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► Discurso político

O discurso político, sendo um texto argumentativo, é fortemente persuasivo e alicerçado em


pontos de vista de um emissor que mobiliza informação objetiva.
Tão antigo quanto a vida do ser humano em sociedade, o discurso político tem a sua origem na
retórica (arte de bem argumentar) e na oratória (arte da eloquência), tendo sido, desde o início,
orientado para convencer o povo.

Exemplo de discurso político

Sobre a Morte de Martin Luther King

Tenho más notícias a dar-vos, a todos os nossos concidadãos e a todas as pessoas que
desejam a paz em todo o mundo: Martin Luther King foi morto a tiro esta noite.
Martin Luther King dedicou a sua vida ao amor e à justiça entre seres humanos, e morreu
por essa causa. Neste dia difícil, nestes tempos difíceis para os Estados Unidos, talvez faça sentido
perguntar que tipo de nação somos nós e que direção queremos tomar. Aqueles de vós que são
negros – tendo em conta as provas evidentes de que houve pessoas brancas que foram
responsáveis – podem estar cheios de amargura, de ódio e de um desejo de vingança. Podemos
seguir nessa direção enquanto país, a da grande polarização: negros entre negros e brancos entre
brancos, cheios de ódio uns pelos outros.
Ou então podemos fazer um esforço, tal como fez Martin Luther King, por compreender e
aceitar, e por substituir essa violência, esse derramamento de sangue que tem manchado a nossa
terra, por um esforço para compreender com compaixão e com amor.
Àqueles de vós que são negros e que se sentem tentados a encher-se de ódio e de
desconfiança contra todos os brancos perante a injustiça de tais atos, eu posso apenas dizer que
tenho o mesmo sentimento no meu coração. Um membro da minha família foi morto, mas foi
morto por um homem branco. Mas temos de fazer um esforço nos Estados Unidos. Temos de
fazer um esforço para compreender e para ultrapassar estes tempos realmente difíceis.
O meu poeta preferido é Ésquilo. Ele escreveu: “Durante o nosso sono, uma dor que não se
pode esquecer cai gota a gota sobre o coração, até que, no nosso próprio desespero, contra a
nossa vontade, a sabedoria chega pela terrível graça de Deus.”
Aquilo de que precisamos nos Estados Unidos não é de divisão. Aquilo de que precisamos
nos Estados Unidos não é de ódio. Aquilo de que precisamos nos Estados Unidos não é de
violência e de criminalidade, mas de amor e de sabedoria, e de ter compaixão uns pelos outros, e
de uma vontade de justiça para com os que ainda sofrem dentro do nosso país, sejam eles brancos
ou negros.
Por isso peço-vos que esta noite regressem a casa e que façam uma oração pela família de
Martin Luther King, sim, mas, mais do que isso, que façam uma oração pelo nosso país, que todos
nós amamos; uma oração pelo entendimento e pela compaixão de que vos falei.
Podemos sair-nos bem neste país. Atravessaremos tempos difíceis; atravessámos tempos
difíceis no passado; atravessaremos tempos difíceis no futuro. Este não é o fim da violência, não é
o fim da criminalidade, não é o fim da desordem.
Mas a grande maioria das pessoas brancas e a grande maioria das pessoas negras querem
viver juntas, querem melhorar a qualidade de vida de todos nós, e querem justiça para todos os
seres humanos que habitam a nossa terra.
Vamos dedicar-nos ao que os gregos escreveram há tantos anos: a amansar a selvajaria do
Homem e a tornar suave a vida neste mundo.
Vamos dedicar-nos a isso, e fazer uma oração pelo nosso país e pelo nosso povo.
Robert Kennedy, “Sobre a Morte de Martin Luther King” (April 4, 1968), in Ripples of Hope: Great American Civil Rights Speeches
(tradução de Amândio Reis), Basic Civitas Books, 2003
Estrutura

A estrutura deste género textual é de natureza essencialmente argumentativa.

