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CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO,
VULNERABILIDADES E
ESTRATÉGIAS DE ENFRENTAMENTO:
pesquisa em Psicologia
Editora CRV
Curitiba – Brasil
2023
Copyright © da Editora CRV Ltda.
Editor-chefe: Railson Moura
Diagramação e Capa: Designers da Editora CRV
Imagem de Capa: @starline | Freepik
Revisão: Os Autores
Bibliografia
ISBN Digital 978-65-251-5856-3
ISBN Físico 978-65-251-5858-7
DOI 10.24824/978652515858.7
2023
Foi feito o depósito legal conf. Lei nº 10.994 de 14/12/2004
Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora CRV
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Três de Febrero – Argentina) University, MMU, Grã-Bretanha)
Eduardo Fernandes Barbosa (UFMG) Jacqueline de Oliveira Moreira (PUC-SP)
Elione Maria Nogueira Diogenes (UFAL) João Ricardo Cozac (PUC-SP)
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Este livro passou por avaliação e aprovação às cegas de dois ou mais pareceristas ad hoc.
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SUMÁRIO
REFERÊNCIAS
BICALHO, P. P. G. et al.. Cinquenta anos de produção do conhecimento: prá-
ticas políticas da pesquisa em Psicologia. In: Psicologia Ciência e Profissão,
v. 32, n. esp., p. 264-275, 2012. Disponível em: https://www.scielo.br/j/pcp/a/
c9gqjz6TN8w87V8KqTXFgPL/?format=pdf&lang=pt. Acesso em: out. 2023.
Fontes, 2010.
1. Introdução
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5. Considerações finais
ou pelos olhos, ou pelos poros, ou por onde for. Porque todos, todos temos
algo a dizer aos outros, alguma coisa, alguma palavra que merece ser
celebrada ou perdoada pelos demais (Galeano, 2005, p. 23)
6 REFERÊNCIAS
AYRES, J. R. Vulnerabilidade, Cuidado e integralidade: reconstruções con-
ceituais e desafios atuais para as políticas e práticas de cuidado em HIV/Aids.
In: Saúde Debate, Rio de Janeiro, v. 46, p. 196-206, 2020.
BOWMAN, B.; STEVENS, G.; EAGLE, G.; LANGA, M.; KRAMER, S.;
NDUNA, M. The second wave of violence scholarship: South African syner-
gies with a global research agenda. Soc Sci Med., v. 146, p. 243-248, 2015.
CAZEIRO, F.; LEITE, J.F.; COSTA, A.J.. Por uma decolonização do HIV
e interseccionalização das respostas à AIDS. In: Physis: Revista de Saúde
Coletiva, v. 33, p.1-21, 2023. Disponível em: https://www.scielo.br/j/physis/a/
QBDdjZzyPLw3kpPYqqsY93k/?format=pdf&lang=pt. Acesso em: out. 2023.
1. Introdução
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3. Processos de subjetivação
4. Direitos Humanos
Quando conversamos sobre Direitos Humanos, evocamos um imaginá-
rio construído internacionalmente, uma borda construída, uma fronteira que
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Outro grande desafio nacional se refere aos direitos dos povos originários,
vítimas de ataques sistemáticos e histórico de aculturação. Seu direito à terra,
estabelecidos na demarcação de terras para povos indígenas e quilombolas,
é constantemente questionado e disputado por décadas a fio (Silva; Euzébios
Filho, 2023).
Percebendo todos estes desafios, fica evidente que falar sobre direitos
humanos é algo complexo, pois diz muito dos direitos que faltam e de pes-
soas que são constantemente pressionadas para fora da humanidade. Como
explicitam Silva e Euzébios Filho (2023):
5. Considerações Finais
você que nos lê, pois implica em recordar que mesmo com esse mapa a vida
pede atualização permanente, uma observação de si, das produções do campo
da ciência, do fazer-se pesquisador e pesquisadora e da produção da psicologia
em sua diversidade epistemológica, metodológica e teórica que pede a cada
dia mais um fazer comprometido com a transformação da nossa realidade
brasileira. Assim como Alice adentra ao País das Maravilhas e - ao perder-se
vai conhecendo este território - ela também implica-se com as injustiças e
desigualdades do seu mundo e do mundo das Maravilhas, construindo cami-
nhos para transformação de ambos.
Assim, entendemos que a Psicologia enquanto ciência e profissão
demanda um compromisso social diante do Brasil desigual. Nossa dimensão
6. REFERÊNCIAS
BOCK, A. M. B. A psicologia a caminho de um novo século: identidade pro-
fissional e compromisso social. Estudos em Psicologia, 1999.
CAETANO, Patrícia de Lima. Por uma estética das sensações: o corpo intenso
dos Bartenieff Fundamentals e do Body-Mind Centrering. In: Revista Bra-
sileira de Estudos Presença, v. 5, n. 1, p. 206-232, 2015.
Brasiliense, 2017.
1. Introdução
2. Fundamentação Teórica
2.2 Gênero
3. Metodologia
sobre quais sentidos são produzidos nos discursos dos diferentes sujeitos
convergem e sobre quais sentidos desses discursos divergem; 3) posicio-
nar socialmente os sujeitos, ouvindo-os a partir dos diferentes lugares
sociais ocupados e dialogicamente posicionados diante do pesquisador,
identificando e relatando os momentos de construção dialógica dos discursos
entre sujeito participante e pesquisador; 4) relacionar o texto produzido pelos
sujeitos (discursos), com o contexto cultural no qual este trabalho foi reali-
zado, seu momento histórico e lugar social, apresentando a as informações
coletadas na observação participante; e 5) constituir unidades de sentidos
as quais serão organizadas a posteriori e analisadas no texto da pesquisa.
gosto e o que não gosto, e isso vai ferindo alguma área da sua vida que não
se conhece porque aceita qualquer coisa né”. Esta renúncia surge a partir da
identificação de quem é autorizado a falar, à quem o discurso é vedado, e
de que forma ocorrem quando permitido a circulação, como observado por
Joana D’arc: “já é naturalizado que os homens se conheçam, se masturbem,
desde muito jovenzinhos e tudo mais... só que mesmo assim quando se fala
sobre, é sempre num tom de piada né, e agora sobre meninas, geralmente
nem se fala, né! A gente não, não entende que a gente pode se conhecer
e se tocar, e conhecer o próprio corpo, e descobrir os nossos gostos”.
As falas acima reforçam a perspectiva do campo do prazer como
direcionada à masculinidade, enquanto a mulher está para o desejo ape-
não tenho e quando falo que me sinto desconfortável, as pessoas que têm
sobrepeso já começam a revirar os olhos, mas cara, dói pra mim, não tô me
fazendo de vítima, é um sofrer que existe sabe, mas aí eu fico na minha pra
não gerar discussão, parece uma competição de dores.” Estabelecendo
assim uma nova rivalidade, depois de conflitos com a sociedade em um
todo e outras brigas internas em seu psicológico, existe uma necessidade
de validar seu sofrimento de modo que outros pareçam menores, desesta-
bilizando novamente o emocional da mulher, que hostilizou seu próprio
corpo anteriormente e reproduz tais danos com o de outras, repetindo o
ciclo de categorização.
Esses movimentos de aceitação estão ganhando visualizações entre
5. Considerações Finais
6. REFERÊNCIAS
ALVES, Jessica. Deusa Afrodite. 2019. Disponível em: https://www.edu-
camaisbrasil.com.br/enem/religiao/deusa-afrodite. Acesso em: 11 jun. 2021.
www.hypeness.com.br/2019/06/medusa-foi-uma-vitima-de-violencia-se-
xual-mas-a- historia-a-transformou-em-monstro/. Acesso em: jun. 2021.
1. Introdução
2. Método
3.2 Liberdade
“M: E nesse sentido de Liberdade, assim... como é que tu vê, é... agora
que tu comentou por exemplo, isso de ser teu próprio patrão? Então,
nesse sentido com os dados, essa forma de talvez tu não tem um patrão
físico, aquela pessoa, mas tem essa relação com a com a tecnologia, com
CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE
ENFRENTAMENTO: pesquisa em Psicologia 85
Aliado a estas questões financeiras, surge uma fala interessante por parte
deste mesmo entrevistado. A necessidade de se obter renda faz com que o
trabalho se estenda não só para momentos em que se exercem atividades,
mas para a vida no geral:
lamento” pra ti, né. Espero que tu não quebre as pernas e os braços, pra ti
poder continuar trabalhando.”
Existem algumas contradições sobre a questão de um seguro contra aci-
dentes. Alguns dos entrevistados relatam a sua existência, mas questionam
se ele de fato é efetivado e é garantido em acidentes. Assim, há um impasse
nesta questão porque o sentimento de desassistência se espalha ao ponto de
ser justificável esta dúvida perante um seguro. Sobre isto, N5 acrescenta: “Se
o seguro deles for verdade, já é uma grande ajuda, né?”
Estas falas destacam a existência de um clima de desamparo e trans-
ferência de riscos para o motoboy que presta serviços de entrega. A fala do
entrevistado N2, trazendo o “sentimento de ser descartável”, explicita como
a uberização utiliza-se da facilidade no cadastramento e do exército industrial
de reserva para contínua exploração e produção de capital: se você não puder
trabalhar, haverá outro entregador apto a vender sua mão de obra nestas con-
dições ofertadas. Assim, isto vai de acordo com o que Marx (2020) destaca
em suas investigações, relatando que o capital não faz qualquer consideração
pela qualidade de vida ou pela saúde do trabalhador, a não ser em situações
em que seja forçado pela sociedade a contribuir com o melhoramento das
condições de trabalho.
N2: “[...] tem que haver uma reforma com relação a regularização dos
aplicativos, ter uma regulamentação, ter um pouco mais de critério. Hoje
o motoboy em si ele fica um pouco desassistido dentro do aplicativo.
Porque por mais que seja uma ferramenta que te forneça ali, que faça uma
ponte entre cliente e motoboy, a gente não tem ali nenhum vínculo, não
tem nada que nos traga uma segurança. Essa insegurança acaba afetando
também os motoboys, a minha categoria... porque você tem medo [por
estar desassistido].”
E há também a seguinte contraposição por parte do entrevistado N5:
M: “E cara, na tua percepção... se tivesse uma possibilidade, talvez con-
tinuar um trabalho de aplicativo, mas através de uma carteira assinada,
por exemplo, tu acha que seria bacana?”
CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE
ENFRENTAMENTO: pesquisa em Psicologia 91
N5: “Que nem eu te falei, a gente tem uma liberdade na questão do salário,
né. Eu acho que se a gente trabalhar de carteira assinada, a gente teria
um salário específico para trabalhar. Dessa forma que a gente trabalha, a
gente tem uma certa liberdade por dia de fazer quantas corridas a gente
quer e dependendo do dia fazer bastante entregas e, quanto mais entrega,
mais dinheiro no caso. Se a gente trabalhasse de carteira assinada, eu acho
que a gente ia receber aquele valor exato por mês e eu acho que morreria
ali, entendeu?”
4. Considerações finais
5. REFERÊNCIAS
ABÍLIO, L. C. Uberização: gerenciamento e controle do trabalhador jus-
t-in-time. In: ANTUNES, Ricardo (org.). Uberização, trabalho digital e
indústria 4.0. São Paulo: Boitempo, 2020, 333 p.
