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O DIÁRIO DE UM BODYBUILDER RUMO À COMPETIÇÃO

CAMPEÕES
NUNCA DESISTEM

PAULO JORGE
TODOS OS DIREITOS RESERVADOS

CAMPEÕES
NUNCA DESISTEM

@PJBODYBUI LDER
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PROJETO GRÁFICO E CAPA


Rafão Araujo

insta: rafao.araujomkt

(73) 9 9804 6993

rafaoaraujomkt@gmail.com
EU
SOU
PJ
Meu nome é Paulo Jorge, sou
atleta de fisiculturismo, tenho
28 anos e não conto com a
companhia do meu pai desde
os 23.

Venho competindo há alguns


anos e inclusive sou profissional
da área de educação física,
atuando como como treinador
pessoal para diversos alunos.

Esse livro tem como objetivo


mostrar a vocês o que a força
mental pode fazer com uma
pessoa.

Não quero que você em


momento nenhum tenha dó ou
pena de mim nesse livro, afinal,
a morte é a consequência
natural da vida e essa é a única
certeza que teremos em vida.

05
Felizmente eu pude enterrar
meu pai, e não o contrário, o
fluxo da vida seguiu
normalmente e eu quero
mostrar a vocês como é possível
superar todas as adversidades
com força mental e perspectiva
de vida.

Tudo na sua vida depende de


como você encara o mundo e
as coisas ao seu redor.

Espero que a experiência que


eu passei nesse livro contribua
de forma positiva para sua
formação como indivíduo.

Um abraço e um aperto de mão


quebra-ossos.

Como dira meu velho:

"Pax e Lux"

06
A cara é de badboy, mas o
coração é de criança!
CAP
01
JULHO
2014
Acordo com a minha mãe
batendo na porta do meu
quarto.

Estranhei, afinal minha mãe


nunca me acordava.

Levantei, atendi a porta, e ela


disse que meu pai estava no
telefone e queria falar comigo.
 
Eu estranhei muito, afinal tinha
mais de 4 meses que meu pai
simplesmente tinha SUMIDO.

Eu não conseguia falar com ele


pela internet, as mensagens
não chegavam, ele simples-
mente estava incomunicável e
eu não entendia a razão disso
acontecer.
 

09
Porém, quando se trata dos
Paulo Jorge, eu já sei que eles
são extremamente complicados
no quesito relacionamento,
então achei normal e não quis
ficar importunando meu pai
pois achei que ele estava
simplesmente tendo o seu
tempo e precisando pôr as
coisas no lugar.

Mesmo após a separação dos


meus pais, eu tinha um bom
convívio com meu velho. Ele me
ligava e a gente conversava
muito.

Eu tinha ido a São Paulo em


2013 competir no campeonato
Brasileiro pela Nabba na
categoria Junior onde fiquei em
quarto colocado, e ele estava
lá comigo.

10
Me aplaudiu de pé! Na fila da
frente, tirando foto, gritando,
exaltando seu filho que estava
naquele palco e mesmo não
sendo o melhor, nem de longe
naquele dia, eu era o campeão
dele e sentia seu orgulho por
mim, afinal, ele foi o meu maior
incentivador no esporte desde
que eu comecei.

Porém, ele tinha sumido e eu


não tinha entendido o porque e
fiquei feliz com aquela ligação.

- Fala Pai. Porra, há quanto


tempo? Pensei que não iria
mais ligar. Lembrou que tem
filho né?

- Oi meu filho, como você está?


Tudo bem? O pai não quis te
incomodar esses dias mas,
quero conversar com você.
Você pode falar?

- Sim, posso, vou treinar só mais

11
tarde. Diga, o que ta rolando?
- Bom meu filho, eu não quero
te preocupar, tá bom? Tudo
aconteceu de uma maneira
muito rápida, e eu
simplesmente não quis te
contar pois sabia que você
estava se preparando pra sua
competição, e eu não queria
que nada atrapalhasse sua
trajetória até lá.

Primeiro quero te ressaltar que


estou bem, estou vivendo
tranquilamente aqui com minha
mulher, ela está cuidando muito
bem de mim.

- Porra pai, para de enrolar, o


que aconteceu? Eu te conheço,
o que que foi?

- Nesses últimos meses eu


comecei a me sentir meio ruim.
Você sabe que eu como muito
bem mas, meu peso começou a
cair e meu apetite também
diminuiu muito.

12
Eu achei que não era nada,
nem liguei, mas após alguns
meses assim, eu fui ao banheiro,
e minhas fezes saíram pretas.
Eu realmente não entendi,
fiquei preocupado e fui ao
médico.

