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DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Autoria: Henriette Damm

UNIASSELVI-PÓS
Programa de Pós-Graduação EAD
CENTRO UNIVERSITÁRIO LEONARDO DA VINCI
Rodovia BR 470, Km 71, no 1.040, Bairro Benedito
Cx. P. 191 - 89.130-000 – INDAIAL/SC
Fone Fax: (47) 3281-9000/3281-9090

Reitor: Prof. Hermínio Kloch

Diretor UNIASSELVI-PÓS: Prof. Carlos Fabiano Fistarol

Coordenação da Pós-Graduação EAD: Prof: Ivan Tesck

Equipe Multidisciplinar da
Pós-Graduação EAD: Prof.ª Bárbara Pricila Franz
Prof.ª Tathyane Lucas Simão
Prof.ª Kelly Luana Molinari Corrêa
Prof. Ivan Tesck

Revisão de Conteúdo: Grazielle Jenske


Revisão Gramatical: Sandra Pottmeier
Revisão Pedagógica: Bárbara Pricila Franz

Diagramação e Capa:
Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI
Copyright © UNIASSELVI 2017
Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri
UNIASSELVI – Indaial.

510.7
D162d Damm, Henriette
Didática da matemática / Henriette Damm.
Indaial : UNIASSELVI, 2017.

108 p. : il.

ISBN 978-85-69910-39-8

1. Matemática – Estudo e Ensino.


I. Centro Universitário Leonardo da Vinci

Impresso por:
Henriette Damm

Possui graduação em Matemática pela


Fundação Universidade Regional de Blumenau
(1993), especialização em Gestão Universitária pela
Fundação Universidade Regional de Blumenau (2015)
e mestrado em Educação Matemática pela Universidade
Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1998),
dissertando sobre “Educação Matemática e Educação
Ambiental: uma Proposta de Trabalho Interdisciplinar como
Possibilidade às Generalizações Construídas Socialmente”.
Atualmente, é professora do quadro da Universidade de
Blumenau (FURB), Chefe do departamento de Matemática,
Membro da CAPEX (Comissão de Avaliação de Projetos de
Extensão), Presidente da Comissão Permanente de Estágio
Probatório e Coordenadora do Estágio das Licenciaturas.
Atuou como Chefe da Divisão de Modalidades de Ensino
por um ano, como Coordenadora do curso de Matemática,
Coordenadora de TCC em cursos de Especialização na
EaD por três anos, foi Tesoureira do SINSEPES (Sindicato
dos Servidores Públicos do Ensino Superior de Blumenau,
membro do CONSUNI (Conselho Universitário), professora
coordenadora do PIBID/FURB, docente em cursos de pós-
graduação e Vice-Presidente da APROF (Associação
dos Professores da FURB). Tem coordenado um
projeto de extensão voltado para pesquisas de
mercado e satisfação junto ao Núcleo de Pesquisas
do Departamento de Matemática. Atua nas áreas
de Estatística, Estágio e Educação Matemática.
Sumário

APRESENTAÇÃO.......................................................................7

CAPÍTULO 1
Conceitos de Didática da Matemática ...................................9

CAPÍTULO 2
Referências da Didática da Matemática ..............................35

CAPÍTULO 3
A Especificidade da Matemática e
da Didática da Matemática......................................................61

CAPÍTULO 4
Questões Metodológicas e a Engenharia Didática...........87
APRESENTAÇÃO
Caro(a) pós-graduando(a)! A Didática da Matemática é uma das tendências
teóricas da Educação Matemática, e para entender melhor o trabalho da Didática
da Matemática, precisamos contextualizar a Educação Matemática, ou seja,
entender esta como uma grande área de pesquisa educacional, sendo sua
consolidação relativamente recente.

O objeto de estudo da Educação Matemática é a compreensão, a


interpretação e a descrição de fenômenos referentes ao ensino e à aprendizagem
da Matemática, nos diversos níveis de ensino, tanto na dimensão teórica, quanto
na dimensão prática.

A Educação Matemática vem ganhando cada vez mais espaço nas


discussões acadêmicas e profissionais do ensino. Rico, Sierra e Castro (2000
apud GODINO 2003) consideram a Educação Matemática como o sistema de
conhecimentos, intuições, planos de formação e finalidades formativas quanto ao
processo ensino-aprendizagem da Matemática.

A consolidação da Educação Matemática como área de pesquisa é


relativamente recente, quando comparada à história da Matemática, e seu
desenvolvimento recebeu um grande impulso nas últimas décadas, dando origem
às várias tendências teóricas, cada qual valorizando determinadas temáticas
educacionais do ensino da Matemática.

Entre as várias tendências teóricas que compõem a Educação Matemática


no Brasil, a Didática da Matemática é uma delas e se caracteriza pela influência
de autores franceses, conforme veremos nos capítulos deste material.

Segundo Régine Douady (apud PAIS, 2002b, p. 10-11), “A Didática da


Matemática estuda os processos de transmissão e de aquisição dos diferentes
conteúdos desta ciência, particularmente numa situação escolar ou universitária.
Ela se propõe a descrever e explicar os fenômenos relativos às relações entre seu
ensino e sua aprendizagem. Ela não se reduz a pesquisar uma boa maneira de
ensinar uma determinada noção particular.”.

Assim, podemos entender que a Didática da Matemática, busca a elaboração


de conceitos e teorias que sejam compatíveis com a especificidade educacional
do saber escolar matemático, mantendo vínculos com a formação de conceitos
matemáticos, tanto da prática pedagógica, como no campo teórico da pesquisa
acadêmica.
A Didática da Matemática teve forte influência de autores franceses,
pois foi na França que teve surgimento este referencial teórico, para após se
espalhar por diversos países. São estas teorias e seus autores: A Teoria da
“Transposição Didática” de Chevallard; A Teoria dos “Obstáculos epistemológicos”
de Bachellard; A Teoria dos “Campos Conceituais” de Vergnaud; A Teoria das
“Situações Didáticas” e a Teoria do “Contrato Didático” de Brousseau; A Teoria da
“Engenharia Didática” de Artigue.

Os capítulos que seguem buscam trabalhar especificamente cada um dos


pontos destacados, ou seja:

No primeiro capítulo, serão apresentados os Conceitos de Didática da


Matemática buscando defini-los, discutindo as implicações dos conceitos na
práxis do professor, bem como, trabalhando a importância do conhecimento
dos conceitos básicos de Didática da Matemática em relação à autoavaliação
profissional.

No segundo capítulo, teremos as Referências da Didática da Matemática


a partir da apresentação do saber matemático e suas particularidades, da
discussão do trabalho do professor de matemática, da definição de obstáculos
epistemológicos e didáticos no ensino da matemática, da articulação do trabalho
do professor de matemática com os obstáculos epistemológicos e didáticos, e da
análise da formação de conceitos e dos campos conceituais.

No capítulo três, o objeto de estudo será a Especificidade da Matemática


e da Didática da Matemática, através da discussão de situações didáticas e
a-didáticas da Matemática, da definição de contrato didático, da avaliação de
situações de ruptura do contrato didático, e da análise do cotidiano escolar e os
efeitos didáticos.

No capítulo quatro, teremos as Questões Metodológicas e a Engenharia


Didática, buscando identificar e organizar as fases da Engenharia Didática
e analisar a dimensão teórica e experimental da pesquisa em Didática da
Matemática.

Assim, buscamos com este material, analisar conceitos criados por autores
que atuam no campo da Educação Matemática, especificamente, da Didática da
Matemática e passar a questionar se o ensino da Matemática pode se resumir à
apresentação de uma sequência de axiomas, definições e teoremas.

A autora.
C APÍTULO 1
Conceitos de Didática da Matemática

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Definir os conceitos de Didática da Matemática.

 Discutir as implicações dos conceitos na práxis do professor.

 Explicar e aplicar a importância do conhecimento dos conceitos básicos de


Didática da Matemática em relação à autoavaliação profissional.
Didática da Matemática

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Capítulo 1 CONCEITOS DE DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

ConteXtualiZaÇÃo
O homem sempre se encontrou envolvido com Matemática. Procurando
atender às necessidades de suas condições de vida, ele conta, mede e calcula.
Agindo sobre o meio em que vive, o homem faz sua própria Matemática ao buscar
soluções para os problemas do cotidiano, produzindo novos conhecimentos e
aplicando-os, refinando e sofisticando os conceitos matemáticos.

A escola se organiza levando em consideração saberes Fornecermos


historicamente acumulados e construídos, acrescentando saberes oportunidades
formados e adquiridos no presente. Estamos na era da tecnologia e aos alunos para
globalização, onde os saberes são dinâmicos e complexos, e esses desenvolverem um
se transformam e/ou evoluem constantemente. Aprendemosa todo o pensamento crítico,
permitir e promover
momento e de diferentes maneiras. E, neste contexto, é imprescindível
a construção do
fornecermos oportunidades aos alunos para desenvolverem um conhecimento.
pensamento crítico, com o intuito de que informações sejam analisadas
e refletidas, para então, permitir e promover a construção do conhecimento.

Os alunos, na contemporaneidade, chegam à sala de aula com muitos


conhecimentos adquiridos nesse mundo cibernético e, muitas vezes, não têm
esse conhecimento organizado ou estruturado, ou seja, às vezes, mesmo que
possuam o conhecimento, os alunos não têm consciência que podem usá-lo sob
outras circunstâncias diferentes àquelas nas que eles aprenderam. O professor
pode auxiliar ao estudante se sentir um cidadão em pleno crescimento com
todas as capacidades para se desenvolver seu papel na sociedade. No caso do
professor de Matemática, tem sua inserção em muitas áreas do conhecimento
que é útil para o estudante. Todas estas questões dizem respeito à Educação
Matemática também. Mas então? O que é a Educação Matemática? Do que trata?
Vamos descobrir adiante!

EducaÇÃo matemática
Assim como em diversas áreas do conhecimento, também na área da
Matemática os alunos têm um caminho percorrido e é justamente o professor
quemtem a função de mediar esse passo do conhecimento construído num
ambiente diferente ao da escola e o vai conectar ao que ele encontra na escola.
Com a organização desses conhecimentos no sistema educativo se entende que
tudo que ele aprendeu é válido e vai se moldurando para ser falado de um jeito
particular no meio escolar. Essa ideia vem ao encontro do que afirma Freire.

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Didática da Matemática

O que tenho dito sem cansar, e redito, é que não podemos deixar
Não podemos de lado, desprezado como elo imprestável, o que educandos,
deixar de lado o sejam crianças chegando à escola ou jovens e adultos a
que educandos centros de educação popular, traz consigo de compreensão do
traz consigo de mundo, nas mais variadas dimensões de sua prática na prática
compreensão do social de que fazem parte. Sua fala, sua forma de contar, de
mundo. calcular, seus saberes em torno do chamado outro mundo,
sua religiosidade, seus saberes em torno da saúde, do corpo,
da sexualidade, da vida, da morte, da força dos santos, dos
conjuros (FREIRE, 2003, p.85-86).

Caminhando essa discussão para o ensino da Matemática, parece haver


um consenso de que uma Educação Matemática básica deve contribuir com a
preparaçãodo cidadão no exercício da cidadania tanto no domínio individual
quanto no coletivo. Nesse sentido, podemos possibilitar novas atitudes e
comportamentos no viver em sociedade, tendo por referência os direitos humanos,
os valores humanos e a justiça social. Além de ensinar Matemática, também é
preciso formar valores. Em primeiro lugar fazermos uma ligação entre o mundo
real e a Matemática da escola, como se menciona nos Parâmetros Curriculares
Nacionais - PCN através de projetos relacionados à realidade dos estudantes.

Os projetos proporcionam contextos que geram a necessidade


e a possibilidade de organizar os conteúdos de forma a lhes
conferir significado. É importante identificar que tipos de
projetos exploram problemas cuja abordagem pressupõe
a intervenção da Matemática, e em que medida ela oferece
subsídios para a compreensão dos temas envolvidos (BRASIL,
PCN, 1997, p.26).

Um dos desafios atuais da aula de Matemática é o professor entender e


aceitar que precisa além de ensinar Matemática, também contribuir na formação
daquele ser humano. A sociedade hoje é diferente da sociedade a qual nós
nascemos e, obviamente, faz-se necessário um novo olhar sobre a formação da
educação básica, o que inclui a formação Matemática.

Partindo deste contexto, é preciso expor dois importantes pontos.


Ter a Matemática
como uma De um lado, ter a Matemática como uma ferramenta para atender
ferramenta as necessidades da vida cotidiana e, por outra, ter ela com as suas
para atender as concepções. Assim, podemos introduzir o termo “Etnomatemática”,
necessidades da como foi definido pelo professor e pesquisador Ubiratan D’Ambrósio,
vida cotidiana e, porcomo a arte ou técnica de explicar, conhecer e entender conceitos
outra, ter ela com as
matemáticos vinculados a diversos contextos culturais. Outro ponto é,
suas concepções.
em meio aos conteúdos específicos matemáticos, trabalhar questões de
cidadania, em que a aula de Matemática pode tornar-se um fórum de debate e
negociação de concepções e representações da realidade. Assim, questionamos,
em quais contextos usar esses conhecimentos?

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Capítulo 1 CONCEITOS DE DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Em jornais, por exemplo, onde alunos e professores trabalham conteúdos de


ensino, atitudes, métodos e procedimentos. Criam um espaço de conhecimento
compartilhado, refletindo sobre suas aprendizagens e dificuldades a superar.
Encontramos notícias ou informações que vêm argumentadas com gráficos, ou
com porcentagens ou com curvas que seguem determinada função.

Esses são casos em que o ensino da Matemática propicia a construção de


um conhecimento com posicionamento crítico do cidadão, aí tanto o professor
de Matemática quanto o aluno têm oportunidade de desenvolver assuntos
paralelos que competem à formação, à ética, proporcionando um momento de
discussão com respeito às opiniões diferentes entre colegas. Algumas dessas
diferenças até podem servir para completar uma ideia ou conhecimento e, ainda,
podemos fomentar e estimular a solidariedade entre os alunos solicitando um
trabalho em grupos para eles mesmos serem mediadores entre eles e propiciar
mais um momento de construção de conhecimento e de formação cidadã. Cabe
lembrarmos que um trabalho em grupo pode revelar várias situações, positivas e
negativas. O professor deve ter certos cuidados para que um trabalho em grupo
se revele algo positivo, o grupo não deveria ser imposto, poderia se sugerir a
participação daqueles que já aprenderam para servir de mediadores, mas com o
consenso dos mesmos.

Outro tema transversal, mencionado nos PCN (BRASIL, 1997), que podemos
explorar é o meio ambiente, porque além de trazer muitas concepções na
Matemática, é um assunto que podemos trabalhar na interdisciplinaridade com
outras matérias como: ciências, geografia, história, artes, sociologia e, assim,
por diante. É o meio onde acontece um incontável número de situações,nas
quaispodemos mergulhar para aprofundar e vincular os conhecimentos e formar
cidadãos críticos e solidários. Alguns desses conceitos na Matemática poderiam
ser médias, áreas, volumes, proporcionalidade, assim como procedimentos
matemáticos,como formulação de hipóteses, realização de cálculos, coleta,
organização e interpretação de dados estatísticos, prática da argumentação,
assim como, é indicado nos Parâmetros Curriculares Nacionais (BRASIL, 1997).

Nessa base também podemos usar temas como saúde, já fazendo relação
com meio ambiente e avançando para outro patamar e, depois, seguindo superar
o preconceito que se tem com a Matemática tanto com a sua dificuldade de
aprendizagem quanto ser exclusiva de áreas específicas do conhecimento e
limitada a algumas classes sociais, especificamente.

Com a evolução da humanidade, a Matemática passa a ganhar caráter


científico, adquirindo forma e estrutura interna própria. Não se desenvolve
apenas em função de necessidades externas, mas também, passa a avançar a
partir dos problemas que surgem em sua estrutura interna. Caberia aqui usar o

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Didática da Matemática

desenho animado do Pato Donald, da Disney, no episódio chamado “Donald no


mundo da matemágica” no qual surge a figura de Pitágoras, ideias platônicas, o
qual fala sobre o símbolo do pentagramae aparece o número áureo, também se
vincula proporções arquitetônicas do Parthenon atrelada às da Catedral de Notre-
Dame (Paris) e, assim, muitos outros exemplos de dimensões e de proporções
na natureza. Trata-se de um episódio para explorar o aspecto multidisciplinar e
desenvolver a ideia da estrutura interna da Matemática.

Figura 1 – Donald no mundo da matemágica

Fonte: Disponível em: <http://www.mdig.com.br/index.


php?itemid=29136>. Acesso em: 15 maio 2016.

Podemos conferir Em sua origem, a Matemática se constitui a partir de uma coleção


à Matemática dois de regras isoladas, decorrentes de experiênciasda vida diária, e se
aspectos distintos: converteu gradativamente em um sistema de variadas disciplinas.
o formalista e o Nesse contexto, podemos conferir à Matemática dois aspectos distintos:
prático.
o formalista e o prático.

Estes aspectos se influenciam mutuamente. Assim como as descobertas dos


matemáticos puros revelam valor prático, ao serem aplicadas as propriedades
Matemáticas em acontecimentos específicos, podem levar ao desenvolvimento
teórico da Matemática. A Matemática, ao longo da história da humanidade,
mostra-se uma ciência viva, dinâmica, em constante evolução e que interage com
a realidade.

A matemática transforma-se por fim na ciência que estuda


todas as possíveis relações e interdependências quantitativas
entre grandezas, comportando um vasto campo de teorias,
modelos e procedimentos de análise, metodologias próprias
de pesquisa, formas de coletar e interpretar dados (BRASIL,
PCN, 1997, p. 24).

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Capítulo 1 CONCEITOS DE DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Além de refletir sobre o caráter do conhecimento matemático,


Didática é um
temos por objetivo refletir sobre o caráter pedagógico da Matemática, conjunto de
ou seja, sobre como ensinar Matemática. A princípio, buscamos reunir princípios, crenças
aqui alguns elementos que possam ser tomados como referência e valores do ensino
para o estabelecimento de uma didática para o ensino da Matemática, e do método, que
assim, precisamos saber o que é a didática. Didática é um conjunto dialogam entre
si, formando
de princípios, crenças e valores do ensino e do método, que dialogam
um conjunto de
entre si, formando um conjunto de preceitos que servem de base para preceitos que
a perfeita execução da tarefa de ensina (PAIS, 2008). Assim, a didática servem de base para
do ensino da Matemática agrega o conjunto de princípios; crenças; a perfeita execução
opinião de autores; textos de obras escritas, entre outras ferramentas, da tarefa de ensina
adotados pelo professor de Matemática que servem de base para o (PAIS, 2008). Pensar
uma didática da
seu sistema de ensino e para a organização da disciplina. Pensar uma
Matemática é pensar
didática da Matemática é pensar sobre as relações no processo ensino- sobre as relações no
aprendizagem de Matemática (PAIS, 2008). processo ensino-
aprendizagem de
De um lado temos o problema da formação dos conceitos Matemática
matemáticos, por outro, a formação dos conceitos didáticos referentes
ao fenômeno da aprendizagem da Matemática. Mas seja qual for ao que fazemos
referência, é fundamental usar o método construtivista, inspirado nas ideias do
suíço Jean Piaget, que propõe que o aluno no seu aprendizado participe ativamente
mediante experimentação, trabalhos ou atividades em grupo possibilitando
a mediação entre colegas, estimulação à dúvida e ao desenvolvimento do
raciocínio, entre outros procedimentos. A partir da própria ação, o estudante vai
estabelecendo as propriedades dos objetos e construindo os conhecimentos e
as características do mundo.Simultaneamente, o professor de Matemática adapta
os conceitos científicos para trazê-los à sala de aula adequando-os às diversas
realidades.

A educação Matemática vem ganhando cada vez mais espaço nas


discussões acadêmicas e profissionais do ensino. Rico, Sierra e Castro (2000
apud GODINO 2003) consideram a educação Matemática como o sistema de
conhecimentos, intuições, planos de formação e finalidades formativas
quanto ao processo ensino-aprendizagem da Matemática. A educação
matemática
objeto de estudo
Simultaneamente, caracterizam a Didática da Matemática como a é a compreensão,
disciplina que estuda e investiga os problemas surgidos na Educação interpretação
Matemática. e descrição
de fenômenos
Conforme Pais(2008, p. 10), referentes ao ensino
e à aprendizagem
A educação matemática é uma grande área de
da matemática, nos
pesquisa educacional, cujo objeto de estudo diversos níveis de
é a compreensão, interpretação e descrição escolaridade

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Didática da Matemática

de fenômenos referentes ao ensino e à aprendizagem da


matemática, nos diversos níveis de escolaridade, quer seja em
uma dimensão teórica ou prática.

A consolidação da Educação Matemática como área de pesquisa é


relativamente recente, quando comparada à história da Matemática, em que seu
desenvolvimento recebeu um grande impulso nas últimas décadas, dando origem
às várias tendências teóricas, cada qual valorizando determinadas temáticas
educacionais do ensino da Matemática.

A expressão tendência teórica é utilizada para representar


a existência de um coletivo de pesquisadores em Educação
Matemática, que compartilha de um mesmo referencial teórico.
Por exemplo: Etnomatemática, Modelagem Matemática, Filosofia
da Educação Matemática, História da Matemática, Didática da
Matemática, entre outros.

Entre as várias tendências teóricas que compõem a Educação Matemática


no Brasil, a Didática da Matemática se caracteriza pela influencia de autores
franceses, conforme veremos neste material.Devemos nos perguntar então:

- O que é Didática da Matemática?

Vamos desvendar essa pergunta juntos!

Didática da Matemática
Quando preparamos uma aula de Matemática, além dos objetivos,
habilidades e competências que queremos desenvolver, fazemos a proposta de
como essa aula irá acontecer, quais os exemplos que iremos fornecer, quais as
realidades que iremos abordar para trazer o conceito em estudo à tona e tudo isso
forma parte da didática pedagógica da aula que será ministrada.

A expressão Didática da Matemática é diferente do que conhecemos como a


disciplina pedagógica de didática aplicada ao ensino.

Conforme Pais(2008, p.11):

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Capítulo 1 CONCEITOS DE DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

A didática da matemática é uma das tendências da A Didática da


grande área da educação matemática, cujo objeto Matemática objetiva
de estudo é a elaboração de conceitos e teorias compreender as
que sejam compatíveis com a especificidade condições de
educacional do saber escolar matemático, produção, registro
procurando manter fortes vínculos com a formação e comunicação do
de conceitos matemáticos, tanto em nível conteúdo escolar
experimental da prática pedagógica, como no da Matemática e de
território teórico da pesquisa acadêmica.
suas consequências
didáticas. Assim
A Didática da Matemática objetiva compreender as condições de sendo, todos os
produção, registro e comunicação do conteúdo escolar da Matemática conceitos didáticos
e de suas consequências didáticas. Assim sendo, todos os conceitos se destinam
didáticos se destinam a favorecer a compreensão das múltiplas a favorecer a
compreensão das
conexões entre a teoria e a prática.
múltiplas conexões
entre a teoria e a
A dimensão teórica é entendida como as principais ideias prática.
resultantes da pesquisa e a dimensão prática como sendo a condução
do fazer pedagógico. Nesse contexto, os elementos do sistema
didático, devem ser fortemente integrados entre si.Tema este que abordaremos
a seguir.

