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PRECARIZAÇÃO DAS
RELAÇÕES DE TRABALHO:
reflexões interdisciplinares
Editora CRV
Curitiba – Brasil
2022
Copyright © da Editora CRV Ltda.
Editor-chefe: Railson Moura
Diagramação: Designers da Editora CRV
Capa: Giuliana Queren Oliveira Costa
Colaboração: Luísa Montes Teixeira, Mariana Queiroz de Ávila,
Paulo Ferndandes Vieira, Rodrigo Henrique Pitton
Revisão: Os Autores
P922
Bibliografia
2022
Foi feito o depósito legal conf. Lei 10.994 de 14/12/2004
Proibida a reprodução parcial ou total desta obra sem autorização da Editora CRV
Todos os direitos desta edição reservados pela: Editora CRV
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Conselho Editorial: Comitê Científico:
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Andréia da Silva Quintanilha Sousa (UNIR/UFRN) Aloisio Krohling (FDV)
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Antônio Pereira Gaio Júnior (UFRRJ) Antônio Pereira Gaio Júnior (UFRRJ)
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Carlos Federico Dominguez Avila (Unieuro) César Augusto de Castro Fiuza (Ferreira, Kumaira
Carmen Tereza Velanga (UNIR) e Fiuza Advogados Associados/UFMG)
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Eduardo Fernandes Barbosa (UFMG) Daniel Amin Ferraz (Amin, Ferraz, Coelho
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Fernando Antônio Gonçalves Alcoforado (IPB) Evandro Marcelo dos Santos
Francisco Carlos Duarte (PUC-PR) (Faculdade Três Pontas/MG)
Gloria Fariñas León (Universidade Gláucia Aparecida da Silva Faria Lamblém (UEMS)
de La Havana – Cuba) Janaína Machado Sturza (UNIJUÍ)
Guillermo Arias Beatón (Universidade João Bosco Coelho Pasin (UPM)
de La Havana – Cuba) Joséli Fiorin Gomes (UFSM)
Jailson Alves dos Santos (UFRJ) Manoel Valente Figueiredo Neto (Registro
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercizalização
Este livro passou por avaliação e aprovação às cegas de dois ou mais pareceristas ad hoc.
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SUMÁRIO
PREFÁCIO����������������������������������������������������������������������������������������������������� 11
Lívia Mendes Moreira Miraglia
PRECARIZAÇÃO E UBERIZAÇÃO
O DESAFIO DA HIGIDEZ
PSÍQUICA NO MEIO AMBIENTE
LABORAL: a precarização das
condições de trabalho
como fator de adoecimento����������������������������������������������������������������������������� 15
Valdete Souto Severo
Matheus Antônio Soares Mariani
O FENÔMENO DA PEJOTIZAÇÃO
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercizalização
UBERIZAÇÃO, PRECARIZAÇÃO
DO TRABALHO E ESTADO:
um debate necessário sobre as novas
formas de gestão empresarial e a
relativização dos direitos sociais do trabalho�������������������������������������������������� 47
Danilo Augusto da Silva Horta
Marisa Silva Amaral
A ATUAÇÃO PREVENTIVA DO
MINISTÉRIO PÚBLICO DO
TRABALHO EM MINAS GERAIS:
promoção à infância saudável e à redução
da exploração do trabalho da criança e
do adolescente diante da pandemia da covid-19������������������������������������������ 105
Diogo Calazans Ferreira Heilbuth
Marcelo Henrique de Sousa Estevam
Shirlei Silmara de Freitas Mello
DO SILÊNCIO À AÇÃO:
como a omissão ajuda o tráfico
de pessoas em âmbito brasileiro������������������������������������������������������������������� 163
Beatriz Pereira Longo
Giovanna Pereira Fernandes de Pádua Netto
Neiva Flávia de Oliveira
O CONTRABANDO DE MIGRANTES
E A SUA SUBMISSÃO AO TRABALHO
ANÁLOGO AO ESCRAVO: perspectivas
acerca das indústrias ‘fast fashion’ no Brasil������������������������������������������������� 177
Daniel Urias Pereira Feitoza
Pedro Lucchetti Silva
Tatiana Cardoso Squeff
PRECARIZAÇÃO E UBERIZAÇÃO
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercizalização
O DESAFIO DA HIGIDEZ PSÍQUICA NO
MEIO AMBIENTE LABORAL: a precarização das
condições de trabalho como fator de adoecimento1
Valdete Souto Severo2
Matheus Antônio Soares Mariani3
Introdução
pandemia de covid-19).
O objeto central do presente artigo, apesar de contemporâneo, estando presente
em inúmeras publicações, ainda carece de compreensão, especialmente em relação
aos fatores que contribuem para o maior adoecimento mental em decorrência do
trabalho e das ações capazes de minimizar os efeitos nocivos do sistema de trocas
que adotamos. Este artigo tem o objetivo de alertar sobre a centralidade e a gravidade
dessa questão, bem como contribuir para a discussão científica do tema.
1 Procura expor as bases da organização do trabalho contemporânea, sua construção a partir do capitalismo
mercantil e subsequente consolidação no capitalismo industrial, além de sua evolução até o capitalismo
de consumo do século XXI, contribuindo diretamente para o adoecimento psíquico no meio ambiente de
trabalho, a nível mundial e também no Brasil.
2 Doutora em Direito do Trabalho pela USP/SP; Pós doutora em Ciências Políticas pela UFRGS/RS;
Professora de direito e processo do trabalho na UFRGS/RS. E-mail: valdete.severo@gmail.com
3 Graduando em Direito pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). E-Mail: mat_soares98@
hotmail.com
16
4 “Art. 7º São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua
condição social: I – relação de emprego protegida contra despedida arbitrária ou sem justa causa, nos
termos de lei complementar, que preverá indenização compensatória, dentre outros direitos; […]”.
5 KEHL, M. R. O Tempo e o Cão: atualidade das depressões. São Paulo: Boitempo, 2009. Págs. 166/167.
6 MAGALHÃES, N.; CAMARGO, J. A. de. Não é coisa da sua cabeça: o que você precisa saber sobre
ansiedade, depressão e outros transtornos emocionais que atingem uma em cada três pessoas. 1. reimpr.
Belo Horizonte: Editora Gutenberg, 2012. p. 57.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 17
da troca por capital. Até mesmo alimento, remédio, roupa serão acessíveis apenas a
quem tiver capital para comprá-los. E o capital, como regra, deve ser obtido através do
trabalho, em uma realidade na qual nunca haverá trabalho para todas as pessoas. Alguns
sempre “sobrarão”. Na centralidade desse novo modo de organização social estão as
noções (reinventadas) de igualdade, liberdade e propriedade. O discurso racional da
modernidade é o de que nascemos livres proprietários de nossa força de trabalho,
por isso somos iguais. Cada pessoa passa a se considerar (e a ser considerada pelos
demais) como responsável pelo próprio sucesso ou fracasso, mesmo que nasça marcada
por significantes que a condicionam, como o de ser pobre, mulher, negra, indígena,
gay ou qualquer outro marcador arbitrariamente criado para distinguir e discriminar.
7 SOUTO MAIOR, J. L.; SEVERO, V. S. Propostas para o Aprimoramento da Justiça do Trabalho e do Direito
do Trabalho. In: SOUTO MAIOR, J. L.; SEVERO, V. S. (coord.). Resistência II: aportes teóricos contra o
retrocesso trabalhista. São Paulo: Expressão Popular, 2018. p. 447.
8 Assim indica Dejours: “[…] Por organização do trabalho, designamos a divisão do trabalho, o conteúdo da
tarefa (na medida em que ele dela deriva), o sistema hierárquico, as modalidades de comando, as relações
de poder, as questões de responsabilidade, etc. […]”; DEJOURS, C. A Loucura do Trabalho: estudo de
psicopatologia do trabalho. 5. ed. ampl. São Paulo: Cortez: Oboré, 1992. p. 25.
9 Conforme versa a professora Sonilde Lazzarin, o sofrimento decorre da organização, e não das condições
do trabalho: “[…] Isso porque, por condições de trabalho se compreende o ambiente físico (temperatura,
pressão, irradiação, altitude, sonorização), o ambiente químico (produtos manipulados, poeiras, gases
tóxicos, etc.) e o ambiente biológico (bactérias, parasitas, fungos, etc.), as condições de higiene, de
segurança e as características antropométricas do posto de trabalho; […]”. LAZZARIN, S. K. A (In)
seguridade Social em Tempos de Pandemia: a renda básica universal como possível solução ao precariado
e à crescente desigualdade social no Brasil. Porto Alegre: HS Editora, 2020.
10 ALVES, J. Capitalismo. Educa + Brasil,[s. l.], 18 jan. 2019. Disponível em: https://www.educamaisbrasil.
com.br/enem/historia/capitalismo.
18
11 FREITAS, E. de. As Etapas do Capitalismo. UOL. [s. l.], [20--?]. Mundo Educação. Disponível em: https://
mundoeducacao.uol.com.br/geografia/as-etapas-capitalismo.htm.
12 MAGALHÃES, N.; CAMARGO, J. A. de. Não é coisa da sua cabeça: o que você precisa saber sobre
ansiedade, depressão e outros transtornos emocionais que atingem uma em cada três pessoas. 1. reimpr.
Belo Horizonte: Editora Gutenberg, 2012. p. 13.
13 TEIXEIRA, S. A Depressão no Meio Ambiente do Trabalho e sua Caracterização como Doença do Trabalho.
Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região, Belo Horizonte, v. 46, n. 76, p. 27-44, jul./dez.
2007. Disponível em: https://www.trt3.jus.br/escola/download/revista/rev_76/Sueli_Teixeira.pdf.
14 DEJOURS, C. A Loucura do Trabalho: estudo de psicopatologia do trabalho. 5. ed. ampl. São Paulo:
Cortez: Oboré, 1992. p. 22.
15 Na apresentação à obra Psicofísica do Trabalho Industrial, de Max Weber, Maria Irene Stocco Betiol
observa que o autor mostra “surpresa com a ausência de análises complementares entre as pesquisas da
antropologia, da fisiologia, da psicologia experimental e da psicopatologia com a análise sócio-científica do
trabalho econômico”. Para ele, seria desejável maior relação entre essas disciplinas, para a compreensão
dos “impactos nas condições do trabalho e da produção”. WEBER, M. A Psicofísica do Trabalho Industrial.
São Paulo: Alphagraphics, 2009. (Série Ciências Sociais na Administração, Departamento de Fundamentos
Sociais e Jurídicos da Administração, FGV-EASP). p. 7.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 19
século XV), o capitalismo comercial não tardou a buscar mão de obra barata (neste
caso, escravizada) para auxiliar forçosamente no acúmulo de riquezas dos países
europeus. As populações indígenas da América Central e do Sul foram as primeiras
a serem alvo das ações genocidas, seguidas dos povos africanos, que tornar-se-iam
a principal classe trabalhadora entre os Séculos XVI e XIX. Os efeitos psicológicos
nocivos da exploração e da desumanização causados pela escravização contribuíram
para que as populações indígenas desenvolvessem – até o Século XXI – altas taxas
de suicídio, sendo que, no Brasil, uma política pública de resguardo à saúde mental
dos povos indígenas só começou a ser pensada no início do Século XX17.
Durante o período de escravização europeia dos africanos cunhou-se o termo
banzo (do quicongo mbanzu e do quimbundo mbonzo: pensamento, lembrança,
mágoa, saudade, paixão18), a fim de referir-se à profunda melancolia que acometia
os escravizados trazidos à América, uma incapacitante forma de depressão que não
raro também resultava em suicídio19. Assim como os povos originários da América,
16 PALESTRA “A Atuação do MPT em Face do Adoecimento Mental No Trabalho”. [S. l.: s. n.], 2016. 1 vídeo (38
min 13 s). Publicado pelo canal TRTPR. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=iZAMEdYVCiM.
17 BERNI, L. E. V. Psicologia e Saúde Mental Indígena: Um Panorama para Construção de Políticas Públicas.
Psicol. Am. Lat., México, n. esp., p. 64-81, nov. 2017. Disponível em http://pepsic.bvsalud.org/scielo.
php?script=sci_arttext&pid=S1870-350X2017000200006&lng=pt&nrm=iso.
18 NUNES, D. Banzo: um estado de espírito negro. Portal Geledés, [s. l.], 30 abr. 2018. Disponível em: https://
www.geledes.org.br/banzo-um-estado-de-espirito-negro/.
19 SILVA, R. P. da. Trauma cultural e sofrimento social: do banzo às consequências psíquicas do racismo
para o negro. In: SIMPÓSIO NACIONAL DE HISTÓRIA, CONTRA OS PRECONCEITOS: História e
Democracia, 29., 24-28 jul. 2017, Brasília. Anais […]. Brasília: Universidade Nacional de Brasília,
2017. Disponível em: https://www.snh2017.anpuh.org/resources/anais/54/1488493521_ARQUIVO_
Traumasocialesofreimentocultural.pdf.
20
a população negra sofre até hoje com o racismo estrutural e com os reflexos do geno-
cídio institucionalizado pelo regime econômico vigente, desde sua origem. Impor-
tante salientar, portanto, o potencial da discriminação como fator de influência para
a deflagração das enfermidades psíquicas desenvolvidas no ambiente de trabalho20.
As mulheres e a comunidade LGBTQIA+ também estão inseridas no rol de
populações que possuem maiores índices de adoecimento psíquico em decorrência
da organização do trabalho. Uma vez que o desenvolvimento do regime econômico
capitalista foi comandado por homens cisgêneros heterossexuais, essas populações
também tiveram de lutar pelo direito de serem consideradas aptas ao trabalho e,
posteriormente, pelo direito de receberem oportunidades de emprego em igualdade
de condições. No caso da classe trabalhadora feminina, há ainda a questão do assédio
sexual, mecanismo violento utilizado para pressionar as empregadas21.
No que concerne à população LGBTQIA+, uma pesquisa da Universidade do
Oregon, nos Estados Unidos, apontou que gays, lésbicas e bissexuais possuem uma
possibilidade 5 vezes maior de tentar o suicídio do que pessoas heterossexuais (índice
que, no Brasil, entre 2017 e 2018, sofreu aumento de 43%)22. Quando a população trans
está em foco, o diagnóstico é ainda pior: estudo da ONG estadunidense National Gay
and Lesbian Task Force indicou que 41% das pessoas trans já tentaram tirar a própria
vida nos EUA, em algum momento23. O preconceito contra a comunidade LGBTQIA+,
20 PEREIRA, A. C. A discriminação racial nas relações de trabalho: pensar o direito brasileiro a partir das
relações étnico-raciais. Belo Horizonte: Casa do Direito, 2020. p. 60.
21 SILVA, A. B. B. Mentes depressivas: as três dimensões da doença do século. São Paulo: Principium,
2016. p. 91.
22 SAÚDE Mental, sexualidade, homofobia e suicídio LGBTQIA+ | Rita Von Hunty | É preciso falar #7. [S. l.:
s. n.], 2019. 1 vídeo (29 min 15 s). Publicado pelo cana: Vita Alere – Prevenção e Posvenção ao Suicídio.
Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=8lzxnxTmFbY.
23 CABRAL, E. A.; NOGUEIRA, S. N. B.; AQUINO, T. A. Dossiê: a geografia dos corpos das pessoas trans.
[S. l.]: Rede Trans Brasil, 2017. Disponível em: http://redetransbrasil.org.br/wp-content/uploads/2019/01/A-
Geografia-dos-Corpos-Trans.pdf.
24 TUCHLINSKI, C. Saúde mental LGBT: Depressão, ansiedade e risco de suicídio são principais
problemas. O Estado de São Paulo, São Paulo, 25 jun. 2019. Disponível em: https://emais.estadao.com.
br/noticias/comportamento,saude-mental-lgbt-depressao-ansiedade-e-risco-de-suicidio-sao-principais-
problemas,70002887220.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 21
25 OMS. Relatório Sobre a Saúde no Mundo 2001 – Saúde Mental: Nova Concepção, Nova Esperança. [S.
l.]: Organização Pan-Americana da Saúde: Organização Mundial da Saúde, 2001. p. 6.
26 KEHL, M. R. O Tempo e o Cão: atualidade das depressões. São Paulo: Boitempo, 2009. p. 31.
27 SILVA, A. B. B. Mentes depressivas: as três dimensões da doença do século. São Paulo: Principium, 2016.
p. 190-191.
28 ROLNIK, S. Esferas da insurreição: Notas para uma vida não cafetinada. São Paulo: N1 edições, 2018. p. 67.
22
[…] o capitalismo diz pra você que você tem que vencer, mano […] […] o
sistema modela essa caminhada […]. O patrão, ele descobre que você bater
a chibata nas costas do trabalhador ficou “demodê”, ficou fora de moda, isso
aí faz perder dinheiro, isso é um péssimo marketing […]. Então será que se
eu entregar o chicote na mão desse cara ele faz isso por mim? […] Aí você
joga o aplicativo e fala: “agora você é dono de si mesmo, você é patrão de si
mesmo”, entendeu? “Você é empreendedor de si mesmo”. E aí, mano, esse cara
começa a trabalhar 12, 13, 14 horas […] Então, basicamente, a uberização
é entregar o chicote na sua mão e falar: “Vai lá, você é dono de si mesmo,
mano! Te escraviza pra mim!” […] “Você faz seu próprio horário”, mentira,
mano, quem faz meu horário são minhas dívidas […]. E isso é aterrorizante,
mano, esse relógio que conta na vida do trabalhador […] esse relógio parece
o fim do mundo29.
29 GALO e Biu | Podcast Lança a Braba #033. [S. l.: s. n.], 2021. 1 vídeo (1 h 51 min 36 s). Publicado pelo
canal Lança a Braba Podcast. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=upqjOnbC5aw.
30 Ver, sobre isso: ANTUNES, R. O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviços na era digital. São
Paulo: Boitempo, 2018.
31 LAZZARIN, S. K. A (in)seguridade social em tempos de pandemia: a renda básica universal como possível
solução ao precariado e à crescente desigualdade social no Brasil. Porto Alegre: HS Editora, 2020. p. 51.
32 ROLNIK, S. Esferas da insurreição: notas para uma vida não cafetinada. São Paulo: N1 edições,
2018. p. 114.
33 SAFATLE, V. Maneiras de transformar o mundo: Lacan, política e emancipação. Belo Horizonte: Autêntica,
2020. p. 21-39.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 23
34 KEHL, M. R. O Tempo e o Cão: atualidade das depressões. São Paulo: Boitempo, 2009. p. 275-276.
35 SAÚDE no Trabalho com Dráuzio Varella e SESI: a importância da saúde mental nas indústrias. [S. l.: s. n.],
2019. 1 vídeo (2 min 45 s). Publicado pelo canal SESI RS. 2019. Disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=LEwaHFN-D6Q.
36 Formalizado pela OIT em 1999, o conceito de trabalho decente sintetiza a sua missão histórica de promover
oportunidades para que homens e mulheres obtenham um trabalho produtivo e de qualidade, em condições
de liberdade, equidade, segurança e dignidade humanas, sendo considerado condição fundamental para
a superação da pobreza, a redução das desigualdades sociais, a garantia da governabilidade democrática
e o desenvolvimento sustentável.
37 Nesse sentido: https://cnf.org.br/afastamento-por-transtorno-mental-dispara-na-pandemia/; https://
exame.com/carreira/transtornos-mentais-afastamentos-trabalho-covid/; https://www.anamt.org.br/
portal/2019/04/22/transtornos-mentais-estao-entre-as-maiores-causas-de-afastamento-do-trabalho/.
Acesso em: 30 nov. 2021.
24
56 SÃO PAULO (cidade). COVID-19: Boletim Semanal 2. São Paulo: Secretaria Municipal de Saúde de
São Paulo, 2020. [Publicado em 17 abr. 2020]. Disponível em: https://www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/
secretarias/upload/saude/PMSP_SMS_COVID19_Boletim%20Semanal_20200417_atualizado.pdf.
