Você está na página 1de 18

Caderno CRH

ISSN: 0103-4979
revcrh@ufba.br
Universidade Federal da Bahia
Brasil

de Santana Batalha, Elisa; Schmidt Arturi, Carlos


MOVIMENTOS SOCIAIS TRANSNACIONAIS E REAÇÃO INTERESTATAL: considerações teóricas à
luz do Fórum Social Mundial e da cooperação securitária na União Européia
Caderno CRH, vol. 19, núm. 48, septiembre-diciembre, 2006, pp. 461-477
Universidade Federal da Bahia
Salvador, Brasil

Disponible en: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=347632170007

Cómo citar el artículo


Número completo
Sistema de Información Científica
Más información del artículo Red de Revistas Científicas de América Latina, el Caribe, España y Portugal
Página de la revista en redalyc.org Proyecto académico sin fines de lucro, desarrollado bajo la iniciativa de acceso abierto
Elisa de Santana Batalha, Carlos Schmidt Arturi

MOVIMENTOS SOCIAIS TRANSNACIONAIS E REAÇÃO

DOSSIÊ
INTERESTATAL: considerações teóricas à luz do Fórum Social
Mundial e da cooperação securitária na União Européia

Elisa de Santana Batalha


Carlos Schmidt Arturi

INTRODUÇÃO A globalização econômica, a proliferação de


atores internacionais e a superação da Guerra Fria
O fenômeno da globalização tem provocado provocaram, entre outros fenômenos, o fim do
intenso debate no âmbito das Relações Internacio- status de que gozavam os estados nacionais de se-
nais como disciplina e induz os pesquisadores da rem praticamente os únicos protagonistas das re-
área a rediscutir seus paradigmas e a estudar te- lações internacionais, pois, doravante, devem le-
mas antes marginalizados, por exigirem um enfoque var em consideração e relacionar-se, muitas vezes
menos estadocêntrico. Um desses temas é o da de forma conflituosa, com outros atores não-esta-
contestação internacional sob suas múltiplas ex- tais de relevante atuação transnacional (Rosenau,

CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006


pressões, que provoca, por sua vez, reações de 1990). Segundo Zygmunt Bauman, a
cooperação securitária de caráter supranacional. transnacionalização da economia constituía, no fim
Com efeito, a transnacionalidade de atores não dos anos 90, o principal aspecto da globalização a
estatais, a formação de redes globais de movimen- afetar a vida cotidiana das pessoas e a dimensão
tos sociais, a cooperação interestatal em áreas até do político, observação também presente entre os
então de exclusiva competência e monopólio das teóricos que trabalham com a noção de
soberanias nacionais, como as de segurança, justi- interdependência. Para Bauman, o tripé da sobe-
ça e inteligência, exigem o questionamento teórico rania (militar, econômica e cultural) já havia sido
e a relativização do papel do Estado nas relações abalado, mas a “perna” econômica fora a mais afe-
internacionais na atualidade. Este trabalho aborda tada (Bauman, 1999).
algumas facetas desse debate à luz dos resultados No entanto, alicerçada nas novas tecnologias
de pesquisas realizadas pelos autores sobre o da informação, a globalização fortaleceu as estru-
Fórum Social Mundial e sobre a cooperação poli-
intitulada “A Mídia Altermundialista: a participação do
cial e judiciária no seio da União Européia.1 Le Monde Diplomatique no Fórum Social Mundial”.
Carlos S. Arturi realizou sua pesquisa de Pós-Doutora-
1
Elisa Batalha defendeu, em 2006, uma dissertação junto do, junto à Universidade de Lisboa (2004/2005), sobre a
ao Mestrado em Relações Internacionais da UFRGS, cooperação policial e judiciária na União Européia.

461
461
MOVIMENTOS SOCIAIS TRANSNACIONAIS E REAÇÃO E...

turas de redes que facilitaram a transnacionalização seio da disciplina Relações Internacionais, à luz
não só da economia, mas também a de sua contes- do resultado de pesquisas realizadas pelos auto-
tação por uma miríade de grupos e movimentos res do artigo.
sociais. Assim, como será visto neste artigo, não só
a conduta dos mercados, mas os movimentos soci-
ais se tornaram igualmente menos previsíveis, como GLOBALIZAÇÃO E CRISE DO ESTADO:
a grande manifestação antiglobalização de Seattle, transnacionalidade e sociologia das rela-
em 1999, por ocasião da Rodada do Milênio da ções internacionais
OMC, bem o demonstrou. Os movimentos organi-
zam-se sob a estrutura de redes transnacionais em O enfoque sociológico nas Relações Interna-
reação à globalização da economia e ao conseqüen- cionais não é novidade e tem seus maiores expoen-
te enfraquecimento do Estado. Em contrapartida, tes em autores franceses como Marcel Merle, Bertrand
verifica-se, atualmente, que alguma forma de “po- Badie e Marie-Claude Smouts (Merle, 1981; Badie,
tência legislativa e policial” começa a se delinear 2004; Smouts, 2004). Entre eles, há em comum a
acima das fronteiras nacionais, notadamente no importância atribuída à interdisciplinaridade e a
âmbito da União Européia. Essa cooperação visão da teoria das relações internacionais como
securitária, fortemente incrementada a partir dos um conhecimento em evolução, paralelo à trans-
atentados de 11 de Setembro de 2001, foi articula- formação da própria realidade global que ela visa a
da sob a justificativa da necessidade de vigilância, descrever e a compreender, com implicações nes-
controle e repressão ao terrorismo, ao tráfico de sa realidade. O objeto das Relações Internacionais,
drogas, à imigração clandestina e aos movimentos para esses autores, não mais se encontra exclusi-
contestatórios transnacionais. vamente circunscrito a termos estadocêntricos: ele
A dinâmica dos conflitos entre movimentos corresponde à estruturação do espaço mundial por
de contestação antiglobalização e a reação a eles arti- meio das redes de relações sociais (Smouts, 2004).
culada por estados nacionais, sobretudo no âmbito Sob a perspectiva do estudo das relações
da União Européia, indicam a possibilidade de cons- internacionais, a globalização, os movimentos que
tituição de uma política verdadeiramente mundial, a contestam e o surgimento de novos atores inter-
o que pressupõe a ação ativa de atores transnacionais nacionais (ONGs, blocos regionais, grandes em-
não-estatais e arranjos institucionais e operacionais presas transnacionais, fóruns, mídia, redes cientí-
CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006

interestatais e supranacionais para confrontá-los. A ficas, etc.) foram responsáveis por um grande im-
transnacionalidade e a supranacionalidade, obser- pacto teórico e metodológico: o questionamento do
vadas em situações que ultrapassam os processos papel hegemônico de que desfrutava o Estado,
econômicos, induzem novos questionamentos te- como ator mais relevante (senão exclusivo) na
óricos no âmbito das Relações Internacionais. A maioria das análises sobre política internacional
primeira parte do artigo será dedicada ao impacto desde o fim da Segunda Guerra, sob a influência
que a atual globalização do capitalismo exerce so- da escola realista. Com efeito, no início dos 1970,
bre o debate teórico nas Relações Internacionais, Keohane e Nye desafiaram frontalmente o modelo
ao relativizar a soberania dos Estados-nacionais e “estado-centrado”, então prevalecente na literatu-
ao estimular a transnacionalidade crescente dos ra especializada, ao considerá-lo inadaptado para
processos econômicos, sociais e políticos. Ao sin- o estudo da emergência de atores transnacionais
tetizar esse debate, realçamos o alcance heurístico autônomos em relação aos estados nacionais, o que
da sociologia das relações internacionais para o implica uma multiplicação de trocas entre os esta-
estudo dos fenômenos da globalização. Na segun- dos e entre eles e os outros atores transnacionais
da parte do trabalho, serão examinadas algumas (Keohane; Nye, 1977). A interdependência e a
questões teóricas suscitadas pelo debate atual no pluralidade de atores internacionais foram os ele-

462
462
Elisa de Santana Batalha, Carlos Schmidt Arturi

mentos centrais do paradigma da “política mundi- terna em relação à política externa, construído des-
al”, que propuseram como denominação mais pre- de Hobbes até Raymond Aron, é questionado por
cisa do que política “internacional”, pelo fato de Pierre Hassner (2004). Segundo esse autor, os mo-
essa última expressão estar demasiado vinculada delos de equilíbrio das potências, segurança coleti-
às relações entre Estados Nacionais. va e governo mundial estão sendo substituídos por
Nye e Keohane ajudaram a forjar, de um noções mais amplas de mercado mundial, socieda-
lado do Atlântico, a noção de transnacionalidade de internacional e turbulência transnacional.
e o conceito de soft power.2 Um pouco mais tarde, Hassner procura destacar o fato de que não se pode
na Europa, os sociólogos das relações internacio- falar na teoria das relações internacionais e de sua
nais procuraram reduzir a autonomia (ou a auto- crise sem considerar a crise da ordem mundial e
suficiência) das relações internacionais em relação da filosofia política.
às outras ciências sociais, aliando um olhar crítico A sociologia das relações internacionais é
sobre o reducionismo e o americano-centrismo da mais crítica em relação à teoria das RI e reflete sobre
disciplina.3 O abalo nos paradigmas das RI é pos- a construção dessa teoria, por exemplo, quanto à
to em evidência justamente devido à globalização teoria da escolha racional. Essa é principal diferen-
e à relativização do papel monopolista do Estado ça entre o enfoque teórico interdependentista e a
nas relações internacionais. Atualmente, parece sociologia das Relações Internacionais, embora o
mais fácil notar as convergências entre essa pers- estudo das redes e fluxos transnacionais esteja
pectiva e a emergência daquelas questões que leva- presente em ambos. Com efeito, na tentativa de
ram Nye e Keohane a notar a insuficiência da expli- resgatar a disciplina, o enfoque da sociologia das
cação neo-realista e a estudar temas considerados relações internacionais procura valorizar e enten-
periféricos às clássicas relações inter-estados-nacio- der as relações complexas entre “teias” de atores
nais, tais como cultura, mídia, ONGs, meio ambi- não-estatais. Em suma, a defesa do empirismo, do
ente, narcotráfico, direitos humanos, entre outros. historicismo e da interdisciplinaridade, a crítica à
A visão dos autores franceses, no entanto, antropomorfização do estado e a defesa do
implicava, desde o início, um questionamento desvelamento do fator normativo no estudo das
maior dos limites da disciplina e a perspectiva relações internacionais são pontos de síntese da
normativa para o seu estudo: “as Relações Inter- sociologia das relações internacionais.
nacionais existem não somente pelo conteúdo, Em conseqüência desse questionamento te-

CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006


processos e efeitos das interações, mas também pelo órico interno, temas antes considerados “margi-
olhar que é lançado sobre eles”, como resume nais” à disciplina puderam ser seriamente consi-
Marie-Claude Smouts (2004, p. 14). Até mesmo o derados e incorporados ao debate, mesmo no ter-
modelo da heterogeneidade radical da política in- reno dominado pelos “neo-realistas”. A ascensão
da pesquisa acerca de atores não estatais e das ins-
2
Para Joseph Nye (2004), enquanto o poder em geral é
conceituado como a habilidade de conseguir os resulta- tituições que capitalizam outros recursos de poder
dos pretendidos, seja de forma pacífica ou coerciva, o
soft power é a habilidade de conseguir que os outros além do militar, do econômico e do político (no
queiram os mesmos resultados. Um país pode obter seus
resultados pretendidos no cenário mundial porque ou- sentido institucional ou representativo) – como a
tros países querem segui-lo, admiram seus valores, imi- cultura e, dentro dela, a mídia – trouxe da perife-
tam seus exemplos, aspiram a seu nível de prosperidade
e abertura democrática. A habilidade de um país de atrair ria para o centro a questão do poder simbólico (ou
outros para as suas preferências seria derivada de sua
cultura, de seus valores e de suas práticas domésticas, e o soft power dos interdependentistas) como ins-
da percepção da legitimidade de sua política externa O
soft power é, portanto, o poder dos símbolos e de cons- tância de análise da política internacional.
trução de representações sociais, de externalizar para o A compreensão da globalização como pro-
mundo representações sociais domésticas. (2004)
3
Uma obra que parece aproximar essas duas visões é a de cesso-chave das relações internacionais contempo-
Thomas Risse-Kappen (2001). Os artigos mostram como râneas é contestada por outras visões que minimizam
as instituições domésticas dos Estados ajudam a mediar
a influência dos atores transnacionais. sua importância histórica e suas implicações polí-

463
463
MOVIMENTOS SOCIAIS TRANSNACIONAIS E REAÇÃO E...

ticas. Na verdade, vigora ainda certa confusão se- neira diversa a importância do fenômeno para a
mântica, uma vez que o termo é usado como expli- política mundial.
cação para esse conjunto complexo de transforma- De acordo com a visão realista, a globalização
ções econômicas, sociais, políticas, tecnológicas e não alteraria significativamente a característica cen-
culturais que enfraqueceram o papel tradicional tral do sistema internacional, a divisão territorial
do Estado-nação. do mundo em Estados-nação. Ainda que o aumento
O autor Jan Aart Scholte (2001) enumera cin- da interconectividade entre as economias e socie-
co usos para o termo “globalização” na literatura. O dades possa torná-las mais dependentes umas das
primeiro seria com o sentido de internacionalização, outras, o mesmo não poderia ser dito do sistema
isto é, intensificação de interações através das fron- de Estados. Nessa concepção, os Estados mantêm
teiras e interdependência entre países; uma segunda a soberania e a globalização não torna obsoleta a
visão atribui ao termo o sentido de liberalização, luta pelo poder político entre eles. Tampouco a
ou seja, um processo de remoção de restrições globalização diminuiria a importância da ameaça
impostas pelos governos ao intercâmbio entre pa- do uso da força ou do equilíbrio de poder. A
íses, de maneira a criar uma economia mundial globalização poderia afetar, portanto, os aspectos
“aberta” ou “integrada”; um terceiro sentido diz sociais, econômicos, sociais e culturais das nos-
respeito à concepção da globalização como sas vidas, mas não transcenderia o sistema políti-
universalização, isto é, a disseminação de produ- co internacional inter-estatal (Baylis et al, 2001).
tos e experiências a pessoas em todas as partes do Uma segunda concepção das implicações
mundo; uma quarta visão é aquela dos críticos do da globalização na política mundial, a dos liberais,
imperialismo cultural, que entendem o sentido de é praticamente oposta àquela dos realistas. Segun-
globalização como ocidentalização, especialmente do Baylis e Smith (2001), os liberais tendem a com-
uma imposição da visão de mundo dos EUA. preender a globalização como o produto final de
Um quinto conceito é o adotado por Scholte: uma transformação profunda da política mundial,
a globalização é identificada com a desterritoria- processo há muito tempo em desenvolvimento. Para
lização, isto é, uma mudança na geografia, através essa corrente, a globalização afeta todos os setores
da qual os lugares, as distâncias e as fronteiras da sociedade e derruba as bases da teoria realista,
territoriais perdem em parte sua influência anteri- uma vez que mostra que os Estados não seriam
ormente determinante. O autor acredita que essa mais os atores quase exclusivos da política mun-
CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006

visão é a que traz uma melhor compreensão do dial. Superando a noção de exclusividade dos
fenômeno, porque implica maiores conseqüências Estados, haveria, para os autores, uma miríade de
para o cenário internacional e para a política mun- atores de variável importância. Os liberais estari-
dial. Para ele, não é possível falar em globalização am particularmente interessados no impacto da
como sinônimo de internacionalização, embora os revolução tecnológica e das comunicações na
dois fenômenos coexistam. globalização. O aumento da interconectividade entre
Além da conceituação, outra controvérsia as sociedades, provocada pela tecnologia e pelas
diz respeito às implicações da globalização para a relações econômicas, resultaria em um padrão iné-
política mundial. Em que profundidade o fenô- dito de relações políticas no âmbito mundial. Os
meno exige uma revisão de conceitos para a análi- Estados não seriam mais unidades fechadas e, como
se do cenário global? Para John Baylis e Steve Smith resultado, o mundo se pareceria mais com uma
(Baylis et al, 2001), existem três tipos de resposta teia de relações do que com o modelo estatal do
na literatura para essa pergunta, de acordo com as realismo ou o modelo de classes do marxismo.
principais correntes teóricas das relações interna- Já para os marxistas, a globalização seria
cionais, segundo eles, o realismo, o liberalismo e praticamente uma falácia. Não traria nada de parti-
o marxismo. Cada uma delas dimensiona de ma- cularmente novo, pois corresponderia, na verda-

464
464
Elisa de Santana Batalha, Carlos Schmidt Arturi

de, ao mais recente estágio de desenvolvimento de. No lugar de aumentar as forças econômicas e
do capitalismo internacional. A globalização não reduzir o alcance da política, as desigualdades
denotaria uma mudança qualitativa na política aumentam o papel dos Estados. Waltz só enxerga
mundial. Acima de tudo, ela constitui, para os au- a relativização do Estado como uma dimensão adi-
tores de inspiração marxista, um fenômeno lidera- cional do sistema internacional, que não anula,
do pelo mundo ocidental, o qual basicamente em todos os aspectos, a importância das fronteiras
aprofunda o desenvolvimento do capitalismo inter- territoriais.
nacional. Ao invés de tornar o mundo mais seme- No entanto, a globalização trouxe um
lhante, ela aprofunda as divisões existentes entre rearranjo das relações sociais em termos
centro, semi-periferia e periferia. (Baylis et al, 2001). supraterritoriais, e, em determinados contextos, não
Na verdade, uma grande parte dos faz sentido falar em relações internacionais para
opositores da globalização a considera como a ex- referir-se a determinadas atividades e questões que
pansão, em escala global, das práticas pregadas hoje são efetivamente globais, desterritorializadas.
pelo discurso neoliberal. Conforme observaremos Existem aspectos que ainda dependem das dis-
através dos exemplos das pesquisas empíricas so- tâncias e das relações intergovernamentais, como
bre o Fórum Social Mundial, a consideração da o comércio de commodities, enquanto que a distri-
influência do discurso e das ideologias na base buição de notícias via satélite, por exemplo, é efe-
dos conflitos atuais são temas emergentes nas rela- tivamente independente de distâncias e instantâ-
ções internacionais. Apesar de os contestadores da nea. Assim, o que ocorre é a concomitância dos
globalização não formarem um bloco de pensamen- dois aspectos no âmbito mundial, o internacional
to e discurso homogêneos, é possível entender, con- e o global. “O campo internacional é uma colcha
forme o faz Muniz Sodré, que o desenvolvimento de retalhos de países e fronteiras, enquanto que a
do conceito de globalização esteja ligado às práticas esfera global é uma teia de redes transfronteiriças”.
discursivas, uma vez que a linguagem é também (Scholte, 2001, p. 15).
um instrumento de poder político. O autor afirma A compreensão do sistema internacional,
ainda que a mídia corporativa comercial possui um considerado como conjunto dos fluxos
discurso “globalista”, e uma de suas práticas é utili- transnacionais, pode se enriquecer quando os ele-
zar o conceito de maneira indiscriminada, “sem mentos que compõem essa rede de fluxos são com-
reconhecer o relativismo das significações, uma vez preendidos “por dentro”, em suas características e

CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006


que recalca conflitos ou antagonismos diante des- funcionamento. Esses elementos são chamados por
sa idéia.” (Sodré, 2003). Colonomos de ator-em-rede (Colonomos, 2004, p.
Segundo Kenneth Waltz (1999), o discurso 200), termo do qual nos apropriaremos para a aná-
da globalização seria um retorno da idéia da lise do Fórum Social Mundial, mais adiante. Para
interdependência: “Muitos dos interde- Manuel Castells, estudar as redes é essencial, por-
pendentistas da década de 70 esperavam que o que elas constituem a nova morfologia social de
Estado se enfraqueceria e desapareceria. Os nossas sociedades, e a difusão da lógica de redes
‘globalistas’ (globalizers) da década de 90 acredi- modifica, de forma substancial, a operação e os re-
tam que desta vez isto está realmente acontecen- sultados dos processos produtivos e de experiên-
do”. Para Waltz, porém, a política global ou mun- cia, poder e cultura (Castells, 1999). Embora a for-
dial não tomou o lugar da política dos estados ma de organização social em redes tenha existido
nacionais, e eles ainda têm larga margem de esco- em outros tempos e espaços, o novo patamar da
lha. Ele sustenta que a principal diferença entre a tecnologia da informação fornece a base material para
política internacional de hoje e a de décadas atrás sua expansão penetrante em toda a estrutura social.
não se encontra no aumento da interdependência A concepção das relações no campo mun-
entre os estados, mas na sua crescente desigualda- dial como uma teia de atores estatais e não-estatais

465
465
MOVIMENTOS SOCIAIS TRANSNACIONAIS E REAÇÃO E...

vai ao encontro da sociologia das relações interna- e seus opositores (counter-rulers)? Quais são as
cionais. Os autores de língua inglesa discutidos estruturas e processos de poder, dissenso e oposi-
acima, embora não citem seus colegas francófonos, ção? Quais são os eventos, fatores e personalida-
utilizam a expressão “world politics” no lugar de des que causam impacto na natureza da contesta-
“international relations”, por considerar a primei- ção? (Ahmad, 1990, p.14). Dahl admite que os
ra mais inclusiva tanto no sentido de não ser movimentos de contestação adquirem poder e in-
estadocêntrica quanto por ampliar o sentido de fluência no processo decisório, mas não como ato-
“político”, considerando todo tipo de fluxo res diretos do processo da globalização. Seu poder
transnacional. São exatamente os argumentos ana- seria o de influenciar os tomadores de decisão nos
lisados pelos autores que buscam um novo olhar espaços institucionais da democracia representa-
sobre a disciplina Relações Internacionais com o tiva (nacional e intergovernamental) e dos organis-
auxílio da sociologia, como Bertrand Badie, Marie- mos multilaterais.
Claude Smouts e Pierre Hassner, entre outros. As A expressão da contestação internacional,
questões de world politics, desde Nye e Keohane, comumente apresentada na mídia de massa como
com a transnacionalidade, e as sistematizações di- movimento “antiglobalização”, tornou-se mundi-
dáticas de Smith e Baylis, têm muitos aspectos em almente conhecida a partir das manifestações de
comum com a sociologia das R.I., porque ambas rua durante os encontros da Organização Mundial
constituem o resultado da rediscussão do estudo do Comércio, em Seattle, em 1999, e do Banco
das questões mundiais nas ciências sociais con- Mundial e do Fundo Monetário Internacional em
temporâneas, face à crise dos paradigmas das Re- Washington, em 2000. James Davidson Hunter e
lações Internacionais. Joshua Yates assim descrevem o movimento de
Seattle, em artigo intitulado “Na Vanguarda da
Globalização”:
CONTESTAÇÃO INTERNACIONAL E COOPE-
RAÇÃO SECURITÁRIA: o desafio Liderados por associações transnacionais como
International Forum on Globalization, Turning
epistemológico da transnacionalidade e da Point Project, Public Citizen, Friends of the Earth
supranacionalidade e Global Exchange, surgiu um movimento cres-
cente, bem organizado, integrado e ágil na utili-
zação da mídia. Em foco, idéias alternativas de
como conseguir da melhor forma o bem público
A transnacionalização dos movimentos soci- global nas condições da globalização contempo-
CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006

ais e o Fórum Social Mundial rânea. (Hunter; Yates, 2004, p. 363).

Uma definição sintética de contestação é Os grupos que formam o corpo dessa con-
encontrada em Robert Dahl: “Contestação signifi- testação são heterogêneos e, por isso, esse movi-
ca ato de contestar, quer dizer, tornar algo objeto mento é descrito como uma “nebulosa” (Fougier,
de disputa, contenda ou litígio, e seus sinônimos 2001). A crítica a instituições como o FMI e o Ban-
mais imediatos são confronto, desafio ou competi- co Mundial se concentrava no fato de que eles se-
ção” (Dahl, 1989). Por ser essencialmente uma dis- riam cúmplices na criação e manutenção de uma
puta, a contestação política é a ação política por “ordem econômica global hegemônica”, que servi-
excelência, um tema central, e não marginal ao es- ria apenas aos interesses das poderosas empresas
tudo da teoria política. Os trabalhos orientados por multinacionais.4
essa visão procuram abordar as seguintes ques- Segundo Mary Kaldor (2000), a disputa
tões: como entender melhor a evolução dos siste- política em Seattle se configurou como uma forma
mas políticos, com foco na disputa pelo poder, de contestação política, uma expressão da “socie-
entre os que ditam as regras (rulers) e os que as 4
Para um histórico da contestação dos alterglobalistas,
seguem (ruled), entre os que ditam as regras (rulers) ver Milani; Keraghel, 2006.

466
466
Elisa de Santana Batalha, Carlos Schmidt Arturi

dade civil global”. Esse encontro foi diferente de nativas e a experimentação de modelos
outras cúpulas mundiais, porque o debate gerado organizativos horizontais, participativos e autoges-
não ficou restrito a um só tema particular, como tionados são elementos que fazem parte, de acor-
gênero ou meio ambiente, mas a contestação che- do com os próprios militantes e alguns analistas
gou à natureza do sistema global como um todo. do Fórum, do processo de construção desse espa-
Apesar de muito diversificados, os movimentos ço ou movimento. A cobertura de mídia é parte da
de contestação adotaram estratégias transnacionais, expressão de poder simbólico do evento em todas
com o aumento da interconectividade, e construí- as suas edições, e nela se percebe um embate entre
ram uma espécie de consenso em torno da rejei- a mídia corporativa ou mainstream e veículos de
ção à lógica de mercado dominante das institui- mídia alternativos.
ções internacionais tradicionais. “O mundo não é Agrikoliansky (2005) relaciona diretamente
uma mercadoria”, como diz o slogan da ATTAC o jornal francês Le Monde Diplomatique à organiza-
(Ação pela Tributação das Transações Financeiras ção e formalização do movimento altermundialista.
em Apoio aos Cidadãos), ONG de origem francesa Ele investiga as razões e características que puse-
dirigida por Bernard Cassen, um dos diretores do ram o jornal na posição de “um precursor da ne-
Le Monde Diplomatique. Em torno desse consen- bulosa antiglobalização/altermundialista na Fran-
so, contrário ao fundamentalismo de mercado, ça”. Para os autores, foi a continuidade e a fideli-
construiu-se o movimento altermundialista e o dade aos valores jornalísticos iniciais do jornal que
Fórum Social Mundial, como um espaço para o levaram à sua linha atual de contestação, ao con-
diálogo entre seus integrantes. trário de uma idéia de ruptura e mudança de ru-
O aumento da desigualdade e da exclusão, mos. Os autores também defendem que a forma-
o déficit democrático das instituições que seriam ção e as condições de trabalho diferenciadas dos
responsáveis por gerir esse sistema global e as jornalistas permanentes do “Diplô” contribuem
questões intrinsecamente transnacionais, como a para a singularidade da publicação. Segundo eles,
ecologia, as minorias étnicas e o controle de epide- os jornalistas transitam entre os campos
mias, são exemplos de temas abordados pelos jornalístico, militante e universitário de um modo
movimentos anti-globalização. A contestação inter- próprio, em condições que raramente aparecem
nacional não teria como se afirmar e traçar suas todas juntas nas demais empresas jornalísticas.
estratégias políticas senão reafirmando a existên- Com efeito, as origens do altermundialismo

CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006


cia da globalização como fenômeno relevante para e do Fórum Social Mundial remontam às páginas
a política e transformador das relações sociais, es- do Le Monde Diplomatique. Em janeiro de 1995,
pecialmente da comunicação. A globalização, por- Ignacio Ramonet publica um editorial cujo título,
tanto, leva a uma redefinição do modo de fazer “La pensée unique” [o pensamento único], passa a
política e está na base do processo que levou à ser repetido incontáveis vezes nos meios
realização do Fórum Social Mundial. midiáticos, acadêmicos e políticos, representando
O Fórum Social Mundial, como expressão a noção de que a expansão da visão economicista
da nova contestação política internacional, repre- do mundo e dos valores capitalistas exacerbados e
senta a abertura de um espaço público para a ex- sintetizados no neoliberalismo seria irreversível,
pressão dos setores da sociedade descontentes com como um processo “natural” e “incontrolável”.
o processo de globalização, que é vista por esses Segundo Ramonet, era preciso desnaturalizar essa
movimentos como expansão da lógica neoliberal a noção e estimular o debate de idéias em busca de
todas as esferas da convivência social e da relação alternativas. A partir dali, uma série de análises e
da humanidade com a natureza. O diálogo, o in- editoriais no jornal francês teve relação direta com
tercâmbio de experiências, o reforço de identida- a construção de um consenso possível entre os
des, a demonstração de união em busca de alter- movimentos sociais, organizações não governamen-

467
467
MOVIMENTOS SOCIAIS TRANSNACIONAIS E REAÇÃO E...

tais, intelectuais de esquerda, enfim, entre os seto- rica Latina e um laboratório de novas possibilida-
res da sociedade insatisfeitos com a financiarização des de gestão. O reconhecimento internacional da
crescente da economia, cuja lógica se expandia experiência, inclusive por agências da ONU, que
para todos os aspectos da sociedade. lhe outorgaram prêmios durante os anos 1990
O crescente poder das instituições interna- (ONU-Habitat, PNUD, entre outras), também cola-
cionais, principalmente do FMI, do Banco Mun- borou para a construção da simbologia do OP de
dial, e, mais tarde, da OMC, de interferir nas eco- Porto Alegre.
nomias nacionais e a falta de mecanismos de con- Também na virada do milênio, as manifesta-
trole democrático nessas instituições entraram na ções que ficaram conhecidas na grande imprensa
pauta de debates e de protestos. Em dezembro de como “antiglobalização” atingiram seu ápice. Passa-
1997, o Diplô publica o editorial de Ignacio Ramonet ram a ocorrer ações sistemáticas e politicamente
intitulado “Désarmer les marchés” [Desarmar os dirigidas durante as reuniões de instituições inter-
mercados], onde lança as bases para a criação da nacionais. O FSM é produto do crescimento des-
Associação para Taxação das Transações Financei- sas manifestações, que evoluíram para se tornar um
ras em Ajuda aos Cidadãos – ATTAC, ao defen- espaço de diálogo e de intercâmbio de propostas
der a tributação da circulação do capital financeiro alternativas. O Fórum Social Mundial é atualmente
transnacional. Em maio de 1998, mais uma vez, um fenômeno múltiplo, que vem suscitando uma
um título de editorial de Ramonet se tornaria pala- extensa bibliografia acadêmica e de análise crítica,
vra de ordem: “Un autre monde est possible”, que concernente não só à história, mas, principalmen-
deu origem à expressão altermundialismo te, à sua estrutura organizacional, aos seus eixos
(altermondialisme, em francês) e seria adotada mais temáticos e à idéia de participação horizontal e mi-
tarde como slogan do Fórum Social Mundial. A nimamente hierárquica. Teivo Teivanem, por exem-
bibliografia sobre o tema altermundialismo é pre- plo, aponta que a estrutura organizacional e de to-
dominantemente francesa, uma vez que um dos mada de decisões no Fórum deve também ser ana-
principais lugares de formulação de seus princípi- lisada, uma vez que ele, em si mesmo, deveria se
os é o movimento social francês, e o seu marco constituir como um modelo de estrutura participativa
fundador pode ser considerado a criação da e democrática, tal como se defende que seja esten-
ATTAC, que é também a via de interconexão com dido para toda a sociedade (Teivanem, 2002).
as questões transnacionais. O jornal Le Monde Se a estrutura e organização do Fórum So-
CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006

Diplomatique cumpre também um papel essencial cial ainda são motivos de debates, um fator ao me-
de formulador e divulgador das idéias anti- nos é praticamente indiscutível: o seu crescimen-
globalização neoliberal, devido ao seu grande al- to. As seguidas edições do evento têm sido bem-
cance internacional. sucedidas em dar visibilidade mundial ao movi-
Nessa mesma época, a cidade de Porto Ale- mento altermundialista. A grandeza do público dos
gre começa a ganhar projeção internacional através Fóruns realizados até o presente momento – 2001
das páginas do jornal por causa da experiência do (Porto Alegre), 20 mil; 2002 (Porto Alegre), 50 mil;
orçamento participativo, iniciativa elogiada como 2003 (Porto Alegre), 100 mil; 2004 (Mumbai, Ín-
radicalização da participação democrática. dia), 115 mil; 2005 (Porto Alegre), 155 mil; 2006
“Democratie participative à Porto Alegre”, de (Caracas), 150 mil – por si só já dá um caráter de
Bernard Cassen, publicado na edição de agosto de força e legitimidade ao movimento. A participação
1998, e “L’expérience du budget participatif de Por- majoritária, entre os 155 mil participantes reuni-
to Alegre”, de maio de 2000, escrito pelo então dos em Porto Alegre, em 2005, foi de jovens (70,
prefeito Raul Pont, divulgam a noção de que a ci- 8% do total tinham entre 14 e 34 anos), a escolari-
dade, governada por um partido de esquerda era dade entre os participantes é mais alta do que a da
um foco de resistência à onda neoliberal na Amé- população em média e a taxa de desemprego é mais

468
468
Elisa de Santana Batalha, Carlos Schmidt Arturi

baixa em relação à geral. A ocupação predominan- comunicações ampliasse o seu sentido. O FSM é
te dos participantes é de estudantes (40,8%), em considerado, especialmente sua edição de 2003, re-
segundo lugar, de funcionários públicos (17, 5%) alizada em Porto Alegre, como um evento crucial
e, em terceiro lugar, de empregados de ONGs, en- no processo de desenvolvimento da agenda social
tidades da sociedade civil, partidos políticos ou no campo das comunicações. Esse tipo de estudos
sindicatos, que, juntos, somavam 11,5%. O equi- contribui para a construção do conhecimento das
líbrio entre os gêneros foi notado como um fator redes de relações e solidariedades transnacionais,
positivo de representatividade dos integrantes do que criam novos atores relevantes e estratégias al-
Fórum (IBASE, 2005). ternativas no cenário político mundial (Milan, 2004).
O volumoso aporte de jornalistas de todo o Segundo Boris Gobille (2005), os fóruns
mundo e a maneira como vem se desdobrando de sociais se impuseram como os momentos fortes
forma eficaz a manobra arriscada de deslocar o do altermundialismo em escala mundial. Esses
Fórum, primeiro para a Índia e, depois, de des- eventos oferecem um prisma pertinente para o es-
centralizar uma mesma edição em diferentes con- tudo dessa nova “causa”. Seus dados empíricos
tinentes, como aconteceu em 2006, também de- revelam que, ao contrário das afirmações correntes
monstram a organização e coordenação eficazes do no fim dos anos 90, esses militantes não são os
sentido transnacional do processo. O desdobra- “perdedores da globalização”. Eles não seriam tam-
mento da idéia original deu origem a dezenas de bém as elites cosmopolitas de uma sociedade civil
Fóruns locais, regionais e temáticos e, hoje, pode- transnacional, pois é ainda no nível nacional que
se dizer que os fóruns são a expressão mais os altermundialistas depositariam seus recursos e
emblemática do movimento altermundialista. as razões do seu engajamento em busca de “uma
Consolidado, o Fórum Social Mundial vive outra globalização”. Daniel Mouchard (2005) refor-
atualmente um momento que pode ser determinante ça essa visão, pois afirma que o movimento
para o futuro dessa nova forma de ação contestatória. altermundialista é, na verdade, uma agregação de
O debate interno diz respeito à própria natureza formas de mobilização enraizadas em contextos so-
do evento em dois aspectos essenciais, que cons- ciais, políticos e geográficos heterogêneos. Essa agre-
tam da Carta de Princípios: o apartidarismo e a gação se dá nas ocasiões específicas dos eventos de
não divulgação de documentos finais, devido à protesto, das quais ele menciona as reações aos en-
natureza plural e não-deliberativa de espaço de contros de cúpula (contre-sommets) e fóruns soci-

CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006


debate, em oposição a um movimento que exigiria ais. Para o autor, a observação desses momentos de
consenso e unidade. homogeneização do movimento não deve levar a
Stefania Milan afirma que as comunicações ignorar a diversidade das trajetórias e dos desen-
constituem um recurso-chave no processo de de- volvimentos das mobilizações altermundialistas, que
senvolvimento e reprodução da sociedade civil. possuem inserção nacional ou regional.
Segundo ela, essa edição do Fórum marcou um A onda contestatória francesa dos anos 90
turning point do processo de participação e de as- não surgiu, segundo Lilian Mathieu, por inspira-
sociação entre questionamento e crítica da mídia ção de algum movimento pioneiro, mas de diver-
corporativa e desenvolvimento de propostas alter- sos movimentos heterogêneos que encontraram no
nativas, postas em prática na própria sala de im- altermundialismo uma forma ainda incompleta de
prensa do evento. As organizações, tais como unificação. Ela analisa a recomposição dos movi-
Indymedia (IMC), Ciranda da Informação Indepen- mentos sociais franceses ao final da década de 1990,
dente e Association Mondiale des Radiodiffuseurs quando já atuavam em um espaço autônomo e
Communitaires – AMARC teriam alcançado um pon- consolidado. A autora aponta quatro aspectos dessa
to ótimo na relação intrínseca entre mídia e mu- recomposição: a reconfiguração das redes
dança social, permitindo que a discussão sobre as organizacionais; os novos instrumentos intelectu-

