Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
A GUERRA NA UCRÂNIA
E O DIREITO INTERNACIONAL:
debates atuais
Editora CRV
Curitiba – Brasil
2023
Copyright © da Editora CRV Ltda.
Editor-chefe: Railson Moura
Diagramação e Capa: Designers da Editora CRV
Imagem de Capa: @vector_corp | Freepik
Revisão: Os Autores
A Guerra na Ucrânia e o Direito Internacional: debates atuais / Sven Peterke, Tarciso Dal
Maso Jardim (organizadores). – Curitiba : CRV, 2023.
444 p.
Bibliografia
ISBN Digital 978-65-251-5181-6
ISBN Físico 978-65-251-5184-7
DOI 10.24824/978652515184.7
1.Direito 2. Direito internacional humanitário I. Peterke, Sven, org. II. Jardim, Tarciso Dal
Maso, org. III. Título IV. Série.
2023
Foi feito o depósito legal conf. Lei nº 10.994 de 14/12/2004
Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora CRV
Todos os direitos desta edição reservados pela: Editora CRV
Tel.: (41) 3039-6418 – E-mail: sac@editoracrv.com.br
Conheça os nossos lançamentos: www.editoracrv.com.br
Conselho Editorial: Comitê Científico:
Aldira Guimarães Duarte Domínguez (UNB) Alexandre Sanson (Justiça Federal – São Paulo/SP)
Andréia da Silva Quintanilha Sousa (UNIR/UFRN) Aloisio Krohling (FDV)
Anselmo Alencar Colares (UFOPA) André Pires Gontijo (UniCEUB)
Antônio Pereira Gaio Júnior (UFRRJ) Antônio Pereira Gaio Júnior (UFRRJ)
Carlos Alberto Vilar Estêvão (UMINHO – PT) Celso Ferreira da Cruz Victoriano (TJ-MT)
Carlos Federico Dominguez Avila (Unieuro) César Augusto de Castro Fiuza (Ferreira, Kumaira
Carmen Tereza Velanga (UNIR) e Fiuza Advogados Associados/UFMG)
Celso Conti (UFSCar) Christine Oliveira Peter da Silva (STF)
Cesar Gerónimo Tello (Univer.Nacional Claudine Rodembusch Rocha (FEEVALE)
Três de Febrero – Argentina) Cristiane Miziara Mussi (UFRRJ)
Eduardo Fernandes Barbosa (UFMG) Daniel Amin Ferraz (Amin, Ferraz, Coelho
Elione Maria Nogueira Diogenes (UFAL) Advogados/ Universidad de Valencia, UV, Espanha)
Elizeu Clementino de Souza (UNEB) Daury Cesar Fabriz (UFES)
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
Este livro passou por avaliação e aprovação às cegas de dois ou mais pareceristas ad hoc.
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
AGRADECIMENTOS
O presente trabalho foi realizado com fomento da Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Brasil (CAPES) – pelo
Programa de Desenvolvimento de Pós-Graduação (PDPG), Apoio Financeiro
a Projeto Educacional e de Pesquisa (AUXPE) – Consolidação 3 e 4, refe-
rido no Contrato nº 8887.707760/2022-00 do Programa de Pós-Graduação
em Ciências Jurídicas da UFPB sob a Coordenação do Professor Gustavo
Barbosa de Mesquita Batista.
Agradecemos, imensamente, à CAPES e ao Professor Gustavo Barbosa
de Mesquita pelo apoio e pela confiança na qualidade dessa obra.
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
APRESENTAÇÃO .......................................................................................... 13
Sven Peterke
Tarciso Dal Maso Jardim
INTRODUÇÃO
Sven Peterke
Tarciso Dal Maso Jardim
PARTE 1
PARTE II
PARTE IV
alguns deles, oferecendo orientações basilares para todos e todas que pretendem
compreender melhor os aspectos jurídicos mais relevantes e urgentes do conflito
armado em andamento. Alguns desses debates não são novos, mas merecem ser
contextualizados e explicados a um público maior. Eles abordam, entre outros
aspectos, a justificação da invasão e ocupação militar de um Estado soberano,
a legalidade de reagir com sanções, o direito da população afetada pelas hos-
tilidades a receber assistência humanitária e a punibilidade de certas condu-
tas criminosas por tribunais internacionais. Outros debates são relativamente
novos, como, por exemplo, referente à classificação de ataques cibernéticos ou
ao possível emprego de Lethal Autonomous Weapons Systems (LAWS). Salvo
engano, ainda não há nenhuma obra em língua portuguesa apresentando esses
debates, tornando o presente livro único no momento em questão.
Sven Peterke
Tarciso Dal Maso Jardim
João Pessoa/Brasília, 24 de maio de 2023
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
INTRODUÇÃO
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
1. INTERNATIONAL LAW IS DEAD?
LONG LIVE INTERNATIONAL
LAW! A guerra na Ucrânia e o
direito internacional público
Sven Peterke
Tarciso Dal Maso Jardim
1. Considerações iniciais
1 UN SECURITY COUNCIL. Letter dated 24 February 2022 from the Permanent Representative of the Russian
Federation to the United Nations addressed to the Secretary-General, S/2022/154, 24 fev. 2022.
2 Desnazificação e genocídio: a história por trás da justificativa de Putin para invasão da Ucrânia. Tradução
Mariana Sanches. BBC News Brasil, 25 fev. 2002. Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/inter-
nacional-60518951. Acesso em: 15 dez. 2022.
3 CAVANDOLI, Sofia; WILSON, Gary. Distorting Fundamental Norms of International Law to Resurrect the
Soviet Union: The International Law Context of Russia’s Invasion of Ukraine. Netherland International Law
Review, s/n, 2022. Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1007/s40802-022-00219-9. Acesso
em: 15 dez. 2022.
18
que tinha rompido pela anexação da Crimeia pela Rússia em fevereiro de 2014,
seria nada menos do que redefinir as fronteiras internacionalmente reconhe-
cidas da Ucrânia e pôr fim à independência política do segundo maior país
da Europa, ao derrubar o seu governo democraticamente eleito, mas hostil à
ideia de se curvar às reivindicações de Putin – entre elas, a de não se tornar
Estado-membro da OTAN.
No momento da última redação do presente texto (4 de maio de 2023),
essa guerra ainda está em andamento e não se sabe qual das partes sairá como
“vitoriosa”, nem como pacificar o conflito. No entanto, milhares de pessoas –
combatentes e civis –, já foram mortas, feridas ou traumatizadas pelas hostili-
dades. Além disso, milhões de indivíduos, sobretudo mulheres e crianças, foram
4 Compare GHARIB, Malaka. Not every war gets the same coverage as Russia’s invasion – and that has conse-
quences. NPR, 4 mar. 2022. Disponível em: pr.org/sections/goatsandsoda/2022/03/04/1084230259/not-every-
-war-gets-the-same-coverage-as-russias-invasion-and-that-has-consequenc. Acesso em: 2 nov. 2022.
5 FOULKES, Imogen. Ukraine war could worsen crisis in Yemen and Afghanistan. BBC News, 12 abr. 2022.
Disponível em: https://www.bbc.com/news/world-60995064. Acesso em: 2 nov. 2022.
6 Veja para uma tentavia: KATCHANOSKI, Ivan. The Separatist War in Donbas: A Violent Break-up of Ukraine?
European Politics and Society, v. 17, n. 4, p. 473-489, 2016.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 19
11 Quer dizer, ocorrendo de modo direto, sem menor esforço de instruir ou financiar grupos não estatais,
camuflando a participação no conflito, o que costuma dificultar a responsabilização internacional.
12 Ver para detalhes: BRUNK, Ingrid; HAKIMI, Monica. Russia, Ukraine, and the Future World Order. American
Journal of International Law, v. 116, n. 4, p. 687-697, 2022. p. 693.
13 Comp. MCDOUGAL, Myres et al. (eds.), Studies in World Public Order. Dordrecht: Nijhoff, 1987; CHEN,
Lung-chu. An Introduction to Contemporary International Law: A Policy-Oriented Approach. 3. ed. Oxford/
New York: OUP, 2016.
14 Ver, p. ex., UN SECURITY COUNCIL, S/RES/1199 (1998); S/RES/1441 (2002).
15 ICJ, Allegations of Genocide under the Convention on the Prevention and Punishment of the Crime of
Genocide (Ukraine v. Russian Federation). Provisional Measures, March 16, 2022.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 21
16 CSÚRI, András. Russian Federation ceases to be a member of the CoE. EUCRIM 1/2022, p. 37-38.
17 Cf. MCGEE, Luke; CALZONETTI, Claire. Porta-Voz diz que Rússia poder usar armas nucleares em caso de
“ameaça existencial”. CNN Brasil, 23 mar. 20222. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/
porta-voz-diz-que-russia-pode-usar-armas-nucleares-em-caso-de-ameaca-existencial/. Acesso em: 15
dez. 2022.
18 Comp. CRAVEIRO, Rodrigo. Putin ameaça usar armas nucleares contra chantagem do ocidente. Correio
Braziliense, 22 set. 2022. Disponível em: https://www.correiobraziliense.com.br/mundo/2022/09/5038526-pu-
tin-ameaca-usar-armas-nucleares-contra-chantagem-do-ocidente.html. Acesso em: 15 dez. 2022.
19 Não é a primeira vez que essa pergunta é lançada. Veja, p. ex., FROWEIN, Jochen Abr. Is International Law
Dead?. German Yearbook of Inernational Law, v. 46, p. 9-16, 2003.
22
fortalecido dessa tragédia, como já foi o caso após outras grandes catástrofes
que abalaram a humanidade.
20 CARTA DAS NAÇÕES UNIDAS, 26 jun. 1945, Decreto n. 19.841, de 22 out. 1945.
21 Ibid., Art. 51 da Carta da ONU.
22 Ibid., Art. 39 da Carta da ONU.
23 ICJ, Armed Activities on the Territory of the Congo (Dem. Rep. of the Congo v. Uganda), Julgamento, 19
dez. 2005, § 148; BRIERLY, James L. The Law of Nations. 6. ed. Oxford: OUP, 1963. p. 413.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 23
outro Estado em contrariedade à Carta da ONU – mundo esse que precisa ser
distinguido do “ser”, do mundo dos fatos24. Embora seja também importante
anotar que a falta de aplicação de uma norma convencional pode afetar a sua
validade, absolutamente nada indica que tal desuetude25 aconteceu com a proi-
bição de usar força. Pelo contrário, a grande maioria dos Estados age em plena
consonância com ela e está disposto a tratá-la, junto com a grande maioria dos
doutrinadores do direito internacional, como ius cogens26.
As debilidades do Conselho de Segurança – órgão ao qual foi transferido
a “principal responsabilidade na manutenção da paz e segurança internacio-
nais”27 – são comumente atribuídas ao poder de veto dos seus cinco Estados
permanentes: China, EUA, França, Grã-Bretanha e Rússia. Critica-se “blo-
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
24 Ver ZIPELLIUS, Reinhold. Juristische Methodenlehre. 10. Aufl. München: C.H. Beck, 2006. p. 2.
25 KOHEN, Marcelo G. Desuetude and Obsolescence of Treaties. In: CANNIZARRO, Enzo (ed.), The Law of
Treaties Beyong the Vienna Convention. Oxford/New York: OUP, p. 350-359, 2011.
26 Compare HELMERSON, Sondre T. The Prohibition of the Use of Force: Explaining Apparent Derogations.
Netherland International Law Review, v. 64, n. 2, p. 164-193, 2014.
27 CARTA DAS NAÇÕES UNIDAS. Op cit. (nota 20), Art. 24 (1).
28 Ibid., Art. 2º (2).
29 WILCOX, Francis O. The Yalta VOTING Formula. The American Political Science Review, v. 39, n. 5,
p. 943-956, 1945.
24
30 Compare, p. ex.: HIRSH, Michael. We are now in a Global Cold War. Foreign Relations, 27 jun. 2022; BELLAMY,
John et al. The United States is Waging a New Cold War: A Socialist Perspective. Studies of Contemporary
Dilemmas, 2022. Disponível em: https://thetricontinental.org/wp-content/uploads/2022/09/20221107_
MR-NCW_EN_Web.pdf. Acesso em 15 dez. 2022.
31 SUY, Eric. Certain Other Perspectives for a Reform of the United Nations Security Council. In: RIETER, Eva;
DE WAELE, Henri (eds.), Evolving Principles of International Law. Studies in Honour of Karel C. Wellens,
p. 91-104, 2012. p. 98.
32 UN GENERAL ASSEMBLY. A/RES/ES-11/1, 2 mar. 2022; A/RES/ES-11/4, 13 out. 2022.
33 Ver U.N. UN General Assembly Votes to Suspend Russia from Human Rights Council. U.N. News, 7 abr.
2022. Disponível em: https://news.un.org/en/story/2022/04/1115782. Acesso em: 15 dez. 2022.
34 UN GENERAL ASSEMBLY, A/77/L.52, 26 Apr. 2022; GA/12417, 26 Apr. 2022.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 25
Uma das citações mais famosas do grande pensador romano Marcus Tullius
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
Cicero (106 – 43 a.c.) é inter armas enim silent leges – entre as armas, as leis
se calam35. Muitas das vezes, esse aforismo é tirado do seu contexto original
e aplicado a cenários bélicos, sugerindo que o autor defendeu tratar guerras
como situações anárquicas em que unicamente vigorasse nada mais do que a
“lei do mais forte”. Não foi bem assim36, mas, com certeza, as terríveis imagens
e impressões da guerra na Ucrânia, que há mais de um ano chamam a nossa
atenção, fizeram com que muitas pessoas acreditassem na completa irrelevância
dos ditames do direito internacional humanitário (DIH), aparentemente incapaz
de pôr algum termo a tanto sofrimento e tanta destruição “sem sentido”.
Entrementes, vale a pena lembrar o fato de que as regras aplicáveis em
tempos de guerra são justamente as mais antigas do direito internacional.
Não somente os romanos, mas diversas outras civilizações da Antiguidade
já reconheciam que guerras têm sim certos limites e, portanto, precisam de
regramento. Assim surgiu, no decorrer de muitos séculos, o chamado ius in
bello – hoje em dia mais apropriadamente denominado como Direito Inter-
nacional dos Conflitos Armados ou DIH37. Embora seja possível criticar, com
muita razão, a idoneidade de algumas das suas regras de lidar adequadamente
com os desafios humanitários postos pelos atuais cenários bélicos, em par-
ticular, cibernéticos38, é preciso ressaltar que “sobreviveu” às duas grandes
guerras da primeira metade do século passado, com ampla aceitação formal.
Houve gravíssimas e terríveis violações desse corpus juris, mas houve também
inúmeros momentos em que foi respeitado, assim confirmando, sobretudo,
35 Tradução livre nossa. CICERO, M.T. Pro Milone. Cambridge/New York: CUP, 2021.
36 KLEINSCHMIDT, Harald. Geschichte des Völkerrechts in Krieg und Frieden. Tübingen: Francke Verlag,
2013, p. 35-37.
37 KOLB, Robert; HYDE, Richard. An Introduction to the International Law of Armed Conflict. Portland: Hart
Publ., 2008, p. 16.
38 Veja para uma análise das operações cibernéticas no contexto da guerra na Ucrânia: ALMEIDA, Marcelynne
A; PETERKE, Sven. Operações cibernéticas como parte da guerra híbrida contra a Ucrânia e sua compa-
tibilidade com a Carta da ONU, nesta publicação.
26
39 Ver para uma visão panorâmica sobre a jurisprudência consolidada: DROEGE, Cordula. Elective Afinities?
Human rights and humanitarian law. International Review of the Red Cross, v. 90 n. 871, p. 501-548, 2009.
p. 507-509.
40 Ver a 1ª CONVENÇÃO DE GENEBRA PARA MELHORIA DA SORTE DOS FERIDOS E ENFERMOS DOS
EXÉRCITOS EM CAMPANHA, de 12 de agosto de 1949, Art. 1º. BRASIL. Decreto 42.121, de 21 de agosto
de 1957. As quatro Convenções de Genebra, de 1949, foram ratificados por todos os Estados do mundo.
CAMERON, Lindsay et al., The updated Commentary on the First Geneva Convention – a new tool for
generating respect for international humanitarian law. International Review of the Red Cross, v. 97, n. 900,
p. 1209-1226, 2015. p. 1211.
41 Ver DE LAURI, Antonio. Humanitarian Diplomacy: A New Research Agenda, CMI Brief, n. 4, p. 1-4, 2018;
SLIM, Hugo. Humanitarian Diplomacy: The ICRC’s Neutral and Impartial Advocacy in Armed Conflicts. Ethics
& International Affairs, v. 33, n. 1, p. 67-77, 2019.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 27
espera, após um fair trial que costuma demorar. Precisamos daquele olhar dife-
renciado exigido pelo direito (penal) e garantido por uma justiça independente
e imparcial. Por enquanto, o sistema internacional de justiça criminal ainda
enfrenta muitas resistências, que, de certa forma, fazem parte da sua própria
lógica de tentar enfrentar a chamada “macrocriminalidade”52. Seu sucesso
dependerá de uma série de fatores, inclusive a insistência da sociedade civil
internacional no seu efetivo reconhecimento como elemento-chave de uma
ordem “social e internacional em que os direitos e liberdades estabelecidos
na presente Declaração possam ser plenamente realizados”53.
4. Considerações finais
internacionais – uma agressão contra um Estado soberano que, por isso, tem
o direito a se defender militarmente junto como outros Estados, inclusive os
da OTAN. O resultado é uma guerra com potencial de se espalhar e que abala
profundamente o sistema internacional. Por isso, no mundo inteiro, gera dúvidas
acerca da validade do direito internacional, da sua força de se opor às diversas
injustiças observáveis no atual contexto bélico. Ao ver de alguns, contém “letras
mortas” na triste praxe dos Estados mais poderosos.
Todavia, foi possível demonstrar que tal percepção seria inadequada
e, sobretudo, precoce. Como outras ordens jurídicas, o direito internacional
sempre passou e vai passar por outras crises causadas por violações graves
e sistemáticas das suas regras fundamentais. Que essas normas são, na sua
grande maioria, certas e necessárias, porém, ninguém duvida. Pelo contrário,
1. Introdução
1 ROTARU, Vasile; TRONCOTA, Miruna (eds.). Russia and the Former Soviet Space: Instrumentalizing Security,
Legitimizing Intervention. Cambridge: Cambridge Scholars Publ., 2017, p. viii.
2 Veja, referente às implicações para a segurança internacional pelo descumprimento parcial das garantias de
dezembro de 1994 pelos três Estados depositários: BUDJIERYN, Mariana. The Breach: Ukraine’s Territorial
Integrity and the Budapest Memorandum. NPIHP Issues Brief, n. 3, 2014; UMLAND, Andreas. The Ukraine
Example: Nuclear Disarmament Doesn’t Pay. World Affairs 178, n. 4, p. 45-49, 2016; BUDIERYN, Mariana;
32
UMLAND, Andreas. Amerikanische Russlandpolitik, die Souveränität der Ukraine und der Atomwaffens-
perrvertrag: Ein Dreiecksverhältnis mit weitreichenden Konsequenzen. Sirius: Zeitschrift für Strategische
Analysen 1, n. 2, p. 133-142, 2017.
3 Veja, p. ex.: UN GENERAL ASSEMBLY, A/RES/68/262 (2014), intitulado “Integridade territorial da Ucrânia”.
Disponível em: https://www.un.org/en/ga/search/view_doc.asp?symbol=A/RES/68/262. Acesso em: 23 abr.
2023; PARLIAMENTARY ASSEMBLY OF THE COUNCIL OF EUROPE. Resolution 1990/2014, “Reconside-
ration on Substantive Grounds of the Previously Ratified Credentials of the Russian Delegation”; Resolution
2132/16, “Political Consequences of the Russian Aggression in Ukraine”; Resolution 2198/2018, “Humanitarian
Consequences of the War in Ukraine; PARLIAMENTARY ASSEMBLY OF THE OSCE. Resolution “On Clear,
Gross and Uncorrected Violations of Helsinki Principles by the Russian Federation”, 28 jun./2 jul. 2014;
Resolution “On the Continuation of Clear, Gross and Uncorrected Violations of OSCE Commitments and
International Norms by the Russian Federation”, 5-9 jul. 2015; EUROPEAN PARLIAMENT. Resolution on the
Invasion of Ukraine by Russia, Eur. Parl. Doc. 2014/2627(RSP), 13 mar. 2014; NATO. North Atlantic Council
Statement on the Situation in Ukraine. Press Release, 2 mar. 2014; Joint Statement of the NATO-Ukraine
Commission, Press Release, 13 maio 2015; etc.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 33
4 THE KREMLIN. Address by President of Russian Federation. President of Russia, 18 mar. 2014. Disponível
em: http://en.kremlin.ru/events/president/news/20603. Acesso em: 29 abr. 2023.
5 HUGHES, James; SASSE, Gwendoly. Power ideas and Conflict: Ideology, Linkage and Leverage in Crimeia
and Chechnya. East European Politics, v. 32, n. 3, p. 314-334, 2016. p. 317.
6 P. ex.: DELAHUNTY, Robert J. The Crimean Crisis. University of St. Thomas Journal of Law and Public
Policy, v. 9, n. 1, p. 125-187, 2014; FABRY, Mikulas. How to Uphold the Territorial Integrity of Ukraine.
German Law Journal, v. 16, n. 3, p. 415-33, 2015; GRANT, Thomas D. Aggression Against Ukraine: Ter-
ritory, Responsibility, and International Law. New York, NY: Palgrave Macmillan, 2015; GRANT, Thomas
D. International Dispute Settlement in Response to an Unlawful Seizure of Territory: Three Mechanisms.
Chicago Journal of International Law, v. 16, n. 1, p. 1-42, 2015; PETERS, Anne. Sense and Nonsense
of Territorial Referendum in Ukraine, and Why the 16 March Referendum in Crimea Does Not Justify
Crimea’s Alteration of Territorial Status under International Law. EJIL: Talk! 16 abr. 2014. Disponível em:
https://www.ejiltalk.org/sense-and-nonsense-of-territorial-referendums-in-ukraine-and-why-the-16-mar-
ch-referendum-in-crimea-does-not-justify-crimeas-alteration-of-territorial-status-under-international-law/.
34
7 Veja, p. ex., a famosa declaração de Putin que a queda da União Soviética seria a “maior catástrofe geopo-
lítica” do séc. XX: “Putin Deplores Collapse of USS”, BBC News, 25 abr. 2005. Disponível em: http://news.
bbc.co.uk/2/hi/4480745.stm. Acesso em: 20 jun. 2020.
8 Brzezinski, Zbigniew. The Premature Partnership. Foreign Affairs, v. 73, n. 2, p. 67-82, 1994. p. 80.
9 Lukyanov, Fyodor. Putin’s Foreign Policy: The Quest to Restore Russia’s Rightful Place. Foreign Affairs, v.
95, n. 3, p. 30-37, 2016. p. 33–34.
10 Yekelchyk, Serhy. The Conflict in Ukraine: What Everyone Needs to Know. Oxford: Oxford University Press,
2015, p. 127. Sobre o papel de Sevastopol na memória coletiva russa, veja Plokhy, Serhii. The City of Glory:
Sevastopol in Russian Historical Mythology. Journal of Contemporary History, v. 35, n. 3, p. 369-383, 2000.
36
11 O termo refere-se aos sentimentos nacionais da Rússia e às narrativas históricas que impactam na
política russa no “exterior próximo; veja WOOD, Elizabeth A. Introduction. In: WOOD, Elizabeth A. et
al. (eds.), Roots of Russia’s War in Ukraine. Washington, DC: Wood Wilson Center Press, 2016, p. 3;
LARUELLE, Marlene. The ‘Russian World:’ Russia’s Soft Power and Geopolitical Imagination. Centre
on Global Interest, 21 maio 2015, p. 1.
12 Cf. WOOD, Ibid., p. 3.
13 Para uma visão panorâmica sobre a história da Crimeia veja Yekelchyk, op. cit. (nota 10), p. 120-22.
14 Ibid., p. 119.
15 Stenogramma zasedaniia Prezidiuma Verkhovnogo Soveta SSSR, 19 fev. 1954.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 37
16 Kul’chyts’kyi, Stanislav. Try Pereiaslavy. Dzerkalo tyzhnia, n. 33, p, 408, 31 ago./6 set. 2002.
17 HUGES; SASSE. Op. cit. (nota 5), p. 318.
38
18 Kuzio, Taras. Ukraine under Kuchma: Political Reform, Economic Transformation and Security Policy in
Independent Ukraine. New York, NY: Palgrave Macmillan, 1997, p. 67.
19 Postanovlenie Verkhovnogo Soveta RF n. 2809-1. O pravovoi otsenke reshenii vysshikh organov gosudars-
tvennoi vlasti RSFSR po izmeneniiu statusa Kryma, priniatykh v 1954 godu, 21 maio 1992.
20 Postanova Verkhovnoi Rady Ukrainy n. 2397-XII. Pro Postanovu Verkhovnoi Rady Rosiis’koi Federatsii
‘Pro pravovu otsinku rishen’ vyshchykh orhaniv derzhavnoi vlady RSFSR shchodo zminy statusu Krymu,
pryiniatykh u 1954 rotsi. 2 jun. 1992.
21 Postanovlenie Verkhovnogo Soveta RF no 53559-I. O statuse goroda Sevastopolia. 9 jul. 1993.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 39
22 Postanova Verkhovnoi Rady Ukrainy n. 3378-XII. Pro postanovu Verkhovnoi Rady Rosiis’koi Federatsii ‘Pro
status mista Sevastopolia. 14 jul. 1993.
23 UN SECURITY COUNCIL. Complaint by Ukraine regarding the Decree of the Supreme Soviet of the Russian
Federation concerning Sevastopol. Repertoire of the Practice of the Security Council 1993-1995, p. 957–59.
Disponível em: https://www.un.org/en/sc/repertoire/93-95/Chapter%208/EUROPE/93-95_8-22-UKRAINE.
pdf. Acesso em: 29 abr. 2023.
24 Ibid., p. 959.
25 Helsinki Act (1975), Part 1(a) (Declaration on Principles Guiding Relations between Participating States);
Principle III (Inviolability of Frontiers); Principle IV (Territorial Integrity of States).
40
nos anos 50, havia motivos objetivos subjacentes à mesma. Estas razões foram
expostas de maneira clara por Mikhail Tarasov, então presidente do Presidium
do Soviete Supremo da Rússia Soviética, em discurso proferido no dia 19 de
fevereiro de 1954, perante o Presidium do Soviete Supremo da URSS:
45 Zakon SSSR “O peredache Krymskoi oblasti iz sostava Rossiiskoi Sovetskoi Federativnoi Sotsialisticheskoi
Respubliki v sostav Ukrainskoi Sovetskoi Sotsialisticheskoi Respubliki”, 26 abr. 1954. In: VEDOMOSTI
VERKHOVNOGO SOVETA SSSR 10 (1954), art. 211.
46 Zakon RSFSR “O vnesenii izmenenii v stat’iu 14 Konstitutsii (Osnovnogo Zakona) RSFSR”, 2 jun. 1954.
47 Konstitutsiia (Osnovnoi Zakon) RSFS. In: KONSTITUTSIIA (OSNOVNOI ZAKON) SOIUZA SOVETSKIKH
SOTSIALISTICHESKIKH RESPUBLIK. Konstitutsii (Osnovnye Zakony) Soiuznykh Sovetskikh Sotsialisti-
cheskikh Respublik. Moskva: Iuridicheskaia literatura, 1978, p. 55-82.
48 Konstitutsiia (Osnovnoi Zakon) USSR. In: KAMENAN, Z. K. (ed.). Sbornik zakonov Ukrainskoi Sovetskoi
Sotsialisticheskoi Respubliki i ukazov Prezidiuma Verkhovnogo Soveta Ukrainskoi Sovetskoi Sotsialisticheskoi
Respubliki: 1938-1979, v. 2. Kyiv: Politizdat Ukrainy, 1980, p. 3-29.
46
49 Zakon SSSR “Ob obrazovanii Soiuznoi Moldavskoi Sovetskoi Sotsialisticheskoi Respubliki,” 2 ago. 1940. In:
SBORNIK ZAKONOV SSSR I UKAZOV.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 47
VERKHOVNOGO SOVETA SSSR 48 (1965), art. 691; Ukaz Prezidiuma Verkhovnogo Soveta SSSR “O
chastichnom izmenenii granitsy mezhdu Uzbekskoi Sovetskoi Sotsialisticheskoi Respublikoi i Kazakhskoi
Sovetskoi Sotsialisticheskoi Respublikoi”, 28 jun. 1971. In: Vedomosti Verkhovnogo Soveta SSSR 28 (1971),
art. 283; Ukaz Prezidiuma Verkhovnogo Soveta SSSR “O chastichnom izmenenii granitsy mezhdu Uzbekskoi
Sovetskoi Sotsialisticheskoi Respublikoi i Kirgizskoi Sovetskoi Sotsialisticheskoi Respublikoi”, 28 jan. 1972.
In: Vedomosti Verkhovnogo Soveta SSSR 5 (1972), art. 38; Ukaz Prezidiuma Verkhovnogo Soveta SSSR
“O chastichnom izmenenii granitsy mezhdu Tadzhikskoi Sovetskoi Sotsialisticheskoi Respublikoi i Uzbekskoi
Sovetskoi Sotsialisticheskoi Respublikoi”, 25 fev. 1972; etc.
55 Presidium of the Supreme Soviet of the USSR: Ordinance “On the transfer of the Klukhori Region of the
Georgian Soviet Socialist Republic to the Russian Soviet Federative Socialist Republic,” 14 mar. 1955.
56 Ordinance of the Presidium of the Supreme Soviet of the USSR “On the partial change of the border between
the Kazakh Soviet Socialist Republic and the Russian Soviet Federative Socialist Republic”, 20 abr. 1956.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 49
58 Cf.: Ukaz Prezidiuma Verkhovnogo Soveta RSFSR “O vydelenii goroda Sevastopolia v samostoiatel’nyi
administrativno-khoziaistvennyi tsentr”, 29 out. 1948. O documento estabelece que a cidade de Sebastopol
deve ser “dado o status de centro administrativo e econômico independente, com orçamento próprio e que
lhe seja atribuída a categoria de cidade com subordinação à república”.
59 FEDOROV, A. B. Fedorov, Pravovoi status Kryma. Pravovoi status Sevastopolia. Moscow: Izdatel’stvo
MGU, 1999.
60 Zakon RSFSR “O vnesenii izmenenii v stat’i 14 i 31 Konstitutsii (Osnovnogo Zakona) RSFSR”, 30 jan. 1958.
61 Zakon RSFSR “O vnesenii izmenenii v stat’i 14 i 31 Konstitutsii (Osnovnogo Zakona) RSFSR”, 27 dec. 1958.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 51
62 Kopylenko, O. Krym iak nevid’iemna skladova chastyna Ukrainy: pravovi aspekty. In: KRYM V ISTORYCHNYKH
REALIIAKH UKRAINY: Materialy naukovoi konferentsii do 50-richchia vkhodzhennia Krymu do skladu URSR.
Kyiv: Instytut istorii Ukrainy NAN Ukrainy, 2004, p. 16.
52
6. Conclusões
PARTE 1
DEBATES SOB A ÓTICA DO DIREITO
INTERNACIONAL DA MANUTENÇÃO
DA PAZ E SEGURANÇA
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
3. A LEGALIDADE DA
“OPERAÇÃO MILITAR ESPECIAL”
DA RÚSSIA NA UCRÂNIA
Ielbo Marcus Lobo de Souza
1. Introdução
da ONU, cf. International Law Commission, Yearbook of the International Law Commission, 1966-II, p. 247;
REPORT ON THE WORK OF THE SEVENTY-FIRST SESSION (2019), UN Doc A/74/10, p. 146-147, 205;
YEARBOOK OF THE INTERNATIONAL LAW COMMISSION, 2001, v. II, Part Two, Draft articles on Respon-
sibility of States for Internationally Wrongful Acts, with commentaries (2001), p. 85.
11 CHARTER OF THE UNITED NATIONS, 26 jun. 1945, 1 UNTS 16, art. 1 (1).
12 Veja LOBO DE SOUZA, I. M. A Segurança Coletiva da Humanidade: uma análise jurídico-institucional do
sistema de segurança coletiva da ONU. Campinas: Unicamp, 2021, p. 286-313.
60
26 ARMS CONTROL ASSOCIATION. Russia, U.S., NATO Security Proposals. ACA, mar. 2022. Disponível em:
https://www.armscontrol.org/act/2022-03/news/russia-us-nato-security-proposals. Acesso em: 11 set. 2022.
27 Presidente da Ucrânia, Representação oficial na web. Decreto Presidencial nº 117/2021 – A respeito da
decisão do Conselho Nacional de Segurança e Defesa da Ucrânia de 11 de março de 2021 “Acerca da
estratégia de desocupação e reintegração do território temporariamente ocupado da República Autônoma
da Crimeia e da cidade de Sevastopol” (tradução livre). 24 mar. 2021. Disponível em: https://www.president.
gov.ua/documents/1172021-37533. Acesso em: 12 set. 2022.
28 Presidente da Ucrânia, Representação oficial na web. Speech by the President of Ukraine at the 58th Munich
Security Conference. 19 fev. 2022. Disponível em: https://www.president.gov.ua/en/news/vistup-prezidenta-
-ukrayini-na-58-j-myunhenskij-konferenciyi-72997. Acesso em: 15 set. 2022.
29 BROWNLIE, Ian. The use of force in self-defence. The British Year Book of International Law, v. 37, p. 183-
268, 1961. p. 227, 266-267; CANÇADO TRINDADE, A.A. International law for humankind: Towards a new
jus gentium. The Netherlands: Martinus Nijhoff, 2010, p. 94-96; HAMID, Abdul Ghafur. The Legality of
64
Anticipatory Self-Defence in the 21st Century World Order: a re-appraisal. Netherlands International Law
Review, v. 54(3), p. 441-490, 2007.
