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Interação Psicol., Curitiba, v. 18, n. 2, p. 191-202, maio/ago.

2014 191

Intervenções Comportamentais no Ensino de Atenção Conjunta para


Crianças com Autismo: Uma revisão de literatura

Flávia Teresa Neves Silva Bacelar *


Carlos Barbosa Alves de Souza
Universidade Federal do Pará, Belém, Brasil

RESUMO
Este trabalho revisou estudos baseados na metodologia e procedimentos da Análise do
Comportamento que investigaram o ensino da atenção conjunta (AC) para crianças com
autismo, procurando descrever e analisar as variáveis envolvidas no ensino de resposta de
atenção conjunta (RAC) e de iniciação de atenção conjunta (IAC). Foram avaliados:
componentes da AC e classes de respostas de RAC e IAC treinados; procedimentos utilizados;
estímulos discriminativos e reforçadores usados; participação de familiares; e resultados de
aquisição e generalização. Os resultados da revisão mostraram o sucesso em estabelecer RAC e
IAC através de procedimentos comportamentais e apontam quais estratégias podem favorecer a
manutenção e generalização desses repertórios. Sugere-se a necessidade de estudos que
avaliem a relação entre AC e operantes verbais básicos.
Palavras-chave: atenção conjunta; autismo; procedimentos comportamentais.

ABSTRACT
Behavioral interventions for teaching joint attention to children with autism:
A literature review
This paper reviewed studies based on Behavior Analysis methodologies and procedures that
investigated the teaching of joint attention (JA) for children with autism, trying to describe and
analyze the variables involved in teaching joint attention responses (JAR) and initiation of joint
attention (IJA). The following aspects were evaluated: JA components and responses classes
for JAR and IJA trained; procedures used; discriminative stimuli and reinforcers used; family
participation, and; results for acquisition and generalization. The results of the review showed
the success in establishing RJA and IJA through behavioral procedures and indicated some
strategies that may favor the maintenance and generalization of these repertoires. Futures
studies should be carried out to investigate the relationship between JA acquisition and basic
verbal operants.
Keywords: joint attention; autism; behavioral procedures.

O autismo é considerado um transtorno do de- de interesse presente no ambiente (Morales et al.,


senvolvimento, caracterizado por déficits e exces- 2000; Mundy et al., 2007; Mundy & Newell, 2007;
sos comportamentais que afetam a interação social White et al., 2011). Tem sido proposto que a habi-
e a comunicação (DSM 5 - American Psychiatric lidade de AC é composta por respostas de atenção
Association, 2013). Pessoas com autismo geral- conjunta (RAC) e iniciação de atenção conjunta
mente apresentam déficits de atenção conjunta (IAC). A RAC se refere à resposta da criança de
(AC), o que é apontado como uma das causas de seguir a direção para onde aponta ou olha outra
pessoa. A IAC se refere aos comportamentos de
suas dificuldades linguísticas (Charman, 2003;
contato visual, apontar ou demonstração que a
Tager-Flusberg, Paul, & Lord, 2005; Tsatsanis,
criança emite de forma intercalada de uma pessoa
2005; Whalen, Schreibman, & Ingersoll 2006).
para um objeto ou evento (ou vice-versa) (Mundy
A AC tem sido caracterizada na perspectiva da et al., 2007; Mundy et al., 2003; Mundy & Ne-
psicologia do desenvolvimento como a capacidade well, 2007). De maneira geral, tem sido apontada
de compartilhar com o outro um evento ou objeto uma maior facilidade em ensinar RAC do que IAC

* Endereço para correspondência: Flávia Teresa Neves Silva Bacelar – flavia.psi@gmail.com


