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Teorias Econômicas

Clássicas da Tecnologia
Prof. Felipe Queiroz
Tecnologia e Desenvolvimento
FACE/UFG
Introdução
• Necessidade de análise e contexto histórico
• Até meados do Séc. XVIII: agricultura era a principal atividade econômica no mundo, no
qual as mercadorias eram feitas individualmente e de forma artesanal;
• Não existia “fábricas”: não havia processos organizacionais e a utilização de máquinas;
• Sem organização e máquinas, o aumento da produtividade era muito limitado. O
aumento da produção dependia do aumento dos fatores de produção;

• Revolução Industrial (1760-1840): divisor de águas na história econômica e tecnológica:


i. Inovações em máquinas e equipamentos: substituição do trabalho manual;
ii. Novas formas de organização da produção: de artesãos autônomos para empresas
hierárquicas;
iii. Novas fontes de energia e materiais: de substâncias vegetais ou animais por minerais.
• Landes (1969): Ao contrário de outras mudanças políticas e econômicas anteriores, a
Revolução industrial traz um caráter de transformação constante nas sociedades.
Inicialmente as transformações são lentas e concentradas (Inglaterra e indústria têxtil);
Introdução
• Revolução Industrial na Inglaterra é explicada por fatores de ordem técnica, institucional
(social e política) e econômica;
• Essas mudanças ocorreram de forma gradual e foram migrando para outros países
europeus e para a América do Norte.
• Landes: para induzir o empresário a inovar é imprescindível a combinação de duas
condições de incentivos:
i. Surgimento de oportunidades tecnológicas para dar resposta à necessidade de conter
os aumentos autônomos nos custos nos fatores de produção, como trabalho e
recursos naturais;
ii. Novas tecnologias devem apresentar uma superioridade de tal ordem que
compensem amplamente os custos da mudança.

• Ciência x Tecnologia: a tecnologia surgiu primeiro;


