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Psicologia
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
Social Jurídica
Resistências no
Sistema de (In)Justiça
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
Laura Cristina Eiras Coelho Soares
Renata Ghisleni de Oliveira
Fernanda Hermínia Oliveira Souza
(Organizadoras)
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
Editora CRV
Curitiba – Brasil
2023
Copyright © da Editora CRV Ltda.
Editor-chefe: Railson Moura
Diagramação e Capa: Designers da Editora CRV
Revisão: Os Autores
Bibliografia
ISBN Digital 978-65-251-5590-6
ISBN Físico 978-65-251-5589-0
DOI 10.24824/978652515589.0
2023
Foi feito o depósito legal conf. Lei nº 10.994 de 14/12/2004
Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora CRV
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Andréia da Silva Quintanilha Sousa (UNIR/UFRN) Christiane Carrijo Eckhardt Mouammar (UNESP)
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Este livro passou por avaliação e aprovação às cegas de dois ou mais pareceristas ad hoc.
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SUMÁRIO
APRESENTAÇÃO ............................................................................................ 9
Laura Cristina Eiras Coelho Soares
Renata Ghisleni de Oliveira
Fernanda Hermínia Oliveira Souza
PREFÁCIO...................................................................................................... 13
Lisandra Espíndula Moreira
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Madalena naquele dia falava de acordo e ficou muito claro pra mim que
ela não entendia qual o verdadeiro propósito de um processo. É preciso
que eu tenha o meu advogado e você o seu e então nós botamos os dois
para brigar feito uma rinha de cães, é preciso que eles escrevam atrocida-
des, saiam de cada combate com as gravatas mordidas rasgadas, degola-
dos, enquanto nós vamos nos apaziguando nesse exagero, acendemos um
cigarro cada uma sob uma árvore murcha na porta do fórum, e estamos
resolvidas (CARRARA, 2022).
Quando ela conta sobre o processo de danos morais que moveu contra
uma mulher, ambas envolvidas numa cena trágica, a personagem vai tensionar
as resoluções jurídicas envolvidas nos mecanismos de mediação ou de litígio.
Mas em um dado momento, ambas emocionadas enquanto advogados usavam
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As pessoas que te mataram ainda estão soltas. E não sei por quanto tempo
elas continuarão livres. Mas elas nunca saberão nada sobre o que você
tinha antes da pele. Jamais saberão o que você carregava para além de
uma ameaça. Por isso, sigo recontando a tua vida, que também é um pouco
da minha. Investiguei os teus afetos através dos meus. Eu ainda não sei
o que fazer com essa descoberta. Não sei o que fazer com essa verdade
inventada. É inventando que consigo ser honesto. Sei que ninguém quer
morrer da maneira que você morreu. um fuzilamento. Sem chance de
defesa. Você não teve a mesma chance de Dostoiévski, não é mesmo? Não
houve nenhum salvo-conduto. Nada. Nenhum czar para te salvar. Mas sei
que durante a vida você passou por essas tentativas de fuzilamento. A sua
grande obra foi continuar levantando, dia após dia. Apesar de tudo você
continuou desafiando a possibilidade de morrer. No sul do país, um corpo
negro sempre será um corpo em risco (TENÓRIO, 2020).
REFERÊNCIAS
Arantes, E. M. M. Mediante quais práticas a psicologia e o direito pretendem
discutir a relação? Anotações sobre o mal-estar. C. Coimbra, L. Ayres, & M.
L. Nascimento (org.), Pivetes: Encontro entre a psicologia e o judiciário (p.
131-148). Curitiba: Juruá, 2008.
Introdução
Esse texto resulta de uma dupla injunção. A primeira, a provocação feita
pelo Núcleo de Pesquisa em Psicologia Jurídica (NPPJ) no seu VIII Encontro
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1 A pesquisadora Maria Cristina G. Vicentin contou com o apoio de bolsa produtividade CNPq processo
n.314659/2021-8.
20
Nesse texto, que toma como objeto de reflexão minha própria trajetória
nas fronteiras psi-jurídicas, busco apresentar algumas inflexões que vivi como
profissional e pesquisadora que possibilitam visibilizar e afirmar essa pers-
pectiva transversalista e uma direção ético-política fronteiriça para o trabalho
sempre em devir nesse campo.
Os que nos formamos e nos engajamos na vida profissional no período
da redemocratização de nosso país – ingressei na universidade em 1977, ano
de intensa mobilização no movimento estudantil, da construção das eleições
diretas para a presidência, da emergência de novos atores políticos e movi-
mentos sociais e das lutas pela democratização do país – experimentamos
uma dupla tarefa: trabalhar pelo desmonte das instituições da violência e da
exclusão e construir saberes e fazeres para uma sociedade cidadã numa pers-
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2 Subjetivação jurídico-política, conforme a pista de Melo (2021), porque se toma o direito como um campo
privilegiado de análise das relações de poder e as crianças e adolescentes como objetos privilegiados destas
práticas para a análise quanto aos modos de produção de verdade, de relações de poder e de cuidados,
assim como quanto às relações de “sujeição” ou de “subjetivação”, ou seja, de formação de uma relação
de si a si, de condições de problematização de si e do mundo”.
22
3 Endossamos a nomenclatura Sistema Febem, apesar da mudança para Fundação Casa, para ressaltar
a similaridade de funcionamento presente em grande parte da política de atendimento aos adolescentes
em conflito com a lei em nosso país e as dificuldades de superação do modelo segregador-repressivo que
estiveram na origem da constituição da Fundação do Bem-Estar do Menor e seguem se reproduzindo a
despeito das novas nomenclaturas adotadas.
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 23
REFERÊNCIAS
ANITUA, Iñaki. Seguridad insegura. El concepto jurídico de seguridad indi-
vidual contra el discurso bélico. Cuadernos de Doctrina y jurisprudencia
penal. Criminología. Teoria y Práxis. Buenos Aires, n. 3, 2005.
7 A coleta do quesito raça-cor, de modo geral, não é realizada no âmbito das instituições do sistema de justiça
e na Defensoria Pública de São Paulo isso não é diferente – o que, por si só, já é um dado, uma expressão
da branquitude.
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 37
que não enxerga a si própria. Paralelamente, corpos não brancos são, através
do racismo, os depositários de todas as contradições sociais.