Atividade de Estudos:

1) Na compreensão do significado da Didática da Matemática no


texto, podemos afirmar que:

Assinale a alternativa correta:

a) A Didática da Matemática está vinculada ao jeito de apresentar


a disciplina aos alunos de uma maneira que estimule seu
aprendizado.
b) A Didática da Matemática está vinculada aos materiais que
o professor providencia para o processo ensino-aprendizagem
indicando explicitamente os conteúdos e não deixando lugar a
dúvidas.
c) A Didática da Matemática está vinculada a trabalhar a disciplina
em conjunto com outras disciplinas, mesmo que o contexto seja
estranho para o aluno, porque ele precisa construir um mundo
global.

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Didática da Matemática

d) A Didática da Matemática está vinculada à elaboração


de conceitos e teorias compatíveis com o saber matemático
específico da escola atrelado tanto à pesquisa acadêmica quanto
à formação dos próprios conceitos matemáticos na prática
pedagógica.

Sistema Didático
O Sistema Didático é uma estrutura composta de nove elementos
O Sistema
Didático é uma (PAIS, 2008) principais: professor, aluno, conhecimento, planejamento,
estrutura composta objetivos, recursos didáticos, instrumentos de avaliação, uma concepção
professor, aluno, de aprendizagem e metodologia de ensino. A interação entre esses
conhecimento, elementos é extremamente necessária para a condução da prática
planejamento, pedagógica. O professor é o maestro dessa orquestra, é por isso, que
objetivos, recursos
ele é o responsável por fazer acontecer tanto à comunicação dele com
didáticos,
instrumentos de seus alunos quanto fornecer exercícios e momentos de discussão
avaliação, uma entre os alunos sobre o assunto estudado para que venha a ocorrer à
concepção de mediação entre os próprios colegas.
aprendizagem e
metodologia de Muitos desses elementos são trabalhados prévio às aulas
ensino.
como o planejamento, relacionado a cada aula que vai ser ministrada
relacionando os conteúdos que serão estudados com o objetivo de
aprendizagem e sua contextualização. A escolha da metodologia está intimamente
ligada aos recursos didáticos como o quadro, o livro didático, os recursos
audiovisuais,que o professor possa utilizar ou que possa recrear no caso tenha
carência de alguns recursos na instituição educativa onde trabalhe. O professor
com tempo introduz também os recursos de contexto da realidade dos alunos em
que pode ser aplicado o conteúdo e as novas concepções de aprendizagem, o
diálogo com outras disciplinas, o próprio conhecimento e uma sequência didática
que leve a obter o sucesso do objetivo alcançado.

As relações entre professor, aluno e saber estão atreladas ao Sistema


Didático, como detalhamos. O rigor e o formalismo são características do
pensamento matemático e, na relação pedagógica entre professor e aluno, o
ensino da Matemática pode estar influenciado por aspectos relativos ao próprio
pensamento matemático, mas que na verdade não pertencem à natureza do
trabalho didático. Na próxima figura podemos observar o esquema do Sistema
Didático proposto por Brousseau (1986).

18
Capítulo 1 CONCEITOS DE DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Figura 2 – Sistema Didático

Fonte: Disponível em: <http://docslide.com.br/documents/1-universidade-federal-do-


para-especializacao-em-didatica-da-matematica.html>. Acesso em: 08 ago. 2016.

Assim, podemos nos fazer algumas perguntas:

- O que influencia na formação do saber matemático previsto na educação


escolar?
- Quem participa do processo seletivo dos conceitos matemáticos ensinados
na escola?

Para responder estas questões sob o olhar da Didática da Matemática,


recorremos ao conceito de transposição didática.

Atividade de Estudos:

1) Vamos imaginar que estamos na sala de aula explicando um


conceito e logo deixamos alguns exercícios para os alunos
aplicarem o tal conceito. A atitude do professor que vem ao
encontro da discussão nesse capítulo qual seria?

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Didática da Matemática

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TransposiÇÃo Didática
A transposição didática se revela uma ideia centralizadora da Educação
Matemática ao estar associada a vários outros conceitos. Lembramos que
a transposição nos leva a uma ideia de deslocamento e alteração. Assim, a
transposição didática permite, por exemplo, interpretar as diferenças que ocorrem
entre a origem de um conceito da Matemática, como ele encontra-se proposto
nos livros didáticos, e a intenção de ensino do professor e os resultados obtidos
em sala de aula. E nesse movimento acontece uma transposição. Aprofundamos
mais um pouco com base em Chevallard.

Segundo definição de Chevallard (1991 apud PAIS, 2008, p.19):

Um conteúdo de saber que tenha sido definido como saber a


ensinar, sofre, a partir de então, um conjunto de transformações
adaptativas que irão torná-lo apto a ocupar um lugar entre os
objetos de ensino. O ‘trabalho’ que faz de um objeto de saber
a ensinar, um objeto de ensino, é chamado de transposição
didática.

Chevallard (1991) conceitua Transposição Didática como o trabalho


de produção necessário para chegar a um objeto de ensino, a partir do saber
gerado pelo cientista.Essa transformação vai muito além da simplificação de
códigos científicos. Estuda a seleção que ocorre através de uma extensa rede de
influências, envolvendo diversos segmentos do sistema educacional.

O termo “Transposição Didática” foi introduzido pelo sociólogo Michel Verret


na França em 1975, e discutido novamente por Yves Chevallard, em seu livro
La Transposition Didactique, de 1985, empenhando-se em tornar evidentes as
transformações pelas quais passa o saber ao transpor o campo científico para o
âmbito escolar (PERRELLI, 1999).

20
Capítulo 1 CONCEITOS DE DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Assim, de maneira ampla, podemos considerar que a transposição


A transposição
didática é o conjunto de adaptações que o saber científico sofre
didática é o conjunto
para transformar-se em saber escolar. Podemos exemplificar isso de adaptações que o
começando pela linguagem utilizada na sala de aula, escolhemos uma saber científico sofre
variedade linguística mais apropriada à compreensão dos estudantes. para transformar-se
Os exemplos que se formulam são aqueles de menor complexidade e em saber escolar.
vai se incrementando a dificuldade na medida em que os alunos vão
compreendendo os conceitos trabalhados na sala.

Yves Chevallardé um didata francês do campo do ensino das


matemáticas. E seu trabalho internacionalmente conhecido é “A
Transposição Didática”. Sua publicação mais difundida no Brasil
é a tradução para o espanhol e o original em francês do livro La
Transposition Didactique, uma versão ampliada da primeira edição
francesa de 1985.

Na discussão entre a dimensão prática e teórica, Gastão Bachelard (1884-


1961), na França, é uma importante referência na interpretação do problema da
conciliação entre essas duas dimensões. Para Bachelard, toda análise teórica
deve passar por uma análise prática, da mesma forma que toda experiência deve
passar pelo controle de uma posição racional.

Nesse contexto, Bachelard (2003),trabalhou o conceito de obstáculos


epistemológicos. No que diz respeito principalmente às ciências exatas e, destaca
que é necessário superar ou haver uma transposição de uma série de obstáculos
à aprendizagem, para que a construção do espírito científico se efetive.

No campo da Matemática, particularmente a respeito da aprendizagem


escolar, abordamos a questão específica de obstáculos didáticos, a qual
definiremos a seguir.

Gaston Bachelard (1884-1962) filósofo e ensaísta francês que se


licencia em matemática no ano de 1912. A teoria da relatividade deita
por terra as suas ideias sobre física, o que o terá levado a estudar
filosofia, obtendo uma segunda licenciatura em letras em 1920. Tendo-
se doutorado em 1927 com a tese Ensaio sobre o Conhecimento
aproximado e Estudo sobre a Evolução de um problema da física,
21
Didática da Matemática

a propagação térmica nos sólidos. Em 1930, iniciou uma carreira


regular de professor universitário, especificamente nas universidades
de Dijon (1930-1940) e, depois na Sorbonne (Paris).

Atividade de Estudos:

1) Enquanto profissional atuante no âmbito escolar, como você se


percebe utilizando a transposição didática?
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OBstáculos Didáticos
Quando pensamos em obstáculo, logo fazemos uma ligação com a ideia de
alguma coisa que dificulta, impede ou simplesmente atrapalha a execução de uma
ação desejada. Assim, Bachelard (2003) discute o tema obstáculos, no sentido de
obstáculos epistemológicos, que são obstáculos que os professores devem evitar,
de maneira a garantir o sucesso do ensino-aprendizagem. Para isso, é necessário
estar atento e identificar esses obstáculos sem seu modo de ensinar, no ambiente
da sala de aula e nos recursos didáticos usados. O professor precisa estar ciente
do que cada um trata, pois somente assim, poderá desvendá-los e superá-los, ou
ainda, ajudar os seus alunos a vencê-los.

Bachelard (2003) observou que a evolução de um conhecimento pré-científico


para um nível de reconhecimento científico passa, quase sempre, pela rejeição de
conhecimentos anteriores e se defronta com obstáculos. Esses obstáculos não
estão atrelados à falta de conhecimento, mas sim, a conhecimentos antigos que
resistem à instalação de novas concepções. Da mesma maneira, acontece com
os obstáculos no ensino-aprendizagem da Matemática.

22
Capítulo 1 CONCEITOS DE DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Como a Matemática apresenta certa regularidade em se tratando


Obstáculos
de sua evolução histórica, ao invés de trabalhar na concepção dos didáticos, ou seja,
obstáculos epistemológicos, Pais (2008) admite a existência de noção motivada
obstáculos didáticos, ou seja, noção motivada pela comparação entre a pela comparação
evolução dos conceitos, no plano histórico dos saberes científicos, e o entre a evolução dos
fenômeno cognitivo, no plano subjetivo da elaboração do conhecimento. conceitos, no plano
histórico dos saberes
científicos, e o
Com essa reflexão nos questionamos sobre como a superação fenômeno cognitivo,
dos obstáculos didáticos pode facilitar a investigação da formação de no plano subjetivo
conceitos? Que elementos precedentes entram na construção de um da elaboração do
novo conceito? conhecimento.

É fundamental que as aulas de matemática lancem


um novo olhar para a construção de conceitos ou É fundamental
significados matemáticos. E esse novo olhar traga que as aulas de
a realidade em que a escola e seus estudantes matemática lancem
encontra-se inserida. Dessa maneira os conceitos um novo olhar
que serão construídos podem se constituir na para a construção
realidade, num mundo concreto e com exemplos
de conceitos
vinculados e aplicados a situações que tanto o aluno
quanto seu professor de matemática conhecem ou significados
e lidam no seu dia-dia ou em circunstâncias matemáticos.
específicas em que o aluno possa se visualizar e
perceber o tal conceito. Assim como Freire nos faz
analisarmos [...].

Não seria, porém, com essa educação desvinculada da


vida, centrada na palavra, em que é altamente rica, mas na
palavra “milagrosamente” esvaziada da realidade que deveria
representar, pobre de atividades com que o educando ganhe
a experiência do fazer, que desenvolveríamos no brasileiro
a criticidade de sua consciência, indispensável à nossa
democratização (FREIRE, 2006, p.102).

Conceber o ensino da Matemática voltado para a problematização e análise


de situações diversas do cotidiano, permite que o aluno faça deduções levando
em conta suas experiências de vida e, consequentemente, levando-o à construção
de conceitos matemáticos.

Nesse contexto, podemos nos questionar pela aplicação prática dos


conceitos matemáticos, considerando o espaço vivo de uma sala de aula. Quais
as competências necessárias para o exercicio docente? Brousseu (1996) nos dá
um dos possíveis caminhos: o estudo das situações didáticas.

23
Didática da Matemática

Guy Brousseau nasceu em 4 de fevereiro de 1933, em Taza,


no Marrocos. Passou a lecionar na Universidade de Bordeaux,
no fim dos anos de 1960, sendo mais tarde diretor do Laboratório
de Didática das Ciências e das Tecnologias e professor emérito.
Em 1991, tornou-se docente do Instituto Normal Superior local.
Brousseau investiu em uma teoria que compreendia as interações
sociais entre os alunos, os professores e o conhecimento.

SituaÇões Didáticas
A teoria de Brousseau (1996) sobre as situações didáticas busca estudar as
relações epistemológicas, cognitivas e sociais do ensino da matemática, ou seja,
Brousseau (1996) se preocupa além da relação professor-aluno, em entender
também o contexto em que essa relação ocorre. A Teoria das Situações Didáticas
desenvolvida por ele se baseia no princípio de que "cada conhecimento ou saber
pode ser determinado por uma situação", entendida como uma ação entre duas
ou mais pessoas.

Situações Didáticas, Na Teoria das Situações Didáticas, o professor propõe problemas


o professor propõe para que os alunos possam interagir, discutir e construir os conceitos
problemas para matemáticos de forma ativa e participativa. Sendo assim, o aluno
que os alunos participa do processo e tem condições de usar o conhecimento
possam interagir, construído no âmbito escolar, fora deste, de forma natural e espontânea.
discutir e construir
os conceitos
matemáticos de Para representar a teoria das Situações Didáticas, Brousseau
forma ativa e (1996) propõe o triângulo didático (figura 1) que relaciona o aluno, o
participativa. professor e o saber, constituindo uma relação dinâmica e complexa.

24
Capítulo 1 CONCEITOS DE DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Figura 3 – Triângulo didático

Fonte: Adaptado de Almouloud (2007, p. 32).

As situações didáticas são ocorrências elaboradas intencionalmente pelo


professor para defrontar os alunos com contextos que exijam dele a busca de
conhecimentos para a análise e resolução das situações.

Para Brousseau (1996) as situações didáticas são classificadas em etapas:


ação, formulação, validação e institucionalização.

a) Ação: Na fase da ação, o professor cede ao aluno a responsabilidade pela


aprendizagem. No momento em que propõe ao aluno uma situação didática,
o aluno realiza uma primeira análise e traz uma devolutiva ao professor que,
contra-argumenta buscando possibilidades de ação por parte do aluno. O aluno
reflete sobre as possíveis soluções, elegendo um procedimento de resolução.

b) Formulação: Já na fase da formulação ocorre a troca de informação, através


de uma linguagem Matemática formal. Nesta fase os alunos procuram
transcrever o compreendido, o coloquial, para o formal que devem comunicar.
Isto é, tem que se transcrever a linguagem falada, onde é comum ser coloquial,
para a linguagem escrita, a qual deve ser formal.

c) Validação: Junto à fase da validação, através de linguagem Matemática


apropriada, buscam convencer os interlocutores da veracidade da informação.
Importante observar que, durante todas essas fases, o professor encontra-
se como mediador, levando os alunos a trilhar o caminho da construção do
conhecimento matemático. Pois ser mediador é uma postura do professor

25
Didática da Matemática

que pode e deve ocorrer durante toda a aula, durante todo o período letivo.
Devemos estar atentos nesse aspecto e em nossas atitudes durante nossas
aulas, pois muitos professores consideram que essa prática só é possível
quando trabalhamos com projetos, mas não. Ela é possível também em
aulas tradicionais, pois o que torna um professor mediador, é ele não dar as
respostas prontas, mas sim, proporcionar ao aluno situações que lhe permitam
construir conceitos.

Figura 4 –Cuidado com a postura no processo ensino-aprendizagem

Fonte: Quino (2003, p.16).

Por fim, temos a fase da institucionalização, onde a intenção do professor é


socializada e onde retoma sua responsabilidade (cedida até então aos alunos),
formalizando os objetos e objetivos de estudo.

Com a Teoria das Situações Didáticas, o erro deixa de ser um desvio


imprevisível para se tornar um obstáculo valioso e parte da aquisição de saber.
Há uma teoria específica que estuda a função do erro na aprendizagem. É visto
como o efeito de um conhecimento anterior, que já teve sua utilidade, mas agora
se revela inadequado ou falso.

26
Capítulo 1 CONCEITOS DE DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Um educador, sob a ótica de Piaget (1982), que considera o erro


Aproveitar o papel
parte do processo construtivo da aprendizagem, deve ser paciente e
do erro no meio
competente para avaliar, segundo a teoria de ensino-aprendizagem escolar.
que utiliza. Isto, pois o processo de construção do conhecimento do
seu estudante, a reformulação dos procedimentos de ensino, de maneira que
esse consiga chegar aos objetivos da escolarização são fundamentais, ou seja:
que sejam alunos formados numa perspectiva integral e com criticidade, que
sejam bem informados, que raciocinem com independência e que sejam capazes
de se posicionar. Isto só será possível sabendo aproveitar o papel do erro no meio
escolar.

Esse deve ser tomado como sinal de que o processo ensino- Esse deve ser
aprendizagem já iniciou e que nesse caminho ele não é considerado tomado como
derrotado/fracassado, não há porque punir o aluno e ele não deve sinal de que o
processo ensino-
temer ou evitar cometê-lo. Ao contrário, deve ser utilizado como parte
aprendizagem já
da construção do conhecimento, uma peça que vai em outro lugar iniciou e que nesse
e não onde está sendo colocado, se deve encorajar e parabenizar caminho ele não
aquele estudante que mostrou o erro, porque isso ajuda a ele próprio é considerado
e aos seus colegas avançar na construção dos novos conceitos. Cabe derrotado/
então, ao professor, ajudar seus alunos a analisarem a adequação do fracassado, não há
porque punir o aluno
procedimento selecionado, encaminhando-os na busca de condutas
e ele não deve temer
mais ricas, complexas e diversificadas. ou evitar cometê-lo.

No caso da figura 5 sobre ensino-aprendizagem aparecem os passos pelos


quais o aluno passa para atingir a aprendizagem, no caso do exemplo é sobre
sistema de escrita, esse seria o assunto, que no nosso caso é a Matemática.
Qualquer conceito matemático também passará pelos passos indicados na figura.
E o erro que o estudante cometer durante esse processo nos mostra seu raciocínio
e, com isso, o professor pode auxiliá-lo a elaborar melhor o conhecimento até
chegar na aprendizagem.

27
Didática da Matemática

Figura 5 –Ensino-aprendizagem

Fonte: Disponível em: <http://pt.slideshare.net/brunarbraga9/


psicognese-da-lngua-escrita>. Acesso em: 15 maio 2016.

Para saber mais sobre o erro na construção do conhecimento,


acesse o artigo Aprendizagem infantil: o erro na visão
construtivista, disponível no site: <http://www.webartigos.com/artigos/
aprendizagem-infantil-o-erro-na-visao-construtivista/93152/#ixzz49V
QqVqlL>.

O trabalho, nessa concepção, leva os alunos a buscar por si mesmos as


soluções, chegando aos conhecimentos necessários para isso. No desenvolver do
processo ensino-aprendizagem, uma parte é a cargo do professor e outra parte, a
cargo do aluno. Essas responsabilidades de ambos os envolvidos, tanto professor
quanto aluno, devem ficar claras, ou seja, qual parte corresponde a cada um. E
isso, geralmente, o faz o professor através do contrato didático que apresentamos
a seguir.

28
Capítulo 1 CONCEITOS DE DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Atividade de Estudos:

1) Explique num pequeno texto dissertativo qual é a atitude mais


adequada do professor frente ao erro cognitivo do aluno quando
ele o comete na sala de aula, em concordância com o tratado
nesse capítulo?
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Contrato Didático
Proposta por Guy Brousseau (2006), no início da década de 1980, a ideia
de contrato didático pretende estabelecer um conjunto de fatores referentes à
relação didática entre professor e aluno, que procura definir as responsabilidades
e os comportamentos que cada sujeito deve ter perante o outro nas práticas que
possibilitam a construção do saber.

Estas responsabilidades/comportamentos, por sua vez, são legitimadas por


meio de regras implícitas, que estão envolvidas, mas não de modo claro e, sim,
subentendido e regras explícitas, aquelas expressas formalmente e de maneira
clara, desenvolvida e bem explicadas. O contrato didático pretende descrever
comportamentos determinados referentes ao professor e que os alunos esperam
desse, assim como um conjunto de comportamentos por parte dos alunos que o
professor deseja desses em vista do seu melhor aproveitamento nas atividades
que acontecem durante as salas de aula.

Assim, a função do contrato didático é equilibrar questões implícitas e


explícitas, buscando criar um espaço de diálogo e troca entre professor e
alunos, tendo em vista que a comunicação tem sentido diferente para ambos
os atores. Deve haver um espaço de significações em relação ao saber, onde
nada é comum ou preestabelecido. Na escola, o contrato didático é fundamental,
pois dá responsabilidade ao aluno também do sucesso das aulas e do melhor

29
Didática da Matemática

aproveitamento da matéria estudada. Esse contrato chama o aluno


A função do contrato
para ser protagonista junto com o professor. No contrato didático, o
didático é equilibrar
questões implícitas aluno também assume tarefas que deve desempenhar para que a
e explícitas, aprendizagem ocorra. Assim, como o compromisso do professor de
buscando criar um levar aulas bem preparadas e desenvolvidas e possibilitar atividades
espaço de diálogo e que motivem a aprendizagem.
troca entre professor
e alunos, tendo
Segundo Régine Douady (apud PAIS, 2002b, p. 10-11):
em vista que a
comunicação tem
sentido diferente A Didática da Matemática estuda os processos de transmissão
e de aquisição dos diferentes conteúdos desta ciência,
para ambos os
particularmente numa situação escolar ou universitária. Ela
atores. se propõe a descrever e explicar os fenômenos relativos
às relações entre seu ensino e sua aprendizagem. Ela não
se reduz a pesquisar uma boa maneira de ensinar uma
determinada noção particular.

Deste conceito podemos apreender que a Didática da Matemática “não


visa simplesmente recomendar modelos ou receitas de solução a determinados
problemas de aprendizagem” (PAIS, 2002b, p. 11). Em Pais (2002a, p. 11),
obtemos uma definição da Didática da Matemática relativa ao contexto brasileiro,
ou seja, uma tendência da grande área da Educação Matemática, que tem por
objeto de estudo,

[...] a elaboração de conceitos e teorias que sejam compatíveis


com a especificidade educacional do saber escolar matemático,
procurando manter fortes vínculos com a formação de
conceitos matemáticos, tanto em nível experimental da prática
pedagógica, como no território teórico da pesquisa acadêmica.

Assim, essa é uma ferramenta valiosa utilizada em vários momentos do


período letivo e para diferentes tipos de atividades que se realizam no percorrer
das aulas e do processo ensino-aprendizagem, a qual sempre tem que estar
presente nas palavras do professor para ter o tempo todo seus alunos vinculados
e comprometidos com o conhecimento.

Atividades de Estudos:

1) Enquanto sua atuação como professor, você traz conceitos através


de situações didáticas objetivando com que seus alunos precisem
raciocinar na resolução de situações que podem acontecer na sua
realidade, aproximando assim, o conceito à vida do estudante. De
que maneira acontece esse processo no seu caso?