- Hmm, beleza, mas isso não é


nada demais, né? Deve ter sido
algum tipo de infecção
alimentar ou algo assim.

- Então, o problema é esse, eu


fui ao médico, e ele logo pediu
alguns exames mais sérios, e
filho... O papai tá com câncer...

O telefone então ficou mudo


por alguns segundos.

Eu não conseguia ter nenhum


tipo de reação.

Não sabia se meu pai tava


brincando ou se aquilo era
verdade, pois pô, ele realmente

13
era muito brincalhão.
- Hahahaha, pára né pai, você?
Tu treina há anos, come bem,
come de tudo, corre, anda de
bike, não é possível que você
esteja com isso, tá zoando né?

Com uma voz baixa e séria,


naquele tom rouco que ele
tinha, soltou um sonoro:

- Não meu filho, infelizmente


não é brincadeira. Papai tá
com câncer.

Ele começou no intestino mas


se espalhou pelo fígado. Eu
estou em tratamento no ICESP
(Instituto do Câncer do Estado
de São Paulo) e eles são
ótimos! Eu realmente tô bem, e
não é uma bobeirinha dessa
que vai me levar!

Você sabe que teu pai é


aroeira pau de certa! Nada
derruba o véi!
 

14
- Mas, como assim pai? Você
fez todos os exames?
Realmente é 100% de certeza
isso?

- Sim meu filho, com certeza. O


médico fez todos os exames e
os marcadores tumorais estão
muito alterados. Infelizmente é
verdade e agora o papai vai
travar a batalha mais difícil da
vida dele.

E assim se seguiu, meu pai me


deu essa notícia e disse que
não quis falar antes pois
simplesmente estava preo-
cupado com minha
competição.

Cara, aquilo doeu demais!


Muito. Como meu pai ousou
pensar que uma competição de
fisiculturismo seria mais
importante que a vida dele?
NUNCA!

15
Eu pararia qualquer
preparação pra ir vê-lo e estar
do lado dele no pior momento
da vida dele, afinal ele esteve
do meu lado nos piores
momentos!

16
Parceria absoluta. Meu
velho, te amo!
CAP
02
21
JULHO
2014
Esse foi o dia que eu cheguei
em São Paulo após ter a notícia
que meu pai estava com
câncer.
 
Logo após essa notícia eu
decidi ir vê-lo, e conhecer sua
casa e sua nova esposa. Eu
sempre tive a cabeça bem
aberta, então essa última parte
foi a mais tranquila de todas.
Ele tinha uma mulher muito
especial a seu lado.
 
Chego ao aeroporto e logo vejo
meu pai. Fiquei em choque.
Realmente vocês não tem ideia
(ou têm) do que o câncer e seu
tratamento pode fazer com
uma pessoa.
 
Meu pai sempre foi um cara
ativo fisicamente e era um
coroa forte pra sua idade, ele
tinha 61 anos e quase 85 kg.

19
Era encorpado e robusto,
extremamente animado pra
fazer o que fosse e tinha um
gosto extremo por esportes,
incentivando a mim e a meu
irmão desde pequenos. Eu,
campeão de fisiculturismo, e
meu irmão, faixa preta em BJJ
(Brazilian Jiu Jitsu).

Quando eu o vi a primeira vez,


ele devia ter seus 65 kg. Nunca
tinha visto meu pai naquele
peso.

Estava magro, visivelmente


debilitado e sofrendo.

Aquilo mexeu comigo de uma


maneira que eu nunca consegui
esquecer.

Meu olho encheu de água,


assim como quando eu recebi a
notícia do seu câncer.
 

20
Após a notícia, ao desligar o
telefone, eu chorei igual
criança dentro do meu quarto.
Porém, na frente do meu pai eu
nunca demonstrei nenhum tipo
de fraqueza, e fui forte e estive
ao seu lado até seu último
suspiro.

Ele nunca me viu derramar uma


lágrima durante sua luta contra
o câncer, pois temos o dever de
ser o porto seguro e o amparo
dos nossos em momentos de
sua fraqueza.

Logo após vê-lo naquele estado


no aeroporto, eu o abracei
muito forte, dei um beijo no seu
rosto e disse o quanto eu
estava com saudade.

O cheiro da sua pele, das suas


roupas, tudo ainda era muito
familiar para mim e naquele
instante eu fui transportado pra
minha infância, quando deitava

21
no colo do meu pai para
ganhar carinho.
Fui então pra sua casa, e
durante os dias que se
seguiram eu fiquei com ele e
fizemos tudo que ele tinha
vontade.

