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INSTITUTO DE ARTES
CAMPINAS
2015
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
INSTITUTO DE ARTES
CAMPINAS
2015
Agência(s) de fomento e nº(s) de processo(s): FAPESP, 2013/05916-3; FAPESP,
2013/20817-1
Ficha catalográfica
Universidade Estadual de Campinas
Biblioteca do Instituto de Artes
Eliane do Nascimento Chagas Mateus - CRB 8/1350
Título em outro idioma: Brazilian Cinematheque: cinema, education and social inclusion
Palavras-chave em inglês:
Laurito, Ilka Brunhilde, 1925
Center of Sciences, Letters and Arts of Campinas
Brazilian Cinematheque
Moving-pictures in education
Área de concentração: Multimeios
Titulação: Mestra em Multimeios
Banca examinadora:
Fábio Nauras Akhras [Orientador]
Március César Soares Freire
Eduardo Victorio Morettin
Data de defesa: 25-11-2015
Programa de Pós-Graduação: Multimeios
This research was aimed to identify the educational activities of the Brazilian
Cinematheque, specifically regarding the activities of the Department of Children and
Youth Film. The time frame chosen, between 1954 and 1966, includes the creation of
the Department of Children and Youth Film, which at the time was in an intense action at
the educational field, headed by the poet and teacher Ilka Brunhilde Laurito. To this end,
we sought to examine the literature on the educational film archives and the Brazilian
Cinematheque, as well as official documents of the Department of Children and Youth
Film. It was also analyzed the news published by the newspapers O Estado de S. Paulo,
Correio Paulistano and Diário do Povo that dealt with the topic at the period in question.
Key words: Brazilian Cinematheque, educational cinema, films for children and youth,
Ilka Brunhilde Laurito, childrens’ cineclubism, Center of Sciences, Letters and Arts of
Campinas
RÉSUMÉ
FIGURA 2 - LE CINÉMATHÈQUE PATHÉ - REVISTA LE CINÉMA CHEZ SOI, N° 6. OUT. 192 ......... 45
TABELA 3 - FILMES PROJETADOS NO CINECLUBINHO DO CCLA ENTRE 1961 E 1962 ...................................... 129
TABELA 5 - FILMES PROJETADOS NO CINECLUBINHO DE SANTOS ENTRE 1962 E 1963
...................................
137
Ooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooooo
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 1
CAPÍTULO I -‐ CINEMA, EDUCAÇÃO E ARQUIVOS DE FILMES: DOS MUSEUS ÀS CINEMATECAS 8
REFERÊNCIAS 142
1
Nesse sentido, fez-se necessário uma aproximação maior com a história desses
arquivos a fim de verificar as influências estruturais e ideológicas que ecoariam na
experiência brasileira.
A partir desse percurso histórico sobre os arquivos de filmes, investigamos a
relação da Cinemateca Brasileira com a educação. Fundada em 1946, a Cinemateca
Brasileira é uma instituição importante para a história cultural do país tanto pelo seu
trabalho de preservação audiovisual quanto pela difusão da cultura cinematográfica.
Nesse sentido, buscamos compreender como ocorreu sua formação e qual foi a
importância dada à educação e aos filmes infantis em sua programação. Por fim,
analisamos a criação do Departamento de Cinema Infanto-juvenil e sistematizamos
suas atividades de difusão cinematográfica (formação e exibição), de formação de
cineclubes infantis e de inserção do cinema no currículo escolar.
Diante do quadro apresentado, torna-se necessário apontar e explicar duas
opções. Primeiro, ao analisarmos os arquivos de filmes educativos notamos que as
instituições francesas aparecem em maior quantidade, pois o contato com o acervo do
Departamento Infanto-juvenil nos indicou que as influências, em grande parte, vieram
da França. Esse fato, não significa que as experiências francesas foram mais
importantes e nem exclui a produção infantil/educativa de países como:
Tchecoslováquia e Rússia. Entretanto, por conta de uma barreira linguística, a
pesquisadora teve acesso aos textos e pesquisas acadêmicas em língua francesa e
inglesa.
O segundo ponto, é que embora nos documentos da Cinemateca Brasileira o
novo departamento dirigido por Ilka Laurito seja referenciado muitas vezes como
“Departamento Infantil” ou “Seção Infanto-juvenil”, neste trabalho optamos por chamar
de Departamento de Cinema Infanto-juvenil, porque as ações educativas não se
limitavam somente a infância. E a própria Ilka Laurito afirmaria que “tudo aquilo que
sugiro em relação a uma seção infantil é válido também para uma seção juvenil”1.
1
LAURITO, Ilka. [Carta] 17 de abril de 1961. Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira.
2
A revisão bibliográfica: os arquivos de filmes e a educação
2
PERRIAULT, Jacques. L’apport des archives du film pédagogique et scientifique aux sciences de l’homme et de la
société. In: Cinéma pédagogique et scientifique. À la redécouverte des archives. Lyon: ENS Éditions, 2004. p.8.
3
Alguns pesquisadores como GAUDREAULT, A.; GUNNING, T. (1989), MANNONI (2003), COSTA (1995) têm
trabalhos dedicados ao pré-cinema.
3
recrutar, além de não dispor de cursos sobre o tema. Ademais, as publicações
existentes são poucas e não existem revistas científicas nesse domínio.
No contexto brasileiro os estudos relacionados aos arquivos de filmes foram
na maior parte realizados por profissionais da Cinemateca Brasileira e concentram-se
sobre os trabalhos de preservação, catalogação e documentação, tais como as quatro
dissertações de mestrado defendidas na Escola de Comunicação e Artes da
Universidade de São Paulo: A representação de palavras do conteúdo de imagens
em movimento: uma perspectiva documentária (MATTOS, 2002); Rastros de
perícia, método e intuição: descrição do arquivo Paulo Emilio Salles Gomes
(FUTEMMA, 2006); A experiência brasileira na conservação audiovisual: um
estudo de caso (COELHO, 2009); Filmes Domésticos: uma abordagem a partir do
acervo da Cinemateca Brasileira (FOSTER, 2010). A eles, soma-se a tese A
Cinemateca Brasileira e a preservação de filmes no Brasil, (SOUZA, 2009) e a
publicação do livro: A Cinemateca Brasileira: Das luzes aos anos de Chumbo
(JUNIOR, 2010) que relata uma perspectiva política e cultural da instituição, ainda
nessa obra temos um anexo sobre atuação de Ilka Brunhilde Laurito na Cinemateca
Brasileira.
Quanto aos arquivos de filmes educativos e ao Departamento Infanto-juvenil
da Cinemateca Brasileira, não encontramos nenhuma obra que trate especificamente
do tema. No campo da educação, a dissertação Escola e cinema: o cinema educativo
na Escola Caetano de Campos em São Paulo entre os anos 30 e 60 (ABREU, 1999)
aborda a utilização do cinema na Escola Caetano de Campos e sistematiza as
exibições de filmes realizadas pela Cinemateca Brasileira.
4
puderam ser consultados encontravam-se sem catalogação e exigiram uma seleção
minuciosa da documentação esparsa. O que tornou o acesso, a organização e a
sistematização dos acontecimentos ainda mais complexa, pois percebemos a
necessidade de nomear, descrever, e organizar cronologicamente todo o material.
Soma-se, ainda, o fato de que, por vezes, alguns documentos se contradiziam ou não
foram localizados.
Nesse aspecto, as informações restituídas aqui são fornecidas por duas
etapas:
• I Fase - Coleta de Dados. Os dados da pesquisa foram coletados nos
seguintes locais: Centro de Documentação e Pesquisa da Cinemateca
Brasileira; Centro de Ciências, Letras e Artes de Campinas; Centro de
Referência em Educação/ CRE- Mário Covas e Centro de
Documentação de Apoio à Pesquisa – CEDAP/Assis.
5
• II Fase - Análise dos Documentos: organização e sistematização das
informações coletadas.
6
efetuada por meio do Departamento de Cinema Infanto-juvenil.
No primeiro capítulo, intitulado “Cinema, Educação e Arquivos de filmes:
dos museus às cinematecas” realizamos uma abordagem histórica sobre a formação
das primeiras coleções de filmes educativos dos museus escolares/pedagógicos até o
surgimento das cinematecas modernas, passando pela criação das cinematecas
educativas. Ainda apresentamos, a partir da bibliografia existente, considerações sobre
as ações educativas do British Film Institute e da Film Library do Museum of Modern Art
de Nova Iorque.
Já o segundo capítulo, “Cinemateca Brasileira: cinema, educação e inclusão
social” é dedicado à análise da formação da Cinemateca Brasileira e de suas ações
educativas. Para isso, identificamos na programação da instituição as exibições para
crianças, os cursos e os seminários de cinema.
O terceiro e último capítulo, narra a história do Departamento de Cinema
Infanto-juvenil da Cinemateca Brasileira e sistematiza suas atividades de formação
(cursos e palestras), de difusão (exibição) e de criação dos cineclubes infantis do
CCLA, da Biblioteca Infantil “Caetano de Campos” e do Cineclube de Santos. Além
disso, investigamos as concepções de cinema educativo desenvolvidas pelo
Departamento Infanto-juvenil para o projeto de inserção do cinema no currículo escolar
da Escola Padre Manoel de Paiva.
Seguem-se aos capítulos, o apêndice A com uma lista de instituições
internacionais que se corresponderam com o Departamento Infanto-juvenil da
Cinemateca Brasileira e dois anexos. O anexo I contém os cinco formulários elaborados
por Ilka Laurito para as sessões dos cineclubes infantis. No anexo II estão os desenhos
e resenhas de filmes feitos pelas crianças dos cineclubinhos.
E por fim, esclarecemos que para facilitar a leitura e compreensão do texto
optamos por: a) atualizar a ortográfica dos documentos de época; b) traduzir as
citações que estivessem em língua estrangeira. Assim, a tradução de trechos
estrangeiros neste trabalho é nossa, exceto quando citada outra fonte.
7
CAPÍTULO I
8
1. As primeiras coleções de filmes educativos
4
Kircher Athanasius nasceu em 2 de maio de 1602, na cidade de Geisa, na Alemanha. Em 1646 publicou o livro Ars
magna lucis et umbrae - A grande arte da luz e da Sombra. Segundo o pesquisador Laurent Mannoni, a obra é um
verdadeiro monumento da história pré-cinematográfica, pois aborda todos os assuntos de catóptrica e dióptrica. Para
mais informações sobre o tema, ver: MANNONI, L. A grande arte da luz e da sombra. Arqueologia do cinema.
São Paulo: Editora SENAC/SP:UNESP, 2003.
5
Ibid., p.49.
9
A lanterna mágica recebera cunho informativo graças aos lanternistas
ambulantes, que viajavam pelos vilarejos com suas caixas amarradas às costas e
projetavam, em seus espetáculos, vistas das grandes cidades da Europa. Um dos
primeiros projecionistas ambulantes com objetivos científicos foi o matemático
dinamarquês Thomas Walgenstein (1627-1681) que, em 1659, deixa a Dinamarca em
direção à Itália.
6
BASTOS, M. Pro Patria Laboremus: Joaquim José de Menezes Vieira (1848-1897). Bragança Paulista, SP:
EDUSF, 2002. p. 253.
10
Laurent Mannoni afirma que a câmera obscura estava presente em todos os gabinetes
da época.
Esses gabinetes, cuja moda atravessou séculos, reuniam numa sala, ou sobre
um móvel grande, raridades naturais (pedras preciosas, fetos, animais
empalhados), instrumentos de física e de óptica, moedas antigas, gravuras dos
grandes mestres, em síntese, tudo o que espicaçava a “curiosidade”. Eram, de
certa forma, museus pré-cinematográficos: além da câmara obscura, exibiam
também lentes, prismas, anamorfoses, discos com imagens e toda sorte de
“espelhos de prazer” ou espelhos mágicos, cujas projeções se rivalizavam com
as da câmara obscura. (MANNONI, 2003 p.43-44)
Para Bastos (2002. p.253), esse fenômeno social foi amplamente difundido e
“pouco a pouco, a natureza e a organização das coleções em museus transformam-se,
rompendo com a tradição da curiosidade”. Em relação aos filmes, Raymond Borde
(1983, p.30-6) esclarece que a ideia de conservação inicia-se em 1898, com Boleslas
Matuszewski, cinegrafista dos irmãos Lumière, que escreveu os textos “Une nouvelle
source de l’histoire: création d’un dépôt de cinématographie historique” e “La
photographie animée, ce qu’elle doit être”, sugerindo a criação de um arquivo para
guardar os registros cinematográficos. Para Matuszewski, era importante conservar as
imagens históricas que retratassem a vida cotidiana das cidades, das festas e das
escolas. Esses filmes documentários poderiam reconstruir o passado. As ações
propostas pelo cinegrafista se limitavam à cidade de Paris. No que diz respeito aos
filmes de ficção, o conselho era guardar somente os que fossem históricos, ou tivessem
aspectos da capital francesa.
Sublinhamos que a invenção do cinematógrafo dos irmãos Lumière, em
1895, intensificou as pesquisas em torno da utilização das imagens no ensino. Países
como Alemanha, EUA, França, Inglaterra e Itália se esforçaram em desenvolver o uso
do cinema na educação7. Desta maneira a medicina foi uma das primeiras a adotar o
7
Neste trabalho os termos “cinema na educação” e “cinema educativo” abrangem os filmes pedagógicos, científicos
e escolares, ainda que como conceito e prática estes filmes sejam diferentes, dentro da proposta da dissertação nos
pareceu coerente mantermos as duas terminologias para designar as imagens em movimento realizadas com fins de
ensino.
11
cinematógrafo, para o ensino da cirurgia. O médico francês Eugène Louis Doyen (1859-
1916) tinha um grande interesse pelas imagens e, em 1897, publicou, junto com o
médico Roussel, o Atlas de microbiologie illustré com 541 fotografias. De acordo com
Thierry Lefebvre (2004 apud Vignaux, 2004a, p.2), o médico construiu sua clínica em
Paris, composta por uma sala de radiografia, um laboratório de microfotografia, um
serviço de fotografia e de cinematografia que compreendia um laboratório e um estúdio
de filmagens, com uma sala de conferência munida de aparelho de projeção.
Eugène Doyen ficaria conhecido por apresentar suas operações filmadas na
reunião anual da Associação médica britânica, em 29 de julho de 1898, que ocorreu em
Edimburgo. Porém, segundo Valérie Vignaux (2004b, p.2) foi o polonês Boleslas
Matuszewski o primeiro a declarar, em la Photographie animée, ter registrado, antes de
Doyen, os trabalhos de vários médicos e cirurgiões franceses.
8
Thierry Lefebvre escreve no artigo De la Science à l’avant-garde – petit panorama que “o filme de divulgação
científica conhece seu apogeu na França entre 1910 e o início da Primeira Guerra mundial. Durante esse breve
período, a maior parte das companhias cinematográficas francesas tinham departamentos de produção
especializados. Esse era o caso da Pathé, da Gaumont, mais também da Éclair, da Éclipse, da Cosmograph e
muitas outras.” (LEFEBVRE, T. De la Science à l’avant-garde – petit panorama. In:_____. Images, science,
mouvement. Autour de Marey. Paris: L’HARMATTAN/SÉMIA, 2003. p.103).
12
medicina operatória Dr. Henri Billet. Tais iniciativas desencadearam uma preocupação
com a conservação dos filmes.
13
deveria ser feito em tiras de papel. Esse procedimento de cópias em papel era adotado
como forma de proteger o acervo documental existente na instituição, haja vista que os
incêndios causados pela combustão do nitrato eram frequentes. Enfatizamos, contudo,
que até o presente momento o objetivo da instituição era de proteger o direito legal das
obras cinematográficas. Em 1912, por conta de modificações nas leis de direitos
autorais a Biblioteca do Congresso recebe menor quantidade de cópias em papel.
Entretanto, continuaria a receber outros tipos de matérias relacionados aos filmes,
como roteiros, materiais de imprensa e fotografias. (MALTZ,A.; SHEFTER,M.R.; 2015,
p.40)
Outro tipo de acervo foram os arquivos militares, que se constituíram com o
objetivo de conservar as lembranças das armadas. Na França, criou-se o
L’Etablissement Photographique et Cinématographique des Armées (1914), na
Alemanha o Bild- und Filmamt (1917) e na Inglaterra o War Museum (1917). No que diz
respeito às ações dos poderes públicos, a questão sobre a constituição de um espaço
para abrigar os filmes seria pauta nas sessões do conselho municipal de Paris
defendidas por Henri Turot em 1906, Victor Perrot em 1911/1921, Emile Massard e
Léon Riotor em 1921.
9
Joseph Majault afirma em sua obra Centres de documentation pédagogique en Europe Occidentale que “se o termo
de documentação pedagógica não figurou no livro Esquisses et vues préliminaires d'un ouvrage sur l'éducation
comparée, de M. A. Jullien, pelo menos o aparelho das instituições futuras encarregadas de reuni-los é claramente
definido: ‘A educação como todas as outras ciências e todas as artes, compõe-se de fatos e observações. Então
parece necessário formar para esta ciência, como se fez para os outros ramos dos nossos conhecimentos, as
coleções de fatos e de observações, arranjadas nos quadros analíticos, que permitam aproximar e comparar, para
deduzir princípios evidentes, regras determinadas, para que a educação torne-se uma ciência quase positiva’.”
(MAJAULT, J. Centres de documentation pédagogique en Europe Occidentale. Paris: UNESCO,1962. p.5, grifo
nosso).
14
Joseph Majault (1960, p.5) propunha elaborar um quadro comparativo dos principais
estabelecimentos de educação da época nos diferentes países europeus. O livro
ressaltava as diferentes maneiras em que a educação e a instrução pública eram
organizadas.
Com base na descrição efetuada por Majault (1962) sobre os Centros
Europeus de Documentação Pedagógica, vamos estabelecer aqui um breve percurso
histórico sobre a importância dos museus de educação ou pedagógicos para a
constituição das primeiras coleções de filmes educativos. Segundo o autor, é a partir do
meio do século XIX e início do XX que serão abertos, em diversos países (Inglaterra,
Canadá, Estados Unidos, Holanda e Áustria), os primeiros museus de educação ou
pedagogia, tendo por objetivo reunir coleções de materiais, informações estatísticas e
obras pedagógicas, e abrir suas salas e suas estantes aos livros e materiais
estrangeiros.
Para Joseph Majault (1962, p.6), é somente a partir de 1879, com a criação
do Museu Pedagógico de Paris, que se “alarga a noção de documentação”. Assim, ao
lado da apresentação dos objetos, era preciso a criação de uma biblioteca para receber
todos os documentos históricos e estatísticos que dizem respeito à organização
escolar. O autor sublinha ainda, o importante papel desempenhado pelos museus, visto
que, entre 1851 e 1911 foram criados 72 museus pedagógicos no mundo. Essas
primeiras coleções dos museus desencadearam na formação dos primeiros arquivos
educativos. Analisaremos adiante a experiência do Museu Pedagógico de Paris (1879)
e do Museu Escolar da Bélgica (1880) que desenvolveram serviços ou seções
direcionadas ao cinema. Por fim, revisaremos a experiência brasileira com o Museu
Nacional (1818), o Museu Escolar Nacional (1883) e o Pedagogium (1890).
15
2.1 O Museu Pedagógico de Paris
10
FRANÇA. Archives Nationales. Musée Pédagogique. État général des fonds des Archives nationales
(Pierrefitte-sur-Seine). Disponível em: <http://www.archivesnationales.culture.gouv.fr/chan/chan/series/pdf/71AJ.pdf
> Acesso em: 4 set. 2014.
16
destinado aos professores. Esse serviço de empréstimos de placas só fecharia em
1953.
17
O conflito que cercava a lei escolar e o boicote subsequente à Exposição
nacional por parte da elite católica forneceu à elite liberal a ocasião de
promover seu ponto de vista aos visitantes [...] tal situação foi suscetível de dar
aos visitantes pouco informados das querelas políticas das elites, a impressão
de que o ensino público e laico era unânime e que a qualidade e a
sobrevivência deste eram inteiramente devidas à administração liberal.
(Constant, 2006, p.368)
18
do Rio de Janeiro. Segundo Margaret Lopes, o museu “foi por praticamente um século
uma das poucas e a principal instituição brasileira dedicada primordialmente à História
Natural” (LOPES, 1997, p.11).
Em 1910, a relação do Museu Nacional com o cinema teria tido início por
meio da organização de uma filmoteca com o objetivo de manter uma coleção de filmes
de história natural. Porém, há dúvidas quanto à data exata de sua criação. Carlos
Roberto afirma que o “Brasil teria sido pioneiro na criação de um setor dedicado ao
arquivamento de filmes com finalidades educativas”11, caso fossem encontrados
registros que comprovassem a existência da filmoteca nos primeiros anos do século
XX. Para o pesquisador, a informação foi fundamentada em um relatório escrito, em
1938, por Edgard Roquette-Pinto, sobre a situação do cinema educativo. Nesse
documento ele afirmava que “o emprego do cinema no ensino e na pesquisa
cinematográfica pode ser datado de 1910, quando foi iniciada a filmoteca do Museu
Nacional que mais tarde a Comissão Rondon enriqueceu notavelmente” (ROQUETTE-
PINTO, 1938, apud SOUZA, 2009 p.16). Conforme Carlos Roberto de Souza (2009,
p.16), não foi localizado nos arquivos do Museu Nacional nenhum registro sobre a
criação da filmoteca antes de 1927, quando se organizou o Serviço de Assistência ao
Ensino de História Natural.
O percurso de Edgard Roquette-Pinto, no Museu Nacional, tivera início em
1905, com sua contratação como auxiliar substituto da Seção de Antropologia,
Etnografia e Arqueologia da instituição. Em 1926, ele se tornaria diretor do Museu
Nacional e durante onze anos permaneceria na instituição. Na análise de Margaret
Lopes (1997, p.229) a atividade educativa da instituição vinha ganhando peso e se
consolidara com o “artigo 59 das ‘Disposições Gerais’ que propunha a criação de um
Museu Escolar”.
11
SOUZA, Carlos Roberto. A Cinemateca Brasileira e a preservação de filmes no Brasil. 2009, 310 p. Tese
(Doutorado) – Departamento de Cinema, Televisão e Rádio / Escola de Comunicação de Artes, Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2009. p.15.
19
No início do século, essa especialidade de museu também se disseminou por
diversos países, no contexto das críticas ao ensino tradicional livresco,
integrando o movimento educacional conhecido por “Escola Nova”. No Brasil,
esse movimento teria seu auge no final da década de 1920, e dele participariam
ativamente os professores do Museu Nacional, como Roquette-Pinto. Museus
“Escolares” ou “Pedagógicos” foram criados a essa época em diversos países
na Europa, nos Estados Unidos e na América Latina. Esses diferiam das
simples coleções mantidas pelas escolas por sua maior abrangência, dispondo
de coleções especiais para atendimento de professores e alunos. (LOPES,
1997, p.229)
12
Cf. Um Cinema de Films Educativos no Museu Nacional. Cinearte, Rio de Janeiro, n.317, p. 15. 23/mar/32.
13
Ibid., p.15.
14
Ibid., n. 318 p.38. 30 mar. 1932.
20
Tabela 1 – Atividades do Serviço de Assistência ao Ensino – Museu Nacional
21
tome maior contato com o processo de consolidação da educação como signo de
civilização, de progresso, de sociedade moderna”. Assim, o deputado Franklin Doria,
que era secretário da comissão diretora da exposição, criou, com o apoio de Conde
d’Eu, a Associação Mantenedora do Museu Escolar Nacional, que estruturou uma
biblioteca, além de cursos, conferências públicas e exposições escolares.
