visitas agora terão que ser acompanhadas,
com extrema segurança. Vamos pedir uma ordem de restrição,
qualquer coisa que deixe você e Henrico protegidos. Eu vou
encontrá-lo.
— Apenas se acalme — digo, tentando abraçá-lo e ele me
afasta, visivelmente descontrolado. — Vá até a delegacia comigo,
não vá atrás de Pablo. Você ir e agredi-lo pode tornar as coisas
mais difíceis. Estamos com a razão, não podemos perdê-la. — Ele
passa as mãos pelo rosto, soca uma parede e me puxa para seus
braços.
— Você está mesmo bem?
— Estou com um pouco de dor na cabeça. Ele puxou meus
cabelos com muita força. Talvez tenham alguns pequenos
hematomas em meus braços. — Lucca me solta de uma só vez e
sai andando rumo ao carro. Eu corro atrás dele, mas dessa vez ele
é muito mais rápido. Ignorando tudo o que eu disse sobre razão, ele
acelera rumo a um assassinato e eu corro até a garagem para pegar
o meu carro e ir atrás.
Dirijo completamente louca e com total imprudência, não
consigo nem mesmo chorar, estou desesperada. Até mesmo
alcanço o carro de Lucca. Parece uma loucura sem fim, quando ele
estaciona diante do prédio de Pablo, o infeliz está do lado de fora,
como se o destino estivesse contribuindo para a desgraça
acontecer.
Lucca desce com sangue nos olhos e eu estaciono de
qualquer jeito. Quando desço, meu noivo está segurando Pablo pela
camisa e seu punho se choca diretamente no rosto dele.
— Lucca! — eu grito, atravessando e indo até eles. Meu
noivo dá mais um soco em Pablo e faz com que o pedaço de merda
simplesmente caia ao chão. Antes que ele bata mais, eu me jogo
nas costas dele. — Por favor, pare com isso. Por favor. Não quero
que nada de mal aconteça a você por minha culpa.
— Encoste na minha mulher mais uma vez e eu o mandarei
direto para o inferno! — Lucca grita, e Pablo começa a rir sentando-
se no chão e limpando sangue de seu nariz.
— Performance incrível — Pablo debocha, e Lucca vira um
tornado incontrolável.
Ele faz Pablo ficar de pé e agora Pablo reage, porém, sem
grandes chances. Eles só param quando os seguranças do prédio
surgem segurando-os, e eu simplesmente mal consigo enxergar a
situação, de tanto chorar. Quando foi que tudo virou do avesso? Por
que diabos Pablo resolveu ser um idiota? Eu estava tão feliz com os
avanços positivos dele em relação ao nosso filho e agora tudo
desmoronou.
Não sei se é o certo, mas, sentindo a real necessidade de dar
um basta nisso, eu volto ao meu carro. Limpo meu rosto, e vou
direto à primeira delegacia de mulher que encontro para dar queixa
e fazer todos os procedimentos necessários para que o tormento
tenha um fim.
Me sinto extremamente mal vendo Lucca brigando. Desde
que Dandara voltou trazendo um filho dele, decidi não o importunar
com meus assuntos relacionados ao Pablo e à Henrico. Fixei em
minha cabeça que a prioridade dele deve ser Samuel, mas as
coisas apenas têm saído do controle frequentemente. Eu fui enfiada
no caos de Dandara, sendo vítima de um sequestro, e agora Lucca
está enfiado no caos de Pablo, lutando fisicamente para vingar o
que idiota fez.
Acabo de perceber que não há como separar as situações
sendo um casal. Eu estarei em meio aos problemas dele e ele
sempre estará em meio aos meus problemas, por mais que eu odeio
enfiá-lo em confusões. É algo que não tenho como controlar ou
decidir; simplesmente faz parte de um relacionamento toda a
cumplicidade e divisão de momentos bons e ruins.
Quando saio da delegacia, encontro 12 chamadas não
atendidas de Lucca e algumas mensagens dele perguntando onde
estou. Respondo dizendo que estou indo para casa, quando chego,
o encontro sentado na calçada, esperando por mim.
Respiro fundo e me acomodo ao seu lado.
— Me desculpe por perder a cabeça — pede, olhando para
baixo. — Há toda uma história pesada em relação à minha mãe que
certamente impactou a família inteira. Quando ouvi você dizer que
ele tentou te agarrar e tudo mais... isso doeu. Minha mãe tinha
quatorze anos quando foi... — Ele não consegue dizer. Um soluço
de dor escapa de sua garganta. — Eu não quero que isso aconteça
com você, Paula. Nenhuma mulher deveria passar por esse tipo de
situação, nenhuma. Não quero que ele toque em você sem seu
consentimento, não quero que seja...
— Eu também não quero. Estive em uma delegacia, está
tudo feito, devidamente registrado. Agora preciso de um bom
advogado, você saberia me indicar?
— Não estou brincando agora, Paula. Ouvir aquilo arrancou a
merda fora de mim. Minha mãe não teve opção, ela estava sendo
ameaçada, nem mesmo pôde pedir ajuda. Mas, você não, você tem
a mim e um monte de pessoas. Eu vou cuidar de você e do nosso
garoto. A ideia de qualquer coisa acontecendo a vocês é
esmagadora. Eu amo você, amo aquele garoto como se... como se
ele fosse meu, como amo meu filho. Eu amo todos vocês
grandiosamente.
— Eu sinto muito pela sua mãe, meu amor. Acredito que
saber disso deve mexer com toda família. Eu nunca imaginaria que
ela passou por algo assim, ela é tão forte. Agora, mais do que
nunca, ela se tornou ainda mais um exemplo para mim. Exemplo de
força, superação, coragem. Eu prometo que não vou me calar, que
não vou passar pano para os acontecimentos em relação a Pablo.
Eu só precisei adiar algumas horas, porque... seria tão injusto adiar
o que nós dois estávamos sonhando há dias por conta daquele
idiota. Talvez não tenha sido a atitude mais correta, mas foi o que
meu coração me guiou. Jamais deixaria Pablo ficar impune. Sou
advogada, lido e vejo casos horríveis sempre. Ocultar não seria uma
opção, principalmente após todas as ameaças de me tirar Henrico.
— Isso nunca vai acontecer, por vários motivos. O histórico
dele como pai é péssimo, você é uma mãe além de excelente,
desempenha seu papel com amor, tem todo um cuidado especial
com o nosso garoto, e... eu jamais deixaria tirá-lo de você, jamais.
Eu moveria o inferno por isso, Paula. Sei que é a minha girl power,
minha garota empoderada e independente, mas eu sempre vou
cuidar de você, sempre combaterei o crime junto com a minha
mulher maravilha. — Isso me leva as lágrimas. Talvez eu seja todas
essas coisas, mas é tão bom ter um abraço reconfortante, um
alguém que quer ser seu tudo, seu lar, seu aconchego. É tão bom
ter um lugar para descansar, um porto seguro. Lucca é isso e mais.
— Vamos subir e colocar um gelo nessa mão? — Ele acena
positivamente com a cabeça.
Quando chego em meu apartamento encontro um bilhete de
minha mãe dizendo que sequestrou meu filho para ficar com ela e
meu pai. Por mais que eu esteja com saudades do meu pequeno,
preciso dizer que isso me traz um alívio imenso. Estou carregada
com todos os acontecimentos, e eu sei que isso passaria para meu
filho de alguma forma.
Cuido da mão do meu noivo, tomamos banho e vamos
verificar Samuel que caga para nós. A sala de Victória e Matheus
virou um acampamento de crianças. Há uma barraca gigantesca e
as crianças estão tocando o terror. Vic está na cozinha enquanto
Matheus é feito de cavalinho pelos netos. É uma cena tão linda que
meus olhos se enchem de lágrimas. Queria tanto que meu filho
pudesse estar nesse meio, brincando, pulando, correndo, se
divertindo, mas há um caminho tão longo para perseguirmos. É uma
luta diária que exige paciência, compreensão, carinho. Tudo tem
que ser lento, mas todo e qualquer progresso é de uma satisfação
imensa. Um passo de cada vez.
— Entendo você, Diabinha — Lucca sussurra em meu
ouvido. — Vamos introduzi-lo nessa bagunça aos poucos. Nosso
garoto vai tocar o terror.
— Às vezes tudo que uma mulher precisa é ter um Lucca na
vida — digo sorrindo. — Pena que você já tem dona, não é
mesmo?
— Se quiser me colocar uma coleira eu não ligo. — Ele pisca
um olho e vai pegar Samuel das costas de Matheus. Eu me
apaixono pela Sophie. Me apaixono muito. Meu Deus!!! Eu estou
apaixonada e quero uma dessas, bem como se fosse uma boneca.
Ela é a cópia de Melinda, e é apenas a coisa mais maravilhosa.
Quando saímos da casa dos pais de Lucca eu ainda estou
falando da garota e ele está rindo.
— Nós precisamos fazer uma menina! — digo empolgada.
Depois de Henrico eu nunca senti muita vontade de ter mais filhos,
mas agora, após ver Sophie, eu só consigo pensar em fazer uma
menina. É lógico que sei que pode vir um menino, mas, é preciso
arriscar. Ficarei feliz também em ter um outro garoto.
— Pare com o anticoncepcional e vamos começar o trabalho
suado, Paula. Jacinta meu desespero, em fazer filhos com você! —
Lucca diz mais empolgado que eu, e isso me faz rir.
— Estou atropelando as coisas, não é mesmo? — pergunto,
e ele dá uma gargalhada, porque geralmente é ele quem atropela o
mundo.
— Entende por que temos que nos casar? — pergunta,
atento ao trânsito. — Somos recordistas em atropelamentos. Eu juro
que estava quieto sobre bebês, mesmo querendo muito. Porém,
agora você despertou a fera adormecida, Paula. Jacinta as
consequências das suas palavras. Vamos fazer alguns filhos. Seu
método contraceptivo é aquele bastonete, não é mesmo?
— Sim.
— Quanto tempo leva para o efeito cessar após a retirada?
— pergunta realmente interessado.
— O médico diz que basta retirá-lo e mandar ver.
— Ele disse exatamente assim? — Agora sou eu
gargalhando.
— Não exatamente. O mandar ver foi por minha conta.
— Partiu tirar essa merda e fabricar um mini nós? Samuel e
Henrico precisam de irmãos ou irmãs. — Me pego mordendo o lábio
inferior e pensando se devo mesmo dar uma de louca assim, do
nada. Esse homem é tão louco, talvez eu deva entrar em sua
loucura de uma vez por todas (mais do que já entrei).
— Vou pensar. No momento estou agindo com a emoção. Há
nosso casamento, há um monte de coisas. Alguém precisa ser
racional, Lucca. — Ele sorri.
— Case grávida do meu bebê.
— Ah foda-se! Bora tirar essa merda!!!
— Aoooo potência! É hoje que você não dorme, Paula!
Jacinta como é ficar três dias me sentindo dentro de você! — brinca,
mas tem um fundo de verdade. — Onde preciso levá-la para tirar
isso?
— Na verdade eu não sei. Talvez eu deva ligar para o meu
médico. Hoje é sábado, são nove da noite, ele só atende de
segunda a sexta em horário comercial — explico, perdendo a
empolgação.
— Decidiu engravidar e há um bastonete em seu braço? Está
tentando buscar uma solução e não consegue? Seus problemas
acabaram! Eu tenho a solução! — meu noivo diz, enquanto tenho
lágrimas em meus olhos de tanto rir. — É isso, bebê Paula. Eu
tenho a solução para seus problemas!
— Qual?
— Humberto Salvatore é o nome dele!
— Quê?
— Humberto é médico. Vamos em busca dele! — avisa,
fazendo o retorno.
— Assim? Do nada?
— Paula, entenda uma coisa, é muito bom ser vida louca
comigo! — ele diz, apertando minha perna e eu decido que é muito
bom ser vida louca, de verdade.

Posso acreditar que, neste exato momento, Humberto está


tendo a certeza de que eu e meu lindo noivo somos completos
malucos. Estou sentada em uma maca no consultório dele,
sacudindo meus pés impacientemente e rindo enquanto ele
esbraveja preparando o necessário para extrair o bastonete. É uma
micro cirurgia muito simples, que dura menos de 3 minutos.
Lucca observa tudo atentamente, falando na cabeça dele
como um maluco. É tão louco como vivemos de extremos. Num
momento estamos querendo matar um homem, no outro estamos
caminhando para a produção de filhos. Talvez eu esteja ficando
mais louca do que sempre fui, mas é isso. Eu escolho a loucura no
lugar da monotonia.
Humberto se aproxima e aplica uma pequena anestesia local
em meu braço. Olho para o lado porque definitivamente odeio
passar por esses procedimentos. É Lucca quem fica de olho em
tudo.
— É só isso? — meu noivo pergunta.
— Sim, é um pequeno bastonete, nada demais — Humberto
explica, provavelmente já fazendo a retirada.
— E nós já conseguiremos fazer um bebê? — Quero rir, mas
contenho.
— Vocês estão de um jeito que acho que eu nem mesmo vou
conseguir fazer a porra de um curativo. Não é igual Miojo não,
queridos. Calma aí. Vocês podem começar a tentar, não há
garantias de quando Paula conseguirá engravidar.
— Você está me tirando só porque sou advogado e não
entendo porra alguma das paradas da medicina. — Começo a rir de
verdade, e puxo meu noivo com o meu braço livre.
— Vem aqui, pimpolho — digo, beijando-o na bochecha. —
Você é o mais engraçado desse universo.
— Minha mãe te contou que me chamava de pimpolho
quando criança? Pimpolho e sadbebê — ele diz rindo.
— Isso é fofo. — Sorrio.
— Fofo será você amarrada nas paradas lá no clube de
BDSM dos Salvatores — Lucca diz. — Libera aí, Humberto.
— Não é motel, caro amigo.
— Que clube? — pergunto curiosa.
— A família de Humberto tem um clube de BDSM, ele
atualmente é a cabeça do lugar — meu noivo explica, e minha boca
vai ao chão.
— BDSM tipo filme cinquenta tons? — questiono, e Humberto
se afasta após terminar o curativo.
— Não diga isso, Paula. Isso é como uma afronta do caralho
— ele responde rindo. — BDSM é muito mais complexo do que é
mostrado naquele filme.
— Não tenho curiosidade — confesso. — O que mostra
naquele filme qualquer casal pode fazer, parece bom, menos a parte
da mulher ser cem por cento submissa. Aquilo é irritante. Há
mulheres que gostam, eu não sou uma delas.
— Graças a Deus! Mas, isso não impede de irmos conhecer
o universo — Lucca sugere.
— Quero conhecer outros lugares — digo sorrindo.
— Ok, deu por hoje, hein?! É a última vez que me fazem vir
no consultório em pleno sábado à noite — Humberto esbraveja de
um modo engraçado.
— E Lili? — pergunto curiosa.
— Estou tentando levá-la para meu universo — responde
sorrindo. — Ela ficaria linda sendo açoitada na pressão.
— Meu Deus! — grito. — Você é dominador?
— Sim, achei que Lucca havia dito.
— Não costumo ficar falando das peculiaridades sexuais das
pessoas com a minha noiva — meu noivo responde.
— Meu Deus!!! — grito novamente. — Lili precisa transar com
você, quero saber dos mínimos detalhes! — Me empolgo e pego os
dois homens me encarando de uma maneira uma tanto curiosa. —
Ok, foi sem querer...
— Sua noiva quer saber como eu transo, bebê Lucca. Talvez
possamos fazer um...
— O teu cu! — Lucca diz, dando um soco no braço dele. —
Termine de falar e eu quebro seus dentes. — A gargalhada de
Humberto preenche todo o consultório, e eu acabo rindo junto, até
Lucca me dá um olhar bravo. — Vai lá! Vai ver Humberto transando!
— Não quero ver — informo. — Mas, quero saber se Lili vai
se submeter a umas chicotadas no lombo.
— A Lili eu não sei, mas você vai levar boas palmadas, Paula
— meu noivo diz em tom promissor.
— Estou contando com isso.
— CHEGA! — Humberto nos repreende. — Bom, por falar
em Lili, estamos indo para outra boate hoje, a turma toda. Victor,
Melinda, Davi, Luma, Ava, Gabriel, Enzo, Lili, Larissa. Partiu? Acho
que é o tempo para o efeito do anticoncepcional passar e vocês
poderem fazer um filho. — Sei que ele está mentindo, mas, o mais
engraçado é ver Lucca acreditando. Ele faz uma cara tão
engraçada, meu garoto entende muito de leis, e nada de métodos
contraceptivos. Ele é incrível e engraçado tentando compreender.
Acabamos aceitando o convite para a boate, mas, antes de
irmos, saímos para jantar apenas os três.
Quando chegamos na boate, vou direto para Lili, já que
Larissa está atracada com Enzo e os dois estão praticamente se
transformando em um só.
— Me conte sobre Humberto — peço no ouvido dela.
— Ele tem uma pegada destruidora, temo pelos meus ossos.
E, ele curte coisas que atiçam a curiosidade de uma mulher.
— E, você vai me contar tudo, por favor. — Ela dá uma
gargalhada e Lucca me puxa para seus braços. — Bebê Lucca.
— Sua cabeça está melhor?
— Sim, só teremos que abster de puxões de cabelo por um
tempo. — Sorrio, mas ele não sorri de volta. — Ok, eu sei que não
há brincadeira nisso, mas não quero estragar a nossa noite, por isso
estou conduzindo dessa forma.
— Eu odeio aquele cara.
— Vamos esquecê-lo. Quero curtir a noite, quero ir à praia
amanhã e ter um dia incrível com você e nossos filhos. Aceita?
— Será maravilhoso.
— Agora vamos entrar. Essa boate é diferente, talvez o
banheiro seja um local bom para o sexo. — Ele sorri e entramos,
porém, a primeira pessoa que encontramos é Dandara, e ela está
acompanhada de um cara que não me é estranho.
Inevitavelmente a cumprimentamos. Enquanto rola uma
conversa, eu apenas observo o rapaz, porque eu realmente o
conheço. Minha mente começa a trabalhar forte, até eu me lembrar.
Meses atrás fui convidada a dar palavras em algumas aulas sobre
Direito Penal na universidade, e ele era um dos alunos. Minha
memória visual é excelente. Sou surpreendida quando Dandara o
apresenta como namorado. Nada contra diferença de idade, mas ela
não me pareceu uma mulher que gosta de homens mais jovens. De
qualquer forma, fico feliz que ela esteja seguindo em frente e torço
para que consiga ser imensamente feliz, que encontre um amor à
sua altura ou que seja feliz mesmo que escolha ser sozinha.
Na pista de dança, ela e o garoto parecem prestes a arrancar
as roupas um do outro. Beira um pouco à constrangedor e ninguém
consegue deixar de olhá-los. Seria cômico... na verdade, é. Do nada
o cara a puxa e eles desaparecem, então todos voltam a agir de
acordo com o ambiente.
— Aquele cara é estudante de direito — comento com Lucca
e com Victor. — Quando dei algumas palestras na universidade, ele
estava em uma das turmas.
— Aoooo Dandara! Pegando o novinho! — Victor brinca. — O
amor não tem idade. — Ele puxa Melinda. — Veja essa linda
princesinha da Disney muito safadinha. É uma novinha, e é a mãe
de todos os meus filhos.
— E quero mais um — Melinda diz sorridente.
— Eu e Paula vamos começar a trabalhar nesse propósito —
Lucca comenta.
— Qual propósito?
— Queremos um bebê — ele explica radiante, todo
empolgado. Eu amo ver a felicidade em seu rosto perfeito.
— Esses filhos da puta me tiraram de casa para tirar o
maldito implante contraceptivo do braço dela. — Humberto nos
entrega.
— Por falar nisso, está na hora de arrumar uma namorada,
hein camarada? — Lucca sugere, socando-o. — Não quer ter filhos,
se casar?
— Deixa rolar, sem pressão, sem grandes planos, sem
grandes expectativas. Quando tiver que ser, será. Há duas opções
quando não temos um alguém: levar isso como solidão ou como
liberdade. Eu conduzo pelo lado da liberdade e está tudo certo —
Humberto explica. — É difícil achar alguém que queira um
relacionamento nos meus termos sexuais.
— Ou não — digo apontando para Lili, e ele sorri
observando-a dançar.
Os deixo conversando e vou dançar com as meninas.
Bebemos vários shots de tequila e eu permito que toda a tensão do
dia desapareça. Há mais motivos para sorrir do que para chorar.
Quando já estamos alteradas o bastante, Melinda cisma de nos
ensinar passinhos de dança e praticamente viramos a atração da
boate. Eu, Ava, Luma, Melinda, Lili e Larissa damos um show como
se fossemos as Spice Girls. A boate é bastante eclética, e quando
uma banda começa a tocar sertanejo eu e Lucca começamos a
dançar e cantar. Ele me mata de rir cantando e me rodando como
marionete. Gustavo Lima parece o preferido dele, porque nunca vi
um ser humano saber de cor todas as letras das músicas. Ele sabe
até os momentos de pausa.
— Quem quer vir no palco cantar a próxima música com a
gente? — o vocalista pergunta.
— Duvido que vocês tenham coragem para ir lá — Victor diz
rindo.
— Eu tenho uma ideia — Melinda anuncia. — Se todas as
mulheres forem lá cantar, vocês terão que tirar as calças na saída e
correr todos nus pela avenida. É isso! Está decidido!
Ela não deixa que os meninos respondam. Quando dou por
mim, estou no palco com todas as garotas e isso é muito vida louca,
como meu noivo diz.
— Temos aqui seis lindas mulheres.
— Comprometidas — Lucca grita, e o vocalista levanta as
mãos se divertindo.
— Qual música as senhoritas vão cantar essa noite?
Nos reunimos e decidimos por Evidências, que é um clássico
e todos conhecem. Cantamos divididas em três duplas, até mesmo
dançamos e sensualizamos. No meio da performance me pergunto
se existe alguém normal nessa família dos Albuquerque’s, porque
me sinto contagiada. Está tão divertido, que sexo no banheiro nem
mesmo passa pela minha cabeça.
Quando terminamos de cantar, somos aplaudidas e então
pegas pelos braços dos nossos respectivos amores; não que
Humberto seja o amor da Lili, ou Enzo da Larissa, mas eles também
as pegaram, então preciso fazer a inclusão.
No final da noite, é o momento de os garotos cumprirem o
desafio. Saímos da boate e Melinda não dá sossego.
— Aoooo Melinda, não reclama se eu for molestado
sexualmente pelas mulheres do Rio de Janeiro. Sou gostoso,
sedutor, sexy — Victor diz, retirando o tênis. — Dá tempo de desistir.
Vai querer que todas olhem minha bunda tatuada e meu pau com
piercing?
— Oh! Ele também piercing e tatuagem na bunda? —
pergunto, chorando de rir.
— Sim, eles são insanos o bastante. Eu evito dar vale night
para o meu Piroca Baby porque nunca presta. Esses animais se
juntam e saem fazendo um monte de merda, tipo tatuagem na
bunda — Ava explica. — Vá Lucca, já mostrou para Paula sua
performance perfeita de strip tease?
Olho para Lucca ligeiramente curiosa e ele sorri.
— Ok, ok, senhoras! Darei a vocês o privilégio de ver a minha
nudez, a grossura e o tamanho do bebê Lucca.
— Não mesmo! — digo, puxando-o pela calça.
— Ao Paula, Jacinta meu strip se aproximando e te deixando
louca.
— Estamos no estacionamento de uma boate — digo rindo, e
me surpreendo com a bunda nua de Victor. — Oh merda! —
exclamo rindo, enquanto Melinda dá tapinhas. Ele tem um Simba
tatuado e Lucca um Hakuna Matata. É tão engraçado, mas sei que
há um motivo por trás disso. Um motivo que Lucca ainda não
contou. Os próximos a ficarem de bunda de fora são Davi e
Humberto. Esses homens são verdadeiras aberrações de beleza,
me pergunto se há ao menos uma coisinha que seja feia em cada
um deles.
Gabriel se junta a eles, e então Enzo. Eu permaneço
segurando meu noivo.
— Vamos lá, Paula. Sou um sujeito macho! Preciso segui-los
— argumenta. — Coloque uma música, Ava — meu noivo solicita se
afastando, e Ava coloca "I'm too sexy" em uma versão remixada
para tocar.
Todos começam a rir quando Lucca começa a dançar. É claro
que ele tinha que fazer diferente dos outros, ou não seria ele. Os
garotos até sobem as calças para acompanharem o show. Meu
noivo retira a camisa lentamente, passando as mãos pelo peitoral e
pela barriga. Estou rindo, mas estou babando também. A camisa
voa em meu rosto e ele se aproxima, pegando minhas mãos e
correndo pela parte nua de seu corpo enquanto todos se empolgam
rindo e zoando.
Ele pega a camisa de volta, se afasta, vira-se de costas e
começa a descer a calça. Ava grita o incentivando e ele rebola
fazendo graça. De repente, ele abaixa tudo de uma só vez, fazendo
Lili e Larissa gritarem.
— Oh meu Deus! Hakuna Matata! É lindo de ver!!! — Larissa
diz, com lágrimas nos olhos.
— Eu te afogo na Baía de Guanabara, filha da mãe! — aviso
rindo, e Lucca ousa virando-se de frente, por sorte ele cobre seu
pau com a camisa, ou ele seria um homem morto. Ele gira o quadril
e faz movimentos insinuando sexo. Eu começo a gargalhar com
força e Luma agacha no chão quase fazendo xixi de tanto rir.
— Aoooo Paula, seu bebê Lucca é stripper nas horas vagas
— Victor diz.
— Aoooo Paula, em casa te mostro a cobra dando rajadas
cuspideiras! — meu noivo promete, virando-se de costas e vestindo
a cueca juntamente com a calça. — Partiu fazer filhos! — o louco
anuncia, me pegando em seus braços e nem me dá tempo de
despedir do pessoal. Estou com crise de riso, por isso nem discuto.
Acho que vou rindo todo o trajeto e só paro dentro do elevador do
prédio dele, quando ele me joga contra o espelho e reivindica minha
boca.
Enrolo minhas pernas em torno da cintura dele e assim
caminhamos até seu apartamento. Com muita dificuldade ele abre a
porta e com um único chute a fecha.
Se beber não transe!
Eu acordo como se um rolo compressor tivesse passado em
cima de mim, e percebo que ele cumpriu a promessa de me deixar
dolorida.
O melhor para curar ressaca é um mergulho no mar. Dizer
que estou radiante seria pouco, é o nosso primeiro programa com
as crianças e estou num misto de euforia e alegria, mal posso me
conter.
Os dois pequenos estão devidamente sentadinhos em suas
cadeirinhas no banco de trás. Lucca está cantando uma música
infantil e os meninos estão bastante animados. É como um
verdadeiro conto de fadas, principalmente por ver meu filho
socializando bem. Parece que Deus resolveu depositar todas as
bençãos sobre mim, porque é quase como um milagre Henrico ser
sociável e receptivo.
Quando estacionamos o carro, descemos e pegamos as
crianças, juntamente com a minha bolsa. É incrível o quanto de
coisas precisamos trazer quando estamos com crianças.
Caminhamos na areia, felizmente a praia está praticamente vazia.
Lucca prepara as cadeiras, o guarda sol e eu retiro minha
saída de praia. Pego o protetor solar e lambuzo as crianças
excessivamente, porque sou um pouco sistemática. Prefiro pecar
pelo excesso a pecar pela falta, principalmente quando há uma
criança que não é meu filho.
— Pode passar um pouco em minhas tatuagens? — meu
bebê Lucca pede, e vou fazer esse serviço suado. Despejo um
pouco de protetor nas mãos e passo por todo seu braço, em seu
peitoral, sua costela e passo um pouco também em suas costas
apenas para prevenir. — Não há tatuagens nas costas, senhorita.
— Eu amo arranhá-lo, senhorito. Se você se queima, acabo
perdendo a diversão — digo baixo em seu ouvido.
— Jacinta o impacto das suas palavras! — Sorrio, e volto às
crianças. — Quer que eu passe em você?
— Se puder passar nas minhas costas, agradeço. Já passei
em meu rosto em casa. — Ele passa arrancando arrepios
involuntários. O filho da mãe ri e eu foco nas crianças. É
extremamente engraçado ver Samuel tentando puxar assunto com
Henrico. Samuel é um Lucca miniatura, mesmo tendo convivido tão
pouco com o pai. É interessante como os filhos herdam
determinadas características mesmo sem a convivência. Ele é
engraçado, risonho, extremamente bonzinho e fofo. Henrico é mais
calado, mas está o observando falar pelos cotovelos, ao menos meu
filho não está o rejeitando.
Quando Lucca termina de passar o protetor em minhas
costas, decidimos ir um pouco no mar. Ele carrega Samuel em um
braço e eu carrego meu filho. Vamos de mãos dadas até o mar e
damos um beijo casto antes da água tocar nossos pés.
— Eu te amo — ele diz. — Hoje é um dos dias mais incríveis
da minha vida.
— É recíproco, bebê Lucca. Não há mais nada que eu queira
na vida.
— Eu quero mais algumas coisas na vida, quero pequenas
coisinhas nossas, mas estou feliz com a nossa atual realidade. —
Sorrio, e solto sua mão para ir nadar um pouco com o meu filho.
Lucca é discreto nas brincadeiras com Samuel porque sabe
das limitações de Henrico, mas, nem por isso, deixamos de nos
divertir. Eu faço Henrico mover as perninhas enquanto o sustento
pela barriga e ele bate as mãos na água, achando o máximo.
Enquanto isso Lucca brinca de mergulhar com Samuel. Brincamos,
nos secamos, almoçamos num restaurante de frente para o mar,
voltamos para a praia e nos divertimos muito.
— Tia Paula, quero água de coco — Samuel me pede.
— Ok, tia Paula vai buscar. Você quer também, filho? —
pergunto ao meu filho, e ele nega. — E você, amor?
— Não, deixe que eu vou buscar, princesa.
— Não precisa. Samuel pediu a tia Paula. — Sorrio ficando
de pé.
— Ok, tia Paula, mas, você vai vestida assim? — Lucca
pergunta, e eu o encaro.
— Até onde sei estamos na praia — respondo. — Eu vou
vestida assim, obrigada pela preocupação. — Sorrio, pego minha
carteira e sigo para o quiosque.
Peço a água de coco, e quando estou virando para ir embora,
encontro Dandara. Deve ser algum tipo de provação, ou apenas
tenha um propósito divino nesses encontros. Decido conduzi-los
pelo lado bom.
— Dandara? — a chamo, já que o encontro é inevitável.
— Virou rotina nos encontrarmos, não é mesmo? —
pergunta, dando um sorriso sem graça.
— Parece que sim. Samuel está ali na praia com Lucca, vim
buscar água de coco para ele — me explico.
— É? Ele ama mesmo água de coco. Obrigada por isso. —
Ela me agradece e eu fico sem graça, sem saber o que dizer.
Decido seguir meu coração.
— Bom, se quiser se juntar a nós... ouça, eu não tenho nada
contra você, e sinto muito por todas as coisas que passou. Não a
odeio, não é minha inimiga. — Talvez ela esteja sozinha, queira ver
o filho e está sem graça. Não sei o que pensar. Mas, quero que ela
saiba que é bem-vinda, apesar dos pesares.
— Desculpa, mas não me sinto preparada para um passo
desse porte. Eu ainda amo Lucca, Paula. — O excesso de
sinceridade... não sei explicar como me sinto ouvindo-a dizer
abertamente na minha cara que ama meu noivo. Eu até acredito que
ame, mas acho desnecessário dizer isso a mim. De qualquer forma,
tento ignorar o mal-estar que essas palavras me trazem. — Preciso
manter a distância para poder tirá-lo do meu sistema. Sei que não
existe mais qualquer possibilidade de ficarmos juntos, te dou a
minha palavra que jamais tentarei qualquer coisa com ele, mas
ainda não me sinto pronta para conviver com vocês. Isso exigiria
uma maturidade que não possuo. Acho que me entende.
— Com certeza entendo. — Forço um sorriso amigável,
mesmo me sentindo péssima agora. — A admiro pela sinceridade.
Precisamos apenas nos respeitar.
— É isso. — Ela sorri. — Bom, não vou lá mexer com
Samuel, não diga a ele que me viu, ok? A noite irei vê-lo. Estou
esperando que a reforma em minha casa termine entre amanhã ou
depois.
— Está tudo bem. Bom, vou lá.
— Ok. — Eu quase vou abraçá-la, mas isso não é possível.
Ela ama dizer que ama meu noivo, isso me incomoda e eu não
consigo suportar tanto. Sempre tento conduzir as coisas da melhor
forma, mas nem sempre tenho sangue de barata.
Volto para Lucca e nossos filhos. Mesmo eu tentando
disfarçar, não consigo. Está explicito em meu rosto que algo
aconteceu. Ser autêntica e transparente às vezes é como um
castigo.
— Pablo? — ele pergunta, já demonstrando uma certa
tensão. Entrego a água de coco para Samuel e volto o olhar para
ele.
— Dandara.
— O que ela fez? — Balanço a cabeça negativamente e me
afasto das crianças um pouco.
— Só nos encontramos no calçadão. Nos falamos um pouco.
— E por que essa carinha?
— Ela parece gostar de dizer na minha cara que te ama. Isso
me incomoda. Sei que talvez ela te ame, sei que faria muitas coisas
para tê-lo de volta, mas não gosto da necessidade que ela sente em
pontuar para mim o amor que sente por você. Não gosto, me
incomoda, me chateia, muda meu humor. Não gosto que ela te ame,
não gosto que qualquer outra mulher sinta algo por você, e talvez
isso seja apenas ridículo, mas há em mim uma possessividade
sobre você e tudo isso me incomoda. Fui transformada, não era
assim.
— Eu sinto muito que tenha ouvido essas coisas. No fundo
eu tenho esperanças de que o namoro a ajude, que ela me tire do
sistema e seja muito feliz. Sei que está sendo o máximo de sangue
frio que consegue, mas isso vai acabar, meu amor. Apenas confie.
Vai acabar — diz, arrumando meus cabelos.
— Eu confio. — Dou um beijo casto em seus lábios e me
volto para as crianças.
Curtimos nosso domingão, e no final da noite, Lucca volta
para seu apartamento com Samuel.
Após um banho demorado, faço duas pipocas de micro-
ondas sabor manteiga, despejo em uma bacia enorme e vou assistir
filme com meu grudinho, e assim termina meu final de semana
perfeito...
Quando inicia a semana, percebo que me tornei o que mais
temia: a mulher que morre de saudades do namorado, e é incapaz
de ficar dois dias sem vê-lo. Que Deus me ajude! Há uma magia em
torno daquele homem, só isso justifica!
Arremeto forte em minha garota enquanto coisas vão caindo
da minha mesa. Eu pouco me importo, Paula gozando me deixa
insano e meu corpo explode dentro dela fazendo com que um som
rouco escape da minha garganta. Minha mão está em seu pescoço,
a estrangulando, enquanto dou as últimas arremetidas certeiras
fazendo-a gozar para mim. Sob o meu controle e em minhas mãos,
eu amo isso!
— Ohhhh... Lucca...— O gemido dela provavelmente foi
escutado por todos do escritório, e eu mal consigo contê-la. Esse
orgasmo foi mais intenso que o normal. Seu corpo está tremendo,
sua respiração instável o bastante e seus braços acabam de ceder,
fazendo-a cair deitada sobre uma pilha de papeis em minha mesa.
— Oh... meu Deus do céu!!! O que você fez? — ela choraminga
ofegante. Bonita pra caralho! A tentação em pessoa com uma
carinha de plena satisfação sexual. Acho que nasci para dar prazer
a ela, porque ela faz com que eu me sinta muito foda quando
transamos, em especial no pós-sexo. Cara de bem comida... isso
abre meu apetite de uma forma voraz, eu poderia simplesmente
continuar se não estivéssemos em minha sala do escritório e não
tivéssemos compromisso.
Quando meu corpo se acalma, a deixo vazia e tento retomar
o controle.
— Gostou do meu escritório? — pergunto, subindo minha
cueca e minha calça, e então me afasto para pegar lenços
umedecidos para limpar minha linda noiva.
— Não faço ideia... — responde ofegante. — Sua mesa é
forte. Isso vale?
Ela veio conhecer o grande escritório da minha família, mas
sua visita não durou nem dois minutos e eu duvido muito que ela
tenha fixado qualquer imagem da minha sala em sua mente. Nessa
posição fica difícil notar a decoração. Isso me faz dar um sorriso
cafajeste.
No banheiro, pego o pacotinho de lenços e volto à minha
garota. Ela está tão sexy com um vestido estilo "advogada", está
com a as pernas abertas, meu esperma está escorrendo um pouco
em sua doce buceta e eu estou ficando duro novamente. Está
decretado o fim do meu expediente, não conseguirei ter o mínimo de
atenção pelo restante do dia. Mas, ela tem uma audiência em duas
horas... E é por isso que foco em limpá-la.
— Ai meu Deusss... — ela geme assim que eu a toco.
— Ei, você está ultra sensível hoje.
— Estou viciada em você — diz, sentando-se e me puxa para
um beijo. Santa puta que pariu... nunca fui assim com qualquer
mulher antes, mas essa retira minha capacidade de controle de um
jeito louco. Deixo o lenço de lado e aprofundo o beijo. Morar sob o
mesmo teto que ela será uma maldita prova de fogo, principalmente
tendo crianças em nossa rotina.
— Diabinha, acho melhor parar antes que eu te arraste para
o primeiro hotel que encontrar no caminho e a faça perder todos os
compromissos — falo, ao afastar nossos lábios. — Ou talvez eu
apenas te dobre sobre essa mesa e te coma por trás até deixá-la de
pernas bambas.
— Estou tentada a abandonar tudo — sussurra. — Estou com
muito tesão hoje. Amei a ideia de tê-lo me comendo por trás.
— Isso mata um sujeito, Paula! — repreendo desesperado.
Ela não deveria me testar dessa maneira. — Vamos dormir juntos?
Eu posso resolver esse problema. — Sorrio. — Quer?
— Quero. Quando as crianças dormirem... eu vou estar sobre
você, Lucca. — Ela morde minha orelha e eu respiro fundo. —
Limpe minha buceta.
— Assim fica difícil. Acordou com o propósito de me deixar
insano? — pergunto.
— Estava com saudades. Não posso passar dois dias sem
vê-lo mais. Antes parecia fácil, agora não parece. Estou louca com
você em todos os sentidos.
— Vamos nos casar logo, por favor.
— Vamos. Apenas deixe a festa de Samuel passar e eu
prometo focar em nosso casamento, Lucca — ela diz, tocando meu
rosto carinhosamente. — Terei que ir em casa tomar um banho.
— Não vá. Vá trabalhar com a lembrança de que eu te comi.
— Mordo sua orelha, e então ela sorri.
— Você é tão canalha e safado. Olha as coisas que me diz!
Isso é tão... errado.
— Você acha?
— Eu acho, mas gosto — responde. — Quero mais — diz,
fazendo um beiço enorme. — Mas, preciso mesmo ir. Eu voltarei em
breve para conhecer seu escritório. — Minha garota fica de pé e vai
até o banheiro se arrumar. Me acomodo em minha cadeira e aperto
meu pau duro. Puta merda! Há tantas coisas a fazer; terminar a
organização do aniversário de Samuel, encontrar uma escolinha
boa, buscar a casa dos meus sonhos, organizar um casamento. Eu
gostaria tanto de sair atropelando tudo, e apenas não posso, porque
todas as coisas exigem calma, cuidado e atenção.
Sorrio percebendo que estamos em constante fase de
amadurecimento. Estou na fase em que estou tendo que usar todo
meu auto controle em todos os campos da vida, aprendendo a
buscar a calma, a dar um passo de cada vez, ser paciente,
esperar. Logo eu, o tornado rompante que sempre é louco o
bastante para sair como um trator desgovernado.
Minha mulher sai do banheiro e nem mesmo parece que
estávamos fazendo qualquer coisa proibida para menores de
dezoito anos. Há um sorriso largo em seu rosto e ela parece ter
vestido sua armadura de advogada.
— Aooo Paula, eu te meteria um processo agora! — digo,
observando-a ir até o sofá pegar sua bolsa. A bandida simplesmente
se vira de costas e caminha até mim. Ela me puxa pela gravata e
beija minha boca.
— Adeus, bebê Lucca.
— Bebê Lucca meu pau te cutuca.
— Te pego mais tarde. — Sorrio, e ela se vai.
Ao invés de ir para casa, sou convocado para uma reunião de
emergência com meu pai.
Eu, Ava, Gabriel, Victor, Melinda, Davi e Luma, estamos
sentados em volta de uma mesa enquanto ele está de pé com uma
cara muito séria.
— Ok, pai, podemos começar? — Victor pede.
— Se for sobre a empresa, eu sou dentista — Luma informa,
levantando os ombros. — Minha presença é dispensável.
— Ah! — meu pai diz a encarando. — Você é dentista?
— Sou, papai.
— Engraçado isso, porque parece passar mais tempo aqui do
que em seu consultório. — Ele dá um sorriso nada legal e eu quero
rir de Luma.
— Venho ver Davi nas horas vagas — ela tenta se explicar.
— E toda a família.
Todos começam a rir, e eu me rendo a risada também.
Porém, sou o primeiro a parar quando encontro meu pai sério.
Maldição, lá vem chumbo grosso.
— Se você viesse apenas ver Davi, estaria muito bom. E isso
vale para todos — meu pai avisa. — Melinda, você por exemplo, o
que está fazendo aqui?
— É... minha presença nessa reunião é dispensável —
Melinda diz, ficando de pé e meu pai a faz se sentar novamente. —
Desculpa, sogro.
— Um pecador profissional já pede desculpas antes de ser
cobrado, estão vendo? — meu pai diz.
— Pai...
— Bonito o vestido de Paula. — Eu viro o alvo, e todos os
olhares se voltam a mim. — O gemido dela também é interessante.
O da sua mãe é mais grave.
— Puta merda... — Victor diz, soltando o ar que eu nem sabia
que estava prendendo.
— Vocês entendem que isso aqui é uma empresa? Que o
que se passa aqui dentro deve ser conduzido com seriedade?
— Entendemos — digo.
— Parece que não. Ava e Gabriel, Victor e Melinda, Davi e
Luma, e agora Lucca e Paula. O que esses quatro casais têm em
comum? A falta de vergonha na cara e o apetite sexual
descontrolado.
— E o senhor nunca fez sexo com a minha sogra aqui? —
Melinda, a corajosa, pergunta deixando meu pai sem muito
argumentos.
— Não é sobre mim.
— Ahhh! — Ava desafia ficando de pé. — Me diga papai,
você fez sexo com a mamãe aqui?
— Ava, sente-se. — Minha irmã suspira e volta a se sentar.
— Não sou contra sexo no escritório, mas deveriam tentar manter
as coisas separadas. Três casais aqui são casados, dividem o
mesmo teto. Lucca em breve estará casado com Paula. Vocês não
acham que podem deixar o sexo apenas para quando não estiverem
no ambiente de trabalho? Sei que é legal, dá uma adrenalina
diferente, mas, tenham limites.
— A vovó diz que é muito bom ser vida louca — Luma
comenta. — Não que eu concorde...
— Concorda sim — Ava diz rindo.
— Ava e Gabriel, vocês brigam como se estivessem em um
ringue de boxe e logo em seguida estão se pegando como canibais,
como funciona isso? — meu pai questiona.
— Trabalhar com o Piroca Baby é irritante. Ele é bem
irritante, me tira do sério e eu tenho vontade de matá-lo
diariamente.
— E trabalhar com uma atriz pornô é um teste para cardíaco
— Gabriel rebate Ava, e olha para meu pai. — Sua filha é a
personificação do diabo. Eu achava que era ruim antes de conhecê-
la, mas, desde que a conheci, descobri o verdadeiro significado da
palavra RUIM. Ela é ruim e gostosa, na mesma frequência.
— Ah! Cale a boca, merda! — Victor esbraveja, tacando um
corretivo na cabeça de Gabriel.
— Vocês estão demitidos — meu pai avisa, e eu nem sei
para quem foi o aviso.
— O quê? — Ava pergunta.
— Você e Gabriel — meu pai pontua.
— É sério? — Gabriel é quem pergunta agora.
— Aqui não é clube da luta ou estúdio pornô. Os dois só
sabem brigar e trepar, façam isso em outro lugar.
— Aooo estado decadente!!! Gabriel e Ava já têm até música.
Eta cuzãooooo! — digo rindo, e Melinda me acompanha na risada.
— Aooo Melinda, vai rindo! — Victor ameaça. — Vai ser na
emoção.
— Só vem... — ela responde, e se cala quando pega meu pai
a observando. — Mentira. Não vem, Victor.
— Aooo Melinda, larga esse só vem e vem ni mim! — brinco,
tacando uma caneta em Victor. — Ai ai ai, ai ai ai, era pra ser só
uma noite, eu acertei foi uma vida toda.
— Em pensar que essas porras saíram de mim! — meu pai
esbraveja! — Aooo caralho! Onde foi que errei na concepção dos
meus filhos? Eu desisto de vocês! Ava e Gabriel, vocês estão
mesmo demitidos. E, para os que ficam, não se esqueçam que
vocês podem ser os próximos!
— Ok, papai! Mamãe dormiu com um cinto de castidade essa
noite, no mínimo! — Ava rebate meu pai. — Mas, quem precisa de
uma empresa grande para trabalhar? Eu e Piroca Baby teremos um
escritório concorrente. Pequenas empresas, grandes negócios! Não
me queiram como concorrente! Estou avisando! Amigos, amigos,
negócios à parte!
— Se em uma empresa grande, cercados por funcionários,
vocês brigam, têm dificuldade de trabalhar juntos e fazem filme
pornô, imagina em um escritório pequeno, onde não há nada para
controlá-los? A falência desse grande negócio é certa — meu pai diz
rindo, e ele está certo. — Há casais que apenas não nasceram para
trabalhar juntos. Eu e sua mãe, por exemplo. Se eu trabalhasse com
Vic, meu desempenho no trabalho seria um fracasso. Sua mãe é
diabólica, ela é provocadora, perto dela eu sou um monge, um cara
focado em trabalhar sério, sou centrado, dedicado ao trabalho.
— Ok, pai. Talvez o senhor esteja exagerando — Victor diz.
— Você coloca a culpa de tudo em Vic como se fosse mesmo
um santo, mas, minha pouca experiência de vida, diz que é você
quem não presta na relação, o verdadeiro diabo, como Victor é.
Victor é diabólico e coloca sempre a culpa em mim. Eu era inocente,
ainda sou. — Melinda... ninguém pode com essa garota!
— Melinda está disposta a testar meus limites no dia de hoje.
Ela está querendo algo doido. Sempre faz isso quando quer um
pouco de violência — Victor comenta.
— Não precisamos saber da vida sexual dos dois — Luma
diz, e Melinda fica rindo.
— Sugar Daddy...
— Não me chame dessa merda no escritório, Melinda! —
Victor repreende.
— Já deu dessa reunião, não? — pergunto. — Isso está meio
louco.
Meu pai pega um envelope sobre a mesa e entrega a Ava. Eu
nem posso acreditar que é real essa porra de demissão. É no
mínimo engraçado.
Ava abre e lê algo em um papel. Um sorriso enorme cresce
no rosto dela antes de se jogar nos braços do meu pai. Ninguém
compreende nada.
— É a melhor demissão da vida! — ela exclama. — Bem feito
para quem não foi demitido.
— Que merda é essa? — Luma pergunta ficando de pé. —
Eu quero ser demitida também!
— Você nem trabalha aqui — digo rindo.
— Ok, nunca é tarde!
— Volte dessa viagem com a cabeça no lugar, Ava, ou a
demissão será mesmo real — meu pai alerta.
— Viagem? — Victor pergunta. — É assim? Ava sempre foi
mesmo a preferida!
— Sua irmã não tira férias a um longo período, Victor. Preciso
relembrar quanto tempo ficou afastado da empresa? — Essa toca
na ferida.
— Não. Desculpe, pai. Foi necessário, Melinda é novinha,
doida, precisa de atenção, o senhor sabe como é.
— É, me dá um pouco da sua atenção então, Sugar Daddy!
— Jesus! Parem! — meu pai repreende.
— Ok, papai, você é meu preferido do universo, mas me diga
por que Finlândia?
— Lá faz um frio do caralho essa época do ano. Vocês
poderão ficar dentro do quarto gastando energia, quando voltarem,
certamente estarão mais calmos. Eu ficarei com meu neto.
— Meu pai não vai curtir muito isso — Gabriel comenta rindo.
— Da última vez que eu e Ava fomos passar um final de semana na
Ilha, Théo ficou com você.
— Théo vai ficar comigo! — meu pai exclama muito decidido.
— Théo é meu neto!
— É neto de Túlio também — Victor diz rindo.
— Mas ele é mais meu neto do que neto de Túlio, e tenho
dito!
— Ou seja, enquanto Ava e Piroca Baby fodem na Finlândia,
a gente se fode aqui separando mais uma briga entre Túlio
Salvatore e Matheus Albuquerque — comento.
— Cada um tem a foda que merece — Piroca Baby diz, e
Victor dá um tapa na cabeça dele. — Adeus, para quem fica! — O
filho da mãe fica de pé. — Obrigado, sogrão. Pela passagem e pelo
capricho na hora de fazer sua filha! Ninguém me tira do quarto! —
Meu pai dá um soco bem dado no braço dele.
— Já posso ir? Estou sentindo uma fraqueza sinistra — peço,
ficando de pé.
— Lucca, eu não estou brincando com você! — meu pai
avisa. — Sexo é em casa ou qualquer outro lugar que não seja o
trabalho.
— Tudo bem, desculpa, pai. Não vou dizer que não vai
acontecer novamente, mas posso prometer tentar me controlar. Se
bem que minha noiva é bem gostosa. A boca dela... sangue e fogo!
— Sorrio. — A gente fez amor, uô uôooooo! Aoooo Davi, você fica aí
só no silêncio! Pai, não vai sobrar para o Davi? Todo mundo tomou
no cu, ele precisa tomar também.
— Davi é um príncipe — meu pai diz, e a gargalhada é geral.
— Meu príncipe gostoso, tesão. — Luma o puxa pela gravata,
e o caos volta com força.
— LUMA! — Depois dessa eu saio da reunião de malucos.
Eu sou o mais normal e o mais santo de todos eles. É
verdade.
Você diria que a treta acabou, mas a noite é que começa a
verdadeira guerra. De um lado, Túlio Salvatore; de outro, meu pai!
Foi uma péssima ideia vir jantar com meus pais. Por sorte meu filho
está distraído com um joguinho, enquanto Théo está entre dois
semi-adultos.
— Ele vai ficar comigo! Pare com isso! Você quer
monopolizar todas as crianças! Sei que todos têm dormido com
você constantemente! — Túlio argumenta.
— Eu não tenho culpa se você não é um avô descolado. Eu
sou o preferido e mais divertido.
— Théo ficará comigo!
— Por cima do meu cadáver! — meu pai rebate. — Eu
inventei a viagem, porque além de ser o melhor avô, sou o melhor
pai e melhor sogro!
— Você sabe que sou um assassino?
— Deus! Apenas parem com isso! Como essas crianças vão
crescer? Théo não é santo, já é endiabrado, aí ele chega na escola
amanhã dizendo que o avô é um assassino! — Analu repreende, e
Victor chega com Melinda e as crianças.
— Tio dindo!!! — Théo corre para os braços de Victor
[BB1]enquanto Soso vem andando de um jeitinho engraçado até
mim.
— Quem é a princesa do tio dindo? — pergunto a ela.
— Soso — responde, e eu sou absurdamente apaixonado por
essa garota. Inclusive, quero muito ser pai de uma menina.
— Ok, está decidido, Théo ficará comigo e NÃO TEM
CONVERSA OU DISCUSSÃO EM RELAÇÃO A ISSO! — Victor
anuncia muito bravo, e Soso franze a testa, o encarando de um jeito
que me faz rir.
— Está vendo? É culpa sua, babaca! — Túlio esbraveja
socando meu pai, e ganha um tapa na cabeça. Parecem ter
dezesseis anos de idade.
— Eu não digo é nada — minha mãe diz.
— Acabou de dizer, fodida Sadgirl do meu...
— PAI! — Victor repreende. — Sophie repete tudo o que
dizemos.
— Fodida — Soso diz, e apenas eu ouço.
— Não pode dizer isso, ok? É muito feio dizer essa palavra.
Você é uma princesinha que não fala coisas feias. — Ela dá um
sorriso diabólico, e eu decido que não quero mais ter uma filha.
— Tio Lucca, você pode brincar com a gente? — Aurora
pede, e eu não resisto à bolinha de queijo. Deixo os adultos
discutindo e levo todas as crianças para a área externa da
cobertura.
Eu amo minha família e o quanto eles tentam conduzir tudo
com humor, brincadeiras, e se permitem ser crianças. Nenhuma
discussão é cem por cento séria. Muitas das vezes acho que meu
pai faz essas loucuras só para arrancar risos de todos, e Túlio
também é assim. São os ensinamentos da vovó, sobre as
maravilhas de ser vida louca. E, digo com propriedade, é muito
melhor ser vida louca, em todos os sentidos. Olhar a união e a
felicidade de todos ali dentro é algo bonito para se guardar na
memória. Saber que meu filho agora faz parte dessa loucura é
incrível também. Falta apenas minha noiva e meu enteado. Espero
que logo Henrico possa fazer parte de toda essa loucura.
No final da noite recebo uma ligação de Paula dizendo que
não poderá ir dormir comigo. Não tenho nem como ficar frustrado.
Há em minha cama meu filho, Aurora, Tiago, Soso, Miguelito e
Théo, porque se meu pai é o melhor avô, eu sou o melhor tio e
carrego todos para a minha casa. Graças a Deus minha cama é
gigante, mas essa noite não caberei nela, definitivamente.
Fazemos uma sessão cinema e os seis desmaiam pouco
antes do filme terminar. É uma cena muito linda e até fotografo para
mandar no grupo da família. Levo meu travesseiro para o quarto de
hóspedes e me acomodo na cama. Ainda estou sem sono, por isso
fico assistindo uma série e conversando com Paula por mensagem.
"Manda nudes, gata" — peço a ela.
"Manda você primeiro, sou tímida." — Sua resposta me faz
rir.
"Partiu fazer um sexo virtual sinistro? Vou te chamar no
Facetime, vou tocar uma canção para você. Aooo Paula, Jacinta
como sou bom na arte de tocar uma. Tenho que te mostrar meu pau
por chamada de vídeo porque não cabe na foto."
"Eu sei como é bom na arte de tocar. Estou mesmo
imaginando isso agora. Se é uma brincadeira, apenas pare, está
surtindo um efeito febril em meu corpo." — Era brincadeira, mas
parece que está deixando de ser.
Estou tentando a fazer a chamada de vídeo quando o
interfone toca, desanuviando minha mente do sexo. Atendo e o
porteiro avisa que é Dandara, isso me deixa em estado de alerta.
Quando abro a porta, encontro uma Dandara machucada e
perdida, que se joga em meus braços e chora desesperadamente.
— O que houve? Se acalme. Está machucada. O que
aconteceu? — pergunto, sustentando seu corpo. A puxo para
dentro, fecho a porta e a carrego até o sofá, onde nos acomodamos.
Ela está tremendo, muito nervosa e vulnerável. O machucado em
sua testa está me assustando.
— Estou com medo. Ninguém mais no mundo conseguiria me
entender, só você. É por isso que estou aqui, me desculpe por isso
também. Eu faço tudo errado, mas só você vai me entender — diz
desesperada.
— Medo de quê? Eu vou ajudá-la, apenas pare de chorar.
Está segura. Vou protegê-la. Alguém está te perseguindo?
— Estou com medo de deixar de te amar. — Meu coração
para de bater por alguns segundos, e ela simplesmente se mantém
abraçada a mim. — Se eu deixo de te amar, como vou me sentir?
— Me explique isso melhor. Não estou conseguindo entender
bem. Quer um pouco de água?
— Sim, por favor. — A afasto e vou pegar água para ela. Ao
invés de voltar ao sofá, me acomodo na mesa de centro, de frente e
bem próximo a ela. Ela sente que só eu posso entendê-la, e eu acho
que talvez seja isso. A água parece acalmá-la um pouco, mas ainda
está tremendo.
— Como machucou a testa?
— Bati com força no carro de Nicolas.
— Nicolas? Seu namorado? — pergunto.
— Sim.
— Ele fez mal a você? O que está havendo? Preciso ir socá-
lo?
— Não, ele não fez mal algum a mim, muito pelo contrário.
Fiz mal a ele. — Ok, preciso me manter impassível. — Para variar,
não é mesmo?
— Eu não ia dizer nada — falo, levantando as minhas mãos.
— É, você é um cavalheiro. — Ela dá um sorriso fraco, e
então reparo em suas roupas. Pode parecer bobeira, mas eu nunca
vi essa mulher com uma calça de moletom. Alguém está passando
por mudanças.
— Me conte o que está havendo — peço.
— Estou com medo de deixar de te amar — repete.
— Por quê?
— Porque sinto que não me restará nada. Se esse
sentimento se for, o que vai restar?
— Você pode transformar esse amor em um outro tipo de
amor — comento. — Dandara, posso ser bastante sincero com
você? Não quero que se sinta mal, então, se não quer minha
sinceridade basta dizer e eu me manterei calado.
— Por favor, diga.
— Você não me ama. Eu amei você, mas não recebi esse
amor de volta. Não estou diminuindo seus sentimentos, nem nada
do tipo, mas eu amei por nós dois, muito. Eu sofri como um
desgraçado durante dois anos, corri atrás de encontrá-la,
investiguei, eu te procurei como um dependente. Foi muito difícil
para mim viver sem você, muito. Para você foi fácil.
— Não foi fácil.
— Foi fácil — afirmo. — Acho que você sentiu a culpa por ter
ido, sentiu solidão, e sofreu porque eu tentava suprir toda essa sua
carência, eu preenchia os espaços vazios, te dava todo o meu amor.
Mas se você me amasse, não suportaria a distância por tanto
tempo, não suportaria, Dandara. Eu não suportei, quis morrer só
para parar de doer — confesso. — Eu vivi dois anos de bebida e
sexo para tentar fazer parar de doer. Você estava bem com o nosso
filho, o protegendo. Poderia ter escolhido me proteger também, sabe
disso. Sabe que eu teria deixado tudo e teria lutado junto com você.
Se você me amasse nós estaríamos juntos hoje. O que acontece
com você, na minha humilde opinião, é que talvez eu tenha sido o
único cara que te deu toda a verdade, que se entregou, que quis te
dar o mundo, e é por isso que acha que me ama. Você sente falta
do que eu te dava, mas não necessariamente me ama, está apenas
carente. Acredito que tenha sim gostado de mim, muito, mas não
acredito que tenha me amado.
— E como conseguiu superar? — ela pergunta. — Dizem que
o amor só se vive uma vez.
— Dizem um monte de coisas que não faz o menor sentido.
— Ela balança a cabeça em concordância. — Encontrei Paula em
um saguão de hotel em Las Vegas. Eu já estava caminhando para
te tirar do sistema, a única coisa que sentia era uma mágoa
tremenda, mas não te amava mais. O amor que eu sentia foi
sofrendo mudanças, foi se acabando com o tempo, mas a mágoa
nunca mudou. Então conheci a Paula de uma maneira muito
inusitada, e ela me cativou. Eu entrei de cabeça, sem medo de ter
meu coração despedaço mais uma vez. Eu me abri, permiti que ela
entrasse, mergulhei de cabeça e eu a amo. Eu a amo porque me
permiti amar novamente, a amo porque eu quis amar. A amo muito e
ela retribui. A reciprocidade faz o sentimento fortalecer a cada dia,
Dandara. Sem reciprocidade, tudo acaba.
— Ela é uma mulher incrível, não é mesmo?
— Ela é — digo, dando um sorriso fraco. — Mas você
também é, e talvez seja isso que esteja faltando em sua vida.
Enxergar que é uma mulher incrível e se abrir à possibilidade de um
novo amor, sem medo. Você não tem medo de deixar de me amar,
você tem medo de desprender de algo que supria sua carência.
Você não me ama de verdade, você se apegou a essa crença
porque ela te mantém segurando em algo, entende? Você deve
pensar que se libertar disso vai deixá-la vazia, mas não vai. Vai
apenas deixá-la livre para se aventurar novamente. Eu só consegui
quando soltei o nó que me prendia a você, é o que precisa fazer
também. Nos conhecemos numa fase em que estava vulnerável,
mergulhada no sofrimento, fui a sua luz naquele momento e você se
apegou a isso.
— Nicolas tem vinte e um anos — comenta, me
surpreendendo. O cara que ela estava não parece ter essa idade.
— É esse o problema?
— Também — confessa. — Eu tenho trinta e sete, Lucca. Ele
tem uma vida inteira pela frente, e é um homem incrível. Sou
carente.
— Eu sei, mas o que Nicolas quer? Já perguntou isso a ele?
Sua opinião não deve ser a única a ser levada em conta. Você tem
essa mania péssima de tomar as decisões sozinha, precisa
aprender a levar em consideração a opinião das demais pessoas. Já
conversou com ele?
— Nossa situação não é o que parece ser — diz. — E eu não
sou capaz de te contar, porque é algo absurdo e tem ligação com
você.
— Não vou achar ridículo — afirmo. — Principalmente vindo
da mestre da impulsividade. Pode me dizer, quero ser seu amigo.
— Eu... quis contratá-lo para ser meu acompanhante no
aniversário de Samuel. — Eu tento não me mostrar chocado, mas
falho.
— Uow!
— Eu não queria ir sozinha. Há você e Barbie, há toda a sua
família. Como eu ficaria naquela situação? É algo difícil para mim,
por isso entrei em um site de sugar mommy, como Victor fez.
— Meu Deus! — Quero rir, mas contenho. — É real?
— É, mas ele não aceitou ser contratado. Ele não estava no
site para ganhar dinheiro, e sim para se aventurar com uma mulher
mais velha. Ele é maduro o bastante, mais que você, se quer saber.
— Não é difícil ser mais maduro que eu — digo rindo. — Eu
levo a vida como um adolescente, sou maduro apenas quando é
extremamente necessário.
— É, como seu pai. — Ela sorri. — Vocês são idênticos.
— É o que dizem.
— Então, nós saímos, mas... eu não esperava química
alguma. Só queria mesmo contratá-lo para fingir ser meu namorado.
Surpreendentemente, contrariando todas as leis, o garoto prometeu
que desgraçaria minha vida com um sorriso e virou um tormento.
— Aooo... hein? — Estou sem saber o que dizer. — O que
fará meritíssima digníssima maravilhosíssima? Está me dizendo que
o novinho te laçou?
— Não.
— Sim.
— Não estou.
— É por isso que está chorando e vivendo esse martírio. É
incapaz de dar o braço torcer — repreendo. — Pare de ser assim,
não há vergonha em se entregar e assumir. Quanto quer o garoto?
— Quero.
— Quanto.
— Eu o quero, isso basta. — Ô mulher do cão! Isso me faz rir,
porque ela é única mesmo. Ela é foda. Tinha me esquecido desse
jeito filho da puta de ser.
— Pobrezinho. Tão jovem... — brinco. — Talvez eu deva
conhecê-lo e dar uns conselhos.
— Não há graça, Lucca.
— Há sim. — Sorrio. — Não cometa os mesmos erros que
cometeu comigo. Tente ouvi-lo, pergunte, leve a opinião dele em
consideração. Se houver reciprocidade, mergulhe de cabeça, se não
houver, você é linda pra caralho e tudo o que mais existe são
homens torcendo por uma chance. Ainda é jovem e há toda uma
vida pela frente. Faça diferente dessa vez.
— Ele não quer mais.
— Quer sim — afirmo por pura intuição. — Talvez ele esteja
assustado, como você também está. Um garoto de vinte e um anos
encontra um mulherão como você, como acha que ele se sente,
Dandara? Já parou para pensar nisso? Eu era mais velho que ele e
fiquei perdido quando te conheci. Pense nisso. Ele deve estar
receoso, principalmente porque sabe que tudo começou por conta
de uma espécie de contrato que tem relação direta com o seu ex.
Na mente dele, você me ama.
— Talvez seja porque eu disse a ele que te amo, no primeiro
encontro.
— Às vezes, ocasionalmente, em algumas situações, eu sinto
vontade de sacudi-la — confesso, passando as mãos em meu rosto.
— Ok, Dandara, rainha da merda, converse com ele de coração
aberto. Pare de se boicotar e transforme seu amor por mim em um
amor de amigos. Ficarei feliz por receber esse sentimento. Eu amo
Paula, espero que você encontre um amor também.
— Eu te amo por me ouvir e por ser meu porto seguro
mesmo quando não estamos juntos. — Sem palavras, engulo a
seco enquanto a observo. — Vou deixá-lo descansar. Amanhã
posso pegar nosso filho?
— Claro. Quer ver como ele está agora? — ofereço, e ela
aceita. A levo até meu quarto e ela sorri com os olhos cheios de
lágrimas.
— Uma tropa!
— De elite. — Sorrio.
— Obrigada por fazê-lo feliz, Lucca.
— Obrigado por me dar o melhor filho e tê-lo educado tão
bem. Você é incrível, meritíssima — digo, beijando o topo de sua
cabeça.
— Obrigada por me receber. — Balanço a cabeça e a
conduzo até a porta. — Obrigada mesmo, irei deixar de te amar —
ela brinca, e me abraça no momento exato em que a porta do
elevador se abre revelando minha noiva.
— Ok, obrigada mais uma vez. — Dandara se afasta. — Oi
— diz a Paula.
— Oi — minha noiva cumprimenta, porém, não há nada
educado nesse cumprimento.
— Bom, vou deixá-los. Amanhã pego Samuel, Lucca.
— Tudo bem. — Dou um sorriso e ela se vai. Paula
permanece calada e passa por mim, entrando em meu apartamento.
Ela segue diretamente para o sofá, se senta e fica me aguardando.
— Ei, princesa, nem um beijo? — pergunto, me
aproximando.
— São quase uma da manhã — fala. — Quase uma da
manhã e Dandara estava abraçada a você na porta.
— Espero que não esteja levando as coisas para onde acho
que está — digo.
— Me explique o que ela estava fazendo aqui — pede num
tom autoritário que nunca vi antes. Respiro fundo e me acomodo ao
lado dela.
— Ela precisava conversar. Está um pouco perdida, teve
problemas com o namorado — explico, e Paula começa a rir. Ela
está realmente nervosa, tanto que fica de pé. Agora sou o sério da
história, porque as coisas estão caminhando para o lado da
desconfiança.
— Ela teve problemas com o namorado e veio até você,
Lucca? Está falando mesmo sério?
— Sim, eu estou falando sério, Paula. Dandara teve
problemas não apenas com ele. Ela está em uma fase de
mudanças, tivemos uma longa e boa conversa amigável. Dandara
precisava de alguém para guiá-la e veio até mim, estava nervosa
quando chegou, inclusive bateu de carro.
— Tudo bem, Lucca. A mulher que diz o tempo inteiro que te
ama veio até aqui uma hora dessa chorar as pitangas pelo
namorado que ela não ama? Isso é absurdo, Lucca!
— Você acha que estou mentindo? — pergunto. — Alguma
vez eu já te dei motivos para duvidar de mim?
— Muitas coisas mudaram desde que Dandara voltou. Eu
tenho sido extremamente paciente, Lucca, quase no patamar de
uma santa. Tenho aguentado tudo, te incentivado a ser o melhor
para ela e para o seu filho, mas está ultrapassando os limites. Eu
não sou obrigada a ficar plena e segura em todas as situações. A
mulher diz o tempo todo que te ama, me olha com sangue nos olhos
e estava agarrada a você. Se fosse Pablo abraçado a mim uma hora
dessa, você iria gostar?
— Não pedi para você gostar, Paula. Entendo seu
descontentamento, mas estou dizendo a você o que de fato
aconteceu. Não há motivos para insegurança ou desconfiança,
inclusive eu iria te falar sobre a vinda dela.
— Estou cansada. É como se todos os acontecimentos
tivessem me atingindo em cheio apenas agora. Não estou satisfeita
com absolutamente nada disso, acho que atingi o limite.
— Paula, Dandara é a mãe do meu filho. Nós vamos
conviver, há escolas para vermos juntos, festas de aniversário,
festas de escola, há uma vida toda do nosso filho para convivermos.
Sei que está magoada, que é complicado, mas você não imagina o
alívio que essa conversa de hoje me trouxe. Não imagina quão bem
estou me sentindo por conseguir ver uma amizade nascendo entre
nós dois. É importante para Samuel, importante para mim,
importante para Dandara. Ela precisava dessa conversa para soltar
a parte que a mantinha presa a mim e eu acho que ela vai conseguir
isso. Ela é a mãe do meu filho. Você mesma me deu vários
conselhos em relação a isso. Não estou te entendendo.
— Te dei conselhos sim, acho que devem ter uma relação
amigável, mas isso não significa recebê-la em sua casa em horários
inapropriados.
— Se eu tivesse que fazer algo com ela o horário seria
apenas um mero detalhe, Paula. Não existe um horário ideal para
transar, entende? Não vem ao caso. Estou com você, sou seu noivo,
quero me casar, quero tê-la grávida de um filho meu. Dandara ficou
no passado, atualmente ela é apenas mãe do meu filho, e isso é
tudo.
— Eu, provavelmente, também sou mãe de um filho seu —
diz, limpando as lágrimas de seu rosto. — Me desculpe por vir. Foi
uma péssima ideia, estou uma bagunça.
— Você quer dizer o que com isso?
— Qual parte?
— Está grávida? — pergunto, sentindo meu coração bater
mais forte.
— Não tenho certeza — diz, jogando uma caixinha de teste
de farmácia em mim. — Não é o momento, Lucca. Não quero
descobrir isso agora, após esse pequeno desastre. Não estou bem
comigo mesma, estou passando por um monte de questões, um
monte de mudanças, estou confusa, chorona, medrosa, estou um
monte de coisas... — Levanto, puxando-a para os meus braços.
— Acha que está grávida?
— Talvez. Não sei... estou brava. — Sorrio. Ela é engraçada
quando está brava.
— Você precisa fazer xixi nisso aí.
— Não farei agora, Lucca. Primeiro eu quero esquecer a
noite de hoje, então, quando eu estiver bem, no meu estado normal,
quero fazer e descobrir se vamos ter um bebê. Quero fazer isso em
um momento alegre, porque se for positivo, comemoraremos.
— Não me torture.
— Lucca, não me agrada que receba sua ex uma hora dessa.
A mulher te ama.
— Porra, Paula! — digo frustrado. — Eu já compreendi! Mas
isso é mais importante que saber se está grávida de um filho meu?
Dandara não me ama.
— Ama.
— Não ama não, Paula. Apenas esqueça ela. Isso não vai
mais acontecer, porque eu vou sequestrá-la para morar comigo.
Você, nosso garoto, e os 12 bebês que teremos. Apenas não duvide
de mim. Não gosto de vê-la desacreditando em minhas palavras.
Sou verdadeiro e sincero com você.
— Vocês estavam abraçados.
— Era um abraço de agradecimento. Não posso empurrar a
mulher, Paula. Eu e Dandara estamos caminhando para a zona de
amizade, isso é um grande avanço. Não vou impedir isso.
Entenderia se fosse amiga do Pablo. Inclusive, quando a confusão
de BH aconteceu, Pablo esteve sob o mesmo teto que você por
alguns dias e eu confiei, eu confio em você, em nós. Eu e você
vamos morar juntos, meu filho vai estar sempre conosco e a mãe
dele vai aparecer ocasionalmente.
— Ok. Estou nervosa, vou para casa. Quando eu estiver
calma, conversaremos.
— Durma comigo.
— Não.
— Por favor?
— Nem fodendo.
— Só um cochilo?
— Nem um cochilo
— E se eu te comer forte até espantar a maldição dessa
raiva? Parece uma opção boa para você, Paula?
— Aí já é um caso a se pensar. — Isso me faz sorrir.
— Então vamos iniciar esse trabalho aí! — digo, beijando-a
com vontade. — Eu te amo, Diabinha.
— Não vim para dormir — fala ofegante. — Meu irmão
chegou de viagem e roubou a minha cama. Está dormindo com
Henrico. Saí para comprar o teste e roubar um beijo.
— Você saiu do Recreio para roubar um beijo?
— É, eu aprendi isso com o melhor. — Ela me dá um beijo
casto e se afasta. — Nos falamos depois, Lucca.
— Fui reduzido a Lucca. Bacana, Paula Jacinta. Vamos ser
formais agora.
— Sim. Não estou boa com você, Lucca, saiba disso.
— Eu te seguiria até em casa, mas há seis crianças em
minha cama. — Ela arregala os olhos. — É, Soso, Tiago, Samuel,
Théo, Aurora e Miguelito. A creche do tio Lucca é real. Não gosto da
ideia de tê-la saindo tarde da noite sozinha.
— Ficarei bem, tenho uma arma.
— Não sei se isso é bom, mas me ligue quando chegar e seja
muito prudente essa hora, ok? Tem certeza de que não vai rolar
uma chuva de xixi?
— Oh, isso foi tão horrível! — diz, finalmente rindo. — Muito
horrível!
— Vamos lá, só um xixizinho.
— Não. Fique com o teste, em outra ocasião faremos isso.
Não sou a Madre Tereza, repleta de paciência e benevolência.
Estou puta, está ouvindo?
— Me bate então! — incito. — Vamos lá. Enfia a porrada.
Que tal quebrarmos a cama? Eu posso amordaçá-la, as crianças
nem vão ouvi-la. Você me bate, eu esbofeteio sua bunda, te faço dar
umas gozadas sinistras. Vamos foder, Paula?
— Adeus!
— Ahhhhh, você não sabe, vídeo chamada, meu pau também
não vai caber na tela. É melhor pessoalmente.
— Adeus, Lucca!
— Que tal tomar um vinho? Um banho? Uma rolada? Vem,
Paulinha!
— Paulinha é o inferno! — avisa ameaçadoramente. — Não
me chame de Paulinha.
— Jacinta minha mágoa por estar brigando comigo. Vá
embora então, Paula. É isso aí! É por isso que os casamentos não
dão certo.
— Não somos casados.
— Para você ver! — Ela começa a rir. — Nem nos casamos e
já estamos passando pela maior crise das nossas vidas.
— Pare de me fazer rir.
— Vá! Mas fique sabendo que você foi a culpada desse amor
se acabar, você quem destruiu a minha vida, você que machucou
meu coração, me fez chorar e me deixou num beco sem saída. Não
vou chorar por você porque homem não chora, Paula! — Ela me
puxa pela camisa e passa a língua pelo meu pescoço. Isso me deixa
duro prontamente, e eu deixo de brincar, puxando-a para mais perto.
Enfio uma mão entre seus cabelos e puxo sua boca para a minha.
Minha língua brinca com a dela e ela tenta morder meu lábio inferior.
Minha outra mão vai até seu pescoço e eu afasto nossos lábios para
observá-la. — Quero você nua.
— Não posso, preciso mesmo voltar para casa. Eu quero
muito você, nu, mas preciso ir, bebê Lucca. Eu amo você.
— Também amo você. Vá, antes que eu mude de ideia. —
Ela sorri, se afasta e dessa vez vai. Antes de entrar no elevador, a
chamo. — Ei, me desculpe, ok? Não fiz por mal. Só queria ajudá-la.
— Ok. Você é extremamente bom, Lucca. Durma bem.
— Me ligue quando chegar.
Eu não recebo uma ligação informando que chegou bem.