30
Capítulo 1 CONCEITOS DE DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

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2) Qual é o objetivo de fazer uso de um contrato didático entre


professor e alunos?
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3) Enquanto profissional atuante no âmbito escolar, como você se


percebe utilizando a transposição didática?
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Algumas ConsideraÇões
A Didática da Matemática, é uma das tendências teóricas da Educação
Matemática. No Brasil, esta tendência teve forte influência dos autores franceses,
alguns dos quais, apresentamos e apresentaremos nos próximos capítulos
as teorias que têm sido utilizadas como suporte em diversos trabalhos de
pesquisadores matemáticos brasileiros.

A partir da década de 1960, foram implementadas algumas mudanças no


ensino da Matemática, com proposição de novos programas, metodologias de
ensino, conteúdos e currículos para a formação de professores. Estas mudanças

31
Didática da Matemática

coincidem com o impulso que teve a Educação Matemática no Brasil e que se


identificou com a grande diversidade de tendências teóricas que surgiram.

Foram concebidas lógicas de organização no ensino da Matemática,


operações realizadas no referente a conjuntos numéricos atrelados a teoremas,
fórmulas, axiomas e demonstrações que são característicos do conhecimento
matemático e as mudanças abarcaram a didática utilizada para essa nova maneira
de ensinar Matemática, Matemática moderna.

A existência deste considerável movimento educacional, que trabalha


na estruturação de um saber pedagógico voltado ao ensino da Matemática,
teve justificativa, em nível social, na necessidade de responder a uma crise
generalizada que atinge toda a educação escolar.

Essas novas tendências revelam variadas concepções da própria educação,


desde as mais tradicionais às mais libertadoras sobre a prática escolar. Neste
contexto, surge a Didática da Matemática como uma forma particular de descrever
e compreender os fenômenos da prática educativa.

Todos os conceitos didáticos visam favorecer a compreensão das múltiplas


conexões entre a teoria e a prática, propiciando compreender as condições de
produção, registro e comunicação do conteúdo escolar da Matemática e suas
consequências didáticas. Deste modo, entende-se a dimensão teórica como o
ideário resultante da pesquisa e a prática como a condução do fazer pedagógico.

Referências
BACHELARD, G. (1928). Ensaio sobre o conhecimento aproximado. Rio de
Janeiro, RJ: Contraponto, 2004, 316p.

______. (1938). A formação do espírito científico. Rio de Janeiro, RJ:


Contraponto, 2003, 316p.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares


nacionais: matemática.Secretaria de Educação Fundamental. Brasília: MEC/
SEF, 1997. 142p.

BROUSSEAU, G. A Teoria das Situações Didáticas e a Formação do


Professor. Palestra. São Paulo: PUC, 2006.

32
Capítulo 1 CONCEITOS DE DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

______. Fundamentos e Métodos da Didáctica da Matemática. In: BRUN, J.


Didática das Matemáticas. Tradução de: Maria José Figueiredo. Lisboa: Instituto
Piaget, 1996a. Cap. 1. p. 35-113.

______. Os diferentes papéis doprofessor. In: PARRA, C.; SAIZ, I. (org). Didática
da Matemática: Reflexões Psicológicas. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996b.
Cap. 4. p. 48-72.

CHEVALLARD, Y., BOSCH, M. e GASCÓN, J. Estudar Matemáticas: o elo


perdido entre o ensino e a aprendizagem. Tradução: Daisy Vaz de Moraes. Porto
Alegre: Artmed, 2001.

______. Educação como prática da liberdade. 29. ed. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 2006.

D’AMBRÓSIO, U. Etnomatemática - elo entre as tradições e a modernidade.


Belo Horizonte: Autêntica, 2005.

FREIRE, P. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a Pedagogia do


Oprimido. 11. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003.

GODINO, J. Perspectiva de la Didática de lãs Matemática como disciplina


científica. Un. Granada: Programa de doctorado “Teoria de la educación
Matemática”, 2003.

PAIS, L. C. Didática da matemática: uma análise da influência francesa. 2.


ed. 2. Reimp. -Belo Horizonte: Autêntica, 2008. 128p. (Coleção Tendências em
Educação Matemática, 3).

______. Transposição Didática. In: ALCÂNTARA, S. D. (Org). Educação


Matemática: uma introdução. p. 13-42. São Paulo: EDUC, 1999.

______. Introdução. In: MACHADO, Silvia Dias A. Educação Matemática: uma


introdução. 2. ed. São Paulo: EDUC, 2002a, 9-12.

______. Transposição Didática. In: MACHADO, Silvia Dias A. Educação


Matemática: uma introdução. 2. ed. São Paulo: EDUC, 2002b, 13-42.

PERRELLI, M. A. S. Uma epistemologia dos conteúdos das disciplinas


científicas: as contribuições da transposição didática. In: Série-Estudos.
Periódico do Mestrado em Educação da Universidade Católica Dom Bosco. n.7,
p. 76-113, abr. Campo Grande, MS: 1999.

33
Didática da Matemática

34
C APÍTULO 2
Referências da Didática da
Matemática

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Apresentar o saber matemático e suas particularidades.

 Discutir o trabalho do professor de matemática.

 Conhecer obstáculos epistemológicos e didáticos no ensino da matemática.

 Articular o trabalho do professor de matemática com os obstáculos epistemológicos


e didáticos.

 Analisar a formação de conceitos e os campos conceituais.


Didática da Matemática

36
Capítulo 2 REFERÊNCIAS DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

ConteXtualiZaÇÃo
Quando falamos em referências, poderíamos pensar em autores ou diretrizes
sobre o estudo da Didática da Matemática, no entanto, o que desejamos fazer é
tornar claras as referências fundamentais que servem para compor uma didática
mais relevante no âmbito educacional e científico. Nesse sentido, abordamos
as questões das escolhas que realizam os professores no seu trabalho,
cuja abrangência é a partir de seus conhecimentos e propostas de ensino, os
conteúdos que terão que trabalhar vinculados ao saber, aos tipos de obstáculos
que podem enfrentar no processo ensino-aprendizagem envolvendo tanto o
próprio professor quanto o aluno com sua intelectualidade e com a valorização do
seu contexto. Além disso, o professor não só trabalha os significados do próprio
conceito, mas leva essas variáveis mencionadas conjugadas no fazer do professor
na realidade escolar. Nesse capítulo, abordamos as referências da Didática da
Matemática, dialogamos com Brousseau (1986a) e realizamos uma análise do
saber matemático levado à esfera escolar.

O SaBer Matemático
Ao pensar em saber matemático, as primeiras ideias que ocorrem são
abstratas, características próprias da matemática. Consideramos, aqui, que a
natureza do saber matemático procedente de um lugar acadêmico irá afetar a
prática na escola desse professor, levando sua concepção das ideias matemáticas
à sala de aula. Cada professor terá sua própria concepção de acordo com a
formação que teve e da sua história pessoal e acadêmica. Lembramos que existe
diversidade de concepções filosóficas e isso traz diferentes práticas educativas.

A criação de conceitos, descobertas de teoremas e demonstrações são


traços característicos do trabalho do matemático, que são básicos no ensino
da matemática, e que posto em prática vem atrelado à aprendizagem dessa
disciplina. Nessa atrelagem se faz necessária tanto à atuação pedagógica quanto
às tarefas realizadas pelos alunos para obter, de fato, o sucesso na aprendizagem
da disciplina e, para isso, se deve considerar o conteúdo estudado relacionado ao
contexto em que o aluno se encontra inserido.

Nesse contexto, a Etnomatemática é uma tendência dentro da Etnomatemática


é uma tendência
educação matemática que, conforme Ubiratan D’Ambrosio (1990, p.5-
dentro da educação
6), é: matemática.

[...] a arte ou técnica de explicar, de conhecer, de entender-


nos diversos contextos culturais. [...] é um programa que visa

37
Didática da Matemática

explicar os processos de geração, organização e transmissão


de conhecimento em diversos sistemas culturais e as forças
interativas que agem nos e entre os três processos [...].

A Etnomatemática pode ser empregada no processo ensino-aprendizagem


da Matemática com o intuito de compreender as diferentes sociedades culturais,
tais como grupos urbanos, grupos rurais, trabalhadores, classes profissionais,
grupos indígenas, entre outros. Não é aprendida dentro de uma escola, e sim,
através do convívio entre colegas de profissão, amigos, familiares e, em geral,
através da vida cotidiana.

Para Ubiratan D’Ambrosio (1990, p.5):

[...] etno é hoje aceito como algo muito amplo, referente ao


contexto cultural, e portanto inclui considerações como
linguagem, jargão, códigos de comportamento, mitos e
símbolos; matema é uma raiz difícil, que vai na direção de
explicar, de conhecer, de entender; e tica vem sem dúvida de
techne, que é a mesma raiz de arte e de técnica.

A Etnomatemática é um dos caminhos para o resgate da função social


da escola, no intuito dessa se constituir em mais um elemento preocupado em
promover aos alunos o questionamento das razões da vida em sociedade. A
escola deve ser tomada como o lugar onde o aluno entra em contato com uma
série de conhecimentos, que ele pode não vivenciar diretamente, mas que lhe
possibilitem uma compreensão mais ampla do mundo que o rodeia. E, nesse
sentido, o saber matemático pode ser socializado e contribuir para elevar o nível
cultural da população, que hoje se encontra alienada dos processos decisórios,
em nome da ignorância. Nesse contexto, a prática pedagógica da
Faz-se necessário
buscar como fonte Matemática, pode se tornar um meio para a construção/reconstrução
para a construção social.
do conhecimento
matemático, as Faz-se necessário buscar como fonte para a construção do
questões que conhecimento matemático, as questões que emergem da realidade
emergem da
social do aluno, ou seja, transformar o ensino em atividade significativa,
realidade social
do aluno, ou seja, o que certamente trará mais motivação e, frequentemente, um
transformar o aprofundamento do significado dessas questões.
ensino em atividade
significativa, o que
certamente trará
mais motivação e,
frequentemente, um
aprofundamento do
significado dessas
questões.

38
Capítulo 2 REFERÊNCIAS DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Conheça um produto educacional envolvendo a Etnomatemática


em um dos trabalhos de Mestrado em Ensino de Ciências Naturais e
Matemática.

TIRONI, Cristiano Rodolfo. As contribuições do Laboratório de


educação matemática Isaac Newton para o ensino de matemática
na educação básica na perspectiva da etnomatemática. 2015.
86 + 61 f., il. Dissertação (Mestrado em Matemática) - Universidade
Regional de Blumenau, Centro de Ciências Exatas e Naturais,
Programa de Pós-Graduação em Ensino de Ciências Naturais e
Matemática, Blumenau, 2015. Disponível em: <http://www.bc.furb.br/
docs/DS/2015/360424_1_1.pdf>. Acesso em: 23 mai. 2016.

Para compreendermos melhor a matemática, no quesito sobre


Para
a sua natureza filosófica Davis e Hersh (1985) assinalam que há compreendermos
historicamente três tendências, o platonismo, o formalismo e o melhor a
construtivismo. A explicitação dos fundamentos dessas tendências, matemática, no
permite a discussão dos objetos de estudo da Matemática a partir de quesito sobre a sua
concepções que se fazem presentes nas práticas pedagógicas com a natureza filosófica
Davis e Hersh (1985)
disciplina.
assinalam que há
historicamente
a) Platonismo três tendências,
o platonismo, o
A tendência mais antiga ,considera que existe um mundo que não formalismo e o
é matéria e, portanto, os objetos são ideias acabadas, assim como os construtivismo.
conceitos também são acabados, já existem previamente aos esforços
intelectuais de cientistas,o que nos leva a pensar que eles não são inventados,
mas descobertos. Nesta concepção, a Matemática existe independente dos
homens, pois está em alguma parte, no mundo das ideias platônicas. Essa
concepção é “O Platonismo”. Davis e Hersh, (1985, p. 359) afirmam que,

[...] os objetos matemáticos são reais. Sua existência é um


fato objetivo, totalmente independente de nosso conhecimento
sobre eles. Conjuntos finitos, conjuntos infinitos não numeráveis,
variedade de dimensão infinita, curvas que enchem o espaço
– todos os membros do zoológico matemático são objetos
definidos, com propriedades definidas, algumas conhecidas,
muitas desconhecidas.
Nesta perspectiva, os objetos são entes ideais, não são físicos ou materiais,

39
Didática da Matemática

existem desligados de um espaço e tempo, portanto são imutáveis e, o papel do


matemático é o de descobrir o que já existe, está pré-determinado no mundo.

b) Formalismo

Já na segunda tendência, entram em jogo elementos conhecidos como


axiomas, definições e teoremas que dialogam entre eles através de regras que,
por sua vez, conduzem a deduções e sequências lógicas traduzindo isso em
atividade matemática. Colocando em prática os conceitos daí derivados, podem
se inventar fórmulas que sejam aplicadas na resolução de problemas numa
realidade específica. Esta tendência tem suas raízes em Kant, que considera
que a lógica desempenha na Matemática o mesmo papel do que em qualquer
outra ciência e, conforme Machado (1994, p. 29): “Considera que, sem dúvida,
em Matemática os teoremas decorrem dos axiomas de acordo com as leis da
Lógica. “Nega, no entanto, que os axiomas sejam eles mesmos, princípios lógicos
ou consequências de tais princípios.””.

Nessa concepção, denominada “Formalismo” não existem objetos


matemáticos, “a matemática consiste em axiomas, definições e teoremas – em
outras palavras fórmulas.” (DAVIS; HERSH, 1985, p. 360). O formalismo, criado
em 1910 por Hilbert (1861-1943), defende a linguagem formal em detrimento
da linguagem cotidiana, natural, pois acredita que a linguagem formal utiliza
raciocínios absolutamente seguros, acima de qualquer suspeita ou contradição.

Para a formação de professores de matemática é fundamental contar com a


amplitude de conhecimentos e opções na sua prática pedagógica, ter acesso ao
objeto didático, o trabalho do matemático e suas concepções. As duas tendências
explicadas são válidas e mesmo parecendo dicotômicas é conveniente considerá-
las para o entendimento de uma noção científica.

c) Construtivismo

Por volta de 1908, surge a corrente construtivista, que admite a existência de


entidades abstratas, mas somente na medida em que são construídas pela mente
do sujeito. O idealizador desta escola foi Brower, que admite um modelo kantiano
de conhecimento a priori, que o homem tem uma intuição particular que lhe
permite construções mentais a partir de uma percepção imediata. A Matemática é
entendida como construção mental e não como um conjunto de teoremas.

Nesta corrente, considera-se que “os objetos matemáticos não podem ser
considerados existentes, se não forem dados por uma construção, em número
finito de procedimentos, partindo dos números naturais. Não é suficiente mostrar

40
Capítulo 2 REFERÊNCIAS DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

que a hipótese de não-existência conduziria a uma contradição.” (DAVIS; HERSH,


1985, p. 375).

Quanto a esta tendência, existem algumas limitantes ligadas à amplitude


das concepções matemáticas que essa tendência aceita. O autor Davis (1985)
se refere às concepções matemáticas com base no “Construtivismo” como
concepções limitadas que só expressam o que pode ser obtido como uma
construção finita, deixando de lado teorias que trabalham com números reais.
Essa natureza filosófica do construtivismo, na área da matemática fica pouco
expressiva quando comparada com as de maior preponderância como são o
Platonismo e o Formalismo. Assim, essas duas últimas tendências são as que
sobressaem na atuação científica.

Aprofunde seus conhecimentos sobre concepções filosóficas,


realizando a leitura do artigo:

MENEGHETTI, R. C. G.; TREVISANI, F. de M. Futuros


matemáticos e suas concepções sobre o conhecimento matemático
e seu ensino e aprendizagem. In: EMP. Educação Matemática
Pesquisa. Revista do Programa de Estudos Pós-Graduados em
Educação Matemática. São Paulo, v.15, n.1, pp.147-178, 2013.

A tendência platônica está baseada nas ideias de Platão, que valorizava o


trabalho intelectual em detrimento do trabalho manual. A Matemática se encontrava
em um mundo ideal, tendo supremacia em relação às outras ciências. Baraldi
(1999, p. 85) considera que esta concepção está presente quando consideramos
a Matemática “contextualizada nela mesma, abstrata, pronta e acabada, que
somente pode ser aprendida intelectualmente.”.

A tendência formalista considera o conhecimento matemático como detentor


de verdades absolutas, que podem ser provadas pelo método dedutivo e que não
podem ser validadas por métodos experimentais. Conforme Baraldi (1999, p.
86): “Os absolutistas aceitam, sem demonstrações, um conjunto de afirmações
básicas, a partir da qual deduzem logicamente outros resultados.”.

E, finalizando, na tendência construtivista, os conhecimentos matemáticos


são construídos e reconstruídos, não sendo separados, conforme Baraldi (1999,
p. 90), “do conhecimento empírico, da física e de outras crenças”. A Matemática

41
Didática da Matemática

é considerada uma construção humana e social. Nesta tendência, privilegia-se


o debate em sala de aula na atuação de professor e alunos, que elaboram uma
Matemática também viva, rejeitando o formalismo, com o seu modelo dedutivo.

Finalmente, percebemos que o saber matemático se constitui de concepções


de conhecimento objetivos, mas sendo feito pelas ideias do homem em que
estão implícitas a intermediação da subjetividade e historicidade na produção
desse saber. Assim, a subjetividade serve de suporte à objetividade que a sua
vez concretiza a descoberta de novas ideias através de demonstração, ou seja,
conhecemos uma coisa de maneira absoluta, quando sabemos qual é a causa
que a produz e o motivo porque não pode ser de outro modo, caracterizando o
saber por demonstração.

Os trabalhos na linha da Etnomatemática, destacada acima, apresentam


múltiplas possibilidades, ou seja, podem ser desenvolvidos junto à matemática
escolar e não escolar, a matemática de grupos profissionais, a matemática
praticada em comunidades das mais diversas. Esses trabalhos envolvem
diferentes abordagens e, o caminho escolhido pelo professor e ou pesquisador,
depende, por exemplo, da percepção e compreensão que tem da matemática e
do conhecimento em geral.

A mais conhecida caracterização da Etnomatemática foi feita por D’Ambrosio


(2011). Seu entendimento se apresenta a partir de uma análise estrutural do termo
“Etno + Matema + Tica” como sendo os diferentes modos, estilos e técnicas de
explicar, aprender, conhecer de cada grupo culturalmente determinado.

Assim, podemos observar que o discurso etnomatemático busca


Podemos, então adotar uma postura crítica diante dos discursos de neutralidade e
entender, que a
universalidade da produção do conhecimento matemático.
partir do olhar
filosófico sobre
a natureza do Podemos, então entender, que a partir do olhar filosófico sobre a
conhecimento natureza do conhecimento matemático, acreditamos que os professores
matemático, podem rever as suas concepções e optar por posturas com perspectiva
acreditamos que os crítica de abordagem do conhecimento, do ensinar e aprender, da
professores podem
relação entre professor e aluno.
rever as suas
concepções e optar
por posturas com Faz-se necessário refletir sobre os currículos de Matemática dentro
perspectiva crítica das escolas, considerando o lugar de atuação dos professores, o objeto
de abordagem do ou objetos de estudo da Matemática, os aspectos internos a esta ciência
conhecimento, do e os aspectos externos à Matemática, que são os possibilitadores para
ensinar e aprender,
pensarmos em Educação Matemática. Conforme Davis e Hersh (1985,
da relação entre
professor e aluno. p. 49):

42
Capítulo 2 REFERÊNCIAS DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

O que é conhecer algo em matemática? Que tipo de sentido


é transmitido por afirmativas matemáticas? Assim, problemas
inadiáveis da prática diária da matemática conduzem a
problemas fundamentais de epistemologia e ontologia, mas
quase todos os profissionais aprenderam a evitar estes
problemas, julgando-os irrelevantes.

Assim, entendemos que o professor de Matemática deva conhecer sobre a


natureza do conhecimento matemático, para que possa rever as suas concepções
e optar por posturas condizentes com uma perspectiva crítica de abordagem do
conhecimento.

Apesar do grande movimento em prol da utilização das novas


propostas de ensino em sala de aula, ainda muitos professores, até
por desconhecimento, se baseiam em tendências do platonismo e do
formalismo.

A exemplo da tendência formalista, podemos citar o ensino


da tabuada. Vemos que muitos professores não se preocupam em
trabalhar com os alunos o significado da mesma, apenas querem
que os mesmos a “decorem”. Também podemos citar como exemplo,
o que acontece em muitas salas de aula de matemática, onde
o algoritmo é muito mais importante do que o entendimento do
processo envolvido.

Você conhece algum exemplo de professor que trabalha desta


forma? Como é a sua atuação como professor (a)?

Atividades de Estudos:

1) O que diferencia as três tendências filosóficas na matemática?


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43
Didática da Matemática

2) Qual sua experiência com a Etnomatemática? Descreva uma


atividade já vivenciada (ou somente conhecida) e identifique
qual a contribuição desta área de pesquisa para a construção de
conceitos matemáticos.
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O TraBalho do Professor de
Matemática
Iniciamos diferenciando o papel do matemático em relação ao papel
O matemático do professor de matemática. O matemático tem como objeto de estudo o
tem como objeto
próprio saber matemático, mas para o professor de matemática, o aluno
de estudo o
próprio saber é prioridade no que diz respeito à matemática quanto saber escolar
matemático, mas que serve para a educação do mesmo. O primeiro, o pesquisador,
para o professor precisa eliminar as variáveis relacionadas ao contexto do objeto de
de matemática, o pesquisa, enquanto o professor deve considerar todo o contexto
aluno é prioridade em que o aluno se encontra inserido para precisamente viabilizar o
no que diz respeito
melhor entendimento dos conceitos matemáticos em estudo e manter
à matemática
quanto saber contextualizando os conteúdos associados ao ensino-aprendizagem.
escolar que serve Para melhor compreendermos o trabalho do professor de matemática
para a educação do se faz necessário conhecer sobre a epistemologia do docente.
mesmo.
Falar de epistemologia é falar de alguma maneira em teoria do
conhecimento, ela aborda o saber no estudo da evolução das ideias
Epistemologia que a formam e a correspondente metodologia aplicada para a ciência
da matemática em estudo com seus valores e objetos que a formam. A noção de
trata do estudo epistemologia se remete, segundo Émile Meyerson (1859-1933), a
do progresso de
ressaltar a compreensão sobre a evolução da ideia científica enquanto
seus conceitos da
disciplina científica estudo da ideia central da filosofia das ciências dedicado à formação
matemática. de conceitos. Assim, a epistemologia da matemática trata do estudo do
progresso de seus conceitos da disciplina científica matemática.

44
Capítulo 2 REFERÊNCIAS DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Com a compreensão do que trata a epistemologia da matemática e,


vinculando-a ao docente chegamos à epistemologia do professor sendo esta,
as concepções que ele tem, referentes à disciplina, originárias do plano estrito
da compreensão do professor e que são aplicadas no contexto educacional.
Neste caso, a epistemologia está relacionada à matemática, mas em geral a
epistemologia se vincula a cada ciência e se pode considerar que representa a
evolução das ideias fundamentais de uma disciplina científica. O que é diferente
às concepções relativas a métodos, valores e objeto da ciência em questão,
assim como sua subjetividade ao aplicar a objetividade do ensino-aprendizagem
no âmbito educacional.

