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Blefarite secundária a pênfigo foliáceo em cão: relato de dois casos /


Blepharitis secondary to pemphigo foliaceous in dog: report of two cases

Article · December 2021


DOI: 10.34188/bjaerv4n4-126

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4 authors, including:

Mirela Tinucci-Costa
São Paulo State University
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Brazilian Journal of Animal and Environmental Research 6441
ISSN: 2595-573X

Blefarite secundária a pênfigo foliáceo em cão: relato de dois casos

Blepharitis secondary to pemphigo foliaceous in dog: report of two cases


DOI: 10.34188/bjaerv4n4-126

Recebimento dos originais: 20/08/2021


Aceitação para publicação: 25/09/2021

Igor Luiz Salardani Senhorello


Doutor em Medicina Veterinária pela Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da
Universidade Estadual Paulista Campus de Jaboticabal
Instituição: Universidade Vila Velha-UVV
Endereço: Avenida Comissário José Dantas de Melo, 21 - Boa Vista II, Vila Velha - ES, 29102-
920
E-mail: igor.senhorello@uvv.br

Alynne Nunes Bertolani


Médica Veterinária pela Universidade Vila Velha-UVV
Médica Veterinária Autônoma
E-mail: alynnebertolani@hotmail.com

Isabela Cristina Canavari


Doutora em Medicina Veterinária pela Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da
Universidade Estadual Paulista Campus de Jaboticabal
Instituição: Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista
Campus de Jaboticabal
Endereço: Via de Acesso Professor Paulo Donato Castelane Castellane S/N - Vila Industrial,
14884-900
E-mail: isabelacanavari@yahoo.com.br

Mirela Tinucci-Costa
Doutora em Patologia Experimental pela Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo.
Instituição: Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias da Universidade Estadual Paulista
Campus de Jaboticabal
Endereço: Via de Acesso Professor Paulo Donato Castelane Castellane S/N - Vila Industrial,
14884-900
E-mail: mirelatcvet@gmail.com

RESUMO
As dermatopatias imunomediadas são aquelas que decorrem da produção de anticorpos ou da
ativação de linfócitos contra algum componente próprio da pele. São doenças pouco observadas na
rotina da clínica de pequenos animais, sendo mais frequente em cães do que em gatos. Esse trabalho
tem por objetivo relatar dois casos de pênfigo foliáceo em cães causando blefarite, demonstrando
os sinais clínicos, tratamento e prognóstico dos dois animais. Foram atendidos no Hospital
Veterinário - FCAV/UNESP de Jaboticabal dois pacientes caninos, uma fêmea poodle de 11 anos e
um Golden Retriever macho de três anos, ambos com sinais de blefarite bilateral com presença de
crostas, alopecia e eritema. Em ambos os casos foram realizados exames hematológicos,
bioquímicos séricos e dermatológicos sem alterações dignas de nota e o diagnóstico só pôde ser
obtido através da biópsia cutânea com posterior exame histopatológico que confirmou o diagnóstico
de blefarite imunomediada secundária a pênfigo foliáceo pela presença de acantólise

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intraepidérmica. Foi instituído tratamento imunossupressor sistêmico com prednisona e associado


ao tratamento tópico com pomada oftálmica de tacrolimus, onde os dois pacientes apresentaram
uma boa resposta clínica. O prognóstico para ambos os casos foi excelente e após três anos de
acompanhamento todos pacientes apresentavam-se em remissão completa da doença.

Palavras-chave: blefarite, cão, dermatopatia, imunomediada, pênfigo

ABSTRACT
Immunomediated dermatopathies are those that result from the production of antibodies or the
activation of lymphocytes against some skin's own component. Are diseases litle observed in the
routine of the small animal clinic, being more frequent in dogs than in cats. This work aims to report
two cases of pemphigus foliaceus in dogs causing blepharitis, demonstrating the clinical signs,
treatment and prognosis of the two animals. Two canine patients, a 11-year-old female poodle and
a 3-year-old male Golden Retriever, were seen at the Veterinary Hospital - FCAV/UNESP in
Jaboticabal, both with signs of bilateral blepharitis with the presence of crusts, alopecia and
erythema. In both cases were performed hematological, serum biochemical and dermatological
examinations without significant changes and the diagnosis could only be obtained through skin
biopsy with subsequent histopathological examination that confirmed the diagnosis of
immunomediated blepharitis secondary to foliaceous pemphigus by the presence of intraepidermal
acantholysis. Was instituted systemic immunosuppressive treatment with prednisonea and
associated with topical treatment with tacrolimus ophthalmic ointment, on what both patients
presented a good clinical response. The prognosis for both cases was excellent and after three years
of follow-up, all patients were in complete remission of the disease.