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para pessoas com autismo (Meindl & Cannella- nhuma revisão sistemática dessa literatura que
Malone, 2011; White et al., 2011). permita uma análise mais precisa das variáveis
Na última década vem se desenvolvendo uma envolvidas no ensino de AC para pessoas com
caracterização analítico-comportamental da AC em autismo, desde uma perspectiva analítico-compor-
termos das relações funcionais estabelecidas entre tamental.
situações discriminativas, comportamentos e suas Este trabalho revisou estudos baseados na me-
consequências (Dube, MacDonald, Mansfield, todologia e procedimentos da Análise do Compor-
Holcomb, & Ahearn, 2004; Holth, 2005; Klein, tamento que investigaram o ensino da AC para
MacDonald, Vaillancourt, Ahearn, & Dube, 2009; crianças com autismo, procurando descrever e
MacDonald et al., 2006). Por exemplo, Dube et al. analisar as variáveis envolvidas no ensino dos
(2004) sugeriram que IAC e RAC são repertórios componentes da AC. Foram avaliados os seguintes
funcionalmente diferentes no processo inicial de aspectos: A. Componente da AC treinado (RAC
aquisição. Na RAC a interação é iniciada pelo e/ou IAC); B1. Classes de respostas de RAC trei-
adulto que emite um mando1 (Skinner, 1957/1992) nadas; B2. Classes de respostas de IAC treinadas;
ao apontar ou olhar para um objeto/evento (ou C. procedimentos específicos utilizados (e.g. tenta-
também combinando essas respostas com vocali- tiva discreta; treino de resposta pivotal); D. Estí-
zações), e a resposta de atenção da criança ao estí- mulos discriminativos e reforçadores empregados;
mulo é caracterizada como uma obediência instru- E. Participação de familiares no procedimento; e F.
cional (ver Greer & Ross, 2008) mantida por refor- Resultados de aquisição e generalização.
çadores generalizados. Na IAC, o antecedente é
uma operação motivadora (OM) 2 (e.g. presença de MÉTODO
um adulto familiar e estímulos com propriedades
discriminativas ressaltadas ou incomuns) que evo- Procedimento de busca
ca a interação da criança com o adulto através da
Foi realizada uma busca sistemática nas bases
resposta de alternar o olhar entre o objeto/evento e
de dados PubMed Central e Education Resources
o adulto (gaze shift), mantida por reforçadores
Information Center (ERIC), sem restrição de perí-
sociais. Inicialmente a resposta de alternar o olhar
odo, utilizando as palavras-chave “joint attention”,
entre o adulto e o objeto/evento se caracteriza co-
“autism” e “training” como termos livres. Esse
mo uma resposta de observação, que pode produzir
procedimento resultou em 324 artigos.
uma consequência específica (ex. acesso a um
brinquedo). Na medida em que se estabelece uma
Critérios de seleção dos artigos para análise
história em que a atenção do adulto tem a função
de alterar a efetividade dos eventos reforçadores A partir da leitura dos títulos e/ou resumos de
(potencializando ou reduzindo a aversividade de- cada artigo localizado, foram selecionados para
les), a resposta da criança de monitoramento da análise aqueles que cumpriam os seguintes crité-
atenção do adulto passa a ser um comportamento rios: 1. ser um relato de pesquisa publicado em um
verbal com função de mando por reforçadores revista com revisão por pares; 2. treinar pelo me-
condicionados socialmente mediados (Dube et al., nos um dos componentes da AC; 3. ter como parti-
2004). Considerando isto, estímulos discriminati- cipantes crianças diagnosticadas com autismo; 4.
vos, reforçadores sociais, bem como operações utilizar procedimentos da Análise do Comporta-
motivadoras podem ser arranjados para tornar mento (e.g. dicas; reforçamento); e 5. exibir con-
RACs e/ou IACs mais prováveis. trole experimental (i.e. demonstrar o efeito do trei-
no no repertório do participante). Foram excluídos
A abordagem analítico-comportamental da AC
da análise os artigos que não preenchiam os cinco
tem produzido estudos experimentais que procura-
critérios listados acima.
ram ensinar os repertórios de RAC e/ou IAC para
crianças com autismo. Estes estudos utilizaram
diversos procedimentos para ensinar classes de RESULTADOS
respostas de RAC e/ou IAC e apresentaram varia- Dezoito artigos preencheram os critérios de in-
ções quanto aos resultados de aquisição e generali- clusão para análise. A Tabela 1 descreve os estu-
zação (e.g. Krstovska-Guerrero & Jones, 2013; dos considerando o perfil dos participantes, o deli-
Taylor & Hoch, 2008; Whalen & Schreibam, neamento experimental, e as variáveis selecionadas
2003). No entanto, não existe até o momento ne- para análise no presente estudo: o componente da

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AC e as classes de respostas de RAC e IAC treina- Feeley, 2006; Kasari, Freeman, & Paparella,
dos, os procedimentos específicos utilizados, os 2006).
tipos de estímulos discriminativos e reforçadores B1. Classes de Respostas de RAC: as classes de
empregados, se houve participação de familiares respostas de RAC que foram treinadas mais fre-
no procedimento, e os resultados de aquisição e quentemente nos 18 estudos foram ‘olhar para o
generalização. Na continuação, descrevemos os objeto apontado por E.’ (ex. Gulsrud et al., 2007;
resultados da análise de cada uma dessas variáveis Isaksen & Holth, 2009; Jones et al., 2006; Kasari et
nos artigos selecionados. al., 2006, 2010; Rocha et al., 2007; Taylor &
A. Componente de AC treinado: dos 18 estu- Hoch, 2008; Warreyen & Royers, 2013; Whalen &
dos analisados, nove ensinaram diretamente apenas Schreibman, 2003; Wong, 2013) e a ‘discrimina-
um dos repertórios: quatro ensinaram RAC (Klein ção da mudança no foco do olhar do adulto’ (ex.
et al., 2009; Krstovska-Guerrero & Jones, 2013; Klein et al., 2009; Martins & Harris, 2006; Rocha
Martins & Harris, 2006; Rocha, Schreibman, & et al., 2007; Warreyen & Royers, 2013; Whalen &
Stahmer, 2007) e cinco IAC (Jones, 2009; Kaale, Schreibman, 2003; Wong 2013). Em Whalen e
Smith, & Spoheim, 2012; MacDuff, Ledo, Schreibman (2003) e Isaksen e Holth (2009) a
McClannahan, & Krantz, 2007; Naoi, Tsuchiya, RAC foi instalada através de seis passos iniciados
Yamamoto, & Nakamura, 2008; Pollard, Betz, & pelo experimentador, que progrediam quanto ao
Higbee, 2012). Os nove estudos que buscaram nível de dificuldade da resposta: 1. olhar para um
ensinar ambos os repertórios apresentaram resulta- objeto colocado na mão da criança; 2. olhar para
dos díspares: aprendizagem apenas de RAC (Kasa- um objeto balançado pelo experimentador; 3. olhar
ri, Gulsrud, Wong, Kwon, & Locke, 2010; Taylor para um objeto apresentado pelo experimentador;
& Hoch, 2008; Whalen & Schreibman, 2003; War- 4. olhar para o rosto do experimentador; 5. olhar
reyn & Royers, 2013; Wong, 2013) ou de ambos em direção ao que era apontado pelo experimenta-
os repertórios (Gulsrud, Kasari, Freeman, & Papa- dor; e 6. seguir a direção do olhar do experimenta-
rella, 2007; Isaksen & Holth, 2009; Jones, Carr, & dor.