15
BASTOS, M. Pro Patria Laboremus: Joaquim José de Menezes Vieira (1848-1897). Bragança Paulista, SP:
EDUSF, 2002. p.271.
22
Ainda que tenha tido uma forte atuação no campo educativo, o Museu
Escolar passava por crises financeiras, pois a associação mantenedora do museu
sobrevivia de donativos e não tinha auxílio do poder público, o que enfraqueceria suas
atividades nos anos seguintes. Bastos (2002, p.272) explica que as discussões em
torno da criação de um museu pedagógico estavam presentes nas conferências
populares da Freguesia da Glória, e que, no ano de 1889, foi proferida uma conferência
sobre “A necessidade de um museu escolar, a cargo do Dr. João Kopke”. Convém,
lembrarmos, que o Museu Pedagógico de Paris e o Museu Escolar belga haviam sido
criados, respectivamente, em 1879 e 1880. Ou seja, um movimento em prol da
formação de uma instituição nos moldes europeus pulsava cada vez mais forte no meio
educacional.
Em 16 de agosto de 1890 é fundado o Pedagogium, com projeto do
inspetor-geral da Instrução Primária e Secundária Franklim Ramiz Galvão o novo
museu iria requisitar o acervo da biblioteca e o material clássico da extinta Associação
Mantenedora do Museu Escolar (1883) e da Associação Promotora da Instrução (1874)
para integrar sua coleção. (CARTOLANO, 1996 apud BASTOS, 2002, p.274).
Com sede no Rio de Janeiro, a nova instituição tinha por objetivo a difusão
dos museus escolares ou pedagógicos nos demais estados da República e a
organização de museus escolares nas escolas. Para Bastos (2000), as propostas do
Pedagogium se aproximavam das do Museu Pedagógico de Paris:
23
pedagógica; criar, manter e desenvolver por todos os modos a estatística do
ensino no país; coligir e coordenar todos os dados possíveis acerca do mesmo
assunto no estrangeiro; publicar anualmente, em edições populares, o fruto
deste duplo trabalho.’ “(BARBOSA, Rui. Obras Completas. Vol. X - 1883. Tomo
m, p. 190-199 apud BASTOS, 2000, p.94).
16
Maria Bastos explica que existe grande semelhança entre a Revista pedagógica e a Revue Pédagogique e entre
as coleções Memórias e Documentos Escolares e Mémoires et documents scolaires du Musée pédagogique “que
constava de documentos legislativos, documentos administrativos, orientações pedagógicas, documentos históricos,
catálogos, variedades científicas, literárias e gramaticais”. (BASTOS, Maria. Ferdinand Buisson no Brasil – Pistas,
vestígios e sinais de suas ideias pedagógicas (1870-1900). História da Educação. ASPHE/FAE/UFPel, Pelotas, set.
2000. p.100).
17
BRASIL. Inspectoria Geral da Instrução Primaria e Secundaria da Capital Federal dos Estados Unidos do Brazil.
Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Rio de Janeiro, 18 dez.1890. Seção 1, p.
5830, grifo nosso.
18
BRASIL. Classificação Geral das Mercadorias – Tarifa II. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil,
Poder Executivo, Rio de Janeiro, 25 jun.1894. Seção 1, p. 2262, grifo nosso.
24
coleções eram obrigados a aceitar o preço estipulado pela comissão. Caso optassem
por receber o prêmio em dinheiro, deveriam ceder os direitos da coleção ao
Pedagogium.
Entre 1894 e 1896, a lanterna mágica aparece na classificação geral das
mercadorias – tarifa II - do Diário oficial da República 19. A pesquisa realizada em torno
da difusão da Lanterna mágica entre 1890 e 1896 no site do Jusbrasil não foi extensa,
pois o desenvolvimento dessa questão implicaria outro tipo de análise e
aprofundamentos, o que extrapolaria os limites temáticos deste trabalho20. Desta
maneira, não podemos afirmar que a exemplo do Museu pedagógico de Paris, o
Pedagogium tenha criado também um serviço de projeções luminosas que distribuísse
vistas para as instituições de ensino. Mas, sabemos que, durante o período de sua
existência, o museu foi responsável pela regulamentação e difusão dos museus
escolares e de suas coleções que como observamos podem ter incluído as lanternas
mágicas. Ademais, a instituição também realizou o levantamento de dados sobre a
situação escolar do país e das funções de ensino (cursos e conferências).
Até o momento, vimos que era latente o interesse pelas imagens no meio
educacional. E principalmente, que esse interesse vai se transformando em ações que
com o tempo ganham forma e se transformam em setores específicos como foi o caso
do Museu de Paris que, entre 1901 e 1903, constitui seu serviço de projeções
luminosas. Veremos que as transformações técnicas irão potencializar ainda mais o uso
das imagens nas instituições escolares.
19
De acordo com o art° 25 do Diário Oficial da República, 06/01/1895, a tarifa n.2 teria aplicação a todas as
mercadorias divididas em 9 classes segundo a pauta anexa a estas condições, e seus fretes seriam cobrados de
conformidade com os quadros em anexo. O que nos leva a acreditar que durante esse período pode ter havido uma
comercialização de lanternas mágicas. Disponível em: <http://www.jusbrasil.com.br/diarios/1597442/pg-2-secao-1-
diario-oficial-da-uniao-dou-de-07-01-1895/pdfView> Acesso em 19 nov. 2014.
20
Para mais informações sobre as lanternas mágicas no Brasil ver : TRUSZ, Alice. Entre lanternas mágicas e
cinematógrafos. São Paulo, SP : Terceiro Nome : Iniciativa Cultural, 2010.
25
3. As Cinematecas Educativas
21
Em 1909, a companhia americana Eastman Kodak anunciou a criação de uma nova película sobre suporte de
diacetato de celulose, intitulada “safety”. Segundo Fernanda Coelho, “sob o nome de “filme de segurança” (safety),
os acetatos de celulose - diacetato de celulose, acetato-propionato, acetato-butirato e triacetato de celulose-
substituíram as películas de nitrato. Lamentavelmente, a denominação ‘película de segurança’ justifica-se somente
porque é um tipo de plástico que queima com dificuldade e não são auto-inflamáveis (como o nitrato). Porém, as
condições necessárias para a sua conservação são tão exigentes quanto para as do nitrato. (COELHO, Maria
Fernanda. A experiência brasileira na conservação de acervos audiovisuais. Um estudo de caso. 2009. 288 p.
Dissertação (Mestrado em Ciências da Comunicação) – Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São
Paulo, São Paulo, 2009.p.241).
22
Iniciado pela companhia Pathé esse sistema ficou conhecido como “Golpe de Estado Pathé”, para mais
informações ver : SADOUL, George. História do Cinema Mundial. 1.V São Paulo: Martins Fontes, 1963. Capítulo V.
26
Para Aubert Michelle et al (2004, p.23), foi a companhia Pathé a grande
inovadora, lançando-se muito cedo na produção educativa graças aos seus formatos
reduzidos: o Pathé Kok 28 mm (1912), o Pathé-Baby 9,5 mm (1922) e o Pathé Rural
17,5 mm (1927). A coleção Pathé-Baby seria o maior sucesso da companhia, o primeiro
projetor lançado para o Natal de 1922 era destinado, inicialmente, apenas à projeção de
filmes - alugados ou comprados - que fizessem parte do catálogo Pathé-Baby. No ano
seguinte seria lançada a “Baby-Câmera” uma pequena câmera de filmar que tinha por
objetivo alcançar um público não profissional. Assim, a Société Pathé-Cinéma colocou
no mercado um produto não inflamável, de fácil manuseio com preço acessível. O novo
aparelho utilizava um filme de 9,5 mm com perfuração central que era mais econômico
que o formato standard 35 mm e mantinha uma boa qualidade de imagem nas
dimensões 6,5 x 8,8 mm (CRETON, 1999, p.150). O equipamento foi bem aceito na
França e o Pathé-Baby acabou sendo comercializado em outros países da Europa, na
América Latina e no Japão. No Brasil podem ser encontrados anúncios dos
equipamentos nas revistas Cinearte e A Scena Muda 23. Segundo a pesquisa de Daniel
Righi (2011), o Cine Educativo de João Penteado realizado, entre 1932 e 1952, na
escola Academia de Comércio Saldanha Marinho utilizava um projetor Pathé-Baby e
possuía filmes educativos produzidos nas décadas de 20 e 30 do século XX24. Para
Laurent Creton (1999, p.144), o Pathé-Baby “foi um sucesso comercial, que não
somente teve um papel importante no desenvolvimento do mercado de cinema amador,
mais ainda conheceu uma perenidade excepcional”.
Desde o lançamento do Pathé-Baby, a companhia Pathé disponibilizava um
catálogo no qual seguia uma lista dos filmes 9,5 mm disponíveis para locação e venda.
No vasto repertório constavam filmes de geografia, de física, de tecnologias, de
psicologia, de botânica, de biologia e de zoologia, além de versões reduzidas dos filmes
23
FOSTER, Lila. Filmes Domésticos: uma abordagem a partir do acervo da Cinemateca Brasileira. 2010. 133 p.
Dissertação (Mestrado em Imagem e Som), Universidade Federal de São Carlos, São Carlos, 2010. p.41.
24
RIGHI, Daniel. O Cine Educativo de João Penteado: iniciativa pedagógica de um anarquista durante a Era
Vargas. 2011. 122 p. Dissertação (Mestrado em Educação) , Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011.
27
clássicos da época, que já haviam sido exibidos comercialmente, e que eram
convertidos de 35 mm para 9,5 mm. Para Borde e Perrin:
a grande ideia de Charles Pathé foi de criar uma enorme cinemateca para
alimentar os projetores 9,5 mm. Ele pretendia que esta cinemateca contivesse
quase tudo que o cinema mundial produziu de bom desde 1895: cômicos
franceses e americanos, dramas, séries, diretores (por exemplo os filmes de
Griffith). Os títulos novos eram comprados pela Pathé e editados, em versões
frequentemente encurtadas (BORDE; PERRIN,1992, p.98).
28
salientar que o período de 1920 e 1930 foi marcado pela militância em prol dos
trabalhadores, pelas sequelas da primeira guerra, pela intervenção da igreja
(moralização e ensino) e pelos movimentos de ensino laico. Notaremos que esses
fatores influenciaram no surgimento e na administração dessas instituições. Portanto
esboçaremos aqui, de forma concisa, o perfil destas, ressaltando os objetivos, a
composição do acervo e o processo de difusão dos filmes.
Figura 1 - Revista Le Cinéma Chez Soi, n°6. Out. 1926 Figura 2 - Le Cinémathèque Pathé - Revista Le Cinéma
Fonte: Arquivo de Periódicos – Cinemateca Francesa o Chez Soi, n° 6. Out. 1926
Fonte: Arquivo de Periódicos – Cinemateca Francesa
29
3.1 A Cinemateca da Cidade de Paris
25
Cf. Rapports et documents du conseil municipal de la ville de Paris, n°26 du 1° mars 1921. Citado por PASTRE-
ROBERT. Enfer, amnésie, rédemption: une histoire du fonds de la Cinémathèque Robert-Lyen. In: PASTRE-
ROBERT, B., DUBOST, M., MASSIT-FOLLÉA, F. (Orgs). Cinéma pédagogique et scientifique. À la redécouverte
des archives. Lyon: ENS Éditions, 2004. p.45.
26
Léon Riotor (1865-1946) era conselheiro municipal da prefeitura de Seine, fundou a Société l’Art à l’école e foi um
grande defensor do cinema de ensino. É atribuído a ele a concepção dos primeiros filmes de orientação e formação
profissional.
27
É notadamente, importante, ressaltar que, em 1922, havia sido criada a Cinémathèque de Saint-Étienne que tinha
por finalidade facilitar a utilização do cinema no contexto escolar. Criada pela cidade de Saint-Étienne, pela Inspeção
Acadêmica e pelo departamento de Loire, seu acervo inicial era composto de filmes instrutivos – documentários,
principalmente, da coleção Pathé, filmes de ficção e animação - doados pelo Ministério de Instrução Pública por
30
A cinemateca de Paris abriu suas portas em 1° de janeiro de 1926, sendo
financiada pelo departamento de La Seine e administrada pela Direção do material e
dos serviços administrativos do ensino primário. Adrien Bruneau, inspetor de ensino
artístico e profissional, seria o diretor de 1926 a 1937. Desde o início, a proposta de
recolher e guardar filmes estava presente como objetivo central da instituição. No texto
de Bruneau apud Devos (1995, p.64), o diretor informa que, entre os objetivos, existia o
de “conservação dos primeiros filmes de ensino e das coleções sobre a história do
cinema”. Béatrice de Pastre-Robert (2004) sublinha que entre a ideia de um arquivo de
filmes e de uma cinemateca escolar, também já figurava o ideal do depósito legal de
filmes. Porém somente no fim dos anos 40, esse sistema se tornaria uma realidade na
instituição.
Não queremos aqui nos aprofundar na questão de qual foi o período exato
que a instituição estabeleceu uma política de depósito legal, mas sim chamar a atenção
para a ocorrência de uma preocupação desde o princípio com a conservação do filme.
No que concerne à constituição do acervo, Devos (1996) e Pastre-Robert
(2004) explicam que a cinemateca tinha como política a compra, encomenda e
produção de filmes. É justamente “a compra de direitos e a tiragem de cópias novas de
31
acordo com negativo” que enriqueceriam o arquivo, “além de guardar sua
independência e de respeitar sua direção pedagógica” (PASTRE-ROBERT, 2004, p.49).
A cinemateca de Paris tinha como objetivo reunir e difundir no ensino, filmes adaptados
aos programas escolares, que muitas vezes se tornavam difíceis de serem encontrados
nas companhias cinematográficas, como Pathé, Gaumont e Éclair. Desta maneira,
mantinha um laboratório fotográfico28, onde compunha seus filmes educativos através
da montagem de imagens de origens diversas. A instituição modificava os intertítulos ou
adicionava aos já existentes, quando julgava haverem lacunas de mapas e esquemas
animados. Segundo Pastre-Robert (2004, p.49), a remontagem dos filmes era algo
natural na época, e cita o prefácio do repertório de 1935 onde M. Masbou explica:
Um laboratório de fotografia que (lhe) permite [...] de tirar parte dos filmes
documentários ou de atualidades que encontra no comércio recortando-os de
outra forma, adiantando ou completando tanto pela introdução de legendas
precisas, de esquemas e de mapas, que os tornem mais facilmente utilizáveis
(PASTRE-ROBERT, 2004, p.49).
28
Emmanuelle Devos afirma que no relatório do conselho municipal escrito por Adrian Bruneau a cinemateca era
formada por uma sala de projeção com 400 lugares, um laboratório de fotografia, um ateliê de montagem e
preparação do filme, um ateliê de desenho e legendas, um espaço para as coleções de filmes de Paris que “oferecia
todas garantias de segurança e conservação”, uma biblioteca de cinema, uma sala de exposição permanente com os
melhores aparelhos escolares, uma sala de reunião e por fim um museu do cinema de ensino que estava em
construção, porém de acordo com os documentos acessados pela pesquisadora no arquivo do Musée École de la
Perrine à Laval tudo indica que a descrição feita por Bruneau pertencia a sua escola “Art et Publicité” criada em 1920
e que anos mais tarde abrigaria a cinemateca de cidade de Paris. In: DEVOS, E. La cinémathèque de la ville de
Paris. Les idées et les faits (1906-1938). 1996. 110 p. Dissertação (Mestrado em Cinema e Audiovisual) –
Universidade Sorbonne Nouvelle Paris III, Paris, 1996. p. 62.
32
formato 35 mm mudo, conjunto revelador de um engajamento pedagógico e estético”
(PASTRE-ROBERT, 2004, p.105).
O acervo de filmes da cinemateca de Paris era específico às necessidades
do ensino primário, e possuíam a seguinte divisão: “ciências naturais; física e química;
lições de coisas; higiene; geografia; grandes documentários; fatos históricos; ensino
artístico; orientação profissional; escolas profissionais; exercícios físicos” (DEVOS,
1996, p. 87).
A cinemateca de Paris abrigou em seu espaço duas instituições: a
Cinémathèque Centrale d’Enseignement Professionnel e l’Office Cinématographique
d’Enseignement et d’Éducation de Paris. A Cinémathèque Centrale d’Enseignement
Professionnel foi criada em 27 de janeiro de 1926, com o objetivo de reunir filmes sobre
as atividades profissionais. Sua atuação não se restringiu a Paris e ao departamento de
La Seine, estendendo-se por toda a França, por intermédio da criação de cinematecas
regionais entre 1924 e 1933. Essas instituições mantiveram uma administração
independente, porém a direção geral era comum. A partir de abril de 1929, o Office
Cinématographique d’Enseignement et d’Éducation de Paris dividiria o espaço com a
Cinémathèque Centrale d’Enseignement Professionnel e a Cinémathèque de la Ville de
Paris. Ele fazia parte da iniciativa da direção geral de ensino técnico, de criar “agências”
com a finalidade de difundir filmes nos horários extraescolares, e sua programação era
formada por sessões recreativas. Tanto a Cinémathèque Centrale como o Office
Cinématographique mantiveram administrações independentes, entretanto suas
estruturas e atividades influenciariam diretamente a Cinemateca de Paris, tornando-se
complementares.
Durante a segunda guerra mundial a atuação da Cinemateca da Cidade de
Paris foi limitada devido, principalmente, a três razões: a restrição das atividades
associativas extraescolares que restringia o acesso de uma parte de seus usuários; a
escassez de película; e a censura e requisições dos alemães. Em 1948, a instituição
retomaria suas atividades apoiando um grupo de professores do Ciné-Club des
Instituteurs que, descontentes com os filmes pedagógicos do mercado, passam a
33
realizar seus próprios filmes. A cinemateca fornecia o material – películas 8 mm, 9,5
mm e 16mm, câmeras 16mm e equipamentos de luz – aos professores, além de
comprar para o acervo da instituição os filmes produzidos por eles. A parceria entre a
cinemateca e o Ciné-Club des Instituteurs se desfaz em 1951, porque os professores
passam a utilizar o material fornecido para uso pessoal.
Entre 1951 e 1959, a cinemateca de Paris investiria novamente na produção
de filmes. A partir de 1955, o novo diretor Gaston Gathier e seus colaboradores Claude
Ehrmann e Pierre Briottet realizaram 11 filmes concebidos para as crianças das escolas
maternais. Os filmes, idealizados como ferramenta de ensino, permitiam “uma
impregnação pelas crianças dos códigos próprios da linguagem cinematográfica e
conduzia a aquisição de uma ‘certa cultura fílmica’” (PASTRE-ROBERT, 2004, p.110).
Atualmente a instituição foi renomeada Cinemateca Robert Lynen de Paris e,
embora passe por crises financeiras, mantém suas atividades de empréstimo e exibição
de filmes em escolas.
34
Em relação à difusão, os Offices distribuíam filmes em 35 mm em escolas,
sociedades laicas e organizações rurais. A programação formava-se de curtas-
metragens pedagógicos, longas-metragens de ficção, desenhos animados e cômicos
americanos e franceses, que faziam parte da sessão recreativa. Borde e Perrin (1992,
p. 8), afirmam que os Offices tiveram papel importante na salvação e divulgação dos
filmes mudos, pois, com a chegada do filme sonoro, na década de 1930, a maioria das
salas comerciais passaram por renovações técnicas, e a publicidade estava totalmente
voltada para o sonoro. Neste sentido, ocorre uma onda de abandono e destruição dos
filmes antigos. Os Offices aproveitam a situação para comprar os antigos aparelhos de
projeção, além de procurar reunir os filmes clássicos da época.
A diferença entre os Offices du Cinéma Éducateur e as demais cinematecas
educativas francesas estava na programação. Os Offices iriam priorizar os filmes de
ficção em detrimento de outros. “Eles abrirão as portas das escolas e das organizações
rurais aos filmes recreativos, o que significa, tudo simplesmente, ao cinema que nós
amamos. Os Offices por conseguinte edificaram-se a partir das redes escolares que vão
absorver e transcender” (PERRIN, 2001, p.130). As sessões realizadas pelos Offices
compreendiam um Ciné-revue, um cômico, um longa-metragem e outro cômico. Quanto
à origem dos filmes de longa metragem: 57% eram estrangeiros sendo 37%
29
americanos, 9% alemães e 11% de outros países . Para Borde e Perrin (1992, p.43),
os Offices olhavam largamente o mundo, principalmente para o mundo antigo, pois os
filmes mais antigos eram de 1918, enquanto os mais novos eram de 1929, e estes
foram distribuídos até a segunda guerra mundial. No caso dos curtas-metragens, a
maior parte eram de cômicos americanos, a exemplo de Charles Chaplin, Harold Lloyd
e Buster Keaton.
29
Dados constantes em: BORDE, R., PERRIN, C. Les Offices du Cinéma Educateur et la survivance du muet
(1925-1940). Lyon: Presses universitaires de Lyon, 1992. p.43.
35
2 - Nas famílias, em versões encurtadas, e em formato reduzido (9,5 mm) com
projetores de apartamentos. (PERRIN, 2001, p.136).
36
oficial da Cinemateca Cooperativa somente seria votada pelos membros da l’Imprimerie
à l’École, movimento pedagógico liderado por Freinet, no Congrès Syndical de Tours,
em 1927. Nesse congresso Freinet e Rémy Boyau apresentam os primeiros filmes
escolares.
37
aquisição de filmes de ensino da coleção 9,5 mm Pathé-Baby. O que levaria a
instituição a completar, em 1929, sua coleção de filmes de ensino do catálogo Pathé-
Baby. Outro fator relevante para a composição do acervo foi a subvenção do Estado
francês, a partir 1928, para a compra de materiais cinematográficos. Desta maneira, a
Cinemateca C.E.L adquiriu uma motocâmera Pathé-Baby de filmagens, que permitiu
aos professores realizarem filmes sobre seus alunos, suas regiões e suas atividades.
38
a estabelecer contatos com cineastas profissionais e militantes, sugerindo a
possibilidade de filmar em formato standard 35 mm e, posteriormente, fazer cópias em
formato reduzido 9,5 mm para o sócios da cinemateca.
Raymond Borde e Charles Perrin (1992, p.100-1) destacam a importância da
liberdade dos filmes documentários produzidos pela Cinemateca C.E.L, que já possuía
em seu acervo filmes realizados por professores, entre eles o próprio Freinet, e
editados pela cinemateca.31 Destes restam alguns trechos de Fabrication des parfums
aux environs de Cannes (C. Freinet), La culture de l’Olivier e l’industrie de l’Olivier
(H. Bourguignon), Um combat de coqs (J.Roger). Todavia, o filme que recebeu maior
notoriedade foi Prix et Profits ou La pomme de terre de 1931, dirigido por Yves
Allégret, com roteiro de Yves Allégret e Michel Collinet e imagens de Eli Lotar. A
película mostra, através da plantação de batata, qual era o caminho percorrido desde a
produção até o consumo, destacando a evolução do preço. “As cenas permitirão
igualmente mostrar a vida cotidiana difícil de uma família camponesa e de uma família
trabalhadora, a exploração capitalista, mais também a ideologia burguesa que é
veiculada nos manuais escolares da época” (PERRIN, 2001, p.119).
39
locação de filmes, e também de vendas de materiais cinematográficos, com a chegada
da segunda Guerra Mundial. Entre 1953 e 1956, a cinemateca C.E.L retomaria suas
atividades sob a presidência de Honoré Alziary, e com o apoio de Célestin Freinet como
tesoureiro.