57 FIOCRUZ. Saúde Mental e Atenção Psicossocial na Pandemia COVID-19 – Recomendações Gerais. [S. l.]:
Fundação Oswaldo Cruz: Ministério da Saúde. 2020. Disponível em: https://www.fiocruzbrasilia.fiocruz.br/
wp-content/uploads/2020/04/Sa%c3%bade-Mental-e-Aten%c3%a7%c3%a3o-Psicossocial-na-Pandemia-
Covid-19-recomenda%c3%a7%c3%b5es-gerais.pdf.
58 CONSELHO REGIONAL DE PSICOLOGIA DO PARANÁ. O sofrimento psíquico das(os) trabalhadoras(es)
em tempos de pandemia. Conselho Regional de Psicologia do Paraná, Curitiba, 1 maio 2020. Disponível
em: https://crppr.org.br/1demaio/.
59 ORGANIZAÇÃO PAN-AMERICANA DA SAÚDE. Escritório Regional para as Américas da Organização
Mundial da Saúde. Proteção da Saúde em Situações de Epidemias. [S. l.]: Organização Pan-Americana
da Saúde, 2006. Disponível em: https://www.paho.org/hq/dmdocuments/2009/Protecao-da-Saude-Mental-
em-Situaciones-de-Epidemias--Portugues.pdf.
60 PEREIRA, A. dos S.; KADRI, M. R. E.; LIMA, R. T. de S.; SILVA, S. E. de S. (org.). Bem Viver: Saúde
Mental Indígena. Porto Alegre: Editora Rede Unida, 2021. p. 136-137.
61 SAÚDE MENTAL de pessoas negras é afetada pela COVID-19. Nações Unidas Brasil, [s. l.], 23 out. 2020.
Disponível em: https://brasil.un.org/pt-br/97130-saude-mental-de-pessoas-negras-e-afetada-pela-covid-19.
28
Considerações finais
62 SOUZA, A. S. R.; PRACIANO, G. de A. F.; SOUZA, G. F. de A. A saúde mental das mulheres em tempos
da COVID-19. Rev. Bras. Saúde Mater. Infant., Recife, v. 20, n. 3, p. 663-665, jul./set. 2020. Disponível
em: https://www.scielo.br/j/rbsmi/a/jxZhPTbgdcGMYcCPYtqDfNx/?lang=pt.
63 LINHARES, E. M.; OLIVEIRA, H. de F.; ANDRADE, J. da C.; AZEVEDO, M. R. D.; MENEZES, R. O.
Angústia, insegurança e medo na população LGBTQIA+: Comprometimento da saúde mental na pandemia
da COVID-19. Research, Society and Development, Itajubá: Universidade Federal de Itajubá, v. 10, n. 8,
2021. Disponível em: https://redib.org/Record/oai_articulo3334405-ang%C3%BAstia-inseguran%C3%A7a-
e-medo-na-popula%C3%A7%C3%A3o-lgbtqia%2B-comprometimento-da-sa%C3%BAde-mental-na-
pandemia-da-covid-19.
64 LAZZARIN, 2020, p. 64.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 29
contribuir para revisar questões históricas que são determinantes para a compreensão
do tema e propor uma abordagem estrutural para seu enfrentamento. Há, ainda, um
longo caminho a seguir.
30
REFERÊNCIAS
ALVAREZ, L. F. A. O Marco Normativo da Precarização do Trabalho no Brasil:
entre a Contenção e a Permissão. Revista Discente do Programa de Pós-Graduação
em História, Juiz de Fora: Universidade Federal de Juiz de Fora, v. 3, n. 6, jul./dez.
2017. Disponível em: https://www.ufjf.br/facesdeclio/files/2014/09/6.Artigo-L4-Luiz.
pdf. p. 127-128.
ALVES, J. Capitalismo. Educa + Brasil, [s. l.], 18 jan. 2019. Disponível em: https://
www.educamaisbrasil.com.br/enem/historia/capitalismo.
DIREITO à Desconexão. [S. l.: s. n.], 2020. 1 vídeo (16 min 14 s). Publicado
pelo canal Valdete Souto Severo. Disponível em: https://www.youtube.com/
watch?v=ZJif1SqiTxM.
FREITAS, E. de. As Etapas do Capitalismo. UOL. [s. l.], [20--?]. Mundo Educa-
ção. Disponível em: https://mundoeducacao.uol.com.br/geografia/as-etapas-capi-
talismo.htm.
GALO e Biu | Podcast Lança a Braba #033. [S. l.: s. n.], 2021. 1 vídeo (1 h 51 min
36 s). Publicado pelo canal Lança a Braba Podcast. Disponível em: https://www.
youtube.com/watch?v=upqjOnbC5aw.
2009. p. 166-167.
MAGALHÃES, N.; CAMARGO, J. A. de. Não é coisa da sua cabeça: o que você
precisa saber sobre ansiedade, depressão e outros transtornos emocionais que atingem
uma em cada três pessoas. 1. reimpr. Belo Horizonte: Editora Gutenberg, 2012. p. 57.
NUNES, D. Banzo: um estado de espírito negro. Portal Geledés, [s. l.], 30 abr. 2018.
Disponível em: https://www.geledes.org.br/banzo-um-estado-de-espirito-negro/.
32
OMS. Relatório Sobre a Saúde no Mundo 2001 – Saúde Mental: Nova Concepção,
Nova Esperança. [S. l.]: Organização Pan-Americana da Saúde: Organização Mundial
da Saúde, 2001. p. 6.
ROLNIK, S. Esferas da insurreição: Notas para uma vida não cafetinada. São Paulo:
N1 edições, 2018. p. 67.
SÃO PAULO (cidade). COVID-19: Boletim Semanal 2. São Paulo: Secretaria Munici-
pal de Saúde de São Paulo, 2020. [Publicado em 17 abr. 2020]. Disponível em: https://
www.prefeitura.sp.gov.br/cidade/secretarias/upload/saude/PMSP_SMS_COVID19_
Boletim%20Semanal_20200417_atualizado.pdf.
TRANSTORNOS mentais e trabalho. [S. l.: s. n.], 2018. 1 vídeo. Publicado pelo
canal TRT-2. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=-Xj8OLgVRjM.
Introdução
tação histórica e evolutiva desta constante guerra entre empregado e empregador, tendo
como foco, a busca, por parte dos empregadores, de meios para flexibilizar e precarizar
os direitos dos trabalhadores, buscando com isso reduzir custos com folha de pagamento.
Em seguida, tentamos conceituar o que é a pejotização, a fim de apresentar
esse fenômeno de forma ilustrativa e didática, expondo a jurisprudência do nosso
Tribunal Superior do Trabalho.
Dando continuidade, abordamos as consequências desse fenômeno que é total-
mente desleal com o trabalhador, para auxiliar na compreensão, mais uma vez, uti-
lizamos como fonte a jurisprudência e a doutrina.
E, por fim, apresentamos as ferramentas utilizadas pelos nossos tribunais trabalhistas,
para elucidar tal fraude e combatê-la, quando utilizada para violar direitos dos empregados.
1 Advogada. Professora na UVA/RJ. Doutora em Direito pela Universidade Veiga de Almeida. Mestre em
Direito pela UCP. Membro da Comissão de Direito do Trabalho da OAB/RJ, seccional Barra da Tijuca.
2 Advogada. Farmacêutica. Doutora em Direito pela Universidade Estácio de Sá e pela Universidade
de Padova – Itália. Mestre em Direito pela Universidade Estácio de Sá. Professora da graduação da
Universidade Veiga de Almeida e Faculdade Presbiteriana Mackenzie – Rio. Pesquisadora do Research
Group on Global Comparative Law: Governance, Innovation and Sustainability – GGINNS e do Laboratório
Empresa e Direitos Humanos – LEDH.uff. Avaliadora de revistas científicas. Coordenadora do grupo de
iniciação científica em Fashion Law da Universidade Veiga de Almeida. Vice-presidente da Comissão de
Bioética e Biodireito da OAB/RJ. Membro efetivo da Comissão do Direito da Moda.
36
relação, que outrora era disciplinada de forma impositiva, passou a ser disciplinada
sob a ótica da dignidade da pessoa do trabalhador, pois o trabalho escravo, servil e
corporativo deu lugar ao trabalho assalariado, onde o trabalhador, após os serviços
prestados deveriam receber uma contrapartida chamada salário.
Nesta esteira, Amauri Mascaro Nascimento3 leciona que:
[…] o direito do trabalho surgiu como consequência da questão social que foi
percebida pela Revolução Industrial do século XVIII e da reação humanista que
se propôs a garantir ou preservar a dignidade do ser humano ocupados no trabalho
das indústrias […]
[…]
Após essa mudança de cenário, o trabalhador passou a ser tratado com mais
dignidade e respeito, porém, passou a ser também um custo considerável nas des-
pesas da empresa, iniciando-se com isso uma guerra de interesses sem fim, onde o
empregador busca precarizar/flexibilidade tais direitos e o empregado almeja man-
tê-los ou melhorá-los.
No decorrer dessa disputa de interesses, o mercado financeiro/econômico que
outrora era fechado, nacionalista, protecionista passaram ser tornar globalizado, ou
seja, passaram a ser um mercado global e não mais local, iniciando-se com isso a
busca por mercados onde as normas trabalhistas não fossem rigorosas e o custo com
a mão de obra fosse menos custosa possível.
No Brasil, essas mudanças ocorreram de forma tardia, pois somente após fatos
históricos como: a abolição da escravatura, a primeira guerra mundial e a criação da
OIT, é que nossos governantes, principalmente na Era Vargas, 1930, se propuseram
disciplinar de forma expressiva e coletiva normas para proteger o trabalhador dos
vários abusos que ocorriam na época, nesta esteira vejamos o que leciona o nobre
professor Sergio Pinto Martins5:
3 NASCIMENTO, A. M. Curso do direito do trabalho. 23. ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
4 GARCIA, G. F. B. Curso de direito do trabalho. 4. ed. rev. atual e ampl. Rio de Janeiro: Forense, 2010. p. 37.
5 MARTINS, S. P. Direito do Trabalho. 30. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 11.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 37
[…]
As transformações que vinham ocorrendo na Europa em decorrência da primeira
guerra mundial e o aparecimento da OIT, em 1919, incentivaram a criação de
normas trabalhistas em nosso país.
[…]
Assim, com todas essas mudanças várias foram as leis criadas para prote-
ger o trabalhador, e de outro lado vários foram os meios utilizados pelos empre-
sários para flexibilizar tais leis, sendo uma delas o tema deste trabalho que se
chama PEJOTIZAÇÃO.
Podemos dizer, especificamente aqui no Brasil, a pejotização teve seu “nasci-
mento” com a entrada em vigor da Lei 11.196/05, a qual prevê em seu artigo 129:
Nessa histórica guerra do capital e labor, um dos métodos de flexibilização dos direi-
tos trabalhistas mais usado pelos empresários na atualidade é a Pejotização que consiste,
6 PEREIRA, L. Pejotização: O trabalhador como pessoa física. São Paulo: Saraiva, 2013. p. 77.
7 GARCIA, 2010, p. 341.
38
Para corroborar com o conceito acima, vejamos o conceito dado por Simone da
Costa e Felipe Ternus9:
8 As pessoas jurídicas são entes criados pela Lei, que lhes fornece a capacidade de serem sujeitos de
direitos e obrigações, atuando na sociedade com personalidade jurídica distinta das pessoas naturais
que a compõem.
9 COSTA, S. da; TERNUS, F. A pejotização e a precarização das relações de trabalho no Brasil e a
relação dos princípios de proteção e da primazia da realidade no direito do trabalho. In: SIMPÓSIO
INTERNACIONAL DE DIREITO: dimensões materiais e eficaciais dos direitos fundamentais, 3., 26 out.
2012, Chapecó. Anais eletrônicos […]. Chapecó: [s. n.], 2012. Disponível em: https://portalperiodicos.
unoesc.edu.br/simposiointernacionaldedireito/article/view/2285. Acesso em: 13 nov. 2021.
10 DELGADO, M. G. Princípios de Direito Individual e Coletivo do Trabalho. São Paulo: LTr, 2001. p. 285.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 39
pelo exame concreto da situação examinada, que o serviço diz respeito apenas
e tão-somente a uma pessoa física, surge o primeiro elemento fático-jurídico da
relação de emprego.
I – as associações;
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II – as sociedades;
III – as fundações.
IV – as organizações religiosas; (Incluído pela Lei nº 10.825, de 22.12.2003)
V – os partidos políticos. (Incluído pela Lei nº 10.825, de 22.12.2003)
VI – as empresas individuais de responsabilidade limitada. (revogada tacitamente
pela Lei 14.195/2021)
Destarte, como princípio basilar do direito trabalho, sua aplicação deve ser
observada tanto pelo julgador na hora de decidir o caso concreto, como também, pelo
legislador na criação de normas que tenham como escopo o direito do trabalhador,
ou seja, é uma norma de cunho imperativo e de ordem pública, pois sua aplicação
deve ser observada por todos, desde criação até a aplicação da norma, obrigando
dessa forma uma ação afirmativa do Estado, a fim de garantir um mínimo condições
ao trabalhador na execução de seu labor.
Nesse sentido, vejamos o conceito dado pelo nobre doutrinador Amauri Nas-
cimento Mascaro15:
14 DELGADO, M. G. Curso de Direito do Trabalho. 16. ed. rev. e ampl. São Paulo: LTr, 2017. p. 202.
15 MASCARO, A. N. Iniciação ao Direito do Trabalho. 34. ed. São Paulo: LTr, 2009. p. 381-382.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 43
Este princípio que talvez seja o mais importante no ramo justrabalhista, tem
como função trazer a verdade na relação entre empregado e empregador, retirando
a maquiagem que externamente aparenta haver uma situação que não é a verdadeira
ocorrida na relação de emprego, dessa forma podemos classificá-lo como fundamental
para se evidenciar a pejotização, vejamos o que leciona o nobre professor Delgado16:
[…]
O princípio do contrato realidade autoriza, assim, por exemplo, a descarac-
terização de uma pactuada relação civil de prestação de serviço, desde que
no cumprimento do contrato despontem concretamente todos os elementos
fático-jurídicos da relação de emprego (trabalho por pessoa física, com pes-
soalidade, não eventualidade, onerosidade e sob subordinação).
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[…]11.
Vejamos ainda, o Voto do Ministro Vieira de Mello Filho, Relator, nos autos
do processo Nº TST-AIRR-268400-57.2009.5.02.0076:
Considerações finais
REFERÊNCIAS
COSTA, S. da; TERNUS, F. A pejotização e a precarização das relações de trabalho
no Brasil e a relação dos princípios de proteção e da primazia da realidade no direito
do trabalho. In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL DE DIREITO: dimensões materiais e
eficaciais dos direitos fundamentais, 3., 26 out. 2012, Chapecó. Anais eletrônicos […].
Chapecó: [s. n.], 2012. Disponível em: https://portalperiodicos.unoesc.edu.br/simpo-
siointernacionaldedireito/article/view/2285. Acesso em: 13 nov. 2021.
DELGADO, M. G. Curso de Direito do Trabalho. 16. ed. rev. e ampl. São Paulo:
LTr, 2017. p. 202.
MARTINS, S. P. Direito do Trabalho. 30. ed. São Paulo: Atlas, 2014. p. 11.
MASCARO, A. N. Iniciação ao Direito do Trabalho. 34. ed. São Paulo: LTr, 2009.
p. 381-382.
Introdução
Nos parece indiscutível que formas de trabalho cada vez mais precárias, exte-
nuantes, empobrecedoras e com vínculos formais cada vez mais frágeis já vem se
estabelecendo no mundo há séculos, particularmente como resultado inexorável da
própria dinâmica capitalista e suas tendências expansionistas, que põem em curso
um imparável processo de incorporação tecnológica ao processo produtivo com o
propósito de, idealmente, anular o uso e, por isso, o custo do trabalho. Essa obsessão
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3 HARVEY, D. Condição pós-moderna: uma pesquisa sobre as origens da mudança cultural. São Paulo:
Edições Loyola, 2008.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 49
[…] a produção de renda e riqueza real passa a se dar sob a lógica dos imperativos
da valorização financeira. Seus processos devem ser adequados às necessidades de
giro rápido e pronta condição de aproveitar ganhos que a acumulação financeira
impõe, o “mínimo” de rendimento real que a produção deve gerar é muito alto,
dada a elevada valorização dos ativos financeiros (o que pressiona no sentido de
uma exploração do trabalho ainda mais violenta)6.
7 ANTUNES, R. Os Sentidos do Trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. São Paulo:
Boitempo, 2002. p. 190-191, itálicos originais.
8 AMITRANO, C. R.; SQUEFF, G. C. Notas sobre informalidade, produtividade do trabalho e grau de utilização
e seus impactos sobre o crescimento econômico no Brasil nos anos 2000. Nova Economia, Belo Horizonte,
v. 27, n. 3, p. 511-550, 2017. Disponível em: https://doi.org/10.1590/0103-6351/2981. Acesso em: 29 maio
2021. p. 516-517.
52
[…] tais atividades, sempre definidas como aquelas que se realizam fora do
âmbito da regulamentação do Estado, podem ter por objeto, em primeiro lugar,
a sobrevivência de uma pessoa ou de uma família por meio da produção direta
para subsistência ou da mera venda de bens e serviços no mercado. Em segundo
lugar, elas podem estar orientadas a melhorar a flexibilidade da gestão e reduzir os
custos trabalhistas das empresas do setor formal por meio da contratação “fora do
quadro de funcionários” e da subcontratação [ou terceirização] de empreendedores
informais. Em terceiro lugar, podem ser organizadas por pequenas empresas de
forma a acumular capital, aproveitando as relações de solidariedade que possam
existir entre elas, a maior flexibilidade e os menores custos9.
9 PORTES, A.; HALLER, W. J. La economía informal. Santiago de Chile: CEPAL, 2004. p. 12-13,
tradução nossa.
10 ILOSTAT. Statistics on unemployment and supplementary measures of labour underutilization. Genebra:
OIT, 2021. Disponível em: https://ilostat.ilo.org/topics/unemployment-and-labour-underutilization/. Acesso
em: 29 maio 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 53
11 ABÍLIO, L. C. Uberização do trabalho: subsunção real da viração. Blog da Boitempo, [s. l.], 22 fev. 2017.
Disponível em: https://blogdaboitempo.com.br/2017/02/22/uberizacao-do-trabalho-subsuncao-real-da-
viracao/. Acesso em: 29 maio 2021.
12 Ibid.
54
[…] custos são eliminados e transferidos para os próprios trabalhadores, que devem
promover a aquisição de todos os equipamentos necessários para o exercício do
14 99 APP. Quem dirige de 99 tem uma dupla imbatível: pagamento rápido e segurança em cada corrida. 99
APP, [s. l.], 2021. Disponível em: https://99app.com/motorista/?country=BR&channel=104. Acesso em: 29
maio 2021.
15 UBER. Ganhe no mínimo R$ 2.300 pelas suas primeiras 200 viagens em São Paulo. UBER, [s. l.], 2021.
Disponível em: https://bityli.com/2cava. Acesso em: 29 maio 2021.