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Tabela 1
Participantes, delineamento e as variáveis analisadas nos artigos revisados no presente estudo (legenda das siglas no final da tabela)
Perfil dos Delineamento Componente AC/ Partic. de Aquisição e
Autores Intervenção Estímulos
participantes experimental Classes de Resp. familiares Generalização
RAC: a criança tinha que
5 crianças com olhar para objetos coloca- TTD para RAC e TRP para IAC; SD: BQ menos preferidos e
Whalen e Aquisição: Positiva
autismo e 6 com Linha de base múltipla dos na sua mão; olhar para Reforçamento positivo e punição painéis com figuras.
Schreibman Não Generalização:
desenvolvi-mento entre participantes objetos apresentados por negativa; Hierarquia de DF, DG e SRef: Consequências naturais
(2003) Negativa para IAC
típico E; OA; DMO DV; RT; SG 3 meses após o treino e tangíveis
IAC: TO e A
TTD para RAC e TI para IAC;
Estudo 1: 5 crianças
Hierarquia de DF e DV; RT; Mode-
com autismo, de 2 e SD: BQ preferidos e de ativa-
lação; MES; Treino de generaliza- Aquisição e Gene-
3 anos; Estudo 2 e ção, painéis com figuras e
Jones, Carr e Linha de base múltipla RAC: AO ção e manutenção. Estudo 1: ralização:
3: 2 crianças. Pre- atividades de rotina SRef: Sim
Feeley (2006) entre as respostas IAC: TO, A Treino de Professores; Estudo 2: Positivas para RAC
sença dos repertó- consequências naturais, sociais
Treino de pais; Estudo 3: verifica- e IAC
rios: contato visual e e comestíveis.
ção de mudanças colaterais e
atender ao nome.
validade social
Treino da AC (TTD para RAC e TI SD: BQ mecânicos e intera- Aquisição e Gene-
58 crianças com
Kasari et al. Delineamento de RAC: OA para IAC); Treino de BS; e Grupo ções físicas com E; ralização:
autismo, entre 2-4 Sim
(2006) grupo randomizado IAC: TO, A, M, EO controle; Hierarquia de DF e DV; SRef: consequências sociais, Positivas para RAC
anos
Feedback corretivo; naturais, acesso ao SD. e IAC
TTD para RAC; Sequência treino:
3 crianças com
1. CN, GC, MF, A e tocar objeto; 2.
autismo, com idade
CN, GC, MF, A sem tocar objeto; 3. Aquisição e Gene-
de 3 e 4 anos. Linha de base múltipla SD: BQ e objetos preferidos
Martins e CN, GC, MF e C; 4. CN, GC e MF; ralização: Positivas
Presença de reper- com reversão entre RAC:DMO SRef: sociais, comestíveis e Não
Harris (2006) Uso dica física com e sem atraso; para RAC, negati-
tórios de IV, mando participantes consequências naturais. TRC
RT; SG após treino. Sondas de vas para IAC
e intraverbal entre
avaliação de IAC pela criança (A e
os participantes.
TO)
Aquisição e Gene-
35 crianças com
Gulsrud et al., Delineamento de RAC: OA; SD: BQ luminosos e musicais. ralização:
autismo, entre 2 - 4 Ver Kasari et. al. (2006) Sim
(2007) grupo IAC: A, M, TO SRef: Ver Kasari et. al. (2006) Positivas para RAC
anos
e IAC
3 crianças com Treino de pais. Ensino RAC: TTD e Aquisição: Positiva
Rocha, SD: BQ preferidos SRef: Con-
autismo, entre 2 e 3 Linha de base múltipla RAC: ver Whalen e TRP; Treino de contato visual; com emergência de
Schreibman e sequências naturais e Tangí- Sim
anos, junto com um entre participantes Schreibman (2003) MES; DF e DV. SG 3 meses após IAC Generalização:
Stahmer (2007) veis
de seus pais treinos. Negativa para RAC

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Perfil dos Delineamento Componente AC/ Partic. de Aquisição e


