O documento discute como se sentir em casa em um novo lugar requer tempo para se readaptar e se reajustar. Mudar envolve se despedir de hábitos antigos e permitir que novos se formem, além de reaprender a ser em um novo mundo. Uma casa é um lugar de estabilidade e rotina, onde as pessoas se recuperam e cuidam de si mesmas e de seus entes queridos.
O documento discute como se sentir em casa em um novo lugar requer tempo para se readaptar e se reajustar. Mudar envolve se despedir de hábitos antigos e permitir que novos se formem, além de reaprender a ser em um novo mundo. Uma casa é um lugar de estabilidade e rotina, onde as pessoas se recuperam e cuidam de si mesmas e de seus entes queridos.
O documento discute como se sentir em casa em um novo lugar requer tempo para se readaptar e se reajustar. Mudar envolve se despedir de hábitos antigos e permitir que novos se formem, além de reaprender a ser em um novo mundo. Uma casa é um lugar de estabilidade e rotina, onde as pessoas se recuperam e cuidam de si mesmas e de seus entes queridos.
Acabo de me mudar, mas ainda não me sinto em casa. Mudar não é simplesmente entrar num novo espaço, é habitá-lo. E habitar requer muitas coisas, como despedir-se de hábitos familiares e permitir que novos se formem; estranhar o próprio corpo e seus movimentos; reprogramar a memória e se acostumar ao esquecimento de lugares e trajetos; redefinir distâncias e proximidades; refazer relações com a luz, o ar, os cheiros. Enfim, reaprender a ser, reconstituindo o mundo da morada e da identidade. Certamente levará tempo para eu me sentir à vontade, o mesmo que para me reajustar a mim mesma. Enquanto a casa e eu não entrarmos em sintonia e viver nela não for uma dança descontraída e espontânea... Enquanto não nos pertencermos mutuamente, a ponto de eu poder dizer que ela é minha, que tem a minha cara ou que minha casa sou eu... Enquanto não me sentir tão enraizada nela, que já nem lembre mais como era viver em outro lugar e ela, então, tome os ares da casa de origem..., continuarei a sentir-me estranha, suspensa no todo da minha vida, sem lugar, sendo pela metade. Entendo agora, melhor do que nunca, o que a filosofia existencial quer dizer quando afirma que o homem é um "ser-no-mundo" ou que "eu sou eu e minhas circunstâncias". Sem mundo, não somos ninguém, porque não chegamos a moldar nosso corpo, nossos gestos, nossas preferências e referências. Uma casa é, felizmente, o lugar de lugares conhecidos, da estabilidade, da rotina, da repetição, da mesmice. Um lugar onde voltamos para nós mesmos, depois da dispersão e da diversidade do dia. Um lugar onde nos recolhemos para descansar e sonhar; para cuidar de nós mesmos e conviver com aqueles que mais amamos e escolhemos para parceiros. O que os antigos gregos sabiam, e nós já nem levamos em consideração, é que a casa de um homem não é apenas algo de que ele tem a chave e a posse, mas o elemento que marca qual o lugar que ele ocupa na cidade (no bairro, no condomínio). A moradia de um homem referenda seu pertencimento à cidade e sua cidadania e, portanto, os direitos e os deveres que ali lhe competem. A casa é, também, o lugar da vida privada, onde um indivíduo pode expressar-se de modo diferente e talvez mais natural do que aquele que desempenha na vida pública, nos espaços onde se expõe e aparece para os outros em sua singularidade (para os gregos era a "ágora", a esfera da vida pública, mas, para a maioria de nós, o reduzido mundo do trabalho). A casa abriga da exposição pública. No interior da casa, uma criança (também um adulto) se experimenta, protegida, para o enfrentamento do mundo. Ensaia com os outros, ou diante do espelho, a fala, o perfil, os modos e as maneiras. Escolhe-se e se esconde. Fica a sós ou sente-se sozinha. Uma casa é o retrato do seu morador. O tratamento que uma pessoa dá à sua casa coincide com seu modo de levar a vida. Embora nossa casa nos abrigue do mundo, ela é, ao mesmo tempo, o nosso mundo mais próximo. E também são nosso mundo o bairro onde vivemos, a cidade, o país, nosso planeta. Eles são nossas moradas, os lugares que, direta e indiretamente, atenta ou desatentamente, aprontamos para existir. Quando esgotamos a terra e interrompemos sua fertilidade, preparamos nossa fome. Preparar a morada coincide com a preparação da nossa própria vida. Morar coincide com existir. Uma tarefa cujo fim termina com nossa morte. Dizer que acabei de "me" mudar é impreciso. Não estou nem no meio do caminho!...
DULCE CRITELLI, professora de filosofia da PUC-SP, é autora dos livros "Educação e
Dominação Cultural" e "Analítica do Sentido" e coordenadora do Existentia - Centro de Orientação e Estudos da Condição Humana