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Stefano Chiacchiarini, Shutterstock

Prólogo
Um
Dois
Três
Quatro
Cinco
Seis
Sete
Oito
Nove
Dez
Onze
Doze
Treze
Quatorze
Quinze
Dezesseis
Dezessete
Dezoito
Dezenove
Vinte
Vinte e um
Vinte e dois
Vinte e três
Vinte e quatro
Vinte e cinco
Vinte e seis
Vinte e sete
Vinte e oito
Vinte e nove
Trinta
Trinta e um
Trinta e dois
Trinta e três
Epílogo
Bônus
Sobre a autora
Outras obras
Contato
Roma, Itália.

Caminhar pelo enorme corredor repleto de fotos nunca foi tão


difícil para mim, por isso questiono a ideia de ter vindo passar uns
dias com meus tios – e padrinhos – Andreas e Silvia Villazza em
Roma.
Achei que não sentiria baterem forte em mim todas as
lembranças de todos os anos que nossas famílias passaram juntas,
compartilhando festas, datas comemorativas e, principalmente,
férias.
Paro em frente a uma foto em que Frank, Antonio e eu
estamos correndo em um enorme gramado na antiga casa dos
Villazzas em Curitiba. Meus olhos se enchem de lágrimas ao
lembrar-me desse dia, pois o curativo no meu joelho está bem nítido
na imagem.
Eu me machuquei e não conseguia andar. Tinha por volta de
12 anos, e Frank me pegou no colo, levou-me até o banheiro da
área da piscina, limpou o ferimento e, munido com um kit de
primeiros socorros, grudou um band-aid sobre a ferida.
— Non piangere più, Mel! — O adolescente magrelo e alto
beijou minha testa. — Sei bella sorridi![1]
Acho que foi naquele dia, pelo menos pelo que me lembro,
que me apaixonei por Francesco Villazza. Depois dessas férias, eu
só queria que o tempo voasse e eu ficasse tão linda quanto as
garotas que via conversando com ele.
Mesmo depois que Frank foi enviado para um colégio interno,
eu contava os dias, porque sabia que nossas famílias iriam se reunir
e que, invariavelmente, iríamos nos encontrar.
Meus cadernos da adolescência eram todos enfeitados com
nossas iniciais e muitos corações. Minhas amigas falavam do Frank,
mesmo sem conhecê-lo, com a intimidade que teriam com um
namorado meu. Eu fazia planos, estratégias para que ele me
enxergasse, organizava minha mala milimetricamente pensada para
que cada roupa pudesse surtir algum efeito nele.
Estudei os seus gostos também, por música, motos, bandas
de rock, livros, até cheguei a experimentar cigarros, porque sabia
que ele fumava escondido. Era um ano inteiro de preparação, para,
enfim, passar duas semanas ao seu lado e tentar, ano após ano,
que ele me notasse.
Olho para outra foto de Frank. Nessa eu não estou, pois ele
furou uma das férias em família pouco antes de ir fazer o college
nos Estados Unidos. Foi com um grupo de amigos para os Alpes
Suíços esquiar, e eu passei as duas semanas mais ridículas da
minha vida, com um mau humor tremendo e ouvindo as pessoas
alegarem que eram meus hormônios.
O ano seguinte àquelas férias frustradas foi marcado por uma
situação diferente: comecei a ser notada, mas por outros rapazes.
Passei a focar tanto em Frank que esqueci de me ver e só ficava
imaginando como queria que ele me visse. Então, de repente, os
rapazes do colégio começaram a se aproximar de mim, e tomei um
susto.
No começo, rechacei cada um deles, porém, depois de
passar outras férias sem a presença de Frank – que, nessa época,
estava morando nos Estados Unidos e simplesmente decidiu passar
as festas de final de ano por lá –, decidi que tinha de esquecê-lo.
Comecei a sair, a prestar mais atenção na minha aparência e
a ficar com os rapazes que me interessavam. É claro que, sempre
que tinha a oportunidade, deixava Frank saber que eu estava
namorando alguém, na esperança de que ele se tocasse que eu
tinha me tornado uma mulher.
Claro que nada aconteceu!
Rio de mim mesma, pensando em como pude passar tantos
anos da minha adolescência focada num só objetivo. Eu era a
melhor aluna, porque Frank era o melhor aluno; estudava vários
idiomas, porque Frank estudava na Europa, e isso fazia parte de
seu currículo escolar. Por muitos anos apenas segui os passos dele,
e isso só mudou, só descobri mesmo quem era de verdade Melissa
Maria Boldani, quando ele partiu de vez meu coração.
A foto da formatura dele está na parede. Frank está
sorridente ao lado da família e dos meus pais, porém eu não estou
nela. Ainda sinto calafrios ao me lembrar dos dias tão sofridos que
tive em Boston, poucos meses antes de essa fotografia ter sido
tirada.
Fecho os olhos, rememorando a sensação de ser
desprezada, descartável, e tento não reviver aquele dia, mas é
impossível.
Fazia frio, era fevereiro, o Dia dos Namorados se
aproximava, e resolvi, depois de muitos anos recebendo “convites”,
ir a Boston visitar o Frank, que estava no final do curso de negócios
em Harvard.
Tinha ido para Nova Iorque para ver uma exposição de um
arquiteto especializado em revitalização de prédios históricos.
Comentei isso com ele durante uma ligação e recebi o já conhecido:
vem me ver!
Eu fui!
Hospedei-me em um hotel perto de onde ele morava, e nós
marcamos um encontro em seu pub preferido, pois ele queria que
eu conhecesse seus amigos antes de irmos jantar.
Não vou mentir, estava animada, ansiosa e esperançosa,
afinal, já era uma mulher bonita, independente, iria me formar em
arquitetura como meu pai, e todos diziam que eu havia puxado seu
talento. Era experiente também, já havia tido alguns namorados e
tinha tudo o que ele gostava.
Arrumei-me com a destreza de uma mulher que conhece
muito bem o gosto do homem por quem é apaixonada, deixei meus
cabelos soltos, compridos, e passei uma maquiagem marcante que
ressaltava meus olhos verdes.
O táxi me deixou no pub com alguns minutos de atraso, pois
pegamos um trânsito pesado que eu não imaginava que enfrentaria.
Entrei praticamente correndo e esbarrei com um rapaz que me
olhou de um jeito que praticamente me vi ser despida.
Olhei em volta, mas o bar estava cheio demais. A maioria dos
clientes era homem, e tinha um grupo bem barulhento num canto,
comemorando alguma coisa. Segui até o bar e pensei em pedir
alguma informação ao bartender, já que eu sabia que Frank era um
assíduo frequentador.
— Boa noite! — gritei em inglês. — Eu estou procurando...
O homem fez uma careta, apontou a orelha e, em seguida,
berrou:
— Ei, pessoal, é a última vez que peço para vocês se
controlarem, ou vou expulsar todos do meu pub! — O barulho
cessou um pouco. — Pois não?
— Estou procurando Frank Villazza, não sei se o senhor
conhece...
— Quem não conhece? — Ele riu e me entregou um
guardanapo. — O safado deixou isto para você.
Peguei o guardanapo dobrado com o coração disparado e li
as palavras de Frank dizendo que havia “pintado” um outro
compromisso, que tentou falar comigo, mas estava com o celular
sem bateria, não sabia meu número e que iria passar no meu hotel
qualquer dia antes de eu ir embora.
Minhas mãos começaram a tremer, sem poder acreditar que
tinha adiado minha volta ao Brasil, estendido meus dias nos Estados
Unidos, viajado até Boston para vê-lo e era tratada daquela forma.
“Outro compromisso” significava que ele havia encontrado
alguma mulher para foder naquela noite, o que era muito melhor do
que jantar com uma amiga de infância.
Senti o quanto estava fazendo papel de idiota, deixando de
viver a minha vida ao pensar nele. Meus olhos queimaram com
lágrimas que recusei a verter, respirei fundo e tomei a decisão de
tentar retornar ao Brasil no dia seguinte.
— Você está bem? — um homem de repente me perguntou,
e apenas balancei a cabeça afirmativamente. — Quer beber alguma
coisa?
— Não. — Suspirei. — Só quero ir embora.
Afastei-me do balcão e andei firme, desviando-me de um e
de outro, até a calçada gelada e escorregadia. Arrependi-me pela
roupa sensual que usava por baixo do sobretudo, pois eu poderia
estar muito mais quente se não tivesse perdido tempo me vestindo
para ele!
Estava aguardando passar um táxi com a luz indicativa de
vaga acesa enquanto me encolhia e tremia.
— Docinho, se estiver disposta, posso te esquentar a noite
toda! — Fui agarrada por trás por um homem indiscutivelmente
bêbado e senti meu estômago embrulhar.
— Solte-me! — gritei, mas ele se manteve firme.
Finalmente vi um táxi livre vindo, e o desespero tomou conta
de mim, porque não conseguiria fazer sinal com aquele nojento me
segurando.
Foi então que senti um solavanco e fui liberada bem a tempo
de chamar o táxi e me refugiar nele, segura e quente. Tremia de frio
e medo quando dei minha localização ao motorista e só quando o
carro começou a andar é que olhei pela janela para ver quem era o
sujeito que tentou me agarrar à força.
Não deu para saber, porque havia uma confusão
generalizada na porta do pub. Respirei aliviada por sair de lá e jurei
para mim mesma que nunca mais iria correr atrás do Frank.
— Promessa essa que foi quebrada no pior momento
possível! — digo, deixando aquela noite tensa para trás, olhando a
foto de Frank, Isabella e os gêmeos.
— Tudo bem, minha querida? — Tio Andreas toca meu
ombro, e percebo que estou com as bochechas molhadas de
lágrimas.
— Tudo, essa parede da tia Silvia me deixa emocionada. É
uma história linda contada através de imagens.
Ele concorda.
— É a história da nossa família. — Olha-me com carinho. —
E isso inclui os Boldanis.
Suspiro e volto a olhar a foto de Isabella com Frank.
— Agora mais ainda...
— Sempre, Mel! — Tio Andreas suspira. — Não ligamos
nossas famílias do jeito que achei que seria. — Olho-o surpresa. —
Mas estou feliz pelo jeito que foi. — Balanço a cabeça, pois sei que
ele adora a Isa. — Minha felicidade ainda não está completa, porque
não te vejo feliz.
Sinto mais lágrimas rolarem.
— Eu estou, tio. Juro que sim!
— Por eles, eu sei que está, mas e por você?
Dou de ombros.
— Talvez eu tenha que aprender a ser feliz de outra forma.
— Ninguém aprende a ser feliz, Mel. Felicidade é como um
dom; ninguém aprende um dom, você o recebe, ele acontece. —
Andreas Villazza me abraça. — O seu vai acontecer, e você vai ser
muito feliz, seja como for.
Soluço ao abraçá-lo, sentindo-me acolhida por esse homem,
que sempre foi como um pai para mim, torcendo para que suas
palavras sejam atendidas e que eu, sozinha ou com alguém, seja
feliz.
Nova Iorque, Estados Unidos.

Rolo na cama mais uma vez, tentando descansar antes


mesmo de ver como estão as coisas aqui, em Nova Iorque. Viajei
durante 10 horas seguidas, sem escala, de Roma para cá, sem
conseguir dormir. Eu estava passando uns dias na capital italiana
com meus padrinhos e tios do coração, Andreas e Silvia Villazza,
quando decidi visitar minha prima, Pietra, antes de retornar ao
Brasil.
Ela, com certeza, é a mulher mais famosa de nossa família,
supermodelo, independente e bem resolvida: Pietra Boldani. Desde
quando se mudou para os Estados Unidos, há dois anos, está
batalhando para se tornar atriz – e não qualquer atriz – de musicais
da Broadway, mas, por enquanto, tudo o que faz são testes atrás de
testes e algumas pontas, principalmente nos corais.
Pietra não desistiu da carreira fashion, mesmo porque é de
onde vem seu dinheiro, mas já pisou no freio, pois sabe que, aos 30
anos de idade, as coisas vão começar a ficar mais difíceis, e os
trabalhos, a rarear, pois o mundo da moda prioriza as modelos mais
novas. O tempo não para, como dizia Cazuza! Por mais que
sejamos mulheres modernas e independentes, sabemos que, para
algumas situações, nosso relógio biológico está começando a ficar
no vermelho e a emitir alertas.
Levanto-me e olho para as ruas do East Village, onde Pietra
mora, desistindo por fim de descansar. Escuto o telefone dela
tocando sem parar e, logo após, um grito de alegria. Sorrio,
pensando que minha prima é a pessoa mais animada da face da
Terra, e eu, no alto dos meus 38 anos, quase 39, vou passar aperto
ao lhe seguir o ritmo.
Assim que liguei para ela, já no JFK, avisando que tinha
chegado e que estava indo para um hotel, ela traçou centenas de
planos para nós e me proibiu de me hospedar em qualquer outro
lugar que não fosse seu apartamento.
Quando o táxi me deixou na porta do prédio, compreendi por
que ela fez tanta questão de achar um apartamento neste bairro: há
uma sucessão de lojas, bares, restaurantes, boates, clubes etc. A
diversão dela fica no quintal de casa. Pelo tamanho do local e
variedade de atrações, ela nunca precisa sair daqui, porque a
diversão nunca tem fim.
O apartamento é descolado, todo rústico por dentro, com
paredes sem revestimento, os encanamentos metálicos – elétricos e
hidráulicos – expostos e o sistema de calefação industrial passando
por todo o teto do apartamento. Como arquiteta, estou encantada
com tudo isto, ainda mais ao ver que ela instalou lustres de fios de
cobre com lâmpadas de filamentos. Tudo é a cara da Pietra, que,
embora seja uma mulher com seus cabelos longos e negros e seus
olhos enormes cor de avelã, dona de um corpo escultural e um par
de pernas impressionantes, não tem nada de delicada ou romântica.
Mal acabo de pensar nela, e eis que a criatura invade o
quarto no qual estou instalada e começa a pular à minha volta.
— Ela voltou, Mel! — Abraça-me. — Ela voltou e trouxe a
sorte junto!
Dou gargalhadas com a sua animação, já sabendo de quem
ela está falando.
— April?
Ela suspira e confirma.
April Stanton, a namorada de Pietra, estava havia seis meses
numa turnê pela Europa, e as duas só mantinham contato via
telefone e facetime.
— Você vai ficar muito chateada se eu cancelar nosso
compromisso hoje? — Faz uma careta. — É que ela conseguiu
convites para uma festa privada de um diretor famoso! — Ela sorri
para mim, demonstrando toda a sua expectativa de conseguir algum
papel.
— Sem problemas, Pietra! — Sento-me na cama. — Vou
aproveitar para descansar mais um pouco...
— Tem certeza? Ontem, quando você chegou, não saímos, e
hoje era nossa noite juntas... — lamenta. — Quer ir conosco? — Ela
bate palmas. — É isso! Vou ligar para a April e pedir a ela que
consiga...
Uma festa cheia de atores?! Não mesmo!
— Não precisa, Pietra. — Olho para a janela do quarto. —
Aqui no bairro tem muita diversão, e eu falo inglês muito bem. Além
disso, não é minha primeira vez em Nova Iorque, e eu tenho alguns
amigos aqui para rever.
— Tem certeza mesmo, Mel? — Assinto. — Eu tenho uma
porção de convites para as mais variadas festas que rolam aqui. —
Imagino que ela tenha, pois é muito popular. — Vou separar alguns,
apenas os melhores, e deixar para você escolher. — Abraça-me. —
Obrigada por ser essa linda! Eu juro que amanhã compenso!
— Vai se arrumar de uma vez para ficar um pouco com April
só para você! Aproveita que você tem alguém que te ama... —
Assim que digo essa frase, arrependo-me, vendo o sorriso no rosto
da minha prima sumir.
— Ah, Mel! Não há ninguém nesse mundo que mereça ser
tão amado quanto você! — Faço uma careta e lhe mostro a língua,
tentando descontrair. — Pode parar com essa cara, porque sei que
você a usa quando quer fingir que está tudo bem! — Ela se senta ao
meu lado. — Você ainda não o esqueceu, não é?
Bufo, não querendo falar desse assunto, mas sabendo que
ela não vai me deixar em paz enquanto eu não lhe disser a verdade.
— Não, e isso é horrível, eu sei! — Balanço a cabeça,
recriminando-me. — Gostar dele é tão natural para mim, Pietra,
porque fiz isso toda a vida! É como um hábito de anos...
— Sim... como um vício que, por mais que você saiba que só
te prejudica, não consegue largar!
— É, é isso! — Limpo meus olhos, evitando que as lágrimas
comecem a cair. — O que sinto por Frank me prejudica de uma
forma enorme, no entanto, tenho que fingir que nada está
acontecendo. — Rio. — Eu queria ser uma tia melhor para meus
sobrinhos, uma irmã presente para Isabella, mas como? — Choro.
— Eu me sinto culpada por sentir isso pelo meu cunhado!
— Ah, Mel! — Ela me abraça. — Sentimentos não vêm com
botão on/off, sabe? Tudo o que aconteceu entre vocês três... —
suspira — foi punk!
Sim. Nossa história parecia uma brincadeira de mau gosto do
destino. Não o fato de Frank finalmente se apaixonar por alguém,
mas sim por esse alguém ser também importante para mim.
Não fui talhada para ser amada! Acontece... Há pessoas que
passam a vida inteira sozinhas, e eu sou uma delas. Nenhum
relacionamento deu certo para mim, primeiro porque eu tinha ainda
a esperança de ter o Frank, depois porque não aconteceu mesmo.
Sou uma mulher independente, bem-sucedida, com uma
situação financeira muito confortável, cercada de amigos e uma
família incrível! Já não é o suficiente?
Dou um sorriso para Pietra e sacolejo meu corpo, espantando
essas lembranças todas.
— Mas a vida seguiu, Pietra! E continua indo e indo, e eu, um
dia, vou acordar de manhã e sentir que o sentimento por ele mudou,
que se tornou casto, como o de uma irmã por um irmão.
— É isso aí! E sabe a melhor forma de isso acontecer? —
Um sorriso maléfico se estampa em seu rosto. — Tendo uma noite
deliciosa ao lado de um homem maravilhoso, curtindo o que tem de
melhor em ser solteira e livre!
— Não sei se estou no clima para isso...
— Ah, Mel! — Ela se levanta. — Eu vou escolher uma festa
para você ir hoje e se divertir, mas, se acontecer de um americano
gostosão ficar louco por você... curta o momento!
Ela sai do quarto saltitando como entrou, animada com a sua
noite e a que está planejando para mim.

Pietra ainda passou pelo meu quarto antes de sair,


certificando-se de que eu iria selecionar um dos convites que ela
tinha separado para mim e deixado sobre algum móvel. No entanto,
eu realmente não estava nem um pouco a fim de sair.
Tomei um banho demorado na banheira dela e depois,
vestindo um roupão e com uma toalha enrolada nos meus cabelos,
abri meu laptop para verificar e-mails.
Fiquei alguns dias em Roma visitando amigos, hospedada na
casa dos meus tios Villazzas, pois, desde o divórcio dos meus pais,
nossa casa na Itália está fechada e à venda. Eu precisava dessas
férias, embora ainda esteja trabalhando em um projeto muito
especial, porém, fora do escritório.
Vejo um e-mail do Nick e abro um sorriso ao ler os elogios
que ele está me fazendo pelo projeto da casa do haras. Ele me
pediu uma casa de campo ampla e espaçosa, porém, não suntuosa
demais, um lar. Sabendo da pretensão dele de fixar residência no
local, pensei em tudo o que ele mais gosta: reunir amigos, tocar seu
violão e comer aquelas delícias do campo. Projetei uma casa com
salas integradas, em que ele poderia facilmente dar uma festa
dentro delas se quisesse, mas com uma função diferente para cada
uma: estar, música e televisão. Não fiz sala de jantar, pois a cozinha
enorme teria uma grande mesa de madeira onde todos se reuniriam
para comer juntos.
No segundo piso, apenas três suítes, conforme sua
orientação. Na principal, a maior de todas, fiz um pequeno terraço
sobre o telhado da varanda da frente, com vista para os açudes e
para a imensidão de pastagem que estava sendo plantada. Lá, ele
poderá colocar uma rede dupla e ficar com sua esposa, quando ele
se assentar com alguém, e namorar ante aquela visão maravilhosa,
mas totalmente longe de olhares curiosos.
Há muito ainda a ser feito, mas, a cada pedacinho daquele
lugar concluído, vejo o quanto aceitar esse desafio foi bom. Nunca
fiz nada igual, e tive de pesquisar muito para conhecer o que seria
funcional dentro de um haras.
Nicholas parece uma criança com um brinquedo sonhado a
cada vez que eu lhe entrego um projeto pronto para ser executado.
Ele é o homem mais incrível que já conheci! Bem-humorado,
cavalheiro, muito simples e com um senso de responsabilidade
social enorme. Quem pensa em um herdeiro de uma empresa
“mega” como a Novak nunca irá associar a imagem projetada a
quem ele realmente é. Além de tudo, o homem é lindo! Todavia,
nunca sentimos uma só faísca de atração um pelo outro. Não sei se
é por causa da nossa diferença de idade – sou sete anos mais velha
que ele e nunca gostei de garotões – ou se, simplesmente, não rola.
Minha grande amiga e quase irmã, Giovanna Villazza, diz que
eu devo experimentar um garotão um dia, porque, segundo ela, irei
pagar minha língua e acabar me casando com um. Não os evito de
propósito, apenas não há atração...
Suspiro ao pensar em Giovanna e no tempo em que não a
vejo. Nós duas moramos na mesma cidade e somos praticamente
vizinhas, mas a encontro menos do que quando ela morava em
Roma ou Milão. Aquela garota sofreu uma transformação medonha
de patricinha a workaholic.
Abro um e-mail do meu pai e, quando leio a notícia, sinto-me
no chão. Frank irá se mudar para São Paulo! Os dois irmãos
decidiram levar a sede da empresa, que fica em Curitiba, para a
capital paulista, e nosso escritório de arquitetura é quem irá fazer os
projetos de reforma do atual Villazza São Paulo, para abrir a sede
da Rede e a residência dos Villazzas, e de construção do novo
Convention SP. Fui escolhida para fazer o projeto de reforma, ou
seja, sou eu quem irá projetar a nova casa de Frank e Isabella.
Começo a rir como louca, pensando que seria cômico se não
fosse trágico. Por mais que eu tente esquecer aquele homem, por
mais que queira ficar longe dele, sempre há algo que me leva para
perto. Oh, destino cruel!
Levanto-me, puta com a situação e decidida a tomar um
porre. Abro a geladeira da Pietra, mas não encontro nada, pois ela,
assim como Gio Villazza, segue uma dieta infernal, e nem álcool
tem neste lugar.
Decido então sair. Olho por cima dos móveis da sala e não
vejo nenhum dos tais convites que Pietra deixou para que eu
escolhesse. Penso se a louca não se esqueceu de realizar a tarefa.
Abro a gaveta do aparador e encontro, lá dentro, um convite negro e
vermelho de alta qualidade. Dentro do envelope há também um
cartão negro junto a um convite com o nome de um clube escrito em
letras vermelhas e a indicação do traje: black tie.
Não é o evento ao qual pensei em ir, mas, pelo menos, irei
encontrar gente da minha idade. Sem pensar duas vezes, confirmo
a data e o horário certos do evento.
Invado o quarto da minha prima e escolho um vestido preto,
longo e de mangas compridas com um enorme decote no busto e
uma fenda na perna esquerda.
Pego o secador de cabelos, seco meus fios o mais rápido
que posso e logo após enrolo-os com um babyliss. Faço uma
maquiagem pesada, batom vermelho, pálpebras esfumadas com
sombra negra e azul-marinho, muita máscara de cílios.
Normalmente não me visto ou me maquio assim, mas a
intenção é sair esta noite e me divertir, esquecer quem sou,
esquecer-me da mulher digna de pena que me tornei.
Pego uma clutch preta toda bordada com pedras, calço
scarpins pretos e chamo um táxi. Confirmo o local da festa mais
uma vez e enfio o pequeno cartão na bolsa antes de sair.
— Puta que... — Refreio o xingamento antes que ele saia,
apavorada com a roubada em que me meti.
Assim que cheguei ao clube, um local todo escuro com um
enorme segurança na porta, achei estranho, pois o estabelecimento,
além de deserto, é muito afastado da grande área movimentada do
bairro. Entreguei o cartão àquele leão de chácara, e, antes de
entrar, ele me levou até o “credenciamento”. Tive vontade de voltar
assim que vi o local, mas o homem continuava com o cartão de
Pietra na mão.
Uma mulher com cara de poucos amigos me revistou inteira
e, depois, ainda passou um detector de metais em mim. Mas que
porra era aquela?! E quando, por fim, uma das moças me atendeu,
solicitou meu celular. Gelei e, claro, neguei-me a entregar meu
aparelho. Ela sorriu e explicou que não era permitida a entrada de
aparelhos eletrônicos no local e que somente com o meu cartão de
acesso e consumo – que ela balançou à minha frente – era possível
pegar o telefone de volta.
A curiosidade foi tão forte que a deixei confiscar meu celular.
Logo após isso, ela me entregou uma máscara veneziana preta com
detalhes em pena de pavão, linda, por sinal, e me instruiu a colocá-
la.
— É proibido retirar o objeto lá dentro — informou-me em
inglês. — A não ser em uma das áreas privadas. Bom divertimento!
Outro segurança grandalhão abriu outra porta, e pude ouvir o
som alto lá dentro.
Agora estou aqui, paralisada e boquiaberta, no meio de
centenas de pessoas – homens e mulheres – usando máscaras,
num ambiente recriando o Carnaval de Veneza, inclusive as
músicas, sem conhecer ninguém e sem saber como agir.
Caminho até o bar e me sento no único banco livre.
— O que vai beber? — o barman, fantasiado de Arlequim,
pergunta-me.
— Vinho...
— Não, não... — Escuto a voz de um homem ao meu lado. —
Não combina com você, pelo menos, não esta noite! — Eu o encaro.
Olhos escuros me fitam por detrás de uma máscara ao estilo
Fantasma da Ópera, porém, preta. — Champanhe rosè, Arlecchino.
Levanto minhas sobrancelhas, pronta para protestar por seu
atrevimento em se meter em minha escolha, mas então ele sorri
para mim, e seguro o fôlego. O homem ao meu lado tem um sorriso
charmoso demais! Dentes brancos, retos e perfeitos em contraste
com sua pele morena. Os olhos escuros não deixam os meus, nem
mesmo quando passo a avaliar seu corpo muito bem vestido num
smoking preto.
— Aprovado? — indaga em tom de deboche.
Ah, Mel, foda-se! Ninguém sabe quem eu sou neste lugar,
além disso, a máscara cria uma barreira muito maior nos meus
próprios princípios do que em meu rosto, então...
— Aprovadíssimo! — E lhe devolvo o sorriso.
O barman volta com uma pequena garrafa do espumante em
um balde de gelo e duas taças, mas meu vizinho de balcão recusa a
sua própria, mostrando um drinque em sua mão.
— Dry Martini? — Levanto uma sobrancelha e rio,
lembrando-me do meu crush cinematográfico: James Bond. Com
certeza o 007 frequentaria uma festa como esta, num clube como
este, vestido num smoking e tomando seu drinque favorito: Dry
Martini batido, não mexido!
Ele dá de ombros e remexe sua taça, fazendo a tira de casca
de limão siciliano ao fundo dançar no líquido translúcido.
Tomo um gole do espumante francês e reviro os olhos de
prazer, com um pequeno gemido de satisfação. Eu estava mesmo
querendo algo assim!
— Obrigada pela dica! — agradeço, levantando a taça para
ele em um brinde.
— Disponha! — Dedica-me de novo um sorriso lindo. —
Estou aqui imaginando o que mais arrancaria esses gemidos além
desse líquido rosa e borbulhante?
Rio da provocação, imaginando muitas formas com as quais
ele conseguiria mais dos meus gemidos. Levanto-me e pego o
cartão de consumo a fim de pagar o drinque, mas ele põe sua mão
sobre a minha, fazendo-me arrepiar com o contato de sua pele
quente e macia.
— Sugestão minha, meu prazer em pagar.
Encaro-o pronta para recusar, mas seus olhos brilham de um
jeito tão hipnotizante que não consigo falar nada. O filho da mãe tem
um magnetismo inacreditável!
— Não é necessário...
— Meu prazer — ele ressalta. — Tenho certeza de que a
senhorita não tem necessidade de que lhe paguem um drinque, mas
faço questão. — Sorri e entrega seu próprio cartão ao garçom. —
Eu sou...
Coloco um dedo sobre essa boca carnuda e sensual,
impedindo-o de falar.
— Sem rosto, sem nome...
Ele parece avaliar o que digo, mas concorda em seguida.
Eu já poderia ter tirado o dedo de cima de sua boca, porém,
não consigo fazer tal ação, pois sinto a ponta de uma língua quente
e molhada lambendo-o devagar, com movimentos circulares.
Imediatamente meu corpo desperta e um desejo poderoso
toma conta de mim. Não sei quem é esse homem, não consigo ver
muito do seu rosto, mas sinto emanar dele tanta coisa! Sedução,
desejo, mistério e, acima de tudo, prazer. Não senti mais atração por
ninguém desde aquela fatídica noite em Lima, com Frank, mas com
ele, neste momento, posso dizer que a mulher dentro de mim voltou
a viver.
— É o que você quer? — Ele me tira dos meus pensamentos
com esse questionamento.
— Não é o que todos querem aqui esta noite? — Olho em
volta.
Ele ri.
— Não posso dizer pelos outros, apenas por mim. —
Levanta-se, e me surpreendo com seu tamanho e seu porte. Não
sou uma mulher baixa, tenho mais de 1,70 m de altura, mas ele é
imensamente alto, além de parecer bem forte também. — Eu estava
decidido a sair daqui, até que você chegou. — Meu coração dá
pequenos saltos. — Agora eu quero você.
Ergo as sobrancelhas com a sua objetividade. Uau!
— Você é do tipo eu quero, eu consigo? — provoco.
Ele ri, uma risada gostosa e rouca.
— Não! — Cruza os braços. — Sou mais do tipo eu quero, eu
corro atrás para ter. — Sorrio, acreditando em cada palavra dele,
pois me passa essa impressão, a de ser persistente e de correr
atrás do que quer. — Aceito sua condição: sem rosto, sem nome. —
Aproxima-se de mim, passando sua mão pela minha cintura e me
puxando contra seu corpo. — Mas você terá que aceitar a minha...
— sussurra em meu ouvido.
Sei que devo deixar claro para ele que não vim até aqui para
fazer sexo com o primeiro estranho que aparecer, mas, quer saber?
Estou curiosa.
— Qual é sua condição?
— Que seja minha a noite toda para tudo o que eu quiser
fazer com você.
Estremeço em seus braços, um tanto apavorada, confesso.
— Hum... — Finjo pensar. — Não vejo muita vantagem nessa
troca de condições...
Ele sorri sexy de novo.
— Ah, mas tem... — Suas mãos começam a acariciar minhas
costas. — Pode acreditar que tem, Misteriosa! — Ele encosta sua
boca em minha orelha, fazendo-me arrepiar. — Será muito mais
prazeroso do que um rosè borbulhante.
Ah, não tenho dúvidas! Ainda assim, afasto-me dele.
— É tentador, Mascarado. — Ele gargalha, e o acho ainda
mais sensual. — Mas só tenho sua palavra sobre isso e...
Sua boca avança sobre a minha, impetuosa. Chego a me
curvar para trás, perdendo o equilíbrio, porém, ele me mantém firme
com uma de suas mãos. O beijo é quente, sensual, com o sabor do
drinque e me mostra a dimensão do desejo que ele está sentindo.
Não resisto e lhe devolvo a carícia, agarrando-me a ele,
segurando em seus cabelos, roçando minha língua na sua, cheia de
tesão. Meu sexo já está molhado e pulsante, minha pele queima
pela dele, e seus beijos somente aumentam a promessa de uma
noite inesquecível.
Ele se afasta e me olha, enquanto tento retomar o fôlego e a
sanidade.
— Tenha uma boa noite!
Arregalo os olhos ao vê-lo se afastar e me deixar aqui,
sozinha e enlouquecendo de desejo. Desgraçado!
Ele para a fim de cumprimentar algumas pessoas e me
relança um olhar questionador, com sua sobrancelha negra
sobressaindo-se por cima da máscara.
— Merda! — exclamo, tentando decidir o que fazer. Eu não ia
sair na noite de hoje, ia ficar em casa, trabalhar um pouco e depois
dormir. Só saí por causa do e-mail...
Todas as lembranças sobre Frank, Isabella e Lima voltam à
minha mente, machucando meu coração mais uma vez. Chega!
Chega de ser tão indecisa, de ver as oportunidades passarem
passivamente. Estou aqui para me deixar ir, para esquecer, pelo
menos por umas horas, que não sou a mulher que ele quis, que ele
amou. Encaro o estranho e sussurro:
— Aceito.
O Mascarado, pelo visto, consegue ler os meus lábios, pois
sorri e depois me faz um sinal para esperar, desaparecendo de
minha vista.
Melissa, isso é loucura! Meu cérebro tenta me convencer a ir
embora, mas estou tão cansada de ser a mulher certinha e doce da
família, tão cansada de só fazer aquilo que acho sensato.
Droga! Frank ficou anos por aí, tendo suas noites de sexo
sem sentido; por que não posso fazer o mesmo?! Porque sou
mulher? Uma ova! Sou dona do meu corpo, dos meus desejos, não
devo nada a ninguém! Repasso somente algumas instruções a mim
mesma: não revelar quem sou; não tirar a máscara; não sair do
clube; usar camisinha...
Meu sexo se aperta só ao pensar na camisinha... Estou há
muito tempo na seca, pelo amor de Deus!
De repente sou surpreendida com um abraço por trás. Os
braços dele me envolvem, e ele fala baixinho em meu ouvido:
— Tudo pronto! Tem certeza?
— Sim! — respondo sem pensar, sentindo a dureza de sua
ereção em minhas costas.
Ele me gira, deposita um beijo em minha boca e em seguida
estende sua mão para que eu a pegue. Olha meu anel de formatura
com sua enorme safira azul, que nunca tiro do dedo, e deposita um
beijo no dorso da minha mão.
Seguimos juntos por um corredor até chegarmos a um
elevador.
— Para onde vamos? — inquiro curiosa e nervosa.
— Isso aqui não parece, mas faz parte de um hotel. — Olho
em volta, mas não vejo nenhuma logomarca. — Vamos até a área
privada. — Dá-me uma piscadinha safada.
Caramba! Eu vou fazer mesmo isso?! Transar com um
estranho, sem saber seu nome ou como é seu rosto? A Melissa
sedutora dentro de mim está sentada de pernas cruzadas ao estilo
Sharon Stone, balançando a cabeça afirmativamente, sorrindo como
uma ninfomaníaca, mas a sensata, a que fala mais alto dentro de
mim, só me manda sair correndo.
Ele parece perceber minha hesitação e, sem nenhum aviso,
puxa-me para seus braços novamente, segurando minha cabeça
enquanto seus lábios devoram os meus. Deus, o homem é uma
máquina de beijar!
Nem sei dizer como entramos no elevador, pois só me dou
conta de onde estou quando ele me gira de costas e eu me encaro
no espelho antes de fechar os olhos novamente, sentindo as mãos
dele explorando minha pele por baixo da saia do vestido conforme
ele me tortura com beijos molhados no pescoço.
— Hum... — gemo quando seus dedos encontram meu sexo
protegido parcamente por uma minúscula calcinha de seda. Ele ri
contra minha orelha, deixando-me louca com o som de sua
respiração logo após.
— É uma pena não poder te comer aqui e agora... — Solto
um gemido lamentoso, querendo, sim, que ele o faça. O Mascarado
ri. — As portas já abriram...
Respiro fundo, obrigando-me a frear um pouco o tesão que
sinto e me recompondo.
O elevador está parado, e vejo o corredor de um hotel, como
ele falou. Sinto uma pontinha de decepção ao perceber que ele está
acostumado a isto tudo, a este clube e aos quartos privados, mas
logo disperso este pensamento incômodo, pois estou aqui apenas
para ter uma noite de prazer e nada mais.
Seguimos em silêncio, e ele abre uma das portas.
Diferentemente do que imaginei, a suíte é padrão cinco estrelas!
Olho tudo com atenção, analisando os padrões da construção, um
vício da profissão que não consigo deixar de ter.
Então escuto a porta ser fechada e em seguida sinto as mãos
dele nas minhas costas, procurando o fecho do vestido.
— Minha por toda a noite... — Beija minha nuca e abre o
fecho até a altura da minha bunda. Fecho os olhos ao sentir os
carinhos que seus dedos fazem em minha coluna, fazendo minha
pele arrepiar inteira.
— Para fazer o que você quiser — completo entre gemidos.
— O que você quer?
— Quero mais gemidos como aquele que o champanhe
recebeu. — Lambe minha orelha, e eu gemo, ouvindo sua
respiração ficar mais ruidosa. — Quero sentir o sabor dele em seu
corpo...
Alguém bate à porta, e ele se separa de mim, aparecendo em
seguida no meu campo de visão com um balde de gelo e um
champanhe nas mãos.
Termino de tirar o vestido, ficando apenas com minha lingerie
de seda sobre a pele. Quando percebe o que fiz, ele para de abrir a
garrafa, passando os olhos pelo meu corpo devagar, memorizando
cada curva.
— Eu sabia que vocês combinavam bem... — Mostra-me o
champanhe em uma taça e caminha até onde estou. — Refinadas,
borbulhantes, transparentes e... — desliza a alça do meu sutiã,
abaixando o bojo, deixando meu mamilo de fora — rosadas.
Ele derrama o líquido da taça sobre meu seio descoberto.
Sorri, safado, antes de abocanhá-lo, lambendo o líquido borbulhante
sobre minha pele, chupando meu mamilo com força.
— Combinação perfeita! — Volta até onde estava.
Estou com a respiração ofegante, sentindo minha calcinha
completamente molhada, e não por causa do líquido que escorreu
pelo meu corpo. Arrumo o sutiã antes de dizer:
— Eu estou em desvantagem aqui. — Aponto sua roupa
sobre seu corpo.
— Ah, não... — Puxa-me para si. — Primeiro vou arrancar
mais gemidos seus, depois tiro minha roupa. — Abre o fecho do
meu sutiã e o tira de vez. — Não se preocupe, temos a noite toda
pela frente!
O Mascarado toca meu corpo com reverência, sentindo a
textura de minha pele, aquecendo-a com o calor de suas mãos.
Nossos olhos estão fixos um no outro, e consigo sentir sua
respiração quente em meu rosto.
Ele arranha minha pele com sua barba, arrastando-a pelo
meu pescoço, cheirando meu perfume no percurso e, quando chega
ao meu ombro, dá uma pequena mordida nele.
— Vire de costas — ouço-o pedir baixinho e concedo.
Ele se afasta de mim, e, quando volta, sinto-o prendendo
meus cabelos no alto da cabeça com algo, uma caneta ou um palito.
Assim que sinto sua língua deslizar pela minha nuca exposta,
fecho os olhos, entregando-me à sensação que faz com que meu
corpo inteiro se arrepie e o tesão aumente consideravelmente.
As suas mãos estão em meus seios, massageando-os,
beliscando meus mamilos, enquanto ele não para de depositar
beijos sobre minhas costas.
— Deliciosa! — ouço-o dizer.
Ele começa a descer pela minha coluna, arrastando seus
lábios e passando sua língua em alguns pontos. Suas mãos, na
parte da frente do meu corpo, acompanham-no, e, enquanto seus
beijos molham a base da minha coluna, uma delas invade minha
calcinha, indo direto ao centro do meu prazer.
— Sim...! — imploro, um tanto chateada por não ter um nome
para chamar, mas minhas regras foram claras, e vou continuar
mantendo-as.
Os dedos dele brincam com meu clitóris rápida e
intensamente, buscando lubrificação dentro de mim e voltando a
repetir os movimentos. Já estou enlouquecida por ele, por sua boca
e suas mãos, deliciando-me com seu toque.
Nem percebi que ele baixou minha última peça; somente
quando sinto sua língua quente deslizando entre minhas nádegas é
que me dou conta de que a calcinha já está embolada aos meus
pés.
As minhas sensações são incríveis, e isso me surpreende,
pois sou uma mulher vivida, já tive alguns relacionamentos com
homens experientes, mas nada comparado ao que ele me faz sentir.
É uma mistura de tesão, loucura, medo e, principalmente,
curiosidade. O fato de não sabermos a identidade um do outro faz
com que esse encontro seja como uma aventura, algo fora do
comum, e é isso que faz com que tudo seja mais pungente.
— Vem comigo! — Ele se levanta e estende a mão para mim.
Caminho com ele até a cama.
— Estava delicioso — revelo e recebo um beijo por isso.
— Ainda nem começamos...
Ele me faz deitar de costas na beirada da cama e, em
seguida, ajoelha-se entre minhas pernas. Confesso que isso me
deixa um tanto constrangida, mas, quando lembro que ele não sabe
quem eu sou, fecho os olhos, esperando o que pretende fazer.
Minhas pernas são abertas ao máximo, e escuto-o respirar
fundo e gemer. Alguns momentos se passam sem que eu sinta
nada. Então um líquido gelado e borbulhante se encontra com o
quente que molha meu sexo.
Rio ao sentir o champanhe molhando tudo, mas paro assim
que ele começa a bebê-lo em mim. O que é isso?!
A sensação da língua quente lambendo o líquido gelado
sobre meu corpo é indescritível, fazendo-me sentir ainda mais
intensamente todos os movimentos que ele, muito experiente no
assunto, faz para me enlouquecer.
— Isso está... — começo a falar, mas não consigo continuar.
Em minha mente só se passam frases dignas de algum escritor de
pornô, e me sinto ainda muito travada para dizê-las. Meu cérebro
está cheio de: “chupa mais forte”, “quero gozar na sua boca”, “me
fode”... Oh, meu Pai...
As carícias param, e abro os olhos, pronta para protestar,
mas o encontro cara a cara comigo. Ele lambe os lábios e em
seguida me beija, e sinto o gosto do champanhe misturado ao meu
próprio prazer.
— Eu disse que você era perfeita para essa bebida! — Vira
um pouco mais da taça sobre meu corpo, e o champanhe se
acumula em meu umbigo. O descarado sorri como o próprio
demônio, safado e cheio de malícia, antes de começar a sugar o
líquido.
— Hum, isso não é justo, sabe? — comento, contorcendo-me
sob ele. — Só você está bebendo...
Ele gargalha.
— Quer experimentar?
Faço que sim.
O homem se põe de pé à minha frente e, sem tirar seus olhos
dos meus, começa a retirar o smoking. À medida que cada peça é
retirada, eu me levanto mais na cama, admirando sua pele morena
e seus músculos muito bem trabalhados.
Uma camada de pelos negros e bem aparados cobre seu
peitoral e desce em linha reta até desaparecer debaixo de sua
cueca preta. Ele começa a tirar a peça, mas tenho outra ideia sobre
isso.
— Não! — impeço-o, sentando-me na beirada da cama. — É
minha vez de sentir se o gosto de sua pele combina com a bebida.
Passo minhas mãos pelo seu abdômen duro, sentindo os
pelinhos espetarem minhas palmas. A pele dele é quente e macia,
seu perfume – masculino e marcante – o deixa ainda mais
irresistível. Deslizo minha língua pelo caminho de pelos, parando no
cós da cueca.
— Gosta de viver perigosamente? — questiono, e ele franze
a testa, sem entender.
Eu me estico e alcanço o balde de gelo e, assim que ele
percebe minha intenção, ouço sua gargalhada ressoar pelo quarto.
— Faça o que quiser comigo...
Fecha os olhos ainda com um sorriso.
Abaixo a cueca de uma só vez e não me decepciono ao ver
seu pau tenso e duro brilhando com sua lubrificação quente.
Antes de começar a brincadeira, decido prová-lo um pouco e
abocanho seu membro de uma só vez, até o fundo da minha
garganta, antes de fazer o caminho de volta sugando-o sem parar.
Os gemidos dele são incríveis e contribuem para me deixar
ainda mais molhada e à espera. Acelero os movimentos, nunca
deixando de sugá-lo, intercalando lambidas e chupando
freneticamente como há muito não tinha vontade de fazer.
Afasto-me, e ele leva uma de suas mãos até seu pau e
começa a se masturbar, para meu deleite. O Mascarado é bruto
consigo mesmo, gosta de se tocar com força, rápido e apertado.
Enfio um cubo de gelo na boca e, em seguida, passo minha língua
gelada na cabeça do seu pau.
Ele para e geme. O safado gosta disso!
Tomo-o inteiro novamente, brincando com o cubo de gelo na
boca enquanto seu pau entra e sai.
— Eu quero te comer assim... — Aumenta a velocidade e
espreme o gelo na minha garganta. — Agora.
Olhamo-nos, e balanço a cabeça, aceitando.
Ele me pega pela cintura e me joga na cama, de quatro.
Confesso que fico um tanto temerosa, mas relaxo ao escutar a
embalagem da camisinha sendo rasgada.
Mais uma vez ele me beija, lambendo meu ânus e colocando
a língua dentro da minha vagina.
— Espero que goste...
Antes que eu pergunte do que ele fala, sinto os cubos de gelo
sendo – literalmente – enfiados dentro de mim.
Ai, meu Deus! A sensação é estranha, mas muito, muito
excitante, e o Mascarado parece se divertir com a brincadeira. Suas
mãos estão segurando meus quadris com força enquanto ele
apenas esfrega seu pênis em mim. Ele brinca fazendo círculos entre
minhas dobras, lubrificando seu pau com a camisinha e o passando
bem no meio das minhas nádegas.
Já estou completamente louca com isso, com o gelo
derretendo dentro de mim e com ele brincando. Então, sem avisar,
ele se afunda, fazendo os cubos gelados sacudirem dentro de mim,
estocando com força e sem parar.
Fecho os olhos e gemo com vontade, apenas permitindo meu
corpo ser saciado por ele, deixando-o me conduzir nessa dança
primária.
— Você é muito gostosa! — ele geme, enquanto eu me
seguro nos lençóis para manter minha posição, tamanha a força e
velocidade dele.
Sinto todo o meu corpo acordar, as sensações de prazer há
muito esquecidas tomando cada fibra, cada nervo, cada músculo.
Meu Mascarado se inclina sobre mim, suas mãos segurando-me
pela cintura e sua voz rouca e sensual gemendo e falando
bobagens.
— Continua...! — imploro quando sinto-o desacelerar os
movimentos, mas ele não me atende e sai de mim.
Novamente sua boca cobre meu sexo inundado de prazer,
quente, sem nenhum vestígio das pedras de gelo que lá estiveram.
Desabo na cama, sentindo minhas pernas trêmulas e a respiração
ofegante.
Ele me vira de frente e, com um sorriso incrível, chupa meu
clitóris com força, sempre mantendo contato visual, seus olhos cor
de chocolate e sombreados pela máscara fixos nos meus enquanto
me enlouquece com a língua.
— Eu vou gozar... — aviso-lhe com um sorriso vitorioso.
Fecho os olhos e seguro em seus cabelos, mantendo-o
naquele ponto maravilhoso de prazer. Quando o orgasmo toma meu
corpo, balanço meus quadris contra sua boca, delirante, sentindo o
corpo inteiro contraído e meu sexo pulsando, quente e molhado.
Abro os olhos e o encaro a poucos centímetros de mim.
— Melhor do que o champanhe... — O descarado lambe os
lábios e depois me beija, enfiando em minha boca a mesma língua
que me levou aos céus. Eu a sugo, sentindo o sabor do meu gozo,
adorando sua safadeza e o quanto isso me faz sentir uma mulher
poderosa. — Pronta para mais?
— Sempre! — respondo, sentindo-me fatal.
Ele ri e, sem sair de cima de mim, penetra-me novamente,
levantando minhas pernas ao máximo, depois apoiando-as em seus
ombros.
Dessa vez seu ritmo é mais lento, mas ainda assim profundo.
Ele rebola gostoso, fazendo seu pau girar dentro de mim, tocando-
me em toda as áreas possíveis. E me beija... faminto, desesperado,
delicioso.
Seguro seu lábio inferior com os dentes, pronta para gozar
mais uma vez. Recebo em troca um gemido e estocadas mais
rápidas e profundas.
Estou ensandecida de tesão. A temperatura ferve dentro do
quarto. Estamos suados, melados por causa do champanhe e do
suor, mas completamente entregues a esse momento de luxúria.
Empurro-o para longe, jogando-o de costas contra o colchão.
Há muito tempo não me sinto tão mulher, tão poderosa, e quero
cavalgar como uma verdadeira amazona sobre ele. Segura seu pau
ansioso por mim e, quando subo em cima dele, descendo devagar,
centímetro por centímetro, vejo-o fechar os olhos e morder o lábio.
Isso me deixa completamente fora de mim.
O homem demonstra todo o tesão que sente, e começo a me
mexer sobre ele. Suas mãos já estão em meus seios, provocantes.
Ele acompanha cada um dos meus movimentos. É delicioso estar
assim, no controle, ditando o ritmo, podendo observar o quanto ele
aprecia o que eu faço.
— Rebola gostoso...! — pede-me em desespero.
Gargalho, aumentando a velocidade, movendo meus quadris
sobre os seus para cima e para baixo, para um lado e para o outro.
Ondulo meu corpo e jogo meu tronco para trás, apoiando minhas
mãos em seus joelhos, completamente empalada pelo seu pênis.
— Caralho, você me mata rebolando assim no meu pau! —
Ele mal termina de dizer isso e se senta na cama, segurando firme
em meus cabelos, que já estão soltos novamente, pois o que ele
usou para prendê-los caiu durante nossa maratona.
Consigo senti-lo batendo fundo em meu interior, mas o tesão
é tão grande que não sinto nenhuma dor ou desconforto. Ele me
espreme contra si, beijando meu pescoço, sugando meus mamilos.
Sinto uma pequena descarga elétrica na base da minha
coluna antes de ser envolvida por mais um gozo fenomenal, e,
dessa vez, a julgar pelos gemidos descontrolados dele, nossos
orgasmos acontecem ao mesmo tempo.
Imediatamente após isso, ele tomba no colchão, levando-me
consigo. Escondo meu rosto na curva do seu pescoço, cansada,
tentando recuperar o fôlego e um pouco da sanidade. Deus, esse
homem me destruiu! Quem precisa de academia? Devo ter
queimado todas as calorias extras das férias! Dou uma risada, e ele
me aperta.
— É melhor eu retirar o preservativo antes que aconteça...
Saio de cima dele, assustada, querendo conferir se o látex
aguentou tantos movimentos bruscos. Fico aliviada ao ver a
camisinha intacta, cheia de esperma em seu reservatório. Uau, que
loucura!
Fico deitada enquanto ele se levanta e vai para o banheiro.
Agora, com meu corpo saciado e meu cérebro funcionando sem a
nuvem da luxúria, penso na loucura que é estar aqui com um
homem que não conheço. Giro na cama, ficando de bruços, com a
cabeça enfiada no colchão, tentando avaliar a noite.
— Hum... — escuto-o. — Que cena tentadora. — O colchão
afunda ao meu lado, e sinto suas mãos deslizando sobre minha
bunda. — Eu estou enchendo a banheira.
— Perfeito! — murmuro, virando o rosto para olhá-lo.
— Tudo bem? — Ele sorri e faz menção de tirar a máscara.
— Não! — Levanto-me como uma flecha e o impeço de fazê-
lo. — Nós combinamos, sem rostos, sem nomes!
Vejo-o enrugar a testa, mas em seguida ele dá de ombros,
sorrindo safado.
— Então vem para o banho comigo. — Estende a mão. —
Ainda temos mais algumas horas para aproveitar o mistério.
Entrelaço meus dedos nos seus e o sigo.
Acordo assustada, ouvindo o barulho alto da sirene de
alguma ambulância. Fico um tanto desorientada, mas logo depois
de ver o homem deitado ao meu lado, sorrio ao me lembrar da
loucura da noite, mas sem nenhum arrependimento.
Olho para o relógio no pulso do meu companheiro, um Rolex
de ouro do último modelo, e tomo meu segundo susto seguido: são
quase 6h da manhã! Preciso sair daqui e nem sei se a maldita boate
ainda está aberta para que eu possa recuperar meu celular.
Levanto-me sem fazer barulho, conferindo que a máscara sobre
meu rosto está torta, porém, ainda permanece ocultando minha
face. Coloco o meu vestido sem nenhuma roupa íntima por baixo,
calço meus sapatos e resgato minha bolsa.
Fito o homem adormecido na cama, admirando seu corpo
trabalhado, a cor morena de sua pele, seus cabelos negros com
alguns poucos fios grisalhos. Respiro fundo ao pensar que eu
gostaria de tê-lo conhecido em outra ocasião, mas, embora
tenhamos tido uma tórrida noite de sexo, não conversamos sobre
nada pessoal e, seguindo minhas próprias regras, não sabemos
nem mesmo o nome um do outro.
Percebo um bloco de notas e uma caneta em cima de um
móvel e vou até lá, escrevendo uma nota de despedida e
agradecimento pela noite. As lembranças da segunda e terceira vez
que fizemos sexo, inclusive no chão do quarto, invadem-me e, sem
pensar, acabo fazendo minha rubrica no papel.
Pego o bilhete para rasgá-lo, mas depois rio de minha
paranoia, afinal, minha rubrica é um simples M que ele com certeza
irá associar ao apelido pelo qual me chamou a noite toda:
Misteriosa[2].
Não tenho praticamente nenhum contato profissional aqui,
nos Estados Unidos, o que faz com que um encontro entre nós seja
uma possibilidade muito remota.
Ponho o bilhete sobre o travesseiro no qual estava deitada e
deixo o quarto.
A boate está vazia, assim como todo o prédio do hotel,
porém, as funcionárias do credenciamento ainda estão aqui, o que é
um enorme alívio. Cumprimento-as e lhes entrego o cartão e a
máscara. Nenhum consumo, além do mínimo, foi debitado em meu
cartão. Faço o pagamento da taxa e recebo meu telefone de volta,
lacrado e desligado.
— A máscara é cortesia. — Ela estende o objeto de volta. —
Deseja levá-la?
Olho para a linda máscara veneziana negra e rendada e a
pego. Um suvenir! Uma lembrança de que, por uma noite, fui uma
mulher sedutora e desejada.
Abro os olhos, um tanto perdido no tempo e no espaço, até
que me recordo de onde estou e como vim parar aqui. Respiro
fundo e noto a outra metade da cama totalmente vazia. Se não
houvesse marcas no travesseiro, poderia pensar que tive um sonho
erótico.
Passo a mão sobre a fronha branca e descubro uma folha de
papel. Não a abro; tenho receio de abrir e acabar com a sensação
perfeita da noite foda que tive, de que, ao ir embora, a Misteriosa
tenha resolvido quebrar suas próprias regras e escrito seu nome.
Suspiro.
Não é que eu não queira saber, claro que quero, mas com o
nome vem toda uma bagagem, a realidade que nos torna pessoas
reais e não dois mascarados que sentiram atração um pelo outro e
decidiram se permitir usufruir do desejo sem pensar no amanhã.
Dios mío! Rio, adorando a sensação de liberdade que isso
me deu depois de digladiar por anos com alguém dentro de um
casamento falido e insuportável.
A verdade é que minha união, há alguns anos, só existiu no
papel. Casei-me com a mulher perfeita para estar ao lado do braço
direito do segundo homem no comando do império que minha
família gere há mais de um século. Atingi as expectativas de meu
pai, dos meus amigos, dos meus irmãos. Claro que não foi um
sacrifício, estava deslumbrado, orgulhoso e queria fazer dar certo,
só que não deu.
Sento-me na cama e olho-me no espelho que fica em cima
de um móvel. Meu rosto moreno, com traços que não escondem
minha genética latina, está amassado, meus cabelos grossos e
escuros estão despenteados. Sinto uma pontada no coração.
Aquele mesmo sentimento que me acompanhou por toda minha
existência parece querer tomar conta de mim e acabar com a
sensação boa com a qual acordei. Balanço a cabeça, pois não sou
mais um garoto há muito tempo, posso controlar isso!
Caminho até o banheiro. As lembranças da noite voltam mais
fortes, e me apego a elas. Fodi com a mulher misteriosa do jeito que
eu gosto, da maneira que me dá prazer, e isso me fez reviver e
lembrar-me do verdadeiro Adam Stone. Não só o CPO[3] da The
Gilded Stone[4] , ou TGS, como chamamos a empresa
carinhosamente, mas aquele que estava esquecido há muito tempo,
perdido entre as viagens e o trabalho exaustivo de atender e
entender os clientes da joalheria ao redor do mundo todo, aquele
que sempre tentou atingir um nível de dignidade dentro da família
que sempre achou não possuir.
A noite de ontem me trouxe mais certeza de que, mesmo
decepcionando a todos, tomei a decisão certa ao pedir o divórcio e
seguir com a minha vida sem mais nenhuma dor na consciência,
nenhuma mentira e, muito menos, nenhum rancor.
Já é hora de começar a viver minha vida segundo a minha
vontade e parar de tentar me encaixar em padrões que não
correspondem ao que eu sou.
Respiro fundo, inconformado por, mesmo depois de tantos
anos, as palavras ainda me ferirem e o sentimento de não pertencer
a lugar nenhum me consumir. Sou um homem maduro, tenho mais
de 40 anos. Contudo, por vezes me sinto o mesmo menino filho de
uma empregada com um milionário que vive tentando se provar e
provar aos outros seu valor.
Não preciso mais disso!, penso puto e entro na ducha forte e
quente do hotel.
Não foi a primeira vez que vim a esse tipo de festa, embora
tenha sido minha estreia sozinho, pois, até a noite passada, só
estive aqui acompanhando meus irmãos. Nunca usufruí da
comodidade de a festa acontecer numa área privada de um grande
hotel. Entretanto, ao ver aquela linda mulher olhando tudo como se
não soubesse como tinha ido parar ali, senti um desejo enorme de
conhecê-la.
Rio ao pensar na cantada barata sobre o champanhe e no
beijo explosivo que trocamos ainda próximos ao balcão do bar. Algo
na mulher misteriosa despertou em mim o homem que não sou há
muito tempo. Senti o delicioso gosto da caça, a excitação de
conquistar alguém que não sabia nem mesmo meu nome, muito
menos de que família eu vinha. Deixei que a química que pairava
entre nós comandasse a noite, e, se ela estivesse sentindo o
mesmo que eu, iríamos passá-la juntos.
— E foi foda! — Respiro fundo, lamentando não ter nenhuma
pista que possa me levar a revê-la. — Foi melhor assim, Adam
Stone.
Saio do banheiro nu, e a primeira coisa que me chama a
atenção é a folha – provavelmente do bloco de notas que o hotel
fornece – dobrada em cima do travesseiro onde ela esteve
dormindo. Caminho até ela e finalmente a abro para ler o que minha
companheira escreveu.
Sua caligrafia é perfeita, palavras desenhadas em letra de
forma parecendo milimetricamente medidas de tão simétricas e
uniformes em tamanho que são. A nota traz menos informações do
que eu esperava – ou gostaria. Todavia, o “M” assinado no final me
faz erguer a sobrancelha.
Sei que a chamei de “misteriosa”, porém, meu instinto de
julgar as pessoas – desenvolvido ao longo dos anos por causa do
meu trabalho – diz que a letra não está ali meramente por causa do
apelido. Sorrio ao constatar que, quem quer que seja a deliciosa
mulher com quem trepei a noite inteira, ela possui um humor
perverso de revelar parte de sua identidade sem que eu possa
desconfiar.
Coloco a nota no bolso do paletó em cima da cadeira do
quarto e tomo a decisão de aceitar o desafio proposto.
Eu vou encontrá-la!

— Adam, meu querido, você está tão magrinho!


Balanço a cabeça ao ouvir tia Beatrice tocando pela
milionésima vez no mesmo assunto.
— Tia, estou no meu peso ideal. — Beijo sua testa. — Nem
magro nem gordo, saudável.
Sento-me ao seu lado à mesa do desjejum, não achando
nada incomum que mais ninguém esteja presente. Os Stones não
são reconhecidos por fazer as refeições juntos.
Provavelmente meu pai já está no escritório, e a cafeteira no
aparador perto de sua mesa está abastecida com café colombiano,
como gosta. Já meu irmão mais velho deve estar na sede da
empresa, deixando loucos cada um dos 15 diretores, que, por sua
vez, estão aterrorizando os mais de 150 gerentes que temos.
Quanto aos meus irmãos caçulas, acho difícil que tenham visto a luz
do dia, pois um deles chegou às 4h da manhã – ouvi barulho de seu
Porsche estacionando na garagem –, e o outro está a trabalho no
Japão, e lá, claro, é noite.
Então o que resta a mim é a companhia simpática de tia
Beatrice e sua tagarelice sobre como nossa família é disfuncional e
viciada em trabalho.
— ...menos John, infelizmente! — ela continua a falar, e,
mesmo que eu não tenha ouvido uma só palavra, percebo que
acertei o tema. — Aquele menino tem tanto talento, mas tem uma
péssima inclinação ao ócio.
Rio.
— Ao menos um Stone não pode ser considerado workaholic.
Não é essa sua queixa recorrente?
— Não! Trabalhar muito é algo que já vem impresso no
sangue de um Stone. O que me aflige é que, mesmo trabalhando
muito, papai sempre teve tempo para a família, e não tenho visto
isso acontecer com esta geração nova. — Ela suspira longamente.
— São um bando de pedras ocas!
— Papai sempre foi muito presente...
— Claro! Ele os levava para a empresa desde que usavam
fraldas! — De repente o olhar dela suaviza um pouco. — Quer dizer,
você foi depois, mas...
— Sim, não fui quando bebê, mas ainda era novo quando
comecei a andar pelas lojas da TGS. — Tento não parecer
incomodado com essa época da minha vida. — Desde então papai
esteve muito presente em minha vida.
— Sim, mas creio que ele lhes ensinou bem sobre o ofício, a
responsabilidade com a marca centenária e tradicional que temos e
a importância da tradição familiar com as joias, mas e quanto ao
amor? — Fico tenso ao perceber que ela vai por esse caminho. —
Você foi o único a se casar, porém, passou mais tempo separado de
sua mulher do que junto dela, até finalmente decidirem se divorciar
legalmente. Seus irmãos parecem que não querem constituir
família...
— Para quê? — Faço a pergunta antes mesmo que consiga
bani-la da minha boca e me arrependo no mesmo instante. — Tia,
vamos tomar nosso...
— Não é possível que vocês acreditem mesmo nisso!
Hillary...
— Hillary e eu não somos parâmetro, nosso casamento foi
um acordo de conveniência, não havia amor. — Levanto-me da
mesa.
Ela arregala os olhos.
— Mas vocês, no começo, não se desgrudavam!
Rio, sentindo-me um pouco malvado por trazê-la à realidade.
— Sexo, tia. — Pisco para ela. — A gente era bom nisso,
mas enjoamos até das coisas que fazemos bem quando não se tem
paixão.
Ela põe a mão sobre o peito, e seu rosto claro fica
imediatamente rubro.
— Bom dia!
Despeço-me dela e subo para o meu quarto na mansão
enorme e antiquada que minha família possui desde sempre em
Beverly Hills. A Califórnia tem sido o lar dos Stones desde que
Joshua Stone veio para cá juntamente aos seus pais em busca de
riqueza durante a corrida do ouro em 1849.
Há mais de 170 anos esta terra tem sido testemunha dos
triunfos e dissabores dos Stones, e, reza a lenda, cobrado com juros
toda a riqueza com que nos presenteou.
Arrumo-me para ir até a empresa, mas, antes de conseguir
sair de casa, meu pai aparece um tanto desgrenhado, vindo de seu
escritório, onde pensa dominar o mundo.
— Adam, hijo, preciso ter uma palavrinha contigo.
Assinto e o acompanho até seu reino de papéis e números.
— Estou indo para a...
— Eu sei, mas antes gostaria de discutir algo. — Ele se
senta. — Jeremy aprontou mais uma em Tóquio, e recebi uma
mensagem um tanto quanto preocupante de um parceiro de lá. —
Ele me mostra a tela do celular, e xingo ao ler o que um importante
empresário, principal acionista da maior rede de shoppings – onde
temos a nossa loja mais rentável da Ásia – escreveu. — Já mandei
que ele volte e quero que você vá para lá.
Arregalo os olhos.
— Pai, eu não sou ouvires...
— É óbvio que não é, temos um ourives competente lá, seu
irmão só estava supervisionando. — Joshua Stone II dá de ombros.
— Precisamos de alguém que saiba fazer política e reestabeleça a
paz, além de impulsionar o negócio por lá.
Franzo a testa.
— Aaron está de acordo?
— Seu irmão está muito ocupado com a campanha ao
Senado, estou reassumindo a direção da TGS — declara como se
fosse algo sem importância, e arregalo os olhos. — Ainda não é
formal, precisamos passar pelo conselho, mas já está tudo acertado,
portanto posso contar contigo em mais essa?
Respiro fundo, pois, da última vez que ele precisou de mim
para estabelecer algum lugar novo, fiquei três anos na Itália.
— Sempre!
Ele sorri, fazendo com que as rugas em volta de seus olhos
se acentuem e seus olhos azuis fiquem praticamente indefiníveis,
apertados pelas pálpebras já um tanto flácidas.
— Mi chico precioso!
Freio o suspiro ao ouvi-lo me chamar assim, pois era como
minha abuela[5] me chamava. Forço um sorriso e me despeço,
dividido entre ir ao Japão, cobrir Jeremy na porrada por ter trepado
com as duas filhas do dono do shopping ou pegar Aaron pelo
colarinho e cuspir na cara dele que temos uma aliança e que eu não
deveria ser pego de surpresa sobre os rumos da empresa, afinal de
contas, sempre fui seu braço direito.
Ou talvez eu tenha superestimado minha posição! A dor do
pensamento me faz lembrar-me de quando cheguei a esta casa,
mais de 30 anos atrás.
— Mas ele é filho da empregada! — ouvi ser dito.
— Sim, mas também é meu filho — a voz grave e um tanto
embargada respondeu. — Eu a engravidei e a condenei à morte...
Porra, Adam, esquece isso! Soco a porta do carro assim que
a fecho e dou a partida no veículo, saindo da garagem cantando os
pneus, já agradecido por passar um período em outro país,
esperando ficar bem longe dos meus fantasmas.
As mãos quentes e fortes deslizam sobre meu corpo, e eu
fico observando o belo contraste da pele morena por cima da minha,
tão pálida perto dele. Sinto sua respiração no ouvido, o que faz com
que os pelos em meu corpo se ericem por completo. Seus lábios
macios e molhados se colam na minha nuca. Estremeço, e ele me
aperta ainda mais em seus braços.
— Melissa... — Seu gemido rouco potencializa o efeito do
corpo dele no meu. — Eu quero você! Eu preciso...
— ...da planilha de custos para a obra dos Albuquerque
Souto.
Abro os olhos assustada e encaro a arquiteta júnior que
trabalha comigo.
— Que susto, Tânia! — Coloco a mão sobre o peito e me
ajeito na cadeira.
— Estava cochilando, Melissa Boldani? — Ela abre um
sorriso enorme e se senta na cadeira em minha frente. — A noite foi
boa assim?
Suspiro e nego.
— Passei a noite ajustando o projeto do haras do Nick. —
Passo a mão nos cabelos. — Não saio de casa à noite há meses!
— Ah, mas têm certas coisas que não precisam ser feitas
necessariamente à noite. — Ela pisca.
Rio.
— Essas coisas não estão sendo feitas por mim nem de noite
nem de dia. — Abro o arquivo da planilha que ela me pediu quando
entrou e quase me matou do coração. — Há meses não tenho um
encontro. — Dou de ombros. — E o último nem foi um “encontro”, foi
mais uma trombada que me deixou completamente sem ação.
— O cara de Nova Iorque? — Assinto, e ela morde a tampa
da caneta, como sempre faz quando está pensando. — Não temos
mesmo como saber quem era ele?
Balanço a cabeça negando, pois tentei de tudo para
encontrá-lo, inclusive implorar no tal clube, através da Pietra, que
conhecia todos por lá, pela identidade. No entanto, todas as minhas
investidas foram infrutíferas.
Cheguei até mesmo a pesquisar no Google homens
americanos morenos e sensuais, mas nem assim o encontrei, só um
monte de modelos que não chegavam aos seus pés em
magnetismo e mistério.
— Às vezes acho que foi um sonho — digo e transfiro o
arquivo para a pasta que compartilhamos. — Mas, se eu tivesse
apenas fantasiado, não teria ficado com as marcas no corpo. —
Meu rosto queima ao lembrar-me dos pequenos arroxeados nos
seios e no interior das coxas.
— A coisa toda foi selvagem! — Tânia ri e suspira. — Queria
eu que Bruno fosse tão enérgico assim, mas ele diz que não
consegue ser bruto com uma mulher nem mesmo na cama.
— Tânia, ele é um amor, e vocês são lindos juntos.
A assistente virtual da minha sala notifica uma reunião, e
Tânia prontamente se põe de pé.
— Acho que vai ser definida hoje a questão dos projetos dos
Villazzas — ela me informa, pois, como transita por todos os
departamentos do escritório, fica mais a par das coisas do que eu.
— Fiquei sabendo que a Karamanlis conseguiu uma área
maravilhosa para o novo hotel.
Assinto, pois Alexios Karamanlis, engenheiro e um dos
herdeiros da empresa, já me contou.
— Pelo que eu sei, a K-Eng é quem vai fazer o projeto da
construção do hotel e depois vai abrir licitação para a execução da
obra. A gente deve ficar com a parte interna e fachada, ou seja, a
parte não estrutural dos projetos. — Levanto-me. — Vamos ver!
Caminho com Tânia até a sala de reuniões e vejo Carlos
conversando com meu pai e Frank Villazza. Meu coração dispara,
não tenho como impedir, ao ver o italiano, e ele, assim que me olha,
abre seu sorriso de lado tão lindo e sedutor.
Merda, Mel, supera!, ralho comigo mesma, sentindo-me mal
por ainda reagir a ele desta forma. Frank está casado, feliz,
realizado, e eu adoro Isabella e as crianças, o que me deixa ainda
mais culpada por ainda me sentir atraída.
— Ninguém possui botão de ligar e desligar sentimento,
Melissa!
As palavras da minha terapeuta me confortam um pouco,
mas eu sei que é através da minha força de vontade que vou
superar estes sentimentos tão impróprios, mesmo porque Frank
nunca correspondeu a eles, e mereço alguém que me ame tão
quanto o amarei.
— Mel! — Frank me cumprimenta. — Isabella e as crianças
mandaram beijos. — Ele beija meu rosto. — Como está? Soube que
passou férias com meus pais na Itália.
— Sim, os tios foram maravilhosos me hospedando. — Sorrio
sem jeito. — Já têm uns meses que estou de volta, Frank.
Ele ergue as sobrancelhas, percebendo que estamos há
muito tempo sem contato um com o outro, algo que tenho feito de
propósito. O clima fica um tanto pesado, porém, muda quando Tony
Villazza aparece.
— Mel, que saudade! — O irmão do meio de Frank e
Giovanna me abraça. — Como tem estado?
— Muito bem, obrigada! Já voltou da lua de mel com esse
trabalhão na mão. — Rio. — Marina deve ter ficado louca com essa
história de você ficar aqui em São Paulo para acompanhar os
projetos.
E eu muito agradecida por não ser Frank!
— Ah, ficou, ainda mais agora. — Ele cochicha a novidade
em meus ouvidos, e arregalo os olhos.
— Ah, Tony, que notícia maravilhosa! Parabéns! — Abraço-o
com muito carinho, pois crescemos juntos, e eu sei o sofrimento que
ele passou. — Marina te enrolou muito para casar, mas nisso vocês
foram bem rápidos.
Ele dá de ombros.
— Ela me deu o golpe. — O sorriso bobo já dá a entender
que ele está muito feliz por ter caído. — Perguntou o que eu achava,
mas já estava com tudo planejado.
— Os tios vão ficar loucos quando souberem!
— Ainda não contamos, estamos pensando em ir até lá
pessoalmente, mas, para isso, vamos esperar mais umas semanas.
— Pisca. — Conto contigo para guardar esse segredo deles.
— Pode deixar!
Entramos na sala de reuniões, e eu conheço não só a área
maravilhosa que a Karamanlis conseguiu, em um local nobre da
cidade de São Paulo, como as ideias de Frank para o antigo hotel
Villazza aqui, da capital paulista.
— Na cobertura, Isabella e eu pretendemos construir nosso
lar e...
— Vocês vão morar em São Paulo? — Interrompo-o.
— Sim. — Ele sorri. — Tony também virá com Marina, por
isso queremos transformar o antigo hotel em um prédio de
apartamentos para a família.
Tony pega minha mão.
— Você agora vai poder ficar mais próxima da sua irmã e dos
seus sobrinhos.
Forço um sorriso.
Que Deus me ajude!
O final de semana chega, e com ele algum tempo livre para
que eu possa fazer minhas coisas pessoais, já que passo a semana
inteira por conta do escritório e dos projetos que toco por lá.
Claro que ainda há um pouco de trabalho nos meus dias
livres, pois tenho clientes exclusivamente meus, fora do escritório, e
hoje vou unir uma deliciosa caminhada a uma pequena e informal
reunião de trabalho.
— Pronto para fazermos algum exercício? — pergunto ao
meu cachorro, Tiger, um lindinho bulldog francês de pelagem tigrada
– o que lhe rendeu o nome.
Rio ao ouvir o som lamentoso do pequeno preguiçoso, que
me olha – com seus doces olhos esbugalhados – deitado em sua
casinha, e balanço sua guia, tentando animá-lo.
— Vamos, Tiger, sei muito bem que você passa a maior parte
dos dias dormindo lá na creche. Já te denunciaram, e seu
veterinário recomendou alguma caminhada, senão terá que fazer
dieta.
Ele continua me olhando com a expressão mais blasé e
descarada de um cão que está confortável em sua caminha. Perco a
paciência, vou até ele e engato a guia em sua coleira. Tiger,
resignado, coloca-se de pé, mas não sem antes abrir a boca para
um grande bocejo.
Desço do prédio onde moro e, no elevador, encontro-me com
uma vizinha que pouco vejo, mas que encontro muito em eventos.
— Bom dia, Kyra!
Ela sorri e faz festa com Tiger.
— Bom dia, Melissa. Como vai?
— Muito bem, e você?
Dá de ombros.
— Cansada! Mal saí de um evento e já estou indo para outro.
O pessoal que trabalha comigo diz que é hora de eu expandir e
contratar mais gente, e estou começando a achar que eles têm
razão. Estou com olheiras enormes!
Franzo a testa, tentando enxergar alguma marca em seu
rosto lindo, detentores dos olhos mais verdes que já vi.
— Ajuda é sempre bom, principalmente quando também vai
ajudar outras pessoas a conseguir um emprego. É seu negócio
crescendo e fazendo crescer. Se possível, contrate mulheres, é uma
oportunidade para muitas de serem donas da própria vida.
Ela assente e sorri.
— Penso exatamente assim! O mundo já é masculino
demais, então, enquanto puder viver cercada de profissionais
mulheres, eu irei.
Chegamos ao térreo e nos despedimos, cada uma seguindo
uma direção. Caminho para o Parque do Ibirapuera, onde Tiger e eu
vamos percorrer uma trilha que o circunda.
Nem bem começo a caminhada, avisto uma mulher de
cabelos tão claros que refletem os raios do sol. Aperto os olhos para
ter certeza do que vejo, pois estou há dias tentando contato com
ela, sem sucesso.
— Então está viva, não é? — Aponto acusadoramente para o
rosto de Giovanna Villazza. — Eu pensava em acionar o corpo de
bombeiros para invadir seu apartamento, pois pensei que tivesse
morrido sem ninguém saber e seu corpo já estivesse fedendo lá
dentro!
Ela reage como sempre, minimizando o fato de estar se
afastando cada vez mais de quem a ama e ainda debochando da
minha preocupação, colocando tudo na conta do seu trabalho, como
se ficasse 24 horas por dia enfurnada na agência de publicidade da
qual é sócia.
— Eu trabalho também, sabia? Muito! — Rebato o argumento
dela. — Confere quantas ligações eu fiz e quantas mensagens te
mandei! Não entendo por que você quer nos afastar...
— Mel, não, por favor! — Giovanna rola os olhos como uma
menina impertinente, e me lembro de que ela não é mais uma
garotinha, é uma mulher independente, prestes a fazer 30 anos.
— Desisto de você, Gio!
Giovanna Villazza e eu crescemos como irmãs. Nós duas
temos o segundo nome Maria, e ela é afilhada do meu pai, Julio
Boldani, melhor amigo do pai dela, tio Andreas Villazza. A Gio
chegou logo depois de meus pais terem perdido meu irmão mais
velho, Riccardo, e os Villazzas a deram a eles para que a
apadrinhassem.
Desde que peguei Gio no colo, parecendo uma bonequinha,
soube que ia amá-la para sempre, e, apesar da nossa diferença de
idade, brincamos muito juntas, dividimos segredos na adolescência,
e nosso amor pelo desenho nos uniu ainda mais.
Ela seguiu para a área do marketing, e eu, para a arquitetura,
como meu pai, mas nunca nos desgrudamos. É por isso que, de uns
anos para cá, tenho estranhado tanto o comportamento dela.
Giovanna se fechou para todos, inclusive para mim.
Caminhamos juntas, lado a lado, pela trilha. Sigo de olho em
Tiger, que parece achar toda e qualquer porcaria no chão do parque
para comer, e ela vai perdida em pensamentos.
— Soube essa semana pelo Tony que você está trabalhando
naquela loucura que é trazer a sede da Rede para cá — comenta de
repente.
Respiro fundo, pois imaginei que a reação dela ao saber que
sua família irá se mudar para cá, para perto dela, seria melhor, mas
parece que me enganei, afinal, ela acha uma loucura.
— Se você se desse ao trabalho de nos atender, já saberia
disso há muito tempo! — Não perco a oportunidade de alfinetá-la
sobre seu sumiço.
Ela emite um som que eu sei que significa que já está ficando
puta.
— O que você achou dessa loucura que o Frank está
fazendo? A Rede está em Curitiba há quase 40 anos!
Diminuo o passo e a encaro, sem saber por que ela está tão
resistente à vinda de seus irmãos para a mesma cidade em que
mora.
— Incrível você estar tão sensível a isso! Você foi a única a
não querer trabalhar na empresa com seus irmãos.
— Mel! Nós já conversamos sobre isso, e você disse que
entendia...
Assinto, concordando, pois, apesar de dar uma enorme
importância aos laços familiares e querer estar junto no negócio de
meu pai, sei que ela quis ter suas próprias asas e seguir pelo
caminho que escolhesse. No entanto, Giovanna não ficou só nisso,
então explico:
— Isso foi antes de, além de não querer contato profissional
com a sua família, você excluir a todos de sua vida. Caramba, Gio!
Nós amamos você...
— Eu sei! Só estou muito ocupada. A agência me consome
muito, e só tenho tempo para dormir!
Novamente a mesma desculpa que não me convence em
nada, pois sempre acreditei que quem quer acha tempo. Tudo é
uma questão de priorizar o que é importante, e, se ela não está
priorizando a própria família, há algo errado.
— Bem, você não é criança... — Voltamos a caminhar, e
tento mudar para um assunto mais ameno. — Por falar em criança,
Tony te contou?
— Sobre a Rede? Sim, eu te disse que foi ele...
Paro novamente, surpreendida por ela não saber.
— Não. Você ainda não sabe?! Oh, Deus, é mais
desnaturada do que eu pensava! Você vai ser titia! — Giovanna
arregala os olhos. — Sim! Marina está grávida.
A expressão no rosto de Giovanna me deixa preocupada,
pois consigo discernir claramente o assombro, o medo e,
principalmente, um pouco de mágoa. Vejo seus olhos se marejarem
e então me lembro da sofrida história de Tony e do quanto a própria
Gio sofreu também.
— Mel, eu vou embora — avisa, já dando a volta e se
afastando rapidamente.
— Giovanna! — grito, mas ela não para e começa a correr na
direção da saída. — Mas que merda, o que está acontecendo com
essa garota?
Olho para o chão, onde Tiger está deitado calmamente
esperando que voltemos a andar, e suspiro desanimada, pois achei
realmente que ela fosse ficar feliz com a novidade, como eu mesma
fiquei.
Um filho! Meu coração se enche de um sentimento que não
tenho conhecimento, desconhecido, mas que me faz sentir como se
tivesse um vazio enorme a ser preenchido em minha alma.
Sempre amei crianças, sempre me dei bem com elas e
imaginava que, com a idade que tenho, já tivesse pelo menos três
pequenos para cuidar e amar.
Só que você se apaixonou pelo homem errado, não é,
Melissa?, minha mente acusa, e meu relógio biológico parece
debochar de mim dizendo que está passando o prazo de eu realizar,
ao menos, esse sonho.
Frank Villazza nunca será o pai das minhas crianças, como
eu sonhava, mas isso não impede de eu tê-las só para mim. Minha
vontade de ser mãe não passou só porque não conquistei o homem
que foi objeto do meu desejo por toda a vida. Uma coisa não
depende da outra.
Então, por que...
— Mel!
Ouço o chamado, olho para a direção contrária a qual Gio
seguiu e vejo Nicholas Smythe-Fox, meu cliente particular que
marcou a reunião informal comigo.
— Nick, bom dia!
Ele sorri, lindo e maravilhoso como sempre foi, e
cumprimenta Tiger coçando sua cabeça.
— Desculpa te incomodar hoje, Mel, mas tive uma ideia para
as casas dos funcionários e queria que você a integrasse ao projeto.
— Tudo bem, é sempre melhor me dizer as coisas antes de
eu desenhá-las.
— Podemos tomar um café? Aí te mostro no celular o que
pensei.
Concordo, e seguimos juntos para a área onde tem uma
lanchonete, porém, antes de irmos, olho novamente na direção em
que Gio foi embora e suspiro, ainda intrigada com o jeito dela e
desejosa de poder ajudar minha amiga.
Tóquio, Japão