Keywords: blepharitis, dog, dermatopathy, immunomediated, pemphigus

1 INTRODUÇÃO
A dermatologia veterinária é uma área em expansão nos últimos anos, refletindo assim sua
importância na rotina clínica de pequenos animais. Diferentes estudos demonstram que afecções do
sistema tegumentar são responsáveis por cerca de 30% dos atendimentos clínicos de cães e de gatos
(Hill et al., 2006; Motiin et al., 2008; Cardoso et al., 2011).
As doenças imunológicas da pele são classificadas em autoimunes ou primárias e
imunomediadas ou secundárias. As afecções cutâneas imunomediadas parecem ser resultantes de
um evento imunológico que não age diretamente contra os autos antígenos, não sendo, portanto, a
pele o antígeno primário (Scott, 2001). Já as dermatoses cutâneas autoimunes são decorrentes da
produção de anticorpos ou da ativação de linfócitos contra os componentes próprios da pele (Val,
2006).
Pênfigo é o termo usado para descrever um grupo de doenças bolhosas autoimunes
mucocutâneas raras, caracterizadas por bolhas e/ou pústulas flácidas, com erosões secundárias das
membranas mucosas e/ou pele (Hertl et al., 2015; Murrell et al., 2020). O complexo pênfigo está
classificado em profundo (paraneoplásico, vulgar e vegetante) e pênfigo superficial (eritematoso e
o foliáceo). O pênfigo foliáceo é uma dermatopatia autoimune caracterizada pela deposição de

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anticorpos nos componentes de adesão que formam a epiderme mais especificamente as


desmogleínas-1, causando sua destruição e por vezes formação de pústulas levando a um processo
chamado acantólise. Clinicamente, ocorre a formação de pústulas, mas, como são muito frágeis, as
lesões geralmente encontradas são as secundárias, e estas variam de crostas secas, colaretes
epidérmicos, pápulas, escamas a alopecia (Balda et al., 2008; Olivry, 2018).
As dermatoses autoimunes são pouco frequentes em cães e gatos, representando de 1% a 2%
dos diagnósticos dermatológicos de pequenos animais (Scott et al., 2001; Hill et al., 2006; Bianchi
et al., 2008; Souza et al., 2009; Lupion et al., 2017). O pênfigo foliáceo apesar de raro, representa
uma das doenças autoimunes mais frequentemente observada na rotina de atendimento
dermatológico veterinário, acometendo várias espécies como cães, gatos, cavalos e até mesmo
cobras, bovinos, ovelhas e porcos, sendo mais comum em cães (Macêdo et al., 2008; Medleau et al.,
2003; Pereira et al.; 2018; Scott, 2001; Olivry, 2018).
A doença acomete mais frequentemente cães de meia idade (Balda et al., 2008), nenhuma
predileção por sexo foi relatada (Olivry, 2006; James et al., 2011) e tem maior prevalência nas raças
Akita, Border Collie, Chow Chow, Dachshund, Dobermann e Terra Nova (Barbosa et al., 2012).
O diagnóstico é difícil por apresentar sintomatologia semelhante com outras doenças e é
feito através da observação do histórico clínico, anamnese, exames complementares como citologia
da pele lesionada e histopatológico das lesões, sendo este o de eleição (Larsson et al., 1998; Scott,
2001; Balda et al., 2008; Barbosa et al., 2012; Patel & Forsythe., 2010). Como diagnósticos
diferencias do pênfigo foliáceo podemos destacar as demais enfermidades do complexo pênfigo,
foliculite bacteriana, leishmaniose cutânea, dermatofitose, diferentes enfermidades seborreicas,
piodermite superficial, entre outras afecções cutâneas (Arroyo-Munive et al., 2018; Barbosa et al.,
2012).
O tratamento é longo e baseia-se em imunossuprimir o animal com a finalidade de diminuir
a produção de autoanticorpos. A monoterapia com Prednisolona é uma das estratégias de tratamento
mais comum (Bizikova et al., 2019). Entretanto, outros princípios ativos podem ser utilizados, tais
como Ciclosporina, Azatioprina, Clorambucil, Tetraciclina e Tracolimus tópico (Simpson et al.,
2019).
O prognóstico do pênfigo varia de bom a reservado, de acordo com o estágio da doença e
devido as complicações do uso prolongado de corticosteroide ou outros imunossupressores, sendo
indicado acompanhar o animal com exames laboratoriais a fim de avaliar estes possíveis efeitos
colaterais (Olivry, 2018).
Levando em consideração que a doença autoimune é um achado pouco frequente na clínica
de pequenos animais, objetivou-se relatar dois casos de cães com blefarite secundária a pênfigo

