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FACULDADE DE MEDICINA DE MARÍLIA

NAYARA DE FÁTIMA MAZINI FERRARI

O OLHAR MÉDICO PARA A CANNABIS MEDICINAL

MARÍLIA
2021
Nayara de Fátima Mazini Ferrari

O olhar médico para a Cannabis Medicinal

Dissertação apresentada ao Programa


de Mestrado Profissional em “Ensino
em Saúde”, da Faculdade de Medicina
de Marília, para defesa. Área de
concentração: Ensino em Saúde.

Orientadora: Prof.ª Dr.ª Camila


Mugnai Vieira

Marília
2021
Nayara de Fátima Mazini Ferrari

O olhar médico para a Cannabis Medicinal.

Dissertação apresentada ao Programa


de Mestrado Profissional em “Ensino
em Saúde”, da Faculdade de Medicina
de Marília, para defesa. Área de
concentração: Ensino em Saúde.

Banca Examinadora:

___________________________
Prof.ª Dr.ª Camila Mugnai Vieira
Faculdade de Medicina de Marília

________________________________
Prof. Dr. Gilson Caleman
Faculdade de Medicina de Marília

______________________________
Prof.ª Dr.ª Solange Aparecida Nappo
Universidade Federal de São Paulo

Data de aprovação: 27 de outubro de 2021


À minha amada, insigne e doce Letícia, ser
humano de luz, que de forma singular, dentre
lágrimas e sorrisos, ressignificou minha
existência, me levando a trilhar caminhos antes
inimagináveis, despertando em mim uma força
e garra para lutar pela vida que transcende o
meu despretensioso entendimento. Filha você
não lerá este trabalho, talvez revire suas páginas
em preto e branco que não te chamarão a
atenção, mas, com ternura, olhando em seus
olhos, te contarei ao pé do ouvido, na nossa
intimidade, que esta obra é um singelo tributo
às muitas noites que, em claro, sozinhas
enfrentamos juntas, sem respostas sobre o dia
de amanhã. A vida sempre nos trouxe
adversidades e escolhas difíceis, mas, de forma
gentil, nos permitiu a fé e uma certeza no
coração de que, ao final, tudo daria certo. E,
vivendo um dia de cada vez, decidimos ousar e
ser feliz. Não por acaso, a possibilidade de
seguirmos juntas é “culpa da maconha”. Assim,
com todo meu amor, dedico a você as vozes que
aqui bradam daqueles que, abraçando o
sofrimento de seus pacientes, optaram
indubitavelmente pela defesa da vida,
desafiando a lei e a “moralidade” insana dos
muitos que negaram e negam a ciência advinda
de uma planta que transformou nossas vidas.
Com todo carinho, mamãe.
AGRADECIMENTOS

A realização deste sonho, lapidado ao longo de muito estudo, abdicação, empenho e


dedicação, inclui o inestimável e valioso apoio de muitas pessoas queridas que me
acompanharam e foram essenciais nesta caminhada, às quais dedico profunda gratidão. Desta
forma, expresso nestas sinceras e singelas palavras um pouquinho da importância que tiveram
nesta conquista tão especial em minha vida.
Primeiramente, agradeço ao meu filho Miguel, à pequena Letícia e à Cida, meu núcleo
familiar, que por muitas vezes foi privado de minha companhia e atenção, mas sempre esteve
ao meu lado, revelando tudo o que sou e implicitamente me motivando no dever de acreditar e
lutar pela construção de um mundo melhor.
À minha preciosa mãe, minha vozinha Carmen, minha tia Márcia e minha irmã Renata,
mulheres de fibra que sempre estiveram ao meu lado nos momentos de lutas, foram meu esteio,
me amparando, me acolhendo, me ajudando, me estimulando e não me deixando cair nos
momentos mais difíceis.
Ao meu pai (in memoriam), que partiu durante este período, mas me deixou a grande
lição da supremacia da liberdade de nossas escolhas, restando a saudade e tantas recordações
que me moldaram no fogo, me ensinaram a ter fé e que tudo passa, me fizeram ser forte e não
sucumbir diante das adversidades.
Ao meu irmão pela contrariedade, que me fez enxergar o quanto a capacidade crítica, a
consciência de classe e a dignidade humana foram usurpadas de nosso povo, o quanto somos
estuprados diariamente pela violência de Estado, o quanto estamos desprovidos de uma
inteligência coletiva que seja capaz de preservar a vida e colocá-la primordialmente acima de
qualquer polarização que nos leve a violar nossos mais caros bens e valores. Valeu brother!!
À minha terapeuta e amiga, Mariana de Lucca, que cuidou o tempo todo de minhas
loucuras e devaneios, das dores mais profundas de meu ser, traduzindo minhas angústias, meus
sofrimentos psíquicos e subjetividades, me conduzindo na ressignificação das agruras da vida,
me permitindo continuar, me reinventar, ser e permanecer, quebrar e me refazer, sumir e
ressurgir no vem e vai do existir. “A árvore e o vento...”
Agradeço de modo singular, com toda ternura e carinho à Prof.ª Dr.ª Camila Mugnai
Vieira, minha orientadora e, sobretudo, uma querida e grande amiga, pela pessoa, mulher e
profissional, que com muita competência e pacientemente me conduziu neste processo, dedicou
um apoio incondicional, acreditou e depositou sua confiança em mim, me oportunizando esta
conquista que traduz uma parcela de todo o significado de uma luta social em nosso país,
peculiarmente no âmbito da saúde. “Reconhece a queda e não desanima, levanta, sacode a
poeira e dá a volta por cima.” (Paulo Vanzolini)
Agradecimentos especiais aos mais sensíveis, empáticos e companheiros colegas de
Mestrado, um grupo incrível que com tanto cuidado, compromisso e respeito se apoiou
mutuamente, sorrindo e chorando junto, compartilhando de uma amizade tão bonita que foi
capaz de coletivamente forjar e superar todos os obstáculos para que cada um de nós
desenvolvesse seu potencial e tivesse êxito ao longo desta caminhada.
Quero agradecer também à Sociedade Brasileira de Estudos da Cannabis (SBEC), à Drª.
Eliane Nunes Guerra e aos médicos que abraçaram junto aos seus pacientes a luta pela vida, me
oportunizando conhecer e publicizar esta fácie de tantos desafios e meandros no campo da
saúde.
Às organizações sociais humanitárias de Marília, das quais sou Cofundadora e muito
grata por toda inspiração nesta trajetória, Associação Anjos Guerreiros (2016), Coletivo de
Mulheres Marília (2018), Maléli – Associação Canábica em defesa da Vida (2019) e
ABRACAMED – Associação Brasileira de Cannabis Medicinal (2021).
Ao Diretor de Pós-Graduação Pesquisa e Extensão Dr. Spencer L. M. Payão, ao
Coordenador estimado Prof. Dr. Osni Lazaro Pinheiro, à Vice-coordenadora Profª. Drª. Magali
A. Alves de Moraes, às bibliotecárias e secretários da pós-graduação, minha sincera gratidão.
O presente trabalho foi realizado com apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de
Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – Código de Financiamento 001.
E, ao mestre com carinho, meus profundos agradecimentos e reverência ao Professor
Elisaldo Carlini (in memoriam), que atuou como docente das primeiras turmas de medicina da
Famema, por seu legado na ciência como pioneiro, precursor e referência mundial nos estudos
farmacológicos sobre as propriedades terapêuticas da Cannabis, por sua atuação e excelência
nas políticas públicas em defesa do potencial medicinal das plantas brasileiras, como ser
humano combatente e incansável pela ciência de nosso país, que permanece inspirando tantos
pesquisadores a decifrar a propedêutica da Medicina Canabinoide.
Ei Deus, não te esqueci não! Sempre esteve à minha frente.
“Para a concepção crítica, o analfabetismo nem
é uma ‘chaga’, nem uma ‘erva daninha’ a ser
erradicada [...], mas uma das expressões
concretas de uma realidade social injusta.”
(Paulo Freire)

“Por que whisky sim? Por que Cannabis não?


Quanto mais proibido, mais faz sentido a
contravenção.
Faça hoje, amanhã pode ser ilegal.
Recrimine a falta de educação.”
(Rita Lee)
FERRARI NFM. O olhar médico para a Cannabis Medicinal [dissertação]. Marília (SP):
Faculdade de Medicina de Marília; 2021.

RESUMO

A busca pelo tratamento com canabinoides para diversas patologias vem crescendo na
população, seja pela abordagem compassiva, paliativa, como monoterapia ou terapia adjunta,
seja como alternativa aos fármacos alopáticos e de alto custo. O manejo desta terapêutica
demanda profissionais médicos capacitados, para que os pacientes tenham acesso e alcancem
os melhores resultados. Evidências científicas vêm sendo amplamente produzidas, e apesar da
postura reticente das instituições regulamentares da medicina, bem como as representações
sociais estigmatizantes, percebe-se um aumento progressivo no número de profissionais
prescritores. Esta pesquisa teve o objetivo de analisar o conhecimento, as concepções e as
práticas dos médicos prescritores de Cannabis Medicinal, por meio da realização de entrevistas
semidirigidas, via Skype. As entrevistas dos 17 participantes foram gravadas, transcritas e os
conteúdos analisados na modalidade temática, baseado em Bardin. Os resultados apontaram a
predominância da especialidade de Psiquiatria e que a maioria prescreve canabinoides via
assistência particular ou convênio, em consultório próprio. Os participantes descreveram sobre
as vivências na prescrição da Cannabis, experiência própria como paciente e prescrevendo para
familiares, motivações que os levaram a tornarem-se prescritores e particularidades do percurso
formativo, questões histórico-sociais de estigma e preconceito, relação com colegas de
profissão, postura do Conselho de Classe, atores sociais relevantes, iniciativas e protagonismo
na aprendizagem e aspectos da formação médica. Sobre a prática clínica, consonante às
evidências científicas encontradas, pontuaram como manejam a terapêutica nas diferentes
faixas-etárias e patologias, quais os resultados alcançados, efeitos colaterais, riscos e
contraindicações da CM, expuseram sobre cuidados quanto interações medicamentosas,
situações de polimedicação, bem como peculiaridades na prescrição de THC. Apresentaram
sobre as dificuldades de acesso ao tratamento, tipos de produtos disponíveis, lacunas de
conhecimento, a temática nas instituições formadoras, necessidades de aprofundamento das
pesquisas, potenciais caminhos para a melhoria do acesso, regulamentação no país e
apresentaram a Medicina Canabinoide como uma especialidade médica a ser construída.

Palavras-chave: Médicos. Educação médica. Terapias complementares. Cannabis. Maconha


medicinal.
FERRARI NFM. O olhar médico para a Cannabis Medicinal [dissertação]. Marília (SP):
Faculdade de Medicina de Marília; 2021.

ABSTRACT

The demand for cannabinoid treatment for several pathologies is growing among the
population, either for the compassionate, palliative approach, as monotherapy or adjunctive
therapy, or as an alternative to allopathic and high-cost drugs. The management of this therapy
requires trained medical professionals, so patients can access and achieve the best results.
Scientific evidence has been widely produced, and despite the reticent stance of medical
regulatory institutions, as well as stigmatizing social representations, a progressive increase in
the number of prescribing professionals is perceived. This research aimed to analyze the
knowledge, conceptions, and practices of medical prescribers of Medicinal Cannabis by
conducting semi-directed interviews via Skype. Seventeen physicians from different regions of
Brazil participated, who responded to contacts through the Brazilian Society for Cannabis
Studies and matched the inclusion criteria of prescribing for at least 1 patient and having a
minimum experience of 6 months. The interviews of these 17 participants were recorded,
transcribed, and subjected to Content Analysis, in thematic modality. Results pointed out the
predominance of medical specialty in Psychiatry and that the majority prescribes cannabinoids
through private or health insurance assistance, in their own office. From the analysis of the
results, 4 themes were found: 1. Path of Medical Cannabis prescribing physicians, 2.
Prescribing Medicinal Cannabis, 3. Participants' perceptions regarding access to Medicinal
Cannabis and 4. Training for Medical Cannabis prescribers. Participants described their
experiences in prescribing Cannabis, their own experience as patients and prescribing for
family members, the motivations that led them to become prescribers and particularities of their
training, historical and social issues of stigma and prejudice, their relationship with professional
colleagues, the position of their Class Council, relevant social actors, initiatives and
protagonism in learning, and aspects of medical training. About clinical practice, in accordance
with the scientific evidence found, they pointed out how they handle therapy in different age
groups and pathologies, the results achieved, side effects, risks, and contraindications, they
explained the care regarding drug interactions, polymedication situations, as well as
peculiarities in the prescription of tetrahydrocannabinol. They reported difficulties in accessing
treatment, types of products available, and knowledge gaps. They also highlighted how the
subject is approached in training institutions, the needs for further research, potential ways to
improve access, regulation in the country, and introduced Cannabinoid Medicine as a medical
specialty to be built. We conclude that, despite all the difficulties and challenges of Brazilian
scenario that demand the revision of paradigms in social sphere and transformations in health
care, the prescribing physicians identify the exponential scientific advances and demonstrate
the therapeutic potential of Cannabis in their practices, consolidating it as a promising
perspective in health field, being essential that medicine appropriates this knowledge
continuously, with investments in training since graduation.

Keywords: Physicians. Medical education. Complementary therapies. Cannabis. Medicinal


Cannabis.
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 – Medidas descritivas de idade e sexo dos participantes da pesquisa ....................... 52


Tabela 2 – Medidas descritivas de tempo de graduação dos participantes da pesquisa ........... 52
Tabela 3 – Participação dos médicos prescritores por especialidade ....................................... 53
Tabela 4 – Participação dos médicos prescritores por modelo de Saúde ................................. 54
Tabela 5 – Participação dos médicos prescritores por Região do Brasil .................................. 54
Tabela 6 – Níveis de complexidade em que os participantes prescrevem a CM...................... 55
Tabela 7 – Redes de Saúde em que os médicos prescrevem a CM .......................................... 56
Tabela 8 – Atividades exercidas na atuação profissional dos participantes ............................. 56
LISTA DE QUADROS

Quadro 1 – Caracterização dos participantes ........................................................................... 57


Quadro 2 – Resultados das entrevistas com médicos prescritores de Cannabis Medicinal ..... 60
Quadro 3 – Percurso dos médicos prescritores de Cannabis Medicinal .................................. 62
Quadro 4 – Prescrevendo a Cannabis Medicinal ..................................................................... 81
Quadro 5 – Percepções dos participantes sobre o acesso à Cannabis Medicinal ..................... 99
Quadro 6 – Formação dos médicos prescritores de Cannabis Medicinal .............................. 109
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

2-AG 2-araquidonilglicerol
ABRACE Associação Brasileira de Apoio Cannabis Esperança
ADI Ação Direta de Inconstitucionalidade
AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária
AZT Zidovudina
CAPS Centros de Atenção Psicossocial
CAAE Certificado de Apresentação de Apreciação Ética
CB1 Receptor Canabinoide tipo 1
CB2 Receptor Canabinoide tipo 2
CB3 Receptor Canabinoide tipo 3
CBD Canabidiol
CEP Comitê de Ética e Pesquisa
CESeC Centro de Estudos de Segurança e Cidadania
CF Constituição Federal
CFM Conselho Federal de Medicina
CM Cannabis Medicinal
CND Comissão de Entorpecentes/Narcóticos
CNFE Comissão Nacional de Fiscalização de Entorpecentes
CONITEC Comissão Nacional de Incorporação de Tecnologias no SUS
CRM Conselho Regional de Medicina
DCN Diretrizes Curriculares Nacionais
DRS Departamento Regional de Saúde IX de Marília
EC Emenda Constitucional
ECDD Comitê de Experts em Dependência de Drogas
ECT Eletroconvulsoterapia
EDEPE Escola da Defensoria Pública
FAAH Fatty Acid Amide Hydrolase
FACT Federação das Associações de Cannabis Terapêutica
Famema Faculdade de Medicina de Marília
HIV Vírus da imunodeficiência humana
MDB-SP Partido Movimento Democrático Brasileiro do Estado de São Paulo
MGL Monoacyl Glicerol
MS Ministério da Saúde
OMS Organização Mundial de Saúde
ONU Organização das Nações Unidas
PL Projeto de Lei
PSB-PR Partido Socialismo e Liberdade do Estado de Paraná
QI Quociente intelectual
RAPS Rede de Atenção Psicossocial
RD Redução de Danos
RDC Resolução da Diretoria Colegiada
RE Recurso Extraordinário
RT Residências Terapêuticas
SEC Sistema Endocanabinoide
SBEC Sociedade Brasileira de Estudos da Cannabis
SP São Paulo
STF Supremo Tribunal Federal
STJ Superior Tribunal de Justiça
SUG Sugestão Legislativa
SUS Sistema Único de Saúde
TCLE Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TDAH Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade
TEA Transtorno do Espectro Autista
THC Tetrahidrocanabinol
TOC Transtorno Obsessivo Compulsivo
TOD Transtorno Opositivo Desafiador
TPM Tensão Pré-menstrual
UNESP Universidade Estadual Paulista
UNIFESP Universidade Federal de São Paulo
UNODC United Nations Office on Drugs and Crime
USP Universidade de São Paulo
UTI Unidade de terapia intensiva
VNS Estimulação elétrica do nervo vago
APRESENTAÇÃO

Sou Nayara de Fátima Mazini Ferrari, enfermeira pela Universidade Estadual de


Londrina/PR, Servidora Pública no Departamento Regional de Saúde (DRS) IX de Marília no
qual trabalhei por 07 anos como Articuladora de Saúde Mental, assessorando tecnicamente os
62 municípios na implantação da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS), bem como no processo
de desinstitucionalização com fechamento de hospitais psiquiátricos e estruturação das
residências terapêuticas.
No desenvolvimento de atividades formativas e de educação em saúde, fui preceptora
da Residência Multiprofissional de Saúde Mental da Faculdade de Medicina de Marília
(Famema) e do Programa de Aprimoramento Profissional em Saúde Mental da Universidade
Estadual Paulista (Unesp) – Campus Assis, facilitadora no curso de Formação em Saúde Mental
para profissionais do Sistema Único de Saúde (SUS), ofertado a três Regiões de Saúde do
âmbito do DRS e no curso de Políticas Públicas do Programa de Aprimoramento da Famema,
proferi palestras em universidades e escolas sobre saúde mental nas diversas perspectivas e,
mais recentemente, sobre Cannabis Medicinal (CM). Fui organizadora do 1º Seminário de
Cannabis Medicinal do Centro Oeste Paulista, junto à Escola da Defensoria Pública de Marília
(EDEPE), em 2019.
Neste mestrado, tornei-me oficialmente pesquisadora sobre a temática da CM, por uma
motivação pessoal advinda da experiência vivenciada no uso de canabinoides no tratamento de
minha filhinha, que desenvolveu epilepsia refratária de difícil controle, a Síndrome de Lenox
Gastaut.
A CM surgiu em nossas vidas como última opção, após outras possibilidades
apresentadas como pulsoterapia de corticoides, terapia de estimulação elétrica do nervo vago
(VNS) um tipo de marca-passo cerebral, eletroconvulsoterapia (ECT) e dieta cetogênica,
tratamentos complexos, invasivos e sem promessas de resultados efetivos. Tentamos a dieta
cetogênica sem êxito.
A possibilidade de tentar um fitoterápico se mostrou mais palatável, entretanto, impôs-
me uma ressignificação total de conceitos, quebra de tabus, revisão de concepções, paradigmas
e estereótipos, principalmente por além de mãe, ser uma profissional da saúde mental. Mas, eu
estava decidida!
A terapêutica com fitocanabinoides para a Lelê proporcionou resultados notoriamente
impactantes em seu desenvolvimento cognitivo e neuropsicomotor, na modulação
comportamental e nociceptiva, na resposta imunológica e redução das crises convulsivas,
cessou as inúmeras e recorrentes internações em UTI e o uso de antibióticos, evidências
incontestáveis sobre a extrema relevância de nosso Sistema Endocanabinoide (SEC) e sua
resposta ao fitocomplexo da planta Cannabis sativa L. Claramente, foi um divisor de águas em
nossa qualidade de vida, mudando completamente nossas histórias.
Entretanto, os inúmeros óbices para o acesso à CM, desde o alto custo, como a
burocracia para a importação, as poucas opções disponíveis e a necessidade de judicialização,
nos levaram a buscar um caminho para a autonomia e amparadas por advogados sensíveis e
solidários com nossa luta, conquistamos o salvo conduto para o cultivo doméstico.
Neste caminhar, surgiu um grupo multidisciplinar composto por juristas, pesquisadores
e profissionais da saúde voltados à discussão da temática, nascia ali a Maléli – Associação
Canábica em defesa da vida, da qual fui membro fundadora e primeira presidente, nome
sugerido por mim em homenagem às duas crianças que deram visibilidade à luta pela
democratização do acesso ao tratamento com CM em Marília, uma delas minha pequena Léli
ou Lelê, minha destemida Letícia.
A partir deste momento comecei a participar de eventos, encontros, cursos, seminários
e reuniões, nos quais conheci outras associações, mães, pais e pacientes e passei a me engajar
progressivamente no movimento nacional. Tempo em que, em parceria com a Escola da
Defensoria Pública de Marília (EDEPE), organizei junto a muitos voluntários o 1º Seminário
de Cannabis Medicinal do Centro Oeste Paulista, que reuniu palestrantes de vários locais do
Brasil, bem como participantes de toda a região.
Durante o percurso, conheci a SBEC – Sociedade Brasileira de Estudos da Cannabis
uma associação científica composta por profissionais da saúde e demais campos afins que
tratam da temática. Foi quando descobri um universo de conhecimentos e vivências riquíssimo,
de pesquisas e publicações científicas, cursos, palestras, relatos de caso e aplicações
terapêuticas e passei a integrar a instituição.
Para além dos movimentos sociais e discussões sobre a articulação de políticas públicas,
minha experiência diária constatando tantos benefícios para a Lelê, instigou-me a entender
como um só remédio, uma planta, um fitoterápico, poderia fazer uma criança voltar a andar, a
sorrir, a interagir e deixar de frequentar hospitais para frequentar a escola. Parecia mágica...seria
uma panaceia?
Paralelo à inquietude de aprofundar-me nesta ciência inovadora, em contato com
pessoas que buscavam informações sobre a terapia para várias doenças, em sua grande maioria
refratária, identifiquei que um grande obstáculo para que tivessem acesso ao tratamento era
encontrar um profissional médico com conhecimentos sobre a terapia canabinoide, que pudesse
prescrever e acompanhar estes pacientes.
Ao me deparar com este desafio, inclusive na associação, percebi num âmbito geral o
quanto os médicos têm pouco conhecimento ou nenhuma aproximação, o quanto há resistências
dentro da própria academia e até mesmo preconceitos que impedem por vezes um ínfimo início
de conversa, o quanto era difícil e desafiador para o paciente abordar que desejava essa opção
terapêutica.
Por outro lado, dentro de minha participação na SBEC, notava dentre os médicos
prescritores de CM os diversos caminhos que encontraram na vivencia pessoal, histórias de
transformações profissionais e pessoais, sucessos e desafios, razões que o levaram ao tema.
Assim, debrucei-me enquanto pesquisadora no mestrado, objetivando compreender
melhor o olhar médico sobre a CM, conhecer e sistematizar suas concepções, práticas e
dificuldades a fim de ampliar o conhecimento sobre o tema, ainda pouco investigado e pensar
possibilidades de melhoria da formação destes profissionais sobre a medicina canabinoide e
alternativas para acesso a mais pessoas que precisam desta terapêutica.
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................... 20
1.1 O uso terapêutico da Cannabis Medicinal (CM) ............................................... 21
1.2 História, políticas públicas, aspectos sociais e econômicos relacionados à
Cannabis ................................................................................................................ 24
1.3 Avanços legislativos, judiciais e mobilização popular ....................................... 35
1.4 Médicos prescritores de CM: formação e cuidado ampliado ........................... 38

2 JUSTIFICATIVA ................................................................................................. 44

3 OBJETIVOS ......................................................................................................... 45
3.1 Objetivo geral........................................................................................................ 45
3.2 Objetivos específicos ............................................................................................. 45

4 MÉTODO .............................................................................................................. 46
4.1 Local....................................................................................................................... 46
4.2 Participantes ......................................................................................................... 46
4.3 Procedimentos éticos ............................................................................................ 47
4.4 Instrumento da pesquisa ...................................................................................... 47
4.5 Procedimentos de coleta de dados ....................................................................... 48
4.6 Análise de dados ................................................................................................... 50

5 RESULTADOS ..................................................................................................... 52
5.1 Caracterização dos participantes ........................................................................ 52
5.2 Resultados das entrevistas com médicos prescritores ....................................... 60
5.2.1 Tema 1: Percurso dos médicos prescritores de Cannabis Medicinal .................. 61
5.2.1.1 Subtema: Cenário de inserção do prescritor de Cannabis .................................... 62
5.2.1.1.1 Categoria: Perspectivas sociais e contextos proibicionistas ................................... 62
5.2.1.1.1.1 Preconceito ............................................................................................................. 62
5.2.1.1.1.2 Conservadorismo e religião .................................................................................... 64
5.2.1.1.1.3 Proibicionismo e legalização .................................................................................. 64
5.2.1.1.2 Categoria: Uso medicinal da Cannabis .................................................................. 65
5.2.1.1.2.1 Primeiros contatos e começo do uso medicinal da Cannabis ................................. 65
5.2.1.1.2.2 Lacunas de conhecimentos e desafios .................................................................... 66
5.2.1.1.3 Categoria: Atores sociais relevantes ........................................................................ 69
5.2.1.1.3.1 Seus familiares ........................................................................................................ 69
5.2.1.1.3.2 Sociedade ................................................................................................................ 70
5.2.1.1.3.3 Colegas de profissão ............................................................................................... 71
5.2.1.1.3.4 Conselhos de classe ................................................................................................ 73
5.2.1.1.3.5 Pacientes e seus familiares ..................................................................................... 74
5.2.1.2 Subtema: Decisão profissional: repercussões e implicações ................................. 76
5.2.1.2.1 Categoria: Tornando-se um prescritor de Cannabis ............................................... 76
5.2.1.2.1.1 Motivações ............................................................................................................. 76
5.2.1.2.1.2 Concepções sobre assumir-se como prescritor ....................................................... 79
5.2.2 Tema 2: Prescrevendo a Cannabis Medicinal ...................................................... 81
5.2.2.1 Subtema: Prática clínica ........................................................................................ 81
5.2.2.1.1 Categoria: Cannabis na atenção integral à saúde ................................................... 82
5.2.2.1.1.1 Sistema endocanabinoide e manejo da Cannabis Medicinal.................................. 82
5.2.2.1.1.2 Saúde da criança e do adolescente .......................................................................... 83
5.2.2.1.1.3 Saúde do adulto ...................................................................................................... 84
5.2.2.1.1.4 Saúde da mulher ..................................................................................................... 87
5.2.2.1.1.5 Saúde do idoso ........................................................................................................ 87
5.2.2.1.2 Categoria: Cuidados ............................................................................................... 90
5.2.2.1.2.1 Efeitos colaterais..................................................................................................... 91
5.2.2.1.2.2 Interações medicamentosas .................................................................................... 92
5.2.2.1.2.3 Riscos e contraindicações ....................................................................................... 93
5.2.2.2 Subtema – Vivências e experiências próximas ....................................................... 95
5.2.2.2.1 Categoria: Autoprescrição e prescrição para familiares ......................................... 95
5.2.2.2.1.1 Experiência própria como paciente ........................................................................ 95
5.2.2.2.1.2 Vivências com entes familiares .............................................................................. 96
5.2.3 Tema 3: Percepções dos participantes sobre o acesso à Cannabis Medicinal .... 98
5.2.3.1 Subtema: Dificuldades de acesso ao tratamento .................................................... 99
5.2.3.1.1 Categoria: Fatores negativos incidentes ................................................................. 99
5.2.3.1.1.1 Tabus e preconceito ................................................................................................ 99
5.2.3.1.1.2 Insuficiência de prescritores ................................................................................. 100
5.2.3.1.1.3 Custo do tratamento .............................................................................................. 100
5.2.3.1.1.4 Falta de regulamentação ....................................................................................... 101
5.2.3.1.2 Categoria: Fatores positivos incidentes ................................................................ 101
5.2.3.1.2.1 Luta dos pacientes e famílias ................................................................................ 102
5.2.3.1.2.2 Atuação dos médicos prescritores ........................................................................ 102
5.2.3.1.2.3 Caminhos para melhorar o acesso ........................................................................ 103
5.2.3.2 Subtema: Políticas PÚBLICAS e perspectivas socioeconômicas ........................ 104
5.2.3.2.1 Categoria: Políticas públicas de saúde.................................................................. 105
5.2.3.2.1.1 Prescrição de Cannabis no SUS ........................................................................... 105
5.2.3.2.1.2 Fomento de políticas públicas .............................................................................. 106
5.2.3.2.1.3 Monetização e farmacêuticas................................................................................ 106
5.2.3.2.2 Categoria: Aspectos socioeconômicos ................................................................. 107
5.2.3.2.2.1 Saúde, economia e impacto social ........................................................................ 107
5.2.3.2.2.2 Produtos disponíveis ............................................................................................. 108
5.2.4 Tema 4: Formação dos médicos prescritores de Cannabis Medicinal .............. 109
5.2.4.1 Subtema: Determinantes na formação médica ..................................................... 109
5.2.4.1.1 Categoria: Percursos do conhecimento ................................................................ 110
5.2.4.1.1.1 Iniciativas dos prescritores na aprendizagem ....................................................... 110
5.2.4.1.2 Categoria: Cannabis Medicinal na educação médica ........................................... 111
5.2.4.1.2.1 Cannabis Medicinal nas instituições formadoras ................................................. 111
5.2.4.1.2.2 Inserção na grade curricular ................................................................................. 113
5.2.4.1.2.3 Medicina canabinoide: ciência e pesquisa ............................................................ 113

6 DISCUSSÃO ....................................................................................................... 116

7 CONCLUSÃO..................................................................................................... 136

8 PRODUTO TÉCNICO EM ELABORAÇÃO ................................................. 139

9 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................. 140

REFERÊNCIAS ................................................................................................................... 141

APÊNDICES ......................................................................................................................... 162


APÊNDICE A – Instrumentos ............................................................................................ 162
APÊNDICE B – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) ........................ 163

ANEXOS .............................................................................................................................. 164


ANEXO A – Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa ................................................ 164
ANEXO B – Termo de Aceite de Instituição Co-Participante ......................................... 167
20

1 INTRODUÇÃO

A saúde é definida como “um estado de completo bem-estar físico, mental e social e não
somente ausência de afecções e enfermidades”, segundo a Organização Mundial de Saúde
(OMS).(1)
Este conceito, aliado à garantia constitucional dos direitos humanos fundamentais,
revela o animus da saúde enquanto direito social, que deve ser assegurado sem qualquer forma
de distinção de raça, religião, ideologia ou condição socioeconômica.(2)
O Sistema Único de Saúde (SUS), uma conquista democrática, expressão do exercício
da cidadania brasileira, consolida o direito à saúde enquanto política pública, por meio de três
pilares que o externam através dos princípios da universalidade, equidade de acesso e
integralidade.(3) Enquanto principal política de inclusão social traz, pelo princípio da
integralidade, uma gama de estratégias e ações voltadas para o atendimento do usuário em sua
totalidade, ouvindo e compreendendo o contexto social em que se insere, a fim de atender suas
demandas, prioritariamente na frente de prevenção de doenças e agravos, não se limitando e
incluindo a assistência em todos os níveis de complexidade.
Assim, a garantia de acesso à saúde a todas as pessoas, também transita os princípios da
universalidade e da equidade, tratando de forma desigual os desiguais, de modo que as
necessidades individuais sejam olhadas dinamicamente, atendendo às peculiaridades próprias
do sujeito, para além da coletividade, outrossim, objeto do cuidado.(4)
A Reforma Sanitária e a construção do SUS trouxeram ao longo dos anos a ampliação
de conceitos, desenvolvendo tecnologias, cuja intencionalidade voltada à defesa da vida, trouxe
na complexidade dos aspectos do cuidado, os processos de transformação e humanização das
práticas de saúde.
Neste contexto, surgem as práticas integrativas, alternativas e complementares, com
métodos investigados, validados e incentivados pelo Ministério da Saúde, numa perspectiva
ampla, múltipla e sincrética articulando estratégias sensíveis ao cuidado holístico, sendo o
sujeito o foco do cuidado, de modo a contemplar suas subjetividades, vivências e
autoconhecimento.(5)
Reconhecidas pela OMS, as Medicinas Tradicionais e as Medicinas Integrativas e
Complementares contribuem para a ampliação dos cuidados voltados à saúde, de forma
holística. Elas trazem o conceito de práticas de promoção e recuperação em saúde,
reconhecendo as dimensões física, mental, espiritual, social e cultural, considerando a
segurança, a eficácia e a qualidade de seu uso, incluindo e consolidando o pluralismo
21

terapêutico nas políticas públicas do SUS.(5)


No Brasil, em 2007, foi legitimada a Política Nacional de Plantas Medicinais e
Fitoterápicos no SUS, cujo objetivo é buscar a promoção das práticas tradicionais de uso de
plantas medicinais, largamente disseminadas na sociedade brasileira, a partir da apropriação
cotidiana transgeracional feita pelas populações nativas e povos originários.(5)
O reconhecimento da fitoterapia é resultado de uma luta que parte de diversos atores,
como pesquisadores, gestores, profissionais de saúde e usuários e vem antes mesmo da criação
do SUS, reunindo conhecimento científico e popular com o resgate de uma prática milenar, a
partir da comprovação de eficácia e segurança terapêutica das plantas medicinais.(6)

1.1 O uso terapêutico da Cannabis Medicinal (CM)

Dentre as plantas medicinais, atualmente ganhou destaque o uso da Cannabis sativa


L.1(7) para o tratamento de diversas patologias, em especial aquelas que são refratárias aos
tratamentos convencionais, caminhando progressivamente a ciência nas pesquisas quanto suas
propriedades.
A versatilidade de seu uso como remédio, para além de seus usos tradicionais,
ritualísticos e culturais, está diretamente ligada à existência do nosso Sistema Endocanabinoide
(SEC). O SEC constitui um sistema biológico modulatório natural, voltado fisiologicamente à
homeostase, tendo sido correlacionado em diversas condições patológicas em nível central e
periférico em razão do importante papel nas várias vias de sinalização, como por exemplo, na
regulação do apetite, processos inflamatórios, metabolismo, equilíbrio de energia, função
imunológica, função cardiovascular, termogênese, digestão, doenças psiquiátricas, regulação
do estresse, entre outros.(8-10)
Segundo evidências clínicas e experimentais, este sistema é constituído por receptores
canabinoides, seus ligantes endógenos e enzimas de síntese e metabolização.(9)
O primeiro endocanabinoide descoberto foi a anandamida (N-araquidoniletanolamida),
seguido pelo 2-araquidonilglicerol (2-AG), metabolizados em compostos inativos pela FAAH
(do inglês – fatty acid amide hydrolase) e pela MGL lipase (do inglês – monoacyl glicerol),
respectivamente. A maior parte dos endocanabinoides identificados até o momento é derivada

1
Conhecida como maconha, a Cannabis sativa L é uma planta milenar que possui um significativo valor
terapêutico. Seu uso medicinal é relatado desde a era medieval, em achados que datam de 3750 a.C.
em países como China, África e Grécia. Atualmente, pela ampla difusão do uso no tratamento de
doenças, adotou-se popularmente a nomenclatura Cannabis Medicinal (CM), a fim de diferenciar o
uso terapêutico do uso social.(7)
22

de ácidos graxos poli-insaturados de cadeia longa, especificamente, o ácido araquidônico, e


ambos estão envolvidos em processos de metaplasticidade, modificação a longo prazo do limiar
de indução de plasticidade.(8,9)
Dentre os receptores mais estudados, temos os receptores canabinoides tipo 1 (CB1),
ligados diretamente à neuroplasticidade, expressos em alta densidade em áreas associadas ao
controle motor, resposta emocional, aprendizagem e memória, comportamento, homeostase
energética e funções cognitivas superiores, e expresso em baixas densidades em órgãos e
tecidos periféricos.(8)
Os receptores canabinoides tipo 2 (CB2) estão expressos principalmente no Sistema
Imunológico e também já foram identificados em algumas áreas do Sistema Nervoso Central.(8)
Existe ainda receptores canabinoides não CB1/CB2 que atuam nas terminações nervosas
nociceptivas por meio da ativação de receptores vaniloides (receptores ionotrópicos), nomeados
como receptores CB3.(11)
Assim, os seres humanos têm receptores para fitocanabinoides dispersos por todo o
corpo, o que explica o fato da Cannabis sativa L ter ampla ação, nas diversas condições
patológicas como Epilepsia, Parkinson, Autismo, Dor crônica, Alzheimer, doenças
neurodegenerativas progressivas, doenças autoimunes, doenças inflamatórias etc.(12-14)
A CM tem efeitos analgésicos capazes de amenizar a dor, efeitos antieméticos contra
náuseas e vômitos, estimula o apetite e ajuda no ganho de peso, benefícios importantes para
pacientes portadores do vírus HIV (AIDS) e pacientes oncológicos. Outros ganhos também
descritos é a redução dos efeitos colaterais do AZT e dos quimioterápicos, comprovados em
estudos com o dronabinol, um fármaco sintético de THC. Da maconha também se extrai ácidos
graxos essenciais capazes de proteger o sistema imunológico. Desta forma, estes resultados a
tornam um potente coadjuvante na preservação do bem-estar destes pacientes.(15-17)
Noutra perspectiva, pensando no tratamento da obesidade, um estudo utilizou o
rimonabanto, um fármaco antagonista canabinoide e verificou que, ao inibir receptores
canabinoides CB1, a ação dos endocanabinoides foi bloqueada e por conseguinte provocou a
perda do apetite. Outra via de perda de peso também ocorre em razão do rimonabanto estimular
a lipólise.(17,18)
Estes efeitos acontecem, pois o rimonabanto age no SEC, em receptores de áreas
específicas do cérebro, como o hipotálamo, e em tecidos periféricos nos adipócitos, hepatócitos,
trato gastrointestinal e músculo esquelético, tornando-o um fármaco potente no tratamento de
diversas doenças, incluindo a obesidade, dislipidemia, resistência à insulina e aterosclerose.(19)
Entretanto, o uso do medicamento Acomplia (rimonabanto) foi suspenso no Brasil pela Agência
23

Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) em 2007, após estudos demonstrarem que


pacientes que utilizaram o medicamento tiveram quase que o dobro de risco de desenvolver
problemas psiquiátricos quando comparado àqueles que não utilizaram o produto, estes
resultados incluíam ansiedade, depressão e ideação suicida.(19)
No Transtorno do Espectro Autista (TEA), a CM tem sido uma alternativa com ótimos
resultados, pois melhora a cognição, a sensibilidade sensorial, atenção, interação social e a
linguagem e ameniza diversos sintomas característicos do autismo tal como as crises com
ataques de automutilação e raiva, problemas de sono, ansiedade, hiperatividade, inquietação,
agitação psicomotora, irritabilidade, agressividade, perseverança e depressão.(19,21)
Uma série de estudos clínicos e experimentais sugere que a CM tem um imenso
potencial terapêutico na Saúde da Mulher e está sendo utilizada para o controle de enxaquecas,
fibromialgia, distúrbios do sono, ansiedade, depressão, sintomas de causas hormonais como a
TPM, cólicas, dispareunia, resultados na saúde reprodutiva e sexual dentre outros.(22-29)
No tocante aos distúrbios neurológicos e neurodegenerativos, a CM foi amplamente
estudada enquanto agente terapêutico para uma série de patologias, dentre elas podemos citar
o Alzheimer, Parkinson, esclerose lateral amiotrófica, esclerose múltipla, êmese, epilepsia, dor
crônica e câncer, cujas evidências constam numa extensa literatura, disponível nas bases de
dados científicas.(30,31)
Os resultados animadores e a ampla divulgação pela mídia, impulsionam os pacientes à
busca alternativa pelo uso da CM, obrigando as instituições públicas a manifestarem-se em
discussões, debates e posicionamentos.(32)
O Conselho Federal de Medicina (CFM) aprovou em 2014 o uso compassivo do
canabidiol (CBD) para o tratamento de epilepsias em crianças e adolescentes refratários aos
tratamentos convencionais, por meio da Resolução CFM n° 2.113/2014.(33) Neste contexto, a
instituição se posicionou restringindo a atuação médica, vedando a prescrição da Cannabis in
natura para fins medicinais bem como a prescrição de outros derivados que não o CBD.
Entretanto, a partir da análise dos motivos que levaram à aprovação da Resolução pelo
CFM, contida nos documentos anexos à resolução, entendeu-se que, apesar da incerteza
científica do tema, os estudos existentes eram suficientes para garantir o uso experimental dos
medicamentos, dado que não havia casos de efeitos colaterais graves registrados em relação aos
pacientes que se voluntariavam nestes estudos.(34)
No ano de 2015, a ANVISA retirou o CBD da lista de substâncias proscritas e permitiu
a prescrição da substância de maneira lícita. A Resolução da Diretoria Colegiada (RDC)
03/2015 colocou o canabidiol na “lista C1” que trata das substâncias sujeitas a controle especial
24

e por meio da RDC n° 17/2015, autorizou a importação de produtos à base de canabidiol.(35-37)