— Como assim ela não quis assinar?! — acabo gritando com


o advogado, amigo da família há anos, que conversa comigo pelo
telefone. — Nós conversamos quando saí do apartamento, e estava
tudo certo, afinal, temos um pacto pré-nupcial!
— Sabemos disso, Adam, por isso achamos que seria uma
conversa tranquila, mesmo sem sua presença. — Harry Stockes soa
desanimado. — Porém, Hillary se recusou a tratar de qualquer
assunto concernente ao divórcio sem sua presença.
Respiro fundo, irritado, sem entender o que minha futura ex-
esposa está pretendendo ao adiar o inevitável, afinal, tudo o que
precisávamos conversar já foi dito no último dia que passei dentro
do apartamento onde morávamos... quer dizer, onde ela morava, e
eu ia esporadicamente quando não estava pelo mundo a trabalho.
— Nós tentamos de tudo, e o acordo pré-nupcial foi vantajoso
para ela, embora vocês não tenham filhos, o que a faria ganhar
duas vezes mais com o bônus...
— Obrigado, Harry. — Interrompo-o, pois conheço todos os
detalhes envolvendo o acordo pré-nupcial e toda a expectativa que
ele trouxe para Hillary dentro do nosso casamento. — Vou entrar em
contato com ela para saber o que quer e, assim que souber, entro
em contato para ajustarmos quaisquer pontos que Hillary queira e
que sejam relevantes.
— Mais uma vez peço desculpas em meu nome e em nome
da Valery. — Ele cita sua sócia e melhor advogada de divórcios da
Califórnia, também conhecida como “A Separadora de Estrelas” por
causa dos seus famosos casos de separação entre atores de
Hollywood. — O acordo está perfeito, vocês não têm por que se
preocupar com ele.
— Eu sei, Harry. Tranquilize a Valery. Vou descobrir o que
Hillary quer, e voltamos a falar.
Desligo o telefone e olho para a cidade sob meus pés. Moro
no apartamento mais alto do prédio e, dele, consigo ver boa parte
do belíssimo Skyline de Shinjuku à noite. Gosto de morar e trabalhar
aqui, no Japão, mas sinto falta de casa, de Lupita e Juanita e suas
brigas intermináveis sobre a gestão da casa e a educação dos
“meninos”. As duas são parte da minha vida, peças fundamentais
que levaram a ser quem me tornei. Sem elas, eu nunca teria sido
localizado e levado ao meu pai.
Fecho os olhos e balanço a cabeça, tomado pela nostalgia e
cansaço. Tenho trabalhado mais horas do que de costume – que já
não eram poucas – mantendo nosso relacionamento em dia com os
investidores e compradores japoneses. Nossas joias são apreciadas
aqui. Contudo, ainda não acertamos totalmente o conceito certo
para agradar aos mais modernos e aos tradicionais ao mesmo
tempo.
A TGS tem como objetivo integrar a cultura dos países em
que se instala, reproduzindo-a de alguma forma em um design
exclusivo. Uma joia desenvolvida para o Japão não será vendida em
qualquer outra loja fora deste país. Isso é uma coisa que agrega
sentido de valor às peças, pois, geralmente, trazem a ideia de luxo e
exclusividade quando o portador as usa fora do lugar onde foram
adquiridas.
Uma vez, em um MET Gala de um ano qualquer, uma cliente
nossa usou joias exclusivas de vários países diferentes, e isso
causou um certo furor na TV e na internet, pois as pessoas
tentavam adivinhar quais locais eram representados por cada peça.
As coleções universais são fixas, as joias tradicionais da
TGS, algumas com mais de 100 anos com o mesmo design. Fora
elas, temos também as coleções especiais e apadrinhadas –
geralmente levando a assinatura e o conceito de algum famoso – e,
por fim, as exclusivas do local. Todas as coleções sofrem
mudanças, pois são edições limitadas, menos as tradicionais da
Stone.
Orgulho-me de fazer parte de uma empresa centenária,
construída e mantida pela minha família e que, mesmo com seus
anos de mercado, está sempre em busca de acompanhar as
mudanças do mundo.
— Só há uma coisa neste mundo que não sai de moda: o
ouro! — digo a frase mais popular da empresa, dita há mais de 50
anos pelo meu avô, quando questionado sobre as renovações que o
mundo estava sofrendo e se ele não tinha medo da modernidade e
da constante mudança na moda. — Ouro... — balbucio, lembrando-
me dos fios dourados dos cabelos da mulher com quem passei a
noite em Nova Iorque.
Caminho até meu armário e abro uma gaveta praticamente
vazia, ocupada apenas por uma máscara de cetim preta, feita para
cobrir toda a face de um lado e a parte dos olhos do outro. O
Fantasma da Ópera Dark! Rio, pois sempre achei que a máscara
preta combinaria muito mais com o personagem, mesmo que o
branco traga a ideia fantasmagórica.
A nota escrita como despedida jaz no fundo da gaveta,
abaixo da máscara. Tenho mania de olhar esses itens para
certificar-me de que aquela noite foi real, que eu estava lá, Adam,
nu, livre, adorando o corpo feminino da forma como sempre amei
fazer, sem nenhuma restrição.
Sentime vivo naquela noite, com aquela mulher, como não
tinha me sentido havia anos e como não tenho me sentido
ultimamente. Já tive outras parceiras sexuais desde então, mas
nenhuma conseguiu despertar em mim o que a misteriosa mulher
dourada me fez experimentar.
Cumpri meu propósito de tentar achá-la, falei com todos os
contatos que tinha naquele clube, no hotel, mas, por algum motivo,
nem eles mesmos sabiam quem era. Vi a lista de convidados
presentes e fui pesquisando nome a nome para identificá-la, mas
nenhum correspondia às minhas memórias.
— Tem certeza de que você não estava bêbado demais e
fantasiou a aparência dela? — Nuno, um luso-brasileiro que trabalha
na minha segurança há anos e que tem o dom de um cão farejador
para achar qualquer coisa, debochou.
— Não — respondi, ainda olhando as fotos das mulheres que
foram lá àquela noite. — Olhos verdes, cabelos dourados, alta,
corpo escultural, um nariz levemente arrebitado na ponta e a boca...
Ele começou a rir.
— Bêbado, Adam, com certeza! — Ele aproveitou e tomou
mais um gole de cerveja. — Uma mulher perfeita dessas não está
aqui... — Ele enrugou a testa. — Para te falar a verdade, todas
são... — ele olhou uma foto aleatória — normais.
— Ela não era! — teimei. — Desde que entrou, mesmo de
máscara, eu senti que iluminava tudo. Reluzia, parecia ouro recém-
refinado, ainda quente do fogo, puro, brilhante e...
— O que você tomou naquela noite? Certamente não foi
apenas seu Dry Martini usual. — Ele se aproximou. — Foi coisa
pesada?
Bufei, puto por Nuno não me levar a sério.
— Vai continuar a busca enquanto eu estiver fora? — Ele
apenas levantou o polegar enquanto bebia. — Ótimo!
— Mas... me tira uma dúvida. — Nuno se levantou e colocou
a mão no meu ombro. — O que você vai fazer quando a achar?
Inspirei longamente e fui o mais sincero que podia ser:
— Não sei. A única coisa que tenho certeza é de que preciso
encontrá-la.
Meu amigo não questionou ou debochou mais, apenas voltou
para a pasta com toda a informação que juntou e ficou olhando para
a lista de maneira pensativa.
— E se ela não estiver aqui? — inquiriu de repente. — E se
ela usou o convite de outra pessoa para entrar?
Assenti e me aproximei.
— Ela parecia surpresa, como se não esperasse encontrar
aquele ambiente. Fiquei olhando-a intrigado, atraído por sua beleza,
mas também adorando sua expressão. — Sorri. — Siga por essa
linha, que vamos achá-la.
Nuno riu.
— Claro, só preciso saber de quem era o convite que ela
usou. — Gargalhou. — E são só umas 100 mulheres para
investigar!
Naquele momento, questionei a mim mesmo a minha loucura
e obsessão para achar a mascarada misteriosa, só que,
contrariando a minha consciência pela primeira vez, não disse uma
palavra sequer para que Nuno parasse as investigações.
Ainda não descobrimos muita coisa, é verdade. Todavia, ele
desvendou ontem de quem era o convite usado, e temos um nome:
Pietra Boldani!
— Eu vou encontrar você de novo — digo, acariciando o
bilhete. — E descobrir se o que aconteceu naquela noite mexeu
somente comigo ou contigo também.

Entro no meu apartamento em Santa Monica e bato a porta


com força, odiando os sentimentos que trago dentro de mim. Não
me sinto bem, estou por um fio e não tenho ideia de como cheguei
em casa, pois estava cego de raiva.
Voltei para os Estados Unidos há duas semanas para poder
dar sequência ao meu divórcio, já que minha digníssima esposa se
recusou a conversar por intermediários ou mesmo por
videoconferência.
Hoje, finalmente, conseguimos ajustar nossas agendas e nos
encontramos no escritório de advocacia de Harry Stockes. Ela, é
claro, levou sua advogada junto, porém, com menos de 10 minutos
de reunião, Hillary pediu para falar a sós comigo.
O que se sucedeu foi como uma punhalada nas costas. Eu
sei que nosso casamento teve motivos tortos e estou disposto a
pagar meu quinhão de culpa. Entretanto, não esperava que a
ganância dela fosse tão extrema a ponto de pegar situações
privadas e que não lhe dizem respeito e ameaçar expô-las caso não
houvesse ajustes no acordo.
— Pense bem! Seu pai não sabe nada do pacto de vocês, e
tenho certeza de que irá ficar extremamente decepcionado quando
souber. — Hillary cruzou os braços e sorriu. — Fiquei muito puta
quando soube, Adam, mas confesso que estou satisfeita com sua
decisão, pois vou ficar bem melhor do que estaria neste divórcio.
Vi os olhos dela brilhando ao saber que venceu, pois durante
um tempo fomos amigos e confiei a ela alguns sentimentos e
segredos que não deveria ter revelado. Hillary tinha consciência de
que eu faria de tudo para não decepcionar meu pai e que ele não
entenderia minha decisão, pois sempre foi um romântico incurável.
Além disso, havia meus irmãos...
Aceitei seus termos, o que chocou meus advogados, e ela
saiu do escritório com prazo para fazer uma proposta formal de tudo
o que desejava além do estipulado no acordo.
Meu telefone toca, tirando-me dos pensamentos. Penso em
ignorá-lo, mas, ao ver o nome de meu pai na tela, atendo-o.
— Adam, ainda bem que atendeu! — ele dispara antes
mesmo de que eu diga “alô”. — Preciso de ajuda em um projeto que
está deixando Earl louco!
Rio, pois o diretor financeiro da TGS sempre está louco por
algum motivo.
— No que posso ajudar?
— Preciso de você no Brasil.
Arregalo os olhos, surpreso com o pedido.
— Pai, só vim para resolver uma questão. Preciso voltar para
Tóquio e...
— Esqueça Tóquio, você já fez sua mágica por lá, agora é
deixar na mão do Raymond e da gerência de lá, afinal, ele é pago
para isso!
Não questiono, pois o diretor de vendas internacionais é
extremamente meticuloso e sabe coordenar e se relacionar muito
bem com todos os coordenadores das diferentes lojas pelo mundo.
Como no Japão só temos uma TGS até o momento, ele não conta
com um coordenador e vai tratar diretamente com o gerente local,
que também é muito eficiente.
— Eu estou lhe dizendo isso há meses, mas...
— Chegou o momento certo, é isso que importa! —
Novamente ele me atropela com as palavras. — Estamos
implantando a primeira TGS no Brasil, em São Paulo, e...
— Estou ciente, participei do processo todo. — Rio ao
lembrá-lo de que sou o segundo homem da empresa depois dele.
— Sim, por isso mesmo é importante que você vá. Estamos
com problemas...
— As vendas já começaram? — Fico em dúvida, pois não me
lembro do cronograma.
— Quem dera! Ainda nem conseguimos terminar as obras!
Franzo o cenho, pois já devíamos estar próximos da
inauguração.
— E o que eu faria por lá?
— Acabaria com o problema criado pelo seu irmão! — Ele
não parece nada feliz, e bufo, cansado de apagar os incêndios dos
gêmeos. — John reprovou todos os projetos apresentados a nós até
hoje e, quando finalmente conseguimos fechar com o escritório mais
conceituado de arquitetura do local, ele parece querer me
enlouquecer!
— Pai, sinceramente, essa parte de projeto não é muito a
minha...
— Não há nada que você não possa fazer, Adam Hidalgo
Stone! — Ele fala meu nome completo, jogando sujo comigo. —
Você não sabia falar inglês, não sabia ler nem escrever quando veio
para mim aos sete anos de idade e, em menos de um ano, já
dominava tudo o que queria, inclusive ensinava ao seu irmão mais
velho!
Fecho os olhos, tentando impedir as lembranças daquele
menino louco para impressionar, decidido a deixar a dor e a
saudade de lado para ser como o garoto mais velho da casa, o
orgulho de seu pai.
— Não podemos perder Julio Boldani, Adam!
Abro os olhos rapidamente ao ouvir o sobrenome tão
conhecido.
— Julio Boldani? — questiono meu pai.
— Sim, o arquiteto mais premiado do país depois do
Niemayer! — Ele ri. — Tereza vive falando dos dois! — Ele cita sua
namorada, brasileira que mora há mais de 30 anos nos Estados
Unidos, uma médica talentosíssima que o fez mudar de vida após o
enfarte. — Julio Boldani e a filha estão à frente do projeto, mas John
está pondo tudo a perder.
Rapidamente sento-me à mesa e abro meu laptop. Digito o
nome de Julio Boldani na busca e abro as informações sobre sua
vida, confirmando aquilo que soube há poucas horas.
Nuno retornou com novidades sobre Pietra Boldani, uma
modelo italiana que estava tentando a vida nos musicais em Nova
Iorque. O pai da moça é um arquiteto renomado que trabalhou
muitos anos no Brasil até se aposentar e dedicar-se a projetos de
restaurações na Itália.
— Além de um irmão, ela tem um tio e uma prima. — Nuno
parecia eufórico. — O nome da prima dela é Melissa Boldani, é
brasileira, arquiteta e solteira. — Ri. — Te mandei uma foto dela.
Eu a abri o mais rápido que pude, e lá estava ela... sem
máscara e com um nome: Melissa Boldani, o “M” do bilhete. Sorri e
estava prestes a perguntar mais sobre ela quando começou a
reunião com Hillary, e tudo se perdeu diante do desastre interno que
me acometeu.
— Adam?! Adam?! — escuto meu pai me chamando aos
berros pelo celular.
— Eu vou para o Brasil, pai. — Abro a foto em que Melissa
aparece ao lado de Julio Boldani. — Não podemos perder os
Boldanis.
— Eu sabia que podia contar contigo, hijo! Quando posso
mandar aquele garoto maluco voltar para casa? — Ele parece
ansioso para trazer John de volta.
— Amanhã — digo, já enviando uma mensagem ao Nuno
para que prepare nossa ida para São Paulo. — Parto para o Brasil o
mais rápido possível.
Hoje o dia está moroso, um tanto chato, parecendo feriado no
meio da semana que te obriga a ficar em casa sem fazer nada, sem
ter para onde ir. Olho em volta da minha sala mais uma vez,
buscando não sei o quê, irritada por não conseguir me concentrar
no trabalho.
Fecho os olhos e tento não me deixar abater pela pressão
que estou sofrendo, dia após dia, por causa desse bendito projeto
que chegou ao nosso escritório com selo de urgência, depois de os
clientes terem recusado vários outros.
— Eu gostaria de ter nossa assinatura nas lojas da TGS, Mel
— meu pai confidenciou a mim, em particular, logo após a reunião
na qual foi apresentado o briefing do que os clientes americanos
desejam para a sua primeira loja no Brasil. — São Paulo é apenas a
porta de entrada, em breve eles se estabelecerão no Rio de Janeiro
e na maioria das capitais da América do Sul.
— Eu sei — concordei, pois era realmente um projeto
gigantesco. — O senhor já pensou em algo inovador para...
— Não, Mel, você não entendeu. — Julio Boldani pegou
minha mão. — Eu já tenho meu nome em várias obras incríveis. Eu
quero que seja a sua vez! — Arregalei os olhos. — Sei que você
tem vários prêmios de conceito. Contudo, acho que chegou a vez de
imprimir a sua mão, o seu estilo, em algo que a projete ainda mais
no nosso meio.
— Pai, eu realmente não sei se...
— Eu confio em você, Mel, sei que vai se sair bem.
Bufo e deito a cabeça sobre o tampo da minha mesa, pois já
não tenho mais a certeza de que meu pai pense assim, afinal,
apresentei dois esboços a um dos herdeiros da marca, e todos
vieram sumariamente rejeitados.
No último, o americano fez questão de frisar – em um e-mail
bem incisivo – que eu não atingia os padrões da TGS.
— Eu achei que era para imprimir meu estilo dentro do que
eles me mandaram como briefing, não copiar os projetos de lojas já
existentes — argumentei com meu pai.
Julio parecia um tanto desnorteado também, sem saber o que
me dizer.
— Todos os seus esboços estavam lindos, Mel, mas talvez eu
tenha entendido mal sobre eles se adaptarem à cultura dos locais
onde montam as lojas.
— Eles criam joias e coleções exclusivas para cada país
onde se instalam, eu mesma tenho algumas TGS da Inglaterra e da
Itália.
Ele começou a andar pela sala.
— Acho que eles preferem uma abordagem mais tradicional.
— Sua voz era lamentosa, e minha expressão não estava diferente,
pois minha abordagem é moderna e sustentável. — Vou designar o
Carlos para trabalhar contigo nesse...
— O Carlos? — Gemi desanimada. — Pai, ele é
extremamente conservador e...
— Exatamente o que você precisa para equilibrar as coisas
— contra-argumentou com um tom de voz que dizia que não estava
aberto a discussões.
Volto a prestar atenção à tela do computador, desanimada
demais em continuar à frente do projeto, mas ciente do quanto
ganhar esse cliente é importante não só para o escritório, mas
também para meu pai.
Se o cliente quer que sejamos mais tradicionais, ele terá
exatamente o que pediu! Abro a planta da primeira loja estabelecida
pela TGS na Rodeo Drive, em Beverly Hills. Analiso calmamente
todos as linhas da loja, bem como toda a parte de planejados, pois
foi para isso que fomos contratados.
A loja do Brasil ficará na entrada de um shopping de alto
padrão, no bairro mais luxuoso da cidade. Já participei de projetos
de reforma de algumas lojas dele auxiliando Samara Schneider, que
fez toda a parte de planejado com a empresa de seu pai, mas nunca
no térreo e nem com o tamanho da TGS.
Projetos para lojas assim são complicados, porque a parte
arquitetônica deve casar perfeitamente com a parte de planejados.
Preciso pensar nos acabamentos, na iluminação, na parte de gesso,
hidráulica e elétrica em conjunto com o projeto de bancadas,
armários e expositores.
Acho que esse foi um dos motivos pelo qual meu pai me
passou o projeto, porque adoro fazer a parte interior, além da
arquitetônica, e consigo conversar muito bem com o arquiteto
responsável pelos móveis. O desenho geral é meu, mas depois
alguém com mais expertise na parte prática dos planejados analisa
o que funciona ou não, além de sugerir melhores aproveitamentos.
A TGS é uma loja de 200 m² que terá as seguintes divisões:
salão principal, duas salas para compras privadas, depósito com
cofre programável – aqueles de banco que só abrem no mínimo em
24 horas –, uma copa e uma pequena oficina onde serão feitas as
joias exclusivas para aquela unidade e que, mais tarde, irão para
todas as lojas brasileiras.
Nesta última tentativa de agradar ao exigente senhor Stone,
decido não inovar muito e seguir a mesma linha da loja-mãe nos
Estados Unidos, mudando apenas alguns pontos que não
funcionariam aqui, uma vez que estamos falando de uma loja de
shopping, e a deles lá é na rua. Escolho alguns materiais mais
modernos, mas sem fugir muito do design que já usam.
O tédio se instala em mim no meio do projeto, e começo a
bocejar. Meu telefone toca, e vejo que minha prima Pietra está me
ligando de vídeo.
— Ei! — ela grita animada. — Eu queria te contar uma
coisa...
Gargalho.
— Oi, tudo bem com você? — Ela faz careta. — O que
houve?
— Estou muito animada, depois a gente se cumprimenta. —
Ela me mostra onde está. — Passei em uma audição para um
musical na Broadway! — Seus olhos brilham de lágrimas. — Mel,
lembra a última vez que você esteve aqui, e eu acabei te
abandonando para ir à festa de um diretor?
Chego a suspirar só de lembrar daquele dia, mais
especificamente, daquela noite. Ainda me ponho a pensar se não foi
tudo um sonho ou uma ilusão, então pego a máscara só para me
convencer de que tudo foi real.
Nunca mais pude tirar aquele homem dos meus
pensamentos e, cada vez que dou prazer a mim mesma, fantasio
com ele. Não é minha mão ou algum brinquedo comigo, é sempre o
Mascarado. Sei que a regra de não revelarmos quem éramos partiu
de mim, porém, é a única coisa da qual me arrependo daquela noite.
Eu queria saber quem ele é! Queria descobrir se a química
que sentimos foi por causa da brincadeira com as máscaras ou...
— Mel?! — Pietra volta a me chamar. — Mel?!
Balanço a cabeça para voltar a me concentrar na ligação com
minha prima.
— Oi, desculpa. — Sorrio feliz. — Pietra, que bom saber que
conseguiu entrar! Fico muito contente por você, porque sei o quanto
tem se esforçado para isso!
— Ah, não é um papel de destaque, vou fazer o coro, mas
pelo menos já consegui entrar, não é?
— Com certeza! Aposto que, com seu talento e dedicação,
em breve vou ter que viajar para te ver estrelando algum musical.
Ela pula animada.
— Com certeza! Agora vou ligar para April e avisar que
estamos on Broadway!
Nós nos despedimos, e, mesmo depois de já ter encerrado a
ligação, fico com o telefone na mão, desejando poder, ao menos,
saber quem era aquele homem e ver como ele está, como é sem
máscara, saber o que faz e do que gosta.
Cacei pelo Instagram em páginas que põem várias fotos de
homens bonitos, mas nenhum sequer me trouxe a lembrança dele.
A fantasia só tem se tornado maior a cada dia, deixando-o quase
como um homem-deus que esteve junto aos mortais apenas para
me levar ao céu com seu jeito delicioso de fazer sexo.
Rio diante do pensamento, mas gemo desanimada ao ver o
projeto na tela do computador.
Que merda, odeio esse tal senhor Stone!

— Mel!
Olho para trás e sorrio ao ver Samara Schneider entrar no
bar onde estou, sozinha, sentada ao balcão, tomando uma cerveja
antes de ir para casa e encerrar o dia.
Saí da Boldani ainda me sentindo desanimada com o projeto,
e detesto me sentir assim com qualquer coisa. Sou naturalmente
animada, empolgada, a primeira pessoa a dizer que vai ficar tudo
bem em uma situação de merda, então ir para casa com esse
sentimento não era uma opção.
Sempre frequento este barzinho onde estou, na Vila
Madalena, no qual me sinto segura e confortável. O pessoal daqui é
ótimo, além de as comidinhas serem divinas. Geralmente venho
com Tânia, a arquiteta que trabalha comigo, mas, quando venho
sozinha, a menina que trabalha no bar conversa comigo sempre que
pode, e ela é um amor!
Não tinha ideia de que Samara vinha aqui também, apesar de
ultimamente o Hill estar se tornando um barzinho da moda e estar
cada vez mais cheio de jovens.
— Oi, Samara! — cumprimento-a e a convido a se sentar ao
meu lado. — Que coincidência maravilhosa! Está sozinha?
— Pois é, adorei te encontrar também! Estou esperando uma
amiga, a Kyra Karamanlis, conhece?
Assinto.
— Moramos no mesmo prédio. — Rio ao pensar em como o
mundo é pequeno.
Lara, a bartender que sempre me faz companhia, oferece a
carta de drinques a Samara, e, enquanto as duas decidem, confiro
meu celular para saber se alguém entrou em contato e vejo uma
mensagem de Isabella.

“Mel, semana que vem vamos fazer um almoço especial aqui


em Curitiba. Papai confirmou que vem. Podemos esperar por
você também?”

Suspiro longamente e deixo o aparelho de lado, sem ainda


dar minha resposta.
— Cansada? — Samara questiona.
— Foi um dia difícil! — Sorrio sem jeito e tomo um gole de
cerveja. — Vou ter que trabalhar todo o final de semana e sem
nenhuma vontade, porque perdi todo o tesão no projeto.
Ela ri.
— Já aconteceu comigo também, uma merda isso! — O olhar
dela parece distante, e isso chama minha atenção, porque Samara
é sempre tão alegre e positiva.
— Beber para comemorar ou para afogar mágoas? —
inquiro, levantando minha garrafinha.
— Afogar mágoas... — ela responde e pega o drinque que a
bartender lhe preparou. — Ultimamente é só o que tenho feito.
Meu coração se aperta ao ver uma moça tão jovem com uma
amargura tão grande.
— Se puder ajudar em algo...
Ela nega.
— É pessoal. — Ri de si mesma. — Eu consigo lidar bem
com as merdas do trabalho, mas, quando se trata da minha vida
pessoal, sou um desastre!
— Bem-vinda ao time! — Pisco, tentando alegrá-la um pouco.
— Duvido que você passaria pelo que eu passo, Mel! É tão
segura de si, tão decidida que já teria tomado uma decisão há muito
tempo.
Balanço a cabeça.
— Aí você se engana. Minha vida amorosa é inexistente,
porque simplesmente não consegui enxergar o óbvio.
Ela franze a testa.
— Estou indo embora do país para esquecer alguém —
confessa, e isso me faz encará-la com seriedade. — Não aguento
mais gostar dele e simplesmente não ser vista.
Engulo em seco, porque era exatamente assim que me sentia
com relação ao Frank. Sinto como se tivesse voltado no tempo para
aquele momento em Boston, quando ele simplesmente se esqueceu
de mim e foi curtir a vida como se eu não existisse.
Pego a mão de Samara.
— Ir embora não resolve as coisas, sabe? — Ela se
surpreende com o que falo. — Vocês já conversaram?
Ela soluça, mas sem chorar.
— Ele está fingindo que nada aconteceu. — Dá de ombros.
— Somos amigos desde sempre, e rolou uma situação, mas... —
Ela parece constrangida. — Ele nunca vai me ver além da amiga
que sempre esteve ao seu lado.
Deus do Céu!, penso apavorada ao perceber que a mesma
história que passei parece se repetir com outras pessoas.
— Conversa com ele, Samara. Não adianta mudar de país,
mudar de vida, porque o que sente está dentro de você. Conversa,
encerra e segue em frente. — Ela não parece tão confiante no meu
conselho, então me abro: — Passei por uma situação parecida.
Esperei por ele a vida toda. Mesmo enquanto tinha um
relacionamento e outro na tentativa de “esquecê-lo”, o sentimento
estava guardado, à espera. Quando, finalmente, decidi conversar e
arriscar ter algo com ele, era tarde demais, não só porque ele
estava apaixonado por outra pessoa, mas porque percebi que nunca
sentiu por mim o que eu sentia por ele. Talvez, se eu tivesse
conversado antes e não fingido que seguia com minha vida,
teríamos resolvido, e eu, desencanado.
Samara engole longamente seu drinque.
— Tenho medo de perdê-lo de vez — confessa. — Acho que
ele está muito acostumado a me ter por perto e que por isso não
consegue medir o que sente... — Fecho os olhos ao entender que,
na verdade, ela não está partindo para esquecê-lo, mas sim para
tentar alguma reação dele. — Kyra diz que ele é um idiota e que
seria melhor se eu encontrasse um espanhol bem gostoso e o
esquecesse.
— Talvez seja um bom conselho, mas, quer saber? Você só
irá descobrir isso se conversar com ele antes de ir.
Ela concorda, mas percebo em sua expressão que não está
convencida. Não fico chateada por Samara não aceitar meus
conselhos, afinal, eu mesma nunca aceitei os das minhas amigas.
Tinha medo de arriscar com Frank porque sentia medo de perdê-lo
também, de ter todas as minhas fantasias desfeitas, sem perceber
que mantê-las só me prejudicava.
Decido não falar mais nada, mas torço intensamente para
que Samara consiga ser feliz com ou sem o homem que a está
deixando desse jeito. E espero, mais ainda, que os dois possam
resolver as coisas no tempo certo, e não ficar postergando algo que
pode doer muito mais no futuro.
— Estou trabalhando em um projeto de dar dor de cabeça. —
Inicio o assunto do trabalho para mudarmos o clima. — Estou a
ponto de matar o cliente.
Samara ri, e começamos a falar sobre as agruras da
arquitetura.
Ando em volta do apart-hotel que John estava usando em
São Paulo e decido que vou manter o lugar. Não sei quanto tempo
terei que ficar na cidade, por isso alugar ou comprar um
apartamento seria precipitado de minha parte.
Nuno foi para a casa de alguns parentes e só estará de volta
na segunda-feira para que conheçamos o escritório provisório da
TGS e possamos nos inteirar de todos os assuntos que meu irmão
deixou para trás.
Ainda fico puto por saber que ele veio para cá, mesmo não
sendo sua área. Temos diretores para isso, além de pessoas de
confiança em cada país em que nos estabelecemos. John é
designer de joias, e é totalmente compreensivo que não tenha
conseguido dar cabo de todo o trabalho burocrático que é abrir uma
loja em um país estrangeiro.
Eu também não viria, pois meu trabalho começa após a
instalação, criando relacionamento com clientes e fornecedores
através da minha equipe. Pessoalmente, só me envolvo quando dá
merda, como no caso de Tóquio, e temos risco de manchar o nome
da empresa.
Viajo demais, mas permaneço pouco tempo em um local, por
isso já me acostumei a ser um tano nômade, a não criar raízes.
Caminho até a varanda do apartamento, satisfeito pela vista das
árvores altas de um parque por perto. São Paulo é uma cidade
interessante, bem diferente do Rio de Janeiro, minha única
referência de Brasil até então. Consigo me conectar bem com este
lugar, apesar de estar perto do mar me lembrar de casa.
Respiro fundo e fecho os olhos, aproveitando os últimos raios
de sol. Vou gostar de trabalhar aqui, ainda mais sabendo que a
mulher que procurei por quase um ano inteiro mora nesta cidade.
— Melissa Boldani — sussurro o nome dela mais uma vez,
grato por ele combinar tanto com a mulher quente e dourada que
entrou na minha vida em uma noite qualquer.
Ainda me sinto muito curioso para saber mais sobre ela, visto
que, nas pesquisas on-line, encontrei basicamente informações
sobre sua família e seu trabalho, nada muito pessoal. O Instagram
dela é privado, por isso não consegui ver suas fotos pessoais, mas,
na página do escritório, vi muito do trabalho dela e fiquei
impressionado.
Penso estar um tanto obcecado por ela, pela fantasia que se
formou em minha cabeça durante todo esse tempo. Pode ser que
tudo desmorone depois que nos encontrarmos sem máscaras, sem
a atmosfera sexual que pairava entre nós dois naquela noite.
Contudo, estou disposto a descobrir e a pagar para ver.
Entro de volta quando o sol se põe totalmente e as luzes dos
edifícios ao meu redor se acendem gradativamente. Ando descalço,
pois gosto de sentir meus pés no chão, porém, meus passos são
abafados pelos grossos tapetes que recobrem a sala. Sirvo-me de
uma dose de uísque enquanto decido se irei pedir algo para jantar
ou se arriscarei um primeiro passeio noturno por São Paulo.
Decido sair, pois não me sinto bem sem ter o que fazer
dentro de um lugar. Ligo para o motorista que está à disposição da
empresa e que levava meu irmão de um canto a outro para avisá-lo
de que vamos sair.
— O doutor deseja ir a algum restaurante para jantar ou
prefere beber algo, comer uns petiscos e ouvir música? — Douglas
Braga pergunta em um inglês com sotaque engraçado, mas possível
de ser entendido.
— Beber e ouvir música, não estou com muito apetite.
— Certo, doutor, vou levá-lo ao melhor lugar da cidade para
isso!
Desligo o telefone e me arrumo de maneira descontraída,
calça jeans, tênis e uma camisa. Penteio os cabelos, notando que
cada vez mais estão se tornando grisalhos, e por último coloco um
pouco de perfume.
Douglas não demora muito a aparecer, e, assim que entro no
carro, questiono para onde vamos.
— É um barzinho que está fazendo sucesso por causa dos
petiscos. — Ele me olha pelo retrovisor. — São incríveis, o doutor
vai gostar.
É uma pena Nuno não estar aqui, pois ele seria uma ótima
companhia para conversar. Não me importo de sair sozinho, mas,
quando não conheço o local, me sinto um tanto deslocado.
Respondo mensagens e e-mails durante o trajeto e só
percebo a passagem do tempo quando Douglas anuncia que
chegamos ao bar. Desço na porta, enquanto ele vai procurar um
lugar para estacionar.
— Quando o doutor quiser ir embora, é só me ligar, que eu
venho buscá-lo.
A primeira coisa que chama minha atenção é a fila na
calçada. Sinto um certo desânimo ao pensar que vim parar em uma
boate, mas então consigo ver o interior pelas paredes envidraçadas
e relaxo, constatando ser mesmo um bar.
— Boa noite. — Um rapaz usando uma camisa com o mesmo
nome do bar me aborda. — Mesa para quantas pessoas?
Oh, droga, meu português é precário, embora eu consiga
entender bem.
— Só eu — respondo, e ele franze a testa, notando meu
sotaque.
— Nome, por favor.
— Adam.
Ele anota numa prancheta e espia dentro do salão.
— Adam, daqui a pouco vai liberar vaga no bar, pois há
pessoas lá apenas esperando uma mesa.
— Puede ser.
Ele sorri e concorda, indo até o próximo da fila.
Volto a trabalhar no celular enquanto espero, um tanto
arrependido por ter deixado Douglas escolher o local, pois não tinha
intenção alguma de ficar esperando vaga.
— Boa noite, Marlon, até a próxima semana! — escuto ao
longe a voz de uma mulher.
— Boa noite, minha deusa! — o rapaz que pega os nomes
para a lista de espera grita o cumprimento bem atrás de mim.
Desconcentro-me por um segundo, mas depois volto a ler
novamente o memorando que meu irmão soltou sobre seu
afastamento e a admissão do partido para que ele seja candidato ao
Senado pela Califórnia.
De repente algo me faz erguer a cabeça e olhar em volta. Um
aroma, um cheiro que me desperta lembranças e... Melissa Boldani!
Saio da fila, procurando por todos os lados da rua cheia de pessoas,
tentando encontrar a mulher que vem povoando meus sonhos por
praticamente um ano e que estava no mesmo local que eu.
Se eu não estivesse concentrado no telefone, a teria
reconhecido!, lamento quando percebo que ela já não está no meu
raio de visão. Calma, Adam! Respiro fundo e tento controlar as
batidas do meu coração, que parece querer saltar pela boca. Seria
maravilhoso encontrá-la já na minha primeira noite em São Paulo,
mas o fato de termos nos desencontrado não atrapalha em nada
nossos encontros futuros, porque o escritório da família dela está
fazendo nosso projeto, e isso nos garante, ao menos, algumas
reuniões.
A questão toda é: será que ela irá me reconhecer?
— Aqui estão todos os documentos que o doutor solicitou. —
Cristina, a moça que foi contratada como assistente do meu irmão,
entrega-me uma pasta. — Há cópias digitais na rede.
— Obrigado, menina Cristina. — Nuno é quem lhe agradece
e a acompanha para fora da sala. — O que estás a pensar?
— Nada, por enquanto — respondo em português, e ele ri por
causa do meu forte sotaque hispânico, então desisto e volto a usar a
língua a que estou mais acostumado. — Preciso olhar os
documentos e entender qual o problema com relação aos projetos.
Nuno senta-se à minha frente.
— Projetos de Melissa Boldani. — Sorri malicioso. — Já
solicitou uma reunião? — Nego com a cabeça. — Por quê?! Estás
atrás da rapariga há cerca de um ano!
— Não quero ser apressado. Como você mesmo disse,
espero há meses, posso esperar mais alguns dias. — Abro o
arquivo do computador onde estão as cópias digitais. — Primeiro,
quero entender quais os problemas, não quero simplesmente
marcar uma reunião com ela sem ter o que dizer, principalmente se
ela não me reconhecer.
Nuno ergue a sobrancelha.
— Há essa possibilidade?
Penso no que aconteceu na porta do bar a que fui há alguns
dias. Eu a ouvi falar com o host, mesmo assim não reconheci sua
voz. Melissa passou perto de mim, não me reconheceu, e nem eu a
ela. Se não fosse pelo perfume, nunca teria sabido que esteve lá.
E não, não era uma mulher com perfume igual, era ela!
Consegui a informação com o tal Marlon quando lhe perguntei se
ela estava no bar ainda.
— Ah, veio para encontrá-la? — ele perguntou animado.
— Estou atrasado. — Tentei me fazer entender e torcendo
para que ele caísse na minha conversa. Se não fosse a Melissa, ele
diria que ela ainda não tinha chegado, mas...
— Ela acabou de sair! — Ele apontou para o fim da rua. —
Não quer ligar para avisar que chegou?
Foi então que, com a confirmação, inventei uma desculpa,
liguei para o Douglas e voltei para o hotel. Passei boa parte da noite
andando de um lado para o outro, sem conseguir entender como
estivemos no mesmo lugar e não nos vimos, e notei o quanto estava
agitado com a mera possibilidade de revê-la. Senti um receio se
formar diante da enorme expectativa que estava criando e me
obriguei a baixá-la um pouco.
Tentei pensar em qualquer outra coisa no final de semana
que não fosse Melissa Boldani, mas foi difícil. Douglas me levou
para conhecer os principais pontos turísticos de São Paulo, bem
como o parque enorme e de nome impronunciável que ficava perto
do apart-hotel.
No domingo fui conhecer a tal Avenida Paulista, onde teria
reuniões durante a semana e nosso escritório estava localizado
temporariamente.
— Douglas, você sabe onde fica a Boldani Arquitetura? —
não resisti e perguntei.
— Sei, sim, não fica longe do apart-hotel onde está
hospedado, doutor. — Ele nos levou até lá. — Aqui está!
Olhei por algum tempo para a enorme casa que, se não fosse
o nome do escritório em aço escovado no muro, nunca poderia
saber que era um ponto comercial.
De fato, estávamos no mesmo bairro, Itaim, mas meu prédio
era mais próximo ao parque do que o escritório da família Boldani.
Uma ideia me veio à cabeça, mas logo a deixei de lado, porque
estava decidido a ir devagar. Todavia, durante o trajeto até onde eu
estava hospedado, fiquei olhando cada casa e prédio, questionando
se Melissa não moraria em algum deles, pois ficam próximos ao seu
trabalho.
Seria uma deliciosa coincidência estarmos no mesmo bairro!
— Adam?
Deixo os pensamentos de lado e concordo, lembrando-me da
pergunta que ele me fez.
— Há, sim. Ela e eu estávamos no mesmo bar na sexta-feira.
— Nuno não esconde seu espanto. — Ela passou ao meu lado, e
não reconheci sua voz quando cumprimentou uma pessoa.
— E como tu sabes que era ela?
— Reconheci o cheiro. — Novamente Nuno parece surpreso.
— E depois confirmei minha percepção com o rapaz que ela
cumprimentou.
— Que loucura! — Ele ri. — Sua primeira noite aqui, e já a
encontra em um bar?
— Tecnicamente, não a encontrei, ela passou por mim, e eu
não a vi. — Abro o primeiro esboço que a Boldani Arquitetura nos
mandou e fico admirado com as ideias que ela colocou no papel.
Rodo a simulação em 3D para Nuno ver, e ele também parece
admirado.
— É muito bom, mas não parece uma loja da TGS.
Concordo com ele, mesmo ainda encantado pelos desenhos
dela. O próximo esboço já se mostra mais integrado às nossas lojas,
ainda que mantenha as linhas únicas de Melissa Boldani. É perfeito,
na minha opinião, e, quando coloco em 3D para Nuno ver, ele
concorda comigo no mesmo instante.
— Qual foi o problema que seu irmão viu nele?
Leio a correspondência feita via e-mail entre o escritório e os
arquitetos e vejo que John pediu que replicassem as lojas já
existentes. Ele não está totalmente errado, pois é isso que
geralmente fazemos, mas, se temos coleções exclusivas para cada
país, por que não podemos integrar sua cultura também ao design
da loja?
— É muito bom! Ainda não parece as lojas que existem, mas
certamente é uma TGS! — Nuno comenta, ainda sem poder tirar os
olhos do projeto.
Ouço uma batida à porta, e Cristina entra na sala.
— Doutor, o escritório de arquitetura mandou um novo
esboço. Acabei de colocá-lo na rede.
Localizo o arquivo e, assim que o abro, escuto Nuno xingar.
— Mas que porra é essa?
Apenas franzo a testa, tentando reconhecer os traços de
Melissa Boldani, mas não a vejo nesse novo esboço. Não é que seja
ruim, pelo contrário, parece ótimo, mas é tão estéril, tão despido de
personalidade que é como se eu visse o esboço de qualquer uma
das lojas já existentes depois de uma reforma.
Que grande merda!
O mundo está de cabeça para baixo, só pode!
Estive fora do escritório ontem o dia todo por causa de uma
emergência familiar. Estava vindo para a Boldani finalizar o último
esboço que minha paciência permitia fazer para o cliente americano,
quando Frank Villazza me ligou.
Pensei até em ignorar, mas, quando ele insistiu pela segunda
vez, atendi a chamada.
— Oi, Frank, estou indo para o escritório e...
— Mel, eu preciso da sua ajuda. — Cheguei a gelar
pensando que pudesse ser algo com Isabella e as crianças. —
Giovanna está no hospital e...
— O que aconteceu com ela?! Onde vocês estão?
Ele me deu o endereço do hospital, e eu rapidamente fui
encontrá-los. Há algumas semanas soube que Giovanna e Nick
estavam envolvidos, até nos encontramos, e fiquei super feliz,
porque ela é como uma irmã para mim, e ele é o homem mais gentil
que já conheci. Percebi o quanto estavam apaixonados e estavam
até falando em casamento, o que me surpreendeu um pouco.
— Ela sabia de tudo o tempo todo, Mel, por isso se afastou
de nós — Frank me contou no hospital. — Por isso também que se
aproximou dele.
Fiquei com ela por algum tempo no hospital, enquanto Frank
resolvia algumas coisas e, depois, em vez de voltar ao escritório,
liguei para o Nicholas.
— Mel, eu realmente preciso de um tempo agora — foi o que
ele me respondeu antes de desligar.
Todos estavam muito machucados, tanto que Frank levou Gio
para Curitiba, e Nicholas simplesmente sumiu. Eu o conheço há
muito tempo e sei como ele é com essas coisas de honestidade e
verdade.
Entro na minha sala e percebo que Tânia me olha de um jeito
estranho, provavelmente por eu não ter aparecido ontem e ter
chegado tarde hoje. Nunca faço algo assim, e ela deve estar
curiosa. Percebo que minha mesa ganhou um ornamento de Natal,
o que me faz lembrar que menos de um mês nos separa desse
feriado e que, no final de janeiro, será meu aniversário de 40 anos.
Caramba! Eu vou fazer 40 anos! Faço uma careta, tentando
afastar todos os pensamentos pejorativos que uma mulher que
chega a essa idade na minha situação enfrenta. Solteira, sem filhos,
sem família... O mundo está moderno, eu sei, mas ainda existe
muito tabu com relação à idade de uma mulher e o que é esperado
dela.
Penso que, se eu tivesse escolhido essa situação para mim,
como muitas mulheres o fazem, eu estaria, sim, equilibrada e
satisfeita, mas não é o caso. Sempre quis amor, um companheiro,
filhos... porém, desperdicei anos e energia com um homem
impossível. Pois bem, agora, como uma boa arquiteta, preciso achar
um jeito de reformar meus sonhos.
Abro minha bolsa e retiro um folder que peguei há algum
tempo na clínica médica onde faço meus exames. Leio o título da
matéria principal do informativo: Reprodução assistida – o sonho de
ser mãe pode se tornar real e penso na ideia mais uma vez. Meu
coração diz que é o momento certo, que estou pronta para ter um
filho, mas minha cabeça ainda insiste em reforçar todos os desafios
dessa empreitada.
Há algum tempo vi uma reportagem sobre uma artista que,
após completar 40 anos, decidiu fazer uma produção independente
para ter um filho. Eu me senti como ela, entendi seu ponto de vista
sobre seu desejo de amar um pequeno ser humano ser maior do
que todos os desafios que viriam.
Sinto que agora, com meu aniversário se aproximando, o
peso de meus óvulos também estarem completando 40 anos me faz
enxergar que essa é minha última chance de conceber e gerar uma
criança.
Sei que ter um filho sozinha irá complicar – e muito – minha
vida profissional, pois praticamente vivo no escritório, debruçada
sobre pranchetas ou fazendo modelagens e apresentações no
Revit. Tirar um conceito do AutoCad e desenvolvê-lo em 3D é
trabalhoso, demanda horas, mas o resultado é o mais próximo
possível da realidade que o cliente pode ter. Terei de diminuir o ritmo
de trabalho, mudar-me para um apartamento maior e pensar em
babás, creches, escolas. Tudo sozinha.
Guardo o folheto para lê-lo mais tarde e abro meu laptop
diretamente na intranet, vendo um memorando do diretor do
escritório, meu pai, endereçado a mim. Pelo título, sei que vou me
irritar bastante, então o ignoro e abro meus programas de desenho
para continuar trabalhando nos projetos que iniciei.
Fico horas assim, desenhando, calculando, fazendo
pesquisas em revistas e sites do ramo, nacionais e internacionais,
esboçando ideias para apresentar aos clientes antes de retomar o
esboço da Stone. Quando sinto minha vista arder, fecho os olhos e
tento relaxar. Inconscientemente, meus pensamentos viajam até
Nova Iorque, a uma noite qualquer de um ano atrás, quando conheci
um homem que conseguiu extrair toda a tensão do meu corpo, da
minha mente e, quiçá, da minha alma.
Sorrio ao me lembrar da cara de espanto da Pietra ao saber
que fui ao tal clube e do meu total assombro quando ela me
mostrou, sobre o balcão da cozinha, os tais convites que havia
separado para mim. Foi então que eu soube que ela havia sido
convidada para aquele evento, pois era sócia da tal boate, e que o
nome registrado por lá, naquela noite, fora o dela.
Ela quis saber detalhes da minha noite, mas eu não estava
disposta a revelar que passara horas sendo degustada, comida e
fodida por um homem desconhecido e sem rosto. Ela iria mandar
me internar!
Mesmo Pietra tendo me aconselhado a ter diversão naquela
noite, com certeza o que aconteceu nem lhe passou pela cabeça. O
que minha prima pensa que fiz foi conhecer alguém, conversar e
passar a noite com ele. O normal. Bem diferente do que fiz, na
verdade. Aquela noite foi minha, e seus detalhes e memórias são
exclusivamente meus.
Fiquei sabendo de lugares que promovem esse tipo de “festa”
aqui no Brasil, então tomei coragem e acabei indo a um deles,
porém, ao chegar lá, senti-me muito estranha. Não havia um
moreno bonito sentado perto do bar, nenhum homem se aproximou
para sugerir uma bebida que combinasse comigo. Enfim, descobri
que o que eu queria não era mais encontros como aquele, mas sim
mais encontros com ele.
Conformei-me, então, a seguir a vida, continuei saindo, tive
um ou dois encontros que não levaram a lugar nenhum, cuidei do
meu cão, visitei minha família, dei apoio aos meus amigos. Tudo
normal no mundo de Melissa Boldani.
Escuto baterem à porta, e Tânia aparece.
— Mel, o doutor Julio quer conversar com você na sala dele.
Suspiro, conformando-me em ter de falar novamente daquele
assunto: a TGS.
— Me dê uns minutinhos, e eu já vou... — Faço uma careta
para ela, que sorri, compreendendo.
— Quer um café para ajudar?
Ai, a Tânia é uma fofa!
— Não, obrigada! — Levanto-me. — Preciso apenas de água
bem gelada. — Abano-me. — O verão virá forte esse ano!
Acompanho-a para fora da sala, rumo à cozinha. Ela me
conta sobre o que viu no jornal acerca da previsão do tempo, mas
de repente fica quieta.
— O que foi?
Ela me olha sem graça, e escuto as vozes sussurradas
dentro da copa:
— É sério! O homem estava apavorado com os projetos dela!
— Reconheço essa voz imediatamente: Carlos Antunes, o
detestável arquiteto que meu pai insiste em manter no escritório
porque ainda conserva a parte mais tradicional do nosso trabalho e
é bom nisso. — Chegou a me perguntar se ela é recém-formada,
sem experiência! — Franzo o cenho, mas sigo adiante, evitando me
contaminar com as fofocas dele. — Agora, sim, vão ver que ela não
tem o talento do pai...
Minha nuca se arrepia ao ouvir essa última frase, e encaro
Tânia.
— Ele está falando de mim?
Tânia fica visivelmente sem graça e vermelha, e tenho minha
resposta, mas ainda assim não consigo entender do que ele está
falando.
— Tânia... — insisto com ela.
— Mel, é melhor você conversar com seu pai. — Arregalo os
olhos. — Ao que parece, o babaca do Carlos já está espalhando
pelo escritório sem se importar se você já está sabendo ou não.
— Sabendo do quê?
Ela aponta para a porta da sala do meu pai, e não enrolo
mais, indo até lá sentindo meu sangue fervendo.
— Mel! — Ele se levanta assim que me vê e pede a sua
assistente para sair e nos deixar a sós. — Sente-se, filha, como
está?
— Pai, sem rodeios. — Ele ergue as sobrancelhas. — O que
o doutor Stone quer agora? Vamos ver... — Finjo pensar. — Ele
quer uma piscina no último andar? Não! Claro que não é isso, seria
moderno demais! — digo com ironia. — Ele quer armários de
carvalho e bancada de mármore num estilo retrô bem brega?
— Mel... — Julio começa a me repreender.
— Pai, o homem não sabe o que quer! Se fosse para apenas
adaptar os projetos das lojas já existentes, eles não precisavam nos
contratar, qualquer recém-formado sabe fazer “copia e cola”! Além
do mais...
— Nós pensamos sobre isso, filha. — Interrompe-me. — E
chegamos ao consenso de que, talvez, seja melhor substituirmos a
equipe.
Isso me pega desprevenida.
— Substituir a equipe? — Rio. — Minha equipe é ótima!
— Sim, ela é, mas o senhor Stone pensa que talvez vocês
ainda não tenham entendido a essência da TGS.
— Essência?! — Não acredito no que estou ouvindo. Que
porra é essa de essência?! — Pai, o homem não aceita dar
brasilidade à obra, quer tudo no padrão americano! Além disso, ele
tirou toda a delicadeza da construção...
— Mel, eles são assim! Por que vão mexer em algo que já
está funcionado? — Bufo, indignada com isso. — Eu sei que, por
você, a loja de São Paulo não seria como as outras, teria
personalidade, mas... — cochicha — eles são americanos!
— Ele solicitou nossa substituição?
— Não diretamente. — Dá de ombros. — Apenas deu a
entender que nosso prazo para apresentar o projeto pronto está se
esgotando e que não entendeu os esboços, pois não se comunicam
entre si. — Franzo a testa, sem entender. — Carlos e eu
conversamos...
— Carlos?! — Não acredito que aquele filho da puta
convenceu meu pai a me tirar esse projeto!
— Sim, o Carlos. — Suspira. — Mel, você precisa de uma
pausa, filha. Depois daqueles dias que você ficou na Itália, parece
que voltou ligada na tomada. Fez um belíssimo trabalho com o
projeto de reforma do prédio da Rede Villazza, ficou virando noites e
noites com todos os projetos que acumulei na viagem que fiz com a
Hilda. Fazer pressão com um projeto de reforma complicado como
esse da Stone é injusto com você.
Começo a rir, meio enlouquecida, pois meu pai nunca teve
problema em me pressionar no trabalho. Ele sabe que eu dou conta!
Penso no Carlos Antunes, e meu sangue ferve. Sinto-me traída, pois
ele quis se integrar à minha equipe com a desculpa de trazer uma
visão mais tradicional, quando, na verdade, queria me tirar da conta.
Saio do escritório de meu pai como se estivesse possuída e
sigo direto para a sala do Antunes. O babaca está lá e, assim que
me vê entrar, dá-me um sorriso irônico.
— Espero que não se importe com isso, Mel. Só fizemos o
que é melhor para a empresa...
— Para com o teatro! — digo, séria. — Eu não nasci ontem,
Carlos. Sou uma mulher lutando nesse mundo onde os homens
acham que nós não temos capacidade para projetar grandes
construções. Estou neste escritório desde que você ainda pensava
em fazer faculdade e já lidei com muita gente que, com voz doce e
boas intenções, só querem puxar nosso tapete!
— Mel, minha querida, você está nervosa. — Ele se senta na
beirada da mesa. — Essas suas descompensadas é um dos
motivos de seu pai ter tirado a TGS de você, além do fato de o
doutor Stone achar que você não tem know-how suficiente.
— O quê?!
Cerro os punhos, tentando me controlar para não dar uns
bons tapas na cara desse filho da puta. Eu deveria ter entrado nos
treinamentos de MMA com a Giovanna!
— É, foi o que ele disse por aí... — Encara-me e sorri. — E,
bem, isso podia afetar a reputação do escritório...
Não escuto mais nada. Saio da sala dele batendo a porta,
passando como um raio pela Tânia e me trancando na minha sala.
Só pode ser sacanagem! A vida inteira lidei com pessoas
comparando meu trabalho com o do meu pai, tido como um dos
melhores arquitetos do Brasil. Há alguns anos, depois de finalmente
mostrar meu estilo e ser reconhecida por isso, afastei essa sombra,
mas agora...
Grito de raiva, pensando no que aquele americano ficou
falando do meu trabalho por aí. Nunca fui insegura, mas sei que,
nesse meio, as pessoas mais aplaudem um malfeito do que tentam
ignorá-lo.
Olho para a minha estante, ao fundo da minha sala, repleta
de plantas pendentes e prêmios. Pego o telefone e ligo para a mesa
da Tânia.
— Tânia, você pode conseguir uma bolsa grande para mim?
Ela fica muda uns instantes, provavelmente tentando
adivinhar para que eu quero isso.
— Há um jogo de malas...
— Ah, sim. Pegue a maior, por favor.
Desligo o telefone e começo a retirar os prêmios do armário.
— Mel? — Tânia me chama com a mala na mão, olhando-me
com curiosidade. — Você vai nos deixar?
Rio.
— Não, Tânia, não se preocupe com isso!
Pego a mala, pensando no que ela me perguntou. Por muitas
vezes, ao ouvir as comparações e cobranças por eu ser a filha de
Julio Boldani, pensei em deixar o escritório, mas nunca o fiz.
Primeiro, porque isto aqui é um legado meu também, afinal, sou filha
dele, mas principalmente porque estive aqui envolvida com esse
negócio toda a minha vida. Não vou desistir assim tão fácil, não!
Coloco na mala todos os prêmios que recebi desde que pude
assinar meu primeiro projeto, após a graduação, sob o olhar curioso
de Tânia. Sei que estou sendo irracional, até mesmo imatura, mas
sabe o que mais? Cansei de ser a mulher boazinha que engole
desaforo, a “mosca morta”, como minha mãe por vezes me chama.
É hora de dar um basta nisso!
Fecho a mala e olho decidida para Tânia.
— Vou dizer a você, mas não diga a mais ninguém, ok? —
Ela assente. — Vou finalmente conhecer o doutor Stone!
Ela arregala os olhos, olhando da mala para meu rosto como
se pensasse que fiquei louca.
— Mel... pensa melhor... — Ela se aproxima. — Você não tem
um horário marcado com ele...
— Pois é, Tânia! — Arrasto a mala pela sala com um sorriso
grudado no rosto, com os dentes travados. — Ele nunca se dispôs a
marcar um encontro entre nós para podermos decidir os
pormenores do projeto, então resolvi que vamos ter um encontro
não marcado!
— Mel, pensa melhor, isso pode te prejudicar.
Balanço a cabeça.
— Eu sempre fiz tudo o que era considerável certo e mesmo
assim sou prejudicada a todo momento. Ninguém pergunta ao
Carlos se ele está feliz por ter priorizado a carreira a
relacionamentos e filhos, mas para mim isso é perguntado a todo
momento.
Ela assente.
Saio da sala com Tânia me ajudando a arrastar a pesada
mala e decidida a mostrar ao prepotente doutor Stone com quantas
linhas se traça um projeto!
Estaciono o carro em um prédio-estacionamento e sigo a pé
até a Paulista, onde fica o prédio com o escritório provisório da TGS.
Estive lá algumas vezes, em reuniões com gerentes e
coordenadores de vendas que vieram para treinar os funcionários
brasileiros, e já conheço a recepcionista, porém, sei que, para falar
diretamente com o diretor, terei de dar uma de louca, afinal, como
Tânia lembrou, não tenho hora marcada.
Entro no elevador, chamando a atenção para a minha mala,
que faz barulho por causa dos prêmios – de metal e vidro – jogados
a esmo dentro dela. O trajeto até aqui deveria ter me deixado mais
calma, mas acho que tudo está entalado em mim há tanto tempo
que simplesmente preciso descarregar tudo hoje.
O elevador para no 25.º andar, e já saio no corredor da
Stone. Ando até as salas que eles alugaram, e, assim que abro a
porta, Cristina, a assistente da diretoria que conheci quando vim
aqui antes, levanta-se com um sorriso para me receber.
— Senhorita Boldani! — ela me cumprimenta muito
educadamente.
— Olá! — Respiro fundo. — O senhor Stone se encontra?
Ela franze o cenho, pois sabe que não há nenhuma reunião
agendada para hoje.
— Ele acabou de sair de uma reunião e já está a caminho de
outra! É algo urgente? Posso tentar encaixá-la para amanhã...
Ela se abaixa para pegar a agenda, e aproveito a deixa.
Passo pela porta de vidro caminhando o mais rápido que posso,
transitando por entre alguns funcionários que me olham com
curiosidade, indo em direção à porta onde está escrito numa placa a
palavra “diretoria”.
Abro-a de uma só vez e marcho sala adentro, pegando o
desgraçado de surpresa, de costas e falando ao telefone, admirando
a Paulista lá embaixo.
Ele se vira para me encarar, mas não me faço de rogada.
Enlouqueci mesmo! Abro a mala e – literalmente – despejo todos os
prêmios e congratulações que recebi ao longo da minha carreira,
fazendo um barulho horrorosamente alto.
Se ele estava achando que eu estava trabalhando em seu
projeto por ser filha do dono da empresa ou se pensava que eu era
uma garotinha inexperiente, faço questão de lhe provar que não,
que sou uma mulher muito competente e mereço respeito!
— Doutor Stone... — Cristina está até sem fôlego, e lamento
que talvez lhe tenha causado problemas. — Eu não consegui...
Encaro-o pela primeira vez. Queixo erguido, cenho franzido e
olhar malvado, mas, assim que meus olhos encontram os dele, sinto
um frio na barriga, principalmente pela forma como ele me avalia,
como se estivesse tentando descobrir quem eu sou ou... como se já
soubesse.
— Obrigado, senhora Pires — ele diz em português com um
forte sotaque. — Eu resolvo.
Não consigo parar de olhá-lo e apenas escuto a porta da sala
sendo fechada, indicando que estamos a sós. Ele olha para sua
mesa, cheia de placas e troféus, franze o cenho e então me olha de
novo.
— Bonita coleção... — Pega uma das plaquinhas e lê meu
nome. — Melissa M. Boldani.
Sua voz lendo meu nome faz minha pele inteira se arrepiar.
Fico quente, sinto o sangue circular mais rápido em meu corpo e...
Melissa, faça o que tem de fazer e vá embora!
— É mais do que uma coleção, doutor Stone — informo em
português, embora tenha vindo preparada para gastar meu inglês
com ele. — Eles contam um pouco sobre a minha trajetória
profissional. Sobre o tipo de profissional que sou...
— Hum... — Ele analisa a bagunça em sua mesa, mas
permanece quieto.
— Eles são o reconhecimento de que eu, embora carregue o
sobrenome do meu pai, não preciso ser carregada por ele, entende?
Tenho meu próprio mérito!
Ele apenas me encara, cerrando seus olhos escuros, cor de
chocolate, fazendo-me lembrar de um certo olhar, em uma certa
noite há um ano.
— Não tenho dúvidas, senhorita Boldani. E foi por esse
motivo que lamentamos a senhorita ter que deixar nosso projeto
para priorizar um mais antigo... — Ele levanta a sobrancelha, e fico
puta com tamanha cara de pau.
— O quê? É essa a desculpa que vocês combinaram sobre
minha saída?
Ele sorri, e eu fico lívida. Imagens daquele sorriso, daquela
pele morena, olhos cor de chocolate... Não, Mel. Você está louca!
Contudo, o porte, o tamanho e até mesmo a proporção do corpo são
iguais.
Além disso tudo, tem a voz... Minha a noite toda para tudo o
que eu quiser fazer com você.
— ...ele me explicou que estava sendo too much conciliar
todos os projetos e, por já termos passado por tantos rascunhos,
seria melhor um profissional que estivesse exclusivamente for us. —
Ele se interrompe, percebendo que estou muda e lhe olhando
fixamente. — Algum problema?
— No, I’m sorry. Can you repeat your explain, please?[6]
Ele estranha eu ter mudado para seu idioma, mas faz o que
peço, explicando-me em inglês que Carlos sugeriu a mudança, pois
ele poderia se dedicar exclusivamente aos projetos deles, seguindo
os padrões americanos... No entanto, eu, que deveria estar bufando,
puta com o espertalhão do Carlos, estou imóvel, com o coração
prestes a sair pela boca.
Não pode ser!
Sinto tudo começar a rodar e me lembro de que não parei
para almoçar hoje e que saí como uma verdadeira Emily Thorne em
busca de Revenge. Fecho os olhos e respiro fundo, esperando que
um buraco se abra sob meus pés e que eu desapareça da frente
desse homem... daquele homem!
Sinto sua mão sobre meu ombro e ainda consigo ouvir sua
voz, embora o som esteja longe e encoberto pelo zunido nos meus
ouvidos. Olho-o novamente, mas a confirmação de que ele é
realmente quem eu penso que seja não vem somente de seu rosto,
mas sim de seu cheiro, de seu perfume.
— Mas que merda... — Ao ver sua expressão divertida,
percebo que não só pensei isso, mas falei em alto e bom som.
Talvez ele ainda não tenha descoberto... Pensa, Melissa! — Sinto
muito por ter invadido sua sala assim.
O sorriso charmoso que me fez admirá-lo há um ano,
bebendo Dry Martini naquela boate, está pregado em seu rosto. Só
pode ser sacanagem comigo! Quais são as chances?
— Penso que... — olha para a sua mesa, e me sinto uma
idiota pela ceninha ridícula que fiz — houve algum mal-entendido.
Suspiro e concordo.
— Sim, sinto muito! — Afasto-me o mais rapidamente
possível, pegando todos os objetos que despejei em cima da sua
mesa e jogando-os de qualquer jeito dentro da mala. — Peço que
me perdoe por isso. Realmente foi a melhor solução eu estar fora do
seu projeto...
— Mesmo? — Parece surpreso. — Não me pareceu que a
senhorita pensasse isso quando entrou aqui.
Detenho-me e o fito, mas os seus olhos estão fixos em minha
mão, e sei bem o que ele está vendo. O anel, o mesmo anel que eu
usava naquela noite, na mão que ele beijou antes de entrarmos no
elevador. Não se lembre!
— Como o senhor disse, foi um mal-entendido. — Fecho a
mala. — Sinto muito, e nós iremos compreender se decidir romper
seu contrato conosco...
Caminho apressada para a porta e a abro sem nenhuma
sutileza, demonstrando que estou em rota de fuga.
— Senhorita Boldani! — ele me chama, e eu o olho. — Nice
to meet you[7]... — dou um sorriso sem graça e lhe viro as costas
para fazer meu vergonhoso caminho de volta, mas sinto meu corpo
gelar quando ele completa — again[8].
Minha humilhação está completa!
Ele me reconheceu!