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foliáceo atendidos no Hospital Veterinário da FCAV/UNESP – Jaboticabal, na cidade de São Paulo,


Brasil.

2 RELATO DE CASO
Foram atendidos no Hospital Veterinário da Faculdade de Ciências Agrárias e Veterinárias,
uma faculdade pertencente à Universidade Estadual Paulista, localizada em Jaboticabal, São Paulo,
uma cadela da raça Poodle, com 11 anos de idade e um cão da raça Golden Retriever, com três anos
de idade. A cadela apresentava lesões com evolução de dois meses e já havia sido tratada com colírio
a base de sulfato de neomicina, dexametasona e sulfato de polimixina B (Maxitrol®) sem sucesso e
o cão apresentava evolução das lesões de apenas um mês, porém não havia sido submetido a nenhum
tratamento. Ambos com sinais de blefarite bilateral, apresentando alopecia, eritema e edema, além
de lesões pustulares e crostosas, hiperqueratose, secreção purulenta e prurido perioculares (Figura
1). O cão apresentava ainda lesões semelhantes na região lateral das narinas.
Ao exame físico geral não foram observadas alterações nos parâmetros vitais, auscultação
cardiopulmonar e palpação abdominal, estando as alterações limitadas a pele e mucosas.

Figura 1. Lesões encontradas nos pacientes (seta vermelha). Cães com sinais de blefarite apresentando alopecia, eritema
e edema, além de crostas e hiperqueratose.

Foram solicitados exames complementares hematológicos e bioquímicos (creatinina, ureia,


alanino amino transferase (ALT), albumina e proteínas totais) para ambos os casos e
ultrassonografia abdominal e radiografia de tórax para a cadela. Os resultados dos exames
hematológicos e bioquímicos apresentaram-se dentro dos valores de referência para espécie e não
foram observadas alterações dignas de nota no ultrassom abdominal e raio-x de tórax da cadela.
Também foram realizados exames dermatológicos, nos quais raspado de pele e citologia por
decalque (imprint das lesões), que não evidenciaram a presença de ácaros e identificaram apenas a
presença de células inflamatórias com presença de neutrófilos e plasmócitos (imprint).

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Diante dos resultados dos exames de triagem optou-se pela realização da biópsia incisional
das lesões e análise histopatológica. A avaliação histopatológica dos tecidos de ambos os casos foi
semelhante, revelando hiperqueratose lamelar, deposição de crostas neutrofílicas, com região
intraepidérmica destacando células acantólicas em suas camadas superficiais. Entre a derme e os
anexos cutâneos, foi observado intenso infiltrado linfoplasmocitário e não foram observados
parasitas ou estruturas fúngicas.
Observando o quadro clínico dos pacientes e através das alterações encontradas nesses
exames, concluiu-se o diagnóstico de blefarite imunomediada, mais especificamente,
sugerindo pênfigo foliáceo.
Para o tratamento, foi instituída a corticoterapia imunossupressora com Prednisona 2mg/kg
a cada 12 horas (BID), durante 15 dias, seguida da diminuição gradativa da medicação a cada 15
dias, sempre após reavaliação dos animais. Associado ao tratamento sistêmico, foi realizada terapia
tópica com a pomada oftálmica de Tracolimus 0,03% a cada 12 horas (BID). Após a melhora clínica
do quadro, que demorou 45 dias para a cadela e 60 dias para o cão, somente o tratamento tópico
impediu a recidiva dos sinais clínicos e com isso manteve-se a pomada oftálmica por 4 meses após
a resolução clínica (Figura 2). Após três anos de acompanhamento, em ambos os casos os animais
apresentam remissão completa das lesões.

Figura 2. Pacientes após o tratamento com Prednisona e Tracolimus 0,03%, apresentando melhora significativa do
quadro clínico (seta vermelha).

