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MÓDULO I

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Dividiremos esta unidade nos seguintes tópicos:
- Evolução nos últimos anos;
- O livro em outros países.

Estamos preparados? Vamos lá!

O mercado editorial – Visão geral

Evolução nos últimos anos

“O brasileiro lê pouco.” É possível que você já tenha


ouvido essa frase várias vezes, dita por pessoas liga-
das à cadeia do livro, educadores, políticos, analistas
sociais ou simplesmente em uma roda de amigos. A
afirmação é muitas vezes associada a uma questão
cultural (“os brasileiros historicamente não gostam de
ler”), política (“o governo não incentiva a leitura”) ou
social (“livros são caros, por isso não são prioridade”).
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Mas até que ponto essas críticas têm razão? O mer-


cado do livro no Brasil é tão restrito? Publicar e ven-
der livros no país é uma aventura?

Para tentar chegar a algumas respostas, é preciso pri-


meiro conhecer algumas estatísticas recentes impor-
tantes. A partir delas, é possível entender o tamanho
do mercado editorial brasileiro e do comportamento
dos leitores. Segundo a pesquisa Produção e vendas
do setor editorial brasileiro, produzida em conjunto pela
Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe),
pelo Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL)
e pela Câmara Brasileira do Livro (CBL), tendo 2017

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como ano-base, foram produzidos mais de 390 mi-


lhões de exemplares, enquanto mais de 350 milhões
foram vendidos.

Considerando a atual população brasileira – cerca de


208 milhões de pessoas em julho de 2018, segundo
o IBGE1 –, chega-se a uma média de pouco mais de
1,5 livro per capita durante todo o ano de 2017, o que
está bem longe de ser um número empolgante, me-
nos ainda ideal. Na verdade, em comparação com o
ano anterior, houve uma queda de praticamente 8%
no total de exemplares produzidos e 7,5% no total de
livros comercializados. Outro fator importante que
precisa ser considerado é a influência das compras
governamentais nesses números. A diminuição dessas
compras foi o principal fator determinante da queda
de desempenho em 2017, em comparação com o ano
anterior, puxando a produção para baixo em mais de
15% e o faturamento, em praticamente 13%.

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www.ibge.gov.br/apps/populacao/projecao/box_popclock.php

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Gráfico 1.1

COMPORTAMENTO DO SETOR EDITORIAL BRASILEIRO - Ano-base 2017

2016 2017 Variação %


Títulos 51.819 48.879 -5,67

Total de exemplares produzidos 427.188.093 393.284.611 -7,94


Faturamento total (em R$) 5.269.973.133,98 5.167.057.536,71 -1,95
Mercado 3.872.510.546,37 3.951.075.849,00 2,03
Governo 1.397.462.587,61 1.215.981.687,50 -12,99

Total de exemplares vendidos 383.416.450 354.938.361 -7,43


Mercado 226.621.534 222.336.845 -1,89
Governo 156.794.917 132.601.516 -15,43

Fonte: Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe)

Diante desse cenário recessivo, o mercado editorial


tem se mostrado muito desafiador nos últimos anos.
Várias editoras fecharam as portas ou foram incor-
poradas pelos grandes grupos editoriais, enquanto
grandes redes de livrarias enfrentam sérios proble-
mas de gestão, entre outros efeitos da crise econô-
mica. Algumas características desse setor são fatores
agravantes, como o alto custo do frete, a dependên-
cia de várias editoras das compras governamentais,
a concorrência agressiva e o sistema de consigna-
2
ção, que representa uma parte significativa da re-
ceita. Confira, no vídeo a seguir, como Sonia Jardim,
presidente do Grupo Editorial Record, um dos maiores Assista o
do Brasil, e que também presidiu o Sindicato Nacional vídeo 1

dos Editores de livros, sintetiza a questão.

2
Neste sistema, amplamente usado no Brasil, a livraria, rede ou distribuidor faz o
pedido e, depois de períodos determinados entre as partes, fatura apenas o que
vendeu, geralmente pagando em parcelas, e devolve o que não vendeu sem ônus. É
criticado por várias editoras, que alegam serem obrigadas a fazer todo o investimen-
to na produção de cada livro muito antes de começarem a capitalizá-lo, o que pode
gerar um sério problema de fluxo de caixa.