Não sei mais onde colocar todas as flores que Lucca está me
mandando. Já recebi mais de 15 buquês e daqui a pouco terei que
sair do meu escritório para caber tudo. Tudo isso porque estou
magoada e não liguei para ele ontem a noite quando cheguei em
casa. Na verdade, eu estava tão exausta psicologicamente, que voei
nos braços do meu irmão e dormi agarrada a ele como pedra.
Há muito acontecendo em um curto intervalo de tempo. Volta
da Dandara, sequestro, pedido de casamento, Pablo resolveu ser
mesmo um cara que nasceu pelo cu, preciso colocar Henrico em
uma escolinha e estou me cagando. Mesmo com a ajuda dos meus
pais, me sinto meio perdida, e como se estivesse depositando sobre
eles uma carga que é minha. Me tornei pai e mãe do meu filho e
tenho medo do futuro, quando Henrico questionar sobre o pai.
Tenho medo de que ele cresça traumatizado, medo de não dar
conta sozinha, é muita responsabilidade e a vida voando na
pressão, tudo rápido demais. Em alguns momentos sinto vontade de
fugir e ficar num local isolado por pelo menos cinco dias, sozinha.
Não sei como dar conta de conciliar trabalho, filho, noivo, todas as
atividades do meu filho, adaptação... Acho que atingi o meu limite de
forma que pequenas coisas estão ganhando uma proporção
gigantesca dentro de mim. Não sou a mulher maravilha, embora eu
esteja tentando dar conta de tudo. Para completar, tenho que lidar
com Dandara. Sei que ela está perdida, que é sozinha, que precisa
do apoio de Lucca, mas PORRA! EU SURTEI VENDO-A
AGARRADA A ELE! Eu, que nunca quis matar ninguém, quis matá-
la e nem é para tanto. Confio em Lucca, merda!
Estou magoada, mas não sei o que falei que fez Lucca
acreditar que estou magoada num nível extremo. As flores apenas
não param de chegar e todas elas com bilhetinho pedindo
desculpas. Esse homem é louco!
Quando dá meu horário de ir almoçar é que o nível de
loucura aumenta. Eu mal saio do edifício, e sou cercada por dois
homens: um com um violão e o outro responsável pela cantoria. Não
sei como não saio correndo, simplesmente começo a rir porque ele
se superou nessa. Misericórdia, eu vou matá-lo! O cara está
cantando Raça Negra e um monte de pessoas estão parando na rua
para olhar a vergonha que estou pagando no débito. Eu taco o foda-
se e começo a cantar o refrão junto. Só faltou uma garrafa de pinga,
aí a brincadeira ficaria perfeita. Até danço com o cantor que me
rodopia e me pega em seus braços enquanto dou gargalhadas.
Talvez eu seja louca.
O mel do seu beijo tem o gosto do amor
Me leva junto com você, me leva junto com você
Meu bem, eu te peço, não me deixe só
Me leva junto com você, me leva junto com você
Ninguém te pertenceu
Ninguém te ama como eu
Não deixe o sonho terminar
Meu coração é o seu lugar
Meu corpo é todo seu
O seu calor me aqueceu
Não deixe a chama se apagar
Meu coração é o seu lugar
Quando ele termina a música, eu peço mais uma.
— Cheia de manias para finalizar? — peço, e o moço ri.
— Ok, é a saideira! — informa, e começa a cantar. Quando
dou por mim, há geral cantando no meio da rua, incluindo eu.
Deus, eu vou matar o Lucca com força! Se antes eu estava
mal-humorada, agora estou no auge do contentamento.
Então me ajude a segurar
Essa barra que é gostar de você
Então me ajude a segurar
Essa barra que é gostar de você
Hiê!
Didididiê
Didididiê
Ê ê ê Didididiê
Uma chuva de pétalas de rosa começa e eu levo minha mão
à boca. Eu só queria entender como ele conseguiu fazer tudo isso.
É um grande exagero, mas não consigo parar de rir. No final do
"show" eles me entregam uma caixa com um cartão em cima e vão
embora. Agora sim eu fico com vergonha, e simplesmente saio
andando apressada até o restaurante onde almoço.
Me acomodo na mesa de sempre, peço um suco e abro a
caixa. Há pelo menos 30 testes de gravidez e eu me pego
impactada, até mesmo esfrego minha testa. Se eu digo para esse
homem que estou grávida, o que ele será capaz de fazer?
Tenho a péssima ideia de abrir o cartão enquanto tomo o
suco de canudinho. Assim que leio, eu me engasgo a ponto de a
garçonete vir esmurrar minhas costas.
“Aoooo Paula, Jacinta minha ansiedade! Te dei uma
chuva de pétalas de rosas, agora me dá uma chuva de xixi,
deixe os testes e o chão moiado! Pense com carinho, coração.
Bebê Lucca, o amor da sua vida, sim senhora!”
Ok. Quando me acalmo, peço a minha comida e uma música
começa a tocar no restaurante. Uma música que me faz começar a
rir sozinha, é uma sofrência sem fim. Pego meu celular e ligo para
Lucca, ele atende já se desculpando.
— Aooooo Paula, tô sofrendo demais nessa vida. Me
perdoa.
— Lucca, você está ficando louco? Tem ideia do que está
fazendo? — pergunto, tentando não rir.
— Não sei, porque você disse adeus!
— Eu não disse adeus, Lucca! — rebato.

— You say goodbye and I say hello[2].


— Eu não disse goodbye! — Explodo em uma gargalhada.
— Só de pensar em te perder por um segundo, eu sei que
isso é o fim do mundo!
— Por que está fazendo toda essa loucura?
— Me perdoa, meu amor. Você é a coisa mais linda desse
universo. Perdoa se eu te magoei, nunca quis desatar o nó que nos
prende. Eu fecho meus olhos e só vejo a imagem da sua boca
perfeita e carnuda, isso me deixa desesperado demais, Paula. Se
eu te perco, me perco e não me encontro. Se te acho, me acabo. —
Lispector, Lucca.
— Deus do céu... — Estou chorando de rir.
— Paula, princesa, você não é peão, mas laçou meu
coração.
— Eu te perdoo, Lucca. Apenas pare de me fazer rir. Estou
quase fazendo xixi. — Eu dou um salto quando do nada o
endiabrado surge do meu lado. — Misericórdia, Lucca.
— Vai lá, amor, faz um xixizinho! — diz, me entregando uma
das caixinhas de teste.
— Onde você estava?
— Só vai lá e faz xixi. — Gente...
— Lucca...
— Pelo amor de Deus, Paula, eu não dormi. Tô num
sofrimento desgramado, já pensei até em tatuar seu nome na minha
outra polpinha do bumbum em busca do perdão. Preciso saber se
está grávida do meu bebê. Espero que sejam três de uma só vez. —
Volto a rir.
— Três filhos? Se eu engravido de gêmeos já fico louca,
Lucca. Imagine trigêmeos? Já tenho Henrico, você tem Samuel.
Precisamos apenas de mais um bebê. Você quer que eu faça um
teste em um restaurante?
— Sim, em qualquer lugar. Apenas faça, meu amor. Eu te
amo demais. Há mais de 13 buquês prontos para serem entregues
em seu escritório. E eu acho que precisamos de três bebês.
— Lucca, eu serei demitida de tanto receber flores — digo,
rindo de desespero.
— Vem trabalhar comigo, satisfação garantida.
— Ok, eu vou almoçar, pegarei minhas coisas no escritório e
iremos para o seu apartamento fazer o teste. De acordo?
— De acordo — concorda, e eu levo as mãos em seu rosto.
— Me desculpa?
— É claro que eu desculpo, meu amor. Eu amo você, muito,
mesmo você sendo completamente louco e tendo um repertório
único.
— Você é uma deusa, uma louca, uma feiticeira — a
garçonete chega justo quando ele diz isso, e tenta a todo custo não
rir. Ela falha e eu não a culpo.
— Me desculpem.
— Está tranquilo — digo rindo. — Obrigada pela refeição.
— O senhor deseja alguma coisa?
— Desejo que essa mulher pare de pisar no meu coração e
me conceda o perdão para eu ter o sossego dos justos. Há algo que
possa ajudar nisso? — pergunta sério, e ela sorri.
— Há sim, logo trarei. — Franzo a testa e encaro Lucca, que
dá um sorriso angelical.
— Diga que não me fará passar mais algum tipo de vergonha
— peço.
— De forma alguma, meu amor. Vamos dividir essa comida
aí? — Ele pega os talheres e decide me dar comida de aviãozinho,
pedindo desculpas o tempo todo. Em alguns momentos ele come
também. Até o suco ele traz à minha boca.
Quando termino, a garçonete traz uma sobremesa sem eu
nem mesmo pedir. Ela quebra um enorme ovo de chocolate e dentro
dele há uma caixinha de veludo. Lucca a pega e a abre revelando
um novo anel de noivado.
— Lucca...
— Esse é diferente, eu juro — diz. — Há nove pedras nesse
anel. As nove qualidades essenciais para sermos felizes em nosso
casamento: generosidade, sabedoria, confiança, amor incondicional,
força de vontade, honestidade, sensibilidade, senso de humor e
otimismo. Temos essas novas qualidades, Paula. Estou ansioso
para construir uma família com você, ansioso para dividir o mesmo
teto, a vida com você. Me perdoa?
— Eu já perdoei um milhão de vezes, Lucca — respondo
emocionada. — Eu te amo. Quero me casar com você. Devo pedir
desculpas também, não estou sendo a mais sincera com você.
— Por quê? O que há de errado?
— Estou cansada — digo, libertando o choro e o abraço. —
Estou cheia de medos. Meu filho perdeu o pai. Ele já não era
presente mesmo, mas ainda aparecia. E então meu bebê precisa
entrar na escola, porque a terapeuta disse que é extremamente
importante, e se ele não de adaptar? E se fizerem bullying com ele?
Se ele sair da escola traumatizado? Se...
— Respire.
— Vamos nos casar, e... eu não queria sobrecarregá-lo com
todos os meus problemas, me sinto extremamente mal por isso.
Você não tem a obrigação.
— Eu quero ser tudo para você e tudo para Henrico —
afirma. — Nunca quis roubar o lugar do Pablo, mas eu prometo a
você que tratarei Henrico como meu filho, porque eu o amo e ele é o
nosso garoto desde sempre. E vou ajudá-la a encontrar uma escola
boa para ele, vou te ajudar com as crises, vou te ajudar com tudo,
meu amor. Não está sozinha, sei que não gosta de sobrecarregar
seus pais, mas estou aqui com você.
— E se eu estiver grávida?
— Eu nem sei dizer o que farei — diz sorrindo. — Talvez eu
perca a mão em minha loucura, porque eu nunca quis nada como
quero um filho com você. Nunca quis nada como quero uma vida
com você. Sou louco, sou brincalhão, mas sou seu porto seguro,
Paula e sei conduzir as coisas com seriedade. Você terá meu apoio,
grávida ou não. Vamos buscar o melhor para o nosso garoto, e
vamos lutar a cada dificuldade que ele tiver, juntos, sempre juntos.
— Essas palavras ajudam tanto, tanto. E o que estava sendo um dia
louco, vira um dia emocionante de um minuto para o outro.
— Deus me deu você — digo, agarrada a ela. — Foi Ele, e eu
nunca, jamais, serei capaz de agradecer o bastante. Você salvou a
minha vida.
— Você salvou a minha. Agora pare de chorar, princesa. Isso
não estava script de loucuras que preparei. Há muitas ainda pela
frente e preciso de você bem para me ajudar a segurar essa barra
que é gostar de você. Ok? — Volto a sorrir e balanço minha cabeça
positivamente.
Ele segura minha mão e adiciona o anel em meu dedo,
unindo ao que eu já possuía. Sorrio quando ele beija.
Duas horas depois, após termos colocado todas as flores
dentro dos nossos carros, chegamos ao apartamento dele e não
tenho opção. Lucca quer a minha chuva de xixi de qualquer modo e
parece muito desesperado, tanto que quer entrar no banheiro
comigo. Obviamente impeço.
Faço xixi no bastão, me limpo e saio do banheiro. Meu
menino maluquinho coloca até cronômetro.
Ele agora está usando uma calça de moletom cinza e
bebendo um copo gigante de Whey, aguardando...
Meu lado tarado surge com força e eu me pego apalpando o
volume em sua calça.
— Aoooo, satanás! Você quer me distrair do propósito! — me
repreende.
— Você está me devendo uma foda destruidora.
— Só deixa aquele resultado ali sair para você ver... se der
negativo, é hoje que te engravido, Paula. O síndico vai bater nessa
porta, mas nem guindaste me tira de cima de você. — Sorrio, e o
cronômetro apita. — Puta merda! Eu vou desmaiar! Você deveria ir
ver o resultado, e me falar com muita delicadeza. É sério.
— Não era você o mais ansioso?
— Eu vou passar vergonha, Paula. Vou cair duro nesse chão.
Pelo amor de Deus, meu amor, confio em você para me dizer com
delicadeza — pede, puxando a cadeira e se acomodando. Isso me
faz rir.
— Ok.
— Misericórdia nessa sua bunda. Vou morrer enterrado nela!
— comenta, quando caminho até o banheiro.
Fecho meus olhos e pego o teste, sentindo meu coração
acelerar de uma só vez. Agora estou nervosa, ansiosa, medrosa,
um monte de coisas. Demora alguns segundos até que eu tenha
coragem de encarar a situação, e, quando faço, a brincadeira dura
pouco, porque sou eu quem perco as forças das pernas e caio dura
no chão.
Um baque no banheiro e eu paro de brincar de dramatizar.
Dou um salto da cadeira e corro para encontrar Paula desmaiada no
chão. O susto é tão grande, que eu deixo de lado o teste e a pego
em meus braços, desesperado.
A carrego diretamente para a minha cama e dou tapas leves
em seu rosto. Não sei como acordar uma pessoa de um desmaio,
mesmo que eu tenha visto meu pai e Victor caírem duros no chão
uma meia dúzia de vezes. Por sorte, Deus sentiu meu desespero e
minha garota começa a despertar. Ela abre os olhos, eu respiro
aliviado e saio correndo para o banheiro em busca do teste. Ela vai
sobreviver, mas eu provavelmente não irei se ficar ao menos cinco
minutos sem saber o resultado.
Esse clear blue é sinistro mesmo. Estou embriagado lendo
GRÁVIDA 2 - 3. Eu vejo o banheiro girar bem diante dos meus olhos
e me sento na privada. Grávida 2 - 3.
OK.
Isso significa que Paula está grávida? Porque significa que eu
provavelmente estou indo ter um infarto e ela será mãe sozinha,
novamente. Sorrio desse pensamento e volto a parar de brincar
observando o teste. Puta merda! Paula está grávida de um filho
meu! Samuel terá um irmãozinho ou irmãzinha, e isso é louco
demais. Não vi o nascimento do meu primeiro filho, mas verei do
segundo e pensar nisso me deixo ligeiramente ressentido. Mesmo
que essa seja a notícia mais foda dos últimos tempos, me pego
pensando na reação do meu primogênito, não quero que ele se
sinta triste ou desfavorecido em relação a mim; que ele fique
magoado pelo fato de eu morar com meu segundo filho e não morar
com ele. Essa é a parte ruim da separação; não que eu tenha me
separado de Dandara, mas eu nunca imaginei que seria pai e viveria
separado da mãe do meu filho. As consequências estão aí. Não vivo
com a mãe do meu primeiro filho, e a minha atual mulher está
grávida. É um pouco confuso para mim, principalmente por eu não
fazer ideia de como lidar com isso em relação a Samuel. Minha
preocupação é compreensível, é a preocupação de um pai que ama
o filho e teme que ele se sinta menos importante. Há coisas tão
grandiosas e importantes passando em minha mente agora. Estou
dividido entre querer gritar ao mundo que serei pai e chorar de
felicidade e ressentimento.
O choro vence. Eu serei pai, verei Paula grávida, verei o
desenvolvimento da gestação, teremos nosso filho e teremos que
lidar com a inclusão de Henrico e Samuel nesse acontecimento
grandioso. Deus sabe o quanto eu quis isso, mesmo que tenhamos
decidido há pouco tempo. Na verdade, ao que parece, essa
gravidez aconteceu bem antes de programarmos e não consigo
compreender, já que Paula fazia uso de método contraceptivo. Algo
deu errado, mas é um errado que deu certo. Teremos nosso
sonhado filho e isso significa muito para nós dois.
Me lembro de quando Victor descobriu que seria pai e quase
caiu duro no meio do fórum da Barra. Agora compreendo o impacto
dessa notícia na vida de uma pessoa, mas, não cederei ao desmaio.
Alguém nessa família Albuquerque Brandão precisa enfrentar as
coisas sem desmaiar. Eu serei esse cara, ao menos por enquanto.
Fico de pé, deixo o teste sobre a pia e volto ao quarto. Ela
está de pé, tomada pela tensão, com um milhão de receios
passando em sua mente. Consigo lê-la tão bem que sou capaz de
ouvir seus pensamentos. Enquanto isso, estou aqui, diante dela,
gritando internamente que serei tudo o que ela precisa que eu seja,
que estarei ao lado dela em todos os momentos, que farei da sua
gravidez a melhor fase, e que eu a amo pra caralho. Também estou
gritando que vou sequestrá-la desde já para morar comigo, porque
não suporto mais viver sem ela estando sob o mesmo teto que eu.
Minha garota de Las Vegas será mãe de um filho meu e se
tornou meu grande amor. Quem diria que uma noitada de sexo
quente, onde até gatos surgiram no quarto e tivemos amnésia, nos
traria ao dia de hoje.
— Estou feliz e estou com medo — confessa chorando. —
Mas, estou mais feliz do que com medo. Você é capaz de
compreender isso? Talvez eu esteja soando confusa. — Ela ri entre
lágrimas.
— Minha Mulher Maravilha! Eu compreendo você — digo,
oferecendo a mão a ela e logo tenho seu corpo grudado ao meu. —
Multiplicamos nosso amor, Diabinha. Ainda não estou acreditando
— confesso. — Achei que reagiria diferente, que iria enlouquecer e
quebrar o apartamento inteiro de tanta felicidade. Acredite, você me
fez o homem mais feliz com essa notícia, mas apenas parece que
estou sonhando. Você está grávida. Puta merda! Grávida! Você é o
motivo!
— O motivo. — Sorri me abraçando forte.
— Vamos marcar um jantar com nossos pais? Eu não posso
guardar essa notícia. Jantamos com os seus pais hoje e com os
meus amanhã — digo, fazendo-a rir. — Seu pai vai cortar minhas
bolas? Ele provavelmente vai! É melhor termos um pouco de sexo
de despedida agora, Paula.
— Meu pai ficará preocupado por conta de todas as coisas
que passei com Pablo, mas ele é um pouco apaixonado por você.
Ficará feliz por nós — comenta, me tranquilizando. Deus! Essa
mulher está grávida e eu serei pai. Meu coração está uma bagunça
agora. Eu quero arrastá-la até o primeiro cartório e exigir um
casamento nesse minuto, mas, apenas não posso.
— Diga que está grávida.
— Estou grávida — ela fala, e eu a pego em meus braços,
fazendo-a rodear suas pernas em torno da minha cintura. — Você
acha que nosso bebê será autista? — Isso me desarma.
— Seja o que for, essa criança será a criança mais amada do
mundo, bebê Paula. Assim como Henrico e Samuel. O que mais
temos dentro de nós é amor, e é isso que daremos aos nossos
filhos, independentemente de qualquer coisa.
— Será que Henrico e Samuel entenderão bem?
— Vamos conversar muito com nossos garotos, eles
entenderão bem e ficarão felizes. Somos uma grande família agora.
— Será que...
— Chega, ok? Você está pirando, apenas confie e fique
calma. É só um bebê nessa barriguinha e isso simboliza todas as
coisas boas do mundo. Nada é mais lindo que isso, Paula. Há dois
corações batendo dentro de você. Essa é a experiência mais foda
das nossas vidas. Apenas felicidade, meu amor.
— Apenas felicidade — concorda.
— É isso. Só diga mais uma vez...
— Eu estou grávida.
Agora eu entendo o real significado de música para os meus
ouvidos.