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3 DISCUSSÃO
Em cães, o pênfigo foliáceo representa a doença cutânea autoimune mais comum. Sendo
caracterizada por pústulas superficiais que afetam predominantemente a face, o plano nasal e as
orelhas (Bizikova et al., 2014). Blefarites imunomediadas podem ocorrer, conforme observado nos
dois casos, pois as pálpebras apresentam extensa irrigação sanguínea, linfática e presença de
inúmeras células do sistema imune.
No caso do pênfigo foliáceo, o processo imunomediado ocorre devido a uma reação de
hipersensibilidade do tipo II, mediada por anticorpos IgG (Olivry, 2006). No entanto, a causa não
está bem estabelecida, pois o desenvolvimento de tal doença sofre influência de diversos fatores
genéticos relacionados à raça do animal e outros, tais como fármacos, alimentação e infecções virais
pré-existentes (Tater & Olivry, 2010). O timoma tem sido associado a uma variante de doenças
autoimunes em humanos, gatos e cães, incluindo diferentes variantes do pênfigo (Olivry et al., 2009;
Takeshita et al., 2000; Hill et al., 2013). Em ambos os casos os fatores tais como fármacos, infecções
virais ou neoplasias não foram relacionadas a doença, diante do histórico e exames complementares.
A doença acomete mais frequentemente cães de meia idade (Balda et al., 2008), nenhuma
predileção por sexo foi relatada (Olivry, 2006; James et al., 2011) e tem maior prevalência nas raças
Akita, Border Collie, Chow Chow, Dachshund, Dobermann e Terra Nova (Barbosa et al., 2012).
Em estudo retrospectivo realizado em agosto de 2000 a julho de 2005, em 43 casos, pode-se
confirmar prevalência em cães de meia idade, sendo que 53,5% (23/43 casos) tinham 4 a 9 anos e
35% (14/43 casos) tinham de 1 a 3 anos. A predisposição sexual não foi relatada, tendo em vista
que houve valores percentuais muito próximos quanto a ocorrência entre machos e fêmeas, sendo
que 44, 2% eram machos e 55,8% eram fêmeas. Já com relação as raças houve predileção por cães
de raça definida, com cerca de 76,7% dos animais atendidos (33/43 casos), sendo as quatro raças
mais acometidas: Cocker Spaniel (9/43 casos – 27,3%), Dachshund (4/43 casos – 12,1%), Poodle
(4/43 casos – 12,1%) e Akita (3/43 casos – 9,1%). (Balda et al., 2008)
Os cães do relato em questão são uma Poodle, fêmea de 11 anos de idade e um Golden
Retriever, macho de três anos de idade, raças que não são citadas como de maior prevalência
segundo a literatura, apesar da raça Poodle ter uma aparição significativa no estudo citado
anteriormente. Entretanto, são de raça pura e de ambos os sexos o que vai de encontro com as
informações da literatura (Olivry, 2006; James et al., 2011). Em relação a idade, nos mostra que
apesar da doença acometer mais comumente cães de meia idade, também pode ser observada em
cães idosos.
Segundo Scott (2001), o pênfigo foliáceo se caracteriza por ser uma dermatite pustular de
caráter intraepidérmica. As pústulas formadas no pênfigo foliáceo são muito frágeis, pois a