MACHADO, L. Dormir na rua e pedalar 12 horas por dia: a rotina dos entrega-
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que lhe cabe no pulmão, pois mesmo que seja difícil, nós temos
que aprender a caminhar, pois os gritos do mundo são seus. E você
só encontrará abrigo, se obtiver uma alma. E mesmo que você se
perca, acenda a chama que chama você, deixa as lágrima irem a pé,
elas costumam brotar num novo dia, elas servem pra lhe dizer que
alguma coisa precisa mudar. Só engolimos a neblina, quando nos
distraímos, ou quando somos traídos, atraídos pelo mar” (João1).
ver, é uma expressão estética e política de seus corpos. Uma forma de socia-
bilidade, de relação com o outro (alteridade) e com o entorno (Nogueira,
2009; Nogueira, 2012; Zanella, 2005). Nesse caminho, passamos a compreen-
der que a percepção sensorial da arte é apenas um impulso para algo muito
mais complexo, para uma emoção estética e, com isso, um fazer político
(Nogueira, 2009).
O espaço que estes artistas ocupam - a cidade - em meio as suas contradi-
ções (produto do desenvolvimento desigual), possui formas de desqualificação
social, entre elas estão o trabalho desqualificado e a segregação do espaço
(Nogueira, 2009). Quem sofre o estigma de ser “desqualificado”, segregado,
nesse processo visível de poder e invisível de dominação, vê sua condição
Assim, esses lugares que compõe o cotidiano, são recriados pelos sujei-
tos a medida em que estes se apropriam da realidade. Ao recriar o sujeito
cria sínteses que contemplam aquilo que é passado no que é presente, que
por sua vez, resulta em um projeto futuro que é constantemente atualizado.
Todas essas objetivações que modificam o mundo, são produtos de apropria-
ções passadas e processos de transformação, tanto de si quanto do contexto,
movimento esse dialético que abre possibilidades para o devir (Spink, 2008;
Furtado; Zanella, 2007)
Esta arte que ganha espaço nos micro-lugares do cotidiano, recriando
estes, modificando sujeitos, é vista por Ranciére (2005) como uma criação
do humano, como um recorte de tempos e espaços, do que é visível aos olhos
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são todas casas indefesas, como se o todo aberto, e sua parede pintada
de cor verde limão, enquanto caminho nas ruas, percebendo placas de
vende-se, aluga-se, compra-se, poucas vezes vejo empresta-se e assim e
de lá nós vemos o sol no fim do quarteirão, eu não culpo você por nem
sempre conseguir me ajudar, afinal só de estar ao meu lado, e não estar
me indicando o caminho errado, já é uma grande ajuda. Depois que
escolhemos um caminho, temos que colher tudo que ele proporcionar. A
minha casa, é um deserto em mim mesmo, com areia movediça a cada
respiração. Mas não se preocupe a casa não rompe a casa, se mantém
de pé, aqui dentro somente a necessidade de mover os móveis, esquina,
a vizinhança, os corredores, porque são todas, são formas, são elas, as
casas como elas são.” (João)
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vista biológico, existem apenas duas saídas para aquilo que não conseguimos
realizar na vida, seriam essas a sublimação ou a neurose. Assim, a vazão desta
energia psíquica se realiza na arte evitando o aparecimento de patologias
(neuroses e psicoses) (VIGOTSKY, 2004; VIGOTSKY, 2009).
Nessa perspectiva, então, do ponto de vista psicológico, a arte é um
mecanismo biológico necessário para a superação de excitações não realiza-
das na vida, assim a criação não é privilégio de alguns, mas uma necessidade
profunda do psiquismo em termos de sublimação da energia psíquica. Em
cada um de nós, existiria, assim, uma certa possibilidade criadora. Numa frase
famosa de Nietzsche, a arte existe para que não morramos com a verdade.
O que separa ainda a arte da doença é seu efeito catártico. Entender o
ou para se fazer ciência. Fonseca (2002) percebe ainda a ciência como uma
forma particular de compreender o mundo e como uma maneira que facilita
a interação com ele. A intenção nesta pesquisa também parte do objetivo de
entender a maneira como os artistas percebem o universo que os cerca, como
eles produzem conhecimento, dessa maneira, concordamos com Fonseca
(2002), quando este afirma que o homem desde que nasce, interage com a
natureza e os objetos à sua volta, logo, ele interpreta o universo que o cerca
a partir das referências que tem, tanto sociais, quanto culturais, sendo que os
sujeitos da pesquisa possuem conhecimentos tanto quanto os pesquisadores,
sendo a pesquisa científica essa possibilidade de diálogo entre os diferentes
conhecimentos, visando a produção de um conhecimento científico.
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Dessa maneira, foram sujeitos dessa pesquisa 6 artistas de rua, que esta-
vam exercendo seu trabalho na cidade de Itajaí. São estes: Anna, Miguel,
Pedro, João, Carlos e Léo, com idade entre 22 e 27 anos. Embora estivessem
atuando no município de Itajaí durante o período que correspondeu a coleta
das informações desta pesquisa, apenas três são moradores do município de
Itajaí. Os demais costumam mudar de residência com frequência, possuindo
um projeto idealizado pelos mesmos em que recebem ou são recebidos na
residência de outros artistas. Nesse sentido, formam redes de solidariedade,
e assim, viajam pelo mundo expressando a arte tal como a conhecem. Dois
dos artistas entrevistados vieram do estado vizinho (RS), sendo que um deles
pretendia morar em Itajaí por algum tempo, já o outro, pretendia viajar em
o contato com os possíveis artistas que ali fossem cadastrados e que atuassem
na cidade de Itajaí. Como não foi possível, visto que poucos artistas de rua
mantêm registros nos sindicatos, fomos encontrá-los no seu local de traba-
lho: a cidade.
Na semana em que iniciamos a coleta das informações, estava aconte-
cendo o Primeiro Festival Clandestino de Artistas de Rua na cidade de Itajaí,
e através desse movimento, encontramos a maioria dos artistas entrevista-
dos. Para isso, participamos do movimento junto a eles e os convidamos a
fazer parte da nossa pesquisa. Com o consentimento dos sujeitos (através
da assinatura do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido) foi realizada
a entrevista, com horário e local previamente agendado, respeitando-se as
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e explicada fora desse vínculo com a situação concreta”, pois ela envolve
para além das palavras o campo extralinguístico do não dito, dos silêncios
que falam (Bakhtin, 1976).
Após a produção do texto de pesquisa, os sujeitos participantes foram
convidados a participarem como ouvintes da banca pública de defesa do
trabalho, e entregaremos uma cópia do relatório final de pesquisa para os
sujeitos participantes.
Sim, amor! Sim poesia! Como pesquisar com artistas e não se afetar-
-mobilizar? Como não transformar nossos olhares diante desses sujeitos, que,
numa entrevista para uma pesquisa nos entregam encantamentos do cotidiano
em pequenas doses, reencantando nossos olhares e nos provocando bons
encontros na alteridade.
Passeio ao vento do amor, nossa pesquisa assim se fez, num movimento
de construção-desconstrução-construção, transformando principalmente a nós,
acadêmicas-pesquisadoras nos afetos que nos geraram. Diante das entrevis-
tas realizadas e dos textos produzidos a partir da transcrição das entrevistas,
passamos a um trabalho onde
tem mais a ver com saber sobre, pois se trata de saber com. Habitar um
estado de coisas, seus trajetos possíveis, seus incompossíveis, subtrair o
que insiste e produzir com (Costa; Angeli; Fonseca, 2012, p. 86).
E isso porque nos encontros com os artistas de rua, nos demos conta de
nossos não saberes e de nossos saberes cristalizados, normatizados e norma-
lizados pelo mundo acadêmico e nos permitimos abrir a este encontro e nos
transformar, transformando também nossa pesquisa.
Assim, partindo das entrevistas realizadas, as informações coletadas
foram nos guiando por territórios de sentidos, sendo que nossa primeira parada
se constituiu na compreensão da arte entendida como linguagem. Para isto, é
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Quando a Anna nos conta que “ah, então eu desenho quando sou obri-
gada a ficar quieta” ela nos indica essa possibilidade de compreender a arte
como uma forma de linguagem, de expressão daquilo que o sujeito vive e
110
pensa, assim como de construir uma ponte ao outro (Bakhtin, 2004), como
uma maneira de objetivação daquilo que antes não encontrava caminho para
ser objetivado.
Também percebemos essa compreensão quando Léo e João nos
contam que
“Existe uma frase do Ferreira Gullar que é ‘a arte existe, porque a vida não
basta’. A arte é isso, cara, o ponto além da vida, é quando tu quer explodir e
quer mandar um foda-se geral, mas não pode, então você expressa na arte,
a arte sempre dá conta de trazer a vida tudo o que não é possível ou aceito
de outras maneiras. A sociedade não permite que tu seja quem realmente é,
e acho que quando o ser humano encontra a arte, ele encontra seu verda-
considera que “eu tive uma epifania”. Dessa mesma forma, a compreensão
da arte como esse “escape absoluto” aparece nas falas de Léo e João, quando
dizem “tu quer explodir e quer mandar um foda-se geral, mas não pode, então
você expressa na arte” (Léo) e ‘É aquilo que me faz adentrar no invisível
das coisas” (João).
Assim, Vygotski (2001) nos faz lembrar que a personalidade humana é
composta em meio a processos conscientes e inconscientes de objetivações
e subjetivações que são marcados por aquilo que cada sujeito significa como
relevante, que sabe, escolhe, que emociona ou mobiliza; ou ainda que passa
por sua vida sem instigar afetos, sem deixar vestígios, encontrando na arte a
forma de comunicar-se, de fazer pontes com o mundo.
Lembra-nos Guatarri (1992, p. 135) que “é evidente que a arte não detém
o monopólio da criação, mas ela leva ao ponto extremo uma capacidade de
invenção de coordenadas mutantes, de engendramento de qualidades de ser
inéditas, jamais vistas, jamais pensadas” dando estratégias outras de dizer/
visibilizar aquilo que antes não encontrava caminho e que mobiliza o sujeito
a essa inventicidade.
Como linguagem, que tem por premissa a comunicação (Bakhtin, 2006),
a arte tem essa função de construir pontes ao outro, a alteridade, de possibi-
litar encontros. Compreensão essa percebida também na fala de Carlos que
nos conta que
Assim, percebemos que para Léo a sua produção se faz no diálogo entre
os afetos gerados em si (“meu principal objetivo [...] é ser feliz) pela possibi-
lidade de encontro com o outro (“meu objetivo como ator eu alcancei, quando
sinto que consigo transmitir alguma coisa pra alguém [...]”). Poderíamos
assim, traduzir que Léo nos diz “faço o que faço para ser feliz e consigo ser
feliz quando cativo o outro”.
Se nos atentarmos a polissemia do cativar, o dicionário nos relata que
cativar é “ficar ou permanecer cativo (perder a liberdade); estar preso (fisica-
mente ou moralmente); sujeitar-se”, ou seja, deixar-se apreender pelo outro,
ou como lindamente descreve Exupery (2009) em sua obra clássica, cativar
CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE
ENFRENTAMENTO: pesquisa em Psicologia 113
é criar laços é ter necessidade do outro e, assim, nos tornarmos “[...] eterna-
mente responsável pelo que tu cativas” (Exupery, 2009). Cativar como esse
lugar da alteridade.
Sabendo que os signos foram sendo construídos desde os primórdios da
civilização, em meio as relações que nela se engendram, portanto relaciona
o eu e o outro, o sujeito e a sociedade no processo histórico de construção
desta, de maneira que cada pessoa seria assim: “um agregado de relações
sociais encarnadas num sujeito”, (Vygotski, 2000, p. 33 apud Zanella, 2005,
p. 103), a linguagem artística passa também a ser entendida como signo,
portanto como mediação cultural.