A marcação racial para negros e indígenas precede os sujeitos singulares
que as portam. Primeiro são associados ao seu grupo racial, carregado de
perspectivas negativas e estereotipadas, para só depois serem vistos como
sujeitos. São eles, portanto, os representantes da ideia de raça. A não mar-
cação da identidade branca é justamente o que confere a ela o sentido e o
poder de se constituir como referência da humanidade, ponto a partir do qual
todos os demais diferem.
Considerando o que Ana Gebrim traz como contribuição conceitual,
penso que há enlaces muito factíveis entre a sua localização na relação com
quem atende no espaço da clínica e a minha localização, ou a de psicólogos
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transite pelo corpo. É um exercício ético que pede fresta, treino, flexibilidade,
adjacência. E pode ser incômodo porque demanda deslocamento, responsa-
bilidade e nos convida ao inesperado, ao assombro.
É preciso escutar para imaginar. Imaginar outros modos de ser e estar
através da ampliação dos repertórios, da recusa das abjeções e da criação de
novos recursos éticos e estéticos. Imaginação como forma de preparo para o
encontro com o outro e o desencontro consigo.
E é preciso imaginar para desaprender. Mas desaprender o quê?
Desaprender as histórias únicas, as estereotipias, os perfis, os diagnósti-
cos, as repetições mortíferas. Desaprender as forças da colonialidade que ditam
como as famílias devem se organizar, como as mulheres devem se portar, onde
as pessoas negras devem estar, onde as pessoas brancas devem se manter.
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REFERÊNCIAS
ADICHIE, C. N. O perigo de uma história única. São Paulo: Companhia
das Letras, 2019.
DINIZ, D.; GEBARA, I. A esperança feminista. São Paulo: Ed. Rosa dos
Ventos, 2022.
MOMBAÇA, J. Não vão nos matar agora. Rio de Janeiro: Cogobó, 2021.
Introdução
9 Sabendo que o CAPS é um serviço de portas abertas, pertencente a RAPS (rede de atenção psicossocial)
responsável pelo cuidado em saúde mental da população do território, temos que esse serviço surge em
meio ao movimento da Reforma Psiquiátrica, com a criação de uma rede substitutiva, que permite e aposta
eticamente no cuidado em liberdade, na tentativa de desinstitucionalizar a população internada em hospitais
psiquiátricos, entendidos como sendo espaços promotores de cuidado do sofrimento psíquico e não espaços
de tratamento. A portaria 336/2002 instituiu oficialmente os CAPS, e embora façam parte da RAPS, esta foi
regularizada somente em 2011 com a portaria 3.088. Como os CAPS IJ são serviços da rede voltados para
o cuidado em saúde mental de crianças e adolescentes e contam com uma equipe multidisciplinar que inclui
diversos profissionais da saúde, dispõe o matriciamento dos outros serviços da rede de saúde do território,
ou seja, promove discussões que possibilitem um cuidado compartilhado entre as equipes. Nessa esteira o
CAPS realiza seu cuidado através de diversos dispositivos, como discussões entre a equipe, momentos de
educação continuada e discussões com outros serviços, realização de grupos com os usuários, grupos de
família, visitas domiciliares e atendimentos individuais. Todavia, o direcionamento ético-político da equipe é
crucial para que esse cuidado seja realizado de uma perspectiva de fato antimanicomial, tal como idealizado
no desenho da rede substitutiva de atenção em saúde mental. Isso significa que os diferentes pontos de
vista dentro de uma equipe expressam, mais que a interprofissionalidade, a complexidade política do fazer
CAPS. O que cada um entende como atenção em saúde mental, processos de saúde e doença, papel da
medicação, papel do diagnóstico e meta de seu trabalho influenciam diretamente na qualidade e no impacto
que esse CAPS produz em seu território.
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 47
10 Esta lei dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona
o modelo assistencial em saúde mental, vedando a internação em instituições com características asilares:
Art. 1o Os direitos e a proteção das pessoas acometidas de transtorno mental, de que trata esta Lei, são
assegurados sem qualquer forma de discriminação quanto à raça, cor, sexo, orientação sexual, religião, opção
política, nacionalidade, idade, família, recursos econômicos e ao grau de gravidade ou tempo de evolução
de seu transtorno, ou qualquer outra. E que são direitos da pessoa portadora de transtorno mental: I – ter
acesso ao melhor tratamento do sistema de saúde, consentâneo às suas necessidades; II – ser tratada com
humanidade e respeito e no interesse exclusivo de beneficiar sua saúde, visando alcançar sua recuperação
pela inserção na família, no trabalho e na comunidade; III – ser protegida contra qualquer forma de abuso
e exploração; IV – ter garantia de sigilo nas informações prestadas; V – ter direito à presença médica, em
qualquer tempo, para esclarecer a necessidade ou não de sua hospitalização involuntária; VI – ter livre
acesso aos meios de comunicação disponíveis; VII – receber o maior número de informações a respeito de
sua doença e de seu tratamento; VIII – ser tratada em ambiente terapêutico pelos meios menos invasivos
possíveis; e IX – ser tratada, preferencialmente, em serviços comunitários de saúde mental.
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 49
“Sabemos pouco ou quase nada de quem elas são porque não há sistema
de informação nacional – o Sipia-Sinase, um Sistema de Informação em
rede de abrangência nacional para a formação de um banco de dados
único, ainda é uma experiência em curso –, sabemos pouco porque os
relatórios sobre sistema socioeducativo costumam não particularizar a
experiência delas e, por fim, porque as pesquisas acadêmicas ainda são
bastante centradas nos adolescentes em conflito com a lei, proporcionando
pouco recorte de gênero” (CNJ, 2015, p. 207).
Itinerários de cuidado
O uso dos itinerários terapêuticos visa analisar as redes sociais de cuidado
e de atenção à saúde das meninas em cumprimento de medida socioeducativa
e toma o itinerário terapêutico como um constructo teórico-metodológico
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Método
14 Em pesquisa sobre homicídios contra jovens no Ceará tivemos um mapeamento de histórias de vida de
adolescentes vítimas de homicídio quando identificaram os percursos dos adolescentes nas políticas públicas
e finaliza com recomendações para a prevenção de homicídios na adolescência – veja mais informações no
sítio: https://cadavidaimporta.com.br/wp-content/uploads/2018/03/trajetorias-interrompidas-junho-2017.pdf
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 53
Analisadores
Lutas e resistências
REFERÊ NCIAS
AGAMBEN, G. Estado de exceção. São Paulo: Boitempo Editorial, 2004.