Ele se cansava muito rápido e


por isso não podia fazer muito
esforço físico, então ficávamos
mais em casa, conversando
muito, vendo tv, e ouvindo sua
mulher tocar piano. Ela era
musicista da Osusp (Orquesta
Sinfonica da USP) e tocava
muito bem.

Aqueles dias que seguiram


foram de descanso puro ao som
de Johann Sebastian Bach, o
músico preferido de sua mulher
e muita comida.

Me senti acolhido, e no frio de


São Paulo, me senti muito bem
novamente ao lado do homem
mais importante da minha vida.

22
Meu pai, meu maior
apoiador e fã!
CAP
03
O ANO
DE 2014
O ano se seguiu. Como já era
julho, parece que o ano voou
mais ainda e em nenhum
momento eu deixei de acreditar
no meu pai. SEMPRE acreditei
no meu velho, e realmente
achava que aquela iria ser só
mais uma história que ele
contaria para os seus netos
quando eles nascessem.
 
Ele sempre se gabava de como
era forte, e o velho era difícil
mesmo! Quando mais novo,
resistiu a 4 acidentes de carro
sendo 3 deles, com
capotamento e perda total dos
veículos.
 
Ele tinha mais de 70 cacos de
vidro no rosto que não
conseguiram retirar.
 
Tinha cicatrizes no rosto inteiro
por causa disso!
 

25
Ele não cansava de se gabar
como foi que sobreviveu a uma
Tuberculose Pleural.

Essa doença é extremamente


complicada, atinge diversas
funções, e debilita demais uma
pessoa, e mesmo assim, ele
resistiu a tudo isso e continuou
cada vez mais forte.

Mesmo após tantas compli-


cações ele enveredou pelo lado
do esporte, ciclismo,
musculação, e sempre me
incentivou a ir junto.
 
Talvez eu saiba de onde tenha
herdado tanta força de
vontade quando o assunto é
adversidade.
 
O ano foi passando, a gente se
falava quase que diariamente
pelo telefone.

26
Ele sempre me falava da vida,
de como era importante
trabalhar, ter minhas coisas e
sair da barra da saia da minha
mãe.

Sempre me motivando e ir em
frente e a conquistar meus
objetivos.

Implicava comigo algumas


vezes, mas normal, que pai não
iria se preocupar com seu filho,
não é verdade?

Hoje, como também sou pai, eu


entendo todas as preo-
cupações dele comigo, e da
minha mãe também.

27
E o ano de 2014 se encerrou
bem, com ele cada vez mais
animado e mostrado melhoria e
recuperação!

Eu encerrei aquele ano


acreditando que aquele seria o
melhor de todos. Acreditava
que em 2015 eu iria trazer o
título de campeão na IFBB
(categoria mais difícil na
época) para ele.

28
O cara mais casca grossa
que já conheci.
CAP
04
INÍCIO
DE 2015
O ano de 2015 tinha tudo pra
ser o melhor ano da minha vida.

Eu estava bem na parte


amorosa, tinha me formado, e
tinha começado a trabalhar na
minha área.

Dava algumas aulas de


personal, trabalhava de
consultoria, tinha muitos
projetos, e também tinha
começado a me preparar pra
Copa Goiana de Musculação,
afinal, tinha ficado em off o
ano de 2014 praticamente todo
(me preparação de janeiro a
março pro estreantes, e após
todos os acontecimentos eu
acabei por entrar em off e
melhorar mais meu físico).

Agora, queria ver como meu


corpo realmente estava após
um período de dieta mais
restrita, cardios e treinos mais
intensos.

31
 
Eu realmente estava muito
motivado!

Treinava extremamente pesado


em uma academia que eu
gostava DEMAIS e que tinha
todo o ambiente de
fisiculturismo (Gymnasium).
Treinava de graça pois o seu
dono tinha falado que se eu
competisse pela academia
poderia treinar sem custo, e isso
foi maravilhoso.

Eram seis refeições por dia,


fazia meu cardio, e meu ciclo
básico e eficaz de sempre.
Trazia bastante resultado
(Propianato e Trembo).

Assim, comecei a preparação 


em Março, pois o intuito
realmente era manter o máximo
de tempo essa rotina intensa e
constante. Foi praticamente o
ano todo de preparação pra
chegar em uma condição física

32
realmente diferente de todas
anteriores.
Eu NUNCA saltava uma
refeição.

Eu NUNCA faltava um treino.

Quando eu ficava triste e meio


deprê, eu lembrava do meu pai
e o quanto ele gostaria de estar
treinando aquele dia e
comendo normalmente (ele não
tinha apetite e a quimioterapia
tinha tirado seu palato), e
então eu levantava minha
bunda e ia fazer o que deveria
ser feito e FODA-SE todo o
resto.