56
A baixa remuneração paga por serviço realizado faz com que os “parceiros”
sejam obrigados a realizar longas jornadas de trabalho sem garantia de que a demanda
diária será suficiente para assegurar ganhos mínimos. Schinestsck, ao debater sobre
o ambiente laboral existente nas plataformas aplicativos diz que,
[…] para alcançar uma maior remuneração, já que o preço fixado para cada tarefa
é baixo, impõem-se jornadas extenuantes. Cabe lembrar que, quando há aumento
da demanda, o valor da hora é reduzido, e é preciso trabalhar mais para ganhar
mais. A jornada não é mais limitada a partir do tempo do trabalho, mas leva em
consideração o valor da remuneração que precisa ser alcançada pelo trabalhador19.
pois, além de não saber quanta demanda conseguirá atender em determinado período
de tempo, também não tem nenhuma garantia de que conseguirá obter os rendimentos
necessários para sua sobrevivência e para arcar com os custos necessários para seguir
trabalhando. O trabalhador, que se crê autônomo, é, na realidade, alienado de seus
direitos trabalhistas e constitucionais assegurados pela legislação brasileira, ficando
submisso aos desígnios das empresas-aplicativo que, além das baixas remunera-
ções, utilizam-se do controle das TICs para manter os trabalhadores sob um estado
de medo e insegurança, dado o desconhecimento da lógica de funcionamento do
trabalho (lógica esta estruturada pelos algoritmos), o que tem por efeito a elevação
da produtividade dos trabalhadores. Como defendido por Siqueira, Pedreira e Boas:
problema reconhecido tanto pelo Estado brasileiro quanto por importantes organiza-
ções internacionais, visto que sua existência viola uma série de direitos. Assim como
há transformações no regime de acumulação, as formas de trabalho se transformam
ao longo do tempo, de modo que não é errôneo defender que as práticas envolvendo
a escravidão se desenvolveram, fazendo da escravidão contemporânea um fenômeno
diverso da escravidão colonial. Por constituir um termo carregado de significados
históricos perversos e desumanos, há a existência de diversas disputas em torno do
conceito de trabalho escravo. Em geral, estas disputas giram em torno da tentativa de
desvincular as formas contemporâneas de trabalhos precários, insalubres e desumanos
das condições “análogas à escravidão”, de forma a escamotear a existência de diversos
elementos características do trabalho escravo presentes nas formas contemporâneas
de trabalho “flexível”. Desta maneira:
Nos parece desnecessário mais do que isso para afirmarmos que a uberização
impõe, indiscutivelmente, condições de trabalho desumanas e degradantes aos supos-
tos “empreendedores”, o que claramente viola não somente os direitos assegurados
pela legislação trabalhista (pelo menos daquela vigente até a Reforma Trabalhista
realizada pelo governo Michel Temer, em 2017), mas principalmente os assegurados
pela Constituição Federal, principalmente em seu 6º e 7º artigos. Este último, por
exemplo, assegura ao trabalhador direitos como:
carta constitucional, mas também é responsável por uma transferência de custos para
a sociedade, que é obrigada a arcar com as consequências de um trabalho realizado
em condições degradantes e sem nenhuma garantia, precarizando, potencialmente,
a vida de todos os membros da nossa coletividade.
Considerações finais
REFERÊNCIAS
99 APP. Quem dirige de 99 tem uma dupla imbatível: pagamento rápido e segurança
em cada corrida. 99 APP, [s. l.], 2021. Disponível em: https://99app.com/motoris-
ta/?country=BR&channel=104. Acesso em: 29 maio 2021.
UBER. Ganhe no mínimo R$ 2.300 pelas suas primeiras 200 viagens em São
Paulo. UBER, [s. l.], 2021. Disponível em: https://bityli.com/2cava. Acesso em: 29
maio 2021.
O “BREQUE DOS APPS” E AS
CONDIÇÕES DE TRABALHO DOS
ENTREGADORES NO BRASIL: autonomia
ou precarização laboral via plataformas?
Rubens Valtecides Alves1
Mariana Vieira Santos2
Taciana Cecília Ramos3
Introdução
5 BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF:
Presidência da República, [2021]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/
Constituicao.htm. Acesso em: 1 mar. 2021.
6 PANASIEWICZ, R.; BAPTISTA, P. A. N. Metodologia Científica – A ciência e seus métodos. Belo Horizonte:
Universidade Fumec, 2013. p. 95.
7 SILVA, E. L. da; MENEZES, E. M. Metodologia da Pesquisa e Elaboração de Dissertação. 3. ed. rev. atual.
Florianópolis: Laboratório de Ensino a Distância da UFSC, 2001 p. 20.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 67
8 BRAVERMAN, H. Trabalho e capital monopolista: a degradação do trabalho no século XX. 3. ed. Rio de
Janeiro: Zahar, 1980. p. 54
9 SILVA, C. M.; MENEZES FILHO, N. A.; KOMATSU, B. K. Uma abordagem sobre o setor de serviços
na economia brasileira. Insper. São Paulo 2016 Disponível em: https://www.insper.edu.br/wp-content/
uploads/2018/09/Abordagem-sobre-Setor-Servicos-Economia-Brasileira.pdf. Acesso em: 29 maio 2021.
10 FILGUEIRAS, V.; ANTUNES, R. Plataformas digitais, Uberização do trabalho e regulação no Capitalismo
contemporâneo. Contracampo, Niterói, v. 39, n. 1, p. 27-43, abr./jul. 2020. Disponível em: https://periodicos.
uff.br/contracampo/article/view/38901/pdf. Acesso em: 28 maio 2021
68
11 DE STEFANO, V. The rise of the “just-in-time workforce”: on-demand work, crowdwork and labour protection
in the “gig-economy”. International Labor Office, Inclusive Labour Markets, Labour Relations and Working
Conditions Branch, Conditions of work and employment series, n. 71, Geneva, 2016. Disponível em: http://
www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---ed_protect/---protrav/---travail/documents/publication/wcms_443267.
pdf. Acesso em: 28 maio 2021.
12 APÓS pressão de empresários, Temer vai aprovar terceirização. Exame, [s. l.], 2017 Disponível em: https://
exame.com/brasil/apos-pressao-de-empresarios-temer-vai-aprovar-terceirizacao/. Acesso em: 30 maio
2021; PEREIRA, R. Empresários comemoram aprovação de reforma trabalhista. Exame, [s. l.], 2017.
Ecnomia. Disponível em: https://exame.com/economia/empresarios-comemoram-aprovacao-de-reforma-
trabalhista/. Acesso em: 30 maio 2021
13 BRASIL. Lei nº 13.467, de 13 de julho de 2017. Altera a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT),
aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, e as Leis n º 6.019, de 3 de janeiro de 1974,
8.036, de 11 de maio de 1990, e 8.212, de 24 de julho de 1991, a fim de adequar a legislação às novas
relações de trabalho. Diário Oficial da União, Brasília, 14 jul. 2017. Disponível em: https://www.in.gov.br/
materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/19173773/do1-2017-07-14-lei-no-13-467-de-13-de-
julho-de-2017-19173618. Acesso em: 20 maio 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 69
14 APPS como Uber e iFood se tornam “maior empregador” do Brasil. Exame, [s. l.], 2019. Disponível em:
https://exame.com/economia/apps-como-uber-e-ifood-são-fonte-de-renda-de-quase-4-milhões-de-
pessoas/ Acesso em: 29 maio 2021.
15 IFOOD. Bons motivos para entregar iFood não faltam… iFOOD, [s. l.], 2021.Disponível em: https://
entregador.ifood.com.br/quero-fazer-parte/bons-motivos-pra-entregar-ifood-nao-faltam/. Acesso em: 29
maio 2021.
16 UBER. Oportunidades onde quer que você esteja. Uber, [s. l.], [20--?]. Disponível em: https://www.uber.
com/br/pt-br/drive/. Acesso em: 29 maio 2021.
17 Ibid.
18 UBER. Realize entregas com a Uber Eats. Uber, [s. l.], 2021. Disponível em: https://www.uber.com/br/pt-br/
deliver/. Acesso em: 29 maio 2021.
19 O “site” da plataforma destaca o uso de equipamentos necessários e definidos por lei como capacete, luva e
o baú. No entanto, sabe-se que existem outras necessidades, como um aparelho celular com boa conexão
de Internet, já que quedas de conexão podem ser prejudiciais aos entregadores perante a plataforma,
como destacado nesta reportagem: https://apublica.org/2021/05/conexao-zero-estrelas-trabalhadores-
de-aplicativos-se-endividam-para-pagar-a-internet/. Acesso em: 24 maio 2021.
20 CARELLI, R. de L. O Caso Uber e o Controle por Programação: de carona para o século XXI. In: LEME,
A. C. R. P.; RODRIGUES, B. A.; CHAVES JÚNIOR, J. E. de R. (coord.). Tecnologias disruptivas e a
exploração do trabalho humano: a intermediação de mão de obra a partir das plataformas eletrônicas e
seus efeitos jurídicos e sociais. São Paulo: LTr, 2017. p. 133.
21 Ibid., loc. cit.
70
não ter que responder a ordens diretas de um patrão ou de uma patroa. Evanylson,
que participou da pesquisa feita por Carelli, afirma que: “Não sinto [subordinação
em relação à Uber]. É um trabalho como outro qualquer: tem um aplicativo, as regras
deles que eu tenho que seguir como parceiro do aplicativo… Eu gosto daqui porque
faço meu horário, trabalho tranquilo”22.
A ideia de que o homem é um empreendedor de si mesmo surge com o libera-
lismo do século XX. Ela foi reforçada de forma a moldar o homem para o exercício
de uma “governabilidade neoliberal”, transformando-o em um “parceiro” do Estado.23
Percebe-se que o “empreendedorismo torna-se genericamente sinônimo de assumir
riscos da própria atividade”24. Porque diferente dos donos das grandes indústrias,
nessa situação o entregador parceiro/a entregadora parceira não é dono dos meios de
produção: ele possui, no máximo, um veículo. Ele não aumenta o valor do seu capital
através do trabalho de outras pessoas. Alinhado a isso, convém a seguinte reflexão:
ritmo do aplicativo. Como expresso por Carelli ao analisar o trabalho de Alain Supiot:
Os trabalhadores não devem mais seguir ordens, mas sim a ‘regras do programa’.
Uma vez programados, na prática os trabalhadores não agem livremente, mas
exprimem ‘reações esperadas’. O algoritmo, cujos ingredientes podem ser modifi-
cados a cada momento pela sua reprogramação (‘inputs’), garante que os resultados
finais esperados (‘outputs’) sejam alcançados, sem necessidade de dar ordens
diretas àqueles que realizam o trabalho.
27 CARELLI, R. de L. O Caso Uber e o Controle por Programação: de carona para o século XXI. In: LEME,
A. C. R. P.; RODRIGUES, B. A.; CHAVES JÚNIOR, J. E. de R. (coord.). Tecnologias disruptivas e a
exploração do trabalho humano: a intermediação de mão de obra a partir das plataformas eletrônicas e
seus efeitos jurídicos e sociais. São Paulo: LTr, 2017. p. 141
28 RIEMENSCHNEIDER, P. S.; MUCELIN, G. A. B. Economia do compartilhamento: a lógica algorítmica
das plataformas virtuais e a necessidade de proteção da pessoa nas atuais relações de trabalho. Redes:
R. Eletr. Dir. Soc., Canoas, v. 7, n. 1, 2019. p. 63.
72
Como alinhavado até o momento, nos últimos anos os trabalhos dos motoristas e
dos entregadores por aplicativos cresceram exponencialmente no País. Determinados
fatores históricos específicos do Brasil favoreceram esse cenário: as reformas legis-
lativas como a lei do Teto de Gastos de dezembro de 2016, a Reforma Trabalhista de
novembro de 2017 e a Reforma da Previdência de novembro de 2019 recrudesceram
a crise econômica nacional33.
Com isso, o desemprego dobrou e permaneceu em patamar superior aos 11%.
Registrou-se, outrossim, que um quarto da população ativa teve sua força de trabalho
subutilizada e, dessa maneira, o crescimento do número de trabalhadores em ocupa-
ções precárias, mais suscetíveis à exploração do trabalho, aconteceu34.
Sob esse contexto, os autores Marcelo Manzano e André Krein focaram na
análise dos dados referentes aos (às) motoristas e entregadores por aplicativos cole-
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercizalização
36 Ibid., p. 11.
37 BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF:
Presidência da República, [2021]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/
Constituicao.htm. Acesso em: 1 mar. 2021.
38 MORAES, M. C. B. de. O conceito de dignidade humana: substrato axiológico e conteúdo normativo. In:
MORAES, M. C. B. de. Constituição, direitos fundamentais e direito privado. 3. ed. Porto Alegre: Livraria
do Advogado, 2010. p. 117
39 BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF:
Presidência da República, [2021]. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/
Constituicao.htm. Acesso em: 1 mar. 2021.
40 Ibid.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 75
vos brasileiros.
Elencado esse rol de direitos constitucionais e internacionais acerca do tema em
estudo, a questão do trabalho dos entregadores de aplicativos é amplificada quando
se adentra no debate de que esse labor se enquadraria no conceito de subordinação
jurídica ou de autonomia constantes na legislação trabalhista brasileira.
Esse aspecto será melhor abordado no tópico seguinte. Porém, desde já con-
vém relacionar duas decisões judiciais recentes descritas no trabalho de Ana Cláudia
Moreira Cardoso, Karen Artur e Murilo Carvalho Sampaio Oliveira sobre esse assunto
e aqui replicadas que revelam alguns entendimentos existentes nos tribunais brasileiros:
Dadas essas argumentações jurídicas, parte-se para o terceiro tópico deste traba-
lho investigativo, a fim de se delinear melhor a autonomia e a subordinação e mostrar
a importância dessa discussão no campo do Direito do Trabalho.
45 CARDOSO, A. C. M.; ARTUR, K.; OLIVEIRA, M. C. S. O trabalho nas plataformas digitais: narrativas
contrapostas de autonomia, subordinação, liberdade e dependência. Revista Valore, Volta Redonda, v. 5,
ed. esp., p. 221, 2020. Disponível em: https://revistavalore.emnuvens.com.br/valore/article/view/657. Acesso
em: 20 maio 2021.
46 Ibid., p. 222-223. Disponível em: https://revistavalore.emnuvens.com.br/valore/article/view/657. Acesso
em: 20 maio 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 77
ramente se a Uber diminuísse a taxa que eu pago. Pra eu poder fazer alguma coisa
aproximada do que eu necessito, eu tenho que trabalhar 10h/12h por dia”49 O depoi-
mento de Robson pontua essa situação da mesma forma:
47 CARELLI, R. de L. O Caso Uber e o Controle por Programação: de carona para o século XXI. In: LEME,
A. C. R. P.; RODRIGUES, B. A.; CHAVES JÚNIOR, J. E. de R. (coord.). Tecnologias disruptivas e a
exploração do trabalho humano: a intermediação de mão de obra a partir das plataformas eletrônicas e
seus efeitos jurídicos e sociais. São Paulo: LTr, 2017. p. 142
48 PERES, A. C. Olha o breque!: movimento dos entregadores vem chamando atenção para a precaridade
das relações de trabalho nas plataformas digitais. RADIS: Comunicação e Saúde, n. 215, p. 17, ago. 2020.
Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/43181 Acesso em 28 maio 2021
49 CARELLI, 2017, p. 134.
50 Ibid., p. 134.
78
carrots. Carrots é a palavra inglesa para cenoura e nesse contexto ela se relaciona a
prêmios. Uma das formas é a utilização de preço dinâmico. Em uma área com alta
demanda, o aplicativo mostra uma zona vermelha e aumenta o valor a ser pago ao(à)
parceiro, que se desloca até lá para que todos os clientes sejam atendidos rapidamente.
Outra forma é o oferecimento de incentivos financeiros para que os parceiros estejam
disponíveis para trabalhar na plataforma em dias nos quais ele escolheria não trabalhar
como em feriados ou dias festivos. Já os sticks são as punições aplicadas quando os
padrões estabelecidos pelo aplicativo não são alcançados. Os trabalhadores podem
ser punidos por receberem avaliações baixas, caso em que podem ficar sem acesso
ao aplicativo por uma quantidade determinada de horas, o que também demonstra o
controle de qualidade do serviço através das notas dadas pelos usuários. O algoritmo
também delega menos corridas a quem deixa de trabalhar um dia, ou dois. Como
afirma Tirza: “Se por algum motivo você para um ou dois dias, pode ter certeza
que, no terceiro, nem vai receber pedido”.51 A Uber assume a mesma conduta, como
afirma Christian: “Diariamente o Uber manda mensagens, quando o motorista deixa
de trabalhar, o Uber manda mensagem falando que a pessoa não está trabalhando e
o que ela está perdendo com isso”52.
A avaliação mediante notas dos usuários está relacionada ao oferecimento de
um padrão de qualidade dos serviços prestados pelos parceiros, de modo que, se há
desconformidade, os parceiros devem ser punidos. E, para que as empresas saibam
A plataforma, nos mesmos moldes que uma empresa tradicional, deseja manter
a qualidade e o padrão de seus serviços ofertados aos consumidores, no sentido
de prover um bom serviço e assegurar que os trabalhadores assim o concretizem,
desenvolvendo instrumentos para tanto53.
O trabalhador pode não só ser punido, como pode, também, ser retirado da plata-
forma. E isso pode acontecer sem que ele tenha qualquer possibilidade de intervenção,
direito de resposta ou ao menos uma justificativa expressa da empresa. Além disso, a
pessoa que presta serviço pelo aplicativo não é autorizada a fazer contato com clientes
de forma a criar uma cartela de clientes que ele possa atender fora do aplicativo. Isso
demonstra ainda mais a falta da suposta autonomia desses trabalhadores.
Estes controles e exemplos citados acima são o que Carelli denomina “controle
por objetivos”. Os algoritmos são utilizados para enviar sinais aos(às) trabalhadores,
que devem responder em tempo real, para que cumpram as metas designadas pelo
aplicativo54. Constata-se que é possível verificar todos os componentes da nova orga-
nização do trabalho por objetivos e isso implica na necessidade de intervenção estatal:
51 PERES, A. C. Olha o breque! Movimento dos entregadores vem chamando atenção para a precaridade
das relações de trabalho nas plataformas digitais. RADIS: Comunicação e Saúde, n. 215, p. 19, ago. 2020.
Disponível em: https://www.arca.fiocruz.br/handle/icict/43181 Acesso em: 28 maio 2021.
52 CARELLI, 2017, p. 137
53 RIEMENSCHNEIDER, P. S.; MUCELIN, G. A. B. Economia do compartilhamento: a lógica algorítmica
das plataformas virtuais e a necessidade de proteção da pessoa nas atuais relações de trabalho. Redes:
R. Eletr. Dir. Soc., Canoas, v. 7, n. 1, p. 67, 2019.
54 CARELLI, 2017, p. 140.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 79
conceito específico e limitado, porque o direito do trabalho deve buscar abarcar todas
as situações de possibilidades de exploração do trabalho59.
O controle do trabalho pode ocorrer fora do estabelecimento e pode ser feito
por meios informáticos ou telemáticos60. Analisa-se, portanto, se os entregadores de
aplicativos são subordinados e se estão sob o controle das plataformas para as quais
prestam serviços.
Como tratado anteriormente, sabe-se que as plataformas não apenas oferecem
um serviço, mas também um padrão de qualidade na prestação deste. A própria
plataforma pode colher dados necessários para essa análise, como tempo para o
atendimento do cliente, trajeto utilizado, corridas recusadas, dentre outros. Além
disso, a avaliação do usuário através das notas também auxilia no controle da pres-
tação do serviço.
No caso de descumprimento desse padrão de qualidade, há a possibilidade de
punições e até desligamento do aplicativo. Assim, pode-se afirmar que o entregador
Ademais, o entregador pode até ser o dono do veículo utilizado para fazer as
entregas e da caixa-mochila onde acondiciona as mercadorias, mas, ao não poder
fidelizar os clientes que atende pelo aplicativo, percebe-se que os clientes não são
do entregador, mas sim do aplicativo. Assim, verifica-se que esse profissional não
possui ampla liberdade para a realização de seu serviço. Quem detém os clientes,
as informações necessárias para o trabalho e possibilita a conexão do entregador
é a plataforma, sendo o entregador dependente desta, o que rompe com a ideia de
autonomia laboral desses profissionais.
Considerações finais
A hipótese era a de que essa autonomia não vigora, pois, nessa economia de pla-
taformas, que operam na categoria work on demand via apps, a proposta de que existe
uma relação de parceria dessas empresas com os entregadores, com os privilégios
de flexibilidade de tempo de trabalho, ausência de chefia direta e ganho relacionado
apenas ao esforço pessoal, se mostra equivocada na prática.