A arte como linguagem se expressa através de signos, que ao serem
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“O que é arte pra mim? Nossa, é uma pergunta... [...] como observador
no universo [...] Um dos fundamentais pontos de ser alguma coisa no
universo é você observar alguma coisa e tentar transmitir o que você
observou de algum jeito, sabe? As vezes de uma história, as vezes de
uma música que eu acho que é muito... a música que eu acho que é mais
próximo... eu acho que de um sentimento, puro assim, sabe? Ou as vezes,
uma pintura assim... então isso, você observou e você transmitiu o que
você observou da sua perspectiva artística-romântica no universo. Então
acho que pra mim é uma representação própria do universo. Então por
isso que eu gosto de improvisar, de não só reproduzir, sabe? Transmitir o
sentimento do momento de algum jeito assim. Isso é arte. Também repro-
duzir também é arte, porque você tá pegando o sentimento de uma outra
pessoa que reproduziu... e ai você tá contando histórias, assim. Então,
de algum jeito acho que todo o artista é um historiador de sentimentos”
(Miguel) [Grifo nosso]
“Pra mim um artista de rua, se ele tiver preparado para dialogar com
qualquer compreensão do que ele tá fazendo, se ele souber pasteurizar
114
o que ele tá fazendo, ele tem como pautar qualquer coisa sabe, por que
ele é o interventor na realidade, ele é uma pessoa que na verdade tira as
pessoas de da bolha em que elas vivem” (João).
“Isso que é o mágico, tá ligado? Você... as vezes você nem tirou o tanto
que.. tipo, sei lá, você tá passando um chapéu, tá vendendo um cd [...]
você não tem certeza quanto você vai ganhar naquele dia. Mas... po,
velho, se para uma pessoa ali e ela realmente parou a vida dela pra ti
ouvir, velho, entendeu?” (Pedro)
“Quando eu viajava com o Pedro. [...] nós... As vezes conhecia as pes-
soas, teve uma vez que a gente chegou numa cidade em onze pessoas. Era
em quatro na banda na época, a gente conhecia as pessoas, ia fazendo
amizade... as vezes, outros viajantes ou outros artesãos, outros músicos,
eles iam com a gente... as vezes dançarinas, dançando bambolê, faziam
esse percurso com a gente. Se tornavam amigos e ia se conhecendo na
estrada assim. E muitas vezes a gente se encontra em diferentes lugares.
As pessoas que eu encontrei lá no RS, encontraram com os meus amigos
que estão viajando com música no nordeste, em SP, em Minas. Isso é muito
maravilhoso também, então sim, acontece seguido de a gente terminar de
tocar, sair pra conhecer pessoas e acaba, as vezes até conseguindo um
lugar pra dormir. Teve vezes que a gente chegou na cidade assim, sem
um real. A gente toca, consegue um dinheiro, consegue ter o que comer,
faz contato. Tem pessoas que dizem: não, você pode dormir aqui em casa
hoje a noite, até vocês se estabelecerem então, ou ficam uma semana, fica
um mês inteiro, “vamô” lá, tem espaço, tem cama, tem tudo” (Miguel)
“Espectadores? Mais próxima possível, se possível, eu nem fico sabendo
quem são espectadores. Não existe essa relação. Eu gosto de romper com
a quarta parede, a todo custo. Não os chamo de espectadores, os chamo
de construtores da realidade” (João) [Grifo nosso].
Assim, naquilo que João nos coloca, como signo, a arte possibilita esse
re-encontro com a cidade, provocando novos encantos e novas significações,
pois reconhece-se que na memória permanece o que cativa, além do “[...]
patrimônio arquitetônico e seu estilo, que nos acompanham por toda nossa
vida, as paisagens, as datas e personagens históricas [...]” (Pollak, 1998, p. 3).
Prosseguindo em nossa co-produção com os artistas, lembremos que
para Vigotski (2009) a criação é condição necessária para a existência no
cotidiano, nesse sentido nos deparamos com falas como a de Anna e Carlos,
que se comparadas aos escritos deste teórico expressam o que este chamou de
Imaginação Coletiva. Ao serem questionados sobre o que é necessário para
ser um artista, Anna e Carlos respondem:
“[...] tem gente que tá lá, fazendo pão todo dia e tendo gosto nisso, e ‘po’,
melhor pão do mundo, saca? Coisa que eu não consigo fazer, então pra
mim, isso ai é artista (Anna).
“Não tem prazer maior que estar fazendo o que se ama cara… Tu não
precisa de nada além de querer ser feliz e viver do que se ama” (Carlos).
arte de ver tal como fazem as crianças e os poetas. Estes encontram poesia
nas pedras, nas paisagens, no cozinhar. Para este autor, algumas pessoas de
olhos sãos, nada veem. Para estas os olhos são apenas ferramentas. Já quando
verdadeiramente olhamos para o cotidiano, percebemos a criação que há nos
“pequenos grãos” mencionados por Vigotski (2009), para ele a criação não
ocorre apenas na elaboração de grandes obras artísticas, aquelas feitas pelas
mãos dos gênios, a criação ocorre no cotidiano das pessoas, quando o sujeito
imagina, combina, modifica e cria algo novo, mesmo que esta criação seja
apenas um grãozinho comparada as criações de pessoas consideradas geniais.
A imaginação coletiva seria aquela que une todos estes “grãozinhos”, não
raros considerados insignificantes. Vigotski (2007) afirma ainda que grande
Assim, podemos perceber que nas falas dos sujeitos dessa pesquisa o
trabalho por si já é arte (ainda mais se considerarmos o que Ana nos coloca
quando afirma que fazer um pão bem feito seria arte), pois compreende nossa
ação de transformação criadora do mundo e de nós mesmos. Por isso a com-
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5. Considerações Finais
“Fique atento: experimentar afetos sinaliza a enunciação de outras formas
de agir a partir dos modos de expressão que vamos percorrendo. Quando
afetados pelas audições e visões, gostos e cheiros, toques de vidas que
nos forçam a pesquisar na historicidade de um tempo que acontece, per-
cebemos que nossas questões são feitas de vidas. Assim, exercitamos uma
ética e expandimos nosso conhecer nas relações de uma vida de todos em
nós, de uma vida de si com todos” (Lazzarotto, Carvalho, 2012, p. 24).
texto) aquilo que nos afetou e nos mobilizou no decorrer da produção desse
trabalho de iniciação científica.
Inicialmente pensou-se na arte como genialidade, como o que está nos
museus, que é pouco acessível, esta que pertence apenas aos mais afortunados
ou dotados de um grande talento. Por outro lado, os discursos dos sujeitos
mostraram a arte como “poesia cotidiana”, como pequenos “grãozinhos”,
tal como propõe Vigotsky (2004) e Rubem Alves (2004) ou como “fazer do
pão” como propõe um de nossos sujeitos de pesquisa. Percebemos ainda a
arte como condição para a existência, como necessidade humana de superar
certos aspectos do psiquismo que não encontram vazão na vida cotidiana. Isso
pode ser percebido nas falas como a de Anna: “ahh, então eu desenho quando
quem passa por eles nas ruas, porém, nos deparamos com a noção de que
estes sujeitos relatam se sentirem recompensados pelos bons encontros que
vivenciam diariamente.
Alguns dos entrevistados relatam terem vivido experiências em galerias
e orquestras, e preferirem a rua como cenário de práticas. Evidenciaram-se
nas falas o motivo: a troca de olhares, o toque, a “conversa” através da arte,
o sentir-se valorizado por que a pessoa “parou a vida dela” para ouvir, a
remuneração através de um prato de comida, abrigo por um dia ou por um
mês, um bilhete de agradecimento, lagrimas de emoção.
Por fim, finalizamos esta pesquisa extremamente felizes e satisfeitas com
o resultado, embora, como já tenhamos dito, este trabalho não contempla nada
perto da grandeza que é o universo artístico de rua e tudo o que há nele para
ser pesquisado e compreendido. Todo o processo foi muito gratificante e cheios
de aprendizados, que não foram só acadêmicos, e isso é o mais importante.
Neste processo nos tornamos muito mais humanas. Nós nos permitimos ser
afetadas por. E espero que você, leitor e leitora tenha se permitido também.
E que termine essa leitura se sentindo um pouco diferente de como estava
quando começou. Assim como nós.
122
6. REFERÊNCIAS
EXUPERY, A.S. O pequeno príncipe. 49. ed. São Paulo: Casa dos
Livros, 2009.
O que pode um corpo? Diz-se ser essa uma das questões que Spinoza
se propõe a responder. E por aqui sigo a repetir essa pergunta: o que pode
um corpo? Talvez eu, Marina - como mulher cis, psicóloga, pesquisadora,
bailarina, docente, entre tantas de mim - precisaria amalgamar essa questão
com uma outra: sobre qual corpo se questionar o poder? E apresento essas
questões como início de uma conversa a qual considero imprescindível no
campo de produção do conhecimento científico.
Entendendo o corpo como território onde se produz relevos, disputas,
inscrições, potências e limites-bordas a serem sempre negociados na arena
alquímica-discursiva do encontro com tantos outros corpos, pensar pesquisa
é habitar esse corpo-território inteiro a tensionar o lugar-saber desse discurso
que, ainda hoje, opera na lógica de uma racionalidade funcionalista e prag-
mática a garantir na cabeça - apartada de toda sua “extensão” - única morada
do pensar capaz de delimitar “a” verdade sobre o mundo e a vida.
A você que por aqui chega, talvez ainda seja necessário te contar que
essas questões nos são caras tendo em vista a realidade com a qual nos depa-
ramos. O ano é 2023, o lugar é Brasil dentre os tensionamentos presentes
saliento aqui o negacionismo do campo científico (e o que vem se chamando
de pós-verdade), a hipervalorização de uma determinada forma de ciência
(carente de exercício crítico-reflexivo) e o questionamento sobre outras epis-
temes chamadas de pseudociências. Nesse campo, a dialogar com a Psico-
logia - essa de letra maiúscula para indicar o território da ciência - nos pede
o exercício político de novamente questionar - o que pode um corpo? O que
pode o meu corpo-mulher como pesquisadora-docente a produzir conheci-
mento científico em outros territórios-ciência?
Na produção desse itinerário em letras, desejo seguir acompanhada, pois
ao apresentar estes questionamentos também entendo que o território-saber
corpo é múltiplo, não somente na minha experiência, mas no corpo social que
126
1 Por obra clariceana entendo os livros da escritora brasileira Clarice Lispector. Ao longo de sua vida, mar-
cada por idas e vindas, como ucraniana que se tornaria brasileira por necessidade e sobrevivência, Clarice
imprime em suas obras a delicadeza do fluxo de consciência e nos convida a habitar os pensamentos de
suas personagens principais, em sua maioria, mulheres. Foi neste lugar subjetivo e, ao mesmo tempo,
concreto, que me encontrei com o desejo de ser psicólogo e, sobretudo, que forjei parte significativa daquilo
que entendo como minha própria identidade.
CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE
ENFRENTAMENTO: pesquisa em Psicologia 127
2 Há uma decisão ética, estética e política em assumir a grafia da palavra corpa e posicionar-me mulher neste
campo. Como pesquisadora das questões de gênero e compreendendo que a linguagem é caminho de
constituição do que somos como também espaço de disputa política, construir nesse território da linguagem
acadêmico-científica o lugar das mulheridades é primordial como posicionamento no mundo, exigindo o
tensionar dos sentidos já produzidos pela construção de sentidos outros na arena discursiva. Assim, sem-
pre que possível a compreensão e tensionamento do texto escrevo no feminino, procurando caminhos de
desterritorializar e reterritorializar a linguagem e as sujeitas.
CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE
ENFRENTAMENTO: pesquisa em Psicologia 129
livre do mal/Te desejo tudo de bom, viu fia’? (Povoada!)/Eu sou uma, mas
não sou só, minha fia’/Povoada/Quem falou que eu ando só?/Nessa terra,
nesse chão de meu Deus/Sou uma mas não sou só/Povoada/Quem falou
que eu ando só?/Tenho em mim mais de muitos/Sou uma mas não sou só”.
3 Pois, então Gustavo, das tramas tecidas na construção de minha tese, uma das imagens me enredou…
E versava sobre um corpo de uma criança atrás das grades de um pátio escolar… me falava sobre como
a escola enclausura a vida. Mas no diálogo com quem produziu a fotografia, o sentido era outro: o retrato
da irmã do amigo, a teia tecida do encontro afetivo possível que escorre pelos buracos que o encontro de
um fio de aço com outro constrói. Tecer a jaula que prende implica em deixar espaços para o que da vida
escapa mesmo nos lugares de encarceramento.
4 Gustavo tua interrogação provoca. Há muito de mim na produção da minha dissertação e mais ainda na
produção da minha tese. A tese foi um projeto de vida, de construção de um sonho possível de uma Marina.
Construir a pesquisa era construir a mim mesma, meu território de trabalho - tendo em vista que realizei
CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE
ENFRENTAMENTO: pesquisa em Psicologia 133
esteja, não basta falar dos outros, acredito ser importante implicar-me junto
ao campo para que não seja um falar sobre e sim um falar com. Aqui, retomo
a máxima cartográfica colocada por Rolnik (2014): cartografar é acompanhar
processos. Assim, se parto de uma ideia processual do fenômeno de pesquisa,
necessariamente, preciso compreender que o olhar do pesquisador precisa ser
localizado, assim como nos indica Donna Haraway (1995).
Assim, passei a fazer parte, ainda que por um período específico, da
vida daquelas pessoas. Conversando nas informalidades possíveis dentro de
um espaço marcado pela vigilância. Conheci os quartos, a horta, as salas de
atendimento e toda história que as pessoas me apresentavam em camadas,
feito tinta que vai descascando da parede. Com o tempo, fui percebendo que
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a pesquisa em uma escola da rede em que atuava como psicóloga. Mas também falava daquela Marina
que teve sua vida transformada pela educação, que se emociona, ri e chora, sente dor nessa corpa a cada
passo dado neste território. Mas que também se reconhece e significa nele.
134
reiterada, preservando um olhar sobre si. Então, estas posições sobre as quais
comentei corporificam visões aceitas socialmente e valoradas positivamente
numa questão salvacionista. Por algum tempo me vi dentro de uma luta pessoal
quase que de salvação das pessoas que lá moravam e isto é, no mínimo, um
exagero (pra não dizer pretensão). A corporificação dessas posições de poder
surge, a meu ver, além da repetição da norma asilar, como uma prática de
blindagem da loucura, a qual dentro desta distribuição moralizante da vida,
adentra num viés de receio pelo contágio. Busca-se a garantia da externação5.
Entendendo a cartografia como a tentativa de mapear estes fluxos de
desejos que aparecem em campo a partir de questionamentos de pesquisa e
ao problematizar esta corporificação do saber psiquiátrico, vejo um ponto
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Esta corpa senta-se mais para frente a cada sentido produzido nesse diá-
logo… meu chá já se foi, mas, confesso, perdi meu interesse nele a medida em
que te ouvia/lia e na possibilidade desse [entre] dialogava com tantos outros
que me compõem. Lembro sempre de uma escrita de Vygotsky (2000) que
considera que a pesquisa científica - como trabalho humano - é uma ação sobre
o mundo que transforma o mundo e constitui a própria consciência. Acredito
5 Essa consideração em muito me lembra, Gustavo, a possibilidade de pensar as relações entre escola e
vida - que foi primordialmente a tese que sustentei (ou tentei pelo menos). Dentre tantas questões que me
vieram, uma delas dizia respeito ao modo como a escola é o contratempo do tempo, contratempo do tempo
no sentido desse lugar de suspensão do mundo, de um tempo que se faz no entre dos tempos da vida.
Operar outros tempos no mundo é interessante, pensar como esses espaços nos aprisionam é primordial.
Entretanto, perceber como a vida escorre, escapa é simplesmente apaixonante!
136
5. REFERÊNCIAS
BHABHA, H. K. O local da cultura. Minas Gerais: Editora UFMG, 1998.
1. Políticas Públicas
internacional por parte dos referidos grupos. Não esquecendo que Poulantzas
constrói suas concepções com base em um modo de produção particular, que
é o modo de produção capitalista (Bonetti, 2018).
O que se observou desde então é que as elites globais, de forma a aten-
der seus próprios interesses, procuraram interferir na produção e operacio-
nalização de políticas públicas de países considerados periféricos, como é
o caso do Brasil. Para isso optaram, desde o Consenso de Washington, por
duas estratégias principais: a concessão de empréstimos e investimentos e a
adoção de parâmetros avaliativos a partir de modelos homogêneos de desen-
volvimento (Boneti, 2018). Como exemplo, no campo da educação, podemos
citar o Programme for internacional student assessment (PISA) – Programa
Internacional de Avaliação de Alunos, instrumento de avaliação em escola
proposto pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
(OCDE) que direciona países a adotarem uma concepção educacional baseada
em competências e habilidades necessárias para inserção e permanência no
mercado de trabalho, conforme demanda global de mão de obra. O referido
programa está em consonância com outras iniciativas de organismos multila-
terais como a Conferência Mundial sobre a Educação Para Todos de Jomtien,
promovida pelo Banco Mundial, pelo Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (PNUD), pelo Fundo das Nações Unidas para a Infância
(UNICEF) e pela Organização das Nações Unidas para a Educação e Cultura
(UNESCO). Conforme Libâneo (2012), essas iniciativas dão uma conotação
instrumental a educação pública, que foca no acesso aos conhecimentos míni-
mos necessários para a sobrevivência social e diminuição da pobreza, uma
formação bastante distinta daquela ofertada nas redes de ensino privado, que
propõe uma formação cultural e científica, que promove o desenvolvimento
das capacidades intelectuais, reflexivas e críticas do sujeito e que se preocupa
com a formação para a cidadania.
Um outro fator importante na formação de políticas públicas é a correla-
ção de interesses que se apresentam no próprio contexto nacional, decorrentes
142
em cada uma das fases citadas acima. Nestes termos, “a judicialização pode
ser compreendida como um movimento em dois sentidos: a ampliação dos
objetos levados ao judiciário e a implantação da lógica judiciária no próprio
tecido social” (Oliveira; Moreira; Natividade, 2020, p. 30). Seja como for,
Oliveira, Moreira e Natividade (2020) irão apresentar como a judicialização
da vida produz tensões nos encontros entre a Psicologia e o Sistema de Justiça:
A primeira tensão é o modo como a Psicologia se apresenta como útil aos
julgadores por centrar suas atividades em processos avaliativos das deman-
das (com testes psicológicos, por exemplo); Outra tensão apresentada pelas
autoras é o borramento na distinção entre norma e lei, construindo estratégias
colonizadoras na implantação de formas que controlam as vidas
igualdade, nunca está pronta, ela é sempre um evento a ser construído, pois,
nas palavras de Rancière, “a igualdade não é um dado que a política aplica,
uma essência que a lei encarna nem um objetivo que ela se propõe atingir. É
apenas uma pressuposição que deve ser discernida nas práticas que a põem
em uso”. (Rancière, 1996, p. 45).
De modo rápido, em Rancière (1995) o político, em que o Sistema de
Justiça participa, é o encontro entre as dimensões de polícia e de política.
Enquanto o processo de polícia trata-se da governança e a indução da criação
do consenso comunitário, distribuindo lugares, suas hierarquias e respectivas
funções, o processo de política trata da igualdade, traduzindo-se em con-
junto de práticas emancipatórias onde todos possuem o mesmo estatuto de
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sujeito, onde verifica-se que qualquer falante deve ter as mesmas condições
de qualquer outro falante. Nesta direção, a construção da igualdade não é a
apropriação de uma determinada identidade, seja ela singular ou coletiva.
A igualdade é um processo de subjetivação por meio da relação de um Eu
com um Outro, ou seja, um processo de desindentificação, uma subjetivação
política de enfrentamento das injustiças.
A subjetivação política, portanto, nunca é a simples afirmação de uma
identidade, pois também é a negação de uma identidade atribuída por um
outro, pelas regras da polícia, pois a polícia dá os nomes corretos, enquanto
a política trata dos nomes incorretos (Rancière, 1995). Como exemplo, no
campo da violência doméstica, o nome correto atribuído pela legislação aos
homens é o de “agressores”; é assim que a lei os nomeia, o nome incorreto,
portanto, é o de “autores de violência”, que os desloca de uma essência bio-
lógica agressiva, para uma agência sobre o comportamento violento. Nas
palavras do autor, “isto significa dizer que nós podemos atuar como sujeitos
políticos no intervalo ou no hiato entre duas identidades, no entanto, nenhuma
delas podemos assumir” (Rancière, 1995, p. 47), ou seja, a igualdade política
está no entre das relações sociais.
Assim, nessa íntima interligação destaca-se a urgência de uma reflexão
crítica e de um engajamento contínuo por parte dos profissionais envolvi-
dos, em especial, aquelas(es) formados pela Psicologia, visando não apenas
aprimorar as políticas existentes, mas também redefinir fundamentalmente o
propósito e a eficácia do sistema de justiça em construção de uma sociedade
mais justa e equitativa, menos legalista, para seguir fazendo justiça, não apenas
com as próprias mãos, mas com o corpo todo.
4. REFERÊNCIAS
AGAMBEN, G. O Amigo Que É Um Dispositivo? Argos, 2014. 71 p.
p. 7-18, 2019.
1 De acordo com o dicionário Michaelis (2008), insurgência pode ser definida como: a) o caráter ou condição
de ser insurgente; b) insurreição contra a autoria. É um termo que, portanto, implica um processo de resis-
tência e rebeldia ao estabelecido como norma e exigência. Pensamos aqui na insurreição como ferramenta
teórica e metodológica, na compreensão das estratégias de enfrentamento construídas por mulheres em
situação de violência grave, que demandam respostas paliativas do Estado enquanto produtor de violências
e mitigação de violações extremas. As estratégias de enfrentamento de mulheres em situação de violência
podem frequentemente ser lidas como expressões de diagnósticos psicopatológicos (Zanello; Silva, 2012)
ou tipologias do ciclo da violência que podem reificar existências, desconsiderando as singularidades situa-
cionais nesses cenários.
CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE
ENFRENTAMENTO: pesquisa em Psicologia 161
último não tem história e não pode falar, o sujeito feminino está ainda mais
profundamente na obscuridade.
Diante disso, o presente trabalho, enquanto matriz analítica, se propôs a
reverter essa lógica e evidenciar as mulheres participantes como protagonistas
do saber construído a partir de seus processos de resistência e enfrentamento
às violências, bem como construir desdobramentos e caminhos metodológi-
cos numa dissonância necessária entre mulheres pesquisadoras e mulheres
participantes nos contextos de violência.