Fazia apenas um cardio por


dia, treinava MUITO PESADO e
meu shape respondia muito
bem.
 
Cada dia eu estava feliz com o
resultado mais motivado em ser
campeão e buscar o
campeonato Overall para São
Paulo, para o meu pai, e

33
podermos comemorar juntos
aquela conquista.
O câncer no fígado é muito
complicado e quando acontece
a metástase, que é quando o
câncer se espalha, isso piora
muito as circunstâncias.

Com o meu pai, o câncer


começou no intestino e depois
para o fígado, dificultando
ainda mais a sua recuperação.
Mesmo assim, com todas as
dificuldades e contra todas as
probabilidades, ele respondia
bem ao tratamento.
 
Estava com mais apetite,
comendo na sua padaria
favorita (Dona Dêolla) e
mostrando que realmente iria
derrotar aquela doença maldita
e que tudo aquilo seria
simplesmente mais uma história
pra ele se gabar!

34
E era isso que eu desejava!
Desejava muito ter meu pai
contando suas histórias,
falando o quanto que ele era
um velho forte, o “vovô garoto”,
e que iria ser difícil levar ele
daqui, pois o amor dele pela
vida era EXTREMO, e então veio
o mês de setembro!

35
Amor absoluto e
inegociável!
CAP
05
SETEMBRO
DE 2015
Esse foi o pior mês da minha
vida desde que eu tenho
recordação.

O ano de 2015 foi simplesmente


magnífico até setembro. Eu já
me encontrava com 90 kg, o
peso que eu competia na
época.

Meu corpo estava muito seco,


muito! Fibras no glúteo,
peitoral, ombros, vascula-
rização extrema, rosto fino.
Restavam mais 28 dias pra
conseguir melhorar ainda mais
meu shape e me colocar em
condição de ser campeão
overall naquele ano.

Porém, nós temos que aprender


que na vida nada é fácil.

Na vida as coisas raramente


acontecem da maneira que nós
esperamos.

38
Nós somos surpreendidos
SEMPRE. E hoje, sexta-feira, 27
de março de 2020, em meio a
uma pandemia mundial, eu
posso afirmar isso
tranquilamente.

Mas sobrevive e vai em frente


sempre aquele que se adapta
melhor ao caos.

Nós somos fruto do caos, da


imperfeição, da dúvida, da
dificuldade, do improvável, e no
meio disso, o ser humano que
melhor se moldar, mais se
comportar de maneira
adequada perante uma
adversidade será aquele que
vai mais obter sucesso na vida.
 
Eu não lembro exatamente qual
data era, mas sei que foi num
domingo. Acordei com uma
mensagem no meu celular bem
cedo. Eu não entendi. Era a
mulher do meu velho me

39
ligando.
A semana que antecedeu esse
domingo foi bastante
complicada para o velho.

Ele tinha tido uma infecção


urinária e seu sistema
imunológico estava muito
debilitado por causa da
quimioterapia, por isso estava
com bastante dificuldade em
se recuperar.

Na sexta-feira eu tinha falado


com ele e as notícias eram
boas!

Ele disse que se sentia bem,  o


seu médico até disse que ele
iria poder ficar no quarto e que
no sábado já poderia ir pra
casa.

40
- Fala velho!! Como estão as
coisas?!

- Fala meu filho, tudo bem?


Papai tá bem. O médico passou
hoje, e me disse que as notícias
são boas.
Os resultados saíram e minha
infecção já baixou muito, ele
disse que vou ficar aqui essa
noite somente em observação e
amanhã provavelmente já vou
poder ir pra casa. E por aí, tudo
bem?

- Pô, que bom! Isso aí, tu é


forte, isso não era nada.

Que bom já vai poder ficar no


quarto essa noite. Por aqui tudo
bem, só estou com muita fome
e bastante cansado por causa
dos treinos e dos cardios mas tô
bem demais. Acho que esse
ano eu vou trazer o título overall
pra gente velho, e vou aí pra

41
São Paulo pra gente
comemorar.
- Vem sim meu filho. Vai trazer
seu troféu e vamos sair pra
comer muito! Quero te ver
campeão naquele palco lá
dando seu melhor mas sabe
que se não ganhar, você é o
campeão do pai né?

- Que nada, eu tô indo pra


ganhar velho, tu sabe que eu
sou competitivo demais né?
(risos). Se eu sair com o
segundo eu vou ficar triste!

- Rapaz, tem que saber perder.


O importante é você ir lá e dar
seu melhor, mas se não der
certo, pelo menos você vai ter
ganhado muito mais
experiência pros próximos.