Autores Intervenção Estímulos
participantes experimental Classes de Resp. familiares Generalização
3 crianças com SD: Objetos, BQ preferidos
Uso de script auditivo; Retirada Aquisição e Gene-
MacDuff et al., autismo, entre 3 - 5 Linha de base múltipla IAC: Ativar um gravador, A e fotografias. SRef: fichas e
gradual da DF e do gravador; Não ralização:
(2007) anos. Presença de entre participantes para SD, TO e repetir script comestíveis, depois retirada
Economia de fichas; SG Positivas para IAC
A/M e IV destes últimos
3 crianças com
autismo, entre 4-7 Aquisição e Gene-
Naoi et al., Linha de base múltipla TTD; modelação; SG imediatamen- SD: BQ preferidos.
anos. Presença de IAC: TO, A, C, AF Não ralização:
(2008) entre participantes te após treino e 2 meses depois SRef: Social
IV, imitação motora Positivas para IAC
e mando
3 crianças com TTD para RAC e IAC; Hierarquia de
Aquisição: Positiva
Taylor e Hoch autismo, entre 3-8 Linha de base múltipla RAC: OA; C; TO DG, DF e DV. Reforçamento positi- SD: BQ não familiares e famili-
Não Generalização:
(2008) anos. Presença de entre participantes IAC: C; TO vo e negativo; SG após treino em ares; SRef: Social
Negativa para IAC
mando e tato locais diferentes
4 crianças com
Treino de RAC e IAC ver Whalen e SD: BQ novos, não familiares à Aquisição e Gene-
autismo, de 3-5
Isaksen e Holth Linha de base múltipla RAC: OA; TO Schreibman (2003); Treino de criança. ralização:
anos. Presença de Sim
(2009) entre participantes IAC: TO DMO; BTT para RAC e IAC; Treino SRef: consequências naturais e Positivas para RAC
tato, mando, IV,
de pais; SG 1 mês após o treino sociais e IAC
imitação motora
SD: BQ de ativação mecânica;
3 crianças com TTD; Treino com ativação do BQ: Interação social com E. Aquisição e Gene-
Klein et al., Linha de base múltipla
autismo, entre 4-6 RAC: DMO atrasada, contingente e intermiten- SRef: ativação de BQ, conse- Não ralização:
(2009) entre participantes
anos te; RT; SG quências naturais e interações Positivas para RAC
sociais.
Aquisição: Positivas
Kasari, Guls-
38 crianças com Generalização:
rud, Wong, Delineamento de RAC e IAC: Ver Kasari et. Treino de pais. Ver Kasari et. al
autismo, entre 1 ano Ver Kasari et. al (2006) Sim Positiva para RAC e
Kwon e Locke grupo al (2006) (2006) para ensino de RAC e IAC
e meio e 3 anos inconsistente para
(2010)
IAC
Aquisição:
ESTUDO 1: SD: BQ de ativa- ESTUDO 1: Positi-
Estudo 1: Ensino de IAC: TTD para vo para de IAC.
ção, Jogos preferidos.
2 crianças com P1 e TI para P2; Sequência de ESTUDO 2: Positi-
ESTUDO 2: SD: Jogos e
autismo, de 3 e 4 treino: 1. Ensino de TO; 2. TO e A; va para duas das
Linha de base múltipla atividades de lazer (montar
Jones (2009) anos, com repertório IAC: TO, A, C 3. TO, A e C. Uso scripts. Estudo 2: Não três situações de
entre respostas quebra-cabeça) e de rotina
estabelecido de Ensino de IAC: TI na rotina para rotina.
(almoço)
RAC P1; Treino de pares e professores. Generalização:
SRef: sociais e consequências
Hierarquia e DF Inconsistente para
naturais de ambos estudos IAC em novas
rotinas

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Perfil dos Delineamento Componente AC/ Partic. de Aquisição e


Autores Intervenção Estímulos
participantes experimental Classes de Resp. familiares Generalização
GEXP: Treino de IAC: TTD, TRP e
currículo escolar; Treino de profes- Aquisição: Positiva
Kaale, Smith e 61 crianças com sores para aplicação do procedi- SD: BQ e objetos. SRef: con-
Delineamento de IAC: Ver Kasari et. al Generalização:
Sponheim autismo, entre 2-5 mento; sequências sociais, naturais, Não
grupo (2006) Inconsistente para
(2012) anos Hierarquia DF; SG após treino. acesso ao SD.
IAC
GCONT Currículo escolar.
Múltiplos scripts (dicas textuais)
3 crianças com para ensino de IAC; Retirada
autismo, entre 4 - 7 Sujeito único, Linha gradual do script; Variação dos Aquisição e Gene-
Pollard, Betz e IAC: Olhar para o SD, A, ambientes treinados; DF e DV com SD: Objetos e BQ preferidos
anos, com repertó- de base múltipla entre Não ralização:
Higbee (2012) ler script em voz alta e TO e sem atraso; Modelação; Proce- SRef: sociais
rios de linguagem e participantes Positivas para IAC
leitura dimento de correção; SG 6 sema-
nas após treino
3 crianças com Ensino de RAC: TTD 1. S; 2. OA e
autismo, entre 2 e 4 SD: BQ e atividades preferidos
Krstovska- S; 3. TO e S. Hierarquia DF (cóce- Aquisição e Gene-
anos, apresentando Linha de base múltipla SRef: ER com BQ preferidos/
Guerrero e RAC: OA, S, TO gas para sorrir), DV com atraso; Sim ralização:
seguimento de entre as respostas comestíveis e TRC de intera-
Jones (2013) MES; SG com pais imediatamente Positivas para RAC
instruções ção social.
após treino
36 cças com autis-
GEXP: Treino de AC, Imitação e Aquisição: Positivas
mo, entre 3-7 anos, SD: BQ e objetos preferidos
Warreyn e Delineamento de RAC: OA, DMO currículo escolar; Treino de RAC e para RAC e IAC
apresentando SRef: interações sociais e Não
Roeyers (2013) grupo IAC: TO IAC através de TRP. GCONT: Generalização: Não
seguimento de consequências naturais.
Currículo escolar. houve SG
instruções simples
Aquisição: Positivas
33 crianças com Grupo AC/BS; Grupo BS/AC; RAC e IAC Genera-
Delineamento de RAC: AO, DMO
Wong (2013) autismo, entre 3- 6 Grupo controle. Treino de AC e BS ver Kasari et. al. (2006) Não lização: Positiva
grupo IAC: TO, A, M
anos ver Kasari et. al. (2006). RAC e Incons. para
IAC
Legenda: A: Apontar para o estímulo; AC: Atenção Conjunta; AF: Abordar fisicamente o experimentador; A/M: Apontar como mando; BQ: Brinquedos; BS: Brincadeira simbólica; BTT: Brincadeira com troca de tur-
no; C: Comentar sobre o estímulo; CN: Chamar a criança pelo nome; CV: Comportamento verbal; DF: Dica física; DG: Dica gestual; DMO: Discriminar a mudança no foco do olhar do experimentador; DV: Dica ver-
bal; E: Experimentador; EO: Entregar o objeto; ER: Esquema de reforçamento; GC: Girar a cabeça; GEXP: Grupo experimental; GCONT: Grupo Controle; IV: Imitação vocal; M: Mostrar o objeto para adulto; MES:
Múltiplos exemplares de estímulos; MF: Mudar o foco do olhar em direção ao objeto; OA: Olhar para um objeto apontado pelo experimentador; P: Participante; RT: Randomização entre tarefas de manutenção e de
aquisição; S: Sorrir; SD: Estímulos discriminativos; SG: Sonda de generalização; SRef: Estímulos reforçadores; TI: Treino incidental; TO: Trocar olhar entre o objeto e o experimentador; TRC: Taxa de reforçamento
contínuo; TRP: Treino de Resposta Pivotal; TTD: Treino de tentativa discreta.