469
469
MOVIMENTOS SOCIAIS TRANSNACIONAIS E REAÇÃO E...

ais de crítica ao liberalismo; a problematização das para o enriquecimento da teoria das relações inter-
fronteiras entre o mundo sindical e o campo polí- nacionais diante dos desafios contemporâneos. É
tico partidário; e a passagem da contestação a um preciso também considerar a dimensão midiática
nível internacional. (Mathieu, 2005). Para a auto- da contestação para a disputa de poder simbólico
ra, o caráter transnacional do movimento situa-se e para a formulação de estratégias entre os atores
mais no nível das preocupações e reivindicações dessa contestação. A mídia, no movimento
diante dos atores globais como OMC, FMI, G8, altermundialista, e, dentro dela, um agente signifi-
enquanto se luta no contexto local ou nacional cativo como o Le Monde Diplomatique, catalisador
contra os efeitos das políticas globais. A conexão do discurso por uma globalização alternativa e um
pontual desses movimentos não formaria uma es- dos realizadores do Fórum Social Mundial, é con-
trutura organizacional transnacional. siderada como um modelo concreto dessa estraté-
Essa negação do caráter transnacional do gia “globalizada” de ação política contestatória.
movimento altermundialista, conforme apresenta-
da pelos autores franceses mencionados acima, é
vista aqui como uma associação entre A Cooperação Securitária na União Européia:
transnacionalidade e desenraizamento. Conforme intergovernamentalismo ou supranacionalidade?
Milani e Laniado, entende-se que “a construção
do espaço da transnacionalidade une o local e o O ambiente e as regras internacionais modi-
global na expressão das estratégias políticas. Nele, ficam-se graças à diversificação dos centros de po-
as clássicas clivagens entre política externa e do- der, à emergência de uma agenda política mais des-
méstica, hard e soft power, high politics e low centralizada e menos hierarquizada e à constituição
politics, tendem a se esvanecer”. (Milani; Laniado, de regimes internacionais que criam as condições
2006). O Fórum Social Mundial pode ser conside- de atuação dos novos atores mundiais, especialmen-
rado como um “ator-em-rede” (Colonomos, 2004), te multilaterais e não-estatais. Com efeito, o proces-
transnacional em suas estratégias, e como expres- so de globalização do capitalismo, nas últimas dé-
são concreta do ideário altermundialista. Mas, longe cadas, está baseado, segundo Tarrow, em dois pro-
de constituir uma elite transnacional afastada dos cessos concomitantes: a internacionalização políti-
espaços nacionais e desconfiada de todas as for- ca, através do surgimento de atores, instituições e
mas de participação política nacional, os militan- redes transnacionais, e a integração econômica, pelo
CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006

tes altermundialistas estão fortemente enraizados, crescimento vertiginoso do comércio internacional,


fortemente interessados pelos debates políticos de dos meios de comunicação e da integração finan-
seus países. Por essas razões, Mouchard (2005) ceira (Tarrow, 2002). Assim, a globalização permi-
cita a expressão de Sidney Tarrow (2001) e consi- te a estruturação da contestação internacional, ao
dera os altermundialistas “cosmopolitas enraiza- criar as estruturas de oportunidade – as políticas
dos”, que ele define como agentes ancorados em neoliberais são gestadas e articuladas a partir de
motivações sociais e culturais nacionais, mas que instituições multilaterais (FMI, OMC, Banco Mun-
se engajam em atividades políticas que requerem dial, etc.) – e ao incentivar e produzir as ocasiões
seus investimentos em assuntos de intercâmbios para a ação dos atores transnacionais
e conflitos transnacionais. antiglobalização, que se reúnem e manifestam-se
Pelas razões expostas, o Fórum Social Mun- nos grandes eventos patrocinados por aquelas ins-
dial constitui uma das principais expressões con- tituições (Ayres, 2002).
temporâneas da contestação política mundial, um As manifestações antiglobalização econômica
ator-em-rede cuja importância exige maiores estu- de Seattle, Praga, Nice, Gênova e as três edições
dos e um bom exemplo de transnacionalização dos do Fórum Social Mundial em Porto Alegre (res-
movimentos sociais, cujo conhecimento contribui pectivamente em 2001, 2002 e 2003), atestam o

470
470
Elisa de Santana Batalha, Carlos Schmidt Arturi

forte crescimento dos movimentos de contestação reta conseqüências para as atividades de vigilân-
a uma ordem mundial baseada, de modo quase cia e controle e, por conseguinte, para a integração
exclusivo, nas dimensões econômica e regional. Assim, a transnacionalização dos protes-
intergovernamental (Milani; Solinís, 2002). A tos antiglobalização se fez acompanhar da
indefinição e os conflitos da nova ordem mundial transnacionalização da vigilância, do controle e da
após a Guerra Fria estimularam igualmente o segurança nas relações dos estados entre si e com
surgimento e a manifestação desses movimentos os movimentos de contestação internacionais. Isso
transnacionais, onde se encontra uma ampla di- afeta a capacidade de os Estados agirem e fixarem
versidade de grupos tanto no que diz respeito às objetivos políticos com a autonomia de outrora em
suas formas de organização, atuação e objetivos, arenas internacionais não estratégico-militares
quanto aos recursos de que dispõem. A (Villa, 1999).
heterogeneidade dos movimentos contestatórios A questão central diz respeito exatamente ao
transnacionais5 – abrangendo desde organizações estatuto da cooperação policial-judiciária na UE: tra-
anarquistas e de revolucionários de esquerda até ta-se apenas de acordos e instituições firmados entre
outras mais “pragmáticas”, centradas em reivindi- estados nacionais, que não alteram o mundo
cações específicas, bem como reformistas da or- “westfaliano”, ou presencia-se a constituição das pri-
dem mundial – não impede que esses grupos unam- meiras instituições realmente supra-estatais a com-
se por ocasião das grandes manifestações e cam- partilhar atributos que até então eram exclusivos dos
panhas de protesto antiglobalização (Keck; Sikkink, estados nacionais, como aqueles concernentes às ati-
1997). Além dos efeitos negativos da globalização vidades de segurança e inteligência? Outra possibili-
econômica atual, o surgimento com força de tais dade, ainda, é a de que a articulação securitária em
movimentos no cenário internacional deve-se tam- curso possa caracterizar uma espécie de “terceira via”
bém ao déficit democrático da globalização e aos de integração regional, nem intergovernamental, nem
limites da democracia representativa no interior supranacional, situação próxima ao status atual da
dos estados nacionais (Montès, 2001). Sua emer- União Européia.
gência e grande repercussão, nos últimos anos, Para a análise das iniciativas de cooperação
exigem repensar o papel e as funções de atores securitária no âmbito da União Européia, partiu-
não-governamentais e dos Estados nas relações se de uma das teses de Charles Tilly (1996) sobre
internacionais. conflitos e rebeliões, bem como sobre repressão e

CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006


Concomitantemente, houve um grande im- negociação entre rebeldes e governantes, que fo-
pulso na cooperação interestatal em questões poli- ram essenciais para constituição do Estado nacio-
ciais, judiciárias e de segurança, o que acarretou nal moderno nos últimos séculos. No que diz res-
novas formas institucionais e organizacionais de peito à “contestação popular”, esse autor afirma,
articulação securitária, que buscamos compreen- baseado em extensa investigação histórica, que os
der não apenas empiricamente, mas também do indivíduos e os grupos aprendem a reivindicar aos
ponto de vista teórico (Arturi, 2004). No que poderosos, formando um “repertório de ações co-
concerne à União Européia, esse domínio da se- letivas” que acompanham o desenvolvimento do
gurança, justiça e assuntos interiores torna-se cada capitalismo e do Estado nacional no Ocidente.
mais “comunitário” e menos “nacional”, o que acar- Assim, anteriormente à industrialização e à urba-
nização, as formas de contestação foram de âmbito
5
Adotamos aqui a definição de Fougier para os “movi- mais local e menos organizadas, mas, a partir do
mentos de contestação da mundialização”: “nebulosa
de grupos e indivíduos que denunciam as conseqüênci- século XIX, tornaram-se de alcance nacional. A
as negativas do processo atual de mundialização, por
eles descrito como mundialização ‘liberal’ ou ‘neoliberal’ resposta do Estado e das elites nacionais foi tam-
e que se esforçam para modificar seu curso num sentido bém mais centralizada, quer quando reprimiu es-
mais conforme a seus ideais e a seus objetivos, por meio
de diferentes tipos de ação” (Fougier, 2002, p. 843). ses movimentos com eficácia, quer quando com

471
471
MOVIMENTOS SOCIAIS TRANSNACIONAIS E REAÇÃO E...