— Mel, por favor, fale mais devagar! — Pietra grita do outro


lado da linha.
Tento parar de tremer e bebo mais um enorme gole de vinho.
Droga, Pietra está a quilômetros daqui e em um lugar com sinal
péssimo, e Giovanna... bem, Gio ainda está cheia de problemas, e
não quero jogar nenhum mais sobre ela. Só preciso contar para
alguém e saber se estou ficando louca. Era só o que faltava: óvulos
querendo aposentadoria, e meu cérebro esclerosando!
A vida já não foi cadela o suficiente comigo? Por favor! Por
que, em nome de Deus, o homem mascarado – que peguei
aleatoriamente em Nova Iorque – tem de ser justamente o Adam
Stone?
Minha cabeça está uma bagunça. Passei 12 meses gozando
com a lembrança dele e, ao mesmo tempo, xingando-o de
enjoadinho e outras expressões bem mais pesadas e pejorativas. O
mesmo homem!
— Naquela noite, eu fiquei com um cara...
— Imaginei isso, afinal, você apareceu aqui de manhã e sem
calcinha! — Ela ri.
— Droga, Pie, o homem está aqui no Brasil! — Minha voz sai
desesperada.
— Ele está perseguindo você?
— Não. Ele é um executivo da TGS, Pie, um Stone! — Ela
gargalha, pois sabe que os tenho xingado todos os dias. — Droga,
Pie, isso é sério!
— Mel, se acalma e me conta qual é, de verdade, o
problema!
Sento-me, tentando fazer o que ela me pede e contar
devagar alguns detalhes daquela noite. Excluo os pormenores mais
íntimos, mas conto sobre a regra de não tirarmos as máscaras e de
não dizermos nossos nomes.
— Uau! — Faço uma careta, pois sei que minha prima usa
essa expressão quando está sem palavras. — Mel... você foi uma
garota má! — E cai na gargalhada. — Imagino que ele tenha valido
muito a pena!
— Valeu... — Suspiro, mas depois tento retomar o assunto
sem me desviar com lembranças daquela noite. — Pie, nós temos
um contrato com ele! Estive trabalhando para ele durante todos
esses meses...
— Ele reconheceu você?
— Acho que sim — informo desanimada.
Ela fica um tempo em silêncio.
— Mel, quero que você seja sincera comigo, ok? — Emito
apenas um som em consentimento, pois sei que a pergunta que ela
me fará será complicada. — Será que não é coincidência demais
para ser ignorada? Sabe, vocês estarem se encontrando de novo...
Acho que, se valeu a pena, você poderia investir...
— Pie, foi bom porque foi daquele jeito. Além disso, não sei
se ele está disponível para isso.
— Hum... Mas e se estiver?
Suspiro novamente, deitando-me no sofá, pensando naquela
noite, analisando todos os relacionamentos que já tive e que deram
errado.
— Eu não gostaria de estragar aquela experiência, Pie. Não
consigo manter um relacionamento...
— Besteira, Mel! — ela me repreende. — Você é a pessoa
mais incrível que eu conheço! Sabe por que todos os seus
relacionamentos naufragaram? — Seguro o fôlego, sabendo a
resposta. — Você estava concentrada no homem errado!
Olho para o enorme quadro em minha parede. Comprei essa
ilustração há alguns anos porque senti empatia pela pobre figura,
sentada sozinha à mesa de um café parisiense enquanto as outras
mesas estavam cheias. Se uma pessoa romântica olhar para a
expressão dela, interpretará como sendo de tristeza e solidão, mas,
se uma pessoa prática a olhar, dirá que ela tem o prazer de usufruir
de seu café e de sua leitura sem que ninguém a perturbe com
conversas.
Eu, infelizmente, sou romântica. Sempre esperei um dia olhar
para a imagem e levantar minha própria xícara de café, saudando-a
pela escolha que fizemos de estar sozinhas, mas até hoje não
consegui fazer isso. Não sou uma alma solitária, que gosta de ser
só. Sou alguém que sente uma enorme falta de sua outra metade,
se isso existir.
— Mel?
— Eu não sei, Pietra — confesso, sincera. — Realmente não
sei.
Não há mais nenhuma dúvida!, penso, ainda atordoado com
a entrada de Melissa Boldani em minha sala. Se eu estava
preocupado por não encontrar mais a mesma química que sentimos
naquela noite, posso relaxar, porque ela está presente e, talvez,
ainda mais forte.
Melissa é como um furacão! Olho para uma das placas que
ela despejou sobre minha mesa e que ficou para trás quando os
juntou apressada, a fim de fugir, e a pego para ler. Não preciso de
nenhuma comprovação de que ela é inteligente, bem-sucedida,
linda e com um gênio forte, exatamente o tipo de mulher que me
atrai, porém, saber que ela tem sido reconhecida por isso me deixa
com ainda mais tesão.
Melissa estava no limite quando chegou aqui. Percebi que
algo aconteceu para que ela explodisse daquela maneira, e isso me
deixa intrigado, pois, quando retornei o e-mail sobre o último
esboço, deixei bem claro que não o havia entendido. Não parecia
um projeto feito por ela, não tinha sua personalidade, suas linhas,
nada! A resposta do escritório foi que a nova equipe faria os ajustes
de acordo com as instruções que eu desse, pois Melissa Boldani
havia se retirado da conta.
Fiquei decepcionado, não vou negar, tanto que solicitei uma
reunião com Julio Boldani para podermos otimizar as coisas, pois,
pelo que entendi de toda a documentação, meu irmão nem sequer
conversou com eles.
Por isso a entrada de Melissa daquele jeito me deixa
intrigado.
É essa a desculpa que vocês combinaram sobre minha
saída? A voz revoltada dela não me sai do pensamento, e pressinto
que algo muito errado aconteceu.
— Posso? — Nuno aparece na soleira da minha porta, que
ficou escancarada desde a saída dela.
— Entra e fecha a porta. — Deixo o prêmio de volta sobre a
mesa.
— Soube que houve uma comoção por aqui e encontrei uma
mulher belíssima entrando no elevador como se estivesse sendo
perseguida. — Nuno ri. — Espero que não tenha sido nenhuma
candidata às vagas na loja, porque ainda nem comecei as
pesquisas.
Respiro fundo e me sento.
— Não, não era nenhuma das candidatas. — Empurro a
placa na direção dele, e, quando Nuno lê o nome, arregala os olhos.
— Pois é, meu amigo, eu queria ir devagar, mas ela chegou me
atropelando.
— Melissa Boldani descobriu que você é o...
— Não foi por isso que ela veio aqui. — Rio ao lembrar-me
da expressão dela quando, finalmente, me reconheceu. — Houve
algum problema com a saída dela da conta da TGS, e veio me
provar que é uma profissional competente, reconhecida, e não uma
menina sem experiência.
Nuno ergue a sobrancelha.
— O que aconteceu para que ela agisse assim? Pelo que
entendemos, saiu porque estava com muitos projetos.
Dou de ombros.
— Parece que não foi bem isso. Ela estava tão nervosa que
quase não consegui acompanhar o que dizia, pois falava muito
rápido. — Ele ri. — Preciso melhorar meu português!
— Ela o reconheceu?
Sorrio satisfeito com a reação de Melissa quando, finalmente,
soube quem eu era.
— No começo, não, mas, quando o fez... — Reclino-me na
cadeira. — Ainda está lá, Nuno, a atração, a química, o magnetismo
que nos arrebatou naquela noite.
— É, meu amigo, acho que, pela forma com que ela saiu
daqui e diante de tudo o que aconteceu no trabalho dela, você terá
um longo caminho para tê-la novamente em sua cama.
Cruzo os braços e dou um meio-sorriso.
— Ah, mas vou tê-la, Nuno. Não há possibilidade alguma de
isso não acontecer. — Ele faz uma expressão cética. — Nem que
para isso eu precise colocar todo meu empenho em conquistá-la.
— Boa sorte, então!
Rio, pois ninguém nunca poderá dizer que a boa sorte não
gosta de mim, afinal, quais eram as chances de um pequeno
bastardo, filho de um empresário rico com uma empregada
mexicana, ser reconhecido como herdeiro de um dos homens mais
ricos dos Estados Unidos?
— A boa sorte está no meu sangue, caro amigo!

Resistir à vontade de entrar em contato com Melissa Boldani


é algo que está difícil de fazer, porém, sei que ela precisa de um
tempo para processar nosso encontro e eu preciso colocar muitos
assuntos de trabalho em dia.
John é um maravilhoso designer de joias, mas, como eu
mesmo previ, é um péssimo gestor. Esmiucei a lista de candidatos
às vagas de emprego para a loja e, sem nenhuma surpresa, percebi
que ele selecionou apenas mulheres “padrão”, ou seja, brancas – a
maioria loiras – e bem jovens. Por sorte, foi a primeira seletiva, e já
encaminhei um e-mail para a agência que está fazendo a
intermediação para começar nova seleção.
Claro que irei aproveitar algumas das moças que ele pré-
selecionou. Entretanto, quero diversidade e que a maioria
represente o povo brasileiro. Negras, índias, ruivas, homens,
mulheres, gays e todo tipo de representatividade. Essa é a política
mundial de inclusão, e a TGS vem se adaptando a ela.
Não foi fácil convencer os mais antigos e tradicionais de que
deveríamos abrir oportunidade a todas as pessoas
independentemente de qualquer ditame, mas, na última década, já
fizemos avanços significativos, não só nas lojas, como também na
mídia, na escolha de modelos para nossas propagandas.
Particularmente, essa nova mentalidade é uma vitória. Sei o
que é ser diferente do “padrão”. Sei o que é ser latino, moreno,
dentro de uma família branca, tipicamente americana. Meu pai
sempre me tratou com muito carinho, não tenho do que reclamar.
No começo, tive alguns problemas com Aaron, pois ele era um
adolescente loiro e de olhos azuis ganhando um irmão de sete anos
totalmente diferente dele.
Com o tempo, aparamos nossas arestas – usando punhos,
inclusive –, e hoje posso afirmar que ele é o melhor amigo que eu
desejaria ter. Compreendo seus medos e traumas, entendo seus
demônios e, embora quisesse muito fazer algo para ajudá-lo a
superar, sei que não está em minhas mãos.
Aaron me ajudou muito durante a fase escolar, quando eu
sofria constantes ataques de bullying. Estudávamos na escola mais
cara e exclusiva de Los Angeles, junto a muitos filhos de astros de
cinema, e, naquela época, eu ouvia piadas sobre minha herança
genética e, principalmente, sobre minha mãe. Coisas do tipo: “estou
precisando limpar a piscina lá de casa, Adam, quer ganhar um
trocado?”. Ou mesmo: “se todo bastardo de empregada mexicana
fosse reconhecido, a escola estaria cheia de latinos.” No começo,
isso me machucava demais, porém, com meu irmão ao meu lado,
conseguimos diminuir, impondo medo de nossos socos, a maioria
das provocações.
Realmente não era comum o que meu pai fez, pois ele não
somente me reconheceu, ele me assumiu e colocou debaixo de
suas asas, dando-me o mesmo tratamento que Aaron e, mais tarde,
Jeremy e John recebiam. Para o velho Joshua Stone II, não havia
nenhuma diferença entre mim e meus irmãos.
Por isso, por saber o que é se sentir prejudicado por ser
quem é, apoiei e continuo pressionando para que nossa política
inclusiva se estenda a todas as unidades da TGS. Aaron também
pensa como eu e foi o responsável por introduzir também o
pensamento sustentável na empresa.
Viemos da mineração antes mesmo de aprendermos a
fabricar joias. Nossos ancestrais ficaram ricos minerando o solo e o
leito de rios atrás de ouro e prata. Reconhecer o quanto
degradamos para chegar aonde chegamos foi um passo enorme na
nossa história, por isso começamos a investir pesado em soluções
ambientalmente corretas para a empresa.
Passo a passo, estamos evoluindo, e acredito que são
pensamentos assim, que acompanham as mudanças de
consciência do mundo, que fazem com que a TGS permaneça
consolidada nesse mercado tão competitivo das joias.
Outro furo enorme que encontrei na “gestão” do meu irmão
foi com relação aos fornecedores locais. O Brasil tem lindas gemas,
que são cobiçadas pelo mundo todo. Raros diamantes coloridos já
foram encontrados aqui, e a nossa grande aposta para uma coleção
exclusiva é a turmalina Paraíba, com sua linda cor azul neon. A
pedra é raríssima, e seu grama pode chegar à casa dos 100 mil
dólares, e é exatamente isso que nossos clientes mais exigentes
querem.
John, claro, pensou nisso e encontrou os melhores
fornecedores. Contudo, dispensou quaisquer outras pedras de solo
nacional, o que por si só é um erro, afinal, não teremos matéria-
prima suficiente de turmalinas Paraíba para trabalhar uma coleção
de muitas peças, e a ideia nem é essa! A gema rara é a cereja do
bolo, por assim dizer, mas o Brasil tem outras pedras tão lindas e
viçosas quanto, mais acessíveis e em maior quantidade.
Então terei que começar a fazer os contatos certos para
conseguir esse tipo de gema que ele descartou achando que não
valia a pena por não ser tão valorizada quanto a pedra rara. Esse
tipo de pensamento dele me surpreende um pouco, afinal, uma
gema é valorizada também pela lapidação, pela combinação com
outras pedras e metais, e ele, como designer, devia ser o primeiro a
saber.
— John parecia estar muito distraído aqui... — concluo para
mim mesmo, analisando seus relatórios. — Tudo parece ter sido
feito de qualquer maneira, como se o foco dele não estivesse no
trabalho.
Estico meu corpo e balanço a cabeça, fazendo meu pescoço
estalar. Há algum tempo venho querendo voltar a praticar
exercícios, e a proximidade com o Parque do Ibirapuera –
finalmente consigo pronunciar esse nome! – me deixa animado para
voltar a correr.
Não sei quanto tempo vou permanecer em São Paulo para
me matricular em algum estúdio e contratar um personal, mesmo
achando que seja essencial, na minha idade, manter o
condicionamento físico.
Penso em Melissa Boldani, e a imagem dela na minha sala,
elegantemente vestida com calça de linho e blusa de seda, faz-me
pensar no quanto seu corpo é firme, sinal de que mantém alguma
rotina de exercícios ou foi extremamente privilegiada pela genética.
Basta esse pensamento para me deixar excitado e meu
membro se enrijecer como o de um garoto na puberdade. Coloco a
mão sobre ele, sentindo-o se contorcer, fecho os olhos e deixo a
mente vagar pelas lembranças, pela textura, pelo sabor de Melissa.
É uma tortura saber que ela está tão perto, em algum lugar
desta cidade, e ao mesmo tempo ter que dar o espaço necessário
para que não se sinta acuada ou pressionada por mim, afinal, temos
também uma ligação profissional.
Gemo e aperto meu pênis ao lembrar-me de que irei vê-la
novamente, pois marquei uma reunião em seu escritório.
É hora de dar mais um passo, Adam, e deixar claro que a
quer novamente!
A caminho do escritório, nesta manhã, estou tentando ignorar
a dor em minha cabeça e, confesso, em meu orgulho. Como era
esperado, tive uma noite insone, pensando em que tipo de
brincadeira macabra o destino está maquinando contra mim.
Desisti de ficar na cama e trabalhei no computador, refinando
detalhes, fazendo projetos paisagísticos – coisa que não faço, pois
temos um profissional para isso –, tudo para me cansar e conseguir,
enfim, conciliar o sono.
Entretanto, ele não veio. Então, como a boba que sou, abri
uma garrafa de vinho branco, sentei-me de frente para a televisão e
selecionei pela milésima vez o filme O melhor de mim, do Nicholas
Sparks. Resultado? Terminei a noite bêbada, com os olhos inchados
de tanto chorar, mas consegui dormir por algumas horas.
Agora, duas aspirinas depois, minha cabeça martela como se
houvesse um marceneiro louco habitando-a, e meu orgulho,
avariado pela loucura de ontem, incomoda-me somente com a
possibilidade do que já foi comentado sobre mim na empresa.
Paciência! Meteu a louca ontem, hoje tem que assumir!
Entro com o carro na garagem da enorme casa onde fica a
Boldani, um local projetado pelo meu pai há muitos anos e que
demonstra o motivo pelo qual ele foi e é considerado um gênio da
arquitetura.
A casa foi construída no formato de uma colmeia, com seis
hexágonos ligados, sendo quatro deles com estrutura completa de
escritórios e áreas de criação, um para área de convivência, copa e
cozinha e o outro com a sala de reuniões e o escritório dos diretores
– meu pai e meu tio, Tadeu, que se aposentou e hoje passa mais
tempo na Itália do que aqui.
Em volta dessa casa tão única, há um jardim bem-cuidado,
as garagens cobertas com capacidade para 10 carros e um
estacionamento para visitantes. A entrada é simples, com um muro
revestido de mármore italiano branco e o nome BOLDANI em aço
escovado.
Desço do meu carro com orgulho – um veículo 100% elétrico,
compacto e perfeito para mim, embora eu receba muita gozação por
causa dele – e pego minha pasta e alguns canudos com pranchas
de projetos que levei para casa e entro logo na recepção,
cumprimentando as meninas que ficam do outro lado do balcão,
mas sem conversar com elas como faço todos os dias. Quero muito
chegar à segurança da minha sala e só sair de lá quando for
estritamente necessário.
Covarde, eu sei, mas é um instinto de preservação do ego!
Tânia se levanta assim que eu chego, e sinto os olhares de
duas estagiárias que estão sob minha supervisão. Cumprimento-as
com a cabeça e passo batido para minha sala. Todavia,
infelizmente, não tenho como ignorar a arquiteta júnior e meu braço
direito.
— Bom dia, Mel. — Ela parece reticente ao me saudar, talvez
por causa do papel de louca varrida que interpretei ontem.
— Bom dia, Tânia! — Resolvo perguntar de uma vez: — Tudo
tranquilo por aqui?
— Sim. — Ela põe alguns recados anotados em seus
famosos post-it coloridos em cima da minha mesa. — Fizemos café,
quer?
— Não, obrigada! — Ela não sabe, mas já tomei quase um
litro dessa bebida tentando melhorar esta maldita ressaca. — Eu
trouxe algumas plantas que estavam comigo. Você pode levá-las de
volta ao arquivo? — Ela assente e pega os canudos, enquanto leio
os recados. — A Isabella adiantou o assunto? — Estranho ver
apenas um recado dela me pedindo para ligar.
— Não. — Dá de ombros. — Ela só pediu que você
retornasse.
Balanço a cabeça assentindo, colocando aquele recado
colado no meu laptop para ligar mais tarde para ela, pois Gio ainda
está em Curitiba e pode ser que o assunto seja sobre ela.
— Seu pai comentou alguma coisa sobre o Natal... — Ela ri e
rola os olhos, e sei do que está falando, pois meu pai a sonda ano
após ano para comprar meu presente. — Comentei sobre um certo
casaco de cashmere que vi na loja da Burberry.
Gargalho, mas logo coloco os dedos nas têmporas, sentindo
minha cabeça latejando.
— Obrigada pela dica! Eu realmente adorei aquele casaco! —
Pisco, agradecendo. — Minha cabeça está me matando...
— Quer uma aspirina? — Nego. — Mel... — Eu a olho ao
sentir que ela está sem graça com o que vai falar. — Não vai trazer
os prêmios de volta? — Ela aponta para minha estante, tristemente
vazia.
Bufo e fecho os olhos, pensando na mala cheia no meu
apartamento e no meu orgulho ferido pelo papelão que
desempenhei.
— Me desculpa por ontem, Tânia. Eu perdi a cabeça.
— Todo mundo surta em algum momento da vida, Mel. —
Sorri, companheira. — Estou aqui desde meu estágio e nunca ouvi
você sequer levantar a voz para alguém, por isso te entendo. Mas
não fique preocupada, até agora não houve nenhuma repercussão...
— Olha-me curiosa. — Você foi mesmo até lá?
O telefone toca, salvando-me de ter que contar a ela que sim
e do enorme papelão que fiz. Tânia atende a ligação e me olha com
a testa franzida, deixando-me tensa.
— ...Sim, doutor Boldani. — Tento perguntar do que se trata,
mas ela está estática. — Pode deixar, assim que ela chegar, peço
para ir até o senhor.
Puta que pariu, ela mentiu para ele!, penso com o coração
disparado, imaginando que meu pai já queira colocar minha cabeça
a prêmio por causa do que fiz ontem.
Deus do Céu, Melissa Boldani! Depois de tantos anos, parece
que estou tendo uma crise de meia-idade – será que já cheguei lá?
– e agindo como nunca agi na vida!
— Quão encrencada eu estou? — indago com uma careta.
— Eu não sei, Mel. — Dá de ombros. — Só sei que o doutor
Julio está à sua espera na sala de reuniões com o Carlos e o
representante da TGS.
Levanto-me de olhos arregalados, como uma criança pega
fazendo estripulia, mas não por causa da conversa que
provavelmente me aguarda, mas sim por saber que Adam Stone
está no escritório.
Sinto-me estremecer da cabeça aos pés, e meu rosto
queima, sinal de que estou corada, ao me imaginar na mesma sala
que ele, em frente ao meu pai, tendo que lidar com duas coisas
constrangedoras: minha atitude de ontem e a atração monstruosa
que sinto por ele.
Estou fodida!
Volto a me sentar e decido só ir até eles quando estiver
absolutamente calma e dona da minha razão. Aceito, então, aquela
xícara de café que Tânia me ofereceu assim que entrei na sala e
tento me concentrar nas tarefas que tenho para o dia de hoje.

Não sei precisar quanto tempo passei tentando trabalhar, sei


que eles estão me esperando há quase uma hora e que, nesse
ínterim, pensei em fugir, inventar alguma doença grave e dizer que
estou de molho em casa, mas, como sou uma mulher adulta,
resolvo arcar com as minhas atitudes.
Chegou a hora de saber o que eles querem e rever Adam
Stone, meu Mascarado. Meu Mascarado!, penso gemendo, ainda
sem entender essa virada do destino.
Tânia bate à porta e enfia a cara na fresta aberta pela terceira
vez.
— Mel, não tenho mais desculpas no meu repertório, e a
Bianca já esteve aqui duas vezes.
Meu pai já mandou a sua secretária atrás de mim, então não
tenho mais como enrolar, pois, da próxima vez, ele mesmo virá.
Respiro fundo, ajeito meu vestido, passo a mão pelos meus cabelos,
levanto o queixo e saio da sala.
Entro na sala de reuniões sem ao menos bater, e logo a
presença do americano chama minha atenção quando ele se
levanta para me saudar.
— Ah, finalmente! — Meu pai não parece nada feliz com
minha demora.
— Desculpem o atraso. — Não vou dar nenhuma desculpa,
pois não sei o que a Tânia disse. Tento não olhar para o homem
vestido com um terno escuro do outro lado da mesa. — Qual é o
assunto?
— TGS — meu pai diz sério e logo em seguida se vira para
Adam. — Senhor Stone, eu lhe apresento minha filha, uma das
melhores arquitetas do escritório, Melissa Maria Boldani.
Tenho vontade de rolar os olhos com a apresentação, pois
somente meu pai me chama de Melissa Maria, mas sei o quanto ele
aprecia um nome composto e como gosta de ressaltar isso para
seus filhos.
— É um prazer finalmente ser apresentado à senhorita. —
Adam me olha fixo nos olhos, e sua voz sexy e muito rouca parece
acariciar meu corpo, fazendo-me lembrar das coisas sujas que ele
sussurrou ao meu ouvido. Em seu rosto há aquele sorriso charmoso
e muito sensual exatamente igual àquele de um ano atrás, quando
ele me ofereceu champanhe no bar daquela boate.
Foco, Melissa! Obrigo-me a não seguir pelo caminho dessa
lembrança, pois a presença dele já é desconcertante o suficiente.
Estendo minha mão para cumprimentá-lo, parecendo profissional e
segura. No entanto, sinto como se mil borboletas voassem dentro do
meu estômago.
— Senhor Stone. — Toco em sua mão o mais rapidamente
que consigo e, em seguida, tomo assento à mesa.
— O doutor Stone sugeriu a reunião, Melissa, para que
possamos dar continuidade ao andamento do projeto. — Meu pai
intercala olhares entre mim e Carlos. — Mas já expliquei a ele que,
a partir de agora, a equipe que irá cuidar da TGS será exclusiva...
— Doutor Julio — a voz carregada de sotaque estrangeiro
interrompe a fala de meu pai —, creio ter havido um... — ele parece
pensar na palavra que vai usar — mistake...
— Erro? — Carlos faz a tradução para ele, mas Adam nega.
— Engano? — meu pai chuta, e ele concorda, agradecendo.
— Um engaño... — Levanto a sobrancelha ao ouvi-lo falar em
um espanhol perfeito, embora errando a pronúncia do português.
Ainda é uma surpresa para mim que ele fale tão bem minha língua...
Minha mente desvia para pensar em nossas línguas juntas, e
respiro fundo, tentando me concentrar. — Eu gostaria de continuar
com os projetos da senhorita Boldani, principalmente o segundo
esboço apresentado... — Encaro-o assustada, e a surpresa com
certeza não é somente minha, porque os olhos azuis do meu pai
estão praticamente ejetados para fora das órbitas, e Carlos está
literalmente de boca aberta. — Acho apenas que precisamos acertar
alguns problemas ocorridos com a concepção do projeto.
Fico puta ao ouvir isso, pois novamente ele está dando a
entender que não consegui desenhar o que ele queria.
— Problemas...? — questiono.
— Sim, senhorita Boldani. Infelizmente, a TGS possui um
padrão e, mesmo que seus diseños sejam maravillosos, meu irmão
entendeu que eles não passariam pela aprovação de todos os
diretores.
— Seu irmão? — indago sem entender, mesmo com o
coração acelerado por ouvi-lo elogiar meus projetos.
— Sí, meu irmão. — Ele ri. — Era meu irmão que estava aqui
representando a TGS. Cheguei há pouco tiempo. O segundo projeto
está praticamente perfecto, só precisam de alguns ajustes que são
padrões da TGS.
— Só isso? — Meu pai está com a testa enrugada e,
disfarçadamente, lança um olhar ao Carlos. — Eu entendi que o
senhor não havia aprovado o trabalho desenvolvido até aqui.
— Não, doutor Julio. — Encara-me. — O segundo trabalho
está perfeito. Para dizer a verdad, não entendi o terceiro draft[9],
estava mucho diferente dos otros. — Seguro minha vontade de rir
da sua confusão de palavras, mas ainda o achando sexy falando em
português, tentando conjugar os verbos certinho, mesmo ainda
tendo algum portunhol no meio das frases. — Podemos trabalhar
com o segundo projeto em pedaços, mas alguns conceitos
importantes devem ser mantidos.
— Desculpe-me... — Peço a palavra antes de meu pai dizer
alguma coisa. — Isso significa que você quer que eu continue no
projeto?
— Sí... — Ele me encara. — I want you, yet... no projeto.
Ai, meu Deus! Tenho certeza de que estou como um
pimentão depois do que ele disse. Adam falou a frase em inglês
para que eu lembrasse exatamente o que me disse há um ano! Eu
ainda quero você! Certamente essa confusão de idiomas não foi
sem querer.
Olho para a mesa, sem graça, torcendo para que nem Carlos
nem meu pai percebam minha reação. Todavia, minha insegurança
e a enorme vontade de saber se ele ainda se sente atraído por mim
fazem-me questionar: será que entendi o duplo sentido
corretamente? Será que ele está dizendo que quer repetir aquela
noite?
— Doutor Stone, como nós explicamos, trabalhar com uma
equipe exclusivamente no projeto de vocês — Carlos parece
nervoso, querendo convencê-lo a deixar as coisas como estão — é
o melhor para ambos os lados. Entendo que a senhorita Boldani
seja uma ótima arquiteta, mas, por isso mesmo, ela está com uma
lista de afazeres...
— Como te chamas? — Adam o interrompe.
Seguro um sorriso.
— Carlos.
— Carlos, eu vim até aqui para dizer que, se a senhorita
Boldani gostar de continuar conosco, nós concordamos.
— Mel? — meu pai me chama baixinho.
Caramba! Quase não consigo reprimir um sorriso ao ver
Carlos murchar e quase sumir debaixo da mesa de reuniões. A
verdade é que eu devia estar fazendo a dancinha da vitória aqui em
cima desta mesa, principalmente vendo a cara de derrota dele, mas,
agora que eu sei quem Adam Stone é, estou em dúvida sobre o real
motivo pelo qual ele quer que eu continue a projetar a TGS no
Brasil.
Sou muito orgulhosa e detesto apenas imaginar que ele me
queira pelo que aconteceu entre nós e não por minha qualidade
profissional. Além disso, trabalhar nesse projeto significa que
teremos contato frequentemente, e ainda não sei se devo seguir
esse caminho.
— A decisão é sua, pai — digo de cabeça erguida e
encarando Adam.
— Eu tinha pensado que seria melhor para você ter uma
pausa... — Julio fala baixinho e depois suspira. — Talvez, se eu
passar os seus outros clientes para as demais equipes...
— Pai, eu estou bem, não preciso de uma pausa... —
Encaro-o, um pouco temerosa de ele me afastar do projeto.
É, eu sei, estou como uma montanha-russa, subindo,
descendo, virando de cabeça para baixo e me contradizendo a todo
instante, afinal, se deixei a decisão para meu pai, por que estou
argumentando em prol de permanecer no projeto?
Hipocrisia, Mel! Eu mesma reconheço que quero, sim, estar
perto de Adam Stone.
— Então está decidido! — Respiro fundo, aliviada ao
perceber que a decisão será favorável à minha permanência. —
Melissa continua à frente dos projetos.
— Perfecto! — Ele sorri novamente, e eu derreto. Droga de
sorriso charmoso dos infernos! Ele se levanta. — Eu gostaria de
conversar com a senhorita. Podemos comer?
Sim, primeiro peço que não me julguem por querer ser a
comida dele, segundo, por ficar um tempo muda, como se não
processasse bem as palavras e sem conseguir dar uma resposta.
— Não vejo por que não — meu pai responde por mim. —
Acho que assim nós iremos conseguir ajustar melhor o conceito,
com contato direto.
Vejo os dois se cumprimentarem, bem como Carlos, que
ainda parece murcho e sem graça, e os dois saem da sala.
— Há algum restaurante favorito seu?
Ainda estou um pouco zonza com isso tudo, mas resolvo ser
direta e franca com ele.
— O que significa isso?
Adam parece não ter entendido a pergunta, fica um tempo
mudo.
— Comer? — Ri de forma contida. — To lunch![10]
— Não, você sabe muito bem do que estou falando, Adam
Stone. — Bufo impaciente. — O que significa o convite?
Ele sorri abertamente agora.
— Acho melhor conversarmos sobre isso em um lugar mais...
private?
— Reservado. — Ele assente, e tenho de concordar. —
Certo. — Consulto meu relógio. — Podemos almoçar amanhã,
porque já tenho reunião agendada hoje...
— Jantar, então, hoje.
Respiro fundo mais uma vez, pronta para negar, mas ele se
aproxima tanto que sinto até sua respiração morna em meu rosto e
murmura: — Pego você às 8h pm. — Pisca para mim. — Na sua
casa ou...
Péssima ideia, Mel, recuse!
— Eu não acho que...
— Sua casa ou aqui, Melissa?
Puta merda! Meu corpo inteiro reage ao ouvi-lo dizer meu
nome num tom de voz mais autoritário que me faz lembrar como ele
me conduziu naquela noite, derramando champanhe sobre mim,
bebendo-o na minha pele, chupando-o em minha...
Melissa! Eu mesma me situo e paro de divagar.
— Meu apartamento. — Decido, por fim. — Eu moro...
— Eu sei onde. — Arregalo os olhos, assustada com a
informação. — Fiz meu homework[11].
Ele pisca, passa por mim e sai da sala, deixando seu perfume
para trás e a mim completamente paralisada pela surpresa de saber
que ele andou pesquisando sobre mim.
Será que fez isso depois que deixei o escritório dele? Ou já
sabia antes mesmo de nos encontrarmos?
— Mas você acha que vamos conseguir cumprir o
cronograma a tempo? — Aaron me pergunta preocupado. — As
obras ainda nem começaram, e, com o projeto ainda sem
aprovação, não se conseguiram nem as licenças necessárias...
— Vou resolver tudo a tempo, pode deixar — afirmo, já pronto
para mudar de assunto. — Você já está pronto para as primárias?
Ele suspira, e sinto vontade de dizer exatamente o que penso
sobre essa loucura de se candidatar a um cargo político. Entendo
que é “tradição” ter um Stone em Washington, mas não entendo por
que tem que ser alguém que não quer estar lá.
Aaron foi criado para isso. Desde pequeno, teve sua vida
monitorada e planejada a fim de ter um histórico irrepreensível para
que, quando fosse concorrer a uma vaga entre os políticos, não
houvesse nada que o desabonasse. Acho que nenhum outro Stone
sofreu o que ele passou, principalmente por papai ter decidido que
seu filho chegaria à presidência.
Na adolescência, enquanto todos estavam dando festas em
casa e saindo às escondidas para namorar, Aaron estava
participando de convenções juvenis e falando sobre planos de
governo. Enquanto seus amigos viajavam para Aspen ou iam
esquiar nos alpes suíços, ele estava acompanhando de perto os
fóruns sobre economia na Europa.
Meu irmão não conheceu diversão, tudo o que fez foi
milimetricamente calculado para este momento. Sei que ele
postergou o máximo que pôde, pois, desde os 30 anos, estava apto
a concorrer às eleições. Contudo, convenceu nosso pai de que ele
deveria ter um currículo profissional que impressionasse, por isso
ficou à frente da TGS por tanto tempo.
— Na verdade — ele responde depois de um tempo —, estou
cansado sem nem mesmo elas terem começado. Viajar para todos
os lados para conseguir fazer meu nome aparecer nas pesquisas
não foi fácil, embora eu admita que, sem isso, o partido não me
aprovaria como pré-candidato. Agora, nas prévias, é fazer lobby
interno, convencer os integrantes de que sou o nome certo para
representar o estado no Senado.
— Como você está com isso tudo? — pergunto de um jeito
que ele entenda que eu quero saber de seus sentimentos, e não de
seu estado físico.
— Torcendo para não ter expressividade a ponto de ser
elegível e com medo de não conseguir realizar o sonho de Joshua
Stone. Não quero ser uma decepção, Adam, como também não
quero ser senador.
Xingo, entendendo seu dilema e ciente de que ele não só irá
conseguir a vaga como candidato, como irá se eleger ao cargo que
não quer. Não há nada que Aaron Stone faça que não seja
extraordinário.
— E se você conversasse com o papai de novo?
Ele ri.
— Adam, nos mais de 10 anos que fiquei à frente da TGS,
batemos todos os recordes possíveis com a empresa. Faturamento,
confiabilidade, valorização da marca, você sabe disso. — Concordo.
— E nem assim foi suficiente para convencê-lo de que eu era
melhor na direção da empresa do que em um cargo político. Tudo
piorou depois da morte da tia Violla, que era a Stone política da
geração dele.
— Eu sei. — Bufo. — Lamento muito e, se pudesse fazer
algo...
— Quer trocar de lugar comigo? — Ele ri.
Meu coração se aperta.
— Nunca fui o Stone “certo” para esta missão. — Dessa vez
é meu irmão quem xinga e me pede desculpas. — Tudo bem, isso já
foi superado, e não vou mentir que não sou grato por não atender às
expectativas neste caso específico.
Rimos juntos, deixando o clima tenso um pouco de lado.
— Mudando de assunto, encontrei-me com Hillary esses dias.
Ela parou para conversar comigo e me fez um pedido curioso.
Merda!
— Qual?
— Que eu o lembrasse da última conversa de vocês e
pedisse para considerar com carinho. — Ele não parece nada
contente. — Não está pensando em retomar aquela loucura de
relacionamento, não é?
— Não, não se preocupe!
— Ainda bem, porque merda a gente só faz uma vez; depois
disso, é pura burrice.
A filha da puta me mandou um recado pelo meu irmão,
sabendo que ele está envolvido na situação pela qual quer me expor
e que eu não deixaria que nada o prejudicasse.
Preciso resolver esta situação de uma vez por todas!

Nervoso!
É assim que me sinto dentro do carro, enquanto Douglas nos
leva até o endereço de Melissa Boldani, que descobri horas antes
de encontrá-la no escritório de arquitetura. E qual não foi minha
surpresa ao perceber que estamos no mesmo bairro, só que cada
um de um lado do Parque do Ibirapuera.
Fiquei mais tempo do que o de costume me arrumando para
o jantar desta noite, indeciso sobre o que vestir. O restaurante foi
altamente recomendado por Nuno, e, quando fiz a reserva –
pagando uma taxa extra pela urgência –, pude conferir nas redes
sociais deles qual era o estilo que eu deveria seguir.
Sou um homem vaidoso, admito, embora simples. Mantenho
um horário reservado na minha agenda, toda semana, para cuidar
dos cabelos, da barba e das unhas. Nada que tome muito do meu
tempo já escasso, mas gosto da sensação de estar alinhado. Aqui,
em São Paulo, ainda não tive oportunidade de pesquisar sobre
barbearias e acabei indo a uma que o gerente da TGS daqui me
indicou.
Gostei do serviço, mas acho que sou um pouco tradicional
demais e não apreciei a atmosfera jovial, com mesas de sinuca e
outros jogos, além de muitos videogames. Adorei poder tomar uma
cerveja e ter opção de comer algo rápido por lá mesmo, porém, o
barulho não me deixou relaxar.
O importante é que consegui aparar cabelo e barba para me
sentir mais apresentável em um encontro – agora marcado – com
Melissa Boldani.
— Chegamos, doutor — Douglas anuncia enquanto estaciona
perto da calçada do prédio.
Ele sai do carro, e permaneço sentado no banco de trás,
ainda tentando controlar meu corpo, que insiste em ficar excitado
com a mera ideia de dividir o pequeno espaço do veículo com
Melissa.
Rio ao pensar que nunca senti nada parecido. Se alguma vez
algo chegou perto, foi quando eu era um garoto prestes a ter minha
primeira interação com uma menina. Respiro fundo e fecho os
olhos, lembrando-me bem da doce e animada Hellen.
Estávamos na escola ainda, eu devia ter de 12 para 13 anos,
e ela era um pouco mais velha. Era bolsista e, assim como eu, filha
reconhecida de algum endinheirado que bancava seus estudos,
porém, nada além disso. Por esse motivo, Hellen era tão deslocada
quanto eu. Era boa aluna, comportada, gentil, mas não usava grifes
nem passava férias no Caribe – algo que estava na modinha na
época –, e assim vivia sendo deixada de lado pelas outras garotas.
Para piorar a situação, Hellen usava aparelhos – um fixo e
um externo para arrumar o queixo – e óculos. Acho que fiquei
encantado por ela durante uma aula de biologia que cursamos
juntos e tivemos de dissecar uma rã. Enquanto todas as garotas
pareciam que iam vomitar ou ficavam dando gritinhos a cada corte,
ela foi precisa e levou a sério o que fazia.
Só a admirei, de boca aberta por aquela garota de olhos
espertos e sorriso fácil ser tão durona. A partir daí, nós nos
tornamos amigos e, mais tarde, tivemos nossas experiências juntos.
Não chegamos a fazer sexo, éramos muito novos, mas imagine todo
tipo de amassos que um adolescente pode dar!
Infelizmente, o mundo não era um lugar fácil para ela. Eu
lidava com minha frustração com os punhos muitas vezes, agredia
quem me machucava com palavras, impondo-me; ela apenas se
encolhia e absorvia. Não houve para Hellen o desabrochar de
menina em mulher, nem se aceitando como era nem mudando seu
visual. Simplesmente, todos os anos de porrada psicológica a
deixaram no chão, e, em uma de nossas férias de verão, ela se
dopou com pílulas para dormir e nunca mais acordou.
Foi um choque cursar o último ano sem ela, não ouvir sua
risada, não secar suas lágrimas. Passei um bom tempo com a
sensação de que poderia ter feito mais, e isso me afetou tanto que
meu pai me encaminhou para a terapia.
Olho pela janela do carro a fim de desviar os pensamentos
sombrios sobre essa fase da minha vida e vejo Melissa sair do
prédio, linda em um vestido elegante e comportado que só me faz
pensar em deslizar as mãos por baixo da saia e...
— Boa noite! — ela cumprimenta Douglas com um sorriso.
Ele abra a porta traseira para ela, e a recebo com um enorme
sorriso enquanto desfruto do delicioso perfume que sempre usa.
— You are wonderful...
— Estamos no meu país, fale em minha língua. — Melissa
me interrompe, e meu corpo estremece com sua voz mais
autoritária.
Porra, que tesão!
— Uau! — Rio, desfrutando demais da sensação que estar
perto dela me causa. — Adoro sua língua, pode acreditar! — Ela
ergue a sobrancelha, mas vejo seus lábios tremerem como se
quisesse rir, então gargalho. — Quando em inglês eu iria conseguir
um...? — Não consigo me lembrar da palavra e não quero falar em
inglês de novo.
— Trocadilho? Duplo sentido?
— Isso! — Ah, o português e suas palavras melodiosas! —
Trocadilho! Como conseguiria algo tão perfeito e verdadeiro?!
Noto como a pele dela se eriça pouco antes de Douglas dar a
partida no carro. Melissa está sentada longe de mim, tem as costas
retas e, para meu infortúnio, parece tensa.
— Você está linda, Melissa. Ainda mais bela do que eu me
lembrava. — Suavizo minha voz para que ela se sinta mais à
vontade e me viro para pegar algo que coloquei no cooler. Ela
arregala os olhos quando vê o champanhe. Tiro a tampa a vácuo,
pois estourei a rolha antes de trazer a garrafa, e lhe sirvo uma taça.
— E ainda acho que vocês combinam perfeitamente! — Pisco e
aponto para o rótulo, mostrando que é o mesmo que ela tomou
naquela noite.
Melissa sorri e toma um gole da bebida, fazendo aquele
mesmo gemido que me desmontou naquela boate.
— Aonde estamos indo? — pergunta, séria, ainda esfregando
os lábios molhados pela bebida.
Demoro para responder, porque simplesmente não consigo
coordenar meus pensamentos. Tudo em que penso é provar sua
boca novamente, virar essa taça e verter o líquido sobre seu corpo,
onde eu possa capturar com minha língua gota por gota.
— Tenho reserva em um restaurante chamado Millenium,
mas, se você quiser...
— O Millenium é ótimo para mim! — Melissa me interrompe,
ciente de que eu faria uma proposta que nós dois estamos querendo
muito aceitar.
Assinto e me arrumo no assento, ficando mais de frente para
ela. Nossos olhares se encontram, e ficamos por muito tempo
apenas nos encarando, sem trocar sequer uma palavra.
Nem é preciso, na verdade, pois nossos corpos parecem se
comunicar muito melhor. A respiração dela está acelerada, vejo seu
peito subir e descer sob o vestido, que, por ter um tecido fino, talvez
seda, não disfarça o delicioso intumescimento de seus mamilos.
— Eu dizia para mim mesmo que não podia ser real... —
penso em voz alta, e ela pisca, parecendo sair do encanto em que
estava.
— Ao notar que eu era a mulher daquela noite?
— Não! — Rio do pensamento absurdo, porque ela é mais do
que minha expectativa criou. — Quando reconheci sua assinatura
nas plantas... — Melissa parece surpresa. — E o melhor de tudo foi
saber que você me deixou clues[12], ainda que inconscientes.
Peguei o bilhete, e a primeira coisa que pensei foi... perfect traits of
a designer[13].
Ela sorri diante do elogio e balança a cabeça negando.
— Quase rasguei a nota quando vi que a tinha rubricado —
confessa, um tanto encabulada. — Eu queria saber mais de você.
Entretanto, fui eu quem fez as regras e por isso devia segui-las, mas
acabei deixando, pensando que um simples M não iria me
denunciar.
— Your rules were made to be broken![14] — sussurro em
inglês mesmo, pois não sei como dizer isso em português, e me
aproximo. — Foi uma noite inesquecível, Melissa. Por muito tempo,
eu não tinha nada parecido. — Pela sua expressão, ela duvida do
que digo. — É verdad! — Rio. — Eu olhei aquela nota e a achei
tão... pouco. Eu queria mais! Queria saber de você, queria te
encontrar de novo, sem máscaras, e saber se tudo aquilo tinha sido
real.
— Eu não...
Ponho o dedo sobre seus lábios, como ela mesma fez
comigo uma vez.
— Eu te procurei por meses, e, se não fosse a loja de São
Paulo, talvez nós nunca nos encontraríamos.
Melissa suspira, e sinto-a estremecer ao meu lado. Acaricio
seu braço desnudo, gostando da sensação de vê-la arrepiar-se, e
quase não me contenho quando fecha os olhos. A energia entre nós
é muito forte, esta ligação, a atração, o desejo. Praticamente me
esqueço de que estamos em um carro com motorista e de que,
embora esteja com o rádio ligado, Douglas pode nos ouvir.
— Como me achou? — ela pergunta baixinho, ainda de olhos
fechados.
— Subornei o pessoal da boate. — Melissa abre os olhos e
me fita assustada. — Pesquisei cada nome daquela lista junto a um
amigo que faz esse tipo de trabalho para a TGS. — Dou de ombros,
rindo, e a vejo tomar um longo gole de champanhe. — Chegamos a
Pietra Boldani...
— O cartão de sócio era dela — Melissa explica, e eu
assinto. — É minha prima.
— Eu sei. Eu me senti um maldito stalker[15], mas não
conseguia imaginar não te ver de novo. Então, quando soube que
Julio Boldani estava projetando para a TGS...
— Decidiu vir ao Brasil para ver se eu era real.
Respiro fundo bem perto de seu pescoço e me afasto.
— Você é, Melissa, muito melhor do que qualquer sonho!
Não a olho mais, pois deixo que ela absorva tudo o que lhe
contei e julgue conforme achar certo. Nunca fui atrás de uma mulher
da maneira como fui dela, como também não senti toda essa
sinergia com mais ninguém.
— Adam, eu...
O carro para, e ela interrompe o que ia dizer quando Douglas
salta do carro para abrir a porta. Pego sua taça vazia e a coloco de
volta no compartimento, e, em seguida, o motorista abre sua porta.
Ele a ajuda a descer e, em seguida, me junto a ela, estendendo
minha mão.
— Melissa...
Ela me olha com certo receio, mas, quando aceita meu toque,
sinto como se uma descarga elétrica nos atingisse e a vejo respirar
fundo para se controlar. Seguimos para a entrada do restaurante,
onde somos atendidos prontamente e encaminhados até a mesa
reservada.
O ambiente é luxuoso e tão familiar que parece que estou em
qualquer lugar do mundo.
— Champanhe? — pergunto sorrindo, e ela nega.
— Vinho branco, por favor.
— O de sempre, senhorita Boldani? — o sommelier
questiona, e ela assente.
— Costuma vir muito aqui? — inquiro curioso, pois minha
intenção era impressioná-la.
— Sim, é meu restaurante favorito. Não sabia?
Tenho vontade de rir, mas me controlo, afinal, ela acaba de
me pegar em um ato falho que conclui que não fiz bem minha
pesquisa.
— Não, mas fico feliz em saber que acertei.
— Sim, acertou. — Ela sorri, e me sinto derreter,
completamente hipnotizado. — Adam, também tentei te encontrar.
Quase perco o fôlego ao ouvi-la confessar isso, mas o
garçom me impede de falar qualquer coisa, servindo nossas bebidas
e pronto a anotar os pedidos. Somente quando ele se afasta, tento
falar, mas Melissa continua:
— Eu falei com o pessoal do clube, mas, diferentemente do
que aconteceu contigo, se recusaram a dar informações. — Ela dá
de ombros como se não se importasse, mas noto seu rosto corado.
— Tentei achar você pela aparência. — Ri de si mesma. — Passei
horas olhando fotos na internet.
— Porra, Melissa! — É a primeira vez que xingo em
português, e confesso que alivia bem a pressão que sinto. Ela
também queria saber quem eu era! — Não sou sócio, tinha um
convite especial. Ia lá com meus irmãos, mas nunca frequentei o
hotel, apenas sabia como funcionava. Estava tão perdido como
você.
— Mesmo? — Ela tem a testa franzida e se concentra na
minha mão e no modo como mexo meu drinque. — Eu te achei
tão... experiente naquela noite.
Gargalho.
— Eu não queria perder você! Tentava me lembrar de tudo
que meu irmão me falou sobre aquele lugar e deu certo. — Pisco. —
Quando descobri que a mulher que eu procurava há meses estava
prestando serviço para a empresa aqui no Brasil, me senti ao
mesmo tempo privilegiado e sacaneado pelo destino.
— Por quê? — Ela ri.
— Porque, se meu irmão tivesse feito o trabalho que lhe
deram direito, eu provavelmente não teria a chance de encontrá-la
como a encontrei. Eu já sabia que você era Melissa Boldani,
arquiteta brasileira, mas ainda não tinha pensado em uma forma de
me aproximar e não queria te assustar.
Melissa gargalha.
— E quem te assustou fui eu, não é? — Ela tampa o rosto
com a mão. — Quando penso no papelão que fiz ao entrar na sua
sala daquela forma...
— Nunca senti tanto tesão na minha vida! — Melissa arregala
os olhos. — Foi como se tivesse sido transportado no tempo e te
visse novamente naquele clube, olhando curiosa, um tanto
assustada com tudo o que via. Naquela época, te desejei tanto que
acho que essa vontade te levou até mim ao invés de te levar para
fora correndo. — Ela concorda sorrindo. — E, naquele dia, quando
você jogou os prêmios na minha mesa e falou sobre sua
competência, sobre sua experiência, tudo o que eu queria era
mandar tudo para o chão, te deitar sobre o tampo e te fazer gemer
tanto quanto você gemeu em Nova Iorque.
Ela respira tão fundo que chega a tremer inteira quando solta
o ar. Melissa balança a cabeça, molha os lábios como se sua boca
estivesse seca e fecha os olhos.
— Adam, eu não sei como...
— Não precisa, só deixa acontecer — aconselho-a, e ela
relaxa. — Vamos comer, falar e depois vemos.
Nosso jantar é servido, e a conversa gira em torno dos
projetos que ela apresentou. Conto um pouco sobre meu irmão e
que ele não tinha experiência nenhuma ao lidar com a parte
burocrática da abertura de uma loja.
— Por que o mandaram, então? — ela questiona.
— Não sei. — Sou sincero.
Falo um pouco mais sobre minha família, de maneira
genérica, confesso, coisas que ela pode facilmente encontrar no
Google.
— Eu tenho uma irmã e sobrinhos também, gêmeos, um
casal. — Ela parece amar demais sua família. — Meu pai e minha
mãe são divorciados, mas estão bem e são amigos.
— Isso é bom! — Não entro em detalhes, mas me sinto
obrigado a falar um pouco do meu pai. — Eu nasci no México,
embora seja americano por ter pai americano. — Ela assente. —
Minha mãe já é falecida, e meu pai segue firme como uma rocha.
Ela ri e comenta algo sobre Julio Boldani também, dizendo
que crê que ele irá enterrar a todos de tão saudável que é.
Terminamos a refeição falando de negócios, e, somente quando o
café é servido, volto ao nosso assunto.
— Eu notei, Melissa, que, apesar do que aconteceu entre nós
em Nova Iorque, você é uma mulher mais...
— Entediante? — Sorrio com a brincadeira, mas nego. —
Séria? Reservada?
— Isso! — Rio. — Adoro que você sempre venha em meu
auxílio quando não me lembro de uma palavra. Geralmente fico
vários minutos pensando e tenho que pedir ajuda para alguém se
pronunciar.
— Talvez eles achem que você não queira ajuda ou fiquem
constrangidos, sem saber se você aprovará ou não essa ajuda.
— Pode ser. — Pego sua mão sobre a mesa. — Sou um
homem objetivo, gosto de ser assim, e ficar sem palavras é
frustrante! Meu professor de português se esforçou muito para me
ensinar a falar e escrever, e tenho um amigo que treina comigo
sempre, então me sinto decepcionado quando não consigo
completar a frase. Por isso, obrigado! — Sorrio, gostando do contato
entre nós e da sinceridade de suas palavras. — E, por ser um
homem objetivo, preciso dizer uma coisa.
— Diga.
— Eu adoraria repetir aquela noite. — Minha pele inteira se
arrepia só de pensar nisso, e a intensidade do que ela me faz sentir
me abala, fazendo com que eu recue: — Mas não sei se é uma boa
ideia.
Ela parece tão surpresa quanto eu, e tento manter a calma,
achar as palavras e ser sincero. Melissa é uma mulher incrível, e,
durante o pouco tempo em que estamos conversando, percebi que
não leva a vida sem medir as consequências do que faz. Ela é
independente, segura, linda, mesmo assim me faz sentir uma
vulnerabilidade que me encanta e apavora ao mesmo tempo.
— Por que não é?
Certo, ela perguntou, então tenho que me virar para explicar.
— Não sei quanto tempo vou ficar em São Paulo, mas não
será muito. — Ela balança a cabeça. — Já rodei o mundo todo,
morei em vários países. Ano passado, se somar todos os períodos
que passei em casa, não dá nem três meses.
Ela ri.
— O que está me dizendo é que, se nos envolvermos, será
algo passageiro e sem grandes dramas? — Franzo a testa e
concordo. — Perfeito!
O surpreendido agora fui eu! Perfeito?!
— Eu realmente quero mais daquela noite — reforço.
Ela fica séria, encara-me e diz:
— Eu também!
Abro a boca para perguntar se podemos começar esta noite a
termos mais um do outro, porém, seu telefone toca.
— Me desculpe, é minha irmã. — Melissa tenciona se
levantar, mas a impeço.
— Atende aqui, já vou pedir a conta.
Aceno para um garçom enquanto ela faz a chamada e escuto
fragmentos da conversa. Melissa parece escutar o que sua irmã lhe
diz e, de repente, como se estivesse distraída, balança a cabeça e
dispara:
— Sim, tudo certo! Amanhã, às 23h, na Spice. Pode
confirmar minha presença. Já falaram com ela?
Seu semblante muda por uma fração de segundos, mas
consigo perceber. Ela parecia empolgada, mas algo que a pessoa
disse do outro lado da linha parece tê-la afetado.
— Ok. Combinado. — Ela desliga o telefone. — Já pagou? —
Faço que sim com a cabeça, e ela me olha séria. — Podíamos ter
dividido.
Rio.
— Eu convidei. Quando me convidar, você paga!
Melissa concorda, e saímos juntos do restaurante, mas ainda
a sinto estranha, então resolvo perguntar se está tudo bem.
— Tudo. Minha amiga fará aniversário amanhã, e nós
programamos uma festa surpresa — explica-me. — Vai ter muita
gente lá, mas não sei se ela está bem para isso. — Suspira. —
Coisas da vida!
Não comento mais nada, entendendo que ela não quer dar
detalhes e respeitando sua decisão. Entramos no carro, e sinto um
clima mais pesado entre nós, estranho, diferente da fluidez que
rolou quando nos vimos na boate.
Ainda não sei como agir com Melissa Boldani. Vim decidido a
propor mais um encontro casual. Contudo, depois de uma breve
pesquisa sobre sua vida e a conversa que tivemos no restaurante,
não sei se devo envolver-me com ela.
Sinto vontade de rir de mim mesmo tamanha minha
hipocrisia. Meu medo não é só por ela!, concluo. Estou com receio
de me envolver com ela! A noite que passamos juntos foi incrível e
fez com que eu a procurasse por cerca de um ano. Melissa habitou
todas as minhas fantasias, e, sinceramente, reencontrá-la superou
todas as expectativas que eu tinha.
Não sei quanto tempo ficarei aqui no Brasil, mas o certo é
que, em algum momento, terei que partir. Esta é minha vida, há
anos não paro em local algum por muito tempo, e isso impede que
qualquer coisa além de um caso temporário se desenvolva.
Fito-a e, no segundo em que nossos olhares se encontram,
sinto toda a energia sexual vibrando entre nós. Ela sorri, e eu me
perco, lançando todas as minhas preocupações para o inferno
quando a puxo para um beijo. Nossos lábios se encontram
saudosos, reconhecendo-se, molhando uns aos outros. Minha
língua passeia pela sua boca antes de invadir seu interior
procurando a dela.
Seguro seus cabelos fortemente com uma das mãos e, com a
outra, a guio até meu colo, encaixando-a contra meu corpo,
fazendo-a sentir minha ereção contida pela calça do terno.
Melissa rebola sobre meu membro, roçando-se em minha
carne latejante, de pernas abertas e completamente enlouquecida
de tesão. Afasto-me um pouco e gemo gostoso em sua boca, o que
a faz sorrir do jeito safado que me enlouquece e quase me faz
esquecer onde estamos. Seguro-a pelos quadris, impedindo que
continue se espremendo contra mim.
— Melissa... — gemo, lamentoso em interromper este
momento. — Nós não estamos sozinhos... infelizmente.
Ela congela e arregala os olhos. Gargalho diante do espanto
e por ela ter ficado completamente sem jeito, a ponto de esconder
seu rosto na curva do meu pescoço. Se não estivesse escuro dentro
do carro, tenho certeza de que a veria corada.
— Vem para o hotel comigo esta noite — peço, ou melhor,
imploro. Melissa tenta sair do meu colo, mas a impeço, e novamente
vem o pedido, só que em tom de ordem: — Vem comigo!
— Você disse que não era aconselhável a gente...
Bufo, querendo me socar.
— Advice when most needed is least heeded[16]. — Ela
assente, e eu sorrio. — Não sei se é um bom ditado para a
situação... — Beijo-a. — Você vem? Eu quero você sem máscaras...
— Sem regras?
Rio e nego.
— Não. — Melissa ergue a sobrancelha, esperando que eu
explique. — Apenas uma! — Respiro fundo e encosto meus lábios
em seu ouvido para dizer: — Serei seu sempre que quiser... pelo
tempo que estiver em São Paulo.
Ela parece refletir sobre minha proposta, mas sua pele
arrepiada demonstra o que seu corpo já me respondeu.
Quando o carro entra na garagem do hotel onde Adam está
hospedado, sinto um frio na barriga de antecipação pelo que virá.
Novamente ele abre minha porta e estende sua mão, entrelaçando-
a na minha, ajudando-me a sair do veículo.
Esperamos o elevador sem trocar uma só palavra, apenas de
mãos dadas, e, quando ele chega, entramos, mas infelizmente não
estamos sozinhos.
Adam cumprimenta dois hóspedes que sobem conosco e em
seguida põe sua mão em minha cintura, abraçando-me. Olho-o, e
ele me dá uma piscadinha, descendo a mão pelas minhas costas e
acariciando minha bunda por sobre o tecido do vestido.
Deus do Céu!, penso, sentindo o corpo estremecer da cabeça
aos pés. Tudo aconteceu muito rápido, mas, ao mesmo tempo, sinto
que estou esperando-o há uma eternidade.
Passei o resto do dia ansiosa, olhando para o relógio a todo
momento, esperando dar o horário para ir para casa e me aprontar
para o jantar desta noite. Trabalhei o resto do dia tensa, sem saber
o que ele gostaria de conversar comigo. Será que pediria para eu
esquecer? Será que queria relembrar? Eu simplesmente não sabia!
O que conheço sobre Adam Stone?! Pesquisei seu nome na
internet, mas fiquei concentrada nas fotos dele e não li nada sobre
sua vida pessoal.
Tenho fantasiado com esse homem há um ano! Se eu
soubesse seu nome, teria batizado meu vibrador com ele, de tanto
que o utilizei com sua imagem em minha mente, com seus beijos,
seu toque. Então, se houver a mínima oportunidade de ficarmos
juntos novamente, mesmo que apenas por mais uma noite, com
certeza irei aceitar. Seria louca se não o fizesse!
Na hora do almoço, eu me reuni com duas clientes, donas de
uma loja que está virando franquia e cujos projetos a serem
seguidos pelos franqueados eu planejei. Depois, meu pai me
chamou para conversar e me mostrou alguns desenhos que havia
feito para a reforma da casa que comprou no litoral da Bahia. Ando
desconfiada de que ele queira se aposentar e viver em eterna lua de
mel com dona Hilda, mas ainda é difícil para mim imaginá-lo
sentado à toa na beira de uma praia, pois sempre foi muito ativo.
Consegui, enfim, parar de pensar um pouco no jantar dessa
noite e me concentrar no trabalho e, por isso mesmo, nem vi a hora
passar. Só então me dei conta de que estávamos no final do dia,
quando Tânia me lembrou de ligar para Isabella.
— Oi, Mel! — ela me atendeu animada. — Tentei falar contigo
mais cedo, depois acabei entrando em uma audiência complicada.
Tudo bem?
Minha irmã, Isabella Villazza, é advogada – uma das bem
famosas, por sinal – e, mesmo tendo se casado com Frank, um rico
empresário do ramo hoteleiro, continuou com seu escritório e seus
clientes independentemente disso. Um traço da nossa família,
talvez!
— Tudo bem, Isa. Eu também estive ocupada aqui, por isso
não retornei antes. O que houve?
— Ah, Mel... — Ela pareceu triste. — É aniversário da
Giovanna nesse sábado, e ela anda tão desanimada por causa do
seu término com o Nick que pensei em fazer alguma coisa para
animá-la.
— Ela não tem um compromisso com aquele festival da
CCCN[17]?
— É no outro sábado! — esclareceu. — Eu acho que, se ela
não estivesse tão envolvida com esse evento, estaria bem pior.
Tive que concordar com Isabella. Giovanna é uma mulher
forte, mas penso que teria desmoronado se não fossem essas aulas
que tem dado na Casa de Cultura. Ela ama música, e estar
envolvida em um projeto social com crianças a tem ajudado a
superar o que aconteceu entre ela e Nick.
— O que você planejou?
Isabella riu.
— Todos estamos pensando em ir para São Paulo ficar com
ela. Tony e Marina sugeriram arrastarmos a Gio para uma boate, e
Frank concordou, mas acho que poderia ser uma coisa mais
tranquila, pois não sei se ela está no clima...
— Acho ótima a ideia da boate! Ela precisa mesmo
extravasar um pouco, deixar essa melancolia de lado — concordei
num impulso, pensando que eu ficaria mais à vontade em um
ambiente festivo do que em um mais intimista, caso estivesse triste.
— Sim, mas como vamos fazer isso?
Ri, pensando em qual desculpa teria de inventar para tirar
Giovanna daquele loft e levá-la para uma noitada. Pensei que talvez
Lori e Tom, sócios da moça numa agência de publicidade,
pudessem ajudar, afinal, eles estão realmente muito preocupados
com a amiga.
— Vou conversar com os amigos dela da Ello e ver se eles
me dão uma mãozinha com isso.
— Ai, Mel, obrigada! — Isabella pareceu animada. — É tão
ruim ficar aqui em Curitiba, longe dela. Ainda bem que ela tem você
aí, em São Paulo. Acho que por isso Frank está tão ansioso com a
mudança para aí, sabe? Ele anda muito preocupado com a Gio.
Sim, merda, vocês vão se mudar para cá!, pensei, sentindo
desânimo e culpa. É horrível querer que eles continuem longe, mas,
como diz aquele ditado: o que os olhos não veem, o coração não
sente! Tenho conseguido abafar, esconder o que ainda sinto pelo
Frank, mas não sei como será depois que ele se mudar para cá e
nosso convívio aumentar.
— Torço para que eles se acertem, Isa — declarei com
sinceridade, embora evitando me pronunciar sobre a mudança deles
para cá. — Eu sei que o Nick também está sofrendo muito.
— Ele não me deixou nem pronunciar o nome dela no dia em
que o procurei para conversar. Queria muito ajudá-los, afinal, Nick
me deu muito apoio quando Frank e eu terminamos.
Fechei os olhos e tentei não emitir som nenhum, mas
sentindo meu peito doer. O término ao qual ela se referiu foi
provocado inconscientemente por mim, mas, depois que tudo se
esclareceu, participei, junto a Nick, da reconciliação dos dois.
— Sim... Isa, preciso desligar agora, pois tenho um jantar de
negócios...
— Tudo bem! Sinto saudades de você, Mel!
Ai, merda! Também tenho saudades dela e dos meus
sobrinhos!
— Eu ando ocupada por aqui, mas vamos nos ver no sábado!
— Ela concordou. — Mande um beijo para os meus sobrinhos.
Despedimo-nos, e desliguei, sacudindo a cabeça. Tudo o que
queria, do fundo do coração, era, um dia, conseguir ser parte da
vida deles como deve ser, sem sentir nada pelo meu cunhado, sem
precisar me manter distante para não sofrer.
Tânia bateu à minha porta perto das 18h, avisando que todos
os funcionários já estavam indo embora e estranhou muito quando
desliguei o computador e anunciei que também estava de partida.
— Tenho compromisso — justifiquei, e ela sorriu, maliciosa.
— Uau! Isso aí, Mel! Aproveite sua vida! — Saímos juntas em
direção ao jardim, porém, antes de chegarmos ao meu carro, ela me
confidenciou: — O comentário do escritório hoje foi sobre o
americano da TGS. — Ela se abana. — Uau, que homem!
Fiquei sem graça, mas tentei não demonstrar, pois, se Tânia
soubesse que meu encontro era com Adam Stone, certamente não
tocaria no assunto assim, teria simplesmente perguntado.
— É bonitão mesmo! — Dei de ombros como se não fosse
grandes coisas.
— Um verdadeiro homão da porra, Mel! — Não aguentei e ri
da expressão que usou para se referir ao Adam, concordando em
gênero, número e grau!
— Nossa, ele impressionou mesmo! — disse rindo.
— Tanto que até tentamos investigar sua vida! — Piscou. —
As meninas da recepção e eu achamos algumas reportagens sobre
ele, a maioria em sites americanos. — Ergui a sobrancelha ao
perceber que elas eram muito mais espertas nessas pesquisas do
que eu. — O homem, apesar de quente daquele jeito, é muito sério.
Não tem muita coisa sobre ele, não, nenhum escândalo apimentado,
infelizmente! Mas também, com aquele mulherão com quem se
casou! — Tânia não percebeu minha expressão de assombro e
continuou: — Ela é linda, de família chique e ainda parece ser bem-
sucedida...
— Eu não sabia que ele era casado...
Tânia rola os olhos.
— Bem, segundo um outro site... — ela se aproximou para
cochichar — os dois estão separados e tratando do divórcio.
Puta que pariu! Essa informação me surpreendeu, e fiquei
imaginando se ele já estava separado dela na época em que nos
conhecemos em Nova Iorque ou se aquele dia e outros mais foram
o motivo por trás do divórcio. Se Adam costumava frequentar locais
como aquele, não me espantava seu casamento não ter durado!
A ansiedade pela noite se transformou em pura decepção e
frustração. Fiquei debatendo comigo mesma, durante todo o trajeto
até meu apartamento, sobre comparecer ou não ao encontro. Decidi
ir para poder conversar com ele, não só sobre a noite que tivemos
um ano atrás, como sobre o que ele pretendia agora.
Estava em dúvida sobre ter mais uma noite com ele por conta
da nossa ligação profissional. Contudo, sentia-me extremamente
tentada. Saber que podia existir uma mulher, um compromisso,
deixou-me mais propensa a rejeitar qualquer aproximação física
entre nós.
Uma pena!
Tomei meu banho, coloquei um vestido preto justo, mas
comportado no comprimento, um pouco acima dos joelhos, escolhi
sandálias elegantes, uma maquiagem leve, cabelos soltos e um
perfume suave.
— Você não está indo para seduzir ninguém, Melissa, apenas
para conversar! — Tentei convencer a mim mesma na frente do
espelho.
Então, ele chegou, tivemos aquela conversa no restaurante,
e, embora eu ainda não tivesse tido coragem de entrar num assunto
tão pessoal quanto seu casamento e o motivo do divórcio, não
consegui fingir nem resistir ao que se passava entre nós dois.
Eu quero Adam Stone tanto quanto sinto que ele me quer!
— Melissa? — Adam me chama, e balanço a cabeça,
voltando para o presente, então percebo que as portas do elevador
estão abertas.
Rio e tenciono sair, mas logo ele me puxa para seus braços e
me esmaga contra a fria parede de aço, exatamente como fez em
Nova Iorque. A lucidez de que estamos atracados dentro de um
elevador de um hotel cinco estrelas cheio de câmeras passa pelo
meu cérebro como um relâmpago, mas não me importo com isso.
Não, tudo o que quero é senti-lo, é ser tocada por ele e me entregar
sem nenhuma barreira.
Ele geme em minha boca e me arrasta para fora, andando a
passos largos até sua suíte, onde põe o cartão de acesso na porta e
me puxa para dentro com ele quando ela se abre.
— Eu estou impaciente, Melissa — revela, pressionando-me
contra a parede sem nem mesmo acender as luzes. — Quero você
há muito tempo.
Sorrio, sentindo-me realmente muito desejada, e não me faço
de rogada. Começo a desfazer o nó de sua gravata enquanto
trocamos beijos molhados e caminhamos juntos em direção à cama.
Quando me livro do acessório, passo a desabotoar sua camisa,
mas, no escuro e agarrados como estamos, não tenho muito êxito,
então, depois que o primeiro botão voa longe, arrancado do tecido,
decido que ele pode ficar com uma camisa a menos em seu guarda-
roupa.
Adam gargalha ao perceber o que estou fazendo, sem se
importar em nada com a peça de roupa, mas, assim que sente
minha boca deslizando pelo seu pescoço e descendo em direção ao
seu tórax, para de rir e geme.
Animada com a resposta, continuo arrastando minha língua
pelo seu corpo moreno, forte e de pelos negros aparados. O rastro
molhado que fica em seu corpo só me faz ficar mais excitada, e,
quando chego ao seu umbigo, uso minhas mãos para desafivelar
seu cinto.
— Melissa... Melissa... — geme. — Estou loco para foder sua
boca.
Encaro-o rindo e, em seguida, realizo seu desejo, ajoelhando-
me, libertando seu pau da cueca e o tomando todo, saboreando-o,
sentindo seu gosto salgado, sua textura macia e seu calor me
aquecendo.
Minhas fantasias não fizeram jus à realidade, e, confesso,
meu vibrador fica aquém do pau dele. Ainda que o brinquedo erótico
tenha boa proporções, ele não tem o sabor da excitação de Adam;
ainda que seja feito em um material que tenta imitar a pele humana,
não tem a maciez quente que desliza como seda na rigidez de seu
membro. Sem contar as veias saltadas que me fazem sentir o
sangue correndo por dentro delas, inchando-o ainda mais, e a
cabeça protuberante e avermelhada.
Ouço-o gemer mais forte quando esfrego minha língua por
todo seu pau, olhando para cima, gostando de ver as expressões de
seu rosto. Adam está com a cabeça jogada para trás e, enquanto
continuo no meu caminho de chupá-lo e lambê-lo, emite uns sons
deliciosos.
De repente, suas mãos agarram meus cabelos, ditando um
ritmo frenético da minha boca em seu membro. Não satisfeito, ele
ainda começa a se mover, fazendo com que eu praticamente o
engula inteiro, sentindo-o no fundo da minha garganta, fodendo-me
com força, a ponto de eu sentir os olhos lacrimejarem e o estômago
se revoltar com suas investidas profundas em minha garganta.
Eu me afasto, querendo tomar o controle da situação
novamente, e ele começa a se tocar, olhando em meus olhos.
— Eu me perco com você... perco limites... You drive me
crazy![18]
A cena é deliciosa de se ver, embora ainda estejamos na
penumbra. Seu corpo é grande e bem-proporcionado, a camisa
aberta revela seu peitoral e os músculos de seu abdômen. Eu me
levanto e retiro seu paletó e a camisa já aberta, impedindo-o de
continuar se masturbando.
As mãos dele parecem não conseguir ficar longe de mim e,
enquanto o dispo inteiro, vão me acariciando, tocando meus seios
ainda sobre o vestido e buscando, incessantemente, o fecho para
abri-lo nas costas.
— Deite-se — sussurro em seu ouvido quando ele já está
completamente nu.
Adam me atende sem questionar e se recosta contra os
travesseiros da cama king size. Caminho até uma das luminárias do
quarto e a acendo. Ainda de costas para ele, abro o fecho do meu
vestido, mas não o tiro. Só o faço ao pé da cama, sob seu olhar
ardente. Vejo-o se tocar a cada pedaço do meu corpo descoberto e
isso guia meus movimentos como uma música sexy e lenta.
— Come here[19], Melissa!
Nego, querendo vê-lo mais, e retiro meu sutiã, jogando-o
para o lado. Nunca tive essa sensação de poder com mais ninguém
além dele, a sensação de que sou uma mulher muito desejável, uma
mulher quente, que consegue tudo o que deseja. O olhar dele me
diz exatamente essas coisas, e a maneira como seu corpo reage a
mim ressalta que não somente me quer, mas me necessita
desesperadamente.
Coloco meu pé sobre a cama a fim de retirar a sandália, mas
ele me impede, segurando-me pelo tornozelo. Nem vi quando ele se
moveu, mas foi tão rápido que me surpreendi com seu toque
— Não. — Retira minha mão do fecho do calçado. — Preciso
de você nelas. — Ergo uma sobrancelha, imaginando se isso é um
fetiche, mas ele logo me explica: — Vai ajudar quando eu te foder
em pé, para deixar igual... — Mal termina de dizer isso e se levanta,
colocando-se atrás de mim e me posicionando exatamente como eu
estava antes, com um dos pés sobre a cama. — Eu vou lembrar um
pouco a sensação de sua... pussy...
Gargalho ao ouvi-lo falar em inglês, porque provavelmente
não conhece a palavra em português, mas meu sorriso morre ao
sentir seus dedos brincando exatamente nesse local. Ah, que
sensação maravilhosa! Os dedos vão suavemente me explorando,
separando meus lábios, encontrando minha entrada úmida e
quente, usando minha própria lubrificação para deslizar sobre meu
clitóris.
— Gosta? — ele indaga e em seguida mordisca minha
orelha. Apenas gemo, perdida no prazer que ele me proporciona. —
Eu vou fazer assim, de pé. — Ouço um barulhinho de algo se
rasgando. — Apenas para lembrar de como você é gostosa.
Adam me penetra lentamente, e sua mão volta pela frente do
meu corpo, estimulando-me. Seus movimentos são contidos,
afundando-se dentro de mim para em seguida sair quase
completamente.
Deliro de prazer e jogo minha cabeça para trás, encostando-a
em seu peito, sentindo-o entrando e saindo devagar, saboreando
meu sexo com o seu. Seus lábios passeiam pelo meu pescoço e
voltam para minha boca. Sua língua brinca com a minha e depois
segue uma rota até meus ombros.
Os movimentos vão aumentando, e as estocadas se tornam
mais fortes, mais poderosas. Não consigo mais conter meus
gemidos, balançando com Adam, seguindo seu ritmo. Minhas
pernas começam a tremer, e abaixo a perna. Ele me tomba de
bruços sobre a cama, enlouquecendo completamente, segurando-
me pelos quadris e fodendo com força. Ouço-o bufar e gemer. De
tempos em tempos, ele diminui o ritmo, rebolando, fazendo seu pau
tocar em todos os pontos dentro de mim.
— Eu quero muito entrar aqui, Melissa.
Só gemo, sentindo-o acariciando minhas nádegas, brincando
com seus dedos entre elas, descendo entre o vale e concentrando
seus carinhos sobre meu ânus. Estremeço ao imaginá-lo aí, seu pau
largo, de cabeça redonda, abrindo caminho dentro de mim,
encaixando-se apertado. Gemo alto, e ele sai de repente,
levantando-me e me girando de frente para si.
Nós nos beijamos sôfregos, ansiosos, com um tesão
crescente, em desespero. Adam me ergue em seu colo, e eu abraço
sua cintura com minhas pernas. Ele me deposita na cama,
colocando-me sobre os travesseiros.
— Se toca para mim — pede-me, e imediatamente abro um
sorriso e deslizo minha mão até meu clitóris já duro e aparente.
Ele se ajoelha no chão, apreciando meus movimentos,
enquanto suas mãos acariciam minhas pernas lentamente. Deliro
com o tesão, muito próxima de chegar ao orgasmo, então uivo de
prazer quando Adam junta sua língua aos meus dedos.
— Isso! — Deliro ao senti-lo introduzi-la em mim e depois
descer lambendo tudo até meu ânus, retornando e voltando,
deixando-me louca de tesão.
Por fim – estou à beira do primeiro orgasmo da noite –, ele
posiciona sua boca sobre meus dedos, fazendo-me tirá-los de ação.
Suga-me de maneira tão intensa, tão constante, tão gostosa que é
impossível conter o êxtase que toma conta de mim.
Enquanto ainda estou gozando, Adam sobe na cama e me
penetra com uma só estocada firme e ergue minhas pernas retas,
apoiando-as em seu tórax. A cada movimento, ele lambe e beija
meus pés, louco de tesão.
Já estou suada, apesar do clima gelado pelo ar-condicionado
do quarto, e vejo que Adam também não está diferente, com seus
cabelos negros e lisos colando em sua testa.
— Essa sua pussy é como um sonho! — Ele continua
metendo como um louco. Às vezes se afasta apenas para ver seu
próprio pau entrando em mim, sorrindo como um descarado,
gostando da cena.
Meu corpo inteiro está tremendo, meu coração parece
cavalgar, e eu nem bem acabei de sair de um orgasmo maravilhoso
obtido através de um sexo oral espetacular e logo me sinto sendo
puxada para outro.
— Goza comigo, Melissa. Aperta meu pau até não restar
mais nenhuma gota...
Ele mal acaba de pronunciar essas palavras, e eu sou
tomada novamente. Meus músculos todos se contraem, a
respiração fica mais rápida, e tudo o mais some da minha mente, só
sinto um prazer enorme, e, a julgar pelos gemidos dele, nós dois
sentimos o mesmo juntos.
Tento voltar ao normal, respirar lentamente, trazer de volta
toda a energia ao meu corpo. Estou deitado em cima de Melissa,
corpo suado, coração palpitando e temperatura nas alturas. Ouço
sua respiração ofegante em meus ouvidos e tenho vontade de
abraçá-la, porém, não sei até que ponto devo ir agora, que já nos
satisfizemos na cama.
Foda-se! Giro para o lado e a arrasto para um abraço
apertado e cheio de carinho. Nós nos olhamos por um instante e
depois sorrimos.
— Amazing[20], como eu me lembrava. — Beijo-a. — É
incrível que eu tenha você nos meus braços de novo... Incrível! —
Melissa se aperta mais contra mim. — Sua pussy é como um sonho!
Ela ri, rubra, e me corrige:
— Boceta. É a palavra que você busca.
— Mesmo? — Rio, pois não fazia ideia. — Eu achava que
isso era como uma bolsa pequena.
Melissa ri tão alto que sou contagiado por sua gargalhada.
Ainda me embolo bastante com o português, sem contar que lido
com o sotaque do Brasil e o de Portugal por causa do Nuno.
— Preciso reciclar meu português — confesso sem jeito.
— Acho bem difícil te ensinarem isso em algum curso. —
Melissa sussurra no meu ouvido: — Veja pornô brasileiro, tem um
vasto repertório.
Rio de novo e a abraço apertado.
— Que tal um banho para relaxar?
Ela se senta na cama, parecendo perplexa.
— Relaxar? — Desliza os dedos pelo meu abdômen. —
Quem aqui precisa disso?
Imediatamente me coloco de pé e a pego no colo. Melissa ri,
dizendo que é pesada, o que é simplesmente um absurdo, porque
ela é perfeita em todos os aspectos.
— Eu preciso de um tempinho, baby.
Ela gargalha alto e esconde a cabeça na curva do meu
pescoço, algo que já percebi que faz toda vez que se sente
constrangida. Sorrio, deliciado pela mulher insaciável, mas que
ainda fica encabulada por me querer tanto. Talvez ela não tenha a
noção do quanto a quero também!
Coloco-a sobre o tapete do banheiro assim que entramos e
sigo para a moderna banheira de imersão, abrindo os registros de
água quente e fria para podermos relaxar como se deve.
— Hum... banho de espuma! — Olho para trás e a vejo
mexendo nos frascos em cima da bancada. — Quer sais?
Nós nos encaramos, e sinto novamente aquela energia
incrível que ela faz correr pelo corpo, despertando cada célula, cada
terminação nervosa e me fazendo ansiar por mais e mais dela.
— Quero você! — respondo, fazendo com que ela olhe para
baixo e arregale os olhos.
— Mas você disse que...
— Parece que me enganei. — Dou de ombros e caminho até
ela. — Nada segue a normalidade quando estamos juntos.
Melissa suspira.
— Eu sei... acontece comigo também. — Abraça-me pelo
pescoço, esticando-se um pouco. — Essa atração que temos é...
Concordo quando Melissa não encontra palavras, porque
nunca sei definir bem o que ela me faz sentir e corro risco de soar
repetitivo ao usar sempre a palavra “incrível”.
Mas, porra, é incrível!