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Ao analisar o panorama do setor editorial a partir da


pesquisa da Fipe, o profissional (seja ele um funcionário
ou empreendedor) precisa ter em mente alguns dados
que indicam o comportamento do mercado e de seus
agentes, além de apontar tendências e lançar alertas.

• Em 2017, a queda nominal do setor editorial foi de


aproximadamente 2% sobre o ano anterior. Con-
siderando a variação do IPCA no período, a queda
real foi de quase 5%.

• Excluídas as vendas ao governo, houve cresci-


mento nominal de pouco mais de 2% em relação
a 2016, mas a mesma correção pelo IPCA indica
queda de quase 1%.

• A redução geral é creditada pela Fipe à queda


real (considerado o IPCA) no desempenho dos
subsetores de Didáticos – 10,43%, incluindo vendas
ao governo – e CTP (científicos, técnicos e profis-
sionais) – 1,39%, também incluídas as vendas go-
vernamentais.

• Ainda não há pesquisas seguras sobre a partici-


pação de formatos digitais, mas há um consenso
de que esteja na faixa de 3%.

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Até meados dá década de 2000, a evolução nas ven-


das de livros no mercado acompanhava o crescimento
do PIB, mas a situação muda nos anos seguintes. No
início da década de 2010, o setor chega a apresentar
queda, em contraste com a curva do PIB. Recentemente,
o declínio tornou-se ainda mais acentuado.
Comparativo entre a evolução do PIB e das vendas no
mercado (número índice)

140

130

120

110

100

90

80

70
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 2013 2014 2015 2016 2017

PIB VENDAS AO MERCADO

Fonte: Fipe

• Ao se considerar as vendas por tipo de obra em


2017, os números indicam que os livros didáticos e
do segmento CTP respondem juntos por mais da
metade das vendas no mercado.

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Participação percentual no faturamento por tipo de obra –


Vendas no mercado3 (2017)

26% Didáticos
31%
Obras gerais

Religiosos
14% CTP
29%

Fonte: Fipe

• Note-se também a participação significativa de


livros religiosos, que correspondem a um terço das
vendas no mercado quando os didáticos e CTP
são excluídos da conta.

33% Obras Gerais

Religiosas

67%

Fonte: Fipe

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Livrarias, distribuidores, bancas, livrarias virtuais e outros canais, excetuando ven-
das governamentais.

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• Outro dado importante revelado na pesqui-


sa Produção e vendas do setor editorial brasileiro é
a manutenção da forte participação dos auto-
res nacionais nas vendas de novos títulos. Apesar
da queda em números absolutos – foram 9.523
novos ISBNs4 de escritores brasileiros em 2017,
uma queda de 7,86% em relação ao ano anterior
–, aproximadamente 60% dos lançamentos são
de autores nacionais. Os novos livros traduzidos
apresentaram redução de praticamente 7%. Em
termos de exemplares vendidos, a participação
dos lançamentos de escritores brasileiros é ainda
mais expressiva, registrando aumento de 3,65%
em relação a 2016 (quase 61,5 milhões de cópias
em 2017), enquanto os traduzidos sofreram queda
de quase 17% (menos de 17 milhões de cópias no
ano passado).

A julgar pelos primeiros meses de 2018, as perspec-


tivas são um pouco mais otimistas. Segundo a sétima
edição anual do Painel de vendas de livros no Brasil, le-
vantamento realizado em conjunto pela Nielsen e
pelo SNEL e divulgado no início de agosto de 2018,

4
International Standard Book Number: sistema internacional padronizado, criado
na Inglaterra em 1967 e oficializado em 1972, que identifica numericamente os livros
segundo o título, o autor, o país, a editora e até edição. Seu sistema numérico é con-
vertido em código de barras, facilitando a circulação e comercialização das obras. No
Brasil, a Fundação Biblioteca Nacional representa a Agência Internacional do ISBN
desde 1978, atribuindo o número de identificação aos livros editados no país. (Fonte:
Agência Brasileira do ISBN em www.isbn.bn.br/website/o-que-e-isbn).

