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Geologia e relevo: alicerces da paisagem Acreana

Chapter · December 2012

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6 authors, including:

Joao Lani Eufran Amaral


Universidade Federal de Viçosa (UFV) Brazilian Agricultural Research Corporation (EMBRAPA)
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Edson Alves de Araújo Bruno Araujo Furtado de Mendonça


Federal University of Acre Federal Rural University of Rio de Janeiro
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CAPÍTULO 1
1
João Luiz Lani
CAPÍTULO Eufran Ferreira do Amaral
Edson Alves de Araújo
Nilson Gomes Bardales
Carlos Ernesto G.R. Schaefer
Bruno A. F. de Mendonça

GEOLOGIA E RELEVO:
ALICERCES
DA PAISAGEM ACREANA
LANI, J. L. ; AMARAL, E. F. ; ARAÚJO, E. A. ; BARDALES, N. G. ; SCHAEFER, C. E. G. R. ; MENDONÇA, B.A.F . Geologia e relevo: alicerces
da paisagem Acreana. In: Edson Alves de Araújo; João Luiz Lani. (Org.). Uso sustentável de ecossistemas de pastagens cultivadas na Amazônia
Ocidental. Uso sustentável de ecossistemas de pastagens cultivadas na Amazônia Ocidental. Rio Branco: Secretaria Estado de Meio Ambiente
- SEMA, 2012, v. 1, p. 09-37.

1 - INTRODUÇÃO ofereçam abrangente visão da geologia, eles mencionam


O conhecimento geológico de uma determinada que pouco se conhece sobre a era Cenozóica (cerca de 65
região é altamente relevante, pois a geologia relaciona- Ma), especialmente na Amazônia Ocidental. Sabe-se, no
se com os solos, relevo, vegetação, fragilidades entanto, que a Amazônia oferece a maior exposição
ambientais (erodibilidade, erosividade), dentre tantas contínua de sedimentos Terciários e Quaternários,
outras. Nos aspectos geológicos pode-se dizer que: Ao se exemplificados pelas chamadas Formações Içá e
desvendar o passado, permite-se conhecer melhor o Solimões. Esta última predomina em quase toda a
presente e vislumbrar o futuro, principalmente, quanto extensão do Acre, com exceção a uma pequena área na
ao uso dos recursos naturais. No entanto, embora a Serra do Divisor.
geologia seja uma base importante ao conhecimento da As razões para esse desconhecimento são as mais
paisagem, deve-se ressaltar que o SOLO é o melhor diversas, podendo-se no entanto elencar algumas:
estratifícador de ambientes (RESENDE, 1985), por atuar Dificuldade de acesso a todas as regiões (falta de
na interface com a biosfera, a hidrosfera e a atmosfera estradas);
terrestre.
Incidência de doenças como a malária e,
Diante disso, reconhece-se que a paisagem
Acreana é um exemplo marcante da influência da Ausência de técnicos especializados (residentes) na
estrutura geológica, tectônica e a composição físico- região.
química, condicionando a formação e evolução da São poucos os profissionais que atuam
paisagem, como relevo (geomorfologia), vegetação, so- efetivamente, na amazônia, apesar do seu grande
los, hidrologia e outros aspectos ambientais importantes potencial mineral e de outros recursos naturais.
no melhor uso dos recursos naturais. O Estado do Acre possui um dos mais ricos e
O Acre é um estado geologicamente recente e variados conjuntos de ambientes florestados da
há ainda uma carência de conhecimentos sobre a sua Amazônia, além da dominância de solos eutróficos, ricos
formação geológica e as relações com os aspectos em nutrientes, especialmente em cálcio e magnésio
ambientais. Embora Schobbenhaus & Neves (2003) singular aos trópicos úmidos do Brasil, decorrentes de uma

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herança paleoclimática holocênica, quando o clima domi- distribuição da vegetação na paisagem (Figura 1). Os
nante era mais seco e de sedimentos ricos vindo dos solos estudados apresentam horizontes superficiais com
Andes. Em seu extremo oeste, ocorre o maior conjunto de quantidades elevadas de material orgânico pouco de-
relevo montanhoso do Acre, a Serra do Divisor. Esta possui composto, de cores bruno escuro a muito escuro, indicando
uma flora riquíssima e pouco explorada, com as condições ambientais favoráveis ao acúmulo. As
características de transição com as florestas subandinas. características texturais do material de origem
Ali tem-se a área mais pluviosa do Acre, que representou condicionam um pedoambiente excessivamente drenado,
um provável refúgio florestal do Quaternário. seja pela elevada porosidade e permeabilidade do
Na Serra do Divisor, noroeste do Acre, a zonação material arenoso ou pela acentuada declividade.
altitudinal e pedológica é básica para o entendimento Os Solos 1 e 2 são típicos de Floresta
das diferentes formações florestais ocorrentes. Na Ombrófila Densa Submontana com predomínio de
classificação Köppen, é uma área com clima do tipo A bromélias no sub-bosque (Figura 2). Essa vegetação
(clima tropical chuvoso), dos subtipos Am (monção com possui características semelhantes à Floresta de
uma estação seca curta, mas com precipitação elevada Ceja, de ocorrência na encosta oriental Andina.
suficiente para manter as florestas tropicais) e Af (floresta Nestes ambientes, o acúmulo de material orgânico
com altas temperaturas, muita chuva e amplitude fibroso com mais de 40 cm de espessura, possui cores
térmica dos meses mais quentes e mais frios, menor que bruno muito escuro, associado com os restos das
5ºC). Esta região constitui uma primeira barreira bromélias em decomposição (Tabela 1). Esse
geográfica para as massas de vapor d'água vindas do acúmulo expressivo de material orgânico nos
leste amazônico, atingindo cerca de 700 metros de horizontes superficiais, devido, em grande parte, à
altitude no território brasileiro, em condições favoráveis pobreza química do material de origem, com teores
às formações de florestas nebulares (cloud forest). Tais elevados de Al trocável, ou ainda, associado a uma
ambientes, conhecidos na região oriental da Cordilheira cobertura vegetal de difícil decomposição; A textura
Andina Amazônica como bosques de ceja ou ceja arenosa destes solos, com acentuada macroporosidade,
andina , ocupam uma faixa altitudinal aproximada entre associada à precipitação elevada da região, também
600 a 2.000 metros, caracterizadas por uma grande favorece a migração dos compostos orgânicos ligados a
variedade de epífitas (destacando a família das formas pouco cristalinas de Fe e Al.
Bromeliaceae), líquens, musgos e espécies arbóreas de Os Solos localizados em pontos mais baixos da
menor porte e com dossel aberto. Serra constituem Neossolos Litólicos em razão da menor
São comuns cicatrizes de deslizamentos, em profundidade e ausência de horizonte B (Figura 2,
razão do mate rial formado por sedimentos Tabela 1). O Solo 3 apresenta acúmulo de 30 cm de
inconsolidados arenosos (Cretáceo). Nestes locais, material orgânico fibroso na superfície (horizonte or-
observam-se elevado acúmulo de material orgânico na gânico), associado à presença conspícua da vegetação
superfície, favorecidos pela extrema pobreza química rasteira do gênero Lycopodium sob Floresta Ombrófila
dos solos e do material vegetal de decomposição lenta, Densa Submontana, não apresentando contato lítico nos
predominantemente de resíduos das bromélias. Pela primeiros 40 cm. O Solo 4 está localizado no terço inferior
grande afinidade entre as formações observadas no da encosta (290 metros de altitude) próximo à margens
topo da serra e as Florestas de Ceja andinas, considerou- do rio Môa, sob Floresta Ombrófila Aberta com grande
se peculiar a ocorrência desta formação, ainda não densidade e diversidade de palmeiras. Possui horizonte
descrita em território brasileiro. orgânico de 10 cm, sobre um horizonte A moderado de 5
As características do relevo, em padrão cm e contato lítico fragmentário a 35 cm de profundidade
escarpado, associada aos solos de textura arenosa (Tabela 1).
(Tabela 1), provenientes da decomposição das rochas As Florestas da Serra do Divisor mostram uma
sedimentares, arenitos da Formação Môa, favorecem os estrutura mais aberta de porte mais baixo, nas cotas
deslizamentos em massa das camadas superficiais do altimétricas acima de 200 metros, associados a solos ricos
solo, sendo comum a presença de afloramentos de rocha. em matéria orgânica e muito pobres em nutrientes; com
De modo geral, em uma toposseqüência de solos na Serra aumento de altitude, o sub-bosque mostra-se cada vez
do Divisor as variações topográficas, associadas ao mais dominado por bromeliáceas e pteridófitas. Nas
material de origem, são determinantes na formação cotas mais baixas, com solos mais ricos, é muito grande a
destes solos e estão diretamente correlacionadas à riqueza de palmeiras, algumas endêmicas à Serra e seu

