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História da África Pré-colonização

Aula 2: O espaço geográfico africano

Apresentação
Estudante, a História é o estudo acerca da humanidade ao longo tempo. O ser humano é um animal histórico. A Geogra;a
é a ciência que estudas as ações do homem no espaço. Assim, como em qualquer estudo, é necessário que você estude
os aspectos geográ;cos africanos para compreender melhor a história da África.

Antes de começarmos a “mapear” o nosso objeto de estudo, é importante você saber que iremos começar com várias
informações. Tais dados são importantes para as nossas explicações. Isso porque há muita relação entre natureza, relevo,
clima, hidrogra;a com a história africana, como em qualquer outro continente.

Objetivo
• Analisar o signi;cado da África como “berço da humanidade”;

• Identi;car aspectos gerais da geogra;a africana;

• Relacionar a geogra;a do continente africano com as diversidades de seus povos.

A pré-história africana
O continente africano é popularmente chamado de “berço da humanidade”. Se admitirmos que a espécie humana pertence a
um único tronco, a teoria das “raças” só pode ser desenvolvida de acordo com o contexto do evolucionismo. Torna-se
importante analisar o que chamamos de pré-história africana, a vida desses ancestrais comuns e sua relação com o ambiente
geográ;co.
! Fonte: TeeFarm / Pixabay.

Os estudos paleontológicos apresentam, de acordo com a


teoria evolucionista da humanidade, que os antepassados
primatas sofreram as mutações e culminaram na espécie
do homo sapiens sapiens — à qual pertencemos —, cujo
surgimento se deu no continente africano. Há sítios de
fósseis na África banhada pelo oceano Índico que apontam
primatas que surgiram há cerca de seis a quatro milhões
Antes da Era Comum1 .

! Fonte: ConexaoCabeca / Pixabay.

Dentre os primatas, os Austrolopitecos viveram em bandos na África do Sul, Quênia e Etiópia, preferindo regiões com Zorestas.
Um de seus sucessores, o homo habilis, já mostra a técnica do uso de pedra para polir instrumentos de caça e o uso de
pedaços de madeira que serviram de lanças, além da própria pedra servir para caça ou para atacar bandos rivais que
disputavam territórios, especialmente fontes de água. Esse nosso antepassado preferia como habitat as savanas, região com
maior quantidade de rios e lagos.

Geógrafos, historiadores, paleontólogos e arqueólogos a;rmam que houve não uma, mas duas correntes migratórias dos
nossos ancestrais. Uma cruzaria o mar Vermelho e iria em direção à Ásia ou por meio de embarcações primitivas, como
troncos de árvores, para o atual sudeste asiático.

O outro Zuxo migratório seria em direção ao norte da África e dali ultrapassaria o Mediterrâneo e chegaria à Europa. Fósseis
encontrados na China, na Irlanda e na Índia mostram uma semelhança muito grande com os fósseis encontrados em sítios
arqueológicos africanos.

Agora, qual seria o motivo para essas migrações?


Há uma hipótese acerca de uma forte alteração climática na região. O
deserto do Saara, assim como o Vale do Nilo seriam territórios
úmidos, com possibilidade de pastoreio e de variedades de frutas e
raízes. Com o aquecimento da região, o Saara acabou por sofrer
desertificação. A região do Nilo ficou mais dependente do rio, pois o
clima mudou e a aridez em seu entorno ampliou-se.

A procura por comida, água e climas mais amenos teriam sido os motivos para essas migrações, que acabaram por espalhar
primatas cada vez mais desenvolvidos, seja quanto ao cérebro, às habilidades manuais ou ao pensamento abstrato. Um ponto
é unânime entre os estudiosos no sentido de que nossos ancestrais, por conta do calor, da incidência dos raios solares,
concentravam muita melanina, isto é, eram negros, como mostram pinturas rupestres no Saara e fósseis na Nigéria.

Comentário

É bom reforçar, caros alunos, que os primatas não obedecem a uma “linha de passe”, como se usa como termo de futebol. Não
houve uma sequência linear de espécies, ou seja, primeiro um primata, depois outro, depois outro, mas sim, a coexistência —
pací;ca (o que era raro) ou não — de espécies diferentes. Esses encontros geraram grande miscigenação, como é o caso da
região do Vale do Nilo, onde etíopes e povos nilo-saarianos acasalaram.

Por questões de aptidão às mudanças ou por eliminação física proposital de um grupo sobre o outro há a sucessão para outro
primata. É bom frisar que na África surgiu o primeiro primata a deixar de ser quadrúpede e passar, de forma ainda muito
vacilante, a ser bípede. Qual a vantagem do bipedismo?