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o mercado editorial manteve, no primeiro semestre,


os sinais de recuperação do início do ano. De janeiro
a junho, a venda de livros no varejo (ou seja, sem a
participação das compras governamentais e vendas
especiais) cresceu quase 9,97% em faturamento, um
total de R$ 1,07 bilhão, e 5,24% em exemplares co-
mercializados, total de 24,27 milhões de cópias, em
comparação com igual período de 2017. Foi também
no início do segundo semestre de 2018 que o governo
sancionou a nova Política Nacional de Leitura e Escrita,
lei que prevê várias medidas, incluindo investimentos
em bibliotecas públicas e ações de incentivo à pro-
dução literária com envolvimento de editoras e livra-
rias como agentes “fundamentais e dinamizadores da
economia criativa”.

Mesmo assim, nem todos os motivos são para come-


moração: o primeiro semestre também enviou men-
sagens preocupantes, como a decisão unilateral da
Saraiva, maior rede de livrarias do Brasil, de suspen-
der temporariamente e renegociar os prazos de pa-
gamento aos principais fornecedores. A situação de
outra rede, a Cultura, também deixou as editoras em
estado de alerta, a ponto de algumas cancelarem en-
vio às lojas enquanto os pagamentos atrasados não
fossem regularizados. Cabe lembrar que a Cultura
comprou em 2016 as lojas da Fnac no Brasil, porém
anunciou o fechamento de algumas delas.

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Tais contradições confirmam o fato de que o mercado


editorial brasileiro ainda enfrenta os problemas cau-
sados pela recessão dos últimos anos e exige cautela.
No entanto, mesmo com queda no desempenho, ele
ultrapassou a marca de R$ 5 bilhões de faturamento.
Também é verdade que está bem aquém dos mais de
R$ 7 bilhões 5 que chegou a faturar no início da década
de 2010, antes da crise econômica, mas ainda assim
é um número expressivo, que coloca o Brasil entre os
maiores mercados mundiais para a indústria do livro,
atraindo o interesse de grandes grupos internacio-
nais em todos os setores, como a editora espanhola
Planeta; a norte-americana Penguin-Random House;
a também norte-americana RR Donnelley, uma das
maiores gráficas atualmente em atividade no Brasil;
e a gigante da tecnologia de vendas online Amazon,
entre outros.

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Valores corrigidos para 2017 pelo IPCA. Fonte: Fipe.

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BOX:

Segundo o site Statista (https://www.statista.com/statistics/288746/


global-book-market-by-region/), o Brasil ocupou em 2017 o décimo
lugar em termos de participação no mercado editorial mundial
com 2%. Veja os dez primeiros colocados:

Estados Unidos (30%)


China (10%)
Alemanha (9%)
Japão (7%)
França (4%)
Reino Unido (4%)
Itália (3%)
Espanha (3%)
Índia (2%)
Brasil (2%)

Se algumas livrarias e redes estão fechando portas,


outras se lançam no mercado, muitas vezes pela via
da segmentação e gestão mais enxuta – caminho
também trilhado por novas editoras. Ainda que as
barreiras à entrada sejam grandes, a tendência ao
oligopólio, tão temida a cada nova aquisição, não inti-
mida certos empreendedores que estão contrariando
os pessimistas e abrindo franquias, criando novos
modelos de clubes de leitura e fundando editoras de
nicho. Beneficiados pelas plataformas de divulgação
e por mídias sociais, autores que frequentam as cobi-
çadas listas de best-sellers atraem centenas, às vezes

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milhares de pessoas às sessões de autógrafos em li-


vrarias, debates em feiras literárias e apresentações
em eventos especiais.

