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MÓDULO 6 - CAPACIDADE DO LADO AÉREO

Cláudio Jorge Pinto Alves


(versão: 21/06/2018)

1 - INTRODUÇÃO

De 1970 a 2010 observou-se um aumento de 7% ao ano no movimento de passageiros e prevê-se,


para o período de 2010 a 2030, uma taxa de crescimento de 5,1% anuais [1]. Em função disso, o
número de atrasos (e cancelamentos) de voos, cresce significativamente, ou por falta de
capacidade em setores do espaço ou nos aeroportos, por condições meteorológicas desfavoráveis,
ou outros motivos. Em Nova Iorque, as operações cresceram 60% e os atrasos, 110%. De fato, a
capacidade de um aeroporto está associada à capacidade de cada um dos seus subsistemas e se
limita pelo "gargalo". De uma forma geral quer-se um aeroporto com sistemas balanceados, sem
ociosidades nem estrangulamentos. A capacidade está sempre associada a um nível de serviço.
Pode-se afirmar que qualquer sistema dispõe de um limite de capacidade, que corresponde a uma
condição de atraso ou desconforto inaceitável.

Em termos de pistas, a FAA trabalha com duas definições:


Capacidade Prática Horária - é o número de operações durante uma hora que corresponde a um
nível tolerável de atraso (referência de atraso médio é de 4 minutos) e
Capacidade Máxima Horária - é o número máximo de operações que o lado aéreo pode
acomodar durante uma hora quando sujeito a demanda contínua. Esta última só pode ocorrer por
pequenos intervalos de tempo, pois sua persistência tende a gerar congestionamentos e a
paralisar o tráfego.

Figura 1 – Capacidade e nível de serviço


São vários os fatores que influenciam a capacidade das pistas em aeroportos:

 Configuração e uso das pistas


 Regras e procedimentos de tráfego aéreo
 Comprimento do trecho comum de aproximação
 Condições meteorológicas
 Relação entre pousos e decolagens
 Frota de aeronaves operantes (mix)
 Características operacionais das aeronaves
 Restrições da pista (obstáculos e horizonte)
 Ocorrência de toque e arremetida
 Separação entre as aeronaves na operação

2 – MÉTODO FAA

Uma pista simples, em média, suporta cerca de 200.000 operações-ano. Num aeródromo com
pequenas aeronaves em condições visuais favoráveis (VMC) uma pista simples atende até 99
operações por hora, Caindo para 60 quando as aeronaves são de grande porte. Condições
instrumentais de operação (IMC) fazem a capacidade cair para 42 a 53 operações por hora.

A Advisory Circular 150/5060-5 de 1983 [2], no site www.faa.gov disponibiliza uma versão com
correções até janeiro de 1995. É recomendado seu uso para o estágio de planejamento. Esse
documento dispõe de 5 capítulos:

( a ) Chapter 1 - traz algumas definições e termos associados à capacidade.


( b ) Chapter 2 – explicita a modelagem para cálculo de capacidade e atrasos para o
planejamento de longo prazo, considerando uma situação comumente encontrada em aeroportos
norte-americanos.
( c ) Chapter 3 – contém instruções para cálculo de capacidade horária, volume de serviço
anual e atrasos para uma ampla gama de configurações e situações de operação.
( d ) Chapter 4 – traz instruções para cálculo de capacidade em situações especiais:
condições meteorológicas desfavoráveis, ausência de cobertura radar/ILS e aeroportos com pista
restrita a pequenas aeronaves.
( e ) Chapter 5 – identifica alguns programas computacionais que calculam capacidade.

Nos seus apêndices estão relatados exemplos de aplicação. Muitas tabelas estão disponíveis,
principalmente nos capítulos 2, 3 e 4, para subsidiar os cálculos necessários.

Cálculo do Índice-Mix

Para o modelo da FAA são consideradas as seguintes classes de aeronaves:


 Tipo A - pequenos monomotores pesando até 5.700 kg
 Tipo B - pequenos bimotores pesando até 5.700 kg
 Tipo C - aeronaves entre 5.700 e 136.000 kg (inclui B737, A320, E145, E190 etc)
 Tipo D - aeronaves pesando mais de 136.000 kg (inclui A330, B747 etc)

O valor do Índice–Mix é obtido através da expressão: Indice-mix = % C + 3 x % D

Isto é, o peso da porcentagem de grandes aeronaves é muito significativo, enquanto que


aeronaves do tipo A e B representam um mesmo nível de solicitação da pista e inferior às
aeronaves maiores.
São hipóteses da modelagem:

 Os valores se baseiam nas regras e práticas de controle de tráfego aéreo observadas nos
aeroportos norte-americanos
 Porcentagens iguais de chegadas e partidas
 Saídas e acessos de pista suficientes e sem cruzamentos
 Porcentagens de toque e arremetida conforme Tabela 1
 Espaço aéreo sem limitações
 Pelo menos uma pista equipada com ILS
 Para o cálculo anual considera-se 10% do tempo em operação VFR