Olhar melhor a caça e seus predadores, alternar entre o solo e as árvores.


Em um processo simultâneo com outras partes do mundo, como a
Mesopotâmia, houve a mudança do nomadismo para o sedentarismo
derivado da agricultura e da domesticação de animais. Foi o Período
Neolítico na África (10.000 – 6.000 AEC).
As características gerais da
geografia africana
Qual papel o meio geográNco desempenhou na história do
Continente Africano?

O isolamento geográ;co de seu interior, que é cercado por


dois oceanos e por um causticante deserto ao norte e outro
mais ao sul e um litoral de difícil acesso. Esse cenário não
facilitou a entrada de outros povos para o seu interior,
mantendo o continente praticamente isolado.

! Fonte: Mapa físico da África. Fonte: Brasil África (2020).

O território africano possui uma particularidade em relação aos demais continentes. Ele é cortado pela linha do Equador e
também pelo Meridiano de Greenwich, isso signi;ca que existem terras africanas em todos os hemisférios. A África é separada
da Europa ao norte pelo mar Mediterrâneo e da Ásia pelo mar Vermelho com uma ligação pelo istmo de Suez.

Saiba mais

Sua costa banhada pelo Índico permitiu várias transações comerciais com o Oriente, em especial com os árabes. A costa
ocidental, banhada pelo Atlântico, foi a porta de entrada para os europeus.

Houve uma convenção em dividir o território africano em duas partes, cuja linha que demarca tal divisão é o deserto do Saara.
Acima do Saara, há o Magreb (“poente” em árabe), que é a costa africana banhada pelo Mediterrâneo, o chamado “chifre da
África”, que compreende uma parte do norte e do nordeste do continente. Ao sul do Saara seria a “África Negra” — termo que
atualmente está em desuso — ou África Subsaariana, região com predomínio de povos negros.

! Características do relevo africano

" Clique no botão acima.

A África tem como uma de suas características um extenso planalto de forma ondulada, que chega a coexistir com
cordilheira de montanhas como a cordilheira de Atlas, no norte africano. Seu planalto é dividido em Planalto
Setentrional (norte), Planalto Central e Planalto Meridional (sul). Nesses últimos planaltos encontram-se depressões
que dão origem à bacia do Congo e ao deserto do Kalahari.

 
No Planalto Setentrional há o Deserto do Saara, que ocupa cerca de 25% do território africano. O Saara, há cerca de
cinco mil anos, era uma região fértil, de clima úmido. Após uma drástica alteração climática no planeta no período
Terciário e Quaternário, os lagos e rios da região do Saara secaram e houve uma mudança em sua con;guração.
Onde antes havia vegetação e pastagens, surgiram dunas de areia. Assim, o deserto constituiu-se em uma barreira
natural entre a África Setentrional e a África Subsaariana. As sociedades africanas tiraram proveito da
complementaridade das zonas climáticas para fazer interações comerciais, como no caso do comércio transaariano.

Nas margens do Saara temos a região do Sahel, que começa desde o oceano Atlântico até o mar Vermelho. É uma
área de transição entre a região árida desértica e as áreas de Zorestas equatoriais ao sul. Na con;guração do Sahel
predominam as savanas. Em seus mais de cinco mil quilômetros de extensão houve a instalação de vários reinos, que
bene;ciaram-se do comércio feito por caravanas de mulas ou camelos que atravessaram o deserto.

! Mapa do Sahel. Fonte: Felix Koenig - Wikipédia (2020).

O continente não é somente deserto e calor! Por conta das altitudes de suas montanhas há regiões que têm neve,
como no caso do monte Kilimanjaro, ao sul do planalto etíope. Há a cordilheira do Atlas, que se estende pelo noroeste
africano, do Marrocos à Tunísia. Nessas regiões há a vegetação de tundra. 

Os geólogos a;rmam que essa cordilheira é consequência de choques de placas tectônicas enquanto havia um único
continente. Vestígios de rochas similares são encontrados em cadeias de montanhas da América do Norte e da
Europa. O fato de ser uma grande cordilheira em extensão não impede a habitação de povos como os berberes, grupo
étnico que habita o atual Marrocos e que tem como característica o pastoreio.

! Cordilheira do Atlas. Fonte: Wikipédia (2020).


O litoral do continente não é entrecortado, não tem muitas baías, não tem muitas entradas — como no caso do Brasil —
e apresenta águas profundas, o que permite atualmente, por exemplo, a exploração de petróleo em plataformas
marítimas. Existem bacias hidrográ;cas e lagos no continente. Os rios geralmente não desembocam no oceano, mas
no interior. Seus rios apresentam problemas para navegação por conta de quedas d’água, o que di;culta a travessia de
grandes navios.