Agora o pai tem que ir, vou


comer e dormir pra amanhã ir
pra casa.

Fica bem, tá meu filho? Papai


te ama muito.

42
- Você sabe como eu sou né
pai? (risos)
Quero ir pra ganhar e levar o
dourado pra você! Vou com
tudo e você vai sentir muito
orgulho!

- Também te amo muito pai,


fica bem e eu tô aqui pra tudo,
ta bom?

- Boa noite meu filho, nunca se


esqueça que sempre estarei
aqui por você!

E essas foram as últimas


palavras que eu troquei com o
meu pai...

43
Sim, eu não tive a chance de
falar com ele pessoalmente
uma última vez, não tive a
chance de exaltá-lo em todas
suas qualidades e falar tudo
que eu não falei em vida.

Não tive a oportunidade de


agradecer por tudo que ele fez
por mim e por toda força que
ele me deu nos momentos que
eu mais fraquejei.

Eu nunca tive essa


oportunidade.
 
No sábado, meu pai piorou.
Com um quadro agudo de
infecção ele precisou tomar
muitos medicamentos, o que
fez a sua função renal
praticamente parar, e as
funções do seu fígado piorar
muito.
 
Ele lutou bravamente contra um
câncer, e no final, a junção de

44
uma infeção urinária que
acabou levando ele daqui.
O seu corpo não aguentava
mais a medicação forte
prescrita, a infecção se
espalhou e ele acabou não
aguentando.

Os médicos tiveram que


colocar tubos nas suas vias
respiratórias para que ele não
sentisse mais dor, e o
colocaram em coma induzido.
 
Então eu olhei a mensagem:
“Venha para São Paulo, rápido,
seu pai não está bem”. Eu liguei
pra ela. E ela disse que meu pai
tinha piorado, e que talvez eu
não conseguisse mais falar com
ele.

Fiquei sem reação.

Como assim? Eu tinha falado


com meu pai na sexta-feira e,
hoje no domingo ele corre risco
de vida e eu talvez não consiga
mais falar com ele?

45
 
Rapidamente eu levantei,
atordoado por todos aqueles
pensamentos ruins e me
reequilibrei.

Falei com minha mãe, e logo


compramos a passagem pra
São Paulo e eu fui ver meu pai.

Lembro como se fosse hoje!

Uma noite mais escura que o


normal, eu chegando em São
Paulo. Naquele dia, a minha
cidade favorita não tinha o
mesmo brilho, não tinha a
mesma beleza que costuma ter
para mim.

Entrei em um táxi, e ele era


dirigido por uma mulher.

Quando eu lhe disse para onde


iria, ela me olhou e disse “Vai
ficar tudo bem”. Porém, não
ficou...

46
Cheguei ao hospital e encontrei
a minha madrasta. Nos
abraçamos e ela logo me
colocou a par da situação.
 
É, eu realmente não conseguiria
mais falar com ele.

O médico disse a ela que agora


era questão de tempo até meu
pai nos deixar. Já não havia
mais o que fazer a não ser dar
o máximo de conforto pra ele
nessa hora.
 
Eu fiquei sem chão. Eu não
sabia o que pensar. Lembro-me
de sentar no leito do hospital,
na área da UTI, onde ficavam
algumas poltronas, e colocar as
mãos na cabeça, passando no
rosto sem entender aquela
situação!

Porque diabos meu pai foi


embora de uma maneira tão
brusca?

47
Eu falei com ele sexta-feira,
PORRA!!

Por que isso tá acontecendo?


Me senti sozinho,
completamente sozinho.

Não conseguia racionar nem


pensar em nada. Não sentia
fome, não sentia vontade de
NADA, eu, como uma criança
indefesa clamava pelo meu pai!

Eu exigia ele ali comigo mais


uma vez, no entanto, isso era
impossível.

Eu não iria mais conseguir


conversar com meu pai.
 
Caminhei e entrei no leito em
que ele se encontrava. Vi meu
pai, cheio de tubos, magro,
fraco, deitado ali.

Aquele corpo não fazia jus a


alma forte e destemida que

48
meu pai tinha.
Aquela doença tinha tirado
tudo dele e eu não entendia o
porquê.

Vê-lo naquela situação, fez a


minha vida mudar pra sempre
depois daquele dia.

Como alguém tão forte, que


exalava vida e amava estar
vivo, que nunca cogitou sobre
morrer ou desistir, estava ali,
naquela situação?

É... A vida é foda!

Ela vem com os dois pés e da


uma porrada no meio do teu
peito que vai te fazer cair
desorientado no chão e se você
meu caro leitor não tiver
FORÇA pra levantar, tu vai ficar
ali par sempre.