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acantólise ocorre nas camadas mais superficiais da epiderme, locais com maior expressão da
desmogleína-1 (Balda et al., 2008). Quando as pústulas se rompem, em seu lugar ficam as lesões
secundárias, que podem variar em erosões superficiais, crostas, escamas, colaretes epidérmicos e
alopecia (Val, 2006; Balda et al., 2008; Medleau & Hnilica, 2009), o que foi observado nos cães
acompanhados no presente relato. Também pode haver prurido de grau moderado a intenso, o que
ocorreu nos pacientes do relato, os quais apresentavam prurido periocular (Barbosa et al., 2012;
Larsson et al., 1998).
As lesões podem apresentar-se localizadas ou generalizadas e acometem normalmente a
face, plano nasal, área auricular, região abdominal e, em alguns casos, os coxins plantares (Barbosa
et al., 2012; Frávega., 2012; Mueller et al., 2006). Nos casos em tela podemos observar
acometimento da região periocular, o que segundo estudo retrospectivo realizado por Balda et al
(2008) nos mostra que não é a área de maior acometimento, sendo a região dorsal (95,3%), região
abdominal ventral (93%) e região axilar (83,7%) como as mais acometidas. Mas ainda assim, a
região periocular tem grande relevância, acometendo 46,5% dos animais atendidos nesse mesmo
estudo.
A doença é gradualmente progressiva em 75% dos cães, apresentando evolução em menos
de três meses em 25% (Thompson, 1997). Manifestações sistêmicas, como febre, dor, depressão,
claudicação, edema, linfadenopatia e leucocitose neutrofílica podem ocorrer nas formas graves e
generalizadas e é possível ocorrer infecção bacteriana secundária (Larsson et al., 1998; Olivry &
Linder, 2009). Em cães, apenas dois estudos fornecem informações sobre sinais sistêmicos, com um
relatando que um terço dos cães apresenta sinais de letargia, e o outro mencionando que os sinais
sistêmicos geralmente acompanhavam apenas a doença grave e mais generalizada (Bizikova et al.,
2019). Os pacientes apresentaram apenas lesões cutâneas sem quaisquer sinais de envolvimento
sistêmico, isso provavelmente se deve a apresentação clínica da doença e o pouco tempo de evolução
em ambos os casos.
O diagnóstico é realizado com base na histórica clínica do paciente, nos sinais clínicos da
doença, nos resultados de exames complementares, tais como, citologia e histopatologia das
pústulas presentes na pele, onde é possível se evidenciar células acantolíticas soltas na epiderme,
esféricas e com hipercromasia nuclear, sendo denominadas células de Tzank, além de ausência de
bactérias, na maioria dos casos (Balda et al., 2008; Barbosa et al., 2012; Olivry, 2006). Pode-se
realizar testes imunológicos, mas devido ao seu custo a sua utilização ainda não é uma realidade
(Paulo et al., 2016). Nos casos do presente relato, foram realizados exames dermatológicos, sendo
eles: raspado de pele e citologia por decalque, onde foram identificadas a presença de células
inflamatórias, mas não foram identificadas a presença de células acantolíticas. Nos apresentando

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assim, um resultado diferente do que encontramos na maioria da literatura. Porém, em estudo mais
recente feito com 162 gatos com pênfigo foliáceo, a acantólise foi confirmada histologicamente em
146 de 162 gatos (90%) e somente em 31 de 162 gatos (19%) teve a acantólise confirmada por
avaliação citológica (Bizikova et al., 2019).
Poderíamos ter como principal diagnóstico diferencial os pênfigos profundos (pênfigo
vulgar, pênfigo vegetante e pênfigo paraneoplásico). Nesses casos os autoanticorpos têm como alvo
os desmossomos nas camadas profundas da epiderme e na histopatologia encontraríamos acantólise
suprabasal (Tham et al., 2020). Na pele, desmogleína-1 é expresso em toda a epiderme, porém mais
intensamente nas camadas superficiais, enquanto desmogleína-3 é expresso nas camadas mais
profundas, ou seja, camada basal (pênfigo profundo). Quando proteínas alvos autoanticorpos em
desmossomos expressos superficialmente (ou seja, desmogleína-1 e/ou desmocolina-1) restrito às
camadas granulares e/ou espinhosas superiores da epiderme, se desenvolve o pênfigo foliáceo, que
é um pênfigo superficial, afetando apenas a pele e não as mucosas (Spindler et al., 2018).
O exame histopatológico é o de eleição para o diagnóstico de pênfigo foliáceo (Larsson et
al., 1998; Scott, 2001; Balda et al., 2008). Segundo Harvey e Mckeever (2004) o exame
histopatológico de amostras de biópsia é diagnóstico em cerca de 80% dos casos e também exclui
quase todos os diagnósticos diferenciais, assim como foi observado no presente relato, onde somente
após a realização da biópsia incisional, a qual revelou hiperqueratose lamelar, deposição de crostas
neutrofilicas, com a epiderme destacando células acantólicas, concluímos o diagnóstico. Somado ao
resultado dos exames hematológicos que não apresentaram alteração e ao intenso infiltrado
linfoplasmático que foi observado entre a derme e os anexos cutâneos.
O tratamento do pênfigo foliáceo é longo e se baseia na administração de drogas
imunossupressoras (Barbosa et al., 2012; Olivry, 2006). Os glicocorticoides isolados ou em
combinação com imunossupressores não esteroidais são as classes de medicamentos mais
comumente usada para indução do controle da doença. A monoterapia com Prednisolona é uma das
estratégias de tratamento mais comum (Bizikova et al., 2019). O tratamento instituído no relato foi
a administração de Prednisona (2mg/kg) por via oral a cada 12 horas (BID), durante 15 dias, seguida
da diminuição gradativa da medicação. Segundo Medleau et al. (2003) e Lucarts (2010) deve-se
manter o uso, diminuindo gradativamente a dose, de acordo com a melhora das lesões do paciente,
até que seja atingida a dose mínima efetiva, preferencialmente em dias alternados. Dentre os cães
penfigosos, apenas 20-40% respondem bem ao uso isolado dos corticoides (Ihrke et al., 1985; White,
2000; Mueller et al., 2006).
O tratamento do pênfigo foliáceo envolve terapias imunossupressoras, como
Glicocorticoides, Ciclosporina, Azatioprina, Clorambucil, Tetraciclina e Tracolimus tópico