Introdução
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Tal campanha foi uma de muitas outras que foram criadas por movimen-
tos feministas na década de 2010, em destaque a “Chega de Fiu fiu”, “Não
mereço ser estuprada”, #MeuAmigoSecreto” e #MeuCorpoNãoÉPúblico,
que se utilizaram também do espaço virtual para denunciar uma violência
comum de todas as mulheres e que é negligenciada por autoridades: o assédio
sexual em espaços públicos (ALMEIDA, 2019; BANDEIRA, 2019; FARIA;
CASTRO, 2014; GELEDÉS, 2017; LARA et al., 2016).
Somente em 2017, a partir da repercussão da notícia de que um homem
havia ejaculado no pescoço de uma passageira dentro do transporte público
coletivo na cidade de São Paulo, episódio conhecido como o “caso do ônibus
da Avenida Paulista” que se criou um cenário forte de comoção social para
que houvesse uma mudança na legislação penal brasileira e trouxesse maior
PARTICIPANTE 9: [...] Que amiga, isso era muito pior quando era mais
nova. Dentro da perspectiva. Masculinista. Quanto mais nova tu é, mais,
mais disponível, tu tá. Tá nessa lógica da fetichização. Tá nessa lógica
desse sistema do ninfetinha, sabe, que é horroroso isso (Transcrição par-
ticipante 9-2022, travesti, parda, 27 anos).
que não foi uma importunação, foi um homem que chegou a tentar dar em
cima de mim, mas como eu era muito nova, eu acho que eu tinha uns 12
anos e nesse nessa ocasião tava na companhia da minha mãe. Foi minha
mãe que percebeu e chamou a atenção dele, na, dentro do ônibus fez um...
escândalo. (Transcrição participante 2-2021, mulher cis, parda, 29 anos).
Na época, ainda menina, a Participante 002 afirmou que não havia notado
o que estava acontecendo e o que nos chamou a atenção em sua fala atual é
que mesmo depois de adulta, restam dúvidas se aquele comportamento poderia
ser considerado uma importunação sexual ou não, o que parece contraditória
em um primeiro momento, haja vista que o caso mencionado veio de uma
pergunta direta sobre as experiências de importunação sexual.
perfeita, percebe-se também nos seus relatos que elas buscaram elementos
que comprovassem não terem contribuído para o ocorrido, como não estarem
sozinhas no momento e a companhia de suas respectivas mães.
Nesse contexto, acredita-se que se não fossem as intervenções das geni-
toras, seja chamando a atenção do assediador ou retirando-a daquele lugar, a
importunação sexual poderia ter continuado por todo o trajeto e até mesmo
se agravar, haja vista a ausência de interferência de outros passageiros nas
situações relatadas por uma mulher preta e outra parda.
Desta forma, é mister compreender que além dos significados sociais sobre
o perfil da vítima trazidos por Sousa (2017) que questionam o reconhecimento de
uma violência sexual, há de se levantar também a “opressão comum” de hooks
(2019a) que está inserida neles, pois não levam em consideração as diferenças
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Considerações finais
Nesse sentido, a noção de “vítima perfeita”, trazida por Sousa (2017), que
compreende a boa reputação e marcas de resistência para o seu reconhecimento
enquanto crime sexual, não funciona, uma vez que na maioria das vezes é
praticado por desconhecidos e não deixa marcas, o que dificulta, inclusive,
que a própria sobrevivente o compreenda como tal, mesmo sentindo medo
e constrangimento como qualquer outra vítima de violência dessa natureza.
Ademais, há de se concluir também que a ideia da “vítima perfeita”
ainda se relaciona com a noção de “opressão comum” (HOOKS, 2019b),
uma vez que o perfil da “boa reputação” está voltada para mulheres cis e
brancas, cuja imagem foi construída a partir da desvalorização de mulheres
“de cor” ou que não seguem a lógica cis-heteronormativa, estas últimas, são
colocadas na categoria de objeto sexual, por isso não são reconhecidas ou
REFERÊNCIAS
AKOTIRENE, C. Interseccionalidade / Carla Akotirene. (Feminismos
Plurais / organização de Djamila Ribeiro). São Paulo: Pólen, 2019.
FARIA, J. DE; CASTRO, B. Think Olga / Meu corpo não é seu / des-
vendando a violência contra a mulher. eBook Kindle: Companhia das
Letras, 2014.
G1SP. Entidades defendem juiz após libertação de homem que ejaculou sobre
mulher em ônibus na Paulista. Portal de Notícias. Disponível em: https://
g1.globo.com/sao-paulo/noticia/entidades-defendem-juiz-apos-libertacao-
-de-homem-que-ejaculou-sobre-mulher-em-onibus-na-paulista.ghtml. Acesso
em: 17 nov. 2022.
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 79
SCOTT, J. Gênero: uma categoria útil para análise histórica. In: Pensamen-
tos feministas: conceitos fundamentais. Audre Lorde... [et al.]; organização
Heloísa Buarque de Hollanda. Rio de Janeiro: Bazar do Tempo, 2019. p. 440.
Introdução
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O acontecimento PNAISP
15 No escopo deste texto, evidenciar a relação entre o PNSSP e a PNAISP interessa mais que evidenciar suas
diferenças por meio de uma análise comparativa. Para este fim, mais informações podem ser consultadas
em Brasil (2005).
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 85
medida de segurança (art. 7), por meio de equipes de diferentes – mas com-
plementares – composições. De acordo com a Portaria n. 482, de 1 de abril de
2014, a assistência no sistema prisional é ofertada pelas Equipes de Atenção
Básica Prisional (EABP’s)16, com cinco tipos previstos em relação ao número
de custodiados/as em cada unidade e a associação com módulo de Saúde
Mental (SM). A equipe mínima (tipo I), indicada para o atendimento de até
100 pessoas, não conta em sua composição com vaga reservada para a Psi-
cologia17 – e no tipo I com SM, a previsão é de caráter opcional, cabendo ao
proponente selecionar dois profissionais entre as áreas de assistência social,
enfermagem, farmácia, fisioterapia, psicologia ou terapia ocupacional. Já as
equipes de Tipo II, II com SM e III contam necessariamente com a participação
da Psicologia (BRASIL, 2014c)18.