A realidade é que as regras são pré-definidas pelas plataformas, sem margem
à liberdade na gestão do trabalho pelos entregadores, que não fidelizam os clientes
usuários e que podem até ser punidos se não se conectam às plataformas. Os baixos
valores pagos por essas empresas ensejam, ainda, longas jornadas diárias e sema-
nais, o que envolve não só o desgaste do veículo do trabalhador como o seu próprio
abatimento psicossocial.
Fato é que o trabalho nas plataformas digitais, exaltado por ser a repre-
sentação da nova era tecnológica no globo, realça a precarização do labor e a
desregulamentação das normas trabalhistas em um cenário de crise econômica no
Brasil. Essa crise vem sendo acentuada por reformas legislativas neoliberais, por
exemplo, que aumentam as taxas de desemprego e elevam, igualmente, os postos
de trabalho que colocam os trabalhadores em situação de maior vulnerabilidade
social – tendo como exemplo a maior exposição e chance de contaminação de
coronavírus (covid-19).
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercizalização
REFERÊNCIAS
ABILIO, L. C. Uberização: do empreendedorismo para o autogerenciamento subor-
dinado. Psicoperspectivas, v. 18, n. 3, p. 41-51, 2019. p. 44.
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Disponível em: https://exame.com/brasil/apos-pressao-de-empresarios-temer-vai-
-aprovar-terceirizacao/. Acesso em: 30 maio 2021; PEREIRA, R. Empresários come-
moram aprovação de reforma trabalhista. Exame, [s. l.], 2017. Ecnomia. Disponível
em: https://exame.com/economia/empresarios-comemoram-aprovacao-de-reforma-
-trabalhista/. Acesso em: 30 maio 2021
APPS como Uber e iFood se tornam “maior empregador” do Brasil. Exame, [s. l.],
2019. Disponível em: https://exame.com/economia/apps-como-uber-e-ifood-são-fon-
te-de-renda-de-quase-4-milhões-de-pessoas/ Acesso em: 29 maio 2021.
KALIL, R. B. Breque dos Apps revela o dumping social das plataformas e se contra-
põe ao discurso da suposta autonomia dos trabalhadores. IHU on-line, São Leopoldo,
15 jul. 2020. Entrevista cedida para Patricia Fachin (IHU). Disponível em: http://
www.ihu.unisinos.br/159-noticias/entrevistas/600954-breque-dos-apps-revela-trans-
formacoes-que-afetam-muito-mais-do-que-o-trabalho-de-entregadores-entrevista-es-
pecial-com-renan-kalil. Acesso em: 01 mar. 2020.
UBER. Oportunidades onde quer que você esteja. Uber, [s. l.], [20--?]. Disponível
em: https://www.uber.com/br/pt-br/drive/. Acesso em: 29 maio 2021.
86
UBER. Realize entregas com a Uber Eats. Uber, [s. l.], 2021. Disponível em: https://
www.uber.com/br/pt-br/deliver/. Acesso em: 29 maio 2021.
Introdução
uberizado aparece como um trabalho livre, no qual o trabalhador pode realizar suas
atividades sem carga horária pré-definida, sem supervisão patronal etc.4
O fenômeno da uberização é amplo e envolve trabalhos que exigem níveis varia-
dos de qualificação, plataformas com diferentes níveis de controle sobre a atividade
laboral, entre outras inúmeras diferenças. A pesquisa sociológica, principalmente,
já criou categorizações para enquadrar melhor as diversas atividades, as quais tem
como signo central: o uso das tecnologias da informação (TIC)5; a falta de controle
6 KALIL, R. B. Capitalismo de plataforma e direito do trabalho: crowdwork e trabalho sob demanda por meio
de aplicativos. 2019. Tese (Doutorado em Direito) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019.
7 LABRONICI, R. B.; ANTUNES, R. (org.). Uberização, trabalho digital e indústria 4.0. São Paulo:
Boitempo. 2021.
8 PACHUKANIS, E. B. Teoria geral do direito e marxismo. Tradução de Paula Vaz de Almeida. São Paulo:
Boitempo, 2017.
9 OLIVON, B. Placar na Justiça do Trabalho é favorável às empresas de aplicativo. Valor Econômico, Brasília,
24 jul. 2020. Disponível em: https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2020/07/24/placar-na-justica-do-
trabalho-e-favoravel-as-empresas-de-aplicativo.ghtml. Acesso em: 1 fev. 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 89
um Estado social mínimo (em diferentes amplitudes), estabilidade nos preços e cresci-
mento econômico elevado, com crescimento médio de 5% ao ano em países centrais11.
No que concerne ao controle da produção predominaram nesse período o con-
trole taylorista e fordista. Em breves palavras, o taylorismo caracteriza-se pela sub-
divisão extrema das tarefas, medição cronometrada da duração de cada movimento,
visando reduzir os poros da jornada com a realização de tarefas com o menor gasto de
energia e no menor tempo possível12. Já o fordismo tem como principal contribuição
a inserção da esteira móvel na linha de montagem da produção, Antunes caracteriza
esse período pela “desantropomorfização do trabalho e sua conversão em apêndice
da máquina-ferramenta”13.
No âmbito da configuração do vínculo de emprego é possível verificar facil-
mente os requisitos da relação de emprego, com a clara cisão entre gerência e execu-
tores. Na figura do gerente fica nítida a presença da subordinação clássica. Logo, não
há maiores dificuldades no que concerne aos requisitos de pessoalidade, onerosidade,
não eventualidade e a pedra de toque da relação de emprego, a subordinação.
Porém, conforme Antunes explica o capitalismo a partir do início dos anos 70,
começou a dar sinais de um quadro crítico14. Pochmann afirma que os países de
10 PINTO, G. A. A organização do trabalho no século XX: taylorismo, fordismo e toyotismo. São Paulo:
Expressão Popular, 2007.
11 KALIL, R. B. Capitalismo de plataforma e direito do trabalho: crowdwork e trabalho sob demanda por meio
de aplicativos. 2019. Tese (Doutorado em Direito) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2019.
12 PINTO, G. A. A organização do trabalho no século XX: taylorismo, fordismo e toyotismo. São Paulo:
Expressão Popular, 2007.
13 ANTUNES, R. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. 2. ed. 10.
reimpr. rev. e ampl. São Paulo: Boitempo, 2009. p. 39.
14 Ibid., loc. cit.
90
15 POCHMANN, M. O mito da grande classe média: capitalismo e estrutura social. São Paulo: Boitempo, 2015.
16 OLIVEIRA, E. Toyotismo no Brasil: desencantamento da fábrica, envolvimento e resistência. São Paulo:
Expressão Popular, 2004.
17 ANTUNES, R. O privilégio da servidão: o novo proletariado de serviços na era digital. São Paulo:
Boitempo, 2018.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 91
23 SILVA, R. B. da. Os motoboys no globo da morte: circulação no espaço e trabalho precário na cidade de
São Paulo. 2009. Dissertação (Mestrado em Geografia Humana) – Universidade de São Paulo, São Paulo,
2009. p. 27.
24 Ibid.
25 GRISCI, C. L. I.; SCALCO, P. D.; JANOVIK, M. S. Modos de trabalhar e de ser de motoboys: a vivência
espaço-temporal contemporânea. Psicol. Ciênc. Prof., v. 27, n. 3, p. 446-461, 2007.
26 ABILIO, L. C. Uberização: do empreendedorismo para o autogerenciamento subordinado. Psicoperspectivas,
Valparaíso, v. 18, n. 3, p. 41-51, nov. 2019.
27 Tais atividades classificam-se como geograficamente aderentes (trabalho sob demanda por meio de
aplicativos), pois necessitam da presença do trabalhador em determinado local específico. Há ainda dentre
as atividades das plataformas digitais, atividades geograficamente não aderentes (crowdwork), dentre as
quais pode-se citar a Amazon Mechanical Turk, que não configura o objeto desse trabalho.
28 Disponível em: https://olhardigital.com.br/2020/04/01/noticias/covid-19-faz-numero-de-candidatos-a-
entregador-de-ifood-dobrar/.
29 ABÍLIO, L. C. et al. Condições de trabalho de entregadores via plataforma digital durante a Covid-19.
Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano, v. 3, 2020.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 93
do chamado sistema Itaú. Pesquisa da Aliança Bike em São Paulo revela que o entre-
gador ciclista típico trabalha todos os dias da semana, 9 a 10 horas por dia, ganha
em média R$992,00 por mês, é homem, negro, entre 18 e 22 anos com ensino médio
completo e estava desempregado30.
Com a pandemia de covid-19 o setor de entregas foi amplamente impul-
sionado, tendo sido considerado atividade essencial (art. 3º, XII e XXII, decreto
nº 10.282/2020) matéria da CNN exemplifica bem a conjuntura:
30 ALIANÇA BIKE. Pesquisa de perfil de entregadores ciclistas de aplicativo. São Paulo: Aliança Bike, 2019.
31 O’BRIEN, S. A. A pandemia impulsionou as empresas de delivery, mas a realidade pode mudar. CNN, [s. l.],
20 dez. 2020. Disponível em: https://www.cnnbrasil.com.br/business/2020/12/20/a-pandemia-impulsionou-
as-empresas-de-delivery-mas-a-realidade-pode-mudar.Acesso em: 4 mar. 2021.
32 RIBEIRO, L. Delivery cresce e contrata em várias partes do mundo, mostra estudo. Estado de Minas,
Belo Horizonte, 16 fev. 2021. https://www.em.com.br/app/noticia/economia/2021/02/16/internas_
economia,1238024/delivery-cresce-e-contrata-em-varias-partes-do-mundo-mostra-estudo.shtml. Acesso
em: 4 mar. 2021.
33 ABÍLIO, 2020.
34 MARTINS, J. C.; SCODRO, C. L.; DE SOUZA, F. M. O papel dos sindicatos e o (des)amparo aos direitos
laborais dos entregadores de aplicativo frente à pandemia de Covid-19. Revista Jurídica Trabalho e
Desenvolvimento Humano, v. 3, 2020.
94
Antecipar resultados com relativa eficiência é, portanto, uma das muitas possi-
bilidades da aplicação jurimétrica bem planejada. À luz das decisões anteriores
e de outras variáveis do processo é possível decidir com muito mais segurança
a respeito do ajuizamento de ações. Os modelos estatísticos permitem fornecer
subsídios mais sólidos aos clientes, sendo uma segurança para o próprio advogado
ou escritório36.
35 Em relação a Ifood uma ação versava sobre o fornecimento de equipamentos de proteção individual a
entregador, em razão da pandemia de covid-19 e outra sobre reconhecimento de vínculo entre vendedora
pejotizada e a plataforma. Já em relação a Rappi, tratavam de ações de empregados da Rappi, com
funções administrativas.
36 ZABALA, F. J.; SILVEIRA, F. F. Jurimetria: estatística aplicada ao direito. Revista Direito e Liberdade, v. 16,
n. 1, p. 87-103, 2014. p. 80.
37 OLIVON, B. Placar na Justiça do Trabalho é favorável às empresas de aplicativo. Valor Econômico, Brasília,
24 jul. 2020. Disponível em: https://valor.globo.com/legislacao/noticia/2020/07/24/placar-na-justica-do-
trabalho-e-favoravel-as-empresas-de-aplicativo.ghtml. Acesso em: 1 fev. 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 95
3. Dos reclamantes
horários e dias que desejar e se insere nas atividades normais da empresa (teoria dos
fins do empreendimento). Nesse ponto, observa-se cisão na estratégia processual
dos reclamantes, parte levanta a tese de que seriam trabalhadores intermitentes,
nos termos do art. 443, §3º/CLT, ou seja, trabalho não contínuo, com alternância
de períodos de prestação de serviços e de inatividade, a convocação do empre-
gador, nos termos do art. 452-A, §1º/CLT se daria através do aplicativo, nesse
ponto ressaltam que nos termos do §3º do art. 452-A/CLT, a recusa da oferta não
descaracteriza a subordinação.
Por fim, trata-se da subordinação. Inicialmente, indicam o poder diretivo, visto
que as regras de trabalho dos motofretistas e a remuneração são fixadas unilateral-
mente pela reclamada. Há instruções detalhadas sobre as execuções das tarefas, men-
suração do trabalho por notas e avaliações dos consumidores, monitoramento total
do entregador através de GPS. Apontam ainda o poder disciplinar, pela possibilidade
de imposição de penalidades (suspensões, descontos nas viagens, bloqueios etc.).
Utilizam-se ainda, do parágrafo único do art. 6º da CLT, o qual equipara meios
telemáticos e informatizados de comando, aos meios pessoais e diretos, para fins de
subordinação. Entendem que tal artigo consagrou a possibilidade da subordinação
por programação ou algoritmo.
Superada a questão do vínculo empregatício, verifica-se que requerem os moto-
4. Dos reclamados
39 Ressalta-se que uma sentença condenou a Ifood por danos morais pela ausência de depósito de verbas
previdenciárias, tendo a ação, portanto, sido julgada parcialmente procedente.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 99
40 Entendem algumas sentenças ser a precificação um elemento relevante da subordinação, pela possibilidade
de gerar jornadas mais longas pelo pagamento de taxas superiores a trabalhadores mais assíduos.
100
Considerações finais
REFERÊNCIAS
ABÍLIO, L. C. et al. Condições de trabalho de entregadores via plataforma digi-
tal durante a Covid-19. Revista Jurídica Trabalho e Desenvolvimento Humano,
v. 3, 2020.
Introdução
1 Mestrando em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Bacharel em Direito pela Faculdade
de Direito “Prof. Jacy de Assis” da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Advogado.
2 Mestrando em Direito pela Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Pós-Graduando em Direito Digital
e “Compliance” pelo Instituto Damásio da Faculdade de Direito do Ibmec-SP. Bacharel em Direito na
Faculdade de Direito “Prof. Jacy de Assis” da Universidade Federal de Uberlândia (UFU). Advogado.
3 Professora Titular na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), na área de Direito Administrativo e
Processo Administrativo, com Pós-Doutorado pela Aalborg University, Dinamarca (AAU). Bacharel,
Especialista e Doutora em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG).
106
ou seu exercício na Justiça do Trabalho. Até porque, cabe a este órgão a defesa da
ordem jurídica, da democracia e a missão de agir na salvaguarda dos interesses sociais
e individuais indisponíveis no âmbito das relações laborais (desde que presente o
interesse público e repercussão social).
No que tange à pauta de enfrentamento ao trabalho infantil e cumprimento da
legislação aos menores aprendizes, estagiários e empregados adolescentes, viu-se que
a atuação do Ministério Público do Trabalho revelou-se imperiosa – especialmente,
pelo fato de atuar preventivamente na proteção e promoção destes sujeitos de direitos.
Destaca-se, entre suas atribuições, a proteção da infância, uma vez que, com
a diminuição de renda das famílias, muitas crianças foram colocadas ao exercício
de atividades laborais, em particular, resultado de vastas demissões, diminuição de
demanda ao trabalho informal e impactos da Medida Provisória nº 936, de 1º de abril
de 2020 (por meio desta, foi admitida a redução da jornada de trabalho e proporcional
redução salarial, com a finalidade de conter as demissões em massa que assolaram
o mercado de trabalho). Do mesmo modo, calhou ao MPT atuar na defesa dos tra-
balhadores menores mediante a preservação de seus contratos de aprendizagem e
de estágio, no sentido de evitar o deslocamento deles até as empresas, garantindo,
contudo, o recebimento correspondente às atividades profissionalizantes de forma
remota ou outras variantes.
4 LEITE, C. H. B. Curso de direito processual do trabalho. 17. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2019. p. 214.
108
Com a finalidade de cessar eventuais atos que possam ferir os direitos humanos
atinentes da seara trabalhista e garantir a legítima promoção de crianças e adolescentes
recomendatórias, pois, consoante Carla Mereles, elas “são alertas sobre a conduta
que empregadores mantêm com seus empregados; ou até mesmo avisos prévios e
preventivos para que não passem a agir de maneira irregular e que isso acarrete num
processo judicial”6. Dessa forma, tanto entidades públicas, por exemplo, prefeitu-
ras e autarquias, como empresas privadas, de pequeno, médio ou grande porte, são
orientadas em como desempenhar uma correta proteção e promoção dos trabalhadores
sob o âmbito laboral, ou então, no que concerne a evitar que sujeitos proibidos por
lei executem atividades laborativas, exemplificativamente, crianças e adolescentes
menores de quatorze anos.
A supracitada atuação preventiva se justifica tendo em vista a imprescindibili-
dade de uma postura permanente de harmonia social entre o Estado e comunidade
civil. Comportamento este que se funda no princípio constitucional da pacificação
social, que vem disposto no preâmbulo da Constituição Federal de 1988, veja-se:
6 MERELES, C. Ministério Público do Trabalho. Portal Politize, [s. l.], 26 maio 2017. Disponível em: https://
www.politize.com.br/ministerio-publico-do-trabalho/. Acesso em: 21 maio 2021.
7 BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília, DF, 1988.
110
13 Nos termos do item “J”, do “Guía de Principios sobre Responsabilidad Social de las Empresas en el
Campo de los Derechos Humanos y el Medio Ambiente en las Américas”, da OEA – Organização dos
Estados Americanos, indica-se que “las empresas y los Estados donde estas operan, deben fortalecer
respectivamente, los sistemas internos y externos de seguimiento, fiscalización y control del cumplimiento
de los derechos laborales, de los derechos humanos y de la protección del medio ambiente. Esto implica,
necesariamente, que los Estados implementen políticas eficientes de fiscalización y supervisión de las
empresas en el desarrollo de sus actividades como también que las propias empresas establezcan
políticas para garantizar el respeto de los derechos humanos y del medio ambiente en sus operaciones.
2 Ambos mecanismos de fiscalización deben consultar fuentes externas, incluidas las partes afectadas”.
ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS. Guía de Principios sobre Responsabilidad Social de
las Empresas en el Campo de los Derechos Humanos y el Medio Ambiente en las Américas. Publicado
em: março de 2014.
14 A responsabilidade das empresas de respeitar os direitos humanos refere-se aos direitos humanos
internacionalmente reconhecidos – entendidos, no mínimo, como aqueles expressos na Carta Internacional
de Direitos Humanos e os princípios de direitos fundamentais estabelecidos na Declaração da Organização
Internacional do Trabalho sobre os Princípios e Direitos Fundamentais no Trabalho. É o que estabelece o
Princípio Orientador de número 12. BRASIL. Secretaria Nacional de Proteção Global. Ministério da Mulher,
da Família e dos Direitos Humanos. Princípios Orientadores Sobre Empresas e Direitos Humanos. Ascom
MMFDH, p. 20.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 113
mental à prioridade absoluta (art. 227, caput); à proteção especial (art. 227, §3º, IV)
e o direito de ter respeitada a sua condição peculiar de pessoa em desenvolvimento
(art. 227, §3º, V). Ou seja, de forma alguma o Estatuto poderia restringir tais garantias.
Por essas razões, não há dúvidas de que os menores de quatorze anos pos-
suem um verdadeiro direito fundamental ao não trabalho. E, mesmo aos de idade
superior, são aplicáveis normas protetivas que limitam o exercício laboral, na
medida em que este não pode ser realizado em locais prejudiciais à sua formação,
ao seu desenvolvimento físico, psíquico e social e em horários e locais que não
permitam a frequência à escola16, nos termos do parágrafo único do artigo 403 da
Consolidação das Leis do Trabalho (CLT).