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Nos estudos de Kasari et al. (2006, 2010) e Isaksen estímulos com propriedades discriminativas realçadas,
e Holth (2009) a classe de resposta treinada na RAC, aumentando a probabilidade de uma resposta discri-
de olhar para um estímulo apontado por E, ocorreu minada da criança. No treino na condição de brinca-
conforme o protocolo de MacDonald et al. (2006), o deira de troca de turno com E, o experimentador e a
qual propõe que o estímulo esteja em duas distâncias criança se engajavam na construção de blocos e mon-
diferentes em relação à criança e em posições diver- tagem de quebra cabeças. Era considerada uma res-
sas. Topografias como alternar o olhar entre o objeto e posta correta de RAC quando a criança pegava o blo-
E. (Isaksen & Holth, 2009; Krstovska-Guerreiro & co ou a peça de quebra cabeça e começava a constru-
Jones 2013; Taylor & Hoch, 2008), comentar (Taylor ção, após as respostas do experimentador de olhar e
& Hoch, 2008) e sorrir (Krstovska-Guerreiro & Jones, apontar para a peça. Para o ensino de RAC com tenta-
2013) apareceram nos treinos como classes mais tivas discretas (ensino baseado em apresentações es-
avançadas coordenadas com ‘olhar para um estímulo truturadas de oportunidades de aprendizagem), en-
apontado por E’. quanto a criança brincava com um estímulo, o expe-
rimentador apontava, olhava e/ou comentava sobre
B2. Classes de Respostas de IAC: todos os estudos
um novo brinquedo. A criança deveria alternar o olhar
que buscavam ensinar a IAC treinaram-na a partir da
entre o item e o experimentador e interagir com o
forma mais simples de ‘alternar o olhar entre o objeto
novo brinquedo. Na ausência de RAC ou IAC no trei-
e E’ (Gulsrud et al., 2007; Isaksen & Holth, 2009;
no inicial com tentativas discretas, 15 estudos introdu-
Jones, 2009; Jones et al., 2006; Kaale et al., 2012;
ziram uma hierarquia de dicas físicas, gestuais e/ou
Kasari et al., 2006, 2010; MacDuff et al., 2007; Naoi
verbais para evocar a resposta correta (Gulsrud et al.,
et al., 2008; Pollard et al., 2012; Taylor & Hoch,
2007; Isaksen & Holth, 2009; Jones, 2009; Jones et
2008; Warreyen & Royers, 2013; Whalen & Schreib-
al., 2006; Kaale et al., 2012; Kasari et al., 2006, 2010;
man, 2003; Wong 2013). Destes estudos, excetuando-
Krstovska-Guerrero & Jones, 2013; MacDuff et al.,
se três deles (Isaksen & Holth, 2009; Taylor & Hoch,
2007; Martins & Harris, 2006; Pollard et al., 2012;
2008; Warreyen & Royers, 2013), os demais ensina-
Rocha et al., 2007; Taylor & Hoch, 2008; Whalen &
ram a topografia de apontar para o estímulo conjugada
Schreibman, 2003; Wong, 2013). Um estudo (Klein et
com a forma anterior. A resposta de mostrar o estímu-
al., 2009) usou a ativação de um brinquedo como uma
lo apareceu em cinco estudos (Gulsrud et al., 2007;
dica inerente ao próprio estímulo.
Kaale et al., 2012; Kasari et al., 2006, 2010; Wong
2013) e a de entregar o estímulo em três (Kaale et al., O ensino de IAC ocorreu através de treino de res-
2012; Kasari et al., 2006, 2010). A resposta de comen- posta pivotal (Isaksen & Holth, 2009; Jones et al.,
tar sobre o estímulo foi treinada em três estudos (Jo- 2006; Kaale et al., 2012; Warreyn & Royers, 2013;
nes, 2009; Naoi et al., 2008; Taylor & Hoch, 2008), Whalen & Schreibman, 2003; Wong 2013), treino
sendo que dois utilizaram dicas textuais (scripts) para incidental em que eram envolvidas atividades já co-
auxiliar a criança a vocalizar sobre o estímulo (Ma- nhecidas, de interesse ou de rotina da criança (Gulsrud
cDuff et al., 2007; Pollard et al., 2012). et al., 2007; Jones, 2009; Kasari et al., 2006, 2010),
C. Características da intervenção: a maioria dos tentativas discretas (Jones, 2009; Kaale et al., 2012;
estudos que ensinou RAC o fez através de um treino MacDuff et al., 2007; Naoi et al., 2008; Pollard et al.,
de tentativa discreta, com as exceções de Warreyn e 2012; Taylor & Hoch, 2008;) e modelação (Jones et
Royers (2013 - treino de resposta pivotal), Rocha et al., 2006; Naoi et al., 2008). O treino incidental se
al. (2007 – tentativa discreta e resposta pivotal) e assemelha ao de resposta pivotal: a oportunidade de
(Isaksen & Holth, 2009 - condição de brincadeira de iniciar uma tentativa de IAC é controlada pela atenção
troca de turno com E). No procedimento de resposta da criança; são arranjados no ambiente estímulos de
pivotal (ensino baseado em oportunidades de aprendi- propriedades discriminativas realçadas, aumentando a
zagem que ocorrem no ambiente natural das crianças, probabilidade de respostas de iniciação da criança e
focado em respostas consideradas pivotais para o de- interações com o Experimentador.
senvolvimento – ex. responsividade para múltiplos Todos os estudos analisados utilizaram reforça-
estímulos, motivação) eram arranjados no ambiente mento positivo para ensinar os componentes de AC.
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198 Flávia Teresa Neves Silva Bacelar & Carlos Barbosa Alves de Souza