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Tabela 1. Características físicas e químicas dos solos na topossequência na Serra do Divisor, com suas respectivas altitudes em metros
Areia Ar eia
Horizonte Cor Silte Argila pH P K Na Ca Mg Al H + Al SB t T C
Gr ossa Fina
(cm) H2O
Úmida -----------------d ag /kg----------------- --------mg/dm 3------- ---------------------------cmolc /dm3 ---------------------------- dag/kg

P1 ESPODOSSOLO FERRIHUMILÚVICO Ór tic o ar ênico Flor est a Ombrófila Densa submontana com Bromé lias
O (40-0) 7,5YR 2/2 - - - - 3,4 16,4 86 8,4 0 0,0 2,4 39,1 0,3 2,7 39,4 29,46
A1 (0-10) 10YR 2/1 57 32 7 4 3,7 5,3 29 0,0 0 0,0 1,1 13,5 0,1 1,2 13,6 2,9
E (10-35) 10YR 4/3 55 38 5 2 4,2 1,5 9 0,0 0 0,0 0,4 3,2 0,0 0,5 3,2 0,4
Bs (35-45) 10YR 5/4 60 33 3 4 4,5 0,9 5 0,0 0 0,0 0,7 8,6 0,1 0,8 8,7 0,8
Bhs (35-70) 10YR 2/1 55 31 5 9 4,7 1,4 4 0,0 0 0,0 1,1 19,7 0,0 1,1 19,7 2,9

CR(70-80+) 10YR 3/3 49 46 1 4 5,2 1,3 4 0,0 0 0,0 0,2 4,1 0,0 0,2 4,1 0,5

P2 ORGANOSSOLO HÁPLICO Fíbrico típico Flore sta Ombrófila De nsa submontana com Br omélias
O (50-0) 7,5YR 2/2 - - - - 3,7 15 217 3,4 0 0,1 2,1 31,2 0,6 2,7 31,8 25,3
A1 (0-15) 10YR 2/2 61 29 2 8 4,2 4,1 60 0 0 0,1 1,2 13,4 0,2 1,4 13,6 3,2
C1 (15-7 0) 10YR2,5/2 72 24 3 1 4,6 0,9 7 0 0 0,0 0,4 4,9 0,0 0,4 4,9 0,5
C2 (70-9 0) 10YR 2/2 81 12 3 4 5,0 2,1 6 0 0 0,0 0,4 8,1 0,0 0,5 8,1 0,7
P3 NEOSSOLO LITÓLICO Hístico típico Floresta Ombr óf ila Densa submontana c om Ly copodium
O (30-0) 7 ,5YR 2 ,5/3 - - - - 3,9 16 189 1,4 0 0,1 1,4 17,0 0,6 1,9 17,6 30,7
A1 (0-10) 10YR 2/2 71 15 4 10 3,8 6 55 0 0 0,1 1,2 13,7 0,2 1,4 13,9 3,5
C (10- 40) 10YR 3/4 69 19 2 10 4,3 1,4 23 0 0 0,0 0,9 8,1 0,1 1,0 8,2 1,0
P4 NEOSSOLO LITÓLICO Distrófico fragmentário Flor esta Ombrófila Aberta com Palme ir as
O (10-0) 10YR 3/3 66 21 4 9 4,7 16 131 0,4 1 0,2 0,7 8,6 1,6 2,3 10,2 4,8
A (0-5) 10YR 3/4 55 32 6 7 5,0 3,2 27 0 0 0,1 0,4 6,8 0,1 0,6 6,9 1,6
AC (5 -15) 10YR 4/4 52 31 11 6 5,6 3,3 21 0 0 0,0 0,3 5,7 0,1 0,4 5,8 1,9
C1 (15-35) 10YR 4/6 62 26 7 5 5,2 1,4 7 0 0 0,0 0,2 3,5 0,0 0,2 3,5 2,1

SB Soma de bases; CTC Capacidade de Troca Catiônica a pH 7. Fonte Schaefer et al,. 2009.