49
As duas faces de 2015
CAP
06
DESESPERO
Após os acontecimentos, eu fui
para meu refúgio: Comecei a
comer! Minhas marmitas
acabaram e mesmo tendo
pegado outras no restaurante
da frente, aquela comida não
me confortou, então... Eu errei.

Eu desci, e fui pra confeitaria


do Hospital, e lá, eu comi. Comi
muito. Comi tudo que eu
consegui ver pela frente, e foi
assim durante todos os dias que
eu estive naquele hospital.

Eu sabia que se não comesse


iria ficar fraco, mas eu não
queria comida da dieta, eu
queria doces, pois nele me
confortava, mesmo sabendo
que era errado e que iria foder
com meu físico.
 
Todos os dias em que estive no
hospital, comi tudo que não
devia. Isso cobrou seu preço.

52
Cheguei na segunda e comecei
a comer na terça... E assim se
seguiu pelos outros dias.

Na sexta-feira, foi o pior dia da


minha vida.

Lembro claramente de ir comer


às 18h30. Desci, comi, e quando
voltei, encontrei minha
madrasta no centro da
recepção da UTI, conversando
com um médico.

Ela me olha de longe abre os


braços e começa a chorar.
Naquele momento eu não
aguentei, me entreguei a dor e
ao desespero diante da morte
do meu pai.

Abracei ela e a pessoa que


estava comigo na época, e
chorei igual uma criança.
Chorei muito, muito mesmo,
coloquei pra fora tudo que
ficou preso durante todo esse

53
tempo da luta do meu pai.
Sentia cada gota que descia
pelo meu rosto e que caia na
minha roupa.

Sentia meu coração sendo


esmagado com uma força
devastadora.

Sentia todos os músculos do


meu corpo contraindo em uma
velocidade extrema.

Sentia minha boca seca, minha


cabeça confusa e uma
pergunta que nunca foi
respondida: “Por que eu não
pude me despedir do meu
pai?”.

Essa é uma dor que nunca


passou.

Eu tenho esse momento


guardado na minha cabeça e
quando alguma coisa fica difícil
na minha vida, me lembro dele,
e aí eu sei que tudo é reversível,

54
menos a MORTE.
E tudo foi passando, o
desespero foi cessando. mas
me tranquei novamente dentro
das minhas dúvidas e
inseguranças.

Não me coloquei mais pra fora


desde então, criei uma
armadura que seria penetrável
somente por aqueles que eu
deixasse ver quem eu era de
verdade.
 
Fiz o reconhecimento do corpo
do meu pai. Vi ele pálido,
gelado, seu corpo sem vida em
cima de uma maca prateada.
Vestido com suas roupas
preferidas.

Não chorei. Duro.

Não seria mais o cara que


chora, pois eu precisava ser
forte pra enfrentar tudo que
ainda viria pela frente.
 

55
Meu velho não queria velório.
Ele sabia que no dia da sua
morte todos estariam  tristes, e
ele mesmo em vida, disse que
não queria isso, que se não
fizessem festa, era pra não
fazer velório porque aquilo era
deprimente demais, e assim foi
feito.

Todos os pedidos dele foram


respeitados.

Foi enterrado, e no momento


antes de seu caixão ter a terra
jogada em cima, eu escolhi a
camiseta, que dentre todas, ele
mais gostava, a camiseta da
Gold’s Gym, e cobri seu caixão
com ela, para que ele nunca
esqueça que a vontade de
crescer e o amor pelo esporte,
que ele sempre pregou, nunca
foram deixados de lado, e que
ele levaria isso pela eternidade
da morte.

56
...
CAP
07
RETORNO
À VIDA
Após uma perda dessas, nós
temos a sensação de que a
vida para.

Porém meus amigos, ela não


para.

A vida continua.

Ninguém vai esperar o seu luto


passar. A vida não espera
ninguém.

As pessoas estarão
trabalhando, treinando e
vivendo normalmente enquanto
você vive o seu luto.
 
É o que eu sempre digo meu
caro: Na vida, nós sempre
iremos ter duas escolhas nos
momentos extremamente ruins:

1 – Ficar parado e se acomodar


com a situação, lamentando,
chorando e vivendo a tristeza
momentânea, ou...

59
 
2 – Levantar, encarar de frente
todos os problemas, sabendo
que a vida não é fácil e que
ninguém vai torná-la menos
complicada para você viver, e
que somente enfrentando todos
seus medos e choros de frente
será possível evoluir e continuar
sendo uma pessoa melhor e
superior a cada novo dia.

E foi por isso, que eu decidi


competir.