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16 Na redação dos dispositivos institucionais aqui listados, encontramos a denominação “Equipe de Atenção
Básica Prisional – EABP”, mesmo que a Secretaria responsável pela coordenação da PNAISP no Ministério
da Saúde se refira às equipes como “Equipe de Atenção Primária Prisional – eAPP”. Aqui, trabalharemos
com a expressão original de cada documento apontado; contudo, por entender que não se tratam de
expressões sinônimas já que ensejam perspectivas descontínuas, sugerimos a leitura de Mello, Fontanella
e Demarzo (2009).
17 A única exceção prevista é colocada no Art. 3, § 12: “Em unidades com até 100 (cem) pessoas privadas
de liberdade que assistam preferencialmente pessoas com transtorno mental em conflito com a lei, é reco-
mendada a habilitação de Equipe de Atenção Básica Prisional tipo II ou Equipe de Atenção Básica Prisional
tipo II com saúde mental” (BRASIL, 2014a).
18 Em setembro de 2021, o Ministério da Saúde publica a Portaria nº 2.298, cujo conteúdo dispõe sobre normas
de operacionalização da política e indica alterações em relação à formação das equipes.
86
19 O levantamento exposto compreende o período entre julho e dezembro de 2019. Disponível em: https://
app.powerbi.com/view?r=eyJrIjoiMmU4ODAwNTAtY2IyMS00OWJiLWE3ZTgtZGNjY2ZhNTYzZDliIiwidCI6I-
mViMDkwNDIwLTQ0NGMtNDNmNy05MWYyLTRiOGRhNmJmZThlMSJ9. Acesso em: 8 mar. 2021.
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 87
O dispositivo-saúde
21 Assinado em dezembro de 2019 pela Coordenadora de Saúde no Sistema Prisional e pelo Diretor do Depar-
tamento de Saúde da Família, ambos no âmbito da Secretaria de Atenção Primária à Saúde. Disponível em:
http://189.28.128.100/dab/docs/portaldab/documentos/ParecerTecnico_N_42019ExtincaoEAPs.pdf.
90
22 Uma em Manaus (AM), três em São Luís (MA), uma em Sidrolândia (MS), uma em Belém (PA), uma em
Recife (PE), três no estado do Piauí e uma na capital de São Paulo.
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 91
Em texto assinado por seu então presidente23, o CNS marca sua função de
formulação e controle na execução da Política Nacional de Saúde e afirma, em
acordo com parecer anterior da Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão
do Ministério Público Federal (PFDC/MPF) de 2011, que “o paciente em
medida de segurança é sujeito da saúde e não da justiça”, o que fundamenta
todos os atos normativos para progressiva extinção dos HCTP’s e destaca a
articulação intersetorial neste processo. As recomendações contemplam não
somente a revogação da portaria que extinguiu o serviço, como também a
garantia do incentivo financeiro federal tanto às EAP’s já habilitadas quanto
a novas equipes a serem implementadas. O documento finda com o destaque
de “que qualquer alteração da Política Nacional de Saúde que afete os direitos
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, F. M. Criminologia Clínica. In: R. S. LIMA; J. L. RATTON; R.
G. AZEVEDO (org.). Crime, polícia e justiça no Brasil, p. 125-134. São
Paulo: Contexto, 2014.
Introdução
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25 Nota Técnica CFP 01/2023, que visa a orientar psicólogas e psicólogos sobre a prática da Constelação
Familiar, também denominada Constelações Familiares Sistêmicas. Disponível em: Nota Técnica 1/2023
– Visa a orientar psicólogas e psicólogos sobre a prática da Constelação Familiar, também denominada
Constelações Familiares Sistêmicas. – CFP | CFP. Acesso em 10 de julho de 2023.
26 Resolução CNJ nº125, de 29 de novembro de 2010. Disponível em: resolucao_125_29112010_23042014190818.
pdf (cnj.jus.br). Acesso em :10 jul. 2023.
98
27 Roberta Dornelas Miranda, sob orientação da professora doutora Lílian Perdigão Caixêta Reis. Pesquisa
desenvolvida junto ao Programa de Pós-Graduação em Economia Doméstica da Universidade Federal
de Viçosa (UFV), cujo título da dissertação defendida em março de 2020 corresponde a “Constelações
Sistêmicas: uma análise do uso desta ferramenta no tratamento de conflitos judiciais familiares”.
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 99
e aqueles que a repugnam. Por si só, este panorama comunica algo importante,
ao enunciar a obscuridade que ronda o assunto, além dos questionamentos,
embates, conflitos de interesses e dilemas éticos existentes.
Ao recorrer-se às referências bibliográficas dentre as obras sobre cons-
telações familiares, depara-se com a pesquisa desenvolvida pela psicóloga
alemã Franke-Bryson, em que a autora esboça uma hipótese de fundamentação
teórica para as constelações familiares, tendo como referência o trabalho de
Bert Hellinger. A partir da compreensão da prática como forma de “resolução
orientada de questões ou terapia sistêmica breve, uma vez que vai do problema
à possível solução em breve intervalo de tempo” (FRANKE-BRYSON, 2019,
p. 27), sugere, enquanto subsídios teóricos, a associação entre a teoria do psi-
codrama, de Jacob Moreno, a escultura familiar e a reconstrução familiar, de
Virginia Satir, e a terapia contextual de Ivan Boszormenyi-Nagy, destacando
a necessidade de estudos científicos que fundamentem sua proposição.
Mediante a leitura dos livros de Bert Hellinger, é possível extrair-se duas
compreensões para as constelações familiares. Em um sentido amplo, seriam um
conjunto de conhecimentos relacionados aos vínculos humanos, entre os quais
estariam o que Hellinger nomeou de “ordens do amor” – condições inconscien-
tes, direcionadas ao pertencimento, ao equilíbrio e à ordem dentro dos sistemas
compostos por indivíduos. Uma vez desordenadas, haveria “emaranhamentos
sistêmicos”, geralmente relacionados a algum acontecimento familiar, o que
levaria a dinâmicas disfuncionais nos relacionamentos, a fracassos pessoais e a
problemas de saúde (HELLINGER, 2015, p. 11). Quando em ordem, estas con-
dições proporcionariam ao sistema paz e estabilidade, permitindo a realização
pessoal dos seus integrantes (FRANKE-BRYSON, 2019, p. 133).