10
entorno, como Dictyocaryum ptarianum, Syagrus smithii, apresentar uma reflexão sobre a geologia e a
Wettinia augusta e Euterpe precatoria var. longevaginata. geomorfologia do Acre, sua influência nos diferentes
Ocorrem ainda diversas espécies dos gêneros Astroca- estratos da paisagem e como a mesma pode influenciar o
ryum, Aiphanes, Attalea, Bactris, além de outras espécies cotidiano dos habitantes, bem como os aspectos
de gêneros como: Chamaedorea, Cheliocarpus, ambientais com o intuito de que, para melhor manejar é
Desmoncus, Geonoma, Iriartea, Hyosphat, Iriartella, preciso, primeiro, conhecer.
Lepidocaryum, Maximiliana, Scheelea, Socratea,
Syagrus, diversos Oenocarpus e Phytelephas macrocarpa.
Portanto, as matas de Palmeiras da Serra do
Divisor são uma das mais ricas em diversidade de todo o

Fonte: Schaefer et al., 2009.


Brasil e possuem padrões dedistribuição em forte
associação com os solos da Serra, que variam desde
eutróficos, argilosos, até solos arenosos e podzolizados,
com acúmulo de matéria orgânica. Variações
fitofisionômicas expressivas acompanham as variações
de solos e relevo.
No caso da geologia do Acre, a maioria das
referências são resul tados dos trabalhos do
Figura 1. Bloco diagrama da Serra do Divisor e parte da várzea do
RADAMBRASIL (BRASIL, 1976, 1977), do Serviço rio Môa, indicando a localização da topossequência dos solos e as
Geológico do Brasil (CPRM), e mais recentemente os respectivas formas do relevo e formações geológicas (1-Espodossolo
desenvolvidos pela EMBRAPA (CAVALCANTE, 2005 a, b, Ferrihumilúvico; 2- Organossolo Háplico; 3 e 4- Neossolo Litólico; TQs-
2006). Formação Solimões; Qai-Aluviões Holocênicos; Qc-Coluviões
Holocênicos; Km-Formação Môa; Kra-Formação Rio Azul; Kd-
Diante disso, procurou-se de forma simplificada Formação Divisor). Fonte: Schaefer et al., 2009.

A B D
Figura 2. Perfil do Espodossolo
Ferrihumilúvico (A), Organossolo Háplico
(B) e (E), Neossolo Litólico (F) coletados
em uma topossequência na Serra do
Divisor, oeste do Acre. Vista geral do
imenso anfiteatro Amazônico (C)
observada no local de coleta do Solo 2,
sob a Floresta de Ceja. Sub-bosque com
Bromélias, típico das Florestas de Ceja,
com perfil de solo com elevado acúmulo
de material orgânico fibroso (D). Encosta
com Floresta Ombrófila Aberta da Serra
do Divisor (G), correlata ao local da
E F G topossequência de solos estudados.

11
2. O ACRE: LOCALIZAÇÃO E SÍNTESE (2) Há diferenças na natureza química e mineralógica
GEOLÓGICA desses sedimentos?
O Estado do Acre localiza-se sobre uma vasta (3) Há relações definidas entre os sedimentos
bacia sedimentar contínua, que ocupa grande parte da (material de origem) e os solos que deles se desenvolvem?
região amazônica ocidental (Figura 3). (4) São estas relações capazes de influenciar
A bacia do Acre, na sua maior parte, é representada diretamente o comportamento agropastoril, ou podem
por sedimentos Cenozóicos (Terciários e Quaternários). indicar tipos de manejos dos solos mais adequados?
Tem seus limites a oeste com os dobramentos mais antigos (5) Quais são os ambientes mais frágeis?
da Serra do Divisor (Paleozóicos até Mesozóicos), que
Tentar-se-á nestas reflexões responder estas
formam os primeiros dobramentos associados aos Andes.
questões com base no acervo de informações existentes,
É denominada de bacia do Acre e tem a Formação
enquanto muitas lacunas vão ser deixadas em aberto,
Solimões como principal componente, e, sua divisa, ao
pois há ainda muito a se conhecer e aprofundar, antes de
oeste (W) se dá com a Serra do Divisor (Figura 4).
oferecer um quadro mais definitivo de assunto tão
É possível perceber que a base geológica que complexo. Os estudos da paisagem nunca se esgotam e
sustenta a Serra do Divisor não é sedimentar, ou em outras há sempre muito conhecimento novo a ser desvendado.
palavras, é constituída de rochas ígneas e metamórficas
muito antigas, do embasamento cristalino. A
profundidade da sedimentação Cenozóica da Bacia do 3. TEMPO GEOLÓGICO NO ACRE:
Acre varia de 800 a 2.000 metros, assentando-se sobre UM ESTADO JOVEM
rochas do embasamento ou sedimentos Paleozóicos
Como dito, os sedimentos da Bacia do Acre não são
sobrepostos. Isto se traduz em enorme dificuldade de se
encontrar "pedra" ou rocha dura, para uso em construção antigos (Figura 5). A maior parte é constituído de
ou pavimentação, pois o embasamento encontra-se oculto materiais acumulados desde o Mioceno (com início a cerca
em grandes profundidades. O pacote sedimentar que o
de 23 Ma), com predomínio de sedimentos bem mais
recobre é relativamente pouco cimentado e dá uma idéia
da intensa erosão que houve nesta região, ao longo dos modernos, do Pleistoceno (os últimos 1,8 Ma). Isso significa
últimos milhões de anos. Para que haja sedimentos que houve pouca cimentação (endurecimento) e a maioria
acumulados numa bacia qualquer é preciso que o solo
deles é bem estruturado, frouxo e friável. A l é m d i s s o ,
seja formado e transportado de outro lugar. Um ponto
importante é que a Formação Solimões ocupa hoje o topo tiveram pouco tempo relativo para formar solos muito
da paisagem dos interflúvios acrianos, indicando que intemperizados. Estes guardam as características de sua
houve um soerguimento da bacia de acumulação após sua
composição sedimentar de origem. São solos que ainda
formação e consolidação. Além disso, indica claramente
que houve uma (ou mais) áreas fontes mais distante, hoje apresentam muitas características dos sedimentos
bastante erodida e rebaixada, que forneceu grande originários. Nesta situação, torna-se difícil distinguir o que
volume de sedimentos.
é solo e o que é sedimento, fato, aliás, comum a todas as
A Formação Solimões se sobrepõe à outras
bacias Cenozóicas Brasileiras.
Formações mais antigas e de composição variada (Figura
4). O Grupo Acre constitui os sedimentos Cretáceos que Os sedimentos mais recentes correspondem à
afloram na Serra do Divisor, assentados sobre rochas Pré- cobertura Detrito-Laterítica Pleistocênica (1,8 Ma);
cambrianas ou Paleozóicas mais antigas (Formação Aluviões e Coluviões Holocênicos (últimos 10.000 anos),
Formosa). Terraços Holocênicos e Pleistocênicos.
Como representa uma bacia sedimentar, importa Ocorrem sedimentos de texturas as mais
conhecer a área fonte dos sedimentos em questão. Nesta variadas, desde argilosos até siltosos, depositados por
situação, há algumas perguntas importantes a serem regimes de águas mais calmas (ambiente flúvio-lacustre)
respondidas: até sedimentos arenosos, com maior energia dos rios
(BRASIL, 1976; KRONBERG & BENCHIMOL, 1992).
(1) Os sedimentos Cenozóicos possuem uma ou mais de
uma fonte? Os principais eventos geológicos com destaque
para o sudeste do Acre encontram-se na Figura 6.