Eu cheguei em Anápolis com


exatos 101 kg. Eu comia tudo
que eu via pela frente. Meu
shape de competição tinha ido
embora na mesma velocidade
do meu cardio de 20 minutos.

Então, eu conversei com meu


treinador na época, Vitor, e ele
aceitou o desafio. Eu me
sujeitaria a ficar em condição
de competição em apenas 18
dias.

60
Eu não iria ficar em casa
chorando, amoado na minha
cama, perguntando “Por que
Eu?”, “Por que meu pai me
deixou tao cedo?”

Não!

Eu me recusava a ser a vítima.

A vítima foi meu pai, vítima de


uma doença maldita, e eu seria
sua redenção!

Por isso decidi que iria me


preparar e que iria ser
campeão por ele, porra!

Era isso que ele queria, me ver


nos palcos e não na cama
chorando por sua morte.

Afinal, ele morreu, e nada nem


ninguém, iria mudar isso.

61
Uma vida de lutas para
chegar até aqui!
CAP
08
REDENÇÃO
Os dias que se passaram foram
praticamente infernais:

2 cardios por dia;


4 refeições de 200g de tilápia
+ salada;
18 dias sem qualquer fonte de
carboidrato;
60min de cardio em jejum;
60min de cardio pós treino;
Treino de manhã ;
Treino a noite;
100mg de prop por dia;
100mg de trembo por dia;
100mg de mast por dia;

Minha visa se resumiu a isso!


 
Sessões de drenagem linfática,
para tirar grande parte da
retenção que eu havia
adquirido comendo igual uma
besta mórbida durante esse
período.

Cardios tarde da noite, sozinho


no parque, pois a academia

64
fechava as 23h.
 
Os dias pareciam se arrastar.
Varias vezes eu acordei, e
fiquei sentado na cama,
simplesmente porque eu não
tinha mais força pra levantar
dali.

Então respirava fundo, tomava


fôlego e levantava.

Eu estava realmente cansado,


mas quer saber?

FODA-SE.

Era só cansaço!

Se fosse o meu pai, ele iria


levantar sem pensar 2x e fazer
o que tinha que ser feito, afinal,
é assim que a vida funciona.

Nós devemos fazer aquilo que


devemos fazer e ponto.

Não devemos usar desculpas de


“estou desmotivado", "hoje não”

65
ou “eu não quero”.
Quem fala “eu não quero” é
criança, e você é a porra de
uma adulto.

FAÇA O QUE TEM QUE SER


FEITO independente das
circunstâncias!

Domine os seus sentimentos e


use a raiva interna para te
inspirar a usar toda sua força e
agressividade dentro da
academia ou em qualquer área
que você esteja.

Os seus sentimentos e vontades


não devem te dominar, e sim o
contrário.

Domine suas vontades e você


vai começar a fazer o que deve
fazer.

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Faça não somente aquilo que
você quer, só assim você sairá
da sua zona de conforto.

Por fim, verá que a vida não é


essa cama macia e confortável
que todo mundo pinta, é uma
zona de guerra aonde, se não
abrir o olho e despertar, tu vai
perder tudo e ficar na míngua!

Faça o que tem de ser feito, e


siga em frente sem olhar para
trás!

67
Por você, eu enfrento
qualquer coisa na vida!
CAP
09
PESAGEM
Acordo, cansado, pra variar.
Sem muitas forças. É o dia da
pesagem. 27 de setembro.

Pego meu carro, vou pra


Goiânia na torcida para ter
conseguido bater o peso ideal.
Eu estava 11 kg a cima do peso
da competição quando
retornei.
 
Cheguei no hotel que a IFBB
estava realizando a pesagem e
fui... Com o cu na mão, mas fui!
 
Lembro muito bem daquele
instante entre estar no chão,
com dúvida se o peso foi
batido, e o subir na balança e
ver 89,6 kg.
 
Eu tinha conseguido.
 
Eu tinha vencido.
 
Eu tinha conseguido descer o
peso, e me colocar em

70
condição de competição.
 
E mesmo não estando com a
qualidade que eu eu estava
antes de tudo isso, eu estava
bem, e poderia dar trabalho
aos meus concorrentes.

Lembre-me exatamente de
pensar o seguinte: “Eu perdi 12
kg, enfrentei a morte do meu
pai, NADA mais até aqui irá me
colocar medo”.

E assim foi feito.

71
CAP
10
O GRANDE
DIA
O dia do campeonato foi
mágico.

Eu estava ali curtindo tudo!

O cheiro de protan no ar...

O cheiro de comida...

O cheiro de desafio...

O cheiro de competição...
 