A segunda compreensão para constelações familiares, em um sentido
mais estrito, seria a de um recurso prático, ou seja, uma “ferramenta uti-
lizada para tornar visível a dinâmica normalmente oculta dos sistemas de
100
28 Os dados biográficos de Bert Hellinger foram retirados dos sites Obituário de Bert Hellinger – Hellinger e https://
cf-evajacinto.pt/download/bert-hellinger-interviewed-2001/; e, e dos livros “A Simetria Oculta do Amor (2006)”,
“A fonte não pergunta pelo Caminho (2005)”; “Ordens do Amor (2003)” e “O rio nunca olha para trás (2019)”.
29 Site HellingerShule®, disponível para consulta em https://www.hellinger.com/pt/hellinger-schule/a-escola/
Acesso em: 10 fev. 2020.
30 Especialistas defendem regulamentação da profissão de constelador familiar. Agência Senado. 2022.
Disponível em: https://www12.senado.leg.br/noticias/materias/2022/09/16/especialistas-defendem-regu-
lamentacao-da-profissao-de-constelador-familiar#:~:text=Para%20Mimansa%20Erika%20Farny%2C%20
alem%C3%A3,de%20atitude%20para%20sua%20aplica%C3%A7%C3%A3o. Acesso em: 10 maio 2023.
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 101
31 Constelação Familiar: no firmamento da Justiça em 16 Estados e no DF. CNJ. 2018: Disponível em https://www.
cnj.jus.br/constelacao-familiar-no-firmamento-da-justica-em-16-estados-e-no-df/. Acesso em: 23 set. 2019.
32 Idem nota nº 5.
33 Constelação Familiar: no firmamento da Justiça em 16 Estados e no DF. CNJ. 2018: Disponível em: https://www.
cnj.jus.br/constelacao-familiar-no-firmamento-da-justica-em-16-estados-e-no-df/. Acesso em: 23 set. 2019.
34 Comissão de Assuntos Sociais debate constelação familiar e cura sistêmica. Senado Federal. 2022. Dis-
ponível em: https://www12.senado.leg.br/tv/plenario-e-comissoes/comissao-de-assuntos-sociais/2022/03/
102
39 BRASIL. Ministério da Saúde. Gabinete do Ministério da Saúde. Portaria nº 702, de 21 de março de 2018.
Disponível em: Ministério da Saúde (saude.gov.br). Acesso em: 10 jul. 2023.
104
Eu não tive participação na história ali, né? Mas é comovente ali (Bár-
bara, 2019).
[...] a gente ficou numa sala lá, o homem falando, a gente escutando e
vendo (João, 2019).
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 105
O juiz convidou. Eu também pensava que era uma negociação, mas quando
cheguei foi uma aula de direito, né? (Walmir, 2019).
Com essa constelação aí, eu não conhecia, eu pensava que era uma audiên-
cia pra uma conciliação, então foi totalmente diferente do que eu pensava
(Valteci, 2019).
Eu nunca tinha visto falar, foi a primeira vez, eu pensei que era uma aula
de psicologia e direito, que ele tava dando ali. Eu fiquei ali assistindo
porque eu gostei, eu pensei que era uma aula (Wilson, 2019).
Eu já tinha ouvido falar, viu, mas na televisão mesmo [...] eu acho que no
dia eu fui assim mesmo para passar o tempo mesmo, eu tinha interesse
mesmo de saber o que era (Renata, 2019).
Pra mim foi novo. O próprio juiz da vara que manda a carta lá convidando
a gente pra assistir. E por ser uma coisa nova, que eu nunca tinha assistido,
aí me despertou a curiosidade, aí eu vim da primeira vez (Vanessa, 2019).
Eu só não gostei de uma coisa, da parte do teatro. A palestra toda foi boa,
agora eu só não gostei na parte do teatro... ficou parecendo um teatro
mesmo, sabe? Não ficou parecendo que era família e tal e tal.
[...]
Fui. Eu pensei também que era reconciliação, mas quando eu cheguei,
vi que era uma aula de psicologia e direito, eu gostei do que ele disse, só
não gostei das encenações (Wilson, 2019).
Eu não sabia o que era a constelação [...] Ele me recomendou, foi ele que
me informou mais ou menos o que era. Eu perguntei a ele o que era né?
E aí ele foi e me informou e disse que era uma palestra, disse que era
mediada pelo juiz, que tinha a participação de psicólogos, que posterior-
mente a gente poderia até procurar um deles para um auxílio maior né?
Um auxílio psicológico, ele me instruiu, ele me explicou mais ou menos
o que era. (Juliano, 2019)
40 Em diálogo com Michel Foucault, entende-se por subjetivação “a maneira pela qual o sujeito faz a experiência
de si mesmo em um jogo de verdade, no qual se relaciona consigo mesmo” (FOUCAULT, 1984/2006, p. 27).
Tal experiência de si pode se dar de forma assujeitada, e é isso que nomeamos por assujeitamento, ou de
forma mais autônoma, a depender da relação com as normas, regras e com as condições de possibilidade
para o exercício de liberdades.
108
E aí mudou já meu ponto de vista que eu vinha hoje pra essa reunião. Hoje
pra resolver o problema já mudou, a gente fez o possível já pra tentar, pra
não haver desavença na família, ficar tudo bem e tal, resolver da melhor
maneira possível pra todos ficar, né, contente com o resultado. [...] E o
objetivo que eu acho, assim, da constelação, é que procura, é que todos
saiam satisfeitos, que não haja desavença dentro da família, discórdia,
né? (Walmir, 2019).
Considerações finais
das partes que, por vezes, tá ali assistindo elas sendo representadas, então
pode confundir um pouco (Alana, 2019).
41 De acordo com a Lei 13.140/ 2015. Disponível em: L13140 (planalto.gov.br). Acesso em: 10 jul. 2023.
110
REFERÊNCIAS
AZEVEDO, A. G. de (org.). Manual de Mediação Judicial. 6. Edição (Bra-
sília/DF:CNJ), 2016.
o afeto como laço, não apenas interno (entre os familiares), mas também
externo (entre famílias). Como gesto humano, integrante em todas as famílias,
universal, cuja ideia de lar é a circular e a origem de sua definição.