40
filmes recreativos para crianças. Além disso, em torno de 360 curtas-metragens
foram aprovados ao público juvenil. (STORCK, 1950, p.161, grifo nosso)
41
ambientadas em quartos, a não ser que tivessem duas camas separadas”. Para
Marjorie Dawson (1950), a utilização do código facilitava o trabalho do comitê.
42
observavam o interesse que as crianças manifestavam durante a projeção e mesmo
filmes de alta qualidade eram rejeitados se aborrecessem os jovens. Se fosse verificado
que cenas isoladas causavam o aborrecimento ou que alguns trechos estavam em
desacordo com as qualidades estipuladas pelo comitê (educativa, moral, social ou
psicológica), poderiam ser realizados acordos com os produtores a fim de retirá-las.
Ressaltamos, contudo, que os filmes somente eram liberados para exibição
comercial depois do parecer do comitê. Portanto, o National Children’s Film Library
Committee fixou duas classificações para os filmes inéditos ou reeditados e distribuídos
no comércio: “1. Children’s Programs Recommend – Esse certificado se aplicava aos
filmes inéditos ou reeditados reconhecidos pela alta qualidade; e 2. Children’s Programs
Acceptable - se aplicava aos filmes inéditos ou reeditados recomendáveis em razão de
seu valor educativo, moral ou social, cuja qualidade não era excepcional” (STORCK,
1950, p.135). Além de regulamentar a exibição dos filmes recreativos, o The Children’s
Film Library mantinha no acervo uma coleção de filmes escolhidos pelo comitê.
Segundo Dawson, as cópias dos filmes recomendados eram conservadas por cada
centro regional de troca, como parte da coleção da instituição. Todos os exibidores que
desejassem mostrar esses filmes em sessões especiais para crianças podiam obtê-los
a um preço reduzido. O exibidores precisavam se dirigir ao The Children’s Film Library
ou ir diretamente ao distribuidor.
Diferente das instituições estudadas até o momento, o The Children’s Film
Library não julgava ser necessário a produção de filmes especializados para crianças
maiores de 8 anos, pois acreditava que a partir dessa idade já era possível distinguir
entre o mundo real e o imaginário. Para Dawson, a criança estava integrada no mundo
adulto e tinha se habituado a viver nele. Em relação aos pequenos espectadores
americanos, ela afirma: “nossas crianças têm já uma vasta experiência dos filmes
destinados ao público de todas as idades. Os filmes realizados especialmente para eles
não alcançam o sucesso e são julgados cansativos por eles” (STORCK, 1950, p.166).
Outro diferencial é que a instituição americana não fazia empréstimos para escolas,
associações e cineclubes: o atendimento da Film Library estava focado nas salas
43
comerciais. Porém, poderiam ser realizadas sessões especiais para grupos escolares.
Sobre o assunto, Marjorie Dawson (1950, p.178) afirma que “com base em sua
experiência e sob longa reflexão, o comitê da cinemateca das crianças considera que a
projeção dos filmes recreativos destinados aos espectadores juvenis deve fazer-se nas
salas de cinema comuns”. Outra colocação a ser feita é que, embora o The Children’s
Film Library mantivesse como critério para seleção dos filmes a qualidade educativa,
seu objetivo era selecionar e constituir um acervo somente de filmes recreativos.
No que se refere ao acervo de filmes, a instituição encontrava dificuldades
para adquirir obras, pois os produtores não queriam correr o risco de ter gastos tirando
uma nova cópia que poderia não ser aceita pelo comitê. E, quando se tratava de filmes
antigos reeditados, os produtores não podiam ceder os direitos à The Children’s Film
Library. Desta maneira, o comitê analisava, especialmente, filmes de 35 mm destinados
aos adultos que eram distribuídos pelas sociedades afiliadas à Motion Picture
Association of America e que poderiam vir a fazer parte do acervo da instituição.
44
especializados que substituem as fantasias e os artistas das famosas comédias. As
transformações sucedidas fizeram com que os pequenos filmes apresentados em
feiras, cafés e teatros perdessem seu valor artístico. Nesse sentido, os antigos filmes
passam a ser chamados de “Vieux ciné” e perdem espaço no mercado que começa a
vendê-los à indústria química. Estima-se que para o período de 1895 a 1915 foram
perdidos em torno de 80% da produção mundial (BORDE, 1988, p.17).
O segundo momento sucedeu no fim dos anos 20 com a rejeição do cinema
mudo. A chegada do filme sonoro transforma o mercado cinematográfico e o
comportamento do público. José Quental explica que:
Podemos afirmar que, novamente, a ideia do “Vieux ciné” ganha lugar e uma
nova onda de destruição se instaura. Porém, dessa vez o desaparecimento de muitos
filmes iria gerar um choque cultural que ocasionaria em mudanças quanto à
conservação dos filmes. É necessário esclarecer dois fatores importantes para
compreendermos as transformações ocorridas em relação à salvaguarda dos filmes: o
primeiro é a valorização do cinema como arte e o segundo é a formação do movimento
cineclubista.
A cinematografia no início era vista como uma diversão das classes
populares (proletariados, pobres e marginais) das grandes cidades. A partir de 1910 e
1920, surgem os primeiros críticos e teóricos que iniciam as discussões em torno da
elevação do cinema como arte, equiparando-o com as Belas Artes. Este movimento
crítico ganharia força em 1921, com o italiano radicado na França Ricciotto Canudo32,
que cria o Club des Amis du Septième Art, e com Louis Delluc e Charles de Vesme, que
32
A partir de 1911, Ricciotto Canudo cunha a expressão Sétima Arte para designar o cinema em seus escritos
publicados em Manifeste des Sept Arts e em Esthétique du Septième Art.
45
resgatam o termo cineclube por meio do periódico Le Journal du Ciné-Club33. Canudo
tinha a intenção de provar “por todos os meios o caráter artístico do cinema”, ele
pretendia “elevar o nível intelectual da produção francesa” e “colocar tudo em obra de
modo a lançar ao cinema os talentos criadores, os escritores e os poetas”.
(MANONNI,1994, p.170). Suas ações incentivaram a formação de novos cineclubes
que promoviam sessões com filmes, clássicos ou da vanguarda francesa, de difícil
acesso, a fim de ensinar a linguagem cinematográfica. Segundo Jean Mitry (1987 apud
Manonni, 1994, p.173), é somente a partir de 1925 que seria desenvolvido esse formato
de cineclube que conhecemos atualmente com sessão acompanhada de uma
apresentação e de um debate.
Na década de 30, com o advento do cinema sonoro, os clubes de cinema se
transformam. O ideal da reflexão crítica perde-se perante aos filmes falados. Este
momento marcou “o fim de um certo gênero de cineclubes intelectuais, aqueles que
sustentavam apaixonadamente os filmes estrangeiros difíceis, ou a excepcional
vanguarda francesa, que não pôde resistir à vaga dos filmes falados comerciais”
(MANONNI,1994, p.172). Na direção oposta da maioria, alguns clubes de cinema
mudam sua postura diante da destruição dos filmes mudos que tornaram-se raridades.
Inicia-se a formação de cineclubes direcionados à exibição do mudo, e com uma
preocupação em formar e conservar uma coleção de filmes, tais como o Cercle du
Cinéma fundado, em 1935, por Henri Langlois, Gerorge Franju e Jean Mitry. No ano
seguinte o cineclube se transformaria na Cinemateca Francesa. Laurent Manonni
(2006, p.23) considera que as “verdadeiras cinematecas” nascem da “carência
progressiva” dos cineclubes que se renderam ao cinema sonoro.
Deste contexto eclodem os arquivos de filmes, tais como: o Svenska
Filmsamfundet (1933), em Estocolmo; o British Film Institute (1933), em Londres, o
33
Laurent Manonni afirma que o termo Cineclube não foi criado por Louis Delluc, pois em “14 de abril de 1907,
Edmond Benoit-Lévy, diretor da revista Phono-Ciné-Gazette, anuncia a fundação do primeiro ciné-club, instalado nº
5, Boulevard Montmartre, em Paris, na sede de um cinema Pathé e da futura sociedade Omnia”. (MANONNI, L.
“Ciné-clubs et Clubs”. In: Dictionnaire du cinéma mondial: mouvements, écoles, courants tendances et genres.
Org Alain et Odette Virmaux. Editions du Rocher, 1994. p.170-175. Tradução Fausto Côrrea Jr., publicado em
http://preservacaoaudiovisual.blogspot.com.br/2008/12/cineclubes-e-clubes.html).
46
Reichsfilmarchiv (1934), em Berlim; a Film Library do Museum of Modern Art de Nova
Iorque (1935) e a Cinemateca Francesa (1936), em Paris. Esses arquivos tinham por
missão salvaguardar os filmes, valorizar e difundir a cultura cinematográfica. Raymond
Borde (1983) denomina estas novas instituições de cinematecas modernas. Para o
autor, os arquivos de filmes fundados a partir deste momento se diferenciam dos
antigos por considerar o cinema como arte, como patrimônio cultural que deveria ser
valorizado, não se restringindo mais a visualizar o filme como um documento
cinematográfico histórico sem valor artístico. “Uma cinemateca moderna, não é
somente uma boia de salvação para uma arte do visível, não é somente uma reserva
de materiais para a sociologia ou uma casa de prazer, é também um gigantesco
laboratório” (BORDE,1983, p.27).
As cinematecas modernas iriam contribuir no desenvolvimento dos estudos
sobre a história e a estética dos filmes e, principalmente, da arquivística fílmica. Neste
sentido, a Federação Internacional dos Arquivos de Filmes (FIAF) foi criada, em 1938,
com sede em Paris, por quatro instituições: a Film Library do Museu de Arte Moderna
de Nova Iorque, o Reichsfilmarchiv, o National Film Library – BFI e a Cinemateca
Francesa. A instituição tinha por finalidade reunir os arquivos de filmes – que
visionavam conservar os filmes e seus documentos - e “desenvolver uma cooperação
mais íntima entre as diferentes cinematecas nacionais e de facilitar as trocas
internacionais dos filmes históricos, educativos ou artístico” (BORDE, 1983, p.72).
No início dos anos 50, ocorreu o terceiro momento de destruição dos filmes
com a mudança da película de nitrato de celulose pela de acetato celulose que não é
auto-inflamável. À época as cinematecas já possuíam o reconhecimento do meio
cinematográfico, porém não foi suficiente para impedir outra onda de destruição. Não
iremos resumir aqui a história destes arquivos ou sublinhar a importância que tiveram
na preservação e difusão dos filmes, pois o objetivo desta pesquisa é analisar as ações
realizadas, por estas instituições, em torno da educação cinematográfica nas escolas,
universidades e organizações educativas. Desta maneira, escolhemos analisar, de
47
forma breve, duas instituições que nasceram com um viés educativo: o British Film
Institute e a Film Library do Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (MoMA).
Entretanto, antes de prosseguirmos, é preciso esclarecer que apesar da
Cinemateca Francesa ter sido um referencial na difusão da cultura cinematográfica e ter
influenciado a criação de inúmeros arquivos de filmes no mundo, no que concerne ao
campo educativo, mas especificamente, na concepção de um departamento
pedagógico ou Infanto-juvenil, a instituição somente iria instituir seu “Departamento
34
Pedagógico” nos primeiros anos da década de 90. Assim, uma análise desse
departamento extrapolaria os limites temporais deste estudo que se detém ao período
de 1954 a 1966. Ressaltamos, contudo, que o cenário francês dispunha de outras
instituições, como observamos no capítulo I, que realizaram este tipo de atividade no
período em questão.
34
Em 1993, o Departamento Pedagógico da Cinemateca Francesa foi criado com o objetivo de investigar uma
pedagogia do cinema que aproximasse o ver e o fazer e que tornasse compreensível a história do cinema.
Atualmente o departamento é dividido em quatro setores: “Cent ans de Jeunesse”, “actions en milieu scolaire et
partenariats”, “programmation et activités Jeune Public sur le temps livrée” e “formations et stages pour les adultes”.
Suas atividades se concentram em organizar: uma programação destinada ao público jovem; ateliês de cinema para
estudantes do maternal ao nível universitário; formação para adultos e professores. Ademais, o Departamento edita
a coleção Ateliers du Cinéma que aborda o cinema em situação didática.
35
FRANCIS, Barbey. L'Éducation aux médias, de l'ambiguïté du concept aux défis d'une pratique éducative.
Paris: Publibook/Société écrivains, 2010. p. 77.
48
questões e, sobretudo, que ajudasse a construir uma política para o filme que
vinculasse estruturas do governo, organizações sociais e produtores de filme. Para
estabelecer o plano do Instituto, a comissão analisou pesquisas realizadas por
diferentes associações e organizações sobre o filme e seu caráter educativo em dois
períodos, de 1916 a 1926 e entre 1929 e 1932. Resultando na seguinte constatação: no
primeiro período, existiam dúvidas em relação ao “papel auxiliar que o cinema podia ter
na educação”. Já no segundo, “houve um otimismo por parte dos representantes da
educação” (FRANCIS, 2010, p.77).
O relatório não tratava somente da questão educativa, mas previa também a
criação de uma cinemateca e um centro de documentação que se tornariam um núcleo
de ligação entre a indústria, os produtores, os distribuidores e as associações culturais
e educativas. O Instituto Nacional do Filme deveria ser público e ter um decreto real
(Charter Royal).
49
preservação dos filmes. Já o BFI Education ficaria encarregado de produzir recursos e
materiais educativos sobre os filmes para professores e alunos.
Desde a idealização do BFI até os anos 1960, a questão educativa esteve
presente com um objetivo protecionista. Os filmes eram vistos como uma influência
para crianças e jovens, pois podiam transmitir falsos valores morais e sociais. Assim, o
instituto era responsável pela classificação dos filmes, que seguiam quatro categorias:
“A” somente adultos; “B” adultos e adolescentes; “C” Filmes que não parecem assustar
as crianças nem causar qualquer perturbação psicológica; “D” Filmes que agrada à
todos particularmente as crianças e que não parecem assustar, nem causar qualquer
perturbação psicológica (STORCK, 1950, p.94). Para Cary Bazalgette, inicialmente, o
papel educativo do BFI era indefinido e avançava lentamente. “Existia certa confusão
em torno da verdadeira função do BFI, tensões que se refletiam nos debates sobre a
alfabetização midiática não somente no cinema, mas em outros meios também”
(BAZALGETTE, 2010, p.16). Na década de 30, além da National Film Library, criou-se a
revista Sight and Sound. Em 1950, formou-se o BFI Education e dois anos mais tarde
seria aberto o Teatro Nacional do Cinema em Londres.
O BFI Education tinha por objetivo a elaboração de uma pedagogia para as
instituições de ensino e a educação informal de adultos. Em abril de 1950, Stanley
Reed assumiria o cargo de Film Appreciation Officer. Posteriormente, em 1956, se
tornaria secretário e por fim diretor da Instituição em 1964. Em relação a sua atuação
no campo educativo, Reed teria um desempenho importante na fundação da Sociedade
dos Professores de Filme (SFT), que formaria professores de cinema e trabalharia em
conjunto com o BFI na organização de atividades e publicações em torno da
valorização e da constituição de uma educação para o cinema. É preciso esclarecer
que existia na Inglaterra, desde 1912, uma censura ao acesso de crianças aos
espetáculos cinematográficos e, durante o ano de 1950, o governo inglês lançou o
relatório Wheare Report sobre as crianças e o cinema. Esse documento procurava
considerar as categorias de censura dos filmes, as atividades recreativas
cinematográficas para crianças - clubes de cinemas infantis que programavam sessões,
50
normalmente aos sábados de manhã, direcionadas a este público – e incentivar o
ensino da “apreciação de filmes” em situações extracurriculares. Neste sentido, Stanley
Reed, citando o relatório, introduz, por meio do BFI Education, o Film Guide, um cartaz
mensal que as escolas podiam assinar. O “Guide foi projetado para referir as
sucessivas ondas de filmes lançados, de modo que os estudantes pudessem conectar
sua própria visão do filme no cinema local com as informações gerais sobre os filmes
que viram rotineiramente” (BOLAS, 2012, p.134). De janeiro de 1954 a setembro de
1959, o Film Guide seria produzido pelo BFI. A partir de outubro de 1959, o cartaz é
renomeado para Screen Guide, a fim de inserir também a televisão e as produções da
Sociedade de Educação do Filme e da Televisão (SEFT) 36.
Em 1957, outro nome importante se juntaria a equipe do BFI Education, o
professor Paddy Wannel, que se responsabiliza pelos cursos de férias (BFI Summer
School). Ele mudaria as diretrizes do departamento ao “incentivar os debates em torno
da cultura popular e questionar o ensino do ‘gosto’” (BOLAS, 2012, p. 135). O BFI
Education programava:
36
BOLAS, Terry. Paddy Whannel and BFI Education. In: The British Film Institute, the government and film
culture, 1933 – 2000. Manchester: Manchester University Press, 2012. p.148, nota 9.
51
Conforme o capítulo III, veremos que Ilka Laurito, diretora do Departamento
de Cinema Infanto-juvenil da Cinemateca Brasileira, observaria as atividades do BFI
Education num estágio realizado, em 1964, na instituição inglesa.
O Museu de Arte Moderna de Nova Iorque foi criado em 1929, com o objetivo
de aproximar o público da vanguarda artística, promovendo assim uma compreensão
das artes visuais da época. Seu primeiro diretor, Alfredo Barr, era um entusiasta das
artes e, ao elaborar o plano de criação do museu, idealizou vários departamentos que
pudessem incluir as belas artes e a arte popular e comercial. Em 1935 Barr com a
colaboração de Iris Barry - diretora da biblioteca do museu – encaminha no relatório
anual à Fundação Rockefeller, mantenedora do museu, uma justificativa para a
necessidade de fundar um arquivo fílmico nos Estados Unidos. Assim, a Film Library foi
instituída como um departamento de cinema que teria por responsabilidade a
preservação e a exibição de filmes de valor artístico. A fundação do novo departamento
estava associada, principalmente, ao desenvolvimento de uma metodologia para a
educação cinematográfica. Alfredo Barr afirmaria que “O público americano que devia
apreciar e apoiar bons filmes nunca teve a oportunidade de consolidar seu gosto.”37
Nesse sentido, o relatório de criação do departamento destaca como objetivo central:
reunir uma coleção de filmes capaz de ilustrar, tanto do ponto de vista histórico,
como artístico, os passos mais significativos do desenvolvimento do cinema
desde o início e torná-la acessível, em condições razoáveis, a universidades,
escolas, museus e outras instituições educativas (BANDY,1993, p.20).
Dirigida pela inglesa Iris Barry, a Film Library buscaria a colaboração das
indústrias cinematográficas americanas para conseguir alcançar sua missão de reunir,
catalogar e divulgar os filmes. Barry (1993, p.31) afirmaria que desde a elaboração do
37
BANDY, Mary. Do outro lado do cinema: Iris Barry e a fundação da Cinemateca do MOMA, em 1938. In: The
Museum of Modern Art New York. Lisboa: Cinemateca Portuguesa, 1993. p.20.
52
relatório era evidente a necessidade de uma parceria com Hollywood, pois “a maioria
dos filmes que interessavam à coleção eram propriedade particular dos diversos
membros da indústria e estavam sujeitos à imponderabilidade da oferta, da cedência ou
do direito de exibição”. Sublinhamos que Iris Barry tinha um vasto conhecimento
cinematográfico. Entre 1923 e 1930 trabalhou, em Londres, como crítica de cinema e
participou do movimento cineclubista europeu. Em Nova Iorque, foi uma das fundadoras
do clube de cinema New York Film Society e no Museu de Arte Moderna era
responsável pela biblioteca e pelo boletim mensal da instituição que tinha uma seção
dedicada ao cinema. Barry seria a primeira conservadora da Film Library e
desempenharia um papel fundamental na preservação e difusão de filmes junto à FIAF.
Em maio de 1935 a criação da Film Library foi aprovada pelos grupos
econômicos da Fundação Rockfeller. No mesmo ano John Abbot, marido de Iris, seria
eleito diretor da Film Library e juntos iriam iniciar a persuasão das companhias de
Hollywood para doarem filmes ao museu. A preocupação dos industriais do cinema era
de que o museu se tornasse um concorrente, afinal eles “iriam ou não perder dinheiro
com o negócio? E porque razão colocar os produtos disponíveis num museu?” 38. Barry
e Abbot esclareceriam que o objetivo da Film Library era criar uma consciência da
história do cinema, restaurando e preservando o patrimônio cinematográfico desde o
princípio e que o cuidado inadequado poderia levar os filmes ao desaparecimento. No
que se refere à exibição dos filmes, eles asseguraram que a programação estaria
disponível somente para instituições educativas e seriam gratuitas. No mês de
setembro, a Paramount, a Century-Fox e a Warner Bros haviam assegurado doações
ao museu e no ano seguinte um acordo feito pela Paramount e a M.G.M – assinado por
grande parte dos estúdios - permitiria a Film Library fazer cópias dos negativos de todos
os filmes produzidos pelos estúdios, com a condição de que os custos pelas cópias
fossem pagos pelo museu e de que as exibições tivessem fins educativos.
38
BARRY, Iris. A Cinemateca do Museu de Arte Moderna. In: The Museum of Modern Art New York. Lisboa:
Cinemateca Portuguesa, 1993. p.23.
53
Com os filmes recebidos, Iris Barry organizou, inicialmente, dois programas:
“Uma breve resenha do cinema americano, 1894-1932” e “Alguns filmes americanos
memoráveis, 1894-1934”. Destinados a estudar a evolução da história do cinema,
estariam à disposição de universidades e museus a partir de janeiro de 1936 (BARRY,
1993, p.23). Os programas eram formados por uma série de cinco blocos com duração
de 2h cada, constituídos da seguinte maneira: “1. Evolução da Narrativa; 2. Os
primórdios do cinema americano; 3. D.W. Griffith; 4. A influência alemã; e 5. Os
sonoros”. As instituições que não possuíam aparelho sonoro tinham a disposição a
série: “5.a O fim da era do silêncio”. O segundo programa “Alguns filmes americanos
memoráveis, 1894-1934” seguia o mesmo padrão do primeiro. A programação
idealizada pela Film Library era organizada por algumas instituições como atividades
extracurriculares, cursos acadêmicos ou ministrados sob a direção de um departamento
de belas-artes ou de arte dramática e vinha encontrando êxito: “ desde 1 janeiro deste
ano [1936], os nossos programas de cinema já foram emprestados a 72 universidades
e sociedades e a popularidade da cinemateca cresce sem parar” (BARRY, 1993, p.35).
39
BARRY, Iris. A Cinemateca do Museu de Arte Moderna. In: The Museum of Modern Art New York. Lisboa:
Cinemateca Portuguesa, 1993. p.33.
54
para a necessidade de preservar os filmes antigos. “A ação desenvolvida durante os
quatro primeiros anos [da Film Library] foi providencial. Sem ela teriam sido perdidos
para sempre filmes essenciais para os estudos cinematográficos, realizados de 1896 a
1918” (GOMES,1981, p.58).
A importância das atividades realizadas por Barry ultrapassou a questão da
preservação de filmes. No que concerne à difusão da cultura cinematográfica, elas se
tornaram imprescindíveis para a formação universitária. Por exemplo, no ano de 1935,
existia somente um curso universitário de cinema nos Estados Unidos. Já em 1957
haviam “cerca de setenta e cinco, além das centenas de cursos de apreciação
cinematográfica que funcionavam nas escolas secundárias, e de clubes criados nas
cidades onde não existe uma instituição escolar para enquadrar o movimento de cultura
cinematográfica” 40.