Nada pode tirar de mim a
sensação que eu tive ao estar
competindo aquele dia.
 
Foi mágico.

73
Conversei com muitos colegas
que só encontramos nos
campeonatos. Recebi suas
condolências e seus parabéns
por estar ali, após todos os
traumas, firme e pronto pra
guerra.

Recebi olhares de respeito de


todos. A conquista que eu
obtive por isso me
acompanham até hoje.

Muitas pessoas vieram até mim,


me dar parabéns simplesmente
por estar ali, lutando até o fim.
 
Após tudo isso, a primeira
categoria foi chamada, e eu fui
para o palco.

Naquele dia eu competiria em 2


categorias, até 100 kg e Junior.

74
Fomos para a Junior, e fiquei
em um amargo quarto lugar.

Porém, eu não me entristeci. Me


mantive erguido, de peito
aberto, pois sabia que ainda
tinha uma categoria (difícil,
com 2 atletas com mais de
100kg) e que iria ser
complicadíssima.

Me mantive forte afinal, o que


poderia me derrubar se há 20
dias atrás eu enterrei meu pai e
hoje estava ali?

Nada poderia me derrubar e eu


iria me erguer perante qualquer
dificuldade.

Após esse quarto lugar, fui ao


palco, e fiz esse um breve
discurso, cedido pelo
presidente da IFBB naquele
ano.

Este momento é lembrado até

75
hoje por colegas e amigos.
Algumas pessoas se
emocionaram, e fui aplaudido.
Retornei ao backstage e me
preparei para minha próxima
batalha, a categoria até 100 kg.
 
Era a última categoria da noite,
e estava preparado.

Nossos nomes eram chamados


e um a um fomos para o palco
para assumir as posições.

Por algum motivo, eu me sentia


extremamente confiante, e
nada iria me abalar.

Os árbitros pediram as poses


compulsórias, as fiz com primor,
ficando no centro do palco
durante todo o tempo.

Logo após isso vem a


apresentação individual, e
então a premiação.

76
Do meio do inferno, eu
ressurgi!
Um a um foram eliminados
cada um dos atletas, e eu ali,
parado, sobrevivendo.

Enfim fiquei sozinho no palco,


meu ultimo competidor fora
eliminado e eu fui sagrando
CAMPEÃO ATÉ 100 KG
naquela noite.
 
Eu desabei.

Caí de joelhos no chão, com as


mãos no rosto, sem acreditar
que tinha conseguido o troféu
dourado após tanta luta.

Mas ele veio. Veio junto de


muito sangue, luta, suor, choro
e lágrima.
 
Eu venho dizendo até hoje que
nenhum campeonato que eu
ganhe vai ter o mesmo valor
que aquele título de Campeão
até 100kg da Copa Goiana de
musculação de 2015.

78
 
Ele estava ali comigo, eu
pude sentir!
Eu consegui, fui campeão pelo
meu velho, e fiz a felicidade
dele. Tenho certeza que, onde
ele estiver, ele viu e ficou muito
feliz com isso.

Fui contra tudo e contra todas


as impossibilidades e
dificuldades.

Não deixei me abater, não


fraquejei e não errei.

Simplesmente fui em frente.


 
Tive desencorajadores, e foram
MUITOS. Muitos amigos que
falaram pra eu não subir, pra
descansar, pra ficar em casa,
que eu não estava bem...

Porém, eu não dei ouvidos.

80
Eu ouvi somente a minha
vontade e somente a voz que
ecoava na minha cabeça: meu
pai falando que não queria
ninguém triste após sua morte.

E que tipo de homem eu seria,


se contradissesse a pessoa que
mais acreditou em mim, e
recuasse perante essa
problema ficando em casa,
triste, chateado e deprimido?

Eu seria somente MAIS UM,


mais um na massa de manobra
que se abate por qualquer
coisa em qualquer situação,
porém, eu não fui essa pessoa.

Fui diferente, dei a volta por


cima, lutei, atingi meu objetivo
e fiz meu velho mais feliz, onde
ele estiver.

81
E por isso, quero deixar essa
pergunta pra você:
 
O que você fez até hoje na
sua vida te orgulha ou te
envergonha?
 
NUNCA abaixe a cabeça em
nenhuma adversidade meu
querido, afinal, a única certeza
que temos é a morte, o resto, a
gente resolve na base da
porrada.
 
E esteja disposto a trocar
porrada, a ter perseverança,
garra, vontade, afinco,
dedicação e fibra moral pra
alcançar aquilo que você quer
alcançar.
 
Um Abraço
 
PJ

82
Faça seu caminho!
Forje sua história!
PROJETO GRÁFICO E CAPA
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