Sinto sede, por isso acordo no meio da noite, um pouco


atordoado, mas, assim que vejo Melissa na cama comigo, lembro-
me de onde estou e o mais importante: com quem.
É uma sensação muito diferente da primeira vez que ficamos
juntos, quando não sabíamos nem mesmo o nome um do outro, e
acordei sozinho naquele quarto de hotel. Após todo o sexo que
fizemos ontem, conversamos um pouco sobre nós mesmos antes de
dormir. Melissa Boldani é filha de dois italianos, mas nascida no
Brasil, uma mulher independente, bem-sucedida e prestes a fazer
40 anos. Nunca esteve casada, embora tenha tido alguns
relacionamentos.
— E você? — ela me perguntou assim que falou sobre seu
estado civil.
Sorri, porque obviamente ela sabia que eu estava me
divorciando, senão duvido que teria se deixado envolver.
— Em processo de divórcio — respondi sem meios-termos.
— Estive casado por quase 5 anos, mas estivemos juntos por mais
de 10.
Melissa arregalou os olhos.
— É muito tempo! Posso perguntar por que não deu certo, ou
serei invasiva demais?
Franzi a testa, porque não entendi bem o que significava a
palavra “invasiva”, mas respondi:
— Minha vida é complicada. Viajo muito, e nós queríamos
coisas diferentes. — Dei de ombros. — Valeu a... experiência.
— Sim. — Ela riu como sempre quando me embolo com as
palavras. — Vocês têm filhos?
Senti-me um tanto desconfortável com o questionamento,
fiquei um pouco tenso, mas fui sincero.
— Não.
Depois disso, acabamos ficando em silêncio, até que rolei por
cima dela, e nos perdemos novamente no prazer um com o outro.
Levanto-me e vou até o frigobar, pego uma garrafa de água
mineral e tomo um grande gole diretamente nela. A nossa noite
mais uma vez foi muito agitada, pois fizemos sexo em todos os
locais possíveis da enorme suíte de cobertura do hotel onde estou
morando há alguns dias. Pela primeira vez, desde que cheguei aqui,
lamentei não estar num espaço mais pessoal, com coisas minhas.
No entanto, ainda assim, acho que comprar algo no Brasil de forma
definitiva é precipitado.
Estou acostumado a não ter uma base, raramente fico em
algum lugar por mais do que alguns meses. A verdade é que a
impessoalidade dos hotéis nunca me incomodou tanto quanto nessa
noite com Melissa.
— Pensei que eu é que tinha sido deixada para trás desta
vez — ela comenta, abraçando-me por trás, com seu cheiro
delicioso se espalhando em volta de mim.
— Estava com sede. — Ofereço-lhe a água, e ela a toma um
pouco. — Mas já está quase na minha hora de acordar mesmo. —
Sorrio lamentoso. — Vou me exercitar um pouco e depois ir para o
trabalho.
— Mais exercícios. — Beija meu pescoço.
— Preciso manter o ritmo. — Pisco. — Vamos nos ver mais
tarde?
Ela sorri satisfeita, e prevejo mais algumas horas intensas de
prazer, até que faz uma careta e fecha os olhos.
— Puta merda, tenho compromisso essa noite. — Bufa. — É
aniversário da minha amiga.
— Ah, sim. Na Spice!
Melissa me olha curiosa por eu saber o nome do lugar aonde
vai.
— Ouvi você ao telefone ontem, com sua irmã.
— Ah, sim. — Suspira. — Hoje vamos comemorar o
aniversário da cunhada dela e minha amiga, e o pessoal escolheu
essa boate.
— Hum... — Mordisco seu pescoço, deixando sua pele
arrepiada. — É uma pena!
Encosto-me nela, e imediatamente meu corpo se acende,
desejando mergulhar em seu interior novamente e se perder por lá
para sempre. Melissa me abraça e beija-me, demonstrando que
sente o mesmo tesão matutino que eu.
— Tem que ser uma rapidinha... — sussurra quando a coloco
sobre a escrivaninha. Não entendo bem o que ela quis dizer com
isso, e, pela risada que dá, Melissa percebe que me deixou confuso.
— Quis dizer que nossa transa tem que ser rápida!
— É meu jeito preferido de manhã. — Ajoelho-me entre suas
pernas. — Você explode[21] na minha boca, e eu, dentro de você.
Cheiro suas coxas, deliciando-me com o perfume de mulher
excitada, antes de esfregar a ponta da minha língua por toda sua
boceta. Melissa geme, e sinto os músculos de suas pernas se
contraírem. Volto a repetir o movimento um pouco mais forte e sorrio
ao ouvir os gemidos.
Afasto suas coxas uma da outra ao máximo e a puxo mais
para a beirada do móvel, de modo que possa acessar todo seu sexo
e abocanhá-lo como gosto. O sabor agridoce preenche toda minha
boca, fazendo-me salivar ainda mais. Sou viciado neste sabor, na
textura, no aroma e, principalmente, nos sons que a ouço emitir a
cada lambida ou chupada.
Enlouqueço com a resposta de Melissa, sinto que ela arqueia
o corpo, aperta as coxas contra mim, rebola gostoso na minha boca
para guiar meus movimentos. Parece que a qualquer momento vou
explodir e me derramar todo em fogo líquido, esvaindo meu ser
diante do majestoso prazer que ela compartilha comigo.
De repente, Melissa me agarra pelos cabelos e uiva feito uma
loba esfomeada, esfregando sua boceta na minha cara enquanto
me mantém refém de seus delírios eróticos e me conduz a um
caminho sem volta.
No way![22], penso, freando meu corpo, inconformado por não
estar dentro dela. Aguardo seu êxtase se acalmar e, com um
movimento rápido, me introduzo nela, trêmulo, gemendo tamanho
prazer que é sentir seu corpo quente e molhado me recebendo e...
— Adam! — Ela se move rápido, e sinto meu pau escapar. —
Camisinha! — Olho-a confuso, ainda perdido na dor da falta do
contato do meu corpo com o dela. — Preservativo.
Porra! Fecho os olhos, entendendo por que ela parou.
— Usamos tudo ontem! — Ela ri, porém, não consigo, pois
meu pau lateja como se tivesse sido martelado. Olho-a – tenho
certeza de que foi um olhar penoso – e sugiro: — Não podemos...?
— Não podemos!
Respiro lentamente para tentar fazer meu sangue voltar a
circular por todo o corpo e sair de uma área específica onde está
todo acumulado e quase me matando.
Concordo balançando a cabeça, porém, não consigo impedir
um bufo de frustração.
— Não dá tempo de comprar mais? — Tento um último
recurso, mas já prevendo a resposta dela.
Melissa, claro, nega.
— Eu preciso ir.
Assinto, mas, antes que eu possa me afastar, vejo-a ajoelhar-
se aos meus pés e, com um sorriso gostoso, dizer:
— Mas não vou antes de lhe retribuir o prazer!
Quando os lábios dela se fecham sobre a cabeça do meu
pênis, sinto como se um terremoto sacudisse São Paulo. Seguro-me
em algo para conter a tremedeira nas pernas, gemo alto e a seguro
pelos cabelos, fodendo sua boca como gostaria de fazer com sua
boceta quente.
Que tesão absurdo!
— Não, estamos refazendo os prazos, mas tenho certeza de
que não iremos atrasar mais do que já havia sido previsto. —
Converso com o diretor de vendas da TGS, que está preocupado
em perder o prazo para a inauguração da nossa primeira unidade no
Brasil.
— Em maio comemoramos duas datas perfeitas para
presentear com joias: o Dia da Mães e o Mês das Noivas. Se não for
possível abrir a TGS até abril, vamos perder a oportunidade de...
— Não vamos! — volto a garantir. — Tenho uma reunião
marcada com a empresa que vai executar a reforma e com a que
fará toda a parte de marcenaria. Vai dar tudo certo!
Escuto T.J. Smith suspirar.
— Adam, seu pai quer falar contigo, vou transferir a ligação.
Caralho!
— Obrigado, T.J.! — Aguardo um momento e logo escuto a
voz barítono de meu pai.
— Adam, soube que, por fim, ajustaram a questão dos
projetos aí, em São Paulo. Eu sabia que podia contar contigo, hijo!
— Aparentemente, estava acontecendo um problema de
comunicação entre nós e a Boldani, mas já foi tudo esclarecido. —
Tento ignorar a onda de tesão que me assola apenas por lembrar-
me de Melissa. — Estava falando há pouco com T.J. que vamos
cumprir o prazo que ele quer.
— Ótimas notícias, porque preciso de você aqui para resolver
uma questão.
Franzo a testa, pois não tenho nenhum compromisso
agendado ainda, só São Paulo.
— Quando o senhor precisa que eu vá?
— No primeiro voo que conseguir. — Fecho os olhos. —
Decidi fazer uma confraternização de final de ano...
— Pai, ainda tenho coisas pendentes aqui, será que...
— Adam. — Joshua me interrompe sério. — Eu decidi me
casar e preciso de vocês todos aqui mostrando apoio.
Juro que, se eu já não estivesse sentado, cairia neste
momento.
— Tereza concordou em se casar?
O homem gargalha do outro lado da linha.
— Não, porque ela não sabe! — Coloco a mão no rosto,
achando que meu pai perdeu o juízo. — Eu vou pedi-la em
casamento no dia da festa, e, caso ela aceite, vamos oficializar tudo
no Natal.
Natal?! Sinto vontade de gemer ao pensar que terei de ficar
várias semanas nos Estados Unidos e imediatamente penso na
merda que é o destino, sempre me puxando para longe de Melissa
Boldani.
— Certo, mas volto para cá logo após as bodas.
Joshua ri de maneira sarcástica.
— E eu vou ficar sem lua de mel? Esquece, hijo, preciso de
você à frente da TGS enquanto faço um cruzeiro rápido pelo Caribe.
Já foi comprovado que não posso confiar ainda nos seus irmãos
mais novos, e Aaron está muito ocupado com a campanha.
Xingo baixinho em português – coisa que tenho aprendido em
uma velocidade alarmante – e o escuto xingar de volta.
— Tereza já me ensinou todas essas maldições, hijo! — ele
me diz rindo. — Tente ao menos fingir que está feliz por seu velho
pai ter achado alguém para amar.
— Não preciso fingir, pai, estou feliz por vocês. — Sou
sincero, pois adoro a Tereza. — Só me pegou desprevenido e no
meio de muitas coisas importantes aqui.
— Confio na sua competência e sei que irá deixar tudo
ajeitado para que, quando voltar, possa retomar as coisas sem
nenhum problema.
Quem dera eu consiga!, penso desanimado e me despeço
dele.
Levanto-me e me sirvo de uísque, tentando entender por que
estou tão relutante em ficar umas semanas fora do Brasil. Eu já
sabia que meu tempo aqui era provisório e que o caso com Melissa
Boldani seria transitório.
Só não queria que fosse tão rápido!
Tivemos apenas mais uma noite, o que só serviu para
confirmar que nós dois juntos somos muito mais do que já fui com
qualquer outra pessoa. Sinto-me livre com ela, verdadeiro, sem
medo de decepcioná-la por ser quem sou.
Ainda que eu queira mais, não posso pedir que ela fique à
espera e, sendo a mulher maravilhosa que é, não vai me admirar
quando eu voltar se a encontrar com alguém.
Sinto meu corpo se rebelando, gritando internamente que não
quer abrir mão dela, que não quer deixá-la ainda, que é cedo
demais. Olho para o celular e abro o aplicativo de mensagens,
pronto para dizer a ela que terei que ir embora e que gostaria de
mais uma noite.
— Shit! — xingo alto ao lembrar que, nessa noite, ela vai sair
para uma comemoração. Tento lembrar o nome do lugar. Era em
inglês, algo sugestivo e...
— Spice! — Jogo o nome no Google e acho o endereço da
boate. — O que você vai fazer, Adam Hidalgo Stone? — pergunto a
mim mesmo, saindo do escritório para ir até meu apart e organizar
as coisas para seguir até Los Angeles no dia seguinte.
No caminho, sentado pensativo no banco de trás do carro,
avisto uma coisa que me faz chamar Douglas e pedir que ele pare
na calçada de forma irregular.
— Não vou demorar! — aviso e saio correndo com a carteira
na mão.
Tive de acelerar minha rotina matinal para chegar ao
escritório e resolver todos os assuntos do dia por aqui. Dei graças a
Deus quando cheguei e não encontrei meu pai. Ele saiu com dona
Hilda e irá voltar apenas no final do dia.
A verdade é que eu estava um pouco receosa de que ele me
perguntasse o que Adam queria conversar comigo em particular.
Não sou boa com mentiras, e obviamente ele iria perceber que eu
estava omitindo algo.
Também não vi o traidor do Carlos. Ainda tenho de acertar
alguns ponteiros com aquele filho da puta, mas foi bom não o ter
visto, pois não quero estragar meu dia, que começou tão bem!
Suspiro ao me lembrar do sexo oral incrível que fizemos e,
depois, do beijo de bom-dia – safado – que Adam fez questão de
me dar. Aquele homem é muito gostoso!
Trabalhei como uma louca, almocei no escritório e só me dei
conta do horário quando recebi mais uma ligação da Isabella,
informando-me que todos iremos aguardar Gio na boate e que
Frank irá levá-la para lá.
Embora eu tenha achado uma boa ideia o plano de
surpreendê-la, estou um pouco reticente, pois tenho estado com ela
durante todos os meses desde que o seu relacionamento com o
Nicholas acabou e não sei se dançar a noite inteira num lugar cheio
de gente é o ideal nessas circunstâncias, embora eu mesma tenha
concordado com a boate quando Isabella mencionou, oferecendo a
opção de um lugar mais tranquilo.
Além disso, há outro fator: Frank. Nós não nos vemos desde
que ele me pediu ajuda para cuidar de Giovanna, que estava no
hospital, em observação, quando ela e Nicholas terminaram, há uns
dois meses e meio. Evito ao máximo estar perto dele, não por medo
de alguma coisa acontecer entre nós, porque eu nunca teria
coragem de fazer isso com minha irmã, e ele também nunca o faria,
pois ama Isabella, mas sim porque tê-lo por perto me faz lembrar do
quanto o amei, e isso ainda me fere.
Não obstante, temos muita coisa em comum, negócios,
amigos, família, então é impossível que eu consiga evitá-lo por
muito tempo. O que me resta fazer é colocar um sorriso no rosto e
fingir que isso não me incomoda.
Pensei, por um momento, enquanto Adam e eu nos
despedíamos hoje de manhã, em pedir a ele que me
acompanhasse, mas, antes de fazer essa loucura, lembrei que o
que tínhamos se resumia somente a nós dois e um local para
transar, nada mais.
— Mel? — Tânia me tira dos meus pensamentos, e eu a olho.
Ela segura um enorme buquê de rosas nas cores champanhe e cor-
de-rosa e tem um sorriso gigante pregado no rosto. — Chegaram
agora...
Salto da minha banqueta que uso quando estou desenhando
na prancheta e pego o buquê das mãos dela, procurando um cartão.
Tânia não volta para sua sala, ficando parada, curiosa sobre o
remetente de tal presente.
Acho o cartão e, dentro dele, há apenas uma frase escrita em
inglês: Thinking of you[23] e um número de telefone celular. Rio
como boba, mais uma vez achando-o contraditório, afinal, quem
quer somente um relacionamento baseado em sexo manda flores no
dia seguinte?
Imediatamente pego meu telefone e ligo para o número, e
uma voz rouca, com sotaque forte, atende.
— Quem é? — Faço-me de desentendida, mas ele ri. — Eu
adorei as flores!
— Que flores? — provoca-me de volta. — Passei em frente a
essa loja de flores quando estava indo para casa, então me lembrei
de você. Não prefere as vermelhas?
Sento-me, rodando em minha cadeira como uma
adolescente.
— Não. Gostei dessas! O vermelho é muito clichê!
— Clichê? — Ele pensa um instante, mas dessa vez não o
ajudo. — É comum?
— Quase isso... é previsível. — Ele concorda. — Trabalhou
até agora?
— Sim. E assumi que você também estivesse no escritório.
Ainda bem que acertei.
Dou outra volta em minha cadeira, não sem ver Tânia ainda
me olhando com um baita sorriso. Ai, merda, me esqueci dela!
Levanto-me, aprumando meu corpo e ficando séria.
— Eu já estava de saída.
— Para a festa.
— Sim. — Novamente sinto vontade de convidá-lo, mas não
o faço. — Obrigada pelas flores!
— Meu prazer! — Arrepio-me somente ao ouvi-lo dizer isso.
— Boa festa!
Desligo o celular e salvo o nome dele na minha agenda.
— Hum... flores vindas da TGS? — Tânia comenta. —
Interessante!
— Quando é que você se tornou tão inconveniente? —
pergunto sem a olhar, encarando as rosas. — Você não devia já
estar em casa?
— E perder este momento? — Olho para ela e sorrio,
balançando a cabeça em recriminação. — Acho que aquele seu
surto que a fez invadir a sala dele o impressionou, não foi? O
homem apareceu aqui, colocou o Carlos no lugar que ele merece e
ainda te fez ficar rodopiando nessa cadeira como uma menina!
— Tânia!
— Vê se larga de ser boba e agarra esse homem, Mel! —
Abro a boca para falar, mas ela não deixa. — Você, mais do que
qualquer outra pessoa, merece encontrar alguém bacana! Ele não
sabe a sorte que tem de ter se interessado por você!
Emociono-me ao ouvi-la dizer isso. Tânia e eu trabalhamos
juntas aqui no escritório há bastante tempo, desde que ela era uma
estagiária. Ela é uma amiga, mais do que é funcionária, e eu me
sinto muito feliz por ela me querer bem. É uma pena que Adam não
seja um homem em quem eu possa apostar minhas fichas!
— Preciso ir! — Seguro as flores no meu colo. — Bom final
de semana!
— Igualmente! Aproveite! — Sorri maliciosa, e eu dou risada.

Chego à boate exatamente no horário combinado e sigo


direto para a ala VIP, que foi reservada. Minha irmã está linda,
usando um vestido tubinho vermelho e saltos altos. Ela é bem mais
baixa que eu, pelo menos uns 10 centímetros, mas tem um corpo
tão perfeito que nem parece que teve filhos gêmeos.
Ela me cumprimenta e me leva até a mesa onde Marina, com
uma enorme barriga de sete meses de gestação, e Tony, seu marido
e meu amigo, irmão do Frank, tomam suco de laranja e conversam
com Tom e Lori, um casal de amigos e sócios de Gio na Ello, sua
agência de publicidade.
— Olá! — cumprimento um por um. — Marina, como está
esse meninão aí?
— Ele está bem, mas confesso que já estou louca para ele
sair daqui! — Ri. — Está pesado, e dormir é difícil!
— Por isso eu nem queria que ela viesse, mas vocês
conhecem minha esposa! Não pode nem ouvir falar de uma festa,
que já está escolhendo a roupa para ir!
Todos riem, porque a fama de festeira da Marina é senso
comum entre os mais chegados. Os dois são muito diferentes nesse
quesito, pois Tony sempre foi o mais certinho dos três irmãos,
sempre o mais sério e centrado, porém, ficou mais animado quando
a conheceu.
Conversamos um pouco mais sobre a viagem de avião deles
até aqui, eu querendo saber se não há risco de um parto pré-maturo
por causa disso, e ela me explicando que não, que o obstetra
liberou e que a duração de voo é muito pequena entre Curitiba e
São Paulo.
Estou aqui há mais de meia hora, e não temos notícias do
Frank e da Gio. Vejo Isabella escrevendo no celular a todo instante,
provavelmente conversando com o marido, e estranho a demora,
pois já era para terem chegado.
— Mel, conta para a gente como vai ficar a filial da TGS! —
Tom pede, mas Lori o repreende, dizendo que é sobre um cliente e
que a ética não me deixaria responder, mesmo entre amigos.
— É isso, Tom. O Lori tem razão! — Dou de ombros,
desconversando.
— Mas você pode falar sobre o tal Stone, não pode? — Lori
me questiona animado, recebendo um olhar raivoso de seu marido.
— O que é, Tom? Todos têm falado do homem, pelo amor de Deus!
Fico curiosa.
— Sobre o que falam?
— Que ele é quente! — Lori se abana, e Tom dá um tapinha
em sua mão. — Eu soube que o primeiro que esteve aqui era um
típico americano, loiro de olhos azuis, mas me falaram que esse de
agora é um homem grandão, moreno e com um olhar matador.
— O sorriso é o melhor! — confesso.
— Danadinha! Então você já o conheceu!
Biblicamente!, penso rindo, mas tento ficar séria.
— Recentemente tivemos uma reunião, e, sim, ele é
charmoso!
Ficamos conversando por mais alguns momentos, até que
Isabella volta para a mesa.
— Gente, o Frank não está conseguindo localizar a Gio. Ele
está preocupadíssimo, pois liga para ela, e só cai na caixa postal.
Todos ficam mudos. Penso em onde ela pode ter se enfiado.
— Vou ligar para o Bê! — Pego meu celular e vejo que há
uma mensagem no aplicativo, mas a ignoro, ligando para o
Bernardo de Toledo, um amigo querido meu que tem ajudado a
tomar conta dela durante esse tempo todo. Depois do terceiro toque,
ele atende. — Bê, é a Mel! Você sabe da Gio?! — praticamente
tenho de gritar com ele.
— Nossa, Mel, eu quase não te escuto! Você quer falar com a
Gio? Nós estamos no Rio de Janeiro, viemos ver uma apresentação
no Teatro Municipal e chegamos ao hotel agora...
Bingo! Olho para todos reunidos aqui, esperando-a, e ela em
outro estado!
— Não precisa, Bê! Depois eu mando mensagem para ela.
— O celular dela está sem bateria, mas ela já deve ter
colocado para carregar. Mas que barulheira é essa? Está na
noitada, Mel? Poxa, quando chamo você para ir à Beat, você nunca
vai comigo!
Rio e me despeço dele, desligando o telefone. Bernardo é
lindo e um amor, mas tem só 27 anos, e nunca pensei em me
envolver com ele, apesar de saber que o garotão adora uma mulher
mais madura que ele.
— Pessoal! — tenho quase que gritar para falar. — Eu
encontrei a Gio.
— Ai, que bom, porque o Frank está nervoso! Onde ela está?
Ele está vindo para cá e pode pegá-la...
— Está no Rio de Janeiro com o Bernardo de Toledo. —
Interrompo minha irmã.
— O quê?! — Tony parece puto. — Aquele garoto mal
chegou à família e já está passando o aniversário da Gio com ela,
monopolizando-a?
— Tony, a gente não avisou que vinha... — Marina tenta
apaziguar.
— O Frank vai surtar! — Isabella ri.
Meu celular vibra, e vejo que mais uma mensagem chegou.
Abro o aplicativo e as leio:

“Você está deslumbrante!”

“Seu grupo é bem desanimado. Cadê a festa?”

Começo a olhar para todos os lados, procurando Adam entre


a multidão. Então o vejo sentado perto do bar com uma IPA na mão.
Meu coração palpita, e me sinto surpreendida por ele estar aqui.
Desço as escadas da área VIP e caminho até onde ele está.
— Agora, sim, me sinto um stalker! — ele exclama quando
me aproximo. — Eu estava muito sozinho no hotel, então resolvi me
divertir um pouco, e o único local cujo nome eu me lembrava era
esse...
— Sei... — Cruzo os braços sobre os seios e levanto uma
sobrancelha. — Eu quis te convidar, mas não sabia como.
— Puxei o assunto duas vezes, esperando o convite. Como
ele não veio, convidei a mim mesmo.
— Melhor decisão! — Pego a cerveja da mão dele e dou uma
golada.
Ele, então, surpreende-me e rouba-me um beijo bem no meio
da multidão de pessoas que não param de dançar e circular à nossa
volta.
— Você está hot com essa roupa colada no corpo! —
murmura no meu ouvido. — Fiquei aqui, te olhando conversando
com os... guys lá em cima e preocupado por eles terem melhor
visão do seu corpo do que eu.
Gargalho, pensando em Lori e Tom e adorando os ciúmes
dele.
— Você quer subir para lá comigo?
Adam desliza uma de suas mãos sobre o tecido fino do meu
vestido preto, parando acima da minha nádega esquerda.
— Claro!
Seguimos juntos, mas sem nos tocar, até o mezanino da área
VIP, e, quando estamos subindo as escadas, vejo Frank
conversando com Tony e Isabella num canto.
Respiro fundo e fecho os olhos, balançando a cabeça,
tentando não sentir nada.
— A Isa estava certa, ele está surtando! — Lori comenta
comigo, sem desviar os olhos do meu companheiro. — Olá! —
saúda-o.
Viro-me para o Adam e sorrio.
— Esse é Lorival Sandler. — E me viro para o Lori. — Esse é
Adam Stone.
Lori não disfarça seu assombro, arregalando os olhos,
perdendo a fala por um momento e descaradamente olhando-o de
cima a baixo.
— Muito prazer... — cumprimenta-o Adam.
— Olá! Eu sou o Elton Simplício, marido do Lori. Como vai?
Adam o saúda de volta, e dou-lhe mais detalhes sobre os
dois.
— Eles são da agência Ello. Não sei se vocês já estão à
procura de alguém para cuidar do marketing...
— Ah, sim! Eu vi o material de vocês, é excelente!
Tom fica animado com a possibilidade de fazer mais um
contato para um possível negócio, enquanto Lori se aproxima de
mim para cochichar:
— Hum... e a ética entre arquiteta e cliente? — debocha. —
Não sabia que era normal os americanos cumprimentarem seus
contratados com um beijo...
— Lori! — Finjo-me de zangada.
— Ai, mas que delícia, Mel! Te dou todo apoio!
Balanço a cabeça, rindo, mas meu sorriso morre ao ver Frank
vindo em minha direção.
— Eu quero o telefone do Bernardo, Mel! — dispara sem nem
mesmo me cumprimentar.
— Oi, Frank, tudo bom? — Ele bufa e assente. — Não vou te
dar o telefone do Bernardo. Não para você o xingar com toda aquela
sua lista de xingamentos.
— Cazzo, Mel! Me dá a porra do telefone!
Isabella toca seu braço, pedindo que ele se acalme.
— Algum problema? — Adam se aproxima de mim e, para
minha total surpresa, passa um braço pela minha cintura, encarando
o Frank.
Frank, já esquentado com a situação de Giovanna, encara-o
de volta, franzindo o cenho.
— Mel... — Frank o ignora. — Nós viemos todos para cá para
estar com ela, e aquele frangote chegou ontem e já está tirando-a
de nós?
— Ele não está fazendo isso, Frank! — Isabella intervém. —
E você está sendo muito grosseiro! — Ela sorri para Adam. — Olá,
eu sou Isabella, irmã da Mel!
— Sou Adam, é um prazer!
— Americano? — Frank o olha com mais atenção.
Respiro fundo e resolvo fazer a apresentação dos dois, enfim.
— Sim, Frank. Adam Stone, representante da TGS aqui, em
São Paulo. — Olho para Adam. — Esse é Frank Villazza.
— TGS? — Ele cumprimenta Adam. — O anel de noivado e a
aliança de casamento de Isabella vieram da loja de Milão. —
Isabella ergue a mão esquerda e mostra as belíssimas joias para
Adam.
— Ah, sim, reconheço! — Ele sorri. — Muito bom gosto na
escolha. — Ele olha para Frank. — Da joia e da esposa.
Frank fica sério, pois sei o quanto é ciumento, porém, não
fala mais nada.
— E então? Ainda vamos ter festa ou não? — Marina
questiona, e apresento Adam a ela e ao Tony.
A família Villazza começa a discutir sobre ficar ou ir embora,
e eu me afasto com Adam.
— O que está havendo? — Ele parece divertido. — O italiano
ali é bem... quentinho!
Rio de sua confusão de palavras.
— Esquentadinho. — Ele concorda. — Sim, ele é. Eles
vieram de Curitiba, no Sul, para comemorar o aniversário da irmã
caçula, Giovanna, mas ela viajou e frustrou os planos deles.
Adam olha mais uma vez para o Frank, que continua
conversando com Isabella, Tony e Marina.
— Então não tem festa? — Dou de ombros, e ele cola seu
corpo no meu. — Então podemos fazer nossa própria festa?
Sinto meu sexo se apertar de vontade.
— Eu adoraria...
Não termino de falar, porque ele me beija como um louco,
agarrando-me pelo pescoço rapidamente, esfregando sua língua por
toda a minha boca, deixando-me molhada e querendo mais.
— Vamos embora! — rosna contra meus lábios. — Ou vou
querer foder você aqui mesmo!
Novamente sinto um tremor de antecipação entre minhas
coxas.
— Mel? — Isabella me chama. — Você se importa se
voltarmos para o hotel? — Ela parece sem graça. — Frank ficou
sem clima, e o Tony quer levar a Marina para descansar.
— Por mim tudo bem! — digo, ainda sentindo a mão de
Adam subindo e descendo em minhas costas.
— O Lori e o Tom vão ficar...
— Nós também vamos embora! — Adam a interrompe. — Foi
um prazer conhecer você, Isabella!
Ando até ela e a abraço, despedindo-me com um beijo.
— Vocês dois...? — ela me pergunta ao ouvido.
— Sim. Mas é recente.
Ela sorri, e em seguida eu me despeço de Marina e Tony,
abraçando-os e trocando beijos. Eles todos vão se despedir de
Adam também e me deixam a sós com Frank.
— Me desculpe por antes, Mel. Você sabe que eu sou muito
ciumento com a Gio.
— Eu sei, não se preocupe! Até mais!
— Tchau! — Ele sorri e vai até Isabella, que conversa com
Adam.
Vejo os dois se cumprimentarem, e em seguida todos saem
da área VIP. Despeço-me de Tom e Lori.
Adam toma minha mão, e saímos juntos da boate.
— Veio de carro? — ele me indaga quando alcançamos a
calçada.
— Sim. — Ele me conta que dispensou o motorista,
planejando que, se não me encontrasse, iria voltar de táxi. — Te dou
uma carona! — Pisco. — Só não quero ouvir nenhuma gracinha
sobre meu carro!
O manobrista chega com o veículo, entro em seu lugar na
direção, e Adam se senta ao lado, no carona.
— Por que eu faria piada do seu carro? — pergunta-me
confuso. — É um belo carro.
Concordo, mesmo achando que ele está zombando, mas
Adam está falando sério, e isso me faz sorrir com mais vontade.
Homens geralmente pensam mais na potência do veículo do que
nas vantagens de se ter um carro menos poluente.
Não Adam!
— Para o seu hotel? — questiono, saindo de perto da guia da
calçada e entrando na estrada.
Ele põe sua mão sobre minha coxa, seguindo até minha
virilha.
— Por que não sua casa?
Surpreendo-me, mas gosto da ideia de tê-lo em minha cama.
— Por que não? Você quer ir para lá?
Ele, em vez de responder, enfia sua mão sob meu vestido e
me toca sobre a calcinha.
— O mais rápido possível, porque acho que esse carro é
muito apertado para eu te foder aqui dentro.
Gemo quando ele esfrega seus dedos sobre meu clitóris e
acelero o carro em direção ao meu bairro.
Foi loucura aparecer na boate em que Melissa estava com os
amigos, eu sei. Fiquei com receio de parecer doido ou mesmo um
homem que sufoca a mulher com quem tem alguma relação.
Entretanto, saber que terei de ir embora do Brasil por, talvez, mais
de um mês, fez com que eu jogasse toda a cautela pelos ares.
Eu simplesmente não poderia ir embora sem ter Melissa mais
uma vez!
Não sou um homem impulsivo, nunca fui, mas o que essa
mulher me faz sentir é algo que altera toda minha noção e faz com
que eu me comporte como um homem completamente diferente do
sempre previsível Adam Stone. E posso estar enlouquecendo, mas
gosto desta versão de mim mesmo, pois ela me faz lembrar da
essência do que fui e que sobrepujei a vida toda para poder me
encaixar.
Tenho poucas lembranças da minha infância no México,
porém, as que ainda permanecem vivas em minha memória são de
festa e aventuras, correr descalço pela grama, subir em árvores e
ouvir a lamentosa voz de minha abuela cantando junto aos músicos
da fazenda onde morávamos.
Tenho flashes desses momentos felizes e me agarro a eles
como quem se apoia numa madeira precária em alto-mar, porque,
não muito tempo depois, veio a dor, a tristeza e a mudança em
minha vida. Tive que deixar de lado o menino impulsivo, brigão e
festeiro e me tornar mais frio que o ouro que tornou minha família
rica.
Tudo isso ficou para trás, e achei que aquele traço da minha
personalidade tinha deixado de existir. Por anos mantive relações
frias e, temo dizer, calculadas com as pessoas. Deixei que
conhecessem apenas a imagem que projetei para mim e não quem
eu era. Até mesmo minha ex-mulher nunca me conheceu de
verdade, apenas o refinado, moldado e lustrado diretor da The
Gilded Stone.
Por que, então, estou me expondo cada vez mais para
Melissa Boldani? Essa questão, eu não saberia responder. A única
coisa de que tenho certeza é que, a cada novo pedaço meu que
desnudo com ela, sinto mais prazer.
O gemido alto de Melissa me faz parar de devanear e dar um
meio sorriso diante das reações acaloradas – e molhadas – do
corpo dela ao meu toque.
Estamos na estrada, na direção do apartamento dela – que,
inconscientemente, eu quis “marcar” com minha presença –, e,
enquanto ela dirige, eu a guio no início da nossa jornada em busca
do ápice. Meus dedos já estão melados, assim como a calcinha
dela, o cheiro delicioso de sexo se espalhando pelo carro, algo sutil,
mas que consigo captar porque já o conheço.
Melissa se remexe no banco do motorista, e a vontade que
tenho é me deitar sobre seu colo e trocar meus dedos pela língua,
pois minha boca não deixa de salivar de vontade de provar a
excitação que empapa sua lingerie. Ah, eu já posso sentir o sabor!
Fecho os olhos em deleite, sentindo meu pau se contorcendo e as
bolas pulsando.
— Adam... eu mal consigo me concentrar aqui!
Rio e a encaro.
— Estou sentindo você bem concentrada — esfrego meus
dedos com mais força — onde quero.
Ela suspira.
— Você é um safado torturador!
Franzo a testa, pois não entendi bem o que ela quis dizer
com isso, mas não questiono, apenas sigo tocando-a e a deixando
mais suculenta para a hora em que for comer sua boceta.
Entramos na garagem do prédio dela, e mal espero que ela
estacione seu veículo na vaga, afasto meu banco para trás e a puxo
para meu colo. Melissa começa a rir com a mão na cabeça – uma
vez que, no pequeno percurso, bateu-a no teto, e um joelho no freio
de mão –, e o som de sua risada é abafada por um beijo cheio de
tesão.
— Hummm... — ela geme e rebola sobre meu colo.
Afundo as mãos em seus cabelos, saboreando seus lábios
cheios, tão sensuais, e adorando o toque safado de sua língua na
minha. O sabor da boca de Melissa me atiça, faz com que meu
corpo pulse de vontade de estar dentro dela, ansiando pela
liberação de todo o desejo com o qual estamos lidando desde o
primeiro olhar que trocamos.
Minha boca deixa a sua momentaneamente para explorar a
pele macia e cheirosa de seu pescoço. O carro parece mais
abafado, quente. Sinto minha pele suando por baixo da roupa,
desejoso por livrar-me de todo o tecido que me cobre e impede de
senti-la por inteiro.
— Adam, aqui é uma... — geme — área comum do prédio...
— Não entendo o que significa — digo e continuo a beijar,
sugar e morder seu pescoço.
Ela rebola mais firme, apertando-se contra meu pau inchado.
— Significa que qualquer pessoa que mora aqui pode nos
ver.
— Ah... — Paro e a encaro, percebendo que isso é uma
questão que a incomoda. — Não pensei sobre isso.
Ela ri e beija-me com carinho.
— Eu sei, nem eu, no começo, mas acho que é melhor
subirmos. — Ela aponta para o alto.
— Para o seu apartamento? — Sorrio feito um lobo prestes a
devorar um cordeiro, com a boca salivando e os olhos brilhando de
vontade. — Para a sua cama, onde posso foder você de todas as
formas?
Ela suspira e estremece.
— Todas as formas?
— Yeah! Every way, all night long!
Melissa sai do meu colo e rapidamente desce do carro. Não
perco tempo e faço o mesmo, alcançando-a com meus braços antes
que se afaste. Coloco-a contra a traseira do veículo e me encosto
nela, esfregando-me de baixo para cima para que possa sentir o
quanto já estou pronto para realizar aquilo que acabei de falar.
— De todas as formas, a noite toda, Melissa!
— Por favor... — ela geme.
De repente ouvimos o som de um carro descendo a rampa da
garagem. Ela arregala os olhos, e a pego pela mão, indicando que
precisamos ir. Melissa me guia até o elevador, que não demora a
descer, e aperta o número de seu andar, ofegante, com a pele
avermelhada exatamente onde eu estava beijando.
— Gosto de como seu corpo... — penso um pouco, buscando
a palavra — mostra que foi beijado. — Toco seu pescoço.
Ela sorri.
— Eu marco à toa. — Dá de ombros. — Daquela vez em
Nova Iorque, fiquei uns dias com as marcas de seus dedos na
minha bunda.
Fecho os olhos e gemo, atingido pela deliciosa sensação de
ter deixado uma parte de mim impressa nela naquela época.
— Fiquei com uma bite. — Melissa logo traduz a palavra. —
Isso, fiquei com uma mordida sua no meu ombro.
Ela ri.
— Temos que ser mais cuidadosos.
Ergo a sobrancelha.
— Temos? — Abraço-a pela cintura e esfrego minha barba
em sua nuca. — Por quê? Não gosta?
Ela parece pensar, mas então se vira para ficar de frente para
mim, passa a língua sobre minha boca, encara-me e responde:
— Adoro!
Nem ouvimos as portas do elevador se abrirem, atracados
um ao outro, língua emboladas, bocas devorando-se. Arrasto
Melissa para fora antes que elas se fechem de novo e a sinto mexer
na pequena bolsa que carrega no ombro.
— Minhas chaves... — explica.
Liberto-a por um instante, mas, assim que pega o chaveiro,
abraço-a por trás e vou beijando sua nuca enquanto abre a porta.
Não sei o que dá em mim, simplesmente é impossível ficar
longe. O corpo de Melissa chama o meu a todo instante, e sinto
como se não pudesse estar sem tocá-la. Estou dentro do
apartamento dela, mas não consigo focar em qualquer outra coisa,
senão nos sons de prazer que ela emite e que me fazem perder a
razão e...
— What the fucker?[24]
Olho para baixo e vejo um pequeno e robusto cachorro
agarrado à barra da minha calça, olhando-me com seus olhos
esbugalhados e com cara de poucos amigos.
Melissa começa a rir, aproxima-se do bichinho e tenta tirá-lo
de mim. Contudo, toda tentativa é em vão.
— Tiger, solta!
Quase morro de rir ao ouvir o nome que ela pôs no bulldog
francês que me ataca ferozmente e não para de rosnar, mesmo com
a mandíbula firmemente fechada no tecido da minha Yves Saint-
Laurent.
— Tiger! — Melissa fala mais firme, e ele finalmente cede,
ignorando-me e indo pular sobre sua dona, que, pelo visto, não
esperava a reação e cai de bunda no chão. — Seu safado, para!
As risadas dela e o carinho evidente que o animal demonstra
me fazem rir também, porém, assim que ele ouve, volta a me olhar
desconfiado.
— Abaixa e deixa que ele te cheire um pouco — Melissa
pede, e eu, mesmo excitado a ponto de sentir dor, faço o que diz. —
Isso, viu, Tiger? É amigo! — Ela sorri sem jeito. — Ele não está
acostumado com visitas masculinas.
Franzo a testa, interessado em perguntar o que isso significa,
mas sem querer adentrar no assunto.
— Bom garoto! — Esfrego a mão entre as orelhas do animal
e ganho de presente uma longa lambida no rosto. — Holly shit![25]
— Ele gostou de você, Adam! — Melissa ri e o arrasta para
longe.
O cãozinho, mesmo pequeno, é pesado, e vejo que ela se
esforça para tirá-lo do chão – e ele não contribui em nada para
facilitar a tarefa – e levá-lo até uma área cercada com a cama e os
objetos dele.
— Desculpa, eu...
Não a deixo terminar e a beijo longamente.
— Um ménage diferente! — Pisco, e ela gargalha por eu ter
compartilhado com ela o beijo que ganhei de seu cachorro.
— Estou acostumada com os beijos do Tiger, ele é muito
carinhoso. — Acaricia meu rosto. — Desculpe por ele ter quase
arrancado um pedaço da sua calça.
Cheiro seus cabelos e, por fim, a curva de seu pescoço.
— Eu faria o mesmo se outro homem entrasse no meu
espaço.
— É? — Ela suspira. — Você é do tipo ciumento?
Rio.
— Nunca fui, mas posso ser.
Seguro-a pelas nádegas, apertando-a contra mim. Melissa
passa seus braços em volta do meu pescoço, e esse movimento é
tudo o que eu preciso para erguê-la e caminhar com ela no colo pelo
corredor que vislumbrei há pouco.
— Última porta — indica.
Assim que entramos no cômodo, ela se estica no meu colo e
aciona o interruptor na parede, que faz com que luzes de algumas
luminárias pelo quarto se acendam. A luz amarelada traz um
conforto e uma sensação de aconchego deliciosos, assim como a
enorme cama no centro do quarto.
Tudo está muito arrumado e elegantemente decorado, como
imaginei que a casa de Melissa seria. O espaço não é grande, mas
ela dispôs as coisas nele de um jeito que aproveitou cada
centímetro.
Coloco-a sobre a colcha, e Melissa logo se esparrama pelos
travesseiros e almofadas. Sorrio, ainda de pé, e sento-me numa
confortável poltrona num canto do quarto.
— Vai ficar aí? — ela questiona, sentando-se na cama.
Sorrio e concordo com a cabeça. Cruzo minhas pernas e
recosto no móvel, apreciando a vista, cheio de ideias malvadas.
— Quero ver você. — Melissa enruga a testa, mas logo
arregala os olhos, entendendo o que estou pedindo. — Quero ver
como faz sozinha.
Apago a luz da luminária ao lado da poltrona onde estou,
sendo encoberto pelas sombras, deixando apenas que ela seja
iluminada e esteja em destaque para meu prazer.
Por um momento, penso que ela não irá fazer o que pedi,
porém, quando a vejo retirar o vestido, restando apenas sua lingerie
linda e romântica, preciso conter o gemido e solto um longo suspiro,
completamente rendido por ela, por sua sensualidade natural, por
seu corpo lindo e suas expressões de mulher que sabe o que quer.
Ela fica na cama, ajoelhada, olhando fixamente para minha
direção. Passa a mão por suas pernas até chegar à renda que limita
suas meias e começa a enrolá-las, uma de cada vez, ficando de pé
até retirá-las por completo. Meu coração retumba forte, parece que
a qualquer momento irá sair pela boca. Seguro firme os braços da
poltrona, apertando minhas mãos como se quisesse me manter no
lugar.
Sinto-me comichando de vontade de sair de onde estou e me
ajoelhar aos seus pés, homenageando-a com meus lábios em sua
pele macia, minha língua molhando cada pedaço que ela descobre
impudicamente para mim, e minhas mãos testando o vigor de seus
músculos.
Melissa sorri para mim e então vira-se de costas. Arfo quando
ela repete o movimento que fez ao retirar as meias, baixando o
tronco, deslizando as mãos pelas pernas, sem baixar os quadris.
Que visão!, penso, segurando meu pau, que parece queimar
dentro da calça. Abro o zíper, meio atabalhoado, e saco-o para fora,
estrangulando-o com meus dedos longos.
Ela volta a subir, mexendo sua bunda devagar, e, quando
está novamente ereta, põe as mãos para trás e alcança o fecho do
sutiã. Melissa me olha de soslaio, um sorriso malicioso brincando
em seus lábios, e retira a peça, ficando com as costas desnudas.
Fecho os olhos, respiro fundo, movimento meu pau com a
ponta dos dedos, indo devagar para não acelerar demais e gozar
assim que encostar nela. Brinco com uma gota de excitação que
brota da cabeça de meu membro, espalhando-a e a usando como
lubrificante, aumentando os movimentos.
Escuto um barulho na cama, volto a olhar para sua direção e
ofego ao ver Melissa segurando seus peitos, excitando os bicos com
os polegares. Os olhos verdes dela estão sombreados por seus
cílios, suas pálpebras quase fechadas, a boca levemente aberta
liberando sons de puro contentamento.
Acabo de abrir minha calça e ajeito-me melhor na poltrona,
relaxando enquanto me masturbo olhando-a. Estremeço quando ela
desliza uma mão por seu abdômen, invadindo sua calcinha e se
tocando de uma forma completamente insana.
— Assim... — gemo entredentes, baixinho, sem querer
atrapalhá-la. — Continue assim...
Melissa afasta mais as pernas, afundando sua mão em seu
corpo, rebolando seus quadris no mesmo ritmo em que estimula sua
boceta. A outra mão continua massageando o peito. Percebo que
ela está curtindo cada toque, joga a cabeça para trás, os sons de
prazer ficando mais altos.
Sinto que a qualquer momento irei perder a razão e me juntar
a ela, dividindo o delicioso vício do tesão, provando o que seus
dedos já estão preparando para mim. Cerro os olhos, os
movimentos da minha mão em meu pau ficando mais fortes, mais
rápidos, mais intensos.
Posso sentir o gosto da boceta de Melissa, o sabor impresso
em minha memória desde aquela primeira noite há um ano. Posso
sentir o cheiro dela, um cio delicioso que impregna todo o ambiente
e me atrai como se fosse um afrodisíaco potente. Posso sentir sua
mão quente envolver a minha e...
Arregalo os olhos e a vejo, ajoelhada entre minhas pernas,
sendo apenas iluminada pelas luzes da cabeceira da cama que
refletem em seus cabelos claros. Ela toma posse do meu pênis,
assim como tomou de todo o meu desejo, firme e decidida, com
toque de quem sabe o que fazer para me deixar à beira do
precipício e saltar.
— Melissa... — sussurro seu nome cheio de tesão, adorando
observar como os movimentos dela são precisos para me dar
prazer.
Ela sabe onde e como me tocar!
Quando Melissa se aproxima mais e abaixa a cabeça na
direção do meu sexo, prendo a respiração por alguns segundos,
ansioso pelo toque de sua língua, e estremeço apenas ao sentir sua
respiração quente sobre mim.
Urro feito um animal feroz quando sou engolido por ela. Sinto
as paredes quentes e úmidas de sua boca, a maciez de sua língua e
o fundo de sua garganta, que limita que ela me tenha por inteiro.
Seguro-a pelos cabelos, e ela me olha, suas íris enevoadas de
vontade, sem parar um segundo de me comer.
Somente acompanho o movimento de sua cabeça, sem
forçá-la, sem imprimir qualquer ritmo além do que ela já tem.
Desfruto da sensação de pressão oferecida por sua sucção e que
faz meu sangue correr mais rápido e inchar ainda mais esta parte da
minha anatomia.
— Você suck me[26] muito gostoso! — Deliro a cada vez que
escorrego até o fundo de sua boca, sem conseguir coordenar meu
cérebro para o idioma correto. — Fuck you!
Ergo-a rapidamente enquanto escorrego pela poltrona, quase
me deitando, e faço-a sentar-se sobre meu rosto. Melissa ainda está
de calcinha, mas isso não me impede de sentir o seu gosto, pois a
peça está toda melada de sua excitação. Chupo o tecido feito um
louco, até que consigo afastá-lo e, enfim, saborear a carne quente,
inchada e molhada que clama por prazer.
Ela está ajoelhada nos braços da pequena poltrona, e estou
quase todo no chão do quarto, mas a posição desconfortável não é
nada diante do imenso tesão que nos envolve. Estou como um carro
desgovernado, sem direção, sem rumo, apenas dependente do
combustível do corpo em chamas da mulher que está sobre mim.
Ela grita quando afundo a língua em seu centro e volto
buscando seu clitóris para chupá-lo como se fosse extrair o néctar
mais precioso do mundo. Melissa rebola na minha cara, agarrada ao
encosto do móvel, e sinto minha língua encharcar-se com seu
orgasmo.
Fecho os olhos e conto até 20, tentando resfriar meu corpo e
não segui-la rumo ao prazeres da pequena morte, e, assim que ela
se acalma, saio de baixo dela, saco um pacote de camisinhas do
bolso da calça, levanto-me e, sem deixar que ela se mova, penetro-
a de costas, ainda ajoelhada na poltrona.
Melissa arfa, e eu a abraço firme, espalmando minhas mãos
em seu peito. Minhas pernas ardem por estar meio agachado, mas
o prazer é tão filho da puta de forte que elas podem cair, que vou
continuar dentro dela, socando, mexendo, rebolando firme,
descontando em estocadas firmes todo o desespero que sinto por
cada segundo que passei fora de seu corpo.
— There’s no place I’d rather be[27]... — sussurro baixinho,
quase em transe.
É isto! Este é o lugar onde quero estar a todo momento
desde Nova Iorque, o lugar em que desejava estar a cada vez que
pensava e sonhava com ela. Mesmo quando estive com outras
mulheres, após aquela nossa noite, não encontrei essa sensação.
Foi exatamente isto que me assombrou durante todos os
meses nos quais a procurei. Não apenas o seu corpo, sua risada ou
a forma intensa com que se entregou a mim, mas esta sensação
que encontrei somente com ela, com Melissa Boldani. Era isto que
eu procurava!
Minha pele se cobre inteiramente de suor, e a dela brilha com
a parca iluminação que chega até nós dois. Tento erguê-la um
pouco mais sem que perca o contato que nos liga, porém, ela se
assusta, perde o equilíbrio e se levanta, e eu acabo escapulindo de
dentro de seu corpo.
Não deixo que se vire, mas aproveito que está de pé e que
tem altura suficiente para foder sem que eu precise me agachar de
novo e, após fazer com que ela apoie um pé na poltrona, volto a
estocar firme.
Melissa se encosta em mim e vira seu rosto o suficiente para
que eu roce minha língua na dela, num beijo lingual cheio de
safadeza e tesão. Nossos corpos ondulam sem parar, e arrasto
minha mão pela frente de seu corpo até descobrir seu ponto inchado
e sensível.
— Adam!
— Gosta? — pergunto em seu ouvido, mordendo seu lóbulo.
— Vem comigo, Melissa!
Aumento os movimentos e vou mais fundo, enquanto meus
dedos trabalham em seu clitóris sem descanso. Consigo sentir sua
boceta me apertar, ela começa a ofegar e gemer alto, seus quadris
seguindo o ritmo dos meus, até que estremece e seu corpo fica
teso.
Travo os dentes, meu abdômen se contrai, assim como os
músculos das pernas e das nádegas, até a liberação chegar e me
fazer rugir como um louco, meus dentes cravados no ombro dela,
enquanto tremo feito um graveto sacudido por um tornado.
Sinto Melissa se afastar, mas, antes que eu pergunte para
onde vai, seus braços me envolvem em um carinho inesperado e
muito, muito gostoso.
— Acho que acordamos a vizinhança! — Sua voz tem tom de
divertimento.
Respiro fundo e tento racionalizar uma resposta, mesmo que
ainda esteja tremendo da cabeça aos pés.
— Acho que acordamos todo o seu país! — Ela ri, e seguro
seu rosto para que me encare. — Você é maravilhosa, Melissa!
Ela sorri e me beija.
— Quer um banho?
Esfrego meu nariz no seu.
— Necessito!
— Adorei sua ida de surpresa à boate! — Pisca, andando
pelo quarto apenas com a calcinha ainda um pouco torta – porra,
nem me lembrei de tirar! – abrindo um armário para pegar toalhas.
— Salvou a noite, quer dizer, pelo menos a minha noite!
— É o importante! — Suspiro. — Eu precisava ver você hoje.
Ela franze a testa, curiosa, e decido contar de uma vez sobre
minha partida.
— Preciso voltar para casa. — Vejo sua expressão se
neutralizar, como se ela não quisesse que eu saiba o que está
sentindo. — Meu pai precisa de mim lá.
— Entendo. — Ela sorri, mas percebo que é forçado. — Está
tudo bem, sabíamos que isso iria acontecer.
Merda, mas não agora!
— Sim.
Ela me entrega uma toalha.
— Quando vai?
— Mañana. — Balanço a cabeça. — Amanhã.
Melissa apenas assente.
— Então acho que devemos aproveitar o máximo possível
esta noite...
— Talvez eu volte...
Seu dedo sobre minha boca me impede de continuar.
— Temos esta noite, Adam, vamos nos concentrar nela.
Concordo e a abraço, mas sinto um gosto amargo ao tragar
saliva e um bolo gigante na garganta.
— Você entendeu tudo sobre o processo?
Balanço a cabeça concordando.
— Depois que todos os meus exames estiverem prontos,
vamos fazer a estimulação dos folículos com injeções e depois outra
medicação para amadurecer os óvulos e só então faremos a coleta
e a fertilização.
A doutora Vânia sorri.
— Exato! Dando tudo certo, implantaremos o embrião e
esperaremos umas duas semanas para saber se houve sucesso ou
não.
Respiro fundo, ainda me sentindo nervosa, mas certa da
decisão tomada.
Há muito tempo tenho pensado na possibilidade de ter um
filho sozinha e, depois de protelar muito, acho que o momento certo
é este. Não só por eu já completar meus 40 anos no próximo mês,
mas sim porque me sinto pronta para amar e cuidar de alguém.
— Tudo bem! — Levanto-me da cadeira. — Vejo você daqui a
alguns dias.
— Sim, uma semana antes do Natal, se os cálculos do seu
ciclo estiverem corretos. — Ela me cumprimenta. — Vamos fazer de
tudo para que você tenha um bebê saudável. O laboratório com as
doações de sêmen que te indiquei é maravilhoso!
— Eu vi, conheço algumas pessoas que o usaram também.
Muito obrigada pela atenção, doutora.
— É meu trabalho e um prazer.
Despeço-me dela e sigo para o estacionamento, onde deixei
meu carro, para poder ir até a loja da TGS antes de ir para o
escritório. Alexios Karamanlis está coordenando as obras da
reforma, e Daniel Schneider está responsável pela execução da
marcenaria, porém, por algum motivo que só Deus entende, os dois
não conseguem dialogar.
Foi uma novela conseguir aprovar o projeto até Adam chegar
ao Brasil, para que eu tenha problemas agora com a construção.
Adam... Tento não pensar nele, mas a tarefa se mostra difícil,
pois faz mais de uma semana que ele retornou aos Estados Unidos,
depois de uma tórrida noite de sexo no meu apartamento.
Tudo lá me faz lembrar dele agora, e talvez isso se deva ao
fato de que não costumo levar homens para dormir em meu lar,
então, como foi ele, ficou marcado. Ou não! Talvez eu só queira me
enganar com essa conversa e sinta realmente que algo dele ficou
em mim e foi mais profundo do que o prazer que sentimos juntos.
Simplesmente não sei, não deu tempo de averiguar o que
estava acontecendo, e ficou este gostinho de coisa mal resolvida, de
caso em suspenso, coisa pela qual eu não queria mais passar de
jeito nenhum.
De forma alguma quero esperar outro homem, como fiz com
Frank, por isso resolvi andar com meu projeto de ser mãe e dar
atenção ao que realmente importa na vida: uma família.
Sorrio ao pensar que, no próximo mês, no mês do meu
aniversário, eu possa realizar esse sonho. Se tudo der certo, no final
do próximo ano, não estarei mais sozinha, terei alguém sempre ao
meu lado, alguém para amar incondicionalmente e ensinar sobre o
amor e a amizade.
Paro de pensar um pouco sobre o grande passo que estou
dando ao chegar ao shopping onde está sendo montada a primeira
loja de uma das redes de joalherias mais antigas e prestigiadas dos
EUA e, quiçá, do mundo.
A TGS conseguiu um local privilegiado, no térreo, cuja vitrine
pega toda a entrada do shopping do lado esquerdo em formato de
“L”. Por questão de segurança, escolhi colocar a entrada do
estabelecimento dentro do prédio, sem nenhuma outra na área
externa, utilizando, assim, toda a fachada como expositor para as
lindas peças produzidas por eles.
— Ei, Mel! — Alexios me cumprimenta assim que entro no
local em obras. O rapaz é muito bonito, chama atenção de longe.
Seus olhos verdes se iluminam cada vez que ele sorri. — Ainda bem
que veio, temos uma questão para resolver.
Suspiro.
— Oi, Alexios! O que houve?
Ele me mostra então uma área onde vai ficar um armário
embutido.
— É para seguir o alinhamento da parede ou ele vai ficar
ressaltado? — Abrimos o projeto. — Porque aqui passava um duto,
e perdemos, pelo menos, 30 centímetros de profundidade.
Puta merda!, penso ao constatar que não fiz a modificação no
projeto dos planejados, por isso está havendo essa inconsistência
entre o que Alexios tem e o que Daniel está produzindo.
— Vou ajustar o projeto dos móveis e mando para a
Schneider assim que possível. — Pego o telefone e mando uma
mensagem para o Daniel avisar à sua equipe. — Soube que
Samara viajou para a Espanha. Será que vai demorar muito a
voltar?
Alexios dá de ombros e logo me mostra outros pontos com
problemas. É sempre assim numa reforma, nunca sabemos de fato
o que nos aguarda, até que começamos a mexer. Eu projetei,
calculei cada pedacinho, mas tenho que acompanhar cada etapa,
pois sempre aparecem surpresas pelo caminho.
— Soube que a Karamanlis comprou uma grande área na
Vila Madalena — comento com ele assim que terminamos de avaliar
tudo. — Vamos ter outro shopping de luxo?
— Não faço ideia, Mel, isso é coisa do Theodoros.
— Eu frequento um barzinho lá e adoro o potencial daquela
área. Acho que seria perfeito se fosse montado algo neste sentido,
como um novo polo gastronômico, sei lá.
Novamente ele dá de ombros. Alexios tem essa aura
misteriosa em volta dele, apesar de ser tão jovem. Nós nos damos
bem, ele é maravilhoso no trabalho, mas é totalmente fechado com
qualquer coisa fora disso.
— Falando em gastronômico. — Encara-me de um jeito que
nunca vi antes. — Que tal um jantar, você e eu, hoje à noite?
Começo a rir.
— Esse é um convite para tentar algo além do jantar ou
apenas vontade de jogar conversa fora? — Pela expressão dele, já
tenho minha resposta. — Desculpa, Alexios, mas não vai rolar! —
Pisco. — Não misturo as coisas.
Novamente aquela frieza estranha, e ele balança os ombros.
— Bom, eu tentei! — Ri. — Acho você linda, Mel!
— Eu também te acho lindo, mas nada além disso, viu? —
Dou um tapa no braço dele. — Vamos falar agora sobre coisa séria:
as planilhas de custos!
Ele faz um barulho lamentável com a boca e depois ri,
mostrando seu lado brincalhão. Eu me divirto com ele no trabalho,
porque é alguém agradável, embora seja reticente quando o
assunto se torna muito pessoal. No entanto, daí a partir para
qualquer coisa, ainda que seja só uma noite...
Uma noite! O pensamento viaja para Nova Iorque, para
aquela noite incrível na qual conheci Adam, e uma saudade enorme
se instala. Temos nos falado por mensagens. Todavia, ao que
parece, ele anda bem ocupado por lá.
Fiz uma pequena pesquisa sobre sua família, e as últimas
notícias giram em torno da pré-candidatura do irmão dele, Aaron,
para o Senado. Adam e eu tivemos tão pouco tempo juntos que
sinto que continuo sem saber nada sobre ele.
Então como posso me sentir tão ligada a alguém que mal
conheço? Como posso sentir falta dele como se fizesse parte da
minha vida, se ficou aqui poucos dias? Duas noites juntos! Apenas
duas noites além daquela há um ano.
Por que sinto tanto a falta dele?

Uma semana depois da minha consulta médica, recebi os


exames, levei-os para a doutora, que os aprovou, e agora estou
apenas esperando minha próxima menstruação. Ainda não contei
para meus familiares ou mesmo para amigos o que pretendo fazer,
pois não sei se faço isso antes ou depois do procedimento.
De qualquer forma, sei que, independentemente da opinião
que emitirem, a decisão já foi tomada. Talvez eu não tenha nascido
para estar em um relacionamento amoroso, mas certamente tenho
todos os requisitos – e não estou falando de dinheiro – para ser uma
boa mãe.
Passei por uma loja de roupinhas de bebê um dia desses e
me senti tentada a comprar algumas coisas, porém, pensei melhor e
decidi esperar. A ansiedade e a expectativa costumam influenciar no
processo e podem prejudicar o resultado, e não quero ter que lidar
com uma frustração maior do que a que já terei caso não consiga.
O fato é que vou tentar engravidar algumas vezes, mas já
coloquei um limite de tentativas para mim mesma. Acredito que
algumas coisas acontecem com propósito, e, se eu não conseguir
realizar o sonho de gestar, isso não vai me impedir de ser mãe.
Compreendo que ser solteira não me ajuda em um processo
de adoção. Entretanto, não vou deixar de tentar. De uma forma ou
de outra, sei que vou conseguir compartilhar todo o amor que tenho
com um pequeno, seja do meu sangue ou não.
Abro uma garrafa de vinho, escolho um filme para assistir e
preparo uma pequena tábua de frios. O final de semana está
chegando, e gosto de fazer algo para marcar esses dias de folga,
ainda que não saia de casa ou veja pessoas.
— Vamos passar esses dias só nós dois, Tiger! — O pequeno
preguiçoso levanta a cabeça e me olha do sofá, onde está tirando
uma soneca antes de o filme começar. Ele adora ficar ao meu lado
quando assisto à TV, e, muitas vezes, penso que as luzes ou os
sons o atraem. — Amanhã de manhã vamos passear no parque, e
no domingo podemos...
Meu interfone toca alto, e dou um pulo de susto, pois não
espero ninguém.
— Oi! — atendo, e o porteiro anuncia quem é. — Tem
certeza? Pode deixar subir.
Desligo o aparelho e olho para o vinho, sem saber se vou
adiar sua degustação ou compartilhá-la com minha visita.
Abro a porta assim que a campainha soa e abro um enorme
sorriso ao ser surpreendida outra vez.
— Surpresa! — Isabella anuncia animada, acompanhada de
meus dois sobrinhos, Laura e Lucca. — Se a titia não vai até a
gente...
— Vamos até a titia! — a esperta Laura completa, pulando no
meu colo, enquanto Lucca entra correndo no apartamento à procura
de Tiger.
— Que surpresa maravilhosa, Isa! — Beijo-a na bochecha. —
Eu nem podia imaginar que vocês viriam.
— Espero não estarmos atrapalhando. — Ela entra, e vejo a
pequena mala. — Nós viemos ficar com meus pais, só que, como
não avisei, os dois resolveram ir para a serra.
Rolo os olhos, e ela também, pois sabemos que nosso pai e
a mãe dela vivem em eterna lua de mel.
— Podem ficar comigo! — ofereço.
— Tem certeza? Eu posso ir com as crianças para um hotel.
Gargalho.
— O Villazza Convention daqui está fechado para reforma, e
o SP ainda não está pronto. — Pisco para ela. — Vai se hospedar
em um concorrente?
Ela ri.
— Frank não se importa... quando não há nenhum hotel da
rede no lugar, claro. — Ela aponta a garrafa de vinho e os queijos
sobre o balcão da cozinha americana. — Não estamos atrapalhando
nada mesmo?
— Pelo contrário! — Ponho Laura no chão, pois ela quer se
juntar ao irmão para acariciar Tiger. — Tenho companhia para
beber?
Isabella põe a mala em um canto.
— Com certeza!
Nós nos sentamos nas baquetas, e, enquanto ela se serve,
termino de cortar os queijos que selecionei.
— Posso ver desenho, mamãe?! — Laura grita do sofá.
Isabella me olha, e eu assinto.
— Pode. Quer ajuda?
A menina, de pouco mais de dois anos, nem responde e já
consegue sintonizar um desenho na TV.
— Laura é muito inteligente, não é?
Minha irmã suspira.
— Nem me fala! Frank a mima demais, e ela o ama
incondicionalmente. Se não fosse aquele pequeno ali — aponta
para Lucca —, eu estaria abandonada naquela casa.
Balanço a cabeça.
— Duvido! Frank adora você.
Isabella parece um tanto constrangida, mas sorri.
— E eu a ele. — Suspira. — E quanto a você? O que está
rolando com o americano daquela noite na boate?
Bebo um longo gole de vinho para tirar o bolo que se formou
em minha garganta ao pensar em Adam.
— Nada no momento. — Isa faz uma cara desconfiada, como
se eu estivesse escondendo o jogo. — Ele voltou aos Estados
Unidos.
— Ah, Mel! — Coloca a mão sobre a minha. — Sabe que eu
tive uma boa impressão de vocês dois juntos? Achei que poderiam
dar certo.
— Ele não veio para ficar, e eu sabia disso desde o começo.
— Dou de ombros. — Vida que segue.
Escuto a risada das crianças e as vejo rolando sobre o tapete
com Tiger.
— Seus olhos brilham ao ver os meninos — Isabella fala, e
eu a encaro. — Eu gostaria tanto que você encontrasse alguém e...
— Talvez isso não seja para mim, Isa! Tive vários
relacionamentos, nenhum deu certo.
Omito o detalhe de eu ter amado e esperado o marido dela a
vida toda, ainda que ela mesma saiba disso.
— Eu entendo que algumas pessoas não queiram um
relacionamento e não acredito que seja necessário ter um para ser
feliz. — Concordo com ela. — Se a pessoa não consegue ser feliz
sozinha, não será a dois, a felicidade é algo individual, pessoal, e
que não depende de outra pessoa. Ela nasce aqui. — Aponta para o
próprio peito. — Assim como o amor. Não dá para amar alguém sem
se amar primeiro. E você tem tanto amor dentro de si, Mel! —
Novamente ela pega minha mão. — Feliz será a pessoa que
compartilhar isso contigo.
— Pode ser que não seja um parceiro — comento, e ela
franze a testa.
Sorrio sem jeito, sem saber se devo ou não contar para ela,
porém, desejando demais dividir os meus sonhos com alguém que
me importa e que se importa comigo.
— O que isso quer dizer?
— Eu resolvi ter um filho sozinha — conto por fim, e ela
arregala os seus enormes olhos azuis. — Eu sei que pode parecer
loucura e...
— Não, não parece, é perfeito! — Isabella se emociona. —
Eu acho que você será uma mãe maravilhosa e vou amar ter
sobrinhos!
A reação dela é bem mais positiva do que imaginei que seria,
e isso me enche de esperança. Começar uma família sozinha e sem
apoio de quem amo seria difícil, embora não me impedisse, mas
agora, já tendo o apoio de Isabella, da irmã que descobri há tão
pouco tempo e que já amo tanto, é muito especial.
— Não sei como o papai vai reagir...
— Ele vai amar, Mel! E, mesmo que fique um pouco
resistente à ideia no começo, pode ter certeza de que vai estar ao
seu lado o tempo todo e que vai amar muito o neto novo. — Suspiro.
— Vai tentar fertilização?
— Vou, e, caso não dê certo, vou para a fila da adoção.
Isabella se estica na baqueta e me abraça.
— Ah, Mel, essa notícia me deixou muito feliz, e sabe o que é
o melhor de tudo? Vou estar pertinho daqui a alguns meses para
poder te ajudar e mimar meu sobrinho, sobrinha ou sobrinhos, quem
sabe!
A animação dela me assusta um pouco, ainda mais ao
pensar em filhos, no plural. Sei que é implantado mais de um
embrião por vez e que, na maioria dos casos, apenas um continua,
mas e se for mais de um? Olho para os gêmeos brincando no tapete
com meu cachorro – que já parece exausto – e penso na
possibilidade de criar dois – ou três – ao mesmo tempo.
Oh, meu Deus!
Seguro o copo de uísque, dando voltas e voltas, ouvindo o
tilintar causado pelas batidas do gelo na borda de cristal. Embora a
casa esteja cheia de pessoas que conheço a vida toda, não me
sinto à vontade para estar entre elas, e isso é algo curioso, porque,
durante muito tempo, eu quis ser parte deste grupo, que agora me
entedia.
Há poucos familiares presentes, apenas meu pai, minha
futura madrasta, meus irmãos e tia Bea. O restante dos quase 100
convidados da noite são amigos da família e parceiros de negócios
de longa data da TGS.
Estamos na casa de Beverly Hills, mas não paro de pensar
em Santa Monica, na vista exuberante que meu apartamento tem do
mar, dos bares à noite, das pessoas caminhando ou fazendo
qualquer esporte, mesmo no inverno. Moro lá há pouco mais de um
ano, quando finalmente decidi me separar de Hillary e sair da nossa
casa.
Escolhi a vibe praiana, a descontração e a jovialidade de
Santa Monica porque estava um pouco saturado do engessamento,
da rigidez tradicional dos bairros mais nobres – e endinheirados –
de Los Angeles.
— Se o velho não estivesse tão feliz, eu juro que iria
debandar. — Jeremy senta-se ao meu lado no sofá, resmungando.
— Soube de uma festa El Segundo e estava louco para ir até lá.
— Longe desse jeito? Têm festas mais perto, não? —
debocho.
Jeremy dá de ombros.
— Gosto da emoção. — De repente, vejo-o abrir um sorriso.
— Ah, que bom! Charlie chegou!
Ele acena para o melhor amigo de papai, animado,
chamando-o para perto de nós.
— Boa noite! — Charlie nos cumprimenta e olha em volta. —
Noite agitada, hein? Que tal irmos para a sala de jogos?
Nem disfarço a gargalhada quando meu irmão imediatamente
se põe de pé para acompanhá-lo.
— Não estou com cabeça para jogar — desculpo-me. — Vou
ficar mais uns minutos aqui e depois irei para casa.
— E John? — Charlie pergunta pelo irmão gêmeo – embora
nada parecido – de Jeremy. — Não o vi em lugar algum.
— Não veio. Ele tem andado estranho, mas quando não foi
assim? Vou te atualizar das últimas notícias dele enquanto te venço
no bilhar.
A risada rouca de Charlie chega até mim, mesmo tendo os
dois já se afastado em direção à sala de jogos. Vejo-o dar um tapa
na cabeça de Jeremy, como sempre fez com todos nós, e dizer algo
com olhar desafiador.
Seria uma boa partida!, penso, lembrando que as melhores
lembranças que tenho da infância e da chegada à família Stone são
permeadas de boas risadas com Charlie.
Bebo o restante do meu uísque – mais aguado do que
maltado por conta do gelo derretido – e me levanto, determinado a
sair de fininho da badalada festa de “noivado” de papai.
— Não está pensando em me deixar aqui sozinho, está?
Suspiro, quase chegando à porta principal para poder pegar
meu carro e sumir de Beverly Hills, quando ouço Aaron reclamar.
— Você tem idade suficiente para não precisar de babá —
retruco e encaro o grandalhão louro.
Ele sorri zombeteiro, sem disfarçar as rugas que nos últimos
anos ficaram ainda mais evidentes.
— Indo para Santa Monica? — Aaron inquire, e confirmo com
a cabeça. — Tenho inveja de você, deveria ter comprado alguma
coisa para mim aqui na cidade.
— Mas preferiu aquele enorme duplex no SoHo.
Aaron ri.
— Eu sou um californiano com alma novaiorquina, o que
posso fazer? Além disso, é mais fácil controlar os negócios próximo
da nossa maior loja. — Concordo com ele. — Prefiro o escritório de
Nova Iorque ao daqui.
— Daqui uns tempos vai ter que se acostumar a Washington.
— Ele bufa contrariado. — Vai mesmo levar isso até o fim?
— Tenho outra opção? Sou o Stone político, este é meu
papel desde que nasci.
— Foda!
— Muito foda! — Ele coça a cabeça, bagunçando os cabelos
loiros lisos. — Não vou te atrasar mais, siga seu caminho.
— Quer vir junto?
Aaron sorri.
— Achei que não ia convidar nunca!