40
GOMES, Paulo Emilio. Relatório da “Film Library”. In: Críticas de cinema no Suplemento literário. 1.v. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1981.
55
CAPÍTULO II
56
1. Breve História da Instituição
41
GOMES, Paulo Emilio. [Carta] 23 de novembro de 1947 apud SOUZA, Carlos Roberto. A Cinemateca Brasileira e
a preservação de filmes no Brasil. 2009. 310 p. Tese (Doutorado) – Departamento de Cinema, Televisão e Rádio /
Escola de Comunicação de Artes, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2009. p. 56.
57
A inquietação com que Paulo aguardava notícias de São Paulo tinha razão de
ser. A essa altura ele havia pago e remetido para o Brasil duas partidas de
filmes para uma filmoteca que até então existia apenas enquanto intenção
exclusivamente dele. Mais ainda: a candidatura da Filmoteca de São Paulo,
oficialmente representada por Paulo Emilio, fora aceita numa reunião da Fiaf
em Paris, em abril de 1948, sob a responsabilidade da Cinémathèque Française
e da Film Library do MoMA; e a hipotética instituição foi confirmada como
membro efetivo da Federação em uma outra reunião, realizada durante o verão
europeu. (SOUZA, 2009, p.57)
42
Há controvérsias quanto à data exata de criação da Cinemateca Brasileira. Fausto Correa Jr. acredita que fora
criada em 1937 quando Paulo Emilio Salles Gomes chega pela primeira vez na França. In: A Cinemateca Brasileira:
das luzes aos anos de chumbo. São Paulo: Editora UNESP, 2010, p.87. Já Carlos Roberto, considera sua criação a
partir da década de 1940 e sua real efetivação com a inauguração do segundo Cineclube de São Paulo em 1946. In:
SOUZA, Carlos Roberto de. A Cinemateca Brasileira e a preservação de filmes no Brasil. Tese (Doutorado)
Departamento de Cinema, Televisão e Rádio / Escola de Comunicações e Artes/USP, 2009. p. 11.
58
o acervo da Filmoteca do MAM combinava três aspectos: “a vertente clássica, formada
por Paulo Emilio; a de vanguarda, iniciada com a compra de filmes de Maya Deren, e
uma terceira, a de filmes de arte, de forma a integrar o acervo pictórico com o de
imagens em movimento...”. Sublinhamos que entre os filmes escolhidos por Lourival
Gomes que seriam enviados pela Film Library do MoMA, em Maio de 1951, constava o
desenho Felix, the cat que na década de 60 faria parte da programação do
Departamento de Cinema Infanto-juvenil.
No que diz respeito à difusão de filmes para crianças e jovens, ou em
contexto educativo, os primeiros anos de atuação já sinalizavam o caráter pedagógico
da instituição. Entre 1950 e 1954 localizamos nos relatórios de difusão menção às
sessões infantis. Contudo, não existe uma lista dos filmes que foram exibidos no
período43. É somente a partir do I Festival Internacional de Cinema (1954) que o tema
ganharia reconhecimento e as exibições se intensificariam. Considera-se pertinente
fazer uma observação em relação à missão cultural da Filmoteca, e mais tarde futura
Cinemateca Brasileira, a fim de compreendermos os propósitos de suas atividades
educativas. Para tanto, relembraremos uma fala de Alfred Barr diretor do MoMA entre
1929 e 1935:
O público americano que devia apreciar e apoiar bons filmes, nunca teve a
oportunidade de consolidar seu gosto. É surpreendente como as pessoas mais
ligadas a modernidade na pintura, na literatura ou no teatro, são tão ignorantes
quanto ao cinema moderno (BANDY, 1993, p.20).
43
Ressaltamos que a Cinemateca Brasileira teve sua história marcada por três incêndios, de 1957, 1969, 1982, e
muitos documentos, equipamentos e filmes foram perdidos.
59
trabalharão para elevar o gosto e as exigências do povo em matéria de cinema
(GOMES,1981, p.96).
Para Alfred Barr e Paulo Emilio o cinema era mal compreendido pela elite.
Eles acreditavam ser preciso aprimorar lhes o gosto incutindo-os uma apreciação crítica
dos filmes, ou seja, fornecendo-lhes uma cultura cinematográfica por meio do acesso
às obras históricas do cinema. Nesse sentido, a Film Library do MoMA e a Cinemateca
Brasileira realizariam mostras, festivais e cursos que atraíssem tanto as elites como a
população. Ao mesmo tempo, as instituições desenvolveram também programas
educativos que divulgavam a história do cinema em associações, escolas e
universidades. No caso brasileiro, Paulo Emilio ressalta que é mediante a formação de
novos “quadros” que poderão ser elevados “o gosto e as exigências do povo”. Assim,
as ações educativas da cinemateca ocorreriam em dois aspectos: as atividades
culturais (festivais, mostras) e atividades educativas (cursos, palestras, publicações,
seminários). Além disso, a instituição incentivou a criação de cursos universitários de
cinema. Concentraremos nossa análise nas atividades educativas da Cinemateca
Brasileira, mas para compreendermos as origens do movimento que desencadeou a
criação do Departamento de Cinema Infanto-juvenil. Analisaremos, de forma concisa, a
I Retrospectiva do Cinema Brasileiro e o I Festival Internacional de Cinema, em especial
o Festival de Cinema Infantil e o Festival de Cinema Científico. Por fim, examinaremos
os registros existentes sobre as exibições para crianças, os cursos e os seminários de
cinema.
60
Carlos Roberto de Souza (2009, p.60-1) pontua que dois fatores podem ter incentivado
a exibição dos filmes nacionais. O primeiro, é que Paulo Emilio vinha explicando aos
amigos da Filmoteca de São Paulo, desde a elaboração do estatuto da instituição, que
era preciso reunir documentos sobre a história do cinema, especialmente, do cinema
brasileiro e que, se possível, fosse adquirida uma cópia dos filmes. Além disso, insistia
na formação de uma lista de todos os filmes produzidos no país. O segundo fator foi a
publicação, em julho de 1948 na revista A Scena Muda, do artigo de Jurandyr Noronha:
“Indicações para a organização de uma Filmoteca Brasileira”, que descreve de forma
minuciosa as tarefas de um arquivo de filme, principalmente no que concerne à
valorização do patrimônio cinematográfico nacional brasileiro. Caio Scheiby que à
época trabalhava na Filmoteca, seria estimulado pelo artigo e pela efervescência
cinematográfica paulistana – criação da Vera Cruz, da Maristela e da Multifilmes - a
produzir e realizar filmes. Esse contato com o meio cinematográfico, em especial com
nomes como Adhemar Gonzaga e B.J Duarte, desencadearia uma retrospectiva do
cinema brasileiro.
Em 28 de novembro de 1952, foi inaugurada a I Retrospectiva do Cinema
Brasileiro formada por 32 filmes, entre antigos e modernos, que eram sempre
apresentados por críticos, diretores e atores. O evento “firmou ainda mais o prestígio da
Filmoteca” agradando o público e a crítica. No que se refere ao papel educativo da
Retrospectiva, Correa Jr. (2010, p.128-135) estuda, a partir do que considera os
“intuitos educacionais e memorialísticos da Filmoteca do MAM”, os textos publicados no
catálogo do evento. De acordo com sua análise, podemos levantar dois pontos em
comum a todos os textos: o primeiro é a ausência de uma formação cinematográfica,
tanto para os profissionais quanto para o público, que pudesse resultar no aumento da
qualidade do filme brasileiro. O segundo refere-se à constituição de uma cinemateca ou
filmoteca que pudesse preservar os filmes ao mesmo tempo em que realizasse um
trabalho pedagógico. Para Fausto Correa Jr.:
61
registro de depoimentos e de biografias dos personagens da história do cinema
brasileiro) era consequência da inexistência de uma filmoteca brasileira ‘que
permitisse a conservação das obras do passado e as reexibisse, para um
exame das características peculiares de cada período’ (CORREA JR., 2010,
p.129).
62
ficou lotado e contou com a presença da primeira dama paulista e do secretário-geral
do festival José Gonçalves de Andrade Figueira. A diretora do clube infantil ficou
visivelmente comovida e agradeceu a presença de todos. O festival infantil tinha como
finalidade exibir para as crianças brasileiras uma seleção de obras de qualidade, que
haviam sido pensadas e criadas especialmente para elas. Sonika Bo, que desde 1932
vinha trabalhando o cinema infantil através de seu cineclube, tornara-se, ao lado da
inglesa Mary Field44, uma das referências no assunto. Assim, ao elaborar a mostra para
o festival brasileiro, traz uma seleção de filmes de sua cinemateca infantil que possuía
em torno de 800 títulos, muitos dos quais doados pela Dinamarca, Inglaterra, Polônia e
Tchecoslováquia (STORCK, 1950, p.135). É de notar que estes países, em especial a
Inglaterra e a Tchecoslováquia, mantinham produções regulares de filmes para o
público juvenil. No caso dos ingleses, os filmes eram produzidos pela Children’s
Entertainment Films que fora criada, em 1944, por Arthur Rank da sociedade Gaumont-
British. Já os tchecos tinham uma indústria cinematográfica controlada pelo Estado,
desde 1945, e tornaram-se especialistas em desenhos animados e filmes de
marionetes. Neste sentido, na sessão de abertura foram apresentados os filmes: Le
ravin des aigles/O pastor de Renas (Sücksdorff), Palle Alene I Verden/ O menino
que ficou sozinho no mundo (Astrid e Bjarne Henning-Jensen, 1949), Zanzabelle à
Paris/Zanzabelle, a girafa, em Paris (Ladislas Starewitch, 1947), Gazouilly, petit
oiseau / Gazouilly, o passarinho (Ladislas Starewitch, 1953) e Le fusil de chasse/ O
fuzil de caça.
A programação do Festival de Cinema Infantil foi formada por filmes de
animação, marionetes e curtas de ficção. Para Sonika Bo, uma sessão infantil não
poderia ultrapassar duas horas de duração e, cada filme apresentado não poderia
conter mais de 20 minutos. No que diz respeito à qualidade das películas, a diretora-
fundadora do Cendrillon considera que um “filme deveria aliar distração à instrução, isto
44
Em 1944, a Children’s Entertainment Films foi criada, por Arthur Rank, com o objetivo de produzir filmes para
crianças e adolescentes. Mary Field foi nomeada diretora, e durante o período de 1945 a 1949 foram realizados 180
filmes. Mais informações ver: BAUCHARD, P. La Presse, le film, et radio pour enfants. Paris: UNESCO, 1952.
p.75.
63
é, deve-se apresentar um conjunto que desperte todo o interesse social e psicológico
da criança. Tais películas devem ter sequência lógica e beleza e não conter cenas
impressionantes ou cruéis”45. Ainda, atenta que um “programa ideal” deveria ser
constituído por um “documentário de natureza com animais; um filme cômico; um filme
de imaginação (seja fantástico, seja filme de marionetes ou um conto para crianças);
um filme harmonioso, sobre a dança ou sobre a neve, por exemplo; um filme de ação e
um desenho animado em cor” (STORCK, 1950, p.127). Em relação às animações da
Walt Disney, o jornal O Estado de São Paulo sublinha no artigo “A importância do
cinema na educação da criança” a opinião de Bo sobre o tema:
Entre as dez películas escolhidas por Sonika Bo para serem exibidas em São
Paulo, dois filmes de marionetes, com direção de Ladislas Starewitch, haviam sido
produzidos por ela: Zanzabelle à Paris/Zanzabelle, a girafa, em Paris (1947) e
Gazouilly, petit oiseau / Gazouilly, o passarinho (1957). O primeiro recebeu o prêmio
de Veneza em 1949. Quanto à origem dos filmes do festival infantil: 5 eram franceses e
5 de outros países sendo 2 dinamarqueses, 1 tcheco, 1 sueco e 1 russo. Em relação à
escolha dos filmes e a reação do público mirim brasileiro, Bo afirmaria:
45
BO, S. A importância do Cinema na Educação da Criança. O Estado de S. Paulo. São Paulo, 14 fev.1954. p.12.
64
O Festival de Cinema Infantil percorreu diversos bairros da cidade de São
Paulo, com sessões gratuitas todas as manhãs, nos seguintes cinemas: Sabará,
Vogue, Braz, Star, São Geraldo, Carlos Gomes, Santo Antônio, Vila Carrão, Brasil e
Ipiranga em que foram exibidos os filmes: Les petits de la ferme/ Os animaizinhos da
fazenda; La flûte magique/ A flauta mágica (Paul Grimault, 1946); L’École des
facteurs/A escola de carteiros (Jacques Tati, 1947); Zanzabelle à Paris/Zanzabelle,
a girafa, em Paris (Ladislas Starewitch, 1947), Gazouilly, petit oiseau / Gazouilly, o
passarinho (Ladislas Starewitch, 1953), Palle Alene I Verden/ O menino que ficou
sozinho no mundo (Astrid e Bjarne Henning-Jensen,1949), Qui aime pardonne/Quem
quer bem perdoa, Ukolébavka/Acalanto (H. Tyrlova,1948), Le ravin des aigles/O
pastor de Renas (Sücksdorff) e Le fusil de chasse/ O fuzil de caça. Por sua temática
itinerante, o festival alcançou um público de 50 mil espectadores que lotaram as salas
de cinemas. O encerramento do Festival Infantil ocorreu no dia 26 de fevereiro, às 14h
no Cine Marrocos com a presença do diretor Rodolfo Nanni e a exibição do seu filme O
Saci (1951). Sobre as exibições infantis, Sonika Bo, em sua entrevista de
agradecimento ao jornal Folha da Manhã, declara que todos viram o sucesso que a
programação do clube infantil Cendrillon havia alcançado entre as crianças brasileiras e
aproveita o momento para fazer um último pedido de que, após sua partida, não fique
somente “Uma bela recordação”, mas “que do meu trabalho surja com urgência uma
aplicação prática, ou seja, organizar sessões populares do verdadeiro cinema para
crianças” 46. Podemos afirmar que seu pedido seria realizado, sete anos mais tarde, por
Ilka Brunhilde Laurito, com o Departamento de Cinema Infanto-juvenil da Cinemateca
Brasileira.
A inauguração do Festival de Cinema Científico ocorreu no Museu de Arte
Moderna com a palestra do diretor do INCE, Pedro Gouveia Filho, sobre os “Aspectos
do cinema educativo no Brasil”. O festival científico tivera a organização de B.J. Duarte,
que se responsabilizou pela seleção dos documentários científicos nacionais. Do lado
internacional, a figura convidada para realizar a curadoria das obras estrangeiras foi o
46
Sonika Bo: “Muito Obrigada”. Folha da Manhã, São Paulo, 20 fev.1954. Boletim do Festival, p.3.
65
cineasta e cientista Jean Painlevé. Segundo Zanatto (2013, p.31), as obras
apresentadas foram divididas em duas categorias: documentários científicos e
documentários de divulgação científica. Na sessão de estreia exibiram-se os filmes:
Coração físico (Ost Walt), Indústria farmacêutica no Brasil (Humberto Mauro, 1948),
Minério e carvão (Humberto Mauro,1953), Lentes oftálmicas (Humberto Mauro,1953)
e O rato, animal de laboratório.
O convidado internacional despertou o interesse da mídia e do público.
Renomado cineasta e grande incentivador do cinema científico, Jean Painlevé era
diretor do Instituto Internacional do Cinema Científico e que, segundo ele, “a ideia da
fundação do instituto partiu do Sr. Roquette Pinto [...] e o Brasil foi o primeiro a enviar
filmes para a filmoteca internacional” 47. A missão do Instituto, sediado em Bruxelas, era
a de formar uma rede de cooperação entre os países em torno do cinema científico.
Nesse sentido, a instituição buscava manter-se atualizada quanto às descobertas do
campo cinematográfico, para que pudesse usar “as técnicas mais aperfeiçoadas no
serviço da ciência”. Em relação às obras de Painlevé, a coluna Personalidade do Dia,
do jornal Folha da Manhã, afirma:
47
Mantem-se em dia o Cinema com as descobertas da ciência. Folha da Manhã, São Paulo, 18 fev.1954. Boletim do
Festival, p.2.
66
No que se refere aos filmes exibidos no Festival de Cinema científico, estes
foram formados por obras da Alemanha, Austrália, EUA, França e Itália. O Brasil esteve
representado pelos filmes de B.J. Duarte e pelos três documentários do INCE: O
Puraquê (Humberto Mauro,1942), Miocárdio em Cultura (Humberto Mauro,1942) e
Penetração de Radio-Iodo na Tireoide (1944). O Festival de Cinema Científico teve
sessão de encerramento no dia 25 de fevereiro com a conferência de Jean Painlevé.
O I Festival Internacional de Cinema tornou-se um sucesso nacional e
internacional e, após seu encerramento, Ciccillo Matarazzo propõe à Paulo Emilio de
assumir o cargo de conservador-chefe da Filmoteca do MAM. O convite foi aceito e ele
desembarcaria definitivamente, no final de maio, no Brasil. Um novo tempo se
estabelece na Filmoteca do MAM. Segundo Souza (2002, p.362) “sem perder de vista o
modelo da Cinemateca Francesa, esperava-se, com sua permanência no Brasil, que
ele viesse para encarregar-se da instalação do Museu do Cinema de São Paulo”. O
momento cultural por qual passava o país aliado à chegada de Paulo Emilio fez surgir
uma nova perspectiva para o cinema nacional, principalmente para a filmoteca, que
buscou sob sua direção: organizar o acervo, adquirido em grande parte por compra ou
doação durante o festival; incentivar a conservação dos filmes por meio da “campanha
do Contratipo”; motivar doação de aparelhos antigos – dioramas, praxinoscópios,
lanternas mágicas – para a estruturação do Museu. Para Paulo Emilio, o museu estaria
incumbido de realizar “cursos, exposições, seminários de especialização artística e
técnica e a formação de uma Filmoteca Educacional para a difusão entre as escolas
primárias, secundárias e universidades” (SOUZA, 2002, p.362).
67
estudos e cursos de cinema48. Dentre as atividades elaboradas, estava a exibição de
filmes para crianças e jovens. No ano de 1955, a realização de uma programação
infantil pela Filmoteca do MAM foi mencionada em diversos jornais: O Tempo, Tribuna
da Imprensa, Shopping News e Última Hora. Em 11 setembro, por exemplo, o jornal O
tempo noticiava o acordo de colaboração entre a Filmoteca do MAM e a Secretaria de
Educação e Cultura do município de São Paulo para a execução de espetáculos
cinematográficos destinados às crianças e jovens com o objetivo de apresentar filmes
com temas variados e educativos. O acordo entre as instituições previa a execução de
sessões reservadas ao público infantil, devendo ser gratuitas e acontecer todos os
domingos, às 10h, no Teatro Leopoldo Froes. Uma observação fora estabelecida:
somente seria permitida a entrada de adultos acompanhados de crianças. Na primeira
sessão, realizada na mesma data, exibiu-se o filme O Circo/The cirque de Charles
Chaplin. Ainda, de acordo com o jornal, outros cinemas da cidade deveriam realizar
sessões, exibindo simultaneamente os filmes programados.
As exibições programadas pela Filmoteca do MAM suscitariam diferentes
opiniões na imprensa. O Shopping News, de 25 de setembro, dedicaria uma introdução
ao tema cinema e crianças através do artigo “Filmes para crianças”, que se concentrou
em afirmar a inadequação dos filmes adultos serem exibidos para crianças e
adolescentes, pois havia diferença na mentalidade e na experiência de vida. E advertia
que a censura, ao proibir algumas produções, considerava somente algumas
perspectivas do problema, tais como a sexualidade, o crime, etc.; O que “não
representa todos os elementos relativos à questão”. Nesse sentido, o texto explicava
que as crianças tinham “seus problemas e sua visão de mundo” e que os chamados
“programas infantis” nem sempre solucionavam o problema, porque não eram
apropriados ao público Infanto-juvenil. Sobre as exibições realizadas pela filmoteca, o
artigo declara que a iniciativa não solucionaria o problema do cinema para o público
48
Para mais informações sobre os Ciclos de Estudos e as Mostras realizadas ver: ZANATTO, Rafael Morato. Luzes
e Sombras: Paulo Emilio Salles Gomes e a cultura cinematográfica (1954-59). 2013. 185 p. Dissertação
(Mestrado em História) – Faculdade de Ciências e Letras, Campus de Assis, UNESP – Universidade Estadual
Paulista “Júlio de Mesquita Filho”.
68
infantil, porém poderia remediar parcialmente a situação dando “às crianças as fitas
adequadas, rigorosamente selecionadas, sem perigo de qualquer deturpação”.
Já o crítico Flávio Pilla, do jornal Última Hora, vinha desenvolvendo uma
“campanha diária” contra a Secretaria de Educação e Cultura por causa da cessão do
Teatro Leopoldo Froes à filmoteca do MAM. Segundo Flávio Pilla, aquele era um
espaço teatral e como tal sua programação deveria ser formada no mínimo por 50%
dos espetáculos direcionados a esta arte. Para esclarecer a situação, o conservador
adjunto da filmoteca do MAM, Rudá de Andrade, é convidado a comparecer à redação
daquele jornal para explicar como se daria o programa que a Filmoteca realizaria em
benefício do público infantil. O crítico afirmara no artigo “E a paz voltará a reinar” de 11
de outubro que
69
Em relação à documentação e prospecção de filmes, as atividades da
Filmoteca continuaram intensas e o espaço da rua Sete de Abril tornou-se insuficiente
para abrigar as obras. Desta maneira, Paulo Emilio, que já vinha pensando na
possibilidade de estabelecer convênios com os poderes públicos, propõe a separação
do Museu de Arte Moderna. Em 1956, a Cinemateca Brasileira se transforma em uma
sociedade civil, porém a dissociação com o MAM não romperia todas as relações com a
instituição. A cinemateca continuaria a manter as projeções de cinema no museu.
Esclareceremos que as sessões de cinema interessavam aos administradores do
museu, pois atraiam novos sócios para o MAM (SOUZA, 2002, p.360).
No que se refere aos cursos de cinema, a cinemateca tinha como política
divulgar a cultura cinematográfica nos cineclubes, escolas e universidades. Nesse
sentido, realizou-se o Curso para Dirigentes de Cineclubes (1958), o Curso de
Formação Cinematográfica (1960), a I Convenção da Crítica Cinematográfica (1960),
entre outros cursos e seminários realizados pelo país. Por exemplo, Caio Scheiby
participaria, a convite do Departamento de Cultural da Faculdade de Direito de Recife,
da exibição de alguns filmes clássicos pertencentes ao acervo da cinemateca e
coordenaria o movimento cineclubista do nordeste49. Além disso, Paulo Emilio e a
equipe da instituição incentivariam a criação dos primeiros cursos universitários de
cinema (Escola Superior de Cinema São Luís, Escola de Comunicação e Artes -
ECA/USP -, Curso de Cinema da Universidade de Brasília). Ressaltamos, contudo, que
existia em São Paulo, desde 1950, o Seminário de Cinema do Museu de Arte de São
Paulo (MASP), que resultou no curso de cinema da Fundação Armando Álvares
Penteado (FAAP).
49
Cine-Clubes: Recife-PE. Revista de Cultura Cinematográfica, n. 17, p.37, maio, 1960.