15 Abaixo dos 14 anos não se admite trabalho algum, embora no âmbito artístico possa ser autorizado, por
via judicial, certas atividades desempenhadas por crianças ou adolescentes. Conforme dispõe o artigo 8
da Convenção 138 da Organização Internacional do Trabalho, “permissões assim concedidas limitarão o
número de horas do emprego ou trabalho autorizadas e prescreverão as condições em que esse poderá ser
realizado”. Fonte: Convenção nº 138 da OIT sobre Idade Mínima de Admissão ao Emprego, complementada
pela Recomendação nº 146 (adotadas em Genebra, em 26 de junho de 1973; aprovadas pelo Decreto
Legislativo nº 179, de 14 de dezembro de 1999; entrada em vigor, para o Brasil, em 28 de junho de 2002,
nos termos do parágrafo 3, de seu art.12; e promulgadas em 15 de fevereiro de 2002. BRASIL. Decreto
nº 10.088, de 5 de novembro de 2019. Consolida atos normativos editados pelo Poder Executivo Federal
que dispõem sobre a promulgação de convenções e recomendações da Organização Internacional do
Trabalho – OIT ratificadas pela República Federativa do Brasil. Publicado em: 6 nov. 2019.
16 O direito a proteção especial abrange a garantia de acesso do trabalhador adolescente e jovem à escola,
nos termos do §3° do art. 227 da Constituição da República, com a redação conferida pela Emenda
Constitucional n°65, de 2010. BRASIL. Emenda Constitucional nº 65, de 13 de julho de 2010. Altera a
denominação do Capítulo VII do Título VIII da Constituição Federal e modifica o seu art. 227, para cuidar
dos interesses da juventude. Publicado em: 14 ago. 2010.
114
17 Sobre a primeira lei sistêmica Wanda Lúcia Ramos da Silva, Juíza do Trabalho, elucida que: “O primeiro
parâmetro de regularidade que deve permear um sistema é a lei do pertencimento ou vínculo. Por esse
critério geral, pertencem à família todos os indivíduos gerados no interior do sistema”. SILVA, W. L. R. da.
O Trabalho do Juiz sob a Perspectiva Sistêmica. Revista do Tribunal Regional do Trabalho da 18ª Região,
v. 1, 2015, p. 14.
18 DUTRA, M. Z. L. Trabalho Infantil Doméstico: vergonhosa chaga social. Portal Fórum Nacional de Prevenção
e Erradicação do Trabalho Infantil, Belém, 2019. Disponível em: https://fnpeti.org.br/artigos/trabalho-infantil-
domestico-vergonhosa-chaga-social/. Acesso em: 23 maio 2021.
19 Atividade constante do item 76 da tabela disposta no Decreto n° 6.481/08, que regulamenta artigos
da Convenção 182 da Organização Internacional do Trabalho sobre a proibição das piores formas de
trabalho infantil.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 115
almejados. Por isso, deve aproveitar ao máximo sua capacidade de fazer transfor-
mação social, inclusive para a promoção de vulneráveis, como as crianças e os
adolescentes. Neste desiderato, sua participação transcende a modalidade judicial/
posterior/repressiva, abarcando atuações extrajudiciais/antecipadas/preventivas, em
busca de melhor tutelar os bens jurídicos ligados a dignidade da pessoa humana.
22 CARVALHO, D. W. de. A natureza jurídica da Pandemia Covid-19 como um desastre biológico: um ponto
de partida necessário para o Direito. Revista dos Tribunais Online. 2020, p. 3.
23 Como explica o autor, “o comprometimento desta estabilidade repercute, assim, na quebra das rotinas
coletivas inerentes às comunidades, na sociedade e na necessidade de medidas urgentes (e, geralmente,
não planejadas) para gerir (restabelecer) a situação” (CARVALHO, 2020, p. 4).
24 ESTEVAM, M. H. de S.; HEILBUTH, D. C. F. Pandemia do COVID-19: O desafio da gestão municipal no
implemento de medidas preventivas/precautórias diante da vulnerabilidade digital presente na sociedade
contemporânea. Revista Avant., v. 4, n. 2, p. 636-657, 2020.
25 UNICEF. UNICEF Brasil – Cenpec Educação. Crianças de 6 a 10 anos são as mais afetadas pela exclusão
escolar na pandemia, alertam UNICEF e Cenpec Educação. Publicado em: 29 abr. 2021. Disponível em:
https://www.unicef.org/brazil/comunicados-de-imprensa/criancas-de-6-10-anos-sao-mais-afetadas-pela-
exclusao-escolar-na-pandemia. Acesso em: 23 maio 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 117
Sabe-se que o descontrole econômico que assolou o país e o mundo foi sentido
principalmente pela camada mais pobre da população, desprovida de mecanismos
para manterem suas formas de sustento. Então, na tentativa de melhorar os rendi-
mentos destas famílias, muitas crianças e adolescentes são desligadas do sistema
educacional (já pouco atrativo, em virtude dos obstáculos de acesso supracitados) e
são atraídos para labores desamparados da proteção legal, quando não são captados
em atividades criminosas.
Diante disso, são nestes cenários que mais se precisa do funcionamento da
rede de proteção social da criança e do adolescente, cuja composição é integrada
por diversas entidades, órgãos e instituições, como o Ministério Público, o Conselho
Tutelar, a Defensoria Pública, as autoridades judiciárias competentes e os Conselhos
de Direitos da Criança e do Adolescente. Por isso, o presente artigo buscou analisar
o âmbito de atuação do Ministério Público do Trabalho em Minas Gerais, estado
federativo que não ficou imune às mazelas sociais supervenientes a eclosão do vírus.
União, de modo que abrange todo o território nacional. Sendo assim, antes de adentrar
na análise proposta, é preciso esclarecer que, embora existam diretrizes comuns a
todos os estados brasileiros, o presente estudo foca nas iniciativas que foram imple-
mentadas em Minas Gerais.
Em uma perspectiva preventiva, nota-se que o MPT não deve esperar que
direitos sejam violados para exercer suas funções institucionais. Neste sentido, o
órgão tem atuado de diversas formas na promoção de direitos e, na pandemia26, uma
série de atuações precisam ser reconhecidas, no que se refere a proteção das crianças
e dos adolescentes, dentre as quais cita-se a realização de campanhas, a criação de
projetos junto a sociedade civil, a manifestação em projetos de lei, a expedição de
recomendações, a firmação de termos de ajustamento de conduta, a instauração de
procedimentos investigativos e o ajuizamento de ações civis públicas.
A Campanha Nacional de Combate ao Trabalho Infantil, lançada no dia 03 de
junho de 2020, foi promovida também em Minas Gerais e o MPT, um dos realizadores
da campanha, juntamente com outras entidades, como o Comitê Regional do Combate
ao Trabalho Infantil e Estímulo à Aprendizagem do TRT3, o Fórum de Erradicação e
Combate ao Trabalho Infantil e Proteção ao Adolescente (FECTIPA/MG) e a Secre-
taria de Desenvolvimento Social do Estado de Minas Gerais (SEDESE), fizeram
palestras com discussões a respeito da problemática enfrentada pela campanha. Com
26 A atuação do Ministério Público do Trabalho em Minas vem sendo “ancorada em cinco princípios: o da
deferência às autoridades sanitárias, o do diálogo social, da priorização da emergência, da proteção dos
servidores, e cumprimento dos dispositivos legais sobre a COVID-19”. BRASIL. Ministério Público do
Trabalho. Atuação do Ministério Público do Trabalho em Minas Gerais Procuradoria Regional do Trabalho
da 3ª Região. Disponível em: https://mpt.mp.br/pgt/noticias/resultados-da-atuacao-parametrizados-pelo-
plano-de-acao-nacional-covid-19-prt-3-por-eixos-revisado-1.pdf. Acesso em: 23 maio 2021.
118
27 PORTAL DA CIDADE GUAXUPÉ. Durante pandemia campanha alerta para risco de aumento da exploração
do trabalho infantil. Publicado em: 09 jun. 2020. Disponível em: https://guaxupe.portaldacidade.com/noticias/
regiao/campanha-alerta-para-risco-de-aumento-da-exploracao-do-trabalho-infantil-5059. Acesso em: 21
maio 2021.
28 Por meio deste projeto, os alunos fazem atividades escolares relacionados aos aludidos temas, os quais
são depois avaliados e selecionados para concorrer a premiações. BRASIL. Ministério Público do Trabalho.
Resgate a Infância – MPT na Escola 2021: MPT MG convida Secretarias de Educação de Municípios para
participar de projeto e capacitação sobre erradicação do trabalho infantil. Disponível em: https://www.prt3.
mpt.mp.br/procuradorias/prt-belohorizonte/1984-resgate-a-infancia-mpt-na-escola-2021-mpt-mg-convida-
secretarias-de-educacao-de-municipios-para-participar-de-projeto-e-capacitacao-sobre-erradicacao-do-
trabalho-infantil. Acesso em: 23 maio 2021.
29 BRASIL. Ministério Público do Trabalho. Nota Técnica Conjunta 05/2020. Nota Técnica que tem por objeto
a defesa da saúde dos trabalhadores, aprendizes e estagiários adolescentes. Assinada em: 18 mar. 2020.
Disponível em: https://mpt.mp.br/pgt/noticias/nota-tecnica_adolescentes.pdf. Acesso em: 23 maio 2021.
30 BRASIL. Ministério Público do Trabalho. Nota Técnica Conjunta nº 10/2020 PGT/COORDINFÂNCIA. Nota
Técnica, que tem por objeto a defesa da saúde e a manutenção dos contratos de trabalho dos empregados
e aprendizes adolescentes, ante o disposto na Medida Provisória nº 936, de 1º de abril de 2020. Assinada
em: 26 abr. 2020. Disponível em: https://mpt.mp.br/pgt/noticias/nota-tecnica_n-10-20_coordinfancia-1.pdf.
Acesso em: 23 maio 2021.
31 BRASIL. Ministério Público do Trabalho. Nota Técnica Conjunta nº 12/2020 PGT/COORDINFÂNCIA.
Publicada em: 14 jul. 2020. Disponível em: https://mpt.mp.br/pgt/noticias/notatecnica_7-2020_gerado-
em-20-07-2020-14h18min59s-nota-tecnica-12-1.pdf. Acesso em: 23 maio 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 119
32 BRASIL. Lei nº 11.788, de 25 de setembro de 2008. Dispõe sobre o estágio de estudantes; altera a redação
do art. 428 da Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de
maio de 1943, e a Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996; revoga as Leis nos 6.494, de 7 de dezembro
de 1977, e 8.859, de 23 de março de 1994, o parágrafo único do art. 82 da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro
de 1996, e o art. 6º da Medida Provisória no 2.164-41, de 24 de agosto de 2001; e dá outras providências.
Publicada em: 26 nov. 2008.
33 BRASIL. Decreto-lei n. 5.452, de 1º de maio de 1943. Aprova a Consolidação das Leis do Trabalho. Diário
Oficial [dos] Estados Unidos do Brasil: secção 1, Rio de Janeiro, DF, ano 82, n. 184, p. 11937-11984, 9
ago. 1943.
34 DELGADO, M. G. Curso de direito do trabalho: obra revista e atualizada conforme a lei da reforma trabalhista
e inovações normativas e jurisprudenciais posteriores. 18. ed. São Paulo: LTr, 2019. p. 491.
35 BRASIL. Ministério Público do Trabalho. Balanço da Atuação do MPT em Minas Covid-19 em Março e
Abril de 2020. Ministério Público do Trabalho 3ª Região. Publicado em 30 de abril de 2020. Disponível em:
https://mpt.mp.br/pgt/noticias/minas-boletim_covid-19_versao_final.pdf. Acesso em: 24 maio 2021.
36 BRASIL. Ministério Público do Trabalho. Cartilha sobre exploração sexual de crianças e adolescentes
promove conscientização acerca do tema. Publicado em: 18 mai 2021. Disponível em: https://www.prt3.mpt.
mp.br/procuradorias/prt-belohorizonte/2025-cartilha-sobre-exploracao-sexual-de-criancas-e-adolescentes-
promove-conscientizacao-acerca-do-tema. Acesso em: 23 maio 2021.
120
caráter pecuniário, pois pode ser feita em troca de favores, presentes, comida, droga,
entre outras “contraprestações”37.
Embora anteriormente já houvesse preocupação em relação a essas violências
praticadas contra meninos e meninas, com a elevação dos índices de evasão escolar
e de trabalho infantil na pandemia, aumentam-se os riscos a que estão expostos,
inclusive os de serem vítimas de exploração sexual. Por isso, o atual momento exige,
mais do que nunca, políticas combativas e um comprometimento assíduo daqueles
que compõem a Rede de Proteção.
Desse modo, a atuação do MPT consegue unir esforços de todos os atores para
o enfrentamento das mazelas sociais que atingem a infância e a juventude. Para tanto,
o Parquet não se restringe ao tradicional peticionamento no âmbito de um processo
judicial, já que adota medidas promocionais e que buscam uma articulação social
para a tutela deste grupo vulnerável.
Considerações finais
37 PCMG. Polícia Civil de Minas Gerais. “Cartilha violar os direitos da criança e do adolescente é
crime. Denuncie!” ASCOM-PCMG. Disponível em: https://www.detran.mg.gov.br/publico/legado/
DicasdesegurancaPCMG.pdf. Acesso em: 24 maio 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 121
REFERÊNCIAS
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realidade pós-moderna. Revista eletrônica: acórdãos, sentenças, ementas, artigos
e informações, Porto Alegre, RS, v. 6, n. 109, p. 72-74, nov. 2010. Disponível em:
https://juslaboris.tst.jus.br/handle/20.500.12178/78492. Acesso em: 5 mar. 2021.
https://mpt.mp.br/pgt/noticias/resultados-da-atuacao-parametrizados-pelo-plano-de-
-acao-nacional-covid-19-prt-3-por-eixos-revisado-1.pdf. Acesso em: 23 maio 2021.
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COORDINFÂNCIA. Publicada em: 14 jul. 2020. Disponível em: https://mpt.mp.br/
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MERELES, C. Ministério Público do Trabalho. Portal Politize, [s. l.], 26 maio 2017.
Disponível em: https://www.politize.com.br/ministerio-publico-do-trabalho/. Acesso
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MINAS GERAIS. Polícia Civil de Minas Gerais. Dicas e orientações para segu-
rança individual e coletiva. Belo Horizonte: ASCOM-PCMG, [2018]. Disponível
em: https://www.detran.mg.gov.br/publico/legado/DicasdesegurancaPCMG.pdf.
Acesso em: 24 maio 2021.
Introdução
1 Graduanda em Direito pela Faculdade de Direito “Prof. Jacy de Assis” da Universidade Federal de
Uberlândia. Integrante da Clínica de Enfrentamento ao Trabalho Escravo da Universidade Federal de
Uberlândia. E-mail: carolinaolisousa@gmail.com.
2 Graduanda em Direito pela Faculdade de Direito “Prof. Jacy de Assis” da Universidade Federal de
Uberlândia. Integrante da Clínica de Enfrentamento ao Trabalho Escravo da Universidade Federal de
Uberlândia. E-mail: isadoranaves22@gmail.com
3 Doutora em Direito Internacional pela Universidad de Valencia, na Espanha. Mestre pela Pontifícia
Universidade Católica de São Paulo. Professora adjunta do curso de direito da Universidade Federal de
Uberlândia. Coordenadora da Clínica de Enfrentamento ao Trabalho Escravo da Universidade Federal de
Uberlândia. E-mail: marcialeonora@hotmail.com
128
71% de todo o desmatamento tropical ocorrido entre 2000 e 2012 foi causado pela
agricultura comercial, que inclui a pecuária e a agricultura. Dessas áreas tropicais
desmatadas, 75% estão localizadas no Brasil e na Indonésia8.
No que concerne à cumplicidade existente entre o trabalho escravo rural e o
agronegócio, essa é antiga. Se os dados atuais demonstram que a criação de gado é
a principal atividade dos resgatados, pesquisa realizada em 2010, pela OIT e pela
ONG Repórter Brasil, já expunha o cenário de que 62% dos trabalhadores brasilei-
ros escravizados trabalhavam com os cuidados com o pasto em áreas de pecuária,
18,6% realizam trabalhos de cultivo de grãos e 12% trabalham em carvoarias9 (4).
A atividade destes trabalhadores escravizados no setor do agronegócio, muitas das
vezes, resume-se à derrubada da mata nativa, haja vista que o mesmo estudo mos-
tra que as práticas de trabalho escravo se concentram na região do conhecido arco
do desflorestamento.
O processo de apropriação de terras pela elite fundiária é causa de uma forte
luta agrária liderada por organizações, como o Movimento Sem Terra (MST), que
buscam por uma divisão fundiária mais equânime e com destinação que atenda aos
fins sociais da propriedade. Contudo, infelizmente, no curso dessa luta, o capital
mostra sua face predatória e, assim, proporcionalmente às batalhas, muitas vidas são
perdidas, como no assassinato de 19 trabalhadores, em 1996, por autoridades policiais
8 LAWSON, S.; BLUNDELL, A.; CABARLE, B.; BASIK, N.; JENKINS, M.; CANBY, K. Bens de consumo
e desmatamento: uma análise da extensão e da natureza da ilegalidade da conversão de florestas para
agricultura e plantações com fins madeireiros. [S. l.]: Forest Trends; UKaid, 2014. p. 10. Disponível em:
https://www.forest-trends.org/wp-content/uploads/imported/for171-consumer-goods-and-deforestation-
letter-exec-summary-portuguese-15-0121-pdf.pdf. Acesso em 29 nov. 2021.
9 COSTA, P. T. M. Combatendo o trabalho escravo contemporâneo: o exemplo do Brasil. Brasília: Organização
Internacional do Trabalho, 2010. 194 p. Disponível em: https://www.ilo.org/wcmsp5/groups/public/---
americas/---ro-lima/---ilo-brasilia/documents/publication/wcms_227300.pdf. Acesso em 26 nov. 2021. p. 72.
10 NEPOMUCENO, E. O massacre – Eldorado dos Carajás: uma história de impunidade. Rio de Janeiro:
Record, 2019.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 131
era referência nacional na criação de gado para a pecuária de corte, sendo o seu pro-
prietário, o paulista João Luiz Quagliato Neto, integrante do Grupo Irmãos Quagliato,
conhecido como “Rei do Gado”.
Curiosamente, o Grupo Irmãos Quagliato é também conhecido pela reincidência
em autuação por submissão de seus trabalhadores a condições laborais deploráveis, como
aquelas descritas no relatório da sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos:
16 REPÓRTER BRASIL. Amazônia: trabalho escravo + dinâmicas correlatas. Equipe Escravo, nem pensar!,
São Paulo: 25 ago. 2015. Coordenadores: Natália Suzuki (coordenadora), Thiago Casteli (coordenador
assistente). Disponível em: https://escravonempensar.org.br/biblioteca/amazonia-trabalho-escravo-
dinamicas-correlatas/. Acesso em: 23 nov. 2021.
17 OBSERVATÓRIO DO CLIMA. Municípios da Amazônia dominam emissões de carbono. Observatório
do Clima, [s. l.], 4 mar. 2021. Disponível em: https://www.oc.eco.br/municipios-da-amazonia-dominam-
emissoes-de-carbono/. Acesso em: 4 mar. 2021.
134
18 SIT. Radar SIT: 15 municípios com mais autos de infração lavrados em todos os anos no Brasil todas as
CNAEs. Portal da Inspeção do Trabalho, [s. l.], [20--?]. Disponível em: https://sit.trabalho.gov.br/radar/.
Acesso em: 23 nov. 2021.
19 GASPARETTO JÚNIOR, A. L. C. Partido da terra: como os políticos conquistam o território brasileiro.
Revista Brasileira de Ciência Política, Brasília, n. 16, p. 295-300, jan./abr. 2015. Disponível em: https://
www.scielo.br/j/rbcpol/a/6NrFXb8ZfkLqv5wrhVjSnTj/?lang=pt&format=pdf. Acesso em: 29 nov. 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 135
20 LEAL, V. N. Coronelismo, enxada e voto: o município e o regime representativo no Brasil. 7. ed. São Paulo:
Companhia das Letras, 2012.
21 LUCCHESE, G. da S.; OLIVESKI, F. E.; FERNADES, S. B. V. A bancada ruralista e a política pública
ambiental brasileira. Revista Observatório de La Economía Latinoamericana, set. 2018. p. 8.