Em 2016, a ANVISA publicou a RDC nº 66/2016 e RDC n° 128/2016, permitindo a
ampliação da lista de importação autorizada de produtos à base de CBD, admitindo à sociedade
concordar sobre o status da Cannabis como substância permitida de uso controlado.(38,39)

1.2 História, políticas públicas, aspectos sociais e econômicos relacionados à Cannabis

A partir de 2016, sob o neoliberalismo do governo Temer e anuência do então Deputado


Jair Bolsonaro, foram instauradas políticas de austeridade, cujas medidas adotadas iniciaram
um processo de sucessivos ataques ao SUS ostentado pelo Novo Regime Fiscal estabelecido na
Emenda Constitucional (EC) nº 95/2016, que congelou os gastos da União com a saúde por 20
anos, provocando o desfinanciamento de um sistema já subfinanciado ao longo de sua
existência.(40)
Paralelamente, junto à crise sanitária que se instala no Brasil, sob o mesmo viés, assumiu
a Coordenação Geral de Saúde Mental, álcool e outras drogas o psiquiatra Quirino Cordeiro
Júnior, impondo retrocessos marcantes à Saúde Mental brasileira, concernentes às escolhas do
Estado. Assim, numa sequência de portarias e regulamentações de cunho autoritário, decretou
a contrarreforma psiquiátrica, com retomada do modelo hospitalocêntrico e asilar como
foco principal de assistência, remodelando o financiamento da Rede de Atenção Psicossocial
(RAPS), desfinanciando os serviços substitutivos como os Centros de Atenção Psicossocial
(CAPS) e Residências Terapêuticas (RT), redirecionando o financiamento para os hospitais
psiquiátricos e Comunidades Terapêuticas.(41)
Tais condutas não coadunam com a Lei da Reforma Psiquiátrica nº 10.216/2010,
tampouco com a Lei Brasileira de Inclusão nº 13.146/2015 e com a Convenção Internacional
dos Direitos da Pessoa com Deficiência de 2007, da qual o Brasil é signatário.(42-44) Também
desconsidera todo o histórico de violações de direitos que aconteceram dentro destas
modalidades institucionais, nas quais atrocidades foram praticadas contra milhares de seres
humanos em nome do cuidado, ditas como terapêuticas ou justificadas como disciplinares.(41,45)
Nesta perspectiva, as políticas sobre drogas nas quais estão a priori inseridos os usos da
Cannabis no Brasil, também retrocederam ao domínio das práticas manicomiais, estimulando
as medidas de internação involuntária e compulsória como “remédio legal” às condições de
“anormalidade” instituídas pelo “saber-poder” médico, tempo em que foram reforçadas práticas
de eletroconvulsoterapia, laborterapia e religião como cuidado, rompendo com todas as
conquistas e avanços que primavam pelo cuidado em liberdade, pela dignidade humana e pela
25

construção de uma democracia antimanicomial contemplados na luta dos pacientes, familiares


e profissionais da saúde mental ao longo dos mais de 30 anos de SUS.(46-52)
Tais acontecimentos elucidam a constatação de que os discursos da psiquiatria sempre
foram preponderantes na criação das técnicas e poderes de normalização e dominação no Brasil
de forma que, ainda hoje, muitos médicos se manifestam contra os usos diversos da maconha,
sobretudo na área da psiquiatria onde os discursos de alguns psiquiatras brasileiros baseiam a
manutenção dessa “normalização”.(53,54)
É lúcido revisitar a história das relações entre a medicina e o uso da Cannabis sativa L
e constatar que, o histórico de proibição desta planta derivou da guerra pós-abolicionismo, da
eugenia de raça estabelecida por meio da biopolítica que exerceu um poder pautado na
manifestação de uma “verdade” sob a qual os discursos médicos de saber serviram como uma
tecnologia, um saber-poder que incidiu ao mesmo tempo sobre os corpos de indivíduos
específicos e sobre uma população para disciplinar e controlar.(53,55,56)
No Brasil, o regime escravocrata durou 338 anos e teve a maior quantidade de negros
escravizados nas Américas, com estimativa de que 4,8 milhões de pessoas foram capturadas
para serem exploradas durante esse período, sofrendo as mais duras penas e torturas, marcas do
punitivismo e repressão que estão presentes na sociedade até os dias atuais como é possível
identificar, implícitos nas práticas manicomiais, genocidas e de encarceramento em voga no
atual governo.(57)
Nesta concepção é visível que, sem qualquer política pública que amparasse as
vulnerabilidades, após a abolição da escravidão o que restou foi uma massa de negros pobres e
sem ocupação, que continuaram a ser perseguidos pelo Estado. Assim, dois anos após a
promulgação da Lei Áurea, a prática da capoeira pelos ex-escravos foi transformada em crime
pelo código penal brasileiro em 1890, permanecendo até 1936. O mesmo código introduziu o
crime de vadiagem, que foi usado até os anos 1980 como uma ferramenta para reprimir e
encarcerar negros e pobres que não pudessem comprovar uma ocupação.(57)
Consequentemente, à tradição proibicionista e punitivista que vinha desde 1930 e que
havia ganhado força na década de 70, com base no imperativo do saber médico, o Estado criava
punições cada vez mais duras e severas para todos os envolvidos com as drogas, incluindo
consumidores, produtores e vendedores.(53)
Neste contexto, tal construção arrazoou-se quando, em 1958, o Ministério da Saúde
lançou uma coletânea de trabalhos sobre a maconha, destacando seus supostos malefícios,
tratando-a como um problema mundial e um desafio à eugenia de raça, afirmações descritas
pelos médicos Roberval Cordeiro de Farias e Irabussú Rocha.(53,58,59)
26

Esta coletânea trouxe alegações que foram alvo de discursos fortemente racistas e
eugenistas, afirmando que o uso da maconha trazia uma degradação da humanidade, pois os
viciados eram analfabetos, sem cultura e o uso da maconha causava nos indivíduos a
despersonalização e perda de sentimentos, como a prostituição das esposas e filhas, assassinatos
por motivos fúteis, sendo de suma importância a defesa destes infelizes do vício dos usos sociais
da planta, pois ameaçavam permanentemente a segurança da sociedade.(53,58)
Desta forma, as relações de poder entre vigilância em saúde, segurança, população e
governo mantêm a sociedade sob a mira das práticas disciplinares, cuja governamentalidade2 é
tanto alvo quanto instrumento nessas relações, sobretudo quando propõe o ideário sobre o
louco/perigoso/criminoso/marginal, colocando-o como um inimigo social, posto que ataca a
sociedade ao cometer delitos ou apresentar “anormalidades”, ofertando como remédio social a
reclusão como forma de punição e controle, em defesa da sociedade.(55,60)
A partir do início do século XX, o médico Rodrigues Dória recorreu desde princípios
de uma suposta “moralidade sã” até ao “conhecimento médico” do mal inerente, alegando que
a proibição da maconha poderia conter a violência. Assim, foi um dos pioneiros nos argumentos
médicos-científicos, trazendo em suas afirmações a experiência do médico francês Roger
Dupouy, especialista em ópio, transferindo o suposto quadro dos viciados em ópio para os
usuários de maconha brasileiros, colaborando fortemente para a proibição do uso da maconha
no país.(58)
Num discurso revolucionário às avessas das lutas sociais, o médico Rodrigues Dória
propôs uma clivagem histórica e política quando, comparando os negros aos brancos, definiu
que os brancos são a raça evoluída na civilização e que a raça preta era considerada inferior,
selvagem e ignorante, não possuía a mesma origem, língua e religião, estragando o robusto
organismo do branco no vício de fumar a maconha. Seu discurso assegurou uma higiene
silenciosa da sociedade, fazendo coincidir suas aspirações quanto à raça negra com a gestão de
polícia, adentrando cada vez mais o racismo nos dispositivos legais de poder.(58)
Os argumentos dos médicos e cientistas seguintes se mantiveram difundindo hipóteses
que, para além das questões raciais, associavam o uso de maconha ao desenvolvimento de
doenças, distúrbios mentais e sociais, caracterizando a maconha como uma substância
altamente perigosa, capaz de levar ao cometimento de crimes bárbaros.(58,61)
Neste sentido, o médico Assis Iglésias contribuiu, alegando que o indivíduo que usava

2
Governamentalidade é um conceito que busca explicar o processo que possibilitou o surgimento do
Estado de governo, o regime de poder e as características de sua tecnologia que, após o século XVIII
terá como alvo principal a população, a saber, a biopolítica.(63)
27

maconha perdia o brio, a dignidade, o sentimento de dever, se tornava incapaz para trabalhos e
só buscava obedecer ao vício, descrevendo a maconha como a “planta da loucura” e até mesmo
da morte.(53)
Os médicos Adauto Botelho e Pedro Pernambuco, além de citarem Assis Iglésias,
categorizam o vício como toxicomania, reafirmando que provinha da África e invadia
assustadoramente o Brasil, sob a alegação de que a raça outrora cativa, como vingança, trouxera
bem guardado consigo o algoz que mais tarde escravizaria a raça opressora.(61) Contribuindo, o
médico Oscar Barbosa, conclamando a atenção dos médicos nortistas e das autoridades
competentes, também se manifestou quanto ao ameaçador vício da maconha. Segundo ele, os
pretos e seus descendentes adeptos da maconha constituíam uma séria ameaça aos patrícios,
dada a rápida vulgarização por meio de suas cerimônias fetichistas.(61)
Isso explica a associação “pobre-preto-maconheiro-marginal-bandido”, diretrizes da
medicina-legal, comum entre as autoridades médicas e policiais, que atribuem à maconha uma
relação com a loucura, a doença e a delinquência, a partir de um “poder-saber” que demarcou
a legitimidade da norma, estabelecendo como princípio a coerção para coibir o que é
considerado crime.(63)
Neste sentido, o saber médico-científico do início do século XX criou um discurso justo
e verdadeiro capaz de constituir um saber-poder que orientou a instauração de mecanismos
diversos como regras, valores, linguagem, comportamentos e desejos, ditando até os dias atuais
o que é considerado como a verdade sobre os usos da maconha.(53)
Estes mesmos discursos também definiram uma justificação social, moral e legal para
classificar alguns sujeitos como anormais, intervindo a favor de uma suposta defesa da
sociedade contra tal “anomalia” ou “mal social”, discursos que constituíram as raízes do
preconceito, derivados de práticas orientadas pelo racismo, tanto pela categoria médica como
pelo senso comum da sociedade.(53)
Decorrente desta construção, a primeira lei de drogas do país foi assinada em 1921 pelo
presidente Epitácio Pessoa, proibindo a venda de cocaína, ópio, morfina e seus derivados.(57)
Em 1932, embasado nos estudos da medicina-legal de Rodrigues Dória e Assis Iglésias,
a maconha foi incluída na lista de substâncias ilegais, sob a denominação de Cannabis Indica,
sendo utilizada como elemento unificador no combate nacional às drogas em 1936, quando foi
criada a Comissão Nacional de Fiscalização de Entorpecentes (CNFE), centralizando numa
única agência federal todos os esforços da guerra contra as drogas.(58)
Em 1938, o governo do ditador Getúlio Vargas promulgou um decreto que reprimia a
posse e o tráfico de entorpecentes, pela primeira vez incluindo a maconha, que passaram a ser
28

tratados como crimes contra a saúde pública.(57)


Neste momento histórico específico, identifica-se a influência médica dos discursos do
saber, dotados de um poder disciplinar moral, podendo observar que, a tomada de poder sobre
os homens, consolida-se na biopolítica por meio da estatização do biológico.(64)
Em 1968, no auge da ditadura militar, houve no país um alinhamento à política adotada
pelos Estados Unidos, que fez com que as drogas passassem a ser o inimigo número um do país.
A Lei nº 6.368, de 1976, equiparou o usuário ao traficante, tratando-o como criminoso.(57)
Decorrente desta legislação, houve o aumento do número de pessoas presas por crimes
relacionados às drogas, situação que perdurou até 1976, quando a tipificação entre usuário e
traficante voltou a ser distinta novamente.(65)
A partir dos anos 1980, com o surgimento dos primeiros grupos de narcotraficantes
organizados no país, o caráter repressivo da política de drogas foi intensificado. Em 1988,
houve a promulgação da Constituição Brasileira (CF), tempo em que o tráfico de entorpecentes,
ao lado da tortura e do terrorismo, foi definido como crime inafiançável e insuscetível de graça
ou anistia.(57)
Em 2006, foi sancionada a Lei nº 11.343 que se encontra vigente até os dias atuais,
estabelecendo o fim da pena de encarceramento para os usuários de substâncias ilegais,
buscando romper com a lógica punitivista.(66)
No entanto, por resultar de uma soma de estereótipos sociais, a nova lei de drogas deu
margem a diversas aplicações, aumentando demasiadamente o número de pessoas presas pelo
crime de tráfico, influenciando drasticamente a situação de encarceramento que temos
atualmente no Brasil.(57)
Mediante o cenário exposto, é possível perceber que existe uma conexão estreita entre
o saber médico, a política e o poder judiciário. Neste sentido, os discursos médicos foram e são
determinantes tanto para criar como para manter, alterar ou reverter essa ideia de
“anormalidade” em relação aos usos sociais da maconha desde o passado até os dias de hoje no
Brasil.
A despeito desse histórico, atualmente as concepções proibicionistas, estigmatizadoras,
segregadoras, preconceituosas e punitivistas estruturalmente construídas ao longo do tempo
sobre os usos sociais da maconha, já não formam um consenso dentre os médicos e,
principalmente entre os psiquiatras, o que tem acirrado as disputas sobre o que é de fato a
“verdade” sobre os usos desta planta, que tem sido amplamente estudada pela ciência.
Assim, contrariando a “verdade” proibicionista, pesquisas avançam rapidamente,
identificando o potencial terapêutico dos compostos da Cannabis, de seu fitocomplexo e
29

mecanismos de ação no SEC humano.


Ao passo das discussões e polêmicas entre médicos proibicionistas pautados na
“verdade” estrutural psiquiátrica e médicos antiproibicionistas impelidos pela ciência, a
promulgação do Decreto 9.761, em abril de 2019, pelo governo Bolsonaro, evidenciou uma
franca decadência social imposta pelo Poder Executivo, num posicionamento constrangedor
que objetivou fixar a Política Nacional sobre Drogas com base na retórica falaciosa e fracassada
de guerra às drogas por meio da repressão penal e da política da abstinência, “em defesa da
família tradicional brasileira”3.(67)
Neste decreto, a priori não houve menção ao uso medicinal da Cannabis sativa L,
entretanto, estabeleceu que o plantio, o cultivo, a importação e a exportação de plantas de drogas
ilícitas, tais como a Cannabis, não autorizados pela União, não serão admitidos no território
nacional, conflitando a ordem natural dos acontecimentos, das discussões científicas e
demandas sociais do país.(67)
No entorno, o posicionamento do atual governo consolida-se numa imposição moral do
Estado de uma Política Nacional sobre Drogas em detrimento ao direito individual, obrigando
à abstenção, desconsiderando as estratégias de redução de danos e a possibilidade do uso
medicinal de substâncias tidas como ilícitas, como é o caso da Cannabis sativa L.(68)
Consequentemente, o decreto viola o direito à saúde do cidadão, bem como deixa de
beneficiar a população com a regulamentação, ostentando óbices quanto ao uso medicinal da
Cannabis, mostrando-se inconstitucional à medida que contraria direitos garantidos em nossa
Constituição.(68)
Neste mesmo cenário, insurgiram constantes discussões por conselhos de classe,
associações de especialidades, instituições de ensino e pesquisa, jornalistas, legisladores,
juristas e entidades, bem como por pacientes (em potencial ou que já se beneficiam do uso),
ocorrendo um exponencial aumento da prescrição de canabinoides pelos médicos e a demanda
expressa na agência regulatória.
Meio às pautas colocadas pela sociedade civil, em junho de 2019 a ANVISA convocou
as consultas públicas nº 654 e nº 655. Estas consultas tiveram a intencionalidade de abrir espaço
para as contribuições de toda a sociedade, com o objetivo de discutir o uso da maconha para
fins medicinais e científicos no Brasil, tanto para favorecer a produção nacional com garantia
de qualidade e segurança por meio do cultivo, quanto para o registro de medicamentos à base

3
“em defesa da família tradicional brasileira”: expressão comumente utilizada pelo atual governo
conservador para referir-se à representação da literalidade da união entre homem e mulher assumindo
um sentido restritivo, pelo viés da repressão à união socioafetiva.(70)
30

de Cannabis sativa L, permitindo a ampliação do acesso da população a medicamentos.(69)


Diante do fato, no mesmo mês, o CFM e a Associação Brasileira de Psiquiatria
publicaram uma nota conjunta na qual pediram a revogação e o cancelamento da consulta
pública sobre o tema, alegando que, ao admitir a possibilidade de liberação de cultivo e de
processamento da Cannabis no país, a ANVISA assumia uma postura equivocada, ignorando
os riscos à saúde pública que decorrem dessa medida.(71)
Em outubro de 2019, considerando uma possível “legalização”, a Associação Brasileira
de Psiquiatria junto ao CFM, lançou um manifesto chamado de “Decálogo da Maconha”,
considerado popularmente como os “10 mandamentos contra a legalização da maconha”. Este
documento sinteticamente traz as seguintes afirmativas: não existe “maconha medicinal”; o uso
da planta não é seguro e tem potencial de causar dependência; deve-se levar em conta os
potenciais malefícios, pois os benefícios iniciais podem ser substituídos por danos decorrentes
do uso crônico como diminuição da atenção, memória e funções executivas, prejuízo na
percepção da realidade e a tomada de decisões, declínio no QI (Quociente intelectual); pode
induzir à esquizofrenia, depressão, transtorno bipolar quadros de ansiedade, ataques de pânico,
risco de suicídio em adolescentes e também na fase adulta; pode levar a câncer de pulmão,
bronquite, enfisema e infecções respiratórias, dentre outras alterações nos diferentes sistemas
orgânicos; se consumida na gestação leva a alterações no cérebro do feto e suas consequências
costumam além do usuário atingir toda a família pelas alterações de humor e mudanças de
comportamento, provocando inclusive acidentes no trânsito.(72)
Este manifesto, demonstrando a postura adotada pelo CFM e Associação Brasileira de
Psiquiatria, causou grande indignação dentre os médicos prescritores de CM no Brasil,
instaurando uma série de controvérsias entre os psiquiatras brasileiros, acirrando o debate e os
conflitos dentre os médicos, especialmente dentro da psiquiatria.
Diante disso, em dezembro de 2019, a Sociedade Brasileira de Estudos da Cannabis
(SBEC) publicou um manifesto-resposta, em que debate ponto a ponto descrito no Decálogo,
expondo por meio de argumentos científicos os usos medicinais da Cannabis sativa L,
explicando cada equívoco das frases curtas e tendenciosas contidas no documento da
Associação Brasileira de Psiquiatria.(73)
Meio à polarização do assunto, mesmo sob as pressões do ministro Osmar Terra e do
atual presidente Bolsonaro, a ANVISA caminhava para a regulamentação do uso da CM nos
tratamentos de saúde no Brasil. Entretanto, a votação da regulamentação foi adiada por
interferências do Poder Executivo junto à Diretoria Colegiada, de forma que somente em
dezembro de 2019, conseguiu aprovar por unanimidade a liberação da venda em farmácias de
31

medicamentos à base de Cannabis por meio da RDC nº 327, com validade de três anos. Neste
momento, a agência vetou o item 241, do relator William Dib, que tratava da regulamentação
dos requisitos para o cultivo da planta no país, arquivando a proposta. Consequentemente, com
a manutenção da proibição do cultivo, os fabricantes ficaram condicionados à importação do
extrato da planta, para a produção de medicamentos no Brasil.(74,75)
A RDC n° 327/2019 dispõe sobre os procedimentos para a concessão da Autorização
Sanitária, tornando possível a fabricação e a importação de produtos de Cannabis, bem como
estabelece exigências para a comercialização, prescrição, dispensação, monitoramento e
fiscalização de produtos derivados para fins medicinais, por empresas do setor farmacêutico.(74)
Neste sentido, a ANVISA foi insuficiente, vez que não tratou do cultivo da Cannabis
sativa L para fins medicinais no país, o que garantiria segurança jurídica às milhares de
pacientes e famílias que necessitam da CM para a realização de tratamentos de saúde.(68)
Numa análise dos acontecimentos, é importante retomar que a Lei de Drogas de 2006
já criou um excludente criminal e salvo conduto quando dispôs sobre a possibilidade de
desenvolvimento das atividades de pesquisa e uso terapêutico de drogas ilícitas. Assim, é
possível o uso medicinal da Cannabis, ainda que haja ausência ou insuficiência de
regulamentação por inércia e/ou omissão do Poder Público, posto que não impede o direito à
saúde dos cidadãos acometidos por enfermidades tratáveis por meio da CM.(77)
No que diz respeito às ações do Poder Legislativo, vários Projetos de Lei (PL) foram
propostos ao longo dos últimos sete anos, como por exemplo, o PL 514/2017 relatado pela
senadora Marta Suplicy (MDB-SP), que surgiu a partir dos debates na Comissão de Direitos
Humanos do Senado sobre a Sugestão Legislativa nº 25 (SUG 25), de iniciativa popular. Este
PL propunha a alteração do artigo 28 da Lei de Drogas, descriminalizando o cultivo de maconha
para fins terapêuticos mediante prescrição médica, determinando que o semeio, o cultivo e a
colheita fossem restritos às quantidades adequadas para o tratamento do paciente. A proposta
foi apoiada por sete senadores e apenas dois foram contrários, entretanto, quando colocada em
votação foi suspensa pelo pedido de vista do senador Eduardo Amorim.(76)
Destaca-se também o Projeto de Lei nº 10.549 de 2018, de autoria do Deputado Federal
Paulo Teixeira, que disciplina e regulamenta o uso da Cannabis e seus derivados, estabelecendo
à União a competência para regulamentação, autorização e fiscalização da importação,
exportação, plantio, cultura, colheita, produção, fabricação, trânsito, transporte, aquisição a
qualquer título, armazenamento, emprego, comércio, distribuição, fornecimento, posse e uso.
Esta proposta legislativa está em conformidade com a política de redução de danos e formaliza
a distinção entre o uso recreativo da Cannabis (que deve ser objeto de regulamentação
32

específica) e o uso para fins terapêuticos e medicinais, garantindo o direito à saúde dos pacientes
que possam se beneficiar do tratamento com a CM. Todavia, encontra-se com a tramitação
suspensa e sem qualquer prazo ou notícia de retomada da discussão.(77)
Neste cenário, o Projeto de Lei nº 399, de autoria do Deputado federal Fábio Cruz
Mitidieri, surgiu em 2015 como uma tentativa de inserir no artigo 2º da Lei de Drogas um
parágrafo que viabilizava a comercialização de medicamentos que contenham extratos,
substratos ou partes da planta Cannabis sativa L em sua formulação, no território nacional.
Entretanto, a referida Lei de Drogas já previa o plantio de plantas com compostos psicoativos
para fins de pesquisa científica e uso medicinal, sob autorização da União.(78) Por conseguinte,
este projeto foi retomado em 2019, quando o presidente da Câmara Rodrigo Maia determinou
que o texto original do PL 399 fosse analisado por uma Comissão Parlamentar, incumbida de
apresentar um texto substitutivo que regulamentasse o cultivo, produção e venda de Cannabis
para fins medicinais.(79)
No âmbito mundial, o Comitê de Experts em Dependência de Drogas (ECDD) da OMS,
após o 41º Encontro realizado em Genebra de 2018, em resposta às Resoluções CND 52/5 e
50/2 que solicitavam a atualização dos relatórios sobre Cannabis já que a análise sobre o uso
do dronabinol apontou pesquisas científicas robustas evidenciando seu potencial terapêutico,
propôs que a Cannabis sativa L, sua resina e subprodutos fossem reclassificados dentro da
recomendação proibicionista que a categorizava como droga potencialmente perigosa e não
reconhecia seu uso medicinal, imposta pelas Convenções da ONU de 1961.(80-82)
Em de 2019, a 62ª Sessão da Comissão de Entorpecentes (CND) do UNODC (United
Nations Office on Drugs and Crime), com objetivo de fazer o balanço da implementação dos
compromissos assumidos para o combate ao problema mundial das drogas, apresentou, discutiu
e aprovou propostas, retirando a Cannabis e suas resinas da Lista IV passando-a para a Lista I,
indicando que a planta ficará sob controle rigoroso e determinado por legislação específica de
cada país, porém com reconhecimento do uso medicinal. Assim, preparações de Cannabis que
não tenham mais que 0,2 % de THC, não devem estar em qualquer Lista proibicionista, pois
não oferecem riscos à saúde e não geram dependência, dispensando qualquer controle
internacional.(80-82)
Meio ao contexto em 2019 e 2020, numa tentativa de reforçar as medidas proibicionistas
e de controle, houve uma nova investida do Executivo, trazendo como pauta comum “a droga
da maconha” junto aos Ministérios da Cidadania e da Mulher, da Família e dos Direitos
Humanos e Secretaria Nacional de Cuidados e Prevenção às Drogas, nas figuras de Osmar
Terra, Damares Alves e Quirino Cordeiro, realizando lives e fazendo mobilizações junto a
33

apoiadores bolsonaristas como a “Marcha das Famílias contra as Drogas”, apregoando que as
estratégias de flexibilização do controle da maconha são danosas e que provocarão o aumento
do narcotráfico, da violência, do encarceramento, de acidentes de trânsito, de transtornos
mentais, de hospitalizações psiquiátricas e intoxicações de crianças.(83-86)
Em 2021, novamente se valendo de discursos médicos investidos do “saber-poder”,
lançaram a ‘Cartilha da Maconha’, sob o apelativo e tendencioso título “Os riscos do uso da
maconha na família, na infância e na juventude” e também a Cartilha ‘Argumentos contra a
legalização da maconha’, um posicionamento contra o PL399 em tramitação.(83,87-89)
No âmbito internacional, perante a Comissão de Narcóticos da OMS, o Brasil adotou
posição contrária à redução do controle internacional sobre a maconha, sob a afirmativa de que
a flexibilização contribuiria para diminuição da percepção de risco sobre os graves malefícios
aos usuários, suas famílias e todo o conjunto social, afetando principalmente as camadas mais
vulneráveis da sociedade, aumentando a gravidade dos problemas enfrentados pela comunidade
internacional.(83)
Consonante, o posicionamento do atual governo não considera aceitável qualquer
legislação que permita uso “terapêutico” de maconha e alega que posturas diversas levarão ao
aumento da perda da confiança, separação conjugal, agressividade, de homicídios, suicídios,
distúrbios mentais, da criminalidade e da violência, decadência do trabalho, declínio da saúde,
já que a maconha é a droga que mais impõe o sistema de justiça criminal às pessoas.(83,87)
Neste sentido, a leitura sobre a legalização das drogas no Brasil é justificada sob a
racionalidade de que, na saúde pública, o acesso ao tratamento de qualidade para um dependente
é limitado e restrito, de modo que extrapola uma perspectiva puramente moral.(87,88)
Por outro lado, assimila o governo que a perspectiva daqueles que propõem a
legalização total ou intermediária do uso de drogas deve ser rechaçada, visto que o usuário além
de colocar em risco a própria integridade, assim o faz com aqueles que fazem parte do seu
círculo social, de forma que a proibição total do uso de drogas seria a melhor opção, pois não
causaria nenhum dano social.(88)
Segundo um estudo recentemente publicado pelo Centro de Estudos de Segurança e
Cidadania (CESeC), referente à análise orçamentária de 2017 dos estados de Rio de Janeiro e
São Paulo, a “Guerra às Drogas”, presente tanto na Justiça como na Saúde, custou no período
de um ano R$ 5,2 bilhões aos cofres públicos, analisando apenas o setor do judiciário (Polícia
Militar, Polícia Civil, Ministério Público, Defensoria Pública e Tribunal de Justiça), sem
acrescentar os gastos do orçamento da saúde. Numa analogia dentro do trágico enfrentamento
do governo brasileiro à pandemia, este montante seria suficiente para a compra de 108 milhões
34

de doses de vacinas, que imunizariam 54 milhões de brasileiros.(92)


Na saúde pública, o proibicionismo dificulta as ações preventivas, como orientar os
usuários de álcool e de outras drogas lícitas sobre o que consumir, quanto consumir, quando
consumir, o que não fazer durante o consumo, dentre outros, não diminui a disponibilidade das
drogas ilícitas, mas torna perigoso, é baseado em conhecimentos oriundos de experiências
malsucedidas de uma minoria de usuários, trazendo além das dificuldades do processo
de “largar o vício”, como problemas físicos, psicológicos, familiares, profissionais, de
adaptação social, na situação de drogas ilícitas, ainda há que lidar com extorsão policial,
legislação inadequada que confunde usuário com traficante, oferta de produtos adulterados de
qualidade duvidosa, exposição a contextos de marginalidade, o que dificulta ainda mais sua
recuperação.(91,92)
Assim, a ideologia proibicionista é uma política de Estado com um alto custo que reflete
as prioridades do governo, partindo de uma lógica punitivista, na qual há a deturpação do
conhecimento científico, as medidas repressivas não concentram a utilização dos serviços de
inteligência e estratégias dirigidas a identificar os megatraficantes (que não ficam nas favelas)
e suas redes de tráfico, não quebra as cadeias de comando dos grupos criminosos organizados,
reforça o racismo, é responsável pelo encarceramento em massa, alimenta a violência policial
cujo alvo é a “repressão do varejo”, tornando-se uma guerra às pessoas. (91,92)
Por outro lado, o “Problema da Maconha no Brasil”, que resulta de uma soma de
estereótipos sociais com vieses da interseccionalidade entre raça, classe e gênero, influenciada
pela política proibicionista mundial derivada dos EUA, levou à criação de poderosos grupos
interessados na perpetuação da “guerra às drogas”, tais como os especialistas em repressão, os
traficantes e setores sociopolíticos da saúde que aumentaram seu campo de interferência e ação
pelos lucros da indústria farmacêutica na substituição do uso de psicoativos ilícitos por
medicamentos que além de caros muitas vezes são mais danosos à saúde.(63)
Assim, vivemos a contradição legal-penal de proibir e condenar cultivadores brasileiros
à duras penas, enquanto destinamos lucros à cultivadores, multinacionais e empresários
estrangeiros dos quais importamos fármacos para o Brasil, pois, conforme afirma o
neurocientista Professor Sidarta Ribeiro, os países que deram origem à proibição já reverteram
tal processo, especialmente os Estados Unidos, transformando as oportunidades advindas da
maconha numa indústria bilionária.(93)
A Cannabis sativa L é uma cultura com múltiplos usos de suas fibras, sementes e flores,
de modo que sua legalização poderia trazer grande impacto econômico para os setores florestal,
agrícola e industrial, além do impacto social positivo na geração de renda de famílias com
35

fomento da economia solidária, colocando o país ao lado de grandes players do mercado


internacional, podendo tornar o Brasil líder no mercado mundial.(96)
No que tange o direito à saúde, segundo a Conitec (Comissão Nacional de Incorporação
de Tecnologias no Sistema Único de Saúde), a inclusão do canabidiol no SUS teria um custo
de R$ 80 milhões por ano para atender apenas 1.000 pacientes, um custo impraticável para um
sistema em progressivo desfinanciamento. Entretanto, conforme levantamento da empresa de
inteligência de mercado de Cannabis Kaya Mind, a legalização da Cannabis sativa L em todos
os níveis permitiria uma queda no preço dos medicamentos permitindo políticas de
redirecionamento dos impostos arrecadados para subsidiar estes custos, como foi possível
acompanhar a partir das experiências de regulamentação internacional, contribuindo para a
educação de jovens sobre o uso de drogas e tantas outras medidas importantes.(94)
Segundo este levantamento, é exponencial o crescimento do mercado da Cannabis no
cenário mundial e a regulamentação no Brasil de todas as suas formas de consumo poderia gerar
117 mil empregos e movimentar R$ 26,1 bilhões em quatro anos no país, com uma arrecadação
de R$ 8 bilhões em impostos.(94)

1.3 Avanços legislativos, judiciais e mobilização popular

Num cenário de tantos interesses em jogo e tantos jogos de interesses, para além dos
manifestos das Marchas da Maconha que datam mais de 20 anos, desde 2014 o Legislativo tem
sido impelido e impulsionado pela sociedade civil por meio da luta dos pacientes de uso
medicinal da Cannabis, pelos avanços das associações que se espalham pelo território nacional
e pela fundação da Federação das Associações de Cannabis Terapêutica (FACT), movimentos
sociais que amparados junto a profissionais da saúde, do direito, da agronomia, da veterinária,
da antropologia, dentre outros campos, embasados na ciência, consolidam a reivindicação de
uma nova política sobre drogas, emergente à regulamentação pela democratização do acesso à
CM, acesso à pesquisa e propostas de reparação social aos atingidos pela falaciosa “guerra às
drogas”.(95,96)
Estados e municípios iniciaram articulações voltadas ao amparo dos pacientes com a
propositura de diversos projetos de lei, ao tempo em que o Judiciário vem caso a caso
discutindo, reconhecendo e legitimando o direito destas pessoas à saúde, à vida e à dignidade
por meio de habeas corpus individual com autorização do cultivo doméstico e habeas corpus
coletivo para associações de pacientes, como é o caso da Cultive - Associação de Cannabis e
Saúde e da Associação Brasileira de Apoio Cannabis Esperança (ABRACE).(97-99)
36

Para além da conjuntura apresentada dos embates e divergências do Poder Legislativo


e do Poder Executivo em relação à atual política de drogas no Brasil, num enquadramento de
vital relevância para os pacientes, o fluxo crescente na liberação de cultivos de Cannabis para
fins medicinais pelo Poder Judiciário, indica uma importante quebra de paradigma do modelo
proibicionista, moralista, eugenista, racista e criminalizador vigente.(100)
Em decorrência, em maio de 2021 o deputado Luciano Ducci (PSB-PR) relator do PL
399, apresentou o texto substitutivo prevendo as condições para o cultivo da planta, desde a
finalidade medicinal até a industrial, seguindo regras bem rígidas como a autorização oficial
dos Ministérios da Agricultura e de Saúde quando a finalidade for medicinal, por meio de
aprovação da ANVISA. Segundo a proposta, a autorização para produção só poderá ser
solicitada por pessoa jurídica, deverá ter segurança específica e se submeter à fiscalização de
órgãos oficiais.(79)
O PL propõe significativas mudanças em como o país se relaciona com a planta e tem
sido amplamente debatido junto à sociedade civil e parlamentares, constituindo atualmente o
marco regulatório da Cannabis sativa L no Brasil.
Deste modo, apesar de limitado por não abordar o cultivo doméstico, traz algum alento
aos pacientes e familiares que necessitam da CM, pois sua implementação possibilitará a
disponibilização do medicamento nas farmácias vivas do SUS, trazendo resultados muito
positivos para a efetivação do direito à saúde e a democratização do acesso à população.(79)
Em 08 de junho de 2021, durante Reunião Deliberativa Extraordinária da Comissão
Especial, o Projeto de Lei nº 399/2015 foi aprovado com 17 votos favoráveis e 17 contrários à
proposta, acontecendo o desempate pelo voto do relator, Luciano Ducci (PSB-PR). Como a
matéria tem caráter conclusivo, caso não haja recurso impetrado para que seja votada em
plenário por 51 deputados (10%), ela seguirá para o Senado para votação.(101,102)
Ante o exposto, enquanto os projetos de lei tramitam e não esgotam aprovados no
Congresso, ações na esfera do judiciário para além dos habeas corpus também acontecem,
como o Recurso Extraordinário (RE) nº 635.659 que trata sobre a descriminalização da posse
de drogas e a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) nº 5.708 sobre o uso/plantio para fins
medicinais, terapêuticos e de importação de medicamentos à base de Cannabis, que aguardam
pronunciamento do Supremo Tribunal Federal (STF).(51,103)
Em relação à atuação do Superior Tribunal de Justiça (STJ), também há manifestação e
extrai-se dos julgados que, sobre a possibilidade de importação ou plantio de maconha para fins
medicinais, é necessária autorização do Poder Público ou supressão através de decisão judicial
para que a conduta seja lícita e que a competência para concessão de salvo conduto para o
37

cultivo doméstico do paciente é da Justiça Estadual.(68)


Nesta perspectiva, as decisões do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo inferem
que, diante da inexistência de salvo conduto e apreensão de quantidade significativa da planta
em várias formas, a mera alegação de plantio de Cannabis para uso medicinal não afasta a
ilicitude do fato, mantendo-se as consequências penais quando não comprovada situação de
saúde do acusado. Desta forma, não há culpabilidade na conduta de plantio, cultura e colheita
da Cannabis sativa L desde que haja autorização e comprovação da finalidade medicinal ou
científica, conforme determina a Lei.(68)
Em relação ao fornecimento de medicamentos à base de CBD, a partir do julgamento
do RE nº 855.178, o STF firmou a tese vinculante (Tema 793) no sentido de que a
responsabilidade pelos cuidados de saúde dos entes federativos é solidária, cabendo ao juiz
direcionar a obrigação de prestação àquele que detém a atribuição, segundo os critérios
constitucionais de descentralização e hierarquização, cabendo à União a responsabilidade de
fornecimento de medicamentos não registrados pela ANVISA.(68)
Mediante os fatos apresentados, ainda que haja no cenário nacional decisões
contraditórias, não equânimes e diversas, frente à inação dos Poderes Executivo e Legislativo,
vem ocorrendo uma legalização silenciosa da Cannabis sativa L por meio da atuação do Poder
Judiciário.(104)
Assim, as demandas no judiciário evidenciam o fato social que reflete a busca dos
pacientes pelo tratamento com canabinoides para diversas patologias que significativamente
vêm crescendo na população, seja numa abordagem compassiva, paliativa, como monoterapia
ou terapia adjunta, seja enquanto alternativa aos fármacos alopáticos e de alto custo.(105)
Por conseguinte, as relações entre o acesso dos pacientes ao tratamento e o exercício
profissional ético-legal dos médicos prescritores de CM estão intrinsecamente vinculados aos
direitos humanos fundamentais garantidos na CF/88, em especial o direito à saúde e o direito à
vida, cabendo ao Estado assegurá-los tanto na dimensão de continuidade da vida, como na
perspectiva da dignidade de existir concernente à qualidade de vida, reforçando ainda mais a
necessidade da regulamentação no país.(106)
Atualmente no Brasil existe mais de 40 associações não-governamentais de pacientes
dedicadas a apoiar o uso medicinal e plantio da Cannabis, tendo como princípios fundamentais
a promoção e a garantia dos direitos dos pacientes. Estas instituições oferecem aos pacientes
associados auxílio na busca por um prescritor, listas de prescritores disponíveis em âmbito
nacional (com o nome, área de atuação, especialidade, contato e região em que atua),
informações acerca de quais doenças a CM pode ajudar, de como iniciar o tratamento,
38

orientação jurídica para acesso ao medicamento e legalização de plantio, atuam ativamente para
a regulamentação da produção nacional da Cannabis para o uso medicinal, apoiam pesquisas,
divulgam conhecimento, tendo a finalidade de simplificar o acesso à informação por meio do
tríplice formado por associado, prescritor e informação sobre Cannabis, melhorando a relação
com o profissional habilitado e formando um consenso teórico sobre o tratamento com a CM e
mais profissionalismo, poupando o tempo do paciente.(107)
A luta dos movimentos sociais pelo acesso à maconha medicinal conseguiu mobilizar
importantes argumentos tanto sobre a verdade médica, como sobre a verdade jurídica,
instrumentalizados contra os discursos médicos e jurídicos anteriores pautados no racismo e
eugenia estruturais, promovendo uma reconfiguração em âmbito nacional sobre a “verdade
médico-legal”. Assim, foram abertos os caminhos para reconfigurações das práticas de poder
(contrapoder) a partir de novos saberes médicos-científicos e novas perspectivas jurídicas
contra o idealismo hegemônico proibicionista. Desta forma, a maconha paulatinamente deixa
de ser vista como droga que deve ser criminalizada e ganha status de remédio, conceito
construído a partir dos discursos médicos que atestam seu poder terapêutico, adentrando no
judiciário sob o prisma da luta pelos direitos humanos fundamentais, diante das dificuldades de
acesso dos pacientes ao tratamento, principalmente pelo alto custo.(108)