Às oito da noite estaciono em frente à casa dos pais de


Paula. É ela quem vem me receber na porta toda linda, mais linda
que o normal. Radiante, eu diria. Está vestindo um macaquinho
branco curto, curto pra caralho. Estou puto ao extremo por ver o par
de coxas gostosas e bronzeadas que essa mulher tem. Subo meu
olhar e encontro um decote bem generoso. Seus cabelos estão
levemente ondulados. Em seus pés há uma sandália alta demais
para uma grávida usar. Não é que eu seja controlador, mas e se ela
cair? Diabos! Eu vou enlouquecer nessa gestação, porque sou
extremamente protetor, vou querer colocar Paula em uma redoma e
serei chato ao extremo devido ao excesso de cuidado. E, ela não
gosta de ser controlada, de forma alguma. Ela vai rebater todos os
meus argumentos e não vai compreender que é apenas
preocupação e zelo.
O infarto é certo.
— Bebê Lucca! — diz, se jogando em meus braços.
— Você está maravilhosa! — elogio, inalando o cheiro de seu
perfume. — Eu certamente fui homem muito bom em outras vidas
para merecer uma mulher como você.
— Após o jantar eu tenho uma surpresa para você. — Há um
sorriso travesso em seu rosto agora, e eu percebo que vou me dar
bem com essa surpresa.
Um vulto chama a minha atenção e eu a solto para pegar
Henrico, que anda com extrema dificuldade.
— Meu garoto!
— Oi — ele diz esfregando um de seus olhos. — Estou com
fome.
— Vamos comer então! — exclamo sorrindo. — Tio Lucca
está com muita fome de leão.
— Cadê o Samuel? — pergunta.
— Samuel está com a mamãe dele, mas prometo levá-lo para
brincar com ele, ok?
Ele concorda e entramos. É engraçado que ele não me solta,
e por isso cumprimento a todos com ele em meu braço.
— Aooooo sogrão!!! — cumprimento meu sogro, e ele ri.
— Aooo menino Lucca, bem-vindo.
— Obrigado. Sogrão caprichou hein! — digo, puxando Paula
e dando um tapa em sua bunda. A cara que ele faz é impagável. —
Com todo respeito, meu sogro, sua filha é...
— Eu tenho um belo soco de esquerda, garoto — ele diz, e
Paula vai se sentar na perna dele. — Minha menina é mesmo linda.
Puxou a mãe.
— Dona Marisa está com tudo em cima, não é mesmo dona
Marisa? — brinco com minha sogra. — Bom, não vou esperar o
jantar.
— Lucca! — Paula repreende ficando de pé.
— Esperar o quê? — meu sogro pergunta, e levo um beliscão
que me faz rir.
— Aooo Paula, Jacinta essa notícia saindo de mim.
— Não é o momento ideal — argumenta, com as bochechas
coradas. — Meu irmão nem virá. — Ela pega Henrico dos meus
braços e o senta em sua cadeirinha. Enquanto é isso, sou alvo do
olhar curioso de Paulo, meu sogro.
— Por que os dois estão de segredinhos? Posso saber? —
pergunta, e decido que o momento de me acomodar à mesa, ao
lado dele. Espero até que minha sogra se acomode também para
poder dizer.
— Bom, o senhor não sabe, mas sua filha é o motivo — digo.
— Acho que os senhores já me ouviram dizer isso e não
compreenderam, mas estou aqui para explicar que ela é o motivo de
muitas coisas, mas, principalmente, da minha felicidade. Nosso
encontro foi inesperado, tanto para mim, quanto para ela. Nos
conhecemos da forma mais louca possível, é engraçado que
moramos em bairros vizinhos e nunca tínhamos nos encontrado
antes, fomos nos encontrar em Las Vegas.
— Quando aquele babaca do Pablo deixou minha menina
plantada feito árvore no altar — ele resmunga.
— Graças a Deus ele fez aquilo, senhor Paulo. — Sorrio.
— Eu tenho que concordar. Graças aquela atitude, minha
menina conheceu um homem que a mereça de verdade.
— Eu mereço, não é mesmo? — Sorrio. — O senhor não
sabe, mas eu me apaixono pela sua filha um pouco mais a cada dia.
Paula mudou minha vida, radicalmente. A conheci quando me
encontrava completamente sem perspectivas. Eu nem mesmo tinha
vontade de voltar ao Brasil até ela surgir. Enfim, temos um
relacionamento muito sério, senhor Paulo. Eu amo sua filha, amo
Henrico como se ele fosse meu filho, mesmo sabendo que não é. O
senhor sabe que pedi a mão dela em casamento.
— Sei sim.
— Acontece que quero antecipar a data — digo,
surpreendendo até mesmo Paula.
— O desespero desses jovens. Eles acham que podem se
casar da noite para o dia — ele diz rindo. — O amor é assim
mesmo, meu filho. Há aquela vontade de atropelar todas as coisas.
— Sim, eu já estava demasiadamente ansioso, porém, agora
estou muito mais.
— Eu já compreendi — minha sogra diz sorridente, e segura
a mão de Paula por cima da mesa. Minha noiva começa a chorar e
eu começo a sorrir.
— Não sei se o senhor ficará feliz, mas eu espero do fundo
do meu coração que fique. Marcamos esse jantar para anunciar que
Paula está grávida, teremos um bebê e eu sou o homem mais feliz
do mundo, senhor Paulo. — Ele fica de pé, engasgado pela
emoção. Me puxa pelo braço e logo estou de pé também,
recebendo um grande abraço que me deixa emocionado.
Quando se afasta, vai até a Paula e é a vez da minha sogra
vir me abraçar.
— Parabéns, meu filho! Você é o homem que sempre sonhei
para a minha filha e esse bebê é um ser humano de sorte por ter
vocês dois como pais. Você trouxe luz e alegria para a nossa
família, Lucca. Mudou a realidade da nossa filha. Nós seremos
eternamente gratos por ver nossa menina sorrir tanto e ver o amor
que tem com o nosso Henrico. Só tenho a agradecer a Deus, aos
seus pais pela educação que te deram, e a você por ser tão bom.
— Prometo fazê-la feliz, prometo cuidar da nossa família,
dona Marisa. Prometo dar o suporte que Henrico precisa. Eu os amo
muito.
— Sabemos disso. — Ela limpa as lágrimas, e é a vez da
minha Diabinha vir me abraçar.
— Você é o melhor! Eu te amo demais!
— Também te amo demais, princesa do agreste. Agora temos
que armar uma cena lúdica para contar ao nosso garoto. — Ela abre
mais um sorriso gigante.
— Após o jantar, ok?
— Ok. Vocês são os motivos!
O tão sonhado aniversário do meu filho chegou! Parece que a
criança sou eu, diante de toda a empolgação em que me encontro.
Três aninhos! O primeiro aniversário dele que passaremos juntos e
a primeira festa. Espero ter ultrapassado a expectativa do meu filho
em relação à festa, busquei tudo que crianças gostam. Ter
sobrinhos foi de grande ajuda para eu descobrir o que faria a alegria
de todos.
Infelizmente meus familiares da Califórnia não conseguiram
vir, mas, estamos fazendo questão de gravar cada detalhe para que
eles possam acompanhar de lá. Isis tem conversado com Samuel
por vídeo chamada quase todos os dias e todos os demais estão
sempre fazendo o mesmo. É incrível como conseguimos
permanecer unidos mesmo com tamanha distância.
O tema da festa é URSO MARINHEIRO, para combinar com
o cenário paradisíaco de Ilha Grande. Hoje está fazendo um lindo
dia, perfeito para todas as atividades aquáticas que a equipe de
recreação desenvolveu para a festa. Parece que Papai do Céu
resolveu caprichar para o grande dia ser inesquecível para meu filho
e para os demais convidados.
Para que Henrico pudesse se sentir incluído na festa, tive o
cuidado de preparar uma área especial para ele, onde não há muito
barulho e onde ele pode encontrar o sossego que tanto gosta e
precisa. Com isso, já ganhei ao menos 300 beijos de Paula,
algumas apalpadas no pau e muitas crises de choro de emoção.
Porém, todo esse afeto está prestes a diminuir, já que Dandara
acaba de chegar e é uma presença extremamente importante para o
dia do nosso filho ser ainda mais perfeito.
— Mamãeee!!! — Samuel grita ao vê-la, e sai correndo para
os braços da temida meritíssima que se transforma em uma boba
alegre perto do filho.
— Meu pinguim! — ela exclama sorridente. Porém, a
conheço bem o bastante para notar que o sorriso não alcança os
olhos. Aos poucos se aproxima, com receio de quem sabe que está
sendo devidamente avaliada. — Lucca! Parabéns! Esse lugar
parece uma Ilha da magia! As crianças estão amando pelo que
estou vendo.
— Sim, fico feliz que tenha gostado. Samuel parece ter
amado, está se divertindo bastante. — Sorrio.
— Obrigada por dar isso ao nosso filho. Eu sempre sonhei
com o dia que ele teria uma festa cheio de amiguinhos e junto da
família. Bom, não somos uma família tradicional, mas, ainda assim,
somos família pelo nosso filho. Eu não teria conseguido preparar
20% do que você fez, acho até que exagerou — diz rindo. — Mas,
está tudo perfeito, Lucca. Obrigada mesmo!
— Não precisa agradecer. O sorriso no rosto dele é o que nós
dois queremos.
— Com certeza sim.
— Onde está o garoto de açúcar? Afinal, foi para vir com
você nesse aniversário que ele surgiu. — O sorriso dela vacila, e eu
até mesmo vejo seus olhos se encherem de lágrimas. Garoto de
açúcar é o apelido que dei ao tal Nicolas.
— Ele não pôde vir — diz balançando a cabeça,
demonstrando um certo nervosismo. — Estudando.
— Mentira — afirmo.
— Não quero falar sobre isso. Talvez você entenda errado o
que vou dizer, mas já está sendo muito difícil estar aqui hoje,
sozinha. Venho de uma semana extremamente difícil, foi uma luta
para enfrentar o desânimo e vir à festa do nosso filho.
— Vocês não estão juntos? Algo deu errado? — Ela dá um
sorriso fraco e desvia o olhar do meu.
— Acho que Deus resolveu que é o momento exato para eu
pagar por todos os pecados que cometi. Quer dizer, comecei a
pagar quando perdi você, mas parece não ter sido o suficiente. Pela
primeira vez estou sendo uma mulher que nem mesmo você
conheceu. Parece que não está dando certo, continuo perdendo
pessoas e não faço mais ideia sobre qual caminho seguir. Eu gosto
daquele garoto, e talvez ele não goste de mim, o que é super
compreensível. Sou bem mais velha, bem complexa, bem difícil de
lidar, uma carga muito pesada para um jovem homem. Pode ser que
eu tenha sido apenas uma experiência para ele, não sei dizer. Estou
pagando porquê... de tantos homens no universo, eu tive que gostar
de um novinho, cheio de vida, cheio de garotas, cheio de pureza...
— As lágrimas escorrem pelos olhos dela. — Eu gosto dele, e ele
pensa que eu fiz algo que não fiz.
— O que ele pensa que fez?
— Ele pensa que foi aprovado na vaga de estagiário no
Fórum da Barra por minha interferência, mas não foi, Lucca. Ele é
competente, estudioso, inteligente, mereceu essa vaga. A promotora
Lívia armou para parecer que eu influenciei a escolha.
— Precisa provar isso. Onde está a Dandara que eu
conheço? Ela atropelaria Lívia em questão de segundos.
— A Dandara parece uma merda grande e talvez tenha sido
melhor. Nicolas merece alguém melhor, alguém que não destrua
tudo e todos.
— Pare! Você está se auto depreciando. Isso não combina
com a meritíssima maravilhosíssima excelentíssima... — repreendo,
mas sou interrompido de dar um sermão.
— Olá, Lucca, essa é a mãe de Samuel? — Érica, uma
cliente e amiga da minha família, surge sorridente.
— Olá, Érica, é um grande prazer recebê-la — digo sorrindo.
— Sim, essa é Dandara, mãe de Samuel. Dandara, essa é Érica,
uma cliente do escritório e amiga da família.
— Oh! Espere, essa é Dandara, a juíza? — Érica pergunta.
— Sim.
— Meu Deus! Você é maravilhosa! Formam um lindo casal!
— elogia, analisando Dandara de cima à baixo.
— Não somos um casal, mas obrigada pelo elogio, senhora
Érica — Dandara se esquiva educadamente. — Bom, vou em busca
do meu garoto. Me deem licença.
— Ainda iremos conversar, Dandara — aviso, e ela apenas
balança a cabeça em concordância.
— Me desculpe, Lucca, eu não imaginei...
— Sem problemas, Érica. Fique à vontade e aproveite a
festa. — Sorrio educadamente e me viro para encontrar Paula. —
Oi, Diabinha!
— Vim ficar um pouco com você, minha mãe está com
Henrico, e adivinha? Ele fez amizade com Sophie — ela diz
radiante. — É o primeiro contato dele com uma garotinha. Você
acha que eu o coloquei em uma redoma?
— Não, seu filho é novinho, autista, cheio de limitações. Você
está respeitando o tempo de desenvolvimento dele, Paula. Aos
poucos está o introduzindo ao convívio social. Acho que terapeutas
e profissionais, que trabalham com você ajudando Henrico, já
disseram isso alguma vez.
— É só que... eu fico ansiosa, Lucca. Eu vejo todas as
crianças correndo, brincando, gritando, se divertindo. Queria tanto
que o meu filho pudesse fazer o mesmo.
— Aos poucos vamos chegar lá. Henrico é uma criança
inteligente, Paula. Ele tem algumas dificuldades em andar, em
socializar, mas ele é bastante inteligente e esforçado. Vamos com
calma, meu amor. Um passinho de tartaruga por vez e nosso garoto
vai melhorando a cada dia. Ele já não está expulsando pessoas
novas, está dando a chance de se aproximarem. Isso já é algo
grande. — Ela balança a cabeça em concordância. — E nosso
bebê?
— Está bem, muito pequenino para sentirmos, mas sei que
está bem — diz sorridente. — Eu ouvi a senhora chamada Érica.
— Sinto muito.
— Acredito que isso vá acontecer muito no dia de hoje. É
só... novo para mim. E novo para você também. Eu não estava
esperando, na verdade, eu não havia pensado que as pessoas iriam
tratá-los como uma família. É só... estranho. Sei que é bobeira, mas,
não é muito agradável ver pessoas dizendo que seu noivo e a ex
dele formam um lindo casal.
— Imagino que não seja fácil, amor, mas acho que isso tudo
é muito bobo e não deve permitir ser afetada. Vamos nos casar, há
um bebê meu em seu ventre e nosso foco deve ser exclusivamente
à nossa relação. Tudo que os outros dizem, bom, é o que eles
dizem. Não podemos controlar o que as pessoas querem dizer ou
interpretar, mas podemos controlar nossas ações diante do que as
pessoas dizem. Não me impactou que Érica tenha dito aquilo. Não
deixe que te impacte também, Diabinha. Eu te amo muito.
— Não vou deixar. Só quis conversar um pouco. Estou com
meu humor oscilando hoje. Num momento estou hiperativa, no outro
pensativa, em seguida estou agindo dentro da normalidade. Me
sinto uma terrível bagunça, bebê Lucca. Minha primeira gestação foi
mais controlada, não houve toda essa loucura de oscilação.
— É porque não estava grávida de um Albuquerque, bebê
Paula. — Sorrio, puxando-a para meus braços. — Meu gene é osso
duro de roer. É preciso ser forte para aguentar a pressão.
— Um bebê Albuquerque, hein? — ela diz, apertando minha
bunda. — Quero transar, mesmo que não seja possível agora.
— Aoooo Paula, tente se controlar, mulher. Você acaba de
me foder. Vou passar a festa pensando que há uma loira gostosa
querendo me dar. — Eu não sei se amo ou odeio minha noiva
agora, por me deixar duro em pleno aniversário do meu filho.
— Vou ali ficar com Henrico, bebê Lucca, mas estou de olho
em você.
— E eu em você — aviso sorrindo, e ela se vai. — Aooo
Paula, não sei se você é mais gostosa indo ou vindo — grito, e ela
se vira sorridente, enviando um beijo.
Quando me viro, encontro uma cena bem diferenciada:
Dandara está no pula-pula com Samuel, dando gargalhadas e saltos
gigantes. Isso parece estar atraindo demasiada atenção. Talvez seja
pelas gargalhadas altas, ou pela cumplicidade que existe entre ela e
o nosso pequeno filho.
— Papai... vemmm! — Samuel grita e eu pondero.
— Não faça isso. É apenas uma criança querendo brincar
com os pais. Não há crime algum nisso — Victor diz. — Lucca, você
ama Paula. Paula sabe que você e Dandara possuem um elo, assim
como ela possui um elo com o babaca do pai de Henrico. É preciso
maturidade de todas as partes envolvidas para lidar com a diferença
entre as relações que existem entre vocês. Você precisa ser amigo
da mãe do seu filho, pelo seu filho. Paula precisa ter uma relação
boa com o ex, mesmo que agora tudo esteja demasiadamente
complexo entre eles. Não se retraia. Você ama Paula e a respeita.
— Sim, eu a respeito e a amo. Eu sabia que teria que estar próximo
de Dandara no dia de hoje e isso não é errado. Somos pais de
Samuel e é o aniversário dele que estamos comemorando.
— Papaiiii
— Estou indo, filho — respondo, dando dois tapas no ombro
do meu irmão e me junto a eles.

Passo grande parte do tempo envolvido em atividades com


meu filho.
Sou uma merda espectadora da festa. Da vidraça da sala que
foi reservada à Henrico eu observo cenas que fazem meu coração
sangrar. Pela primeira vez consigo enxergar Dandara, Lucca e
Samuel como uma família em potencial, uma linda família, daquelas
de tirar o fôlego.
Não são os hormônios falando agora. É visível, e sinto que
todos os presentes nessa festa estão tendo o mesmo pensamento
que eu. Tudo que ouvi as pessoas dizendo sobre Dandara não
condiz com o que estou vendo agora. Ela parece sofrer alguma
espécie de transformação quando está com o filho. Ali, brincando de
guerrinha de balão de água com o meu noivo e Samuel, há uma
mulher de riso largo que se transformou em uma criança grande no
dia de hoje para fazer o filho feliz. E, talvez pareça equivocado o
que vou dizer, mas, também pela primeira vez, estou vendo uma
grande compatibilidade dela com Lucca. O lado crianção dela se
encaixa perfeitamente o lado crianção de Lucca, e é algo
dolorosamente bonito de se ver. Os três estão brincando,
gargalhando. Mas, o que mais está causando impacto em mim, é a
felicidade de Samuel por ter os pais juntos nesse dia, eu nunca o vi
tão feliz, tão radiante. Em vários momentos ele faz questão de
abraçar os dois juntos, e a cada vez que acontece sinto meu
coração despedaçar. Me sinto como se estivesse destruindo a
felicidade de um garotinho. Se eu não tivesse entrado na vida de
Lucca, provavelmente eles iriam ficar juntos, mais cedo ou mais
tarde. E seriam uma linda família, repleta de felicidade,
cumplicidade, diversão.
Não é um ciúme bobo também, embora eu esteja sim com
ciúme. É só... horrível sentir como se estivesse estragando uma
família, embora eu saiba que não fui eu quem estragou as coisas
entre eles. Sou mãe, e houve uma época em que quis muito que
meu filho tivesse uma linda família, quis muito fazer meu
relacionamento com Pablo dar certo, porque em minha mente meu
filho merecia uma família linda, unida. Vendo a felicidade de
Samuel, eu também acho que ele merece isso, mesmo que implique
diretamente na vida do bebê em meu ventre.
Estou confusa, sem lugar, me sentindo uma invasora num
momento tão familiar e bonito. Me sinto como "a outra" agora e não
desejo a qualquer mulher se sentir dessa maneira. Tudo em mim
grita para que eu conserte as coisas e os permita viver mais
momentos como esse... eu acho que me odeio agora, odeio meu
altruísmo, minha empatia, minha sensibilidade. Odeio ser
desprovida de egoísmo, porque eu queria tanto ser egoísta agora,
com todas as forças, e apenas não consigo.
Quando chega o momento dos parabéns, Lucca vem me
chamar, mas eu não posso ir. É o momento mais temido por uma
mãe de uma criança autista, por isso, após explicar a ele, me junto
ao meu filho no tapete, o pego em meus braços e tento distraí-lo do
barulho. Eu não gosto que essa casa seja totalmente de vidro,
porque consigo ver tudo daqui e vejo o momento exato em que
Lucca e Dandara se juntam à Samuel para uma sessão de fotos.
Não consigo evitar que as lágrimas caiam e decido que não posso
mais permanecer aqui, chorando em plena festa de aniversário do
filho do meu noivo.
Com uma imensa dor no coração, fico de pé, pego minha
bolsa, seguro meu filho e vou embora sem que possa ser notada.
Só quando a lancha me deixa no cais de Conceição me dou
conta de que deixei não apenas Lucca, mas meus pais. Isso me
deixa pior do que já estou, por isso, pego meu celular e ligo para a
minha mãe, que atende no primeiro toque:
— Paula, minha filha, o que está acontecendo?
— Mãe, eu precisei... — digo perdida. — Eu, não sei o que fiz
e o que estou indo fazer. Só quero ir para casa.
— Lucca está indo atrás de você com o seu pai, minha filha.
Ele está desesperado. — Merda! Ainda estou com ela no telefone
quando vejo uma lancha vindo à toda velocidade. — A festa meio
que parou.
— Não foi a minha intenção, mãe. Eu não quis isso... só
queria ir embora — argumento, e vejo meu pai e Lucca andando
apressados em minha direção. Chego a estar trêmula e fria.
— O que aconteceu? Você está passando mal? Precisamos
levá-la ao médico? Há algo com Henrico? — Lucca está tão branco
quanto é possível estar.
— Está tudo bem, eu só quis vir embora.
— Minha filha, você quase nos mata de susto — meu pai diz,
pegando Henrico de meus braços.
— Por que quis ir embora, Paula? — Lucca questiona, e
agora seu semblante muda de desesperado para decepcionado.
— Não é algo para ser conversado agora — digo a ele que,
sem deixar de olhar nos meus olhos, pede algo ao meu pai:
— O senhor pode levar Henrico de volta à festa? Vou
conversar com Paula e quando terminarmos solicito a lancha.
— Tudo bem, espero que fique tudo bem, meus filhos — meu
pai diz e se vai com Henrico, deixando-nos a sós. Lucca me leva até
um banco próximo à areia da praia e nos acomodamos.
— Por que decidiu ir embora sem nem sequer se despedir de
mim ou dos seus pais? — pergunta, com uma calmaria que faz meu
sangue gelar.
— Não estava me sentindo bem. Estou confusa.
— Confusa? Confusa com o quê?
— Você, Dandara e Samuel — confesso, incapaz de olhá-lo
nos olhos.
— Ok. No português bom e claro, você está com ciúmes
porque eu e Dandara estamos dando atenção ao nosso filho
aniversariante? Mais claro ainda, você nos viu próximos e ficou
insegura?
— Sim.
— Ok, Paula! E por isso você juntou suas coisas e sumiu —
diz, olhando para o mar, desolado. — Eu não sei mais o que fazer,
não sei como provar a você o meu amor. Parece que tudo que faço
não é o suficiente, não sei conduzir as coisas, Paula. O meu filho
está lá, radiante, feliz por ter o primeiro grande aniversário dele. Ele
é uma criança e quer os pais próximos a ele nesse dia. E é isso que
estamos dando a ele, Paula. Tenho certeza que o fato dele estar
tendo os pais perto dele nesse dia está o fazendo muito mais feliz
do que todas as merdas dos brinquedos mais caros que aluguei.
Meu filho está radiante, e a felicidade dele era para ser a minha
felicidade. Porém, deixa de ser quando a minha noiva, mãe do meu
segundo filho, resolve me deixar em plena festa porque está
insegura por eu estar agindo como qualquer pai BOM deveria agir.
— Vocês... ele está tão feliz tendo os dois juntos.
— E ele vai ficar feliz para sempre, Paula. Porque eu e
Dandara sempre estaremos juntos por ele, sempre que ele precisar.
E você sabe disso, inclusive, se me lembro bem, você me incentivou
a ter um bom relacionamento com a mãe do meu filho. É isso que
estamos tendo, um bom relacionamento, um relacionamento
amigável. Algo totalmente diferente do relacionamento que eu tenho
com você. Dandara se tornou uma amiga, não nutro qualquer merda
que seja por ela, além de um carinho de amigos. Nós tivemos uma
história juntos, tivemos um filho e eu não vou destruir a relação
bonita e saudável que estamos criando. Eu preciso que entenda que
você é a mulher que eu amo, a mulher que eu desejo. Deixo isso
claro em todos os momentos, Paula, está explícito. Todos sabem
disso, Dandara sabe disso, só você parece não saber.
— Eu sinto muito. Eu me senti como uma penetra naquela
festa, como se estivesse impedindo Samuel de ter a família...
— Pare com isso! Eu fiz tudo para você estar aqui comigo, ao
meu lado. Preparei um local para Henrico, todos os momentos eu
vou até você, te dou um beijo, brinco com o nosso garoto.
Infelizmente você não pode estar na festa como todos os demais
convidados, mas eu e minha família estamos fazendo o que
podemos para levar uma festa mais calma até você e Henrico. Eu,
Dandara e Samuel somos uma família, você não destruiu nada,
apenas somos uma família diferente da família que estou indo
construir com você. É questão de maturidade conseguir
compreender e separar os diversos tipos de relações. Não esperava
isso de você, pelo amor de Deus, você já me deu baile de
maturidade centenas de vezes. Agora eu me encontro perdido,
porque meu bom relacionamento com a mãe do meu filho está
afastando de mim a mulher que eu amo. Como vou conduzir isso?
Como posso mandar Dandara se foder, Paula? Eu não sou esse
cara. Você me conheceu sendo um homem com o coração gigante,
do tipo que é capaz de guardar as próprias dores no bolso para
cuidar da dor de todas as demais pessoas. Como posso me afastar
da mãe do meu filho?
— Não quero isso. Me desculpe, Lucca, não é a minha
intenção — digo chorando, vendo a dimensão da situação. Eu o
conheci sendo assim, ele está certo.
— Estou tentando dar o mundo a você, Paula. Mas estou
fodido agora, entre meu filho e entre a mulher que eu amo. Parece
que preciso escolher um lado e eu estarei dilacerado em qualquer
um deles; renunciar a algo que faz o meu filho feliz ou renunciar a
mulher que eu quero me casar. Pensei que te passava segurança o
bastante, que havia excesso de confiança na nossa relação, que é
algo que sempre exaltei e valorizei. A confiança que eu achava que
possuímos era algo grandioso para mim.
— Eu confio em você.
— Confia mesmo? Porque todas as suas atitudes
demonstram que deixou de confiar desde que Dandara voltou.
— Não há nada anormal nisso, Lucca. Não pode exigir que
eu me mantenha cem por cento segura diante de todas as
situações. Não sou a Madre Tereza, sou bem compreensiva na
maioria das vezes, talvez isso tenha aumentado seu nível de
exigência em relação a mim.
— Não exijo nada de você, Paula, principalmente em relação
à Dandara. Não é uma exigência, mas, pelo histórico do meu
relacionamento com você, achei que compreenderia, já que foi você
quem sempre pontuou a importância de um bom relacionamento
entre pais. Acho que, por mais que tenhamos um relacionamento
excelente, está faltando um pouco diálogo, um pouco de se abrir
mais. Eu me abro a você com frequência, mas você se fecha muitas
vezes com medo de dizer o que se sente, como se sente, eu vejo
sua relutância em me contar as coisas por medo de ser um fardo,
por medo de estar levando problemas à mim. Se abra, Paula,
exponha todas as merdas, talvez o seu ex não te dava esse tipo de
liberdade, mas eu te dou. Você pode tudo comigo, porque eu te amo
de verdade e sua felicidade é importante para mim, assim como a
felicidade de Henrico. Sinto muito que esteja magoando você,
Paula. Só estou fazendo o que acho que é certo e saudável. Como
eu disse, sou assim, fui assim a vida toda, sou só coração o tempo
todo, com tudo e com todos. Volte à festa comigo?
— Não tenho coragem, tampouco clima. — Sou sincera. —
Não posso fazer isso agora. Me desculpe por decepcioná-lo, mas
preciso trabalhar meu psicológico, porque tudo que vejo é que estou
perdida e sem preparo para lidar com todas as mudanças radicais.
Parece que o peso de todos os acontecimentos está vindo agora, e
eu preciso lidar com eles, antes que eu bote tudo a perder. Eu amo
você, Lucca. Nem nos meus melhores sonhos eu imaginei que
pudesse existir um homem tão grandioso como você é. Está certo
quando diz que é só coração, você é um coração gigante, puro,
você é um em um bilhão. Não quero perdê-lo.
— Se você está indo embora para pensar, acho que precisa
de algumas informações. Dandara está apaixonada pelo garoto da
boate, ela esteve enganada por anos sobre o que sentia por mim.
Eu não sou e nunca fui o amor da vida dela.
— Mas ela foi o amor da sua vida.
— O amor da minha vida é você. Eu quero me casar com
você, e eu não irei repetir isso uma milésima vez — afirma com
seriedade. — Estou cansando de bater na tecla sobre o que sinto
por você, sobre a importância que tem em minha vida. Eu já disse
um milhão de vezes que você é o motivo e não volto atrás. Você é o
motivo, e eu estou certo disso desde o dia em que te conheci.
Nunca vacilei, Paula. NUNCA VACILEI OU TIVE DÚVIDAS — diz
alto. — Nem por um momento. Estou com a consciência limpa de
que todos os dias tento ser o melhor homem para você, que sou fiel,
leal, seguro. É você quem precisa pensar agora, abrir a mente e
enxergar todas as coisas que venho te dizendo e te mostrando. Vá,
descanse, pense e me procure quando enxergar que eu sou o amor
da sua vida, por gentileza.
— Você é.
— Prove — diz, ficando de pé. — Vá de uma vez ou fique
comigo como havíamos planejado.
— Eu fico — digo, me jogando em seus braços. — Eu te amo
demais, me desculpe pela insegurança.
— Apenas não me deixe, não desapareça. Me bata, me
prenda, faça tudo comigo, mas não saia como uma louca sem avisar
a qualquer pessoa, sem nem mesmo se despedir.
— Estou com vergonha de voltar.
— Ninguém sabe o porquê você decidiu deixar a festa e
ninguém precisa saber. Não diz respeito a qualquer pessoa que está
lá, cabe apenas a nós dois.
— Lucca... eu me sinto ridícula agora.
— Não tem que se sentir, Paula. Mas, por favor, da próxima
vez que sentir insegura e perdida, me chame, proponha uma
conversa e vamos resolver isso como adultos. Eu brinco o tempo
inteiro, mas sei falar sério quando necessário. Sempre estarei com
você, juntos nós sempre conseguiremos resolver tudo, basta diálogo
para nos entendermos. Você está grávida, está sentida por não
poder estar cem por cento ativa na festa, está um pouco abalada
por ver todas as crianças brincando e Henrico tendo limitações. Há
muito se passando nessa sua cabecinha, por isso é necessário
dividir os problemas comigo, se abrir, para podermos achar a melhor
maneira de lidar com todas as coisas. Nós podemos fazer isso dar
certo. Sobre Dandara, apenas infiltre em sua mente que o tipo de
relação que tenho com ela é completamente oposto ao tipo de
relação que tenho com você e que desde que surgiu em minha vida,
o meu passado ficou no passado. Ok?
— Ok.
— Promete que vai se abrir comigo sempre? Que vai me
bater?
— Quer que eu te bata? — pergunto, encarando-o.
— Eu prefiro que me bata, se sua outra opção for fugir — diz,
limpando as lágrimas em meu rosto. — Não se sinta insegura,
Diabinha. Você é o motivo, poxa. Você é minha razão.
— Você é o motivo... do meu surto.
— Que seja, ao menos sou o seu motivo — diz sorrindo e me
abraçando forte. — Eu amo você, Paula. Jacinta isso, pelo amor de
Deus! Você é o motivo, é o meu amor!
— Ok, bebê Lucca.