Um estudo empregou também punição negativa E. Participação de familiares no procedimento:


(Whalen & Schreibman, 2003) com a retirada do Sete estudos introduziram pessoas familiares à criança
brinquedo caso a resposta de IAC fosse incorreta, e no procedimento, tanto nos testes de generalização
um estudo (Taylor & Hoch, 2008) procurou instalar dos repertórios após o treino (Gulsrud et al., 2007;
IAC através de contingências de reforçamento negati- Kasari et al., 2006; Krstovska-Guerrero & Jones,
vo usando estímulos discriminativos com proprieda- 2013) quanto na modalidade de treino parental
des aversivas. (Isaksen & Holth, 2009; Jones et al., 2006; Kasari et
D. Estímulos discriminativos e reforçadores: na al., 2010; Rocha et al., 2007), com resultados positi-
seleção de estímulos discriminativos, dez estudos vos na generalização dos repertórios treinados na
usaram brinquedos, jogos ou atividades preferidas e maioria dos estudos.
de escolha da criança (Jones, 2009; Jones et al., 2006; F. Aquisição e generalização: Todos os artigos
Krstovska-Guerrero & Jones, 2013; MacDuff et al., analisados foram bem sucedidos em estabelecer RAC
2007; Martins & Harris, 2006; Naoi et al., 2008; Pol- e/ou IAC, mas o resultado de generalização e manu-
lard et al., 2012; Rocha et al., 2007; Taylor & Hoch, tenção do repertório de IAC variou entre estudos. O
2008; Warreyen & Royers, 2013), oito utilizaram sucesso da generalização e manutenção da IAC parece
brinquedos de ativação (Gulsrud et al., 2007; Jones, ter sido afetado positivamente pelo ensino com treino
2009; Jones et al., 2006; Kaale et al., 2012; Kasari et de resposta pivotal ou incidental, à familiaridade e/ou
al., 2006, 2010; Klein et al., 2009; Wong 2013) e três preferência dos estímulos antecedentes, às consequên-
usaram interações físicas com E (Kasari et al., 2006, cias sociais oferecidas no treino e/ou à inclusão de
2010; Klein et al., 2009). Dois estudos usaram painéis familiares no treino (Gulsrud et al., 2007; Isaksen &
com figuras (Jones et al., 2006; Whalen & Schreib- Holth, 2009; Jones et al., 2006; Kasari et al., 2006;
man, 2003;), e outros dois empregaram brinquedos Naoi et al., 2008; Pollard et al., 2012).
novos, não conhecidos pelos participantes (Isaksen &
Holth, 2009; Taylor & Hoch, 2008). MacDuff et al.
DISCUSSÃO
(2007) utilizaram fotografias.
Considerados conjuntamente, os 18 estudos anali-
Quanto aos reforçadores, 14 estudos usaram con-
sequências naturais, ou seja, consequências relaciona- sados mostraram que a AC pode ser ensinada para
das ao próprio estímulo discriminativo apresentado pessoas com autismo por meio de intervenções com-
(Gulsrud et al., 2007; Isaksen & Holth, 2009; Jones, portamentais, mas que a RAC, replicando os dados da
2009; Jones et al., 2006; Kaale et al., 2012; Kasari et literatura sobre AC, é mais facilmente instalada do
al., 2006, 2010; Klein et al., 2009; Krstovska- que a IAC (MacDonald et al., 2006; Meindl & Can-
Guerrero & Jones, 2013; Martins & Harris, 2006; nella-Malone, 2011; White et al., 2011). Uma das
Rocha et al., 2007; Warreyen & Royers, 2013; Wha- explicações para as dificuldades da aquisição de IAC
len & Schreibman, 2003; Wong 2013), seis usaram parece estar na exigência de um pré-requisito de “mo-
consequências tangíveis como manipulação de brin- tivação social” a qual é estabelecida quando as conse-
quedos ou comestíveis (Jones et al., 2006; Krstovska- quências mediadas pelos adultos já adquiriram função
Guerrero & Jones, 2013; MacDuff et al., 2007; Mar- reforçadora (Isaksen & Holth, 2009). Os resultados
tins & Harris, 2006; Rocha et al., 2007; Whalen & dos estudos mostraram uma aquisição consistente de
Schreibman, 2003), e onze introduziram consequên- RAC mantida através de contingências de reforçamen-
cias sociais junto com uma das mencionadas antes to generalizado, tangível e/ou exclusivamente social.
(Gulsrud et al., 2007; Isaksen & Holth, 2009; Jones, No entanto, a aquisição da RAC não levou a emergên-
2009; Jones et al., 2006; Kaale et al., 2012; Kasari et cia de IAC, o que oferece suporte para a sugestão de
al., 2006, 2010; Klein et al., 2009; Krstovska- que esses repertórios são funcionalmente independen-
Guerrero & Jones, 2013; Martins & Harris, 2006; tes (Dube et al., 2004). Além disso, no estudo de Mar-
Warreyn & Royers, 2013; Wong, 2013). Três estudos tins e Harris (2006) a RAC foi mantida na ausência de
usaram consequências exclusivamente sociais (Naoi et reforçamento específico, sugerindo que esse repertório
al., 2008; Pollard et al., 2012; Taylor & Hoch, 2008) e pode também ser independente (ao menos na etapa de
um usou economia de fichas (MacDuff et al., 2007). aquisição) do operante verbal mando.
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Intervenções Comportamentais no Ensino de Atenção Conjunta para Crianças com Autismo: Uma revisão de literatura 199