— Então ela é a arquiteta que projetou a loja do Brasil?


Balanço a cabeça confirmando, tomando mais um gole – olho
para o chão a fim de contar quantas cervejas já tomamos – e fecho
os olhos ao reclinar-me sobre o sofá de couro da sala.
— Eu não queria ter voltado agora — confesso, já bêbado e
sem nenhuma trava na língua. — Ela é... foda!
Aaron ri.
— Por que não volta?
É a pergunta que me faço a cada noite em que me deito na
cama e penso em como Melissa está, no cheiro de sua pele, no seu
toque macio, no calor do seu corpo.
— Porque meu trabalho lá já foi concluído, e as obras já
começaram. Temos gente para acompanhar esse tipo de trabalho,
você sabe.
— Sei. — Escuto Aaron se mover, abro os olhos e o vejo
pegar mais garrafas na cervejeira. — Assim como sei que você
nunca tira férias. Por que não agora?
— Não está programado — respondo, pondo fim ao assunto.
— Papai precisa de mim aqui, pelo menos enquanto estiver
viajando. — Pego a cerveja que me oferece. — No mais, nós já
sabíamos que eu estava no Brasil apenas para resolver a questão
do projeto.
Só não esperava que se resolvesse tão depressa! Bebo,
meio puto, imaginando que, mesmo se eu resolver voltar ao Brasil
depois de ter coberto o tempo de férias de meu pai, Melissa já
possa ter seguido com sua vida, encontrado alguém que não
sumisse poucos dias depois de encontrá-la.
— Não fico muito tempo no mesmo lugar — volto a falar com
meu irmão. — Já devia ter me acostumado com isso.
— Nunca o tinha ouvido se queixar, apenas agora, e por
causa dessa mulher. — Ele ergue a sobrancelha. — Isto é um sinal,
você não acha?
Rio.
— De que estou ficando um velho resmungão?
— Disso não tenho dúvidas! Você sempre foi mais velho que
eu. — Faço careta, e ele aponta para sua própria cabeça. — Velho
aqui. Às vezes tenho a sensação de que você nasceu velho, Adam!
As memórias da minha infância na hacienda no México,
correndo descalço, subindo em árvores, volta com toda força e
pesam sobre meu coração. Aaron tem razão ao dizer que sempre fui
mais velho que ele, mas apenas porque achava que não podia me
dar as mesmas liberdades de ser rebelde ou inconsequente como
ele e meus irmãos foram em certas partes da vida, especialmente
os gêmeos.
Sempre achei que devia algo ao meu pai por ele ter me
recebido, por ter me aceitado e colocado no seio de sua família e
morria de medo de fazer qualquer coisa que pudesse decepcioná-lo.
— Mas não. — Aaron fica sério ao retomar a fala. — O que
você está sentindo, essa insatisfação com sua vida, se deu a partir
do momento em que ela se interpôs entre você e Melissa. Você
queria mais. Na verdade, acho que quer mais e ficou puto quando
não conseguiu.
O filho da puta tem razão, mas não abro a boca para
confirmar sua teoria. Na vida, eu aprendi a não contestar o que não
pode ser mudado, a lidar com minhas frustrações e a me adaptar
aos diferentes cenários que o destino monta. Um jeito pragmático de
levar minha existência? Sim, mas, para um garoto mexicano que
vivia à margem da pobreza e que, de repente, se viu como filho de
um dos homens mais ricos dos Estados Unidos, era difícil contestar
os fios que o Universo traça.
As coisas são como têm que ser!
— Em algum momento eu teria que voltar, então...
— Ah, Adam... não consigo lidar com seu conformismo.
Rio.
— Eu? Olha quem está falando! O homem que é cotado para
assumir uma cadeira no Congresso Americano, mas que não
suporta nem a ideia de se sentar nela! O conformado sou eu?
— São situações diferentes! A mulher mexeu contigo, e olha
que, para fazer algo assim, é quase preciso um milagre. — Xingo-o,
e ele ri. — Eu não a perderia se fosse você. — Sua voz está mais
calma, e percebo que ele diz isso sem nenhum deboche ou
provocação. — Vocês se encontraram em duas situações
inusitadas, e nas duas ela te deixou com essa sensação de querer
mais.
Maldita hora que contei a ele sobre Nova Iorque!, recrimino-
me, culpando a cerveja por ter soltado a minha língua no começo
desta noite.
— Não acho justo pedir a ela que espere...
— Não peça. — Meu irmão sorri feito um gato que comeu um
pássaro. — Aja! Mostre a ela que está interessado, embora esteja
longe, e deixe que ela decida se você vale a pena.
Imediatamente olho para o celular. Trocamos poucas
mensagens desde que voltei para casa, mas temos nos falado todos
os dias. Eu me convenci de que saber se ela está bem é o
suficiente, porém, agora percebo que não é.
Aaron tem razão, não posso desperdiçar a chance de
entender o que é que Melissa tem que me causa todas essas
sensações, que me faz sentir a mesma alegria de quando criança e,
ao mesmo tempo, estar inconformado com situações que nunca me
afetaram.
É hora de agir!
Não posso voltar correndo ao Brasil. Contudo, posso
demonstrar o quanto queria estar com ela e o quanto quero voltar.
Vou aproveitar o tempo que terei que permanecer aqui na Califórnia
e finalizar as pendências do meu divórcio, resolver assuntos mais
importantes da empresa e aguardar a volta de meu pai.
Por enquanto, não tenho nenhum local que necessite minha
presença, e, quem sabe, umas férias serão bem-vindas no ano que
vem.
Pego o celular e abro o aplicativo para mandar uma
mensagem a Melissa, mesmo que ela não a veja agora, uma vez
que é madrugada no Brasil.

“Não consigo deixar de pensar no seu cheiro, na sua pele, no


gosto do seu beijo. Toda noite desejo estar com você, dentro
de você, sentindo o suave aperto do seu corpo no meu,
dividindo nossa respiração, trocando nossas salivas. Não
consigo deixar de te querer, Melissa.”

Termino de digitar, envio a mensagem e olho para o lugar


onde meu irmão estava sentado, porém, não o vejo lá.
— Não sabia que tinha virado poeta — o desgraçado
comenta, postado às minhas costas, lendo o que escrevi. — Essa
mulher vale a pena, meu irmão! Tomara que ela ache o mesmo
sobre você!
Porra, tomara!
Estou sentada na minha banqueta, desenhando em nanquim
sobre papel vegetal, uma técnica antiga de quando ainda não havia
computadores, mas que eu gosto ainda de fazer quando vou colocar
algum desenho para concorrer em concursos de designer.
Gosto de fazer os desenhos à mão. Desenhar me acalma,
aplaca parte da ansiedade e me faz pensar melhor. Não são
desenhos artísticos, são calculados, medidos, milimetricamente
programados, e levei anos aperfeiçoando cada traçado para que
ficassem tão perfeitos quanto os de um computador.
Escuto batidas à minha porta, ergo os olhos da prancheta e
vejo Tânia segurando um buquê de rosas nos braços. Sorrio ao vê-
las, sabendo que ele não falharia em mandá-las.
— Mais um! — ela diz rindo. — Já coloquei na água. —
Mostra o vaso. — Esse vai ficar ou você vai levá-lo? — Penso em
minha casa, nos buquês que levei para lá nas últimas semanas, e
decido deixar esse aqui. — Já vai fazer um mês que esses buquês
estão chegando! Acho que tem um homem muito apaixonado na
área.
Ela pisca para mim e sai do escritório, deixando-me com o
delicioso perfume de rosas na mais linda cor de champanhe. Pego o
cartão, sabendo que vou achar uma mensagem impressa, porém,
de Adam. Desta vez ele escreveu em inglês, e isso me surpreendeu.

“Esta semana a equipe daqui revelou uma nova coleção de


joias para o Valentine’s Day, e uma delas me lembrou você.
Fiquei horas olhando a peça e imaginando você a usando,
somente ela sobre seu corpo delicioso, fazendo par com sua
pele perolada e com seus deliciosos mamilos rosados.”

Meu rosto queima ao imaginar que a pessoa que imprimiu o


cartão tenha lido e entendido o idioma.
— Bom, vai saber que sou uma mulher branca com bicos
rosa. — Rio, cheirando um botão ainda por desabrochar.
Eu não esperava essa sequência de flores e, muito menos,
tantos bilhetes. Depois que Adam foi para os Estados Unidos, achei
que perderíamos o contato gradualmente, ainda mais porque não
estávamos conversando muito, apenas nos cumprimentando via
mensagens.
Foi então que, num dia qualquer, acordei de manhã e achei
uma declaração quente do quanto ele sentia minha falta. Tive que
reler várias vezes o texto para crer que realmente era o que estava
escrito ali: que Adam se sentia como eu.
O desejo insistente, meu corpo buscando o dele, minha pele
ansiando pela sua. Eu sonhava com Adam, com suas mãos
grandes, com sua boca me levando ao auge do prazer, com seu
pênis preenchendo tudo dentro de mim. Naquela noite mesmo,
enquanto ele me escrevia, eu suava em meio a outro sonho erótico
e acordava resfolegando como se tivesse corrido uma maratona.
Foi delicioso saber que toda aquela paixão não era platônica
e que, embora estivesse no outro hemisfério do planeta, ele
desejava estar comigo.
Respondi com um bom-dia e decidi provocar um pouco:
“Seus pensamentos libidinosos entraram em contato com meu
subconsciente, e eu acordei gozando contigo num sonho,
desejando que fosse real, que você estivesse aqui comigo.”

Então, a partir daí, começaram as mensagens cheias de


conteúdo sexual, revelações, fantasias e provocações. Adam não
respondeu na hora, ainda tive tempo de tomar um banho e me
arrumar para o trabalho. Já havia desistido de esperar, quando meu
telefone notificou que eu havia recebido mensagem.

“Eu gozo contigo nos sonhos e fora deles também, apenas


fecho meus olhos e lembro como você me toca, como é a
sensação da sua boca no meu pau e como é delicioso me
afundar no seu corpo quente, na sua boceta molhada.”

Lembro que cheguei a tropeçar no caminho para o carro na


garagem do prédio e que tive que respirar fundo várias vezes,
tamanho tesão que me abateu apenas por imaginá-lo se
masturbando pensando em mim.
Mais tarde, enquanto eu estava em uma reunião tensa com o
Carlos, querendo já mandá-lo para a puta que o tinha parido,
chegou o primeiro buquê de rosas.
Primeiro, fiquei surpresa, sem saber quem as havia
mandado, afinal, nem imaginaria que Adam se daria ao trabalho de
me mandar flores estando ocupado nos Estados Unidos. Por isso,
quando li o cartão que continha apenas a frase “Sigo pensando em
você” e o nome dele no final, sorri tanto que cheguei a ficar com dor
nas bochechas.
Trocamos muitas mensagens desde então, além de ligações
e vídeos. Esse contato é tão gostoso que aplaca um pouco a
saudade, mas aumenta tanto a vontade de estar com ele que muitas
vezes pensei em fazer uma loucura, embarcar em um avião e parar
em Los Angeles.
E olha que ele me tentou a fazer isso!
— Vai passar o Natal com sua família? — perguntou-me em
uma das ligações telefônicas.
— Vou, sim, é tradição.
— Acho bonito, embora preferisse que você não a tivesse. —
Suspirou. — Meu pai se casa no Natal e depois embarca em sua lua
de mel, e eu ficarei a cargo da TGS.
— Muito trabalho no final de ano?
— Uma loucura por causa do Valentine’s Day em fevereiro,
pois é quando lançamos a coleção do novo ano.
Ele me explicou mais sobre seu trabalho e os encargos que
acumulava por conta das férias românticas de seu pai. Tive vontade
de me oferecer a ir passar o Ano Novo com ele, porém, não o fiz,
depois de saber o quanto ele iria trabalhar no final do ano e começo
do próximo.
Realmente acompanhei o volume louco de trabalho e as
horas que ele passava no escritório. Adam me mandava bom-dia
cedo, falávamos esporadicamente durante o tempo em que ele
estava na empresa e depois somente perto da meia-noite de lá, que
era quando ele ia para seu apartamento dormir.
Não perguntei sobre quando ele voltava nem me dispus a ir
vê-lo, pelo menos não enquanto a lua de mel do CEO da TGS não
acabasse.
Olho para o calendário na minha agenda, de repente, e sinto
um frio na barriga. Semana que vem faço aniversário e,
infelizmente, não irei conseguir comemorar como pretendia, pois a
fertilização teve que ser adiada por conta das festas do final de ano
e uma emergência familiar da médica responsável pelo
procedimento.
Eu aspirei os óvulos, porém, não seguimos com a segunda
etapa do tratamento, que é a fertilização, porque o pai da doutora
Vânia ficou doente em estado grave e faleceu na semana passada.
Ela até quis que outro profissional, amigo dela de confiança,
continuasse a FIV, mas decidi esperar e autorizei o congelamento
dos óvulos.
— Você vai desistir? — ela me questionou quando contei
sobre minha decisão.
— Não, estamos apenas adiando.
— Eu volto no início de fevereiro, então podemos retomar...
Mesmo não querendo admitir, eu queria o adiamento e acho
que tudo o que aconteceu para que não conseguíssemos seguir
com o tratamento foi um sinal de que devo ir mais devagar.
Não é que eu esteja arrependida ou mesmo insegura, foi
apenas uma sensação que me fez desacelerar. Vou fazer 40 anos,
ainda tenho tempo de fazer a fertilização, e congelar meus óvulos já
me traz algum alento para o futuro.
Acontece que não consegui dizer ao Adam o que estava
fazendo. Sei que parece besteira, mas toda vez que eu pensava em
tocar no assunto, não podia ir adiante. Sei que não tenho
compromisso algum com ele, pelo contrário, nós dois passamos
apenas três noites – intensas e perfeitas – juntos. No entanto, essa
aproximação que tivemos, mesmo à distância, fez-me protelar.
Pela primeira vez em muitos anos, estou me sentindo
envolvida por alguém e não somente isso, desejo ardentemente
revê-lo, estar com ele e tentar algo que possa funcionar. Quero
conhecer e ser parte da vida de Adam Stone.
E como poderei sequer ter essa chance se já chegar com a
notícia de uma gravidez? Desejo ter a oportunidade de apostar em
algum relacionamento de verdade, não como fiz das outras vezes,
apenas passando tempo enquanto esperava Frank.
Adam toca meu coração de maneira única, por isso decidi
adiar os planos de maternidade um pouco, até ver o que são esses
sentimentos, se eles irão perdurar e se serão correspondidos.
É o mais certo a fazer, se quero dar uma chance a mim
mesma de tentar amar e ser amada, é este o momento. Se
acontecer, maravilha! Caso não dê em nada, a vida vai seguir, e
meus planos de ter um filho solo se concretizarão.
Conversei sobre isso com Isabella durante as festas de final
de ano. Ainda estava abalada com a resolução de Giovanna em ir
embora definitivamente do Brasil e magoada com o rumo da
situação, pois Nicholas acabou se afastando de mim, principalmente
depois que entrou em outro relacionamento.
Eu tinha certeza de que os dois se amavam muito, mas nem
sempre o amor é suficiente para manter duas pessoas juntas.
Meu telefone toca, e abro um sorriso, pois nem preciso olhar
para o nome na tela para saber quem é. Meu coração parece
ensaiar para fazer parte da bateria de uma escola de samba, e me
sinto uma menina apaixonada.
— Olá! Como estão as coisas aí?
— Com saudade de você! — ele responde rindo. — Tudo
bem?
— Sim. — Giro o assento da cadeira para poder olhar meu
presente. — Acabei de receber suas rosas...
— Queria tê-las entregado pessoalmente — lamenta, e minha
garganta fica seca, coração apertado, porque ele expressou tudo o
que eu mais queria. — Meu pai ainda não voltou... — Respira fundo.
— Estou louco para ver você de novo, Melissa!
Sorrio, adorando que ele me queira tanto quanto eu.
— Também quero muito!
— Qual a possibilidade de você vir me ver?
Paro de girar a cadeira e abro minha agenda, lamentando
profundamente a minha resposta, mesmo antes de dá-la.
— Não consigo ir este mês, talvez no recesso de Carnaval.
— Escuto seu suspiro frustrado. — Vou tentar dar um jeito e...
— Tudo bem, eu fico um tanto desesperado, mas também
estou muito cheio de trabalho, mal conseguiria ficar contigo. — Bufa,
e eu rio, imaginando a sua frustração sexual. — Posso te ligar hoje
à noite para aliviar um pouco a saudade...
Gargalho, pois sei que quer ouvir minha voz enquanto se
masturba.
— Deve! — Ele ri e se despede, pois precisa voltar ao
trabalho. — Obrigada pelas rosas, são lindas!
— Combinam com você!
Droga! Como eu posso não estar envolvida com esse
homem? É por isso que protelei a fertilização, porque não quero
deixar de viver esse frio na barriga, e, principalmente, não quero
deixar de ter esperança de que essa ligação se torne mais forte.
Devagar, Mel, cuidado para não criar expectativas demais!,
minha razão avisa, porém, temo que meu coração esteja com
protetores auriculares.

— Já sabe o que vai fazer no seu aniversário? — A pergunta


é feita pela minha mãe, enquanto tomamos um cafezinho após o
almoço.
Sempre que posso, passo em sua casa para podermos fazer
uma refeição juntas, seja qual for. Não gosto da ideia de que ela
esteja tão sozinha, ainda que pareça ter se adaptado bem à solidão
após a separação há alguns anos.
Minha mãe tem uma vida social intensa, por isso quase não a
encontro em casa. Ela tem muitas amigas, faz muitos trabalhos
sociais, além, claro, de seu lazer semanal, que constitui
basicamente em uma noitada de jogos e petiscos. Fico feliz que
dona Suzana tenha estabelecido uma rotina que a ajudou a se livrar
do constante estado melancólico em que se sentia desde a perda de
meu irmão.
— Vou fazer o mesmo de sempre, mãe: tirar o dia de folga,
cuidar de mim, assistir a um bom filme na companhia de uma taça
de vinho e dormir cedo.
A reação dela é a mesma do ano passado, uma careta que
demonstra seu desagrado.
— É seu aniversário de 40 anos, Mel! — Dou de ombros, mas
ela continua como se eu não tivesse entendido. — É um marco,
mais uma década vivida, a chegada da maturidade e...
— Pelo amor de Deus, mãe, daqui a pouco vou começar a
comprar novelos de lã e a jogar bingo! É só mais um ano...
Ela suspira.
— Bom, o aniversário é seu. Eu, no seu lugar, faria uma
festa, chamaria minhas amigas e dançaria até não aguentar mais.
Gargalho, achando que, se ela estivesse solteira na minha
idade, certamente faria o que está me aconselhando.
— Já tive essa fase, lembra? Ainda gosto da companhia das
amigas, de dançar e curtir uma noite inteira sem dormir, mas há dois
pontos que a senhora não considerou: meu aniversário cai em dia
útil, então a maioria trabalha no dia e no seguinte; e eu venho
trabalhando sem parar, por isso ter esse dia só para mim é um
presente inestimável.
— Está certo, então. Podemos, pelo menos, almoçar juntas?
Sorrio e a abraço.
— Estava esperando só o convite!
Termino o cafezinho combinando com ela sobre o restaurante
onde comemoraremos meu aniversário. Logo em seguida, volto
para o escritório, onde tenho uma última reunião com o pessoal da
K-Eng e com a Schneider sobre o projeto da TGS.
Suspiro ao pensar em Adam, desejando que ele estivesse de
volta ou que eu pudesse ir encontrá-lo antes do Carnaval, duas
coisas que não vão acontecer. Provavelmente Adam não voltará ao
Brasil, e só conseguirei vê-lo durante os dias em que estarei de
folga em fevereiro.
Bom, pelo menos iremos nos ver, e isso já alivia um pouco a
necessidade mais premente. Lá poderemos conversar melhor e ver
se funcionará estendermos nossa ligação, mesmo com toda a
distância entre nós. Já estamos muito envolvidos, nós nos falamos
todos os dias, já contamos fatos de nossa vida, tornamo-nos
amigos, não é mais uma relação puramente sexual.
Rio ao pensar que efetivamente temos conversado mais do
que fizemos sexo. Não por falta de vontade, é óbvio, porque, se ele
estivesse aqui, duvido que passaríamos uma só noite sem trepar.
Oh, fogo que não se apaga!
Quarenta anos!
Passo a mão sobre o espelho do banheiro, que está coberto
com o vapor do chuveiro, e me encaro. Não me sinto diferente. Há
um certo “estigma” e, no meu caso, por ser solteira e sem filhos,
uma pressão por causa dessa idade. Todavia, não parece ser nada
de mais, apenas minha idade trocou, como aconteceu no ano
passado.
Lavo meu rosto e faço uma demorada limpeza, seguida de
tonificação e hidratação. O som delicioso que enche o apartamento
me faz balançar levemente os quadris, e sinto o roupão raspar sobre
minha pele nua.
A sensação de prazer é enorme, e lamento que este dia já
esteja acabando!
Foi maravilhoso acordar já recebendo presentes! Eu digo que
é um dia como qualquer outro, mas, quando as pessoas que amo
demonstram que se lembraram de mim, me emociono toda.
Recebi a cesta de café da manhã, lindamente recheada com
tudo o que gosto, e fui logo abrindo o cartão para descobrir quem a
enviou. Era de Isabella, e a mensagem do cartão terminou de me
abalar, e liguei para ela chorando.
— Parabéns! — ela atendeu.
— Ah, Isa, recebi sua cesta, muito obrigada! Suas palavras
me deixaram sem saber o que dizer para agradecer.
— Só de ouvir sua voz e sentir que a emocionei já é
agradecimento suficiente. Demorei muito a te conhecer
pessoalmente, mas desde o começo me senti amada e querida. Eu
não podia ter ganhado uma irmã melhor, nem mesmo nos meus
sonhos de menina, Mel. Eu te amo muito!
Solucei ao ouvir em palavras o que ela havia me escrito.
— Eu também te amo, Isa! Obrigada pelo carinho.
— Frank e as crianças te mandam beijos!
— Agradeça a todos por mim.
Coloquei a cesta sobre a mesa da sala de jantar e, depois de
uma ducha rápida, comecei a desfrutar das delícias que ela me
mandou. Folhados, brioches recheados, biscoitos caseiros, salada
de frutas, bolos, frios, geleias e uma manteiga divina. Para beber
havia suco de laranja natural, além de uma mistura para capuccino
cremoso.
Escolhi um croissant de queijo e preparei o capuccino com
leite bem quente. Enquanto ia respondendo às mensagens que
chegavam, degustava vagarosamente meu desjejum.
Não tinha nem finalizado o folhado quando o interfone tocou
e mais uma entrega chegou. Daquela vez foi um enorme arranjo
floral enviado pelo escritório e uma sacolinha chique de uma
joalheria que eu gostava, enviada por papai. Mais uma vez chorei
emocionada com o cartão e liguei para agradecer.
Passei a manhã toda recebendo presentes, em sua maioria
flores, de amigos queridos que lembraram do meu dia.
Na hora do almoço, como marcado previamente, encontrei
mamãe no restaurante do nosso clube, local aonde sempre íamos
quando eu era criança. Ela me presentou com uma bolsa linda que
estive namorando por um tempo, e imaginei que tinha dedo de
Tânia na dica de presente.
— Parabéns, minha filha! — Ela me abraçou emocionada, e
quase me desfiz em lágrimas mais uma vez.
— Obrigada, mamãe!
Sentamo-nos à mesa, fizemos o pedido e, como me
lembrava, a comida estava maravilhosa, mas não se comparava ao
bolo que ela havia levado de surpresa da minha confeitaria favorita.
Todos os presentes no restaurante cantaram parabéns, e,
mesmo sem querer, acabei tendo uma “festinha”, conforme dona
Suzana achava que deveria.
Do clube, voltei para casa, troquei de roupa e fui para o
parque caminhar com Tiger. O dia estava quente, mas não havia sol,
pois o céu estava encoberto, prenunciando chuva para mais tarde.
Fiz um pouco de exercício com meu fiel escudeiro e somente
quando ele começou a se sentar várias vezes é que retornei à casa.
Na portaria, o enorme buquê de rosas fez meu coração
disparar, pois ainda não havia recebido notícias de Adam.
— Chegaram para a senhora, dona Mel. — O porteiro me
entregou.
— Obrigada! — Peguei o buquê e segurei a curiosidade até
chegar em casa para ler o bilhete. — Adam, eu sabia!
Joguei-me no sofá para ler suas palavras e suspirei tantas e
tantas vezes que achei que estava exalando açúcar de tão “melosa”
que fiquei. Tentei falar com ele. Contudo, seu celular não
completava, e as mensagens não chegavam. Lembrei que ele havia
falado sobre uma reunião e, então, desisti de tentar.
Minha manicure veio me atender em casa – coisa que faz
todo ano no meu aniversário – e cuidou das minhas unhas, mãos e
pés com o carinho e a dedicação de sempre. A única diferença é
que ela também resolveu me levar um presente, uma amiga dela
massoterapeuta.
Quase dormi durante a massagem e logo tratei de reservar
mais sessões com a moça, pois ela era realmente fabulosa com as
mãos.
Falei com Gio por telefone minutos antes de ter atendido uma
ligação de Nicholas. Alexios também me ligou e me convidou
novamente para sair.
— É uma tentação...
— Mas você vai me recusar de novo. — Ele riu, pois já sabia.
— Acho que você faz isso para me proteger, Mel, porque sabe que
meu coração frágil não resistiria ao seu poder de sedução.
— Você é mesmo um safado, Alexios! Essa sua cara de anjo
não me engana, viu?
— Por isso você é imune a mim!
Diverti-me um bocado com ele, sabendo que ele me
provocava porque percebia que eu achava engraçado. Nunca houve
qualquer possibilidade de acontecer algo entre mim e ele, assim
também como com Bernardo Novak, outro homem mais novo que
sempre “jogava charme”.
— É a minha idade? — Bê me questionou quando me ligou
para parabenizar e disse o quanto eu era incrível, mas era uma
pena que eu não lhe dava uma chance.
— Não, Bê, não ligo para isso, mas não há química entre
nós, você sabe.
— Eu sei, Mel, mas isso não quer dizer que eu não lamente.
Depois que as felicitações diminuíram, finalmente pude tomar
meu banho de espuma. Fiquei lá, imersa na água quente,
navegando entre a consciência e o sono. Acabei sonhando com
Adam e acordei muito, muito excitada.
Tomei uma ducha rápida para aplacar o tesão, pois queria
ainda cozinhar algo, abrir um vinho e ver um filme antes de dormir,
conforme o que havia planejado.
Novamente sinto o tecido do roupão esbarrar na parte interna
das minhas coxas por causa do movimento que faço ao dançar e
volto à realidade, encarando-me no espelho, excitada e com
vontade de gozar.
Planos adiados!, penso ao entrar no closet para escolher algo
para vestir. Abro minha gaveta de lingeries, mas, em vez de me
concentrar nas camisolas e baby-dolls, fixo os olhos na pequena
caixa no canto da gaveta. Abro-a e sorrio ao ver a máscara que usei
quando entrei naquele clube em Nova Iorque e tive minha primeira
noite com Adam.
Coloco-a sobre meu rosto, retiro o roupão e olho-me no
enorme espelho que vai do chão ao teto. Sento-me sobre o puff e
passo a mão sobre meu corpo, notando minha pele sensível ao
toque, os pelos se arrepiando, o coração disparando e meu clitóris
pulsando.
Toco-me devagar e não fico nada surpresa ao me encontrar
molhada. É isso que eu quero esta noite!, penso, massageando meu
sexo com carinho. Levanto-me e vou para o quarto, deito-me na
cama, e os lençóis frios me causam ainda mais prazer. Giro no
colchão e abro a última gaveta da mesinha de cabeceira, de onde
tiro um vibrador potente.
— Oi, Mascarado! — Rio ao me lembrar do apelido dele.
Ligo-o e passo-o por cima dos meus seios, deixando meus
mamilos duros e sensíveis e sigo em direção ao local que mais o
necessita. Estremeço ao sentir as vibrações sobre meu clitóris, ergo
o tronco da cama, gemo entredentes, agitada pelas deliciosas
correntes de prazer que se espalham pelo meu corpo.
Fecho os olhos, mergulhada no delicioso transe do desejo, e
o rosto que aparece em meus pensamentos é o de Adam. Lembro-
me de sua voz dizendo sacanagens ao meu ouvido, seus gemidos
roucos, o sorriso único... Gemo alto, sendo tomada pelos espasmos
que antecedem ao orgasmo e...
O interfone toca, e, assustada, solto o brinquedo na cama.
Preciso de um tempo para voltar a respirar normalmente. Meu
corpo, frustrado pela interrupção de seu prazer, parece não querer
corresponder às ordens do cérebro para que se mexa.
Pego o roupão no closet e atendo o porteiro, imaginando ser
ou algum outro presente ou a visita de alguém próximo.
— Oi, dona Melissa, tem um senhor aqui na portaria que
deseja subir. — Meu coração dispara, mas tento não criar
expectativas. — O nome dele é Adam.
Balanço a cabeça, achando que devo ter gozado tão forte
que acabei desmaiando e agora estou sonhando. Adam? Aqui?
Como?
— Dona Melissa?
— Oi, pode deixar subir, obrigada.
Saio correndo para a sala, onde deixei o celular carregando,
e confiro a mensagem que mandei para ele, porém, não há resposta
alguma, nada! Sorrio nervosa, sem entender, mas com um enorme
sorriso.
Ouço batidas à porta e não penso muito antes de atender,
mesmo de roupão e provavelmente descabelada.
— Oi! — cumprimento-o assim que o vejo, parado no
corredor, segurando o maior buquê de rosas rosadas que já vi na
vida.
Adam arregala os olhos, depois sorri.
— Feliz aniversário! — Entrega-me as flores e entra no
apartamento. Ponho o buquê sobre a mesa de centro, então ele me
abraça apertado. — Achei que te faria uma surpresa, mas o
surpreendido fui eu.
Não entendo o que ele quer dizer, afinal, estou
completamente maravilhada por ele ter aparecido aqui sem avisar
apenas para me surpreender no dia em que completo mais um ano.
Então, antes que eu o questione, ele toca meu rosto, e sinto o
tecido da máscara roçar em mim.
Deus do Céu! Acho que devo ter aberto tanto os olhos que
ele ri.
— Você quer me matar! — declara antes de me beijar com
loucura, sugando meus lábios e minha língua.
Agarro-o pelos cabelos e me penduro nele, que me levanta
em seu colo.
— Fiquei tão empolgada quando o porteiro te anunciou que
esqueci que estava usando isso. — Aponto para a máscara.
— Ela me lembra...
— É ela. — Adam fica sério. — Eu a trouxe comigo e a
guardei.
Ele geme e, sem falar mais nada, me leva para o quarto e me
joga em cima da cama, arrancando suas roupas em seguida. Deliro
ao ver seu pau já duro e molhado. Adam caminha em minha
direção, mas de repente para e olha para o colchão.
— Mais uma surpresa. — Pelo sorriso que dá, já imagino o
que viu.
Tento pegar o vibrador, mas ele é mais rápido e pega o
Mascarado, olhando-o com as sobrancelhas erguidas. Fico
momentaneamente constrangida, então olho para seu corpo nu e
para a expressão safada em seu rosto e decido levar as coisas mais
levemente.
— Pensei que ia passar meu aniversário sozinha... — Pisco
para ele. — Então decidi comemorar de um jeito mais privado.
Ele ri e sobe na cama.
— Posso comemorar com você? — Adam liga o aparelho e o
desliza sobre meu corpo. — Vou adorar comer sua bunda enquanto
ele vibra dentro da sua boceta.
Se eu estou excitada com isso? Chego a gritar de tesão
quando ele abre o cinto do meu roupão e me olha com fome. Adam
se ajoelha na cama e segura seu membro em minha direção. Sem
me fazer de rogada, abocanho-o, sugando-o com força e fundo,
como sei que ele gosta.
Enquanto o faço, ele continua usando o vibrador em mim,
esfregando-o nos meus seios, na minha barriga e chegando bem
próximo do meio das minhas pernas. Estou muito excitada,
completamente louca com o clima entre nós.
Passo a chupar sua virilha, lambendo suas bolas e
deslizando a língua até seu ânus, enfiando minha cabeça entre suas
pernas, e ele geme mais alto. Adoro chupá-lo inteiro e amo a
desinibição dele ao me deixar explorar todo o seu corpo.
— Adam! — grito quando o vibrador finalmente encosta no
meu clitóris inchado.
Estremeço, e ele vai esfregando gostoso, passando o
aparelho pela minha virilha, descendo pelas coxas, pela entrada do
meu sexo, até voltar ao ponto sensível.
Sinto-o se mover e deitar-se sobre mim em um 69, causando-
me a expectativa pela sua boca. Não demora muito, e aperto sua
cabeça entre minhas coxas devido à violência com que ele me
chupa. Não consigo me afastar de seu corpo nem mesmo para
gemer, então o faço com suas bolas dentro da minha boca.
Sinto quando ele se estica mais e passa a língua entre
minhas nádegas, antes de encostar o vibrador. Arfo de tesão,
minhas narinas se dilatam, meu corpo inteiro se arrepia ao sentir o
estímulo que faz em minha bunda.
— Você gosta? — Emito um som abafado pouco antes de
gemer. — Eu adoro quando você geme, Melissa... Fuck, é muito
gostoso!
Em seguida ele volta a pôr sua boca em meu clitóris,
chupando-o, lambendo-o e voltando a sugar, até que eu não me
contenho mais. Gemo como louca, segurando os lençóis, sentindo
meu gozo escorrendo e ele tomando cada gotinha.
Adam ri quando se levanta, volta a se ajoelhar e beija minha
boca de ponta-cabeça.
— Fica de quatro, Melissa! — Sua voz soa desesperada, e
entendo que ele também está no limite, por isso atendo-o mais do
que depressa.
Adam respira fundo, afagando minhas nádegas, separando-
as para então beijar-me intimamente, penetrando-me com sua
língua e me preparando com seus dedos. O vibrador foi esquecido
em algum canto, e ainda o escuto funcionar, mas não me preocupo
com o brinquedo sexual, concentrada demais nas carícias que
recebo.
— Se toca para mim... — ele sussurra. — Faz igual fizemos
por telefone.
Olho para trás, e ver seu rosto transtornado de prazer, sentir
suas mãos me acariciando, seus dedos abrindo espaço devagar no
meu corpo, faz com que eu sinta novamente todas as contrações
musculares de um orgasmo. Toco-me e abro mais as pernas para
que ele possa ver, de onde está, minha mão mexendo-se sobre
minha boceta, mantendo o prazer que ele me proporcionou com a
boca.
Sua língua molhada penetra minha bunda de um jeito tão
sensual que chego a morder a colcha de tanto tesão. Ela entra e sai
de mim, gira na entrada, e cobre tudo com sua saliva quente. De
repente, o colchão cede, e, ao olhar de soslaio, vejo quando ele fica
de pé na cama.
Adam se agacha e esfrega seu pau do meu cóccix até a
entrada da minha vagina, onde usa minha lubrificação para estar
mais escorregadio. Seguro-o firme, e ele rosna quando o uso para
me masturbar, rebolando contra seu corpo. Não me demoro muito,
queria apenas provocá-lo um pouco, e, quando ele se liberta,
posiciona-se devagar sobre meu rabo.
Fecho os olhos. Uma mistura de tesão e dor toma conta de
todo o meu corpo. Sinto-o entrar centímetro por centímetro em mim,
alargando-me, apossando-se de todo espaço disponível e
requerendo mais. A respiração de Adam é ruidosa, e ele parece
estar se controlando ao máximo para ir devagar.
— Se toca, Melissa! — A ordem é dada entredentes, e eu,
que nem percebi que havia parado, obedeço-lhe sem pestanejar.
Entro numa viagem louca, sentindo um prazer único,
diferente, pungente. Ele se encaixa em mim, seus quadris nos meus
quadris, suas mãos trêmulas mantendo-me firme contra ele. Então
se movimenta devagar, e eu acelero a masturbação, rebolando
contra ele, exigindo mais, querendo mais, desejando-o por inteiro
e...
Gozo tão forte que desabo sobre a cama, meu corpo mole, a
cabeça nas nuvens e as pernas tão trêmulas que não conseguem
me sustentar de quatro sobre o colchão. Adam se afasta, retirando-
se de mim, vertendo seu esperma quente sobre minhas costas.
— Ah...!
O gozo é imensamente mais forte do que todos os que já tive,
e chego a trincar os dentes tamanho o prazer que sinto. Meu
coração acelera tanto que parece que vai explodir, e já não respiro.
Não sei quanto tempo se passa até que ele se deita ao meu
lado, coberto de suor, os cabelos escuros colados em sua testa, seu
peito subindo e descendo tão rápido como se tivesse corrido
quilômetros.
— Você quer... me... matar... — Beija minha nuca, ainda sem
fôlego. — Mas... morro... happy[28]!
Rio quando ele termina de falar em inglês, e ele me olha
sério, desse jeito tão enigmático que me faz ter certeza de que está
pensando em algo que não irá me falar.
— Feliz aniversário! — Beija meus lábios.
Aconchego-me a ele, deitada sobre seu peito, ouvindo as
batidas de seu coração.
— Foi o melhor presente! — confesso.
Ele passa a mão pelos meus cabelos.
— Eu ainda nem dei seu presente, Melissa. — Ri.
Olho-o.
— Tudo o que eu queria está aqui! — Beijo-o e volto a me
deitar sobre seu peito.
Não falamos mais nada, palavras neste momento são
desnecessárias. Estou muito feliz por tê-lo de volta ao Brasil,
principalmente por ter vindo no dia do meu aniversário.
Não sei se ele veio para ficar ou só por causa da data, mas
tudo o que importa agora é que está aqui, deitado comigo, onde o
tenho imaginado por semanas.
Melhor aniversário de todos!
Vir para São Paulo não estava programado. Entretanto,
quando meu pai chegou há dois dias e logo anunciou que iria voltar
a trabalhar, não tive mais nenhuma outra ideia na cabeça além de
surpreender Melissa no dia de seu aniversário.
Estava havia semanas em agonia, desejando estar mais
perto dela, tocá-la, senti-la, e ter a oportunidade de fazer isso em
um dia especial me deixou bem empolgado. Tramei tudo, confesso,
pelas costas dela!
Estamos nos falando por telefone todos os dias, desde minha
conversa com Aaron. Eu me aproximei, fiz-me presente e deixei
bem claro que, mesmo sem saber quando retornaria a São Paulo,
não queria perdê-la. O que descobri com essa atitude foi que
Melissa, além de inflamar meu sangue, afaga minha alma.
Ela é uma boa amiga, boa ouvinte e tem um humor ótimo.
Temos conversado bastante sobre tudo e sobre nada e, claro,
praticado algo que nunca imaginei que faria, nem mesmo nos meus
delírios hormonais na puberdade: sexo virtual.
É uma delícia escrever o que eu gostaria de fazer com ela e
um tormento ler o que ela deseja fazer comigo. Comecei a mandar
uns vídeos inusitados, coisa de rotina no começo, desejando “bom
dia” na mesa do café da manhã; ou “boa noite” já deitado na cama;
que tivesse um bom final de semana de descanso, enquanto eu
estava de terno e gravata no escritório; até, claro, fazer um vídeo no
chuveiro.
A partir daí, a coisa esquentou, e só trocamos vídeos e fotos
maliciosos, explícitos, quase pornográficos.
E foi bom pra caralho!
Às vezes, no final da noite, depois de um dia estressante
tendo que lidar com todas as questões que envolvem a empresa, eu
só queria ouvir sua voz. Falávamos e falávamos por horas, e até
adormeci a ouvindo algumas vezes, assim como ela.
Ríamos no outro dia, chamando-nos de loucos, mas
voltávamos a fazer de novo e de novo.
As rosas foram uma iniciativa que começou despretensiosa.
Mandei o primeiro buquê depois que decidi que, não importava a
distância ou qualquer outra questão, eu a queria. Só que não parei
mais! Toda semana encomendava as flores e escrevia alguma coisa
safada ou romântica – algo que nem sabia que era capaz – para
Melissa.
Aaron ria e dizia que eu “estava fazendo meu caminho” de
forma adequada com ela, só que eu não via assim. Não foi
calculado, Melissa aconteceu na minha vida como raros outros
milagres que me encontraram ao longo de minha existência.
Termino de colocar a roupa com a qual cheguei,
amaldiçoando-me por ter deixado minha pequena maleta no hotel
onde me hospedei antes de vir encontrá-la.
Foi tudo muito corrido, e não tive tempo de racionalizar as
coisas para que corressem de forma melhor. Tudo o que fiz foi
reservar o jatinho da TGS – que havia acabado de voltar com papai
e Tereza –, colocar umas mudas de roupa na mala de mão e vir
como um louco atrás de Melissa.
Somente quando desembarquei no aeroporto é que
encomendei as rosas – tive sorte por encontrar o tom que queria tão
em cima da hora – e fiz reserva em um hotel, não querendo nem
usar o apart-hotel que a TGS mantém alugado. Chamei o Douglas
para me buscar única e exclusivamente porque não tenho
autorização para guiar aqui, no Brasil.
O cheiro delicioso que chega até mim é o sinal de que
Melissa saiu do banho. Entramos juntos, porém, saí antes, porque
ela quis lavar os cabelos. Gosto desse ritual de ir com ela para o
chuveiro, ensaboar suas costas, seus peitos deliciosos, seus
quadris. Obviamente fiquei excitado de novo, mas já cometemos um
deslize mais cedo fazendo sexo – anal, ainda por cima – sem
preservativo, por isso não prosseguimos.
— Tudo bem aí?
Sorrio quando ela faz a pergunta, vindo do banheiro com um
roupão e uma toalha na cabeça.
— Wonder... maravilhoso! — corrijo-me a tempo.
— Ainda não virou a “chavinha”, né? — Tento entender o que
ela quis dizer, e ela gargalha por causa da minha expressão. —
Ainda fala inglês como se estivesse em casa.
— Ah... sim.
Em casa... Sim, os Estados Unidos têm sido minha casa
desde que eu era garoto, mas não me sinto em um lar. É estranha
essa sensação, afinal, tenho pai, irmãos, tia Bea e muitos amigos
por lá, era para me sentir mais enraizado. Contudo, não é o que
acontece.
Já viajei para o México, visitei a fazenda onde minha avó
trabalhava como cozinheira na Baixa Califórnia, visitei seu túmulo,
assim como o de minha mãe, peguei aquela terra seca na mão, e
não me senti parte dela também.
— Às vezes você fica com o olhar tão distante! — Melissa
afaga minha barba. — Fica com cara de malvado.
Pego-a pela cintura, colando-a ao meu corpo.
— Está tudo bem mesmo? — Ela assente. — Não
machuquei...
— Não, foi delicioso! O melhor presente que eu...
Afasto-me dela e coloco minha mão sobre sua boca,
impedindo-a de falar.
— Ainda não lhe dei seu presente. — Vou até onde ela
deixou o enorme buquê de rosas champanhe com a borda rosada,
algo que pedi especificamente porque as duas cores me lembram
dela, e pego a caixa que enfiei no meio das rosas antes de atacá-la
e levá-la para a cama. — Não deu tempo de entregar.
Ela sorri, mas, assim que se atenta à caixa, abre a boca.
— É uma joia da TGS?
Cruzo os braços sobre o peito e sorrio meio bobo.
— Da nova coleção que ainda nem foi lançada. — Pisco. —
Quando olhei esta peça, foi impossível não subornar o pessoal de
vendas para que eu pudesse trazê-la.
Melissa gargalha e, antes de abri-la, me abraça e beija.
— Tenho certeza de que... — Ela fica sem palavras por um
momento e depois volta a me olhar. — Adam!
Ela pega a delicada corrente feita com elos em forma
hexagonal e olha atentamente para a minúscula abelha craveja com
diamantes amarelos e opalas negras.
A pulseira é uma peça exclusiva para a coleção do
Valentine’s Day deste ano, que foi inspirada na natureza. Quando vi
seus elos em forma de colmeia e a pequena abelha, não pude
deixar de pensar em Melissa e na forma como todos a chamam:
Mel.
Conheço muitas “Mels” americanas, geralmente Melindas ou
Melanies, mas, como no inglês a palavra para o néctar produzido
pelas abelhas é honey – que também é usado como nome próprio
ou apelido carinhoso –, nunca fiz a mesma associação.
— Ela é linda! — Melissa declara emocionada, e eu pego a
pulseira.
— Foi fabricada com o mesmo ouro que meu tataravô
encontrou, da mesma mina, ativa há mais de 100 anos — explico
enquanto a coloco em seu pulso. — O diamante é da cor amarelo
vivo, raro, encontrado na África do Sul, e a opala vem da Austrália.
Ela me encara.
— É um presente muito...
— Especial, para alguém especial.
Beijo sua mão, vendo a peça brilhar.
— Eu volto a repetir, meu maior presente foi você ter vindo.
— Admira a joia em seu pulso e sorri. — Mas eu seria louca se
dissesse que não adorei a pulseira!
Rio, adorando vê-la tão encantada.
— Bom, todo aniversário tem bolo, e eu não como nada
desde... — Olho o relógio no meu pulso. — Bom, há horas!
— Ah, meu Deus, não tenho bolo!
— Então vamos ter que conseguir um!
Melissa balança a cabeça negativamente, mas insisto:
— Você tem 15 minutos para se arrumar. — Aproximo-me e
falo em seu ouvido: — Tenho uma reserva para comemorarmos.
Deixo o quarto, mas não sem antes conferir se ela ainda está
parada, linda e cheirosa, no meio do cômodo, com cara de espanto.
Está! Vou para a sala rindo a fim de acudir o pobre coitado do
cão, que está latindo de seu cercadinho, afinal, se pretendo
frequentar o apartamento de Melissa, preciso ganhar seu
companheiro para o meu time.

— Pretende ficar por quanto tempo aí? — Joshua Stone II


não parece muito satisfeito quando lhe informo que estou no Brasil e
que não retornarei por agora aos Estados Unidos.
— O senhor precisa de mim em algum lugar? — pergunto,
sem lhe responder.
— Não, mas conto com você aqui me auxiliando, afinal é o...
— Pai, eu posso fazer meu trabalho remotamente, não se
preocupe. Toda vez que vou para algum país, continuo com minhas
funções normalmente, não é? — O velho não responde. — Quero
acompanhar a inauguração da TGS São Paulo.
— Certo. Nunca o vi tão empenhado em uma unidade por
abrir. — Respira fundo. — Seu irmão vai discursar na Flórida, pensei
que fosse bom você estar ao lado dele...
— Aposto que ele apreciaria muito mais se fosse o senhor. —
Corto-o antes que invente algo para me levar de volta para casa.
Termino de arrumar minha mala, na suíte do hotel onde me
hospedei, e espero que ele insista mais, porém, não o faz e se
despede, dizendo que vai me mandar um relatório para análise
antes do fim do dia.
Desligo e vejo que Melissa já me mandou duas mensagens
enquanto eu estava em ligação com meu pai.

“Oi, já estou saindo de casa, te pego em 15 minutos.”

E na seguinte ela avisa que já chegou.


Merda!
Fecho a mala de qualquer maneira, digito que estou
descendo, mas, quando abro a porta da suíte, vejo-a parada, pronta
para bater.
— Achei que tivesse acontecido algo. — Ri sem jeito.
— Não, era meu pai ao telefone. Talk, talk, talk...— Rio e
mostro minha mala. — Vamos?
Ela concorda, e saímos do hotel de mãos dadas.
— O haras fica longe daqui?
— Não muito, mas cada hora vale a pena, pode ter certeza!
— Ela parece orgulhosa. — Fiquei feliz por você ir comigo.
Puxo-a mais para perto.
— Aonde não vou por você?
Ela ergue a sobrancelha, parecendo não levar o que eu disse
tão a sério, mas não volto ao assunto. A verdade é que decidi ficar
mais tempo no Brasil e acompanhar a instalação e inauguração da
loja daqui apenas porque quero aproveitar ao máximo sua
companhia.
Ontem, depois do jantar esplêndido que tivemos em um
restaurante de uma das melhores chefs de cozinha do mundo,
comemos o bolo na cama do apartamento dela e dormimos tão
pouco que poderíamos colocar a culpa em todo açúcar que
consumimos, porque nossa energia e tesão não baixavam.
De manhã, quando ela perguntou se eu pretendia ir ao
escritório, respondi que estava tirando uns dias de folga, e ela, que
tinha acordado agitada e estava correndo de um lado para o outro,
parou.
— Você também não vai ao escritório?
— Não. — Deu de ombros. — Estou fazendo um desenho
para concorrer em um concurso e pretendo ficar em casa para fazê-
lo, e as demais coisas consigo despachar por e-mail.
— Eu me hospedei em um hotel ontem à noite e...
— Não gostaria de ficar por aqui esses dias? — ela ofereceu
de repente. — Quer dizer, não sei se você gosta de hotéis nem sei
quanto tempo vai...
— Eu adoraria sua companhia, Melissa. Pretendo comprar
algo aqui, em São Paulo, então, se não for atrapalhar, posso ficar
aqui enquanto isso.
— Não atrapalha, não. — Ela me deu um sorriso enorme de
satisfação. — Você me deu uma ideia: tirar folga! Nem desenho nem
e-mail hoje!
Comecei a rir, adorando a ideia de ficar sem fazer nada o dia
todo ao lado dela, de preferência, na cama.
— Ideia maravilhosa, nós podemos...
O telefone dela tocou alto, interrompendo minha proposta
indecente. Melissa pegou o aparelho e conversou com alguém
chamado Joaquim.
— Sim, Joaquim, sou eu. O que houve? — Ela ficou um
tempo ouvindo. — Qual desenho? — Depois de outra longa pausa,
ela me olhou e, suspirando, disse: — Eu poderia ir até aí... Chego aí
em duas horas.
Melissa pareceu consternada.
— Folga cancelada?
— Infelizmente, sim. Precisarei ir até um haras para ver uma
obra... — Rolou os olhos.
— É longe? — Ela negou. — Posso ir com você?
Eu sei que poderia parecer grudento, mas não estava
escondendo de ninguém que voltei para estar com ela e, se tivesse
que ir para um haras no interior para estarmos juntos, eu iria.
— Claro que sim, mas não sei quanto tempo irá levar.
— Se for atrapalhar...
— Adam, não me atrapalha! — Ela me abraçou toda
animada. — Vou adorar companhia. Gosta do campo?
Fiz uma careta, e ela gargalhou.
— O quê? Cresci em Los Angeles!
— E eu em São Paulo, mas adoro o interior...
Sorri cheio de malícia.
— Eu também... o seu!
— Por que você está com esse sorriso? — Melissa pergunta,
e paro de lembrar de hoje mais cedo, entrando no carro estacionado
próximo ao hotel onde estava hospedado. Depois que combinamos
nossa excursão ao interior, pedi ao Douglas que me pegasse,
encerrei minha estada e subi para o quarto apenas para mudar de
roupa e pegar minhas coisas.
Depois que eu voltar do haras, passarei uns dias com
Melissa, até que o corretor que me indicaram da Karamanlis possa
achar um imóvel para mim.
— Pensando em como vai ser bom o ar do campo...
Melissa ri.
— Mentiroso! — Ela liga seu carro elétrico e põe a mão na
minha coxa. — Sua cara estava mais para pensamentos impuros.
Gargalho.
— Completamente impuros!
Beijo-a antes de pegarmos a estrada rumo ao mato.
Dirigi meu carro até o haras, que não fica muito distante da
capital, enquanto ouvia Adam conversando em inglês ao telefone.
Ao que parece, o dia de folga não funcionou nem para mim nem
para ele, que teve que despachar algo com seu assistente.
Mal conseguimos conversar, pois ele trabalhou quase o
caminho todo até o haras de Nicholas. Olho-o com o canto do olho,
mas ele está concentrado no telefone, então tento não rir como uma
boba.
Sim, porque essa é a minha vontade!
A surpresa que ele me fez foi maravilhosa, e nunca serei
capaz de esquecer. As rosas estavam lindas, com uma coloração
única e diferente, a mistura de champanhe dourado e rosé. E o que
falar da pulseira? Deus do Céu, que coisa linda! Delicada, elegante
e, ao mesmo tempo, tão singela, mesmo tendo uma porção de
diamantes amarelo vivo, que é uma especialidade da TGS.
Não obstante, a melhor surpresa, além das flores e da joia,
foi a presença de Adam. Ainda não entendo o que está
acontecendo, se estou somente empolgada com o sexo estupendo
que fazemos ou se realmente ele é diferente de todos os outros
relacionamentos malfadados que já tive.
Ao que parece, vocês vão descobrir isso juntos!, penso ao
lembrar que Adam ficará hospedado comigo por um tempo
enquanto procura um imóvel para comprar em São Paulo.
Tento não me empolgar com isso, por saber que ele
pretende, se não se estabelecer na cidade, ao menos ter um ponto
fixo para vir sempre que quiser, uma ligação com a minha cidade e,
talvez, comigo.
Dou seta para sair da estrada principal e pego uma
estradinha de chão. Meu carro, nada adaptado a isso, balança um
pouco, o que faz com que Adam pare de ler no telefone.
— Estamos chegando? — ele pergunta, e aponto para frente,
onde a enorme construção da casa principal resplandece sobre uma
colina.
Paro na porteira e fico feliz por descobrir que ela só está
encostada. Entro no haras e logo vejo Joaquim, o responsável pela
criação dos cavalos de raça do Nicholas. Paro em frente à casa, no
enorme gramado com vista para o lago, e Adam desce do carro,
olhando tudo à sua volta.
— Foi você quem projetou isso tudo?
Afirmo com a cabeça e sigo para cumprimentar Joaquim.
— Ei! Como vai? — saúdo-o. Ele me cumprimenta tirando
seu chapéu – que sempre está em sua cabeça – e em seguida olha
para meu companheiro. — Joaquim, esse é Adam, meu amigo.
Os dois se cumprimentam.
— Inglês? — Joaquim pergunta ao ouvir o sotaque dele.
— Mexicano, criado nos Estados Unidos. — Ele ri de si
mesmo.
— Ah... — Joaquim sorri abertamente, demonstrando ter
gostado de Adam. — Os treinadores dos cavalos aqui são ingleses
e têm um sotaque como o seu. — Adam sorri. — Seja bem-vindo ao
Círculo N!
Joaquim nos convida para entrar na casa, e Adam
novamente pega minha mão para andarmos juntos. Sorrio para ele,
só que meu sorriso morre assim que entro na casa e vejo um
lindíssimo piano de cauda na sala de música. Meu coração dói ao
vê-lo, pois sei que Nick não toca esse instrumento, quem é pianista
é Giovanna. Joaquim percebe meu olhar e suspira.
— O patrão quis botar fogo — informa, dando de ombros
como se não fosse nada de mais e depois chama sua esposa, Célia,
gritando seu nome na direção que fica a cozinha.
Adam solta a minha mão e a passa sobre o instrumento.
Seus olhos estão brilhantes, e ele parece tão atento ao toque de
cada tecla quanto quando me toca.
— Sabe tocar? — questiono.
Ele assente, e sorrio, pois, embora eu cante, meu forte nunca
foi a parte instrumental.
— Não sou muito bom, aprendi já grande, mas me esforço.
— Mel! — Célia aparece, interrompendo a conversa sobre o
piano, principalmente sobre a melancolia que vi nos olhos de Adam
quando ele olhou para o instrumento.
Célia me abraça, como o faz sempre que me vê. Nós nos
conhecemos há alguns anos, e, no começo, ela ainda tentou dar
uma de Cupido entre mim e Nicholas, mas nós sempre fomos
amigos e nunca sentimos atração um pelo outro.
— Que bom que voltou para nos ver! — ela volta a falar e
olha para Adam. — Seu marido?
Fico sem graça e sorrio, negando, mas é Adam quem
responde:
— Unfortunately, não. Como vocês dizem aqui? — Ele parece
pensar, e fico confusa e tensa com o que vai dizer. — Ah,
namorado. — Não disfarço o choque ao ouvir essas palavras. —
Sou Adam, como está?
Sabe a expressão “o gato comeu a língua”? É exatamente
como me sinto, como se esse órgão não mais existisse em minha
boca, impedindo-me de pronunciar qualquer coisa, assim, fico
apenas acompanhando a interação dos três, Célia, Joaquim e
Adam, enquanto meu cérebro analisa o que ele falou.
— Mel? — Joaquim me chama, e concentro-me nele,
obrigando-me a deixar as análises e considerações para mais tarde.
— Podemos ir até lá?
— Claro! Adam... — chamo-o — o problema é na área de
lazer aqui da casa. Você quer vir comigo?
— Se quiser, pode ficar aqui na casa! — Célia responde por
ele. — Acabei de fazer uns quitutes e estou preparando o almoço!
— Hum... — Ele sorri tão charmoso que eu penso ver Célia
babar por ele também. — Cheira muito bem!
Rio, balançando a cabeça pela sua gulodice. Eu sei que
Adam adora comer, bem como ama a comida brasileira. Disse-me
isso várias vezes e provou seu ponto ao levar-me ontem a um
restaurante que ressalta a brasilidade em cada prato. Então me
despeço dele e vou com Joaquim encontrar os trabalhadores da
obra.
Fico quase meia hora debaixo do sol a pino, conversando
com eles sobre como se dará a execução do projeto, percebendo
que a maior dificuldade dele é na construção da cascata sobre a
piscina, pois estamos trabalhando com pedras naturais
pesadíssimas que precisarão ser erguidas por um guindaste.
Quando por fim sanamos todas as dúvidas, volto para a casa
ao lado de Joaquim, e, ainda da porta, nós dois ouvimos a
gargalhada de Adam.
— E como é isso? — ouço-o perguntar.
O cheiro do almoço de Célia está incrível, e entendo que ele
tenha ficado enfiado dentro da cozinha com ela, mas, ao entrar,
vejo-o conversando com Johanna e Gabriel, de 9 e 11 anos de
idade, respectivamente, filhos dos treinadores dos cavalos.
— Ah, está de volta! — Ele cochicha algo em inglês com o
menino, que ousadamente me olha da cabeça aos pés e concorda.
— O almoço já está pronto, Mel! — Célia anuncia. —
Joaquim, vai lavar as mãos! E vocês também, meninos!
Os três obedecem ao comando dela, e eu me aproximo de
Adam, sentando-me ao seu lado.
— Se divertindo?
— Muito! — Sorri. — Esses garotos são espertos, além de
falarem meu idioma.
— Eles são ingleses, vieram com os pais para cá há alguns
anos.
— Sim, eu sei. — Dá-me um beijo rápido. — Senti sua falta,
mas você estava tão concentrada no trabalho que eu não quis ir
para lá te atrapalhar.
— Consegui resolver tudo. Você quer ir ou ficar para o
almoço?
— O quê? E não comer isso que cheira... — ele inspira fundo
— bem assim? Nunca!
— Por que vocês não passam a noite? Aposto que Adam
nunca viu um céu tão cheio de estrelas como o nosso!
— É uma ótima ideia, Mel, assim, amanhã de manhã, você
conversa com o engenheiro que está vindo olhar aquela estrutura
que te falei do celeiro maior.
Olho para Adam.
— Eu não trouxe roupas... — falo baixinho. — Mas, se você
quiser ficar...
Ele parece estar pensando, e juro que achei que fosse numa
desculpa educada para irmos embora, então ele se aproxima mais
de mim e cochicha:
— Você já fodeu no mato, vendo as estrelas?
Engasgo com minha própria saliva, e, enquanto tusso, ele
responde ao casal:
— Gostamos muito de ficar!
Nem consigo corrigir o verbo conjugado errado depois do que
ele me perguntou. A única coisa agora que habita meus
pensamentos é a ideia de nós dois nus no meio do gramado,
trepando como loucos debaixo de um manto estrelado.
Deus, estou ficando viciada nisso!

— A gente é doido, sabia? — falo rindo, enquanto vamos


iluminando o caminho com as lanternas do celular. — Onde você
conseguiu esse saco de dormir?
Adam faz sinal para que eu fale mais baixo conforme
andamos para a parte de trás da casa, onde está sendo construída
a área de lazer.
— As crianças me deram.
Arregalo os olhos.
— O quê? Como você...
— Take it easy[29]! Disse que íamos fazer camping.
Começo a rir sem parar, algo que me acontece
constrangedoramente sempre que fico nervosa, percebendo que ele
planejou realmente tudo isso durante sua conversa com as crianças,
já que o idioma lhe facilitava muito conseguir o que queria.
Passamos o dia todo no haras, e, depois de degustar a
fantástica comida da Célia, Adam acompanhou Joaquim até as
baias para ver os cavalos. Ficou claro que ele não é um homem do
campo, pois não sabia nada sobre os animais, mas ficou
impressionado com o meu trabalho, o que me envaideceu e
emocionou.
Johanna, embora pequena, é uma exímia amazona e exibiu
seu talento numa arena, e ele observou tudo com um sorriso de
admiração. Gabriel não desgrudava dele, conversando sobre o
colégio e, principalmente, sobre meninas.
Gostei de vê-lo interagindo com as crianças. Nunca o havia
imaginado um homem que tivesse desenvoltura para lidar com os
pequenos curiosos, mas, ao vê-lo dar atenção e ser tão paciente
com Gabriel, passei a enxergá-lo sobre outra ótica.
Adam já foi casado por muitos anos. Contudo, não teve filhos
com a ex-esposa, e eu, com minha cabeça de querer sempre uma
família grande, logo supus que ele não gostasse de crianças ou que
não estivesse pronto para elas. Talvez fosse exatamente isso na
época em que se casou ou, quem sabe, a decisão partiu dela. Não
sabia e achei melhor parar de conjecturar.
Um dos grandes problemas que já tive na minha vida foi
acabar criando ilusões acerca dos homens com quem me relacionei.
Era sempre assim, eu ia preenchendo os espaços de informações
que não tinha – afinal, leva tempo para se conhecer alguém – de
acordo com o que achava que combinava com a pessoa e, temo
dizer, de acordo com o que eu queria – no caso, que tivesse
algumas características do Frank. Tudo o que encontrei foi
frustração e, o pior, a realidade de saber que não foram eles que
causaram a ilusão, mas eu mesma. Quando acabava por conhecer
de verdade a pessoa que estava comigo, percebia que ela não me
empolgava e que não era o que eu queria.
Uma vida inteira espelhando um ideal de homem em outros
que nada tinham a ver. Talvez, se em algum momento eu tivesse
percebido isso, tivesse descoberto que um deles era bem mais do
que eu queria e sonhava, mas não dei essa chance.
Isso não vai acontecer novamente!, penso, decidida a não
inventar nada sobre Adam e a receber suas informações, conhecê-
lo de verdade tanto quanto me for possível.
— Chegamos! — ele anuncia, trazendo-me de volta ao
momento “adolescentes sorrateiros” que estamos tendo. — O garoto
é mesmo esperto!
Estamos perto da cerca viva de ciprestes que foram
plantados há alguns meses. Todos têm bom tamanho e foram
calculadamente colocados aqui para que, de fora da colina onde fica
a casa, ninguém possa ver o que se passa na área de lazer.
— A casa dos funcionários fica lá embaixo. — Aperto meus
olhos e o fito, condenando-o. — Você planejou ficar fora das vistas
de Célia e Joaquim!
— Claro! — Ele então estende o saco de dormir sobre a
grama, olha todo o gramado em volta, conferindo não haver bichos
e tira uma sacola de dentro do saco. — Joaquim me presentou hoje.
— Tira uma garrafa de pinga e dois copos. — Disse que é “da boa”.
Não resisto e começo a rir sem parar. Estamos no final de
janeiro, num calor escaldante, embora haja uma brisa fria vindo da
mata e dos lagos, mas não tão fria que me justifique a beber
aguardente.
— Isso esquenta como fogo! — aviso-o, quando ele se serve
e depois oferece um copo para mim. — Só metade!
Brindamos, e ele bebe devagar, como se a cachaça fosse
uísque, enquanto viro tudo de uma só vez.
— É doce — comenta surpreso. — Pensei ser parecida com
tequila.
Rio e nego.
— É feita de cana, a mesma coisa de onde sai o açúcar —
explico. — É uma delícia, deve ser fabricação do próprio Joaquim.
Ele termina de beber a pinga e pergunta se quero mais. Nego
e justifico:
— Já estou quente o suficiente.
Adam deixa a garrafa e os copos num canto do chão e me
abraça forte, colocando as mãos por baixo do meu “pijama” – leia-se
uma camisa de malha enorme que ele me emprestou –, segurando
firme minha bunda.
— Eu fervo por você!
Sua boca desce para a minha em um beijo molhado e cheio
de desejo. Agarro-o com força, enroscando minhas pernas em volta
dele, enquanto sou erguida do chão. Ele caminha comigo no colo
até onde colocou o saco de dormir, mas não me deita, escolhendo
se sentar.
Adam usa uma bermuda e nada mais, por isso consigo sentir
seu pau pulsando esmagado entre nós dois. Mexo os quadris,
excitando-o ainda mais, e ele deixa minha boca e suga meus seios
por cima de sua camisa. Gemo e jogo a cabeça para trás,
rebolando, moendo-me contra ele, enquanto sou chupada e mordida
com força no mamilo.
De repente sou agarrada pelos cabelos. Abro os olhos e o
encaro, mesmo na escuridão, percebendo que o fogo que queima
dentro de mim o incendeia por inteiro.
— Quero te ver com as estrelas — diz rouco e baixo, cada
palavra exalando o tesão que sente.
Eu o empurro contra o saco de dormir, fazendo com que se
deite e me coloco de pé à sua frente. A pouca iluminação que temos
provém de luzes dos postes que foram instalados ao longo de todo
o caminho desde a casa até as baias. A noite não está clara, a lua
está crescente, mas o céu está salpicado de estrelas.
Tiro a camisa e a jogo sobre ele, como numa performance de
strip-tease. Adam ri e a embola para usar como travesseiro. Passo a
mão sobre meu corpo, como fiz no dia do meu aniversário ao me
olhar no espelho, e escuto os sons deliciosos que ele emite.
— Porra, Melissa!
É tão bom sentir a brisa fria na minha pele, e, mesmo
estando uma noite quente, sinto-a se arrepiar por inteiro. Abaixo-me
lentamente, retirando a calcinha e faço a mesma coisa que fiz com a
camisa, jogo-a na cara dele.
Adam a cheira ruidosamente, depois a coloca na boca e a
suga. Estremeço de tesão testemunhando o quanto ele aprecia
minha boceta, o quanto a deseja.
Piso no saco de dormir e caminho até a altura de seu peito.
Num ato impetuoso, passo uma das pernas por cima dele e paro de
pernas abertas, nua, completamente exposta, sobre seu corpo e seu
olhar.
Ele xinga em inglês e segura minhas panturrilhas com força,
puxando-me mais para cima e depois faz com que me abaixe,
ficando de joelhos com sua cabeça entre minhas coxas.
Sua língua traça o formato do meu sexo, deixando um rastro
molhado em minha virilha. Depois, sinto-a explorar-me por dentro,
enfiada em mim, tremulando, girando, entrando e saindo. Curvo-me
tamanho prazer, espalmo as mãos no chão acima de sua cabeça e
me movo conforme o ritmo que ele impõe com a boca.
Adam desfere um tapa forte na minha nádega esquerda.
Gemo de prazer, descobrindo que gosto desta combinação de tesão
e dor. Seus dedos se cravam nos meus quadris, mantendo o ritmo,
enquanto me chupa com vontade, engolindo minha excitação como
se bebesse uma preciosa bebida.
Ele se esfrega contra mim, sacode a cabeça, balança sua
língua de um jeito tão rápido e leve que parece a mesma sensação
do vibrador, e eu desabo em gozo intenso, sem conseguir conter a
avalanche de prazer que me toma toda.
Não sei em que momento ele me virou, muito menos o vi
colocar o preservativo que está usando quando o sinto me
preencher até o fundo.
— Oh, God!
Adam pressiona sua mandíbula e fecha os olhos, mantendo
movimentos curtos, sem sair de mim. Abraço-o com minhas pernas,
permitindo-o ir mais fundo, e, quando ele percebe seu acesso
irrestrito, estoca com mais força, movendo-se de modo que seu pau
quase sai do meu sexo antes de voltar com toda intensidade.
Vibro a cada investida, meus seios balançam, o corpo se
arrasta sobre o saco de dormir, mas nada importa, apenas esse
mundo tão nosso que criamos juntos a cada vez que unimos nossos
corpos.
Esqueço-me de tudo quando estou com ele, sinto-me mais
confiante, renovada, querida, uma mulher cheia de poder e
extremamente desejada. Eu o admiro por conseguir enxergar em
mim o que muitas vezes ninguém viu e por me conquistar
ressaltando o quanto já sou feliz, bem-sucedida, linda e
autossuficiente, como a maioria dos homens não faz.
Adam não me vê como a mulher que chegou aos 40 anos
solteira, enquanto a maioria de suas amigas e familiares já
constituiu família. Ele não impõe sobre mim nenhuma pressão, pelo
contrário, ele me admira e sente tesão por eu ser exatamente a
mulher que sou.
Ele me beija enfurecido, usando seus dentes nos meus
lábios, gemendo dentro de minha boca, enquanto soca seu pau em
mim sem nenhuma piedade. Abandono-me em seus braços, deixo
que me ame como quiser, pois nada do que experimentamos juntos
até o momento me fez mal.
Eu confio nele!
Eu o quero demais!
Arranho suas costas, e ele enlouquece, esticando-se como
um gato que é acariciado. Faz uma pequena pausa, saboreando o
pulsar de nossos sexos, então volta a se mover como um furacão,
arrancando-me do chão e levando-me através do céu estrelado
enquanto encharco tudo de prazer e ele jorra dentro da camisinha.
Abraçamo-nos, nus e suados, à revelia de tudo, ao relento,
debaixo do melhor teto que duas pessoas apaixonadas poderiam
ter: o céu brilhante.
Apaixonadas? Abro os olhos de repente, surpresa com meu
pensamento e olho para Adam, que está com as pálpebras
fechadas, tentando recuperar seu fôlego. Deus do Céu, será que me
apaixonei por ele?
Faço o maldito “teste” que fiz a vida toda e penso em Frank, e
a resposta é absurdamente maravilhosa e estarrecedora.
E agora?
Eu sou completamente louco por essa mulher!
O pensamento me assalta assim que desabo sobre Melissa e
a abraço suado e sem fôlego. Tudo e qualquer coisa que fazemos
juntos é empolgante, alegre e cheio de vida, seja uma curta viagem
ao interior até uma foda muito rápida e forte sob as estrelas.
Melissa me faz querer viver intensamente, um sentimento
que não reconhecia mais em mim, pois só seguia a minha vida
como se estivesse cumprindo um papel dentro de um espetáculo
morno, sem graça e previsível.
Respiro fundo, tentando fazer meu coração voltar a seu ritmo
normal, e Melissa se deita sobre meu peito, deixando com que o
perfume suave de seus cabelos chegue até mim. Acaricio os fios
macios, deixando que eles escorreguem entre meus dedos,
relaxando meu corpo, sentindo o ritmo cardíaco dela e me sentindo
acolhido.
Estamos ao ar livre, numa noite estrelada de verão, deitados
sobre um saco de dormir aberto sobre a grama recém-plantada de
um jardim. Os sons da natureza à nossa volta, o cheiro gostoso da
relva, da mata perto da casa e até dos cavalos ao longe completam
um cenário tão diferente de tudo o que já experimentei, e isso me
deixa com uma sensação estranha no peito.
Sinto Melissa estremecer de repente e a encaro.
— Com frio?
— Não. — Ela se senta. — Acho melhor entrarmos, pois os
pernilongos logo começarão a nos devorar.
Ergo-me também, aproveito para tirar o preservativo e busco
a bermuda que estava usando, localizando-a juntamente à calcinha
de Melissa.
— Seu cheiro é... — comento e a escuto rir. — Acha que sou
maluco por gostar tanto?
— Acho que nós dois somos malucos, Adam. — Ela coloca a
peça, já depois de ter vestido a camisa que lhe emprestei para
dormir. — Eu nunca imaginei que um dia estaria na casa de um
cliente, trepando no seu jardim.
— Nem eu. — Pego o saco de dormir, a garrafa e os
copinhos de pinga. — Mas gostei... — ia falar a expressão em
inglês, mas decido colocar em prática algo novo que aprendi com o
pequeno boca suja Gabriel — pra caralho!
Melissa ri e me abraça.
— Eu também, adoro cada momento contigo!
O jeito que ela diz isso mexe comigo. Sinto meu estômago se
contrair, e um frio perpassa por todo meu abdômen, sem contar que
os meus batimentos cardíacos, que haviam voltado ao normal,
voltam a acelerar de forma assustadora.
Não consigo falar nada, embora sinta meu peito queimar,
mas o nó na garganta não me deixa pôr em palavras aquilo que
sinto, mesmo porque nem sei o que é.
Voltamos juntos para a casa, abraçados e quietos. Tomamos
banho na suíte de hóspedes, aproveitando o enorme chuveiro. Tudo
nesta casa parece grande, e Melissa me diz que o dono queria uma
família grande para morar aqui, com muitos filhos e bichos de
estimação, além dos cavalos.
Deitamo-nos juntos. Ela gosta de dormir abraçada a mim, e,
para falar a verdade, sentir o corpo dela no meu é ótimo e não me
incomoda em nada. Melissa não tarda a dormir, mas meu sono não
vem. Fico olhando para o teto, pensando, analisando, tentando
encontrar uma razão para tudo o que ela me desperta.
É difícil admitir o óbvio, principalmente diante de nossa
situação, afinal, moramos em países diferentes. Só que, admitindo
ou não, ele não deixa de existir, está aqui. Eu sei, entendo, aceito,
apenas não sei como agir.
Estou apaixonado por Melissa Boldani, talvez esteja assim
desde aquela primeira noite, sob as máscaras e o anonimato. O
fascínio, o tesão só cresceram ao longo do tempo e se juntaram a
mais elementos primordiais, como admiração, afeto, amizade, ou
seja, a receita para o fortalecimento de uma chama que começou há
mais de um ano e agora parece incendiar tudo sem controle.
Suspiro e fecho os olhos, sentindo-me um pouco perdido, é
verdade. Sou um homem de 42 anos que nunca se apaixonou,
apenas uniu desejo à conveniência nos relacionamentos, buscando
uma aceitação forçada dentro de um grupo de pessoas. Só essa
questão já mostra o quanto sou inexperiente nessa área da vida.
Olho para Melissa, que dorme com a cabeça no travesseiro,
a boca levemente aberta, os cabelos espalhados em volta de sua
cabeça.
E ela?, pergunto-me, querendo saber como uma mulher
incrível como Melissa Boldani ainda estava sozinha. Opção sua?
Relacionamentos fracassados? Como fui ter a sorte de ela entrar na
minha vida?
Ajeito-me melhor na cama, buscando uma posição mais
confortável para dormir – mais perto dela, claro – e deslizo as mãos
sobre sua pele quente e macia, fazendo meu pau crescer e inchar
cheio de tesão.
Ela se vira, talvez incomodada com meu toque, e fica de
costas para mim. Penso em deixá-la dormir em paz e tentar conciliar
meu sono, mas, então, a sinto rebolar contra mim.
Sorrio.
— Acordada?
— Seu pau pulsando na minha bunda me acordou — ela
responde sonolenta. — Na verdade, meu cérebro quer continuar
dormindo, mas minha pussy está fazendo motim.
Rio, puxando-a mais para perto, segurando-a pelos peitos
deliciosos que enchem minha mão.
— Vou me juntar a ela, posso?
Melissa suspira.
— Apresente sua arma, companheiro!
Vira a cabeça para me olhar, e eu a beijo, já encaixando meu
pau entre suas coxas. Dormir? É para meros mortais não
apaixonados!