30 BOWETT, D. Self-Defence in International Law. Manchester: University of Manchester Press 1958, p. 184-199;
BOWETT, D. Review of International Law and the Use of Force by States. International and Comparative
Law Quarterly, v. 18, p. 1107-1108, 1964. p. 1107.
31 WALDOCK, H., op. cit., p. 497-498.
32 TAFT IV, W. H.; BUCHWALD, T. F. Preemption, Iraq, and international law. The American Journal of Interna-
tional Law, v. 97, n. 3, p. 557-563, 2003; Attorney General’s Advice on the Iraq War Iraq: Resolution 1441.
The International and Comparative Law Quarterly, v. 54, n. 3, p. 767-778, 2005.
33 Secretary-General. In larger freedom: towards development, security and human rights for all. UN GENERAL
ASSEMBLY, A/59/2005, § 124.
34 Veja, no mesmo sentido, o Relatório do Painel das Nações Unidas sobre Ameaças e Riscos: “No entanto,
um Estado ameaçado, de acordo com o direito internacional há muito estabelecido, pode tomar medidas
militares desde que o ataque ameaçado seja iminente, que nenhum outro meio o afaste e que a ação seja
proporcional”. Cf. High-level Panel on Threats, Challenges and Change. A more secure world: our shared
responsibility. UN GENERAL ASSEMBLY A/59/565, § 188.
35 LUBELL, Noam. The Problem of Imminence in an Uncertain World. In: WELLER, Marc (ed.), The Oxford
Handbook of the Use of Force in International Law. Oxford: Oxford University Press, 2015, p. 718.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 65
dos Estados que amparariam a tese de uma intervenção armada de caráter huma-
nitário, mesmo na ausência de autorização do Estado que sofre a intervenção,
para o fim de resgatar os nacionais38. Contudo, o Estado russo não parece haver
invocado oficialmente este fundamento legal. Waldock oferece três critérios
que deveriam ser cumulativamente observados para uma intervenção armada
no exterior em favor de seus nacionais estar de acordo com a Carta da ONU: a)
deve haver uma ameaça iminente de dano aos nacionais; b) o Estado que sofrerá
a intervenção deve ter falhado em protegê-los ou ser incapaz de protegê-los;
e c) as medidas de proteção devem estar confinadas ao objeto de proteger os
nacionais contra danos39. O Relatório do Special Rapporteur sobre Proteção
Diplomática, da Comissão de Direito Internacional, fez um estudo da doutrina
e da prática dos Estados para, ao fim, aduzir os seguintes requisitos para o exer-
Com efeito, no dia 21 de fevereiro, portanto, três dias antes do início da OME,
a Rússia reconheceu a independência das duas Repúblicas de Donbass e fir-
mou, com cada qual, um tratado bilateral de amizade e assistência mútua44.
Em ambos os tratados, há uma cláusula comum que estabelece a assistência
militar em caso de agressão externa, nos seguintes termos:
ser atendidas para que haja um exercício legítimo do direito de defesa coletiva.
Suscintamente, deve o Estado favorecido denunciar um ataque armado sofrido
e solicitar a assistência de outros Estados, evitando-se, assim, que terceiros
intervenham na situação sob um falso pretexto de direito de defesa coletiva47.
O reconhecimento, por resolução do Conselho de Segurança, do direito de
defesa coletiva em determinada situação de conflito armado, constituiria um
forte embasamento da legalidade das medidas militares tomadas em favor do
Estado vítima, colocando os Estados intervenientes em harmonia com o sistema
de segurança coletiva. Esta hipótese, contudo, não se verificou no caso sob
exame, nem se configurou o caso de medidas coletivas com base no Capítulo
VII da Carta48. Por outro lado, se entre o Estado que se diz vítima de um ataque
armado e o Estado que intervém em seu favor há um tratado que expressamente
52 ICJ, Case concerning rights of nationals of the United States of America in Morocco. Julgamento, 27 ago.
1952, p. 183-188.
53 CASESSE, Antonio. International Law. Oxford: Oxford University Press, 2005, p. 73-76; LAUTERPACHT,
Hersch. Recognition in International Law. Cambridge: Cambridge University Press, 1947, p. 55-66; BIER-
ZANECK, Remigiusz. La non-reconnaissance et le droit international contemporain. Annuaire Français de
Droit International, v. 8, p. 117-137, 1962, p. 124.
54 CADOUX, Charles; RANJEVA, Raymond. Droit International Public. Paris: EDICEF, 1992, p. 91-93.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 71
4. Conclusão
89 GROSS, E. As Nações Unidas: Estrutura da paz. Rio de Janeiro: GRD, 1964, p. 20.
4. OS PODERES DA CORTE
INTERNACIONAL DE JUSTIÇA NA
EMISSÃO DE MEDIDAS CAUTELARES
NO CASO DE ALEGAÇÕES DE
GENOCÍDIO ENTRE UCRÂNIA
E FEDERAÇÃO RUSSA
Lucas Carlos Lima
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
1. Introdução
1 Há alguma discussão sobre a melhor tradução da expressão em inglês “provisional measures” ou em francês
“mesures conservatoires” à língua portuguesa. A expressão “medidas provisórias”, presente na tradução
oficial da Carta da ONU à legislação brasileira (Decreto nº 19.841, de 22 de outubro de 1945) associar-se-ia
às normas exaradas pelo Poder Executivo brasileiro, gerando potencial equívoco com a função. Optou-se
pela opção “medidas cautelares” a fim de aproximar a expressão às figuras processuais brasileiras, dada a
função do instituto no interior do regramento processual da Corte Internacional de Justiça.
80
6 THIRLWAY, Hugh. Peace, Justice and Provisional Measures. In: GAJA, Giorgio; STOUTENBURG, Jenny.
(eds.). Enhancing the Rule of Law through the International Court of Justice. Leiden: Brill, 2014, p. 75-86. Ver
também: AKANDE, Dapo. The role of the International Court of Justice in the Maintenance of International
Peace. African Journal of International and Comparative Law, v. 8, 1996, p. 592.
7 GAJA, Giorgio. Preventing Conflicts between the Court’s Orders on Provisional Measures and Security
Council Resolutions. In: GAJA, G.; STOUTENBURG, J. (eds.). op. cit., p. 87-92.
8 CORTE INTERNACIONAL DE JUSTIÇA. Document (with annexes) from the Russian Federation setting out
its position regarding the alleged “lack of jurisdiction” of the Court in the case, 7 mar. 2022.
82
Embora a ausência de uma das partes não seja um óbice para a con-
tinuidade do procedimento, a Presidente da Corte, a estadounidense Joan
Donoghue, fez questão de ressaltar o prejuízo desta estratégia processual
para a boa administração da justiça e para a condução bilateral do litígio, na
medida em que a arguição de uma das partes restou bastante prejudicada. Essa
indicação da presidente é relevante e particularmente rara. Não porque o não
aparecimento perante a Corte Internacional de Justiça não esteja já bem esta-
belecido na jurisprudência da Corte9. No caso concreto, ele poderia ter sido
particularmente útil diante da gravidade, urgência e no estabelecimento das
medidas. A manifestação escrita russa, essencialmente contestando a jurisdição
e repisando os argumentos jurídicos oferecidos pelo Kremlin, deixou de se
pronunciar sobre outros pontos importantes da decisão que a Corte teria se
3. A decisão da corte
16 PETERS, Anne. Intervention by Invitation: Impulses from the Max Planck Trialogues on the Law of Peace
and War. Zeitschrift für ausländisches öffentliches Recht und Völkerrecht, v. 79, p. 639-641, 2017. Ver
também: VISSER, Laura. May the Force be With You: The Legal Classification of Intervention by Invitation.
Netherlands International Law Review, v. 66, p. 21-65, 2019.
17 VISSER, Laura. Intervention by Invitation and Collective Self-Defence: Two Sides of the Same Coin? Journal
on the Use of Force and International Law, v. 7, p. 292-316, 2020.
18 ASSEMBLEIA GERAL DAS NAÇÕES UNIDAS. Resolução A/ES-11/L.1, Aggression against Ukraine, 1
mar. 2022.
19 CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU. Resolução S/RES/301, 20 out. 1971; CONSELHO DE SEGURANÇA
DA ONU. Resolução S/RES/476, 30 jun. 1980; CONSELHO DE SEGURANÇA DA ONU. Resolução 662. S/
RES/662, 9 ago. 1990.
20 Ver, nesse sentido: GREEN, James; HENDERSON, Christian; RUYS, Tom. Russia’s attack on Ukraine and
the jus ad bellum. Journal on the Use of Force and International Law, v. 9, n.1, p. 4-30, 2022.
86
Jurisprudence of the International Court of Justice. The British Yearbook of International Law, 2018 e KOLB,
Robert. Digging Deeper into the “Plausibility of Rights” Criterion in the Provisional Measures Jurisprudence
of the ICJ. The Law & Practice of International Courts and Tribunals, v. 19, n. 2, p. 365-387, 2020.
30 LANDO, Massimo. Plausibility in the Provisional Measures Jurisprudence of the International Court of Justice.
Leiden Journal of International Law, v. 31, n. 1, p. 641-668, 2018. p. 651.
31 Ibid., p. 650.
32 BECKER, M. Op. cit. (nota 33), p. 9.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 89
Ainda assim, a Corte optou por ultrapassar o pedido ucraniano, não conec-
tando a suspensão das atividades militares às alegações de genocídio. Trata-se
de uma postura notadamente ousada se comparada com aquela adotada pela
Corte de 2019, a qual estipulou medidas provisionais mais tímidas do que
aquelas requeridas pela Gâmbia41.
As razões pelas quais a Corte elegeu esta postura são bastante evidentes.
Um comportamento mais hesitante bastaria à Rússia para esta levar adiante sua
estratégia de alegar a legalidade do uso da força sem conexão com a Convenção
do Genocídio (o que apareceu em sua manifestação, mas também na curiosa
declaração do Presidium do Ramo Russo da International Law Association) sob
risco de frustrar a disputa42. A estratégia da Corte de conceder medidas mais
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
5. Desafios do mérito
6. Conclusões
1. Introdução
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
1 REIS, Bruno Cardoso. Da invasão de Putin à uma revolução estratégica. IDN Brief, n. 40 (18 mar. 2022). Dis-
ponível em: https://www.idn.gov.pt/pt/publicacoes/idnbrief/Documents/2022/IDN_brief_mar%C3%A7o_2022.
pdf. Acesso em: 25 abr. 2023.
96
Por força do artigo 24, § 1º, da Carta da ONU, os quase duzentos Esta-
dos-membros da organização mundial “conferem ao Conselho de Segurança
a principal responsabilidade na manutenção da paz e da segurança interna-
2 Não obstante, ressalva-se a importante atuação do Secretário-Geral e da Corte Internacional de Justiça como
outros órgãos principais da ONU, cuja análise, porém, ultrapassaria o escopo limitado do presente capítulo.
3 Todavia, é às vezes difícil distinguir essas decisões das medidas não vinculantes aprovadas pelo Conselho. Veja
para detalhes: HIGGINS, Rosalyn. The Advisory Opinion on Namibia: Which UN Resolutions Are Binding under
Article 25 of the Charter? International and Comparative Law Quarterly, v. 21, n. 2, p. 270-286, 1972.
4 Art. 23 (1) da Carta da ONU.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 97
5 Art. 51 da Carta da ONU: “Nada na presente Carta prejudicará o direito inerente de legítima defesa indivi-
dual ou coletiva, no caso de ocorrer um ataque armado contra um Membro das Nações Unidas, até que o
Conselho de Segurança tenha tomado as medidas necessárias para a manutenção da paz e da segurança
internacionais [...]”.
6 TRAHAN, Jennifer. Existing Legal Limits to Security Council Veto Power in the Face of Atrocity Crimes. New
York: Cambridge University Press, 2020, p. 20.
7 Art. 23 da Carta da ONU.
8 Informação disponível em: https://www.un.org/securitycouncil/content/current-members. Acesso em: 23
abr. 2023.
98
Enfim, outra medida aprovada pelo CS ainda antes do início das “ope-
rações especiais” na Ucrânia, em fevereiro de 2022, se referiu ao Protocolo
de Minsk II, de 12 de fevereiro de 2015, acordo negociado entre a Rússia e
a Ucrânia sob os auspícios da OSCE, para pôr um fim à guerra no leste da
Ucrânia. Incluiu medidas como cessar-fogo, a retirada de efetivos e equipa-
mentos militares das linhas de frente, libertação de prisioneiros de guerra,
além da concessão de autonomia para certos distritos das regiões de Donetsk
e Lugansk que passariam ao controle do governo de Kiev. O CS aprovou o
Protocolo mediante a Resolução 2022, de 17 de fevereiro de 201515, para
assim fortalecer o processo da sua implementação.
Todavia, a partir de março de 2021, por motivos analisados em outros
capítulos dessa publicação, a Rússia mobilizou um grande contingente militar
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
21 Security Council vote sets up emergency UN General Assembly session on Ukraine crisis, UN News, 27 fev.
2022. Disponível em: https://news.un.org/en/story/2022/02/1112842. Acesso em: 14 out. 2022.
22 BLANCHDIED, Luisa; WEED, Matthew C. United Nations Security Council and General Assembly Responses
to the Russian Invasion of Ukraine. CRS Insight, 7 mar. 2022.
23 UN GENERAL ASSEMBLY. Resolution 377 (A) C, 2 nov. 1950.
24 NAÇÕES UNIDAS. Conselho de Segurança aprova reunião emergencial na Assembleia Geral sobre a Ucrânia.
ONU News, 27 fev. 2022. Disponível em: https://news.un.org/pt/story/2022/02/1781082#:~:text=Foram%20
11%20pa%C3%ADses%20que%20votaram,%C3%8Dndia%20e%20Emirados%20%C3%81rabes%20
Unidos. Acesso em: 23 abr. 2023.
25 UN SECURITY COUNCIL, S/PRST/2022/3, 6 maio 2022.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 101
30 SHAW, Malcolm N. Direito Internacional. São Paulo: Martins Fontes, 2010, p. 911.
31 RAMSDEN, Michael. International Justice in the United Nations General Assembly. Cheltenham, Reino
Unido: Edward Elgar Publ., 2021, p. 66.
32 Veja a análise no capítulo 4 dessa publicação de: LIMA, Lucas Carlos. Os Poderes da Corte Internacional
de Justiça na Emissão de Medidas Cautelares no Caso de Alegações de Genocídio entre Ucrânia e Fede-
ração Russa.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 103
Isto porque, diante do fato que a expressiva abstenção ocorrida na dita votação
(a abstenção de 58 Estados-membros) foi o que possibilitou o resultado de
maioria por 2/3, quantitativo necessário a aprovação, ao passo que na ocasião
somente 24 Estados-membros foram contrários à suspensão35.
Como acima mencionado, a atuação da AG se iniciou já em 28 de feve-
reiro de 2022, quando o CS solicitou uma sessão de emergência neste órgão
para tratar da invasão da Rússia, já que não conseguiu tratar deste assunto
dentro de sua competência, diante do veto russo como país permanente do
próprio Conselho de Segurança.
Durante essa reunião emergencial, a expectativa era que pudesse ser apro-
vada uma recomendação, por maioria de 2/3 dos membros, “condenando” a
ofensiva militar russa no território ucraniano, o que não aconteceu de imediato.
Embora já sabendo que as resoluções da AG não possuem efeitos externos
vinculantes, a referida normativa seria interessante para ratificar o pensamento
político da grande maioria Estados-Membros, carregando um certo “peso” e
legitimidade na posição defendida por eles.
Ato contínuo, em 2 de março de 2022, a AG finalmente aprovou uma
Resolução intitulada “Agressão contra Ucrânia”36, em afirmar o princípio
fundamental que o direito internacional não tolera a aquisição de território
mediante o uso ilegal de força, apelando à Rússia a se retirar imediatamente
do solo ucraniano. O Brasil foi um dos 141 (cento e quarenta e um) Estados
33 No capítulo 20 de: PETERKE, Sven; DANTAS, João Gabriel Dias Arruda Viera. A Atuação do Conselho de
Direitos Humanos da ONU no Contexto do Conflito Armado na Ucrânia.
34 UNITED NATIONS. UN General Assembly votes to suspend Russia from Human Rights Council. UN News,
7 abr. 2022. Disponível em: https://news.un.org/en/story/2022/04/1115782. Acesso em: 25 abr. 2023.
35 GREEN, Mark A. Only 93 of the Human Rights Council´s 193-member General Assembly Voted to Suspend
Russia. Insight & Analysis, 21 jun. 2022. Disponível em: https://www.wilsoncenter.org/blog-post/only-93-cou-
ntries-human-rights-councils-193-member-general-assembly-voted-suspend-russia#:~:text=In%20the%20
UN%20General%20Assembly,from%20the%20Human%20Rights%20Council. Acesso em: 24 abr. 2023.
36 UN GENERAL ASSEMBLY, A/RES/ES-11/1, 2 mar. 2022.
104
que votaram a favor, contra cinco votos contrários (Belarus, Correia do Norte,
Eritreia, Rússia e Síria) e 35 trinta e cinco abstenções, incluindo China, Índia,
Paquistão e África do Sul37.
Uma segunda e terceira condenação das anexações de territórios ucra-
nianos pela Rússia ocorreram em 12 de outubro38 e 15 de novembro de 2023.
A Resolução ES-11/4 foi até aprovada por 143 Estados, entre eles novamente
o Brasil, contra os mesmo cinco votos39, destarte sublinhando o que consta
na Carta da ONU e representa direito costumeiro: que todo Estado possui um
direito à existência dentro das fronteiras internacionalmente reconhecidas e
que qualquer operação militar servindo para colocar em xeque esse direito
jamais terá reconhecimento pela comunidade internacional.
Já a Resolução ES-11/5 foi muito além do conteúdo do documento apro-
4. Considerações finais
1. Introdução
cabem discutir dois pontos iniciais: (i) a legalidade das sanções e (ii) sua
limitação ou adequação aos direitos humanos.
Assim, no que concerne ao primeiro tópico, afirma-se que as sanções econô-
micas não representam, por si, uma violação ao art. 2.4, da Carta da ONU, pois
este dispositivo veda a aplicação de ameaça ou da força física contra a integridade
territorial ou a dependência política de qualquer Estado. Contudo, esse aspecto
não garante a sua legalidade de modo teórico. Essa prática, de modo doutrinário,
poderia ser caraterizada como contramedidas, as quais podem ser compreendidas
como ações que um Estado lesado é autorizado a implementar como resposta
à ação do Estado responsável pela violação do direito internacional, buscando
reestabelecer a adequação de sua conduta com os deveres internacionais, fazendo
parte do direito costumeiro. No caso, os terceiros Estados promovem as sanções
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
que Estados que não foram afetados pela agressão de outro podem auxi-
liá-lo na defesa de sua soberania e interesses, desde que o Estado agredido
tenha solicitado a cooperação e a tenha feito declaração pública de que foi
atacado28. Esse direito de legítima defesa coletiva não requer a tomada de
medidas militares contra o Estado agressor, permitindo-se, pois, a aplicação
de sanções de natureza econômica. Nesse sentido, como é cabível a utilização
de sanções com o recurso à força, consequentemente, deflui-se o cabimento
de medidas menos restritivas, como é o caso das sanções econômicas, desde
que proporcionais, a exemplo das aplicadas pelos terceiros Estados, os quais
foram conclamados pelo Estado ucraniano a colaborar com as ações de repri-
mendas ao Estado russo pela agressão.
Por sua vez, quanto à limitação ou adequação aos direitos humanos,
5. Conclusão
1 United States Government Accountability Office. GAO-10-1036R Hybrid Warfare. 10 set. 2010. Disponível
em: https://www.gao.gov/assets/gao-10-1036r.pdf. Acesso em: 9 set. 2022.
2 HOFFMAN, Frank G. Conflict in the 21st Century: the rise of hybrid wars. Arlington: Potomac Institute for
Policy Studies, 2007, p. 28.
124
5 WIENER, Norbert. Cybernetics: or the control and communication in the animal and the machine. Massa-
chusetts: MIT – Massachusetts Institute of Technology, 1948.
6 WIENER, Norbert. Cibernética e Sociedade: o uso humano de seres humanos. Tradução: José Paulo Paes.
2. ed. São Paulo: Cultrix, p. 15-16, 1965.
7 KUEHL, Daniel T. From cyberspace to cyberpower: defining the problem. In: KRAMER, F. D.; STARR, S.
H.; WENTZ, L. K. (eds.). Cyberpower and National Security. Washington: University of Nebraska Press, p.
24-42, 2009, p. 27.
126
13 CONNELL, Michael; VOGLER, Sarah. Russia’s Approach to Cyber Warfare. Center for Naval Analyses
Occasional Paper Series, Arlington, mar. 2017, p. 19. Disponível em: https://www.cna.org/cna_files/pdf/
DOP-2016-U-014231-1Rev.pdf. Acesso em: 16 jan. 2022.
14 European Parliamentary Research Service. Russia’s war on Ukraine: Timeline of cyber-attacks. European
Parliament, jun. 2022. Disponível em: https://www.europarl.europa.eu/RegData/etudes/BRIE/2022/733549/
EPRS_BRI(2022)733549_EN.pdf. Acesso em: 11 nov. 2022.
15 CLAYTON, Mark. Ukraine election narrowly avoided ‘wanton destruction’ from hackers. The Christian Science
Monitor,17 jun. 2014. Disponível em: https://www.csmonitor.com/World/Passcode/2014/0617/Ukraine-elec-
tion-narrowly-avoided-wanton-destruction-from-hackers. Acesso em: 4 set. 2022.
16 CONNELL, M.; VOGLER, S. Op cit (nota 13), p. 20.
17 Ibid., Id.
18 POLITYUK, Pavel. Hackers have infiltrated Ukraine’s power grid – and they could take down other infrastructure
at any time. Business Insider. 27 jan. 2016. Disponível em: https://www.businessinsider.com/r-exclusive-hac-
kers-may-have-wider-access-to-ukrainian-industrial-facilities-2016-1. Acesso em: 10 out. 2022.
128
contra a rede elétrica de outro país não ficaram aquém19, e a alta capacidade de
realizar ataques coordenados e sincronizados para controlar e operar remota-
mente disjuntores e influir sobremaneira em instalações industriais faz ponderar
que, pelo desenvolvimento e precisão, tais malwares bastante complexos não
tenham sido programados por um indivíduo ou organização não estatal20.
Em 2017, o uso de ataques cibernéticos foi intensificado, com o famoso
caso do malware de exclusão de dados NotPetya, que atingiu proporções
mundiais. Tido como um dos piores ciberataques do mundo21, o NotPetya
foi projetado para se propagar automaticamente e, ao infectar computadores,
possuía a capacidade de tornar o sistema inutilizável. Inicialmente, foi lançado
no contexto do conflito entre Rússia e Ucrânia para prejudicar a funcionali-
43 SCHMITT, Michael N (ed.). Tallinn Manual 2.0 on the International Law Applicable to Cyber Operations.
Prepared by the International Group of Experts at the Invitation of the NATO Cooperative Defence Centre
of Excelente. 2. ed. Cambridge University Press, 2017, p. 333-337.
44 Ibid., p. 313; SCHMITT, M.; BILLER, J. Op cit. (nota 25).
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 133
4. Considerações finais
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
com base nos artigos sobre Responsabilidade dos Estados por Atos Internacio-
nalmente Ilícitos59 os especialistas do Manual de Tallinn acordaram que um
Estado pode ser responsabilizado por operações cibernéticas conduzidas por
atores não estatais quando tem efetivo conhecimento das atividades60. Aos
poucos, a comunidade internacional tem avançado nos pormenores de como as
operações cibernéticas não dispensam atenção às normas primárias constantes
na Carta da ONU, sejam essas ameaças híbridas qualificáveis como uso da
força ou não; reflexo disso são os fóruns realizados no escopo das Nações
Unidas61 sobre segurança internacional e uso do ciberespaço, e a inserção de
debates sobre como o direito internacional se aplica ao ciberespaço na agenda
da Organização dos Estados Americanos – OEA62.
1. Primeiro movimento
O presidente ucraniano Volodymyr Zelensky pronunciou um discurso
surpresa durante a noite do Grammy 2022, em abril. Ali, dirigiu um pedido
a uma plateia espantada com a sua inesperada presença: “Em nossa terra,
estamos lutando contra a Rússia, que trouxe um silêncio horrível com suas
bombas. O triste silêncio da morte. Preencham esse silêncio com sua música.
Preencham-no agora. Contem nossas histórias. Digam a todos a verdade sobre
essa guerra [...]. Por favor, apoiem-nos de qualquer maneira possível. De todas
as formas, mas não com o silêncio. Então também haverá paz em todas as
cidades destruídas por esta guerra”1.
A guerra, porém, não é apenas silêncio. A guerra tem um som. E não é
só o rumor de bombas, os gritos, as sirenes antiaéreas, as explosões, o pranto
ou os tiros. Há também os hinos marciais, os clarins, o rufar de tambores, a
cadência da marcha e os cânticos de batalha que animam as tropas e ame-
drontam os inimigos. Essa tem sido a trágica e estrondosa melodia da guerra
há muitos séculos.
Em 2010, o popstar Simon Bikindi, célebre cantor e compositor de
Ruanda, espécie de Michael Jackson local e rosto mais visível do Ministé-
rio da Juventude e Esporte do país africano destruído pela guerra civil, foi
condenado a quinze anos de prisão, por crime contra a humanidade, por um
tribunal das Nações Unidas. O seu delito? Incitar de maneira grave, repetitiva,
2. Segundo movimento
Mas e quanto à paz: a paz tem um som? Esse som seria um ruído ou
poderia ser música? Aliás, pode uma melodia constituir um caminho para
a paz? A música pode ser um instrumento de peacemaking, peacekeeping,
peacebuilding e peace enforcement3?
2 PARKER, James E. K. Acoustic Jurisprudence: Listening to the Trial of Simon Bikindi. Oxford: OUP, 2015.
3 Para uma definição didática desses conceitos, consultar: https://peacekeeping.un.org/en/terminology. Acesso
em: 23 nov. 2022.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 139
3. Terceiro movimento
4 URBAIN, Olivier. Overcoming Challenges to Music’s Role in Peacebuilding. Peace Review: A Journal of
Social Justice. v. 31, n. 3, 2019, p. 334.
140
4. Quarto movimento
Quando um músico executa uma melodia contra a guerra, ele nos permite
enxergar, em primeiro lugar, que a música é uma excelente metáfora para
5 O comunicado foi feito em sua conta no Twitter: shorturl.at/jkNR6. Acesso em: 24 nov. 2022.
6 PHILLIPS, Gerald L. Can There Be “Music For Peace”? International Journal on World Peace. v. 21, n. 2,
June 2004, p. 63-73.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 141
dizer que a música é uma linguagem universal, a cultura musical está for-
temente ligada às tradições locais, à cultura da região e ao sentido de per-
tencimento a uma comunidade. Repartir uma melodia comum ou entoar um
ritmo folclórico reforça o senso de acolhimento, quebra percepções de dissi-
milaridade e cria um sentido de solidariedade e um sentimento de reconcilia-
ção. Uma performance musical, muitas vezes, permite ouvir uma expressiva
convergência de gestos musicais que enfatizam o sentido de fraternidade. O
mesmo sentido de fraternidade presente, por exemplo, no quarto movimento
da 9ª sinfonia de Beethoven, o Hino à Alegria, que sempre nos encanta e
emociona a todos desde as suas notas iniciais.
E por falar em emoção, um terceiro ponto pode ser citado no profundo
e eloquente diálogo entre música e paz. Dado o apelo emocional que as
manifestações musicais apresentam, um concerto demonstra que a música
tem o condão de amplificar ações em favor da paz. Ações que vão desde as
demonstrações antiguerra, passando pelas afirmações da própria humanidade
em meio ao conflito e o apoio à cicatrização dos traumas, até a promoção
do empoderamento da comunidade e a expressão e a valorização de grupos
marginalizados. Nesse quadro, a música pode, sem dúvida, apoiar e reforçar os
processos de peacemaking, peacekeeping, peacebuilding e peace enforcement.
Uma apresentação musical ainda proporciona uma quarta reflexão, agora
sobre a privilegiada conexão entre música e humanidade. Uma peça musical
bem composta e bem executada é uma grande proeza do espírito humano –
tanto quanto uma pintura de Da Vinci ou uma escultura de Nicola Pisano,
por exemplo. Mas, no caso da performance musical, é como se estivésse-
mos sentados precisamente ao lado do grande mestre Nicola Pisano no exato
momento em que ele maneja o martelo e o cinzel para esculpir o majestoso
púlpito do Batistério de Pisa, joia do gótico e uma das pedras angulares da
7 BARENBOIM, Daniel. La Musica è un Tutto. Milano: Feltrinelli, 2018, p. 12. BARENBOIM, Daniel. La Musica
Sveglia il Tempo. Milano: Feltrinelli, 2008, p. 61 e ss.
142
8 Ópera em quatro atos, com música de Giacomo Puccini e libretto de Giuseppe Giacosa e Luigi Illica. Estreou
no Teatro Regio de Turim em 1 de fevereiro de 1896, sob a regência de Arturo Toscanini.
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
PARTE II
DEBATES SOB A ÓTICA DO DIREITO
INTERNACIONAL HUMANITÁRIO
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
9. O DIREITO DA GUERRA
NAVAL NO CONFLITO ENTRE
A UCRÂNIA E RÚSSIA
Victor Alencar Mayer Feitosa Ventura
Eduardo Cavalcanti de Mello Filho
1. Introdução
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
1 HUNDER, M.; BALMFORTH, T. Rússia abandona Ilha da Serpente em vitória estratégica para Ucrânia.
Disponível em: https://noticias.uol.com.br/ultimas-noticias/reuters/2022/06/30/russia-abandona-ilha-da-ser-
pente-em-vitoria-estrategica-para-ucrania.htm. Acesso em: 15 nov. 2022.
2 Essa divisão, no entanto, não é hermética. Em particular, as regras sobre neutralidade marítima e presas
marítimas influenciam diretamente o jus in bello.
146
3 O direito das presas marítimas não está no foco das discussões no que diz respeito ao aspecto naval da
Guerra na Ucrânia. De toda forma, será mencionado durante as duas partes da segunda seção, pois (i) é um
aspecto da conduta das hostilidades e há questões de proteção humanitária e (ii) uma embarcação neutra
que, após visita e inspeção, é razoavelmente suspeita de ter caráter inimigo pode ser apresada.
4 Por exemplo, cf. BRUM, Matheus. EUA já deram US$ 2,4 bilhões em arma e munição à Ucrânia; veja quem
ajudou. Uol Notícias, 19 abr. 2022. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/internacional/ultimas-noti-
cias/2022/04/19/que-paises-ajudam-a-ucrania-contra-a-russia-e-o-que-deram-ate-agora.htm. Acesso em:
15 nov. 2022.
5 Mais especificamente, de acordo com o Artigo 6, analisado na seção 3.2 deste capítulo, da Convenção
sobre os Direitos e Deveres das Potências Neutras na Guerra Naval, de 1907 e de que são partes Rússia,
Estados Unidos, China, França, Alemanha, Noruega, Suécia, Brasil, Holanda, Finlândia, Dinamarca, Bélgica
e, desde 2015, Ucrânia. Convention (XIII) concerning the Rights and Duties of Neutral Powers in Naval War,
18 Oct. 1907, International Peace Conference, The Hague, Official Record (original: French), Art. 6.
6 A violação do Artigo 2 (4) não importa automaticamente num Ato de Agressão. A referência clássica nesta
discussão é a Resolução 3314 (XXIX) da Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU), sobre a “Definição
de Agressão”. Enquanto o Artigo 1 do Anexo à resolução estipula que é ato de agressão qualquer uso de
força armada contrário à Carta — portanto, uma simples violação do Artigo 2 (4) seria um ato de agressão
— o Artigo 2 do Anexo faz a ressalva de que o Conselho de Segurança das Nações Unidas (CSNU) ao
determinar se um ato de agressão foi cometido pode levar em consideração outras circunstâncias relevantes.
Entre estas circunstâncias estão a gravidade do uso de força armada em questão. Ademais, o Artigo 3 lista
casos em que se tem configurado um ato de agressão, incluindo, relevantemente para o aspecto naval da
Guerra da Ucrânia, bloqueio naval e o ataque pelas forças armadas de um contra as frotas navais ou aéreas
de outro. UN GENERAL ASSEMBLY. A/RES/3314 (1974).
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 147
7 Para obras iniciais a respeito desta mudança no direito da neutralidade: DE LA PRADELLE, Paul. L´évolution
de la neutralité. Revue de Droit International, v. 14, p. 197-221, 1934 p. 210; JESSUP, Philipp C. Neutrality:
Its History, Economics and Law, v. 4, Today and Tomorrow. Nova Iorque: Columbia University Press, 1936,
121ss. Para entender as bases do entendimento atual de neutralidade qualificada, cf.: SKUBISZEWESKI,
Krzysztof. Use of Force by States: Collective Security, Law of War and Neutrality. In: SORENSEN, Max (ed.).
Manual of Public International Law. Nova Iorque: St. Martin’s Press, p. 739-843, 1968, p. 840 ss.
8 ZEMANEK, Karl. Was Hugo Grotius Really in Favour of the Freedom of the Seas? Journal of the History
of International Law/Revue d’histoire du droit international, v. 1, n. 1, p. 48-60, 1999, p. 49-52.
9 TUCK, Richard. The Rights of War and Peace: Political Thought and the International Order from Grotius
to Kant. Oxford, New York: Oxford University Press, 1999, p. 81.
10 MARQUES GUEDES, Armando, A Guerra Naval e o Direito. Nação e Defesa, v. 23, p. 68-119, 1982. p. 72.
148
11 A fórmula clássica pode ser encontrada nas Convenções de Genebra de 1949. Cf. Convention for the Ame-
lioration of the Condition of Wounded, Sick and Shipwrecked Members of Armed Forces at Sea (Second
Geneva Convention), Art. 2, 12 ago. 1949, 75 UNTS 85.