Tabela 1 – Hipóteses Intrínsecas [2]

% Toque e
Índice-mix X* Y**
arremetida
0-20 0-50 290 9
21-50 0-40 300 10
51-80 0-20 310 11
81-120 0 320 12
121-180 0 350 14
X* - razão entre demanda anual e demanda média diária (do mês pico)
Y** - razão entre demanda média diária e demanda média de hora-pico (do mês pico)

Assim, identificando-se o Índice-Mix e a configuração que melhor se ajusta às especificadas temos


os valores fornecidos pelo modelo. A Tabela 2 traz um extrato com as configurações existentes no
Brasil.

Para avaliação de espera (atrasos) pode ser utilizada a Figura 2 que fornece uma estimativa da
espera por aeronave baseado na razão entre a demanda anual e o volume de serviço (capacidade
anual). Multiplicando-se o valor da espera por aeronave pela demanda anual obtêm-se a estimativa
de total de atraso anual. Adota-se a porção superior da banda quando domina a operação de
operações da Aviação Comercial Regular. A parte inferior refere a situações onde a Aviação Geral
é dominante.
Tabela 2 – Capacidades Fornecidas [2]

Configuração Índice-Mix VFR IFR Vol. Anual


0 a 20 98 59 230.000
21 a 50 74 57 195.000
Pista Única 51 a 80 63 56 205.000
81 a 120 55 53 210.000
121 a 130 51 50 240.000
Pista Paralela 0 a 20 197 59 355.000
21 a 50 145 57 275.000
Separadas de 210 e 750 m 51 a 80 121 56 260.000
81 a 120 105 59 285.000
121 a 130 94 60 340.000
Pista Paralela 0 a 20 197 62 355.000
21 a 50 149 63 285.000
Separadas de 750 e 1030 m 51 a 80 126 65 275.000
81 a 120 105 70 300.000
121 a 130 103 75 365.000
Pista Paralela 0 a 20 197 119 370.000
21 a 50 149 113 320.000
Separadas De mais de 1030 m 51 a 80 126 111 305.000
81 a 120 105 105 315.000
121 a 130 103 99 370.000
0 a 20 98 59 230.000
21 a 50 77 57 200.000
Cruzadas 51 a 80 77 56 215.000
81 a 120 76 59 225.000
121 a 130 72 60 265.000
0 a 20 150 59 270.000
21 a 50 108 57 225.000
Em V aberto 51 a 80 85 56 220.000
81 a 120 77 59 225.000
121 a 130 73 60 265.000
Figura 2 – Estimativa de atraso [2]

Estão disponíveis ainda os custos decorrentes pela espera. Na Tabela 3 estão reveladas as
estimativas para custos com tripulação, combustível e manutenção, para operadores da aviação
comercial (regular ou táxi aéreo) e, os custos de combustível e manutenção, para os operadores
da aviação geral (geral).

No capítulo 3 (Chapter 3) desse mesmo documento é apresentado o procedimento para avaliação


da capacidade de pista e de atraso. São 62 figuras contendo valores de capacidade básica, fator
de saída e toque e arremetida. O procedimento é:
 Selecionar a configuração de pista e identificar as figuras a serem consultadas
 Consultando a figura apropriada para obtenção da capacidade ou do atraso, baseado no
Índice-Mix e na porcentagem de chegada obter o C*, o T e o Fator de Saída (E).
 O cálculo da capacidade corresponde ao produto de C* por T e por E.

Situações mais específicas e cálculos de capacidade de pátios e pistas de taxiamento, com


exemplos, são abordadas nos capítulos seguintes da referida AC.
Tabela 3 – Custos Associados a Atrasos [2]

Aeronave USD/minuto
Classe A - 1 motor 1-3 assentos 0,60
+ 4 assentos (geral) 1,00
Até 12.500 lb + 4 assentos (regular) 1,80
Classe B - + 1 motor 2 / pistão (geral) 2,50
2 / pistão (táxi) 3,70
Até 12.500 lb 2 / turbina (geral) 5,20
2 / turbina (táxi) 6,80
Classe C Motor pistão (geral) 2,80
Motor pistão (táxi) 4,00
De 12.500 a 300.000 lb Motor pistão (regular) 2,90
2 / turbina (geral) 5,60
2 / turbina (táxi) 7,30
2 / turbina (regular) 6,60
4 / turbina (regular) 15,10
2 / jato (geral) 13,60
2 / jato (táxi) 16,80
2 / jato (regular) 22,00
3 / jato (regular) 31,40
4 / jato (regular) 35,50
Classe D 2 / jato (regular) 39,00
3 / jato (regular) 57,60
+ 300.000 lb 4 / jato (regular) 79,30
Pistão (geral) 1,40
Pistão (táxi) 2,30
Helicópteros Turbina (geral) 3,30
Turbina (táxi) 4,40