As pesquisadoras reivindicaram uma psicologia construída com o outro,
compreendendo-o como protagonista de sua própria história. Assim, o estudo
aborda o fenômeno da violência contra a mulher em uma perspectiva crítica e
histórica, demarcada no cenário da América Latina. A proposta foi alicerçada,
metodologicamente, na “sistematização de experiências” (Holliday, 1996),
método que valoriza os saberes populares e a construção coletiva, suspendendo
a díade pesquisador e pesquisado.
acolhimento institucional.
Esta etapa também serviu para criar vínculos com as entrevistadas, assim
como colocar em prática a experiência, ao passo que a sistematização se tor-
nou uma certeza frente ao desejo de aprender sobre existência e resistência
com essas mulheres. Diante disso, realizamos essa pesquisa com o intuito de
compreender os sentidos atribuídos por mulheres sobreviventes de violência
em acolhimento institucional relacionados aos enfrentamentos da violência
de gênero, a partir das experiências, estratégias e trajetórias destas para além
da violência vivida.
Para que tal intento fosse possível, um deslocamento fez-se necessário.
O conhecimento é circular, democrático, flexível e curioso, assim como nós
precisamos ser para construir um saber que abarcasse as vivências individuais,
ao mesmo tempo em que produzisse coletivamente novas perspectivas e sen-
tidos para as experiências do que já se foi e do que permanece.
A vista disso, no terceiro passo organizamos um grupo de discussão, o
qual era formado pelas acolhidas, a psicóloga da instituição e as pesquisadoras.
A experiência foi vivenciada em 4 encontros, o objetivo de tais reuniões foi
construir, junto às participantes, uma investigação mais profunda dos dados
coletados nas entrevistas individuais realizadas anteriormente, bem como,
elaborar a análise coletiva dessas informações, construindo um novo saber a
partir do compartilhamento da história de vida das participantes.
O primeiro encontro teve como finalidade a promoção de vínculo,
explicação do funcionamento da etapa de análise das informações coletadas
anteriormente e reflexões sobre as vivências em comum das participantes. A
utilização de uma dinâmica de aquecimento possibilitou a promoção do vín-
culo, enquanto o convite à identificação e reflexão vieram através dos seguintes
disparadores: “Vocês sabem as dificuldades que as outras passaram?”; “Como
foi para vocês passar por essas dificuldades?”; “Como é se ver nas dificuldades
umas das outras?”; “Vocês acham que isso as aproxima mais?”.
166
que sobreviver, sendo assim, a busca pela liberdade e felicidade são neces-
sidades tão fundamentais quanto o pão. Em consonância com Sawaia (2009,
p. 364) “por trás da desigualdade social há sofrimento, medo e humilhação,
mas há também o extraordinário milagre humano da vontade de ser feliz e
de recomeçar onde qualquer esperança parece morta”. A autora acrescenta
que apesar do indivíduo constituir-se em um contexto social que define suas
alternativas de realização, é incoerente voltar-se apenas para a análise das
determinações sociais que atravessam o sujeito, desprezando a singularidade
deste, bem como as estratégias desenvolvidas para lidar com as violências
experimentadas cotidianamente.
Por fim, o quinto passo, chamado ponto de chegada, é o momento de
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refletir sobre quais resultados esta vivência nos proporcionou. A vista disso,
nós consideramos que tanto a identificação das estratégias de insurgências
individuais das mulheres, como a promoção do espaço coletivo, onde foi
possível que estas olhassem para as próprias trajetórias e se reconhecessem
nas histórias umas das outras, constituíram o movimento de humanização e
cuidado que a pesquisa-participante propõe.
Tal exercício metodológico possibilitou um contato mais profundo com
os saberes populares, correspondendo ao nosso objetivo primeiro: compreen-
der quais sentidos as mulheres residentes em uma Casa-abrigo atribuem à
experiência com a violência doméstica.
Diante disso, restou a indagação: o que ficou? Para Maria o que se mani-
festa é a possibilidade de contribuir para o conhecimento acadêmico das
pesquisadoras: Eu nunca pensei que a minha vida, a minha experiência, a
nossa experiência pudesse ajudar vocês também nos estudos, isso pra mim
é marcante [sic].
4. Considerações finais
é que esta pesquisa constituiu uma estratégia de insurgência contra uma estru-
tura opressora colonial, capitalista e patriarcal que nos mata diariamente. A
convergência construída no coletivo também foi um ato político e contra-
-hegemônico, foi através do afeto compartilhado que, juntas, criamos potên-
cia de vida.
Após tal experiência, seguimos com a certeza de que Audre Lorde (2007)
estava certa ao dizer que não seremos livres se outras mulheres ainda forem
prisioneiras. Portanto, pesquisar a experiência da violência de gênero e suas
resistências implica em partilhar, também, o que nós vivemos como mulhe-
res nesse contexto, por meio de uma construção coletiva que considera as
vivências das pesquisadoras e não exclusivamente seus saberes acadêmi-
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cos. Pesquisadoras que sentem, que choram e que dividiram suas histórias e
vivenciaram a experiência junto com aquelas que se dispuseram a construir
e partilhar um saber emancipador. Destarte, afirmamos que não há possibili-
dade de uma psicologia que não seja a psicologia que coloca os pés no chão
e constrói relações reais com o seu povo.
172
5. REFERÊNCIAS
BRASIL. Resolução CNAS nº 13, de 13 de maio de 2014. Tipificação Nacio-
nal de Serviços Socioassistenciais – Reimpressão 2014. Brasília, 2014.
1. Introdução
2. Fundamentação Teórica
Tais dados são também encontrados em Gundim et al. (2021) apud Sunde
(2021, p. 8) onde “fala de reações emocionais descritas como estresse, ansie-
dade, luto, raiva e pânico, associadas à preocupação com o atraso das ativi-
dades acadêmicas e ao medo de adoecer”.
Por outro ângulo, vale considerar a própria fase em que o jovem estu-
dante se encontra, que, culturalmente, se vê como uma transição entre o fim
da adolescência e o começo da vida adulta, essa com mais responsabilidades
e pedindo o aprimoramento de habilidades já presentes no jovem. Em isola-
mento social, quando é esperado que ele se adapte seguindo as influências do
meio socioambiental, o estudante não tem ou diminui o contato com outros
de sua idade, não tendo um modelo, sentindo-se então perdido (Teixeira et
3. Metodologia
4. Análise e Discussão
Foi uma adaptação assim de todo mundo, né? Que nos pegou de surpresa
e a gente teve que, é, sem imaginar que algo assim fosse acontecer, a gente
teve que, todo mundo se preparar para isso, né? (LUARA)
182
[...] É de utilizar coisas que eu já usava, né? Que eu já fazia do meu, do,
do, minha prática diária, mas que eu estava tendo que usar também, né?
É, técnicas respiratórias, meditação, coisas relacionadas à concentração
para entrar dentro da sessão, né? (ROBERTO)
Mas foi um momento bom, porque eu fiquei num, muito tipo num, um
vazio assim. Aí eu pude estruturar, tipo, mais ou menos o que eu queria
com a universidade e o que que eu ia fazer da universidade para mim,
sabe? (JANA)
Nessa comunicação que não é cara a cara muitas vezes, a gente, quando
a gente não é claro, há muitos mal entendidos, então, aprender a ser
um pouco mais pontual, né? Na, nas relações ali com os colegas de
sala (VERÔNICA).
distâncias percorridas todos os dias até a universidade não são mais necessá-
rias, assim como os gastos financeiros e o tempo investido em transporte não
são mais uma preocupação.
[...] então, no meu caso, que mora em outra cidade, é, quando há, por
exemplo, alguma, é, notícia de que alguma matéria vai ser remota, eu
gosto porque nesse sentido, para mim é muito conveniente, né? Então, eu
acho que esse perfil, essa característica do ensino remoto, ser remoto, né,
dá mais liberdade para o aluno, é maravilhoso (VERÔNICA).
porque daí às vezes eu estou o dia inteiro fora de casa, eu não quero
voltar para a universidade de novo [...] tipo você sai às 7 e fica fora de
casa até às 22:30, 23 horas, isso cansa, sabe, tipo custa a saúde física
e psicológica. E aí decidi que não ia mais fazer isso, daí as disciplinas
remotas vieram, tipo, foi muito bom ter algumas para escolher assim na
grade, porque, é, eu consigo tipo, não atrasar tanto a graduação e também
‘tá em casa descansando (JANA).
Então pra mim era tipo, ah, acordar faculdade e tu fica lá, tipo, 4 horas
e meia tipo vendo uma tela de computador, que tipo, pra, pra mim que
uso óculos ainda, tipo, doeu muito a cabeça e ainda aumentou um pouco
ainda o meu grau (LARA).
Então, era muito comum ver os professores “bah, gente, mas ninguém
tem nada para falar?” (ROBERTO).
Então, também fica aquela situação, dizer assim é, aqui, aquele vazio,
aquele silêncio tem que acontecer também para, de alguma maneira,
tocar o coração das pessoas e elas quererem participar, né? (ROBERTO)
o risco de perder conexão com a plataforma, por isso ele e outros colegas
acabavam optando por assistir as aulas gravadas fornecidas pela plataforma.
Barbosa, Viegas e Batista (2020) discutem a partir dos relatos de docentes
que as principais dificuldades dos alunos em assistir às aulas são a internet
que não atende as necessidades (33%) e não ter computador ou outro equi-
pamento (21%).
Como eu sou uma pessoa mais velha, é mais difícil pra mim essa parte
tecnológica. Assim, ela não está tipo, não está em mim ainda, né? Então
eu tive que aprender bastante, assim, sobre isso, desenvolver essa parte
um mim meio na força, assim, meio na marra, né? (LUARA)
[...] e muitas pessoas preferem o atendimento remoto, [...] talvez seja mais
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fácil você não está encarando a pessoa frente a frente. É como se tivesse
uma tela, como se fosse uma barreira protetora, entendeu? A pessoa está
te vendo, mas ao mesmo tempo não está ali, né? (NOEMI)
5. Considerações Finais
6. REFERÊNCIAS
BARBOSA, A.M.; VIEGAS, M.A.S.; BATISTA, R.L.N.F.F. Aulas presenciais
em tempos de pandemia: relatos de experiências de professores do nível superior
sobre as aulas remotas. Rev. Augustus., v. 25, n. 51, p. 255-280, jul./out. 2020.
1. Introdução
2. Metodologia
3. Resultados e Discussões
Como produto das entrevistas, tivemos um registro por escrito dos encon-
tros, o qual hibridizava o nosso e o discurso das pessoas que entrevistamos.
Cientes da indissociabilidade entre estas instâncias, fizemos a categorização
das informações considerando que produzimos um discurso possível na rela-
ção, o qual emergiu no e do encontro. Por isso, admitimos a não-neutrali-
dade do fazer científico e sua característica localizada, como aponta Haraway
(1995), uma vez que, como citado anteriormente, encontramos uma série de
questões pessoais e institucionais que delimitaram as condições de possi-
bilidade desta pesquisa. Para produzir reflexões que respondam à pergunta
de pesquisa, construímos categorias de análise, as quais serão expostas a
partir de agora.
De acordo com Butler (2017), a identidade de gênero acaba por ser per-
formativa, sendo constituída através de gestos, atos e de um acumulado de
fatores visuais, como elementos corporais e de vestimenta.