Para Filho (2010, p. 28), a família se constitui por “agrupamentos sociais
diferentes, que mudam em função da época, da geografia, do desenvolvimento
econômico, técnico-social, de classe social e da evolução das ideias”.
Nos casos de famílias pós-divórcio, assume-se aqui, conforme aponta
Therense (2020), a compreensão de que a noção de dupla residência pós-rup-
tura produziu a ideia de convivência com dois núcleos familiares. Assim, no
contexto pandêmico, a sustentação da noção de dois lares ocorreu a partir de
manejos familiares, tais como, segundo apresentam Mendes et al. (2022),
decisão pela suspensão do pernoite, substituição da guarda compartilhada pela
Identidade visual
Roteiro
Edição e sonorização
Distribuição
Temporada de episódios
Fonte: Elaboração dos autores, a partir dos dados do site Spotify for Podcasters, 2023.
Sobre o lócus
Uma outra questão que nos pareceu fundamental responder foi a respeito
do lócus de aceitação do podcast. Para tanto, observou-se os dados relacio-
nados ao gênero e idade dos ouvintes.
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 127
Considerações finais
Os impactos da Pandemia de covid-19 no contexto de trabalho institucio-
nal e na forma de prestação jurisdicional, bem como as engrenagens movidas
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 129
REFERÊNCIAS
ANTUNES, Evelise Dias; FISCHER, Frida Marina. A justiça não pode
parar?! Os impactos da COVID-19 na trajetória da política de teletrabalho
do Judiciário Federal. Revista Brasileira de Saúde Ocupacional, v. 45,
2020. Disponível em: https://doi.org/10.1590/2317-6369000025920. Acesso
em: 6 maio 2023.
G1. Mais de 33 milhões de brasileiros não têm acesso à internet, diz pesquisa.
G1 Tecnologia, 21 de março de 2022. Disponível em: https://g1.globo.com/
tecnologia/noticia/2022/03/21/mais-de-33-milhoes-de-brasileiros-nao-tem-a-
cesso-a-internet-diz-pesquisa.ghtml. Acesso em: 1 maio 2023.
NAVAS, Ana Luiza Gomes Pinto et al. Divulgação científica como forma de
compartilhar conhecimento. CoDAS, São Paulo, v. 32, n. 2, e20190044, 2020.
Disponível em: https://doi.org/10.1590/2317-1782/20192019044. Acesso em:
Introdução
42 Com base no pensamento de Michel Foucault, Zanello (2016) usa o termo dispositivo materno para referir
o modo de subjetivação das mulheres, no qual são forjadas para o cuidado, ser para cuidar do outro.
140
43 Art. 156 do CPC: O juiz será assistido por perito quando a prova do fato depender de conhecimento técnico
ou científico. § 1º Os peritos serão nomeados entre os profissionais legalmente habilitados e os órgãos
técnicos ou científicos devidamente inscritos em cadastro mantido pelo tribunal ao qual o juiz está vinulado.
142
[...] a iniciativa dos tribunais brasileiros tem sido aparentemente cada vez
mais de lançar mão de pessoal contratado, voluntário e terceirizado em
substituição do servidor público. É notório que a fragilidade das relações
de trabalho e a ausência de relações duradouras no próprio sistema judi-
ciário têm efeitos deletérios sobre a garantia e a promoção de direitos.
44 Art. 465 do CPC (BRASIL, 2015): O juiz nomeará perito especializado no objeto da perícia e fixará de
imediato o prazo para a entrega do laudo.
45 Conforme o Código de Ética Profissional dos Psicólogos (CONSELHO FEDERAL DE PSICOLOGIA, 2005),
Art. 1º – São deveres fundamentais dos psicólogos: b) Assumir responsabilidades profissionais somente
por atividades para as quais esteja capacitado pessoal, teórica e tecnicamente
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 143
(BRASIL, 2010) têm se criado cada vez mais demandas no campo social
e jurídico, dirigidas especialmente às psicólogas, para a identificação − ou
“diagnóstico”, conforme a lei − do ilícito alienação parental.
Além disso, no que tange às alegações de abuso sexual infantil, estu-
diosas apontam a complexidade que envolve tais situações, particular-
mente, nos casos em que o abuso não deixa vestígios físicos. Assim, a sua
identificação seria feita por meio de eventuais sintomas, comportamentos
e falas da criança supostamente abusada. No entanto, os estudos sobre a
memória, no campo da Psicologia cognitiva, têm sido utilizados em argu-
mentos sobre a implantação de falsas memórias, como forma de desacre-
ditar o relato da criança, atribuindo-o à prática de alienação parental pela
mãe (AMENDOLA, 2014a; OLIVEIRA; RUSSO, 2017).
Considerações finais
REFERÊNCIAS
AMENDOLA, M. F. Crianças no labirinto das acusações: Falsas alegações
de abuso sexual. Curitiba: Juruá, 2009.
CADAN, D.; ALBANESE, L. Um Olhar Clínico para uma Justiça Cega: uma
Análise do Discurso de Psicólogos do Sistema de Justiça. Psicologia, ciência
e profissão, v. 38, n. 2, p 316–31, 2018, Apr.
154
família em que se discuta alienação parental. Brasília, DF, 2016. Disponível em:
https://atos.cnj.jus.br/files/compilado1405452023080264ca62b928d2b.pdf.
FELIZARDO, N. Pagando bem, que mal tem? Psicólogos lucram com laudos
contratados por pais e padrastos suspeitos de estuprar crianças (Em nome
dos pais – parte 2). Intercept Brasil, 04 de maio de 2023. Disponível em:
https://web.archive.org/web/20230509150443/https://www.intercept.com.
br/2023/05/04/abuso-sexual-infantil-psicologos-lucram-com-laudos-con…
Introdução
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47 O DSD surgiu para atender os casos envolvendo abuso sexual, os quais possuem dificuldade de produção
de provas. O DE expande o rol de violências abarcadas, contemplando violência psicológica, física, sexual
e institucional. Ademais, no início do DSD, não se fazia uso de protocolos na inquirição, o que atualmente
é uma exigência da Lei do DE (Lei nº 13.431, 2017). Entende-se que algumas questões do DSD foram se
desenvolvendo e ampliando com o tempo, dando origem ao DE.