12
Fonte: Silva et al. (2003).
Figura 3. Bacia do Acre, incluída de forma muito generalizada no contexto das bacias sedimentares Cenozóicas interiores do Brasil.

Figura 4. A Formação Solimões ocupa grande parte do Estado do Acre com sedimentos que variam de 800 a 2.000 metros de profundidade.
Fonte: Eiras et al.,1994.

13
Figura 5. Coluna estratigráfica do Estado do Acre. Fonte: Modificado de Eiras et al., 1994.

14
23
15

Figura 6. Coluna geológica com destaque para a geologia do sudeste do Estado do Acre.
Fonte: Amaral, 2007.
4. PAISAGEM E GEOLOGIA: cordões em nível, terraços de base estreita e outras
UMA INTEGRAÇÃO práticas) e o armazenamento da mesma em açudes etc.
Desse modo, é possível reduzir a perda de água e efeitos
No aspecto geológico, há diversas observações
adversos da seca tanto como na falta de água potável
úteis para entender a paisagem Acreana e seus usos
como também para as culturas e pastagens nos curtos
atuais. Como exemplo, citam-se:
períodos de estiagem. Sugere-se que o Estado, para
No Estado do Acre verifica-se que há ausência minimizar os efeitos da baixa infiltração da água no solo,
geral de rochas duras aflorantes (a popular pedra ). invista e estimule obras de Engenharia como cordões de
Diante disto, pode-se inferir que a causa é a grande infiltração de água, bacias de infiltração, açudes e canais
profundidade da bacia de sedimentação argilo siltosa de condução da água de estradas com destino a valetas
da Formação Solimões e a incipiente dissecação da de infiltração . Estas práticas já são bem conhecidas e
paisagem; apresentam alto grau de eficiência.
Nos perfis de solo, como barrancos de beira das Na parte central da Bacia do Acre, os vales são
estradas, há camadas de diferentes cores e texturas. pouco profundos e o talvegue (diferença entre o topo da
Predominam, entretanto, camadas mais argilosas com paisagem e o fundo do vale) é menor. Os rios não possuem
material mais fino, muito pegajoso, alternando com menor cachoeiras, pois não correm sobre rocha dura, e sim sobre
proporção de camadas arenosas, que são também mais sedimentos friáveis. Além disso, os rios são muito recentes
delgadas (Figura 7). A explicação plausível para isto é e ainda pouco encaixados. A paisagem como um todo é
que na Bacia do Acre ocorreram ambientes de muito recente, como ilustra a sucessão primária de
sedimentação predominantemente mais calmos (águas vegetação de bambu espinhento (Guadua weberbaueri),
calmas), com áreas-fonte ricas em silte e argila. Não há formando gigantescos taquarais quase monodominantes,
muita areia, como também não são comuns solos arenosos. popularmente conhecidos como taboca. Na direção das
Normalmente a fração areia predomina na parte bordas da Bacia do Acre, a leste e a oeste, os rios são
superior do solo (primeiros 10 cm) e há uma maior ocor- mais encaixados e o topo da paisagem mostra a
rência na região entre Cruzeiro do Sul e Mâncio Lima, ocorrência de paisagens bem mais antigas.
onde foram identificados Espodossolos e Neossolos
Na borda leste, na região de Capixaba, ocorrem
Quartzarênicos.
muitos geoglifos, um dos temas mais intrigantes da
Em algumas regiões, sobretudo na porção central Arqueologia Amazônica. São possíveis testemunhos de
do Estado, as argilas são expansivas, muito plásticas e ocupação por sociedades indígenas pré-colombianas,
pegajosas, quando molhadas. Apresentam trincamento nas áreas mais altas do Estado, local atualmente ocupado
quando secas. Elas dificultam a infiltração da água das pela Floresta Ombrófila Densa, com inúmeras
chuvas. São solos rasos, que se fecham após as castanheiras do Brasil (Bertholletia excelsa), árvores
primeiras chuvas, impedindo a recarga do lençol freático. frondosas que se destacam na paisagem. Aparentemente,
Sendo esta, uma das principais razões da grande varia- os geoglifos sugerem um modelo de ocupação de uma
ção de vazão dos rios e a ocorrência, no curto período de paisagem savânica aberta, pois a maioria situa-se em
seca, de inúmeros igarapés secos (Figura 8). pontos estratégicos de observação do horizonte, com
A implicação mais notável das características forte aspecto defensivo (SCHAAN et al., 2007), que não
físico-hídricas destes solos é que o pedoclima (clima do teriam sentido na paisagem florestada. Estudos estão
solo) não reflete exatamente o clima atmosférico sendo conduzidos na Universidade Federal de Viçosa com
(BARDALES, 2005; AMARAL, 2007). Os efeitos da seca se o intuito de conhecer melhor sua origem, bem como pelos
fazem notar bem mais rapidamente, pois quase a vestígios das sociedades que ocuparam esta região
totalidade das águas das chuvas perde-se por es- (CARMO et al., 2009) (Figura 9).
coamento superficial (o solo não permite uma boa O encaixamento e direções dos rios acreanos
infiltração), o que eleva rapidamente o nível dos rios e obedecem a controles estruturais dos sedimentos e a
igarapés nas chuvas, enquanto a evaporação é intensa. condicionantes tectônicos bem evidentes pela elevação
Pela pouca recarga durante os períodos chuvosos, sobra dos Andes. Isso é demonstrado em razão da assimetria
pouca água para abastecer os rios e igarapés durante a generalizada dos vales, basculados por sutis
estação seca. Assim, o manejo desses solos deve ser deslocamentos tectônicos de blocos. As partes mais altas
voltado à práticas que aumentem a capacidade de possuem solos mais desenvolvidos.
infiltração de água no solo (uso de cobertura do solo,