Imagem 1.2 - Fila durante sessão de autógrafos na Livraria Cultura do Conjunto Nacio-
nal, em São Paulo: eventos com autores atraem o público leitor aos pontos de venda

Foto: Omar de Souza

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Considerando as mudanças do setor editorial, como


o desenvolvimento das plataformas de distribuição
digital de conteúdo, a consolidação do e-commerce, o
fenômeno da autopublicação, a informatização dos
processos gráficos, os novos players globais e tantas
outras revoluções maiores ou menores das últimas três
décadas, o desafio agora não se limita a identificar as
alternativas para o negócio do livro (aquilo que o man-
tém), mas também as alternativas ao livro (aquilo que
o ameaça).

O livro em outros países

Em mercados de economia mais estável e um histórico


mais favorável para o setor de livros, como Estados
Unidos, Japão e os principais países da Europa, os
movimentos de avanço ou retrocesso no desempe-
nho são proporcionalmente mais tímidos, mas tam-
bém são acompanhados de perto.

• Nos Estados Unidos, de acordo com o NPD Group,


especializado em pesquisas de mercado, as ven-
das de livros impressos em 2017 tiveram um au-
mento de quase 2% no total de exemplares em
relação a 2016 – um pouco abaixo da média de
cerca de 3% dos quatro anos anteriores. Foram
vendidos pouco menos de 700 milhões de cópias,

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pequeno crescimento que não salvou a rede de


livrarias Barnes & Noble de dar mais um sinal ne-
gativo ao mercado com a demissão de seu CEO,
Demos Parneros.

• Quanto ao mercado digital norte-americano,


uma notícia ruim e outra boa: os e-books registra-
ram uma queda de aproximadamente 10% no total
de unidades vendidas no mesmo período de apu-
ração, ficando em 162 milhões de unidades. Mas
o entusiasmo está no formato audiolivros, que,
segundo estimativas da norte-americana Audio
Publishers Association, cresceu em 2017 mais de
22% em comparação ao faturamento de 2016,
chegando a US$ 2,5 bilhões.

• Dois importantes mercados editoriais europeus


apresentaram ligeira queda no ano passado. O
Syndicat National de l’Edition (SNE), que reúne as
editoras francesas, informou que o faturamento
com as vendas de livros em 2017 caiu 1,6% em re-
lação ao ano anterior. Em exemplares vendidos, a
redução foi de 1,1%, ficando na faixa de 430 mi-
lhões de livros. Na Alemanha, a queda também foi
de 1,6%, mas o dado mais alarmante foi revelado
a partir de uma pesquisa da GfK: o país perdeu
mais de 6 milhões de leitores de 2013 a 2017. Em

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compensação, a média de livros que um alemão lê


por ano passou de 11 em 2016 para 12,4 em 2017.

• Em Portugal, o mercado ficou praticamente es-


tável, com 11,8 milhões de exemplares vendidos em
2017 – apenas 120 mil livros a menos em compa-
ração com o resultado de 2016. No entanto, houve
um aumento de 3% no faturamento, segundo a
GfK Portugal.

• No Reino Unido, as vendas de livros cresceram


5%, segundo o relatório da associação dos edito-
res britânicos PA Publishing Yearbook 2017. Os nú-
meros, que comparam o mercado a 2016, foram
puxados pelo aumento de 8% nas exportações
de livros, mas houve queda de 12% na venda de
livros didáticos, resultado de cortes de gastos pú-
blicos. Os livros físicos apresentaram aumento nas
vendas de 5%, enquanto os e-books caíram 2%. Tal
como nos Estados Unidos, a estrela é o audiolivro,
com aumento de 25%.

• O Relatório da Cámara Argentina del Libro6, ba-


seado na Agencia Argentina de ISBN, indica que
houve uma queda de cerca de 19% no total de
exemplares produzidos em 2017, pouco mais de 51

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https://issuu.com/camaradellibro/docs/2018.03.04_informe_de_producci_n_an

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milhões. É o terceiro ano consecutivo de queda. A


proporção dos formatos digitais se manteve está-
vel, na faixa de 17%.

Imagens 1.3, 1.4. 1.5 e 1.6 - Livrarias em Portugal, Inglaterra, França e Argentina:
um mercado em momento de transição

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Fotos: Omar de Souza

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