Nós voltamos à festa e eu sigo direto para o banheiro da área


da piscina. Assim que entro, ouço alguém chorando. Tento ignorar,
vou lavar meu rosto, e quando estou me secando, Dandara surge e
eu descubro que era ela chorando...
— Você está bem? Precisa de ajuda?
— Não perca Lucca, por favor. Ele ama você. Eu não quero
ser o motivo para destruir mais uma relação. Não aguento mais
destruir pessoas, não o deixe. Eu irei me afastar.
— Calma...
— Ele te ama.
— Quer um pouco de água? — ofereço, e ela simplesmente
apoia as mãos na pia, abaixa a cabeça e chora.
Ainda chorando, Dandara me encara e sorri.
— Meu Deus! Você é mesmo a alma gêmea de Lucca, só
isso justifica — diz, limpando o rosto e respirando profundamente.
— Não enxerga isso?
— Enxergo.
— Vocês são perfeitos juntos, Paula. Você é a versão
feminina dele. Foi embora minutos atrás porque se sentiu ameaçada
por mim e está aqui, no banheiro, perguntando se preciso de ajuda.
Típico do Lucca fazer isso, basta ver todo o mal que causei a ele e
tudo que ele fez para me manter segura naquela situação terrível
que passamos.
— Lucca é incrível — concordo com ela.
— Você é incrível, Paula. Nem preciso conviver muito para
saber disso, é bastante visível. Sei que, quando retornei, você foi a
grande mulher por trás de Lucca. Aquela que o incentivou a ser
maleável, a conduzir as coisas com calma. Ele não é tolo, Paula.
Acredito que se não fosse por você, ele teria me atropelado com
força, mesmo carregando uma quantia generosa de benevolência e
atitudes honráveis. O que eu fiz com Lucca e com meu próprio filho
foi muito grave, não são todas as pessoas que seriam capazes de
perdoar algo dessa dimensão. Tudo na vida tem um limite, até a
mesmo a bondade.
— Eu sei.
— Acho que chegou o momento de termos uma conversa
definitiva. Eu me sinto pronta para isso, e você? — pergunta.
— Eu acho que pode ser bom, desde que haja respeito e
cuidado ao conduzir a conversa.
— Me acompanhe, por favor — pede, e eu a sigo. Ela possui
uma familiaridade com a casa, porque parece conhecer cada canto
do lugar.
Vou a seguindo até ela abrir a porta de um escritório e dar a
passagem para que eu possa entrar. Me acomodo em uma cadeira,
ela fecha a porta e puxa uma cadeira sentando-se de frente para
mim.
— Bom, primeiramente, quero deixar claro que eu e Lucca
não estávamos juntos hoje. Aí você vai dizer "eu vi vocês juntos", e
eu vou te dizer, não, não estávamos. Sei que está grávida, que há
hormônios bagunçados e que eles são capazes de nos transformar
em mulheres fragilizadas, entendo você, Paula. Sei que não deve
aceitar tudo e todas as coisas, mas hoje, especialmente hoje, você
cometeu um erro. E, é normal errar, é humano. Eu, por exemplo,
não consigo nem calcular todos os erros que já cometi na vida; erros
realmente graves que nem se comparam ao que você fez. Paula, eu
abandonei Lucca duas vezes, sem dizer nada a ele. Lucca
certamente possui um trauma em relação a abandono e a culpa é
inteiramente minha. Então, a partir do momento que você
desaparece sem deixar rastros, sem dizer nada, para ele é como se
estivesse sendo abandonado e talvez você nem tenha se dado
conta disso.
— Eu enxergo sim que errei nisso, não pensei no momento.
Foi uma fraqueza que não cabia, sendo que Lucca fez tudo por mim
e pela acessibilidade do meu filho nessa festa, ele se preocupou
com cada detalhe. Porém, estou passando por um conflito interno,
venho de muitos acontecimentos e não consegui processar tudo,
além de estar grávida e temendo... eu preciso apenas me abrir para
o meu noivo, porque se não fizer isso, não há como ele adivinhar
como tenho me sentido. Tenho a péssima mania de guardar tudo
para mim.
— Entendo — ela diz. — Enfim, Paula, eu sou mulher,
determinadas situações me fariam sentir ameaçada, mas tudo
depende do contexto. Sabe o quanto o dia de hoje é importante para
Lucca e para Samuel? Eu vou ser bem sincera com você, não
queria estar aqui, mas eu vim pelo meu filho, porque uma mãe é
capaz de tudo, assim como um paizão como Lucca também é. Você
certamente viu Lucca, eu e Samuel brincando, mas ali não éramos
ex amantes, ali éramos pais fazendo a alegria de um filho. O nosso
filho pediu que brincássemos com ele, Paula. Como iríamos negar
isso a ele? Na verdade, sendo sincera novamente, não pensei em
você, não pensei em ex, não pensei em merda alguma. Meu único
pensamento foi "meu filho quer brincar com os pais, e ele terá isso".
Não pensei que causaria um mal-estar a ponto de você ir embora.
Outra cena que deve ter visto, os parabéns. Paula, como não
iríamos cantar juntos os parabéns do nosso filho? Você é mãe, é
separada do pai do seu filho. Não sei o tipo de relação que
possuem, mas eu e Lucca estamos construindo algo grande pelo
nosso filho, e eu acho que todos os casais que se separam
deveriam saber conduzir essa situação da melhor forma para a
criança.
"Minha intenção aqui não é fazer com que se sinta mal, mas
preciso falar todas essas coisas para chegar aonde quero. Quantas
vezes já agi por impulso? Embora eu seja juíza, meus julgamentos
ficam para os tribunais. Não vou julgá-la, mas preciso que
compreenda o tipo de relação que há entre Lucca e eu, e que saiba
que não sou uma ameaça. Sei que já disse na sua frente algumas
vezes sobre amar Lucca, e foi ele mesmo quem me mostrou que eu
estava enganada sobre isso. Você, recentemente, me encontrou
saindo da casa dele, talvez tenha sido horrível para você lidar com
essa situação, mas sabia que aquela conversa foi uma das mais
importantes da minha vida e talvez até da vida de Lucca?"
— Ele me disse.
— Eu descobri que amo Lucca, Paula, mas eu o amo de uma
maneira diferente da que você ama. Eu amo o ser humano Lucca, o
amigo Lucca, não amo o Lucca como um homem em potencial para
mim, e, descobri isso graças àquela conversa, desde então, a minha
vida mudou por completo e a minha relação com ele também. Ele
agora se sente mais seguro para fazer as brincadeiras que faz, para
ser meu amigo, porque ele sabe que eu não o quero, que não vou
insistir em uma relação diferente. Depois daquela conversa, eu me
tornei uma pessoa até mesmo mais leve e me entreguei a um garoto
que... um garoto... ele tem o meu coração e o melhor de mim. Ele
tem tudo que nunca fui capaz de dar a outra pessoa. E eu o perdi.
— Os olhos dela voltam a se encher de lágrimas, logo, os meus
também se enchem. Hormônios! — Me desculpe.
— Não fique assim. — Ela balança a cabeça, e volta a dar
um suspiro profundo.
— Entendo sua reação, Paula. De verdade, mas não se sinta
ameaçada mais, porque eu não senti por Lucca dez por cento do
que eu sinto por Nicolas. Eu não sofri por Lucca dez por cento do
que estou sofrendo por perder Nicolas. Um garoto de vinte e um
anos... — Ela ri entre lágrimas. — Sabe, eu te apelidei de Barbie,
mas é porque você era a pessoa perfeita e o excesso de perfeição
diante do erro ambulante que sou, me incomodava. É tão bom ver
que você também é falha, que Lucca também é falho, que cada um
de nós cometemos erros. Eu amo Lucca, Paula. Eu o amo mesmo,
como pai do meu filho e como amigo que sempre me estendeu a
mão, sempre me ouviu e que me deu uma nova visão em relação ao
que eu achava sentir. Tenho uma gratidão imensa por ele, um
respeito imenso, mas, se te magoa essa proximidade, eu me afasto
e passo a lidar com ele apenas como a mãe de Samuel.
— Não precisa disso. Por favor, não se afaste, de verdade.
Eu só... não me abri tanto com ele, talvez eu teria entendido melhor
a situação. Os vendo juntos, eu me senti como se tivesse destruído
a família de Samuel. Sabe por que me senti assim? Porque o meu
sonho era que o meu filho tivesse uma linda família e não pude dar
isso a ele; o pai de Henrico não é dez por cento do que Lucca é
para Samuel e para você. Lucca dá um suporte gigante não apenas
para o filho, mas para você também. Eu nunca tive esse suporte,
nem mesmo quando ainda tinha um relacionamento com Pablo. Eu
queria tanto que meu filho tivesse uma família, que me sinto mal
vendo que Samuel poderia ter tido isso se não fosse...
— Se não fosse o meu grande erro, Paula. Não pense que
não estamos juntos porque você está na jogada. Tenho certeza de
que se tivesse que ser, você não seria impedimento. Lucca tem
excesso de lealdade e verdade; se ele ao menos se sentisse
balançado por mim, certamente teria dito a você. Transparência é o
ponto alto de Lucca. Não estamos juntos porque eu fugi, tomei as
decisões erradas no passado. Meu filho tem sim uma família, mas
uma família diferente, de pais separados. O importante é que todos
nós tenhamos um bom relacionamento, que Samuel consiga
perceber que é um privilegiado por ter uma madrasta incrível, um
pai incrível, uma mãe incrível... Você não atrapalhou nada, muito
pelo contrário. Não estarmos juntos não é sua culpa. Tenho certeza
de que mesmo que você não estivesse com Lucca, nós dois nunca
teríamos chances, porque somos diferentes demais e porque
determinados erros não podem ser reparados. Agora, se posso te
dar uma dica, se abra com ele, ok? Exponha tudo, ele vai te ouvir,
vai te compreender. Não sei se conversaram, mas tente conversar
um pouco mais quando a festa terminar, quando Lucca não estiver
temendo um abandono. Por mais que ele não vá dizer isso a você,
eu sei que essa ideia passou na cabeça dele, pela forma como tudo
foi conduzido. Conversem, se abra, vocês são incríveis juntos. Estou
feliz por ter ido e então voltado, Paula. Ao menos essa atitude nos
levou a ter uma conversa que era mais que necessária, espero que
seja a primeira de muitas. — Dou um sorriso fraco e pego as mãos
dela.
— Obrigada por isso. Não se afaste, ok? Em breve eu e
Lucca moraremos juntos e quero que faça parte da nossa vida,
juntamente com Samuel.
— Quem sabe em alguns meses podemos nos tornar amigas
e eu acabe sendo madrinha do seu bebê? Sou tão fodida que nem
afilhados tenho! — A maneira como ela diz me faz rir. Dandara pode
ser espirituosa.
— Vamos trabalhar nisso.
— Apenas me deixe chamá-la de Barbie e me perdoe por
todas às vezes que fui rude ou ameaçadora.
— Perdoo você. Espero que se entenda com o tal Nicolas,
você merece ser feliz e viver um grande amor.
— Eu vou atropelar algumas cabeças para tê-lo de volta —
diz com firmeza. — Enfim, essa sou eu, Paula.
HORAS MAIS TARDE
— Por que você mandou todos embora? — pergunto a
Lucca, vendo a lanchar levar o restante dos nossos familiares.
— Porque precisamos de um tempo a sós. Eu tinha
organizado isso dias atrás, vamos ficar aqui, sozinhos, relaxando
um pouco de toda tensão. Me lembro de ter dito que a levaria para
uma viagem de descanso. Não estamos em uma viagem, mas
estamos em uma ilha deserta e paradisíaca, serve?
— Serve.
— Então, que tal continuarmos nossa conversa antes de
irmos tomar um banho bem gostoso na hidromassagem?
— Eu acho uma boa ideia, há muitas coisas que preciso te
dizer.
— Há muitas coisas que quero dizer também — diz
sorridente. — Paula, promete que nunca mais vai fugir? — ele pede,
com os olhos marejados. — Não me deixa daquela forma, sem me
dar satisfações, por favor.
— Prometo.
— Então vamos conversar, Diabinha. Temos uma audiência
de conciliação, é hora de colocarmos as cartas na mesa!
No interior da casa, faço Paula se sentar em um sofá e me
acomodo em outro, de frente para ela. Preciso que ela me explique
todas as coisas, que ela se abra a ponto de me contar coisas que
tem guardado para si mesma, e não é apenas sobre Dandara. Sei
que há muitos pensamentos consumindo minha noiva, sobre tudo e
todas as coisas. A Dandara é como se fosse a ponta do iceberg, há
muito mais por trás da insegurança da minha mulher.
A conheci sendo uma mulher cem por cento segura, dona de
si. Inclusive, essa característica foi uma das coisas que mais me
atraiu. É bom lidar com uma mulher que confia em si própria a ponto
de não sentir qualquer tipo de insegurança. Pessoas assim são
confiáveis, e confiança foi tudo que vi em Paula desde o início.
É claro que compreendo o fato dela estar passando por um
momento delicado. Vi minhas irmãs se tornarem mães, minha
cunhada. Era uma confusão hormonal quase assustadora, sei que
minha mulher talvez passe por isso. Estou pronto para lidar com
isso, mas, há uma diferença: todas as mulheres que vi passando por
isso, eram explosivas e abertas, nenhumas delas se fechou. Não é
que eu queira transformar Paula, mas eu preciso que ela se abra,
que ela exponha o que está sentindo, seus medos, o que
desagrada, e tudo mais, para que eu consiga trabalhar até mesmo
em meu comportamento se for necessário. Quando ela não diz
nada, eu penso estar cem por cento certo e sigo conduzindo as
coisas ao meu modo, mas parece que meu modo está
desagradando, então preciso que ela me diga o que a incomoda
para que eu tente consertar, mudar, qualquer merda que seja
necessário. Fica difícil adivinhar quando ela não diz.
— Vamos, Paula, se abra comigo, sem medo, sem receios.
Eu vou buscar compreendê-la.
— Eu surtei em relação a Dandara. E, o motivo pelo qual eu
estou me sentindo estúpida, é porque nunca me deu motivos para
duvidar de você, do seu caráter, da sua índole. Você é uma das
pessoas mais sinceras que conheço e, confesso, por alguns minutos
eu tive insegurança em relação ao nosso relacionamento. Mas, foi
apenas porque... odeio dizer isso, Lucca...
— Apenas diga.
— Você, Dandara e Samuel brincando... foi uma das cenas
mais lindas que já vi na vida. E, é ridículo. Isso, em minha cabeça,
parece como se eu estivesse abrindo mão facilmente de você, e eu
repudio ter esse tipo de pensamento.
— É bom que repudie mesmo, Paula. Mas, compreendo a
confusão mental. De verdade, meu amor. Compreendo seus
pensamentos. Só ficou confusa momentaneamente, é normal,
principalmente passando por uma fase tão delicada.
— Há mais, Lucca, eu sempre quis que meu filho tivesse uma
família. Nunca escondi isso de você. Eu já não amava Pablo, mas
iria me casar com ele porque acreditava que o casamento nos
transformaria em uma família feliz, que ele passaria a conviver mais
com Henrico, eu iria fazer aquilo porque era um grande sonho ter
uma família unida. Então, eu vi você e Dandara, vi os dois tão
unidos para fazer a alegria de Samuel, e eu senti como se estivesse
atrapalhando, como se eu fosse um obstáculo. Foi como se eu
estivesse refletindo meus desejos em vocês, entendeu bem? Não
sei se refletir é o termo correto.
— Você pensou que o mesmo desejo que você tinha,
Dandara também tem? É isso?
— É, é quase isso, porém, mais complexo. Não consigo
explicar ao certo, mas é nesse sentido. — Ela é linda conversando
sério.
— Mas, então, me desculpe, isso me leva a pensar em uma
questão, Paula. Você iria se casar com Pablo para que Henrico
pudesse ter a família que você tanto sonhou. Como fica isso agora?
— Isso foi no passado. Antes de eu conhecê-lo, Lucca. O que
eu e você construímos em poucos meses, eu jamais tive com Pablo
em anos. Não tenho ressentimento algum por eu e ele não termos
dado certo, não tenho tristeza alguma por ele ter me deixado
plantada no altar. Na verdade, depois que te conheci, eu sinto que
devo ao Pablo centenas de agradecimentos por ele ter sido um
grande pedaço de merda, foi por ele ser assim que eu conheci você.
Se as coisas tivessem saído conforme eu havia planejado na época,
eu seria infeliz de todas as maneiras possíveis.
— Compreendo — digo, respirando fundo. — O que te
incomoda na minha relação com Dandara? Preciso que jogue limpo,
que exponha. Paula, eu sou um homem cem por cento brincalhão,
com tudo e com todos; independente de quem seja, eu brinco até
mesmo com pessoas que eu mal conheço. É o meu jeito de ser,
você me conheceu exatamente assim e não posso prometer a você
uma mudança, mas posso prometer tentar melhorar se as minhas
brincadeiras com Dandara te fazem mal. O que acontece é que eu
tinha muito para odiar aquela mulher, mas, após ouvir a versão
completa sobre a vida filha da puta que ela teve, após ver a maneira
incrível como ela trata o nosso filho, após ter a minha noiva me
incentivando a ser amigável, eu decidi que seria amigo dela.
Dandara é uma mulher solitária o bastante, o jeito dela ser sempre
afastou muitas pessoas e ela sempre foi autossuficiente o bastante
para achar que não precisava de qualquer pessoa, de qualquer
amizade. Acontece que, recentemente, ela descobriu que precisa de
pessoas, precisa de ajuda, precisa de amigos. E houve uma
aproximação entre nós, como amigos. Inclusive, essa aproximação
serviu para ela enxergar que não me ama mais como um homem
em potencial, isso tirou um grande fardo das minhas costas, e sei
que tirou das costas dela também. Dandara está com outra pessoa.
Somos ligados por Samuel e pela amizade que estamos
construindo.
"Sei que isso é louco e até mesmo incomum. É raro ver
‘casais’ que se separaram sendo grandes amigos, mas aconteceu, e
não vou negar para você que estou gostando de ser amigo dela,
estou gostando de dar bons conselhos quando ela pede, muito disso
porque sei que ela não tem ninguém, ou ao menos não tinha. É algo
que eu faria por qualquer um e que quero fazer pela mãe do meu
filho. Eu gostaria até mesmo que ela fosse sua amiga algum dia.
Acho que você é um grande exemplo de mulher, uma amiga que
vale à pena ter, creio que seria uma grande amiga para ela, mas
não posso forçar isso. Só estou te explicando, não estou obrigando
você a aceitar ou achar correto. Quero que me dê sua opinião
sincera, Paula."
— Eu consigo entender isso, de verdade. Quando Pablo deu
aquele acesso de paternidade e começou a frequentar minha casa
constantemente, eu também tentei conduzir as coisas pelo caminho
da amizade, tentei ser o mais amigável possível com ele. Não posso
julgá-lo por isso, porque você foi super compreensivo, não brigou,
não protestou, muito pelo contrário, da mesma forma que eu te
incentivei a ser amigo de Dandara, você me incentivou a ter uma
relação saudável com Pablo. Deus! Lucca, você até mesmo o levou
para a chácara em Belo Horizonte, e não se importou com o fato de
que eu e ele estaríamos dividindo o mesmo teto por alguns dias. Se
para uma mulher é difícil aceitar determinadas coisas, imagine para
um homem? E você passou por cima disso porque estabelecemos
uma relação de confiança. A confiança sempre foi a nossa base, o
nosso alicerce e talvez seja por isso que tenhamos dado tão certo.
— Balanço a cabeça em concordância. — Não quero que mude,
não quero que perca sua essência. O conheci assim, dizendo à
Melinda que era mais potente na cama do que Victor, brincando com
tudo e com todos. É óbvio que você não pode dizer à Dandara que
beijaria a boca dela e essas coisas que diz à Melinda. — Isso me
faz rir. — Mas, não deixe de ser quem é. Foi um momento de
insegurança boba, principalmente por vislumbrar uma família linda.
Entendo que mesmo separados vocês sempre serão uma família, só
me perdi no momento — diz suspirando. — Em breve dividiremos o
mesmo teto, e sei que Dandara sempre estará conosco por Samuel.
Ela é bem-vinda ao nosso lar, bem-vinda à nossa família. Conversei
com ela mais cedo.
— Conversou?
— Sim, e tive um vislumbre de uma mulher forte, íntegra,
uma mulher que está batalhando fortemente para ser melhor, para
superar as próprias expectativas que criou. Ela reconhece os erros,
assume e não tem problemas em pedir desculpas. Isso é tão bonito,
ao menos eu achei. Poucas pessoas que erram estão dispostas a
se desculparem, e ela faz isso, até mesmo de maneira fácil. Eu
quero me aproximar dela, senti que ela precisa de mais pessoas,
está um pouco perdida em alguns acontecimentos pessoais, mas ao
mesmo tempo está tão determinada que chega a ser inspirador.
Quero me aproximar dela, Lucca, quero que possamos ter uma
convivência mega saudável e que, em breve, todos possamos ser
uma grande família. Ela me fez enxergar que o amor pode ser
transformado em vários tipos. Eu confio nela agora.
— Fico imensamente satisfeito, princesa. Eu gostaria de
poder ter o mesmo tipo de relação com Pablo, gostaria que vocês se
dessem bem, principalmente por achar que Henrico merece o
melhor. Porém, aconteceu de Pablo ter se mostrado inescrupuloso e
abusivo, e eu sinto muito por isso, do fundo do meu coração. Ele
está com ordem de restrição, vai enfrentar processo e tudo mais.
Compreendo que todas essas coisas devem estar pesando em sua
cabecinha. — Basta eu dizer para que ela comece a chorar. Eu
disse que Dandara era só a ponta do iceberg e parece que eu
estava certo. Me levanto e me acomodo ao lado dela, puxando-a
para os meus braços. — Não tenha medo. Sei que tudo isso foge do
que planejou, do que queria para Henrico, mas vocês não estão
sozinhos, Paula. Eu amo Henrico como meu filho, se precisar eu
serei a figura paterna que ele precisa, merda, eu já até mesmo sou.
O amo, Paula. Amo você. Nós vamos criar nosso garoto juntos, com
todo amor, com todo o suporte que ele precisa. Vamos criar esse
bebê em sua barriga também, e Samuel, mesmo tendo uma mãe
fantástica, também será criado conosco. Temos amor para todos.
Nós dois somos amor.
— Eu só queria não decepcionar o meu filho.
— Você não o decepciona, nunca. É uma mãezona, faz tudo
o que pode e até mesmo o que não pode por ele. Não carregue uma
culpa que não te pertence. Não tem culpa se Pablo nasceu pelo cu,
Paula. Quem perde é ele, apenas ele. Você e Henrico se livraram de
um merda e ganharam um monte de pessoas que são capazes de
tudo para fazê-los feliz. Não carregue essa culpa, porque ela não é
sua.
— Bebê Lucca... estou com medo do nosso bebê nascer com
algum problema — diz, chorando mais forte, até mesmo agarrando
meu pescoço.
— Não deve ficar pensando nisso, princesa. Mas, se ele ou
ela nascer com algum problema, nós sempre estaremos juntos para
tornar a vida dele melhor, lutando, batalhando. Sempre juntos —
falo, mexendo em seus cabelos. — Henrico é perfeito, nosso bebê
será também. Agora, preciso comunicar, você está indo morar
comigo ainda essa semana. Não vou deixá-la livre de mim quando
está louca de hormônios. — Ela começa a rir entre lágrimas e eu
sorrio também. — Sente-se pronta para dar esse passo?
— Eu preciso de...
— Infraestrutura para todas as coisas que Henrico precisa —
concluo. — Eu sei, meu apartamento dá três do seu, não há
desculpas, Paula. Jacinta minha fúria crescendo. Já estou quase
encontrando a casa ideal para vivermos, enquanto é isso, nosso
garoto estará bem amparado em meu apartamento. Quando vai
entender que eu te amo?
— Eu sei que ama.
— Sabe mesmo? — pergunto, olhando em seus olhos. — Me
responda. Você sabe que eu te amo e que farei tudo para que seja
feliz? Sabe que eu sempre farei tudo que estiver ao meu alcance
para Henrico ser feliz? Sabe que eu preparei um maldito bolo para
cantarmos parabéns para Samuel no local que criei para o seu filho?
Sabe que eu sempre irei incluí-lo em tudo e todos os meus planos?
— E vem novamente o choro. Agora compreendo quando Victor
fugia de Melinda em algumas ocasiões, e Gabriel e Davi fugiam de
Luma e Ava. — Pare de chorar, bebê Paula. Apenas coloque em
sua cabeça que ser sozinha e ter que se virar em mil para resolver
todas as coisas faz parte do seu passado. O seu presente é ao meu
lado, é ao lado de um homem que te deu a mão e quer caminhar
junto com você, junto com o seu filho. Na alegria, na tristeza, na
saúde, na doença, na riqueza e na pobreza, amando-te,
respeitando-te e sendo fiel em todos os dias de minha vida, até que
a morte nos separe.
— Você é o melhor!
— Promete sempre se abrir comigo? — peço, jogando seus
cabelos para trás e a observando limpar o rosto.
— Prometo. Eu me sinto quinhentos quilos mais leve agora
— diz, sorrindo entre lágrimas. — Me desculpe?
— Não há nada a ser desculpado. Só precisamos manter a
conexão, manter conversas, mantermos a transparência. Se
fizermos isso, sempre estaremos bem, princesa.
— Eu só preciso daquele banho gostoso agora — comenta,
com sua carinha de santa. — E de uma massagem.
— Nunca dá certo fazer massagem em você. O óleo corporal
faz deslizar muito e determinada parte do meu corpo acaba
entrando em lugares em seu corpo. Você sabe, sou massagista
profissional, porém, gosto de trabalhar nu, absorvendo a energia da
minha mulher. — Ela ri. — Quer assim mesmo?
— Quero por isso — afirma, mordendo o lábio.
— Aooo Paula, Jacinta a cobra deslizando na sua cavidade
anal! É amanhã que você não senta!!! — A pego em meus braços e
fico feliz por vê-la gargalhando. Agora é o momento de dar adeus
para o meu lado sério e dar as boas-vindas ao lado que quer fazer
essa mulher rir e sentir prazer.
Não sei porquê, mas a cada vez que olho para ela, sinto que
o meu propósito na vida é fazê-la feliz. Espero conseguir.
— Eu te amo, Diabinha!
DOIS DIAS DEPOIS
Um bom resumo das últimas horas é que: me fodi.
Tive a infeliz ideia de noticiar sobre a minha despedida de
solteiro na casa de Victor, quando minha ex estava lá com seu
novinho sagaz após uma reconciliação, e antes de comunicar à
minha noiva. Mas, em minha defesa, despedidas de solteiro são
muito comuns, não? Acho que todas as pessoas que estão indo se
casar, sendo homens ou mulheres, têm aquela reunião com amigos
ou amigas dias antes do grande momento. Ou ao menos quase
todas.
"— Já que estamos na fase da amizade, Nicolas, novinho,
garoto de açúcar, você tem a honra de ser o primeiro convidado
da minha despedida de solteiro — comunico. — Acho que
estaremos sempre próximos, devido à Samuel. Vamos ser bons
amigos, cara.
— Que despedida de solteiro, Lucca? — Paula pergunta,
e eu começo a rir.
— Todo mundo que se casa precisa de uma despedida de
solteiro, Paula. Vamos nos casar — explico.
— Ok. Vai haver uma maldição de uma despedida de
solteiro e eu sou a última a saber?
— Na verdade, você está sendo uma das primeiras, meu
amor. Jacinta que eu te respeito, bebê. É tudo em família,
relaxa. Eu, Victor, Piroca Baby, garoto de açúcar..."
Bem que minha mãe sempre disse que não sou todo
mundo... A sentença da meritíssima foi clara e dolorosa, como se
ela tivesse disposta a me cravar um punhal e me rasgar até as
partes traseiras.
"— Você vai querer nunca ter convidado o meu
namorado para essa merda! — Dandara avisa. — Farei todos
vocês se arrependerem! Paula, Jacinta minha parceria
chegando para a organizar a sua despedida de solteira!
Melinda, se sente pronta para uma noite de diversão?"
Foi uma má ideia, definitivamente. Dandara cismou de chefiar
a situação a partir do momento que convidei o garoto de açúcar,
Melinda está decidida a fazer loucuras e Paula? Paula quer me
foder agora, e não de uma maneira prazerosa para ambos.
— Eu acho que é cedo para você e Dandara se tornarem
amigas — comento, enquanto dirijo para o meu apartamento. — Na
verdade, eu tenho certeza de que é realmente cedo. Deveria deixar
essa aproximação para depois, para o futuro.
— Pois eu sinto que ela pode ser minha BFF.
— O que diabos é BFF, Paula? — questiono.
— Best Friend Forever[3]! — explica. — Você só está falando
isso porque está se cagando em relação à minha despedida de
solteiro, mas quero deixar bastante claro, Lucca Albuquerque, eu
nem mesmo estava ponderando uma despedida de solteiro.
Enquanto eu estava inocente, sua mente maquiavélica já estava
com a despedida provavelmente organizada. Foi você quem
despertou esse desejo em mim, agora lide com as consequências.
Direitos iguais, se você pode ter, eu também posso e VOU! — Eu
quase perco o controle do carro com a porrada que ela dá no
vidro. A mulher está nervosa e eu não sei o que fazer para sair
dessa situação.
— Eu disse que desisti da despedida, Paulinha. Me arrependi
— argumento, relembrando da conversa.
"— Estou ligeiramente arrependido de ter dito sobre a
despedida de solteiro — faço minha confissão, tentando
desfazer a situação. — Dandara vai botar no meu cu, usando
minha futura esposa contra mim. Ela é o diabo, e eu...
— E você é o homem que mexeu com o diabo — a
satanás da juíza completa minha frase. — Estava mesmo
quieta, Lucca. Você envolveu meu namorado nessa brincadeira,
agora vai aguentar. Sua noiva terá a melhor despedida de
solteira da história do Rio de Janeiro. E, olha que nem decidi se
faremos isso aqui no Rio mesmo. Talvez uma viagem até algum
lugar aqui por perto seja bem-vinda. O que acha, Paula? Me
lembro de um filme bem interessante, nacional, ele se chama
Muita Calma nessa hora. Vou inspirar sua despedida de solteira
nesse filme.
— Pera aí! Mas esse filme não é aquele que as mulheres
vão solteiras após uma delas descobrir a traição do noivo dias
antes do casamento? — questiono, ao perceber a gravidade
dos fatos.
— É, exatamente! — Dandara me fode.
— Mas Paula não é solteira, nem fodendo!
— Quem se importa? — a megera indomável pergunta,
cruzando seus braços e sustendo meu olhar de súplica.
— Amo viajar — Paula diz sorrindo. — Não posso beber,
mas, quem disse que eu preciso de bebidas para ser louca?"
Sim, minha Diabinha tem um ponto fodido, ela não precisa de
bebidas para ser louca e isso só complica a minha situação.
— NÃO ME CHAME DE PAULINHA! ODEIO! — esbraveja. —
Você pode ter desistido, mas eu não.
— Você deveria ficar calma por conta do nosso sadbebê —
comento, tentando pacificar a situação.
— Não envolva nosso filho nisso. E o que é um sadbebê?
— Bebê sádico, mas não no sentido de sadismo, não usando
o verdadeiro significado da palavra sadismo. Começou com um
apelido que meu pai deu à minha mãe, e agora todos os bebês da
família são chamados de sadbebê. — Ela me encara como se não
acreditasse. — Não me olhe assim, não estou chamando nosso
bebê de sádico ou sádica. Eu considero um apelido fofo, é até
mesmo importante.
— Sadbebê... posso me acostumar com isso — diz, voltando
a ser dócil.
— Você é linda demais, Diabinha. Não terminei com você
ainda.
— Lucca, acho que batemos os recordes de sexo esse final
de semana — comenta, demonstrando estar chocada, mas logo dá
uma risadinha. — Mas eu quero mais.
— Quando seus pais voltam com Henrico? — Os pais de
Paula viajaram para Petrópolis, levando Henrico.
— Em dois dias, estou morrendo de saudades do meu
pequeno.
— Vou cuidar de distraí-la.
— Ainda não sei, Lucca. Acho que está merecendo ser
castigado — fala ameaçadoramente.
— Como? — Estou muito perplexo agora. — Mais castigo do
que você ter uma despedida de solteira sendo organizada por
Dandara, que quer me matar por conta do novinho?
— Você tem um ponto. Acho que já será bastante castigado
em minha despedida de solteira. — O sorrisinho em seu rosto me
faz suspirar, emputecido com essa situação.
— Aoooo Paula, você ainda não me viu sendo louco, hein?
Se você acha que sabe tudo sobre as minhas loucuras, está muito
enganada, bebê. Eu vou com tudo hoje, eu não fico de fora, se a
saudade apertar eu chego o reio e meto a espora. Sou esse tipo de
homem, bruto e rústico.
— Coitado! Se acha muito macho, sou eu quem te esculacho,
te faço de capacho — responde, cruzando os braços.
— Aooo Paula! Tu vai ver quem faz quem de capacho nessa
relação quando chegar em casa. Vou te esculachar no movimento
pélvico, o prédio vai tremer, vou te engravidar já estando grávida,
vamos fazer quadrigêmeos e você vai ficar três dias me sentindo!
— Não vou negar, amo seus esculachos, bebê Lucca. Seu
jeito na cama me rende, um olhar safado que chama, e uma pegada
que desgrama... — Ela está me respondendo com letra de música?
É isso?
— Isso é uma música?
— Ora ora, o que temos aqui! Um espertinho que não sabe
distinguir se é uma música! — Essa mulher está surtada de
hormônios. — Sherlock, investigue. — Estaciono o carro em meu
prédio e seguimos rumo ao elevador.
— Fodeu! Fodeu pra caralho mesmo! Você realmente não
precisa de bebidas para ficar louca. Desista dessa despedida de
solteira, Paula. Estou implorando.
— O que você acha que farei nela?
— Acredito que não vá me trair, mas acredito também que vá
ter homens nus, mostrando as rabiolas para você e todas as
mulheres. Vão ter strippers nessa merda, Paula, eu sinto isso, é um
sofrimento que não tem fim, uma angústia.
— Deus! Pare de dramatizar! — repreende. — São só
strippers — fala, quando chegamos na cobertura e damos de cara
com os meus pais.
— Strippers? Onde? — minha mãe questiona.
— Eu acho sinceramente que nada relacionado a strippers
deve interessar a você, Sadgirl! — meu pai argumenta.
— Minha despedida de solteira, sogra — Paula responde,
dando um beijo em minha mãe e então um beijo em meu pai. —
Lucca disse que terá uma despedida de solteiro, logo, eu terei
também. Dandara e Melinda já estão dentro.
— Epa! Despedida de solteira e Victória Brandão não
combina muito. Aliás, despedidas de solteiras onde tenha qualquer
mulher da família, nunca acabam bem. Sofri igual um cão na
despedida de fodida Sadgirl do meu caralho. A mulher quase
vendeu a alma para o diabo, que no caso era sua vó, a grande
responsável pela queda do muro dos Albuquerque’s. Se vai mesmo
ter uma despedida de Paula, você precisa se preparar, filho. Estarei
ao seu lado dando apoio paterno. Anos de maturidade servem para
isso, apoiar os filhos em momentos difíceis como esse.
— COMO? — minha mãe pergunta, colocando as mãos na
cintura, e eu abro a porta, para evitarmos de discutir logo no
corredor. — Paula, meu amor, estarei com você nesse momento,
como base de apoio. Os anos de maturidade também servem para
apoiar a minha nora, que resolveu se casar com um filho que é
completamente idêntico ao pai! Sabe o que isso significa? Que não
presta! Portanto, estarei com você para dar apoio nesse momento
delicado.
— POR CIMA DO MEU CADÁVER TALVEZ VOCÊ VÁ
NESSA MERDA, VICTÓRIA! Eu só estarei com Lucca porque ele
precisa do pai.
— E eu estarei com Paula porque ela precisa da sogra nesse
momento. Ela está grávida, pelo amor de Deus! — minha mãe
argumenta, enquanto eu e Paula ficamos apenas observando o
caos. Fodeu tanto! Talvez eu tenha cuspido na cruz ou algo do tipo.
— Paula, minha linda, vou ajudar na organização da sua despedida
de solteira. Podemos fazer um coquetel. O que acha?
— Igual ao coquetel que você fez em sua despedida? — meu
pai pergunta.
— Em minha defesa, não fui eu quem organizei a minha
despedida. Eu sequer sabia dela, e você sabe bem disso.
— Não sabia, mas foi, subiu em cima dos lugares para
dançar, bebeu até perder a alma e eu tive que ir resgatá-la. — Essa
eu realmente eu não sabia. Estou surpreso.
— Graças à minha despedida de solteira você descobriu que
eu estava grávida de Victor!
— Foi a única coisa boa! — meu pai rebate. — Você estava
toda solta naquela boate, traidora. Já eu, estava santo na chácara,
ansioso, contando os minutos para me casar com a infiel. — Meu
pai é mesmo o rei do drama. Talvez eu seja como ele, não sei. Só
sei que me sento e esfrego meu rosto. Paula vai judiar do meu
coração e estou ponderando abrir uma investigação na qual
precisarei do garoto de açúcar. Ele precisa descobrir os planos de
Dandara, custe o que custar, ou todos estaremos fodidos.
— Não seja dramático, Matheus Albuquerque, é só um pouco
de diversão. Olhe para mim, para a minha idade!
— Estou olhando, acredite. É por isso mesmo que essa ideia
está fora de cogitação. Você é extremamente gostosa e bonita, Vic.
— Olha a que ponto chegamos! Culpa da Paula!
— Você é gostoso e bonito. Poderia ser facilmente um Sugar
Daddy tesudo, por cima do meu cadáver, é claro.
— OK, OK! FAMÍLIA! — digo. — Sem despedidas de solteiro
para nós!
— Com despedida, bebê Lucca. COM DESPEDIDA.
— Meu Deus do céu! Pobre filho! Não sabia que Paula era
uma Sadgirl infernal! Fuja, meu filho! Ela é como sua mãe, um
caminho sem volta — meu pai aconselha. — Vou chamar Túlio para
se juntar a nós. Ele já matou o pai, deve ter alguma solução! — ele
diz, pegando o telefone e eu percebo que só piora.
— O quê? O pai de Humberto matou o próprio pai? — Paula
pergunta incrédula.
— É uma longa história. Mas, essa família é louca, eles
fazem humor com coisas absurdas — minha mãe explica. — A frase
de efeito do Túlio é "eu matei meu pai". Ele usa isso para
amedrontar as mais diversas pessoas, incluindo padres, mas não
assusta nem mesmo um gatinho que já é assustado. A história é
complexa e de muito sofrimento, não é um bom momento para você
saber. Agora, mudando de assunto, Paula. Vamos ao que de fato
interessa: sua despedida de solteira! — exclama, enquanto estou
boquiaberto. — Vou ligar para Analu, para Ava, Luma e Beatriz. Oh,
Beatriz não pode faltar, ela é mestre em coisas erradas!
— Tia Bia não, mãe! Eu sou seu filho, caramba! Está
armando contra seu próprio filho?
— Se te conforta, não estou armando contra você, estou
armando contra o seu pai, filho. Mas, como diz o ditado, o fruto
nunca cai longe do pé, então você se fode junto e está tudo certo!
Os justos pagam pelos pecadores, é a lei, ou não. De qualquer
forma, não percebeu que seu pai está indiretamente/diretamente
querendo usá-lo para se vingar da minha despedida de solteira que
aconteceu na idade média? Preciso retalhar e farei isso!
— Paula, eu não acho que seja uma boa ideia. Sou um
homem de família, centrado, quieto, estou arrependido, de verdade,
meu amor. Prometo ficar grudado com você até mesmo na hora de
vestir o vestido de noiva. Não vou sair de perto nunca mais, meu
amor. Te dei o sol, te dei o mar.
— Estou amando isso! Não me divertia tanto assim há muito
tempo! — Paula diz, batendo as mãos, eufórica.
— Túlio topou, filho. Bernardo também. Eles irão comunicar
aos demais membros da família — meu pai diz, encarando minha
mãe maquiavelicamente. Só que ele não esperava receber uma
encarada mil vezes pior, daquelas que faz o sangue gelar e o pau
encolher.
— É GUERRA, MATHEUS ALBUQUERQUE!
— Você entende o que o nosso casamento está virando? —
pergunto a Lucca, em seu escritório. — Um circo dos horrores, onde
só há loucos.
Ontem à noite foi um caos e eu descobri que meus sogros
conseguem ser mais loucos que meu futuro marido, que já é louco o
bastante. Enquanto eu faço uma série de perguntas, Lucca se
mantém de pé, tentando de todas as maneiras se manter sério.
Porém, o conheço bem para perceber que há uma gargalhada
presa.
— Acho que para começarmos a consertar as coisas você
deve renunciar à despedida de solteira, Paula — argumenta com
sua carinha de anjo.
— E você?
— Ok, talvez eu tenha me expressado mal ontem à noite.
Não é bem uma despedida de solteiro que eu quis propor, é apenas
uma confraternização de amigos.
— Deus! Lucca Albuquerque! Sua cara não queima? —
questiono. — É assim que quer conduzir isso? Então, que seja! Eu
também quero confraternizar. Não será mais uma despedida de
solteira, e sim uma confraternização.
— Confraternizações duram um dia, poucas horas, e
geralmente são feitas em botecos, Paula. Confraternizações não
duram dias e exigem viagens.
— Cada um confraterniza como quer. Eu gostei da ideia da
Dandara sobre fazermos uma viagem de mulheres, será algo
interessante. Faz um tempo que não viajo. Muita calma nessa hora.
— Faço uma referência ao filme para provocá-lo. Ele suspira e se
senta. Agora sou eu segurando o riso.
— Irei sequestrá-la — avisa, cruzando as mãos sobre a
mesa. — É isso! Não pense que não entendi sobre aquele maldito
filme, vou até assistir aquela merda novamente e vou memorizar
todos os detalhes. Vou foder com você, Paula, e não será
sexualmente dessa vez.
— Você pode tentar, eu foderei com você também,
provavelmente em uma intensidade mais alta. Agora, temos coisas
mais importantes para decidir.
— Despedida de solteiro é um assunto importante para mim
— informa. — Não vai acontecer!
— Para mim já está decidido, vai acontecer e ninguém vai
impedir, muito menos você. Você tem a sua confraternização, eu
tenho a minha. Ponto final, deixe de dramatizar. Foi você quem
começou, sustente isso até o final. — Ele arqueia as sobrancelhas e
eu arqueio as minhas também, então ele cede.
— Eu imploro, Paulinha, meu amor, minha Diabinha mais
linda do mundo.
— Precisamos discutir sobre padrinhos — digo, encerrando
o assunto. — NÃO ME CHAME DE PAULINHA! Vamos lá, bebê
Lucca, vamos falar sobre padrinhos.
— Ok. Já possui alguma ideia? Eu tenho algumas. — É tão
fofo quando Lucca conversa sério, como um homenzinho. Eu sou
muito apaixonada mesmo, só isso justifica. Estou babando em meu
noivo sério. Antes que eu possa responder, Victor surge na sala
acompanhado de Ava.
— Olá! Casal! O que estão organizando? — Ava questiona,
puxando uma cadeira e se juntando a nós enquanto Victor faz o
mesmo.
— Estamos começando a decidir sobre padrinhos — explico.
— Já têm alguma ideia em mente? Eu sou uma opção! —
Victor sugere rindo.
— Meu irmão, meu amigo, aqui as escolhas são visionárias!
— Lucca comenta, ficando de pé. — Jogo com artilharia pesada.
— Como assim? — Ava pergunta, e vejo um sorriso crescer
no rosto de meu noivo. Eu aposto um rim que há uma merda grande
sendo construída em sua mente.
— Lembra que lá em Minas, quando éramos todos
adolescentes, tínhamos uma empregada que se chamava Soninha?
— pergunta aos irmãos.
— É claro! Soninha era a melhor! — Ava diz sorridente.
— Ao longo dos anos de convivência aprendi muitas coisas
com ela; desde tacar limões na parede para amolecer à forjar as
assinaturas no boletim. — Arregalo os olhos e Victor começa a
rir. — Quem nunca? — pergunta.
— Eu nunca forjei assinatura dos meus pais em boletins —
afirmo.
— Voltando, Soninha, minha querida empregada, amada por
toda a família, vida louca purinha... uma vez ela estava lá em casa,
sentada no balcão descascando batatas e conversando por telefone
com sua sobrinha enquanto eu tomava Yakult. — Eu já quero rir,
porque ele sempre tem que contar histórias enormes para chegar a
um ponto e as histórias são sempre muito engraçadas. — Sua
sobrinha, Marilene, iria se casar e estava precisando da ajuda da tia
para tomar decisões. A pobrezinha estava perdida, não sabia nem
mesmo como era o ato sexual. Sim, segundo Soninha a garota era
virgem, mas não sei não. Enfim, parece que a garota queria chamar
os irmãos para serem padrinhos e a tia não pôde ajudá-la. Soninha
ficou boladona de pau duro.
— Ela tinha um pau? — pergunto rindo.
— Não que eu saiba, talvez um pau giromba elétrico ou de
borracha, vai saber?! De qualquer forma, Soninha ficou boladona e
socou o balcão, revoltada com a péssima ideia da sobrinha. Ela
disse à Marilene que iria arrancar todos os cabelos dela fora, caso a
garota escolhesse irmãos para serem padrinhos da linda união
virginal. Aquilo chamou minha atenção, obviamente, o debate
estava muito interessante para um jovem de 15 anos, e eu passei a
ficar fixado na conversa, atento a cada mínimo detalhe. Me lembro
quando ela disse: "Irmãos já são obrigados a ser legais e gentis com
você, a dar presentes bons. Não desperdice a chance de ganhar
presentes caros chamando irmãos, sua burra! Chame alguém de
fora, porque padrinhos têm a obrigação de dar os melhores
presentes, juntamente com os irmãos. Por que não chama a patroa
da sua mãe?" — Estou boquiaberta escutando a história, até
consigo imaginar a cena. — Marilene disse algo em resposta e
Soninha não curtiu nem um pouco. Me recordo que ela ficou
realmente possessa. Ela acrescentou: "E daí se não tem
intimidade? O importante é que ela pode te dar uma geladeira ou
um fogão! Ela vai ficar sem graça de recusar e mais sem graça
ainda de dar um jogo de jantar de doze peças Tramontina ou
aqueles kits de taça de cristal falsificado de doze reais."
— Misericórdia, Lucca! — digo rindo.
— Soninha era o veneno mesmo. Uma vez ela quase me
pegou em flagrante numa guerra dos cinco dedos, se é que vocês
me entendem — Victor comenta rindo, como se tivesse dito que a
ela o pegou rezando.
— Você sabe que tem dinheiro, não é mesmo Lucca? — Ava
pergunta rindo. — Victor, eu não quero pensar em você adolescente
se masturbando, por favor, contenha-se.
— É claro que sei que tenho dinheiro, mas isso agora não
vem ao caso. Soninha me deu muitos ensinamentos, muitos
conselhos matrimoniais indiretamente. É por isso, caros amigos, que
eu tenho a honra de dizer que tenho um padrinho em mente: Joseph
Vincenzo é o nome dele. Se a patroa da mãe de Marilene tinha
grana e poderia dar uma geladeira fantástica ou um fogão, imagine
o que Joseph Vincenzo nos dará? — Eu sei que o palhaço, no
fundo, está brincando. Mesmo assim não consigo não ficar chocada
com a audácia, principalmente porque essa será a versão dele à
Joseph quando for convidá-lo. Não conheci esse homem ainda,
mas, desde Las Vegas, Lucca fala muito dele e sei que são grandes
amigos, que Joseph esteve com ele em momentos em que ele
esteve completamente perdido. No fundo é pela amizade que ele
está convidando Joseph, mas, até que se prove o contrário, esse
será o argumento louco de meu noivo.
— Por que diabos eu não pensei nisso em meu casamento?
— Victor questiona socando a mesa. — Melinda ficará puta quando
eu contar. Nossa senhora, minha Santa Josefina, que saudade da
minha mulher, caralho! Não posso nem falar o nome dela! — Gente,
que diabos são os membros dessa família? Há de existir alguém
normal!
— Victor, você não é cria da favela, meu caro irmão! Você
não é um visionário, empreendedor como eu. Acredito que Joseph
Vincenzo está no top do TOP PADRINHOS. Precisamos ser
inteligentes na escolha, ele é o dono do mundo! — meu noivo
argumenta rindo.
— Jesus, eu não estou ouvindo isso! — digo.
— Essa foi uma jogada de mestre do caralho! — Ava afirma.
— Sério, que ódio! Acho que vou me divorciar de Gabriel, ou talvez
apenas renovar os votos, com padrinhos novos obviamente. Você
deveria fazer isso também, Victor. Não creio que fomos estúpidos.
Se a patroa da mãe de Marilene deu uma geladeira, Joseph
Vincenzo vai dar à Lucca uma cobertura luxuosa em Las Vegas, Los
Angeles ou Dubai! Um prédio inteiro não é nada para aquele
homem! Que filho da puta sortudo esse Lucca é! — Lucca para de
sorrir e fica um pouco pensativo.
— Morei em Los Angeles durante dois fodidos anos. Eu e
Joseph ficamos muito próximos, somos muito amigos, quase como
irmãos, mas não somos irmãos. Ele é um cara que vale à pena ter
como amigo. É engrandecedor e enriquecedor ficar perto dele, por
toda experiência e vivência que ele tem a passar — comenta. —
Aoooo Paula, Jacinta nós dois em uma suíte no Bellagio, comendo e
bebendo de graça, relembrando os velhos tempos em que dois
gatos surgiram do nada e a gente não lembrava se tinha trepado ou
não.
— Como? — Victor e Ava perguntam juntos.
— Nossa primeira vez foi um tanto quanto exótica — comento
relembrando. — Acordamos no dia seguinte com gatos na suíte,
nus, perdidos, dois preservativos descartados na lixeira e
desprovidos de memória. Para ficar ainda mais perfeito, Pablo, meu
ex que nasceu pelo cu, surgiu, eu estava destruída. Sentindo dores
em músculos que eu nem sabia possuir e cheia de marcas pelo
corpo. Foi memorável.
— Ainda me lembro das marcas em seu corpo, do
"eutrepoecemia". Temos uma grande história para contarmos para
os netos — Lucca comenta voltando a se sentar.
— Nunca contarei aos nossos netos como foi nossa primeira
vez. O que diabos é "eutrepoecemia"? — pergunto, e ele começa a
gargalhar.
— Eu trepando em você, você miando junto com os gatos. Na
verdade, não me lembro muito, mas sei que você é uma gatinha que
curte miar e acredito que os gatos tenham miado naquela noite. Foi
muito EU TREPO E CÊ MIA, TREM BÃO SÔ. AOOO CHÃO
MOIADO, CABA NÃO BELLAGIO! — Eitxaaa... controle-se
Paula! — Bom, então já temos os primeiros padrinhos vindos da
minha parte: Joseph Vincenzo e Maria Flor. Quantos teremos? —
Como ele muda de assunto assim? Estou morrendo de rir junto com
Ava, e Victor está encarando Lucca como se ele fosse uma
aberração. Talvez ele seja.
— Como você consegue ter essas sacadas monstruosas? —
Victor pergunta.
— Minhas sacadas saem do meu saco, por isso são
monstruosas. Monstruosas com meu pau com duas bolas! — meu
noivo justifica ao irmão.
— A cada dez palavras que Lucca diz, treze são besteiras —
Ava comenta rindo. — Não sei como ele consegue ser dois tipos de
homem em um só.
— Nem eu sei — concordo com ela. — Bom, sobre os
padrinhos, acho que no mínimo dois casais cada — respondo,
pensando nas possibilidades.
— E isso precisa ser decidido logo? — Lucca pergunta.
— Podemos esperar mais alguns dias, mas não podemos
demorar. Há curso de padrinhos. Joseph e Maria Flor moram na
Califórnia, não é?
— Sim, precisaremos verificar como ficará a situação deles,
caso aceitem. Aliás, tenho um outro casal em mente — Lucca
anuncia. — Bruce e Isis.
— Mas Isis é a nossa irmã! — Ava diz, parando de sorrir. —
Não pode chamar Isis para ser sua madrinha.
— É a minha preferida. Sinto muito, Ava. — Um bloco de
post-it voa na cara de Lucca, e eu fico sem compreender quando
mais objetos começam a ser jogados contra ele. Ava até mesmo fica
de pé e isso faz com que Victor fique também. Estou mais perdida
do que bala em tiroteio. Ava avança em meu noivo e começa a
socá-lo enquanto ele se defende e ri. — Pare, merda! É a nossa
irmã mais velha, inferno, Ava!
— Você não pode chamar ela para ser sua madrinha! Se ela
for, eu e Piroca Baby também seremos! É injusto! Por que ela é sua
preferida? O que eu te fiz?
Ok, os irmãos estão brigando por ciúmes.
— Ela não é a sua preferida! — ela afirma. — NÃO É A SUA
PREFERIDA! — Eu permaneço sentada, vendo Ava começar a
chorar e Lucca abraçá-la.
— Ava e Isis têm uma relação de amor e ódio — Victor
comenta, voltando-se a sentar. — Elas sempre foram assim. Essa
mesma crise que Ava está dando, Isis costuma dar, tudo por conta
do meu pai. Elas podem ser muito amorosas de vez em quando,
mas podem ser explosivas. A guerra entre elas é sinistra,
principalmente quando disputam quem é a preferida de Matheus
Albuquerque. Mas, em defesa das duas, elas se amam
incondicionalmente e sabem ser as melhores irmãs na maior parte
do tempo. Nós adoramos provocá-las.
— E Luma?
— Luma é louca, mas é mais no estilo maluca beleza. Ela
vive num universo paralelo e encantado. Davi é o único que sofre.
— Eu começo a rir. — Isis é oito anos mais velha que eu, uma
grande diferença entre todos os filhos. A história é um pouco
complexa, meu pai só a conheceu quando ela tinha 7 anos e ele
sempre teve muita preocupação em relação a ela não se sentir
excluída pelo fato dele ter acompanhado o nascimento e a infância
de todos os demais filhos.
— E aí surgiu a guerra entre Ava e ela? — pergunto curiosa.
— Sim, Isis era a única menina até Ava e Luma nascerem.
Certamente o casamento de vocês será interessante. Todos são. As
duas disputam até buquê, mesmo já sendo casadas.
— Isso deve ser hilário. — Volto a observar Ava, e ela está
agarrada a Lucca. Eles estão tendo uma conversa baixa quando
meu sogro surge e fica parado observando a cena sem
compreender.
— O que houve? — ele pergunta.
— Papai! — Ava exclama, indo direto abraçá-lo. — Eu te amo
muito, muito, muito.
— Eu também amo você, princesa. — Meus hormônios de
grávida... estou chorando agora e há dois homens me achando
maluca: Victor e Lucca.
— Estou grávida — explico, e isso é o suficiente para que
Lucca me puxe para os seus braços. Enquanto Ava chora de um
lado, eu choro de outro e Victor simplesmente sai da sala
reclamando que todos nós somos loucos.
— Não chora, Diabinha. Eu cuido de você, meu amor. Vamos
tomar um sorvete bem grandão? Você é uma princesa, princesas
não choram — meu noivo argumenta.
Deus do céu... a loucura dos Albuquerque’s é contagiante. A
loucura deles somada com a minha... Que Deus nos acuda! Por
favor! Meu casamento será um pandemônio!
Estou paralisado olhando para um monitor onde há um
pequeno ponto. Nem mesmo consigo piscar meus olhos ou
descrever a maneira como estou me sentindo agora. Isso torna tudo
real. Embora eu seja pai, não tive a oportunidade de sentir a
ansiedade da espera, não tive a chance de acompanhar cada
detalhe da gestação. Agora é tudo novo e posso dizer que é uma
experiência única e capaz de deixar um homem hipnotizado, tão
hipnotizado que sei que está havendo uma conversa, mas não
consigo nem mesmo prestar atenção.
Sexo faz bebês! Como pode, não é mesmo? Saber que um
momento é capaz de gerar uma vida. Talvez eu esteja apenas
alucinando e tendo todos esses pensamentos malucos, mas é
surreal, incrível, é foda de todas as maneiras e só agora a minha
ficha caiu. Paula está mesmo grávida de um filho meu, e ele está
aqui, diante dos meus olhos, em forma de pontinho. O som
constante desses batimentos cardíacos só me faz crer que já o amo
com todas as minhas forças, assim como amo essa mulher que está
me proporcionando esse momento mágico.
— Lucca? — A voz de Paula me tira do transe. — Você está
bem?
— Estou — afirmo, dando um sorriso. — Você está bem?
— Muito, muito bem — responde sorridente. — Está feliz?
Parece em outro universo agora.
— Eu me sinto em outro universo. É claro que estou feliz, na
verdade, estou radiante e em transe. Agora tudo parece real o
bastante — digo, segurando suas mãos. — Obrigado por ter me
dado esse bebê. Isso se parece como um sonho.
— Me assustou. Nunca o vi assim, tão aéreo em uma
situação. — Sorrio, depositando um beijo em suas mãos.
— Acho que as coisas acabaram de mudar para mim. Uma
mudança boa e bem-vinda — confesso, voltando a olhar o monitor.
— Bom, Paula, pelo que estou vendo aqui sua gestação está
passando pela décima semana. Pelos meus cálculos, esse bebê
deve nascer por volta de março. Está tudo bem, já pode ir se limpar
e se vestir para continuarmos nossa conversa — a doutora informa,
tirando o aparelho assustador de dentro da minha mulher.
Paula se vai e eu fico a aguardando, sentindo uma ansiedade
fora do comum. Embora eu esteja muito radiante nesse momento,
não consigo deixar de sentir uma leve pontada de dor ao pensar que
perdi todo o acompanhamento do meu primeiro filho. É algo que
estou trabalhando em meu psicológico e preciso superar, entendo
isso, mas não impede de sentir uma pequena fagulha de dor.
Paula está de volta e nos acomodamos em cadeiras de frente
para a mesa da médica.
— Bom, papais, vocês têm dúvidas?
— Eu tenho — informo, ganhando a atenção das duas. —
Paula é mãe de segunda viagem. Eu até tenho um filho, mas não
pude acompanhá-lo desde o início, então tudo isso é uma grande
novidade para mim. Tenho irmãs que são mães, mas não as
acompanhei em consultas ou qualquer coisa do tipo — explico. —
Há algumas questões que preciso perguntar.
— Vá em frente, Lucca — a médica diz.
— Bom, eu e Paula estávamos mantendo a rotina normal até
o dia de hoje. Eu acabo de ver meu filho pelo monitor, pequeno
demais, só uma pequena bolinha que parece vulnerável o bastante
e isso é um pouco assustador para mim. A realidade acaba de cair
sobre mim. Vê-lo pelo monitor e ouvir o coraçãozinho torna tudo
real. — Sorrio. — A questão é... é seguro continuar mantendo a
rotina normal? Paula sabe os cuidados que dever ter, mas e eu? Há
algum cuidado que eu deva ter?
— Bom, Paula me disse que não tem ido malhar, não tem
ingerido bebida alcoólica, disse ter diminuído o ritmo das atividades
desde que descobriu sobre o bebê. O primeiro trimestre é o mais
delicado, que requer um maior cuidado. Você só precisa continuar
sendo esse parceiro, é tudo que ela precisa agora.
— Sim, não restam dúvidas de que estarei ao lado dela e que
ela terá todo o meu cuidado, mas vamos direto ao ponto aqui:
relação sexual. — Paula sorri e morde o lábio inferior, quase
fodendo meu foco. — Espero que não riam de mim, porém, agora,
estou com um pouco de medo de que o sexo possa machucar o
bebê. É claro que sei que os casais continuam fazendo sexo
durante a gravidez, doutora, mas até onde podemos ir? Vou explicar
melhor e em um português bem claro. Eu e Paula estamos em fase
de transição, iniciando a vida sob o mesmo teto. Nossa vida sexual
é bastante intensa, fazíamos muito sexo quando vivíamos em casas
separadas, mas agora a coisa aumentou um pouco desde que
temos ficado mais tempo juntos, de forma que fazemos sexo várias
vezes ao dia, com muita intensidade. Desculpe o que vou dizer, mas
preciso que entenda. Nós fazemos um sexo mais selvagem,
gostamos de sexo um pouco bruto.
— Lucca! — Diabinha exclama em choque, mas preciso
mesmo me informar sobre isso.
— Paula, eu realmente preciso saber ou as coisas vão mudar
devido à minha preocupação — explico com seriedade. — São
preocupações que precisam ser abertas. Acredito que a doutora
ficará feliz em sanar minhas dúvidas de marinheiro de primeira
viagem.
— Ele está certo em perguntar, Paula. Estou aqui para isso
— a médica diz rindo. — Gostei da sinceridade, Lucca, mas não há
nada que se preocupar, Ok? Não existe a menor possibilidade do
bebê ser machucado, ele está alojado lá no fundo do útero de
Paula, devidamente protegido. O sexo é recomendado, inclusive. É
saudável e uma boa maneira de se manterem conectados nessa
fase. Só descartamos o sexo se surgir algum problema no meio do
caminho, mas, se Deus quiser, não vai acontecer com Paula.
Podem continuar com a rotina sexual, faz bem para a mente, para o
corpo.
— Ótimo, me sinto mais seguro agora. A segunda questão é:
quando conseguiremos descobrir o sexo do bebê? Estou
extremamente ansioso sobre isso. — Paula dá um sorriso e beija
minha bochecha.
— A partir da décima sexta semana talvez possamos
descobrir se tivermos sorte. Varia muito, depende da boa vontade
do bebê — ela brinca. — Alguns gostam de torturar os pais
mantendo as perninhas fechadas e dificultando a descoberta.
— Perfeito. — Sorrio imaginando meu bebê.
— Doutora, eu tenho algumas dúvidas, mas eu não me sinto
devidamente preparada para colocá-las para fora — Paula diz. —
Estou um pouco receosa devida à condição de Henrico. Na verdade,
acho que só quero me preparar psicologicamente para o que está
por vir. Porém, vou estruturar melhor minhas dúvidas antes de dizê-
las a você.
— Vamos sim conversar sobre isso quando se sentir
preparada, Paula. — De repente, eu decido que gostei dessa
médica. Ela é a mesma que cuidou de Paula na gravidez de
Henrico, e minha Diabinha parece extremamente confortável com
ela. — Tudo que precisa saber agora é que precisamos iniciar um
pré-natal bem elaborado, precisa ser bastante cuidadosa com a
alimentação, tomar todas as vitaminas, manter o psicológico bem,
evitar stress, relaxar um pouco, Paula. Tudo isso ajuda muito para
ter uma gestação saudável. Acho que você tem um bom homem ao
seu lado, certamente ele irá ajudar bastante a tornar esse momento
ainda mais especial.
— Com toda certeza irei — afirmo, beijando a mão de Paula.
— Sabe, doutora, toda essa conversa sobre hábitos saudáveis
muito me interessa — confesso. — Como um bom futuro marido,
quero que a gestação de Paula seja tranquila. Gosto desse negócio
da minha mulher ser mais saudável nesse período, mais cuidadosa,
evitar aglomerações, festas, despedidas de solteiro. É importante
para a saúde do bebê. — Ela solta a minha mão na hora e me dá
um olhar quase que assassino. Cada um joga com as armas que
tem, ela precisa entender isso.
— Eu não me lembro dela ter dito qualquer coisa sobre
despedida de solteiro, Lucca Albuquerque! — Diabinha afirma quase
irada. — A senhora disse, doutora?
— Não me recordo — a médica responde rindo.
— Você precisa se resguardar nessa fase. Precisa de
tranquilidade, amor — digo, voltando a pegar sua mão. — Vamos
fazer esse período ser de paz, amor. Vamos resguardar essa fase.
— Não estou doente, Lucca. Não há nada a ser resguardado
aqui — argumenta.
— Não acho que deveria ter uma despedida de solteiro. —
Vou direto ao ponto.
— Então eu não acho que devemos ter sexo até os quarenta
dias de resguardo após o nascimento desse bebê. — Porra! Isso é o
mesmo que levar um chute no saco. — Se tenho que me resguardar
de tudo, me resguardarei das atividades sexuais.
— A médica disse que as atividades sexuais estão permitidas
e são saudáveis.
— Lucca, sua cara não queima não? — Jacinto a pressão
das palavras da minha noiva. — Entenda de uma vez por todas, EU
TEREI UMA DESPEDIDA DE SOLTEIRA E PONTO FINAL. Não
adianta tentar usar a gravidez contra mim, bebê. Estou saudável.
— Bom, ninguém pode dizer que eu não tentei impedir essa
situação — digo sorrindo. — Meu Deus do céu, Paula não cansa de
me fazer sofrer não, doutora. Há alguma recomendação? Essa
mulher tem me magoado com força.
— E assim começa o momento drama — minha noiva diz,
revirando os olhos. — Doutora, pode me passar a listagem de
vitaminas e os exames que preciso fazer? Quero fazer logo, antes
de marcar minha despedida de solteira. — Eu me calo, percebendo
que há uma tora gigante de árvore prestes a invadir minha cavidade
anal.
Enquanto a doutora começa a digitar incansavelmente em
seu laptop, minha mente agora começa a trabalhar em uma forma
de descobrir tudo sobre essa bendita despedida de solteira. Há algo
me perturbando, por que Paula não está preocupada com a minha
despedida de solteira da mesma forma que estou preocupado com a
dela? Dona Paula, Jacinta minha desconfiança!

— Bebê Lucca, você prefere menino ou menina? — Paula


pergunta enquanto dirijo para casa.
— Eu vou amar o que quer que seja, mas acho que ficaria
enlouquecido com uma menininha — respondo, imaginando uma
menininha estilo Sophie. Acho que eu me deitaria no chão para ela
passar em cima de mim como um pequeno trator desgovernado. —
Ei, quando sua barriga começará a dar sinais de que está
carregando um sadbebê? — Ela sorri com a minha pergunta.
— Dizem que na segunda gestação a barriga cresce um
pouco mais rápido. Porém, não sei dizer com precisão — responde
sorridente. — Lucca, passa muito rápido. Outro dia mesmo estava
grávida de Henrico, e todos os meus planos eram completamente
diferentes. Agora sou sua noiva, estou grávida do meu segundo filho
e me sinto extremamente bem-cuidada por você. Acredito que
esteja levemente sentido por não ter acompanhado a gestação de
Dandara, mas, preciso te contar que só tive meus pais ao meu lado
na gravidez de Henrico. Eu estava com Pablo, mas ele não se
importava muito, não era muito delicado, não fazia muita questão,
nem mesmo assistiu o parto, foi meu irmão quem insistiu para ficar
ao meu lado. É basicamente uma nova experiência para mim.
— Eu estarei ao seu lado, Diabinha. Faço questão de estar
com você em todos os momentos, de viver cada dia dessa gestação
ao seu lado. Vou cuidar de você princesa e estarei ao seu lado
quando nosso bebê nascer, até que o desmaio nos separe.
— Você está dizendo que vai desmaiar na sala de parto?
— É preciso deixá-la preparada para qualquer incidente.
Prometo que lutarei contra isso. — Ela começa a rir. — O desmaio é
uma herança familiar. Não desmaiei ao saber do nosso bebê, mas
não posso garantir que não irei ter um apagão quando ele nascer.
— Você são todos muito loucos, mas, ao mesmo tempo, são
incrivelmente fofos. Sou uma mulher de sorte, assim como sei que
Melinda também é por ter Victor.
— Sorte é ter você, bebê Paula.
— Lucca, obrigada por estar ao meu lado nessa fase.
— Paula, eu sinto muito que Pablo tenha sido um merda com
você. Estar ao lado da mulher durante a gestação não é mais do
que obrigação, embora eu não esteja fazendo isso por obrigação.
Quando você fala assim, parece que estou fazendo uma grande
coisa, mas isso é o mínimo, meu amor. Eu engravidei você, eu quis
esse bebê, fodi você.
— Meu Deus...
— É o que é. Se eu fui bom para fodê-la e fazer um filho, eu
tenho que ser bom para acompanhá-la durante a gravidez. Não diga
como se eu estivesse sendo quase um super herói, amor, é o
mínimo. — Pego sua mão e coloco sobre a minha coxa enquanto
dirijo. — Esqueça a maneira como foi tratada no passado, princesa.
Serei tudo o que tenho que ser e muito mais. Eu amo você, está me
dando um enorme presente, vamos nos casar, é a minha mulher, a
mãe do meu segundo filho, a mulher que tem relações sexuais
comigo. Se eu não valorizar isso, não sou um homem, e sim um
verme.
— Você valoriza até o ato sexual — diz, sorrindo com os
olhos cheios de lágrimas.
— Claro. Embora goste muito de sexo, Paula, você não é
obrigada a estar sempre disposta, mesmo que sempre demonstra
estar, você nunca me nega isso, mesmo que tenha o direito de
negar.
— Posso te dizer algo?
— Claro.
— Eu nunca neguei sexo a você porque sempre estou
disposta a fazê-lo. É algo novo para mim, já me forcei a transar por
obrigação no passado, não é bom ou legal. Com você não preciso
forçar nada. Você despertou meu lado sexual que esteve
adormecido durante um longo tempo. Eu sinto muito desejo sexual,
bebê Lucca, de forma que nunca precisei forçar fazer sexo com
você. Não forço fazer, mas algumas vezes me forço a não fazer.
— Como assim? Me explique isso — peço rindo.
— Tenho medo de que pense que sou uma ninfomaníaca. —
Eu quase freio o carro.
— Você é maluca? — pergunto incrédulo, dando uma
gargalhada alta.
— Maluca sexual por você. Você é o melhor sexo da minha
vida, me fez descobrir um prazer que eu jamais saberia que poderia
existir. Você mexe com a minha libido o bastante — responde
sorrindo e com as bochechas coradas. — Já quis surgir em seu
escritório um milhão de vezes e exigir sexo, já quis sair do meu
apartamento durante a madrugada e bater na sua porta para exigir
sexo, já quis sexo em situações que deveria não querer, como por
exemplo, perto da sua família.
— Pelo amor... Paula, Jacinta minha ira. — Ela começa a rir.
— Não se contenha, Diabinha. Por favor, não faça isso. Se quer
sexo, diga, venha até mim, me ligue, mande a porra de um sinal de
fumaça, qualquer merda. Não seja podada em relação a isso. Eu
estarei mais que disposto a te dar a quantidade de sexo que quiser
e precisar, bebê. Não acredito que se controla comigo.
— Me desculpa por isso. Prometo que não irei me podar
mais, inclusive, eu quero muito foder quando chegarmos em casa.
Talvez possamos fazer isso dentro do carro, na garagem, tenho
esse fetiche.
— Aooo Paula, razão da minha libido! Seu desejo é uma
ordem!
— Senhor da Glória, Melinda!!! Pelo amor da Santa
Josefina!!! O que eu fiz para merecer uma facada no coração? —
Estou trancado em minha sala, brincando com uma caneta,
tamborilando meus dedos na mesa. Mesmo trancado, eu consigo
ouvir a discussão do meu irmão com sua digníssima esposa, que
está acompanhada da minha mãe e da minha noiva traidora.
Está sentindo esse cheiro? É o cheiro do meu divórcio se
aproximando antes mesmo do casamento! E é o cheiro do divórcio
de todos os demais casais envolvidos nessa situação. Victor é
trouxa de estar tentando conter Melinda, ela é uma coisinha
pequena, delicada, que engana qualquer pessoa com seu rostinho
de princesa da Disney. Mas, de longe, eu posso afirmar que ela é
uma das piores mulheres da família, tão diabólica quanto minha
mãe ou Ava, talvez mais.
Aooo ressentimento que eu estou sentindo! Não consigo nem
mesmo me concentrar no trabalho desde que tive a infeliz ideia de
falar sobre uma despedida de solteiro. A cena é bastante clara: eu
peguei um consolo de 30 centímetros e enfiei em meu próprio cu! É
o que é!
A briga segue acontecendo e eu decido colocar meu fone de
ouvido, escutar uma moda sertaneja. Minutos depois, minha sala se
enche. Gabriel, Davi, Victor, meu pai... brasileiro não tem um dia de
paz nessa vida mesmo!
Victor se senta em uma cadeira e meu pai deposita uma mão
em seu ombro direito. O coitado nem sabe sofrer com categoria tipo
eu.
— E aí, o que vamos fazer? — Gabriel pergunta, se jogando
no sofá. — Porque elas não vão desistir mesmo dessa merda. Ava
está quase me batendo já.
— Normal — digo rindo. — Ava te bate todo dia, babaca! Pau
mandado!
— Teu rabo!
— Quando foi que Paula resolveu ser amiga da Dandara
nessa merda? Porque a meritíssima está na porra de um grupo que
a diabólica da Melinda criou ontem, e elas estão trocando até
receitas naquela merda, além de estarem dispostas a nos foder! —
Victor comenta, e eu já fico em estado de alerta. Como existe um
grupo e eu não sei?
— Grupo? — pergunto.
— Você não sabia? — Davi pergunta. Até ele sabe e eu não?
— Aooo... Paula, filha da mãe! Por que diabos eu não sabia?
— pergunto, ajeitando minha postura na cadeira. Paula, Paula,
Jacinta o castigo....
— Paula só começou a ver hoje pela manhã. Melinda não me
deixa pegar a merda do celular desde ontem à noite. Hoje, na hora
do café da manhã, cheguei sorrateiramente por trás e vi a tropa toda
reunida. Uma verdadeira guerra está por vir.
— Vocês são dramáticos demais! — Davi pontua. — Duvido
que Luma vá nessa merda de despedida.
— Se você dúvida disso, então não conhece a mulher que
tem — meu pai rebate. — Luma é sim uma princesa, comparada às
outras, mas ela tem o sangue quente de Victória, e ela pode ser
influenciável em algumas situações. Só o fato dela ter nascido de
Victória já diz muito. — O deboche de Davi passa no instante em
que meu pai conclui a frase.
— É, meu amigo, estamos todos fodidos! Não há como
escapar! — comento.
— E de quem é a culpa? Sua! — Victor exclama, ferindo
meus sentimentos.
— Sim, eu confesso ser o culpado, não imaginava que as
coisas chegariam nesse ponto. Porém, aconteceu, e elas não vão
desistir dessa ideia. Agora nós temos que executar duas ações:
preparar a minha despedida de solteiro e descobrir tudo sobre a
despedida de solteira da Paula. As mais perigosas dessa história
são Melinda e Dandara, mas Dandara ainda é a que mais me
preocupa, por isso, precisaremos contar com a ajuda do garoto de
açúcar.
— Que apelido de bosta que você inventou, Lucca — meu pai
diz. — Victória também é perigosa, aliás, acho que todas. É difícil
dizer qual das envolvidas é menos perigosa.
— Vamos precisar contar com a ajuda inclusive do Humberto
e de Enzo; os dois estão saindo com as amigas da Paula, talvez
consigam extrair algo. Humberto pratica BDSM, talvez no meio de
algum tipo de tortura e chicotada ele obtenha alguma informação —
comento. — Vamos tomar uma cerveja hoje, em algum quiosque.
Vou criar um maldito grupo no WhatsApp e adicionar todos para
combinarmos. Só preciso saber onde encontrar o garoto de açúcar.
— Eu sei — Victor anuncia. — Ele foi deixar Samuel lá em
casa ontem e deixou o número de celular.
— Então quer dizer que MEU FILHO já está me traindo com o
padrasto???
— Foco, Lucca! — meu pai diz.
— Também sei onde ele estuda, e até a turma — Victor
comenta.
— Então vocês são mais que friends agora? — pergunto.
— Foco, Lucca!
— Que porra! — esbravejo. — Joseph Vincenzo será o
padrinho do meu segundo filho.
— Por cima de mim! — Victor exclama. — Por que tudo
agora é Joseph?
— Se Dandara engravidar, você pode ser padrinho do filho
dela, eu não me importo! Joseph é meu grande amigo e não é um
traidor.
— Qual a sua idade Lucca? — ele pergunta.
— 3 anos e meio! Babaca!
— Enquanto vocês brigam como crianças, Paula e as demais
mulheres estão organizando alguma parada com strippers que
possuem pênis de 30 centímetros e um gingado da Bahia — Gabriel
diz.
— Que porra de gingado da Bahia? — eu e Victor
perguntamos juntos.
— Aqueles dançarinos da Bahia, que parecem ter a cintura
solta e parecem não usar cueca. Nada contra, é claro, mas acredito
que a mulherada goste, e se elas gostarem, nós estamos fodidos —
Gabriel argumenta. — Seremos cornos pelo menos nas mentes
safadas delas.
— Vocês estão fodidos, né? Eu tenho a malemolência no
sangue! Meu gingado é imbatível! Agora vamos deixar de
conversinha. Já deu o horário de ir embora. Fiquem ligados, vou
criar o grupo e combinar o horário do bat encontro.
— Ok, ficaremos aguardando — Victor diz, ficando de pé.
— Um de nós tem que ficar para vistoriar as coisas enquanto
vocês organizam tudo. Eu ficarei e tentarei conseguir o celular de
Vic — meu pai avisa. — Me mantenham informado sobre tudo,
qualquer novidade.