• Inovações na Revolução Industrial surgiram por meio de caráter prático sem formação
científica;
• O uso comercial da ciência só veio a começar a aparecer no final do século XIX:
laboratórios de pesquisa nas empresas.
Automação da Indústria Têxtil
• Indústria têxtil: inovações primeiro na fiação e depois na tecelagem aumentou muito a
produtividade e fez com que o custo de produção caísse muito, estimulando a expansão
do mercado;
• Preço do tecido de algodão na Inglaterra: 38 shillings em 1786 para 6 shillings em 1807;
• Em 1820: tecidos passaram a ser a maior commodity industrial do mundo. 60% da
produção britânica era exportada.
• Desequilíbrio ao longo da cadeia produtiva: introdução de novos equipamentos
manuais mais rápidos de tear levou a uma escassez de fios. Isso induziu um grande
número de inovações na indústria de fiação, que aumentou a sua capacidade, mas que
depois deixou a indústria de tecelagem defasada até o surgimento do tear mecânico.
• Dahmén (1988): conceito de “bloco de desenvolvimento”, que se refere a uma
sequência de complementariedades entre os setores industriais por meio de uma série
de tensões estruturais, nos quais os desequilíbrios poderiam resultar numa situação de
desenvolvimento equilibrado e dinâmico.
Desenvolvimento da Máquina a Vapor
• Máquina a vapor é o símbolo de inovação da Revolução Industrial;
• Exemplo de inovação que seguiu uma trajetória tecnológica: primeiras máquinas
tinham pouco uso prático devido a baixa qualidade do ferro disponível para a sua
fabricação (matéria-prima) e o seu baixo rendimento energético inicial. A máquina a
vapor visou uma trajetória de aumentar a sua eficiência energética (aumentar mais
energia com a mesma quantidade de combustível) até se tornar viável;
• Múltiplos aperfeiçoamentos: melhores materiais, introdução de válvulas e medidores
de seguranças, adoção de um carvão mais adequada a produção de vapor, etc.
• O motor a vapor teve como primeira aplicação nas minas de carvão, depois muito
utilizado nos transportes ferroviário e fluvial. A produção de carvão duplicou entre 1700
1750.
• Bloco de desenvolvimento: uso carvão mineral na metalurgia → permitiu
melhoramento na qualidade do ferro → com material mais resistente os cilindros da
máquina a vapor se tornaram mais eficientes e menores → permitindo o uso nas
indústrias e nos meios de transporte
Tecnologia e Capitalismo
• O capitalismo surgiu com a Revolução Industrial?
• O capitalismos antecedeu a revolução industrial: formas tipicamente capitalista de produção
antecederam o surgimento de fábricas;
• Sistema produtivo putting-out: sistema de terceirização que começou a se desenvolver ainda na
Idade Média. Várias etapas de um processo produtivo eram produzidas em diferentes
artesanatos. Isso gerava uma série de dificuldades de coordenação. Assim, surgiu a figura de um
coordenador central (empresário capitalista) mesmo sem ter uma fábrica. Este “coordenador”
passava a matéria prima de uma etapa para outra e vendia no mercado, apropriando-se do
resultado da produção, pagando os trabalhadores intermediários e ficando com o lucro final.
• Consolidação do capitalismo com o surgimento de fábricas:
i) concentrar artesãos individuais em um mesmo local (fábrica), diminuindo os custos de
transação;
ii) introdução da automação, especialização e divisão do trabalho, aumentando a produtividade;
iii) O capital físico (máquinas, ferramentas, imóveis) que antes pertenciam aos artesãos passou a
pertencer aos capitalistas, detentores dos meios de produção.
Tecnologia e Capitalismo
• Então qual foi o papel da tecnologia para o capitalismo?
• O capital encontrou na tecnologia e na manufatura uma oportunidade de se reproduzir em
escalas muito superiores à permitida pela atividade mercantil;
• As oportunidades trazidas com as inovações da Revolução Industrial ofereceram uma
oportunidade ímpar de acumulação do capital que, por sua vez, estimulou o desenvolvimento
tecnológico através de investimentos produtivos.
• Relação endógena: a tecnologia determina o social ou o social determina a tecnologia?
• Tigres: “A tecnologia precisa de condições institucionais adequadas para se difundir, enquanto a
ordem econômica e social influencia a direção assumida pelo desenvolvimento tecnológico”
• Por que a revolução tecnológica ocorreu na Inglaterra?
• Além do domínio de territórios e rotas comerciais em todo o mundo, o fim de forças absolutistas
e feudais, substituídos por um parlamento constitucional em 1640, estimulou o emprego do
capital acumulado com segurança em um contexto socioinstitucional que reconhecia e
estimulava o capitalismo industrial. Estabilidade política, sistema jurídico independente e
garantias de direitos de propriedade (patentes) ascendeu a burguesia.
• Revolução francesa e americana no final do século XVIII estimularam ainda mais a expansão do
capitalismo e revolução industrial pelo mundo
Tecnologia no Pensamento Econômico Clássico
• Fisiocratas: crescimento da renda nacional advém da atividade agrícola;
• Autores clássicos colocaram a acumulação do capital vindo da industrialização no centro
da análise sobre o processo de crescimento econômico;
• Smith: o crescimento econômico (riqueza das nações) advém do crescimento da
produtividade, que, por sua vez, advém da introdução da maquinaria e à divisão do
trabalho;
• Fábrica de alfinetes: alta especialização de trabalhadores em etapas distintas de uma
fábrica de alfinetes aumentavam muito a produtividade do trabalho em comparação com
o processo artesanal;
• A divisão social do trabalho aumenta o produto médio (produtividade) de três formas:
I. Especialização e repetição aumenta a habilidade, destreza e experiência do trabalhador;
II. Especialização evita a necessidade de deslocamento e troca de ferramentas,
economizando tempo;
III. Especialização do maquinário a cada função facilita a execução e abreviação do
trabalho, não exigindo trabalhadores habilidosos.
Tecnologia no Pensamento Econômico Clássico
• Para Smith: a divisão do trabalho não era propriamente um produto da sabedoria
humana, mas sim resultado de uma implementação lenta e gradual da propensão natural
do homem para negociar, mudar ou trocar uma coisa pela outra.
• O uso de novas técnicas, no entanto, só era possível se empregado em grande escala.
Grande escala, por sua vez, exige um grande mercado (demanda). “Quando o mercado é
muito pequeno, nenhuma pessoa pode ter o estímulo necessário para se dedicar
inteiramente a único ofício”

• Ricardo: chama atenção para o possível desemprego gerado pela substituição de


trabalhadores por máquinas. O crescimento da produção também demanda
trabalhadores, mas em menores proporções e de forma decrescente (retornos marginais
decrescentes);
• Lei de Say: o aumento da produtividade e da produção geradas pelas inovações e divisão
do trabalho aumentam também a demanda, tornando o desemprego de trabalhadores
uma questão temporária. Assim, o progresso técnico beneficia toda a sociedade,
Tecnologia no Pensamento Econômico Clássico
• Ricardo: inicialmente ia contra a Ley de Say, acreditando que o aumento dos lucros dos
empresários por meio da automação não necessariamente beneficia os trabalhadores com
aumento da produção e consequentemente do emprego;
• No entanto, posteriormente Ricardo ameniza seu pessimismo sinalizando que o aumento dos
lucros do capitalista facilitaria o aumento dos investimentos.