“Não é uma descoberta”, foi a colocação feita por Estefani quando ques-
tionada sobre sua vivência de gênero. Conta que se declarou aos 14 anos como
homossexual, e aos 17 anos como mulher trans. Quando questionada sobre
como foi esse processo de transição, ela respondeu “foi não, está sendo”, diz
206
que foi bem difícil a questão do preconceito e aceitação por parte dos pais,
mas que se sente bem do jeito que é. Bruna relata que desde sempre “já dava
pinta”, aos 19 anos, se reconheceu como mulher trans e iniciou a transição.
Relata que sempre teve a mãe como apoiadora, que a ajudava muito. Para
Verônica, a nomeação de sua identidade de gênero não normativa aconteceu
dentro da prisão, sendo que somente durante a entrevista que ela se apresenta
com o desejo de ser uma mulher trans.
Como foi possível perceber, a questão da identidade de gênero pode se
manifestar em diferentes momentos da vida, o que vem ao encontro da reflexão
apontada por Lanz (2016), ao dizer que essa “descoberta” pode ocorrer em
diferentes períodos, na infância, adolescência, na vida adulta ou até mesmo
preconceito por parte de um agente, que fez piada sobre ela tomar o “coquetel”
(se referindo de forma estigmatizante ao esquema de tratamento ao HIV).
Além disso, Bruna também relatou uma série de atitudes violentas por parte
dos agentes penitenciários, todas elas direcionadas a sua identidade de gênero:
foi chamada de “traveco” e “viado”, recebe frutas podres durante as alimen-
tações e sua cela foi apelidade de “24”, número que pejorativamente é asso-
ciado à homossexualidade. Em sua fala, destacamos sua reação diante destas
situações: “Estou presa, mas não sou bicho”. A fala de Bruna nos relembra a
condição de não-humanidade lançada às pessoas fora dos enquadres norma-
tivos, o que de maneira perversa, autoriza práticas de violência e exclusão.
Nesse âmbito, a instituição total age sobre a mortificação da subjetividade
como forma de punição, transformando os seres humanos ali inseridos, quase
que de forma literal, como somente um número, como parte de uma categoria
generalizada. Como descrito por Goffman (1974), a privação não se resume
apenas aos direitos básicos, mas no sistema prisional atual priva-se de uma
“vida vivível”, uma vez que as atividades cotidianas ficam à mercê da disponi-
bilidade e agência da instituição, cumprindo a função de uma instituição total.
As situações descritas acima são atos de transfobia escancarados e
descumprem a Resolução Conjunta nº 1, de 15 de abril 2014, do Conselho
Nacional de Combate à Discriminação e do Conselho Nacional de Política
Criminal e Penitenciária (CNPCP), que afirma que, às pessoas trans e travestis
encarceradas serão garantidos a manutenção do seu tratamento hormonal e o
acompanhamento específico de saúde.
O Manual da Resolução nº 348/2020, reafirma as questões acima e acres-
centa que as pessoas LGBTQIAP+ têm o direito de serem tratadas pelo nome
social, de acordo com sua identidade de gênero, mesmo que distinto do nome
que conste de seu registro civil e que o local de privação de liberdade será
determinado pelo magistrado em decisão fundamentada após consulta à pessoa
acerca de sua escolha.
210
As pessoas LGBTQIAP+ não possuem uma ala exclusiva para sua per-
manência na penitenciária em questão, mas são mantidos em duas celas des-
tinadas unicamente a eles, afastados dos demais presos, para sua segurança,
a fim de evitar confrontos. A partir do momento em que algum preso tem
envolvimento com alguma pessoa LGBTQIAP+, essa pessoa é separada dos
demais. A maioria dos outros encarcerados, principalmente dos membros de
facções, não aceitam a vivência e expressão da sexualidade e de gênero destas
pessoas, deixando explícito as ameaças de morte.
A penitenciária em questão, conta com cerca de 1500 detentos, com
somente um ambiente para tomar banho de sol, que ocorrem em turnos alter-
nados, pois, a penitenciária é dividida em grupos, como por exemplo, mem-
por isso. Passar por um momento como este na situação apresentada eviden-
cia a ausência de rede de apoio e sentimentos de solidão, algo que pode ser
determinante para ideação suicida ou pensamentos de morte (Botega, 2015).
De Jesus et al. (2015) relatam que o abandono familiar está associado
a fatores, como, dificuldades socioeconômicas das famílias dos apenados,
a distância das penitenciárias, o constrangimento das revistas para adentrar
esse espaço, o pouco tempo das visitas, além da questão da moralidade, pelo
envolvimento dos indivíduos com a criminalidade. O que contribui para a
diminuição da qualidade de vida e a perda do suporte afetivo e social, ocasio-
nando os sentimentos de solidão, desamparo e sofrimento. Observamos que
muitos deles não recebem visitas, muitas famílias moram em outro estado,
então alguns se comunicam com os entes queridos apenas por cartas, outros
as famílias abandonaram. Durante a pandemia foi implementado a “visita
virtual”, na qual é realizada por meio de chamada de vídeo. Segundo os entre-
vistados essa foi uma ótima mudança, pois possibilitou um maior contato com
suas famílias, mesmo que não presencialmente, alguns até restabeleceram o
vínculo e puderam ver seus entes queridos depois de muito tempo.
Dentre as perguntas da entrevista, uma delas se referia ao que eles gosta-
riam que fosse diferente naquele ambiente, e alguns responderam comumente
que seria “humanizar mais alguns agentes”. Sobre os agentes de segurançapri-
sional, Duarte (2010), apresenta que o seu papel seria de ressocialização dos
encarcerados, porém estes têm a função de manter a ordem e a segurança da
unidade prisional, sendo a contenção e a disciplina do preso, sua prioridade.
É imprescindível que o Estado promova condições, para que os agentes cum-
pram o seu devido papel, de combater a violência institucional e a promoção
dos direitos humanos, uma vez que percebemos a partir dos relatos que são
os agentes penitenciários os representantes da instituição. Em linhas gerais,
é como se os agentes representassem a epiderme de um sistema ainda mais
complexo, mas são eles o contato próximo, onde o toque das relações de
212
4. Considerações finais
5. REFERÊNCIAS
ANZINI, V. B. O poder das coisas: corpa, falocentrismo, transgeneridade e
arqueologia. Revista Discente de Arqueologia, v. 1, n. 1, p. 31-48, jul. 2020.
LANZ, Letícia. Ser uma pessoa transgênera é ser um não-ser. Revista Perió-
dicus, v. 1, n. 5, p. 205-220, 2016.
OSÓRIO, L.; SANI, A.; SOEIRO, C.. Violência na intimidade nos rela-
cionamentos homossexuais gays e lésbicos. Psicologia & Sociedade,
v. 32, 2020.
Este capítulo é uma tentativa de apresentar parte de uma pesquisa que tive
o prazer de acompanhar. Suely Rolnik (2014) nos adverte que cartografar é
acompanhar processos e, definitivamente, o processo que Marco nos apresenta
é pulsante. Tem muito dele, tem muito de mim, tem muito de nós. Esta pesquisa
surge a partir de uma inquietação que ele me traz em orientação: Gustavo, estou
cansado de falar sobre o sofrimento da nossa comunidade. Quero falar sobre
acolhimento. De fato, Marco. Nossa felicidade é um ato radical e seguiremos
buscando pelo direito de ser feliz e vivenciar a felicidade no espaço público,
na cidade. Enquanto isso, costuramos uma delicada trama que nos sustenta em
rede para dar conta das constantes violações que sofremos. Como homem gay,
um pouco antes de começar as orientações para a elaboração da pesquisa de
Marco, eu havia sofrido diferentes ataques homofóbicos, um deles no ambiente
universitário. Este trabalho veio como um processo de elaboração de algo não
só individual, mas também coletivo. Sentimos este tipo de situação cotidiana-
mente e, como sugere Paul Preciado (2014), precisamos construir uma multidão
queer para produzir força suficientemente capaz de romper com as lógicas da
desigualdade sem que nos machuquemos no caminho.
Marco consegue apresentar em uma escrita de guerrilha um texto potente,
oriundo de uma pesquisa feita com o corpo. Seguimos uma proposta de “psi-
cologia suja”, como propõe Sofia Favero. Não espere encontrar neste capí-
tulo, leitora, uma pesquisa fechada com respostas objetivas. Prepare-se para
reflexões dentro das condições de possibilidade apresentadas no contexto da
pesquisa. A fim de publicar esta pesquisa em outros meios de divulgação,
optamos por fazer um recorte, apresentaremos especificamente uma das três
categorias de análise. Com a palavra, Marco:
1. Introdução
Ocupação. Em muitos momentos essa palavra nos assusta, já que nos
ensinaram que ela é agressiva na maioria das vezes, porém, já diz a ciência
220
da física há séculos: os corpos e corpas ocupam espaços e não tem como um/
uma ocupar o lugar do/a outra/o ao mesmo tempo, surgindo a individualidade,
retratada ainda apenas na materialidade. A partir dessa individualização, cons-
truímos cidades, locais de lazer, lugares específicos para diversas atividades,
dividimos em gostos, estéticas, preferências, vocações, dinheiro, etnia, gênero.
Tudo passou - muito por conta de preconceitos - a ser separado, portanto nós
ocupamos os espaços que nos sentimos confortáveis, que nos identificamos,
criando, inclusive, uma certa territorialidade, que é entendida por uma demar-
cação geográfica e política, mergulhando mais nas individualidades em uma
perspectiva para além do palpável, já que o social e o subjetivo fazem parte
do território (Fernandes, 2006).
2. Transgeneridade e subjetividade
talvez um dia, sermos vistos como seres humanos de direitos, porém sei que
estamos na luta, primeiramente, para conquistarmos a posição de ter uma
existência legitimada.
As palavras, que foram escritas/costuradas em retalhos e foram lidas por
você, certamente me geraram reflexões, incômodos, aflições, felicidades e uma
série de encontros e desencontros com o eu que permeia a vivência trans, que
significa, consoante a etimologia do prefixo, “através, além de”. Portanto, as
nossas existências percorrem espaços que vão contra aquilo que nos limita,
nos dizem que somos anormais, que nos violentam, que nos matam, justa-
mente por isso usei o termo “retalhos”, pois não me possibilitam o desfrute
por inteiro, sempre vejo a mim e aos meus/minhas semelhantes se rasgando
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e se remendando.
relações das alteridades ali presentes, das vidas, histórias, memórias e aden-
trando na imensidão da fronteira com o outro, que não é o limite, todavia é o
espaço entre dois, no qual existe o vínculo (Hissa; Nogueira, 2013).
E estas cidades-corpos nos fazem promessas, tais como o direito a habi-
tá-las, seja de maneira permanente ou transitória. A Carta Mundial do Direito
à Cidade (2005) afirma que todas as cidades possuem o dever e a responsa-
bilidade de assegurar os direitos de todas as pessoas que estão na cidade.
Ainda segundo a carta, essas garantias permeiam os direitos básicos para
todas as pessoas.
Para Slomski (2021) a heteronormatividade e a cisgeneridade estão
impostas de maneira tão intrínseca na nossa sociedade que tudo o que foge
4. Metodologia
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Discussão
elu em sua casa e fomos para o local, sendo este um lugar acolhedor para
Kamrah. Xica foi entrevistada em um café em Balneário Camboriú, perto
de onde ela trabalha. A entrevista foi realizada à noite depois do seu horário
laboral. Já com Paul e Stefan, a entrevista foi realizada no mesmo lugar, em
momentos diferentes, e escolhidas de maneira fluida, no mesmo banco público
da beira-rio (uma parte da cidade de Itajaí é beirada pelo rio Itajaí-Açú). Na
entrevista com Paul, eu quem escolhi o banco, já na entrevista com Stefan
ele quem escolheu o local.