1.4 Médicos prescritores de CM: formação e cuidado ampliado

Neste ínterim, a sobressaliente postura dos médicos prescritores de CM é tida como uma
“contraconduta”4 ao prescrever o uso de uma planta proibida para o tratamento de doenças,
comportando-se como resistência frente ao poder disciplinar e à biopolítica5, à medida que
exprime um outro paradigma que não o sustentado ao longo da história e mantido pelo governo
federal. Esse fenômeno constitui um status relevante de “contrapoder” em relação à veracidade
vigente sobre o uso desta planta, pois propõe conflitos, controvérsias e disputas sobre o que é
de fato a verdade em torno de seus usos, trazendo uma proposta de remodelação de baixo para
cima nas lutas de transformação das estruturas de poder.(55,109)
Com o a entendimento e a clareza sobre como a biopolítica eugenista foi estruturada em
nosso país, torna-se possível compreender a magnitude da luta dos pacientes, familiares e

4
Contraconduta: definição focaultiana sobre a resistência contemporânea que designa reações, com
deslocamento da noção de poder/resistência para a compreensão do poder inserido nas relações como
ações ético-políticas, com origem na “atitude crítica”.
5
Biopolítica: agregamento entre os discursos médicos e jurídicos que torna a saúde um objeto de
intervenção crescente resultando em uma normalização dos hábitos da população.(110)
39

médicos prescritores que abraçaram a Medicina Canabinoide como resposta às questões de


saúde sobre as quais a Medicina Convencional não é suficiente, tampouco eficaz.
Subsequente, é visível que os estudos e pesquisas avançam, entretanto, não
acompanham a urgência social que a cada dia aumenta, demandando profissionais médicos
capacitados a fim de que os pacientes tenham acesso à CM e alcancem os melhores resultados
a partir do manejo desta terapêutica com baixa toxicidade e alta performance e versatilidade.
Consequentemente, os pacientes que necessitam fazer o uso da CM como alternativa de
tratamento para suas patologias, pressionam a classe médica para buscar conhecimentos
científicos relevantes sobre o tema. Neste sentido, o engajamento dos profissionais médicos,
vem aumentando progressivamente em relação à CM nas diversas especialidades, porém, a
graduação em medicina não contempla formação que proporcione o aprofundamento em
conhecimentos sobre o SEC e a terapia com canabinoides e os cursos de pós-graduação ainda
são limitados.(111)
Conforme dados disponibilizados pela ANVISA, o número de prescritores, que são
profissionais habilitados que prescrevem o uso da Cannabis como uma medida terapêutica, de
2015 a 2018 obteve uma alta de 183%, crescendo de 321 para 911 prescritores. Apesar do
crescente número de médicos prescritores, ainda é muito abaixo do esperado, se contrastado
com o número de pacientes com autorização para importar o CBD, sendo 4.236 até outubro de
2018.(112)
Listas de prescritores circulam na internet e há filas em consultórios dos médicos
prescritores de CM. Entretanto, muitos médicos ainda não prescrevem porque têm medo, não
sabem como é a metabolização, as implicações, assim como têm incertezas sobre as substâncias,
dificuldades de delimitar dosagens e insegurança sobre a legalidade da prática.(113)
Há milhares de pesquisas sendo realizadas em todo o mundo e inúmeros exemplos de
aplicação da CM, com evidências científicas de sucesso e robustez de resultados que podem ser
observados na qualidade de vida de milhares de pacientes que sofrem das mais variadas
doenças, comprovando o potencial dessa ferramenta terapêutica. No mesmo contexto,
as descobertas pela ciência sobre o SEC e sua importância para o bom funcionamento do corpo
humano fizeram surgir uma nova fronteira na medicina: a terapia canabinoide.(113)
Os principais entraves para a popularização do tratamento são, além do tabu, resistência
e estigma em torno do assunto, a inexistência de disciplinas na graduação e pós-graduação das
ciências médicas, fazendo com que ainda haja um baixo número de profissionais aptos a
prescrever produtos à base da planta. Por isso, diante das necessidades dos pacientes e das novas
perspectivas de fabricação de medicamentos derivados da Cannabis, é preciso oferecer
40

educação e formação para que os médicos possam prescrever essa ferramenta terapêutica com
segurança e eficácia, ampliando o acesso ao conhecimento a todas as especialidades e áreas de
atuação da medicina.(113)
Mesmo com nomes consagrados na comunidade científica brasileira, como do
pesquisador e Professor Elisaldo Carlini, referência mundial no assunto, hoje contamos com
mais de 500 mil médicos em atuação no Brasil, mas apenas dois mil deles efetivamente
prescrevem a CM. Então, para que seja possível democratizar o acesso à CM no vasto território
brasileiro, é necessário um trabalho forte na formação e qualificação dos profissionais da saúde,
impactando os médicos e pesquisadores com estudos laboratoriais e clínicos em relação ao
assunto, com informações baseadas em evidências. (114)
Professor Carlini já apontava para as dificuldades na realização de pesquisas no Brasil
na temática da Cannabis e do CBD, em razão da construção ideológica proibicionista dos
periódicos científicos nas décadas de 1950 e 1960, que reverberaram no judiciário. Entretanto,
revela a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, em Ribeirão Preto, como o
grande celeiro de pesquisas do país, com a criação em 2017 do Centro de Pesquisas em
canabinoides, resultado da parceria entre a faculdade e a indústria farmacêutica Prati-
Donaduzzi, fruto de um alinhamento que nasceu já com estudo clínico aprovado sobre o uso do
CBD em mais de 120 crianças e adolescentes com epilepsia refratária. (115)
Neste sentido, um estudo combinando diversos parâmetros bibliométricos realizou uma
análise de 1.167 artigos científicos publicados entre 1940 e 2019, considerados de relevância
científica pelas principais bases de dados, identificou que a USP é a instituição que mais publica
artigos sobre o canabidiol (CBD) no mundo. A Universidade tem mais que o dobro da segunda
instituição, o King’s College London, do Reino Unido, seguida em terceiro pela Universidade
de Jerusalém, em Israel e, em quarto, pelo Instituto Nacional de Abuso de Drogas dos Estados
Unidos. (116)
Ademais, é de extrema importância, para além da produção de conhecimento acerca do
assunto, identificar se os médicos que prescrevem medicamentos à base de CM estudam sobre
o assunto, onde buscam se atualizar, como estudam e produzem conteúdo dentro da academia,
se utilizam estudos já existentes para prescrever e informar seus pacientes sobre todos os
benefícios e efeitos adversos do uso da CM como uma alternativa terapêutica.(112)
Entende-se que existe um processo de geração de transmissão e recepção da informação
científica, e que o mapeamento dos produtores de saberes, dos usuários desta informação e os
meios pelos quais ocorre é fundamental para compreender o fenômeno, já que todo o processo
judicial e as tomadas de decisões dos juízes e gestores, devem partir da ideia da comunicação
41

científica.(112)
Tradicionalmente, a formação médica está fundamentada em conceitos em que se
estabelece um ciclo prioritariamente biológico e se desenvolve o apego à tecnologia para apoio
à clínica, com critérios de normalidade que pouco estimulam a interação com o paciente para a
definição da conduta, condição que negligencia a subjetividade da pessoa em prol do cuidado
físico do corpo.(117)
O movimento da epidemiologia clínica é um dos pilares da chamada medicina baseada
em evidências, com foco na medicina preventiva, auxiliando na sustentabilidade dos sistemas
de saúde, influenciando a implantação de políticas de saúde, públicas e privadas, embasadas no
processo de sistematicamente descobrir, avaliar e usar achados de investigações de modo que
as melhores referências disponíveis, distribuídas ao longo de uma escala de evidências, devem
ser consideradas no processo de escolha como base para decisões. Isso implica que, a prática
clínica apenas baseada na experiência profissional, tem maior probabilidade de levar a erros e
consequentemente, prejuízos à saúde dos indivíduos afetados por essa prática.(118)
O método da medicina centrada na pessoa traz no enfoque do atendimento médico a
partilha de responsabilidades, buscando maior autonomia do paciente frente ao seu tratamento
e sua saúde, diferente do modelo biomédico. Preconiza o conhecimento da pessoa de modo
holístico, entendendo o adoecimento não apenas no âmbito biológico, mas reconhecendo que
há um processo de experiência em que por diversas vezes, as causas não são específicas,
demandando a compreensão da integralidade da pessoa e seu meio, de modo que o médico,
além dos aspectos biológicos tenha um olhar para os sentimentos e subjetividades, no
significado da experiência do adoecimento. Por conseguinte, o médico em conjunto com o
paciente, faz o plano de diagnósticos, condutas, responsabilidades e metas, incorporando a
prevenção e a promoção de saúde, para melhoria de qualidade de vida, com redução de riscos
e complicações.(122)
A Clínica Ampliada e Compartilhada enfatiza o sujeito singular, sem desconsiderar a
doença e o contexto, abrindo novas possibilidades de cuidado. O objeto de interesse é o sujeito
singular adoecido ou com risco de adoecer, levando-se em consideração o contexto e a doença,
de forma que a história de vida do paciente assume relevância nos encontros clínicos
objetivando a busca pela autonomia do doente de modo que continue sua vida apesar da doença,
podendo escolher seu caminho, diante das opções científicas comprovadas estatisticamente.(119)
Neste ínterim, observa-se que o tratamento com a CM impõe ao médico uma relação
mais próxima do paciente, propondo uma mudança do método convencional da clínica para um
método contra hegemônico, trazendo para além do processo saúde-doença, o vínculo,
42

comprometimento e coparticipação.
Dentro dos modelos da educação médica, o movimento pela Reforma Sanitária
Brasileira, defendeu uma atenção à saúde de forma integral, como direito de todos e dever do
Estado, nascendo com o SUS uma iniciativa audaciosa ao tentar constituir um sistema voltado
à promoção da saúde, prevenção de agravos, tratamento e reabilitação. Logo, o modelo
biomédico flexneriano já não se enquadrava, sendo necessário o rompimento com o
aprendizado hospitalocêntrico, demandando parte da formação para a atenção básica e outros
cenários, permeados pela humanização da assistência, com uso de metodologias ativas de
ensino-aprendizagem, estabelecidos nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN).(120-122)
Entretanto, a escola médica ainda é concebida à imagem da cátedra, não permitindo
qualquer avanço organizacional à medida que mantém um modelo educacional médico-
assistencial de estrutura rígida, burocrática e centralizada, baseado numa concepção autoritária
e autocrática, de ideologia liberal e individualista, cuja estrutura acadêmica permanece
anacrônica, determinada por interesses industriais e mercantilistas que inviabilizam a
modernização do processo educativo, transformando o médico num elo na cadeia do consumo
de produtos e equipamentos, em especial os medicamentos.(123)
Assim, ainda que na maioria dos regimentos das escolas médicas brasileiras esteja
estabelecido o compromisso com a formação de um profissional técnico e eticamente preparado
para atender aos problemas prioritários da comunidade, o modelo educacional encontra-se
profundamente desvinculado da realidade socioeconômica e sanitária do país, distanciado da
realidade do quadro de saúde da população, sem embasamento conceitual e metodológico e
muito pouco ou nada tem feito em busca da correção destes desvios.(123)
Desta forma, o desenvolvimento de uma política científica e tecnológica comprometida
com os interesses maiores da sociedade, coloca para a universidade o desafio na definição e
aplicação de uma política de vigilância cuja organização curricular deve ser reformulada com
ênfase na aprendizagem, incorporando o desenvolvimento de atitudes e habilidades, de maneira
a superar o modelo acadêmico autoritário, por meio de um projeto educacional ajustado ao
projeto da sociedade, para atender as necessidades e exigências, guardando coerência com o
processo de transformação da cultura social, trazendo solução para os problemas médico-
sociais individuais e coletivos, com base no impacto social, na eficiência, na eficácia, na
equidade e na prevenção.(123)
Hoje, o desafio na formação do profissional médico comprometida com o projeto de
transformação colocado pela sociedade, envolve as mais diversas formas de tecnologias duras
e leve-duras, inclusive auxiliando a própria formação, sem perder de vista os aspectos de
43

integralidade, humanísticos e intersetoriais, inferindo ao profissional médico que seja agente


ativo do próprio saber, buscando atualizar-se de forma contínua e permanente a fim de
corresponder às necessidades da população.(124)
Neste sentido, a educação médica passa por um processo de tensões morais no qual
existe um confronto entre questões de formação para um modelo contra-hegemônico, cenário
em que os conhecimentos sobre o SEC e a CM surgem enquanto inovação tecnológica no
cuidado à saúde, acrescentando novos conceitos científicos que levantam diversas e complexas
questões éticas, pondo em xeque ações, posicionamentos e decisões anteriormente incorporados
por profissionais médicos, incidentes nas relações de poder, controle e regramento. Assim a
proposição desta medicina revestida por novos saberes baseados em descobertas científicas
questiona as “verdades” médicas positivistas construídas e impostas ao longo dos anos, seus
protocolos ou normatizações na busca de uma suposta normalidade.
Desta forma, o presente estudo propôs-se a pesquisar junto aos médicos prescritores de
Cannabis Medicinal qual o percurso desta construção de conhecimentos, quais as motivações,
concepções, vivências e atitudes na aplicação da terapêutica canabinoide, a relação com os
pacientes, seus desafios e perspectivas frente ao cenário regulatório brasileiro e às políticas
públicas de saúde.
A análise é dotada de relevância científica posto que trata de assunto ainda pouco
investigado, que remete à necessidade de construção de conhecimentos sistematizados e tem
impacto social, visto que o conhecimento, a compreensão e a adesão dos médicos prescritores
de Cannabis Medicinal podem ampliar o acesso à população que por consequência poderá se
beneficiar desta terapêutica, de modo responsável e baseado em evidências científicas.
Tem-se ainda a pretensão de, a partir dos resultados, trazer a proposta de estratégias e
conteúdo para a formação efetiva destes profissionais, podendo ser extensiva aos demais
profissionais da saúde.
44

2 JUSTIFICATIVA

A busca pelo tratamento com canabinoides para diversas patologias vem crescendo na
população, seja pela abordagem compassiva, paliativa, como monoterapia ou terapia adjunta,
seja enquanto alternativa aos fármacos alopáticos e de alto custo, pelos resultados positivos
evidenciados cientificamente.
O manejo desta terapêutica de baixa toxicidade, alta performance e versatilidade traz a
necessidade de profissionais médicos capacitados a fim de que os pacientes tenham acesso à
Cannabis Medicinal e alcancem os melhores resultados.
Evidências científicas vêm sendo amplamente produzidas comprovando seus
benefícios, e apesar da postura reticente ao uso medicinal desta planta recentemente assumida
por algumas entidades médicas, bem como as representações sociais estigmatizantes, vários
médicos amparados pelos resultados significativos vêm se dedicando e aprofundando seus
conhecimentos para a oferta da Cannabis Medicinal como possibilidade terapêutica aos seus
pacientes.
45

3 OBJETIVOS

3.1 Objetivo geral

Analisar o conhecimento, as concepções, as atitudes e as práticas de médicos


prescritores de Cannabis Medicinal a respeito desta terapêutica no cuidado em saúde.

3.2 Objetivos específicos

• Identificar médicos prescritores de Cannabis Medicinal e verificar quais foram as


motivações que os levaram à aplicação da terapêutica canabinoide;
• detectar quais as concepções dos médicos prescritores na opção pelo uso da Cannabis
Medicinal;
• compreender as vivências dos médicos prescritores junto aos seus pacientes e como
tem sido este processo, suas potencialidades e desafios;
• elaborar estratégias educativas para a capacitação de médicos e profissionais da saúde,
voltadas à aplicação da terapêutica com Cannabis Medicinal.
46

4 MÉTODO

Trata-se de pesquisa de abordagem qualitativa, por meio de entrevista semiestruturada


e análise interpretativa de discurso.
A abordagem qualitativa refere-se a estudos de significados, significações,
ressignificações, representações psíquicas, representações sociais, simbolizações, simbolismos,
percepções, pontos de vista, perspectivas, vivências, experiências de vida e analogias,
culminando num produto educacional.(125)
Nas ciências da saúde, a percepção e conceito sobre saúde e doença são constituídos a
partir de uma construção social, econômica e cultural, demandando uma forma de estudo que
revele os sentidos que orientam as ações, bem como a desconstrução da dicotomia entre a
objetividade e a subjetividade, exigindo a objetivação da subjetividade humana.(126)
Desta forma, acredita-se que a pesquisa qualitativa seja a mais apropriada à análise e
consolidação dos resultados esperados.

4.1 Local

A coleta de dados foi realizada ao longo de 2020, com entrevista online, via Skype, o
que permitiu que os participantes fossem de vários locais do país. Os contatos dos médicos
convidados foram disponibilizados pela SBEC uma associação científica, pessoa jurídica de
direito privado, sem fins lucrativos, formada por profissionais e acadêmicos de diversas áreas,
interessados na promoção, consolidação e expansão da pesquisa científica, formação
profissional e estudo das aplicações da Cannabis e seus derivados, tendo objetivo voltado à
promoção de atividades e finalidades de relevância pública e social.
A opção de aplicação do estudo junto à Sociedade, que congrega membros que se
apoiam entre si, derivou das limitações de participação dos médicos em razão das
regulamentações dos órgãos de controle nacionais, que acabam por manter estes profissionais
anônimos e expostos a possíveis complicadores legais, já que as normativas existentes do
próprio conselho de classe são deveras restritivas tanto com relação às especialidades
autorizadas a prescrever canabinoides, bem como quanto à indicação terapêutica, o que traz
temeridade aos médicos prescritores.

4.2 Participantes

Inicialmente, após explicado a intencionalidade e metodologia do estudo, foram


47

convidados todos os médicos que estavam no grupo de WhatsApp da Comissão Temática de


Prescrição, 36 médicos prescritores de CM (fonte: site da SBEC), de modo que na 1ª Etapa
houve 27 inscritos, entretanto, participaram efetivamente de todas as etapas 17 médicos
integrantes da SBEC.
O critério de inclusão foi o aceite e o uso da terapia canabinoide com pelo menos um
paciente, pelo tempo mínimo de seis meses. Este recorte mínimo de tempo foi proposto
considerando a janela terapêutica e o período de titulação da dose do tratamento com a CM que
é específico de cada paciente, de modo que o médico prescritor entrevistado de fato já tivesse
alguma experiência consistente no manejo de canabinoides, a fim de atender aos objetivos do
estudo.
Os critérios de exclusão na 1ª Etapa compreenderam os participantes que preencheram
o formulário, entretanto, eram estudantes de medicina não formados, profissionais não-médico
(dentista ou veterinário) ou médicos em formação que ainda não prescreviam a Cannabis
Medicinal.
A razão seguinte do não avanço de alguns participantes para a próxima etapa foi que,
apesar de apresentado aceite no formulário, não responderam ou retornaram os contatos
realizados posteriormente por WhatsApp, ligação e e-mail, inviabilizando que a 2ª Etapa por
meio de entrevista fosse realizada dentro do prazo da coleta dos dados.
Estas tentativas ocorreram no período de quatro meses, correspondente ao tempo limite
para a coleta, esgotando-se os meios de contatos descritos. Findando este prazo, definiu-se por
delimitar a amostra da pesquisa.

4.3 Procedimentos éticos

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa com Seres Humanos
(CEP).
Os dados pessoais dos participantes estarão sob sigilo e os resultados serão utilizados
em divulgação científica, sem a identificação destes.

4.4 Instrumento da pesquisa

O questionário do Formulário Google, trazia o levantamento de informações referentes


à caracterização do grupo tais como: nome completo e celular para contato, endereço de e-mail;
gênero; data nascimento; graduação em medicina (ano de conclusão); pós-graduação (área e
48

ano de conclusão); mestrado (área e ano de conclusão); doutorado (área e ano de conclusão);
município(s)/estado(s) em que atua; atua na Saúde: pública, privada, suplementar/convênios;
Atividades exercidas na atuação profissional: assistência, gestão, docência, pesquisa; Formação
específica sobre Cannabis Medicinal: (qual(is) curso(s), onde, como, quando); Aplica a
terapêutica canabinoide na: Atenção Primária, Atenção Secundária, Atenção Terciária ou
consultório; Nível de complexidade: Atenção Primária, Atenção Secundária, Atenção Terciária,
Consultório; Prescreve Extrato de Cannabis na Rede: Pública, Privada ou suplementar; Aceita
ser contatado para participar da próxima etapa da pesquisa. O roteiro de entrevistas
semiestruturado, foi elaborado visando atender aos objetivos propostos pela pesquisa. A
pesquisadora desenvolveu um instrumento norteador, com perguntas abertas, direcionado para
o que sabem, o que pensam e quais as vivências dos médicos prescritores em relação à temática
da Cannabis Medicinal (APÊNDICE B).
Este roteiro foi submetido a dois especialistas para apreciação e realizadas adequações
a partir de sugestões destes. Também foi realizado um estudo piloto, por meio da realização de
uma entrevista, baseada no roteiro, com dois médicos prescritores, para avaliar se de fato
atendia aos objetivos da pesquisa, sendo feitas as alterações necessárias para a versão final.
Para Manzini(127), o planejamento da coleta de informações, demanda a elaboração
cuidadosa de questões voltadas a atingir os objetivos pretendidos, o que exige a adequação da
sequência de perguntas, a elaboração de roteiros, a necessidade de adequação de roteiros por
meio de juízes, a realização de projeto piloto para, dentre outros aspectos, adequar o roteiro e a
linguagem.

4.5 Procedimentos de coleta de dados

Num primeiro momento, foi realizado contato telefônico com a Diretora Executiva da
instituição, explicando sobre a pesquisa, seus objetivos e o método que seria utilizado,
solicitando sua anuência em relação à parceria junto à instituição de pesquisa.
Ao aceite, a Diretora Executiva, durante uma reunião online com os membros,
apresentou a pesquisadora que pôde falar sobre a pesquisa, e solicitar a colaboração dos
mesmos.
A coleta de dados foi realizada no período de maio a agosto de 2020, com os médicos
membros da instituição, em duas etapas, a primeira por meio de formulário eletrônico
disponível na plataforma Google Forms e a segunda por entrevista online agendada.
Na 1ª Etapa, foi encaminhado por meio de grupo de WhatsApp, do qual participavam
49

estes prescritores, um breve texto explicativo com o link de acesso para o Formulário Google,
cujo questionário trazia o levantamento de dados básicos referentes à caracterização do grupo
a ser entrevistado.
Foi encaminhado via redes sociais, Whatsapp e para lista de e-mails disponibilizada pela
instituição um breve texto explicativo convidando os médicos para a pesquisa, por meio de link
do formulário eletrônico com questionário de caracterização dos participantes membros da
SBEC.
Este mesmo texto com o link foi encaminhado de tempo em tempo, no decorrer do
processo de coleta de dados (maio a agosto de 2020), bem como individualmente no contato
privado de WhatsApp ou via e-mail, para os médicos que sinalizaram disponibilidade para
participar da pesquisa durante a reunião, ou noutros momentos aleatórios.
A pesquisadora explicou todos os procedimentos da pesquisa, passando por meio do
aplicativo WhatsApp e por e-mail as orientações e um cronograma para agendamento das
entrevistas que ocorreram via Skype, em horários diversos flexíveis conforme a disponibilidade
dos participantes.
Os critérios iniciais que excluíram participantes decorreram de não terem iniciado ainda
a prescrição de Cannabis Medicinal, ainda serem estudantes de medicina não formados, ou por
serem prescritores, porém de categoria não médica (veterinário ou dentista).
Alguns, apesar de apresentado aceite no formulário, não responderam ou retornaram os
contatos realizados posteriormente por WhatsApp, ligação e e-mail, inviabilizando que a
entrevista fosse realizada dentro do prazo estabelecido para a coleta dos dados.
Todos receberam o TCLE, assinaram e encaminharam para a pesquisadora, via
WhatsApp ou por e-mail.
À medida que os participantes respondiam o formulário, as entrevistas foram marcadas,
seguindo a disponibilidade de tempo de cada um.
Fechado o agendamento, foram realizadas entrevistas semiestruturadas, a partir do
roteiro já adequado.
A entrevista semiestruturada também é conhecida por entrevista semiaberta ou
semidiretiva, é focada num assunto, com perguntas básicas e principais que são
complementadas por questões que surgem a partir das circunstâncias vivenciadas durante a
entrevista. (127)
Houve um total de 27 inscritos pelo formulário eletrônico. Destes, 17 participantes
avançaram para a etapa seguinte, a entrevista online e concluíram sua participação, compondo
a amostra final do estudo. As entrevistas foram gravadas na íntegra em áudio e tiveram duração
50

de 45 minutos a 120 minutos, com média de 70 minutos.

4.6 Análise de dados

Os áudios das entrevistas foram transcritos na íntegra, constituindo o corpus da


pesquisa. Os dados transcritos obtidos durante as entrevistas foram tratados, analisados,
interpretados e organizados, realizando o tratamento dos dados a partir da técnica de Análise
de Conteúdo, modalidade temática, baseado em Bardin.(128)
A ferramenta escolhida para análise prevê procedimentos sistemáticos e objetivos a fim
de descrever o conteúdo das mensagens, propiciando ao pesquisador a interpretação a partir da
compreensão de características, estruturas ou modelos que estão por trás dos fragmentos de
mensagens tomados em consideração, mirando contemplar as subjetividades individuais e
coletivas do estudo qualitativo proposto.(129)
Desta forma, a análise das informações ocorreu em três etapas principais: pré-análise,
exploração do material e tratamento dos resultados, inferência e interpretação.
A primeira etapa compreendida na pré-análise dos dados transcritos, é o momento em
que se organiza o material num primeiro contato, por meio de leitura flutuante objetivando o
processo de sistematização das ideias iniciais. Assim, foi procedida a leitura das entrevistas e
realizada a organização dos conteúdos, valendo-se da orientação pelas questões do roteiro para
elaboração das categorias e posterior formulação de hipóteses, objetivos e elaboração dos
indicadores para a interpretação, codificados em temas e subtemas.(128)
A segunda etapa corresponde à exploração do material e tratamento dos resultados com
a definição de categorias e subcategorias. Nesta fase, foi esgotada por leitura exaustiva a
totalidade das informações, trazendo nas amostras a representatividade, com organização dos
dados por temas e subtemas, obtidos por mesma técnica e de indivíduos semelhantes,
garantindo a homogeneidade. Os conteúdos foram adaptados aos objetivos da pesquisa e
classificados a partir de características comuns, mantendo a pertinência e exclusividade. Assim,
as subcategorias foram progressivamente estabelecidas à medida que eram mencionadas, de
forma que a repetição de subcategorias já citadas permitiu concluir pela saturação da
amostra.(128)
A terceira etapa implica o tratamento dos resultados, inferências e interpretação,
resultando na condensação e destaque nas informações para análise, finalizando na
interpretação inferencial orientada pelo instrumento de indução (roteiro de entrevistas), análise
reflexiva com investigação das causas (variáveis inferidas) e crítica a partir dos efeitos
51

(indicadores). Assim, a partir dos levantamentos, realizou-se a síntese dos agrupamentos


conforme as categorias da interpretação do material, percorrendo o processo para saturação
teórica, além da demonstração das subcategorias contempladas nos quadros dentro de cada
categoria, considerando a comunicação de cada um dos 17 entrevistados.
A interpretação dos dados reivindica uma revisitação atenta aos marcos teóricos
pertinentes à pergunta de pesquisa, buscando o que se esconde sob a aparente realidade, o que
querem dizer em profundidade, pois é a relação entre os dados obtidos e a fundamentação
teórica que dará sentido à interpretação.(128)
52

5 RESULTADOS

5.1 Caracterização dos participantes

Ao final, participaram do estudo 17 médicos prescritores de CM. O grupo de


participantes foi composto por 08 (oito) entrevistados que se identificaram como do sexo
feminino e 09 (nove) do sexo masculino, na grande maioria, adultos jovens.
A Tabela 1 ilustra as idades e sexos dos prescritores participantes da pesquisa.

Tabela 1 – Medidas descritivas de idade e sexo dos participantes da pesquisa

Variável Mínimo Máxima Média Desvio padrão

Grupo 26 anos 67 anos 41,1 anos 11,8


Sexo feminino 26 anos 67 anos 41,8 anos 13,2
Sexo masculino 29 anos 60 anos 52,1 anos 11,2
Fonte: Elaboração própria.

A média de idade das mulheres prescritoras de CM ficou aproximadamente em 42 anos,


enquanto que a média dos homens pontuou 52 anos. Tais informações nos levam a concluir
que, dentre o grupo de prescritores, temos um número maior de médicas mais jovens.
A Tabela 2 apresenta o tempo de graduação dos entrevistados participantes.

Tabela 2 – Medidas descritivas de tempo de graduação dos participantes da pesquisa

Variável Mínimo Máxima Média Desvio padrão

Grupo 01 ano 44 anos 15,4 anos 12,3

Sexo feminino 02 anos 44 anos 17,1 anos 13,8


Sexo masculino 01 ano 31 anos 12,2 anos 11,3
Fonte: Elaboração própria.

O resultado evidenciado informa que o tempo de graduação não foi um fator


determinante em relação a tornar-se um prescritor, pois há uma variação de médicos formados
há apenas 01 ano e outros formados já há 44 anos.
A Tabela 3 demonstra a variedade de especialidades que compõem a formação e o saber
dos médicos prescritores.
53

Tabela 3 – Participação dos médicos prescritores por especialidade

Especialidade Frequência Porcentagem

Psiquiatria 8 40%
Saúde Mental Coletiva 1 5%
Medicina da família 1 5%
Preceptoria e Medicina da família e comunidade 1 5%

Medicina Preventiva e Social 1 5%


Clínica Médica 1 5%
Cirurgia Geral Oncológica e Mastologia 1 5%

Pediatria 1 5%
Radiologia Pediátrica 1 5%
Anatomia Patológica 1 5%

Perícia Médica 1 5%
Medicina Aeroespacial 1 5%
Cannabis Medicinal 1 5%

Total 206 100%

Fonte: Elaboração própria.

Consonante aos dados apresentados, é notória a predominância da Psiquiatria dentre a


diversidade de áreas de formação dos participantes. Os resultados apontam também que, alguns
profissionais possuem formação em mais de uma especialidade médica.
Da totalidade dos participantes, 05 (cinco) possuem Mestrado, dentre eles 01 mulher e
04 homens e 03 (três) possuem Doutorado, dentre eles 01 mulher e 03 homens.
A Tabela 4 apresenta em quais modelos de saúde os participantes prescrevem a CM,
caracterizados como Saúde Pública, Saúde Privada e Saúde Suplementar.

6
O número total de especialidades indica que há situações em que o profissional possui mais de uma
especialização.
54

Tabela 4 – Participação dos médicos prescritores por modelo de Saúde

Modelo de Saúde Frequência Porcentagem

Pública 13 39,4%
Privada 15 45,5%
Suplementar 05 15,1%
Total 337 100%
Fonte: Elaboração própria.

Em relação aos atendimentos, percebe-se que a maioria compõe a assistência particular


ou convênio e este fato, conforme relatos durante as entrevistas, possivelmente está ligado à
falta de respaldo do Conselho de Classe, mantendo o profissional médico prescritor de CM
continuamente exposto a riscos de implicação legal no exercício da profissão, já que pode ter
suas condutas questionadas a qualquer tempo.(28)
Nos atendimentos descritos pelos prescritores, o modelo de Saúde Pública não faz
referência específica ao atendimento em serviços de saúde do SUS, mas na grande maioria
refere-se às consultas pro bono realizadas seja no próprio consultório ou em mutirões de
projetos e nas associações, destinadas aos pacientes que atendem critérios de hipossuficiência
e/ou vulnerabilidade social.
Outra característica identificada durante as entrevistas é que muitos dos participantes
estão atendendo no formato de telemedicina, em razão da pandemia, o que permite assistir
pacientes de todas as localidades do país, bem como de outros países.
A Tabela 5 indica em quais estados e regiões da federação estes médicos participantes
da pesquisa prescrevem a CM em suas práticas clínicas.

Tabela 5 – Participação dos médicos prescritores por Região do Brasil

Região Localidade Porcentagem


Continua
1 município do estado de Roraima e 1 município
Região Norte
do estado de Amazonas 9,5%
-
Região Nordeste -

7
O total se refere ao número de respostas concedidas pelos participantes, pois podiam indicar mais de
uma resposta.
55

Região Localidade Porcentagem

Conclusão
Região Centro-
- -
Oeste
8 municípios do estado de São Paulo/SP; 8
Sudeste municípios do estado de Minas Gerais; 1 81,0%
município do estado de Rio de Janeiro;
1 município do estado de Paraná e 1 município do
Região Sul 9,5%
estado de Santa Catarina
Total 218 100%
Fonte: Elaboração própria.

Conforme dados apresentados, mais de 80% destes profissionais atuam na Região


Sudeste e consonante às entrevistas, concentram-se em maior número nas capitais.
A Tabela 6 indica em quais níveis de serviços de saúde os médicos prescrevem a CM.

Tabela 6 – Níveis de complexidade em que os participantes prescrevem a CM

Nível de Complexidade Frequência Porcentagem

Atenção Primária 11 28,2%

Atenção Secundária 9 23,1%


Atenção Terciária 3 07,7%
Consultório 16 41,0%

Total 399 100%


Fonte: Elaboração própria.

Os resultados expostos indicam que a CM é preponderantemente prescrita em nível


ambulatorial, nos consultórios médicos.
Esta constatação traz para a reflexão quanto a possibilidade de prescrição e aplicação
desta terapêutica no âmbito hospitalar, tanto em relação à regulamentação pelas instâncias de
vigilância em saúde, como nos aspectos de direitos do paciente em tratamento com a CM.
A Tabela 7 apresenta a distribuição dos atendimentos dos médicos prescritores nas
diferentes redes de assistência à saúde.

8
O número total indica que alguns profissionais trabalham em mais de um município.
9
O número total de respostas indica que os entrevistados prescrevem nos vários níveis de complexidade
em saúde.
56

Tabela 7 – Redes de Saúde em que os médicos prescrevem a CM

Rede Assistencial Frequência Porcentagem

Consultório - Rede Privada 16 69,6%


Saúde suplementar e convênios 1 4,3%
Saúde Pública 5 21,8%
Atenção Primária 1 4,3%

Total 2310 100%


Fonte: Elaboração própria.

Quase que a totalidade dos participantes prescreve a Cannabis Medicinal no espaço de


seu consultório particular, ao passo que apenas seis participantes prescrevem na Rede do SUS.
O fato chama a atenção, pois evidencia um cenário de acesso restrito do tratamento, já
que quem não pode pagar ou não possui convênio médico fica à margem deste instrumento
terapêutico.
Neste sentido, durante as entrevistas os médicos relataram e reconheceram esta situação,
apontando que dentro de seus limites e limitações realizam também atendimentos sociais.
A Tabela 8 apresenta quais as atividades exercidas pelos participantes, distribuídas entre
assistência, docência, pesquisa e gestão.

Tabela 8 – Atividades exercidas na atuação profissional dos participantes

Modelo de Saúde Frequência Porcentagem

Assistência 17 41,5%

Docência 08 19,5%
Pesquisa 09 22,0%
Gestão 07 17,0%
Total 4111 100%
Fonte: Elaboração própria.

Os resultados esclarecem que uma parcela significativa destes médicos atua na docência

10
O número total de respostas demonstra que os médicos participantes prescrevem a CM nas diversas
redes.
11
O número total de respostas indica que estes médicos exercem mais de um tipo de atividade na prática
profissional.
57

e pesquisa, o que demonstra estarem inseridos em atividades de ensino e aprendizagem no


sentido de ser comum ainda a CM no âmbito de pesquisas e estas serem desenvolvidas em
universidades.
O Quadro 1 apresenta um detalhamento de cada participante, com dados sobre as
respectivas formações e práticas profissionais.

Quadro 1 – Caracterização dos participantes

Participante Caracterização

Continua

Homem, 41 anos, graduado há 16 anos, Psiquiatra há 14 anos, atende apenas


P1 num município do estado de São Paulo, na saúde privada. Exerce atividades
de assistência e pesquisa. Fez vários cursos sobre Cannabis por iniciativa
própria. Prescreve CM só no consultório, na rede privada de saúde.
Mulher, 36 anos, graduada há 11 anos, Psiquiatra há 8 anos, atende apenas
em um município do estado de São Paulo, na saúde privada. Atua na saúde
P2 pública e privada, em atividades de assistência e gestão. Tem formação em
CM por meio de 2 cursos e diversas aulas. Prescreve apenas no consultório,
na rede privada de saúde.
Homem, 32 anos, graduado há 4 anos, realizando especialização em
Anatomia Patológica, atende apenas num município do estado de São Paulo,
na saúde pública e privada, na assistência. Fez cursos de formação sobre
P3
Cannabis por meio da SBEC e curso de Redução de Danos pela Cultive.
Prescreve CM na Atenção Secundária, nas complexidades primária,
secundária e terciária, na rede privada de saúde.
Mulher, 26 anos, graduada há 2 anos, realizando especialização em CM.
Atende apenas num município do estado de São Paulo, na saúde pública,
P4
privada e suplementar/convênios. Prescreve apenas no consultório, na rede
privada de saúde.
Homem, 30 anos, graduado há 5 anos, clínico geral. Atende apenas num
município do estado de São Paulo, na saúde pública e privada. Exerce
P5 atividades na assistência, docência e gestão. Fez curso de formação sobre
Cannabis na USP em 2019. Prescreve CM no consultório nos níveis
primário e, na rede pública e privada de saúde.

Mulher, 31 anos, graduada há 7 anos, realizou especialização em Psiquiatria


e Medicina da Família há 4 anos. Atende apenas num município do estado
P6 de Rio de Janeiro, na saúde privada e suplementar/convênios. Realiza
atividades na assistência, docência e gestão. Prescreve apenas no
consultório, na rede privada e suplementar de saúde.
58

Participante Caracterização

Continuação

Homem, 57 anos, graduado há 32 anos, especializado em Cirurgia Geral


Oncológica e Mastologia há 29 anos, Mestre em Saúde da Mulher. Atende
P7 num município do estado de Minas gerais. Atua na saúde pública, privada e
suplementar. Realiza atividades na assistência, docência, pesquisa e gestão.
É autodidata em sua formação em CM e fez curso da Green Flower.
Prescreve na atenção primária, secundária e terciária, no consultório e por
telemedicina, na rede pública e privada.
Mulher, 67 anos, graduada há 44 anos, realizou especialização em Saúde
Mental Coletiva, Mestre em Saúde Coletiva. Atende num município do
estado de São Paulo, na saúde privada. Realiza atividades na assistência,
P8
docência, pesquisa e gestão. Realizou formação em CM pelo II curso de CM
da UNIFESP. Prescreve apenas no consultório, em nível primário, na rede
privada de saúde.
Homem, 35 anos, graduado há 5 anos, especializado em Preceptoria e
Medicina da Família e Comunidade há 2 anos, Mestrando em Saúde
Coletiva. Atende num município do estado de Minas Gerais, na saúde
P9 pública. Exerce atividades na assistência, docência e pesquisa. É autodidata
em sua formação sobre Cannabis Medicinal e curso no Green Flower
(EUA). Prescreve CM no consultório nos níveis primário, secundário e
terciário, na rede pública e privada de saúde.
Mulher, 52 anos, graduada há 27 anos, realizou residência médica. Atende
em três municípios do estado de Minas Gerais e num município do estado
P10 de São Paulo. Realiza atividades na assistência, na saúde pública e privada.
Não realizou formação específica em CM. Prescreve apenas no consultório,
em nível primário, na rede privada de saúde.
Homem, 60 anos, graduado há 31 anos, especializado em Medicina
Preventiva e Social há 29 anos, Mestre em Engenharia Biomédica, Doutor
em Planejamento e Gestão de Sistemas de Saúde. Atende num município do
P11 estado de Minas Gerais, na saúde pública. Exerce atividades na assistência,
docência, pesquisa e extensão e gestão. É autodidata em sua formação sobre
Cannabis Medicinal, realizou cursos e supervisão clínica com Dr Paulo
Fleury. Prescreve CM na Atenção Primária, na rede pública de saúde.
Mulher, 41 anos, graduada há 16 anos, especializada em Psiquiatria há 8
anos. Atende num município do estado de Santa Catarina, na saúde pública
P12 e privada. Realiza atividades na assistência. Realizou formação específica
em CM por meio do curso da UNIFESP/SBEC. Prescreve no consultório,
em nível primário e secundário, na rede pública e privada de saúde.
59

Participante Caracterização

Conclusão

Homem, 38 anos, graduado há 14 anos, especializado em Radiologia


Pediátrica, Mestre e Doutor em Radiologia. Atende em dois municípios do
P13 estado de Minas Gerais, na saúde pública, privada e suplementar. Exerce
atividades na assistência, docência, pesquisa e gestão. É autodidata em sua
formação sobre Cannabis Medicinal, com pesquisa de artigos e sites de
Universidades da Europa/US. Prescreve CM na Atenção Primária,
secundária e terciária, no consultório, na rede pública e privada de saúde.
Homem, 29 anos, graduado há 3 anos, especializado em Pediatria. Atende
num município do estado de Paraná, no consultório, na saúde privada e
suplementar/convênio. Exerce atividades na assistência e pesquisa. Sua
P14
formação sobre CM foi por meio de diversos cursos e iniciará uma pós-
graduação específica em CM. Prescreve em seu consultório, pela rede
privada de saúde.
Mulher, 34 anos, graduada há 7 anos, especializada em Psiquiatria há 4 anos.
Atende num município do estado de São Paulo, no consultório, na saúde
P15
privada e pública. Realizou curso em Sistema Endocanabinoide em 2020.
Prescreve CM no consultório, na rede privada de saúde.
Mulher, 47 anos, graduada há 23 anos, especializou-se em Medicina
Aeroespacial em 1999 e Psiquiatria em 2008. Iniciou no ano de 2015
Doutorado em Ciências da Linguagem – Análise do Discurso. Atende num
município do estado de São Paulo na saúde privada e na Psiquiatria Forense
P16
em perícias psiquiátricas. Exerce atividades em assistência e pesquisa. É
autodidata em sua formação em CM realizando cursos livres, cursos
promovidos por laboratórios, artigos e conteúdo de sites. Prescreve em seu
consultório, na rede privada de saúde.
Homem, 43 anos, graduado há 19 anos, especializado em Psiquiatria há 6
anos. Atende em municípios dos estados de Roraima e Amazonas, na saúde
pública e privada. Realiza atividades na assistência, docência, pesquisa,
P17
perícias cíveis, criminais e administrativas. Realizou formação em CM pela
Plataforma de Educação Médica Continuada HEALER (Cannatech e
Cannmed). Prescreve CM pelo consultório na rede privada de saúde.
Fonte: Elaboração própria.