22 MARTINS, M. da M. Os interesses orientadores do modus operandi das elites da bancada ruralista na
câmara dos deputados no Brasil na 55a legislatura (2015–2019). 2017. Dissertação (Mestrado em Ciência
Política) – Centro Universitário Unieuro, Brasília, 2017.
23 LIMA, M. S. A atuação do ruralismo como elite política no Brasil: mobilização de viés mediante desigualdades
sociais e de representação política. Revista Agenda Política, v. 4, n. 3, set./dez. 2016. p. 115.
24 GASPARETTO JÚNIOR, 2015.
25 REPÓRTER BRASIL. Ruralômetro: medindo a febre ruralista dos deputados. Repórter Brasil, [s. l.], 2021.
Disponível em: https://ruralometro.reporterbrasil.org.br/. Acesso em: 28 nov. 2021.
136
[…] enquanto exportamos soja e minério de ferro para a China, desse país importa-
mos plataformas de perfuração ou de exploração, partes e acessórios de máquinas,
aparelhos de toda sorte, circuitos integrados e componentes eletrônicos. Aos Esta-
dos Unidos vendemos óleos brutos de petróleo, celulose e café, deles adquirimos
partes de motores e turbinas para aviação, medicamentos, instrumentos e aparelhos
os mais diversos, adubos e fertilizantes. Há que se considerar, que a dinâmica
26 ARANHA, A.; MAGALHÃES, A.; CAMARGO, D. Um em cada quatro deputados que têm empresas rurais
violaram a lei trabalhista. Repórter Brasil. [s. l.], 12 set. 2018. Disponível em: Acesso em: https://ruralometro.
reporterbrasil.org.br/. 28 nov. 2021.
27 SOUZA, J. de S. A elite do atraso: da escravidão a Bolsonaro. Rio de Janeiro: Estação Brasil, 2019. p. 118.
28 XAVIER, G. L. Agronegócio e capitalismo dependente na América Latina: o caso brasileiro. Argum, Vitória,
v. 9, n. 2. p. 147-160, maio/ago. 2017. p. 154-155.
29 G1. Agronegócio cresce 24,3% em 2020 e responde por mais de um quarto do PIB do Brasil, diz CNA.
G1, [s. l.], 11 mar. 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/economia/agronegocios/noticia/2021/03/11/
agronegocio-cresce-243percent-em-2020-e-responde-por-mais-de-um-quarto-do-pib-do-brasil-diz-cna-1.
ghtml. Acesso em: 30 nov. 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 137
Considerações finais
REFERÊNCIAS
ARANHA, A.; MAGALHÃES, A.; CAMARGO, D. Um em cada quatro deputados
que têm empresas rurais violaram a lei trabalhista. Repórter Brasil. [s. l.], 12 set. 2018.
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G1. Agronegócio cresce 24,3% em 2020 e responde por mais de um quarto do PIB
do Brasil, diz CNA. G1, [s. l.], 11 mar. 2020. Disponível em: https://g1.globo.com/
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-2020-e-responde-por-mais-de-um-quarto-do-pib-do-brasil-diz-cna-1.ghtml. Acesso
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G1. Ministro do meio ambiente defende passar a boiada e mudar regras enquanto
atenção da mídia está voltada para a Covid-19. G1, [s. l.], 22 maio 2020. Disponínel
em: https://g1.globo.com/politica/noticia/2020/05/22/ministro-do-meio-ambiente-
-defende-passar-a-boiada-e-mudar-regramento-e-simplificar-normas.ghtml. Acesso
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LAWSON, S.; BLUNDELL, A.; CABARLE, B.; BASIK, N.; JENKINS, M.; CANBY,
K. Bens de consumo e desmatamento: uma análise da extensão e da natureza da ilega-
lidade da conversão de florestas para agricultura e plantações com fins madeireiros.
142
[S. l.]: Forest Trends; UKaid, 2014. p. 10. Disponível em: https://www.forest-trends.
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SIT. Radar SIT: 15 municípios com mais autos de infração lavrados em todos os anos
no Brasil todas as CNAEs. Portal da Inspeção do Trabalho, [s. l.], [20--?]. Disponível
em: https://sit.trabalho.gov.br/radar/. Acesso em: 23 nov. 2021.
Introdução
Art. 5º – Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza,
garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabili-
dade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercizalização
termos seguintes:
II – Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em
virtude de lei;
III – Ninguém será submetido a tortura nem a tratamento desumano ou degradante;
XLI – A lei punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberda-
des fundamentais9.
Ademais, pode-se citar também os direitos sociais tratados no capítulo II, mais
especificamente do artigo 7º:
Art. 7º – São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem
à melhoria de sua condição social:
V – Salário mínimo, fixado em lei, nacionalmente unificado, capaz de atender a
suas necessidades vitais básicas e às de sua família com moradia, alimentação,
educação, saúde, lazer, vestuário, higiene, transporte e previdência social, com
reajustes periódicos que lhe preservem o poder aquisitivo, sendo vedada sua
vinculação para qualquer fim;
VI – Irredutibilidade do salário, salvo o disposto em convenção ou acordo coletivo;
VII – Garantia de salário, nunca inferior ao mínimo, para os que percebem remu-
neração variável;
8 Considerou-se a relação realizada pela Organização Não Governamental Repórter Brasil. REPÓRTER
BRASIL. Dados sobre trabalho escravo no Brasil. Repórter Brasil, [s. l.], 2015. Disponível em: http://
reporterbrasil.org.br/dados/trabalhoescravo/. Acesso em: 29 nov. 2021.
9 BRASIL. [Constituição (1988)]. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Brasília: Presidência
da República, 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm.
Acesso em: 29 nov. 2021.
148
Ademais, em seu artigo 149, incluído pela Lei nº 13.344, de 2016, também
prevê a pena de reclusão, de quatro a oito anos, e multa para aquele que “agenciar,
aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar ou acolher pessoa, mediante
grave ameaça, violência, coação, fraude ou abuso”12. Coloca-se:
10 BRASIL, 1988.
11 BRASIL. Lei nº 10.803, de 11 de dezembro de 2003. Altera o Art. 149 do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de
dezembro de 1940 – Código Penal, para estabelecer penas ao crime nele tipificado e indicar as hipóteses
em que se configura condição análoga à de escravo. Brasília: Presidência da República, 2003. Disponível
em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/LEIS/2003/L10.803.htm. Acesso em: 21 nov. 2021.
12 BRASIL. Lei nº 13.344, de 6 de outubro de 2016. Dispõe sobre prevenção e repressão ao tráfico interno
e internacional de pessoas e sobre medidas de atenção às vítimas; altera a Lei nº 6.815, de 19 de agosto
de 1980, o Decreto-Lei nº 3.689, de 3 de outubro de 1941 (Código de Processo Penal), e o Decreto-Lei
nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); e revoga dispositivos do Decreto-Lei nº 2.848, de
7 de dezembro de 1940 (Código Penal). Brasília: Presidência da República, 2016. Disponível em: http://
www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2016/lei/l13344.htm. Acesso em: 21 nov. 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 149
Art. 203 – Frustrar, mediante fraude ou violência, direito assegurado pela legis-
lação do trabalho:
Pena – detenção, de um ano a dois anos, e multa, além da pena correspondente
à violência.
§ 1º – Na mesma pena incorre quem:
I – Obriga ou coage alguém a usar mercadorias de determinado estabelecimento,
para impossibilitar o desligamento do serviço em virtude de dívida;
II – Impede alguém de se desligar de serviços de qualquer natureza, mediante
coação ou por meio da retenção de seus documentos pessoais ou contratuais.
§ 2º – A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito
anos, idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física ou mental14.
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Art. 206 – Recrutar trabalhadores, mediante fraude, com o fim de levá-los para
território estrangeiro.
Pena – detenção, de 1 (um) a 3 (três) anos e multa.
Art. 207 – Aliciar trabalhadores, com o fim de levá-los de uma para outra locali-
dade do território nacional:
Pena – detenção, de um a três anos, e multa.
§ 1º – Incorre na mesma pena quem recrutar trabalhadores fora da localidade de
execução do trabalho, dentro do território nacional, mediante fraude ou cobrança
de qualquer quantia do trabalhador, ou, ainda, não assegurar condições do seu
retorno ao local de origem.
§ 2º – A pena é aumentada de um sexto a um terço se a vítima é menor de dezoito
anos, idosa, gestante, indígena ou portadora de deficiência física ou mental16.
Art. 23 – 1. Todo ser humano tem direito ao trabalho, à livre escolha de emprego,
a condições justas e favoráveis de trabalho e à proteção contra o desemprego.
2.Todo ser humano, sem qualquer distinção, tem direito a igual remuneração por
igual trabalho.
3. Todo ser humano que trabalhe tem direito a uma remuneração justa e satis-
fatória, que lhe assegure, assim como à sua família, uma existência compatível
com a dignidade humana, e a que se acrescentarão, se necessário, outros meios
de proteção social.
4. Todo ser humano tem direito a organizar sindicatos e neles ingressar para
proteção de seus interesses17.
17 ONU. Declaração Universal dos Direitos Humanos. Nova Iorque: Unicef, 1948. Disponível em: https://
www.unicef.org/brazil/declaracao-universal-dos-direitos-humanos. Acesso em: 29 nov. 2021.
18 ONU. Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos. Nova Iorque: ONU, 1966. Disponível em:
https://www.oas.org/dil/port/1966%20Pacto%20Internacional%20sobre%20Direitos%20Civis%20e%20
Pol%C3%ADticos.pdf. Acesso em: 29 nov. 2021.
19 ONU. Pacto Internacional Sobre os Direitos Econômicos, Sociais e Culturais. Nova Iorque: ONU, 1955.
Disponível em: http://www.unfpa.org.br/Arquivos/pacto_internacional.pdf. Acesso em: 29 nov. 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 151
entre outros parceiros. Assim como outros dispositivos referentes a sua erradicação,
como a Convenção sobre a Abolição do Trabalho Forçado n° 105 de 195721, que
trata da proibição da prática independente da finalidade; o Protocolo à Convenção
sobre o Trabalho Forçado de 2014, que dispôs das formas de escravidão moderna; e a
Recomendação sobre Trabalho Forçado de 2014, que mencionou medidas necessárias
para combater a escravidão moderna.
Neste sentido, no ano de 1995, o Estado Brasileiro reconheceu a existência
do trabalho escravo contemporâneo, após o país ter sido denunciado na Comissão
Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos pela
existência de trabalho escravo no país22.
Viola o trabalho descente, segundo as diretrizes da OIT, aquele que assegura,
dentre outras estratégias, a eliminação de qualquer modalidade de discriminação,
além de buscar conciliar produtividade e qualidade com a proteção do trabalhador
e o fortalecimento de sua representação social. Para a análise do trabalho decente
no Brasil, no relatório divulgado em julho de 2012, a OIT considerou vários
marcadores: i) oportunidades de emprego; ii) rendimentos adequados e trabalho
produtivo; iii) jornada de trabalho decente; iv) combinação entre trabalho, vida
pessoal e vida familiar; v) trabalho a ser abolido; vi) estabilidade e segurança
no trabalho; vii) igualdade de oportunidades e de tratamento no emprego; viii)
ambiente de trabalho seguro; ix) seguridade social; x) diálogo social e represen-
21 Estabelece que o trabalho forçado não poderá jamais ser utilizado ou justificado para fins de desenvolvimento
econômico ou como instrumento de educação política, discriminação, disciplinamento através do trabalho
ou punição por participar de greve. OIT. C105 – Abolição do Trabalho Forçado. Genebra, Disponível em:
https://www.ilo.org/brasilia/convencoes/WCMS_235195/lang-pt./index.htm. Acesso em: 29 nov. 2021.
22 SILVA, P. R.; SILVA, M. S. E., 2018, p. 16.
23 OIT. Uma década de promoção do trabalho decente no Brasil: uma estratégia de ação baseada no diálogo
social. Genebra: Organização Internacional do Trabalho, 2015. p. 142.
24 O Manual de Combate ao Trabalho em Condições análogas às de escravo conceitua gato como aquele que:
preposto do empregador ou o próprio empregador, financia débitos pendentes do trabalhador (a exemplo das
dividas com alimentação e pousadas onde permanecem à espera de trabalho); ou antecipa (“adiantamento”)
parte do salário que garanta as mínimas condições de subsistência da família do trabalhador por algum
período de tempo. Ainda, aquele que cobra do trabalhador as despesas efetuadas a título de transporte e
alimentação desde o local da contratação até o local de trabalho. BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego.
Manual de Combate ao Trabalho em Condições Análogas às de Escravo. Brasília: Mte., 2011. p. 96.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 153
29 OLIVEIRA, R. Eram escravos no Brasil e não sabiam. Agora o mundo todo ficou sabendo. El País, São Paulo,
6 jan. 2017. Disponível em: https://brasil.elpais.com/brasil/2016/12/17/economia/1481988865_894992.html.
Acesso em: 29 nov. 2021.
30 SILVA, J. A. da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 16. ed. rev. atua. São Paulo: Malheiros, 1998. p. 92.
31 A OIT, em 1999, formalizou o conceito de trabalho decente que é, de forma sintética, um trabalho produtivo
e de qualidade, que oferta condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade humanas e permite a
superação da pobreza, a redução das desigualdades sociais, a garantia da governabilidade democrática e
o desenvolvimento sustentável. OIT. Trabalho Decente. Disponível em: https://www.ilo.org/brasilia/temas/
trabalho-decente/lang-pt./index.htm. Acesso em: 29 nov. 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 155
apresentaram, após o resgate, medo e temor pela própria vida e por voltar a uma
situação semelhante, além da alusão à um código de honra, ao sentirem a necessidade
de quitar as dívidas a eles impostas, o que como colocado por Ana Cláudia Chehab,
“o trabalho envolve o sujeito, além do tempo em que se encontra no trabalho, não
podendo reduzir seu envolvimento em uma análise exclusivamente temporal33”.
Deste modo, em outubro de 2016, a Corte Interamericana de Direitos Huma-
nos condenou internacionalmente o Estado brasileiro, já que o país não cumpriu o
compromisso assumido para a erradicação do trabalho escravo contemporâneo, além
de não ter responsabilizado os autores das violações de direito ao reconhecimento
da personalidade jurídica (art. 3); do direito à integridade pessoal (art. 5); do direito
à liberdade pessoal (art. 7); do direito à proteção da criança (art. 19), do direito à
honra e à dignidade (art. 11); do direito de circulação e residência (art. 22); dos
direitos de não serem submetidos a qualquer forma de escravidão ou servidão e não
serem submetidos ao tráfico de pessoas (art. 6.1); bem como, o direito à razoável
duração do processo (art. 81), posto sua extensão34. Ainda, a condição de discrimi-
nação estrutural histórica em razão da condição econômica, e a garantia de proteção
judicial prevista no art. 25 da CADH. Tal como, a reabertura do inquérito policial
e a indenização das vítimas pelo valor de cinco milhões de dólares. Finalmente,
32 PARÁ. 2ª Vara Marabá. Inquérito nº 0000285-28.2001.4.01.3901. Relator: Juiz Heitor Moura Gomes.
Diário Oficial da União. Marabá.
33 CHEHAB, A. C. de J. V. et al. Mediação do sofrimento em trabalhadores resgatados do trabalho em
condições análogas à de escravo. 2015. p. 26.
34 CORTE INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS. Sentença do caso “Trabalhadores da Fazenda
Brasil Verde vs. Brasil”. Exceções preliminares, méritos, reparações e custas. Outubro, 2016. Disponível
em: https://www.corteidh.or.cr/docs/casos/articulos/seriec_318_por.pdf. Acesso em: 21 out. 2021.
156
Considerações finais
O Estado brasileiro se fez omisso diante das violações aos direitos humanos
dos trabalhadores, não responsabilizando os culpados dos crimes cometidos, quanto
menos assegurando os direitos das vítimas, por isso, condenado pela Corte Intera-
mericana de Direitos Humanos, sendo obrigado a não só indenizar as vítimas, mas
também a investigar os fatos ocorridos àquela época. Tal acontecimento foi de suma
importância visto o enfoque dado à problemática do trabalho análogo à escravidão,
além de, a partir da sanção posta, incentivar os países a combaterem o crime, apurando
ocorridos e protegendo os direitos dos vulneráveis.
Neste sentido, também é perceptível a participação de interesses políticos e
econômicos, especialmente da chamada “bancada ruralista” no Congresso Nacional
(frente parlamentar que atua em defesa dos proprietários rurais), que tentam difi-
cultar a conceituação de trabalho escravo na legislação brasileira e sua fiscalização,
caracterizando notório retrocesso ao combate e erradicação do trabalho forçado37.
Por fim, houve efeitos positivos para o entendimento mundial do conceito
moderno do trabalho análogo ao de escravo. Ainda assim, mesmo após a condenação
posta, o trabalho análogo ao de escravo é uma problemática existente38. Para tanto
a importância de combatê-lo e retornar aos debates e preocupações, fomentando a
aplicação efetiva de políticas públicas e da normativa nacional.
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37 Para mais informações acessar: CARAM, B.; CALGARO, F. Trabalho escravo: com portaria, governo
fez mudança que tramita no Congresso há 14 anos. G1, Brasília, 22 out. 2017. Política. Disponível em:
https://g1.globo.com/politica/noticia/trabalho-escravo-com-portaria-governo-fez-mudanca-que-tramita-
no-congresso-ha-14-anos.ghtml. Acesso em: 21 nov. 2021; RODRIGUES, A. OIT: mudança de regra no
combate ao trabalho escravo pode provocar retrocessos. Agência Brasil, Brasília, 19 out. 2017. Disponível
em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2017-10/oit-mudanca-de-regra-no-combate-
ao-trabalho-escravo-pode-provocar. Acesso em: 21 nov. 2021; TEMER faz agrado a bancada ruralista
e altera conceitos de ‘trabalho escravo’. Rede Brasil Atual, [s. l.], 2017. Disponível em: https://www.
redebrasilatual.com.br/cidadania/2017/10/temer-faz-agrado-a-bancada-ruralista-e-altera-conceitos-de-
trabalho-escravo/. Acesso em: 28 nov. 2021.
38 Lista suja referente à empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas à de
escravo. BRASIL. Cadastro de Empregadores que tenham submetido trabalhadores a condições análogas
à de escravo. 2021. Disponível em: https://www.gov.br/trabalho-e-previdencia/pt-br/composicao/orgaos-
especificos/secretaria-de-trabalho/inspecao/areas-de-atuacao/cadastro_de_empregadores.pdf. Acesso
em: 29 nov. 2021.
158
REFERÊNCIAS
BARSOTTI, L. S. Trabalho infantil no Brasil: a inocência roubada. 2018. 55 f.
Monografia (Bacharelado em Direito) – Centro Universitário Toledo, Araçatuba, 2018.
CARAM, B.; CALGARO, F. Trabalho escravo: com portaria, governo fez mudança
que tramita no Congresso há 14 anos. G1, Brasília, 22 out. 2017. Política. Disponível
em: https://g1.globo.com/politica/noticia/trabalho-escravo-com-portaria-governo-fe-
z-mudanca-que-tramita-no-congresso-ha-14-anos.ghtml. Acesso em: 21 nov. 2021;
RODRIGUES, A. OIT: mudança de regra no combate ao trabalho escravo pode
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 159
provocar retrocessos. Agência Brasil, Brasília, 19 out. 2017. Disponível em: https://
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agrado a bancada ruralista e altera conceitos de ‘trabalho escravo’. Rede Brasil Atual,
[s. l.], 2017. Disponível em: https://www.redebrasilatual.com.br/cidadania/2017/10/
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Disponível em: https://www.unicef.org/brazil/declaracao-universal-dos-direitos-hu-
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1966. Disponível em: https://www.oas.org/dil/port/1966%20Pacto%20Internacio-
nal%20sobre%20Direitos%20Civis%20e%20Pol%C3%ADticos.pdf. Acesso em:
29 nov. 2021.