12 Autores respeitados compartilham esta opinião. Por exemplo, cf. KRASKA, James. The Kerch Strait Incident:
Law of the Sea or Law of Naval Warfare? EJIL: Talk!, 3 dez. 2018. Disponível em: https://www.ejiltalk.org/
the-kerch-strait-incident-law-of-the-sea-or-law-of-naval-warfare/. Acesso em: 15 nov. 2022; FINK, Martin, The
ever-existing “crisis” of the law of naval warfare, International Review of the Red Cross, v. 104, p. 1971-1988,
2022, p. 1976.
13 Em 2014, a Assembleia Geral das Nações Unidas aprovou uma resolução condenando a anexação da
Crimeia pela Rússia: A/RES/68/26, 27 March 2014. Disponível em: https://documents-dds-ny.un.org/doc/
UNDOC/GEN/N13/455/17/PDF/N1345517.pdf?OpenElement. Acesso em: 20 jan. 2023.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 149
14 ITLOS, Case concerning the detention of three Ukrainian naval vessels (Ukraine v. Russia), Ordem de
Medidas Provisórias, 25 maio 2019, p. 9-10.
15 Esses fatos foram destacados pelo tribunal arbitral a que os pedidos de mérito foram submetidos. PCA,
Dispute concerning the detention of three Ukrainian naval vessels (Ukraine v. Russia), Decisão de objeções
preliminares, 27 jun. 2022, para. 117.
16 UNITED NATIONS CONVENTION ON THE LAW OF THE SEA, 10 dez. 1982, 1833 UNTS 397.
17 MARCOS, Henrique Jerônimo Bezerra; MELLO FILHO, Eduardo Cavalcanti de. Complexidades Jurídicas
Relativas à Execução da Lei e ao Uso da Força no Mar: Uma Análise do Caso Ucrânia v. Rússia no Tribunal
Internacional de Direito do Mar. In: TOLEDO, Andre de Paiva et al. (eds.). Direito do Mar: Reflexões, Ten-
dências e Perspectivas, v. 3. Belo Horizonte: Editora D’Plácido, p. 237-262, 2019, p. 244.
18 Para mais detalhes sobre como o Tribunal tem usado este critério, cf. Id., p. 239-243.
150
O jus in bello no mar é, nos seus termos mais gerais, informado pelo Pro-
tocolo Adicional I e pelo DIC, tal como codificado no Manual de San Remo.
Os Artigos 48 a 67 do Protocolo delineiam princípios gerais do jus in bello,
incluindo o princípio da distinção (Artigo 48); regras sobre ataques indiscrimi-
nados e participação direta nas hostilidades (Artigo 51); a definição de objetivo
militar (Artigo 52(2); e precauções em ataque (Artigo 57). Estes dispositivos
são aplicáveis à guerra naval, mas apenas na medida em que afetam a população
civil ou objetos civis em terra. Ademais, o Artigo 49(3) limita a aplicação de
certos dispositivos a ataques conduzidos da terra ao mar ou vice-versa, excluindo
ataques mar-mar, ar-ar, mar-ar e vice-versa48. O Manual de San Remo através
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
48 Como veremos mais abaixo nesta subseção, no contexto da Guerra da Ucrânia, ataques terra-mar e mar-terra
se tornaram a regra.
49 San Remo MANUAL. Op cit. (nota 44), § 102.
50 Ibid., §§ 103-104.
51 Ibid., §§ 93-95. Este é aspecto interessante do direito da guerra naval. Desde pelo menos Grócio, passando
por Bynkershoek, a extensão do mar territorial era doutrinariamente baseada na “efetividade” imposta pelo
Estado costeiro. Daí a regra da bala de canhão, de forte influência francesa. É apenas no século XIX que se
consolida a ideia de um “direito” a um mar territorial, de três milhas náuticas. A regulação do bloqueio naval
156
60 Ukraine tensions: Russia accused of sea blockade. BBC News, 10 fev. 2022. Disponível em: https://www.
bbc.com/news/world-europe-60340232. Acesso em: 16 nov. 2022.
61 LOTT, Alexander. Russia’s Blockade in the Sea of Azov: A Call for Relief Shipments for Mariupol. EJIL: Talk!,
14 mar. 2022. Disponível em: https://www.ejiltalk.org/russias-blockade-in-the-sea-of-azov-a-call-for-relief-shi-
pments-for-mariupol/. Acesso em: 16 nov. 2022.
158
de passagem de trânsito em estreitos, que por definição não pode ser suspendido
pelo Estado costeiro, continua aplicável em tempos de guerra. No entanto, esta
é potencialmente uma das partes do Manual classificadas como em “desenvol-
vimento progressivo”. Embora a Parte III da CNUDM – “Estreitos Usados para
a Navegação Internacional” – seja considerada DIC, o debate é controverso
em se tratando de tempos de guerra, sobretudo porque a CNUDM entrou em
vigor há menos de 30 anos. Como aponta von Heinegg, a prática dos Estados
após 1945 revela que, quando Estados às bordas de um estreito internacional se
envolveram em conflito armado internacional, eles tenderam a fechá-lo mesmo
para navegação pacífica por parte de países neutros71.
Esta prática, porém, parece em contradição com a decisão da Corte Inter-
nacional de Justiça no caso do Canal de Corfu: a Albânia, em guerra com a
Grécia, poderia emitir regulações a respeito da passagem de navios de guerra
(neutros) pelo estreito, mas não, proibir ou sujeitar a passagem a seu consenti-
mento72. Ainda antes da assinatura da CNUDM, em 1980 no início da Guerra
Irã-Iraque, o Irã reconheceu sua obrigação legal de manter aberto o Estreito
68 Títulos históricos entram no espinhoso debate sobre consolidação histórica e prescrição aquisitiva. A pers-
pectiva mais aceita hoje parece ser aquela que foi adotada pelo UN Study on Historical Waters e pelo
Tribunal Arbitral, no caso do Mar do Sul da China. Segundo tal perspectiva, o título histórico é fundado em
dois movimentos: por um lado, determinado Estado exerce e reivindica determinado direito e, por outro,
outros Estados afetados aquiescem. PCA. South China Sea Arbitration (Philippines v. China), Julgamento,
12 jul. 2016, para. 265.
69 O Tratado de Kerch não se insere na exceção ao “direito geral” prevista no Artigo 35(c) da CNUDM, já que
esta se refere apenas a “convenções internacionais de longa data”. É o caso do Tratado de Montreux de
1936. Neste tipo de caso, não se precisa do consentimento de Estados terceiros.
70 A Ucrânia sustentou que sempre entendeu que o Mar de Azov e as águas do estreito, após sua indepêndencia
não eram águas interiores comuns, mas estavam sujeitas ao direito do mar geral. Salientou que apenas
aceitou os termos do Artigo 1 do Tratado de 2003, pois este previa que as partes ainda delimitariam a área.
PCA, op. cit., paras. 237-239.
71 VON HEINEGG, Wolff. H. The Law of Naval Warfare and International Straits. International Law Studies,
v. 71, p. 263-292, 1998, p. 265.
72 ICJ. Corfu Channel case (Reino Unido v. Albânia), Julgamento, 9 abr. 1949, p. 29.
160
76 TONDO, Lorenzo. Sea mines: the deadly danger lurking in Ukraine’s waters. The Guardian, 11 jul. 2022.
Disponível em: https://www.theguardian.com/world/2022/jul/11/sea-mines-ukraine-waters-russia-war-black-
-sea. Acesso em: 19 nov. 2022.
77 SAUL, Jonathan. Ukraine says Russia planting mines in Black Sea as shipping perils grow. Reuters, 30 mar.
2022. Disponível em: https://www.reuters.com/world/europe/ukraine-says-russia-planting-mines-black-sea-
-shipping-perils-grow-2022-03-30/. Acesso em: 19 nov. 2022.
78 OZBERK, Tayfun. Opinion: Is there a serious sea mine threat in the Black Sea? Naval News, 27 mar. 2022.
Disponível em: https://www.navalnews.com/naval-news/2022/03/opinion-is-there-a-serious-sea-mine-threa-
t-in-the-black-sea/. Acesso em: 19 nov. 2022.
162
86 Seraphim Sarovskiy – Cargo Ship, IMO 8867222, MMSI 273334800, Callsign UHSO, Flag Russia – ves-
seltracker.com. Disponível em: https://www.vesseltracker.com/en/Ships/Seraphim-Sarovskiy-8867222.
html. Acesso em: 19 nov. 2022; BUSH, D. Turkish bulker hit by bomb off Odessa. Lloyd’s List, 24 fev.
2022. Disponível em: https://lloydslist.maritimeintelligence.informa.com/LL1139973/Turkish-bulker-hit-by-
-bomb-off-Odessa. Acesso em: 19 nov. 2022; Cargo ship Namura Queen hit by rocket off Ukraine – local
agent. Reuters, 25 fev. 2022. Disponível em:https://www.reuters.com/world/europe/cargo-ship-namura-
-queen-hit-by-rocket-off-ukraine-local-agent-2022-02-25/. Acesso em: 19 nov. 2022; Bangladeshi killed in
attack on ship “Banglar Samriddhi” at Ukraine port. The Financial Express, [s.d.]. Disponível em: https://
thefinancialexpress.com.bd/national/bangladeshi-killed-in-attack-on-ship-banglar-samriddhi-at-ukrai-
ne-port-1646276767. Acesso em: 19 nov. 2022. SAUL, J. Foreign ship sinks in Mariupol after missile
attacks, says flag registry. Reuters, 5 abr. 2022. Disponível em: https://www.reuters.com/world/europe/
foreign-merchant-ship-hit-by-missile-mariupol-ukrainian-official-2022-04-05/. Acesso em: 19 nov. 2022.
Seafarer killed as Russian shells hit icebreaker in Mariupol, says Ukrainian army. Llods List. Disponível
em: https://lloydslist.maritimeintelligence.informa.com/LL1140466/Seafarer-killed-as-Russian-shells-hit-
-icebreaker-in-Mariupol-says-Ukrainian-army. Acesso em: 19 nov. 2022.
87 Tradução livre nossa: “Com relação aos ataques, as seguintes precauções devem ser tomadas:
(a) aqueles que planejam, decidem ou executam um ataque devem tomar todas as medidas possíveis para
coletar informações que ajudarão a determinar se objetos que não são objetivos militares estão ou não
presentes em uma área de ataque;
(b) à luz das informações disponíveis, aqueles que planejam, decidem ou executam um ataque devem fazer
todo o possível para garantir que os ataques sejam limitados a objetivos militares;
(c) devem ainda tomar todas as precauções viáveis na escolha de métodos e meios para evitar ou minimizar
baixas ou danos colaterais; e
(d) um ataque não deve ser lançado se for esperado que cause baixas colaterais ou danos que sejam excessivos
em relação à vantagem militar concreta e direta antecipada do ataque como um todo; um ataque deve ser cancelado
ou suspenso assim que se tornar aparente que as baixas ou danos colaterais seriam excessivos”.
164
mar (tempos de paz) ou dos conflitos armados. A saber, enquanto o jus in bello
é aplicável entre duas forças beligerantes, a regra é que o direito de tempos de
paz seja aplicado entre um Estado beligerante e outro neutro.
A realidade é que a beligerância afeta muito claramente os direitos e liber-
dades de Estados neutros. Por exemplo, boa parte do Mar Negro é composta por
ZEEs de Estados neutros, como a Romênia, onde, em regra, todos os Estados
gozam de liberdade de navegação, e onde a Romênia detém direitos de soberania
e de algum grau de jurisdição88. Nesses casos, o que acontece na ZEE não se
trata mais de uma ponderação entre os direitos do Estado costeiro e as liberdades
dos outros, na medida em que as necessidades militares dos beligerantes passa
a ter enorme peso na equação, concretamente limitando os direitos da Romênia
e a liberdade de navegação de Estados neutros na região.
agressor e vítima, adotando uma posição mais benevolente para com esta,
rememorando ensinamentos de Vitória e Grócio sobre guerra justa. A prática
estadunidense a partir da Segunda Guerra Mundial, e a entrada em vigor da
Carta da ONU fortaleceram de vez essa posição. Como via de consequência,
as regras inscritas nas Convenções de 1907 sobre neutralidade raramente
foram observadas em todo o seu rigor95.
Voltando a discussão para o prisma de atuação do Conselho de Segu-
rança, a tese da neutralidade benevolente se revela controversa se o órgão
da ONU não consegue identificar determinado Estado como agressor. Isso
porque ambas as partes de um conflito podem alegar agir em legítima defesa,
sem qualquer violação à Carta, o que ocorre com a Guerra na Ucrânia, em
4. Considerações finais
Armed Conflicts: A Collection of Conventions, Resolutions, and Other Documents. Boston: Martinus Nijhoff,
p. 1425-1430, 2004.
102 TREISMAN, Rachel. Russia responds to Zelenskyy’s visit by accusing the U.S. of a proxy war in Ukraine,
NPR, 22 dez. 22. Disponível em: https://www.npr.org/2022/12/22/1145004513/russia-ukraine-us-proxy-
-war-zelenskyy-visit. Acesso em: 24 jan. 2023; WINTER-LEVY, Sam. A Proxy War in Ukraine Is the Worst
Possible Outcome — Except For All the Others, War on the Rocks. Disponível em: https://warontherocks.
com/2022/03/a-proxy-war-in-ukraine-is-the-worst-possible-outcome-except-for-all-the-others/. Acesso em:
24 jan. 2023.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 169
1. Introdução
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
legais que devem ser observados caso haja o emprego de alguma arma letal
totalmente autônoma3.
Ocorre que antes mesmo da guerra Russo-Ucraniana, as diferenças de
opinião sobre o tema dentro do GGE impediam um acordo célere, embora a
maior parte dos Estados concordam com a definição proposta pelo Comitê
Internacional da Cruz Vermelha (CICV), segundo a qual uma LAWS é um
“sistema de armas com autonomia em suas funções críticas” capaz de sele-
cionar e atacar alvos sem intervenção humana, outros Estados – França e
Alemanha – apresentam a sua própria definição, concentrando no tipo, grau
e forma de interação homem/máquina4.
Tudo indica que é apenas uma questão de tempo até que os “robôs assas-
3 Ibid.
4 Ibid.
5 HAMBLING, David. Efforts to regulate ‘killer robots’ are threatened by war in Ukraine. New Scientist, 13 jul.
2022. Disponível em: https://www.newscientist.com/article/2327965-efforts-to-regulate-killer-robots-are-
-threatened-by-war-in-ukraine/ Acesso em: 25 abr. 2023.
6 ICRC. Autonomy, Artificial Intelligence and Robotics: Technical Aspects of Human Control. Geneva: ICRC,
2019, p. 7.
7 Ibid.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 173
humanos sem intervenção humana8. Embora não haja uma definição inter-
nacionalmente acordada de LAWS, estes sistemas são relativamente fáceis
de definir, uma vez que envolve a delegação da tomada de decisões a uma
máquina pré-programada por um humano9.
Em suma, é a capacidade de puxar o gatilho, após selecionar o alvo,
bem como promover o ataque devido, sem intervenção de um indivíduo10.
Neste caso, os algoritmos decidem quem vive e quem morre. Trata-se de um
sistema sofisticado de Inteligência Artificial programado para determinar suas
próprias ações, tomar decisões e se adaptar ao ambiente11. Nesse sentido, a
autonomia é definida como a capacidade de um robô, após a ativação, operar
sem qualquer controle externo em algumas ou todas as áreas de sua operação
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
global unificado para destacar os riscos de armas autônomas letais, uma “corrida
armamentista de Inteligência Artificial” é possível, agravando ainda mais os
riscos inerentes de imprevisibilidade e comportamento escalonado22.
medidas que restringem o tipo de alvo e as atividades das LAWS – por exem-
plo, limites temporais e espaciais, restrição quanto aos efeitos e ativação do
mecanismo à prova de falhas; (ii) controle sobre o meio ambiente: medidas
que controlam o ambiente em que as LAWS são usadas – por exemplo, limi-
tação da atuação do sistema apenas em ambientes onde civis e bens civis não
estão presentes; (iii) controle por meio da interação homem-máquina, como
medidas que permitam ao usuário supervisionar as LAWS e intervir em sua
operação quando necessário.
Os tipos de controle supracitados não estão vinculados a uma tecno-
logia específica, portanto, fornecem uma base normativa sólida aplicável a
qualquer tipo de arma. Além disso, tais medidas de controle visam reduzir ou
compensar a imprevisibilidade inerente ao uso das LAWS e mitigar os riscos,
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
A mais importante condição que permite que LAWS possam ser usadas em
conflitos armados é a sua adequação às normas de DIH. Ainda é controverso,
porém, se essas armas em algum momento serão capazes de seguir as normas de
DIH como combatentes humanos, existindo muitos debates acerca da rejeição
de tal possibilidade, com base no argumento de que decidir um alvo em meio
a um conflito armado também envolve julgamentos de valor que são subjeti-
vos60. Deste modo, faz-se necessário apresentar as revisões legais pelas quais
tais armas devem ser submetidas e suas limitações específicas, observando os
princípios norteadores do DIH e as regras de condução de hostilidades.
conota uma capacidade ofensiva que pode ser aplicada a um objeto militar
ou combatente inimigo63. Os “meios” referem-se a armas, sistemas de armas
e plataformas, sendo difícil diferenciar o termo “armas” do termo “meios”.
Já os métodos, por sua vez, abordam a maneira como as armas são usadas e,
mais amplamente, as táticas militares64.
Assim, é obrigatório, para os Estados que são partes do PA I, a revisão
das armas, bem como dos métodos que serão utilizados no seu emprego, antes
de as usarem. A importância de realizar revisões, conforme a previsão legal
do Artigo 36, é amplamente reconhecida no Direito Internacional, sobretudo
devido ao desenvolvimento tecnológico militar empregado em guerras. Dessa
forma, é imprescindível que os Estados sejam capazes de conduzir hostilida-
des de acordo com as obrigações impostas pelo DIH, e, por isso, a condução
das revisões do Artigo 36 deve ser minuciosa ao determinar se a adoção de
novas tecnologias pode ou não causar preocupações significativas do ponto
de vista humanitário65.
Porém, mesmo com a obrigatoriedade de revisão de armas e novas tec-
nologias imposta pelo Artigo 36 do PA I, um número pequeno de Estados é
conhecido por ter um mecanismo formal de revisão estabelecido, e o artigo
também não fornece nenhuma orientação concreta sobre como os países
devem formalizar tal processo. Contudo, para o Comitê Internacional da Cruz
Vermelha (CICV) essa questão não é necessariamente um problema66, porque
63 MCCLELLAND, Justin. The review of weapons in accordance with Article 36 of Additional Protocol I. Inter-
national Review of the Red Cross, v. 85, n. 850, p. 397-415, 2003. p. 404.
64 SASSÒLI, M. Op cit. (nota 60), p. 380.
65 BOULANIN, Vincent; VERBRUGGEN, Maaike. Article 36 Reviews. Dealing with the challenges posed
by emerging technologies. Stockholm: SIPRI, 2017, p. 15. Disponível em: https://www.sipri.org/publica-
tions/2017/other-publications/article-36-reviews-dealing-challenges-posed-emerging-technologies. Acesso
em: 15 nov. 2022.
66 ICRC. A Guide to the Legal Review of New Weapons, Means and Methods of Warfare. Geneva: ICRC, 2006.
Disponível em: https://ww.icrc.org/en/publication/0902-guide-legal-review-new-weapons-means-and-methods-
-warfare-measures-implement-article. Acesso em: 21 nov. 2022.
184
82 CICV. Base de Dados do Direito Internacional Humanitário Consuetudinário. Norma 15. Op cit. (nota 80).
83 Art. 57 do Protocolo Adicional I. Op cit. (nota 49).
84 Ibid.
188
5. Conclusão
Internacional Humanitário (DIH), uma vez que este ramo do Direito Inter-
nacional Público é responsável pela regulação de conflitos armados e seus
princípios fundamentais sempre devem ser observados. As LAWS não estão
isentas dessas obrigações, mesmo assim apresentam um enorme desafio
quanto à aplicação das normas humanitárias em vigor. Enquanto a regula-
mentação da matéria por tratado ou outro instrumento internacional parece
desejável e urgente, não há uma conjuntura política favorável a tal medida.
Como vimos, a atual guerra na Ucrânia não somente impede chegar logo a
um consenso sobre os limites do emprego de LAWS, mas também aumenta
a chance do seu uso por algumas das partes envolvidas. Cada dia que passa,
o desenvolvimento dessa tecnologia avança.
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
11. O DIH E O DIREITO DA
POPULAÇÃO CIVIL UCRANIANA
DE RESISTIR À INVASÃO RUSSA
Cláudio Cerqueira B. Netto
Leticia Heinzmann
1. Introdução
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
2. O conceito da ocupação
1 Reproduzidas em português em: DAL MASO JARDIM, Tarciso. O Brasil e o Direito Internacional dos Conflitos
Armados. Tomo I. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2006, p. 263-454,
192
entre duas ou várias das Altas Partes Contratantes, mesmo que o estado de
guerra não seja reconhecido por uma delas”. O mesmo dispositivo esclarece
no seu segundo parágrafo que “se aplicará, igualmente, em todos os casos de
ocupação da totalidade ou de parte de território de uma Alta Parte Contratante,
mesmo que essa ocupação não encontre resistência”.
O Artigo 1º (4) do Protocolo Adicional I às Convenções de Genebra, de
10 de junho de 19772, ampliou o conceito por incluir “[...] conflitos armados
em que os povos lutam contra a dominação colonial e a ocupação estrangeira
e contra os regimes racistas no exercício do direito dos povos à autodetermi-
nação[...]”. Todavia, somente completa as quatro Convenções de 1949 e, por
isso, não afeta a validade da referida regra que se aplica à ocupação bélica.
Os critérios que caracterizam uma ocupação militar já foram definidos no
7 SASSÒLI, Marco; NAGLER, Patrick. International humanitarian law: rules, controversies, and solutions to
problems arising in warfare. Cheltenham, UK: Edward Elgar Publishing, 2019, p. 308.
8 ICJ, Case concerning Armed Activities on the Territory of the Congo (República Democrática do Congo vs.
Uganda). Julgamento, 19 dez. 2005, § 173.
9 SASSÒLI; NAGLER. Op cit. (nota 7), p. 306.
10 UN GENERAL ASSEMBLY, A/RES/71/205. Disponível em: https://documents-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/
GEN/N16/455/74/PDF/N1645574.pdf?OpenElement. Acesso em: 12 jun. 2023.
11 UN GENERAL ASSEMBLY, A/RES/76/174. Disponível em: https://documents-dds-ny.un.org/doc/UNDOC/
GEN/N21/403/46/PDF/N2140346.pdf?OpenElement. Acesso em: 14 nov. 2022.
12 VISUAL JOURNALSIM TEAM. Ukraine in maps: Tracking the war with Russia. BBC News, 28 out. 2022.
Disponível em: https://www.bbc.com/news/world-europe-60506682. Acesso em: 8 nov. 2022.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 195
13 GENEVA ACADEMY. Military occupation of Ukraine by Russia. RULAC, 3 nov. 2022. Disponível em: https://www.
rulac.org/browse/conflicts/military-occupation-of-ukraine#collapse2accord. Acesso em: 8 nov. 2022.
14 SASSÒLI.; NAGLER. Op. cit. (nota 7), p. 303.
15 Ucrânia treina civis para defesa em caso de invasão russa, Exame, 28 dez. 2022. Disponível em: https://exame.
com/mundo/ucrania-treina-civis-para-defesa-em-caso-de-invasao-russa. Acesso em: 11 jul. 2022.
196
16 HAROUN, Azmi. Ukraine’s parliament passed a law allowing citizens to carry firearms, and a local NGO
official said “there’s a feeling that Ukrainians will fight. Business Insider India, 24 fev. 2022. Disponível em:
https://www.businessinsider.com/ukraine-parliament-passes-law-allowing-citizens-to-carry-firearms-2022-2.
Acesso em: 11 jul. 2022.
17 SHETH, Sonam. Ordinary Ukrainian citizens are taking up arms to fend off Russian forces as they close in
on Kyiv. Business Insider India, 25 fev. 2022. Disponível em: https://www.businessinsider.com/ordinary-u-
krainians-take-up-arms-defend-kyiv-from-russia-2022-2. Acesso em: 11 jul. 2022.
18 SASSÒLI, Marco; BOUVIER, Antoine.; QUINTIN, Anne. How does law protect in war? Geneva: ICRC,
2011, p. 186.
19 LONGOBARDO, Marco. The Use of Armed Force in Occupied Territory. Cambridge: Cambridge University
Press, 2018.
20 FORD, William J. Resistance Movements and international law. International Review of the Red Cross, v. 8,
n. 82, p. 7-15, 1968.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 197
Assim, mesmo que eles tenham sido incluídos no escopo de proteção especial
dos prisioneiros de guerra, seu status não é estável e se restringe apenas a um
período muito específico da sua participação nas hostilidades.
aos membros de grupos que estejam de acordo com tais requisitos25. Dessa
maneira, não poderão ser PDGs os indivíduos que atendam aos requisitos
individualmente, mas façam parte de um grupo que não os atende como um
todo26. Sobre o requisito de que o movimento de resistência esteja subor-
dinado a uma das partes ao conflito, tal subordinação pode ser expressa ou
tácita; sendo imprescindível que o grupo esteja de fato lutando em nome
dessa parte ao conflito armado e que tal parte ao conflito aceite que o movi-
mento de resistência tenha função de combate 27. Assim, basta que haja
uma relação fática entre o movimento de resistência e a parte do conflito
armado, sendo desnecessário um ato formal que reconheça o movimento
de resistência como força auxiliar à parte ao conflito28.
1949, que deverá definir o seu status como civil ou combatente. Esse artigo
não exige que tal tribunal seja parte do Poder Judiciário do Estado em questão,
mas estabelece que ele deve ser um órgão colegiado de natureza judicial ou
administrativa e tem o objetivo de impedir que um único oficial militar decida
o status da pessoa capturada33.
Marco Longobardo observa que as regras do DIH sobre ocupação beli-
gerante buscam regular, de modo geral, a conduta do poder ocupante, e não
a da população ocupada34. Ainda, o autor resume as regras aplicáveis da
seguinte forma:
33 Ibid.
34 LONGOBARDO, Marco. Op cit. (nota 19).
35 Ibid. (Tradução livre).
36 Ibid.
37 Ibid.
200
38 CORTE ESPECIAL DOS PAÍSES BAIXOS. Christiansen trial. Julgamento, 1948, § 128. Cf. DINSTEIN. Op
cit. (nota 21).
39 CONVENÇÃO DE GENEBRA RELATIVA À PROTEÇÃO DAS PESSOAS CIVIS EM TEMPOS DE GUERRA,
4., 12 ago. 1949, Art. 33. Reproduzida em: DAL MASO JARIM. Op cit. (nota 1), p. 389-453.
40 DINSTEIN. Op cit. (nota 21).
41 Ibid.
42 SUPREME COURT OF ISRAEL. Taha (minor) et al. v. Minister of Defence et al. Julgamento, 1993, § 63.
Cf. DINSTEIN. Op cit. (nota 21).
43 MELZER, Nils. International Humanitarian Law: A Comprehensive Introduction. Geneva: ICRC, 2019. p. 246.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 201
44 Ibid.
45 CONVENÇÃO DE GENEBRA RELATIVA À PROTEÇÃO DAS PESSOAS CIVIS EM TEMPOS DE GUERRA,
4., 12 ago. 1949, Art. 51. Reproduzida em: DAL MASO JARIM. Op cit. (nota 1), p. 389-453.
46 UN GENERAL ASSEMBLY, A/RES/71/205: “Urges the Russian Federation: [...] To end the practice of
compelling Crimean residents to serve in the armed or auxiliary forces of the Russian Federation, including
through pressure or propaganda, and in particular ensure that Crimean residents are not compelled to
participate in military operations of the Russian Federation”.
47 Entende-se por internamento a privação de liberdade de natureza administrativa, ou seja, desvinculada de
um processo penal.
48 CONVENÇÃO DE GENEBRA RELATIVA À PROTEÇÃO DAS PESSOAS CIVIS EM TEMPOS DE GUERRA,
4., 12 ago. 1949. Reproduzida em: DAL MASO JARIM. Op cit. (nota 1), p. 389-453.
49 MELZER. Op. cit. (nota 43), p. 190.
202
6. Conclusão
50 Ibid., Id.
51 Ibid., Id.
52 PICTET, Jean S. (ed.). The Geneva Conventions of 12 August 1949. Commentary – IV Geneva Convention
Relative to the Protection of Civilian Persons in Time of War. Geneva: ICRC, 1958.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 203
revogação de leis locais. Ainda que o poder ocupante possa impor medidas à
população do território ocupado, ele possui obrigações em relação aos civis do
território ocupado, devendo também garantir a segurança e, até certa medida,
satisfazer as necessidades da população local53.
53 NETTO, Cláudio Cerqueira Bastos. Reducing the Negative Effects of Counterterrorism Frameworks and
Other Restrictive Measures on Humanitarian Action and Enforcing the Obligations of States in Relation to
the COVID-19 Vaccine. American University International Law Review, v. 37, n. 2, p. 209-252, 2022.
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
12. O DIREITO À ASSISTÊNCIA
HUMANITÁRIA E A ATUAÇÃO DA
COMUNIDADE INTERNACIONAL
NA PROTEÇÃO DA POPULAÇÃO
AFETADA PELA GUERRA NA
UCRÂNIA, EM ESPECIAL, CRIANÇAS
José Wagner de Oliveira Tavares
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
1. Introdução
3 Ibid., Id.
4 PICTET, Jean. Développement et principes du droit international humanitaire. Paris: Pedone, 1983.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 207
5 LERCH, Marika. Russia´s War on Ukraine in International Law and Human Rights Bodies: Bringing Institutions
Back in. European Parliament. Directorate-General for External Policies of the Union: Policy Department for
External Relations, Brussels, abr. 2022.
6 SCHWENDIMANN, Felix. The Legal Framework of Humanitarian Access in Armed Conflict. International
Review of the Red Cross, v. 93, n. 384, p. 993-1008, 2011.
7 Ibid.
8 Ibid.
208
p. 853-878, 2004.
28 ICESCR. Op cit. (nota 25).
29 SCHWENDIMANN, F. Op cit. (nota 11).
30 Ibid.
31 HENCKAERTS, Jean-Marie; DOSWALD-BECK, Louise. Study on Customary International Humanitarian
Law. v. 2. Cambridige: CUP, 2005, Chap. 17, Sec. A, Rule 53.
32 Ibid.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 213
38 Ibid.
39 UNITED NATIONS HIGH COMMISSIONER FOR REFUGEES. Ukraine Situation: UNHCR Supplementary
Appeal 2022. Italy, Mar. 2022.
40 LOFT, Ph.; BRIEN, Ph. Op cit. (nota 1).
41 Ibid.
42 Ibid.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 215
47 Ibid.
48 UNICEF. Op cit. (nota 44).
49 Ibid.
50 Ibid.
51 MÉDECINS SANS FRONTIÈRES. MSF Response to War in Ukraine: Responding as Millions of People
flee war in Ukraine. Switzerland, jun. 2022. Disponível em: https://www.msf.org/msf-response-war-ukraine.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 217
4. Considerações finais
56 R7 INTERNACIONAL. Milhares de Crianças de Orfanatos na Ucrânia Vivem Situação Caótica, jun. 2022.
Disponível em: https://noticias.r7.com/internacional/milhares-de-criancas-de-orfanatos-na-ucrania-vivem-si-
tuacao-caotica-27062022. Acesso em: 28 ago 2022.
57 UNHCR. Ukraine Situation: UNHCR Supplementary Appeal 2022. Italy, Mar. 2022.
58 R7 INTERNACIONAL. Op cit. (nota 56).
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 219
64 Ibid.
65 Ibid.
66 SPIEKER, H. Op cit. (nota 18).
67 MÉDECINS SANS FRONTIÈRES. Op cit. (nota 51).
68 SPIEKER, H. Op cit. (nota 18).
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 221
1. Introdução
1 As ameaças ambientais podem assumir diversas formas, entre elas: ataques diretos ao meio ambiente, como
o uso do agente laranja, um herbicida e desfolhante, durante a guerra no Vietnã; a liberação de substâncias
perigosas como resultado de ataques a locais industriais, como os que ocorreram em Kosovo em 1999 e no
Líbano em 2006; o uso de certos meios ou métodos de guerra, como armas biológicas, químicas e nucleares; e
a exploração de recursos naturais (diamantes, ouro, cobre, coltan, madeira etc.) para financiar forças armadas e
comprar armas ou para enriquecimento pessoal. HENCKAERTS, Jean-Marie; CONSTANTIN, Dana. Protection
of the Natural Environment. In: Andrew Clapham, Paola Gaeta (eds.), Tom Haeck; Alice Priddy (assistant eds.).
The Oxford Handbook of International Law in Armed Conflict, Oxford University Press, 2014, p. 569.
2 Os esforços significativos para proteger o meio ambiente durante o conflito armado começaram na década
de 1970, principalmente em resposta a eventos ocorridos durante a Guerra do Vietnã; houve ressurgimento
da atenção internacional para as questões que se seguiram aos incêndios e derramamentos deliberados
de petróleo durante a Guerra do Golfo de 1990-1991. No entanto, a estrutura que se desenvolveu nas
últimas quatro décadas contém numerosas lacunas e ambiguidades. BOTHER, M; BRUCH C; DIAMOND,
J; JENSEN D. International law protecting the environment during armed conflict: gaps and opportunities.
International Review of the Red Cross, v. 92, n. 879, set. 2010, p. 591.
3 ICRC. Natural environment: Neglected victim of armed conflict, International Committee of the Red Cross,
5 jul. 2019. Disponível em: https://www.icrc.org/en/document/natural-environment-neglected-victim-armed-
-conflict. Acesso em: 23 abr. 2023.