Em relação à formação específica voltada à prescrição de CM, conforme observado no


Quadro 1, 11 (64,7%) participantes responderam que haviam feito algum curso e um
entrevistado está realizando pós-graduação. Alguns se denominam autodidatas, pois estão
sempre em busca de aprimoramento do conhecimento, estudando tudo o que é publicado dentro
desta temática, não necessariamente por meio de curso instituído formalmente. Neste sentido,
6 (35,2%) participantes disseram não ter um curso de formação específica.
60

Dentre as ferramentas de formação, estudo e aperfeiçoamento, os mais citados foram o


Curso de prescrição da SBEC, experiência clínica orientada por profissionais experientes,
Curso de CM da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), Curso de prescrição da
Universidade de São Paulo (USP) sobre Sistema Endocanabinoide, Curso de Redução de Danos
(RD); também sendo citados a Plataforma de Educação Médica Continuada HEALER
(Cannatec; Cannamed); Curso Green Flower; Cursos livres, Cursos promovidos por
laboratórios, artigos científicos e conteúdo de sites (faculdades, associações etc.).
5.2 Resultados das entrevistas com médicos prescritores

A seguir são apresentados os resultados referentes aos relatos dos médicos prescritores
entrevistados, organizados em Temas, Subtemas, Categorias e Subcategorias.

Quadro 2 – Resultados das entrevistas com médicos prescritores de Cannabis Medicinal

TEMAS SUBTEMAS CATEGORIAS SUBCATEGORIAS

Continua
1. Perspectivas sociais e 1. Preconceito
contextos proibicionistas 2. Conservadorismo e religião
3. Proibicionismo e legalização

1. Primeiros contatos e começo do uso


1. Cenário de inserção 2. Uso medicinal da
medicinal da Cannabis
do prescritor de Cannabis
TEMA 1: Percurso 2. Lacunas de conhecimentos e desafios
dos médicos Cannabis
prescritores de
Cannabis Medicinal 1. Seus familiares
2. Sociedade
3. Atores sociais relevantes 3. Colegas de profissão
4. Conselhos de classe
5. Pacientes e seus familiares

2. Decisão profissional: 1. Motivações


1. Tornando-se um prescritor
repercussões e 2. Concepções sobre assumir-se como
de Cannabis
implicações prescritor

1. Sistema Endocanabinoide e Manejo da


TEMA 2: Cannabis Medicinal
Prescrevendo a 1. Cannabis na Atenção 2. Saúde da Criança e Adolescente
1. Prática Clínica
Cannabis Medicinal Integral à Saúde 3. Saúde do Adulto
4. Saúde da Mulher
5. Saúde do Idoso
61

Conclusão

1. Efeitos colaterais
2. Cuidados
2. Interações medicamentosas
3. Riscos e contraindicações

2. Vivências e 1. Autoprescrição e 1. Experiência própria como paciente


experiências próximas prescrição para familiares 2. Vivências com entes familiares

1. Tabus e Preconceito
1. Fatores negativos 2. Insuficiência de Prescritores
incidentes 3. Custo do Tratamento
1. Dificuldades de 4. Falta de Regulamentação
acesso ao Tratamento

TEMA 3: 1. Luta dos pacientes e famílias


2. Fatores positivos
Percepções dos 2. Atuação dos médicos prescritores
incidentes
prescritores sobre o 3. Caminhos para melhorar o acesso
acesso à Cannabis
Medicinal
1. Prescrição de Cannabis no SUS
1. Políticas Públicas de
2. Fomento de Políticas Públicas
2. Políticas Públicas e Saúde
3. Monetização e Farmacêuticas
Perspectivas
Socioeconômicas
2. Aspectos 1. Saúde, Economia e impacto social
socioeconômicos 2. Produtos disponíveis

1. Percursos do 1. Iniciativas dos prescritores na


Conhecimento aprendizagem
TEMA 4: Formação
dos médicos 1. Determinantes na
1. Cannabis Medicinal nas Instituições
prescritores de Formação Médica
Formadoras
Cannabis Medicinal 2. Cannabis Medicinal na
2. Inserção na Grade Curricular
Educação Médica
3. Medicina Canabinoide: ciência e
pesquisa

Fonte: Elaboração própria.

5.2.1 Tema 1: Percurso dos médicos prescritores de Cannabis Medicinal

Nesse tema foram abordados os relatos dos entrevistados sobre suas vivências,
permeadas por diversos fatores relacionados ao percurso trilhado até se tornarem médicos
prescritores de CM.
Assim, foram organizados os subtemas ‘Cenário de inserção do prescritor de Cannabis’
e ‘Decisão profissional: repercussões e implicações’, delineados em categorias e suas
respectivas subcategorias, conforme Quadro 3.
62

Quadro 3 – Percurso dos médicos prescritores de Cannabis Medicinal

SUBTEMAS CATEGORIAS SUBCATEGORIAS

1. Perspectivas 1. Preconceito
sociais e contextos 2. Conservadorismo e religião
proibicionistas 3. Proibicionismo e legalização

1. Primeiros contatos e começo do


2. Uso medicinal da uso medicinal da Cannabis
1. Cenário de inserção do Cannabis 2. Lacunas de conhecimentos e
prescritor de Cannabis desafios

1. Seus familiares
2. Sociedade
3. Atores sociais
3. Colegas de profissão
relevantes
4. Conselhos de classe
5. Pacientes e seus familiares

1. Tornando-se um 1. Motivações
2. Decisão profissional:
prescritor de 2. Concepções sobre assumir-se
repercussões e implicações
Cannabis como prescritor

Fonte: Elaboração própria.

5.2.1.1 Subtema: Cenário de inserção do prescritor de Cannabis

Contextualizando sobre a conjuntura que permeia o campo de atuação dos médicos


prescritores, os participantes descreveram sobre as perspectivas sociais, como aconteceu a
aproximação inicial com o uso medicinal da Cannabis e os atores sociais relevantes que
compõem as relações e conjecturas.

5.2.1.1.1 Categoria: Perspectivas sociais e contextos proibicionistas

Nesta categoria, encontram-se as subcategorias: Preconceito, Conservadorismo e


religião e Proibicionismo e legalização.

5.2.1.1.1.1 Preconceito

Em meio às vivências e contextos nos quais estão inseridos, os entrevistados relataram


que a abordagem sobre o uso medicinal da Cannabis e a Medicina Tradicional está num cenário
difícil e complicado, pois a grande maioria dos médicos ainda desconhece sobre o SEC e reage
com preconceito, trazendo o assunto no bojo de concepções precárias como se fosse uma
63

panaceia ou mesmo algo do curandeirismo, sem espaço para validação científica enquanto
opção terapêutica. Segundo eles, esta é a tendência quando não se sabe como age uma
substância, algo que só é passível de romper com conhecimentos.
Os participantes pontuaram que permeia a classe médica o mesmo senso comum
estrutural da nossa sociedade, cujo direcionamento acadêmico e construto retórico caminha
disseminando discursos limitantes de que a Cannabis é uma droga, com muitos efeitos
colaterais, que causa dependência, que gera prejuízo de memória, é ruim, não se pode usar
porque vai viciar e fazer mal, sem ofertar acesso aos conhecimentos científicos sobre o SEC e
o uso medicinal, tampouco entender as suas relações com os demais sistemas do nosso corpo,
ou mesmo conceder abertura para discussões a respeito, deixando o aluno à margem da ciência.
Desta forma, descreveram que por vezes o preconceito é acentuado a tal ponto, que
impossibilita o profissional de se quer ouvir sobre o assunto, uma objeção ligada com o desejo
de não saber mesmo, de não ir atrás, não conhecer, de prontamente se negar e rejeitar, dizer
não, inviabilizando qualquer chance de se quer pensar sobre ofertar a CM dentro de sua prática
clínica.
O entrevistado P15 contou que é difícil dizer que os colegas têm essa postura, mas é a
realidade, lamentou.
Admitiram que a percepção desta hostilidade e aversão resulta da simples constatação
de que há tanta coisa sendo divulgada sobre a CM, como seus resultados benéficos para as
crianças, segurança e eficácia que, se o médico não disponibiliza nem o mínimo de tempo para
pesquisar, ler a respeito e verificar se há ou não fundamento científico, é difícil não pensar que
tal desmotivação não decorra do preconceito.
Neste sentido, ressaltaram que muitos colegas prescrevem medicamentos potentes, com
efeitos colaterais importantes e que podem gerar consequências graves para o paciente, como
opioides e outros medicamentos, de modo que não veem outro motivo senão o preconceito e
falta de conhecimento para justificar essa postura de refuta, rejeição, desprezo e repulsa à
prescrição da Cannabis, o que para eles claramente está ligado à planta.
Por conseguinte, acrescentaram que, não obstante, prevalece uma cisão completa
conceitual, visto que associam a maconha fumada com o CBD ou mesmo que o CBD é remédio
e maconha é outra coisa, de modo que não é factível ainda a clareza de que CBD é remédio e
não deixa de ser maconha.
Assim, inferiram a compreensão sobre o papel do médico prescritor assumindo um
posicionamento proativo, publicando estudos, fazendo lives, no intuito de desmistificar o
assunto, salientando sobre a relevância do trabalho de quebrar o preconceito, fazendo com que
64

as pessoas revejam suas ideias e ideologias, propondo um novo paradigma.

5.2.1.1.1.2 Conservadorismo e religião

No âmbito da religião, os prescritores apontaram que os povos indígenas há milênios


fazem o uso ritualístico da Cannabis, sabem manejar e alinham sua aplicação à concepção
espiritual, utilizando-a tradicionalmente nos rituais, enaltecendo sobre a riqueza e beleza destes
conhecimentos e saberes. Neste sentido, descreveram que os povos originários, xamãs e índios
curandeiros que trabalham com ervas, dizem que as plantas são nossas professoras, nossos
mestres, pois nos ensinam, esclarecendo que o sentido figurado do qual falam reflete as muitas
descobertas na ciência que aconteceram a partir das plantas.
Noutra perspectiva, os participantes esclareceram que há no meio médico a interferência
do dogma religioso que traz para a moralidade o senso de que maconha faz mal e é ruim como
uma verdade, implicando na conduta dos médicos de se posicionarem pela não prescrição desta
planta.
O médico P1 enfatizou que, dentro da religião a maconha é vista como uma droga que
faz mal e seria um erro seu uso como remédio.
Desta forma, expuseram a percepção de que há pacientes e familiares mais
conservadores que mantêm rejeição com relação ao uso da Cannabis, uma grande maioria dos
professores de medicina que vivenciaram o período da ditadura militar e da criminalização da
Cannabis, bem como uma parte da população médica que, mesmo entendendo a cientificidade
do tratamento, nunca se tornará prescritora tanto por questões ligadas ao conservadorismo,
como a indisponibilidade pessoal para mudanças.

5.2.1.1.1.3 Proibicionismo e legalização

Conforme relataram os prescritores, um aspecto que tem privado o conhecimento dos


médicos no processo formativo é o proibicionismo e os seus determinantes que, ao longo do
tempo, vem vedando, tolhendo a consciência das pessoas e deixando os usos da Cannabis num
campo marginal, do inconsciente, da maldade e da demonização.
Consequentemente, segundo os entrevistados, esta situação que a rigor nega a própria
ciência, assusta muitos médicos que, desprovidos de conhecimentos já que por não ser
legalizado nem estágio é possível realizar, ficam sem saber como prescrever, com medo de ter
algum problema com a polícia ou com o próprio conselho de classe, ainda que seja irrefutável
65

o fato de que a prescrição é um ato médico.


Neste ínterim, esclareceram que o contexto de proibição colocou a maconha na mesma
cesta do ópio dentro do projeto político mundial da Guerra às drogas, entretanto, ressaltaram
que os meandros do capitalismo internacional têm configurado um novo cenário para a
Cannabis, um mercado de interesse de grandes indústrias e farmacêuticas, fato que tem flertado
com o Brasil, mesmo frente à inércia persistente do legislativo.
Destarte, salientaram sobre a urgência de ampliação da ciência, da pesquisa, bem como
da divulgação das evidências e constatações, reconhecendo que a situação em nosso país requer
a realização de campanhas de conscientização, pois tudo passa pela falta de legalização, um
aspecto desfavorável que carece solução, regulamentando o plantio, cultivo e produção de
remédios e medicamentos, introduzindo a terapêutica no SUS para o amplo acesso da
população.

5.2.1.1.2 Categoria: Uso medicinal da Cannabis

Nesta categoria, encontram-se as subcategorias: Primeiros contatos e começo do uso


medicinal da Cannabis e Lacunas de conhecimentos e desafios.

5.2.1.1.2.1 Primeiros contatos e começo do uso medicinal da Cannabis

Os participantes descreveram suas trajetórias até tornarem-se prescritores de Cannabis,


contando sobre como tiveram contatos iniciais com a temática, cada qual com seus percursos
de vida.
Como resultante, vários médicos pontuaram que ouviram falar algo a respeito durante o
período da faculdade, no estágio de neurologia ou psiquiatria ou mesmo na residência,
explicando que eram informações superficiais que citavam a Cannabis como uma nova
possibilidade para o tratamento de epilepsia refratária em crianças, ou acesso a informações por
iniciativas próprias lendo publicações científicas dos EUA e Canadá, o livro ‘Maconha, Cérebro
e Saúde’, percebendo que era algo que estava surgindo e poderia fazer a diferença, ao tempo
em que era bem frustrante porque os alunos não aprendiam absolutamente nada sobre esta opção
terapêutica no ambiente formador e na psiquiatria era completamente proscrito.
Outros elencaram sobre experiências pessoais com o uso medicinal da Cannabis no
tratamento de crise asmática na infância por meio da fitoterapia tradicional, uso para dor crônica
que datava mais de 40 anos sem cessar e com resultado positivo, como adjuvante no tratamento
de câncer, tratamento de amigos e familiares, ou mesmo contatos inicias por meio de cursos
66

indicados por pessoas do círculo pessoal de convívio.


Neste sentido, a médica P8 contou que havia usado CBD para dor crônica, mas não
conseguiu os resultados que desejava. Entretanto enfatizou que, ao usar cinco gotas de THC,
em meia hora a dor desapareceu, um sofrimento que datava 40 anos, exclamou.
Alguns citaram ter o primeiro contato por meio do Documentário ‘Ilegal’, de sites e
mídias sociais de associações, palestras e eventos online, vídeos com relatos das mães e de
pacientes que realizam o tratamento, por informações em grupos de Whatsapp, contato com
ONG sobre Autismo e projetos em comunidades.
Os entrevistados também falaram deste start inicial que aconteceu por demanda de
pacientes refratários que os abordaram sobre a terapêutica canabinoide como uma opção, casos
cujas tentativas da medicina convencional não trouxeram respostas e também descreveram a
participação em mutirões de atendimento de associações, podendo constatar na prática os
resultados do tratamento.
A partir do interesse despertado pelo assunto por tais contatos, os médicos
desencadearam uma sequência de ações, pesquisando por conta própria, estudando, realizando
formação e aprofundamento para entender sobre o SEC e sobre o tratamento e manejo da CM,
participaram de eventos, lives e cursos, adquirindo conhecimentos com médicos que já
prescreviam, para enfim utilizar a terapêutica na prática prescrevendo para seus pacientes.

5.2.1.1.2.2 Lacunas de conhecimentos e desafios

Um aspecto importante no percurso do médico prescritor de CM trata dos saberes que


domina para que sua conduta seja assertiva diante das necessidades dos pacientes e do crivo da
sociedade. Neste sentido, os participantes trouxeram relatos que propunham a intersecção entre
os conhecimentos existentes disponíveis, os desafios frente aos estudos e aprofundamento
pessoal e como se sentiam frente à prática clínica enquanto prescritores de CM.
Com relação ao conhecimento dos médicos sobre a temática, reconheceram que não é
todo profissional que está disposto a ficar pesquisando artigos, as patologias e ação dos
fitocanabinoides. Neste sentido, expuseram a visão de que a grande maioria dos médicos não
tem a propensão de ser autodidata e, de certa forma, quer um guidelines pronto e aprovado por
uma Sociedade. Assim, esclareceram que o uso da CM é permeado de subjetividade, não tem
uma regra como os medicamentos convencionais, o que por vezes para alguns representa uma
certa insegurança, reforçando sobre a necessidade de mudança de postura dos profissionais,
buscando por iniciativas próprias os conhecimentos necessários a fim de melhor atenderem as
67

demandas da sociedade.
Os entrevistados apontaram que a falta de conhecimento também deve ser compreendida
a partir das dificuldades de acesso à informação, situação que perdura na graduação e na pós-
graduação, posto que o desconhecimento sobre o SEC e o uso de canabinoides é algo comum
tanto aos médicos recém-formados quanto aos médicos especialistas, como por exemplo,
neurologistas, psiquiatras e oncologistas que ainda não prescrevem canabinoides. Esta
constatação está atrelada ao fato de que não há cursos estruturados, apenas cursos livres avulsos,
o repertório literário manual específico sobre SEC e Cannabis é ínfimo, a divulgação sobre o
tratamento na sociedade de forma geral e peculiarmente na comunidade acadêmica é restrita,
bem como a divulgação sobre os resultados da terapêutica canabinoide na prática clínica, o que
por vezes leva o médico a ter “um pé atrás”, esperar ficar pronto todos os estudos, ensaios
clínicos randomizados de altos níveis de evidência, para depois decidir se quer ou não
incorporar aquela opção dentro de sua prática.
Alguns médicos, apesar de terem um bom nível de conhecimento e experiência na
prescrição de Cannabis, ou mesmo saberem que é um tratamento com baixos riscos, revelaram
que não se sentem plenamente seguros, pois é preciso considerar o preconceito social que
também está nos pacientes e se precaver de algum possível processo judicial. Muitos
prescritores afirmaram que o processo de aquisição de conhecimentos nunca é suficiente, é
inesgotável, há muito que estudar e aprender principalmente da prática clínica, por não ser uma
terapêutica com protocolos estabelecidos, por ser caro, não existir acúmulo amplo sobre o
assunto, um conhecimento que está sendo construído, carece de estudos clínicos para
determinadas doenças, alvitrando que dá para melhorar bastante, para aperfeiçoar, nem estamos
perto do todo que é possível desvendar, do que ainda é possível evoluir, do que tem para
acontecer.
Outros se descreveram novatos, indicando que ainda estão aprendendo, estudando, se
inteirando, tendo experiências próprias como prescritor, discutindo casos, tomando coragem
para ampliar o repertório, mantendo-se sempre em busca de cursos, atualizações, pós-
graduação, congressos, aulas e palestras, instruções de outros médicos, retomando que, em
termos científicos, há muito a estudar principalmente sobre interação medicamentosa, relação
com a gravidez e puerpério, áreas em que ainda têm receios, situações em que vêm muita
diferença na resposta terapêutica, entender melhor a forma quantitativa de miligramagem,
dentre outras questões.
Por outro lado, alguns participantes disseram que tinham ressalvas e um pouco de medo
de prescrever a Cannabis no início, por ser uma terapêutica completamente diferente das outras
68

medicações costumeiras, na qual cada indivíduo é único e cada caso tem uma dose específica,
uma resposta específica, o que de certa forma gera uma certa insegurança. Entretanto,
esclareceram que a tranquilidade veio com o tempo, por meio dos estudos e da prática clínica
realizando o manejo, das melhoras vivenciadas junto aos pacientes, constatando que é uma
prática segura, com nenhum ou pouco efeito colateral, e o máximo que pode acontecer é não
alcançar os resultados esperados. Citaram ainda que lhes trouxe confiança fazer cursos, ler
livros e artigos, de modo que atualmente sentem uma segurança razoável, interagindo com
outros prescritores, com grupos de outros profissionais, compartilhando informações, cientes
de que os avanços científicos são gradativos.
Noutra perspectiva, entrevistados relataram que só começaram a prescrever quando se
sentiram seguros com todo o contexto que envolvia a CM, tanto com relação à própria família,
as questões judiciais, mas principalmente ao se razoar sobre a segurança para o paciente,
aplicando o princípio de primum non nocere, ou seja, de primeiro não fazer nenhum mal à
pessoa, posto que os canabinoides não têm potencial tóxico a ponto de causar uma depressão
respiratória, não causarão prejuízos ao paciente.
Nesta perspectiva, os participantes destacaram que a falta de formação e seus
determinantes compõem um fenômeno muito desafiador ao pensar sobre o número escasso de
prescritores de CM no Brasil, visto que muitos profissionais ainda não ouviram falar sobre o
assunto, os prescritores estão com as agendas abarrotadas e muitos pacientes precisam do
tratamento, mas permanecem marginalizados, atravessados também pelo alto custo.
Neste âmbito, citaram outro fator incidente explicando que existem médicos que não
conhecem por própria experiência os resultados da terapêutica canabinoide e preferem que o
outro prescreva que não ele, por medo. Por vezes, este medo vem do receio de não saber
manejar, de ter dificuldades com os pacientes, por falta de conhecimento ou por reticência
pessoal, por não querer mesmo se tornar um prescritor. Desta maneira, afirmaram que quem se
propõe a buscar, a pesquisar sobre o SEC acaba, se não prescrevendo, indicando um profissional
prescritor. Entretanto, ressaltaram que se o profissional médico além de não obter informação
estiver fechado, não prescreverá nunca.
Desta forma, pontuaram que não tem como ser experiente sem começar a prescrever a
CM, pois por mais que se estude, a prática clínica exige outros conhecimentos e habilidades
que são desenvolvidos com a vivência e experiência da prescrição, de modo que não há como
alcançar um nível suficiente de conhecimento apenas estudando. Complementando,
enfatizaram que ainda que a Cannabis seja algo seguro, é necessário saber manejá-la, saber
sobre o CBD, o THC e outros canabinoides, sobre o efeito entourage, terpenos e demais
69

substâncias do fitocomplexo, saber como encontrar a dosagem certa, a melhor dose, fazendo o
máximo possível para a adequada adaptação do paciente, a fim de se alcançar os melhores
resultados.

5.2.1.1.3 Categoria: Atores sociais relevantes

Nesta categoria, encontram-se as subcategorias: Seus familiares, Sociedade, Colegas de


profissão, Conselhos de Classe e Pacientes e seus familiares.

5.2.1.1.3.1 Seus familiares

No âmbito das relações familiares, os participantes relataram que receberam apoio e


ajuda de seus entes, pois entenderam que é um tratamento que provém da ciência, algo novo e
inovador, que se tem respaldo para prescrever. Assim, disseram que parte dos familiares se
expressou de forma curiosa achando interessante, outros ficaram um pouco desconfiados no
início, mas agora estão animados, outros já tinham a mente mais aberta e não acharam nada
demais. De modo geral, trouxeram que assumirem-se prescritores foi uma experiência
tranquila, pois não houve por parte de seus entes preconceito, pelo contrário foram bastante
receptivos, gostaram e também abraçaram a causa, inclusive adentrando de alguma forma neste
cenário, seja como paciente ou como profissional atuando na área.
Nas situações em que a iniciativa da prescrição foi motivada por alguma situação de
familiar ou de pessoa próxima, observou-se nos discursos que pelos resultados positivos do
tratamento houve uma aceitação melhor, apesar de ainda citarem que há muita confusão, como
quem acha que CBD é remédio e maconha é veneno, ou mesmo que o médico que prescreve
Cannabis para seus pacientes é “doidão” ou prescreve para o paciente fumar.
Os entrevistados mencionaram que, mesmo quando se tratava de familiares mais
abertos, favoráveis e confiantes sobre o tratamento, havia preocupação e muito medo com
relação a possíveis implicações legais, temor de que fossem presos, caçados, denunciados em
razão das leis do Brasil, pois é sabido de muitas situações de perseguição, casos em que marcam
consulta basicamente para levantar informações.
Por outro lado, vários médicos descreveram suas experiências na esfera familiar como
o lugar com mais barreiras, um contexto permeado de muito preconceito, por vezes desespero,
conflitos com entes conservadores, um início muito difícil, repleto de questionamentos,
julgamentos, limitação do senso comum da sociedade, mistura com o conceito do uso recreativo
70

e alguns que não aceitam de forma alguma, pois não conceberam a possibilidade do uso
medicinal da Cannabis até os dias atuais.
O participante P5 pontuou que o pior preconceito sofreu dentro de sua família, pois, faz
parte de uma árvore genealógica de mesma especialidade e, ao decidir-se mudar de área,
rompeu com a tradição da família, com um planejamento de anos, ficaram sem falar com ele
por um preconceito pesado que perdura até hoje. Ele disse que seu pai, apontando o dedo em
sua cara, o julgou questionando se ele iria abrir um consultório para ficar fumando maconha
com o paciente e dizendo que iria manchar o nome dele, perguntando ainda se ele havia se
formado médico para ficar receitando maconha. Ele afirmou estar certo de que sua decisão foi
assertiva ao perceber que os médicos querem prescrever, os pacientes precisam do tratamento
e é difícil encontrar um profissional prescritor, assumindo um projeto de vida junto a sua noiva
e um amigo.
Noutro panorama, os entrevistados expuseram que a aceitação dentre os familiares foi
melhorando à medida que foram estudando, se apropriando e tendo bons resultados a partir do
tratamento com a CM, de modo que inclusive passaram a prescrever para seus entes.

5.2.1.1.3.2 Sociedade

No contexto da sociedade, alguns médicos manifestaram-se e contaram que por vezes


ocorrem questionamentos no sentido de sofrer preconceito e como reagem com relação ao
trabalho como prescritor de Cannabis.
Aparentemente numa tentativa de se preservar, a médica P9 relatou que prescreve a CM
de acordo como identifica o perfil do paciente, analisando se tem ou não abertura para conversar
sobre este tratamento, em razão das muitas dificuldades que já enfrentou neste percurso.
Neste sentido, outros dois entrevistados expressaram ainda sentir certo medo de abordar
sobre o assunto, pois ainda têm lidado com muitas contradições, vêm trabalhando de forma
cuidadosa para resguardar a segurança e estarem disponíveis para quem precisar. Esclareceram
que não levantam a bandeira da luta dos pacientes, pois não têm mais forças para continuar os
enfrentamentos, optando por este caminho para não ficar o tempo inteiro polemizando e
provando, passando por situações que os fazem se sentir muito impotentes, insuficientes,
decepcionados, frustrados e sozinhos, sem poder agir e mostrar para a sociedade como um todo
que é uma terapêutica com muitos resultados positivos, de modo que não divulgam sobre este
trabalho.
De outro modo, outros prescritores pontuaram que a sociedade os mantém num
71

determinado patamar de confiança propiciando que, ao abraçarem lutar por uma causa, as
pessoas param para escutá-los e refletem a respeito.
Segundo a concepção de um participante, existem dois grupos distintos de pessoas. O
primeiro trata-se daqueles que realmente não gostam, não entendem, não querem saber mesmo,
são preconceituosos, ignorantes e cabeça fechada, não importa se veem evolução e melhora do
paciente que faz o tratamento com a Cannabis, pois nunca se simpatizarão, ressaltando que é o
tipo de preconceito que está impregnado na sociedade, citando o exemplo da reação negativa
das imobiliárias quando buscava um imóvel para seu consultório. Por outro lado, esclareceu
que também há pessoas que se convencerão a partir de argumentos, de artigos e estudos, de
trocas de ideias e experiências, situações nas quais é possível observar que as pessoas estão
realmente melhorando. Para ele, as pessoas são muito “8 ou 80”, ou não querem saber, ou falam
que é fantástico e que tem algum parente que precisa do tratamento, um preconceito esdrúxulo.
Afinal, foi consenso dentre os prescritores sobre o trabalho fundamental que ou já
desempenham ou precisam se comprometer para a conscientização, tanto da classe médica, dos
profissionais de saúde, das pessoas que trabalham no judiciário, advogados, quanto
procuradores, juízes e defensores e citaram sobre palestras ministradas na OAB, na Câmara
Municipal, no serviço público fazendo visitas domiciliares, pois o entendimento da sociedade
como um todo é muito preconceituoso e desprovido de informações científicas.

5.2.1.1.3.3 Colegas de profissão

Os discursos apresentados pelos entrevistados permitiram visualizar das relações com


os colegas de classe dois nichos bem antagônicos, que se expressam peculiarmente, inclusive
interpelados pela atual polarização da ciência que vivemos em nosso país.
Neste sentido, por um lado os participantes apontaram que mais da metade da classe
médica constitui um grupo ainda com muito preconceito, profissionais que ficam com “o pé
atrás”, não se envolvem, se mantém isentos, olham com total desconfiança, desdenham, não se
interessam ou não querem nem saber, no máximo pensam a possibilidade quando já não há
mais nada a se fazer, um enfrentamento difícil que impõe ao prescritor situações desafiadoras
e desagradáveis, pois vez ou outra há um desconforto, um incômodo, sendo expostos como se
estivessem usando de mecanismos para ludibriar o paciente, como placebo, como que quase
um charlatanismo, desconsiderando completamente a cientificidade do tratamento.
Assim, ilustraram situações de colegas que aceitam o ópio e várias outras medicações
bem mais perigosas, que dão risada, tiram sarro e acham o tratamento bizarro, outros que
72

questionam ironicamente se realmente tratam seus pacientes com Cannabis, afirmando que não
teriam essa coragem, colegas que tratam o assunto como se estivessem “prescrevendo crack
para criança”, fatos que ocorreram tanto com médicos de suas idades, como com médicos da
velha guarda que não gostam do assunto de jeito algum, causando um impacto de sofrimento e
frustração pela falta de apoio e pelo descrédito, o que consideram uma grande hipocrisia.
Por conseguinte, os entrevistados se posicionaram de que são profissionais que
deveriam difundir conhecimento e, pelo contrário, estão restringindo por puro preconceito e
desconhecimento, até mesmo privando uma gama de pacientes de ter acesso a um tratamento
que talvez fosse o melhor para suas necessidades. Entretanto, apesar de continuarem
enfrentando preconceito de muitos colegas, situaram que sempre se mantêm disponíveis para
conversar sobre o assunto.
Num foro mais específico, foi possível observar que, dentre as mulheres prescritoras,
houve mais relatos quanto a percepção de se sentirem apontadas, questionadas e julgadas, ao
ponto de ter repercussão sobre a prática profissional. Neste sentido, relataram tristeza e
descontentamento com relação aos demais médicos por manterem uma posição de rejeição e
não aceitarem o tratamento com a CM como uma prática médica, o que demonstra inclusive a
falta de conhecimento sobre uma terapêutica que tem se mostrado tão eficaz.
Neste ínterim, a entrevistada P16 descreveu que se sente muito mal pelo julgamento de
pessoas que a colocam como “maconheira” e a discriminam, até pelo jeito que a olham.
Entretanto, ela afirmou que prefere passar por estas situações desconfortáveis e se assumir como
uma profissional que está a favor da saúde, provocando nestas pessoas um incômodo que traga
reflexão.
Por outro lado, alguns entrevistados declararam que não sofreram preconceitos, não
tiveram quaisquer problemas, nunca foram questionados por estarem trabalhando nesta área e
acreditam que os outros médicos já entenderam, outros veem o tratamento com ar de
curiosidade e fazem perguntas pensando na possibilidade de tratar um parente que precisa,
muitos colegas de trabalho param e escutam sobre o assunto, a maioria sabe sobre a existência
do CBD, pois foi bem divulgado e os que não sabem ou não conhecem também não criticam,
ou mesmo aqueles que criticam ou não gostam atualmente não estão falando nada e aqueles que
têm um pouco mais de abertura estão começando a se informar, estudar e incorporar a
terapêutica em suas práticas clínicas, um cenário bem diferente quando comparado há 10 anos
atrás, tempo em que colegas precursores iniciaram a prescrição de canabinoides.
Apontaram que tem colegas que acham fantástico esta possibilidade terapêutica e os
apoiam, bem como outros com olhar um tanto mais empreendedor, dizendo que ganharão muita
73

grana, que serão muito procurados, que é uma área promissora na qual terão muito sucesso.
Também contaram sobre médicos mais velhos que querem aprender a respeito para abrir clínica
e estudantes que os procuram querendo realizar estágio no último ano da faculdade, pedindo
curso, módulos, aulas, planejando abrir uma clínica ou franquia quando se formarem.
Então, relataram de suas experiências que a opinião das pessoas tem mudado rápido e
hoje em dia, os mesmos colegas que tinham “um pé atrás” têm pedido ajuda, encaminhado
pacientes, querem entender como a terapêutica é aplicada, os consultam sobre as indicações,
principalmente quando veem a melhora de casos em que já não se tem mais o que fazer, ou
outros que não prescrevem mas reconhecem a própria limitação pela falta de conhecimento,
não condenam a decisão do paciente, o que de algum modo, já é um avanço.
Desta forma, pontuaram que o feedback por parte dos pacientes e colegas de trabalho
tem sido positivo e isso se deve aos estudos publicados e relatos de casos demonstrando a
eficácia do tratamento com a CM, cujos resultados com o passar do tempo legitimam a prática
clínica.

5.2.1.1.3.4 Conselhos de classe

Conforme apontaram os prescritores, o posicionamento do CFM é um dos principais


óbices para a classe médica, condição que advém da Resolução do CFM 2113/2014, na qual se
manifesta favorável apenas ao uso compassivo do CBD para pacientes refratários, nas
especialidades de psiquiatria e neurologia, impondo uma situação de irregularidade para
qualquer outra situação que necessite do tratamento com outros canabinoides, uma postura
muito tendenciosa e repleta de preconceito, pois, conhecedores da aplicação na prática clínica,
vários prescritores acreditam que o uso da Cannabis não tem que ser compassivo, mas sim
tratamento de primeira escolha ou mesmo manejada como prevenção.
Noutra perspectiva, referiram que o problema é sustentado pelos que estão à frente do
CFM em Brasília, que não deixam o assunto entrar em pauta, um Conselho com viés ideológico
e ajustado ao paradigma bolsonarista, inviabilizando qualquer avanço na discussão, situação
muito revoltante, complicada e que precisa ser questionada, pois além de não representarem
seus interesses tampouco a opinião dos associados, também não agem para melhorar a situação
dos pacientes, não por falta de evidências científicas e, se não é má fé, é má vontade.
A postura contrária à CM mantida pela Associação Brasileira de Psiquiatria, segundo os
participantes, impõe muitas dificuldades, resistência de colegas e faz com que os psiquiatras se
sintam expostos perante sua classe.
74

Assim, os entrevistados salientaram que muitos médicos optam por não prescrever
justamente por não poder contar com o apoio do CFM que, numa situação jurídica, será o
primeiro a ser contra a posição do prescritor, quando na verdade deveria defender os associados.
Neste sentido, complementaram que quando foram descobertas as ações dos canabinoides não
houve qualquer divulgação por parte do CFM, que, destarte, mantém uma nébula em torno do
assunto e se vale do medo para coagir a ação dos médicos prescritores.
Por conseguinte, alguns participantes relataram que a judicialização da medicina é uma
temeridade muito grande dentre os médicos, enfatizando que enfrentaram muito medo de sofrer
perseguição pelo CRM. Entretanto, esclareceram que este sentimento acaba quando o médico
se instrui juridicamente e passa a conhecer as outras leis e meios que o protegem, entendendo
que o conselho até pode tentar caçar o CRM do médico, mas perderá a ação porque a
regulamentação da ANVISA se sobrepõe à resolução do CFM, apropriando-se de que o ato
médico é inviolável e ninguém pode ser indiciado, nem preso por prescrever o tratamento com
Cannabis.
Neste ínterim, os médicos afirmaram que o CFM está muito defasado e atrasado sobre
o assunto, pois desde 2014 muita coisa aconteceu e não modificaram uma resolução que não
tem valor jurídico algum. Assim, queixaram-se da lentidão nas instruções e também apontaram
a necessidade de que o conselho assuma uma postura mais favorável, que se manifeste sobre o
assunto e traga uma maior tranquilidade e segurança aos médicos associados, principalmente
para aqueles que estão iniciando, pois há vários colegas bem interessados em conhecer sobre o
SEC, um sistema importantíssimo, e saber como é o tratamento com canabinoides.
No tocante às restrições impostas, os entrevistados enfatizaram sobre a repercussão das
consequências que acabam por impedir o acesso dos mais pobres e vulneráveis posto que
inviabiliza a prescrição do tratamento com Cannabis no SUS. Desta forma, retomam quanto a
necessidade de atitudes mais pró-ativas dos médicos, assumindo junto aos pacientes uma
postura de resistência, coragem e enfrentamento perante o CFM, ainda que a garantia de direitos
demande a justiça.

5.2.1.1.3.5 Pacientes e seus familiares

Os participantes contaram que, com relação aos pacientes e familiares, não passaram
por nenhuma situação de desrespeito ou não aceitação quanto a decisão de serem prescritores
de CM, não perceberam qualquer paciente que tenha abandonado o consultório, pelo contrário,
muitos acabam inclusive trazendo algum familiar que também precisa do tratamento, um pai,
75

um irmão, assim como muitos de nós conhecem alguém com dor crônica, um familiar que é
epilético, autista, alguém com depressão.
Entretanto, pontuaram que não desconsideram o fato de que existem muitas pessoas com
preconceito sobre o uso da Cannabis e quando o tratamento é proposto, ficam “de cabelo em
pé”, cabendo ao prescritor esclarecer, explicar e nunca forçar de modo que, se o paciente tiver
medo, não quiser, não for uma terapêutica que ele aprove por qualquer razão, respeitam a sua
decisão.
No mesmo sentido, alguns entrevistados explanaram que identificam pacientes que se
beneficiariam muito com o tratamento, mas esbarram no preconceito dos pais, um cenário
complicado e que traz algumas dificuldades, não deixam o médico totalmente confortável em
conversar sobre o assunto, pois nem sempre são bem recebidos. Assim, sugerem a CM quando
já conhecem o paciente há um tempo, mesmo porque não é para todos os pacientes que indicam
o tratamento.
Noutra situação, um médico expôs que quando se trata de casos em que já possui larga
experiência na prática clínica, consegue falar sobre o tratamento na primeira consulta sem
barreiras, pois sabe dos resultados com propriedade. Mas também revelou sobre vivências com
pacientes que aceitam o tratamento a princípio e depois voltam atrás e vice-versa.
Os entrevistados apontaram que ultimamente há uma busca expressiva pelo tratamento
que tem aumentado progressivamente, de modo que têm recebido muitas pessoas que já chegam
com a demanda do tratamento com Cannabis para suas patologias, dentre eles pacientes
encaminhados por colegas especificamente para a prescrição de canabinoides, o que gerou um
crescimento importante no movimento dos consultórios.
Por outro lado, citaram que pensam na coragem dos pacientes em praticar a
desobediência civil, das mães que foram taxadas como traficantes internacionais na defesa dos
direitos de seus filhos, então, questionaram por que sendo médicos não poderiam se juntar aos
pacientes nesta luta, assumindo também estes riscos.
Isto posto, descreveram sobre a postura profissional, narrando que mantêm uma prática
tanto no serviço público como no consultório de proximidade e dedicação junto aos seus
pacientes, um aspecto relevante do tratamento com Cannabis, pois além da relação médico-
paciente, também acontece uma aproximação com os familiares e esse contato é muito positivo.
Desta forma, por fim, familiares também acabam aderindo ao tratamento com canabinoides
para questões de saúde e inclusive se apropriam do tema até mesmo realizando cursos.
76

5.2.1.2 Subtema: Decisão profissional: repercussões e implicações

Neste subtema, os entrevistados apontaram como transitaram o percurso que culminou


na tomada de decisão de tornarem-se prescritores de canabinoides, quais fatos foram
propulsores, bem como as interfaces que se conectam no âmbito das relações e subjetividades.