16
Nas áreas mais elevadas dos extremos leste e em direção contrária a atual. Em razão desse fenômeno
oeste do Acre, existem condições de melhor drenagem e era chamado de SANOZAMA (Amazonas escrito de trás
ocorrem com freqüência os Latossolos (um dos solos mais para frente).
velhos). Os Latossolos Amarelos só ocorrem em grandes A elevação Andina impôs uma acentuada
extensões no extremo oeste, em Cruzeiro do Sul. Na mudança ecológica e ambiental, de grande importância
borda leste, na região de Capixaba, menos dissecada, na região Amazônica. Com ela houve a formação de uma
predominam Latossolos Vermelho e Vermelho-Amarelo. gra Oceand ssáfito Pfançindd d
Devido à elevada pluviosidade atual, esperava-se a
predominância de solos mais amarelados. Uma das
hipóteses para explicar a cor observada é a influência do
sedimento carbonático com maiores teores de cálcio que
favoreceu a formação e manutenção da hematita, e o
tempo relativamente recente de instalação do clima
úmido, insuficientes para a goethizacão. Esta região
apresenta o maior potencial para o uso de mecanização,
pois o relevo varia de plano a suave ondulado e os solos
são, na sua maioria, profundos e bem drenados
(Latossolos) (ARAÚJO et al., 2001; ACRE, 2006).
Na região central do Estado, após o rio Caeté e
logo depois de Sena Madureira, há predomínio de solos
jovens com argilas de atividade alta e altos teores de silte
e argila. No extremo oeste do Acre, onde o clima é bem
mais úmido, praticamente sem estação seca, ocorrem
Espodossolos desenvolvido de sedimentos areno-
argilosos profundamente lixiviados sob vegetação
denominada de Campinarana (Figura 10).
A coluna geológica (Figura 6) pode ser utilizada
para emoldurar a cronologia dos principais eventos e suas
consequências na paisagem Acreana. Do Mioceno (23
Ma) ao Plioceno (5,3 Ma), eventos tectônicos deflagraram
a formação dos Andes, cujos primeiros dobramentos
ocorrem no Acre, constituindo a Serra do Divisor (Figura
11), onde se localiza importante área de conservação da
natureza, (Parque Nacional da Serra do Divisor). Nessa
mesma época definiu-se o arcabouço tectônico do Acre, já
que a parte central mais baixa passou a receber
sedimentos provenientes do eixo de canais que erodiam a
borda Andina, à medida que esta se elevava.
Antes da elevação Andina, a drenagem
amazônica com sua imensa rede de rios e canais, tinha
como direção o atual Oceano Pacifico (Figura 12). Os
sedimentos Mesozóicos e Paleozóicos foram dobrados e
começaram também a ser erodidos contribuindo para o
entulhamento da recém-formada Bacia do Acre, agora
para leste. Entretanto, a maior parte dos sedimentos
provinha dos blocos tectônicos mais elevados dos Andes,
que eram mais ricos e mais erodidos. Desta forma, a Bacia Figura 7. Corte de estrada ao longo da BR 364, no trecho entre Sena
do Acre passou a receber sedimentos mais jovens, menos Madureira e Manuel Urbano, onde é possível visualizar os estratos
intemperizados e quimicamente mais ricos. Nessa época, sedimentares da Formação Solimões. Fotografia: Edson Alves de Araújo,
os rios do sistema hidrográfico do Amazonas drenavam outubro de 2009.
Fonte: Amaral, 2007.
Figura 8. Igarapé, com leito quase seco, ao longo da BR 364, trecho
entre os municípios de Feijó e Sena Madureira. Fotografia: Edson Alves
de Araújo, agosto de 2009.

Figura 12. Evolução da paisagem da região de inserção do Estado do


Acre. A. Fase I. Sedimentação da borda continental (Sanozama). B.
Fase II. Compressão preliminar (Transgressões marinhas). C. Fase III.
Figura 9. Vista aérea do Geoglifo Bimbarra, na região do município Formação de Ilha em Arco (Inversão do sentido geral da drenagem,
de Capixaba, Acre. Fotografia: Acervo do Instituto do Patrimônio Histórico e grandes lagos secundários e formação do lago Amazonas). D. Fase IV.
Artístico Nacional (IPHAN), em julho de 2008. Clímax orogênico (Cordilheira dos Andes e Formação Solimões,
paisagem atual).

Figura 13. Rua calçada com argila calcinada (tijolo) no município de


Figura 10. Espodossolo com predominância de Campinaranas do Rio Branco. Fotografia: Nazaré Macedo, setembro de 2006.
Acre, no município de Cruzeiro do Sul, Acre. Fotografias: Edson Alves de
Araújo, agosto de 2009.

Figura 14. BR 364 entre Tarauacá e Cruzeiro do Sul. Devido à


ausência de brita ( pedra ) na região, utiliza-se uma camada de
Figura 11. Presença de rochas metarenitos na região da Serra do
cimento para dar suporte ao leito da estrada. Fotografia: João Luiz Lani,
Divisor, Acre. Fotografia: Carlos Schaefer, 2009. agosto de 2008.