70
Paulo e de outros Estados entrariam em contato com a instituição em busca de
participar dos cursos e seminários ou com a intenção de pedir orientação técnica e
empréstimos de filmes. Este foi o caso do Centro de Ciências, Letras e Artes de
Campinas (CCLA) que por intermédio de Marino Ziggiatti iria estabelecer, ainda no final
da década de 50, uma parceria com a Cinemateca que alguns anos depois
desencadeou na formação do primeiro cineclube infantil orientado pelo Departamento
de Cinema Infanto-juvenil. É importante salientar que a cidade de Campinas havia
criado em 1947, um Serviço de Cinema Educativo que funcionou de forma descontinua
até 1973 e deu origem, em 1976, ao Museu da Imagem e do Som. Porém, seriam as
atividades de exibição do Cineclubinho infantil criado por Ilka Laurito que atrairiam a
atenção da imprensa e da sociedade local.
A escritora, poetisa e professora de português Ilka Brunhilde Gallo Laurito
(1925-2012) é a figura central na criação do Departamento Infanto-juvenil da
Cinemateca Brasileira. Formada em Letras pela Universidade de São Paulo em 1949,
iniciou sua carreira com o livro de poesia Caminho (1947). Anos mais tarde publicaria
Autobiografia de Mãos Dadas (1958), Janela de Apartamento (1968) e Genetrix
(1982). Durante as décadas de 1960 e 1980 trabalhou no ensino secundário e superior,
lecionando os cursos de língua portuguesa e literatura.
Na área cultural tornou-se responsável, em 1960, pelo Departamento de
Literatura do Centro de Ciências, Letras e Artes de Campinas. De 1961 a 1966 dirigiu o
Departamento de Cinema Infanto-juvenil da Cinemateca Brasileira e publicou o livro
Cinema e Infância (1962) - Cadernos da Cinemateca 2. A convite de Rudá de
Andrade, atuou como Conselheira na mesma instituição de 1978 a 2005. Entre 1969 e
1975 participou do movimento Poesia na Praça, com a exposição de seus poemas na
Praça da República, em São Paulo.
Na década de 1980, organizou o livro Casimiro de Abreu (1982) e Cinema
e Verdade (1988) em coautoria com Flora Bender. Em 1987 recebeu o Prêmio Jabuti
de Poesia, pelo livro Canteiro de Obras, e em 1990, o Prêmio Jabuti de Literatura
Juvenil, pelo livro: A Menina que Fez a América. Nos anos 90, publicou Crônica:
71
História, Teoria e Prática (1993), em coautoria com Flora Bender, e Parque de
Diversões (1995).
Embora grande parte de sua obra seja dedica a literatura, Ilka Laurito foi uma
amante do cinema. Em sua trajetória como educadora e poetisa sempre ambicionou
unir a sua paixão pela arte em seus textos. Além de suas publicações, Laurito ainda iria
colaborar com os jornais Correio Paulistano e o Estado de S. Paulo.
72
expressionista. A exposição vem divulgada não apenas nos espaços destinados
ao “Noticiário” da Revista, como também em texto de um colaborador [...] Os
cronistas de Campinas teriam sido, de qualquer modo, e com eles o CCLA,
mais receptivos às novas formas de expressão artística representadas nas telas
de Segall que os da Capital, que se mostrara um tanto reticente quanto à
novidade. (Mazzola; Borges, 2002, p.40)
73
a Cinemateca tinha voltado a fazer circular um pequeno acervo de filmes em 16
mm entre os cineclubes. Uma “Campanha de Divulgação da Arte
Cinematográfica” foi iniciada nos moldes da antiga “Campanha do Contratipo”.
Pedia-se a doação de 25 mil cruzeiros aos aderentes, que receberiam de volta
o direito de exibição de 25 filmes [...] A “Campanha da Catástrofe”, apelido dado
por Rudá à “Campanha de Divulgação”, possibilitou a ampliação das fitas
(SOUZA, 2002. p. 374).
50
GOMES, Paulo Emilio. [Recibo Provisório] 10 de junho de 1955. Arquivo Institucional/CCLA.
51
ANDRADE, Rudá. [carta] 23 de agosto de 1955. Arquivo Institucional/CCLA.
52
Breve História da Arte Cinematográfica. [Catálogo] Arquivo Institucional/CCLA.
74
Cinemateca Brasileira do “Ciclo de Revisão do Cinema Francês”, que foi apresentado
nos cineclubes de Avaré, Dom Vital em São Paulo, Marília e Santos. Em junho de 1960,
o departamento daria continuidade as suas ações culturais realizando o Festival
Lamorisse que exibiu os filmes: Bim, le petit âne/Bim (1949), Crin Blanc/Crina-
Branca (1952) e Le Balon Rouge/ O Balão Vermelho (1956). Aliás, como veremos
adiante, é nesse Festival que Ilka Laurito, que era diretora do setor de Literatura do
Centro, se apaixona pelo filme Crina Branca e inicia seu trabalho de cinema para
crianças.
Na sequência, foi promovido em agosto e setembro o II Curso de Formação
Cinematográfica, com carga horária de 32 horas, o evento iria:
O curso foi divido em dois blocos: no primeiro, Paulo Emilio falou sobre a
“Linguagem do Cinema” e sobre “Estilos, Gêneros e Escolas Cinematográficas”.
Gustavo Dahl aprofundou a questão da “Estética do Filme” e da “Crítica
Cinematográfica”. O segundo bloco teve Luiz Souza Lima Macedo, que expôs os
“Métodos do Cine-fórum”, Caio Scheiby, que apresentou o “Passado e Presente do
Cinema Brasileiro” e Rudá de Andrade, que finalizou o evento com “Pesquisa Histórica
Cinematográfica” (FOLHETO, II Curso de Formação Cinematográfica, 1960, p.2).
É justamente nesse curso que Ilka Laurito teria feito seus primeiros contatos
com a equipe da Cinemateca, mais especificamente com Rudá de Andrade, que mais
tarde a convidaria para criar o Departamento de Cinema Infanto-juvenil. Em entrevista
Ilka explicaria, “eu tinha assistido a uma série de palestras da equipe da cinemateca [...]
75
e fiquei muito entusiasmada. Fiquei cinéfila. Eu já era apaixonada por cinema e virei
cinéfila. Quis transmitir isso para os meus alunos”. 53
Figura 3 - II Curso de Formação Cinematográfica do CCLA. Paulo Emilio em pé no centro. A sua frente sentados da
esquerda para direita Heládio Brito, Marino ZIggiatti e Rudá de Andrade. Do outro lado na segunda fileira na primeira
cadeira está Ilka Laurito.
Fonte: Arquivo Institucional/CCLA.
76
pintura, orientado pelo artista Egas Francisco. Em 1961 o CCLA realizou uma “Semana
54
da Criança” , em comemoração ao 12 de outubro, com uma programação especial
que incluiu uma exposição de pintura infantil, sessões de teatro e cinema infantil, uma
exposição de livros sobre cinema e educação elaborada pela Cinemateca Brasileira e
uma palestra com Ilka Laurito sobre cineclube infantil. No ano seguinte a instituição
promoveu novamente o evento, que teve a exibição do filme O Balão Vermelho de
Lamorisse.
Para Dayse Fonseca, o CCLA foi responsável pela criação de todos os
movimentos culturais realizados na cidade de Campinas até o fim da década de 1960.
54
Inauguração da Mostra de Cinema da VI Bienal. O Estado de S. Paulo, São Paulo, 12 out.1961, p.10.
77
3.2 A experiência de Ilka Brunhilde Laurito no CCLA
55
Para mais informações sobre a programação ver Relatório do CCLA de 1960/61. Arquivo Institucional/CCLA.
56
Dados retirados do Relatório da Secretaria do CCLA, disponível no Relatório Geral de 1960. Arquivo
Institucional/CCLA.
78
se um debate com as crianças. Posteriormente Laurito declararia, em carta à Almeida
57
Salles: “eu fizera cineclubismo infantil, sem o saber” . Em entrevista concedida a
Theresinha Aguiar do Jornal Diário do Povo, ela relata sua impressão quanto à primeira
sessão infantil: “Creio que me encontrei nessa ocasião, e que encontrei o cinema como
forma de realização, uma síntese de todas as tentativas que eu vinha fazendo até então
de unir a Arte à Educação” 58.
Desde então, Ilka inicia uma pesquisa, na biblioteca e no Departamento de
Cinema do CCLA, de toda bibliografia disponível sobre o tema cinema e infância. À
procura de aprofundar seus conhecimentos em cinema, participa do II Curso de
Formação Cinematográfica e começa um contato com a equipe da cinemateca: “com
cada um deles, procurei conversar sobre o assunto que me preocupava” 59. Em janeiro
de 1961, Ilka participara da III Jornada de Cineclubes no Rio de Janeiro, onde assistiu a
uma palestra da delegação do cineclube argentino Rio Cuarto sobre cineclubes infantis,
o que contribuiu não só para conhecer as atividades desenvolvidas em outros países,
mas também para tomar consciência da realidade nacional sobre o tema. Influenciada
pelo trabalho realizado por Sonika Bo no Cineclube Cendrillon de Paris, decidiu criar e
dirigir um cineclube infantil dentro do Departamento de Cinema do CCLA, que recebeu
orientação e apoio da Cinemateca Brasileira.
57
LAURITO, Ilka. [Carta] 17 de abril de 1961. Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira.
58
AGUIAR, Theresinha. Cineclubinho do Centro de Ciências – Criação belíssima da poetisa “Ilka Laurito”. Jornal
Diário do Povo, Campinas, 07 mai.1961.
59
LAURITO, I. [Carta] 17 de abril de 1961. Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira.
79
CAPÍTULO III
80
1. O Departamento: enfim uma realidade
60
LAURITO, Ilka. [Carta] 17 de abril de 1961. Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira.
61
Entrevista de Ilka Laurito concedida à José Inácio de Melo e Souza em 11/03/1997. Arquivo José Inácio de Melo e
Souza/Cinemateca Brasileira.
81
departamento fica criado, com um cargo executivo que é o seu”62. Em 25 de abril de
1961, foi criado na Cinemateca Brasileira o Departamento de Cinema Infanto-juvenil,
dirigido por Ilka Brunhilde Laurito63. No que diz respeito ao novo departamento, Cecília
Thompson afirma que:
82
totalmente desconhecidos da nossa infância”; e por fim, que o “estímulo à criação do
filme para a infância brasileira, de assunto essencialmente nacional”. Previa-se a
criação de “concursos de roteiros e de sugestões à atividade criadora de caráter
didático ou recreativo dentre os elementos do cineclubismo adulto” 64.
A Cinemateca Brasileira passava por um momento de crise. A instabilidade
financeira decorrente dos atrasos no pagamento do convênio – juros da Dívida
Municipal - com a prefeitura de São Paulo obrigou a instituição a procurar outras
parcerias no governo estadual e na União. Em 1959, para conseguir recursos, a
cinemateca realizou dois eventos patrocinados: a Semana de Cultura Cinematográfica
para a Comissão Estadual de Cinema e o Festival História do Cinema Francês para V
Bienal. Os valores recebidos permitiram que a instituição se estruturasse
funcionalmente, possibilitando a contratação de Gustavo Dahl como secretário e
“liberando os dirigentes para pensarem em outros problemas”, tais como “a formulação
de um projeto com a União” 65. Segundo José Inácio, um convênio com o estado tinha
sido discutido com a Comissão Estadual de Cinema no ano anterior, e a transformação
jurídica de Sociedade Civil para Fundação começara naquele momento. “Desse modo,
em 1/12/60 realizou-se a reunião de instituição da Fundação Cinemateca Brasileira, que
passaria a ter existência legal no primeiro dia do ano seguinte” (SOUZA, 2002, p.384).
A mudança ocorrera como exigência para a concretização do convênio com o governo
do Estado de São Paulo, que foi assinado em 17/03/1961, mas que seria publicado
somente em setembro do ano corrente.
Em decorrência desses fatores, Almeida Salles esclarece que, a respeito dos
objetivos propostos por Ilka Laurito, era necessário consolidar os convênios com os
governos estadual e federal para que fossem destinadas “verbas adequadas ao
Departamento Infantil, para a aquisição de filmes e outros materiais, e para as
66
atividades complementares” . No que tange, porém ao cineclube infantil piloto, o
64
LAURITO, Ilka. [Carta] 17 de abril de 1961. Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira.
65
SOUZA, José Inácio de Melo. Paulo Emilio no Paraíso. Rio de Janeiro: Record, 2002. p. 384.
66
SALLES, Francisco. [Carta] 25 de abril de 1961. CB 844/61- Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira.
83
presidente iria sugerir a anexação do Cineclubinho já em desenvolvimento no CCLA de
Campinas como sendo “centro experimental” da Cinemateca Brasileira.
1.1 Organização
67
Entrevista de Ilka Laurito concedida à José Inácio de Melo e Souza em 11/03/1997. Arquivo José Inácio de Melo e
Souza/Cinemateca Brasileira.
84
as crianças. Em entrevista concedida a autora68, Maurice Capovilla afirma não se
lembrar das atividades realizadas junto ao Departamento de Cinema Infanto-juvenil. Ele
relata que seu contato com Ilka Laurito ocorreu em função da amizade com o escritor
João Antônio que era um amigo comum. Porém quando lhe foi perguntado sobre
algumas correspondências trocas, além de relatórios existentes no arquivo da
Cinemateca, o cineasta explica que a memória é falha. Mas confirma que na época era
diretor do Departamento de Difusão Cultural e que se “dedicava a montar cineclubes
em São Paulo, interior e outros Estados”. Possivelmente é por conta do envolvimento
de Capovilla com a formação de cineclubes que a colaboração com Ilka Laurito e o
Departamento Infanto-juvenil tenha nascido. Como podemos verificar através das
correspondências e relatórios do período de 1961 a 1963.
Em carta de 19/04/61, Maurice escreve:
Ilka, grandes novidades. Encontrei-me ontem com Samuel Pfromm [...] tendo
me referido ao cineclube infantil consegui o interesse dele, até entusiasmo [...]
No sábado, por ocasião da aula de Caio, espero que nos encontremos para
69
traçar as novas Diretrizes e Bases do Cineclube Infantil. Um abraço, Maurice .
68
Entrevista concedida por e-mail em 14/04/15.
69
CAPOVILLA, Maurice. [Carta] 19 de abril de 1961. CB 766/61 - Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira.
70
LAURITO, Ilka. [Relatório Sessões do Cineclubinho do CCLA] 25 e 27 de Março de 1961. Acervo Departamento
Infantil/Cinemateca Brasileira.
85
cineclubes adultos, etc...). Nesse sentido, buscou constituir um grupo de colaboradores
do Departamento de Cinema Infanto-juvenil vindos de diferentes áreas. Desta maneira,
com a finalidade de estabelecer um estudo em torno das pesquisas filmológicas,
firmou-se contato com o professor Samuel Pfromm71, da Universidade de São Paulo
(USP) e com a professora Nelda de Fillipi da Universidade Estadual de Campinas
(UNICAMP). Em correspondência ao Prof. Pfromm, Laurito o convida para participar do
grupo de colaboradores e esclarece:
Essa seção, cuja direção, como você sabe, está à meu cargo, necessita a
orientação de pessoas como você, que se dedicam à pesquisa filmológica. O
que pretendemos, por ora, é constituir um acervo de filmes adequados à
infância, avaliá-los, catalogá-los por idade, observar a reação do público a que
eles se destinam, colher dados, enfim, para uma futura produção
cinematográfica brasileira. A par dessa parte, queremos também colaborar com
aqueles que, como você, dedicam-se às pesquisas, fornecendo-lhes o material
72
humano e o campo da experimentação .
Na mesma direção, também foi contatado o Prof. Enzo Azzi, que era
responsável pelos estudos de psico-filmologia do Instituto de Psicologia da
Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).
Como vamos trabalhar num campo que muito lhe deve interessar, esperamos
contar com a sua preciosa colaboração, através de sugestões, publicações ou
indicações bibliográficas, assim como ficamos inteiramente ao seu dispor para
73
auxiliá-lo em qualquer trabalho que deseja encetar no âmbito da pesquisa .
71
O professor Samuel Pfromm Netto (1932-2012) formou-se na Faculdade de Educação, na década de 1950, e
exerceu suas atividades de ensino e pesquisa, na Universidade de São Paulo (USP), no Instituto de Psicologia. Na
escola desenvolveu pesquisas em torno da relação entre as mídias (Cinema, TV e Rádio) e o ensino. Entre 1960 e
1970, participou da equipe do Serviço de Recursos Audiovisuais (SRAV/CRPE-USP), inicialmente, em projetos de
produção de filmes educativos e posteriormente na implantação da TV Universitária da USP. Sua bibliografia sobre o
tema compreende os seguintes títulos: Telas que ensinam (1998), Tecnologia da educação e comunicação de
massa (1977) e Comunicação de massa (1972).
72
LAURITO, Ilka. [Carta] 01 de fevereiro de 1962. CB 289/62 - Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira.
73
Idem., [Carta] 01 de fevereiro de 1962. CB 290/62 - Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira.
86
Ademais, no que concerne a estrutura do Departamento Infanto-juvenil, o
plano de trabalho de 1962 previa como meta a ser cumprida a formação de “um
Conselho Consultivo de, no mínimo, três membros, para orientar a seção infantil” 74. Por
causa da instabilidade financeira da Cinemateca Brasileira, a equipe idealizada por Ilka
Laurito nunca chegou a ser constituída.
1.2 O acervo
74
Plano de trabalho 1962. Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira.
87
compreendia películas sobre as artes e, especialmente, sobre a arte cinematográfica.
Em entrevista ao Jornal O Estado de SP, Ilka Laurito define quais filmes eram
recomendados e cita o exemplo de uma sessão:
88
influência teve, por um longo período, seus reflexos em toda atividade cineclubista
brasileira, espalhando-se por quase todo o país”. Em 1951, no Rio de Janeiro, a Ação
Social Arquidiocesana inicia um curso de cinema no seu Centro de Estudos. O objetivo
central do curso era formar o espectador, visando filmes com moral religiosa. Da
mesma forma, o Centro de Orientação Cinematográfica (COC), presidido pelo Pe.
Guido Logger, ministrava cursos de cultura cinematográfica pelo país. Estas atividades
foram analisadas por Ilka Laurito, principalmente, as sessões promovidas por Humberto
Diderot e o livro “Iniciação ao Cinema Infantil” (1965), do Frei Urbano Plentz. Além
disso, os cineclubes de origem católica se tornariam os maiores incentivadores da
criação de seções infanto-juvenis dentro dos clubes adultos e nas escolas; e apoiariam
veementemente as ações do Departamento de Cinema Infanto-juvenil da Cinemateca.
Para Ilka Laurito, a pesquisa nos acervos deveria ser por filmes
(documentários, desenhos animados, curtas e longas–metragens) que fizessem as
crianças e jovens reconhecer uma obra de qualidade artística. Assim, os critérios para a
seleção dos filmes se dividem em quatro vertentes: filmes adultos adequados as
crianças; filmes infantis; filmes realizados por crianças e jovens; filmes sobre crianças
destinados aos professores, psicólogos e pedagogos. Este último critério viria ao
encontro com um dos objetivos do Departamento Infanto-juvenil de estabelecer uma
Cinemateca Infantil e ser um centro de informações que pudesse assessorar todas as
pessoas e instituições que se interessassem pelo tema.
A prospecção de filmes de 16 mm e 35 mm para o acervo ocorreu em quatro
fases que, em determinados momentos, sucederam-se simultaneamente. A primeira
seleção do material existente direcionado às crianças foi realizada no próprio acervo da
Cinemateca Brasileira. Estabeleceu-se um processo de separação dos filmes infantis
ou adultos que poderiam servir para o público Infanto-juvenil. Em entrevista, Ilka Laurito
afirma que a “cinemateca tinha uma série de documentários preciosos feitos pelo
National Film Board do Canadá, que eram esplendidos e que podiam ser perfeitamente
89
trabalhados com crianças” 75. A experiência de utilizar filmes do próprio acervo ou filmes
comerciais para exibições infantis já tinha sido praticada pela The Children’s Film
Library. Nesse sentido, o Departamento Infanto-juvenil seguiria o mesmo caminho e,
além de utilizar os documentários canadenses, também seriam selecionados filmes de
Charles Chaplin e longas nacionais que seguissem os critérios estabelecidos. Ilka
Laurito constataria que no acervo da Cinemateca Brasileira não havia grande variedade
de filmes infantis. Por consequência, começou uma procura nos consulados,
embaixadas e filmotecas privadas e comerciais de São Paulo. A ideia era constituir um
catálogo76 com todos os títulos pertinentes à infância que pudessem ser encontrados
nessas instituições paulistas.
Nesta perspectiva, a segunda tentativa de aquisição de filmes ocorreu por
meio de contato com os consulados e as instituições congêneres estrangeiras. É
preciso enfatizar que a situação financeira da Cinemateca Brasileira fez com que a
procura por filmes nessas instituições fosse realizada com a intenção de firmar
convênios de empréstimos ou doações, visto que as condições não permitiam a compra
de películas para o acervo. Assim, a diretora do Departamento Infanto-juvenil
estabelece contato com os consulados e consegue das repartições francesas, suecas e
tchecas o empréstimo de filmes por um ano. Em geral, o acordo com as instituições
consulares exigia que o departamento da cinemateca enviasse um relatório trimestral
ou anual mencionando todas as projeções realizadas durante o período de concessão.
Em 16 de abril de 1963, por exemplo, Ilka Laurito escreve ao cônsul da
Tchecoslováquia relatando a circulação do filme Como as crianças pintam, de Jiri
Jerabek, e lhe pede a renovação da cessão da obra por mais um ano. A diretora do
departamento ainda argumenta que o filme havia sido utilizado com “inteligência e
proveito” 77 pela Cinemateca Brasileira.
75
Entrevista de Ilka Laurito concedida à José Inácio de Melo e Souza em 11/03/1997. Arquivo José Inácio de Melo e
Souza/Cinemateca Brasileira.
76
O Departamento Infanto-juvenil da Cinemateca produziu um catálogo dos filmes disponíveis nas filmotecas de São
Paulo, em que constava a seleção dos títulos julgados adequados as crianças e jovens. Posteriormente, o catálogo
foi enviado para cineclubes e pessoas interessadas no assunto. Infelizmente não encontramos nenhuma versão
deste documento durante o andamento desta pesquisa.
77
LAURITO, Ilka. [Carta] 16 de abril de 1963. CB 361/63 - Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira
90
A parceria com os consulados tornou-se uma boa alternativa e o
Departamento Infanto-juvenil não cessou em buscar novos convênios. Em carta ao
consulado geral do Japão, Laurito agradece o empréstimo das obras Bonecas
Japonesas e canções infantis e argumenta:
Assim é que gostaríamos de poder contar, no nosso acervo, com alguns filmes
adequados à infância, através dos quais difundiríamos a cultura, a paisagem e
os costumes do Japão [...] estudando a lista que o consulado geral do Japão
nos forneceu, podemos destacar os seguintes filmes, que seriam do maior
interesse para o nosso Departamento: “Bonecas Japonesas”, “canções infantis”,
“Fuji”, “Japão encantador” e outros que poderiam servir de educação e
78
recreação às nossas crianças .
78
Idem., [Carta] 30 de março de 1962. CB 529/62 - Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira
79
LAURITO, Ilka [Carta] 20 de novembro de 1961. CB 2923/61 - Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira
91
Sublinhamos que o jornal O Estado de São Paulo noticiaria em 19 de
novembro que
80
LAURITO, Ilka. [Carta] 18 de Janeiro de 1962. CB 158/62 - Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira
81
O Departamento de Cinema Infanto-juvenil entrou em contato com outras instituições, porém optamos por
considerar somente as que efetivaram um contato com a entidade brasileira. Para verificar quais foram as instituições
que se corresponderam com o departamento ver lista “Instituições estrangeiras contatadas” no apêndice.