5.2.1.2.1 Categoria: Tornando-se um prescritor de Cannabis

Nesta categoria, encontram-se as subcategorias: Motivações e Concepções sobre


assumir-se como prescritor.

5.2.1.2.1.1 Motivações

Os entrevistados descreveram diversas situações como motivadoras tanto para o início


da prescrição do tratamento com canabinoides, bem como para se assumirem como prescritores,
assinalando que o profissional precisa estar aberto para esta possibilidade terapêutica.
Num âmbito de contexto de vida, vários participantes declararam que grande parte dos
médicos que se tornou prescritor muitas vezes iniciou em razão de alguma necessidade pessoal,
seja de um filho, um pai, uma mãe, uma esposa, um amigo, alguém afetivamente próximo ou
mesmo por uma demanda própria. Assim, contaram sobre vivências que os motivaram dentro
desta trajetória, permeadas por preocupação, urgência em ajudar mesmo sem saber por onde
começar, desde as questões burocráticas, qual profissional buscar, qual remédio seria melhor,
como indicar e como funcionaria. Assim, relataram que ascendeu a necessidade junto com a
vontade de voltar a estudar, um grande despertar que impulsionou o caminho da prescrição,
situações determinantes no sentido da intensidade com que se dedicaram, prazer e amor com o
qual desenvolveram o trabalho, de confiança nos resultados, experiências propulsoras para a
imersão nesta área, que os levaram a introduzir a CM em suas práticas profissionais e estender
esta possibilidade terapêutica para seus pacientes.
Na perspectiva de motivação a partir do paciente que proporcionou o primeiro contato
com a temática, alguns entrevistados citaram situações em que foram demandados por pacientes
acometidos por doenças de difícil controle pedindo pelo tratamento e buscando informações,
casos de esclerose múltipla, transtorno bipolar, autismo, Alzheimer, demência, Parkinson,
convulsão refratária, infecções persistentes, quadros muito graves, situações de extremo
sofrimento psíquico e orgânico em razão de doenças degenerativas, pacientes para os quais já
haviam tentado todos os medicamentos possíveis sem resultados satisfatórios, também mães e
77

filhos de pacientes que chegavam já relatando o uso do óleo artesanal, buscando ajuda médica
para o manejo adequado do tratamento e saber mais a respeito, se podiam continuar, buscavam
por uma opinião e direcionamento médico.
Neste sentido, apontaram que eram contextos que traziam muito incômodo e os
deixavam com a sensação de impotência, de pouco estarem fazendo por aquelas pessoas,
situações que os chocavam muito, se sentiam incapazes como profissionais, circunstâncias de
busca da própria família que chegava com artigos e uma série de informações e terem que
assumir que não sabiam o que fazer, de modo que os impulsionaram a estudar, a buscarem sobre
como poderiam resolver tais problemas mais a fundo, melhorar a qualidade de vida daquelas
pessoas.
Dentre os participantes, dois médicos pontuaram (P5 e P8) que estavam muito
insatisfeitos com a forma como vinham exercendo a medicina, recebendo pacientes que
tomavam remédios para pressão, diabetes, dores, para dormir, antidepressivos, ansiolíticos e
fármacos para o estômago por conta de tantas drogas que usavam e isso em série, uma situação
frequente, recorrente e que se arrastava ao longo de anos, sem melhorar a vida daquelas pessoas,
copiando receitas e ajudando a manter essa sequência de coisas, com cada pessoa tomando uma
média de 10 a 12 medicamentos por dia sem mudar os hábitos de vida, sem conseguir emagrecer
e com muita depressão, de modo que em vez de ajudá-las a melhorar, de certa forma estavam
contribuindo para ficarem mais doentes e dependentes de todas aquelas medicações.
Segundo eles, este cenário todo lhes trazia muita inquietação, indignação e foi quando
pensaram nas opções dentro da fitoterapia, começaram a considerar sobre a Cannabis, se
informaram e viram que era um tratamento com resultados positivos, perceberam que era um
campo de atuação que poderia ser mais palpável e de fato fazer diferença na vida de seus
pacientes. Então, tomaram a decisão de não mais fazerem receitas daqueles tipos, pois com a
CM conseguiram diminuir os remédios para pressão, regularam a glicemia, diminuíram a
ansiedade e repensaram o estilo de vida, passando a viver de uma maneira mais simples e com
saúde, uma mudança deveras significativa.
Dois participantes (P10 e P11) contaram que a grande motivação enquanto prescritor foi
decorrente da atuação em entidades do terceiro setor, participando de mutirões de atendimento,
acompanhando o trabalho de outros prescritores, tendo a oportunidade de verem na prática o
manejo clínico, os resultados dos pacientes, impactos sociais e repercussões na vida tanto dos
pacientes como das famílias, salientando que há uma demanda efetiva de pessoas que buscam
pelo tratamento por meio das associações que não pode ser desconsiderada.
O prescritor P11 contou que todo esse movimento junto à sociedade civil organizada o
78

motivou, de modo que levou suas vivências para dentro da Universidade, desenvolveu projetos
de extensão prevendo a realização de atendimentos para prescrição de canabinoides, compondo
momentos bem dinâmicos em que está dialogando com diversos grupos para possíveis
parcerias, o que, segundo ele, é muito gratificante e, até onde pode revelar, já tem cerca de 75%
de resultados com o uso da CM como muito bons e espetaculares.
Noutra perspectiva, entrevistados relataram que conhecer a terapêutica por meio de
palestras, congressos, seminários, mais profundamente por meio das experiências demonstradas
em cursos sobre prescrição de Cannabis e efetivamente os resultados têm sido maravilhosos, o
que os motivam muito. Desse modo, a imersão em conhecimento os encorajou a decidirem
tentar esta nova opção de tratamento, se convenceram de fato a prescrever, momento em que
perceberam que estavam se reinventando em algo realmente palpável que foi um divisor de
águas, pois era um cenário sem médico para “dar a cara a tapa” e estava na hora de usarem a
credibilidade profissional, se exporem e assumirem o trabalho para valer.
Continuando, revelaram que uma coisa é ler sobre um assunto, estudar, saber a respeito
e, outra coisa, é ver acontecer, acompanhar todo o processo, certificar na prática a melhora do
paciente, a surpreendente diferença na qualidade de vida, experiências que mudam o ponto de
vista enquanto médico de forma positiva, pois deixam o profissional impactado, despertam o
entusiasmo para estudar, não deixar mais de se dedicar e se aprofundar, porque vale toda a luta
contra qualquer preconceito imposto ao trabalho como prescritor.
Por unanimidade, em todos os discursos ficou evidente que a motivação médica para
prescrever está intimamente vinculada às respostas à terapêutica da CM vivenciadas pelos
participantes com alcance de resultados tão positivos, que os estimulam cada vez mais a
prescrevê-la, além de ser notória a adesão dos pacientes ao tratamento, percebendo-se a baixa
ou nenhuma desistência. Por conseguinte, enfatizaram que são vidas que o tratamento com a
Cannabis tem feito toda a diferença, trazendo uma melhora significativa sobre a disposição, a
vontade, o apetite, a diminuição da insônia e da dor, o otimismo, voltam a sorrir, contar piadas
e, de modo especial, os pacientes terminais que falecem podendo sorrir, um conforto muito
diferenciado, um resultado tão expressivo que fica marcado e faz desejar que outros pacientes
tenham a mesma oportunidade.
Segundo os relatos, a expressão dos sentimentos dos médicos experienciando os
resultados positivos, se não na queixa principal, na melhora de algum outro aspecto associado,
traz ao prescritor esperança, alívio diante do sentimento de impotência frente à realidade dos
pacientes refratários e polimedicados, pessoas que atendem em seus consultórios, pronto
socorro, atenção primária e hospitais, cuja repercussão proporciona a retomada da viabilidade
79

de acreditar no cuidado da prática médica. Assim, citaram que o vínculo, afeto e relação de
confiança tornam-se intensos, de modo que conjugam os resultados numa série de adjetivos
como “impressionantes, notórios, surpreendentes, parecem milagre, parecem mágica, são
inegáveis”. Tais expressões remetem ao êxito frente à possibilidade de reduzir o sofrimento, de
modo especial e peculiar dos pacientes refratários, situações em que foram esgotadas as opções
terapêuticas convencionais.
Por fim, lamentaram não ter começado antes a utilizar esta ferramenta terapêutica
incorporando-a na prática clínica, por não terem conhecido essa possibilidade durante a
formação, pois já teriam ajudado muitas pessoas, ofertando para seus pacientes um melhor
tratamento.

5.2.1.2.1.2 Concepções sobre assumir-se como prescritor

Os participantes trouxeram relatos sobre a experiência de tornarem-se prescritores de


Cannabis, abordando perspectivas, percepções e significados, desde os médicos de vanguarda,
até médicos que iniciaram a prescrição de canabinoides mais recentemente.
Enquanto precursor, um entrevistado descreveu que quando começou a prescrever não
existia caminho algum, nada pronto, nenhum protocolo, apenas existia uma situação pessoal
que surgiu da história de vida de sua mãe, quando, em busca de caminhos para tratá-la,
constatou que a prescrição de canabinoides fazia parte do que vinha estudando, do ensino da
medicina e da atenção primária, explicando que tornar-se um prescritor de Cannabis ressoou
sobre várias peculiaridades de sua história pessoal e de sua carreira.
Alguns prescritores afirmaram que para os médicos não é fácil se assumir abertamente
enquanto prescritor, pois muitos colegas têm preconceito, não reconhecem e desvalorizam a
prática do tratamento, acham que os médicos prescritores pegaram um caminho errado, se
esquivam para não falar a respeito ou mesmo questionam sobre a validade da terapêutica, uma
discussão polêmica que por vezes gera muitos conflitos. Decorrente disso, disseram que têm a
impressão de que os médicos, de forma geral, acham que serão malvistos e acreditam que de
fato tenha sim sempre os maldizeres, os desdenhadores e até mesmo os invejosos. Por estas
razões, muitos começam aos poucos, tateando o contexto, optando por vezes em não se expor,
não divulgar sobre o trabalho amplamente, manter apenas num círculo mais próximo,
aguardando que as mudanças venham com o tempo pela ciência, pelas políticas públicas,
mostrando que a CM veio da medicina e então será preciso aceitar e quebrar o preconceito.
Por conseguinte, a participante P12 elucidou que vem se fortalecendo junto à rede de
80

prescritores de Cannabis e agora está começando a se assumir, divulgando seu trabalho nas
redes sociais e esta nova fase tem feito a diferença em sua vida pessoal e está fazendo em seu
consultório, pois identificou que precisa continuar a acreditar em si e ajudar as pessoas que
precisam, sem hipocrisia.
Por outro lado, vários médicos pontuaram que, desde o início de suas trajetórias na
prescrição de CM, não passaram por nenhuma experiência constrangedora ou desagradável,
não tiveram maiores problemas, não sentiram mudanças abruptas, não foi algo polêmico,
ocorreu como algo normal e tranquilo, pois na prática observavam que seus pacientes de fato
estavam melhorando e acreditam que esta aceitação pode estar ligada ao fato de serem pessoas
muito conhecidas, já estarem no mercado de trabalho há muito tempo, terem uma história e um
nome construído, boas referências, o que determina de certa forma que a sociedade atribua
crédito e confiança ao trabalho que desenvolvem, então seguiram estudando e se aprofundando,
aumentando a confiança, com retornos sempre positivos.
Sob um prisma diverso, dois entrevistados (P2 e P8) narraram que tornarem-se
prescritores de Cannabis trouxe mudanças na forma de cuidar dos pacientes, no sentido de ver
uma possibilidade de tratá-los integrando mais suas práticas clínicas, de forma ampliada,
pensando para além de protocolos, pensando no paciente como um todo. Assim, explicaram
que estudar o SEC e perceber que está envolvido em todos os processos do corpo humano,
conduziu uma reflexão sobre a contextualização das patologias neste todo, e que deveriam se
preocupar mais com a integralidade do cuidado.
Seguidamente, participantes expuseram que assumirem-se prescritores foi muito
positivo e não têm problemas com críticas, pois, de certa forma se sentem muito bem e mais
confortáveis em conhecerem e estudarem o SEC, constatarem os efeitos dos canabinoides,
capazes e conhecedores de um campo muito rico em possibilidades terapêuticas, uma saída bem
mais fácil e tranquila quando comparada aos alopáticos antipsicóticos, por exemplo. Desse
modo, hoje se veem como referência nesta área e avaliam que a prescrição de Cannabis agrega
muito valor à prática clínica pela versatilidade e pelo amplo espectro de ação, ressaltando que
os resultados de seus pacientes melhoraram muito, fatos que os levam a afirmar que a Cannabis
deveria fazer parte do arsenal de toda e qualquer especialidade médica.
Noutra concepção, alguns entrevistados contaram que, decidir atuarem especificamente
como prescritores de canabinoides, proporcionou priorizar a prática clínica alinhada ao prazer
em trabalhar numa perspectiva que lhes trouxe satisfação, declarando que gostam muito dessa
área, pois realmente impacta a vida dos pacientes e dos familiares, os resultados são
expressivos, os feedbacks são muito bons e vivenciar isso é muito prazeroso.
81

Nos aspectos financeiros, os médicos pontuaram que existe um custo que é real, pois
investem bastante em tempo para estudos, cursos, marketing, pagam aluguel de clínica, mas por
outro lado sentem que estão ajudando muitas pessoas, ganhando experiência clínica e sabem
que, num futuro não distante, será um trabalho muito grande e valorizado.

5.2.2 Tema 2: Prescrevendo a Cannabis Medicinal

Nesse tema os entrevistados trouxeram relatos específicos sobre os conhecimentos


adquiridos e constatações referentes à aplicação terapêutica dos canabinoides nas diferentes
faixas-etárias e patologias, advindos dos estudos e da prática clínica.
Assim, foram organizados os subtemas ‘Prática Clínica’ e ‘Vivências e experiências
próximas’, delineados em categorias e suas respectivas subcategorias, conforme Quadro 4.

Quadro 4 – Prescrevendo a Cannabis Medicinal

SUBTEMAS CATEGORIAS SUBCATEGORIAS

1. Sistema Endocanabinoide e Manejo


da Cannabis Medicinal
1. Cannabis na
2. Saúde da Criança e Adolescente
Atenção Integral à
3. Saúde do Adulto
Saúde
4. Saúde da Mulher
1. Prática Clínica 5. Saúde do Idoso

1. Efeitos colaterais
2. Cuidados 2. Interações medicamentosas
3. Riscos e contraindicações

1. Autoprescrição e
2. Vivências e 1. Experiência própria como paciente
prescrição para
experiências próximas 2. Vivências com entes familiares
familiares

Fonte: Elaboração própria.

5.2.2.1 Subtema: Prática clínica

Frente aos estudos, pesquisas e consolidação de evidências que, por ora, não
acompanham as demandas cotidianas, bem como a legitimidade dos resultados alcançados
pelos pacientes, os participantes expuseram sobre como vêm conduzindo a prática clínica,
mediando ciência e realidade com ética e responsabilidade, a fim de garantir aos seus pacientes
82

o melhor tratamento nas distintas condições do ciclo da vida, bem como os melhores resultados
mediante os diversos objetivos terapêuticos.

5.2.2.1.1 Categoria: Cannabis na atenção integral à saúde

Nesta categoria, encontram-se as subcategorias: Sistema Endocanabinoide e manejo da


Cannabis Medicinal, Saúde da Criança e do Adolescente, Saúde do Adulto, Saúde da Mulher e
Saúde do Idoso.

5.2.2.1.1.1 Sistema endocanabinoide e manejo da Cannabis Medicinal

Conforme relataram os entrevistados, nosso SEC foi descoberto por conta de pesquisas
referentes à planta Cannabis sativa L, durante estudos sobre o THC, quando o primeiro receptor
canabinoide foi identificado no cérebro, constatando que o mesmo se ligava a estruturas de
células do nosso Sistema Nervoso, advindo deste fato sua nomenclatura. Assim, enfatizaram
que esta descoberta obviamente não remeteu existir um receptor no cérebro só por existir a
planta, mas, foi a partir daquele momento que as pesquisas avançaram e progressivamente
pesquisadores têm decodificado um complexo sistema, suas ações e funções em nosso corpo.
Neste ínterim, os prescritores explicaram que a resposta terapêutica ao uso de
canabinoides acontece, pois temos receptores espalhados pelo nosso corpo todo, o que produz
um efeito que não trata uma doença especificamente, mas atua no equilíbrio de todo o
organismo buscando a homeostasia. Assim, quanto maior a homeostasia, melhor o resultado.
Em relação aos resultados, os médicos apontaram que, quando o paciente vai iniciar o
tratamento, é importante esclarecer que o tempo da resposta terapêutica é muito individual e
peculiar, de modo que há pacientes que melhoram em três dias, outros com uma semana e outros
demoram meses para alcançar a remissão dos sintomas, os melhores benefícios, mas, de forma
geral, pontuaram que a melhora é rápida e notável.
Neste sentido, ressaltaram que o prescritor deve ter em mente que não haverá prejuízo
ao paciente e que é possível manejar a Cannabis tranquilamente sempre começando com doses
baixas, aumentando devagar e acompanhando o paciente. Complementando, explicaram que a
terapêutica canabinoide não é como na medicina convencional que se prescreve tantos
miligramas por quilo, até existe uma indicação neste sentido, mas o mais importante é que a
resposta terapêutica será específica a depender de cada pessoa, do SEC do indivíduo naquele
momento que está passando, de modo que o ideal é estar sempre pensando que o paciente pode
83

responder com uma dose baixa, fazendo ajustes aos poucos, monitorando e observando se não
passou a janela terapêutica, ou seja, se não ultrapassou a melhor dose, pois acima disso o
paciente começa a não ter o efeito esperado.
Os entrevistados afirmaram que o fato de ter uma segurança bem conhecida sobre o
CBD, dá uma tranquilidade para o médico para testar a eficácia, pois é questão de fazer a
tentativa do tratamento com o paciente. Entretanto, apontaram quanto a importância de
conhecer e estar atento à possíveis interações medicamentosas, pois qualquer medicamento que
seja metabolizado pelo Citocromo P450 do fígado, pode interagir com o CBD, o que não é
impeditivo de usar, mas é necessário acompanhar por meio de exames, especialmente de função
hepática e coagulação, citando como exemplo o uso concomitante com fármacos como o
Clobazam (Frisium) e os antiagregantes plaquetários.
Diante do exposto, os entrevistados afirmaram que a Cannabis é uma ferramenta
terapêutica versátil e eficaz que pode ser prescrita para todas as faixas-etárias, conforme
critérios de indicação, anamnese e exames, para uma variedade de situações clínicas, sintomas
e doenças, principalmente as refratárias.

5.2.2.1.1.2 Saúde da criança e do adolescente

Os entrevistados apresentaram uma diversidade de indicações para pacientes na Infância


e Adolescência, em diferentes síndromes, transtornos e condições, sendo os principais:
síndromes genéticas e outras síndromes raras, Síndrome de Down, doenças congênitas e
degenerativas, ansiedade, depressão, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade
(TDAH), Transtorno Opositivo Desafiador (TOD), hiperatividade e principalmente nos casos
de Autismo e Epilepsia refratária, com os mais variados efeitos benéficos.
Um dos participantes relatou que há um estudo evidenciando que, em neonatos expostos
à hipóxia neonatal, o tratamento com canabinoides diminuiu a morte neuronal e melhorou a
neuroplasticidade cerebral.
Dentre os vários benefícios descritos pelos prescritores, apontaram efeitos
comportamentais observados em seus pacientes de extrema relevância para esta faixa-etária tais
como: melhora na sensopercepção, na neuromodulação nociceptiva, melhora cognitiva e
funcional.
Vários entrevistados que atendem casos de Transtorno do Espectro Autista (TEA),
elucidaram que geralmente são quadros permeados por componentes de agressividade, alguns
refratários aos tratamentos convencionais e outros polimedicados, apontando que o tratamento
84

com fármacos convencionais não tem bons resultados, pois deixam a criança robotizada. Nesta
perspectiva, destacaram dos aspectos sobre a clínica como principais benefícios no TEA: a
melhora da sociabilidade, da cognição e da modulação comportamental, relatando que há
crianças que começam a falar, houve redução da hiperatividade, melhora da afetividade, do
humor e do convívio social, a criança passa a brincar, para de convulsionar, de gritar, de bater
a cabeça contra a parede, melhora o sono, vai acalmando e volta a frequentar a escola, onde
tinha dificuldades de aceitação.
Diante de suas vivências, descreveram os resultados alcançados com o tratamento com
a Cannabis no TEA como espetaculares, excelentes e notáveis, explicitando que quando
comparado ao tratamento com medicamentos alopáticos, percebe-se que o paciente responde
claramente melhor ao tratamento com canabinoides.
Dentre as principais repercussões sociais, pontuaram de forma enfática a redução do
sofrimento da mãe que nestas situações sempre está em estado de alerta, desesperada e sem
dormir, de forma que melhora muito os ganhos na qualidade de vida.
Na Epilepsia, os participantes citaram que o tratamento com a CM é eficaz para 70%
dos pacientes, está indicado e comprovado cientificamente. Explicaram que há pacientes que
deixam de usar medicamentos de resgate, mas mantêm o uso dos alopáticos e há situações em
que os resultados são tão positivos que torna possível retirar completamente os medicamentos
alopáticos e ficar apenas com a Cannabis. Diante disso, lamentaram que os casos mais
incidentes ainda são os quadros dos pacientes refratários, pois várias famílias procuram pelo
tratamento com canabinoides no desespero, como último recurso terapêutico.
Na adolescência, expuseram que a Cannabis é indicada para casos de autismo, epilepsia
e epilepsia refratária, transtornos de ansiedade, depressão, Transtorno Obsessivo Compulsivo
(TOC), TDAH, Síndrome de Tourette, Transtorno Bipolar, apontando que, nesta faixa-etária,
em muitos casos o transtorno de ansiedade e depressão estão associados ao vestibular.
Assim, mediante as considerações referendadas pelos médicos prescritores, é possível
considerar que o tratamento com canabinoides na infância e adolescência é seguro e que, além
de tratar sintomas, tem como foco terapêutico essencial a qualidade de vida, revelando que
quanto mais cedo inicia-se o tratamento, melhor é a resposta.

5.2.2.1.1.3 Saúde do adulto

Abarcando as condições incidentes na faixa-etária adulta, os participantes expuseram


que a demanda por prescrição de Cannabis incide frequentemente em situações nas quais os
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pacientes não alcançam um nível satisfatório de controle dos sintomas por meio dos
medicamentos convencionais ou não toleram seus efeitos colaterais.
Segundo os prescritores, em adultos jovens a grande procura é para o tratamento de
ansiedade, angústia e depressão, situações que intensificaram em razão da pandemia pelo
isolamento social, home office, condições financeiras e incertezas sobre a continuidade do viver.
Nestas condições, enfatizaram que as respostas são incríveis e citaram a melhora do sono,
redução da ansiedade, melhora da depressão e humor, e interrupção das crises de pânico,
ajudando a acalmar.
Um dos médicos contou que houve um caso em que foi necessário o uso de coadjuvantes
alopáticos para resolver completamente a queixa principal de seu paciente, a insônia.
Entretanto, afirmou que durante o tratamento apenas com canabinoides, pôde observar
melhoras significativas nas causas de base que compunham o quadro clínico, referindo-se ao
desaparecimento da dor no corpo e controle da ansiedade.
Outras patologias também descritas pelos prescritores tratáveis nos adultos mais jovens
compreendem: o câncer, TOC, Síndrome de Rett, doenças refratárias, pânico, fobia social,
transtorno bipolar, transtorno esquizoafetivo, autismo, pós-operatório, lúpus, artrite, artrose e
fibromialgia.
Na explanação de um dos participantes, houve a narrativa sobre sua experiência clínica
no tratamento da Síndrome de Tourette, uma doença que afeta muito a inserção social do
paciente, na qual apenas após ter tentado todas as medicações e protocolos convencionais sem
resultados, partiu para o tratamento com canabinoides. Entusiasmado, contou que desde o início
do tratamento com a Cannabis o resultado foi excelente, inclusive permitindo a diminuição dos
fármacos alopáticos.
Outro prescritor contribuiu que a especialidade de ortopedia já entende a ação dos
canabinoides, pois vê que o paciente em uso de CM obtém o alívio da dor e a consolidação
óssea é muito mais rápida.
Na população entre 30 a 60 anos, segundo os participantes, uma das queixas recorrentes
associada aos quadros clínicos é a dor de difícil controle em circunstâncias que requerem
tratamento multiprofissional como dor neuropática, fibromialgia, dor decorrente do diabetes,
artrite, artrose e outras dores crônicas, descrevendo que o resultado do tratamento é muito
positivo e notório, lamentando que muitos destes pacientes só buscam pelo tratamento com
Cannabis quando a dor evoluiu para um estágio insuportável.
Na oncologia, os prescritores afirmam que a terapêutica com canabinoides corrobora
nos cuidados paliativos, atua como antineoplásico coadjuvante à quimioterapia, e tem indicação
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desde o início do tratamento. Outros resultados descritos pelos entrevistados foram: conseguir
parar o avanço do câncer, ao longo do processo não ter perda de peso, conseguir comer, não ter
quase nada de efeitos adversos da quimio e radio, não ficar vomitando, não passar mal e ao final
ganhar peso. Assim, descreveram como uma melhora que fica marcada sobre a qualidade de
vida, a disposição, a vontade, o apetite, a diminuição do enjoo, o otimismo, relatando que alguns
pacientes voltam a sorrir, contar piada, do jeito que eram antes e nos quadros graves falecem
sorrindo, em paz.
Para pacientes com HIV, consoante à experiência clínica de um dos médicos, a CM
trouxe benefícios em amplo espectro e pode ser prescrita tanto no início do tratamento, como
em fase de estabilidade viral, ajudando no controle da dor e outros sintomas.
Dentre os participantes, alguns contaram sobre suas vivências junto aos pacientes no
tratamento da dependência química. Neste contexto, indicaram a eficácia do uso medicinal no
tratamento da dependência à maconha fumada, cocaína, na redução de danos, ressaltando sobre
a alta procura dos pacientes, descrevendo sobre os resultados a melhora da fissura, redução da
impulsividade e ansiedade, o paciente deixa de buscar a droga, para de gastar, de trazer
prejuízos à família. Por conseguinte, revelaram que o uso da CM interfere no ciclo do vício, na
busca pela alteração da consciência para alívio do sofrimento, pois, reduz a ansiedade, a
impulsividade, o nervosismo, a irritabilidade, além de clinicamente não sobrecarregar o fígado
e corroborar contextualmente para a recuperação dos vínculos e laços sociais rompidos. Na
experiência clínica e opinião destes profissionais, nenhuma outra medicação proporcionou
todos estes benefícios.
Outros entrevistados relataram situações nas quais a CM é prescrita para familiares de
pacientes com demência por apresentarem comumente quadros de ansiedade e insônia, e
também como ferramenta terapêutica de prevenção. Estes médicos apontaram que há estudos
em animais que demonstram a possibilidade de uso como prevenção, pelo efeito da
neuroplasticidade.
De modo geral, os participantes identificaram que a indicação da Cannabis para adultos
entre 50 a 60 anos de idade é prevalente em casos de Parkinson, Alzheimer e outras demências,
doenças relacionadas à saúde mental, dor crônica, casos oncológicos e fibromialgia, ressaltando
ainda sobre a crescente procura diretamente pela Cannabis para o tratamento de condições de
saúde, sobretudo de pacientes que não querem usar alopáticos.
Destarte, destacaram que os benefícios fazem a diferença na vida dos pacientes, pois, o
tratamento com canabinoides exige uma mudança em todo o contexto e estilo de vida para o
melhor resultado, proporcionando além da melhora orgânica, uma melhora psíquica, o que
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consequentemente traz um impacto significativo em seus quadros de saúde e no bem-estar.


Outro benefício fundamental citado pelos entrevistados foi o fato de que o paciente em
uso de CM questiona, busca informações, maneja e apropria-se tanto de seu tratamento que
ganha autonomia tornando-se protagonista do próprio cuidado e volta ao médico quando possui
dúvidas ou deseja aprimorar o tratamento.

5.2.2.1.1.4 Saúde da mulher

Na Saúde da Mulher, os entrevistados compartilharam a constatação de que há uma


maior incidência de procura pelo tratamento por pacientes abaixo dos 50 anos, ou seja, mulheres
mais jovens.
Ademais, os participantes ressaltaram que há indicações para todas as faixas-etárias,
pois o uso medicinal da Cannabis abrange uma ampla gama de condições peculiares à saúde e
bem-estar das mulheres, como: sintomas hormonais, reprodutivos e ginecológicos, para
tratamento de disfunções como TPM, enxaqueca, cólica menstrual, endometriose, disfunção
sexual, dispareunia, libido e lubrificação vaginal, desregulagem menstrual, ansiedade,
menopausa, fogacho, estresse, distúrbios do sono, ansiedade, esclerose múltipla e com grande
incidência fibromialgia refratária, dores crônicas de origem somática e ansiedade.
Um dos entrevistados avaliou de forma muito positiva a experiência que vivenciou junto
a uma paciente que necessitou passar por uma cirurgia, revelando sobre os benefícios que pôde
visualizar na analgesia e na cicatrização da pele, no pós-operatório.
Num consenso, os prescritores destacaram que o tratamento com canabinoides para as
mulheres proporciona benefícios no padrão geral de vida, pois é possível a redução de
medicamentos alopáticos principalmente opioides, ansiolíticos e antidepressivos, diminuição
de efeitos colaterais destes fármacos, as dores cessam, as pacientes voltam a praticar atividades
físicas, a sorrir, dormir bem, cantar, bordar e ter qualidade de vida.

5.2.2.1.1.5 Saúde do idoso

Na aplicação terapêutica da Cannabis em idosos, os entrevistados descreveram alguns


cuidados que o prescritor deve observar, pois são pacientes com um metabolismo mais lento e,
portanto, uma meia vida maior. Assim, sinalizaram que uma dose excedente pode provocar
sintomas como moleza, dificuldades para conseguir segurar coisas com as mãos e sonolência,
esclarecendo que a ocorrência destes efeitos é baixa e controlável por meio da progressiva e
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cuidadosa titulação da dose.


Ademais, como é comum a condição destes pacientes de polimedicação e de uso de
anticonvulsivantes e anticoagulantes, também apontaram a necessidade de atentar-se às
possibilidades de interação medicamentosa, ressaltando que dadas as especificidades é
importante considerar que esta parcela da população tem uma ótima resposta terapêutica ao uso
de óleos de THC e geralmente respondem ao tratamento com baixas ou baixíssimas doses.
Segundo a maioria dos entrevistados, a CM nesta faixa-etária é predominantemente
procurada para o tratamento de Alzheimer, quadros demenciais, dores crônicas e Parkinson,
para pacientes em torno de 80 anos de idade. Nesta população também há muita busca do
tratamento para quadros com convulsões, insônia, ansiedade e depressão, dor neuropática,
fibromialgia, doença inflamatória intestinal, retocolite e neoplasias.
Neste sentido, segundo as vivências narradas pelos prescritores junto aos seus pacientes,
o tratamento com canabinoides evitou a progressão do Alzheimer, conteve a evolução da lesão
neurológica, houve a preservação da lucidez, melhora da agitação, da comunicação, do
entendimento e da memória, os pacientes voltaram a lembrar de coisas que já não recordavam.
Outros resultados relevantes apontados, conforme a resposta do paciente, foram a possibilidade
de redução de fármacos alopáticos ou mesmo a retirada de anti-hipertensivos, anti-psicóticos e
benzodiazepínicos, sendo exequível ficar apenas com o óleo de Cannabis.
Por outro lado, os participantes também trouxeram da prática clínica a percepção de que
se o paciente já estiver num estado muito avançado da doença, o resultado não será tão bom no
sentido de recuperar as sequelas neurológicas de tudo que já se perdeu. Entretanto, salientaram
que, se a doença ainda está num estágio que não trouxe tantos comprometimentos, o resultado
do tratamento com canabinoides é ótimo, enfatizando que a melhora do cognitivo nos pacientes
chama muito a atenção e que nunca tinham visto o paciente “voltar para trás” com nenhuma
outra medicação.
Diante disso, alguns prescritores indicam o uso da Cannabis para os filhos de pais que
evoluíram com quadros demenciais quando atingem cerca de 50 anos de idade, como tratamento
preventivo, a fim de que não desenvolvam a doença.
Nos casos de Parkinson, as melhoras relatadas pelos participantes aconteceram nas
funções motoras, no humor, na depressão e embotamento, na consciência e na dor, sobressaindo
de modo peculiar, as respostas positivas para o tremor facial, sintoma este que traz muitas
implicações sociais para os pacientes e geralmente não responde aos fármacos convencionais.
Nas diversas condições de dor, os médicos explicaram que a terapia com a Cannabis
ajudou na modulação e na analgesia, com resultados muito positivos nos casos de dor severa,
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fibromialgia, dor crônica e principalmente na dor neuropática. Desta forma, esclareceram que
por vezes os tremores ainda permanecem, entretanto, é possível reduzir medicações alopáticas
nos casos de politratamento e o paciente consegue ter ânimo e sair da cama, uma resposta muito
gratificante.
Outro resultado extremamente significativo do tratamento com CM para os idosos,
relatado por um entrevistado, é a imunomodulação, algo importantíssimo, pois o paciente deixa
de ter infecções recorrentes, evitando uso de antibióticos e internações, um benefício
diferenciado que muitos prescritores desconhecem completamente.
No tratamento de idosos com câncer, os entrevistados enunciaram que os resultados são
incríveis e sobressaem em relação às demais doenças, pela melhora na qualidade de vida do
paciente. Estes médicos relataram esta percepção tanto ao narrar experiências próprias como no
compartilhamento dos bons resultados dentre os prescritores, concordando de que não é
possível afirmar que o tratamento com canabinoides cura câncer, pois uma metástase pode
aparecer até 20 anos depois do tumor inicial. Entretanto, foram unânimes em orientar que o
tratamento deve ser iniciado de forma precoce, a fim de que traga os melhores benefícios,
acrescentando que, existem estudos demonstrando que a CM ajuda a reduzir tumores em
diversos tipos de câncer como de mama, ovário, pâncreas, sistema gastrintestinal, pulmão e
mioblastoma.
Neste ínterim, um dos prescritores explicou que os canabinoides têm mecanismos de
ação antineoplásicos diferentes dos quimioterápicos e atuam em sinergia, mudando a relação
do tumor com o sistema imune, reduzindo a atração dos macrófagos e a disseminação de
metástases, diminuindo a capacidade das células cancerosas de formarem novos vasos. Segundo
ele, o CBD em altas doses consegue inibir o crescimento do tumor, pois induz um ambiente
desfavorável para seu crescimento, ao mesmo tempo em que provoca apoptose matando as
células do câncer. Assim, explicou que no tratamento de mioblastoma, o uso de CBD e THC
em altas doses reduz a velocidade de crescimento do tumor, além de matar as células
cancerígenas por apoptose, modificando a história da doença.
Para além do impacto nas especificidades fisiopatológicas da doença, os participantes
identificaram que o tratamento com canabinoides na oncologia tem três focos fundamentais
para o paciente: a quimioterapia, o cuidado paliativo e a sobrevida.
Em relação à quimioterapia, descreveram que a Cannabis dá suporte ao tratamento
diminuindo os efeitos colaterais das medicações, atuando sinergicamente e inclusive reduzindo
o tempo total de quimioterapia.
Se o câncer está em estágio avançado, os médicos indicaram que os benefícios da
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Cannabis estão voltados aos cuidados paliativos, no suporte à dor, aos aspectos
psicoemocionais e à melhora na qualidade de vida, reduzindo o sofrimento.
Mas, dentre os três focos, debatem que o benefício principal é o aumento da sobrevida
geral do paciente, que pode acontecer tanto pelo tratamento em si como também pela maior
proximidade na relação médico-paciente que o tratamento exige. Neste ínterim, salientaram que
o tratamento com a CM traz qualidade de vida para idosos com doenças em fase terminal,
sentimento de esperança e de certa forma satisfação, trazendo impactos também para a família.
Os prescritores citaram vários efeitos benéficos para a terceira idade, dentre eles os
principais foram os neurorregenerativos, neuroprotetores, anti-inflamatórios e sedativos que
favorecem em especial os pacientes com doenças refratárias e os pacientes polimedicados, que
sofrem com os efeitos colaterais dos medicamentos alopáticos.
Nesta mesma perspectiva, também descreveram que de forma geral os principais
resultados compreendem: a melhora da dor, do sono, do apetite, efeitos positivos na modulação
psicoemocional, melhora do comportamento disfuncional, melhora da agressividade, os
pacientes voltam a sorrir, a conversar, reconhecer os familiares, voltam a fazer algumas coisas
que não conseguiam mais fazer sozinhos, sendo possível inclusive o paciente ter percepção
sobre a própria melhora, mesmo em queixas subjetivas.
Por conseguinte, relataram que estes resultados significativos ocorrem no tratamento de
doenças neurológicas e crônico-degenerativas, pois há o resgate da autonomia do paciente, fato
que muda completamente a vida dos cuidadores que têm a sobrecarga diminuída. Assim,
afirmaram que é visível a situação destes cuidadores que antes passavam a noite acordados
cuidando da agitação do idoso e tendo que trabalhar no dia seguinte, frente às mudanças com a
melhora do idoso, pois passam a conseguir dormir com tranquilidade e voltar a uma rotina
cotidiana com qualidade de vida.
Na Saúde do Idoso, portanto, os participantes trouxeram o entendimento de que a
Cannabis, ao tratar patologias e sintomas, harmoniza as relações do paciente com a família à
medida que modula o humor, o comportamento e a percepção, melhora a autonomia e traz alívio
ao sofrimento, devolvendo ao paciente a dignidade de viver, dias nos quais ainda seja possível
voltar a sorrir.