Os resultados dos estudos também mostram que construções verbais (ex. tato com autoclítico4. No
uma condição prévia que parece facilitar o desenvol- estudo de Pollard et al. (2012) as crianças eram ensi-
vimento de IAC é o refinamento da topografia de res- nadas a emitir as respostas de apontar para o estímulo
posta no treino de RAC, exigindo que a criança não só e ler em voz alta a dica textual, tendo como conse-
olhe para um item sendo apontado pelo adulto, mas quência comentários sobre o estímulo feitos pelo ex-
também siga a mudança no foco do olhar do outro. perimentador. Foi observado que na condição na qual
Esse refinamento parece facilitar a discriminação, por o experimentador oferecia múltiplos exemplares de
parte da criança, do comportamento do adulto de aten- comentários após a emissão de IAC pela criança, hou-
tar para estímulos, o que, por sua vez, contribui para ve um aumento de repertório verbal independente
estabelecer esse comportamento do adulto como estí- (sem dica) para dois dos três participantes, em compa-
mulos condicionais discriminativos e/ou reforçadores ração com a condição na qual os comentários eram os
(ver Dube et al., 2004; Holth, 2005). mesmos. Esses resultados mostram uma relação de
Para o estabelecimento das respostas de IAC parece facilitação mútua entre repertórios verbais básicos e
importante avaliar, em condições naturais, que estímu- IAC que precisa ser explorada em novos estudos.
los antecedentes ou propriedades de estímulos podem Os resultados dos artigos analisados sugerem que
funcionar como uma operação motivadora (OM), no as intervenções mediadas pelos pais ou professores
sentido de aumentar a probabilidade da emissão dessas são efetivas em estabelecer AC, além de repertórios
respostas no treino. Os dados têm indicado que as cri- sociais importantes que são deficientes em crianças
anças olham mais para os estímulos conhecidos que com autismo. Porém, alguns estudos que fizeram trei-
consideram interessantes, o que sugere a natureza idi- no de pais/professores não conseguiram manter os
ossincrática da OM para estabelecer oportunidades de repertórios nos testes de manutenção realizados meses
IAC em função dos interesses restritos de crianças com após o treino (Jones, 2009; Kaale et al., 2012; Kasari
autismo. Isso alerta sobre o risco de selecionar previa- et al., 2010; Rocha et al., 2007). A explicação para
mente, com base nos julgamentos do experimentador, essa inconsistência pode estar relacionada às diferen-
quais estímulos poderão ter propriedades discriminati- ças individuais entre os pais ao ensinarem as diferen-
vas realçadas e evocativas de IAC. tes classes de respostas que constituem a RAC e a
Outro aspecto que parece importante para o estabe- IAC. Observou-se que a maioria dos pais implemen-
lecimento das respostas de IAC é o pareamento da tou com maior frequência e precisão as primeiras fa-
presença de outra pessoa com uma variedade de estí- ses do treino (e.g segurar e mostrar um estímulo), do
mulos reforçadores tangíveis, promovendo o aumento que as últimas (e.g apontar e alternar olhar entre obje-
do valor reforçador da interação social e da probabilida- to e a criança) (e.g. Rocha et al., 2007). Outro pro-
de de estabelecer os comportamentos das outras pessoas blema que pode ter levado a falhas na generalização é
como OM(s). Essa relação entre a efetividade com que que os pais foram instruídos, em ambientes controla-
o comportamento de outras pessoas funciona como dos, a oferecer oportunidades de RAC e IAC para a
estímulos condicionais discriminativos e/ou reforçado- criança, mas não foram diretamente ensinados a como
res e a aquisição de RAC e IAC deve ser investigada de fazer isso em ambiente natural. Rocha et al. (2007)
forma mais detalhada em estudos futuros. apontam que os pais apresentaram dificuldade em
Dois estudos foram bem sucedidos em promover discriminar e oferecer todas as oportunidades para que
aquisição, generalização e manutenção do repertório as crianças apresentassem RAC e IAC e sugerem que
de IAC através de dicas auditivas e textuais (MacDuff o os treinos de pais sejam estendidos aos ambientes
et al., 2007; Pollard et al., 2012) em crianças que já naturais.
tinham repertórios verbais estabelecidos (ex. mando, No que diz respeito à generalização e manutenção
tato3, leitura). No estudo de MacDuff et al. (2007) dos repertórios, os estudos mostraram resultados in-
todos os participantes aprenderam a IAC apontando consistentes. Na maioria dos estudos a intervenção em
para o gravador e repetindo a dica auditiva. Quando a AC ocorreu em contexto estruturado, não natural e
dica foi retirada, as crianças não só continuaram a através de tentativas discretas, o que levou a um
repetir a dica, mas também começaram a usar novas aprendizado eficiente na situação específica de ensino,
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200 Flávia Teresa Neves Silva Bacelar & Carlos Barbosa Alves de Souza