92
Os empréstimos dos consulados, do National Film Board e do conselho
Britânico não foram suficientes para a difusão cultural. Desta maneira, a terceira via de
acesso aos filmes foi a locação em filmotecas privadas e comerciais. A relação entre as
multinacionais, em especial as empresas petrolíferas, com os meios de comunicação e
cultura começaram na década de 40. A empresa americana de petróleo Esso
patrocinaria o jornal Repórter Esso, no rádio e depois na televisão, e criaria também a
Filmoteca Esso. Em contrapartida a companhia Shell funda sua filmoteca, em 1942,
com sede em São Paulo e no Rio de Janeiro, composta principalmente por
documentários82. Além das filmotecas privadas, consolidaram-se no mercado as
companhias comerciais Fotóptica, Mesbla e Polifilmes.
O departamento da cinemateca estabeleceria contatos com as filmotecas,
porém, a procura por filmes para serem alugados se tornou uma missão difícil, pois as
obras eram antigas e encontravam-se em mal estado de conservação. Além disso, as
filmotecas não possuíam uma lista atualizada dos filmes para locação. Maurice
Capovilla explica à Ilka, em carta de 5 de abril de 1961, que a Fotóptica onde ele havia
ido buscar os filmes “apresentou um catálogo tão antigo, que os filmes que nós
escolhemos já não existem mais” 83. Ademais, uma das dificuldades em realizar esses
empréstimos se dava primeiramente pela ausência de filmes adultos ou infantis que
atendessem os critérios estabelecidos para serem exibidos ao público Infanto-juvenil. O
segundo problema era a inesperada e constante troca dos filmes locados por parte das
filmotecas. Embora existissem essas adversidades no funcionamento das filmotecas, o
Departamento Infanto-juvenil manteria boa parte dos filmes exibidos nas sessões do
Cineclubinho do CCLA vindos desses estabelecimentos.
Em busca de incluir documentários e filmes nacionais na programação das
sessões infantis realizadas pelo Departamento Infanto-juvenil, Ilka Laurito daria início a
82
A partir da década de 70, a empresa patrocinaria o programa Globo Shell Especial, uma série de documentários,
veiculada pela Rede Globo. A Filmoteca Shell teria grande importância na difusão de filmes e lançaria, na época, a
campanha “venha assistir um dos filmes educativos Shell” que tinha por finalidade emprestar gratuitamente
documentários para associações, igrejas e estabelecimentos de ensino. Mais informações ver: FRANÇA, Andréa. O
pensamento do documentário na televisão brasileira: a década de 1970. ECO-POS, n°2,V.14, 2011.
83
CAPOVILLA, M. [Ofício] 5 de abril de 1961. CB 642/61 - Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira
93
quarta fase de constituição de um acervo, ao procurar estabelecer contato com três
entidades públicas: o INCE; o departamento de Cinema Educativo do Serviço de
Expansão Cultural da Secretaria de Educação do Estado de São Paulo; e o Serviço de
Recursos Audiovisuais da Cidade Universitária – SRAV-USP. O Instituto Nacional de
Cinema Educativo criado, em 1936, por Roquette-Pinto, teria como objetivo promover e
orientar a utilização do cinema, especialmente como processo auxiliar do ensino, e
ainda como meio de educação popular em geral84. O INCE funcionou de 1936 a 1966,
produzindo sob a direção-técnica de Humberto Mauro mais de 400 documentários85
educativos de curtas e médias metragens. A exibição era direcionada às escolas,
instituições culturais e salas de cinema. Ilka Laurito que havia visitado as instalações do
Instituto em janeiro de 1961, durante sua estádia no Rio de Janeiro por conta da III
Jornada de Cineclubes, iria solicitar em maio, ao então diretor Flavio Tambellini, um
curso ou estágio previsto para ocorrer em julho. A intenção era expandir o
conhecimento do trabalho realizado pelo Instituto. Neste sentido, ressaltaria que
“gostaria, principalmente, de conhecer as realizações de Humberto Mauro” 86. O estágio
no INCE, ocorreu, provavelmente, em 1962, pois em uma carta enviada ao professor
Bandeira Duarte, em 26 de julho de 1962, Ilka escreve:
94
Cantos de trabalho, Casinha pequenina, Engenhos e usinas, Manhã na Roça: o
carro de bois, Ponteio, Pinhal, Dragãozinho manso: Jonjoca, Jardim Zoológico do
Rio de Janeiro Cerâmica artística do Brasil, Congonhas do campo, Sabará, Cidade
de Salvador, Vicente de Carvalho, Coisas que os olhos não veem, O oxigênio, O
papel, Fantasia brasileira, Como se filmam e sonorizam os filmes. As películas
seriam cedidas em forma de empréstimo e ficariam depositadas na Cinemateca
Brasileira. Tudo indica que não foi possível o envio dos filmes, pois Ilka consideraria a
possibilidade de conseguir uma cópia de alguns destes filmes por intermédio do
departamento de Cinema Educativo do Serviço de Expansão Cultural.
A Seção de Cinema Educativo do Serviço de Expansão Cultural da
Secretaria de Educação foi criada, em 1957, por meio de um acordo de colaboração
entre o Ministério da Educação e Cultura e Governo do Estado de São Paulo. O acordo
visionava manter na Secretaria de Educação uma seção de cinema educativo, que
incluiria uma filmoteca que atendesse as necessidades das instituições de ensino
paulistas. Orientada pelo Instituto Nacional de Cinema Educativo (INCE), o Serviço de
Expansão Cultural receberia, deste instituto, projetores de 16 mm, filmes, diafilmes e
treinamento técnico para a equipe. Caberia ao órgão de cinema educativo de São Paulo
organizar estágios e cursos, estimular a criação de órgão de cinema educativo nos
municípios e providenciar a realização de filmes educativos, sobre aspectos geográficos
e históricos, que proporcionassem um conhecimento do estado88. Desta maneira, a
direção da seção de cinema iniciaria uma seleção no acervo do INCE com o intuito de
copiar os filmes que fossem interessantes para fazerem parte do acervo. Nesse
sentido, Ilka visionaria a oportunidade de incluir na lista do departamento da secretaria
de cultura, os filmes do INCE já selecionados pelo Departamento Infanto-juvenil da
cinemateca, pois a nova seção do governo paulista possuía grande quantidade de
películas virgens.
88
LEI N. 4.724, DE 6 DE MAIO DE 1958.
Disponível em http://www.al.sp.gov.br/repositorio/legislacao/lei/1958/lei-4724-06.05.1958.html Acessado em 03 de
fevereiro, 2014.
95
A última instituição contatada foi o Serviço de Recursos Audiovisuais do
Centro Regional de Pesquisas Educacionais Prof. Queiroz Filho – CRPE/SRAV-USP.
Em 1955, com a finalidade de solidificar as pesquisas no campo educacional, foram
criados os Centros Regionais de Pesquisas Educacionais nos estados do Rio de
Janeiro, São Paulo, Minas Gerais, Bahia, Rio Grande do Sul e Pernambuco. O Centro
Regional de Pesquisas Educacionais de São Paulo, vinculado à Universidade de São
Paulo, foi instalado na Cidade Universitária e abrigava uma biblioteca especializada em
Educação e Ciências Sociais, além de realizar atividades de documentação e estudos e
pesquisas educacionais, sociais e estatísticas (FAZENDA, 1987, p.62). Na década de
60 o centro fundou o Serviço de Recursos Audiovisuais (SRAV), a partir do programa
americano Ponto IV89, que, mediante o acordo entre o centro de audiovisual da
Universidade de Michigan e o Inep, recebeu a doação de equipamentos para “a
produção, montagem, sonorização e cópia de filmes educativos, assim como
equipamentos de áudio, projetores, equipamentos de estúdio”90. O Serviço de Recursos
Audiovisuais utilizaria os recursos audiovisuais como auxiliares no ensino primário e
secundário, produzindo filmes educativos e realizando tradução, adaptação e dublagem
das películas estrangeiras. Por meio do contato com o Prof. Samuel Pfromm, que fazia
parte da equipe do SRAV, Ilka examinaria alguns filmes da instituição para serem
exibidos pelo Departamento Infanto-juvenil.
89
O Ponto IV tinha por finalidade ajudar países pobres a se modernizar tecnologicamente cooperando na criação de
centros de produção audiovisual. O programa fazia parte do plano Aliança para o Progresso que buscava ampliar, na
América Latina, a influência política e econômica dos Estados Unidos.
90
PFROMM, Samuel. Telas que ensinam: Mídia e Aprendizagem - Do Cinema às Tecnologias Digitais. São Paulo:
Alínea, 2011. p.93.
96
os cineclubes nacionais a fim de orientar e fornecer uma programação de filmes aos
cineclubes infantis, escolas, associações e orfanatos. Assim, a direção do
departamento faria um levantamento de todos os cineclubes adultos do país que
mantinham uma seção infantil ou que já haviam fundado um cineclube para crianças e
jovens. A finalidade era descobrir o que estava sendo feito no Brasil, em relação ao
tema, para posteriormente estudar uma programação adequada e incentivar o
movimento de cineclubismo infantil. Nesse sentido, Ilka Laurito iria estabelecer contato
com todos os cineclubes da lista de correspondentes da Cinemateca Brasileira e com o
Centro dos Cine-clubes.
Em relação à difusão escrita, iniciou-se um trabalho de constituição de um
acervo bibliográfico sobre o cinema e a infância. Ilka Laurito procurou compilar uma
literatura especializada. Visto que as publicações em língua portuguesa dedicadas ao
tema eram escassas e que a maioria dos livros e manuais estavam publicados em
língua estrangeira, principalmente em francês, inglês e italiano, ela começa a
elaboração de uma bibliografia básica sobre o tema que foi publicada com o título de
“Cinema e Infância” pelos Cadernos da Cinemateca em 1962. O livro destaca a
importância da educação cinematográfica e apresenta um plano de estudo para as
pessoas interessadas no assunto. A obra relaciona 240 publicações (artigos e livros)
referenciados por uma síntese dos temas abordados que estão organizados em quatro
seções temáticas: educação artística; iniciação cinematográfica; cinema e infância
(teoria) e (prática); e cinema na educação.
Na apresentação, a organizadora coloca em relevo a limitação do trabalho
realizado, considerando que “este plano de estudos e esta relação de livros, sua
maneira de a dispor e apresentar. Não é obra de equipe, embora as sugestões e
auxílios”91 e afirma que a obra se destina a “todos aqueles que, interessados nas várias
formas de expressão infantil, descobriram no cinema uma forma nova e atuante” entre
eles pais, professores, e pessoas que amam criança e cinema. A primeira seção aborda
91
LAURITO, ILKA. Cinema e Infância. Cadernos da Cinemateca. São Paulo: Fundação Cinemateca Brasileira,
1962, p.1.
97
a necessidade de conhecer o percurso das expressões artísticas a fim de que seja
possível realizar uma educação para as artes. Ilka Laurito explica que:
92
LAURITO, ILKA. Cinema e Infância. Cadernos da Cinemateca. São Paulo: Fundação Cinemateca Brasileira,
1962, p.1.
98
meio dos cineclubinhos, das sessões em escolas ou em parques. Esta seção torna-se a
mais densa, pois reúne 124 artigos e livros sobre o tema.
Por fim, a quarta seção é dedicada ao Cinema na Educação. O conteúdo
desta parte discute o cinema entre os meios audiovisuais, o cinema como fator de
cultura, o cinema na escola e a situação brasileira. A seleção de livros da seção reúne
obras de Canuto Mendes, Venâncio Filho, Roquette-Pinto, Jean Painlevé e Jean
Benoit-Levy. Além do livro, Ilka Laurito escreveria, entre 1961 e 1964, para os jornais: O
Estado de São Paulo e o Correio Paulistano.
Já a difusão oral seria realizada com Simpósios, conferências, cursos e
palestras para o público em geral. O objetivo era chamar a atenção dos pais,
professores e pessoas ligadas ao ensino para a necessidade de implementar uma
educação cinematográfica para as crianças e jovens.
99
10/10/63 Clube de Esporte de O Cineclube e a comunidade - Proferida durante o
Ilhabela I curso Intensivo de Formação do professor para o
litoral. Promovida pelo Departamento de Educação
do Estado de SP.
A Fundação [...] é uma entidade cultural que tem convênio com o Estado e que,
através de seu Departamento Infantil, vem desenvolvendo um trabalho de
difusão cinematográfica, de valor educativo e recreativo e cultural, nas escolas
e cineclubes infantis. Todas as sessões são orientadas no sentido de que se
desenvolva na criança uma atitude ativa em face do cinema, através do
93
desenvolvimento de seu espírito crítico e de sua cultura cinematográfica .
93
LAURITO, Ilka. Cinemateca Brasileira. Anexo n°4. Relatório da biblioteca Infantil “Caetano de Campos”, 15/12/62.
In: ABREU, Ailton. Escola e Cinema: o cinema educativo na escola Caetano de Campos em São Paulo entre os
anos de 30 e 60. 1999. 186 p. Dissertação (Mestrado em Educação) – Universidade Católica de São Paulo -
PUC/SP.
94
Atividades do Cinema Educativo. Folha de São Paulo, 06/08/61.
100
campanha do governo federal intencionava editar filmes e diafilmes educativos;
promover o desenvolvimento e a utilização em todo o país dos meios audiovisuais;
organizar seminários sobre cinema educativo; financiar mediante planejamento e
convênios a instalação de filmotecas regionais em estabelecimentos de ensino;
promover o aparelhamento de unidade móveis de projeção cinematográfica, fixa e
filmagem; prestar assistência técnica a iniciativa particular; conceder estágios de
ensinamentos das técnicas cinematográficas; financiar a produção de filmes educativos;
editar livros relativos ao cinema educativo; manter intercâmbio com instituições
nacionais e estrangeiras; cooperar com os órgãos federais, estaduais e municipais de
caráter educativos e por fim estabelecer convênios e ajuda mútua entre os órgãos
públicos.
Diante dessa preocupação dos poderes públicos com as sessões
cinematográficas educativas, a Cinemateca Brasileira buscou estabelecer um acordo de
colaboração com o governo de São Paulo, por meio de um convênio com a Secretaria
de Educação e Cultura que tinha por finalidade desenvolver no Estado o emprego
educativo do cinema em parques infantis, bibliotecas e outros lugares públicos. Além de
ser firmado também um acordo com o Instituto Nacional de Cinema Educativo (INCE)
para colaborar na distribuição e orientação dos filmes daquela entidade.
101
D - promover, periodicamente, cursos, conferencias, seminários, ou, em
caso de necessidade, congressos ou conclaves sobre assuntos culturais
do cinema.
E - organizar exposições circulantes ilustrativas da história do cinema e
seus problemas culturais, pedagógicos e sociais, em museus, bibliotecas,
escolas de qualquer grau, cineclubes e outras entidades culturais e de
ensino.
F – COLOCAR A DISPOSIÇÃO DA SECRETARIA DA EDUCAÇÃO, A
FIM DE SER UTILIZADO NAS ESCOLAS ESTADUAIS, SEU ACERVO
DE FILMES CULTURAIS E EDUCATIVOS, dentro das finalidades que
presidiram ao convênio estabelecido entre o Ministério da Educação e
Cultura e a referida Secretaria pela Lei n° 4,724, de 6 de maio de 1958.
95
LAURITO, Ilka. [Documento] sem data. Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira.
96
MARQUES, Wilma. [Ofício] 09 de outubro de 1962. Recebido em 11/10/62, CB 587. Acervo Departamento
Infantil/Cinemateca Brasileira.
102
Gastyne). A sessão será dirigida por Ilka Brunhilde Laurito. (O ESTADO DE SP,
17/10/62)
97
LAURITO, Ilka. [ Relatório de 1962 ] Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira.
98
Ilka Laurito escreve no texto “Programa Infantil” as bases de uma programação infantil. O documento foi
organizado para um Festival de Cinema, porém não consta no texto uma descrição do Festival, nem mesmo uma
data. Desta maneira, não foi possível identificar a que evento se referia o documento. Contudo, seguindo os matérias
(relatórios e questionários de sessão) utilizados pelo Departamento Infanto-juvenil nas exibições nos cineclubes
infantis e nas projeções em locais públicos nós pudemos analisar que as programações intencionavam seguir ou
seguiam, no caso dos cineclubinhos, a mesma ordem deste documento. Ver: LAURITO, Ilka. Programa Infantil.
Acervo Departamento Infanto-juvenil/ Cinemateca Brasileira.
103
de filmes se concentrariam nos cineclubes infantis criados pelo Departamento Infanto-
juvenil.
O contato com a literatura estrangeira lhe traria influências, principalmente
no que tange a organização do acervo e a criação dos cineclubes infantis. Porém, sua
viagem à Inglaterra ampliaria sua visão sobre as questões de acesso aos meios
audiovisuais para as populações desfavorecidas; a formação de professores em cinema
e a realização de filmes por crianças. Nesse sentido, para o município de São Paulo foi
estabelecido um plano de “Utilização do cinema nas obras assistências e educacionais”
que intencionavam auxiliar os poderes públicos. O programa formulado pelo
Departamento seguia a mesma estrutura de difusão que já era desenvolvida na
instituição, mas o projeto possuía uma direção mais social e previa uma ação diferente
para seis locais: 1. Parques e recantos infantis; 2.Bibliotecas Infantis Municipais; 3.
Escolas primárias municipais; 4.Obras assistenciais diversas; 5. Logrados públicos; 6.
Bairros periféricos. Esse projeto buscava incentivar a projeção quinzenal tanto de
caráter recreativa como educativa, principalmente em locais públicos, em associações
de paraplégicos, surdos-mudos, orfanatos, abrigos de menores, lares e asilos, hospitais
infantis, casas dos filhos de trabalhadores ou casa do pequeno trabalhador e na
periferia urbana.
É preciso compreender que em seu estágio em Londres, Ilka acompanhou
as atividades de oito instituições cinematográficas e educativas que desenvolviam
desde curso de cinema para professores até a realização de produções por e para
crianças e jovens. Essa experiência trouxe novas ideias que ela pensaria em adaptar
para o contexto brasileiro. Além da influência inglesa, a diretora do Departamento já
vinha se apoiando nas experiências de Sonika Bo e de Jean Michel, nas revistas de
cinema juvenil francesas e no exemplo do Cine-clube do Porto que dentro do
movimento de cineclubismo infantil difundido na Europa criou um setor infantil dirigido
por Maria Helena Alves. Assim, os cineclubes infantis acabaram se tornando a
prioridade do Departamento.
104
2.2 Cineclubismo Infantil no Brasil
105
O primeiro contato de Ilka Laurito com a obra de Sonika Bo ocorrera na III
Jornada de Cineclubes (1961), com a palestra da delegação do cineclube argentino Rio
Cuarto. Em seu artigo para a Revista de Cultura Cinematográfica, Padre Edeimar
Massote elogiaria a atuação do cineclube.
99
ANDRADE, Rudá. Infância e cultura. Suplemento Literário. O Estado de São Paulo, 01/12/62, p.39.
106
seguidamente com a militância católica. Esta atuação orientou a formação de uma
“cultura cinematográfica tipicamente católica” 100.
100
MALUSÁ, Vivian. Católicos e Cinema na Capital Paulista – O Cine-Clube do Centro Dom Vital e a Escola
Superior de Cinema São Luis (1958-1972). 2007, 165 p. Dissertação (Mestrado em Multimeios) – Instituto de Artes /
Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2007. p.5.
107
assistência aos cine-clubes locais [...] O interior do Estado tem solicitado,
também, a nossa colaboração, através de cursos e da fundação de cine-
101
clubes .
101
GOMES, Carmen. [Carta] 29 de Julho de 1961. Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira.
102
FOLHETO. Cinema e a Criança. Federação de Cineclubes de Minas Gerais, 1962.
103
LAURTO, Ilka. [Carta] 05 de janeiro de 1962. Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira.
104
Cine-Clubes: Recife-PE. Revista de Cultura Cinematográfica, n. 17, p.37, maio, 1960.
108
Contrariando as diretrizes católicas que procuravam separar os filmes por
temas moralmente aceitáveis, Ilka Laurito iria propor um modelo de cineclube infantil
fundamentado em desenvolver o gosto pela arte cinematográfica. Sua revisão
bibliográfica realizada para o livro “Cinema e Infância” e a análise dos cineclubes
infantis internacionais seriam seu embasamento para a formação das experiências
nacionais.
109
organizado por meio de uma agremiação com exigência de credenciais. Os sócios
tinham em média de 13 anos e, normalmente, eram alunos da Escola Carlos Gomes,
local que Laurito lecionava à época. No artigo “Difusão do Cinema entre as crianças” do
Jornal Correio Paulistano, são esclarecidos os motivos que levaram o cineclube infantil
a ser estruturado como uma agremiação que possuía distintivo e flâmula. Ilka Laurito
afirmaria que a finalidade era “ fazer as crianças amarem a entidade a que pertencem
105
dando lhes ao mesmo tempo o senso de responsabilidade” . Nesse sentido,
aproximando-se da organização proposta por Jean Michel para o Ciné-club de Jeunes,
o Cineclubinho do CCLA formaria também uma diretoria mirim e todo o valor
arrecadado pela tesouraria seria direcionado para a locação de filmes.
110
deveriam ser respondidos pelas crianças, pelo convidado adulto e pela orientadora.
Esclarecemos que uma das propostas de Laurito era que além de explicar aspectos dos
filmes ou de suas profissões os convidados deixassem suas opiniões e sugestões
mediante o preenchimento do formulário. Assim, ela poderia avaliar a qualidade das
projeções de acordo com os comentários pontuados. Entretanto, Ilka afirmaria que o
formulário para os convidados “jamais funcionou porque os adultos tinham mais
preguiça que as crianças para responder”106.
No que concerne a programação, esta era composta por um longa-metragem
e dois curtas-metragens, em geral um documentário e um desenho animado de caráter
educativo. A respeito da seleção dos filmes, Laurito afirmara que faltavam filmes
realizados para crianças e que dentro “dos recursos e das possibilidades atuais os que
desejam trabalhar pelo cinema da criança, tem de selecionar, entre o material disperso
nas várias entidades que possuem filmotecas” e como solução sublinha que no futuro a
seção Infanto-juvenil da Cinemateca teria uma filmoteca “rica e variada”107. As
dificuldades em conseguir filmes produzidos para crianças e jovens não era somente
um caso nacional, em carta para Carmen Gomes, Laurito explica que havia escrito para
algumas instituições estrangeiras (National Film Board, British Film, Ciné-club
Cendrillon), mas que “quanto ao problema vital, que é a constituição de um acervo
fílmico adequado [...] todos, na correspondência, queixam-se das mesmas dificuldades
financeiras de que nos queixamos” 108.
Para manter a programação do Cineclubinho, o Departamento de Cinema
Infanto-juvenil da Cinemateca se valeu inicialmente dos empréstimos efetuados nas
filmotecas e posteriormente dos filmes cedidos pelos consulados e instituições
estrangeiras que formariam um acervo temporário de difusão. No primeiro ano de
funcionamento foram realizadas 12 sessões que exibiram em torno de 36 filmes e
tiveram a participação de convidados como Carlos Vieira, Eduardo Curado, José
Marques de Oliveira, Marino Ziggiatti, Maurice Capovilla, Paulo Emilio Sales Gomes e
106
Transcrição de aula realizada por Ilka em 1966. Acervo Jean-Claude Bernardet/Cinemateca Brasileira.
107
LAURITO, Ilka. Importância das sessões infanto-juvenis. D 246/4. Cinemateca Brasileira.