3 – MODELAGEM ANALÍTICA

O estudo de capacidade pode ser feito através de modelos analíticos baseados na representação
gráfica das trajetórias das aeronaves durante procedimentos de pouso e decolagem, os diagramas
espaço-tempo. A capacidade é formulada como o inverso do tempo médio de serviço das
aeronaves que se movimentaram na pista. O tempo médio desse serviço na pista é definido pelo
maior dos dois valores: a separação no ar em termos de tempo ou o tempo de ocupação da pista.
Considerando o caso mais simples de uma pista dedicada apenas a pousos, sob condições de
demanda contínua e não levando em conta as possibilidades de ocorrência de erros por parte de
pilotos e controladores de vôo, o tempo de ocupação de pista por uma aeronave pode ser obtido
pela diferença entre os tempos de passagem pela cabeceira da pista de uma aeronave líder i e
outra seguidora j. As aeronaves que compõem a frota operante na pista podem ser agrupadas em
classes discretas de velocidades de aproximação Vi, Vj, etc. O tempo médio de serviço ponderado
pelas classes de aeronaves pode ser obtido através de uma matriz Mij, de separações entre
aeronaves que chegam à cabeceira da pista e das porcentagens de participação Pij, das classes
de aeronaves na frota. O valor esperado do tempo médio de serviço ponderado entre as classes
de aeronaves da frota E[Tij] é o somatório entre os produtos de Pij e de Mij. Esses modelos
determinam o número máximo de operações que um sistema de pistas pode acomodar num
intervalo de tempo específico quando há demanda contínua de serviço. Nestes modelos o valor da
capacidade pode ser traduzido pelo inverso da média do tempo de serviço para todas as
aeronaves e tratam do corredor de aproximação em conjunto com a pista, formando o sistema
pista. Janic mostra em [5] uma abordagem muito interessante de avaliação de capacidade dos
diversos subsistemas do Transporte Aéreo. De forma geral o tempo de ocupação de uma pista na
decolagem varia de 30 segundos (pequenas aeronaves) a 60 segundos (grandes aeronaves). Já o
tempo de ocupação no pouso depende das velocidades e do porte das aeronaves líder e
seguidora. Essas separações variam de país para país. Para decolagens, numa pista simples, a
separação oscila de 45 a 120 segundos. Para o pouso a variação é de 3 a 7 milhas náuticas. Em
rota, no Brasil, utilizam-se os mínimos, no caso de separação radar, mostrados na Tabela 4.

Tabela 4 – Separações-Radar [4]

No Brasil o cálculo da capacidade da pista é efetuado pelo Centro de Gerenciamento de


Navegação Aérea (CGNA) através de uma metodologia descrita no MCA 100-14 [6]. No sítio
www.cgna.gov.br, considerando as condições locais de cada aeroporto, é revelado o valor adotado
como sendo o da capacidade horária de pista. O gerenciamento do fluxo de tráfego aéreo leva em
consideração esse valor no planejamento e monitoramento dos voos.

4 – SIMULAÇÃO

Muitos são os modelos desenvolvidos que utilizam técnicas de simulação que buscam retratar as
operações de uma pista e quantificar sua capacidade e identificar suas limitações. O Simulation
Model (SIMMOD) é um dos modelos mais utilizados no Brasil. O Airfield Delay Simulation Model
(ADSIM) é um modelo de simulação por eventos discretos que calcula tempos de viagem, atrasos
e fluxos de operação. O Runway Exit Interactive Design Module (REDIM), um software free, está
sendo testado no ITA para verificar sua eficácia no cálculo de capacidades de pista. Outros
modelos como o Reorganised ATC Mathematical Simulator (RAMS), também está sendo estudado
no ITA mais diretamente quanto à capacidade do espaço aéreo e o TAAM, um programa de custo
bastante elevado, tem sido empregado por especialistas no Brasil. Muito citado na literatura, o
ARENA, um pacote de aplicação mais geral, tem sido estudado mais para simulação do lado
terrestre de aeroportos (por exemplo: terminais de carga, estacionamento de veículos e terminais
de passageiros).
Referências

 [1] Ashford, N. et al (2013). Airport Operations. Elsevier.


 [2] Federal Aviation Administration (1983). Airport capacity and delay. (AC 150/5060-5).
Washington (versão 1995)
 [3] Horonjeff, R et al (2010). Planning and design airports. 4th ed. McGraw-Hill
 [4] Ministério da Defesa (2013). Regras do ar. (ICA 100-12) Brasília
 [5] Janic, Milan (2000). Air transport system analysis and modelling: capacity, quality of
services and economics. Gordon and Breach Science Publishers, UK
 [6] Ministério da Defesa (2009). Capacidade do sistema de pistas. (MCA 100-14). Brasília

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