Quando chego em casa, tomo banho, crio o grupo, marco o


horário com a galera e ligo para Paula. É Henrico quem atende e
isso me desarma na hora.
— Tio Lucca.
— Campeão! Você gostou de viajar? Tio Lucca está com
saudades!
— Gostei — responde. — Sophie.
— O que há com a Sophie? Você gostou de brincar com ela?
— Sim, Samuel também. — Sorrio.
— Tio Lucca vai levá-los para brincar com você. Quer?
— Hoje?
— Hoje não. Já está um pouco tarde, mas tio Lucca vai ver
com sua mamãe um bom dia para brincarmos todos juntos, ok?
— Tá bom. — Paula surge na ligação, com sua voz angelical
logo em seguida. Ela pensa que me engana, ela!
— Bebê Lucca!
— Meu pau te cutuca, Paula. Tudo bem?
— Sim, e você? Como foi o trabalho hoje?
— Foi tenso. Trabalhei sob tensão o dia inteiro, e você?
Alguma novidade? Alguma coisa para me contar? Qualquer mínima
coisa para me contar?
— Ah, claro, você já está sabendo do grupo de WhatsApp,
mas não há nada demais. Apenas um grupo de amigas — explica.
— Legal, também criei um agora — comento, e abraço meu
travesseiro, sofrendo feito um louco. — Estou com saudades. Muita,
muita mesmo, bebê Paula Diabinha.
— Eu também estou. Queria dormir de conchinha, mas, vou
dormir de conchinha com meu filhote. Estava alucinada de
saudades e ele está bem grudadinho comigo. Não vou nem mesmo
conseguir fugir para te dar um beijinho de boa noite.
— Falta só trazer tudo para a minha casa. Não vai me enrolar
por muito tempo, Diabinha.
— Não vou. Prometo começar a cuidar de tudo — diz.
— Ouça, eu vou sair com os meninos para tomar uma cerveja
em algum quiosque da praia. Ligo para você quando chegar,
princesa.
— Tudo bem, meu amor. — Até arqueio as duas
sobrancelhas juntas. Ela não ficou com ciúmes ou desconfiada?
— Tudo bem mesmo? — pergunto, em estado de alerta.
— Sim, precisa ter um tempo com os seus amigos.
— Você sabe que vou te achar nem que eu tenha que ir ao
inferno no dia da sua despedida de solteira, não sabe? Cê vai
passar o perrengue que meu coração sofreu, quando perceber que
me perdeu.
— Oh! Henrico está me chamando, preciso desligar. Beijo,
bebê Lucca. Amo e confio em você! — A filha da mãe encerra a
ligação e eu fico boquiaberto olhando para o aparelho.
Maldição! É mais grave do que eu imaginava!
Salto da cama, visto uma roupa e saio para o crime.
Enquanto dirijo, pego meu telefone e ligo para Dandara.
— Lucca, querido! — Ela atende, e eu já dou logo uma freada
no carro. Essa porra está ficando bizarra.
— Querido?
— Você me ligou, precisa de algo?
— Meu filho! Como ele está? — pergunto.
— Ele está brincando com uma maldição de um carro elétrico
que Nicolas deu para ele. Inclusive, eu estou ficando louca já! Ele
está achando que está em uma cena de velozes e furiosos, e eu
descobri que não preciso mais malhar. Correr atrás desse carro é o
suficiente para queimar as calorias. SAMUEL!!! — ela grita. —
Misericórdia, Lucca! Enfim, ele realmente está bem!
— Ok, Dandara. E o que você está tramando com a minha
noiva? É bom abrir logo de uma vez, para evitarmos problemas
futuros. Você só precisa me falar e eu...
— Lucca, preciso desligar. Samuel está bem... bem atentado!
Beijos! — Filha da puta!!!
Aooo Dandara, filha do cão! Todas elas devem ter combinado
essa merda, talvez, isso acabe em divórcio mesmo. Se não acabar
em divórcio, vai acabar em sexo. Uma das duas opções. Toda essa
adrenalina pode contribuir para esquentar a relação...
Ou não!
Sigo dirigindo até o local combinado, quando chego, todos já
estão, exceto Nicolas.
— Cadê o garoto de açúcar? — pergunto, puxando uma
cadeira.
— Ele está saindo mais cedo da faculdade — Victor informa,
e então olha além de mim. — Já está aqui!
Nicolas cumprimenta a todos, um pouco perdido. Coitado. O
menino parece um bom garoto, que pena! Dandara vai pagar os
pecados em vida!
— O que eu tenho a ver com essa reunião? — Nicolas
pergunta, se juntando a nós. — Isso parece algo familiar.
— Você é a peça-chave! Dandara está encabeçando a
despedida de solteira da Paula — explico.
— Dandara nem tocou mais nesse assunto. Vocês estão
enganados — ele afirma.
— Você está enganado, garoto de açúcar.
— Nicolas — ele diz.
— Sua mulher está em um grupo de WhatsApp com todas as
mulheres, combinando tudo sobre a despedida de solteira — Victor
informa, entregando a ele um copo de tequila. — Ela e Melinda são
as cabeças ao que parece. — O garoto vira o líquido, e pede para
Victor encher mais. Eu quero rir, mas acabo enchendo um copo para
mim e bebo junto.
— Mande lembranças para Dandara. Diga que foi Enzo quem
mandou — Enzo diz, e ganha um olhar não muito legal de Nicolas.
— Somos amigos — explica, levantando as mãos, e eu desconfio de
algo.
— Você e Dandara? — Humberto pergunta, e ele vira o
centro das atenções.
— Apenas amigos. Qual é... não posso mandar lembranças
para ela?
— Que merda! — Nicolas exclama. — Eu não fui com a sua
cara — diz, apontando para Enzo, e vira mais uma dose.
— Ok. A reunião aqui é sobre despedida de solteiro. Todos
precisam agir com atenção, estamos sendo feitos de idiota se ainda
não repararam. Elaborei mentalmente um plano — informo.
— Qual? — Gabriel pergunta. — Porque Ava está possuída,
além do normal.
— Eu percebi que elas estão agindo angelicalmente, mas
estão preparando algum tipo de emboscada. Humberto, você ficará
de olho em Lili, vai usar seus dotes sexuais na arte do BDSM para
extrair informações dela.
— Você tem ideia da merda que está falando? — ele
pergunta rindo.
— Tenho, você lida com dominação e submissão. Pode usar
isso para obter informações privilegiadas. Vai que no auge de uma
chicotada você começa a fazer perguntas sedutoras, manda ela
dizer "sim senhor" e ela entrega algo?
— Puta merda! — Nicolas diz rindo. — Vocês são realmente
loucos.
— Nicolas, vamos te conduzir para o caminho do bem. Confie
em mim — Victor diz, propondo um brinde a ele. — Você é família,
sem ser família. Fecha com a gente.
— Enzo, você é investigador, caralho. Além de andar armado,
possuir algemas, você é mestre em investigar, certamente vai
conseguir fazer uma boa investigação, vai saber enrolar Larissa e
descobrir tudo que é falado na merda do grupo.
— Eu posso tentar, mas investigar uma mulher que estou
saindo é meio arriscado. É bem diferente de investigar um possível
bandido. Isso pode colocar à prova nosso caso — explica.
— Iiii... que merda hein? — Victor dá uma gargalhada. — Não
está nem namorando com a garota e está com medo de pôr o
"caso" à prova. Aooo paixão...
— Davi, você vai construir um castelo de taças de cristal para
Luma, vai ser o príncipe que ela ama, e vai arrancar isso na base do
amor. Acredito que seja capaz de driblá-la — informo. — Gabriel,
você querido... só num tatame, na base da luta corporal mesmo,
mas, há uma vantagem; existe um pequeno espião em sua casa.
— Você quer que eu coloque Théo no meio dessa loucura?
— Gabriel pergunta.
— Théo é um mini gênio. É o moleque mais esperto e 171
que conheço na vida. Você pode distrair Ava e ele pode conseguir o
celular dela.
— Eu acredito no potencial do meu afilhado. Ele consegue
isso fácil! — Victor concorda.
— Ok, eu tentarei.
— Victor, você... — digo olhando para o meu irmão e começo
a rir. — Você, sem chance! É mais provável que Melinda descubra
nossos planos do que você descobrir os planos das garotas. Basta
ela surgir com um desenho nas unhas ou qualquer merda fofa que
você cai de joelhos e deixa ela até te dar uma dedada no cu.
Apenas trate de manter seu celular seguro, já ajuda o bastante.
— Teu cu! — ele esbraveja, me jogando um guardanapo.
— Meu foco principal é Nicolas.
— Eu não sei se farei parte disso não — o garoto de açúcar
diz. — Isso é loucura. De loucura em minha vida já basta as que
vivo com Dandara. A mulher é louca!
— Está com medo de Dandara? — pergunto rindo.
— Não, mas ela é louca. Você deve saber disso. Ela
desgraçou a minha vida.
— Aooo Dandara!!! Senta e não paraaa!!! — Victor está
bêbado! — Desgraça pouca é bobagem! Melinda me fodeu!
— Nicolas, Dandara é mesmo o diabo, assim como Melinda.
A única diferença é que Dandara não brinca no quesito maldade, e é
mais experiente que Melinda. Porém, você parece saber lidar com
ela, a mulher está na sua, e é tudo muito recente. Você pode jogar
no talento e descobrir os planos diabólicos dela. Não seja idiota.
Você pode não querer ir à minha despedida de solteiro, mas ela vai
na da Paula. Você vai querer sair por baixo? — pergunto, enquanto
ele vira mais uma dose de tequila. Isso vai dar ruim demais essa
noite! Já estou até vendo o final...
— Ok. Eu preciso descobrir o que há no celular dela, é isso?
— É. E ficar atento a tudo, a qualquer passo dela. Vamos lá,
você é um novinho, cheio de gás, pode saber usar isso para
derrubar a meritíssima e pegar o celular dela para descobrir. Pode
fazer isso?
— Tudo bem. Estou dentro, já que não tenha saída. Se ela
vai para a despedida, eu também vou!
— É isso! Porra! — digo, propondo um brinde geral. — Todos
de acordo?
— De acordo! — eles respondem.
— Agora vamos beber, porque o sofrimento é certo! — Victor
anuncia! — Garoto de açúcar, o que acha de tatuar a bunda?
— Tatuagem na bunda? Quem em sã consciência tatua a
bunda? — Nicolas pergunta.
— Em sã consciência ninguém., mas alcoolizado, eu posso
citar exemplos presentes aqui mesmo — Humberto responde rindo.
— Temos aqui um imbecil que tatuou o Simba, e outro imbecil que
tatuou Hakuna Matata. E, adivinha a coincidência? Eles são irmãos!
— Quê? Isso que ele está dizendo é verdade? — Seguro a
vontade de rir pela maneira como Nicolas está olhando para mim e
para Victor, como se fossemos mesmo o Debi e o Loide, ou quem
sabe o Tico e Teco? Ah, vamos lá, Hakuna Matata é lindo dizer!
Eu sou o primeiro a ficar de pé e aproveito a música para
fazer uma dança sensual.
— Aooo garoto de açúcar, vai conhecer minha porta dos
fundos!
— Teu cu! — Nicolas exclama alta.
— É ele mesmo! — informo rindo.
— Veja só, com alguns minutos de convivência "teu cu" já
entrou para o vocabulário do garoto de açúcar. Só por isso, vou
mostrar meu cu também. Ele merece! — Victor me acompanha.
— Eu poderia estar em casa com meu filho, mas, ao invés
disso, estou num boteco vendo bundas masculinas — Davi
protesta.
— É a liberdade provisória, Davi! — Victor justifica, abrindo a
calça.
— Porra! Não queremos ver seu pau não, Victor. Já basta ter
que ver essa bunda que já está ficando rodada — Enzo informa.
Eu não perco mais tempo e desço minha calça. Nicolas se
engasga com tequila e leva três socos de Humberto diretamente em
suas costas. O próximo a descer a calça é Victor, e eu penso que o
menino está prestes a sair correndo quando dou uma rebolada
sinistra no talento.
— Deu por hoje! — Gabriel anuncia rindo e ficando de pé.
— Não deu não! — Davi o puxa. — Quantas vezes Ava
costuma te dar um vale night?
— Talvez... não sei.
— Aooo Ava! Tirana!!! Strani Amoreee, bebê! — digo,
subindo minha calça. — Alô Piroca Babyyy.... sua piroca já até
entrou no cu de tanto medo da Ava!
— Que Piroca Baby? — Nicolas pergunta enquanto todos
riem.
— Ava, minha irmã, apelidou o marido de Piroca Baby. Se é
que você me entende — Victor responde rindo.
— O negócio é o seguinte, a maior dificuldade da vida é ter
um vale night, então temos que usufruir disso da melhor forma. Elas
vão guerrear de qualquer jeito, até mesmo se voltarmos para casa
agora. Então, já que a guerra é certa, vamos ficar aqui, tomando
umas, curtindo uma moda — Davi faz um argumento altamente
correto.
— Vou conhecer a fúria de Dandara — Nicolas diz
suspirando. — Estou fodido, de um jeito ou de outro, mas se ela
está armando pelas minhas costas, eu vou ficar aqui, junto com
caras que têm a bunda tatuada e apelido de Piroca Baby.
— Dandara está armando pelas suas costas? Aooo chão
moiado! Garoto de açúcar gosta de levar por trás!
— Você é doente! — ele diz, me jogando um paliteiro.
— Aooooo garoto de açúcar, vou tocar uma pra você! — digo,
voltando a sentar.
"Amar não tava nos meus planos/ Não tava procurando mas
eu encontrei/ Agora tô aqui falando/ Foi o erro mais lindo que eu
acertei/ Você, você virou o meu mundo de ponta cabeça /Se um dia
do amor duvidei/Hoje eu tenho certeza/ Tiro certo bem na mosca/
Eu nem mirei quando acertei sua boca"
— Ai ai ai, ai ai ai.... Eu nem mirei quando acertei sua boca —
Gabriel canta rindo.
— Ai ai ai mesmo! — Ouço a voz da assombração e Victor
começa a rir com força.
— Porra, Ava, fala sério, você é chata pra caralho! — digo à
minha irmã.
— Piroca Baby... — ela diz, se sentando nas pernas dele. —
Vim apenas trazer a chave de casa que você esqueceu. — Eu e
Victor trocamos um olhar suspeito, principalmente quando Ava
começa a beijar as bochechas de Gabriel. — E vocês, são todos
uns idiotas por acharem que eu vim interromper a noite de diversão
do meu marido.
— Não, peraí, Ava, eu já vou para casa — Gabriel diz
desesperado.
— De forma alguma, meu amor. Só trouxe a chave porque
você esqueceu e eu quero dormir mais cedo, estou com preguicinha
hoje — ela responde sorridente e dando tapinhas nas bochechas
dele. — Você está com os meus irmãos, confio neles e em você.
Fique tranquilo, piroquinha.
— Agora fodeu mesmo! — exclamo. Ava está dizendo que
confia em nós... isso é grave.
— Piroquinha é foda... — Enzo ri.
— Meu Piroca Baby é apenas o melhor, querido Enzo. — Ela
pisca um olho e beija a ponta do nariz de Gabriel.
— Eu vou embora com você — Gabriel anuncia, visivelmente
dando uma freada na cueca nesse minuto.
— NÃO VAI! — diz ríspida, e então sorri amavelmente indo
cochichar algo no ouvido dele, certamente algum tipo de putaria
imprópria para um ser puro como eu. — Fique um pouco mais.
— Ok. Eu espero mesmo que seja verdade, Ava.
— Em breve você irá descobrir. — Ela se vai, e o silêncio
reina até que Enzo o quebra:
— Temos aqui cinco idiotas fodidos; Piroca Baby, Davi, Sugar
Daddy, bebê Lucca, e o tal garoto de açúcar — diz num tom de
diversão. — E dois homens espertos, que não entram em
relacionamentos e não precisam ficar com o cu trancado de medo:
eu e Humberto, no caso. Estou tentando fazer uma análise de quem
vai tomar mais no cu essa noite. Não conheço muito bem a Paula,
então vou descartar Lucca dessa análise. Ava é o diabo,
maquiavélica com ninguém, logo, Gabriel está com a morte
decretada. Melinda é uma princesinha da maldade. Ela conseguiu
derrubar Victor, que era a versão masculina de Ava e tinha pacto
com o coisa ruim. Victor terminará a noite de joelhos, implorando por
clemência. Luma vive entre a realidade e os sonhos, mas não é
nada idiota. Certamente ela irá arrumar uma forma lúdica de foder
Davi. E Dandara.... — Ele começa a rir. — Com todo respeito, você
está fodido, Nicolas. Dandara é veneno mesmo. Não é à toa que ela
é juíza e temida por todos, ela vai te foder quando você menos
esperar.
— Eu sei lidar com ela — Nicolas afirma. — Muito bem, por
sinal. — Tadinho mesmo. A não ser que Dandara tenha passado por
algum tipo exorcismo ou descarrego. Só isso me faria acreditar que
esse pobre rapaz não estará fodido no final da noite.
Enquanto Enzo defeca pela boca, Humberto não está
passando despercebido mantendo nossos copos cheios. Jacinto a
alegria me consumindo aos poucos. Aooo saudade da minha
mulher! Que Deus a mantenha calma e tranquila, caso contrário,
Jacinto o pau me achando sem dó.
Eu até pego meu celular e mando uma mensagem para ela:
"Ei, Paula, Jacinta meu coração doendo de saudades, bebê."
— Ava... Puta merda. Vocês sabem que cobra mata
abraçando, não sabem? É assim que será a minha morte essa
noite. Ava nunca é fofa, e ela acabou de ser. Eu nem sei por que
diabos me casei com ela mesmo... até sei. Enfim, é melhor beber e
esquecer meu nome. Quanto mais bêbado eu chegar em casa,
menos vou lembrar das coisas que ela vai fazer comigo. — Piroca
Baby entrega os pontos. — Antes da minha morte, eu desafio todos
a tatuarem a bunda, inclusive eu. Quem está dentro?
— Eu — Davi informa. — Se eu tatuar um castelo, Luma me
perdoa?
— Eu tatuaria um caminho de flores, uma princesa montada
em um cavalo branco, seguindo rumo a um túnel que leva até o
castelo. O túnel seria o seu cu. Ia ficar da hora. O castelo você tatua
acima do cóccix. Do jeito que Luma viaja, ela irá fazer todo o trajeto
com os dedinhos — Victor comenta sério. Eu mantenho meu
semblante sério enquanto minha mente faz o desfavor de imaginar a
tatuagem. Até mesmo imagino uma princesa montada em um cavalo
branco, caminhando em meio as flores e seguindo até o túnel.
Puta merda! É a visão do inferno! Eu até perco os
comentários desse desastre.
— Eu topo — Enzo é quem diz agora. — Só não sei o que
vou tatuar ainda, mas, um por todos, todos por um.
— V.A. Propriedade de Victor Albuquerque. — Meu irmão
hoje está um pouco "demais".
— Tatua na sua testa P.M.M. pau mandando da Melinda —
Enzo rebate.
— Eu topo se vocês dois toparem fazer tatuagens do outro
lado da bundinha — Humberto sugere rindo. — Mas, também não
sei o que vou tatuar ainda.
— E você, garoto de açúcar? — Victor pergunta. — Eu
tatuaria o Ursinho Pooh com um pote de mel.
— Não vou fazer isso — Nicolas afirma, enquanto todos os
encaramos. — O quê? Eu não sou dessa família não. Nem Dandara
é, apenas Samuel.
— Ouça, garoto de açúcar, Dandara, querendo ou não, faz
parte da família, logo, você também é um agregado. É padrasto do
meu sobrinho. Você precisa vestir a camisa — Victor usa seu poder
de argumentação. — Estaremos sempre juntos, é inevitável.
— Você precisa fazer a tatuagem para entrar na nossa legião.
Todos farão — afirmo. — Não vai arregar. Pense que Dandara está
organizando a despedida de solteira da Paula nas suas costas. —
Puta merda, Dandara vai me matar, eu sei que vai!
— Merda! Ok! Eu faço!
— Aeee!!! — Todos batemos na mesa em comemoração.
Duas horas depois, estamos bêbados e em um estúdio de
tatuagem que fica aberto 24 horas. Eu e Victor invertemos as
tatuagens. Ele tatuou Hakuna Matata do outro lado, e eu tatuei o
Simba. Enzo tatuou um código de barras, alegando que sua bunda é
única. Davi... que vergonha Deus! Davi tatuou uma coroa de
princesa e um L, de Luma. Gabriel acabou de tatuar o nome de Ava
Salvatore na polpa direita e agora, neste momento, eu sinto a morte
se aproximando enquanto Humberto confere a tatuagem que
escolhermos para ele no espelho.
— ISSO SÓ PODE SER ZOAÇÃO! DIGA QUE ESSA
PORRA SAI! — ele esbraveja, enquanto quase choramos de tanto
rir. — ISSO É DE RENA? FALA SÉRIO, CARALHO!
— Foi você que pediu para escolhermos! — Victor se
defende.
— PORRA EU PEDI PARA ESCOLHER ALGO SÉRIO,
MALDIÇÃO! ISSO AQUI É SACANAGEM! FILHOS DA PUTA!
— Está bonitinho, cara. É minimalista. — Victor tenta mostrar
o lado bom da vida, mas se fode.
— Minimalista é o seu pau, Victor! Desgraçado! Vai ter troco,
babaca! Todos vocês vão pagar por essa merda!
Humberto deixou que escolhêssemos, e agora porta um
chicote no rabo com a escrita "SPANK ME".
— Pense pelo lado positivo; você é um dominador, as
mulheres, provavelmente, nunca vão por trás, a não ser que você
seja daqueles que curta uma cinta caralha no teu orifício e nunca
tenha contado nada a ninguém. Me diga, Humberto, esse lance de
dominador é apenas fachada? Você curte uma giromba de borracha
no toba ou quem sabe uma giromba real? — O desgraçado se
aproxima pronto para me matar, e Victor me salva, entrando na
frente.
— Relaxa, ninguém vai saber do seu segredinho. — Provoco,
e começo a rir ao ver a tatuagem de Nicolas. — Que porra é essa?
— Isso aqui é o que vou levar no cu por ter acompanhado
vocês. Há apenas vinte e sete chamadas em meu celular. Estou
fodido! — o garoto de açúcar responde. — Perdi a dignidade que
conquistei uma vida inteira em apenas 3 horas de convivência com
vocês! Provavelmente perdi minha excelência também.
— Relaxa, você é um novinho sagaz. Vai saber usar seus
dotes para acalmar Dandara — Victor o tranquiliza.
— Prepare-se, no próximo rolê é piercing na piroca! —
anuncio, enquanto Victor dá uma risada escandalosa.
— Que porra! Vocês estão dizendo que têm piercing no pau?
— Nicolas pergunta. — Se vocês disserem que têm... puta merda!
Eu não vou fazer isso! Nem fodendo que deixo furar meu pau!
— Apenas Humberto e Enzo não têm piercings, não que eu
tenha visto..., mas eles disseram — argumento. — Na próxima
saída os três vão embora com o piercing na rolinha!
— Eu não saio mais com vocês depois dessa merda —
Humberto anuncia irado. — Isso desmoraliza um homem, ok? Eu
sou um dominador, e agora virei uma piada. Spank me? Porra! Se
fosse só o chicote estava bom...
— Se você está achando ruim, imagine a tatuagem de Enzo...
que pode ser interpretada como um produto, uma mercadoria que
está à venda? — digo rindo.
— Aooo Enzo, quanto custa meia hora de cu? — Victor
pergunta.
— Vá se foder, Victor — Enzo esbraveja, e meu celular toca.
Só então vejo 32 chamadas não atendidas... FODEU!
— Aoooo... — Atendo.
— ONDE VOCÊ ESTÁ, LUCCA ALBUQUERQUE?
— Eitaaa... eu estou num estúdio de tatuagem.
— Como?
— É... eu e os caras... resolvemos vir tatuar — explico. — Eu
vou te processar, cê vai ver...
— Quê?
— Por abandono de incapaz, cê vai ver. Incapaz de viver sem
você. Te amo demais, Paula. Jacinta o meu amor!
— Nós vamos conversar muito sério, Lucca. Estou te
avisando desde já!
— Ultimamente já não tenho mais mandado em mim, foi só
você que fez com que eu ficasse assim. Não há nada que eu possa
fazer, a não ser me envolver. Não precisa brigar, Paulinha. Você me
seduziu, me hipnotizou. Eu me apaixonei, a cabeça virou. Eu sigo a
minha vida numa prisão sem grades. Eu sigo te amando e todo
mundo sabe. Não há motivo para insegurança.
— Que música é essa? — ela pergunta.
— São os meus sentimentos, amor da minha vida. Vou tatuar
seu nome no meu corpo, Paula. Jacinta a declaração do meu amor
chegando. Assim que eu terminar, me espere de porta aberta que
vou entrar embaixo da sua coberta! Aiiiii bebê! Fala comigo! — Ela
desliga na minha cara, e eu encontro sete rostos me encarando,
contando com o tatuador.
— Você se superou nessa! — Victor diz, e o celular dele
também toca. — PUTA MERDA! Aooo Melinda, pelo amor da Santa
Josefina, eu não vi suas ligações, Senhor da Glória, me perdoe... só
vem com emoção, não, não vem não, princesinha. Me espera que
eu tô chegando, tô voltando. Seja no tempo que for, eu só quero
esse amor. — Eu começo a rir.
— Que porra de música eu terei que cantar quando Dandara
me ligar? — Nicolas pergunta, e eu levo uma mão em seu ombro.
— Vem com o pai, vou te ensinar o que dizer....
[CINCO MINUTOS DEPOIS — LIGAÇÃO DE DANDARA
PARA NICOLAS]
— Aooo Dandara! Sei que sou um preso, preso em liberdade.
Confesso, não sou um covarde. Sempre fiz meu papel de homem.
Não matei e nem roubei. Só sei que estou condenado, eu pretendo
ser julgado, pelo tribunal do amor.
As consequências da noite passada podem ser numeradas e
isso é realmente triste.
1º Victor foi expulso de casa, dormiu comigo e acordei numa
conchinha com algo duro cutucando a minha bunda. Sem dúvidas
me encontro traumatizado depois dessa situação. Essa porra de
tesão de mijo é um inferno!
2º Paula não quer me atender por estar raivosa; fui
abandonado cruelmente sem ter feito qualquer coisa para merecer.
Eu até tatuei parte do nome dela em minha nádega. Antes eu tinha
tatuado um Hakuna Matata, agora eu tenho um "Jacinta Hakuna
Matata". Fiz isso após a ligação carinhosa no meio da noite, onde
não consegui convencê-la com músicas românticas.
3º Estou sofrendo de carência afetiva e precisei pedir à
Dandara, a mulher que quer colocar no meu cu, para deixar meu
filho ficar comigo, porque ele sim me ama, me dá carinho.
Felizmente, ao menos isso eu consegui, e agora estou esperando
minha mãe trazer meu filho, já que não sou mais bem-vindo na casa
da princesinha da Disney.
Agora, eu e Victor estamos fodidos. Ele foi para o trabalho e
eu estou em casa, já que não há nada importante para eu fazer no
dia de hoje. A verdade é que, deixando as brincadeiras de lado, eu
sinto falta da convivência diária com Samuel, é algo que tenho que
me acostumar, e vou usar o dia de hoje para ficar com meu filho.
Felizmente minha mãe não demora a trazê-lo. Eu o pego na
portaria e ele vem correndo para os meus braços.
— Papai!!!
— Meu pinguim! — digo, percebendo que peguei a mania de
Dandara. — Estava com saudades, filho.
— Eu também. Tio Nico estava pelado — ele diz rindo, e
minha boca se abre em choque.
— Quê?
— Tio Nico estava de bumbum de fora, papai. Ele caiu de
maduro no chão.
— Aooo Dandara! — esbravejo, com meu filho nos braços e
subo com ele para o meu apartamento. Zildinha vai logo o pegando
no colo e eu saio como um demônio rumo ao banheiro, onde irei me
sentar no trono e ligar para a meritíssima!
— Você deve me amar, Lucca.
— Deus do céu, Dandara! Satanás! Diabólica do caralho! Por
que diabos nosso filho viu o seu garoto de açúcar pelado? —
pergunto, indo direto ao ponto.
— O que você acha, Lucca? Que eu estava fodendo com
Nicolas e nosso filho pegou a cena? Ou será que está imaginando
que eu estava fazendo um belo boquete matinal e fui pega? Acha
que sou irresponsável? — Ela é muito delicada. Admiro.
— Não disse isso. Mas, é estranho que meu filho tenha o
encontrado nu e esteja contando isso de uma forma bem divertida.
— Ela suspira. — O que houve para Nicolas mostrar seu corpo
sedutor ao meu filho?
— Muito sedutor, sim. Nicolas é bem gostoso. Enfim.
Aconteceu pela manhã, eu sou a culpada — diz. — Eu fui tomar
banho, quando terminei e voltei ao quarto, descobri a maldita
tatuagem na bunda de Nicolas e acabei dando um grito capaz de ter
acordado todos na vizinhança. Nicolas se assustou, caiu da cama, e
Samuel entrou no quarto desesperado pelo grito e o viu de bunda de
fora. Nicolas dormiu nu por motivos óbvios que não lhe dizem
respeito. Isso é tudo.
— Esse garoto de açúcar é mais esperto que eu e Victor
juntos. É injusto que ele tenha se dado bem quando todos nós nos
fodemos. O plano parece que era brigar, torturar os homens sem
sexo. Você já contou as suas amigas que cedeu e que não está
envolvida nesses planos?
— Eu não sou idiota, meu querido. Não preciso ficar sem
sexo para me vingar de Nicolas ou de qualquer pessoa. Minhas
necessidades estão acima de tudo, se Melinda e as demais gostam
de ficar na vontade, eu não. Sou uma jogadora diferenciada, bato
com carinho. — Nicolas está fodido, de um jeito ou de outro.
Pobrezinho.
— Ok. Enfim, só precisava entender o contexto da nudez.
— Você deveria ir arrumar alguma ocupação, não acha não,
meu filho? Se você não trabalha, eu trabalho. Não queira cair em
uma audiência comigo porque irei te foder, Lucca Albuquerque! Não
pense que não irei me vingar por estar levando meu namorado
novinho para caminhos errados. Ele era um garoto de ouro antes de
se aproximar de você. Espero que continue sendo e que essa
amizade não dure muito.
— Ah, mas essa amizade vai durar sim, vamos ver que vence
essa batalha. Se existe alguém que precisa se vingar, esse alguém
sou eu. Passar bem, Dandara! Te encontro na vara criminal por
estar levando minha Diabinha para a vida perdida. Paula era uma
diabinha angelical, agora está perdida e eu vou me vingar disso! —
Encerro a ligação e vou brincar com Samuel.
— Papai, tia Zilda vai fazer osso.
— Osso? — pergunto, e Zilda começa a rir.
— Parece que é assim que ele chama drumete — ela explica.
— Ele viu na TV e pediu com batatinhas fritas, não é mesmo
Samuel?
— Sim — ele responde.
— Iiii, então tia Zilda vai fazer muitos ossos para nós!
Enquanto ela faz, vamos brincar? Eu quero brincar de desenhar,
você quer?
— Simmm!
Pego um monte de papeis no escritório, lápis e os trago para
a sala. Eu e Samuel passamos a tarde inteira desenhando,
comendo, e assistindo desenhos. Eu esqueço até que existe uma
vida fora desse apartamento, mas quando dá oito da noite eu
começo a sentir um grande desconforto e Paula surge em minha
mente com força total. Eu volto a ligar para ela, a enchê-la de
mensagens, e não obtenho resposta alguma.
Victor e Melinda estão prolongando a briga por fogo no cu,
tanto que estão trocando mensagens. Mas, Paula, apenas não
responde, nem mesmo para brigar ou me mandar tomar no cu.
— Ei, pergunte a Melinda se ela tem notícias da Paula, por
favor? — peço a Victor, e o vejo digitando.
— Ela disse que Paula não respondeu a nenhuma
mensagem agora à noite.
— Ok, eu estou sentindo que algo está errado e não tem
absolutamente nada a ver com o nosso relacionamento. Você pode
cuidar de Samuel? Eu vou apenas conferir se está tudo bem com
ela e com Henrico, não vou demorar.
— Vá lá. Eu vou arrumar um filme e fazer pipoca — Victor
diz, e eu vou até meu filho que está vendo vídeos no celular.
— Ei, pinguim, papai vai só ir ver a tia Paula e já volta, ok?
Tio Victor vai descolar um filme maneiro e fazer pipoca.
— Ebaaa!
— Papai volta logo. Amo você. — Beijo sua testa, pego
minha carteira e a chave do carro e sigo para o apartamento de
Paula. O porteiro libera minha entrada e diz que ela está em casa.
No início penso que ela não quer mesmo falar comigo, mas, assim
que chego no corredor, já noto que talvez não seja nada disso. Há
gritos de Henrico, e um choro de Paula. Eu não bato campainha por
medo de ser uma crise, apenas forço a maçaneta e entro.
Encontro-os no quarto dele, e eu não sei como reagir diante
do que vejo.
Paula está sentada no chão, enquanto Henrico se debate. Ele
conseguiu rasgar até mesmo as próprias roupas e Paula está
simplesmente sentada, observando, chorando baixo, porque talvez
seja isso o certo a ser feito.
O observo conseguir rasgar o resto da camisa e correr para
os braços dela. Ela o recebe carinhosamente, mas então ele
começa a arranhá-la, não é um abraço normal, e ela simplesmente
permanece abraçada a ele, silenciosa e amorosa. É um abraço de
desespero da parte dele, nada carinhoso, até mesmo a chuta sem
querer, e eu temo pelo fato dela estar grávida. O vejo puxar os
cabelos dela, e a vejo fazer uma cara de dor, mas em momento
algum diz qualquer coisa ou deixa de abraçá-lo. Henrico se afasta e
começa a socar a parede, a tentar rasgar a bermuda. O choro dele é
de puro sofrimento e angustiante para quem está de espectador.
Isso é tão assustador. Estou com tanto medo de intervir e piorar as
coisas, me sinto completamente perdido. É extremamente doloroso
ver o desespero de uma mãe tentando acalmar o filho no auge de
uma crise. Está doendo em mim de uma maneira que não consigo
descrever, porque eu a amo, e eu amo esse garoto como ele fosse
meu. Não consigo evitar o choro que escapa de mim, meu coração
parece apertado demais e eu só queria conseguir conter a dor dos
dois, mas o que eu posso fazer? Eu posso abraçá-la agora? Posso
pegar Henrico e dizer que tudo ficará bem?
Paula se dá conta da minha presença e balança a cabeça
negativamente.
— Lucca, você não precisa disso. Vá embora. Por favor. —
Não levo suas palavras em consideração. Estando nesse
desespero, talvez eu fizesse o mesmo.
Henrico simplesmente volta para ela, puxando sua blusa,
esfregando o próprio rostinho, a agarrando, dando joelhadas
involuntariamente na barriga dela, a escalando como se fosse um
muro de escaladas. As lágrimas dela me matam e sua força... essa
mulher... ela está aguentando tudo sozinha, firme e forte, mesmo
chorando.
Henrico agarra os braços dela e quando vejo sangue
escorrendo por eles, eu arrisco tudo e me aproximo. Eu prefiro ser
ferido a vê-la sangrar. Ela também está com medo da minha
aproximação, porque até mesmo perde a cor do rosto ao me ver
sentando ao seu lado. Eu pego Henrico em meus braços e ele chora
mais forte, agarrando minha camisa e me chutando. Eu
simplesmente o abraço o mais forte que consigo e fico de pé.
Henrico está preso em meus braços e eu começo a andar com ele
pelo quarto, tentando passar total segurança e acalmá-lo. Tento
controlar o meu choro para não o assustar.
— Ei, Henrico, tio Lucca vai cantar uma música que a Sophie
ama... — digo, enquanto ele se acaba de gritar. Começo a cantar
baixinho a música do Rei Leão que tanto Soso quanto Miguelito
amam.
"Desde o dia em que ao mundo chegamos
Caminhamos ao rumo do sol
Há mais coisas pra ver
mais que a imaginação
muito mais que o tempo permitir"
Aos poucos ele vai parando de me chutar e gritar... então eu
simplesmente continuo cantando no mesmo tom baixo e andando
com ele...
"E são tantos caminhos pra se seguir
e lugares pra se descobrir
e o sol a girar sobre o azul deste céu
nos mantém neste rio a fluir
É O Ciclo Sem Fim
Que nos guiará
a dor e a emoção
pela fé e o amor
até encontrar
o nosso caminho
neste ciclo, neste ciclo sem fim"
Vou repetindo a música conforme ele vai se acalmando, e ele
logo está me abraçando, deitando sua cabeça em meu ombro. Olho
para Paula, e ela está desolada, porém surpresa com a reação. Eu
começo a fazer carinho nos cabelos dele e sigo cantando por longos
minutos. Agora deixo o quarto um pouco e começo a andar pela
casa com ele, indo até a varanda para ele tomar um pouco de ar
fresco.
— Papai... — ele diz me abraçando forte.
— O que tem o papai? — Ele apenas repete PAPAI, e eu
acho que compreendi. — Você está chamando o tio Lucca de
papai? — pergunto.
— Sim.
— Está tudo bem, campeão. Tio Lucca pode ser o papai
Lucca. — Sorrio. — Eu amo você, amigão. Amo muito você.
— Música da Sophie, papai... — pede, e eu volto a cantar.
Ele gosta da Sophie, isso é engraçado e fofo.
Eu volto a cantar a música e as poucos sinto seu corpinho vai
relaxando. Quando percebo que ele adormeceu, respiro fundo e
deixo as lágrimas voltarem a correr pelo simples fato de ter
conseguido controlá-lo. Me sinto capaz. Eu posso fazer isso!
Quando volto ao quarto, Paula ainda está sentada no mesmo
lugar, porém, agora está abraçando as pernas.
— Ei, preciso que arrume a cama para ele — peço baixinho,
e ela se apressa para fazer.
— Ele desmaiou? — a pergunta me assusta. Talvez seja
comum um desmaio, mas, felizmente, não aconteceu.
— Não, meu amor. Ele dormiu. — O coloco sobre a cama,
Paula liga o ar-condicionado e eu o cubro. Ela fica um tempo o
observando e eu a pego em meus braços. Não é só ele que precisa
de cuidados agora, minha Diabinha está ferida fisicamente e
emocionalmente.
— Obrigada — agradece, me abraçando forte quando
estamos fora do quarto, abrindo as compotas e chorando tudo o que
segurou. — Muito obrigada!
— Eu amo vocês, não vou deixá-los, nunca.
— Foi horrível...
— O que o fez agir assim?
— Pablo. — Engulo a seco. — Ele surgiu, eu não quis deixá-
lo entrar, ele quase arrebentou a porta, Henrico viu tudo e entrou em
desespero. O segurança do prédio levou Pablo, e eu não pude ligar
para ninguém, porque precisava acalmar Henrico...
— Paula, eu sinto muito, mas você não fica nesse
apartamento nem mais uma noite — informo. — Você vai arrumar
algumas coisas suas e de Henrico, e está vindo comigo. Eu não me
importo se você quer ou não, mas está vindo comigo e não há
discussões sobre isso. Não vou deixar que ele foda com Henrico e
com você, principalmente agora que Henrico me chamou de pai. Ele
me escolheu como pai, e eu irei honrar isso.
— Como assim?
— Ele me chamou de pai, portanto eu sou o pai dele e eu irei
protegê-lo custe o que custar. — Ela volta a chorar agarrada a mim.
— Não sou o Pablo, Paula. Eu não vou desistir de vocês, não vou
desistir de Henrico. Você não tem que enfrentar tudo sozinha,
porque eu quero dividir a minha vida com você e quero que divida a
sua comigo. Há um filho meu em seu ventre, há um filho seu que é
meu filho de coração, e eu estarei por vocês da mesma maneira que
estarei por Samuel. Vocês são meus, são parte de mim, e eu irei
protegê-los até o meu último suspiro. Não me mande embora mais,
não relute, apenas aceite o meu amor e venha comigo, para
sempre.
— Eu vou — concorda para o meu alívio. — Você é o
motivo... obrigada por ser o meu amor, Lucca. Obrigada pelo que fez
pelo meu filho. Obrigada por existir.
— Então desista da despedida de solteira... — brinco apenas
para descontrair.
— NÃO!
— Ok, eu te amo mesmo assim, cheio de ressentimento. —
Beijo sua testa. — Eu amo você, meu amor. É muito sério. Eu
estarei aqui por você sempre, com ou sem despedida de solteira.
Não importa, você é o motivo. Agora vamos limpá-la, está uma
bagunça, Diabinha, mas eu vou cuidar de você.

Lucca...
Acho que devo estar ficando repetitiva de tanto elogiar esse
homem, mas como não fazer? Ele está aqui, cuidando de mim, após
ter controlado uma crise horrível do meu filho. Está aqui agindo
como pai de Henrico, como o meu marido, sem nem mesmo ser. Ou
talvez ele seja, talvez Deus tenha o enviado para ser tudo isso e um
pouco mais.
O meu filho o chamou de pai após ter dado uma crise real por
conta do verdadeiro pai. É algo que preciso assimilar e tentar
compreender. O que foi que levou Henrico a chamá-lo de papai? Há
tanto em minha mente, e é cansativo demais ficar pensando.
Preciso manter Pablo afastado de uma vez por todas, porque estou
ficando com medo por mim e por Henrico. Hoje em dia o que mais
vemos nos noticiários é agressões contra mulheres, ex-maridos, ex-
companheiros, loucos matando por nada, sem pensar nas
consequências. Há uma ordem de restrição, mas ele parece não
querer segui-la e isso me amedronta. Sei que ainda hoje preciso
fazer uma denúncia sobre isso, mas, a questão é que... se ele
tivesse conseguido entrar, será que eu estaria bem agora? Será que
Henrico estaria bem? O que teria acontecido?
Por mais cuidados que tenhamos, o pior sempre pode
acontecer inesperadamente, como ocorreu dele aparecer hoje.
Infelizmente estou achando melhor abandonar a minha carreira
neste momento e me manter segura, por Henrico e pelo bebê em
meu ventre. É algo que preciso conversar com Lucca, já que vamos
morar juntos. Eu preciso estar segura agora e preciso preservar
Henrico mais do que nunca.
Estou sentada na bancada do meu banheiro enquanto Lucca
prepara a banheira. Enquanto o observo, as lágrimas caem dos
meus olhos. Elas misturam dor e gratidão, e é impossível acreditar
que dois sentimentos tão diferentes podem fazer parte de mim
agora. A dor física é porque Henrico me machucou, e dói a minha
alma por vê-lo envolvido no mais completo desespero.
Minha cabeça e meu couro cabeludo estão doendo, meus
braços estão gritando de dor devido aos chutes e a toda força que
precisei fazer em alguns momentos para tentar conter a fúria do
meu pequeno. Lucca chegou praticamente no fim da crise. Há
objetos quebrados na sala, uma bagunça completa.
Henrico já teve muitas crises, mas nenhuma delas foi tão
fodida quanto essa. Por um momento eu quis apenas morrer,
apenas para não o ver tão desesperado. Ver meu filho tendo uma
crise tão horrível, fez com que eu me sentisse incapaz de ajudá-lo.
Naquele momento eu não sabia quem estava mais vulnerável, ele
ou eu, mas a minha vulnerabilidade pouco importava, precisei ser
forte, paciente, e deixei ele colocar para fora toda fúria. Tentar
impedi-lo apenas tornaria tudo muito pior. Henrico já teve convulsão,
já desmaiou, e eu juro que estava esperando por uma dessas duas
coisas quando Lucca chegou.
O que me faz crer que talvez ele seja um anjo, o meu anjo. O
homem que surge sempre nos momentos mais fodidos, desde o
primeiro dia... Quando serei capaz de agradecer? Eu só consigo
pensar em fazê-lo feliz, porque se existe alguém no mundo que
merece isso; esse alguém é ele.
Muitos teriam fugido, muitos achariam uma bagagem pesada
demais; uma bagagem que só diz respeito a mim, mas ele escolheu
permanecer desde o início. Desde Las Vegas deu indícios do
homem que era; prova disso foi ir até Los Angeles para conseguir
uma fantasia para uma criança que ele nem mesmo conhecia; o
meu filho. Um gentleman, um ser humano único, dono do coração
mais puro que já tive o prazer de conhecer. Lucca é aquele homem
que não importa o que você faça com ele, ele até pode ficar
magoado no início, mas, logo em seguida, vai guardar a mágoa no
bolso, vai te estender a mão e perdoar o que quer que tenha feito.
Lucca é aquele que vai te fazer rir até mesmo nos momentos
mais desesperadores. É aquele que parece uma criança, mas é
dono de uma maturidade surpreendente. Oscila entre um
adolescente maluco e um homem que desbanca qualquer outro.
— Pronto, Diabinha. Vem comigo — ele convida, me pegando
em seus braços.
Permito que ele retire todas as roupas do meu corpo e me
coloque dentro da banheira como uma garota de quatro anos. E
começo a chorar quando ele retira as próprias roupas, ficando
apenas de cueca, se senta do lado de fora banheira e começa a me
lavar cuidadosamente.
— Não faça isso não, por favor, meu amor. Você não sabe a
dimensão da dor que sinto quando te vejo chorar.
— Eu sei que não posso chorar, Lucca.
— Você pode sim, pode chorar em meus braços. Não tem
que ser forte o tempo inteiro, ninguém tem. Mas, me parte o coração
ver você chorar. — Eu toco em seu rosto perfeito, e me dói ver seus
olhos vermelhos porque ele chorou junto comigo, pegou a minha dor
e a dor de Henrico para ele.
— Ainda bem que você vive comigo, por que senão, como
seria essa vida?
— Sei lá, sei lá — ele responde, dando um sorriso. —
Aprendeu comigo, Diabinha?
— Essa música representa o que eu sinto.
— Eu gosto dessa música, nem só de sertanejo vive um
homem, Diabinha — diz sorrindo.
— Se há dores, tudo fica mais fácil, seu rosto silencia e faz
parar.
— Agora vocês serão meus para sempre, e eu não vou
permitir que qualquer coisa ruim aconteça a vocês. Não quero que
enfrente situações sozinha, principalmente estando grávida. Há um
bebê nosso aí, e você precisa viver uma gravidez tranquila. Temos
que proteger nossos pequenos, juntos, eu e você por eles. E, acho
que deveríamos marcar uma consulta apenas para saber se está
tudo realmente bem após o stress de hoje. Sou marinheiro de
primeira viagem, mesmo tendo Samuel, é a primeira vez que
acompanho uma gestação, tenho medo, Paula. Não quero perder
esse bebê.
— Não vai perder, não vamos. Esse bebê é bem forte, porque
é filho de duas pessoas bem fortes. Nada vai acontecer, eu tenho
certeza — falo, tentando tranquilizá-lo. — Embora eu tenha passado
por muito desespero minutos atrás, estou bem, não estou sentindo
nada que me faça ficar apreensiva em relação a gestação.
— Não me esconda se sentir qualquer coisa, ok?
— Não esconderei, bebê Lucca. Obrigada, meu amor.
Obrigada, obrigada e obrigada, Lucca! Eu amo você demais, e amo
esse bebê aqui com toda a minha vida. E não importa que ele nasça
com autismo, ele será perfeito como Henrico, e eu irei amá-lo como
amo meu pequeno.
— Nós seremos os melhores pais do mundo, Diabinha.
— Eu o mandei embora mais cedo porque cuidar das crises
de Henrico sozinha se tornou um costume — desabafo. — Eu nunca
tive um companheiro para segurar a minha mão ou a mão do meu
filho, e isso me fazia acreditar que era um fardo grande demais para
qualquer pessoa carregar por mim ou comigo. Me acostumei a agir
e a pensar dessa maneira. Porém, você sempre surge e enche de
luz os momentos mais sombrios, e eu sei que posso contar com
você, sei disso. Sei que com você ao meu lado eu sou capaz de
passar por tudo uma, duas três, quantas vezes forem necessárias.
— Que bom que você sabe disso, Diabinha.
— Por que vai ficar do lado de fora da banheira?
— Porque mesmo em momentos como esse, em meio ao
caos, eu sinto desejo por você e se eu entrar nessa banheira meu
pau vai sair correndo e entrar em lugares deliciosos e apertados. —
Isso me faz rir, porque estou imaginando o pau de Lucca correndo.
— Ouça, Henrico após as crises dorme muito?
— Sim. Ele ficou por um longo período sofrendo, então
esgotou toda energia. Não acho que ele vá acordar hoje, já é um
pouco tarde.
— Samuel está no meu apartamento com Victor. Não vamos
acordar Henrico para irmos para lá hoje, ele precisa se
recuperar. Eu vou buscar Samuel, tudo bem? Amanhã cedo
terminamos de arrumar tudo e iremos de vez para o meu
apartamento. Acho que Henrico vai ficar bem o encontrando pela
manhã. O que acha?
— Henrico ama Samuel e Sophie, é impressionante. De
todas as crianças, ele se apegou aos dois.
— Perfeito, então irei deixá-la por alguns minutos. Vou buscá-
lo, pegar algum lanche para nós, e logo estarei aqui — ele diz, me
dando um beijo na testa.
— Tudo bem — concordo. — Ei, não fique receoso. Eu amo
Samuel da mesma forma que você ama Henrico, embora ele tenha
uma mãe maravilhosa, eu serei uma boadrasta para ele.
— Eu sei que sim.

— Boa noite! — o porteiro do prédio da Paula me


cumprimenta quando paro diante dele.
— Seria mesmo uma boa noite se você não tivesse liberado o
acesso de uma pessoa que está com ordem de restrição e impedida
de se aproximar da minha mulher — digo a ele, vendo-o ficar sem
graça. — Eu vou precisar sair, e espero que minha mulher fique
segura com o meu filho, tendo em vista que ela paga o condomínio
e que vocês precisam manter a segurança dos moradores. Hoje
aconteceu um episódio fodido, o filho dela é autista e teve uma crise
horrível, a minha mulher está machucada física e psicologicamente.
Eu espero de coração não ter qualquer problema em minha
ausência, porque eu nem mesmo sei do que sou capaz quando
mexem com o que é meu. Não importa que tenham que colocar
todos os seguranças dessa merda na porta dela, não deixe aquele
homem se aproximar enquanto eu não estiver aqui, está me
ouvindo?
— Sim senhor. Me desculpe, senhor. Ele simplesmente saiu
entrando...
— Teria como impedir, poderia até mesmo ter chamado a
polícia. O senhor não vê os noticiários?
— Me desculpe mesmo, senhor. Pode ir que garantiremos a
segurança dos dois em sua ausência.
— Estou contando com isso. E, não diga nada aos pais dela
caso eles surjam, não queremos assustá-los — aviso, e saio rumo
ao meu carro.