Em se tratando da didática das ciências, existe um esclarecimento oportuno,


ou seja, a epistemologia do professor com certeza está atrelada à epistemologia
da ciência com a que ele trabalha, mas nunca essas duas epistemologias serão
a mesma. Isso, podemos, confirmar em Astofoli e Develey (1990) que ainda
completam que mesmo com a existência de um esforço para que a compreensão
do professor esteja imbuída da essência objetiva do conceito, mesmo assim,
pode até acontecer divergências. Essas divergências e o distanciamento que
naturalmente acontece entre o cientista e o professor, levam a perceber, pela
experiência, que há um “espaço” entre o saber científico e o saber escolar
evidenciado nas próprias práticas pedagógicas dos professores.

Havendo diferenciado a epistemologia do professor e a epistemologia da


ciência (matemática), a matemática que está em mãos do professor continua
ligada à matemática do saber científico e de alguma maneira através da atuação
pedagógica o professor orienta e medeia o processo ensino-aprendizagem da
matemática e enfrenta junto ao aluno os obstáculos que podem ocorrer tanto de
um lado do processo como do outro.
O professor deve
O papel do professor de Matemática deve motivar os alunos para procurar atuar
aprender, promover o enriquecimento técnico-científico-social com como um mediador
entre a disciplina
vistas à formação da sua personalidade com a finalidade de exercer
e as nuances do
a sua cidadania e preparação para o mercado formal de trabalho e processo de ensino-
para a vida. Nesse contexto, o professor deve procurar atuar como aprendizagem,
um mediador entre a disciplina e as nuances do processo de ensino- buscando formas
aprendizagem, buscando formas de trabalho mais amplas, mais de trabalho mais
motivadoras e mais eficientes quanto ao desenvolvimento epistêmico amplas, mais
motivadoras e mais
dos alunos e da eficácia do trabalho do docente. Assim, o papel do
eficientes quanto
professor que atua como docente da disciplina de matemática deixa ao desenvolvimento
de ser o de um mero repetidor de fórmulas sem sentido algum para epistêmico dos
o aluno e sem a menor função social para ser alguém que ajuda a alunos e da eficácia
construir fórmulas a partir do cotidiano dos mesmos. do trabalho do
docente.

45
Didática da Matemática

Para buscar mais informações sobre o Papel do Professor de


Matemática acesse o artigo intitulado Guy Brousseau: referência
na didática da Matemática. Disponível em: <http://revistaescola.abril.
com.br/matematica/fundamentos/pai-didatica-matematica-427127.
shtml>.

Temos, então, o saber matemático e o trabalho do professor de matemática.


Nesse contexto, podemos ter obstáculos. Mas então? O que são obstáculos? Do
que tratam? Vamos descobrir adiante!

Os OBstáculos e a Matemática
No Capítulo 1 deste caderno, já falamos genericamente dos obstáculos
didáticos e, neste momento, retomaremos a temática de forma mais aprofundada
bem como, buscaremos interligar esta ao processo ensino-aprendizagem da
matemática.

A matemática apresenta uma evolução histórica regular no seu


desenvolvimento, mesmo que com algumas pausas no tempo, mas sem
rompimento da sua linha histórica contínua, e que em ciências
No caso específico experimentais podem e têm acontecido rupturas no processo de
da matemática, evolução das mesmas. Na matemática, entre a descoberta do
justamente pela
conhecimento e sua sistematização, por meio de uma demonstração,
sua natureza, os
obstáculos surgem ocorre a regularidade do saber quando acontece à formulação final do
quando acontece conceito matemático, por isso, não ficam registradas as não linearidades
a criação dos e os conflitos que acontecem na formulação de ideias e construção de
conceitos, nessa conceitos, na história da evolução dessa ciência.
trilha que perpassa
pelos conceitos
A formulação das ideias em qualquer ciência inicia com um
adjacentes e
intrínsecos da movimento prévio de fluxo de ideias que passam por um processo de
matemática para maturação para serem conectadas e, uma vez superados os conflitos
criar os novos que causam o fato de romper pré noções, as novas ideias devem ser
conceitos emergidos colocadas num texto para serem compreendidas.
das novas ideias
e que harmonizam
No caso específico da matemática, justamente pela sua natureza,
com os paradigmas
dessa área os obstáculos surgem quando acontece a criação dos conceitos,
científica. nessa trilha que perpassa pelos conceitos adjacentes e intrínsecos

46
Capítulo 2 REFERÊNCIAS DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

da matemática para criar os novos conceitos emergidos das novas ideias e que
harmonizam com os paradigmas dessa área científica. Pais (2008) observa
que os obstáculos são mais evidenciados na fase de aprendizagem e síntese
do conhecimento. Isso nos permite perceber que no processo de ensino-
aprendizagem levamos a vantagem de que aqueles obstáculos que apareceram
na formulação dos conceitos como erros, dúvidas, avanços e retrocesso, foram
superados a partir do momento em que encontramos o texto pronto para ser
estudado.

Os obstáculos, pela própria semântica da palavra, podem ser considerados


elementos ruins dentro da área do conhecimento. Contudo, no caso da
matemática, em que conceitos, teoremas e demonstrações exigem se submeter
a provas e refutações, esses obstáculos vêm a ser a alavanca da elaboração
de argumentos para a validação da matemática e para a formação de novos
conceitos e ao mesmo tempo, ajudam a forjar as bases para a continuidade na
evolução desta ciência.

Da mesma maneira, esse fenômeno cognitivo acontece na


Os obstáculos
escola durante o processo ensino-aprendizagem da matemática.
servem para a
Os obstáculos servem para a construção do conhecimento e para construção do
constituir uma aproximação entre o professor e o aluno, porque com conhecimento e
os obstáculos o professor serve de mediador, orientando para, a para constituir uma
partir desse, fazer acontecer à evolução do conhecimento do aluno, aproximação entre
aproveitando ainda esta oportunidade para contextualizar na realidade o professor e o
aluno, porque com
do aluno e fazer a ponte com suas próprias experiências.
os obstáculos o
professor serve de
Ao encontro dessa realidade dos obstáculos e a matemática, mediador, orientando
percebemos que nessa última ciência os maiores obstáculos se para, a partir desse,
apresentam antes sequer da elaboração do texto que a posteriori fazer acontecer
será estudado. Esses obstáculos (erros, dúvidas, avanços, retrocesso à evolução do
conhecimento do
entre outros) anteriores à formulação do texto final são os obstáculos
aluno, aproveitando
epistemológicos. No entanto, existem também os referentes ao ensino ainda esta
da matemática, nesse sentido, é fundamental a atuação do professor oportunidade para
conjugando conteúdo e didática. Saber envolver os alunos tanto no contextualizar na
conteúdo teórico quanto no prático lembrando sempre de contextualizar, realidade do aluno
para o aluno ter uma ideia mais concreta dos assuntos estudados e e fazer a ponte
com suas próprias
sua relação e/ou aplicação no seu entorno, viabilizando a compreensão
experiências.
matemática de cada aluno levando em consideração sua bagagem
de conhecimento. Dessa maneira, os obstáculos poderão ser minimizados, na
aplicação da matemática em experiências práticas na vida do aluno.

Nesse contexto, podemos então diferenciar os obstáculos? Quais seriam


estes e como defini-los?

47
Didática da Matemática

Os OBstáculos Epistemológicos e
Didáticos
Temos dialogado sobre obstáculos e acabamos de mencionar os obstáculos
epistemológicos. Um dos primeiros estudiosos a trazer a noção de “obstáculo
epistemológico” foi Bachelard na sua obra publicada em 1938. Ele explica que
na evolução histórica dos conceitos, há toda uma área de estudos e de ideias
que se manifestam para formar conceitos e que esse grupo de ideias passa pela
fina peneira do saber científico antes mesmo de escrever a primeira palavra
sobre um conceito, um teorema ou uma demonstração. Todo esse estudo,
discussões, análises de ideias são os obstáculos epistemológicos que se opõem
à desconstrução de conceitos de determinada ciência. Todo esse processo fica
velado após os novos conceitos evolutivos a serem aceitos.

Esse tipo de obstáculo, Lakatos (1978), aborda fazendo uma descrição de


análise epistemológica relativa à evolução conceitual da matemática que se faz
com provas e demonstrações. O desenvolvimento das provas, ele explica, é
feito procurando manter um seguimento contínuo do problema, resolvendo uma
sequência de rupturas parciais dos argumentos. Com isso, Lakatos manifesta que,
de fato, os problemas de obstáculos epistemológicos, na matemática, acontecem
no período da demonstração em si, mais do que a posteriori que o texto de uma
demonstração esteja pronto.

Assim, todo o processo que antecede à elaboração de conceitos, teoremas e


demonstrações, todas as refutações que sofrem e questionamentos ficam ocultos
nas experiências dos cientistas que não deixam registrados esses fatos nos textos
formais, limpos e bem elaborados sobre conceitos, teoremas e demonstrações.
Podemos encontrar mais detalhes em Balacheff (1988). Os alunos recebem o texto
formal trabalhado pelo professor de matemática e, é a partir desse contato com
os saberes matemáticos, que o professor necessita atentar à questão pedagógica
que permita explorar meios para que o aluno tenha acesso à compreensão dos
conceitos que perpassam o material.

Vamos exemplificar obstáculos epistemológicos:

48
Capítulo 2 REFERÊNCIAS DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

EXEMPLO 1. OBSTÁCULOS EPISTEMOLÓGICOS

A compreensão dos números naturais exige, por exemplo,


certa maneira de conceber esses números e suas operações: um
número natural como 4 tem um sucessivo e, seu produto por outro
número natural (N) será maior que esse número. Algumas dessas
propriedades falham quando 4 é entendido como um número racional
(Q), ou seja, não tem mais sucessivo.

O aluno não se dá conta dessa passagem e continua aplicando


as propriedades de N também em Q. Assim, encontram-se estudantes
que afirmam, em Q, que 2,33 é o sucessivo de 2,32, ajudados nisso
até por alguns livros textos.

Além disso, por exemplo, 0,7 × 0,8 = 0,56 é menor do que cada
um dos fatores. O professor chama de “multiplicação” ou “divisão”
novas operações e gostaria que os estudantes as “reconhecessem”
e assimilassem às anteriores.

O conhecimento dos números naturais é indispensável para Esse fenômeno


adquirir o conhecimento dos racionais, mas ao mesmo tempo, é um gera equívocos
obstáculo para essa aquisição. Esse fenômeno gera equívocos e e dificuldades
dificuldades importantes e invisíveis, porque o obstáculo se esconde importantes e
no interior de um saber que funciona, mas que é “local” e que não pode invisíveis, porque
o obstáculo se
ser generalizado para o objeto matemático que deveria ser aprendido.
esconde no interior
Este é o sentido da ideia de obstáculo epistemológico. de um saber que
funciona, mas
que é “local” e
que não pode ser
generalizado para o
objeto matemático
que deveria ser
aprendido. Este
é o sentido da
ideia de obstáculo
epistemológico.

49
Didática da Matemática

EXEMPLO 2. OBSTÁCULOS EPISTEMOLÓGICOS

Alunos que concluíram o Ensino Fundamental, muitas vezes


se atrapalham com divisão entre números naturais, apesar de
saberem questões de geometria e trabalhar com álgebra, conteúdos
mais complexos. Em divisões como 1236 / 12, que resulta em 103,
frequentemente aparece o número 13, pois os alunos se atrapalham
com o algoritmo e não se preocupam com o valor posicional dos
números, bem como não tem noção da ordem de grandeza dos
números envolvidos.

Figura 6 - Divisão de Números Naturais

Fonte: A autora.

O significado de cada passo do algoritmo quase nunca é justificado, levando


ao problema acima constatado.

Em sala de aula, os professores utilizam conhecimentos, métodos,


convicções sobre a maneira de encontrar, aprender ou organizar um saber. Essa
bagagem de conhecimento é construída de forma empírica, buscando satisfazer
as necessidades didáticas.

O professor propõe aos seus alunos, por exemplo, um problema que


considera análogo a um problema que havia proposto anteriormente, mas no qual
muitos haviam fracassado. Com esse processo, espera que os alunos reconheçam

50
Capítulo 2 REFERÊNCIAS DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

a semelhança e que utilizem a correção e as explicações que havia dado para


reproduzir o mesmo método de resolução, a fim de enfrentar com sucesso a nova
situação. Indica, então, que os alunos procurem utilizar essa analogia.

Esse procedimento leva ao sucesso segundo o professor. Mas, na realidade,


o aluno produz uma resposta correta, mas não porque tenha entendido a sua
necessidade matemática ou lógica a partir do enunciado, não porque tenha
“compreendido e resolvido o problema”, não porque tenha aprendido um objeto
matemático, mas simplesmente porque estabeleceu uma semelhança com outro
exercício. O aluno apenas reproduziu uma solução já feita por outros para ele, e o
professor, “acreditará” que o aluno compreendeu a questão matemática em jogo,
enquanto na verdade só interpretou uma intenção didática.

Atividade de Estudos:

1) De que forma os obstáculos no ensino da matemática interferem


na construção de conceitos matemáticos?

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É em matemática que os alunos entram em contato com


sistemas de conceitos que permitem resolver problemas e fazer
novas deduções; em que a coerência e a precisão do raciocínio
conferem legitimidade às ideias e às conclusões obtidas, segundo
a necessidade lógica, de premissas definidas (por outros) (BICUDO,
1999, p.163).

51
Didática da Matemática

Podemos nos perguntar, então, qual o significado dos conceitos, esquemas e


definições na matemática?

Conceitos, esquemas e definições

Até aqui temos discursado sobre a formação dos conceitos, a evolução


histórica dos saberes da matemática em forma geral e dos obstáculos que
precisa o aluno passar para formulação dos novos saberes, conceitos, teoremas
e demonstrações. Mas agora queremos abordar o significado dos conceitos,
esquemas e definições, além do aspecto cognitivo, epistemológico, também
escolar no que diz respeito ao processo ensino-aprendizagem proporcionando
meios para facilitar o entendimento na aprendizagem conceitual por parte dos
alunos.

Uma das vias que estudamos para refletir as condições de como acontece
e como se facilita a aprendizagem conceitual por parte do aluno é a teoria dos
Campos Conceituais, trazida e definida por Vergnaud (1994, p. 75), como: “um
conjunto de situações cujo tratamento implica esquemas, conceitos e teoremas
em estreita relação, assim como representações linguísticas e simbólicas que
podem utilizar-se para simbolizá-los”.

O autor delimita essa teoria indicando que ela respeita a estrutura progressiva
da elaboração de conceitos e sua aplicação vai além da Educação Matemática.
Uma das características da teoria dos Campos Conceituais é que dá um realce ao
tratamento do saber escolar de uma maneira diferente àquela do saber científico
e, aqui, encontra lugar o saber escolar visualizando-o entre o saber cotidiano
e o saber científico. Nesse sentido, entra o importante papel da didática para
proporcionar ao aluno a oportunidade de elaborar os conceitos, que geralmente
não vêm sozinhos, mas atrelados a outras noções que, dada a situação problema,
o aluno resolve o problema passando por uma sucessão de adaptações até a
compreensão dos conceitos e vinculação com as experiências do seu contexto.
Pais (2008, p.53) afirma que,

No caso ideal em que a aprendizagem acontece com sucesso,


os conhecimentos anteriores são adicionados uns aos outros
e incorporados à nova situação. Assim ocorre uma parte do
processo cognitivo que consiste no conjunto de procedimentos
de raciocínio desenvolvidos pelo sujeito para coordenar as
adaptações necessárias para que informações precedentes
sejam incorporadas em uma situação de aprendizagem,
sintetizando o novo conhecimento.

A Teoria dos Campos Conceituais nos ajuda a entender como os alunos


constroem os conceitos. De acordo com Vergnaud (1996), o conhecimento
emerge de resolução de problemas, a partir da ação do aluno sobre a situação.

52
Capítulo 2 REFERÊNCIAS DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Essa ação necessita de uma reflexão para que se direcione para a formação e
desenvolvimento. Para a formação de um conceito, faz-se necessário interagir
com ele numa variedade de situações, entendendo que o conhecimento é fruto
de uma maturação do indivíduo, de sua experiência e de sua prática. A teoria
dos campos conceituais permite a análise de competências e dificuldades dos
alunos, pois o processo cognitivo envolvido não tem nenhum vínculo com o uso
de aprendizagem mecânica ou memorizadora de repetição seja de modelos,
fórmulas ou qualquer outra maneira de automatizar uma aprendizagem.

Conforme Vergnaud (1993), uma das formas de veicular a aprendizagem


de um conceito é aplicando a noção de esquema. Vergnaud (1993, p. 2) define
esquema como “[...] a organização invariante do comportamento para uma classe
de situações dada.”.

O esquema serve para decompor um conceito em classes de situações que,


por sua vez, tem certa organização ou forma que permite uma melhor visualização
por parte do aluno e que o leva através de situações experimentais e racionais
conhecidas pelo aluno até a conceitualização desejada.

Quando o aluno aprende um conceito, isso é uma conquista para sua


aprendizagem. É isso que fornece bases para a construção de conhecimentos
mais amplos e o que lhe permite fazer ligações entre outros conceitos e chegar a
um saber mais aprofundado. Por isso, é fundamental, não confundir conceito com
definição. A definição seria o texto que procede da formalização de um conceito.
É o conceito posto em palavras, palavras essas que não conseguem abranger a
amplitude de um conceito, seja este qual for.

Para Vergnaud (1993) um conceito não pode ser reduzido à sua definição
quando a prioridade é o ensino e a aprendizagem significativa, pois um conceito
somente adquire significado para o aluno, através da linguagem e dos símbolos
envolvidos.

Como exemplo, podemos citar o conceito de adição. A adição é uma operação


matemática que corresponde às ideias de juntar quantidades e de acrescentar
uma quantidade à outra. A sentença 3 + 4 = 7 indica uma adição cujas parcelas
são 3 e 4 e cujo resultado ou soma é 7. O aluno pode saber a definição de adição,
mas não compreender seu significado ou ainda não conseguir transferi-lo para
uma situação diferente daquela em que aprendeu.

Assim, Vergnaud (1994, p. 8) define um conceito “ao conjunto das situações


que constituem a referência de suas diversas propriedades, e ao conjunto dos
esquemas utilizados pelos sujeitos nessas situações”, ou seja, um conceito
abrange a uma combinação de três conjuntos: 1) conjunto de situações que dão

53
Didática da Matemática

sentido ao conceito (referência); 2) conjunto de invariantes operatórios que são


utilizadas para analisar e dominar as situações (o significado) e; 3) conjunto de
representações simbólicas que são utilizadas para representar os invariantes (o
significante).

Para melhor entendermos ao que se refere um conceito de alguma coisa,


precisamos entender que este está relacionado a um significado, mas vai
ainda mais fundo porque o conceito deve também incluir aspectos que lhe são
fundamentais e intrínsecos. Segundo Pais (2008, p. 55) “[...] o conceito é algo
em permanente processo de devir, estamos sempre nos aproximando a sua
objetividade, generalidade e universalidade [...]” sendo nessa citação, “devir”,
referente à formação de conceito relativo ao fenômeno de aprendizagem.

Observe assituações abaixo:

Situação 1 - João tinha 12 carrinhos e ganhou 7. Com quantos ficou?


- É de mais ou de menos?
- Se ele ganhou, só pode ser de mais!

Situação 2 - Maria tem 9 bonecas. Quando ela mudou de casa, 3 sumiram.


Com quantas bonecas ela ficou?
- Esse é de menos porque ela perdeu as bonecas que tinha...

Quantas vezes você já ouviu comentários como esse ao formular um problema


matemático para a turma? Os alunos ficam aflitos para saber qual operação usar
e chegar ao resultado final e você, muitas vezes, precisa domar a tentação de dar
a dica. Quando as operações são assim apresentadas, há a tendência de a turma
acreditar equivocadamente que ambas são opostas e conflitantes, mas é possível
resolver o mesmo problema usando uma ou outra, porque há vários caminhos
que levam à resolução.

Podemos utilizar a teoria do Campo Conceitual, para melhor organizar as


práticas em sala de aula. Ao apresentar problemas, devemos observar se os
significados envolvidos estão sendo explorados para que os alunos percebam
que diferentes situações podem ser resolvidas pelo uso de uma mesma operação.

Entendemos, assim, que a maioria dos conhecimentos são competências, e


a análise dos esquemas revela que eles não consistem somente em maneiras de
agir, mas também em conceitualizações implícitas. Os conhecimentos modificam,
porque o aluno enfrenta situações cada vez mais complexas. À medida que
existe uma apropriação do conhecimento, o aluno tem contato com a dimensão
conceitual o que lhe permite navegar entre saberes passando do escolar ao
científico.

54
Capítulo 2 REFERÊNCIAS DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Para buscar mais informações sobre a Teoria dos Campos


Conceituais acesse o material abaixo:

JENSKE, Grazielle. A teoria de Gérard Vergnaud como


aporte para a superação da defasagem de aprendizagem de
conteúdos básicos da matemática: um estudo de caso. 2011. 131f.
Dissertação (Mestrado em Educação em Ciências e Matemática) —
Faculdade de Física, PUC-RS, Porto Alegre (RS). Orientador: João
Batista Siqueira Harres. Disponível em: <http://tede2.pucrs.br/tede2/
bitstream/tede/3412/1/434027.pdf>. Acesso em: 10 mai. 2016.

Atividades de Estudos:

1. Com base na visão sociocultural de inteligência propõe-se


que a escola participe do processo de desenvolvimento da
inteligência da criança ao lhe oferecer acesso a instrumentos
e objetos simbólicos, como sistemas de numeração, que
amplificam sua capacidade de registrar quantidades, lembrar e
solucionar problemas. Essa perspectiva está vinculada à Teoria
dos Campos Conceituais (VERGNAUD, 1996), segundo a qual
os conceitos são desenvolvidos num longo período de tempo por
meio da experiência, maturação e aprendizagem, expressas por
esquemas.
NUNES, T. et al. Educação Matemática: números e operações
matemáticas. São Paulo: Cortez, 2005 (adaptado).

A partir do texto acima, avalie as afirmações a seguir.

I. Os conceitos de adição e subtração tem origem nos esquemas de


ação de juntar, separar e colocar em correspondência um-a-um.
II. Os conceitos de multiplicação e divisão têm origem nos esquemas
de ação de correspondência um-a-muitos e de distribuir.
III. O raciocínio aditivo implica a existência de uma relação fixa entre
duas variáveis, e o raciocínio multiplicativo, da relação parte-todo.
IV. A criança consegue ordenar sua atividade teórica com a contagem,
quando se torna capaz de resolver problemas simples de adição
e subtração.

55
Didática da Matemática

É correto apenas o que se afirma em


A - I e II.
B - I e IV.
C - III e IV.
D - I, II e III.
E - II, III e IV.

2. Qual a diferença entre Definição e Conceito, segundo Vergnaud


(1993)?