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(Simpson et al., 2019), como nos casos em questão, onde foi associado o tratamento tópico com
pomada oftálmica de Tracolimus 0,03% a cada 12 horas (BID) e após melhora clínica do quadro,
somente o tratamento tópico impediu a recidiva dos sinais clínicos, uma vez que é um
imunomodulador potente, o qual reduz o tempo de utilização das medicações sistêmicas e seus
possíveis efeitos adversos. Em estudo recente, mostra-se o resultado satisfatório do uso de
glicosaminoglicano polissulfatato em três cães, nos quais o uso de tal medicamento parece ser um
tratamento adjuvante bem tolerado, que junto com outras terapias imunomoduladoras também
podem permitir a redução de necessidade de glicocorticoides para manter a remissão da doença
(Simpson et al., 2019).
Apesar dessas opções de tratamento, observa-se que o pênfigo foliáceo diminui a qualidade
de vida de pacientes caninos e pode resultar em eutanásia como um resultado de complicações da
doença e dos efeitos adversos terapêuticos, como poliúria, polidipsia, letargia, ganho de peso e
atrofia muscular (Simpson et al., 2019). Deve-se sempre considerar possíveis efeitos colaterais,
como anemia, sangramento gastrointestinal e hepatotoxicidade, além da ocorrência de pancreatite
aguda relatados por outros autores (Mueller et al., 2006; Rosenkrantz, 2004). Além disso, infecções
secundárias bacterianas na pele e na bexiga são comuns, assim como dermatofitose e demodicose
(Medleau & Hnilica, 2009). Nos dois casos relatados não foi preciso realizar a associação de
imunossupressores sistêmicos com a corticoterapia, pois os animais apresentaram boa resposta com
a associação do Tracolimus, reduzindo assim o uso de medicações sistêmicas e minimizando os
efeitos colaterais.

4 CONCLUSÃO
O pênfigo foliáceo é uma doença autoimune de grande importância na dermatologia de
pequenos animais, sendo a forma mais comum de pênfigo e provavelmente a doença autoimune
mais frequente em cães, apesar de não ser comumente diagnosticada. Porém, é importante que o
clínico inclua esta patologia em seus diagnósticos diferencias, diante de sinais clínicos como os
apresentados nestes relatos de casos, principalmente quando não são responsivos a tratamentos
anteriormente realizados. O pênfigo foliáceo quando diagnosticado precocemente pode ter uma boa
resposta ao tratamento, como ocorreu nos casos relatados. Seu diagnóstico deve ser feito em
somatória com o histórico clínico, avaliação física e exames laboratoriais, sendo o exame
histopatológico o exame de eleição, o qual foi determinante para elucidação do diagnóstico nos
casos relatados. Seu tratamento se baseia em imunossuprimir o animal com medicamentos à base
de corticoide havendo também a possibilidade de associar a outras classes medicamentosas e a
terapia tópica, que minimiza o uso de medicações sistêmicas e seus efeitos colaterais.

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REFERÊNCIAS

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foliáceo en un Pinscher. Reporte de un caso. Revista Veterinária y Zootecnia, 12(2):62-70.
Balda, A. C., Otsuka, M., Larsson Júnior, C. E., Michalany, N. S. & Larsson, C. E. (2008). Pênfigo
foliáceo canino: estudo retrospectivo de 43 casos clínicos e terapia (2000-2005). Pesquisa
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