— O que houve? — Victor pergunta baixo, assim que eu


entro em casa. Samuel está desmaiado no sofá ao lado dele.
— O ex da Paula esteve lá. Parece que tentou invadir o
apartamento, Henrico presenciou tudo, deu uma crise que... puta
merda, Victor. Doeu para caralho presenciar aquilo. Parecia um
filme de terror onde eu fiquei completamente perdido vendo-o
arranhar Paula, socar a cabecinha e as mãozinhas na parede, meu
Deus do céu... — Ele se levanta e me dá um abraço que tanto traz
conforto quanto me faz liberar o choro que estava mantendo preso.
— Foi fodido.
— Eu posso imaginar.
— Ele é só uma criança e... porra... eu queria tirar aquilo
dele. Ele não merecia...
— Eu sei que não, mas aconteceu e vocês precisam lidar
com isso. Paula é uma mãezona, faltam elogios para tecer a ela. E
você, por mais que não seja o pai dele de sangue, é pai de coração,
Lucca. Henrico é um garoto de sorte por ter as duas melhores
pessoas com ele e sei que, tanto você quanto Paula, sempre vão
tirar de letra todos os problemas. Vocês vão vencer um pouco a
cada dia, não importa quanto tempo demore. Juntos sairão
vencedores dessa batalha.
— Ela está tão fragilizada, tentando, lutando, se esforçando
para mostrar uma força que está completamente oscilando agora. E
sei que a cabeça dela está doendo, que as feridas no braço estão
ardendo, e ela estava sorrindo para mim dentro da banheira, como
um anjo, me agradecendo por algo que qualquer homem deveria ter
a obrigação de fazer. Ela me agradeceu um milhão de vezes, Victor,
e eu quero ser tudo para eles, tudo para ela... porque aquele babaca
nunca foi homem para ela, e eu deveria socá-lo, eu queria fazê-lo
sofrer tudo o que vi minha mulher e meu... meu filho sofrer. Ele não
é o pai dele, nem fodendo, Victor. Eu sou. Henrico me chamou de
papai.
— Está vendo? Ele te escolheu. Ele fez isso porque você é
bom para ele, porque você é o super-herói da vida dele, é o
exemplo paterno. Não vamos deixar um idiota vencer. Vamos
trabalhar para colocar Pablo no lugar onde ele merece estar. Agora
você precisa parar de chorar. Nesse momento você tem que ser a
força que Paula precisa. E, quando estiver demais, me ligue e chore
nos meus braços, irmão, como eu fiz com você todas as vezes que
precisei. Era nos seus braços que eu chorava, se lembra? —
Balanço a cabeça em concordância. — Não deixe que ela ou
Henrico vejam a sua dor, porque vai doer neles. Seja forte por eles,
seja forte por Samuel e pelo bebê que Paula está carregando. Você
é uma pessoa boa, Lucca, será recompensado por isso. Tenha fé e
força.
— Eu te amo muito! — digo, abraçando-o mais forte. — Eu
amo você pra caralho!
— Hakuna Matata!
— Hakuna Matata!
— O que veio fazer aqui? — ele pergunta quando eu me
afasto.
— Buscar Samuel. Você deve querer ir para casa...
— Não vou, eu e Melinda estamos levando a brincadeira a
sério. Não o acorde, deixe-o continuar dormindo. Fique com Paula e
volte amanhã quando acordar. Relaxe, sou o melhor tio.
— Tem certeza?
— Não vou deixar você acordá-lo. Olhe como ele está
apagado... — Eu vou conferir meu filho e deposito um beijo em seu
rostinho. — Ele é foda como você. Sabe disso?
— Não...
— Ele é a sua miniatura. Dandara que me desculpe, mas
esse é um mini Lucca. — Me pego sorrindo. Minha miniatura.
— Esse garoto é o meu oxigênio.
— Sabemos disso. Vá. Vou cuidar do seu oxigênio, irmão.
Cuide da Paula, ela precisa de você.
— Obrigado, irmão! — O abraço novamente e vou cuidar da
Diabinha.
Eu só precisava de um abraço e de alguém que me dissesse
que vai ficar tudo bem. Agora eu me sinto forte novamente.
Lucca Albuquerque viciou meu filho em vídeos de um projeto
chamado Turma da Joaquina[4]. Henrico simplesmente encontra-se
hipnotizado com a animação. Há uma banda de bichinhos fofos que
cantam as mais diversas canções e promove valores éticos. O ponto
principal que chama a minha atenção é que eles promovem também
uma convivência respeitosa entre as diferenças. É encantador e
meu pequeno está contente.
Enquanto Henrico se perde (ou se encontra) nos vídeos, eu e
a gangue estamos conversando pelo WhatsApp, decidindo detalhes
sobre a minha despedida de solteira.
Faz duas semanas que eu e Lucca estamos dividindo o
mesmo teto. Graças a Deus Henrico parece muito melhor aqui do
que parecia em minha casa. O apartamento de Lucca é maior, mais
arejado, mais seguro. Os profissionais que o acompanham estão
altamente felizes com a mudança e com o ganho de espaço.
Henrico está quase perto de conseguir andar completamente bem e
sozinho, e esse sempre foi meu maior sonho, vê-lo andando,
correndo por aí, bagunçando todas as coisas. Há um atraso em sua
coordenação motora, mas com muito trabalho já conseguimos ver
avanços e eu me apego a cada um deles com toda esperança que
possuo.
Eu decidi pedir demissão do escritório de advocacia onde
trabalhava. Meu sogro me deu uma vaga na empresa deles, mas
agora não é o momento. Eu quero estar mais tempo com Henrico,
cuidar da minha gestação. E, desde que saí do emprego, já
consegui organizar muitas coisas relacionadas ao casamento,
inclusive até mesmo escolhi meu vestido. O buffet foi fechado,
mudamos o local do casamento por falta de data disponível. Nos
casaremos na ilha. Parece que é tradição familiar se casar lá ou em
Belo Horizonte. Eu e Lucca decidimos pela Ilha por ser mais perto e
mais viável para todos os convidados. Nos casaremos em um mês,
mas não sem antes ter uma despedida de solteira, obviamente.
Dandara é a cabeça por trás da situação, mas,
constantemente, ela e Ava têm se desentendido. Talvez minha
cunhada fique magoada, mas Dandara tem sido perfeita nas
decisões. Ela resolveu criar nossa própria versão do filme Muita
calma nessa hora. Estamos agora vendo fotos de algumas das
casas que ela reservou para escolha e estou embasbacada. Não me
lembro quando foi a última vez que estive em Búzios, mas amo
aquele lugar e estou bastante animada para uma temporada lá.
— A minha preferida é essa — Dandara digita abaixo de uma
das fotografias.
— A sua opinião não é a única que vale, querida meritíssima
— Ava rebate. — Eu não gostei dessa, gostei da casa azul.
Ok. A casa azul é realmente bonita, mas a casa branca
ganhou meu coração por ser de frente para o mar e ter saída
diretamente para a areia. Sou praieira assumida, além de amar a
rua das pedras e a casa branca ser mais próxima. Porém, vou
aguardar mais opiniões para poder dizer a minha. Desde que
começamos a organizar com mais afinco, tenho estado sempre ao
lado das decisões da Dandara e estou realmente com medo de ficar
parecendo que estou puxando o saco ou algo assim. Apesar de quê,
seria mais vantajoso puxar o saco da minha cunhada...
— Ava, meu amor, novamente terei que contrariá-la. A casa
que Dandara escolheu é maravilhosa o bastante e perfeita para nós
que não estamos grávidas. Iremos tomar algumas cachaças, dirigir
não é uma opção boa, e por mais que Paula vá ser a motorista da
rodada, o carro não caberia todas. É melhor estarmos perto da Rua
das Pedras. — Eu já disse que amo a minha sogra? Sim, eu a amo
do tamanho do universo. Dandara toma as decisões e ela sempre
bate o carimbo de aprovação.
Luma concorda com elas, Lili e Larissa também.
— Aff, vocês são ridículas, enfim, vou adicionar mais
participantes nessa situação — Ava informa e logo entram mais
pessoas: Isis, Analu, Melissa, Milena, Beatriz, Maria Flor... Sei que
Isis é irmã de Lucca, as demais são primas, se não estou enganada.
Não as conheço ainda e estou ligeiramente tonta.
Vira uma loucura de apresentações, uma porrada de mulher
falando ao mesmo tempo, uma mais louca que a outra e eu me sinto
normal pela primeira vez na vida. A conversa vai fluindo até a Maria
Flor dizer algo:
— Joseph Vincenzo é o maldito por trás da despedida de
solteiro de Lucca. — Minha boca se abre em surpresa. — Agora eu
entendo o motivo do desespero dele para ir para o Brasil.
— Fodeu! Maria Flor, já que você é casada com o tudão, isso
faz de você uma tudona — Ava comenta. — Com Joseph na jogada,
a despedida de solteiro de Lucca tem tudo para ser a mais foda dos
últimos tempos, então precisaremos contar com você para subir o
patamar da despedida da Paula. Isso virou uma guerra, então
precisamos de armamento pesado. Eles vão jogar sujo.
— Se não for para destruir, eu nem participo disso! — Maria
Flor anuncia. — Estava louca para uma temporada de aventuras.
Joseph vai querer nunca ter me conhecido, mas depois dou um
carinho e tudo se resolve.
— Joseph é puxa saco de Lucca, Victor e Matheus — minha
sogra comenta. — Ele não vai medir esforços. Precisamos descobrir
os planos deles. Lucca é muito filho do Matheus, esse demônio
chamou Joseph para ser padrinho do casamento.
— Tia Vic, eu serei madrinha. A disputa é justa. — Maria Flor
parece realmente louca para guerrear com o marido. Me inspiro!
— Eu preciso extrair essa merda de Lucca! — comento.
— Eu tentarei jogar bem sujo com Nicolas. Ele ainda não
conhece minha capacidade de extrair informações das pessoas,
conseguirei algo, com toda certeza. — Dandara garante.
— Temos aqui advogadas, juíza, uma bilionária, uma dentista
caso seja necessário, uma economista para gerenciar os gastos.
Isso está saindo melhor que encomenda. Não estive animada em
muito tempo — Ava comenta, mandando carinhas diabólicas.
— Aoooo Paula! — Lucca sussurra em meu ouvido, e eu
quase caio do sofá diante do susto. Corro para bloquear o celular e
o encaro com o olhar assassino. — É... eles disseram, dona Paula!
Jacinta a confusão se formando!
— A próxima vez que me pegar por trás, eu irei matá-lo!
— Até essa manhã você costumava gostar muito quando eu
te pegava por trás — diz baixinho.
Eu morro de ódio por arrepiar com essas palavras. Por que
ele tem que ser tão malditamente quente e ter tanta influência sobre
mim? Me pego o puxando para um abraço, porque me sinto sensível
mais que o normal.
— Não quer mais me matar? — pergunta sorrindo.
— Quero, mas deixa para depois. — Sorrio, e ele se afasta
para pegar Henrico.
Esse homem está agindo estranho. De repente, ele nem
mais se importa com a minha despedida de solteiro. Isso é bastante
grave.
Informo no grupo do zap que a barra está suja, desligo meu
celular e me junto a eles. Meus meninos mais lindos do mundo!
— Que vídeo é esse, filhote? — pergunto ao meu garoto
mimado.
— Xacalakalacabum! — Ele e Lucca respondem juntos e eu
percebo que preciso me atualizar. É questão de honra decorar todas
as músicas!

Me surpreendo de manhã. Estamos tomando café quando o


interfone toca informando da presença de Dandara.
Quando ela surge, eu sou golpeada pela surra de beleza
matinal. Misericórdia nessa mulher! Ela é o diabo mesmo! É sem
lógica alguém ser tão bonita, principalmente sendo ex do meu noivo.
Essa mulher é uma afronta, um tapa bem dado na cara sem usar as
mãos.
— Cachinhos! — Lucca a cumprimenta dessa maneira.
— Sim, eu fico oscilando entre cachos e cabelos lisos — ela
explica, e vem me abraçar. — Onde está Henrico? — pergunta.
Ela é a mais nova paixão do meu filho, pelo fato de ser mãe
de Samuel, melhor amigo dele.
— Ainda dormindo — informo. — Sente-se, quer café?
— Na verdade, não. É até bom que Henrico esteja dormindo,
preciso conversar com vocês. — Isso me deixa em estado de alerta
e parece deixar Lucca também. — Posso?
— Claro! Vamos nos sentar — falo, e seguimos para a sala.
Ela se senta em um sofá de frente para mim e para Lucca, tira uma
pasta da mesa e nos encara.
— Há duas semanas algo caiu em minhas mãos. O processo
que está movendo contra Pablo está comigo — diz. — E, primeiro
de tudo eu quero dizer que sinto muito que você e Henrico tenham
passado por uma situação tão fodida, Paula. Ele, negligenciado pelo
pai. Você, quase vítima de um estupro, fora outras perseguições.
Algo doentio o bastante.
— O caso de Paula está em suas mãos para ser julgado? —
Lucca pergunta.
— Por algum motivo, sim — ela confirma. — Eu achei
necessário vir até aqui conversar com vocês. Não conseguiria
apenas repassar o caso e fingir que não sei de nada. A verdade é
que não posso seguir com isso, Lucca e Paula. Mas, fiz questão de
estudar o caso, e estarei empenhada para que seja julgado da
maneira correta.
— Então você não vai julgar o caso? — pergunto tentando
compreendê-la, e ela dá um sorriso fraco.
— Você não sabe o quanto eu queria isso, Paula. Deus! Eu
queria foder aquele homem tão forte, que ele jamais seria capaz de
se reerguer. Nenhuma mulher e nenhum filho merecem o que esse
homem tem feito. Eu poderia ir e julgá-lo, mas seria altamente
antiético, porque eu não teria como separar as coisas. Sou intensa
em tudo que faço e teria que mascarar nossa relação. Ver aquele
processo, saber que se trata de alguém tão próximo a mim... eu não
saberia julgar aquele caso sendo cem por cento profissional. E, há o
agravante de alguém descobrir que existe uma forte ligação entre
nós, isso poderia prejudicá-la, Paula — diz suspirando.
— É claro que compreendo — afirmo.
— Apenas, contem comigo para o que for necessário.
Acompanharei o caso, farei com que tudo seja resolvida da melhor
maneira para você, Henrico e Lucca. Se precisarem do que quer
que seja, não hesitem em me procurar, em pedir ajuda, pedir
conselhos jurídicos. Por mais que eu saiba que são advogados, há
informações que apenas um juiz seria capaz de fornecer. E, Paula,
deve ser triste ter que lidar com isso em relação à Henrico, mas
saiba de uma coisa, Henrico não está perdendo nada. Ele ganhou o
melhor pai, porque tenho certeza de que Lucca o ama e o considera
como filho. Pense que obteve um grande livramento. Sabe lá o que
aquele homem traria de ruim para o psicológico do seu filho?! Você
não está sozinha. Está bem amparada por Lucca e por todos que
amam vocês. Até mesmo eu, que acabei me tornando próxima,
mesmo com todas as confusões que são até mesmo recentes. Eu
espero que Samuel e Henrico sejam mais que grandes amigos,
sejam irmãos.
— Eles serão — digo, ligeiramente emocionada. — Muito
obrigada por ter vindo, explicado, por ter tido a sabedoria de não ser
a juíza desse caso, por pensar à frente.
— Estarei de fora acompanhando. E, já adianto, com todas
as informações disponibilizadas ali, Pablo não tem chance alguma
de vencer qualquer batalha que se disponha a travar. A lei está do
seu lado.
— Obrigada. — Sorrio, enquanto limpo as minhas lágrimas.
— Por mais que tempos atrás eu tenha sentido a vontade de forçar
algo que não faz sentido, é realmente difícil lidar com um pai que
não se importa com o filho, perceber que escolheu o homem errado.
Eu me culpo muito por isso.
— Não temos condições de saber como as pessoas de fato
são. Não conhecemos todo mundo cem por cento, então se culpar é
depositar energia em algo que não faz sentido. Você não tem culpa
disso, assim como Lucca não teve culpa quando eu desapareci. —
Eu fico embasbacada quando ela diz coisas assim, quando usa os
próprios erros que cometeu no passado como exemplo de algo. Ela
faz isso constantemente. — Ninguém tem culpa pelos erros dos
outros. Não existe isso.
— Quero aproveitar esse clima amigável, de atitudes
realmente bonitas, que tocam o coração das pessoas e pedir ao
meu passado, ao meu presente e futuro, Dandara Farai, Paula
Jacinta minha súplica... desistam da despedida de solteira. — Lucca
é tão cara de pau que uma risada escapa de mim. Eu jurava que ele
iria dizer algo sério, algo bonito, mas, não! Seriedade não combina
muito com ele.
— Ai, que preguiça dessa merda, Lucca! — ela diz ficando de
pé, pega a pasta e volta a guardar na bolsa. — À propósito, Paula,
já fechei aquela situação. — Abro um sorriso e até esqueço que
estava emocionalmente mexida há alguns segundos. — Bom, isso é
tudo. Vim porque meu coração pediu para fazer isso.
— Não sei que coração, mas obrigado, Dandara — Lucca diz.
— Agora, falando realmente sério, obrigado mesmo. É importante
saber que temos seu apoio. Aliás, estou extremamente orgulhoso
pela sua atitude de ter renunciado a algo que sabia que poderia usar
toda sua influência. É honesto, verdadeiro, uma atitude sensata que
preciso agradecer. A longo prazo poderia mesmo respingar
negativamente em Paula. Foi sensata em sua decisão e uma amiga
por vir aqui nos oferecer apoio. Tenho um orgulho imenso da mulher
que se tornou e da mãezona que é para o nosso filho. Ele é
fantástico e a maior parte disso é mérito seu.
— Ele puxou o pai — ela diz sorridente. — Agora chega de
melação. Eu vou fodê-lo, Lucca! Paula, nos falamos mais tarde. —
Me levanto e nos despedimos sob o olhar desesperado de Lucca.
Ele chega a tremer quando trocamos beijos na bochecha. É no
mínimo engraçado.
— Não faz essa carinha de bebê — digo, abraçando meu
noivo.
— Eu sou muito ciumento sobre você, Paula. Acho que sabe
disso, não sabe?
— Eu também sou muito ciumenta sobre você, quase
psicopata, e nunca fui ciumenta antes. Ou seja, não sei lidar com
esse sentimento e posso vir a enlouquecer em algum momento,
sem contar que estou com os hormônios bagunçados. Então, me
conte da sua despedida e eu te conto da minha.
— Se a proposta fosse desistir, eu toparia agora, mas como
só quer saber, eu dispenso! — Ele se afasta com um sorriso
vitorioso. Lucca não perde por esperar, principalmente porque o
conheço o bastante para saber que ele vai nos encontrar, não
importa onde seja, nem que tenha que contratar o FBI. A
possessividade dele desconhece limites e é por isso que vou
aprontar!
Falta muito pouco...
Eu vou enlouquecer meu noivo em grande estilo!
— Por que Henrico vai viajar com você? — Maldição! Vou me
divorciar antes do casamento! Paula simplesmente está arrumando
malas e vai levar o nosso garoto para a perdição.
— Se te conforta, Samuel também vai.
— O QUÊ? — pergunto, seguindo-a do banheiro para o
quarto, do quarto para o banheiro, do closet para o quarto, do quarto
para o closet. Puta merda! — Por que Samuel vai e eu não estou
sabendo?
— Todas as crianças vão nessa viagem. Contratamos 4
babás, 2 cozinheiras, tudo — explica, pegando calcinhas.
— Para onde vocês vão? Se as crianças estão indo, não terá
despedida de solteiro, não é isso?
— Claro... — responde sorridente.
— Ufa...
— Que não! Por que acha que há babás? Lucca, pare de
fazer tempestade em um copo d'água. Eu já volto, é só um final de
semana, bebê. E eu sei que fará algo com seus familiares também
— diz, se aproximando. — Não há motivo para surtar.
Primeiramente; você é o meu motivo da vida. Segundo; estou
grávida de um bebê seu. Terceiro; eu não sou idiota de fazer
qualquer coisa que coloque em risco a nossa relação. Apenas
relaxe, ok? Nem beber eu posso. — Tudo bem. Minha encenação
precisa acabar agora e eu preciso fingir que está tudo certo.
— Faz sentindo, Diabinha.

A GRANDE SACADA:
“— Consegui! Descobri! — Nicolas grita ao telefone o
bastante para eu afastar a merda do aparelho do ouvido. —
Búzios! Elas estão indo para Búzios!
— Joseph! É Búzios! — aviso.
— Eu não sei vocês, mas estou indo para lá. É mais fácil
o diabo surgir diante de mim que Dandara obter sucesso nessa
merda! — o garoto de açúcar avisa, e eu saio correndo.
Mal sabe ele que o diabo se chama Dandara, e que a
assessora dele se chama Paula.
Aooo Paula, Jacinta a treta chegando!
— Há duas opções: ou Maria Flor é sonsa ou ela quer
mesmo que eu descubra os planos dela. Eu voto na segunda
opção, porque de sonsa ela não tem absolutamente nada —
Joseph diz realmente sério olhando os últimos gastos do
cartão...”

— Já você... ficará solto, não é mesmo? Você pode encher o


cu de cachaça, arrastar chifre no asfalto, curtir. Não vá achando que
não saberei dos seus passos, ok? Princeso da sua mãe! — Opa!
Alerta treta detectado...
Porém...
Não sabe de nada, inocente!
A deixo terminar de arrumar a mala e vou ver Henrico. Ele
está deitadinho em sua cama assistindo a Turma da Joaquina. Isso
me faz rir. É engraçado porque ele fica analisando cada detalhe,
inclusive os traços que formam os bichinhos. Ele pode até possuir
uma lentidão na coordenação motora, mas ele tem um QI elevado.
— Ei, pequeno — digo, sentando-me em sua caminha. — O
que está assistindo aí?
— A canoa virou — responde vidrado.
— E o que faremos para salvar os bichinhos? Será que eles
estão de boia? — Ele sorri e começa a pensar sobre isso.
— Papai, a mamãe comprou uma boia. — Ainda não me
adaptei a tê-lo me chamando de papai, é algo que me toca bastante
pelo fato de ter sido uma escolha. Uma criança me escolher como
pai demanda muita responsabilidade e eu terei que fazer valer à
pena essa escolha.
— Sua mãe é uma... — eu iria dizer diabólica, mas não digo.
— Linda demais da conta.
Nós ficamos juntos até o furacão surgir e roubar meu garoto
de mim. Aproveito para fazer um vídeo chamada para Dandara para
poder falar com Samuel. E, quando ela entrega o telefone para ele,
eu percebo que estaremos muito fodidos, pois meu filho está se
transformando numa amostra grátis minha. Ele simplesmente não
para quieto, como se fosse ligado na voltagem mais alta. Eu mal
consigo enxergá-lo de tanto que ele está pulando.
— Ei, carinha, você vai viajar com a mamãe? — Aquela bruxa
filha da puta... eu vou destruir com o garoto de açúcar!
— Sim, papai — ele responde gargalhando enquanto pula no
sofá.
— SAMUEL DESCE DAÍ AGORA! — Dandara esbraveja, e
ele faz uma cara engraçada antes de descer.
— Papai vai te dar uma cama elástica grandona, o que acha?
Também vou te ensinar a andar de skate. Vou comprar um
capacete, joelheiras, e vamos curtir a vida adoidado, filhão!
— EBAAA!!! — ele grita, e sai correndo com o celular em
mãos. Eu me pego gargalhando.
— SAMUEL FARAI!!! — a maluca volta a gritar. — MEU
DEUS DO CÉU! EU JURO QUE TEREI QUE TE COLOCAR DE
CASTIGO PELA PRIMEIRA VEZ NA VIDA!
O garoto finalmente sossega após ouvir a fera e ficamos
conversando, bolando planos mirabolantes. A conversa dura até o
diabo dizer que está indo viajar e que precisa arrumar nosso filho.
Eu fico sentado na sala, vendo o mundo se acabar diante dos meus
olhos e aguardando as instruções de Joseph.
Minha Diabinha surge linda pra caralho, com Henrico em um
de seus braços e puxando uma mala.
— Bebê Lucca, pode pegar minha outra mala? — pede, e
quem sou eu para negar? Minha mulher está indo cravar uma faca
no meu peito e eu ainda tenho que carregar a mala que simboliza
sua partida, mas, tudo bem, nasci para ser pisado mesmo.
Há um táxi a aguardando e o taxista me ajuda a colocar as
malas no bagageiro. Paula coloca Henrico dentro do carro e vem se
despedir.
— Ei, vou sentir saudades de foder — diz sussurrando em
meu ouvido.
— Eu não sou um objeto sexual. Tenho sentimentos. — Ela ri
da minha resposta.
— Quando eu voltar, Henrico ficará um dia inteiro com a
minha mãe para podermos recuperar o tempo perdido.
— Não deixe de me ligar, Paula. Quero notícias diárias, ok?
— Mal sabe ela que eu terei notícias de um jeito ou de outro, mas
preciso manter a farsa. — Te amo, bebê.
— Também amo você. — Ela se vai e eu espero até que o
táxi desapareça da minha vista para subir correndo.
Encho uma mala com roupas e tudo que eu possa precisar, e
desço para meu carro na velocidade de um cometa.
O ponto de encontro é na Marina da Glória, mas só
compreendo o real motivo quando chego e vejo Joseph Vincenzo
perto de um enorme iate. E, quando digo enorme, é enorme mesmo.
Beira a assustador.
— Aooo! Que porra é essa? — pergunto a ele após
cumprimentá-lo.
— Vamos para Búzios, não? — pergunta com seu português
americanizado.
— Eu pensei que iríamos de van, qualquer merda, não um
iate desse porte — respondo rindo.
— Relaxa, vamos aproveitar o final de semana! — ele diz, e o
resto do povo surge de dentro do iate. Só falta Nicolas, e ele não
demora a chegar.
— Foi mal. Dandara hoje está diabólica — ele informa. —
Onde está o ônibus?
— Aqui. — Victor aponta para o iate, e eu vejo a boca do
garoto se abrir e fechar. — Vamos? Não falta ninguém?
— Porra! Melissa quer fazer sexo virtual! — meu tio
Arthurzinho surge dizendo, e todos os olhares se voltam para ele, o
deixando envergonhado. — Calma! É apenas para provar que estou
em casa... Eu disse que não vai rolar, porque ela está de castigo.
— O que mais está tomando no cu nessa brincadeira sou eu
— Victor protesta. — Não sei quantos dias não faço sexo. Já até
perdi a prática.
— Estamos juntos nessa, amigo — Joseph diz rindo. — Maria
Flor me fodeu sem foder há duas semanas.
— Já a minha delegada... — Heitor diz, mostrando os pulsos
machucados.
— Que porra é essa? — Bruce pergunta.
— Algemas. A noite passado foi do caralho — o desgraçado
responde rindo.
— Isis esteve insana também. Não há o que reclamar aqui,
meus caros — meu cunhado diz satisfeito, e Victor dá um soco no
braço dele. — Eu fiz filhos orando, babaca! Não queira que eu te
devolva o soco, Victor!
— Isso será assim o final de semana inteiro? — Nicolas
pergunta, e eu o abraço.
— Vamos, camarada! Vou te mostrar o caminho, a verdade, a
luz!

Somos ao todo quatorze integrantes.


A duração da viagem de iate é o dobro de tempo que duraria
de carro, porém, é muito mais proveitosa e bonita. Além de termos a
magnífica visão do mar, o iate que Joseph alugou mais se parece
com uma mansão flutuante. O capitão informou que o iate tem 35
metros, 9 suítes contando com as dos tripulantes, 16 camas. Será a
nossa casa no final de semana e parece surreal andar dentro desse
lugar. Há uma sala gigantesca, hidromassagem, piscina, deck com
mesas, simplesmente beira ao absurdo. Só não é mais bonito que o
iate que Joseph tem na Califórnia. O de lá é maior, ultra tecnológico,
e extremamente luxuoso de maneira que dá até medo de tocar nas
coisas.
Estou um pouco tonto com isso, até mesmo um pouco
isolado, apenas observando as pessoas se divertirem. Na verdade,
acho que estou ansioso e nem tanto é para a despedida de solteiro.
Minha ansiedade é pelo casamento, não que eu tenha dúvidas ou
qualquer ponto negativo. É apenas surreal que a vida tenha
passado tão depressa, que eu tenha filhos, que Paula esteja grávida
e que nosso casamento esteja se aproximando, antes que ela possa
imaginar.
Dentro desse iate há um bando de homens possessivos,
ciumentos, que amam suas mulheres com total desespero, e agora
faço parte desse time. Aliás, o garoto de açúcar também faz.
Gosto dele, da maneira como ele ama meu filho e a mãe do
meu filho. Ele está apaixonado, completamente, e eu o compreendo.
Isso é um pouco estranho, por mais que conduzimos em total
harmonia. Eu me tornei amigo da minha ex, da mulher que mais me
fez sofrer na vida. Me tornei amigo do atual namorado dela.
Consegui adquirir um novo sentimento por ela. Fui de repulsa à
admiração em um curto espaço de tempo.
A vida toda mudou e tudo aconteceu rápido demais.
Sentimentos desfeitos, novas relações... e estou emotivo por pensar
que Paula é o grande motivo por trás de todas essas mudanças. Ela
costuma dizer que eu sou o anjo da vida dela, mas, por mais que eu
tenha dito infinitas vezes, creio que ela nunca será capaz de
imaginar o significado que possui para mim. Ela mudou
absolutamente tudo.
Nas duas últimas semanas estou experimentando novas
sensações morando com ela e com Henrico. E é tão diferente de
tudo que havia vivido. Ela está sempre sorridente, sempre
carinhosa, sempre inventando maneiras de me agradar e, mesmo
que eu já sabia que ela era uma mãezona, agora estou convivendo
com isso mais de perto. A mulher é realmente foda. Ela tem uma
capacidade incomum de guardar seus receios e demonstrar total
segurança, além de passar essa segurança à Henrico, e isso me
deixa tanto admirado quanto assustado. Além disso, estou
experimentando a sensação de viver com uma criança que se
tornou meu filho. Isso mexe comigo um pouco por conta de Samuel.
A verdade é que, embora eu tenha perdoado e compreendido
Dandara, eu nunca me preparei para viver a vida afastado de um
filho. Por mais que eu o veja com frequência, fico um pouco
magoado por viver mais tempo com Henrico e com o bebê que vai
nascer. Sei que eu e Dandara precisaremos trabalhar junto para que
isso não atinja nosso filho. Eu sou um completo medroso quando se
trata de Samuel...
— Ei, cara, o que está pegando? Está aí sozinho. — Meu pai
surge me abraçando.
— Apenas pensando na vida.
— Que tal desligar de Paula e ir curtir um pouco? Elas não
vão aprontar tanto...
Sabe quando você não bebe, mas está em meio a um monte
de bêbados e acaba ficando bêbada junto? Essa sou eu. Me sinto
embriagada de ver essas mulheres e simplesmente me jogo de
cabeça nessa despedida de solteiro.
Já é noite. As crianças estão com as babás e sendo
supervisionadas por minha mãe, Beatriz, Analu e Vic, que não
quiseram acompanhar nossa jornada por Búzios essa noite.
Estamos em um boteco na rua das pedras. Eu quase bebi uma dose
de tequila sem querer, mas consegui parar a tempo. Agora estou
dançando e tomando meu suco de laranja, feliz da vida. Só não sei
dizer quem é a pessoa que mais está me surpreendendo.
Para começar, Dandara está sambando como se fosse uma
passista de escola de samba, em cima do pequeno palco onde um
grupo de pagode está tocando. Melissa, meu Deus do céu, essa
mulher é uma criatura e tanto. Ela está em cima da mesa, achando
que está no chão, e bebendo cerveja, completamente bêbada. As
demais estão no chão, onde estou, mas há de tudo aqui. Milena, por
exemplo, é o tipo de mulher que intimida. Ela pareceu bastante séria
durante a viagem, mas, desde que começou a beber na piscina, ela
se transformou. Está tocando pagode e Maria Flor está dançando
funk. Isis e Ava estão dançando juntas com as costas grudadas e
indo até o chão. Lili e Lari estão mais para lá do que para cá. E eu?
Estou fingindo de bêbada para sobreviver. Nunca imaginei uma
Dandara tão solta em toda a minha vida. Nunca imaginei Ava sendo
insana, tampouco Isis que é a irmã mais velha.
É amanhã à noite que será a verdadeira festa. Iremos para
uma boate chamada Privilege que terá uma noite voltada apenas
para mulheres, e eu não sei o que esperar. Uma coisa eu tenho
certeza de que terá naquele lugar: strippers. Quando se diz "noite
das mulheres", essa é a única certeza que se pode ter.
Eu daria muitas coisas para poder encher a cara e aloprar,
mas isso só poderá acontecer daqui longos meses. Porém, nunca
fui o tipo que precisa de bebida para se divertir, então está sendo
incrível. Mesmo assim estou com uma pulga atrás da orelha em
relação à Lucca e os demais membros da gangue. Eu gostaria muito
de saber onde eles estão, mas pareço ser a única realmente
preocupada com isso. Há quatorze homens soltos por aí... e, sinto
muito, mas a insegurança bate ao me dar conta da beleza de todos
(ao menos dos que conheço). Tendo em vista da beleza das
mulheres que estão aqui, eu posso quase afirmar que todos os
homens lá são todos absolutamente lindos e gostosos. Quatorze.
Meu Deus!
Ava agora está dançando com o cantor da banda, e após
muitas brigas, ela e Dandara parecem melhores amigas e a culpa
disso é de Isis. Parece que elas estão disputando de quem Dandara
gosta mais, mas, devo dizer que Ava está perdendo feio.
Maria Flor... acho que ela consegue estar muito mais bêbada
que Melissa. Antes ela estava dançando funk com pagode, agora
ela está fazendo a mesa de tambor e sua maquiagem está uma
bagunça. Um idiota, bastante gato, a pega por trás e eu vejo o
sorriso dela morrer na hora. Ela endireita sua postura e se vira de
frente para o cara, e, antes que ele possa fugir, ela dá uma joelhada
certeira nele que me faz levar as mãos à boca na mesma hora.
— Deus do céu, Flor trepadeira! — Melissa grita do alto da
mesa. — Esse golpe foi foda, real oficial! Quero fazer!!! — A louca
pula da mesa e cai diretamente no chão.
Eu e Isis corremos para ajudá-la, mas ela permanece no
chão, morrendo de rir e dizendo coisas sobre sonho de princesa,
num português que mistura inglês e italiano. Misericórdia! Como
será a volta para casa? Isso está pior que Muita Calma Nessa Hora,
com certeza.
Um homem cabeludo e gato, estilo hippie, se aproxima de
mim.
— Olá. Nunca a vi por aqui. De onde é?
— Rio de Janeiro. É a minha despedida de solteiro — explico
educadamente, e ele toca em meus cabelos. O simples toque me
faz recuar, até porque não dei o mínimo de liberdade.
— Não acredito que uma princesa dessa vai se casar. Que tal
aproveitar a noite comigo?
— Olha! Que cantada fenomenal! — exclamo. — Estou
aproveitando a noite com as minhas amigas, obrigada pelo convite,
mas dispenso. Eu vou me casar, sou comprometida. — Isso o faz se
afastar e Larissa fica rindo.
— Etxaaa gota serena da peste esse diabo!!! Um desses não
chega em mim! — diz rindo, mas vejo seu sorriso sumir quando o
telefone dela toca e o nome de Enzo surge na tela. — Fodeu!
— Ué, não era a você a solteirona convicta? — pergunto
rindo.
— Você já viu o pau de Enzo? — ela pergunta, como se o
pau dele fosse a resposta para todas as coisas.
— Eu já. É realmente bom, não vale a pena arriscar uma
troca. — Dandara surge do nada respondendo e eu a encaro
boquiaberta. — O quê? Eu não estava com Lucca. Foi depois do
lance de BH. Não vai me julgar, Barbie moda e magia!
— Você já transou com o meu homem??? — Larissa
praticamente grita, e a atenção de todas passa a se concentrar em
nós.
— Foi apenas uma vez, ou duas. Não me lembro bem, mas
desencana. Quase transei com Humberto também, mas nosso
universo é diferenciado. Ambos somos muito dominadores... —
explica, e por sorte Lili não ouve. — Enfim, Nicolas coloca todos
esses homens no bolso com muita facilidade. Estou em outra...
gota. — Ela chama Larissa de gota e todas às vezes que faz isso
Lari treme de raiva. A meritíssima vira dois copinhos de tequila de
uma só vez e se afasta, voltando para o palco. É então que começo
a reparar algumas coisas; a cada momento chega um homem
diferente em uma de nós... o bom de estar sã é que a consigo
captar todos os detalhes.
Primeiro na Flor, depois em mim, agora em Milena...
Até o final da noite todas nós levamos dezenas de cantadas.
É algo normal, todas aqui somos bonitas, sem exceções. Não há
uma que eu posso dizer que é "mais ou menos" bonita. Mas, eu
cronometrei até mesmo o espaço de tempo entre uma cantada e
outra... e isso me parece algo armado.
— Ei, Flor, vem aqui... — a chamo discretamente, e ela vem
pulando como uma louca.
— O quê?
— Eles armaram. Há homens chegando em nós a cada
cinco, seis, minutos. Eles estão por perto — aviso, e ela abre um
sorriso que quase me faz arrepiar.
— Ok. É hora de contra-atacar, Paula! Você está preparada
para isso? É hora de sair do samba e ir para uma festa de verdade!
— Calma! — digo a ela, que está empolgada o bastante para
uma vingança. — Não podemos sair daqui. Eles perceberão que
sabemos de algo, precisamos continuar e fingir que nada está
acontecendo.
— Eu estou puta, Paula! É ridículo termos nossa fidelidade
testada.
— Sim, é absurdo, mas é engraçado também — comento
sorrindo.
— Como assim?
— Eu sei uma maneira de dar o troco. Quando algum homem
se aproximar de cada uma de nós, podemos fingir interesse e
criticar nossos respectivos companheiros. A masculinidade deles
sofrerá consequências. — Maria Flor parece aprovar, porque ela
sorri e parece ponderar isso.
— Deus! Isso pode ser arriscado! E se estivermos enganadas
sobre ser um plano?
— Nós saberemos como sair da situação. Pode ser que eu
esteja enganada, mas, imagine se eu estiver certa? Será que os
caras vão fugir ou serão loucos de cair na nossa lábia de cantada?
— Uau! Joseph é capaz de invadir esse estabelecimento.
Estou ansiosa agora!
— Agora precisamos falar disso discretamente para as
demais meninas — aconselho, e ela vai fazer o trabalhinho sujo.
Enquanto trabalho em ajudar a comunicar as garotas sobre o
ocorrido, me dou falta de duas pessoas: Melinda e Luma. Não faço
ideia de onde elas estão, por isso, decido procurá-las. Eu rodo o bar
inteiro, e acabo no banheiro, onde pego uma cena absurda. Luma
está de lingerie tirando fotos sensuais de Melinda, que está de
calcinha, e usando uma camisa com quase todos os botões abertos,
sensualizando encostada em uma parede. É sério, meu nível de
loucura é anos luz abaixo do nível de loucura dessas mulheres. Eu
acho que estou ficando assustada, de verdade.
— Que porra vocês estão fazendo?
— Criando armamento para provocarmos Sugar Daddy e o
príncipe de Luma — Melinda responde visivelmente alcoolizada, e
pega em seus seios. — Agora quero tirar assim, por favor. Victor é
pirado em meus seios!
— Luma, você está de calcinha e sutiã! — digo perplexa.
— Eu já vou me vestir. Já tenho armamento suficiente para
seduzir Davi durante um mês inteiro — comenta com total
naturalidade.
— Ok, a questão é que eles estão por perto e estão armando.
Há homens dando em cima de todas nós e eu percebi que faz parte
de uma armadilha para nos testar, para ver se vamos cair. O plano é
fingir interesse e detonar nossos parceiros. Por exemplo, um cara te
dá uma cantada, você retribui, conversa vai e você diz que tem
interesse porque está insatisfeita sexualmente. Algo assim.
— Meu Deus!!! Eu amei isso! Vou detonar com Victor muito
forte para ele deixar de ser possessivo e insano! — Melinda vibra
em plena animação.
— Davi é muito meu amor. Não sei se terei coragem...
— Luma, você precisa ser forte nessa brincadeira. Seu
príncipe está te testando, bonitinha! — Melinda alerta, vestindo seu
short e fechando a camisa. Luma também começa a se vestir e
saímos do banheiro após alguns minutos.
— É sério que estão nos monitorando? — Dandara surge
perguntando. — Deus! Isso é obra dos Albuquerque’s malditos e
meu garoto de açúcar está entrando na onda deles. Tem ideia do
quanto eu gostaria de matar seu noivo? Não, você não tem. Nicolas
era um anjo. Só confrontávamos quando eu fazia grosserias. Desde
que ele se juntou com Lucca, o garoto mudou por completo e eu não
estou satisfeita. Quero o meu Nicolas de volta, e vou matar o seu
bebê Lucca, Barbie!
— Mate-o, por favor. — Sorrio, e foco em Melinda.
Esses idiotas estão dando grana para os caras mais gatos de
Búzios, porque até agora não apareceu um único que fosse feio.
Melinda está agindo como uma pervertida, até mesmo dizendo
coisas no ouvido do cara. Mas, minha análise termina quando um
homem chega em mim.
— Olá! Está sozinha?
— Estava. — Sorrio simpática. — Agora acho que não estou
mais. Estou?
— Só fica sozinha se quiser, gata. Qual seu nome?
— Paula, e o seu? Quero saber se seu nome é tão quente
quanto você parece ser, gato. — Ele fica me analisando e sorri
alguns segundos depois.
— Lucas.
— Oh! Seu nome me lembra o nome do meu noivo. Ele se
chama Lucca — digo sorridente.
— Então não é solteira?
— Não, infelizmente — falo. — É a minha despedida de
solteiro e eu quis vir curtir já que as coisas estão muito paradas no
meu relacionamento — comento, e mexo em um cordão de prata no
pescoço dele. — Estou grávida... por isso irei me casar.
— Uau! — Ele se assusta. — Grávida, noiva e linda.
— Não se importa com isso?
— Acho que não. — Olha a incerteza aí, meu povo!
— Deus! Era isso que eu estava realmente precisando;
alguém que não se importasse com o meu estado civil e minha atual
situação. Alguém que sentisse tesão numa grávida safada. Quer
sair daqui? Se chegou até mim acredito que tenha algum interesse
além... estou certa? Não vejo a hora de matar minha vontade.
— Vontade de... — gagueja. — Vontade de sexo? —
pergunta, e o receio está visível em seu rosto. Não esperava por
uma dessa, né... eu amo! Chupa essa, bebê Lucca! Meu pau te
cutuca!
— Vontade de foder mesmo. Dizer sexo é muito basiquinho, eu
gosto de foder com força mesmo, de ser destruída e rasgada ao
meio. É que meu noivo não está mais dando conta do recado. Se é
que você me entende... — Misericórdia porra!!! Minha Diabinha!!! —
Vamos? Há apenas um detalhe, no minuto em que eu me sentar em
você ninguém mais me tira de cima!

— Vontade de foder mesmo. Dizer sexo é muito basiquinho,


eu gosto de foder com força mesmo, de ser destruída e rasgada ao
meio. É que meu noivo não está mais dando conta do recado. Se é
que você me entende... — Misericórdia porra!!! Minha Diabinha!!!
Péssima ideia ter pedido filmagem e áudio dessa merda. — Vamos?
Há apenas um detalhe, no minuto em que eu me sentar em você
ninguém mais me tira de cima!
— AEEE! — Um bando de idiotas começa a gritar e rir. Heitor,
por exemplo, chega a estar rolando no chão e eu estou puto pra
caralho. — Nem casou ainda e está negando fogo!!! — Gabriel diz
rindo.
— Eu vou lá! — aviso e eles me impedem. Há quatro me
segurando agora. — Porra, me solta!
— Calma, caralho! Quem garante que elas não estão
jogando? — Victor tem um ponto, mas suas palavras se tornam
nada em questão de segundos.
— Eu sou uma princesinha muito safadinha, sabia? —
Ouvimos a voz de Melinda e Victor corre para o Ipad onde a cena
está acontecendo. — Meu marido é mais velho e não aguenta mais
apagar meu fogo constante. Eu sou novinha, cheia de energia, louca
para conhecer coisas diferenciadas e encontrar alguém que consiga
durar mais do que cinco minutos. Que tal irmos conhecer alguns
cantos desse lugar? Eu gosto da sensação de poder ser pega
fodendo... é um fetiche.
— AOOO MELINDA!!! — Agora é ele quem se desespera e
Heitor segue no chão, rindo.
— Meu Deus do céu! Não sei se fico mais preocupado com
isso ou com o fato da minha esposa estar em cima de uma mesa!
Nunca vi gostar de ficar em cima dos lugares! — meu tio Arthur
choraminga. — Cinco minutos de foda, Victor? Puta merda!!!!
— Estou um pouco assustado agora, Melinda — o homem
contratado diz.
— Eu faço seu susto passar em cinco segundos, quer pagar
para ver? — Victor é quem tem que ser segurado agora.
— Me solta! Eu farei Melinda sofrer de tanto... — Ele não
conclui a frase. — Ela vai se arrepender ou eu não me chamo Victor
Albuquerque!
— Olha o tamanho da bunda da Dandara! Sinceramente, se
juntar todas as mulheres ali não chegam no patamar daquele corpo!
— Enzo tem a infeliz ideia de dizer e a briga começa.
Nicolas o empurra, e ele empurra Nicolas de volta. Mas, o
garoto de açúcar parece possuído. O punho dele se choca no rosto
de Enzo e então todos temos que ir separá-los.
— Fale assim da minha mulher mais uma vez, babaca!
Moleque! — Nicolas esbraveja. — Foda-se se você a acha gostosa.
Guarde essa merda para você, imbecil!
— Era para ela estar comigo — Enzo grita de volta, e eu me
sinto perdido nessa história.
— Era? — meu pai questiona.
— Você está sendo um idiota, cara — repreendo Enzo. —
Um belo idiota. Não é porque está bêbado que tem o direito de falar
coisas assim. Se fosse sobre Paula você estaria no mar agora,
imbecil.
— Está puto por que fiquei com sua ex? — pergunta.
— Foda-se o que você e ela fizeram, Enzo. Não venha
estragar a porra da minha despedida de solteiro. Respeite a mãe do
meu filho! Isso que você está fazendo é coisa de moleque! Não
acha que está velho demais para isso? Está agindo como babaca!
— Enzo, acho que você precisa ir dar uma descansada,
camarada. — Meu pai o pega e nem há como brigar, ele tem uma
força capaz de derrubar dez homens de uma só vez.
— Porra tio, esse idiota me deu um soco.
— Enzo, bora descansar? — meu pai propõe mais uma vez,
e Enzo não se opõe porque nem é louco.
— Relaxa, cara. Ele está bêbado. Não justifica, mas releve
dessa vez, ok? — digo a Nicolas.
— Estou aguentando piadinhas desse idiota já tem um tempo
— Nicolas comenta. — Não vou permitir, não sou um moleque e
Dandara é minha mulher.
— Sei disso, apenas relaxe. Não vamos permitir que
qualquer pessoa aqui falte com respeito com qualquer mulher que
seja — aviso.
— E aí, vai querer ou não? — Paula pergunta a Lucas, e
novamente atrai minha atenção. Pior é ver que o idiota daria tudo
para ir. Espero que ele tenha amor à vida, de coração, porque nem
meu pai me segura se ele tocar em um fio de cabelo da minha noiva
traidora. Se ele disser que sim... aooo Paula, Jacinta a fúria...
— Ouça, eu não imaginava que estava grávida, foi por isso
que me aproximei. Deixa para a próxima, gata. — O cara sai
andando, e eu não consigo escutar mais minha noiva.
— Ainda bem que sou parcialmente solteiro. — Humberto se
diverte.
— Eu e meu marido temos alguns fetiches — é Flor quem diz
agora, e Tudão surge como um diabo. — Sou uma mulher que
possui os fetiches mais sujos.
— Ok, eu não vou escutar minha filha falando essa merda
não — tio Bê informa, e desaparece. Eu quero rir, mas estou bravo.
— Que tipo de fetiche, princesa? — o homem pergunta.
— Gostamos de ménage — ela diz, e a gargalhada sai não
apenas de mim, mas todos os demais presentes. — Nós, e mais um
integrante masculino — explica. — Mas, há um pequeno detalhe
que faz toda a diferença, não gosto de ser pega por dois homens.
Gosto de ver dois homens se pegando, gosto de ver meu marido
sendo fodido. Isso me deixa louca!
— O QUÊ??? — Joseph questiona irado.
— AOOO TUDÃO, LEVANDO NO BUTÃOOO!!! — Heitor
grita. — Porra, eu vou mijar na roupa! Joseph, eu já sabia que Maria
Flor botava no seu cu, mas não dessa maneira.
— Joseph, não se preocupe. Continuaremos sendo sua
família, cara. Não há problemas em gostar de paradas assim. Você
continua sendo o nosso tudão, dono da porra toda. Seu corpo te
pertence e se você quer dar o cu, dê cara! — Bruce discursa, e se
afasta quando Joseph o ameaça. Agora sou eu quase fazendo xixi
de tanto rir.
— Joseph tem fixação anal. Ele sente muito tesão quando
toco a traseira dele, mas às vezes meus dedos não são suficientes,
nem mesmo um vibrador. Ele gosta da coisa pulsando, viva, sabe?!
Eu fico louca ouvindo-o gemer, muito excitada mesmo — Maria Flor
explica. — Você curte uma parada mais bissexual? Eu sou
bilionária, posso conseguir um helicóptero para irmos para o Rio em
questão de segundos. Eu e ele pagamos bem.
— Joseph transa de costas! — Gabriel zomba, até o
momento em que a voz de Ava surge.
— O apelido do meu marido é Piroca Baby porque o pênis
dele não é lá grandes coisas. Eu me casei com ele porque ele é um
cara legal, até me dá orgasmos, mas eu gostaria de um homem que
fosse mais bem dotado, entende? Que fosse direto ao ponto.
Quantos centímetros de rola você tem? — Humberto e Davi caem
em cima dele. Fodeu pra caralho!
— Eu sabia que havia algo nesse apelido — Nicolas comenta
rindo. — Piroca Baby é meio vergonhoso.
— É baby nada baby, ela mesma diz. Ava é a personificação
do diabo! Eu vou ficar um mês se encostar nela depois dessa! —
Piroca Baby se revolta e Milena entra na parada.
— O pênis do meu marido deve ter ao menos uns 25
centímetros, mas ele definitivamente não sabe usar. Desculpe meu
sotaque estranho, não sou brasileira e não consigo ter um sotaque
cem por cento normal. Mas, voltando ao assunto. Eu sou delegada,
Heitor tem um pau enorme, mas estou querendo me divorciar e
arrumar um cara que saiba como foder de verdade. Tamanho nem
sempre é documento, Heitor é a prova viva disso!
— Milena disse uma grande verdade. — Heitor agora se
levanta, mas lágrimas de riso ainda estão molhando seu rosto. — 25
centímetros de piroca, porra!!! Eu sou o mais dotado da família,
parceiros! Se cortar meu pau, dá para complementar o do Piroca
Baby!
— E sobre não saber usar? — Nicolas pergunta rindo.
— O cu dela que eu não sei! Essa tirana! Ela não disse isso
ontem à noite! — ele esbraveja. — Vai ter troco esse merda!
— Vai complementar meu pau no teu rabo, Heitor! — Piroca
Baby diz.
— AOOO MERITÍSSIMA! — digo, vendo Dandara dançar
grudada com um cara. A cara de Nicolas é impagável.
— Se ele descer as mãos um pouco mais, nós vamos
terminar a noite em uma delegacia — ameaça.
— Vamos lá! Eu procuro caras interessados em foder meu
marido e isso é tão raro... Por favorzinho. Pago em dólar! — Maria
Flor volta a aparecer.
— CHEGA DESSA MERDA! — Joseph avisa, e não há quem
consiga segurá-lo. Maria Flor parece estar fodida.
— NÃO ACHO QUE DEVERIA IR, JOSEPH! — grito, e ele
para de andar. — Elas certamente perceberam nossos planos de
hoje, mas tenho grandes planos para amanhã! Hoje elas ganharam
a noite, mas amanhã ganharemos o dia!
— O que faremos? — pergunta voltando. — Eu espero que
seja algo realmente grandioso, porque elas precisam pagar por toda
merda que falaram. Maria Flor não faz ideia do que espera por ela.
— Vem com o pai, galera! Preparados para contra-atacar?
Amanhã é o dia! Heitor nos salvou hoje com seu talento de
cinegrafista amador. Se não fosse por ele, não saberíamos de toda
essa merda. Agora é hora de botar pra foder!
— Qual o plano? — Nicolas pergunta.
— O plano é levar ao menos uns três tapas na cara. Se Paula
não me bater amanhã, eu não terei feito isso direito!
— Eles se foderam! — digo rindo. Espantamos todos os
babacas que foram pagos para vir até aqui. Apenas um deles não
foi embora, o cara que estava conversando com Dandara.
— Ok, mas estou com um problema. O homem que eu estava
dançando não me parece ter sido contratado. Eu disse uma porrada
de coisas pervertidas para ele, e agora ele está me encarando como
um tarado completo — Dandara comenta, e eu me viro para
encontrá-lo exatamente como ela descreveu: parecendo um tarado.
— Meu Deus do céu! Eu disse que para ele que eu era uma perfeita
engolidora de espadas!
Melinda cospe toda a bebida que estava em sua boca e eu
começo a rir. Não consigo imaginá-la dizendo algo assim, isso torna
tudo pior do que realmente é.
— Joseph deve estar encomendando a minha morte,
queridas! Eu acabei com ele de uma maneira nada gentil. Acho que
exagerei na dose de vingança. Meu marido deve estar sendo alvo
de chacota daqueles homens — Maria Flor desabafa.
— O que de tão grave você disse? — Ava pergunta.
— Disse que éramos adeptos à ménage, mas de maneira
diferenciada. Eu disse que sentia prazer vendo Joseph sendo
fodido. — Minha boca se abre e fecha. — Porém, eu disse
detalhadamente e... peguei realmente pesado, não peguei? Vou
morrer e deixar dois filhos adolescentes!
— E eu achando que tinha pegado pesado ao dizer que
Lucca não dá conta do recado.
— O meu foi leve. Só disse que o apelido do meu marido é
Piroca Baby porque o pau dele é pequeno — Ava diz rindo. — Que
merda! Gabriel tem um big pau com piercing, e eu estou morrendo
para encontrá-lo e poder transar.
— Já eu, disse ao contrário. Falei que o pau de Heitor é
gigante, mas que ele não sabe fazer uso. — Milena só me faz
acreditar ainda mais no quanto estaremos fodidas.
— Eu falei que amo meu tutuzinho, que ele é e sempre foi
meu sonho de princesa, mas disse que sou uma princesa pervertida
que curte gang bang. — Minha gargalhada é alta, quando Melissa
termina de dizer.
— E você Luma? — Ava pergunta. — Se disser que não fez
nada eu vou socar a sua cara!
— Eu me juntei com Isis — Luma responde. — Não saberia
dizer nada. Davi é um príncipe perfeito, é o mais lindo do mundo. —
Davi é realmente de tirar o fôlego. A beleza dele é impactante, mas
Luma viaja demais mesmo. Como Lucca diz, ela vive no mundo da
"Luma".
— Ah, a preferida! — Ava debocha encarando Isis. — Ok,
preferida, o que você disse?
— Disse que somos irmãs e gostamos de swing. Disse
também que meu marido tem um clube de sexo e que fazemos
performances todas as sextas-feiras. Eu, ele, Luma, Davi e todos
que quiserem participar. Falei que já dei para 9 homens de uma só
vez e que Luma deu para 5, ainda disse que meu marido tem um
pau maior que o do Kid Bengala e que não possuo mais pregas.
— Mas isso deve ser verdade — Maria Flor diz rindo. —
Tudão tem um pauzão, mas tenho certeza de que o do Bruce é
maior. Do Heitor eu tenho trauma!
— O pau do Heitor é quase insuperável — Isis comenta rindo.
— Uma vez dormir com ele e foi assustador.
— Como assim? — Milena questiona.
— Calma, delegata. Só dormi mesmo. Heitor é meu primo,
caralho. Eu o amo como um irmão. Mas, foi tentador... confesso,
principalmente porque eu estava num período de seca sexual.
Ponderei tapar o rosto dele e usar o armamento. Aquilo é um pau
digno de ganhar premiações penianas! — Eu não fazia ideia de que
Isis poderia ser tão louca. Por ser a irmã mais velha, eu achava que
ela era diferenciada. Vejo que me enganei. Ela deve ser a chefe das
loucas, pelo visto. — Mas o do meu marido também é. Bruce possui
o melhor pau do planeta, certeza.
— Olha o nível dessa conversa! — Melissa diz rindo. — Meu
marido tem o apelido de pirocomonstra, não preciso dizer o motivo.
— Ok, quando isso virou debate sobre paus? Porque eu
preciso dizer que o pau do meu Sugar Daddy toca o meu útero —
Melinda anuncia com orgulho. — Saudades! Meu Deus do céu! Juro
que se eu soubesse o local que eles estão, eu iria lá só para dá para
o Victor.
— Gente, na boa, vocês poderiam parar de falar desses
homens? Ok, eu estou saindo com Humberto, tem um big pau, mas
somos apenas "peguetes" e não temos futuro. Estou começando a
temer um "término". Vocês estão falando de super-homens bem
dotados e fodedores profissionais, estou em uma mesa com
mulheres privilegiadas. Depois de ouvi-las, vou sair daqui deprimida
e pular do primeiro degrau que eu encontrar pela frente. Onde vou
encontrar um espécime de homem assim? — Lili questiona, fazendo
todas rirem. — Não! É realmente sério e injusto. Vocês são
maravilhosas, peles incríveis, isso significa que são bem fodidas
diariamente e que são felizes no relacionamento. Isso é raridade.
Essa Paula é uma desgraçada sortuda do caralho! Saiu do Pablo
que nasceu pelo cu e foi para Lucca, aquele gostoso, com todo
respeito.
— Com todo respeito? — pergunto rindo.
— Amiga, eu juro que é com todo respeito. — A abraço
rindo.
— Invista firme no Humberto. Ele é tão incrível como todos
esses caras que estamos falando — Luma diz. — Ele é perfeito.
— Humberto está no topo das melhores pessoas que já
conheci — Dandara comenta. — Ele é extremamente amigo.
— Ele tem uma foda sinistra — Lili comenta, e eu decido
suspender o álcool delas. — É cada chicotada que... até arrepio,
Jesus! — diz, mostrando os pelos do braço arrepiados.
— Vocês praticam BDSM? — Ava pergunta interessada.
— Sim, e é realmente bom, não é assustador como parece.
Lógico, tem partes assustadoras, mas não precisamos das partes
assustadoras. Eu nunca havia praticado, Humberto tem me
ensinado tudo e eu nunca senti tanto prazer antes, nunca fui tão
explorada, sabe?
— Explorada? — pergunto curiosa.
— Sim. Explorada no sentido de receber cuidados em cada
pedaço do meu corpo. Humberto me fez sentir prazer em lugares
onde eu nem sabia ser possível. É algo mágico, mas estou lutando
para não me apegar. Ele não gosta de mim. — Meus olhos
lacrimejam ao ouvir minha amiga, e os dela também.
— Ouça, eu acho o contrário — Dandara diz, e a vejo limpar
lágrimas. — Humberto não ficaria tanto tempo com alguém que não
gosta. Ele é um homem bastante prático. Acho que ele está sim
gostando de ficar com você, caso contrário, ele permaneceria
sozinho. Solidão nunca foi um problema para ele, na verdade, ele
ama ser sozinho e, se resolveu dividir momentos com você, é
porque é importante para ele. Não pense pouco.
— Ok, obrigada. Eu a odiava por ser tão linda, mas agora eu
acho que gosto de você — Lili a responde, rindo entre lágrimas.
— Por favor, Dandara, preciso saber sobre o seu novinho —
Isis pede. — Não tenho preconceito, mas nunca te imaginei com um
homem mais jovem.
— Acho que ninguém imaginou — Luma concorda.
— Nicolas é extremamente maduro, às vezes muito mais que
eu. — Ela ri. — E sobre o pau dele, eu o amo acima de todas as
coisas desse mundo.
— Você ama o pau dele acima de todas as coisas desse
mundo? — Maria Flor pergunta rindo.
— Exatamente.
— É... acredito que Nicolas seja o verdadeiro pica de ouro —
Isis comenta pensativa. — Para Dandara dizer isso, o menino
conseguiu bater Heitor, o homem que merecia premiações
penianas.
— Ok, vamos parar de falar de paus porque estamos todas
na seca sexual — argumento. — Quer dizer, eu transei antes da
viagem.
— Transar... não sei o que é isso há uns quinze dias no
mínimo. Victor, saudades do que a gente ainda não viveu.
— Melinda, é o momento de parar de beber. — Ava pega o
copo da mão dela do seu modo nada delicado de ser. — Já é tarde,
vamos dormir porque amanhã é o grande dia, garotas! Quero ver
esses homens conseguirem invadir a boate. Vou botar no cu do
Gabriel!
Nós vamos andando para casa, cantando músicas de funk e
dançando. É engraçado, principalmente porque não estou bêbada.
A noite termina caótica quando Dandara passa mal em frente
à casa, e quando Melissa segura numa folha de coqueiro dizendo
que é a Jane e a maldita folha gigante despenca sobre ela.
É cedo para eu dizer que estou morrendo de saudades do
meu bebê Lucca?