5.2.2.1.2 Categoria: Cuidados

Nesta categoria, encontram-se as subcategorias: Efeitos colaterais, Interações


medicamentosas e Riscos e contraindicações.
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5.2.2.1.2.1 Efeitos colaterais

A maioria dos participantes seguramente apontou que a grande vantagem desta


terapêutica, além dos benefícios e eficácia, é a ausência ou baixa incidência de efeitos
colaterais, ressaltando que é sabido e muito claro que são incapazes de levar o paciente à morte
ou mesmo provocarem alguma situação grave. Assim, ainda que ocorram reações adversas ao
uso dos canabinoides, estas são muito menores quando comparadas aos efeitos colaterais dos
medicamentos alopáticos. Entretanto, consensuaram de que o paciente deve ser orientado sobre
os principais efeitos dos canabinoides, bem como o que esperar em altas dosagens.
Entrevistados assinalaram que em crianças, de modo geral, são poucos os efeitos
colaterais e, ao contrário do que acontece com os adultos, o CBD no início do tratamento pode
ser estimulante, provocar agitação e enjoo, interferindo no sono, observando que é um efeito
que passa após a adaptação. Assim também esclareceram que no tratamento do idoso, o efeito
colateral mais comum é a sonolência, prontamente controlável com o manejo da dose,
enfatizando sobre a importância de orientar os cuidadores.
Alguns prescritores mencionaram que o uso de alta dosagem de CBD, principalmente
de extratos isolados, pode provocar enjoo e vômito em pacientes com estômago mais sensível,
sonolência e tontura no início do tratamento, sendo outros efeitos comuns relatados a boca seca,
insônia, perda de apetite e diarreia.
Os médicos pontuaram que, no início do tratamento com uso de óleos ricos em THC,
pode ocorrer enjoo, desânimo, tontura, sonolência, mal estar, perda da noção do tempo,
confusão mental, discreta elevação da pressão arterial e sintomas gastrointestinais, seja
constipação ou diarreia. Um dos prescritores relatou que em alguns casos podem ocorrer
aumento da agressividade, irritabilidade e desregulação do sono.
Em relação ao efeito euforizante (psicoativo) do THC, um dos médicos desmistificou
dizendo que pode ser um resultado desejável ou não, dependendo da patologia e do paciente.
Afirmou ainda que é um efeito que pode ser controlado com a titulação da dose e que, em sua
prática clínica, não teve qualquer queixa de seus pacientes de ocorrência de alucinações ou
sintomas similares.
Neste sentido, dois participantes relataram que, em determinadas condições, o THC em
doses subclínicas pode produzir os mesmos efeitos que o CBD, mas com uma concentração
bem menor e livre de efeitos psicoativos. Entretanto, consideraram que o CBD puro tem sua
indicação peculiarmente para pessoas que não toleram o THC, encontrando uma boa aceitação
na psiquiatria e neurologia, especialidades endossadas pelo CFM para prescrever.
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Uma circunstância também apontada pelos prescritores foi a situação de que, por vezes,
os pacientes com dor crônica usam a Cannabis na forma fumada quando precisam de uma via
de administração rápida. Neste sentido, enfatizaram sobre a importância de esclarecer ao
paciente de que a queima é prejudicial e a fumaça é tóxica ao sistema respiratório, que traz
riscos, pode causar tolerância e certa dependência no futuro.
Alguns entrevistados sinalizaram que, mesmo analisando o conjunto plural de seus
pacientes, nenhum deles apresentou falha terapêutica ou piora, inclusive nas situações em que
a Cannabis foi o tratamento de primeira escolha e também não presenciaram a ocorrência de
efeitos colaterais, afirmando que não houve situação alguma em que foi necessário retirar ou
mesmo diminuir a CM, por isso não veem riscos ou malefícios nesta terapêutica. Deste modo,
afirmaram que o tratamento com canabinoides além de ser seguro, com pouco ou nenhum efeito
colateral, minimiza efeitos colaterais do tratamento com alopáticos à medida que torna possível
reduzir as dosagens, bem como retirar medicamentos. Assim, esclareceram que a Cannabis é
uma ferramenta terapêutica e é preciso saber usá-la, pois, tudo é questão de dose.
Um dos prescritores expressou sua indignação, dizendo que o pior efeito colateral é o
preconceito, pois leva muitos profissionais sem conhecimento a se posicionarem de forma
equivocada e errônea sobre o assunto.
Mediante as alegações e ponderações apresentadas pelos participantes, a experiência
clínica vivenciada junto aos pacientes revela que o tratamento com a Cannabis é seguro,
entretanto, podem ocorrer efeitos colaterais que são evitáveis quando o tratamento é manejado
adequadamente pelo prescritor, com a titulação da dose terapêutica.

5.2.2.1.2.2 Interações medicamentosas

Num discurso comum, alguns prescritores mencionaram que tomam cuidados com as
interações medicamentosas, especialmente em pacientes que utilizam anticoagulantes,
anticonvulsivantes, neurolépticos e principalmente benzodiazepínicos como Rivotril e
Diazepam, pois o uso simultâneo com a Cannabis tanto pode provocar sonolência como
provocar insônia, assim como altas doses de THC podem diminuir os níveis da nivaldina
(antirretroviral) se administrado concomitantemente, por isso é recomendado o intervalo de
administração de três ou quatro horas.
Entrevistados informaram que há muitos estudos sobre os receptores, enzimas e genes
relacionados ao CBD, mas ainda existe uma lacuna de estudos em relação ao THC, expondo
também que há certa preocupação e apreensão sobretudo em relação aos idosos que muitas
93

vezes já chegam polimedicados, no sentido de dificuldades que podem ocorrer durante a prática
clínica, salientando quanto a necessidade do médico aprofundar e ter atenção às possíveis
interações e saber como evitá-las.
Comumente os participantes apontaram aspectos que demonstram conhecimento em
relação aos fármacos que interagem com a CM, como evitar as interações, a necessidade de
aprofundamento nas pesquisas científicas e as situações de polimedicação que inspiram maiores
cuidados e acompanhamento.

5.2.2.1.2.3 Riscos e contraindicações

Ao questionar sobre possíveis riscos do tratamento com a CM, a maioria dos relatos dos
entrevistados descartou prontamente a possibilidade de riscos pelo uso medicinal e expressou
preocupações em relação ao uso fumado ou abusivo do THC, correlacionando à possibilidade
de desenvolvimento ou não de psicose e/ou esquizofrenia.
Alguns dos prescritores apontaram que, apesar de não terem presenciado qualquer
situação a respeito, o uso de THC em altas doses pode tornar o paciente menos interativo,
indisposto para o trabalho, trazendo repercussões na responsabilidade do indivíduo e impactos
sociais, tal como acontece no abuso de opioides. Também relataram que, quanto ao uso de
maconha fumada, é importante pensar os riscos para a população pediátrica e para os jovens
com propensão genética para esquizofrenia, pois o abuso de THC pode desencadear quadro
psicótico.
Neste sentido, apresentaram como principal contraindicação ao uso de THC os casos de
pacientes esquizofrênicos, psicóticos intensos, transtorno bipolar exacerbado e outros
transtornos psiquiátricos ou com casos na família, por receio de desencadeamento de crise.
Explicaram que são poucos casos, mas são pacientes que inspiram mais cuidados, requerendo
uso controlado em baixas/baixíssimas doses, uma boa avaliação do paciente e acompanhamento
com regularidade.
Corroborando sobre o assunto, alguns médicos esclareceram que em casos de psicose
ou mesmo no Alzheimer é necessário estabilizar a crise e controlar a patologia antes de iniciar
o tratamento com a CM, posto que é um fitoterápico e requer mudança no estilo de vida.
Noutra abordagem, prescritores narraram que nunca vivenciaram com seus pacientes
situações em que o uso terapêutico da Cannabis provocou psicose, salientando que esta é uma
questão que carece de estudo clínico. Segundo eles, as circunstâncias em que presenciaram
manifestações de pânico decorreram do uso abusivo de THC e configuraram um quadro
94

transitório, que cessou com a descontinuidade do uso. Neste âmbito, alertaram que a atribuição
de causa da esquizofrenia à maconha é uma afirmação temerária, ligada e correlacionada às
alusões do proibicionismo, corroborando que, até o momento, ainda não houveram estudos que
conseguiram de fato relacionar causa e efeito com a maconha excluindo outros fatores, como
por exemplo, o uso do álcool.
Em situações similares, um dos entrevistados explicou que, em pacientes com medo do
efeito psicoativo do THC, a própria ansiedade pode desencadear efeitos fisiológicos e
psicológicos desagradáveis.
Em perspectiva diversa, um médico explicitou sobre o tratamento com a CM que o risco
é muito pequeno e pode estar relacionado à hipersensibilidade do paciente a algum canabinoide
ou no uso concomitantemente com outras drogas metabolizadas pela via Citocromo P450, pois
pode ocorrer interação, aumentando ou diminuindo o clearance sistêmico, ou seja, afetando a
biodisponibilidade.
Participantes elucidaram que é necessário avaliar a necessidade e as hipóteses de riscos
caso a caso, ponderando que há pacientes que inspiram maior acompanhamento e
monitoramento, situações em que possa haver alguma contraindicação relativa, ou seja, casos
específicos principalmente de pacientes que usam muitas medicações, pacientes renais crônicos
ou com insuficiência renal grave pela falta estudos, casos que desenvolvem hiperemese ou têm
algum comprometimento hepático.
Alguns prescritores afirmaram que não indicam o tratamento com CM para pacientes
com problemas vasculares em uso de altas doses de anticoagulantes, infartados graves em uso
de antiarrítmicos, pacientes com doenças cardiovasculares e pulmonares graves, por receio do
paciente misturar os sintomas ou mesmo passar mal. Assim, outra preocupação que também
apresentaram foi com relação às gestantes, puérperas e mães que estão amamentando, por não
existir estudos suficientes de uso seguro.
A única contraindicação absoluta citada por um dos médicos foi para casos de depressão
endógena, que está relacionada a um fenótipo ligado à alteração genética, mas que ainda
necessita de aprofundamento das pesquisas. Para os demais tipos de depressão, ele retomou que
a Cannabis é muito indicada e por isso, é importante o levantamento do histórico familiar
durante a anamnese.
Num âmbito diverso, alguns médicos afirmaram não terem observado até então na
prática clínica situações que contraindicaram o uso terapêutico de canabinoides, não ouviram
relatos e desconhecem qualquer contraindicação absoluta até agora.
No cenário exposto, as citações dos prescritores demonstraram posicionamentos
95

diversos, desde a não existência de contraindicações, contraindicações relativas e


contraindicações absolutas, pautadas em situações nas quais não haja respaldo científico,
insuficiência de estudos, experiências da própria prática clínica ou mesmo para patologias sobre
as quais ainda não tenham lido ou estudado.
Medidas apontadas pelos participantes para precaver possíveis riscos, incluíram o
comprometimento do médico com o paciente ao orientar o tratamento e o cuidado necessário
na titulação da dosagem, intervindo prontamente nas primeiras manifestações.

5.2.2.2 Subtema – Vivências e experiências próximas

A decisão médica do uso terapêutico da Cannabis para si ou para um familiar, posterior


à singularidade dos enfrentamentos e apropriações individuais mediante os aspectos histórico-
sociais e científicos, adentra e envolve contextos peculiares de vida que trazem o campo da
atuação profissional para dentro de casa, uma complexidade inter-relacional dentre entes que
extravasa o binário clássico médico-paciente.

5.2.2.2.1 Categoria: Autoprescrição e prescrição para familiares

Nesta categoria, encontram-se as subcategorias: Experiência própria como paciente e


Vivências com entes familiares.

5.2.2.2.1.1 Experiência própria como paciente

Durante as entrevistas, houve relatos de pouco mais da metade dos médicos sobre
vivências no tratamento com a Cannabis para suas próprias patologias, incluindo a terapêutica
tanto em situações de quadros clínicos agudos, como em condições crônicas.
Desta forma, descreveram circunstâncias de saúde que os prejudicavam
consideravelmente tanto nas atividades de vida cotidiana, como no trabalho, por vezes até os
impedindo de atuar durante os períodos de agudização, citando patologias como crises de
ansiedade, crises de asma relacionadas à ansiedade, insônia importante, Lúpus com processos
de adoecimento e depressão, transtornos causados por estresse e esgotamento, hérnia de disco
cervical encarcerada, dor intensa e incessante por colocação de prótese metálica, dor crônica
por compressão de nervos com duração de mais de 40 anos, linfoma não Hodgkin, situações de
submissão a cirurgias e quimioterapia.
Por conseguinte, pontuaram que a autoprescrição do tratamento com canabinoides os
96

tem ajudado em muitos aspectos com um sucesso muito grande, com eficácia para quadros de
insônia, ansiedade e depressão, redução notória das crises de asma, diminuição e/ou retirada de
fármacos alopáticos, cessação das crises de Lúpus desde 2015, período em que começou o uso
medicinal da Cannabis, salientando nunca ter conseguido ficar tanto tempo sem nenhuma crise,
analgesia durante as cirurgias e pós-operatórios sem necessidade do uso de anti-inflamatórios,
melhor aceitação da doença e de como lidar com as questões de vida decorrentes da condição,
passar pela quimioterapia sem perder peso, sem dor, sem desespero, não vomitar nenhuma vez,
sem sofrer com as reações adversas. Neste sentido, afirmaram convictamente de que têm a clara
percepção e consciência de que a Cannabis foi crucial para o tratamento de suas condições,
ressaltando-a como um divisor de águas em suas vidas.
Com relação ao manejo, cada um teve experiências singulares dentro das vivências do
processo de adoecimento, entretanto, em comum passaram pela busca de informações seja por
iniciativa pessoal ou por aconselhamento com outro profissional. A partir disto, contaram
especificidades do tratamento, como por exemplo sobre o uso do CBD para dor crônica sem
resultado satisfatório, o que mudou completamente com o uso de apenas cinco gotas de um óleo
concentrado de THC, uso associado de extrato artesanal com um óleo importado rico em CBD
para conseguir chegar à melhor formulação para seu organismo, uso da Cannabis desde o início
do tratamento com quimioterapia tomando o óleo antes e após as sessões além do uso de horário,
uso da planta nos preparos da própria alimentação, uso no pré e pós-operatório, uso por
consumo homeopático, ou seja, usos personalizados adaptados à realidade de cada um, saberes
que adquiriram por meio de pesquisas, estudos, aprofundamentos e aprendendo com outros
prescritores participando de grupos, lendo e perguntando.
Os prescritores salientaram que a experiência pessoal com a Cannabis foi de extrema
importância, pois os ajudou a ter mais coragem, ver a partir dos próprios resultados que podiam
acreditar nessa terapêutica, ter o viés de um olhar diferente por testificar em si mesmo a vivência
deste tratamento e sentir na pele como é, ter segurança para prescrever, poder testemunhar a
realidade sem hipocrisia, o que os inspirou ainda mais a enfrentar os desafios de ser um médico
prescritor de CM na luta junto aos seus pacientes.

5.2.2.2.1.2 Vivências com entes familiares

Alguns participantes descreveram sobre suas vivências indicando a Cannabis para


tratamento de entes familiares, expondo algumas situações em que buscaram ajuda com
profissionais prescritores quando haviam esgotado todas as opções terapêuticas convencionais,
97

outras situações em que ouviram falar a respeito e, sem saberem por onde começar, foram
proativos, se informaram e assim tiveram a primeira experiência como prescritor.
Dentre os entrevistados, um deles descreveu que seu start para a prescrição de
canabinoides foi um familiar que desenvolveu Parkinson, outro contou sobre a necessidade de
saúde de um tio, três participantes relataram suas experiências com filhos com Autismo e um
deles com epilepsia refratária, um médico contou sobre sua luta para tratar sua mãe com
neuralgia do nervo trigêmeo e outro retratou sobre sua iniciativa para tratar a madrinha que tem
dor crônica, fibromialgia, dor neuropática, insônia e ansiedade.
Neste ínterim, uma psiquiatra contou que percebia que o filho tinha alguns
comportamentos diferentes, pois era muito zangado, a escola sempre ligava por ter batido num
coleguinha, batia a cabeça na parede quando pequenininho, por vezes tinha crises em que se
batia e quebrava as coisas, mas sempre terceirizava essas inabilidades sociais, porque por outro
lado passava de ano e era um garoto muito inteligente. Assim, o diagnóstico do autismo
aconteceu tardiamente, quando já tinha 16 anos e naquele momento sua vida mudou, passou a
entendê-lo e modificou sua relação com ele. Usou a risperidona, que a princípio foi efetivo,
entretanto, não segurava as crises, causou ganho de peso e desenvolvimento de mamas então,
pesquisando descobriu a opção da Cannabis, iniciou o uso do óleo de uma associação e buscou
autorização da ANVISA, para ter opções diferenciadas como chocolates, cápsula para usar
durante o dia e cápsula para usar a noite para dormir. E avaliando todo o contexto de luta com
seu filho, revelou que a médica precisou da mãe para conseguir chegar nesse lugar.
Contribuindo, outra médica relatou que sempre teve muitos pacientes autistas, inclusive
faz diagnóstico de autismo tardio, situações em que a pessoa passou a vida em sofrimento, se
achando inadequada e vê como o diagnóstico por vezes é libertador. Neste contexto, expôs que
já prescrevia canabinoides, mas apenas quando tudo que havia tentado tinha dado errado,
somente para patologias cujas indicações tinham estudos e nunca era a terapia de primeira
escolha. Ela pontuou que há dois anos recebeu o diagnóstico de Autismo de seu filho e, a partir
de sua vivência visualizando os resultados do próprio filho, passou a refletir e enfaticamente
declarou que se arrepende de não ter começado o tratamento com a Cannabis antes, por falta
de informação, pois no mesmo sentido, em sua prática clínica, muitos de seus pacientes
poderiam estar bem melhores há muito tempo.
Num mesmo contexto de vida, um participante relatou que tem um filho autista e
epilético que depende do uso medicinal de Cannabis e a partir desta experiência própria,
observando os resultados e sua melhora, tomou a decisão e começou a estudar para prescrever
para seus pacientes.
98

Noutro âmbito, um entrevistado contou que seu primeiro contato com a Cannabis foi
para o tratamento de sua mãe que tem neuralgia do trigêmeo, uma dor que chegou num estágio
insuportável, mesmo com os diferentes tipos de tratamentos realizados. Segundo ele,
declinando sobre uma indicação de uma intervenção cirúrgica, foi quando pesquisando soube
do uso medicinal da Cannabis, tentou o tratamento com CBD, mas não obteve resultados
satisfatórios. Entretanto, seu irmão insistia no uso do THC e mostrando publicações sobre as
aplicações terapêuticas o convenceu a tentar. Ele tomou coragem, realizou a prova terapêutica
em si para depois iniciar com sua mãe, acompanhando-a de perto, administrando um óleo
artesanal que além de suprimir o choquinho na língua que ela sentia e cessar as dores, não
provocou qualquer efeito colateral.
Um médico expôs que sua primeira experiência prescrevendo a Cannabis foi para sua
madrinha que tinha dor crônica, fibromialgia, dor neuropática refratária, insônia e ansiedade,
com resultados expressivos. A partir desta vivência, pôde ver amigos que fumavam maconha,
começaram a usar o óleo artesanal e pararam de fumar, bem como outros tantos resultados em
pessoas próximas de seu convívio, fatos que despertaram seu interesse e o levaram a incluir
essa terapêutica em sua vida, possibilitando constatar resultados maravilhosos em várias
patologias.
Corroborando, um médico contou que seu primeiro carimbo de prescrição de CM foi
para um tio, indicando o uso de um óleo full spectrum de associação.
Nesta perspectiva permeada por vínculos e afetos, foi possível perceber durante as falas
dos entrevistados que, prescrever para familiares impõe responsabilidades que extravasam a
relação médico-paciente, pressupondo relações de confiança num contexto de subjetividades,
potencializando emoções, sentimentos e significados com relação à terapêutica e aos resultados
proporcionados.

5.2.3 Tema 3: Percepções dos participantes sobre o acesso à Cannabis Medicinal

Nesse tema foram abordados os relatos dos entrevistados sobre as percepções quanto o
acesso dos pacientes ao tratamento com canabinoides.
Assim, foram organizados os subtemas ‘Dificuldades de acesso ao Tratamento’ e
‘Políticas Públicas e Perspectivas Socioeconômicas’, delineados em categorias e suas
respectivas subcategorias, conforme Quadro 5.
99

Quadro 5 – Percepções dos participantes sobre o acesso à Cannabis Medicinal

SUBTEMAS CATEGORIAS SUBCATEGORIAS

1. Tabus e Preconceito
1. Fatores negativos 2. Insuficiência de Prescritores
incidentes 3. Custo do Tratamento
4. Falta de Regulamentação
1. Dificuldades de
acesso ao Tratamento
1. Luta dos pacientes e famílias
2. Fatores positivos
2. Atuação dos médicos prescritores
incidentes
3. Caminhos para melhorar o acesso

1. Prescrição de Cannabis no SUS


1. Políticas Públicas de
2. Fomento de Políticas Públicas
Saúde
3. Monetização e Farmacêuticas
2. Políticas Públicas e
Perspectivas
Socioeconômicas 1. Saúde, Economia e impacto social
2. Aspectos
2. Produtos disponíveis
socioeconômicos

Fonte: Elaboração própria.

5.2.3.1 Subtema: Dificuldades de acesso ao tratamento

Os médicos prescritores descreveram sobre aspectos e nuances que interferem no acesso


à terapêutica com canabinoides, retratando tanto as dificuldades como os caminhos possíveis
junto aos pacientes.

5.2.3.1.1 Categoria: Fatores negativos incidentes

Nesta categoria, encontram-se as subcategorias: Tabus e Preconceito, Insuficiência de


Prescritores, Custo do Tratamento e Falta de Regulamentação.

5.2.3.1.1.1 Tabus e preconceito

Vários entrevistados afirmaram que o acesso ao tratamento é muito prejudicado em


razão do preconceito com relação ao uso da Cannabis aliado a falta de conhecimento e à
ignorância, que acontece tanto por parte dos profissionais como por parte dos pacientes,
indicando ser este um empecilho pior que a própria falta de legislação, uma variável que
100

inclusive impede os avanços na regulamentação.


Considerando estes aspectos sociais, o participante P2 enumerou alguns
questionamentos dos quais se utiliza na desistigmatização da temática durante sua abordagem,
como: ‘Se fosse um familiar seu, você não daria?’, ‘Por que não?’, ‘Por que você não daria?’,
“Se você prescreve um monte de outras medicações, nada funciona e você sabe que não vai
adiantar, mesmo sendo conservador, se fosse com um familiar seu, por que você não daria?”,
“Por que você não tentaria?”, “Se é seguro, por que não?”, “Se nada dá certo, por que não?”.
Numa análise geral, os entrevistados pontuaram que, ainda que haja tantos tabus e
dificuldades de acesso, os avanços são progressivos e não há como refutar as respostas dos
pacientes que são tão significativas e evidenciam dia-a-dia os resultados benéficos e
impactantes do tratamento, pois estão ali, acontecendo o tempo todo nos consultórios,
quebrando o preconceito pela a ciência e pela luta da sociedade.

5.2.3.1.1.2 Insuficiência de prescritores

Muitos entrevistados colocaram que a primeira condição para o acesso ao tratamento é


o paciente buscar um médico prescritor para saber se possui indicação ou não para o tratamento,
sendo consenso dentre os prescritores que a Medicina Canabinoide no Brasil está longe de ser
algo facilmente alcançável, pois o número de prescritores não atinge nem 0,1% da classe
médica, ou seja, é baixíssimo frente à necessidade da população.
Neste sentido, os entrevistados usaram algumas expressões elucidando a respeito, tais
como: não existem prescritores suficientes, a gente sabe disso, é óbvio, são muito poucos
prescritores, é insuficiente, estamos muito distantes, somos um número muito pequeno, poderia
ter muito mais, temos muito poucos médicos prescritores, com certeza é insuficiente, falta
bastante ainda, não tem muitos médicos que prescrevem.
Entretanto, ressaltaram que o número de prescritores melhorou bastante em comparação
com a quantidade de médicos desde quando começou a prescrição no Brasil, explicando que
atualmente não é mais restrito à psiquiatria ou neurologia, pois qualquer médico pode
prescrever, apesar da postura reticente do CFM, que mantém uma regulamentação restritiva e
anacrônica que autoriza a prescrição de canabinoides à apenas 0,5% dos médicos brasileiros.

5.2.3.1.1.3 Custo do tratamento

Nos aspectos econômicos, para além das questões de acesso ao médico prescritor que
101

só é possível para quem tem dinheiro e pode pagar pela consulta e acompanhamento particular,
uma constatação unânime dos entrevistados destacou como óbice o custo do tratamento que o
torna restrito, acessível apenas para aqueles que podem pagar e arcar com a manutenção do
tratamento, pontuando que, mesmo para os pacientes com melhores condições financeiras, os
produtos liberados, que vendem em farmácias ou por importação são muito caros.
Neste cenário, os participantes descreveram que é uma lástima ver a dificuldade de
acesso pelo custo do tratamento, salientando que essa é a pior parte, a situação que mais frustra
e cansa o prescritor que acredita e trabalha com dedicação junto aos seus pacientes, ao ver o
paciente sair com receita, feliz e esperançoso e, depois de alguns meses, responder que não
conseguiu dar continuidade e manter o tratamento.

5.2.3.1.1.4 Falta de regulamentação

Sob o prisma legislativo, os entrevistados arguiram que o status da não legalização da


Cannabis sativa L contempla interesses escusos de grupos políticos e econômicos que atuam
para que continue desta forma, identificando que são questões que envolvem o lucro, comércio
de armas, o tráfico e todas as esquivas deste meio marginal que os mantêm.
No contexto jurídico, os prescritores apontaram sobre a realidade dos médicos de que
tudo passa por este crivo e que há medo das questões legais, por ignorância ou falta de
conhecimento, dúvidas sobre como prescrever, para quais patologias pode indicar, se pode ser
penalizado pelo Conselho, se vai ou não ter algum problema com a polícia, até mesmo se pode
estimular ou não o paciente ao cultivo doméstico, por ser uma situação que está à margem da
Lei.
Assim, argumentaram que a ausência de uma robusta regulamentação constitui um
atraso, pois inviabiliza as pesquisas e impede os brasileiros de buscar soluções em saúde por
meio da ciência, ressaltando que a lógica de tais práticas constitui a perpetuação da indústria da
doença, cuja exploração propõe um ciclo, uma cadeia predatória em que o paciente se torna
refém, capturado por condições de saúde que só se agravam ao longo do tempo, concluindo
pela necessidade premente de mobilização social para o avanço na pauta da regulamentação.

5.2.3.1.2 Categoria: Fatores positivos incidentes

Nesta categoria, encontram-se as subcategorias: Luta dos pacientes e famílias, Atuação


dos médicos prescritores e Caminhos para melhorar o acesso.
102

5.2.3.1.2.1 Luta dos pacientes e famílias

Segundo os prescritores, um aspecto relevante para o aumento do número de prescritores


e o avanço no acesso ao tratamento com a CM tem sido a divulgação dos resultados vivenciados
pelos pacientes, por meio das diferentes mídias, o que levou ao aumento progressivo na procura
da população, principalmente nos casos de doenças progressivas e refratárias, condições em
que os pacientes têm evidenciado na prática clínica a boa qualidade e segurança do tratamento.
Os participantes apontaram que este movimento dos pacientes e famílias tem levado a
população a se instruir e adotar uma postura ativa e ativista, chegando até os médicos munida
com artigos científicos, demonstrando a indicação para o tratamento e pedindo ajuda, cobrança
esta que tem um peso considerável para o médico.
Neste sentido, os entrevistados reforçaram que existe uma demanda muito grande dos
pacientes pelo acesso ao tratamento com Cannabis para necessidades de saúde e alívio do
sofrimento, pacientes idosos e crianças que viajam até mais de 12 horas para uma consulta
presencial, por não encontrarem nenhum médico prescritor mais próximo de suas localidades.
Por conseguinte, complementaram que a sensibilização dos médicos vem acontecendo
por meio dos pacientes mostrando as respostas, as mães e famílias divulgando o que o
tratamento com a Cannabis proporcionou na vida de seus filhos, testemunhos de vida que são
provas vivas, as evidências que os médicos prescritores presenciam cotidianamente, o que
concluem que é motivador e motriz dentro da sociedade.

5.2.3.1.2.2 Atuação dos médicos prescritores

Os entrevistados identificaram que o médico prescritor também tem um papel


importante na ampliação do acesso à CM, à medida que com ética compartilha com outros
médicos as vivências e resultados do tratamento de seus pacientes, mostrando a veracidade dos
fatos e que não se trata de um tratamento empírico ou placebo, ou seja, o exercício de um papel
social pedagógico do prescritor explicando, desmistificando, desestigmatizando e
sensibilizando os colegas de profissão quanto o uso da Cannabis enquanto ferramenta
terapêutica.
Neste âmbito, numa perspectiva de conscientização, pontuaram que os médicos que
prescrevem a CM precisam realizar uma força tarefa em cada estado, a partir de um
planejamento e uma programação de ações não apenas no meio médico, mas junto à sociedade
civil como um todo, ao meio jurídico, aos movimentos sociais, com palestras nos conselhos
103

regionais, promover lives e outras atividades para a divulgação do SEC e o tratamento com
canabinoides, pois o conhecimento pode facilitar o acesso do paciente ao tratamento seja por
meio da compra do medicamento, fornecimento pelo SUS ou por meio de autorização judicial
para o cultivo doméstico.
Assim, apontaram que estão chegando novos prescritores todos os dias e que os médicos
que já prescrevem estão nos projetos de partilha, somando e ajudando estes novos prescritores,
bem como expuseram que os médicos que estão se formando agora ou mesmo que ainda estão
na faculdade têm demonstrado bastante interesse e procurado conhecer sobre o uso medicinal
da Cannabis e a prática clínica, condições favoráveis que podem aumentar significativamente
o número de prescritores, pelo embasamento teórico-científico e pelo desenvolvimento de
segurança em relação à terapêutica.
Consequentemente, confluíram de que, mesmo na vigência deste governo conservador,
grandes avanços estão acontecendo de modo que acreditam numa renovação das lideranças que
estão dentro das instituições de saúde ao findar desta gestão.

5.2.3.1.2.3 Caminhos para melhorar o acesso

Os entrevistados expuseram que para além das dificuldades enfrentadas, existem fatores
que podem incidir favoravelmente para que haja a democratização do acesso ao tratamento,
apontando que muito ajudaria nesta questão a incorporação da Cannabis ao SUS, pois assim os
médicos conseguirão chegar até quem precisa e hoje não tem acesso.
Outro ponto salientado pelos prescritores é de que temos avanços interessantes, pois há
progressivamente um aumento da apropriação sobre o conhecimento de modo que opinaram
ser uma questão de tempo, de experiência, de começar aparecer as informações nos congressos
e cursos, dos médicos verem na prática que a terapêutica tem resultado, para que mais médicos
avancem na prescrição.
Nesta perspectiva, concordaram que para aumentar o número de prescritores é
necessário mais estudos, mais conhecimentos e o caminho se perfaz desde a formação na
faculdade com ciência e educação em saúde, com difusão de informações, divulgação dos
avanços na ciência, nas pesquisas e a introdução deste conteúdo na formação, seja em disciplina
ou na abordagem como tema durante a graduação, enfatizando que se o uso da Cannabis fosse
popularizado, se a prescrição de canabinoides fosse mais disseminada e mais consciente, não
teríamos essa realidade de um médico que se recusa a oferecer uma opção de tratamento que
talvez seja a única que beneficiaria seu paciente.
104

Uma iniciativa muito importante descrita pelos participantes foram os mutirões de


atendimentos gratuitos por meio de projetos junto às associações, que além de assistir aos
pacientes hipossuficientes e vulneráveis no acesso ao tratamento, incluiu novos médicos na
atuação como prescritores. Estas ações foram interrompidas com a chegada da pandemia.
Por outro lado, os prescritores também citaram como ferramenta o acesso dos pacientes
aos médicos por meio da internet, realizando buscas nos sites das associações e mídias sociais,
procurando diretamente esse tipo de tratamento e pesquisando profissionais que o prescrevem.
Com relação ao custo elevado dos produtos, ressaltaram que é necessário que os
prescritores pensem junto aos seus pacientes estratégias para viabilizar uma autossuficiência
seja em produção a nível individual, como em cooperativismo, ou mesmo em como fomentar a
escala industrial, ainda que farmacêutica, a fim de que os pacientes que precisam e não podem
pagar saiam da marginalização imposta pelo cenário estatal atual. Neste sentido,
fundamentaram que este problema poderia ser amenizado e seria mais simples de se resolver se
fosse possível a produção e comercialização nacional, bem como se houvesse a regulamentação
e os pacientes pudessem plantar, cultivar e fazer o próprio remédio.
Parte dos médicos prescritores defendeu que na atualidade a melhor forma de acesso é
pelo contato com as associações de pacientes, se associando, buscando o coletivo de sua cidade,
instruindo de que a sociedade precisa aprender a funcionar em rede, num fluxo que permita ao
paciente ter suas necessidades acolhidas ao acionar esta rede no município, na sua comunidade.
No contexto, esclareceram que mesmo que a associação ainda não esteja com autorização
judicial para a produção, o ato de cultivar e produzir o remédio para seus associados não pode
ser entendido como uma conduta criminosa, mas ser compreendido a partir do conceito de
desobediência civil pacífica diante da resistência e inércia do Estado, que mantém a sociedade
a margem da Lei.
Assim, intuíram que, se cada estado tivesse pelo menos uma associação e se essa
associação fosse ligada a uma universidade, seria possível produzir e atender uma boa parte das
pessoas que precisam, pois com uma supervisão médica e o acompanhamento técnico e
tecnológico de uma faculdade, seria viável entregar um produto artesanal final de qualidade e
mais funcional aos pacientes.

5.2.3.2 Subtema: Políticas PÚBLICAS e perspectivas socioeconômicas

Neste subtema, os médicos prescritores teceram uma análise do cenário da Cannabis no


Brasil, trazendo pontos importantes no contexto da construção para implementação de políticas
105

públicas de acesso à CM e também sobre constituintes sociais e econômicos imbricados neste


processo.

5.2.3.2.1 Categoria: Políticas públicas de saúde

Nesta categoria, encontram-se as subcategorias: Prescrição de Cannabis no SUS,


Fomento de Políticas Públicas e Monetização e Farmacêuticas.

5.2.3.2.1.1 Prescrição de Cannabis no SUS

No panorama do SUS, alguns prescritores relataram que é inerente à prática médica


orientar o paciente a buscar o melhor tratamento para sua condição de saúde, afirmando que a
inserção do tratamento com Cannabis na Saúde da Família, onde estão os pacientes mais pobres
e que menos conseguem acessar o tratamento, seria eficiente para a resolução de 80% dos casos.
Entretanto, ponderaram que existe normativas que impõem que não se pode prescrever
qualquer medicação que não esteja no escopo do SUS, pela possibilidade de gerar
judicialização, exemplificando que toda vez que um médico for prescrever um produto que não
seja padrão SUS deverá, além da receita, fazer um relatório pormenorizado com uma via para
o paciente, outra que fica no prontuário, uma para a farmácia, ou seja, burocracias que
dificultam muito, assustam e coagem os médicos a não prescreverem medicações passíveis de
judicialização, situação tal que obsta ao paciente do SUS ter acesso à CM.
Diante disso, muitos revelaram que no serviço público evitam conversar sobre
Cannabis, recomendam que o paciente busque por uma lista de médicos prescritores, até fazem
orientações para os pacientes quando chegam pedindo pelo tratamento, porém têm um receio
muito grande de indicar a CM na esfera pública em razão do cenário político que estamos
vivendo atualmente. Então, dentro do SUS não se declaram como médico prescritor, apesar de
atenderem muitos casos que se beneficiariam com a terapêutica, lamentando que poucos são os
pacientes que conseguem o acesso à terapia canabinoide por meio do custeio do governo.
Noutra perspectiva, o entrevistado P11 contou que não tem consultório, é professor e
seu único local de trabalho é no SUS, onde procura acompanhar o maior número possível de
pacientes, esclarecendo que desenvolve este trabalho indicando o tratamento informalmente,
conversando, tentando entender qual a intenção do paciente, verificando se realmente tem essa
abertura. Em sua opinião, o paciente deve demandar do seu SUS, dizer que ouviu informações
sobre o tratamento e que deseja ter acesso para a melhoria de suas condições de saúde, acionar
106

os Conselhos de seu município e buscar apoio nos coletivos.


No tocante à judicialização do SUS, não alheios quanto as críticas dificuldades de
financiamento do sistema e o processo progressivo de desfinanciamento, os médicos
argumentaram que, enquanto não houver um mercado regulado e políticas públicas eficientes
para a garantia do direito dos pacientes de acesso à terapêutica, este é um fato inerente.

5.2.3.2.1.2 Fomento de políticas públicas

No campo de políticas públicas no cenário nacional, os entrevistados elucidaram ver


uma construção muito interessante de regulamentação, um avanço nas discussões com relação
à descriminalização do uso de drogas, um progresso no desenvolvimento das pesquisas,
inclusive no mundo como um todo.
No entendimento dos médicos que trabalham na saúde pública, o tratamento com a
Cannabis deve ser viabilizado na Farmácia Viva, dentro das Práticas Integrativas
Complementares do SUS, sendo essencial a conscientização sobre esse processo de assistência.
Assim, defenderam que o tratamento deve ser demandado pelos cidadãos do município uma
vez que o governo municipal também é omisso, cabendo ao paciente em contato com a
sociedade civil exercer o papel de pressionar o governo.
Neste contexto, os entrevistados apontaram que um caminho ideal seria o
estabelecimento de uma rede de assistência e apoio articulando dentro do território os pacientes
junto à comunidade, aos Conselhos, às associações e universidades, num trabalho em conjunto
com o poder público, com esforços comuns para a legitimação e viabilização do acesso à CM.
Por sua vez, também cabe aos médicos prescritores neste processo a postura proativa no
sentido de levar conhecimentos e se manter disponível para explicar, discutir, descrever sobre
a repercussão de suas vivências na prática clínica, realizando a inserção da temática na atenção
primária e secundária e nas práticas integrativas, convidando as diferentes instâncias
governamentais para os eventos e atividades nas universidades, bem como a imprensa para
ampla divulgação e cobertura, assim como toda a sociedade de modo geral, embora ainda haja
nuances um pouco contraditórias.

5.2.3.2.1.3 Monetização e farmacêuticas

Os participantes salientaram que as mudanças que foram ocorrendo ao longo do tempo


no Brasil decorreram da dura luta dos pacientes junto aos médicos e logo em seguida, houve o
107

interesse da indústria que começou a se articular.


Por conseguinte, descreveram que neste cenário da CM, sempre houve aqueles que
“cresceram os olhos” e vislumbraram possibilidades de fazer negócios voltados ao lucro,
divulgando marcas de extratos de Cannabis, práticas habituais perpetuadas pela indústria
farmacêutica que mantém a regularidade destas condutas e quando descobre que o médico está
prescrevendo o procura para mostrar seus produtos, buscando que os prescreva, fato que
acontece principalmente com os extratos que são específicos, pois cada indústria tem uma
concentração diferente, uma porcentagem diferente de cada canabinoide, de modo que cada um
quer “vender seu peixe”.
Noutro prisma, participantes admitiram que quaisquer expectativas com relação a
mudanças na postura do atual governo estão estritamente ligadas aos interesses e motivações
de grupos ligados às indústrias, farmacêuticas e ao desenvolvimento de commodities, dentro de
um projeto neoliberal.

5.2.3.2.2 Categoria: Aspectos socioeconômicos

Nesta categoria, encontram-se as subcategorias: Saúde, Economia e impacto social e


Produtos disponíveis.

5.2.3.2.2.1 Saúde, economia e impacto social

No âmbito dos custos para a saúde pública, os participantes elucidaram ainda que,
pacientes em uso de CM, têm redução do uso de altas tecnologias em saúde, como idas ao
Pronto Socorro, internações em UTI, redução ou interrupção do uso de outros medicamentos,
inclusive de alto custo, ou seja, é claramente vantajoso para o sistema público de saúde.
Noutra perspectiva, destacaram que a implementação de toda a cadeia de produção da
Cannabis pode trazer geração de renda para o país, impactando positivamente nossa Economia,
um resultado importante a ser considerado pelo governo para sua aprovação e regulamentação.
Os médicos destacaram impactos positivos sobre aspectos sociais e econômicos,
assinalando que ao tratar o paciente, melhorando as condições de saúde, o comportamento, o
sono e a independência, reduz-se o sofrimento e a sobrecarga dos cuidadores, refletindo no
descanso, no sono e inclusive na renda, porque muitos conseguem voltar a trabalhar. A partir
desta constatação, entendem que o tratamento com CM traz impacto positivo para toda a
sociedade, pois a melhora do paciente repercute diretamente em todo contexto social no qual
108

está inserido: na família, no trabalho, junto aos terapeutas e vínculos de amizade.