____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________

Algumas ConsideraÇões
O professor de matemática que se forma nesse século XXI já não é mais
aquele teórico dedicado exclusivamente ao saber matemático, nem mesmo
aquele que tinha que escrever tudo o que sabia no quadro da sala de aula sem
mesmo nem saber sobre a natureza e contexto social de seus alunos.

É necessário entender que, além de ensinar o conteúdo, o professor é um


transformador de conceitos e produtor dos mesmos, como afirma Freire (1996,
p. 69), “[...] saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as
possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção”.

Com a Didática da Matemática, o aluno passa a estar num foco


importante como alvo de difundir o saber, de providenciar através da didática a
contextualização de suas vivências e com a aplicação do saber cotidiano chegar
ao saber escolar e a partir desse, uma vez atingido as conceitualizações e se
apropriado dos conhecimentos, tenha o acesso ao saber científico.

É uma missão significativa para o professor de matemática levar seus alunos


para a construção de conceitos, através da sua prática pedagógica e fazer a
diferença. Para tanto, precisa se preparar para, por meio de métodos e criando
situações que viabilizem atividades em que se manifestem situações reais,
possa aplicar esquemas que levem o aluno, ao alcance das conceitualizações e

56
Capítulo 2 REFERÊNCIAS DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

pelo conhecimento chegar a ter sentido mais concreto nas aplicações do saber
matemático.

Referências
ALMOULOUD, S. A. (2007). Fundamentos da Didática da Matemática.
Curitiba: UFPR, 2007.

BRASIL. Ministério da Educação e Cultura. Fundação Nacional de Material


Escolar (1973). Desenho 2: plano – espaço. Brasília: MEC.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares


nacionais: matemática / Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília :
MEC/SEF, 1997. 142p.

BACHELARD, G. (1928). Ensaio sobre o conhecimento aproximado. Rio de


Janeiro: Contraponto, 2004, 316p.

______. (1938). A formação do espírito científico. Rio de Janeiro: Contraponto,


2003, 316p.

BARALDI, I.M. Matemática na escola: que ciência é esta? Bauru: Edusc, 1999.

BICUDO, M. (Org.). Pesquisa em educação matemática: concepções e


perspectivas / São Paulo: Editora UNESP, 1999, 311p.

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Paulo: Edgard Blücher, 1996.

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Professor. Palestra. São Paulo: PUC, 2006.
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Didática das Matemáticas. Tradução de: Maria José Figueiredo. Lisboa: Instituto
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______. Os diferentes papéis do professor. In: PARRA, C.; SAIZ, I. (org).
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CHEVALLARD, Y.; BOSCH, M.; GASCÓN, J. Estudar Matemáticas: o elo


perdido entre o ensino e a aprendizagem. Tradução: Daisy Vaz de Moraes. Porto
Alegre: Artmed, 2001.

57
Didática da Matemática

______. Educação como prática da liberdade. 29. ed. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 2006.

DAVIS, P.; HERSH, R. A experiência matemática. Rio de Janeiro: Francisco


Alves, 1985.

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Paulo: Editora Ática, 1990.

______. Etnomatemática: Elo Entre as Tradições e a Modernidade. Coleção


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2011.

FREIRE, P. Pedagogia da Autonomia: saberes necessários a prática educativa.


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______. Pedagogia da Esperança: um reencontro com a Pedagogia do


Oprimido. 11. ed. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2003.

GODINO, J. Perspectiva de la Didática de lãs Matemática como disciplina


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MACHADO, N. J. Matemática e Realidade: análise dos pressupostos filosóficos


que fundamentam o ensino da matemática. São Paulo: Cortez, 1994.

PAIS, L. C. Didática da matemática: uma análise da influência francesa. 2. ed.


2. Reimpressão. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. 128p. (Coleção Tendências em
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______. Transposição Didática. In: ALCÂNTARA, S. D. (Org.). Educação


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introdução. 2. ed. São Paulo: EDUC, 2002b, 9-12.
______. Transposição Didática. In: MACHADO, S. D. A. Educação Matemática:
uma introdução. 2. ed. São Paulo: EDUC, 2002c, 13-42.

PERRELLI, M. A. S. Uma epistemologia dos conteúdos das disciplinas científicas:


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58
Capítulo 2 REFERÊNCIAS DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

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VERGNAUD, G. El aprendizaje y la enseñanza de la matemática: teoría


e conceptos fundamentales. In: VERGNAUD, G. (Erg). Aprendizajes y
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VERGNAUD, G. (org.). El aprendizaje y la enseñanza de la matemática: teoría


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didácticas: que hay de nuevo?.Buenos Aires: Edicial, 1994.

VERGNAUD, G. Teoria dos campos conceituais. 1º Seminário Internacional de


Educação Matemática do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro/RJ, 1993. Anais… p
1-26.

59
Didática da Matemática

60
C APÍTULO 3
A Especificidade da Matemática e da
Didática da Matemática

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

Constatar a especificidade da matemática e da Didática da Matemática.

Discutir situações didáticas e a-didáticas da Matemática.

Definir contrato didático.

Avaliar situações de ruptura do contrato didático.

Analisar o cotidiano escolar e os efeitos didáticos.


Didática da Matemática

62
Capítulo 3 A ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA E
DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

ConteXtualiZaÇÃo
No processo da construção do saber, este é concebido, validado e
comunicado. À Didática cabe analisar e discutir as variações, no processo ensino-
aprendizagem, desses três aspectos.

Quando o saber é concebido lhe precede um processo de elaboração de tal


saber, assim, primeiro temos o contato com os conceitos, sua origem, sua causa
e suas aplicações e, em muitos, casos as aplicações auxiliam na compreensão do
conceito que a posteriori será concebido. O saber está relacionado com o mundo
exterior, isto é, ele existe e sabemos disso, mas ainda não nos apropriamos dele.
Quando o saber passa pelo processo ensino-aprendizagem, por uma construção
e vira conhecimento porque a pessoa se apropriou do saber, então, podemos
passar ao seguinte estágio.

Assim que nos apropriarmos de um conhecimento, procuramos as diversas


situações em que podemos testar ele e procuramos pelos meios conhecidos de
validar tal aquisição. Tentamos buscar experiências para a não validação do saber
para de uma maneira indireta desconstruir o tal saber, e isso auxilia na validação
do saber aprendido, quando o resultado demonstra as propriedades do saber em
questão.

Uma vez que o saber foi concebido e validado, é a vez de ser comunicado.
Enquanto professores, sabemos que ao preparar um assunto, que implica a
explicação de um saber, o fato de ser comunicado passa antes por um estágio
de assentamento. Esse assentamento do saber permite o encontro de estratégias
para que seja comunicado, questionarmos de que maneira seria mais efetiva
a estratégia da comunicação, além de sobrepor às prenoções dos saberes já
adquiridos que em muitos casos atrapalham para o novo saber ser aceito.

O trabalho pedagógico necessita de uma análise dessas


Para estudar
variações no processo ensino-aprendizagem e, para estudar as formas
as formas de
de elaboração e apresentação do saber escolar, recorremos à teoria elaboração e
das situações didáticas, elaborada por Brousseau (2006), a qual apresentação do
discutiremos neste capítulo e, também das situações a-didáticas que saber escolar,
também apresentaremos. recorremos à teoria
das situações
didáticas.

NoÇões de SituaÇões Didáticas


Na educação nos deparamos inevitavelmente com diversos tipos de
situações que envolvem tanto ensino quanto aprendizagem, e a maneira como

63
Didática da Matemática

fazemos para que esse processo seja bem-sucedido, tanto para o estudante
quanto para o educador. Temos o que se apresenta como conjunturas didáticas,
que se refere a circunstâncias dentro do momento em que acontece a construção
do conhecimento que vincula, de alguma maneira, os fatores que estão no meio
do acontecer desse processo e que chamamos de situação didática. Pais (2008)
explica como Brousseau (1988) diferencia conhecimento de saber e que isso é
explicado com a teoria das situações didáticas e aponta que segundo o tipo da
situação didática será mais apropriado ou falar em conhecimento ou em saber.
Nesse quesito, acudimos a lembrarmos do que trata a teoria das situações
didáticas.

Uma situação Conforme Pais (2008, p. 65): [...] uma situação didática é formada
didática é pelas múltiplas relações pedagógicas estabelecidas entre o professor,
formada pelas os alunos e o saber, com a finalidade de desenvolver atividades voltadas
múltiplas relações para o ensino e para a aprendizagem de um conteúdo específico.
pedagógicas
estabelecidas entre
Professor, aluno e saber, componentes de uma situação didática,
o professor, os
alunos e o saber. esses três elementos formam o chamado triângulo didático e eles são a
essência da sala de aula, mas não são suficientes para que possamos
entender/analisar a complexidade do processo cognitivo. Além desses três fatores,
temos o ambiente em que esta situação didática acontece o que formaria o quarto
membro do que influencia numa situação didática quando está em execução, o
processo ensino-aprendizagem.

Podemos ver como esclarece Brousseau (1988), que falou sobre polígonos
da didática e além dos elementos citados professor, aluno e saber, acrescentou o
que ele chamou de “milieu” nome dado ao ambiente em que acontece o processo
de ensino-aprendizagem. Contudo, esse autor ainda achou que não estaria sendo
considerada a variável referente à bagagem de conhecimento que traz cada
aluno, mesmo assim, considerando entre as variáveis o ambiente ou “milieu” já
ficaria mais próximo a um ajuste da realidade contextualizada no espaço escolar,
chamado por Brousseau (1988) como quadrilátero da didática.

O processo cognitivo se efetiva na associação dos elementos professor/


aluno/saber a outros elementos do sistema didático, ou seja, objetivos, métodos,
posições teóricas, recursos didáticos, entre outros. E, nesse contexto, a
especificidade de cada conteúdo trabalhado, influencia diretamente no processo
ensino-aprendizagem do aluno e na pedagogia da didática usada pelo professor,
e ainda, considerando o quarto vértice daquele primeiro polígono professor, aluno,
saber mais o ambiente em questão.

Lembramos ainda que mesmo levando em conta essas variáveis, ainda


não conseguimos diferenciar nele os saberes escolares dos conhecimentos

64
Capítulo 3 A ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA E
DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

já adquiridos no sistema apresentado. Juntando todas essas variáveis, o autor


Brousseau (1988), nos leva a estudar as situações didáticas através de um
hexágono da didática e apresenta a seguinte estrutura:

Figura 7 - Hexágono da Didática

Fonte: D’Amore (2007, p.7).

Figura 8 - Situação didática

Fonte: Disponível em: <http://www.submarino.com.br/produto/116521086/livro-numeros-e-


matematica-colecao-atividades-educativas-turma-da-monica>. Acesso em: 15 jul. 2016.

65
Didática da Matemática

As relações entre esses fatores ou variáveis deverão ser consideradas para


fazer acontecer o processo de ensino-aprendizagem e as relações entre esses
fatores serão as situações didáticas que se apresentam, e que deveremos avaliar
para obter o nosso objetivo que é o aprendizado. Trazemos a figura da Turma
da Mônica para ter presente às diversas bagagens de conhecimentos que cada
aluno traz pelas diferentes características históricas, culturais, sociais, familiares e
experienciais que eles carregam.

Na educação matemática, esse hexágono da didática tem aplicação no


próprio saber matemático e suas características. O saber fazer, o entendemos com
dois aspectos que precisam ser considerados no processo ensino-aprendizagem,
que descrevemos a seguir:

- A possível influência da natureza do saber matemático nas relações


pedagógicas estabelecidas entre professor-aluno e,

- A influência da natureza do trabalho do matemático, sobretudo na forma


textual em que o saber é apresentado, sobre o professor.

Assim, na análise didática é preciso ponderar as especificidades das relações


referentes ao conteúdo matemático.

Nas situações Nas situações didáticas outro aspecto a ser analisado é a


didáticas outro contextualização, significativa para o aluno, do conteúdo matemático,
aspecto a ser afinal, neste ponto, encontramos a dimensão de seus valores educativos.
analisado é a Sem este vínculo, como alcançar as transformações formativas do
contextualização. saber científico?

Situações reais A teoria das situações didáticas fundamenta-se, então, na forma de


em que esse apresentação do conteúdo, buscando um significado do saber, para o
saber passa a ser aluno. O saber matemático escolar deve ser elaborado em sintonia com
conhecimento com a situação didática e a relação dos fatores mostrados e que apresentam
a aplicação de uma alguma relação no entorno escolar e a sua realidade. Trabalhamos os
situação próxima
conteúdos, e as atividades propostas aos alunos, definem o tipo de
do seu cotidiano
em que pode ser situação didática relativa a situações reais em que esse saber passa
aplicado. a ser conhecimento com a aplicação de uma situação próxima do seu
cotidiano em que pode ser aplicado.

Depois de discursarmos sobre as situações didáticas, podemos inferir


que são situações que acontecem em todas as áreas do saber, mas será que
existe alguma especificidade educacional do saber matemático? Existe diferença
quando falarmos em situações didáticas aplicadas no saber matemático. Vamos
prosseguir para compreendermos melhor esse processo.

66
Capítulo 3 A ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA E
DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Atividades de Estudos:
1) Uma situação didática tem vários elementos que devem ser
considerados, mas os fundamentais são três. Eles são:

a) Conhecimento, saber, escola.


b) Professor, saber, aprendiz.
c) Aprendiz, conhecimento, pedagogia.
d) Metodologia, saber, professor.
e) Aluno, escola, ensino.

2) Explique quais você considera, em situações didáticas, as


especificidades da matemática. Qual a diferencia entre as outras
disciplinas do currículo escolar?

____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________

A Especificidade Educacional do
SaBer Matemático
A maior parte da sociedade, especialmente a escola, considera o saber
matemático como um conhecimento imutável e verdadeiro, que o aluno deve
assimilar. O professor “ensina” e o aluno “aprende”. Contudo, não há uma só
concepção sobre as ideias matemáticas e suas práticas educativas.

Precisamos considerar o saber matemático como uma ferramenta para


melhor compreender e atuar sobre o dia a dia. Seu conhecimento não é imutável,
mas sim, fruto da construção humana no processo de interação com o meio,
considerado aqui natural, social e cultural. É fundamental que para o aluno, faça
sentido aquilo que se explica e aplica no saber matemático, para ele conseguir
levar o abstrato para o concreto. É natural que o conceito matemático possa
parecer abstrato, mas é importante ter presente que ele é construído para ser
aplicado aos fenômenos do mundo real. Observar isso é muito importante
para trazer para a sala de aula situações reais e não irreais. Dessa maneira, os

67
Didática da Matemática

exemplos e situações que se apresentam nas explicações aos alunos tem que ter
contextualização de situações reais.

A didática da matemática permite interpretar a prática pedagógica escolar,


que busca desenvolver o saber matemático, envolvendo professor, aluno e saber,
como mencionado no item anterior e acrescentando as variáveis do hexágono
da didática. E, essa interpretação, nos permite fundamentar uma prática
educativa mais significativa, proporcionando um saber escolar comprometido
com o desenvolvimento de um aluno crítico e participativo. Conceber o ensino da
matemática voltado para a problematização e análise de situações diversas do
cotidiano, permite que o aluno faça deduções levando em conta suas experiências
de vida e, consequentemente, levando-o à construção de conceitos matemáticos
do saber matemático.

Figura 9 - Exemplo de compreensão

Fonte: Disponível em: <www.nanihumor.


com+matemáticas&espv>. Acesso em: 08 ago. 2016.

A figura 9 do “exemplo de compreensão” mostra nos diálogos que nem


sempre o que está sendo mostrado fica compreensível. Na figura existe dúvida
em cada informação que é dada pelo adulto. Dessa mesma maneira acontece
na sala de aula quando nós professores de Matemática explicamos e, por isso,
é bem importante garantir e verificar que os estudantes estão compreendendo o
assunto que está sendo tratado e a contextualização a que fazemos referências.

É claro que na figura podemos perceber que não se trata somente de


matemática. Assim, é na vida real que notamos que não se trata de uma

68
Capítulo 3 A ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA E
DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

matemática abstrata isolada do mundo em que estamos inseridos, pois junto a


ela coexiste um mundo social, a qual conforme apresentada na charge, envolve
Línguas, Geografia, História para mencionar algumas áreas do conhecimento,
mas que envolve, na verdade, qualquer uma. Percebemos assim, que para
falarmos de qualquer área do conhecimento, é preciso ter domínio de uma
linguagem própria, dessa maneira, não é diferente com a Matemática.

As especificidades do saber matemático nos trazem em primeiro


Linguagem
lugar, a linguagem alfanumérica explícita desta disciplina, que precisa
alfanumérica
de uma competência determinada num aluno para saber que ele se explícita desta
apropriou da decodificação dessa linguagem para a continuação do disciplina, que
processo de ensino-aprendizagem. Na matemática, o aluno constrói precisa de uma
ou edifica os conhecimentos partindo de bases que não consegue competência
em outra área do saber que não seja a matemática. Posteriormente, determinada num
aluno para saber que
todas as tarefas solicitadas pelo professor requerem de uma sequência
ele se apropriou da
de aprendizagem para evoluir no saber matemático e no fazer da decodificação dessa
matemática, mesmo que seja considerado, e devemos fazê-lo, o que linguagem para
traz o aluno do seu cotidiano. Nesse sentido, precisa que exista gestão a continuação do
de representações próprias da matemática e suas aplicações com processo de ensino-
experiências e relações dos conceitos com as práticas. Todas essas aprendizagem.
ações de colocar os conceitos na prática junto com as linguagens
e simbologias próprias têm que ser dominadas pelos aprendizes e levadas na
comprovação pelas explicações do professor de matemática.

Nesse contexto, identificamos mais uma vez a necessidade da elaboração


do significado do saber escolar para levar à reflexão sobre a criação e as formas
de apresentação do conteúdo no meio de situações que propiciam ao aluno fazer
matemática, isso veremos na continuação.

NoÇões de SituaÇões A-Didáticas


A educação matemática busca contribuir para o desenvolvimento de um
aluno autônomo, e que o saber escolar aprendido lhe possibilite a intervenção
sobre o meio em que vive.

Nesse contexto, precisamos considerar que muitas situações, apesar de


contribuírem para a formação de conceitos, não estão no controle pedagógico
do professor. O espaço e tempo escolar são somente uma parte dos momentos
de aprendizagem dos alunos. Assim, o desafio da didática está em equilibrar e
conciliar os elementos indicativos de uma possível progressão da aprendizagem

69
Didática da Matemática

escolar, tanto em situações onde encontramos o controle direto do professor,


como nos demais.

As noções das situações a-didáticas perseguem definir de que maneira o


estudante pode ser conduzido a elaborar a apropriação do conhecimento do
saber matemático, como de fato o fazer matemática e com ela, saber utilizá-la ou
recriá-la sem mesmo contar com a mediação do professor. Isso é mais profundo
do que acontece numa sala de aula, e refere-se ao saber científico, aquele que
pode ser capaz de, a partir de saberes, chegar a criar e montar conceitos e teorias
matemáticas com a resolução de problemas e, para isso, o aluno precisa contar
com conhecimento prévio para conseguir a elaboração dos novos conhecimentos.
Nessa situação existiria uma auto-didática em que o professor não influenciaria
além das paredes da escola.

Essas situações que Brousseau (2003) discute e chama de a-didáticas,


permitem compreender a interação entre o ambiente escolar e o espaço maior
da vida, incluindo o imaginário do sujeito cognitivo. Entender a relação entre o
didático e o a-didático é um dos grandes desafios da didática da matemática. Um
exemplo de situação a-didática é quando o aluno fora da sala de aula consegue
relacionar aprendizagem do saber matemático em situações reais no seu
contexto de vida. Continuando o exemplo da Charge do item anterior, do “exemplo
de compreensão” e, o aluno já tivesse aprendido as frações, saberia quanto é a
terceira parte das metas da Educação, uma situação que pode acontecer na rua,
com os amigos ou em casa com os familiares. O conhecimento não é só uma
questão de sala de aula, ele tem que chegar além e ser utilizado pelos nossos
estudantes.

É muito conhecida a história de Albert Einstein como aluno


medíocre que, posteriormente, se tornou quem nós conhecemos
hoje, mas você já leu sobre a carta de Thomas Edison. Procure em
https://mensagensavellar.wordpress.com/2015/11/26/a-carta-de-
thomas-edison/

Os casos mencionados no Leo mascote, Albert Einstein e Thomas Edison,


são casos de pessoas brilhantes na sua inteligência e que dentro da sala de aula
foram considerados medíocres, mas que levaram o conhecimento além da sala
de aula para suas realidades e sem limitações para projetar o conhecimento que
conseguiram ter e conseguir novidades no mundo do conhecimento. Leia e verá.

70
Capítulo 3 A ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA E
DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Considerar as situações a-didáticas, claramente nos demonstra que a função


do professor está muito além de ser um mero transmissor de conhecimentos.

Segundo definição de Brousseau (1986 apud PAIS, 2008, p. 68):

Quando o aluno torna-se capaz de colocar em funcionamento e


utilizar por ele mesmo o conhecimento que ele está construindo,
em situação não prevista de qualquer contexto de ensino e
também na ausência de qualquer professor, está ocorrendo
então o que pode ser chamado de situação adidática.

Assim, em determinados momentos do processo de aprendizagem, o aluno


trabalha de forma independente, não havendo uma intencionalidade pedagógica
direta ou um controle didático por parte do professor. Mas, a intenção pedagógica
caracteriza todas as etapas do sistema didático, uma vez que o trabalho do
professor é determinado por objetivos, métodos e noções conceituais.

Voltando ao contexto da sala de aula, é no ambiente escolar que o professor


exerce sua liderança no processo de ensino-aprendizagem, considerando
as condições em que o aluno seja mentalmente e emocionalmente saudável
e, justamente por causa dessa responsabilidade, é o professor que deverá
estabelecer as regras do jogo para quando o conhecimento a partir do saber
acontece. Essas regras do jogo são o assunto que abordaremos a seguir.

Atividade de Estudos:

1) Uma situação a-didática da matemática pode até não ser muito


frequente encontrar, mas ela se identifica quando:

a) O aluno, fora da sala de aula, consegue copiar e repetir aquilo


que o professor ministrou na sala de aula.
b) O aluno através do conhecimento que está construindo consegue
colocar em funcionamento o tal conhecimento sem qualquer
auxilio de professor.
c) O aluno não consegue com mediação ou sem mediação do
professor conseguir fazer aplicar um conhecimento dado.
d) O aluno não é capaz de colocar em funcionamento um
conhecimento que ele está construindo, a menos que conte com
a ajuda do professor.

71
Didática da Matemática

e) O aluno em situação não prevista de qualquer contexto de ensino


é capaz de construir um conhecimento com a intervenção de um
professor.

NoÇões de Contrato Didático


Quando um professor no ambiente escolar propõe a planificação do ensino
da sua disciplina, também considera que os alunos terão sua participação ativa
nela, bem como que depende do processo ensino-aprendizagem e do tempo que
os estudantes levarão para o sucesso desse processo, o fato de cumprir esse
planejamento. O professor deve levar e explicar, e de alguma maneira, fazer com
que os alunos concordem com a maneira como esse processo irá acontecer,
permitindo assim, que o processo se efetive.