18
5. PRINCIPAIS FORMAÇÕES (APP - Área de Preservação Permanente). Contudo, estes
GEOLÓGICAS DO ESTADO DO ACRE solos de várzea são um dos ambientes mais sustentáveis e
mais produtivos da Amazônia, e responsável por quase
tudo que se venda nas feiras regionais, e sustenta a
As principais formações geológicas identificadas subsistência das comunidades ribeirinhas. Tais usos
no Acre, encontram-se no Quadro 1. Neste subitem, aparentemente conflitantes com a lei atual, indicam a
tentar-se-á descrever desde a beira do rio (Aluviões necessidade de ajustes da legislação, que levem em conta
Holocênicos) até o topo da paisagem onde foram o conhecimento da geomorfologia e das características
identificadas a Formação Solimões e a Cobertura dos solos, que podem contribuir para um melhor uso, tendo
Detrítica-Laterítica Pleistocênica. como unidade de planejamento a bacia hidrográfica. Um
caminho mais adequado seria uma regionalização da
legislação, que deve ser específica e adequada a cada
5.1. Aluviões Holocênicos
bacia hidrográfica, devido às peculiaridades do
Este material ocorre às margens dos rios e ambiente e dos usos tradicionais.
igarapés (Figura 15). São sedimentos recentes e formam
Guerra (1955) eglata que o Acre não possui
as praias. Grande parte do material terroso tem a sua
tantas extensões de várzeas como as que ocorrem no
possível origem no desbarrancamento dos rios
baixo Amazonas. Entretanto, os rios de maior volume,
(solapamento). A granulometria do material depositado
como Juruá, Tarauacá, Chandless e Purus, possuem
às margens dos rios depende da energia da água dos
extensas várzeas que são utilizadas frequentemente com
cursos d'água. Onde são mais enérgicas (maior
cultivos agrícolas de grande importância à subsistência
correnteza) ocorrem sedimentos mais grosseiros (areia), e
tais como o milho, a melancia, o feijão, hortaliças, entre
nas mais calmas depositam-se materiais mais finos (argila
outros. Tais ambientes são absolutamente essenciais para
e silte).
os povos ali residentes, e seu cultivo remonta há mais de
Apesar da extensa cobertura vegetal, os rios do um século de agricultura dos ribeirinhos tradicionais na
Acre são muito barrentos e carreiam grande quantidade região.
de sedimentos finos. Supõe-se, pela extensa cobertura
vegetal, que a erosão laminar não seja tão intensa. É
possível que a argila suspensa seja proveniente do 5.2. Coluviões Holocênicos
encaixamento atual da drenagem erodindo as bordas Os Coluviões Holocênicos são originados a partir
dos terraços antigos, ou ainda à erosão dos solos muito de sedimentos oriundos da erosão lenta e gradual que
intensa durante as primeiras chuvas. Pesquisas para incide nas encostas e topos dos morros adjacentes. Este
identificar a origem desses sedimentos e da verdadeira material que se desloca lentamente ao longo das
causa da elevada turbidez da maioria das águas vertentes, e se deposita nos sopés do morro, é
superficiais (barrentas), devem ser implementadas. Rios denominado de colúvio. Sua idade é do Holoceno, e são
que drenam áreas geologicamente mais antigas e portanto egcentes (dos últimos 10.000 anos ou 10 Ka).
arenosas, como o rio Moa, não possuem tal carga Quanto à classe de solos pegdominam os Argissolos e
sedimentar argilosa. Outra causa possível é o próprio Latossolos, além de Plintossolos.
fluxo lateral de argilas (translocação de argilas) devido
ao proceso de podzolização dos solos do Acre, além do
desbarrancamento dos terraços. 5.3. Terraços Holocênicos
Os Aluviões, sedimentos próximo às margens mais O conceito geológico de Terraço é a de uma
baixas dos rios, estão sujeitos ao encharcamento superfície plana ou levemente inclinada, em geral com
temporário nos períodos de cheia dos rios. Nestes locais frente escarpada de beira do rio, que já foi inundado
formam-se Gleissolos e Neossolos Flúvicos. A depender (aluvião). Atualmente, em razão do aprofundamento do
da origem do material, podem ser ricos em nutrientes talvegue (do rio), as cheias afetam esses níveis apenas
(eutróficos) e formarem excelentes pastagens (Brachiaria eventualmente (grandes cheias) (Figura 16), ocasionando
sp.) ou mesmo serem utilizados em culturas de ciclo curto graves problemas urbanos, como no caso de Rio Branco e
(milho, feijão, melancia, etc.). Atualmente o uso agrícola seus bairros centrais (CARMO, 2007).
dessas áreas é proibido em razão da legislação que
preconiza que deve ser deixada com vegetação nativa