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para ensinar RAC e IAC utilizaram as estratégias ana- sis: Inducing and expanding new verbal capabilities in
lítico-comportamentais (e.g. hierarquia de dicas, vari- children with language delays. Boston: Pearson Educa-
ação de reforçamento, uso de múltiplos exemplares de tion, Inc.
estímulos, testes de preferências, modelação e rando- Gulsrud, A. C., Kasari, C., Freeman, S., & Paparella, T.
mização de tarefas) inseridas em treinos que envolvi- (2007). Children with autism’s response to novel stimuli
am a participação de adultos familiares em condições while participating in interventions targeting joint atten-
naturais do desenvolvimento da criança (Gulsrud et tion or symbolic play skills. Autism, 11, 535-546.
al., 2007; Isaksen & Holth, 2009; Krstovska-Guerrero Holth, P. (2005). An operant analysis of joint attention
& Jones, 2013). Pesquisas futuras devem avaliar os skills. Journal of Early and Intensive Behavior Interven-
efeitos isolados e combinados dessas variáveis para o tion, 2, 160-175.
ensino, expansão e manutenção dos repertórios de AC.
Isaksen, J., & Holth, P. (2009). An operant approach to
Uma questão de grande relevância, considerando- teaching joint attention skills to children with autism.
se a relação entre AC e desenvolvimento verbal suge- Behavioral Interventions, 24, 215-236.
rida pela literatura (Charman, 2003; White et al., Jones, E. A. (2009). Establishing response and stimulus
2011), mas que nenhum dos estudos analisados abor- classes for initiating joint attention in children with au-
dou diretamente, diz respeito à extensão dos efeitos da tism. Research in Autism Spectrum Disorders, 3, 375-
aquisição da RAC e ou IAC sobre a aprendizagem de 389.
operantes verbais básicos (e.g. mando, tato). Alguns Jones, E. A., Carr, E. G., & Feeley, K. M. (2006). Multiple
estudos longitudinais, não incluídos nessa revisão effects of joint attention intervention for children with
(e.g. Kasari, Paparella, Freeman, & Jahromi, 2008; autism. Behavior Modification, 30, 782-834.
Kasari, Gulsrud, Freeman, Paparella, & Hellemann, Kaale, A., Smith, L., & Sponheim, E. (2012). A random-
2012; Morales et al., 2000; Whalen et al. 2006), mos- ized controlled trial of preschool-based joint attention in-
traram efeitos positivos da aquisição de AC no desen- tervention for children with autism. Journal of Child
volvimento da linguagem e de outras habilidades so- Psychology and Psychiatry, 53, 97-105.
ciais. Esses resultados oferecem suporte à hipótese de Kasari, C., Freeman, S., & Paparella, T. (2006). Joint atten-
que a habilidade de AC é uma cúspide comportamen- tion and symbolic play in young children with autism: A
tal (behavioral cusp – ver Rosales-Ruiz & Baer, 1997) randomized controlled intervention study. Journal of
que permite o desenvolvimento de repertórios mais Child Psychology and Psychiatry, 47, 611-620.
avançados (Greer & Ross, 2008). Essa hipótese, apli- Kasari, C., Gulsrud, A., Freeman, S., Paparella, T., & Hel-
cada ao contexto da relação entre AC e desenvolvi- lemann, G. (2012). Longitudinal follow up of children
mento verbal em crianças com autismo, deve levar a with ASD receiving targeted interventions on joint atten-
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Aceito em: 17/04/2014
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Notas:
1
O mando é um operante verbal controlado por variáveis motivacionais (e.g. privação, punição) e mantido por reforça-
mento específico – Por exemplo, se uma pessoa me diz o seu telefone, e eu não tenho uma caneta para anotar o número,
posso emitir o mando “Me empresta a sua caneta”, que será reforçado pela entrega da caneta.
2
MO se refere a “um evento ou estímulo que momentaneamente altera (a) o valor das consequências que atuam como
reforçamento ou punição, e (b) a probabilidade dos comportamentos que têm sido previamente associados a tais conse-
quências” (Langthorne & McGill, 2009, p. 22)
3
O tato é um operante verbal controlado por estímulos antecedentes não verbais e mantido por reforçamento generaliza-
do (Skinner, 1957/1992) – Por exemplo, diante de um pássaro, um estudante de ornitologia diz “Serinus canaria”, e o
seu professor reforça esta resposta dizendo “Muito bem”.
4
O autoclítico é um operante verbal de segunda ordem: comportamento verbal sob controle de outro comportamento
verbal do falante, que pode ser caracterizado principalmente pelos seus efeitos sobre o ouvinte ao descrever, qualificar,
quantificar ou relacionar para este as relações de controle da emissão do comportamento verbal de primeira ordem
(Skinner, 1957/1992) - Por exemplo, duas pessoas estão buscando um endereço, e diante de uma casa uma delas diz “É
esta casa, tenho certeza”.

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