Bocejo pela terceira vez sobre uns relatórios que estou lendo
no laptop, enquanto espero que a máquina de café termine seu
trabalho para abastecer-me do líquido precioso.
Melissa ainda estava dormindo plácida e satisfeita quando
deixei a cama e vim trabalhar. Tenho muitos relatórios acumulados e
uma reunião um tanto desconfortável com o diretor de vendas a fim
de ajustar a situação de alguns gerentes que estão se dedicando
aquém do que é pedido a pessoas de sua posição.
Perdi praticamente dois dias com a visita ao haras. Não
reclamo, pois foi um tempo ótimo ao lado de Melissa e que nos
serviu para clarearmos as ideias e traçar um objetivo em comum.
Suspiro e penso na viagem de volta, depois que a ouvi
conversar com dona Célia sobre o dono do lugar e o quanto ele
estava distante e desanimado com o empreendimento.
— Mas ele está descontente com o resultado do seu projeto?
— questionei enquanto Melissa dirigia de volta a São Paulo.
— Não. — Ela respirou fundo e balançou a cabeça. — Mas
penso em como meu trabalho perdeu um pouco o sentido. — Franzi
o cenho, não entendendo. — Ele vai acabar desistindo de tudo.
— Por quê?
— Acho que a atual companheira dele não é a mulher com
quem ele queria dividir aquilo tudo. — Melissa deu de ombros. — Os
dois, o haras e ela, não combinam, e Nick sabe disso.
Não demonstrei o quanto o que ela disse me tocou, porque
era a pura verdade. Já é difícil manter um relacionamento quando
as duas pessoas têm afinidades, mas, quando querem coisas
diferentes, é impossível! Sei disso porque desde o começo foi o meu
caso com Hillary.
Eu estava deslumbrado quando nos casamos. Ela era a
mulher certa para que eu me sentisse integrado à classe social a
que pertencia por causa da minha família, mas que sempre torceu o
nariz para mim. Meu pai era um homem respeitado pela maioria das
pessoas. Contudo, nunca fez questão de manter-se próximo, tendo
seus amigos escolhidos a dedo e todos de longa data.
Hillary era querida, popular. Uma mulher moderna que tinha
uma carreira promissora, mas que mantinha as tradições que essas
famílias antigas sempre fizeram questão de perpetuar. Isso, no
começo, uniu-nos, mas depois percebi o quanto o meio era vazio e
que eu não precisava da aceitação de nenhuma daquelas pessoas.
Começamos então a viver cada vez mais nossos próprios
interesses separadamente. Ela não queria me conhecer de verdade,
apenas me moldar conforme achava que eu deveria ser: menos
latino, menos carrancudo, mais despojado e ambicioso.
Para ela, era inconcebível eu ser o segundo no comando da
empresa, quando poderia ser o CEO. O engraçado é que ela nunca
me perguntou se eu queria ser o diretor executivo da TGS, apenas
achava que deveria querer.
Nós dois nunca nos amamos e, para piorar, tínhamos ideias e
ideais muito diferentes.
— Complicado! — respondi sem entrar em detalhes.
Melissa respirou fundo novamente, olhou-me algumas vezes
com o canto dos olhos, mas continuava concentrada na estrada.
Percebi que queria dizer algo, talvez até me perguntar sobre o meu
casamento, e não sabia como iniciar a conversa.
— Relacionamentos são complicados — tornei a falar,
desejando saber o que a estava agitando.
— O que foi aquilo quando chegamos? — Melissa disparou a
pergunta de repente, e, confesso, no primeiro instante, não entendi.
— Adam?
— É como me sinto, Melissa — confessei com sinceridade,
percebendo que ela se referia ao modo como me apresentei à Célia.
— Eu sei que não foi o que combinamos, mas me sinto assim,
alguém fixo em sua vida.
— Por quê?
Ri e dei de ombros.
— É difícil mandar no coração! O que me trouxe aqui foi a
atração, mas o que me faz querer ficar é algo mais forte que isso.
— O que é, então? — perguntou baixinho.
Fechei os olhos, soltei o ar que estava preso dentro de mim e
respondi o mais sinceramente possível:
— Eu também quero descobrir.
As unhas de Tiger arranham a minha perna, e, deixando de
lado os pensamentos, rio para ele e lhe jogo um pedaço de pão,
gostando da forma com que nosso convívio tem melhorado.
— Aha! — pulo com o susto que levo quando Melissa grita.
— Agora eu sei por que ele gosta tanto de você! — Sorrio cheio de
charme e pisco. — Você o tem comprado com comida! — Ela olha
para o cachorro com uma expressão que até eu sinto medo. — Você
sabe que não pode comer isso, mocinho!
Decido intervir e salvar a pele do doguinho – como ela o
chama às vezes – e assim marcar mais pontos com meu
companheiro masculino.
— Bom dia, Melissa! — saúdo-a indo até ela, abraçando-a e
depositando um beijo longo e cheio de promessas em sua boca. —
Você é muito dura com o Tiger!
— Olha só o tamanho dele, Adam! — Tiger escapa para seu
cercadinho, fugindo da reprimenda. — O meu doguinho parece um
miniporco!
Não consigo resistir e gargalho do seu exagero.
— Prometo que vou fazer exercícios com ele. — Tento
apaziguar. — Vem comer. — Pisco um olho. — Tem pão,
panquecas, ovos mexidos, suco de laranja e o café da máquina que
você gosta.
Ela geme de prazer, e meu corpo responde na hora.
— Você é meu herói! — Beija-me. — É difícil não se
apaixonar por um homem que prepara um desjejum desses.
Meu coração parece parar de bater, e fico imóvel ao lado da
mesa.
— E você está?
Melissa franze a testa, então parece entender minha
pergunta. Ela me encara com seus olhos verdes brilhantes.
— Apaixonada por você? — replica a minha pergunta
implícita. — Estou. — Pega uma panqueca como se não tivesse dito
nada de mais e, quando percebe que não me movi ainda, respira
fundo. — É difícil mandar no coração, lembra? Você disse isso
ontem. — Dá de ombros. — Não se preocupe com o modo como me
sinto, não vou cobrar e...
— Para! — peço antes que diga alguma bobagem.
Melissa fica um tanto assustada, principalmente quando me
abaixo ao seu lado.
— Minha... — concentro-me para expressar tudo o que tenho
que dizer de maneira correta — preocupação era você não sentir o
mesmo por mim. — Ela abre a boca surpresa, e eu rio. — Passei
praticamente um ano procurando por você, vim ao Brasil para te
reencontrar, retornei porque não conseguia mais ficar longe, e você
acha que não estou apaixonado? Estou muito, muito apaixonado por
você, Melissa Boldani!
Então, depois de eu ter me declarado a uma mulher pela
primeira vez, ela faz algo que eu nunca podia esperar que
acontecesse: chora.
Caralho, o que eu disse de errado?
— Melissa? O que houve? — A voz preocupada de Adam
não me causa reação, pois ainda estou em choque.
Acordei me sentindo muito bem, estiquei-me na cama, como
sempre faço, mas, ao virar-me, senti o cheiro do xampu de Adam no
travesseiro ao meu lado. Sorri. Pensem em um sorriso bobo,
daqueles de doer a bochecha, que fica pregado na sua cara e
parece que nunca mais vai sair. É desse sorriso que estou falando!
Bem, os dias de folga haviam acabado e, embora não
tivessem sido programados, foram muito melhores do que eu
poderia imaginar. Ter passado a noite no haras, na companhia de
pessoas tão gentis, comida boa, um lugar maravilhoso e as
“aventuras noturnas” propostas por Adam foi incrível.
Ah! Esse homem ainda vai me matar de prazer!
Levantei-me, resolvi tomar um longo banho e lavar os
cabelos, mas não conseguia parar de olhar para os itens dele todos
na minha bancada, fazendo par com os meus. Adam é um homem
vaidoso, e sua toilette não me deixava ter dúvidas disso.
Saí do banho e, depois de hidratar meu corpo com um creme
cheiroso, coloquei o roupão, enrolei uma toalha nos cabelos e segui
para a sala. Pelo cheiro que chegava até o quarto, ele estava
fazendo o desjejum.
Ia falar algo com ele, mas logo me calei quando o vi alimentar
Tiger – que está muito acima do peso – com um naco de pão.
— Aha! — Sentime como uma criança gritando isso e tive
que segurar o riso quando Adam saltou de susto. — Agora eu sei
por que ele gosta tanto de você! — Fingi-me de zangada, mas, no
fundo, adorava como os dois já não se estranhavam, embora tenha
ficado surpresa pela forma rápida com que Ti o aceitou. Estava ali a
explicação! — Você o tem comprado com comida!
Ralhei com o pequeno bulldog francês e, mesmo diante de
seus olhos sofredores, não deixei de olhá-lo com cara feia. Adam
tentou ainda me comprar com um cumprimento, um beijo e teve a
audácia de defender o meu doguinho, que malandramente escapou
para sua casinha no cercado.
— Olha só o tamanho dele, Adam! O meu doguinho parece
um miniporco!
Ele gargalhou, e fiquei imóvel, sem fôlego, completamente
encantada pelo homem que estava hospedado comigo.
Hospedado... Eu não fazia ideia se tinha sido uma boa ideia
convidá-lo para ficar comigo, pois temia me acostumar à sua
presença, imaginá-lo como parte da minha rotina, da minha vida, e
não parecia ser aquilo que ele queria.
Mesmo porque... horas de avião separavam minha vida da
dele.
— Prometo que vou fazer exercícios com ele. — Tentou
apaziguar. — Vem comer. Tem pão, panquecas, ovos mexidos, suco
de laranja e o café da máquina que você gosta.
Ai, Deus, ele cozinha!
— Você é meu herói! — Beijei-o, empolgada com meu
primeiro café da manhã preparado pelo homem que amo. — É difícil
não se apaixonar por um homem que prepara um desjejum desses.
A declaração saiu tão naturalmente que não tive tempo de
pensar sobre ela. Mas, quer saber? Eu não tinha mais paciência
para jogos, não tinha por que ficar fingindo que não estava
envolvida por sentimentos mais fortes do que nossa atração
incendiária.
— E você está? — Adam pareceu temer fazer a pergunta ou
obter a resposta, e eu não sabia se isso era bom ou ruim.
De qualquer forma, eu disse, e se ele queria que eu usasse
todas as palavras para que não ficasse nenhuma dúvida, não havia
problema algum.
— Apaixonada por você? — Encarei-o séria. — Estou. —
Pronto, feito, dito! Escolhi alguma coisa da mesa a esmo e tencionei
comer e finalizar o assunto. Entretanto, Adam pareceu tão atônito
que não me restou outra solução a não ser voltar à conversa. — É
difícil mandar no coração, lembra? Você disse isso ontem.
Sei que foi péssimo ficar usando suas palavras contra ele,
mas era isso. Se eu tivesse pensado racionalmente, não teria
acontecido, mas o coração não é racional, ele apenas sente. O meu
estava havia muito tempo sem sentir, fixado em algo que poderia ter
acontecido e não aconteceu. Adam chegou em um momento em
que eu não esperava mais nada, muito menos amar alguém, por
isso mesmo esse sentimento era tão caro para guardá-lo só para
mim, ainda que ele não sentisse o mesmo.
Adam continuou quieto, e completei:
— Não se preocupe com o modo como me sinto, não vou
cobrar e...
— Para! — Sua voz enérgica fez com que eu engolisse o
restante das palavras e o olhasse um tanto assustada. Para piorar a
situação, ele se agachou ao meu lado e tocou minha mão.
Não, o discurso de compensação, não!, implorei
mentalmente, já imaginando aquela célebre frase: você é
maravilhosa, Mel, qualquer homem seria um sortudo a seu lado,
mas eu...
— Minha... — ele começou a falar, e percebi que estava com
dificuldade, respirou fundo e continuou — preocupação era você
não sentir o mesmo por mim. — O quê?! Quase balancei a cabeça,
achando que tinha ouvido errado. — Passei praticamente um ano
procurando por você, vim ao Brasil para te reencontrar, retornei
porque não conseguia mais ficar longe, e você acha que não estou
apaixonado? Estou muito, muito apaixonado por você, Melissa
Boldani!
Foi assim que desabei, completamente em choque,
impactada por, pela primeira vez na minha vida, amar alguém e ser
correspondida. Eu juro que achei que isso nunca iria acontecer
comigo!
— Melissa? — Adam volta a me chamar, trazendo minha
mente de volta, e tudo o que consigo fazer é abraçá-lo com força. —
Eu entendi que... Oh, God! Disse algo de errado?
— Não. — Soluço com a cabeça apoiada em seu ombro.
— Por que está chorando? — Sua voz demonstra alívio e até
um pouco de diversão.
— Choro quando estou feliz. — Olho-o, e ele enxuga meu
rosto, sorrindo daquele jeito que me chamou a atenção desde nosso
primeiro encontro. — E eu estou muito, muito feliz!
Adam encosta a testa na minha.
— Eu também! Esperei por isso, por você, sem nem mesmo
saber que queria tanto a encontrar!
Soluço ainda mais depois de ouvi-lo dizer isso.
— Eu queria, mas já não esperava, achei que não ia
acontecer, que não era para mim. — Ele balança a cabeça
negativamente. — Até você chegar, eu achava que minha sina era
ser só.
Sinto quando ele entrelaça seus dedos nos meus e olho
nossas mãos juntas. Há tanto a dizer, mas as palavras parecem
desnecessárias.
— O escritório vai sobreviver mais um dia sem você? —
pergunta-me de repente, e eu sorrio. — Não tenho como deixar
você ir.
— Nem se viessem me buscar em casa, eu iria!
Mal termino de falar, e ele me levanta no colo e me leva de
volta para o quarto.
Os fones de ouvido estão altos, e eu, concentrada em
terminar a última parte do projeto que estou desenhando para o
concurso. Meu pai não se cansa de colocar prêmios no currículo do
escritório e, sempre que vê alguma possibilidade de ter mais, fica
todo assanhado para concorrermos.
A maioria é dele mesmo, de seus projetos únicos, suas linhas
inconfundíveis, porém, há alguns anos deixou de desenhar à mão,
e, toda vez que isso é exigido em algum edital, sou eu quem
assume a frente. E eu gosto! Desenhar é algo que me dá muito
prazer.
Prazer! Suspiro e me lembro dos dias mágicos e prazerosos
que tenho passado com Adam. Ainda custo a acreditar que estou
vivendo essa fase tão gostosa e que acompanhei tantas vezes
acontecer com amigas e parentes. A felicidade junto a quem se
ama! Confesso a vocês que tem sido melhor do que eu havia
sonhado.
Meu apartamento se encheu de risadas, gemidos, conversas
e provocações. Adoro chegar em casa e encontrá-lo à mesa de
jantar – que ele denominou de seu home-office – com uma caneca
de café quentinha me esperando e com Tiger deitado aos seus pés.
Descobri que Adam realmente cozinha, e, como eu também
gosto de testar receitas, separamos a sexta-feira para fazer nossa
culinária a dois.
— Já pensou em fazer um curso? — indaguei quando comi o
ragu de carne com polenta digno de um chef. — O Frank tem um
amigo que comanda uma das cozinhas do hotel lá de Curitiba e que
vai ter um restaurante enorme em cima do Villazza SP, que estamos
projetando. O nome dele é Vincenzo Giacontti.
— Italiano?
— Não. — Ri. — Os avós dele e o pai eram, se não me
engano, mas Vince nasceu no Brasil, assim como eu. Só que,
quando decidiu ser chef de cozinha, foi morar com uns parentes na
Toscana. Estudou e aprendeu lá, trabalhando numa trattoria de
família. — Comi mais uma garfada de sua receita. — Ele é bom,
mas seu ragu ganha do dele.
Adam gargalhou e me beijou, agradecendo ao elogio.
Além de bom cozinheiro, ele é ótimo em dar dicas de filmes e
séries. Às vezes eu perdia tempo lendo sinopses e escolhendo algo
para ver, mas agora conto com um catálogo humano que entende
tudo sobre cinema e TV.
— Quando você teve tempo para acompanhar essas coisas?
— inquiri curiosa.
— Eu viajo muito, Melissa, e não sou de sair, então passava
os dias de “folga” assistindo a filmes ou lendo. — Deu de ombros,
mas notei uma certa melancolia em sua voz.
— Parece uma vida solitária.
Ele sorriu.
— Era! — Abraçou-me. — Acredito que não será mais.
Claro que o filme daquele dia foi esquecido, e tivemos que
assistir a ele no dia seguinte.
Além de todas essas qualidades, tenho amado a dedicação
dele em aprender a lidar com o Tiger. Adam nunca teve um bicho de
estimação, mas pegou jeito bem rápido com meu doguinho. Ele
acorda bem mais cedo que eu e sai para caminhar com o Ti.
Quando vai para o escritório, leva o bichinho para a creche e, se sai
antes de mim, o busca para que esteja em casa quando eu chegar.
Ainda acho que rola um contrabando de comida, mas, por
causa das caminhadas diárias, tenho sentido Tiger mais disposto e
mais brincalhão, embora ainda adore um chamego.
— Isto tem que parar! — Tânia entra rindo na sala,
segurando mais um vaso cheio de rosas. — Esse homem vai
extinguir todas as rosas da cidade!
Levanto-me animada e vou até ela para pegar meu presente
semanal – sim, ele ainda me manda um buquê toda semana! – e o
coloco no único canto livre sobre o aparador da sala.
— Acho que vou levar este para casa — comento. — O que
levei semana retrasada já está murchando.
— O melhor de tudo é seu pai tentando investigar de onde as
rosas estão vindo. — Encaro-a surpresa, pois não esperava isso. —
Ele até tenta disfarçar, mas comenta algo sobre as flores aqui e ali,
fazendo-se de bobo para que eu caia na armadilha e lhe conte
quem é o romântico.
Gargalho.
— Ele está fazendo isso, é? — Tânia assente rindo. —
Imagina quando souber quem é!
— Nem eu sei! — Ela fica séria. — Esse homem não é
casado, né, Mel? Porque isso é roubada, amiga...
— Não! — Rio.
— Ah, sei lá, você o está escondendo de todos.
Franzo a testa.
— Não estou escondendo-o de ninguém, só não tive
oportunidade... — Paro e penso em todas as semanas –
praticamente um mês – em que estamos juntos de verdade e tão
envolvidos e apaixonados que não saímos para lugar algum. —
Bom, acho que a oportunidade vai se apresentar, mas não estou
escondendo-o.
— Eu o conheço?
Sorrio vaidosa.
— Conheceu aqui na Boldani. — Tânia arregala os olhos. —
Ele é gringo, bonito, charmoso...
— Mel! — Ela bate palmas. — O Stone? — Pisco e assinto.
Abro a boca para dizer que ele está no Brasil, mas ela me abraça,
pulando feito uma doida. — Amiga, já conheceu o irmão dele? —
Abana-se. — Se tiver oportunidade, me apresenta!
— Qual deles? Adam tem três irmãos!
— O político, que é candidato ao Senado. Que homão da
porra, Mel!
Adam comentou comigo sobre seu irmão que está
concorrendo a uma vaga no congresso e, pelo que me lembro, ele é
o mais velho de todos. Vi fotos da família dele, mas não me fixei em
ninguém, apenas admirando-o e vendo o quanto destoava do resto,
embora tivesse o tamanho e os traços de seu pai.
— Seu pai está inteiro ainda — comentei ao ver a foto do
casamento dele, que aconteceu no final do ano passado.
— Ô, se está! — Riu. — Minha madrasta é brasileira também,
embora more há muitos anos nos Estados Unidos. Achei que ele
nunca mais fosse se casar depois da mãe dos gêmeos, mas Tereza
o conquistou de uma forma que eu nunca tinha visto acontecer. —
Ele cheirou meu pescoço. — Puxei ele nisso!
Uma batida à porta da minha sala me faz parar de lembrar-
me dos amassos que demos no sofá e de que acabamos por não
falar mais de sua família por causa disso, e Tânia para de pular feito
uma cabra.
— Posso? — Papai enfia a cabeça no vão da porta.
— Claro! — Faço sinal para que entre, e Tânia se despede,
deixando-nos a sós. — Veio ver o projeto? Já estou quase...
— Não, quero vê-lo terminado, tenho certeza de que estará
tão perfeito quanto os que você fez antes. — Beija meu rosto. —
Soube que não vai mais estender a semana do Carnaval como
havia planejado. Algum problema?
Sorrio.
— Não, só os planos que mudaram mesmo. — Dou de
ombros. — Ia viajar, mas não será mais preciso.
Ele resmunga algo que não consigo entender e anda até o
aparador com as rosas.
— Bom gosto ele tem! — comenta, e eu rio.
— Pai! — Abraço-o pelas costas. — O que você quer de
verdade vindo aqui?
— Acho meio ridículo eu me preocupar com você, afinal é
uma mulher crescida e muito inteligente, mas continuo sendo seu
pai...
— Eu estou bem. — Interrompo-o. — Estou feliz, de verdade.
Julio Boldani se vira para me encarar.
— Ele é um cara bacana?
Levanto a sobrancelha e decido provocá-lo.
— Quem lhe disse que é um “cara”?
Quase morro de rir ao vê-lo arregalar os olhos e,
rapidamente, tentar disfarçar pigarreando.
— Bem, o mundo está moderno, e eu sempre achei que toda
forma de amor é válida, desde que a pessoa esteja feliz...
Começo a rir e o abraço.
— Estou brincando, doutor Julio! — Beijo sua bochecha. —
Ele é bacana, sim.
Ele fica mudo por um tempo, olhando-me.
— Então por que ainda não o conheci?
Ah, aí está o motivo da visita!
— Gostaria de conhecê-lo? — Meu pai me olha como se eu
estivesse lhe perguntando o óbvio. — Está certo, vou falar com ele,
e depois marcamos algo, pode ser?
Seu sorriso demonstra que minha resposta o acalmou.
— Pode, mas não me enrole! Agora, mudando de assunto, a
vistoria do final da obra da TGS saiu hoje, e está tudo aprovado.
Sorrio, pensando que não mudamos o assunto tanto assim.
— Eu soube mais cedo e fiquei feliz. — Adam me ligou para
comunicar e para dizer também que o dia da inauguração estava
marcado. — Eles vão adiantar a inauguração para março.
— Como você soube disso? Ninguém me falou nada.
Ato falho!
— Tenho meus meios, doutor Julio! — Pisco, e ele balança a
cabeça, olhando para o meu pulso.
— Bela pulseira!
Cruzo os braços.
— Reconhece o design?
— Não, mas reconheço a cor dos diamantes. A aliança de
Hilda tem um desses e dos grandes. — Faz careta, fingindo estar
sentindo dor, e imagino que o preço tenha sido exorbitante. — É
bom ter contato com alguém da TGS, principalmente se quisermos
assinar os próximos projetos deles aqui no Brasil.
— Concordo. — Claro que não pelo mesmo motivo que ele.
— Pode deixar, que estou mantendo contato direitinho!
Ele ergue a sobrancelha desconfiado, mas não diz mais nada
e se despede, só que antes...
— Ah, Isabella, Frank e as crianças vêm para o nosso Baile
de Carnaval. Hilda e eu esperamos contar com sua presença
também. — Concordo. — Incluo um convite a mais no seu nome?
Ah, velha ave de rapina!, penso ao perceber que a enrolada
fui eu e que durante todo o momento ele tinha a armadilha pronta
para eu cair.
Estou suando dentro do carro, e isto não se deve ao calor
que está fazendo hoje, mas sim pelo que vai acontecer em alguns
minutos.
— Calma, Melissa...
Adam aperta minha coxa, e percebo que pensei em voz alta.
Sorrio e o olho tentando não transparecer todo o estresse pelo qual
estou passando. Não seja dramática, Melissa!, repreendo-me.
— Se quiser, voltamos para...
— Não! — Interrompo-o. — Quer dizer, você quer voltar?
Adam gargalha e aponta para si mesmo, mostrando seu traje.
— Foi um inferno vestir esta coisa!
Suspiro.
— Mas ficou lindo demais! — Relaxo um pouco e o beijo. —
Sexy como o Christian Bale.
Ele balança a cabeça, ainda um tanto inconformado por ter
ficado absolutamente gostoso na fantasia de Batman.
Adam recebeu o convite para irmos juntos ao baile de uma
forma muito boa, e me alegrou muito perceber que havia ficado
contente por, finalmente, conhecer “oficialmente” minha família e
amigos. Primeiro, contei a ele que o baile era uma iniciativa de meu
pai, não da Boldani, e que ocorreria em sua residência e expliquei o
que havia por trás da festa.
— É um evento beneficente que ele faz todo ano e arrecada
doações em alimentos para alguma comunidade carente —
expliquei. — Não podemos doar dinheiro, apenas cestas básicas.
Então tive que explicar o que eram as tais “cestas básicas”, já
que Adam não estava familiarizado com o termo. O fato é que meu
pai convida seus amigos e colegas empresários para um delicioso
baile de Carnaval, como também a contribuírem com alimentos.
Claro que eles não levam as doações para o baile, apenas um
recibo da quantidade comprada, e a empresa entrega à ONG local
que fará as distribuições.
Sempre fui ativa no baile e nas arrecadações, mas este ano
eu não iria participar por que pretendia passar a semana do feriado
de Carnaval nos Estados Unidos com Adam. Pelo menos era o
plano antes de ele vir para cá.
— Eu nunca vi o Carnaval brasileiro — Adam comentou
intrigado. — Já vi o Mardi Gras em New Orleans e soube que tem
semelhanças.
— É, na questão da fantasia e na festança, sim. O Mardi
Gras é famoso pelos festivais de jazz, e nós somos famosos pelo
samba, axé music, pagode, frevo, marchinhas... — Adam franziu a
testa, confuso. — Você vai adorar! Vamos aceitar o convite?
— Pensava em não ir?
Ai, Cristo!
— Sim, eu pensava em ir se estivesse aqui, em São Paulo,
como estou. Quero saber se você se sente à vontade para ir.
Novamente ele refletiu uma expressão confusa, como se não
conseguisse entender o que eu dizia.
— Por que não me sentiria? — De repente ele abriu a boca
em um grande “o”. — Por ser no jardim da casa de seu pai?
— É... — Ri. — Minha família, amigos e todos que me
conhecem estarão lá. O que estou querendo saber é se isso não
será precipitado...
Adam começou a rir.
— Melissa, eu me apaixonei por você na primeira noite. Tem
algo mais precipitado do que isso?
Não tive como não agarrar aquele homem e beijá-lo muito
depois de uma declaração dessa!
— Então posso confirmar nossa presença? — Ele concordou
com a cabeça. — Ótimo! Então precisamos correr para achar
fantasias e...
— Fantasias? Holly shit, me esqueci dessa parte!
Depois disso discutimos nossos trajes, e ele se negou a vestir
coisas óbvias como pirata – eu acho que ele ficaria lindo com um
tapa olho – ou mesmo Zorro, o herói mexicano mascarado. Todavia,
descobri que ele era fã de quadrinhos e tinha coleção de revistas da
Marvel e da DC.
— Que tal Superman? — Mostrei o traje na loja de fantasias.
— Eu poderia ir de Mulher-Maravilha.
Ele fez careta.
— Eles não são um casal! — Rolou os olhos, como se o que
eu havia dito fosse um absurdo.
— Okay! — Peguei então a fantasia do Homem-Morcego. —
Que tal esta? Tem Mulher-Gato aqui também!
— Hum... — Adam me abraçou no meio das araras da loja,
cheias de fantasias. — Gosto da ideia de ver você em couro...
E foi assim que eu, acostumada a me vestir de Colombina ou
personagens marcantes da história, estava vestida com uma
fantasia agarrada ao meu corpo, totalmente sexy, com maquiagem
pesada e lábios vermelhos.
Douglas, o motorista que presta serviços para o Adam,
aproxima o carro do portão da casa de meu pai e de dona Hilda, e
eu respiro fundo. Não é a primeira vez que apresento alguém para
meu pai, mas é diferente. Tudo relacionado ao Adam é diferente.
Ele pega minha mão e a aperta fortemente.
— Seu pai, eu conheço — começa a falar. — Mas tem sua
madrasta...
— Dona Hilda — relembro a ele o nome dela.
— Isso, dona Hilda. Sua irmã, Isabella, eu conheci na Spice.
— Concordo. — O marido dela...
— Frank.
Ele assente.
— Dos hotéis. Preciso saber mais?
— Há vários amigos presentes aqui hoje, mas posso
apresentá-lo de acordo com que formos nos encontrando com eles.
— Ok.
— Está nervoso?
Ele ri.
— Pela fantasia ridícula? Sim! — gargalho, sem conseguir
me conter. — Por estar aqui, não.
— Você está um charme de Batman!
Ele se aproxima mais de mim e sussurra no meu ouvido:
— Quero saber se vou foder a Catwoman no telhado. —
Arrepio-me toda ao ouvir, e ele se aproveita para esfregar os lábios
no meu pescoço.
— No telhado, não garanto...
Adam ri, mas logo recupera a compostura e pega sua
máscara de Homem-Morcego.
— Chegamos!
Douglas abre a porta para que ele desça, e, em seguida,
Adam me ajuda a descer também do veículo. O jardim da casa do
meu pai está um espetáculo, todo enfeitado ao estilo retrô, com
lanternas penduradas ao longo do caminho que leva até os fundos,
onde está ocorrendo o baile.
— Ainda bem que não choveu — comento para mim mesma
ao andar de mãos dadas com Adam, ouvindo o som da banda que
toca marchinhas.
A primeira pessoa que encontramos é a responsável pelo
evento deste ano, Kyra Karamanlis.
— Uau! — Ela pisca para mim quando passo ao seu lado. —
Boa noite, Mel!
— Boa noite, Kyra — cumprimento-a e apresento-lhe Adam.
— Sejam bem-vindos. — Entrega-me um papel. — Este é o
mapa da festa. — Aponta os desenhos. — Usamos todo o jardim,
como pode ver. A pista de dança está no meio, em cima da piscina,
mas há áreas decoradas e um pequeno labirinto no pomar. — Sorri
maliciosa e cochicha comigo: — Lugar que, temo eu, será o
preferido dos casais mais aventureiros.
Sua assistente, Helena, entrega-nos um pequeno saquinho
de veludo vermelho.
— Um mimo que o doutor Julio fez para os convidados —
explica e se despede para atender ao próximo casal que acaba de
chegar.
Abrimos a embalagem e encontramos uma pequena
miniatura de madeira.
— Ah, papai! — digo emocionada ao ver o belíssimo trabalho
que ele fez ao esculpir um arlequim. — É o passatempo preferido
dele, fazer essas esculturas.
Adam parece surpreso.
— Ele mesmo fez?
— Cada uma delas! — Olho a dele, percebendo detalhes
diferentes na roupa e na expressão do palhaço triste. — Papai é um
artista excepcional!
Seguimos para a festa, montada totalmente ao ar livre. A
decoração está magnífica! Há vitrais, espelhos, lanternas
pendurados por todo o jardim, além de muitas flores, tecidos
esvoaçantes e coloridos, poltronas e bancos.
Não há mesas para comer, apenas alguns aparadores com
quitutes, pois o coquetel está sendo servido por garçons vestidos de
uniforme, criando contraste com os convidados todos fantasiados.
Começo a rir ao ver papai e dona Hilda jogando confete para
cima a fim de promover uma pequena chuva colorida sobre a
cabeça de seus netos, Laura e Lucca.
— Mel! — O chamado de Isabella me faz olhar para trás e a
ver lindamente vestida de Mulher-Maravilha e sua clássica fantasia
de shortinho azul com estrelas e corpete sexy vermelho e dourado.
— Que bom que chegou!
Ela me abraça e, em seguida, olha para Adam.
— Batman, hein? — Ri. — É um prazer revê-lo!
— O prazer é meu! — Adam a cumprimenta no mesmo
instante em que Frank se junta a nós.
Adam e eu nos olhamos tentando não rir, pois ele está
vestido de Superman.
— Eles não são um casal! — Adam cochicha, e eu o
repreendo com uma careta.
— Frank, se lembra do Adam? — Isabella é quem faz as
apresentações.
Os dois se cumprimentam com um aperto de mão, mas,
antes que possam dizer qualquer coisa, Theo Karamanlis aparece,
vestido de Elvis Presley, e passa o braço ao redor do pescoço de
Frank.
— Quem diria que reuniríamos a Business School aqui em
São Paulo! — Frank e Adam o olham sem entender. — Vocês não
se conheceram em Harvard? Nem no Joey’s?
Meu coração dispara ao ouvir o nome do bar onde Frank me
deu o bolo mais homérico de toda minha lastimável paixão platônica
por ele.
— Você estudou em Boston também? — pergunto ao Adam.
— Eu estava entrando na Business School logo depois do
college, e o Adam estava se formando — Theo explica. — Ele era
seu veterano, e vocês não se conheceram?
Frank nega.
— Ouvi falar que havia um Stone nas turmas mais
avançadas, mas não me liguei muito nisso na época. — Ele ri com a
boca meio de lado. — Éramos de irmandades diferentes.
— Creio que sim — Adam concorda. — Theodoros e eu nos
conhecemos por causa de uma pesquisa que ele estava fazendo, e
eu acabei o ajudando, mas não encontrei nenhum Villazza no
Campus.
— Adam sempre foi muito sério, talvez só perdesse para o
Aaron. — O grego ri. — Por falar nisso, ouvi dizer que ele está
buscando vaga no Senado. Não me surpreendeu ele se candidatar,
apenas ter demorado tanto.
— Surpreendeu a todos nós — Adam responde, mas parece
ainda intrigado com a história sobre todos terem estudado em
Harvard na mesma época. — Por acaso você ia ao Joey’s com
Robert Malone?
Frank balança a cabeça.
— Com aquele figlio di puttana? Infelizmente, sim!
Arrumávamos muita confusão por lá. Na época, eu o achava
divertido, mas então a verdadeira natureza do homem se revelou. —
Adam de repente me olha com a testa franzida, e Frank bufa. —
Parece que minha sina era ser enganado por tipos como aquele.
Theo fala algo para o amigo, e sinto que o clima fica pesado.
— O que está havendo? — pergunto para Isabella, que,
como eu, acompanha a interação entre os três.
— Robert Malone foi preso antes de se formar, pois estuprou
uma colega. Foi o que Frank me disse. — Arregalo os olhos, e Isa
dá de ombros. — Malone, Baden, tudo corja da mesma laia.
Que merda!, penso, sem entender por que Adam trouxe esse
assunto, já que sabia que o tal “companheiro de farra” de Frank era
um canalha criminoso.
— O que é isso aqui? Confraria da Yve League[30]? — Millos
chega com sua previsível fantasia de motoqueiro fantasma e
cumprimenta Adam. — Pode este humilde egresso que preferiu a
universidade grega à famosa americana se juntar a vocês?
— Como vai, Millos? — Adam o saúda calorosamente. —
Agora só falta Alexios para a...
— Está ali. — O barbudo aponta. — O presidiário, perto do
Mario e do Luigi.
Começo a rir ao ver as fantasias de Alexios, Murilo – filho de
uma das maiores jornalistas do Brasil e amiga querida de meu pai –
e João Alberto – também filho de um amigo de meu pai e um
promissor médico.
— Presidiário? Esse rapaz brinca com coisa séria, viu? —
comento. — Bom, eu achei que teria de apresentar Adam a todos,
mas acho que ele conhece a maioria aqui presente.
— Ainda não tive o prazer de conhecê-lo, Mel. — Dona Hilda
se aproxima, linda, vestida de Cleópatra, ao lado de um Júlio Cézar
aparentemente surpreso. — Olá, sou Hilda Boldani, madrasta da
Mel e mãe da Isabella.
— É um prazer, senhora. — Adam olha de novo para
Isabella. — Vocês duas parecem irmãs.
— Ah... — Dona Hilda põe a mão sobre o peito, lisonjeada.
Isabella e eu rimos, pois, além de elas sempre ouvirem isso,
sua mãe adora, o que, certamente, já lhe causou boa impressão
sobre ele.
Homem esperto! Sinto vontade de beijá-lo por isso.
— Doutor Julio, como vai? — Os dois apertam as mãos. — É
uma bela festa!
— Obrigado. — Papai me encara. — Veio junto com Melissa
ou usou o convite que mandei para a TGS?
— Pai!
Escuto a risada de Theo, além de um xingamento de Frank
em italiano e noto, pelo canto dos olhos, todos atentos à conversa
de Julio e Adam.
— Não recebi o convite enviado para a TGS. — Adam dá de
ombros, parecendo se divertir com a situação. — Estou em home-
office, não tenho ido ao escritório.
Julio não parece gostar da resposta.
— Seu português melhorou muito desde nossa primeira
reunião — comenta, antes de dar a cartada final: — Presumo,
então, que Adam esteja usando o convite extra que lhe dei?
A pergunta é direcionada a mim, por isso Adam me olha
como que buscando orientação sobre o que responder.
— Deixa comigo! — falo baixinho para ele antes de pegar
firme sua mão e encarar meu pai. — Sim. Pai, este é Adam Stone,
meu namorado.
Pronto, foi dito! Mantenho meu queixo erguido, mesmo me
sentindo um tanto constrangida, porque, convenhamos, não tenho
mais idade para estar passando por esta situação de meu pai
pressionar a pessoa com quem saio.
Julio, então, sorri e dá um tapinha no ombro de Adam.
— Você tem bom gosto, rapaz! Divirtam-se!
— Passou pelo crivo de Julio Boldani... — Millos o provoca
assim que meu pai e dona Hilda saem de perto.
— Foi muito mais fácil do que na minha vez, não é, Bella? —
Frank debocha.
— Mais um enforcado! Daqui a pouco começam a fazer
pressão para que eu me case. — Theo faz careta.
Arregalo os olhos com o que ele diz e olho para Adam, mas
ele só sorri, balançando a cabeça.
— Antes você do que eu! — Millos comenta para o primo,
fazendo Frank gargalhar.
— Eu acho graça, porque não tem jeito. — Abraça Isabella.
— Quando a mulher certa aparecer, vou assistir de camarote a um
por um cair.
— Frank! — Isabella o repreende, mas ri.
— O quê, amore mio?
— Não os assuste antes do tempo! — Ela o arrasta para
longe do grupo. — Vamos ver as crianças. — Pisca para mim. —
Bem-vindo à família, Adam!
Fico vermelha e nem noto quando todos se dispersam.
— Tudo bem?
Encaro Adam e respiro fundo.
— Estou ótima!
Ele me abraça.
— Então me mostre por que o Carnaval é tão famoso! Vamos
nos divertir!
Assinto e o levo para a pista de dança me sentindo a mulher
mais sortuda deste mundo!

Já são altas horas da madrugada, estou exausta de tanto


dançar, por isso me sento em uma das poltronas enquanto assisto a
Adam se divertir com meus sobrinhos. Novamente me dá uma
sensação boa vê-lo interagir com crianças, pois noto que a
impressão que tive no haras do Nick não foi errada.
Adam tem muito jeito com os pequenos! Ele ouviu
calmamente cada coisa que Laura, inteligente e falante, lhe contou
sobre ela mesma, depois conversou animado com Lucca sobre
desenhos e carros. Brincou, dançou e até cuidou, fazendo com que
bebessem água de tempos em tempos.
— Seus sobrinhos são incríveis! — comentou comigo. —
Laura é muito inteligente, e Lucca é sensível.
— Sim, ela é o alfa dos dois. — Ri orgulhosa. — Mas se
adoram.
— Percebi. Tenho irmãos gêmeos, e a ligação deles é forte.
Brigam muito, mas não se largam.
Adam conversou com muitos convidados, interagiu com
minha família como se já fizesse parte dela havia anos e parecia
muito feliz. Na verdade, a impressão que eu tinha era que ele estava
à vontade, sendo ele mesmo, brincando, cantando as músicas –
errado, mas se divertindo com isso –, relaxado.
Em um momento da noite, fomos até o tal labirinto, mas ele
estava tão cheio – principalmente de adolescentes e jovens – que
desistimos de qualquer coisa por lá.
— Mesmo porque as fantasias não facilitam nada... —
comentei com ele, um pouco frustrada.
— Oportunidade perdida de te comer no jardim do seu pai.
Arregalei os olhos.
— Adam!
Ele só gargalhou.
Foi uma noite mágica, com certeza, e nem mesmo o
constrangimento que ainda sinto perto de Frank foi capaz de ofuscá-
la.
— Ei, tudo bem?
Adam se junta a mim na poltrona, e encosto a cabeça no
ombro dele.
— Só descansando um pouco. Estas botas estão matando
meus pés!
Ele pega minha mão.
— Quando chegarmos em casa, faço massagem. — Gemo
só em pensar nas mãos dele no meu corpo. — Melissa...
O jeito que ele diz meu nome me faz erguer a cabeça para
olhá-lo.
— Aconteceu algo entre você e Frank?
Fico um tempo parada, acho que nem respiro, chocada com
a forma direta com que ele me perguntou sobre esse assunto.
— Por quê?
Ele ri e dá de ombros.
— Notei uma distância entre vocês. Na boate, naquela noite,
percebi que abraçou a todos, menos a ele, mas, como estava
nervoso, achei que era o motivo. Hoje vi que dançou com todos e o
deixou de lado de novo.
Ah, merda!, penso, dividida entre dizer que está tudo bem ou
contar a ele a verdade.
— Houve uma situação... — opto pela verdade, mas de forma
resumida. — Eu tinha uma queda pelo Frank desde a adolescência,
mas, quando resolvi ver o que poderia acontecer, ele já havia
conhecido Isabella. — Adam assente. — Na época, eu não sabia do
envolvimento deles e nem que ela era minha irmã. — Rio sem jeito.
— Então teve um mal-entendido, e eles quase terminaram por
causa isso.
Adam fica um tempo mudo, e sinto meu coração disparar.
— Eles são muito apaixonados. — Concordo. — Você já... —
Bufa. — Não sei qual palavra usar...
— Esqueci? — Ele balança a cabeça afirmativamente. — Já,
Adam. Não tenho dúvidas disso, ainda mais depois que conheci
você.
Ele sorri.
— Eu lembrei dele da época de Harvard. — Adam não me
olha. — Não o vi na universidade, mas no Joey’s uma vez.
— Com o tal Malone?
— Sim. — Encara-me. — Só me lembrei porque aconteceu
algo naquela noite...
— O estupro? — pergunto assustada.
— Não. O estupro foi meses depois, eu já estava formado.
Auxiliei na acusação.
— Como assim?
— Aaron trabalhava na promotoria na época. Ele se formou
em Direito em Harvard e, no começo, pensava seguir carreira, por
isso aproveitou a chance de trabalhar em Boston.
— Você foi testemunha do estupro?
Adam respira fundo.
— Não, mas colaborei para fundamentar o caráter do
acusado por tê-lo visto tentar agarrar uma mulher. — Fecha os
olhos. — Foi no Joey’s.
Meu coração dispara.
— Frank estava junto?
— Não, ele havia saído pouco antes. — Franzo a testa, sem
entender. — A mulher que ele tentou agarrar estava procurando
Frank Villazza. — Arregalo os olhos e sinto minha garganta dar um
nó. — Eu a vi no bar, perguntando por ele e, em seguida, sair.
Estava barulhento e não havia ninguém que eu conhecia lá naquela
noite, por isso decidi ir embora também. Quando cheguei à calçada,
a moça estava se debatendo para se soltar de Malone.
Começo a tremer, e ele pega mais firme nas minhas mãos.
— Foi você?
Os olhos de Adam estão cheios de lágrimas.
— Fui eu, Melissa. — Suspira. — E você não sabe o quanto
estou feliz por ter decidido ir embora naquela hora!
Ele me abraça apertado, e liberto as lágrimas que estava
contendo, lembrando-me do susto daquela noite e do alívio que
senti quando tiraram aquele homem de perto de mim. Passei anos
com medo de sair à noite, até que, depois de uma conversa com um
terapeuta, ele me aconselhou a enfrentar meus medos e não ser
refém deles.
— Vamos para casa? — Adam faz a pergunta, levanta-se e
me pega no colo.
No caminho, escuto-o dizer a algumas pessoas que estou
cansada e com dor nos pés ao se despedir, mas não tiro minha
cabeça de seu peito coberto pelo tecido preto da roupa do Batman,
sentindo-me segura como se ele fosse realmente o herói dos
desenhos.
Não era minha intenção fazer Melissa revisitar aquela noite,
muito menos terminar o baile de Carnaval, que foi tão alegre, com
ela em meus braços chorando. Acontece que estou tão chocado que
não consegui guardar para mim, eu precisava ter certeza!
Demorei a me lembrar de onde conhecia o nome de Frank
Villazza na primeira vez que fomos apresentados na tal Spice.
Então, como o sobrenome dele é famoso no ramo de hotéis,
presumi que fosse por isso que me parecia familiar. Somente
quando Theo disse que ele também havia estudado em Harvard é
que me lembrei de Robert Malone e do italiano que sempre
agitavam as coisas no Joey’s.
Assim que fiz essa ligação entre Frank e Boston,
imediatamente me lembrei da mulher linda que esteve procurando-o
no bar e que quase foi vítima de Malone. Já faz muitos anos que a
vi, a lembrança é vaga, mas ainda recordo que os cabelos de Mel
não eram tão claros quanto estão agora, e ela usava um pesado
sobretudo que não tirou nem quando entrou no bar.
Eu estava irritado, pois sempre ia ao bar para relaxar um
pouco, beber, conversar com o Joey – o barman e proprietário – e
comer alguma coisa. Naquela noite, a turma do Malone estava lá,
inclusive o Frank, e estavam fazendo a maior bagunça.
Já tinha recusado outra garrafa de cerveja quando uma
mulher se postou ao meu lado, sorrindo e perguntando por Frank –
que tinha saído havia pouco tempo com outra –, e fiquei parado,
apenas olhando para ela.
Notei a decepção no seu rosto assim que leu o bilhete, vi que
queria falar algo, como se estivesse engasgada, temi que estivesse
prestes a chorar. Ofereci-lhe ajuda, mas ela nem me olhou, negou e
saiu correndo do bar.
— Outra, Adam?! — Joey gritou para que eu o ouvisse.
— Não, outro dia eu volto. — Apontei para os beberrões no
fundo. — Quando tiver menos barulho.
O barman olhou insatisfeito para o grupo e pegou o dinheiro
da cerveja que eu havia bebido, despedindo-se de mim.
Saí do bar e estava colocando meu casaco quando vi Malone
segurando a mulher à força, falando obscenidades em seu ouvido,
quando claramente ela se debatia para se soltar.
Não pensei muito, apenas puxei-o para longe dela e o joguei
contra a parede do pub. O Adam encrenqueiro adolescente havia
voltado com tudo, e coloquei em meus punhos toda a frustração que
estava sentindo naquela noite, motivo pelo qual havia saído para
beber.
O barulho da briga chamou rapidamente a atenção das
pessoas, que se amontoaram em volta de nós, tentando apartar ou
incentivando a violência. Joey me segurou, enquanto uns amigos de
Malone fizeram o mesmo com ele.
— Seu covarde, aprenda a respeitar uma mulher! — gritei
enfurecido.
Joey me levou para dentro, pois já havia expulsado todo
mundo, e eu lhe contei o que acontecera. Foi por isso que, meses
depois, quando uma moça acusou Malone de estupro, contei ao
meu irmão o incidente no pub e testemunhei, junto a outras
pessoas, sobre o mau caráter dele.
— Acha que Frank ficou sabendo o que o amigo dele tentou
fazer? — Melissa me pergunta de repente, já sentada no banco de
trás do carro, onde a coloquei assim que entrei.
— Creio que não — tranquilizo-a. — Pelo que soube na
época, muitos dos seus colegas de fraternidade ficaram chocados
com o que ele fez.
Melissa sacode a cabeça, e eu a abraço.
— Nem cheguei a vê-lo, foi um susto e, graças a Deus, muito
rápido. Mas aquela noite me fez temer ser mulher e, se eu não
tivesse buscado alguma ajuda para superar, talvez não teria
conseguido mais sair à noite e usufruir da liberdade que é minha
independentemente do meu gênero.
— Eu sei, fiquei louco quando o vi agarrando você. — Beijo
sua testa. — Para você saber, ele foi condenado e passou bons
anos na cadeia.
Ela dá um suspiro meio trêmulo.
— Tomara que tenha repensado suas atitudes. A maioria sai
para continuar cometendo seus crimes.
— Desculpe-me por ter trazido essa história de volta...
Melissa sorri consoladora.
— Fiquei abalada quando me disse, mas muito comovida
com sua atitude de defender alguém que nem conhecia. Obrigada!
Respiro fundo e a aperto junto ao peito, imaginando o que eu
teria feito ao Malone se Melissa já representasse para mim, naquela
época, o que representa hoje.
— Te quiero[31], Melissa Boldani. — A declaração sai na
minha língua materna, a primeira que aprendi a falar. Ela, então,
encara-me na quase escuridão do carro, e continuo a lhe dizer como
me sinto: — I mad about you![32]
Melissa sorri.
— No meu idioma, Adam!
Respiro bem mais fundo e declaro:
— Amo você!
— Eu te amo muito!
A declaração de amor impacta meu coração de uma forma
tão forte que sinto-me estremecer. Nunca senti nada parecido e não
pensei que pudesse ser assim, que poderia sentir tanto amor
transbordando entre nós.
Beijo-a sem me importar com Douglas ao volante, mas
contenho minha vontade de puxá-la para meu colo e começar a
adorá-la do jeito que gosto, da maneira com que meu corpo clama.
Dou graças a Deus quando sinto o carro parar e não espero que o
motorista abra a porta, carregando Melissa para a entrada do
prédio.
Ela ri ao cumprimentar o porteiro e desejar-lhe um bom
Carnaval.
— Não vai me colocar no chão? — pergunta, esfregando o
rosto no meu pescoço como uma gata.
— Não até chegarmos ao quarto. — Aperto o número
correspondente ao andar do apartamento e aguardo as portas se
fecharem.
— Hum... Posso fazer maldades com você, já que está com
as mãos ocupadas me segurando. — Melissa lambe minha orelha.
— Miau!
Arrepio-me dos pés à cabeça e a olho sério, imaginando
como irei retribuir toda essa provocação. Não penso muito quando o
elevador se abre, apenas saio e a levo correndo para a porta.
— Pegue a chave — peço, e Melissa a tira do esconderijo
para abrir o apartamento. — Rápido!
Ela ri com meu ímpeto e abre a fechadura com mãos
trêmulas de desejo – ou talvez seja também porque bebemos um
pouco esta noite –, e levo-a o mais rápido que minhas pernas
conseguem até seu quarto, ouvindo o barulho da porta de entrada
batendo e se trancando atrás de nós.
Coloco-a no chão e tomo seus lábios sem dizer uma só
palavra. Prendo o inferior entre meus dentes. Minhas mãos
exploram seu corpo, apertando sua carne contida pelo tecido justo
que imita couro.
— Preciso nos livrar das fantasias — Melissa geme, olhos
fechados, completamente entregue a mim.
Não penso muito, viro-a de costas e procuro o fecho que a
ajudei a subir quando colocou o macacão de Mulher-Gato. Abro-o
de uma só vez, sinto-me impaciente e lambo suas costas nuas de
pele perolada e pontilhada de sinais claros e de variados tamanhos.
— Adoro suas pintas — digo ao seu ouvido, lembrando-me
do nome que ela me ensinou sobre as manchinhas nas suas costas.
— Adoro tudo em você, Melissa.
Ela suspira, e eu a ajudo a se livrar de todo o macacão,
deixando-a apenas com a minúscula calcinha que escolheu para
não marcar no traje. Respiro fundo a fim de me controlar, porque
cada vez que a vejo nua tem o mesmo impacto da primeira vez.
Melissa se vira de frente para mim, e retenho o fôlego,
admirado com a perfeição de suas formas, que, por mais que ela me
diga que não são perfeitas, são exatamente do jeito que gosto.
— Sua vez, Homem-Morcego!
Sorrio e enrolo um dedo nos seus cabelos, agradecido pelo
fato de, esta noite, ela não ter feito nada com eles. Gosto dos fios
claros soltos, naturais, revelando suas leves ondulações. Disse que
achava sexy, e ela resolveu que usaria as orelhas de gato em uma
tiara – que deve ter se perdido em algum momento do baile – e não
como no traje original, cobrindo toda sua cabeça, para deixar seus
cabelos à mostra.
— Você é linda, Melissa!
Ela cora como sempre acontece quando recebe um elogio,
mas sorri. Beijo seu pescoço, arrasto meus lábios por seus ombros
e abocanho um mamilo saliente para chupá-lo até fazê-la gritar de
prazer.
Melissa me segura pelos cabelos, encosta mais seu corpo no
meu, sua pele quente avisando que está pronta para mim, assim
como estou pronto para ser dela.
— Vamos para o banho... — ela sugere entre gemidos.
Não titubeamos, arrancamos minha fantasia o mais rápido
possível e entramos juntos debaixo do jato morno do chuveiro. Eu a
ensaboo por inteiro, massageando seus ombros, sabendo que,
depois de horas de dança, calor e festa, ela deve estar louca por
isso.
Ela, em troca, encosta-se em mim, rebola sua bunda redonda
contra meu pau e coloca as mãos para trás, acariciando-o,
estimulando-o a ficar cada vez mais duro. Adoro esse contato, gemo
de satisfação a cada movimento das suas mãos, sentindo a espuma
do sabão fazendo-as deslizar mais fácil e mais rápido.
— Eu amo seu cheiro — declaro quando o aroma de seu
sabonete nos envolve, trazendo-me lembranças desse perfume em
sua pele mesmo na nossa primeira vez em Nova Iorque. — Essa
noite inteira, tudo o que quis era estar contigo.
Ela geme alto quando a encosto na parede do boxe e acaricio
sua boceta com minha mão. Melissa rebola contra meus dedos, e
posso sentir, mesmo debaixo d’água, seu sexo molhado, quente e
pronto para mim.
Não penso muito, penetro-a sem avisar, estremecendo ao
sentir minha carne ser envolvida pela sua, o latejar intenso de suas
paredes íntimas, que contraem meu pau e me fazem ver estrelas.
Estou em desespero, não consigo parar de me mover,
entrando e saindo com força, indo fundo, enquanto mordo suas
costas. Abraço-a por um momento e deslizo a mão entre suas
pernas para estimular seu clitóris, esfregando-o rapidamente, ao
ritmo das estocadas.
O ardor dela, seus gemidos, o modo como mexe seu corpo
para me receber mais fundo é contagiante e excitante, e logo sinto
meu corpo exigindo mais, querendo liberação. Então, quando
Melissa goza, sinto meu pau ser encharcado, o calor se eleva e
deliro junto a ela, chegando ao clímax, derramando-me
completamente, juntando meu gozo ao seu.
Ficamos abraçados, recuperando o fôlego, molhados,
saciados e cansados.
— Isso foi... incrível... embora rápido — comento e rio, sem
fôlego ainda.
Melissa só respira fundo. Sinto seu corpo ainda estremecer, e
isso me faz querer de novo.
— Você gozou dentro de mim...
Concordo rindo, deliciado, mas percebo uma certa
preocupação em sua voz.
— Eu estou limpo, Melissa. — Beijo seu ombro para acalmá-
la. — Fiz meus exames há pouco tempo e, se você quiser, posso
mostrá-los a você, pois estão no meu e-mail.
Melissa não responde, e eu me afasto, deixando-a pensar
enquanto me lavo.
— Adam, precisamos conversar.
Paro de me ensaboar, notando que algo realmente a está
preocupando. Lavo-me rápido e desligo o chuveiro.
— Tudo bem. — Beijo sua testa. — Vamos sair e conversar.
Saio do chuveiro e a deixo terminar seu banho. Coloco meu
roupão e vou para o quarto pegar meu telefone e procurar o e-mail
do laboratório onde fiz meus exames de saúde, inclusive de DST[33].
Melissa não demora muito a aparecer, também envolvida
com seu roupão, os cabelos molhados e a maquiagem borrada.
— Eu sempre quis ser mãe — fala de repente, e sinto meu
sangue gelar. — Mesmo sem ter ninguém, eu sonhava em ter um
filho, em ter uma família. — Não sei como agir. Tento não tremer,
não a imaginar grávida e, muito menos, parindo. — Há algum
tempo, eu decidi fazer uma fertilização, uma reprodução assistida
com um doador de esperma.
Meu coração dispara, e me viro para encará-la.
— Você fez? — O medo parece tomar conta de mim, e as
palavras saem esganadas.
— Não. — Suspira e senta-se na beirada da cama. — Fiz o
tratamento, aspirei os óvulos enquanto você estava nos Estados
Unidos.
— Por que nunca me disse nada? — Ele parece assustado.
— Conversamos durante todo o tempo em que estive longe e...
— Não me senti à vontade para falar. Nós não sabíamos se
iríamos continuar de onde paramos, havia a distância e... — Melissa
fecha os olhos e respira fundo antes de continuar: — E depois,
bem... — Sorri para mim. — Quando nos apaixonamos, tomei outra
decisão.
Meu Deus do Céu!
Não consigo parar de tremer, por isso deixo o celular de lado.
— Qual decisão?
Ela dá de ombros.
— Desisti de fazer, momentaneamente, a fertilização e
implantar o embrião, por isso congelei os óvulos.
— Por quê? — Essa é uma pergunta que eu não gostaria de
fazer, mas preciso.
— Porque te amo e quero ter uma família contigo e, se você
também quiser... — Engulo em seco. Minha cabeça dá voltas, e
preciso me sentar também. — E é por isso que estou um pouco
temerosa com o que acabou de acontecer. — Encaro-a sem
entender. — Entenda bem, Adam, não quero forçar uma situação,
mas fiz um tratamento hormonal, posso ainda estar amadurecendo
os óvulos que restaram imaturos na época da aspiração. Acho difícil
acontecer uma gravidez por conta da minha idade e dos anos em
que utilizei anticoncepcional, mas não é impossível.
— O que você está querendo me dizer, Melissa?
— Eu posso tomar uma pílula do dia seguinte, mas você
entende a contradição disso? — Ela ri. — Eu fiz tratamento para
engravidar de um desconhecido, e agora, quando tenho alguém que
amo, numa relação de verdade, vou tomar algo que me impedirá de
realizar o sonho de ser mãe?
Sonho de ser mãe! As palavras dela me assustam, e o medo
de perdê-la me apavora.
— Melissa... — começo, mas ela não me deixa terminar de
falar.
— Eu sei que é cedo e, sinceramente, não planejei nada
disso. Pode ser que nada aconteça, como eu disse, as chances são
mínimas, mas eu me sentiria melhor se não evitar e deixar isso nas
mãos do destino.
— Um filho... — formulo uma pergunta que é tão óbvia, que
temo já saber a resposta — é tão importante para você?
— Sim. — Os olhos dela estão marejados, e seu sorriso me
diz o quanto ter uma criança a faria feliz. — Sim, é tudo o que eu
mais quero, com você. Não consigo mais pensar em um doador
anônimo de um banco de esperma, só penso em você, em ter um
bebê lindo como você.
Ergo-me, afastando-me dela, sentindo uma dor tão grande
que quase não consigo me mover.
— Melissa, preciso de um tempo para pensar... — Não
consigo encará-la, ando pelo quarto como um animal ferido
procurando abrigo.
Soluço quando ela põe a mão no meu ombro.
— Me desculpe por ter forçado essa situação sobre você,
Adam. Entenderei se você quiser que eu tome a pílula e evite e juro
que não foi proposital e que não vou fazer nada que você não
queira...
Abraço-a apertado, temendo perder essa mulher tão
maravilhosa que entrou em minha vida.
— Tudo o que eu mais quero, Melissa, é te ver feliz — falo
baixinho. — Descobri que não há nada que eu queira mais neste
mundo, porque isso me faz ser feliz também. — Beijo sua testa. —
Só temo não conseguir fazê-la feliz como merece.
Melissa se afasta, testa franzida e me olha séria.
— Por quê?
Respiro fundo, pronto para contar a verdade a ela e perdê-la
de vez.
Em todas as minhas relações, sempre me preocupei em
manter a honestidade. Isso significa ir muito além de não ser infiel,
mas de manter a lealdade, deixando claros os sentimentos ou a falta
deles. Nunca disse “eu te amo” a nenhum homem até Adam e,
embora fosse apaixonada por Frank, percebo agora a diferença
entre uma fantasia e algo real.
Foi por isso que, assim que a adrenalina do sexo baixou, eu
quis contar a Adam sobre o tratamento e meu sonho de ser mãe.
Entendo que pode ser cedo demais para pensarmos em constituir
uma família, porque nem mesmo conversamos sobre como vai ser
nosso relacionamento quando ele precisar voltar à sua rotina normal
de passar meses em algum país distante ou mesmo nos Estados
Unidos.
Tenho uma vida e uma carreira no Brasil e dou muito valor a
tudo o que conquistei até aqui. Tive, sim, o empurrão extra de ser
filha do meu pai. Todavia, tenho plena consciência de que isso
apenas não bastou, que cheguei até onde cheguei por causa do
meu esforço e talento. Não dá simplesmente para mudar tudo e
começar do zero em outro país, pelo menos não por agora.
Adam e eu nos amamos, e acredito que vamos dar um jeito
de fazer dar certo. Só não contávamos com uma possível gravidez
no caminho, e, ainda que ela não venha a acontecer, ele sabe agora
que eu sonho ser mãe e que não somos mais dois jovenzinhos que
podem postergar as coisas como se fossem os donos do tempo.
Foi por tudo isso que abri o jogo sobre deixar as coisas
seguirem seu curso. Não desejo tomar uma pílula do dia seguinte
para evitar uma possível gravidez. Isso me deixaria triste e iria
contra tudo aquilo que sempre quis. No entanto, também sei que
não posso impor a ele a minha vontade e, pelo curso que vai a
conversa, percebo que Adam não quer o mesmo que eu.
— Me desculpe por ter forçado essa situação sobre você,
Adam. — Decido entregar os pontos. — Entenderei se você quiser
que eu tome a pílula e evite e juro que não foi proposital e que não
vou fazer nada que você não queira...
Adam me abraça apertado, e o sinto tremer.
— Tudo o que eu mais quero, Melissa, é te ver feliz — fala
baixinho, e meu coração dispara ao notar que existe um “mas”
depois do que ele disse. — Descobri que não há nada que eu queira
mais neste mundo, porque isso me faz ser feliz também. — Beija
minha testa, e vejo seu olhar triste. — Só temo não conseguir fazê-
la feliz como merece.
Está aí o “mas”! Afasto-me dele, querendo entender.
— Por quê?
Minha pergunta é feita de maneira temerosa, com inúmeras
possibilidades passando pela minha cabeça.
Adam respira fundo e passa a mão pelos cabelos.
— Porque não posso te dar o que me pede. — Franzo a
testa, ainda sem entender. — Não posso engravidar você, Melissa.
Abro a boca a fim de questionar o motivo, mas, pelo rosto
dele, já sei a resposta. Meu coração se quebra ao perceber que
Adam está me dizendo que não pode ter um filho, que é infértil.
Penso em todos os anos em que ele e a ex-mulher foram casados e
entendo agora a falta de crianças.
— Você tem certeza de que...
— Tenho! — Ele me interrompe. — Não posso ser pai. —
Apenas assinto, ainda sentindo o choque de não poder ter um filho
com o homem que amo. — Não preciso que tome uma pílula para
evitar a gravidez, porque ela naturalmente não vai acontecer. —
Soluço. — E é por isso que não acho justo interromper seus sonhos
e...
— Não diga isso! — Calo-o, levantando-me. — Eu ia fazer
uma FIV, Adam, meus óvulos estão lá prontos para isso. — Ele fica
pálido. — Podemos fazer isso juntos.
— Não sei o que te dizer.
Engulo em seco.
— Você não quer ter um filho?
— Nunca foi uma opção. — Aquiesço, entendendo seu ponto
de vista. — Já pensei em adotar uma criança um dia, mas não via
isso acontecer no meu casamento.
Adotar!, penso cheia de esperanças.
— Eu também penso em adotar. — Adam arregala os olhos.
— É uma alternativa caso a FIV não dê certo, mas gostaria de tentar
engravidar primeiro.
Ele parece pensar, mas ainda vejo seu rosto transtornado e
seus músculos trêmulos.
— Não posso te pedir para não tentar engravidar, Melissa,
apenas não posso participar disso contigo.
Meu coração se quebra.
— Por que não?
Adam balança a cabeça e, para minha surpresa, vai até o
closet, deixando-me sozinha no quarto. Tento entendê-lo, colocar-
me em seu lugar, mas meu coração parece não querer aceitar que
ele não pense em estar ao meu lado se eu decidir fazer a
fertilização.
Será porque vamos usar o material genético de outro
homem?, conjecturo sobre essa possibilidade, levando em conta
também quem ele é. Não sei como a família Stone reagiria diante
desta situação e, talvez, isto seja importante para o Adam.
Quando ele volta, completamente vestido, um frio perpassa
minha barriga.
— Acho que precisamos pensar — ele começa a falar, e eu
concordo. — Eu gostaria de dizer que amo você o suficiente para
abrir mão de estarmos juntos pela sua felicidade. — Soluço. — Não
posso dar o que você quer e não acho justo que te impeça por
causa disso.
Não falo nada, pois não sei o que dizer. Sinto-me entre a
espada e a cruz, porque esta situação nunca me passou pela
cabeça. Não posso forçá-lo a aceitar me ver gerar o bebê de um
desconhecido, não sei como o afetaria emocionalmente. Nem todo
mundo está preparado para lidar com algo assim. Não posso
compará-lo a mim, pois já estava me preparando para fazer o
procedimento havia algum tempo. Contudo, também não sei se
posso deixar meu sonho de lado.
— Você está bem? — Adam me pergunta quando fico em
silêncio.
— Estou. — Suspiro. — Pensando sobre tudo isto.
Ele assente.
— Acho melhor eu dormir em um hotel esta noite. — Seguro
as lágrimas e engulo em seco, porque concordo que é o melhor.
Precisamos de espaço para pensar. — Vai ficar bem...
— Vou.
Então ele se aproxima de mim, segura meu rosto e beija
minha testa.
— Tente dormir...
Assinto e me despeço dele, consciente de que não pregarei o
olho a noite toda.