160
48 A tese de Doutorado de Ramos (2015) deu origem ao documentário H(OUVE)? e apresenta esses diferentes
posicionamentos. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=mDMxTzwGDbg&t=85s
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 161
Infraestrutura
Equipe e capacitação
50 Esse capítulo é parte de um trabalho mais amplo desenvolvido na condição de pesquisa de mestrado da
primeira autora sob orientação da segunda autora, no PPGPSI da UFMG, que contou com financiamento
da FAPEMIG por meio da bolsa de mestrado atribuída à primeira autora.
51 Esta pesquisa foi conduzida pela Universidade de Fortaleza e publicada pelo CNJ. Nas entrevistas foram
contemplados os Tribunais dos Estados Pará, Ceará, Distrito Federal, Goiás, São Paulo e Rio Grande do Sul.
52 A pesquisa contou com 86 participantes, sendo eles psicólogos, assistentes sociais e profissionais do direito
(juízes e promotores). O objetivo era verificar as representações sociais que os profissionais possuem acerca
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 163
Metodologia do DE
Procedimentos prévios ao DE
Art. 4º. O SEADE poderá emitir parecer técnico não vinculante, contrain-
dicando o Depoimento Especial, levando em conta os seguintes critérios:
I- Idade mínima de 5 anos, tendo em vista que a técnica demanda sobretudo
maturação da linguagem e desenvolvimento cognitivo do infante; II- Exis-
tência de comprometimento cognitivo comprovado nos autos; III- Grau de
proximidade ou parentesco entre vítima e acusado; IV- Decurso do tempo
entre a data do(s) fato(s) e a data da audiência; V- Verificação no banco de
dados de eventual oitiva anterior no NUDECA, visto que não deverá ser
realizado novo Depoimento Especial, de acordo com o art. 11, parágrafo
2º da Lei nº13.431/2017; e VI – Indícios ou notícias de alienação parental.
Parágrafo único: Nos casos em que a criança tiver menos de cinco anos
de idade, será avaliado o decurso do tempo entre a data dos fatos e a data
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 165
53 O CNJ é um órgão do Poder Judiciário. Foi criado em 2004 e instalado em 2005. O órgão atua no aper-
feiçoamento do judiciário brasileiro, em diversos âmbitos, a saber: política judiciária, gestão, prestação de
serviços, moralidade e eficiência dos serviços (CNJ, [entre 2005 e 2023]).
54 As discussões sobre essas atividades se aproximam das discussões propostas nas avaliações realizadas
nos procedimentos prévios ao DE. Todavia, por serem atividades que ocorrem em momentos diferentes,
também são pensadas em momentos diferentes neste capítulo.
168
‘Você me falou que ia para a casa de sua tia [ou outro local da suposta
violência]… Me conte sobre as pessoas com quem você encontrou lá’
(CHILDHOOD BRASIL, CNJ, UNICEF, NCAC, 2020, p. 31).
e o TJSE, outras com mais detalhes, como o TJSC e o TJRJ – apenas o TJSC
descreve mecanismos para isso, em relação ao entrevistador. A instituição
catarinense ressalta a “autonomia do entrevistador para avaliar as perguntas
complementares apresentadas e a pertinência destas à fase de desenvolvi-
mento da vítima ou testemunha, e para se manifestar caso entenda que as
perguntas sejam inadequadas” (TJSC, 2020, n.p), bem como sinalizam como
dever do entrevistador em comunicar “a inadequação de perguntas comple-
mentares” (TJSC, 2020, n.p).
Tendo em vista o modelo no qual ocorre a audiência do DE, a literatura
demonstra que a autonomia do entrevistador durante o DE, muitas vezes,
está associada ao magistrado que está conduzindo a audiência, sendo possí-
vel encontrar diferentes posicionamentos acerca do trabalho interdisciplinar
(PELISOLI; DELL’AGLIO, 2016). No Tribunal do Rio Grande do Sul per-
cebem-se três posicionamentos em relação ao tema: o entrevistador não tem
autonomia para modificar as perguntas; o entrevistador pode modificar as
perguntas, mas o conteúdo deve ser mantido (esta foi a mais encontrada) e por
fim, o entrevistador possui total autonomia, podendo negar algumas perguntas
(PELISOLI; DELL’AGLIO, 2016). Diante disso, considera-se imprescindível
instrumentalizar os entrevistadores para que possam exercer o trabalho aten-
tando-se mais para as necessidades das crianças e dos adolescentes e menos
para os magistrados, considerando que o foco do psicólogo no judiciário deve
ser o sujeito em interface com a justiça e não os profissionais do direito. Dotar
os entrevistadores de autonomia para não realizarem determinados questio-
namentos vai ao encontro da interdisciplinaridade, entendida como relação
entre saberes diferentes sem submissão de áreas. A hierarquia institucional
dos tribunais deve-se estar direcionada aos aspectos administrativos e não ao
componente técnico do saber-fazer de cada campo do conhecimento.
172
Desdobramentos
Considerações finais
REFERÊNCIAS
AMÊNDOLA, M. F. Crianças no labirinto das acusações: falsas alegações
de abuso sexual. Curitiba: Juruá, 2009.
de https://www.scielo.br/j/pc/a/GvXkxJvXbgT8Dc3xrj99jPf/abstract/?lang=pt
cio-profissional-e-revoga-a-resolucao-cfp-no-15-1996-a-resolucao-cfp-no-
-07-2003-e-a-resolucao-cfp-no-04-2019?q=006/2019
entrevistadores,a%20intera%C3%A7%C3%A3o%20entre%20as%20salas.