No caso particular da matemática, o professor pode usar o método de


indução, raciocínio cujas premissas têm caráter menos geral que a conclusão,
ou de dedução, raciocínio que parte de uma ou mais premissas gerais e chega
a uma ou mais de umas conclusões particulares, ou qualquer outro método e
uma grande variedade de metodologias e recursos para usar nas suas aulas. No
decorrer do período letivo, os alunos assimilam essa maneira de acontecer em
que fica implícito, muitas vezes, o contrato didático.

No campo específico do ensino da matemática, a prática pedagógica é


caracterizada especialmente por quatro situações didáticas, segundo Brousseau
(2003), ou seja, situação de ação, situação de formulação, situação de validação
e situação institucionalização. Quase sempre estas situações encontram-se
fortemente entrelaçadas entre si, mas analisadas separadamente permitem
operacionalizar uma análise didática. Assim, cada uma das situações articula
diferentes regras de contrato, pois as tarefas do professor e dos alunos se
diferenciam em cada uma delas.

Dessa forma, a noção de contrato didático passa a ser essencial, tendo


em vista os diferentes caminhos e olhares que as situações didáticas podem
proporcionar.

Para Brousseau (1986 apud PAIS, 2008, p.77):

72
Capítulo 3 A ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA E
DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Contrato didático refere-se ao estudo das regras e


das condições que condicionam o funcionamento Contrato didático
da educação escolar, quer seja no contexto de uma refere-se ao estudo
sala de aula, no espaço intermediário da instituição das regras e das
escolar quer seja na dimensão mais ampla do condições que
sistema educativo. condicionam o
funcionamento da
A noção de contrato didático está associada a dois conceitos: educação escolar,
conceito de contrato social, segundo Jean-Jacques Rousseau (1712- quer seja no
contexto de uma
1778) e ao conceito de contrato pedagógico, segundo Filloux (1974).
sala de aula, no
espaço intermediário
Jean-Jacques Rousseau (1712-1778), através do conceito de da instituição
contrato social “propõe uma forma de compreender as regras de escolar quer seja
funcionamento da sociedade e suas aplicações na educação” (PAIS, na dimensão mais
2008, p. 78). Suas ideias levaram a distinguir três diferentes estados ampla do sistema
educativo.
no transcorrer do desenvolvimento intelectual: o natural, o social e o
contratual. No estado natural prevaleciam a liberdade e a igualdade.
Já, no estado social, o ser humano estaria condicionado por um conjunto de
regras e compromissos e, o estado contratual, deveria representar uma evolução
para combater as injustiças do estado social, onde deveria prevalecer a vontade
da coletividade.

Jean-Jacques Rousseau (1712-1778) foi um filósofo social,


teórico político e escritor suíço. Em sua obra mais importante “O
Contrato Social” desenvolveu sua concepção de que a soberania
reside no povo.

Filloux (1974), através do conceito de contrato pedagógico “destaca


inconveniência de predominar indevidamente, no sistema didático, uma certa
superioridade do professor em relação ao aluno” (PAIS, 2008, p. 79). Essa
situação permite a imposição de um poder – o professor -, a uma inferioridade –
os alunos.

Assim, tanto o contrato social como o contrato pedagógico, reproduzem as


relações de poder e, o sentido proposto por Brousseau (2003), leva a necessidade
de considerar o contrato didático sob três perspectivas – professor, aluno e
conhecimento, sempre acompanhado pelas regras da educação escolar.

73
Didática da Matemática

Importante destacar ainda, que a diferença entre as regras de um


Condições exigidas
no meio escolar contrato didático e um contrato jurídico reside nas condições exigidas no
de forma implícita, meio escolar de forma implícita, aumentando a complexidade do sistema
aumentando a educativo. O professor deve conhecer a especificidade educacional de
complexidade do sua disciplina e saber como a consciência desta pode influenciar no
sistema educativo. sucesso ou fracasso em se tratando da dimensão didática.

Nesse contexto, podemos nos questionar sobre possíveis rupturas em um


contrato didático, dessa maneira estaremos preparados para resolver situações
relativas a essas circunstâncias. Como trabalhar esta questão? Vejamos a seguir.

Leia mais sobre contrato didático no arquivo disponível em:


<http://www.edumat.com.br/wp-content/uploads/2008/12/o-contrato-
didatico-e-a-resolucao-de-problemas-matematicos-em-sala-de-aula.
pdf>.

Ruptura do Contrato Didático


Para Brousseau (2003) mais importante que explicitar todas as regras que
compõem um contrato didático, é delinear possíveis pontos de ruptura. Em
ambas as situações, nos defrontamos com uma difícil situação, ou seja, tratar
com questões implícitas, subjetivas, que não são totalmente previsíveis.

É possível e viável Apesar desta dificuldade, é possível e viável estudar/analisar


estudar/analisar possíveis situações vulneráveis na atividade pedagógica escolar. Estas
possíveis situações situações vulneráveis exigem do professor um conhecimento amplo e
vulneráveis
aprofundado quanto ao grupo com o qual está trabalhando, o espaço
na atividade
pedagógica escolar. escolar, a estrutura pedagógica e o conteúdo a ser trabalhado.

Podemos exemplificar situações de ruptura do contrato pedagógico, segundo


Pais (2008) quando:

- O aluno mostra desinteresse pela atividade proposta

74
Capítulo 3 A ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA E
DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Figura 10 - Desinteresse do aluno

Fonte: Disponível em: <vaniagenarioggenario.blogspot.com>. Acesso em: 08 ago. 2016.

- A atividade proposta está além do nível intelectual e cognitivo do aluno;

Figura 11 - Atividade proposta está além do nível intelectual e cognitivo do aluno

Fonte: Disponível em: <portaldoprofessor.mec.gov.br>. Acesso em: 02 mai. 2016.

- O professor perde a paciência com o aluno e passa a aplicar retaliações ao


aluno que se comportou de forma inadequada;

75
Didática da Matemática

Figura 12 - Punição verbal do professor para o aluno

Fonte: Disponível em: <tvweb-brasilia-barreiras.blogspot.com>. Acesso em: 2 mai. 2016.

- Punição indireta do professor para com o aluno

Figura 13 - Punição indireta do professor para com o aluno

Fonte: Disponível em: <fucxic0.blogspot.com>. Acesso em: 02 mai. 2016.

Cabe ao professor Assim, não podemos deixar de destacar que o conjunto de regras
planejar sua ação do contrato didático é resultado de uma ampla fonte de influências, ou
e verificar em
seja, o cotidiano, o espaço da sala de aula, a instituição escolar, os
que condições as
situações didáticas alunos, bibliografias, entre outros.
foram efetivadas
pelos alunos. O Cabe ao professor planejar sua ação e verificar em que condições
contrato didático as situações didáticas foram efetivadas pelos alunos. Avaliar se
se rompe e implica a aprendizagem ocorreu e, em caso de negativa, redirecionar as
na desistência de
atividades de forma adequada ao nível cognitivo dos alunos. Não
engajamento no
processo de ensino. havendo esse processo, o contrato didático se rompe e implica na

76
Capítulo 3 A ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA E
DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

desistência de engajamento no processo de ensino e, portanto, no abandono do


objetivo da atividade profissional docente. Mas é fundamental compreendermos
as relações que se sucedem no ambiente escolar e as condições que estão
atreladas a efeitos didáticos como veremos a seguir.

Atividades de Estudos:

1) Numa situação de ruptura de contrato didático, qual deverá ser a


postura do professor? O que ele deve propor aos seus alunos?

____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________

2) No caso de ruptura de contrato pedagógico cabe ao professor


planejar sua ação para validar esse contrato, mas o que faria
você na situação exemplificada no capítulo referente à quando o
aluno mostra desinteresse pela atividade proposta?

____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________
____________________________________________________

Cotidiano Escolar e os Efeitos


Didáticos
Ao pensar em contrato didático não podemos deixar de equilibrar duas
condições presentes em sala de aula – negociações e expectativas. Estas
necessitam ser trabalhadas no contexto do professor, do aluno e do saber, a
princípio com os elementos principais, sem tirar a importância de outros elementos
que fazem parte do composto escolar, mas que não são protagonistas desse
contrato.

77
Didática da Matemática

Silva (2008) destaca que muitas das dificuldades dos alunos têm sua causa
em contratos didáticos que podem ser considerados como mal dimensionados
(quanto à comunicação e entendimento). Tanto professor quanto alunos têm
objetivos e expectativas que precisam se encontrar para que ocorra o processo
ensino-aprendizagem. E ambos deverão estar cientes no transcurso do período
letivo sobre as características e os assuntos vinculados no contrato didático.

A teoria das situações didáticas e a noção de contrato didático


Situações que buscam contribuir para a especificidade do ensino da matemática, mas
podem acontecer
tendo em vista cada realidade educacional, o cotidiano escolar pode
em sala de aula e
que se caracterizam apresentar surpresas que dificultam a aprendizagem.
como momentos
cruciais para a Assim, Brousseau (2003) descreveu alguns efeitos didáticos, que
continuidade do conforme Pais (2008, p. 89) são “[...] situações que podem acontecer
processo ensino- em sala de aula e que se caracterizam como momentos cruciais para a
aprendizagem”.
continuidade do processo ensino-aprendizagem”.

Figura 14 - Professora remeta-se ao site

Fonte: Disponível em: <educaacaovv.blogspot.com>. Acesso em: 02 mai. 2016.

Tais situações não podem ser consideradas determinantes quanto ao


resultado final da ação educativa, mas sim, dizem respeito a momentos
localizados, cuja superação depende tanto do aluno como do professor. Por
exemplo, na figura “professora remeta-se ao site” é um momento localizado, mas
que o professor pode aproveitar para falar em autoria, na importância de cada
pessoa fazer suas atividades como parte da construção do conhecimento e como
parte do seu esforço para aprender esse ou aquele conceito.

78
Capítulo 3 A ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA E
DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

É verdade que nos dias de hoje encontra-se tudo na Internet, mas nem
tudo é verdade e nem tudo é transformado em conhecimento para o aluno. Aqui
se pode também ressaltar que o professor também tem que estar atento nas
facilidades que hoje se têm na Internet e nas redes sociais e que têm de ser bem
administradas no entorno educativo.

São consequência de vários aspectos vinculados ao processo ensino-


aprendizagem, tais como: metodologia de ensino, obstáculos, formação do
professor, nível dos alunos, conceitos, entre outros, que farão a diferença
para cada aluno nesse processo. E, quanto aos efeitos didáticos, o autor que
abordamos é o autor Guy Brousseau.

Para Brousseau (2003), são cinco os efeitos didáticos: efeito Topázio, efeito
Jourdain, efeito da Analogia, deslize metacognitivo e efeito Dienes. Mas o que
determina e diferencia cada um deles? É o que passaremos a estudar agora.

Figura 15 - Relacionamento dos fenômenos didáticos e seus efeitos

Fonte: Disponível em: <pt.slideshare.net>. Acesso em: 02 mai. 2016.

79
Didática da Matemática

a) Efeito Topázio

No processo ensino-aprendizagem, durante a prática pedagógica da


matemática, muitas vezes, o aluno sente-se bloqueado diante da dificuldade
em resolver certo problema. Como professores podemos não atentar para a
situação e buscar resolver a situação acelerando a aprendizagem e antecipando o
resultado que deveria ser alcançado pelo aluno.

Brousseau (2003) identificou este efeito como Topázio, ao traçar uma


analogia com uma passagem do romance Topázio, de Marcel Pagnol, onde o
professor aplica um ditado junto a sua turma e no momento da correção, junto
a um aluno que comete erro de concordância, na esperança de ajudá-lo acaba
dando ênfase ao erro, levando o aluno à correção única e exclusivamente por seu
estímulo e não pela real consciência do mesmo.

Este efeito caracteriza-se pela tentativa de transferência de


No contexto das
situações didáticas,conhecimento em situações que deveriam envolver a autonomia do
sinaliza para a próprio aluno. Do ponto de vista pedagógico, este efeito é uma ação
direção oposta inadequada, pois entende que o conhecimento pode ser transmitido do
da participação plano intelectual do professor para o aluno. No contexto das situações
ativa do aluno no didáticas, sinaliza para a direção oposta da participação ativa do aluno
processo ensino-
no processo ensino-aprendizagem. A situação de aprendizagem fica
aprendizagem.
esvaziada. Para que isso não aconteça, o professor deve possibilitar
ao aluno seu próprio momento de aprendizagem, deixá-lo pensar e construir o
conhecimento, questioná-lo para ser ele próprio quem chega à resposta final e
não dar a resposta final de graça. Dar autonomia ao aluno é respeitá-lo, tratá-lo
como ser intelectual e, socialmente valioso.

b) Efeito Jourdain

O efeito Jourdain está no contexto de um fracasso eminente do


Quando o professor processo de ensino, quando o professor busca para si a responsabilidade
busca para si a
da tarefa de compreensão que cabia ao aluno. Na ânsia de identificar
responsabilidade
da tarefa de a existência de algum saber escolar ou científico, passa a valorizar
compreensão que indevidamente, o conhecimento superficial manifesto pelo aluno e
cabia ao aluno. passa a não ter mais o controle pedagógico da situação. Ocorre uma
desistência, por parte do professor, em aprofundar o diálogo com o
aluno, pois poderia se ver em uma situação embaraçosa, por não apresentar mais
nenhuma estratégia didática satisfatória para a situação.

Para isso o professor deve ser humilde quando não conhece uma situação
e virar o jogo ao fazer a proposta de uma nova pesquisa no assunto, deixar para
outra aula em que ele tem tempo de se preparar melhor e os alunos também e,
desse jeito, existe benefício tanto do aluno quanto do professor.
80
Capítulo 3 A ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA E
DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Em uma situação onde ocorre o efeito Jourdain, o aluno trata de uma situação
deslocada do significado matemático e o professor admite o fato como suficiente
para considerar a aprendizagem satisfatória.

c) Efeito da Analogia

Em diversos momentos do processo ensino-aprendizagem, a utilização de


analogias entre um conteúdo já conhecido pelo aluno e os conceitos estudados
em uma nova situação, é considerada um recurso didático eficiente.

Para que uma analogia obtenha uma resposta efetiva no processo ensino-
aprendizagem, deve ser acompanhada de uma vigilância criteriosa por parte do
professor, para ao final não chegar a conclusões reducionistas sobre os conceitos
envolvidos. Assim, o uso inadequado de analogias, pode desencadear em um
efeito Topázio, que por sua vez, pode terminar em um efeito Jourdain.

No efeito Analogia, o aluno chega a uma conclusão não porque


No efeito Analogia,
aprendeu realmente, mas porque visualiza indícios com situações
o aluno chega a
análogas que o professor propôs que repetisse e, após algumas uma conclusão não
tentativas, reconhece nestas, a melhor solução. Para isso não porque aprendeu
acontecer, é fundamental apresentar exemplos e exercícios de diversas realmente, mas
maneiras rompendo com as possíveis analogias. porque visualiza
indícios com
situações análogas
d) Deslize Metacognitivo
que o professor
propôs.
Fenômenos didáticos têm origem a partir de dificuldades, que
podem ser do aluno em compreender certo problema, ou do professor
que não consegue dar uma continuidade ao processo ensino- Ensino não chega
aprendizagem. a um resultado
satisfatório e o
Quando uma situação de ensino não chega a um resultado aluno explicita
sua dificuldade, o
satisfatório e o aluno explicita sua dificuldade, o professor na busca
professor na busca
da continuidade de seu trabalho e, percebendo o esgotamento de da continuidade
seus argumentos didáticos, pode passar às explicações baseadas de seu trabalho
unicamente em suas próprias concepções. Nesse caso, é importante e, percebendo o
procurar outros autores e, inclusive, trazer os alunos que já esgotamento de
compreenderam, que já adquiriram o conhecimento, como mediadores seus argumentos
didáticos,
e proporcionar outro momento e circunstância para fazer acontecer
pode passar
à aprendizagem. Este momento caracteriza-se por um deslize às explicações
metacognitivo, no momento em que quebra o procedimento vinculado baseadas
a um discurso científico e passa a explicações com origem no saber unicamente em
cotidiano do professor. suas próprias
concepções.

81
Didática da Matemática

Importante destacar que, normalmente a mudança do discurso científico


para um discurso baseado no saber cotidiano do professor não é percebida pelos
alunos, favorecendo a confusão entre o saber escolar e o mundo cotidiano.

e) Efeito Dienes

O efeito Dienes, está baseado, segundo Brousseau (2003), nos trabalhos do


educador Dienes, no contexto da matemática moderna, na década de 1960. Sua
proposta era chamada de processo psicodinâmico e, consistia em um modelo de
aprendizagem que buscava sistematizar certos modelos de ensino, envolvendo
a repetição de problemas ou exemplos semelhantes na busca de respostas
padronizadas.

Esta concepção de ensino, baseada em uma visão puramente estruturalista


da matemática, contribuiu para incorrer em confusões entre o saber científico e a
especificidade de seus valores educacionais.

Este efeito traz implícito o afastamento do professor no processo ensino-


aprendizagem, pois não necessita mais acompanhar e compreender os processos
de ensino. Dienes (1975) pretendia construir um modelo didático que fosse
independente do conteúdo.

Para a superação desse efeito, a relação professor-aluno deve ser


Para a superação
referência na função educativa do saber. Um exemplo que podemos
desse efeito, a
relação professor-mencionar, é o modelo Kumon, que para alguns alunos funciona bem.
aluno deve ser Esse modelo pretende dar uma base sólida para o aluno para que ele
referência na funçãopossa aprender por si só, em que a relação professor-aluno iria a sua
educativa do saber.mínima expressão. Esse método divulgou uma fama de rapidez em
cálculos matemáticos e desenvolvimento dos conhecimentos abstratos
que até em piadas aparece essa fama como mostra a vinheta abaixo.

Figura 16 - Fama do método Kumon: bom em matemática

Fonte: Disponível em: <piadasdocardosinho.blogspot.com>. Acesso em: 02 mai. 2016.


82
Capítulo 3 A ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA E
DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

Para deixar ainda mais claro, os efeitos dos fenômenos didáticos ficam
resumidos no quadro a seguir, que apresenta as características de cada um dos
fenômenos.

Quadro 1 - Características dos efeitos dos fenômenos didáticos

Efeito Caracterização
Apresenta-se uma situação, onde, após um problema proposto, num mo-
Topázio mento determinado, o professor percebe a dificuldade do aluno, então, tenta
acelerar a aprendizagem, antecipando o resultado.
Apresenta-se uma situação em que o professor reconhece uma resposta
Jourdain
simples do aluno como a expressão de um conhecimento científico.
Da Analogia Acontece quando o professor incorre no uso inadequado de uma analogia.
Deslize Circunstância onde o professor toma suas próprias explicações como objeto
Metagognitivo de estudo no lugar do verdadeiro conhecimento matemático.
Situação em que o professor com suas concepções (epistemológicas) tenta
Dienes
aproximar o saber científico do saber ensinado.
Fonte: A autora.

Conheça um trabalho exemplificando os efeitos didáticos em


sala de aula. Disponível em: <http://rbep.inep.gov.br/index.php/rbep/
article/viewFile/676/654>.

Atividade de Estudos:

1) Considerando realidades educacionais específicas do dia a dia,11


podem acontecer imprevistos que atrapalham a aprendizagem.
Esses são conhecidos como efeitos didáticos. Aquele efeito
didático vinculado a tentar passar conhecimento diretamente ao
aluno sem deixar acontecer o desenvolvimento da autonomia do
aluno é conhecido como:

a) Efeito Jourdain.
b) Efeito Metacognitivo.

83
Didática da Matemática

c) Efeito da Analogia.
d) Efeito Topázio.
e) Efeito Dienes.

Algumas ConsideraÇões
A sala de aula é um espaço complexo que envolve muitas variáveis, mas
que se fundamentam na relação professor, aluno e saber. A relação didática
estabelecida traz consigo negociações e expectativas que necessitam ser
dialogadas e acordadas, caracterizando a importância do contrato didático no
processo ensino-aprendizagem.

Por mais que haja planejamento e definição clara de objetivos, o processo


de construção do saber traz consigo variáveis intangíveis que podem emergir na
relação estabelecida entre o professor, aluno e saber, motivo pelo qual a análise e
discussão de possíveis obstáculos didáticos se fazem presentes e necessárias no
fluxo do processo de ensinar e aprender.

Para Brousseau (2003) mais importante que explicitar todas as regras que
compõem um contrato didático, é delinear possíveis pontos de ruptura e, em
ambas as situações nos defrontamos com uma difícil situação, ou seja, tratar com
questões implícitas, subjetivas, que não são totalmente previsíveis.

A partir da análise dos possíveis problemas encontrados no cotidiano


escolar, podemos entender e visualizar a dinâmica da sala de aula. Neste
cotidiano acontecem inúmeras interações e relações, o conhecimento é produzido
e reproduzido e o meio externo exerce constante influência. Assim, precisamos
observar e repensar a prática pedagógica no dia a dia. A teoria das situações
didáticas e a noção de contrato didático buscam contribuir para a especificidade
do ensino da matemática, tendo em vista que cada realidade educacional e cada
cotidiano escolar podem apresentar surpresas que dificultam a aprendizagem.

Referências
ALMOULOUD, S. A. (2007). Fundamentos da Didática da Matemática.
Curitiba: UFPR, 2007. Brasil. Ministério da Educação e Cultura. Fundação
Nacional de Material Escolar (1973). Desenho 2: plano – espaço. Brasília: MEC.

84
Capítulo 3 A ESPECIFICIDADE DA MATEMÁTICA E
DA DIDÁTICA DA MATEMÁTICA

BACHELARD, G. (1928). Ensaio sobre o conhecimento aproximado. Rio de


Janeiro, RJ: Contraponto, 2004, 316p.

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Contraponto, 2003, 316p.

BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares


nacionais: matemática / Secretaria de Educação Fundamental. – Brasília: MEC/
SEF, 1997. 142p.

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Professor. Palestra. São Paulo: PUC, 2006.

______. Fundamentos e Métodos da Didáctica da Matemática. In: BRUN, J.


Didática das Matemáticas. Tradução de: Maria José Figueiredo. Lisboa: Instituto
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______. Os diferentes papéis do professor. In: PARRA, Cecília; SAIZ, Irma


(org). Didática da Matemática: Reflexões Psicológicas. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1996b. Cap. 4. p. 48-72.

CHEVALLARD, Y., BOSCH, M. e GASCÓN, J. Estudar Matemáticas: o elo


perdido entre o ensino e a aprendizagem. Tradução: Daisy Vaz de Moraes.
Porto Alegre: Artmed, 2001.

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Bolema. Boletim de Educação Matemática. Vol. 20, n° 28, 1179-205. ISSNÇ
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DIENES, Z. P. As seis etapas do processo de aprendizagem. (Trad. Maria Pia


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GODINO, J. Perspectiva de la Didática de lãs Matemática como disciplina


científica. Un. Granada: Programa de doctorado “Teoria de la educación
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PAIS, L. C. Didática da matemática: uma análise da influência francesa. 2.


ed. 2. reimp. - Belo Horizonte: Autêntica, 2008. 128p. (Coleção Tendências em
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85
Didática da Matemática

SILVA, B. A. Contrato Didático / Educação Matemática Uma Nova Introdução /


Anna Franchi... et al; org. Silvia Dias Alcântara Machado – 3. ed. Revista. – São
Paulo: EDUC, 2008.