São quatro as principais bacias hidrográ;cas do continente: as dos rios Nilo, Níger, Congo e Zambeze. É bom
relacionarmos essas fontes de água com densidade populacional, ou seja, onde existe água há maior concentração de
pessoas. Assim, nas regiões desérticas há uma pequena parte da população, como é o caso de beduínos, que
acomodam-se com suas tendas perto de oásis.

 
Os minerais talvez constituam seu recurso natural mais signi;cativo, que permitiu ao homem o controle do meio
ambiente. Vastas zonas da África repousam sobre massas rochosas das mais antigas do planeta, algumas altamente
mineralizadas, como a zona cuprífera do Shaba (Zaire), a zona diamantífera da África do Sul, as minas de ouro de
Gana, do Zaire e da África do Sul, o estanho do Zaire e da Nigéria (SILVÉRIO, 2013).

O subsolo do continente africano é muito rico em minérios, que atualmente são explorados por empresas
internacionais. Destacam-se carvão, petróleo, gás, diamantes (90% da produção mundial), cobre, bauxita.

 
O que devemos analisar é o porquê dessas riquezas não resultarem em progresso para os africanos, pois há baixa
industrialização — com algumas exceções ao norte e em alguns pontos da África do Sul. Apesar de tantas fontes de
energia, grande parte de sua população usa lenha para aquecer suas casas e seus alimentos.

A agricultura na África, é usada em sua maioria de forma intensiva em latifúndios controlados por empresas internacionais.
Entre as culturas destacam-se a de café, a de borracha, de açúcar e de cacau. As interações sociais e a escravidão
transatlântica levaram para a África a cultura de alimentos que não eram cultivados, como amendoim a banana.

 
A pecuária é mais concentrada no norte africano, com a criação de camelos, carneiros e ovelhas. Simultaneamente ao sistema
de plantation existem:

A agricultura de subsistência

• Cultivada por nativos da Zoresta.

A permanente

• Cultivada por alguns povos da África Meridional e berberes no Marrocos e Egito.

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' (Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online

Um dos pontos mais importantes sobre a geogra;a humana africana é sua a diversidade étnico-linguística. Falamos na aula
anterior da imensa diversidade dos povos africanos e de suas culturas e que não era possível dimensionar a África como um
território padronizado — mesmo que tenha alguns padrões comuns em um ponto ou outro. Um dos motivos é porque a África
tem cerca de 800 grupos étnicos e cada qual com sua língua, seus costumes, suas heranças culturais.
O mapa dos troncos linguísticos não combina com o mapa das alocações “raciais” presentes, herança das migrações, das
fronteiras “líquidas” da fase pré-colonial ou das arti;ciais quando na presença de imperialistas.

Na realidade, quanto ao idioma, há mais de mil línguas faladas no continente, que são derivadas de quatro troncos linguísticos:

"Clique nos botões para ver as informações.

Afro-asiáticas !

Como os berberes, anteriormente citados e os egípcios) ou camito-semíticas, que cobrem a maioria do norte da África.

Tronco khoisan !

Em processo de extinção, pois não tem escrita e seus povos são grupos étnicos minoritários dispersos no deserto do
Kalahari e na África do Sul.

As línguas de origem nígero-congolesa !

Útil em casos de mal-estar, febre, reumatismo. Usado como analgésico. Produz o precursor do ácido acetilsalicílico.

As de origem nilo-saarianas !

Que possui cerca de 10 famílias linguísticas.

Sua formação deriva dos povos que saíram do Saara quando houve a deserti;cação. Os povos dos grandes lagos africanos,
como o Chade e aqueles que são herdeiros do antigo Império Sonhgai, como os países do Mali e Níger fazem parte de seu
tronco linguístico).

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Além das línguas de matriz africana, há o uso de línguas europeias como o inglês e o francês por conta do neocolonialismo do
século XIX, ou do português e do africânder (variação do holandês), que são derivadas do colonialismo dos séculos XVI e XVII.

As religiões são tão híbridas e numerosas como os troncos linguísticos. Há diferenças, assimilações, sincretismos, mas
observam-se certos padrões em comum, como a valorização dos ancestrais ou de pessoas mais idosas. Como vimos na
primeira aula, o ancião não representa somente a história ou a construção do mito de origem de um povo, mas também decifra
os códigos das forças do sobrenatural e interpreta suas leis, independentemente da religião, seja monoteísta ou politeísta.
! Fonte: naralsina_2 / Pixabay.