“Para mim, quando o Bolsonaro foi eleito a sociedade mostrou quem ela
é, pois tu elege um representante. Se tu acha que aquele cara te representa,
CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE
ENFRENTAMENTO: pesquisa em Psicologia 229
cara, temos um problema. [...] Ah, falam ‘mito’, mas mito para quem? O
cara é um babaca, ele não tem respeito nenhum pela vida, nem na pande-
mia ele teve.” – Paul
Ele ainda fala sobre existirem pessoas que não te possibilitam crescer
ou estar em um bom cargo no ambiente de trabalho, somente por ser trans.
Xica relatou uma boa experiência de trabalho na “Donuts quero”, que fica
em Balneário Camboriú, relatando ter tido um bom contato com o dono e
ele não ser preconceituoso, o que a ajudou nos processos de crescimento de
carreira e afirmar o trabalho como rede de apoio, além de o lugar ter empre-
gado mais pessoas trans/travestis além dela. Ela me disse que depois de uma
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Ela fez uma colocação sobre grandes empresas quererem empregar pes-
soas trans, mas exigirem término do ensino médio, completou dizendo sobre a
importância de as pessoas pesquisarem e entenderem a pauta de verdade para
poderem ajudar e acabar com o preconceito laboral. Stefan trabalhou em uma
hamburgueria, a Burguer-X em Itajaí, porém não teve uma boa experiência no
local, ele não sofreu transfobia diretamente, mas sempre ouvia comentários
230
Também disse se sentir acolhido e seguro em sua própria casa, pois mora
sozinho. Essa solidão acompanha as pessoas trans/travestis quase que como
uma assombração. Sofremos tantas violências e estamos tanto à mercê daquele
outro correto (Butler, 2018), que o que nos resta muitas vezes é a solidão o
tempo inteiro (Conserva; Rabêlo, 2020) quase que como um ímpeto de fuga
do açoite. Ele também contou sobre adorar estar na praia quando está vazia:
ambiente, resgatando o que Matumoto et al. (2002) fala sobre rede de apoio
para a possibilidade de construção de bem-estar.
Resgatando a rede de apoio e famílias, Kamrah comentou sobre a casa
de seus pais e de suas amigas terem sido lugares de acolhimento e segurança
na adolescência (a casa de seus pais ainda hoje), possibilitando que elu se
experimentasse e fosse identificando quem era e como era. Paul, Xica e Erika
também têm o apoio da família do pequeno núcleo e relatam que isso é extre-
mamente importante, tendo em vista que é uma boa rede de apoio que auxilia
o ser humano a enfrentar questões da vida (Matumoto et al., 2002) ainda
mais em relação à identidade própria. Porém, os quatro relatam ter sofrido
transfobia na família em um contexto de grande núcleo, mas que com o tempo
isso foi cessando justamente pelo pequeno núcleo fornecer apoio e auxiliar
no enfrentamento das violências.
“Eu vivi a adolescência na casa das minhas amigas e na minha casa tam-
bém, minhas amigas iam muito na minha casa. Na época eu não me enten-
dia enquanto uma pessoa trans, eu me entendi na pandemia que é quando
eu estive dentro de casa [...] O primeiro lugar que me vem quando eu penso
em espaços seguros e acolhedores, por mais que isso não esteja presente
para a maioria das pessoas LGBT’s, é a minha casa e a casa das minhas
amigas, que são os lugares que eu comecei a experimentar.” – Kamrah
Como Kamrah disse, a maioria das pessoas LGBT’s não são aceitas em
suas próprias casas, sofrem violências e até são expulsas de casa (Benevides;
Nogueira, 2020), como acontece com Stefan que não tem o apoio de sua
família, que até hoje não aceita e respeita o fato dele ser trans, por isso ele
saiu da casa dos pais para morar sozinho. Contudo, encontrou acolhimento
na família de sua namorada e considera essas pessoas como família, mesmo
elas ainda não sabendo que ele é trans:
232
“Um lugar que as pessoas não saibam que você é trans, que as pessoas não
te conhecem, que seja indiferente você ser trans ou não. Tipo, eu já viajei
para cidades grandes como Porto Alegre, São Paulo e Maringá. Lá, como
as pessoas não te conhecem, é indiferente em relação a transexualidade.
Lá você corre outros perigos como assalto, mas no geral é onde as pessoas
não me notam.” – Erika
Esse “não notar” me dói, pois precisamos nos esconder e nos colocar
na solidão para não sermos violentados. Os locais públicos foram trazidos
como não acolhedores e seguros. Hoje, por conta novamente da passabilidade,
Stefan e Xica não sentem medo de andar nas ruas, mas já sentiram. Xica sente
desconforto em andar nas ruas de Camboriú (cidade ao lado de Balneário Cam-
boriú), pois é menor e pelo fato das pessoas a conheceram antes da transição.
Já Kamrah, Erika e Paul não consideram os locais públicos seguros e acolhe-
dores, justamente por nossos corpos estarem visíveis e a qualquer momento
nosso “erro” pode ser descoberto e gerar alguma agressão (BUTLER, 2018).
No início da entrevista com Paul eu o percebi muito inquieto e olhando o
tempo todo para os lados, principalmente quando alguém passava mais perto
de nós, então, mais para o final da entrevista tomei a liberdade de perguntar
CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE
ENFRENTAMENTO: pesquisa em Psicologia 233
um banheiro “é o banheiro de uma casa só” e isso traz conforto para Paul.
Já teve uma situação em um acampamento de escotismo, no qual ele foi um
dos líderes, que um outro líder/chefe chamou-o pelo pronome feminino e se
incomodou com o fato de ele usar o banheiro masculino. No final do acampa-
mento todos se reuniram para uma “finalização”, para se identificarem todos
tinham um crachá com seus nomes, então escreveram o nome de Paul atrás
dos seus próprios crachás e quando os responsáveis com cargos mais altos se
pronunciaram contra a situação, todos viraram os crachás para que o nome
real de Paul ficasse à vista.
seguro.” – Paul
Parece que estou rodando em círculos, mas, mais uma vez, Butler (2018)
aparece aqui em peso reafirmando o que a sociedade realiza com a dissidência
trans, pois como não somos verdadeiros, somos fora da norma, somos não
inteligíveis, então também não teremos direito ao básico (fisiológico). E claro,
eles vêm com a desculpa de que a nossa biologia é quem manda. Certa vez vi
um vídeo no qual um homem trans estava sendo entrevistado (não me recordo
seu nome e nem o nome do vídeo) e ele disse “o dia em que estiver escrito
‘banheiro para pessoas com vulva’ e ‘banheiro para pessoas com pênis’ eu
vou no banheiro que vocês tanto querem que eu use sem problemas, pois eu
tenho uma vulva.” Gera um certo nojo falar sobre esse ponto, porque estamos
falando de direitos humanos, de políticas públicas e de saúde pública, tendo
em vista que o preconceito e dificuldade no acesso aos banheiros aumenta a
probabilidade das pessoas trans/travestis terem problemas urinários (Movi-
mento Posithivo, 2019).
6. Considerações Finais/Começos
Chegamos a um final-começo, pois a partir dessa pesquisa a vontade de
fazer outras está pulsando loucamente em mim. Convido você a pensar de
maneira crítica e quem sabe também ir por esses caminhos de pesquisa. Tive
que deixar guardado muito do que foi falado nas entrevistas, pois não cabia
aqui e escolhi me aprofundar nos assuntos que mais gritavam para serem
escritos. E nesses gritos chorei, ri, fiquei enjoado e nervoso, mas escrevi,
escrevi com alma, corpo, e dei à luz a este trabalho/filho/preciosidade nessa
costura de retalhos em materialidade, inclusive sinto isso em meu corpo, pois
sou literalmente costurado.
Muitos pensam que as histórias estão trancadas em pedaços de papéis e
que elas só acontecem ali, todavia é na vivência do corpo-mundo que essas
236
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, J. R. C. F. de; MIRANDA, M. A. O uso de pronomes de pri-
meira pessoa em artigos acadêmicos: Uma abordagem baseada em corpus.
Veredas On-Line - Linguística de Corpus e Computacional, Juiz de Fora,
p. 68-83, 2009.
BUTLER, J. Corpos em aliança e a política das ruas: notas para uma teoria
performativa de assembleia. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2018.
1. Introdução
1 O Conselho Federal de Psicologia apresentou publicamente repúdio à Nota Técnica Nº 11/2019 e afirma
que é um grande retrocesso nas conquistas da Reforma Psiquiátrica no Brasil (CFP, 2019).
CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE
ENFRENTAMENTO: pesquisa em Psicologia 243
relata que o sofrimento psíquico está envolvido em aspectos que vão além do
psicologismo e biologicismo, mas sim do campo relacional, nos contextos de
vida, ou seja, onde mora, no que trabalha, como acessa seus direitos, o que
implica as políticas a refletir sobre os processos de inclusão e exclusão dos
usuários. A noção de território atravessa as concepções de um instrumento de
gestão, o lugar de vida e a sociabilidade, e busca a liberdade, o livre-trânsito,
e não a clausura (Costa-Rosa, et al., 2003).
Portanto, a Atenção Psicossocial expressa a redefinição do paradigma
de cuidado relacionados aos movimentos populares na consolidação do SUS.
Neste sentido, a “atenção” é um conceito amplo, que se refere a “prestar aten-
ção, acolher, receber com atenção, tomar em consideração, levar em conta
e escutar atentamente” (Costa-Rosa, et al. p. 22). É com esse paradigma, de
Atenção Psicossocial, que trabalhamos neste artigo, que dá importância à
participação dos usuários e não a exclusão deles.
Ao refletir sobre a participação popular, deve-se reconhecer o movimento
de conflitos e disputas políticas, entre as lógicas liberais e progressistas no que
tange a saúde, com os mesmos efeitos na Atenção Psicossocial. A democrati-
zação do espaço da saúde se dá por meio da participação popular, articulada
através de Conselhos Municipais e Conferências Nacionais de Saúde. A par-
ticipação dentro desses espaços “é conduzir os rumos da história, é alimentar
sonhos, é superar obstáculos, para quem sabe um dia, esses espaços se tornem
uma grande arena do exercício da democracia e não somente um espaço de
representação” (Quaresma, 2012, p. 185).
Quando pensamos em um Conselho Temático relacionado ao campo
da atenção psicossocial, é necessário refletir como a participação popular se
torna um campo contraditório e regido por disputas em relação aos modelos
de cuidado, mas que também viabiliza ao usuário uma reconstrução de direitos
sobre seu tratamento, implicando-o numa posição de articulador da Rede,
convocando-o para discutir e participar da construção, realização, fiscalização
244
e avaliação das políticas públicas e lutar assim pelo direito à saúde (Valla,
1998). Os Conselhos Municipais são uma das formas de efetivar a participação
popular dentro do SUS e tem como foco a descentralização das decisões. São
formados por representantes dos profissionais de saúde (25%), dos usuários
do serviço de saúde (50%), do governo e dos prestadores de serviços de saúde
(25%) (Brasil, 2013). Entende-se que, nesse espaço de participação popular,
os interesses não sejam pautados na individualidade de cada conselheiro, e
sim nos interesses coletivos (Costa; Vieira, 2013). O envolvimento da popu-
lação em assuntos do município, bairro e nas práticas de serviços de saúde,
é a democracia exercida cotidianamente, ou seja, a democratização da vida
(Miguel, 2017; Pateman, 1992).