86
C APÍTULO 4
Questões Metodológicas e a
Engenharia Didática

A partir da perspectiva do saber fazer, neste capítulo você terá os seguintes


objetivos de aprendizagem:

 Identificar e organizar as fases da Engenharia Didática.

 Analisar a dimensão teórica e experimental da pesquisa em Didática da


Matemática.
Didática da Matemática

88
Capítulo 4 QUESTÕES METODOLÓGICAS E A ENGENHARIA DIDÁTICA

ConteXtualiZaÇÃo
Ao pensarmos sobre a engenharia de qualquer coisa, uma das primeiras
imagens relacionadas é a do conhecimento científico aplicado, isto é, o que
científicamente conhecemos desse “assunto” e o aplicamos na prática. No nosso
caso, o conhecimento científico que estudamos é sobre a Didática da Matemática,
então, passamos a explorar os estudos em que podemos aplicar o conhecimento
de uma maneira prática e através da metodologia científica.

Por outro lado, ao falarmos em engenharia mergulhamos num assunto que


nos remete a arte de construir uma obra de grande porte, para isso é necessário
termos conhecimentos teóricos que colocaremos em prática para obtermos essa
obra. Na didática da matemática não é diferente se utilizarmos a metodologia
da engenharia, pensamos na aplicação na prática pedagógica do ensino da
matemática, espaço no qual as teorias dessa disciplina vem à tona.

Os assuntos que temos discutido até este ponto nos fornecem bases teóricas,
as quais são, atualmente, utilizadas para estudos de pesquisas e que usam a
metodologia da Engenharia Didática. Esta tem um procedimento diferenciado cujo
ponto de partida é a conjugação da dimensão teórica com a dimensão prática.
Mas, de que forma? Qual o caminho escolhido para tal fim? Veremos a seguir as
noções da Engenharia Didática que nos auxiliarão neste quesito.

NoÇões da Engenharia Didática


A educação matemática é sem dúvida uma obra de engenharia de grande
porte e, no nosso espaço, cabe fazer essa parte da obra no que diz respeito à
Didática da Matemática. Pesquisas nessa área implicam em domínio de conceitos.
Em qualquer área do conhecimento isso é fundamental, mas é preciso levar esse
conhecimento à prática e, para isso, fazemos a ponte com a engenharia que não
só precisa de conceitos, mas planejamento e execução de um projeto. Aqui, a
analogia é entre a didática e o trabalho do engenheiro. Na aplicação da didática, é
necessário considerar os outros elementos da obra, como os alunos. Na didática,
o professor se apropria do campo das ideias e se utiliza de conceitos, para de
alguma maneira, usando sua criatividade qualificada, lhe dar a forma racional e a
colocar em prática, destacando que essa prática na maioria dos casos acontece
na sala de aula.

Conforme, já estudado nos capítulos anteriores, Brousseau (1996a; 1996b) e


Artigue (1996), dentre outros pesquisadores da linha da Didática da Matemática,
defendem a utilização de situações de aprendizagem, em que os alunos são

89
Didática da Matemática

colocados em ação diante de jogos e situações-problema, mobilizando assim,


estratégias de resolução e conhecimentos anteriores para que sejam capazes
de realizar operações de seleção, organização e interpretação de informações.
Nesse contexto, entendem que o processo de construção do conhecimento
matemático efetivamente ocorre e, consequentemente a formação passa a fazer
sentido para o aluno. Essas situações (jogos e situações-problema) acima de tudo
instrumentalizam o professor para a elaboração de situações, em que o aluno
tenha um papel dinâmico, social e participativo na própria aprendizagem.

Situações de Aprendizagem permitem que o estudante interaja


permanentemente no processo ensino-aprendizagem e aprenda a aprender, para
entender as definições e conceitos que se fazem necessários.

Seu desenvolvimento e aplicação é um desafio para os docentes e para


os estudantes, que aprendem através de estratégias de ensino. Este aprender
fazendo, permite que os alunos produzam, questionem, pesquisem, criem,
compreendam, interpretem e, até mesmo, descubram novos conhecimentos,
como cita Prado (2009 apud FREIRE; PRADO, 1995, p. 3):

[...] uma situação de aprendizagem deve propiciar ao aluno a


vivenciar ações reflexivas, que possa favorecer tanto aprender-
com, como aprender-sobre o pensar. Isto significa que o
aluno deve aprender-fazendo (colocando a mão na massa) e
construindo algo que lhe seja significativo, de modo que posso
envolver-se afetiva e cognitivamente com aquilo que está
sendo produzido. É importante que o produto seja algo tangível
e passível de ser feito e compreendido pelo aluno-produtor;
algo que permita ao aluno reconhecer durante o processo de
produção, uma utilidade imediata para aquilo que está sendo
feito e aprendido.

A seleção do uso de estratégias de ensino adequadas na realização da


situação de aprendizagem deve permitir ensaios, testes, trabalhos de pesquisa,
práticas diversas que promovam êxito nos resultados esperados.

Um dos referenciais para viabilizar a intenção de colocar o ensino como


um projeto social se fortaleceu com a proposta da metodologia da Engenharia
Didática, delineada por Brousseau (1996a; 1996b) e estruturada nos trabalhos de
Artigue (1996). A Engenharia Didática foi inicialmente concebida para fomentar
a criação de recursos e meios para aprimorar o trabalho em sala de aula, mas,
posteriormente, evoluiu para a estruturação em um quadro teórico mais amplo, de
modo a possibilitar a concepção de situações de aprendizagem, servindo também
como referencial metodológico para a posterior análise do material empírico.

90
Capítulo 4 QUESTÕES METODOLÓGICAS E A ENGENHARIA DIDÁTICA

Segundo Artigue (1996), a Engenharia Didática é um processo


Segundo Artigue
empírico que objetiva conceber, realizar, observar e analisar as (1996), a Engenharia
situações didáticas. A autora pondera que a Engenharia Didática possui Didática é um
dupla função, a qual pode ser compreendida como uma produção para processo empírico
o ensino tanto como uma metodologia de pesquisa qualitativa. que objetiva
conceber, realizar,
observar e analisar
Assim, a Engenharia Didática deve ser concebida sob dois
as situações
enfoques: pode ser utilizada como metodologia qualitativa de pesquisa didáticas.
na área de Matemática, mas também é extremante útil para a
elaboração de situações didáticas que configurem um quadro de aprendizagem
significativa em sala de aula.

Pais (2008, p. 99) destaca a engenharia didática como uma metodologia


que “possibilita uma sistematização metodológica para a realização prática da
pesquisa, levando em consideração as relações de dependência entre teoria e
prática”.

Segundo Artigue (1996), a Engenharia Didática enquanto metodologia de


pesquisa é um esquema experimental, baseado em realizações didáticas na sala
de aula, tratando da concepção, realização, observação e análise de sequências
de ensino.

Deste modo, a Engenharia Didática se caracteriza por propor:

[...] uma seqüência de aula(s) concebida(s), organizada(s) e


articulada(s) no tempo, de forma constante, por um professor-
engenheiro para realizar um projeto de aprendizagem para certa
população de alunos. No decurso das trocas entre professor e
alunos, o projeto evolui sob as reações dos alunos e em função
das escolhas e decisões do professor (MACHADO, 2002 apud
DOUADY, 1993, p. 2).
A Engenharia
Podemos distinguir dois níveis de engenharia didática – a Didática, como
microengenharia e a macroengenharia, ambos necessários e metodologia descrita
complementares. Na microengenharia, as pesquisas têm por objeto por Artigue (1996),
compreende
de estudo, um determinado assunto. São pesquisas localizadas e
quatro fases: a 1ª
levam em conta a complexidade dos fenômenos de sala de aula. Já na fase, das análises
macroengenharia, estão às pesquisas que permitem uma composição preliminares, a 2ª
entre a complexidade das pesquisas da microengenharia e os fase, da concepção
fenômenos ligados à duração nas relações ensino/aprendizagem. e da análise a
priori, a 3ª fase, da
experimentação e a
Além dos níveis, a Engenharia Didática, como metodologia
4ª e última fase, da
descrita por Artigue (1996), compreende quatro fases: a 1ª fase, das análise a posteriori e
validação.

91
Didática da Matemática

análises preliminares, a 2ª fase, da concepção e da análise a priori, a 3ª fase, da


experimentação e a 4ª e última fase, da análise a posteriori e validação, conforme
expresso na figura abaixo.

Figura 17 - As quatro fases ou etapas da Engenharia Didática

Fonte: A autora.

Essas fases permitem prover o professor de referencial propício e motivador


para conceber, aplicar e, posteriormente, analisar algumas tarefas didáticas, ou
seja, introduzir um novo conceito e desenvolver diversas estratégias, conforme
sugere Brousseau (2006).

Cabe salientar que as quatro fases podem não ocorrer de forma linear
e estanque. A elaboração da Engenharia Didática necessita, em alguns
momentos, da articulação, da antecipação e até da superposição dos elementos
caracterizadores destas quatro fases.

Fases da Engenharia Didática


Anteriormente, afirmamos que a Engenharia Didática se constitui pela teoria
posta em prática, sendo esta prática sistematizada e organizada por meio de um
planejamento. Agora, apresentaremos o trabalho realizado através das fases da
Engenharia Didática.
92
Capítulo 4 QUESTÕES METODOLÓGICAS E A ENGENHARIA DIDÁTICA

1ª fase - Das análises preliminares

Nesta fase, conforme descreve Machado (2002), são feitas ponderações


envolvendo o quadro teórico didático geral, bem como sobre conhecimentos mais
específicos envolvendo o tema da pesquisa. Como análise preliminar, é feita uma
revisão bibliográfica envolvendo as condições e contextos presentes nos vários
níveis de produção didática e no ambiente onde ocorrerá a pesquisa. Também se
desenvolve uma análise geral quanto aos aspectos histórico-epistemológicos dos
assuntos do ensino a serem trabalhados e dos efeitos por eles provocados, bem
como, da concepção, das dificuldades e obstáculos encontrados pelos alunos
dentro deste contexto de ensino.

Um ponto de apoio das análises preliminares “[...] reside na fina análise


prévia das concepções dos alunos, das dificuldades e dos erros tenazes, e a
engenharia é concebida para provocar, de forma controlada, a evolução
das concepções” (ARTIGUE, 1996, p. 202). A primeira fase
está apoiada em
um referencial
Assim, a primeira fase está apoiada em um referencial teórico
teórico já adquirido
já adquirido e analisa como se encaminha aquele conhecimento no e analisa como se
aprendiz, como se dá o ensino atual em relação àquele conteúdo/ encaminha aquele
domínio, as concepções dos alunos, as dificuldades e os obstáculos conhecimento no
que marcam a evolução desse conhecimento. Deve-se ter presente os aprendiz, como se
fundamentos teóricos vinculados com o assunto que será desenvolvido dá o ensino atual
em relação àquele
pelo professor/pesquisador e as categorias que ele apresenta com o
conteúdo/domínio,
intuito de conseguir fazer a montagem de uma sequência didática. as concepções
dos alunos, as
O objeto de pesquisa/interesse passa por uma análise preliminar, dificuldades e os
primeiro percebendo as concepções dos alunos e o contexto em obstáculos que
que será inserido. Fazem-se as deduções sobre o levantamento de marcam a evolução
desse conhecimento.
constatações empíricas, as quais serão consideradas explicitamente,
na medida do possível, dentro do planejamento, mas, em não se
concretizando, essas constatações empíricas devem ao menos ser consideradas
na elaboração da proposta da sequência didática. É muito importante termos
presente, ao constituir o objeto de estudo, suas dimensões com respeito ao vínculo
com o sistema de ensino, bem como a epistemologia cognitiva e principalmente
pedagógica. O levantamento das dificuldades e obstáculos permitirá a análise
dos fatores que permitirão superar os problemas observados na aprendizagem, o
que viabiliza a etapa seguinte: a concepção da sequência didática.

2ª fase - Da concepção e da análise a priori

Nesta fase, Machado (2002) ressalta que a pesquisa delimita as variáveis


microdidáticas (ou locais) e macrodidáticas (ou globais), conforme já destacadas

93
Didática da Matemática

anteriormente como níveis, pertinentes ao Sistema Didático (professor/aluno/


saber) que podem ser consideradas pelo pesquisador/professor. A importância
da determinação dessas variáveis está na fundamentação da construção das
sequências didáticas, que permitirão o surgimento do conhecimento almejado.

A delimitação das variáveis microdidáticas (locais) e macrodidáticas (globais),


permite fazer evoluir os comportamentos dos alunos, através da possibilidade
de mudanças de estratégia na resolução de problemas. Machado (2002)
descreve que estas duas modalidades de variáveis (variáveis microdidáticas e
macrodidáticas), identificadas como variáveis de comando são interdependentes.
A escolha das variáveis globais (macrodidáticas) precede a escolha das variáveis
locais (microdidáticas), afinal esta última está ligada a organização do meio mais
imediato.

Assim, segundo Artigue (1996, p. 205), na segunda fase da Engenharia


Didática, a análise a priori:

[...] deve ser concebida como uma análise do controle do


sentido; muito esquematicamente, se a teoria construtivista
coloca o princípio do compromisso do aluno na construção
dos seus conhecimentos por intermédio das interações com
determinado meio, a teoria das situações didáticas que serve
de referência à metodologia de engenharia [didática], teve,
desde sua origem a ambição de se constituir como uma teoria
de controle das relações entre sentido e situações.

Artigue (1996, p. 205), ainda destaca, que o objetivo da análise a priori é:

[...] determinar de que forma permitem as escolhas efetuadas


controlar os comportamentos dos alunos e o sentido desses
comportamentos. Para isso, ela funda-se em hipóteses;
será a validação destas hipóteses que estará, em princípio,
indiretamente em jogo no confronto, operado na quarta fase,
entre a análise a priori e a análise a posteriori.

Machado (2002) destaca que para alcançar o objetivo da análise a priori,


esta deve estar vinculada às características da situação a-didática (já discutida
em capítulos anteriores) desenvolvida e aplicada aos alunos. Para organizar o
meio, a pesquisa deverá:

• Descrever as variáveis locais ou globais e as características da situação


a-didática;
• Ponderar qual o grau de investimento que esta situação terá para o aluno em
decorrência de suas opções de ação, formulação, controle e validação na
experimentação;

94
Capítulo 4 QUESTÕES METODOLÓGICAS E A ENGENHARIA DIDÁTICA

• Prever os comportamentos possíveis e como a situação permitirá controlar


esses comportamentos em prol do desenvolvimento do conhecimento
almejado.

Machado (2002) ressalta ainda, que na análise a priori o caráter descritivo e


o caráter preditivo são pertinentes dentro do papel do aluno. Já com relação ao
professor, temos apenas a análise descritiva, devido aos papéis assumidos pelo
professor e aluno na concepção de Brousseau (1996a) para a fase a-didática.
Assim, o aluno é o ator principal, e o papel do professor é recuperado no
contrato didático. O aluno reflete e trabalha com tentativas, de modo a eleger um
procedimento de resolução, através de uma interação com o ‘milieu’. Os alunos
tomam as decisões que faltam para organizar a resolução do problema ou do jogo
proposto.

Conforme já destacado no capítulo 3, podemos ver como


esclarece Brousseau (1988), que falou sobre polígonos da didática
e além dos elementos professor, aluno e saber, acrescentou o que
ele chamou de “milieu” nome dado ao ambiente em que acontece o
processo de ensino-aprendizagem.

Segunda fase é a da
Podemos, então afirmar, que esta segunda fase é a da concepção concepção e análise
e análise a priori das situações didáticas nas quais o professor/ a priori das situações
pesquisador definirá as variáveis que estarão sob controle e onde o didáticas nas
quais o professor/
comportamento esperado do aluno é o foco principal da análise. É a fase
pesquisador
em que se realiza uma análise preliminar de variáveis designadas pelo definirá as variáveis
professor/pesquisador como aquelas que afetam significativamente que estarão sob
o objeto de estudo. A partir da identificação e escolha das primeiras controle e onde o
variáveis acontece à análise a priori propriamente dita que determina comportamento
quais dessas variáveis é possível controlar, de alguma maneira, e esperado do aluno
é o foco principal da
associar atividades com conteúdo trabalhado em sala, através das
análise.
quais se viabilize a apropriação dos conceitos estudados.

O instrumento fundamental para a pesquisa em Didática


da Matemática é a análise a priori de uma situação didática [...].
A análise a priori de uma situação didática, significa a análise
das representações epistemológica, representações histórico-

95
Didática da Matemática

epistemológicas e comportamentos, supostos corretos ou não, para


a solução da situação didática dada (ARAÚJO; IGLIORI, 2012, p. 4).

3ª fase - Da experimentação

Conforme Machado (2002), esta fase, consiste basicamente no


desenvolvimento da aplicação da Engenharia Didática, concebida a um grupo
de alunos, objetivando verificar as ponderações levantadas na análise a priori.
Portanto, a experimentação pressupõe:

• A explicitação dos objetivos e condições de realização da sequência didática


aos alunos;
• O estabelecimento do contrato didático;
• A aplicação da sequência didática;
• O registro das observações feitas durante a sequência didática.

Segundo Brousseau (1996a), no contrato didático, é essencial a não


interferência explícita de conhecimentos, evitando explicações ou ‘dicas’ que
induzam caminhos para a resolução da sequência didática por parte dos alunos.
É de suma importância para o processo ensino-aprendizagem, condições que
permitam a mobilização do aluno em enfrentar o problema e em resolvê-lo,
através da sua lógica e dos conhecimentos anteriores. Assim, é imprescindível o
entendimento mútuo dos papéis - da não interferência do professor/pesquisador e
da ação independente do aluno. O respeito a estas condições, garante condições
para se caracterizar o contrato didático. Importante destacar que a intenção de
propiciar condições de situar o aluno em confronto com a situação da forma
mais independente possível, pressupõe o aceite do aluno em enfrentar
“Sequências o desafio intelectual de resolver as situações propostas, como se o
didáticas são problema fosse dele.
um conjunto
de atividades
Podemos, aqui, observar a importância do contrato didático, sendo
ordenadas,
estruturadas e este um conjunto de normas ou cláusulas, geralmente implícitas, que
articuladas para regulam as obrigações recíprocas do professor/pesquisador e dos
a realização de alunos, em relação ao projeto de estudo de ambas as partes, que evolui
certos objetivos à medida que o processo didático avança.
educacionais, que
têm um princípio e
Cabe resgatar o conceito de sequência didática. Para Zabala
um fim conhecidos
tanto pelos (1998, p.18) “sequências didáticas são um conjunto de atividades
professores como ordenadas, estruturadas e articuladas para a realização de certos
pelos alunos”. objetivos educacionais, que têm um princípio e um fim conhecidos tanto
pelos professores como pelos alunos”.
96
Capítulo 4 QUESTÕES METODOLÓGICAS E A ENGENHARIA DIDÁTICA

Uma sequência didática é constituída por uma série de aulas planejadas e


analisadas com antecedência em função dos conceitos previstos na pesquisa e o
processo ensino-aprendizagem que acontece, uma vez elas aplicadas, com foco
na observação de situações de aprendizagem. Nessas aulas que fazem parte
da sequência didática, é relevante toda e qualquer informação relacionada ao
fenômeno investigado para ser registrada e ter um desenvolvimento da pesquisa
mais completo. Também é fundamental o registro da contextualização das
características reais sobre a aplicação dessas sequências, através de registros
escritos em relatórios e, se necessário, através do registro com filmagens,
gravações e fotos.

Quanto ao tipo de registro, está de alguma maneira, enlaçado ao tipo de


variáveis que foram priorizadas na fase da análise a priori. O importante é que o
registro tenha a ver com o tipo de variável destacada como principal no fenômeno
de estudo, porque a descrição da variável tem de ser fidedigna com o contexto
em que está envolvida. Se os dados que precisam ser registrados foram definidos
como o discurso do aluno, deverá existir uma gravação e transcrição desses
dados. Se for um estudo de caso, ou um grupo, talvez o mais apropriado seja
filmagem e, assim, vai se adequando a fonte de registro com as variáveis a que se
deu prioridade na segunda etapa.

Machado (2002) destaca que na fase da experimentação, em determinados


momentos torna-se necessário a obtenção de dados complementares,
A terceira fase,
em que é possível obter esclarecimentos das respostas e
entendendo ser esta
comportamentos dos alunos, assim como, efetuar eventuais correções a fase de aplicação
nas atividades subsequentes. da sequência
didática com os
Finalizamos, assim, a terceira fase, entendendo ser esta a fase alunos, registrando
de aplicação da sequência didática com os alunos, registrando as as observações
realizadas durante a
observações realizadas durante a mesma.
mesma.

4ª fase - Da análise a posteriori e validação

De acordo com Artigue (1996), esta fase apoia-se sobre os


Caracteriza-se
dados obtidos ao longo da experimentação pelas observações do
pelo tratamento
professor/pesquisador. Caracteriza-se pelo tratamento dos dados e a dos dados e a
confrontação com a análise a priori, levando à interpretação e análise confrontação
dos resultados. com a análise a
priori, levando
Podemos assim, entender que a quarta e última fase, segundo à interpretação
e análise dos
Artigue (1988, p. 10):
resultados.

97
Didática da Matemática

[...] se apoia no conjunto de dados recolhidos quando da


experimentação, [...] mas também nas produções dos alunos
em sala de aula ou fora dela. Esses dados são geralmente
completados por dados obtidos pela utilização de metodologias
externas: questionários, entrevistas individuais ou em
pequenos grupos, realizados em diversos momentos do ensino
ou a partir dele.

Assim, por meio do confronto das análises a priori, com base no referencial
teórico constituído, e da análise a posteriori, realizada sobre os dados recolhidos
quando da ação efetiva dos alunos, é realizada a validação das hipóteses da
pesquisa. A principal diferença entre as pesquisas realizadas dentro de uma
Metodologia da Engenharia Didática e outras, é a busca de um confronto das
análises iniciais com os dados sobre os procedimentos e desempenhos dos
alunos, analisados posteriormente, validando assim, as hipóteses da pesquisa.

Podemos, então, resumir esta fase como aquela em que nos debruçamos
sobre os dados registrados, relacionando-os com a teoria para assim, analisar e
ponderar sobre o objeto de estudo. Além disso, nessa etapa se complementam
os dados já obtidos com uso de outros recursos como diálogos, gravações
adicionais, filmagens e similares. Com todos os dados armazenados e tratados,
nos debruçamos sobre a análise para alcançar a realidade de produção dos
alunos, usando as ferramentas cognitivas e metodológicas com o objetivo de
conseguir perceber os procedimentos de raciocínio dos alunos.

Nesta última etapa, fazemos o fechamento com a validação dos resultados.