As religiões chamadas animistas são aquelas que valorizam a relação entre os membros da sociedade com elementos da
natureza tais como árvores, pedras ou rios. Ao contrário do que o preconceito causado pela ignorância nos faz supor, a
adoração a uma árvore não se dá pela árvore em si, mas sim porque a derrubada daquela árvore signi;cará algo para aquele
povo, pois há uma conexão direta entre o homem e a natureza, algo semelhante ao que foi abordado no ;lme Avatar (2009), de
James Cameron.

Os abalos humanos na natureza signiNcam a perda da memória coletiva e da


sobrevivência da própria comunidade, pois cria-se um divórcio que não tem
volta entre o humano e seu meio ambiente.

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' (Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online

As primeiras formas de organização social têm como base a família. Esse é o maior núcleo de referência da cultura africana. A
partir dela há outras linhagens, como os casamentos promovidos por alianças estratégicas ou pela necessidade de terem um
ancestral comum. O casamento era derivado pela busca pelo alcance de maior patrimônio e de reforço de laços ou, ainda, de
buscar tréguas em conZitos étnicos.

A partir da família derivam os trabalhos na África pré-colonial, especialmente até o século XVI DEC. O africano tem como per;l
a especialização de sua mão de obra. Assim, surge na paisagem humana africana a diversi;cação de atividades que resultam
em aumento da produtividade da tribo, do reino ou do império.

É uma divisão social aprimorada do trabalho e bem à frente da época em que tal tema foi estudo na Europa por cientistas
sociais do século XIX.

Saiba mais
Essa divisão não resultava em alienação do que era produzido, pois tudo baseava-se em interesses comunais e no acúmulo de
experiência. Os saberes manuais — assim como os orais — eram uma forma de acúmulo de técnica. Assim será, tanto para
ferreiros como para oleiros, para joalheiros ou guerreiros, para artesãos ou griôs.

Atualmente, o continente tem quase um bilhão de pessoas com predominância da população rural, que gira em torno de 60%
por cento do total. Há um lento processo de urbanização nas duas últimas décadas. As densidades demográ;cas estão entre
as mais altas do mundo, isto é, grandes aglomerações em espaços insu;cientes. Essa densidade é motivada por questões
ambientais — acesso à água —, políticas — perseguições religiosas ou guerras civis — ou econômicas — procura de emprego
nas regiões mais industrializadas.

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' (Aqui existe uma videoaula, acesso pelo conteúdo online

Atividade
1. Leia a reportagem do link abaixo:

https://www.publico.pt/2018/03/30/ciencia/noticia/o-deserto-do-sara-esta-a-expandirse-1808479

Aponte as questões relacionadas entre alterações climáticas e as fronteiras do Saara e as diferenças entre as mudanças do Saara
na Antiguidade e no contexto atual.

2. Era muito comum, no trá;co transatlântico, negros que foram capturados para serem escravos nas Américas se jogarem das
pequenas embarcações que os levavam para os navios negreiros ou “tumbeiros”, optando por se afogar a abandonar a terra dos
antepassados, além de várias culturas identi;carem o oceano como a residência dos mortos. Por que os europeus não atracavam
mais perto do litoral para evitar as fugas e suicídios desses africanos capturados?

3. Veja a reportagem a seguir e responda,

- A paisagem do deserto é homogênea?

- O que é ser nômade, segundo aqueles que foram entrevistados?

https://www.youtube.com/watch?v=1Bk5tO5zdjQ

Notas

Antes da Era Comum 1

A partir de agora, usaremos a abreviatura AEC. Essa nomenclatura é a usada quando abordam-se as histórias de sociedades
de pluralidade religiosa).
SILVÉRIO, V. R. (org.). Síntese da coleção História Geral da África: Pré-história ao século XVI. Brasília: UNESCO, MEC, UFSCar,
2013.

VISENTINI, P. F.; RIBEIRO, L. D. T.; PEREIRA, A. D. História da África e dos africanos. Petrópolis: Vozes, 2014

Próxima aula

• Identi;car os aspectos políticos, econômicos e culturais do Egito na Antiguidade;

• Analisar as relações políticas e econômicas entre o Egito e a Núbia;

• Demonstrar as dinâmicas internas do Reino de Cuxe e do Reino de Axum.

Explore mais

• No livro indicado a seguir há artigos interessantes sobre esta aula e as futuras. O material pode ser gratuitamente baixado
pelo link ou por meio impresso nas livrarias: http://books.scielo.org/id/yf4cf/pdf/macedo-9788538603832.pdf

• MACEDO, J. R. (org.). Desvendando a história da África. Porto Alegre: UFRGS, 2008.

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