“— Eu sou uma princesinha muito safadinha, sabia? Meu


marido é mais velho e não aguenta mais apagar meu fogo
constante. Eu sou novinha, cheia de energia. Louca para
conhecer coisas diferenciadas e encontrar alguém que consiga
durar mais do que cinco minutos. Que tal irmos conhecer
alguns cantos desse lugar? Eu gosto da sensação de poder ser
pega fodendo... é um fetiche.”
Puta merda, Melinda! Essas palavras não saem da porra da
minha mente!
— Não sei não. Esse seu plano aí vai dar merda — digo, ao
ouvir a grande ideia de Lucca. — Você tem que entender que fomos
nós que pagamos alguns idiotas para irem até elas. Essa merda não
foi ideia delas. A culpa é de Heitor.
— Só minha? — Heitor pergunta revoltado. — Eu dei a ideia,
vocês a seguiram porque quiseram. Não tem nenhum menor de 30
anos aqui. Ops, tem sim, o garoto açucarado, novinho sensação
com todo seu poder de sedução, repleto de sexy appeal.
— Acredito que a queixa da sua esposa em relação ao seu
desempenho deva ser porque é gay e não sente mais atração por
mulheres — Nicolas diz. — Respeito seus gostos, mas sou hétero.
— O único aqui que curte as paradas diferenciadas é Joseph,
que gosta de tudão! O rei do ménage! — Heitor provoca, e a
gargalhada é geral. — Tudão é total flex!
— Sou sim. Quer ver? — Joseph responde, ficando de pé.
— Ok, crianças, é hora de acalmar os ânimos — Davi diz,
empurrando-o novamente para o lugar. — Já tomamos no cu essa
noite, é o momento de seguir a ideia de Lucca. É sempre bom lidar
com mulheres nervosas. Ao menos eu gosto muito de Luma
nervosa, ela fica uma...
— Não termine a frase se quiser manter seus dentes inteiros!
— ameaço.
— Às vezes agradeço a Deus por ser filho único e ter uma
família pequena — Nicolas comenta rindo. — Bom, se vamos
mesmo manter o plano, acho melhor irmos dormir. Teremos que
acordar cedo.
— De acordo — concordo, ficando de pé.
Ficamos mais alguns minutos do deck e então seguimos para
dormir.
Eu durmo em uma suíte que possui duas camas de solteiro.
Por algum motivo, ninguém a ocupa.
Uma e meia da manhã meu celular vibra. Desbloqueio a tela
e uma foto da minha esposa surge: Eu me pego como um completo
idiota analisando cada pedacinho da perfeição. A coisa mais incrível
é o narizinho empinado. Eu deveria estar puto! É isso! Melinda não
merece minha admiração.
Mas puta merda...
É muito princesinha da Disney.
— QUEM TIROU ESSE CARALHO DE FOTO? — Mando
gentilmente essa mensagem como resposta.
— Um homem qualquer na rua, Victor Albuquerque! Não
acredito que está me perguntando isso!
— Ok Melinda, a questão aqui é o seguinte, que diabos você
pensa que está fazendo da sua vida?
— Nesse momento estou pensando em como queria te dar,
meu amor. Está quente aqui... — ela responde, e envia uma foto de
agora. E PUTA MERDA, MELIDINHA! Ela está com uma blusinha
branca curta, que mostra a barriga, um shortinho jeans curto, sua
bunda empinada... Minha Santa Josefina! Isso acaba com um
marido desesperado.
— Aoooo... — Não consigo digitar mais nada. Estou quase
perdendo a dignidade de tão duro. Por que diabos me casei com
uma ninfeta quente?
Meu telefone toca e eu atendo até respirando com
dificuldade.
— Senhora da Glória, Melinda, que diabos você quer me
atentar agora?
— Vamos fugir?
— O quê? — pergunto, saltando da cama quase no
desespero. Fugir nunca pareceu tão tentador.
— Vamos nos encontrar para foder? Ninguém precisa saber.
— Não sei se deveríamos — digo, já caçando uma camisa.
Se essa mulher falar que eu preciso pular de um penhasco para
comê-la, eu pulo.
— Sugar Daddy, por favor. Sei que fui uma menina malvada
nas últimas semanas, você pode me castigar se quiser, mas... só
vem... por favorzinho.
— Não estou interessado, Melinda. Mas, onde seria esse
encontro? — pergunto, procurando meu chinelo.
— Aqui na casa em que estou hospedada. Há um quarto de
empregada na área da piscina, podemos nos encontrar lá, ou onde
quer que você queira. Eu faço qualquer coisa que você quiser,
Sugar Daddy.
— Me espere na porta da casa em quinze minutos. Eu vou
esbofetear sua bunda e depois te foder, Melinda. Vamos ver se eu
consigo ou não apagar seu fogo! — Encerro a ligação e saio
disposto a provar alguns pontos para a minha princesa safadinha.
Em doze minutos estou diante do portão da entrada da
enorme mansão onde as garotas estão. Pontualmente, quando o
ponteiro marca quinze minutos, Melinda surge com o sorriso de
quem sabe que me tem muito fácil em suas mãos.
Dou um sorriso de lado e a puxo pela camisa, fazendo com
que seu corpo delicioso colida com o meu.
— Olá, princesinha da Disney.
— Que pegada, Sugar Daddy! Você é o melhor na arte de me
pegar e me foder.
— Porque eu sou o único que já pegou e fodeu você, meu
amor — digo, cheirando seu pescoço. Esse próprio perfume natural
é como um afrodisíaco. Eu sou louco pelo cheiro da minha mulher.
— Não é tão o único assim, você sabe...
— Não venha me comparar com o moleque de dezessete
anos que nem mesmo foi capaz de romper seu hímen, Melinda —
repreendo, e logo em seguida sorrio. — Vim comer você.
— Arrepiei até os pelos que não tenho, Sugar Daddy —
sussurra em meu ouvido, e deixa uma leve mordida em minha
orelha. — Você me vai me foder e então irá embora, nada terá
acontecido entre nós.
— Vou deixá-la dolorida, princesinha. Suas amiguinhas vão
reparar, elas vão saber que eu meti em você...
— Victor, apenas pare de falar — pede afetada. Eu paro a
puxando para um beijo que a faz gemer alto. Amo pegá-la assim,
forte. Amo ainda mais vê-la necessitada.
Enquanto uma mão está firmemente em torno de sua cintura,
mantendo-a presa contra mim, a outra começa a fazer uma
exploração seguindo diretamente para um de seus seios incríveis.
— Deus... — ela geme em minha boca, assim que fecho
minha mão em torno de seu seio, por cima da camisa. Sinto seu
mamilo rijo na palma da minha mão e a beijo com mais fome. Suas
mãos me empurram, fazendo com que eu afaste nossos lábios. —
Me tire daqui...
— Nos meus termos.
— Quais os seus termos? — pergunta ofegante. — Senhor
da Glória! Você me tem louca demais, desesperada por você. —
Sorrio vendo seu desespero. — Eu aceito qualquer coisa.
— Não vou arriscar o quarto de empregadas. Não sei se há
alguma armação nisso aí.
— Você acha que estou armando? — pergunta, com tom de
indignação.
— Tenho dúvidas e não estou disposto a discutir. Eu quero
você e vou passar por cima de qualquer merda de armação, estou
no meu limite — afirmo. — Você vai até seu quarto, vai pegar seu
RG, e vai voltar aqui para irmos para algum lugar que seja seguro.
Ela não está feliz quando sai pisando duro rumo ao interior da
casa, mas, o que posso fazer? Desde que se juntou nessa ideia
louca de despedida de solteiro, Melinda se tornou perigosa o
bastante para eu não confiar em suas ações.
Ela demora o bastante para eu achar que desistiu. Estou
quase invadindo a casa quando ela surge para acabar com a minha
vida.
— Puta merda, Melinda! Eu me pergunto todos os dias em
que eu estava com a cabeça de me casar com você! — exclamo,
quando ela joga uma bolsinha pequena sobre mim e sai andando,
agora vestindo a maldição de um vestido decotado e curto.
— Estava com a cabeça entre as minhas pernas, Victor! No
primeiro contato da sua boca com a minha buceta, você caiu de
amores lá naquela ilha. Pode assumir! Foi amor à primeira lambida.
Veja só, estamos casados e temos dois filhos incríveis! Seu amor
por mim é inquestionável, Sugar Daddy. Você é louco por mim,
principalmente porque sou uma ninfetinha safada.
— Você está me testando no meio da rua! Deveria estar ao
meu lado, de mãos dadas comigo, e não andando feito uma louca
na minha frente. Sua bunda é meu templo no mundo! E eu não sou
louco por você por ser uma ninfetinha safada.
— Não?
— Não mesmo. Isso é apenas parte do bônus, você é a
garota mais incrivelmente foda que já conheci em toda a minha
existência. — Ela se vira sorridente e se joga em meus braços.
— Eu te amo imensamente. Você é o amor da minha vida
inteira, Sugar Daddy.
— Se não fossemos casados eu te pediria em casamento
novamente, princesa. Eu amo você e os nossos filhos acima de
todas as coisas do mundo. — Ela começa a chorar enquanto sorri, e
eu me pergunto em qual momento resolvi ficar romântico demais.
Era para estar virado no mestre da foda selvagem, mas estou
agindo mais como um príncipe encantado.
— Ok, Sugar Daddy — ela diz, limpando as lágrimas. —
Precisamos ficar safados novamente. Acho que deveríamos beber
uma cachaça em algum bar. Certamente deve haver algo aberto.
— Não preciso de bebida para ficar safado, Melinda. — Ela
sorri, segura minha mão e sai me puxando feito louca pelas ruas de
Búzios. Aqui tem é lugar para foder viu, não queria falar não... é
cada canto escuro que benza Deus!
Encontramos um posto de conveniência aberto e Melinda me
faz comprar bebidas e um pirulito. Inocente, eu compro.
Ao invés de irmos para um maldito hotel, ela cisma de passar
na areia da praia da armação. Escuro o bastante para termos o
mínimo de privacidade, decidimos nos sentar na areia e ficar
bebendo as cervejas que compramos. Às vezes me pego pensando
se existe casal mais aleatório que nós dois. Nossas ideias dão um
giro que nem nós mesmos somos capazes de entender, mas tudo
bem.
Tudo vai bem até ela abrir o maldito pirulito e começar a
chupá-lo. Eu até erro o caminho da minha boca e levo a cerveja ao
queixo.
— Vocês armaram para aqueles caras chegarem em nós,
não foi? — pergunta, chupando o pirulito.
— Heitor teve essa ideia.
— Seria interessante dizer que o cara que estava dançando
com a Dandara não fazia parte da lista de pagamentos de vocês. —
Arregalo os olhos. — Ela disse muitas pornografias para ele e o cara
ficou desesperado.
— Mas ela está bem? Está segura?
— Sim, ela está. Apenas passando mal, exagerou na bebida
— explica sorrindo. — Sei que vão armar alguma na próxima noite.
— Provavelmente.
— Por quê?
— Não posso dizer pelos outros, posso dizer por mim. Você é
minha esposa, e a ideia de tê-la sozinha sendo cobiçada em
qualquer maldito lugar não me agrada. Confio em você, mas não
confio em qualquer outro homem perto de você. Eu sei o que pensei
quando te vi pela primeira vez, sei o que se passa na mente
masculina, Melinda.
— Você quis me foder?
— Tentei não querer, mas minha mente me levou para isso —
confesso, e ela sorri, vindo até mim e montando em minhas pernas.
— Você tem um rosto de anjo e um corpo que deixa um homem de
joelhos, Melinda.
— Eu deixo você de joelhos?
— O tempo inteiro.
— Deixo você duro? — pergunta, se esfregando em minha
protuberância.
— Extremamente.
— Eu testo muito os seus limites?
— Excessivamente — digo, observando-a chupar o bendito
pirulito. Ela tem o dom de fazer com que eu me sinta pervertido.
De repente, ela simplesmente joga o pirulito longe e dá um
sorriso perfeito de quem vai aprontar. E apronta quando reivindica
minha boca violentamente.
Deixo a garrafinha de cerveja cair da minha mão e mergulho
de cabeça em minha mulher, esquecendo-me até mesmo de onde
estamos. Melinda abre a minha bermuda e sua mão esperta captura
meu pau por dentro da cueca. Quando ela o toca, eu perco o resto
da racionalidade que possuía e invado o vestido dela. Afasto sua
calcinha para o lado e toco seu clitóris inchadinho.
— Você está molhada para mim, princesinha — elogio, e ela
me faz sorrir quando pega o controle da situação para si. Sou
obrigado a tapar sua boca quando ela desliza sua buceta em meu
pau lentamente. Eu nunca vou me cansar de dizer o quão apertada
e gostosa Melinda é. A sensação de estar dentro dela é sempre a
mesma: avassaladora.
— Ai meu útero... — diz, ainda com minha mão cobrindo sua
boca. A solto porque preciso beijá-la, tocá-la, fodê-la. Eu precisava
da minha mulher, precisava senti-la após um longo período de
guerra que travamos. Nada está saindo como eu planejei, mas o
tesão está sobressaindo e ganhando a melhor. É tão malditamente
gostoso transar quando estamos explodindo de necessidade após
um longo período de abstinência.
Melinda prova estar em pleno acordo com os meus
pensamentos. Ela se move tão bem sobre meu corpo, se esfrega
tanto em busca do próprio prazer, que é necessário usar toda minha
força de vontade para não gozar.
Levo uma mão entre seus cabelos e beijo seu pescoço
enquanto ela rebola sobre mim de uma maneira alucinante.
Quando está perto de gozar, ela começa a gemer e eu mal
posso controlá-la. Ela me arranha, abraça meu pescoço e quase me
sufoca entre seus seios, tornando-se insana pra caralho. Tão insana
que eu deixo de me segurar e acabo gozando junto com ela.
— Essa foi a melhor rapidinha... — diz ofegante em meu
ouvido.
— Eu não estou nem um pouco satisfeito — confesso,
beijando o vão entre seus seios. — Quero você em uma cama,
beijar cada pedacinho do que me pertence, sem emoção, com muita
calma.
— Você está tão duro que nem parece ter gozado... — diz, se
remexendo provocativamente. — É tão gostoso. Tão bom... —
Aperto sua bunda e impulsiono um aumento dos seus movimentos.
Minha garota safada segue meus comandos e começa a me montar
com força. Ela joga sua cabeça para trás e tento capturar seus seios
que estão devidamente cobertos pelo vestido. As coisas
simplesmente voltam a esquentar, mas de uma maneira mais
intensa. Eu pondero deitá-la sobre essa areia e foder com vontade,
mas não faço. Seus sons retornam e eu retiro uma mão de sua
bunda apenas para puxá-la pelo pescoço e calar sua boca com a
minha.
Quando goza novamente, ela se afasta e solta um som que
faz minhas terminações nervosas atingirem um novo estado. Tudo
parece perfeito pra caralho, até uma luz de lanterna ser apontada
para nós. Eu consegui tirar meu pau de dentro da minha esposa e
guardá-lo dentro da cueca rapidamente.
Eu me odeio agora por ter perdido a noção e por fazê-la
enfrentar uma situação altamente constrangedora.
— De pé, os dois, por favor — um policial diz, e eu apenas
cuido de proteger Melinda. Me levanto a mantendo o mais longe dos
olhos dele. Ela fica atrás de mim e eu puxo seus braços para me
abraçar.
— Ok. Não foi um ato legal. Sou advogado, entendo que o
que acabei de fazer é atentado ao pudor, mas, por favor, apenas
não quero expor minha mulher a algo tão constrangedor —
argumento.
— Pensasse nisso antes. Se é mesmo advogado, deve ter
dinheiro para pagar um hotel ou motel, ou qualquer lugar privado
para fazer sexo — o babaca diz, mirando a lanterna atrás de mim.
— Solte-a. Quero o documento dos dois.
— Podemos resolver isso de maneira amigável? —
proponho.
— Não sou seu amigo.
— Me desculpe, é tudo minha culpa, eu não deveria... —
Melinda diz choramingando baixinho.
— Não é sua culpa, meu amor. É nossa culpa. Eu te amo.
O policial está cumprindo o papel dele, mas não deixa de ser
um babaca pela maneira como está falando. De qualquer forma, eu
e Melinda fazemos o que nos foi solicitado; nos afastamos e eu
entrego nossos documentos para conferência. Tudo vai muito bem
até ele chamar um outro policial para me revistar e ameaçar tocar
em minha esposa com o mesmo propósito. Ele provavelmente
achou que eu estava brincando sobre ser advogado e isso me faz
dar um único sorriso antes de enfiar a porrada nos dois desgraçados
que, mesmo armados, não são bons o suficiente para me deter.
Policiais ou não, ninguém toca em Melinda. Eu serei um homem
morto quando isso acontecer!

Embora esteja sendo uma fase divertida, não consigo evitar


de sentir saudades de Paula. Talvez isso pareça psicótico, porém,
principalmente desde quando ela se mudou para o meu
apartamento, me tornei altamente apegado à sua presença. Foram
dias de diversão, discussões engraçadas e quentes, mas agora que
estamos de fato na despedida de solteiro, há em mim um desgosto
por não tê-la em meus braços.
Resumindo: não consigo dormir e passo parte da noite
perambulando pelo iate.
Me assusto com meu celular tocando no meio da noite, e
mais ainda quando leio o nome de Victor na tela.
— Victor? — pergunto.
— Preciso que venha até à delegacia.
— O quê?
— Eu e Melinda fomos detidos, eu agredi dois policiais e me
trouxeram para cá. Preciso que venham, principalmente se for
precisar de grana, não tenho o suficiente aqui. — Isso poderia ser
alguma piada, mas não é. Ele acaba de dizer que bateu em dois
policiais e está em uma delegacia? — Ligue para Paula também, ela
é advogada e... foda-se, apenas venha, ok?
— Por que está acordado a essa hora? — Joseph surge
questionando.
— Victor acaba de me ligar.
— Ele não está dormindo?
— Victor e Melinda estão detidos em uma delegacia —
comunico, passando as mãos pelos cabelos.
— Como? — Joseph parece tão perplexo quanto eu.
— Por que tudo nessa família tem que ser tão louco? —
pergunto, quase rindo de desespero. — Enfim, eu preciso ir. Não
vou dizer nada ao meu pai para não preocupá-lo.
— Vou com você, espere só eu vestir uma camisa. —
Balanço a cabeça afirmativamente e ligo para Paula. Ela atende
rápido demais.
— Não consigo dormir sem você — choraminga.
— Nem eu consigo dormir sem você, Diabinha. Porém, agora
estamos com problemas.
— O que houve? — pergunta apreensiva.
— Victor e Melinda estão detidos na delegacia. Precisamos ir
até lá.
— Traidores! Fugiram de nós! — ela exclama. — Ok, vou me
trocar, porém, preciso que me busque. Não vou sair sozinha esse
horário.
— É claro que não, em dez minutinhos passo aí.
— Óbvio que você sabe onde é a casa. — Sarcasmo não
combina com ela.
Encerro a ligação e vou até a suíte pegar minha carteira.
Em poucos minutos eu e Joseph estamos pegando minha
Diabinha, Milena e Dandara. Há aqui advogados, delegada e juíza,
chega a ser engraçado.
— A tropa de elite! — digo, puxando Paula para os meus
braços. — Aooo Paula, Jacinta minha saudade de você, Diabinha,
meu amor, minha vida — brinco, cheirando seu pescoço. — Estou
puto com você num grau... — A solto ao me lembrar da merda que
ela disse horas atrás.
— Ninguém mandou pagar um idiota para chegar em mim.
Agora sua reputação de fodedor está abalada.
— Você sabe que não. — Sorrio, abaixando para dar um
beijo em meu bebê em seu ventre. — Olá, sadbebê! Papai está com
saudades!
— Não é o momento de discutirem a relação, Lucca —
Joseph me repreende. — Vamos?
— Só Victor mesmo para atrapalhar meu sono de beleza! —
Dandara diz. — Sem contar que ainda estou bêbada!
— Victor ligou para você? — pergunto rindo.
— Sim. Ser juíza às vezes é um pé no saco, sabia? Vamos
salvar o cidadão.
Seguimos para a delegacia andando. Bom de Búzios é que é
quase tudo perto.
Quando chegamos há um leve alvoroço na porta. Logo de
cara já encontro dois policiais com ferimentos no rosto. Eu não
quero imaginar o que levou Victor a fazer isso. Victor e Melinda
estão sentados em frente ao delegado.
— Chegaram! — meu irmão anuncia, ficando de pé. — Posso
ao menos conversar em privacidade com os meus advogados?
— Olha só, eu não estou com tempo ou disposição para estar
aqui — Dandara anuncia, pegando seu distintivo de juíza. —
Desprazer, Dandara Farai. Juíza criminalista no fórum da Barra do
Rio de Janeiro. — Ela se apresenta ao delegado e ele parece ficar
tonto. — Vamos direto ao ponto, Victor? Você já me explicou parte
por telefone, já expliquei à Paula, sua representante nessa linda
madrugada. — Dandara dá um sorrio nada amigável e volta o olhar
ao delegado. — Bom, senhor delegado, inicialmente, apenas para
começar, eu quero o mandato que foi expedido para que seus
policiais HOMENS revistassem uma mulher. Na verdade, EU EXIJO
ESSE MANDATO ANTES QUE SEJA NECESSÁRIO QUE EU FAÇA
UMA LIGAÇÃO.
— Meritíssima, Artigo 244 do código de processo penal — o
delegado argumenta, e eu olho para Melinda tentando entender
onde ela se encaixa nesse artigo.
— Ok, Artigo 244? — Paula pergunta sorridente. — Paula
Jacinta, advogada — ela se apresenta a ele. — Bom, vamos lá,
onde está a arma ou qualquer coisa que a torne suspeita de
cometer algum crime? Eles foram detidos pelo artigo 233 do código
Penal, até aí tudo bem, seus policiais estão cobertos de razão, é
terminante proibido fazer sexo em público. Atentado ao pudor. Eles
devem sim pagar por isso, mas, daí, seus policiais tentarem uma
abordagem pessoal a uma mulher que não possui qualquer outra
evidência para justificar tal abordagem, é abuso de poder e isso
também é crime, sem contar que esse ato colocou a minha cliente
em constrangimento, lembrando que a lei 4.898 /65 considera abuso
de autoridade "submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a
vexame ou a constrangimento não autorizado em lei".
EU VOU ME CASAR COM ESSA MULHER!
— Ela é boa, hein? — Joseph diz em meu ouvido.
— Por que acha que vou me casar com ela? Ela não é boa.
Ela é a melhor. — Sorrio orgulhoso.
— O senhor e seus policiais não estão lidando com
criminosos, muito pelo contrário. Até acho que vocês estão lidando
com as únicas pessoas que não deveriam ter que lidar. Mas, é claro,
não tem como saber que eles não são criminosos, vocês não os
conhecem. — Paula sorri. — Meus clientes cometerem um ato
ilegal, por mais que tenha sido em um local deserto e um horário em
que não havia mais pessoas na rua. Seus policiais, que portavam
toda a razão, a perderam após tentar a abordagem pessoal à
mulher que aqui se encontra, levando meu cliente a ter que fazer
uso da força para privar a esposa do constrangimento e do abuso.
Eu gostaria de saber qual o motivo levou seus policiais a terem a
brilhante ideia de tocarem em minha cliente. Por favor, há alguma
resposta plausível? Houve oposição da parte dos meus clientes
para acompanhá-los até a delegacia, sendo assim necessário o uso
da força? Tiveram qualquer relutância? — Paula questiona.
Porra, estou com uma ereção agora. Nunca tinha a visto em
"ação".
— Não senhora.
— Ótimo. Eu proponho um acordo — Paula anuncia. — Se
quiserem colocar um ponto final nessa história agora, seus policiais
esquecerão a agressão e o episódio de atentado ao pudor. Nós
iremos embora e nada disso terá acontecido — informa. — Agora,
caso queiram prosseguir, nós iremos entrar com uma ação referente
ao abuso de poder, assédio à minha cliente, entre outras coisas que
posso numerar sobre esse episódio. Lembrando que, uma vez que
houve a tentativa de tocar em minha cliente sem consentimento,
caracteriza como importunação sexual, Lei 13.718/2018. Sem contar
que a lei está do lado das mulheres, senhor. — O delegado olha
para os policiais feridos e balança a cabeça negativamente.
— Acordo aceito — diz.
— Meu trabalho aqui está feito — Paula anuncia. Victor
suspira aliviado e puxa Melinda para seus braços.
— Ninguém toca em você, meu amor. Nunca — ele diz.
— Desculpa por tudo que aprontei essa noite, Sugar Daddy.
— Melinda é o diabo mesmo. Mas, agora, eu simplesmente pego
minha advogata.
— Minha ereção te ama, Paula.
— Romântico. — Ela sorri. — Gastei meu Tico e Teco ao
máximo. Chego a estar tonta.
— Você foi brilhante ao extremo, Diabinha. Acho que agora,
após todos esses acontecimentos, você deveria mesmo abandonar
a despedida de solteira. — Ela sorri e beija a ponta do meu nariz
carinhosamente.
— Você acha isso, bebê Lucca?
— Acho, princesa. — Sorrio tocando em suas bochechas. —
Perfeita.
— Que pena que eu não acho! — diz, se afastando. — Vocês
vão pagar pela contratação de homens para nos cantar! Estou com
sangue nos olhos, Lucca Albuquerque.
— Que merda, Paula! — exclamo frustrado. — Tudo bem, só
não venha reclamar depois, ok?
— Reclamar de quê?
— Victor, vamos embora? Já resolvemos tudo — falo, sem
respondê-la.
Deixamos a delegacia e vamos todos andando.
— Paula, estou impactada com a sua defesa. É assim nos
tribunais? — Milena pergunta.
— Um pouco mais agressiva. Estou com um pouco de sono,
então precisei ser mais maleável — Diabinha responde sorrindo.
— Muito obrigada por isso. Victor tentou argumentar de todas
as maneiras, mas eles não estavam dispostos a ouvir, estavam
agressivos. Eles avançaram sobre mim para fazer uma revista
desnecessária, sendo que estava de vestido e minha bolsa estava
com Victor, já havia sido revistada. Foi assustador, mas Victor foi
rápido o bastante. Se não tivesse reagido, eles teriam me tocado —
Melinda explica.
— Esse é um tema que mexe muito comigo. Estou orgulhosa
e aliviada pelo fato de Victor ter conseguido protegê-la. É triste que
muitas outras mulheres não tenham essa sorte. Fico imaginando o
que esses idiotas já fizeram com outras garotas — Milena comenta.
— Há uma linha tênue entre querer, dever e poder.
— Não foi certo o que fizemos, mas não havia uma alma viva
na rua além de nós. Estávamos num local escuro, que parecia
seguro. Não justifica, eu sei. Agimos errado e deveríamos sim pagar
pela impulsividade, mas quando as coisas avançaram, eu tive medo.
Se eles fossem um pouco mais espertos, Victor poderia ter sido
baleado, ou qualquer coisa. Victor conseguiu desarmá-los —
explica. — Foi chocante e assustador.
— Está tudo bem agora, meu amor. Minha para eu proteger.
— Sua — Melinda concorda sorrindo.
— Minha, para eu foder — sussurro no ouvido de Paula,
mesmo movido pelo ódio agora. — Estou te olhando, Paula, mesmo
de longe. Eu sigo seus passos, Diabinha. Minha para eu vigiar.
— Prefiro a primeira opção — ela diz, pegando minha mão e
entrelaçando nossos dedos.
— Pessoal, vou andar um pouco mais rápido, não estou me
sentindo bem — Dandara informa.
— Vou com você — Joseph anuncia.
— Se precisarem de qualquer coisa me ligue — aviso.
— Vou com eles — Milena anuncia os seguindo.
Ficamos eu, Victor, Melinda e Diabinha para trás. Vamos
andando mais devagar e noto Victor silencioso. Eu o conheço bem
para saber de todas as merdas que estão passando em sua
cabeça.
— Ei, vá com Melinda na frente. Victor precisa conversar —
digo à Paula, e ela faz o que pedi. — Esqueça isso.
— Não pensamos, foi no calor do momento. Eu jamais teria
exposto Melinda a uma situação constrangedora como essa.
— Todos sabemos disso, Victor. Ficar alimentando esse
acontecimento em sua mente não vai ajudar em nada. Vocês
erraram, mas quem nunca errou? Eu, por exemplo, já fiz sexo no
carro centenas de vezes, tenho certeza de que você e Melinda
fizeram também. As pessoas estão constantemente fazendo isso,
logo, estão correndo os mesmos riscos. No carro, na praia, não
importa, sexo em público é atentado ao pudor. Aconteceu, agora é
vida que segue. Esqueça isso. Melinda está bem, você fez seu
papel de marido e a protegeu.
— Fiquei cego quando vi o policial tentando tocá-la. Você não
faz ideia do que senti, Lucca. Eu quis matá-los, nem sabia que era
tão forte. Parecia um filme de luta, enquanto eu socava um, chutava
o outro. Eu não sou esse cara.
— Ninguém é, até que seja necessário defender uma mulher
— digo, abraçando-o. — Fez certo em protegê-la, Victor. Não se
cobre por isso.
— Já se assustou com os próprios sentimentos? — pergunta
pensativo.
— Algumas vezes.
— Eu mataria por Melinda, ela é o sentido de tudo.
— Paula é o motivo, compreendo você — digo, vendo nossas
garotas andando a alguns metros à frente. — Não quero deixá-la.
— Mas elas estão unidas para o dia de hoje. Acredite, eu
tentei convencer Melinda a abandonar essa merda.
— Ao menos isso vai distrai-la — comento. — Isso tudo é
uma brincadeira para você também?
— Sim — confirma. — O que não fazemos para proporcionar
um pouco de diversão para as nossas mulheres? Aceitamos até
uma merda de despedida de solteira. Se elas estão felizes, nós
também estamos, não é isso?
— Paula merece essa diversão. A rotina dela com Henrico é
pesada, cara. Agora, vivendo sob o mesmo teto, eu simplesmente
tenho a certeza de que ela é a própria Mulher-Maravilha. O que ela
suporta sorrindo, eu não suportaria chorando — confesso.
— Suportaria sim, você é uma das pessoas mais fortes que
conheço, Lucca. Acho que ser forte é um pré-requisito para ser filho
de Victória Brandão e Matheus — Victor diz sorrindo.
— Nossos pais são inspiradores, realmente. Porém, não acho
que tenho cinquenta por cento da força dos dois — comento. —
Essa viagem está sendo um descanso merecido para Paula. Por
mais possessivo que eu seja, compreendo que ela precisa disso e
espero que faça com mais frequência. Estou feliz por ver todas tão
unidas, tão amigas. Faltava isso para eu ser completamente feliz.
— Está falando de Dandara e Paula?
— Dandara é a mãe do meu filho, por mais que nossa
relação tenha sido catastrófica, priorizo um bom relacionamento
pelo nosso filho. Tive medo de que nossa relação fosse ruim, nunca
imaginei que um dia teria um filho e não seria casado com a mãe
dele. Temia a relação dela com a Paula, e o que um mal
relacionamento acarretaria em relação à Samuel. Ver as duas sendo
amigas, é incrível, cara. Meu filho está feliz, nos tornamos uma
grande família, até mesmo Nicolas. Acredito muito que Samuel
nunca vá se sentir deslocado pelo fato da mãe e o pai não serem
mais um casal. Somos amigos, estaremos sempre juntos. Eu não
saberia conduzir essa situação se fosse de maneira diferente.
— Maturidade, irmão. Por mais loucas que elas demonstrem
ser, a seriedade surge quando realmente necessária, assim como
acontece conosco. Há sempre muita brincadeira e drama, mas há
muita maturidade para lidar com situações que exigem isso. Por fim,
salvaram-se todos.
— Graças a Deus! — exclamo sorrindo. — Nunca imaginei
que seria feliz novamente.
— Paula é o motivo.
— Paula é — confirmo, observando-a. — Chega de
seriedade agora. Lembre-se, temos um plano para o dia de hoje.
Precisamos dormir um pouco.
— Acho que acabaremos na delegacia outra vez.
— Espero que seja outro delegado e outros policiais —
brinco, e chegamos em frente à casa das bonitinhas.
— É... — Victor diz à Melinda.
— Também acho — ela responde, enquanto eu e Paula os
encaramos sem compreender o diálogo insano.
— Concorda?
— Sim.
— Pois é.
— Com certeza.
— Sempre foi.
— Não é?
— Absolutamente.
— Absolutamente?
— Não acha?
— Ok, buguei, bebê Lucca! — Diabinha diz, me
abraçando. — Eu te amo.
— Também amo você, demais. Se cuide e não apronte muito,
Paula.
— Também estou de olho em você, Lucca. — Ela pisca um
olho e eu a puxo para um beijo. — O melhor beijo do universo.
— Eu sou bom em beijar outras partes do corpo também.
Ansioso pela lua de mel.
— Não me contou o destino ainda.
— Praia de nudismo — informo brincando. — Vou embora,
Diabinha. Te pego mais tarde.
— Nem tente! É a minha despedida de solteiro.
— Meu pau, Paula!

Eu e Victor vamos dormir...


A alegria vem pela manhã...
Ao menos para alguns.
Meu Deus do céu! Sabe quando você percebe que faz parte
de um grupo privilegiado de pessoas? Me sinto exatamente assim,
como se tivesse tirado a sorte grande nessa vida. Há um festival de
homens absurdamente lindos na praia, e, por pura coincidência, um
deles é comprometido comigo e os demais são comprometidos com
as mulheres que estão ao meu lado. É impactante ver todos juntos,
e é revoltante a atenção que eles estão chamando.
Como não sou idiota, meu foco fica em torno do meu noivo.
Ele com seu jeitinho menino/homem/moleque é um perigo. Os
benditos estão em torno de duas mesas altas de madeira que foram
colocadas na areia exclusivamente para eles. Estão conversando e
rindo, enquanto observamos de longe, como verdadeiras espiãs. Até
as meninas que não iriam vir estão aqui, portando da mesma raiva
que eu.
— Todos eles juntos... misericórdia... parece um crime,
deveria se enquadrar como atentado ao pudor — comento.
— Posso dizer algo com todo respeito? — Lari pede, e sei
que vem merda.
— Sim. — Ela sorri com a resposta.
— Se eles fossem solteiros, eu faria um gang bang fácil
demais. Abriria as pernas e diria: faz a fila e vem! Olhem para todos
eles! Com todo respeito mesmo, de coração.
Não a repreendo, é muita testosterona e beleza junta. Porém,
contínuo não gostando da atenção que eles estão recebendo,
principalmente quando vejo um trio de garotas se aproximarem
deles. Uma delas vai diretamente em Lucca, e ele, educado que é,
acaba dando atenção. Por um momento eu me arrependo de ter
persistido nessa despedida de solteira, porque não gosto da
maneira como o ciúme me transforma.
Já disse isso algumas vezes, mas eu sempre repito; não
costumava ser uma mulher ciumenta antes de conhecer Lucca. Na
verdade, sempre fui confiante o bastante. E, embora eu ache um
pouco normal sentir ciúmes, eu também penso que esse sentimento
não combina muito com uma mulher cem por cento segura.
Acontece que até minha segurança falha um pouco quando o
assunto é o meu noivo. Lucca é aquele cara que surgiu para abalar
meu mundo, pôr em prova as minhas convicções, e mais uma série
de fatores.
Pelo fato de o ciúme ser uma zona desconhecida para mim,
não sei muito bem lidar com ele. Opto pelo silêncio, buscando me
manter devidamente calma. Não importa que ele esteja dando
atenção à garota, há uma aliança em seu dedo e ele me ama, é
nisso que devo focar. Porém... eu sinto um leve tremor quando as
três garotas se juntam frente ao mar e meu noivo vai fotografá-las.
— Eu estou vendo certo? — pergunto em um tom que
certamente assusta as garotas.
— Calma. Vai ver elas só queriam um fotografo mesmo —
Melinda diz, quase roendo as unhas. — Meu Deus, é uma puta
mentira. Não há como ser plena quando estamos no olho do
furacão. Que diabos!
Tudo piora muito quando mais mulheres começam a se
aproximar.
— Eu não estou vendo isso não! — digo. — Definitivamente!
Meu Deus do céu!
— Respire — Dandara diz com tranquilidade. — Eu tenho
uma arma. — Todas nós olhamos para ela assustadas. — O quê?
Vocês acham que vou atirar nas meninas? — A gargalhada dela é
alta, e eu começo a rir também, de nervoso. — Não mato nem uma
barata queridas, mas existe um tipo de tiro que se chama "espanta
galinha". Imagina, surge uma mulher dando tiro para o alto como
louca, vai voar pena para todo lado. Rapidinho elas encontram o
lugar delas.
— Você veio armada? — pergunto.
— Você não? — ela pergunta de volta, e eu não respondo.
Não sei dizer quem é mais louca.
Agora as três continuam conversando com Lucca e, quando
uma delas toca o braço dele, eu retiro a minha saída de praia, deixo
sobre a mesa, e ignoro as meninas tentando me impedir. Se
Dandara da tiros para o alto, eu vou na agressão física.
— Paula, você vai estragar a espionagem! — Ava esbraveja.
— Por via das dúvidas, eu estou sozinha. Mantenham-se aí
— aviso, caminhando rumo ao meu noivo.
Ele também vai pagar. Meu biquíni é indecente o bastante e
sei que posso atrair atenção tanto quanto ele, e é o que de fato
acontece. Há vários homens me encarando descaradamente
durante todo o trajeto. A melhor parte é quando Lucca me vê e
arregala os olhos, me avaliando da cabeça aos pés. Eu até escuto
os caras rindo, porque é digno de risadas mesmo. Só não me junto
a eles na gargalhada porque estou virada no ódio.
— Aooo... que caralho você está vestindo? — ele pergunta,
ignorando a existência das meninas.
— Biquíni, já ouviu falar? Igual o que as suas amigas estão
vestindo. — Sorrio. — A propósito, sou Paula, noiva dele — me
apresento às garotas, e saio puxando Lucca pela bermuda.
— Paula, eu não estou brincando agora.
— Eu tampouco estou! — aviso, levando-o até o canto da
praia, onde há algumas pedras.
— Calma.
— Calma? Percebe o que está fazendo? Você é idiota?

Minha mulher está o veneno puro!