108
LAURTO, Ilka. [Carta] 05 de janeiro de 1962. Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira.
111
Rolf de Luna Fonseca. No que concerne a qualidade das projeções, os problemas eram
de ordem, principalmente, do estado do filme que por vezes partia durante a exibição; e
das legendas e áudios em língua estrangeira. Entre maio e setembro de 1962, foram
109
realizadas 6 sessões que reuniu um público de 337 crianças . Para o encerramento
das atividades do ano organizou-se o curso ABC do cinema para crianças de 6 à 14
anos. O evento foi divido em quatros encontros. No primeiro, falou-se sobre a História
do Cinema e foi exibido o filme Nascimento do Cinema. O segundo, introduziu o tema
da Linguagem no Cinema e teve a projeção de Crina Branca. O terceiro encontro,
exibiu The making of a movie e o tema abordado foi “Como se faz um filme”. Para
finalizar o curso, o terceiro encontro aprofundou a questão dos gêneros no cinema e em
seguida foram exibidos desenhos, comédias e documentários. O curso havia sido
estruturado para que em cada encontro um membro do cineclube adulto do CCLA
proferisse uma aula, porém Laurito relata em seus comentários sobre o desempenho do
evento que houve falhas administrativas. Pois somente Marino Ziggiati pôde ministrar
as aulas, além desse fato, outro problema estrutural foi a falta de divulgação do curso.
O número de participantes foi de 15 crianças, das quais apenas 6 assistiram todas as
aulas.
Durante os dois anos de atividade do Cineclubinho foram realizadas
palestras, cursos e exibidos filmes desde os clássicos do período silencioso ao
desenhos animados da Walt Disney.
109
Idem., [ Relatório de 1962 ] Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira
112
Tabela 3 - Filmes projetados no Cineclubinho do CCLA entre 1961 e 1962
Ano Filmes
O imigrante e O aventureiro; Un jardin public; História de Pedrinho e do oleiro;
O vaqueiro e seu cavalo; O ladrão de sonhos; Conserve seus dentes; Mickey, o
mágico; No Tempo do Pastelão; Loops, Recusa de uma cadeira em deixar-se
sentar e Le merle; Kit Carson; 3.000 m de profundidade; Dois palermas em
1961 Oxford; Vida animal nas montanhas rochosas; No tempo das diligências; O
homem mosca; O nascimento do cinema; Festival de ballet; Come to the fair;
Romance do Transporte; Nossa Cidade; Messages d’hiver; Bola de Cristal; O
saci;
Crina Branca; O pequeno mundo de Ig; Lição Merecida; Jardins Japoneses; O
1962 último dos moicanos; Nez au vent; Angotée, o pequeno o esquimó; Como as
crianças pintam; Cara de Fogo; Danças escocesas; A ilha dos pássaros; A
primeira Chance;
110
O Jornal Nosso Esforço editado regularmente, entre 1936 e 1967, pelos alunos da escola representou junto aos
relatórios de exibição da Cinemateca Brasileira (1962) as únicas fontes textuais sobre o Cineclubinho da Biblioteca
Infantil Caetano de Campos.
113
Silveira. Devido a este fato, a segunda experiência de formação de um cineclube infantil
ocorreria na Biblioteca Infantil “Caetano de Campos”. Produzidas como uma atividade
extracurricular, as projeções cinematográficas procuravam “integrar o cinema dentro da
educação utilizando-o como auxiliar do ensino e meio de formação humana”111. Nessa
perspectiva, em 05 de maio de 1962, ocorreu a primeira sessão do Cineclubinho da
Biblioteca com a presença de 78 crianças pré-selecionadas através de um questionário
sobre cinema que continha as seguintes questões: “1.Quais são as coisas que você
gosta de fazer aos domingos?; 2. Você já lidou com a máquina de cinema? Onde?; 3.
Diga o nome de um filme de que você gostou muito e conte, em poucas palavras, a sua
história” (RELATÓRIO,1962). A intenção era avaliar o interesse dos alunos a respeito
do cinema. Na inauguração, Ilka fez uma palestra sobre a importância de um cineclube
e explicou o que era uma cinemateca. Em seguida foi exibido no auditório da escola o
filme Crina Branca. O jornal Nosso Esforço daria destaque para a nova atividade e
afirmaria que a película de Lamorisse havia “sugerido motivos de interpretação e
debates por parte dos cineclubistas” e transcreve a opinião da aluna Rosa Maria Maciel
sobre o filme.
O filme “Crina Branca” que tinha a missão de ensinar às crianças, que homem e
animais devem viver em paz, é um verdadeiro poço de fantasia. Se fosse conto
de fadas, teria de ser fantástico. Mais um filme educativo, tem que ser a
realidade e, ao mesmo tempo atrativo.
Nunca foi possível, um menino que já estava sem forças, aguentar segurar um
cavalo pela corda e flutuar sobre a lama e leitos de rios. Também não é
possível, um cavalo vigoroso, dar um forte coice em um menino tão fraco e ele
cair no chão e se levantar sem nada haver acontecido.
No final, também houve fantasia. O menino e o cavalo nadaram muito tempo e
chegaram a uma ilha onde homens e animais são amigos.
Nunca existiu uma ilha assim. Se houvesse, logo começariam a ir para lá
homens maus, que maltratariam os animais. Mesmo que houvesse prisão eles
fugiriam e nunca seriam encontrados.
Portanto esta história é fantástica como um conto de fadas. Esse filme
reformado seria muito melhor (NOSSO ESFORÇO, 1962, p.5).
114
um caráter mais educativo. Na maior parte da programação as obras sugeriam um tema
que pudesse ser trabalho em sala de aula. Por exemplo, na segunda sessão foi exibido
parcialmente o filme O descobrimento do Brasil de Humberto Mauro, pois um
problema no aparelho interrompeu a projeção no meio. Mesmo assim, foi conduzida
uma apresentação sobre o diretor do filme e sua carreira no Instituto Nacional de
Cinema Educativo (INCE), além de ter sido sublinhados os “aspectos de reconstituição
112
histórica do filme” . O filme voltaria a ser apresentado, em novembro, para 391
crianças do curso primário e ginásio (RELATÓRIO, 23/11/62). A partir da quarta sessão
seriam privilegiados assuntos como higiene, geografia e história.
No que se refere a qualidade das exibições, Laurito escreve no relatório de 6
maio de 1962, que faltavam cortinas negras no auditório e que a primeira projeção tinha
sido muito prejudicada pela luz. Esse comentário nos leva a considerar que a escolha
da biblioteca como local para as sessões posteriores tenha sido feita também em
decorrência deste fator. Numa visão inclusiva, o programa de 25 de março receberia
alunos surdos-mudos de uma classe especial.
112
Cine-clubinho “Caetano de Campos”. Jornal Nosso Esforço. Ago/set. 1962, p.5.
115
No decorrer do mês de junho, as sessões foram aprimoradas. Houve
mudanças no ambiente de projeção, além da divisão e diminuição dos alunos em cada
sessão. Ilka ainda elaborou dois questionários um para filmes de ficção e outro para
filmes educativos. Eles deveriam ser preenchidos pelas crianças após do término da
sessão.
O Cineclubinho da Biblioteca “Caetano de Campos” assim como o Cineclube
infantil do CCLA teria uma direção composta por alunos. Para a eleição do presidente e
vice foi realizado um concurso de redação sobre o primeiro filme apresentado. Assim,
113
os autores dos dois melhores textos assumiriam o cargo. Pérsio Árida foi eleito o
presidente e Rosa Maria Maciel a vice-presidente. Em entrevista concedida Rosa Maria
nos conta que “segundo a Ilka, as duas [redações] estavam maravilhosas, mas o Pérsio
seria o presidente porque o presidente tinha que ser um homem e eu então ficaria de
vice porque era mulher”114. É preciso notar que a época se iniciava um movimento de
emancipação feminina. Rosa Maria sublinha, ainda, que “as mães mais avançadas que
começavam a usar calças compridas eram impedidas de entrar na Caetano de Campos
para irem conversar com uma professora ou com a diretora. Imagine ter uma presidenta
do Clube do cinema!”. Ressaltamos, contudo, que como vice-presidente Rosa teria uma
participação frequente nas atividades do Cineclubinho e na sessão de encerramento do
ano de 1962 faria um discurso em homenagem à Ilka Laurito e lhe entregaria flores.
Em 1963, o cineclubinho retomaria suas atividades. De 13 a 25 de maio, o
Departamento Infanto-juvenil da Cinemateca Brasileira organizou na entrada da
Biblioteca Infantil Caetano de Campos a exposição “Invenção do Cinema”. O evento
113
Pérsio Arida nasceu em São Paulo no dia 1º de março de 1952. Cursou História e Filosofia na Universidade de
São Paulo e formou-se em Economia na Faculdade de Economia e Administração da mesma universidade em 1975.
Em 1979 concluiu seus créditos de doutorado em Economia e escreveu uma tese, sem contudo defendê-la. Arida
obteria seu PhD em Economia anos mais tarde, em 1992, com a tese Essays on Brazilian Stabilization Programs
pelo MIT. Entre 1980 e 1984 foi professor dos cursos de graduação e pós-graduação do IPE-USP e, posteriormente,
da PUC/RJ. Em 1985 ingressou no setor público como secretário de Coordenação do Ministério do Planejamento
(gestão Sayad). Entre 1994 e 1995, foi presidente do Banco Central durante a gestão de Fernando Henrique
Cardoso como Presidente da República. In: MARTINS, Gustavo. BELGO, Túlio. Resenha – sobre BIDERMAN, Ciro;
COZAC, Luis Felipe L.; REGO, José Marcio. Conversas com Economistas Brasileiros. Pérsio Arida. São Paulo:
Editora 34, 1996 p. 319-339. Disponível em http://www.ufjf.br/oliveira_junior/files/2013/01/CcEB-14-P%C3%A9rsio-
Arida-FINAL.pdf Acessado em 4 de dezembro, 2015.
114
Entrevista concedida por e-mail em 16/04/15.
116
do mesmo ano, foram exibidos os filmes Zaa, o pequeno camelo branco e uma
seleção de desenhos animados que atingiram um público de 2087 crianças.
Esclarecemos que um mesmo filme chegava a ser projetado para 35 classes
distribuídas entre o curso primário, ginasial e colegial. Apresentamos abaixo os filmes
exibidos entre 1962 e 1964.
Ano Filmes
118
cineamodorismo e o cinema nacional. Além das projeções e debates, o cineclube
mantinha uma biblioteca com mais de 120 obras sobre cinema e coleções completas
das revistas Cahiers du cinéma, Imagem e Celuloide; e um conjunto de vários volumes
da A Scena muda, Cinelândia e Modern Screen. Em 1962, a diretoria do clube era
formada por Cid Marcos Braga Vasques (presidente), Geraldo de Figueiredo Forbes
(Secretário), Clovis Galvão (Secretário), Maurice Armand Legeard (tesoureiro) e Nilo
Rovai (tesoureiro). No conselho fiscal: José Demar Peres, Nelson Alfinito e Oberdan. O
Clube que havia se estabelecido como o ponto de encontro da cidade para ver e
discutir filmes mantinha contato com as instituições culturais da capital, entre as quais
com a Cinemateca Brasileira. Assim, prosseguindo com seu plano de difusão
cinematográfica, o Departamento Infanto-juvenil iniciaria a supervisão das sessões
infantis em Santos.
No dia 15 de junho, o jornal A Tribuna noticiava a ampliação das atividades
do Clube de Cinema que apresentaria no conservatório Lavignac o primeiro “Programa
Especial para Crianças”. O evento receberia a orientação da professora Ilka Laurito e
para a inauguração foram projetados os filmes Crina Branca, Aventuras artísticas,
Formação para o futuro e A cabra do senhor Seguin. A sessão obteve sucesso e
Laurito, com a ajuda dos membros do clube, fundaria o Departamento Infanto-juvenil
que, inicialmente, teria sua supervisão até que fosse formada uma equipe adequada.
Com o propósito de divulgar o cineclubismo infantil para os professores
organizou-se em 18 de agosto, no parque Leonor Mendes de Barros, a palestra
“Cinema para a infância” que teve uma sessão-modelo. O objetivo era que outras
instituições pudessem também realizar atividades semelhantes. A palestra repercutiu
no meio educacional e logo o novo Departamento do Cineclube de Santos teria o apoio
de Maria Lourdes da Silva Vicente. Ao lado de Laurito, ela seria responsável pela
elaboração dos programas seguintes. Tal como os outros cineclubinhos as sessões
eram quinzenais, precedidas de apresentação e finalizadas com um debate. Já na
programação além de serem utilizados os filmes do acervo da Cinemateca e das
filmotecas, seriam também projetados os filmes do Cineclube de Santos e da
119
Cinemateca do Serviço de Divulgação e Relações culturais dos EUA. Desta maneira,
notaremos uma presença maior de filmes educativos americanos. Sublinhamos,
contudo, que em 1961 o Serviço de Informações dos Estados Unidos (USIS) mantinha
no Brasil 15 cinematecas que emprestavam, em especial, filmes de 16 mm. Esses
filmes geralmente buscavam mostrar aspectos da vida americana e enfatizar o sistema
democrático do país. As películas eram emprestados pelas repartições oficiais ou
consulados americanos.
Ano Filmes
120
projeções alternavam entre o Conservatório Lavignac, o Cine Bandeirantes e o
Educandário. Em carta à Maria de Lourdes, Ilka Laurito pede que a envie notícias sobre
as atividades no educandário e ressalta que seria muito importante manter as sessões.
“Gostaria que você encaminhasse o trabalho, pelo menos durante um ano, sozinha:
115
mesmo que seja uma vez por mês” . Por meio do jornal A Tribuna de Santos,
localizamos 8 programas direcionados às crianças. A partir de 1963, Maria de Lourdes
assumiria a direção do Departamento Infanto-juvenil do Clube de cinema de Santos.
Desta maneira, Laurito apenas supervisionaria o departamento, principalmente, em
relação ao empréstimo de filmes.
podemos chamar de cinema educativo não só aquele que informa, que ensina
noções novas ou ajuda a fixar noções antigas, mas também aquele que,
através da ficção, permite ao espectador sentir um acréscimo de sua
116
experiência de vida e um amadurecimento como pessoa humana .
115
LAURTO, Ilka. [Carta] 02 de maio de 1963. Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira.
116
LAURITO, Ilka. Anotações para a entrevista “Educar com o Cinema e não apesar” concedida ao Jornal O
Estado de S. Paulo. Hemeroteca/Cinemateca Brasileira.
117
Idem., Educar com o Cinema e não apesar. O Estado de S. Paulo. Hemeroteca/Cinemateca Brasileira.
121
ajude a formação da infância, seja pelo valor estético ou pela problemática humana que
apresentou.
Na direção contraria de outras instituições que priorizavam a utilização do
cinema como forma de instrução ou das associações religiosas que procuravam separar
o “bom cinema” para infância e juventude, a Cinemateca Brasileira buscava selecionar
filmes que pudessem “formar um público jovem ativo, com espírito crítico e estimular
possíveis vocações para o cinema nacional”. Assim, elaborou três propostas de
utilização do cinema em contexto educacional. A saber:
Desta maneira, Ilka Laurito elaborou dois planos de ação. O primeiro era
direcionado aos cineastas e produtoras de filmes e recomenda a criação de filmes
infantis com personagens representados por crianças. O plano geral de trabalho de
118
1963 remarca que a produção cinematográfica é um ponto importante a ser
desenvolvido. No que concerne a esse assunto são elencados três objetivos.
O primeiro objetivo era estabelecer contato com companhias
cinematográficas e cineastas para criar filmes de valor cultural e artístico sobre a
educação brasileira. Esses filmes deveriam documentar as atividades das classes
experimentais e das escolas de artes.
118
LAURITO, Ilka. Cinema Educativo. Plano de trabalho apresentado ao Departamento de Educação, 1963. Acervo
Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira.
122
O segundo objetivo era a produção de filmes sobre os problemas culturais
brasileiros, tais como: os documentários de natureza sociológica, para fins de estudo e
conscientização. O filme Aruanda (Linduarte Noronha, 1960) é citado como exemplo no
gênero.
O terceiro e último objetivo colocado era a criação de reportagens sobre as
atividades do Departamento Infanto-juvenil.
A efetivação de alguns desses objetivos pode ser constatada na parceria do
Departamento da Cinemateca Brasileira com o Instituto Nacional de Cinema Educativo
(INCE) que produziu e distribuiu a série “Brasilianas” de Humberto Mauro sobre as
canções folclóricas brasileiras.
O segundo plano foi a elaboração de um projeto modelo de inclusão do
cinema no currículo escolar. Para Ilka Laurito o cinema não deveria ser entendido
somente como auxiliar da educação, pois ela acreditava ser evidente a sua inserção em
todos os graus do ensino. E explica que
119
LAURITO, Ilka. Integração do Cinema na Escola. Apresentação IV Jornada Nacional de Cineclubes, 1963.
Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira.
123
filmológicos e haviam dúvidas sobre os benefícios da exibição de filmes para crianças
muito pequenas. Mesmo assim, Ilka Laurito iria aconselhar as escolas e bibliotecas
infantis que possuíssem aparelhos de projeção a utilizarem o cinema em suas
atividades para a educação moral, social, cívica e artística e declara que “o estudo do
comportamento de um personagem, a análise de hábitos e atitudes; a contemplação da
paisagem brasileira, os costumes, as tradições nacionais; o apurar da sensibilidade,
através da beleza dos temas, ou da criação formal, tudo isso poderia ser conseguido
120
através do cinema utilizado no curso primário” . A projeção dos filmes seguia a
mesma estrutura dos cineclubes infantis: apresentação, exibição e discussão dos
filmes.
No curso médio (ensino normal, técnico e colegial) o cinema receberia maior
importância, pois a direção do Departamento Infanto-juvenil considerava que o nível
intelectual dos alunos permitia um trabalho mais elaborado. Além disso, o próprio
currículo dos ginásios, escolas normais e colégios ofereciam mais oportunidades de
inserção da linguagem cinematográfica. Deste modo, o projeto ficou subdividido em
curso normal, ensino técnico, ginásio e colégio. Em relação ao curso normal ficou
estabelecido que numa “situação ideal de ensino”, o cinema seria integrado como
matéria a parte do currículo. Ilka esclarece que os futuros professores, os normalistas
iriam adquirir a “consciência exata do cinema como instrumento de educação, e a
cultura cinematográfica suficiente para usá-lo com inteligência na formação de seus
alunos” 121. Quanto ao modo de inclusão do cinema no currículo, o projeto sublinha as
dificuldades existentes em encontrar uma lacuna para integrá-lo e recomenda como
ponto de partida chamar a atenção e o interesse dos professores do curso para as
vantagens de se utilizar os filmes.
Nesse sentido, foram elaboradas algumas sugestões explicando como cada
disciplina poderia adotar o cinema em sala de aula. Apresentamos estas orientações no
quadro a seguir:
120
LAURITO, Ilka. Integração do Cinema na Escola. Apresentação IV Jornada Nacional de Cineclubes, 1963.
Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira.
121
Idem.,
124
Disciplina Orientação
Ao professor desta matéria cabe a compreensão do
Metodologia do fenômeno cinematográfico como processo educativo
ensino em si mesmo, e como auxiliar de disciplina.
125
determinado modelo de filme, ou seja “bom cinema” x “o mau cinema”, Ilka escreve no
texto “cinema para a infância e juventude” que a influência do cinema sobre as crianças
pode se fazer nos hábitos e atitudes, no culto as estrelas e astros. Porém, quanto ao
problema da delinquência ela afirmaria que era um assunto controvertido.
(LAURITO,1962).
Para o ensino técnico que estava fragmentado em ensino agrícola, comercial
e industrial o plano previa uma estrutura para cada área. Assim, para o ensino agrícola
o cinema deveria ser visto como um fator de integração ao meio, no ensino comercial
como uma “abertura para uma humanização do ensino” e por fim como uma “expressão
artística” no caso do ensino industrial. Ilka explica que no ensino técnico, mas do que
em outras áreas do conhecimento, o cinema era uma “fonte inesgotável de
informações” e o seu caráter de auxiliar do ensino deveria orientar sua compreensão
para o domínio cultural. (LAURITO, 1963, p.3).
Seguindo as diretrizes do projeto, o cinema alcançaria seu viés cultural no
ginásio e no colegial, porque seria nessa etapa do ensino que a arte cinematográfica
poderia ser inserida na matéria de Prática Educativa. Esta disciplina pertencia ao
currículo escolar comum de todas as escolas brasileiras, e o cinema seria uma matéria
optativa com frequência obrigatória, mas sem nota. No que se refere a implantação
dessa matéria, caberia a cada escola, em cada Estado, inserir o cinema em seu
currículo ou em suas atividades extracurriculares. A direção do Departamento
Infanto-juvenil informa que a Lei de Diretrizes e Bases permite que cada
estabelecimento de ensino forme seu programa educacional e ressalta que o êxito
dessa disciplina dependia da formação de professores, diretores, inspetores escolares,
técnicos de educação e orientadores educacionais. Além de uma estrutura escolar que
abrigasse um serviço de cinema permanente. O projeto sintetiza essas necessidade de
integração em cinco pontos: “a) professores com cultura cinematográfica ou
profissionais de cinema com qualidades didáticas; b) programação de cursos: seu
espírito, suas finalidades; c) programações de projeções: seleção e adequação dos
filmes aos meios; d) material didático especializado: diapositivos, diafilmes, gravuras,
126
fotografias e filmes; e) equipamento escolar: projetor fixo, projetor cinematográfico e
epidiascópio”.
Como forma de auxiliar escolas e interessados em inserir o cinema como
disciplina, Ilka apresenta um “Plano Geral de Trabalho” para o Departamento de
Educação de São Paulo. Esse texto, elaborado em maio de 1963, estruturava a
organização e o desenvolvimento de um setor de Cinema Educativo na Instituição122. O
plano pontuava cinco divisões:
122
No texto intitulado “Entrevista à BBC” de 1964. Ilka Laurito afirma “tenho desenvolvido no Brasil trabalhos na
Cinemateca Brasileira, dirigindo um Departamento destinado ao estudo da infância e da juventude nas suas relações
com o cinema. E à frente da Seção de Cinema do Departamento de educação de S. Paulo”.
127
preocupação quanto ao estado de conservação das películas ao sugerir que os filmes
do acervo passassem por um trabalho constante de revisão e que era preciso realizar
um levantamento de todo o material cinematográfico (filme, projetor, diapositivo e
diafilme) que estivesse abandonado em escolas ou outras repartições do Estado. Com
relação ao tema, Ilka afirma que
Apesar de todo o empenho de Ilka, tudo indica que o projeto do setor não
saiu do papel e infelizmente grande parte desses materiais se perderam. Atualmente,
um trabalho de pesquisa vem sendo feito pela professora Maria Cristina Meneses da
Universidade Estadual de Campinas que, por meio do CIVILIS - Grupo de Estudos e
Pesquisa em História da Educação, Cultura Escolar e Cidadania, da Faculdade de
Educação, tem localizado e classificado os materiais encontrados nestas duas escolas
de Campinas.