19
5.4 - Terraços Pleistocênicos Compõem-se de sedimentos argilo-arenosos de cor
São mais antigos que 10.000 anos, mas em geral amarelada, cauliníticos, parcial a totalmente
não devem ultrapassar 100.000 150.000 anos. pedogeneizados. Costa (1991) reconheceu dois
Semelhante ao anterior quanto ao relevo e também com principais eventos de laterização durante o Cenozóico
relação à localização, diferindo apenas no maior tempo (últimos 65 Ma): um primeiro, no Eoceno-Oligoceno,
de formaçao. Por serem mais antigos, estão normalmente formador das lateritas maduras ricas em caulinita e outro
mais distantes da calha dos rios, acima do Terraço Ho- mais bem recente, no Pleistoceno, formador das lateritas
locênico subatual (Figura 17). São menos suscetíveis às imaturas com alto teor de ferro. A cobertura detrito-
cheias dos rios. Nestas áreas, esta situada a maioria das laterítica neopleistocênica é, portanto, similar. A laterita é
cidades e comunidades ribeirinhas, principalmente nas também conhecida como canga ou concreções
regiões de relevo acidentado. ferruginosas. Elas são utilizadas em construções e em
especial em leitos de estradas (Figura 18).
Quanto aos solos, como já houve maior tempo
para a pedogênese (intemperismo) e já são mais
maduros, podendo ocorrer Cambissolos ou mesmo 5.6.1. Horizonte ferruginoso (petroplintita):
Argissolos. A textura varia conforme a energia de ocorre na porção superior do perfil e exibe nódulos,
transporte do rio a época da deposição e a área fonte concreções, esferólitos e fragmentos compostos de oxi-
dos sedimentos. hidróxidos de ferro em matriz argilosa e terrosa (Figuras
20 e 21). Outra feição observada é uma crosta formada
de oxi-hidróxido de ferro entrelaçando porções argilosas
5.5. Formação Solimões Inferior FSIN amareladas. A tonalidade dominante desse horizonte é
Entre as unidades geológicas acreanas, a marrom-avermelhada com matriz/cimento (quando
Formação Solimões Inferior destaca-se em extensão e presente), branco-amarelada. As estruturas dominantes
importância, com ocorrência de cerca de 85% do desse horizonte são os nódulos, concreções e plasmas
território acreano (BRASIL, 1976). Corresponde a parte (micro a criptocristalino), em seguida há os canais em
superior da paisagem onde atualmente encontram-se os forma de raízes e colunas centimétricas, aquelas
solos mais evoluídos pedogeneticamente como os resultantes de lixiviação, como cavernosas são mais res-
Latossolos (topo da paisagem mais planos, Argissolos tritas.
(terço médio) e Plintosso los (terço inferior). Cavalcante (2006) em levantamento expedito
Geologicamente a FSin é formada de rochas geológico da região de Rio Branco identificou três
sedimentares, dominantemente pelíticas, altamente horizontes característicos detalhados na Figura 19.
fossilíferas, sob a forma de argilitos (argila) com
intercalações de siltitos (silte), arenitos finos, calcários e
material carbonoso (linhito), micáceos. Ambiente redutor, 5.6.2. Horizonte argiloso: ocorre logo abaixo
a época a deposição; predominantemente lacustre, do ferruginoso. É constituído dominantemente por
localmente fluvial e flúvio-marinho, com estratificações argilominerais. A feição mais característica desse
paralelas e cruzadas tabulares e acanaladas. horizonte é uma zona mosqueado/amarelada (plintita)
Embora esta seja a definição geológica da (Figura 22). Isso se deve ao fato dessas coberturas terem
Formação, em algumas regiões, como Capixaba, devido sua origem vinculada a depósitos sedimentares
à intensa pedogênese os solos são intensamente (Formação Solimões). Trata-se de um horizonte muito
intemperizados e os fósseis, se existentes, já foram intemperizado, com manchas irregulares de vermelho e
destruídos. Isto não impede que haja no horizonte C e no violeta por dispersão de micro partículas de oxi-
sedimento (rocha) onde são mais preservados. hidróxidos de ferro que se instalam nos planos de
Semelhantemente os calcários já foram muito clivagem e fratura. Na parte superior do horizonte
intemperizados no climatropical úmido atual. argiloso as manchas se transformam em nódulos, ou
mesmo desaparecem, originando uma zona nodular
marrom-amarelada.
5.6. Coberturas Detrito-lateríticas 5.6.3. Horizonte transicional: imediatamente
Neopleistocênicas abaixo do horizonte argiloso e contato direto com a
Dispõe-se sobre os sedimentos da Formação Formação Solimões, caracteriza-se pela coloração mais
Solimões e restringem-se a parte sudeste do Estado. clara do que a da Formação Solimões.

20
Observam-se também na região stone lines
(linhas de pedras) nos perfis, em corpos argilosos entre a
zona de esferólitos e o solos pedobioturbado. Tais
estruturas constituem-se de fragmentos de lateritos em
matriz argilo-arenosa. Costa (1991) associa essas
estruturas à dissecação do relevo regional durante o
Terciário e o Quaternário. Tais linhas são de dimensões
métricas e de espessura centimétricas. O diâmetro dos
grânulos varia de unidades de milímetros a de centímetros
e são derivados dos lateritos imaturos (horizonte
ferruginoso), sobre os quais se assentam. As coberturas
detrito-lateríticas apresentam na cobertura latossólica Figura 15. Aluviões Holocênicos, de ocorrência às margens dos
areno-argilosa (Figura 23). grandes rios e igarapés. Fonte: Carlos Ernesto Schaefer, 2005.

Alguns depósitos de piçarras equivalem aos


stone lines, outros são de fato os próprios horizontes
concrecionários dos lateritos imaturos. Na área em
questão, a definição da origem dessas estruturas é
prejudicada pela falta de continuidade dos perfis.
A parte superior, fortemente microestruturada,
dependp da a ividaf p pedo pio ló gic a pra s u a
formação, e os remanescentes de petroplintita em
processo de degradação são feições comuns em todos os
perfis de Latossolos. Segundo C. Schaefer, ( informação
pessoal) os Latossolos Vermelhos da região seriam
Figur . Terraço
16 Holocênico habitado. Área sujeita a inundação
basicamente produtos do intemperismo da canga, e a dur ante o período de cheia do rio Mur Com Novo Por
hematita, herdada da petroplintita. Município de J , Acre.
Fotografia: Edson Alves de Ar , junho de
2010.

Quadro 1. Principais classes geológicas de ocorrência no Estado do Acre, relação ambiental e solos
Simb. Class e Descrição Relação ambiental e Solos
Ter iário (entr e o Eoceno e o Mioceno)
QHa Aluviões Ocorrem nos canais dos antigos r ios e nas margens
mes mos.
dos AOcor rem os Neos solos Flúvicos e Gleiss olos (a
Holocênicos textura varia em razão da ener pia de deposição. Nor almente s ãofer ilidade depende da fonte do material de
ar enos os relativos a barra em pontal acionados
e pelíticos a igem. or
elr São sujeitos constantemente à inundação
transbordamentos . mesmo nas cheias menos express vas.
QHc Coluviões Mater ial er odido da parte superior que rs e deposita
im aoiop ur o Ocor rem Argiss q olos, Cambis solos e Latoss
Holocênicos no sopé da encosta. Nor almente os s Pdimentos s ão mais pobres
dos Aluviões Holocênicos.
QHt Ter raços Cons truções sedimentar es aluviais, cujos constituintes mos tr Ocorm rem os Neos solos Flúvicos e onde encontram-s
Holocênicos car acterísticas típicas de depó sitos de planíciede umafluvialf e smor dias com o temasis de proteção das enchentes
anterior a atual. São cascalhos lenticular Ps de defundo
canal, areias (casas altas do chão).
quar tzos as incons lidadas de bar ra em pontal,
e s ee silt argilas de
transbordamento.
QPt Ter raços Depó tos de terraços f luviais antigos aços,
e r cons ampas-ter tituídosTrata-se de amientes não maisinundáveis na sua
Pleistocênicos por ar gilas, siltes e eias
ar, às vezes maciços
, de
e cor aver melhadas.
maior ia planos (ambiente conservador) ondecorr o em
Localmente mostr m intercalações lenticular
es tos
de ear Cambissolospili .ãoS s los na s ua de boa fer tilidade
conglomerados . um dos mais utilizados pela agr icultur af amiliar
les . Ne
es tão a maioria das vilas e cidades .
TNsi For mação Solimões
Rochas s edimentar Ps dominantemnte pelíticas , altamen
tesilífer
osf as, Cor responde a par teuperior
s da paisagem onde
Inferior sob a forma de ar pilitos com inter laçõe , ar de Pnitos
s finos,
iltitos
atualmente encontram- se os solos mais evoluídos
calcár ios e material carbonoso (linhito), micáceos e. Aminteedutorr pedogeneticamente
a como os Latos solos (topo da
época; pr Pdominantemente lacustre, localmente f e luvial flúvio-mr inho, paisagem Ar giss los (terço médio) e Plintoss ol
com es tr atif icações paralelas e cruzadas tabulares naladas e. aca (ter er
inf ior) nas regiões de Capixaba e Cruzeir
do ul.S Nasdemaisregiões o Ar piss olo predomina
nos topos.
TNss For mação Solimões
No há evidência de ocor ência dess a Formação no te acriano.
amien
Super ior
QPdl Cober tura Dispõe-
seobr
es os sedimentos da Formção Solimões, restringindo-s
ea São identif icados à s uper ície e dif icultam
Detr ítica-later
ítica parteudeste
s do Es tado. Compõem- se de sedimentos a rgilo-arenosos mecanização. Quando a ocorrência é intens so
Pleistocênica de cor amrelada, cauliníticos, parcial a totalmente pe dogeneizados .extr aídos para ser vir em de pis
o nas estr adas
. N ste
caso são denominados de cascalheir as.
Fonte: Adaptado de Acre, 2006.