5.2.3.2.2.2 Produtos disponíveis

Os entrevistados colocaram que o acesso seguro do paciente ao tratamento com


canabinoides, está primeiramente ligado ao médico que precisa estar aberto para prescrever,
reforçando que cada indivíduo é único e que para cada organismo a terapêutica tem uma
repercussão, pressupondo do prescritor conhecimento e disponibilidade na escolha do produto
e no manuseio da dose junto ao paciente, acompanhamento da evolução clínica e o uso
direcionado especificamente ao objetivo terapêutico.
Neste ínterim, os participantes apontaram que há uma variedade de tipos de produtos
desde óleos de cultivo doméstico produzido pelo próprio paciente ou familiar, óleos produzidos
por jardineiros que geralmente se mantêm anônimos por estarem à margem da lei, óleos
artesanais produzidos pelas associações de pacientes, óleos padronizados nacionais disponíveis
para a compra em farmácias e uma diversidade de produtos importados passíveis de serem
adquiridos mediante autorização de importação da ANVISA, cada qual com suas vantagens e
desvantagens quando analisados sobre o prisma específico das necessidades e possibilidades
individuais de cada paciente, considerando os caminhos para alcançar o produto, o controle de
qualidade, bem como o custo final do tratamento. De forma geral, concordaram que, assim
como temos bons produtos no mercado externo, temos óleos de boa qualidade no Brasil.
Em relação aos tipos de produtos, os prescritores descreveram como ideais aqueles
preparados a partir planta inteira, categorizados como full spectrum, pois identificam na prática
clínica que os pacientes que fazem uso destes óleos apresentam melhores respostas em razão
do efeito comitiva, pela sinergia dos canabinoides, também descrito como efeito entourage.
Entretanto, expuseram a limitação de raramente encontrarem estudos com o óleo full spectrum,
o tipo de produto mais acessado pelos pacientes, pois geralmente os estudos são com produtos
isolados e o número mais expressivo de publicações trata predominantemente do CBD e THC.
Noutra perspectiva, alguns entrevistados afirmaram não ter presenciado qualquer
problema com nenhum óleo, seja o importado ou o nacional. Estes participantes esclareceram
que, sobre os diferenciais dentre os produtos, tomam decisão considerando as necessidades do
paciente, de forma que, se é uma patologia que necessita de maior aporte de CBD, optam por
um óleo importado que alcança a vantagem de apresentações muito concentradas em CBD, mas
tem a limitação do THC, se é uma patologia que precisa de tratamento com mais THC, optam
pelo o arsenal terapêutico das associações brasileiras que dispõem de produtos com um
109

predomínio do THC e, por fim, se é uma patologia tratável com relações proporcionais de CBD
e THC, optam por um óleo equilibrado brasileiro ou ampliam o espectro do tratamento
combinando óleo nacional e óleo importado, quando possível e viável para o paciente.
O médico P7 exemplificou o uso combinado de produtos relatando que, quando trata
um paciente com câncer, foca no CBD em altas doses para o efeito antineoplásico e utiliza o
THC principalmente para redução dos efeitos dos quimioterápicos e nos cuidados paliativos.
Os prescritores relataram validar todas as formas de produtos, principalmente os
naturais, pois o paciente precisa ter acesso à terapêutica da forma que for possível, seja por
meio de um óleo artesanal de uma cepa rica em THC ou um óleo rico em CBD, ainda que em
uso de subdoses por não poder aumentar a quantidade do óleo em razão dos custos, ressaltando
a importância de tonificar o SEC.

5.2.4 Tema 4: Formação dos médicos prescritores de Cannabis Medicinal

Nesse tema foram delineadas as vivências, experiências, percepções e concepções dos


prescritores de Cannabis Medicinal sobre os caminhos percorridos e expectativas de avanços
na ciência e formação médica.
Assim, foi organizado o subtema ‘Determinantes na Formação Médica’, descrito em
categorias e suas respectivas subcategorias, conforme Quadro 6.

Quadro 6 – Formação dos médicos prescritores de Cannabis Medicinal

SUBTEMA CATEGORIAS SUBCATEGORIAS

1. Percursos do 1. Iniciativas dos prescritores na


Conhecimento aprendizagem

1. Cannabis Medicinal nas


1. Determinantes na Instituições Formadoras
Formação Médica 2. Cannabis
Medicinal na 2. Inserção na Grade Curricular
Educação Médica
3. Medicina Canabinoide: ciência e
pesquisa

Fonte: Elaboração própria.

5.2.4.1 Subtema: Determinantes na formação médica

Neste subtema, foram apresentados os discursos dos entrevistados descrevendo sobre o


110

processo de aquisição de conhecimentos, aspectos que incidiram durante o percurso formativo


e os desafios nas instituições formadoras, nas pesquisas e na ciência.

5.2.4.1.1 Categoria: Percursos do conhecimento

Nesta categoria, encontra-se a subcategoria: Iniciativas dos prescritores na


aprendizagem.

5.2.4.1.1.1 Iniciativas dos prescritores na aprendizagem

A maioria dos prescritores se denominou autodidata em razão de buscar conhecimentos


por iniciativa própria, forma pela qual estes profissionais foram conhecendo sobre os
canabinoides, terpenos, estudando a planta em si e todas as suas partes, pois é tudo muito recente
e há publicações de novas descobertas constantemente.
Alguns participantes contaram que o início foi bem difícil, pois estavam sozinhos
tentando desbravar esse universo pouco acessível. Destarte, relataram que o caminho se tornou
muito menos complicado quando encontraram apoio de outros prescritores e passaram a receber
bastante literatura, assim como a convivência com grupos de associações e grupos de cursos,
que possibilitou um desenvolvimento e aprofundamento muito mais rápido.
De modo geral, os entrevistados retrataram que, com o início de uma divulgação maior
no Brasil sobre as aplicações terapêuticas da Cannabis, começaram a acompanhar sobre seus
usos para epilepsia, dor, câncer e outras patologias, atentos sempre em relação às constatações,
estudando a fundo, buscando informações por meio de publicações, artigos científicos, livros,
cursos online, inclusive fora do Brasil, congressos, atualizações, conhecendo centros de
pesquisa in loco, entendendo como é o acesso e as questões da legislação brasileira, aprendendo
a acompanhar as redes sociais por onde são divulgados e acontecem vários eventos e a colocar
o conhecimento em prática, introduzindo na rotina cotidiana a prescrição da CM. Assim,
ilustraram que é necessário buscar artigos científicos, ler sobre um assunto, pesquisar outro
artigo que contraponha o primeiro, e assim por diante.
O participante 11 salientou que, como sanitarista, epidemiologista e estudioso da
medicina baseada em evidências, tem seus critérios de busca, esquivando-se das “evidências”
produzidas a partir do interesse das empresas, declarando que sente falta de um posicionamento
dos médicos que já prescrevem de compartilhar as experiências e conhecimentos de uma forma
mais clara e mais acessível.
111

Uma limitação descrita por um dos prescritores (P8) relacionada aos obstáculos na
adesão de médicos à CM e à dificuldade dos pacientes na busca de informações é a questão da
língua, pois as publicações dos artigos são preponderantemente em inglês.
Acrescentando, alguns participantes relataram que a aquisição de conhecimentos sobre
a Medicina Canabinoide também permitiu que exercessem à docência levando conteúdos para
seus alunos que estão sempre perguntando e têm bastante interesse, circunstâncias que os
estimulam ainda mais como prescritores, impulsionando progressos na academia por meio de
iniciativas de projetos de pesquisa e extensão.
Por conseguinte, se posicionaram partilhando que o conhecimento nunca é suficiente,
pois se aprende todos os dias estudando, pesquisando, assistindo documentários, lives,
palestras, cursos sobre o SEC, evidências clínicas das indicações e como prescrever,
participando de grupos de discussão e mentoria, com a clareza de que nem os profissionais mais
dedicados têm o domínio sobre tudo, nem nunca terão.

5.2.4.1.2 Categoria: Cannabis Medicinal na educação médica

Nesta categoria, encontram-se as subcategorias: Cannabis Medicinal nas Instituições


Formadoras, Inserção na Grade Curricular e Medicina Canabinoide: ciência e pesquisa.

5.2.4.1.2.1 Cannabis Medicinal nas instituições formadoras

De modo geral, independente do ano de formação, os participantes contaram que não


tiveram qualquer conteúdo durante a graduação que abordasse sobre o SEC e a terapêutica com
canabinoides, sendo a única abordagem ofertada noções negativas atribuídas aos usos da
Cannabis, prevalecendo uma ausência de espaços de formação para que os médicos se tornem
prescritores, fato que é compreendido desde a graduação, o primeiro local formal de aquisição
de conhecimentos.
Os prescritores admitiram que, apesar de o SEC ser uma descoberta mais recente,
somado ao fato de que o conteúdo teórico da graduação foi estruturado há pelo menos 25 anos,
boa parte dos cursos de medicina ainda não possui qualquer inserção sobre o assunto, há uma
carência de estudos sobre o SEC durante a formação nas faculdades que por vezes se quer é
citado, não há espaço para esta discussão no meio acadêmico, reconhecendo assim que a falta
de acesso ao conhecimento constitui um obstáculo nos avanços com relação à classe médica,
pois incide diretamente na problemática da falta de profissionais capacitados para a prescrição
112

de Cannabis.
Alguns entrevistados apontaram que a formação convencional ofertada pelos cursos de
graduação em medicina é voltada à produção de mão de obra direcionada para a empresa,
focando os hospitais e a venda de medicamentos, ao passo que desvaloriza a atenção primária
e a pluralidade dos saberes. Segundo eles, o modelo de formação médica, esta forma de ensinar
e aprender a ciência, a medicina e a saúde, constitui um fator de extrema importância que
interfere na postura dos profissionais em relação à CM.
Por outro lado, os participantes que exercem à docência apontaram que o cenário
imposto pela pandemia favoreceu a possibilidade de que os professores revissem suas propostas
e repensassem o que poderia ser exequível diante da inviabilidade das salas de aula lotadas,
propondo a reflexão sobre um processo de ensino-aprendizagem factível de forma mais
saudável, articulando o ensino a distância ao telessaúde, tele atendimento, utilizando a
tecnologia para promover uma educação mais significativa, acolhendo as dificuldades dos
alunos.
Noutra abordagem, o médico P17 afirmou que é uma irresponsabilidade um Sistema
dessa relevância ainda ser menosprezado nas universidades. Ele afirmou não acreditar que haja
um consenso entre a academia de não ensinar sobre o SEC e o uso dos canabinoides, mas na
verdade tem certeza de que nem se discute a respeito, ou seja, um preconceito estrutural que
leva à negação da ciência.
Corroborando, o participante P9 descreveu que o aluno passa a faculdade inteira
acessando diversos conhecimentos, definindo o que mais gosta, tomando decisões e, com base
em tudo o que vê, vai delineando qual área seguirá após a graduação, explicando que durante
este processo, o aluno passa a ter referências, professores nos quais se espelha e se inspira.
Entretanto, tal qual é insuficiente o número de médicos prescritores, não existe professores que
sejam prescritores ou que dominem a temática, e, por consequência os alunos não conhecem,
não têm acesso à informação e formação.
No contexto dado, os prescritores admitiram que os discentes apenas se aproximarão e
conhecerão sobre o assunto se tiverem motivações próprias, de modo que aqueles que se
interessam veem que as descobertas estão acontecendo, procuram e pedem aulas.
Neste ínterim, descreveram que são diversos os questionamentos com os quais se
defrontam, ilustrando: “Como vou prescrever?” “Quem vai me orientar?” “Quem vai
supervisionar esse trabalho?” “Com quem vou discutir os casos?”. Assim, ressaltaram sobre a
necessidade da academia assumir este compromisso na formação médica, pois além de não
haver a abordagem na graduação, são poucas as pós-graduações que existem no Brasil e não há
113

como realizar estágio, pois não é regulamentado.


Por conseguinte, os participantes confluíram na convicção de que se houvesse uma
imersão no assunto durante a graduação, o desenvolvimento de ligas acadêmicas, residência
médica, professores formados e centros de pesquisas, certamente a terapêutica com
canabinoides seria uma realidade acessível, pois ter profissionais com conhecimento já não
seria um óbice.

5.2.4.1.2.2 Inserção na grade curricular

Os entrevistados, ao reforçarem que a CM constitui uma ferramenta terapêutica que tem


transformado a vida de pacientes e famílias, instruíram que a Medicina Canabinoide é uma
realidade do presente e, dado o mérito de sua relevância, é fundamental que seja inserida na
grade da graduação nas diversas disciplinas como, por exemplo, na farmacologia, bioquímica
e fisiologia, pois assim os médicos saberiam minimamente aonde os canabinoides agem e
entenderiam porque a Cannabis tem tamanha versatilidade no tratamento de tantas patologias
e, diante da atualidade, acham pouco provável que os professores não tenham essa consciência.
Assim, pontuaram acreditar que a situação será aos poucos modificada e que teremos
avanços nos processos formativos desde a graduação, com redução do preconceito e médicos
que já saiam prescritores, posto que a segurança e a confiança se consolidam com o tempo,
prescrevendo e tendo contato com os pacientes, pois o interesse é grande e muitos médicos e
estudantes os procuram para entender como entraram nesta área.
Corroborando, o entrevistado P8 relatou que depois de um grande esforço conjunto,
conseguiram incluir a formação sobre o SEC e a CM nos cursos de Campina Grande, na
psiquiatria, bioquímica e na farmácia.
Noutro prisma, alguns entrevistados inferiram que a Medicina Canabinoide pode ser
vista constituída como uma especialidade médica, o que está acontecendo no mundo por meio
das certificações em SEC, coisas que no Brasil ainda não tem ou tem algumas iniciativas, como
por exemplo, as primeiras disciplinas que surgiram em cursos superiores voltadas ao SEC e à
aplicação terapêutica da Cannabis. Assim, pensar na Medicina Canabinoide como uma
especialidade é um novo caminho possível a se estruturar.

5.2.4.1.2.3 Medicina canabinoide: ciência e pesquisa

Os médicos prescritores ressaltaram que mantêm esforços contínuos na busca de


114

informações para um constante aprimoramento, entretanto, ressaltaram que não é nada fácil,
pois enfrentam junto aos seus pacientes desafios todos os dias.
Estes médicos apontaram o quanto é imprescindível os avanços nas pesquisas, os testes
clínicos e todos os demais ritos científicos, pois a falta de pesquisas no Brasil produz uma
situação de penumbra que nem todos os médicos estão dispostos a encarar, enfatizando que a
ciência é feita de erros e acertos, não cabendo a justificativa de se ter medo para ficar insistindo
no erro.
No cenário apresentado, o participante P17 lembrou que a medicina teve uma
experiência frustrada quando tentou fazer uma medicação que age no SEC, em 2007. Ele contou
que introduziram no mercado de fármacos uma medicação chamada Rimonabanto, com a
promessa de reduzir o apetite, ajudar a emagrecer e tratar a obesidade. Assim, explicou que se
tratava de um medicamento cujo mecanismo de ação é um antagonista total de receptor CB1 e
que foi retirado de comercialização às pressas, pois estava provocando nos pacientes o suicídio.
Então, problematizou a situação questionando sobre como foi permitido lançar um fármaco que
o médico desconhece como age, tampouco conhece o sistema envolvido, pois não aprende em
sua formação sobre o assunto.
No mesmo contexto, outra situação exposta por alguns prescritores com indignação foi
a polarização da ciência que temos enfrentado no Brasil, um imbróglio que reflete diretamente
na postura adotada pelos médicos e que, tais quais as situações polemizadas na pandemia, as
questões referentes à Cannabis se tornaram mais um objeto de polarização com viés ideológico,
observando ainda que, para conseguir caminhar e avançar neste campo é inerente a atuação dos
agentes políticos, perspectiva que não pode ser ignorada.
Subsequente, reconhecendo as limitações da ciência, os entrevistados referiram que,
apesar dos avanços de estudos já divulgados, a carência de pesquisas e o número de publicações
nessa área ainda não permitem uma ampla discussão em aspectos como, por exemplo, situações
de crise, de interação medicamentosa e superdosagem. Assim, afirmaram que é essencial para
a medicina o investimento em pesquisas a fim de que os profissionais tenham conhecimento
técnico, estejam embasados em evidências, tenham mais confiança e se sintam mais seguros.
Nesta conjuntura, o prescritor P8 salientou a importância do desenvolvimento de
pesquisas no Brasil, explanando sobre o equívoco em sermos obrigados a ter por referência
achados científicos de outros países, exemplificando que a planta que nasce aqui não é igual as
plantas americanas ou europeias, pois há variáveis que as diferenciam como o solo, a
temperatura, o calor, características bem distintas, inclusive se compararmos entre as próprias
regiões do Brasil.
115

Neste caminho, o entrevistado P3 foi enfático ao afirmar sobre a necessidade de


investimentos na ciência e na educação e priorização da saúde em nosso país, porque não temos
apenas a Cannabis para pesquisar, mas a Amazônia como um todo que até hoje tem apenas
cerca de 3% de suas plantas descritas e catalogadas.
Os participantes reforçaram quanto a imprescindibilidade dos médicos se apropriarem
dos estudos, de termos no Brasil centros de pesquisas com desenvolvimento de projetos na
temática e divulgação da terapêutica com a Cannabis sativa L para a classe médica e demais
profissionais da saúde.
116

6 DISCUSSÃO

Por meio dos resultados foi possível verificar que, independente do ano de formação,
uma realidade comum a todos os participantes foi a ausência de conteúdo sobre o SEC e a
terapêutica com canabinoides durante a graduação, indicando que a falta de acesso ao
conhecimento constitui um obstáculo nos avanços com relação à classe médica, pois incide
diretamente na problemática da falta de profissionais capacitados para a prescrição de
Cannabis.
Neste sentido, os entrevistados correlacionam que soma-se o fato do SEC ser uma
descoberta mais recente à estruturação do conteúdo teórico da graduação que aconteceu há pelo
menos 25 anos, ainda que orientada em 2014 com fulcro na reflexão e crítica sobre a prática
para a transformação da realidade(130), constatando-se que ainda é prevalente o modelo de
formação medicocentrada, voltado à produção de mão de obra direcionada para o mercado, na
qual predomina o corporativismo, a preocupação excessiva com o profissionalismo, a
autarquização, o clientelismo ao passo que desvaloriza a atenção primária e a pluralidade dos
saberes, ou seja, não assume de fato um compromisso fidedigno com as condições
socioeconômicas e de saúde da população, fator que interfere na postura dos profissionais em
relação à Cannabis, posto que a ausência de espaços de discussão e formação nas instituições,
assim como a falta de fomento voltado à inserção destes conhecimentos, corrobora para a
continuidade do preconceito e o baixo número de médicos prescritores, consequências
completamente desvinculadas das necessidades da população. (121,123)
As lacunas de conhecimento sobre a temática, conforme demonstraram os prescritores,
devem ser compreendidas a partir das dificuldades de acesso à informação nos diferentes
âmbitos de formação profissional e divulgação restrita sobre a terapêutica e seus resultados na
prática clínica para a sociedade e comunidade acadêmica, fatores agravados pela ausência de
professores que dominam a temática, e, por consequência os alunos não conhecem, não sabem
minimamente aonde os canabinoides agem ou entendem porque a Cannabis tem tamanha
versatilidade no tratamento de tantas patologias, como apontado pelas publicações.
No percurso de aquisição de conhecimentos, a maioria dos entrevistados se denominou
autodidata por se apropriar da Medicina Canabinoide por iniciativas próprias de buscas,
pesquisando, estudando, realizando formação e aprofundamento sobre o SEC e CM, mantendo
esforços contínuos para um constante aprimoramento, um processo por vezes solitário e difícil,
desbravando um universo muito recente, com frequentes publicações de novas descobertas,
entretanto, pouco acessível.
117

As perspectivas sociais descritas pelos participantes revelaram que o preconceito, o


conservadorismo, a religião, a criminalização e o proibicionismo são preponderantes e
estruturais no senso comum, permeados por discursos limitantes e cisões conceituais, atribuindo
ao tratamento com a CM discriminação pela moralidade, conotação de panaceia, empirismo e
curandeirismo, mantendo os usos da Cannabis sativa L num campo marginal, do inconsciente,
da maldade e demonização.
No Brasil observa-se uma moral reguladora que ao longo do tempo carrega um
imperativo de poder no âmbito da dominação, marginalização e criminalização étnico-racial,
consolidada institucionalmente por meio do biopoder construído e alavancado pela coletânea
de trabalhos sobre a maconha lançada pelo Ministério da Saúde brasileiro em 1958 e pela
Campanha Nacional de Repressão ao Uso e ao Comércio de Maconha, fundamentadoras de um
racismo exercido sob a governamentalidade e autorizadoras de práticas legalizadas de
criminalização pelo Estado voltada à purificação e normalização social, sob a alegação central
de que o uso da maconha causava a despersonalização dos indivíduos, ameaçando a segurança
da sociedade.(53,58,135)
Este achado aponta para a herança do projeto político mundial de Guerra às drogas que
marginalizou e criminalizou as medicinas tradicionais e populares, que se pautavam nos saberes
e práticas das culturas indígenas e africanas e se utilizavam das plantas para o tratamento de
doenças, valendo-se da legitimação do saber médico especializado para instituir uma “verdade”
histórico-político-social derivada do racismo institucional e da eugenia pós-abolicionista para
controlar e disciplinar indivíduos específicos. (53,55,56)
Assim é mister registrar que, desta forma, ocorreu a desqualificação dos saberes
populares, culturas e práticas dos povos e comunidades tradicionais, ignorados, invisibilizados
e inferiorizados pela sociedade e pelas estruturas de poder em razão de não fazerem parte dos
valores hegemônicos do capital, relegados à nulidade e ao obscurantismo por não serem
considerados conceituais segundo a hierarquia dos conhecimentos das ciências pelos padrões e
valores característicos da ocidentalidade.(135,131)
Neste sentido, visualiza-se um construto que encontra ressonância na literatura do
século XX, revelando que no pós-aboliscionismo foi o discurso médico enviesado por
ideologias racistas, higienistas e proibicionistas que legitimou políticas públicas eugenistas
através das hierarquias de classe, de raça e de gênero, apregoando o embranquecimento da
população como ideário de nação e progresso, valendo-se da Cannabis para a instauração de
mecanismos institucionais de criminalização dos negros, reforçada ulteriormente pelo Decreto
nº 9.761/2019 que trata sobre a nova Política Nacional sobre Drogas, retomando a guerra às
118

drogas por meio da repressão penal e da política da abstinência, reiterando a ideia de proteção
da sociedade dos males das drogas.(67)
O debate literário contemporâneo figura a historicidade que traz os diferentes contornos
aos usos da Cannabis, tangível pelos meandros do Brasil colonial até os constituintes da
atualidade, desde os determinantes das cátedras acadêmicas ao cerne das lutas sociais,
possibilitando entender as discrepâncias experimentadas pelos médicos no percurso enquanto
prescritores de CM, já que remete a retomada de saberes milenares advindos das transferências
intergeracionais somados às atuais constatações por meio da ciência, refletindo a complexidade
das diferentes realidades vivenciadas a partir das peculiaridades dos cenários nos quais estão
inseridos.(53,57)
Coaduna com a situação exposta o fato de que a própria classe médica mantém
resistências frente às recentes pressões para alteração de leis e normas vigentes sobre a
Cannabis sativa L, evidenciadas pelos posicionamentos reticentes adotados pelo CFM e
acirrados pela Associação Brasileira de Psiquiatria afirmando não existir qualquer potencial
terapêutico nesta planta.(33,72)
Estas constatações refletem que, apesar da existência de importantes publicações
científicas, há uma resistência no Brasil em aceitar o uso medicinal da Cannabis, por parte de
médicos, legisladores e políticos, fato que adentra a realidade das instituições acadêmicas,
conflitando a ordem natural dos acontecimentos, das discussões científicas e demandas sociais
do país.(67,137)
Os resultados descreveram um panorama que reflete a ambiguidade e cisão que paira
sobre a temática, trazendo estereótipos estruturais e perspectivas científicas que por ora se
contrapõem, num cenário neste momento atravessado pela polarização da ciência com viés
ideológico que tem dividido a classe médica, trazendo vertentes dissidentes que incorporam o
ideário sócio-político-econômico no qual transitam os atores sociais que compõem a cena da
regulamentação da CM no Brasil.(132)
A ascensão da ideologia proibicionista deriva do discurso médico-científico brasileiro,
positivada por argumentos do início do século XX que difundia hipóteses sobre os usos da
Cannabis associando-a ao desenvolvimento de doenças, despersonificação do indivíduo,
distúrbios mentais e sociais, baseados em teorias raciais de eugenia, alegando que a proibição
dessa planta poderia conter a violência, discursos produzidos e difundidos por médicos como
Rodrigues Dória, Adauto Botelho, Pedro Pernambuco e Oscar Barbosa, utilizados para a
proibição da maconha.(58,61,132)
Estes argumentos agora são refutados pelos avanços da ciência nas descobertas do SEC
119

e evidências das aplicações terapêuticas da Cannabis que vem progredindo exponencialmente


nos últimos anos, fenômeno que levou os médicos a experimentarem novas possibilidades
conceituais sobre os usos de uma planta outrora usada para estigmatizar, controlar, prender e
punir, propondo um contrafluxo não acolhido pelo contraditório de concepções anacrônicas que
impõem o negacionismo como medida para sustentação das práticas de colonialidade,
fundamentadas na hegemonia e lógica eurocêntrica dos saberes, à medida que emerge uma
“contraconduta”, acirrando os debates e instaurando um “contrapoder” sobre o uso medicinal
da Cannabis, especialmente na psiquiatria, propondo passos que rumam para a emancipação,
libertação e decolonialidade das verdades absolutas.(132-136)
Os resultados deste estudo apontaram que a existência de médicos prescritores é uma
condição para que o paciente tenha sua necessidade de acesso ao tratamento atendida
adequadamente. Neste sentido, os entrevistados pontuaram o baixíssimo número de prescritores
existente no Brasil que não atinge nem 0,1% da classe médica, situação que atribuem à falta de
estímulo e postura reticente do CFM, que mantém parecer regulamentar que restringe a
prescrição à apenas 5% dos médicos brasileiros (neurologistas e psiquiatras).(33,72) Ainda assim,
é possível observar um aumento no número de prescritores, pois de acordo com dados
disponibilizados pela ANVISA, referentes ao período de 2015 à 2018, houve um aumento no
número de prescritores de 183%, entretanto, quando comparado ao número de pacientes que
demandam o tratamento, o contingente de prescritores é ínfimo, fato que pode ser ilustrado, por
exemplo, com relação à dor crônica que segundo a Sociedade Brasileira de Estudos da Dor,
hoje atinge cerca de 20 milhões de brasileiros.(137,138)
Os médicos contaram que foram aprendendo a colocar o conhecimento adquirido em
ação, demonstrando uma intersecção entre os conhecimentos disponíveis, as dificuldades frente
aos estudos e aprofundamento pessoal, introduzindo a prescrição da Cannabis no cotidiano e
enfrentando na prática clínica os desafios junto aos seus pacientes, constatando que o
conhecimento nunca é suficiente, e, especialmente nesta área, há um longo trajeto que aos
poucos vem sendo construído e aprendido todos os dias. Esta construção está alinhada à
aprendizagem significativa, cuja integração ensino-aprendizagem da medicina com os serviços
de saúde e a participação da comunidade são capazes de proporcionar mudanças essenciais,
atendendo às DCN que preconizam a formação profissional com olhar ampliado, integrativo,
humanista, crítico e reflexivo, capacitado para atuar noutra perspectiva de assistência em
saúde.(130)
Dentre as dificuldades enfrentadas pelos médicos no percurso da prescrição de
canabinoides, os entrevistados falaram sobre o medo que existe na classe médica quanto às
120

questões legais, possível penalização pelo Conselho ou problemas com a polícia, pelo
desconhecimento sobre as leis que amparam o exercício da profissão e o uso médico da
Cannabis, dúvidas sobre como indicar e prescrever, situações advindas da carência de
regulamentação, um atraso que inviabiliza pesquisas e impede o acesso aos brasileiros. Assim,
retrataram o posicionamento de profissionais que optam por esperar altos níveis de evidência
para depois decidir se querem ou não incorporar aquela opção em sua prática. Indicaram ainda
o preconceito social que também está nos pacientes e leva o médico a ser temerário e se precaver
de alguma forma de um possível processo judicial, preferindo por vezes que outro prescreva.
De fato, muitos são os desafios enfrentados na prescrição e no acesso a produtos em
território brasileiro se comparado a países como Canadá, Uruguai, Colômbia, Espanha, Itália,
Israel, Holanda e 47 estados dos EUA. Entretanto, os avanços regulamentares da ANVISA
reconhecem o potencial terapêutico da Cannabis e não restringe a especialidade médica
prescritora, já que não lhe cabe avaliar o exercício profissional.(139)
Aspectos apontados que atrapalham inclusive o processo de regulamentação no país são
os tabus e preconceitos que permanecem impregnados na sociedade e no âmbito do cuidado,
tanto por parte dos profissionais quanto por pacientes, pela falta de conhecimento e ignorância,
identificando ser uma situação passível de remodelação por meio da ciência e pela luta da
sociedade.(140)
Diante disso, relataram que, com uma divulgação maior no Brasil, adotaram estratégias
de apropriação de conhecimentos, tornando o caminho da aprendizagem, desenvolvimento e
aprofundamento menos complicado e muito mais rápido, alcançando uma maior segurança,
confiança e tranquilidade na aplicação da Cannabis com o tempo, construindo a formação
sempre atentos às constatações e buscando informações por meio de publicações, artigos
científicos, livros, cursos, congressos e atualizações, entendendo como é o acesso e as questões
da legislação brasileira, assim como por meio de experiências e vivências, prescrevendo e tendo
contato com os pacientes, discutindo casos, ampliando o repertório e nas trocas com outros
médicos.
No âmbito das relações e correlações, os entrevistados elencaram que há atores sociais
importantes cuja representatividade e comportamentos incidiram positiva ou negativamente
tanto nos aspectos pessoais quanto nos aspectos profissionais durante os caminhos que
percorreram desde o processo formativo até a exerção da prática clínica, cada qual com suas
particularidades, citando neste papel seus familiares, a sociedade, os colegas de profissão,
Conselhos de classe, pacientes e familiares.
Na perspectiva do método ativo, a comunicação e interação dos atores do processo são
121

permeadas por questões pessoais e profissionais recíprocas que trazem no encontro das
experiências e trocas fragilidades e fortalezas, possibilitando espaços potentes de uma
construção coletiva do saber, consolidando a aprendizagem significativa.(130)
Quanto aos desafios e enfrentamentos, contaram sobre situações familiares e
profissionais nas quais sofreram preconceitos, tiveram barreiras e conflitos, julgamentos,
comportamentos de desdém, descrédito, ironia e contextos discriminatórios junto aos colegas
de profissão, relatados principalmente pelas mulheres prescritoras. Sobre os Conselhos de
classe, trouxeram que o posicionamento é tendencioso e com viés ideológico, obstando avanços
ao passo que impõe um cenário de exposição, insegurança e vulnerabilidade pelas normativas
defasadas que negam a cientificidade do tratamento.
De outra maneira, participantes destacaram como fatores favoráveis o apoio e ajuda na
esfera familiar, o fato de não sofrerem preconceito e questionamentos na sociedade, a
receptividade junto aos colegas de profissão, a adesão dos pacientes ao tratamento e
proximidade com os familiares, ratificando a postura profissional que assumiram.
Não distante, aludiram sobre a luta dos pacientes e seus familiares no contexto
anacrônico brasileiro por meio da mobilização social, divulgando os resultados, segurança e
eficácia da CM, vivenciados pelos pacientes e prescritores na prática clínica, impactando no
aumento da procura pela população e na adesão médica à terapêutica, principalmente nos casos
de doenças progressivas e refratárias.(140)
A luta social dos pacientes e familiares, associações e movimentos pelo acesso à CM
surge no cenário brasileiro em 2014, com famílias de crianças com epilepsia refratária lutando
pelo direito à saúde e dignidade humana, na busca pelo acesso ao tratamento com canabinoides,
cuja força motriz trouxe a insurreição de saberes, contrariando os efeitos do estabelecido “saber-
poder” outrora considerado científico, travando um embate para dessujeitar saberes históricos
tradicionais, tornando-os livres e capazes de oposição. Deste lugar inicia os enfrentamentos
sociopolíticos-legais que tencionam as estruturas do Estado e pressionam por uma
regulamentação ampla da Cannabis no país.(136)
As associações de pacientes ao longo dos anos foram apropriando-se das possibilidades
de trabalhado em rede, com projetos e mutirões de atendimentos gratuitos, parcerias com as
universidades, emergindo na esfera jurídica o conceito de desobediência civil pacífica diante
da resistência e inércia do Estado que mantém a sociedade à margem da Lei.
A postura ativa e ativista dos pacientes, mães e famílias chegando aos médicos munidos
de conhecimentos científicos e demandando pelo tratamento com a CM, tem pressionado,
sensibilizado e mobilizado os médicos a se apropriarem quanto a Medicina Canabinoide para o
122

atendimento das necessidades de saúde e alívio do sofrimento.


As evidências científicas que chegam à comunidade médica quanto aos efeitos da
Cannabis Medicinal ainda não são numerosas, entretanto, a credibilidade do tratamento vem
sendo construída a partir dos depoimentos de pacientes atestando a melhora em seus quadros
de saúde, disponíveis nas redes sociais das associações brasileiras, sendo imprescindível validar
a legitimidade e credibilidade destes relatos que configuram os fatos sociais.(139)
Neste âmbito, também é notório o papel pedagógico dos médicos prescritores na
conscientização social e na ampliação do acesso à CM, compartilhando com a classe médica e
a sociedade civil conhecimentos, vivências e os resultados no tratamento, comunicando-os com
as evidências científicas publicadas que descrevem o uso da Cannabis enquanto ferramenta
terapêutica.
Em vista disso, é válido salientar que o uso da Cannabis como planta medicinal foi
descrito pela primeira farmacopeia há 4.000 anos e, no Brasil, no século XIX era indicada como
calmante, desintoxicante e antiespasmódica, mencionada no livro de botânica Flora Brasiliensis
de Carl Friedrich Ph. Von Martius, sendo vendida naquela época como remédio em farmácias
e boticários.(132,141-143)
Seu uso medicinal é reconhecido desde a antiguidade, como uma planta valiosa pela
grande quantidade de compostos químicos, sendo que alguns dos 483 componentes
identificados são exclusivamente da Cannabis sativa L. Na década de 1960, as descobertas dos
fitocanabinoides e a possibilidade de obtê-los aumentou significativamente o interesse
científico pela planta, revigorado posteriormente por volta de 1990 com o início da identificação
do SEC no cérebro.(144)
Corroborando, com o desenvolvimento científico atual, os estudos validam o uso dos
canabinoides no tratamento de diversas patologias, apontando evidências conclusivas sobre o
uso do CBD em alguns quadros de epilepsia e esclerose múltipla; evidências substanciais no
alívio de dores crônicas e sintomas de esquizofrenia; evidências moderadas para o uso de
canabinoides no tratamento de dores crônicas e espasticidade, em distúrbios do sono derivados
de sintomas neurológicos, glaucoma, sintomas do trato urinário inferior, de esclerose múltipla
e síndrome de Tourette; e evidências limitadas em quadros de agitação provocada por demência,
fobia social, estresse pós-traumático e sintomas da doença de Parkinson.(145,146)
Assim, a descoberta do SEC trouxe uma nova perspectiva de cuidado para a medicina,
possibilitando que o tratamento com canabinoides seja aplicado como monoterapia ou como
agente adjuvante no tratamento de doenças, permitindo ainda a diminuição e até mesmo retirada
de fármacos alopáticos, bem como a redução de efeitos colaterais em pacientes polimedicados.
123

Isto é possível em razão de receptores, enzimas e ligantes dispersos pelo corpo todo com
funções fisiológicas pró-homeostáticas, que respondem ao fitocomplexo da Cannabis, de modo
que a atuação nestes sítios desencadeia uma série de respostas que proporcionam uma
modulação na liberação de neurotransmissores e das respostas imunológicas.(8-11,147)
Na prática clínica, observa-se a singularidade deste sistema nos pacientes, visto que a
resposta à terapêutica é muito individual e peculiar, o que demanda do prescritor iniciar com
baixas doses e aumentar lentamente, titulando a dosagem junto ao paciente a fim de não
ultrapassar a janela terapêutica, sendo possível constatar de modo geral que, o paciente pode
responder com uma dose baixa e na maioria dos casos o resultado é rápido e notável. Isso se
explica pela ação dos fitocanabinoides no SEC humano em mecanismos multimodais de forma
dosedependente, agindo em seus receptores e sinalizadores de forma agonista e antagonista em
altas e baixas doses.(145,148,149)
Os entrevistados colocaram que o acesso seguro ao tratamento com canabinoides,
pressupõe do prescritor conhecimento e disponibilidade na escolha do produto e no manuseio
da dose junto ao paciente, pois há uma variedade de tipos de produtos desde óleos de cultivo
doméstico produzidos pelo próprio paciente ou familiar, óleos produzidos por jardineiros, óleos
artesanais produzidos pelas associações, óleos padronizados nacionais disponíveis nas
farmácias e uma diversidade de produtos importados autorizados pela ANVISA, cada qual com
suas vantagens e desvantagens.
Os prescritores identificam na prática clínica que os pacientes que fazem uso de óleos
full spectrum geralmente apresentam melhores respostas, fato que é explicado em razão do
efeito comitiva ou efeito entourage pela sinergia de canabinoides, terpenos e flavonoides,
resultados também encontrados em estudos pré-clínicos. (147,148,150-152)
Entretanto, expuseram a limitação quanto a pouca existência de estudos com o óleo full
spectrum, tipo de produto mais acessado pelos pacientes, dada sua complexidade e o fato de
que a maioria das pesquisas realizadas foram com produtos isolados, com publicações
predominantemente tratando apenas do CBD e THC. (152,153)
Os entrevistados afirmaram não ter presenciado qualquer problema com nenhum óleo,
seja o importado ou o nacional, explicando que os óleos importados alcançam a vantagem de
apresentações muito concentradas em CBD e limitação do THC, já os óleos das associações
brasileiras são produtos com predomínio do THC. Assim, ressaltando a importância de
tonificação do SEC, esclareceram que pautam suas decisões considerando as necessidades e
possibilidades individuais de cada paciente, os caminhos para alcançar o produto, o controle de
qualidade, bem como o custo final do tratamento.
124

As experiências vivenciadas pelos prescritores, em conformidade com os achados


científicos, revelam que o tratamento com a Cannabis é seguro, pois não tiveram de seus
pacientes relatos de falha terapêutica, piora, situação em que foi necessário retirar ou efeitos
colaterais mesmo quando a CM foi o tratamento de primeira escolha, reforçando quanto a
necessidade do manejo adequado e a titulação criteriosa já que o melhor resultado está
diretamente ligado à dose.(145,150,153)
No âmbito das faixas-etárias, na infância e adolescência os prescritores indicaram a CM
para pacientes com síndromes genéticas e outras síndromes raras, Síndrome de Down, doenças
congênitas e degenerativas, Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH),
Transtorno Opositivo Desafiador (TOD), Transtorno Obsessivo Compulsivo (TOC),
Transtorno Bipolar, transtornos de ansiedade, depressão e principalmente nos casos de Autismo
e Epilepsia, quadros com componentes de agressividade, refratários aos tratamentos
convencionais e geralmente polimedicados.
Para este recorte de idade, os principais resultados descritos pelos prescritores foram
melhoras nos aspectos comportamentais, na sensopercepção, modulação nociceptiva, melhora
cognitiva e funcional, melhora da sociabilidade, do sono, da afetividade e humor,
desenvolvimento da fala, comprovando os efeitos da Cannabis inclusive na neuroplasticidade
cerebral, posto que atua em mecanismos do SEC com regulação de neurotransmissores
excitatórios e inibitórios, bem como na modulação da liberação de ocitocina e vasopressina. As
conquistas descritas são de suma relevância, pois implicam e repercutem diretamente na
redução do sofrimento das mães e familiares, no convívio social e na inclusão escolar.(154-156)
Salientaram ainda os resultados da CM no tratamento da Epilepsia e Autismo, atribuindo
efetividade para 70% dos pacientes, apontando além dos benefícios na redução e controle das
crises, a retirada de medicamentos de resgate, diminuição dos alopáticos e situações em que as
respostas foram tão positivas que se mantiveram apenas os canabinoides. No âmbito da
Epilepsia, as evidências encontradas em estudos clínicos apontam o papel fundamental dos
canabinoides na neuromodulação atenuando circuitos cerebrais hiperativos e, em estudos pré-
clínicos, o CBD parece ter mais efeito antiepiléptico do que o THC. No tratamento do TEA são
substanciais as melhoras nos sintomas como a irritabilidade, agressividade, ansiedade,
hiperatividade e déficit de atenção, depressão ou ataques epilépticos, bem como nas
comorbidades, trazendo qualidade de vida para o paciente e para os cuidadores.(20,21,157,158)
Na população adulta, os entrevistados apontaram uma crescente procura pelo
tratamento, sobretudo por pacientes que não querem usar alopáticos, ou são refratários aos
tratamentos convencionais ou não toleram seus efeitos colaterais.
125