eles negociou franquias e direitos políticos, esta- a três acontecimentos principais, que dotam esse
belecendo novos canais de ação coletiva e institui- heterogêneo movimento de nova capacidade
ções responsáveis por novas formas de contesta- organizativa: o anúncio da realização do Fórum
ção não-violentas, como a legalização de partidos Social Mundial para janeiro de 2001, em Porto
de esquerda, por exemplo (Tilly, 1986). Somando- Alegre, e as mobilizações de Praga e de Nice. Em
se a esses dois “repertórios de ação coletiva” – lo- junho de 2000, por ocasião da Conferência Social
cal e nacional –, o autor referiu-se ao terceiro, que das Nações Unidas (também conhecida como
corresponde aos movimentos transnacionais, si- “Copenhagem + 5”), em Genebra, associações, ONGs
multaneamente de alcance mundial e e sindicatos organizam um encontro alternativo.
deslocalizados (1992). Ainda durante o ano de 2000, em setembro, ocor-
A tese de Charles Tilly sobre a centralidade rem as mobilizações de Praga, que reúnem cerca de
dos conflitos e da mobilização coletiva na ruptura dez mil pessoas em contraposição à reunião anual
ou reforma profunda de uma ordem política e no do Banco Mundial e do Fundo Monetário Interna-
desenvolvimento das instituições, permite cional, realizada entre os dias 26 e 28 na capital da
problematizar e atualizar o tema em uma dimen- República Tcheca. Depois de Praga, o movimento
são mundial e compreender, assim, as expressões de contestação à globalização organiza, em outubro
da contestação internacional antiglobalização e da de 2000, uma contra-conferência em Bayonne, si-
reação interestatal à sua emergência nos últimos multaneamente à reunião do Conselho Europeu de
anos. Admite-se que, face aos conflitos e à contes- Biarritz. Mas é no Conselho Europeu seguinte, reu-
tação de movimentos organizados, bem como à nido de 6 a 7 de dezembro em Nice, na França, que
presença de novos atores internacionais, os esta- se sucedem fatos de suma importância para o futu-
dos nacionais procurem dar uma resposta – coer- ro do movimento na Europa.
ção e (ou) reformas – também de âmbito mundial, A reunião de Nice fora convocada tendo
articulando entre si políticas e práticas de segu- como pauta a adoção de um novo tratado que pro-
rança e inteligência. Essa articulação securitária longava o de Amsterdã (1997, com entrada em vi-
certamente dará lugar a novas formas de coerção gência de 1999). Os movimentos sociais, por seu
em escala supra-estatal e (ou) a instituições políti- turno, organizam uma contra-conferência e, no dia
cas de caráter mundial. Atualiza-se, assim, o “re- 06 de dezembro de 2000, promovem uma grande
pertório de ações coletivas” e as instituições polí- manifestação em torno do tema da Europa social.
CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006

ticas, em tempos globalização. Com efeito, a con- A importância de Nice para o estudo da governança
testação, a coação e a jurisdicionalização da políti- e da contestação na Europa se dá pelo fato de figu-
ca internacional sofreram notável desenvolvimen- rar como o início efetivo da adoção de medidas
to nos últimos anos, o que provocou uma mudan- conjuntas, ao nível de U.E., para dificultar ou im-
ça de nível de atuação, do nacional ao mundial, pedir as manifestações de contestação à
tanto dos movimentos antiglobalização como dos globalização. Os governos europeus decidiram,
órgãos de inteligência e coerção dos estados. nessa ocasião, suspender os Acordos de Schengen
Os movimentos altermundialistas, com suas durante o período do encontro, visando a conter a
redes e mobilizações internacionais centradas em chegada de manifestantes de outros países.6
eventos, desterritorializam os conflitos entre esses Enquanto Nice revela a primeira suspensão
grupos e os estados, e a “cronopolítica” como que do Acordo de Schengen, Gotemburgo traz consigo
substitui a geopolítica (Bigo, 1998). Se os protes-
6
O Acordo de Schengen foi assinado em 1985 por Alema-
tos em Seattle, em 1999, têm sido caracterizados nha, França e os países do BENELUX e “... previa a livre
como o batismo de fogo do movimento de contes- circulação de todos que residem ou viajam nos seus
territórios, por meio da supressão gradual dos controles
tação à globalização econômica, o ano de 2000, na nas fronteiras comuns. Todavia, (...) esse acordo foi con-
cretizado apenas em 1990 pela assinatura da Convenção
Europa, inaugura-lhe uma nova fase. Isso se deve de aplicação do Acordo de Schengen, que entrou em vi-

472
472
Elisa de Santana Batalha, Carlos Schmidt Arturi

a primeira atuação das forças policiais que dispa- violenta repressão policial, que deixa o saldo trá-
ram contra os manifestantes com munição real. Esse gico de um manifestante morto pela polícia italia-
episódio ocorre por ocasião da reunião do Conse- na e centenas de prisões (Bayon; Masse, 2002).
lho Europeu de 14 a 16 de junho de 2001, na refe- Os eventos de Nice, Gotemburgo e Gênova
rida cidade sueca. Os movimentos europeus havi- formam uma linha de continuidade que abarca
am preparado uma contra-conferência, organizada desde a suspensão dos direitos de livre circulação
por uma plataforma batizada de Ação de Gotembur- (Nice), passando pelo emprego de armas de fogo
go, que envolvia cerca de 80 organizações. No dia contra manifestantes (Gotemburgo) e culminando
15, na visão dos manifestantes e da opinião pública com a morte de um deles em um esquema
européia, a polícia reagiu de forma desproporcional antiprotestos que lembra teatros de operações béli-
aos atos violentos de alguns provocadores, atiran- cas (Gênova, julho de 2001).
do balas reais contra os manifestantes e atingindo O surgimento de estruturas comunitárias de
três deles, sendo um ferido gravemente. cooperação policial é mais um passo que está sen-
Em decorrência do incidente, o ministro do dado na configuração de uma unidade política
alemão do Interior, Otto Schily, impulsionou a supranacional na Europa, o que implica questões
organização de uma conferência com seus importantes para as relações internacionais. A coo-
homólogos do Conselho de Justiça e Assuntos In- peração policial, judiciária e de inteligência na União
ternos da União Européia, para melhor coordenar Européia ocorre em três níveis: o primeiro é o pla-
estratégias de segurança, realizada em Bruxelas em no político propriamente dito, em que são elabora-
13 de julho de 2001. Embora o documento apro- dos os projetos e a legislação comunitária para a
vado pelos representantes reunidos defenda “o área de justiça e assuntos internos da UE (Conse-
desenvolvimento de diálogos construtivos com os lho, Comissão e Parlamento Europeu) e em que são
organizadores das manifestações para garantir que tomadas as decisões gerais; o segundo plano é o
manifestações legítimas não sejam exploradas por técnico, que envolve os principais atores e altos
grupos com uma agenda violenta”, em outra pas- quadros operacionais da área (Europol, Eurojust,
sagem ele sugere o uso de todos os meios disponí- etc.); e, finalmente, o plano da cooperação
veis para impedir o livre trânsito de indivíduos operacional, que abrange o cotidiano das operações
dos quais se suspeite estarem viajando “com a in- policiais e judiciárias, e em que a colaboração entre
tenção de organizar, provocar ou participar de dis- os vários órgãos comunitários e nacionais ocorre

CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006


túrbios graves da lei e ordem públicas”.7 Ainda muitas vezes de maneira informal e sob relações
em Julho de 2001, ocorre a grande manifestação pessoais de confiança entre os seus responsáveis.
antiglobalização em Gênova, que culmina com uma Nesse sentido, os Acordos de Schengen e a
criação da EUROPOL são dois elementos funda-
gor em 1995. Os demais Estados da União [U.E.] aderi- mentais a serem analisados, com destaque para a
ram a essa convenção com exceção do Reino Unido e da
Irlanda, e com restrições de parte da Dinamarca” (D’Arcy, maneira como as autoridades européias os vêm
2002, p. 163-164). Embora inicialmente estabelecido no
âmbito da cooperação intergovernamental, o Acordo de utilizando para controlar e reprimir a contestação
Schengen foi elevado ao status comunitário quando
incorporado, em 1997, ao direito da União Européia, por internacional. A Agência Européia de Polícia –
um protocolo anexo ao Tratado de Amsterdã, que en- EUROPOL – foi criada em 1995 e entrou em ope-
trou em vigência, por sua vez, em 1999. Em 25 de março
de 2001, Noruega e Islândia – embora não-integrantes ração em 1999. Com sede em Haia, visa a “melho-
da U.E. – tornaram-se membros associados do Acordo
de Schengen, passando a usufruir os direitos corres- rar a cooperação entre os Estados-membros na luta
pondentes, à exceção do de participar da tomada.
contra o terrorismo, contra o tráfico ilícito de estu-
7
Ver <http://register.consillium.eu.int/pdf/em/01/st10/
10916en1-pdf>. Essa mesma diretiva é implementada na pefacientes e outras formas graves de crime inter-
elaboração de listas dos manifestantes “perigosos”, prática
denunciada por resolução do Parlamento Europeu (Reso-
lução 2001/2167 (INI). “Recomendation du Parlament et autres événements internationaux comparables.http://
européen au Conseil sur um espace de sécurité, de liberte et w w w 3 e u r o p a r l . e u . i n t / o m k / o m n s a p i r. s o /
de justice: securité lors des réunions du Conseil européen pv2?PRG=CALDOC&FILE=011212&LANGU>.