4 ICRC. Global call for papers: “Protecting the Environment in Armed Conflict: The Legal and Policy Framework
of the Future”, International Review of the Red Cross. Disponível em: https://international-review.icrc.org/
call-for-papers-protection-of-environment. Acesso em: 23 abr. 2023.
224
5 As Diretrizes de 2020 também contêm comentários que podem servir como referência para todas as partes
envolvidas em conflitos armados ou que estejam em posição de influenciá-las. Com o objetivo de proteger
o meio ambiente natural, as Diretrizes exigem a divulgação das regras relevantes do DIH, a adoção de
medidas que aumentem a consciência dos efeitos dos conflitos armados sobre o meio ambiente natural, a
designação de zonas desmilitarizadas para proteger áreas de particular importância ambiental ou fragilidade,
e o intercâmbio de boas práticas para melhorar o comportamento. ICRC, Guidelines on Protection of Natural
Environment in Armed Conflict, 2020. Disponível em: https://www.icrc.org/en/publication/4382-guidelines-
-protection-natural-environment-armed-conflict. Acesso em: 23 abr. 2023.
6 ICRC, Global call for papers: “Protecting the Environment in Armed Conflict: The Legal and Policy Framework
of the Future”. International Review of the Red Cross. Disponível em: https://international-review.icrc.org/
call-for-papers-protection-of-environment. Acesso em: 23 abr. 2023.
7 Os 27 princípios da CDI, juntamente com seus preâmbulos e comentários, preveem a proteção do meio
ambiente em relação aos conflitos armados, estabelecendo as responsabilidades dos Estados e dos atores
não estatais. Além de abordar a lei aplicável durante conflitos armados, os princípios também se aplicam antes
e depois do conflito. Eles abordam a obrigação dos Estados de tomar as medidas legislativas, administrativas
e judiciais necessárias para proteger o meio ambiente, recomendam a designação de zonas protegidas
pré-conflito, e abordam a remoção de restos de guerra em terra ou no mar pós-conflito. INTERNATIONAL
LAW COMMISSION, Draft Principles on the Protection of the Environment in Relation to Armed Conflicts,
2022. Disponível em: https://legal.un.org/ilc/guide/8_7.shtml. Acesso em: 23 abr. 2023.
8 Ver mapa dinâmico da “Ecozodor”, uma plataforma que reúne dados sobre consequências ambientais e
os riscos dos combates na Ucrânia, cujo desenvolvimento e a manutenção do sistema são apoiados pela
Zoï Environment Network (Suíça), pelo Coordenador de Projetos da OSCE na Ucrânia e pelo Programa
das Nações Unidas para o Meio Ambiente. Disponível em: https://www.ecodozor.org/index.php?lang=en.
Acesso em: 15 nov. 2022.
9 Ver PEREIRA, Paulo; BAŠIĆ, Ferdo; BOGUNOVIC, Igor; BARCELO, Damia. Russian-Ukrainian war impacts
the total environment. Science of the Total Environment, n. 837, p. 1-6, 2022.
10 O artigo apresenta dados empíricos do grau de poluição causada pelas hostilidades na Ucrânia. A Ucrânia
tem uma economia industrializada extensa e diversificada, incluindo fábricas pesadas e instalações nucleares.
Para além dos riscos ambientais decorrentes da contaminação de seu património industrial, os danos nas
infraestruturas comerciais, industriais e energéticas exacerbaram os riscos para a população civil e para o
ambiente em geral. Ibid., p. 1.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 225
11 Como todos os elementos do meio ambiente estão interligados, danos em determinados elementos do
meio ambiente podem gerar impactos (in)diretos sobre outros elementos. Em razão das atividades militares
intensas e prolongadas, por exemplo, o desmatamento pode diminuir a capacidade dos ecossistemas de
regular a poluição do ar e a degradação do solo pode dificultar a produção de alimentos. Ver PEREIRA;
BAŠIĆ; BOGUNOVIC; BARCELO. Op cit. (nota 11), p. 2-5.
12 Conflitos armados de alta intensidade requerem e consomem grandes quantidades de combustível, con-
duzindo às emissões maciças de gás carbônico e contribuindo para as alterações climáticas. Em grande
escala, os movimentos dos veículos podem levar a danos físicos generalizados em paisagens e geodiver-
sidade. Conflict and Environment Observatory, How does war damage the environment? CEOBS Blog, Law
and policy, 4 jun. 2020. Disponível em: https://ceobs.org/how-does-war-damage-the-environment/. Acesso
em: 2 nov. 2022.
13 Apesar do atual presidente ter feito críticas em 2019 quanto à efetividade do Protocolo Adicional I, a Rússia
segue sendo parte de todas as Convenções de Genebra de 1949 e seus Protocolos adicionais de 1977.
Nada obstante, mesmo que houvesse denunciado o tratado em uma tentativa de eximir-se das obrigações
de proteção em conflitos armados de caráter internacional, a maioria das previsões do Protocolo Adicional
I compõe o Direito Costumeiro. Ver ICRC Database: Treaties, States Parties and Commentaries. Protocol
Additional to the Geneva Conventions of 12 August 1949, and relating to the Protection of Victims of Inter-
national Armed Conflicts (Protocol I), 8 jun. 1977. Russian Federation: Notification to the Governments of
the States parties to the Geneva Conventions of 12 August 1949 for the Protection of War Victims/Swiss
Federal Department of Foreign Affairs FDFA, 30.10.2019.
226
2. Proteção geral
35 Ibid., p. 56.
36 Ibid., p. 58.
37 HULME. Op cit. (nota 30). Ver Ukraine conflict: Russian shelling blamed for corrosive gas leak, BBC News, 21
mar. 2022, Disponível em: https://www.bbc.com/news/world-europe-60818488. Acesso em: 15 nov. 2022.
38 HULME. Op cit. (nota 30).
39 ICRC. Op cit. (nota 5), p. 61.
40 Ibid., Id.
230
41 Ibid., p. 53.
42 Em geral, um ataque contra um combatente ou um objetivo militar será legítimo quando houver propor-
cionalidade entre o objetivo que se procura em relação aos eventuais danos a civis e a bens civis dele
resultantes, incluindo ao meio ambiente natural. Ver Art. 51(5)b do Protocolo Adicional I e a Regra 14 do
Direito Costumeiro.
43 MELZER, Nils; KUSTER, Etienne. International humanitarian law: a comprehensive introduction. Geneva:
ICRC, 2016, p. 101.
44 Ibid., Id.
45 ICRC. International Humanitarian Law and The Challenges Of Contemporary Armed Conflicts. Report,
2019, p. 18-19. Segundo o relatório: “Under this view, for instance, the attack must be directed at the rooftop
of the civilian house or at the specific apartment in the multi-storey building, provided it is feasible in the
circumstances, to avert the possibility of civilians losing their homes and livelihoods”. Ver também: ICRC.
Urban services during protracted armed conflict: a call for a better approach to assisting affected people.
Geneva: ICRC, 2015, p. 11.
46 ICRC. Op cit. (nota 5), p. 53.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 231
3. Proteção especial
se envolver com tal tipo de prática. Esse direcionamento para coibir a prática de
apoio é essencial na conjuntura atual onde há grupos armados separatistas den-
tro da Ucrânia recebendo treinamento e apoio russo, os chamados The Donetsk
People’s Militia and Luhansk People’s Militia62 (em tradução livre: Milícia do
Povo de Donetsk e Milícia do Povo de Luhansk).
A ENMOD tem na sua integralidade a proibição de técnicas que afetem
a dinâmica, composição ou estrutura da terra63. O que de fato, de acordo com
evidências que estão sendo coletadas desde 2014 e com dados atualizados, tem
relação direta com as práticas tomadas pela Rússia e os grupos armados por
ela apoiados, em minas de carvão64 em um território ocupado denominado de
People’s Republics (em tradução livre: Repúblicas do Povo). Historicamente,
essas minas já tinham resquícios de água subterrânea com radiação devido
por terem sido local de uma explosão nuclear na mina de Yukom em 197965.
Dentre as 220 minas de carvão da região, 38 foram inundadas sob o controle de
ocupação e, por conseguinte, estão causando inundações na superfície, terre-
motos, vazamento de gases tóxicos, dentre outras consequências irreversíveis à
vida e saúde dos habitantes que circundam esse lugar66. A proibição aferida na
ENMOD é bem explícita quanto à proibição de vias técnicas para manipular o
para proporcionar proteção adicional ao meio ambiente natural e a aplicação das regras do direito internacional
humanitário que protegem o meio ambiente natural nos conflitos armados internacionais nos conflitos armados
não internacionais. Ver as regras 16, 17 e 18 nas Guidelines de 2020. ICRC. Op cit. (nota 5), p. 79-85.
62 DHANANI, Seraphin. The Case for Designating the Donetsk and Luhansk People’s Militas as Foreign Terrorists
Organizations. Disponível em: encurtador.com.br/jzJSU. Acesso em: 31 out. 2022.
63 ENMOD, Art. 3.
64 FADEK, Timothy. How war has devastated Ukraine’s coal industry. CNN News, 6 fev. 2022. Disponível em: https://
edition.cnn.com/2022/02/05/europe/gallery/ukraine-coal-miners/index.html. Acesso em: 31 out. 2022.
65 CEOBS. Are abandoned mines flooding in Ukraine’s Donbas region?, 27 abr. 2020. Disponível em: https://
ceobs.org/abandoned-mines-are-flooding-in-ukraines-donbass-region/. Acesso em: 31 out. 2022.
66 KULLAMAA, Kaarel. Is Russia Committing an Environmental War Crime in Donbas? International Centre for
Defence and Security Commentary, 3 mar. 2022. Disponível em: https://icds.ee/en/the-harsh-reality-of-the-rus-
sian-liberation-signs-indicating-that-russia-has-committed-an-environmental-war-crime-in-donbas-since-2018/.
Acesso em: 14 nov. 2022.
234
e a fauna de uma área de terra, de outra forma árida, que é indispensável para
a sobrevivência da população civil76.
No caso do conflito Rússia e Ucrânia, destaque deve ser dado também
à proteção especial de obras e instalações que contenham forças perigosas,
ou seja, diques, represas, centrais nucleares de energia elétrica, e outras ins-
talações localizadas nas proximidades, a fim de evitar a liberação de forças
perigosas em caso de ataque e consequentes perdas graves entre a popula-
ção civil, conforme Artigo 56 do PAI77. Para os Estados Parte no Protocolo
Adicional I, tais bens não podem ser objeto de ataque, mesmo quando esses
bens são objetivos militares, se tal ataque puder causar a liberação de forças
perigosas e consequentes perdas graves entre a população civil, sujeito às
exceções especificadas no Artigo 56(2) do Protocolo78.
fruto; e a propriedade privada deve ser respeitada e não pode ser confiscada,
exceto quando a destruição ou apreensão de tal propriedade for exigida por
necessidade militar imperativa. As Guidelines do CICV interpretam bens móveis,
imóveis e propriedade privada incluindo os bens que fazem parte do ambiente
natural102. Segundo relatório da OSCE publicado em junho de 2022, a situação
ambiental em alguns territórios ocupados é preocupante devido à poluição do ar,
do solo e da água e à deterioração das situações sanitárias e epidemiológicas103.
A presença de forças russas na Central Nuclear de Zaporizhzhia (ZNPP),
atestada pela Agência Internacional de Energia Atômica, eleva as preocu-
pações com a segurança nuclear da região e seus potenciais efeitos ao meio
ambiente natural104. Para a Anistia Internacional, as forças russas não só estão
colocando em perigo as da usina e seus arredores, mas também aumentando
o risco de uma catástrofe nuclear em toda a região105.
4. Conclusão
PARTE III
DEBATES SOB A ÓTICA DO DIREITO
INTERNACIONAL PENAL
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
14. PUTIN PERANTE O TRIBUNAL
PENAL INTERNACIONAL?
Allan Jones Andreza Silva
Thiago Fernando Alves de Araújo Lima
1. Introdução
1 Ver para detalhes: BUERGENTHAL, Thomas. The Evolving International Human Rights System. The American
Journal of International Law, v. 100, n. 4, p. 783-807, 2006.
2 WERLE, Gerhard. Principles of International Criminal Law. 2. ed. The Hague: TMC Asser Press, 2009. p. 7.
246
3 SOUSA, Fernanda Nepomuceno. Tribunais de Guerra. Belo Horizonte: Del Rey, 2005. p. 16.
4 MAIA, Mariele. Tribunal Penal Internacional. Aspectos Constitucionais, jurisdição e princípio de complemen-
tariedade. Belo Horizonte: Del Rey, 2001. p. 45-59.
5 ROME STATUTE OF THE INTERNATIONAL CRIMINAL COURT, 7 jul. 1998, 2187 UNTS 3.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 247
nidade, assim provocando a pergunta: se e até que ponto tais crimes podem
ser perseguidos pelo TPI? Como é sabido, este já enviou no início de março
de 2022 investigadores para a Ucrânia, que, sem ser Estado-parte, aceitou
a sua jurisdição ad hoc8. Tendo em vista o fato de que a Câmara de Ques-
tões Preliminares (Pre-Trial Chamber) II do TPI acabou de emitir, em 17 de
março de 20239, uma ordem de prisão contra o Presidente russo Vladimir
Vladimirovitch Putin (assim como a sua Comissária para os Direitos de
Criança, Maria Alekseyevna Lvova-Belova), a presente análise foca na sua
possível responsabilização perante o Tribunal na Haia pelo cometimento dos
crimes internacionais tipificados pelo ER. Para tanto, o trabalho em pauta
foi estruturado em duas partes: a primeira, de natureza suscinta e didática,
introduz aos crimes que se encontram sob a jurisdição do TPI e traz uma
visão panorâmica sobre o seu provável cometimento no contexto da Guerra
Russo-Ucraniana; já a segunda parte, examina as condições jurisdicionais
para responsabilizar o presidente russo perante o TPI, iluminando alguns
obstáculos processuais e práticos-políticos.
6 Veja para uma análise mais profunda da ilegalidade dessas operações militares o capítulo de LOBO DE SOUZA,
Ielbo M. A Legalidade da “Operação Militar Especial” da Rússia na Ucrânia, na presente publicação.
7 A Missão de Monitoramento de Direitos Humanos na Ucrânia constatou pelos menos 416 vítimas de deten-
ções arbitrárias e desaparecimentos forçados em áreas controladas pelas forças russas, não obstante
também haver relatos de casos de tortura e maus-tratos pelas forças ucranianas contra militares russos, con-
soante dados informados em: NAÇÕES UNIDAS. ONU alerta sobre abusos sofridos por prisioneiros de guerra
ucranianos e russos. ONU News, 9 set. 2022. Disponível em: https://news.un.org/pt/story/2022/09/1800591.
Acesso em: 25 set. 2022.
8 Maiores informações disponíveis sob: https://www.icc-cpi.int/ukraine. Acesso em: 15 abr. 2023.
9 As ordens de prisão (ainda) não estão publicamente acessíveis. Por enquanto, o TPI somente afirmou a
sua existência e os principais motivos para a sua emissão. Cf. ICC, Situation in Ukraine. ICC judges issue
arrest warrants against Vladimir Vladimirovich Putin and Maria Alekseyevna Lvova-Belova, Press Release,
17 mar. 2023. Disponível em: https://www.icc-cpi.int/news/situation-ukraine-icc-judges-issue-arrest-warrant-
s-against-vladimir-vladimirovich-putin-and. Acesso em: 29 abr. 2023.
248
dias depois, esta circunstância foi tomada pelo governo ucraniano para requerer
um posicionamento da CIJ face a falta de devida comprovação do delito. Em
medida cautelar exarada em 16 de março de 202215, a CIJ considerou que não
havia elementos comprobatórios suficientes sobre a prática de genocídio no ter-
ritório ucraniano e, mesmo não havendo a configuração de tal crime, entendeu
que havendo risco real e iminente estavam estabelecidos os pressupostos para a
emissão de decisão cautelar que pugnou pela suspensão imediata das operações
militares russas no território ucraniano e que os Estados-partes deveriam abster-se
de quaisquer ações que pudessem agravar ou estender as controvérsias.
Notadamente, tal decisão não se prendeu a incidência do genocídio, mas
se prestou a considerar a desnecessidade do uso da força como forma de tutela
de direitos humanos e manutenção da paz, o que notadamente não foi cum-
prido pelo governo russo que não reconheceu a decisão16 e deu continuidade
a intervenção militar. Enquanto isso, a CIJ assim já deixou bastante claro que
a Rússia, como Estado, pode ser responsabilizado, entre outras violações do
direito internacional, pelo uso ilegal de força militar contra a Ucrânia.
12 MAZZUOLI, Valério de Oliveira. O Tribunal Penal Internacional. Integração ao direito brasileiro e sua
importância para a justiça penal internacional. Revista de Informação Legislativa, v. 41 n. 164, p. 157-178,
out./dez. 2004.
13 ICJ. Armed Activities on the Territory of the Congo (República Democrática do Congo v. Ruanda), parágrafo
62; Case concerning the Application of the Convention on the Prevention and Punishment of the Crime of
Genocide (Bósnia e Herzegovina v. Iugoslávia – Sérvia e Montenegro), Julgamento, 2007, § 161.
14 ICJ. Barcelona Traction Case (Bélgica v. Espanha), Julgamento, 1970, § 34; ICJ. Case concerning the
Application of the Convention on the Prevention and Punishment of the Crime of Genocide (Bósnia e
Herzegovina v. Iugoslávia – Sérvia e Montenegro), Decisão sobre Exceções Preliminares, 1996, § 31.
15 ICJ. Ukraine v. Russia: Allegations of Genocide under the Convention on the Prevention and Punishment
of the Crime of Genocide. 16 mar. 2022. Disponível em: https://www.legal-tools.org/doc/pw9myi/. Acesso
em: 29 abr. 2023.
16 LIMA, Lucas Carlos Os Poderes da Corte Internacional de Justiça na Emissão de Medidas Cautelares no
caso de alegações de genocídio entre Ucrânia e Federação Russa, na presente publicação. Veja também o
mesmo autor: As medidas cautelares da Corte Internacional de Justiça no caso entre Ucrânia e Federação
Russa. Revista de Direito Internacional, Brasília, v. 19, n. 1, p. 32-38, 2022.
250
Dado o fato de que a intervenção militar pela Rússia representa uma fla-
grante violação das regras que compõem o sistema de segurança coletiva da
ONU e que ela foi ordenada pelo Presidente Putin, coloca-se a pergunta sobre
a sua responsabilidade pessoal, perante o TPI, por crime de agressão.
A incorporação do crime de agressão ao ER, por intermédio da edição
do art. 8º bis, ocorreu a partir do “compromisso” alcançado na conferência
de Kampala, em 2010, mas que só ganharia oficialização após 1 de janeiro
de 2017 e mediante a aceitação de pelo menos trinta Estados-partes, algo
que ocorreu apenas em julho de 2018.
com o Art. 8 (2) (a) (vii) e o Art. 8 (2) (b) (viii)27. Por enquanto, o inquérito
do TPI ainda está em andamento. É preciso observar, no entanto, que é bem
provável que os investigadores encontrarão outro material probatório que
motivarão o Procurador do TPI ampliar as suas acusações.
Como foi demonstrado, há uma série de relatos que, embora ainda não
se saiba se as informações recolhidas prestam como material probatório, ao
menos fundamentam a suspeita de que vários crimes internacionais foram
cometidos no contexto da Guerra Russo-Ucraniana para qual a persecução
penal o TPI é materialmente competente. Neste momento, o Tribunal de Haia
já está formalmente exercendo a sua jurisdição, de acordo com o art. 13 do
ER, o “trigger mechanism”, que prevê três possibilidades, entre elas, uma
denúncia por um Estado-parte do TPI. A este respeito, em 1 de março de
2022, o Procurador do TPI recebeu a remessa do Estado-parte da República da
Lituânia, o que foi posteriormente acompanhado por mais outros 42 Estados,
notificando sobre a situação da Ucrânia, o que originou uma investigação
instalada a partir de 2 de março de 202228.
Todavia, ao poder exercer a sua jurisdição sobre determinado suspeito,
a corte precisa verificar também a sua competência territorial, temporal e
pessoal. No caso do Presidente russo, Vladimir Putin, houve – e ainda há –
certas dúvidas em relação a essas condições essências, razão pela merecem
uma breve análise.
25 NEVES, M. S. Op cit., p. 94.
26 NAÇÕES UNIDAS. Comissão de Inquérito Internacional diz que houve crimes de guerra na Ucrânia, ONU
News, 28 set. 2022. Disponível em: https://news.un.org/pt/story/2022/09/1802141. Acesso em: 25 abr. 2023.
27 ICC, Situation in Ukraine. Op cit. (nota 27).
28 ICC. Situation in Ukraine. Op cit. (nota 27).
254
4. Considerações finais
passar por brasileiro para se infiltrar como estagiário no TPI, releva que essa
guerra já foi iniciada há algum tempo36. Faz parte dela a tentativa contínua
de deslegitimar o tribunal como projeto “neoimperial” dos países ocidentais,
algo que outros regimes autoritários, como governo chinês, estão também
interessados em cultivar. Neste sentido, a decisão do TPI de emitir a ordem
de prisão contra Putin representa não somente um ato corajoso, mas também
altamente arriscado. Enquanto essa ordem fez o Presidente russo ter entrado
no “clube dos grandes bad boys da história” – como Slobodan Milosevic,
Charles Taylor, Muammar Gaddafi e Omar al-Bashir –, consideravelmente
minando a sua reputação e autoridade assim como limitando a sua liberdade
de visitar conferências e cúpulas internacionais no exterior, assim não se pode
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
36 Veja PEREIRA, Carlos Federico de Oliveira. Espionagem no Tribunal Penal Internacional no Contexto da
Guerra na Ucrânia, capítulo contido nesta obra.
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
15. CRIMES DE GUERRA E O
CONFLITO NA UCRÂNIA*
Fredys Orlando Sorto
1. Introdução
estoica, precisamente de Cícero (106-43 a.C.), que estabeleceu pela primeira vez
a distinção jurídica entre as guerras justas (as de legítima defesa) e as injustas
(ilegítimas). Os requisitos da Guerra Justa foram estabelecidos especialmente por
Santo Agostinho (354-430 d.C.), que adotou e defendeu a distinção estabelecida
por Cícero. A questão é retomada e sistematizada por Santo Tomás de Aquino
(1225-1274 d.C.) na Idade Média. Segundo ele, com base em Santo Agostinho,
a guerra é justa quando cumpre os três requisitos seguintes: a) que seja declarada
pela Autoridade competente, isto é, pelo Poder legitimamente constituído (o
Príncipe)2; b) que a guerra tenha uma causa. Por outras palavras, que a guerra
seja a resposta merecida a um direito violado, com o intuito de reparar o dano e
restabelecer a ordem3; c) o terceiro requisito refere-se à intenção reta dos belige-
rantes, isto é, que a guerra tenha por escopo “promover o bem ou evitar um mal”4.
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
2 Em apoio a este requisito da Guerra Justa, Aquino cita Santo Agostinho (o livro Contra Faust.): “El orden natural,
acomodado a la paz de los mortales, postula que la autoridad y la deliberación de aceptar la guerra pertenezca
al príncipe”. AQUINO, Tomás de. Suma de Teología III. Parte II-II (a). Tradução: Ovidio Calle Campo; Lorenzo
Jiménez Patón. Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos, 1990, p. 338. (Cf. II-II Cuestión, 40, Art. 1º).
3 Santo Tomás de Aquino recorre novamente à autoridade de Santo Agostinho (Heptateuco. Libro VI, q. 10)
para fundamentar este requisito: “Suelen llamarse guerras justas las que vengan las injurias; por ejemplo, si
ha habido lugar para castigar al pueblo o a la ciudad que descuida castigar el atropello cometido por los suyos
o restituir lo que ha sido injustamente robado”. Idem. Cf. AQUINO, Tomás de. Op cit. (nota 2), p. 338. (Cf.
II-II Cuestión, 40, Art. 1). No original da tradução espanhola (bilingue) está assim: “Suelen llamarse guerras
justas las que vengan injurias, en el caso de que una nación o una ciudad, que hay que atacar en la guerra,
ha descuidado vengar lo que los suyos han hecho indebidamente o devolver lo que ha sido arrebatado por
medio de injurias”. SAN AGUSTÍN. Obras completas. Escritos bíblicos (4º). Cuestiones sobre el Heptateuco
(en siete libros). v. 28. Tradução: Olegario García de la Fuente. Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos, 1989.
739 p. Cf. Cuestiones sobre el Heptateuco. Libro VI. Cuestiones sobre Josué Nave, 10.
4 O terceiro requisito da guerra justa apoia-se também em Santo Agostino (Contra Faust.): “En efecto, el deseo
de dañar, la crueldad de vengarse, el ánimo inaplacado e implacable, la ferocidad en la lucha, la pasión de
dominar y otras cosas semejantes, son, en justicia, vituperables en las guerras”. Idem. Cf. AQUINO, Tomás
de. Op cit. (nota 2), p. 338. Cf. II-II Cuestión, 40, Art. 1º. Esta citação está também um pouco diferente no
original publicado pela mesma Editora BAC, in verbis: “El deseo de dañar, la crueldad en la venganza, el
ánimo no aplacado e implacable, la ferocidad de la rebelión, la pasión de dominio y cosas semejantes: he
aquí lo que, conforme a derecho, se considera culpa en las guerras”. SAN AGUSTÍN. Escritos antimaniqueos
(2). Contra Fausto. Tradução: Pio de Luis. Madrid: Biblioteca de Autores Cristianos, 1993, p. 604. Cf. Libro
22, C. 74. Licitud del servicio militar.
5 A invasão do Iraque (Operation Iraqi Freedom), em 2003, trouxe à tona o tema da Guerra Justa. Bobbio
defendeu-a como guerra justa, embora depois tenha mudado de ideia. Cf. BOBBIO, Norberto. Una guerra
giusta? Sul conflitto del Golfo. Venezia: Marsilio, 1991. 92 p. Veja também: BELLAMY, Alex J. Just wars:
from Cicero to Iraq. Cambridge: Polity, 2006. 280 p.
262
Há que ter em conta que o direito internacional nasceu, como afirma com
acerto Sette-Câmara, sob a sombra do direito de guerra6. Ele diz que a maioria
das obras clássicas de direito internacional ocuparam-se mais da guerra do
que da paz, em abono dessa afirmação cita as seguintes obras: Lignano, De
Bello (1360), Gorco, De Bello Justo (1420), Wilhelmus Mathias, Libellus de
bello justo et licito (1514), A. Guerrero, Tractatus de bello justo et injusto
(1543), Francisco de Vitoria, De jure Belli (1557), Alberico Gentili, De Jure
Belli (1598), Grócio, De Jure belli ac Pacis (1625).
A sabendas de que a tese da guerra justa não é mais aceita como lícita,
nem por isso os conflitos armados foram banidos, o fato de a guerra ser crime
não afasta o aparecimento de conflitos armados, como ainda se observa em
tempos recentes. Portanto, é preciso retomar o tema na sua correta dimensão.
EUA. A despeito da sua importância, o Pacto Briand-Kellog, assinado em Paris em 27 de agosto de 1928,
“[...] não proscrevia a guerra de conquista, nem dispunha de sanções”. MELLO, Rubens Ferreira de. Op.
cit. (nota 12), p. 324.
O tratado bilateral foi transformado e multilateral por sugestão de Kellog. O Brasil aderiu em 1934. Cf. Decreto
nº 24.557, de 3 de julho de 1934.
14 REZEK, Op. cit. (nota 1), p. 445.
15 PASTOR RIDRUEJO, José Antonio. Curso de derecho internacional público y organizaciones internacionales.
6. ed. Madrid: Tecnos, 1996. p. 681.
16 Ibid., Id.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 265
17 Ipsis verbis: “Crimes against international law are committed by men, not by abstract entities, and only by
punishing individuals who commit such crimes can the provisions of international law be enforced”. Sentença
de 1 out. 1946. Cf. Trial of the Major War Criminals before the International Military Tribunal, v. 1, Nürnberg
1947, p. 223.
18 CRAWFORD, James. Los artículos de la comisión de Derecho internacional sobre la responsabilidad
internacional del Estado. Tradução: Luis Fonseca. Madrid: Dykinson, 2004. p. 291.
19 FONSECA, José Roberto Franco da. Crimes de guerra. Revista da Faculdade de Direito da Universidade
de São Paulo. São Paulo, v. 93, p. 371-389. jan./dez. 1998. p. 378.
20 Ibid., Id.
266
21 JESUS, Damásio E. de. Direito penal: parte geral. 32. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 210.
22 FONSECA, José Roberto Franco da. Op. cit. (nota 19), p. 378.
23 A doutrina no geral tem posição crítica com respeito à responsabilidade criminal da pessoa jurídica. Assim,
Fernando Capez, baseando-se em Cernicchiaro, assevera que “[...] a pessoa jurídica não pode ser autora de
crimes nem passível de sanção penal porque, não sendo dotada de consciência e vontade própria, a ela não
se aplicam os princípios da responsabilidade pessoal e da culpabilidade”. CAPEZ, Fernando. Curso de direito
penal. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2011. p. 170. A despeito disso, no direito interno admite-se a responsabilidade
penal das pessoas jurídicas em casos pontuais. Mas não contra o Estado. No Brasil, por exemplo, a Constituição
Federal estabelece a responsabilidade penal objetiva das pessoas jurídicas em atos cometidos contra a economia
popular, a ordem econômica e financeira e “condutas e atividades consideradas lesivas ao meio ambiente”. Cf.
artigos. 173, § 5º e 225 § 3º. Portanto, não há negar a constitucionalidade da Lei 9.605/98, que detalha a referida
responsabilidade penal das pessoas jurídicas por crimes ambientais (art. 3.). As penas estabelecidas pela Lei
9.605/98 (art. 8º) são as seguintes: “Prestação de serviços à comunidade; interdição temporária de direitos;
suspensão parcial ou total de atividades; prestação pecuniária; recolhimento domiciliar”. Se observadas com
rigor, as penas cominadas parecem distantes da esfera penal no que tange ao castigo, mas próximas das esferas
civil e administrativa, no tocante à reparação pelo dano causado ao titular bem jurídico.
24 FONSECA, José Roberto Franco da. Op. cit. (nota 19), p. 378.
25 Ibid., p. 379.
26 Vale registrar aqui a posição de Gómez-Robledo Verduzco, a respeito de responsabilidade penal, ele afirma
que: “A diferencia de lo que sucede en los órdenes jurídicos nacionales, en el derecho internacional se des-
conoce el principio de la llamada responsabilidad penal, por lo que la responsabilidad internacional asegura
simplemente la reparación como consecuencia de una violación jurídica”. GOMEZ-ROBLEDO VERDUZCO,
Alonso. In: Diccionario de Derecho Internacional. México: Porrúa; UNAM, 2001. p. 304.
27 FONSECA, José Roberto Franco da. Op. cit. (nota 19), p. 382.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 267
28 Eis aqui alguns Casos do Brasil na Corte Interamericana de Direitos Humanos: 1) Caso Ximenes Lopes
versus Brasil. Sentença de 4 de julho de 2006. Este caso abre uma série de condenações do Brasil na CIDH.
Interessante notar que a sentença condenatória já constitui forma de reparação: “Esta Sentença constitui
per se uma forma de reparação, nos termos do parágrafo 251”. 2) Caso Nogueira de Carvalho e Outro
Versus Brasil. Sentença de 28 de Novembro de 2006. 3) Caso Gomes Lund e outros vs. Brasil (“Guerrilha
do Araguaia”). Sentença de 24 de novembro de 2010. 4) Caso Herzog e outros vs. Brasil. Sentença de 15
de março de 2018. O Brasil foi condenado por unanimidade.
29 PASTOR RIDRUEJO, José Antonio. Curso de derecho internacional público y organizaciones internacionales.
6. ed. Madrid: Tecnos, 1996. p. 676.
30 “Cette frontiere un peu artificielle entre ces deux corps de droit tendd’ailleurs a disparaitre”. NAHLIK, Stanislaw.
Précis abrégé de droit international humanitaire. Revue Internationale de la Croix-Rouge, n. 748, 1984. p. 203.
Quanto a essa divisão entre o direito de Genebra e o direito da Haia, veja-se do mesmo autor: Droit “de Genève”
et Droit “de La Haye”: Unité ou dualité? Annuaire français de droit international, Paris, v. 24, p. 9-27, 1978.
31 “[...] l’intention des delegues rassembles a ces deux occasions a La Haye semble avoir ete bien claire:
incorporer le droit de Geneve dans le droit de La Haye afin que celui-ci constitue un systeme complet des
lois de la guerre”. Ibid., p. 203.
32 GROS ESPIELL, Héctor. Derechos humanos, derecho internacional humanitario y derecho internacional de
los refugiados. Derechos humanos, México, año 8, n. 49, p. 47-55, mayo/jun. 2001. p. 51. Disponível em:
http://historico.juridicas.unam.mx/publica/ librev/rev/derhum/cont/49/pr/pr18.pdf.
268
Merece cuidado especial o lugar que cabe aos crimes de guerra no marco
36 PICTET, Jean. Desarrollo y principios del derecho internacional humanitario. 2. ed. 2. reimpr. Bogotá: Tercer
Mundo; Ginebra: Instituto Henry Dunant; Comité Internacional de la Cruz Roja, 1998. p. 75.
37 Ibid., p. 79.
38 Ibid., p. 80.
39 TRINDADE, Antonio Augusto Cançado. Desarrollo de las relaciones entre el derecho internacional huma-
nitario y la protección internacional de los derechos humanos en su amplia dimensión. Revista IIDH, San
José, n. 16, 1992. p. 43.
270
modo que o TPI, que não está acima das instancias jurisdicionais estatais,
só age em caso de omissão ou de impossibilidade das instancias nacionais.