A campainha toca sem parar, e eu, que apenas cochilei por


alguns momentos, levanto-me da cama para ver quem está à porta.
Estranho o porteiro não ter anunciado pelo interfone, o que significa
que é uma pessoa conhecida, o que me faz pensar que Adam está
de volta.
Sem fazer barulho, olho pelo olho mágico da porta e suspiro,
quase chorando, ao ver minha irmã. Encosto-me na madeira, sem
saber se abro a porta ou não.
— Mel?! Está tudo bem?! — Isabella grita no corredor. —
Mel?! Eu liguei várias vezes e... — Abro a porta, e, assim que ela
me vê, abraça-me apertado. — O que houve?
Não consigo falar, apenas a deixo me apertar em seus braços
como se pudesse me manter inteira. Passei a noite toda a pensar,
ora achando que exageramos na conversa, que era muito cedo para
tomar qualquer tipo de decisão sobre o futuro; ora pensando que
fizemos o certo, que não temos tempo a perder, precisamos entrar
em um relacionamento com todas as expectativas às claras.
Minha cabeça está uma bagunça, porque não tenho como
avaliar o peso de cada uma das decisões que preciso tomar.
— Mel, por favor, estou ficando preocupada... — Isa se afasta
para me olhar. — O que houve? — Olha em volta. — Cadê o Adam?
— Está em um hotel — consigo responder e a deixo entrar no
apartamento.
Isabella corre até a cozinha e, como se estivesse
acostumada a lidar com tudo aqui em casa, coloca uma chaleira no
fogo.
— Você tem chá? — pergunta, abrindo os armários. — Achei!
— Sorri. — Vamos conversar e tomar um chá.
— Isa, não quero...
— No momento, é o que eu posso fazer por você, Mel, e
Deus sabe que faço todo o possível para te ver feliz. — Ela pega
minha mão. — Você merece!
Nego.
— Sou uma péssima irmã...
Isabella ri.
— Você é a melhor que eu poderia ter tido, já disse!
A consciência pesa, e sinto um aperto no peito ao pensar em
quanto tempo a evitei para ficar longe do Frank e da felicidade dos
dois. Não por eu não querer que eles fossem tão felizes quanto
eram, mas porque a alegria deles, de certa forma, me doía.
— Eu poderia ter sido mais. Poderia ter estado mais
presente.
Isabella aperta minha mão.
— Mel, eu entendo a distância que você impôs a si mesma,
mas nunca te senti longe, pelo contrário! Nos falamos muito e nos
vemos quando podemos. As crianças te adoram, e, se você não
tivesse sido presente, elas nem te reconheceriam. — Seco meu
rosto. — Eu sei que começamos nossa relação de uma forma
conturbada, e tudo o que eu não queria era machucar você.
Soluço e a abraço.
— Você nunca me machucou, pelo contrário, eu quase
afastei você de...
— Bobagem! Você nos uniu de novo, Mel. E não só isso. —
Isabella me olha sorrindo. — Você me amou desde quando soube
de mim e acolheu minha mãe como se fosse sua.
— Eu amo você, Isa!
— Eu sei, Mel, e te amo também! — Ela respira fundo. — Por
isso, quero que você me conte o que aconteceu para que possamos
pensar juntas em como resolver.
Balanço a cabeça, admirada com o feeling de minha irmã.
Não é à toa que Isabella é uma grande advogada; ela consegue ver
os problemas de longe e já pensando em soluções.
— Eu contei ao Adam sobre a fertilização.
Isabella, que estava andando até o fogão para pegar a água
fervente para o chá, para e me olha assustada.
— Ele reagiu mal?
Dou de ombros.
— Eu disse que tinha congelado os óvulos e que preferia ter
um filho com o homem que amo a de um doador anônimo. —
Isabella fecha os olhos, imaginando que Adam não tenha aceitado.
— A questão é que ele não pode ter filhos, Isa.
Isabella demonstra perplexidade.
— Não pode ou não quer?
— Não pode. — Dou de ombros e me sento numa banqueta
da ilha. — Nós fizemos sexo sem proteção, e eu disse que não
queria tomar pílula do dia seguinte... — Suspiro. — Ele disse que
não havia possibilidade de eu estar grávida, porque não podia me
engravidar.
— Ah, Mel...
— Ele estava arrasado, eu também fiquei, e foi aí que falei
que ainda podíamos ter um filho juntos se eu fizesse a FIV.
— Ele não topou — Isabella conclui e pega a chaleira do
fogo.
Busco duas canecas no armário e coloco os saquinhos de
chá. Ficamos em silêncio enquanto ela despeja a água nos dois
recipientes.
— Ele explicou por que não? — Isabella é quem volta ao
assunto.
— Não, só disse que não poderia fazer isso comigo. —
Respiro fundo, segurando as lágrimas. — Disse que pensou em
adotar uma vez, mas que não ia me impedir de engravidar se eu
quisesse, só não poderia acompanhar.
Isabella franze a testa.
— Deve ser difícil... — Ela bebe o chá devagar. — Imagine-se
no lugar dele, Mel. Se você não pudesse engravidar, como se
sentiria se outra mulher tivesse um filho com ele? Acho que, ainda
que fosse em consenso, seria uma situação difícil, não?
Concordo com Isabella.
— Não sei se é só isso, acho que também envolve a questão
da herança dos Stones e...
— Não creio, Mel. Se fosse assim, ele também rejeitaria
adotar. — Novamente aquiesço. — Você o ama?
Choro, sem conseguir me conter.
— Como nunca achei que chegaria a amar alguém.
— Mel, sei que é uma pergunta complicada, mas gerar é tão
importante assim para você?
Encaro-a, refletindo a questão que ocupou minha mente a
noite inteira.
— Nem sei se consigo, Isa! — Rio. — Não pela idade, mas
por ter tido alguns problemas ao longo dos anos. Foi por isso a
decisão da FIV, seria uma oportunidade. — Suspiro. — Mas não, o
que eu quero é ter uma família, ter alguém para amar, seja gerado
ou não por mim.
Isabella sorri.
— Acho, então, que você já tem sua resposta, não?
Assinto.
— Mas não sei se ele vai aceitar. Disse que me ama o
suficiente para abrir mão de mim para que eu seja feliz.
Ela me segura pelos ombros.
— Então você tem que mostrar que estar com ele é o que te
faz feliz.
— Ah, Isa! — Volto a chorar, mas, desta vez, sorrio. — Às
vezes penso que isto não é para mim, sabe? Ter o tipo de felicidade
que você tem com Frank e que Marina tem com o Tony ou mesmo
dona Hilda com meu pai.
— Todos nós tivemos percalços até conseguirmos essa
felicidade, Mel. É hora de vencer o seu!
Isabella tem razão! Nenhum desses casais que hoje são tão
felizes teve um caminho fácil, então não será no primeiro desafio
que eu irei desistir de tentar construir uma história com Adam.
— Preciso descobrir em que hotel ele está!
Isabella ri animada.
— Fácil, vamos ligar para o Frank, que ele conhece todo
mundo desse ramo aqui!
Isa pega o telefone, e eu me sinto a mulher mais sortuda do
mundo por ter uma irmã como ela.
Não sei quanto tempo levei do meu apartamento até o outro
lado da praça, ao apart-hotel que a TGS mantém alugado na cidade
e onde Adam e eu tivemos nosso primeiro encontro aqui, no Brasil.
Não me lembrei do lugar porque, ao retornar para São Paulo,
Adam ficou hospedado comigo e à procura de um local para
comprar, então somente quando Frank descobriu que Adam estava
no apart-hotel é que vi o óbvio, afinal, ele saiu no meio da
madrugada, certamente não iria procurar um hotel.
Decidi não vir de carro, pois teria que dar uma volta maior do
que se andasse em linha reta, e o trânsito não colaboraria para que
eu chegasse no tempo que minha urgência solicitava.
A cada passo, as palavras de Isabella, assim que terminei de
me arrumar para vir, martelavam minha cabeça: não perca esse
homem se o ama, Mel!
Eu amo Adam demais! A confirmação dos meus sentimentos
foi me dando a força necessária para, fosse qual argumento ele
apresentasse, eu não o deixasse ir sem lutar. Mesmo ainda não
sabendo como faremos para dar certo, morando em países
diferentes e distantes, quero tentar com todo afinco, porque acho
que vale a pena.
Confesso que, mesmo sabendo o que ele sente por mim,
ainda sinto um frio na barriga, e a lembrança da rejeição que já sofri
ao decidir lutar por Frank naquele momento, anos atrás, paira sobre
mim como uma sombra obscurecendo a minha certeza.
Ele não é Frank!, repito a todo momento. Adam ama você,
essa é a diferença entre antes e agora!
Saber a distinção entre o que sentia pelo italiano e o que
sinto agora é o que me faz ter mais coragem. Eu sonhava com um
Frank que nunca existiu, fantasiava coisas sobre ele que nunca
fizeram parte de quem é, e nada disso acontece com Adam.
Apaixonei-me por quem fui conhecendo pouco a pouco, ainda que
tivesse me encantado quando era um desconhecido mascarado.
Respiro fundo, abandonando meus pensamentos, ao chegar
à portaria do apart-hotel e andar até a recepção.
— Boa tarde, eu vim ver Adam Stone.
A moça bonita, uniformizada e com um sorriso desenhado
não disfarça o pequeno choque ao ouvir o nome de Adam.
— O senhor Stone pediu para não ser incomodado nem
mesmo com ligações — esclarece. — Ele está trabalhando. — Pega
um cartão. — Caso seja importante, ele pediu que entre em contato
com o escritório da TGS.
Respiro fundo.
— Não é sobre trabalho, é um assunto pessoal, e tenho
certeza de que o senhor Stone não se importaria se você lhe
avisasse que...
— Lamento muito, as ordens dele foram essas. — Dá de
ombros, desculpando-se.
Merda!
Pego o telefone e novamente tento falar com ele. Entretanto,
a ligação vai direto para a caixa de mensagens. Confiro o aplicativo,
e, como antes, ele não está on-line desde ontem.
O que fazer?!, penso, olhando para todos os lados, em
dúvida se devo montar acampamento no saguão ou se ligo para a
TGS, pois certamente eles têm um jeito de entrar em contato com
Adam.
E se eu oferecer algum dinheiro... Não! Odeio esse tipo de
comportamento. Olho novamente para o balcão da entrada e noto
que a moça que falou comigo não está mais em seu posto. Uma
ideia se forma, e, antes que eu considere todos os motivos para a
realizar, um casal se encaminha para o elevador, e vou atrás dele.
Aguardo atrás do homem e da mulher, que conversam entre
si e parecem não notar minha presença, e dou algumas olhadas
para conferir se a moça que falou comigo voltou. Respiro aliviada
quando a porta do elevador se abre, mas não entro imediatamente.
Espero que um dos dois ocupantes insira o cartão de acesso ao
quarto e entro como se estivesse apressada.
— Boa tarde — cumprimento-os com um sorriso,
conseguindo disfarçar meu nervosismo.
— Boa tarde. — A mulher retribui a saudação, enquanto o
homem apenas balança a cabeça. — Qual andar?
Tento recordar exatamente o número em que Adam estava
hospedado no ano passado, torcendo para que não tenha mudado.
— Oitavo, por favor.
O desconhecido aperta o botão correspondente, e
imediatamente as portas do elevador se fecham. Encosto-me ao
espelho do fundo, sinto minhas pernas tremerem e não quero
chamar a atenção para meu nervosismo. A adrenalina de ter
invadido o apart-hotel já me deixou, e o que faz meu corpo
chacoalhar agora é a expectativa da conversa com Adam.
Por sorte, o andar para onde o casal se dirige fica bem acima
daquele para o qual eu vou, por isso salto para fora do elevador
assim que ele abre no oitavo andar e caminho rapidamente rumo ao
número que me lembro.
Esteja aí!, suplico enquanto toco a campainha.
Torço as mãos, tentando me controlar, quando ninguém
atende e novamente aperto o botão ao lado da porta, ouvindo o som
ressoar dentro do apartamento. Nada!
Olho para a porta vizinha, disposta a procurar em cada um
dos apartamentos até encontrar Adam, porém, não dou dois passos
e escuto a porta ser destrancada e aberta.
— Melissa?
O alívio que sinto é tão grande que encaro Adam com um
baita sorriso.
— Ainda bem que não trocou de apartamento! — exclamo,
soltando o fôlego que estava retendo.
— O quê? — pergunta confuso.
Meu sorriso morre ao notar suas olheiras, assim como seus
cabelos despenteados e a roupa amassada. Adam está péssimo, e
isso aperta meu coração de um jeito que chega a me doer.
— Posso entrar? — Ele se afasta da porta para que eu
passe, e entro no apartamento, ainda lembrando-me da noite
maravilhosa que passamos nele. — Desculpe-me por aparecer
assim...
— Você pode aparecer quando quiser. — Interrompe-me. —
Está tudo bem?
Confirmo com a cabeça e sorrio, um tanto constrangida por
ter invadido o espaço dele desta forma.
— Pensei sobre o que conversamos. Quase não dormi noite
passada de tanto pensar.
— Eu também. — Adam se senta no sofá, parecendo
cansado. — Ainda não dormi; não consegui.
Engulo em seco.
— Acho que as coisas saíram um pouco do controle noite
passada...
— Não acho, Melissa. Foi bom falarmos sobre o que cada um
quer. — Concordo com ele. — Não quer se sentar?
— Não; se eu me sentar, talvez não consiga fazer o que vim
fazer aqui.
Ele franze o cenho.
— O que é isso?
— Lutar para não perder você.
Adam parece surpreso com o que eu disse.
— Não me perder? — Ri nervoso. — Estou aqui desesperado
com o medo de já ter te perdido!
Ajoelho-me no tapete entre as pernas dele e pego suas
mãos.
— Acho que demoramos muito para nos encontrar para
acabar assim, não?
— Sim, mas ainda temos a questão de ter um filho...
— Eu sei, mas vamos resolvê-la, acredito nisso.
— Melissa, eu não posso... — Adam soluça. — Não consigo
te dar a família que você sonha.
Aquiesço e acaricio seu rosto.
— Consegue, sim. — Sinto as lágrimas escorrerem por meu
rosto. — Temos outra forma de formarmos um lar. — Ele me encara
profundamente. — Quero ter uma família contigo, não importa se
seremos só nós dois ou se incluiremos mais alguém para amarmos,
de qualquer jeito. Juntos, já realizaremos meu sonho.
Vejo-o soluçar, e seus olhos se enchem de lágrimas.
— Tem certeza?
— Sim. Eu sempre quis adotar, mas achava que, sendo
sozinha, seria mais difícil conseguir. A preferência ainda são os
casais. — Ele aquiesce. — Podemos fazer isso em qualquer tempo,
desde que estejamos juntos.
Ele me abraça apertado, erguendo-me do chão e colocando-
me em seu colo.
— Eu amo você, Melissa, e tudo o que quero é poder estar
ao seu lado enquanto me quiser.
— Quero para sempre, pode ser?
Ele sorri pela primeira vez desde que cheguei.
— Não esperava menos do que isso!
Adam abaixa a cabeça e toma meus lábios com carinho,
esfregando-os nos seus em uma carícia leve. Fecho os olhos,
entregando-me ao delicioso torpor que toma conta de mim,
deixando meu corpo lânguido e à mercê do dele, que me deita no
sofá e prende meus braços para cima. Abro os olhos e suspiro alto
ao encontrar os dele, completamente transformados. Antes, as
belas íris castanhas estavam tristes, mas agora parecem pegar
fogo. Ele sorri antes de beijar meu pescoço, cheirando-o e
lambendo-o de modo a me deixar completamente arrepiada.
Sinto seu membro excitado entre minhas coxas, movo-me
contra ele, pressiono-o contra meu sexo, desejando ser preenchida
por toda sua carne; Adam, entretanto, parece ter outra ideia e
passeia sua boca pelo meu corpo, lambendo o decote do vestido
que uso enquanto o afasta com os dentes.
Tento me libertar para ajudá-lo a tirar o tecido de seu
caminho, mas sou impedida, pois Adam segura meus punhos com
apenas uma das mãos, usando a outra para baixar as alças da
minha roupa e desnudar toda a parte superior do meu corpo.
— Gosto quando não usa sutiã — comenta, abocanhando um
mamilo.
Não respondo, porque simplesmente não consigo,
deleitando-me com sua boca no meu seio, sugando meu mamilo
lentamente e excitando-o com a ponta da língua. Arqueio levemente
o corpo quando sinto sua mão grande cobrir todo o outro seio e
apertar o bico entre seus dedos.
Adam se ergue e, liberando, enfim, meus braços, pressiona
um seio contra o outro, juntando-os, e lambe os dois como se
fossem um só, arrastando sua língua molhada de um para o outro
sem perder o contato com minha pele.
Gemo alto e sinto meu interior úmido, o clitóris latejar e
espremo-me mais contra seu pau duro como aço. Seguro seus
cabelos quando desce na direção do meu umbigo e brinca com o
pequeno furo no meio do meu abdômen. Ele me encara enquanto o
contorna com a ponta da língua, até mergulhá-la em seu interior
como se me fodesse, colocando e tirando, molhando e abrindo.
Contorço-me, excitada demais para me manter quieta.
— Você me enlouquece! — declaro com a voz entrecortada
de desejo. — Adoro quando usa sua boca em mim.
Adam sobe a barra do meu vestido, embolando-a na minha
cintura e toca reverentemente minha calcinha.
— Onde em você?
Sorrio e ergo a cabeça para olhá-lo.
— Aí!
Ele ergue a sobrancelha.
— Aqui? — Toca meus joelhos, e eu nego. — Aqui, então? —
Sua mão aperta minha coxa, e nego de novo. — Acho que precisa
ser mais...
Ele parece não se recordar da palavra, e o ajudo sorrindo.
— Específica?
— Sim! Específica. Onde?
Deslizo minhas mãos por meu corpo, chegando até o centro
do meu prazer, o lugar que ele sabe como tocar seja com a mão,
com a boca ou com seu pau.
— Aqui! — Masturbo-me por cima da calcinha sob o
escrutínio ininterrupto dele. — Adoro quando chupa aqui. — Afago
meu clitóris. — E quando enfia a língua aqui. — Coloco um dedo
sobre a entrada e forço a calcinha para dentro.
Ele geme baixo.
— Gosto de fazer isso com ela bem suculenta. — Lambe os
lábios devagar, e eu estremeço. — Você está bem molhada,
Melissa?
Afasto o tecido da calcinha e sinto meus dedos se
empaparem com a minha excitação. Esfrego-os a fim de deixá-los
bem úmidos e depois estendo-os na direção de Adam.
— Prove!
Ele se abaixa e abre a boca. Sinto seu hálito quente nos
dedos assim que os insere dentro dela, então fecha os lábios e suga
forte, engolindo e saboreando meu tesão.
— Hum... — Fecha os olhos e se afasta. — Preciso provar
mais!
Volto com a mão para minha boceta, mas, antes que eu
possa manipulá-la, Adam segura meu pulso e o afasta do local.
— Deixa que eu faço isso.
Vibro inteira quando ele me toca, seus dedos gentis
contornando cada detalhe dos meus lábios, cada reentrância e
relevo. Busco o ar em desespero quando começa a friccionar meu
clitóris de maneira rítmica, com movimentos sinuosos que fazem
meu corpo ferver como se estivesse em brasa.
— Macia, suculenta... — Beija-me sobre sua própria mão. —
Cheirosa...
Arquejo quando ele lambe meu clitóris, continuando os
movimentos que outrora fazia com os dedos, deixando-me ainda
mais vidrada com as sensações únicas que sua língua quente me
presenteia.
— Não para! — Rebolo contra sua boca, e ele começa a me
sugar. — Isso, Adam, chupa!
Ele acelera o movimento, movendo também a mandíbula,
como se estivesse me comendo de verdade, o que causa uma
combustão tão grande dentro de mim que meu corpo parece
explodir em milhares de pedaços que flutuam pelo ar e depois
voltam lentamente a se integrar sobre o sofá.
Deus do Céu!, penso, ainda sem fôlego, com um sorriso
bobo, tentando me recuperar do orgasmo delicioso.
Ouço um farfalhar de roupas e, antes que consiga abrir os
olhos, sinto-o me invadir, expandindo meu interior para recebê-lo,
buscando a melhor forma de se acomodar entre meus músculos
tesos e molhados.
— Tão apertada... — sussurra em transe.
A cada centímetro, meu corpo parece retumbar, vibrando com
a investida, alegrando-se pelo vazio sendo preenchido. Encaixamo-
nos tão perfeitamente que parecemos duas peças de um quebra-
cabeça, separadas, mas que se complementam e formam uma só
quando unidas.
— Eu sou sua! — digo de repente, a declaração ardendo em
meu peito e saindo por minha boca com alívio. — Eu sou toda sua!
— É! — Ele se deita sobre mim, e o sinto tremer. — Você é
minha, assim como eu te pertenço.
Adam se move e toma minha boca ao mesmo tempo, sua
língua imitando os movimentos que seu pau faz, arremetendo com
força, circundando ou apenas ficando parada no fundo da minha
boca.
Ele ergue minhas pernas, dobra meus joelhos e os prende na
lateral de seu corpo com os braços, ficando com mais espaço para
se movimentar, indo mais profundamente, saboreando-me devagar.
O tesão é tão forte que, quando ele me penetrou, ainda
sentia as ondas do orgasmo do sexo oral, e agora elas voltam a se
propagar com força pelos meus músculos, minhas terminações
nervosas, fazendo com que eu me retese, que me falte ar, até não
aguentar mais.
Grito no mesmo instante em que ele acelera as estocadas,
fazendo com que o sofá saia do lugar, rangendo a cada impacto de
seus movimentos. Cravo minhas unhas em suas costas, elevada,
deleitada, completamente arrebatada pelo gozo, que me enche de
satisfação.
Adam sorri e ao mesmo tempo xinga. Vejo sua mandíbula se
comprimir, o músculo de seu peitoral se contrair e sinto seu pau
pulsar com força dentro de mim, recheando-me com seu sêmen em
jatos quentes e volumosos.
Ele cai sobre mim, encosta testa contra testa, respirando
fundo, trêmulo e levemente suado.
— Você está bem?
Sorrio diante de sua preocupação.
— Estou ótima, e você?
Adam me beija.
— No céu!
Saio do carro, e Douglas me dá um sorriso e um tapa nas
costas, encorajando-me a seguir em frente. Não sei dizer por que
estou nervoso desse jeito, afinal, não é a primeira vez que passo por
isso, apesar de serem duas situações completamente diversas.
Na primeira vez, era só um homem crescido, com mágoas de
garoto, fazendo de tudo para ser quem não era. De lá para cá,
aprendi muito sobre mim mesmo, descobri o que realmente vale a
pena lutar para conquistar, e a aceitação dos outros não é uma
dessas coisas.
Pego a encomenda que quase me atrasou hoje, pois, quando
cheguei para buscá-la, não tinha ficado como imaginei e acabei
mudando de ideia, pedindo para refazerem. Espero ter acertado e
parar de suar também.
É o calor do Brasil!, justifico-me com um sorriso ao pensar em
quanto tempo levarei para me acostumar totalmente a ele. A
Califórnia também é quente, mas eu estava bem próximo do mar,
praticamente com os pés na areia, e aqui, em São Paulo, embora
tenha muitas áreas arborizadas, o concreto predomina, o que ajuda
a concentrar ainda mais as altas temperaturas.
Caminho na direção da entrada do lugar para onde vou,
lembrando-me da primeira vez que o vi, como admirei suas linhas e
seu design. Naquela época, eu não acreditaria se me dissessem
que faria planos de ficar aqui e, na verdade, até semana passada,
ainda não havia decidido 100% sobre como seguir com meu
relacionamento com Melissa.
O que me fez decidir de vez foi a possibilidade de perdê-la!
Quando soube que ela deseja ser mãe, engravidar, percebi
que talvez, para vê-la feliz, tivesse que me afastar. Tive uma noite
no inferno, cheia de arrependimentos, culpa e desespero. Pode
parecer exagero, mas eu só pensava que a tinha perdido para
sempre e em como aquilo estava me doendo.
Melissa Boldani é a realização de todos os sonhos, é a
mulher para quem nasci, a mulher que é a dona de um sentimento
que nunca experimentei antes, e perdê-la daquela forma, por aquele
motivo, parecia ser uma punição do destino.
Quando saí do apartamento dela, estava mesmo pensando
em ir para um hotel, nem chamei Douglas, pedi um carro por
aplicativo e dei o endereço do escritório, mas, assim que paramos
lá, mudei de ideia, lembrando-me do apart-hotel.
O apartamento estava vazio desde que saí dele no começo
de dezembro do ano passado, por isso eu não tinha nada, nem
mesmo uma muda de roupa limpa que pudesse usar no dia
seguinte. Fiquei sentado no sofá por horas, até pedir uma garrafa de
uísque e gelo na recepção.
Não comi nada, apenas bebi e fiquei assistindo ao sol se
levantar no céu, trazendo a luz do recomeço; para mim, no entanto,
era como se fosse um dia cinzento, com garoa e ventos gelados.
Tive vontade de ligar para o meu irmão e contar a ele sobre o
que havia acontecido; pensei melhor, todavia, achando que não
seria bom dividir com ele toda a lástima que estava sentindo. Nada
era possível fazer pelo que já havia passado, eu precisava pensar
em como seguir com meu futuro, caso Melissa realmente não me
quisesse mais ao seu lado.
Tentei trabalhar, mas estava sem o computador, então avisei
ao escritório que não estava me sentindo bem e pedi à recepção do
apart-hotel que não me passasse ligações. Tentei dormir, mas não
consegui. Apenas rolei na cama, amarrotando a única roupa que
tinha, até que ouvi a campainha soar.
Estranhei, pensei em ignorar, presumindo ser alguém da
administração do lugar ou mesmo a arrumadeira. Somente quando
ela soou de novo é que fui olhar e quase tive um infarto ao ver
Melissa.
Ainda nem consigo acreditar em tudo o que aconteceu!
Prometi a mim mesmo que iria recompensá-la pelo resto dos meus
dias por não poder realizar seu sonho de gerar uma criança. Iria
amá-la sem que houvesse dúvidas, cumprir cada um dos seus
desejos, e, quando fosse nossa hora, adotaríamos quantas crianças
ela quisesse.
Melissa passou o dia todo em meus braços, e, à noite,
voltamos para o seu apartamento, saímos para jantar e depois
fomos dançar. Foi uma noite maravilhosa, regada a risadas e
recheada de bom sexo.
A partir daí, acho que me toquei de que não sou mais um
garoto que não sabe o que quer – e isso não tem necessariamente
a ver com minha idade – e tomei de vez a decisão de mudar minha
vida.
— Pai. — Comecei a mudança ao telefone, assim que ele
atendeu. — Preciso comunicar algo.
O velho Joshua suspirou.
— Ela te faz feliz?
Ri de sua perspicácia.
— Mais do que eu poderia sonhar!
Ele estalou a língua.
— Pronto. Agora você pode me contar a parte que irá me
desagradar.
Gargalhei e fiz exatamente o que ele previu. Sei que
contrariei seus planos para mim e que acabei também desonrando a
promessa que me fiz de nunca o decepcionar, mas, como meu pai
mesmo ressaltou, planos não são certos, e felicidade é a melhor
promessa na vida de uma pessoa.
Foi por isso que acelerei todos os processos que precisava
para concluir meu objetivo, e, hoje, é o último e mais importante
passo para alcançá-lo.
— Boa tarde. Posso ajudá-lo?
Sorrio de volta para a recepcionista da Boldani.
— Estou aqui para ver Melissa.
Ela franze a testa e confere algo no computador.
— A senhorita Boldani não tem nenhuma reunião agendada
hoje. — Pega uma agenda. — Posso agendá-lo para a próxima
semana. Já é nosso cliente?
Concordo.
— Adam Stone. — Vejo-a anotar meu nome e concluo que
ele não lhe diz nada. — A senhorita Boldani fez o projeto da minha
empresa, a...
— Senhor Stone!
Olho para a pessoa que me reconheceu, mas não me lembro
de quem se trata.
— Sou Tânia, trabalho com Melissa. — Ela não disfarça a
curiosidade pelo que trago na mão. — Veio vê-la?
Sorrio satisfeito.
— Sim. — Aproximo-me da moça. — Mas gostaria de lhe
fazer uma surpresa.
Tânia ri cúmplice.
— Venha comigo!
Sigo-a para o interior do escritório, uma enorme construção
feita em vários níveis, com jardins internos bem elaborados e uma
decoração de fazer qualquer revista se render.
— Aquela é a sala dela. — Aponta. — Mel está terminando
um projeto, por isso não está com ninguém hoje.
— Obrigado.
— De nada! Ah, bata à porta e não espere que ela atenda; eu
faço isso.
Ela se afasta, e sigo suas instruções. Dou duas batidas à
porta e já a abro, impondo-me na sala onde a mulher que amo faz
os projetos mais fodas do mundo da arquitetura.
— Adam? — Melissa se levanta de repente, completamente
surpresa. — O que você...
Não a deixo terminar de falar, pois logo a alcanço e encosto
meus lábios nos seus.
— Vim porque preciso de sua ajuda.
Ela parece se preocupar.
— Aconteceu algo grave?
— Não. O corretor da Karamanlis me ligou dizendo que
achou uma cobertura ótima aqui perto, mas preciso ser rápido, pois
há muitos interessados. Por isso pensei em ir até lá para avaliar.
— Quer minha ajuda para saber se o investimento vale a
pena?
Sorrio como um cordeiro e assinto.
— Antes, porém... — Entrego-lhe a caixa de vidro com uma
única, enorme e perfeita rosa vermelha.
— Eu já tinha visto, claro! — Ela ri quando pega o presente.
— É linda como uma joia, e o bom é que vai secar e se manter
intacta para sempre.
— Sim!
A ideia que tive – e que ela descobriu só de olhar para a flor
solitária – demonstra que eu estava certo em não levar um enorme
buquê, mas algo que ela possa guardar e se lembrar eternamente.
Melissa pega sua bolsa e, sem soltar o presente, me chama:
— Vamos lá ver a tal cobertura?
É agora!
— Vamos!
Saímos juntos, de mãos dadas, da Boldani, e novamente me
sinto suar por baixo do terno. Douglas sorri quando nos vê e se
apressa a abrir a porta do carro para entrarmos. Melissa, como
sempre, cumprimenta-o e pergunta-lhe sobre sua família.
— Todos bem, dona Melissa, obrigado.
Quando me sento no carro, ele me dá uma piscada e coloca
seu polegar para cima, o que me deixa ainda mais nervoso.
— Ele não te enviou fotos do lugar? — Melissa pergunta de
repente.
— O quê? — Olho-a confuso, sem entender do que está
falando.
— A cobertura, Adam. O corretor não te enviou fotos?
— Não. — Ela ergue a sobrancelha, mas não fala nada. —
Eu disse que iria ver pessoalmente.
— Fez bem. Quão perto é daqui? Este é um ótimo bairro, os
imóveis são muito valorizados e...
— Chegamos! — Interrompo-a, e Douglas para o carro. —
Disse que era bem perto.
Ela ri.
— Adoro este lugar! — Ela olha pela janela. — É um ótimo
condomínio, pelo que ouvi falar, tem uma bela infraestrutura, os
prédios são todos de luxo, dois apartamentos por andar até o 10.º e
depois um por andar até a cobertura, que tem três andares.
— Sim — respondo apenas, nervoso demais para
compartilhar sua animação, porém, feliz por vê-la vibrar pelo local.
Douglas consegue a liberação do porteiro para entrarmos, e,
já na garagem, ajudo Melissa a descer do carro.
— Tudo muito organizado — ela decreta. — Gosto de ter
verde na garagem. Geralmente é um lugar escuro e pintado com
tinta epóxi.
Não entendo nada do que ela diz, mas sorrio, fingindo estar
prestando atenção em cada detalhe que vê, aponta e avalia.
— O corretor já está nos aguardando? — indaga quando
entramos no elevador, e apenas assinto. — A cobertura, hein? Um
verdadeiro achado neste prédio.
Quando finalmente chegamos, abro a porta – que está
destrancada –, e Melissa suspira ao ver o tamanho dos cômodos.
— Deus do Céu, já posso imaginar como ficará lindo
decorado!
— Se você me ajudar, porque não sei nada sobre isso.
Ela ri.
— Claro que irei ajudar! — Beija-me. — É uma diversão para
mim, sinto-me quase de volta à infância.
Andamos mais um tempo no primeiro andar, que conta com
toda a área social do apartamento e com uma linda varanda na sala
principal.
— Há dois quartos aqui embaixo com banheiro completo.
Isso é muito bom — Melissa pontua ao subir para o segundo andar.
— Gostei também que tenha elevador; é sempre bom ter uma
alternativa além das escadas quando possível... Oh, meu Deus!
Ela fica muda ao ver a sala íntima e as três enormes suítes.
— Qual é a máster? Todas são do mesmo tamanho.
— Lá em cima. — Aponto, já trêmulo.
Cada degrau rumo ao terceiro andar me faz suar mais e
mais, e nem mesmo a bela vista e nem o enorme terraço com jardim
e jacuzzi me fazem relaxar.
— É como um paraíso no meio de São Paulo. — Melissa olha
cada detalhe dos canteiros. — Olha esta vista!
Não posso, pois não consigo tirar os olhos dela. Seus
cabelos sendo agitados pelo vento, o cheiro das flores e plantas, o
sol, tudo parece existir apenas para ser cenário da mulher
maravilhosa que sorri encantada.
— Vamos ver a máster? — chamo-a, e voltamos para dentro,
na outra metade do terceiro andar.
Respiro fundo e abro a porta.
— Ainda não vi o corretor em lugar nenhum. Será que ele
está...
Melissa perde a fala e para de repente, e quase trombo com
ela. Solto o fôlego, concentrado em todas as suas reações.
— O que está acontecendo? — inquire baixinho.
Entro no enorme quarto repleto de flores, velas e com uma
enorme cama no centro. Vou até o aparador, que suporta o balde de
champanhe com as taças, e pego a caixinha que deixei lá mais
cedo.
— Eu quis... — Engasgo e começo de novo: — Quis recriar e
melhorar nossa primeira noite juntos. — Sorrio. — Sem máscaras
desta vez.
Melissa relaxa e sorri.
— Sem segredos — completa, e eu nego.
Vou até onde ela está parada.
— Estou escondendo algo neste momento.
Ela sorri maliciosa.
— O quê?
Estendo-lhe a caixinha e abro a tampa, expondo o lindo anel
de diamantes. Melissa arregala os olhos, seu sorriso some, e
percebo seu queixo tremer.
— Um pedido de casamento — respondo à sua pergunta.
— Adam, você está falando sério?
Rio e tento soar descontraído.
— Disse que ia precisar de uma decoradora para este
apartamento, e, pelo tamanho dele, é um trabalho que vai demorar
muito. — Mais uma vez ela fica boquiaberta por descobrir que já
comprei a cobertura. — Como você é a melhor no que faz, cheia de
prêmios, como eu mesmo já vi — ela ri ao se lembrar da cena que
fez no escritório da TGS —, achei que seria melhor me casar
contigo...
Melissa gargalha.
— Para não falir com meus honorários? Que pão-duro!
Rio, mas logo fico sério.
— Achei que seria melhor me casar contigo e garantir que
farei de tudo para manter esse sorriso. — Ela respira fundo. — Amo
você, Melissa, quero construir novos sonhos, uma nova história, ao
seu lado.
Seus olhos verdes estão brilhantes de lágrimas.
— Aqui, em São Paulo? — Assinto. — Tem certeza?
— Tenho, embora já esteja ficando tenso de novo.
— Por quê? — Ela realmente parece confusa.
— Porque ainda não tive uma resposta. — Então faço o
impensável e apoio um joelho no chão à sua frente. — Você aceita
ser minha esposa?
Melissa chora, mas, desta vez, não fico apavorado como
quando a vi chorar na noite em que me declarei apaixonado. Sei
que se trata de um choro de alegria.
— Sim, Adam, eu aceito!
Deus!
O alívio e a felicidade que sinto são tão fortes que não coloco
o anel em seu dedo, mas ergo-a do chão, rodando com ela em meu
colo, sentindo-me novamente um menino para quem a vida sorriu
com a sorte grande.

— Como está sua agenda para o resto da semana? —


questiono, ainda nu, deitado com a cabeça para os pés da cama,
olhando para Melissa, que está recostada nos travesseiros, também
nua e gloriosamente descabelada.
Ela termina de mastigar o morango que comemos ao tomar
champanhe, pensa um pouco e dá de ombros.
— Cheia, mas nada que não possa ser remarcado. — Senta-
se, e beijo seu pé. — O que tem em mente?
— Liguei para comunicar ao meu pai, meu chefe e CEO da
TGS, que iria manter minha base de trabalho aqui, em São Paulo,
além de reduzir o tempo nas viagens. — Melissa sorri, não
escondendo seu contentamento. — Claro que não era o que ele
queria, mas entendeu.
— Falou sobre nós? — pergunta tão baixinho que sinto como
se ela estivesse com medo da resposta.
— Nem precisei, ele já sabia de algum jeito. — Rio. —
Concordou com minha decisão, mas me pediu algo em troca.
Ela se estica, deitando-se de bruços ao meu lado, e, claro,
não resisto e passo a mão em sua bunda perfeita.
— O que ele quer?
— Conhecer você. — Rio quando ela começa a tossir e a
ajudo a desengasgar.
— Ah, meu Deus! Não sei se...
— Eu disse que, assim que você me aceitasse como marido,
iríamos para Beverly Hills. — Sorrio sem jeito. — Ele quer nos dar
sua bênção, e valorizo muito isso.
Melissa está visivelmente emocionada.
— Quando pensa em ir?
Abraço-a.
— Assim que recebermos a bênção do seu pai também!
O sorriso no rosto de minha noiva diz tudo.
— Eu amo você, Adam! Por que demorou tanto tempo para
aparecer na minha vida?
Beijo sua nuca, excitado de novo, desejando demonstrar de
todas as formas o quanto a amo.
— Não demorei, amor, cheguei no momento marcado.
Se eu já suei quando fui pedir Melissa em casamento,
imagina como estou agora, ao falar com Julio Boldani? E, para
piorar, o homem não facilita a minha vida, olhando-me sério e
esperando um pedido formal de minha parte, mesmo que estejamos
em sua casa, em um jantar com toda sua família.
Finalmente conheci a mãe dela, que não estava no baile de
Carnaval, e adorei minha futura sogra. Além dela, estão presentes
um primo de Melissa, Thiago, representando a família do tio de
Melissa que mora na Itália; Isabella, sua mãe, as crianças e o
marido.
Nem de longe se parece com uma das festas de meu pai,
cheia de amigos, parentes e parceiros de negócios, mas, mesmo
com o público reduzido, sinto como se minha boca estivesse cheia
de areia, tamanha pressão que Julio Boldani faz com o olhar.
— Senhor Julio... — começo, tentando me esmerar no
português. — Eu amo sua filha...
— Fico feliz em saber. — Ele interrompe-me.
Pigarreio e volto a falar:
— E gostaria que o senhor nos abençoasse...
— Melissa — novamente ele não me deixa continuar e
chama a filha —, você deseja se casar com esse homem?
Ela ri.
— Claro, pai!
— Você o ama? — Ela assente e pega no meu braço. — E
sente que ele a ama ainda mais?
— Não deixo dúvidas quanto a isso — sou eu quem
responde. — Melissa sabe que a amo mais que tudo.
Ela deita a cabeça no meu ombro.
— Eu sei, pai, sinto o quanto Adam me ama.
Julio, por fim, abre um sorriso.
— Diante disso... eu os abençoo e lhes desejo toda a
felicidade do mundo!
Melissa suspira e se solta de mim para abraçá-lo, enquanto
palmas ressoam pela sala e pessoas começam a vir nos
cumprimentar.
— Cazzo, ainda bem que Isabella e eu fugimos para nos
casar — Frank diz debochado. — Não sei se conseguiria passar por
isso!
— Provavelmente teria xingado meu pai, mas não se
esqueça de que ele conhece mais xingamentos do que você, afinal,
também é italiano! — Isabella rebate o marido e me abraça. — Seja
bem-vindo à nossa família!
— Obrigado!
Os cumprimentos se estendem até que Julio aparece com
uma taça de champanhe na mão.
— Quando Melissa nasceu, eu tinha planos grandiosos para
ela. — Começa o discurso. — Eu tinha um feeling de que ela havia
herdado a mesma facilidade em ver formas e desenhar como eu. —
Ele olha carinhosamente para dona Suzana, mãe de Melissa, e ela
concorda. — Nosso filho mais velho, Riccardo, era fascinado por
animais e não se interessava muito pela arquitetura, mas Mel
sempre gostou. Lembro-me de como ela passava horas ao meu
lado, olhando atentamente, enquanto eu desenhava e calculava
projetos. — Melissa funga ao meu lado, emocionada. — Depois,
quando se tornou uma moça e já desenhava muito bem, quis fazer
curso para aprender a mexer no computador e me ensinou a usar as
ferramentas de desenho que usamos até hoje. — Ele olha
diretamente para a filha. — Tenho muito orgulho da mulher que você
é, da grande profissional que se tornou, superando qualquer plano
que tivesse. Porém, acima de tudo, orgulho-me da mulher
apaixonada pela vida, pelas pessoas, capaz de ajudar um
desconhecido sem pensar duas vezes e de amar sua família
incondicionalmente.
Melissa aperta minha mão, e sinto que está tremendo.
— Por isso — Julio continua — espero que você, Adam
Stone, aprecie a sorte que lhe sorriu em forma de mulher e saiba
que Melissa é essa pessoa doce, mas também tem fogo nas ventas.
Todos riem, e eu olho para ela.
— Como se eu não soubesse disso! — Ela gargalha com o
que digo, levemente corada. — Não só aprecio, Julio, como amo
cada parte dela.
Beijo a testa de Melissa, e todos aplaudem no mesmo
instante em que o champanhe é estourado e a bebida é servida aos
convidados para comemorar o compromisso de casamento entre
nós.
— Quem diria que, a esta altura, eu teria uma festa de
noivado tradicional, com direito a discurso e tudo! — ela comenta
rindo.
— Tenho certeza de que seu pai ensaia esse discurso há
anos. — Pisco para ela. — Todos te amam muito.
— Eu sei! — Suspira. — Sou muito abençoada por isso. —
Fica séria de repente. — Espero que eu possa conquistar seus
familiares também.
Rio.
— Não tenho nenhuma dúvida quanto a isso! Meu pai adora
uma mulher bonita e inteligente, diz que é uma combinação perfeita.
Meus irmãos vão ficar encantados e um tanto invejosos. — Melissa
nega. — Ah, vão, pode ter certeza! E tia Bea vai se encantar, porque
sempre quis uma sobrinha.
— Eles se davam bem com sua ex-mulher?
A pergunta me pega desprevenido, mas não me causa
desconforto, mesmo porque Melissa sabe que Hillary ainda não
assinou o divórcio, motivo pelo qual ainda não podemos oficializar
nossa união, e que fiz uma última proposta de acordo antes de partir
para a Justiça e fazer valer o pacto pré-nupcial.
— Hillary é filha de um parceiro de negócios do meu pai,
então, praticamente, já era amiga da família. — Melissa arqueia a
sobrancelha. — Namoramos na adolescência, depois cada um foi
estudar em um lugar diferente. Ela se mudou para a Europa, e,
somente quando retornou, ficamos juntos de novo.
— Então vocês tiveram uma longa história.
— Sim, mas cheia de altos e baixos.
— Ficaram 10 anos casados...
— Na verdade, não. Eu estava viajando muito naquela época,
mas, quando estava em casa, ficava no apartamento dela. Só nos
casamos oficialmente há cinco anos, depois de uma crise, e logo
percebemos que tínhamos feito besteira.
— Sinto muito.
Abraço-a apertado.
— Eu não. Houve motivos para eu passar por tudo isso, e um
deles acho que foi para me preparar para quando encontrasse a
pessoa certa e pudesse reconhecê-la. — Beijo sua nuca. — Mal
sabia eu que já havia cruzado com a mulher da minha vida em um
bar. É uma pena que ela nem sequer me viu.
Melissa suspira.
— Gostaria de tê-lo visto, mas acredito que tudo acontece no
momento certo. Eu não estava pronta para reconhecer o amor
verdadeiro ainda, precisava dos meus processos também.
Concordo.
Ficamos um tempo sem falar, observando as pessoas ao
nosso redor, vendo as crianças de Isabella correrem pela enorme
sala do avô, e penso logo no que nos espera depois de amanhã.
— Está preparada para enfrentar uma festa grandiosa?
Melissa franze a testa.
— Preciso estar?
Rio, pensando na mania de grandiosidade de Joshua Stone e
em sua fama de festeiro, imaginando quantos convites já foram
entregues para o noivado de seu filho do meio. Toda Beverly Hills
estará presente, de artistas de cinema a grandes empresários.
— Absolutamente, sim!
Melissa arregala os olhos, e a beijo com fervor para já
começar a compensá-la.

— Pronta? — pergunto à Melissa, e ela assente, não sem


antes puxar fôlego longamente.
Nós chegamos a Santa Monica muito tarde, pois tivemos
atraso no voo. Tínhamos um jantar marcado para que ela
conhecesse meu pai e minha madrasta antes da festa. Não
obstante, com os contratempos que tivemos, não conseguimos
chegar a tempo e preferimos ir para meu apartamento. Estávamos
cansados da viagem de avião e da de carro do aeroporto até minha
casa, por isso tomamos um banho e fomos dormir.
Eu estava ansioso sobre o que Melissa ia dizer sobre meu
pequeno e funcional apartamento com uma bela vista em um bairro
descolado da cidade, porque entendo que muitas pessoas me veem
como um homem sério e um tanto engessado e acham que ele não
combina com meu estilo.
— Uau, este lugar parece contigo! — A primeira fala dela de
manhã, assim que acordamos, já me deixou todo derretido. —
Consigo sentir sua personalidade em cada cantinho deste lugar!
Melissa olhava detalhadamente todos os cômodos,
apontando objetos, rindo de alguma coisa ou se surpreendendo.
— Eu o decorei sozinho. Fiz um bom trabalho?
Ela sorriu.
— Sabe o que penso sobre decoração de casas? Mais do
que seguir tendências e estilos, ela precisa refletir a alma de quem
mora no lugar. Entrar em um lar é diferente de entrar em uma casa,
porque, num lar, a gente sente que as pessoas vivem e interagem
com cada coisa disposta na decoração. Quando se entra em uma
casa onde isso não é levado em conta, não temos essa conexão. —
Compreendi o que ela queria dizer e concordei. — Eu sempre digo
isso aos meus clientes, o importante não é estar na moda, até
porque tendências mudam, e o que está em alta hoje pode ser uma
peça brega amanhã. O que deve ser considerado é a mensagem
que a decoração passa, principalmente para quem vive naquele
espaço. — Ela riu. — Uma vez fiz o projeto de decoração de um
casal que ainda não tinha filhos, mas que desejava tê-los e senti,
nas conversas e decisões sobre a decoração, que esse desejo era
mais um “passo” do casamento do que realmente uma vontade. Em
nenhum momento eles pensaram que as escolhas deles iriam ser
incompatíveis com crianças e, mesmo eu alertando, decidiram
seguir com o projeto que haviam idealizado. A casa ficou linda, saiu
em várias revistas.
— E eles tiveram filhos? — perguntei curioso.
— Ah, sim, mas as crianças são proibidas de entrar em
alguns ambientes. — Deu de ombros.
Pensei na minha infância na casa do meu pai em Beverly
Hills e em como Aaron e eu brincávamos dentro dela. Mesmo os
gêmeos, que eram terríveis quando bebês, nunca tiveram nenhuma
restrição ou perigo em brincar nos cômodos todos, até mesmo no
escritório de papai.
— Hoje você vai conhecer a casa onde passei boa parte da
minha infância e toda a adolescência e vai poder julgar a decoração.
Claro que mudaram muitas coisas dos anos 80 até hoje, mas a
distribuição dos móveis, os cômodos, não mudaram.
— Deve ser uma casa linda!
— É, sim, uma mansão daquelas de cinema. — Ri. — Papai
não economiza em nada do que ama, e estar em casa é o que ele
mais gosta. Ele mal frequenta o clube e viaja pouquíssimo, porque
diz que tem tudo o que precisa no seu quintal. E é verdade!
— Ai, meu Deus, já estou imaginando!
Como minha geladeira estava vazia, descemos para tomar o
desjejum em um café do qual sou cliente há muitos anos, cujo dono
é um porto-riquenho que tem ótimo humor e mãos divinas para fazer
quitutes.
— Eu me sinto em casa aqui, em Los Angeles, por causa da
diversidade — comentei enquanto tomávamos um delicioso café da
manhã, sentados na varanda do estabelecimento. — Onde cresci
não era muito assim, por isso me sentia deslocado. Beverly Hills
ainda é predominantemente americana e branca, mas os outros
bairros são assim. — Apontei para a rua, onde pessoas de todos as
cores e origens se misturavam. — Escolhi me mudar para cá a fim
de sentir que faço parte do local, não que sou uma peça deslocada
dele.
Melissa pegou minha mão.
— Eu acho que acertou muito na sua escolha, além do que a
energia daqui é maravilhosa!
Concordei com ela, feliz por me entender. Andamos pela 3rd
Street Promenade, onde a levei a algumas lojas que achava
diferentes, com itens alternativos, sustentáveis e todas essas coisas
que ela ama.
Almoçamos em um bistrô na calçada, outro estabelecimento
pequeno e de imigrante e logo depois fomos para o Santa Monica
Pier, de onde vimos o Pacific Park, tão famoso com sua roda-
gigante na beira do mar, cenário de vários filmes que se passaram
aqui.
Decidimos deixar os outros passeios para outro dia e
voltamos para o apartamento a fim de descansar antes de nos
preparar para ir até a mansão dos Stones em Beverly Hills.
Combinamos com meu pai que iríamos mais cedo, pois
Melissa queria conhecer a todos antes do evento. Acabamos
adormecendo depois que fizemos sexo e acordamos próximo ao
horário do café programado com meus familiares.
— Vamos nos arrumar para a festa lá? — Melissa perguntou,
segurando seu vestido.
— Vamos, sim. Leve tudo o que for precisar para passar a
noite também, porque dificilmente conseguiremos voltar para cá
hoje.
Assim, com duas valises na mão, terno e vestido no cabide,
nós nos encaminhamos para uma das áreas mais famosas do
mundo.
— Eu nunca tinha vindo para Beverly Hills — ela comentou
no caminho. — Quando estive aqui, em Los Angeles, fiquei mais em
Hollywood, não tive interesse em fazer o tour pela rua das mansões.
— Bom, agora vai conhecer uma delas por dentro. — Ela
respirou fundo. — Não é diferente do que você está acostumada,
Melissa.
Riu.
— Claro que é! Eu sei que, no meu país, moramos em um
bairro privilegiado, a casa do meu pai também é considerada uma
mansão, mas tem toda essa oponência e os vizinhos famosos...
Gargalhei.
— Sabe quem é o nosso vizinho famoso? — Ela negou, e
cochichei o nome do famoso ator de Hollywood em seu ouvido.
— Mentira! — Ela arregalou os olhos. — Seu pai não o
convidou, não é?
— Ele é muito educado para não o ter convidado, somos
vizinhos há mais de 30 anos!
— Meu Deus!
Contei a ela histórias sobre minha infância com os filhos do
tal famoso e das brigas épicas entre nossas governantas. As duas
são melhores amigas, mas, quando se arranham, é xingamento
trocado em espanhol de um lado e com sotaque inglês do outro.
— Acha que seu pai vai gostar de mim?
A pergunta de Melissa me faz voltar ao presente, e paro
pouco antes de abrir a porta da frente da mansão.
— Ele vai se apaixonar por você assim como eu, tenha
certeza disso!
Ela sorri nervosa. Pego sua mão com mais força e abro a
porta, vendo Lupita no hall, acompanhando o serviço de limpeza do
lustre.
— Adam, hijo! — Ela sorri ao me ver, e a abraço apertado.
— Como está, Lupita? — Chamo Melissa para mais perto. —
Essa é Lupita, que foi como uma mãe para mim desde que cheguei
a esta casa, junto a outra funcionária, Juanita. — As duas mulheres
se olham sorrindo. — Essa é minha noiva, Melissa Boldani.
— Madre de Dios! Che guapa, cabrón! — Gargalho diante de
sua reação. — É um prazer, senhorita Boldani.
— Chame-me de Mel, Lupita. O prazer de conhecê-la é todo
meu!
Tia Bea aparece na sala e põe as mãos nas bochechas ao
me ver com Melissa na entrada.
— Ah, eles chegaram! — Vamos até ela, e a apresento à
Melissa. — Eu estava ansiosa por conhecer a mulher que colocou
esse menino de joelhos!
— Tia, ela me coloca em todos as posições possíveis, creia-
me! — provoco-a, e, imediatamente, ela fica rubra como sempre e
me dá um tapa no braço.
— Você não tem juízo, Adam!
Tia Bea conversa com Melissa, falando principalmente sobre
o menu da noite, querendo a opinião dela sobre as bebidas e a
música. Ao longe, escuto a voz de meu pai falando com Tereza, e,
assim que a velha raposa aparece no topo da escada, ergue uma
sobrancelha, olha Melissa com interesse e depois assente
silenciosamente.
O velho tem bons olhos para o negócio, mas principalmente
para mulheres, então sorrio ao ver que ele aprovou minha escolha,
ainda que não fizesse a menor diferença se não o houvesse feito.
— Aí está o casal! — Tereza abraça Melissa afetuosamente.
— Estou feliz em ter uma conterrânea na família! — diz animada. —
Uma brasileira como eu para apimentar a nova geração. É um
prazer conhecê-la, querida!
— O prazer é meu!
Minha madrasta abraça Melissa afetuosamente, então me pai
se aproxima, alto, os cabelos, que outrora foram loiros, agora
totalmente grisalhos, os olhos azuis atentos a cada detalhe da
mulher que amo.
— Olá, Melissa, eu sou Joshua Stone — apresenta-se em
português com um sotaque pronunciado e levemente hispânico. —
Seja bem-vinda à minha casa.
— É um prazer estar aqui e conhecê-lo, senhor Stone.
— Ah, não, vai ser minha nora, pode me chamar de Josh!
Essa fala do meu pai pode parecer algo simples a quem
ouvir, mas para mim é especial, porque pouquíssimas pessoas do
nosso círculo de amizade o chamam pelo apelido familiar. Minha
madrasta e tia Bea também percebem isso e sorriem para mim.
— Só se me chamar de Mel.
Ele ri.
— Mel. Eu gosto de como soa. — Abraça Tereza. — Viu,
Tetê, todos gostamos de apelidos!
Sua esposa rola os olhos.
— Não sou “Tetê” e gosto do meu nome inteiro, obrigada —
ela o rebate e volta a prestar atenção em Melissa. — Mel combina
contigo.
— Eu disse o mesmo! — concordo. — Doce, intensa, forte,
inconfundível...
Melissa fica vermelha, e eu beijo sua testa.
— Apresentações feitas, podemos ir até o solário para
tomarmos nosso chá? — Tia Bea aponta para uma das portas que
dá acesso ao jardim, onde, bem no centro, fica uma construção feita
para ser usada, principalmente no inverno. — Lupita, já pode se
organizar para servir.
Melissa e eu seguimos de mãos dadas pela casa, enquanto
meu pai vai abraçado à Tereza de um lado e à tia Bea do outro.
— Sua tia ainda mora aqui com eles mesmo depois do
casamento? — Melissa questiona.
— Sim, mas em uma edícula só dela, com empregados e
independência. Ela sempre morou perto de papai e apenas quando
éramos crianças é que morava na casa.
— Nunca se casou?
Nego.
— Reza a lenda que nunca sequer namorou. — Adam sorri.
— Desde a adolescência eu a provoco com frases de duplo sentido,
e ela se finge de ofendida e me bate.
— Eu vi hoje. — Melissa ri. — Vocês são uma família muito
bonita.
— Sim, mas, se arranhar além do verniz, descobre um ou
outro pedaço podre. — Dou de ombros. — É normal, eu acho.
— É, sim.
O solário é uma construção da qual meu pai sempre teve
orgulho. O jardim em volta é um primor do paisagismo, e a
construção, toda feita em ferro e vidro, tem uma lareira 360º bem no
meio, sofás confortáveis, muitas mantas e almofadas e a área de
café, que geralmente meu pai e tia Bea usam durante os meses
mais frios, para jogar e ter a visão do jardim.
— Isso é uma maravilha! — Melissa suspira, olhando cada
detalhe. — E parece ser tão aconchegante.
— É, sim! — Afasto a cadeira para que ela se sente à mesa
completamente lotada dos quitutes mais deliciosos para um chá
digno da realeza. — Meus irmãos e eu ficávamos aqui no inverno...
— Eles montavam um forte com lençóis e fingiam que
estavam na África — meu pai relembra rindo.
Sento-me à mesa ao lado de Melissa no exato momento em
que meu telefone notifica uma mensagem.

“Hillary assinou a papelada. O pessoal do escritório de


advocacia tentou falar contigo mais cedo, mas não conseguiu,
por isso ligou para a empresa.”

Meu sorriso anuncia que estou tendo uma boa notícia.


— O que houve? — Melissa inquire curiosa.
— Sou, finalmente, um homem livre! Hillary aceitou o acordo
e assinou o divórcio. — Ela não esconde sua felicidade. — Daqui a
pouco poderemos nos casar.
— Não me importo com isso, você sabe! Quero que
estejamos juntos e felizes, já me satisfaço assim.
— Mas eu não! Quero dizer ao mundo que encontrei a mulher
da minha vida.
Melissa me surpreende ao me beijar, e esqueço tudo à nossa
volta, concentrado demais na textura de seus lábios, no calor de sua
boca e no fogo que ela acende no meu corpo.
— Ah, agora, sim, tudo está explicado!
O reconhecimento da voz me faz afastar-me dela e já me
colocar de pé.
— Hillary? — Meu pai se levanta também, cenho franzido,
intercalando olhares entre mim e ela. — Olá, querida, não sabia que
viria à minha casa hoje.
Ela sorri amarga.
— Houve um tempo, Joshua, que eu não precisava de
convite. — Ela cruza os braços, sua atenção cravada em Melissa. —
Mas percebo que os tempos mudaram aqui.
Saio de onde estou e vou até ela.
— O que está fazendo aqui? Acabei de saber que assinou os
papéis e...
— Sim! — Ela tira uma pasta de sua bolsa. — Estamos
divorciados, Joshua! — Pisca para Melissa provocativamente e volta
a falar com meu pai: — Adam se aproveitou da minha juventude,
das minhas amizades e do nome da minha família e depois me
descartou.
Meu pai ri.
— Não sei por que ele precisaria disso tudo, querida. É um
Stone, isso diz mais do que qualquer outra coisa.
Hillary ri.
— É um bastardo, mexicano, filho de empregada... — O
desprezo em sua voz me choca, pois ela nunca o havia
demonstrado até então. — Suportavam-no pelo sobrenome, sim,
mas daí a ele ser aceito como um de nós? Eu fiz isso para ele!
Meu pai me encara, mas não tenho coragem de olhá-lo e
pego no braço de Hillary.
— Você conseguiu mais do que tinha direito. Achei que
tínhamos um acordo!
— Mais? Você me enganou, Adam Stone! — grita e olha para
Melissa. — Espero que ainda não tenha assinado o pacto pré-
nupcial, porque, se o fez, vai ser mais uma em quem ele vai passar
a perna!
— Não seja ridícula, Hillary! — meu pai reage. — Seu pai e
eu somos parceiros de negócios há muito tempo, e tenho certeza de
que ele não estaria nada contente em saber que sua filha está em
minha casa dando escândalo. Pelo que você acabou de dizer, não
há mais nenhum vínculo entre você e Adam.
Ela balança a cabeça.
— Não há e nunca poderia ter havido...
— Hillary... — aviso-a a não continuar com suas insinuações,
tremendo para me controlar e não a arrastar para fora do solário
— O quê? Eu concordei com sua oferta e assinei os malditos
papéis, porém, não fiquei satisfeita...
— Hillary, não é o momento de... — Tento tirá-la do solário,
mas ela se recusa a ir.
— Acho que é o momento ideal, afinal de contas, não
queremos que mais ninguém entre enganada em uma relação com
você.
— Do que você está falando? — Meu pai olha curioso para
mim. — Adam?
Meu corpo inteiro está tenso, meu coração parece que vai
saltar pela boca, e suo demais, mesmo estando com o clima ameno
aqui dentro. Preciso tirar Hillary daqui!
— Ela está nervosa, pai, só isso...
Hillary ri e, com um movimento rápido, se livra da minha mão.
— Nervosa eu fiquei enquanto passava meses tentando ter
um filho seu! — grita, e eu fecho os olhos. — Tentando entender o
que estava errado comigo, porque não conseguia ter a porra de um
bebê!
Olho para Melissa, mas, pelo seu olhar, ela já sabe em qual
assunto Hillary vai tocar, por isso ainda me olha de maneira
consoladora. Ainda...
— Minha querida, não era para ser e... — Tia Bea se levanta
para tentar acalmá-la, mas Hillary se afasta dela.
— Claro que não era, mas só eu não sabia disso! — Fuzila-
me com o olhar. — Você contou a ela? — Aponta para Melissa. —
Disse que, mesmo estando previstas cláusulas sobre herdeiros no
acordo, você não vai fazer um!?
Fecho os olhos e respiro fundo, incapaz de encarar meus
familiares e, muito menos, Melissa.
— Sim, ele me contou. E eu não me importo.
Puta que pariu, não! Assusto-me quando Melissa reage à
provocação dela.
— Do que vocês estão falando? — Meu pai parece confuso.
— O que Adam contou a vocês?
— A mim? Só depois que eu, chorando, disse que estava há
meses tentando engravidar...
— A gente não tinha conversado sobre filhos, Hillary —
rebato-a. — Você demorou meses para me contar porque estava
tentando engravidar sem que eu soubesse!
— Éramos casados, estava na porra do acordo!
Bufo e balanço a cabeça, porque ela nem esconde mais que
seu objetivo ao ter um filho meu era somente pensando no dinheiro
que o maldito acordo pré-nupcial estipulou sobre os prováveis
herdeiros.
— Ainda não estou entendendo o que está acontecendo!
— Simples, Joshua, seu filho nunca irá te dar um neto! —
Meu pai franze a testa. — Ele é egoísta, prepotente e mentiroso...
— Não é culpa dele! — Melissa vem em minha defesa, e me
sinto péssimo, sem saber o que fazer para parar o trem que vem
desgovernado em minha direção. — Eu tenho certeza de que, se ele
pudesse, seria um ótimo pai, mas...
Hillary começa a rir freneticamente, e faço uma última
tentativa de tirá-la de perto de todos, agarro-a pela cintura e a ergo
do chão. A mulher, pequena e magra, não pesa nada, mas se
debate, chuta e me xinga sem parar enquanto a levo para fora.
— Ele não quer ser pai! — grita, e apresso os passos. — Se
quisesse, nunca teria feito vasectomia para evitar...
Paro, incapaz de andar, tomo coragem e encaro Melissa, que
parece em choque.
— Feito o quê? — Meu pai é quem reage. — Que conversa
doida é essa?
— Seus filhos são doidos! — Hillary me empurra e volta para
o chão, e eu a deixo, pois não há nada mais que possa fazer. —
Meses tentando engravidar, tomando hormônio, fazendo tratamento,
para descobrir que Adam e Aaron decidiram não ter filhos e se
esterilizaram!
Meu pai xinga e se senta. Vejo Tereza e tia Bea o acudirem
pelo canto dos olhos, mas minha atenção total está em Melissa. Sua
expressão me causa dor. Os olhos verdes, marejados,
decepcionados me fazem querer ajoelhar a seus pés pedindo
perdão.
— Melissa, eu posso explicar...
— Ah, já vejo! — Hillary se acalma, arruma-se e respira
fundo. — Desta vez ele não omitiu, inventou uma mentira. — Pega
sua bolsa, que havia caído no chão. — Bom, querida, agora você
sabe que qualquer esforço não dará em nada! — Ela me olha. —
Agora, sim, estou satisfeita, Adam Stone!
Então, depois de ter feito um verdadeiro estrago em uma
reunião familiar que nem conseguiu se concretizar, ela sai de
cabeça erguida, equilibrando-se nos seus grandes saltos, com a
pose de uma rainha vingadora.
Sinceramente, não me importo o mínimo com ela, pois já
falamos tudo o que tínhamos para falar. Nosso casamento nunca foi
um mar de rosas e piorou quando contei que havia feito a
vasectomia antes de nos casarmos e que, como ela nunca
demonstrou nenhum interesse em crianças, achei que não fosse
relevante.
Mas era, principalmente para um divórcio polpudo!
— É verdade? — Melissa questiona, aproximando-se de mim.
— O que ela disse é verdade?
— Sim, mas eu posso explicar...
Ela nega.
— Você poderia ter explicado se tivesse me contado e não
inventado uma mentira.
— Eu não inventei, realmente não posso engravidar você...
— Porque escolheu não ser pai! Como acha que ainda posso
acreditar que você deseja ter um filho, ainda que por adoção,
comigo?
— Eu posso explicar, Melissa, vamos para...
Tento tocá-la, mas ela se afasta.
— Não, você perdeu o timing para sua explicação quando me
deixou acreditar que tinha um problema que o impedia de ser pai.
Você mentiu para mim!
— Eu sei, não queria te perder...
Melissa desvia-se de mim e deixa o solário pelo mesmo lugar
que Hillary saiu depois de ter causado toda essa tempestade. Sinto-
me péssimo, arrependido do que fiz, desesperado diante da
perspectiva de perdê-la.
Começo a andar para ir atrás dela, mas meu pai me detém,
colocando a mão no meu ombro. Tereza e tia Bea passam por mim
e, ao saírem, fecham as portas do solário.
— Deixe que ela digira essa história um pouco — aconselha-
me Joshua Stone. — Não vai adiantar sair atrás dela desse jeito.
Tereza vai tentar acalmá-la.
Assinto e soluço, dando vazão às lágrimas que queimam
meus olhos.
— Eu não posso perder Melissa, pai.
Ele me abraça.
— Você não vai. Ela o ama muito, pude ver. — Choro
copiosamente em seu ombro, e ele afaga meus cabelos como fazia
quando eu era um garoto. — Adam, que loucura foi essa que vocês
fizeram?
Respiro fundo, afasto-me para encará-lo e digo aquilo que
prometemos nunca dizer a ninguém.
— Decidimos quebrar a maldição dos Stones.
Joshua fica um tempo mudo e depois faz careta.
— Mas que maluquice é essa? De que maldição vocês estão
falando?!
Engulo em seco, envergonhado por todas as conversas atrás
das portas que Aaron e eu ouvimos, por termos vasculhado todo o
sótão da antiga fazenda e por nunca termos contado nada a
ninguém.
Chegou a hora de ele saber!
Adam mentiu para mim!, penso a todo momento enquanto
vou arrumando minhas coisas e tentando conseguir um carro para
sair desta casa. Preciso de um tempo só para mim, colocar a
cabeça no lugar e entender por que ele fez isso!
É apavorante que ele tenha tomado uma decisão como
aquela e não ter contado a ninguém, nem mesmo quando se casou
com Hillary. Entendi que ele não sabia que ela estava tentando ter
um filho, mas, assim que soube, lhe contou a verdade, então por
que não fez o mesmo comigo? Por que me fez acreditar que sua
infertilidade era um problema e não uma escolha?
Deus do Céu! Eu sonho tanto em ser mãe, e pensar que ele
decidiu nunca ser pai me dá medo, porque pode muito bem ter
mentido sobre uma futura adoção também.
Talvez eu não o conheça como achava que conhecia!
Limpo as lágrimas e escuto uma batida à porta do quarto
para onde trouxeram nossas coisas quando chegamos. Só o
encontrei porque perguntei à uma funcionária da casa, e,
provavelmente, foi a mesma pessoa quem contou para onde eu
tinha vindo.
Não quero falar com Adam agora nem ouvir suas
explicações, que deveriam ter sido ditas quando soube do meu
desejo de ser mãe. Isabella tinha razão quando suspeitou que havia
algo mais do que somente a impossibilidade dele, por ter se negado
a tentar a fertilização com doador anônimo.
— Mel? — Tereza me chama do outro lado da porta. — Você
está bem?
Ouvir meu idioma em uma voz tão preocupada me faz
soluçar, então decido abrir a porta e, assim que o faço, sou
recepcionada por braços calorosos em um abraço consolador.
— Fique calma, por favor!
— Por que ele mentiu para mim? — repito para ela a
pergunta que martela minha mente.
— Eu não sei! Adam escondeu de todos, ninguém aqui sabia.
— Ele mentiu para mim, Tereza. — Afasto-me dela e olho
pela janela. — Adam sabe o quanto desejo ter um filho, contei a ele
que estava fazendo tratamento para engravidar por meio de
fertilização.
— Sozinha? — Assinto, e ela sorri. — Você é muito corajosa
e de grande coração.
— Eu queria ter alguém para amar, para dedicar minha vida,
então ele apareceu, nos apaixonamos, e contei a ele sobre meu
desejo.
— Foi aí que ele lhe disse que não podia ter filhos?
Lembro-me da conversa, de como me senti, de todas as
dúvidas e da certeza de que o amava e queria ter uma família com
ele fosse como fosse.
— Disse que não podia me engravidar. — Ela faz uma
expressão estranha. — Eu entendi que ele era estéril.
— Eu também entenderia, mas agora... — Ela se senta na
beirada da cama. — Tento entender por que ele falou dessa forma e
não que não podia ter filhos.
Seco meu rosto com as mãos.
— Falamos em adotar uma criança no futuro, porque era algo
que eu gostaria de fazer também. — Ela assente. — Então nunca
me passou pela cabeça a possibilidade de que ele não desejava ser
pai.
— Foi tudo tão desagradável, eu nunca poderia imaginar que
Hillary iria aparecer aqui hoje, ainda mais para isso! — Suspira. —
Josh ficou sem chão por saber o que seus dois filhos fizeram... e
sem entender também. É tudo muito estranho.
Concordo.
— Adam disse que tinha uma explicação, e eu realmente
acredito que tenha, mas não sei se quero ouvir agora, não depois de
ele ter mentido deliberadamente para mim.
— Compreendo, mas quer um conselho? Esfrie a cabeça,
descanse, depois vocês conversam. — Dou razão a ela. — Ouça o
que ele tem a dizer e depois julgue se consegue ou não o perdoar.
Se quiser, meu apartamento em Downtown está vazio.
— Agradeço, mas talvez seja melhor eu ir para um hotel.
— Besteira! — Tereza se levanta. — Vou pedir ao Manuel
para levá-la. O apartamento está limpo, pois o tenho usado como
escritório, você vai ficar bem instalada.
Por fim, concordo com ela.
— E a festa?
— Bea está entrando em contato com os convidados dizendo
que tivemos um imprevisto. Josh não disse o motivo da
comemoração no convite, porque queria que fosse surpresa. — Ela
ri. — Ele gosta de surpreender. Eu detesto, mas, neste caso, acho
que foi melhor, gera menos especulação.
Olho para o grande anel de noivado na minha mão e suspiro.
— Não sei o que fazer. Meu coração dói, é até difícil respirar.
— Vai dar tudo certo, Mel, vocês só precisam conversar.
— Não quero falar com ele agora.
— Eu sei, e pode ter certeza de que direi isso quando falar
com Adam.
— Obrigada, Tereza.
Descemos juntas para o andar térreo. Levo apenas a valise
que trouxe com a roupa extra, deixando o vestido para a festa de
noivado para trás, afinal, não há mais o que fazer com ele.
O motorista da família aparece com o carro, e, sem ver Adam
em lugar algum, entro no veículo em direção ao centro de Los
Angeles, onde fica o apartamento de Tereza.
Meu telefone vibra várias e várias vezes em minha bolsa,
mas não o pego, incapaz de falar com quem quer que seja, ainda
mais sabendo que meus familiares no Brasil estão loucos por
notícias de como foi meu encontro com o poderoso Joshua Stone.
É, preciso admitir que tudo foi melhor do que eu havia
imaginado. Fui muito bem recebida pela família de Adam, embora
seus irmãos não estivessem presentes, e adorei a cada um deles.
Senti o quanto são ligados, afetuosos, e isso me animou, pois
acredito que uma boa base familiar é algo importante.
Só não esperava receber uma ótima notícia – a assinatura do
divórcio – e ser surpreendida com a mentira de Adam.
Por que ele fez isso? Suspiro, tentando não chorar. Entendo
ele não ter me contado logo no início, porque isso é algo pessoal,
assim como não contei a ele sobre meu processo de fertilização,
mas, quando ele soube do meu sonho de ser mãe e do quanto
queria ter uma família com ele, com o homem que amo, deveria ter
me dito a verdade!
Meu telefone toca várias vezes ao longo do caminho, e
somente quando entro no apartamento de Tereza e tomo um
demorado banho regado a lágrimas é que olho para ver quem está
tentando falar comigo.
Obviamente, há várias ligações de Adam e muitas
mensagens. Ignoro todas e vejo as de Isabella. Pego o recado que
ela deixou na caixa de mensagem e me sento ao ouvir sua voz
preocupada.
— Mel, o que aconteceu? Eu estou em Los Angeles, viemos
de surpresa para a festa de noivado a convite do Adam, e agora
recebemos a notícia de que foi cancelada. Tentei falar contigo e com
ele, mas ninguém atende. Quando pegar o recado...
Não termino de ouvir, sentindo meu coração se apertar ao
saber que Isa está aqui e que, como eu também ficaria, está
preocupada comigo. Decido lhe mandar uma mensagem para
acalmá-la, evitando falar para que ela não perceba minha voz de
choro.

“Isa, estou bem. Adam e eu tivemos um problema, por isso


cancelamos a festa. Eu não sabia que você viria, desculpe-me
pela preocupação.”

Não demora muito, e ela retorna a mensagem:

“Mel, onde você está? Quero te ver.”

“Amanhã. Hoje eu preciso ficar sozinha.”

Isabella não responde mais, e vou até a cozinha beber água.