• Introdução:
› Informação sobre a trágica morte de Martin Luther King, recordando a sua luta e
mostrando que a sua morte pode levar à reflexão da nação.

• Desenvolvimento:
› Apresentação dos argumentos a favor da rejeição da violência, ultrapassando questões
raciais. Para credibilizar o seu argumento, recorre ao exemplo do seu irmão, J. F. Kennedy,
assassinado por um homem branco. Ao invés de usar um argumento de autoridade, o autor optou
por se referir ao assassinato de J. F. Kennedy como “Um membro da minha família”, mostrando
compaixão.
› Recurso ao exemplo de Ésquilo, enquanto prova viva da atualidade das suas palavras
naquele contexto em concreto, visto que o país não precisava de mais ódio.
› Exposição, de forma credível, dos seus argumentos, mobilizando exemplos que atestam a
pertinência das suas palavras, envolvendo o público e convidando-o a partilhar das suas ideias.

• Conclusão:
› Reiteração da sua convicção de que é possível alterar a consciência cívica mediante o
envolvimento de todos na luta contra o racismo e contra o ódio, daí o recurso ao paralelismo nos
parágrafos finais, como forma de vincar essa crença na possibilidade de aprender com o passado e
de construir um futuro melhor.

Marcas de género específicas:

Carácter persuasivo
• Defesa de um ponto de vista contra a violência, através de informação seletiva e percetível, com
um certo grau de sofisticação na mobilização de dados históricos e procedimentos retóricos
complexos, apresentando dois caminhos (o do ódio ou o da compaixão), para concluir que, afinal,
só há um caminho possível. A intencionalidade persuasiva e a diversidade de níveis de sentido são
eficazes no objetivo de provar a dimensão humanista da mensagem veiculada.
Informação seletiva
• Seleção de dados objetivos, que provam que há motivos para que haja divisão racial nos EUA,
mas que um país não sobrevive com esta tensão racial.

Capacidade de expor e argumentar


• O texto revela uma estrutura cuidada, parágrafos bem definidos e uma evidente progressão
expositivo-argumentativa, com sequências bem delimitadas, nas quais é evidente o cruzamento
de diferentes planos temporais e culturais, nomeadamente a leitura do presente com base nos
filósofos gregos. São mobilizados argumentos e contra-argumentos pertinentes.

Dimensão ética e social


• Preocupação evidentemente humanista, procurando desenvolver o sentido de cidadania através
da promoção da compaixão e do amor fraterno, de modo a que um país que já enfrentou tempos
difíceis possa caminhar para um futuro mais justo.
Eloquência
• Recurso a um vocabulário expressivamente rico, embora acessível, marcado por mecanismos de
reiteração lexical (“Atravessaremos”, “atravessámos”, “atravessaremos”) que veiculam a
informação com notória fluência.

Nota
• Após a análise deste discurso político, conclui-se que apresenta as marcas específicas de género:
possui um carácter persuasivo na defesa de um ponto de vista, através de informação seletiva
eficaz, expondo uma argumentação clara e objetiva. A dimensão ética e social está em evidência
na apologia humanista feita com recurso a um tom eloquente que reforça a intencionalidade
deste género textual.

► Debate

Caracterização

Género textual oral que consiste na discussão de um tema através da apresentação de diferentes
pontos de vista, com a apresentação de informação significativa e pretendendo esclarecer o
público.

• Defesa das ideias de forma clara, recorrendo a argumentos convincentes, sem esquecer o
respeito pelo princípio da cortesia.

• Preparação cuidada das intervenções, com reflexão sobre os seus argumentos e exemplos.

• Pode apresentar a seguinte estrutura:


› sequência de abertura com a apresentação dos intervenientes;
› apresentação de argumentos válidos e de exemplos significativos;
› conclusão que pode não ser fechada, isto é, pode apontar para diálogos futuros.

Marcas de género específicas:

• Carácter persuasivo.

• Papéis e funções dos intervenientes.

• Capacidade de argumentar e contra-argumentar.

• Concisão das intervenções e respeito pelo princípio da cortesia.

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