473
473
MOVIMENTOS SOCIAIS TRANSNACIONAIS E REAÇÃO E...

nacional”. A EUROPOL consiste de um centro de nacionais (Apap, 2002); b) “criminalização” da


intercâmbio e coordenação de informação, mas tam- exclusão social e de movimentos sociais, na legis-
bém de coleta e análise, e tem sido criticada como lação nacional de alguns países europeus; c) o es-
risco potencial às liberdades civis, na medida em tabelecimento de um continuum securitário (Bigo,
que inexistem instrumentos adequados de contro- 1994) na legislação européia, que vai desde medi-
le público sobre a atuação de seus agentes (Paye, das contra a violência das torcidas organizadas
2002, p. 68-70). (hooligans), passando pelo combate ao crime orga-
Após o 11 de Setembro de 2001 e o 11 de nizado e à imigração clandestina, e chegando à luta
Março de 2004 em Madri, acelerou-se o processo contra o terrorismo; d) amálgama na utilização da
de articulação policial, judiciária e de inteligência legislação criminal por autoridades policiais e ju-
no seio de União Européia, com a criação, em 2002, diciais, por exemplo, na invocação da legislação
da EUROJUST, que visa a incrementar a coopera- anti-hooligans para impedir a transposição de fron-
ção entre os poderes judiciários dos Estados-mem- teiras na Europa por cidadãos europeus por oca-
bros, e da EUROINTEL, em 2004, que centralizou sião de alguns eventos antiglobalização; e)
as atividades de inteligência em relação ao crime militarização do combate ao crime organizado e ao
organizado, à imigração ilegal e ao terrorismo. terrorismo, sobretudo após o 11 de Setembro
Verifica-se, portanto, a constituição de um (Benoit, 2002); f) baixo controle e supervisão do
padrão reativo e cada vez mais repressivo na Parlamento Europeu e dos tribunais sobre a coo-
integração européia relativa aos assuntos de segu- peração policial e judiciária na EU.
rança e justiça. Cada incremento importante da A reação dos Estados, sobretudo das gran-
cooperação nessa área ocorre logo após um grande des potências, à contestação internacional
atentado terrorista. Os atentados em Londres, em antiglobalização está sujeita a diferentes interpre-
07 e 21 de Julho de 2005, o comprovam, pois uma tações, que não serão objeto de análise neste traba-
série de medidas restritivas foram aprovadas ou lho. De qualquer modo, a expansão e articulação
sugeridas na Europa logo após esses atos terroris- interestatais de agências de inteligência e seguran-
tas, tais como o controle massivo das ligações tele- ça representa um risco para a democracia nas rela-
fônicas e de mensagens trocadas via Internet, de- ções internacionais e no interior mesmo dos espa-
portação de estrangeiros suspeitos de cumplicida- ços nacionais, pois freqüentemente implica o re-
de com o terrorismo, mesmo que corram o risco cuo da diplomacia, a predominância do Executivo
CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006

de tortura ou morte nos seus países de origem e a falta de accountability (Cepik, 2003).
(medida que o Tratado europeu interdita), criação
de uma nova polícia de fronteiras especializada
contra a imigração clandestina, etc. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O grande incremento da cooperação polici-
al e judiciária na Europa, nos últimos anos, pode O estudo dos movimentos de contestação
representar um risco de deriva securitária, embora internacional e da cooperação policial e judiciária
haja alguns avanços democráticos no projeto de entre os Estados nacionais permite vislumbrar com
Constituição Européia (Rojo; Milani; Arturi, 2004). maior clareza qual seria o “repertório de ações co-
Todavia eles não seriam ainda suficientes para con- letivas” transnacionais que está se constituindo nos
trabalançar algumas tendências securitárias últimos anos. Ele acarretará mais conflitos e re-
preocupantes (Anderson; Apap, 2002a, 2002b), tais pressão, ou assistiremos ao surgimento de insti-
como: a) a erosão da distinção entre inimigo inter- tuições políticas representativas supranacionais,
no e externo, devido à chamada guerra contra o sobretudo na União Européia, que poderiam cons-
terrorismo, que envolve comunidades minoritárias tituir os alicerces de uma política mundial,
étnicas e (ou) religiosas no interior dos Estados multidimensional e em vários níveis de atuação?

474
474
Elisa de Santana Batalha, Carlos Schmidt Arturi

De um ponto de vista teórico-metodológico, trata- política de defesa e de relações exteriores, a fonte


se de incorporar aos estudos sobre a globalização e de maior resistência à cooperação entre os Estados
de seus efeitos o aporte da sociologia das relações europeus; hoje, tornou-se, ao lado do mercado, o
internacionais e da sociologia histórica comparati- novo motor da integração européia, em contraste
va, que permitem a análise de dimensões desse com a área político-institucional, que encontra gran-
fenômeno pouco iluminadas pelas perspectivas des obstáculos para seu aprofundamento.
estadocêntricas. O desenvolvimento dos Estados nacionais
A formulação dos discursos e das estratégi- também associou estreitamente o capital, a coerção
as dos movimentos de contestação à ordem mun- e a guerra. (Tilly, 1990). Nesse sentido, estaria a
dial vigente é uma das faces da moeda da UE repetindo a trajetória de desenvolvimento dos
transnacionalização da política trazida pela Estados nacionais, aos quais ela poderia hipoteti-
globalização. Compreender o altermundialismo, camente vir a substituir, integrando-os numa enti-
expressão dessa contestação transnacional, que tem dade política supranacional ou até mesmo pós-
como marco emblemático o Fórum Social Mundi- nacional?8 No que diz respeito, portanto, ao futuro
al, é uma oportunidade de observar um fenômeno da polity européia, a prevalência final quer da ten-
contemporâneo singular: o desenvolvimento de dência “intergovernamental”, quer da “federalista-
uma rede transnacional de movimentos sociais, in- supranacional”, ou mesmo a permanência do status
tegrados pela tecnologia da informação e preocu- quo, no desenvolvimento político da União Euro-
pados em adquirir poder simbólico em um ambi- péia, sobretudo nas questões de segurança, justiça
ente político fortemente influenciado pelas estra- e inteligência, será determinada em boa medida tanto
tégias midiáticas. A configuração atual da contes- pela dinâmica dos conflitos e (ou) negociações en-
tação internacional tornou mais complexos os agen- tre os movimentos altermundialistas e os aparatos
tes e o cenário das relações internacionais, de ma- interestatais que lhes fazem face, assim como pela
neira a desafiar as abordagem teóricas “clássicas”. luta anti-terrorista, que não é objeto de análise neste
No que concerne à possibilidade de consti- trabalho. Essas alternativas encontram-se também
tuição de um espaço político de caráter essencial- sob a influência conjunta e combinada dos impera-
mente mundial e supranacional, os resultados pre- tivos da globalização econômica, dos conflitos ex-
liminares da investigação sobre cooperação polici- ternos e internos nacionais, das políticas de alian-
al e judiciária na UE não são conclusivos. Com ças e dos interesses corporativos das organizações

CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006


efeito, encontramos sinais de avanços, mas tam- interestatais.
bém de dificuldades e de recuos na integração na A possibilidade de uma ordem mundial mais
área de Justiça e de Assuntos Internos. Verifica-se, pacífica e democrática depende, em boa medida, do
portanto, uma grande incerteza no que concerne resultado desses conflitos na esfera política inter-
ao futuro político da UE. Qual dos modelos de nacional, que envolve o “terceiro repertório de ações
integração mencionados irá prevalecer é difícil ain- coletivas”, em construção pelos movimentos
da de prever, como bem o demonstram as dificul- altermundialistas. Impulsionada pelo combate ao
dades atuais para a aprovação do Tratado Constitu- terrorismo, a cooperação securitária na União Euro-
cional europeu. Referente a esses obstáculos, ob- péia pode estar esboçando empiricamente a catego-
serva-se um processo muito peculiar: atualmente, a ria antes controversa e difusa da supranacionalidade,
área de justiça e assuntos internos do bloco é a que em termos de redes onde a soberania estatal é, de
mais avança em direção à sua comunitarização, via fato, relativizada. Concebemos que, para o estudo
cooperação policial-judiciária e textos legais em
8
O monopólio do controle da circulação de seus cidadãos,
reação aos atentados terroristas e aos protestos através da criação dos passaportes, foi um passo essen-
antiglobalização que tiveram lugar nos últimos anos. cial para a consolidação dos Estados nacionais moder-
nos (Torpey, 2000). Nesse quesito, verifica-se, também,
Até então, esse domínio constituía, ao lado da uma grande integração e comunitarização na UE.

475
475
MOVIMENTOS SOCIAIS TRANSNACIONAIS E REAÇÃO E...