Essa validação acontece ao confrontarmos os dados da análise a priori com a
análise a posteriori e, assim, analisamos as hipóteses que foram elaboradas
ao iniciar a pesquisa. Nesse momento, o cuidado deve ser maior para garantir
a validade científica da pesquisa, além do aspecto epistemológico da pesquisa
didática. Ressaltamos, entretanto, que o uso da engenharia didática tem maior
adequação quanto metodologia, especialmente, em registros de estudo de casos,
por ter uma valorização no contexto em que a pesquisa foi realizada.

1 - A engenharia didática compreende quatro fases. Identifique


e diferencie as mesmas
A Engenharia Didática compreende quatro fases: a 1ª fase,
das análises preliminares, a 2ª fase, da concepção e da análise a
priori, a 3ª fase, da experimentação e a 4ª e última fase, da análise a
posteriori e validação.

98
Capítulo 4 QUESTÕES METODOLÓGICAS E A ENGENHARIA DIDÁTICA

A contribuição da Engenharia Didática para a sala de aula, diz


A contribuição da
respeito à possibilidade de prover a fundamentação teórica para que Engenharia Didática
o professor conheça o significado e amplie seu leque de possibilidades para a sala de
de ações, sempre buscando o elo entre a teoria e a prática de sala aula, diz respeito
de aula. A Engenharia Didática representa uma forma de análise e à possibilidade
compreensão da relação entre teoria e prática, estabelecendo um de prover a
fundamentação
vínculo com a questão da formação de conceitos matemáticos. Nesta
teórica para que o
metodologia, a revisão bibliográfica com relação ao conhecimento professor conheça
(dimensão epistemológica) é de suma importância. A busca das origens o significado e
dos conhecimentos de matemática aprimora a relação com o saber do amplie seu leque
professor, consequentemente incrementando a crítica com relação de possibilidades
a materiais didáticos disponíveis e fomentando o trabalho criativo e de ações, sempre
buscando o elo entre
dinâmico em sala de aula. Ao conhecer os fundamentos que regem as
a teoria e a prática
etapas de análise preliminar, concepção e análise a priori, o professor de sala de aula.
obtém um domínio da formulação das situações de aprendizagem,
aprimorando a construção do conhecimento pelos alunos.

A estrutura proposta pela Engenharia Didática mantém um elo entre o saber


acadêmico (resultados da pesquisa) e o saber a ser ensinado (constatações
práticas), permitindo um movimento constante de aproximação da academia com
as práticas escolares.

Conheça dois trabalhos que recorrem à Engenharia Didática


1. http://www.lume.ufrgs.br/handle/10183/31596. Acesso em: 30
mai. 2016.
2. http://www.mat.ufrgs.br/~vclotilde/publicacoes/ENGENHARIA
%20ZETEIKE2005.pdf. Acesso em: 15 de jun. 2016.

Após o estudo da Engenharia Didática e da leitura dos trabalhos destacados


no “Léo – Sugestão de leitura”, podemos, então, finalizar este tópico, destacando
que a Teoria das Situações Didáticas de Guy Brousseau, concebida como suporte
teórico, associada a Engenharia Didática, como metodologia, podem contribuir
significativamente para a construção de conhecimentos em sala de aula.

Os elementos teóricos apresentados por Brousseau, permitem identificar


como e por que transformar os saberes matemáticos em conhecimentos
matemáticos. Tradicionalmente os modelos de algoritmos são apresentados pelo
professor, na perspectiva de assimilação pelos alunos. Com a sequência didática,

99
Didática da Matemática

o processo passa a ser invertido, ou seja, a partir da estratégia de tentativa e erro,


os alunos podem desenvolver outras estratégias como recursos para a resolução
dos problemas.

Este tipo de proposta pode ser complementada, permitindo ao professor


explicar a origem do algoritmo de resolução do problema para a busca dos
possíveis novos caminhos. A utilização de uma sequência didática, onde a atuação
do aluno se intensifica pela possibilidade de autonomia e pelo confronto com as
situações propostas, possibilita uma evolução de estratégias, potencializando a
cognição dos alunos. A prioridade e a atenção do processo ensino-aprendizagem
recaem sobre uma cultura do pensar.

Assim, podemos entender a importância de possibilitar em sala de aula a


autonomia da aprendizagem, a participação efetiva dos alunos e a cultura do
pensar, propiciando aos alunos:

• Uma forma de explicitar estratégias de resolução, tornando-as passíveis de


compartilhamento;
• Um estímulo ou motivação para pensar, de forma a alcançar decisões
acertadas;
• Coragem para enfrentar situações novas e diferenciadas;
• Transferência de estratégias e conhecimentos gerados em um dado contexto
para outros, ou seja, a generalização do conhecimento.

A utilização de contextos práticos, do dia a dia, junto a sequências didáticas,


permite ainda o desenvolvimento do uso das várias linguagens matemáticas e
permite articular competências essenciais para a construção do conhecimento, ou
seja:

• A capacidade de compreensão, ao tomar contato com contextos práticos;


• A capacidade de argumentação, ao possibilitar o raciocínio e o exame de
situações matemáticas em diferentes pontos de vista e estratégias;
• A capacidade de decisão, ao realizar as possíveis análises dos resultados;
• A capacidade de contextualização, possibilitada pela inserção em situações
cotidianas e de fácil compreensão, situadas em contextos próximos aos
alunos.

O uso de sequências didáticas está no contexto da cultura de propostas


de situações de aprendizagem. Para nós, profissionais da educação, que
nos propusermos a empreender uma jornada na aplicação dos conceitos
apresentados, inicialmente, deverá ocorrer uma busca das situações-problema e
jogos que possuam as características adequadas para a aplicação das situações
fundamentais. Buscaremos uma redução das mediações do professor e a

100
Capítulo 4 QUESTÕES METODOLÓGICAS E A ENGENHARIA DIDÁTICA

valorização da interação do aluno com o meio em que está inserido bem como,
de sua autonomia no processo ensino-aprendizagem. Isto requer por parte do
professor, um trabalho reflexivo e coletivo, em que a dialética da teoria com a
prática, possa contribuir para formar um cidadão com uma cultura matemática
mais significativa.

Para introduzir o próximo tópico, assista ao vídeo: Educação


Brasileira - Ubiratan D’Ambrosio e Nilson José Machado. Disponível
em: <https://youtu.be/-vRBZYw_wfw>. Acesso em: 30 mai. 2016.

1 - Quais as funções da Engenharia Didática? Disserte sobre


elas.
A Engenharia Didática possui dupla função, a qual pode ser
compreendida como uma produção para o ensino tanto como uma
metodologia de pesquisa qualitativa. Relato pessoal.

2 - Qual a contribuição da Engenharia Didática para a sala de


aula?
A contribuição da Engenharia Didática para a sala de aula,
diz respeito à possibilidade de prover a fundamentação teórica
para que o professor conheça o significado e amplie seu leque de
possibilidades de ações, sempre buscando o elo entre a teoria e a
prática de sala de aula.

As Bases Atuais Compartilhadas


Pela PesQuisa em Didática da
Matemática
A Didática da Matemática é uma das tendências teóricas da Educação
Matemática. No Brasil, esta tendência teve forte influência dos autores franceses,
com teorias que têm sido utilizadas como bases atuais em diversos trabalhos de
pesquisadores matemáticos brasileiros em Didática da Matemática.

101
Didática da Matemática

Entre os autores franceses, podemos destacar:

• A Teoria da “Transposição Didática” de Chevallard;


• A Teoria dos “Obstáculos epistemológicos” de Bachellard;
• A Teoria dos “Campos Conceituais” de Vergnaud;
• A Teoria das “Situações Didáticas” e a Teoria do “Contrato Didático” de
Brousseau;
• A Teoria da “Engenharia Didática” de Artigue.

1. Quais os autores e teorias consideradas como bases atuais


para a pesquisa em Didática da Matemática?
• A Teoria da “Transposição Didática” de Chevallard;
• A Teoria dos “Obstáculos epistemológicos” de Bachellard;
• A Teoria dos “Campos Conceituais” de Vergnaud;
• A Teoria das “Situações Didáticas” e a Teoria do “Contrato
Didático” de Brousseau;
• A Teoria da “Engenharia Didática” de Artigue.

2. Como você descreve as teorias consideradas como bases


atuais para a pesquisa em Didática da Matemática?
Descrever as teorias abaixo, conforme compreensão individual
• A Teoria da “Transposição Didática” de Chevallard;
• A Teoria dos “Obstáculos epistemológicos” de Bachellard;
• A Teoria dos “Campos Conceituais” de Vergnaud;
• A Teoria das “Situações Didáticas” e a Teoria do “Contrato
Didático” de Brousseau;
• A Teoria da “Engenharia Didática” de Artigue.

Após o conhecimento das teorias que têm sido utilizadas como bases atuais
na pesquisa em Didática da Matemática, podemos analisá-la, segundo três
dimensões: os valores, os conceitos e as questões metodológicas.

Primeira dimensão – OS VALORES

Quando pensamos no ensino da matemática, entendemos os valores


educacionais da matemática como argumentos básicos para justificar a
importância dessa disciplina no currículo escolar. Questiona-se o seu significado
real e sua função no currículo escolar, que deste modo, passam a ser pesquisados
e analisados de forma mais pontual, contextualizada e consciente.
102
Capítulo 4 QUESTÕES METODOLÓGICAS E A ENGENHARIA DIDÁTICA

A Didática da Matemática defende uma estreita relação entre a prática


pedagógica e o território acadêmico. Desenvolve-se como uma forma particular
de descrever e compreender os fenômenos da prática educativa.

Segundo Régine Douady (apud PAIS, 2002, p. 10-11),

A Didática da Matemática estuda os processos de transmissão


e de aquisição dos diferentes conteúdos desta ciência,
particularmente numa situação escolar ou universitária. Ela
se propõe a descrever e explicar os fenômenos relativos
às relações entre seu ensino e sua aprendizagem. Ela não
se reduz a pesquisar uma boa maneira de ensinar uma
determinada noção particular.

Deste conceito podemos apreender que a Didática da Matemática “não


visa simplesmente recomendar modelos ou receitas de solução a determinados
problemas de aprendizagem” (PAIS, 2002, p. 11).

Em Pais (2002, p. 11), obtemos uma definição da Didática da Matemática


relativa ao contexto brasileiro, junto a uma tendência da grande área da Educação
Matemática, que tem por objeto de estudo:

[...] a elaboração de conceitos e teorias que sejam compatíveis


com a especificidade educacional do saber escolar matemático,
procurando manter fortes vínculos com a formação de
conceitos matemáticos, tanto em nível experimental da prática
pedagógica, como no território teórico da pesquisa acadêmica.

Todos os conceitos didáticos visam “favorecer a compreensão das múltiplas


conexões entre a teoria e a prática” (PAIS, 2002, p. 11), propiciando “compreender
as condições de produção, registro e comunicação do conteúdo escolar da
matemática e suas conseqüências didáticas” (PAIS, 2002, p. 11). Deste modo,
entende-se a dimensão teórica como o ideário resultante da pesquisa e a prática
como a condução do fazer pedagógico.

É fato que existe uma especificidade educacional no saber matemático, que


se constitui num campo de pesquisa e, paralelamente, temos uma complexa
relação estabelecida entre professor, aluno e saber. Assim, para pensar na
dimensão dos valores da Didática da Matemática, faz-se necessário, o cuidado
constante na estreita relação entre o saber acadêmico e o saber a ser ensinado –
o saber da escola.

Mas como pensar nesta relação, sem priorizar conceitos didáticos que
venham com a finalidade maior de fornecer uma fundamentação para a Educação
Matemática?

103
Didática da Matemática

Segunda dimensão – OS CONCEITOS

Conceitos como transposição didática, obstáculos didáticos, campos


conceituais, situações didáticas, efeitos didáticos e contrato didático, tanto em
nível acadêmico como nas aplicações práticas no cotidiano escolar, constituem o
corpo da Didática da Matemática.

A transposição didática se revela uma ideia centralizadora da educação


matemática ao estar associada a vários outros conceitos. Lembramos que
a transposição nos leva a uma ideia de deslocamento e alteração, assim a
transposição didática permite, por exemplo, interpretar as diferenças que ocorrem
entre a origem de um conceito da matemática, como ele encontra-se proposto
nos livros didáticos, e a intenção de ensino do professor e os resultados obtidos
em sala de aula. E, nesse movimento, acontece uma transposição. Assim, a
transposição didática permite uma visão panorâmica das transformações por
que passa o saber matemático. Parte de sua criação acadêmica, passando
entre outros, pelas ideias de autores de livros, por responsáveis pela política
educacional, pelas interpretações do professor, chegando à sala de aula, no
processo de construção do conhecimento por parte do aluno.

Os obstáculos didáticos foram descritos por Bachelard. Ele explica que na


evolução histórica dos conceitos há toda uma área de estudos e de ideias que
se manifestam para formar conceitos e que esse grupo de ideias passa pela
fina peneira do saber científico antes mesmo de escrever a primeira palavra
sobre um conceito, um teorema ou uma demonstração. Todo esse estudo,
discussões, análises de ideias são os obstáculos epistemológicos que se opõem
à desconstrução de conceitos de determinada ciência. Todo esse processo fica
velado após os novos conceitos evolutivos a serem aceitos. Assim, os obstáculos
didáticos descritos por Bachelard referem-se a resistência oferecida por conceitos
considerados verdadeiros, em um determinado período, e que, na realidade,
dificultam a formação de um novo saber.

A Teoria dos Campos Conceituais nos ajuda a entender como os alunos


constroem os conceitos. De acordo com Vergnaud (1996), o conhecimento
emerge de resolução de problemas, a partir da ação do aluno sobre a situação.
Essa ação necessita de uma reflexão para que se direcione para a formação e
desenvolvimento. Para a formação de um conceito, faz-se necessário interagir
com ele numa variedade de situações, entendendo que o conhecimento é fruto
de uma maturação do indivíduo, de sua experiência e de sua prática. A teoria
dos campos conceituais permite a análise de competências e dificuldades dos
alunos, pois o processo cognitivo envolvido não tem nenhum vínculo com o uso
de aprendizagem mecânica ou memorizadora de repetição seja de modelos,
fórmulas ou qualquer outra maneira de automatizar uma aprendizagem. Assim, a

104
Capítulo 4 QUESTÕES METODOLÓGICAS E A ENGENHARIA DIDÁTICA

teoria dos campos conceituais está em sintonia com o problema do significado do


saber escolar visando a realização dos valores educacionais da matemática.

Na teoria das Situações Didáticas, o professor propõe problemas


para que os alunos possam interagir, discutir e construir os conceitos As situações
didáticas são
matemáticos de forma ativa e participativa. Sendo assim, o aluno,
ocorrências
participa do processo e tem condições de usar o conhecimento elaboradas
construído no âmbito escolar, fora deste, de forma natural e espontânea. intencionalmente
As situações didáticas são ocorrências elaboradas intencionalmente pelo professor para
pelo professor para defrontar os alunos com contextos que exijam dele defrontar os alunos
a busca de conhecimentos para a análise e resolução das situações. com contextos que
exijam dele a busca
Assim, por meio da noção de situações didáticas é possível descrever
de conhecimentos
atividades previstas para o ensino da matemática, cada qual voltada para a análise
para o desenvolvimento de uma competência ou habilidade associada e resolução das
a essa disciplina. O funcionamento das situações didáticas ocorre situações.
sob o controle de regras e de condições que constituem a noção de
contrato didático.

Os efeitos didáticos se caracterizam como certos momentos


Situações que
decisivos para o sucesso ou para a continuidade da aprendizagem.
podem acontecer
Brousseau (2003) descreveu alguns efeitos didáticos, que conforme em sala de aula e
Pais (2008, p. 89) são “[...] situações que podem acontecer em que se caracterizam
sala de aula e que se caracterizam como momentos cruciais para a como momentos
continuidade do processo ensino-aprendizagem”. Tais situações não cruciais para a
podem ser consideradas determinantes quanto ao resultado final da continuidade do
processo ensino-
ação educativa, mas sim, dizem respeito a momentos localizados,
aprendizagem”.
cuja superação depende tanto do aluno como do professor. São
consequências de vários aspectos: metodologia de ensino, obstáculos, formação
do professor, nível dos alunos, conceitos, entre outros. Para Brousseau (2003),
são cinco os efeitos didáticos: efeito Topázio, efeito Jourdain, efeito da Analogia,
deslize metacognitivo e efeito Dienes.

Proposta por Guy Brousseau (2006), no início da década de 1980, A função do contrato
a ideia de contrato didático pretende estabelecer um conjunto de fatores didático é equilibrar
referentes à relação didática entre professor e aluno, que procura definir questões implícitas e
as responsabilidades e os comportamentos que cada sujeito deve ter explícitas, buscando
perante o outro nas práticas que possibilitam a construção do saber. A criar um espaço de
diálogo e troca entre
função do contrato didático é equilibrar questões implícitas e explícitas,
professor e alunos,
buscando criar um espaço de diálogo e troca entre professor e alunos, tendo em vista que
tendo em vista que a comunicação tem sentido diferente para ambos a comunicação tem
os atores. Deve haver um espaço de significações em relação ao sentido diferente
saber onde, nada é comum ou preestabelecido. Na escola, o contrato para ambos os
didático é, pois, fundamental, pois dá responsabilidade ao aluno atores.

105
Didática da Matemática

também do sucesso das aulas e do melhor aproveitamento da matéria estudada.


Esse contrato chama o aluno para ser protagonista junto com o professor. No
contrato didático, o aluno também assume tarefas que deve desempenhar para
que a aprendizagem ocorra. Assim, como, o compromisso do professor de levar
aulas bem preparadas e desenvolvidas e possibilitar atividades que motivem a
aprendizagem.

Terceira dimensão – AS QUESTÕES METODOLÓGICAS

A importância da questão metodológica está na fundamentação que ela


permite à sistematização dos procedimentos operacionais de pesquisa. O método
nos orienta para novos conhecimentos e viabiliza a validação deste. Nesse
contexto, a Engenharia Didática é uma forma de organizar a pesquisa em didática
da matemática, a partir da criação de uma sequência de aulas planejadas com a
finalidade de obter informações para desvelar o fenômeno investigado.

Considerando o contexto da formação de professores, objetivamos a


formação de professores reflexivos, através da junção da ação com a investigação.
Podemos, então, observar que a teoria da Engenharia Didática se insere neste
momento, pois exige e organiza a reflexão em diferentes níveis, onde destacamos:

• Reflexões sobre os conteúdos a serem ensinados;


• Reflexões da esfera didática, quando o assunto gira em torno do modo como
o conteúdo em pauta é tradicionalmente ensinado e sobre possibilidades e
limites para implementação de mudanças;
• Reflexões sobre questões de âmbito cognitivo, com observação, registro e
análise da produção em sala de aula, cruzando os dados com resultados de
teorias já estabelecidas.

Segundo Artigue (1996), a Engenharia Didática é um processo


Segundo
Artigue (1996), a empírico que objetiva conceber, realizar, observar e analisar as
Engenharia Didática situações didáticas. A autora pondera que a Engenharia Didática possui
é um processo dupla função, a qual pode ser compreendida como uma produção
empírico que para o ensino tanto como uma metodologia de pesquisa qualitativa.
objetiva conceber, Assim, a Engenharia Didática deve ser concebida sob dois enfoques:
realizar, observar
pode ser utilizada como metodologia qualitativa de pesquisa na área
e analisar as
situações didáticas. de Matemática, mas também é extremante útil para a elaboração de
situações didáticas que configurem um quadro de aprendizagem
significativa em sala de aula.

106
Capítulo 4 QUESTÕES METODOLÓGICAS E A ENGENHARIA DIDÁTICA

Algumas ConsideraÇões
Podemos observar que existe uma dialética entre o conhecimento escolar
e o acadêmico, mas, apresentam tensões que precisam ser debatidas junto a
formação inicial e formação continuada de professores. Há de se atentar para
a especificidade do conhecimento matemático escolar e do conhecimento
matemático científico que o professor necessita para lidar com a sala de aula.

Qual a capacidade que devemos desenvolver para relacionar conteúdos


matemáticos com problemas da prática cotidiana, envolvendo, inclusive, os
vinculados as questões sociais?

Possuir competência matemática significa entre outras coisas, conhecer,


compreender, fazer, usar e possuir uma opinião bem fundamentada sobre
a Matemática em uma variedade de situações e contextos, onde ela tem ou
pode vir a ter um papel. E, como usar esta competência no processo ensino-
aprendizagem? A didática da matemática nos dá possibilidades de caminhos.

Podemos observar em pesquisas realizadas, nos PCN, nos livros didáticos,


nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o ensino de Matemática, entre outros,
a influência francesa na Educação Matemática no Brasil. No entanto, embora
já possamos perceber aplicações da Didática da Matemática nas escolas,
temos muito ainda a estudar e compartilhar quando tratamos do conhecimento
acadêmico e do conhecimento a ser desenvolvido junto aos alunos.

A Didática da Matemática é uma das linhas de pesquisa da Educação


Matemática e para tanto, precisamos relacionar esta tendência às demais, ou
seja, a etnomatemática, a modelagem matemática, a história da matemática,
entre outras. Tal estudo e relação nos possibilitará cada vez mais entender o
complexo processo com o qual nos deparamos diariamente – o processo ensino-
aprendizagem.

Reforce os conceitos trabalhados neste material, assistindo ao


vídeo “Didática da Matemática”. Disponível em: <https://youtu.be/
FpdcqZr9L4c>. Acesso em: 30 mai. 2016.

107
Didática da Matemática

Referências
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matemática. V Seminário internacional de pesquisa em educação matemática.
Petrópolis, RJ. Anais... Petrópolis: 2012. Disponível em: <http://www.sbem.com.
br/files/v_sipem/PDFs/GT04/CC16516613591_A.pdf>0. Acesso em: 14 nov.
2016.

ARTIGUE, M. Engenharia Didática. In: BRUN, J. (Org.). Didática das


matemáticas. Tradução
de M. J. Figueiredo. Lisboa: Instituto Piaget, 1996. p. 193-217.

BROUSSEAU, G. A Teoria das Situações Didáticas e a Formação do


Professor. Palestra. São Paulo: PUC, 2006.

______. Fundamentos e Métodos da Didáctica da Matemática. In: BRUN, J.


Didática das Matemáticas. Tradução de: Maria José Figueiredo. Lisboa: Instituto
Piaget, 1996a. Cap. 1. p. 35-113.

______. Os diferentes papéis do professor. In: PARRA, C.; SAIZ, I. (org).


Didática da Matemática: Reflexões Psicológicas. Porto Alegre: Artes Médicas,
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MACHADO, S. D. A. Engenharia Didática. In: MACHADO, S. D. A. (org.).


Educação Matemática: Uma introdução. 2. ed. São Paulo: Educ, 2002. p. 197-
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PAIS, L. C. Didática da matemática: uma análise da influência francesa. 2. ed. 2.


reimp. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. 128p. (Coleção Tendências em Educação
Matemática, 3).

______. Transposição Didática. In: ALCÂNTARA, S. D. (Org). Educação


Matemática: uma introdução. p. 13-42. São Paulo: EDUC, 1999.

______. Introdução. In: MACHADO, Silvia Dias A. Educação Matemática: uma


introdução. 2. ed. São Paulo: EDUC, 2002.

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