Um aspecto importante ressaltado pelos prescritores foi o fato de que os pacientes


assumem um perfil ativo buscando informações, questionam, manejam e apropriam-se de tal
forma do tratamento que ganham autonomia e tornam-se protagonistas do próprio cuidado. Esta
dimensão implica em mudanças no estilo de vida para o alcance do melhor resultado, de forma
que além da melhora orgânica, há uma melhora psíquica e consequentemente um impacto
significativo no quadro de saúde e bem-estar.
Neste sentido, a terapêutica com canabinoides propõe a revisão conceitual do cuidado
em saúde cooptado pelo tecnicismo capitalista e atravessado por uma moralidade higiênica,
intervencionista, normativa e reguladora de corpos, que instituiu a desapropriação dos saberes
e práticas tradicionais apartando-os da concepção da ciência da saúde. Assim, no íntimo das
relações médico-paciente retoma-se a ciência harmonizada com a assimilação criativa, estética,
ética e significativa, o respeito e a compreensão na perspectiva do cuidado ampliado, trazendo
para a centralidade o empoderamento do sujeito na apropriação sobre si e a realidade cotidiana
social na produção do cuidado.(159)
Na faixa-etária até 60 anos, os resultados descritos foram a melhora do sono, controle
da angústia e ansiedade, melhora da depressão e humor, interrupção das crises de pânico e fobia
social, melhora da cicatrização no pós-operatório e menor tempo na consolidação óssea,
controle da dor e outros sintomas do HIV, controle de sintomas em patologias como transtorno
bipolar, TOC, transtorno esquizoafetivo, autismo, câncer, Síndrome de Rett, Parkinson,
doenças refratárias e progressivas, lúpus, artrite, artrose, fibromialgia, dor neuropática e outras
dores crônicas. Diante do exposto, as pesquisas mostram que os derivados da Cannabis são
uma alternativa importante para o tratamento principalmente em doenças que ainda não têm
resposta ou que a resposta não é tão eficaz. Assim, apesar de faltar estudos robustos quanto a
ação dos canabinoides, estas substâncias hoje constituem uma esperança no campo da
saúde.(153,160)
Nesta população, foi sobressaliente o uso da Cannabis na oncologia e, segundo os
participantes, há três focos fundamentais do tratamento: a quimioterapia, o cuidado paliativo e
a sobrevida. Assim, delinearam que durante a quimioterapia, os canabinoides são importantes
coadjuvantes e ofertam suporte na redução dos efeitos colaterais, atuam sinergicamente por
mecanismos antineoplásicos que mudam a relação do tumor com o sistema imune, reduzindo a
atração dos macrófagos e a disseminação de metástases, diminuindo a capacidade de formação
de novos vasos, inibindo o crescimento do tumor pela indução de um ambiente desfavorável ao
mesmo tempo em que provoca apoptose das células cancerígenas. Conforme estudos já
publicados, a CM tem potencial terapêutico em diversos tipos de câncer como de mama, ovário,
126

pâncreas, sistema gastrintestinal, pulmão e mioblastoma. Os estudos crescem de forma


exponencial e já demonstraram as propriedades dos canabinoides atuando em receptores
endógenos, no anticrescimento tumoral, analgesia, potencial anti-inflamatório e antibiótico,
constatando seus efeitos junto aos tratamentos convencionais, trazendo bem-estar e qualidade
de vida.(161,162)
Segundo os entrevistados, a terapêutica proporcionou que os pacientes não percam peso,
consigam comer, não tenham efeitos adversos da quimio, tenham disposição e mantenham o
otimismo no enfrentamento da doença, inclusive nos quadros de cuidados paliativos, reduziu o
tempo total de quimioterapia, teve ação no suporte à dor em casos avançados, reduzindo o
sofrimento e aumentando a sobrevida geral do paciente, trazendo impactos também para a
família.
Outro uso da CM com grande procura pelos pacientes, descrito principalmente pelos
médicos psiquiatras, foi para o tratamento de dependência química à maconha fumada, cocaína,
na redução de danos, ressaltando os resultados na melhora da fissura, redução da impulsividade
e ansiedade, do nervosismo e da irritabilidade, da busca pela droga, pela alteração da
consciência para alívio do sofrimento. Além disso, clinicamente não sobrecarrega o fígado e, à
medida que o paciente obtém estes resultados, corrobora a recuperação dos vínculos e laços
familiares e sociais rompidos. Isso se explica pelos mecanismos de ação do CBD, cujas
investigações são promissoras por suas propriedades ansiolíticas, antidepressivas e
antipsicóticas, interferindo no ciclo do vício, pois, atua no córtex pré-frontal medial, amígdala
e hipocampo, áreas diretamente relacionadas ao sistema de recompensa.(163-168)
Uma indicação menos relatada, mas não menos relevante foi a prescrição de
canabinoides como tratamento preventivo, para os filhos de pais que evoluíram com quadros
demenciais, para que não desenvolvam a doença. Estes médicos apontaram que há estudos em
animais que demonstram a possibilidade de uso como ferramenta terapêutica de prevenção.
Neste sentido, diversos grupos de pesquisas têm encontrado efeitos importantes dos
canabinoides, especialmente CBD e THC, demonstrando a supressão de fatores relacionados a
neurobiologia das demências, incidindo sobre a neurodegeneração de neurônios e formação
de placas amiloigênicas, prevenção da hiperfosforilação da proteína TAU, menor alteração na
morfologia celular no SNC, diminuição da liberação do fator de necrose tumoral,
processamento da excitotoxicidade e estresse oxidativo e menor taxa de lesão mitocondrial e
dos processos neuroinflamatórios corticais.(169-174)
No âmbito da Saúde da Mulher, há a predominância de busca pelo tratamento pelas
mulheres mais jovens para saúde e bem-estar e as indicações compõem um leque ampliado
127

dentro das perspectivas de cuidado em sintomas hormonais, reprodutivos e ginecológicos. Os


principais impactos evidenciados pela prática clínica e comprovados cientificamente estão na
redução de medicamentos alopáticos e seus efeitos colaterais, especialmente opioides,
ansiolíticos e antidepressivos, possibilitando mudanças de hábitos e estilo de vida. Estudos
apontam que os hormônios sexuais como o estrogênio podem regular a atividade das enzimas
metabolizadoras dos endocanabinoides, afetando a atividade e funcionamento do SEC, com
forte modulação dependente em CB1, sendo que os transcritos de CB1R-mRNA flutuam
durante as diferentes fases do ciclo ovariano, o que permite discutir que apesar dos estudos
remeterem um papel regulador dos hormônios sexuais no sistema endocanabinoide, estas
relações ainda não são tão claras, pelo contrário, mostram-se bastante complexas.(22-29,145,175,176)
No perfil da população idosa, concordante às recentes publicações, os participantes
descreveram o uso de canabinoides como seguro e com ótimos resultados, colocando que
algumas especificidades devem ser ponderadas visto que geralmente são pacientes
polimedicados, em uso de anticonvulsivantes e anticoagulantes, com um metabolismo mais
lento e uma meia vida maior, condições que demandam atenção quanto às interações
medicamentosas.(177)
A prática clínica dos entrevistados demonstrou que são pacientes que apresentam ótima
resposta terapêutica ao uso de THC em baixas ou baixíssimas doses e a titulação deve ser
realizada cuidadosamente, pois doses excedentes podem provocar sonolência. Assim,
pontuaram que os melhores resultados estão ligados ao estágio de evolução da patologia, de
modo que se não houve tantos comprometimentos, as respostas à terapêutica são ótimas.(184)
Os resultados vivenciados pelos prescritores junto aos seus pacientes idosos
confirmaram efeitos neurorregenerativos, neuroprotetores, analgésicos e anti-inflamatórios e
atuação na neuroplasticidade, favorecendo especialmente os pacientes com doenças refratárias
e polimedicados, tornando viável a diminuição e retirada de medicamentos alopáticos, por
conseguinte reduzindo os efeitos colaterais destes.(148,178)
Estes efeitos foram evidenciados pelas melhoras nas funções motoras, no humor, sono,
apetite, na depressão e comportamento disfuncional, no embotamento, na agitação e
agressividade, na memória, consciência, lucidez, percepção, entendimento e comunicação,
queixas subjetivas, alívio do sofrimento e na dor, permitindo resgate da autonomia, diminuição
da sobrecarga dos cuidadores e harmonização nas relações familiares e sociais.
Nesta população, destaca-se a busca pelo tratamento de pacientes em torno dos 80 anos,
para patologias como Parkinson, Alzheimer e outras demências, dores crônicas, quadros com
convulsões, insônia, ansiedade e depressão, dor neuropática, fibromialgia, doença inflamatória
128

intestinal, retocolite e neoplasias.(12-14)


Outros aspectos destacados pelos entrevistados que sobressaem de modo peculiar no
tratamento dos idosos, são as respostas positivas para o tremor facial e melhora do cognitivo
que chamam muito a atenção, pois são sintomas que geralmente não respondem aos fármacos
convencionais. Neste sentido, também apontaram a imunomodulação proporcionada pelos
canabinoides, incidindo de forma que o paciente deixa de ter infecções recorrentes, de usar
antibióticos e ser submetido a internações, benefícios diferenciados e importantíssimos que
muitos desconhecem.
Os benefícios citados são evidenciados pela ação dos canabinoides nos receptores CB2
abundantes em órgãos do sistema imunológico como baço, amígdalas, timo, tecidos linfoides e
na superfície dos leucócitos, encontrados também em menor concentração no pâncreas, medula
óssea, útero, pulmões e SNC, cujo principal efeito mediado é a imunomodulação, produzindo
a regulação das células imunológicas, indução de migração, apoptose e supressão da
proliferação de células imunes, aumentando a produção de citocinas anti-inflamatórias e
induzindo o desenvolvimento de células T reguladoras.(179-181)
Segundo o grupo, a grande vantagem desta terapêutica, é a ausência ou baixa incidência
de efeitos colaterais, a incapacidade de provocar situações graves, overdose ou levar o paciente
à morte, constatações também evidenciadas pela ciência, ressaltando que, ainda que ocorram
reações adversas, são muito menores quando comparadas aos efeitos colaterais dos
medicamentos alopáticos, cabendo ao prescritor orientar o paciente e cuidadores quanto os
principais efeitos dos canabinoides, bem como o que esperar em altas dosagens, prevendo
possíveis interações medicamentosas com fármacos metabolizados pelo Citocromo P450,
acompanhando a evolução do tratamento por meio de exames, especialmente de função
hepática e coagulação.(182,183)
Quanto aos efeitos colaterais, consonante à literatura, os entrevistados afirmaram que
altas dosagens de CBD, principalmente de extratos isolados, podem provocar enjoo e vômito,
sonolência e tontura no início do tratamento, sendo comuns relatos de boca seca, insônia, perda
de apetite e diarreia. Enquanto que, no uso de óleos ricos em THC, os efeitos mais incidentes
são enjoo, desânimo, tontura, sonolência, mal estar, perda da noção do tempo, confusão mental,
discreta elevação da pressão arterial e sintomas gastrointestinais, seja constipação ou diarreia,
em altas doses pode ocorrer aumento da irritabilidade, desregulação do sono e o efeito
euforizante (psicoativo), que pode ser um resultado desejável ou não, dependendo da patologia
e do paciente.(153)
Neste sentido, afirmaram que os efeitos adversos podem ser evitados e controlados com
129

a titulação adequada da dose e que, na prática clínica, não tiveram qualquer queixa de ocorrência
de alucinações ou sintomas similares.(153)
Com relação às interações medicamentosas, os prescritores salientaram sobre os
cuidados que tomam especialmente em pacientes que utilizam anticoagulantes,
anticonvulsivantes, neurolépticos e benzodiazepínicos, pois o uso simultâneo com a Cannabis
tanto pode provocar sonolência como insônia.
Quanto ao uso de altas doses de THC, afirmaram que podem diminuir os níveis da
nivaldina se administrado concomitantemente e relataram certa preocupação com relação aos
pacientes que muitas vezes já chegam polimedicados, expondo que ainda existe uma lacuna de
estudos, exigindo do prescritor que esteja atento a possíveis interações e se mantenha em
contínua atualização quanto às publicações científicas. Assim, os achados da literatura apontam
um manejo que consiste em abordagens iniciais com baixas doses, redução de medicamentos,
troca de quimovares, diminuição ou até mesmo interrupção dos canabinoides para o controle
de interações medicamentosas.(153)
Os participantes demonstraram posicionamentos diversos com relação às
contraindicações, de forma que alguns disseram não terem observado até então na prática
clínica situações que contraindicaram o uso dos canabinoides, não ouviram relatos e
desconhecem qualquer contraindicação absoluta até agora, outros afirmaram que há
contraindicações relativas que podem estar relacionadas à hipersensibilidade do paciente a
algum canabinoide ou no uso concomitantemente com outras drogas metabolizadas pela via
Citocromo P450, pelo aumento ou diminuição do clearance sistêmico e biodisponibilidade e
alguns trataram como contraindicações absolutas as situações nas quais não haja respaldo
científico, insuficiência de estudos, ausência de experiências da prática clínica ou mesmo para
patologias sobre as quais ainda não tenham lido ou estudado.(153,184,185)
Neste contexto, a maioria dos entrevistados descartou prontamente a possibilidade de
riscos no uso medicinal, enfatizando a necessidade de avaliar caso a caso, pois, de fato conforme
literatura há pacientes que inspiram maior acompanhamento e monitoramento como pacientes
com insuficiência renal grave, renais crônicos, casos que desenvolvem hiperêmese ou com
comprometimento hepático, pacientes com problemas vasculares em uso de altas doses de
anticoagulantes, infartados graves em uso de antiarrítmicos, pacientes com doenças
cardiovasculares e pulmonares graves, gestantes, puérperas e mães que estão amamentando ou
mesmo casos em que a CM pode ser contraindicada por não existir estudos suficientes de uso
seguro.(153,186)
A única contraindicação absoluta citada pelo participante 7 foi para depressão endógena,
130

indicando que demanda o levantamento do histórico familiar durante a anamnese, mas que
ainda necessita de aprofundamento das pesquisas posto que até então não há evidências
científicas conclusivas.
Foi notável que paira dentre os entrevistados inseguranças e preocupações em relação
ao uso do THC, particularmente citando o uso fumado ou abusivo, correlacionando à
possibilidade de desenvolvimento de psicose e/ou esquizofrenia por propensão genética e riscos
na população pediátrica. Desta forma, apesar de afirmarem não terem presenciado qualquer
situação a respeito, explicando que são poucos os casos, acabam contraindicando o uso do THC
para pacientes esquizofrênicos, psicóticos intensos, transtorno bipolar exacerbado e outros
transtornos psiquiátricos ou com casos na família, por receio de desencadeamento de
crise.(153,185)
Entretanto, o que a literatura tem demonstrado é que o THC é seguro mesmo em altas
dosagens e, apesar de apresentar efeitos considerados adversos, quando é administrado com o
CBD tem seus efeitos psicomiméticos modulados, amenizados e até neutralizados, adendo o
fato de que CBD e THC interagem sinergicamente para melhorar os efeitos terapêuticos um do
outro (efeito entourage), sendo possível seu uso em tratamentos de transtornos
comportamentais.(148,149,187)
A vivência do grupo somada aos resultados de pesquisas publicadas permite inferir que
o THC em doses subclínicas, em baixa concentração e livre de efeitos psicoativos, pode
produzir os mesmos efeitos que o CBD, entretanto, consideraram que o CBD puro também tem
sua indicação peculiarmente para pessoas que não toleram o THC, encontrando uma boa
aceitação na psiquiatria e neurologia.(145,148,188)
Por outro lado, participantes elucidaram que as circunstâncias em que presenciaram
manifestações de pânico ou quadro psicótico decorreram do uso abusivo de THC e foram
transitórias, cessando com a descontinuidade do uso. Neste âmbito, alertaram que a atribuição
de causa da esquizofrenia à maconha é uma afirmação temerária, já que ainda não houveram
estudos que conseguiram de fato relacionar causa e efeito excluindo outros fatores, como por
exemplo, o álcool. Assim, concordaram que o uso de THC em altas doses pode tornar o paciente
menos interativo, indisposto para o trabalho, trazendo repercussões na responsabilidade do
indivíduo e impactos sociais. Explicaram que o THC requer uso controlado em
baixas/baixíssimas doses, uma boa avaliação do paciente, acompanhamento com regularidade,
intervindo prontamente nas primeiras manifestações. Corrobora neste sentido as evidências
científicas pré-clínicas, de estudos em animais de laboratório e humanos, demonstrando que
proporções variáveis de CBD: THC têm efeitos significativos de utilidade terapêutica.
131

Entretanto, diante de um complexo panorama de investigação e entendimento, ainda há um


caminho longo de esclarecimentos sobre as bases farmacológicas e neurobiológicas das
relações e correlações dos canabinoides.(153,188)
No grupo, mais da metade dos entrevistados relataram vivências com a autoprescrição
e prescrição para familiares do tratamento com Cannabis para quadros agudos e crônicos,
constatando muitos benefícios nas diversas condições e patologias. Segundo eles, estas
experiências se localizam em contextos permeados por significados e subjetividades, impondo
responsabilidades e relações de confiança, exigindo disponibilidades pessoais que extravasam
a relação médico-paciente, levando-os a descrevê-las como um divisor de águas em suas vidas,
fortalecendo-os nos enfrentamentos dos desafios como prescritor de CM na luta junto aos seus
pacientes. Neste sentido, não há expresso pelo CFM, Código de Ética Médica e pareceres
qualquer proibição quanto à prática da autoprescrição e prescrição de familiares, com ressalva
apenas quanto a recomendação de não autoprescrição com relação a entorpecentes e
psicotrópicos, indicando neste sentido que busque avaliação e orientação com outro médico,
para isenção no entendimento avaliador-prescritor-paciente.(189-192)
Quanto às possibilidades para a democratização do acesso ao tratamento com a
Cannabis, os entrevistados descreveram sobre a necessidade de popularização do uso medicinal
alcançando os pacientes hipossuficientes e vulneráveis que hoje são marginalizados pelo
cenário estatal atual.
Um óbice notoriamente importante é o elevado custo tanto para o início como para
manutenção do tratamento, fato que o torna restrito, pois mesmo para os pacientes com
melhores condições financeiras, os produtos regulamentados são muito caros, uma situação
deveras frustrante para o prescritor.(139,140,151)
Outra barreira que obsta o acesso à CM exposta pelos prescritores foi a situação de
normativas que impedem a prescrição de produtos que não façam parte do escopo padrão do
SUS, burocracias que dificultam e coagem os médicos a não prescreverem a CM no serviço
público, de modo que, enquanto não há a regulamentação da Cannabis no Brasil, resta aos
pacientes que necessitam da terapêutica o resguardo de seus direitos pelo árduo e moroso
caminho da judicialização. Deste modo, a judicialização é entendida como uma reivindicação
legítima dos cidadãos para garantia de seus direitos explícitos nas leis, quando a Estado falha
na democracia representativa deixando de atender às necessidades da população.(104,140)
No que concerne os aspectos econômicos, para além do uso medicinal, é plausível
esclarecer que a Cannabis também possui usos comerciais como matéria prima que data mais
de 6.000 anos, na extração do cânhamo, utilizando-se praticamente toda a planta como sua flor
132

e o cerne lenhoso, fibras resistentes para papel, têxteis e outras finalidades, sementes para
alimentação, óleos para fins medicinais e produção de biocombustível, beneficiando o meio
ambiente e a economia rural ao mesmo tempo em que proporciona uma fonte alternativa
sustentável. A Cannabis produz oito vezes e meia mais fibras por hectare do que as árvores e
absorve contaminadores de metal pesado do solo, limpando gradualmente a terra, e, depois que
é colhida, o campo fica praticamente livre de pragas para o plantio seguinte, uma economia de
milhares de dólares.(193,194)
Nos países em que a Cannabis foi legalizada, observa-se um impacto positivo na
economia, como por exemplo, os Estados Unidos que movimentou apenas com o uso medicinal
em 2017, o equivalente a U$ 6,7 bilhões, estimando-se que o mercado recreativo esteja
atualmente em U$ 1 bilhão, com expectativas de chegar a US$ 20 bilhões até 2022.(195)
É óbvio que não escapa ao cenário as intervenções das práticas habituais perpetuadas
pela indústria farmacêutica que visualiza na Cannabis um mercado extremamente lucrativo,
cuja lógica mercadológica, interesses e motivações de grupos específicos são capazes de
impulsionar mudanças na postura do atual governo neoliberal, ocupando os espaços
desbravados e construídos pela luta dos pacientes, familiares e médicos prescritores precursores
que assumiram todos os riscos até então.
Com relação às possibilidades para redução dos custos do tratamento e fomento das
políticas públicas, os prescritores citaram a necessidade de estratégias para viabilizar a
produção, comercialização e autossuficiência nacional, seja na produção a nível individual,
como em cooperativismo, ou mesmo em escala industrial e farmacêutica, por meio de uma
regulamentação que contemple a realidade brasileira das associações com iniciativas nos
estados que priorizem as parcerias com as universidades para acompanhamento e
implementação técnica e tecnológica, visando o fornecimento via SUS de produtos que atendam
os padrões de qualidade e funcionalidade para os pacientes. Neste sentido, acreditam que um
caminho profícuo é o papel dos pacientes e sociedade civil pressionando o governo e
demandando do SUS.
Diante disso, é fundamental destacar que o Estado existe em função da pessoa humana
e não o contrário, de forma que, assegurar o bem-estar individual e coletivo pela efetivação dos
direitos e garantias fundamentais é a forma pela qual o Estado demonstra aos cidadãos o porquê
de existir. Assim, cabe ao Estado sanar as dificuldades dos pacientes que necessitam do
tratamento à base de Cannabis para a seguridade de seu direito à saúde e dignidade humana,
resolvendo os entraves jurídico-burocráticos, os obstáculos financeiros do alto custo e a letargia
regulatória.(104)
133

Noutra perspectiva, destacaram que uma ampla regulamentação alinhada às políticas


públicas de saúde e reparação social poderia implementar toda a cadeia de produção da
Cannabis, proporcionando geração de renda e impactos positivos para a economia do país, além
do impacto para toda a sociedade pela melhora do paciente, que repercute diretamente em todo
contexto social no qual está inserido: na família, no trabalho, junto aos terapeutas e vínculos de
amizade.
Por meio de campanhas de esclarecimentos e eventos divulgação de informações,
emergem estratégias educativas com vistas à formação voltada à Medicina Canabinoide, a partir
da medicina translacional12, objetivando levar à população e à classe médica informações
científicas atuais e conhecimentos aprofundados pela aplicação clínica de produtos advindos da
Cannabis para melhor atender as demandas da sociedade.(72,196)
Dentro dos caminhos propostos, na construção do campo do conhecimento, os
prescritores ilustraram a difusão de informações e divulgação dos avanços na ciência e
pesquisas por meio da internet e mídias sociais, introdução da Medicina Canabinoide na
formação profissional desde a graduação e educação em saúde para a sociedade.
No contexto do ensino em saúde os entrevistados aduzem sobre a postura proativa que
deve ser assumida pelos prescritores nesta construção, levando conhecimentos, mantendo
disponibilidade para explicar, discutir as vivências da prática clínica, realizando a inserção da
Medicina Canabinoide na atenção primária e secundária, nas práticas integrativas, promovendo
eventos e atividades nos espaços acadêmicos abertos para a comunidade e à divulgação pela
imprensa, compondo com as diferentes instâncias governamentais. Estas posturas atitudinais
vão ao encontro das propostas das metodologias ativas que propõem a construção do
conhecimento pela disponibilidade para pesquisar e colaborar de forma ativa frente a situações
novas e até mesmo imprevistas.(130)
Neste sentido, reconhecendo as limitações da ciência pela carência de evidências que
permitam uma ampla discussão, os participantes apontaram que há uma situação de penumbra
que nem todos os médicos estão dispostos a encarar, de modo que, é imprescindível para os
avanços dos testes clínicos e demais ritos científicos, o investimento em pesquisas a partir das
especificidades da realidade brasileira, a fim de que os profissionais tenham conhecimento
técnico, confiança e se sintam mais seguros, fatores essenciais para a prática médica.
No Brasil, a ausência de regulamentação que permita o cultivo nacional traz limitações

12
A Medicina Translacional é voltada para estabelecer a conexão entre a pesquisa biomédica básica e a
inovação em saúde, de modo a gerar produtos, serviços e políticas que possam beneficiar a
população.(197)
134

às pesquisas, pois o fomento ao desenvolvimento científico nacional poderia, por meio de


estudos baseados em nossa realidade, contribuir, passar segurança e melhor amparar as decisões
e práticas médicas para o alcance dos melhores resultados para o paciente.(139)
Os prescritores que exercem à docência se posicionaram de que têm levado conteúdos
para seus alunos e percebem bastante interesse, estão impulsionando progressos na academia
por meio de projetos de pesquisa e extensão, circunstâncias que segundo eles estimulam ainda
mais o empenho enquanto prescritores. Assim, ressaltaram a necessidade da academia assumir
o compromisso de inserir a Medicina Canabinoide na grade da graduação, dado o mérito de sua
relevância na saúde humana, por meio do desenvolvimento de ligas acadêmicas, projetos de
extensão, residência médica, formação para docentes e centros de pesquisas, tornando a
terapêutica com canabinoides uma realidade acessível.
Neste ínterim, cabe a reflexão sobre os aspectos de formação quanto o concebimento da
prática pedagógica como política institucional, posto que a literatura identifica que as ações de
formação são esporádicas demonstrando a escassez de espaços de Educação Permanente
voltados aos pressupostos pedagógicos da aprendizagem significativa. Desta forma, é possível
inferir que a atuação dos médicos prescritores na docência traz em seu bojo esforços na
perspectiva de alavancar as mudanças sobre os usos medicinais da Cannabis por meio da
problematização, da construção do saber pela experiência e pela motivação das condições
dinâmicas de suas vivências a partir da construção social cotidiana junto aos pacientes,
representando interações entre as situações de aprendizagem e a prática educativa propriamente
dita, constituindo um processo de ensino-aprendizagem que atende aos compromissos
assentados pelas Diretrizes Curriculares Nacionais.(130)
Conforme relataram, apesar das dificuldades, é grande o interesse na temática tanto por
médicos formados como por estudantes em formação, a fim de conhecer e se apropriar do
conhecimento teórico-científico, das pesquisas, estudos e da prática clínica sobre o uso
medicinal da Cannabis, buscando o desenvolvimento de segurança em relação à terapêutica,
pois já perceberam que trata de uma ferramenta terapêutica que tem transformado a vida de
pacientes e famílias.
Assim, acreditam que esta situação será aos poucos modificada, com redução do
preconceito e avanços nos processos formativos como tem acontecido mundialmente,
vislumbrando ainda a concepção da Medicina Canabinoide como uma especialidade médica,
um novo caminho a se estruturar.
Afinal, mediante as necessidades de saúde da população de acesso à Cannabis
Medicinal bem como a necessidade de formação de profissionais capacitados e qualificados,
135

constata-se que as demandas postas pela sociedade se colocam para as instituições formadoras
questionando o modelo médico assistencial vigente, que ainda perpetua a ideologia liberal e
individualista atravessada pela lógica do lucro do complexo médico-industrial, com vieses dos
interesses industriais e mercantilistas, uma estrutura acadêmica anacrônica que pouco tem feito
para as mudanças no processo educativo.(123)
Diante disso, o reconhecimento da precariedade desta política de saúde excludente para
os menos favorecidos não contempla a realidade socioeconômica e sanitária do país, fato que
aponta para a necessidade de uma profunda reformulação que desconstrua a concepção
autoritária e autocrática da educação médica e traga um currículo integrado, com abordagem
dialógica de competência e uso de metodologias ativas de ensino e aprendizagem, que assuma
o compromisso ético de um modelo de atenção à saúde cujo sistema educacional preconize o
desenvolvimento científico-tecnológico dentro do propósito conceitual e metodológico que
cumpra com a função social, favorecendo a construção de conhecimentos compatíveis com a
solução de problemas e produção da cidadania, numa perspectiva ampla e humana voltada para
a resposta das necessidades da sociedade.(130)
136

7 CONCLUSÃO

Este estudo reforçou que é preponderante e estrutural a herança histórico-político-social


da Guerra às drogas perpetuando dogmas, preconceitos, a criminalização e proibicionismo
relacionados à Cannabis, tratados ideologicamente por um senso moral e conservador,
potencializado pela atual polarização da ciência, que repercute na classe médica, provocando
cisões conceituais.
A rigor, estes estereótipos estruturais contrapostos aos avanços científicos no âmbito
mundial ficam evidentes no posicionamento reticente até então adotado pelo CFM e a postura
acirrada e tendenciosa defendida pela ABP, afirmando não existir qualquer potencial
terapêutico na planta Cannabis sativa L, posturas que deixam fatídicos registros na história da
ciência brasileira.
No contexto anacrônico brasileiro, o caminho regulatório tem sido pavimentado pela
luta dos pacientes e seus familiares por meio da mobilização social, divulgando os resultados,
segurança e eficácia da Cannabis Medicinal, impactando no aumento da procura pela população
e na adesão médica à terapêutica. A desobediência civil pacífica proposta pelas associações
também constitui uma mola propulsora diante da resistência e inércia do Estado que mantém a
sociedade à margem da Lei, emergindo tensionamentos sócio-jurídico-político-econômicos,
pressionando para alteração de leis e normas vigentes sobre a Cannabis sativa L no Brasil, em
busca de uma robusta regulamentação.
Este cenário de omissão, isenção e insuficiência normativa incide diretamente no
baixíssimo quantitativo de médicos prescritores no país, que hoje não atinge 0,1% de toda a
classe médica, pela falta de respaldo, exposição, insegurança, jurídica, sentimentos de coação
relatados pelos médicos prescritores, um óbice grave no acesso seguro ao tratamento com
canabinoides que mantém marginalizados milhares de pacientes brasileiros no âmbito da saúde.
As constatações permitem inferir que, além da falta de médicos capacitados, a
precariedade deliberada pelo custo elevado do tratamento impõe um recorte social desumano,
no qual a população atingida contundentemente pela violência de Estado figura os pacientes
hipossuficientes e vulneráveis do SUS, restando-lhes para a salvaguarda de seus direitos à
dignidade e saúde a submissão ao árduo e moroso caminho da judicialização para a concessão
da “piedade” do Estado, ou, iniciativas próprias de cultivo doméstico, cujo saldo final ainda
pode imputar o encarceramento, também concedido pela mesma “piedade” de Estado no
“exercício de seu dever para com a sociedade”.
Diante disso, os médicos prescritores participantes trouxeram a necessidade de
137

estratégias que fomentem viabilização da produção, comercialização e autossuficiência


nacional, seja na produção a nível individual, como em cooperativismo, ou mesmo em escala
industrial e farmacêutica, por meio de uma ampla regulamentação que contemple a realidade
do país. Uma sugestão de regulamentação includente alvitrada pelos participantes propõe
iniciativas que estabeleçam o trabalho em rede pelas associações em parcerias com as
universidades e poder público, visando o fornecimento via SUS de produtos de Cannabis que
atendam os padrões de qualidade e funcionalidade para os pacientes.
Tais questões não seriam de tamanha relevância sem a exposição de motivos que
fundamentam este retrato. Neste sentido, consonante aos achados científicos, os prescritores
extraíram de suas vivências junto aos pacientes resultados apontando que o uso medicinal da
Cannabis demonstrou propriedades terapêuticas homeostáticas fundamentais, atuando na
neuroplasticidade, neuromodulação, imunomodulação, efeitos neurorregenerativos,
neuroprotetores, analgésicos e anti-inflamatórios, com resultados na melhora cognitiva e
funcional, modulação nociceptiva e comportamental, mecanismos antineoplásicos, efeitos
modulatórios em sintomas hormonais, reprodutivos, ginecológicos e no circuito do sistema de
recompensa.
Os benefícios foram expressivos em todas as faixas-etárias, favorecendo especialmente
pacientes com doenças refratárias e em politerapia, viabilizando a redução e retirada de
medicamentos alopáticos, consequentemente diminuindo os efeitos colaterais destas drogas,
possibilitando resgate de autonomia, adesão efetiva a cuidados de saúde e qualidade de vida,
diminuição da sobrecarga dos cuidadores e impactos positivos nas relações sócio-familiares e
subsequente redução de gastos na saúde pública pela diminuição de internações e uso de
serviços de urgência e emergência.
Quanto a eficiência e eficácia da Cannabis, sabe-se que os fitocanabinoides agem em
receptores e sinalizadores do SEC humano, por mecanismos multimodais de forma agonista e
antagonista dosedependentes, de modo que a ciência vem progredindo exponencialmente nos
últimos anos com evidências que transitam em níveis conclusivos, substanciais, moderados e
limitados, sendo nítida a convergência para a validação desta ferramenta terapêutica enquanto
abordagem compassiva, paliativa, preventiva, como monoterapia, terapia complementar ou
adjuvante, consolidando uma nova perspectiva de cuidado na medicina.
Com relação à segurança terapêutica, observou-se que na prática clínica há ausência ou
baixa incidência de efeitos colaterais, incapacidade de provocar situações graves, overdose ou
levar o paciente à morte, constatações também evidenciadas pela ciência. Segundo os médicos,
quando comparado aos efeitos colaterais dos medicamentos alopáticos, as reações adversas à
138

CM são muito menores e os sintomas mais comuns são enjoo, vômito, sonolência ou insônia,
tontura no início do tratamento, boca seca, perda ou aumento do apetite e sintomas
gastrointestinais.
Consonantes à literatura científica, pode ocorrer interações medicamentosas com
fármacos metabolizados pelo Citocromo P450 e há pacientes que inspiram maior
acompanhamento e monitoramento ou mesmo casos em que derivados da Cannabis podem ser
contraindicados, pois ainda há muito a ser pesquisado.
Visualiza-se no cenário da classe médica que o uso do THC ainda provoca muitas
polêmicas. Neste sentido, com relação ao desenvolvimento de psicose ou esquizofrenia e riscos
para a população pediátrica, a prática clínica dos prescritores demonstrou que esta é uma
afirmação que carece de estudos conclusivos relacionando causa e efeito, excluindo outros
fatores, pois o manejo seguro por meio da titulação criteriosa da dose tem efeitos significativos
de utilidade terapêutica.
Os desafios no processo formativo ressaltados derivam das dificuldades de acesso à
informação decorrentes da restrita divulgação dos conhecimentos para a sociedade e
comunidade acadêmica, não isentos dos contraditórios sociais, constituindo um obstáculo nos
avanços com relação à classe médica, incidindo diretamente na falta de profissionais
capacitados e na falta de acesso da população. Desta forma, percorreram estes caminhos
assumindo uma postura autodidata, construindo seus saberes estudando a fundo e buscando
continuamente aprimoramento, interfaceando os conhecimentos científicos disponíveis, as
trocas de experiências com outros prescritores e as vivências junto aos seus pacientes,
desenvolvendo habilidades no manejo terapêutico, alcançando uma maior segurança, confiança
e tranquilidade na aplicação da Cannabis com o passar do tempo.
Apresentadas todas estas perspectivas, conclui-se, portanto, que a carência de inserção
destes conhecimentos nos currículos em saúde, de espaços de discussão e formação nas
instituições, assim como a falta de fomento à pesquisa são questões centrais que requerem
posturas proativas pressionando, sensibilizando e mobilizando o poder público a assumir
compromissos que rumem para avanços na construção científica e democratização do acesso
ao tratamento com a CM para a população, sendo fundamental que a classe médica se aproprie
continuamente destes conhecimentos desde a graduação, explícito o mérito de sua relevância
na saúde humana.
139

8 PRODUTO TÉCNICO EM ELABORAÇÃO

A partir dos resultados deste estudo, será elaborado um produto técnico com proposta
de desenvolver um curso de capacitação sobre Cannabis Medicinal para profissionais do SUS
da Região de Saúde de Marília, com base em metodologias ativas de ensino e aprendizagem,
por meio de estratégias educacionais variadas, contando com professores qualificados
convidados de diferentes formações.
A atividade será coordenada pela pesquisadora e acontecerá em cinco encontros, com
duração de duas horas e periodicidade quinzenal, via plataforma online.
Serão ofertadas 50 vagas para profissionais de nível superior que atuem no SUS, em
serviços dos diferentes níveis de complexidade, indicados pelas Secretarias Municipais de
Saúde. As vagas serão distribuídas para os municípios de forma paritária, sendo 50% destinadas
a profissionais médicos.
140

9 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Esta pesquisa traz contribuições no sentido do entendimento das vivências, trajetórias e


práticas dos médicos prescritores de Cannabis sativa L, que podem servir para intervenções
eficazes na formação de futuros prescritores.
Outras pesquisas neste sentido devem ser realizadas com prescritores de outras
localidades, com médicos ainda não prescritores, visando compreender suas inseguranças e
dúvidas, podendo utilizar outros instrumentos e procedimentos de coleta e análise de dados,
como um mapeamento quantitativo mais ampliado sobre a situação dos prescritores e médicos
interessados no tema pelo Brasil, a realização de grupos focais e outros desenhos de estudo que
permitam o aprofundamento quanto a apropriação da temática nas instituições formadoras, bem
como as concepções dos docentes.
141

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191. Processo-consulta CFM nº 969/2002 PC CFM n° 1/2004 [Internet]. 2004 [citado 10


out 2021]. Disponível em:
https://sistemas.cfm.org.br/normas/arquivos/pareceres/BR/2004/1_2004.pdf
161

192. Processo-consulta CFM nº 4.696/2002 PC/CFM/nº 12/2003 [Internet]. 2003 [citado 10


out 2021]. Disponível em:
https://sistemas.cfm.org.br/normas/arquivos/pareceres/BR/2003/12_2003.pdf

193. Barbiero FS. Cultivo de Cannabis: uma análise cienciométrica e bibliográfica


[monografia na Internet]. Porto Nacional (TO): Universidade Federal do Tocantins;
2021. 38 f. [citado 05 out 2021]. Disponível em:
http://umbu.uft.edu.br/handle/11612/3099

194. Cervantes J. Marijuana horticulture: the indoor/outdoor medical grower's bible. 5a ed.
Vancouver: Van Patten Publishing; 2006. 464p.

195. Freitas VP. Reflexos da liberação da maconha sobre o meio ambiente. Revista
Eletrônica do Curso de Direito da UFSM. 2020;15(1):1-26.

196. Ceccim RB, Freitas CR, organizadores. Fármacos, remédios, medicamentos: o que a
Educação tem com isso? [Internet]. Porto Alegre (RS): Rede Unida; 2021. (Coleção
Vivências em Educação na Saúde) [citado 04 out 2021]. Disponível em:
https://www.lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/220730/001125434.pdf?sequence
=1

197. Morel C. Pesquisa translacional: o que é isso? Centro de Desenvolvimento


Tecnológico em Saúde [Internet]. [citado 15 out 2021]. Disponível em:
https://www.cdts.fiocruz.br/opiniao-de-especialistas/pesquisa-translacional-o-que-e-
isso
162

APÊNDICES

APÊNDICE A – Instrumentos

1 - FORMULÁRIO GOOGLE: Identificação dos participantes e dados de formação.


Pesquisa: O olhar médico para a Cannabis Medicinal –
Certificado de Apresentação de Apreciação Ética (CAAE): 28696720.4.0000.5413
Disponível em: https://forms.gle/36uWR3RPRqwSJs6d9

2 - ROTEIRO DE ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA


1) Quando você começou a utilizar canabinoides em sua prática médica? Relate a história
de como você passou a prescrevê-los. O que te levou a essa terapêutica?
2) Qual era o seu grau de conhecimento em relação à Cannabis e os canabinoides antes
de começar a prescrever? Como ele está atualmente, acha que é suficiente para lhe dar
segurança em relação à prática clínica?
3) Qual a principal fonte de informação sobre Cannabis e canabinoides na sua prática
profissional? Por favor, mencione experiências relevantes que tenha tido com cursos
independentes, sites na internet, grupos de discussão, pacientes, colegas ou cursos
universitários/pós-graduações.
4) Em quais situações, para quais doenças e faixas-etárias você prescreve atualmente?
5) Quais os principais benefícios? Em quais situações/casos/patologias houve os
melhores resultados?
6) Quais os riscos, efeitos colaterais e contraindicações desta terapêutica?
7) O que mudou em sua prática profissional desde que começou a prescrever Extrato de
Cannabis? (forma que é visto e tratado por colegas, pacientes e familiares, como se vê e
se sente?)
8) Acha que existem prescritores suficientes no Brasil? Na sua opinião, qual o principal
empecilho para adesão dos médicos a esse tipo de tratamento?
9) Na sua opinião, qual a melhor forma de se ter acesso ao tratamento atualmente no
Brasil? Se houver, experiência específica, favor comentar a respeito dos tratamentos com
produtos importados, industriais, de associações ou caseiros individuais.
163

APÊNDICE B – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE)


164

ANEXOS

ANEXO A – Aprovação do Comitê de Ética em Pesquisa


165
166
167

ANEXO B – Termo de Aceite de Instituição Co-Participante

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