21
Figura 17. Terraços Pleistocênicos. Localizam-se nas porções mais Figura 20. Nódulos concrecionários rolados do horizonte ferruginoso.
elevadas em relação aos Terraços Holocênicos, tornando-se menos No terreno, superfície com "piçarra". Fotografia: João Luiz Lani, agosto de
2008.
sujeitos a inundação. Fotografia: Carlos Schaefer, 2005.

Figura 18. Concreções ferruginosas também conhecidas com laterita, Figura 21. Detalhe da concreção ferruginosa no perfil de solo.
canga itapanhoacanga, tapiocanga, tapunhunacanga. Fotografia: Fotografia: João Luiz Lani, agosto de 2008.
João Luiz Lani, agosto de 2008.

Figura 22. Zona mosqueada no perfil das coberturas detrito-


Figura 19. Perfil simplificado das coberturas detrito-lateríticas na lateríticas. Fotografia: João Luiz Lani, agosto de 2008.
região sudeste do Estado do Acre. Fonte: Cavalcante, 2006.

22
Figura 23. Stone lines (linhas de pedras) recobertos por material Figura 24. Perfil simplificado da sequência de intemperismo das
areno-argiloso. Fotografia: Nilson Badales, maio de 2010 coberturas detrito-lateríticas que ocorrem na região sudeste do Acre.
Fonte: Cavalcante, 2006.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Assim, a matéria orgânica comanda os processos de


acidificação, enquanto o subsolo permanece rico em
carbonatos e minerais primários, formando um contraste
O Acre apresenta uma paisagem de exceção à evidente entre a atributos de herança geogenética e
Amazônia: suas vastas Florestas Tropicais abrigam muitas outros associados à atual tendência pedogenética.
variações fitofisionômicas (Tabocais, Florestas Ombrófilas
Em razão da natureza sedimentar da região, há
Densas, Abertas, Buritizais, Palmeirais, Campinaranas
no Acre uma grande ausência de rocha consolidada%, o
Florestadas, etc), assentadas sobre sedimentos e solos
consolidadas na Serra do Divisor e também foram
muito jovens, em muitos casos quimicamente mais ricos que
identificadas algumas poucas aflorantes na região de
os solos amazônicos em geral. São condições atípicas à
Assis Brasil. Esta pobreza ou ausência de rochas ígneas e
Amazônia, pela maior fertilidade. A paisagem apresenta
metamórficas é um dos grandes problemas para a
forte herança sedimentar e de um clima mais seco. Em
construção civil propriamente dito (casas, edifícios etc),
meio a deposição agrilo-arenosa, acumularam-se
para a construção de estradas e no calçamento de ruas.
carbonatos, sulfatos e alguns fosfatos, precipitados em
Na ausência de pedras , utiliza-se o tijolo. Isto eleva em
extensas planícies sazonalmente inundáveis, que secavam
muito o custo de construção e manutenção das obras de
de forma pronunciada, na época de sua formação, no
engenharia e a conservação de estradas e ruas pelas
Pleistoceno. Tais depósitos tornaram-se importantes na
fertilidade e no comportamento físico dos solos acreanos.
O pedoclima no Acre não reflete exatamente o
clima atmosférico. As argilas 2:1 herdadas do material de
origem mais rico da Formação Solimões presentes na
bacia sedimentar do Acre, expandem muito rapidamente
e não permitem a água das chuvas infiltrar, o que
aumenta as perdas de solos e água pela enxurrada. Ao
mesmo tempo, a pouca infiltração retarda o intemperismo
químico (lixiviação), por dificultar a entrada de água nos
solos. Tal condição pedoclimática singular mantém solos
rasos e pouco desenvolvidos mesmo em clima tropical
úmido. Na superfície, onde a vegetação acumula matéria
orgânica e retém umidade, os solos se mostram ácidos.
O desmatamento tende a agravar essa tendência. O meáveis do Acre, onde a manutenção de boa cobertura
Planejamento do uso do solo tendo as bacias hidrográfi- vegetal é imprescindível para evitar perdas de solo e
cas como unidade de planejamento deveria ser manutenção ecossistêmica dos igarapés e rios.
implementado além de procurar criar legislação São solos únicos, numa paisagem sui generis, e
ambiental específica neste sentido. vão exigir um conhecimento amazônico original e local,
As soluções de manejo dos solos acreanos com bem como a compreensão dos saberes de suas
vista à produção sustentável, seja com pastagens ou populações tradicionais, para o êxito de ações voltadas
agricultura, devem levar em conta as suas peculiaridades ao seu desenvolvimento. Embora já exista um belo acervo
físicas e químicas. É improvável que se possa extrapolar de informações, há muito a investigar e desvendar, e o
experimentação de outras partes da Amazônia, ou de Estado do Acre já demonstrou a capacidade de seus
qualquer região do Brasil, para os solos pouco per- recursos humanos autóctones para este desafio.

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