— Calma.
— Não tem calma, Lucca. Primeiro contrata homens para me
cantar, depois fica de papo com mulheres. O que você está
pensando agora? — questiona revoltada.
— Estou pensando que você fica realmente linda quando
está ciumenta. Linda e assustadora.
— Você está falando sério?
— Você está grávida. Se estressar por bobeira é...
— Bobeira? Você gostou de ver homens tão próximos de mim
ontem? Você teria gostado se eles tivessem me tocado como aquela
garota tocou em você?
— Eu teria quebrado os dois braços de qualquer um que
ousasse — afirmo. — Você está linda pra caralho.
— Estou tão indignada, porque estou puta, estou falando
sério, e você está... você está... — Ela está tremendo, e eu me
arrependo por tê-la testado. — Pare de dizer coisas fofas quando
estou brava — diz, distribuindo socos em meu peito e eu a pego em
meus braços para levá-la a um passeio. — Onde está me levando?
— Em um lugar.
— Lucca, me coloque no chão! — Ela está brava, e eu estou
achando engraçado.
— Eu paguei aquelas garotas, eu sabia exatamente onde
vocês estavam. Agora pare de brigar à toa. Estou fugindo com você
se não percebeu. Nem os caras sabem disso.
— O quê?
— Shiu, Paula! — A carrego até um carro que está nos
aguardando e ela entra a contra gosto. É bonitinho quando ela cruza
os braços no peito e faz um bico. O motorista começa a dirigir e ela
gruda a testa no vidro do carro, vai assim durante todo trajeto.
Quando chegamos, sou obrigado a puxá-la do carro e
carregá-la até o helicóptero que está nos esperando.
— Lucca, aonde estamos indo? Não tenho roupas,
documentos, nada...
— Terá tudo o que precisa lá — digo, prendendo o cinto em
torno dela e colocando o fone contra ruídos. Me ajeito, e logo
estamos levantando voo.
— Que lindo! — elogia, mais calma. — Eu nunca havia
sobrevoado Búzios.
— Nem eu... — digo, e ela olha para mim. — Mais calma?
— Não sei — responde com sinceridade, e segura minha
mão. Eu a levo até meus lábios e deposito um beijo casto. De
repente, nada mais importa, apenas esse momento.
A viagem é curta e logo estamos pousando em heliporto onde
pegamos uma lancha pequena para irmos até a casa. Paula agora
parece radiante, principalmente por estarmos a sós e ser eu a
conduzir a lancha. Eu paro diante de uma casa e ela me encara com
um olhar cheio de perguntas.
— É nossa — digo, me aproximando dela assim que termino
de fazer os procedimentos de ancoragem.
— O quê?
— Essa casa. Ela é nossa — afirmo, pulando da lancha e a
ajudando a descer.
— Você a alugou para passarmos o dia? — pergunta,
enquanto caminhamos rumo a entrada, onde nossas malas estão.
— Não, eu a comprei para passarmos muitos outros
momentos como esse. — Essa casa é um sonho e eu quero viver
esse sonho com Paula, Samuel, Henrico e toda a nossa família.
— Eu... — ela diz com os olhos cheios de lágrimas, e se vira
para observar a parte interna da sala. — Isso é demais...
— Há duas casas nessa Ilha, eram do mesmo dono. Ele faliu,
colocou à venda por um preço realmente imperdível. Eu e Victor
compramos — explico. — Essa é a nossa casa. Do outro lado da
ilha é a casa de Victor. Os terrenos se interligam e há uma capela
absurdamente perfeita entre eles. Podemos ir de uma casa para
outra andando, há parquinho para as crianças, piscina privativa e
piscina para uso das duas casas, além de pequenas praias
privativas em torno da ilha. Samuel é um peixinho e Henrico ama
praia, porém, ele sempre se assusta com o excesso de pessoas,
então eu me peguei pensando em um lugar onde ele pudesse se
sentir livre, seguro de todas as coisas que o assustam e pudesse
aproveitar junto com as demais crianças...
— Lucca...
— E tive um monte de outros pensamentos; pensei na
qualidade de vida dos nossos filhos, de Samuel, Henrico, e todos os
outros que tivermos. Pensei que seria ideal ter duas ilhas da
felicidade; uma em Ilha Grande e uma em Búzios; Região dos Lagos
e Costa verde, para variar. Pensei, inclusive, que seria fantástico
viver grandes momentos nesse lugar com a mulher que é o motivo
de eu sorrir hoje, a mulher que mudou toda a minha vida, que me
deu o filho dela de presente, está gerando um filho nosso e trata
meu filho como se tivesse nascido dela.
— Eu não mereço você — ela fala chorando, e se ajoelhando
ao chão. Isso assusta a merda fora de mim, e eu me sento ao chão
para poder pegá-la.
— Não faça isso comigo, pelo amor de Deus. Eu só quero
fazê-la feliz, não quero que chore. Meu coração não aguenta isso.
— Eu fui uma garota tão sonhadora... eu sonhava com um
príncipe encantado, sabe? Acreditava que um dia ele surgiria
montado em um cavalo branco e me mostraria o verdadeiro amor,
mas isso nunca aconteceu, Lucca. Conforme eu fui crescendo, fui
me decepcionando a cada experiência — ela diz limpando as
lágrimas, dando um sorriso fraco e balançando a cabeça
negativamente. — Eu conheci Pablo... e me apaixonei por ele. Ele
tinha uma lábia, um poder de fazer as pessoas acreditarem em cada
uma das suas palavras, e eu caí no conto do falso príncipe. Me
envolvi cada vez mais, engravidei e ele resolveu mostrar de fato
quem era quando eu me sentia mais vulnerável. Logo no início da
gravidez ele começou a ser grosseiro, a exigir mais do que eu
poderia dar naquele momento, a ser impaciente com os meus
enjoos e minha indisposição. Meus sonhos foram ruindo, Lucca, e
talvez você não entenda, mas uma mãe certamente me entenderia.
Tudo começou a ruir, mas eu tinha esperança de que quando nosso
filho nascesse ele mudaria. E pareceu mudar, até Henrico ser
diagnosticado com autismo.
"Pablo queria um garoto que pudesse ser transformado por
ele; um macho, como costumava dizer. Queria jogar bola, exibir o
estilo do filho. E, quando ele descobriu sobre o autismo, foi tão
decepcionante, como se Henrico possuísse algum tipo de doença
contagiosa e vergonhosa. E, eu ainda tentei relevar, passei a
acreditar que o casamento ajudaria. Além de lidar com todas as
questões de Henrico sozinha na maior parte do tempo porque eu
tinha vergonha e medo de sobrecarregar meus pais, ainda passei
pela humilhação de ter sido largada no altar de uma igreja que
estava lotada de pessoas. Aquilo doeu, Lucca, mesmo que eu tenha
me mantido forte diante de todos, tenha ido à festa do meu
casamento fracassado, aquilo doeu. Enquanto eu estava no avião
indo para Las Vegas, eu finalmente me dei conta de que Pablo havia
destruído todos os meus sonhos, todos os sonhos que eu carregava
comigo desde a infância. E estava decidida a nunca mais me
entregar daquela maneira a qualquer pessoa. E, quando cheguei em
Las Vegas, encontrei você, simplesmente do nada."
— Só porque você já era minha antes de ser, bebê Paula.
— E eu acho que é exatamente isso, bebê Lucca. — Ela
sorri. — Construímos uma amizade lá. Tivemos sexo, mas tivemos
diversão também. O dia que sumiu e voltou trazendo a fantasia de
Henrico, foi o dia em que mais fiquei chocada na vida, nem ser
deixada no altar me chocou tanto. Mas, ali, você ainda era um
estranho e teve a capacidade de ser empático com o meu
desespero, além de ter feito um esforço absurdo para realizar o
desejo de uma criança que nem sequer conhecia. Eu acho que me
apaixonei por você naquele momento. Tentamos ser apenas amigos
por um tempo, mas...
— Mas não deu, porque ali, naquele saguão de hotel,
enquanto você esbraveja no telefone, foi amor à primeira vista,
Diabinha. Conviver com você naquele lugar foi uma experiência que
me salvou da porra toda em que eu estava mergulhado. Não minto
quando digo que você é o motivo. Se eu pudesse fazer o relógio
voltar, faria com que Pablo nunca tivesse tido a honra de possuir
você, faria com que Henrico fosse fruto do nosso amor, teria
acompanhado cada segundo do desenvolvimento dele, teria
segurado as suas mãos em todos os momentos mais difíceis.
Infelizmente eu não posso voltar o relógio, Paula, mas eu posso
realizar todos os seus sonhos de infância, posso segurar as mãos
de Henrico e acompanhar os passos firmes dele, posso estar aqui
quando ele sair correndo... porque isso vai acontecer. — Ela volta a
chorar. — Nosso menino vai sair correndo, Paula, porque ele é seu
filho, ele nasceu da mulher mais forte e incrível que já conheci. Ele é
perfeito como você, meu amor, e eu o amo como amo o meu filho, o
amo como se fosse o irmãozinho de Samuel. Eu não quero ouvi-la
nunca mais dizer que não merece. Isso faz parecer que eu sou
muito foda e que você não é nada. Paula, você é apenas TUDO,
meu amor. Você é o mundo do Henrico, você é o amor da minha
vida, você é advogada mais quente que já vi, é a nora perfeita para
os meus pais, a filha perfeita para os seus pais, a amiga mais legal,
a pessoa mais doce, a dona do sorriso mais lindo, a mãe mais cheia
de garra e amor, você é o universo inteiro em um coração que só
possui amor. Diga que você merece o melhor que eu posso dar a
você, Paula...
— Eu mereço.
— É isso, meu amor! Você merece muito ser feliz, e eu farei
tudo que estiver ao meu alcance porque você é o meu amor e por
gratidão por ter me salvado... você me salvou e me salva todos os
dias, e eu serei grato pelo resto da minha vida. É a minha Mulher-
Maravilha!
— Eu te amo, Lucca.
— Agora eu consegui fazer você desistir da despedida de
solteira? — Juro por Deus, parece que os olhos dela sugam as
lágrimas no mesmo segundo. Paula me lança um olhar que quase
me faz ficar de pé, então começa a me bater...
Eu disse que ia apanhar hoje.
— Você destruiu o momento! Tudo por conta da maldita
despedida de solteira, inferno! Lucca Albuquerque!
— Jacinta que foi verdadeiro tudo o que disse. Ao invés de
focar nas coisas bonitas, você focou logo no meu pedido?
Sinceramente, Paula, Jacinta a minha decepção! — falo, ficando de
pé e ela se levanta como uma velocista. Saio andando pela casa e
ela vem atrás...
— Por que está tão preocupado com a despedida de
solteira?
— Porque você vai se casar comigo amanhã na capela da
nossa casa de praia. — Me viro abruptamente fazendo com que ela
bata diretamente em meu peitoral. — Aceita se casar comigo
amanhã?
— Sim — ela diz, voltando a chorar e se joga em meus
braços. — Por favor, não me deixe no altar, ok?
— Puta merda, Paula...
— Eu te amo demais. Eu não saberia... não saberia continuar
sem você... eu te dei o meu coração e você trouxe de volta todos os
sonhos que eu havia perdido. Não me deixe no altar...
— Nunca, meu amor. Eu nunca vou deixá-la no altar ou em
qualquer outro lugar. Eu te amo.
Um dia inteiro de preguiça com a minha mulher é perfeito pra
caralho. Estamos o dia todo conversando, comendo, e fazendo
absolutamente nada mais que isso. Sem sexo, sem tensão, sem
preocupações, sem nada...
Eu e ela. Agora, deitados em uma rede, um de cada lado.
— Ei, mamãezinha. Me diga aí quando é que essa sua
barriga vai começar a crescer? — peço, observando-a sorrir.
— Dizem que na segunda gravidez a barriga cresce mais
rápido, mas não está acontecendo —explica, fazendo um biquinho e
voltando a sorrir. — Estou ansiosa!
— Eu não vejo a hora de vê-la bem barriguda.
— Você quer uma menininha, não é mesmo? — pergunta.
— Menino ou menina, eu vou amar incondicionalmente. Mas,
não vou mentir, gostaria que fosse uma menininha.
— Eu quero muito que seja uma menina. Muito — confessa,
deslizando as mãos pelas minhas panturrilhas. — Você já pensou
em nomes?
— Já. — Ela sorri. — E você?
— Não, sou péssima em escolher nomes. Qual a sua
sugestão?
— Yasmin. Estou pensando no apelido. — Paula dá uma
gargalhada que me faz sorrir junto.
— Deixe me adivinhar, senhor Lucca, Yaya?
— Você acertou, Paula. Jacinta a nossa conexão. Eu serei
muito apaixonado pela nossa Yaya.
— Eu amei esse nome. Amei muito, bebê Lucca. E se for um
menino? — pergunta.
— Primeiro eu preciso saber a listagem de nomes que você
já beijou. Não vou colocar o nome de um cara que beijou a sua boca
no nosso filho. — Mais uma gargalhada, e eu estou amando cada
uma delas.
— Você está falando sério?
— Muito sério — afirmo a minha mentira.
— Então nosso filho será sem nome. — Arregalo meus olhos
chocado. — Fui muito beijoqueira na adolescência — justifica,
sentando-se e me puxando. — Só beijo você agora, meu amor.
— Quer que eu diga obrigado?
— Não mesmo. Eu apenas queria ter te conhecido antes,
muito antes de tudo... — diz, me abraçando e deitando sua cabeça
em meu ombro.
— Ei, minha Diabinha, sinta como meu coração bate quando
você está em meus braços.
— Não apenas seu coração. Eu sinto outra coisa tendo
pulsações....
— Esse seu romantismo me deixa louco! Mas, sexo só
depois do casamento, Diabinha, independente do meu pau pulsar
de amor por você. — Ela se afasta para me encarar, olhos nos
olhos.
— Não se esqueça que é a minha despedida de solteira!
— Puta merda! Vamos ali fazer um sexo lento e suave,
Diabinha! Sem despedida de solteira para você! Agora, me deixe
propor algo. Que tal esquecermos despedida de solteiro,
esquecermos de tudo apenas por hoje? Nossa relação tem sido
muito... digamos que muito tumultuada. Está faltando um pouco de
tempo apenas para nós, Paula. As crianças estão inclusas nisso,
sempre estarão. Estou dizendo sobre todas as demais coisas. Acho
que precisamos focar mais em nós dois e em nossos filhos, estou
mesmo sentindo essa necessidade. É o momento de viver nossa
vida a 4 e meio.
— Eu acho isso muito perfeito.
— Eu acho que podemos esquecer esse negócio de sexo só
após o casamento...
— Acho que você nunca disse algo que fizesse tanto sentido
como isso. — Sorrio, a seguro em meus braços e fico de pé. Levo
minha mulher diretamente para o quarto, onde passamos grande
parte da noite fazendo amor lento e suave, como nunca fizemos
antes.
Durante a madrugada, não conseguimos dormir; ambos
tomados pela ansiedade. Parece que nós não estamos acreditando
que vamos mesmo nos casar. Todas as vezes que paro para fazer
um balanço da relação, fico um pouco chocado com a forma como
tudo aconteceu.
Tudo que eu vejo é que podemos ser considerados
resistentes. Nossa conexão é tão intensa e forte, que resistimos a
todas as provações sem nem mesmo balançarmos. Não apenas
resistentes, mas determinados a ficar juntos desde o início, é isso o
que somos. Nossa determinação foi mais forte que tudo, mais forte
que nós mesmos.
Não vou dizer que meus pensamentos não vacilaram, porque
de fato isso ocorreu. Quando Dandara voltou, eu acreditei que Paula
não iria aceitar ou iria vacilar. E ela, em meio a muitas dúvidas, não
desistiu de mim. Vencemos também a aproximação de Pablo, e logo
em seguida as tentativas de abuso. E seguimos vencendo um pouco
a cada dia. Posso dizer por mim que permanecerei determinado a
vencer qualquer obstáculo que surja ao lado da minha mulher. Eu
sei que eles vão surgir, acontece com todos, mas felizmente, Paula
me oferece um tipo de relacionamento que faz com que me sinta
seguro e tenha a convicção de que sempre estaremos juntos.
Somos muito maduros, e quando queremos, muito crianças
quando, isso é fantástico.
Agora, por exemplo, estou me sentindo muito maduro
enquanto a observo olhar o mar.
Tão maduro que me aproximo e a abraço por trás.
— Eu serei a noiva mais feia do universo — ela diz.
— Não existe essa possibilidade, acredite.
— Não estou com sono, o casamento será durante o dia,
estou ansiosa...
— Por que está ansiosa? Nos amamos, estou aqui com você,
não há o que temer. Há? — pergunto.
— Não há, você está certo, mas isso não impede que eu me
sinta ansiosa. Não consigo controlar, bebê Lucca. Vamos nos casar!
— Venha para cama comigo. Farei você dormir, Diabinha. —
Ela não reluta, me acompanha de volta para o quarto, se desfaz das
roupas e se acomoda ao meu lado. A abraço por trás e fico
mexendo em seus cabelos por um longo período, até perceber que
pegou no sono. Eu me rendo também, porém, na manhã seguinte,
acordo antes dela.

Quando saio do quarto, percebo que a casa já está cheia de


profissionais preparando tudo. Sinto que acordei diretamente no
olho do furacão.
— Papaiii!!! — Samuel surge correndo, e eu o pego em meus
braços.
— Ei, campeão! Estão todos aqui já?
— Sim.
— Precisamos ter uma conversa, hein?
— É seu casamento — ele responde sorrindo. — Mamãe me
disse.
— Você está feliz pelo casamento do papai?
— Simmm! — ele grita de maneira exagerada, e se força a
descer dos meus braços. Esse menino está diferenciado. Quando o
conheci era um anjinho, quietinho. Agora é um mini...
...Eu!
— Bom dia, meu filho, onde está a minha menina? — Minha
sogra surge sorridente em busca da minha Diabinha.
— Querida sogrinha, Paula não conseguiu dormir bem essa
noite. Estava ansiosa, e sei que medrosa também. Vamos deixá-la
descansar um pouco mais, ok?
— Mas ela precisa começar o dia de noiva.
— Ela é perfeita pra caralho, nem precisa desse tal dia de
noiva. Ela precisa dormir um pouco mais para acordar bem —
explico, abraçando-a. — Relaxa, sogrinha. Eu direi a ela que não
permiti que a acordassem.
— Espero que diga mesmo, ela ficará furiosa. — Sorrio. —
Obrigada por pensar em Henrico.
— Ele é meu filho, sempre irei pensar nele — digo,
bagunçando os cabelos dela. — Amo a sua filha, amo seu neto. Os
dois são muito meus, sogrinha. Agora, nada de chorar. Vamos tomar
uma cerveja?
— Você acabou de acordar, menino! — reprende.
— Só uma cervejinha, vamos lá!
Quando saio para a área da piscina, a primeira coisa que
noto é Maria Flor e Joseph discutindo sob o olhar de todos.
— O que houve? — pergunto à Heitor, que está filmando a
merda toda.
— Flor estava dançando num pole dance ontem, com alguns
homens.
— O quê?
— É exatamente isso. Sorte sua que raptou Paula, foi uma
jogada de mestre. Havia uma quantidade enorme de strippers na
boate — diz rindo. — Melissa, Isis e Maria Flor eram as piores
daquele lugar. Bruce não está falando com Isis, Melissa está
rastejando literalmente atrás de Arthurzinho e Maria Flor... ela é
mais agressiva na abordagem.
— Maravilha! E como será na hora do casamento? Meus
padrinhos estão brigados — pergunto.
— Tudo se ajeita, parceiro. Relaxa. Aliás, que casa, hein?
Padrão Joseph Vincenzo.
— É tudo nosso! — digo a ele. — Minha casa, sua casa.
— Lucca, pode vir aqui? — Ava me grita, ela está segurando
um enorme buquê de flores nas mãos.
— Ei. Onde está Théo?
— Ele vai sumir nessa ilha com Aurora, Luiz Miguel e Tiago!
Eu vou matá-los! — responde, carinhosa como sempre. — Ok,
houve problemas entre Dandara e Nicolas. Eles não virão no
casamento, mas Dandara enviou essas flores e uma carta para você
e Paula.
— O que houve?
— Lucca, não queira saber, ok? Não foque nos problemas
dos outros, ao menos hoje. Posso parecer insensível agora, mas
Dandara já teve todo suporte hoje, e é o seu casamento. Ela e
Nicolas logo vão se resolver. — Balanço a cabeça em compreensão
e pego as flores juntamente com a carta.
"Lucca e Paula,
a vida é feita de momentos; alguns bons, outros ruins. É
bonito ver como vocês são unidos para enfrentar todos os
momentos ruins e como aproveitam intensamente todos os
momentos bons. Acho que todos os casais deveriam ser como
vocês; deveriam permanecer juntos diante de todos os problemas.
Quanto mais convivo com os dois, mais percebo que ambos são
inspiradores, cada um ao seu modo. Eu não acreditava muito em
almas gêmeas, porém, vendo-os juntos, eu percebi que talvez isso
realmente exista. Não preciso desejar a felicidade, porque sei que
são e sempre serão imensamente felizes, mas desejo mesmo assim
para que possam continuar inspirando pessoas, contagiando a
todos com essa energia tão boa que emana dos dois.
Paula, você é a mulher feita para Lucca. É aquela que nunca
soltou a mão dele, nem nos momentos em que tudo parecia prestes
desmoronar. Serei eternamente grata por ter sido tão paciente,
compreensiva e amável quando tinha tudo para me odiar. Você
acolheu o meu filho com tanto amor, e acabou me acolhendo
também. Espero que saiba o quanto é parecida com Lucca, e o
quanto isso te torna FANTÁSTICA! Sua força, o seu amor, sua
garra... você é uma mulher inspiradora. Uma mulher que levanta
mulheres.
Lucca, você é o homem que Paula merece. Aquele que
sempre será a base que ela e Henrico precisam. É o ser humano
com o coração mais puro que eu já conheci e a pessoa que mais
serei eternamente grata. Você é tão incrível, possui tantas
qualidades, mas a maior delas é a capacidade de guardar todas as
suas dores no bolso para poder ajudar quem precisa. Sua bondade
desconhece limites. Obrigada por ser o pai do meu filho. Obrigada
por ser o meu grande amigo e por ter me ensinado tanto. Você é a
melhor pessoa que já conheci e sou muito feliz por Samuel tê-lo
com o porto seguro e super-herói.
A vida não é fácil, muito pelo contrário, mas sei que juntos
vocês vencerão todos os obstáculos que surgirem ao longo da
caminhada. E eu desejo que essa caminhada seja linda, regada de
momentos de tirar o fôlego. Que vocês sejam imensamente felizes e
continuem sendo inspiração. O amor de vocês é um amor especial
como poucos. Vocês são os motivos... um do outro.
Felicidades!
Dandara Farai."
Estou emocionado quando termino de ler. Não teria como ser
diferente.
— Eu queria que ela e o garoto de açúcar estivessem aqui —
digo a Ava, limpando meus olhos. — Eles vão ficar bem ou foi algo
terrível demais?
— Vão ficar bem sim. Foi um mal-entendido ocasionado por
Larissa, que levou uma porrada de Melinda.
— O quê? Você vai me contar. Que merda aconteceu?
— Dandara chorou ao ouvir sobre o casamento. Não por
você e Paula, por Samuel. Ela já não estava bem, e a notícia a
deixou assustada. Ela esperava ter tempo para conversar com
Samuel e explicar, além disso, há uma suspeita de gravidez. Foram
muitas informações para um só dia. Larissa a provocou na boate
dizendo que ela estava chorando por você, contou a Nicolas, foi um
pouco tumultuado. Sei que os dois foram embora, Melinda descobriu
sobre a confusão, estava bêbada, deu um soco no olho de Larissa.
Nada disso deveria ter acontecido, mas aconteceu. Agora, esqueça
tudo isso. Dandara e Nicolas vão se entender, Larissa foi embora
com Enzo porque está com o olho realmente roxo.
— Que porra! — exclamo chocado. — Não sei o que mais me
choca, a atitude de Larissa, a possível gravidez de Dandara ou
Melinda, a princesinha da Disney dando um soco em alguém.
— As meninas ficaram putas com Larissa. Até Lili. Foi
tenso. Melissa, Isis e Maria Flor não viram por que estavam
bêbadas demais para isso. Puta merda! — Ava exclama, olhando
atrás de mim e eu me viro para entender o motivo. Joseph Vincenzo
está com Maria Flor jogada no ombro, a levando para a lancha
ancorada em frente à casa. Maravilha! É o casamento perfeito!
— Já sabemos o que vai acontecer. Só espero que terminem
isso antes do casamento começar — argumento. — Bom, vou
colocar essas flores em um jarro e ficar com Samuel. Iria tomar uma
cerveja com a minha sogra, mas, agora que sei que Dandara
precisou ter uma conversa com ele, talvez eu precise também.
— Samuel está feliz da vida com o seu casamento, se quer
saber. Dandara foi ótima. Ela só achou que seria um pouco difícil,
mas não foi. O garoto deu um baile de maturidade e não consegue
parar quieto de tanta empolgação, mas vá sim ficar com ele. Ficou
lindo o espaço que montou para Henrico. Certamente Samuel está
lá, juntamente com Sophie.
— Eu nem vi o espaço ainda. Só solicitei. — Sorrio.
— Guarde a carta no bolso, me dê as flores, vou colocá-las
em um jarro. Vá ficar com a tropa mirim, mas não se esqueça de
comer. Não queremos você desmaiando no casamento. — Ava se
vai e eu vou ver meus pequenos meliantes.
Os três estão sentados desenhando com Luma e Davi. Me
junto a eles e esqueço da vida...
— Lucca, Paula cismou que você sumiu e que estamos
ocultando isso, pode vir comigo? — Lili surge dizendo.
— Isso é sério?
— Está chorando e tudo... — E eu percebo que é verdade
quando chego no quarto e encontro minha Diabinha em cima da
cama, chorando, rodeada de pessoas.
— Vocês podem nos deixar sozinhos? — Todos fazem o que
eu pedi, e eu não se rio ou se choro enquanto encaro minha noiva.
— Não adianta me olhar com essa carinha. Você achou que fugi?
— Eu tive um pesadelo. Eu cheguei na igreja e você não
estava, foi horrível. — Não morro sem fazer com que Pablo entre
pelo cu que ele saiu.
— Ok, bora começar a arrumar para se casar? Aooo Paula,
seu dia de noiva vai ser com o noivo! É hoje que mostro meus dotes
de maquiador.
— O quê? Você não vai me maquiar!
— Vou sim! Vou arrumar seus cabelos também, farei a merda
toda. Vem com o pai! Vamos começar com uma massagem
relaxante para você ficar bem levinha na hora do casamento. Usarei
as técnicas tântricas — digo, puxando-a pelos braços. — Vamos
ficar juntos até o fim, mas, para começar, você já tomou café da
manhã? — Ela nega com a cabeça. — Ok, vamos resolver isso
primeiro e depois faremos todo o restante. Nós vamos juntos para
àquela capela, Paula, e eu não vou soltar sua mão nem por um
segundo a partir de agora.
— Eu sou ridícula.
— Não, você não é. Eu compreendo você. Agora pare de
chorar. Não quero que tenha dor de cabeça no dia do nosso
casamento. Temos um bebê para ser alimentado, princesa. Apenas
relaxe, vou cuidar de você. Sabe aquela igreja? Tô aqui na frente,
imaginando chuva de arroz na gente!
— Isso foi fofo.
— Foi sim. — Sorrio. — Vamos Diabinha! Estou louco para
consumar o casamento! Te foder até entortar.
— Nossa, muito romântico. Cadê a magia? É o nosso
casamento.
— Com magia agora, bebê Paula. Sim salabim bim bim, te
pego de quatro e te fodo assim! Aooo rei da pisadinha! É hoje que te
pego e te envergo, Paula. Jacinta a potência!
— Foi apenas um pesadelo. Pareceu real o bastante para eu
acabar entrando em desespero. Por mais que eu tenha dito sobre
ser deixada no altar, sei que jamais faria isso. Não existe homem
mais incrível no mundo, Lucca Albuquerque. Você é um homem de
verdade, que honra os compromissos e com H bem maiúsculo.
— Ainda bem que sabe disso, Diabinha. Honro meus
compromissos e me casar com você é tudo o que mais quero. Tem
certeza de que não precisa dos meus dotes de maquiador e
cabeleireiro? — pergunto, fazendo um carinho em seu lindo rosto.
— Certeza absoluta. Agora, por gentileza, permita que eu me
arrume para ir lá diante daquele altar dizer um grande SIM.
— Com certeza permito! — Sorrio. — Eu te amo e não nasci
pelo cu, Paula. Jacinta a potência!
— Ainda estou sentindo a potência da madrugada, bebê
Lucca! — diz sorrindo. — Vá! Vou ficar com meu irmão, meus pais,
e estaremos juntos em breve.
Eu vou.
Sigo para o quarto reservado para começar a me arrumar e
fico um tempo sentado na cama, olhando as crianças se divertindo
no jardim. Analisar meu filho é o que me faz sorrir agora. De
repente, não existe nenhuma outra criança, apenas ele.
Desde que ele chegou, adquiri a mania de ficar observando-
o, ligado em cada uma das ações dele, parece que na tentativa de
memorizar cada detalhe e tentar recuperar algo que não tive por
dois anos.
Quanto mais o observo, mas percebo o quanto ele se parece
comigo; em tudo e todos os sentidos. Samuel tem pouquíssimos
traços da Dandara, se você parar para observar. O tom da pele dele
é uma mistura, todo restante é uma cópia mirim minha.
Ele é terrível! Extremamente bagunceiro, elétrico, ligado na
mais alta voltagem. Só se acalma quando está perto de Henrico, e
eu acho isso muito incrível. Aos três anos, meu filho já possui um
coração generoso, é portador de uma inteligência absurda e se
parece mais maduro do que deveria ser. É bonito de ver que ele
respeita as limitações de Henrico; surpreendente também. Parece
que possuem algum tipo de ligação a mais. Em meio aos dois há
uma coisinha muito linda que é uma mistura perfeita de Victor e
Melinda. Soso é a fiel escudeira dos dois garotos, mas, por algum
motivo, a ligação dela com Henrico é maior. Ela é extremamente
carinhosa com ele, de ficar fazendo carinho e tudo mais. É a coisa
mais linda de se ver.
Aqui de cima, observando-os, principalmente, observando
meu filho, respiro aliviado. Samuel parece bem, feliz, radiante.
Porém, mesmo aliviado, eu acho que nunca deixarei de sentir
aquela dorzinha lá no fundo da alma, de um pai que só conheceu o
filho recentemente.
Desde que conheci Paula, nunca senti saudades de Dandara;
nem mesmo quando ela surgiu com um filho. Mas, ainda assim, eu
sempre fui tão apegado à instituição “família”, que carrego um pesar
enorme por saber que meu filho não é criado diretamente comigo,
sob o mesmo teto, como fui criado com os meus pais e irmãos.
Embora eu esteja muito feliz e que saiba que Samuel agora tem
duas famílias, essa mágoa sempre seguirá comigo. Venho de uma
família numerosa e unida, com casais que superaram as mais
diversas situações e se mantêm juntos. Idealizei que seria assim
comigo também, que teria todos os meus filhos com uma só mulher
e que seríamos uma família tradicional. Sei que estou construindo
uma família com Paula, mas, em alguns momentos, me pego
pensando em como seria incrível se Samuel fosse fruto do nosso
relacionamento, apenas para poder viver sob o mesmo teto que eu,
junto com os irmãozinhos.
A única opção que tenho, é aceitar os desígnios da vida, e
sempre trabalhar para que o meu filho jamais se sinta mal por não
ter os pais juntos, por não morar sob o mesmo teto que eu.
Felizmente, Dandara e eu estamos conseguindo construir uma boa
relação. Sei que ela na linha de frente de um lado, assim como
estou na linha de frente do outro. Sendo assim, vamos trabalhar
para nos tornarmos uma grande família pelo nosso filho.
Com tempo sobrando, decido que estou preparado para
enfrentar o passado que perdi. Em Belo Horizonte, ela me mostrou
que possuía uma espécie de dossiê sobre os dois primeiros anos do
nosso filho. Naquele momento, não fui capaz de encarar a situação.
Agora, após todos esses meses, me sinto pronto e me pego
entrando em meu e-mail pelo notebook.
Não demoro a localizar o arquivo, quando o abro, começo
logo com o choque de ver Dandara grávida. É surreal como os
sentimentos podem mudar. Não adianta, algumas pessoas não
foram feitas para ficar juntas, não importa quanto você tente, quanto
você se entregue e insista. E, até você conseguir chegar no nível de
conseguir enxergar isso, você sofre o bastante e anda em círculos.
A vida adulta é repleta de inconstâncias, impermanência. Ela vai
seguindo exatamente dessa maneira até você colidir com aquela
pessoa que parece ter sido destinada, criada sob medida, para ser o
seu encaixe, o seu par. Seria tão mais fácil se lidássemos com as
decepções amorosas pensando dessa maneira. Mas, infelizmente,
estamos constantemente nos apegando a relações fadadas ao
fracasso, criando uma ilusão em algo que, se você parar para
analisar bem, encontrará diversos sinais mostrando que não foi feito
para você.
É tão louco como não conseguimos enxergar os sinais tão
óbvios em algumas ocasiões. Isso nos ajudaria a não desperdiçar
tempo e a manter a nossa saúde mental resguardada.
Ignorei todas as minhas intuições, sofri extremamente, para
chegar ao dia de hoje. É por isso que estou tão certo do que quero.
Todas as experiências me fizeram amadurecer nos mais diversos
sentidos e me trouxeram ao dia de hoje, onde realizarei um grande
sonho ao lado da mulher que é o amor feito sob medida para a
minha vida, para mim.
Meu coração sangra quando começo a ver as fotos do
nascimento do meu filho. Sangra ao ver Dandara sozinha,
enfrentando aquela situação. Pelos vídeos fica nítido como não há
ninguém, além da equipe médica. Fico tocado ao ver um membro da
equipe indo segurar as mãos dela, isso arranca o meu primeiro
soluço. Tudo poderia ser tão diferente, mas ela fez escolhas e
pagou o preço por elas. Por mais fodido que as escolhas dela
tenham me deixado, agora eu consigo enxergar a força que essa
mulher possui. Do modo torto e completamente errado, ela salvou o
nosso filho, deu à luz sozinha e o criou mesmo sem ter qualquer
experiência com crianças.
O segundo soluço vem quando Samuel finalmente nasce e
ouço o som do choro forte. Certamente eu teria desmaiado, pois só
de ver através de uma tela de notebook, sinto minhas pernas
fraquejarem. É chorando, que sigo a sequência de imagens e
vídeos. Dandara não mentiu quando disse que gravou todas as
primeiras vezes. O mais surpreendente é que ela diz meu nome em
todos eles; surpreendente e curioso, visto que ela mesma afirmou
que não tinha planos para voltar e me falar sobre o nosso filho.
A mente dela é mais complexa do que posso compreender.
Talvez nem mesmo um profissional capacitado seja capaz de atingir
um nível de compreensão completa. Porém, ela fez o que fez
visando a proteção do nosso filho, o criou com dedicação. Samuel é
um exemplo de criança bem educada e me enche de orgulho todos
os dias, mesmo sendo bagunceiro.
Encerro minha “descoberta” sentindo mais diversos tipos de
sentimentos, um conflito entre amor, ódio, raiva, gratidão, empatia.
Eu mal consigo colocar as ideias no lugar diante de toda a confusão
mental. É então que meu pai surge no quarto. O único homem
capaz de compreender tudo o que estou sentindo.
— Tudo bem por aqui? — ele pergunta.
— Acabei de ver imagens e vídeos de Samuel que Dandara
gravou desde o nascimento. Não sei como me sinto, tampouco sei
como tirar essa dor que habita minha alma. O senhor se sentiu
assim?
— Muito. Até hoje tenho um grande pesar por ter perdido 7
anos da vida de Isis. Nada substitui o tempo perdido, houve um
período em que acreditei que tendo outro filho, essa dor seria
amenizada, mas não aconteceu, filho. É algo que você precisa
aprender a conviver e precisa deixar de alimentar. Deixe tudo isso
guardado bem lá no fundo, mergulhe de cabeça no presente,
construa o futuro sem fazer do passado um sofrimento constante. É
possível superar, mesmo que seja impossível esquecer. Pelo bem
da sua saúde mental, do seu relacionamento com Dandara e seu
casamento com Paula, não volte a sustentar o que te causa dor.
Você acabou de ver os vídeos e fotos? Então guarde-os em sua
memória e exclua. Pense que seu filho agora tem três anos, você
está tendo a oportunidade de viver todos os momentos incríveis,
acompanhar o crescimento e desenvolvimento dele. Não pense no
que perdeu, pense no que conquistou.
— Obrigado, pai — digo, abraçando-o. — Obrigado e me
perdoe por ter sido rude com o senhor no hospital, quando descobri
sobre Samuel. Eu vi vermelho aquela madrugada, desafiei o senhor,
errei.
— Eu sei que errou, mas sei também como estava perdido no
desespero. Não levei em consideração. — Sorri. — Apenas esqueça
as coisas ruins e foque em seu casamento, foque em suas
conquistas e na felicidade merecida. Samuel é um garoto de sorte,
tenha isso em mente.

E é com Samuel em meus braços e de mãos dadas com a


minha mãe, que entro na capela onde vou me casar, e meu filho fica
a cerimônia inteira ao meu lado, segurando a minha mão e atento
ao padre. É engraçado, porém, ao contrário do casamento do Victor,
o meu ocorre dentro da normalidade, e consigo conduzir tudo com
muita maturidade, sem fazer piadinhas ou loucuras. Paula merecia
um casamento dos sonhos, e é isso que estou dando a ela.
As lágrimas ficam quando o padre anuncia a entrada das
alianças. É Henrico quem vem trazendo, acompanhado de Sophie.
Nem mesmo eu consigo segurar as lágrimas ao vê-los. Ele vem
andando muito lentamente, da forma como sua limitação permite, e
Sophie vem junto, segurando a mãozinha dele e tendo toda
paciência do mundo. Os dois arrancam suspiros, risadas e lágrimas;
Paula mal consegue se conter, pois foi inesperado. É bonito vê-la
vibrar por cada passo correto e firme do filho, e eu me pego
vibrando junto.
— Papai — ele me chama para pegar a caixinha da aliança,
pois não consegue esticar os braços por completo e o nervosismo
está fazendo com que mantenha os dedinhos preguiçosos agora. Eu
me abaixo até ele e cuidadosamente retiro a caixinha de sua mão.
— Obrigado, campeão. Viu? Você pode fazer isso! —
exclamo, bagunçando seus cabelos e deixo um beijo na bochecha
da minha afilhada. — Você é a menina mais bonita do universo
inteiro e mais.
— Tio dindo! — Soso exclama me dando um abraço, como se
fosse uma verdadeira mocinha.
— Amo você, mocinha princesinha da Disney.
Os dois se juntam a Samuel, e agora somos cinco no altar;
dois de pé e três meliantes sentados. Quando finalmente acontece o
“pode beijar a noiva”, eu tenho que ser delicado em respeito aos
mirins. Isso não diminui a empolgação, muito menos a felicidade. Eu
amo Paula e recebo a reciprocidade. Nós seremos felizes, custe o
que custar. Juntos iremos superar as dificuldades, respeitar as
adversidades, e viver a vida como deve ser vivida.
— Deus! Esse é o casamento mais normal da história da
família! — Ouço uma voz dizer e me afasto dos lábios de Paula.
Todos presentes agora estão rindo. Dona Mariana chegou em
grande estilo, de forma inesperada. Meus avós estavam na
Califórnia, disseram que iriam acompanhar por vídeo chamada, mas
aqui estão. Dona Mari, dona Liz, e meus dois avôs.
Sabe o que isso significa? Sorte!
Sorte é ter todas as pessoas mais importantes comigo no dia
em que estou realizando um dos maiores sonhos da minha vida.
Sorte é ter meu filho. Sorte é ter sido escolhido como pai do
Henrico. Sorte é ter minha Diabinha mais linda do mundo como
esposa.
— E eles viveram felizes para sempre! — dussurro no ouvido
de Paula.
— Onde será a Lua de Mel?
— Aoooo Paula, estragou o romantismo!
— Filipinas, como era seu sonho? Ava e Piroca Baby
amaram.
— Não, nada de Filipinas agora. Pensei em algo diferenciado.
— Sorrio misteriosamente.
— Que espécie de algo diferenciado?
— Las Vegas, baby! Acho que ainda temos mistérios a
desvendar naquele lugar. Que tal voltar ao lugar onde tudo
começou, reviver algumas cenas e desvendar o mistério dos gatos?
Agora não teremos Pablo que nasceu pelo cu para nos atrapalhar.
Ele está pagando os pecados em grande estilo.
— Sinceramente? Essa é a melhor ideia dos últimos
tempos!!! Aooo Las Vegas, baby! — Diabinha se joga em meus
braços e eu a rodo diante do altar, esquecendo-me da classe e de
todos os convidados presentes.
Enquanto todos aplaudem, eu sorrio.
Eu encontrei o motivo!
Pablo respondeu por tentativa de estupro e desapareceu por
um tempo...
Paula descobriu que Larissa era exatamente a pessoa que
Dandara falou. Além disso, passou a trabalhar no escritório de
advocacia dos Albuquerque’s, juntamente com Davi e Gabriel
Salvatore.
Lucca realizou o grande sonho de ser pai de menina. Yaya
veio para completar a felicidade da família.
Samuel... está cada dia mais parecido comigo e não sente
nem por um momento a separação dos pais. É uma criança feliz,
com o coração repleto de generosidade para dar e receber o amor
de todos.
Henrico tem mostrado avanços significativos em sua
coordenação motora, além de possuir um nível de inteligência
elevada.
As dificuldades sempre surgem, mas juntos, Paula e Lucca,
encontram diariamente motivos que os levam a ter forças para
enfrentar qualquer problema que surge pelo caminho. Todos os dias
eles lutam pela inclusão de Henrico e se dedicam para que os três
filhos sejam as crianças mais felizes e amadas do mundo.
Trabalham juntos para que as limitações de Henrico sejam
respeitadas, para que ele nunca se sinta “diferente” e mostram que
ele pode ir muito “Além do Azul”.

Embora alguns finais causem dor, há sempre os recomeços.


Os recomeços curam!

E viveram sim, felizes para sempre, merecidamente!


— Oh meu Deus, Lucca Albuquerque!
— Ele vai conseguir, Paula. Ele pode fazer isso. Não demonstre
medo, mantenha-se calma. Sophie está com ele e não existe
qualquer pessoa no mundo que o encoraje mais que ela, mesmo
que a princesinha endiabrada nem mesmo saiba o significado de
encorajar. — Estamos na Ilha de Búzios e Henrico está prestes a
sair correndo pela primeira vez. Foi uma longa caminhada até
chegarmos ao dia de hoje. Nosso pequeno não teve que lidar
apenas com as limitações físicas; o psicológico, que muitas das
vezes se torna o grande vilão da vida, vive tentando pregar peças. É
uma luta constante.
— E se...
— E se... nada disso, meu amor. Incentive-o, princesa. Você é a
mulher que odeia todos os “e se”. — Relembro, e me volto para
Henrico. — Vamos lá, filho! Você é capaz! Você pode fazer isso e
tudo mais!
— Papai, Henrico vai correr? Nós vamos poder brincar de muitas
coisas! — Samuel se empolga em meus braços, e me pego sorrindo
por perceber que a torcida aqui é forte.
— Acho que sim, filho. Vamos incentivá-lo? — proponho.
— Simmm!
— Henrico, lembre-se do que papai sempre diz, se você nunca
tentar, então nunca saberá se é capaz — incentivo.
— Eu estou com você. Você vai conseguir — Soso diz, fazendo
todos suspirarem. E, por incrível que pareça, essas palavras
causam um efeito. De mãos dadas com ela, Henrico parece mais
corajoso que nunca. De repente, nem mesmo o medo é possível ser
encontrado em seu olhar, tudo que vejo é coragem e determinação.
Sou obrigado a colocar Samuel no chão, diante de toda a emoção
que sinto ao ver Henrico sair correndo com Sophie. Enquanto
Samuel grita, Paula me abraça aos prantos, e eu sinto lágrimas
queimando em meus olhos. Um misto de alegria, amor, diversão. A
parte engraçada é ver Yasmin correndo atrás dos dois, com suas
pernoquitas roliças. Samuel acaba a seguindo na corrida e eu
transbordo ao ver meus três filhos e minha afilhada, tão unidos e
vibrando alegria.
É lindo ver a confiança de Henrico, que nem mesmo olha para trás
quando se dá conta de que está no caminho certo e da capacidade
que possui. Não é fácil ser pai de um garotinho autista; é desafiador,
repleto de crises e inconstância, mas com amor e paciência, eu
evoluo todos os dias com cada evolução de Henrico. É uma das
experiências mais desafiadoras e surpreendentes.
Isso me leva a pensar nas adversidades, em como algo que é tão
simples para uma pessoa, pode ser tão complexo para outra. Eu
tenho que lidar com Paula e Henrico. Acredito que para ela o medo
seja muito maior.
— Ele conseguiu! — ela exclama tomada pela emoção, e Henrico
volta correndo. Agora ele solta a mão de Sophie e Paula se agacha
para abraçá-lo fortemente. — Meu super garoto!
— Eu corri, mamãe. Sophie é a menina mais bonita do mundo e me
ajudou! — Por algum motivo, me arrepio com essas palavras e
busco minha afilhada com os olhos. Eles são apenas crianças, mas
parece que um se encaixa no outro da maneira mais linda que se
pode existir.
— Eu te amo, filho. Eu te amo ao infinito e além! — Paula se
declara, e eu deixo os dois terem um momento de privacidade.
Me junto com Samuca, Yaya e Soso, e decido fazer o que faço de
melhor: ser criança.
Há muito a ser comemorado, não apenas hoje, mas todos os dias
em que recebemos novas oportunidades.
DESPEDIDA DE SOLTEIRO NA BOATE

Faz muitos anos desde que estive em uma boate. Quer dizer,
estive em uma com Nicolas, mas era de um estilo bastante diferente
dessa aqui. Aqui é tudo mais escuro, e a escuridão não é muito
bem-vinda agora.

Logo de cara, Melissa e Maria Flor encontram um pole dance


e resolvem sensualizar. Isis logo se junta a elas, e Ava começa a
protestar:

— Esses demônios darão trabalho esta noite! Custava deixar


para beber apenas aqui? Estou rezando para que Joseph Vincenzo
surja e atole um rojão no cu de Maria Flor!

— Bruce e Arthurzinho são infinitamente mais maleáveis que


Joseph — comento sorrindo.

— Bruce nem tanto, mas Arthurzinho... Melissa o enrola com


muita facilidade — Luma diz. — Ela começa com aquela coisa de
“real oficial”, “meu sonho de princesa”, “tutuzinho”, ele logo se joga
no chão e a deixa tripudiar em cima dele. Nicolas é mais estilo
Tudão ou Arthurzinho?

— Ainda estou o conhecendo. — Puta merda! Estamos


prestes a enfrentar o caos e nem mesmo o conheço completamente.
— Porém, não acho que seja estilo Arthurzinho, acho que ele está
mais para Joseph, embora seja um homem muito amoroso. Nicolas
tem um pouco de algumas características que possuo.

— Isso é interessante. — Ava sorri.

— Acho que sim. Bom, vou pegar uma bebida. — Oculto o


fato de que é uma bebida sem álcool. — Por favor, um coquetel sem
álcool — peço ao barman, enquanto espero observo o ambiente.
Noite das mulheres. Tirando os barmans, o DJ e os seguranças, só
há mulheres nesse local, mas isso logo muda. Arregalo os olhos
quando vejo homens sarados surgindo no palco para dançar. Dois
deles vão diretamente ao pole dance onde as três mosqueteiras
estão dançando como loucas. Minha pouca experiência com os
Albuquerque’s me diz que essa noite não será tão calma como está
sendo, e diz que Maria Flor, Isis e Melissa estão fodidas.

Fico encostada no balcão do bar só assistindo todas as


cenas desembolarem. Os homens ousam se aproximando das
mulheres, e eu quero rir da cara de Ava. Bom, testar nossos
homens pareceu legal, porém, parece que a situação mudou. Ava
está desconfortável, Luma também. As três mosqueteiras só estão
leves devido ao fato de estarem embriagadas.
— Por que não está bebendo? — Larissa surge perguntando.
Meu Deus, eu não consigo ir com a cara dela!

— Até onde sei isso aqui é uma bebida — respondo.


mostrando meu coquetel.

— Você não é uma boa atriz — diz, virando uma dose de


tequila.

— Por que eu iria querer ser uma atriz?

— Para disfarçar a dor e o sofrimento por ter perdido Lucca.


— Ela sorri. — Deveria ter o mínimo de senso, Dandara. Foi ridículo
chorar assim que soube do casamento surpresa. O que você pensa
da vida?

— Eu quem deveria fazer essa pergunta. O que você pensa


da vida? — pergunto a ela. — Não faço parte de qualquer escola
para atores, tampouco atuo. Sou uma juíza e as minhas ações só
dizem respeito a mim — alerto. — Não vou perder meu tempo
argumentando com você sobre o motivo pelo qual eu chorei. Não
faz ideia do motivo, não fará, e o que eu faço ou deixei de fazer não
é da sua maldita conta. Quem você pensa que é?

— Sou amiga da mulher que vai se casar com seu ex


amanhã, e não vou permitir que atrapalhe.

— Você deve estar brincando com a minha cara. Acha que eu


quero atrapalhar a felicidade de Lucca e de Paula? — pergunto
perplexa.
— Eu deveria ter filmado a sua reação assim que Victória
comunicou sobre o casamento. Foi ridículo, nem mesmo conseguiu
disfarçar a dor. Acabou com a diversão se ainda não percebeu.
Essa era para ser uma noite divertida, mas, por sua causa, as
pessoas estão preocupadas com o seu bem-estar — rebate, e eu
começo a rir, sentindo a adrenalina começar a fazer efeito.

— Não estou vendo ninguém aqui preocupada comigo. Aliás,


estou. Você. Posso te dar um conselho? Não deveria brincar
comigo, Larissa. Você não me conhece, portanto não faz ideia do
que sou capaz de fazer com quem defeca palavras sobre mim. Eu
fui gentil até hoje cedo, mesmo te achando uma vadia que não pode
ver macho e que morre de inveja da Paula e de todas as demais
integrantes da turma. É isso que penso de você. Está com inveja
porque Paula vai se casar com um homem fantástico, está com
inveja porque todas ali são casadas com homens extremamente
bem sucedidos, lindos, ricos. Enquanto você, coitadinha, precisa se
contentar com as migalhas que Enzo te dá. Ele só a usa para o
sexo, tanto que ontem nenhum homem foi pago para se aproximar
de você. Acha mesmo que Enzo vai levá-la a sério? — pergunto
sorrindo. — Ele não se importa. Nem se você esforçar mais irá
conseguir um partido desse porte, meu amor. Desde que a conheci,
tudo o que faz é usar a frase "com todo respeito" para tecer elogios
a homens comprometidos. No fundo, não sou eu quem quero
atrapalhar Lucca e Paula. Deve ser terrível ser consumida pelo
bichinho da inveja, não é mesmo? Esse seu "com todo respeito" não
me convence, querida. Brincou com a pessoa errada. — Os olhos
dela estão repletos de lágrimas, mas, ainda assim, vejo um sorriso
crescer em seu rosto.
— Acho que Nicolas vai gostar de saber sobre algumas
coisas — diz, esticando o braço e logo Nicolas está diante de nós.
— Nicolas, você é um garoto tão jovem que nem mesmo percebe
que está sendo feito de idiota por essa mulher. — Nicolas me
encara e volta a olhar para ela. Estou rindo quando estou prestes a
matá-la. — Acho que você vai gostar de saber que sua namorada foi
aos prantos assim que Victória anunciou que Lucca vai se casar
amanhã. Deve ser horrível namorar com uma mulher que ama outro
homem e chora por ele. Como se sente sabendo que está sendo
enganado e que ela ainda ama o ex?

— Você tem algum tipo de problema? — pergunto, jogando a


bebida em meu copo diretamente na cara dela. Nicolas tenta me
segurar, mas eu agarro os cabelos dela. — O que pensa que está
fazendo?

— Me solta! — a filha da mãe grita, e minha mão estala em


seu rosto. Ela começa a chorar e eu passo a enxergar vermelho.

— O que está acontecendo? — a voz de Enzo surge, e ele


tenta me afastar de Larissa. — Solte ela, Dandara. Seja o que for,
vamos resolver de uma maneira mais prudente.

— Você deveria tirar a sua namoradinha daqui se não quiser


que eu a jogue no mar — ameaço, soltando-a e empurrando-a
longe.

Busco Nicolas com o olhar e o vejo saindo da boate. Eu me


apresso e caminho decidida rumo a saída.
— Nicolas! — o chamo quando o encontro andando pela rua.
Ele para de andar, mas parece nervoso o bastante. O alcanço e o
faço me encarar: — Você não acreditou naquela merda, não é
mesmo?

— Não sei o que pensar. Você parecia triste essa tarde, fez
todo um esforço para uma despedida de solteira da Paula, esteve
em torno deles... eu não sei o que pensar. Preciso de um tempo.

— Eu chorei, mas não foi pelo motivo que ela disse. Há


Samuel, eu... eu me sinto culpada ainda e fui pega de surpresa.

— Você sempre soube que eles vão se casar, Dandara. Não


foi pega de surpresa.

— Eles iriam se casar semana que vem. Eu teria uma


semana para preparar meu filho para o casamento. Ele é criança,
tem sentimentos, precisa de explicações. Agora eu terei que fazer
isso amanhã, horas antes do casamento. Eu nem sei como fazer
isso, nem sei como explicar. Foram muitos acontecimentos.

— Sabe qual é o problema, Dandara? Você se importa muito


mais do que Samuel. O garoto está feliz, está sempre com o pai,
ama Paula, ama você, tem uma família excelente como base. É
você quem se importa, é você quem coloca a culpa pelo passado
acima de tudo. Você afirma que virou a página, mas é mentira.
Sempre que pode, se pega revivendo a merda do passado, me
desculpe, mas estou de saco cheio do seu passado. Enquanto você
não virar a página, não teremos um futuro. Não percebe isso?
— Eu não estou entendendo aonde quer chegar.

— Não? Então eu serei mais claro. Eu te amo, Dandara. Eu


te amo muito mesmo, amo seu filho, sou um maldito viciado em
você, mas o seu passado está sempre entre nós e eu não quero
isso. Você se livrou dos segredos, mas não se livrou do passado.
Enquanto não fizer isso, não vamos funcionar. Estou te dando um
tempo a partir de agora.

— Um tempo? — pergunto incrédula, sentindo as lágrimas


correrem livremente pelo meu rosto. — Você está terminando
comigo?

— Não, estou te dando a oportunidade de enterrar seu


passado. — Balanço a cabeça em compreensão, rindo e chorando.

— Ok. Eu farei isso — aviso. — Bom, já que estamos falando


do passado, então você deve saber que errei com Lucca, não é
mesmo?

— Sim.

— Eu não vou errar com você — informo. — Vou deixá-lo ir,


Nicolas, mas, antes disso, merece saber uma coisa...
MANHÃ SEGUINTE

— Filho, pode vir aqui um pouco? — chamo Samuel, após


ficar um longo tempo treinando na frente do espelho. Não posso
chorar, não posso demonstrar fraqueza ou vulnerabilidade. Preciso
sorrir, ser feliz, mostrar ao meu filho que há algo lindo prestes a
acontecer.

O pego em meus braços e subo para o quarto.

— Mamãe, você é linda, hein?! — Isso me faz sorrir de


verdade. Ele está mudando a forma de dizer, ficando muito
"Luccanizado".

O coloco sentado na cama e me sento no chão, para ficar da


sua altura.

— Você que é muito lindo, hein?! Bom, precisamos ter uma


conversa de homem para mulher. — Ele sorri e bate os pés para
fora da cama. — A tia Paula é muito legal, não é mesmo?

— Muito legalll! Ela é mãe do Henrico, meu irmão.

— É isso! Henrico é seu irmão — digo orgulhosa. — Bom, e


você sabe que o papai e a mamãe são muito amigos, não sabe?

— Sim, mamãe.

— Isso é legal, não é mesmo? Você tem uma família


grandona, repleta de pessoas incríveis.

— Théo é bagunceiro.
— Théo é — concordo rindo. — Bom, filho, hoje vai haver um
casamento. Você nunca foi em um, não é mesmo?

— Nunca, mas a vovó me mostrou fotos outro dia.

— Sim. O papai Lucca e a tia Paula vão se casar. Isso não é


maravilhoso?

— Uaaauuu!

— É muito uauuu mesmo! Eles vão se casar, você terá


irmãozinhos, em breve haverá um monte de crianças bagunceiras e
você será o irmão mais velho! — Ele parece animado, graças a
Deus!

— Eu vou mandar?

— Mandar é um pouco feio, não acha? Você vai comandar a


turma toda, será o responsável. — Ele sorri, salta da cama e cai
direto em meus braços. Eu ganho tantos beijos no rosto que chego
a ficar tonta. — Você está feliz, filho?

— Muito feliz, mamãe.

— Então a mamãe está feliz também — digo, abraçando-o.


— A mamãe terá que ir para casa, então obedeça aos seus avós, dê
infinitos beijos no papai e na tia Paula, e não esqueça de dizer que
você os ama muito, do tamanho do universo inteiro. É o seu
presente de casamento, combinado?

— Combinado, mamãe.
— Eu te amo e tenho muito orgulho do garoto incrível que é.

— Eu te amo, mamãe. Amo o tio Nico.

— Tio Nico te ama muito grande também. — Sorrio, sentindo


meu coração rasgar o peito. — Agora vá e comporte-se como um
principezinho.

Ele obedece aos meus comandos e sai festejando a notícia.

Isso significa que a minha missão nesse lugar foi


devidamente cumprida.

Existem pessoas que não foram criadas para serem compreendidas


e sim aceitas. Eu faço parte desse time. Complexa o bastante para
ser compreendida, difícil demais para ser aceita. De qualquer
forma, tudo que uma pessoa precisa é entender que ela tem que ser
como ela é.
Mesmo que isso não seja muito bom.
Às vezes precisamos apelar...
https://linktr.ee/Autorajussaraleal

[1]
Big Shot, uma explosão de 49 metros de altura no topo do topo da torre,
proporcionando uma experiência de força G à medida que você desce de volta
para a barra de lançamento.

[2]
Você disse adeus quando eu disse olá!
[3]
Melhores amigas para sempre.
[4] O Canal da TURMA DA JOAQUINA exibe os shows, as aventuras e as novidades sobre a

essa lúdica Turminha. Nossa missão é produzir conteúdo que contribua para o exercício lúdico da
criançada e possibilite, também, a promoção de valores éticos centrada na convivência respeitosa
entre as diferenças. A TURMA DA JOAQUINA é formada por três cadelas vira-latas, um morcego, um
sapo e uma gatinha que perdeu uma patinha. A prioridade, são personagens
socialmente estigmatizados, mas que, uma vez unidos em nome da arte, evidenciam que seres
diferentes podem viver de forma pacífica e tornar a vida menos egoísta. A TURMA
DA JOAQUINA entende que as artes são importantes condutores para a construção de uma sociedade
mais humana e democrática, contribuindo, assim, para a consolidação de um mundo cada vez mais
justo.
[BB1]Dele quem? Matheus? Túlio? Lucca?

Você também pode gostar