40 Estatuto do Tribunal Internacional para Julgar as Pessoas Responsáveis por Violações Graves ao Direito Inter-
nacional Humanitário Cometidas no Território da Ex-Jugoslávia desde 1991. Adotado pelo Conselho de Segu-
rança das Nações Unidas, em 25 de maio de 1993 (Resolução n. 827, de 25 de Maio de 1993). Alterado pelas
resoluções do Conselho de Segurança n. 1166, de 13 de Maio de 1998 (altera os artigos 11, 12, 13, que tratam
da composição do Tribunal Internacional, das câmaras e das qualificações e eleição dos juízes) n. 1329, de 30
de Novembro de 2000 (altera o artigo 14 do Estatuto, que trata de cargos e membros das câmaras).
41 Os crimes de guerra são tratados pelo Estatuto no seu artigo 3º: “Violações das leis ou dos costumes da
guerra O Tribunal Internacional terá competência para julgar as pessoas que violarem as leis ou os costumes
da guerra. Tais violações incluem, mas não se limitam a: a) Emprego de armas tóxicas ou outras concebidas
com o objetivo de causar sofrimentos inúteis; b) Destruição sem motivo de cidades, vilas e povoações ou
devastação não justificadas pelas exigências militares; c) Ataque ou bombardeamento, por qualquer meio,
de cidades, vilas, habitações ou construções não defendidas; d) Confisco, destruição ou danificação deli-
berada de edifícios consagrados ao culto, à beneficência e ao ensino, às artes e às ciências, monumentos
históricos, obras de arte e de caráter científico; e) Pilhagem de bens públicos ou privados”.
42 Instituído pelo Conselho de Segurança das Nações Unidas, em 8 de novembro de 1994 (Resolução n. 955),
e alterado pela Resolução n. 1329, de 30 de novembro de 2000. O Tribunal tem competência para julgar as
pessoas físicas (Competência ratione personae) que tenham cometido os seguintes crimes: a) genocídio
(art. 2º); b) crimes contra a humanidade (art. 3º); c) violações graves do artigo 3º comum às Convenções
de Genebra e ao Segundo Protocolo Adicional (art. 4º).
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 271
43 Artigo 2º da Convenção de 1948 define genocídio nestes termos: “Na presente Convenção, entende-se por
genocídio qualquer dos seguintes atos, cometidos com a intenção de destruir, no todo ou em parte, um grupo
nacional, étnico, racial ou religioso, tal como: assassinato de membros do grupo; dano grave à integridade
física ou mental de membros do grupo; submissão intencional do grupo a condições de existência que lhe
ocasionem a destruição física total ou parcial; medidas destinadas a impedir os nascimentos no seio do
grupo; transferência forçada de menores do grupo para outro”.
44 Os crimes de guerra são definidos pelo Estatuto do Tribunal de Nuremberg deste modo: “Violações de leis
e costumes de guerra. Essas violações compreendem, sem serem limitadas nas leis e costumes: o assas-
sinato, maus-tratos, ou deportação para trabalhos forçados ou para qualquer outro fim, das populações
civis nos territórios ocupados, assassinatos ou maus-tratos de prisioneiros de guerra ou de pessoas no mar,
execução de reféns, pilhagem de bens públicos ou privados, destruição sem motivo de cidades e aldeias,
ou devastações que as exigências militares não justifiquem” Cf. Art. 6.
45 O Estatuto de Roma estabeleceu, entre os tipos penais, o crime de agressão, mas sem defini-lo. A defi-
nição veio somente em 2010 (Resolução RC/Res.6), Artigo 8º bis: “1. Para efeitos do presente Estatuto,
entende-se por ‘crime de agressão’, o planejamento, a preparação, o desencadeamento ou a execução
por uma pessoa que se encontre em posição de controlar ou conduzir de forma efetiva a ação política ou
militar de um Estado de um ato de agressão que, pelo seu caráter, pela sua gravidade e dimensão, constitui
uma violação manifesta da Carta das Nações Unidas”. O § 2. do mesmo artigo diz ainda: “[...] entende-se
por ‘ato de agressão’, o uso da força armada por um Estado contra a soberania, integridade territorial ou
independência política de outro Estado, ou de qualquer outra forma incompatível com a Carta das Nações
Unidas. Independentemente da existência ou não de uma declaração de guerra, em conformidade com a
Resolução n. 3314 (XXIX) da Assembleia Geral das Nações Unidas, de 14 de dezembro de 1974”. O artigo
inclui como atos de agressão estes: a) A invasão do território de um Estado; b) O bombardeio; c) O bloqueio
de portos ou das costas de um Estado; d) O ataque pelas forças armadas de um Estado contra as forças
terrestres, navais ou aéreas, ou contra a marinha mercante e a aviação civil de outro Estado; e) O envio,
272
por parte de um Estado, de grupos armados, de forças irregulares ou de mercenários que pratiquem, contra
outro Estado, atos de força armada de gravidade equiparável à dos atos acima enumerados.
46 Cf. MELLO, Celso D. de Albuquerque. Direito penal e direito internacional. Rio de Janeiro: Livraria Freitas
Bastos, 1978. p. 211-212. Veja-se também JESCHECK, Hans-Heinrich. Crimes du droit des gens. Revue
internationale de droit pénal, 1955, v. 26, p. 534, apud GIL GIL, Alicia. El genocidio y otros crímenes
internacionales. Valencia: Centro Francisco Tomás y Valiente, 1999. p. 83. A questão da parcialidade do
Tribunal de Nuremberg é abordada por Celso Mello da seguinte forma: “Devemos reconhecer que razão
assiste àqueles que afirmam que o grande crime dos alemães foi terem perdido a guerra, porque se eles
vencessem os mesmos argumentos aqui desenvolvidos seriam utilizados em sentido contrário”. MELLO,
Celso D. de Albuquerque. Op. Cit. p. 213.
47 JESCHECK, Hans-Heinrich. El Tribunal Penal Internacional. Tradução: María José Pifarré de Moner. Revista
penal, n. 8, p. 53-59, 2001. p. 54. Disponível em: http://hdl.handle.net/10272/12965.
48 JIMENEZ DE ASUA, Luis. Principios de derecho penal: la ley y el delito. Buenos Aires: Abeledo-Perrot,
1997. p. 174-175.
49 Ibid., p. 175.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 273
Segurança, nos termos do Capítulo VII da Carta das Nações Unidas, pode
ampliar a jurisdição do Tribunal Penal Internacional (Cf. art. 3, b, do Esta-
tuto de Roma). Neste caso, o TPI “[...] assume na prática a função de órgão
permanente do Conselho de Segurança com competência geral em matéria
de crimes previstos no Estatuto, independentemente do lugar que se tenham
cometido”51. Como se pode observar, há mecanismos jurídicos e instâncias
adequadas para castigar os criminosos de guerra. No entanto, o Conselho de
Segurança, ainda mal, continua sendo o óbice intransponível nessa matéria,
porque abriga Estados com direito de veto, dentre eles a Rússia.
Francisco Rezek, que nega a personalidade jurídica internacional do
indivíduo, afirma que:
54 A/RES/94 (I) Confirmação dos princípios do Direito Internacional reconhecidos pelo estatuto do Tribunal
de Nuremberg. Quinquagésima quinta sessão plenária, de 11 de dezembro de 1945. A/RES/488(V) For-
mulação dos princípios de Nuremberg, de 12 de dezembro de 1950. Esses Princípios de Nuremberg foram
publicados no Yearbook of the International Law Commission 1950. United Nations: New York, 1957. v. 2,
p. 195. Nas páginas 191-195, comenta-se princípio por princípio. Cf. também o Relatório de J. Spiropoulos,
Relator Especial (Document A/CN.4/22). p. 181-190.
55 A Comissão de Direito Internacional das Nações Unidas foi instituída pela Assembleia Geral mediante a resolução
174 (II), 1947. A Comissão de Direito Internacional tem por finalidade “Promover o desenvolvimento progressivo
do direito internacional e sua codificação” (Art. 1. do Estatuto). A Comissão, que se reúne anualmente em
Genebra, é composta por 34 membros de “reconhecida competência em direito internacional”.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 275
58 A lista de perdas provocadas pelas guerras é enorme e irreparável, vale lembrar, por último, os sérios danos
causados pelos venezianos ao templo do Parthenon, da Acrópole de Atenas, em 1687 (Cf. Grande Guerra
Turca) ou a demolição das torres da Alhambra (Espanha), em 1812, feitas pelos franceses comandados
por Napoleão. Cf. Convenção e Protocolo para a proteção de bens culturais em caso de conflito armado,
de 1954. Protocolo I, art. 53; Protocolo II, art. 16.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 277
deste crime, convém esclarecer que o conceito de guerra total foi teorizado pelo
general alemão Erich Ludendorff (1865-1937), veterano da Primeira Guerra
Mundial, na obra A Guerra Total (Der Totale Krieg, 1935). Esse tipo de guerra
consiste na mobilização de todos os recursos materiais e humanos do Estado
com vistas à destruição do inimigo. Importa observar que a obra clássica “Da
Guerra” (Vom Kriege, 1832) de Clausewitz é considerada pelo próprio Luden-
dorff como “[...] resultado de uma evolução histórica hoje anacrônica e desde
qualquer ponto de vista ultrapassada; o estudo desta obra correria o risco de
criar confusão”59. A guerra total de Ludendorff refere-se à prática da guerra,
não à teoria, como faz Clausewitz na aludida obra. Este expediente de guerra
sem quartel viola todas as regras aplicáveis aos conflitos armados, posto que,
sobretudo da parte russa, tudo indica que não há distinção entre beligerantes
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
59 LUDENDORFF, Erich. La guerra total. Tradução: J. C. Iglesias Brickles. Buenos Aires: Pleamar, 1964. 12 p.
60 Não dar quartel se traduz pela violência indiscriminada, sem respeito pela vida das pessoas, mesmo as
que estejam impossibilitadas de defender-se ou tenham se rendido. Com afronta, portanto, às normas que
disciplinam a conduta dos beligerantes. O Protocolo I (1977), no art. 40, preceitua o seguinte: “É proibido
ordenar que não haja sobreviventes, ameaçar com isto o adversário ou conduzir as hostilidades em função
de tal decisão”. Veja-se também o art. 23 da Convenção de Haia, de 1907 (IV), relativa às Leis e Costumes
da Guerra Terrestre.
61 REZEK, José Francisco. Op. cit. (nota 1), p. 447.
278
projéteis, materiais e métodos de combate que, pela sua própria natureza, causem
ferimentos supérfluos ou sofrimentos desnecessários ou que surtam efeitos
indiscriminados, em violação do direito internacional aplicável aos conflitos
armados”. Trata-se de aspecto importante que já consta do Protocolo I de 1977,
na seção relativa aos métodos e meios de guerra (art. 35 § 2º). Em relação aos
métodos de combate, que agravam em vão o sofrimento das pessoas que estão
fora de combate, a Regulamento da Convenção da Haia (1907) relativa às leis
e costumes da guerra terrestre (IV) já trata desse assunto (cf. art. 22). Como se
disse em outra parte deste artigo, o Estatuto de Roma acolhe todas as contri-
buições de direito internacional humanitário até então existentes.
Constituem-se crimes de guerra, do mesmo modo, os atos contrários à
62 Cf. Convenções de Genebra de 1949. Na Convenção I, artigos: 3 e 12. Na Convenção II, artigos: 3 e 12.
Na Convenção III, artigos: 3, 14, 16, 25, 29, 49, 88, 97 e 108; Na Convenção IV, artigos: 3, 14, 16, 17,
21-23, 27, 38, 50, 76, 85, 89, 91, 97, 98, 119, 124, 127, 132. No Protocolo I (1977) artigos: 8º, 70, 75, 76.
No Protocolo II (1977) artigos 4, 5, 6. VERRI, Pietro. Diccionario de Derecho Internacional de los conflictos
armados. Tradução: Mauricio Duque Ortiz y René Cabrera. Bogotá: Tercer Mundo, 1999. p. 67.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 279
63 Segundo o UNICEF há, atualmente, em torno de 300.000 crianças vítimas de recrutamento e que participam
como soldados em mais de 30 conflitos em todo o mundo, com destaque para estes Estados: Sudão do
Sul, República Democrática do Congo, Afeganistão, Iêmen, Síria, Etiópia, Mianmar etc. O UNICEF analisa
essa grave situação das crianças com estas palavras: “Durante o tempo em que estas crianças estão vin-
culadas às forças e grupos armados, são testemunhas e vítimas de terríveis atos de violência e, inclusive,
são obrigados a exercê-la. Os traumas emocionais que isso lhes pode provocar são difíceis de superar”.
Cf. UNICEF. Comunicado de prensa. 31 dez. 2021. Veja também: Noor Mahtani. El precio de la guerra
lo pagan los niños. El País. 25 ene. 2022. Disponível em: https://elpais.com/planeta-futuro/2022-01-25/
el-precio-de-la-guerra-lo-pagan-los-ninos.html.
280
conflitos. A Encíclica diz: “Difunde-se cada vez mais entre os homens de nosso
tempo a persuasão de que as eventuais controvérsias entre os povos devem ser
dirimidas com negociações e não com armas” (Pacem in Terris, nº 125).
A catástrofe nuclear, já faz certo tempo, ronda o mundo como o maior
desafio. Vive-se sob o manto da ameaça quotidiana, sob o medo de que alguém
empregue armas atômicas, não necessariamente a Rússia de Putin. É preci-
samente nesse sentido que João XXIII, a suma autoridade da Igreja Católica,
questiona a licitude da guerra. Diz ele: “[…] o terrível poder de destruição
das armas modernas é alimentado pelo temor das calamidades e das ruínas
desastrosas que estas armas podem acarretar”. Dá-se o alerta no documento
para o tamanho do perigo, ademais de mostrar a inadequação da violência como
meio de solução de desavenças: “[…] não é mais possível pensar que nesta
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
nossa era atômica a guerra seja um meio apto para ressarcir direitos violados”
(Pacem in Terris, nº 126). Parece-me irretocável essa afirmação. Não é sensata
a promoção de guerra, seja de que tipo ela for (legal ou ilegal, legítima ou
ilegítima, justa ou injusta). Mas, o permanente espetáculo da guerra no caso
da Ucrânia, que dia após dia segue inalterado, seguramente não é a melhor
maneira de lidar com situação tão temerária. Há riscos incomensuráveis para
todos. Quanto tempo falta e quantos malefícios ainda serão necessários, antes
de os beligerantes invocarem ou aceitarem o diálogo?
Deve lembrar-se que o caso da guerra na Ucrânia não é novo, os Estados
Unidos, por exemplo, só para citar casos recentes, ocuparam militarmente o
Iraque, antes tinham invadido o Afeganistão, usando argumentos semelhan-
tes (Guerra Preventiva66), como resposta aos atentados de 11 de setembro de
2001. Neste caso, assim como no caso da Ucrânia, antes do uso da força a
questão deveria ter sido deslocada para o Conselho de Segurança e passar a
ser tratada como questão de interesse da sociedade internacional, e não apenas
de interesse de um Estado que invade outro como “prevenção”. Trata-se de
questão relevante, porque tanto os Estados Unidos como a Rússia têm “direito
de veto” no Conselho de Segurança.
66 Remeto o leitor a texto escrito por mim a respeito desse assunto: “Os fundamentos da denominada Doutrina
Bush em geral, e da guerra preventiva em particular, encontram-se numa série de discursos e documentos
emanados da Casa Branca a partir de 2001. Na versão oficial, a justificativa da formulação dos preceitos que
constituem essa doutrina está na proteção preventiva e na afirmação da hegemonia dos Estados Unidos.
O propósito central da doutrina é o de Combater o terrorismo. Mas, de acordo com essa doutrina, quem é
considerado terrorista e quem julga essa questão? O conceito de terrorismo pode abranger várias categorias
de sujeitos. Assim, terroristas podem ser, por exemplo, os Estados reunidos sob a denominação eixo do mal;
pode ser considerado terrorista, ainda, qualquer Estado que os Estados Unidos apontem como tal; podem ser
também considerados terroristas, do mesmo modo, facções ou pessoas; tudo sempre a critério do governo de
Washington. Consoante o presidente Bush: “Não fazemos distinção de espécie alguma entre os terroristas e
os que conscientemente lhes dão abrigo ou fornecem ajuda”. SORTO, Fredys Orlando. A Doutrina Bush das
guerras preventivas e o Sistema das Nações Unidas. In: MERCADANTE, Araminta de Azevedo; MAGALHÁES,
José Carlos (org.). Reflexões sobre os 60 anos da ONU. Ijuí: Unijuí, 2005. p. 139.
282
67 Eis a referência nos mesmos termos: “The provision of Article 2, paragraph 4 to refrain from the threat
or use of force constitutes certainly a true obligation of the Members since the enforcement measures of
Chapter VII are primarily intended to be applied as reaction against the threat or use of force in violation of
Article 2, paragraph 4”. KELSEN, Hans. The law of the United Nations: a critical analysis of its fundamental
problems. London: Stevens and Sons, 1954. p. 108.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 283
como afirma Rezek (2016, p. 405), a própria Carta lista em primeiro lugar
os meios diplomáticos.
Como fecho deste singelo texto, recapitulando de certo modo o que foi
dito acima, gostaria de lembrar que a religião (Pacem in Terris), o direito
internacional (Carta da ONU) e a literatura (Guerra e Paz) são unânimes
em considerar a guerra: nociva, ilícita, estúpida. Parece-me lapidar o célebre
trecho de Guerra e Paz, do notável escritor russo Liev Tolstói (1828-1910),
a respeito da guerra, segundo ele, “O objetivo da guerra é o assassinato, os
instrumentos da guerra são a espionagem, a traição e o seu encorajamento, o
extermínio dos habitantes, a pilhagem dos seus bens ou o roubo para o abas-
tecimento do exército, a fraude e a mentira, chamadas de astúcias militares”68.
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
8. Conclusões
O direito internacional humanitário não deve ser confundido com os
direitos humanos, são distintos em razão das suas especificidades, da natureza
das sentenças proferidas pelos tribunais e da índole das penas cominadas. Essa
confusão conceitual deve ser evitada.
A bem da verdade, a despeito do que ainda sustenta parte da doutrina, a
noção de guerra justa não faz mais sentido diante do poder de destruição das
armas modernas, especialmente as atômicas. O direito à legitima defesa está
acautelado na Carta das Nações Unidas, sem necessidade alguma de apelo
ao direito de “guerra justa”.
O preço da alegada segurança russa nesta guerra é a morte, a destruição,
a insegurança, o êxodo. O governo ucraniano pede armas para defender-se, é
legítimo proceder assim, mas descura a diplomacia, o diálogo, o apoio diplo-
mático em favor da negociação e não da guerra. A tragédia virou espetáculo
patético na mídia, prevalece o discurso em favor das armas em detrimento
das palavras que deveriam buscar a paz a todo custo. Certamente, falta a
razão e a diplomacia nessa lutuosa guerra, mas decerto sobram estupidez e
incompetência diplomática.
A guerra se impõe pela certeza da impunidade dos seus mentores, mal-
grado haja a proibição na Carta da ONU e em documentos imprescindíveis
como a Encíclica Pacem in Terris. Questão de grande atualidade, sobretudo
quando se percebe que a maioria dos internacionalistas se dedica à análise do
conflito armado, como se a guerra fosse a única evidência em pauta e o único
caminho possível. Que desalento! Dever-se-ia lembrar a esse respeito que os
meios pacíficos de solução dos conflitos internacionais (diplomáticos, políti-
cos e jurídicos) também fazem parte do direito internacional. A diplomacia é
sem dúvida o meio mais eficiente, ela é inevitável, porque mais cedo ou mais
68 TOLSTÓI, Liev. Guerra e paz. Tradução: Rubens Figueiredo. São Paulo: Cosac Naify, 2013. p. 1617.
284
xx) Utilizar armas, projéteis; materiais e métodos de combate que, pela sua
própria natureza, causem ferimentos supérfluos ou sofrimentos desnecessários
ou que surtam efeitos indiscriminados, em violação do direito internacional
aplicável aos conflitos armados, na medida em que tais armas, projéteis, mate-
riais e métodos de combate sejam objeto de uma proibição geral e estejam
incluídos em um anexo ao presente Estatuto, em virtude de uma alteração
aprovada em conformidade com o disposto nos artigos 121 e 123;
De outro lado, a não inclusão igualmente das armas biológicas e químicas foi
consequência lógica. Ou seriam todas as armas de destruição em massa incluí-
das, ou nenhuma, pois manter as biológicas e as químicas daria a impressão
de que as armas nucleares estavam autorizadas.
regional. Foi considerado, todavia, que o tema deveria ser analisado pelo DIH
e não pelo Pacto, pois aquele é a lex specialis aplicada a tempo de conflito
armado. Tampouco poderia se inferir que todo o uso de arma nuclear implica
em genocídio, pois para a configuração desse crime é necessária a intencio-
nalidade de eliminar certos grupos. Outro argumento é o de que necessaria-
mente haveria incompatibilidade entre o uso de arma nuclear e os tratados
de proteção do meio ambiente, bem como o art. 35, § 3º, e 55 do Protocolo
Adicional I de 1977 adicional às quatro Convenções de Genebra de 1949, que
proíbem utilizar meios e métodos de guerra que são concebidos para causar,
ou dos quais se pode prever que causem, danos extensos, duradouros e gra-
ves ao meio ambiente natural. Sobre esse tópico a CIJ teve mais dificuldades
em não admitir a proibição geral das armas nucleares. Argumentou que tem
consciência que o meio ambiente não é uma abstração, mas um espaço onde
vivem os seres humanos e do qual depende a qualidade de sua vida e saúde,
a incluir as gerações futuras. Mesmo assim, consideram que essas regras não
possui o objetivo de impedir totalmente o direito à defesa, em que pese os
Estados terem limites e o cuidado com o meio ambiente é um deles, que con-
diciona a necessidade e a proporcionalidade do uso da força diante objetivos
militares legítimos. Lembre-se, contudo, que a Índia, ao aceitar o texto do
art. 35 do Protocolo Adicional I, declarou que entendia incluir nesse artigo o
uso de todas as categorias de armas, inclusive a nuclear7.
Sobre a formação de costume internacional, a CIJ defendeu que a tensão
entre a opinio juris do não uso dessas desde o fim da Segunda Mundial não era
suficiente para considerar que os Estados estavam considerando o banimento
como obrigação jurídica, pois entrava o papel da política de utilizar as armas
nucleares para a dissuasão dos conflitos.
Quanto à relação das armas nucleares e o DIH e a neutralidade, a CIJ
determinou que as armas nucleares não podem ser utilizadas contra pessoas
7 INDIA. Statement at the CDDH, Official Records, V. VI, CDDH/SR.39, 25 mar. 1977. p. 115.
292
8 INTERNATIONAL COURT OF JUSTICE, Advisory Opinion on Legality of the Threat or Use of Nuclear
Weapons, Dissenting Opinion of Judge Weeramantry. ICJ Rep. 1996, p. 255 e 330.
9 Ibid., Dissenting Opinion of Judge Koroma, ICJ Rep. 1996, p. 336 e 348.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 293
Artigo 2º
1.Comete crime nos termos da presente Convenção toda pessoa que ilícita
e intencionalmente:
a) possuir material radioativo ou produzir ou possuir um dispositivo: i)
com o propósito de causar morte ou lesões corporais graves; ou ii) com o
11 A/RES/1653 (XVI), 24 nov. 1961; A/RES/37/71 B, 14 dez. 1978; A/RES/34/83, 11 dez. 1979; A/RES/35/152,
12 dez. 1980; A/RES/36/92, 9 dez. 1981.
12 HUMAN RIGHTS COMMITTEE. General comment n. 14: Right to life (1984). In: UN HUMAN RIGHTS
INSTRUMENTS. Compilation of General Comments and General Recommendations Adopted by Human
Rights Treaty Bodies, HRI/GEN/1/Rev.3, 15 ago. 1997. p. 178.
13 HUMAN RIGHTS COMMITEE. General comment n. 36: Right to life (2019). CCPR/C/GC/36, 3 set. 2019.
296
14 ICRC. Avoiding catastrophe: we must act now to ensure nuclear weapons are never again used. News
Release, 17 maio 2023. Disponsível em: https://www.icrc.org/en/document/avoiding-catastrophe-we-must-
-act-now-ensure-nuclear-weapons-are-never-again-used. Acesso em: 23 abr. 2023.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 297
1. Introdução
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
1 CAILLER, Adam. Russian wife tells soldier husband ‘you can rape Ukrainian women if you use a condom’,
Daily Star, 13 abr. 2022. Disponível em: https://www.dailystar.co.uk/news/world-news/russian-wife-tells-sol-
dier-husband-26700311. Acesso em: 1 nov. 2022.
2 Ibid.
3 See GODBOLE, Ramona. Gender-Based Violence in the DRC. New Security Beat, 6 jan. 2011. Disponível
em: https://www.newsecuritybeat.org/2011/01/gender-based-violence-in-the-drc/. Acesso em: 7 dez. 2022.
4 HALL, John. Revealed: How ‘up to 60’ women rule ISIS’s capital by fear. Merciless ‘Jihadettes’ order execu-
tions, punishment lashings, and manage sex slave brothels. Daily Mail, 4 dez. 2014. Disponível em: https://
www.dailymail.co.uk/news/article-2858819/Up-60-British-Jihadette-women-rule-ISIS-s-capital-fear.html.
Acesso em: 7 dez. 2022.
5 TPIR. Prosecutor v. Nyiramasuhuko. Julgamento, 24 jun. 2011, § 4985.
306
6 SJOBERG, Laura. Women as wartime rapists: beyond sensation and stereotyping. New York: New York
Press, 2016.
7 Ibid.
8 Veja, p. ex., PIERCE, Karen F; DEACY, Susan (eds.). Rape in Antiquity: Sexual Violence in the Greek and
Roman Worlds. London: Bloomsbury Academic, 2002.
9 Veja, p. ex., ZURBRIGGEN, Eileen L. Rape, War and the Socialization of Masculinity: Why our Refusal
to Give up Ear Ensures that Rape cannot be Eradicated. Psychology of Women Quarterly, v. 34, n. 4, p.
538-549, 2010; CAMPBELL, Emer. How does Hegemonic Masculinity Influence Wartime Sexual Violence?
E-International Relations, 2 set. 2018. Disponível em: https://www.e-ir.info/2018/09/02/how-does-hegemo-
nic-masculinity-influence-wartime-sexual-violence/ Acesso em: 1 nov. 2022.
10 UN SECURITY COUNCIL, S/RES/1820 (2008), § 4.
11 SEGATO, Rita Laura. Território, soberania e crimes de segundo Estado: a escritura nos corpos das mulheres
de Ciudad Juarez. Revista de Estudos Feministas, v. 13, n. 2, p. 265-284, 2005. p. 275
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 307
12 Ibid., Id.
13 Veja, p. ex., VASILIEV, Sergey. Aggression against Ukraine: Avenues for Accountability for Core Crimes,
EJIL: Talk!, 3 mar. 2022. Disponível em: https://www.ejiltalk.org/aggression-against-ukraine-avenues-for-ac-
countability-for-core-crimes/. Acesso em: 1 nov. 2022.
14 OFFICE OF THE PROSECUTOR, Notification on receipt of referrals and on initiation of investigation, ICC-
01/22-2, 7 mar. 2022. A atuação do TPI também pode ser relevante à luz do princípio da complementaridade,
informando a interpretação do estupro em julgamentos domésticos.
15 ANISTIA INTERNACIONAL. Ukraine: Epidemic of violence against women in conflict-torn east, 11 nov.
2020. Disponível em: https://www.amnesty.org/en/latest/press-release/2020/11/ukraine-epidemic-of-violen-
ce-against-women-in-conflicttorn-east/. Acesso em: 1 nov. 2022.
308
16 OHCHR; UN WOMEN. The strategy for prevention of and response to the conflict-related sexual violence
in Ukraine. UN Women, 6 abr. 2019. Disponíel em: https://ukraine.un.org/en/90689-strategy-prevention-an-
d-response-conflict-related-sexual-violence-ukraine. Acesso em: 1 nov. 2022.
17 ASKIN, Kelly D. Prosecuting Wartime Rape and Other Gender-Related Crimes under International
Law: Extraordinary Advances, Enduring Obstacles. Berkeley Journal of International Law, v. 23, n. 2,
p. 288-349, 2003.
18 A Ucrânia e a Rússia são partes das Convenções de Genebra, bem como do Protocolo Adicional I. Veja,
respectivamente, na base de dados do Comitê Internacional da Cruz Vermelha (CICV), disponível em: https://
ihl-databases.icrc.org/en/ihl-treaties/treaties-and-states-parties. Acesso em: 20 abr. 2023.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 309
as pessoas que não tomem parte diretamente nas hostilidades devem ser tra-
tadas, em todas as circunstâncias, com humanidade, sem nenhuma distinção
de carácter desfavorável baseada, entre outros, no sexo22. Uma das exceções
a este princípio é a clara referência a mulheres no Título III da Convenção,
relativo ao Estatuto e Tratamento das Pessoas Protegidas, em que se estabelece
que: “as mulheres serão especialmente protegidas contra qualquer atentado a
sua honra e, em particular, contra a violação, prostituição forçada ou qualquer
atentado a seu pudor”23. A inclusão deste dispositivo pode ser compreendida
como uma reação às acusações de estupros cometidos durante a II Guerra
Mundial, inclusive àqueles praticados por soldados da ex-União Soviética24.
A limitada tematização do estupro no contexto pós II Guerra Mundial não
permitiu constatar, de forma clara, se o recurso à violência sexual foi uma
estratégia oficial deliberadamente adotada pela ex-União Soviética. Há, no
entanto, indícios de a violência sexual ter, ao menos, reforçado o elo entre
19 CONVENÇÃO DE HAIA RELATIVA ÀS LEIS E COSTUMES DE GUERRA TERRESTRES (ANEXO), 18
out. 1907, Art. 43.
20 Ibid., Art. 46.
21 Para maiores informações sobre as dificuldades encontradas pelo CICV para a elaboração e aprovação da
IV Convenção de Genebra, veja COMITÊ INTERNACIONAL DA CRUZ VERMELHA, Notas Preliminares.
In: COMITÊ INTERNACIONAL DA CRUZ VERMELHA, Convenções de Genebra de 12 de Agosto de 1994.
Genebra: CICV, 1992.
22 Este princípio informa o direito internacional humanitário como um todo. Sobre seu impacto para a proteção
de mulheres, veja OOSTERVELD, Valerie. Feminist debates on civilian women and international humanitarian
law. Windsor Yearbook of Access to Justice, v. 27, n. 1, p. 385-402, 2009.
23 IV CONVENÇÃO DE GENEBRA RELATIVA À PROTEÇÃO DE PESSOAS CIVIS EM TEMPO DE GUERRA,
12 de Agosto de 1949, Art. 27. Vale lembrar que na III Convenção de Genebra, voltada para a proteção dos
prisioneiros de guerra, há dispositivos direcionados à proteção das mulheres. Estes dispositivos, todavia,
não serão abordados neste artigo. Sobre o tema, veja LINDSEY, Charlotte. Women and war: the detention
of women in war time. International Review of the Red Cross, v. 83, n. 842, p. 505-520, 2001.
24 Vários livros fazem referência ao estupro de mulheres por soldados soviéticos, veja, por exemplo, BOEHM,
Philip (ed.). A Woman in Berlin Eight Weeks in the Conquered City: A Diary. Nova Iorque: Metropolitan books,
2005; GEBHARDT, Miriam. Crimes Unspoken: The rape of German women at the end of the Second World
War. Oxford: Polity Press, 2016.
310
25 O’BRIEN, Melanie; QUENIVET, Noelle. Sexual and Gender-Based Violence against Women in the Russia-
-Ukraine Conflict. EJIL: Talk!, 8 jun. 2022. Disponível em: https://www.ejiltalk.org/sexual-and-gender-base-
d-violence-against-women-in-the-russia-ukraine-conflict/. Acesso em: 1 nov. 2022.
26 Ibid.
27 ESCRITÓRIO DO ALTO COMISSARIADO PARA DAS NAÇOES UNIDAS PARA OS DIREITOS HUMANOS.
Conflict-Related Sexual Violence in Ukraine, 14 March 2014 to 31 January 2017. Office of the United Nations
High Commissioner for Human Rights, 16 March 2017, A/HRC/34/CRP.4. Disponível em: http://www.ohchr.org/
Documents/Countries/UA/ReportCRSV_EN.pdf. Acesso em: 1 nov. 2022. Veja também Anosova, Iuliia, Will
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 311
50 TPII. Prosecutor v. Kunarac, Kovac and Vukovic, Julgamento. 22 fev. 2001, § 442. A jurisprudência posterior
do TPII buscou conciliar as decisões nos casos Furndzija e Kunarac, indicando a possibilidade de uma
interpretação mais ampla dos termos força e coação. TPII. Prosecutor v. Kunarac, Kovac and Vukovic.
Julgamento em fase de Apelação. 12 jun. 2002, § 129.
51 TPII. Prosecutor v. Kunarac, Kovac and Vukovic, Julgamento. 22 de Fevereiro de 2001, §§ 450-452.
52 Ibid., § 452.
53 ASSEMBLBLY OF STATES PARTIES TO THE ROME STATUTE OF THE INTERNATIONAL CRIMINAL
COURT. Elements of Crimes, 3-10 set. 2002, Art. 8(2)b(xxii)-(estupro como crime de guerra) e Ar. 7(1)(g)-1
(estupro como crime contra a humanidade).
54 Ibid. Id.
55 TPI. Prosecutor v. Ntaganda. Julgamento, 8 jul. 2019. A condenação de Ntaganda foi confirmada em apelação.
316
portanto, não tivessem filhos ucranianos, Block caracterizou o ato como geno-
cídio61. A autora prossegue sua análise indicando que “os soldados poderiam
ter matado as mulheres e meninas para impedir a reprodução. Mas, eles esco-
lheram infligir danos sexuais como um sinal de seu poder”62. A caracterização
do genocídio pautada exclusivamente na manutenção da vida destas mulheres
não parece, todavia, ser congruente com intenção exigida para a caracterização
do genocídio: a destruição no todo ou em parte, de um grupo nacional, étnico,
racial ou religioso. Até o momento, provas coletadas em relação aos vários
crimes praticados parecem não apoiar a prática do genocídio63.