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ÍNDICE REMISSIVO
A
Adolescentes 10, 21, 22, 24, 25, 28, 29, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 51, 52, 54,
55, 56, 57, 60, 61, 63, 67, 69, 70, 71, 75, 76, 101, 103, 115, 130, 131, 133,
137, 138, 140, 143, 145, 146, 154, 155, 159, 161, 165, 166, 171, 173, 175,
176, 177, 178
Atendimento 22, 33, 35, 45, 47, 48, 49, 50, 57, 58, 59, 60, 83, 85, 105, 120,
136, 137, 154, 157, 166, 167, 172, 185
Audiência 13, 97, 98, 101, 102, 105, 124, 125, 126, 159, 164, 167, 170,
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171, 172
C
Covid 9, 50, 58, 68, 95, 113, 118, 128, 130, 132, 133, 134, 135
E
Estudo 12, 33, 35, 42, 47, 48, 50, 58, 60, 62, 67, 68, 75, 76, 79, 98, 104, 122,
126, 127, 147, 149, 155, 164, 166, 173, 190
F
Famílias 11, 25, 39, 41, 97, 98, 100, 102, 104, 106, 113, 114, 115, 119, 120,
121, 122, 123, 124, 125, 127, 129, 131, 133, 148, 153, 157, 188, 190
Ferramenta 32, 97, 98, 99, 100, 101, 106, 109, 111, 115, 116, 117, 118,
133, 166
I
Importunação 10, 11, 65, 66, 67, 68, 69, 70, 71, 72, 73, 74, 75, 77
J
Justiça 3, 9, 10, 11, 12, 15, 19, 20, 21, 23, 25, 27, 29, 32, 35, 36, 40, 45, 46,
49, 51, 54, 55, 56, 59, 61, 83, 86, 92, 94, 96, 97, 98, 100, 101, 103, 104, 107,
108, 109, 110, 111, 112, 113, 114, 115, 119, 121, 130, 133, 135, 136, 137,
138, 141, 142, 144, 145, 146, 147, 148, 149, 150, 151, 153, 154, 155, 156,
157, 158, 160, 161, 162, 163, 165, 171, 175, 176, 177, 178, 179, 187, 188, 189
L
Liberdade 10, 11, 24, 46, 47, 48, 49, 50, 52, 55, 59, 77, 81, 83, 84, 85, 86,
87, 89, 92, 93, 94, 95, 116, 118, 132, 158
182
M
Mães 49, 73, 115, 131, 132, 134, 138, 139, 140, 143, 144, 145, 155, 156, 157
Mulher 11, 15, 32, 33, 35, 36, 39, 61, 65, 71, 72, 73, 74, 75, 78, 79, 123,
125, 126
O
Organização 9, 54, 60, 68, 77, 78, 80, 90, 100, 102, 105, 117, 119, 128, 146
P
Parental 113, 114, 115, 123, 125, 127, 136, 138, 139, 140, 141, 143, 144,
145, 148, 150, 152, 153, 154, 155, 156, 157, 164, 165, 168
R
Racismo 11, 15, 23, 25, 28, 32, 34, 36, 37, 39, 42, 43, 49, 50, 54, 65
S
Saberes 10, 16, 21, 22, 25, 26, 28, 51, 52, 53, 82, 96, 98, 107, 110, 150,
157, 171
Saúde 10, 11, 19, 21, 24, 42, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 51, 52, 53, 54, 55, 56,
57, 58, 59, 60, 61, 62, 63, 68, 79, 81, 83, 84, 85, 86, 87, 88, 89, 90, 91, 92,
PSICOLOGIA SOCIAL JURÍDICA: resistências no sistema de (in)justiça 183
93, 94, 95, 96, 99, 103, 110, 113, 115, 118, 129, 130, 131, 133, 147, 157, 158,
185, 186, 187, 189, 190
Sistema 3, 10, 11, 19, 20, 21, 22, 25, 28, 32, 35, 36, 45, 46, 48, 49, 50, 51,
52, 53, 54, 56, 60, 70, 71, 81, 82, 83, 84, 85, 87, 89, 90, 91, 93, 94, 95, 96,
97, 98, 99, 100, 101, 103, 104, 107, 109, 110, 113, 114, 115, 117, 121, 130,
137, 138, 142, 146, 147, 148, 153, 157, 163, 173, 175, 176, 177, 186
T
Testemunha 153, 161, 169, 171, 172, 176, 177, 178
Transtorno 11, 48, 60, 84, 85, 86, 89, 92, 93, 94, 95, 189
Tratamento 11, 23, 25, 26, 46, 47, 48, 51, 61, 73, 83, 97, 98, 101, 104, 109,
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V
Violência 10, 11, 14, 21, 22, 23, 24, 25, 27, 35, 36, 37, 40, 42, 47, 50, 52,
58, 62, 65, 66, 67, 68, 69, 70, 71, 72, 73, 74, 75, 76, 77, 78, 79, 80, 101, 106,
112, 123, 125, 126, 129, 131, 133, 137, 139, 145, 148, 153, 154, 159, 161,
166, 170, 172, 175, 176, 177, 178
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SOBRE OS AUTORES
Gabriela Gramkow
Psicóloga; doutora em Psicologia Social com pós-doutorado na Faculdade
de Educação da Universidade de São Paulo (USP); Docente da Faculdade de
Ciências Humanas e da Saúde da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo (PUCSP). Integrante do Grupo de Pesquisa Direitos Humanos, Demo-
cracia e Memória do Instituto de Estudos Avançados da USP e do grupo de
pesquisa “Políticas da subjetividade” da Pós Graduação de Psicologia Clínica
da PUC SP.
E-mail: ggramkow@pucsp.br
ORCID: https://orcid.org/0000-0001-6527-6583
ORCID:https://orcid.org/0000-0003-1718-6721
Munique Therense
Doutora em Saúde Coletiva pelo Instituto de Medicina Social da Universidade
do Estado do Rio de Janeiro (IMS/UERJ). Professora da Escola Superior de
Ciências da Saúde da Universidade do Estado do Amazonas (UEA) e psicó-
loga do Tribunal de Justiça do Amazonas (TJAM). Docente permanente do
Programa de Pós-Graduação em Saúde Coletiva e do Programa de Segurança
Pública, cidadania e direitos humanos, ambos da UEA.
E-mail: mtpontes@uea.edu.br
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-5433-9267
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Sander Firmo
Graduando em Psicologia pela Universidade Federal do Amazonas, coorde-
nador/editor do podcast e grupo de estudo de psicologia analítica Sombras &
Símbolos; foi estagiário do CEJUSC-Famílias do TJAM e membro do podcast
Falando de Famílias.
E-mail: sfs.connect@gmail.com
ORCID: https://orcid.org/0000-0002-8006-6637
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
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SOBRE O LIVRO
Tiragem: Não Comercializada
Formato: 16 x 23 cm
Mancha: 12,3 x 19,3 cm
Tipologia: Times New Roman 10,5 | 11,5 | 13 | 16 | 18
Arial 8 | 8,5
Papel: Pólen 80 g (miolo)
Royal | Supremo 250 g (capa)