Não como nada desde o almoço, mas não tenho apetite, minha
vontade é me deitar e dormir para que este dia acabe logo, ainda
que saiba que pouco irá resolver.
Estou magoada, chateada, a vontade que tenho é de... Assim
que a ideia passa pela minha cabeça, pego meu celular de volta e
procuro voos para o Brasil. Nem acredito na minha sorte ao
descobrir um que parte nessa madrugada e que ainda tem vaga.
Faço minha reserva, contando os minutos para estar de volta
em casa, apertar o Tiger em meus braços e ir trabalhar para ocupar
a mente.
É disto que preciso agora, voltar para minha casa!
Acordo do cochilo com o barulho da porta da frente se
fechando e fico apreensiva. Desliguei meu telefone logo depois que
comprei a passagem de volta ao Brasil e me deitei, porém, não
conseguia dormir.
Liguei a TV e deixei em algum canal aleatório para que
dissipasse um pouco a sensação de estar sozinha. Somente perto
das 9h da noite é que consegui cochilar, já que deixei o despertador
para que me acordasse às 2h da manhã a fim de sair para o
aeroporto.
— Mel?
A voz de Isabella faz com que eu me sente na cama
assustada e acenda a luz do abajur. Ela aparece na porta do quarto
e dá um sorriso triste ao me ver.
— Como você me achou?
Aproxima-se e se senta na cama.
— Tereza. — Assinto, pois era a única que sabia onde eu
estava. — Entrei em contato com a família de Adam, e a tia dele me
passou para ela. Eu estava preocupada, não queria que ficasse
sozinha.
Abraço-a.
— Obrigada por estar aqui.
— Eu sempre vou estar ao seu lado, Mel, assim como você
sempre está ao meu! Somos irmãs, demoramos muito para nos
encontrar, e eu te amo muito!
— Eu também te amo, Isa! Frank e as crianças também
vieram?
— Não, só Frank e eu. As crianças ficaram com mamãe.
Adam achou que seria bom ter alguém que você amasse na festa...
— Suspira. — O que houve, Mel?
— É uma longa história!
Isabella se levanta.
— Vamos pedir uma pizza, e você me conta. Estou morta de
fome, e você, aposto, também não comeu nada.
Concordo e me levanto, pronta para lhe contar que o homem
a quem amo, que teve todo o apoio dela, mentiu para mim. Ela pede
a pizza por um aplicativo de entregas, e nós duas nos sentamos na
sala de Tereza, à espera.
— Tereza não vai se importar se bebermos um de seus
vinhos, né? — Aponta para a adega de madeira num canto da sala.
— Isa, eu vou voltar para o Brasil daqui a pouco — informo-
lhe.
— O quê? Por quê? Nós viemos de jatinho, se você quiser...
— Não, obrigada, você já fez muito por mim, não quero dar
trabalho a você e Frank. Aproveitem esses dias aqui para curtir
sozinhos.
Ela suspira.
— Mel, o que aconteceu?
Dou de ombros.
— Ele mentiu para mim e achou que eu nunca iria descobrir,
mas julgou mal a coragem de uma mulher enraivecida.
Conto a ela todo o episódio do frustrado chá da tarde, com a
invasão de Hillary, suas acusações e revelações.
— Puta merda, Mel! E o que Adam disse?
— Que podia explicar. — Rio amarga. — Um pouco tarde
para isso, né?
— É. Eu gosto muito dele, mas fica difícil defender um
mentiroso. — De repente Isabella franze a testa. — Mas deve haver
uma boa história por trás disso, porque, pensa comigo... Se só ele
tivesse feito, eu poderia até sentenciar que realmente Adam nunca
quis ser pai, mas os dois fizeram ao mesmo tempo, ele e o irmão! —
Olha-me curiosa. — Não é estranho?
— É, mas ele poderia ter me contado ainda assim e não me
deixar pensar que tinha um problema.
Isabella concorda no exato momento em que a pizza chega.
Ela recebe o entregador e, apenas usando guardanapos, serve um
generoso pedaço para mim.
— Ele disse que tinha medo de perder você. — Ela repete o
que lhe contei. — Mas vasectomia pode ser revertida. — Mastiga a
pizza e conclui: — Embora nem sempre dê certo.
— Ele se negou também a usar um doador para que eu
engravidasse...
Isabella arregala os olhos, lembrando-se disso.
— Sim, tem esse ponto também, mas estava disposto a
encarar um longo processo de adoção.
Rio e nego.
— Talvez tenha dito isso só para me agradar.
— Será, Mel? Um homem que faz vasectomia não significa,
necessariamente, que não quer ser pai. — Não entendo o raciocínio
dela, então Isabela explica: — Ele não quer engravidar uma mulher.
Há homens que já são pais e que fazem, e conheço casos de
homens que congelam o esperma e se esterilizam, para assim só
ter um filho quando for planejado. Isso é muito comum em famosos
solteiros, até para evitar a furada de camisinha.
— Se fosse o caso, Adam poderia usar seu próprio material
na minha fertilização. — Isabella assente. — De qualquer forma,
ainda que ele tenha bons motivos, deveria ter me dito a verdade. —
Ela fica parada. Sinto que quer dizer algo, mas não sabe se deve. —
Pode falar, Isa.
— Como você teria reagido se ele tivesse lhe dito que tinha
feito vasectomia? — Dou de ombros, pois realmente não sei. —
Entenda bem, não o estou justificando, ele errou demais, mas acho
que você deveria ouvir suas explicações antes de ir embora. — Ela
suspira. — Não se esqueça do que houve entre mim e Frank
exatamente por eu não ter dado a chance de ele se explicar sobre o
que acontecido.
Concordo com ela.
— Eu vou, só preciso de um tempo. Não sei se estou pronta
para acreditar em qualquer coisa que me diga. Não lido bem com
mentiras, você sabe.
— Eu te entendo. — Pega minha mão. — Não importa o que
decidir, saiba que sempre estarei ao seu lado para apoiá-la. Só
quero que seja feliz!
Isabella seca uma lágrima solitária que deixei rolar e me
abraça apertado, dando-me todo o carinho e consolo que preciso
para enfrentar tantas dúvidas e incertezas.
Parece que tudo isto que estou vivendo é um pesadelo, justo
no dia em que seria um marco, o dia em que minha família
conheceria a mulher que amo, que escolhi para estar ao meu lado
pela única razão que uma pessoa deveria levar em consideração ao
pensar em casamento: amor.
Ando de um lado para o outro dentro do meu quarto, cômodo
em que cresci, passei muitos momentos maravilhosos e outros de
dúvida e incerteza, percebendo agora a grande confusão que criei
em minha vida por conta de uma história mal contada, segredos de
família e uma mente fértil.
A maldição dos Stones! Pelo amor de Deus! Pensando bem,
chego até a ficar com vergonha de mim mesmo por ter acreditado
nisso por tantos anos, ao mesmo tempo em que ainda sinto a
insegurança de deixar de acreditar.
A conversa que tive com meu pai foi decisiva e
esclarecedora, porém, não sei se será suficiente para reconquistar a
confiança de Melissa. Eu menti para ela, ainda que não o tenha feito
com a intenção de enganá-la, mas de boas intenções o inferno está
cheio, como diz tia Bea.
A batida à minha porta anuncia a chegada de Aaron – liguei
para meu irmão e pedi a ele que viesse até aqui sem falar com
ninguém –, e vou correndo abri-la antes que alguém o veja e fale
com meu pai.
— Entra! — Puxo-o para dentro do quarto.
— Que confusão você arrumou agora? — ele pergunta rindo.
— Estava já no meu impecável terno quando tia Bea ligou dizendo
que não haveria mais festa.
Ele para de sorrir quando vê meu rosto e xinga, sentando-se
na cadeira da minha escrivaninha.
— Melissa me deixou. — Ponho para fora a verdade em que
não consigo nem suportar pensar.
— Puta que pariu! O que você fez?
Passo a mão pelos cabelos, sem saber como começar,
porque o que houve hoje também o afeta.
— Ela sonha em ser mãe...
Aaron se coloca de pé em um salto.
— Contou para ela sobre a vasectomia?
Nego.
— Arrependo-me muito, mas não, não contei. — Ele enruga a
testa, sem entender. — Aaron, nós fizemos merda!
— Nós? Quer dizer você e eu?
Assinto, e ele parece ainda mais confuso.
— Eu sei que crescemos cercados de histórias sobre nossos
ancestrais e a tragédia que cercou cada um deles e que isso nos
impressionou muito. — Ele concorda. — Éramos praticamente
garotos, ambos sem mãe, tentando entender por que o destino
delas foi daquele jeito. — Respiro fundo. — Conversei com nosso
pai e contei tudo o que ouvimos e tudo o que achamos. Ele, claro,
sabia de tudo, mas acrescentou fatos que não sabíamos, coisas
boas e surpreendentes.
— Como você disse, éramos garotos...
— Mas acabamos tomando uma atitude drástica por causa
disso. — Aaron balança a cabeça, sem entender. — A maldição dos
Stones...
Ele ri.
— Adam, falando assim, parece até que realmente
acreditamos nisso! — Continua rindo, mas, de repente, fica sério. —
Você realmente acreditava nela?
Porra! Sento-me na cama, incapaz de falar qualquer coisa, ao
constatar que somente eu levei a sério a situação toda.
— Nós fizemos a vasectomia para evitar que ela
continuasse...
Aaron arregala os olhos.
— Não! Nós conversamos sobre a vasectomia depois que
quase engravidei aquela mulher com quem saía, lembra? A
camisinha estourou, e ela se recusou a tomar a pílula, alegando que
era contra sua religião. — Aaron, cínico como sempre é, rola os
olhos. — Então, quando o resultado deu negativo, nós tomamos um
porre, e eu sugeri a cirurgia para não corrermos esse risco!
Madre de Dios!, penso ao tentar recordar cada palavra
daquela noite, mas sem conseguir, pois realmente bebemos demais.
Tudo o que posso recordar é de, no dia seguinte, estar certo de que
era melhor terminar com qualquer possibilidade de fazer um filho.
Liguei para Aaron, e ele também estava decidido, então, após todos
os processos, realizamos a cirurgia.
— Não é assim que me lembro, porra! — insisto e me
levanto, andando pelo quarto, agora muito puto. — Falamos sobre o
alívio por ela não estar grávida. — Meu irmão concorda. — Então
falamos da tal maldição. — Novamente ele indica que estou certo.
— E eu comentei que seria ótimo não correr o risco de engravidar
ninguém sem querer, e você concordou.
— Sim! — ele parece dizer o óbvio. — Mas eu estava
pensando nas mulheres que se aproximavam de nós por causa de
quem somos, do nosso sobrenome e dinheiro. — Eu bufo, e Aaron
passa a mão pelos cabelos. — Adam, eu sei que ficamos meio
obcecados com as histórias da nossa família e com o que
aconteceu às nossas mães, mas, na época em que fizemos a
vasectomia, o motivo não era esse, pelo menos, não para mim.
Ainda não posso acreditar na confusão que uma noite de
bebedeira seguida de dias de falta de conversa entre nós causaram.
Não éramos mais garotos, ele já tinha quase 40 anos, e eu, uns 36,
então como fomos fazer aquela bagunça toda?
Analiso tudo agora.
— Nós ouvimos as histórias, sabemos o que aconteceu,
achamos os documentos, estava tudo lá. — Aaron concorda. —
Minha mãe, sua mãe e depois a mãe dos gêmeos... — Encaro-o. —
Eu sei que pode parecer irracional, mas eu acreditava, estava no
diário do nosso tataravô. — Respiro fundo. — Que, obviamente, não
terminamos de ler depois de termos achado o que queríamos.
— Eu terminei. — Ele dá de ombros, e eu arregalo os olhos.
— O que aconteceu com nossas mães foi lamentável, mas não foi
uma maldição. Eu brincava com essa história porque era engraçado
e achava que você fazia o mesmo!
Balanço a cabeça negando.
— Foram anos e anos me sentindo deslocado, querendo
respostas sobre o que aconteceu com minha mãe, e, como não
havia nenhuma, a tal maldição preencheu esse espaço. Depois,
quando me tornei adulto, somente o medo de perder alguém que
amasse ficou, e eu achava que poderia acontecer com um de nós
dois. — Ponho a mão na cabeça. — Então a verdade é que você
decidiu fazer a cirurgia apenas para fugir de mulheres interesseiras?
— Sim.
— Mas e quando você achar alguém que ame? Não vai
desejar ter uma família?
Aaron ri.
— Não creio que isso vá acontecer! Sou um solteirão
convicto e desejo permanecer assim por toda a minha vida. — Ri. —
Mas, caso ocorra um milagre e eu ame alguém a ponto de me
estabelecer e querer ter um filho, basta descongelar meu material
genético e pronto.
Sobressalto-me com o que ele diz.
— Você congelou seu sêmen? — O espanto em minha voz é
tão evidente que ele dá um passo para trás.
— Sim. Você não congelou? — Saio de perto dele, porque,
embora tenha vontade de partir sua cara, sei que ele não tem
responsabilidade nenhuma sobre a decisão que tomei. Puta que
pariu, que confusão que eu fiz! — Puta que pariu, Adam!
— Por que eu iria congelar? Hillary e eu nunca falamos sobre
filhos, e ela nunca demonstrou interesse por crianças. Além disso,
somente a possibilidade de ter uma mulher grávida de um filho meu
me deixava em pânico com a possibilidade de ela vir a morrer.
— Que merda! — Noto que ele realmente lamenta. — Mas
ainda pode reverter, é possível fazer se você quiser.
Concordo.
— As chances são mínimas, mas, sim, posso. — Decido ser
pragmático.
— Então não estou entendendo por que você e Melissa não
estão juntos! Se ela deseja ser mãe e você pode tentar ser o pai,
mesmo surtando os nove meses de gestação, qual é o problema?
Fecho os olhos.
— Porque eu menti para ela. Disse que não podia engravidá-
la, mas não disse que era por causa de uma vasectomia. — Aaron
fica parado, mudo, sem expressão. — Ela, claro, subentendeu que
eu tinha problema de fertilidade, e a deixei pensar assim.
— E como é que ela ficou sabendo?
Mais uma merda que fiz!
— Hillary tentou engravidar no último ano do nosso
casamento, e, quando descobri sua intenção, contei a ela que
tínhamos feito vasectomia. — Aaron xinga. — Hoje, ela apareceu
aqui e jogou a merda toda no ventilador na frente da família e de
Melissa.
— Porra, Adam! — Agora, verdadeiramente, ele está
transtornado. — Papai já sabe? — Confirmo. — Fodeu, minha vida
vai se tornar um caos! Há anos ele me cobra casamento e filhos...
— Bom, você vai poder deixá-lo mais calmo quando contar
que congelou seu material — digo, transparecendo que estou bem
puto por ele ter feito isso e não haver me contado.
— Perdoe-me por não ter dito nada, mas eu realmente achei
que você faria o mesmo.
— Esse foi nosso problema! Fomos tão afoitos que nossa
comunicação foi parca e insuficiente. Eu não estava preocupado
com interesseiras ou qualquer merda dessa, estava pensando em
não condenar alguém à morte!
Meu irmão, um gigante com mais de 1,90 m, aproxima-se de
mim e me puxa para um abraço.
— Fizemos merda, né? — ele diz o óbvio. — Mas tenho
certeza de que, se conversar com Melissa, contar tudo, ela vai
entender sua decisão.
— Pode ser que ela entenda, mas não muda o fato de que
não fui sincero.
Meu telefone toca alto, e me solto do abraço dele, correndo
até o aparelho, desejando que Melissa esteja retornando uma das
várias ligações que fiz. Desde que saí do solário, depois da
conversa com meu pai, e descobri que ela havia saído, estou à sua
procura, porém, não consigo obter nenhuma resposta. Ela não
atende o telefone, por sinal, até o desligou e não respondeu a
nenhuma mensagem.
O número na tela é desconhecido, mas, como ela pode estar
usando outro aparelho, atendo-o assim mesmo:
— Alô!
— Madonna Santa, que demora! — A voz não me é estranha,
mas não consigo me lembrar de onde a conheço. — Não costumo
ajudar um stronzo, mas, como já passei por isso, senti que deveria
lhe dar uma oportunidade de não perder a mulher maravilhosa que,
Dio solo sa, te ama.
— Frank Villazza?
— Quem mais seria? — Respira fundo, impaciente. — Escuta
com atenção: minha Bella está com a Mel e acaba de me dizer que
ela pretende embarcar para o Brasil nesta madrugada. — Meu
coração quase para, e, imediatamente, penso em sair correndo para
o aeroporto. — Antes de eu facilitar sua vida e lhe falar em qual voo
ela pretende partir, quero saber se você realmente a ama.
— Eu não entendo por que isso é...
— Cazzo, estou tentando te ajudar porque minha Bella diz
que vale a pena, mas vi Mel nascer e crescer, além do mais, ela é
minha cunhada, então...
— Eu a amo, Frank Villazza. Melissa é a mulher da minha
vida.
— Va bene, anota tudo aí para não fazer mais merda.
Não o mando tomar no cu porque ele está me ajudando e
presto atenção em tudo o que diz, horário, portão, número do voo e,
quando desligo, olho para meu irmão.
— Veio com qual carro?
Aaron sorri animado.
— Com a Lamborghini. — Balança o chaveiro. — Para onde
vamos?

Correr pelo corredor de um aeroporto no meio da madrugada


não é algo que pensei que faria, ainda mais com meu irmão junto a
mim, atraindo todos os olhares, afinal, o rostinho dele tem aparecido
em todo lugar desde que começou a campanha para o Senado.
Encaminho-me para a área de embarque e vejo Melissa
colocar sua bolsa e a mala de mão na esteira, antes de passar pelo
detector de metais.
— Merda, ela vai entrar no embarque! — Corro feito um louco
para ficar mais perto e, assim que ela tira os sapatos, o desespero
me bate, e grito: — Melissa!
Ela para, olha em volta e, quando me vê, parece assustada.
A guarda que está fazendo a inspeção pergunta algo para ela, mas
Melissa nega e volta a calçar os sapatos.
Respiro aliviado, mas não paro de correr até alcançá-la.
— Senhor, sua passagem, por favor. — O segurança me
para.
— Não vou embarcar — explico. — Estou tentando impedir
que a mulher que eu amo vá embora.
— O senhor não pode ficar aqui...
Abro a boca para discutir com o homem, mas sou impedido.
— Tudo bem, Adam, ela já está voltando — Aaron fala ao
meu lado, fazendo com que eu recue.
O guarda olha meu irmão com curiosidade e sorri.
— Senhor Stone, pode contar com meu voto!
Aaron fica um tanto desconfortável, mas sorri e lhe agradece.
Não presto mais atenção ao que eles dizem, pois, à medida que
Melissa se aproxima, as batidas do meu coração parecem me deixar
surdo.
— O que você veio fazer aqui? — ela me pergunta assim que
ficamos perto e olha para meu irmão. — Como soube que eu...
— Precisamos conversar.
Ela nega.
— Eu preciso entrar, o embarque é daqui a 40 minutos.
Tento novamente, disposto a ajoelhar-me na frente dela se
necessário.
— Vem comigo, por favor!
— Adam, acho que não é o momento para...
Aaron entra na minha frente e estende a mão para Melissa.
— É um prazer finalmente conhecê-la. — Sorri. — Sou
Aaron, irmão desse idiota aqui.
Ela parece confusa, mas o saúda de volta.
— Eu o reconheci, é um prazer.
— Eu sei que meu irmão fez merda, mas acho que vocês
devem conversar antes de embarcar. Se, em 40 minutos, esse
parvo não a convencer a ficar, eu mesmo a acompanho até aqui de
novo.
— Obrigado pela ajuda — agradeço-lhe puto, falando
entredentes, e o desgraçado só balança os ombros.
— Você mentiu para mim... — Melissa sussurra, e sinto toda
sua mágoa em cada palavra.
— Eu sei, fui um idiota, mas, por favor, me deixa explicar.
Ela suspira, olha para o relógio e finalmente assente,
fazendo-me ficar aliviado por pelo menos ter condições de tentar.
— Um café, porque tenho pouco mais de meia hora antes do
embarque.
Concordo, mesmo que tenha vontade de dizer-lhe que ela
não estará naquele avião, nem que, para isso, eu precise me deitar
na frente dele!
— Um café — concordo.
— Eu seguro isso! — Aaron pega a valise das mãos dela. —
Ficarei aqui, esperando a decisão de vocês.
Ele sorri encorajador, e eu rolo os olhos, louco de vontade de
levantar o dedo do meio e mandá-lo à merda.
Vamos até a cafeteria em total silêncio, tensos. Nunca senti
Melissa tão distante como neste momento, nem mesmo quando ela
invadiu o escritório da TGS e jogou seus prêmios sobre a mesa.
— O que vai pedir? — pergunto assim que nos acomodamos.
— Água.
Peço duas águas e, assim que ficamos a sós, decido
começar o assunto.
— Eu deixei que você acreditasse que eu tinha problema de
fertilidade, e isso foi um erro gigante, do qual me arrependo. —
Melissa me olha séria. — Mas, acima de tudo, arrependo-me das
minhas decisões passadas. Quando você me disse sobre sua
vontade de ser mãe, eu me senti o homem mais desgraçado do
mundo por não poder realizar o sonho da mulher que amo, só que,
mais do que isso, senti-me infeliz ao perceber que eu também
queria ter um filho seu e não poderia ter.
— Por que não me disse a verdade?
— Tive medo de te perder, mas, acima de tudo, temia te
causar mal. — Melissa parece confusa. — Meu pai perdeu as
mulheres que amava depois de terem um filho. A mãe de Aaron
sofreu um acidente de carro quando estava com sete meses de
gravidez. Conseguiram salvar meu irmão, mas ela faleceu. Papai
ficou anos em depressão, até que conheceu minha mãe. — Melissa
fecha os olhos, notavelmente consternada. — Ela se chamava Maria
José e era empregada doméstica de uma das mansões vizinhas à
nossa. Meu pai conta que a conheceu na praia e ficou encantado
com ela. Os dois ficaram juntos por meses, mas ele não conseguiu
enfrentar o preconceito e assumi-la. Então ela foi mandada embora
e desapareceu. Ele nunca se perdoou e, anos depois, soube que ela
havia morrido ao dar à luz um filho seu no México.
— Adam...
— Eu vivia em extrema pobreza, sem comida, e já trabalhava
com meu avô, mesmo pequeno. Lembro-me pouco, tenho algumas
memórias do lugar, da alegria de correr pelo descampado em
liberdade, mas também da fome e do frio à noite. Meus avós nunca
falaram de minha mãe, mas cuidaram de mim do jeito que
conseguiram. — Engulo em seco, pensando na vida que levava e na
guinada que deu logo depois do meu aniversário de sete anos. —
Quando meu pai apareceu, quis melhorar a vida deles, mas meu
avô era muito orgulhoso para aceitar e só deixou que Joshua me
levasse e me assumisse. Minha vida mudou a partir daí, mas nunca
deixei de ser o garoto que chegou descalço, desnutrido e sem saber
falar inglês a uma mansão de Beverly Hills. — Balanço a cabeça. —
Pelo menos nunca havia acontecido isso com um futuro herdeiro.
— Eu não tinha ideia de que sua história era assim.
— Eu tive sorte, Melissa, apesar de todos os percalços, tive
muita sorte. — A água chega, mas não toco na bebida. — Era
desprezado, perseguido, mas, ainda assim, era um Stone. Os
garotos da alta-sociedade diziam que eu era um estranho no ninho,
e era exatamente assim que me sentia. — Tomo fôlego antes de
continuar: — Meses depois de minha chegada, os gêmeos
nasceram, e meu pai retornou da fazenda da família apenas com as
crianças e com tia Bea, pois a mãe dos meninos também havia
morrido. — Melissa arregala os olhos. — Só fui me dar conta do que
estava acontecendo nessa época. — Bem, pelo menos ao que eu
pensava que estava acontecendo!, concluo, lembrando-me da
história que meu pai me contou no solário. — Aaron e eu, um dia,
comentamos sobre isso, sobre o azar de nosso pai, então ouvimos
tia Bea falar umas coisas estranhas sobre o diário do nosso tataravô
e a maldição dos Stones...
Melissa arregala os olhos.
— Maldição?
Suspiro.
— Sim. Descobrimos que todas as esposas, geralmente as
primeiras, dos nossos ancestrais morreram depois de terem o
primogênito. — Melissa abre a boca, pasma. — Foram situações
diferentes, mas aconteceu desde o pai do nosso tataravô, e ele
registrou sua viuvez como uma maldição causada pela mina de ouro
que havia descoberto. Na época, ele fechou a mina, proibiu que
extraíssem o metal da terra e começou a criar gado. — Vejo os
olhos de Melissa se encherem de lágrimas. — E seguiu assim,
Stone após Stone, por algum motivo. Até mesmo meu pai perdeu
sua mãe, e quem o criou foi a segunda esposa de meu avô, a mãe
de tia Bea.
— Meu Deus do Céu! — Ela parece realmente abalada. — E
você achou que iria acontecer contigo?
— Ou com Aaron — confesso, sentindo-me meio sem jeito.
— Era adolescente e fiquei muito impressionado com a descoberta.
Cresci acreditando piamente nisso e temendo, um dia, engravidar
uma moça e condená-la à morte.
Melissa mal respira.
— Por isso decidiu se esterilizar?
— Sim. Meu irmão e eu estávamos conversando, bêbados,
quando o assunto surgiu e, tempos depois, já fizemos a cirurgia. Foi
tudo muito rápido, pois pulamos várias etapas. — Olho para as
minhas mãos e lembro-me do dinheiro astronômico pago ao médico.
— Namorava a Hillary na época, e, realmente, nós nunca falamos
sobre ter filhos, por isso não contei, mas, assim que soube que ela
estava tentando engravidar, disse a verdade.
— Por isso o casamento acabou?
Nego.
— Nosso casamento nasceu morto, Melissa. — Ela não
entende o que quero dizer com isso. — Eu disse a você que não era
bem-visto no meio em que cresci, então, quando tive a oportunidade
de namorar justamente a mais popular de todos da minha idade,
não perdi a chance. Nos dávamos bem, no começo era divertido,
porque via os outros homens putos por eu estar com ela. Nos
distanciamos por causa da universidade, eu fui para Boston, e ela,
para Columbia, mas nos reencontramos e reatamos depois. Eu
ainda tinha essa sensação de não pertencimento, de ter de provar
meu valor, e achei que, me casando com ela, conseguiria isso.
— Meu Deus, Adam!
— Hillary, por sua vez, também se casou comigo interessada
em algo além de mim. A família dela é tradicional, mas não tem o
dinheiro que os Stones têm. — Melissa assente, compreendendo. —
Um bebê iria garantir a ela o prestígio e uma fortuna quando nos
divorciássemos.
— O acordo pré-nupcial?
— Sim, usei o mesmo que meu pai sempre utilizou e não me
atentei àquela maldita cláusula. — Dou de ombros. — Cometi uma
sucessão de erros, mas nenhum me faz sentir mais dor do que ter
escondido de você o que fiz.
Ela suspira.
— Eu odeio mentiras, Adam. Acho difícil voltar a confiar em
alguém depois de descobrir que fui enganada. — Ela soluça. —
Entendo, em parte, tudo o que você fez, mas não o fato de ter
mentido para mim.
— Eu sei, lamento por ter feito isso, mas, se te contasse que
havia feito vasectomia, você poderia querer tentar uma reversão, e a
ideia de te deixar grávida era apavorante, entende? — Bufo e
admito: — Ainda é! Desejo muito ter um filho com você, mas prefiro
nunca te perder.
Melissa soluça.
— Isso não vai acontecer...
— Eu sei, é um medo irracional, e prometo que vou buscar
ajuda para superá-lo. — Pego sua mão. — Eu amo você, Melissa,
quero ter uma vida, uma família ao seu lado. Por favor, me perdoe!
Não sei quanto tempo se passa, mas parece que horas
transcorrem enquanto espero que ela responda. Tudo parece em
suspenso, parado, como numa cena de filme em que todos
congelam e fica apenas o casal e uma batida forte de coração,
martelando, pulsando de maneira ensurdecedora.
— Eu amo você, Melissa, quero ter uma vida, uma família ao
seu lado. Por favor, me perdoe!
Fico olhando para Adam, absorvendo tudo o que ele me
falou, tentando colocar-me em seu lugar. Já sabia que havia algo
obscuro na infância dele. Sempre falou de seu pai quase como um
herói, e nunca falava de sua mãe. Agora eu sei por quê, ele não a
conheceu!
A história sobre a viuvez dos homens da família realmente
deve tê-lo impressionado muito quando jovem, a ponto de fazer com
que tomasse a decisão que tomou. Percebi que a ideia de me ver
grávida era algo que o angustiava, mas achei que era por eu gerar
um filho de um desconhecido, não pelo medo de que eu morresse
no parto ou algo assim.
Entendo sua decisão, compreendo seu medo. No entanto,
saber que ele não me contaria nada disso se sua ex-mulher não
tivesse revelado daquele jeito ainda me magoa.
— Eu também amo você, Adam. — Não posso mentir quanto
a isso.
Ele me olha desanimado.
— Mas...
— Não posso dividir minha vida com quem não confia em
mim, com quem mantém segredos que afetam a nós dois. — Ele
concorda. — Compreendo seu medo, mas eu quero um filho, seja
como for que ele venha.
— Eu também quero! Nunca senti tanto arrependimento por
algo na vida como naquela noite em que saí do seu apartamento e
fiquei no apart-hotel. Apesar de tentar me convencer de que foi
melhor ter feito a vasectomia, pois assim não a colocaria em risco,
eu ficava imaginando um filho nosso. — Fecha os olhos, e vejo seus
cílios úmidos. — Percebi que não era apenas o seu sonho, era o
meu também.
— Não vou mentir que saber que temos uma chance não me
anima.
— Eu sei que vai ser complicado, mas estou disposto a
buscar ajuda. Tive uma conversa com meu pai e descobri que
muitas das coisas que fantasiei quando garoto sobre o que
acontecia eram apenas informações pela metade. — Ele sorri. —
Criei verdadeiros bichos-papões apenas com sombras. — Adam
toma fôlego. — Podemos tentar reverter ou, caso não seja possível,
tentar a fertilização com doador anônimo ou a adoção. — Seguro o
fôlego ao ouvi-lo dizer isso. — De qualquer forma, eu quero ter uma
família contigo, o que te disse não era mentira! — Não consigo mais
conter as lágrimas, e Adam seca meu rosto, fazendo carinho. —
Não posso prometer que nunca mais a farei chorar, Melissa, apenas
que não por esse motivo. Dou minha palavra de que não haverá
mais mentiras entre nós, nem omissões. — Aperta minha mão e
acaricia o anel, que ainda está no meu dedo. — Só não me deixe,
por favor! Não consigo mais imaginar minha vida sem você.
A verdade é que, ainda que eu esteja magoada, também não
me imagino sem ele. Adam é o homem que eu amo, com quem
sonho estar junto e formar uma família, ainda que não tenhamos
filhos. Estar com ele não é abrir mão dos meus sonhos, mas
concretizá-los.
— Tudo bem por aqui? — Aaron para ao lado de nossa
mesa, segurando minha valise, e Adam o fuzila com os olhos. — Só
vim avisar que já chamaram o voo para São Paulo, Melissa.
Sorrio.
— Obrigada por avisar, mas acho que vou deixar meu lugar
vago.
O candidato ao Senado abre um enorme sorriso e dá uns
tapas tão fortes nas costas de Adam que chegam a sacudi-lo.
— Vão precisar de uma carona ou...
— Some, Aaron! — Adam rosna para ele, que imediatamente
deixa minha pequena mala na mesa e se despede.
— Foi um prazer conhecê-la, Melissa, nos encontramos em
breve.
— Não muito breve, se depender de mim! Some, Aaron! —
Adam repete, mas sorri. — Obrigado pela ajuda, irmão!
— Sempre que precisar!
Ele nos deixa a sós, e Adam finalmente abre o sorriso que
me conquistou desde o princípio.
— Vamos para casa? — sugere.
— Não dá. — Ele fica sério, e eu tenho vontade de beijá-lo.
— Nossa casa fica em São Paulo, mas podemos ir para seu
apartamento em Santa Monica.
Adam deixa algumas notas de dinheiro sobre a mesinha do
café, pega minha mala e estende a mão para mim.
— Vamos conseguir um táxi!
Gargalho, feliz por termos nos acertado, e ele me abraça
forte antes de tomar todo meu fôlego em um beijo cheio de desejo,
desespero e amor. Perco-me nos seus lábios, na maciez de sua
língua, que busca contato com a minha o tempo todo, e agarro-me
em seu pescoço, esticando-me toda para sentir seu corpo no meu.
— Procurem um quarto! — alguém grita.
Nós nos separamos, e ele começa a rir. Antes de retomar o
caminho para fora, responde bem alto:
— Obrigado pelo conselho, é exatamente o que vamos fazer!
Meus Deus!
— Eu gosto de pensar em nós dois velhinhos morando aqui.
O que acha? — comento enquanto escovo os dentes.
— Neste apartamento ou em Los Angeles?
Rio, cuspo a pasta e respondo:
— Em Los Angeles. O clima é bom, tem belas praias e, nas
montanhas, há uns lugares lindos e tranquilos, caso quisermos fugir
da agitação da cidade.
— Mas e nossos filhos?
Suspiro ao pensar em filhos e por ouvi-lo falar do assunto de
maneira natural e desejosa.
— Eles podem vir estudar aqui, nos Estados Unidos, como
você.
Adam me abraça pelas costas e me olha através do reflexo
do espelho.
— Gosto da ideia! — Cheira meu pescoço, fazendo minha
pele arrepiar-se. — Talvez tenhamos que vir morar aqui antes disso,
caso Aaron se eleja e se dedique de vez à política. — Não entendo
muito bem o que ele quer dizer, então Adam explica: — Meu pai vai
se aposentar um dia, e eu sou o próximo a lhe suceder, já que
Aaron não poderá.
— Ah... — Sorrio. — Tudo bem, nós vamos nos adaptando de
acordo com que as coisas forem acontecendo.
Ele concorda.
— Eu sei que você quer estar perto de sua família e que seu
pai conta contigo para tocar o escritório. Por isso, apenas se for
realmente necessário é que precisaremos nos mudar para cá, pois
posso fazer meu trabalho de qualquer lugar do mundo.
Viro-me de frente para ele e o beijo.
— Já disse o quanto te amo?
Adam sorri e finge pensar.
— Acho que ouvi algo entre gemidos quando a estava
chupando há pouco.
Sinto meu rosto arder e, pelo brilho de divertimento nos olhos
dele, devo estar corada, mas admito que tem razão.
Estamos em uma espécie de lua de mel antecipada há dois
dias. Desde que ele foi me impedir de voltar ao Brasil, nós nos
fechamos em seu apartamento e temos dedicado o tempo a amar,
cuidar e conversar um com o outro. Avisamos a todos, claro, e
pedimos um tempo somente para nós.
Não foi fácil entender os motivos que o levaram a mentir para
mim, mas pude perceber que seu pedido de perdão era sincero e
que sua vontade de estar ao meu lado, de termos uma família,
também. Nós nos amamos e merecemos uma chance de ser felizes.
— Tem certeza de que não quer estender a viagem por mais
alguns dias? — Adam pergunta, aparando sua barba. — Podemos
seguir para Nova Iorque e...
— Seria ótimo, mas, com a inauguração da TGS São Paulo
antecipada, preciso estar lá. — Ele concorda. — Além disso, tenho
de reorganizar minha agenda para uma viagem mais longa.
Ele sorri e me abraça pela cintura.
— Está pensando em me fazer esperar para realizarmos um
grande evento de casamento?
Franzo a testa e nego.
— Nunca sonhei com isso! Tudo o que preciso é das pessoas
que amamos por perto, talvez um pequeno bolo e algumas taças de
champanhe.
— Perfeito, então! Quanto tempo vai levar para preparar
isso?
Gargalho.
— Não sei, vamos procurar saber assim que chegarmos ao
Brasil.
— Não quero demorar demais para ter você oficialmente
minha! — Beija meu pescoço. — Acha que vamos conseguir
decorar o apartamento a tempo?
Respiro fundo, lembrando-me do tamanho do lugar e de
todas as coisas que precisarei comprar.
— Vou ter sua ajuda?
Adam arregala os olhos.
— Minha experiência com decoração se limita ao que você vê
aqui. — Aponta seu apartamento. — Mas, ao seu lado, posso
aprender qualquer coisa. — Beija-me, e sinto o delicioso cheiro do
balm de barba que usa. — Eu te amo.
O simples encostar de lábios logo se torna intenso, molhado.
Sinto as mãos de Adam por todo o meu corpo, sua pele quente
contra a minha e a inegável excitação que estica sua cueca
esmagando-se entre nós.
— Adam... — gemo, porque ele aproveita que separei minha
boca da sua e começa a lamber meu pescoço. — Precisamos ir até
a casa do seu pai... Já estamos atrasados.
Ele para e fica abraçado a mim, seus braços me mantendo
firme contra seu corpo, enquanto respira e se acalma.
— Tem razão. — Balança a cabeça e se afasta. — Mas
vamos ficar lá apenas o necessário, porque ainda não consigo
encostar em você e não te querer nua, se contorcendo sob mim,
enquanto estou dentro de você.
Beijo suas costas.
— Prometo não demorar demais.

— Não vou poder cumprir minha promessa! — sussurro,


rindo, assim que chegamos à mansão dos Stones em Beverly Hills.
Marcamos com o pai de Adam um pequeno jantar apenas
para tirar aquela sensação ruim que restou do chá que terminou
com a inesperada aparição de Hillary.
— Eu quero conhecê-la melhor, Adam — alegou, ao telefone,
Joshua Stone. — Pedir desculpas pelo que houve aqui e dizer a ela
que estamos felizes que vocês se reconciliaram.
Adam sorriu e me olhou esperando que eu concordasse.
— Pode contar conosco, senhor Stone — respondi, pois
estávamos em viva-voz.
— Ah, Mel, já disse que pode me chamar de Josh, afinal
espero que em breve você se torne uma filha.
Tinha como eu resistir a um homem desses?!, penso,
olhando em volta da sala da mansão onde, aparentemente, o
“jantarzinho” se tornou uma comemoração. É claro que não é a festa
de noivado que eles planejaram, mas eu me sinto muito mais feliz
ao ver o pequeno grupo do que a grande multidão que Adam contou
que seu pai gostava de convidar.
— Mel! — Isabella me cumprimenta. — Seu sogro é um amor
de pessoa!
Assinto, olhando-o com ternura.
— É, sim! Nos pegou de surpresa.
Frank cumprimenta Adam, dando um tapa em suas costas e
falando algo sobre uma dívida. Rio, pois sei que foi ele quem deu a
informação sobre meu voo e minha volta ao Brasil para que ele
pudesse ir atrás de mim no aeroporto.
— Obrigada, Frank! — Abraço-o. — Sempre fiquei puta com
seu jeito de se meter na vida alheia, mas, desta vez, eu lhe
agradeço.
Ele ri.
— Minha Bella quase arrancou minha pele, mas eu precisava
retribuir o que você fez quando sua irmã e eu nos desentendemos e
percebi que esse stronzo realmente amava você.
— E amo mesmo, muito! — Adam envolve minha cintura com
seu braço. — Ah, Melissa, meus irmãos estão aqui também!
Vejo-o chamá-los para nos apresentar e sinto um frio na
barriga, pois ainda não tive a oportunidade de conhecer os gêmeos.
— John e Jeremy. — Ele aponta para cada um deles. — Essa
é minha futura esposa, Melissa Boldani.
— É um prazer conhecê-la, Melissa — Jeremy me
cumprimenta com um sorriso sedutor.
Os dois não são absolutamente parecidos em nada, embora
conservem os mesmos traços. Um é loiro e possui olhos verdes, e o
outro é moreno – não tanto quanto Adam – e com olhos azuis.
— Finalmente conheço a famosa Melissa Boldani. — John
olha para Adam de um jeito estranho. — Era eu quem estava no
Brasil e quem não conseguiu entender bem seus projetos.
Abro a boca, lembrando-me disso, e ele sorri sem jeito.
— Não ligue para isso! Esse idiota não consegue enxergar
algo bonito nem se usar óculos! — Jeremy o provoca, mas posso
sentir carinho e diversão em suas palavras.
Cumprimento os dois e peço a John para esquecer o que
passou, afinal ele me matou de raiva, mas nunca tivemos um
embate.
— Sorte a sua, meu irmão, porque, do jeito que essa mulher
é brava... — Cutuco Adam antes que conte sobre minha cena em
seu escritório. — Fico feliz que tenham finalmente se conhecido em
bons termos. — Ele acena para um convidado que também não
conheço. — Charlie está aqui!
Olho para o famoso melhor amigo de Joshua Stone, quase
um segundo pai para seus filhos. Adam me contou sobre ele e como
foi importante seu apoio à família Stone por todos esses anos.
Somos apresentados, e percebo o quanto o homem é
carinhoso e muito observador e como ama essa família como se
realmente fosse a sua.
A tia de Adam, Bea, se junta a nós na conversa, contando
como foi difícil convencer Joshua de que uma recepção pequena
seria melhor diante de tudo o que aconteceu.
— Agradeço-lhe seu bom-senso, tia. Nem Melissa nem eu
queríamos passar a noite cercados de pessoas além das que estão
aqui e que são preciosas para nós dois.
— Sua tia sempre foi uma mulher sensata, mesmo quando
toma decisões difíceis — Charlie elogia, e Bea fica levemente
corada.
— Será que posso dar um abraço na minha cunhada? —
Aaron aparece ao meu lado de repente.
O irmão mais velho de Adam é realmente um homem
impressionante. Sua postura chama atenção, e ninguém pode negar
que tem um charme e um magnetismo capazes de encantar a
maioria das mulheres. Quando o olho, vejo um daqueles políticos de
filme, solteiro, bonito, bem-sucedido e que desfila com beldades. Só
resta saber se a vida dele vai ser tão clichê quanto a ficção e vai
fazê-lo apaixonar-se sem querer por uma mulher que chega para
virar sua existência de cabeça para baixo.
Tomara!, penso ao abraçá-lo, pois Adam me disse que é
cínico e completamente cético com relação ao amor.
De repente ouvimos o tintilar de uma taça de cristal, e vejo
Joshua Stone no centro da sala.
— Esta noite não temos uma celebração comum — ele sorri
—, e não digo isso pela falta de uma multidão de convidados. —
Tereza balança a cabeça, rindo. — Esta noite estamos celebrando
uma união por amor, como deveriam ser todas! Sou um homem que
acredita no amor verdadeiro e que preza a sinceridade desse
sentimento, por isso ver meu filho querido tão apaixonado é a
melhor coisa que eu poderia esperar da vida. — Sinto Adam respirar
fundo e reter o fôlego por um momento. — Desejo que Adam
demonstre a Melissa todos os dias o quanto a ama e que se sinta
correspondido na mesma medida. Desejo aos dois muita felicidade,
prosperidade e, principalmente, muita paixão. — Joshua abraça a
esposa. — O amor nos mantém unidos, mas a paixão é o
ingrediente que dá liga a essa união. — Ergue a taça de champanhe
e espera que um garçom sirva um cálice para cada convidado. — A
Melissa e Adam!
Todos repetem o brinde, e Adam beija minha mão bem em
cima de onde colocou o anel de noivado.
— Eu amo você, Melissa, e, quanto à paixão, posso dizer que
nunca irá faltar. — Abraça-me e sussurra: — Inclusive, neste
momento, estou pensando em como despistar a todos e demonstrar
toda minha paixão por você lá em cima, no meu antigo quarto.
— Vamos pensar num jeito juntos! — respondo, e ele
gargalha, erguendo-me em seus braços e beijando-me com todo
amor e paixão que eu nem sonhava que podiam existir para mim.
Mas existe, eu só não tinha encontrado ainda!
Meu primeiro casamento foi realizado com pompa e
circunstância, mas pelos motivos errados. Foram mais de dois anos
de preparação, além de muitas discussões e ausências. Era um
protocolo, um rito, e nenhum de nós dois estava pensando em nada
além da opinião alheia.
Agora, meu segundo – e último! – casamento segue sem
nenhuma semelhança com o primeiro, pois, além de Melissa e eu
nos amarmos, realmente não estamos preocupados com aprovação
ou qualquer coisa que não a nossa felicidade.
— Pronto, agora você parece um noivo! — Aaron debocha
assim que ponho na lapela o cravo que minha sogra deixou há
pouco comigo.
— Ainda espero um dia retribuir todas essas piadinhas —
falo, olhando-o através do reflexo no espelho.
Ele faz careta e arruma sua gravata.
— Já te disse que o máximo que chegarei perto de um altar é
sendo seu padrinho. — Estremece. — Só de pensar em passar a
vida inteira com a mesma mulher, sinto calafrios.
— Posso te garantir que calafrios são a última coisa que vai
sentir quando estiver apaixonado.
— Não é para mim. — Dá de ombros. — Sou pragmático
demais para me deixar levar por páthos[34]. Prefiro as relações
físicas bem entendidas e limitadas.
Balanço a cabeça.
— Quando acontecer, não vão importar suas preferências,
pode apostar.
Aaron ergue seu copo de uísque.
— Então que nunca aconteça!
Não tenho tempo de dizer a ele que, sim, pode nunca
acontecer ou, simplesmente, pode já estar em curso. Ninguém
escolhe se apaixonar, só sente, é envolvido pelo sentimento de
forma irremediável. Podemos nos retrair, esconder, negar, mas
escolher não sentir é impossível.
Termino de me arrumar e olho para o relógio, arrancando
gargalhadas do meu irmão.
— Calma, homem, já está quase na hora! Que pressa!
— Não é pressa, apenas já esperei tanto para encontrá-la
que não vejo a hora de tê-la comigo.
Aaron sorri.
— Ela já está contigo.
Assinto, pois é verdade. Mesmo assim, unir nossas vidas
deixa tudo mais forte e real, e tenho esperado demais por esse dia.
Sei que posso estar exagerando, pois ficamos noivos há quase dois
meses, mas nossa rotina tem sido tão intensa com todos os
preparativos que pareceram anos.
Primeiro, foi a inauguração da loja no Brasil – que, por acaso,
foi um sucesso – e a decoração do apartamento. Na primeira
semana, arrependi-me de ter comprado algo tão grande, porque
enxerguei o enorme trabalho que ia dar à Melissa.
Ajudei-a em tudo, nunca vi tantos catálogos de móveis nem
visitei tantos designers em toda minha vida. Ela desenhou os
móveis e contratou uma empresa para executar o projeto, depois foi
em busca de todos os itens que não eram sob medida e, por fim, fez
o paisagismo e escolheu obras de arte.
Só terminamos tudo há uma semana. Melissa recebeu suas
amigas para um chá de casa, e minha participação foi fazer e servir
os drinques, enquanto a mulherada se divertia com minha noiva.
Além da rotina com os preparativos, continuei o meu trabalho
no escritório da TGS e acompanhei de perto o primeiro mês de
vendas da loja, já estudando a possibilidade de abrir outra unidade
no Rio de Janeiro. Visitei um médico para saber da possibilidade de
reversão e fiz um espermograma, que revelou que não só era
possível, como parte do canal já havia se regenerado, pois havia
uma porcentagem baixa de espermatozoides no meu sêmen.
— Mas isso é possível?
O doutor riu.
— Não só é, como acontece mais do que imaginamos, por
isso a recomendação de fazer a contagem de ano em ano. — Dá de
ombros. — A maioria dos homens não faz, porque acha que
vasectomia é um método 100% eficaz. Houve um caso, há pouco
tempo, de um homem que engravidou sua mulher mesmo depois de
quatro anos de vasectomia e ainda processou o médico. —
Balançou a cabeça, reprovando.
Senti uma esperança crescente de poder ter um filho com
Melissa e marquei o procedimento de reversão para depois da
nossa lua de mel. Contei a ela sobre o que o médico havia dito, e
reagiu chorando e me abraçando.
— Não quero criar muitas expectativas, porque, se não der
certo, nós podemos adotar...
— Ou fazer a fertilização com doador anônimo — completei.
— Eu gostaria de vê-la grávida.
Melissa sorriu e concordou. Tudo isso nos deu o “gás”
necessário para continuarmos na rotina intensa em que estávamos,
até que, no meio desta semana, estávamos tão cansados que
jogamos todos os compromissos para o alto, pegamos o carro e
fomos passar uns dias no litoral, onde dormimos até a hora que
quisemos, fizemos amor e curtimos dias de sol.
Uma batida forte à porta me faz olhar para o relógio
novamente e estranhar, pois ainda falta mais de meia hora para o
horário marcado para a cerimônia no jardim da casa de Julio
Boldani.
Um juiz de paz vai realizar o rito, depois teremos a bênção de
um padre amigo da família, e então vamos partir o bolo e brindar
com champanhe, exatamente como Melissa queria.
Entre os convidados, estão apenas nossos familiares e
alguns amigos, o número não passa de 50 pessoas.
— Adam? — A voz preocupada de Isabella me faz correr até
a porta do quarto e abri-la.
— O que houve? — pergunto com o coração disparado.
Ela respira fundo, e minha cabeça dá voltas, imaginando que
Melissa tenha se arrependido e desistido de se casar comigo.
— Mel passou mal, desmaiou. Chamamos um médico...
Saio do quarto correndo, indo na direção da suíte de Julio e
Hilda, onde Melissa está se arrumando. Isabella corre em meu
encalço, tentando dizer que ela já está bem, mas não paro para falar
com ela, desesperado para ver a mulher que amo.
Abro a porta e vejo Melissa deitada na cama, usando ainda
seu roupão de noiva e com os cabelos penteados. Ela está com o
rosto vermelho de chorar, e, assim que me vê, as lágrimas voltam a
descer pelo seu rosto.
— Melissa, pelo amor de Deus, o que você está sentindo? —
pergunto, sentindo uma pontada forte de medo no coração.
De repente ela sorri, mesmo com as bochechas molhadas.
— Eu estou feliz! — Porém, ao contrário do que alega, soluça
feito uma criança.
Franzo a testa sem entender, confuso, olho para Isabella
tentando buscar algum tipo de resposta que faça sentido. Contudo,
minha cunhada também está sorrindo e chorando.
Caralho, o que aconteceu?
— Passou mal porque está feliz? — inquiro devagar, tentando
fazer com que me conte tudo o que aconteceu.
Isabella se move ao meu lado e põe a mão no meu braço.
— Vou deixar vocês a sós, mas, Adam, não demore muito,
ainda preciso ajudar a Mel a se vestir.
Assinto, e ela fecha a porta atrás de si, então vou até onde
minha noiva está e sento-me ao lado dela na cama.
— Melissa, por favor, me diga o que aconteceu.
Ela suspira.
— Promete que não vai surtar? — Respiro fundo diante da
pergunta, já imaginando que seja algo muito sério. — Aconteceu um
milagre, Adam!
Ela vai me matar se ficar dando voltas desse jeito! Tento me
acalmar e a toco, pegando sua mão.
— Do que você está falando? Eu não estou entendendo
nada!
Melissa leva minha mão, que está apertada na sua, e a põe
sobre sua barriga. Quando seus olhos verdes se encontram com os
meus, fico parado, as ideias se passando pela minha mente, e eu
achando todas incríveis demais para serem verdade.
— Eu já havia notado que estava atrasada, mas achei que
era por causa da ansiedade e do cansaço... — Arregalo os olhos, o
coração disparado, a boca seca. — Mas não! Hoje, quando
desmaiei e a Isa chamou o médico, ele me perguntou sobre a
possibilidade...
— Melissa, você está querendo dizer que...
Ela estica a mão livre e pega um objeto em cima da mesinha
de cabeceira. Pego o teste com mãos trêmulas, vendo ali duas
linhas rosa, mas nada escrito.
— Isabella pediu para alguém comprar um teste... — Melissa
soluça. — Está confirmado.
Fico lívido, o coração disparado, as mãos suando. Fecho os
olhos para combater o medo que, involuntariamente, vem como uma
sombra sobre a felicidade que sinto. Tento não pensar em tudo o
que aconteceu com meu pai e com as mães dos primeiros Stones a
nascerem... Foi só coincidência, Adam!
— Ei, tudo bem?
A voz de Melissa, bastante preocupada, faz-me expulsar
todos os demônios que insistem em dizer que vou perdê-la. Suspiro,
abro os olhos e um sorriso.
— Eu vou ser... pai. — A última palavra sai baixinha, trêmula,
e, sem que eu possa controlar, sinto uma lágrima quente descer
pela minha bochecha.
Melissa seca meu rosto, beijando-o logo depois.
— Ainda quero fazer o teste laboratorial, mas meu coração
diz que é verdade!
Por incrível que pareça, também sinto que é. A contagem,
baixa, mas existente, de espermatozoides no meu esperma era um
sinal de que havia a possibilidade, embora remota. Penso na
reversão marcada e na história que o médico contou sobre a
regeneração do canal e do homem que engravidou a esposa. Era
possível. Eu não acreditava, mas aconteceu.
— Está tudo bem? — ela pergunta preocupada, acariciando
meu rosto. — Adam?
Tento sorrir, mas tudo o que consigo é soluçar.
— Nós vamos ter um filho! — Abraço-a forte. — Tem certeza
de que você está bem? Quer que adiemos o...
— Eu estou ótima! — Melissa é enfática. — Ainda um pouco
surpresa, admito, mas muito, muito feliz!
— Eu também estou! — confesso. — Mas agora só penso em
te levar ao médico para nos certificarmos de que está tudo bem e de
que é seguro...
Ela cala minha boca com um beijo longo e muito gostoso.
— Está tudo bem, Adam, nós vamos ficar bem!
Abraço-a novamente, chorando feito um menino. Beijo-a com
amor, sentindo meu coração retumbar e a alegria agitar todos os
meus músculos.
Um pigarrear nos interrompe, e olho para trás, vendo Isabella
e mais uma senhora na porta do quarto. Levanto-me, secando
minhas lágrimas, ajeito meu terno e me despeço.
— A vejo no altar! — falo para Melissa. — Eu já era um
homem feliz por você ter me escolhido e amado, agora sou
infinitamente mais.
Ela sorri, levantando-se para vestir seu traje de noiva.
— Assim como eu sou! Amo você, Adam!
— E eu te amo, Melissa!
— Gente! — Isabella ri. — Faltam menos de 15 minutos! Não
querem deixar para fazer os votos na hora certa? — Ela me
empurra levemente em direção à porta. — Converse com seu irmão,
ele está parecendo um tigre enjaulado naquele quarto, preocupado
com a possibilidade de você ser abandonado. — Ela ri. — Não lhe
contei a novidade, deixei para você fazer isso.
— Obrigado, Isabella.
Volto para o quarto, andando pelo corredor me sentindo um
homem de sorte. Quem diria que um garoto que nasceu em uma
fazendola no deserto mexicano, que não tinha um par de sapatos
quando criança, iria ser um homem tão afortunado na vida!?
E, quando me refiro a fortuna, não falo de bens materiais,
mas sim da mulher maravilhosa que a vida me presenteou em um
encontro não marcado e da bênção de receber a chance de ter um
filho seu.
O que mais eu poderia querer para ser feliz?

— Eu não consigo ficar aqui...


Começo a andar mais uma vez, mas meu irmão me detém e
coloca um copo de uísque na minha mão.
— Toma tudo! — Nego, pois tenho que estar sóbrio. — Toma
logo, ou vou meter essa bebida pela sua garganta!
Seguro o copo e viro todo o conteúdo de uma só vez na
minha boca.
— Agora sente-se, stronzo!
Respiro fundo para não mandar Frank Villazza para a puta
que pariu, então me sento em uma das poltronas vazias. Olho para
o relógio na parede e volto a suar.
— Já se passaram muitas horas.
— Demora mesmo! — Frank ri. — Minha Bella levou horas na
sala de parto, ainda mais que eram dois!
— Vai dar tudo certo, Adam! — Julio Boldani bate nas minhas
costas.
Abaixo a cabeça, apoiando meu rosto com as duas mãos, e
tento me acalmar e não ser consumido pelo medo de que algo dê
errado e eu acabe perdendo Melissa ou nosso filho.
Eu os amo demais, e pensar em... Não pense!, minha
consciência manda, e tento escutá-la, como fiz nos últimos nove
meses.
Desde que Melissa disse que estava grávida, no dia do nosso
casamento, tenho estado em constante trabalho de controle. No
começo, ainda consegui me controlar bem, aproveitando a alegria
de todos, fazendo planos com minha esposa.
Não viajamos como havíamos planejado, pois não foi
indicado pela médica que ela estivesse tanto tempo dentro de um
avião. Contudo, quando ela completou cinco meses, fomos para os
Estados Unidos, visitamos minha família, passeamos em Nova
Iorque.
Ainda não sabíamos o sexo do bebê, pois Isabella estava
preparando uma festa para revelar, mas Melissa comprou malas e
malas de roupinhas. Quando voltamos, o quarto já estava
praticamente pronto, com os móveis todos já no lugar, faltando
apenas o toque de decoração que ela fez questão de dar
pessoalmente.
Sua barriga foi crescendo, começamos a sentir nosso bebê
se mexer, e, lá pelo sétimo mês, comecei a surtar pela aproximação
do parto. Descobrimos o sexo, choramos, e, a partir daí, senti bater
forte o medo.
A cada gemido dela, eu pulava e já queria ligar para a
médica. Ligava de hora em hora para o escritório a fim de saber se
ela estava se sentindo bem e mal dormia à noite, tomando conta
dela.
— Adam, você precisa de ajuda — Melissa disse, um tanto
brava, numa noite em que, mesmo excitado como um touro, não
quis fazer amor com ela, com medo de machucá-la. — Acho que
deveria conversar com alguém, senão como vai estar até nosso
pequeno Samuel nascer?
Concordei, alisando sua barriga e me desculpando. Fizemos
amor, claro, devagar, de lado, tomando cuidado com a preciosidade
que eu tinha ao meu lado, a mulher que eu amava.
Passei a ir, uma vez por semana, a um terapeuta, e as
conversas me fizeram acalmar, pelo menos até hoje de manhã.
— Adam? — Melissa chamou, descendo as escadas.
— Estou na cozinha com Tiger. — Joguei mais um pedaço de
pão para o pequeno cachorro e sussurrei: — Segredo nosso, depois
vamos correr!
Quando ela entrou no meu campo de visão, levantei-me tão
rápido que acabei derrubando o prato com ovos mexidos que estava
na bancada.
— Tiger, tem caco de louça, não coma! — Peguei o pequeno
cão no colo e me aproximei de Melissa.
— Está sentindo alguma coisa?
Ela, que devia estar vestida para ir ao trabalho, mas que
ainda estava de pijama, negou.
— Ainda não. — Congelei diante de sua resposta, e ela
sorriu. — Minha bolsa acabou de estourar... — Apontou para a
escada. — Bem ali.
Arregalei tanto os olhos que tive que fazer respiração
cachorrinho, enquanto ela mesma ligava para a médica. Fui um total
inútil, e as funcionárias da casa foram quem ajudaram minha esposa
a se trocar e pegaram sua mala, pois eu estava imóvel com Tiger no
colo.
— Adam!
Corri atrás dela na direção do elevador, mas Melissa
começou a rir.
— Tiger não pode ir!
Olhei para o cachorro e o coloquei no chão, ajeitando meu
terno. Abracei Melissa pela cintura.
— Você está bem?
Ela assentiu, e somente quando estávamos chegando ao
hospital é que começaram as contrações. Melissa aguentava
bravamente, e eu suava e rezava todas as rezas que devia haver no
mundo.
Tentei acompanhar o trabalho de parto, mas comecei a me
sentir mal dentro da sala e fui convidado a sair, sendo substituído
por Isabella. Não aguentava ver Melissa sofrer daquele jeito.
— Está demorando dem... — Interrompo-me assim que vejo
uma enfermeira chegar com um sorriso e levanto-me da cadeira. —
Como está minha mulher?
— Muito bem e querendo vê-lo. Nós estamos transferindo-a
para um quarto, venha comigo. — Sigo-a nervoso, mas já relaxado
por saber que Melissa está bem.
— Foi tudo certo no parto, não é?
— Ela teve que fazer cesariana, mas...
— O quê?! — Paro no meio do corredor. — Por quê?
A enfermeira ri.
— O menino era grande demais, e ela não tinha passagem
suficiente. — Franze a testa. — Ninguém informou ao senhor?
Imediatamente lembro-me de quando um enfermeiro
apareceu, disse que estava tudo bem, mas falou com o doutor Julio
depois. Até cheguei a perguntar o que era, mas ele disse que foi um
recado de Isabella, nada de mais.
Chegamos ao quarto, e vejo minha esposa deitada na cama,
coberta com muitas mantas e com soro ao seu lado.
— Melissa! — Beijo sua testa, emocionado. — Como você...
— Ela não pode falar ainda, Adam — Isabella é quem
responde, entrando no quarto com um pacotinho no colo. — Por
causa da cirurgia, tem que evitar falar.
Melissa sorri ao ver o bebê, e Isabella o coloca sobre seu
peito. Minha esposa chora ao vê-lo, e eu também não consigo
segurar, soluçando feito um menino. Toco sua pequena cabeça
envolvida com uma touca. Ele é tão pequeno e lindo.
— Nosso filho... — ela diz baixinho.
— Psiu...não fale, amor. — Acaricio seus cabelos. — Ele é
lindo. Desculpe por não ter estado contigo.
Isabella ri.
— Foi melhor, pois, quando o doutor disse que teria que fazer
a cesariana, já te imaginei caindo duro na sala.
Ouço uma batida à porta e vejo a fotógrafa que acompanhou
o nascimento.
— Podemos tirar uma foto com a família?
Abaixo-me para ficar mais perto dos dois e, assim que os
primeiros clicks acontecem, vejo Samuel passar a língua na pele da
mãe e começo a rir.
— Acho que tem alguém com fome! — sussurro, e Melissa
sorri, completamente apaixonada por nosso filho. — Eu amo vocês!
Obrigado por ser essa mulher tão forte e por ter me dado esse
presente tão lindo.
Ela me fita com lágrimas nos olhos.
— Eu amo vocês também!
Beijo-a, e logo somos iluminados por mais alguns flashes.
Quatro anos depois

O casamento da minha amiga Giovanna Villazza foi lindo e


emocionante. Para quem acompanhou a história de amor dos dois,
como eu, participar daquele momento foi como ver um milagre
maravilhoso acontecendo.
Milagre...
Adam e eu fomos convidados para ser padrinhos, e fiquei
eufórica para estar com ela nesse dia. Fiz inúmeros planos de vir
mais cedo para a Itália, de ajudá-la com os preparativos, como ela
ajudou no meus, e de estar mais próxima de minha afilhada, Mia.
Todavia, não consegui.
Ainda consigo lembrar-me de quando soube que Giovanna
estava grávida, antes mesmo que ela me contasse e que me
convidasse para ser madrinha de seu bebê.
Estava no escritório, concentrada em um projeto, pouco antes
de me casar com Adam, e Frank apareceu, assustando-me como
sempre.
— Não sabe bater, Frank? — perguntei com a mão no peito.
Ele riu, debochado.
— Está nervosa, hein, Mel!? — Abraçou-me. — Eu vim
conversar com o pessoal da Novak sobre a obra do Convention. —
Bufou. — Você soube que o franguinho deixou a presidência?
Franguinho! Frank insistia em chamar o Nick assim, ainda
mais depois de Giovanna ter sofrido tanto por causa dele.
— Soube, sim, mas ele continua aqui em São Paulo mesmo e
está a acompanhar as obras.
— Tem tido contato com ele?
Estranhei sua curiosidade acerca do Nick.
— Pouco. O projeto que fiz para ele já está quase concluído,
e, bem, desde que começou a namorar a Caroline, nós nos
afastamos.
Frank balançou a cabeça, sério.
— Giovanna e ele terminaram há quanto tempo? Você sabe,
Mel?
— Uns seis meses já? — Tentei contar e cruzei os braços
curiosa. — O que está acontecendo, Frank?
Ele bufou, e percebi que estava preocupado com algo.
— Minha irmã anunciou para a família que está grávida, Mel.
— Arregalei os olhos, completamente pasma com a notícia. — Disse
que, nos dias em que esteve em Milão, conheceu alguém, fez sexo
sem proteção e acabou acontecendo. — Deu de ombros. — Você,
que a conhece tão bem quanto eu, acha que isso seja possível?
Sem chance! Mas...
— Ela estava sofrendo, pode ter descarregado o sofrimento
tentando esquecê-lo com outro...
— Acredita mesmo nisso?
Ri.
— Não. Não acredito! — Parei para pensar em tudo o que
aconteceu durante esses meses, lembrando-me do estranhamento
que me causou a repentina decisão de Giovanna de voltar para a
Itália. — Frank, mesmo depois que Gio e Nick terminaram, ela ainda
queria ficar aqui, em São Paulo, e continuar com a Ello, então, de
repente... — Pensei no tal festival do qual ela participou e na ligação
que me fez no dia seguinte, dizendo que ia embora do Brasil para
sempre. — Algo aconteceu...
Ele concordou.
— Mel, não falei disso para mais ninguém, nem mesmo para
a Bella. Mas eu penso que essa criança é dele.
Eu não podia nem imaginar isso! Será que os dois tiveram
uma recaída e ela engravidou? Se sim, por que, em nome de Deus,
ela não contou para ele? Por que os dois ainda estavam separados?
Uma criança!
— O que você vai fazer, Frank?
— Nada. Se ela não quer que ninguém saiba, é porque tem
motivos, ainda mais depois do modo como ele a tratou...
— Você perdoaria a Isabella se ela te escondesse uma coisa
dessas? — Frank arregalou os olhos. — Se ela estivesse esperando
um filho seu e não te contasse? E se você descobrisse anos
depois? Perdoaria?
— Não. Droga, Mel! O que ela está fazendo?
— Eu não sei, mas, em nome da amizade que tenho por ela,
respeito. Mas, se ela confiar em mim e me contar a verdade sobre o
bebê, direi a ela que Nicholas deve saber a verdade. Ele merece,
mesmo depois de tudo o que aconteceu entre os dois.
— Obrigado, Mel. — Sorriu, mas as linhas em seu rosto
denunciavam sua preocupação. — Já vou.
Despedi-me dele e mandei um abraço para a Isa e as
crianças.
— Nos vemos daqui umas semanas no seu casamento. —
Piscou. — Estou muito feliz por você!
— Eu também estou feliz por mim!
Depois disso, Giovanna me contou sobre o bebê, mas não
quis me dizer sobre o pai da criança, e respeitei sua vontade,
mesmo achando que estava cometendo um erro.
Ainda bem que tudo deu certo e que os dois acabaram se
reconciliando, ainda que tivessem de ter passado por tudo o que
aconteceu até chegarem a um entendimento.
Olho para o homem ao meu lado e sorrio satisfeita.
Adam e eu estamos juntos há quatro anos, casados e felizes.
No dia da nossa união, descobri que um milagre havia acontecido e
que meu tratamento de fertilidade junto à regeneração do canal em
que foi feita a vasectomia foram suficientes para me presentearem
com um bebê.
Samuel nasceu alguns meses depois do casamento e trouxe
verdadeira emoção a nós dois. Tive que lidar com as inseguranças
de Adam, seu medo do parto, mas também recebi carinho, amor e
muita dedicação. Ele foi mais do que imaginei que seria, cuidando
de mim, amando-me, falando com nosso bebê toda noite e me
fazendo sentir a mulher mais desejável do mundo, ainda que
estivesse barriguda, com pés inchados e humor terrível.
Tive que fazer uma cesariana de emergência e pedi a
Isabella que não contasse ao Adam, que aguardava na sala de
espera. Imaginem só como meu marido ficaria louco de
preocupação! No entanto, graças a Deus, tudo deu certo, e, quando
Adam pegou nosso menininho no colo a primeira vez, chorou mais
do que o bebê.
— Bom dia! — Isabella, Frank, Marina e Tony falam quase
em uníssono ao entrar na sala de jantar, onde meus tios Silvia e
Andreas, Adam e eu estamos sentados à mesa, compartilhando um
delicioso café da manhã, após as núpcias da noite passada.
Deixo de lado os pensamentos, por enquanto, pois quero
surpreender a todos com a novidade.
— Bom dia! — cumprimento-os.
— Alguém conseguiu ver o Nicholas e a Gio depois da valsa
nupcial? — minha irmã pergunta, rindo muito.
— Não — Adam responde divertido. — Os dois preferiram
uma festa mais privé...
— Adam! — repreendo-o, olhando para meus tios, que
também estão rindo com vontade. Meu pai e dona Hilda entram na
sala, cumprimentando-nos e logo engatam uma conversa com meus
tios.
— Não acha que essa é a oportunidade que nós estávamos
querendo? — Adam me indaga, e respondo que estou esperando
mamãe aparecer.
E logo minha mãe, Suzana, aparece com Mia no colo.
— Eu gostaria de um momento da atenção de vocês. —
Coloco-me em pé, e Adam segura minha mão. — Como vocês
sabem, Adam e eu estamos há algum tempo pensando em ter outro
filho. Samuel vai fazer quatro anos, e pensamos que era hora de
encher um pouco mais nossa casa de risadas. — Vejo a alegria
aparecer no rosto de cada pessoa à mesa. — Contudo, decidimos
que, desta vez, eu não iria gerar essa criança na minha barriga, mas
sim no coração.
Minha mãe já começa a chorar, e meu pai parece reter o ar.
— Mel? — Isabella me questiona sem palavras.
— Sim! — Adam responde, colocando-se de pé e me
abraçando. — Nossa família vai aumentar ainda mais. Nós vamos
adotar uma menina.
— Dio Santo! — Tia Silvia abraça minha mãe.
Olho para Adam e sorrio maravilhada com a reação de todos.
A verdade é que, enquanto Samuel crescia, a cada dia eu ficava
mais apaixonada por meu filho e mais segura de que queria mais
crianças naquele apartamento enorme.
— Não sei se consigo passar por tudo aquilo de novo,
Melissa — Adam confidenciou quando falei que queria ser mãe de
novo.
— Eu sei, também não quero. — Rolei na cama e o olhei. —
Quero dar um lar a uma criança, amá-la e gerá-la no meu coração.
Ele sorriu.
— Adoção? — Assenti. — Ah, Melissa, eu também quero
muito isso!
Então foi assim que nos candidatamos, há pouco mais de um
ano, para ser pais de uma criança que seria acolhida, amada e feliz
ao nosso lado. Entramos na fila de adoção e, como não tínhamos
nenhuma preferência, decidimos que, a primeira que entrasse em
nosso caminho, nós adotaríamos.
Conhecemos, então, uma linda garotinha de quase três anos
de idade e portadora de Síndrome de Down. Confesso a você que
me emocionei muito quando a conheci. Ela é uma menina alegre,
tão forte, cheia de lições a ensinar, com uma história de vida tão
impressionante, embora seja tão pequenininha.
Passamos a visitá-la sempre no abrigo onde estava e, a cada
visita, sentimos que não somente nós a estávamos adotando, mas
ela também nos escolhia como pais. Éramos recebidos com tanto
carinho, e, inclusive, Samuel a adorava.
Ficou penoso vê-la e ter que nos despedir dela enquanto o
processo seguia seu curso, mas, há alguns dias, recebemos a
notícia de que faltava pouco e que, assim que voltássemos da
viagem à Itália, iríamos buscá-la definitivamente.
Nossa Letícia, nossa alegria!
A comoção na mesa é geral. Tony abraça Adam, deixando-o
sem palavras, fazendo-o chorar. Marina e Isabella me perguntam a
todo momento sobre como ela é, como a encontramos e quando
poderão conhecê-la.
A gargalhada do meu marido enche a sala, e meus olhos se
enchem de lágrimas quando meu filho, que deve ter acabado de
acordar, entra na sala correndo e pula em seu colo. Adam está
exultante de felicidade e me diz que tudo isto que nos está
acontecendo é fruto do amor que sentimos um pelo outro, e eu
concordo com ele.
Temos uma família como nunca imaginamos que teríamos!
Ele me olha e vem até onde estou.
— Eu sou o homem mais afortunado do mundo por ter você,
Melissa. — Eu lhe digo que o amo, e ele me beija. Sou abraçada
pelo pescoço pelos bracinhos pequenos de Samuel, que está em
seu colo. — Eu já estava me sentindo um filho da mãe sortudo por
ter o seu amor, e agora... — Olha nosso filho. — Agora creio que
ninguém pode ter mais sorte do que eu nesta vida, pois vou poder
amar mais duas pessoas lindas e vê-las crescer e se tornar como
você!
— Eu amo você! Obrigada por ter entrado na minha vida!
— Sou eu quem tem que te agradecer todos os dias, Melissa.
— Beija-me. — Obrigado por me amar.

Fim
J. Marquesi sempre foi apaixonada por livros e, na
adolescência, descobriu seu amor pelos romances. Escreveu sua
primeira história aos 13 anos, à mão, e desde então não parou mais.
Só tomou coragem de mostrar seus escritos em 2017, tornando-se
uma das autoras bestsellers da Amazon e da Revista VEJA.
Série, Os Karamanlis
THEO, livro 1
-> Disponível em e-Book Compre aqui!
KOSTAS, livro 2
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ALEXIOS, livro 3
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MILLOS, livro 4
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QUÍMICA PERFEITA
Disponível em e-Book
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SINOPSE
Raffaello Ferrero conquistou fama e prestígio no mundo dos vinhos,
tornando-se um dos enólogos mais disputados pelas vinícolas europeias.
Obcecado por achar a química perfeita capaz de produzir um vinho perfeito,
Raffaello é informado da morte de seu único parente vivo e precisará retornar
ao Brasil, após 20 anos longe, para decidir o que fará com a herança que
nunca quis e que estava reservada ao seu amado irmão mais velho, falecido
há alguns anos.
Disposto a vender a vinícola e retornar à Europa, Raffa será surpreendido
pela notícia de que tem um sobrinho, um garoto de pouco mais de dois anos,
fruto de um relacionamento do irmão com uma ruiva de quem nunca ouviu
falar, e que só apareceu após sua morte, com o pequeno herdeiro a tiracolo.
Poderá ele confiar naquela mulher? Como impedir seu coração de se
apaixonar pelo guri tão esperto?
E a mais complexa questão: como impedir-se de sentir a química perfeita
que parece pulsar entre ele e a mãe do garoto?
Série Família Villazza

NEGÓCIO FECHADO, livro 1


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LEGALMENTE ATRAÍDO, livro 2
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SEGREDO OBSCURO, livro 3 – Parte 1
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SEGREDO OBSCURO, livro 3 – Parte 2
-> Disponível em e-Book Compre aqui!
Série Recomeço
DUAS VIDAS, livro 1
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DOIS CORAÇÕES, livro 2
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DOIS DESTINOS, livro 3
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Série, Poderoso Destino
PODEROSO DESTINO, livro 1
-> Disponível em e-Book Compre aqui!
Disponível em físico Compre aqui!
PODEROSA LIBERDADE, livro 2
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ONDA AZUL
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SINOPSE
Bernardo Novak sempre perseguiu desafios!
Surfista profissional especializado em ondas gigantes, mal sabe ele que
está prestes a viver o momento mais desafiador de sua vida.
Helena Santorini é uma dedicada assessora de casamentos. Mãe de
Heitor, um garoto apaixonado pelo mar, vê, no projeto inclusivo de surfe
WaveAccess, uma oportunidade para seu filho praticar o esporte.
O que ela não esperava era encontrar-se com Bernardo novamente e
perceber que o playboy, que conheceu há alguns anos, está tão mudado a
ponto de se conectar instantaneamente com seu filho e despertar nela
sentimentos que acreditava já não ser capaz de ter.
Embarque na jornada de Bernardo, Helena e Heitor, redescobrindo juntos
a vida e o amor.

Atenção:
1) Classificação do livro: 18+;
2) Pode conter gatilhos;
3) Contém SPOILER do livro Segredo Obscuro - da Série Família Villazza.
UM CEO DE NATAL
Disponível em e-Book
Compre aqui!
SINOPSE
Bem-vindos a Penedo, lar de verão oficial do Papai Noel!
Júlia Virtanen ama o Natal e todos os significados dele!
Descendente de finlandeses, ela trabalha com orgulho e afinco na
loja de doces de sua família, no sul do estado do Rio de Janeiro.
Sonhadora, batalhadora, apesar de ter sofrido uma grande
perda ainda criança, Júlia crê na magia do Natal... bem, talvez não a
ponto de acreditar que o "bom velhinho" atenda a um pedido fajuto,
feito por sua prima em seu nome, afinal, o que ela mais precisa é
salvar a sua loja tão especial, e não de UM CEO DE NATAL.

Atenção:
Recomendado para maiores de 18 anos;
Livro único.
UM DOCE DE NAMORADO
Disponível em e-Book
Compre aqui!
SINOPSE
Digo Virtanen conquistou a vida que sempre sonhou! Solteiro,
bonito e bem-sucedido, o confeiteiro se tornou também o garoto-
propaganda da franquia da Casa Virtanen.
Com a aproximação do Dia dos Namorados, uma
megacampanha publicitária é montada, e Digo acaba parando em
uma casa de acolhimento de idosos, onde conhece uma mulher que
mexe com ele como nenhuma outra.
Dulce Maria de Macedo é uma mulher tão doce quanto seu
nome. Diretora de um lar para idosos, ela sempre dedicou sua vida
ao próximo. Discreta, elegante e religiosa, a ex-noviça se
surpreende quando descobre que um casal de velhinhos do seu lar
foi escolhido para estrelar um comercial de TV e não só isso: uma
propaganda ao lado do intitulado "doceiro gostosão" Rodrigo
Virtanen!

Atenção:
1) Conteúdo indicado para maiores de 18 anos;
2) Contém spoiler de Um CEO de Natal.
Entre em contato com a autora em suas redes sociais:
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Wattpad | Grupo do Facebook
Gostou do livro? Compartilhe seu comentário nas redes sociais e na
Amazon indicando-o para futuros leitores. Obrigada.
[1] Nota da autora: “Não chore mais, Mel. Você é linda sorrindo!” – tradução do
italiano.
[2] Nota da revisora: em inglês, “Mysterious”, permanecendo o jogo de
palavras com o M inicial da palavra e o M da rubrica de Melissa.
[3] Nota da autora: CPO, sigla para Chief Process Officer, é um cargo de
direção dentro de uma empresa. Ele é o responsável por gerir os processos
do negócio no mais alto nível de uma organização e se reporta somente ao
CEO.
[4] Nota da autora: The Gilded Stone é o nome do negócio da família, que
significa “a pedra dourada” em inglês, um jogo de palavras entre o sobrenome
deles e a área onde atuam, joalherias.
[5] Nota da autora: avó em espanhol.
[6] Nota da autora: Não, sinto muito. Você pode repetir sua explicação, por
favor?
[7] Nota da autora: É um prazer conhecê-la...
[8] Nota da autora: de novo.
[9] Nota da autora: rascunho, em inglês.
[10] Nota da autora: almoçar, em inglês.
[11] Nota da autora: dever de casa.
[12] Nota da autora: pistas.
[13] Nota da autora: traços perfeitos de uma designer (desenhista).
[14] Nota da autora: suas regras foram feitas para serem quebradas.
[15] Nota da autora: perseguidor.
[16] Nota da autora: ditado equivalente ao nosso “se conselho fosse bom não
se dava, vendia”.
[17] Nota da autora: CCCN – Casa Cultural Cândida Novak.
[18] Nota da autora: Você me deixa louco!
[19] Nota da autora: venha aqui.
[20] Nota da autora: incrível.
[21] Nota da autora: o personagem fez a tradução literal da expressão “to
cum”, que é semelhante a gozar em português.
[22] Nota da autora: No way é uma expressão em inglês que equivale a “nem
pensar”.
[23] Nota da autora: pensando em você.
[24] Nota da autora: expressão em inglês semelhante a “que merda”.
[25] Nota da autora: expressão em inglês semelhante à “puta merda”.
[26] Nota da autora: me chupa, em inglês.
[27] Nota da autora: Não há nenhum lugar onde eu preferisse estar...
[28] Nota da autora: feliz.
[29] Nota da autora: expressão em inglês que pode ser traduzida como: “se
acalme”, “vá com calma”, “pegue leve”.
[30] Nota da autora: Yve League é um grupo formado pelas oito universidades
mais famosas e disputadas dos EUA. Harvard é uma delas.
[31] Nota da autora: expressão em espanhol equivalente a “te amo”.
[32] Nota da autora: expressão em inglês que significa “eu sou louco por você”.
[33] Nota da autora: Doenças Sexualmente Transmissíveis.
[34] Nota da autora: expressão grega para a paixão.

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