CEPIK, Marco A. C. Sistemas Nacionais de Inteligência:


desses temas, é necessária a incorporação da soci- origens, lógica de expansão e configuração atual. DADOS
ologia das relações internacionais entre as princi- – Revista de Ciências Sociais. Rio de Janeiro, v. 46, n.1,
p.75-127, 2003.
pais abordagens analíticas da disciplina, como in-
COLONOMOS, Ariel. O ator em rede colocado à prova do
dicamos na primeira parte deste artigo. internacional. In: SMOUTS, Marie-Claude. As novas re-
lações internacionais. Brasília: Ed. da UnB, 2004. p. 195-
216.
D’ARCY, François. União Européia. Instituições, políticas
(Recebido para publicação em agosto 2006) e desafios. Rio de Janeiro: Konrad Adenauer Stiftung,
(Aceito em setembro de 2006) 2002.
DAHL, Robert. Democracy and its critics. New Haven/
Londres: Yale University Press, 1989.
FLYVBJERG, Bent. Making social science matter: why
REFERÊNCIAS social inquiry fails and how it can succeed again.
Cambridge: Cambridge University Press, 2001.
AGRIKOLIANSKY, Éric, et al (Orgs). L’altermondialisme FOUGIER, Eddy. Mondialisation: radiographie de la
en France: la longue histoire d’une nouvelle cause. Paris: contestation. In: Sociétal, n. 34, 4o trimestre, 2001.
Flammarion, 2005.
GOBILLE, Boris. Les altermondialistes: des activistes
AHMAD, Zakaria Haji. Introduction: political contestation transnationaux? Critique Internationale, Paris, n. 27, abr./
in comparative perspective. In: MAHMOOD, Norma. jun., p. 131-145, 2005.
Political contestation: case studies from Asia. [S.l.]:
Friedrich Naumann Foundation, 1990. HASSNER, Pierre. Da crise de uma disciplina à crise de
uma época. In: SMOUTS, Marie-Claude. As novas rela-
ANDERSON, M.; APAP, J. Changing conceptions of ções internacionais. Brasília: Ed. da UnB, 2004. p. 361-
security and their implications for eu justice and home 380.
affairs cooperation. Brussels: CEPS Policy Brief, n. 26,
Oct. 2002a. HUNTER, James Davidson e YATES, Joshua. Na van-
guarda da globalização - o mundo dos globalizadores ame-
________; _______. Striking a balance between freedom, ricanos. In BERGER, Peter L. e HUNTINGTON, Samuel P.
security and justice in an enlarged European Union. Muitas Globalizações - diversidade cultural no mundo
Brussels: CEPS Policy Brief, n. 26, Oct. 2002b. contemporâneo. Rio de Janeiro, Record, 2004.
APAP, M. (Ed.). Justice and home affairs in the European IBASE. Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econô-
Union. [S.l.]: Cheltenham, Edward Elgar Publishing. 2004. micas. Fórum social mundial: raio-x da participação no
FSM 2005: elementos para o debate. nov. 2005. Disponí-
ARTURI, Carlos S. Movimentos anti-globalização e coo- vel em <http://www.ibase.org.br>. Acesso em: maio
peração securitária na União Européia. Civitas, v. 4, n. 2, 2006.
dez. 2004.
KALDOR, Mary. The idea of global civil society.
AYRES, J. Transnational political processes and International Affairs, n. 79, p. 583-593, 2003.
contention against the global economy. In: In : SMITH,
J.; JOHNSON, H. Globalization and resistance: KECK, Margaret; SIKKINK, Kathryn. Activists beyond
transnational dimensions of social movements, 2002. borders, International Advocacy Networks in International
Politics. Ithaca: Cornell University Press, 1997.
BADIE, Bertrand. Da soberania à competência do Estado.
In: SMOUTS, Marie-Claude. As novas relações internaci- KEOHANE, R.; NYE, J. Power and Interdependance.
onais. Brasília: Ed. da UnB, 2004. p. 35-55. Boston: Little Brown, 1977.
CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006

BAYON, Nathalie; MASSE, Jean-Pierre. Petites MACLEAN, John. Philosophical roots of globalization and
impressions génoises. Chroniques quotidiennes d’une philosophical routes to globalization. In: GERMAN,
mobilisations antimondialisation. Cultures & Conflits, n. Randall D. Globalization and its critics: perspectives from
46, p. 143, 2002. political economy. [S.l.], Macmillan/Basingstoke, 2000.
BENOIT, Loïk. La lutte contre le terrorisme dans le cadre MATHIEU, Lílian. La constitution du mouvement
du deuxième pilier: un nouveau volet des relations altermondialiste français. Critique internationale. n. 27,
extérieures de l´Union européenne. Revue du Droit de avril/jun., p. 147-161, 2005.
L´Union Européenne, n. 2, p. 283-313, 2002.
MERLE, Marcel. Sociologia das relações internacionais.
BAYLIS, John et al. The globalization of the world politics. Brasília: Ed. UnB, 1981.
2nd edition. Oxford: 2001.
MILAN, Stephania. Communicating civil society:
BAUMAN, Zygmunt. Globalização: as conseqüências participation as the main benchmark of civil society me-
humanas. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 1999. dia. The case of the third World Social Forum. In:
INTERNATIONAL ASSOCIATION OF MEDIA AND
BIGO, Didier; GUILD, Elspeth. De Tampere à Séville, vers COMMUNICATION RESEARCH, PARTICIPATORY
une ultra gouvernementalisation de la domination COMMUNICATION RESEARCH, Porto Alegre, de 25 a 30
transnationale? Cultures & Conflits, n.46, été. 2002. de julho de 2004. Disponível www.pucrs.Br/famecos/
_______. The European internal security field: stakes iamcr/textos/Milan.pdf>. Acesso: maio de 2006.
and rivalries in a newly developing area of police MILANI, Carlos; LANIADO, Ruthy. Transnational social
intervention. In: ANDERSON, M.; Den BOER, M. (Eds.). movements in a globalising world: a methodological
Policing Across National Bounderies. London: Pinter, approach based on the analysis of the World Social Forum.
1994. p. 161-173. In: SEMINÁRIO INTERNACIONAL TRANSNATIONA-
CASTELLS, Manuel. A Sociedade em rede - a era da infor- LIZATION OF SOLIDARITIES AND WOMEN´S MOVE-
mação, economia, sociedade e cultura. São Paulo: Paz e MENTS, Montreal (Canadá), Universidade de Montreal,
Terra, 1999. v. 1. 2006.

476
476
Elisa de Santana Batalha, Carlos Schmidt Arturi

_______; KERAGHEL, Chloé. The International Agenda SMOUTS, Marie-Claude. As novas relações internacio-
for Sustainable Development: International Contestatory nais: práticas e teorias. Brasília: Ed. da UnB, 2004.
Movements. In: THOYER, S.; MARTIMORT-ASSO, B.
(Eds.). Participation for sustainability in trade. London: SODRÉ, Muniz. O globalismo como neobarbárie. In:
Ashgate Publishers, 2006. MORAES, Denis (Org). Por uma outra comunicação. Rio
de Janeiro: Record, 2003.
_______; ARTURI, Carlos; SOLINIS, Germán (Orgs.).
Democracia e governança mundial. Que regulações para TARROW, Sidney. From lumping to splitting: specifying
o século XXI? Porto Alegre: Editora da Universidade/ globalization and resistance. In : SMITH, J.; JOHNSON,
UFRGS, 2002. H. Globalization and resistance: transnational dimensions
of social movements. Lanham: Rowman & Littlefield,
_______; SOLINÍS, Germán. Pensar a democracia na 2002. p. 229-250.
Governança mundial: algumas pistas para o futuro. In:
_______; ARTURI, Carlos; SOLINIS, Germán (Orgs.). _______. Rooted cosmopolitans: transnational activism
Democracia e governança mundial. Que regulações para in a world of states. In: SEMINÁRIO UNIVERSIDADE
o século XXI? Porto Alegre: Editora da Universidade/ DE WISCONSIN, Madison, nov. 2001.
UFRGS, 2002. p. 266-292. TEIVANEN, Teivo. The World Social Fórum and global
MONTÉS. Jérôme. Mouvements anti-mondialisation: la democratisation: learning from Porto Alegre. Third World
crise de la démocratie representative. Etudes Quarterly, Porto Alegre, v. 23, n. 4, p. 621-632, 2002.
Internationales, Paris, v. 32 n. 4, déc., 2001. TILLY, Charles. Cultures et Conflits, Réclamer viva voce,
MOUCHARD, Daniel. Les altermondialismes. Critique 1992.
Internationale, Paris, n. 27, abr./jun., 2005. _______. Coertion, capital and European States. Oxford:
NYE, Joseph. Power in the global information age: from Blackwell, 1990.
realism to globalization. [S.l.], Routledge, 2004. _______. The contentious french. Cambridge: Bellknap,
PAYE, Jean- Claude. Europol, une police autonome. 1986.
Maniére de Voir, Paris, jan./fév, p.68-70, 2002. TORPEY, John. The invention of passport – surveillance,
RISSE-KAPPEN, Thomas (Org). Bringing transnational citizenship and the state. Cambridge: Cambridge University
relations back In: NON STATE ACTORS, DOMESTIC Press, 2002.
STRUCTURES AND INTERNATIONAL INSTITUTIONS. VILLA, Rafael A. Duarte. Formas de influencia das ONGs
Cambrige: Cambridge University Press, 2001. na política internacional contemporânea. Revista de Soci-
ROJO, Raúl E.; MILANI, Carlos R. S.; ARTURI, Carlos S. ologia e Política, Curitiba, n.12, jun., p.21-33, 1999.
Expressions of international contestation and TORPEY, John. 2002. The invention of passport –
mechanisms of democratic control. International Social surveillance, citizenship and the state. Cambridge,
Science Journal, n.182, dec., 2004b. Cambridge University Press.
SCHOLTE, Jan Aart. The globalization of world politics. WALTZ, Kenneth N. Globalization and governance. In:
In: BAYLIS, John; SMITH, Steve. The Globalization of PS Online, Ed. dz, 1999. Columbia University, 1999. Dis-
the World Politics. 2nd edition. Oxford: 2001. ponível em www.mtholyoke.edu/acad/intrel/walglob.htm
Acesso em 24 ago. 2003.

CADERNO CRH, Salvador, v. 19, n. 48, p. 461-477, Set./Dez. 2006

477
477

Você também pode gostar