É no âmbito dos crimes contra a humanidade que o Estatuto de Roma
regula de forma expressa os crimes sexuais, prevendo, pela primeira vez
em âmbito internacional, a título exemplificativo, diversas formas de crimes
sexuais – violação sexual, escravidão sexual, prostituição forçada, gravidez
forçada, esterilização forçada e outras formas de violência. Exige-se, neste
contexto, que a violência sexual seja cometida no quadro de um ataque, gene-
ralizado ou sistemático, contra qualquer população civil. O termo generali-
zado implica um grande número de vítimas, um ataque em grande escala, já
o termo sistemático sugere serem os ataques de alguma forma organizados
ou tolerados, sendo improvável que os incidentes ocorram aleatoriamente.
A generalidade e sistematicidade dos ataques têm sido concebidas à luz das
estruturas hierárquicas que envolvem combatentes durante o conflito armado.
Em outros termos, o potencial impacto da tolerância social, se não do apoio
60 ASSEMBLBLY OF STATES PARTIES TO THE ROME STATUTE OF THE INTERNATIONAL CRIMINAL
COURT. Elements of Crimes, 3-10 set. 2002. Op cit. (nota 3).
61 BLOCK, Sharon, The rape of Ukraine, NCB News, 15 abr. 2022, Disponível em: https://www.nbcnews.com/
think/opinion/ukraine-russia-war-crimes-spotlight-soldier-rape-strategy-rcna25903. Accesso em: 1 nov. 2022.
62 Ibid.
63 Veja, por exemplo, SCHABAS, William A. Genocide and Ukraine: Do words mean what we choose them to
mean? Journal of International Criminal Justice, v. 20, n. 4, p. 843-857, 2022; Quénivet, Noëlle, The conflict
in Ukraine and Genocide, Journal of International Peacekeeping, v. 25, n. 2, p. 141-154, 2022.
318
social, à prática da violência sexual durante conflitos armados ainda não foi
articulado pelo direito internacional penal. Ainda assim, de acordo com o
relatório da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa, a prá-
tica do estupro no conflito entre a Rússia e a Ucrânia pode caracterizar crime
contra a humanidade64.
Um dos grandes desafios que se observa em relação à caracterização do
estupro como crime contra a humanidade diz respeito aos baixos índices de
notificação65, o que dificulta a coleta de provas. Como resultado, Goetz afirma
haver uma tendência a supor a não ocorrência de estupros66. Para evitar o
impacto desta reticência em se reconhecer a prática do estupro, O´Brien e Que-
nivet sugerem dever ser presumida a ocorrência de violência sexual em conflitos
que eles não faziam parte do propósito comum dos membros da milicia sob a
responsabilidade de Katanga nos termos do artigo 25(3)(d) do Estatuto do TPI70.
Desta forma, apesar de não combatentes poderem ser condenados por crimes de
guerra, o TPI parece compreender a noção de propósito comum de forma não
inclusiva, isto é, o amplo apoio social à prática do estupro como instrumento
de guerra não seria suficiente para a caracterização de um propósito comum,
manifesto em um plano ou política.
Uma vez caracterizados os elementos do crime, a condenação por estupro
exige ainda a análise da participação do acusado. À luz da seletividade do
direito internacional penal, o incitamento, de forma individualizada, parece
não ser capaz de mobilizar o direito internacional penal. No contexto de parti-
cipação indireta na prática o estupro, ganha centralidade a responsabilidade de
comando, isto é, se o acusado sabia que as forças sob o seu comando cometiam
ou cometeram crimes internacionais e as medidas adotadas para impedir e
repreender estes atos. No caso Bemba, o TPI entendeu ser necessário avaliar
as medidas que estavam à disposição do comandante nas circunstâncias da
época71. Considerando o status de Bemba como um comandante remoto
com tropas em um país estrangeiro, o TPI afirmou que lhe era devida certa
deferência devido às “limitações que o Sr. Bemba teria enfrentado ao inves-
tigar e processar crimes cometidos em outros países”72. Este entendimento
70 TPI. Prosecutor v. Katanga, Julgamento, ICC-01/04-01/07, 7 mar. 2014, §1663. Esta compreensão foi pau-
tada na ausência de provas capazes de comprovar a prática do estupro antes da batalha de Bogoro. Neste
sentido, a definição do início do conflito armado entre a Rússia e a Ucrânia pode ser importante para a
caracterização do estupro como crime de guerra. Segundo Rosenberg, o conflito remonta a 2014, sendo que
a partir de 2017-2018 relatórios documentando a prática do estupro começam a surgir. Veja ROSENBERG,
Erin Farrel. Response to conflict-related sexual violence in Ukraine: Accountability and Reparations. Opinio
Juris, 21 jun. 2022. Disponível em: http://opiniojuris.org/2022/06/21/response-to-conflict-related-sexual-vio-
lence-in-ukraine-accountability-and-reparations/. Acesso em: 1 nov. 2022.
71 TPI, Prosecutor v. Bemba, Julgamento em fase de Apelação, ICC-01/05-01/08, 8 jun. 2018, § 168.
72 Id. § 191.
320
4. Considerações finais
73 Veja SÁCOUTO, Susana; SELLERS, Patricia. The Bemba Appeals Chamber Judgment: Impunity for Sexual
and Gender-Based Crimes? William & Mary Bill of Rights Journal, v. 27, n. 3, p. 599-622, 2019.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 321
1. Introdução
penal relativos à prisão de um agente russo que tentou ingressar em solo holan-
dês com o objetivo de realizar espionagem no Tribunal Penal Internacional
(TPI). O referido agente se fazia passar por brasileiro e atualmente está preso
por sentença condenatória no Distrito Federal originária da justiça federal em
São Paulo. A análise debruça-se sobre o tratamento legislativo no nosso país
dado à espionagem, primeiro dentro da violação de acesso a comunicações e
bancos de dados, fato que já se constitui em crime, como, também, quanto à
obtenção da informação sigilosa, o que se pode considerar como criminaliza-
ção da espionagem de forma direta. Procuramos demonstrar, após análise do
tema espionagem no direito internacional, sobre a necessidade de alteração do
Estatuto de Roma para se fazer previsão de crime específico de espionagem
contra os órgãos da Corte, como também sugerimos alterações nas legisla-
ções nacionais dos Estados que aderiram ao Tratado, como forma de melhor
preservar a atividade judicante deste importante Tribunal Internacional.
2. O conceito de espionagem
Já neste caso as definições dadas pela lei para informações restritas funcionam
como definição da matéria proibitiva dos tipos relacionados diretamente com a
espionagem, por exemplo, artigo 359-K do CP, que, portanto, se classifica como
norma penal em branco em sentido amplo e heterogênea.
Entretanto, como não se admite crime sem lesão efetiva ou potencial ao bem
jurídico, mesmo uma informação que ingresse no conceito legal de ¨segredo¨ ou
¨restrita¨ deixa de ter proteção penal se a sua ¨natureza¨ não for de informação
que não possa vir ao conhecimento público, sob pena de causar prejuízo público
ou privado, de qualquer índole, material ou não. Não se admite tipicidade penal
sem potencialidade lesiva, decorrente da devassa ou divulgação da informação
supostamente sigilosa. No nosso entendimento, deve-se aferir se a informação
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
3. Clandestinidade
importante a sua não divulgação. Cumpre aos Estados que ponham em segredo
aquilo que consideram relevante.
5 No CP, o artigo 154-A pune o acesso ilegal de sistemas de informática. Observe-se que o simples ingresso
no sistema, sem autorização, já se constitui crime, independente de a informação ser ou não sigilosa. A
clandestinidade do comportamento é o suficiente para a punição. O passo seguinte, a obtenção de informação
sigilosa, apenas qualifica o crime. Observe-se que quando o “acesso” ilegal de sistemas for da administração
pública, o crime passa a ser de ação penal pública incondicionada. Então, conclui-se que o tipo penal tutela
a proteção da informação em nível público e privado. A legislação penal brasileira, como dito, se antecipa
à obtenção de informações sigilosas, pois o acesso ilegal já é crime mesmo que visando informação sem
caráter sigiloso. A obtenção da informação, resultado seguinte ao acesso ilegal, é tratada como resultado
da atividade de espionagem, que apenas qualifica o crime. Segue-se outra hipótese de acesso ilegal de
informações – a devassa de correspondência – isto é, a tomada de conhecimento do conteúdo de corres-
pondência, que também pode se manifestar como uma forma de espionagem. Cf. os artigos 40 e 41 da
Lei nº 6.538/78. Outra hipótese de acesso ilegal de informações é a interceptação telefônica ou de telemática,
prevista na Lei nº 9.296/96, art. 10. Sem dúvida, a criminalização mais importante nesse tema, em vista da
antecipação da resposta penal e que passou por recente alteração legislativa. Em nível seguinte ao acesso
ilegal de informações, temos a “revelação” ou “divulgação” de segredo. Em nível privado a tutela ocorre no
artigo 154 do CP. Tratando-se de informação sigilosa de natureza pública, temos os artigos 153 e 325 do
328
CP. Observe-se que o sujeito ativo do artigo 153 do CP é o particular. Caso a revelação de segredo acarrete
prejuízo para a administração pública, o crime passa a ser regido por ação penal pública incondicionada.
Já no crime do artigo 325 do CP, o sujeito ativo é o funcionário público, tal como definido no artigo 327 do
mesmo código. Aqui o particular pode ser sujeito ativo, porém em concurso com o funcionário público, por
força do que dispõe o artigo 30 do CP. A punição do particular no artigo 153 pressupõe que atua isoladamente
sem concurso com o funcionário público. Desses crimes podem decorrer a tutela direta da espionagem, que
serão referidos à frente. A nosso sentir, os tipos relacionados ao acesso ilegal de informações se situariam
como fase de execução da tutela direta da espionagem e, portanto, seriam absorvidos pelo princípio da
consunção, situando-se como antefato impunível.
6 Art. 195. Comete crime de concorrência desleal quem: [...]
XI – divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos, informações ou dados confidenciais,
utilizáveis na indústria, comércio ou prestação de serviços, excluídos aqueles que sejam de conhecimento
público ou que sejam evidentes para um técnico no assunto, a que teve acesso mediante relação contratual
ou empregatícia, mesmo após o término do contrato;
XII – divulga, explora ou utiliza-se, sem autorização, de conhecimentos ou informações a que se refere o
inciso anterior, obtidos por meios ilícitos ou a que teve acesso mediante fraude.
7 CONDEIXA, Fábio de Macedo Soares. Espionagem e Direito. Revista Brasileira de Inteligência, n. 10,
p. 21-40, 2015.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 329
atua dentro dos limites do Direito Internacional9. Claro, atuando sob falsos
propósitos, o agente diplomata age de forma clandestina, se torna um espião,
e a consequência disso normalmente é a sua consideração como persona non
grata. Já o espião, na grande maioria dos países paga com uma longa privação
da sua liberdade ou até com a própria vida. Como veremos a seguir, no Direito
de Guerra o espião perde o estatuto de prisioneiro de guerra, o que facilita a
sua punição de acordo com as leis penais domésticas. No direito internacional,
porém, não há norma explicitamente criminalizando tais condutas.
8 Cf. Hernandéz, Juan Pablo. The Legality of Espionage Under International Law. The Treaty Examiner, issue
1, p. 31-38, 2020.
9 O supracitado autor traça a diferença entre a atuação do espião e do diplomata (p. 34): “O principal objetivo
da espionagem é coletar informações do Estado anfitrião e comunicá-las ao Estado remetente. Este propósito
não é inédito no direito internacional. O direito diplomático a define como uma das atribuições cometidas às
missões diplomáticas. Espiões e diplomatas são diferentes em quatro aspectos. Primeiro, os espiões não
revelam sua condição ao Estado receptor, pois sua operação é encoberta. Em segundo lugar, ao contrário
dos diplomatas, os espiões não procuram apenas averiguar ‘condições e desenvolvimentos’ no Estado
receptor, mas também descobrir informações confidenciais e altamente sensíveis que o Estado receptor não
disponibiliza prontamente (por exemplo, informações de segurança nacional). Em terceiro lugar, ao contrário
dos diplomatas, os espiões não empregam necessariamente meios legais nesse esforço. Finalmente, os
diplomatas têm múltiplas funções além da coleta de informações: a Convenção de Viena sobre Relações
Diplomáticas (VCDR) de 1961 estabelece que as outras funções dos diplomatas são representar seu Estado
de envio, proteger seus interesses e seus nacionais no exterior, negociar e promover relações amigáveis
relações (ver artigo 3º, n. 1). A similaridade dos papéis cria um risco significativo de sobreposição, o que
tem levado Estados a expulsar diplomatas por acusações de espionagem. Alguns autores consideram que
o envio de espiões disfarçados de diplomatas é um abuso da imunidade e dos privilégios diplomáticos.
O VCDR não regula o cenário de envio de agentes secretos para coletar informações confidenciais ou
influenciar assuntos internos. Algo que pode ser destacado é que um dos propósitos do VCDR é facilitar
as relações amistosas entre os Estados; se a espionagem conduz a relações amigáveis entre Estados
parece ser uma questão de análise situacional. No entanto, interpretar a legalidade da espionagem a
partir do silêncio do VCDR seria repugnante ao objeto e finalidade daquele tratado. Conforme esclarece
o preâmbulo do VCDR, as questões não regulamentadas devem continuar a ser reguladas pelo costume
internacional” (tradução livre).
330
10 Não se sabe de detalhes, mas da existência de tais balões: SOUSA, Isaías. Como um balão chines pode
espionar os Estados Unidos. Revista Segurança, sem data e página. Disponível em: https://revistaseguranca.
com.br/como-um-balao-chines-pode-espionar-os-estados-unidos/. Acesso em: 24 abr. 2023.
11 A busca de informações é atividade essencial para se tomar decisão militar, seja ataque ou defesa. Como
dito, de posse de informações precisas, o comandante evita o ataque a objetivos que não sejam militares,
como também consegue discernir objetivos militares dos civis. Cf. Art. 29 do anexo à Convenção IV da
Haia de 1907 relativa às leis e costumes das guerras terrestres, e Artigo 46 do Protocolo (I) adicional às
Convenções de Genebra de 12 de agosto de 1949 relativo à proteção das vítimas dos conflitos armados de
caráter internacional, abaixo transcrito.
12 Ibid., art. 46:
1. Não obstante qualquer outra disposição das Convenções ou do presente Protocolo, qualquer membro das
Forças Armadas de uma Parte em conflito que caia em poder de uma Parte adversa enquanto realize atividades
de espionagem não terá direito ao estatuto de prisioneiro de guerra e poderá ser tratado como espião.
2. Não se considerará que realiza atividades de espionagem o membro das Forças Armadas de uma Parte
em conflito que, em favor dessa Parte, recolha ou tente recolher informação dentro de um território controlado
por uma Parte adversa sempre que, ao fazê-lo, envergue o uniforme das Forças Armadas a que pertence.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 331
6. Espionagem cibernética
3. Não se considerará que realiza atividades de espionagem o membro das Forças Armadas de uma Parte
em conflito que seja residente em território ocupado por uma Parte adversa e que, em favor dessa Parte
de que depende, recolha ou tente recolher informação de interesse militar dentro desse território, exceto
se o fizer mediante falsos pretextos ou proceder de modo deliberadamente clandestino. Além do que, esse
residente não perderá seu direito ao estatuto de prisioneiro de guerra e nem poderá ser tratado como espião
a menos que seja capturado enquanto realize atividades de espionagem.
4. Um membro das Forças Armadas de uma Parte em conflito que não seja residente em território ocupado
por uma Parte adversa e que tenha realizado atividades de espionagem nesse território, não perderá seu
direito ao estatuto de prisioneiro de guerra e nem poderá ser tratado como espião a menos que seja capturado
antes de reintegrar-se às Forças Armadas a que pertence (grifo nosso).
13 Cf. Art. 4 A 6) da Convenção III de Genebra relativa ao tratamento dos Prisioneiros de Guerra, de 12 de
agosto de 1949.
332
14 SCHMITT, Michael N. (ed.). Talinn Manual 2.0 on the International Law Applicable to Cyberoperations.
Cambridge: CUP, 2017.
15 Cf. BAKER, Kurt. What is Cyber Espionage? Crowdstrike, 28 fev. 2023. Disponível em: https://www.crowdstrike.
com/cybersecurity-101/cyberattacks/cyber-espionage/. Acesso em: 25 abr. 2023.
16 Art. 49 do Protocolo (I) adicional às Convenções de Genebra de 12 de agosto de 1949 relativo à proteção
das vítimas dos conflitos armados de caráter internacional: 1. A expressão “ataques” designa os actos de
violência contra o adversário, quer sejam actos ofensivos, quer defensivos [...].
17 INTERNATIONAL COMMITTEE OF THE RED CROSS. Cyber warfare, 29 out. 2010. Disponível em: https://
www.icrc.org/en/document/cyber-warfare. Acesso em: 26 abr. 2023.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 333
7. Descrição do fato
Feita essa breve introdução ao tema, vamos nos debruçar sobre o fato que
se relaciona à espionagem dentro de um órgão internacional, com personali-
dade jurídica de Direito Público Internacional, no caso, o TPI. Não se tratou
de tentativa de espionagem de um Estado contra outro. Esta é a primeira parte
do problema, pois não existe regra internacional a este respeito, nem entre os
Estados, a não ser relativamente a conflitos armados, pior ainda em relação
a organismos internacionais, particularmente dentro do Estatuto de Roma.
Parece-nos que a hipótese deve ser analisada à luz da analogia, tratando a
possível espionagem em questão como se fosse praticada contra os interes-
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
18 Cf. SABBAGH, Dan. Russian spy caught trying to infiltrate war crime court, says Netherlands. The Guardian,
16 jun. 2022. Disponível em: https://www.theguardian.com/law/2022/jun/16/russian-spy-caught-trying-to-in-
filtrate-war-crimes-court-says-netherlands. Acesso em: 26 abr. 2023.
19 CORERA, Gordan. Russian GRU spy tried to infiltrate International Criminal Court. BBC News, 16 jun. 2022.
Disponível em: https://www.bbc.com/news/world-europe-61831961. Acesso em: 27 abr. 2023.
20 BORGES, Rebeca. Ao menos três espiões russos teriam se passados por brasileiros. Metrópoles, 7 abr.
2023. Disponível em: https://www.metropoles.com/brasil/ao-menos-tres-espioes-russos-teriam-se-passado-
-por-brasileiros. Acesso em: 27 abr. 2023.
334
27 POLÌCIA FEDERAL. Portaria SEI PF n. 13578516, 20 jan. 2020. Disponível em: https://www.gov.br/pf/pt-br/
assuntos/imigracao/lei-de-migracao/publicacoes/parana/numig-dpf-fig-pr/instauracao-de-procedimento-
-para-efeito-de-expulsao-do-territorio-nacional-do-a-estrangeiro-a-yovany-ceballo-morejon. Acesso em:
28 abr. 2023.
28 PRAZERES, Leandro; CORERA, Gordon. Op cit. (nota 26).
29 ICC. Headquarters Agreement between the International Criminal Court and the Host State, 7 jun. 2007.
Disponível em: https://www.icc-cpi.int/sites/default/files/NR/rdonlyres/99A82721-ED93-4088-B84D-7B8A-
DA4DD062/280775/ICCBD040108ENG1.pdf. Acesso em: 29 abr. 2023.
336
9. Conclusão
b) A pedido do Tribunal, qualquer Estado Parte submeterá, sempre que o entender necessário, o caso
à apreciação das suas autoridades competentes para fins de procedimento criminal. Essas autoridades
conhecerão do caso com diligência e acionarão os meios necessários para a sua eficaz condução.
34 SERAPIÃO, Fábio. PF transfere suspeito de ser espião russo para presídio de segurança máxima em
Brasília. Folha de S.Paulo, 24 fev. 2023. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/mundo/2023/02/
pf-transfere-suspeito-de-ser-espiao-russo-para-presidio-de-seguranca-maxima-em-brasilia.shtml. Acesso
em: 29 abr. 2023.
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
PARTE IV
DEBATES SOB A ÓTICA DO DIREITO
INTERNACIONAL DOS DIREITOS
HUMANOS E DOS REFUGIADOS
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
19. A ATUAÇÃO DO CONSELHO
DE DIREITOS HUMANOS DA ONU
NO CONTEXTO DO CONFLITO
ARMADO NA UCRÂNIA
Sven Peterke
João Gabriel Dias Arruda Vieira Dantas
1. Introdução
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
1 Cf. FREEDMAN, Rosa. The Human Rights Council. In: MÉGRET, Frédéric; ALSTON, Philip (eds.). The
United Nations and human rights: a critical appraisal. Oxford: OUP, p. 181-238, 2020. p. 184; RAMCHARAN,
Bertrand. The UN Human Rights Council. New York: Routledge, 2013. p. 24.
2 A necessidade de realização de uma revisão por pares (peer review) através da atuação do novo órgão
figurou desde o princípio entre as várias propostas que Kofi Annan, então Secretário-Geral da Organização
das Nações Unidas, apresentou ao longo do processo de reestruturação que levaria à extinção da Comissão
de Direitos Humanos e posterior criação do Conselho de Direitos Humanos (2003-2005). Com o avanço das
reformas, chegou-se à Revisão Periódica Universal.
3 UN GENERAL ASSEMBLY, A/RES/60/251 (2006).
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 343
9 TISTOUNET, Eric. The UN Human Rights Council: A Practical Anatomy. Cheltenham: Edward Elgar Publishing,
2020, p. 17.
10 Ibid., Id.
11 BENVENUTI, Paolo; BARTOLINI, Giulio. Is there a need for new international humanitarian law implemen-
tation mechanisms? In: KOLB, Robert; GAGGIOLO, Gloria (ed.). Research Handbook on Human Rights and
Humanitarian Law. Cheltenham: Edward Elgar Publ., p. 590-627, 2013.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 345
dações, é nítido como a RPU foi utilizada pela Ucrânia como mais um âmbito
no qual o Estado pôde confrontar as condutas da Rússia, tendo em vista que,
quando oportuno, explicitou a responsabilidade desta em também adimplir
com o DIDH e o DIH nas regiões por ela controladas. É o que o Grupo de
Trabalho da RPU apontou ao registrar que, em relação às recomendações feitas
pela Federação Russa, a Ucrânia assentiu serem realmente relevantes às partes
do país controladas pelo Estado revisor, mencionando ter sido na Crimeia que
a impunidade e a discriminação étnica e religiosa se intensificaram, e onde o
direito de ser educado em sua língua nativa foi violado34.
Tunísia, Uganda, Emirados Árabes Unidos, República Unida da Tanzânia, Vanuatu e Iêmen. Foram ausentes:
Afeganistão, Armênia, Azerbaijão, Benin, Burkina Faso, Djibouti, Guiné Equatorial, Guiné, Líbano, Mauritânia,
Marrocos, Ruanda, São Tomé e Príncipe, Ilhas Salomão, Somália, Turquemenistão, Venezuela e Zâmbia.
46 Votos favoráveis: Albânia, Andorra, Antígua e Barbuda, Argentina, Austrália, Áustria, Bahamas, Bélgica, Bósnia
e Herzegovina, Bulgária, Canadá, Chade, Chile, Colômbia, Comores, Costa Rica, Costa do Marfim, Croácia,
Chipre, República Tcheca, República Democrática do Congo, Dinamarca, Dominica, República Dominicana,
Equador, Estônia, Ilhas Fiji, Finlândia, França, Geórgia, Alemanha, Grécia, Granada, Guatemala, Haiti, Hon-
duras, Hungria, Islândia, Irlanda, Israel, Itália, Jamaica, Japão, Kiribati, Letônia, Libéria, Líbia, Liechtenstein,
Lituânia, Luxemburgo, Maláui, Malta, Ilhas Marshall, Ilhas Maurício, Micronésia, Mônaco, Montenegro, Mianmar,
Nauru, Países Baixos, Nova Zelândia, Macedônia do Norte, Noruega, Palau, Panamá, Papua-Nova Guiné,
Paraguai, Peru, Filipinas, Polônia, Portugal, República da Coreia, República da Moldávia, Romênia, Santa
Lúcia, Samoa, San Marino, Sérvia, Seicheles, Serra Leoa, Eslováquia, Eslovênia, Espanha, Suécia, Suíça,
Timor-Leste, Tonga, Turquia, Tuvalu, Ucrânia, Reino Unidos, Estados Unidos da América e Uruguai.
47 Votos contrários: Argélia, Belarus, Bolívia, Burundi, República da África Central, China, Congo, Cuba, República
Popular Democrática da Coreia, Eritreia, Etiópia, Gabão, Irã, Cazaquistão, Quirguistão, Laos, Mali, Nicarágua,
Federação Russa, República Árabe Síria, Tajiquistão, Uzbequistão, Vietnã e Zimbabué.
48 UN NEWS. UN General Assembly votes to suspend Russia from the Human Rights Council, 7 abr. 2022.
Disponível em: https://news.un.org/en/story/2022/04/1115782. Acesso em: 15 nov. 2022.
49 NAÇÕES UNIDAS BRASIL. Ucrânia: Conselho de Direitos Humanos recebe denúncias de execuções, 12
maio 2022. Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/181603-ucrania-conselho-de-direitos-humanos-recebe-
-denuncias-de-execucoes. Acesso em: 15 nov. 2022.
50 ACNUDH. Bachelet descreve série de violações de direitos humanos na Ucrânia, 13 maio 2022. Disponível
em: https://acnudh.org/pt-br/bachelet-descreve-serie-de-violacoes-de-direitos-humanos-na-ucrania/. Acesso
em: 15 nov. 2022.
51 UN REGIONAL INFORMATION CENTRE FOR WESTERN EUROPE. The UN and the war in Ukraine: key
information, 9 mar. 2022. Disponível em: https://unric.org/en/the-un-and-the-war-in-ukraine-key-information/.
Acesso em: 15 nov. 2022.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 355
52 FARGE, Emma. Investigação da ONU conclui que crimes de guerra foram cometidos na Ucrânia, 23 set.
2022. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/noticias/investigacao-da-onu-conclui-que-crimes-de-guer-
ra-foram-cometidos-na-ucrania/. Acesso em: 15 nov. 2022.
53 UN GENERAL ASSEMBLY, A/77/533 (2022).
54 Ibid.
55 UN HUMAN RIGHTS COUNCIL, A/HRC/51/CRP.1 (2022).
356
6. Considerações finais
56 Ibid.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 357
ser utilizado em cenário tão crítico quanto o atual. Nesse sentido, no pre-
sente, a realização das próximas revisões de Ucrânia e Rússia é tão incerta
que soa presunçoso supor que, quando finalmente realizadas, poderão sus-
citar plena e satisfatoriamente todas as questões que vêm sendo objeto de
levantamentos tanto do próprio Conselho de Direitos Humanos quanto de
outras fontes.
Em continuidade, a partir do segundo recorte, evidencia-se que o Con-
selho de Direitos Humanos tem logrado êxito ao menos no que diz respeito
às fact-finding missions e suas consequentes compilações de informações
ou até material probatório. Significa dizer que, naquilo que concerne à
guerra na Ucrânia intensific em 2022, à despeito das especificidades que
afastam a ocorrência da RPU, outro tipo de mecanismo do Conselho – a
Comissão de Inquérito Independente – promete gerar resultados que pos-
sam ser relevantes para identificação de graves e sistemáticas violações
de direitos humanos e a responsabilização tanto dos perpetradores como
os Estados envolvidos.
Convém, contudo, ressaltar duas características que distinguem o seu
funcionamento perante o da Revisão Periódica: primeiramente, o caráter de
independência de sua equipe certamente distancia as Comissões de Inquérito
das consequências danosas da carga política que permeia o ConsDH; todavia,
é igualmente necessário reconhecer que o seu objetivo de compilação de fatos
é outro que aquele da RPU: realizar uma coleta de informações documentando
potenciais crimes contra os direitos humanos, para que justiça possa ser feita
em momento posterior.
Com os futuros acontecimentos do conflito, incluso o seu término, resta
vislumbrar de que forma as suas conclusões servirão de base para ações mais
definitivas quanto à responsabilização de violadores de direitos humanos e
direito humanitário, ao acesso à justiça de suas vítimas e à reconstrução de toda
358
a sociedade por ele impactada. Nesse sentido, é possível especular até mesmo
que sejam utilizados nos próximos ciclos de revisão de Ucrânia e Rússia.
Verificou-se que, dentro do que lhe cabe, o ConsDH tem sido capaz
de aplicar alguns dos mecanismos que detém às circunstâncias mais atuais
do histórico conflito entre a Ucrânia e a Rússia. Nesse sentido, é necessário
reconhecer a respeitabilidade do seu trabalho, sobremaneira tendo em mente
não ser justo e tampouco sensato atribuir a apenas um órgão de todo o sistema
internacional de proteção dos direitos humanos a missão de pôr fim a uma
guerra originada por causas tão múltiplas.
1. Introdução
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
6 RENUCCI, Jean-François. Introduction Générale à la Convention Européenne des Droits de l’Homme: Droits
garantis et mécanisme de protection. Strasbourg: Editions du Conseil de 1’Europe, 2005, p. 42.
7 CONVENTION DE SAUVEGARDE DES DROITS DE L’HOMME ET DES LIBERTÉS FONDAMENTALES,
Rome, 3 set. 1953, 213 UNTS 221, Arts. 1 a 18.
8 DAUDI, Mireya Castillo. Derecho Internacional de los Derechos Humanos. Valencia, Tirant lo Blanch, 2006.
9 ALVARADO, Paola Andrea Acosta. Tribunal Europeo y Corte Interamericana de Derechos Humanos. Esce-
narios idôneos para Ia garantia dei derecho de acceso a Ia justicia internacional?. Bogotá: Universidad
Externado de Colombia, 2007.
10 Importante notar que o Conselho de Ministros também exercia uma importante função de apreciação das
demandas de violação da Convenção. Entretanto o Protocolo Adicional nº 9 limitou a função do Conselho
de Ministros à supervisão da execução de sentenças emitidas pela Corte. GASPAROTO, Ana Lúcia; BLA-
NES SALA, José. O Sistema Europeu de Proteção dos Direitos Humanos. Revista do Instituto Brasileiro de
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 361
Parte pode submeter à Corte petições que digam respeito a violações das
disposições da Convenção e dos seus protocolos e julguem poder ser impu-
tadas a outro Estado Parte. A pedido do Comitê de Ministros, a Corte pode,
ainda, emitir pareceres sobre questões jurídicas relativas à interpretação da
Convenção e dos seus protocolos adicionais.
Enquanto Estados Partes do Conselho da Europa, tanto a Rússia quanto
a Ucrânia ratificaram a Convenção Europeia de Direitos Humanos e aderiram
à jurisdição da CEDH.
A Rússia aderiu ao Conselho da Europa em 28 de fevereiro de 1996 e
ratificou a Convenção Europeia de Direitos Humanos através da Lei Federal
nº 54-FZ de 30 de março de 1998 que entrou em vigor em 5 de maio de 1998.
Através do mesmo ato, a Rússia admitiu o direito de petição individual e a
jurisdição obrigatória da CEDH12.
Nas primeiras horas do dia 24 de fevereiro de 2022, a Rússia anunciou
uma operação militar contra a Ucrânia que se tornou, até o momento, um
dos maiores conflitos militares na Europa desde o fim da Segunda Guerra
Mundial, gerando a maior crise de segurança no continente europeu desde
a Guerra Fria.
Em 25 de fevereiro, um dia após a invasão, a Rússia foi suspensa de seus
direitos de representação no Conselho da Europa, sob cuja égide funciona o
sistema europeu de direitos humanos. Em virtude de sua retirada do Conselho
da Europa, a Rússia sinalizou sua intenção de denunciar a Convenção Europeia
de Direitos Humanos13.
14 STATUT DU CONSEIL DE L’EUROPE. Op cit. (nota 2), Art. 7: “Qualquer Membro do Conselho da Europa
pode retirar-se, notificando a sua decisão ao Secretário-Geral. A notificação terá efeito no fim do ano financeiro
em curso, se houver sido feita nos nove primeiros meses desse ano, e no fim do ano financeiro seguinte,
se houver sido feita nos últimos três meses”.
15 CONSEIL DE L’EUROPE. Conséquences de l’agression de la Fédération de Russie contre l’Ukraine. Avis
300 (2022). Disponível em: https://pace.coe.int/fr/files/29885/html. Acesso em: 11 out. 2022.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 363
“de lançar ataques militares contra civis e objetos civis, incluindo casas,
veículos de emergência e outros bens civis especialmente protegidos,
tais como escolas e hospitais, e para tais como escolas e hospitais, e para
16 CEDH, Affaire A.S. c. France, n. 46240/15, Julgamento, 19 abr. 2018. CEDH, Affaire Novaya Gazeta et
autres c/ Russie, n. 11885/22. Medidas cautelares, 10 mar. 2022.
17 COUR EUROPÉENNE DES DROITS DE L’HOMME. Les mesures provisoires. Strasbourg, L’Unité de la
Presse, août 2022. Disponível em: https://www.echr.coe.int/documents/fs_interim_measures_fra.pdf. Acesso
em: 15 out. 2022.
18 CEDH, Affaire Ukraine c. Russie, n. 11055/22. Medidas cautelares, 1 mar. 2022.
364
19 Ibid., § 1.
20 COUR EUROPÉENNE DES DROITS DE L’HOMME. Communiqué de Presse 073/2022. Strasbourg,
3 mar. 2022.
21 CEDH, Affaire Novaya Gazeta et autres c/ Russie. Op cit. (nota 16).
22 O Novaya Gazeta tem como editor o jornalista Dmitry Muratov, ganhador do Prêmio Nobel da Paz em 2021
pela defesa dos direitos e liberdades de expressão.