REPÓRTER BRASIL. Dados sobre trabalho escravo no Brasil. Repórter Brasil, [s. l.],
2015. Disponível em: http://reporterbrasil.org.br/dados/trabalhoescravo/. Acesso em:
29 nov. 2021.
TRABALHO ESCRAVO
TRÁFICO DE PESSOAS E
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DO SILÊNCIO À AÇÃO: como a omissão
ajuda o tráfico de pessoas em âmbito brasileiro
Beatriz Pereira Longo1
Giovanna Pereira Fernandes de Pádua Netto2
Neiva Flávia de Oliveira3
Introdução
Quanto à culpabilidade destes grandes casos, muitos acreditam que estão apenas nos
traficantes e na má fiscalização governamental, porém, com este trabalho, o nosso
precípuo objetivo é demonstrar como uma sociedade inteira pode fazer parte de todo
esse processo.
Dessa forma, será exaltado neste texto a importância do pensamento crítico
a fim de manter a dignidade humana de todos, a grande influência midiática em
âmbito societal, a força de uma população e como o diálogo é imprescindível para
o avanço social.
pessoas, recorrendo à ameaça ou uso da força […] para obter o consentimento de uma
pessoa que tenha autoridade sobre outra, para fins de exploração”. O atual Código
Penal brasileiro, do ano de 1940, também traz uma definição do tráfico de pessoas
em sentido amplo; segundo o art.149-A, considera-se tráfico de pessoas “Agenciar,
aliciar, recrutar, transportar, transferir, comprar, alojar, ou acolher pessoa, mediante
graves ameaças, violência, coação, fraude ou abuso”5. Porém, a definição fornecida
pelo Protocolo de Palermo é a mais aceita.
O tráfico de pessoas em geral é considerado a terceira atividade criminosa
mais lucrativa do mundo, ficando atrás apenas dos outros dois tipos de tráficos, o de
drogas e o de armas, chegando a render mais de 30 bilhões de dólares anualmente
(UNODC). Ele pode acontecer entre regiões de um mesmo país, entre países fron-
teiriços e entre continentes.
Dentre todos os fatores que levam ao tráfico de pessoas, a pobreza é o que mais
se destaca, uma vez que há uma combinação entre a vulnerabilidade social da vítima
e seus sonhos por melhores condições de vida. Os traficantes se aproveitam dessa
vulnerabilidade para induzir a vítima, enganando-a com oportunidades de emprego
atraentes no exterior. Uma vez que a vítima cai na “armadilha”, dificilmente ela con-
segue escapar, permanecendo presa em condições degradantes de trabalho, e quando
ela consegue escapar e voltar ao seu país de origem, ela é relutante em denunciar o
5 BRASIL. Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940. Código Penal. Diário Oficial da União, Rio de
Janeiro, 31 dez. 1940.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 165
6 VENSON, A. M.; PEDRO, J. M. Tráfico de pessoas: uma história do conceito. Rev. Bras. Hist., São Paulo,
v. 33, n. 65, p. 61-83, 2013. Disponível em: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0102-
01882013000100003&lng=en&nrm=iso. Acesso em: 18 maio 2021.
166
7 FRINHANI, F. As representações sociais dos profissionais do direito sobre tráfico de pessoas. 2014. Tese
(Doutorado em Direito) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014
8 Ibid.
9 OLIVEIRA, A. C. de; MARIN, M. A. L. Tráfico de pessoas: uma análise sob a ótica dos direitos
humanos. 2020.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 167
Nesse novo ciclo, o III Plano se apresenta como uma oportunidade para conquistas
adicionais nos campos da gestão da política, gestão da informação, na articulação
e na integração de programas. Igualmente importante, esse terceiro ciclo reforça a
necessária continuidade na capacitação de atores, na sensibilização das opiniões
públicas, na prevenção ao tráfico de pessoas, na proteção das vítimas e na res-
ponsabilização dos seus agressores14.
A obra literária 1984, publicada em 1949 pelo renomado autor britânico George
Orwell, conta a história de uma sociedade distópica, caracterizada, sobretudo, pela
censura, cujos cidadãos vivem constantemente monitorados pelo governo totalitarista,
representado pela figura do “Grande Irmão”, que pregavam lemas como “Ignorância
é força”. Na trama, as pessoas que viviam sob o domínio do “Grande Irmão” perdiam
a sua essência para obedecê-lo, vivendo assim em extrema alienação, sem nenhum
tipo de pensamento crítico. Além disso, a trama mostra que aqueles que tinham
um pouco de pensamento crítico, ou possuíam uma opinião divergente daquela do
governo, eram obrigados a ficarem calados por medo de serem presos pela polícia
do pensamento ou torturados e/ou executados pelo Ministério do Amor (Tal como
mencionado na história: “O crime pensamento não leva à morte, mas é a morte”).
14 BRASIL. Ministério da Justiça e Segurança Pública. III Plano Nacional de Enfrentamento ao Tráfico
de Pessoas. Site do Ministério da Justiça. Brasília: Ministério da Justiça e Segurança Pública, 2018.
Disponível em: https://www.justica.gov.br/sua-protecao/trafico-de-pessoas/coletanea-de-instrumentos-
de-enfrentamento-ao-trafico-de-pessoas. Acesso em: 24 maio 2021.
15 BARROS, A. Com pandemia, 20 estados têm taxa média de desemprego recorde em 2020. Agência de
Notícias IBGE. [s. l.], 2021. Disponível em: https://agenciadenoticias.ibge.gov.br/agencia-noticias/2012-
agencia-de-noticias/noticias/30235-com-pandemia-20-estados-tem-taxa-media-de-desemprego-
recorde-em-2020#:. Acesso em: 28 maio 2021.
16 TRAFICANTES de pessoas aproveitam pandemia para criar novas rotas, diz ONG. O Tempo, Belo
Horizonte, 21 ago. 2020. Disponível em: https://www.otempo.com.br/brasil/traficantes-de-pessoas-
aproveitam-pandemia-paracriar-novas-rotas-diz-ong-1.2375185. Acesso em: 1 dez. 2020.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 169
Sob tortura, os personagens de 1984 perdiam a sua essência, suas próprias opiniões
e ideias, que eram retiradas e substituídas pelos ideais do Partido17.
Analisando a obra em questão e a sua trama, é possível compreender os concei-
tos de Espiral do Silêncio e Banalidade do Mal, introduzidos, respectivamente, por
Elisabeth Noelle Neumann e Hannah Arendt. Ambos os conceitos estão relacionados à
questão da relutância dos membros de uma sociedade em agir diante de um problema.
A Espiral do Silêncio de Elisabeth Noelle-Neumann, consiste em uma teoria,
desenvolvida na década de 1970, segundo a qual as pessoas que têm uma opinião
minoritária tendem a cair no silêncio ou no conformismo, perante a opinião pública
geral. Um ponto importante dessa teoria é que ela parte da ideia do homem como um
ser social, sendo considerada uma luz em meio a investigação sobre tal natureza18.
Devido a essa natureza social, os homens possuem um medo do isolamento, da rejei-
ção, o que influencia substancialmente o seu comportamento. Dessa forma, quando
há a possibilidade de uma determinada opinião ser rejeitada, há uma tendência de
não expressá-la publicamente; por outro lado, se essa opinião é aceita, os indivíduos
que a defendem tendem a expressá-la com convicção19.
Por sua vez, a teoria da Banalidade do Mal, de Hannah Arendt, afirma que o
mal não é uma categoria ontológica, mas sim um produto dos homens, e se manifesta
onde se encontra espaço institucional para isso, em razão de uma escolha política. A
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17 ORWELL, G. 1984. 29. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2003.
18 KAID, L. L. Handbook of Political Communication Research. London: University of Florida: Lawrence
Erlbaum Associates: Publishers, 2004.
19 NOELLE-NEUMANN, E. The Spiral of Silence: Public Opinion – Our Social Skin. Chigago: University of
Chicago Press, 1993.
20 ARENDT, H. Eichmman em Jerusalém: um relato sobre a banalidade do mal. Tradução de José Rubens
Siqueira. São Paulo: Companhia das Letras, 1999.
170
21 MIDÕES, M. Caso Esmeralda e a Espiral do Silêncio de Elisabeth Noelle Neumann. [S. l.: s. n.], 2008.
Disponível em http://www.bocc.ubi.pt/pag/midoes-miguel-caso-esmeralda-espiral-do-silencio.pdf. Acesso
em: 28 maio 2021.
22 ANDRADE, S. S. Tráfico de pessoas e trabalho escravo: direito de decidir? Revista ESMAT, Palmas, ano
4, n. 4, 2012.
23 FRINHANI, F. As representações sociais dos profissionais do direito sobre tráfico de pessoas. 2014. Tese
(Doutorado em Direito) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2014
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 171
seu trabalho: “os sólidos suprimem o tempo; para os líquidos, ao contrário, o tempo
é que importa” 26. Conforme essa passagem, é nítido que o presente corre contra o
relógio: os vínculos são frágeis e quase nunca longínquos, e os laços são vistos apenas
como meios para um possível lucro: tudo tem o seu preço27.
Com as relações superficiais e a agilidade da Modernidade Líquida, a qual é um
fator que rapidamente se adapta a todas as sociedades modernas, há uma fetichização
do consumo: você só possui um lugar social desde que esbanje um status diferencial.
As redes sociais intensificaram o processo, o qual faz o indivíduo buscar o prazer a
qualquer custo, ainda que seja necessário utilizar as pessoas como meros objetos 28.
Em tempos modernos, pelo fato dos relacionamentos serem tão frágeis, tornaram-
-se artigos de luxo, dignos de ostentar – vide a necessidade de vários a comparar o
número de seguidores.
Por fim, por mais que o sujeito tenha inúmeros seguidores, ainda assim nenhum
desses vínculos é sólido e permanente. É na solidão individual que a mídia se alimenta
com o ideal do fetiche de consumo: o ato de consumir conteúdo midiático substitui-
ria o vazio social. Dessa forma, a mídia escolhe e decide sobre aquilo que deve ser
focado, a fim de encontrar meios que o beneficiem lucrativamente.
24 SARMENTO, L. Indústria cultural, cultura de massa e contracultura. [S. l.]: Intercom Sudeste, 2006.
25 ADORNO, T. W.; HORKHEIMER, M. Dialética do esclarecimento: fragmentos filosóficos. Rio de Janeiro:
Zahar, 1985.
26 BAUMAN, Z. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2000.
27 SARAIVA, K.; VEIGA-NETO, A. Modernidade líquida, capitalismo cognitivo e educação contemporânea.
Educação & Realidade, v. 34, n. 2, 2009.
28 BAUMAN, Z. Amor líquido: sobre a fragilidade dos laços humanos. [S. l.]: Editora Schwarcz: Companhia
das Letras, 2004.
172
Considerações finais
Por fim, pode-se concluir que o tráfico de seres humanos é uma prática cruel
e esquecida, por mais que seja lucrativa e envolva circunstâncias bárbaras. É visí-
vel que, uma vez que pode ser observado que as vítimas são pessoas fragilizadas e
minorias, o assunto não se torna um interesse público, mostrando a fragmentação da
sociedade e a falta de empatia já demonstrada nos textos de Bauman. Um crime tão
lucrativo quanto esse, chegando a 20 bilhões de dólares anuais, não possui patamar
nem perfil de um crime pequeno, sendo a falta de denúncias e investigações algo
triste e desumano.
Ao decorrer do trabalho, tornou-se explícito que o desinteresse acerca do crime
não pode ser culpabilizado somente ao governo – a mídia e a população são extre-
mamente omissas, apenas se atentando a situação desde que ela traga algo – a mídia
torna-se para o ganho pecuniário, uma vez que como visto anteriormente, tempo é
dinheiro, então porque focariam em um assunto o qual não traria retorno? A novela
“Salve Jorge” visava audiência e o aumento monetário da empresa; no caso da popu-
lação, não há uma gratificação aparente em se envolver com a temática, e como
29 BERGAMO, M. Após ‘Salve Jorge’, denúncias contra tráfico de pessoas aumentaram em São
Paulo. Folha de S.Paulo, [s. l.], 2013. Disponível em: https://www1.folha.uol.com.br/paywall/adblock.
shtml?origin=after&url=https://m.folha.uol.com.br/colunas/monicabergamo/2013/04/1261268-apos-salve-
jorge-denuncias-contra-trafico-de-pessoas-aumentaram-em-sao-paulo.shtml?loggedpaywall Acesso em:
28 maio 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 173
REFERÊNCIAS
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filosóficos. Rio de Janeiro: Zahar, 1985.
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ORWELL, G. 1984. 29. ed. São Paulo: Companhia Editora Nacional, 2003.
TRAFICANTES de pessoas aproveitam pandemia para criar novas rotas, diz ONG.
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br/brasil/traficantes-de-pessoas-aproveitam-pandemia-paracriar-novas-rotas-diz-
-ong-1.2375185. Acesso em: 1 dez. 2020.
Introdução
O presente texto tem por fim analisar o possível nexo causal entre o tráfico de
migrantes realizado por intermédio de coiotes e as condições às quais os mesmos são
submetidos no Brasil, sobretudo, nas indústrias têxteis de fast fashion – um modelo
de produção originado nos anos 90 por comerciantes têxteis que se baseia na rápida
transformação da indústria da moda, a qual, pela necessidade de produzir em um
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4 BRASIL. Decreto nº 5.016, de 12 de março de 2004. Promulga o Protocolo Adicional à Convenção das
Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional, relativo ao Combate ao Tráfico de Migrantes por
Via Terrestre, Marítima e Aérea. Brasília: Presidência da República, 2004. Disponível em: www.planalto.
gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2004/decreto/d5016.htm. Acesso em: 30 maio 2021.
5 BRASIL. Decreto nº 5.017, de 12 de março de 2004. Promulga o Protocolo Adicional à Convenção
das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição
do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças. Brasília: Presidência da República, 2004.
Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2004/Decreto/D5017.htm. Acesso em: 30
maio 2021.
6 SUZUKI, N. S. Bolivianos em Cortiços? Onde e como vivem os imigrantes submetidos ao trabalho
escravo na cidade de São Paulo. In: FIGUEIRA, R. R.; PADRO, A. A.; GALVÃO, E. M. (org.). Discussões
contemporâneas sobre trabalho escravo: teoria e pesquisa. Rio de Janeiro: Manual X, 2016. v. 1, p. 147-163.
180
7 PRETURLAN, R. B. Mobilidade e classes sociais: o fluxo migratório boliviano para a cidade de São Paulo.
2011. Dissertação (Mestrado em Sociologia) – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2011. p. 73.
8 SILVA FILHO, B. de L. e; NEVES, L. S.; SILVA, B. de M. e. Restrições das liberdades substantivas como
indutoras do trabalho análogo ao de escravo. In: FIGUEIRA, R. R.; PRADO, A. A.; SANT´ANA JUNIOR,
H. A. de (org.). Trabalho escravo contemporâneo: um debate transdisciplinar. Rio de Janeiro: Mauad X,
2011. p. 227239.
9 Há quem sustente que a falta de conhecimento da legislação e do idioma torna os migrantes em
hipervulneráveis. Cf. GARBINI, V. G.; SQUEFF, T. C.; SANTOS, T. F. A vulnerabilidade agravada dos
refugiados na sociedade de consumo. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, v. 119, p. 19-49, 2018.
10 É o que prescreve a Lei de Migrações: Art. 13 […] § 1º É vedado ao beneficiário de visto de visita exercer
atividade remunerada no Brasil. BRASIL. Lei nº 13.445, de 24 de maio de 2017. Institui a Lei de Migração.
Brasília: Presidência da República, 2017. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/
lei/l13445.htm. Acesso em: 28 maio 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 181
é uma prática comum nesta travessia o confisco dos documentos dos migrantes pelos
aliciadores, os quais serão utilizados posteriormente pelos empregadores das fábricas
têxteis como uma forma de impedimento de denúncia por abusos trabalhistas, além
do controle da liberdade do indivíduo de procurar outras opções de trabalho no país11.
Sendo assim, a irregularidade é um dos pilares da conjuntura da exploração desses
indivíduos visto que, de forma regular, a organização da rede de trabalho análogo à
escravidão não se sustentaria12.
Tais indivíduos, ao chegarem ao Brasil, deparam-se com uma situação contrá-
ria à que lhes foi prometida. Desta feita, inseridos no contexto de marginalização,
descobrem que as promessas que lhes foram realizadas em seus países de origem
fomentando a migração, não passam de uma fachada atrativa para incentivar o seu
próprio aliciamento à uma forma de trabalho que explora sua vulnerabilidade, con-
dicionando-os ao trabalho análogo à escravidão – situação que, por si só já viola os
preceitos fundamentais do Estado Brasileiro13.
Inseridos no contexto de obrigação de trabalhar para sanar as dívidas que adqui-
riram para chegar ao Brasil, estes se veem inseridos em um ambiente degradante
e insalubre, no qual enfrentam jornadas de trabalho exaustivas, entende-se que o
modelo de produção empregado pelas indústrias têxteis que se utilizam da mão de
obra migrante se mostra estruturalmente pensado para uma máxima produção e
Editora CRV - Proibida a impressão e/ou comercizalização
11 SOUZA, L. G. Trabalho escravo e imigração na indústria têxtil brasileira: um estudo de economia política
crítica. 2016. 54 f. Trabalho de Conclusão (Bacharelado em Economia) – Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Rio de Janeiro, 2016. p. 33-35.
12 SILVA, C. F. da. Trabalho informal e redes de subcontratação: dinâmicas urbanas da indústria de confecções
em São Paulo. 2008. Dissertação (Mestrado em Sociologia) – Universidade de São Paulo, São Paulo,
2008. p. 91. Disponível em: https: //teses.usp.br/teses/disponiveis/8/8132/tde-24112009-113627/pt-br.php.
Acesso em: 30 maio 2021.
13 TRINDADE, A. A. C. Princípios do Direito Internacional Contemporâneo. Brasília: Universidade de Brasília,
2017. p. 379.
14 REPÓRTER BRASIL. As marcas da moda flagradas com trabalho escravo. Repórter Brasil, [s. l.], 12 jul
2012. Disponível em: https://reporterbrasil.org.br/2012/07/especial-flagrantes-de-trabalho-escravo-na-
industria-textil-no-brasil/. Acesso em: 28 maio 2021.
15 Esse não é o único relato. Veja-se a mesma situação no caso da fábrica da Hippychick, em Americana,
interior do estado de São Paulo, em que relatou-se a seguinte situação a qual diversos migrantes estavam
sendo submetidos: “O calor era intenso, por causa das telhas de amianto, o pé direito baixo e as laterais
fechadas – o que impedia a circulação de ar. As pilhas de tecido espalhadas pelo espaço, além de
dificultarem a circulação dos trabalhadores, aumentavam o risco de incêndio, por estarem próximas a
“gambiarras” elétricas – o local não possuía extintores e saídas de emergência”. SANTINI, D. Após flagrante
em fornecedor, Lojas Americanas se comprometem a fiscalizar cadeia produtiva. Repórter Brasil, [s.
l.], 1 out 2013. Disponível em: https://reporterbrasil.org.br/2013/10/apos-flagrante-em-fornecedor-lojas-
americanas-se-comprometem-a-fiscalizar-cadeia-produtiva/. Acesso em: 29 maio 2021.
182
Importante destacar que essas condições estruturais nas quais esses indi-
víduos submetidos ao processo de contrabando, muitas vezes devido às irregu-
laridades e ao desprezo pelo seu bem estar físico e emocional, cooperam para o
risco de acidentes, destacando-se o episódio de 2016 quando, no bairro do Brás,
zona central da cidade de São Paulo, um cortiço de migrantes bolivianos que
prestavam serviços às indústrias têxteis, de fato, incendiou-se, ocasionando a
morte de quatro pessoas16. Esse trágico episódio abriu margem para que novas
investigações acerca da exploração do trabalho análogo à escravidão no setor
têxtil fossem alçadas.
