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SCOTT, Rebecca J. Emancipação escrava em Cuba. A transição para o trabalho livre. 1860-1899.

Rio de Janeiro: Paz e Terra; Campinas: Editora da UNICAMP, 1991.

Prefácio (p. 17-20)


No Prefácio, a autora assinala a complexidade das relações entre senhor e escravo no processo de
abolição em Cuba. Destaca a situação dos patrocinados, observando que eles não foram objeto
passivo da atuação dos projetos gradualistas, pelo contrário, agiram visando acelerar a transição.
Para Scott, o desenrolar do processo de abolição permite penetrar na estrutura da escravidão cubana,
e isso a permitiu questionar diversos aspectos consagrados na bibliografia sobre o tema (em especial
Moreno Fraginals), assim como questionar as diferentes explicações para a decadência do sistema
escravista. Propõe-se a colocar a escravidão em perspectiva comparativa com outras experiências de
trabalho. Observa ainda que a emancipação, em Cuba, representou um êxito econômico na medida
em que a produção açucareira cresceu, e que no caso em questão a luta anti-colonial e anti-
escravista foram concomitantes e se sobrepuseram.

Introdução

I – Açúcar e escravidão (p. 23-53)


Para abordar o término da escravidão em Cuba, analisa o caráter dessa escravidão. Ao invés das
interpretações usuais - como processo político resultante de pressões anti-escravistas sobre a
Espanha, ou de uma suposta crise estrutural do trabalho escravo perante a sua incapacidade de
corresponder ao desenvolvimento tecnológico, sem oposição da elite dominante, ou ainda uma
combinação de ambas, com o governo colonial atendendo às necessidades da elite – Scott propõe-se
a levar em conta o aspecto da ação de escravos, libertos e insurgentes (um “termo ausente” nas
explicações anteriores). Ao longo do capítulo argumentará contra a hipótese de contradições
internas insanáveis na sociedade cubana de então. Há uma breve descrição de Cuba e sua produção
açucareira, aspectos demográficos (negros minoritários; escravos e significativos forros). Fala da
discriminação social sofrida pelos forros: por um lado encarados como elemento de perigo e
desequilíbrio pela elite colonial, por outro tentando afastar-se da mácula de um passado escravo.
Assinala ser estéril debater se a escravidão cubana foi ou não severa e observa diversos aspectos
que vem sendo analisados e observados também na historiografia brasileira: a importância de
pequenos proprietários de escravos; diversidade de suas formas de trabalho; gradual auto-resgate
(coartación = aquisição da alforria); possibilidade de uma economia, espaços de cultivo e
transações próprias dos escravos (embora sempre assinale as relações de poder intrínsecas);
formação de famílias (assinala dificuldades e limitações, e tampouco quer desfazer a imagem
devastadora do desenraizamento, mas não nega possibilidades de criação de novos vínculos – a
idéia do apesar lembra o Gutman1). Aponta o cuidado a ser tomado para não generalizar as
condições de tratamento dos escravos nos maiores engenhos. Apresenta dados sobre a produção de
açúcar em Cuba, tanto em termos cronológicos como geográficos. Discute, finalmente, as técnicas
agrícolas, analisando a suposta incompatibilidade de desenvolvimento tecnológico e escravidão.
Simplesmente apresenta evidências de uso de maquinaria pelos escravos. Relativiza, por fim, a
distinção trabalho escravo X trabalho livre, analisando o caráter formal de sua liberdade, seja do
ponto de vista da remuneração ou do tratamento a eles dispensado. Atribui a presença de chineses
em atividades tecnológicas a outros fatores. Segundo Scott, os dados disponíveis não permitem a
realização de uma comparação entre lucratividade relativa do trab. escravo e livre em Cuba. Por
fim, enumera fatores que colocaram a escravidão cubana em xeque (decadência do tráfico
transatlântico, abolição nos EUA). Menciona ainda o surgimento de perspectivas reformistas /
gradualistas em Cuba e as primeiras propostas sobre a emancipação junto à Espanha, na década de
1860.

Parte I – Conflito, adaptação e contestação – 1868-1879

II – Insurreição e escravição (p. 63-76)


1
nesse ponto e anterior – discussão direta com Fraginals.
Scott discute a questão da escravidão entre os revoltosos de 1868. Plantadores descontentes com os
tributos cobrados pela Espanha se insurgiram. Eles adotaram uma postura hesitante perante a
questão da escravidão. Considerando que o contingente populacional escravo era relevante em
termos militares, determinaram a abolição e seu engajamento nas forças rebeldes. Por um lado
libertaram seus escravos, porém condenaram à morte quem os incitasse à rebelião. A autora traz
diversos exemplos (trabalha com processos / sumárias criminais) das tensões decorrentes daquele
momento, quais sejam, a expectativa de manutenção de vínculos de dependência e de ausência de
mobilidade, por parte dos senhores, e a aspiração por autonomia, circulação e acesso à terra por
parte dos escravos. A partida era encarada como fuga. “Embora seja evidente que muitos oficiais
rebeldes pretendiam continuar tratando libertos como escravos, é também evidente que muitos
libertos não tinham intenção de continuar se comportando como escravos” (p. 66-67). Assinala,
portanto, a ambigüidade da categoria libertos, as tensões sociais resultantes da nova mobilidade, a
formação de comunidades assemelhadas às marroons2, e ainda a divisão étnica (termos dela)
criollos X africanos. Os espanhóis assinalaram a elevada quantidade de ex-escravos entre as forças
rebeladas, mas isso partia de um interesse político em caracterizá-la como uma luta racial; dentro do
exército os ex-escravos eram relegados a posições secundárias.

III – A Espanha reage: a Lei Moret (p. 79-97)

2
Majoritariamente de mulheres. Texto: “Alguns acabavam indo para as colinas, onde constituíam pequenas
comunidades. (...) composta quase inteiramente de negros e predominantemente mulheres (...) no interior da
comunidade a propriedade era privada: 'Cada um é senhor absoluto do que reúne, e distribui como melhor lhe parece
os produtos do seu trabalho' . O jornalista não supunha que os ex-escravos tivessem qualquer noção de propriedade,
mas, dada a tradição do cultivo de conucos e a criação de animais, isso parece ser perfeitamente explicável. Essas
instalações, embora oficialmente administradas por prefeitos rebeldes, parecem ter tido muito em comum com as
comunidades marroons, sociedades que por longo tempo existiram nos montes do oriente cubano formadas por
escravos fugidos” (p.67)

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