Antes de continuarmos nossa análise de como ocorreu na prática a inserção
do cinema no currículo escolar, é importante, pontuarmos, que o Departamento de
Cinema Infanto-juvenil já havia realizado, em 1962, algumas projeções de filmes nos
colégios: Brasil-Europa, Escola Estadual Alberto Comte e na Escolinha de arte. No que
se refere as essas atividades existe quase uma total ausência de informações. Com
base no relatório de 1962, sabemos que sob a direção de Ana Maria Smith foram
realizadas dez sessões no Colégio Brasil-Europa com a presença de 352 alunos. De
acordo com o documento, o cinema era utilizado como auxiliar de ensino e atividade
extraclasse. No caso da Escolinha de Artes, duas sessões foram realizadas para 40
alunos. Examinando os documentos e cartas do acervo do Departamento Infanto-juvenil
pudemos depreender da leitura que nessas aulas foram exibidos filmes experimentais
de McLaren. E que diferentemente da escola anterior, o cinema foi trabalhado como
128
expressão artística e os alunos foram convidados a produzirem desenhos,
provavelmente em película, que posteriormente se tornariam um filme de animação. O
relatório geral de atividades de 1962, indica que o filme estava sendo montado pelo
cineasta Roberto Miller. Entretanto, em três anos de pesquisa não localizamos o filme e
nenhum documento sobre o tema. Convém lembrar que Ana Maria Smith era
professora nas duas instituições, além de ser secretária da Cinemateca, o que
provavelmente facilitou a introdução dessas atividades na escola.
129
A introdução procurava triar o conhecimento dos alunos sobre o cinema.
Discutiam-se os filmes que estavam em cartaz na cidade. O objetivo era “preparar o
espírito para o programa a ser iniciado”. Na primeira unidade abordavam-se questões
gerais sobre a produção de um filme. A pretensão era esclarecer para os alunos como
era feito um filme, qual o trabalho para sua realização e qual era a equipe que o tornava
realidade. A segunda unidade, ensinava linguagem cinematográfica. Partindo do
princípio de cinema como arte, a intensão era traduzir a “linguagem própria” do cinema.
Nesse sentido, ensinava-se “o papel da imagem, a criação da câmera, as elipses,
metáforas e símbolos, os fenômenos sonoros, a montagem e a profundidade de campo,
123
os diálogos, o tempo e o espaço” . Essa unidade compreendia ainda um tópico
especial de técnica cinematográfica que era formado por informações sobre a
produção, a película e seus formatos, ação da luz, tipos de aparelhos, laboratórios e
sala de montagem, faixa sonora e técnicas de projeção. A terceira unidade, intitulada
“Gêneros Cinematográficos”, buscava ensinar por meio da análise e discussão do tema
dos filmes quais eram os principais gêneros do cinema (LAURITO,1963).
O programa previa que as aulas teóricas fossem acompanhadas de projeção
de slides e filmes. E também indicava a realização de trabalhos práticos; críticas dos
filmes em cartaz e aulas complementares dadas pela professora ou por convidados
com a intenção de proporcionar ao curso um caráter de centro cultural. Essas aulas
complementares tinham por tema: “A trucagem”; “A busca do movimento da imagem” e
“Estudos comparativos: cinema e pintura, literatura e cinema, cinema e teatro” e
deveriam ser exibidos os filmes Pantomimes, como exemplo de comparação entre
cinema e teatro; O saci para comparação entre cinema e literatura e Les Oursins para
refletir sobre cinema e ciência. Além desses títulos, o texto sugere a projeção de The
Making of movie e de filmes brasileiros. Esse material seria fornecido pela
Cinemateca, porém com o decorrer do curso, Ilka verificaria que seriam muitos os
problemas matérias e de espaço físico que impediriam, por exemplo, a exibição de
123
LAURITO, Ilka. Cinema, Prática Educativa. Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira.
130
filmes. Em seu relatório de 1963, ela afirma que “foram feitas duas projeções apenas,
por falta de equipamento e de sala especial na escola” 124.
Para as 4ᵃˢ séries, o programa se estruturava de forma mais densa. Além de
possuir 5 unidades de trabalho, o plano de ensino sugeria uma visita aos estúdios de
filmagens. Seguindo o mesmo padrão na introdução, as unidades eram:
Notamos que este segundo programa iria incluir não somente uma
abordagem histórica do cinema como também abriria espaço para o cinema nacional.
Na primeira unidade foram ministradas aulas sobre as sombras chinesas, os
brinquedos ópticos e a cronofotografia. Já na segunda unidade o tema era os
precursores do cinema. A terceira e a quarta unidade tinham um viés histórico e
procuravam retratar a evolução do cinema por meio das características dos diretores e
atores do período mudo e sonoro.
Enfim, a quinta unidade era dedica ao cinema brasileiro e estava subdividida
em quatro tópicos: a) cinema mudo – São Paulo, Recife, Campinas e Cataguazes – os
pioneiros; b) cinema sonoro: os estúdios, os filmes, as obras e os autores; c)
importância artística, cultural e econômica; d) o documentário: seu valor e significado
para o estudo da realidade nacional (LAURTIO,1963). Entre os materiais ilustrativos
selecionados para as aulas estavam os slides sobre os aparelhos ópticos e os filmes
primitivos. No que se refere às projeções foram indicadas as películas: La naissance
du cinéma (Roger Leenhardt, 1946), Cinéma Lumière, Early Film Selection, O
homem Mosca/Safety Last (Sam Taylor e Fred Newmeyer, 1923), Le Million (René
124
Idem., [ Relatório de 1963 ] Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira.
131
Clair,1930). No que se refere ao cinema nacional, temos os curtas-metragens: O
mestre de Apipucos (1959) e o Poeta do Castelo (1959) de Joaquim Pedro de
Andrade; Primeira Chance (Roberto Santos, 1959); e Aruanda (Linduarte
Noronha,1960);
Em uma análise não extensa dos matérias pedagógicos criados por Ilka
Laurito, podemos observar uma similaridade entre o programa dos cursos de formação
cinematográfica ministrados pela Cinemateca Brasileira, no final do anos 50, no CCLA e
os planos de ensino idealizados por ela para as escolas secundárias. Acredita-se que o
fato de Ilka ter participado desses cursos tenha influenciado na divisão temática e na
referência bibliográfica e filmográfica.
Antes de prosseguirmos, é preciso esclarecer dois pontos sobre a parte
prática da inclusão do cinema no currículo escolar do colégio Padre Manoel de Paiva. A
primeira é que Ilka Laurito já lecionava a matéria de língua portuguesa na escola, o que
facilitou o processo de conscientização da direção quanto a necessidade de se ensinar
cinema. O segundo fator é que devido a sua experiência como diretora do
Departamento de Cinema Infanto-juvenil, ela havia aprendido como selecionar e
conseguir os filmes para serem projetados. Na visão de Ilka o cinema apresentado
como prática educativa incluía não somente uma educação artística e cívica, mas ia
além do método tradicional. As atividades desenvolvidas nos cineclubes infantis haviam
lhe provado ser positiva a utilização do filme, documentário e ficção, para o
levantamento e conscientização dos alunos. E para o contexto educativo, ela acreditava
que sua inclusão no currículo escolar podia “conferir à escola brasileira o caráter não de
edifício público isolado, mas de um organismo vivo e participante” (ESTADÃO,
25/04/63).
Entretanto, na prática, a situação se mostrou muito mais complexa. O
contato com os alunos lhe fariam perceber, desde a primeira aula, que o interesse entre
meninos e meninas iria variar de classe para classe. O que exigiria adaptação em suas
aulas. Para compreendermos melhor, segue abaixo um esclarecimento feito por Ilka
sobre a situação ao Padre Moisés Fumagalli:
132
nós, professores, devemos adaptar-nos às suas reais necessidades de saber,
pois através dessas necessidades, é que lhes poderemos ensinar o que
realmente nós queremos. Isso lhe digo porque senti que se tenho uma classe
de 4 série, só de rapazes, excelente para a discussão de problemas estéticos e
éticos que o cinema sugere, com uma certa profundidade, já tenho outra classe,
só de garotas, que se interessam de partida pelos “truques” e pelos astros.
Seria falso torcer seu gosto vivo ou passar por cima da sua curiosidade pelo
menos importante em cinema, na minha opinião, que é a trucagem: o que
interessa, realmente, é utilizar esse interesse, satisfazendo o interesse das
garotas e, através da narração pitoresca dos truques fazê-las compreender o
sentido da linguagem cinematográfica; e através do seu interesse pelos astros,
desperta-lhes problemas sobre a vocação cinematográfica ou sobre o “star-
125
system”, e o problema que é sua a influência sobre a adolescência .
125
LAURITO, Ilka. [Carta] 14 de março de 1963. CB 524/63 - Arquivo Institucional/Cinemateca Brasileira.
126
Idem., Cinema para a infância. Palestra SESC 14/12/66. D-246/2 - Cinemateca Brasileira.
127
Entrevista de Ilka Laurito concedida à José Inácio de Melo e Souza em 11/03/1997. Arquivo José Inácio de Melo e
Souza/Cinemateca Brasileira.
133
que os alunos eram do curso noturno e normalmente “estavam cansados de uma rotina
128
de trabalho e que entravam noutra rotina escolar, da qual queriam fugir” . Mesmo
com as circunstâncias negativas, Ilka é enfática ao assegurar que a experiência teve
pontos positivos como, por exemplo, o interesse dos alunos pela linguagem
cinematográfica e sublinha, ainda, que os debates eram muito úteis.
Em geral, as atividades do Departamento Infanto-juvenil eram
acompanhadas pela imprensa, mas especificamente, pelo jornal O Estado de S. Paulo,
no qual Paulo Emilio escrevia para o suplemento literário e sedia sempre que
necessário o espaço para os membros da Cinemateca. Ilka, por exemplo, escreveu
diversos artigos narrando não somente as atividades do Departamento, mas
esclarecendo e argumentando em favor do cinema infantil/educativo e do movimento de
cineclubismo infanto-juvenil. Assim, uma atividade tão importante e inovadora para a
época não passaria despercebida.
Em 27 de Abril, Ilka publicaria, no suplemento literário, o artigo “Cinema,
prática educativa” que reservaria poucas linhas a experiência da escola paulista, pois a
intenção era chamar a atenção para o potencial da proposta: cinema na escola. E isso
ficou bem claro ao ressaltar a necessidade de criar um diálogo entre os poderes
públicos, os produtores, os cineastas e os gestores escolares para a formação de uma
equipe especializada. Além disso, o texto relata, de forma breve, a experiência
realizada no Colégio de João Pessoa, na Paraíba, que, em 1962, havia integrado o
cinema em seu currículo escolar. É importante, pontuarmos, contudo que o
Departamento Infanto-juvenil vinha, desde 1961, orientando instituições e escolas de
outros Estados quanto à criação de setores de cinema infantil e a organização do
cinema como matéria curricular ou como atividade extra. Esse foi o caso, por exemplo,
da Escola Estadual do Paraná – Escolinha de Arte; da Escola Parque de Brasília; e do
Colégio São Francisco de Sales, em Teresina. Mas, o foco principalmente do artigo de
Ilka seria justamente despertar a “atenção das autoridades competentes, para a
128
LAURITO, Ilka. Cinema para a infância. Palestra SESC 14/12/66. D-246/2 - Cinemateca Brasileira.
134
necessidade de equipamento das escolas primárias e secundárias com projetor
cinematográfico e sala-ambiente” (ESTADÃO, 27/04/63).
As aulas de cinema da Escola Padre Manoel de Paiva foram encerradas em
novembro e durante o período em que a disciplina foi ministrada foram produzidas
inúmeras resenhas e atividades relacionadas aos filmes trabalhos em aula. No ano
seguinte, Ilka Laurito iria realizar um estágio na Europa e a matéria não estaria mais no
currículo da instituição.
135
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Sabemos agora todas as dificuldades materiais por que temos que atravessar.
Sabemos o trabalho de desdobramento e quase de ubiquidade que temos que
realizar, proferindo palestras, participando de reuniões, fazendo exposições,
estabelecendo contatos, estudando experiências alheias, catequisando os
meios ainda não conscientes do problema, solicitando auxílios de todas as
espécies [...] semeamos ideias com entusiasmo, mas continuamos com as
mãos vazias, sem o material necessário para manter o nível e a continuidade
da tarefa que nos propusemos por falta de recursos econômicos adequados. E
a conclusão a que chegamos, é que só nos podem ajudar eficazmente os
poderes oficiais, sempre que tomarem consciência do trabalho que
intencionamos realizar e da importância que ele tem para a educação nacional
(LAURITO, 1963, p.5).
136
129
concedeu uma bolsa de estudos, ela acompanha a programação de oito instituições
entre elas: o British Film Institute, a Children’s Film Foundation, a Televisão Educativa
da BBC e o Centre for Educational Television Oversea. Essa experiência lhe traz novas
perspectivas quanto ao cenário nacional, em especial, nas questões sociais, na
realização de filmes por crianças e adolescentes e na utilização da televisão como uma
nova alternativa. No texto “Entrevista à BBC”, Ilka explica:
Após terminar seu período na Inglaterra, Ilka partiu para a França em busca
de ter contato com o trabalho realizado por Sonika Bo. Em paris, acompanha as
sessões do Cineclube Infantil Cendrillon. Em relação a essa experiência, Ilka diz: “Há
30 anos essa mulher faz filmes para a infância, desde de 1933. [...] Essa mulher é
pioneira. Não só fez o Cineclube infantil, como passou a realizar os filmes e os filmes
estão cheios de poesia”. 130
Ao retornar ao Brasil, Laurito encontrou dificuldades econômicas maiores
que a impediam de manter o Departamento de Cinema Infanto-juvenil que necessitava
de uma equipe, de material e de espaço adequados. As dificuldades, porém não foram
somente financeiras. Com a ascensão em 1964 da ditadura militar, um novo ciclo
político de censuras, cassações e prisões se instala no país. O que dificultou ainda
129
Ilka Laurito visitaria também as seguintes instituições: Society for Education in Film and Television, National
Committee for Audio-Visual AIDS in Education, Educational Foundation for Visual AIDS e o Overseas Visual Aids
Centre.
130
Transcrição de aula realizada por Ilka em 1966. Acervo Jean-Claude Bernardet/Cinemateca Brasileira.
137
mais as possibilidades de trabalho, haja vista que não somente a Cinemateca Brasileira
teria suas atividades engessadas. Mas grande parte de todas as instituições e artistas
nacionais. O relatório de atividades desse ano registra a realização do curso de cinema,
em janeiro e fevereiro, ministrado para professores. E ainda apresenta um relato do
estágio de Ilka Laurito com uma descrição das atividades efetuadas em cada instituição
Europeia.
Por consequência dessa situação o Departamento diminui suas atividades no
ano seguinte, mas não podemos afirmar que suas atividades estavam totalmente
paralisadas, porque Ilka escreve, em 21 de Junho 1965, uma carta ao diretor do
Colégio Estadual do Paraná, Roaldo Roda, explicando que o atraso em sua resposta é
decorrente do fato de estar indo a Cinemateca uma única vez por semana e
complementa que em decorrência da falta de funcionários e possibilidade materiais, ela
aproveitava para ajudar no trabalho dos outros companheiros.
Em 1966, um plano de uma Filmoteca Central foi elaborado por Ilka. Ao que
tudo indica, pela anotação a caneta, no canto do documento, o programa seria para a
prefeitura. O plano era uma síntese realista da experiência adquirida por Ilka nos
últimos anos como diretora do Departamento da Cinemateca. Seu planejamento previa
uma filmoteca central e outras filmotecas periféricas, o objetivo era que o acervo central
fosse distribuído pelos “bairros periféricos da cidade, e depositados em subprefeituras
ou mesmo em bibliotecas municipais, ou outras entidades adequadas”. A Cinemateca
Brasileira ficaria encarregada “da revisão e manutenção do acervo, bem como da
revisão das cópias das filmotecas periféricas num período anualmente pré-
estabelecido”. Tudo nos leva a crer que esse projeto de uma Filmoteca Central nunca
tenha saído do papel, pois nenhum outro documento ou correspondência se refere ou
cita o assunto. É preciso, contudo, pontuarmos ainda que numa palestra realizada no
Sesc, em 14 dezembro 1966, Ilka afirmaria que ficou dois anos em pausa, isto é,
desatualizada quanto ao “que se está fazendo no Brasil, no norte, no centro e no sul”131.
Em nenhum momento ela faz referência a criação de uma Filmoteca Central. No
131
LAURITO, Ilka. Cinema para a infância. Palestra SESC 14/12/66. D-246/2 - Cinemateca Brasileira.
138
mesmo ano numa aula ministrada à convite de Jean-Claude Bernardet, na Escola de
Comunicação e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP), ela definiu esse
período de trabalho como “uma descoberta do cinema em relação à infância” 132.
A trajetória de Ilka Laurito na Cinemateca Brasileira, não terminaria com o fim
das atividades do Departamento de cinema Infanto-juvenil. A convite de Rudá de
Andrade, ela voltaria a instituição como conselheira. Cargo que iria exercer de 1978 a
2005. Em seu período de atuação localizamos, no ano de 1981, uma sugestão sua para
a criação de um pequeno Museu de Cinema, com peças da própria Cinemateca, que
pudesse ter atividades para escolas e outras instituições. A ideia foi bem recebida pelos
conselheiros que lhe atribuíram a tarefa de organizar o museu, porém não foram
localizadas nas atas das reuniões seguintes nenhuma referência ao tema. Podemos
afirmar que Ilka nunca deixou de incentivar o cinema educativo e infantil, em entrevista
a José Inácio ela afirma que como conselheira que raramente dava conselhos todas as
vezes que havia falado nas sessões foi “levantando ainda, quixotescamente, esta
possibilidade de se retomar este trabalho” e sublinha “até hoje [1997], eu acho que se
houvesse possibilidade de ser feito um trabalho bonito ligado à cinemateca, neste nível,
sessões especiais com debates, com preparação...seria um trabalho bonito 133”.
Neste trabalho pretendemos narrar a história do Departamento de Cinema
Infanto-juvenil com o objetivo de identificar suas ações educativas e analisar como
foram entendidas pelos administradores da Cinemateca Brasileira e como se efetivaram
na prática. Para que pudéssemos visualizar como ocorreu a formação dos arquivos de
filmes educativos no Brasil, optamos por começar nosso percurso abordando a
presença das imagens no ensino a partir de um contexto mais amplo, pensando nos
países europeus onde estas ações já estavam em desenvolvimento. Mesmo sabendo
que a situação desses países fosse distinta da realidade brasileira, não se pode negar a
influência, direita ou indireta, que desempenharam na criação das nossas instituições.
132
Transcrição de aula realizada por Ilka em 1966. Arquivo Jean-Claude Bernardet/Cinemateca Brasileira.
133
Entrevista de Ilka Laurito concedida à José Inácio de Melo e Souza em 11/03/1997. Arquivo José Inácio de Melo
e Souza/Cinemateca Brasileira.
139
Nesse sentido, analisamos a formação das primeiras coleções de filmes
educativos dos museus escolares/pedagógicos até o surgimento das cinematecas
modernas, passando pela criação das cinematecas educativas. E por fim, nos
dedicamos a Cinemateca Brasileira e as ações educativas do Departamento de Cinema
Infanto-juvenil que em seus três anos de atividades ininterruptas conseguiu chamar a
atenção de especialistas, professores e cineastas para o cinema educativo,
contribuindo na construção de um novo olhar sobre o filme e suas funções
educacionais.
É importante, contudo, pontuar que as ações educativas do Departamento
Infanto-juvenil destoaram do que normalmente era oferecido por outras instituições,
como o INCE, a seção de Cinema Educativo do Serviço de Expansão Cultural da
Secretaria de Educação do Estado de São Paulo e o Serviço de Recursos Audiovisuais
da Cidade Universitária. Ainda que saibamos que, em muitos momentos, essas
instituições foram aliadas do Departamento, podemos considerar que suas ações e
projetos foram inovadores mesmo quando se pensa no que é oferecido às escolas
atualmente pela Cinemateca Brasileira.
Se ponderarmos as atividades de cinema e educação que ocorreram depois
desta iniciativa, como, por exemplo, o Programa Cine Educação, idealizado pela
Cinemateca Brasileira em parceria com a assessoria Via Gutenberg e a Secretaria
Estadual de Educação de São Paulo vamos notar que o projeto se desenvolve em torno
de uma perspectiva do cinema somente como instrumento complementar do trabalho
pedagógico.
Ao nosso ver, esta pesquisa sublinha algumas questões quanto ao lugar que
a educação cinematográfica infanto-juvenil teve, no período de 1954 a 1966, na
Cinemateca Brasileira. Assim, ao concluirmos este trabalho parece necessário
esclarecer que o tema não se esgota aqui e que nossa intenção foi dar o primeiro passo
para futuras pesquisas. Pois, o acervo do Departamento Infanto-juvenil é composto por
uma variedade de documentos esparsos entre o Centro de Documentação da
Cinemateca Brasileira, os arquivos da escola Caetano de Campos e os documentos da
140
família Laurito. E como um quebra-cabeça que a cada nova peça se transforma,
acreditamos que esta dissertação foi a primeira peça de um grande jogo. Portanto,
esperamos contribuir com novos olhares sobre o papel da educação na Cinemateca
Brasileira.
141
REFERÊNCIAS
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temp. In: PASTRE-ROBERT, B., DUBOST, M., MASSIT-FOLLÉA, F. (Orgs). Cinéma
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2004.
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MOMA, em 1938. In: The Museum of Modern Art New York. Lisboa: Cinemateca
Portuguesa, 1993.
BARRY, Iris. A Cinemateca do Museu de Arte Moderna. In: The Museum of Modern
Art New York. Lisboa: Cinemateca Portuguesa, 1993.
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government and film culture, 1933 – 2000. Manchester: Manchester University Press,
2012.
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Formação Cinematográfica. Campinas, 1960.
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cinematográfica (1954-59). 2013. 185 p. Dissertação (Mestrado em História) –
Faculdade de Ciências e Letras, Campus de Assis, UNESP – Universidade Estadual
Paulista “Júlio de Mesquita Filho”, 2013.
ARTIGOS
146
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p.28. Disponível em < http://www.icem-pedagogie-freinet.org/node/16716> Acesso em
15 set.2014.
ARQUIVOS
Cinemateca Brasileira
Cinemateca Francesa
DOCUMENTOS JURÍDICOS
BRASIL. Classificação Geral das Mercadorias – Tarifa II. Diário Oficial [da] República
Federativa do Brasil, Poder Executivo, Rio de Janeiro, 25 jun.1894. Seção 1, p. 2262.
FRANÇA. Archives Nationales. Musée Pédagogique. État général des fonds des
Archives nationales (Pierrefitte-sur-Seine). Disponível em:
<http://www.archivesnationales.culture.gouv.fr/chan/chan/series/pdf/71AJ.pdf > Acesso
em: 4 set. 2014.
ENTREVISTAS
147
APÊNDICE A - Instituições Estrangeiras contatadas por ordem alfabética
148
ANEXO I - Formulários do Departamento de Cinema Infanto-Juvenil
149
Formulário 2 - Convidado
150
Formulário 3 – Crianças
151
Formulário 4 – Curso: Cinema, Pratica Educativa
152
Formulário 5 – Apresentação
153
ANEXO II - Desenhos e resenhas realizados pelas crianças
Desenhos
Desenho sobre o filme “Angotee, pequeno esquimó” - Cineclubinho Biblioteca “Caetano de Campos”
Fonte: Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira
154
Desenho sobre o filme “O mundo do pequeno Ig” - Cineclubinho Biblioteca “Caetano de Campos”
Fonte: Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira
155
Desenho sobre o filme “O mundo do pequeno Ig” - Cineclubinho Biblioteca “Caetano de Campos”
Fonte: Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira
156
Resenhas
157
Resenha sobre o filme “Angotee, pequeno esquimó” - Cineclubinho Biblioteca “Caetano de Campos”
Fonte: Acervo Departamento Infanto-juvenil/Cinemateca Brasileira
158