2. Caminhos Metodológicos
3. Resultados e Discussões
“Eu estou até aqui por acreditar nisso, nesse protagonismo dos usuários
e por entender que enquanto profissionais a gente precisa dessa cutucada,
estarmos juntos e dizer “é com vocês [usuários] também”. A gente precisa
ouvir o que está se passando com vocês, o que vocês estão sentindo antes
de qualquer coisa”
“Eu vou tentar me colocar como igual, se sentir igual, tentar não me
esconder atrás da minha profissão, é um lugar engraçado esse… É muito
fácil nos esconder atrás desse título de trabalhador”
“O que pega para mim é que saúde é um direito, que todos têm um valor,
perante a constituição, que ela é uma decisão enquanto povo, enquanto
povo a gente decide. Ver todas as pessoas como iguais e com direitos”
“Eu acho um máximo quando a gente se junta e faz alguma coisa, eu acho
um máximo quando a gente vai no Conselho Municipal de Saúde e diz
que queremos os leitos e se não tiver os leitos a gente não vai aprovar o
plano. Não porque a gente quer ferrar o hospital, mas porque a gente quer
que eles façam com a gente, vamos fazer, a gente tá precisando disso”
“Como elas (CTs) são e como funcionam? Como esses serviços de cuidado
se efetivam no município? Quantas são e onde estão? Como podemos
achar elas?” (Diário de Campo de uma das pesquisadoras)
“No início a gente não sabia, sabíamos muito pouco ainda, quase nada.
E o que nós vamos fazer agora? Agora que temos uma diretoria eleita,
o que nós faremos? Ninguém sabia essa resposta, a gente foi buscar”
“Acho que o CT-RAPS tá sendo isso para mim, uma grande escola prática
do Controle Social”
Compreendemos que isso se deve, a partir dos motivos que fazem com
que acadêmicos ocupem os espaços sociais que, usualmente, são para o cum-
primento de experiências práticas, sem um envolvimento politicamente impli-
cado. No nosso caso, como pesquisadoras, entendemos que a forma como se
CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE
ENFRENTAMENTO: pesquisa em Psicologia 259
“Já me sinto mais à vontade para estar ali e uma maior abertura para me
posicionar. Também penso, que me sinto responsável pelo que discutimos
nas reuniões, o que me permite falar e me posicionar no grupo” (Diário
de Campo das pesquisadoras).
4. Considerações Finais
5. REFERÊNCIA
ALENCAR, T. O. S.; NASCIMENTO, M. A. A.; ALENCAR, B. R. Herme-
nêutica Dialética: Uma Experiência Enquanto Método de Análise na Pes-
quisa sobre Acesso do Usuário à Assistência Farmacêutica. Rev Bras Promoç
Saúde., v. 25, n. 2, p. 243-50, 2012.
Ainda estamos a nos conhecer, olhar nos olhos – quando possível -, ouvir
o outro no fazer-se docente pesquisador e pesquisadora, no experimentar-se
constituir nos diálogos que partilhamos para além do mundo acadêmico.
Ainda estamos a nos conhecer e gostaríamos de grafar aqui nosso exis-
tir-conhecendo[-nos] em nossas tramas de vidas, com pontos-nós que nos
atravessam naquilo que transversaliza nossos diálogos. E nesse “ainda estamos
a nos conhecer”, convidamos você a ser interlocutor, corpo-mão a cozer-tramar
conosco, pois a alteridade nos constitui e nesse escrever-viver-pensar-sen-
tir com você também vamos construindo quem somos nesse coletivo-trama
que produzimos.
Particularmente gosto muito de uma afirmativa de Larrosa e Kohan (2007)
que afirma que não escrevemos o que já sabemos, escrevemos para apren-
der o não sabido e transformar aquilo que sabemos. Ao produzir esse livro
aprendemos de nós e estamos a aprender o que é fazer-se grupo de pesquisa.
Certa de que aqui temos uma pequena trama do que nos forma, não
entendo possibilidade de um arremate, mas sim os fios soltos que o diálogo,
agora com você que nos lê (e conosco mesmo que nos leremos) para as
novas tramas que precisaremos tecer. No fio do tempo, esta obra se tece. No
fio do tempo, rezo1 a cada ponto-nó para que essa trama possa ser destecida,
carregando as marcas do que tramamos neste momento, mas também a pos-
sibilidade de outras marcas num novo tecer. O mundo é mover-se.
Destecer para tecer novamente no devir. Se, como lembrar Deleuze,
“acreditar no mundo significa principalmente suscitar acontecimentos,
mesmo que pequenos, que escapem ao controle, ou engendrar novos espa-
ços-tempos, mesmo de superfície ou volumes reduzidos”, rezo que essa
tecitura se faça acontecimento e que, sem controle se desfaça e refaça em
outros tempos-espaços.
1 No dicionário e língua portuguesa online há algumas definições para rezo. Aqui gostaria de posicionar
aquela definição a qual apreendo ser necessária nessa produção. Rezar como “Falar baixo, resmungando,
murmurando; murmurar. Lembro que a origem etimológica de rezar deriva do recitar. Rezo como possibilidade
de murmúrio-cantarolar a ritmar o bailarinar de dedos no tecer-destecer a trama dessa produção.
268
REFERÊNCIAS
DELEUZE, G. Controle e devir: entrevista de Gilles Deleuze a Toni Negri.
1990. Disponível em: https://historiacultural.mpbnet.com.br/pos-modernismo/
Controle_e_Devir.pdf. Acesso em: nov./2023.
C
Cartografia 126, 127, 128, 129, 130, 132, 135, 136, 137, 225, 226, 227,
236, 239
Ciência psicológica 9, 163, 170
Conhecimento histórico 20, 27
D
Desigualdade social 18, 24, 169, 173, 206, 217, 239
Direitos humanos 10, 17, 19, 21, 27, 29, 31, 34, 35, 37, 38, 39, 40, 41, 42,
43, 44, 54, 69, 149, 199, 202, 211, 214, 235, 263, 277, 278
Ditadura militar 52, 140, 145
E
Educação escolar 145, 146
Emoção estética 98, 103, 120
Ensino remoto 175, 176, 177, 179, 180, 181, 182, 184, 185, 186, 195
Entrevistas 55, 56, 67, 68, 79, 80, 83, 84, 87, 89, 90, 107, 108, 109, 132,
134, 164, 165, 166, 168, 180, 181, 192, 202, 203, 204, 206, 207, 209, 210,
225, 226, 228, 235
Epistemológicos 22, 23, 28, 123, 127, 265
Estudantes de psicologia 177, 180, 190
Ética da desigualdade 217, 239
270
F
Feminismo 137, 215, 238
Ferramentas de trabalho 77, 86
G
Gênero 19, 20, 21, 22, 29, 35, 40, 45, 48, 49, 61, 71, 128, 132, 142, 146,
150, 158, 159, 160, 161, 165, 166, 169, 171, 172, 174, 197, 199, 203, 204,
205, 206, 207, 208, 209, 210, 213, 215, 217, 220, 222, 228, 230, 232, 234,
H
Histórico-cultural 124, 239
L
Leitos psiquiátricos 250, 251, 255, 256, 259, 260
Lgbt 199, 200, 214, 216, 217, 229, 231, 233, 234
M
Ministério da saúde 145, 155, 156, 176, 237, 241, 256, 262, 263
N
Neoliberalismo 73, 74, 75, 76, 77, 78, 84, 85, 94, 96, 141, 277
P
Pandemia da covid-19 92, 176, 180, 182, 194, 195, 247, 261
Paradigma 20, 27, 101, 122, 123, 156, 242, 243, 252, 253, 263
Pautas emergentes 241, 260
Penitenciária 197, 201, 203, 208, 209, 210, 212, 274
Percepção sensorial 98, 103, 120
Período de lockdown 177
Políticas públicas 10, 17, 18, 19, 21, 22, 23, 139, 140, 141, 142, 143, 144,
145, 146, 147, 148, 149, 151, 152, 154, 155, 157, 166, 213, 224, 235, 241,
244, 245, 250, 252, 263, 274, 277, 278
Promoção dos direitos 200, 211, 214
CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE
ENFRENTAMENTO: pesquisa em Psicologia 271
R
Rede de atenção 143, 144, 157, 167, 241, 246, 250, 251, 256, 257, 260, 276
S
Saúde mental 23, 33, 40, 80, 142, 144, 156, 157, 163, 174, 179, 195, 241, 245,
251, 252, 253, 254, 256, 261, 262, 263, 264, 265, 273, 275, 276, 277, 278, 279
Sexualidade 45, 46, 47, 50, 51, 56, 57, 59, 61, 63, 65, 66, 67, 69, 132, 142,
146, 197, 199, 204, 207, 210, 213, 230
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
T
Tecnologias psicossociais 10, 139, 140, 151, 152, 153
Trabalhadores de aplicativos 96
Trabalho digital 94, 95, 96
Transexuais 200, 206, 214, 216, 217
U
Uberização 75, 76, 77, 83, 85, 87, 88, 89, 90, 93, 94, 95, 96
V
Violência de gênero 21, 29, 159, 160, 165, 166, 171
Vulnerabilidades 3, 9, 18, 20, 22, 31, 163, 170, 278
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SOBRE OS AUTORES
Enis Mazucco
Possui graduação em Psicologia pela Universidade Federal de Santa Catarina
(1995) e mestrado em Sociologia Política pela Universidade Federal de Santa
Catarina (2001). Atualmente é professor titular da Universidade do Vale do
Itajaí. Tem experiência na área de Psicologia, com ênfase em Antropologia,
Psicologia Clínica (Gestalt terapia) e Psicologia Social. Currículo disponível
em: http://lattes.cnpq.br/8498975353903261.
CONSTITUIÇÃO DO SUJEITO, VULNERABILIDADES E ESTRATÉGIAS DE
ENFRENTAMENTO: pesquisa em Psicologia 275
Ketlyn Terres
Psicóloga pela Universidade do Vale do Itajaí - UNIVALI. Atualmente cur-
sando especialização multiprofissional em Atenção Psicossocial - CAPS Ita-
Marco Vagnotti
Possui graduação em Psicologia pela Universidade do Vale do Itajaí (2022).
Atuando como Psicólogo Clínico, atendendo principalmente demandas vol-
tadas à pessoas LGBTQIAPN+. Pesquisador, palestrante e mediador em
grupos de estudos sobre a população trans/travesti. Desenvolve trabalhos
com interesse nas áreas de saúde LGBTQIAPN+, subjetivação e linguagem
nas vivências trans/ travestis. Currículo disponível em: http://lattes.cnpq.
br/1444001017326944.
Matheus Braciack
Psicólogo graduado pela UNIVALI (2023), sua experiência acadêmica foi vol-
tada para temas como saúde coletiva, neoliberalismo, psicanálise e marxismo.
Coordenou e participou de grupos de estudos e ligas acadêmicas durante este
período, além de ter a experiência de pesquisa e extensão através de projetos
da universidade. Atualmente é pós-graduando em Psicanálise e Análise do
Contemporâneo, pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do
Sul (PUCRS).
SOBRE O LIVRO
Tiragem: não comercializado
Formato: 16 x 23 cm
Mancha: 12,3 x 19,3 cm
Tipologia: Times New Roman 10,5 | 11,5 | 13 | 16 | 18
Arial 8 | 8,5
Papel: Pólen 80 g (miolo)
Royal | Supremo em brilho 250 g (capa)