• Processo de acumulação do capital e crescimento econômico:


• Inovações → Aumento de produtividade → queda nos preços → Aumento da renda → Aumento da
demanda → Aumento dos investimentos → Inovações
• À medida que o aumento do consumo alimenta o investimento produtivo, surge a necessidade de
empregar mais trabalhadores. Dessa forma, parte das pessoas deslocadas na primeira etapa da
automação poderia ser empregada depois (desemprego apenas temporário da Lei de Sey);
• Para esse ciclo se concretizar é necessário que os preços caiam com o aumento da produtividade. O
que é necessário para a queda de preços?
• Presença de concorrência: enfoque normativo concorrencial dos mercados
A Segunda Revolução Industrial
• Segunda metade do século XIX: aprofundamento do processo de industrialização europeu
e na América do Norte
i. Difusão da aplicação da máquina a vapor em toda a indústria manufatureira e nos meios
de transporte;
ii. Avanço na metalurgia com o uso do carvão mineral e à invenção do aço;
iii. Avanço em escala: processo produtivo em massa;
iv. Europa Continental e América do Norte equiparou-se à Inglaterra em desenvolvimento
industrial, ainda que esta continuava a ser a maior potência;
v. Mudanças constitucionais nas esferas jurídica, financeira e política.

• Teria econômica: interpretações do capitalismo


i. Karl Marx: teoria do valor trabalho com base nos autores clássicos;
ii. Leon Walras: escola neoclássica, valor utilidade e equilíbrio geral
Inovações da Segunda Revolução Industrial
• Metade do Séc. XIX é marcado por aprimoramento e difusão de inovações desenvolvidas
anteriormente, visando torná-las mais operacionais e econômicas;
• Outras inovações radicais estavam surgindo, mas ainda sem o aprimoramento que iriam
alcançar um grande impacto no século XX: eletricidade, telégrafo e motor a combustão;

• Transportes ferroviários e marítimos: o desenvolvimento das ferrovias exigiram uma série


de inovações complementares na tecnologia do vapor, na indústria mecânica, na
qualidade do material e no manejo de equipamentos pesados, a exemplo do macaco a
vapor e os guindastes suspensos. Primeira estrada de ferro (Inglaterra 1825). Boom
ferroviários EUA e conexões na Europa (1840-1860). A alta demanda por ferro impulsionou
inovações na metalurgia.
• Ferro e aço: inelasticidade da oferta de madeira e capacidade limitada dos fornos tornou-
se antieconômica a fundição utilizando carvão vegetal. O carvão mineral, muito mais
abundante, permitiu um aumento contínuo do tamanho dos equipamentos e das usinas,
gerado o estímulo por aperfeiçoamentos tecnológicos e melhorias na purificação do aço.
Marx e o papel da tecnologia na dinâmica econômica
• Capitalismo é um processo evolucionário, alimentado pelo progresso técnico e que
reflete a luta de classes entre capital e trabalho: busca por maiores lucros, a concorrência
e a mudança tecnológica eram os fatores que induziam os capitalistas a investirem o
excedente produtivo (mais valia) em máquinas poupadoras de trabalho;
• Tecnologia como um elemento endógeno nas relações produtivas e valorização do capital,
necessária para o processo de acumulação de capital: “a burguesia em si não poderia
existir sem revolucionar constantemente os meios de produção”.
• Inovação como busca de monopólios temporário: usufruto de lucros maiores ao
introduzir a inovação até a queda dos preços devido a imitação.
• Preocupação de Marx: impactos sociais da tecnologia. A tecnologia permitia ao capital
aumentar a exploração da força de trabalho. Ao poupar mão-de-obra, o capital diminuía a
sua demanda e consequentemente os salários.
• Automação cria um exército industrial de reserva, disposta a aceitar menores salários e
piores condições de trabalho.
A visão neoclássica da firma e da tecnologia
• Teoria do valor utilidade: valor subjetivo de satisfazer as necessidades humanas, baseado
no comportamento dos indivíduos e nas condições de equilíbrio;
• Do social para o individual: foco passa a ser a formação de preços e alocação de recursos
ao invés das origines e causas do desenvolvimento;
• Papel da tecnologia é negligenciada por meio de hipóteses restritivas: fora do âmbito da
economia, devendo ser tratada por engenheiros e administradores;
• Equilíbrio geral (Walras) e equilíbrio parcial (Marshall) marcam o rigor formal da
formação de preços e da alocação de recursos;
• Firma neoclássica: vista como um agente autônomo e passivo maximizador de lucros, com
a função de transformar fatores de produção em produtos com uma tecnologia existente
(exógena);
• Contexto histórico: embate ideológico entre mercantilistas, liberais e, mais tarde,
marxistas, levaram o enfoque da teoria neoclássica recair sobre as condições necessárias
para o mercado funcionar de forma livre;
• Conforme foi aumentando a concentração de capital, neoclássicos passaram a avançar em
outras estruturas de mercado mais concentradas, mas sem tratamento da tecnologia.

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