Entretanto, há uma grande dificuldade em estabelecer investigações concisas
entre a indústria têxtil e a exploração dessa condição de trabalho. Isso se dá pela
contratação de costureiras terceirizadas pelas marcas para, assim, se isentarem de
algum tipo de responsabilidade jurídica, culminando na “terceirização” não apenas
a fabricação de seus produtos como também a responsabilidade pelo modo que
estes são produzidos17.
Apesar disso, o benefício econômico oriundo da exploração abusiva/irre-
gular de migrantes18, tal como diversos casos revelados pelo Ministério Público
do Trabalho (MPT) como os casos Zara19, M.Officer20 e Casas Pernambucanas21,
ampliaram as perspectivas de ação por parte do Estado em prol do combate a tais
16 TRAGÉDIA no Brás expõe a dramática situação de imigrantes em São Paulo. InPacto, [s. l.], 26 nov. 2016.
Disponível em: https://inpacto.org.br/nota-tragedia-no-bras-expoe-a-dramatica-situacao-de-imigrantes-
em-sao-paulo/. Acesso em: 28 maio 2021.
17 Cf. DELGADO, G. N.; AMORIM, H. S. Os limites constitucionais da terceirização. São Paulo: LTr, 2014.
18 CYMBALISTA, R.; XAVIER, I. R. A comunidade boliviana em São Paulo: definindo padrões de territorialidade.
Cadernos Metrópole, São Paulo, v. 1, n. 17, 2007. p. 124.
19 OJEDA, I. Zara admite que houve escravidão na produção de suas roupas em 2011. Repórter Brasil, [s.
l.], 22 maio 2014. Disponível em: https://reporterbrasil.org.br/2014/05/zara-admite-que-houve-escravidao-
na-producao-de-suas-roupas-em-2011/. Acesso em: 28 maio 2021.
20 TRT CONFIRMA condenação da M.Officer por trabalho escravo. Veja, [s. l.], 10 abr. 2018. Economia.
Disponível em: https://veja.abril.com.br/economia/trt-confirma-condenacao-da-m-officer-por-trabalho-
escravo/. Acesso em: 28 maio 2021.
21 Neste caso, por exemplo, os migrantes tiva da empresa. No total, foram resgatadas da escravidão
(31 pessoas – entre elas, dois adolescentes de 16 e 17 anos – vindas da Bolívia, Paraguai e Peru)
eram subcontratados para trabalhar em São Paulo, nas empresas Dorbyn Fashion Ltda. e Nova Fibra
Confecções Ltda, as quais eram contratadas pela Casas Pernambucanas para a produção de roupas.
Nesse caso, “o juiz Marcelo Donizeti Barbosa discordou da empresa e considerou que, mesmo sendo
terceirizada, a produção era de responsabilidade da Pernambucanas: ‘a linha de produção tinha início
e término na própria ré [Casas Pernambucanas]’, resumiu”. “[A]s vítimas foram submetidas a jornadas
exaustivas e servidão por dívidas, além de produzirem peças em oficinas consideradas em condições
degradantes pela fiscalização”. WROBLESKI, S. Casas Pernambucanas é condenada a multa de R$ 2,5
milhões por trabalho escravo. Repórter Brasil, [s. l.], 8 dez. 2014. Disponível em: https://reporterbrasil.
org.br/2014/12/casas-pernambucanas-e-condenada-a-multa-de-r-25-milhoes-por-trabalho-escravo/.
Acesso em: 30 maio 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 183
[…] o setor foi transformado pela abertura comercial (que possibilitou a concor-
rência dos produtos chineses no mercado local), pela desregulamentação do setor,
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(que são contratadas por grandes marcas do setor fast fashion) e fazem o transporte
irregular desses indivíduos até o local em que posteriormente, será explorado.
Nesse sentido, com o objetivo de maximizar os lucros, as empresas fast fashion
se utilizam do sistema de subcontratação de micro e pequenas empresas que oferecem
o serviço de costuraria extremamente barato28. Entretanto, esse baixo valor, competi-
tivo para o mercado, se dá com base na exploração de trabalho análoga à escravidão
de migrantes bolivianos29. Dessa forma, “com a terceirização, a dissimulação do
trabalho escravo tornou-se fácil e eficaz, haja vista as empresas poderem explorar
mais e a lei ter menos eficácia”30 considerando o processo de flexibilização das leis
trabalhistas no que diz respeito ao sistema de subcontratação31.
Com isso, apesar da lei de migrações hoje combater a coiotagem32, uma questão
que ainda não é plenamente abordada é justamente a possibilidade de responsabiliza-
ção dos empresários à frente da indústria têxtil também pelo aliciamento e imigração
irregular de migrantes não se limitando a aplicação de multas vultosas pela situação
de trabalho na qual os migrantes são submetidos nas fábricas no país. Acerca disso,
parece que o desenvolvimento mais efetivo ocorre desde o viés de tráfico de pessoas
(em detrimento de contrabando).
28 BIGNAMI, R. Trabalho escravo contemporâneo: o sweating system no contexto brasileiro como expressão
do trabalho forçado urbano. In: NOCCHI, A. S. P.; VELLOSO, G. N.; FAVA, M. N. (org.). Trabalho escravo
contemporâneo: o desafio de superar a negação. 2. ed. São Paulo: LTr, 2011. p. 76-112. p. 82.
29 REPÓRTER BRASIL; SOMO. Da responsabilidade moral à responsabilização jurídica? As condições
de escravidão moderna na cadeia global de suprimentos da indústria do vestuário e a necessidade
de fortalecer os marcos regulatórios: o caso da Inditex-Zara no Brasil. Disponível em: http://somo.nl/
publicationsen/Publication_4188/at_multi_download/files?name=Da%20responsabilidade%20moral%20
a%26%23768%3B%20responsabilizac%26%23807%3Ba%26%23771%3Bo%20juri%26%23769%3Bdi
ca%3F. Acesso em: 30 maio 2021. p. 13.
30 MOREIRA, L. V.; FERRAÇO, D. A. B.; SANTOS, E. V. dos. Escravos da moda: Análise da terceirização
a partir do caso Zara. Revista Científica Dimensão Acadêmica, v. 2, p. 133, 2017.
31 Cf. DELGADO, M. G. Curso de Direito do Trabalho. 16. ed. São Paulo: LTr, 2017; ALVES, G. Terceirização:
o futuro do trabalho no Brasil. Revista Trabalho, Educação e Saúde, Escola Politécnica de Saúde Joaquim
Venâncio, v. 15, n. 2, 2017.
32 Consoante o art. 115 da Lei de Migrações, resta inserido o art. 232-A no Código Penal, segundo o qual
“promover, por qualquer meio, com o fim de obter vantagem econômica, a entrada ilegal de estrangeiro
em território nacional ou de brasileiro em país estrangeiro” pode ensejar uma pena de reclusão, de dois
a cinco anos, e multa, a qual, ainda, pode ser majorada em 1/6 a 1/3 se a vítima é submetida a condição
desumana ou degradante. BRASIL. Lei nº 13.445, de 24 de maio de 2017. Institui a Lei de Migração. Brasília:
Presidência da República, 2017. Disponível em: www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2017/lei/
l13445.htm. Acesso em: 28 maio 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 185
33 UNODC. Tráfico de Pessoas e Contrabando de Migrantes. [S. l.]: UNODC, 2019. Disponível em: https://
www.unodc.org/lpo-brazil/pt/trafico-de-pessoas/index.html. Acesso em: 29 maio 2021.
34 SILVA, E. S.; BARAKAT, N. J. D. Contrabando e tráfico de migrantes: Um olhar crítico sobre as violações
dos direitos humanos no século XXI. In: CONGRESSO INTERDISCIPLINAR DE DIREITOS HUMANOS
– INTERDH 2020: Globalização e globalismos, 2020, Rio de Janeiro. Anais […]. Rio de Janeiro: Pembroke
Collins, 2020. p. 470.
35 NOGUEIRA, C.; NOVAES, M.; BIGNAMI, R. et al. Tráfico de pessoas e trabalho escravo: além da
interposição de conceitos. Revista do Ministério Público do Trabalho, v. 46, p. 235, 2013.
36 ITIKAWA, L.; CÂNDIA VEIGA, J. P. Canais de negociação no âmbito do trabalho informal precário em
duas pontas do setor têxtil: produção e comercialização. In: CONFERÊNCIA INTERNACIONAL DA REDE
GLOBAL LABOUR UNIVERSITY, abr. 2008, São Paulo. Anais […]. São Paulo: [s. n.], 2008. Disponível em:
http://www.global-labour-university.org/fileadmin/GLU_conference_Unicamp_2008/Submitted_papers/
PAPER_ITIKAWA-CANDIA.pdf. Acesso em: 15 dez. 2013.
186
37 Sobre as modificações legais, cf. CASTRO, H. H. M. Lei de Tráfico de Pessoas traz avanços e causa
perplexidade. Conjur, [s. l.], 11 out. 2016. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2016-out-11/academia-
policia-lei-trafico-pessoas-traz-avancos-causa-perplexidade. Acesso em: 2 jun. 2021.
38 LOUREIRO, C. R. de O. M. da S. A análise interseccional entre migração e trabalho escravo contemporâneo
na era da globalização dos riscos. In: ORLANDINI, M. L. S. R.; PALUMA, T.; SOUZA, A. M. A. de (org.).
Desafios do trabalho contemporâneo. Uberlândia: EDUFU, 2019. v. 1, p. 162.
39 FAGUNDES, M. K. Trabalho Escravo e Pandemia: os desafios da Inspeção do Trabalho na promoção do
trabalho digno. Laborare, ano 3, n. 5, jul./dez. 2020. p. 87-105.
40 BERSANI, H.; HERNANDES, K. S. Ações governamentais e políticas de combate ao trabalho escravo
contemporâneo no Brasil. Revista de Estudos Jurídicos UNESP, Franca, ano 21, n. 34, p. 227-257, jan./
jun. 2017.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 187
civil das empresas que se utilizam de tal sistema degradante de trabalho, partindo-se
da verificação da codificação brasileira sobre o tema (2.1), para que se possa ponderar
sobre a inserção das empresas envolvidas com essa prática na ‘lista suja’ (2.2) e os
problemas oriundos do desmonte do Ministério do Trabalho (2.3).
situações como servidão por dívidas (já prevista na Convenção Suplementar sobre
a Abolição da Escravatura de 1956) e jornadas laborais extensas, situações que
passam a ser consideradas como elementos que ajudam a retirar da vítima o
integral controle de seu destino, atrelando-o à vontade do contratante e assim
evidenciando o exercício, em face do escravizado, dos atributos inerentes ao
direito de propriedade42.
41 BRITO FILHO, J. C. M. de. Dignidade da Pessoa Humana como fundamento para o combate ao trabalho
em condições análogas à de escravo: a contribuição da 1ª Turma do Tribunal Superior do Trabalho no
processo TRT-RR-178000-13.2003.5.08.0117. Revista do Tribunal Superior do Trabalho, v. 78, n. 3, jul./
set. 2012. p. 101-102.
42 BELTRAMELLI NETO, S. Apontamentos sobre a imprescritibilidade dos crimes relativos a trabalho escravo
segundo a sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos para o Caso Trabalhadores da Fazenda
Brasil Verde. In: KNOERR, F. A.; SOUZA, J. F. V.; SPOSATO, K. B. (org.). Eficácia de direitos fundamentais
nas relações do trabalho, sociais e empresariais. In: CONGRESSO DO CONPEDI, 25., 2017, Florianópolis.
Anais […]. Florianópolis: CONPEDI, 2017. v. 1, p. 64. Disponível em: http://conpedi.danilolr.info/publicacoes/
roj0xn13/e7x5ou99/1EBj3rzTBMyJewjd.pdf. Acesso em: 31 maio 2021.
43 VIANA, M. T. Trabalho escravo e “lista suja”: um modo original de se remover uma mancha. Rev. Trib.
Reg. Trab. 3ª Reg., Belo Horizonte, v. 44, n. 74, p. 189-215, jul./dez. 2006.
188
44 CAMPOS, A.; VAN HUJISTEE, M.; THEUWS, M. Da responsabilidade moral à responsabilização jurídica?
As condições de escravidão moderna na cadeia: o caso da Inditex-Zara no Brasil. Repórter Brasil, Amsterdã,
2015. Disponível em: https://reporterbrasil.org.br/wp-content/uploads/2015/05/Reporter-Brasil-web-P.pdf.
Acesso em: 31 maio 2021.
45 MERÇON, M. Imigrantes bolivianos no trabalho escravo contemporâneo: análise do caso Zara a partir
das RPGs. Revista do CEDS, v. 1, n. 2, p. 5, 2015.
46 REPÓRTER BRASIL. Flagrantes mostram roupas da Zara sendo fabricadas por escravos. Reporter Brasil,
[s. l.], 19 ago. 2011. Disponível em: https://www.oabrj.org.br/noticias/flagrantes-mostram-roupas-zara-
sendo-fabricadas-escravos. Acesso em: 30 maio 2021.
PRECARIZAÇÃO DAS RELAÇÕES DE TRABALHO: reflexões interdisciplinares 189
Ocorre que nem sempre essa medida é efetiva. No caso da Zara, por exemplo,
nem todos aqueles envolvidos na cadeia produtiva tiveram seus nomes inseridos na
‘lista suja’ do MPT, sobretudo, a controladora de grande parte do seu capital – Indi-
tex –, demonstrando a limitação do uso dessa prática de combate a condição análoga
à escravidão no país. O mesmo aconteceu no caso da Restoque Confecções que
administra marcas como Le Lis Blanc, Bo.Bô e Dudalina que já foram autuadas por
trabalho análogo à escravidão47.
Portanto, é importante levar em consideração que os conglomerados de empresas
fast fashion, ainda podem ter acesso a crédito e políticas de incentivo fiscal e político
já que essas não são incorporadas à ‘lista suja’ de trabalho escravo. Desta feita, há de
se inferir que embora a lista suja tenha um papel fundamental para que as empresas e
pessoas físicas que já foram sentenciadas em segunda instância pelo Poder Judiciário
não tenham acesso a crédito e incentivos públicos de desenvolvimento, essa condição
pode ser burlada por esses conglomerados configurando assim uma rede de subcon-
tratação entre as costurarias e as empresas que administram e uma “subcontratação
da subcontratação” por intermédio do conglomerado e a marca.
Para além dessa limitação, destaca-se também as dificuldades enfrentadas patual-
mente no Brasil em função do desmonte do Ministério do Trabalho, prejudicando o
combate e a fiscalização do trabalho análogo à escravidão no país.
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47 FISCALIZAÇÃO acha trabalho escravo em oficinas de marcas de luxo. G1, São Paulo, 30 jul. 2013, São
Paulo. Disponível em: http://g1.globo.com/sao-paulo/noticia/2013/07/fiscalizacao-acha-trabalho-escravo-
em-oficinas-de-marca-de-luxo.html. Acesso em: 31 maio 2021.
48 BERSANI, H.; HERNANDES, K. S. Ações governamentais e políticas de combate ao trabalho escravo
contemporâneo no Brasil. Revista de Estudos Jurídicos UNESP, Franca, a. 21, n. 34, p. 227-257, jan./jun.
2017. p. 242.
49 BRASIL. Medida Provisória Nº 870, de 1º de janeiro de 2019, art. 83. Estabelece a organização básica dos
órgãos da Presidência da República e dos Ministérios. Diário Oficial da União: seção 1, ed. esp., p. 1-13,
Brasília, DF, 1 jan. 2019. Disponível em: https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/
content/id/57510830. Acesso em: 31 maio 2021.
190
Considerações finais
notadamente em São Paulo pelo seu histórico, as quais se utilizam de mão de obra
escrava para produzir os seus bens a menores preços, almejando um lucro ainda maior.
Nesse sentido, sob a perspectiva da condição na qual o migrante se encontra
no país, aventou-se que essa prática pode ser combatida no Estado brasileiro de
duas formas: pela configuração do contrabando ou do tráfico de pessoas, tendo sido
avultado que, apesar das diferenças terminológicas entre as duas categorias, parece
que a consideração do ato praticado pelos coiotes como tráfico de pessoas parece
ser melhor, em especial, em virtude das modificações legislativas havidas em 2016,
em que pese este não seja um caminho tão explorado no contexto da responsabili-
zação dos empresários das indústrias fast fashion, apesar do vínculo existente entre
estas fábricas e vinda de migrantes bolivianos de maneira irregular ao Brasil e a sua
submissão a situações desumanas, degradantes e cruéis de trabalho das costurarias.
Afinal, a via utilizada no país é a de responsabilização das fast fashion quando
se verifica o vínculo entre elas e as empresas terceirizadas, onde os migrantes são
submetidos a situações análogas ao de escravo. Ou seja, responsabiliza-se as indústrias
não com base no art. 149-A do Código Penal (tráfico de pessoas), mas pela previsão
do art. 149 (redução à condição análoga à de escravo). Entretanto, esse caminho não
tem se mostrado tão efetivo. Não só as recentes condenações na Corte Interamericana
denotam as falhas do Brasil no que tange o combate ao trabalho análogo à escravidão
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REFERÊNCIAS
BELTRAMELLI NETO, S. Apontamentos sobre a imprescritibilidade dos crimes
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Humanos para o Caso Trabalhadores da Fazenda Brasil Verde. In: KNOERR, F. A.;
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ALVES, G. Terceirização: o futuro do trabalho no Brasil. Revista Trabalho, Educação
e Saúde, Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio, v. 15, n. 2, 2017.
SAKOMOTO, L. Covid: País tem déficit de 1,5 mil fiscais para vigiar condição de
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trabalho. UOL Notícias, [s. l.], 17 jul. 2020. Disponível em: https://noticias.uol.com.
br/colunas/leonardo-sakamoto/2020/07/17/brasil-tem-deficit-de-15-mil-fiscais-para-
-verificar-condicoes-de-trabalho.htm. Acesso em: 31 maio 2021.
TRT CONFIRMA condenação da M.Officer por trabalho escravo. Veja, [s. l.], 10
abr. 2018. Economia. Disponível em: https://veja.abril.com.br/economia/trt-con-
firma-condenacao-da-m-officer-por-trabalho-escravo/. Acesso em: 28 maio 2021.
E
Enfrentamento ao tráfico 165, 166, 167, 168, 174, 175
Entregadores de aplicativos 65, 66, 73, 74, 75, 76, 79, 80, 81
Erradicação do trabalho escravo 108, 128, 129, 142, 146, 147, 151, 152,
155, 188
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Exploração do trabalho 23, 50, 69, 71, 73, 77, 79, 83, 105, 106, 107, 118,
123, 132, 133, 151, 182, 186
I
Intermediação de mão de obra 69, 71, 77, 83, 100
M
Ministério Público do Trabalho 8, 11, 105, 106, 107, 108, 109, 114, 115, 117,
118, 119, 120, 121, 122, 123, 124, 147, 151, 178, 182, 185, 194
P
Prestação de serviços 37, 38, 39, 40, 69, 79, 96, 98, 99, 166, 184
R
Relação de emprego 7, 16, 35, 37, 38, 39, 40, 41, 43, 44, 61, 71, 89, 97
T
Trabalhadores da Fazenda Brasil Verde 127, 131, 132, 141, 143, 146, 153,
155, 159, 187, 190, 192, 193
Trabalho análogo à escravidão 11, 12, 47, 58, 59, 60, 156, 157, 163, 177,
178, 180, 181, 182, 183, 185, 186, 187, 188, 189, 190, 191
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SOBRE O LIVRO
Tiragem sem comercialização
Formato: 16 x 23 cm
Mancha: 12,3 x 19,3 cm
Tipologia: Times New Roman 10,5 | 11,5 | 13 | 16 | 18
Arial 8 | 8,5
Papel: Pólen 80 g (miolo)
Royal Supremo 250 g (capa)