23 CEDH, CM/Res 2 (2022).
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 365
críticas leves30.
Tal decisão deveu-se à interpretação do artigo 15, em especial dos parágrafos
1 e 4, que dispõe que os princípios e normas de direito internacional universal-
mente reconhecidos, assim como acordos internacionais da Federação Russa,
devem ser parte integrante de seu sistema jurídico. Segundo este parágrafo “se
um acordo internacional da Federação Russa estabelecer regras diferentes das
estipuladas por lei, as regras do acordo internacional serão aplicadas”31.
Neste sentido, segundo dispõe a jurisprudência e ordenamento jurídico
russo, se regras diferentes daquelas previstas por lei forem estabelecidas por
um tratado internacional da Federação Russa, as regras do tratado internacional
devem prevalecer. Assim, não se contesta que a Convenção prevalece sobre as
leis – sejam elas federais ou regionais – e sobre atos normativos em geral. Mas
a Constituição, de seu próprio ponto de vista, prevalece sobre os compromissos
internacionais qualquer que seja sua natureza, segundo a jurisprudência russa.
A interpretação acerca da hierarquia da Convenção Europeia de Direitos
Humanos, de fato, não representa por si só um perigo ao descumprimento
das decisões da Corte. A decisão não está muito longe do que diversos países
europeus ou não tem expressado em sua jurisprudência acerca dos tratados
internacionais. O que faz da Rússia um caso à parte é sua reiterada resistência
ao cumprimento das decisões da Corte e aos direitos e liberdades expressos
na Convenção.
A Rússia foi até agora a principal fonte de casos perante a CEDH, dos 70.000
casos pendentes na Corte, quase um quarto (24,2%) diz respeito à Rússia32,
30 KOROTEEV, Kirill. La Russie et la Convention Europeenne des Droits de l’homme. Bilan Jurisprudentiel et
Institutionnel. Droits fondamentaux, n. 5, jan. – déc. 2005. Disponível em: https://www.crdh.fr/wp-content/
uploads/la_russie_et_la_convention_europeenne_des_droits_de_lhomme._bilan_jurisprudentiel_et_insti-
tutionnel.pdf. Acesso em: 4 nov. 2022.
31 Ibid., p. 8.
32 Ibid., p. 1.
368
Não que as relações com a Rússia tenham sido fáceis desde a adesão desta
ao sistema. O relacionamento da Rússia com a Corte Europeia tem sido com-
plicado desde o seu início. A Rússia, pouco depois de se juntar ao Conselho da
Europa, embarcou em uma segunda guerra na Chechênia, por exemplo33.
A Corte emitiu centenas de sentenças contra a Rússia por violações de
direitos humanos durante o conflito. Apenas uma parte das decisões foram
executadas. O motivo para o descumprimento das decisões seria o fato de
muitas delas envolverem as forças de segurança russa, um dos principais
pilares do atual regime34.
Durante os últimos 10 anos, as autoridades russas têm defendido e per-
petuado o sexismo e a homofobia sob o disfarce de “valores tradicionais”.
4. Considerações Finais
o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos que não pode ser formal-
mente denunciado e que conta com um sistema de comunicações individuais
dirigidas ao Comitê que o monitora.
É pouco provável que a Rússia se submeta às decisões ou observe o
conteúdo de tais dispositivos. Entretanto, em um Estado onde os direitos e
garantias fundamentais desmoronam, não se pode ignorar, contra todas as
adversidades, uma pequena luz no fim do túnel.
Neste cenário sombrio em que se assevera o governo russo, resta difícil
vislumbrar a construção de um governo disposto a reconstruir uma Rússia que
respeite os direitos humanos, com a perspectiva de reintegração ao Conselho
da Europa. Na possibilidade de existência de uma reintegração, esta nova
Rússia terá que lidar com violações passadas e presentes dentro do país, mas
1 Cf. TANAKA, Hideo; SMITH, Malcolm D.H. (ed.). The Japanese Legal System: Introductory Cases e Materials.
Tokyo: University of Tokyo Press, 1976.
2 HELSINKI FINAL ACT, 1 August 1975. Disponível em: https://www.osce.org/files/f/documents/5/c/39501.pdf.
Acesso em: 23 abr. 2023.
3 UNIVERSAL DECLARATION OF THE RIGHTS OF PEOPELS, 4 jul. 1976, Art. 3. Disponível em: http://
permanentpeoplestribunal.org/wp-content/uploads/2016/06/Carta-di-algeri-EN-2.pdf. Acesso em: 23 abr. 2023.
Veja também CASSESE, Antonio; JOUVES, Edmond. Pour un droit des peuples: essais sur la Déclaration
d´Alger. Paris: Berger-Levraurlt, 1978, p. 28.
4 FINAL DOCUMENT. Conference on Peace and Human Rights, Oslo, 20-22 December 1978, para. 1. Bulletin
of Peace Proposals, v. 10, n. 2, p. 224-228, 1979.
374
5 O´BRIAN, Peter. Rapport Final. Meeting of Experts on Human Rights, Human Needs and the Establishment
of a New International Economic Order. Paris, 29 dez., SS.78/CONF.630/12, SS.78/CONF.630/COL.2. Dis-
ponível em: https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000032647_fre. Acesso em: 23 abr. 2023.
6 UN COMMISSON OF HUMAN RIGHTS, E/CN.4/RES/5(XXXII), 27 fev. 1976, para. 1.
7 UN GENERAL ASSEMBLY, A/RES/33/73, 15 dez. 1978.
8 UN GENERAL ASSEMBRLY, A/RES/36/67, 30 nov. 1981; A/RES37/16, 16 nov. 1982.
9 UN GENERAL ASSEMBLY, A/Res39/11, 12 nov. 1984.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 375
guerra (disputas, pobreza, acesso aos recursos violações dos direitos humanos)
e, em segundo lugar, os meios materiais de fomento da guerra, tanto a fim de
estabelecer condições para uma paz verdadeira e duradoura.
O aspecto coletivo do direito à paz diz respeito aos Estados e aos seus
órgãos. Os Estados são obrigados a respeitar o princípio da autodeterminação,
independência e integridade territorial e a abster-se de guerras agressivas e
do uso ilegal da força.
Estas obrigações foram apoiadas nos relatórios apresentados pelos Estados
ao Secretário Geral das Nações Unidas sobre as medidas que tinham adotado
para implementar a declaração de direito à paz de 1984 anteriormente refe-
rida. Nestes relatórios, os Estados comprometeram-se a confiar nos princípios
consagrados na declaração e comunicaram medidas para a implementação do
direito. De um modo geral, os Estados informaram sobre as suas disposições
constitucionais em matéria de direitos humanos, assinatura de acordos relativos
ao controle de armas e ao desarmamento. Alguns Estados também insistiram
na busca da paz através do desenvolvimento social e econômico.
O direito à paz consagrado no artigo 23º da Carta Africana dos Direitos
Humanos e dos Direitos dos Povos, de 1981, refere-se, além disso, ao dever
dos Estados de assegurar que o seu território não seja utilizado para atividades
subversivas ou terroristas contra outro Estado.
O direito específico das mulheres à paz, proclamado no artigo 10º do Pro-
tocolo da Carta Africana, refere-se ao direito de participar em várias atividades
relacionadas à paz e solicita aos Estados que tomem as medidas adequadas
para assegurar essa participação, nomeadamente na educação para a gestão
e resolução de conflitos para a paz.
O direito individual inclui o direito à evolução e ao ambiente pacífico e o
direito à vida, discutido anteriormente. Além disso, o direito dos indivíduos à
paz inclui o direito de participar em associações de paz, o direito à educação
382
5. Conclusões
31 UNITED NATIONS. Our Common Agenda. Report of the Secretary-General, A/75/982, §§ 88 e 89.
22. APONTAMENTOS SOBRE PADRÕES
E TENDÊNCIAS DE PROTEÇÃO ÀS
PESSOAS REFUGIADAS NO CONTEXTO
DA INVASÃO DA UCRÂNIA:
boas práticas e aspectos negativos
Liliana Lyra Jubilut
Flávia Oliveira Ribeiro
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
1. Introdução
países da Europa vindas da Ucrânia foi dez vezes maior do que o recorde de
entrada do fluxo de pessoas deslocadas da Síria em 20157.
O acolhimento a essas pessoas passa pelo atendimento primário de neces-
sidades básicas, mas também por proteção jurídica, ou seja, a combinação
de necessidades e direitos, necessária para a assistência humanitária8. Em
análise preliminar, e nesses dois níveis, percebe-se que o tratamento dado às
pessoas deslocadas da Ucrânia, que tecnicamente podem ser consideradas
refugiadas, está sendo diferente ao visto em outros fluxos migratórios9. A
solidariedade com que as pessoas refugiadas da Ucrânia têm sido recepcio-
nadas vem produzindo diversas tendências de boas práticas de acolhimento,
as quais poderiam, e deveriam, serem replicadas em outras situações. Em
paralelo, os aspectos negativos identificados nesse processo precisam ser
migrantes, tais como uso de coiotes; meios não seguros de locomoção, como
os barcos no Mar Mediterrâneo; desaparecimentos; entradas irregulares etc.
Contudo, no caso da Ucrânia isso parece estar minimizado.
Na busca por acesso a territórios seguros, as pessoas deslocadas da
Ucrânia têm encontrado uma Europa que parece estar mais de portas abertas
do que para outros fluxos. Isso se exemplifica na não criminalização do fluxo
migratório da Ucrânia e na inexistência de centros de detenção; políticas que
derivam do fato de que não se foi posto em pauta se esse movimento repre-
sentaria uma ameaça à segurança dos países de acolhida16. Ao contrário,
a recepção se deu por meio de fronteiras abertas, sem penalização a quem
busca proteção17. Nesse sentido, o Alto Comissariado das Nações Unidas
para Refugiados (ACNUR) classificou como extraordinária a solidariedade
dos países que têm acolhido pessoas da Ucrânia18.
(org.). Reflexões sobre Direito Ambiental e Direito Internacional. Santos: Editora Universitária Leopoldianum,
p. 70-74, 2022. p. 72-73.
12 HAYTER, Teresa. Open Borders: The Case Against Immigration Controls. In: GUPTA, Suman; OMONIYI,
Tope (eds.). The Cultures of Economic Migration International Perspectives. London/New York: Ashgate, p.
17-26, 2007. p. 17-18.
13 Global Compact for Safe, Orderly and Regular Migration, § 24. Disponível em: https://refugeesmigrants.
un.org/sites/default/files/180713_agreed_outcome_global_compact_for_migration.pdf. Acesso em:
30 nov. 2022.
14 Ibid., § 27.
15 Global Compact on Refugees, § 54. Disponível em: https://www.unhcr.org/5c658aed4. Acesso em:
30 nov. 2022.
16 AZEREDO, Laís; JAROCHINSKI SILVA, João Carlos. A Crise Humanitária na Ucrânia e a Resposta aos
Refugiados e Refugiadas: o que determina o rechaço e a acolhida? GEDES – Grupo de Estudos de Defesa
e Segurança Internacional, 25 abr. 2022. Disponível em: https://gedes-unesp.org/a-crise-humanitaria-na-
-ucrania-e-a-resposta-aos-refugiados-e-refugiadas-o-que-determina-o-rechaco-e-a-acolhida/. Acesso em:
15 nov. 2022.
17 Ibid.
18 ACNUR. ACNUR atualiza dados sobre pessoas refugiadas na Ucrânia para refletir movimen-
tos recentes. ACNUR, 10 jun. 2022. Disponível em: https://www.acnur.org/portugues/2022/06/10/
392
acnur-atualiza-dados-sobre-pessoas-refugiadas-na-ucrania-para-refletir-movimentos-recentes/. Acesso
em: 28 out. 2022.
19 UNHCR. Private Sponsorship Pathways. UNHCR, 30 nov. 2022. Disponível em: https://www.unhcr.org/
private-sponsorship-pathways.html#:~:text=Private%20sponsorship%20programmes%20provide%20indi-
viduals,displaced%20persons%20in%20their%20country. Acesso em: 30 nov. 2022.
20 Ibid.
21 GOV.UK. Immigration Rules Appendix Ukraine Scheme. GOV.UK, 18 mar. 2022. Disponível em: https://www.gov.
uk/guidance/immigration-rules/immigration-rules-appendix-ukraine-scheme. Acesso em: 29 out. 2022.
22 Foi permitido que as pessoas protegidas pelo Ukraine Extension Scheme (abordado no tópico 2.2 sobre
proteção complementar) – aplicável às pessoas de nacionalidade ucraniana que já estavam no Reino Unido
antes do início da invasão – apadrinhassem sua própria família, trazendo-os para o território seguro, por
meio do patrocínio do governo do País de Gales e da Escócia, ao invés de particulares. CLARK, Olivia. More
labels, less protection: A comparison of the Afghan and Ukraine protection schemes. Refugee Law Initiative
Blog – School of Advanced Study University of London, 12 set. 2022. Disponível em: https://rli.blogs.sas.
ac.uk/2022/09/12/more-labels-less-protection-a-comparison-of-the-afghan-and-ukraine-protection-schemes/.
Acesso em: 19 out. 2022.
23 Ibid.
24 GOV.UK. Homes for Ukraine: record your interest. GOV.UK, 28 out. 2022. Disponível em: https://www.gov.
uk/register-interest-homes-ukraine. Acesso em: 28 out. 2022.
25 MACASKILL, Andrew. Britânicos receberão 350 libras por mês para abrigar refugiados ucranianos. CNN
Brasil, 13 mar. 2022. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/britanicos-receberao-350-li-
bras-por-mes-para-abrigar-refugiados-ucranianos/. Acesso em: 28 out. 2022.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 393
350 libras (pouco mais de dois mil reais26) mensais para as famílias que
acolherem essas pessoas27. As pessoas solicitantes de refúgio receberão
permissão de estadia por até 36 meses; devem ser nacionais da Ucrânia ou
devem ser da família imediata de um nacional da Ucrânia; e poderão ter
acesso a fundos públicos, trabalho e estudo28. Já o segundo programa – o
Ukraine Family Scheme – permite que alguém da família, que pode ou não
ser nacional do Reino Unido, e que esteja em território britânico, patrocine
um parente nacional da Ucrânia29. Após o ingresso no país, esse programa
permite a regularização migratória por até 36 meses que possibilita o acesso
a fundos públicos, trabalho e estudo30.
Ou seja, às pessoas da Ucrânia o governo britânico assegurou entrada
legal, estadia legal por 36 meses, local para morar, apoio à família acolhedora,
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
46 JUBILUT, Liliana. O Direito Internacional dos Refugiados e sua aplicação no ordenamento jurídico brasileiro.
São Paulo: Método, 2007. p. 17.
47 Ibid, p. 17.
48 TONDO, Lorenzo. Revealed: 2,000 refugee deaths linked to illegal EU pushbacks. The Guardian, 5 maio
2021. Disponível em: https://www.theguardian.com/global-development/2021/may/05/revealed-2000-refu-
gee-deaths-linked-to-eu-pushbacks. Acesso em: 28 out. 2022.
49 RAHMAN, Abdul. Europe’s treatment of refugees is racist and murderous. Peoples Dispatch, 7 set. 2022.
Disponível em: https://peoplesdispatch.org/2022/09/07/europes-treatment-of-refugees-is-racist-and-murde-
rous/. Acesso em: 20 out. 2022.
50 TONDO, L. Op cit. (nota 48).
51 Tradução nossa: legislação restritiva, arame farpado, bloqueios navais e retrocessos.
52 No mesmo sentido, está a conclusão do relatório do jornal The Guardian que considerou que a morte de mais
de duas mil pessoas refugiadas, em 2020, eram decorrentes de políticas da UE. TONDO, L. Op cit. (nota 48).
53 ANSA. UNHCR chief calls naval blockades and pushbacks ‘racism’. InfoMigrants, 6 set. 2022. Disponível em:
https://www.infomigrants.net/en/post/43113/unhcr-chief-calls-naval-blockades-and-pushbacks-racism?pre-
view=1662455733677. Acesso em: 28 out. 2022.
54 Ibid.
55 MEZZANOTTI, G. Op cit. (nota 11), p. 71.
396
56 HUMAN RIGHTS WATCH. Ucrânia: tratamento desigual para estrangeiros que tentam fugir. Human Rights Watch,
6 mar. 2022. Disponível em: https://www.hrw.org/pt/news/2022/03/06/381330. Acesso em: 27 out. 2022.
57 Aqui não se incluem homens entre 18 e 60 anos que foram proibidos de deixar a Ucrânia, em razão de uma
mobilização militar geral. Ibid.; QIBLAWI, Tamara; ALVARDO, Caroll. Homens ucranianos de 18 a 60 anos
estão proibidos de deixar o país. CNN Brasil, 24 fev. 2022. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/inter-
nacional/homens-ucranianos-de-18-a-60-anos-estao-proibidos-de-deixar-o-pais/. Acesso em: 28 out. 2022.
58 Ibid.
59 MWAKIDEU, Chrispin. Ukraine war: African students scramble to flee. DW, 28 fev. 2022. Disponível em: https://
www.dw.com/en/african-students-scramble-to-flee-fighting-in-ukraine/a-60947768. Acesso em: 20 out. 2022.
60 HUMAN RIGHTS WATCH. Op cit. (nota 56).
61 MWAKIDEU, C. Op cit. (nota 59).
62 HUMAN RIGHTS WATCH. Op cit. (nota 56).
63 Ibid.
64 Ibid.
65 BBC. Guerra na Ucrânia: Putin convoca 300 mil reservistas após derrotas. BBC News Brasil, 21 set. 2022.
Disponível em: https://www.bbc.com/portuguese/internacional-62980096. Acesso em: 19 out. 2022.
66 JONES, Martin. Ukraine war: why Russians fleeing conscription should be treated as refugees. The Conversation,
29 set. 2022. Disponível em: https://theconversation.com/ukraine-war-why-russians-fleeing-conscription-shoul-
d-be-treated-as-refugees-191450?mc_cid=1236eae074&mc_eid=84714ec347. Acesso em: 20 out. 2022.
67 CARVALHO, Tiago. Russos em fuga através da última fronteira aberta do espaço Schengen.
Público, 16 out. 2022. Disponível em: https://www.publico.pt/2022/10/16/mundo/reportagem/
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 397
pras71. Dois dias antes da convocação dos reservistas, os três Países Bálticos
e a Polônia passaram a impedir a entrada de turistas russos72. Após mais de
17 mil nacionais da Rússia cruzarem a fronteira finlandesa em uma semana
da convocação dos reservistas73, a Finlândia passou a impedir o ingresso de
pessoas russas que tenham visto de turismo europeu74.
Além disso, verifica-se a construção de barreiras físicas nas frontei-
ras. A proposta da guarda de fronteira finlandesa para a construção de uma
cerca com concertinas e câmaras de vigilância em partes da fronteira com
a Rússia (em uma extensão de 1.340 quilômetros75 que representa 20% da
fronteira76), com a pretensão de conter a migração irregular, recebeu o apoio
de todos os partidos políticos, em outubro de 202277. Destaca-se que a cerca
estará nas áreas identificadas como de maior potencial de migração em grande
russos-fuga-atraves-ultima-fronteira-aberta-espaco-schengen-2023996?utm_source=copy_paste. Acesso
em: 20 out. 2022.
68 Ibid.
69 SYTAS, Andrius; KAURANEN, Anne; OSMOND, Ed. Países bálticos e Polônia proíbem a entrada de turistas
russos. CNN Brasil, 19 set. 2022. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/paises-balticos-
-e-polonia-proibem-a-entrada-de-turistas-russos/. Acesso em: 26 out. 2022.
70 HILLE, Peter; WITTING, Volker. Can Germany grant asylum to Russian deserters? DW, 23 set. 2022.
Disponível em: https://www.dw.com/en/ukraine-war-germany-wants-to-grant-asylum-to-russian-deserter-
s/a-63220796. Acesso em: 19 out. 2022.
71 CARVALHO, Tiago. Russos em fuga através da última fronteira aberta do espaço Schengen. Público, 16
out. 2022. Disponível em: https://www.publico.pt/2022/10/16/mundo/reportagem/russos-fuga-atraves-ulti-
ma-fronteira-aberta-espaco-schengen-2023996?utm_source=copy_paste. Acesso em: 20 out. 2022.
72 SYTAS, A.; KAURANEN, A.; OSMOND, E. Op cit. (nota 69).
73 CARVALHO, T. Op cit. (nota 71).
74 G1. Finlândia anuncia que fechará fronteira para turistas russos. G1 Globo, 29 set. 2022. Disponível em:
https://g1.globo.com/mundo/noticia/2022/09/29/finlandia-anuncia-que-fechara-fronteira-para-turistas-russos.
ghtml. Acesso em: 26 out. 2022.
75 EL DIARIO. Finlandia acuerda levantar una valla con concertinas en su frontera con Rusia. El Diario, 19
out. 2022. Disponível em: https://www.eldiario.es/desalambre/finlandia-acuerda-levantar-valla-concertinas-
-frontera-rusia_1_9636763.html. Acesso em: 20 out. 2022.
76 Ibid.
77 Ibid.
398
3. Proteção
78 HENLEY, Jon; WINTOUR, Patrick. Finland’s main parties back plans to build Russia border fence. The
Guardian, 19 out. 2022. Disponível em: https://www.theguardian.com/world/2022/oct/19/finland-main-par-
ties-back-plans-build-russia-border-fence?CMP=Share_AndroidApp_Other. Acesso em: 20 out. 2022.
79 Ibid.
80 A acusação era de que o presidente de Belarus, Alexander Lukashenko, estaria utilizando da migração em
massa de pessoas vindas principalmente do Iraque como forma de pressionar a UE a suspender sanções
impostas como consequência da repressão aos oponentes do governo após as eleições de 2020, ampla-
mente vistas como fraudulentas. HENLEY, Jon; ROTH, Andrew; RANKIN, Jennifer. Latvia and Lithuania
act to counter migrants crossing Belarus border. The Guardian, 10 ago. 2021. Disponível em: https://www.
theguardian.com/world/2021/aug/10/latvia-and-lithuania-act-to-counter-migrants-crossing-belarus-border.
Acesso em: 27 out. 2022.
81 HENLEY, J.; WINTOUR, P. Op cit. (nota 78).
82 UNHCR. UNHCR, UNICEF establish dozens of support hubs in countries hosting Ukrainian refugees.
UNHCR, 21 set. 2022. Disponível em: https://rli.blogs.sas.ac.uk/2022/09/12/more-labels-less-protection-a-
-comparison-of-the-afghan-and-ukraine-protection-schemes/. Acesso em: 19 out. 2022.
83 Ibid.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 399
prática, conflitos são causas de refúgio, tendo em vista que muitas vezes tais
situações têm como causas matrizes (root causes) a raça, etnia, religião, polí-
tica, o gênero ou grupo social101, ou ainda que têm como seu reflexo impactos
em direitos humanos que podem ser entendidos como perseguição.
Diante dessa relação prática entre conflitos armados e refúgio, o ACNUR
emitiu diretrizes, em dezembro de 2016, sobre as solicitações de reconheci-
mento do status de refugiado relacionadas a situações de conflito armado e
violência, em que fundamentou que ameaças à vida ou à liberdade e outras
violações graves dos direitos humanos podem constituir perseguição para fins
da definição da Convenção de 51102-103.
Neste documento, o ACNUR também destacou que o contexto de uma
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
unhcr.org/publications/legal/5ddfcdc47/handbook-procedures-criteria-determining-refugee-status-under-
-1951-convention.html. Acesso em: 10 dez. 2022. para. 164.
101 UNHCR. A Guide to International Refugee Protection and Building State Asylum Systems – Handbook for
Parliamentarians n. 27, 2017. UNHCR, 2017. Disponível em: https://www.unhcr.org/3d4aba564.pdf. Acesso
em: 10 dez. 2022. p. 135.
102 UNHCR. UNHCR Guidelines on International Protection n. 12 on claims for refugee status related to situations
of armed conflict and violence under Article 1A(2) of the 1951 Convention and/or 1967 Protocol relating
to the Status of Refugees and the regional refugee definitions, § 11. UNHCR, 2 dez. 2016. Disponível em:
https://www.unhcr.org/58359afe7. Acesso em: 3 nov. 2022.
103 No que poderia ser entendido como uma internacionalização do já expresso em 1984 na Declaração de
Cartagena sobre Refugiados.
104 Ibid., § 12.
105 Ibid., § 13.
106 Ibid., § 33.
107 Ibid., § 35.
108 JUBILUT, L.L. Op cit. (nota 8), p. 44.
402
109 Artigo I.2 da Convenção Africana para Refugiados. UN. OAU Convention governing the specific aspects of
refugee problems in Africa. Addis Ababa, 1969. Disponível em: https://treaties.un.org/doc/Publication/UNTS/
Volume%201001/volume-1001-I-14691-English.pdf. Acesso em: 8 out. 2022. p. 3.
110 Terceira Conclusão da Declaração de Cartagena. Cf. ACNUR. Declaração de Cartagena, 1984, p. 3. Dis-
ponível em: https://www.acnur.org/fileadmin/Documentos/portugues/BD_Legal/Instrumentos_Internacionais/
Declaracao_de_Cartagena.pdf. Acesso em: 14 nov. 2021.
111 Assim como foi feito para os fluxos migratórios da Síria, do Afeganistão e do Haiti. MJSP/MRE. Portaria Inter-
ministerial n. 9 de 8 de outubro de 2022. MJSP/MRE, 8 out. 2019. Disponível em: https://portaldeimigracao.
mj.gov.br/images/portarias/PORTARIA_INTERMINISTERIAL_9.pdf. Acesso em: 3 nov. 2022; MJSP/MRE.
Portaria Interministerial n. 24 de 3 de setembro de 2021. MJSP/MRE, 3 set. 2021. Disponível em: https://
portaldeimigracao.mj.gov.br/images/portarias/PORTARIA_INTERMINISTERIAL_MJSP.MRE_N%C2%BA_24_
DE_3_DE_SETEMBRO_DE_2021.pdf. Acesso em: 3 nov. 2022; MJSP/MRE. Portaria Interministerial n. 29
de 25 de abril de 2022. MJSP/MRE, 25 abr. 2022. Disponível em: https://portaldeimigracao.mj.gov.br/images/
portarias/PORTARIA_INTERMINISTERIAL_MJSP.MRE_N%C2%BA_29_DE_25_DE_ABRIL_DE_2022.
pdf. Acesso em: 3 nov. 2022.
112 MJSP/MRE. Portaria Interministerial n. 28 de 3 de março de 2022. MJSP/MRE, 3 mar. 2022. Disponível em:
https://portaldeimigracao.mj.gov.br/images/portarias/PORTARIA_INTERMINISTERIAL_MJSP.MRE_N%-
C2%BA_28_DE_3_DE_MAR%C3%87O_DE_2022.pdf. Acesso em: 3 nov. 2022.
113 Ibid.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 403
114 MJSP/OIM. Ministério da Justiça e Segurança Pública – Migração Ucraniana – Regularização Migratória de
janeiro a março de 2022. MJSP/OIM, mar. 2022. Disponível em: https://brazil.iom.int/sites/g/files/tmzbdl1496/
files/documents/informe-migracao-ucraniama-mar2022.pdf. Acesso em: 10 dez. 2022.
115 CONSELHO DA UE. Infografia – Proteção temporária da UE para pessoas deslocadas. Conselho da
União Europeia, 20 jun. 2022. Disponível em: https://www.consilium.europa.eu/pt/infographics/tempo-
rary-protection-displaced-persons/#:~:text=Em%204%20de%20mar%C3%A7o%20de,B%C3%B3snia%-
2DHerzegovina%20e%20do%20Kosovo. Acesso em: 28 out. 2022.
116 HUMAN RIGHTS WATCH. Op cit. (nota 56).
117 Ibid.
118 BUNDESAMT FÜR MIGRATION UND FLÜCHTLINGE. FAQ about entry from Ukraine an residence in
Germany. Disponível em: https://www.bamf.de/DE/Themen/AsylFluechtlingsschutz/ResettlementRe-
location/InformationenEinreiseUkraine/InformationenEinreiseUkraineEN/_documents/ukraine-faq-en.
html?nn=1159474. Acesso em: 2 dez. 2022.
119 GOV.PL. Permanência legal no território da Polônia. Disponível em: https://www.gov.pl/web/ua/Lehalne-pe-
rebuvannya-v-Polshchi. Acesso em: 2 dez. 2022.
120 GOV.UK. Immigration Rules Appendix Ukraine Scheme. GOV.UK, 18 mar. 2022. Disponível em: https://www.gov.
uk/guidance/immigration-rules/immigration-rules-appendix-ukraine-scheme. Acesso em: 29 out. 2022.
404
121 Ibid.
122 CLARK, Olivia. More labels, less protection: A comparison of the Afghan and Ukraine protection schemes.
Refugee Law Initiative Blog – School of Advanced Study University of London, 12 set. 2022. Disponível em:
https://rli.blogs.sas.ac.uk/2022/09/12/more-labels-less-protection-a-comparison-of-the-afghan-and-ukraine-
-protection-schemes/. Acesso em: 19 out. 2022.
123 Ibid.
124 GOV.UK. Afghan Citizens Resettlement Scheme. GOV.UK, 6 jan. 2022. Disponível em: https://www.gov.uk/
guidance/afghan-citizens-resettlement-scheme. Acesso em: 29 out. 2022.
125 CLARK, O. Op cit. (nota 123).
126 Ibid.
127 Ibid.
128 Ibid.
129 Isso porque as regras para reunião familiar de pessoas não refugiadas são ter um patrocinador com renda
mínima exigida; os membros da família chamados serem aprovados em teste de inglês; e cada familiar chamado
ter pago uma taxa de aproximados 3.500 libras (mais de 22 mil reais) que pode ser isentada. Ibid.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 405
130 Ibid.
131 Ibid.
132 UNHCR. Op cit. (nota 4). UNHCR, 2 dez. 2022. Disponível em: https://data.unhcr.org/en/situations/ukraine.
Acesso em: 2 dez. 2022; CONSELHO EUROPEU. Infografia –Refugees from Ukraine in the EU. Conselho
Europeu, 2 dez. 2022. Disponível em: https://www.consilium.europa.eu/pt/infographics/ukraine-refugees-eu/.
Acesso em: 2 dez. 2022.
133 Ibid.
134 CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA. Afluxo de refugiados da Ucrânia. Conselho da União Europeia, 22 nov.
2022. Disponível em: https://www.consilium.europa.eu/pt/policies/eu-migration-policy/refugee-inflow-from-u-
kraine/. Acesso em: 2 dez. 2022.
135 HILLE, P.; WITTING, V. Op cit. (nota 70).
136 MWAKIDEU, C. Op cit. (nota 59).
137 Ibid.
138 Ao lado da objeção de consciência, a deserção poderia ser caracterizada como perseguição tendo em vista a ile-
galidade da invasão, isso é, as pessoas serem forçadas a servir ou estarem sujeitas a punições desproporcionais
406
4. Integração
(como dez anos de prisão para desertores), e serem forçadas a cometerem, direta ou indiretamente, crimes
de guerra (de acordo com relatos desde o início da invasão). GUIMARÃES, Maria João. Charles Michel quer
decisão europeia sobre russos que fogem à guerra. Público, 24 set. 2022. Disponível em: https://www.publico.
pt/2022/09/24/mundo/noticia/charles-michel-quer-decisao-europeia-russos-fogem-guerra-2021740. Acesso
em: 19 out. 2022; CHADE, Jamil. ONU: crimes de guerra foram cometidos na Ucrânia e cita estupro de idosos.
UOL, 23 set. 2022. Disponível em: https://noticias.uol.com.br/colunas/jamil-chade/2022/09/23/onu-diz-que-cri-
mes-de-guerra-foram-cometidos-na-ucrania-e-cita-russos.htm. Acesso em: 5 nov. 2022.
139 Ibid.
140 COURT OF JUSTICE OF THE EUROPEAN UNION. In the context of the civil war in Syria, there is a
strong presumption that refusal to perform military service there is connected to a reason which may give
rise to entitlement to recognition as a refugee. Court of Justice of the European Union, 19 nov. 2020.
Disponível em: https://curia.europa.eu/jcms/upload/docs/application/pdf/2020-11/cp200142en.pdf. Acesso
em: 30 out. 2022. p. 1.
141 Ibid., p. 1.
142 Ibid., p. 2.
143 Ibid., Id.
144 Ibid., Id.
145 GUIMARÃES, Maria João. Op cit. (nota 138).
146 HILLE, P.; WITTING, V. Op cit. (nota 70).
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 407
147 JUBILUT, Liliana L.; GARCEZ, Gabriela S.; RIBEIRO, Flávia O.; RODRIGUES, Maria Eduarda. A Essenciali-
dade da Relação entre Direitos Humanos e Refúgio nas Soluções Duráveis. In: JUBILUT, Liliana L.; GARCEZ,
Gabriela S.; JAROCHINSKI SILVA, João Carlos; LOPES, Rachel de Oliveira; FERNANDES, Ananda (org.).
Direitos Humanos e Vulnerabilidades e Migrações Forçadas. Boa Vista: Editora UFRR, no prelo.
148 CRISP, Jeff. The Local Integration and the Local Settlement of Refugees: a conceptual and historical analysis.
New Issues in Refugee Research, Working Paper n. 102. UNHCR, 2004. Disponível em: https://www.unhcr.
org/research/working/407d3b762/local-integration-local-settlement-refugees-conceptual-historical-analysis.
html. Acesso em: 13 out. 2022. p. 1; ACNUR. Soluções duradouras. Disponível em: https://www.acnur.org/
portugues/solucoes-duradouras/. Acesso em: 15 nov. 2022.
149 PUENTE, Beatriz. Duração da guerra definirá integração de refugiados da Ucrânia na Europa, dizem especia-
listas. CNN Brasil, 1 mar. 2022. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/internacional/duracao-da-guerra-
-definira-integracao-de-refugiados-da-ucrania-na-europa-dizem-especialistas/. Acesso em: 2 nov. 2022.
150 Ibid.
151 MANTOVANI, F. Op cit. (nota 6).
152 Ibid.
153 INAÊ, Güinewer. O Dilema da Nova Crise de Refugiados na Europa. CSVM – UFG, 4 nov. 2022. Disponível em:
https://csvm.ufg.br/n/152679-o-dilema-da-nova-crise-de-refugiados-na-europa. Acesso em: 4 nov. 2022.
154 PUENTE, Beatriz. Op cit. (nota 149).
408
155 JUBILUT, L.L.; GARCEZ, G.S.; RIBEIRO, F.O.; RODRIGUES, M.E. Op cit. (nota 147).
156 GOV.PL. Amendment to the law on assistance to Ukrainian citizens in connection with the armed conflict
on the territory of the country. GOV.PL, 28 mar. 2022. Disponível em: https://www.gov.pl/web/udsc-en/the-
-law-on-assistance-to-ukrainian-citizens-in-connection-with-the-armed-conflict-on-the-territory-of-the-coun-
try-has-entered-into-force#:~:text=Every%20citizen%20of%20Ukraine%20legally,guaranteed%20from%20
the%20state%20budget. Acesso em: 4 nov. 2022.
157 ACNUR. Saúde. ACNUR Brasil – Help, 4 nov. 2022. Disponível em: https://help.unhcr.org/brazil/saude/#:~:tex-
t=Solicitantes%20de%20ref%C3%BAgio%20e%20refugiados%20t%C3%AAm%20o%20direito%20de%20
acessar,parceira%20para%20procurar%20assist%C3%AAncia%20m%C3%A9dica. Acesso em: 4 nov. 2022.
158 MYERS, Dayna Kerecman. What Makes Ukraine’s Refugee Crisis So Different. Johns Hopkins Bloomberg
School of Public Health – Global Health Now, 13 maio 2022. Disponível em: https://globalhealthnow.org/2022-
05/what-paul-spiegel-wants-you-know-about-ukraines-refugee-crisis. Acesso em: 4 nov. 2022.
159 Ibid.
160 Ibid.
161 Estima-se que mais de 16 mil crianças e adolescentes da Ucrânia foram transferidas ilegalmente da região
de Kherson para a Rússia no segundo semestre de 2022. Houve alegações de pressões para o envio
das crianças e adolescentes para a Crimeia, ocupada pela Rússia desde 2014, onde frequentariam um
acampamento de verão por 2 semanas. Contudo, as crianças não voltaram por mais de 5 meses e foram
transferidas para outras regiões da Rússia. Em março de 2023, com o auxílio da organização Save Ukraine,
algumas famílias começaram a se reencontrar, mas muitas continuam a busca pela localização de suas
crianças. Essa situação levou à emissão de mandados de prisão pelo Tribunal Penal Internacional, pelos
crimes de guerra de deportação ilegal e transferência ilegal de população de áreas ocupadas da Ucrânia para
a Rússia, com base nos artigos 8(2)(a)(vii) e 8(2)(b)(viii) do Estatuto de Roma, em março de 2023, contra
duas autoridades da Rússia: Vladimir Putin, Presidente do país, e Maria Lvova-Belova, Comissária para os
direitos da criança no gabinete do presidente. ICC. Situation in Ukraine: ICC judges issue arrest warrants
against Vladimir Vladimirovich Putin and Maria Alekseyevna Lvova-Belova. ICC, 17 mar. 2023. Disponível
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 409
em: https://www.icc-cpi.int/news/situation-ukraine-icc-judges-issue-arrest-warrants-against-vladimir-vladi-
mirovich-putin-and. Acesso em: 26 abr. 2023; OURDAN, Rémy. ‘I was scared I’d be there forever’: Children
deported by Russia finally return to Kyiv. Le Monde, 23 mar. 2023. Disponível em: https://www.lemonde.fr/
en/international/article/2023/03/23/i-was-scared-i-d-be-there-forever-children-deported-by-russia-finally-re-
turn-to-kyiv_6020441_4.html. Acesso em: 23 abr. 2023; STEWART, Briar. Russia is accused of deporting
thousands of Ukrainian children. 17 returned home this week. CBC News, 23 mar. 2023. Disponível em:
https://www.cbc.ca/news/world/ukrainian-children-return-1.6788318. Acesso em: 23 abr. 2023.
162 CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA. Solidariedade da UE com a Ucrânia. Conselho da União Europeia,
18 out. 2022. Disponível em: https://www.consilium.europa.eu/pt/policies/eu-response-ukraine-invasion/
eu-solidarity-ukraine/. Acesso em: 3 nov. 2022.
163 Ibid.
164 CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA. Conselho adota conclusões sobre os direitos da criança. Conselho
da União Europeia, 9 jun. 2022. Disponível em: https://www.consilium.europa.eu/pt/press/press-relea-
ses/2022/06/09/council-adopts-conclusions-rights-child/. Acesso em: 3 nov. 2022.
165 COMISSÃO EUROPEIA. Fuga da Ucrânia: apoio à educação. Comissão Eurpeia, 4 nov. 2022. Disponível
em: https://eu-solidarity-ukraine.ec.europa.eu/information-people-fleeing-war-ukraine/fleeing-ukraine-su-
pport-education_pt. Acesso em: 4 nov. 2022.
166 Ibid.
167 GOVERNMENT OF THE NETHERLANDS. Government decides on education and healthcare for refugees
from Ukraine. Government of the Netherlands, 21 abr. 2022. Disponível em: https://www.government.nl/latest/
news/2022/04/21/government-decides-on-education-and-healthcare-for-refugees-from-ukraine. Acesso em:
4 nov. 2022.
168 Ibid.
410
169 MARTINS, Elisa; GONÇALVES, Gabriela. Europa abriu portas a refugiados ucranianos, mas os desafios
daqui para a frente são enormes. O Globo, 17 mar. 2022. Disponível em: https://oglobo.globo.com/mundo/
europa-abriu-portas-refugiados-ucranianos-mas-os-desafios-daqui-para-frente-sao-enormes-25432791.
Acesso em: 2 nov. 2022.
170 eTALK. Free English language courses for refugees from Ukraine. eTalk, 4 nov. 2022. Disponível em: https://
etalkschool.com/supportukrainian/. Acesso em: 4 nov. 2022.
171 MIQR. Language courses for Ukrainians – free programs for learning German for refugees at the MIQR.
Mitteldeutsches Institut für Qualifikation und berufliche Rehabilitation (MIQR), 21 maio 2022. Disponível em:
https://mitteldeutsches-institut.de/en/language-courses-for-ukrainians-b/. Acesso em: 4 nov. 2022.
172 BABBEL. Babbel supports Ukrainian refugees with language courses. Babbel, 4 nov. 2022. Disponível
em: https://support.babbel.com/hc/en-gb/articles/4985331352980-Babbel-supports-Ukrainian-refugees-
-with-language-courses. Acesso em: 4 nov. 2022.
173 Ibid.
174 BABBEL. The Most Important Words And Phrases To Welcome Refugees From Ukraine. Babbel, 6 abr.
2022. Disponível em: https://www.babbel.com/en/magazine/most-important-ukrainian-phrases. Acesso em:
4 nov. 2022.
175 KOSYAKOVA, Yuliya; KOGAN, Irena. Labor market situation of refugees in Europe: The role of individual
and contextual factors. Front. Polit. Sci., Sec. Refugees and Conflict, 23 set. 2022. Disponível em: https://
doi.org/10.3389/fpos.2022.977764. Acesso em: 1 dez. 2022.
176 MARTINS, E.; GONÇALVES, G. Op cit. (nota 169).
177 Em 2021, os países de baixa e média renda acolheram 83% das pessoas refugiadas do mundo. UNHCR.
Global Trends Report 2021. Disponível em: https://www.unhcr.org/62a9d1494/global-trends-report-2021.
Acesso em: 12 out. 2022. p. 2.
178 MARTINS, Elisa; GONÇALVES, Gabriela. Op cit. (nota 169).
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 411
ração e suporte financeiro de outros países europeus para que haja efetiva
integração da mão de obra das pessoas do movimento migratório da Ucrânia
nas sociedades de acolhida179.
Algumas das medidas adotadas pela UE para auxiliar as pessoas refugia-
das a encontrar vagas de trabalho são: por meio da Fundação Europeia para
Formação, autoridades da UE recebem auxílio para comparar os quadros de
qualificações ucranianos e europeus, de modo a ajudar tanto as pessoas vindas
da Ucrânia que procuram assistência para fazer reconhecer suas qualificações,
como as pessoas empregadoras que precisam de ajuda com a interpretação
dessas qualificações180. No mesmo contexto, a Comissão Europeia publicou
uma recomendação para facilitar o reconhecimento das qualificações profis-
sionais e acadêmicas obtidas na Ucrânia nos Estados-membros da EU181. São
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
5. Conclusão
198 CONSELHO DA UNIÃO EUROPEIA. Solidariedade da UE com a Ucrânia. Conselho da União Europeia,
18 out. 2022. Disponível em: https://www.consilium.europa.eu/pt/policies/eu-response-ukraine-invasion/
eu-solidarity-ukraine/. Acesso em: 3 nov. 2022.
199 JUBILUT, L.L.; GARCEZ, G.S.; RIBEIRO, F.O.; RODRIGUES, M.E. Op cit. (nota 147).
200 HICKSON, Alice. Why Are Refugees Returning to Ukraine? New Lines Institute, 1 set. 2022. Disponível em:
https://www.grid.news/story/global/2022/07/18/they-thought-we-were-crazy-why-millions-of-ukrainian-refu-
gees-are-coming-home/. Acesso em: 4 nov. 2022.
201 MANTOVANI, F. Op cit. (nota 6)
202 Ibid.
203 FRONTEX. More people continue to return to Ukraine. Frontex, 6 set. 2022. Disponível em: https://frontex.
europa.eu/media-centre/news/news-release/more-people-continue-to-return-to-ukraine-UjZVYP. Acesso em:
4 nov. 2022.
204 OIM. Ukraine Returns Report. OIM, 23 jan. 2023. Disponível em: https://dtm.iom.int/reports/ukraine-retur-
ns-report-16-23-january-2023. Acesso em: 23 abr. 2023.
414
1. Introdução
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
1 MARXSEN, Christian. The Crimea Crisis: An International Law Perspective. Zeitschrift für ausländisches
öffentliches Recht und Völkerrecht, v. 74, n. 2, p. 367-391, 2016. p. 368.
2 Ver para uma análise mais profunda: CAVANDOLI, Sofia; WILSON, Gary. Distorting Fundamental Norms
of International Law to Resurrect the Soviet Union: The International Law Context of Russia´s Invasion of
Ukraine. Netherlands International Law Review, v. 69, p. 383-410, 2022. Disponível em: https://link.springer.
com/article/10.1007/s40802-022-00219-9. Acesso em: 25 abr. 2023.
3 Em inglês: Internally Displaced Persons (IDPs).
4 INTERNATIONAL ORGANIZATION OF MIGRATION. Ukraine Crisis 2022: 6 Months of Response.
IOM: 2022, p. 2. Disponível em: www.iom.int/sites/g/files/tmzbdl486/files/situation_reports/file/
416
Pessoas forçadas a sair dos seus países por sofrer algum tipo de per-
seguição se enquadram na categoria de refugiados. No entanto, quanto aos
chamados de “refugiados de guerra”, é preciso observar que eles geralmente
não preenchem os critérios previstos pela Convenção Relativa ao Estatuto
dos Refugiados de 1951 e seu respectivo Protocolo de 1967, por não sofre-
rem perseguições5. Não obstante, é hoje internacionalmente reconhecido o
mandato do Alto Comissariado das Nações Unidas para Refugiados (ACNUR)
para cuidar desse grupo quantitativamente muito maior do que os grupo dos
refugiados no sentido da Convenção de 19516.
10 GOLDMAN, Robert K. Internal Displacement, the Guiding Principles on Internal Displacement, the Principles
Normative Status, and the Need for their Effective Domestic Implementation in Colombia. ACDI, v. 2, p. 59-86,
2009. p. 60.
11 BASOVA, Iryna. Internally Displaced Persons and Their Legal Status: The Ukranian Context. Juridica Inter-
national, n. 26, p. 113-124, 2017.
12 UKRAINE. Law n. 1706-VII, 20 Oct. 2014, on Ensuring of Rights and Liberties of Internally Displaced Persons.
Disponível em: www.ilo.org/dyn/natlex/natlex4.detail?p_lang=fr&p_isn=99133. Acesso em: 22 set. 2022.
13 Tradução nossa de “was forced or voluntarily left one’s residence place as a result of or in order to avoid
negative impact of armed conflict, temporary occupation, situations of generalized violence, mass violations
of human rights and disasters of natural or human-made origin”.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 419
17 OSCE. Report on Violations of International Humanitarian and Human Rights Law, War Crimes and Crimes
against Humanity Committed in Ukraine (1 APRIL – 25 JUNE 2022). ODIHR.GAL/36/22/Corr.1, 14 jul. 2022.
Disponível em: https://www.osce.org/files/f/documents/3/e/522616.pdf. Acesso em: 8 nov. 2022.
18 Ministry for reintegration of the temporarily occupied territories of Ukraine. Disponível em https://minre.gov.
ua/en/rubric/about-ministry. Acesso em: 7 out. 2022.
19 OSCE. Op cit. (nota 17).
20 Há também milhares de homens estrangeiros que participam como foreign fighters nas hostilidades. Para
uma análise do seu status específico, veja: MALET, David. The Risky Status of Ucraine’s Foreign Fighters.
Foreign Policy, 15 mar. 2022. Disponível em: https://foreignpolicy.com/2022/03/15/ukraine-war-foreign-fighter-
s-legion-volunteers-legal-status/. Acesso em: 23 set. 2022.
21 Devido à imposição do direito marcial pelo governo ucraniano, homens entre 18 e 60 anos estão proibidos
para viajar para exterior. UKRAINE. Presidential Decree n. 64/2022, 24 Febr. 2022. Veja para uma análise
crítica da ampliação do direito marcial: CARPENTER, Charli. Civilian Men Are Trapped in Ukraine. Human
rights and humanitarian NGOs should pay attention to Kyiv´s sex-selective martial law. Foreign Policy, 15
jul. 2022. Disponível em: https://foreignpolicy.com/2022/07/15/ukraine-war-conscription-martial-law-men-
-gender-human-rights/. Acesso em: 24 set. 2022.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 421
22 IOM. Regional Ukraine Response Situation Report #21, 10 jun. 2022. Disponível em: https://www.iom.int/
sites/g/files/tmzbdl486/files/situation_reports/file/iom-regional-ukraine-response-external-sitrep-10062022-fnl.
pdf. Acesso em: 21 out. 2022.
23 GAGGIOLI, Gloria. Sexual violence in armed conflicts: A violation of international humanitarian law and
human rights law. International Review of the Red Cross, v. 96, n. 984, p. 503-538, 2014. p. 538.
24 UNITED NATIONS. Reports of sexual violence in Ukraine rising fast, Security Council hears. UN News, 6
jun. 2022. Disponível em: https://news.un.org/en/story/2022/06/1119832. Acesso em: 24 set. 2022.
25 CAMPASSO, Ariadna et al. Lessons from the field: Recommendations for gender-based violence pre-
vention and treatment for displaced women in conflict-affected Ukraine. The Lancet, v. 17, n. 100408,
422
população civil dos territórios ocupados pela Rússia, já que assumir o risco
de permanecer nas suas residências não é opção, menos ainda, quando a vida
própria e da família está colocada em xeque.
Há, porém, outros dados angustiantes que destacam a urgência do pro-
blema sob a ótica de gênero. Em grande porção, são vinculados a vulnerabi-
lidades socioeconômicos. Por muitas vezes estarem como únicas chefes de
família no processo de deslocamento interno, as mulheres passam a acumular
dificuldades provenientes das normas de gênero incorporadas na sociedade
ucraniana por estereótipos culturais complexos e desequilíbrios de poder nas
relações públicas e privadas.
No mais, muitas vezes, acumulam outras circunstâncias de complexidade
e vulnerabilidade por serem grávidas, lactantes, estarem acompanhando seus
Com rendas mais baixas, muitas deslocadas internas da Ucrânia têm difi-
culdades maiores de contratar moradias adequadas, especialmente quando são
chefes de família, razão pela qual muitas vezes optam pelo contrato informal
de arrendamento, que, no entanto, não lhes permite reivindicar benefícios
sociais, colocam-nas em instabilidade jurídica quanto ao direito de moradia.
Ainda, os bancos se recusam a conceder empréstimos e outros serviços ban-
cários para mulheres com mais frequência do que para homens, especialmente
quando se tratam de deslocadas internas.
Isoladas em suas moradias ou em casas de pessoas que a acolheram,
vivenciam trabalho doméstico não remunerado e violência doméstica. Sofrem
com a dificuldade de acesso à Justiça, com disputas familiares em casos de
divórcio e pedidos de pensão alimentícia para os filhos, com a indeterminação
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
35 Id., § 17.
36 GOVERNMENT OF UKRAINE. Ninth periodic report submitted by Ukraine under article 18 of the Convention,
due in 2021, U.N. doc. CEDAW/C/UKR//9, 29 dez. 2021. Tradução livre. Disponível em: https://tbinternet.
ohchr.org/_layouts/15/treatybodyexternal/TBSearch.aspx?Lang=en. Acesso em: 18 set. 2022.
37 O Comitê, atacando o desafio de monitorar a implementação das obrigações decorrentes da referida con-
venção, elaborou, nos últimos anos, uma série de Recomendações Gerais (General Recommendations)
que buscam interpretar os direitos e princípios previstos na Convenção. Destarte, facilitam e orientam a
elaboração dos relatórios periódicos cuja apreciação sempre termina na editoração de observações finais
(Concluding Observations) que, por sua vez, contém recomendações específicas. Outros comitês chamam
o mesmo instrumento de “Comentário Geral”. PETERKE, Sven. O significado dos General Comments para
a interpretação dos direitos humanos. Notícia do Direito Brasileiro, n. 15, p. 77-102, 2009.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 427
ram a redes locais para atenção à saúde mental e serviço social por meio
de parcerias com unidades médicas, delegacias de polícia, serviços sociais,
bem como Ministério da Política Social e autoridades locais. Linhas diretas
nacionais como SupportME e La Strada para denúncia, além do uso de kits
de saúde reprodutiva de emergência no atendimento e tratamento pós-estupro,
tonaram-se essenciais.
O projeto expandiu-se também para aumentar as oportunidades econô-
micas das mulheres deslocadas por conflitos, reforçando o empreendedorismo
social liderado por mulheres. Em 2020, o UNFPA Ucrânia fez parceria com
10 empresas para desenvolver as habilidades vocacionais e oferecer oportu-
nidades de emprego a mais de 3.000 mulheres deslocadas40.
Após a invasão da Rússia em 2022, com o agravamento do deslocamento
interno e das violências suportadas pelas mulheres, o apoio tangível fornecido
incluiu alimentos, itens não alimentares e de higiene, campanhas informa-
tivas para ajudar a prevenir o tráfico de pessoas bem como a exploração e
abuso sexuais, e novas promessas de assistências sociais e previdenciárias.
No entanto, essas últimas têm sido referidas com dificuldades diante das
exigências específicas do Governo.
Tem se mostrado cada vez mais necessário fornecer treinamento obriga-
tório de gênero para todo o pessoal de resposta humanitária que trabalha com
mulheres e meninas em risco, pois é preciso que esteja preparado para acolher
e responder às violências relatadas pelas deslocadas, inclusive, aderindo-se
a códigos éticos de conduta e obrigações de denúncias. É urgente a demanda
por reforço de proteção às mulheres ao longo dos corredores humanitários,
38 UNICEF. Mental Health and Psychosocial Support for Children in Humanitarian Settings: An Updated
Review of Evidence and Practice, nov. 2020. Disponível em: https://mhpsscollaborative.org/wp-content/
uploads/2021/05/MHPSS-2020-REVIEW.pdf. Acesso em: 24 abr. 2023.
39 CAMPASSO, A. et al. Op cit (nota 25), p. 1.
40 Id., p. 2
428
5. Conclusão
41 UNITED NATIONS. Ukraine: Protection and participation of women is essential, say UN human rights experts,
UN Press Release, 4 mar. 2022. Disponível em: www.ohchr.org/en/press-releases/2022/03/ukraine-protec-
tion-and-participation-women-essential-say-un-human-rights. Acesso em: 20 set. 2022.
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 429
A
Ameaça nuclear 285
Armas autônomas 171, 172, 173, 174, 175, 176, 177, 178, 179, 180, 186, 188
Armas nucleares 21, 31, 40, 61, 87, 114, 117, 198, 279, 285, 286, 287, 288,
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
289, 290, 291, 292, 293, 294, 295, 296, 297, 298, 299, 300, 301, 302, 303,
304, 377
Assembleia Geral da ONU 21, 24, 58, 60, 95, 101, 104, 110, 135, 180, 194,
201, 251, 292, 296
Assistência humanitária 14, 18, 100, 117, 205, 206, 207, 208, 209, 210, 211,
212, 213, 214, 215, 216, 217, 219, 220, 221, 365, 390, 398, 414, 437
C
Carta da ONU 17, 19, 20, 22, 23, 24, 25, 26, 58, 59, 60, 63, 65, 66, 67, 71,
73, 74, 75, 79, 85, 93, 95, 96, 97, 98, 99, 101, 102, 104, 105, 108, 109, 110,
115, 121, 123, 130, 131, 132, 136, 166, 250, 282, 283, 295, 374, 377, 379, 380
CEDH 360, 361, 362, 363, 364, 365, 366, 367, 368, 369, 370
Ciberespaço 123, 125, 126, 127, 131, 132, 133, 134, 135, 136, 194
Civis 13, 18, 26, 89, 95, 120, 126, 151, 152, 155, 156, 161, 162, 177, 180,
181, 182, 185, 186, 187, 188, 195, 196, 197, 198, 199, 200, 201, 202, 203,
206, 207, 208, 209, 210, 212, 215, 220, 226, 227, 228, 229, 230, 231, 237,
238, 252, 253, 260, 264, 271, 276, 277, 278, 280, 284, 286, 291, 292, 295,
307, 308, 309, 330, 331, 349, 354, 355, 360, 363, 364, 369, 372, 374, 377,
380, 417, 419
Clandestinidade 325, 327, 329, 330, 336, 337
Comunidade internacional 23, 24, 27, 32, 69, 73, 77, 85, 95, 98, 104,
105, 115, 134, 136, 160, 167, 191, 205, 206, 212, 213, 214, 218, 219, 220,
221, 224, 248, 249, 296, 312, 336, 338, 350, 356, 380, 381, 382, 387, 416,
425, 429
Conflito russo-ucraniano 126, 130
432
Conflitos armados 18, 19, 25, 26, 27, 73, 130, 136, 145, 146, 147, 148, 150,
151, 152, 154, 164, 169, 180, 182, 185, 189, 191, 192, 195, 205, 206, 207,
208, 209, 210, 212, 219, 223, 224, 225, 226, 232, 233, 240, 241, 252, 260,
262, 263, 264, 267, 268, 276, 277, 278, 280, 285, 286, 287, 288, 305, 306,
307, 308, 309, 310, 311, 312, 313, 316, 318, 319, 320, 321, 326, 329, 330,
331, 332, 333, 341, 346, 351, 377, 385, 401, 402, 417, 420, 426
Conselho da Europa 31, 359, 360, 361, 362, 364, 365, 367, 368, 369, 370,
371, 372
Conselho de Direitos Humanos 24, 102, 103, 252, 341, 342, 343, 344, 347,
353, 354, 355, 356, 357, 376, 377, 379, 380, 385, 388
Conselho de Segurança 17, 20, 21, 22, 23, 24, 31, 39, 58, 59, 60, 61, 63, 68,
D
Dádiva imperial 31, 32, 33, 34, 35, 36, 37, 38, 39, 40, 42, 43, 46, 49, 53, 54, 98
Direito à paz 373, 374, 375, 376, 377, 378, 379, 380, 381, 382, 383, 387
Direito brasileiro 249, 251, 336, 426
Direito da guerra 145, 147, 148, 150, 151, 152, 153, 154, 155, 158, 160, 161,
162, 168, 169, 252
Direito de Defesa 59, 60, 61, 63, 64, 65, 67, 68, 70, 71, 73, 77
Direito humano à paz 373, 377, 378, 380, 382, 383, 384, 385, 386, 387
Direito internacional da manutenção da paz 14, 55, 136
Direito internacional humanitário 14, 25, 57, 74, 101, 116, 117, 143, 172,
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
177, 182, 184, 186, 187, 188, 191, 195, 196, 199, 202, 205, 206, 223, 225,
232, 233, 240, 246, 252, 259, 262, 263, 264, 265, 267, 268, 269, 270, 274,
275, 277, 278, 279, 283, 285, 286, 288, 301, 306, 308, 309, 311, 314, 320,
341, 343, 344, 346, 350, 353, 386, 417, 420, 421
Direito internacional penal 14, 25, 240, 243, 268, 307, 312, 313, 316, 318,
319, 320
Direito internacional público 17, 68, 69, 189, 260, 268, 271, 277, 314, 316,
320, 362, 369, 437
Direitos das mulheres 404, 415, 423, 425, 428, 429
Direito soviético 34, 43
E
Elite política 42, 44, 107, 111, 118
Espionagem 127, 199, 257, 283, 323, 324, 325, 326, 327, 328, 329, 330, 331,
332, 333, 334, 335, 336, 337, 338
Espionagem cibernética 127, 331, 332
Estatuto de Roma 212, 219, 240, 246, 259, 265, 268, 269, 271, 272, 273,
274, 275, 276, 277, 278, 279, 285, 287, 288, 289, 302, 303, 313, 315, 317,
319, 323, 324, 333, 337, 348, 408
Estupro 280, 305, 306, 307, 309, 310, 311, 312, 313, 314, 315, 316, 318,
319, 320, 321, 401, 406, 424, 427, 428
F
Fevereiro de 2022 13, 17, 57, 63, 65, 67, 76, 79, 84, 99, 103, 107, 109, 132,
148, 157, 162, 166, 191, 194, 195, 206, 246, 250, 254, 298, 333, 353, 355,
361, 364, 366, 389, 397, 415, 420
434
G
Genocídio 17, 20, 67, 72, 76, 79, 80, 82, 83, 84, 86, 87, 88, 89, 91, 92, 93,
94, 102, 138, 177, 245, 247, 248, 249, 265, 270, 271, 291, 303, 313, 315,
316, 317, 320, 415
I
Invasão russa 24, 85, 105, 129, 191, 195, 202, 218, 362, 363, 366, 394,
395, 406
L
LAWS 14, 40, 167, 171, 172, 173, 174, 175, 177, 178, 179, 180, 181, 182,
M
Manutenção da paz 14, 23, 55, 74, 81, 90, 96, 97, 101, 108, 136, 249, 375
Medidas cautelares 76, 79, 80, 81, 82, 84, 85, 86, 87, 88, 90, 91, 92, 93, 94,
102, 249, 363, 365, 366
Meio ambiente 181, 223, 224, 225, 226, 227, 228, 229, 230, 231, 232, 233,
234, 235, 238, 239, 240, 241, 266, 290, 291, 294, 298, 301
Meios pacíficos 22, 24, 66, 101, 260, 280, 282, 283, 378
Mudanças territoriais 34, 43, 46, 48, 49, 50
Música 137, 138, 139, 140, 141, 142
O
Ocupação 14, 41, 191, 192, 193, 194, 195, 196, 197, 199, 200, 201, 203, 233,
272, 308, 348, 351, 352, 354, 401, 418, 419, 420
ONU 17, 19, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 31, 39, 58, 59, 60, 63, 64, 65, 66,
67, 70, 71, 73, 74, 75, 77, 79, 83, 85, 90, 92, 93, 95, 96, 97, 98, 99, 100, 101,
102, 103, 104, 105, 106, 107, 108, 109, 110, 111, 115, 118, 120, 121, 123,
130, 131, 132, 135, 136, 139, 142, 164, 165, 166, 171, 180, 185, 193, 194,
201, 214, 216, 217, 224, 226, 246, 247, 250, 251, 252, 253, 281, 282, 283,
290, 292, 295, 296, 307, 311, 341, 342, 343, 348, 355, 374, 375, 377, 379,
380, 384, 388, 390, 406, 417, 421
Operação militar especial 17, 19, 57, 110, 113, 247
Operações cibernéticas 25, 123, 126, 130, 131, 132, 135, 136
A GUERRA NA UCRÂNIA E O DIREITO INTERNACIONAL: debates atuais 435
P
PDI 415, 416, 417, 418, 419, 420, 421, 425, 426, 428, 429
Pessoas refugiadas 389, 390, 391, 392, 394, 395, 398, 399, 404, 406, 407,
408, 410, 411, 412, 413, 414, 416
População civil 155, 187, 191, 195, 196, 197, 200, 203, 205, 206, 208, 209,
210, 211, 219, 221, 224, 227, 228, 229, 230, 231, 234, 235, 236, 237, 251,
252, 275, 276, 278, 287, 288, 317, 331, 332, 365, 422
Prisioneiros de guerra 26, 27, 99, 149, 150, 151, 162, 197, 247, 252, 264,
271, 275, 286, 309, 331, 355
Proteção da população 200, 205, 206, 213, 219, 227, 234
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
Protocolo adicional I 153, 154, 155, 182, 184, 185, 187, 192, 194, 198, 210,
211, 212, 220, 225, 226, 227, 228, 230, 234, 236, 237, 291, 302, 308, 310
Putin 17, 18, 19, 21, 25, 28, 33, 35, 60, 61, 84, 95, 100, 104, 119, 129, 193,
245, 246, 247, 250, 253, 254, 255, 256, 257, 279, 280, 281, 396, 408, 409
R
Região da Crimeia 33, 34, 36, 38, 41, 42, 43, 44, 45, 46, 51, 52, 53, 54, 351,
352, 356, 357
Relações russo-ucranianas 34, 35, 37, 38
Revisão periódica universal 341, 342, 344, 347, 352, 356
RSFS da Rússia 39, 41, 42, 44, 45, 46, 47, 48, 49, 50, 52, 53, 54
RSS da Ucrânia 34, 40, 41, 42, 44, 45, 46, 49, 51, 52, 53
S
Sanções econômicas 18, 111, 115, 116, 118, 121, 129, 131, 156
Sebastopol 33, 34, 35, 37, 38, 39, 40, 42, 49, 50, 51, 52, 53, 63, 65, 113,
156, 348, 352, 419
Século XXI 24, 125, 134, 297, 341, 386
Segunda Guerra Mundial 13, 21, 23, 24, 26, 31, 35, 36, 41, 97, 125, 166,
245, 247, 268, 272, 359, 361, 389, 396, 415
Segurança internacional 31, 135, 136, 180, 302, 391
Sistema Europeu de Direitos Humanos 21, 359, 361, 362, 366, 370
Sociedade civil 29, 299, 354, 362, 368, 372, 378, 380, 382, 383, 384, 385,
387, 428, 429
Soviete Supremo 36, 41, 44, 45, 46, 48, 49, 50, 52, 53
Sujeito ativo 259, 265, 266, 328
436
T
Territórios seguros 389, 390, 391, 395, 406, 414
Território ucraniano 74, 76, 79, 83, 84, 86, 89, 93, 95, 99, 103, 104, 105,
107, 108, 110, 111, 193, 194, 201, 234, 246, 249, 254, 307, 310, 350, 353,
357, 362, 366, 389, 415
TPI 28, 29, 219, 246, 247, 248, 250, 251, 253, 254, 255, 256, 257, 268, 269,
270, 271, 273, 274, 279, 280, 285, 286, 287, 307, 314, 315, 316, 318, 319,
320, 321, 323, 324, 331, 333, 335, 336, 337, 338
Transferência da Crimeia 32, 33, 34, 35, 36, 38, 40, 42, 43, 44, 45, 46, 49,
50, 53, 54, 98
Tribunal Penal Internacional 24, 28, 58, 105, 138, 219, 245, 246, 249, 251,
V
Violência Sexual 251, 253, 305, 306, 307, 308, 309, 310, 311, 312, 315, 316,
317, 318, 319, 320, 321, 348, 355, 393, 394, 414, 421, 425, 426
SOBRE OS ORGANIZADORES
Sven Peterke
Professor no Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas (PPGCJ)
da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). Doutor summa cum laude em
Ciências Jurídicas e Mestre em Assistência Humanitária Internacional pela
Universidade de Bochum, Alemanha (2005, 2001). Jurista diplomado pela
Universidade de Kiel (2000). Estágio pós-doutoral no Instituto Max Planck
para Direito Público Comparado e Direito Internacional Público em Heidel-
berg, Alemanha (2016-2017).
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
Luíza Fernandes
Coordenadora Geral (2023) da UFRGS IHL Clinic.
Leticia Heinzmann
Graduanda em Ciências Jurídicas e Sociais pela Universidade Federal do Rio
Grande do Sul.
Giovanna M. Frisso
Professora na Faculdade de Direito da Universidade de Lincoln, Reino Unido.
Doutorado em Direito pela Universidade de Nottingham, Reino Unido; Mestre
em Direito Internacional e Comparado pela Universidade de Uppsala, Suécia,
Bacharel em Direito pela Universidade de Brasília (UnB), Brasil.
SOBRE O LIVRO
Tiragem não comercializada
Formato: 16 x 23 cm
Mancha: 12,3 x 19,3 cm
Tipologia: Times New Roman 10,5 | 11,5 | 13 | 16 | 18
Arial 8 | 8,5
Papel: Pólen 80 g (miolo)
Royal | Supremo 250 g (capa)
A GUERRA NA UCRÂNIA E O
DIREITO INTERNACIONAL
Debates Atuais
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercialização
ISBN 978-65-251-5184-7
9 786525 151847